almanaque uberlândia de ontem & sempre

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ano 2 núMero 4 fevereiro 2013 Almanaque UBERLÂNDIA DE ONTEM & SEMPRE UMa ProDUÇÃo nós Projetos De conteúDo

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Resgate da história e vida da Cidade de Uberlândia, projeto de conteúdo.

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Page 1: Almanaque Uberlândia de Ontem & Sempre

ano 2 • núMero 4 fevereiro 2013

AlmanaqueuberlÂndiA de ontem & sempre

UMa ProDUÇÃo nós Projetos De conteúDo

Page 2: Almanaque Uberlândia de Ontem & Sempre
Page 3: Almanaque Uberlândia de Ontem & Sempre
Page 4: Almanaque Uberlândia de Ontem & Sempre

direçãoCelso Machado

realizaçãoPaulo Henrique Petri

edição e projeto gráficoAntonio Seara

pesquisa e reportagemnúbia Mota

colaboraçãoAdriana FariaAdemir reisAntônio PereiraAnaísa ToledoCarlos GuimarãesClarissa AranyCora Capparelliilma de Moraes Júlio César de Oliveiranara SbreebowOscar Virgílio

capaHélvio de lima

fotografiasroberto ChacurAcervos pessoais Arquivo PúblicoCorreio de uberlândia

revisãoilma de Moraes

tratamento de imagemnideias

agradecimentosCarlos roberto ViolaCristiana Heluy de Castro

rua tenente virmondes, 997centro, uberlândia – mgfone: (34) 3236-8133www.close.com.br

Sumário2012 • FUTEBOLracha reúne ex-atletas 6

1968-2012 • paTrimôniOMemória curta 8

1933-2013 • vida EmprEsariaLACiub 80 anos 12

1966 • anTEs da qUEda dO mUrOVerdão x rússia 16

1960 • FacULdadE dE FiLOsOFia no rumo da uFu 18

martinésiabonecas Pretas 20

GenTe nOSSAdona Julieta Cupertino 22

1943 • a gOyanaTemplo da moda 28

1996 • INSTITUTO dO CORAÇÃOCirurgia pioneira 30

1938 • JOrnaLismOCorreio 75 anos 32

1920 • ImIgRAÇÃO jApONeSATemplo no cerrado 36

boemiaSombrias noites 38

artista da capaHélvio de lima 40

UMA CIDADE EDUCADORA

INCENTIVO:PRODUÇÃOREALIZAÇÃOPATROCÍNIO

Page 5: Almanaque Uberlândia de Ontem & Sempre

concluir uma nova edição do “almana-que uberlândia de ontem e sempre” é

sempre uma alegria enorme que não deixa de provocar uma certa angústia pela incer-teza da reação que irá causar.por mais que tenhamos cuida-do, atenção e zelo, quando se lida com fatos e registros his-tóricos, há sempre a probabili-dade de algum equívoco.mas, só erra quem faz.a tentativa de recuperar, regis-trar e valorizar uma história tão rica quanto a de uberlân-dia e de sua gente vale esse risco.neste quarta edição, procura-mos mesclar fatos históricos relevantes com curiosidades. dentre todas as matérias, nos permitimos dois destaques. um para uma mulher que tem uma trajetória de vida exemplar e dignificante, julie-ta cupertino.de uma das nossas famílias tradicionais ela é, aos 105 anos, a referência viva do que há de melhor em nossa cidade. exemplo de uma mulher ativa, moderna e atuante. para quem o tempo nunca foi um proble-ma, mas um aliado. uma uber-landense que orgulha a todos nós.o outro destaque é um alerta: o descuido que temos tido com nosso patrimônio públi-co. prédios históricos demoli-

dos pela insensibilidade da iniciativa privada e também da pública, como foi o caso do antigo fórum abelardo penna, um prédio de rara beleza ar-quitetônica que o estado der-rubou. até a igreja, normal-mente tão conservadora, mo-dernizou seus templos, per-dendo a riqueza de suas con-cepções originais.ainda temos muito o que pre-servar e é bom fazer isso en-quanto é tempo. o distrito de cruzeiro dos peixotos é um desses patrimônios que po-dem e devem ser cuidadosa-mente avaliados pelo poder público municipal. com seu jeito bucólico, suas casas cen-tenárias, seu ar de tranquilida-de e encanto, corre um risco danado de ser sacrificado pela ganância da modernidade. pe-los “minha casa minha vida”.só que pouco adianta tombar e não assumir os encargos de restauração e manutenção.uberlândia tem sim (ainda) um patrimônio histórico valio-so que merece ser preservado, para que todos saibam que aqui tem gente empreendedo-ra, voltada para o futuro, mas que reverencia e preserva suas tradições. que tem dinamismo mas também sensibilidade.fica o registro e o alerta.boa leitura a todos.

Celso Machadoengenheiro de Histórias

Carta ao leitor

1960 • aFOnsO pEnaA rua da lavoura 42

1911 • feRNANdO vIlelAFazedor de estradas 44

1950 • vErEadOrEsA serviço do eleitor 48

sécULO 17 • cOLOnizaçãOA grande Caiapônia 51

década dE 1960 • pErsOnagEmAstolfo Silva 54

1970 • mOgianaA estação no chão 57

1960 • iOnEi siLvaMestre dos Magos 60

Page 6: Almanaque Uberlândia de Ontem & Sempre

MeMÓriA e HiSTÓriA eM diFerenTeS CAPÍTulOS

Calendário

uberlândia ganhou um calen-dário de mesa personalizado, com imagens antigas de

locais modificados ou extintos com o tempo. no decorrer dos meses, as pessoas têm em casa ou no local de trabalho, 12 registros do filme “uber-lândia cidade menina”, uma película da década de 40 feita pela cia. ci-nemathográfica do rio de janeiro e recuperada pela close comunicação. a tiragem modesta de 500 exempla-res esgotou em dois dias. a recep-tividade mais uma vez suplantou a modesta previsão.no fim do ano, será lançada a se-gunda edição e com tiragem mais adequada.

eventos

em cada lançamento do “almanaque uberlândia de ontem e sempre” é promovido um evento em que os personagens podem conviver com a

obra e são apresentados registros do programa.desde a terceira edição é homenage-ada uma figura relevante da história uberlandense.como futebol também tem história, em dezembro último foi promovido um racha reunindo ex-atletas. um re-encontro em que o menos importan-te é o resultado e o mais relevante, a recordação da história de cada um. das passagens e lembranças de suas carreiras. o nome do racha e o slogan demonstram esse objetivo: “racha dos velhos malandros, um jogo de vida ou gole!”o evento foi destaque no “correio de uberlândia”.uma turma que já passou dos 50 anos, que sabe tudo de bola e tem muita história para contar é o ingre-diente perfeito para o projeto “racha dos velhos malandros”, idealizado pelo jornalista celso machado. o pro-jeto, que será realizado uma vez por ano, integra o programa de tv “uber-lândia de ontem e sempre”.

“uberlândia de Ontem e Sempre”, que começou há sete anos com um pro-grama de tv, há dois lançou a versão impressa no formato almanaque, está dis-ponível em site e continua ampliando formatos focando sempre na memória e história de nossa cidade

6 Almanaqueuberlândia deontem e sempre

Fotos: Cleiton Borges

Três craques de gerações diferentes: Fazendeiro, Arara e Vilfredo

Paulo Henrique entrega a charge que homenageia o craque Fazendeiro.

Page 7: Almanaque Uberlândia de Ontem & Sempre

“‘uberlândia de ontem e sempre’ é um projeto maior que um programa de televisão. temos o almanaque, um site, lançamos o calendário e va-mos fazer eventos artísticos. pensei então em um evento futebolístico, porque futebol tem suas histórias que precisam ser relembradas“, disse celso machado.na primeira edição do racha, o home-nageado foi edson gonzaga souza, o fazendeiro, ídolo do uberlândia es-porte clube (uec) durante a década de 1960 e início dos anos 70.sobre a homenagem, fazendeiro, de 70 anos, não esconde a emoção e ressalta a importância do evento. “é uma iniciativa fantástica do celso. é num momento como este que a gen-te vê que, ao longo da vida, fez tantas amizades. sou muito grato pelo reco-nhecimento e sempre que o evento for realizado, quero estar junto, par-ticipando, mesmo sem ter condições para jogar”, disse o ex-jogador que ganhou o apelido porque o pai tinha uma pequena propriedade rural no

Fazendeiro destaca a importância da homenagem

“racha dos Velhos Malandros” resgata memórias do esporte e reúne ex-atletas

Edmundo, Banga, Gildo, Zé Carlos, Fazendeiro, Arara,Viola, Celso, Marcelo, Lézio, Batista, Junior, Chicão, Fernandinho, Moacir, Pascoal, Paulo Henrique, Hugsmar, Sidney, Ramiro, Estrangão, Vilfredo e Zézinho, os craques daprimeira versão do “Racha dos Velhos Malandros”

Quem sabe nunca esquece, Hugsmar e o seu toque de classe.

Um dos maiores goleadores com um dos maiores goleiros, Fazendeiro e Moacir.

município.fazendeiro foi pretendido por vários times, mas preferiu vestir somente a camisa do uberlândia esporte. “tive muitas propostas para sair daqui (uberlândia), mas, naquela época, além de jogar futebol, eu era bancá-rio, ganhava um bom salário. além disso, tinha o que o clube me paga-va e o dinheiro que os torcedores davam para os jogadores depois da partida. quase sempre, o que eu ga-nhava dos torcedores era muito mais do que o meu salário no banco e no uberlândia esporte. e, com certeza, tudo isso era muito mais do que os outros times pagavam. além disso, eu sempre tive uma verdadeira pai-xão pela cidade”, disse o craque.

etc.

a missão de “uberlândia de ontem e sempre” e a sua determinação de resgatar, divulgar e valorizar a histó-ria de uberlândia não vai parar. no-vos formatos estão vindo por aí...

Page 8: Almanaque Uberlândia de Ontem & Sempre

bens materiais e imateriais que marcaram a história da

cidade estão desaparecendo

MeMÓriACurTA

1968-2012 a passos lentos

enquanto cidades de porte similar como juiz de fora tem 221 bens tombados, uber-

lândia possui exatos 20 tomba-mentos registrados desde 1968. até 2002, a cidade tinha apenas quatro bens preservados: a igre-ja nossa senhora do rosário, a casa da cultura, a oficina cul-tural e o conjunto formado pela praça clarimundo carneiro, o museu municipal e o coreto.por ser mais conhecida como ci-dade progressista, riquezas ma-teriais e imateriais do passado acabaram sendo deixadas para trás, enquanto empresas e no-vos moradores foram chegando. o trabalho de tombamento, segundo a ex-secretária muni-cipal de cultura mônica debs,

no alto: Fórum Abelardo Penna. no centro: Palácio dos leões, atual Museu Municipal, tombado em 1985. Abaixo: estação rodoviária, hoje biblioteca Municipal, tombada em 2009.

8 Almanaqueuberlândia deontem e sempre

Page 9: Almanaque Uberlândia de Ontem & Sempre

teve que ser intensificado nos últimos 12 anos com foco na formação das novas gerações. “fizemos uma cartilha que foi distribuída para professores das escolas públicas e um projeto de educação patrimonial, com visitas diárias de crianças a par-tir de 2 anos ao museu munici-pal. a mudança de atitude vai acontecer com o tempo.”a preservação do patrimônio cabe à secretaria municipal de cultura e ao conselho muni-cipal do patrimônio Histórico, arqueológico, artístico e cul-tural de uberlândia (comphac), mas a concretização do trabalho depende dos donos dos bens sujeitos a tombamento e da aju-da da comunidade. “é difícil. as pessoas pensam assim: ‘por que você não joga fora, destrói e faz outro mais bonito e moderno?’ é cultural. muitos acham que um prédio antigo atrapalha”, afirmou valéria cavalcante lo-

pes, diretora de memória e pa-trimônio Histórico da secretaria municipal de cultura.para valéria queiroz, o patrimô-nio cultural é pouco valorizado por grande parte dos moradores vindos de outros municípios, conhecidos como “uberlandi-nos” e que não têm laços afeti-vos significativos com a cidade. segundo pesquisa de 2012, do instituto brasileiro de geografia e estatística (ibge), 48,5% dos moradores de uberlândia são de outras cidades. uberlândia é o 39º entre os 853 municípios de minas gerais no ranking de população não natural. “Havia um painel em uma casa em obras no centro da cidade, um mosaico de vidro, muito bonito. sugeri à pessoa responsável que o reaproveitasse depois da obra. ela respondeu ‘não conheço a história, não sou daqui’ e jogou tudo no chão no outro dia”, con-tou valéria queiroz.

