a escola e seus processos de humanização: implicações da gestão

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A ESCOLA E SEUS PROCESSOS DE HUMANIZAÇÃO

MAGALI DE FÁTIMA EVANGELISTA MACHADO

A escola e seus processos de humanização

Implicações das práticas da gestão escolar e da docência na superação do desafio de ensinar

a todos e a cada um dos estudantes

Brasília-DF2013

© Copyright : Programa Mestrado e Doutorado em Educação da UCB / 2013.

É proibida a reprodução total ou parcial desta publicação, por quaisquer meios, sem autorização prévia, por escrito, da editora e do Programa Mestrado e Doutorado em Educação da UCB.

Grafia atualizada segundo o Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa de 1999, que entrou em vigor no Brasil em 2009.

Coleção Juventude, Educação e Sociedade

Comitê EditorialAfonso Celso Tanus Galvão, Célio da Cunha, Cândido Alberto da Costa Gomes, Carlos Ângelo de Meneses Sousa, Geraldo Caliman, Luiz Síveres, Wellington Ferreira de Jesus

Conselho Editorial ConsultivoMaria Teresa Prieto Quezada (Mexico), Bernhard Fichtner (Alemanha), Maria Benites (Alemanha), Roberto da Silva (USP), Azucena Ochoa Cervantes (Mexico), Pedro Reis (Portugal).

Conselho Editorial da Liber Livro Editora EPP.Bernardete A. Gatti, Iria Brzezinski, Maria Celia de Abreu, Osmar Favero, Pedro Demo, Rogério de Andrade Córdova, Sofia Lerche Vieira

Capa: Edson FogaçaRevisão: Jair Santana de MoraesDiagramação: Samuel Tabosa de CastroImpressão e acabamento: Cidade Gráfica e Editora Ltda.

Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)

M149eMachado, Magali de Fátima Evangelista

A escola e seus processos de humanização: implicações da gestão escolar e da docência na superação do desafio de ensinar a todos e a cada um dos estudantes / Magali de Fátima Evangelista Machado — Brasília: Liber Livro, 2013.

296 p. 17 cm

ISBN: 978-85-7963-101-6

1. Educação. 2. Ensino-aprendizagem. 3. Práticas docentes. 4. Gestão escolar. 5. Processos de humanização. I. Título.

CDU – 37.02

Índices para catálogo sistemático:1. Educação: Gestão Escolar 37.022. Gestão Escolar: Educação 37.02

Cátedra UNESCO de Juventude, Educação e SociedadeUniversidade Católica de BrasíliaCampus I, QS 07, lote 1, EPCT, Águas Claras71906-700 – Taguatinga-DF / Fone: (61) 3356-9601 observatorio(at)ucb.br

Liber Livro Editora EPPSHIN CA 07 Lote 14 Bloco N Loja 02Lago Norte – 71503-507 – Brasília-DF

Fone: (61) 3965-9667 / Fax: (61) [email protected] / www.liberlivro.com.br

Dedico este livro à minha família, que sempre se faz presente.

Quando Mariana, minha sobrinha, partiu, pareceu-me que uma parte

de mim também se esvaiu. Mas, com o apoio da família, aprendi

a superar a dor e compreendi que era necessário seguir em frente.

Dedico também, especialmente, a todos e a todas educadores

e educadores que se identificam com a profissão docente e que, com

seu comprometimento, conseguem resgatar alunos e alunas numa

relação amorosa por meio da qual são respeitados e valorizados nas

dimensões afetiva, ética, histórica, social e cultural, transcendendo

a relação acadêmica.

Rendo homenagem à professora e amiga-irmã Olzeni, com quem

redescobri o verdadeiro sentido de ser professora. Obrigada pela sua

imensa generosidade para comigo.

Obrigada, Marcelino, pelo companheirismo, incentivo e cumplicidade

ao longo dessa jornada.

Finalmente, last but not least, agradeço, às Professoras Doutoras Beatrice

Laura Carnielli (in memoriam) e Clélia de Freitas Capanema, minhas

eternas orientadoras, que tanto me nutriram nesta longa caminhada

intitulada “doutorado”, e ao Professor Doutor Célio da Cunha, meu

sincero respeito e admiração. Obrigada pelo incentivo e os inúmeros

esforços para realização deste sonho.

SUMÁRIO

Prefácio ...............................................................................................9

Apresentação......................................................................................13

Capítulo 1 – Para falar de origens: abrindo o “parêntese” para o ponto de partida .................................................17

Capítulo 2 – Conversas sobre educação ..............................................29

Capítulo 3 – Contribuições do locus acadêmico: a pesquisa educacional e a mudança de foco para o sucesso escolar ...37

Capítulo 4 – Literatura da eficácia escolar: perspectivas e desafios nos caminhos percorridos ..............................................67

Capítulo 5 – Incursões metodológicas: o caminho desenvolvido ao encontro de uma nova concepção do espaço escolar .....101

Capítulo 6 – Consolidando o caminho do método: aspectos gerais sobre objeto e sujeitos da pesquisa ...............................109

Capítulo 7 – Escola Maria: o estudo de caso consolidado .................123

Capítulo 8 – Escola Maria: conjugação de evidências na superação do desafio da eficácia escolar ........................................167

Capítulo 9 – Estudo de caso da Escola Ana ......................................177

Capítulo 10 – Escola Ana: evidências relacionadas à eficácia escolar ...229

Capítulo 11 – Descobrindo e descobrindo-se na teia da eficácia escolar .......................................................................239

Referências ......................................................................................259

Sobre a autora ..................................................................................295

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PREFÁCIO

Este livro que Magali de Fátima Evangelista Machado entrega à comunidade acadêmica e ao sistema de ensino brasileiro tem atualidade e relevância por tratar de um ente essencial na constituição de qualquer sociedade, em todos os tempos: o ente chamado escola. Revestida das mais variadas formas, desde as mais rudimentares às mais sofisticadas de nossos dias, em diferentes contextos históricos, políticos, sociais, econômicos, religiosos e étnicos, a escola sempre teve lugar na vida da humanidade. Por isso, escola é um assunto sério, que tange vidas individuais e a coletividade. Deveria ser preocupação diuturna dos homens públicos e da sociedade civil.

O objetivo da obra é contribuir para a discussão contemporânea sobre o quanto a escola deve ser eficaz no cumprimento de seu desiderato de formar integralmente o indivíduo em todas as dimensões humanas. A autora deixa de lado a retórica negativa de apontar com ênfase as fragilidades do sistema educacional, sem deixar de reconhecê-las, preferindo indagar como e por que existem escolas eficazes. Ela o faz com dupla legitimidade: a partir de uma pesquisa de campo em duas instituições de educação básica, e fundamentada na experiência profissional, adquirida em 26 anos de vivência em escolas.

Quando descreve suas origens, Magali mostra como o ambiente familiar alimentou a vocação de professora que ela exercitava com os irmãos na “escolinha” improvisada num cantinho da casa onde foi criada. Pode-se presumir que daí nasceu a motivação quase apaixonada com que abraçou a pesquisa sobre escolas eficazes, aquelas com que ela sonhou durante sua carreira docente. Portando o título de doutora em educação, ela hoje tem

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condições de analisar, com fundamentação teórica, a dinâmica da escola, os descaminhos que marcam a história da educação brasileira, os caminhos que continua procurando e os achados que ora divide com a comunidade educacional nas páginas deste livro.

O texto da obra é muito bem estruturado. A apresentação situa o leitor na gênese do trabalho: é o resultado de uma bem elaborada tese de doutorado, em que explorou a Identidade com a profissão docente na trama da eficácia escolar e que inspirou o título deste livro: A escola e seus processos de humanização: implicações das práticas da gestão escolar e da docência na superação do desafio de ensinar a todos e a cada um dos estudantes.

O título remete inevitavelmente à complexa e polêmica questão da qualidade, cujo padrão é garantido, melhor diria, exigido, na Constituição brasileira de 1988, como um dos princípios do ensino. Isso quer dizer que não basta haver a escola. Ela tem de ser de qualidade, que passa a ser um direito do aluno e, em contrapartida, um dever do Estado, de oferecer e exigir escolas eficazes.

Em “Conversas sobre educação”, a autora mostra o processo de construção, validação e implementação dos sistemas de avaliação e suas consequências para os sistemas de ensino, processo intrinsecamente correlacionado com a qualidade.

São igualmente discutidas as contribuições da pesquisa e os conceitos de escolas eficazes e de escolas bem-sucedidas, bem como o papel das estratégias de gestão na melhoria do desempenho das escolas.

O livro traz um alentado aporte da literatura sobre a eficácia escolar, com uma análise das perspectivas e dos desafios do desenvolvimento conceitual do tema central da obra e de sua prática, nos mais variados contextos. Remonta a Anísio Teixeira (1956) a preocupação de investigar as práticas educacionais, partindo da indagação das razões por que existe uma grande disparidade entre as escolas de um mesmo sistema, seja no Brasil, seja no mundo, em cujo âmbito ainda são registrados 72 milhões de crianças fora da escola. Acordos internacionais e legislação mundo afora são mencionados com a lúcida observação de que somente por meio de legislação não se cumprirá a meta de universalização da educação no horizonte de 2015, como estabelecido pela Unesco. Para a autora,

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é urgente a ressignificação de posturas e de concepções na sociedade e nos sistemas de ensino.

Na busca dessa ressignificação, ela pesquisou estratégias de gestão e de práticas escolares ligadas ao desempenho satisfatório de duas escolas da rede escolar pública do Distrito Federal, à luz dos resultados obtidos no Ideb. Em síntese, pretendeu responder às seguintes questões: o que de fato a escola precisa “ensinar”? As escolas pesquisadas podem ser chamadas de eficazes? A busca das respostas observou com rigor científico todos os trâmites da pesquisa. O resultado final está expresso numa engenhosa figura intitulada Trama da Eficácia Escolar, composta por grandes categorias e por subcategorias, representativas dos fatores de eficácia encontrados nas duas escolas pesquisadas, os quais têm sua centralidade no fator essencial, como percebido pela pesquisadora, que ela chamou de “identificação com a profissão de professor”.

O livro conduz a um conceito de escola de esperança e humanizadora, extraído dos depoimentos de vários personagens que transitaram na composição de Magali. É permeado por conceitos científicos e relatos sentimentais, todos conducentes à ideia do que deva ser uma escola eficaz. É um texto rico de exemplos de vida e de experiências profissionais, muitas vezes lírico, sem perder a cientificidade. É um livro sério sem ser pesado. Inspirador para todos os que acreditam no poder da educação para aperfeiçoar a sociedade e necessário para os que ainda duvidam.

É uma leitura recomendada para os que militam em salas de aula, os gestores de vários níveis e, espera-se, para aqueles que têm responsabilidades na formulação e na execução de políticas educacionais.

Profª Drª Clélia de Freitas Capanema

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APRESENTAÇÃO

Este livro é resultado da tese de doutorado em Educação, intitulada Identidade com a profissão docente na trama da eficácia escolar. Traz como essência três aspectos fundamentais relacionados à área da educação: uma discussão densa a respeito do caminho que levou a identificar uma nova visão acerca da função social e educativa da escola e sua relação com a gestão escolar, o processo de ressignificação do conceito de eficácia escolar desenvolvido a partir dos resultados de duas experiências bem-sucedidas em escolas da rede de ensino público e os passos de uma pesquisa acadêmica realizada em profundidade. De um lado, pretendemos contribuir para a discussão sobre questões complexas que permeiam o cotidiano das escolas influenciando seu desempenho na relação com as comunidades interna e externa e nas estratégias de ensino-aprendizagem adotadas em seu projeto político-pedagógico. De outro lado, com a prática da pesquisa acadêmica, na medida em que sua estrutura e sua origem baseiam-se no relato de um denso percurso metodológico, desenvolvido para atingir os objetivos estabelecidos para a construção da referida tese de doutorado. Entre outras, houve um esforço para trazer luz sobre duas questões essenciais que, embora não constituíssem as questões de pesquisa formalmente estabelecidas, também foram eleitas como instigadoras dessa discussão: o que a escola, de fato, precisa “ensinar”? Escolas bem-sucedidas são escolas eficazes?

Concluída no final de 2012, na Universidade Católica de Brasília (UCB), posso relatar que houve duas fases bem distintas no percurso de construção deste trabalho, cuja emergência ocorrida nesse percurso me expôs a um contexto ainda mais desafiador. Na primeira fase do trabalho,

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a Profa. Dra. Beatrice Laura Carnielli, orientadora que deu início à estruturação do estudo, surpreendeu-me com uma separação inesperada e, desta vez, não “negociada” com o meu coração, visto que era uma professora que se destacava pelo cuidado em preparar os caminhos a cada novo passo que empreendíamos juntas, atitude extensiva a todos os seus orientandos. Em setembro de 2011, nosso convívio foi interrompido em razão do seu falecimento, colocando-me diante de uma situação de perda súbita e para a qual não estava preparada. Entretanto, como já dizia o poeta Khalil Gibran1 “a vida não anda para trás e não se demora com os dias passados”, então foi preciso prosseguir e completar a travessia deste largo rio. Na segunda fase do trabalho, fui acolhida por uma nova orientadora que, apoiando-me nessa difícil travessia, tomou para si o leme da embarcação e conduziu-me até o ponto de chegada. Com isso, a construção da tese seguiu sob a orientação da Profa. Dra. Clélia de Freitas Capanema.

As recordações da sessão de doutoramento, as quais se mantêm ainda muito presentes em minha memória, são únicas e sei que as levarei para sempre na “gaveta dos guardados”,2 enriquecendo e nutrindo a minha trajetória profissional e pessoal. À medida que incorporava as contribuições e as impressões de cada membro da banca, conforme eles as expressavam, fui dando-me conta de que não se tratava somente de uma tese, mas de um trabalho que havia se impregnado à minha própria alma no que remete à paixão por ser professora, desde sempre. Já havia percebido, mesmo durante a fase de construção, que estava tomando dimensões que transcenderiam seu resultado como meta acadêmica. E transitar da percepção à materialização foi uma questão de tempo, desta vez, o tempo decorrido entre o processo de análise e o seu resultado. Sim, descobri que o fio que tecia os fatores de sucesso de duas escolas imersas em um cotidiano de adversidades era a identidade do professor com a profissão docente. E não

1 Fonte: <http: //www.culturabrasil.pro.br/gibran.htm>.

2 “Gaveta dos guardados” refere-se a um texto escrito por Iberê Camargo sobre memória, arte e vida. Repleto de profundas reflexões e belas imagens, o título me inspirou a aplicá-lo às memórias de meu doutoramento, quão fortes se fazem até hoje.

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há como deixar de reconhecer que a identidade é gerada da paixão por essa profissão que tanto requer e, ao mesmo tempo, tanto contribui.

Falar de escolas que deram certo no momento em que defendia a tese fez com que as palavras pronunciadas pelos professores doutores ecoassem naquele ambiente parecendo compreender e perceber que se referia a uma escola mais amorosa, que, de fato, inclui estudantes, seus pais e professores, que agrega com mais dinamismo a diversidade e que busca, obstinadamente, estabelecer entre seus atores sociais uma cultura de paz. Nesse sentido, a tese passou a representar e a expressar também a educação que sempre sonhei para todos os alunos e alunas que, almejando um futuro mais feliz, recorrem a esse espaço chamado escola, para se alimentar de sua força motriz e, assim, se preparar para superar as adversidades. São pessoas em construção na busca de uma educação pautada pela ética, sobretudo transformadora, capaz de fazer desses espaços escolas mais humanizadas e humanizadoras. Inspirando-me nas palavras de Rousseau, simplesmente uma escola imbuída da arte de ensinar a viver:

Que se destine meu aluno à carreira militar, eclesiástica ou à advocacia; pouco me importa. Antes da vocação dos pais, a natureza chama-o para a vida humana. Viver é o ofício que quero ensinar. Saindo de minhas mãos, ele não será, concordo, nem magistrado, nem soldado, nem padre; será primeiramente um homem (JEAN-JACQUES ROUSSEAU, 1959).

Encerro, por fim, esta breve apresentação expressando o quanto sou grata aos muitos professores que me acompanharam nessa travessia e, de modo muito especial, deixo registrada a minha gratidão aos Mestres que tanto me nutriram e me motivaram a seguir em frente. Entre outros igualmente importantes, minha eterna gratidão às Professoras Doutoras Beatrice Laura Carnielli e Clélia de Freitas Capanema e aos Professores Doutores Candido Alberto da Costa Gomes, Célio da Cunha, Cleyton Hércules Gontijo, Geraldo Caliman e Luiz Carlos de Brito Lourenço.

A Autora

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Capítulo 1

PARA FALAR DE ORIGENS: ABRINDO O “PARÊNTESE” PARA

O PONTO DE PARTIDA

O sentido do que somos, ou melhor, ainda, o sentido de quem somos, tanto para nós mesmos, como para os outros, depende das histórias que contamos e que nos contamos. Essas histórias estão construídas em relação com as histórias que escutamos e que lemos, que, de alguma maneira, nos pertencem. Por outro lado, essas histórias que nos constituem são produzidas e mediadas no interior de determinadas práticas sociais, mais ou menos institucionalizadas: um confessionário, um tribunal, uma escola [...] (LARROSA, 2004).

Relatar eventos pessoais evocam aspectos que revelam como fomos construídos e como somos sucessivamente reconstruídos. De fato, como diz Larrosa (2004), são as histórias que contamos e que nos contamos que terminam por desvelar as motivações que nos conduzem aos mais ousados desafios. No estudo que deu origem a este livro, refletir sobre essas histórias me levou às origens do desejo de cursar o doutorado, na

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medida em que ele se transformou em um rico exercício de resgatar da memória acontecimentos e lembranças que marcaram minha trajetória, desde a infância até a vida adulta. Afinal, narrar é uma arte complexa, para a qual, raramente, a escola propicia espaços de expressão.

As raízes da pesquisa realizada remontam ao interior de uma história familiar, marcada pelo contato muito próximo de uma determinada acepção de “escola”, já que estudar sempre fez parte da minha vida, tornando-se, inclusive, a brincadeira preferida entre os irmãos, no tempo de infância. Tínhamos em casa um quadro afixado na parede, espaço que era carinhosamente chamado por nós de “escolinha”. Ali, os irmãos mais velhos ensinavam para os mais novos as tarefas de casa, como fazer as pesquisas solicitadas pelos professores ou como se tornar uma aluna aplicada na escola. Afinal, por serem os mais velhos traziam-nos mais experiência.

Foi exatamente nesse ritmo de cooperação e de aprendizagem mútua entre irmãos que comecei a viver minha primeira experiência como professora. Compreender desde muito pequena que esse espaço chamado “escola” é um lugar rico em experiências fecundas e um campo fértil para novas descobertas foi fundamental, contribuiu e continua contribuindo para a minha formação, ao longo desses 26 anos de profissão. Inspirada nas palavras de Galiazzi, foi possível constatar: “Se sou melhor como professora é porque aprendi a ser melhor como ser humano, que é capaz de ouvir, gostar, tolerar, de procurar entender o ponto de vista do outro, que é capaz de refletir e aceitar que o professor nem sempre tem razão” (2003, p. 18). Entretanto, foi somente há cerca de três anos e meio que embarquei nessa travessia chamada doutorado na tentativa de consolidar essas percepções ainda pouco amadurecidas. Talvez pelo modo como me deixasse envolver nesse universo da educação, a preocupação com as questões relativas ao que a escola representa na vida de todos os estudantes tem me acompanhado ao longo de minha trajetória profissional. Ainda assim, a investigação das implicações das práticas escolares nos processos que pudessem conduzir os estudantes ao sucesso se configurou um grande desafio. As etapas de superação desse desafio foram traduzidas nas páginas de uma fecunda história que culminou na minha pesquisa de doutorado.

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Antes, porém, de apresentar o substrato dessas etapas, já antecipando uma visão geral de como se desenvolveu a investigação, considero essencial narrar a vivência de um episódio que se estabeleceu como fator fundamental de motivação para realizá-la. Tal experiência gerou uma profunda inquietação, incomodando-me por algum tempo, até se transformar em um problema de pesquisa possível de ser investigado, tomando corpo no percurso do doutorado. Essa inquietação se aprofundava cada vez que refletia sobre “o que, de fato, a escola precisa ensinar?” Em um primeiro momento, poderia até considerar que se tratava de uma questão meramente técnica, pedagógica, pragmática. No entanto, um acesso providencial a determinadas teses de doutorado lembraram-me das palavras de Barba (2008), quando a autora se refere a uma “consciência cósmica” (p. 39) que desencadeia uma espécie de intuição ou mesmo premonição acadêmica, capaz de nos remeter, por um impulso inexplicável, ao ponto exato do que estamos buscando. A autora entende esse fenômeno como decorrente de uma manifestação da criatividade que pode ocorrer toda vez que se estiver trabalhando sobre uma questão desafiadora e que se consiga submergir a um profundo nível de concentração e empenho na tarefa de investigá-la. Esse impulso parece direcionar a mente para as páginas de periódicos ou outros referenciais, exatamente dedicadas ao tema que se está trabalhando. Ao contrário da tradicional justificativa de que se trata de mera coincidência, Barba vem nos despertar para a existência de uma visão bem mais profunda – concebida no domínio da complexidade – , a partir da qual podemos considerar esse fenômeno como uma conexão do nosso pensamento com o universo.

O que considero uma feliz experiência, a qual lançou luz sobre esse pensamento de Barba (2008) foi a de permitir-me, depois de guiada pela literatura, estabelecer uma conexão entre minha própria história de vida e as possibilidades de resposta à questão supracitada (o que, de fato, a escola precisa ensinar?). Ao revisitar as referidas teses de doutorado deparei-me com resultados mais recentes de pesquisas acadêmicas que têm observado a necessidade de desdobramentos, para além dos aspectos de ordem epistemológica e prática (GUIMARÃES, 2010; PICOLLO, 2005; RANGHETTI, 2005; YARED, 2009). Esses autores, entre outros,

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designaram como de alta relevância, não somente acadêmica, mas pessoal e profissional, enfatizar as relações que envolvam elementos das histórias de vida do pesquisador cruzando-se com o tema pesquisado. Tal procedimento tem feito emergir de forma mais autêntica os reais motivos que levam à seleção dos problemas investigáveis, direcionando, inclusive, para temas de pesquisa mais convergentes com relação às inquietações dos pesquisadores. Ranghetti (2005), por exemplo, além de concordar, complementa com uma reflexão que parece descrever o que me levou ao encontro com o problema que deu origem à minha pesquisa, em todos os aspectos descritos neste tópico:

[...] perceber os vestígios presentes nas ações e no meu jeito de ser; exercitar a espera e a escuta para captar, nos detalhes, nas marcas, nos ruídos e silêncios, a expressão impressa, o registro feito. O exercício da espera vigiada requer acreditar que é possível a descoberta, a revelação, o renascimento de algo que para nós foi preterido. No entanto, o passado está ali e pode ser (re)significado a partir do movimento que se produz, quando se tenciona passado/presente e se projeta o devir. É (re)visitando os lugares/tempos/espaços pelos quais se passou que se consegue ver com sentido novo as dimensões esquecidas, ver o “mais dentro” e buscar a luz que se reveste de energia, alimento do renascimento diário do meu eu (RANGHETTI, 2005, p. 56).

De um modo diferente, mas convergindo para a mesma situação descrita por Ranghetti, as palavras literais de Lavoisier (1743-1794), transcritas por Chassot (1995, p. 21), embora tenham sido pronunciadas há dois séculos por alguém que sequer atuou como professor, parecem exprimir pontualmente o modo como essa experiência influenciou minhas escolhas, a partir daquele dia: “o único modo de bem julgar a maneira pela qual, são afetados os outros homens, é colocarmo-nos, de algum modo, em seu lugar, e relembrarmos as impressões que nós mesmos experimentamos em circunstâncias semelhantes” (sic). De fato, ocorreu que me coloquei no lugar de determinado aluno, e as impressões que emergiram por meio de lembranças me trouxeram a este lugar. O episódio a que me refiro está narrado nas linhas que se seguem.

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O feliz encontro com “Tonico”

No ano de 2009, trabalhando como professora da sala de recursos de uma escola pública, em Brasília-DF, um aluno chegou à porta da minha sala de aula, depois de ter sido retirado de sua sala pelo professor regente. Decidi parar o que estava fazendo e escutá-lo, logo que percebi sua aflição. Esse episódio me fez refletir, já inserida no contexto acadêmico, sobre algumas inquietações: que o papel do educador também é o de ser transparente, permitindo revelar-se em sua dimensão emotiva; que os estudantes, mais do que informações isoladas, visões objetivas e destituídas de significação, merecem e precisam vivenciar as situações escolares também no âmbito dos sentimentos, respeitadas as doses adequadas, obviamente. Dei-me conta de que os caminhos ideais para a educação passam pela humanização do conhecimento, a começar pelas metodologias adotadas desde a construção do saber que a humanidade acumulou por meio da ciência e da pesquisa científica. Esse poderia se tornar um dos recursos mais potentes para o crescimento emocional e social desses estudantes, para além do cognitivo e do intelectual. Para referir-me ao aluno em questão, visando preservar sua identidade, aqui será tratado pelo pseudônimo de Tonico.

Tomando como exemplo a situação do Tonico, percebi que está na capacidade do educador interagir com o mundo extraescolar, exercitando a escuta sensível, a possibilidade de se atingir esse propósito de humanização do conhecimento. Na perspectiva de Barbier (2002), a escuta sensível é um conceito que significa exatamente esse movimento acolhedor na direção do outro, promovendo a reciprocidade entre ação pedagógica e emoção, elementos que Moraes (2008) propõe como expressão da totalidade humana e que podemos relacionar com o que se conceitua como formação integral. Assim, o aluno poderá se desenvolver como um ser completo, sem perder de vista o caráter permanente de construções e de reconstruções que implicará seu processo pleno de formação.

Logo que começamos a conversar, senti que Tonico estava muito triste e que, em seu modo de perceber, ao contrário do alegado pelo professor, ele é quem fora desrespeitado. Com os olhos cheios de lágrimas, começou

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a contar a sua versão do episódio ocorrido em sala de aula, visão que descrevo no relato que se segue:

– Professora, eu estudo nessa escola, porque meus pais acreditam que ela é a melhor escola da Asa Norte. Por isso, eu levanto muito cedo, todos os dias, pego ônibus lotado, muito congestionamento, porque meus pais querem que no futuro eu tenha um emprego e uma condição de vida melhor do que eles tiveram. O professor disse, na hora da confusão lá na sala, para todos escutarem, que não entende porque esse tanto de aluno vem estudar aqui no Plano Piloto; na fala dele, a gente vem pra cá só pra complicar e lotar as salas de aulas da escola. Para o professor, a gente deveria estudar lá nas nossas cidades e, assim, ficaria melhor para todos. Eu fui tentar dizer ao professor, porque vinha todos os dias estudar aqui e ele não me ouviu, como também me disse que era muito difícil mudar a história da minha família [...] (Relato de aluno). 3

À medida que Tonico contava-me sua versão, confesso que fui tomada pela sensação de impotência diante das possibilidades de resolver a situação. Para mim, cada vez ficava mais claro o quanto aquele aluno se sentira excluído daquela comunidade e de qualquer possibilidade de “se tornar um deles”. O sentimento de pertença havia sido cruelmente atingido pelas palavras de seu professor. Na verdade, foi como se aquela escola confirmasse a Tonico uma “incapacidade” inerente de aprender conforme as práticas que aquela escola desenvolvia e nas mesmas condições que aprendiam os estudantes que “faziam parte” daquela cidade que, por acaso, não era a sua. Gadotti (1981) acolhe a impossibilidade de um educador permanecer neutro em uma sociedade por natureza partidária, obrigando-se a tomar uma posição dualista: ou educa a favor dos privilégios da classe dominante ou age contra eles, nesse caso, voltando seu olhar para as classes dominadas. Nesse episódio, confesso que tive dificuldades de posicionar-me.

3 Cabe esclarecer que se trata de um relato resgatado da memória, portanto não literal. Porém, mesmo narrado com as palavras da pesquisadora, seu conteúdo traduz, em sua essência, a fala do aluno naquela época.

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Por um lado, para um profissional da educação, não há como passar incólume pela dura realidade das escolas públicas do Plano Piloto/DF, mesmo se tratando de região central, e deixar de reconhecer turmas superlotadas, expressivo número de estudantes oriundos da periferia da cidade, entre outros problemas. Por outro lado, em que pese essa realidade flagrante, pais e estudantes residentes na periferia acreditam na força transformadora da escola, sobretudo, senão com mais proeminência, daquelas que se localizam em regiões centrais. Para essas pessoas, essas escolas contêm a magia das “escolas da cidade grande”. São pais e estudantes cuja carência em todos os aspectos, inclusive de condições de vislumbrar outros horizontes, os obrigam a depositar seus sonhos e desejos de uma vida melhor integralmente na educação e nessa escola da “cidade grande”.

Ainda naquele momento, deparando-me com o desapontamento do Tonico, muitas inquietações emergiram. O que leva pais e filhos a acreditarem que uma escola seja melhor do que outra, se todas pertencem à mesma rede de ensino, sendo a formação e os salários dos profissionais definidos por padrões similares? Por que inúmeras crianças são retiradas tão cedo do convívio de seus amigos de rua, bairro e mesmo de cidade e são trazidas pelos pais para estudar em escolas tão distantes de sua casa e, consequentemente, tão estranhas à sua realidade?

E foi a tentativa de responder ao Tonico, e a outros tantos questionamentos que surgiram depois daquele episódio, que me impeliu para um novo desafio. Aprendi que para seguir em frente seria necessário sair da zona de conforto em que me encontrava, afastando-me do ambiente da escola na qual trabalhava, da sala de recursos na qual atuava e partir para novos caminhos. Afinal, conforme recomendam autores como Demo (2005), Nóvoa (2000) e Perrenoud (2001), a pesquisa se tornou atribuição de professores, não somente no âmbito acadêmico, mas em todas as situações do cotidiano que os inquietem e os instiguem a desvelar as melhores possibilidades de alcançar o aluno e de fazê-lo se sentir pertencido, ser um entre os demais. Assim, ao tornar-me conhecedora das teorias já constituídas, poderei, em um futuro próximo, aprofundá-las em meu fazer docente, agora nutrido e potencializado pelas relações que

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envolvem essa teoria, meus estudantes, a escola e minha própria história de vida. Em outras palavras, a verdadeira relação teoria/prática que será sempre aquela que carrega em si a força da corporeidade.

Compreendi ainda que cursar o doutorado não significou seguir por uma estrada reta. Tornou-se, contudo, um encontro comigo mesma, enfrentando vários momentos solitários, em que as leituras me consumiam por horas a fio e, por vezes, até as palavras chegavam a desaparecer. E foi assim, trilhando essa rota, que me redescobri nos últimos três anos. Um percurso que ora pareceu sombrio, ora alegre, outras vezes, cheio de vida, esperanças e sonhos.

Adversidades que teceram novas perspectivas

A trajetória percorrida, entretanto, não se constituiu somente de desafios promissores e de alegrias. Durante essa caminhada a vida também me surpreendeu com momentos de profunda tristeza, sobretudo quando foram retiradas de minha convivência, de forma definitiva, duas pessoas que contribuíram expressivamente para que eu chegasse até aqui. Com a partida definitiva de duas professoras, as quais me nutriam exatamente da citada visão humanizadora sobre a educação, o impulso inicial foi desistir. De um lado, alimentada pela força da juventude, a professora Mariana, a qual se mantinha fiel ao sonho de uma educação a serviço da autonomia que, por sua vez, gera libertação. Trabalhava com crianças carentes, oriundas das camadas mais desfavorecidas da comunidade onde vivia, propiciando-lhes uma relação irrigada de afetividade. A cada dia, ela procurava demonstrar-lhes, com ações, o encantamento que nutria pela área que assumira por escolha. De outro lado, irrigada pela força da experiência, a Profa. Dra. Beatrice Laura Carnielli, conforme já mencionado, minha primeira orientadora, que, em razão do seu falecimento, me vi privada de um frutuoso convívio.

Deparei-me, com felicidade e certa apreensão, diante do paradoxo da juventude e da maturidade, ambas como etapas humanas que carregavam, em diferentes níveis e espaços de convivência, a força da sabedoria. Essa

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força que terminou por influenciar-me e direcionar-me, em diferentes aspectos, na superação desse intenso desafio que se tornou o doutorado. Compreendi que, mesmo diante de tamanha dor, precisava perseverar em busca das respostas que tanto me afligiram naquele encontro com Tonico. Sei que o exercício mais bem realizado foi o de aprender a lidar com os obstáculos de forma serena, madura e, mesmo quando não consegui desviá-los, aprendi a respeitá-los e a enfrentá-los.

Se me fosse permitido retornar no tempo, talvez agora pudesse dizer ao Tonico que conheci duas escolas que assim como a sua casa ficam distantes do centro urbano do Distrito Federal. Além disso, os pais e os estudantes que lá estudam também compartilham, com a mesma esperança, dos sonhos de seus pais e seu próprio sonho. Acredito que existam várias escolas, tanto no Distrito Federal como distribuídas por diversos municípios do Brasil e, ouso mencionar, mundo a fora, que buscam e conseguem o desenvolvimento integral de todos seus estudantes independentemente da comunidade ou da classe social a que eles pertencem. Essas escolas conseguem atingir resultados satisfatórios, por vezes inusitados, levando em conta seu rendimento prévio, além da situação social, econômica e cultural das famílias. São escolas que, se caracterizadas na visão de Mortimore (1998), poderiam ser denominadas de “escolas eficazes”. E foi esse o motivo pelo qual essa visão passou a constituir a linha de discussão tecida em um trabalho que considero construído a “quatro mãos”4 e um coração: eu, Tonico, Beatrice, Mariana e a paixão compartilhada em diferentes finalidades pela área da educação.

Contudo, para alcançar essa percepção mais acurada e humanizadora da escola, bem como da pesquisa que foi realizada, foi preciso seguir por um caminho pouco usual. Refiro-me a um caminho que Fazenda e Soares (2010) denominaram de “metodologia não convencional”, por não delimitar a fronteira que distingue claramente o convencional do não convencional. As autoras os reconhecem como sendo caminhos que se esquivam à regra, ao mesmo tempo em que podem coexistir com a regra,

4 A expressão “quatro mãos” está sendo utilizada em sentido figurado, para representar, além da minha presença como autora, a influência benéfica, quase que no plano metafísico, de três grandes personagens nessa travessia acadêmica: Tonico, Beatrice e Mariana.

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e os descrevem de tal maneira que, além de explicar alguns “parênteses” abertos ao longo deste texto, ainda os tornam parte de uma narrativa na qual pesquisadora e sujeitos da pesquisa se fizeram presentes e atuantes em mútua cumplicidade. Podemos dizer que as descobertas dessas duas autoras convergem e traduzem de uma terceira forma as palavras de Ranghetti e Lavoisier, autores já mencionados, no que se refere à corresponsabilidade do “eu” compartilhada com a sua história de vida e à corporificação das marcas do outro em nossas próprias experiências:

Metodologias não convencionais, negando a possibilidade de neutralidade e de objetividade, admitem o pesquisador como locutor – locutor já não é o referente, a terceira pessoa, já não é “ele” (o “dado”); é o pesquisador, é o “eu” quem assume o papel daquele que fala, daquele que revela. [...] Nesse tipo de pesquisa, o interlocutor privilegiado seriam os próprios pesquisados, aqueles que “participam”, aqueles com que e por quem uma ação é deflagrada, aqueles que informam e desvelam (FAZENDA; SOARES, 2010, p. 139-140).

Por fim, o caminho que foi trilhado relatou a história de duas escolas que superaram adversidades e que estão conseguindo obter o êxito escolar de seus “Tonicos”. São escolas cuja característica essencial Rubem Alves descreve remetendo à imagem de “gaiolas” e “asas”, conforme se expressa neste fragmento de um dos poemas de sua autoria:

Há escolas que são gaiolas e há escolas que são asas. Escolas que são gaiolas existem para que os pássaros desaprendam a arte do voo. Pássaros engaiolados são pássaros sob controle. Engaiolados, o seu dono pode levá-los para onde quiser. Pássaros engaiolados sempre têm um dono. Deixaram de ser pássaros. Porque a essência dos pássaros é voo. Escolas que são asas não amam pássaros engaiolados. O que elas amam são pássaros em voo. Existem para dar aos pássaros coragem para voar. Ensinar o voo, isso elas não podem fazer, porque o voo já nasce dentro dos pássaros. O voo não pode ser ensinado. Só pode ser encorajado (ALVES, 2002, p. 29).

Pretendo, portanto, nos capítulos que se seguem, sinalizar para que as escolas se tornem asas e, desse modo, contribuam para que o Tonico e

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todos os demais estudantes que padecem da ausência de um conhecimento humanizado passem a se sentir pertencidos em qualquer ambiente escolar. Neste momento, fecho o primeiro parêntese e procedo à travessia da imersão pessoal para a emersão de uma realidade externa no tocante ao horizonte pessoal. Trata-se de uma realidade passível de ser problematizada, restringindo as possibilidades de intervenção do “eu”, que agora se resguarda de uma exposição mais direta para afastar-se a uma distância crítica que possibilite enxergar essa realidade na perspectiva de sua totalidade.

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Capítulo 2

CONVERSAS SOBRE EDUCAÇÃO

A educação deve possibilitar o uso de estratégias multidimensionais de ensino e aprendizagem, voltadas para o desenvolvimento e o aprimoramento das diferentes dimensões humanas. (MORAES; ALMEIDA, 2010, p. 252)

(Carta de Fortaleza – Por uma educação transformadora: os sete saberes necessários à educação do presente. 2010). 5

Em geral, a mídia brasileira parece guardar preferência por anunciar e publicar somente os aspectos negativos, quando se trata da educação. Atos de violência, depredação do patrimônio público, doenças que acometem os professores em virtude das condições inadequadas de trabalho nas escolas, entre outras, são algumas das notícias que reiteradamente ocupam as páginas de jornal, revistas e as telas dos noticiários de TV. Além disso, observa-se grande ênfase sobre os índices de evasão dos estudantes que por diversas razões, mas principalmente pelo desapontamento em relação ao que lhes é oferecido pela escola, escolhem desistir de estudar ou fracassam

5 Participaram da redação da Carta de Fortaleza Maria Cândida Moraes e Juan Miguel Batalloso Navas, como principais inspiradores, e as professoras Rosamaria de Medeiros (UECE e Ecotransd), Celina Éllery (UECE), Lucia Helena Granjeiro da Fonseca (UECE) e Ruth Cavalcante (CDH/CE). A carta foi aprovada em assembleia-geral, realizada em 24 de setembro de 2010, com a participação de mais de 800 profissionais da educação. Foi uma carta que resultou dos sonhos dos educadores que sonham juntos por uma escola-humanidade melhor. Fonte: MORAES; ALMEIDA, 2010, p. 247.

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no ensino fundamental por não alcançarem as competências mínimas exigidas em leitura e matemática.

Ainda que tenha alcançado o percentual de 94,4% dos estudantes na faixa etária dos 7 aos 14 anos matriculados na educação básica, a educação no Brasil continua a enfrentar grandes desafios, visto que esse avanço implica a quase totalidade da universalização no acesso ao ensino fundamental, impulsionada pela criação da política global em direção à Educação para Todos, coordenada pela Unesco (2005). Um desses desafios é motivar para que permaneçam na escola os 10% de adolescentes que aos 15 anos começam a abandoná-la; os 25% que aos 17 anos escolhem ir embora, quando já deveriam estar concluindo o Ensino Médio; os quase 50% de jovens que aos 18 anos já desertaram da escola; e, por fim, os incontáveis milhares de crianças que embora não a abandonem por ainda estarem impregnadas do sonho de aprender, de fato não aprendem e, desapontadas, percebem mais tarde, aos 15, aos 17, aos 18 anos, que preferem mesmo é desistir do sonho (SCHWARTZMAN; TORRES; KAM, 2010). Além disso, encontram-se resguardadas pelo dever a ser cumprido por parte da família e pelo direito a ser garantido pelo Estado.

De acordo com Schwartzman, Torres e Kam (2010), “o Brasil chegou tarde ao mundo da educação e ainda está procurando seu rumo” (p. 21), talvez por ter demorado cem anos mais que muitos países da Europa e Japão, para perceber a importância da educação. Os autores destacam, ainda, que, em 1950, enquanto metade da população brasileira sequer sabia ler e somente 26% dos jovens com idade entre 5 e 19 anos de idade frequentavam a escola, em grande parte dos países da Europa além do Japão, “todas as pessoas já estavam alfabetizadas desde o início do século ou antes” (p. 21). Dados como esses expressam o colapso de um sistema de ensino que urge por encontrar mecanismos de superação da situação que está posta. A Unesco (2012), por sua vez, detecta que o Brasil posiciona-se entre os 53 países que ainda não atingiram e nem se aproximaram dos objetivos da Educação para Todos até 2015, a despeito dos importantes avanços no campo da educação nas duas últimas décadas.

Ao se comparar a realidade vigente e o alcance das exigências desse programa, compreende-se com mais ênfase o quanto uma mudança

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de concepção com relação a prioridades no desenvolvimento do País é urgente e necessária. É preciso que se resgate ou que se construa o sentido da educação como caminho, percurso, processo, fluxo ascendente, desde que consista na aquisição de aprendizagens e não como “um fim em si mesma” (LUNA, 2005, p. 171). As palavras do autor convergem para o pensamento de Paulo Freire (2007, p. 67), quando esse pensador pondera:

Se a educação sozinha não transforma a sociedade, sem ela tampouco a sociedade muda. Se a nossa opção é progressista, se estamos a favor da vida e não da morte, da equidade e não da injustiça, do direito e não do arbítrio, da convivência com o diferente e não de sua negação, não temos outro caminho senão viver a nossa opção. Encarná-la, diminuindo, assim, a distância entre o que fizemos e o que fazemos.

Nessa perspectiva, Luna (2005) chama a atenção para as atitudes que deveriam ser levadas em conta ao se proclamar a educação como prioridade. Conforme o autor, para que, de fato, este setor da sociedade se torne capaz de contribuir e de gerar as transformações necessárias, três condições básicas são exigidas: que seja considerada parte integrante de um projeto nacional; que seja efetivamente atendida como prioridade na agenda política dos Estados; que as políticas educacionais de mudança estejam em consonância com as necessidades da população a que atende e que sejam assumidas por todos os setores, em especial pelos professores.

Os resultados do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep) terminam por corroborar a visão de Luna (2005), no sentido de que se realizem transformações urgentes na área educacional, para que a educação passe a se tornar prioridade. A preocupação se confirma ao se verificar, por exemplo, que no quantitativo mais recente de matrículas da educação básica, referente ao ano de 2011, os números mantiveram uma tendência em relação aos anos anteriores (INEP, 2012). Essa tendência consiste em uma redução gradativa que vem ocorrendo ano a ano. Tal constatação poderia minimamente ser considerada um indicativo de decadência das estratégias de gestão adotadas, as quais não conseguiram mudar a realidade sombria da educação no Brasil. Conforme os dados levantados, ao mesmo tempo em que houve queda de

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2,1% nas matrículas da rede pública em relação ao período supracitado, a rede privada apresentou um crescimento de 4,7%. Esse cenário, além de colocar em risco a democratização do ensino, ainda denota queda no acesso principalmente dos estudantes que apresentem menores condições socioeconômicas. Pode parecer um número insignificante (2,1%) diante do total da população matriculada e do propagado sucesso da universalização; entretanto, significam menos 241 mil estudantes deixando de beneficiar-se da convivência escolar no período 2010-2011.

O decréscimo detectado foi calculado em torno de 577.270 matrículas, e é atribuído, pelo próprio Inep, especialmente, a uma atitude de “acomodação do sistema educacional, em especial na modalidade regular do ensino fundamental, com histórico de retenção, e, consequentemente, altos índices de distorção idade-série” (INEP, 2012, p. 11). Decerto que, além de envolver outras dimensões, se trata de fatores decisivos para uma evolução positiva em relação às melhorias pretendidas. Afinal, o direito à educação não pode se restringir ao direito de ocupar uma vaga e, sim, de ter acesso às mínimas condições de aprendizagem, ao estímulo e aos requisitos para a permanência e aos mecanismos mais diversificados e efetivos para que se obtenha sucesso. Fatores como distorção idade-série e retenção remetem ao insucesso que gera o afastamento/isolamento, que, por sua vez, acarreta a não permanência. Contudo, não se pode conceber a não permanência como uma ocorrência que desresponsabiliza a escola de sua principal atribuição; ao contrário, coloca ainda mais em evidência uma responsabilidade educacional que distingue o estudante de um mero indicador estatístico: o dever da escola no cumprimento de sua função social.

Com tudo isso, sabe-se que tanto o Brasil como os demais países da América Latina comemoram os níveis satisfatórios atingidos nos índices de cobertura escolar da população, divulgando amplamente os benefícios da universalização. Inclusive, estendendo a obrigatoriedade do atendimento escolar, gradativamente, até 2016, à população de 4 a 17 anos, o que amplia a faixa etária atendida atualmente e estende a escolarização obrigatória para todas as etapas da educação básica. Se comparado aos demais países, dados de 2007 revelaram que somente o Brasil, a Turquia e a Rússia alcançavam

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os 90% de atendimento a partir dos 7 anos de idade (GONÇALVES, 2010). Entretanto, há que se compreender que esse cenário abrange tão somente os aspectos estatísticos do acesso à escola, o que não significa que corresponda ao nível de qualidade exigido como direito do estudante.

Nesse contexto da qualidade, pesquisadores do Programa Internacional de Avaliação de Estudantes (Pisa) compararam os estudantes que demonstravam as competências mínimas nas avaliações realizadas em 2009 com os estudantes que mostraram alto desempenho. Os extremos variaram na sequência de 53,3%, 27,8% e 27,9%, em disciplinas de Matemática, Leitura e Ciências, respectivamente, entre o primeiro grupo, enquanto o segundo alcançou a mera pontuação de 1,2%, 5,8% e 0,5%. Nos índices do Pisa (2009), o Brasil é colocado em posição de equivalência a países da região, como o México, e em posição expressivamente inferior a países como a Finlândia, por exemplo, que, reconhecidamente, possui um dos melhores sistemas educacionais do mundo, de acordo com o Pisa.

Sabe-se que, na trajetória da educação brasileira, poucos foram ou são ousados em sua forma de ressignificar os caminhos da escola. Mais raros, ainda, são os que se predispõem a construir pontes onde há paredes, ou seja, aqueles que ousam buscar estratégias que, de fato, alcancem níveis de eficácia, por considerar a situação atual, muitas vezes, um desafio desmedido e, sobretudo, trabalhoso. A sociedade por muitas vezes deixa-se levar pela ideia de que a educação de modo geral e, de modo particular, a educação pública, está longe de tornar-se um direito e, principalmente, um instrumento de justiça social. No entanto, embora se reconheça que muitos desses fatos são verdadeiros, trata-se, ao mesmo tempo, de uma visão singular, parcial e distorcida da realidade de várias escolas brasileiras que deram o primeiro passo e se propuseram a mudar esse contexto.

A despeito do cenário negativo que se constata nessa trajetória, observa-se que na última década houve um esforço notável por parte dos governantes para a ampliação das matrículas nos ensinos fundamental e médio. A meta definida no Plano Decenal de Educação para Todos (1993-2003) previa, para as regiões do País, a cobertura do ensino fundamental para a totalidade das crianças e dos jovens de 7 a 14 anos de idade, cujos indicadores estatísticos apontaram sucesso. No que concerne

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ao rendimento escolar, o Brasil começa a registrar pequenas, porém, significativas melhorias. Essa constatação advém, entre outras fontes, dos resultados registrados nas sucessivas edições do Sistema Nacional de Avaliação da Educação Básica (Saeb), da Prova Brasil e mais recentemente do Programa Internacional de Avaliação de Estudantes (Pisa).

Na mesma direção, dados recém-publicados na revista britânica The Economist (2010) mostram que o Brasil saltou do último para o 53º lugar, entre os 65 países da quarta avaliação do Pisa, a qual envolveu os estudantes de 15 anos de idade. De acordo com o relatório da Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE, 2010), o Brasil apresentou, na última década (2000-2010), ganhos mais sólidos na área da educação. Contudo, os dados das avaliações em larga escala revelam que ainda há muito a fazer em matéria de equidade e de qualidade do sistema educacional brasileiro. Provavelmente, tal constatação se esclareça na percepção de Castro (2010), quando a autora diz que os modestos avanços que o País demonstrou ter alcançado em relação à elaboração e à consolidação dos sistemas de avaliação parecem corresponder, na mesma proporção, à habilidade por parte das redes de ensino em fazer, dos resultados dessas avaliações, estratégias possíveis de serem aplicadas em prol da melhoria de sua prática, desde a sala de aula até a formação de professores (CASTRO, 2010). Afinal, o Brasil ainda pode se considerar incipiente em termos de desenvolvimento de um sistema de avaliação da educação básica.

Até o início dos anos 1990, por exemplo, as políticas educacionais eram estabelecidas e implantadas de forma contingencial, sem passar por qualquer processo de avaliação sistemática que apontasse evidências sólidas quanto à qualidade dos sistemas de ensino, o que pode ter contribuído, como herança, para a realidade que as redes de ensino enfrentam atualmente. O que prevalecia como base, na época, era o paradigma da saudosa escola pública como referência de escola de qualidade, o que não a eximiu de tornar-se excludente e de qualidade para os poucos eleitos que conseguiam ter acesso a ela. Hoje, no entanto, o desafio tornou-se bem mais complexo, uma vez que, somado à exigência de ter qualidade, a escola agora deve ser “democrática e para todos” (CASTRO, 2009, p. 277).

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Todo esse processo de construção, de validação e de aplicação dos sistemas de avaliação desencadeou diferentes efeitos, sendo apreendidos de diferentes modos em cada sistema e em cada escola, em particular. Algumas escolas, menos atentas às demandas intrínsecas dos processos naturais de evolução da educação, permaneceram em zona de conforto, mantendo seu cotidiano no curso da normalidade, poupando-se de desafios mais provocadores. Outras escolas, mais antenadas e incomodadas com o impacto real da opinião pública depois da divulgação ampla e transparente dos resultados das avaliações, vislumbraram-nos como balizadores para a criação de estratégias mais eficazes de atendimento às necessidades de seus estudantes. Ambas as situações, entretanto, muitas vezes ocorriam em escolas vinculadas à mesma rede de ensino, apresentando realidades significativamente distintas.

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Capítulo 3

CONTRIBUIÇÕES DO LOCUS ACADÊMICO: A PESQUISA EDUCACIONAL E A MUDANÇA

DE FOCO PARA O SUCESSO ESCOLAR

Atualmente, já se pode reconhecer que, entre as diversas questões aqui discutidas, grande parte se originou de pesquisas dessa natureza, cujos resultados costumam mostrar problemas e limitações da gestão escolar. Tanto a ação como o perfil de liderança dos gestores são comumente analisados por diferentes áreas acadêmicas. Na maioria desses estudos, os resultados não têm sido muito promissores, sobretudo quando se comparam os avanços propagados e o que efetivamente se constata sobre a educação brasileira. Onde estaria o ponto de estrangulamento?

Relatam-se, aqui, resultados de estudos dessa natureza. Entretanto, embora todos estejam sempre imbuídos de esperança e de empenho em dar contribuições relevantes, desejo presente nos pesquisadores de modo geral, no caso deste estudo, almeja-se que, especialmente no domínio educacional, ele não seja apenas mais um estudo e, sim, que consiga apontar para um novo e efetivo caminho que siga na contramão do fracasso escolar. Se analisados os resultados que foram levantados por meio do estudo que gerou esta publicação, é possível observar que sua essência esteve atentamente atrelada ao olhar da pesquisadora, ao mesmo tempo que se consubstanciava nos depoimentos convincentes dos gestores, estudantes e professores, o que leva à constatação de se ter alcançado insumos para uma avaliação consistente das questões. Por essa razão, espera-se por uma contribuição que transcenda o locus da academia

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e alcance o espaço para o qual foi destinada, uma vez que tomou por base a disseminação de experiências bem-sucedidas como sendo o recurso mais coerente e instigador do debate em torno de estratégias promotoras do sucesso escolar.

Nessa perspectiva, levando-se em conta os diferentes rumos tomados pelas escolas, o desafio foi o de compreender como essas dinâmicas escolares elaboradas, gerenciadas e construídas pelo coletivo da própria escola, se inter-relacionam e determinam sua eficácia na promoção da aprendizagem dos estudantes. Com os resultados alcançados, constatou-se que as ações construídas pelo coletivo das escolas estavam, de fato, refletidas no avanço do Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb), apurado em 2009. Desse modo, foi organizada uma discussão, em profundidade, em torno de aspectos que auxiliassem na compreensão do que se elaborou como sendo a finalidade do estudo que estava sendo realizado. No caso, visava ao resgate de conceitos trabalhados há décadas, mas que se tornariam atuais diante das características dessas escolas. Afinal, nada mais desafiador do que resgatar o conceito de escolas eficazes, reacendendo o debate sobre um tema que, embora tenha sido amplamente discutido por pesquisadores educacionais de décadas anteriores, todavia, lamentavelmente, não parece ter logrado o êxito esperado.

Conforme a evolução natural dos conceitos, hoje já se vislumbra a concepção de escolas bem-sucedidas em substituição à de escolas eficazes. Contudo, essa substituição precisa ser pensada com prudência, uma vez que a essência do conceito de escolas eficazes não se encontra devidamente traduzida e contemplada no conceito de escolas bem-sucedidas. Há aspectos e elementos imbricados nessa “antiga” concepção, que fazem falta no desvelamento de questões pontuais da “nova concepção”. Esses aspectos se referem, principalmente, à relação entre desempenho satisfatório e condições adversas, fatores não enfatizados na visão das escolas bem-sucedidas. Por essa razão, optou-se por considerar no escopo da investigação realizada que tal polêmica se assenta em questões muito menos de oposição excludente entre o novo e o velho e muito mais em questões de atualização necessária para tornar os conceitos mais contextualizados e acessíveis aos paradigmas atuais. Assim, considerando a similaridade e a congruência

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das características que levam a distingui-las daquelas que não alcançaram patamares semelhantes de superação da realidade vigente e o contexto epistemológico escolhido para a realização da referida pesquisa, adotou-se a designação “escolas eficazes” com referência ao campo conceitual de identificação das chamadas, atualmente, “escolas bem-sucedidas”.

Por ter se tratado de um estudo pertinente a uma linha de pesquisa que o vincula à gestão escolar, o grande desafio consistiu em responder à seguinte indagação: o que distingue as estratégias de gestão e práticas escolares das escolas da rede pública de ensino, situadas em áreas de periferia e que conseguem atingir desempenho superior à meta estipulada? Embora, aqui, seja expressa de forma bem mais abrangente, essa questão foi explorada no âmbito específico de duas escolas da periferia do Distrito Federal, num período em que ambas superaram a própria meta, considerando-se o crescimento do Ideb, além de superar também os índices alcançados pelo ente federado ao qual estão vinculadas.

O contexto teórico-epistemológico e sua relevância científica

A década de 1980 tornou-se um marco das reflexões acerca da exclusão educativa. Desde então, a questão vem se tornando o centro das discussões acadêmicas e institucionais, sendo amplamente utilizada para enriquecer os discursos governamentais. Em contrapartida, não avançam o suficiente para atender à diversidade que ocupa as salas de aula e transformar os baixos índices do Ideb com os quais a educação se depara ano a ano. Nessa década, de acordo com D’Ávila (1985), pelo fato de a escola ser considerada aparelho ideológico do Estado, a exclusão educativa era entendida como um artifício colocado a serviço da dominação.

No âmbito educacional, o foco dos discursos, que antes se sustentava na teoria do “déficit” e “dos dons”, passa a ser redirecionado para a questão da “diferença”. Assim, todas as faltas ou lacunas, no que se referem a níveis de capacidade, eram atribuídas às crianças das classes populares, ou seja, às mais pobres. Na teoria do déficit, essa relação se dava a partir da identificação de carências, e na teoria dos dons, a partir

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do que se considerava “não dotação” ou, de acordo com a genética, “pouca inteligência” (D’ÁVILA, 1985). Autores como Bourdieu, Passeron e Paulo Freire, por sua vez, passaram a discutir a questão do fracasso escolar no contexto de uma sociedade de classes, associando-o à ideia de dominação, na qual se pressupõe uma intenção de subjugar a população empobrecida, para atender aos interesses nacionais, os quais correspondiam aos interesses das classes dominantes. Bourdieu e Passeron (1970) foram mais contundentes ao afirmarem que o critério adotado pela escola, na avaliação das competências dos indivíduos, segue os princípios defendidos pelas classes dominantes. Logo, as crianças das classes sociais desfavorecidas obtêm menos sucesso por serem colocadas a uma distância expressiva da cultura escolar, sendo que o mesmo não ocorre com as crianças oriundas das classes privilegiadas.

O que se vislumbra, portanto, é um panorama excludente que decorre das políticas públicas globais do Estado, afetando, consequentemente, as políticas de educação, situação que parece não ter evoluído até os dias atuais. Percebe-se, além disso, que, em seu percurso histórico, a educação no Brasil segue impregnada de um caráter excludente, aspecto que denuncia a exclusão como marca cultural pejorativa, imputada ao País, revelando, curiosamente, diferenças expressivas em relação a escolas vinculadas à mesma rede de ensino. Em decorrência, se observa um cenário em que crianças têm acesso diferenciado às oportunidades educacionais públicas. São crianças que passam a ser submetidas a diferentes realidades escolares, uma vez que as práticas pedagógicas desenvolvidas em cada escola terminam por discriminar determinada parcela da população que não goza das mesmas condições de acesso, embora oriundas do mesmo espaço geográfico. Assim, a educação pública se depara com um contexto, o qual, mesmo apresentado numa visão essencialmente estatística por levar em conta resultados das avaliações, introduz uma questão crítica na esfera educacional: a ineficácia da escola no tocante a questões da equidade e do sucesso escolar dos estudantes.

