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ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA GERENCIAL E O PRINCÍPIO DA EFICIÊNCIA:

ORIGEM, EVOLUÇÃO E CONTEÚDO

Kleber Rocha Sampaio1

Elisa Ivna Pinheiro Costa2

RESUMO

O objetivo geral desse estudo é investigar a origem e evolução do princípio da eficiência,

buscando analisar seu conteúdo e relações com os demais princípios que regem a

Administração Pública. O princípio da eficiência impõe à Administração Pública e a seus

agentes o dever de desempenhar suas funções com rapidez, perfeição e rendimento

compatíveis, de modo a satisfazer os anseios dos administrados. O grande desafio é pesquisar

ferramentas modernas de administração, para que estas possam ser implantadas de forma a

melhorar a qualidade do serviço, trazendo consigo uma maior eficiência nas atividades

públicas.

Palavras Chaves: Princípio da Eficiência. Administração Gerencial. Qualidade.

ABSTRACT

The general objective of this study is to investigate the origin and the evolution of the

principle of efficiency, that seeks to analyze their contents and relations with other principles

governing the Public Administration. The principle of efficiency requires the Public

Administration and its agents the duty to perform their duties quickly, perfection and

performance compatible, so as to meet the aspirations of the administered. The great

challenged is to research modern tools of administration that can be deployed to improve the

quality of the service, bringing whit it greater efficiency in public activities.

Keywords: Principle of Efficiency. Administration Management. Quality.

1 INTRODUÇÃO

1 Mestre em Direito Público pela Universidade Federal de Pernambuco (UFPE). Possui Aperfeiçoamento em

Serviços Púbicos pela Universidade Estadual do Ceará (UECE). Especializando em Docência do Ensino

Superior pela Faculdade Cearense (FAC). Professor de Direito Administrativo do Curso de Direito da Faculdade

Cearense (FAC.). Advogado na Assessoria Jurídica da Secretaria da Saúde do Estado do Ceará.

[email protected]. 2 Estudante do 5º Semestre do Curso de Graduação em Direito da Faculdade Cearense (FAC). Estagiária da

Procuradoria Jurídica do Conselho Regional de Farmácia no Ceará. [email protected].

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A gestão da administração pública, sob a perspectiva de reforma administrativa,

evoluiu através de três modelos básicos: A Administração Patrimonialista, Administração

Burocrática e a Administração Gerencial.

Na Administração Gerencial a reforma do aparelho do Estado adota os valores da

eficiência e qualidade na prestação de serviços públicos, abrindo espaço para uma maior

participação dos agentes privados e das organizações da sociedade civil.

A noção de eficiência, mesmo que implicitamente, é um valor inerente a qualquer

ideia de boa administração. O Estado brasileiro há muito tempo havia incorporado esse valor,

visto que ao reestruturar a Administração Pública, através do Decreto-Lei nº 200/1967,

determinara a necessidade de estruturar a administração pública de modo a desempenhar, com

eficiência, ações voltadas à satisfação das necessidades da sociedade.

É, entretanto, com a Emenda Constitucional nº 19/1998 que a eficiência é elevada

à condição de princípio constitucional (art. 37 da CF). Só então, esse valor passou a ser

percebido como de observância obrigatória pela Administração Pública, ao lado dos

princípios da legalidade, impessoalidade, moralidade e publicidade.

Um dos objetivos era inserir o Estado brasileiro na economia globalizada, tanto

que a Reforma do Estado foi pensada sob o influxo da ideologia da eficiência do setor

privado, buscando-se reestruturar a função estatal sob a ideia da eficiência gerencial no

desempenho de suas atividades administrativas.

Ocorre que a ideia de eficiência foi tomada emprestada da Ciência Econômica e

aplicada no âmbito da administração pública, sem preocupações quanto à necessária

adaptação para esse setor. A eficiência no setor privado é vista como flexibilização dos meios

para atingir um resultado de maior lucratividade. A Administração Pública, no entanto, não

visa lucro, nem pode se afastar dos meios, principalmente quanto isto significar se apartar de

outros princípios, como, por exemplo, o princípio da legalidade.

Daí surge o grande problema a ser analisado: qual o sentido jurídico do princípio

da eficiência frente aos outros princípios que regem a administração púbica?

Assim, o objetivo geral desse estudo é investigar a origem e evolução do princípio

da eficiência, apresentando-o como integrante do regime jurídico administrativo, buscando

analisar seu conteúdo e relações com os demais princípios que regem a Administração

Pública, assim como identificar a distinção entre os mesmos.