9 Almanaqueuberlândia deontem e sempre

Mercado Municipal, tombado em 2002

“ Muitos acham que um prédio antigo atrapalha”

Coreto, tombado em 1985

Page 10: Almanaque Uberlândia de Ontem & Sempre

O passado no chão

no fundinho, em agosto de 2012, foi demolida a casa de dona adélia, do fim do sécu-lo 19, considerada por espe-cialistas um patrimônio da cidade como a mais antiga construção remanescente do passado de uberlândia. a proprietária, a professo-ra de piano adélia santos frança que morreu em 2004, havia dado início ao processo de tombamento. a procuradoria do município indeferiu o pedido pela falta de documentação e com-provação do valor histórico da edificação e pelas con-dições precárias da casa. “a casa foi caindo aos poucos e limpamos o lote. como não tínhamos condição de refor-mar, pedimos à prefeitura outro imóvel em troca, mas eles não tiveram interesse”, afirmou o sobrinho de dona adélia, que pediu para não ter o nome divulgado.outro caso conhecido é o da casa dos migliorini, cons-truída na década de 1960 na praça coronel carneiro e uma das principais edifica-ções da arquitetura moder-na da cidade. o pedido de tombamento foi aprovado por unanimidade pelos membros do comphac em 17 julho de 2008. dois dias depois, antes que um docu-mento fosse entregue à pre-feitura e aos proprietários, a casa foi demolida com uma retroescavadeira.

10 Almanaqueuberlândia deontem e sempre

igreja n. S. das dores

igreja do rosário

escola estadual uberlândia (Museu)

igreja de n. S. do rosário (Miraporanga)

escola estadual dr. duarte Pimentel de ulhôa

estação Ferroviária Sobradinho

Palacete Ângelo naghettini

Casa da Cultura

Oficina Cultural

biblioteca Municipal

Praça Clarimundo Carneiro, Museu e Coreto

Mercado Municipal

residência Chacur

uberlândia Clube

igreja espírito Santo do Cerrado

imagem de nossa Senhora do Carmo

Festa do Congado

Círculo de Trabalhadores Cristãos

Painéis em mosaico de vidro de Geraldo Queiroz

escola estadual enéas Oliveira Guimarães

Praça Tubal Vilela

OS 20 TOMbAMenTOS

Casa da Cultura, tombada em 1985

Page 11: Almanaque Uberlândia de Ontem & Sempre
Page 12: Almanaque Uberlândia de Ontem & Sempre

a imprensa e o empre-sário tito teixeira, em 1924, trabalharam para que se fundasse

uma associação comercial em uberlândia. Houve algumas reuniões, mas não tiveram se-quência. pouco antes de 1933, a imprensa voltou a tocar no assunto. não sei se estimulado por ela ou não, josé de oliveira guimarães, português, comer-ciante, sócio de josé dos santos, também português, donos da casa castro, na avenida afonso pena, procurou os empresários e lhes propôs a fundação de uma instituição que congregas-se os empresários locais. o primeiro apoio que recebeu foi o do seu sócio. o idealizador

ACiub80 AnOS

1933-2013 vida empresarial

Apenas para comerciantes ou para todos os empresários, o debate das mensalidades e uma carta esclarecedora. AnTÔniO PereirA narra os bastidores da fundação da Associação Comercial e industrial de uberlândia em 1933

uma reunião das primeiras reuniões da Associação Comercial, industrial e Agropecuária de uberlândia

Page 13: Almanaque Uberlândia de Ontem & Sempre

do empreendimento recusou a presidência e estimulou arman-te carneiro a aceitá-la. antes da reunião que formou a entidade, tudo já estava mais ou menos preparado, tanto que armante carneiro telegrafou ao presi-dente da associação comercial de minas gerais pedindo que interferisse junto ao governo do estado para recolher a fisca-lização que se realizava na cida-de e assinou como presidente. nem a associação existia, nem ele tinha sido eleito.no dia 15 de outubro de 1933, na sede do uberabinha sport club, reuniram-se vários em-presários. Homero monteiro de carvalho, por solicitação de josé de oliveira guimarães,

levou um projeto de estatuto que foi aprovado na ocasião. Houve alguns debates, sendo o mais interessante o levantado por youssuf andraus gassa-ni, que pretendia que a nova instituição só abrigasse comer-ciantes e que seu nome fosse apenas associação comercial de uberlândia. foi derrotado. o nome escolhido foi associação comercial, industrial e agrope-cuária de uberlândia (aciapu) e aceitava não só empresários, como profissionais liberais. um desses profissionais associados da nova instituição foi o advo-gado jacy de assis. quem tam-bém se opôs a essa extensão da entidade foi o associado não presente, angelino pavan, que

13 Almanaqueuberlândia deontem e sempre

O PriMeirO PreSidenTe era de uberaba, onde fez os primeiros estudos. Foi para São Paulo e formou-se em Farmácia em 1902 e em enge-nharia em 1903. Trabalhou na estrada de Ferro Goiás e foi agrimensor no sul goiano. Montou uma farmácia em uberaba, construiu a estrada de roda-gem ligando rio Verde a Mineiros e foi presidente da Companhia Auto Via-ção Sul Goiana. Veio para uberabinha para montar uma fábrica de tecidos. reuniu sócios e, em novembro de 1923, lançou a Fábrica de Tecidos uberabinha, construída dentro do pátio da Mogiana e, ao lado, as resi-dências dos operários que deram ori-gem à Vila Operária, hoje pertencente ao bairro Aparecida. A indústria não teve sucesso. Armante tentou outras atividades. Montou ser-raria, teve a concessão para a constru-ção de uma ferrovia de uberabinha a Porto Feliz, no rio Paranaíba. A revo-lução de 1930 derrubou esse último sonho. Voltou à atividade farmacêuti-ca. Foi presidente da Comissão da Construção da Catedral de Santa Tere-zinha. Foi presidente da Ação Católica e fundou, em uberlândia, o Partido Católico, do qual foi presidente.

armante carneiro

na fachada da primeira sede, o registro do primeiro nome

Page 14: Almanaque Uberlândia de Ontem & Sempre

justificou sua ausência por josé de oliveira guimarães, portador de sua proposta de mudança do esta-tuto, que também foi rejeitada.

A mensalidade

outra questão muito debatida foi a da mensalidade. josé gonzaga de freitas e oscar miranda queriam que ela fosse de cinco mil réis (5$000) por mês porque os em-presários de pequeno porte não suportariam valor maior. gassani e vicente maradei queriam que fosse de dez mil réis (10$000). oliveira guimarães conciliou as propostas sugerindo que quem tivesse estoque inferior a dez contos de réis (10:000$000) pa-gasse cinco, quem tivesse estoque maior, pagasse dez. foi aprovado. o tesoureiro é quem estabeleceria os limites.após esses debates foi eleita a di-retoria. o presidente, assim como já tinha sido definido, era armante carneiro, o vice era tubal vilela, o segundo-vice era carlos de olivei-ra marquez, o secretário-geral josé de oliveira guimarães, o primeiro secretário josé rezende filho, o primeiro tesoureiro aristides ber-nardes de assis, o segundo tesou-reiro era alcides borges de oliveira e o bibliotecário era eulálio de ulhoa cintra.

UmA CARTA de gUImARÃeS

14 Almanaqueuberlândia deontem e sempre

“O doutor Armante, que era meu amigo, não foi o funda-dor da Associação Comercial e sim o seu primeiro presi-dente, convidado por mim para exercer esse cargo, em uma reunião que convoquei, convidando vários comer-ciantes e entre eles o doutor Armante, que aceitou meu convite com relutância, alegando não ter participado dos trabalhos preparatórios para formalizar a Associação Co-mercial. Trabalhos esses que aliás foram só meus.

A ideia e execução do plano de fundação da Associação Comercial são minhas, sendo eu, portanto, seu fundador, para o que contei com o apoio do meu então sócio José Santos.

Para formalizar a Associação Comercial, contratei o Homero Monteiro de Carvalho, advogado, já falecido. Conjuntamente, o doutor Homero e eu elaboramos os estatutos da Associação Comercial e lhe demos o nome de Associação Comercial, industrial e Agro Pecuária de uberlândia, tendo eu funcionado como primeiro secre-tário, pois não ficaria bem que eu me constituísse presi-dente, quando eu era o criador da Associação, e, eis aí a razão do convite ao doutor Armante.

Quem conhece bem os primórdios da fundação da As-sociação Comercial é o senhor José Santos Júnior que aí está e pode comprovar o que digo.

Talvez os novos diretores ignorem o quer aqui ex-ponho, mas os antigos, das primeiras diretorias, têm

conhecimento disso.esta será, além do mais, uma contribuição para a

história da Associação Comercial, quando ela foi feita. era isso que desejava esclarecer e retificar.

Muito obrigado pela atenção que se designarem dis-pensar a este esclarecimento e sem mais, subscrevo-me cordialmente,

José de Oliveira Guimarães”

(nota escrita por josé de oliveira guimarães e publicada na revista da aciub em 1978, retificando reportagem da edição anterior que citava armante car-neiro como o idealizador da associação)

José de Oliveira Guimarães

“Houve alguns debates interessantes como o levantado por Youssuf Andraus Gassani, que pretendia que a nova instituição só abrigasse comerciantes”

Page 15: Almanaque Uberlândia de Ontem & Sempre

“Houve alguns debates interessantes como o levantado por Youssuf Andraus Gassani, que pretendia que a nova instituição só abrigasse comerciantes”

Page 16: Almanaque Uberlândia de Ontem & Sempre

e m 1966, a seleção da então união soviética, de olho na copa do mundo que seria disputada na inglaterra,

veio ao brasil para se preparar para a competição. como parte do treina-mento, os soviéticos participaram do torneio quadrangular magalhães pinto, em belo Horizonte, ao lado do atlético mineiro, cruzeiro e fla- mengo, no recém-inaugurado minei- rão. aproveitando a vinda do time ao estado, o então presidente do uberlândia esporte clube (uec), renato freitas, convidou os russos para um amistoso contra o verdão, em dis-puta marcada para 9 de fevereiro de 1966,

veRdÃO enCArA

A urSS

1966 antes da queda do muro

16 Almanaqueuberlândia deontem e sempre

“Jogo foi debaixo de muita chuva e de muita pancadaria”

“ Foi uma noite de gala. um espetáculo digno de ser assistido”

correio de uberlândia

Moacir Lopes de Carvalho, diretor, e Luiz Cesar Fabrini, radialista, ambos da Rádio Educadora entregam um brinde ao capitão da seleção russa

Page 17: Almanaque Uberlândia de Ontem & Sempre

em uma quarta-feira, no estádio juca ribeiro. um dia depois da final do torneio na capital mineira, onde a união sovié-tica venceu o cruzeiro por 1 a 0 e se sagrou campeã, o time foi recebido em uberlândia. “no dia do jogo, caiu uma chuva danada e a prefeitura não cobrou nenhum ingresso”, lembrou renato de freitas em entrevista em 1998.no elenco do verdão, estava edson gonzaga souza, na época com 23 anos e que hoje pouco se lembra da partida. “lembro só que choveu muito e foi uma pancadaria. na época, não tinha cartão amarelo. se a gente caísse, o jogador vinha e chutava a nossa cabeça”, disse fazendeiro. o cartão amarelo foi introduzido pela fifa apenas na copa de 1970, disputada no méxico.como nas duas partidas que dis-putou em belo Horizonte contra o atlético mineiro (6 a 1) e o cruzeiro (1 a 0), a união soviética venceu o verdão por 2 a 0, com gols de bibo e um contra marcado pelo zagueiro dunga. “jogou bem o time soviético. mas jogou além do que esperáva-mos o conjunto dirigido por japiassú (técnico do verdão). foi de fato uma noite de gala. foi realmente um

espetáculo digno de ser assistido”, publicou o “correio de uberlândia” na época. foi também a primeira vez que um árbitro, armando marques, apitou com o uniforme da fifa em uberlân-dia. várias emissoras de rádio do país reservaram linhas para transmitir o jogo, mas desistiram devido ao mau tempo. um dia depois, o técnico japiassú foi dispensado do uec.

1uma reportagem do “Correio de uberlândia” depois do jogo di-vulgava contas feitas pelos fun-

cionários do Hotel Presidente, onde os jogadores soviéticos se hospeda-ram do dia 7 ao dia 10 de fevereiro de 1966. Segundo o jornal, os russos comiam diariamente o que um “homem comum” comia durante uma semana. Além dos pratos quentes, incluindo frango, filé à parmegiana, mortadela, bananas e laranjas, os russos pediam refrige-rantes, doces e confeitos finos diariamente. nada menos que um milhão de cruzeiros foi o preço da hospedagem da delegação em uberlândia, custeada pelo Verdão.

2A camisa da seleção da união Soviética trazia as letras CCCP em branco sobre o vermelho,

iniciais no alfabeto russo para união das repúblicas Socialistas Soviéticas. A sigla CCCP, segundo

uma piada que corria no país na épo-ca, significava “Camarada, Cuidado (com o) Crioulo Pelé”. em 1958, a seleção soviética foi a primeira a en-frentar Pelé e Garrincha juntos, quando foi derrotada por 2 a 0 na Copa do Mundo da Suécia. Conta-se que Garrincha passou a chamar os adversários de “João” depois deste jogo, pois não conseguia pronunciar o nome do russo que o marcou.

FrAnG0, Filé, dOCeS e COnFeiTOS beM FinOS

urss em uberlândia

17 Almanaqueuberlândia deontem e sempre

O repórter Josué Borges entrevista o árbitro Armando Marques.