Diante desse cenário, não há como desconsiderar que no contexto da educação brasileira, ainda se perpetue sinais de desigualdade, sobretudo se analisada a situação de cada escola, em particular. A diferença se acentua

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expressivamente em escolas localizadas em bairro central e as que se localizam na periferia6 de uma mesma cidade. Vale ressaltar que a Prova Brasil aplicada em 2007 havia constatado, na interpretação mais aprofundada dos dados, uma influência significativa da situação socioeconômica dos estudantes7 em relação ao baixo desempenho, sobretudo no que alude ao atraso escolar (INEP, 2007). Os dados revelaram que quanto maior a idade, pior o desempenho nas provas e, como o atraso escolar sempre esteve relacionado à pobreza; concluiu-se que o desempenho escolar sofria forte influência das condições econômicas da família, minimizando, assim, a responsabilização da escola em oferecer as condições adequadas à aprendizagem e ao sucesso dos estudantes (INEP, 2007). Em contrapartida, também foi verificado que a diferença entre os Estados supostamente mais abastados, se comparados àqueles considerados de menor renda média familiar, não se manifestava de forma relevante nos resultados. Como exemplo, cita-se o resultado de pesquisas em que Minas Gerais superou Brasília no quesito desempenho escolar, apesar de a capital do País ser considerada a Unidade Administrativa de maior renda familiar e o Estado de Minas Gerais ter renda média mensal inferior. Do mesmo modo, ocorre com o Ceará, que, mesmo apresentando renda média mensal inferior ao Rio de Janeiro, apresentou melhor desempenho em suas escolas.

Uma nova questão, levantada por Schwartzman, Torres e Kam (2010), passa a ocupar o centro das preocupações: estando na escola, o que os estudantes aprendem? Os autores concluem que, embora as

6 O significado de periferia foi aplicado em seu significado literal, ou seja, para referir-se às cidades ou regiões que se situam em torno de uma região central, não tendo, portanto, relação semântica com as condições de pobreza ou de desigualdade social dessa região, concepção comumente, e equivocadamente, atribuída ao termo. No caso da pesquisa realizada, as escolas estão localizadas em regiões de periferia do Distrito Federal, ou seja, regiões que estão a determinada distância da região central, que é Brasília/Plano Piloto. Por questões de atendimento ao critério adotado na definição do objeto de estudo, as regiões escolhidas possuem menores possibilidades de acesso a condições mais favoráveis de saúde, educação e segurança, devido estarem a uma distância relativamente maior dessa região central, cuja população se encontra supostamente mais bem servida de recursos, especialmente educacionais, por se tratar da capital do País, sede dos governos local e federal. No caso específico, foi adotado o critério de distancia superior a 20km do centro administrativo.

7 Nesta pesquisa foram consideradas as escolas situadas em Regiões Administrativas (RAs) com renda per capita inferior a dois salários mínimos, por corresponder à média encontrada no Distrito Federal.

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condições econômicas e sociais prevaleçam no topo da desigualdade como a principal causa, as escolas e as políticas públicas educacionais são categorias de análise que ainda fazem muita diferença. Tal percepção remete à constatação de que, entre esses e outros entraves verificados no sistema educacional brasileiro, a repetência e a evasão escolar, provocadas pela precariedade de algumas escolas, tanto nos aspectos físicos quanto nos aspectos pedagógicos, lideram o ranking dos problemas detectados. Este se configura em um cenário, por exemplo, que não se conforma à visão de Haddad (2008), quando afirma considerar a educação escolar não somente um direito de homens e mulheres como também um bem público. Essa ideia foi compartilhada por Parente (2003), autor que reforçava ser a educação, em si, um bem estratégico, uma vez que se torna condição para o alcance de objetivos sociais e econômicos, individuais e coletivos, assim como se revela um instrumento, por excelência, de inclusão social e de combate à pobreza.

Por certo se está diante de dois cenários altamente antagônicos, se comparados na dimensão do discurso e da ação. Qual deles corresponderia à realidade de tantas crianças e jovens que ocupam os bancos escolares, atualmente? A quem compete a solução para tamanha desconexão?

Gomes, Carnielli e Assunção (2004), por sua vez, tratam da desigualdade no âmbito do currículo e a ele se reportam para dizer que, desde sua organização, o próprio conhecimento se revela um instrumento de desigualdade. Para esses autores, por se apresentar “dividido em setores de status mais e menos altos” (p. 30), o currículo termina por estratificar as matérias com base no critério do prestígio. Desse modo, aquelas de status superior tendem a ser associadas à ideia de recompensa e, portanto, reservam-se aos estudantes “mais capazes”. Tal constatação, segundo os autores, denuncia que a própria cultura escolar não opera de forma imparcial e, sim, legitima “uma perspectiva cultural particular, que favorece uns e desfavorece outros” (p. 30).

Seguindo nessa direção, Buarque (2011) chama a atenção para o grave problema da exclusão social no Brasil, ponderando que ela se manifesta de diversas formas e destacando entre as mais proeminentes aquelas que relacionadas à pobreza. O abandono de crianças pobres nas ruas, sem

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escolas, no trabalho infantil ou até mesmo nas “falsas escolas”,8 tem se intensificado no cenário brasileiro. Para o autor, a primeira providência a ser tomada para a erradicação da pobreza no Brasil está diretamente vinculada à educação para todos os meninos e meninas, porém efetivada em uma escola de qualidade. Em pesquisa que tratou da expansão do ensino médio, Gomes e Carnielli (2003) questionam se isso vem ocorrendo e, ao levantarem uma indagação que converge para o pensamento de Buarque, chamam a atenção para o interesse que, de fato, subjaz às políticas educacionais brasileiras na questão da exclusão social. Assim, entre outros desafios, os autores instigam a refletir: “a educação brasileira tem tido maior interesse em manter um cardápio variado para atender a diferentes clientes, num sistema segmentado e estratificado, ou tem realizado a concretização de oportunidades educacionais democráticas, segundo os objetivos da ‘educação para todos’, subscritos legalmente pelo País?” (p. 48).

Em face do exposto e considerando, ainda, o cenário sombrio, que reflete os elevados índices de repetência e de abandono da escola, citados no Relatório de Monitoramento de Educação para Todos (UNESCO, 2010), entende-se que a transformação da escola se estabelece como palavra de ordem. Na área da educação, o Brasil precisa alcançar patamares equivalentes aos que demonstra em algumas áreas, como a economia, por exemplo. De acordo com o relatório, a qualidade da educação no País apresenta-se em níveis muito baixos, especialmente na educação básica.

Diante desse cenário, emerge uma nova vertente de discussão, que direciona o foco para a eficácia das escolas. Trata-se de um movimento que teve sua origem nos Estados Unidos e na Inglaterra na década de 1960, o qual passou a questionar e a suscitar reflexões para além das questões sociais, econômicas e culturais envolvidas no sucesso escolar.

8 Buarque denomina “falsas escolas” aquelas que não têm as condições mínimas para serem chamadas de escolas do século 21, nem sequer as tinham na primeira metade do século 20. Na maioria, não passam de restaurantes mirins populares, para onde as crianças vão apenas pela merenda: sem aulas, sem deveres de casa, sem acompanhamento, algumas sem água, nem banheiro, outras sem energia elétrica, sem todas as disciplinas, sem atividades complementares, quase nenhuma com horário integral, muitas sem nem ao mesmo quadro-negro, para não dizer biblioteca e computadores (BUARQUE, 2011, p. 56-57).

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Assim, a nova questão passou a ser: como as características das escolas podem influenciar positivamente no desempenho de seus estudantes?

Vale ressaltar nessa questão a percepção de Marli André (1992), que vem reforçar a pertinência da linha de condução do estudo realizado, quando a autora diz que uma das razões que motivam investigar boas práticas pode estar exatamente na ressignificação do foco de atenção, que comumente tende a se concentrar nas experiências de fracasso. Como dito anteriormente, o foco aqui esteve direcionado para examinar os fatores de sucesso, uma vez que as mazelas da escola brasileira, especialmente a da rede pública de ensino, e que não são fictícias, têm sido recorrentemente exploradas e pouco se tem discutido sobre o que está dando certo.

Assim sendo, a vertente que se elegeu como centralidade dessa discussão contraria a usualmente adotada e instiga a enxergar a face positiva que se pode encontrar na escola pública. Essa visão facilita reconhecer que desse espaço, por vezes tão subjugado em relação à rede privada, se possa aprender muito também do seu sucesso. Obviamente que o olhar lançado buscou operar em posição dialógica, na medida em que, de um lado, não descartou contradições, admitindo suas limitações diante das barreiras impostas pelos próprios sistemas, e, de outro, deu voz às suas potencialidades, por entender que os caminhos encontrados se constituem parâmetros importantes, especialmente, para a melhoria da qualidade nas demais escolas da mesma rede de ensino.

Direcionadas para esse foco, portanto, algumas pesquisas acenaram para o efeito escola, começando pelos estudos de Brookover (1979), entre outros, que, mais tarde, por volta das décadas de 1980 e 1990, ampliaram seu objeto para a caracterização das escolas eficazes. A respeito do efeito escola, o pensamento vigente era o de compreender as relações existentes entre a desigualdade social, neste caso, manifestada pela diversidade sociocultural e econômica dos estudantes, e as estratégias aplicadas em cada escola, a fim de favorecer o desenvolvimento do processo de ensino e aprendizagem. Quanto às escolas eficazes, a maior contribuição de sua inserção no corpus de conhecimentos que discute o sucesso escolar foi o destaque para a necessidade de se buscar a equidade da educação, finalidade que compromete os agentes externos e internos envolvidos no processo

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educacional e que vislumbra alcançar, de modo especial, os estudantes que se encontram em condições de vulnerabilidade e de desfavorecimento econômico.

A vertente de estudos sobre as escolas eficazes trouxe, ainda, como uma das contribuições mais importantes, o interesse e a disposição em compreender por que determinadas escolas alcançam o ranking dos melhores resultados com todos os estudantes, superando condições subjacentes ao seu contexto social, cultural ou econômico, enquanto outras, entre as que vivem condições semelhantes, não conseguem o mesmo resultado ou fracassam em suas tentativas de elevar a qualidade de ensino. Esse debate se intensificou, sobretudo, pelo intuito de refutar as várias teorias que, por volta das décadas de 1950 e 1960, não reconheciam que as escolas faziam diferença no desempenho dos estudantes (CANGUSSU, 2010).

Cabe ressaltar que o Relatório Coleman (1966) foi o que mais contribuiu para disseminar a visão do contexto socioeconômico como determinante do desempenho dos estudantes, minimizando o encargo da escola, que pouco ou nada passou a representar como elemento propiciador de mudanças dessa realidade. Para Coleman e colaboradores (1966), o desempenho dos estudantes mantinha estreita relação com sua origem social, não sofrendo, portanto, influência significativa dos fatores escolares.

A despeito dessas influências, nos últimos anos, milhares de brasileiros que se encontravam excluídos estão tendo a oportunidade de voltar a estudar. De certa forma, finalmente, com quase um século de atraso, as políticas públicas no Brasil estão esforçando-se para implantar ações voltadas para a inclusão educacional, direito que é de todos. Vale ressaltar, no entanto, que, embora a escola pública brasileira, no momento, não seja a que os brasileiros almejam, nada impede que o País comemore pequenas vitórias. Assim, mesmo com um século de atraso em relação aos países desenvolvidos, e contrariando aspectos de sua trajetória na educação, o Brasil começa a resgatar, para a centralidade dos debates institucionais, o papel da escola no processo crescente de democratização da oportunidade para todos.

Sabe-se, todavia, que a busca por oferecer a melhor educação, nomeadamente às camadas mais carentes e desfavorecidas social e

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economicamente, consiste no atendimento ao grande desejo, ao mesmo tempo, o maior desafio atribuído às políticas públicas e às instituições escolares, em particular. Atenta a essa premissa e à crença de que a equidade social, naturalmente, começa pela educação, a finalidade dessa linha de discussão, antes de tudo, é despertar para a importância de uma questão raramente investigada no Brasil e que se faz primordial na extinção gradativa da desigualdade de direitos, neste caso, uma educação de qualidade para todos os estudantes, indistintamente. Para tanto, definiu-se como escopo do estudo realizado examinar duas escolas da rede pública de ensino do Distrito Federal, que viessem apresentando, consecutivamente, uma evolução positiva no Ideb, em 2005, 2007 e 2009. O esforço concentrou-se, portanto, em identificar e compreender quais foram as ações ou as iniciativas que essas escolas desenvolveram e que acarretaram impacto no desempenho escolar dos estudantes em seu desempenho escolar. É importante observar que essas duas escolas se encontram inseridas no mesmo sistema e na mesma rede de ensino e que são submetidas a condições semelhantes de gestão e de recursos de outras escolas que não conseguiram esse mesmo desempenho. De certa forma, seus resultados poderão contribuir também com as teorias que defendem que a escola exerce, sim, influência importante sobre o sucesso ou o fracasso escolar de seus estudantes.

Contrariando uma tendência generalizada de realçar aspectos negativos quando se trata da educação, optou-se por adotar uma posição contestadora, opondo-se ao negativismo que circunda as questões educacionais, procurando direcionar o foco para outra vertente de abordagem, mais raramente adotada. Para tanto, investigaram-se escolas que conseguem promover as condições favoráveis ao sucesso de seus estudantes, buscando, ainda, levantar fatores que as caracterizem como espaços educacionais capazes de superar as adversidades políticas, administrativas e pedagógicas, entre outras, e destacar-se pelo êxito em desempenho medido nas avaliações externas.

Na intenção de antecipar-se a possíveis inferências de que, por gozarem de condições locais favoráveis e, por esse motivo, alcançaram resultados positivos, optou-se por selecionar escolas da rede pública de ensino localizadas em regiões distantes do centro de Brasília, que

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apresentassem renda per capita mensal inferior à média do Distrito Federal. Visando, desse modo, dar consistência ao critério citado para a escolha do objeto de estudo, procurou-se apresentar, no tópico que se segue, aspectos que retratem o contexto onde as referidas escolas estão inseridas.

Distrito Federal: aspectos da conjuntura local

Pensar em análise de conjuntura implica o desafio de compreender as inter-relações entre elementos e aspectos que são apreendidos do espaço analisado, funcionando como uma espécie de “roteiro” que permite ao pesquisador “viajar” na realidade investigada. Entende-se que caracterizar o espaço geográfico e social que abriga determinado objeto de estudo é o mesmo que reconhecer a existência de um conjunto indissociável de fatores que implicam a visão que se apreende desse objeto, auxiliando na análise dos dados que são gerados, a partir da imersão do pesquisador na dinâmica desse espaço.

Santos (1996, p. 73) traduz de forma clara essa percepção, na medida em que considera que “o espaço é igual à paisagem mais a vida nela existente; é a sociedade encaixada na paisagem, a vida que palpita conjuntamente com a materialidade”. Nessa perspectiva, sentiu-se a necessidade não de simplesmente descrever elementos que caracterizassem o Distrito Federal, espaço mais amplo onde as duas escolas estão inseridas, mas de apresentar um retrato mais dinâmico de uma realidade que pudesse ter influenciado, positiva ou negativamente, os resultados de uma investigação. Assim, torna-se pertinente refletir sobre em que consiste esse conjunto de aspectos, objetos e ações que compõem esse espaço.

Quanto aos aspectos de origem, a história do atual Distrito Federal começou com a transferência da capital para o interior do País, ideia defendida desde a época dos inconfidentes mineiros, em 1789, questão essa que voltou a ser abordada por José Bonifácio de Andrade e Silva também em 1821. Entre idas e vindas sobre a temática de interiorização da capital do País, o historiador Francisco Adolfo de Varnhagen fez uma viagem, em 1877, ao Planalto Central do Brasil e recomendou a área próxima à Vila

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Formosa da Imperatriz, hoje Formosa (GO), para ser a nova capital do País. Em 1893, Luiz Cruls chefiou a Comissão Exploradora do Planalto Central do Brasil, denominada Comissão Cruls, responsável pela demarcação da área que mais tarde se tornou o atual Distrito Federal.

Em 1891, a transferência da capital da União adquire o preceito legal na Constituição daquele ano, a qual, em seu Art. 3º, definiu: “Fica pertencendo à União, no Planalto Central da República, uma área de 14.400 Km² que será oportunamente demarcada para nela estabelecer-se a futura Capital Federal”. Somente em setembro 1922, como parte da comemoração do Centenário da Independência do Brasil, ocorreu o lançamento da pedra fundamental, no Morro Centenário, na cidade de Planaltina (GO). A Constituição de 1934 reafirmava: “será transferida a Capital da União para um ponto central do Brasil”. Em outubro de 1957, o então presidente Juscelino Kubitschek sancionou a Lei nº 3.273, que marcava para o dia 21 de abril de 1960 a transferência da nova capital da União para o novo Distrito Federal. Brasília foi inaugurada na data estabelecida pelo presidente e passou a ser considerada uma cidade administrativa e polo de desenvolvimento regional.

Para facilitar a administração dessas localidades, foi sancionada a Lei nº 4.545/1964 que dividiu o território do Distrito Federal em oito Regiões Administrativas (RAs), cada uma com um administrador nomeado pelo antigo prefeito. Com a evolução territorial, em 1989, procedeu-se a uma nova divisão em 12 RAs. Em 1993, mais três RAs foram criadas, incorporando, assim, novas RAs ao território do Distrito Federal, o que ocorreu no período entre 1994 e 2009. Em 2012, mais precisamente no mês de maio, mais uma região administrativa foi incorporada, ampliando o espaço ocupado na região que pertence ao Distrito Federal.

No que concerne aos aspectos socioeconômicos, em 2010, o Distrito Federal era composto por 31 Regiões Administrativas, com uma população, estimada pela Pesquisa Distrital por Amostra de Domicílios (PDAD)/2010, de 2.194.422 habitantes. O conjunto de habitantes que compõem cada uma dessas RAs e diferencia-se quanto ao nível socioeconômico, conforme demonstrado no Quadro 1 a seguir. Os percentuais revelam dados de renda domiciliar e per capita mensal, expressas em salários mínimos (SM), das 31 RAs.

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Quadro 1 – Regiões administrativas e aspectos socioeconômicos – 2010

Regiões administrativas HabitantesRenda domiciliar

mensal (SM)

Renda

per capita

mensal (SM)

Distrito Federal 2.096.534 9,0 2,4

RA I – Brasília 198.906 19,3 6,8

RA II – Gama 112.019 6,0 1,6

RA III – Taguatinga 223.452 9,6 2,5

RA IV – Brazlândia 48.958 3,4 0,8

Ra V – Sobradinho 61.290 9,2 2,4

RA VI – Planaltina 141.097 3,2 0,8

RA VII – Paranoá 39.630 5,2 1,2

RA VIII – Núcleo Bandeirante 22.688 8,3 2,4

RA IX – Ceilândia 332.455 4,7 1,2

Ra X – Guará 112.989 12,3 3,3

RA XI – Cruzeiro 40.934 12,1 3,1

Ra Xii – Samambaia 147.907 4,0 1,0

RA XIII – Santa Maria 89.721 3,7 0,9

RA XIV – São Sebastião 69.469 5,2 1,4

RA XV – Recanto Das Emas 102.271 3,9 0,9

RA XVI – Lago Sul 24.406 43,4 10,8

RA XVII – Riacho Fundo 26.093 5,9 1,5

RA XVIII – Lago Norte 23.000 34,3 7,8

RA XIX – Candangolândia 13.660 8,3 2,2

RA XX – Águas Claras 43.623 12,4 3,3

RA XXI – Riacho Fundo II 17.386 3,3 0,9

RA XXII – Sudoeste/Octogonal 46.829 24,1 8,6

RA XXIII – Varjão 5.945 2,8 0,8

RA XXIV – Park Way 19.252 19,6 4,9

RA XXV – Scia (Estrutural) 14.497 1,9 0,4

RA XXVI – Sobradinho II 71.805 6,5 1,7

RA XXVII – Jardim Botânico 22.726 21,8 6,4

RA XXVIII – Itapoã 46.252 1,6 0,4

RA XXIX – SIA (1) – – –

RA XXX – Vicente Pires 75.162 11,8 3,4

RA XXXI – Fercal (2) ND ND ND

1. Não existem informações por não possuir unidades residenciais.2. Não existem informações por terem sido criadas depois do término da pesquisa.Fonte: <www.codeplan.df.gov.br/sites/200/216/00000199pdf 2010>.

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Se comparados numa perspectiva meramente quantitativa, é possível observar que os números revelam a discrepância quanto ao nível socioeconômico entre as regiões localizadas em espaços relativamente equidistantes. Verifica-se que, entre as 31 apresentadas no Quadro 1, a RA VI e RA XII, cidades onde se localizam as escolas pesquisadas (Planaltina e Samambaia, respectivamente), são as que apresentam um quadro de menor poder aquisitivo e que se situam a uma distância numérica expressiva das quatro regiões (RAs I, XVI, XVIII, XXII) consideradas como as que melhor detêm condições de infraestrutura física, socioeconômica, cultural e mesmo educacional. Essa avaliação leva em conta a visão de que estando próximas à Região Central, naturalmente, essas regiões gozariam de maiores possibilidades de acesso a tais benefícios. Enquanto Planaltina e Samambaia se encontram na faixa de 3,2/4,0 salários mínimos e 0,8/1,0 de renda per capita mensal, as quatro regiões destacadas multiplicam exponencialmente suas condições econômicas, na medida em que se situam em faixas que variam de 19,3 a 43,4 salários mínimos e 6,8 a 10,8 de renda per capita mensal.

Apresentando dados mais específicos quanto à renda bruta média mensal domiciliar, a maior parcela da população de Planaltina (38,3%) tem renda entre dois e cinco salários mínimos, e 23,8% de seus habitantes recebem de um a dois salários mínimos. A situação de Samambaia se assemelha à de Planaltina, pois 35,8% da população têm renda entre dois e cinco salários mínimos e 25,4% da população têm renda entre um e dois salários mínimos. Para efeito de comparação, a RA I – Brasília tem a maior parcela (28,6%) com renda acima de 20 salários mínimos e 24,6% com renda entre 10 e 20 salários mínimos (SEPLAN9/CODEPLAN,10 PDAD/2010).

Reportando-nos ao mencionado desafio de se compreender, a partir de uma análise de conjuntura, as inter-relações entre os elementos e os aspectos que são apreendidos do espaço analisado, a situação das duas escolas coloca em evidência algumas reflexões, entre as quais se destacam:

9 Secretaria de Estado de Planejamento e Orçamento do Distrito Federal.

10 Companhia de Planejamento do Distrito Federal.

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a) quais os mecanismos de superação de uma realidade que, pela própria infraestrutura deficitária em vários aspectos, já pressupõe índices importantes de pobreza, os quais podem levar à violência, que por sua vez pode afetar o desempenho dos estudantes que habitam esse espaço?

b) que condições são proporcionadas aos educadores que, fora da escola, supostamente estariam imersos em problemas estruturais semelhantes aos de seus estudantes?

c) de que modo seria garantido a esses professores, por exemplo, o acesso a condições adequadas de formação e de qualificação profissional?

d) o que move essa comunidade escolar a participar e a influenciar avanços tão positivos no desempenho de uma escola que se encontra submersa em um espaço geográfico e social que, pela sua conjuntura, evidencia problemas de múltiplas origens?

É possível inferir, também, a partir desses dados, que há um visível movimento de desigualdade social, quando se observa a divisão de renda entre os grupos sociais no espaço do Distrito Federal. Tal desigualdade se reflete na situação das escolas, que passam a apresentar maiores ou menores dificuldades de acesso a recursos de melhoria, conforme a proximidade ou a distância da região central.

De acordo com Nunes e Kohlsdorf (1999), diferentes teorias sociológicas que discutem as desigualdades sociais e econômicas nos espaços urbanos convergem para a visão de que, especialmente em Brasília, essa ocorrência toma uma proporção maior de legitimidade. Assim, nas RAs XVI e XVIII (Lagos Sul e Norte), por exemplo, a quase totalidade da população está situada na faixa de renda acima de 40 salários mínimos. Por essa razão, estas e outras regiões citadas estão inseridas em espaços denominados, efetivamente, de áreas nobres, caracterizadas por “habitações unifamiliares”, as quais se destacam pelo elevado padrão médio e pelo conforto urbano, ou seja, gozam do privilégio de habitar um espaço urbano de “infraestrutura de primeira qualidade, um projeto urbanístico impecável, segurança pública eficiente” (NUNES; KOHLSDORF, 1999, p. 12).

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A análise de Nunes e Kohlsdorf reforça um dos critérios de escolha das duas escolas, legitimando a afirmação de que as famílias mais pobres residem nas RAs que se localizam na periferia do Plano Piloto e informa que algumas antecedem à transferência da capital e que outras foram criadas na medida em que se consolidava a vida urbana. Entre as RAs que resultam das políticas de ocupação de terra, empreendidas por governantes que exerciam o poder, estão Planaltina, a mais antiga, e, Samambaia, pertencente ao grupo das mais recentes. Segundo dados de renda familiar, não tão atuais, porém ainda válidos, Samambaia, uma das cidades que abrigavam a maior parte das pessoas pobres de Brasília, e Planaltina se destacavam pelo expressivo percentual de famílias pobres (menos de dois salários mínimos), se considerado o total da população (CODEPLAN, 1997).

Não seria tampouco mérito aprofundar essas questões, sobretudo por não constituir finalidade desta discussão. Importante, sim, se faz aprofundar os resultados que mostraram a superação de uma realidade que fez com que essas duas escolas, apesar de imersas nessa realidade adversa, se aproximassem do que a literatura define como escolas eficazes. Essa é a razão, acredita-se, que, de imediato, corrobora a pertinência em levantar, mesmo sem o necessário aprofundamento, questões ontológicas e sociológicas do espaço geográfico em que ambas estão inseridas.

Trazendo um recorte dos dados gerados, nota-se que os depoimentos pessoais dos próprios professores e da diretora corroboram a realidade das escolas analisadas. Na área educacional, considerando a fala da diretora da escola situada em Planaltina, fica evidente, inclusive, o baixo nível de instrução das famílias dos estudantes: “a escola situa-se em uma comunidade muito carente, seus pais têm pouca instrução, várias mães tiveram bebês muito cedo e os estudos foram deixado de lado” (D: EM).

Para além do retrato de uma realidade precária, revelado nas informações oficiais e consubstanciado na voz dos sujeitos, é imprescindível que se tenha em conta que o cerne da questão, sobre a qual deverão se debruçar pesquisadores, educadores, sociólogos, antropólogos, órgãos institucionais e gestores, em geral, consiste na certeza de que “entre os que fracassam estão, não por acaso, os mais desfavorecidos da sociedade”

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(GUERRA, 2005, p. 12). O passo seguinte foi buscar, nos princípios que fundamentam a ação das escolas eficazes, o que, de fato, interessa: quais são as providências que deverão ser tomadas para reverter essa situação?

Implicações da conjuntura educacional: escolas que compõem a rede pública pesquisada

A Secretaria de Estado de Educação do Distrito Federal (SEE/DF) executa sua política educacional, de modo a assegurar o pleno funcionamento do sistema de ensino oficial regular. Atualmente, diga-se, ano de 2012, essa Secretaria conta com 640 escolas, sendo que, desse total, 564 estão localizadas em área urbana e 76 em área rural. As escolas públicas são caracterizadas como Jardim de Infância (JI), Centro de Educação Infantil (CEI), Centro de Atenção Integral à Criança (Caic), Escola Classe (EC), Centro de Ensino Fundamental (CEF), Escola-Parque (EP), Centro Interescolar de Línguas (CIL), Centro de Ensino Especial (CEE), Centro Educacional (CED), Centro de Ensino Médio (CEM), Educação de Jovens e Adultos (EJA), Promoção Educativa do Menor (Proem); Escola dos Meninos e Meninas do Parque (EMMP), Biblioteca EQS 108/308 Sul e Biblioteca EQS 104/304 Sul. Focalizando o zoom nas duas escolas selecionadas, observe-se que elas se incluem entre as que são caracterizadas como Centro de Ensino Fundamental por atenderem à população de estudantes que cursa as séries finais do ensino fundamental. Cabe complementar que a escola de Planaltina atende também aos anos inicias.

Retratando sucintamente a realidade educacional nas duas RAs, os indicadores oficiais (CODEPLAN, 2010) mostram que o maior percentual da população de Planaltina possui o 1º grau incompleto (40,6%), apenas 3,8% dos habitantes cursaram o ensino superior completo e 3,2% da população declararam ser analfabetos. Com relação à Samambaia, os dados mostram que 38,1% da população têm o 1º grau incompleto e somente 19,2% têm o 2º grau completo. Quanto ao ensino superior, apenas 1% da população declarou ter concluído o curso de graduação. Os dados mostram, ainda, um percentual de 4,2% que se declararam analfabetos.

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Aspectos conceituais na delimitação de abordagens

Tratar de temas controversos por natureza – como são os temas que envolvem a educação – exige que se estabeleça, de forma mais precisa, porém nada inflexível, os limites sobre os quais a discussão se enquadrará, dada a abrangência e a complexidade que lhes são inerentes. Essa reflexão muitas vezes esboça o foco da discussão no que compete às tendências paradigmáticas, às perspectivas teórico-filosóficas e mesmo às abordagens metodológicas que forem adotadas, sobretudo se tratando de resultados de estudos científicos. Logo, também pode oferecer algumas pistas para o reconhecimento da linha de pensamento dos autores que foram convidados a dialogar sobre o tema, sobretudo quando é o caso de se tratar de assuntos relacionados a concepções de educação, sucesso e fracasso escolar, inclusão, desigualdade etc. Há, todavia, toda uma riqueza da língua que permite o enriquecimento de abordagens, possibilitando uma compreensão mais profunda da postura filosófica que se adota em discussões densas como essas.

Por essa razão, optou-se por abrir, aqui, um segundo parêntese na estrutura dessa narrativa para refletir sobre o modo como a escola conecta sua prática ao cotidiano dos estudantes. Entende-se que dizer isso por meio de uma narração metafórica é propiciar e instigar a emersão de imagens capazes de atribuir um sentido ou significado à questão fundamental que está sendo discutida.

A narração começa com dois meninos, muito diferentes um do outro, que estavam caminhando em uma floresta. Tanto os professores quanto os pais do primeiro menino o consideravam inteligente e ele também se considerava assim. Obtinha notas excelentes e um currículo que deveria ajudá-lo a ter sucesso em sua vida acadêmica. Em contrapartida, poucas pessoas consideravam o segundo menino inteligente. Suas notas não eram nada especiais, e seu currículo, embora satisfatório, não chegava a ser considerado notável. Na melhor das hipóteses, as pessoas diriam que ele era esperto ou que “vai se safando”. Passeando pela floresta, se deparam com um problema: um urso muito grande e feroz, aparentemente faminto, estava se preparando para atacá-los. O primeiro menino começou a calcular que o urso

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feroz levaria 17,3 segundos para chegar até eles. Essa é uma façanha impressionante, dada a tensão em que se encontram. Esse menino não só sabia a fórmula: distância = velocidade x tempo, como também era capaz de aplicá-la em situações de grande coação. O segundo menino jamais seria capaz de calcular o número de segundos, e nem tentaria. O primeiro, em pânico, olhava na direção do segundo menino, que estava descalçando as botas de caminhada e calçando as suas sapatilhas. O primeiro menino diz para o outro: – Deves estar louco! É completamente impossível corrermos mais do que este urso feroz! O segundo replicou: – É verdade. Mas tudo o que eu tenho a fazer é correr mais do que você! O resultado é que o primeiro se tornou o almoço do urso feroz e o segundo correu até se salvar (STERNBERG; GRIGORENKO, 2003, p. 15).

A história criada por Sternberg e Grigorenko (2003), ainda que fictícia, traduz a essência de uma questão que tem instigado muitas discussões na área educacional: o que, de fato, a escola precisa “ensinar”? Onde buscar o cerne de uma práxis que deveria dar respostas efetivas à diversidade dos estudantes? Não se pode perder de vista que, mesmo diante da constatação de que as escolas acolhem estudantes procedentes de realidades muito distintas e em distintos aspectos, suas práticas têm de alcançar resultados com todos eles. Que desafios precisam ser enfrentados com relação aos indicadores lamentáveis do País, no sentido de transformar os números em resultados positivos, de fato?

Defende-se, como pressuposto, a ideia de que não se alcançará uma resposta adequada a esse desafio tão recorrente senão pelo caminho da eficácia. Assim, uma nova questão que emerge é: não faltaria às escolas uma faceta investigativa da realidade social de seu entorno, para que se pudessem obter as ferramentas que levariam a esses resultados? Como “ensinar” e “preparar para a vida, que é humana e, por natureza, complexa? O que a escola esteve, está e estará fazendo por estudantes como os “meninos da floresta”, para os quais os mecanismos de aplicação das aprendizagens agem de formas tão diferentes?

Sobre essa questão, entende-se ser fundamental que as escolas não se isolem das influências e dos condicionantes externos. Contudo, é também fundamental que levem em conta as experiências bem-sucedidas

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que possam auxiliá-las na construção de seus próprios caminhos. Como instituição inserida num contexto similar a outros contextos, caberá a todas as escolas conseguirem dar respostas adequadas à diversidade de seus estudantes, acreditando que podem e precisam buscar elementos que tornem essa resposta cada vez mais eficaz. A própria sociedade vem mostrando-se cada vez mais dinâmica, e a escola precisa se dar conta disso. Os avanços tecnológicos, as exigências da globalização e o mercado de trabalho a cada dia mais competitivo passam a agregar a ideia de uma sociedade em constante e frenética mudança. Assim, espera-se que os diversos segmentos políticos, econômicos e educacionais do País adotem uma postura diferenciada no enfretamento dos novos desafios.

Nessa direção, a escola é cada vez mais desafiada a dar respostas adequadas às situações que são colocadas cotidianamente e que, muitas vezes, exigirão mudanças radicais em suas estratégias. Assim como ocorreu com o segundo menino. A prática da escola seria inoperante diante de uma situação de emergência, do imprevisível. A escola precisa se dar conta de que a própria dinâmica da vida não é previsível. Observa-se, contudo, que parte significativa dos profissionais da educação parece insistir em permanecer em sua zona de conforto, dando mais ênfase às práticas que costumam aplicar e que os levam à sensação de segurança, de terra firme, de falsa certeza, revelando a prevalência de posturas adquiridas como herança da modernidade. Esses profissionais muitas vezes não percebem que essas práticas vêm se mostrando incompatíveis com os novos padrões. A situação da educação no Brasil, amplamente discutida e frequentemente questionada pelos índices educacionais que flagram o fracasso escolar, está aí para corroborar essa visão. Especialistas contemporâneos alertam que já não se trata de uma questão de preferência, mas que se tornou quase uma necessidade inerente aos tempos atuais, pensar a educação na perspectiva de que as escolas busquem o caminho para dar respostas eficazes.

Se levado em conta, ainda, o Relatório da Comissão Internacional sobre Educação no Século XXI, apresentado pela Unesco em 1996 e 2000, observa-se que seus resultados ratificam o papel essencial que a educação tem para o desenvolvimento econômico e sociocultural de um País e de seus habitantes ao longo da vida. Para Delors e colaboradores (2000),

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a educação surge como um trunfo indispensável à humanidade, para a construção dos ideais de paz, de liberdade e de justiça social. Este último, como o ideal que garantirá a eliminação dos fatores de exclusão dos estudantes que ainda não foram beneficiados pelos resultados de uma educação de qualidade e pela materialização do discurso da “oportunidade para todos”.

Nesse debate, reforça-se a posição da escola como objeto de atenção de grupos sociais que desejam ter seus direitos reconhecidos, bem como daqueles grupos que necessitam ter seus direitos reafirmados. A importância do papel da escola na garantia da qualidade e da igualdade de oportunidades educativas tem sido um dos temas mais frequentes adotados nas pesquisas nessa área. Apesar do consenso a respeito da contribuição essencial da educação, ainda persistem muitas indagações acerca do que fazer para encontrar as melhores estratégias, na perspectiva de oportunizar a educação para todos e com qualidade.

Em face da extensão dos desafios e das várias indagações que circundam as questões relacionadas à oferta da melhor educação para todos, optou-se por direcionar o foco do estudo realizado para a eficácia escolar. Entende-se ser esse direcionamento um dos pontos que justifica sua relevância, se levada a sério a intenção de desencadear uma discussão que suscite políticas educacionais e sociais, com vistas à promoção de ações orientadas para ressignificar as práticas atuais e construir sistemas capazes de oferecer escolas eficazes à população brasileira.

Nessa perspectiva, elege-se como ponto de partida o relatório de Coleman e colaboradores (1966) que, apesar dos resultados desanimadores, deram sua contribuição para os primeiros estudos sobre os efeitos das escolas nos resultados educativos, despertando a comunidade educacional para que tomasse para si o encargo da mudança dessa realidade tão nebulosa. Nessa trajetória, surge, ainda, o Relatório Plowden (1967), cuja origem partiu de uma exigência do governo britânico, de que se revisasse o ‘estado da arte’ da escola primária, na perspectiva de identificar tendências e sugerir as mudanças necessárias. Esse relatório foi contemporâneo ao de Coleman, e seus resultados revelaram uma pequena influência da escola no desempenho de seus estudantes.

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Posteriormente, como resposta aos trabalhos anteriores, nasce uma nova linha de investigação sobre escolas eficazes e efetivas e suas características, contrapondo-se ao pensamento de Coleman e colaboradores. Brookover (1979) foi um dos estudiosos que confirmou a necessidade de se considerar o efeito das estratégias da escola sobre o processo de aprendizagem dos estudantes. Para esse autor, além de exercer influência na vida acadêmica de seus estudantes, a escola se constituía fator de progresso e de crescimento individual e coletivo. Assim, o lema foi modificado para schools do make difference (“as escolas fazem diferença”) ou, ainda, schools can make a difference (“as escolas podem fazer a diferença”).

Na América Latina, a pesquisa sobre eficácia escolar começou em meados dos anos 1970. No Brasil, dez anos mais tarde, começaram as primeiras discussões motivadas por estudiosos como Saviani (1980, 1983), Mello (1979, 1982), Libâneo (1985) e Silva (1988). A linha de estudos desses autores buscou compreender a importância da escolaridade para a melhoria das estratégias de vida das camadas sociais mais desfavorecidas da população brasileira, com diferentes graus de sucesso, chamando a atenção para a organização interna da escola como fator determinante do sucesso dos estudantes.

Atualmente, entretanto, isso constitui um corpus de conhecimentos ainda pouco abordado na literatura brasileira e, em consequência, pouco compreendido, se levada em conta sua importância como estratégia de gestão para alcançar resultados efetivos. Portanto, investigar escolas públicas do Distrito Federal, localizadas em áreas menos favorecidas, distante do centro da capital, e consideradas escolas bem-sucedidas, pela comunidade e pelos gestores do sistema, pode trazer importante contribuição para a literatura na área da educação. Além disso, poderá ampliar as possibilidades do debate sobre o sucesso escolar e, de forma

mais ampla, sobre a função social da escola, abrangendo sua ação para além do encargo de promover mecanismos de aprendizagem.

No que concerne à sua relevância quanto aos aspectos teóricos, o estudo buscou reelaborar o conceito de escolas eficazes e os fatores que as caracterizam, na perspectiva de ressignificar concepções e resgatar sua essência. Para tanto, entendemos ser necessário objetar o estigma da ênfase

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na quantificação, equivocadamente propagada ao longo dos anos, e nos direcionarmos para uma visão inclusiva e integradora, a qual defende que múltiplos aspectos se unem para garantir o sucesso da escola e torná-la capaz de superar condições adversas e alcançar um desempenho satisfatório de todos os estudantes, indistintamente. Aqui, o esforço se deu, ainda, no sentido de compreender em que medida o movimento que indica a existência de escolas eficazes poderia voltar a contribuir com alternativas de solução para os entraves ao progresso na área educacional. Cabe ressaltar que a investigação se desenvolveu no âmbito da própria realidade local, o que a torna mais consistente no conjunto de argumentações. Ainda, a formulação das novas ações administrativas nessa área poderá ser impulsionada e potencializada, a partir da caracterização das estratégias adotadas por escolas inseridas na realidade do Distrito Federal, revelando aspectos que fazem com que estas se destaquem das demais, se levados em conta os resultados que apresentam.

Nessa direção, Machado (2007) corrobora a importância dessa linha de abordagem, quando diz que a eficácia e a eficiência são dois atributos básicos para se alcançar uma educação de qualidade para todos. Acrescenta, além disso, que esses atributos deverão constituir-se foco da ação pública no terreno da educação, justificando, portanto, identificar a importância de se compreender em que medida uma escola eficaz traduzirá essa conquista, a qual, por sua vez, se estabelece como um direito de todos. Também se faz necessário analisar em que medida a administração pública se mostra eficiente, respeitando o direito do cidadão, para que seu esforço material seja adequadamente reconhecido e retribuído. Machado (2007) conclui reafirmando que a eficiência não é um imperativo economicista, senão uma obrigação derivada do respeito à condição e aos direitos individuais universais.

É importante esclarecer que não se constituiu objetivo do estudo desenvolver uma análise específica sobre a questão da educação de qualidade, uma vez que ainda há várias controvérsias a respeito do que significa a expressão “qualidade na educação”. Entende-se que se trata de um conceito multifacetado e mais amplo do que o de eficácia, embora a concepção de qualidade da educação apareça em vários documentos

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do Inep (BRASIL, 2004), Unesco (2002), Nóvoa (1998) e Laboratório Latino-Americano de Avaliação da Qualidade de Educação (LLECE, 2002-2003). A despeito da diversidade de concepções acerca dos dois termos – eficácia e qualidade – , observe-se que ambos apresentam alguns pontos em comum, como por exemplo, a vinculação com a ideia de medida, rendimento, e a indicação da necessidade de a instituição criar e participar de programas de avaliação da aprendizagem, além de apontar alguns requisitos básicos para o alcance da qualidade pretendida.

Frente às controvérsias, o debate ficou circunscrito à reflexão sobre a temática eficácia escolar, subjacente ao discurso das escolas que apresentam bons resultados de desempenho de seus estudantes e que atendem às ações e aos mecanismos que as vinculam aos resultados de avaliações externas, em nível nacional. Para tanto, elegeu-se, como eixo orientador, investigar de que maneira os sujeitos das escolas pesquisadas elaboravam seus processos de construção de práticas administrativas e pedagógicas, as quais vêm possibilitando a eficácia escolar, tornando-se, assim, bem-sucedidas.

Contextos e problemas identificados na perspectiva da eficácia educacional

A educação pensada na perspectiva clássica dos economistas, conforme Schwartzman e Cox (2009), visa como objetivo central a formação de recursos humanos, sem a qual os outros fatores de produção (capital, trabalho e recursos naturais) não têm como se unir para gerar benefícios e bem-estar. Por outro lado, a educação vista pelos sociólogos clássicos pode ser compreendida como o “cimento da coesão social, sem o qual as instituições modernas, a divisão social do trabalho e os próprios mercados não conseguem funcionar adequadamente” (SCHWARTZMAN e COX, 2009, p. 3).

Ao longo da história da educação, sempre existiram escolas preocupadas com a melhoria constante de seu desempenho, para atender ao que delas se espera, inserindo-se, como exemplo, nas teorias formuladas acerca do que venha a ser uma boa escola. Muitas das pesquisas realizadas nas últimas

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décadas mostraram que o corpo docente e discente das escolas e a realidade socioeconômica da comunidade escolar são fatores que, associados, influenciam o desempenho escolar, ainda que prevaleça a discordância sobre o peso desses fatores se tratados individualmente (LEE et al., 1993). Entretanto, para além da diversidade de concepções acerca da educação e dos embates epistemológicos em sua trajetória, surgiu um movimento, na década de 1990, na América Latina, que se dedicou, especialmente, à reforma e à melhoria do ensino. Nesse contexto, realizaram-se muitos estudos e pesquisas, os quais, por um lado, informavam sobre a dificuldade e a complexidade das mudanças e das melhorias na educação (SARASON, 1990; HERNÁNDEZ, 1995; SANCHO, 1995; FULLAN, 1994) e, por outro, ofereciam uma visão de conjunto dos elementos que caracterizavam as escolas que ousaram e conseguiram, com maior ou menor sucesso, melhorar a qualidade de seu ensino (HARGREAVES et al., 1998).

Em um estudo qualitativo mais recente, realizado em profundidade por Raczynski e colaboradores (2003), em 14 escolas chilenas, os autores investigaram uma linha de pesquisa denominada, na literatura educacional, de escolas efetivas ou escolas eficazes. O propósito foi compreender de que forma os estudantes, apesar das adversidades vividas em seus contextos sociais, culturais e econômicos, se superaram e conseguiram obter resultados comparáveis aos das melhores escolas particulares chilenas. Por esse feito, no final do estudo, os autores caracterizaram essas escolas como escolas eficazes, por terem conseguido desenvolver ações efetivas que envolveram todos os atores educacionais (direção, professores, pais e funcionários), na promoção do desenvolvimento integral de todos e de cada um dos estudantes. Cabe ressaltar que o diferencial nessas ações foi o fato de eles transcenderem, segundo os autores, aquilo que seria previsível, levando em consideração o desempenho inicial dos estudantes, a alta expectativa do corpo docente em relação aos discentes, bem como a superação dos estudantes em vencer as adversidades. Santos (2010) avaliou que os resultados alcançados por esses estudantes decorreram da capacidade de os professores e diretores conseguirem neutralizar as múltiplas interferências, as quais sustentavam e de forma frequente contribuíam para dificultar a aprendizagem daqueles estudantes.

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Seguindo essa ótica, a pesquisa realizada nas escolas do Distrito Federal buscou desenhar um novo cenário de discussão, a fim de contribuir com as questões relativas à melhoria dos resultados alcançados pela escola. Constituir esse novo cenário, porém, implicaria a articulação de três noções fundamentais: a de eficiência, a de eficácia e a de efetividade escolar. Assim, buscou-se clarificar a diferença entre esses conceitos, na medida em que constituem importantes sinalizadores para uma mudança de postura da escola em relação à construção e, sobretudo, à concretização de seus objetivos e estratégias.

Eficácia, eficiência e efetividade: a diferença que impacta o sucesso escolar

Há necessidade de distinção entre o conceito de eficácia e o de eficiência, utilizados na administração e o que pode ser adotado na área educacional. Uma das razões é a constatação recente de que eles vêm sendo aplicados como possibilidade de progresso na busca da qualidade do ensino. Na área da administração, Maximiano (2010) usa a palavra eficácia para qualificar uma organização que desempenha com sucesso seus objetivos. Para o autor, quanto mais alto o grau de realização dos objetivos, mais a organização é considerada eficaz. Ao conceituar a palavra eficiência, ele a usa para indicar que a organização utiliza produtivamente ou, de maneira econômica, seus recursos. Nesse sentido, a organização é eficiente quanto maior for o grau de produtividade ou de economia na utilização dos recursos. O autor destaca como exemplo de uma organização eficaz e eficiente as equipes de trocas de pneus na Fórmula 1. Peter Drucker (1999), por sua vez, na distinção vital entre eficácia e eficiência, define a eficácia como sendo “fazer as coisas certas” e eficiência como “fazer certo as coisas”. Em outras palavras, eficiência é fazer as coisas da maneira correta, enquanto eficácia é fazer bem as coisas certas no momento adequado. Nessa teia de definições, o autor ressalta que aquele que administra, na execução das suas atividades, deve buscar, ao mesmo tempo, a eficiência e a eficácia.

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Percebe-se que, embora sutis, há diferenças entre os conceitos de eficiência e eficácia, o que leva, por vezes, estes a se tornarem polêmicos quando não compreendidos corretamente. De acordo com Santos (2010), a confusão no entendimento das duas palavras pode provocar danos ao desempenho e aos resultados de um administrador; por isso, nos dias atuais, torna-se importante conceituá-las e empregá-las de modo correto.

No que se refere ao campo educacional, por exemplo, a eficiência escolar pode ser definida como a melhor utilização dos recursos disponibilizados para a obtenção dos avanços das estratégias escolares. Por outro lado, a eficácia escolar é alcançada quando se garante aos estudantes aprendizagens efetivas baseadas em princípios de equidade social, os quais possibilitam o êxito escolar. Portanto, quando a escola otimiza os recursos existentes e obtém o maior êxito escolar, alcançando todos ou a maior parte dos estudantes, pode-se dizer que ela é eficiente e eficaz. Souza (2000), por exemplo, diz que uma escola pode apresentar infraestrutura deficiente, mas, se em seu quadro profissional contar com professores interessados e comprometidos com a educação, isso por si pode ser traduzido em melhora na autoestima dos estudantes, facilitando sua aprendizagem e ampliando seu desenvolvimento cognitivo, resultando, assim, no êxito escolar.

Sobre a efetividade, numa acepção mais geral, será entendida como a garantia de acesso e de permanência dos estudantes na escola, porém, respeitando-lhes o direito de receber um ensino de qualidade, nos diferentes níveis e modalidades nos quais terão que transitar. Os três termos – eficiência, eficácia e efetividade – articulados entre si demonstram o nível de compreensão da função social da educação e da escola que a comunidade escolar deseja. No entanto, a intenção foi conhecer a realidade das escolas eficazes, não necessariamente as eficientes, uma vez que a ênfase da análise se deu nos processos de gestão bem-sucedidos, que vêm levando os estudantes ao êxito escolar e não nos recursos materiais, humanos ou econômicos aplicados para tal alcance.

Ainda, de acordo com a literatura mais abrangente, as escolas caracterizadas como eficazes são aquelas que apresentam nível superior de desempenho de seus estudantes. Isso denota capacidade de superação das dificuldades e fraquezas, evidenciando a construção de estratégias educativas

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bem-sucedidas, as quais fortalecem suas práticas, independentemente do nível socioeconômico, da remuneração de seus professores e dos recursos sofisticados, conforme o discurso corrente.

Nesse sentido, vislumbra-se a busca permanente de uma educação básica eficaz e eficiente, ancorada nos princípios da equidade, oportunizando a todos a formação para a cidadania. Em respeito à Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDBEN) (BRASIL, 1996), isso se dará por meio da criação de condições que levem ao desenvolvimento da capacidade de aprendizagem, tendo em vista a aquisição de conhecimentos e de habilidades e a formação de atitudes e de valores. A LDBEN também ressalta a importância do fortalecimento dos vínculos de família, dos laços de solidariedade humana e de tolerância recíproca, em que se assenta a vida social (art. 32, incisos III e IV). Portanto, espera-se que a escola brasileira desempenhe seu papel primordial na construção de uma sociedade mais justa, democrática e mais igualitária, desenvolvendo ações, entre outras, como a democratização da escola, a defesa e a melhoria do ambiente e da cultura escolar.

A fim de contextualizar a literatura pertinente, adotou-se o pensamento de Mortimore (1991) como linha de abordagem principal da eficácia no âmbito educacional. Esse autor define como escola eficaz aquela que consegue desenvolver estratégias que levem seus estudantes a apresentar um desempenho educacional superior às expectativas estabelecidas, sobretudo, se for levada em conta a origem social de seu corpo discente.

Entre as várias formas de entendimento do que Mortimore enfatiza quando se refere a “desempenho superior às expectativas estabelecidas”, adotou-se a visão de que o autor se mantenha atento para uma postura comum na sociedade. Essa visão prima por considerar que os estudantes oriundos das classes menos favorecidas da população trazem em si uma potencial dificuldade para atingir níveis mais altos ou até mesmo satisfatórios de desempenho. Sobre expectativas estabelecidas, portanto, a visão aqui está focada em um domínio conceitual mais abrangente, ou seja, para o que se espera da escola como possuidora de uma função social, que transcende sua função pedagógica.

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Para atender à abordagem de investigação formulada por Mortimore (1991), partiu-se do levantamento de unidades escolares que a priori manifestassem, em avaliações externas, desempenho educacional acima da meta específica da escola, com ênfase em alguns aspectos da análise de conjuntura que caracterizassem a origem social de seus estudantes. Nesse caso, para que as escolas selecionadas atendessem aos aspectos conceituais estabelecidos como aporte à pesquisa, foi necessário organizar um conjunto de critérios que apontassem para duas escolas em meio a 155 instituições que se conformavam em dois dos critérios de delimitação estabelecidos previamente delimitadores essenciais: ter participado do Ideb 2009 e atender ao 9º ano do ensino fundamental.

A intenção foi, portanto, caracterizar as práticas desenvolvidas pela escola, as quais, supostamente, pudessem ter contribuído para os resultados alcançados, propiciando um desempenho satisfatório, embora se encontrasse inserida no mesmo sistema de ensino e em condições similares às demais. De forma mais específica, a tarefa consistiu em revelar e caracterizar as estratégias de gestão escolar e as práticas escolares associadas ao desempenho satisfatório de duas escolas da rede pública de ensino, situadas em áreas de periferia do Distrito Federal. O foco para responder às questões de pesquisa foi direcionado para compreender como se processam as dinâmicas intraescolares nessas escolas, as quais possibilitam sua eficácia.

Sendo assim, como recurso para atender a determinadas inquietações que emergem toda vez que se discute sucesso ou fracasso na educação, foram elaboradas questões de pesquisa que visaram a imergir nesses processos em realidades pontuais, caracterizadas pela convergência entre o que requer a literatura, como campo conceitual, e o que se aspira alcançar por meio do objeto escolhido para ser investigado. Ressalta-se que “questões de pesquisa” no fórum acadêmico tinham por finalidade orientar o atendimento de seus propósitos, na medida em que servem de base para se pensar e organizar os procedimentos metodológicos, por meio dos quais se buscará responder a algumas inquietações que suscitam a realização de uma pesquisa.

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Assim sendo, com suporte em um conjunto de características que, segundo a literatura, qualificam o perfil de escolas eficazes, essas questões, no caso da pesquisa que foi realizada, se tornaram a bússola que apontou o caminho para responder ao desafio proposto. Entretanto, o tratamento dado a essas características levou em conta a realidade das escolas no contexto do Distrito Federal. O desafio foi direcionado a duas escolas situadas na periferia, que, apesar dos obstáculos, conseguiram sobressair-se pela média acima do que alcançou o próprio ente federativo ao qual estão vinculadas administrativamente. Visando de modo mais específico ao melhor direcionamento da ação investigativa, quatro questões foram respondidas no decorrer de sua realização.

Uma vez que se está descrevendo os resultados e possíveis contribuições de um estudo já realizado e consolidado, o conteúdo das questões originais foi adaptado de modo a configurar possibilidades de aplicação e de replicação. Portanto, descritas de forma mais abrangente, as indagações versaram sobre os seguintes aspectos: em que consistem as práticas de gestão escolar capazes de levar escolas situadas em áreas de periferia a atingirem metas de crescimento superiores à do próprio ente federativo que as administra? A participação de professores e de estudantes no ambiente escolar contribui, de fato, para o processo de práticas eficazes nas escolas? Existem elementos que apresentem um clima favorável entre os atores escolares, de modo a propiciar o desempenho satisfatório dos estudantes em aprendizagem ou no sucesso escolar? Quais os elementos revelados pelas duas escolas, que levam à identificação de fatores não contemplados na literatura que fundamenta o tema e que contribuem para que escolas sejam consideradas escolas eficazes? A partir da análise realizada, é possível identificar se essas escolas cumprem sua função social?

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Capítulo 4

LITERATURA DA EFICÁCIA ESCOLAR: PERSPECTIVAS E DESAFIOS NOS

CAMINHOS PERCORRIDOS

Até o momento, não temos passado, de modo geral, do simples censo estatístico da educação. É necessário levar o inquérito às práticas educacionais. Procurar medir a educação, não somente em seus aspectos externos, mas em seus processos, métodos, práticas, conteúdo e resultados reais obtidos. Tomados os objetivos da educação, em forma analítica, verificar, por meio de amostras bem planejadas, como e até que ponto vem a educação conseguindo atingi-los (TEIXEIRA, 1956).

Por que existe no Brasil uma grande disparidade entre as escolas de um mesmo sistema de ensino, quer seja federal, estadual ou municipal? Essa disparidade se deve a quais fatores? Afinal, a escola faz ou não faz diferença na vida dos estudantes? Qual é, de fato, o papel da educação básica na sociedade pós-moderna?

Essas indagações sempre permearam e ainda hoje instigam várias discussões na sociedade. Além disso, tem suscitado o debate o pensamento de Delors et al. (2000), quando afirmam que somente é possível vislumbrar a construção de uma sociedade mais justa, solidária e ética por intermédio

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da educação. Entende-se, ainda, que a educação exerce papel primordial no desenvolvimento social, econômico e cultural de um país. Aos seus governantes, cabe priorizar e disponibilizar a educação primária, gratuita e obrigatória para todas as crianças de todas as nações. Isso se constitui um direito fundamental e consagrado, desde 1948, com a Declaração Universal dos Direitos Humanos. Direito, também reafirmado nas Declarações das Conferências das Nações Unidas, como Jomtien (1990) e Dacar (2000).

Lamentavelmente, de acordo com o relatório da Unesco denominado Educação para Todos (2008), cuja finalidade consiste em avaliar as metas educacionais constantes dos acordos internacionais, em muitos países esse direito ainda está longe de ser exercido. Segundo Machado (2007), existem aproximadamente 72 milhões de crianças fora da escola em todo o mundo. No entendimento da autora, a legislação por si só não garante o acesso à educação primária, especialmente na África Subsaariana, no sudeste da Ásia e em alguns países árabes. Portanto, não será somente por meio da legislação que se cumprirá o prazo para que todos os países alcancem a meta de universalização da educação, cujo limite foi estabelecido para 2015.

Frente à urgência da ressignificação de posturas e de concepções, para as quais a sociedade é desafiada a se engajar, a escola é vislumbrada como espaço por excelência de onde devem emergir as discussões acerca das formas de conduzir a educação, além de receber o encargo de recriar sua própria estrutura organizacional. Nesse sentido, compreender a necessidade dessa ação conjunta, em prol da ressignificação do seu papel, implica reconhecer que existem diferenças entre as escolas. Essas diferenças podem ser sutis e abrangerem desde os fatores físicos, como as instalações escolares e seu estado de conservação, até os equipamentos, a biblioteca, a quadra de esportes, os laboratórios, entre outros, que são mais perceptíveis. Também podem ser percebidas diferenças significativas quando se trata da gestão escolar, dos processos de discussão e de inovações curriculares, da mobilização dos pais na escola, da cultura e do clima escolar e, ainda, da forma de implantação do projeto pedagógico escolar.

Pesquisadores, de modo geral, e a sociedade civil debatem determinadas questões relacionadas à educação como opostas e contraditórias, quando deveriam ser consideradas complementares. Um exemplo nítido dessa

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relação contraditória está em definir entre uma educação eficiente, que visa a capacitar as pessoas para o mundo do trabalho, e uma educação eficaz, que atue, ao mesmo tempo, na formação e no desenvolvimento intelectual e moral de crianças e jovens. Assim, entende-se que essa educação, para ser eficaz, deve proporcionar aos indivíduos instrumentos fundamentais de participação no mundo do trabalho. Ao mesmo tempo, deve desenvolver habilidades para entender e fazer uso de competências relacionadas ao domínio da língua e do raciocínio matemático. Tais aspectos poderão contribuir para que avancem no entendimento da cultura, da história, das questões sociais e dos dilemas éticos da sociedade em um mundo cada vez mais globalizado (SCHWARTZMAN; COX, 2009).