Entende-se que o princípio da eficiência não é um princípio novo no regime

jurídico administrativo, contudo sua positivação na Constituição Federal teve o corolário de

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despertar à sociedade para cobrar da Administração Pública a prestação de serviços públicos

de qualidade. Seu conteúdo jurídico diferencia-se das ciências econômicas, bem como suas

relações e semelhanças com os outros princípios da Administração Pública, não lhe retiram a

individualidade, nem lhe autorizam excluir os demais princípios. Esse princípio, entretanto,

por si só, não é capaz de impor a qualidade ótima dos serviços públicos, devendo ser buscada

sua efetividade a partir da incorporação de novas tecnologias de gestão, permitindo meios de

trabalho de qualidade, com a consequente mudança de comportamento dos agentes públicos,

garantindo-se uma boa administração.

O interesse pelo tema decorre da necessidade de se melhor compreender o

conteúdo deste principio, de modo a contribuir, através do debate, para que o mesmo venha a

ser efetivado em todas as suas dimensões e assim se possa, um dia, vivenciar a excelência da

gestão da Administração Pública.

Este artigo está estruturado da seguinte forma: após a introdução segue noções

sobre o percurso da positividade do princípio da eficiência, onde se destaca sua positivação

como consequência de uma política mundial, que exigia a implantação de um Estado mínimo.

Apresenta-se esse Estado mínimo como uma ilusão, visto que as funções e atividades da

Administração Pública não foram reduzidas e, faz-se um breve apanhado sobre a significação

e positividade desse princípio na legislação brasileira e no direito comparado. Adiante,

aborda-se a questão do conteúdo do princípio da eficiência, tecendo-se, primeiramente,

comentários sobre o conteúdo das normas principiológicas, com fim de distingui-las das

normas regras, para em seguida expor sobre o conteúdo e conceito do aludido princípio,

fazendo-se, ainda, uma relação desse princípio com os demais, tanto em suas semelhanças,

quanto diferenças. Ao fim, vêm as considerações finais e as referências bibliográficas.

2 O PERCURSO DA POSITIVIDADE DO PRINCÍPIO DA EFICIÊNCIA

O princípio da eficiência foi introduzido no texto constitucional pela Emenda

Constitucional nº 19/98, com objetivo primordial de romper com a administração burocrática,

informada pelo princípio da estrita legalidade, visando instalar uma administração gerencial, a

partir de uma gestão voltada para os resultados.

Na última década do século passado, o mundo presenciava grandes

transformações nas economias capitalistas. Os grandes grupos transnacionais se firmavam na

economia mundial, submetendo todos os governos dos Estados nacionais a uma economia

globalizada. Os países em desenvolvimento encontravam-se endividados, de modo que o

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Fundo Monetário Internacional e o Banco Mundial despontaram como instrumentos de

domínio estratégico dos países desenvolvidos sobre os demais. Esse domínio concretizou-se a

partir da imposição de políticas econômicas que priorizaram a privatização e o capitalismo de

livre mercado para aqueles que precisavam de financiamento (HOBSBAWM, 2003).

O Brasil precisava deixar de ser um estado intervencionista, patrocinador do bem-

estar social, para adotar uma postura de estado gerencial, conforme exigia a economia

globalizada. Nesse contexto surge a Reforma do Estado, patrocinado pelo Governo Fernando

Henrique Cardoso, capitaneada pelo Ministro Bresser Pereira.

Essa Reforma buscava melhorar a organização do Estado, incluindo a

profissionalização de seus servidores, a otimização de seus recursos financeiros e de seu

sistema institucional-legal, de modo a proporcionar uma relação mais harmoniosa com a

sociedade civil. A ideia era diminuir o tamanho da máquina operacional do Estado, abrindo

espaço para uma maior participação da atividade privada no campo do bem-estar social e no

da atividade econômica, impropriamente ocupada pelo Estado. Acreditava-se que o “estado

mínimo” possibilitaria uma maior especialização do núcleo estratégico do Estado, que

passaria a tomar decisões mais adequadas e ofereceria serviços públicos com maior eficiência.

Buscou-se então implantar o estado mínimo, transferindo-se atividades sociais e econômicas

para a atividade privada, assumindo o Estado o papel de agente regulador. Para tanto,

venderam-se empresas estatais, descentralizou-se a prestação de serviços públicos, foram

instituídos os contratos de gestão, as agências reguladoras e as organizações sociais, a fim de

imprimir maior efetividade à reforma estatal (TORRES, 2004).

É nessa conjuntura do cenário mundial, e da realidade interna do Brasil, que

ocorre a positivação do Principio da Eficiência na Constituição Federal.

2.1 O Princípio da eficiência e a ilusão do Estado Mínimo

A Constituição Federal de 1988 já nascera sob o influxo dos ventos neoliberais

que sopravam em todo o mundo globalizado, adotando formalmente à ideia de que o estado

mínimo seria capaz de atuar com maior eficiência, razão porque já previa a redução da

participação na atividade econômica (art. 173 CF) e a possibilidade de descentralização de

várias atividades antes desenvolvidas pelo Estado (art. 175 CF). Em face disso, a Reforma

Administrativa promovida pela EC nº 19/98, em especial com inserção do princípio da

eficiência no texto constitucional, provocou a sensação de que surgia um novo regime jurídico

administrativo.