Page 18: Almanaque Uberlândia de Ontem & Sempre

ela nasceu no mesmo dia em que a faculdade de direito e também

foi autorizada pelo então presidente da república juscelino Kubitschek. um grupo de intelectuais católicos, contrários à orientação marxista da faculdade de filosofia, que vinha sendo idealizada por nelson cupertino, procurou as irmãs do colégio nossa senhora. a comissão, formada pelo padre mário forestan, superior dos

O deSAFiO dA CONSTRUÇÃO dA uniVerSidAdeFaculdade pioneira do Colégio nossaSenhora foi um dos pilares da uFu

1960 faculdade de filosofia, ciências e letras

1970 - Alunos da Faculdade de Filosofia recebem a madre Maria Vilac, que autorizou a criação da instituição em 1960

Formatura da primeira turma da faculdade, em dezembro de 1963

18 Almanaqueuberlândia deontem e sempre

Page 19: Almanaque Uberlândia de Ontem & Sempre

padres salesianos, pelo presidente da câmara, andré fonseca, pelo diretor da rádio educadora, moacir de carvalho, e pelo professor do colégio estadual saint-clair netto foi recebida pela superiora, madre emília ribeiro, e pela diretora do colégio, irmã maria lázara fioroni, que ficaram interessadas no projeto de criação de uma outra faculdade. o advogado jacy de assis que, com a ajuda do então deputado rondon pacheco, já se encontrava no processo de criação da faculdade de direito junto ao governo federal, colaborou na preparação dos papéis necessários para o curso de filosofia. no dia 12 de novembro de 1959, o “correio de uberlândia” antecipou a notícia e publicou na primeira página: “faculdade de filosofia de uberlândia também funcionará em 1960”. em dezembro, jacy de assis ligou do rio de janeiro, informando que o processo havia sido aprovado. no mesmo dia, um alto-falante anunciou a notícia nas ruas de uberlândia, que contava, na época, com cerca de 80 mil habitantes.depois do primeiro vestibular, em

fevereiro de 1960, que aprovou 22 alunos para os cursos de letras neo-latinas, anglo-germânicas e pedagogia, aconteceu a aula inaugural ministrada por francisco ribeiro sampaio, professor da pontifícia universidade católica (puc) de campinas, que falou sobre santa tereza de ávila. no dia 14 de março, deu-se o início das aulas. em janeiro de 1962, a madre superiora maria vilac transferiu a madre maria lázara fioroni, diretora da faculdade, para campinas (sp). em março, para substituí-la, chegou de campinas a irmã ilar garotti, então com 27 anos. “eu era orientadora de alunos da puc que moravam em um pensionato, onde também fiz faculdade de pedagogia” lembrou irmã ilar, hoje com 80 anos. ao chegar, irmã ilar recorda que seu primeiro desafio foi fazer uma pesquisa para conhecer a demanda de novos cursos de graduação. o segundo foi conseguir trazer professores de ribeirão preto, campinas, são paulo, araraquara e

goiânia. “era preciso equilibrar as finanças. os alunos pagavam pouco. os professores ficavam hospedados no colégio nossa senhora, com a esperança de que um dia a faculdade fosse federalizada”, disse irmã ilar.durante 18 anos, a faculdade de filosofia, com média de 2 mil alunos por ano, funcionou no colégio nossa senhora. em 1970, foi incorporada à universidade de uberlândia (unu), hoje universidade federal de uberlândia (ufu).

O deSAFiO dA CONSTRUÇÃO dA uniVerSidAde

1970 - Alunos da Faculdade de Filosofia recebem a madre Maria Vilac, que autorizou a criação da instituição em 1960

Cerimônia de instalação da universidade de uberlândia em 10 de fevereiro de 1970. da esquerda para a direita: Francisco Palma de Souza, Jacy de Assis, Genésio Melo Pereira, Milton de Magalhães Porto e irmã ilar Garotti

19 Almanaqueuberlândia deontem e sempre

irmã Maria lázara Fioroni, fundadora da faculdade em 1960

Page 20: Almanaque Uberlândia de Ontem & Sempre

na rua da fortuna, no distrito de martinésia, uma história de provação e dificuldade. é onde vive, em uma casa

modesta, elvira ferreira brasil e suas bonecas de pano, em grande parte irmãs de cor da criadora. como dona negrinha, como é conhecida, não encontrava bonecas pretas nas lojas, resolveu criá-las na velha máquina de costura de segunda mão. À medida que vão sendo finalizadas, as bonecas pretas ganham um nome. a

maior delas é a tutucona. personagens que de certa forma abrem a discussão sobre o preconceito racial levantada por esta senhora de 66 anos, com pouco estudo, mas de muita sabedoria. “meu pai falava que nunca ia acabar o preconceito. algumas pessoas querem que acaba, mas sempre vai ter alguém que não gosta dos negros”, disse dona negrinha.o dom para o feitio de bonecas, que também ganham outras cores de pele e cabelo, vem desde a infância, quando

A neGrinHA dAS bOneCAS PreTAS

MArTinéSiA

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morava com os pais e seis irmãos nas fazendas, onde trabalhavam em troca de arroz e feijão ou um pouco de fubá para o angu. “eu via as meninas brincando de boneca, minha mãe não podia comprar e então ela enrolava um pano no sabugo para eu brincar”, disse a artesã que precisou sair de casa aos 8 anos para trabalhar. “sofri demais, filho de gente honesta é muito sacrificado. olhava menino dos outros, fazia comida e brincava com boneca quando dava.”a gargalhada contagiante, às vezes, cede lugar às lágrimas quando ela se lembra dos maus-tratos de alguns patrões. “eles pegavam nós, davam casa para morar, a gente morria de trabalhar e, depois, eles jogavam a gente na beira da estrada, no chão, de qualquer maneira.”apesar das más lembranças, dona negrinha disse que hoje consegue passar por cima dessas ofensas e preconceitos por causa de sua cor. “eu respeito para ser respeitada. se você tiver um estudo grande, mas não tiver educação, não adianta. não vai viver bem”, afirmou a artesã. dona negrinha é uberlandense nata, nascida em um quilombo próximo ao distrito de cruzeiro dos peixotos, durante a colheita do feijão. “eles falavam assim: dias das mangas, das chuvas, da jabuticaba. fui registrada em julho, mas minha mãe contava que nasci no dia 14 de outubro”, disse dona negrinha, casada com o potiguar josé brasil filho e mãe de três filhos.

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Tradutora uberlandense completa 105 anos de uma história de alegria esuperação

qual será o segredo da longevidade? como alguém pode chegar a mais de um século de

vida ainda serena e relativamen-te saudável? são questões difí-ceis de responder, embora seja esse o desejo da maioria e o grande desafio da ciência. em uberlândia, carregando consigo a lembrança de boa parte da his-tória de nossa cidade, julieta cupertino guimarães celebrou, em outubro do ano passado, 105 anos de existência. julieta cupertino, além de exemplo de uma mulher vigoro-sa que atravessou mais de um século acompanhando a evolu-ção dos tempos, teve uma vida de contribuições para a cidade, seja educando uberlandenses que se torna-ram pessoas de sucesso ou participando de grandes momentos de nossa história. falar hoje de grandes histó-rias como a do praia clube e do uberlândia clube é tam-bém lembrar

da presença de dona julieta em todas elas. sabe-se que longevi-dade não é sinônimo de vida tranquila. mesmo sendo um poço de tranquilidade, dona ju-lieta, como é chamada por to-dos, além de ter passado por al-guns dissabores na idade adulta, como a perda de filhos, teve in-fância e adolescência atribula-das, marcadas por dificuldades e pela luta para sobreviver em uma família de dez filhos. famí-lia e trabalho foram os grandes amores de julieta ao longo da vida. com a primeira, aprendeu a lidar com a vida e obteve os ensinamentos que lhe garanti-riam a trajetória profissional. em sua época, para a mulher, bastava concluir o 1º grau esco-lar. ajudando os filhos na esco-

la, obteve a licen-ça para o magis-tério e, posterior-mente, aos 51 anos, aprendeu a língua inglesa com o tio, nelson cupertino, e con-quistou o direito de ensiná-la em qualquer lugar, com um diploma da universidade de michigan, nos estados unidos. como professora,

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GenTe nOSSA

Julieta nos anos 1950

por CARlOS gUImARÃeS COelhOcolaborou Clarissa Guimarães Aranyi

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JulieTAde todos os filHos

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aposentou-se aos 72 anos. aos 84 anos, começou a carreira de tradu-tora e descobriu a grande ferramen-ta de trabalho da modernidade, o computador, que foi uma boa com-panhia profissional e um grande entretenimento.

Vida em família

julieta foi a primeira filha de um funcionário público, josé cuperti-no e de isolina perfeito cupertino, conhecida como dona zozola. dois de seus irmãos faleceram precoce-mente em uma mesma semana do ano de 1908, quando ela tinha 11 anos, vítimas da gripe espanhola, epidemia que se alastrara pelo pla-neta, matando milhões de pessoas. até os 17 anos, julieta, envolvida com afazeres domésticos, ajudava a cuidar da casa e dos sete irmãos. em um baile à fantasia, para o qual foi convidada pela mulher do pre-feito, conheceu enéas de oliveira guimarães, por quem se apaixonou e com quem se casou. tiveram nove filhos: olavo, isolina, mauro, renato, outro renato, marcelo, fausto, aloísio e maria cristina, to-dos guimarães cupertino, aqui apresentados na ordem de chegada ao mundo. julieta perdeu quatro fi-lhos: renato, aos 2 anos, mauro, em um acidente com um planador aos 21 anos, e marcelo e fausto, os dois com câncer na meia idade. enéas era de família conceituada de prata. ao lado dele, julieta diz ter vivido os melhores momentos de sua vida. o casal tinha agenda social movimentada e participou de momentos marcantes da vida da cidade, como a fundação do praia clube, da associação comer-cial e do uberlândia clube. julieta

dona Julieta com 1 ano de vida

A noiva Julieta entre as mulheres das famílias Guimarães, Cupertino, Savastano, Fonseca e Carneiro

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tem o título número três do praia clube e frequentava o clube até há poucos anos, principalmente quan-do familiares vinham à cidade para celebrar seu aniversário. antes da festa oficial, havia sempre uma tar-de festiva em algum recanto do clu-be. ela lembra bem do início do praia, quando um grupo se reunia para nadar no rio uberabinha no lo-cal conhecido como “prainha”. aos poucos, o número de pessoas foi aumentando e começaram os al-moços beneficentes e as quermes-ses para arrecadar fundos para a construção de um barracão e um vestiário. assim, a prainha come-çou a tomar a forma do clube que hoje é um dos cartões-postais da ci-dade.da uberabinha, do fim dos anos de 1920, julieta recorda-se da primeira jardineira, o veículo de transporte coletivo da época. antes dela, anda-va-se pela cidade a pé ou de charre-te. a jardineira era chamada de “te-reza” pela população. “a criançada adorava. era um veículo aberto e bastante diferente para a época”, lembrou dona julieta.

Vida social

julieta cresceu observando o avô, bernardo cupertino, trabalhar na impressão do jornal “o progresso”, o segundo da cidade, do qual era proprietário, e a dinâmica intelec-tual e a militância política do tio, o professor nelson cupertino. viveu a juventude frequentando as sessões do theatro são pedro e do cine theatro uberlândia. na matu-ridade, frequentava com assiduida-de os salões do uberlândia clube, sempre em companhia do marido.

Julieta, o marido, enéas, e os filhos Aluízio e Cristina (sentados), Fausto, Marcelo, renato, Olavo, isolina e Mauro (em pé)

Julieta é a sócia número 3 do Praia e lembra das tardes na “prainha” no início do clube

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dona Julieta aos 15 anos se dedicando aos livros

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O computador, os livros e uma imagem recente de dona Julieta, ao celular, adequando-se aos tempos modernos

“ uma mulher muito à frente do seu tempo, sempre aberta a conhecer melhor o mundo”

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1 “Minha mãe era muito avançada para uma cidade que tinha apenas 40 mil habitantes. naquele tempo, uma

ligação interurbana era bastante demora-da. ela tornou-se radioamadora, seguindo os passos do pai, José Cupertino. Fascina-do com o aparelho, eu também aprendi o código Morse e, sem que minha mãe perce-besse, digitava o prefixo dela e, quase dia-riamente, me comunicava com mais de 120 países. ela acompanhou a Segunda Guerra Mundial pela rádio bbC, de londres. uma mulher à frente de seu tempo, sempre com abertura para conhecer melhor o mundo.” aLUíziO cUpErTinO gUimarãEs

2 Julieta passou a vida toda no Fundi-nho, centro histórico de uberlândia. Sua história foi registrada no livro

“Chego aos 100 anos de bem com a vida”, escrito por ela em 1997, mas está também registrada no patrimônio arquitetônico da cidade. recentemente, a escola que leva o nome de seu marido, enéas de Oliveira Gui-marães, foi tombada como patrimônio his-tórico de uberlândia. Outro imóvel de im-portância histórica, onde hoje funciona o restaurante Casarão, foi construído pelo tio de Julieta, Alexandre Faria Marquez. A data da construção, 1924, está inscrita na fachada do imóvel.

