análise da constitucionalidade da taxa de limpeza pública e da taxa de coleta de lixo

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1 Análise da Constitucionalidade da Taxa de Limpeza Pública e da Taxa de Coleta de Lixo Jéssica Rêgo da Silva (e-mail: [email protected]) Estudante de Direito Universidade Federal de Campina Grande Centro de Ciências Jurídicas e Sociais Campus de Sousa - (083) 9666.5746 Mirele Queiroga de Oliveira (e-mail: [email protected]) Estudante de Direito Universidade Federal de Campina Grande Centro de Ciências Jurídicas e Sociais Campus de Sousa - (083) 9343.6093 RESUMO O presente artigo tem por intuito basilar tratar sobre a temática tributária da constitucionalidade e inconstitucionalidade das taxas de lixo domiciliar e taxa de limpeza pública, respectivamente, analisando, por sua vez, se há legalidade na cobrança das mesmas, sempre se utilizando como fundamento e base o estudo doutrinário, a jurisprudência dominante e os requisitos legais da cobrança legal dos referidos tributos. Palavras chave: Taxa de coleta domiciliar de lixo. Taxa de limpeza pública. Constitucionalidade. Inconstitucionalidade. Tributação. Área temática: Direito Direito Tributário. 1 INTRODUÇÃO O direito tributário é o ramo do direito que rege as relações jurídicas entre o Estado e o contribuinte, no que diz respeito à arrecadação, fiscalização e extinção do tributo. Todavia, o Estado só pode realizar esta atividade tributária em relação ao contribuinte, mediante lei. Dito isto, busca-se analisar as bases e requisitos legais para a cobrança de taxas que geram controvérsias no decorrer de sua aplicação, no caso em questão, as taxas de lixo domiciliar e taxas de limpeza pública. Para que se possa determinar a legalidade da cobrança das referidas taxas, faz-se mister, a priori, conceituá-las, determinar os requisitos essenciais para a

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Direito Tributário

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    Anlise da Constitucionalidade da Taxa de Limpeza Pblica e da Taxa de

    Coleta de Lixo

    Jssica Rgo da Silva (e-mail: [email protected])

    Estudante de Direito Universidade Federal de Campina Grande Centro de

    Cincias Jurdicas e Sociais Campus de Sousa - (083) 9666.5746

    Mirele Queiroga de Oliveira (e-mail: [email protected])

    Estudante de Direito Universidade Federal de Campina Grande Centro de

    Cincias Jurdicas e Sociais Campus de Sousa - (083) 9343.6093

    RESUMO

    O presente artigo tem por intuito basilar tratar sobre a temtica tributria da constitucionalidade e inconstitucionalidade das taxas de lixo domiciliar e taxa de limpeza pblica, respectivamente, analisando, por sua vez, se h legalidade na cobrana das mesmas, sempre se utilizando como fundamento e base o estudo doutrinrio, a jurisprudncia dominante e os requisitos legais da cobrana legal dos referidos tributos.

    Palavras chave: Taxa de coleta domiciliar de lixo. Taxa de limpeza pblica.

    Constitucionalidade. Inconstitucionalidade. Tributao.

    rea temtica: Direito Direito Tributrio.

    1 INTRODUO

    O direito tributrio o ramo do direito que rege as relaes jurdicas entre o

    Estado e o contribuinte, no que diz respeito arrecadao, fiscalizao e extino

    do tributo. Todavia, o Estado s pode realizar esta atividade tributria em relao ao

    contribuinte, mediante lei. Dito isto, busca-se analisar as bases e requisitos legais

    para a cobrana de taxas que geram controvrsias no decorrer de sua aplicao, no

    caso em questo, as taxas de lixo domiciliar e taxas de limpeza pblica.

    Para que se possa determinar a legalidade da cobrana das referidas taxas,

    faz-se mister, a priori, conceitu-las, determinar os requisitos essenciais para a

  • 2

    classificao das mesmas, bem como analisar o entendimento dos Tribunais em

    relao a este tributo.

    Muito se discute em relao cobrana dessas taxas e os motivos que

    respaldam o fato de uma ser considerada constitucional e a outra no. Tenta-se, no

    referido trabalho, esclarecer essa distino, levando-se em conta que algumas

    localidades cobram este tributo de forma indevida ou de forma imprpria,

    prejudicando por sua vez, o contribuinte, maior interessado por ser o usurio dos

    servios prestados.