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Muitos juristas (MODESTO, 2000) perceberam a positivação do princípio da

eficiência na Constituição como a consolidação da ideologia neoliberal. Outros propugnaram

a ruptura com o modelo de organização burocrática, por permitir que a administração pública

passasse a cuidar mais dos resultados externos do seu mister do que dos meios e processos.

Entretanto, como assevera Modesto (2000, p. 65):

Na sociedade contemporânea, a Administração Pública permanece cumprindo um

papel central e estratégico na conformação social. [...] Embora submetido a uma

dieta orgânica, o Estado contemporâneo não interrompeu o seu crescimento

enquanto instituição social, ampliando continuamente a sua intervenção nos

domínios do "mundo-da-vida". [...] O Estado hoje manipula uma parte expressiva do

produto interno bruto nacional. Fomenta e tributa, executa e delega serviços, regula

a atividade econômica e cultural em dimensões nunca vistas, controla, reprime e

estimula, produzindo e reproduzindo tanto a riqueza quanto a exclusão social. Numa

expressão de síntese: é a organização nacional central na transferência de recursos

entre os diversos grupos sociais. O Estado não foi reduzido ao mínimo, nem é uma

instituição em processo adiantado de decomposição, como alguns sugerem.

Desta forma, não se pode pensar na atualidade em um Estado mínimo, aos moldes

do liberalismo puro. O Estado contemporâneo busca legitimidade e está em constante

crescimento: se busca diminuir sua estrutura administrativa; também necessita ampliar seu

papel social e regulador das atividades privadas. Isto porque só o Estado é capaz de equilibrar

os interesses privados individuais com os sociais, de modo a preservar o bem comum e o

desenvolvimento nacional, efetivando os fins sociais esperados pela coletividade, associando

eficiência e equidade.

A ideia do estado mínimo, portanto, é uma ilusão. O Estado cresce e também as

dificuldades para satisfazer as necessidades sociais. Em decorrência, questiona-se sua

capacidade de agir e à qualidade do seu agir. Essas questões, entretanto, “não são dirigidas a

um Estado liberal, mas a um Estado Democrático e Social, executor e fomentador da

prestação de serviços coletivos essenciais” (MODESTO, 2000, p. 66). Tal ocorre porque é o

Estado Social que se ocupa da prestação dos serviços públicos, que são financiados com

recursos do povo. Esses serviços, portanto, devem retornar à sociedade com o máximo de

eficiência possível, a fim de satisfazer as necessidades sociais. Esclareça-se, por oportuno,

que a eficiência é o que almeja a atividade de gerir negócios, assim é exigida em todo o atuar

da Administração Pública, seja na obtenção de utilidades para o cidadão, na regulação da

conduta pública e privada, na vigilância ao abuso de mercado ou no manejo dos recursos

públicos.

2.2 Eficiência: obrigação e positividade na Carta Magna.

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Antes da Carta Magna ora em vigor já existia a exigência de uma administração

pública eficiente, basta verificar o Decreto- Lei 200/67 e, implicitamente, toda gestão almeja

ser eficiente. “Nunca houve autorização constitucional para uma administração pública

ineficiente” (MODESTO, 2.000, p. 68). Contudo, a obrigação da efetivação do princípio da

eficiência do serviço público não se fazia real, pois o serviço público era percebido pela

sociedade como uma espécie de filantropia.

Com a positivação do princípio da eficiência em sede constitucional, o

constituinte derivado possibilitou para a sociedade uma nova percepção, qual seja: um serviço

público não filantrópico, mas obrigatório, cujo fim se aperfeiçoaria na prestação do serviço

mais satisfatório para os administrados ou nas palavras de Diego Figueiredo (2005, p. 107) “a

melhor realização possível da gestão dos interesses públicos, em termos de plena satisfação

dos administrados com os menores custos para a sociedade”.

Nesta senda, a obrigação da Administração Pública de prestar serviços públicos de

maneira eficiente passou a ser um dos objetivos básicos da Administração Pública. Como

leciona Modesto (2.000, p. 68),

A boa gestão da coisa pública é obrigação inerente a qualquer exercício da função

administrativa e deve ser buscada nos limites estabelecidos pela lei. A função

administrativa é sempre atividade finalista, exercida em nome e em favor de

terceiros, razão pela qual exige legalidade, impessoalidade, moralidade,

responsabilidade, publicidade e eficiência dos seus exercentes. O exercício regular

da função administrativa, numa democracia representativa, repele não apenas o

capricho e o arbítrio, mas também a negligência e a ineficiência, pois ambos violam

os interesses tutelados na lei.

