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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES
PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”
PROJETO A VEZ DO MESTRE
GLOBALIZAÇÃO: A ESTRATÉGIA PSICOPEDAGÓGICA DOS CONTOS INFANTIS
Por: Andréa Fabíola Lira Waldemar
Orientador
Profª. Maria Ester
Rio de Janeiro
2003
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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES
PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”
PROJETO A VEZ DO MESTRE
GLOBALIZAÇÃO: A ESTRATÉGIA PSICOPEDAGÓGICA DOS CONTOS INFANTIS
Apresentação de monografia à Universidade
Candido Mendes como condição prévia para
a conclusão do Curso de Pós-Graduação
“Lato Sensu” em Psicopedagogia.
Por:. Andréa Fabíola Lira Waldemar
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AGRADECIMENTOS
Agradeço a Deus por me dar força
a cada dia para conseguir caminhar
em direção aos meus sonhos.
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DEDICATÓRIA
Dedico mais esta etapa de conquistas
aos meus familiares: Jorge, Suzete,
Carmelita, Carla, tios, primas e
padrinhos.
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RESUMO
Estudo dos efeitos lançados pela tecnologia da informação frente à sua imagem
social no mundo contemporâneo. Analisar os instrumentos ideológicos utilizados pelos
veículos de comunicação de massa na produção do conhecimento. Examinar os
posicionamentos do aluno diante do seu potencial crítico atual. Viabilizar o crescimento da
criança e do adolescente na criação de condições para a formação de sua identidade
individual. Obter uma auto-imagem mais satisfatória para evitar problemas físicos e
psíquicos posteriores. Compreender o auxílio da técnica psicopedagógica dos contos de
fada na prática da sala de aula. Pesquisar em literatura infanto-juvenil e bibliografia
especializada.
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METODOLOGIA
Este trabalho tem por objetivo questionar o nível de aceitação incondicional do
discurso que a informação propõe ao permanecer num espaço de poder que ocupa
atualmente. Para isso, utilizou-se de uma extensa pesquisa bibliográfica multidisciplinar,
compreendendo uma investigação e posterior análise dos discursos psicopedagógicos
inseridos no contexto social da sala de aula. A articulação do material coletado com a
prática do pedagogo, permitiu uma observação mais abrangente do objeto de estudo do
presente trabalho: a estratégia psicodiagnóstica dos contos de fadas enquanto literatura
infanto-juvenil. O universo abrangeu as realidades históricas com suas transformações
advindas das novas formas de produção industrial até as constatações da pós-modernidade.
Verificação da realidade das experiências dos professores que lecionam para classes de
crianças e adolescentes, e os outros profissionais que também compõem o grupo de
trabalho em educação, permitindo que sejam pensadas as novas formas de construção do
conhecimento humano.
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SUMÁRIO
INTRODUÇÃO 08
CAPÍTULO I - O COMPLEXO DE ÉDIPO E A FORMAÇÃO DA
AUTO-ESTIMA 09
CAPÍTULO II - A IMPORTÂNCIA DOS CONTOS DE FADAS 14
CAPÍTULO III - O TRABALHO PSICOPEDAGÓGICO COM HISTÓRIAS 21
CAPÍTULO IV - OS MECANISMOS IDEOLÓGICOS DE MASSA 25
CONCLUSÃO 32
BIBLIOGRAFIA CONSULTADA 35
ÍNDICE 37
FOLHA DE AVALIAÇÃO 38
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INTRODUÇÃO
A globalização tornou possível a construção de uma realidade contemporânea
provisória e incerta, que ultrapassa os limites temporais e espaciais, resultando em um
hibridismo cultural. Como a informação tomou grande poder na contemporaneidade, é
necessário que seja feito um exame abrangente dos meios utilizados pela comunicação,
com seus efeitos normativos, e que suscitam na criação de uma ideologia transitória, que
acompanham as solicitações do sujeito pós-moderno, distinto tanto em sua historicidade,
quanto na falta de formação crítica própria.
Essas influências penetram delicadamente o âmbito social, afetando as relações
humanas, gerando grandes transformações na cultura e inferindo ideais na vida particular
de cada pessoa. A contribuição da literatura infanto-juvenil utilizando-se dos contos de
fadas, para estimular a criança e o adolescente a criarem condições psíquicas para que
consigam trabalhar melhor suas dificuldades e problemas decorrentes da construção de uma
identidade pessoal, encontra no conto maravilhoso um auxílio efetivo. Por ser composto de
um conjunto de elementos organizados de maneira que a criança e o adolescente assimilem
os ensinamentos que o texto propicia, possibilitando o remanejamento de seus
comportamentos, o conteúdo do conto de fadas é incorporado naturalmente na mente
infantil com a assimilação da história lida ou contada.
Em razão das constantes transformações que o sujeito está submetido, a análise dos
desajustes gerados por esse mundo contemporâneo diversificado, nos leva a repensar a
produção de novos conhecimentos psicopedagógicos.
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CAPÍTULO I
O COMPLEXO DE ÉDIPO E A FORMAÇÃO DA AUTO-ESTIMA
O trabalho com a contação de histórias baseadas nos contos de fadas auxilia o aluno
a dar significado a sua vida, diminuindo as dúvidas existenciais, fazendo com que
desenvolva seus recursos internos de forma segura e estruture uma personalidade capaz de
enfrentar as dificuldades do mundo contemporâneo. As primeiras experiências com o
convívio familiar e posteriormente social, são extremamente significativas para a criança,
pois determinam como sua auto-estima está ligada à imagem que os pais fazem da criança,
e como eles conseguem trabalhar esse amor sendo devolvido ao seu filho. A auto-imagem
formada por essas mensagens tanto positivas quanto negativas, vão lentamente sendo
introjetadas em sua personalidade que está ainda em formação, e que serão a base para
representar a maneira como o aluno vai manifestar sua habilidade de relacionar-se e sentir-
se aceito no meio social. A partir do conteúdo das mensagens provenientes da herança
familiar e cultural, a criança começa a elaborar essas habilidades para solucionar seus
anseios e dúvidas diante do futuro.