Incursão na trajetória conceitual da eficácia escolar

Para tratar da natureza dessa discussão, nada mais propício do que problematizar as controvérsias e convergências, fazendo uma incursão histórica sobre a temática eficácia escolar, partindo das referências de trabalhos desenvolvidos por Brooke e Soares (2008), Rosa Blanco (2008) e Raczynski e colaboradores (2003). A concepção de eficácia escolar, começando por Raczynski e colaboradores (2003), deve ser entendida como um sistema complexo, como um todo integrado, no qual as inter-relações entre das partes são mais importantes que as partes e seus efeitos isolados. No entendimento dos autores, para que uma escola seja eficaz é necessário que todos os fatores escolares sejam analisados em conjunto, a fim de garantir bons resultados de modo permanente. Raczynski e colaboradores partem, então, da concepção de Murillo (2000, p. 25), que entende escolas eficazes como sendo aquelas que

[...] promovem de forma duradoura o desenvolvimento integral de todos e de cada um dos seus estudantes, para além daquilo que seria previsível, levando em conta seu rendimento inicial e sua situação social, cultural e econômica.

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Nessa perspectiva caberá à escola garantir altos níveis de desempenho de seus estudantes, mesmo em condições de vulnerabilidade social, de forma que possam estabelecer como meta a melhoria constante de seu processo de aprendizagem, favorecendo a manutenção de suas conquistas. Ressalta-se que as possíveis dificuldades extracurriculares com as quais possam se deparar não devem constituir empecilho para que ocorra efetivamente a aprendizagem de cada aluno na escola. Em pesquisa realizada no Chile, por exemplo, mostrou-se a possibilidade de escolas que pertenciam a contextos sociais vulneráveis obterem êxito, desde que certas condições externas e internas fossem mantidas (RACZYNSKI et al., 2003).

Trazendo para a realidade brasileira, destaca-se um estudo realizado pelo Grupo de Avaliação e Medidas Educacionais (Game),11 intitulado “Escola eficaz”, originado de estudo de caso em três escolas da rede pública de ensino do Estado de Minas Gerais, coordenado pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG). O estudo detectou um grau importante de desconhecimento acerca das questões relacionadas à eficácia escolar no Brasil. Provocados pelos resultados do referido estudo, outros estudiosos do assunto buscaram compreender melhor a questão. O esforço culminou na publicação, em 2008, de uma obra que se tornou vanguarda na literatura brasileira, intitulada Pesquisa em eficácia escolar: origens e trajetórias. A obra foi organizada por José Francisco Soares, em parceria com o professor Nigel Brooke (BROOKE; SOARES, 2008).

Trajetória de pesquisas: eficácia escolar em período de gestação

Os estudos sobre eficácia escolar começaram nos Estados Unidos em meados da década de 1960, tendo como origem o controverso estudo conduzido por James S. Coleman e colaboradores (BROOKE; SOARES, 2008). Tinha por objetivo compreender de que forma eram

11 O Game é um grupo de pesquisa criado em 1995, na Faculdade de Educação da UFMG, com apoio da Fundação Ford. Constitui-se o grupo interdisciplinar, envolvendo professores dos departamentos da Faculdade de Educação, do departamento de Estatística do Instituto de Ciências Exatas e da Escola de 1º e 2º graus do Colégio Técnico e do Centro Pedagógico. Disponível em: <www.fae.ufmg.br/pagina.php?pape=grupos>.

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distribuídas as oportunidades de aprendizagem na escola entre os estudantes americanos. Nesse contexto, no ano de 1964, o Congresso norte-americano apresentou um requerimento solicitando a Coleman e colaboradores a realização de um estudo amplo que envolvesse os 650 mil estudantes oriundos de 4 mil escolas diferentes. O título IV da Lei de Direitos Civis de 1964 exige do Departamento da Educação dos Estados Unidos (BROOKE; SOARES, 2008):

Seção 402. O Comissário deve conduzir um “survey” e fazer um relatório para o Presidente e para o Congresso, dentro de período de dois anos da promulgação da lei, sobre a falta de disponibilidade de oportunidades educacionais iguais para os indivíduos em função da sua raça, cor, religião ou origem nacional em todas as instituições de instrução e em todos os níveis nos Estados Unidos, nos seus territórios e domínios, assim como no distrito da Columbia (BROOKE; SOARES, 2008, p. 23).

No intuito de responder à solicitação feita pelo Congresso norte-americano, Coleman e colaboradores consideraram o êxito escolar como critério de igualdade de oportunidade e atribuíram aos recursos materiais e humanos, assim como às características familiares das crianças, o estatuto de variáveis independentes. Soares (2002, p. 11) afirma que “a metodologia utilizada no Relatório Coleman foi o modelo “input-output”, ou seja, entrada-saída, o qual procurava identificar se os recursos humanos, materiais e financeiros e as características dos estudantes (entrada) eram capazes de acrescentar algo aos seus resultados escolares (saída)”. Nesse contexto, o relatório constatou que as diferenças em relação ao sucesso acadêmico dos estudantes guardavam maior proporção em relação às suas condições socioeconômicas do que em relação às variáveis potencialmente modificáveis pela escola. Como variáveis de entrada na metodologia consideraram o tipo de escola e de recursos humanos, materiais e financeiros e as características individuais, econômicas e sociais dos estudantes. A variável de saída seria determinada pelos resultados acadêmicos alcançados pelos estudantes em testes padronizados.

Os primeiros resultados do relatório foram divulgados, causando muita polêmica. A respeito do que apresentou, Cherkaoui (1979) afirmou

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que “nenhum dos dados foram tão severamente julgados, tão intensiva e minuciosamente analisados” (1979, p. 96). Para os pesquisadores, as escolas exerciam pouca ou nenhuma influência sobre o êxito dos estudantes, ao contrário dos fatores sociais e econômicos, que, de acordo com Coleman e colaboradores, apresentavam peso maior.

Cabe destacar que, nas primeiras avaliações metodológicas, os pesquisadores observaram que, nas notas dos testes que avaliavam aptidões verbais e não verbais, compreensão na leitura, conteúdos matemáticos, conhecimentos gerais em ciências da Natureza, ciência do Homem e Artes (CRAHAY, 2002, p. 97), a média dos estudantes pertencentes às minorias étnicas, à exceção das minorias de origem asiática, eram inferiores à média dos estudantes brancos. Acrescentaram, ainda, que a diferença em relação aos recursos de que dispunham as escolas variava de um lugar para outro; no entanto, quando se referiam à mesma zona geográfica, eram idênticos. Apesar disso, faz-se necessário ressaltar que naquela época eram raras as escolas em que estudantes negros pudessem estudar com estudantes brancos.

Paralelamente aos estudos americanos que investigavam o grau de influência da escola na vida dos estudantes, no Reino Unido, foi publicado em 1967, o Relatório Plowden, intitulado As crianças e suas escolas de ensino fundamental. A despeito da polêmica em torno de aspectos metodológicos dos estudos mencionados, uma das conclusões foi considerar que as escolas não se mostravam efetivas como se julgava, para extinguir o déficit de aprendizagem dos estudantes, decorrente das desigualdades econômicas, sociais e culturais entre suas famílias. Corroborando esses estudos iniciais a respeito da eficácia escolar, Jencks e colaboradores (1972) reforçaram a concepção pessimista em seus trabalhos, com relação à função da educação e da escola na mudança social dos estudantes. Para os autores, “a school doesn’t matter” (“a escola não tem importância”), pois, segundo eles, as escolas exerciam pouca influência sobre o desempenho de seus estudantes.

No entendimento de Brooke e Santos (2008), as descobertas de Jencks corroboraram a teoria de Coleman, quando concluem que a escola não faz diferença para o desempenho do aluno. Jencks e colaboradores acrescentavam, ainda, que a escola americana tinha meramente a função de

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agência certificadora. Para os autores, as escolas em nada contribuíam para a redução da desigualdade, e os insumos tradicionalmente considerados como indicadores de qualidade pouco ou nada influíam no sucesso escolar em termos de aproveitamento educacional. Porém, vale mencionar que foi exatamente nos estudos de Jencks e colaboradores que surgiu a expressão “clima escolar”, servindo como ponto de partida para pesquisas futuras sobre as características comuns entre escolas que demonstram ter eficácia e aquelas que não manifestam tais características (BROOKE; SANTOS, 2008).

Em face dos resultados das discussões apresentadas, verifica-se que o tema clima escolar segue indefinido (KOEHLER, 2006). No entanto, existe certo grau de convergência ao considerá-lo essencial para a garantia do sucesso escolar dos estudantes, sendo capaz de propiciar um ambiente favorável ao desenvolvimento dos processos de ensino e aprendizagem (CASASSUS, 2002). Na concepção de Abramovay (2005), por exemplo, o clima escolar estaria relacionado à própria identidade da escola, revelando a forma de organização de seus processos internos, incluindo as relações interpessoais entre seus atores. É preciso considerar, entretanto, que o clima escolar não pode ser tomado como o único responsável pelo sucesso dos estudantes, sobretudo quando se refere ao alcance da eficácia e da efetividade por parte da escola. Nesse caso, há muitos outros fatores envolvidos, que, de forma interligada, constituem, igualmente, elementos essenciais para responder a esse desafio.

Estudos paralelos sobre o sucesso escolar realizados na França apresentaram resultados similares aos estudos americanos e ingleses. Entre os mais conhecidos, incluem-se os trabalhos dos sociólogos Bourdieu e Passeron (1970) e de Berger e Luckman (1974). Nesses estudos, o sucesso acadêmico dos estudantes estava diretamente relacionado ao resultado do capital cultural que herdavam por descendência familiar, portanto, mais uma vez, a escola ficava relegada a segundo plano, uma vez que a origem do capital cultural era atribuída à família. Assim, a escola nada fazia a não ser reproduzir a estrutura social vigente.

Com a intenção de desencadear uma discussão sobre a influência da escola nos processos que lhe dizem respeito, que são os de ensino e

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aprendizagem, Soares (2002) descreveu a situação remetendo à imagem de um enigma. O autor comparou a resistência em reconhecer a capacidade de influência da escola, por parte dos pesquisadores que o precederam, à imagem de uma “caixa-preta”, para dizer que esses pesquisadores insistiam em ignorar tudo o que ocorria no interior dela, ou seja, tanto os processos que levavam aos resultados dos estudantes como a organização de suas estruturas eram simplesmente deixados de lado.

À época, Mello (1994), por sua vez, afirmava que nenhum insumo importante na aquisição da aprendizagem pelos estudantes parecia fazer diferença nas escolas pesquisadas. Corroborando a afirmação de Mello, Crahay (2002) pontua que, enquanto o peso dos indicadores do ambiente familiar se revelava importante, todas as variáveis escolares contribuíam muito modestamente para a explicação da variância do êxito escolar. Em outras palavras, a escola norte-americana refletia o determinismo da origem social de seus estudantes.

Nessa nova trajetória, surge a investigação sobre escolas eficazes e efetivas e suas características, como resposta ao pensamento subjacente aos trabalhos anteriormente realizados. É possível que esses diagnósticos relativos à “ineficácia da escola” sejam válidos em outros sistemas de ensino? As conclusões de Coleman e colaboradores a respeito dos Estados Unidos, na década de 1960, podem se tornar generalizáveis, em relação ao conjunto dos países, mundo afora? O que faltava exatamente para ser examinado? Questões como essas começaram a fragilizar os pressupostos do paradigma vigente, suscitando novos estudos, atrelados, desta vez, a novas perspectivas teórico-epistemológicas.

No final da década de 1970, surgiram os primeiros estudos enfocando essa abordagem, alguns deles vindo da Inglaterra, os quais traziam como principal objetivo combater o lema imposto nos anos anteriores de que “a escola não fazia diferença” (BROOKE; SANTOS, 2008). Tais estudos partiam da premissa de que as escolas não podiam ser tratadas como se todas fossem iguais, além de afirmar que as pesquisas realizadas anteriormente não identificavam adequadamente as diferenças e especificidades (CRAHAY, 2002). Nos estudos de Coleman, a ideia era tratar de modo igual indivíduos desiguais; por isso, na visão do autor, a

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distribuição uniforme dos recursos escolares pelo sistema educativo poderia gerar desigualdade de resultados.

Surgiram, ainda no final dos anos 1970, outros estudos que buscavam compreender o modelo de abordagem entrada-saída (input-output) utilizado por Coleman e colaboradores em sua metodologia. Com esse modelo, foi integrada à metodologia das pesquisas sobre escolas eficazes a variável “processo”, a qual passou a exercer efeito positivo sobre o aprendizado dos estudantes, segundo Brookover (1979), em seu estudo Schools can make a difference. Desse modo, o autor constatou que as escolas podem, sim, fazer diferença, se considerados os fatores-chaves de eficácia na metodologia da investigação sobre o efeito escola (entrada-processamento-saída ou input-process-output).

Na década seguinte, anos 1980, autores como Madaus, Airasian e Kellaghan (1980) recomendaram uma releitura do Relatório Coleman, sugerindo que poderiam ter ocorrido equívocos na análise e na interpretação dos dados. Para Brooke e Soares (2008), a pesquisa dos três autores citados configurava o estado da arte ao tratar do “efeito escola”, uma vez que abrangia o conhecimento acumulado, até aquele momento, sobre “as características da escola, do professor e do ensino, atribuindo a estes maior responsabilização sobre o desempenho dos estudantes” (SANTOS, 2010, p. 54). O foco dessas pesquisas estava direcionado a comprovar que o sucesso escolar dos estudantes estava relacionado às características individuais de cada escola, fazendo referência à eficiência e à eficácia como os fatores que influenciavam os resultados.

Eficiência e eficácia: implicações conceituais na caracterização das escolas

No contexto da educação brasileira, pesquisas com abordagem sobre eficácia e eficiência nas escolas ainda são consideradas incipientes. Ao contrário, se vislumbradas no panorama internacional, essas pesquisas remetem a uma tradição que vem se consolidando há algumas décadas (SAMMONS; HILLMAN; MORTIMORE, 1995; MAYER; MULLENS;

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MOORE, 2000). Desse modo, optou-se por utilizar, com maior ênfase, o aporte da literatura internacional, tendo em vista a constatação de que os dados utilizados nas pesquisas brasileiras ainda estão aquém do desejável.

Começando pelo sentido atribuído aos conceitos, sabe-se que eficácia e eficiência são bastante utilizados na caracterização de uma atividade produtiva, sendo que a eficiência está associada mais diretamente à padronização e à especialização. Além disso, esse conceito é geralmente aplicado para medir a relação custos/resultados em um sistema, a fim de avaliar, por meio de cálculos específicos, se os produtos adquiridos correspondem aos investimentos realizados. Eficácia, por sua vez, está diretamente relacionada à capacidade de as instituições escolares cumprirem sua principal atribuição, que é ensinar e educar todos os estudantes, porém, com qualidade. Portanto, eficácia não se refere a um produto que gera investimento por unidade de ensino, por exemplo, mas, sim, à capacidade de cada unidade produzir efetivamente os resultados compatíveis com as expectativas da sociedade (BROOKE; SOARES, 2008).

No tocante ao contexto em que esses conceitos são mais utilizados, Paulo Krieser (2008), da Krieser IT Solutions (empresa especializada no desenvolvimento de aplicações corporativas nas mais diversas tecnologias), atribui a ênfase ao fenômeno da globalização. Destaca que o efeito provocado pela competição acirrada, característica da contemporaneidade, desencadeia grande necessidade de os profissionais tornarem-se cada vez mais produtivos (KRIESER, 2008). Krieser estabelece uma relação direta do termo “produtividade” com os conceitos mais amplos de eficiência e eficácia, apesar da confusão causada pela falta de entendimento da diferença entre os dois conceitos, pois muitas vezes as pessoas acreditam estar falando da mesma coisa.

Assim, o conceito que emerge do contexto organizacional diz que a eficiência trata do como fazer e não do que fazer. O foco está em realizar a tarefa ou atribuição de forma correta, isto é, “fazer certo a coisa”, o que leva a inferir que não necessariamente é o que precisa ser feito. Em contrapartida, a eficiência não está relacionada a “fazer a coisa certa”. Esse conceito implica dizer que a eficiência está diretamente relacionada à produtividade, cuja ênfase consiste em fazer mais com o mínimo de

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recursos possíveis; logo, há uma valorização da quantidade em detrimento da qualidade.

Em contrapartida, na eficácia, a pergunta a ser respondida é “o que fazer?”. Neste caso, note-se que a ênfase está na busca de “fazer as coisas certas”, orientando, portanto, para a tomada de decisão sobre que caminho seguir, o que, certamente, levará a alcançar o resultado desejado. É importante compreender que a máxima da eficácia é a escolha; por isso que, conforme os estudiosos da temática, seu conceito deve remeter à capacidade de discernir, divisar caminhos, em suma, saber escolher. Em seguida, depois de definir o caminho a seguir, o ponto alto da questão estará em percorrê-lo de forma produtiva, o que, conforme explicado anteriormente, levará à eficiência. A eficácia consiste, portanto, em determinar, de forma pontual, a medida de compatibilidade entre resultados e necessidades e, nessa equação, os resultados de uma estratégia sempre corresponderão às expectativas e aos desejos de seus destinatários.

Cabe destacar que os conceitos de eficácia e eficiência, quando aplicados ao contexto da educação, envolvem as competências exigidas, especialmente do gestor, por referirem-se diretamente aos processos de tomada de decisão. Assim sendo, parece coerente a relação que Paulo Krieser (2008) estabelece entre eficácia e nível tático/gerencial, e entre eficiência e nível operacional, orientando para “como realizar as operações” com menos recursos, em menos tempo, racionalizando o orçamento, envolvendo menos pessoas e menos matéria-prima. Em suma, fazer mais com menos, economizar acima de tudo.

O pensamento de Krieser (2008) induz a concluir que existe uma relação linear entre os termos. De um lado, eficiência remete a resultados, que remete a recursos empregados para seu alcance. De outro, eficácia estabelece seu marco conceitual ao traduzir um resultado plenamente alcançado, ou seja, existe uma conformação plena entre realizar determinado trabalho e atingir integralmente o resultado esperado. Peter Drucker (1999, p. 44), autor reiteradamente citado na área da administração, sintetiza dizendo que “eficiência é fazer as coisas de maneira correta, eficácia são as coisas certas”. Infere-se que o melhor resultado, naturalmente, decorrerá de fazer certo as coisas certas. Assim, acrescenta-se

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ao conceito de eficácia que, além de fazer a coisa certa, é preciso fazê-la no momento correspondente, isto é, quando precisa ser feito, integrando resultado e necessidade atendida em tempo hábil.

Remetendo a conceituação de eficácia e eficiência para o contexto da reflexão sobre a caracterização das escolas, cita-se Muñoz-Repiso e colaboradores (2010), cuja concepção esclarece que o movimento teórico-prático em torno da eficácia escolar tem se preocupado em conhecer os fatores que caracterizem a escola eficaz, entendendo-a como aquela que promove o desenvolvimento global de todos e de cada um de seus estudantes, indistintamente. Acrescenta, ainda, que os resultados alcançados pelas escolas eficazes precisam ser duradouros, além de superar o esperado para aquele contexto, se levadas em conta suas condições prévias e as dificuldades de qualquer ordem.

Entende-se, portanto, que determinadas escolas, quando muito, atingem a medida da eficiência, uma vez que até demonstram a potencialidade para produzir um resultado, porém, considerando os flagrantes resultados das avaliações institucionais, constata-se que essa potencialidade não tem sido evidenciada; logo, não se pode dizer que sejam eficazes. Tal observação instiga a deduzir que possuir as competências necessárias para a produção de um resultado caracteriza muitas escolas e sistemas como eficientes, porém se mantêm ineficazes, por nada ou pouco realizarem para produzir o resultado esperado, terminando por frustrar as expectativas da comunidade e da sociedade como um todo. Deduz-se, ainda, que o sistema de avaliação institucional demonstra sua eficiência ao identificar como buscar o que precisa ser feito, mas foge ao seu papel ser eficaz, uma vez que caberá às escolas e, de forma mais ampla, à gestão do sistema de ensino o encargo de encontrar o caminho para a solução ou de fazer o que precisa ser feito, no momento adequando e aplicando as estratégias ajustadas à sua realidade.

Muñoz-Repiso e colaboradores (2010) ponderam que, se considerada a definição formulada para as escolas eficazes à luz dos pensamentos de Levin e Lockheed (1993), comprova-se, de forma explícita, que existem relações entre eficácia escolar e a adoção de valores como equidade e eficiência e, de forma implícita, de coesão e liberdade, uma vez que implica

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almejar o desenvolvimento global do aluno, tanto na dimensão social como na dimensão pessoal. Nessa direção não há como deixar de estabelecer um vínculo quase inerente entre os conceitos de escolas eficazes e de escolas bem-sucedidas, se levados em conta os valores implicados na concepção de escolas eficazes.

A respeito do movimento de construção de referenciais que tendem a contribuir para a evolução das pesquisas na linha da eficácia escolar, Muñoz-Repiso e colaboradores (2010) esclarecem que os fatores identificados atualmente constituem um misto de influências das diferentes teorias, com exceção da sociocrítica, que tem desenvolvido poucas pesquisas nessa linha. Compreende-se que para ocorrerem avanços, faz-se necessário, de antemão, dar ciência ou disseminar conhecimentos entre as escolas acerca das questões conceituais relativas ao termo. Desse modo, pesquisas realizadas com tal finalidade, mesmo pouco frequentes, poderão contribuir, de fato, para desencadear um movimento que alcance a tão almejada qualidade de educação para todos.

No que tange às formas de avaliação para se constatar níveis de eficácia, Navarro e Closa (2002) revelam que, nas primeiras avaliações realizadas por eles, a preocupação foi demonstrar que existiam escolas mais capazes de ensinar as habilidades básicas aos seus estudantes do que outras. A etapa seguinte consistiu em identificar quais as características que distinguiam essas escolas, na perspectiva de que pudessem servir de base para melhorar aquelas que evidenciavam baixos resultados.

Como resultado dessas pesquisas, segundo os citados autores, estabeleceu-se que a eficácia escolar abrange quatro níveis ou dimensões: a escola, a aula, o professor e o diretor. Para os autores, essas dimensões não ocorriam de forma fragmentada, mas atuavam de forma integrada nos aspectos relacionados ao ambiente acadêmico e à liderança do diretor, em práticas efetivas dos docentes que ajudavam a melhorar o rendimento dos estudantes e na busca constante para atingir com êxito os objetivos educacionais (NAVARRO; CLOSA, 2002).

No entendimento de Edmonds (1979), as características comuns entre as escolas eficazes estariam mais relacionadas à liderança por parte dos diretores, às altas expectativas do professor em relação aos estudantes,

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à ênfase na formação de competências básicas, ao ambiente escolar disciplinado e, por fim, às avaliações frequentes do progresso dos estudantes. Posteriormente, outras investigações (REYNOLDS, 1982; RUTTER, MORTIMORE, SMITH, 1983; GOOD, BROPHY, 1985) confirmaram a importância das características formuladas por Edmonds. Autores como Purkey e Smith (1983) consideraram também a autonomia escolar, a estabilidade do professor, o programa efetivo de desenvolvimento do pessoal, a participação e o apoio dos pais, além do apoio institucional dos órgãos centrais de ensino, como características comuns às escolas eficazes.

Seguindo a direção dos estudos sobre os fatores de eficácia, Sammons, Hillman e Mortimore (1985) realizaram estudos investigativos em instituições escolares no Reino Unido, complementando, assim, outras características consideradas comuns entre as escolas eficazes. Tais características englobariam 11 fatores:

1) liderança compartilhada;2) visão e metas compartilhadas;3) clima de aprendizagem;4) ênfase no ensino e na aprendizagem;5) altas expectativas dos professores em relação aos estudantes;6) reforço positivo;7) avaliação do rendimento escolar;8) direitos e responsabilidades dos estudantes;9) propósitos de ensino;10) organização da aprendizagem; e 11) colaboração dos pais.

Outros aspectos acerca da pesquisa sobre eficácia escolar passaram a ser considerados, como, por exemplo:

a) a persistência no tempo dos efeitos da escola;b) a consistência dos efeitos da escola em diferentes resultados

cognitivos e afetivos;c) os efeitos diferenciados para grupos diferentes de estudantes;

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d) a dimensão dos efeitos das escolas;e) as diferenças de eficácia entre os departamentos nas escolas de

ensino médio; ef ) descrição das características dos departamentos eficazes.

A respeito da essência das contribuições da pesquisa sobre as escolas eficazes, destacam-se as realizadas por Levine e Lezotte (1990), Cotton (1995), Scheerens e Bosker (1997) e, principalmente, Sammons, Hillman e Mortimore (1995). Esses pesquisadores ingleses estabeleceram que fossem 11 os fatores relacionados com as escolas eficazes, conforme Quadro 2. Vale ressaltar que esses fatores devem ser considerados de forma independente um dos outros, aspecto em que os autores nos recomendam estabelecer diferentes associações, a fim de favorecer os meios de compreensão dos prováveis mecanismos de eficácia.

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Quadro 2 – Fatores de eficácia escolar relacionados na pesquisa internacional

1. Liderança profissionalFirme e dirigida;Enfoque participativo; Profissional destacado;

2. Objetivos e a visão compartilhados

Unidade de aproveitamento;Consistência na prática;Colaboração e trabalho em equipe.

3. Ambiente de aprendizagemAmbiente ordenado;Ambiente de trabalho.

4. O ensino e a aprendizagem como centro da atividade escolar

Otimização do tempo de aprendizado;Ênfase no plano acadêmico;Foco no aproveitamento.

5. Ensino com objetivos

Organização eficaz;Propósitos claros;Ensino estruturado;Adaptação curricular.

6. Expectativas elevadasExpectativas globais elevadas;Comunicação de expectativas;Desafio intelectual.

7. Reforço positivoNormas claras e justas;Retroalimentação.

8. Acompanhamento do progressoAcompanhamento do êxito dos estudantes;Avaliação da escola de formação de professores.

9. Direitos e deveres dos estudantesElevação da autoestima dos estudantes;Posições de responsabilidades;Controle dos trabalhos.

10. Colaboração entre a escola e as famílias

Participação das famílias no aprendizado dos filhos.

11. A escola como uma organização de aprendizado

Formação e desenvolvimento do corpo docente baseado na escola.

Fonte: SAMMONS; HILLMAN; MORTIMORE, 1995.

Em face das questões e dos elementos supracitados, a escola se depara com a urgência em estabelecer seus próprios mecanismos de organização – próprios no sentido de que necessitam ser contextualizados para se identificar com a comunidade que transita em cada espaço. Como

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cerne dessa organização, destacam-se as relações profissionais, as quais garantirão uma identidade coletiva e o tão almejado clima escolar, ideal para a promoção da aprendizagem e do sucesso escolar. A qualidade das lideranças e os modelos participativos de exercício do poder evidenciarão igualmente sua capacidade de funcionar como lugar de construção de competências na organização da aprendizagem. Para Thurler (1998), a escola deve revelar-se um espaço aberto à inovação, às novas proposições, aos novos elementos que se dispõe a partilhar de e para suas conquistas.

De um modo geral, os modelos abrangentes de eficácia escolar têm duas características básicas. A primeira delas parte de uma visão sistêmica da escola, que abrange a interação entre os elementos do sistema, as relações recíprocas estabelecidas entre eles e o modo como essa interação contribui para o sucesso dos estudantes. A segunda, por sua vez, abrange não apenas os resultados da pesquisa empírica, mas também fatores hipotéticos.

Há também estudos sobre ensino eficaz, que foram desenvolvidos em diversas instituições na França, pelos pesquisadores Grizay e Meuret (1993; 1997). Segundo a visão desses pesquisadores, o ensino eficaz é aquele que compreende uma atmosfera tranquila e ordenada em torno do trabalho e a maximização do tempo destinado à aprendizagem, aspecto em que os autores alertam para a insistência no êxito escolar. Nesse contexto, os autores reforçam a importância da disciplina e do controle dos processos escolares, recomendando que a escola assuma o controle do progresso do aluno e de seu rendimento. O aluno, por sua vez, também tem de ser orientado a ser responsável pela sua aprendizagem. Por fim, no entendimento dos autores, a organização eficaz, com objetivos claros, classes estruturadas e práticas bem aceitas são as principais características de uma escola que se propõe a oferecer ensino eficaz aos seus estudantes (GRIZAY; MEURET, 1993, 1997).

A investigação, realizada em diferentes países, como Estados Unidos, Inglaterra e França, comprovou, em períodos distintos, que a maioria dos fatores que influenciaram a eficácia escolar convergiu de acordo com os seguintes aspectos: em primeiro lugar, conseguiu aferir a extensão dos efeitos escolares e, em segundo, identificar os fatores da sala de aula, da escola e do contexto social, econômico e cultural, que contribuíram

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para que uma escola fosse caracterizada como, de fato, eficaz. Para Brooke e Soares (2008), as possíveis diferenças entre uma ou outra característica podem estar relacionadas aos métodos utilizados pelos pesquisadores.

A eficácia escolar no contexto da América Latina e Caribe

Identificou-se que grande parte dos países latino-americanos sofreu influência decorrente da crise financeira que se estendeu por toda década de 1980. Na área educacional os prejuízos se intensificaram na medida em que a educação já passava por dificuldades em meio às constantes crises econômicas, reduzindo sua inserção nas políticas públicas como prioridade. De modo geral, nessa época, a maioria dos países da América Latina sofreu as consequências de um cenário caótico, sobretudo no que dizia respeito às políticas públicas voltadas para a educação. Casassus (2002) se pronunciou revelando que o orçamento destinado à área educacional foi expressivamente reduzido, prejudicando grande parte da região latino-americana. Para o autor, uma onda de pessimismo se espalhou no meio educacional por toda América Latina.

Na tentativa de melhorar seus indicadores sociais, os governos latino-americanos, especialmente representados pelos respectivos ministros da Educação, participaram da Oficina Regional de Educação da América Latina e Caribe (Orealc), em Santiago do Chile (1990). O objetivo principal do encontro era provocar os países para que se comprometessem em lançar um amplo programa para desenvolver sistemas educacionais que pudessem modificar o estado alarmante em que se encontrava a educação em alguns países da América Latina e Caribe (OREALC, 2002). Instalou-se um estado de desânimo que somente começou a melhorar no começo dos anos 1990, quando os governos, influenciados pela Conferência de Jomtien (1990), assumiram o compromisso de assegurar, no prazo de dez anos, que educação básica fosse ofertada com qualidade para todos, a fim de se promover a equidade e reduzir aquelas diferenças regionais entre os países e em cada país. A partir desse período de contestações, os países se comprometeram a eliminar todas as formas de discriminação,

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especialmente as baseadas em distinção de gênero, uma vez que o direito à educação se constitui um direito inalienável de todo indivíduo. Esse compromisso foi assinado pelos 150 países participantes da conferência.

Nos anos 1990, o desafio educativo nos países da América Latina passou a ser assumido com uma nova conotação teórica e prática. Nesse quesito, tratou-se de compreender melhor o papel da educação em um mundo que se encontrava em pleno desenvolvimento e cada vez mais globalizado. No aspecto político, o desafio era voltar a situar o discurso educativo na agenda das estratégias de desenvolvimento econômico e social dos países. O reposicionamento da educação como prioridade no âmbito das políticas públicas decorreu de um esforço coletivo, alcançado com mais facilidade do que se esperava. Vencido o desafio, tornou-se necessário determinar como e o que fazer (CASASSUS, 2002).

Ainda nessa década, vários compromissos importantes foram assumidos, em eventos e congressos, pelos países desenvolvidos e também pelos países da América Latina e Caribe, os quais tinham como foco oferecer uma educação de qualidade e com igualdade de oportunidade para todos. No entendimento de Casassus (2001), a educação entraria em uma nova etapa de desenvolvimento, pois teria de responder pelos desafios da transformação das atividades de produção, da equidade social e da democratização política. Nesse contexto de mudanças que se desenhava, seria necessário suscitar uma “profunda transformação da gestão tradicional da educação” (CASASSUS, 2001).

Conforme Torrecila, os organismos multilaterais destacaram-se, na América Latina, entre os mais fortes defensores do movimento teórico-prático que buscava a produção de escolas eficazes. Para o autor, “en todos os casos son las agencias internacionales, como el Banco Mundial, o el Banco Interamericano de Desarrollo, quienes han assumido el liderazgo en la difusión de las ideas” (TORRECILA, 2003, p. 13). Para alguns pesquisadores, os estudos sobre a produção da eficácia na escola compõem uma tendência relevante na pesquisa e na política educacional, contribuindo para qualificar a educação pública, sobretudo por enfatizar os aspectos internos ao ambiente escolar, capazes de produzir o sucesso dos objetivos educacionais (TORRECILA, 2003).

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Com efeito, não seria legítimo afirmar que, nos últimos anos, esse movimento tenha sido reconhecidamente um marco nas discussões mais calorosas a respeito das escolas eficazes. No entanto, no que se refere às pesquisas nessa linha investigativa, existiu uma influência, embora indireta, relativamente positiva, pois tanto nas decisões macro (políticas) quanto nas decisões pequenas acerca da organização da escola, os resultados dessas pesquisas se constituíram sinalizadores de caminhos satisfatórios. Entre os fatores que mais influenciaram o alcance de resultados mais promissores em relação ao desempenho acadêmico dos estudantes, destacam-se o clima escolar e a liderança educacional (MURILLO, 2008).

Cabe ressaltar que o foco das investigações no âmbito do movimento “escolas eficazes” se assentou nos resultados dos estudos empíricos que buscavam medir o nível do “efeito escola” sobre os fatores que influenciavam positivamente o sucesso dos estudantes. Se considerado o conceito de Murillo (2005), por exemplo, para ser eficaz, a escola deverá encontrar mecanismos para alcançar o desenvolvimento integral de todos os estudantes, superando, inclusive, as expectativas relacionadas à sua origem social, econômica e cultural. Para tanto, o autor destaca três deles:

1) a inclusão de princípios de eficácia colocados em prática na escola, sendo a eficácia entendida como o progresso dos estudantes em seu desempenho passado e em sua história cultural;

2) a equidade de gênero como um dos elementos básicos do conceito de eficiência, na medida em que for preciso observar e diferenciar, quando a aplicação dos princípios da eficácia exercerem influência positiva para alguns estudantes, mais do que para outros; e, por fim,

3) visar ao desenvolvimento integral dos estudantes, como uma finalidade essencial de qualquer sistema de educação. Nesse caso, eficácia não só significa uma ação que superará os aspectos cognitivos ou acadêmicos, como auxiliará a alcançar elementos como a felicidade, a autoestima e a atitude crítica e criativa.

Ao chamar a atenção para algumas críticas que têm sido feitas acerca do movimento das escolas eficazes, Murillo (2008) destaca dois

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elementos considerados fundamentais. O primeiro é a necessidade de se reconhecer o quanto a discussão sobre esse tema tem sofrido evolução ao longo dos últimos trinta anos e que, com efeito, essa evolução também é fruto das críticas, e até mesmo da autocrítica, advindas dos próprios investigadores. O segundo elemento é gerado da contradição de algumas dessas críticas, as quais se originam e se referem a múltiplos pontos de vista. De um lado, para Teddlie e Reynolds (2001) é “irônico” o fato de alguns investigadores caracterizarem essa linha de investigação como avanço, na medida em que ela se preocupa com as questões de equidade e resultados entre estudantes oriundos das classes empobrecidas. De outro, emerge um processo educativo cuja característica é não enfatizar a relação entre situação econômica e rendimento escolar.

O que se conclui, portanto, quanto à temática, no contexto das críticas que se levantam de diferentes pontos de vista, é que se trata de um campo altamente heterogêneo e indefinido, discutido por investigadores de distintos campos do conhecimento e até de diferentes visões, principalmente ideológicas. Há de se considerar, também, que esta será sempre uma temática dada a controvérsias, pelo simples fato de se abordar assuntos de natureza e de propósitos concernentes ao impacto das políticas educacionais sobre o desempenho das escolas.

Por fim, no âmbito da América Latina e Caribe, essa discussão remonta à década de 1970, e desde essa data até os dias atuais tem crescido o número de estudos empíricos que abordam as características das escolas eficazes, o que denota ampliação gradativa do interesse de pesquisadores acerca do assunto. Pergunta-se: é possível que o interesse crescente sobrevenha da flagrante sequência de erros estruturais, de funcionamento e de organização das escolas, os quais vêm submetendo incalculável número de estudantes às mazelas do fracasso escolar? O que levaria tantos pesquisadores a buscar em estratégias supostamente superadas uma possível solução para problemas tão atuais? Não serviram esses problemas de alerta para o estudo da educação? É possível que a ausência de reflexão acerca da necessidade de se repensar o curso das investigações tenha afetado a aplicação mais eficaz de seus resultados?

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O fato é que o número de trabalhos na área da eficácia escolar tem tomado corpo na atualidade, tanto em quantidade quanto em qualidade, de tal forma que se pode afirmar que o terreno é fértil para a presente discussão, apontando excelentes expectativas para o futuro (MURILLO, 2008). Nesse sentido, é válido pontuar que na América Latina destacam-se quatro características das investigações:

a) o caráter eminentemente aplicado, b) a ênfase na equidade; c) a influência de uma variedade de referenciais teóricos, alguns que,

inclusive, se contrapõem entre si; e d) a ligação íntima com o desenvolvimento da educação e com as

investigações de cunho educativo (UNESCO/OREALC, 2001).

Em face desse contexto, Murillo (2008) destaca que se vislumbra um futuro promissor no que se refere aos avanços das pesquisas na área. No entanto, ainda há muitos desafios a enfrentar, entre eles, fomentar melhores trabalhos nessa nova geração de pesquisadores, maiores financiamentos e fomento às pesquisas, maior disseminação dos resultados, melhor formação técnica dos investigadores e maior utilização dos resultados.

O incipiente movimento das escolas eficazes no Brasil

O desafio da educação na sociedade brasileira no fim dos anos 1980 assumia também um discurso tanto teórico como prático, por parte dos legisladores e pesquisadores, a respeito da democratização do ensino brasileiro, durante o período de redemocratização do País, no início da Nova República, em 1986. Nas discussões teóricas, o que se buscava era compreender melhor o papel da educação na sociedade e nos discursos pautados pela concepção política. O verdadeiro desafio era voltar a situar a educação como estratégia de desenvolvimento econômico e social do País. Tanto que questões teóricas sobre democratização do ensino brasileiro permeavam as discussões dos estudiosos naquela época. Dois aspectos

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ganharam relevância em relação à democratização do ensino: o direito de acesso à escola e a qualidade da educação oferecida à sociedade brasileira.

Em face desse contexto, os pesquisadores terminaram por reconhecer que o número de estudantes que ingressava no sistema de ensino estava aumentando. Dados do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (INEP, 2009) comprovavam que, na década de 1980, a matrícula escolar de crianças com idade compreendidas entre 7 e 14 anos aumentava com o passar dos anos. Por outro lado, ressaltava-se a percepção de que a qualidade da educação nas escolas públicas brasileiras não ocorria no nível desejado. Nada tinha sido medido, mas havia a preocupação de que era preciso melhorar a qualidade do sistema educacional brasileiro.

Estudiosos se uniram no desafio de discutir a importância da escolaridade na qualidade de vida e na garantia dos direitos à cidadania para as camadas sociais mais desfavorecidas da população brasileira, chamando a atenção para a organização interna da escola como fator determinante do sucesso dos estudantes (SAVIANI, 1980, 1983; MELLO, 1979, 1982; LIBÂNEO, 1985; SILVA, 1988). De acordo com Oliveira (2000), os trabalhos tinham como objetivo compreender como tais fatores, caracterizados pelo movimento das escolas eficazes surgido nos Estados Unidos no final dos nos 1960, influenciavam as próprias escolas na trajetória de seus estudantes.

Nessa época, pesquisadores e estudiosos como Mello (1983) chamavam a atenção, por meio de ensaios teóricos, para os fatores intraescolares que poderiam auxiliar as escolas a melhorarem o desempenho de seus estudantes. A autora destacava entre os fatores intraescolares a autonomia financeira das escolas, aliada aos mecanismos sistêmicos de avaliação, e a responsabilização dos dirigentes escolares e professores pelo sucesso do desempenho dos estudantes. No entendimento de Mello, esses fatores estariam centrados na defesa da mudança do padrão de gestão escolar como o principal mecanismo para a superação das debilidades da oferta educacional no País, em meados da década de 1980.

De acordo com Saviani (1980, p. 51), as instituições educacionais deveriam estabelecer entre suas funções a de “ordenar e sistematizar as

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relações homem-meio para criar condições ótimas de desenvolvimento das novas gerações”. Na concepção do autor, as escolas se mostrariam efetivas, eliminando assim o déficit de aprendizagem que deriva das desigualdades dos estudantes oriundos das classes mais desfavorecidas social e economicamente do País. Isso implica, afirma o autor, definir para a educação objetivos claros e precisos, com os quais os indivíduos possam superar o ceticismo quanto ao papel da escola. Ainda para o autor, essa seria uma luta pela garantia da equidade em relação à oportunidade de acesso à escolaridade e à qualidade da escola. Para tanto, seria imprescindível que as escolas assumissem, como função inerente à sua missão, prover a população das ferramentas básicas de participação na sociedade (SAVIANI, 1980, p. 172).

No final da década de 1980, os estudos sobre a efetividade da escola (School Effectiveness Research – SRE) ou a “escola eficaz” consolidaram-se como um campo de pesquisa que visava a compreender, em cada contexto social, os processos internos das escolas que determinam a eficácia delas, ou seja, sua capacidade de interferir positivamente, mediante políticas e práticas escolares, no desempenho dos estudantes (SAMMONS; HILLMAN; MORTIMORE, 1995). A proposta da “escola efetiva” começou a ser conhecida e analisada no Brasil em meados dos anos 1980. Estudo apresentado por Coelho (1984) situa na formulação dessa concepção as tendências e os resultados da pesquisa educacional acumulados nos anos 1960 e 1970. Para o autor, foi dada ênfase aos aspectos relacionados à tecnologia, limitando os espaços de inserção da escola ao torná-los essencialmente instrucionais.

Em 1994, em um trabalho que sobre eficácia escolar, Guiomar de Mello traz à tona essa questão, propondo-a como forte tendência a influenciar o trabalho do gestor escolar. Mello (1994) identificou algumas características das escolas eficazes: presença de liderança; expectativas em relação ao rendimento do aluno; tipo de organização, atmosfera ou clima da escola; natureza dos objetivos de aprendizagem perseguidos; distribuição do tempo; tipo de acompanhamento e de avaliação do aluno; estratégia de capacitação de professores; relacionamento e suporte técnico de instâncias da administração do ensino (distrito/região); e apoio e

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participação dos pais (MELLO, 1994, p. 13-14). Segundo a autora, as escolas que apresentassem essas características seriam escolas eficazes.

Retomando a discussão do incipiente movimento das escolas eficazes no Brasil, a busca da eficácia e da eficiência escolar sempre esteve associada à contribuição da “sociedade civil”, considerada portadora de recursos e de competências necessárias à gestão do público (TORRECILA, 2003, p. 13).

Trajetória da educação brasileira na discussão sobre a eficácia escolar

A reforma educacional, implantada a partir da década de 1990, no Brasil, trouxe definições inovadoras no que concerne à gestão educacional, à profissionalização dos professores, ao currículo nacional e à avaliação da educação básica. O Brasil avançou muito nesses últimos vinte anos e, nesse período, várias iniciativas deram forma a um sistema de avaliação em diferentes níveis e modalidades de ensino, a saber: Sistema Nacional de Avaliação da Educação Básica (Saeb); Exame Nacional do Ensino Médio (Enem); Exame Nacional de Cursos (ENC), também conhecido como Provão, posteriormente, substituído pelo Exame Nacional de Desempenho do Ensino Superior (Enade); Exame Nacional de Certificação de Competências de Jovens e Adultos (Encceja); Sistema Nacional de Avaliação do Ensino Superior (Sinaes); Prova Brasil e o Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb).

Todos esses sistemas se destacaram por sua eficiência, como política de avaliação educativa, na medida em que se revelaram instrumentos que despertaram as escolas para que verificassem seu desempenho diante das demais. A começar pela LDBEN nº 9.394 (BRASIL, 1996), de 20 de dezembro de 1996, a qual estabelece em seu art. 87 (§ 3º, inciso IV) como dever dos municípios e, supletivamente, dos Estados e da União, a integração de todos os estabelecimentos de ensino fundamental ao sistema nacional de avaliação do rendimento escolar até o final da Década da Educação (1997-2007).

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Para Locatelli (2002, p. 5), coube à avaliação sistêmica da educação básica o objetivo de “monitorar a qualidade” e de promover a incorporação da avaliação externa no cotidiano escolar, como apoio para melhorar a qualidade do ensino. No entanto, a literatura mostra como instrumento favorecedor da qualidade as experiências focadas na aprendizagem e na escola. As avaliações institucionais atuam como política estratégica de acesso ao interior das escolas, à sua “caixa-preta”, com o fim de conhecer a dinâmica interna subjacente à prática dos professores, alcançando, por tabela, a prática dos gestores. Países como Cuba e Chile, México, Peru, China, Espanha, Inglaterra, Estados Unidos e França, entre outros, também se utilizam dessa estratégia, confiando aos sistemas nacionais de avaliação o encargo de propiciar esse acesso de forma mais efetiva. (CASTRO, 2010, p. 148).

Histórico do Sistema Nacional de Avaliação da Educação Básica (Saeb)

Nesse cenário, o Ministério da Educação, em meados da década de 1980, implantou uma proposta pioneira de avaliação em larga escala. Nascia o primeiro Sistema de Avaliação do Ensino Público de 1º Grau (Saep), que visava avaliar o Programa de Educação Básica no Nordeste do País e também responder às demandas do Banco Mundial, no sentido de desenvolver uma sistemática de avaliação para esse segmento da educação. Essa sistemática foi estendida para o resto do País em agosto de 1988, com os ajustes necessários.

A institucionalização desse sistema de informação e de avaliação no Brasil, um dos principais eixos da reforma, começou no final da década de 1980 com a criação do Sistema Nacional de Avaliação da Educação Básica (Saeb), que foi reestruturado na segunda metade dos anos de 1990. Atualmente, o Saeb é composto por duas avaliações complementares. A primeira, denominada Avaliação Nacional da Educação Básica (Aneb), mais conhecida como Saeb, e a segunda a Prova Brasil.

A avaliação do Saeb abrange uma amostra dos estudantes das redes públicas e privadas das áreas rural e urbana do País, matriculados no

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5º e no 9º anos do ensino fundamental e no 3º ano do ensino médio. Nesses estratos, os resultados são apresentados para cada Unidade da Federação, região e para o País como um todo. O Saeb é um importante subsídio para o monitoramento das políticas gerais de desenvolvimento educacional. Com base nas informações coletadas por ele, o MEC e as Secretarias Estaduais e Municipais de Educação devem definir as ações voltadas para a correção das distorções e das debilidades identificadas, de modo a orientar ações de apoio técnico e financeiro, para o crescimento das oportunidades educacionais, da eficiência e da qualidade do sistema educacional brasileiro em seus diferentes níveis.

No entendimento de Santos (2010), essas reformas iniciadas no sistema educacional brasileiro no começo dos anos 1990 “recorriam ao modelo administrativo puramente gerencial, centrado na transposição das relações e da lógica do mercado para a gestão pública, como alternativa necessária à modernização e ou à indução de melhorias no funcionamento do Estado” (SANTOS, 2010, p. 19). Essas tendências vêm sendo incorporadas a novas formas de administração e gestão, de acordo com Castro (2010). Castro corrobora o que diz Santos, quando enfatiza a “necessidade de melhorar a eficiência dos sistemas educacionais e de fomentar a responsabilidade social e profissional pelos resultados da educação” (2010, p. 149).

Ainda, segundo Castro (2010), não há como desconhecer a contribuição dos sistemas de avaliação como ferramentas que afetam a ação das escolas em busca da qualidade, na perspectiva de tentar melhorar seus índices. Mesmo se permitirem uma visão mais geral, na medida em que o processo educativo não gera resultados imediatos e visíveis em curto tempo, ainda assim os sistemas contribuem como uma política que desperta a escola de sua zona de conforto. Brooke e Soares (2008) afirmaram que somente a partir da efetivação do Saeb foi possível avaliar a influência da escola no desempenho dos estudantes, ou seja, investigar o “efeito escola”,

[...] mediante o cruzamento de informações do Saeb sobre as condições de funcionamento das escolas, as características socioeconômicas dos estudantes e o nível de aprendizagem alcançado, a pesquisa brasileira começou a quantificar o efeito-escola e a desvendar as especificidades da escola eficaz (BROOKE; SOARES, 2008, p. 9).

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Prova Brasil: instrumento de apoio à gestão escolar

A segunda avaliação do MEC foi criada em 2005 e é denominada Avaliação Nacional do Rendimento Escolar (Anresc), mais conhecida como Prova Brasil. É aplicada censitariamente aos estudantes de 5º e 9º anos do ensino fundamental público, nas redes estaduais, municipais e federais, da área rural e urbana, em escolas que tenham no mínimo 20 estudantes matriculados na série avaliada. Nesse estrato, a prova recebe o nome de Prova Brasil e oferece resultados por escola, município, Unidade da Federação e país, que também são utilizados no cálculo do Ideb. A Prova Brasil e o Saeb utilizam a mesma metodologia, por isso são consideradas avaliações complementares. A partir de 2007, a Prova Brasil e o Saeb passaram a ser operacionalizados em conjunto pelo Inep.

Um dos aspectos relevantes da Prova Brasil é oferecer a todas as escolas participantes um diagnóstico consistente sobre o desempenho de seus estudantes, utilizando a mesma métrica de avaliação do Saeb. Os resultados são comparáveis e permitem que a escola identifique suas potencialidades e fragilidades em relação ao desempenho de seu município, seu Estado, ou em relação ao País. Como importante instrumento de apoio à escola, a Prova Brasil tem contribuído para aprimorar seu projeto pedagógico e suscitar a revisão de práticas didáticas que têm se mostrado ineficazes, ainda que de forma tímida.

Prova Brasil e Saeb: aspectos comuns entre instrumentos para o mesmo fim

A Prova Brasil e o Saeb são dois exames complementares que compõem o Sistema de Avaliação da Educação Básica. Para a elaboração das avaliações, é selecionado um conjunto de habilidades julgadas essenciais ao domínio dos estudantes que cursam o 5º ano (4ª série) e o 9º ano (8ª série) do ensino fundamental, baseadas nas Matrizes de Referências dos Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN). No Quadro 3, abaixo, estão descritos os pontos comuns e as diferenças entre as duas avaliações.

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Quadro 3 – Semelhanças e diferenças entre a Prova Brasil e o Saeb

Prova Brasil Saeb

A prova foi criada em 2005. A primeira aplicação ocorreu em 1989.

Avalia as habilidades em Língua Portuguesa (foco em leitura) e Matemática (foco na resolução de problemas).

Estudantes fazem prova de Língua Portuguesa (foco em leitura) e Matemática (foco na resolução de problemas).

Avalia apenas estudantes de ensino fundamental, de 5° e 9° anos.

Avalia estudantes de 5° e 9° anos do ensino fundamental e também estudantes do 3º ano do ensino médio.

Avalia as escolas públicas localizadas em área urbana e rural.

Avalia estudantes da rede pública e da rede privada, de escolas localizadas nas áreas urbana e rural.

A avaliação é quase universal: todos os estudantes das séries avaliadas, de todas as escolas públicas urbanas e rurais do Brasil, com mais de 20 estudantes na série, devem fazer a prova.

A avaliação é amostral, ou seja, apenas parte dos estudantes brasileiros das séries avaliadas participa da prova.

Como resultado, fornece as médias de desempenho para o Brasil, regiões e unidades da Federação, para cada um dos municípios e escolas participantes.

Oferece resultados de desempenho apenas para o Brasil, regiões e unidades da Federação.

Parte das escolas que participarem da Prova Brasil ajudará a construir também os resultados do Saeb, por meio de recorte amostral.

Todos os estudantes do Saeb e da Prova Brasil farão uma única avaliação.

Fonte: <http: //portal.inep.gov.br/web/prova-brasil-e-saeb/semelhancas-e-diferencas>. 2011.

Tanto nas avaliações do Saeb quanto nas avaliações da Prova Brasil, diretor e professores das turmas avaliadas respondem a um questionário que coleta dados demográficos, perfil profissional e condições de trabalho. Aos estudantes é aplicado um questionário socioeconômico, no qual eles fornecem informações sobre fatores de contexto que podem estar associados ao seu desempenho escolar.

Nos últimos anos, influenciados por esse modelo de avaliação do Saeb, muitos Estados da Federação elaboram e desenvolvem seus próprios sistemas de avaliação. Em geral, as avaliações são censitárias, envolvem todos

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os estudantes das séries determinadas e toda a rede de ensino. Exemplos de Estados que já desenvolveram seus próprios sistemas de avaliação de desempenho: Sistema Permanente de Avaliação da Educação Básica do Ceará (Spaece), Sistema Mineiro de Avaliação da Educação Pública (Simave), Sistema de Avaliação de Rendimento Escolar do Estado de São Paulo (Saresp) e Sistema de Avaliação do Desempenho das Instituições Educacionais do Sistema de Ensino do Distrito Federal (Siade).

Plano de Desenvolvimento da Educação (PDE): política de consolidação

O governo federal, por meio do MEC, lançou em abril de 2007 o Plano de Desenvolvimento da Educação (PDE), com o objetivo de melhorar substancialmente a educação que é oferecida às crianças, aos jovens e aos adultos. Autores como Alves e Silva (2009) concordam que as diretrizes do PDE, de modo geral, têm reafirmado a política educacional existente no País desde os anos 1990. Os três eixos que os autores discorrem estão relacionados à gestão do sistema de ensino, à ênfase nos processos de avaliação externa como meio de aferir e requerer a qualidade da educação e ao financiamento da educação. Nesse sentido, o PDE sintetiza várias ações em busca de uma educação equitativa e de boa qualidade e se organiza em torno das modalidades de ensino, a saber: educação básica; educação superior; educação profissional e alfabetização.

Para que o PDE pudesse ser implantado e efetivado, foi também elaborado um Plano de Metas, o qual estabeleceu um conjunto de diretrizes para que a União, os Estados, o Distrito Federal e os municípios, em regime de colaboração, conjugassem esforços, buscando superar a extrema desigualdade de oportunidades existentes no País. A intenção do regime de colaboração estabelecido no Plano de Metas foi desenvolver ações e estratégias para que escolas e secretarias de educação ofertassem uma educação de qualidade para todos que procuram a escola. Para Saviani (2007), o problema da qualidade do ensino brasileiro precisa ser enfrentado conjuntamente pela União Federal, os Estados, o Distrito

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Federal e os municípios, porém é necessária a participação também das famílias e da comunidade.

Na ocasião do lançamento do PDE, o ministro da Educação proferiu em seu discurso,12 em abril de 2007, que todos os estudantes brasileiros têm o direito à educação e que o envolvimento da família dos estudantes e dos governos municipais e estaduais é necessário para o sucesso da escola, reforçando, ainda, o papel preponderante desta.

Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb): critério universal de aferição do desempenho das escolas

Em 2007, o governo federal, entre as metas do PDE, criou o Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb). O indicador de qualidade, com notas de 0 a 10, combina a avaliação de desempenho em provas com dados de repetência e evasão. Seu cálculo baseia-se nos dados de aprovação escolar, apurados no censo escolar e nas médias de desempenho obtidas nas avaliações nacionais: o Saeb, para as unidades da Federação e para o País, e a Prova Brasil, para os municípios. No Quadro 4, é possível verificar a fórmula que o Inep utiliza para calcular o Ideb das escolas brasileiras.

Quadro 4 – Fórmula para calcular o Ideb

IDEBji = Nji Pji

I = Ano do exame (Saeb e Prova Brasil) e do Censo Escolar.Nji = Média da proficiência em Língua Portuguesa e Matemática, padronizada para um

indicador entre 0 e 10, dos estudantes da unidade j, obtida em determinada edição do exame realizado ao final da etapa de ensino.

Pji = Indicador de rendimento baseado na taxa de aprovação da etapa de ensino dos estudantes da unidade j.

Fonte: <http: //portal.inep.gov.br/comoidebecalculado>. 2011.

Com esse índice, o MEC traçou metas de desempenho bienais para cada escola e cada rede até 2022. O novo indicador utilizou na primeira

12 Acesso ao conteúdo completo do discurso no portal do MEC: <http: //portal.mec,gov.br/index.php?option=com>.

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medição dados que foram levantados em 2005. Com o Ideb, o sistema municipal, estadual e federal de ensino têm metas de qualidade para atingir. A fixação da média 6 a ser alcançada considerou o resultado obtido pelos países da Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico (OCDE), quando se aplica a metodologia do Ideb nos resultados educacionais. A nota 6 foi a obtida pelos países desenvolvidos que ficaram entre os 20 mais bem colocados do mundo. O Gráfico 1 apresenta uma prospecção da evolução da trajetória do Ideb para os próximos anos.

1 4 7 10 13 16 19 22 25 28 31 34 37 40 43 46 49

IDEB -meta

ano

IDEB2005 Esforço

necessário

Tempo

IDE

B

10

9

8

7

6

5

4

3

2

1

0

Gráfico 1 – Comportamento esperado para a trajetória do Ideb até 2022

Fonte: < http: //portal.inep.gov.br/comooidebecalculado>. 2011.

Os resultados do Ideb em 2005, observados nas escolas públicas brasileiras, nos anos finais do ensino fundamental, alcançaram a média de 3,5 pontos. Em 2007, o resultado nas mesmas séries foi de 3,8 pontos. Nota-se que houve pequeno acréscimo de 0,3 pontos no índice. Novamente, em 2009, o resultado medido teve novamente uma pequena melhora de 0,2 pontos, passando para 4,0. Foi possível notar, a partir dos resultados, que as escolas da rede federal obtiveram índices melhores que as escolas das redes estaduais e municipais. Entretanto, é necessário esclarecer que essa melhoria pode não ser tão significativa, se comparada com os valores mínimos e máximos da escala do Ideb, ou seja, possui um intervalo

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de 0 a 10. De acordo com os anos de 2005, 2007 e 2009, os resultados das escolas da rede federal foram: 5,8; 5,9 e 5,9 pontos, respectivamente. As escolas das redes estaduais obtiveram, consequentemente, 3,3; 3,6 e 3,8 pontos e as escolas municipais, 3,1; 3,4 e 3,6 pontos. As escolas que foram selecionadas no estudo obtiveram os seguintes índices no Ideb, em 2005, 2007 e 2009: a escola de Planaltina alcançou, consecutivamente, 3,5; 3,5 e 4,4, e a escola de Samambaia obteve os índices 3,4; 3,8 e 4,5 pontos.