Por muito tempo cultivou-se a ideia de serviço público prestado sem dispêndio

financeiro por parte dos usuários. Como sobredito, seria uma espécie de filantropia estatal.

Tal concepção, historicamente, fora utilizada como justificativa para explicar o oferecimento

de serviços públicos de má qualidade. Esse entendimento, contudo, não resistiu ao desgastante

confronto frente à realidade, haja vista a elevada tributação a que o brasileiro é submetido, a

fim de custear tais serviços, tornando o oferecimento da eficiência do serviço público um

dever e obrigação.

O mérito de sua positivação, portanto, está em despertar o sentimento social de

descontentamento diante a ineficiência dos serviços públicos prestados pelo Estado brasileiro,

reascendendo uma nova esperança para, a partir da pressão popular, esse princípio vir a ser

efetivado, passando a ser ofertado serviço público satisfatório, adequado e no menor custo

possível.

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2.3 O princípio da eficiência no Direito Comparado.

O princípio da Eficiência pode ser considerado como resultante de uma

necessidade de abrir o Direito Administrativo e, consequentemente, a Administração Pública,

à influência de outros ramos do conhecimento humano, notadamente das Ciências da

Administração e da Economia. Sua elevação a princípio constitucional decorreu de uma

tendência mundial, a qual demonstra que as reformas do Estado empreendidas em vários

países na década de noventa, do século passado, se fundaram justamente no princípio da

eficiência, com fim de estabelecer uma administração gerencial.

Miragem (2013, p. 37-38) associa o princípio da eficiência com o princípio da boa

administração, existente no direito italiano. Inspirado na obra do italiano Enrico Bassi,

Lezioni de diritto ammnistrativo, observa que as duas expressões se consideram sinônimas em

direito administrativo, pois o princípio da boa administração significa que a administração

pública deve usar no seu modo de atuar, a diligência e inteligência, respeitando a regra da boa

administração, de modo a assegurar a eficiência da atividade administrativa. E arremata

registrando que o agente público cria com base em seu próprio conhecimento profissional, a

regra de comportamento, a qual se der bons resultados, constituirá o precedente para inspirar

outros agentes em casos análogos. Surgindo daí, “a praxe administrativa que, inspirada nos

diversos conhecimentos técnicos e científicos, imprimirá significado ao princípio da boa

administração ou da eficiência”. Assim, pode-se resumir a boa administração como aquela

seguidora da moral administrativa, eficiência, justiça e racionalidade.

Dando ênfase à correlação entre o principio da boa administração e o da

eficiência, Miragem (2013, p. 38) assevera:

O Princípio da Eficiência possui lugar de destaque no direito administrativo

contemporâneo. Primeiro, porque possibilita a administração pública se atualizar,

adotando modelos de gestão focados em metas e resultados, inclusive mediante sua

contratualização entre órgãos de administração superior e os agentes públicos

responsáveis pelo alcance dos objetivos definidos. E, do mesmo modo, orienta a

otimização dos recursos financeiros como base da atuação administrativa. Por fim,

permite avaliar a própria conduta do agente público, não mais sob o aspecto formal

tradicionalmente associado ao exame sobre o modelo de exercício de poder,

vinculado à legalidade ou discricionário, subordinado à decisão do administrador,

mais em vista dos resultados alcançados.

O jurista, entretanto, alerta para o fato de que a atuação da administração de modo

a assegurar a eficiência de desempenho, pautada na administração gerencial ou de resultados,

não pode incorrer em “deficiência de juridicidade”. A questão é compreender o processo de

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transformação da Administração Pública, não como simples reestruturação de órgãos e

carreiras, mas, sobretudo, como fomento a uma nova relação entre o Estado e a sociedade.

Assim, ainda na esteira de Miragem (2013, p. 38):

Na doutrina de direito comparado, esta nova visão da administração pública – e,

nessa linha de raciocínio, do direito administrativo – comporta um novo modelo de

relação desta com os administrados. Na França, resulta da transformação, a partir de

sucessivas reformas administrativas, da visão de administrados-clientes

(l’admnistré-client) de serviços públicos dos anos de 1980, para a de administrados-

cidadãos (l’adminisré-citoyen), na bem apanhada expressão de Jaques Chevallier,

que conflui para um modelo baseado em quatro aspectos: participação,

transparência, qualidade e cidadania. Em nosso direito, a melhor doutrina identifica,

com breves distinções, estes novos traços da administração pública, a partir de

princípios elementares dessa nova visão, a eficiência, a transparência e participação.