3 O neto luiz Antônio recorda que ha-via se saído muito mal em uma prova de inglês. A professora comentou o

fato com dona Julieta. A avó chamou-o e lhe passou um “pito”. “Sua mãe fala inglês, eu falo inglês, não há por que você tirar uma nota dessas.” Mas, ela não comentou com ninguém o assunto, até que ele recu-perasse a nota. “Manteve o segredo. isso me marcou muito, o cuidado e a discrição que teve comigo me emocionou muito”, disse luiz Antônio.

TrêS VezeSJulieTA

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julieta acompanhou a evolução dos tempos. sempre foi moderna e, até com pouco mais de 100 anos, navegava na internet e realizava traduções literárias para a editora revan, no rio de janeiro, que per-tence ao seu filho renato. este, ao lado dos irmãos, marcelo e fausto, décadas antes, deram muitas preo-cupações quando viveram momen-tos de difíceis na luta política con-tra a ditadura militar. Hoje, aos 105 anos, dona julieta tem filhos, netos, bisnetos e tataranetos espalhados pelo país e pelo mundo. todos a ve-neram como uma grande dama, que tem uma vida digna e um lega-do de sabedoria, de amor à vida e a necessidade da evolução intelectu-al. talvez seja este o segredo da lon-gevidade: não se entregar às intem-péries e levar a vida com leveza, por mais que o baú de memórias esteja lotado de saudades e, até mesmo, de algumas lembranças tristes.

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O TeMPlOdA MOdAloja vendia tecidos nacionais e importadosque vestiam os mais elegantes da cidade

1943-2013 a gOyana 70 anOs

a s mulheres dividiam os afazeres diários com idas às costureiras, empenha-das com os feitios do ves-

tidos do próximo fim de semana, en-quanto os homens frequentavam alfaiatarias e revezavam ternos de linho de tons claros, próprios para o verão, e os de tons escuros, feitos de

tropical inglês, para quando esfriava. quem se lembra dessa época sabe que os tecidos importados da itália e da frança ou vindos de fábricas do rio e de são paulo eram o carro-che-fe de uma loja de três andares que ficava na avenida afonso pena, em um prédio que existe até hoje. a loja a goyana, que tinha como slogan

“o templo da moda”, vendia perfumes nacionais, roupas íntimas, calçados e tinha uma seção de cama, mesa e banho. inaugurada há 70 anos, descendia de outra, com o mesmo nome, situada a poucos metros dali, onde cyro avelino franco trabalhou como arrumador de estoque. “meu pai era muito trabalhador. nasceu em uma família simples. minha avó era costureira. mas, ele se tornou um dos homens mais ricos desta cidade. andava muito bem vestido, com bons chapéus, mas continuou sim-ples. nada de anéis de brilhante”, lembrou o empresário vicente augusto santa cecília franco.

Comedor de bananas

cyro avelino franco nasceu em indianópolis (mg). mudou-se para uberlândia ainda criança, onde o pai era vendedor das bolachas duchen, uma fábrica paulista inaugurada em 1903 e ainda em atividade. cyro logo conseguiu emprego em uma sapataria da cidade. era encar-regado de apanhar no chão os pregos usados para prender as solas. com o primeiro salário, cyro franco com-prou um cacho de bananas e comeu todas as frutas de uma só vez. “ele não dividiu com ninguém e passou muito mal. mas sempre ajudou mui-to no sustento dos irmãos e até dos sobrinhos”, disse vicente franco. casou-se com a professora maria stella santa cecília, com quem teve dois filhos: vicente , hoje com 78 anos, e paulo antônio santa cecília franco, de 70 anos. cyro franco fundou também a concessionária uberlândia veículos, até hoje em atividade. a goyana fechou em 1981, ano da morte do empresário aos 72 anos.

CYrO AVelinO FrAnCO com os funcionários na escadaria da loja

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CirurGiA PiOneirAiCT foi o primeiro a fazer pontes de safena

em maio de 1996, com a inauguração do instituto do coração do triângulo mineiro (ict) do Hospital

santa catarina, pacientes com problemas cardíacos de uberlândia não precisavam mais ir a são paulo. procedimentos complexos e iné-ditos como angioplastias, pontes de safena e transplantes cardíacos passaram ser feitos na cidade. o ict foi o primeiro da américa lati-na a fazer cateterismos com arqui-vo em cd. no início dos anos 90, o então pre-feito virgílio galassi havia convoca-do um grupo de médicos na prefei-tura. direto como sempre, virgílio disse aos médicos: “chamei vocês aqui para gastarem mais dinheiro. como sou vendedor de uberlândia, vendo a cidade aqui e lá fora”. possíveis investidores na cidade costumavam perguntar ao prefeito sobre a qualidade da assistência médica na cidade. “o doutor vir-gílio nos disse assim: ‘uberlândia é top em telefonia, na área ataca-dista, é o maior polo de armazena-mento de grãos. e por isso gostaria que vocês também fossem tops’. aquilo mexeu com o meu brio. fui embora remoendo o que ele falou”, lembrou o médico carlos salomão, diretor do Hospital santa catarina.quando o próprio virgílio acabou sendo mandado a são paulo para colocação de pontes de safena, adib jatene foi visitar o ex-prefeito. ”que vergonha até o prefeito vir fazer a cirurgia aqui. morei em uberlândia até os 18 anos, o camilo abulmassih é de tupaciguara, o roberto botelho é de araguari. todos cardiologistas. precisamos devolver à terra o que ganhamos dela”, disse jatene. a partir daí, adib jatene e sua

1996 instituto de cardiologia do triângulo

O médico Adib Jatene apresentando como funcionaria o instituto do Coração do Triângulo

Os médicos Carlos Salomão, Abdala Miguel, roberto botelho com o prefeito Virgilio Galassi

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equipe de médicos foram atrás de potenciais hospitais em uberlândia que pudessem receber um centro cardiológico. “eu já vim para uber-lândia desanimado. rodei todos os hospitais e ninguém quis. quando passei a lista de exigência para o car-los (salomão) e ele balançou a cabe-ça dizendo que sim, pensei: ‘ele é doido. o hospital não tinha condição nenhuma”, disse o cardiologista ro-berto botelho, fundador do instituto do coração do triângulo mineiro. mesmo diante do grande desafio, o Hospital santa catarina já vinha se preparando ao longo do tempo em outras especialidades, com parte do aparato para receber o ict. foi mar-cada então uma assembleia entre os 66 médicos cotistas que prontamen-te autorizaram os investimentos pa-ra o novo empreendimento, em um total de 5 milhões de dólares. no jantar de comemoração, em um restaurante de frutos do mar aos fundos do estacionamento do Hospital santa catarina, carlos sa-lomão fez a premonição que logo se concretizou. “no fundo do esta-cionamento tinha uma gruta, com a imagem de santa catarina e eu disse para o roberto (botelho): ‘daqui um ano, você vai fazer o primeiro cateterismo aqui’. exatamente um ano depois isso aconteceu. em seis meses fizemos um prédio de 2,3 mil metros”, disse carlos salomão.

O paciente número 1

adelino rosalen tem uma rotina normal desde que se submeteu a uma ponte de safena em 18 maio de 1996. mesmo aposentado, rosalen, hoje com 80 anos, ainda trabalha em manutenção de veículos e aproveita o bônus daquela que foi a primeira cirurgia cardíaca realizada

em uberlândia. o aposentado se lembra que por cinco meses pro-curou o diagnóstico de uma dor no braço esquerdo. foi em vários espe-cialistas, entre eles neurologistas e clínicos, até que o médico domingos pimentel ulhôa o indicou o recém-inaugurado instituto do coração do triângulo mineiro (ict). “ninguém descobria o que eu tinha. o doutor roberto (botelho) fez o cateterismo e descobriu a veia entupida.”com a facilidade de se tratar na ci-dade onde mora, o aposentado logo fez os exames necessários e se sub-meteu à bem-sucedida cirurgia. “foi uma bênção, porque se eu tivesse que ir para outra cidade, pagar via-gem, hotel para mim e para acompa-nhante, eu não teria condição. além disso foi a sobrevida que tive, a graça de poder trabalhar até hoje”, afirmou o primeiro paciente.três meses depois, outra interven-ção inédita na região foi a da recém-nascida geovânia, na época com três meses, que passou por um cate-terismo. em um ano de existência, o ict realizou 750 procedimentos cirúrgicos.

Telemedicina

apenas dois anos depois de ser inaugurado, o instituto do coração do triângulo mineiro (ict), em parceria com o grupo algar, deu outro título inédito a uberlândia, que passou a ser a primeira cidade do interior do brasil a operar a tele-medicina, considerado pouco tempo depois como o mais avançado siste-ma integrado da américa latina.na época, 40 países trabalhavam com essa aparelhagem. no brasil, eram 18 capitais e uberlândia. o próprio paciente passou a fazer o eletrocardiograma em casa e a transmiti-lo para a central receptora. a conexão acontecia por meio de telefone convencional, celular e até mesmo telefone públicos. segundo roberto botelho, o aten-dimento nas primeiras duas horas após os primeiros sintomas pode salvar mais de 50% das vidas. “e isso se deu graças a uberlândia ter um serviço de telefonia tão eficiente e que nasceu na própria cidade. se fosse em outro lugar, não seria possí-vel”, disse botelho.

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As instalações do instituto do Coração ao lado do Hospital Santa Catarina

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da redação instalada na antiga praça da matriz, 90, hoje praça cícero macedo, no dia 7 de fe-vereiro de 1938, numa segunda-

feira, saiu o primeiro número do “correio de uberlândia”. a edição é a única sem um exemplar no arquivo público municipal, que conserva todos os números do jornal a partir do segundo, que circulou no dia 20 de fevereiro com a manchete “uberlândia, cidade de turismo”. a iniciativa de editar o jornal na cidade foi do fazendeiro josé osório junqueira, proprietário de outros sete jornais no inte-rior de são paulo, entre eles o “correio do oeste” em ribeirão preto. com periodici-dade irregular, o “correio de uberlândia” era administrado pelo filho de junqueira, luiz nelson, tendo como redator-chefe abelardo teixeira. no início da década de 1940, o jornal foi vendido para um grupo de 18 empresários da cidade ligados à união democrática nacional (udn), en-tre eles joão naves de ávila, nicomedes alves dos santos e alexandrino garcia. naquela época, o “correio” era paginado

COrreiO75 AnOS

deSde 1938 uberlândia acontece aqui

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O “Correio” era feito em linoti-pos, máquinas que montavam os textos linha por linha, fundidos em chumbo. em meados de 1950, o jornal instalou a primeira impres-sora rotativa

A edição 2 do Correio, a mais antiga existente no Arquivo Público

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à mão e composto em linotipos, máqui-nas que montavam os textos linha por linha, fundidos em chumbo. a primeira reformulação gráfica ocorreu em meados de 1950, quando a empresa instalou uma impressora rotativa, também tipográfica, comprada do jornal “o popular”, de goiâ-nia. o equipamento, bastante moderno para a época, foi usado até 1989, quando o jornal passou a ser impresso em uma rotativa off-set.a mudança para impressão off-set foi um projeto implantado pelo então superin-tendente do “correio”, arly trindade, que tornou-se viável quando a abc-editora base, hoje algar mídia, importou a nova máquina. o embrião da transformação efe-tiva foram as edições de domingo, chama-das “correio de domingo”, que ajudaram jornalistas e profissionais da área gráfica a se familiarizar com as vantagens do off-set, para produzir o novo “correio”. uber-lândia ganhou um jornal mais ilustrado, com mais espaço para fotografias e bem mais ágil. o “correio”, que levava cerca de 8 horas para ser produzido, com a nova

máquina passou a ser impresso em apenas 1 hora. de 1952 até a o início da década de 1970, valdir melgaço barbosa se manteve na direção do “correio”, alternando o tra-balho no jornal com a carreira política.devido ao envolvimento político, o “cor-reio” tornou-se adversário do jornal “o triângulo”, criado em 1956 por renato de freitas, pessedista roxo, em sociedade com rafael marino neto. o jornal circulava de terça a sábado com oito e depois 12 páginas. o redator-chefe era marçal costa, ao lado de lycidio paes e dos irmãos jacy de assis e ruth de assis. a sede, que ficava na rua santos dumont, passou para a avenida floriano peixoto e, em seguida, para a praça clarimundo car-neiro até se mudar definitivamente para o distrito industrial.em 1971, quando melgaço afastou-se do veículo, a direção passou para sérgio mar-tinelli. o jornal, então, passou a circular de terça a domingo e ganhou o slogan “correio de uberlândia, agora o diário de todos os dias”. “éramos três pessoas para fazer todo o jornal. eu era o diretor, vendia

anúncios, fazia uma coluna e escrevia notícias. o expedito (josé expedito) co-bria o esporte e o quirino (luiz fernando quirino) fazia as crônicas políticas e me ajudava na redação”, afirmou martinelli.