A relevância do Ideb pode ser atribuída a dois fatores diretamente vinculados à aprovação escolar e ao desempenho do aluno, obtido nas avaliações nacionais, evitando que os sistemas de ensino direcionem suas ações para um dos seus componentes. Vale ressaltar que, desde o final dos anos 1980, o governo federal vem, sucessivamente, adotando medidas de intervenção educativa para o combate à repetência dos estudantes. Medidas como, por exemplo, a criação e a expansão de classes de aceleração e de programas de progressão continuada. Muitos governos são favoráveis a essas medidas por entenderem que elas podem apresentar uma melhora nos indicadores de cobertura e de fluxo escolar. Segundo Fernandes e Natenzon (2003), a “promoção automática é como subterfúgio para encobrir as mazelas que ocorrem no interior das escolas, seria como quebrar um termômetro para não diagnosticar a febre” (2003, p. 6). Para Gomes (2005), por exemplo, a aceleração da aprendizagem é uma forma de (des)seriação que visa a recuperar o tempo perdido. Ainda que haja vários programas e formas de execução diferentes, eles tendem a elevar a autoestima dos estudantes e a oferecer condições especiais de ensino-aprendizagem para os estudantes com distorção idade-série.

A trajetória de duas décadas mostra que o sistema educacional brasileiro teve avanços bem expressivos em suas políticas públicas educacionais. Segundo Schwartzman (2011), o Brasil melhorou sensivelmente seus indicadores de acesso e de fluxo de crianças e jovens na escola. Recentemente foram divulgados os dados preliminares do Censo 2010 e foi constatado um decréscimo no número de matrículas em toda a educação básica, em torno de 2%. Isso significa 1.030.563 de matrículas. Na ocasião da divulgação do Censo, o então presidente do Inep, Joaquim Neto, justificou que ocorreu esse decréscimo devido a dois fatores: a própria acomodação

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do sistema educacional e a melhora do fluxo escolar dos estudantes, uma vez que a distorção idade-série e a reprovação também diminuíram.

Na tentativa de exemplificar melhor, diz-se que não é desejável que uma escola reprove sistematicamente. Esse efeito certamente tem contribuído para os altos índices de evasão com os quais a escola se depara, atualmente, mesmo antes de o aluno completar a educação fundamental. Também o contrário não é a melhor solução, desde que a escola tenha o necessário controle sobre os mecanismos de garantia da qualidade da aprendizagem de seus estudantes. De nada adianta alcançar taxas elevadas de conclusão do ensino fundamental e médio se os estudantes aprendem de modo superficial, deixando de usufruir das condições que a escola deve prover-lhes, na perspectiva de que adquira a autonomia necessária à sua sobrevivência na sociedade. Esta é a verdadeira finalidade do Ideb: “evitar o aumento da aprovação sem que os estudantes aprendam e evitar que as escolas reprovem em massa, excluindo estudantes com desempenho insuficiente e selecionando os melhores estudantes para aumentar as notas na prova” (CASTRO, 2010, p. 156).

Em suma, o Ideb é um indicador bem conhecido e aceito pelos Estados e municípios, bem disseminado junto às escolas, aos dirigentes e aos professores das redes públicas. Trata-se de um indicador relativamente simples de ser compreendido pela sociedade, o qual permite um monitoramento permanente dos sistemas educacionais.

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Capítulo 5

INCURSÕES METODOLÓGICAS: O CAMINHO DESENVOLVIDO AO ENCONTRO DE UMA NOVA CONCEPÇÃO DO ESPAÇO ESCOLAR

Nessa etapa da discussão, abre-se o terceiro parêntese. Afinal, aproximar-se de uma visão diferenciada de escola, na intenção de ressignificar concepções aparentemente superadas por não permanecerem recorrentes na literatura, requer exercício metodológico intenso. Pelos meios convencionais, dificilmente seria possível superar esse desafio. O método por si não se conformaria a uma inquietação que emerge da alma do pesquisador, mais do que da necessidade de cumprimento das regras que respondem a uma meta acadêmica. Foi preciso integrar forças de diferentes origens e, como diz Carvalho (2012, p. 95), integrar a “experiência como base para a experimentação de novas formas de entendimento do mundo”.

No decorrer do processo, foi preciso compreender que, mesmo estando vinculada a um projeto elaborado a priori, a pesquisa, cuja essência se mistura à própria natureza do pesquisador, não se encerra em si mesma e não se permite manter circunscrita ao domínio acadêmico ou científico. Assim, liberta-se da rigidez das normas e, em determinados momentos, parece transcorrer como um caminho, um caminho que se faz ao caminhar, que se constrói em pleno movimento, que se realiza somente no próprio percurso. O célebre poeta espanhol António Machado (1989), de alguma maneira, expõe essa condição que, no contexto e na estrutura do estudo realizado, pode ser aplicada ao método, dada a maneira como foi desenvolvido. A contribuição de Machado se fez por meio de um poema

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que, pela particularidade da imagem que suscita, sintetiza o modo como a pesquisa fluiu ao encontro dessa visão diferenciada do espaço escolar. De outro modo, talvez permanecesse no limiar do comum.

Caminhante, as tuas pegadas. São o caminho e nada mais; Caminhante não há caminho, O caminho faz-se ao andar. Ao andar faz-se o caminho E ao olhar-se para trás, Vê-se a senda que jamaisSe há de voltar a pisar. Caminhante não há caminho, Somente sulcos no mar [...].

A visão que emerge do poema nesse trecho traduz melhor traduz o desafio de uma pesquisa cujo conhecimento construído transcorreu em intensa sinergia entre sujeito e objeto, espírito (dimensão pessoal) e mundo (dimensão profissional). Uma estrutura que não seria autêntica sem os parênteses abertos nos momentos oportunos. Isso para dizer que assim ocorre com a dinâmica da própria vida, pois narrar os resultados de um estudo que nasce das inquietações da alma de seu autor faz com que a composição desse registro se misture à narrativa da própria trajetória dele, resguardando-se as devidas proporções de formalização acadêmico-científica. Sobretudo porque o decurso dessa pesquisa se deu como um espaço de tempo que se teve de percorrer, cheio de obstáculos, ora enfrentando muitas dificuldades, ora se realimentando do prazer de experimentar momentos felizes. Da intensidade desses momentos, surgiu uma visão que integrou objeto de estudo, “eu” pesquisador, elementos do cotidiano das escolas pesquisadas, instrumentos e procedimentos formais e percepções do cotidiano em diferentes dimensões. Uma visão que se esforçou para transcender a dimensão da prática e alcançar o movimento interno que gera esse elemento da pesquisa que se chama “realidade”, ou seja, o que se pode enxergar a “olhos nus”.

Mesmo o enfrentamento de obstáculos que serviram para mostrar que ciência e vida não se encontram a distâncias intransponíveis, foram

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os objetivos e os propósitos que mantiveram a resistência para que esse desafio se tornasse uma experiência fecunda. Aliás, propósitos constituem os elementos da objetividade que respondem pelo encargo de manter essa interconexão com a subjetividade da vida, provocando para que o pesquisador se desinstale do estado de passividade e queira ir “mais além”. Isso porque a vida, assim como ocorre com um caminho, exige que se faça a travessia de um estado inicial, ponto de partida, para um estado final, este, por sua vez, mais evoluído, desde que impliquem as dimensões pessoal, social, profissional, objetiva e subjetiva, entre outras, pois, ninguém mais do que a pessoa pode imprimir o movimento de seguir por esse caminho (RIBEIRO, 2012). Segue-se, portanto, a narrativa do terceiro parêntese.

Pesquisadora aprendiz: trajetória do caminhar

As lembranças que trago na memória das escolas nas quais estudei e mesmo das em que, por muitos anos, lecionei são de um espaço em que prevalece o modelo de educação tradicional, de natureza conservadora. Ao longo de minha trajetória profissional pude perceber que a concepção de educação que construímos com nossas experiências segue muito enraizada e por isso se reflete em nossa prática, quando atuamos no processo ensino-aprendizagem. Embora, por poucas vezes, nessa longa caminhada, ousasse andar na contramão das rotinas escolares, minhas incursões foram tímidas, temerosas da reação que pudessem gerar, porém sempre impulsionadas por sonhos de mudanças na educação. Em determinado momento, porém, percebi que desempenhando a função de professora de matemática dificilmente conseguiria liderar qualquer tipo de mudança. Matar o sonho que me acompanhou desde sempre seria a consequência mais provável se optasse permanecer na zona de conforto.

Foi exatamente a chegada daquele menino à porta da minha sala de aula que me fez enxergar uma nova possibilidade e ter interesse em voltar a estudar. Senti, com aquele episódio, que era chegada a hora de mudar e, num impulso imediato, percebi que era necessário caminhar, imprimir passos mais largos e seguir em direção às inquietações que tanto

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me afligiram e que foram potencializadas naquele encontro. Para seguir em frente, foi necessário mudar internamente, incorporar esse sentido de caminho, pois essa nova etapa se misturou à dinâmica de minha própria vida, cujo roteiro passou a ser desenhado por uma meta pessoal (RIBEIRO, 2012). Esses foram os meus primeiros passos na compreensão de que existe uma educação que liberta e que propicia a aquisição de conhecimento crítico, que consegue transformações significativas em uma sociedade desigual (PATTO, 1997). Essa busca certamente me levaria a uma escola que se torna amorosa, porque sua dinâmica interna supera as limitações externas e vai além do processo ensino aprendizagem. Batalloso (2010, p.149) denomina essa concepção de educação de condição humana, quando cita as palavras de Alejandro Cussianovich (2007): “el verdadeiro nombre de una educación transformadora es que sea humanizante”. Trata-se de uma concepção que transcende o comum, assim como foi sintetizada na Carta de Fortaleza, 2010:

A educação deve possibilitar o uso de estratégias multidimensionais de ensino e aprendizagem, voltadas para o desenvolvimento e o aprimoramento das diferentes dimensões humanas (MORAES; ALMEIDA, 2010, p. 252).

Ao sair em campo para realizar minha pesquisa de doutorado, constatei, pela primeira vez, que me tornara uma pesquisadora aprendiz. Incorporei de tal modo o sonho de encontrar novas possibilidades para os incontáveis “Tonicos” que se isolam e desolam nos bancos escolares, que aquelas lembranças da profissão ficaram guardadas para que não neutralizassem minha esperança. Lancei-me nas escolas, em suas rotinas estruturais, nesse universo cheio de contradições e ao mesmo tempo cheio de subjetividade e singularidade. A cada visita às escolas pesquisadas, tive a oportunidade de ver e de rever com outro olhar toda a dinâmica escolar, um olhar lançado com a necessária distância crítica. À medida que os dados iam se materializando e se consolidando conjuntamente com a literatura, novos “flashes de luz” conduziram-me a outro lugar da educação. Despertei para a importância de se repensar uma educação que vai além dos processos cognitivos. Compreendi que na escola é essencial estabelecer

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processos de convivência mútua, baseados nas relações dialógicas e respeitosas entre todos os atores sociais. Moraes (2008) exemplifica essa percepção dizendo que é o diálogo que “se estabelece como base fundacional, como o cimento que liga, religa e sustenta os vínculos entre indivíduos e sociedade, conhecimento e vida e entre os diferentes saberes” (p. 23).

Durante esse processo fecundo de aprendizagem, para o qual me investi do papel de “pesquisadora aprendiz”, tive que apreender também a superar a dor da ausência de um ente querido – Mariana – , cuja visão e ação fizeram parte quase inerente de toda essa jornada pessoal, profissional e acadêmica. Naquele momento, parecia que as forças haviam se esgotado para seguir em frente. Entretanto, tanto a literatura como as diferentes leituras, às quais recorria como fontes de energia e de suporte, costumavam colocar-me diante de palavras propícias. Em um desses momentos, deparei-me com as palavras de São Paulo, em sua Carta aos Filipenses, quando remetem à imagem de um atleta que corre rumo ao pódio em busca de uma medalha de ouro: “esquecendo o que fica para trás, eu me lanço para o que está na frente” (FP 3,13). A mensagem de São Paulo me ajudou a compreender e a buscar forças para superar esse momento passado e a seguir em frente rumo ao futuro que eu havia projetado.

Mariana, ainda que muito jovem, 21 anos de idade, acreditava no valor da aprendizagem integral e abrangente, na qual o conhecimento pudesse ser pautado pelo caráter e pela relação amorosa. Expressava e realizava na prática muito do que acreditava fazer a diferença na construção de uma escola de sucesso. Para ela, ensinar e aprender eram duas faces da mesma moeda, troca e cumplicidade com o saber ser, o saber fazer e o saber conviver. Quando foi arrebatada do seu sonho de forma tão inesperada, a vida que se esvaiu parece ter levado também um pouco de mim, uma vez que ela, juntamente com a imagem do Tonico, havia inspirado meu sonho e parte da minha trajetória acadêmica. Mas a alegria com que viveu sua vida, embora relativamente curta, e seu ofício de professora se tornaram referenciais capazes de motivar-me, como pesquisadora, a resgatar o ânimo de levantar todos os dias e dar continuidade à pesquisa.

E foi assim, visitando as escolas, gerando dados, convivendo de perto com estudantes e professores das escolas, que pude perceber que o ideal

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e a utopia tão sonhados por Mariana não foram em vão. Foi possível observar e até sentir, em muitos momentos da pesquisa, que ainda existem professoras e professores que se identificam com sua profissão, que têm um desejo maior de fazer da escola em que atuam um campo fértil onde seja possível ensinar e apre(e)nder de forma significativa e transformadora.

A vida de Mariana e sua partida não foram em vão. Trouxeram e deixaram uma representação viva do significado de seu próprio nome. Maria,13 que significa serenidade, força vital e vontade de viver, e Ana,14 que remete a alguém que predispõe a criança a se tornar segura. Parece que incorporada e irrigada desse significado, Mariana dava tratamento diferente à educação. Suas ações, dedicadas desde mais jovem, ao trabalho voluntário com estudantes em situação de vulnerabilidade social, propagavam-se como o resultado de uma trindade educacional, composta pela equação “Amor = Atenção = Cuidado”. Essa equação encontra-se assim explicada em seus manuscritos deixados em um diário de classe,15 datado de 2008:

[...] para mim, essa relação que venho desenvolvendo com meus estudantes é uma mistura de amor que se transforma em atenção e que se apresenta como um cuidado. A cada dia percebo que este cuidado amoroso que estamos desenvolvendo em nossa classe vem transformando-a em um ambiente agradável e muito harmonioso.

Boff (2012) parece complementar Mariana (2008), quando diz que “sem o cuidado essencial, o encaixe do amor não ocorre, não se conserva, não se expande nem permite a consorciação entre os seres”. Às palavras de Boff e Mariana, imergindo de um modo ainda mais profundo na essência desse cuidado, agregam-se as de Maturana, citado por Boff, que nos esclarece: “o que é especialmente humano no amor não é o amor, mas o que fazemos no amor enquanto humanos [...] é a nossa maneira particular de viver juntos como seres sociais na linguagem [...] sem amor nós não somos seres sociais” (MATURANA apud BOFF, 2012, p. 127).

13 O significado do nome Maria. Disponível em: <http: //www.portalbrasil.net/nomes/m.htm>. 2012.

14 O significado do nome Ana: Disponível em: <http: //www.portalbrasil.net/nomes/m.htm>. 2012.

15 As transcrições de alguns trechos utilizados dos diários de classe da professora Mariana Evangelista Conrado Amaral (2008) foram autorizados pela família.

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Assim como acreditava Mariana, a educação, na atualidade, precisa ser repensada sob um novo prisma que esteja relacionado à afetividade entre seus atores, à moral, à ética e à formação cidadã. Nesse sentido, torna essencial se desvencilhar das amarras profissionais na área educacional, que engessam professores em suas certezas e verdades. São grandes os desafios que a escola precisa enfrentar. Sampaio (2004) diz que, ao evocar essa concepção de educação, a sociedade busca sincronizá-la com a educação em valores humanos. Essa concepção de educação, nas palavras do autor, torna-se o instrumento efetivo para a condução da conquista da paz e da liberdade criativa dos indivíduos que vivem em sociedade (p. 101). Ao assumir esse novo papel, a escola coloca-se diante da sociedade como agente de mudança, capaz de interferir no processo histórico de forma positiva.

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Capítulo 6

CONSOLIDANDO O CAMINHO DO MÉTODO: ASPECTOS GERAIS SOBRE OBJETO

E SUJEITOS DA PESQUISA

Partindo-se do pressuposto de que se tratava de um estudo que envolvia índices de desempenho (dimensão objetiva) e percepção dos integrantes do cotidiano das duas escolas acerca desse desempenho (dimensão subjetiva), tornou-se consequência natural a adoção das abordagens quantitativas e qualitativas de natureza descritivo-analítica. Assim, o primeiro passo para empreender o movimento metodológico foi estabelecer de que forma os dados seriam gerados. Por ampliar o foco de alcance dos aspectos que se pretendia investigar, dada a complexidade do caminho para se chegar aos objetivos estabelecidos, observou-se a necessidade de diversificar as fontes de geração de dados como uma estratégia de aproximação ao nível de profundidade almejada. Ficou constituído, assim, o conjunto de instrumentos que foram utilizados: a observação in loco, a análise documental, os questionários e as entrevistas semiestruturadas. De cada um desses instrumentos, procurou-se abstrair aspectos distintos, na perspectiva de ampliar as possibilidades de análise e atingir uma quantidade de elementos que pudesse representar a realidade de forma fidedigna. Para aplicá-los, entretanto, foi preciso delimitar o objeto de pesquisa a partir de alguns critérios que justificassem, de antemão, a escolha de duas entre as 640 escolas que compõem a rede de ensino do Distrito Federal. Em seguida, foram definidos os sujeitos, escolhidos entre os diferentes segmentos da comunidade intraescolar, de

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modo que pudessem responder à expectativa de abrangência quanto à análise dos dados. Essa foi a razão principal que levou a envolver gestor, professor e aluno, em cada uma das escolas.

Ao chegar o momento de escolher as escolas, percebeu-se a necessidade de buscar critérios mais pontuais, pois, dado o universo de escolas que compõe a rede do Distrito Federal, considerava-se imprescindível manter o critério de coerência e congruência teórico-epistemológica. Afinal, existia um corpus conceitual que motivara a realização do estudo e que se constituíra como aporte à linha de discussão que se pretendia desenvolver. Como resultado desse processo de reflexão, foi eleito como critério-nuclear o resultado do Ideb 2009, indicador de qualidade desenvolvido pelo MEC. Em que pesem as controvérsias e idiossincrasias que possam surgir toda vez que se faz referência a critérios de medida institucionais, sobretudo em nível governamental, esse indicador precisa ter seu lugar de credibilidade, uma vez que, atualmente, é o único meio oficialmente constituído de se estabelecer um parâmetro universal de comparação e, portanto, pode-se investi-lo de caráter de equidade. Descrevendo-o de modo sucinto, trata-se de um recurso de avaliação que compõe as metas do governo federal, para as quais combina a avaliação de desempenho em provas (proficiência) com dados de repetência e evasão (fluxo). Seu cálculo baseia-se nos dados de aprovação, apurados no censo escolar e nas médias de desempenho obtidas nas avaliações externas, no caso, a Prova Brasil. Julga-se importante trazer essas informações como um meio de corroborar o critério-núcleo de escolha, mais uma vez destacando-o como o único indicador oficial da educação básica no País.

Estabelecido o Ideb como ponto de partida para a decisão sobre o conjunto de critérios, escolheram-se 155 escolas entre as 640 (2º critério), uma vez que estas atenderam ao perfil de recorte para um dos grupos de sujeitos que foram investigados: estudantes do 9º ano do ensino fundamental. Situado o locus dos participantes, o estudo estabeleceu mais outros quatro critérios, desta vez, relacionados ao escopo da pesquisa. Estes, por sua vez, deveriam se conectar ao que a literatura define por escola eficaz. Assim sendo, na intenção de delimitar somente duas das 155 escolas como objetos de estudo, foram estabelecidos os demais critérios:

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3º critério) as 30 primeiras classificadas no Ideb de 2009, tendo participado das três edições mais recentes da Prova Brasil, em 2005, 2007 e 2009, reduzindo, assim, para 22 escolas; 4º critério) as escolas que estivessem localizadas em regiões de periferia, considerando uma distância superior a 20km do centro administrativo do Distrito Federal, reduzindo o universo de opções para 13 escolas; este quarto critério se vinculou aos aspectos da literatura de fundamentação do estudo; 5º critério) as escolas localizadas em Região Administrativa (RA) com renda per capita mensal inferior à média do DF (2,4 salários mínimos), restringindo o universo quantitativo para oito escolas; este critério ainda buscou convergir para a literatura, visando a aspectos desfavorecedores na dimensão socioeconômica; 6º) por fim, reduziu-se para seis escolas, selecionadas entre aquelas cuja meta de crescimento do Ideb (variação entre o projetado e o obtido em 2009) se mostrava superior à meta do Distrito Federal (15%).

Esgotados os fatores relativos ao escopo da pesquisa e alcançado um número considerado suficiente para a etapa final de seleção das escolas, nada mais havia a se considerar, senão o fator “disponibilidade”: este foi o 7º e último critério. Portanto, de posse dos dados de identificação das seis últimas escolas, procedeu-se ao convite formal para elas participarem da pesquisa, estabelecendo-se o contato diretamente com as equipes de direção de cada uma delas. Entre as seis, somente duas demonstraram interesse, abertura e disponibilidade, encerrando-se, assim, o processo de seleção do objeto de estudo. Depois de alcançada essa etapa final, o objeto ficou assim estabelecido: duas escolas que atendem ao 9º ano do ensino fundamental, as quais apresentaram proficiência superior à meta do Distrito Federal, entre as 30 primeiras, conforme resultado do Ideb 2009, tendo participado por três anos consecutivos das edições mais recentes da Prova Brasil; estão localizadas em diferentes regiões administrativas da periferia do Distrito Federal, com renda per capita inferior a 2,4 salários mínimos (SM).

Considerando o processo complexo de decisão para se alcançar a delimitação do objeto descrito, visto que pertencia a um universo amplo de opções, criou-se, em forma de diagrama, a síntese das etapas desse processo, optando-se por dar prioridade à representação da dimensão numérica

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dos critérios. Diagramas são recursos utilizados para expressar por meio da imagem, a organização final de determinado processo evolutivo. Os diagramas se constituem elementos importantes no processo final de dada organização e expõem um modo de representação esquemática de “dados” na forma, ao mesmo tempo, abstrata e lógica. Assim, permitem visualizar com maior clareza a relação entre valores estabelecidos e, por consequência, ampliam a compreensão sobre a informação construída. Além disso, remetem, muitas vezes, a uma imagem fractal, porque traduzem a ideia de encadeamento, interatividade e ausência de elementos hierarquicamente dominantes (SERRA; KARAS, 1997).

No caso da pesquisa realizada, pretendeu-se demonstrar, no movimento de escolha, a inserção das duas escolas em todos os critérios, evoluindo gradativamente até se distanciarem das demais, estabelecendo seu diferencial para se constituir objeto de estudo. O Diagrama 1, a seguir, foi elaborado, portanto, de modo a expressar a complexidade do processo de escolha, uma vez que ocorreu integrando estratégias de inclusão e de exclusão, na tentativa de reduzir 155 escolas para duas, baseando-se em critérios de consistência metodológica.

ESCOLAS PÚBLICAS DO DF COM 9º ANO

PRIMEIRO CRITÉRIO 155 escolas

CLASSIFICAÇÃO NO IDEB DF/2009

SEGUNDO CRITÉRIO 1ª a 30ª

PARTICIPAÇÃO NA PROVA BRASIL – 2005, 2007 E 2009

TERCEIRO CRITÉRIO 22 escolas

ESCOLAS SITUADAS EM RAS COM DISTÂNCIA SUPERIOR A 20 KM DO CENTRO DO DF

QUARTO CRITÉRIO 13 escolas

ESCOLAS LOCALIZADAS EM RA COM RENDA PER CAPITA INFERIOR À MÉDIA DO DF (2,4 SM)

QUINTO CRITÉRIO 8 escolas

ESCOLA COM A META DE CRESCIMENTO ACIMA DO IDEB/DF (2009) – 15%

SEXTO CRITÉRIO 6 escolas

DISPONIBILIDADE PARA PARTICIPAR DA PESQUISA

SÉTIMO CRITÉRIO 2 escolas

Diagrama 1 – Critérios de inclusão/exclusão das escolas

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Demarcado o objeto de estudo, a etapa seguinte foi dar-lhe um nome para que fosse identificado nos diversos momentos de análise e discussão dos dados. No entanto, por se tratar de uma das exigências da pesquisa acadêmica, foi imprescindível manter o sigilo sobre o reconhecimento das escolas como objetos de pesquisa, justificando-se, assim, a necessidade de estabelecer pseudônimos. Por conseguinte, muito mais do que atribuir-lhes meros símbolos de denominação, houve a necessidade de que esses nomes conferissem uma identidade às escolas selecionadas, de modo que fizessem sentido no escopo da pesquisa e que fossem coerentes com sua motivação, embora se estivesse fazendo uso de nomes fictícios. Por essa razão, considerando a trajetória da autora da pesquisa, entendeu-se não ser coerente atribuir um símbolo qualquer, destituído de significado, a espaços de investigação escolhidos de forma tão especial, dentro dos quais foram vivenciados momentos intensos de interação entre pesquisadora e sujeitos da pesquisa. Assim, desencadeou-se um novo processo decisório, ao fim do qual as escolas passaram a denominar-se Escola Maria (para a que se encontra localizada na parte norte do Distrito Federal) e Escola Ana (situada na parte oeste). A fim de esclarecer o significado afetivo dessa denominação, tomou-se a liberdade de abrir um quarto parêntese para um breve relato do que motivou a escolha dos nomes das escolas.

Escola Maria e Escola Ana: implicações de uma história pessoal

As escolas Maria e Ana foram assim nomeadas em homenagem a Mariana, ente citado anteriormente. O significado desse nome sintetiza a trajetória de uma jovem professora mineira com quem a pesquisadora conviveu de forma intensa e por tempo suficiente para compreender a dimensão de seus sonhos e o envolvimento necessário de sua dimensão humana e profissional na educação e na formação do indivíduo. Mais do que um nome que identifica uma pessoa igualmente especial, Mariana representa um caminho determinado por princípios e valores que influenciam diretamente a vida daqueles que entram em contato com esse caminho.

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Ao transpor esse conceito para a educação, percebi um espaço que começava a ressignificar-se. Vislumbrava uma escola como espaço transformador, impregnado de sentido, cuja função social revelava-se por meio de uma educação que agrega valores e apresenta novas possibilidades para o sistema, para a sociedade e para os indivíduos que os habitam. Mariana, nesse sentido, não representa apenas o ponto de partida. Mais do que isso, representa o caminho a ser trilhado e o ponto de chegada que almejei alcançar na fronteira desse trajeto. Esse ponto, que é de chegada, mas não implica o fim de uma jornada, se traduz na dinâmica implícita que, do lugar de pesquisadora, consegui apreender no ambiente das duas escolas investigadas.

O fato de esse ambiente remeter de forma espontânea à trajetória de Mariana não se deu por acaso. Certamente, tornou-se algo impulsionado pela percepção de que essas escolas pareciam impregnadas da alegria, do vigor, do entusiasmo e da esperança, do respeito, da identidade e de outros valores humanos refletidos na vida profissional e pessoal de Mariana. Assim como fazia para ela, essas escolas faziam sentido na vida daqueles estudantes e professores e, por essa razão, foram capazes de apontar novas perspectivas dentro do contexto do desafio a que me propus superar e, para o qual, precisava resgatar as forças necessárias para prosseguir. Assim, a reflexão que me impulsionou para frente também se fez presente nesse episódio pessoal. É possível que algum dos valores apreendidos da história da Mariana constituísse um diferencial para que essas instituições, finalizadas as etapas de análise e de discussão dos dados, fossem caracterizadas como escolas eficazes, transcendendo o que a literatura trata como conceito.

Fechando o parêntese, retomo o rito do “caminho do método”, em sua estrutura mais formal. Para registro, segue uma espécie de sinopse dos instrumentos utilizados no estudo, para clarificar a estratégia de delimitação e de aplicação dos passos procedimentais na busca de resposta aos objetivos.

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Escolha dos participantes e descrição dos instrumentos utilizados

Uma vez delimitado o objeto de pesquisa e a identidade que lhe foi atribuída, as duas escolas passam a ser tratadas por “Escola Maria” e “Escola Ana”, para referir-se às escolas de Planaltina e Samambaia, respectivamente. No passo seguinte, procedeu-se à escolha daqueles que se submeteriam à aplicação dos instrumentos. Com base na técnica de amostra intencional, os sujeitos da pesquisa foram compostos pela equipe gestora de cada escola (diretor, vice-diretor, coordenadores, supervisor administrativo e pedagógico), pelos professores e pelos estudantes das turmas do 9º ano. Na sequência, foram organizados, conforme citado, quatro instrumentos de geração de dados: observação in loco, análise documental, questionário e entrevista semiestruturada.

Da observação in loco, pretendeu-se obter uma visão do cotidiano das escolas, buscando informações relacionadas com o estado de conservação do prédio e as adequações realizadas nas instalações físicas, além de verificar aspectos como “liderança administrativa” e “liderança pedagógica” da equipe gestora. A observação in loco consistiu em uma técnica que envolveu a pesquisadora no cotidiano das duas escolas, possibilitando-lhe agregar os dados e apreender aspectos importantes relativos ao espaço físico e humano. Além disso, a observação auxiliou na compreensão e na descrição da dinâmica das atividades realizadas em cada contexto, o que permitiu a complementação dos dados, ampliando e enriquecendo as possibilidades de análise. A observação in loco ocorreu entre outubro de 2011 e março de 2012. Nesse período, a pesquisadora teve acesso a eventos e reuniões realizados pelas escolas, para os quais solicitou autorização e foi prontamente atendida. Os dados gerados nessas ocasiões foram complementados com registros pessoais em um caderno denominado “diário de bordo”. Vale explicar que por intermédio desse instrumento a pesquisadora não exerceu nenhuma interferência no local pesquisado. Tão somente registrou as observações tal como as recebeu ou percebeu, atendendo, com esse procedimento, ao pensamento de Jung (2003), que diz que a observação em campo possibilita ao pesquisador entender o como e o porquê do cenário da pesquisa.

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Da análise documental, o objetivo foi obter dados de determinados itens de análise, os quais não poderiam ser alcançados por meio da observação in loco, entre os quais, a verificação de um projeto pedagógico e a validação de sua aplicação aos conteúdos desenvolvidos pelos professores. As informações que subsidiaram a análise foram geradas por meio da consulta de documentos reservados de cada uma das escolas, como, por exemplo, a proposta pedagógica, o planejamento dos professores, os projetos educativos desenvolvidos nas escolas, entre outros. Tais documentos representaram uma fonte natural de informação, auxiliando na busca de evidências que fundamentassem as afirmações e as declarações da pesquisadora no decurso de toda a pesquisa, originadas a partir das questões que a motivaram (LÜDKE; ANDRÉ, 1986). Uma vantagem dessa técnica foi ter permitido a aquisição de dados nos momentos em que não foi possível ter acesso direto aos sujeitos.

Com a aplicação dos questionários, foi possível descrever elementos que caracterizaram aspectos da prática pedagógica dos professores e que levaram as escolas a serem consideradas escolas eficazes. Permitiu também ampliar o quantitativo de sujeitos abordados, na medida em que se tornou possível aplicá-los a número expressivo de sujeitos. Por essa razão, concorda-se com Günther (2003), quando diz que os questionários são o principal instrumento para o levantamento de dados por amostragem, ou survey, sendo capaz, ainda, de assegurar melhor representatividade, possibilitando a elaboração de generalizações para uma população mais ampla, quando for o caso. Ao mesmo tempo, foi preciso averiguar em que medida o envolvimento dos professores, dos estudantes e da equipe gestora contribuiu para o processo de construção de práticas eficazes em ambas as escolas pesquisadas.

Para se chegar a essa extensão dos dados, foram elaborados três tipos de questionários, destinados a públicos distintos: estudantes, professores e equipe gestora. Estes foram os sujeitos qualificados por Gray (2004) como aquelas pessoas que são convidadas a responder a um conjunto de perguntas seguindo uma ordem predeterminada, embora, contrariando um pouco o autor, os questionários, neste caso, apresentaram questões específicas de cada grupo, para atender ao contexto da pesquisa. Parasuraman (1991)

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corrobora os procedimentos adotados, quando considera o questionário um instrumento especialmente apreciado pelo ramo das ciências sociais.

É válido enfatizar que, no caso da investigação que se realizou, o questionário ofereceu à pesquisadora a vantagem de ter maior acessibilidade às informações mais pontuais, em maior número de questões, favorecendo a agilidade na entrada de dados e a rápida codificação das perguntas, tendo em vista o intenso movimento que ocorre no cotidiano escolar e o excesso de atividades, especialmente dos professores e gestores (GOMÉZ; ROQUET, 2004; GÜNTHER, 2003; VIEIRA, 2009). Outro ponto de adequação observado nesse instrumento consistiu em sua característica de integrar diferentes acepções epistemológicas. Prova disso foi a visão de que, ao mesmo tempo em que é defendido numa acepção quantitativa, o questionário adquire um caráter sutil de subjetividade, quando utilizado para gerar informações de pessoas acerca de suas ideias, sentimentos, planos, crenças, adquirindo informações também acerca de sua origem social, educacional ou econômica, visão que, de forma mais abrangente, convergiu para o contexto pesquisado.

Um fato a destacar na aplicação dos questionários foi a convergência para o pensamento de Gillham (2000), porém levando a contestar sua afirmação no que concerne aos cuidados com a quantidade de questões. Para o autor, a extensão do questionário pode afetar seriamente a taxa de retorno, se demasiado longo. Na tentativa de antecipar prováveis problemas nesse sentido, aplicou-se um pré-teste com os questionários distintos (equipe gestora, estudantes e professores), escolhidos aleatoriamente, em uma escola com características semelhantes às escolas selecionadas para a pesquisa. Além da finalidade de complementar com algumas questões não vislumbradas a priori, ou antecipar dúvidas que pudessem surgir durante a aplicação do questionário em sua versão final, a pesquisadora cronometrou o tempo gasto para respondê-lo. Observou que não houve questionamentos explícitos dos respondentes quanto à extensão dos questionários, porém, considerando o cotidiano da escola, concluiu que, de acordo com o tempo gasto, em média 10 minutos, justamente no questionário dos professores, a pesquisadora intuiu que esse tempo pudesse ser demasiado longo e viesse de fato a prejudicar a taxa de retorno. Como as escolas disponibilizaram

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um espaço destinado à coordenação pedagógica, para que os professores pudessem responder aos questionários, a pesquisadora decidiu permanecer junto ao grupo, incentivando-o e aguardando o retorno deles. Assim, dos 60 questionários distribuídos nas duas escolas, conseguiu o retorno de 54, ou seja, embora considerado demasiadamente extenso, sua estratégia fez com que a taxa de retorno alcançasse o número expressivo de 90% de questionários respondidos, contrariando a visão de Gillham (2000).

Por fim, as entrevistas, instrumento por meio do qual se procurou obter alguns dados que não foram possíveis de ser observados nos outros instrumentos aplicados, entre eles, o clima que prevalece no ambiente da escola. Sentiu-se a necessidade de identificar, principalmente, no discurso da liderança pedagógica, neste caso, diretor e professores, elementos que corroborassem a provável existência de um ambiente que vinha contribuindo para o êxito na aprendizagem escolar. Além disso, havia dados não perceptíveis por intermédio da observação. Era preciso que fossem verbalizados. Por essa razão, julgou-se interessante conhecer a opinião dos sujeitos diretamente envolvidos (diretor e professor), supostamente responsáveis pela promoção dessa dinâmica favorável no ambiente observado.

No tocante a esses dois grupos, entrevistou-se a diretora de cada uma das escolas e seis professores de áreas distintas do conhecimento, três de cada escola, sendo um de Códigos e Linguagens, um de Ciências da Natureza e Matemática e um de Ciências Humanas. Um segundo critério de recorte adotado foi selecionar professores que atuassem na escola pelo tempo mínimo de cinco anos. A intenção desse critério foi abstrair aspectos subjetivos no que se refere à participação do professor em propiciar um clima favorável naqueles ambientes e se essa participação foi um fator que contribuiu para o êxito da escola no Ideb.

Sobre a entrevista, notou-se que, embora ainda desperte certo posicionamento cético na esfera acadêmica e científica, trouxe a possibilidade de se perceber com mais clareza a subjetividade implícita nos dados, sobretudo quanto à questão exposta no parágrafo anterior. Na mesma direção, autores como Arksey e Knight (1999), citados em Gray (2004), concordam que o ato de entrevistar é capaz de tornar explícito

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o que, aparentemente, estiver implícito em determinado momento da pesquisa. Essa foi a razão pela qual a pesquisadora entendeu que o instrumento era um recurso para apreender o ambiente escolar, sua real dinâmica, já que a oportunidade de estar face a face com o diretor e o professor possibilitaria amenizar o caráter subjetivo que é atribuído à observação in loco e ao questionário. Assim, caso conseguisse articular pessoalmente essas questões, poderia fazer emergir aquilo que, porventura, estivesse subentendido: percepções, sentimentos, entendimentos e visões, conforme ocorreu. Nesse caso, concordou-se com Duarte (2004), pois a entrevista se tornou um instrumento privilegiado na dimensão qualitativa do estudo realizado, uma vez que preencheu lacunas deixadas pelos outros instrumentos utilizados.

Vale registrar uma intercorrência importante nesse processo de geração de dados: a greve de professores das escolas públicas do Distrito Federal, deflagrada em 12 de março de 2012. Em que pesem as dificuldades pertinentes ao episódio, a pesquisadora conseguiu concluir, com êxito, a aplicação das entrevistas. Três dos seis professores que participariam da entrevista haviam aderido à greve; no entanto, decidiram atender prontamente à solicitação da pesquisadora. A entrevista (P1: EA), portanto, ocorreu fora do ambiente da escola, logo depois do término da aula. Ao contrário, as demais entrevistas ocorreram nas respectivas escolas.

Quanto ao roteiro da entrevista, as perguntas foram elaboradas a priori e testadas em uma escola escolhida de forma aleatória, como um recurso de validação dos instrumentos da pesquisa. Apesar de o roteiro ter sido preestabelecido, a abordagem dos sujeitos correspondeu ao critério de liberdade e flexibilidade, pois, atendendo ao pensamento de Gray (2004), estas se constituem alternativas mais produtivas, uma vez que permitem lançar mão de questões elaboradas apenas como um aide-mémoire, ou seja, com um recurso consistente de lembrança das questões que não podem ser esquecidas pelo pesquisador.

Considerou-se que tanto a aplicação como a taxa de retorno dos instrumentos podem ser avaliadas como um procedimento bem-sucedido nas duas escolas devido ambas terem sido visitadas pela pesquisadora durante um período relativamente longo (outubro de 2011 a março de

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2012), com frequência semanal, na tentativa de gerar o maior número de informações possível. O tempo de visita variou conforme a disponibilidade da rotina escolar, chegando a se estender por até um dia em cada escola, durante determinado período. Desse modo, foi possível observar de forma mais frequente e com maior proximidade as relações interpessoais entre os próprios professores e entre professores e estudantes, bem como favoreceu a participação em algumas aulas e reuniões pedagógicas.

Entende-se que essa imersão natural no ambiente e no cotidiano das duas escolas desenvolveu uma relação amistosa entre pesquisadora e sujeitos da pesquisa, chegando a construir, na prática, a ponte necessária entre a academia e a busca do conhecimento. Esse episódio ampliou as possibilidades de legitimação quanto à finalidade da construção de teorias. Em um trecho de uma das entrevistas, fica evidente essa percepção, quando a professora 3 (P3: EM), diz: “Você já faz parte desta escola, você soube respeitar cada um aqui, e os professores se sentiram à vontade para participar da sua pesquisa e também os estudantes”.

Visando à padronização dos dados coletados nas escolas, foram determinados, tanto na observação, quanto na análise documental, nos questionários e nas entrevistas, parâmetros e limites comuns de ambas as escolas. Todavia, essa padronização não impediu que a pesquisadora, quando percebesse a necessidade, voltasse seus olhos para outros espaços ou elementos que não estavam previamente definidos nos roteiros das observações, da análise documental e das entrevistas, principalmente, a natural especificidade de cada escola.

No Diagrama 2, apresenta-se o caminho percorrido pelo método de pesquisa e como eles foram organizados para melhor compreensão dos dados gerados.

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ESTUDO DE CASO

ANÁLISE DOCUMENTAL

ANÁLISE QUANTITATIVA:Microsoft Of ce Excel 2007,fi

Teste Qui quadrado(Statistical Analysis

(Software SAS), versão 9.2)e Escala Likert

ANÁLISE QUANTITATIVA:Análise de Conteúdo

(Bardin e Foucault) e :DSCquestão aberta dos

áquestion rios dos estudantes(Lef vre e Lef vre)è è

QUES ONÁRIOTIEQUIPE GESTORA

QUESTIONÁRIOPROFESSORES

QUESTIONÁRIOALUNO

ENTREVISTASDIRETORA E

PROFESSORES

QUESTÃO ABERTADO IQUESTIONÁR ODOS ESTUDANTES

OBSERVAÇÃO IN LOCO

Diagrama 2 – Caminho metodológico para a organização e geração dos dados

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Capítulo 7

ESCOLA MARIA: O ESTUDO DE CASO CONSOLIDADO

A finalidade dos tópicos que compõem este capítulo é percorrer o caminho de resposta a cada uma das questões que motivaram a realização da pesquisa e respectivos objetivos. Esse caminho foi desenvolvido em passos distintos, estratégia que possibilitou avançar na identificação e na organização dos elementos necessários ao delineamento das considerações finais, de forma gradativa e devidamente encadeada. Define-se o conteúdo do capítulo como a apresentação do estudo de caso propriamente dito, no que se refere à tarefa de levar a conhecer cada uma das escolas, objetos de estudo, desde sua caracterização. O intuito foi trazer, como possível diferencial, a interconexão entre aspectos de conjuntura, perfil, dados gerados, analisados e discutidos e aspectos da literatura, aplicados ao contexto de cada escola, em particular, para que, em seguida, as percepções levantadas culminassem na discussão conjunta, envolvendo as escolas, com todos esses elementos em relação. Essa estratégia foi motivada pela percepção de que os fatores de eficácia não ocorreram, nessas escolas, de forma fragmentada, isolados entre si, e, sim, constituíram-se a partir de uma teia de inter-relações, em que nem um e nem outro agiu por si só, mas que ambos de consubstanciaram mutuamente. A relação mútua e interconectada entre dimensão humana, social e educacional é que pode ter influenciado a proficiência das escolas investigadas, apesar do contexto adverso ao qual estavam submetidas, sobressaindo-se entre tantas que gozam das mesmas condições.

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Visando desenvolver o capítulo nessa linha de discussão, descreveu-se, primeiramente, a Escola Maria, integrando, em seu contexto, aspectos de identificação e de caracterização como objetos de estudo, de forma particularizada. Em seguida, foram apresentados os procedimentos de análise e de discussão dos dados gerados.

Aspectos da conjuntura local

A Escola Maria localiza-se a 38km do centro do Distrito Federal, em Planaltina, VI Região Administrativa do Distrito Federal. Planaltina é a cidade mais antiga do Distrito Federal, fundada em 1859 e, de acordo com Pesquisa Distrital de Amostra de Domicílios (PDAD/2010), tem uma população em torno de 160 mil habitantes. A Figura 1 ilustra o deslocamento da pesquisadora até a escola onde foram registradas em seu diário de bordo as anotações que subsidiaram as análises dos dados gerados pela pesquisa.

Figura 1 – Trajeto Brasília-Planaltina – Mapa do Distrito FederalFonte: <http: //www.brasil-turismo.com/distrito-federal/mapa-regioes.

htm&docid=SQEMFmTEQABg0M&imgurl>. 2012.

Em relação ao número de instituições de ensino vinculadas à Secretaria de Estado de Educação do Distrito Federal (SEE/DF), Planaltina conta com 64 escolas públicas. Destas, 42 estão localizadas na área urbana e

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22 na área rural. Dados da PDAD (2010) mostram que 31,8% da população de Planaltina são estudantes e que, destes, a maioria (85,2%) estuda em escolas públicas.

A Escola Maria está localizada na área urbana e, atualmente, atende em torno de 1.100 estudantes distribuídos nas modalidades de Ensino Fundamental (Anos Iniciais e Finais) e Educação de Jovens e Adultos (EJA) – 1º e 2º Segmentos, no período noturno. Nas proximidades da escola há um posto policial, igrejas, comércio local e uma via pública movimentada.

Quanto à sua estrutura física, o prédio possui 16 salas de aulas, duas salas de recursos (multifuncionais), sala de informática com mais de 30 computadores com acesso à internet (nesta parte, a instalação elétrica está sendo ampliada), sala de professores, biblioteca, cabana literária, espaço de descanso para servidores, espaço para área administrativa (sala da direção e sala das coordenadoras), biblioteca, secretaria e banheiros adaptados para atendimento aos estudantes com necessidades educacionais especiais (ANEE’s). Na área externa conta, ainda, com pátio coberto, quadra de esportes e parque infantil. A escola é toda murada, sobressaindo-se pela organização e limpeza do espaço físico.

No que concerne aos recursos humanos, a unidade de ensino contava, em 2011-2012, período de realização da pesquisa, com 60 professores, incluindo coordenadoras e professores que trabalham na equipe gestora; uma orientadora educacional; uma pedagoga e quatros monitores. Atuando em setores administrativos, como secretaria, vigilância, portaria e limpeza, a escola conta com 24 funcionários.

Aspectos do contexto intraescolar: perfil da comunidade

Antes de descrever aspectos do perfil da equipe da Escola Maria, cabe informar da mudança na gestão ocorrida no fim do ano que antecedeu o acesso inicial da pesquisadora à escola (2010). Julga-se pertinente mencionar esse episódio, pois o processo de transição pelo qual a equipe passou, nesse caso, com a pesquisa em curso, trouxe algumas implicações para o perfil investigado da equipe atual e para as práticas da escola, de

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um modo geral. Tais implicações foram discutidas no capítulo que trata dos resultados parciais da Escola Maria.

Informa-se, portanto, que, antes da direção atual, a Escola Maria con tava com uma equipe gestora que exercia essa função havia oito anos, mandato assumido desde o fim de 2002. Essa equipe era composta por um diretor, uma vice-diretora e dois assistentes. Em 2008, a atual diretora passou a compor a nova equipe gestora, assumindo a função de vice-diretora da unidade escolar. A equipe cumpriu, até dezembro de 2010, dois períodos de gestão, conforme legislação vigente. A partir de 1º de janeiro de 2011, a direção da Escola Maria passou a ser conduzida pela vice-diretora que, dessa vez, assumiu o cargo de diretora.

Retomando a descrição do perfil de qualificação da equipe gestora atual, os dados revelaram que duas das seis participantes possuem curso superior em Pedagogia e as demais gestoras possuem curso superior em outras licenciaturas. Todas possuem pós-graduação lato sensu (com mínimo de 360 horas) como a mais alta titulação. Em relação aos 25 professores, inquiridos sobre sua graduação, 14 (56%) informaram possuir curso superior em licenciatura, sete (28%) disseram ser formados em Pedagogia, dois (8%) são formados em outros cursos e dois (8%) não responderam à questão. Do total apenas um professor informou ter realizado o curso superior na forma semipresencial, sendo que todos os outros afirmaram tê-lo feito na forma presencial. Os dados mostram um número significativo de professores que possuem pós-graduação lato sensu (80%) e dois professores (8%) têm somente cursos de atualização de no mínimo 180 horas.

A maioria dos membros da equipe gestora (83,3%) só exerce atividades na SEE/DF, sendo que um dos integrantes não respondeu à questão (16,7%). Em relação ao tempo de profissão na área da educação, duas gestoras (33,3%) trabalham na área entre onze e quinze anos e as quatro demais (66,7%) trabalham na educação há mais de quinze anos. Em relação à carga horária de trabalho na escola, as gestoras apresentaram respostas bem distintas: duas (33,3%) alegaram trabalhar 40 horas semanais, duas (33,3%) não responderam à questão e outras duas gestoras (33,3%) afirmaram que trabalham mais de 40 horas semanais.

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Quanto a essa relação anos versus horas dedicadas ao trabalho, autores como Tardif e Raymond (2000) afirmam que o tempo de trabalho na profissão não é, definitivamente, um meio, no sentido de um “meio marinho” ou “aéreo”, remetendo aos meios de transporte, ou seja, nesse ambiente estão imersos o trabalho, o trabalhador e seus saberes. Igualmente, não se trata apenas de um dado quantitativamente caracterizado, por exemplo, pela mera duração administrativa das horas ou dos anos de trabalho. Ao contrário, significa um dado carregado de subjetividade, no sentido de que contribui poderosamente para modelar a identidade do trabalhador. A explicação de Tardif e Raymond revela um traço singular observado na relação entre os professores e o ambiente escolar em ambas as escolas, contribuindo com um elemento em potencial para a organização das conclusões nas respostas à questão principal. Trazido para o âmbito do estudo, esse traço explica um fator preponderante para o desenvolvimento de um processo íntimo, afetuoso e complexo de identificação dos professores com a profissão docente.

Quanto às questões de gênero e faixa etária, os dados mostram que dos 25 professores da Escola Maria que participaram da pesquisa, 23 são mulheres e dois são homens. Dois (8%) informaram ter idade entre 50 e 55 anos. A maioria dos entrevistados, 14 professores, os quais representam 56,0% do total, informou ter idade entre 40 e 49 anos. Sete professores tem idade entre 30 e 39 anos (28%) e dois (8%) têm entre 25 e 29 anos.

Sobre o perfil dos estudantes, de 92 entrevistados, 40 são do sexo masculino e 52 do sexo feminino. Sete têm 13 anos de idade, 46 possuem 14 anos, 25 têm 15 anos e 14 disseram ter 16 anos ou mais. Quanto ao nível de escolaridade de seus pais e/ou responsáveis, a maioria dos estudantes, 37 entrevistados, totalizando 40,2%, respondeu que os pais possuíam o ensino médio. Alguns estudantes informaram os níveis de escolaridade da mãe e do pai. Nesse caso, optou-se por considerar como resposta o nível de escolaridade da mãe, conforme Gráfico 2, apresentado a seguir.

128

Gráfico 2 – Dados de escolaridade das mães dos estudantes da Escola Maria

Entre os resultados do Gráfico 2, destaca-se uma ocorrência em relação à definição dos níveis de escolaridade dos pais dos estudantes. Enquanto a Codeplan/DF (2012), órgão oficial, informa que somente 19,2% da população que reside no local da Escola Maria declararam ter concluído o ensino médio, a diretora da escola afirma “que não sabe dizer se a maioria da comunidade concluiu o ensino médio”. No entanto, nos questionários dos estudantes, esses dados foram revelados, descrevendo uma realidade diferente da que foi descrita tanto pela diretora quanto pelos dados da Codeplan/DF. A resposta dos estudantes mostrou que 40,2% dos pais (ou mães, quando não declarado o pai) têm o ensino médio concluído.

Contexto de aplicação dos instrumentos e dos critérios de análise na Escola Maria

Com a observação in loco, foi possível perceber a comunidade da escola como participativa e envolvida nas atividades escolares. Por essa razão, a participação se constitui um dos fatores que se discutiram no

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estudo como favorecedor do sucesso escolar. Gadotti (2000) compõe o quadro de autores que concordam que quando uma “organização formal compõe-se de indivíduos que estão juntos para atingir objetivos previamente definidos, estes se tornam os objetivos da organização” (p. 25). Nessa direção, as palavras de Lück (2002) também lançam luz sobre a questão, quando a autora afirma que uma gestão que se pauta pela participação alcança, em decorrência, a criação de um ambiente favorável à aprendizagem. Assim, a participação ganha ênfase como um dos elementos de sucesso no desempenho dos estudantes. Da participação emerge, ainda, a manifestação dos diferentes talentos, cuja valorização faz com que todos incorporem seu papel na organização, assumindo responsabilidades coletivas, como um ganho partilhado entre todos e cada um.

Um quadro em que se descreve a missão da escola está exposto no pátio coberto da Escola Maria, de fácil acesso, para que todos possam conhecê-la. No texto, merece destaque a citação de que o “papel da escola é o de contribuir para a formação integral dos indivíduos, a fim de que se tornem cidadãos críticos, criativos, conscientes e preparados para o exercício da vida profissional”. Trechos das entrevistas expressam essa confiança na proposta que a escola oferece à comunidade. Isso pode ser constatado tanto na fala da direção, como do corpo docente, respectivamente: “temos muito alunos que moram longe, mas preferem estudar nesta escola, porque gostam e confiam no trabalho desenvolvido pela equipe escolar” (D: EM); “acredito na educação que forma cidadãos, que muda e promove mudança na vida do aluno” (P2: EM). As vozes das entrevistadas convergem de modo particular, revelando elementos que aprovam a confiabilidade e a força com que esse discurso, transcrito na dimensão textual, se torna vivo e ecoa no imaginário daquele coletivo.

Foi também possível observar uma escola bem organizada em sua estrutura física, aspecto visivelmente expresso na limpeza e na conservação dos ambientes escolares, nas salas de aulas arejadas, nos projetos em movimento por todos os espaços e momentos daquele cotidiano. O cuidado e o zelo pelo bem-estar dos que ali convivem são valores que se materializam em cada ambiente que se visita, cujo efeito se confirma no acolhimento e na disponibilidade transmitidos.

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A dinamicidade que se observa agindo positivamente no setor administrativo também ocorre na área pedagógica, no que se refere aos projetos que estavam sendo desenvolvidos por ocasião das visitas ao campo. Projetos como o que acontece no local, pertinentemente chamado de Cabana Literária, parecem ser recursos importantes no incremento dos processos de aprendizagem da leitura. Também foi possível notar a alegria dos estudantes nas aulas de educação ambiental e o entusiasmo deles quando eram conduzidos até a horta escolar. A pesquisadora participou de alguns momentos de planejamento coletivo da escola, entre eles, a coordenação dos professores e os preparativos da Remix Fest, evento que ocorre todo final de ano. Ressalte-se também a oportunidade de a pesquisadora participar e acompanhar a aplicação da Prova Brasil, que ocorreu em novembro do ano de 2011.

Nesse contexto de aplicação da avaliação externa, chama-se a atenção para o fato de que a Escola Maria, na edição de 2009 da Prova Brasil (Língua Portuguesa), apresentou uma discreta queda em seu desempenho, se comparado às notas do Distrito Federal. Nota-se um paradoxo, na medida em que, nas edições anteriores de 2005 e 2007, a escola vinha apresentando notas acima da média do Distrito Federal. Considerando que o desempenho das duas escolas em avaliações externas foi um dos pontos centrais do estudo, julgou-se válido trazer os gráficos que se seguem, situando a Escola Maria no Distrito Federal em relação às notas obtidas nas três edições (2005, 2007 e 2009) da Prova Brasil. Cabe informar que a escala de proficiência da disciplina Língua Portuguesa varia do nível 125 ao nível 325.

O Gráfico 3 demonstra que a escola obteve 233,35, 237,41 e 230,22, enquanto o Distrito Federal alcançou 232,40, 236,87 e 242,87. Observa-se um discreto declínio em 2009, embora tenha superado, também de forma relativamente discreta, a nota do Distrito Federal nos dois anos anteriores.

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Gráfico 3 – Desempenho da Escola Maria na Prova Brasil – Língua PortuguesaFonte: <http: //www.portalideb.com.br/#{“municipio_id”: “5300108”,”rede”: “estadual”,”serie”: “8”,”-visao”:

“proficiencia”,”aba”: “escola”}>. 2012.

Na avaliação de Matemática, na edição de 2009, conforme Gráfico 4, a escola repetiu a performance apresentando uma nota menor, se comparada ao Distrito Federal. Diferente da prova de Língua Portuguesa, tal ocorrência já havia sido observada na edição da prova em 2007. As notas do Distrito Federal nessa avaliação foram 249,10, 250,70 e 249,70, e as da Escola Maria foram 249,82, 245,84 e 244,94, nas sucessivas edições (2005, 2007 e 2009). Para fins de esclarecimento, a escala de proficiência de Matemática varia de 125 a 350.

Gráfico 4 – Desempenho da Escola Maria na Prova Brasil – MatemáticaFonte: <http: //www.portalideb.com.br/#{“municipio_jid”: “5300108”,”rede”: “estadual”,”serie”: “8”, “visao”:

“proficiencia”, “aba”: “escola”}>. 2012.

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Com relação ao Ideb, a Escola Maria apresentou aumento no índice em 2009 (4,4), em relação aos índices de 2005 (3,5) e 2007 (3,5). Os resultados do Distrito Federal em 2005, 2007 e 2009 foram, respectivamente, 3,2; 3,5; 3,9. Esses resultados denotam claramente que a escola, além de superar a si própria, superou também os índices do Distrito Federal. Para efeito de cálculo do Ideb, são considerados o fluxo escolar e a proficiência dos estudantes nas avaliações da Prova Brasil. Quanto ao fluxo, que é o ritmo de progressão dos estudantes ao longo das séries, calculado pela taxa de aprovação, variando de 0 a 1,16 a Escola Maria apresentou em 2009 o valor de 0,96, o que é considerado adequado. Em relação à proficiência, que indica o aprendizado do aluno construído pelos resultados na Prova Brasil de Língua Portuguesa e Matemática e varia de 0 a 10,17 a Escola Maria obteve a nota 4,59, alcançando o que pode ser chamado de proficiência razoável. O Gráfico 5 torna visível esse movimento de ascensão da Escola Maria.

Gráfico 5 – Evolução do Ideb da Escola MariaFonte: <http: //www.portalideb.com.br/#{“municipio_id”: “5300108”,”rede”: “estadual”, “serie”: “8”, “– visao”:

“proficiencia”, “aba”: “plano”}>

Diante dos dados gerados, expressos no Gráfico 4, não há como ignorar a percepção de uma contradição, a qual foi batizada, pela pesquisadora, de

16 O Ideb particularizou a seguinte escala em relação ao fluxo: 0 a 0,74 (baixo), 0,75 a 0,94 (razoável) e 0,95 a 1 (adequado).