Nota-se, portanto, que ao se analisar o Princípio da Eficiência no plano do Direito

Comparado, tem-se a noção de que há uma exigência de uma administração publica de

qualidade, ou pelo menos desburocratizada e de boa economicidade. Esses, na essência, são

os parâmetros desejados por aqueles ordenamentos jurídicos que buscam a eficiência em sua

Administração Pública.

3 SENTIDO JURÍDICO DE PRINCÍPIO E O PRINCÍPIO DA EFICIÊNCIA

O jurista Bandeira de Melo (2001, p. 772) lembra que “é o conhecimento dos

princípios que preside a intelecção das diferentes partes componentes do todo unitário que há

por nome sistema jurídico positivo”. Esses princípios, como registra Cunha Jr. (2006, p. 12) já

foram considerados meros instrumentos secundários ou auxiliares na função integrativa do

direito e hoje, com o influxo do pós-positivismo, são considerados verdadeiras normas

jurídicas, “as mais importantes de todas, responsáveis pela harmonia e coerência do sistema

jurídico que condicionam a própria validade desse sistema”.

Em razão disso, para melhor compreensão do tema, faz-se necessário a distinção

entre norma regra e norma princípio, pois ambas integram o sistema normativa e são

indispensáveis ao equilíbrio do direito, porém se não compreendidas e utilizadas de forma

adequada, podem causar prejuízos irreparáveis a todo o sistema jurídico.

3.1 Normas princípios e normas regras.

Para Soares (2013, p. 46) as normas regras disciplinam uma situação jurídica

determinada, exigindo, proibindo ou facultando uma conduta em termos definitivos. Já as

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normas princípios expressão uma diretriz, prescrevendo o agir humano em conformidade com

os valores jurídicos, possuindo, assim, um maior grau de abstração, irradiando-se pelos

diferentes setores da ordem jurídica, embasando a compreensão unitária e harmônica do

sistema normativo. O jus filósofo destaca que havendo contradições entre normas regras,

fatalmente uma das regras será excluída para aplicação ao caso concreto, entretanto quando a

antinomia for valorativa não haverá a exclusão de qualquer dos princípios, uma vez que esse

conflito se resolve pelo critério da ponderação, aplicando-se com maior intensidade o valor

mais adequado à situação.

As regras jurídicas desempenham papel diferente dos princípios, pois aquelas

“descrevem fatos hipotéticos, possuem nítida função de disciplinar as relações intersubjetivas

que se enquadrem nas molduras típicas por elas descritas.” Os princípios são “multi

funcionais, podendo ser vislumbradas as funções supletiva, fundamentadora e hermenêutica”.

A função supletiva está representada pelo fato dos princípios servirem como elemento

integrador do direito, preenchendo as lacunas do subsistema normativo do direito. Na função

fundamentadora os princípios se apresentam como ideias básicas que servem de embasamento

ao direito positivo, são os alicerces ou vigas mestras do sistema normativo. Por sua vez, a

função hermenêutica dos princípios jurídicos é percebida pelo fato de os princípios orientarem

a interpretação e aplicação de todo o sistema normativo, inclusive das regras jurídicas

(SOARES, 2013, p. 48-49).

Didier (2011), observando a importância dos princípios para a interpretação das

regras jurídicas, diz que princípio é uma espécie normativa, cuja hipótese de incidência e

consequente normativo é aberta, visto que não possui o fim de estabelecer normas, mas sim

interpretar as normas regras:

Os princípios exercem, ainda, em relação às normas menos amplas, uma

função interpretativa, na medida em que servem para interpretar normas

construídas a partir de textos normativos expressos. Não se admite uma

interpretação de um texto normativo que dificulte ou impeça a realização do

fim desejado pelo princípio. (DIDIER, 2011, p. 35)

De fato, ao se desrespeitar um princípio, desrespeita-se verdadeiramente todo o

sistema jurídico, dado que todo ele é construído e alicerçado conforme seus princípios

norteadores implícitos ou explícitos. Ao contrário, as normas regras, que possui consequente

normativo e hipótese de incidência fechados, visando normatizar situação específica, ao serem

desrespeitas ocasiona lesão tão somente para essa norma regra, não a todo um sistema.

Dado o alcance dos princípios jurídicos, pode-se dividi-los em: princípios

fundamentais, princípios gerais e princípios setoriais. Para o que interessa mais de perto, os

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princípios setoriais, segundo Soares (2013), “estabelecem os vetores axiológicos e

teleológicos que orientam a compreensão e aplicação de ramos mais específicos ou

particularizados do direito”, como os previstos no art. 37, caput, da Lei Maior que prescrevem

os princípios que regem a Administração Pública, dentre eles o da eficiência.

Nesse momento, faz-se relevante ressaltar que os princípios não podem ser

considerados isoladamente, de modo que a eficiência não se sobrepõe aos demais princípios,

devendo ser observado em consonância com todos os valores que informa a Administração

Pública.