    2 CONCEITUAO DA TAXA E DISPOSIES LEGAIS

    Para a realizao de uma anlise quanto constitucionalidade da taxa de lixo

    e da taxa de limpeza pblica faz-se necessrio, primeiramente, a explanao acerca

    do que seria propriamente taxa, bem como a sua previso legal.

    Nesse sentido, pode-se aferir, segundo a Constituio Federal de 1988, que:

    A Unio, os Estados, o Distrito Federal e os Municpios podero instituir os seguintes tributos: II - taxas, em razo do exerccio do poder de polcia ou pela utilizao, efetiva ou potencial, de servios pblicos especficos e divisveis, prestados ao contribuinte ou postos a sua disposio (CF/88, art. 145, caput, II).

    notvel que o dispositivo legal refere-se a dois tipos de taxas, aquele

    proeminente do poder de polcia estatal e o cobrado pela prestao de servios

    pblicos. Sendo o primeiro fundamentado no princpio da supremacia do interesse

    pblico sobre o interesse privado, e o segundo trata da remunerao de um servio

    pblico que seja especfico, de modo que o contribuinte tenha conhecimento do

    servio que est pagando, e seja ainda, divisvel, uma vez que possvel ao Estado

    a identificao dos usurios do determinado servio custeado.

    Para a presente anlise pouco importa a espcie taxa de polcia, devendo-se

    ater a taxa de servio. Assim, para que fique claro, a taxa de servio, harmnico com

    o raciocnio de Ricardo Alexandre (2012, p.28), aquela em que possibilita tanto ao

    Estado como ao contribuinte o emprego da seguinte frase: Eu te vejo e tu me vs.

    Trata-se de o Estado v o contribuinte/usurio referente a certo servio, e o

    contribuinte v o servio no qual o Estado est prestando.

  • 3

    Destarte, no se pode deixar de elucidar sobre o conceito de taxa em seu

    sentido amplo, assim como diferenci-la do imposto, que dentre a definio de

    tantos doutrinadores, tm-se de forma dinmica o pensamento do tributarista Paulo

    de Barros Carvalho:

    Taxas so tributos que se caracterizam por apresentarem, na hiptese da norma, a descrio de um fato revelador de uma atividade estatal, direta e especificadamente dirigida ao contribuinte. Nisso diferem dos impostos, e a anlise de suas bases de clculo dever exibir, forosamente, a medida da intensidade da participao do Estado (CARVALHO, 2009, p. 38-39).

    .

    Taxa e impostos constituem espcies distintas, de modo que os impostos so

    tributos no vinculados incidentes sobre a manifestao de riqueza dos

    contribuintes, na busca por recursos que financiem o Estado na sua execuo do

    bem comum. Enquanto que as taxas, como j observado, reportam-se a um

    determinado servio.

    Outra valiosa distino que se faz necessrio explorar, entre taxa e tarifa,

    ambos esto ligados contraprestao entre Estado e contribuinte. Entretanto, a

    taxa submetida ao regime jurdico tributrio de Direito Pblico, enquanto que a

    tarifa submete-se ao regime contratual de Direito Privado. Portanto, a taxa explora

    uma prestao pecuniria compulsria e a tarifa uma prestao pecuniria

    facultativa.

    Observa-se que as taxas podem ser cobradas ao contribuinte mesmo que

    este no utilize efetivamente o servio especfico, desde que sejam servios

    definidos em lei como de utilizao compulsria, isto , admitida a cobrana pela

    modesta utilizao potencial.

    Logo, para a instituio de taxa, deve o legislador previamente analisar se o

    servio ultrapassa o interesse individual. Pois se a faculdade de no utilizar o dado

    servio reverter-se prejudicial para a coletividade, a taxa poder ser cobrada j que

    se trata de um servido de utilizao compulsria. A ttulo de exemplo, podemos citar

    um dos objetos do presente estudo, que ser analisado posteriormente, a taxa de

    coleta de lixo. Na opo do particular no utilizar o servio de coleta de lixo, sero

    atingidas a higiene e a sade pblica da coletividade, ento, constituindo caracteres

    prejudiciais ao interesse pblico, a taxa desse servio deve ser cobrada sem livre

    manifestao do particular, pela sua mera potencialidade de utilizao, encontrando-

    se o servio ao seu dispor.