Grupo Algar assume

na fase em que valdir melgaço foi diretor, o jornal era deficitário e a redação de-pendia de recortes de outros jornais para editar todo o espaço das páginas. o telex foi instalado em 1979. em 1971, melgaço vendeu suas cotas para agenor garcia, irmão do comendador alexandrino garcia. martinelli dispensou marçal costa e im-plantou uma nova linha editorial, que ele chamava de “financeira”, ou seja, seguiria os interesses do grupo proprietário. em 1986, o grupo algar assumiu o con-trole acionário do jornal e o mantém até os dias atuais. desde então, o “correio de uberlândia” passou por várias mudanças gráficas e editoriais e se firmou como o principal veículo impresso de uberlândia e da região.

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As máquinas linotipos montavam os textos em linhas de chumbo e a impressora rotativa instalada na década de 1950

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durante o regime militar, logo no início, houve muita gente que, aproveitando do clima

tenso que a revolução provocou, fez denúncias infundadas sobre pessoas com quem tinham alguma rusga. era a famosa “deduragem” que rotulava como comunistas pessoas que tinham pensamentos próprios e uma capacidade crítica mais aguçada.como bastava a denúncia para a prisão ser efetuada, muita gente que passou por esse constrangimento nem gosta de tocar no assunto.por isso, o registro do fato, mas não a menção da fonte.

aqui em uberlândia, uma pessoa que sofreu com isso foi um professor de gramática altamente qualificado. daqueles que conheciam e lidavam com a ortografia como poucos. um mestre em língua portuguesa.e coube a um de seus ex-alunos a triste incumbência de lhe dar a voz de prisão.sem muita polidez, o ex-aluno o abordou e foi logo falando: “teje preso”.o sábio professor sem perder a calma e com muita serenidade retorquiu: “não vou preso não, porque aluno meu não fala errado. se quiser me prender, por favor corrija a expressão, o correto é: esteja preso!”recomendação atendida, lá foi ele para o quartel explicar o que não precisava porque alguém resolveu falar para os militares aquilo que não devia...

“TeJe PreSO!”

Custódio da Costa Pereira, em 28 de novembro de 1909, ainda na época de São Pedro do uber-

abinha, inaugurou a primeira casa de diversões da cidade. ele a batizou com o nome de Theatro São Pedro. era utilizado também como cinema e outros programas de entre-tenimento. O primeiro preço cobrado na bilheteria foi de 500 réis.

VOCê SAbiA?

O Cine Teatro uberlândia, de propriedade de nicomedes Alves dos Santos, foi uma das

mais luxuosas salas de cinema do in-terior brasileiro. Com cerca de 1,2 mil cadeiras estofadas, tinha palco que permitia a utilização também para apresentações teatrais. A recepção de muito bom gosto abrigava amplos bancos para que as pessoas pudessem aguardar a liberação do acesso à sala de cinema. A lanchonete atendia os clientes por ocasião das sessões e funcionava também com acesso pela avenida Afonso Pena. era a preferida para os encontros de articulações e ajustes políticos.

Toda essa suntuosidade tinha um preço que não estava imputado no valor do ingresso, mas sim na exigên-cia do traje masculino para as sessões noturnas: paletó e gravata. Valia tanto

para a primeira sessão, às 19h30, quanto para a segunda, às 21h30.Homem que não quisesse usar ou não possuísse o traje tinha duas alternati-vas, ficar de fora ou ir para o “poleiro”, como era chamado a parte do mezza-nino com entrada independente, des-tinada também aos negros e policiais.

O Cine Teatro uberlândia tinha movi-mentação diária intensa, mas a primei-ra sessão aos domingos era disputadís-sima e tinha um ritual infalível: as moças sentavam primeiro e os homens ficavam circulando pelos corredores fazendo suas insinuações e galenteios, buscando a receptividade que os permi-tisse a recompensa maior de assistir ao filme muito bem acompanhados.bons tempos que, com o passar dos anos, o advento da TV e de novas formas de lazer fizeram com que ficassem ap-enas na recordação de quem os viveu.

CineMA SÓ de PAleTÓ e GrAVATA

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instantâneos

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uM TeMPlO nO CerrAdO

Monges pacifistas e curas espirituais na uberlândia do período entreguerras

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na década de 1930, quan-do a cidade mal chegava aos trilhos da mogiana, nas proximidades do

atual terminal central, e resumia-se ao centro e ao fundinho, havia no alto da avenida brasil uma casa de cômodos ocupada por famílias de colonos japoneses. o advogado joão alberto de carvalho luz, 82 anos, lembra que o terreno ocu-pado pela casa tinha nos fundos uma plantação de abacaxi. “ainda criança, de bicicleta, eu atravessava a mogiana e ia apanhando gabiroba. de vez em quando, pegava um aba-caxi atrás da cerca de arame far-pado da casa dos japoneses. eles ficavam bravos comigo.” em uma fita gravada de posse do historiador antônio pereira, o relo-joeiro rikoto tanaka fala sobre ou- tra casa de colonos japoneses e um templo instalados nas imediações de onde fica hoje o terminal rodoviário. os tanaka chegaram a uberlândia em 1927 e já encontra-ram algumas famílias orientais. eram principalmente agricultores e horticultores e uma pequena parte se dedicava ao comércio. “lembro que nesta outra casa, eles tomavam banho às 17h e dava para gente ver de longe”, disse o advogado carv-alho luz. de acordo com luz, entre os colo-nos japoneses de uberlândia havia um grupo de monges pacifistas que, na década de 1920, teve que partir do japão para o exílio porque se opunha à militarização do país. os monges teriam chegado à ci-dade em meados de 1929 e eram importantes a ponto de receber companheiros vindos do japão em busca de aconselhamento. em uberlândia, havia fiéis da seita omoto, que chegou ao brasil em 1924 trazida pelo missionário teru-

1920-1940 cOLOnizaçãO JapOnEsa

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37 Almanaqueuberlândia deontem e sempre

kichi oyama, fora das colônias japone-sas. a seita foi acolhida por algumas famílias da cidade e começaram a cir-cular notícias de curas que teriam sido obtidas pelas orações e pelo uso da água fluida preconizada pelos adep-tos. de acordo com antônio pereira, um fiel agradecido teria até oferecido um terreno para a construção do tem-plo. tanaka se recorda de curas em uberlândia, depois de enormes gastos com médicos e remédios. as orações eram feitas em japonês e traduzidas para os que não falavam a língua. um dos que recorreram ao tratamento espiritual foi o líder coió marcos de freitas, influente político da cidade. “os colonos japoneses ficaram em uberlândia até 1942, quando, em agosto, o brasil declarou guerra ao eixo (alemanha, itália e japão). apa-receram na cidade policiais do dops (departamento de ordem política e social) que os levaram para são paulo, onde ficaram presos como espiões em campos de concentração até o fim da guerra”, contou carvalho luz. tanaka foi um dos presos, acusado de espionagem. papéis apreendidos com ele como provas foram traduzidos depois de algum tempo: eram cartas comerciais sobre adubos, sementes e implementos agrícolas. libertado, tanaka continuou na omoto, mas o templo de uberlândia foi desativado. anos mais tarde, ele coordenou a re-construção do templo em jandira, no interior paulista, e foi presidente ad-ministrativo da seita por vários anos.

Adeptos da seita oriental Omoto, em frente ao templo da cidade

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diferentemente das noites marcadas pelos grandes espe-táculos teatrais e

musicais, em que os holofotes buscavam iluminar o artista, captando-lhe os movimentos e registrando-lhe o sorriso, exis-tiam em uberlândia noites mal focadas pelas lanternas dos policiais. madrugadas povoa-das pelo tinir de suas armas.o que causava constrangimen-tos, medos e insegurança na população da cidade era a temida cavalaria, que, segundo os jornais da época, era man-tida pelos cofres municipais e ficava alojada na fazenda tubalina, de propriedade do então prefeito tubal vilela. a cavalaria trazida pelo prefeito no início dos anos 1950, após uma greve de condutores de veículos – considerada pacífica pela imprensa –, tinha como um de seus objetivos ordenar o espaço urbano, dele expur-gando negros e pobres: “domingo, às nove horas da noite acima da linha, na rua guarany, soldados da polícia espancaram barbaramente um preto até que ele caiu no chão,

tendo sido depois levado pela ‘carrocinha’. disse o vereador que acha necessário o policia-mento da cidade. mas que es-pancamentos como estes não estão de acordo com uberlân-dia, ‘cujos moços, se precisam de correção, devem ser procu-rados’, legalmente. terminou por afirmar que ‘a situação cada vez se agrava entre os soldados e o povo’, pedindo que o seu protesto fosse acompanhado de um pedido de providências. “(correio de uberlândia, uberlândia, n. 3522, p.1, 22/10/1952).alegando retirar dos prostíbu-los os menores de idade, os beberrões, desordeiros e crimi-nosos, a corporação utilizava-se de métodos que oscilavam entre a extorsão e a agressão física e moral de meretrizes que trabalhavam nessas casas de baixo meretrício: “anteontem, cerca das 19 horas, dois ou três soldados da cavalaria da tubalina penetra-ram na pensão de mulheres de propriedade de negrinha de tal, situada em pequena traves-sa que liga a extremidade alta da rua agenor paes a rua ipi-

ranga, e lá praticaram desor-dens, derrubando mesas e ca-deiras, quebrando garrafas e espancando as habitantes da casa, uma das quais teria fica-do ferida numa perna. os diri-gentes de uberlândia não com-preenderão nunca que esses militares estão constituindo fator de permanente desas-sossego na cidade?”. (correio de uberlândia, uberlândia, n. 3529, p.1, 1/11/1952).essa força militar que causava furor em toda a sociedade, in-cluindo a imprensa, também afrontava impiedosamente as moças de família: as senhoritas cacilda de oliveira, que era professora do liceu de uber-lândia e da escola municipal noturna que funciona no gru-po escolar doutor duarte, e terezinha de oliveira foram agredidas por um soldado da cavalaria, de acordo, também, com os jornais da época. no entanto, o dia a dia da ci-dade não era somente pautado na violência e nos sinais acústicos da repressão. nas noites chuvosas, devido ao silêncio das ruas e casas, ou-via-se o tamborilar monótono

e tranquilizador da chuva que, insistentemente, batia nos telhados, nas copas das ár-vores e nas torres das igrejas, para, logo em seguida, escorrer lenta pelo dorso dos rochedos e das ruas. nesses instantes, diversos indivíduos cediam ao convite sonoro e monótono das águas que copiosamente caíam sobre os telhados, as árvores e as torres para en-tregarem-se ao sono reparador.após as tempestades, escuta-va-se dos quintais e das grandes poças d’água que se formavam nos terrenos baldios a reverberação de uma orques-tra composta pelo lamúrio da rã-de-boca-estreita, o latido do sapo-cachorro, o trinado do sapo grilo-do-brejo, os sons de guizo do sapo-do-campo, o ronco do sapo-roedor e o ar-roto do sapo-boi. das calçadas molhadas, ouvia-se o assobio solitário de um boêmio em-briagado de cachaça e, talvez, de amor.

(*) doutor em História social pela puc/sp. autor do livro “ontem ao luar: o cotidiano boêmio da cidade de uberlândia (mg) nas décadas de 1940 a 1960”. (edufu, 2012)

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SOMbriAS nOiTeSbOeMiA

por júlio césar de oliveira*

A temida cavalaria do prefeito Tubal Vilela em formação na área central da cidade

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A primeira personalidade nacional a receber o títu-

lo de Cidadão uberlandense foi o presidente Juscelino Kubitschek em 1959. A ho-menagem foi criada em 1957 por meio do Projeto de lei 878, de iniciativa do então

vereador renato de Freitas. Algumas das personalidades contempladas não vieram a uberlândia para receber o título, como a atriz Fernanda Montenegro, o apresentador raul Gil e o cirurgião plástico ivo Pitanguy.

JK FOi O PriMeirO CIdAdÃO hONORáRIO

1959 Homenagem da cidade

O presidente Juscelino Kubitschek e renato de Freitas

O presidente Juscelino Kubitschek em visita à Camara Municipal

em 1872, a população es-crava no brasil represen-tava 15,24% do total e, em uberlândia, a proporção

era semelhante. a vila de são pedro do uberabinha, então pertencente a uberaba, era habitada por 3.483 brancos entre homens e mulheres, enquanto o número de negros era de 545 (15,64%). os dados foram levanta-dos em um censo elaborado naquele ano, a única contagem de população ocorrida durante o período imperial em todo o território brasileiro. os da-dos foram divulgados em 2012 pela fundação de amparo à pes- quisa do estado de minas gerais.

Analfabetismo

o censo de 1872 registrou quase 10 milhões de habitantes no país, distribuídos em 21 províncias. cada província se subdividia em mu-nicípios, que, por sua vez, se subdi-vidiam em 1.440 paróquias, as unidades mínimas de informação. a coleta foi realizada nas paróquias.além do levantamento do número de habitantes, foram investigadas informações específicas sobre pes-soas com deficiência, acesso à escola e profissões exercidas, entre outras. em uberlândia, 2.960 pessoas eram analfabetas e apenas 523 em toda a cidade sabiam ler e escrever, o que correspondia a 17% da população livre, porque escravos não eram alfa-betizados.