3.2 Conceito e conteúdo jurídico do princípio da eficiência.

O conceito de eficiência, segundo Moreira Neto (2005, p. 106) foi construído fora

dos domínios da ciência jurídica, tendo sua origem a partir da Revolução Industrial, quando

foi percebido “como relação de um produto útil e aquele teoricamente possível com os meios

empregados”. Posteriormente, passou para a Ciência da Economia, na qual foi entendido

como conceito de produtividade, isto é, de “uma relação mensurável ou estimável entre

produto e insumos”, daí chegando à administração privada e à pública.

Corroborando essa evolução do princípio da eficiência, Gomes (2012, p. 46-47)

adverte que o conceito de eficiência é característico das empresas privadas, em que a busca do

lucro constitui a finalidade principal. Se uma empresa é lucrativa, otimizando seus lucros,

com respeito às regras de governança corporativa, então é eficiente e isso é comprovável

através de suas demonstrações financeiras. Contudo, na Administração Pública a finalidade

precípua é a satisfação do interesse público, o qual é um referencial cuja aferição não é tão

objetiva quanto à aferição do resultado econômico de uma empresa, “de modo que o padrão

de eficiência a ser exigido no setor público deve ser auferido de modo diverso”.

Nesse ponto, merece realce a lição de Miragem (2013, p. 39) quando esclarece

que o aspecto mais relevante do princípio da eficiência consiste em determinar, do ponto de

vista jurídico, “à introdução na Administração Pública de técnicas de gestão de resultados e de

um dever jurídico geral de conduta finalística, conduzida ao interesse público, por parte dos

agentes públicos”. Esse dever, contudo, não pode ser interpretado isoladamente, nem

exclusivamente de acordo com o conceito econômico de eficiência, pois requer um conceito

jurídico de eficiência. Sob esse aspecto, Neto (2005, p. 106) assinala:

Destaca-se sua origem em estudos jurídicos doutrinários de vanguarda,

desenvolvidos desde meados do século XX, por juristas do porte de Raffaele Resta e

de Guido Falzone, no sentido de superar o conceito de poder-dever de administrar,

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afirmado pela administração burocrática, empenhada apenas em lograr eficácia, para

estabelecer, como um passo adiante, um dever da boa administração, que passou a

ser respaldada pelos novos conceitos gerenciais, voltados à eficiência da ação

administrativa pública. [...] passou-se a reconhecer não ser o bastante praticar-se atos

que, simplesmente, estejam aptos a produzir os resultados juridicamente deles

esperados, o que atenderia apenas ao conceito clássico de eficácia, Exigiu-se mais,

que esses atos devam ser praticados com tais qualidades intrínsecas de excelência,

que possibilitem lograr-se o melhor atendimento possível das finalidades para ele

prevista em lei.

As exigências das qualidades intrínsecas da excelência devem ser definidas

através de parâmetros objetivos, previamente fixados, destinados à aferição dos resultados

alcançados pela ação administrativa. Tais parâmetros, explica Neto (2005, p. 106) poderão ser

fixados pela lei, pelo ato administrativo, pelo contrato administrativo, sob critérios de tempo,

de recursos utilizados, de generalidade do atendimento ou de resposta de usuários, “tendo

sempre em conta que o conceito de eficiência jamais poderá ser subjetivo, de outro modo,

chegar-se-ia ao arbítrio no controle”.

Sintetizando esses parâmetros objetivos, Gomes (2012, p. 46-47) diz que o

princípio da eficiência “impõe à Administração Pública e a seus agentes o dever de

desempenhar suas funções com rapidez, perfeição e rendimento compatíveis, de modo a

satisfazer os anseios dos administrados.” Ele explica que a rapidez, significa que a

Administração Pública não pode retardar indevidamente a pratica de seus atos, pois isto se

configura ato de improbidade administrativa. A perfeição traduz-se pela observância dos

corretos e adequados padrões técnicos fixados para a prestação de determinado serviço

público e, por fim, o rendimento se verifica pelo exato equilíbrio na relação custo-benefício

na prática de determinado ato administrativo.

Destaca-se da definição acima dois aspectos inatos ao conceito jurídico de

eficiência (DI PIETRO, 2003, p. 83): “pode ser considerado em relação ao modo de atuação

do agente público”, do qual se espera o melhor desempenho possível de suas atribuições, para

lograr os melhores resultados; “e pode também ser visto em relação ao modo de organizar,

estruturar e disciplinar a Administração Pública”, com o mesmo objetivo de alcançar os

melhores resultados no desempenho da atividade administrativa.

De ambos se exige a gestão da coisa pública com a menor burocracia possível e

comprometida com os resultados. Para tanto, impõe-se a necessidade de se estabelecer metas

e objetivos claramente fixados, com a finalidade de obter-se a administração ótima,

assegurando-se excelência na qualidade dos serviços a ser prestado à coletividade, com

observância do equilíbrio na relação custo benefício.