  • 4

    3 CONSTITUCIONALIDADE DA TAXA DE LIXO

    Para abordar acerca da constitucionalidade da taxa de lixo, faz-se necessrio

    estabelecer algumas consideraes iniciais. de conhecimento que para

    proprietrios de imveis, ou at mesmo pessoas que possuam o domnio ou a

    posse, existe a obrigao do adimplemento do Imposto Predial e Territorial Urbano,

    o famoso IPTU. Alm deste imposto, os municpios veem cobrando a Taxa de

    Limpeza Urbana, ou taxa de coleta de lixo, contudo, os questionamentos sobre a

    constitucionalidade da taxa de lixo tornaram-se polmicos no universo tributrio.

    Primeiramente, analisemos se a coleta de lixo enquadra-se em um servio de

    utilizao compulsria. Ora, se o particular tem a sua disposio o servio de coleta

    domiciliar de lixo, ou ainda, caso estiver com seu imvel fechado, no utilize tal

    servio de coleta, deve em um ou em outro caso, pagar imperativamente a

    respectiva taxa, afinal o que importar ser a disposio de tal servio, em que o

    particular no poder recusar-se, pois implicaria em atributo prejudicial

    coletividade. Sendo assim, a vontade do contribuinte irrelevante e constatada a

    compulsoriedade. O que afirma que o servio de coleta de lixo de utilizao

    compulsria.

    Em segundo ponto, observemos se tal servio pode ser cobrado mediante

    taxa. Para que isso ocorra, deve este ser um servio alm de especfico, ser

    divisvel. Para calcular o valor da taxa de lixo referente a cada imvel, o que o torna

    um servio divisvel, os Municpios tm como base a rea do imvel, isto , utilizam-

    se da mesma base de clculo do Imposto Predial e Territorial Urbano (IPTU).

    H quem defenda que tal forma de clculo viola o art.145 da Constituio

    Federal de 1988, em sentido diverso o Ministro Carlos Velloso preceituou em seu

    voto no julgamento acerca do tema:

    Numa outra perspectiva, deve-se entender que o clculo da taxa de lixo, com base no custo do servio dividido proporcionalmente s reas construdas dos imveis, forma de realizao da isonomia tributria, que resulta na justia tributria (CF, art. 150,II). que a presuno no sentido de que o imvel de maior rea produzir mais lixo do que o imvel menor. O lixo produzido, por exemplo, por imvel com mil metros quadrados de rea construda, ser maior do que o lixo produzido por imvel de cem metros quadrados. A previso razovel e, de certa forma, realiza tambm o princpio da capacidade contributiva do art.145, 1., da C.F., que, sem embarao de ter como destinatria (sic) os impostos, nada impede que

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    possa aplicar-se, na medida do possvel, s taxas. (RE 232.393/SP. DJ 05.04.2002,p.55).

    1

    Tempos depois, em nova composio do Supremo Tribunal Federal, caso

    semelhante foi julgado, impulsionando a edio, proposta por Ricardo Lewandowski,

    da STF- Smula Vinculante 29 constitucional a adoo no clculo do valor de

    taxa de um ou mais elementos da base de clculo prpria de determinado imposto,

    desde que no haja integral identidade entre uma base e outra.

    Diante dessas assertivas, no resta dvidas de que o uso da base de clculo

    do IPTU para o clculo do valor da taxa de lixo seja constitucional, alm de atender

    os princpios de isonomia tributria e da capacidade contributiva.

    vista disso, j foi constatado que a taxa de coleta de lixo constitui um

    servio de utilizao compulsria, objeto das taxas. Podendo ser cobrado por

    intermdio de taxas, devido seu carter especfico, pois se trata de um servio

    visvel sob a ptica do contribuinte que sabe pelo que est pagando, e divisvel, em

    que tem seu valor calculado proporcional rea construda do imvel. Tal juzo

    reconhecido pelo julgado do STJ:

    EMENTA: (...) TAXA DE COLETA DE LIXO E TAXA DE COLETA DE LIXO E DE LIMPEZA PBLICA (...) I legtima a cobrana da Taxa de Coleta de Lixo (...), consoante firme e reiterada jurisprudncia dessa Corte, porquanto em tal exao encontram-se presentes os requisitos de divisibilidade e especificidade (arts. 77 e 78 do CTN). (REsp 137.013/RS, 1 T. j. 07-11-1996).