PeSQuiSAdiVulGA núMerOSinédiTOS

1872 o censo imperial

39 Almanaqueuberlândia deontem e sempre

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dO FundinHOPArA O MundO

artista da capa HélViO de liMA

conversar com ele é como dar um passeio pela uberlândia dos velhos tempos, quando ainda havia concursos de

calouros nas rádios e o curso clássico, hoje ensino médio, onde o então aluno

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e futuro artista plástico já se destacava entre os colegas de classe nas aulas de desenho. Hélvio de lima, 65 anos, nasceu na antiga avenida dos andradas, hoje raulino cotta pacheco, próximo ao córrego cajubá, que deu lugar à avenida

getúlio vargas. com o pai, iracy de lima, que era pintor de paredes, aprendeu a trabalhar com as cores, e por incentivo da mãe, maria pereira lima, dona de casa e bandolinista, começou também a cantar. “o sonho da minha mãe era que a gente

O filho de uma família de artistas

de uberlândia tem sua obra nas

cidades do planeta

A Catedral de Santa Terezinha em construção na praça Tubal Vilela, no fim da década de 1930

Hélvio com Adélia e os filhos, isabela e renan

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fosse artista. aos 6 anos, fui cantar nas rádios difusora e educadora. como prêmio, ganhava um guaraná big boy, um macarrão erlan ou um brinquedo da casa sabag. foi uma infância feliz”, disse Hélvio.o artista plástico era sobrinho do maes-tro carlos de alcântara, responsável pela orquestra tapajós, no qual o ir-mão de Hélvio, o saxofonista Hélio de lima também tocava. Hélvio é ainda irmão da pianista maria terezinha de jesus lima e de Helmo de lima, o único sem dom para a música. “meu avô materno, antônio alves pereira, tocava trombone na jazz band ás de ouro, onde minha avó carlota rezende pereira tocava piston”, lembrou Hélvio.

O desenho

apesar da boa voz e de tantos músicos na família, ainda no curso clássico da escola bueno brandão, Hélvio era o aluno preferido do professor de dese-nho eurico silva. “foi o professor eurico quem me estimulou. lembro-me bem dele. usava bigodes, era per-fumado e estava sempre de terno. era escritor, cronista e morava no Hotel goyano. naquela época, tínhamos muito respeito pelos professores”, afir-mou Hélvio. já adulto, Hélvio chegou a se matricular em pequenos cursos

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A jazz Band ás de Ouro e o maestro, avô de Hélvio, Antônio Alves Pereira, o 2º da esquerda para direita. O tio Carlos de Alcântara é o último à esquerda

Hélvio (menor) com os pais e irmãos

particulares de desenho e pintura com a professora neusa barbosa neto. em 1968, fez as primeiras exposições de arte. uma no clube recreativo ara-guarino, na vizinha araguari, e outra no uberlândia clube e, a partir daí, em vitrines de lojas da cidade. na faculdade de filosofia, ciências e letras, da qual foi aluno, fez as primeiras mostras indi-viduais em 1970 e 1971. foi apresentado, por meio da escri-tora martha pannunzio, à marchande lourdes saraiva, que logo se encantou pelos quadros dele e, por sua vez, o apre-sentou a josé de moraes, o braço direito de cândido portinari e que desenhou o painel de pastilhas do uberlândia clube, executado por geraldo queiroz. Hoje, mesmo sem nunca ter deixado de morar na terra natal, a obra de Hélvio de lima se espalhou pelo brasil e mundo, com trabalhos vendidos para os esta-dos unidos e europa, acumulando da mesma forma, prêmios nacionais e inter-nacionais. “não me arrependo de não ter ido embora. aqui é minha cidade, com pessoas de boa índole, fechadas, mas muito solidárias”, disse Hélvio.Há 35 anos, Hélvio é casado com a escul-tora adélia de lima, com quem tem dois filhos, isabela e renan. Há dez anos, fun-dou o jornal “fundinho”, que conta as histórias dos moradores do bairro mais tradicional e onde uberlândia, assim como ele, deu os primeiros passos.

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A ruA dAlAVOurAVia recebeu o primeiro calçamento da cidade

1900 avenida afonso pena

na virada do século 19 para o 20, o comercian-te arlindo teixeira con-tratou o engenheiro da

mogiana, james mellor, para fazer uma planta urbanizada do espaço que ia do cemitério que havia na praça clarimundo carneiro até a estação da mogiana, onde hoje é a praça sérgio pacheco. ele traçou uma espécie de tabuleiro de xa-drez com cinco vias mais largas que iam de um ponto ao outro e várias travessas mais estreitas.essa parte de cima chamou-se “cidade nova” e o bairro fundinho “cidade velha”. a avenida afonso pena, por sua vez, recebeu o nome de rua da lavoura e uma das primeiras residências cons- truídas nela foi a do farmacêutico antônio vieira gonçalves. era uma avenida de terra, que possuía árvores plantadas em seus dois lados. a rua recebeu o primeiro calçamento da cidade, em 1922, da praça tubal vilela à clarimun-do carneiro. obra do prefeito joão severiano rodrigues da cunha, o

Vista da avenida Afonso Pena, coma concessionáriairmãos Garcia e a torre da catedralao fundo

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por anTôniO pErEira

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joanico. ali começou o vaivém da rapa-ziada nos domingos e feriados e o carnaval de rua. a maioria dos assassinatos e tentativas também aconteceram nela. os alto-falantes, precursores das emissoras de rádio, ali se instala-ram e o maior cinema de minas gerais, o cine uberlândia, com 2,5 mil lugares. na década de 1960, tinha tantos anúncios em neon que ganhou o slogan de “cidade dos lumino-sos”. os primeiros arranha-céus se ergueram nela: o edifício da drogasil e o tubal vilela. os des-files cívicos e carnavalescos se

realizavam nela. o mais famoso rei momo, o Hipopota, descia a avenida e abria o carnaval na praça tubal vilela.até 1970, foi impedida de expan-dir-se pelas linhas da estrada de ferro que, naquele ano, foram retiradas, durante a administra-ção de renato de freitas.mas por que o nome do ex-go-vernador afonso pena? muito mais justa a homenagem seria se a avenida se chamasse coronel carneiro, fernando vilela, au-gusto césar ou joão severiano rodrigues da cunha: homens aos quais a cidade deve as sementes de quase tudo o que tem.

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detalhe das obras de calçamento da avenida Afonso Pena

na avenida Afonso Pena começou o vaivém da rapaziada aos domingos e feriados e o Carnaval de rua

eduardo Machado foi um viajante por-tuguês boa praça que veio morar em uberlândia na década de 40. um dos fundadores do Clube Português foi também um dos organizadores das fa-mosas bacalhoadas que nos anos 60 e 70 atraíam a sociedade uberlandense ávida pela fantástica culinária lusitana.bem-humorado, Machado, por força de sua atividade de representante comer-cial, ia todo mês a São Paulo. nessas viagens, nunca deixava de ir ao Mer-cado Municipal onde comprava baca-lhau e uma deliciosa linguiça tipo por-tuguesa que servia aos felizardos ami-gos aqui em uberlândia. Tanta frequên-cia aliada à simpatia não demorou que estabelecesse uma relação de amizade com o dono da banca que passou a lhe chamar de “português” de Minas. numa dessas idas, ficou frustradíssimo ao saber que o estoque de linguiça ha-via acabado. Como o dono da banca já se tornara seu amigo e sabia da sua pro-cedência mineira perguntou-lhe em que cidade morava. Ao receber a res-posta de uberlândia soltou um largo sorriso e informou ao incrédulo Macha-do que a linguiça que ele tanto apre-ciava e ia comprar em São Paulo era produzida em uberlândia. um produto da fábrica de banha Wanda, tradicional estabelecimento da avenida estrela do Sul, que produzia diversos derivados de carne suína. O irreverente Machado ficou sabendo que a linguiça que tanto apreciava e que ia comprar em São Pau-lo era na verdade produzida aqui. A amizade continou, mas o dono da ban-ca perdeu um fiel cliente das linguiças.

lINgUIÇAbuMerAnGue

“português” de minas

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O INCANSávelFAzedOr de eSTrAdAS

1911 fernando vilela

fernando vilela, pio-neiro na construção de estradas no bra-sil central, nasceu

há 140 anos em canápolis, a 121 km de uberlândia. estu-dou engenharia na escola politécnica do rio de janei-ro. recém-formado, mudou-se para ituiutaba, onde foi eleito agente executivo e presidente da câmara muni-cipal, o que na época corres-pondia à função de prefeito da cidade. ocupou o cargo de 1908 a 1911.

uberabinha

a região praticamente não tinha estradas e, em agosto de 1911, vilela mudou-se para uberabinha de posse de uma concessão do governo do estado para abrir uma estrada que ligasse a cidade a ituiutaba. uberabinha era

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O engenheiro queatraiu recursos da iniciativa privada para um dos mais ousados projetosdo brasil Central

uma das primeiras jardineiras que fazia a ligação entre as cidades da região

o lugar ideal para centralizar uma grande rede rodoviária, porque a cidade já era o ponto final da ferrovia mogiana, era o centro dos mercados do triân-gulo mineiro e sudoeste goiano e a única com iniciativa privada capaz de investir na construção das estradas. além disso, vilela tinha credibilidade para unir os grupos políticos cocões e coiós em torno de um mesmo proje-to. em agosto de 1912, em frente à estação da mogiana, a popula-ção da cidade e as principais autoridades participaram da sessão solene que marcou o iní-cio dos trabalhos de construção da estrada intermunicipal, que contava com uma verba estima-da em 250 contos de réis – mais de três vezes o orçamento do município, que em 1912 havia sido de 73 contos de réis. foi criada uma sociedade anônima, a companhia mineira de auto viação intermunicipal, com

O engenheiro Fernando Vilela liderou, a partir de 1911, a construção da malha rodoviária da cidade

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sede na chácara goiandira, que ficava onde hoje é a esqui-na da avenida floriano peixo-to com a avenida joão naves de ávila. os dois primeiros motoristas contratados tive-ram que aprender a dirigir.era enorme o espanto da po-pulação, acostumada apenas a ver carros de bois, com a frota da companhia: três modernos caminhões fiat de três tonela-das, um carro reboque para 2 mil quilos, o ônibus fiat de 12 lugares e três carros overland para cinco passageiros.em setembro de 1913, foram entregues os primeiros 74 km, que ligavam uberabinha a monte alegre de minas e, em janeiro de 1915, completaram-se os restantes 80 km até

ituiutaba. em 1916, a extensão da rede operada pela empresa passaria para 333 km com a construção do trecho ligando uberabinha a bom jardim do prata. a companhia transpor-tava cargas e passageiros e de-cidiu ampliar os percursos para municípios de estados vizinhos. entre outras iniciati-vas, foi construída a rodovia entre itumbiara (go) e morri-nhos (go), um dos empreen-dimentos mais ousados da história rodoviária do país, que atraiu recursos da iniciati-va privada para uma obra com mais de 500 km de extensão.

fonte

“das sesmarias ao polo urbano: formação e transformação de uma cidade”, de oscar virgílio pereira

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Mesmo precárias, estradas eram a base do crescimento regional

A construção de estradas foi responsável por intensa distribuição de mercadorias

gilberto garcia, produtor de programas como “os trapalhões” e “chico anysio show”, pai das atrizes isabela e rosana

garcia, foi funcionário do “correio de uberlân-dia” no fim da década de 50. gilberto era res-ponsável por etiquetar e despachar os exem-plares dos assinantes para moacyr franco, o cantor, fazer as entregas de bicicleta. de acordo com moacyr franco, gilberto co-nheceu uma moça e ficava horas namorando pelo telefone do jornal. como não conseguia etiquetar todos os jornais, começou a escon-dê-los por cima do forro do teto. mesmo diante das reclamações dos assinan-tes, o diretor do jornal, valdir melgaço, não desconfiava de nada. em um dia de chuva for-te, o teto da sala de expedição foi abaixo com o peso de quilos de jornais velhos acumula-dos. gilberto garcia foi demitido na hora e co-meçou sua carreira de sucesso na televisão.

TeMPeSTAde de PAPel

namoro no jornal

Gilberto com a esposa dirce e os filhos Gilberto, ricardo, isabela e rosana

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O brasil, num tempo não tão longínquo assim, tinha padrões de comportamento bastante preconceituosos. um deles que

tristemente perdurou até ali pelo final dos anos 50, início da década de 60, era o de não permitir a associação de pessoas negras nos principais clubes sociais das cidades.uberlândia infelizmente não fugiu à regra e por algumas décadas não permitiu o ingresso de negros no quadro de associados do mais importante clube recreativo da cidade, o praia. esse episódio para ser esquecido na história do clube, acabou sendo responsável também pelo surgimento de boatos que ganharam vida e sobreviveram ao longo dos anos. o mais famoso deles dava conta de que até pelé, o rei do futebol, havia sido barrado na portaria do praia. o fato tem sido propagado com tanta ênfase e por tantas pessoas, que no imaginário popular é considerado absolutamente verdadeiro.

o porteiro do praia, otair rodrigues silva, mais conhecido como pedro, com a autoridade de quem comanda a portaria do clube há mais de 60 anos, em recente depoimento ao programa “uberlândia de ontem e sempre” afirmou categoricamente que isto jamais aconteceu.acrescentou que, por um tempo, a norma de não admitir pessoas negras como sócias do praia realmente prevaleceu, mas que negros eram convidados por sócios e iam ao clube.portanto, pelé nunca foi barrado no praia clube. aliás, há uma passagem muito interessante quando ele, acompanhando a equipe do cosmos, esteve almoçando por lá.depois de visitar as instalações do praia, simpático como sempre foi, fez questão de elogiar a cozinheira e lhe dar um beijo no rosto. segundo consta (e pode ser que isto também seja um boato) , ela teria ficado uns três dias sem tomar banho apenas para não tirar o troféu do rosto...