17 O Ideb considerou a seguinte escala em relação a proficiência: 0 a 3,4 (baixo), 3,5 a 4,9 (razoável) e de 5 a 10 (adequado).

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o “paradoxo da proficiência”. Ora, sendo a Prova Brasil (parte) um dos elementos que compõem a nota do Ideb, como se explicaria o declínio no desempenho da escola nessa avaliação, ao mesmo tempo que ascende na classificação de desempenho do Ideb (todo)? Estaria esse fato corroborando um dos princípios da visão complexa, de que a soma das partes nem sempre constitui o todo? Que elemento “estranho” interagiu nessa dinâmica, levando ao paradoxo da proficiência?

A despeito de a Prova Brasil compor um critério importante no âmbito do estudo, é preciso revelar que esse recurso não faz parte do discurso ou não ocupa a centralidade da preocupação da escola, e sequer seus resultados são trabalhados pelos professores ou lhes é dedicada a necessária atenção na ocasião de sua aplicação. Tal constatação ficou evidente nas declarações das professoras, conforme trechos coletados das entrevistas: “A Prova Brasil não faz parte das nossas discussões, não conheço os resultados dessa avaliação” (P1: EM). No trecho seguinte, a professora 3 também revela essa ausência de contextualização dos resultados da Prova Brasil: “Não posso falar da Prova Brasil, não me lembro se alguma vez discutimos sobre ela nas coordenações coletivas” (P3: EM).

Nas entrevistas com as professoras, em relação às avaliações da Prova Brasil, percebeu-se que há um ligeiro descompasso entre avaliação externa e planejamento pedagógico. Nesse sentido, torna-se fundamental o esclarecimento da comunidade escolar local sobre em que consiste a avaliação institucional, seu planejamento, seus objetivos, suas metodologias e, sobretudo, quais são as ações que efetivamente a escola pode desenvolver a partir de seus resultados.

A observação in loco aliada a algumas percepções apreendidas por intermédio dos outros instrumentos responde a essa questão, trazendo ao contexto um conjunto de fatores que agiram em nível de influência mútua. Nessa situação, destaca-se o papel da gestão escolar, como liderança presente na integração de necessidades entre setor o administrativo e a área pedagógica da escola. Nos fragmentos das entrevistas a seguir, pode-se notar inclusive a inter-relação entre a realidade da Escola Maria e a visão de Bourdieu (1989) e Foucault (1986) sobre relações de poder. Essa inter-relação é confirmada pelo corpo docente, quando afirma:

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“Na escola temos um respeito muito grande entre os colegas, entre a direção e também entre os funcionários” (P1: EM). A docente 2 diz que a relação de respeito transcende o relacionamento pessoal e, no trecho a seguir, a professora assegura: “Temos liberdade de expor nossas ideias” (P2: EM).

Prosseguindo na abordagem dos instrumentos, integrando-a aos dados gerados, a análise documental permitiu à pesquisadora ter acesso ao Projeto Político-Pedagógico da Escola, às atas de reunião de conselho de classe, às fichas disciplinares dos estudantes e ao livreto que contém as normas disciplinares da escola, entre outros documentos. A análise documental não foi tratada no relato da pesquisa como um instrumento específico; portanto, não mereceu capítulo específico. Ao contrário, os dados gerados por essa fonte consubstanciaram as principais ocorrências em que a percepção e a subjetividade da pesquisadora estiveram presentes. Assim sendo, segundo Leite (2008), ao integrar elementos capturados pelo “olhar-visão”, recurso da subjetividade, e documentos escritos, ou estes se complementaram mutuamente, ou serviram de elemento que atendeu aos critérios de validação das informações e considerações apresentadas. A análise documental, portanto, diferente de ser um instrumento-fim, foi um instrumento-meio, perpassando transversalmente, explícita ou implicitamente, por todas as situações de registro.

Conforme mencionado anteriormente, foram elaborados três tipos de questionários, direcionados a públicos-alvo distintos (equipe gestora, professores e estudantes), de acordo com as frequências do Quadro 5, desta vez demonstrando dados da Escola Maria:

Quadro 5 – Total de questionários aplicados na Escola Maria

Tipos de Questionários Quantidade

Equipe Gestora 06

Professores 25

Estudantes 92

Escola Maria 123

135

A aplicação dos questionários ocorreu em três etapas: a primeira, no mês das férias escolares; ocorreu com a diretora da escola, momento em que também foi realizada a entrevista. A segunda etapa de aplicação foi realizada com os professores e demais membros da equipe gestora da escola. Essa etapa ocorreu na terceira coordenação coletiva do mês de fevereiro de 2012, em dois turnos (matutino e vespertino). A Escola Maria preocupou-se em reservar um horário de 30 minutos para que os professores tivessem oportunidade de responder a esses questionários. A pesquisadora permaneceu o dia inteiro na escola, no intuito de conseguir o maior número de professores respondentes e o maior quantitativo possível de retorno dos questionários. A estratégia valeu a pena, pois foram distribuídos 30 questionários e retornaram 25, sendo que os professores demoraram, em média, 20 minutos. Alguns avaliaram que por ser demasiado extenso respondê-lo, naquele momento, poderia demandar muito tempo, afetando o fluxo de suas atividades. Dois não acharam prudente responder, porque trabalhavam na escola há pouco tempo; uma única professora expressou seu desinteresse em responder e outras duas receberam o questionário, mas não o devolveram.

Na coordenação coletiva do turno matutino estavam também presentes a vice-diretora, a supervisora pedagógica, duas coordenadoras e uma assistente administrativa, abrangendo, assim, toda a equipe gestora da escola. Todas responderam ao questionário O assistente pedagógico não o respondeu, porque trabalha no turno noturno com Educação de Jovens e Adultos (EJA), modalidade que não fez parte da pesquisa. Portanto, dos seis questionários distribuídos à equipe gestora a taxa de retorno foi de 100%.

A terceira etapa de aplicação dos questionários ocorreu com os estudantes. Para realizá-la, a pesquisadora organizou-se de modo a respeitar o horário estabelecido pela equipe de professores para ter acesso às três turmas do 9º ano. Os estudantes foram receptivos ao preenchimento, sendo que cada turma levou, em média, de 15 a 20 minutos para responder. Foram distribuídos 92 questionários, e a pesquisadora recebeu de volta os 92, atingindo uma taxa de retorno de 100%, com todos os questionários devidamente preenchidos.

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Uma vez finalizada a etapa de geração de dados via questionários, envolvendo os três segmentos distintos, deu-se início à etapa de realização da entrevista com os professores da escola. Apesar da intercorrência da greve da categoria, a pesquisa não foi prejudicada, em função da relação amistosa e de cumplicidade, estabelecida entre pesquisadora e objeto de pesquisa, devido ao tempo de dedicação às visitas ao campo. Vencidos, pois, os aspectos de imprevisibilidade da pesquisa, a entrevista com a diretora, que já havia ocorrido em janeiro de 2012, propiciou a abertura necessária para que as entrevistas com as professoras fossem previamente agendadas, de acordo com a disponibilidade de cada uma. O Quadro 6, a seguir, apresenta as informações quantitativas sobre as entrevistas realizadas na Escola Maria:

Quadro 6 – Quadro-síntese das entrevistas Escola Maria

Entrevistadas Área de atuação Sigla DataTempo de gravação

Páginas transcritas

Diretora Gestão D: EM 26/1/2012 31m12s 13 páginas

Professora 1 Humanas/Geografia P1: EM 26/3/2012 26m59s 13 páginas

Professora 2 Exatas/Matemática P2: EM 26/3/2012 14m55s 8 páginas

Professora 3 Códigos/Português P3: EM 28/3/2012 14m24s 16 páginas

Total 1h27m33s 50 páginas

Concluídas as entrevistas, procedeu-se ao processo de análise. Para efetivá-la, foi adotado como suporte teórico-metodológico o método de Bardin (1988). Remete-se a Bardin (1988), para chamar a atenção para um estilo de categorização que inspirou a construção do Diagrama 3. O termo categoria foi definido como classe que congrega elementos análogos, os quais recebem um título geral pelos caracteres que apresentam em comum. Para identificá-las, iniciou-se pela classificação de termos e, posteriormente, de expressões obtidas por diferenciação, a partir das respostas de cada entrevista, o que é denominado de conjunto por Bardin. Em seguida, essas expressões e/ou termos foram reagrupados, por analogia, extraindo-se aqueles que mais se repetiam em cada resposta. Por se tratar

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de um tipo de análise, cujos resultados são obtidos pelo desmembramento de um texto em unidades ou categorias e em que os elementos emergem a partir do que cada um tem em comum, caracterizou-se esse procedimento como estruturalista.

Desse modo, para estabelecer as categorias e elaborar o Diagrama 3, procedeu-se, detalhadamente, às seguintes etapas:

1) sublinhar no texto das entrevistas as falas mais relevantes;2) registrar essas falas, sintetizando-as em instrumento específico

para cada entrevista;3) extrair das falas mais relevantes expressões e/ou termos que

representassem, na visão da pesquisadora, a essência do pensamento do entrevistado como resposta àquela questão;

4) classificar as palavras/expressões que mais se destacaram em cada uma das quatro entrevistas, agrupando-as e registrando-as, em tabela-base, os resultados das quatro entrevistas.

Encerradas as quatro etapas de análise, conforme descritas, foi preciso reorganizá-las e redefini-las, a fim de encontrar as grandes categorias, ou seja, as categorias mais gerais que abrangessem o maior número possível de expressões e termos encontrados. Assim, foram estabelecidas duas categorias resultantes da análise do discurso, à luz de Bardin: 1) Escola como ambiente propício de aprendizagem e 2) Clima escolar. As grandes categorias foram divididas em subcategorias, conforme destacadas a seguir. No Diagrama 3, estão representadas essas subcategorias, visualizando-se sua afluência para as grandes categorias. É preciso esclarecer, todavia, que as categorias encontradas nos dados da Escola Maria (Diagrama 3) e da Escola Ana (apresentadas em tópico pertinente), depois de identificadas, passaram a subsidiar, transversalmente, toda a análise e a discussão dos dados em cada uma das escolas. A opção por esse procedimento decorreu da percepção de que seria imprescindível que a discussão sobre categorias e subcategorias ocorresse de forma integrada, interconectada, comparando-se o que foi encontrado nas duas escolas, na perspectiva de se detectar paradoxos e convergências, além de prováveis elementos de inovação.

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Diagrama 3 – Apresentação das categorias e subcategorias após leitura das entrevistas Escola Maria

Práticas de gestão escolar e suas implicações na superação das metas de crescimento

Os estudantes da Escola Maria são oriundos das classes menos favorecidas da população. À luz da literatura, escolas eficazes são aquelas que conseguem superar a realidade e alcançar resultados positivos. Pode-se afirmar que a Escola Maria superou essa realidade, de onde se conclui que um dos fatores que contribuíram para isso esteve relacionado às práticas da gestão escolar, ao modo como essas práticas se inter-relacionam naquele cotidiano e à influência dessa inter-relação na produção da eficácia escolar. Responder a esse objetivo se constituiu um dos maiores desafios da pesquisa.

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Explica-se que, à luz do que Mortimore (1996) considera como ponto de convergência para a eficácia e o identifica como organização do ambiente de trabalho, essa denominação foi substituída por “ambiente organizacional”. Na visão do autor, essa organização é responsável pela melhoria no desempenho e pela motivação dos agentes que atuam naquele ambiente. Nesse sentido, a questão que emergiu foi: se a equipe da Escola Maria se mostrou envolvida no processo de ensino, se as ações desenvolvidas por essa equipe se refletiram positivamente e produtivamente no processo de aprendizagem do aluno, seria válido afirmar que se estava diante de uma escola eficaz?

Para responder ao primeiro objetivo e descrever as práticas da gestão escolar que contribuíram para o “sim” a essa questão, a pesquisadora imergiu no cotidiano da escola. Nessa imersão, via observação in loco e análise documental, principalmente, pôde anotar que alguns fatores mencionados na literatura sobre “escolas eficazes” foram, por diversas vezes, corroborados pelos resultados dos instrumentos aplicados. De maneira geral, os participantes da pesquisa terminaram por tornar visível, em suas respostas, um conjunto de fatores que contribuíram para o desempenho satisfatório da escola no Ideb/2009. Os fatores, por sua vez, ao serem confrontados com a literatura, ao serem comparados, poderiam, como diferencial, levar à descoberta de algum fator, porventura, não mencionado na literatura abordada. Entre os fatores elencados, alguns merecem ser destacados: a boa infraestrutura da escola; a equipe gestora atuante; os recursos físicos e pedagógicos disponíveis para os professores; a baixa rotatividade de professores; o respeito e o diálogo entre a equipe gestora e os professores, entre a equipe gestora e os estudantes e entre a equipe gestora e os pais; os projetos efetivamente desenvolvidos por todos e, por fim, o envolvimento de toda a comunidade escolar no processo de construção de aprendizagens significativas para os estudantes.

Participar e acompanhar momentos importantes do cotidiano da escola possibilitou à pesquisadora, no primeiro momento, conhecer o Projeto Político-Pedagógico (PPP) dela, como foi elaborado, se e como está sendo desenvolvido. Foi possível constatar, por meio desse documento e das visitas, que, efetivamente, a Escola Maria desenvolve vários projetos

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durante todo o ano letivo e estes, por sua vez, estão diretamente vinculados ao PPP. Entre os projetos visitados, a pesquisadora teve oportunidade de observar as aulas de literatura na “Cabana Literária” e presenciou o projeto intitulado “Aulas Compartilhadas”, voltado para as turmas do 5º ano. Uma das finalidades desse projeto é preparar os estudantes para a dinâmica escolar dos anos finais do ensino fundamental, visando a minimizar problemas de adaptação e de integração do aluno em uma realidade diferente da anterior. Para a diretora da escola, os estudantes já vão aprendendo a lidar com a diversidade de professores com a qual irão se deparar no 6º ano.

Outro projeto mencionado na entrevista com a professora foi o “Recuperação Contínua”, desenvolvido nos anos finais do ensino fundamental e que teve por mérito reduzir a taxa de reprovação dos estudantes. Nas palavras da professora, o projeto estabeleceu a média da escola, que passou a ser 6,0 (seis) e não 5,0 (cinco). Além das atividades desenvolvidas em classe/casa, os estudantes realizam também as avaliações bimestrais. No projeto, essas avaliações são compartilhadas e divididas em duas áreas de conhecimento: ciências humanas e ciências da natureza. Cada professor passa a trabalhar seu conteúdo, inter-relacionado com o projeto selecionado para aquele bimestre, ou deve levar o aluno a interagir com o tema básico de cada bimestre. A avaliação bimestral é constituída de uma única prova. No fim de cada bimestre, a nota dessa avaliação é somada à média do aluno em cada uma das disciplinas.

De acordo com o Censo Escolar/SEE/DF de 2009 (2010), que trata da taxa de aprovação, a Escola Maria subiu de 71% para 90%. Se observado o fluxo do Ideb/2009, a escola obteve a nota 0,96 numa escala que varia de 0 a 1, valor considerado significativamente adequado, uma vez que está somente quatro décimos abaixo da nota máxima. O fluxo escolar é o ritmo de progressão dos estudantes ao longo das séries e é calculado pela taxa de aprovação. Refere-se, especificamente, à análise do comportamento da progressão dos estudantes em determinado nível de ensino seriado, comparado à sua condição de aluno promovido, repetente ou evadido (BRASIL, 2012). A propósito, em relação ao fluxo escolar, o Brasil está ameaçado de não atingir as metas de conclusão dos ensinos

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fundamental e médio até 2022, caso não encontre estratégias viáveis de solução para esse problema, o qual, segundo especialistas, resulta, especialmente, do ingresso tardio em consequência de repetência ou do abandono. Esses resultados se encontram no relatório De olho nas metas 2011, lançado pelo programa Todos pela Educação.

A Escola Maria parece, portanto, ter encontrado uma alternativa viável de solução, por intermédio dos vários projetos que desenvolve, de forma efetiva, com o diferencial de serem pensados e construídos pela sua coletividade. Exatamente nesse aspecto observou-se o papel preponderante do gestor escolar. Autores como Lück (2002) mostraram que, nas escolas consideradas eficazes, os diretores agem efetivamente como líderes pedagógicos, não permitindo que sua intervenção se dê somente na área administrativa da gestão. Essa liderança motivou a trazer para esse contexto os dados relativos aos projetos e à dinamicidade com que são desenvolvidos na escola.

O instrumento utilizado para ilustrar essa percepção foi o questionário. Por meio de seus resultados, a pesquisadora captou as múltiplas visões dos professores, nas questões de 32 a 35, as quais tratam da figura da diretora. Como resultado da análise das referidas questões (dados ilustrados na Tabela 1), identificou-se que, dos 25 docentes abordados, 21 deles, total que representa 84%, afirmaram que a diretora consegue desenvolver uma dinâmica escolar que impulsiona os professores a se comprometerem com a escola; 20 docentes (80%) informaram que a diretora estimula as atividades inovadoras; para 19 professores (76%), a diretora dá atenção especial aos aspectos relacionados à aprendizagem dos estudantes, e 19 docentes (76%) revelaram que a diretora também dá atenção especial aos aspectos relacionados com a manutenção da escola, valor obtido somando-se as colunas de concordo totalmente e concordo. Essa dinâmica curricular é considerada por Câmara (1995) como a gestão escolar propriamente dita. Ainda, segundo a autora, a posição de liderança exercida pelo gestor escolar denota responsabilidades diferenciadas, porém não menos importantes que aquelas exercidas pelos docentes.

O que se trouxe como dados que respondem mais diretamente ao objetivo I encontra ressonância nos registros de Lück (2002), quando

142

a autora reconhece, entre as práticas pertinentes à função do gestor escolar, tornar o papel do currículo, seus princípios, fundamentos e perspectivas de tal modo efetivo, que leve a escola a atingir um desempenho que resulte no sucesso escolar dos estudantes. A missão do gestor se estabelece, portanto, na capacidade de articular a habilidade de gerir o currículo e a proposta pedagógica, em interface com as políticas e as atividades administrativas concernentes à infraestrutura do sistema escolar. De certo modo, trata-se de uma competência obrigatoriamente requerida e essencialmente necessária em todo processo de gestão no âmbito das instituições de ensino.

Uma das intenções que se manteve como foco foi, portanto, provocar a discussão acerca do papel fundamental do gestor escolar, para além das questões administrativas, ou seja, dizer que sua preocupação deve abranger também os aspectos acadêmicos da dinâmica curricular da escola. Sobre isso, a Tabela 1 traz informações relevantes.

Tabela 1 – Avaliação dos docentes da Escola Maria quanto ao envolvimento da diretora nos processos pedagógicos da escola

Questões 1 2 3 4 5 6

O(a) diretor(a) consegue que os professores se comprometam com a escola.

(A)8

32%

(B)13

52%

(C)1

4%

(D)00

(E)00

(F)3

12%

O(a) diretor(a) estimula as atividades inovadoras.

(A)7

28%

(B)13

52%

(C)3

12%

(D)00

(E)00

(F)2

8%

O(a) diretor(a) dá atenção especial a aspectos relacionados com a aprendizagem dos estudantes.

(A)8

32%

(B)11

44%

(C)3

12%

(D)00

(E)00

(F)3

12%

O (a) diretor (a) dá atenção especial aos aspectos relacionados com a manutenção da escola.

(A)9

36%

(B)10

40%

(C)2

8%

(D)1

4%

(E)00

(F)3

12%

Legenda: Coluna 1: “Concordo totalmente”; Coluna 2: “Concordo”; Coluna 3: “Neutro”; Coluna 4: “Discordo totalmente”; Coluna 5: “Discordo”; Coluna 6: “Não informado”.

Conforme se pode observar, expressiva maioria dos professores questionados concorda ou concorda totalmente que o gestor escolar os motive para o comprometimento com a escola, estimule-os para que busquem

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desenvolver atividades inovadoras e dedique atenção especial aos aspectos relacionados à aprendizagem e à manutenção da escola. Diante desses resultados, comparados ao desempenho das demais escolas do sistema de ensino do Distrito Federal, não há como desconsiderar a influência da equipe gestora que atua na Escola Maria.

Em contexto idêntico se destacam, mesmo que de forma nem tão explícita, outros elementos que convergem para as práticas da gestão escolar, conforme a Tabela 2. Quando abordados sobre práticas eficazes da escola, os professores revelaram em suas respostas resultados que também indicaram positivamente. Estes, entretanto, referem-se, mais especificamente, ao âmbito didático-pedagógico. Perguntados se conseguiram desenvolver com seus estudantes os conteúdos previstos no ano anterior, 60% afirmaram desenvolver mais de 80% dos conteúdos previstos; cinco informaram que entre 60% e 80% dos conteúdos foram desenvolvidos e dois professores disseram que concluíram somente 40% a 60% deles. Somente três professores não responderam a essa questão. Nota-se que o fluxo de desenvolvimento do currículo escolar, expresso no índice de conteúdos efetivamente desenvolvidos, pode ser considerado altamente satisfatório. Igualmente, se levados em conta os resultados do Ideb, pode-se considerar que esses conteúdos são desenvolvidos também de forma eficaz.

Inquiridos a respeito do desenvolvimento dos conteúdos e do envolvimento dos estudantes, de seus pares e da equipe gestora da escola, as respostas dos professores resultaram nos dados apresentados a seguir.

Tabela 2 – Opinião da equipe quanto à realidade da Escola Maria

SituaçãoOpinião do professor

1 2 3 4 5

O ensino que a escola oferece aos estudantes é muito influenciado pela troca de ideias entre os professores.

728%

1560%

14%

14%

14%

Os professores desta escola coordenam o conteúdo das disciplinas entre as diferentes séries.

520%

1456%

416%

14%

14%

O diretor, os professores e demais membros da equipe da escola colaboram para fazer esta escola funcionar bem.

1560%

936%

14%

– -

Legenda: Coluna 1: “Concordo totalmente”; Coluna 2: “Concordo”; Coluna 3: “Neutro”; Coluna 4: “Discordo”; Coluna 5: “Discordo totalmente”.

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Na opinião dos docentes, a realidade da escola se revela de forma promissora. Para todas as perguntas feitas, cujas respostas estão consolidadas na Tabela 2, os professores concentraram suas respostas em concordo ou concordo totalmente. Os dados, mais uma vez, podem ser traduzidos em aspectos que refletem práticas adequadas da gestão escolar. No caso da Tabela 2, os resultados demonstram que há entrosamento e comprometimento entre a equipe de trabalho, aspectos que remetem à ação da liderança, na medida em que podem ser traduzidos em clima organizacional que leva à busca de objetivos comuns. Aqui será acrescentado também o termo “cumplicidade”, pois 15 professores (60%) concordaram totalmente com a afirmação de que o diretor, os professores e demais membros da escola colaboram para fazer a Escola Maria funcionar bem.

Ao discorrer sobre as práticas da gestão escolar da Escola Maria, é pertinente, ainda, estabelecer a relação com a subcategoria 1.5, “Prática de projeto”, encontrada depois da leitura das entrevistas com as professoras e com a diretora. Para Nogueira (2001), quando a escola trabalha com a prática de projetos, dá margem a perguntas desafiadoras que não podem ser respondidas pelo método de ensino habitual ou mais conservador. O autor destaca que o trabalho com projetos oferece muitos benefícios tanto para os estudantes, quanto para os professores, possibilitando que se amplie a participação dos estudantes, se reduza a evasão e, ainda, se favoreça o bom desempenho escolar (NOGUEIRA, 2001).

Na percepção dos professores, a direção da escola tem uma postura acolhedora em relação às propostas de mudança ou de inclusão de um novo projeto. Existem projetos que já estão consolidados pela escola, como os seguintes: “Projeto Literário”, “Recreio Saudável”, “Aulas Compartilhadas”, “Recuperação Contínua”, “Parceiros da Escola”, entre outros. Também há outros projetos que não dependem exclusivamente da equipe gestora ou dos professores para funcionar, como, por exemplo, o Laboratório de Informática, pois esse necessita de professor especializado para atuar na área de informática e, pelo menos no tempo de realização da pesquisa, a escola não dispunha desse profissional.

De maneira geral, trechos das entrevistas confirmaram que os estudantes se envolvem em todas as atividades e que gostam de estudar na Escola Maria. Também ficou evidente que os pais acreditam no trabalho

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que a escola desenvolve e, com raras exceções, comparecem à escola para apoiar as decisões que são tomadas pela equipe gestora e pela equipe escolar: “Na avaliação semestral, discutimos os projetos que constam no PPP, os professores e servidores são convocados e os estudantes e os pais são convidados” (D: EM); “Nos projetos desenvolvidos no colégio, há participação dos professores e alunos” (P2: EM).

Na Escola Maria confirma-se, destarte, a existência de práticas, direta ou indiretamente, atribuídas à gestão escolar que a levaram a superar a meta do Ideb do Distrito Federal, a despeito de sua realidade adversa. Visando apresentá-las de modo categorial, conforme Bardin (2004), as práticas mencionadas nesse tópico foram acopladas e reescritas de forma textual, tomando-se por base o que se abstraiu do questionário e das entrevistas dos professores. Portanto, a Escola Maria se destaca pelo conjunto de práticas da gestão escolar e pelo fomento à construção coletiva e à efetiva realização de projetos que convergem para a solução de empecilhos à aprendizagem dos estudantes. Considera-se essa uma categoria que integra todas as ações de liderança da gestora escolar, as quais têm desencadeado a dinamicidade do currículo em favor do desenvolvimento dos estudantes.

Participação dos professores e dos estudantes no ambiente escolar: um fator de eficácia?

Começando por incursões nos aspectos conceituais, Motta (1994) define participação como “todas as formas e meios pelos quais os membros de uma organização, como indivíduo ou coletividade, podem influenciar os destinos dessa organização” (p. 434). Diferente da mera manifestação de uma opinião, a participação se estabelece na medida em que essa “opinião” se configura em real aporte na questão para a qual a comunidade foi chamada a contribuir. Dessa forma, participar se torna um verbo a ser conjugado no plural, e seu ponto de partida se dá na esfera dos processos de decisão no nível de gestão, mais especificamente no que se refere às demandas advindas do processo educativo. Essas demandas emergem cotidianamente nos ambientes escolares.

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Por essa razão, os ambientes escolares são percebidos, na atualidade, como espaços de compartilhamento de ideias e de práticas socioculturais e institucionais. Nesse panorama, a escola é vislumbrada como locus de aprendizagem, de compartilhamento de saberes e de experiências, ou seja, um espaço educativo que gera efeitos positivos nas aprendizagens de professores e estudantes. Libâneo (2006) esclarece que as formas de organização e de gestão dos ambientes escolares adquirem dois novos sentidos. No primeiro, o autor considera o ambiente escolar em sua dimensão educativa, ou seja, as formas de organização e gestão, o estilo das relações interpessoais, as rotinas administrativas, a organização do espaço físico, entre outros. No segundo, as escolas são tidas como instituições aprendentes; portanto, espaços de formação e aprendizagem, em que as pessoas mudam com as organizações e as organizações mudam com as pessoas (LIBÂNEO, 2006).

As palavras de Libâneo ecoam em coerência na direção da Escola Maria. Percebe-se nesse ambiente a relação mútua que o autor preconiza existir entre pessoas e organizações. Parece que, de fato, ocorreu esse processo de mudança partilhado e compartilhado, em que tanto os professores, a direção, os estudantes e os pais se tornaram parte intrínseca da organização escola. A escola tornou-se um ponto de encontro cotidiano, que se volta para a busca da partilha de um caminho a percorrer. Um encontro de vivências comuns que, sem perder de vista o foco das práticas educativas necessárias ao desempenho dela, também se volta para as relações humanas. Em escolas assim, a participação passa a ser valorizada, porque a capacidade de seus agentes se tornou um valor que converge para o sucesso da coletividade, não sendo temida, portanto, como uma ameaça que gera a competição predatória.

Estabelecer nesse espaço educativo um lugar que possibilite aos sujeitos da educação uma nova relação entre conhecimento, atitudes práticas e reflexivas é um desafio a ser enfrentado pela escola na atualidade. Nessa direção, o caminho mais acertado para reinventar a escola, dando significado às suas finalidades e objetivos, passa pela construção de seu Projeto Político-Pedagógico (PPP). Mais uma vez, o PPP representa o compromisso da equipe escolar com a trajetória da escola no cenário educacional.

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O PPP pode se revelar um eixo acoplador das ideias, das intenções, dos desejos e das metas de uma equipe e, ao mesmo tempo, se materializar em práticas que vão produzir o sucesso escolar. Para Veiga (2002), construir um projeto pedagógico significa enfrentar o desafio da mudança e da transformação, tanto na forma como a escola organiza seu processo de trabalho pedagógico como na gestão que é exercida pelos interessados, o que implica o “repensar da estrutura de poder da escola” (p. 15).

A participação como exercício da voz dos professores

No caso da Escola Maria, a finalidade do PPP parece convergir para um recurso que implica a participação como um fator de cumplicidade, certamente por constituir um instrumento que se aplica desde o planejamento até a execução e a avaliação das práticas da escola. Tal constatação foi apreendida via análise documental e evidenciada ao se observar as práticas que a escola realiza. Ao torná-lo um dos elementos que compuseram a análise documental, a intenção foi ter acesso a um recurso que respondesse ao objetivo de investigar se o fator participação no ambiente escolar contribui para o processo de práticas eficazes. Integrada a esse recurso, a segunda possibilidade foi captar nos questionários dos professores e dos estudantes respostas que revelassem aspectos relacionados à estratégia de elaboração desse projeto e que sugerissem a participação dos dois segmentos em sua construção.

Os questionários respondidos pelos professores, em princípio, mostraram algumas divergências, uma vez que as respostas apontavam ora para a elaboração pela diretora, ora pelos professores. A resposta de maior frequência (44%), por exemplo, pode dar a entender que o projeto foi elaborado de forma isolada e menos participativa, já que citava a “diretora” e uma “equipe de professores” como os responsáveis. E ainda: cinco professores (20%) informaram que a diretora elaborou a proposta do projeto e a apresentou ao grupo de professores para possíveis sugestões; três (12%) informaram que o grupo dos professores apresentou uma proposta e, com base nela, a diretora chegou à versão final; dois professores (8%) informaram que o PPP da escola segue o modelo encaminhado pela

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SEE/DF; um professor (4%) informou que o PPP foi elaborado de “outra maneira” e um professor (4%) não registrou sua resposta. Ver esses dados no Gráfico 6.

Gráfico 6 – Indicativo de participação na elaboração do PPP da Escola Maria

No entanto, a observação in loco ajudou a desvelar a questão. Ao confrontar as respostas e algumas anotações sobre as falas dos professores e da diretora, por ocasião das diversas visitas realizadas, detectou-se que, muitas vezes, as respostas dos questionários podem apenas revelar diferentes focos de visão dos participantes sobre um mesmo fenômeno e não necessariamente ações incoerentes ou contraditórias. Nesse caso, o que ficou claro para a pesquisadora foi o foco de alguns participantes sobre etapas ou momentos de vivência diferentes na elaboração do PPP, o que supostamente pode ocorrer, caso as estratégias de elaboração não fiquem bem esclarecidas para o grupo. Sendo assim, o dado que mostra 44% dos professores atribuindo a elaboração à diretora e à equipe de professores significa a última etapa de uma sequência de ações voltadas para a finalização de um projeto participativo.

Descrevendo as etapas, não necessariamente nesta ordem, mas convergindo o relato para o conteúdo das perguntas do questionário, elas

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ocorrem da seguinte maneira: a escola recebe um modelo encaminhado pela Secretaria de Estado de Educação; há a elaboração de uma proposta inicial pela diretora, que a submete aos professores, porém, na perspectiva de orientar um percurso que deverá ser sistematizado em conjunto; os professores trabalham suas sugestões, a partir desse referencial de organização; elege-se uma equipe que trabalhará na versão final juntamente com a diretora, mas que traz em seu bojo as ideias e sugestões dos demais.

Observou-se, ainda, que, quando elaborado em conjunto, o PPP articula várias dimensões que devem ser colocadas em prática, uma vez que o projeto torna-se uma das principais ferramentas da escola na efetivação de suas práticas escolares. Nesta direção, Freire (2003, p. 100) expõe sua opinião, revelando uma relação intensamente humanizadora com as questões da educação, ao relacionar a participação a uma possibilidade de “exercício da voz, de ter voz, de decidir em certos níveis de poder, enquanto direito de cidadania, se acha em relação direta, necessária, com a prática educativo-progressista”. Demo (1993) afirma que “não existe participação suficiente ou acabada. Não existe como dádiva ou como espaço preexistente. Existe somente na medida de sua própria conquista” (p. 66).

Tomando como ponto de partida a visão de Freire, responde-se a essa vertente do segundo objetivo da pesquisa afirmando que a força da voz dos professores é exercida, uma vez que, naquele ambiente da Escola Maria, a equipe pedagógica parece ter conquistado o seu lugar desde o momento de construção do instrumento que dará o norte a todas as ações. Parafraseando Demo, os dados levam a confirmar que não há participação “suficiente” dos professores na Escola Maria, se for considerada como base a proximidade dos 100%, mas há um espaço disponibilizado na medida necessária para que esse fator contribua para o processo de práticas eficazes nessa escola.

A participação como exercício da voz dos estudantes

Quanto ao segmento dos estudantes, ao serem indagados sobre sua participação na elaboração do PPP e/ou em outros projetos que são desenvolvidos na escola, a resposta da maioria (64%) foi de que “não

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participam”. No entanto, 29 estudantes, ou seja, 32%, afirmaram já ter participado da elaboração do PPP e/ou de outros projetos desenvolvidos na escola. Mais uma vez, se apreendidos somente em sua dimensão quantitativa, os números vêm expressar incongruências. Entretanto, a análise documental, aliada à observação in loco, contribuiu para elucidar uma possível percepção negativa ou equivocada sobre os números.

A partir da leitura de atas dos conselhos de classe e de participações em reuniões pedagógicas semanais da escola, a pesquisadora observou que a Escola Maria tem como prática convocar somente os estudantes que exercem a função de representante de turmas e, sendo estes eleitos pela sua coletividade, os representam na integralidade do número e na legitimidade da voz. Assim, o que, de fato, dizem os números é que os 29 estudantes que responderam “sim” à questão são os que o fizeram, dando voz a todos os demais, porque são ou já foram representantes de turmas (Gráfico 7).

Gráfico 7 – Você participou da elaboração do Projeto Político Pedagógico ou de outros projetos que são desenvolvidos na escola?

Desse modo, diferentemente da visão quantitativa do Gráfico 7, saiba-se que 32% dos estudantes participam da construção do PPP, o que, na verdade, equivaleu ao percentual de 100%, caso seja levado em conta que o exercício da voz e o direito democrático de ter voz para decidir em seu nível de poder foram estabelecidos e garantidos (FREIRE, 2003). Assim, denota-se que o universo de estudantes foi alcançado, na medida em que suas ideias e sugestões se integraram à “voz” de seus representantes.

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Infere-se, portanto, que a democracia se estabeleceu na Escola Maria, considerando que, na inviabilidade de todos os estudantes se fazerem presentes em todos os momentos de decisão, seus legítimos representantes garantiram o direito à cidadania.

Seguindo com a análise e a discussão sobre o questionário dos estudantes, desta vez na questão 5, a finalidade foi verificar a origem da motivação para o bom desempenho que os estudantes vinham demonstrando. Para tanto, verificou-se se existia correlação entre as questões 5 (Seus pais ou responsáveis incentivam você a estudar?) e 8 (Você conversa com seus pais ou responsáveis sobre o que acontece na escola?). A pesquisadora fez uso do Teste Qui-Quadrado de Independência de Variáveis. Na resposta da questão 5, 98,9% dos estudantes afirmaram que são incentivados pelos pais ou pelos responsáveis em relação ao estudo. A questão 8 perguntava se os alunos conversavam com seus pais ou responsáveis sobre o que acontece na escola. Nessa questão, os dados sinalizaram que 58 estudantes (63%) responderam “sim” e 32 estudantes (34,8%) responderam “não”. No teste utilizado, foram confrontadas duas hipóteses: Ho, onde as questões 5 e 8 são independentes e Ha, onde as questões 5 e 8 não são independentes. Considerando um nível de significância (α) de 5%, ou seja, estabelecendo em 5% a probabilidade de se rejeitar a hipótese nula (Ho), sendo ela verdadeira, rejeita-se a hipótese de independência entre as questões se o p-valor for inferior a 0,05. No teste realizado, entende-se como p-valor a probabilidade de se observar valores em toda a população considerada “igual”, ou ainda, mais extrema aos valores observados na amostra, considerando que a hipótese nula foi válida para essa população. Os resultados de cada p-valor utilizado foram obtidos com o auxílio do Statistical Analysis Software (SAS), versão 9.2. Depois da utilização do programa, os dados apurados não identificaram correlação entre as respostas das questões 5 e 8.

Por fim, na Escola Maria foi possível observar e presenciar nas reuniões coletivas que a equipe gestora procura trabalhar de forma respeitosa e dialógica com os professores, os estudantes e demais funcionários da escola. Aqui, o conceito de dialógica não está restrito ao diálogo entre pessoas de uma organização somente. De forma muito mais abrangente e conectada ao que de fato representa a ação dialógica na Escola Maria, diz-se de um

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espaço que é proporcionado exatamente para que as ideias contrárias sejam valorizadas e remetidas ao campo da interação e não da rejeição (MORIN 2008; 2007; 2005). Para Morin, a ocorrência do princípio da dialógica entre ordem e desordem é o exemplo mais vivo e pertinente que pode ser encontrado na relação entre equipes, abrangendo a figura do gestor e da liderança que ele exerce não sobre, mas com a equipe. Trata-se, nesse contexto, à evidência de um espaço do conflito produzido e sabiamente alimentado pela contradição. Normalmente, e em termos de liderança, nessa situação a equipe tenderia à desorganização, às idiossincrasias relacionais ou interpessoais. Ao contrário, estando a desordem articulada por uma postura dialógica, mesmo que de forma não intencional, mas instintiva, uma vez que nem o líder nem o grupo carecem do conhecimento formal dessa teoria, a desorganização se configurará no movimento ordem/desordem e será bem direcionada na relação profissional. Nesse caso, a ordem ocorrerá como fruto da dialogicidade e do entendimento recíproco.

Diante dessa visão, questiona-se: em que lugar estaria a equipe da Escola Maria se a contradição não fosse evidenciada e nutrida em uma perspectiva de constituição de um elemento bem-vindo às relações interpessoais e profissionais? Certamente que se poderia vislumbrar a imagem de pessoas descontentes, frustradas em seus desejos de manifestar e experimentar as próprias ideias, gerando, em consequência, um grupo submisso e acomodado diante de qualquer desafio que a gestão pudesse propor. Para aqueles professores, todavia, sua participação e envolvimento nas reuniões coletivas, nos projetos desenvolvidos pela escola, o engajamento dos estudantes e a presença da comunidade escolar contribuíam expressivamente para que os objetivos e os conteúdos escolares se efetivassem em práticas eficazes que seguiam refletindo positivamente no funcionamento e na organização da escola.

A participação como exercício da voz dos pais dos estudantes

Nos questionários respondidos pelos estudantes, a pesquisadora apurou que havia uma participação efetiva dos pais deles nas reuniões promovidas

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pela escola. Por essa razão, embora no objetivo em questão a investigação estivesse restrita à participação de professores e estudantes, julgou-se necessário tornar visível também os dados de participação dos pais, uma vez que foi declarada pelos próprios estudantes. Ao serem indagados sobre a frequência com que seus pais ou responsáveis comparecem à reunião de pais da escola, mais de 90% dos estudantes responderam “sempre” ou “quase sempre”. Entre todos os estudantes entrevistados, não foi identificado nenhum que tivesse seus responsáveis ausentes nas reuniões de pais da escola (Gráfico 8). Se considerada a realidade contemporânea, em que o apelo das escolas para que os pais compareçam à reunião grande parte das vezes se mantém sem resposta ao longo de todo um ano letivo, esse dado da Escola Maria, de fato, surpreende.

Na entrevista da diretora, foi informado que a escola disponibiliza horários extras, depois da reunião geral dos pais, para aqueles que porventura não puderam comparecer à reunião bimestral. É possível que a partir desse mecanismo de flexibilidade, colocando à disposição outros espaços de acordo com as condições de comparecimento dos pais, a escola aumente a participação desse segmento nas reuniões escolares e informe o total dos estudantes que disseram que os pais sempre comparecem. O trecho de uma das entrevistas descrito abaixo deixa clara a ocorrência desse procedimento: “quando os pais não comparecem, no dia marcado das reuniões bimestrais, a escola agenda outro horário que seja compatível, para que os pais possam comparecer” (D: EM).

Gráfico 8 – Frequência dos pais ou responsáveis às reuniões escolares

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Além da participação nas reuniões escolares, os pais também interagem com a escola por intermédio de representação constituída via Associação de Pais e Mestres (APM) e Conselho Escolar. Borges (2002) elucida que associações como APM ou a Caixa Escolar são instâncias de participação que auxiliam a equipe gestora na aplicação e na execução das verbas públicas ou das doações repassadas às escolas. O fortalecimento das instâncias de participação da comunidade escolar se traduz em ações efetivas que beneficiam a escola em suas necessidades. Nas entrevistas foi possível apreender que a direção desenvolve um processo efetivo de comunicação com os pais, inclusive no que se refere à prestação de contas dos recursos que a escola recebe. Entre eles incluem-se os da Associação de Pais e Mestres (APM), cuja prestação de contas aos pais é sempre realizada nas reuniões bimestrais.

Outra instância de participação é o Conselho Escolar. Retomando Libâneo et al. (2003), “o conselho escolar é um órgão com atribuições consultivas, deliberativas e fiscais em questões definidas na legislação estadual ou municipal e no regimento escolar” (p. 340). A criação dos conselhos escolares busca garantir a autonomia da escola, por meio de um órgão constituído conjuntamente por representantes da própria escola e da comunidade; portanto, legítimo. O Conselho Escolar da Escola Maria se reúne, periodicamente, a fim de acompanhar e avaliar as ações e os projetos desenvolvidos, como também validar a prestação de contas das verbas (federais e distritais) recebidas pela escola. Destarte, o conselho escolar tem exercido um papel importante na escola, destacando-se o poder de intervir e de fiscalizar questões que envolvem tanto aspectos financeiros como pedagógicos e administrativos.

Ainda, considerando que a gestão participativa parece ser o melhor caminho para a democratização, a Escola Maria parece ter aprendido a lição. Nas observações in loco realizadas durante as visitas da pesquisadora, foi constatada uma presença expressiva de pais e mães nas reuniões escolares. Outro episódio que vale mencionar foi presenciar a liberação pela equipe gestora para que os estudantes frequentassem a quadra de esportes aos sábados (fato rotineiro na escola). A pesquisadora também teve oportunidade de presenciar mães que solicitavam o espaço escolar

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nos fins de semana, para realização de festas familiares. A direção da escola sempre autoriza quando solicitada, desde que as famílias se comprometam em deixar a escola limpa e organizada e, se possível, como contrapartida, doem produtos de limpeza para a escola.

Navarro (2004) esclarece que a “gestão da escola se traduz cotidianamente como um ato político, pois implica sempre uma tomada de posição dos autores (sic)18 sociais: pais, estudantes, professores e funcionários” (p. 24). A Escola Maria demonstrou que o diálogo é sua principal ferramenta para envolver seus atores e também para solucionar possíveis problemas. Porém, os professores, os estudantes e os pais sabem que só participando com efetividade alcançarão o sucesso escolar. Essa afirmação se confirmou nas palavras da professora (P2: EM), quando declarou: “Nas coordenações coletivas, a gente senta, discute, vê o que está dando certo, como também vê o que está errado”.

O clima escolar e suas implicações no desempenho dos estudantes

Autoras como Duru-Bellat e Van Zanten (1998) esclarecem que o clima escolar resulta de uma conjunção particular de fatores distintos, os quais passam a exprimir um conjunto de modos de funcionamento e de práticas pedagógicas. Para Néri (2003), o clima escolar é o principal fator de atração e de permanência dos estudantes nas escolas. Nesse sentido, a pesquisa buscou identificar tanto nos questionários dos professores e dos estudantes como nas entrevistas com os professores se existia na Escola Maria um clima escolar favorável, que contribuía para o desempenho satisfatório dos estudantes e, consequentemente, para o sucesso escolar.

A fim de identificá-lo, passou-se a refletir sobre o que poderia se constituir um conceito de clima escolar no âmbito daquela coletividade. Partindo da visão dos autores supracitados, existe um composto de

18 Sic: Entendeu-se que o autor deveria ter utilizado “atores” como termo mais comumente adotado para designar os indivíduos integrantes desses grupos.

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fatores que se interligam e interagem conjuntamente no ambiente escolar, determinando um estilo pedagógico subjacente ao modo como cada escola realiza suas práticas. Essa conjunção de fatores que é única a cada realidade escolar pode ser definida visualmente como uma grande teia constituída de cada elemento que emerge da rotina da escola, para compor seu ambiente. A energia, como fator de atração e permanência (NÉRI, 2003), que paira sobre esse ambiente, pode manifestar-se de forma positiva ou negativa sobre seus entes e, ao se integrar todos os elementos que compõem esse ambiente, passa a constituir o que se denomina de clima escolar. Aqui, o termo “elementos” faz referência a tudo que existe, vivo e não vivo, compondo um ambiente escolar, desde os jardins, as carteiras, o quadro de giz, a sala de aula, o pátio, as lixeiras, os equipamentos disponíveis, até os estudantes, a equipe de professores, porteiros, servidores, merendeiras, diretora, famílias etc. Para tanto, cabe esclarecer que, ao definir tudo isso como elementos que compõem o clima escolar, eles precisam estar em relação, ou seja, a sinergia entre modo de organização e como essa organização é aceita e vivida pelos integrantes desse ambiente é que forma a teia, para a qual, como resultado do estudo realizado, atribuiu-se o nome de teia da eficácia escolar.

A partir dessa visão, assimilada das observações in loco, foi possível perceber uma relação amistosa entre a equipe gestora, os professores e os estudantes, além de um “brilho” de orgulho no olhar dessas pessoas, ao falarem do ambiente físico, pedagógico, social e humano da escola. Nas reuniões coletivas, também foi possível observar que se trata de uma relação dialógica. Nesse caso, entende-se que a equipe gestora e seus liderados conseguiram atingir os efeitos de um clima escolar propício à aprendizagem, pautado, especialmente, pelo respeito mútuo. Tanto a direção convida e estimula os professores a participarem das decisões coletivas da escola, como os professores em sua maioria respondem a esse chamado com sugestões e, ao mesmo tempo, demonstram coesão nas decisões tomadas pelo grupo. Nas entrevistas realizadas com as professoras, nota-se um discurso coerente entre os docentes que se expressaram acerca dessas questões. Partes do trecho citado também remetem e confirmam a visão adotada sobre o conceito de dialógico apresentado em tópico anterior,

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quando tratava das práticas da gestão que colaboram para o sucesso escolar: “Nossa convivência aqui na escola é bastante respeitosa” (P1: EM); outra professora revela que “a primeira mudança que ocorreu na escola foi no espaço físico. Depois, a direção começou a trabalhar com os professores, dando-lhes suporte pedagógico” (P3: EM).

Piaget (1970) concorda que os espaços escolares podem desencadear experiências decisivas na aprendizagem e na formação de estruturas cognitivas do indivíduo. Ribeiro (2004), por sua vez, reforça que essa vivência em espaços escolares agradáveis pode contribuir para a formação de laços efetivos, construindo um sentimento de identidade e de pertença. Na Escola Maria foi possível observar e até captar nas entrevistas e questionários uma dimensão de identificação dos agentes escolares, tanto no que se refere ao local de trabalho, quanto de estudo, no caso dos estudantes. Ora, se o espaço escolar constitui um lugar onde devem ser desenvolvidas as práticas pedagógicas que propiciam condições favoráveis ao bem-estar e ao conforto de docentes e discentes, não há como negar que há um clima favorável à aprendizagem (por parte dos estudantes) e à realização das atribuições de trabalho (por parte da equipe de professores e servidores administrativos).

Outro aspecto a destacar foi identificado nas respostas dos estudantes. Perguntados se a direção e os professores levavam em consideração suas sugestões para a melhoria e o sucesso escolar, mais da metade do total de estudantes inquiridos (72,8%) respondeu que “sim”; 19 (20,7%) responderam que “nem sempre isso ocorre”, enquanto apenas cinco deles (5,4%) disseram que “não”. Portanto, para a quase totalidade dos estudantes, a direção e os professores desenvolvem uma relação amigável, e suas sugestões são levadas a sério e aplicadas, de maneira oportuna, pela equipe gestora e pelos professores. O Gráfico 9 representa o resultado da analise dessas respostas, corroborando a afirmação. Entende-se, nesse aspecto, que levar em consideração as sugestões que são apresentadas para a melhoria da escola remete ao respeito mútuo, à valorização da presença e à atitude de credibilidade sobre a capacidade de alguém buscar interferir em determinada questão. Esses sentimentos, por sua vez, impulsionam a energia positiva do ambiente para a composição de um clima favorável

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a todas as relações, entre elas, e potencialmente, as relações que auxiliam na aprendizagem, que são o foco e a finalidade da escola.

Gráfico 9 – A direção e os professores da Escola Maria levam em consideração as sugestões dos estudantes

A fim de corroborar, além de enriquecer, a importância dessa discussão remete-se a Rosenthal e a Jacobson (1968), que contestam a questão da apatia das massas, fenômeno que pode surgir como efeito do desrespeito à capacidade de exercer o direito de efetiva participação. Para os autores, a contrapartida a esse efeito é reconhecer o oposto, nesse caso, a profecia autorrealizadora, a qual está relacionada ao modo como os educadores percebem e se relacionam com a maioria de seus estudantes. De acordo com essa profecia, são as expectativas que determinam as reações, ou seja, conforme forem tratados, assim eles responderão à escola. Sendo assim, se professores, pais e estudantes forem tratados com respeito e alta expectativa na escola, responderão positivamente a essa atitude, e o clima escolar, seguramente, será favorável à aprendizagem.

Lück (2000) acrescenta, além disso, entre os fatores que contribuem para um clima escolar agradável, a liderança da equipe gestora, as expectativas dos professores em relação aos estudantes, a disciplina, a organização escolar e a convivência escolar, entre outros. Para a autora, esses fatores juntos é que determinam o modo de ser e de fazer da escola, cuja centralidade está no campo pedagógico. Desse modo, se existe uma correlação entre esses fatores, a escola, consequentemente, terá um clima escolar positivo. Nessa direção, as pesquisas sobre as escolas eficazes convergem para a visão de Lück, na medida em que os resultados dos estudos

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mostram a forte liderança do diretor como um dos fatores da eficácia escolar. O seu efeito sobre o aproveitamento do aluno é indireto e exercido por meio do clima social estabelecido na escola, estimulador da aprendizagem, bem como da manutenção da ordem e da disciplina (COHN; ROSSMILLER, 1987; BROPHY, 2001; WALBERG; PAIK, 2001).

Ainda sobre a investigação do clima escolar, desta vez enfocando os professores, a pesquisadora buscou compreender a avaliação da equipe em relação à diretora da escola. Nas questões 30 a 37 do questionário aplicado aos professores, foi mensurada essa avaliação. Destaque-se que as opções dessas questões foram dispostas no formato da Escala de Likert, escala usual para a captação do posicionamento ou da opinião dos entrevistados, diante de um assunto ou indivíduo(s).

Ao ser calculado o Índice Geral de Satisfação (IGS)19 dos professores, em relação à direção da escola, o índice obtido da Escola Maria foi de 8,32. Dessa forma, a relação entre professores e diretora foi bem avaliada, uma vez que o IGS pertence à maior categoria de aprovação. Diante da avaliação satisfatória dos professores em relação à diretora, também foi interessante captar a visão dela em relação aos professores. Esta declaração da gestora da escola, coletada de um trecho da entrevista, reforça a existência do clima escolar positivo: “Dscutimos assuntos pedagógicos e administrativos em nossas reuniões escolares; de vez em quando, há discórdias, mas nada que prejudique o diálogo. Existe respeito entre todos” (D: EM).

Mais uma vez, destaque-se a coerência do princípio dialógico, o que pode ser apreendido das palavras da diretora, mesmo que sua intenção não tenha sido a de se referir formalmente a uma perspectiva paradigmática. Nota-se que as “discórdias” emergem e que são bem resolvidas; assim, a diretora ao dizer “nada que extrapole”, fica evidente, mesmo que por inferência da pesquisadora, que a discórdia traduz os momentos de ordem/desordem e a liberdade de expressão e comunicação de ideias, embora contraditórias. A diretora ainda confirma em sua fala que o respeito

19 Em seguida, é calculado o Índice de Satisfação Geral (IGS), a partir da média aritmética de todos os índices obtidos. O IGS possui mínimo de 0 e máximo de 10, tendo os seguintes intervalos de decisão: 0 a 1,99 : Discordo totalmente; 2 a 3,99: Discordo; 4 a 5,99: Neutro; 6 a 7,99: Concordo; 8 a 10: Concordo totalmente.

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prevalece e que existe o “número de acordos que é feito”, ou seja, denota que a discussão é plena e contempla as necessidades que as motivaram. As pesquisas de Herzberg (1966) revelam a presença de fatores “motivadores”, os quais asseguram a satisfação do indivíduo e, consequentemente, promovem a eficácia da atuação dele em seu local de trabalho.

Entre esses fatores, destaca-se a participação na gestão da organização e do trabalho, como parece ser confirmado no trecho da entrevista. Na Escola Maria, os professores demonstraram estar satisfeitos e motivados com o trabalho e com a organização escolar e, convergindo para a teoria de Herzberg, a razão desse bem-estar funcional pode ser encontrada exatamente na abertura que é dada à participação, o que, por sua vez, também propicia um clima escolar favorável à eficácia.

Na tentativa de avançar na compreensão daquilo que é perceptível no contato mais próximo com a escola, a pesquisadora também mensurou alguns problemas que pudessem influenciar a instituição de ensino em sua organização. Mediante os questionários respondidos pela equipe gestora, observou-se que os dados revelam a existência de alguns problemas que ocorreram na escola e, ainda, foi possível avaliar a extensão do peso desses problemas. A Tabela 3 evidencia os problemas de maior ênfase pontuados pela gestora no ambiente de trabalho, os quais dificultam o funcionamento da escola: a insuficiência de recursos, a carência de pessoal administrativo e pedagógico e os problemas disciplinares causados pelos estudantes. É sabido que não existe uma escola perfeita, todas têm problemas. Entretanto, na fala da professora (P2: EM), identifica-se o esforço conjunto empreendido pela equipe gestora e pelos professores para que os problemas não sejam maiores que as soluções encontradas de forma conjunta: “Essa escola é a melhor que já trabalhei. Logicamente, que nenhuma escola é perfeita! Não tem escola perfeita. Entre as escolas que trabalhei, essa aqui é onde eu me sinto mais apoiada” (P2: EM).

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Tabela 3 – Frequência das respostas das gestoras diante da ocorrência de problemas na escola.

ProblemasOcorreu o problema na escola?

1 2 3

Insuficiência de recursos financeiros.2

(33,3%)2

(33,3%)2

(33,3%)

Inexistência de professores para algumas disciplinas ou séries.

5(83,3%)

1(16,7%)

Carência de pessoal administrativo.2

(33,3%)2

(33,3%)2

(33,3%)

Carência de pessoal de apoio pedagógico (coordenador, supervisor, orientador educacional).

3(50,0%)

2(33,3%)

1(16,7%)

Falta de recursos pedagógicos.4

(66,7%)2

(33,3%)–

Alto índice de faltas por parte dos professores4

(66,7%)2

(33,3%)–

Alto índice de faltas por parte dos estudantes.3

(50,0%)3

(50,0%)–

Problemas disciplinares causados pelos estudantes.2

(33,3%)3

(50,0%)1

(16,7%)

Legenda: Coluna 1: Não; Coluna 2: Sim, mas não foi um problema grave; Coluna 3: Sim, e foi um problema grave.

Em suma, em que pese a existência de grandes problemas, a intensidade com que ocorrem não parece chegar a afetar o clima escolar propício ao desempenho satisfatório identificado na organização da escola, na disciplina, nas regras de convivência escolar, no respeito mútuo e nas atitudes positivas entre estudantes, funcionários e equipe gestora. Todos esses fatores contribuem para que a Escola Maria goze de um ambiente agradável e acolhedor. Esse conjunto de expectativas recíprocas compartilhadas pelos atores educacionais no espaço escolar levou a pesquisadora a observar imagens, gestos e ações positivas, além de compreender como os processos internos colaboram para a existência de uma escola eficaz.

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Visão de fatores de eficácia não contemplados na literatura de aporte ao estudo

Nas visitas à Escola Maria, a pesquisadora pôde perceber a presença de um fator de eficácia escolar que não está explicitado em Sammons, Hillman e Mortimore (1995). Trata-se da constatação de que existe uma identidade visível do professor com a sua profissão. A palavra “identidade”, segundo o Dicionário Michaelis (2006), reúne o conjunto de caracteres próprios de uma pessoa, aquilo que é considerado exclusivo dela, como esta deve ser reconhecida. Para a pergunta formulada pela pesquisadora em relação aos sentimentos quanto à profissão, as respostas, tanto da diretora como das professoras, foram assertivas, confirmando estarem todas satisfeitas com a profissão e, em algumas entrevistas, expressaram essas falas até mesmo carregadas de emoção.

A profissão docente não pode ser pensada sem a articulação da dimensão pessoal, profissional e organizacional (NÓVOA, 1992). Na dimensão pessoal, é importante ficar atento às histórias de vida e às consequentes trajetórias individuais que os professores percorrem no decorrer da vida. Por essa razão, reconhece-se a importância da diversidade de instrumentos, a partir dos quais se torna possível abranger dimensões igualmente diversas na geração de dados. Assim, a análise das entrevistas, complementada por elementos apreendidos da análise documental e da observação in loco, permitiu a integração de respostas objetivas e subjetivas, ampliando o foco da percepção do que os dados procuravam mostrar. A fala desses docentes, captada nos trechos de algumas entrevistas, expressa a importância de se integrar diferentes dimensões.

– Completo este ano 30 anos de profissão. Nestes 30 anos aprendi muito, porque a cada dia que você entra na sala de aula, você não só passa algo para o aluno, mas você também recebe muito [...]. Sou feliz por ter escolhido a profissão de professor! (P1: EM). – Sei que há outras profissões bem melhores, que até ganham muito mais. Eu gosto de ser professora, sinto que sou respeitada na escola pela direção e também pelos estudantes [...] (P2: EM).