    2

    E por fim, para que no gere incertezas quanto constitucionalidade da

    cobrana da taxa de coleta de lixo, o STF editou a Smula Vinculante 19 A taxa

    cobrada exclusivamente em razo dos servios pblicos de coleta, remoo e

    tratamento ou destinao de lixo ou resduos provenientes de imveis, no viola o

    artigo 145, II, da Constituio Federal. Nota-se o uso do termo exclusivamente

    para deixar claro que o presente texto sumular refere-se taxa de coleta domiciliar

    de lixo, excluindo os servios que sejam de natureza indivisvel e/ou gerais, como a

    limpeza de logradouros pblicos.

    1 STF, Tribunal Pleno, RE 232.393/SP, Rel. Min. Carlos Velloso, j.12.08.1999, DJ 05.04.2002,p.55

    2 REsp 137.013/RS, 1 T., rel. Min. Jos Delgado, j. 07-11-1996

  • 6

    4 INCONSTITUCIONALIDADE DA TAXA DE LIMPEZA PBLICA

    Antes de adentrar no cerne da questo, preciso a priori, retomar a fazer

    algumas consideraes entre taxas e impostos. De acordo com o Cdigo Tributrio

    Nacional, tem-se que tributo :

    Toda prestao pecuniria compulsria, em moeda ou cujo valor nela se possa exprimir, que no constitua sano de ato ilcito, instituda em lei e cobrada mediante atividade administrativa plenamente vinculada (CTN, art. 3, caput).

    Dentre as espcies de tributo, tm-se as taxas e os impostos, onde taxas,

    como dito anteriormente, so tributos que tm como fato gerador o exerccio regular

    do poder de polcia, ou a utilizao, efetiva ou potencial, de servio pblico

    especfico e divisvel, prestado ao contribuinte ou posto sua disposio (CTN, art.

    77, caput) e impostos so tributos cuja obrigao tem por fato gerador uma situao

    independente de qualquer atividade estatal especfica, relativa ao contribuinte

    (CTN, art. 16, caput).

    Destarte, diante do exposto pelo artigo, entende-se que as taxas s podem

    ser cobradas mediante o poder de polcia (exerce uma fiscalizao especfica) ou

    em virtude de servio pblico. Todavia, somente o servio pblico, caracterizado por

    ser divisvel e especfico, pode ser tributado por taxas, visto que o que caracteriza a

    taxa a especialidade quanto ao servio prestado, bem como a singularidade

    quanto ao indivduo beneficiado, em consonncia com o art. 79, II e III do Cdigo

    Tributrio Nacional, que impe estes requisitos para que a mesma seja dita

    constitucional.

    A taxa de limpeza pblica, tendo em vista ser geradora de um servio

    indivisvel e inespecfico, no podendo ser particularizado a cada contribuinte, uma

    vez que a limpeza de vias pblicas atende a coletividade, de forma genrica, no

    possui os requisitos da lei, sendo por sua vez, considerada inconstitucional.

    4.1 Ausncia do requisito Divisibilidade e Especialidade

    notvel que as taxas de limpeza pblica no atendem aos requisitos de

    divisibilidade e especialidade exigidos por lei para serem constitucionais. Para

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    esclarecer o exposto, faz-se mister explicitar as conceituaes e peculiaridades de

    ambos os requisitos, no que tange a sua atuao abstrata no servio pblico.

    Servio especfico e divisvel ou servios uti singli ou individuais so os que tm usurios determinados e utilizao particular e mensurvel para cada destinatrio, como ocorre com o telefone, a gua e a energia eltrica domiciliares. Esses servios desde que implantados, geram direito subjetivo sua obteno para todos os administrados que se encontrem na rea de sua prestao ou fornecimento e satisfaam as exigncias regulamentares (MEIRELLES 2007, p. 314).

    Assim, o servio pblico especfico aquele que pode ser destacado em

    partes autnomas, possibilitando a identificao do sujeito passivo da tributao ou

    mesmo discriminar o usurio do servio (SABBAG, 2010).

    Por outro lado, o servio pblico geral indivisvel, no podendo ser medido

    no que tange a sua utilizao.

    Servios gerais ou uti universi so aqueles que a Administrao presta sem ter usurios determinados, para atender coletividade no seu todo, como os de polcia, iluminao pblica, calamento e outros dessa espcie. Esses servios satisfazem indiscriminadamente a populao, sem que se erijam em direito subjetivo de qualquer administrado sua obteno para seu domiclio, para sua rua ou para seu bairro (MEIRELLES, 2007, p. 314).