Pelé nO PrAiA

O primeiro decreto-lei autorizando a cons-trução do Mercado Municipal data de 1923. Porém, a construção na rua Olegário Maciel, 255, só iniciou em 1944, no mandato do prefeito Vasconcelos Costa.

90 AnOS dATAS

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1982 lenda urbana

Pelé, cercado por sócios, visita o Praia Clube em 1982 com o time do Cosmos

A primeira edificação da igreja do rosário foi planejada em 1876, e deveria ser construída na atual praça doutor duarte. Mas em 1891, Arlindo Teixeira, mem-bro da Comissão Procu-radora da irmandade de nossa Senhora do rosário propôs a mu-dança de lugar. desta forma, ela foi iniciada em 1893, em um terreno vago onde atualmente é a praça rui barbosa, que era, naquela época, uma área bastante afastada do centro urbano.

120 AnOS

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por ilma de moraes

O salário de um vereador na uberlândia de hoje gira em torno de r$ 15 mil mensais, além de uma verba indeni-zatória de até r$ 10 mil. Mas, houve um tempo em que a remuneração de um vereador era simbólica: um salário mínimo mensal pelos serviços prestados à cidade. Os três relatos a se-guir relembram a vida pú-blica de vereadores que atuaram no legislativo Mu-nicipal quando não havia altos salários (ou até mesmo salário algum), mas que ti-veram mandatos significati-vos para o desenvolvimento da nossa cidade.

Angelino Pavan

depois de eleito verea-dor por cinco vezes pelo psd e exercer em várias gestões o cargo

de secretário municipal, angeli-no pavan tornou-se um marco na vida política de uberlândia. a musicista cora pavan cappa-relli, única filha de angelino, lembra que seu pai veio de ube-raba para uberlândia, aos 16

A SeRvIÇO dO eleiTOr

1950/60 quando os vereadores não tinHam salários

48 Almanaqueuberlândia deontem e sempre

Angelino Pavan no dispensário dos pobres no Mercado Municipal na década de 1960

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anos, para trabalhar na livraria cos-mos. interessou-se por contabilidade, tipografia e estudou inglês e francês. cora conta que, desde jovem, pavan gostava de fazer trabalhos voluntários e acabou tomando gosto pela política. eleito vereador, angelino era rotaria-no e maçon. empresário, dono de uma livraria e uma tipografia, ocupou a presidência da associação comercial e industrial de uberlândia (aciub) por duas gestões, quando construiu a sede da entidade na avenida joão pi-nheiro. “meu pai foi um batalhador na política. mesmo sem a alta remunera-ção dos dias de hoje, ele não via difi-culdades em servir à população da cidade.”

Amir Cherulli

contemporâneo de pavan, o ex-vereador amir cherulli, hoje com 77 anos, recorda-se bem dos 34 anos de intensa

vida parlamentar. ele conta que seu gosto pela política está no sangue e,

Amir Cherulli emcampanha,

49 Almanaqueuberlândia deontem e sempre

reynaldo Cazabona prepara ata em sessão da Câmara

aos 10 anos de idade, trabalhou na campanha política do seu tio manoel crosara, presidente do prp (partido de representação popular), distri-buindo santinhos e folhetos. em 1962, pelo prp, amir cherulli fez sua primeira campanha para vereador, apoiando o candidato para prefeito raul pereira de rezende, vencedor do pleito daquele ano. eletricista e enca-nador, o “homem do paletó xadrez”, como era chamado no “correio de uberlândia” pelo jornalista luiz fer-nando quirino, afirma que, naquela época, os vereadores tinham outras profissões das quais tiravam seu sus-tento. ele ressalta ainda que as campa-nhas eram modestas, feitas muitas vezes com dinheiro próprio ou doa-ções e consistiam em comícios nos bairros e no centro da cidade, nos quais a distribuição de panfletos e santinhos e os pronunciamentos ao ar livre divulgavam as propostas dos candidatos. “tudo era feito por muito amor à cidade e não por dinheiro”, disse cherulli.

reynaldo Cazabona

o advogado aposentado rey-naldo cazabona, 75 anos, recorda-se que, desde os tempos da faculdade de

direito, em uberaba, sempre gostou de fazer política. em 1962 elegeu-se vereador pela udn. segundo cazabo-na, não existiam assessores parlamen-tares e apenas os funcionários da casa auxiliavam o vereador. cazabona lem-bra das animadas rodas de conversas no antigo senadinho, reduto político da cidade ao lado do cine uberlândia. “Havia efervescência política na cida-de! em 1964, a revolução jogou nossa constituição no lixo e começou um período de muita perseguição e re-pressão a todos.” cazabona, um dos fundadores do partido de oposição ao regime, o mdb, recorda que o governo militar determinou que apenas os municípios com mais de 200 mil ha-bitantes podiam remunerar os verea-dores. durante quatro anos foram ex-tintas as remunerações na câmara.

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HOMenAGenS vivas

A cidade de uberlândia tem poucos órgãos e logradouros públicos homenageando pessoas vivas

Humilde, nossa maestrina chegou a contestar o significado dessa ho-menagem.

”quando fiquei sabendo que o conser-vatório levaria meu nome, fiquei preocu-pada. eu havia sugerido que se chamasse ladário teixeira, um homem de muita importância para a música e que deixou uma grande obra, mas os três deputados que colaboraram para a transformação do conservatório falaram que não abririam mão de que o conservatório levasse o meu nome. disseram que eu estava fazendo uma doação muito importante para o estado de minas. eu tinha a escola há mais de dez anos, doei 18 pianos, acordeões violinos, diversos instrumen-tos e toda a minha biblioteca particular. ao mesmo tempo que tenho satisfação me esforcei muito para não desapontar, é uma responsabilidade muito grande em vida ter uma instituição de tamanha importância com o meu nome.”

o centro administrativo virgilio galassi também foi outra dessas homenagens, pois foi feita ainda com o ex-prefeito vivo. tanto que ele exerceu seu último man-dato no prédio que tinha seu nome.

a lei federal nº. 6.454, de 24 de outubro de 1977, que proibe que se dê o nome de pessoas vivas a prédios ou outros bens públicos, acabou sendo responsável pela retirada do nome de paulo ferolla do terminal central.

certamente, a mais conhecida é a avenida rondon pacheco, nossa principal via que leva o nome desse benfeitor da cidade e um

dos mais respeitados homens públicos do nosso país.o acanhado teatro anexo ao uberlândia clube também tem o nome desse ilustre uberlandense.

“ muito gratificante e confortador o cidadão conviver na sua terra natal recebendo manifestações de carinho e apreço. é uma forma de reconhe-cimento da população e dos setores

representativos da câmara municipal e do próprio poder executivo no sentido de prestigiar o trabalho desenvolvido em favor da comunidade mineira e especialmente o compromisso político que sempre tive com uberlândia, com minas gerais e com a nossa amada pá-tria querida, o brasil”, disse rondon.

outra homenagem viva está no conser-vatório estadual que tem o nome da responsável por sua criação e uma das pessoas que mais lutam pelo seu forta-lecimento e crescente significado, cora pavan capparelli.

50 Almanaqueuberlândia deontem e sempre

Avenida rondon Pacheco

Cora

celso macHado

O estádio municipal tem o nome de outra pessoa viva, João Havelange. Homenagem contestada, pois ele nada teve com a história da cidade. existe um projeto na Câmara para mudar essa denominação

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com 180 km percorridos, das principais nascentes em uberlândia até a foz em tupaciguara, o rio

uberabinha, no tupi “água que bri-lha”, foi testemunha da história da cidade desde os seus primórdios, quando a região, ainda chamada sertão da farinha podre, era domi-nada pelos índios caiapós. segundo a antropóloga lídia mei-relles, os caiapós formavam o maior grupo indígena em densida-de habitacional, transitando desde o pontal do triângulo mineiro ao sul de goiás, noroeste de são paulo e leste do mato grosso do sul. “isso fez com que o antropólogo darcy ribeiro chamasse a região de gran-de caiapônia. os caiapós formaram um grande cinturão humano que bloqueou as frentes de expansão econômica.

A GrAndeCAiAPÔniA

SéCulO 17 a cOLOnizaçãO dO cErradO

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Os caiapós eram o maior grupo da região em densidade habitacional

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foram um grande empecilho para a colonização portuguesa.” a resistência caiapó era tamanha que, segundo o historiador luis augusto bustamanti, a ocupação das terras da região começou bem mais tarde do que no restante de minas gerais. “por aqui havia apenas uma estrada que ligava são paulo a goiás, por onde passavam tropeiros. o resto era ocu-pado pelos caiapós que acabaram di-zimados pelos paulistas.”

Caiapós dizimados

os índios foram expulsos entre 1754 e 1758 e substituídos pelos bororo e pa-recis, do mato grosso, trazidos como soldados pelos paulistas e mais tarde empregados como de mão de obra pelos colonos que ocuparam a área. o coronel antônio pires de campos, que perseguiu e dizimou caiapós, foi

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o responsável pela distribuição dos novos moradores indígenas por al-deias, onde construíam uma igrejinha e suas casas. mas, logo a região come-çou a ser ocupada por colonos vindos do sul de minas gerais. “e a área dos índios acabou invadida, como ainda acontece hoje em dia”, afirmou a an-tropóloga lídia meirellesno livro “brasil novo mundo”, o geó-logo alemão Wilhelm von eschwege afirma que um certo antônio eustá-quio, sargento-mor responsável pelo povoamento do triângulo mineiro, desalojou 871 índios na faixa de terra entre o rio das velhas e o rio grande,

onde hoje fica uberaba e uberlândia. duas dessas aldeias se transformaram nos povoados de sant’anna e rio das pedras, que mais tarde se transforma-ram nas cidades de indianópolis e cascalho rico. em uberlândia, uma dessas aldeias, chamada rocinha, possivelmente tornou-se o atual dis-trito de tapuirama.

fonte

série expedição rio uberabinha, produzida pela close comunicação com apoio da algar telecom e aprovação da lei estadual de inventivo à cultura

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A série “expedição rio uberabinha” levantou informações valiosas so-bre os Caiapós em uberlândia.

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a presença de pessoas tidas como “diferentes” na vida pública brasileira não é algo recente. Há décadas,

em uberlândia inclusive, figuras tor-nam-se folclóricas por saírem dos padrões da sociedade e frequenta-rem os salões políticos, muitas vezes levantando bandeiras estapafúrdias

QueM Se leMbrA de ASTOlFO SilVA? entre delírios e questionamentos, ele marcou presença na Câmara Municipal

déCAdA de 1960 deu a louca na política

Foto rara de Astolfo Carlos da Silva, primeiro à esquerda, entre figuras importantes de uberlândia

cidade, na praça clarimundo car-neiro.se estivesse vivo, astolfo hoje estaria feliz de ver um sonho rea-lizado, pelo qual fez inúmeros discursos, boa parte deles em pra-ça pública em cima de tambores. ele defendia arduamente a cons-trução de um teatro municipalpara a cidade.segundo o memorialista antônio pereira, astolfo era uma figura simpática, que conhecia todos os vereadores da casa. se as suas fa-las, em maior parte, não tinham nexo, já era outro assunto. mas, ele próprio levava a sério o que dizia. em um plano fictício, por exemplo, se lançou candidato avereador e arrastou consigo a tru-pe das pessoas excêntricas mais populares da cidade. o seu candi-dato a prefeito era jerônimo coe-lho, um lenhador por profissão, e para deputados ele lançava no-mes como maria do pito aceso e paco, entre outros, todos perso-nagens reais de uberlândia, cuja insanidade mental era atestada pela população.se a candidatura de astolfo ocor-reu em seu delirante plano imagi-nário, houve ao menos uma oca-sião em que ela quase se tornou real. em 1988, o pdt chegou a lançar a sua candidatura. ele se apresentava aos eleitores com espada e com o figurino de um super herói dos desenhos anima-dos da época, o “He-man”.uma de suas propostas era criar o “recanto das mariposas”, um lo-cal próximo a cruzeiro dos peixo-tos destinado ao público glt, que, naqueles tempos, eradenominado por expressões me-nos adequadas.essa forma inusitada de sua can-