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Assim, o princípio da eficiência busca em seu ínterim a “produtividade,

economicidade, qualidade, celeridade, presteza, desburocratização e flexibilização da

administração pública” (RODIGUES, 2012. p -210). Mas para que esses fins sejam

alcançados, faz-se indispensável uma mudança de comportamento dos agentes públicos e da

sociedade em geral. É preciso que o Estado incorpore modernas ferramentas de

administração, a fim de que possa melhorar a qualidade do serviço e materializar a eficiência

nas atividades públicas.

Nesta direção, José dos Santos Carvalho Filho destaca que falar de eficiência

(2014, p. 31):

Significa que a administração pública deve recorrer à moderna tecnologia e

aos métodos hoje adotados para obter a qualidade total da execução das

atividades a seu cargo, criando, inclusive, novo organograma em que se

destaquem as funções gerenciais e a competência dos agentes que devem

exercê-las.

Isto é, o desenvolvimento de novas tecnologias e métodos devem sempre ser

fortes aliados para melhor servir os administrados, até mesmo criando novos organogramas

em que tragam ênfase as funções gerenciais.

3.3 Princípio da eficiência: relações com outros princípios.

O ordenamento jurídico não consagra a eficiência como valor único a ser

perseguido pelo administrador. Consagra também uma série de outros princípios que devem

ser ponderados por ocasião da atividade administrativa.

Desse modo, é indispensável se demonstrar a relação existente entre o princípio

da eficiência e outros princípios constitucionais administrativos, já que para o seu efetivo

cumprimento, faz-se indispensável o cumprimento de outros princípios constitucionais. Como

resalta Valois (2003, p. 1):

Nenhum princípio do direito administrativo tem valor substancial auto-suficiente,

que se integra aos demais princípios, não podendo sobrepor-se a eles ou infirmar-

lhes a validade. E nisso não há novidade, pois sabemos que princípios são normas

que exigem ponderação, concordância prática, aplicação tópica e complementação.

Assim como todo princípio, o da eficiência não possui caráter absoluto, mas irradia

seus efeitos.

Nesta direção, considerando-se o conteúdo jurídico do princípio da eficiência, não

há negar que o mesmo visa à realização do bem comum. Dessa forma, deve ser aplicado em

perfeito alinhamento com o princípio da supremacia do interesse público, haja vista que a

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administração pública só atuara com eficiência se direcionar suas atividades e seus serviços

públicos à realização de forma ótima do interesse da sociedade, ou interesse público.

Di Pietro (2002) sustenta que a eficiência deve estar em consonância com o

princípio da legalidade, pois nunca se poderá justificar a atuação administrativa contrária ao

ordenamento jurídico, por mais eficiente que seja, na medida em que ambos os princípios

devem atuar de maneira conjunta e não sobrepostas.

Muito embora se possa perceber uma acentuada oposição entre o princípio da

eficiência, no seu significado extrajurídico, e o da legalidade, imposto na Constituição como

inerente ao Estado de Direito, quando se pensa o princípio da eficiência no seu significado

jurídico percebe-se que esse não entra em colisão com aquele. Na sistemática jurídica, os

princípios, como valores que encerram, devem conviver harmonicamente, não sendo possível

um excluir ao outro, a tensão entre eles, resolve-se pela ponderação.

Desta forma, tomando-se por conta o significado do princípio da moralidade, o

qual exige por parte do administrador público a observância de preceitos éticos, sob pena de

lesionar o próprio princípio da legalidade, compreende-se que a legalidade faz-se instrumento

imprescindível para alcança-se o princípio da eficiência em sua dimensão puramente jurídica

(FILHO, 2014), visto que o ato eficiente deve ser moral e, para tanto, tem que ser legal.

Considerando que o princípio da eficiência deriva do princípio da boa

administração, existente no direito italiano, onde a boa administração é definida como aquela

seguidora da moral administrativa, da eficiência, da justiça e da racionalidade, é de se admitir

que, para os italianos, ele é visto como gênero, o qual comporta outros princípios, tais como o

da moralidade e da razoabilidade. No direito brasileiro, entretanto, esses princípios coexistem

ao lado do princípio da eficiência, de modo que possuem conteúdo específico, que os

distinguem do princípio da eficiência. Todavia, ressalta SILVA (1999, p. 17) "há uma

interligação do princípio da eficiência com os princípios da razoabilidade e da moralidade,

pois o administrador, ao realizar sua atividade discricionária deve procurar o melhor critério".