    Dito isto, nota-se que a limpeza pblica classificada como um servio

    pblico geral, j que atende aos interesses da coletividade, tantos queles

    indivduos que residem em determinada localidade, como tambm queles que

    esto apenas em trnsito. Essa indivisibilidade do servio prestado pela limpeza

    pblica torna impossvel de determinar a quantidade do valor do servio prestado a

    cada sujeito beneficiado.

    Est explcito na nossa Carta Maior que os Entes da federao podero

    instituir taxas de servios pblicos especficos e divisveis, prestados ao contribuinte

    ou postos a sua disposio (CF/88, art. 145, II). perceptvel que a limpeza pblica

    no corrobora com esses requisitos, tampouco podendo se encaixar nesse contexto,

    sendo assim, considerada inconstitucional e de cobrana ilegtima, no podendo ser

    custeado por meio de taxas.

  • 8

    4.2 Base de Clculo Imprpria

    A base de clculo desempenha a funo de determinar a grandeza a ser

    tributada, e consequentemente, apurar o referido montante.

    Base de clculo a expresso econmica do fato gerador do tributo. H de estar contida na norma que descreve a hiptese de incidncia tributria. Assim, quando a lei institui um tributo, h de se referir a uma realidade economicamente quantificvel. Essa realidade que nos permite identificar a espcie de tributo, muito especialmente distinguir e identificar a espcie imposta, a que mais direta e claramente se relaciona a uma realidade econmica (MACHADO, 2009, p. 135).

    A base de clculo do IPTU tem como fator determinante de clculo a rea do

    imvel, e como exposto anteriormente, o servio de limpeza pblica carece de

    individualidade, no podendo assim, ser calculado particularmente. Sabe-se que a

    base de clculo do IPTU corresponde ao valor venal do imvel, enquanto que a taxa

    de limpeza pblica cobrada em funo da rea do imvel e de sua localizao

    (CARVALHO, 2002).

    Ainda vale ressaltar que a taxa no pode ter base de clculo ou fato gerador

    idnticos aos que correspondam a imposto nem ser calculada em funo do capital

    das empresas (CF/88, art. 145, 2). Por tais motivos, a taxa de limpeza pblica

    no pode ter base de clculo relativo metragem do imvel, visto que, equipara-se

    ao que ocorre na tributao feita no Imposto de Propriedade Territorial Urbana

    (IPTU).

    Dessa forma, tem-se que a taxa de limpeza pblica inconstitucional por violar o carter retributivo da taxa, uma vez que a limpeza de logradouros pblicos um servio genrico, que no encontra respaldo nos critrios da especificidade e divisibilidade necessria exigibilidade da taxa. Pela generalidade desse servio, se torna bvio o entendimento, de que ele deve ser custeado por impostos, por ser esse o tributo hbil a financiar as atividades desvinculadas do Estado, dotadas desse carter de abstrao e indivisibilidade (ARAJO, 2010).

    Com isso, se a base de clculo no fornece o elemento fundamental para

    determinao, classificao e distino dos tributos, ela se torna insuficiente para

    que se possa fixar o valor da espcie tributria, sendo considerada inconstitucional,

    tendo em vista sua importncia para a individualizao de cada tributo, onde as

    taxas no podem custear a limpeza urbana, sendo esta feita por meio de receitas

    gerais do Estado, basicamente por impostos.

  • 9

    4.3 Entendimento Jurisprudencial

    O Supremo Tribunal Federal reconhece legalidade das taxas, quando estas

    atendem aos requisitos de especificidade e divisibilidade, no adentrando nesse

    contexto, a cobrana da taxa de limpeza pblica, por se tratar de um servio que

    atende a coletividade com um todo, no encontrando assim, respaldo na Smula

    Vinculante n 19 do STF. A referida smula foi motivada por diversos precedentes,

    tais como:

    a) RE 576.321-QO-RG (DJE de 12-2-2008): Com efeito, a Corte entende como

    especficos e divisveis os servios pblicos de coleta, remoo e tratamento ou

    destinao de lixo ou resduos provenientes de imveis, desde que essas atividades

    sejam completamente dissociadas de outras servios pblicos de limpeza realizados

    em benefcio da populao em geral (uti universi) e de forma indivisvel, tais como os

    de conservao e limpeza de logradouros e bens pblicos (praas, caladas, vias,

    ruas, bueiros). Decorre da que as taxas cobradas em razo exclusivamente dos

    servios pblicos de coleta, remoo e tratamento ou destinao de lixo ou resduos

    provenientes de imveis so constitucionais, ao passo que inconstitucional a

    cobrana de valores tidos como taxa em razo de servios de conservao e

    limpeza de logradouros e bens pblicos.3

    b) AI 651.389-AgR (DJE de 8-8-2008): Pacfica a jurisprudncia desta Corte no

    sentido da impossibilidade de aplicao de efeitos ex nunc, nos termos do art. 27 da