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– Sou professora há 14 anos. Sempre quis ser professora [...]. Minha família tem muitos professores. Eu gosto da profissão e me sinto muito feliz, e ainda mais por trabalhar aqui nesta escola (P3: EM).

– Gosto muito da profissão e gosto também de ser diretora. Trabalho há 24 anos na área. Sei nem tudo são flores na educação, mas gosto muito do que faço! (D: EM).

Na dimensão profissional, implica fortalecer o acolhimento da docência como profissão. Faz-se necessário entender todo o percurso pessoal e profissional dos docentes, e assim vislumbrar a importância das práticas de formação continuada para os professores, práticas essas que devem enfocar não somente o professor individualmente, mas o coletivo docente. Não faz mais sentido um professor pensar que, ao terminar sua formação escolar e se identificar com sua escolha profissional, estará acabado e pronto para atuar em sua profissão. Segundo alguns estudiosos da área, os cursos de formação continuada têm como objetivo proporcionar aos professores atualização nas áreas acadêmicas, abrir novas possiblidades para a trajetória deles e levá-los a se inteirar de novas metodologias de ensino, colocando esses profissionais a par das discussões teóricas atuais. É certo que conhecer novas teorias fazem parte do processo de construção profissional, mas não basta, se elas não possibilitarem ao professor relacioná-las com o conhecimento prático construído em seu cotidiano (NÓVOA, 1995; PERRENOUD, 2000).

Nos questionários da equipe gestora e dos professores, havia uma questão que investigava se eles haviam participado de atividades de formação continuada. Os dados apresentaram uma divisão exata entre as respostas “sim” e “não” sobre a participação, nos últimos dois anos, em cursos de formação continuada. Três gestoras (50%) responderam “sim” e outras três (50%) responderam “não”. No caso dos professores, entretanto, a situação foi diferente. Enquanto 19 deles (76%) informaram que participaram de curso de formação continuada nos últimos dois anos, somente seis docentes (24%) responderam “não” à pergunta. Portanto, na Escola Maria, observou-se, a partir dos dados apresentados no Gráfico 10, que a maioria dos professores participou de algum curso de formação

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continuada, e isso pode ser considerado um dos fatores determinantes para uma atuação eficaz, conforme discutem autores como Perrenoud (1993, 1999) e Freire (1999).

Gráfico 10 – Você participou de alguma atividade de formação continuada?

Alves (2005) esclarece que, na dimensão organizacional, a escola necessita ser pensada como uma organização global do trabalho pedagógico. Nesse aspecto, a Escola Maria desenvolve os vários projetos já mencionados, os quais estão inseridos em seu PPP, ou seja, incluem-se como um elemento importante na dimensão organizacional. Tais projetos têm papel importante, no sentido de impulsionar as ações coletivas e apontar a direção comum a ser buscada. Nas entrevistas, também foi possível identificar que as ações coletivas por parte da direção e dos professores são construídas no decorrer das reuniões da escola. A Professora 1 informa que “na escola os projetos e as propostas pedagógicas são discutidos em reunião coletiva” (P1: EM). A Professora 2 diz que nas “reuniões coletivas da escola, todos buscam a melhor solução para o grupo” (P2: EM). E, por último, a diretora destaca que nas coordenações coletivas os professores sentem que esse é o momento de crescimento profissional coletivo: “As reuniões coletivas são importantíssimas para a escola e já fazem parte do calendário escolar” (D: EM).

Com a realização da pesquisa, foi possível notar que na escola existem professores comprometidos e visivelmente identificados com a profissão de

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educadores. E é nesse processo que a educação adquire nova significação, gerando um ensino transformador, prazeroso e multicultural, quando todos os docentes estão envolvidos com o sucesso escolar. Na entrevista da Professora 1 (P1: EM), foi possível captar essa identidade com a profissão, quando ela conclui “que são 30 anos de profissão, em que ensinou e também aprendeu muito com seus estudantes”.

A escola e o cumprimento de sua função social

Como parte de uma sociedade em transformação, a escola deve pautar-se pela compreensão histórica, científica, cultural e social da humanidade, pois é uma instituição social na qual o funcionamento cognitivo dos sujeitos se torna parte essencial da atividade principal da instituição. Em consonância com a Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDB), nº 9.394, que estabelece como um dos objetivos principais dos ensinos fundamental e médio oportunizar a todos a formação para a cidadania por meio da criação de condições de aprendizagem, a escola, hoje, precisa estar atenta à formação do cidadão pleno pela mediação do conhecimento científico, filosófico e cultural.

Nas palavras de Capanema (1996), esse ente chamado escola precisa articular entre seus profissionais de educação e estudantes a capacidade de trabalhar com experiências curriculares que busquem a inserção deles na comunidade e construir a autonomia necessária para planejar e desenvolver seu projeto pedagógico. Essa autonomia, sobretudo por resultar da competência, é que vai favorecer a construção de propostas inovadoras. Em seu artigo 32 (incisos III e IV), a LDB também estabelece que seja função da escola “o fortalecimento dos vínculos de família, dos laços de solidariedade humana e de tolerância recíproca em que se assenta a vida social”.

Libâneo (2003) chama a atenção para a participação como ferramenta primordial para a cidadania, considerando-a um recurso propiciador do cumprimento da função social da escola. Esta, por sua vez, possibilita as intervenções dos profissionais da educação, dos pais, dos estudantes, em

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prol da autonomia da escola, formando uma comunidade de aprendizagem democraticamente organizada, a qual interage com a sociedade. O autor complementa que, nesse contexto, “todos os segmentos da comunidade podem compreender melhor o funcionamento da escola, intensificando seu envolvimento, e, assim, acompanhar a educação oferecida” (LIBÂNEO, 2003, p. 330).

Considerando as estratégias pedagógicas e administrativas desenvolvidas na escola, a participação de todos os segmentos no ambiente escolar e o envolvimento do corpo docente com a prática de projetos, pode-se dizer que a Escola Maria é um espaço social privilegiado de aprendizagem e de exercício dos princípios democráticos, permitindo a contribuição daqueles que se propõem a colocar a serviço desse espaço suas aptidões cognitivas, intelectuais e sociais. Espaços assim ensinam o real significado da responsabilidade sociopolítica que deve ser exercida pela escola, além de refletir e estimular a construção de uma proposta que vem contribuindo para a produção de uma prática escolar eficaz.

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Capítulo 8

ESCOLA MARIA: CONJUGAÇÃO DE EVIDÊNCIAS NA SUPERAÇÃO DO DESAFIO DA EFICÁCIA ESCOLAR

A estrutura deste capítulo visa a agregar, na forma de uma síntese pré-conclusiva, os elementos principais resgatados da análise e da discussão dos dados, abrangendo aspectos da literatura e todos os instrumentos e procedimentos aplicados. Essa estratégia foi adotada para ambas as escolas, por não fazer parte dos procedimentos da pesquisa realizada compará-las entre si. Teve como objetivo organizar os elementos fundamentais apreendidos dos resultados do estudo, elencados e enfatizados conforme a visão da pesquisadora e consoante os aspectos apreendidos na literatura. A intenção, ao criar essa estratégia, foi lançar luz sobre os fatores essenciais que mais saltaram aos olhos com relação à eficácia escolar, em cada uma das escolas, e, em seguida, reuni-los em uma crítica mais ampla, na forma de considerações finais, desta vez, para apresentar os resultados alcançados com o estudo, convergindo para a resposta ao seu objetivo geral. Cada um dos aspectos será denominado de “evidência positiva” ou “evidência negativa”, quando for o caso.

Primeira evidência: visão singular do coletivo de estudantes

A visão desenvolvida acerca da primeira evidência teve sua origem nos resultados do questionário aplicado aos estudantes, no que se refere às respostas dadas à questão aberta. Ao ser solicitado a expressar sua opinião

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acerca do sucesso e eficácia da escola, o coletivo dos estudantes, em sua expressiva maioria, respondeu “sim”, enquanto somente cinco marcaram a opção “não”. Considera-se esse dado positivo por refletir a visão dos estudantes a respeito da escola. Decerto que esse segmento escolar é o principal beneficiário das práticas eficazes e o elemento que se constitui a finalidade de tantos esforços que visam à melhoria dos processos de ensino e aprendizagem. É preciso salientar a importância da formação de um conceito positivo a respeito da escola, sobretudo se construído com base na percepção dos estudantes. A razão mais importante é o fato de corresponder a uma confirmação de que a escola atende às suas necessidades e, de certo modo, pode-se inferir que contempla suas expectativas.

Defende-se, nesse sentido que, sem alcançar essas duas dimensões (necessidades e expectativas), dificilmente os resultados seriam satisfatórios. A primeira se define em torno das obrigações da escola, deveres a cumprir que são imputados pelo sistema de ensino e pela própria legislação. A segunda, por sua vez, diz respeito às esperanças, às perspectivas de futuro, ao desejo que todo estudante traz consigo de ser bem-sucedido. Além disso, faz parte das atribuições da escola garantir-lhe o bem-estar em todos os aspectos (físicos, emocionais, psicológicos, cognitivos e intelectuais), o que, certamente, resultará em eficácia escolar. A percepção que emerge, portanto, é de que a Escola Maria está atenta a esses aspectos e conseguindo cumpri-los a contento. Na atual conjuntura do sistema escolar, o qual tem se destacado cotidianamente pelos altos índices de evasão e reprovação, esse resultado pode ser considerado uma prerrogativa bastante positiva.

A partir da resposta dos estudantes, a pesquisadora concluiu que existe cumplicidade entre a escola e sua comunidade. Proximidade implica identificação com aquele espaço. Identificação, por sua vez, gera afeto, que gera comprometimento e envolvimento conjunto em prol do sucesso de todos e de cada um. Em outras palavras, pode-se dizer que há intensidade e reflexibilidade no relacionamento do aluno com a escola, o que faz com que ele se sinta parceiro, sujeito do processo e não somente receptor de informações. Demo (2003, p. 22) parece traduzir uma das razões que, no ambiente de aprendizagem da Escola Maria parece provocar esse envolvimento discente. O autor se pronuncia de forma convergente,

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quando diz que “em vez do ritual expositivo docente e da passividade discente, busca-se criar um espaço e um momento de trabalho conjunto, no qual todos são atores, colaborando para um objetivo compartido”.

Com o fim de consubstanciar essa percepção, construiu-se um discurso coletivo, conforme orienta o método adotado do Discurso do Sujeito Coletivo (DSC), cuja elaboração levou em conta a manifestação dos estudantes nessa questão aberta do questionário. Assim, pode-se resumir que, em seus argumentos, os estudantes da Escola Maria se manifestaram da seguinte forma:

– Na escola todos se respeitam, existe diálogo e as pessoas conseguem ter um bom relacionamento. A escola tem boa estrutura física, recursos pedagógicos, é organizada, está sempre limpa e possui uma direção muito responsável, que é formada por boas pessoas. Além disso, tem ótimos professores, oferece um ensino de qualidade e que atende às nossas necessidades. A escola leva em consideração a nossa opinião e também a dos servidores, por isso podemos responder que é uma escola eficaz.

O discurso dos estudantes deixa clara a visão positiva que esse coletivo construiu acerca da Escola Maria.

Segunda evidência: o paradoxo no estilo de gestão

O paradoxo no estilo de gestão foi identificado a partir de análise realizada sobre o estilo de liderança da equipe gestora, o qual foi analisado sob dois ângulos: um poderia ser considerado evidência positiva e outro evidência negativa, conforme os diferentes olhares lançados sobre a questão. No ângulo positivo, destaca-se o modo como a gestora estimula a participação e o envolvimento dos professores em ações pedagógicas e administrativas. Reynolds e Teddlie (2008) justificam que o estilo de liderança do diretor constitui aspecto primordial em uma escola. Tal é a importância atribuída a esse aspecto que, em pesquisas sobre eficácia escolar, a liderança efetiva do diretor pode ser concebida como “sinônimo”

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de escola bem-sucedida. Motivar envolvimento com a tarefa constitui fator primordial para o sucesso escolar, na medida em que o entusiasmo dos professores na expectativa de bons resultados termina refletindo para o estudante mais do que mero conteúdo e simples meio de cumprir o currículo preestabelecido. O papel do educador nesse caso transcende o comum e transmite emoção, alegria, esperança e vontade de ensinar, atitudes que, por sua vez, estimulam a vontade de aprender.

Visando consubstanciar o estilo de liderança como evidência positiva, procedimento análogo foi adotado, desta vez utilizando o conjunto de respostas às questões da entrevista realizada com as professoras. Do mesmo modo, ao responderem sobre “o que é uma escola eficaz” e se elas “consideravam a Escola Maria uma escola eficaz” (questão semelhante à dos estudantes), concluiu-se, conforme rege o método (DSC), que o “coletivo” dos professores respondeu da seguinte forma:

– Uma escola eficaz é aquela em que todos trabalham visando a um objetivo comum, que é o sucesso escolar do aluno. Onde os estudantes respeitem e também se sintam respeitados, onde há regras de convivência estabelecidas e cumpridas e onde a direção da escola torna-se parceira dos diferentes segmentos da escola. A Escola Maria é uma escola eficaz, porque nós, professores, temos oportunidades e liberdade para desenvolver conteúdos e projetos. É um ambiente de aprendizagem, os estudantes são incentivados a estudar e desafiados a buscar novos caminhos para a aprendizagem com as diversas práticas de projetos. A escola tem um ambiente harmonioso e tranquilo para se trabalhar, as regras de disciplinas são cumpridas por todos, é uma escola organizada, limpa e aconchegante. Os professores participam das reuniões, opinam e se envolvem com os projetos da escola. Os conteúdos ministrados em sala de aula são desenvolvidos de forma contextualizada, para que todos os estudantes tenham possibilidade de aprendê-lo. Nessa escola, há um ambiente onde se estabelece uma relação respeitosa nas salas de aulas com os estudantes, seus pais e com a comunidade escolar.

O discurso dos professores igualmente reflete a visão positiva que esse coletivo construiu acerca da Escola Maria, no fator liderança escolar.

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Em contrapartida, olhando pelo ângulo negativo, que, paradoxalmente, poderia sugerir vestígios de um estilo de liderança, chama-se a atenção para uma evidência observada na Escola Maria, a qual denota atitude de suposta “submissão” dos agentes diante da figura da gestora. Nesse ponto, resgata-se a mudança de direção da escola e o processo de transição pelo qual a equipe passou, em decorrência da permanência de uma equipe gestora por oito anos consecutivos, trazendo implicações para o perfil da equipe atual e para as práticas da escola. As implicações decorrentes desse episódio dizem respeito à percepção de certo movimento “passivo”, ao estabelecer as práticas escolares. A despeito da cumplicidade, da harmonia visível e do envolvimento intenso, como fatores positivos que emergem do ambiente da Escola Maria, percebe-se que se trata de uma escola que precisa do comando da figura do diretor ou da equipe gestora para direcionar as ações a serem realizadas, mesmo sendo planejadas em conjunto, o que, supostamente, remeteria a um alto grau de controle, e que, decerto, se tornaria prejudicial ao clima escolar. No entanto, o que se observou claramente foi a distinção entre essa atitude de comando e aquela que provém do estilo “chefia”. Esse não é o caso da Escola Maria.

Infere-se, todavia, que esse perfil passivo veio se desenvolvendo num crescendo, em decorrência do estilo de liderança que antecedeu o atual. Embora não se pretenda imergir nas questões de gênero, julga-se importante – e, questão intrigante para novos estudos – informar que a equipe anterior era composta somente por membros do sexo masculino e a equipe seguinte, por membros do sexo feminino. Não há como desconsiderar o consenso, nesse caso, de que a visão que distingue situações pelo critério de pertencer ao sexo oposto decorre de uma construção social, corroborada, muitas vezes, pelas diferentes instituições, em diferentes contextos. Assim, conforme os valores defendidos, não há como evitar a hipótese de que possa ter havido alguma influência nesse aspecto. Nem tanto pela questão de gênero, mas pelo modo de agir que parece ser inerente à natureza humana e que, reconhecidamente, se diferencia em cada sexo. Segundo Cummings (1993), essa diferença se deve ao fato de que os líderes homens tendem a privilegiar os comportamentos mais assertivos e voltados para a execução de tarefas, ao contrário das

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líderes mulheres, que costumam privilegiar a construção de relações mais “democráticas”.

Observação inconteste, entretanto, foi a de que a equipe da escola parece ter adquirido um perfil de “deixar-se conduzir”, o que se revelou, depois da mudança, como a necessidade de ser orientada a agir, apesar de se mostrar uma equipe responsiva às necessidades dos estudantes. A relação entre a passagem, relativamente longa, da equipe (masculina) anterior e a atual (feminina) pode ser constatada pelo depoimento dos próprios membros da direção atual, que terminam por deixar implícito que prevalece a tendência em dar continuidade ao estilo da equipe anterior:

– Assumi a direção com um pouco de receio, porque o diretor que estava aqui era muito querido por todos. Tiveram e ainda têm muitas comparações. Fazer o quê? O diretor era assim, adorado na escola, na comunidade e aqui no bairro. No início da nossa gestão, fomos rígidas com as regras disciplinares, continuamos dando apoio e liberdade aos professores e servidores. Os estudantes sentiram muito a saída do diretor. Não foi fácil, espero que este ano seja melhor, pois toda equipe percebeu que continuamos o trabalho (D: EM).

– Na época que o diretor chegou aqui na escola foi um alívio para todos. A escola era muito problemática. O diretor começou a mudar a imagem da escola junto à comunidade aqui do bairro. Fez um compromisso com todo grupo da escola, professores, servidores, alunos e com a comunidade local. Ele dizia que a escola iria mudar, era só uma questão de tempo. Fizemos muitos mutirões de limpeza, construímos juntos muitas coisas. As meninas da direção estão continuando o trabalho que foi iniciado por ele. No começo do ano passado, tivemos receios, sim. Hoje estou feliz com a equipe gestora, pois elas estão trabalhando e dando sequência ao trabalho que foi iniciado anos atrás (P3: EM).

Conforme se infere das respostas, de fato, se mantém um vínculo forte com a equipe gestora anterior, a qual parece permanecer “comandando” o ambiente da escola no imaginário de seus segmentos. Esse apego se revela de tal modo expressivo que a ideia de “continuar o trabalho anterior” se repete em todas as falas. Diante desses dados, a pesquisadora foi induzida

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a concluir que o perfil subserviente generalizado se deve, como herança, à personalidade forte e centralizadora da equipe anterior, sem perder de vista que não houve prejuízo para as relações benéficas e práticas bem-sucedidas que a escola aprendeu a desenvolver.

Terceira evidência: implicações de um ambiente favorável

Nesse aspecto, destaca-se que a Escola Maria apresentou, em seu conjunto, práticas escolares efetivas em um ambiente que favorece a participação e o envolvimento de todos os atores educacionais. Foi observado, também, que na escola existe um clima favorável à aprendizagem e ao sucesso escolar. Nessa questão do ambiente favorável, concorda-se com Antunes (2003, p. 47), quando reforça a importância de duas vertentes essenciais em relação à função da escola. De um lado, a tarefa de “trabalhar as relações interpessoais para desenvolver no aluno uma visão sistêmica da escola e de seu papel”; de outro, preocupar-se em “facilitar sua integração com a comunidade, professores e colegas, através de uma colaboração confiante e pertinente”. Ou seja, o alerta é para o valor de se integrar o interno e o externo da escola, de forma equitativa atribuindo significado e finalidade ao desenvolvimento da visão sistêmica do aluno em relação à escola e ao seu papel na comunidade.

Resgatando o perfil de Mariana (2008), traz-se à evidência o relato sobre sua alegria depois de uma atividade desenvolvida em sala de aula com essa ideia de visão sistêmica da escola. Assim Mariana se expressava:

– [...] quando olho para essas crianças, vejo uma alegria que irradia dos seus olhos e consigo perceber o que atitudes de amorosidade são capazes de fazer. Diante de um simples gesto de amor e carinho, as crianças demonstram o quanto são carentes, o quanto a escola passa a ser um local seguro para elas. Trago comigo um compromisso pessoal e profissional junto a essa escola, além das atividades escolares, que é oficio primordial da escola. Também deixo fluir o amor que tenho por meus estudantes e pela profissão que abracei de forma tão verdadeira e intensa. Muitas vezes percebo que as crianças (meus estudantes),

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a cada dia necessitam ser vistas (olhadas) e cuidadas e é a isto que chamo de atenção. O que recebo em troca? Olhares e muitos gestos de uma gratidão que irradia dos seus olhos, e se materializam em abraços, beijos e cartinhas que elas me escrevem.

Quarta evidência: a identificação com a profissão e a consciência do papel social

O olhar focalizou aqui um elemento inusitado, quando se considera uma situação que raramente é observada nas organizações, de modo geral, e principalmente nas escolas: trata-se da “identificação com a profissão”. É visão consensual nos dias de hoje que a escolha da profissão, desde há muito tempo, não tem merecido o privilégio de eleger a “empatia profissional” como critério essencial. Em decorrência de toda uma conjuntura desfavorável às escolhas profissionais por afinidade, os indivíduos, na maioria das vezes, se veem induzidos a ingressar em um campo de trabalho por infinitas razões, menos pelo talento, habilidade ou vocação para desempenhar determinados papéis. Essa identidade com a profissão de professor, felizmente, fez a diferença na Escola Maria, de tal maneira, que o brilho nos olhos daqueles que a declararam não passou despercebido à pesquisadora.

Freire enfatiza que nenhuma atuação docente pode fazer-se competente se o indivíduo não estiver realizado no espaço que trabalha, com as pessoas com quem convive diariamente. É necessário, afirma o autor, que o docente incorpore e assuma seu papel como ser social, como ser pensante, transformador e criador, capaz de realizar não só os sonhos do “outro”, mas também os seus. A partir dessa nova postura, deverá reconhecer-se conforme a máxima de Freire que diz: “a assunção de nós mesmos não significa a exclusão dos outros” (FREIRE, 2004, p. 98). Em outras palavras, é permitido ao professor elevar-se ao patamar inusitado do que é regido pela esperança e pelo amor, sem prescindir dele mesmo e de seus estudantes.

Freitas (2005), por exemplo, insere essa questão no âmbito da função social da escola, na medida em que esse envolvimento extraescolar do

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professor propicie o acesso a espaços e informações que resultam no exercício da cidadania. Essa visão remete de imediato à consciência de que o professor tem um papel social a cumprir, abrangendo também a tarefa de “provocar ‘conflitos intelectuais’, para que, na busca do equilíbrio, o aluno se desenvolva” (p. 95). Desse modo, se alcançará o reconhecimento, portanto, de que esse papel social só emerge quando o educador se identifica com o ambiente e, em consequência, passa a exercer o que se pode chamar de “maturidade profissional”, elemento que permite enxergar a profundidade da dimensão humana subjacente à sua profissão. Essa dimensão, por sua vez, vai alcançar a seara da responsabilidade social, o outro fim do trabalho, elemento que se distingue como extensão da identidade com a profissão. Tudo isso foi colocado aqui como reflexo das práticas que foram observadas na Escola Maria e que estão envolvidas nos projetos educacionais, cujos resultados parecem ser orientados por essa identificação e delas se originam como fator propulsor.

Quinta evidência: uma visão renovada da função social da escola

Caracterizada como “renovada”, fala-se de uma visão que se acredita resultar da identidade com a profissão de educador. Lück (2002) afirma que, quando todos os segmentos da escola têm liberdade para trabalhar, ensinar e aprender e agir com criatividade frente aos obstáculos, superando as expectativas em relação às demandas dos sistemas de ensino e intervindo de forma direcionada sobre os objetivos da instituição, a escola demonstra estar cumprindo sua função social. Entre outros indicadores, esse aspecto é evidenciado quando a escola consegue ensinar todos os estudantes. Os dados do Ideb, corroborados por outras evidências apontadas, demonstram que se trata de uma situação verificada na Escola Maria.

Cumprir sua função social, por conseguinte, atribuiu à escola, antes de tudo, uma habilidade, por parte da equipe gestora e docente, de ser responsiva às necessidades e às expectativas do aluno. O empenho para tanto decorreu de uma consciência que veio sendo construída gradativamente e

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que permanece em construção num processo ad infinitum, por se tratar da educação do humano. Essa consciência diz respeito à compreensão de que ensinar é um verbo a ser conjugado no modo de uma prática da responsabilidade social. Tal ação tem mais valor quando é correspondida na forma de aprendizagem pelos estudantes oriundos de ambientes desfavorecidos em todos os aspectos.

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Capítulo 9

ESTUDO DE CASO DA ESCOLA ANA

Como ocorreu com a Escola Maria, este capítulo destina-se ao estudo de caso realizado na Escola Ana. A linha de discussão tecida aqui teve por base os objetivos estabelecidos na pesquisa de origem e as questões que instigaram sua realização. Adotou-se, desse modo, o mesmo trajeto utilizado na Escola Maria, cuja estratégia permitiu prosseguir na identificação e na organização dos elementos necessários ao delineamento das considerações finais, de forma gradativa e devidamente encadeada.

Escola Ana: aspectos da conjuntura local

A Escola Ana situa-se a 25km do centro do Distrito Federal, em Samambaia, XII Região Administrativa. A localidade já existia como área agrícola às margens do Córrego Samambaia. Com a intensificação da migração para o Distrito Federal e o surgimento de várias invasões, o governo local, em 1985, transferiu essas invasões para aquele espaço geográfico, fixando assim os primeiros moradores de Samambaia. A Figura 2 ilustra o roteiro de deslocamento do centro até a escola.

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Figura 2 – Trajeto Brasília/Samambaia – Mapa do Distrito Federal

Fonte: <http: //www.brasil-turismo.com/distrito-federal/mapa-regioes.htm&docid=SQEMFmTEQABg0M

&imgurl>. 2012.

No que concerne à conjuntura educacional, Samambaia conta, atualmente, com 39 escolas da rede pública de ensino, todas situadas na área urbana. Quanto ao quantitativo de estudantes, dados da Pesquisa Distrital de Amostra de Domicílios (PDAD/2010), revelam que é composto por uma parcela de 33,5% da população de Samambaia, sendo que a maior parte está matriculada em escolas públicas.

Em seu quadro discente, a escola possui, aproximadamente, 1.300 estudantes, todos matriculados no ensino fundamental (anos finais), que é o único nível atendido pela escola. Possui, ainda, vinte salas de aula e uma estrutura física comum à maioria das demais escolas pertencentes à rede pública do Distrito Federal: um laboratório de informática, uma sala de leitura e uma sala de vídeo.

Há, ainda, nessa estrutura, a área denominada de administrativa, composta pela sala da direção e pela sala das coordenadoras, biblioteca, secretaria, banheiros, pátio coberto, quadra de esportes e sala de informática com mais 30 computadores com acesso à internet. A escola é toda murada e, assim como a Escola Maria, também chama a atenção pelo ambiente limpo e muito bem organizado. Quanto aos recursos humanos, a unidade de ensino contava, em 2011/2012, período de realização da pesquisa, com

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40 professores (incluindo coordenadoras e professores que trabalham na equipe gestora). Atuando em setores administrativos, como secretaria, vigias, porteiros e pessoal de limpeza, a escola possuía um quadro de 20 funcionários.

Aspectos do contexto escolar: perfil da equipe e da comunidade a que atende

A equipe gestora é composta por cinco pessoas, nenhuma delas graduada em Pedagogia, mas formadas em outros cursos, tendo a pós-graduação lato sensu (com mínimo de 360 horas) como a mais alta titulação. Levantando dados do perfil dos professores, quando inquiridos sobre sua graduação, uma professora (3,4%) informou ser graduada em Pedagogia; 22 docentes (75,9%) informaram possuir educação superior no nível de licenciatura e dois (6,9%) em outros cursos superiores; quatro (13,8%) não responderam à questão. Os dados revelaram, ainda, que 20 professores (69%) possuem a pós-graduação lato sensu, seis (20,7%) não a possuem ou não completaram a pós-graduação, um (3,4%) tem somente curso de atualização de no mínimo 180 horas e dois docentes (6,9%) nada informaram. Se levado em conta o quesito nível de formação e considerando que a maior parte dos professores da Escola Ana possui título de pós-graduação, pode-se afirmar que a equipe possui os mais altos níveis de qualificação para o exercício da função.

No que concerne ao tempo dedicado à escola, todas as respondentes da equipe gestora (100%) afirmaram que só exercem atividades na SEE/DF, o que quer dizer que fizeram opção pela “dedicação exclusiva”, requisito exigido pela legislação própria do sistema público do Distrito Federal. Em relação ao tempo de profissão na educação, três (60%) trabalham há mais de 15 anos e duas (40%) informaram que exercem a profissão entre cinco a dez anos. Com relação à carga horária de trabalho na escola, as respostas das gestoras foram distintas: três (60%) alegaram trabalhar 40 horas semanais, uma gestora (20%) informou que trabalha mais de 40 horas e uma (20%) não respondeu à questão.

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Os dados da Escola Ana registram 28 docentes (96,6%) com dedicação exclusiva e um professor (3,4%) informou exercer outra profissão fora da educação. Com relação ao tempo de profissão dos docentes, os resultados foram distintos. De acordo com o Gráfico 11, 12 docentes (41,4%) informaram que atuam entre 15 a 20 anos, nove (31%) entre 10 a 15 anos, quatro (13,85%) há mais de 20 anos, três (10,3%) de seis a nove anos e um professor (3,4%) informou que trabalha entre três e cinco anos. Instados a se manifestar em relação à sua carga horária de trabalho, 27 professores (93,1%) responderam que sua carga é de 40 horas, um professor (3,4%) alegou que trabalha entre 21 e 30 horas por semana e um nada informou.

Gráfico 11 – Há quantos anos você está lecionando na Escola Ana?

Refletindo mais uma vez sobre a relação anos de profissão/horas dedicadas ao trabalho, à luz de Tardif (2001), concorda-se que:

[...] o trabalho cotidiano do professor é um ato que não apenas engloba a prática pedagógica, mas também estrutura organizacional, pressupostos, valores e condições de trabalho, método, organização

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e âmbito das atividades, organização do tempo e do espaço, não sendo nem simples e nem previsível, mas complexo e enormemente influenciado pelas próprias decisões e ações desses atores (p. 121).

Tardif destaca que os elementos que compõem a rotina profissional do professor transcendem as tarefas que dizem respeito à prática pedagógica, como o planejamento das aulas, o acompanhamento da aprendizagem dos estudantes, entre outras. O autor diz que há outros fatores que agem de forma integrada, afetando positiva ou negativamente o modo como o professor passará a agir diante de sua profissão, ao longo dos anos de trabalho.

Quanto às questões de gênero e faixa etária, dos 29 participantes da pesquisa na Escola Ana, 21 são mulheres e 8 são homens. A maioria (55,2%) se inclui na faixa etária entre 30 e 39 anos, 12 (41,4%) entre 40 a 49 anos e somente um (3,4%) informou ter acima de 56 anos.

Sobre o perfil dos 224 estudantes entrevistados, 104 são do sexo masculino e 120 do sexo feminino. Em relação à idade, 17 têm 13 anos, 122 têm 14 anos, 69 têm 15 anos, 13 afirmaram ter 16 anos ou mais e 3 não informaram a idade. Quanto ao nível de escolaridade de seus pais e/ou responsáveis, os dados mostraram que os pais de 46 estudantes possuíam ensino superior; 91 têm o ensino médio; 41 concluíram o ensino fundamental; 29 têm o ensino fundamental incompleto; 2 informaram que os pais são analfabetos; 9 responderam “outros” e 6 estudantes não informaram. Entre os dados, misturam-se os níveis de escolaridade de mães e pais. Nesse caso, conforme procedimento adotado na Escola Maria, optou-se, como resposta, pelo nível de escolaridade da “mãe”, como pode ser constatado no Gráfico 12.

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Gráfico 12 – Dados da escolaridade das mães dos estudantes da Escola Ana

Contexto da análise aplicada na Escola Ana

Com a observação in loco foi possível perceber a comunidade como participativa e envolvida nas atividades escolares. Por essa razão, a participação, também na Escola Ana, se constitui um dos fatores que se destacou como favorecedor do sucesso escolar. Nas palavras de Neubauer e Silveira (2009), quando se referem à participação da comunidade, esta não ocorre de imediato, pois a escola não se torna participativa num “passe de mágica”. Trata-se, portanto, de um processo gradativo, construído num crescendo, em conjunto, a partir de ações que se tornam sistematizadas, na medida que tanto os seus segmentos como a comunidade externa abraçam a causa da escola. É necessário, contudo, que ambas sejam estimuladas a se integrar à escola e a participar de seu cotidiano, bem como a construir uma imagem positiva das possibilidades efetivas e dos resultados dessa participação nas melhorias do ambiente escolar.

Trechos das entrevistas confirmam o grau de confiabilidade e a força desse discurso naquele ambiente escolar. A diretora se coloca em uma posição de escuta, quando revela: “Sempre escuto as opiniões dos professores, servidores e alunos. Depois avalio com a equipe gestora

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aquelas sugestões que serão viáveis para o melhor andamento da escola” (D: EA). No fragmento da entrevista da Professora 3, fica evidente a força da comunidade escolar: “A equipe de direção sempre está presente nas reuniões coletivas da escola, e também os nossos alunos se envolvem efetivamente em todos os projetos” (P3: EA).

Tanto quanto na Escola Maria, a limpeza e a organização da parte física da Escola Ana também se destacam como boas práticas na administração e na conservação do ambiente escolar. Observação semelhante se confirma na área pedagógica, mais especificamente, quando se trata dos projetos, os quais a pesquisadora teve oportunidade de conhecer e, por diversas vezes, até de assistir quando estavam sendo desenvolvidos, em visitas de campo. Entre outros, o Projeto de Dança, que ocorre há onze anos, recentemente renomeado para o Festival de Talentos. Outro projeto, que é desenvolvido há cinco anos, é o Semana África-Brasil. Neste são trabalhadas as questões étnico-raciais, ressaltando-se um envolvimento entusiasmado de todos os professores e estudantes. É interessante que esse projeto se torna tema transversal dos conteúdos, buscando integrar e conectar todas as disciplinas, resultando em uma prática interdisciplinar. Durante o quarto bimestre, ocorre o fechamento da Semana África-Brasil, sempre no dia 20 de novembro. Observou-se, ainda, que, na apresentação do projeto Semana África-Brasil, a escola conta com a presença de muitos convidados, entre eles representantes da coordenação da Regional de Ensino de Samambaia, do Sindicato dos Professores do Distrito Federal, dos grupos culturais da cidade e um número expressivo de pais, o que denota a adesão e a valorização das ações pela comunidade externa, de gestores do governo local e de parceiros da sociedade, em geral.

Semelhante ao ocorrido na Escola Maria, a pesquisadora também teve a oportunidade de acompanhar a aplicação da Prova Brasil, em novembro de 2011. Para esse contexto da avaliação externa, chama-se a atenção para o fato de que a Escola Ana, na edição de 2009 da Prova Brasil – Língua Portuguesa, diferentemente da Escola Maria, apresentou avanços em seu desempenho, se comparada às notas do Distrito Federal. Na Escola Maria, os índices regrediram discretamente nesse mesmo ano e disciplina. Os gráficos que se seguem situam a Escola Ana no Distrito

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Federal, em relação às notas obtidas nas três edições (2005, 2007 e 2009) da Prova Brasil. Na disciplina Língua Portuguesa, a escala de proficiência varia do nível 125 a 325.

O Gráfico 13 demonstra que a Escola Ana obteve 235,16, 248,28 e 250,32 e o do Distrito Federal, 232,40, 236,87 e 242,87. Observa-se que, em todos os momentos aqui apresentados, a escola esteve acima da proficiência do Distrito Federal.

Gráfico 13 – Desempenho da Escola Ana na Prova Brasil – Língua PortuguesaFonte: <http: //www.portalideb.com.br/#{“municipio_id”: “5300108”,”rede”: “estadual”,”serie”: “8”,”-visao”: “proficiencia”,”aba”: “escola”}>. 2012.

Na disciplina Matemática, edição 2009, conforme Gráfico 14, a escola apresentou nota menor, se comparada à edição de 2007; mesmo assim permanece, em proficiência, superior ao Distrito Federal. As notas do Distrito Federal nessa avaliação foram 249,10, 250,70 e 249,36; as notas da Escola Ana, 254,12, 262,89 e 252,96, nas sucessivas edições (2005, 2007 e 2009). No caso de Matemática, a escala de proficiência varia de 125 a 350, variando pouco em relação à Língua Portuguesa.

Gráfico 14 – Desempenho da Escola Ana na Prova Brasil – MatemáticaFonte: <http: //www.portalideb.com.br/#{“municipio_id”: “5300108”,”rede”: “estadual”,”serie”: “8”,”-visao”: “proficiencia”,”aba”: “escola”}>. 2012.

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Comparada ao Ideb, a Escola Ana apresentou aumento no índice em 2009 (4,5), em relação a 2005 (3,4) e a 2007 (3,8). Os resultados do Distrito Federal, em 2005, 2007 e 2009, foram respectivamente 3,2; 3,5; 3,9. Em face desse quadro, conclui-se que a escola tem superado a si e ao DF nas avaliações externas do período investigado, como ocorreu também na Escola Maria. Avaliando a Escola Ana nos moldes de cálculo do Ideb, admite-se que, em 2009, ao apresentar o valor de 0,89, incluiu-se na faixa do que é considerado razoável. Em relação à proficiência, que indica o aprendizado do aluno, o qual é representado pelos resultados de Língua Portuguesa e Matemática na Prova Brasil e que varia de 0 a 10,20 a Escola Ana obteve a nota 5,05, alcançando o que pode ser chamado de proficiência adequada. O Gráfico 15 demonstra, com clareza, os avanços da Escola Ana.

Gráfico 15 – Evolução do Ideb da Escola AnaFonte: <http: //www.portalideb.com.br/#{“municipio_id”: “5300108”,”rede”: “estadual”,”serie”: “8”,”- visao”: “proficiencia”,”aba”: “plano”}>.

É preciso dizer, também em relação à Escola Ana, que não se observou, como prática adotada na escola, trazer a Prova Brasil, ou qualquer outra avaliação externa, para o contexto pedagógico e explorar esse evento como base para conteúdos ou sugestões que possam enriquecer ou orientar o planejamento diário, no período em que antecede sua aplicação.

20 O Ideb considerou a seguinte escala em relação a proficiência: 0 a 3,4 (baixo), 3,5 a 4,9 (razoável) e 5 a 10 (adequado).

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Igualmente ocorre com o período posterior aos resultados da avaliação. Entretanto, outro aspecto foi observado, a partir das entrevistas, em relação às avaliações externas: os professores confundem a avaliação institucional que a SEE/DF implantou com o Sistema de Avaliação do Desempenho das Instituições Educacionais do Sistema de Ensino do Distrito Federal (Siade)21 e com a Prova Brasil, que é realizada pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep). As entrevistas corroboram essa afirmativa tanto nos fragmentos das falas da diretora como nas do Professor 2, que afirmam: “Não sei bem falar da Prova Brasil. Acho que faço confusão com a prova que a SEE/DF aplicava, o Siade” (D: EA). Em outro trecho: “Os resultados da Prova Brasil não são discutidos na escola” (P2: EA).

Juntamente com a observação in loco, integraram-se elementos da análise documental, o que levou a pesquisadora a verificar na escola aspectos relevantes de seu Projeto Político-Pedagógico e de uma apostila que contém as normas disciplinares. Esses elementos serviram de base para a análise e a discussão em todos os momentos. Com relação aos resultados dos questionários, estes foram elaborados conforme o público a que se destinou e de acordo com o quantitativo expresso no Quadro 7.

Quadro 7 – Total de questionários aplicados na Escola Ana

Tipos de questionários Quantidade

Equipe gestora 5

Professores 29

Estudantes 224

Escola Ana 258

21 O Sistema de Avaliação do Desempenho das Instituições Educacionais do Sistema de Ensino do Distrito Federal (Siade) foi criado por meio do Decreto nº 29.244, de 2 de julho de 2008. É um instrumento permanente de planejamento, destinado a aferir as condições da oferta do ensino nas escolas públicas e privadas do Distrito Federal, de forma a garantir o pleno desenvolvimento do educando, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho. O Siade possibilita a realização de um profundo diagnóstico do sistema de ensino do Distrito Federal, na medida em que é composto de vários tipos de instrumentos relacionados a distintos aspectos do processo de ensino-aprendizagem, além de levar em conta o desempenho da escola nas avaliações oficiais realizadas pelo MRC e no Ideb. Permite, assim, que a própria administração da instituição seja também avaliada. (SEE/DF, 2008). Disponível em: <www.antigo.se.df.gov.br/300/30001007.asp?++CD_CHAVE=13438>.

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As etapas de aplicação transcorreram normalmente durante a coordenação coletiva dos professores, em que estavam também presentes a supervisora pedagógica e as coordenadoras. Não houve resistência por parte dos professores e da equipe gestora em responder aos questionários, sendo que destes retornaram 15 da parte dos professores e quatro da parte da equipe gestora. Durante o intervalo, autorizada pela direção, a pesquisadora conversou com os professores que estavam em coordenação no turno contrário, buscando sensibilizá-los para responder aos questionários. Estavam presentes 14 professores e todos (100%) devolveram os questionários devidamente respondidos. Quanto ao retorno da parte da equipe gestora, dos sete membros, cinco devolveram os questionários respondidos, portanto a taxa de retorno foi de 71,42%. Diferentemente da Escola Maria, os professores não apresentaram nenhuma objeção em relação ao número de questões e nem ao tempo que seria subtraído de sua rotina para respondê-las. Foram distribuídos 29 questionários e o retorno foi de 100%.

A terceira etapa de aplicação ocorreu com os estudantes nas turmas do 9º ano. No dia estabelecido para a aplicação, uma turma estava em aula de educação física na quadra da escola e outra turma estava em atividade fora da escola; portanto, o acesso foi somente para oito turmas. Os estudantes foram receptivos no preenchimento, sendo que cada turma levou, em média, de 10 a 15 minutos para responder. Foram distribuídos 224 questionários, com taxa de retorno de 100%.

Concluída a etapa da coleta de dados via questionários, iniciou-se a realização das entrevistas. Apesar da intercorrência da greve dos professores, a pesquisa transcorreu normalmente, mesmo diante dos obstáculos que seriam comuns à conjuntura vigente. Uma das professoras (P1: EA), por exemplo, além de concordar em realizar a entrevista no período de greve, tentou viabilizá-la, solicitando que fosse realizada fora do ambiente da escola. Com a diretora, a entrevista havia ocorrido em janeiro de 2012. Informa-se, por oportuno, que, assim como ocorreu na Escola Maria, todos os procedimentos formais exigidos pela academia foram cumpridos, entre eles, prestar todos os esclarecimentos sobre a pesquisa e os respectivos procedimentos de sua realização, dentro do que fosse necessário, além de

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solicitar autorização para as gravações, as quais foram, posteriormente, transcritas na íntegra. Quanto às informações quantitativas das entrevistas, seguem detalhadas no Quadro 8.

Quadro 8 – Quadro síntese das entrevistas Escola Ana

Entrevistados Área de Atuação Sigla Tempo de gravação Páginas transcritas

Diretora Gestão D 31m15s 16 páginas

Professora 1 Humanas/História P1: EA 26m59s 13 páginas

Professor 2 Códigos/Inglês P2: EA 14m55s 7 páginas

Professora 3 Ciências da Natureza P3: EA 14m24s 8 páginas

Total 1h18m17s 44 páginas

Da categorização dos dados resultou o Diagrama 4, que se segue, cuja estratégia manteve como suporte teórico-metodológico o pensamento de Bardin (1988). Todos os procedimentos realizados com a Escola Maria, no que se refere às etapas de análise, linha de discussão e categorização, foram desenvolvidos de forma idêntica com a Escola Ana, visando manter o foco nos objetivos da pesquisa, que foram comuns, e a congruência quanto aos procedimentos metodológicos.

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Diagrama 4 – Apresentação das categorias e subcategorias após leitura das entrevistas – Escola Ana

No que concerne às categorias encontradas, ocorreu que, em grande parte, aquelas definidas na análise da Escola Maria se repetiram na Escola Ana. Na visão da pesquisadora, ancorada em suas observações de campo e nas reflexões que se sucederam durante a integração entre impressões e dados levantados, justifica-se essa ocorrência pelas similaridades entre ambas as escolas, dadas as características e os critérios que levaram à escolha dessas e não de outras, entre tantas escolas da rede escolar do Distrito Federal. Desse modo, comparando-se as duas escolas, as categorias coincidentes foram: 1) Escola como ambiente propício de aprendizagem e 2) Clima escolar, classificadas como as “grandes categorias”. Como

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subcategorias, convergindo para cada uma das “grandes categorias”, encontraram-se: 1.1) Disciplina; 1.2) Prática de Projetos; 2.1) Respeito; 2.2) Diálogo; 2.3) Confiança; 2.4) Relações interpessoais.

Se comparadas as duas escolas, observa-se que no grupo das subcategorias houve convergência para a grande categoria: Clima Escolar. Como subcategorias diferentes da Escola Maria, destacaram-se quatro, somente entre as que convergem para a grande categoria Escola como ambiente propício de aprendizagem. São elas: 1) Envolvimento da equipe gestora com a equipe escolar; 2) Expectativas elevadas do professor/aluno; 3) Exigência/cumprimento sistemáticos das atividades professor/aluno; e 4) Colaboração entre escola e família.

É interessante observar que, embora algumas categorias não tenham coincidido, quando se estabelece uma comparação entre as duas escolas, algumas questões causam estranhamento. Apesar de tais questões estarem apresentadas de forma mais aprofundada no capítulo final, vale antecipar que essa diferença não significa que aspectos identificados nas categorias Organização dos espaços físicos e pedagógicos e Objetivos comuns, por exemplo, não sejam característicos também da Escola Ana. Diante do que foi avaliado, a posteriori, como sendo nível superior de “maturidade organizacional” alcançado pela Escola Ana, esses aspectos parecem já ter se incorporado à sua dinâmica. Seguindo por essa via de raciocínio, as outras duas categorias – Expectativas elevadas do professor/aluno; Exigência/cumprimento sistemático das atividades professor/aluno – entre as quatro subcategorias que somente foram identificadas nesta escola, parecem corroborar essa percepção, na medida em que podem ser consideradas como passos adiante na mentalidade ou, dito em outras palavras, como fator que indica crescimento, evolução positiva, por parte de uma instituição educacional.

Conforme mencionado neste tópico, a análise e a discussão mais aprofundadas acerca das categorias e subcategorias, sua finalidade e o que representaram como implicações do estudo são realizadas no capítulo final. Contudo, julga-se imprescindível ratificar que, depois de identificadas as categorias, os aspectos, os elementos ou fatores a que remetem cada uma delas passaram a subsidiar, transversalmente, todo o processo de

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reflexão que orientou e conduziu as respostas aos objetivos/às questões de pesquisa, também na Escola Ana. A opção por esse procedimento partiu do entendimento de que a discussão de categorias e subcategorias, dada a sua importância e o fato de terem sido geradas a partir da “voz” dos participantes, devesse ocorrer de forma integrada a todo o processo de análise e não tratada em capítulo isolado, de forma fragmentada. Por essa razão, elas não aparecem mencionadas explicitamente.

Vale esclarecer alguns aspectos metodológicos conceituais, uma vez que não há como ignorar a concepção de categorização que se adotou no estudo realizado. É preciso destacar que categorizar denota acoplamento de respostas ou de dados, constituindo-se um recurso capaz de unir partes a um todo, resultando em um processo de reconstrução desse todo, baseado na univocidade, e tornando-se oportuna em determinado contexto. Tal é sua importância como procedimento de análise que, para Lakoff (2007), categorizar deixa de significar simplificação ou “achatamento” de diferenças, para se tornar objeto importante de cognição, auxiliando na busca de parâmetros ou de características comuns, o que incide em um processo lógico de aprendizado.

Categorização torna-se, portanto, um processo natural de compreensão e de exercício do raciocínio, não podendo ser confundida como tentativa de uniformizar ou de reduzir a complexidade do processo de linguagem para se chegar a alguma identidade. O autor advoga, ainda, que o modo como se categoriza revela o modo como se compreende e se traduz o próprio pensamento, a ação e o discurso, na relação complexa entre sujeito e objeto. Assim, categorias conceituais representam estruturas simbólicas designativas de categorias do mundo real ou de algum mundo possível, e todo uso do raciocínio exige, de imediato, o emprego de categorias (LAKOFF, 2007). Em face do que se expôs, parece ficar claro, portanto, a razão pela qual as categorias se tornaram o eixo transversal na discussão.

A partir dos próximos tópicos deste capítulo, similar ao que ocorreu na Escola Maria, elaboramos uma estratégia que visou responder a cada um dos objetivos/questões da pesquisa, de forma clara e individualizada, sem perder de vista, contudo, a interconexão natural que se percebeu entre os dados e os fenômenos pertencentes a ambas as escolas. Resgatando

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a passagem registrada na Escola Maria, aqui também os dados foram sendo apresentados e discutidos no contexto de cada objetivo específico, de tal modo que o título de cada tópico se identifica pela transcrição literal desses objetivos.

Práticas da gestão versus desempenho da escola

A Escola Ana, conforme mencionado, localiza-se em Samambaia na periferia do Distrito Federal, e seus estudantes são oriundos da própria cidade e região circunvizinha. Retomando o pensamento de Mortimore (1996), um elemento que caracteriza as escolas eficazes é conseguir superar essa realidade adversa e alcançar resultados positivos. Entre os fatores que contribuíram para essa superação destacam-se as práticas da gestão escolar.

Segundo Casassus (2002), bons resultados têm relação com as condições do ambiente escolar, quando estas se tornam favoráveis às inter-relações naquele ambiente, podendo ser atribuídas à habilidade do gestor, que, nesse caso, faz com que os professores e demais funcionários sintam-se encorajadas a melhorar cada vez mais seu desempenho. Conhecer o modo como essas práticas se inter-relacionam naquele cotidiano e a influência dessa inter-relação na produção da eficácia escolar foi um dos desafios da pesquisa. No entendimento de Estevão (2008), as inter-relações podem também se estruturar em torno da interdependência, ou seja, os atores devem reaprender a estarem sujeitos ao bem-estar do outro em busca de seu próprio bem-estar, sem, contudo, se tornarem escravos. No caso, vale a atitude de partilha do poder, o aprendizado da cooperação e a dinamização da participação de forma conjunta.

No contexto desse objetivo, observou-se na Escola Ana o oposto do que se constatou na Escola Maria, embora o estilo de gestão na Escola Maria também tenha sido apontado como importante contribuição para os resultados positivos que a escola vem alcançando. Ao contrário da Escola Maria, em que a figura da diretora aparece no comando e a equipe de professores aguardando para executar suas ações, na Escola Ana observou-se certa autonomia da equipe de professores ao lidar com

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as questões do cotidiano escolar. No entanto, a figura da diretora não perdeu seu lugar de autoridade constituída, nem demonstrou qualquer traço de submissão, temor ou fragilidade diante da equipe, nos momentos de organização da escola ou de tomada de decisão. Conforme mencionado no tópico anterior, foi avaliada a existência de certo nível de “maturidade organizacional” na Escola Ana. Atribuiu-se essa conquista ao estilo de gestão da diretora, consequentemente, incorporado pelos demais membros da equipe gestora. Dito em outras palavras, significa que a eficácia da escola depende da eficácia da gestão, mesmo orientada por diferentes estilos de liderança.

As palavras de Maximiano (2007) confirmam essa concepção e parecem descrever a situação da Escola Ana, quando o autor afirma que “a eficácia do estilo de liderança pode ser avaliada pelo efeito que causa sobre o desempenho da tarefa e sobre a satisfação do liderado” (p. 298). Neste caso, observou-se que, se os professores se mostram satisfeitos e se, como resultado, apresentam desempenho satisfatório, é válido afirmar que a Escola Ana, do ponto de vista do autor, pode ser caracterizada como uma escola eficaz. Considera-se válido afirmar, ainda, que são as práticas da gestão que contribuem para que isso ocorra, uma vez que essas práticas derivam de seu estilo de liderança, que também é eficaz.

Outra visão da literatura que converge para as práticas de gestão na Escola Ana encontra-se em Tannenbaum e Schmidt (1973). Ao indicarem critérios de eficácia na liderança, os autores elegem o próprio líder como uma das peças centrais da situação. Parafraseando-os, esse critério consiste em relacionar a maneira como a diretora tem colaborado para desenvolver a independência e a autonomia em seu grupo. Esses elementos influenciam um estilo de liderança que valoriza o dinamismo, a autonomia, a liberdade de ação e a proatividade. Líderes assim, segundo Tannenbaum e Schmidt, tendem a revelar comportamentos democráticos.

Procede, ainda, a alusão a Petracca (1997), cuja visão traz um elemento enriquecedor no contexto desse objetivo. O autor postula que o vínculo entre o líder e seus seguidores se funda em uma tarefa ou missão, componente que os coloca em uma situação de influência recíproca, tornando seus seguidores fiéis colaboradores de quem exerce a liderança.

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O autor atribui um caráter científico à liderança, quando a considera uma prática que se manifesta em um contexto específico de interações, já que exige a combinação das variáveis da função com as variáveis da motivação. Nesse caso, amplia a visão de liderança, pois abrange a integração entre “atributos e recursos dos líderes e as expectativas, recursos, aspirações e atitudes dos liderados” (PETRACCA, 1997, p. 713).

Faz-se referência, por fim, às ideias da escola comportamental de Kurt Lewin (1892-1947), citado por Boudon e Bourricaud (1993, p. 257), por trazerem um aspecto ainda mais convergente para o contexto da gestão na Escola Ana. Diz respeito “ao estímulo à participação dos liderados”, aspecto no qual se pode basear para dar ênfase à contribuição da gestão escolar no desempenho favorável da escola nas avaliações externas. Segundo o viés psicológico da escola de Kurt Lewin, “a excelência da liderança democrática” resulta da “orientação pedagógica e participativa que o líder se empenha em fazer prevalecer”. Trata-se de uma concepção que apoia o que a literatura traz como referências diversas a um vínculo entre esse estímulo à participação e a capacidade de o líder congregar pessoas em torno de um propósito estabelecido, sobretudo, em conjunto, mesmo que decorra de um sonho, uma missão, uma intenção estratégica.

É possível compendiar, em torno dos elementos que emergem da visão de Tannenbaum e Schmidt, Petracca, Boudon e Bourricaud, os elementos que constituem a base teórico-epistemológica que sustenta o estilo de gestão praticado na Escola Ana, justificando a percepção que emergiu acerca do que a diferencia da Escola Maria. Na primeira escola, observou-se um clima de poder partilhado, o qual se manifestou de tal modo eficaz que provocou a mobilização do grupo para que agisse proativamente na busca de objetivos comuns. Entende-se que esses objetivos estão, gradativamente, sendo alcançados, tendo como um dos fatores o estilo de liderança da equipe gestora. Umas das categorias – Envolvimento da equipe gestora com a equipe escolar – corrobora essa afirmação, na medida em que retrata um modo de agir dessa equipe de gestão.

A fim de tornar mais clara a visão apresentada, abre-se um quinto parêntese para explicar o fenômeno pelo recurso da linguagem metafórica. Acredita-se que, muitas vezes, se deva recorrer a esse recurso para buscar

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diferentes possibilidades de materialização do sentido real do que se gostaria de enfatizar. Assim como os próprios conceitos, as metáforas se constituem um dos recursos de que o pesquisador pode se utilizar ao voltar o olhar para “dentro” de sua própria pesquisa e se descobrir participante ativo de um determinado contexto. Isso ocorre quando ele precisa lançar mão de linguagens do exterior, para compreender de forma mais profunda esse contexto, bem como de se fazer compreender de forma mais plena. Dito nas palavras de Rojas (2001), significa a descoberta de analogias que têm como papel ampliar as possibilidades de o pesquisador se fazer entender pela proximidade de uma linguagem simples, porém irrigada pela dimensão sensível da emoção e da imaginação. E acrescenta:

Imaginação e sentimento emergindo como capacidades metafóricas facilitam interpretar o símbolo no estilo da escrita e na metodologia das ações práticas. Imaginar é possibilitar novas formas de reescrever o mundo. Sentir é realizar um processo de interiorização, é tornar nosso o que foi colocado à distância pelo pensamento, em fase de objetivação (ROJAS, 2001, p. 209).

Concorda-se com a autora, quando afirma, ainda, que “a linguagem metafórica exprime a força e a virtude na expressão poética daquilo que se quer dizer e ser” (p. 210). Nesse contexto se pretendeu, antes de tudo, expressar com a ênfase almejada, o sentido do que a pesquisa se propôs a revelar acerca dos dados e não se considerou se teria êxito caso não o fizesse pelo recurso da linguagem simbólica. Assim sendo, comparou-se essa situação à tradicional metáfora denominada de voo dos gansos.22 Emprega-se a metáfora por entender que ela retrata a dinâmica apreendida do ambiente da escola, cuja percepção, pelo seu grau de subjetividade, não poderia ser representada de outra forma. Em síntese, a narrativa começa quando bandos de gansos voam rumo ao sul e o fazem formando um grande “V” no céu. Diz-se que já existe uma explicação científica sobre o porquê de os gansos voarem desta forma. Sabe-se, entretanto, que quando cada ave bate as asas, move o ar para cima, ajudando a sustentar

22 Fonte: <http: //kamal.com.br/coach/o-sentido-dos-gansos /2012>.

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a ave imediatamente de trás. Os gansos descobriram que, ao voar no sentido da formação de um “V”, o bando se beneficia de pelo menos 71% a mais de força de voo do que um ganso voando sozinho. Sempre que um ganso sai do bando, sente subitamente o esforço e a resistência necessária para continuar voando sozinho. Rapidamente, ele entra outra vez em formação, para aproveitar o deslocamento de ar provocado pela ave que voa imediatamente à sua frente. Quando o ganso líder se cansa, ele muda de posição dentro da formação e outro ganso assume a liderança. Os gansos de trás gritam, encorajando os da frente para que mantenham a velocidade. Finalmente, quando um ganso fica doente, ou ferido por um tiro e cai, dois gansos saem da formação e o acompanham para ajudá-lo e protegê-lo. Ficam com ele até que consiga voar novamente, ou até que morra. Só, então, levantam voo, sozinhos ou em outra formação, a fim de alcançar o bando.