Melo (1999) e Vettorato (2003), dissertando sobre as diferenças entre o princípio

da eficiência e os da moralidade e razoabilidade, ensinam que enquanto o princípio da

eficiência é referente a aspectos de meios, insumos e resultados dos atos administrativos na

busca dos fins do Estado, o princípio da moralidade se volta para os aspectos da boa-fé e

lealdade administrativa. Já o princípio da razoabilidade busca a coerência dos meios usados

pela administração pública para alcançar seus fins, isto é, o interesse público. Assim, um ato

pode ser plenamente eficiente no que tange ao resultado custo-benefício, mas carecer de

juridicidade se foi desarrazoado, incoerente, praticado sem considerar as "situações e

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circunstâncias que seriam atendidas por quem tivesse atributos normais de prudência, sensatez

e disposição de acatamento às finalidades da lei atributiva da discrição manejada" (MELLO,

1999, p. 80).

A eficiência se afina com o princípio da impessoalidade, o qual proporciona o

tratamento isonômico, neutro e racional a todo e qualquer administrado, vedando o

favorecimento do interesse particular em detrimento do interesse coletivo. A eficiência requer

a prestação de serviços de qualidades ofertados a todos os administrados, nos mesmos padrões

técnicos e científicos, no melhor custo benefício possível. Requer transparência, característica

pela qual evidência a necessidade de subordinação ao principio da publicidade dos atos

administrativos, o que permite o acompanhamento dos atos administrativos no que diz

respeito limpidez e lisura que obrigatoriamente devem nortear os administradores. Impõe a

participação popular, conforme disposto no art. 37, §3º da Constituição federal, introduzido

pela Emenda Constitucional nº. 19, que obriga haja uma maior aproximação e participação

popular frente à gestão administrativa pública.

Por fim, não se pode nesse pequeno espaço destacar as relações e distinções entre

o princípio da eficiência e todos os demais princípios que informam a Administração Pública.

Vale registrar, entretanto, que apesar das diferenças de conteúdo, há uma inter-relação entre

todos eles, pois a característica de qualquer princípio jurídico é a sua instantaneidade

aplicativa, sendo impossível a aplicação isolada de um só princípio, pois todos têm dimensões

próprias de peso e importância, e, ao mesmo momento.

4 CONSIDRERAÇÕES FINAIS

Esse trabalho teve como objetivo principal investigar a origem e evolução do

princípio da eficiência, apresentando-o como integrante do regime jurídico administrativo,

buscando analisar seu conteúdo e relações com os demais princípios que regem a

Administração Pública, assim como identificar a distinção entre os mesmos.

Nesse sentido constatou-se que a origem do princípio da eficiência ocorreu nos

domínios das Ciências Econômicas, evoluindo para a Ciência da Administração, com

aplicação inicial na atividade privada e em seguida na administração pública. Sua adoção na

Administração Pública ocorreu, inicialmente, de forma implícita, decorrente da própria

natureza da atividade de gestão, a qual por si só almeja alcançar a excelência em seus

resultados.

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Verificou-se que com o avanço do neoliberalismo e crescimento do mundo

capitalista e globalizado, floresceu a ideia da administração gerencial, implantando-se o

“Estado mínimo”, com vistas a deixar a exploração direta da atividade econômica para

atividade privada, bem assim transferir para essa a execução dos serviços públicos

considerados não estratégicos. Acreditava-se que assim a Administração Pública poderia ser

mais eficiente. A partir de então se iniciou um movimento de positivação do princípio da

eficiência nas legislações de vários países, tendo o Brasil elevado esse princípio à sede

constitucional, com a Emenda Constitucional nº 19/98.

Ficou evidenciado que o princípio da eficiência, no sentido jurídico, impõe à

Administração Pública e a seus agentes o dever de desempenhar suas funções com rapidez,

perfeição e rendimento compatíveis, de modo a satisfazer os anseios dos administrados. Desta

forma pode ser considerado em relação ao modo de atuação do agente público, e pode

também ser visto em relação ao modo de organizar, estruturar e disciplinar a Administração

Pública. Sempre com o mesmo objetivo de alcançar os melhores resultados no desempenho da

atividade administrativa.

Demonstrou-se que o desenvolvimento de novas tecnologias e métodos devem

sempre ser fortes aliados para melhor servir os administrados, até mesmo criando novos

organogramas em que tragam ênfase as funções gerenciais.

Por fim, comprovou-se que apesar das diferenças de conteúdo, há uma inter-

relação entre todos os princípios que informa a Administração Pública, pois a característica de

qualquer princípio jurídico é a sua instantaneidade aplicativa, sendo impossível a aplicação

isolada de um só princípio, pois todos têm dimensões próprias de peso e importância, e, ao

mesmo momento.

REFERÊNCIAS

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Atlas, 24ª Ed., 2014.

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MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de Direito Administrativo. Ed. 12, São Paulo:

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<http://jus.com.br/artigos/4369>. Acesso em: 23 jan. 2015.