    Lei 9.868/1999, declarao de inconstitucionalidade de legislao do Municpio do

    Rio de Janeiro que (...) instituiu a Taxa de Coleta de Lixo e Limpeza Pblica (TCLLP)

    e a Taxa de Iluminao Pblica (TIP).4

    c) RE 206.777 (DJ de 30-4-1999): Taxas de limpeza pblica e de segurana. Leis

    municipais (...). Acrdo que os declarou inexigveis. (...). Deciso que se acha em

    conformidade com a orientao jurisprudencial do STF no que tange (...) taxa de limpeza

    urbana (...), exigida com ofensa ao art. 145, II e 2, da CF, porquanto a ttulo de

    remunerao de servio prestado uti universi e tendo por base de clculo fatores que

    concorrem para formao da base de clculo do IPTU. Declarao da inconstitucionalidade

    dos dispositivos enumerados, alusivos taxa de limpeza urbana. Pechas que no viciam a

    3 (RE 576.321-QO-RG, voto do Rel. Min. Ricardo Lewandowski, julgamento em 4-12-2008, Plenrio,

    DJE de 12-2-2008, com repercusso geral). 4 (AI 651.389-AgR, Rel. Min. Menezes Direito, julgamento em 10-6-2008, Primeira Turma, DJE de 8-

    8-2008).

  • 10

    taxa de segurana, corretamente exigida para cobrir despesas com manuteno dos

    servios de preveno e extino de incndios.5

    d) RE 393.331 AgR (DJ de 05-8-2005): Taxa de limpeza pblica - municpio de belo

    horizonte - ausncia de especificidade e divisibilidade. Assentando a Corte de

    origem que a taxa no se mostrou especfica nem divisvel, considerado o

    contribuinte e o imvel do qual proprietrio, foroso concluir pela ausncia de

    enquadramento do extraordinrio no permissivo da alnea "a" do inciso III do artigo

    102 da Constituio Federal, no que glosado o tributo.6

    5 TAXA DE LIXO DOMICILIAR X TAXA DE LIMPEZA PBLICA

    Para uma anlise sobre a questo da constitucionalidade acerca das taxas de

    limpeza pblica e coleta de lixo, precisa-se ter em mente em que consiste a

    diferena entre esses dois servios.

    O saneamento bsico e as outras formas de controle do meio fsico so

    elementos bsicos para a manuteno de um ambiente saudvel para o ser

    humano. Do contrrio o lixo acumulado s margens de cursos dagua ou de canais

    de drenagem e em encostas, acabando por provocar o seu assoreamento e o

    deslizamento dos taludes, respectivamente, bem como O lixo mal acondicionado

    ou depositado a cu aberto constitui-se em foco de proliferao de vetores

    transmissores de doenas (ratos, baratas, moscas, etc.) (BAHIA, 2005, p. 05).

    Assim sendo, a definio de lixo, fornecida pela Cartilha de Limpeza Urbana,

    a seguinte: Lixo , basicamente, todo e qualquer resduo slido proveniente das

    atividades humanas ou gerado pela natureza em aglomeraes urbanas, como

    folhas, galhos de rvores, terra e areia espalhados pelo vento (BAHIA, 2005, p. 08).

    Podendo ser divido entre 4 espcies, lixo residencial, comercial, pblico e de fontes

    especiais.

    A limpeza pblica aquela responsvel primordialmente pelo lixo pblico, no

    qual so:

    5 (RE 206.777, Rel. Min. Ilmar Galvo, julgamento em 25-2-1999, Plenrio, DJ de 30-4-1999).

    6 http://www.jurisite.com.br/sumulas/vinculante/sumulasvinculante/sumula19.html

  • 11

    Os resduos da varrio, capina, raspagem, etc., provenientes dos logradouros pblicos (ruas e praas, por exemplo), bem como mveis velhos, galhos grandes, aparelhos de cermica, entulho de obras e outros materiais inservveis deixados pela populao, indevidamente, nas ruas (BAHIA, 2005, p. 09).

    Assim, quando se tratar de limpeza pblica ser a realizada principalmente

    em logradouros pblicos, isto , reas de interesse coletivo.