A relação estabelecida entre a narrativa e as práticas de gestão da Escola Ana se deveu, especialmente, a quatro aspectos que a história traz subjacente:

1) a direção da escola conseguiu que a comunidade incorporasse um senso de comunidade engajado em seguir na mesma direção e atingir os objetivos comuns;

2) a direção revela sensibilidade para se comunicar em uma linguagem simbólica entendida por todos, uma vez que não se impõe, como “autoridade instituída”, envolvendo-se, disponibilizando-se, acolhendo, mas também partilhando necessidades e problemas;

3) a direção conseguiu imprimir uma visão de que o poder é para ser partilhado, reveza tarefas e divide a responsabilidade na tomada de decisão;

4) a direção parece ter conseguido encorajar a equipe a aumentar seu desempenho.

Na Escola Ana, percebeu-se, portanto, que o modelo dos gansos é vivenciado pelo grupo. Existe o compartilhamento da liderança, o apoio mútuo entre professores e gestores, todos são encorajados e encorajam

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os demais a buscar, através de práticas sistematizadas, a melhoria do desempenho dos estudantes. Existe, desse modo, um processo de sinergia23 em andamento naquele ambiente.

Na esfera da literatura de base, novamente remete-se ao que Mortimore (1996) considera tendência para a eficácia escolar: as condições de organização do ambiente de trabalho ou do ambiente organizacional, conforme denominado nesse contexto. Não há como desconsiderar que a organização do ambiente se reporta a um encargo da liderança que comanda esse ambiente. Gray, Reynolds et al. (1996) e Reynolds e Teddlie (1999), por sua vez, relacionam a organização do ambiente de trabalho ao “melhoramento da escola”. Para os autores, existem conexões entre as evidências de eficácia escolar e as possibilidades para que a escola imprima um curso de crescimento positivo. Destarte, passa a oferecer um ambiente propício de aprendizagem e a conquistar, agindo de forma colaborativa, a implementação de mudanças fecundas. Como recurso primordial, conectam-se objetivos e planos para diagnosticar e priorizar o estabelecimento de metas, contando com a participação dos professores, entre outros. Beard (2006) acrescenta que todas essas ações também se refletem nas condições e no melhoramento da aprendizagem dos estudantes.

Quanto ao mencionado por Beard (2006), há um aspecto revelado nas entrevistas com os professores que se destacou dos demais: as rotinas de práticas didático-pedagógicas consistentes. Entre essas práticas, estão as dinâmicas curriculares coerentes, o cumprimento de regras disciplinares e, principalmente, a cobrança sistemática das atividades escolares por parte dos professores, em relação aos estudantes, seguida da atitude responsiva destes a essas exigências. Mais uma vez, Mortimore et al. (1988) argumentam que em escolas onde os professores adotaram uma prática consistente em relação ao uso das diretrizes curriculares, o impacto positivo no progresso dos estudantes saltou aos olhos. Por outro lado, é visão de

23 O termo sinergia se refere um efeito que resulta da ação dinâmica de vários agentes que atuam de forma coordenada para um objetivo comum. Refere-se especialmente à crença de que o valor da ação em conjunto tem maior valor do que realizada individualmente, sem esse objetivo comum previamente estabelecido.

198

consenso no domínio educacional que também esse tipo de organização, que leva à sistematização de regras e de atitudes pertinentes aos aspectos de disciplina, carrega forte influência de quem está comandando o ambiente; logo, remete à figura de um gestor atuante.

Nos trechos que se seguem, recortes das entrevistas dos professores, foi possível destacar e confirmar que, de fato, há uma prática de deferência às regras de cunho disciplinar, as quais são desenvolvidas de forma conjunta e sistemática entre os professores. Como esclarece a Professora 1, “Na escola os estudantes são muito participativos. Tudo é anotado na planilha da turma, isto é muito bom para os dois lados (P1: EA). As palavras do Professor 2 também confirmam a forma conjunta e sistemática de trabalho que é desenvolvida na escola: “Temos um relatório diário de todas as turmas, uma planilha; o professor vai anotando tudo o que os estudantes fizeram durante a aula, inclusive as atividades de casa” (P2: EA).

A partir dessas rotinas de práticas consistentes, também foi observado e relatado pelos professores, com satisfação, o resultado alcançado pela escola nas Olímpiadas Brasileiras de Matemática das Escolas Públicas (OBMEP).24 Nesse caso, com referência ao hábito da escola de participar de atividades externas, buscando socializar conhecimentos, aprendizagens e resultados.

Concorda-se com Sammons (1999) que o papel da liderança em uma escola influencia essas práticas e se torna primordial para o desenvolvimento e a sustentação de uma missão comum a todos. Com as visitas e as observações in loco, a pesquisadora teve oportunidade de presenciar na rotina da Escola Ana o respeito, o diálogo, o envolvimento da equipe gestora com a equipe escolar e a execução de alguns projetos que se desenvolvem, de forma efetiva, pela sua coletividade, rotina também observada na Escola Maria. As equipes gestoras estão à frente desse processo dinâmico com que são desenvolvidos os projetos e as ações nas duas escolas.

24 A Olímpiada Brasileira de Matemática das Escolas Públicas (OBMEP) é um projeto que tem como objetivo estimular o estudo da matemática e revelar talentos na área. Criada pelo MEC em 2004 e iniciada em 2005, a OBMEP vem crescendo a cada ano, desenvolvendo um ambiente estimulante para o estudo da matemática entre estudantes e professores de todo o País. Em 2011, cerca de 18,7 milhões de estudantes se inscreveram na competição, e mais de 98% dos municípios brasileiros estiveram representados (BRASIL. MEC, 2012).

199

Redirecionando o olhar para a dimensão quantitativa da pesquisa, também foi possível ilustrar essa visão sobre as práticas da gestão à luz dos resultados do questionário aplicado. Com os resultados, buscou-se captar diferentes percepções dos professores, especificamente nas questões de 32 a 35, mais relacionadas à figura da diretora. Como resultado da análise, a partir de dados ilustrados na Tabela 4, identificou-se que dos 29 docentes abordados, 25 deles (86,2%) afirmaram que a diretora: consegue desenvolver uma dinâmica escolar que impulsiona os professores a se comprometerem com a escola; 23 docentes (89,3%) informaram que a diretora estimula as atividades inovadoras; 22 professores (75,9%) atribuem importância aos aspectos relacionados à aprendizagem dos estudantes; e 28 docentes (96%) responderam que a diretora dá atenção especial aos aspectos relacionados com a manutenção da escola, dado obtido na soma das colunas Concordo totalmente e Concordo.

Tabela 4 – A avaliação dos docentes da Escola Ana, quanto ao envolvimento da diretora nos processos pedagógicos da escola

Questões 1 2 3 4 5 6

O(a) diretor(a) consegue que os prof. se comprometam com a escola.

(A)3

10,3%

(B)22

75,9%

(C)3

10,3%

(D)00

(E)00

(F)1

3,4%

O(a) diretor(a) estimula as atividades inovadoras.

(A)4

13,8%

(B)19

65,5%

(C)5

17,2%

(D)00

(E)00

(F)1

3,4%

O(a) diretor(a) dá atenção especial a aspectos relacionados com a aprendizagem dos estudantes.

(A)6

20,7%

(B)16

55,2%

(C)6

20,7%

(D)00

(E)00

(F)1

3,4%

O(a) diretor(a) dá atenção especial aos aspectos relacionados com a manutenção da escola.

(A)4

13,8%

(B)24

82,8%

(C)00

(D)00

(E)00

(F)1

3,4%

Legenda: Coluna 1: “Concordo totalmente”; Coluna 2: “Concordo”; Coluna 3: “Neutro”; Coluna 4: “Discordo totalmente”; Coluna 5: “Discordo”; Coluna 6: “Não informado”.

Os resultados das questões oscilaram entre as respostas “concordo”, “concordo totalmente” ou “neutro”. Embora a maioria dos professores questionados concorde ou concorde totalmente que o gestor escolar os

200

estimula e os provoca ao comprometimento com a escola, para que busque desenvolver atividades inovadoras, não se pode deixar de mencionar a neutralidade de alguns professores em relação a essas questões. Essa neutralidade variou de três (10,3%) a seis docentes (20,7%) nas questões. No entanto, para a expressiva maioria dos docentes (96,6%), a direção da escola dedica atenção especial aos aspectos relacionados à aprendizagem e à manutenção da escola. Notou-se, também, que um docente não expressou sua opinião. Em face desses resultados, não há como deixar de reconhecer a influência positiva das práticas de gestão escolar no desempenho da Escola Ana.

Questionados sobre as práticas eficazes da escola, os professores revelaram em suas respostas resultados que sinalizaram positivamente para a percepção dessas práticas eficazes. O Gráfico 16 refere-se, mais especificamente, ao domínio didático-pedagógico. Para 17 docentes (58,6%), os conteúdos previstos no ano de 2011 foram desenvolvidos em mais de 80%; nove professores desenvolveram 60% e 80% dos conteúdos previstos e três professores não responderam a essa questão.

Gráfico 16 – Em relação aos conteúdos, quanto você conseguiu desenvolver com os estudantes?

Onde está a relação desses resultados com o estilo de liderança? No pressuposto de que, se a escola tem um papel de destaque no desempenho dos estudantes, é porque se verifica a ocorrência de um conjunto de fatores que certamente estão voltados para tal, uma vez que, de forma

201

isolada, sabe-se que, dificilmente, se alcançaria um avanço. Na visão de Scheerens (1992), trata-se de uma escola eficaz, por colocar em posição central o processo ensino-aprendizagem. Corroborando o autor, Gipps (1992) e Sammons et al. (1994d) destacam a existência de uma condução administrativa eficaz, na presença de fatores como a clareza de objetivos, o bom planejamento, a organização adequada do tempo e das atividades dos estudantes, a ênfase na comunicação de tarefas e o ensino desafiador.

Em contexto idêntico, detectaram-se outros elementos que podem direcionar o foco para as práticas da gestão escolar, desta vez, abordando essas práticas em conexão com a área pedagógica, conforme Tabela 5.

Tabela 5 – Opinião dos professores quanto à realidade da Escola Ana

SituaçãoOpinião do professor

1 2 3 4 5 6

O ensino que a escola oferece aos

estudantes é muito influenciado pela

troca de ideias entre os professores.

3

10,3%

21

72,4%

2

6,9%

1

3,4%0

2

6,9%

Os professores coordenam o

conteúdo das disciplinas entre

as diferentes séries.

3

10,3%

17

58,6%

6

20,7%0

1

3,4%

2

6,9%

O diretor, os professores e os e

demais membros da equipe da escola

colaboram para fazê-la funcionar bem.

9

31%

18

62,1%0 0

02

6,9%

Legenda: Coluna 1: “Concordo totalmente”; Coluna 2: “Concordo”; Coluna 3: “Neutro”; Coluna 4: “Discordo totalmente”; Coluna 5: “Discordo”; Coluna 6: “Não informado”.

É possível observar que há entrosamento e comprometimento entre a equipe de trabalho, e que esses aspectos remetem à ação da liderança. Desta vez, essa afirmação se confirma pelos dados numéricos, os quais incluem a figura do diretor como elemento colaborador, na medida em que, para 27 dos docentes inquiridos, 93,1% afirmaram que existe colaboração mútua entre direção, professores e demais membros da comunidade escolar, e que isso se reflete no bom funcionamento da instituição.

202

Participação dos professores e dos estudantes no ambiente escolar: implicações para as escolas eficazes

Ao começar a discutir se a participação dos professores e dos estudantes no ambiente escolar contribui para o processo de práticas eficazes, vale lembrar autores como Neubauer e Silveira (2010), os quais argumentam que os processos de práticas eficazes perpassam pela gestão autônoma do diretor e, consequentemente, pela autonomia escolar. Corroborando as autoras, Machado enfatiza que, para ser considerada uma escola eficaz, é fundamental que a instituição escolar conquiste sua autonomia. Para a autora, as escolas devem ser repensadas como um espaço de gestão compartilhada entre professores, pais e equipe gestora numa perspectiva de administração colegiada. Portanto, “se quisermos que mude a educação teremos de mudar a escola” (MACHADO, 2002, p. 216). No entendimento da autora, para que isso ocorra, é necessário que a escola esteja mais inserida na comunidade escolar, ou seja, mais próxima dos seus usuários.

A Lei de Diretrizes e Bases da Educação (nº 9.394, de 1996), em seu art. 12, inciso VI, estabelece que as instituições de ensino devem “articular-se com as famílias e a comunidade escolar, criando processos de integração da sociedade com a escola”. Paro (2001) esclarece que cada vez mais se firma a participação da comunidade, não apenas como um direito, mas como uma necessidade do próprio desenvolvimento da escola. Nesse sentido, a organização escolar deve estar sustentada pela colaboração recíproca e fundada não na imposição, mas na convivência e no diálogo, de tal modo que possa garantir a participação efetiva envolvendo equipe docente, estudantes e pais.

Com base nessa visão, justifica-se que está na construção do Projeto Político-Pedagógico (PPP) da instituição o primeiro recurso a abrir espaço efetivo para a participação em uma escola. Nesse caso, o PPP deve ser compreendido na sua globalidade, isto é, nos aspectos em que diretamente possa influenciar para que os objetivos prioritários da escola, tanto administrativos como pedagógicos, sejam plenamente atingidos. É também “um instrumento que identifica a escola como uma instituição

203

social, voltada para a educação; portanto, com objetivos específicos para esse fim” (VEIGA, 2002, p. 13-14). As observações realizadas no contexto da Escola Ana mostraram que seu PPP não foi meramente um documento formal, mas que buscou efetivamente a construção prática da democracia participativa. Feijó (2007) reforça isso, afirmando que o cotidiano da escola está ancorado basicamente em seu PPP, o qual é o “centro em torno do qual gravitam as práticas desenvolvidas na escola e é também fruto dessas mesmas práticas” (p. 83).

A importância do PPP também consiste em sua finalidade de direcionar e organizar de forma sistemática os rumos da escola. Revela-se como uma intenção real e fundamentada, descrita na forma de ações e estratégias, pontuando prioridades na formação do aluno, como cidadão ativo capaz de transformar a sociedade. De posse de alguns dados acerca da participação dos professores, o PPP contribuiu como acesso a um recurso que complementasse e enriquecesse os resultados do estudo. Além desse projeto, investigou-se, via questionários, a existência de elementos que evidenciassem a participação de professores e estudantes em sua construção.

Os questionários respondidos pelos docentes apresentaram convergência para duas repostas. A primeira, que obteve 34,5%, diz respeito à elaboração do PPP pela diretora, a qual, posteriormente, o apresentou aos professores para sugestões, no intuito de chegar à versão final. A segunda, com o mesmo percentual dos docentes, que o PPP foi elaborado pela diretora e por uma equipe de professores. Mais ainda: cinco professores (17,2%) informaram que não sabiam como o PPP foi desenvolvido; três docentes (10,3%) afirmaram que os professores elaboram uma proposta e, com base nela, a diretora chegou à versão final; um único professor (3,4%) manifestou que o PPP segue modelo encaminhado pela SEE/DF. Em que pesem as diferentes manifestações dos docentes a respeito da elaboração do PPP da escola, cabe ressaltar que, na Escola Ana, 23 docentes (79,3%) reconheceram ter amplo espaço para expressar sua opinião, durante o processo de construção do projeto (Gráfico 17).

204

Gráfico 17 – Como foi elaborado o Projeto Político Pedagógico da Escola Ana?

Corroborando outros autores, Lück (2003) considera que o PP tem um papel preponderante na escola. Para a autora, sua elaboração e execução estão relacionadas com a visão do gestor e de sua equipe, o que influi de forma importante na eficácia de sua elaboração e, a posteriori, de sua execução. Lück ressalta que o PPP acentua o status de “ferramenta de gestão e de planejamento”, em face de face de sua natureza para orientar os rumos do trabalho coletivo, propiciando a criação de estratégias preditivas de sucesso.

O que o pensamento de Lück (2003) termina reforçando é a imprescindibilidade, numa gestão participativa, da voz dos professores, neste caso, adquirindo um caráter inerente de força. Portanto, percebeu-se na Escola Ana um ambiente escolar harmonioso, tranquilo, de compartilhamento na tomada de decisões e de valorização da participação de todos os segmentos. Nas palavras da Professora 3, esse sentimento foi assim retratado: “Aqui o professor sempre é convidado a manifestar suas opiniões, e o que mais a gente faz é conversar e tentar juntos os melhores caminhos para escola e para todos” (P3: EA).

205

Participação dos estudantes na dinâmica escolar

Instados a se manifestarem sobre sua participação na elaboração do PPP, bem como em outros projetos, obteve-se resultado da parte dos estudantes semelhante ao da Escola Maria. A resposta foi de que “não participam”, embora 77 estudantes (34%) declarassem ter participado. Da mesma maneira, uma das modalidades de participação na Escola Ana se assemelha à da Escola Maria e parece ser uma prática comum em escolas da rede pública. Os estudantes comumente são convidados a participar das reuniões de conselhos de classe e de reuniões pedagógicas semestrais, porém o convite não é extensivo a todos. Por questões de organização e de maximização do tempo, somente participam aqueles que exercem a função de representante de turmas. Desse modo, justifica-se o número de 77 estudantes que responderam “sim” à questão. Eles são ou foram representantes de turma (Gráfico18).

Gráfico 18 – Você participou da elaboração do Projeto Político Pedagógico ou de outros projetos que são desenvolvidos na Escola Ana?

O depoimento do professor P2 reforça essa participação dos estudantes representantes de turma, quer seja nas reuniões de conselhos de classes como também em reuniões pedagógicas para as quais são convocados: “na escola os estudantes representantes de turma participam das reuniões da escola, quando eles são convocados” (P2: EA).

Avaliando outro aspecto pertinente aos estudantes, reproduzindo o procedimento aplicado à escola anterior, buscou-se verificar se existia

206

correlação entre as questões 5 (Seus pais ou responsáveis incentivam você a estudar?) e 8 do questionário dos discentes (Você conversa com seus pais ou responsáveis sobre o que acontece na escola?). Para tanto, fez-se uso do Teste Qui-Quadrado de Independência de Variáveis. Na questão 5, 99,6% dos estudantes afirmaram que são incentivados pelos pais ou responsáveis em relação ao estudo. Na questão 8, os dados revelaram que 147 estudantes (65,6%) responderam “sim” e 73 estudantes (32,8%) responderam “não”. Resta informar que, depois da utilização do programa, os dados apurados não identificaram correlação entre as respostas das questões 5 e 8.

Por fim, o engajamento dos estudantes contribuiu para que os objetivos e os conteúdos escolares se efetivassem em práticas eficazes, as quais se refletiram no funcionamento e na organização da instituição como um todo. A confirmação foi obtida na fala do Professor 2, em um trecho da entrevista que ele se refere aos estudantes: “Aqui na escola se respeita os estudantes, nós também somos respeitados. Eu sei que isso é determinante para nossa escola”.

Participação dos pais dos estudantes da Escola Ana

Dados relativos a esse aspecto foram obtidos de duas fontes de dados: os questionários dos estudantes e as entrevistas realizadas com a diretora e com os professores. A análise confirmou a existência da participação efetiva de pais e/ou de mães, especialmente, nas reuniões promovidas pela escola, fato que foi registrado também na Escola Maria. Essa foi a razão pela qual se julgou importante fazer referência à participação de pais e mães, embora o objetivo específico em questão não exija tal informação. Ao perguntar com que frequência seus pais ou responsáveis comparecem à reunião na escola, a maioria dos estudantes (83,9%) respondeu sempre ou quase sempre; 34 discentes (15,2%) afirmaram que seus responsáveis comparecem de vez em quando; e dois estudantes (0,9%) informaram que seus responsáveis nunca ou quase nunca vão às reuniões na escola (Gráfico 19).

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Gráfico 19 – Frequência dos pais ou dos responsáveis nas reuniões de pais

Nas entrevistas realizadas com a diretora e com os professores, notou-se que a participação dos pais nas reuniões convocadas pela escola também faz parte do processo da construção de práticas eficazes. Observa-se que, ao somar os números do gráfico e as respostas das entrevistas realizadas com a diretora e com os professores, a percepção se confirma, porque os dados convergem.

– A participação dos pais nas reuniões da escola eu considero muito boa, em vista das outras escolas. São sempre 90%. Pode ter uma reunião ou outra em que esse índice caia, mas para 80% a 70%. Aí, o que a gente faz? Junto com o serviço de orientação, já na semana seguinte, começa a ligar para eles e dizer que não compareceram e perguntar o que aconteceu, afirmando que os estamos aguardando aqui na escola (D: EA).

– Essa é a primeira escola em que trabalho que vejo que isto acontecer. Os pais aqui são muito participativos. Por exemplo: a reunião de entrega de nota, a sala fica lotada! Se acontecer alguma coisa fora da reunião de pais, eles ligam para saber o que aconteceu. Os pais participam muito e, quando vou conversar alguma coisa específica do aluno, eu peço, inclusive, que o aluno esteja presente. Penso que agindo assim, poderemos encontrar uma solução para resolver o problema, se for o caso (P3: EA).

208

Outra fonte de dados que revelou a participação dos pais além das reuniões escolares foi a análise documental. Verificando os registros, constatou-se que também o conselho escolar representa uma instância significativa para que os pais se engajem na missão da escola. No entendimento de Paro (2001), o conselho escolar representa mais um espaço que foi conquistado pelos “usuários” e profissionais das escolas. O autor reforça que a escola que conta com um conselho escolar atuante abre-se para mais uma possiblidade de integração entre a escola e a comunidade escolar. Paro diz que os dirigentes escolares precisam compreender que, para dividirem as responsabilidades que assumiram diante da função, é necessário também compartilhá-las com sua comunidade intra e extraescolar. Esse compartilhamento de autoridade possibilita experimentar diferentes formas de convivência no exercício da direção, na medida em que momentos de conflito e de superação podem ser democraticamente articulados “por instâncias de discussão e decisão que lhes deem legitimidade e força” (PARO, 2001, p. 80).

Vale destacar a estratégia adotada pela direção, que é a de divulgar os eventos e as atividades realizadas em forma de cartazes espalhados pela escola, o que tem sido uma dinâmica eficaz no estímulo à participação, sobretudo das famílias. Faz parte dos chamados mecanismos efetivos de comunicação. De acordo com a diretora, essa prática representa mais uma ferramenta que a escola disponibiliza para alcançar toda a comunidade ou a maior parte dela. Desse modo, a direção da Escola Ana busca promover uma gestão participativa e equânime entre seus pares, professores, servidores, estudantes e pais.

Clima escolar: elemento favorável à eficácia?

A fim de identificar a existência de um clima favorável ao desempenho satisfatório dos estudantes em aprendizagem, a pesquisadora buscou conhecer o cotidiano da escola. Por intermédio das atividades rotineiras, torna-se possível perceber que as escolas podem revelar práticas administrativas e pedagógicas bastante semelhantes, que, porém, não

209

chegam a ser iguais. Lück (2010) esclarece que cada “escola se faz e existe como uma organização social, a partir deste cotidiano, marcado por relações interpessoais” (p. 131). Sendo que cada indivíduo é dotado de uma personalidade, em que apresenta uma capacidade de ajustamento, de comportamento, nos diferentes ambientes de trabalho, o clima organizacional também influencia direta e indiretamente a satisfação das pessoas envolvidas com o ambiente.

Na percepção de Luz (2001), o clima é o grau de satisfação e de motivação dos indivíduos na organização. E em Paro (1986) a escola é vista como uma “organização onde se busca, de forma sistematizada e organizada, a apropriação do saber historicamente produzido” (p. 18). O que se considera consenso, ademais, é a visão de que os profissionais da educação agem diante das atitudes de valorização e de confiança por parte da liderança, expressando sua satisfação por intermédio dos vínculos pessoais e dos harmônicos que são estabelecidos no trabalho. Esse é considerado um dos bons meios de se estabelecer um clima favorável.

Sergiovanni e Carver (1973), por sua vez, afirmam que,

[...] na verdade, a melhoria no clima de ensino depende da melhora do clima organizacional da escola. O atrito interpessoal excessivo entre os professores e administradores, o moral baixo, um sentimento de fraqueza por parte dos professores e uma estratégia de submissão coercitiva não podem ser removidos apenas fechando a porta. Eles têm efeitos poderosos sobre o que os professores fazem, na maneira como os professores se relacionam entre si, como sobre a realização do estudante e suas aquisições efetivas (p. 108).

No caso da Escola Ana, o clima escolar foi investigado por meio do questionário, aplicado a professores e a estudantes, e da observação in loco. Como resultado desta última, destacou-se o modo como a equipe gestora se relaciona e se envolve com os professores, estudantes e demais servidores na escola. Parte-se da premissa de que existe um clima escolar favorável, quando as relações intraescolares estão pautadas em três dimensões do respeito: o respeito pessoal mútuo, o respeito ao direito de participação e o respeito à opinião, o que significa que esta será valorizada e aceita,

210

quando for o caso. Sintetiza-se nas três dimensões, o que foi observado no ambiente da Escola Ana, no aspecto do clima escolar.

Nas entrevistas realizadas com os professores, nota-se um discurso coerente nas falas dos entrevistados, o que converge para o que foi observado e relatado no parágrafo anterior:

– Na escola a gente construiu uma relação amistosa e respeitosa não apenas comigo, mas no geral, com todos que trabalham aqui e também com os estudantes. A equipe toda é muito humana. A direção consegue enxergar muito o lado humano e também o profissional. Existe muito respeito (P1: EA).

– A tônica do relacionamento aqui na escola é o respeito, a atenção à situação de cada um. A postura aqui é extremamente flexível, quando se trata de situação em que o professor precisa realmente de uma ajuda da equipe gestora da escola. Essa postura é respeitosa e cuidadosa, ela vai além da simples, digamos assim, categoria dos professores. Essa postura se repete também entre os estudantes, de modo que eles são atendidos com todo o cuidado, com todo o respeito (P2: EA).

– Nesta escola tem a questão do respeito. Tem uma ética muito grande nas relações direção-professor, professor-direção, professores-estudantes e direção-estudantes. Os pais também são muito respeitosos conosco (P3: EA).

Paralelamente aos resultados das entrevistas, notou-se que foi possível mensurar mediante os questionários, as evidências de identificação e empatia entre os agentes e seu habitus (BOURDIEU, 2004),25 focalizados no âmbito escolar. Por habitus faz-se menção não a um local determinado ou a um destino. Antes, porém, caracteriza-se o modo de adquirir e conviver com a identidade social conquistada por um grupo, a partir de uma experiência feliz vivida em um dado espaço e que predispõe cada indivíduo ou o próprio grupo a fazer escolhas. Por essa razão, atribuiu-se

25 O conceito de habitus é adotado conforme desenvolvido por Pierre Bourdieu (1930-2002), para dizer da capacidade que adquirem os agentes de uma determinada estrutura social, de incorporá-la em suas dimensões e aspectos distintos, adaptando-se e integrando-se a essa estrutura, por meio de disposições para sentir, pensar e agir.

211

essa identificação tanto no ambiente de trabalho, no caso dos profissionais, como no de estudo, no caso dos estudantes.

Brito (2009) diz que em escolas nas quais as relações de diferentes membros da comunidade educacional (docentes, equipe gestora, discentes e funcionários) são positivas, estabelece-se um clima favorável no ambiente de trabalho, com os resultados positivos refletidos no processo pedagógico. Perguntados se a direção e os professores têm uma relação amistosa com os estudantes, a maioria dos discentes (92%) informou que “sim” (Gráfico 20). Para o percentual obtido nessa resposta, percebe-se que a relação de respeito e cuidado, aspecto também percebido nas entrevistas com professores, não se limita exclusivamente ao rendimento acadêmico desses estudantes, mas alcança a dimensão do relacionamento humano e do sentimento de pertença, sobretudo, quando uma aceitação tão expressiva deriva do corpo discente, fenômeno reconhecidamente incomum nos sistemas de ensino e, mais ainda, envolvendo adolescentes, com é o caso da escola pesquisada.

Gráfico 20 – A direção e os professores desta escola têm uma relação amistosa com os estudantes?

Entre os fatores que potencialmente poderiam afetar o clima escolar estão a organização e a disciplina. Entretanto, eles se constituem valores predominantes na Escola Ana e se inserem entre os que favorecem o seu sucesso. Além dos outros fatores já citados, entende-se que a organização e a disciplina também são responsáveis pelo clima escolar satisfatório e que

212

ajudam a colocar em destaque a influência das inter-relações dos agentes educativos sobre a dinâmica da escola. A forma como essa dinâmica se articula entre as relações pessoais, grupais, ambientais e as práticas pedagógicas podem trazer contribuições, dependendo do modo como tais agentes percebem as organizações escolares e de como a constituição dessa visão pode vir a beneficiar ou não o desempenho desses agentes. No momento em que se percebeu a questão do clima escolar nessa linha de raciocínio, julgou-se como dado mais procedente uma das subcategorias identificadas na Escola Ana: exigência sistemática das atividades escolares dos estudantes por parte dos professores. Começando pelas respostas das entrevistas dos professores, todos afirmaram que os estudantes, em sua maioria, cumprem as tarefas de sala e de casa.

Para Mortimore et al. (1988), alguns estudos sobre escolas eficazes mostraram que quando os estudantes cumprem suas tarefas escolares e há uma cobrança sistemática por parte dos professores, uma série de resultados melhora nas escolas. Igualmente, perguntados a respeito das tarefas de casa que são repassadas pelos docentes e se são corrigidas, os estudantes responderam, em sua maioria (76,8%) que seus professores “sempre ou quase sempre” as corrigem; 22,3% informaram que as tarefas são corrigidas “de vez em quando” e somente dois estudantes (0,9%) responderam que “nunca ou quase nunca”, conforme pode ser verificado no Gráfico 21:

Gráfico 21 – Os professores corrigem as tarefas de casa?

Trazendo ao contexto uma análise realizada pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (BRASIL, INEP, 2010),

213

com base nos resultados do Sistema Nacional de Avaliação da Educação Básica (Saeb), foi demonstrado que 43,2% dos estudantes que apresentaram os piores resultados não têm rotina de estudos fora da escola. Por inferência, percebe-se uma correlação desse resultado com a subcategoria identificada na Escola Ana, na medida em que se pode atribuir a falta de rotina de estudos como consequência da falta de exigência sistemática das atividades escolares dos estudantes por parte dos professores. Parte-se do pressuposto de que a exigência sistemática, prática aliada da organização e da disciplina, se constitui numa estratégia favorável para a formação de valores e hábitos que propiciam o desenvolvimento adequado dos estudantes em sua vida escolar. Mafra argumenta que se trata de uma construção nutritiva do funcionamento organizacional de cada escola, colocando-se, inclusive, no lugar do diferencial entre elas. Ao explicar, o autor institui o conceito de ethos escolar, para dizer desse “conjunto de valores, atitudes e comportamentos que dão identidade particular à escola” (MAFRA, 2003, p. 113).

Resgatando-se a linha de raciocínio inicial, qual seja, a de relacionar o clima escolar aos aspectos de organização e disciplina predominantes na Escola Ana, os resultados sugerem que a escola tornou-se centrada em objetivos comuns e construiu um conjunto de práticas sistematizadas que parecem ter sido incorporadas à sua rotina. O processo de “maturidade organizacional” foi considerado como um dos fatores que influenciaram para que essa rotina se caracterizasse como uma ampla adesão ao habitus escolar. Tal processo se refletiu na linguagem coerente adotada por todos os agentes escolares, tanto no que se refere às exigências e às cobranças das regras construídas em conjunto, quanto ao respeito irrestrito a essas regras. Como resultado, o grupo desenvolveu uma cultura escolar embasada em práticas sistemáticas e consistentes, geradoras de um clima escolar favorável à aprendizagem dos estudantes.

O cerne da questão, entretanto, consiste na adesão generalizada à proposta de exigência, por parte dos professores, e de cumprimento das tarefas, por parte dos estudantes. Considera-se esse fenômeno uma atitude de respeito e de credibilidade mútua diante de uma escola que parece cumprir sua função social, estimulando os estudantes a tornarem-se

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responsivos às suas estratégias. Resulta da análise reflexiva realizada que essa adesão favorece o clima propício, porque todos os professores se tornam “iguais” perante os estudantes, no quesito “disciplina”, expresso na exigência sistemática quanto à realização das atividades escolares. O motivo disso é que, na medida em que se dá a unidade na linguagem e na comunicação, emerge a união do grupo entre si e consolida-se a imagem de equipe coesa que, por sua vez, se reflete positivamente para os estudantes, despertando sentimentos de confiança e de segurança. Afinal, “o limite situa, dá consciência de posição ocupada dentro de algum espaço social – a família, a escola, a sociedade como um todo” (LA TAILLE, 1994, p. 9).

A diferença significativa observada consistiu na ausência de atitudes de rivalidade, tradicionalmente criada pelos estudantes frente a determi-nados professores e culturalmente estabelecida entre certas disciplinas do currículo. Se a cobrança ocorre na mesma proporção, a visão dos estudantes também se torna equitativa, ou seja, deixará de existir a dualidade professor “bonzinho” versus professor “carrasco” no ambiente escolar. Assim, as regras se firmam por sua real finalidade, distanciam-se da conotação de repressão e enquadramento e aproximam-se do sentido de organização. A indisciplina, por sua vez, deixa de ser apreciada pelos estudantes como a “expressão da rebeldia” e passa a adquirir a imagem negativa do desrespeito e da intransigência diante dos contratos firmados pelo grupo. Em contrapartida, a disciplina se vê absolvida da imagem de tirania, podendo ser contemplada por outro enfoque, como nas palavras de La Taille:

Crianças precisam, sim, aderir a regras (que implicam valores e formas de conduta), e estas somente podem vir de seus educadores, pais ou professores. Os limites implicados por estas regras não devem ser apenas interpretados no seu sentido negativo: o que não pode ser feito ou ultrapassado. Devem também ser entendidos no seu sentido positivo [...] (LA TAILLE, 1994, p. 9).

Visto por outro ângulo de percepção, concorda-se também com Barroso (2005), quando o autor reforça a necessidade das normas, se houver o desejo de garantir o funcionamento pleno da escola, destacando,

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para tanto, o papel do diretor. Para Barroso, é fundamental reconhecer que “processos formais e informais garantem a coordenação da ação coletiva na escola, através da produção e manutenção de regras que asseguram o seu funcionamento” (p. 171). Em face do exposto, não há como deixar de reconhecer a pertinência da relação entre o clima escolar e a exigência sistemática de uma postura disciplinada no ambiente de estudo.

A seguir, ainda no contexto do clima escolar, foram apresentados os resultados obtidos do questionário aplicado aos professores da Escola Ana, os quais, desta vez, foram inquiridos a expressar sua percepção acerca da figura da diretora. A intenção se voltou para a busca da apreensão de elementos dessa relação líder/liderados, que influenciassem o clima favorável ao desempenho da escola. Nesse ponto de vista, Tardif reconhece e chama a atenção para um aspecto primordial no ambiente de trabalho de uma escola: a afetividade e a emoção como dimensões inerentes ao trabalho de todo professor. A atividade pedagógica faz dele um profissional capaz não somente de pensar nos estudantes, mas de perceber e sentir suas emoções, seus medos, suas alegrias e até mesmo corporificar seus próprios bloqueios afetivos (TARDIF, 2002). Nesse enfoque é que se assume o clima escolar como um dos maiores desafios ao papel do gestor contemporâneo. É exigido desse profissional, por primazia, nutrir as boas relações no ambiente escolar e construir um eixo de coesão para que a escola incorpore a prática de trabalho conjunto, ciente de que vai lidar com algo maior do que a dimensão administrativa de espaços e pessoas.

Entre as variáveis passíveis de interferir nessa relação, a pesquisa verificou, entre as questões 30 e 37 do questionário dos professores, aspectos que se relacionem aos níveis de satisfação entre equipe de trabalho e gestor escolar, mensurando essa avaliação por parte dos professores. Conforme mencionado no estudo de caso da Escola Maria, utilizou-se, novamente, a Escala de Likert. O resultado obtido na Escola Ana foi de 7,70 como Índice Geral de Satisfação (IGS)26 dos professores em relação à

26 Em seguida, é calculado o Índice de Satisfação Geral (IGS), a partir da média aritmética de todos os índices obtidos. O IGS possui mínimo de 0 e máximo de 10, tendo os seguintes intervalos de decisão: 0 a 1,99: Discordo totalmente; 2 a 3,99: Discordo; 4 a 5,99: Neutro; 6 a 7,99: Concordo; 8 a 10: Concordo totalmente.

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direção da escola. Partindo para dados de corroboração, o olhar se voltou para os resultados da entrevista, também realizada com os professores. De um lado, foi possível perceber que essa satisfação com a direção da escola é fato; de outro lado, também foram registradas opiniões ou propostas que ainda não estão ocorrendo:

– Existe aqui muito respeito, envolvimento, mas tem uma coisa que talvez eu ache que falta ainda, não sei se é falta de maturidade da equipe gestora. É com relação à prestação de contas das verbas recebidas. A verba chega, a diretora pergunta o que os professores gostariam que comprasse, mas creio também que isso poderia ser feito com um grupo de estudantes. De repente, os estudantes têm alguma necessidade e gostariam que a escola adquirisse. Outra coisa: a diretora, normalmente, atende a nossos pedidos e diz que está na direção registrado a prestação de contas, que a gente pode ir lá ver quanto foi recebido e o valor gasto. Penso que, se as meninas da direção colocassem fixadas aqui no quadro da sala de professores as prestações de contas, poderia haver mais interesse da nossa parte (P1: EA).

– Acho que aqui na escola falta a integração nas reuniões pedagógicas do pessoal da limpeza e da cozinha. Acredito que as opiniões deles também são importantes para a gente crescer como escola (P3: EA).

Percebe-se nos trechos das entrevistas que os professores, sentindo-se contemplados com essa inclusão no processo de tomada de decisões, no caso, quanto à aplicação de recursos financeiros da escola, agora conseguem enxergar mais longe e sentir a falta desse benefício para outros grupos em busca de adesão, como o grupo de estudantes e dos demais servidores. Essa postura remete (e confirma), mais uma vez, a maturidade organizacional da equipe, na medida em que parece decorrer de um comportamento que vem se construindo num crescendo, como reflexo de uma espécie de “cultura escolar”.

A emergência dessa questão, ou seja, de que o olhar da equipe de professores se desenvolveu positivamente no sentido de perceber a necessidade de incluir estudantes e demais servidores nos processos decisórios da escola, traz ao cenário da pesquisa uma argumentação que vai se inserir na dimensão da “cultura escolar”, segundo a expressão de

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Jakubíková (1999, p. 71), citado por Milan Pol et al. (2007, p. 66).27 Essa argumentação expõe um aspecto importante da relação entre a cultura escolar e a abordagem metodológica da pesquisa. Para tornar clara sua importância, remete-se a Carvalho (2006), ao dizer que a cultura escolar pode ser expressa em diferentes níveis e dimensões, dada a sua multiplicidade de vieses conceituais, conforme reconhecem Pol et al. (2007), apoiados por outros autores. Isso quer dizer que sua concepção, modo de inserção e grau de influência no ambiente educacional se tornam igualmente amplos e plurais, características que justificam afirmar que não se descobriu, até o momento, modelo de pesquisa que dê conta de abranger todas as facetas da realidade (CARVALHO, 2006) em qualquer situação que envolva a tentativa de desvelamento na relação sujeito/objeto.

Por outro lado, reconhece-se a importância da imersão no cotidiano da escola para que se possa, de fato, compreender aspectos essenciais de sua estrutura e, sobretudo, aproximar-se das dimensões mais subjetivas da realidade, distinguindo representações e pontos de vista, dos procedimentos legais e das condutas que efetivamente ocorrem e afetam essa dinâmica. Entretanto, não se justifica dizer que as análises e inferências, que possibilitam aos pesquisadores se aproximarem do desvelamento do seu objeto de estudo, sejam menos válidas, mesmo se esse mergulho, embora captado por vários encontros e contatos com o ambiente (observação in loco, por exemplo), seja considerado de forma menos profunda. A visão de Schein (1982), ao tratar da cultura de uma organização, numa acepção mais ampla, de certo modo, se aplica ao contexto da Escola Ana, em relação ao que foi observado, quando diz:

27 Apesar de a expressão “cultura escolar” ainda causar dúvidas conceituais, dada a multiplicidade de visões devido à ausência de definição e de delimitação do termo, adotar-se-á, como mais adequada ao exemplo citado, a definição elaborada por Jakubíková (1999), autor citado por Pol et al. (2007, p. 66). Segundo Jakubíková, a cultura escolar consiste em “um conjunto de suposições, abordagens e princípios, geralmente perfilhados numa determinada escola e mantidos durante um longo período de tempo” (p. 71), ou seja, converge para o contexto no qual foi adotada a expressão, na medida em que remete a um jeito de ser construído por determinado grupo e que se perpetua e domina, positiva ou negativamente, o modo de agir desse grupo. Jakubíková diz que a cultura escolar sempre manifestou determinados sinais que possibilitam inferir sua aceitação ou rejeição por parte de uma comunidade escolar. No conceito, incluem-se “a tradição, a capacidade para mudar, caráter e a capacidade de autotransformação” (1999, p. 72).

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A cultura de uma organização manifesta-se a três níveis fundamentais: artefatos observáveis, valores manifestos e pressupostos básicos [...]. Os valores manifestos são os valores partilhados pelos elementos da organização, os objetivos e as estratégias da organização. O nível mais profundo é o dos pressupostos básicos e inclui as crenças, percepções, pensamentos e sentimentos inconscientes sobre a natureza do tempo e espaço, da realidade e verdade, da atividade humana e das relações humanas no contexto da organização. Este nível é, portanto, a fonte última de valores e ações (SCHEIN, 1982, p. 2).

A conclusão a que se chega, considerando as variáveis discutidas, é de que a situação da Escola Ana e a da opção metodológica adotada se inserem no “nível mais profundo” e se distanciam dos “artefatos observáveis”, conforme definido por Schein. Tendo em vista a complexidade da questão, quando se conjetura essa relação real versus imaginário na pesquisa, aspecto que não nos compete aprofundar, é que se admitem essas controvérsias entre percepção do pesquisador, fala dos participantes e realidade observável.

De volta ao contexto do clima escolar, buscou-se complementar esse processo de análise invertendo os papéis. Desta vez, visando captar a percepção da diretora em relação aos professores. O resultado também sugere um clima positivo, o qual parece resultar de um processo fluido de negociação e de diálogo, conforme declaração na entrevista: “Temos nossas diferenças e divergências. Procuro escutar outras opiniões, não posso impor a minha opinião só porque sou a diretora. Avaliamos o que será melhor para a escola. Posso te garantir que o clima na escola é muito tranquilo” (D: EA)

Há outro aspecto do clima escolar, citado por Casassus (2002), a respeito de um estudo realizado em países latino-americanos, intitulado A escola e a desigualdade. Nesse estudo, o clima escolar favorável foi associado à aprendizagem dos discentes. Machado (2002, p. 216), por sua vez, afirma que o clima favorável à aprendizagem está diretamente relacionado, por um lado, ao trabalho de equipe dos docentes e, por outro, às condições que a escola oferece aos discentes para que sejam efetivadas as aprendizagens. Para a autora, um clima organizacional

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favorável para o sucesso escolar é aquele em que “professor e aluno deem o melhor de si”. A autora conclui que “os insumos e os processos devem estar a serviço da aprendizagem dos estudantes. Só assim, a escola pode cumprir sua missão”.

Na Escola Ana, um clima visivelmente tranquilo e acolhedor, sugerindo harmonia, cuidado e bom relacionamento entre professores e estudantes, tem se mostrado favorável à aprendizagem. Mesmo na ausência de alguns professores, a diretora, a vice-diretora, a supervisora pedagógica e as coordenadoras assumem a regência da sala de aula, organizando-se por meio de uma escala de substituição, medida que visa evitar ou minimizar rupturas no ritmo de aprendizagem e sugere parceria e corresponsabilidade de toda a equipe com a aprendizagem dos estudantes. Portanto, a pesquisa revelou que na Escola Ana existe um clima favorável entre os atores escolares, de modo a propiciar o desempenho satisfatório dos estudantes em aprendizagem, favorecendo o sucesso escolar.

Fatores de eficácia possivelmente não contemplados pela literatura

Vaillant (2009) faz uma interessante abordagem ao conceito de profissão, tema para o qual se quer chamar a atenção. Para a autora, profissão se vincula ao “resultado de um marco sociocultural e ideológico que influi uma prática de trabalho, já que as profissões são legitimadas pelo contexto social em que se desenvolvem” (VAILLANT, 2009, p. 126). Nos anos 1990, o conceito de “profissional docente” reacendeu os debates. Para Ávalos (1997), a ênfase nessa década recai sobre o pensamento inverso, ou seja, se desloca da defesa da docência como profissão para o desvelamento do processo pelo qual o professor transita para a construção de sua própria concepção de profissão. Fullan (1993) argumenta que os professores e os mestres dos países latino-americanos estão no centro do que se denomina “problema educacional”; entretanto, o próprio autor esclarece que os docentes são também o fator estratégico de sua solução. Essa aparente contradição pode ser resumida na seguinte afirmação do autor, que é

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muito conhecida: “Os professores têm a honra de ser, simultaneamente, o pior problema e a melhor solução na educação” (FULLAN, 1993, p. 5).

Contradições como essas se tornam, para o autor, representações que a educação tem adquirido nos últimos quinze anos, na América Latina, continente onde a maioria dos países foi palco de várias reformas educacionais, algumas exitosas e outras nem tanto. Este, talvez, seja o grande desafio dos países latino-americanos em matéria de profissionalização dos docentes: atrair candidatos qualificados e estimular os docentes a buscar novas estratégias que se efetivem em aprendizagens significativas para os estudantes.

Com essa visão, Vaillant (2009) reconhece como um aspecto importante associado à profissionalização docente o “desempenho autônomo, com responsabilidade sobre a tarefa que se executa” (p. 127). Destaca que, embora se trate de características que não carregam o peso da obrigatoriedade legal, para que sejam construídas no decorrer da trajetória do professor, três elementos interagem: 1) a existência de um ambiente de trabalho adequado, o que se pode associar ao clima escolar; 2) uma formação inicial e contínua de qualidade; e 3) uma gestão e avaliação que melhore a prática laboral dos professores (VAILLANT, 2009, p. 128). Somados, pode-se dizer que esses elementos se traduzem, basicamente, em condições favoráveis para que o professor possa desempenhar o seu trabalho, nos aspectos físicos, ambientais, pedagógicos e de qualificação.

Nos questionários da equipe gestora e dos professores, havia um ponto que investigava se eles haviam participado de atividades de formação continuada. A resposta das cinco gestoras (100%) “sim”. Contudo, em relação aos professores, 20 docentes (69%) informaram que participaram de curso de formação continuada nos últimos dois anos, 8 (28%) responderam “não” à pergunta e um docente não informou (Gráfico 22).

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Gráfico 22 – Você participou de alguma atividade de formação continuada?

Portanto, o que se observou na Escola Ana foi um número expressivo de professores e de gestores que investem em sua formação continuada. Para Hypolitto (2004), os cursos de formação continuada podem ser comparados a uma conquista, a qual a autora nomeia de “maturidade” e “consciência” do profissional docente. A autora acrescenta que “quando a reflexão permear a prática, docente e de vida, a formação continuada será a exigência sine qua non para que o homem se mantenha vivo, energizado, atuante no seu espaço, crescendo no saber e na responsabilidade” (HYPOLITTO, 2004, p. 1). Os cursos de formação continuada buscam resgatar a figura do docente, que, na atualidade, anda tão desacreditada. As palavras freireanas podem ser um alento, quando o autor reforça que “ninguém nasce educador ou marcado para ser educador. A gente se faz educador, a gente se forma, como educador, permanentemente, na prática e na reflexão da prática” (FREIRE, 1991, p. 58).

Também a diretora e os professores foram provocados, nas entrevistas, a expressarem os seus sentimentos em relação à profissão que exercem. As respostas foram assertivas, e todos os inquiridos afirmaram estar realizados e felizes com sua profissão e, como ocorreu na Escola Maria, as falas dos entrevistados, em alguns momentos, estavam carregadas de alegria e de emoção:

– Eu gosto muito de ser professora. Hoje estou diretora. Também gosto muito de estar na direção da escola. Tem dia que a gente fica assim, muito sobrecarregada. Algumas vezes, fico me perguntando

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se está tudo funcionando bem na escola. Acho que é um desafio ser diretora, mas acredito que, a cada ano que passo no cargo de diretora, aprendo mais. Gosto muito da escola, das pessoas que trabalham aqui na minha equipe e também gosto muito dos estudantes (D: EA).

– A minha vida não foi nada fácil. Quando me tornei professora, foi para mim a realização de um sonho! Sou apaixonada pela educação. Você pode registrar aí, sou realmente apaixonada pela escola, pelos estudantes e alunas e meus colegas professores e professoras. Acredito que todo mundo precisa se sentir respeitado no local que trabalha e estuda. Vou me aposentar este ano, mas não vou parar de trabalhar, quero fazer o mestrado, ainda tenho sonho de continuar estudando (P1: EA).

– Já vivi muito e estou com uma idade que posso dizer que sou um professor realizado, gosto da minha profissão. Venho para a escola com alegria, gosto tanto da escola, que vim falar com você com satisfação, mesmo estando em greve. Mas, enfim, gosto muito de ser professor (P2: EA).

– Eu gosto de trabalhar aqui na escola. Sou muito feliz na minha profissão. É muito difícil um professor dizer isto. Que é feliz. A gente normalmente só escuta o contrário, não é? Mas eu posso dizer que sou uma professora muito feliz naquilo que eu faço (P3: EA).

O grifo foi usado na fala “vim falar com você com satisfação, mesmo estando em greve” por se tratar de um fenômeno relativamente incomum. De fato, interromper um movimento grevista, propor-se a participar de uma entrevista acadêmica e ainda expressar amor por uma profissão que, naquele momento, poderia estar provocando sentimentos de rebeldia e de desapontamento comprova uma atitude de maturidade, de consciência e de estima pelo que se faz. Este pode se constituir um fator a mais, que se alia como favorecedor do desempenho positivo da Escola Ana.

Para compor os fatores considerados “não” ou “pouco” contemplados na literatura da eficácia escolar, recorreu-se, também, às observações in loco. Desta vez, o olhar se voltou para um aspecto que pode sugerir simplicidade, mas que exige, porém, o que já foi enfatizado em outros momentos: maturidade organizacional. Refere-se a uma rotina metódica

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nas atividades escolares, tanto por parte dos estudantes como dos professores. Ao primeiro sinal para entrada do turno, os estudantes são recebidos por um membro da equipe gestora e seguem para suas salas de aula; ao segundo sinal, os professores já se encontram posicionados na porta da sala em que irão ministrar a aula. Essas rotinas foram observadas também nas dependências administrativas e pedagógicas da instituição. Na sala de professores, há um quadro em que são registrados avisos da parte das coordenadoras e da direção, os quais se destinam aos docentes.

Nas entrevistas com os professores, também foi registrado que a diretora está sempre presente na escola, nas reuniões coletivas dos professores e nas reuniões do conselho de classe, que ocorrem a cada final de bimestre. McLaren (2000) considera a rotina escolar um “verdadeiro ritual”, que se desdobra no bom funcionamento do cotidiano da escola. Essas rotinas escolares determinam o ritmo da organização administrativa e pedagógica da instituição, a disciplina; os processos de avaliação e a metodologia didático-pedagógica que é utilizada pelos docentes. Nesse contexto da dinâmica escolar, os professores influenciam e são influenciados e, desse modo, se faz pertinente recorrer ao pensamento de Freire (1996), que explicita essa relação dualista da profissão docente:

Ensinar não é transmitir conhecimentos, conteúdos, nem formar. É a ação pela qual o sujeito criador dá forma, estilo ou alma, a um corpo indeciso e acomodado. Não há docência sem discência, as duas se explicam, e seus sujeitos, apesar das diferenças que os conotam, não se reduzem à condição de objeto, um do outro (FREIRE, 1996, p. 25).

Há, contudo, um dado que mais uma vez se torna inusitado na educação, talvez pela suposta raridade de ocorrência, explícita ou implicitamente. Explicitamente, porque não se escuta facilmente, ecoando da voz de professores. Implicitamente, porque os resultados da educação, de modo geral, constatados na própria realidade que se observa no cotidiano da sociedade, se constituem de fracassos evidentes. Rubem Alves (2004) distingue professor como profissão e educador como vocação. Vale esclarecer que falar de vocação não se trata de remeter à perspectiva “missionária”, destituída do caráter de profissionalização, e, sim, falar de

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uma profissão nutrida pelo amor e pela esperança, para além dos aspectos de ordem formal. É nessa trilha que a educação será ressignificada, trilha que será traçada por docentes envolvidos com o sucesso escolar de todos os (tipos de) estudantes.

No trecho final da entrevista do Professor P2, percebe-se visível essa identidade com a profissão e com a educação, quando diz: “O grande legado da escola é realmente contribuir na preparação dessa juventude para um mundo mais consciente e mais cidadão. Sei que estou no lugar certo porque trabalho e faço o que gosto”.

Ampliando o debate que envolve a relação vocação versus profissionalização e visando a uma abordagem diferente da concepção mais ensaísta de Rubem Alves, cabe a reflexão embasada no pensamento de Weber (1864-1920), sociólogo e filósofo da pesquisa social. Ao tratar da vocação na ciência, o autor apresenta elementos cujo significado converge para a dimensão vocacional a que se está referindo. Weber (2004, p. 47) fala da “vocação alicerçada na especialização e posta a serviço de uma tomada de consciência de nós mesmos e do conhecimento das relações objetivas”. Aplicando essa visão à Escola Ana e também à Escola Maria, estima-se que a equipe de profissionais delas parece ter construído uma prática especializada, no sentido de alcançar a necessidade de seus estudantes e de conseguir obter êxito nos resultados. À luz do pensamento de Weber, infere-se que esse alcance se deu com a tomada de consciência do sentido da profissão docente (o que pode ser concebido como encontro, identidade/identificação), levando a equipe à percepção da dimensão objetiva do que poderia ser alcançado, na prática, a partir de uma provável evolução no nível de maturidade profissional. O segundo elemento de concordância definido por Weber acerca do modo de conceber a dimensão vocacional é relacioná-la à paixão. Para o sociólogo,

[...] a paixão e o trabalho andam juntos. Sem a paixão pela ciência, o professor-pesquisador jamais possuirá a vocação para ser cientista. E a única solução para este seria procurar outra profissão. Quando o trabalho e a paixão atuam juntos, fazem com que nasça a intuição. E ao contrário do que julgam os pedantes, a intuição não é menos importante na ciência do que na arte ou nos problemas da vida

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cotidiana [...] dá condições de se ter opinião, escolher os meios de resolver um problema e expor com clareza os conceitos em que a opinião está embasada (WEBER, 2004, p. 47).

Sendo a paixão um elemento que se tornou manifesto no modo como aqueles professores relataram sua relação com a profissão, infere-se que o êxito nos resultados também pode advir da intuição, do discernimento sobre o que, de fato, leva a gerar práticas eficazes para os estudantes. O modo como Weber classifica a intuição termina por remetê-la ao status de uma “ação científica”, transcendendo a mera dimensão “passional”, aproximando-a mais da razão e menos da emoção. Conforme Weber (2004), nessa linha de reflexão, a ciência (da natureza) revela seu paradoxo: contrariando o clássico “poder de explicação”, não consegue desvelar o sentido das coisas. Assim, a dimensão vocacional da ciência poderia ser identificada como a de voltar-se para o sentido, transcendendo a mera dimensão técnica de apontar o “que fazer”. Este se constitui também o enfoque adotado para dizer da dimensão vocacional da profissão docente: ir ao encontro do sentido que, por sua vez, levará à intuição para a descoberta de práticas eficazes.

Encerra-se esse tópico chamando a atenção para a ênfase dada e que será discutida no capítulo final. Consiste em destacar elementos que compuseram algumas conclusões acerca de tudo o que foi analisado e discutido, como resultados da pesquisa, por manter relação com fatores diferentes daqueles identificados na literatura da eficácia escolar. Esses elementos se constituem em torno da maturidade organizacional ou profissional, desencadeada pela construção da identidade com a profissão, este último elemento como fator principal. Entretanto, tomou-se por pressuposto que a identidade com a profissão transcende a dimensão vocacional per se, para alcançar um encadeamento de componentes, identificados como fazendo parte de uma trama, tecida no interior da escola, a qual, por sua vez, só emerge na ocorrência de um conjunto de outros fatores encontrados nas duas escolas pesquisadas.

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Função social na perspectiva da Escola Ana

A Constituição Federal (1988) estabelece em seu artigo 205 que “a educação, direito de todos e dever do Estado e da família, será promovida e incentivada com a colaboração da sociedade, visando ao pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho”. Entre outros artigos, entende-se que este se destaca como mandamento das escolas, para que não prescindam de sua função social, sobretudo quando o artigo faz referência a dois elementos que denotam preparação para práticas que remetem ao futuro dos estudantes: cidadania e profissionalização.

Para além do que determina a legislação, a função social da escola avança, na atualidade, segundo Moran (2005), a ideia de instituir uma dinâmica curricular que busca ao mesmo tempo desenvolver os processos de aprendizagem e viabilizar aos estudantes a possibilidade de adquirirem as competências necessárias para se tornarem cidadãos conscientes na luta por uma sociedade mais solidária e equânime. Ponte (1997) esclarece que o papel da escola inclui a preparação da totalidade dos jovens para uma sociedade que cada vez mais se revela em sua complexidade. Por isso, demanda outras competências como, por exemplo, ser capaz de distinguir oportunidades, ter flexibilidade de raciocínio, adaptar-se a novas situações, ter persistência e capacidade de interagir e cooperar. Acrescenta, ainda, que essas capacidades não devam permanecer inertes, mas, torná-lo um sujeito crítico, criativo e interveniente. Corroborando o autor, Figueiredo (1988) reforça que o novo papel da escola deverá incluir a promoção “da aquisição de saberes e competências-chave e de auxiliar a estruturar a grande diversidade de vivências exteriores em torno desses saberes e competências-chave” (FIGUEIREDO, 1998, p. 2).

Analisando as falas dos professores da Escola Ana, encontrou-se convergência para o perfil de uma escola que cumpre sua função social, na medida em que o acompanhamento e o contato dos professores extrapola o âmbito escolar. No recorte abaixo, professores entrevistados revelaram suas práticas e crenças, sugerindo que a função da escola vai além da aprendizagem formal e do tempo escolar.

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– Fico feliz quando entro no Facebook e tem lá um recadinho de algum aluno. Muitos postam mensagem assim: como fui feliz na escola! Esta escola modificou minha vida. Posso lhe dizer tranquilamente que a escola cumpriu com a função social, que é formar estudantes e alunas para a vida e para o trabalho, e mais, ainda ajudou a formar um cidadão melhor (P1: EA).