“ uberlândia conta com a presença em praça pública de um candi-dato pobre contra um montão de cobre”

e, não raro, mobilizando a socieda-de. entre essas pessoas, na cidade, uma marcou a cena política em mea-dos do século passado. era astolfo carlos da silva, um cidadão comum, com alguns sinais de demência, fre-quentador assíduo da câmara muni-cipal de uberlândia, quando esta funcionava onde está o museu da

por CARlOS gUImARÃeS COelhO

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“ Astolfo frequentava as sessões da Câmara na época em que elas aconteciam no Palá-cio dos leões”

didatura não passou despercebida pela rede globo, que veiculava pí-lulas com 1 minuto de duração apresentando candidatos exóticos.mas a justiça eleitoral impugnou-a, alegando que ele não tinha domínio de suas capacidades mentais para a legislatura. uma contradição, uma vez que astolfo era eleitor. se ele tinha a capacidade de votar, portan-to poderia também se eleito.o estranho é que, embora com a saúde mental comprometida, astol-fo demonstrava certa erudição. mesmo com conteúdos desconexos e com muita inventividade, seus textos eram bem rechonchudos, com palavras difíceis e também de difícil compreensão.o historiador político eduardo afonso registra que astolfo era figu-ra frequente, quase sempre única, nas sessões da câmara de vereado-res. e muitas vezes era lhe dado o direito de fazer perguntas e até mesmo apresentar propostas.afonso lembra outros fatos pitores-cos dessa figura que foi marcante na vida de uberlândia.o primeiro deles até pela coincidên-cia, pois ambos comemoravam ani-versário no mesmo dia, 28 de agos-to. astolfo tinha mania de produzir folhetos convidando todos que en-contrava para comemorar com ele essa data no recinto da câmara mu-nicipal. nesse dia, o movimento nas sessões costumava ser outro...de tanto conviver no meio político, conseguiu acesso ao pró morar e obteve uma casa no bairro tancre-do neves.e mais do que isso, o prefeito da época, renato de freitas, escolheu sua residência para que o ministro tancredo neves fizesse oficialmen-te a inauguração do conjunto resi-dencial.

astolfo pintou cada parede da casa de uma cor e orgulhosamente abriu as portas para que tancredo fizesse o ato solene. como não havia rede elétrica e nem bar nas redondezas, o brinde foi feito com uma provi-dencial coca-cola natural que as-tolfo tinha em casa.no quintal dessa residência, abriu um buraco de 6 metros que chama-va de aterro sanitário onde deposi-tava o lixo de toda vizinhança.como era muito bem relacionado e muito solidário falava para todos os seus conhecidos que consideras-sem aquela casa como deles. só que não deixava isso ficar como conver-sa demagógica, tirava cópia das cha-ves e dava para cada um deles.parece folclore e não deixa de ser, mas há quem conte que mais de 400 pessoas tinham as chaves da casa do astolfo. que, afinal, era de-les também.

astolfo carlos da silva morreu no início dos anos de 1990, de mal sú-bito, já idoso, nessa conhecida e compartilhada casa, no bairro tan-credo neves.

Frases de Astolfo“eu era cristão... e sou cristão... não, agora eu não sou mais cristão.agora, eu sou o diabo!”

“eu tenho quatro sinais de bala no corpo. agora, eu digo, se ‘eles’ de-rem um tiro ni mim, têm que acer-tar. porque comigo, se jogo uma la-ranja pra cima, não cai nem bagaço”

“eu não sou deus. deus foi feito pra carregar a cruz... e eu não voucarregar a cruz. os tempos muda-ram”

“uberlândia conta com a presença em praça pública de um candidato pobre contra um montão de cobre”

“o candidato pobre confia nos ho-mens que dirigem o destino das leis e se responsabiliza considerando a receita elaborada pelo seu líder e como responsável e de nosso muni-cípio que participa das ideias coti-dianas como sofredoras pelos irres-ponsáveis que tampam a boca do povo com demagogia”

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“brevemente, a cidade ficará livre de um dos seus maiores e mais graves problemas, verda-deiro entrave ao seu progres-so: os trilhos da Mogiana no Centro da cidade. uberlândia tem a sorte de ver o serviço de mudança caminhar acelera-damente. A nova estação vai ficar localizada bem distante do Centro, nas imediações do Aeroporto eduardo Gomes, e diversas avenidas, atualmente interrompidas pelas passa-gens de nível, terão prossegui-mento. A Afonso Pena, nossa principal artéria, terá continu-ação, atentando, brevemente, um traçado monumental.”

a notícia, publicada em 23 de setembro de 1969 pelo “correio de uber-lândia”, revela o que re-

presentava a presença da estação da mogiana no centro de uberlân-dia, onde hoje é o terminal central e a praça sérgio pacheco, com trilhos nas avenidas joão naves de ávila e monsenhor eduardo. mesmo tendo servido à cidade por 98 anos, apontada como propulso-ra do desenvolvimento econômico e social da região, a estação acabou

A eSTAÇÃOvAI AO ChÃO

déCAdA de 1970 estrada de ferro

Pátio da estação da Mogiana na Av. Afonso Pena

depois de 98 anos, as instalações da Mogiana se tornaram um obstáculo ao desenvolvimento

O prédio da estação da Mogiana sendo derrubado

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se tornando um problema à me-dida que os espaços urbanos pas-saram a ser mais valorizados. as notícias sobre a mudança dos trilhos, segundo o historiador an-tônio pereira, já haviam começado a aparecer em 1959, quando a as-sociação comercial reivindicou da empresa a instalação de uma balança no pátio da estação. como resposta, a mogiana disse que não ia fazer novos investimentos porque estava em estudo a retirada da estação da região central. “dois anos depois, tudo continuava como estava. nem balança, nem estação”, lembrou pereira. empresários e políticos come-çaram a pressionar a empresa. o crescimento urbano estava sendo bloqueado. em princípio, a mogi-ana concordou em instalar a nova estação em alguns quarteirões acima do entroncamento da ave-nida cesário alvim com a rodovia. os trilhos passariam por baixo das avenidas afonso pena e floriano peixoto. nos fins da década de 60, saiu o edital de concorrência para a construção da nova estação. as obras começaram em 1968. a mogiana cedeu os terrenos da região central à prefeitura por 99 anos, quando seriam devolvidos para a empresa mediante ressarci-mento dos benefícios ou a compra definitiva dos terrenos pelo execu-tivo por 50 salários mínimos. a prefeitura planejava construir uma praça no lugar ocupado pela estação. rondon pacheco era

chefe da casa civil e, apesar de adversário político do prefeito re-nato de freitas, interferiu para que fosse feita a doação do terreno, que passou a se chamar praça sérgio pacheco, graças à interferência do então vereador josé pafume. “o movimento para retirar a fepasa (que incorporou a mogiana) do centro da cidade foi apoiado por rondon pacheco. fiz minha parte, mas a obra deve ser creditada a ele”, afirmou renato de freitas em entrevista a celso machado em 1998. sérgio pacheco era filho de rondon pacheco e havia falecido vítima de um acidente automobilístico. renato de freitas reuniu na inauguração da nova estação além governador de são paulo, abreu sodré; o governador de minas, is-rael pinheiro; o ministro dos trans-portes andreazza e o presidente da mogiana, antonio seixas. a praça sérgio pacheco, projetada pelo urbanista burle marx, foi en tregue à cidade em novembro de 1976, mas esta é uma outra história a ser contada.

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Vista da demolição e os pedestres passeando sobre os trilhos que estavam sendo arrancados

A passarela por sobre os trilhos da Mogiana ligando a avenida João Pessoa com o bairro brasil

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odublador ionei silva, a voz do mestre dos magos no desenho “caverna do dragão”,

com 40 anos de carreira e 70 de vida, começou a trabalhar aos 10 anos, quando venceu o concurso para apresentar um programa infantil na rádio difusora, em uberlândia. foi radialista e diretor da rádio educadora, trabalhou na rádio bela vista, até seguir para são paulo em 1964.longe de casa e sem muitos contatos nas rádios, foi feirante, tintureiro e vendedor de enci-clopédias até ser convidado pa-ra um teste no estúdio ibrasom. “lá descobri o que era dubla-gem, fiz o teste e passei.” no início dos anos 1970, foi para o rio de janeiro dirigir o estú-dio de dublagem cine castro. silva era encarregado de revisar os textos traduzidos, adaptar e sincronizar o tempo das falas. com o fechamento da empresa em 1974, trabalhou por mais 22 anos na Herbert richers, a maior da américa latina, entre “homéricas brigas com o dono”. além do mestre dos magos, sil-va deu voz a personagens co-nhecidos da tv como o tubarão do desenho “tutubarão”, cli-ffjumper, dos “transformers”, sanguessuga em “she-Ha” e yabba-doo, o irmão de “scooby-doo”. foi ainda a voz de tony baretta na série “baretta” e de Hideki goh em “o regresso do ultraman”. dublou muitos filmes como “a família ad-dams”, “indiana jones e a últi-ma cruzada” e “conan, o bárba-ro”, entre muitos outros. silva se afastou das dublagens no início dos anos 2000.

MeSTre dOS MAGOSdublador apresentou programa infantil na difusora de uberlândia aos 10 anos

GenTe nOSSA ionei silva

O dublador ionei Silva na varanda de seu apartamento em uberlândia

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O dublador ionei Silva na varanda de seu apartamento em uberlândia

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Cartas dos leitores

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parabéns pelo extraordinário evento na cachaçaria do dedé, um point novo que realmente você mostrou para a sociedade. essse pessoal tem que valorizar os grandes mestres e você conse-guiu reunir em um só local o clã de nossa sociedade, seus amigos, familiares e pessoas afins, no grande lançamento da edição 3, do almanaque. sua filha educa-damente me presenteou com os três volumes e vou vê-los com calma, pois trabalhamos em ou-tros dois eventos até a uma hora da manhã. meus cumprimentos, parabéns e saudades de pessoas que você mencionou no almana-que e que são de saudosas me-mórias, como o meu ex-patrão renato de freitas, na antiga rá-dio cultura.mAURO meNdONÇA revista dystaks

parabéns pelo evento de mais um lançamento de conteúdo excep-cional. o almanaque é um impor-tante instrumento da consciência da nossa história, retratando que a uberlândia de hoje não é obra do acaso e sim fruto de muito tra-balho e personagens pioneiros e visionários.FAbriCiO SAnGeneTTO

recebi há alguns dias sua gentil remesssa da edição de número 3 do almanaque “uberlândia de ontem e sempre” que, como as duas anteriores, muito me agra-dou. acho muito interessante ler sobre o passado de determinadas cidades e ver como progrediram com o passar do tempo – é o caso de uberlândia, cidade muito bo-

nita e progressista. quanto à re-vista em si, é dispensável qual-quer comentário: papel couché, belas fotografias; enfim, qualida-de gráfica e conteúdo de primei-ríssima ordem. parabéns e muito obrigado por sua cortesia. CéliO MATTiOli lavras (mg)

foi com enorme prazer que rece-bi o calendário 2013 “uberlândia cidade menina”, o livro “do fio @o sem fio” e as três edições do “almanaque - uberlândia de on-tem e sempre”. nasci em uber-lândia, em 1959, e há 17 anos resi-do em araguari. porém, voltei a atuar profissionalmente em uberlândia, desde 2011. as pági-nas das revistas me trouxeram ternas lembranças da infância e juventude, com fatos marcantes e os riquíssimos personagens da cidade. iniciei minha atividade profissional na sabe, antes ainda de sua aquisição pelo grupo al-gar, quando trabalhava na gráfica. parabéns a celso machado e toda equipe.edilVO MOTA

venho parabenizar celso macha-do e sua equipe, pela iniciativa e pela qualidade da publicação “uberlândia de ontem e sempre”: francamente não tinha ideia do que seria a sua revista. bem cui-dada, bem editada, uma revista para se colecionar. lendo a entre-vista concedida por meu pai, re-nato de freitas, 14 anos atrás, me-ses antes de sua morte, me emo-cionei. tive um reencontro com meu pai ao lê-lo. as fotos foram bem escolhidas. a introdução fi-

cou enxuta. não teria reparos a propor. está lá, nas páginas do almanaque, para quem conheceu ou ficou conhecendo agora, um dos filhos mais devotados da ci-dade de uberlândia. nestes tem-pos de desalento ante a corrup-ção generalizada, sua voz disso-nante me lembra de que é possí-vel e normal querer que política e retidão não sejam ideias contradi-tórias ou incompatíveis. obrigada a vocês. renATA de FreiTAS

parabéns pelo almanaque 3. desejo sucesso na divulgação e espero por novos volumes.luiz AlberTO rOdriGueS

vocês estão de parabéns pela noi-te de lançamento da edição 3 do almanaque “uberlândia de ontem e sempre.” sucesso absoluto com um padrão sensacional. aprovei-to esta oportunidade para sugerir uma pauta para os próximos al-manaques que estão, a cada nu-mero, se superando. assistindo a um dos filmes no evento vi a usi-na elétrica que foi criada pelo co-ronel carneiro. pelo que se vê e se sabe, ele foi o primeiro no mundo a pensar em “sustentabilidade”, pois, no século 19, construiu uma usina hidrelétrica que tocou uberlândia até a década de 60 do século 20. quer mais sustentabi-lidade que isso? foi a força e luz que ele criou que deu condições (infraestrutura) para o progresso de uberlândia. vale a pena um capítulo para os próximos belos e hoje insubstituíveis almanaques. parabéns e obrigado.CleANTO vIeIRA gONÇAlveS

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