    Todavia, ao tratar de coleta de lixo, refere-se ao lixo domiciliar, isto , os

    resduos slidos produzidos pelo homem em suas residncias.

    Encontra-se a a distino entre os referidos servios. Embora a coleta de

    ambos seja de interesse de toda coletividade, para que proporcione um ambiente

    livre de doenas e sujeiras, os servios so inconfundveis, visto que a limpeza

    pblica responsabiliza-se pelo lixo produzido pela coletividade nas vias pblicas,

    medida que a coleta de lixo domiciliar responsvel pelo lixo de uma pessoa ou por

    um pequeno grupo de pessoas na delimitao do espao de sua moradia.

    O Supremo Tribunal Federal firmou entendimento que as taxas de coleta de

    lixo domiciliar so constitucionais. Todavia, as taxas relativas aos servios de

    limpeza pblica de logradouros foram, por sua vez, consideradas inconstitucionais.

    Faz-se imprescindvel explicitar as distines entre ambas as taxas, de modo a

    determinar os motivos que culminaram na constitucionalidade de uma e

    inconstitucionalidade de outra.

    Em primeiro momento, ressalta-se que as taxas necessitam ser divisveis e

    especficas para assim, terem sua cobrana devida e respaldada na lei. Tem-se

    assim, que as taxas de lixo domiciliar, segundo o prprio entendimento do STF,

    possui o carter divisvel e especfico, por permitir a possibilidade de ser prestado de

    maneira singular, podendo-se determinar o sujeito passivo da relao tributria. Em

    contrapartida, a taxa de limpeza pblica no carece dessa divisibilidade, por esta ser

    um servio pblico genrico, voltado a satisfazer as necessidades da coletividade,

    no sendo possvel identificar e mensurar quem utilizou e quanto utilizou o servio

    pblico prestado, alm do que, o Estado tem o dever para com os cidados de

    realizar a manuteno das vias pblicas.

  • 12

    Destarte, o lixo domiciliar cobrado por taxas, enquanto que, a limpeza

    pblica, por no atender os requisitos necessrios por lei, no pode ser cobrada por

    taxas, mas sim por impostos.

    Doutrina majoritria e jurisprudncia entendem que h inconstitucionalidade,

    para o STJ, na taxa de limpeza dos logradouros pblicos, atrelada a atividades como

    varrio, lavagem, capinao, desentupimento de bueiros e bocas de lobo

    (SABBAG, 2010). Em posio diversa, entende-se que a cobrana por meio de

    taxas do lixo domiciliar legal, visto que esse atua favorece aos imveis suscetveis

    utilizao de forma separada por cada usurio do referido servio.

    certo que um assunto que de posies contrrias como este alvo de

    crticas. Motivado pelo entendimento de constitucionalidade da taxa de lixo pelo

    STF, doutrinadores e estudiosos consideram que a mesma, embora considerada

    legal, injusta. Afirma-se isto, visto que, como apontado anteriormente, a referida

    taxa cobrada seguindo uma base de clculo similar a do IPTU, isto , levando-se

    em conta a rea do imvel.

    Economicamente, a maioria dos contribuintes sero beneficiados com isso,

    embora, ache-se descabido cobrar a taxa dessa forma. Isto ocorre motivado pelo

    fato de que, embora um imvel de, por exemplo, 300 m morem duas pessoas, outro

    imvel de 150 m, possa vir a morar cinco pessoas. No caso em questo, lgico

    afirmar que embora menor, em termos de tamanho fsico, por ter mais moradores, o

    ltimo imvel vai produzir mais lixo. Sendo assim, mensurar o valor a ser cobrado de

    acordo com a rea da propriedade, pode vir a no atender a um carter isonmico,

    tributariamente falando.

    Sobre esse assunto, o Ministro Carlos Brito afirmou o seguinte:

    Todas s vezes, fico em dificuldade para compreender como se pode, sem artificializar a mensurao, dividir e quantificar o consumo. E, s vezes, chego concluso de que, no raras s vezes, a cobrana se torna uma ofensa ao princpio da razoabilidade porque, com frequncia, h casas e apartamentos menores habitados por muita gente. Ento a produo de lixo no guarda conformidade com o tamanho do imvel.

    7

    Fazendo um contraponto, o Ministro Ricardo Lewandowski, no mesmo

    recurso exps que:

    7 RE 576.321-QO-RG, voto do Rel. Min. Ricardo Lewandowski, julgamento em 4-12-2008, Plenrio,

    DJE de 12-2-2008, com repercusso geral.