– Acredito que a missão da educação seja trabalhar como mais humanidade. Uma humanidade compreendida como cidadania, como crença nas virtudes que devem nortear um homem, um cidadão. O grande legado da escola seria preparar essa juventude com estes valores, pois eles poderão contribuir muito no País (P2: EA).

– Uma das coisas que me deixa mais feliz como professora é quando encontro um aluno que passou por esta escola. Sempre que encontro com eles, vêm logo os comentários: professora eu fui tão feliz na escola, eu gostava tanto de lá, que saudades! (P3: EA).

Ante as evidências, pode-se afirmar que a Escola Ana se tornou um ambiente privilegiado de aprendizagem e de exercício dos princípios democráticos, permitindo a contribuição daqueles que se propõem a colocar a serviço desse espaço suas aptidões cognitivas, intelectuais e sociais. Para Pellegrini (2000), Martins (2001) e Morais (2000), os educadores devem adquirir o que nomeiam de “olhar diferente” para o ensino neste milênio. Segundo os autores, o ensino no século 21 deve seguir pelos caminhos das relações humanas, objetivando um bem a mais para os estudantes.

Ainda na perspectiva do “olhar diferente” proposto pelos autores, a escola não deve se preocupar somente com a execução de suas matrizes curriculares, mas, sim, buscar incansavelmente uma maneira de integrá-las com práticas pedagógicas motivadas a partir das vivências e dos conhecimentos essenciais adquiridos ao longo da vida. Portanto, a Escola Ana demonstrou, com suas práticas pedagógicas e com o envolvimento e a participação de toda a comunidade escolar, que está cumprindo a função social junto a seus estudantes, pais, professores e funcionários, de forma eficaz.

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Capítulo 10

ESCOLA ANA: EVIDÊNCIAS RELACIONADAS À EFICÁCIA ESCOLAR

Conforme explicitado no texto de introdução do estudo de caso da Escola Maria, na discussão a seguir se buscou mostrar o resultado de um exercício complexo de “ruminação”, depois de encerrado todo o processo de análise, exaustivamente aplicado em ambas as escolas. Nomeia-se de complexo, pela própria acepção da palavra, uma vez que resultou da etapa de travessia de um modo de análise cartesiano para uma visão mais sistêmica (MARIOTTI, 2000). No primeiro momento (cartesiano), a tarefa adquiriu um caráter linear, visando associar os dados às questões levantadas na pesquisa, no intuito de corroborar percepções. No segundo (sistêmico), exercitou-se o atrelamento de partes interdependentes de um todo, no exercício de integrar dados e literatura, na perspectiva de estabelecer coesão entre o supostamente “real” e as percepções, crenças, visões, incorporando, ainda, elementos apreendidos da experiência profissional da pesquisadora. O resultado está aqui sintetizado, como os elementos principais resgatados da análise e da discussão dos dados, desta vez, referentes à Escola Ana. Ao resgatar-se a mesma estrutura, cada um dos aspectos também foi denominado de “evidências da Escola Ana”.

Primeira evidência: conquista de um perfil de maturidade organizacional

Pelo modo como se destacou o estilo de liderança e seus efeitos sobre os resultados obtidos, observado depois de uma revisão refletida,

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considerou-se que o fluxo do trabalho pedagógico adquiriu um ritmo ajustado às necessidades da escola, ficando visível que cada um sabe o que deve ser feito no exercício de sua função. Nessa percepção, o papel do diretor é colocado no lugar de coadjuvante, funcionando a liderança em sua essência. Para expor o sentido dessa primeira evidência, retoma-se o recurso da expressão por meio da metáfora, como um meio de ilustrar o significado do que se pretende revelar, na tentativa de atingir o objetivo em sua essência.

Para tanto, tomam-se como exemplo duas experiências de travessia pelo mar: a Endurance (1913-1914),28 lendária expedição à Antártica liderada pelo britânico Sir Ernest Shackeleton, cujo desafio era conseguir atravessar de um extremo a outro o continente antártico. E a Karluk,29 expedição idêntica diferenciando-se por seguir para o norte, enquanto a primeira seguia para o sul. A analogia com o contexto da Escola Ana se estabelece na série de coincidências entre as expedições e se encerra no único fator que as torna diferentes. As coincidências, aqui, foram comparadas ao fato de existirem várias escolas no sistema, gozando das mesmas condições, porém nem todas alcançam resultados que as levem a se destacarem entre as demais. Nas expedições, entre as semelhanças, estava o objetivo de cada tripulação, o qual consistia em lutar pela sobrevivência; determinada distância a percorrer, pois as duas histórias falam de jornadas de 1.100 a 1.300 quilômetros em busca de resgate; e o destino, inclusive, foi o mesmo: as duas embarcações ficaram aprisionadas pelo gelo.

Entretanto, houve uma diferença primordial quanto aos resultados que cada expedição obteve, os quais foram totalmente diferentes. A expedição Karluk, em consequência de sua desintegração, resultou na morte de 11 homens. Na Endurance, Sir Shackeleton se destacou pela prioridade da segurança, do cuidado e do bem-estar de seus homens, resgatando os 27 que haviam começado a expedição e conseguindo que todos sobrevivessem. Essa diferença foi atribuída ao modo como os dois

28 Os dois anos, 1913 e 1914, abrigaram as duas últimas expedições à moda antiga às regiões polares feitas em barcos de madeira. <Fonte: http: //www.skoob.com.br/livro/12689/>.

29 Fonte: <http: //www.skoob.com.br/livro/12689/>.

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líderes conduziram a tripulação diante dos obstáculos e dos desafios: fazer com que a tripulação trabalhasse em prol de um objetivo comum; organizar ações eficazes em um ambiente caótico; trabalhar com recursos limitados; estimular a equipe, apesar das adversidades. Ocorreu que a tripulação do Karluk transformou-se em um grupo de indivíduos em que predominavam o individualismo, as barganhas, as calúnias, entre outros “atributos” negativos, que se tornaram lugares-comuns. Ao contrário, na tripulação do Endurance, a lição aprendida na expedição derivou da liderança, fator que fez toda a diferença. O estilo de liderança de Shackeleton provocou um efeito de sinergia na equipe, de tal modo, que significou a diferença entre o sucesso e o fracasso da tripulação em situações extremas.

À semelhança da lendária experiência do Endurance, na Escola Ana parece que o mesmo efeito de sinergia foi criado, provavelmente, por uma série de fatores, sendo o principal deles, certamente, a atuação da gestão escolar. A percepção que emergiu nas visitas, as observações e as vozes apreendidas do ambiente, foi a de que a diretora conduz a “tripulação” do barco, mas não determina seu curso, nem os instrumentos de navegação, tampouco o modo e o momento como devem ser usados. Parece que a diretora faz parte da tripulação, como integrante e não “comandante”, mas sem se esquivar do papel de autoridade constituída. Não toma a dianteira, mas propicia a cada tripulante a liberdade de exercer sua função e experimentar a tomada de decisão. Todavia, os comandados seguem seu caminho próprio, sem se desconectarem de um percurso preestabelecido em conjunto, revelando a existência de desejos e de propósitos comuns. E a rotina não deixa de fluir consistente e sistematicamente.

Como resultado, a escola alcançou a evolução progressiva em desempenho, superando os indicadores oficiais e, aos poucos, está conquistando o feito de não perder nenhum aluno pelo caminho, resgatando todos os que apresentarem dificuldades de prosseguir. Da imagem dessa dinâmica resultou a visão de maturidade organizacional. Inclusive por parte do aluno, o qual demonstra consciência de seu papel e o exerce com seriedade e maturidade, engajando-se “de modo quase inconsciente” (P2), conforme trecho da entrevista abaixo. Modo “quase inconsciente” pode remeter a valores incorporados à própria vida e não

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somente à dimensão acadêmica. As percepções referidas podem ser confirmadas em várias expressões da fala de um dos entrevistados:

– [...] os estudantes da escola se engajam de verdade nos projetos; poderia até falar uma expressão assim: “os estudantes se engajam de modo quase inconsciente”, e o resultado é a melhoria constante dos índices de aprovação e dos diversos indicadores (P2: EA).

Segunda evidência: prática consistente como representação de coerência

Faz-se referência à dinâmica administrativa e pedagógica que organiza o ambiente escolar. Observou-se a existência de um conjunto de regras estabelecidas coletivamente e uma prática já incorporada, tanto pelos estudantes quanto pelos professores, de respeito e não de temor a essas normas. É preciso esclarecer, entretanto, que não se trata de comportamentos padronizados, os quais poderiam afetar a individualidade, caso os indivíduos passassem a se transformar em uma extensão do grupo. A percepção que emergiu foi a de que os estudantes apreciam ser cobrados e exigidos, porque isso denota coerência e seriedade de propósitos por parte da escola. Há que se reconhecer que a escola termina por oferecer um espaço de vivência semelhante à vida em sociedade, cuja harmonia das relações sucumbirá mediante atitudes de desrespeito às regras e aos preceitos defendidos em cada cultura. São as regras que, na maioria das vezes, norteiam os mecanismos que propiciam a convivência entre as diferenças. O comportamento atual da escola decerto procedeu de um processo de mudança que gradativamente foi incorporado pelos membros da comunidade.

É sabido que regra remete a comportamento e comportamento se forma na perspectiva do lugar onde as pessoas interpretam as situações nas quais se encontram. Em uma escola, assim como em qualquer organização, pessoas diferentes passam a se integrar impulsionadas pela busca de objetivos comuns e, a partir dessa integração, começam a compartilhar valores, crenças, desejos, expectativas de futuro. A imagem que constroem

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dessa organização pode determinar o nível de credibilidade a partir do qual seus integrantes concordam ou não com as estratégias e as propostas apresentadas. Schein (1982) cita o líder como o grande responsável para que essas mudanças se tornem eficazes.

Terceira evidência: expectativas elevadas dos professores com relação aos estudantes

Um dos pontos que pode ser considerado o mais influente para as estratégias que conduzem a bons resultados vai ao encontro de uma das subcategorias identificadas exclusivamente na Escola Ana. É bem certo que expectativas altas, per se, não significam melhoria no desempenho escolar, uma vez que podem fechar-se num mero comportamento otimista. Porém, se altas expectativas estiverem entrelaçadas a um contexto escolar favorável, em que a organização do ambiente torna-se um espaço propício para a aprendizagem, nesse contexto elas tornar-se-ão produtivas podendo virar sinônimo de melhoria do desempenho escolar.

Na Escola Ana esse efeito positivo parece resultar da relação harmoniosa percebida entre direção, professor e estudantes. Bandura diz que “expectativas não agem diretamente no desempenho do aluno, mas, através da atitude do professor, torna-se um efeito que contribui para elevar a autoestima do aluno” (1992, p. 367). Corroborando o autor, Mortimore et al. (1998b) reforçam que, mesmo quando o professor não consegue visualizar melhoria na aprendizagem do aluno, é importante que ele acredite no potencial deste. Para o autor, quando o professor tem expectativas elevadas em relação aos seus estudantes, isso pode se tornar um efeito poderoso no processo de melhoria do desempenho escolar da turma e, principalmente, dos estudantes que demonstrem algumas dificuldades no processo de aprendizagem.

Em trechos das entrevistas da diretora e dos professores, foi possível identificar que na Escola Ana a equipe escolar reforça o sucesso dos estudantes, motivada pelo recurso aos elogios em sala de aula, os quais, por sua vez, são transmitidos aos pais, mães ou responsáveis nas reuniões

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da escola. A diretora esclarece sua postura diante dos alunos e de seus responsáveis, quando afirma que, depois da reunião do conselho de classe, visita cada turma, conversando com os estudantes sobre o desempenho que obtiveram, reforçando-o por meio do elogio. Segundo a diretora, também os pais ou responsáveis são elogiados e parabenizados pelo sucesso dos filhos e pela confiança na escola. Com relação à opinião do corpo docente, uma das professoras entrevistadas disse reconhecer a atitude da diretora como positiva para a escola e enfatiza: “Uma coisa muito boa que acontece aqui na escola é que a gente sempre acredita nos estudantes. Acho muito boa a postura da diretora também de passar nas salas de aulas e conversar com os estudantes, se dispondo a ajudá-los” (P1: EA). Em outro entrevista, a Professora 3 confirma que toda a equipe escolar procura motivar os estudantes: “Os estudantes sentem-se valorizados e felizes com cada conquista ou prêmios que recebemos [...]. Faz parte da nossa função de professora acreditar no aluno, reconhecer que todos eles são capazes de aprender” (P3: EA).

É interessante notar que há uma crença que parece generalizada quanto à capacidade dos estudantes. Isso se expressa como “alta expectativa” por parte da equipe escolar e parece ter sido incorporado à escola como função: “Então faz parte da nossa função de professora também acreditar no aluno, saber que todos são capazes de aprender” (P3).

As observações e as visitas realizadas na Escola Ana demonstraram que os estudantes estão integrados ao ambiente escolar e que podem ser considerados sujeitos do saber. Na mesma direção, os professores demonstraram que também o são. A existência dessa relação dialógica e de cumplicidade torna a escola um espaço democrático, em que prevalece a valorização do processo ensino-aprendizagem. Ora, “alta expectativa” remete a “autoestima” e lembra a ausência de pensamento preconceituoso, o que teria por princípio distinguir entre os que conseguem e os que não conseguem. O benefício adjacente é que os estudantes desenvolvem afeto pela escola e interesse pelo estudo, além de uma boa relação com os professores. Tudo isso se reflete em autoestima elevada no ambiente escolar. Portanto, cabe ressaltar que quando o professor tem expectativas elevadas em relação aos estudantes, incentiva-os, elogia-os e monitora seu

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desempenho escolar, consequentemente, gera ações de efeito positivo, tornando-se elemento fundamental de uma educação que busca ser eficaz.

Quarta evidência: “visão da escola sob o ponto de vista do aluno”

Nessa evidência, contudo, optou-se por apresentar como dados somente o Discurso do Sujeito Coletivo (DSC) dos estudantes, construído a partir da questão aberta do questionário. Considera-se que, em muitos momentos, a voz do aluno foi contemplada de forma ampla e legítima. Qualquer outro aprofundamento na apresentação dos dados se tornaria mera repetição do óbvio: os dados revelaram que os estudantes da Escola Ana e os da Escola Maria, construíram uma imagem positiva acerca da escola e do sentido que esta representa em suas vidas.

Por essa razão, encerra-se no DSC a exposição de dados concernentes à visão dos estudantes acerca do sucesso e da eficácia da Escola Ana. Resgatando algumas evidências quantitativas, como ocorreu na Escola Maria, 155 estudantes, ou seja, uma expressiva maioria, responderam “sim” ao serem perguntados se consideravam a escola como “eficaz”. Esses dados foram avaliados como positivos, porque podem ser traduzidos como o olhar dos estudantes para a instituição em que estão inseridos.

A mesma visão positiva foi manifestada por meio do DSC, construído sobre as justificativas que esses estudantes apresentaram ao responderem a essa questão. Assim sendo, pode-se afirmar que, em seus argumentos, os estudantes da Escola Ana concebem esta da seguinte forma:

– Na escola todos se esforçam para ser cada vez melhor. A direção e os professores levam em consideração a opinião dos estudantes e existe diálogo. A escola tem boa estrutura física, tem recursos pedagógicos, é muito organizada, os ambientes sempre estão limpos e é muito, muito calma. Além disso, tem ótimos professores, que são muito exigentes, ensinam bem as matérias, por isso os estudantes passaram a gostar de estudar. Escola eficaz é aquela que forma cidadãos do bem, em que professores e direção dão o exemplo dentro e fora da escola; por isso, podemos responder que a Escola Ana é uma escola eficaz.

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Quanto ao DSC dos professores, da mesma forma que o dos estudantes, considerou-se que a visão docente acerca da escola já fora amplamente exposta. Portanto, nesse caso, julgou-se desnecessário descrever o DSC.

Quinta evidência: clima escolar que induz à sensação de um bem-estar geral

Por remeter à imagem de tranquilidade, harmonia, calma e silêncio, decidiu-se retomar para denominar a quinta evidência o “clima escolar”. Em que pese a quantidade de estudantes que atende nos dois turnos de aula, a instituição é reconhecida pela vizinhança que a circunda como um local muito tranquilo. Isso se deve ao fato de que a Escola Ana se localiza no centro de quadra residencial, hoje cercada por alguns empreendimentos imobiliários. Entretanto, a impressão que emerge à primeira visita é que se está diante de uma “ilha” naquele local. Por algumas vezes, a própria pesquisadora observou e relatou em seu diário de bordo notas sobre esse ambiente de absoluta tranquilidade, harmonia e profundo silêncio.

Outra observação foi com relação à exigência/ao cumprimento sistemático das atividades dos estudantes e professores, em geral, demostrando ser esse um ponto-chave da escola. Ressalta-se, aqui, a percepção corrente sobre a rotina de escolas em que certas disciplinas carregam subjacente o caráter de rigidez e de “ditadura de regras”, promovendo um ambiente, de certa forma hostil, dada a competitividade entre professores e estudantes, sobretudo, naquelas escolas em que as regras ainda mantêm conotação opressora. Nesses espaços, as normas estabelecidas, quando existem, não são condição indispensável à convivência social, mas assumem o caráter de instrumentos de coerção, e os professores que preconizam a disciplina são considerados “carrascos”. Na Escola Ana, a unidade de pensamento, de linguagem e de ação é o que também contribui para gerar o clima favorável à união entre gestores, professores e estudantes. Não por acaso, as influências benéficas do clima escolar parecem se estender também ao ambiente físico, conforme referido na fala dos professores P2 e P3.

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– [...] muitas pessoas chegam aqui e perguntam se está tendo aula, tal é o silêncio. O ambiente aqui é sempre assim. Eu devo dizer que essa postura de silêncio não é medo, não, porque o respeito se conquista. O respeito que vem com o medo não é respeito (P2: EA).

– Nesta escola a gente não vê nada de violência. Tenho oito anos de trabalho aqui e nunca vi nada de violência nesta escola. É uma escola tranquila, os estudantes respeitam os professores e também são respeitados (P3: EA).

Reforçando a afirmação anterior, esse clima tranquilo foi considerado um ambiente propício à aprendizagem escolar e uma das evidências significativas apreendida no decorrer da pesquisa. Resgatando alguns elementos que colaboram para que isso ocorra, inclui-se o envolvimento da equipe gestora, dos professores, dos funcionários e dos estudantes.

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Capítulo 11

DESCOBRINDO E DESCOBRINDO-SENA TEIA DA EFICÁCIA ESCOLAR

Chegando ao capítulo final, foi possível experimentar uma sensação explicada de forma especial por Marques (2006), autor que expõe as consequências da palavra escrita, no modo como deve ser expressa na etapa de comunicação de resultados alcançados, de objetivos atingidos, de esperança de que algo possa contribuir para a mudança. Considerando a responsabilidade que permeia esse momento, julga-se pertinente abrir o capítulo, que fecha um ciclo, com o pensamento do autor:

Na fala, a palavra que digo ou me escapa está dita. Não há como fugir ao fato. Mas na escrita posso apagá-la, suprimi-la ou substituí-la; no ato de escrever sinto-me dona do meu próprio texto. Posso mudá-lo a qualquer momento, destruí-lo até. Quando, porém, ele ganha o mundo, quando passa ao domínio público, sinto que me fugiu, emancipou-se, escapou de meu alcance. Uma sensação muito viva e estranha: a de só agora ver a cara de meu filho ao mesmo tempo em que dele me despeço, vê-lo cair na vida, ausentar-se, entregue à indiscrição de quem não conheço, a destinos que fogem de meu controle. Talvez a chacota e o desprezo, talvez a acolhida amiga, a simpática oportunidade de ser útil a alguém. É isso que faz dramático meu ato de escrever, e cheio de surpresas, de temores e alegrias (MARQUES, 2006, p. 27).

Conforme orienta Marques, os resultados de uma pesquisa “ganham o mundo” e intentam contribuir com a área para a qual foram destinados,

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na perspectiva de oferecer subsídios, não para respostas, mas para que mais perguntas instiguem o progresso da ciência. Por essa razão, trazem explícita uma estrutura formal, a partir da qual deve fluir a concretização de etapas que levem às respostas das indagações que a motivaram. A pesquisa que subsidiou essa publicação, por exemplo, se iniciou visando a um objetivo geral, o qual propunha caracterizar estratégias de gestão e de práticas escolares associadas ao desempenho satisfatório de duas escolas da rede escolar pública, situadas em áreas de periferia, que obtiveram desempenho superior à meta de crescimento do Ideb do Distrito Federal. Para alcançar esse objetivo, a pesquisa manteve-se fiel a um cenário teórico-epistemológico predeterminado, inclusive pelos elementos que motivaram sua realização: a eficácia escolar. Tanto que pretendeu responder, no fim de toda a jornada investigativa, a duas questões que se mantiveram latentes e subjacentes em todas as discussões: 1) O que, de fato, a escola precisa “ensinar”? 2) As escolas que subsidiaram a pesquisa realizada podem ser chamadas de escolas eficazes, por serem consideradas como bem-sucedidas?

A temática “escolas eficazes” subsidiou, portanto, toda a discussão apresentada, a qual teve como ponto de partida identificar, com base na literatura, se duas escolas públicas situadas em áreas periféricas do Distrito Federal, selecionadas depois da exaustiva aplicação de um conjunto de critérios, apresentavam características correlacionadas aos 11 fatores de eficácia escolar citados por Sammons, Hillman e Mortimore (1995). A elaboração desses critérios também levou em conta o maior número de características que situassem o objeto de estudo dentro do que a literatura define como sendo escolas eficazes, a fim de atingir um recorte, no universo inicial de 155 escolas, o mais fiel possível.

Para compreender a dinâmica que promoveu o bom desempenho em cada uma delas, adotou-se um conjunto de instrumentos e de procedimentos, o qual primou por alcançar a multiplicidade de visões e de vozes que compõem o cotidiano de uma escola e, de modo especial, de escolas consideradas por avaliações externas como bem-sucedidas. Com base nesses múltiplos instrumentos, buscou-se verificar a presença dos fatores associados à “eficácia escolar”, segundo a visão da equipe gestora, dos professores, dos estudantes e também da pesquisadora, que,

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embasada pela experiência na área da educação e irrigada da subjetividade como componente indispensável à pesquisa qualitativa, pôde saborear um período fecundo de vivência in loco e de construção acadêmica sustentada pelo desafio de tentar desbravar novos horizontes.

É preciso esclarecer, ainda, que, apesar da realização da pesquisa em duas escolas, o objetivo não foi de compará-las entre si. Por essa razão, os resultados de cada uma foram analisados separadamente e, em ambos os casos, foi criado um espaço para o registro dos resultados parciais, o qual relatava as evidências mais significativas que subsidiaram os resultados finais da pesquisa.

Os estudos relacionados às escolas eficazes têm longa trajetória, principalmente quando se trata de publicações internacionais. No contexto brasileiro, as publicações nacionais vêm aumentando ao longo da última década e trazendo pistas do efeito positivo das práticas escolares sobre o desempenho dos estudantes. Na visão de autores como Brooke e Soares (2008), que discutem a temática, os principais recursos escolares são a organização do ambiente escolar e o clima acadêmico, os quais se estabelecem com a liderança do diretor e o envolvimento coletivo do corpo docente com o aprendizado dos estudantes, associando todos esses fatores ao processo de ensino-aprendizagem.

Como um breve relato do movimento geral da pesquisa realizada, na intenção de resgatar alguns elementos essenciais, seguem algumas abordagens que subsidiaram seus resultados.

No decorrer da pesquisa, os fatores evidenciados em cada escola foram agrupados em duas grandes categorias, juntando-se o resultado das duas escolas. À primeira categoria, identificada como “a escola como ambiente propício de aprendizagem”, foram associadas oito subcategorias convergentes: 1) acolhimento, 2) disciplina, 3) objetivos comuns, 4) organização dos espaços físicos e pedagógicos, 5) prática de projetos, 6) expectativas elevadas dos professores em relação aos estudantes, 7) cobrança sistemática das atividades dos estudantes pelos professores e 8) colaboração entre escola e família. A segunda, identificada como “clima escolar”, associou quatro subcategorias: 1) respeito, 2) diálogo, 3) confiança e 4) relações interpessoais.

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Os resultados obtidos pela Escola Maria e pela Escola Ana, no que tange à escola como ambiente propício de aprendizagem, tiveram pontos semelhantes, principalmente os que se referem à infraestrutura física do espaço escolar, aos recursos pedagógicos, aos recursos humanos, a prática de projetos e ao acolhimento. Outro ponto de convergência dos dados foram as normas internas estabelecidas em parceria pela equipe gestora, professores e estudantes. Entre essas normas, pode-se relacionar a disciplina, os objetivos comuns e a colaboração intensiva que ocorre entre família e escola. Essas subcategorias evidenciadas nas duas escolas convergem para um ponto fundamental constatado nas instituições, que foi o envolvimento entre a equipe gestora e a equipe escolar.

Nas duas escolas, notou-se a presença de três elementos determinantes que se fundiram: 1) a coerência das ações desenvolvidas pela equipe gestora, 2) o envolvimento de professores e de estudantes na elaboração e na execução de práticas pedagógicas e 3) uma organização clara do trabalho realizado. É oportuno destacar que, tanto na Escola Maria, quanto na Escola Ana, a integração desses elementos se estabeleceu por intermédio do diálogo, da participação e do envolvimento da equipe gestora, dos professores e dos estudantes, que se transformou em comprometimento e, posteriormente, se traduziu em melhoria no desempenho escolar dos estudantes.

O exercício de estabelecer um paralelo e se voltar para uma visão integrada entre o que foi vivenciado, tanto na Escola Maria como na Escola Ana, permitiu à pesquisadora inferir que as ações pedagógicas e administrativas de ambas não se tornaram um fim em si mesmas, ou seja, não visaram somente a alcançar resultados de desempenho escolar. Ao contrário, buscaram propiciar que as instituições de ensino cumprissem seus objetivos sociais, além dos objetivos educacionais a que se propuseram. Nessa direção, parece ser fundamental o entendimento de que só é possível falar de construção de práticas eficazes se esses objetivos institucionais, de fato, transcenderem a dimensão escolar, pois se trata de uma visão que introduz a noção de complexidade, que, por sua vez, permeia e constitui o cotidiano das escolas em sua missão tríplice: humana, social e educacional.

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Parafraseando Morin (2004), a complexidade emerge quando se alcança a visão de que os fatores de eficácia passam a representar uma teia de relações entre os seus segmentos e elementos do ambiente (partes) e a escola (todo), como um fio que cinge e que abarca todos eles: segmentos, fatores e ambientes. Por sua vez, essa construção só pode ser compreendida e efetivamente construída quando as partes (os fatores de eficácia) que constituem o todo (a escola) forem consideradas como inseparáveis, formando um tecido interdependente e interativo, além, e sobretudo, de agir como um movimento inter-retroativo entre esses elementos todos.

Na pesquisa, os professores declararam-se satisfeitos com a escolha da profissão. Esse fator foi evidenciado nas duas escolas e pode sinalizar um efeito positivo de relação bem-sucedida com o processo ensino-aprendizagem. É fundamental reconhecer também que os docentes se tornaram gestores de seu trabalho, aspecto observado, principalmente, na Escola Ana, a qual demonstrou um processo de gestão peculiar em relação à Escola Maria. Contudo, orientados pelo clima que circunda o ambiente escolar, essa autogestão não tornou os professores soberanos em suas práticas e atitudes, mas, sim, agentes compartilhadores de uma perspectiva de autogestão que se alia aos novos tempos, na medida em que se distancia do ar soberano e se aproxima dos princípios da autonomia.

Percebeu-se quão fundamental se torna para a dinâmica intraescolar a instituição considerar os saberes dos docentes, proporcionar espaços de convivência e de socialização de experiências, inseri-los, enfim, na gestão política e pedagógica da escola. Comprovadamente, essas dinâmicas estimularam o envolvimento, a confiança e a cumplicidade entre toda a equipe escolar. Na Escola Ana, os resultados sugerem que a equipe já encontrou o seu caminho, ou seja, conseguiu visualizar o ponto de conexão, a partir do efeito de sinergia, anteriormente explicitado. A Escola Maria, seguindo por uma trilha diferente, cujo percurso resultou de elementos característicos de sua trajetória (vínculo forte com equipe anterior de gestão), também encontrou seu lugar de escola bem-sucedida refletido em seu desempenho.

No que tange a um aspecto crítico que distingue as duas escolas, vale destacar o fato de a Escola Ana atender a uma única modalidade, sendo

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que a Escola Maria ainda atende a uma diversidade relativamente ampla de modalidades e de etapas da educação básica. No caso da Escola Maria, a dificuldade abrange diferenças quanto à faixa etária dos estudantes, à série, à estrutura curricular e ao perfil dos professores, diferenças que requerem um esforço extra da equipe de gestão para conseguir articulá-las e manter o equilíbrio e um clima sempre propício ao fluxo contínuo e benéfico para o bom desempenho dos estudantes.

Entendeu-se, por um lado, que a Escola Ana apresenta uma linguagem convergente, fator que parece auxiliar na fluência da rotina escolar e que, provavelmente, explique a percepção de que os professores agem com mais autonomia. Não há a exigência de um ritual que restrinja, de certa forma, a liberdade de ação e de atuação deles, embora ambas as escolas tenham conseguido resultados satisfatórios. De um lado, na Escola Ana parece que todos já sabem o que, como e quando fazer, desenvolvendo-se uma rotina harmônica, organizada e produtiva. De outro lado, na Escola Maria parece existir um “controle” maior por parte da equipe gestora. Talvez o “controle” signifique que todos se voltam para seguir essa voz que se revela de diferentes maneiras, por estar direcionada a diferentes receptores. Mesmo assim, com base no conjunto de dados, mas, especialmente, nas observações in loco, é possível afirmar que diferentes modalidades de ensino na mesma escola constituem uma barreira substancial para a fluidez das práticas. Ao gestor daquela unidade cabe o encargo de exercer diferentes papéis, assumir diferentes posicionamentos e, ainda, utilizar diferentes linguagens, na tentativa de alcançar plenamente públicos tão distintos. E ele o faz com maestria.

Talvez este seja mais um ponto em que se espera contribuir a partir da divulgação deste trabalho: no âmbito de somente duas escolas está manifesta uma pequena, porém, fecunda amostra da riqueza da diversidade e da necessidade de se respeitar as diferenças de realidade. A lição aprendida é que, embora os caminhos percorridos não fossem os mesmos, ambas seguiram na trilha do sucesso escolar, testemunhando que de muitos modos se podem empreender esforços para uma nova perspectiva de resultados na área da educação e mudar a realidade que está posta.

Tecidas as considerações acerca de uma visão integradora de tudo o que foi observado em ambas as escolas, apresentam-se os resultados que

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a pesquisa alcançou, desta vez, na perspectiva de reunir todas as peças em um todo integrado. Antes, cabe dizer de uma percepção intrigante acerca dessa jornada que, neste momento, toma o curso de suas últimas linhas. Essa condição, reconheço, responde a um sentimento de esperança que, acredita-se, deva emergir a cada pesquisa concluída. Provavelmente, será consequência de uma tomada de consciência sobre um novo passo na direção de um conhecimento mais profundo, muitas vezes não conhecido ou, pelo menos, não visto ainda. Isso ocorre porque avançar em algum aspecto do conhecimento resulta no compromisso de assumir uma postura de permanente vigilância contra a instigante sedução da certeza como prova de uma verdade supostamente alcançada.

Contudo, não há como se esquivar de uma dimensão de relativa certeza que se julga ter alcançado. Não diretamente relacionada ao domínio da natureza científica da pesquisa, mas ao caráter subjetivo que se foi adquirindo, naturalmente, cada vez que ocorria um processo mais fecundo de imersão na análise dos dados. Atribui-se esse processo a certa “distância crítica” que, necessariamente, se teve de estabelecer ao afastar o zoom do objeto de pesquisa, no momento de iniciar as etapas de reconstrução do processo realizado, desta vez, por meio da escrita. É como juntar as peças multicores e costurar uma colcha de retalhos, a qual, diferentemente da ideia de fragmentação, deve traduzir a reconstituição plena do todo esteticamente integrado que compõe a pesquisa concluída.

A relativa certeza referida no parágrafo anterior consiste em reconhecer que, em determinado ponto do percurso, a investigação foi adquirindo um novo corpo, identificado pelo desejo de imergir em uma nova perspectiva de investigação dos resultados obtidos pelas duas escolas. No curso das discussões e, principalmente, da análise dos resultados parciais da pesquisa, item que exigia e provocava uma imersão no “cotidiano virtual” particular de cada escola, foi tomando corpo a necessidade de apresentar uma visão mais humanizada e menos estatística e linear da eficácia escolar.

Atribui-se essa provocação a uma concepção de função social que naturalmente está sendo demandada da escola atual e que foi apreendida da realidade vivida nas escolas Maria e Ana. O texto de Seeger (2001) apoia essa proposição, quando valida a existência de algum tipo de discurso elaborado a partir dos fundamentos que derivam da apropriação de uma

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sabedoria relacionada a experiências concretas. Assim, concorda-se que essas experiências, somadas aos conhecimentos adquiridos por meio da literatura e dos subsídios derivados dos dados da pesquisa, por exemplo, dão pistas norteadoras para que um pesquisador construa novas reflexões e redirecione o curso da pesquisa, sem perder de vista seu eixo central. Seeger considera esse exercício de reflexividade uma ferramenta igualmente legítima para a construção de conhecimento sobre qualquer atividade.

Apoiada nesse pensamento constatou-se que emerge da realidade educacional uma nova vertente, a qual demanda dos agentes da educação uma postura diferente diante das desigualdades sociais, do estilo de vida imposto pela própria contemporaneidade, entre outros aspectos. Desse modo, não há como discutir eficácia escolar restringindo o foco de visão à dimensão dos resultados de desempenho. Torna-se imperativo transcender o escopo formal e avançar a crítica no sentido de alcançar a dimensão humana da escola e, nesse exercício da reflexividade, abranger as percepções e a emoção que possa emergir do ser pesquisador, que, não por acaso, também se constitui em sua dimensão humana. Sobretudo porque se entendeu, com esse estudo, que cabe mais um encargo à escola, o qual foi observado com mais ênfase na Escola Ana e que pode ser traduzido pelo pensamento de Boff (2001): tornar, dentro das possibilidades, a humanidade menos desumana. Compreendeu-se, por conseguinte, que um ponto de partida, redirecionando a responsabilidade para a academia, consiste em irrigar também a prática da pesquisa com um olhar mais humano. Portanto, se a função da escola passa por um processo de ressignificação, mediante uma nova concepção de mundo que vem sendo incutida na humanidade, toma-se, por princípio, a ideia de que, para se avançar na identificação das características de escola eficaz, se deva transcender o eixo conceitual tradicional já desgastado que traz a literatura.

A emergência dessa discussão levou a pesquisadora a concluir, depois de ler reiteradamente relatos, dados e respostas abertas dos questionários, que não foi possível reconhecer “fatores excepcionais” que, por si só, identificassem as duas escolas como escolas eficazes. Melhor dito, admite-se que, ao partir para o campo da investigação em busca de elementos que caracterizassem as escolas, foram encontrados não fatores

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isolados, mas uma lista de fatores, uma rede de significações que afastou qualquer possibilidade de entendimento linear para se conseguir remeter à necessidade de identificar o modo como esses fatores se relacionavam em cada ambiente e se articulavam entre si, constituindo uma teia de relações.

Essa nova percepção, nova por não ser esperada e ter surgido como emergência no decurso da pesquisa, foi provocada por uma inquietação em face de uma constatação. Ora, se os fatores levantados não se apresentavam tão diferentes de aspectos que são comuns a praticamente qualquer ambiente escolar, quais razões os levaram a provocar efeito nessas duas escolas? O que havia de diferente em relação a tantas outras que gozam das mesmas condições, das mesmas características e que são vinculadas ao mesmo sistema de ensino? Por que em tantas outras escolas esses fatores, embora possa ser facilmente identificados, parecem permanecer inativos?

Na tentativa de responder às indagações emergentes, mais uma vez recorreu-se à literatura, encontrando em Furlan (2004) e Boff (2002) ponderações coerentes e convergentes para as questões. Furlan fala da noção de rede de significações, por meio das quais os sentidos que compõem o mundo não decorrem da mera soma de fatores, mas da interconexão no interior de um sistema em que cada sentido se define na sua relação com os outros elementos com os quais interage. Quando um elemento dessa rede age ou se comporta de determinada maneira, é toda a rede que se atualiza ou se modifica, embora explicitamente cada individualidade esteja presente, sem perder sua essência. No caso das Escolas Maria e Ana, esse elemento da rede parece configurar-se em torno da gestão escolar e de seu estilo de ação. Por sua vez, Boff enriquece a contribuição, ao dizer que uma célula não existe sozinha, mas que faz “parte de um tecido, que é parte de um órgão, que é parte de um organismo, que é parte de um nicho ecológico, que é parte de um ecossistema, que é parte do planeta Terra, que é parte do sistema solar, que é parte da galáxia, que é parte do cosmos, que é uma das expressões do Mistério ou de Deus. Tudo tem a ver com tudo [...], respeitando essa totalidade orgânica, feita de relações em rede e de processos de integração” (BOFF, 2002, p. 50-51). A concepção de Boff complementa a de Furlan, para dizer que se aproxima da visão que embasa a atuação dos gestores de ambas as escolas, na medida em que

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eles parecem se distanciar da tradicional postura de soberania subjacente à função de “chefia”, para se aproximarem de uma postura de parceria com seus liderados. Essa parceria se conforma ao reconhecimento da gestão como elemento da rede, embora exercendo função que, por sua natureza, estaria em nível superior de hierarquia.

Inspirada na visão dos autores supracitados, foi possível compreender que a diferença entre a Escola Maria, a Escola Ana e as demais escolas está na forma como elas se articulam em seu cotidiano, aspecto que à primeira vista parece tão comum e até corriqueiro. Como resultado dessa imersão, formulou-se a tese de que:

a) o efeito dos fatores identificados não se encerra em cada um individualmente, mas na relação entre eles e no modo como são articulados e colocados em processo de sinergia no ambiente escolar;

b) constatou-se no estilo de liderança da gestão escolar a possibilidade de interligar esses fatores e de levá-los a compor uma rede de significações, uma vez que está na liderança o papel de catalisadora das partes, para que se constituam em sua totalidade;

c) a gestão escolar conseguiu estimular a equipe de professores e os estudantes a se envolverem e a se engajarem nessa rede de significações e, por intermédio da participação, do clima escolar propício, da alta expectativa em relação às possibilidades de sucesso e de todas as demais subcategorias encontradas, levar todos esses agentes a comporem um tecido, a partir da trama articulada de relações intra e extraescolares; além disso, destaca-se

d) a identidade com a profissão docente como o fator que conseguiu transcender a dimensão vocacional e o responsável por imprimir o movimento em teia, o qual, por sua vez, provocou o encadeamento de todos os componentes identificados pela pesquisadora, como que fazendo parte dessa trama tecida no interior da escola.

Constatou-se, ainda, a partir da experiência bem-sucedida, com mais proeminência, na Escola Ana, que esses elementos se constituem em torno da evolução da escola para um processo de maturidade organizacional ou profissional.

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Em face da argumentação exposta, construiu-se, como síntese dos resultados da pesquisa realizada, a Figura 3, à qual se atribuiu o título de “Trama da eficácia escolar”.

Figura 3 – Trama da eficácia escolarFonte: Elaboração da autora.

Conforme se observa, a figura é composta pelas grandes categorias e pelas subcategorias, todas consideradas como os fatores de eficácia encontrados nas duas escolas pesquisadas e que as moveu para o desempenho obtido com seu corpo discente. Entretanto, esses fatores, tão comuns à rotina de qualquer ou da maioria das escolas, se tornam incomuns e, por vezes, inusitados no movimento de conexão e de articulação que se desdobra a partir da existência do que a pesquisadora atribuiu como fator essencial: a identificação com a profissão de professor, razão pela qual tal fator está posicionado no centro da figura.

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Assim, ao se deparar com a lista de fatores “descobertos” se reconhece que o ineditismo da ação realizada pelas duas escolas não se concentra nos fatores, mas, sim, no modo como se articulam e se potencializam produzindo resultados. Aplica-se o grifo em “descobertos” para chamar a atenção para o conceito em sua acepção literal, em se tratando do domínio científico e acadêmico. Nesse caso, a adoção do termo é a mais coerente com o contexto das duas escolas e da pesquisa realizada, na medida em que se distingue do conceito de criação ou de invenção, aproximando-se ainda mais de uma realidade viável de ocorrer. Conceituando conforme Machado (2012, p. 272), descobre-se “o que já existia e não era percebido”, inventa-se o que se cria, “o que nasce da ação realizada”. Para Machado, entretanto, não existe uma distinção clara entre os termos criar e descobrir, exceto que “descobrir é criar possibilidades; criar é descobrir virtualidades”. Fica claro, portanto, o fenômeno que resultou do estudo na Escola Maria e na Escola Ana: houve uma “descoberta”, se considerado que os fatores estavam lá, assim como estão em todo o cotidiano escolar, para serem encontrados e “des-cobertos”, ou seja, para que fosse retirado o que os cobria. E, aproximando-se ainda mais do pensamento de Machado, sobre essa descoberta foram criadas novas possibilidades, uma delas, certamente, foi desvelada nas estratégias adotadas pelas escolas para obterem o desempenho revelado. Conclui-se, portanto, que o incomum está nesse modo de articulação do que é comum; foram a interconexão e a habilidade de articulação dos fatores que os tornaram peculiares, únicos em cada realidade escolar.

Situando o foco no segmento docente, desta vez mais voltado para um processo de criação e não de descoberta, observou-se que se reconhecer professor, olhar para si e gostar do que se tornou, faz parte de um processo humano complexo, tecido no lugar em que esse indivíduo-professor se dispõe em relação à diversidade de contextos e reage diante das múltiplas e conflitantes circunstâncias a que está exposto cotidianamente. Nesse contexto, concorrem, igualmente, múltiplos e contraditórios olhares e vozes, os quais emergem dos discursos apreendidos de também múltiplas fontes. Considera-se a “identificação com a profissão de professor ou

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profissão docente” uma chave que abre a porta para a conexão plena dos vários outros fatores que contribuem para o sucesso dos estudantes. O conceito de “chave”, também aplicado em seu sentido literal, remete a alguma coisa que abre, que disponibiliza, que torna acessível a intervenção interna e externa. A identificação com a profissão certamente contribuiu para que os professores se deixassem irrigar pela ação dos fatores aos quais se permitiram e foram expostos, facilitando a condução da liderança, tornando-a mais uma ação de parceria e menos de autoridade, na perspectiva de domínio. Mais uma vez se deve admitir que um fator isolado não se potencializaria de forma tão produtiva. Por essa razão, situa-se esse fenômeno da identificação no mesmo domínio de atributos como abertura pessoal, flexibilidade de concepções, capacidade de integrar razão e emoção na atividade de ensino, disponibilidade plena em acolher as diferenças e possibilitar novas formas de reescrever o mundo. Identificar-se possibilita resgatar a dimensão do sentimento, já que exige realizar um processo de interiorização, de voltar-se para si. Ao identificar a si próprio, desatando-se das várias “identidades” que lhes são deliberadamente atribuídas, o professor ressignifica seu olhar na direção do estudante e passa também a distingui-lo em suas fragilidades e potencialidades. Nesse momento, passa a tornar “seu” o que foi colocado à distância pela realidade fria e desumana dos sistemas de ensino.

Arroyo (2000, p. 117-118) reforça essa ideia, quando sugere que não se deve esquecer de que a docência é uma atividade essencial à sobrevivência humana. O autor tranquiliza ao esclarecer que falar da dimensão humana, de amor, de esperança, de paixão, não subestima a atividade de ensinar e de aprender, nem se está repudiando “as dimensões a formar, os saberes a aprender, a cultura e os significados a internalizar, os hábitos a incorporar”. O que se propõe é tão somente equacionar “a pluralidade dessas dimensões como conteúdos de nossa humana docência”. A natureza da visão renovada de escola que se está propondo passa por esta certeza: humanizar-se como escola não significa perda de autoridade constituída para o ensino e, sim, ganho em potencialidade acolhedora da necessidade de também aprender.

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Considera-se que não exigirá muito esforço imaginar um ambiente escolar irrigando-se e sendo irrigado pela existência desses fatores, em movimento de sinergia. Pensar a escola nessa perspectiva é não reconhecer uma mera listagem ou justaposição de fatores e, sim, admitir e considerar que o estudante possui sua dimensão humana, é um sujeito complexo, logo é múltiplo e plural em sua diversidade. Isso exige que as mais distintas e excêntricas possibilidades de acesso a práticas eficazes lhe sejam oferecidas. Essa provavelmente será uma escola humanizada e humanizadora e, por consequência, uma escola, de fato, para a vida.

Fechando o parêntese do ponto de chegada

Para compreender o modo como se constituíram os elementos aqui expostos, foi preciso retroagir no tempo e no espaço, a fim de alcançar, na dimensão pessoal da pesquisadora, as razões que a trouxeram até aqui. Abre-se um quinto parêntese em meio a uma estrutura formal, para imergir na circunstância fundamental que permeou seu processo de construção. Esse contexto fala de uma viagem recente, durante a qual a pesquisadora teve a oportunidade de vivenciar um ritual de origem dos descendentes dos povos maias. Relatando o episódio em síntese, os maias comemoram o “Fuego de la vida”, ritual que revela a morte como um fenômeno que existe para nutrir a vida e, como tal, quando ocorre, simboliza a chama que aquece, reacende e ilumina a vida dos que ficaram. Diante da fogueira, elemento utilizado no ritual, me foi permitido compreender que aquele fogo reaquecera dentro de mim a “força da vida” que me nutriu para a superação deste desafio e que se esvaíra desde a partida das professoras Mariana e Beatrice.

A convergência desse episódio para a centralidade de uma pesquisa acadêmica se deveu ao fato de ter-me deparado com a “morte” de duas pessoas tão importantes em minha vida, ao mesmo tempo que o ritual despertou-me para a visão de que tal adversidade poderia reacender sentimentos de amor, resiliência e de esperança, nutrindo-me para seguir

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em frente. Ao escolher, não por acaso, nomear as escolas pesquisadas de Maria e Ana também pretendi expressar o real e, agora, o ressignificado sentido de sua função social: nutrir esses estudantes para a vida ou, em outras palavras, atribuir sentido às suas construções, mesmo diante das adversidades do sistema; oferecer um espaço onde os estudantes adquiram a liberdade de pensar e agir produtivamente; propiciar-lhes um ambiente em que, de fato, possam instrumentar-se por meio do processo de aprendizagem formal que a escola deveria oferecer.

Visando a esse ambiente ideal, decorreu a necessidade de se investir em uma visão humanizadora para a pesquisa da eficácia escolar e, dessa visão, derivou a trama da eficácia. Como ponto de partida, foi lançada, não por coincidência, a metáfora de Sternberg e Grigorenko (2003), autores que instigavam a refletir sobre o que, de fato, a escola precisa “ensinar” e onde buscar o cerne de uma práxis que deveria dar respostas efetivas à diversidade dos estudantes. Agora, acredito que já se tornou praticável sinalizar para mais possibilidades de responder a essa inquietação tão recorrente no contexto educacional e desvelar, mesmo que timidamente, as ferramentas que possam proteger os estudantes do “urso feroz” presente nessa “floresta” que se chama sociedade e que prima, antes de tudo, pela meritocracia. Algo naquelas escolas levou à descoberta de que a escola deve transcender sua função social e oferecer esperança. Divergindo da literatura, somente um conceito de eficácia aplicado numa visão humanizadora, isenta do cunho estatístico, poderia permitir uma releitura dos resultados que as Escolas Maria e Ana vêm obtendo, tomando o caminho de volta do lugar em que a escola vem sendo concebida. Essa visão foi percebida no brilho do olhar do professor, ao falar de sua paixão pela profissão e do papel que exerce com seus estudantes.

Longe de afirmar que essas escolas são as melhores do Distrito Federal, chamo a atenção para a magia que ambas refletem, tal foi o modo como permitiram irradiar o respeito à dimensão humana e social de seus estudantes, aspecto que só pôde ser observado depois de uma imersão em seu cotidiano, mesmo respeitados os limites da pesquisa. Considero, igualmente, que a magia mencionada só pôde ser observada pelo olhar de

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uma pesquisadora que, por sua vez, se viu reforçada em consequência do contexto de vida com o qual se envolveu nessa trajetória. Por essa razão, faz-se necessário, no apagar das luzes, resgatar os cinco personagens que a constituíram em sua essência e que permitiram que ela se desdobrasse em todas as etapas descritas, de tal modo que, apesar das adversidades que tive de superar, consegui atingir o ponto de chegada. Esses personagens chamam-se Beatrice, Mariana, Tonico e os dois meninos tão diferentes um do outro, os quais foram aqui, batizados simplesmente de Meninos da Floresta.

Tonico, personagem mencionado no texto de abertura, contribuiu sobremaneira como o estudante que me levou, pela primeira vez, a questionar os efeitos devastadores provocados pelas escolas que não respondem à necessidade de todos os estudantes. Hoje, ao me perguntar O que seria uma boa escola para o Tonico? O que seria uma boa escola para os Meninos da Floresta?, a bússola certamente apontará a agulha não para a Escola Maria, tampouco para a Escola Ana, mas para um ambiente escolar que reúna os atributos de uma e de outra, compondo uma nova visão de escola, uma visão ressignificada pelo amor e pela esperança, não por acaso descobertos nessas duas escolas, e que, certamente, em futuras pesquisas, poderão ser encontrados em tantas outras, suscitando novos olhares, nutridos por novos Tonicos e novos Meninos da Floresta.

Fazendo uma breve incursão pela história, vê-se que um importante personagem já despontou para uma olhar paradoxalmente renovado, uma vez que remonta a 1809 e se atualiza no século 21. Filho de carpinteiro e agricultor, cuja razão do difícil relacionamento com o pai pode ser atribuída à paixão pela escola em detrimento do trabalho no campo, esse personagem apelou aos professores da época para que transcendessem a rigidez na concepção de “ensino”. Esse menino chamava-se Abraham Lincoln30 (1809-1865), que, embora tenha desenvolvido seus estudos pedindo livros emprestados aos vizinhos, elegeu-se presidente dos Estados Unidos. A coerência em finalizar a narrativa de uma pesquisa acadêmica

30 Informações coletadas na Biblioteca do Congresso. Disponível em: <http: //rogerjnorton.com/Lincoln77.html>.

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reportando-se a Lincoln se deve a uma carta,31 supostamente escrita por ele e endereçada ao professor de seu filho, cuja essência preciosa de seu conteúdo, além de justificar a importância de ser resgatada nesse contexto, converge para os resultados encontrados pela pesquisa, tendo em comum um aspecto bastante peculiar: a esperança. Nessa palavra se congregam os desejos e as perspectivas de Tonico, dos Meninos da Floresta, de Mariana e, agora, de Abraham Lincoln, que manifestou esta esperança no texto da seguinte carta:

Caro professor, meu filho terá de aprender que nem todos os homens são justos, nem todos são verdadeiros, mas, por favor, diga-lhe que, para cada vilão há um herói; que para cada egoísta, há também um líder dedicado; ensine-lhe, por favor, que para cada inimigo haverá também um amigo; ensine-lhe que mais vale uma moeda ganha que uma moeda encontrada; ensine-o a perder, mas também a saber gozar da vitória; afaste-o da inveja e dê-lhe a conhecer a alegria profunda do sorriso silencioso; faça-o maravilhar-se com os livros, mas deixe-o também perder-se com os pássaros do céu, as flores do campo, os montes e os vales. Nas brincadeiras com os amigos, explique-lhe que a derrota honrosa vale mais que a vitória vergonhosa; ensine-o a acreditar em si, mesmo se sozinho contra todos.

Ensine-o a ser gentil com os gentis e duro com os duros; ensine-o a nunca entrar no comboio simplesmente porque os outros também entraram. Ensine-o a ouvir a todos, mas, na hora da verdade, a decidir sozinho; ensine-o a rir quando estiver triste e explique-lhe que, por vezes, os homens também choram. Ensine-o a ignorar as multidões que reclamam sangue e a lutar sozinho contra todos, se ele achar que tem razão. Trate-o bem, mas não o mime, pois só o teste do fogo faz

31 Explica-se que essa carta foi declarada como “supostamente” escrita por Abraham Lincoln, em face de controvérsias encontradas em fontes de referência. Enquanto as fontes se referem à carta como sendo de Abraham Lincoln ao professor de seu filho, uma delas, contudo, ao afirmar “desconhecer” sua autoria, refere-se à impossibilidade de ter sido escrita por Abraham Lincoln em tom relativamente irônico e crítico. Por considerar a possibilidade de que os antecedentes político-partidários em sua biografia possam ter influenciado tal julgamento, optou-se por não atribuir relevância às controvérsias e levar em conta a riqueza do conteúdo da carta. Diante da impossibilidade de se afirmar a autoria, põe-se em causa a real possibilidade de representar o apelo de um pai, de uma comunidade ou mesmo da sociedade, direcionado à escola ideal para a formação integral dos estudantes.

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o verdadeiro aço; deixe-o ter a coragem de ser impaciente e a paciência de ser corajoso. Transmita-lhe uma fé sublime no Criador e fé também em si, pois só assim poderá ter fé nos homens. Eu sei que estou a pedir muito, mas veja, caro professor, o que pode fazer. Abraham Lincoln, 1830.32

Curiosamente, a mensagem da carta veio revelar que, em 1830, há quase dois séculos, alguém já pensava em uma escola que poderia ser motivada pela esperança e que, pelos resultados de um estudo realizado, podemos remeter ao perfil de uma escola eficaz. Atribuindo-lhe uma síntese conceitual, a carta caracteriza-se por uma espécie de pedagogia visionária, com base na qual se deverá perpetuar o princípio do “nenhum a menos”, ou seja, nada deve ser deixado para trás: nenhuma possibilidade de melhoria, nenhum estudante sem aprender, nenhum professor sem qualificação para ensinar, nenhum esforço para mudar o que está inoperante. Um princípio que se pauta, por sua vez, pela realidade de que se está lidando com pessoas, portanto, que devem ser trabalhadas em sua integralidade humana.

Lincoln, àquela época, já sinalizava para uma perspectiva da integralidade humana do estudante, quando recomendava aos professores, mesmo não estando expresso de forma explícita, que ensinassem a esperança e, em consequência, seriam agregados valores que contribuiriam para a formação integral de seus estudantes, para muito além da aprendizagem acadêmica. Vislumbra-se, portanto, uma escola irrigada pelo valor à vida e capaz de encantar estudantes e professores, uma escola semelhante às escolas “Marias” e às escolas “Anas” – quem sabe, não se chamassem Escolas MariAna?

A esperança a que nos referimos é a de que a visão superficial que predomina nas escolas contemporâneas seja convertida pelo olhar de Mariana, um olhar cujos desdobramentos poderiam ser potencializados pelos valores pedagógicos e humanos sustentados no ambiente da Escola Maria e da Escola Ana, espaços que nos colocaram diante da certeza

32 Texto de Bento Oliveira (s/d), coletado no site <http: //www.educris.com/v2/oteuespaco/artigo/ 2023-veja-o-que-pode-fazer-caro-professor>.

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de que isso é possível. Assim como essa jovem professora conseguiu desenvolver com seus estudantes uma relação humanizadora e de cuidado antes de tudo com a pessoa, assim também as escolas podem transcender a dimensão acadêmica ao tratar das questões que envolvam a dinâmica “ensino-aprendizagem”, tornando-a, de fato, uma relação sinérgica não só de mútua consequência, como também de mútua competência. Mariana deixou registrado em seu diário de classe, em 2008, uma passagem que retrata um modo de tratar a educação, que deve se pautar pelos valores humanos:

Depois que as pipas foram confeccionadas em nossa sala de aula, fomos ao campinho de várzea bem perto da escola para empiná-las. A temperatura estava muito agradável, naquela tarde de junho. Depois de ter ensinado às crianças todas as técnicas de confecção das pipas, era chegada a hora das minhas primeiras lições de como soltar, empinar e a “dar de bicos” com a pipa. As crianças se divertiram muito com as minhas dificuldades, minha pipa não subia, se enrolava toda na linha e aos poucos fui aprendendo a dominar a técnica de empinar com mais sutileza. Ao final da tarde, minha pipa já subia e até consegui dar alguns “bicos”. Aquele momento se tornara mágico em nossas vidas, pois no colorido do céu pudemos contemplar a alegria da troca que se transformou em uma aprendizagem para a vida.

Em seu registro, Mariana faz alusão a um momento fecundo de aprendizagem compartilhada com as suas crianças, além de suscitar-nos à compreensão de que esse espaço pode, sim, transcender a sala de aula e, sobretudo, mudar a realidade atual. Sua pedagogia, ainda que incipiente, dado o próprio fato de Mariana possuir pouca idade, traz em sua essência essa plena abertura à “humana docência”, citada por Arroyo (2000, p. 118), a partir da qual se deve reconhecer que uma pedagogia humanizadora não está, nem de longe, repudiando “as dimensões a formar, os saberes a aprender, a cultura e os significados a internalizar, os hábitos a incorporar”.

Proponho, por fim, que, somente uma pedagogia pautada pela humana docência seja capaz de ressignificar as práticas vigentes e transmutá-las para

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a concretização da esperança em realidade. Essa realidade certamente passa pela profunda transformação do que está posto atualmente. Urge repensar uma escola diferente, capaz, antes de tudo, de autotransformar-se. Visando, portanto, contribuir com a materialização dessa esperança, ofereço um caminho possível, cujo trajeto foi traçado nesta obra denominada:

A escola e seus processos de humanizaçãoImplicações das práticas da gestão escolar e da docência na superação

do desafio de ensinar a todos e a cada um dos estudantes

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SOBRE A AUTORA

Magali de Fátima Evangelista Machado ([email protected])

Doutora e Mestre em Educação pela Universidade Católica de Brasília. É graduada em Matemática pelo Centro Universitário de Brasília. Atualmente é professora titular da Secretaria de Ensino do Distrito Federal (SEE/DF). Professora Colaboradora Voluntária (Externo) do Programa de Pós-Graduação Stricto Sensu Mestrado e Doutorado da Universidade Católica de Brasília (UCB) Brasília/DF. Tem trabalhos publicados e experiência na área de Educação, com ênfase em gestão educacional, políticas públicas, avaliação institucional e educação inclusiva.