  • 13

    Calcula-se o custo do servio - municipalidade tem o custo desse servio - e a melhor forma, para que haja o mnimo de isonomia, tomar como base um dos elementos para clculo do IPTU, que a grandeza do imvel, porque, realmente sugere que o imvel maior produza mais lixo do que o menor.

    8

    No obstante as divergncias de opinies predominou o entendimento de que

    a coleta de lixo, servio especfico e por isso, pode ser calculada individualmente

    por meio de taxas, diferente do que ocorre com a limpeza pblica. Dessa forma, as

    duas taxas em questo so, de maneira indubitvel, distintas. Uma atende aos

    requisitos da lei, sendo constitucional e a outra no, conforme foi determinado pela

    jurisprudncia.

    6 CONSIDERAES FINAIS

    Nesse mbito, foi explorada a conceituao de taxa, distinguindo-a de

    impostos e tarifas, com a finalidade de estudar a possibilidade dos servios de

    limpeza pblica e de coleta domiciliar de lixo serem cobrados mediante taxas.

    Ficou constatado, segundo decises de tribunais, assim como por opinies de

    doutrinadores, que o servio de coleta domiciliar de lixo pode ser cobrado por taxas,

    considerando constitucional esta prestao. Sendo possvel por se tratar de um

    servio que atende aos requisitos essenciais ao conceito de taxa, isto , como

    exaustivamente explanado, um servio especfico e divisvel.

    Por outro lado, no tocante ao servio de limpeza pblica, chegamos a

    concluso que a sua cobrana por intermdio de taxa inconstitucional, por se tratar

    de um servio geral, no qual atende toda populao, e ainda, em decorrncia de sua

    base se clculo imprpria. Verificou-se, portanto, que o servio de limpeza pblica

    abarca os requisitos atinentes aos impostos.

    Para averiguao de tais resultados, fez-se necessrio diferenciar os ditos

    servios, de modo que embora se assemelhem no se confundem. Sendo limpeza

    pblica um servio geral e indivisvel, relativos a logradouros pblicos, enquanto que

    coleta domiciliar de lixo um servio especfico e divisvel, inerente aos resduos

    gerados por um domiclio. 8 Idem.

  • 14

    Conclui-se, por conseguinte, que a interveno dos tribunais e do poder

    judicirio, de modo geral, nas relaes tributrias consideradas como triviais,

    demonstram grande importncia, pois, auxiliam na aplicao correta das normas,

    fornecendo subsdios populao para que possam adimplir o que lhes devido, e

    protegendo-os de cobranas injustas por parte do Poder Pblico.

    7 REFERNCIAS

    ALEXANDRE, Ricardo. Direito Tributrio Esquematizado. 6. ed. rev. e atual. So Paulo: Mtodo, 2012.

    ARAJO, Zuleica Garcia de. A Taxa de limpeza pblica considerada inconstitucional, enquanto a taxa de lixo no. Por qu? Artigonal, 29 de junho de 2010. Disponvel em: < http://www.artigonal.com/direito-tributario-artigos/a-taxa-de-limpeza-publica-e-considerada-inconstitucional-enquanto-a-taxa-de-lixo-nao-por-que-2745053.html>. Acesso em: 11 fev. 2013.

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    _____. Superior Tribunal Federal. Agravo de Instrumento, n 651.389-AgR, de DJE de 8 de agosto de 2008.

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    _____. Superior Tribunal Federal. Recurso Extraordinrio, n 393331 AgR, de DJ de 05 de agosto de 2005.

    _____. Superior Tribunal Federal. Recurso Extraordinrio, n 576.321-QO-RG, de DJE de 12 de fevereiro de 2008.

    _____. Lei n 5.172, de 25 de Outubro de 1966 - Cdigo Tributrio Nacional. Brasil, So Paulo: Rideel, 2012.

    _____. Superior Tribunal Federal. Smula vinculante, n 19. In: ______.

  • 15

    _____. Superior Tribunal Federal. Smula vinculante, n 29. In: ______.

    CARVALHO, Luiz Augusto de Mello. Inconstitucionalidade da taxa de limpeza pblica do Municpio de Salvador. Jus Navigandi, Teresina, ano 7, n. 56, 1 abr. 2002. Disponvel em: . Acesso em: 11 fev. 2013.

    CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de direito tributrio. 21. ed. So Paulo: Saraiva, 2009.

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