Os contos de fadas têm suas raízes na tradição oral, sendo transmitidas, ao longo de
gerações, diversas mensagens de cunho universal e inconsciente, recontando histórias que
denotam as mesmas problemáticas vividas por qualquer criança, independente de raça,
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nível social, cultural ou da época histórica. Os contos mostram caminhos para que elas
consigam não se fixar nas ansiedades que sentem a respeito da incerteza que o futuro trás.
Através dos relatos aparentemente fantásticos, a criança projeta na figura do
protagonista, o herói da história, todas as suas aspirações, que juntamente com ele, vai
conseguindo dirimir seus questionamentos, desenvolvendo uma maior autoconfiança e
capacidade de se tornar um adulto mais satisfeito.
Segundo a teoria freudiana, o conto de fada é universal, fala das trajetórias vividas
pelo ser humano. A interpretação do conto de fada pode ser feita de modo individual, sendo
proporcional à imagem que a criança forma no inconsciente desde suas primeiras relações
com os objetos de amor e ódio materno e posteriormente, com a intervenção da figura
masculina, configurando-se assim o nascimento do complexo de Édipo. Por complexo de
Édipo, Freud entende que é a situação em que a criança se coloca na posição de filho, e
impedida de concretizar um amor incestuoso com a progenitora, sente-se ameaçada pela
castração da figura paterna, que interdita e ameaça o amor simbiótico entre o bebê e a mãe.
Desta forma, a criança disputa o amor exclusivo de sua mãe diante do rival que passa a ser
seu pai, criando um sentimento de ódio por ele. A criança reage desejando o lugar desse
rival, criando sentimentos bons e hostis, o que leva à repressão dessa pulsão que permanece
no inconsciente como um desejo infantil, instaurando um corte essencial na criança,
impondo a lei primordial, limitadora e determinante da estruturação de sua personalidade.
A forma como os conflitos são instalados na mente humana tem uma relação direta
com os sentimentos de exclusão e ansiedade que a criança sente diante da mãe e do rival, e
de ansiedade diante da resposta obtida pelo investimento de sua libido dirigida aos pais.
Quando a criança é nomeada pelos pais, vai absorvendo os conteúdos simbólicos que eles
vão lhe fornecendo, e aquele novo ser ganha um papel na relação amorosa. A criança então
começa a compreender que é um terceiro ser e não mais a extensão de sua mãe, e vai se
reconhecendo como um ser humano dotado de características diferentes das figuras que o
originaram. O inconsciente então começa a formar seus elementos principais e criando
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registros que são reatualizados no momento em que a pessoa vivencia uma situação que faz
conexão com os modelos que foram internalizados primariamente.
Quando a criança seleciona uma determinada história para ler ou para ouvir e
mostra encantamento e interesse por alguns personagens ou situações, ela está associando
sua história familiar que a marcou e constituiu. Para que sua auto-estima possa ser
trabalhada através dos contos de fadas, a teoria freudiana mostra que não há distinção se o
conteúdo auto-depreciativo, o sentimento de inferioridade e incapacidade da criança, tenha
uma relação concreta com algum fato ocorrido na realidade, que por ventura a tenha
marcado como um trauma ou apenas um fato proveniente da sua imaginação, pois o
conteúdo das fantasias pode ser tanto consciente como inconscientes. Assim, a realidade do
mente diverge da realidade material. Os contos de fadas interagem diretamente com a
imaginação tanto da criança como do adulto e com a maneira que todo ser humano fantasia.
As histórias são construídas com critérios universais, reais ou fictícios, pois utilizam-se de
lugares, objetos e pessoas que podem ser pensados racionalmente, mas que sempre
introduzem conteúdos mágicos, fantásticos, inconscientes que se harmonizam através da
imagem projetada na história, os conteúdos inerentes ao humano, as dualidades entre o real
e a ficção, bom e mau, concreto e abstrato.
O final feliz que aparece praticamente em todos os contos de fadas, atribui um
desfecho satisfatório, pois ameniza a turbulência de sentimentos humanos ambíguos, e essa
busca pela harmonia que fora perdida no complexo de Édipo, pelo entendimento de Freud,
só é possível na imaginação. Portanto, no desenvolvimento da auto-estima da criança, ela
pode amenizar seu sofrimento psíquico encontrando uma saída feliz pela via dos contos de
fadas. Segundo Goldgrub:
“Não havia como compreender a universalidade das fantasias originárias (sedução, castração, cena primária) pelas quais todos os pais se transformavam no protótipo desses ogros e bruxas que povoam a mitologia infantil. Em outras palavras, se o complexo de Édipo vale para todos os Humanos, se seus componentes essenciais são ficções onde os progenitores desempenham o papel de vilões, se na grande maioria dos casos os eventuais excessos educativos - quer de coerção, proteção ou omissão - não justificam o amor, o ódio, o ciúme, a rivalidade e a sedução vivenciados pela criança". (GOLDGRUB, 1989:40, 41)
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Segundo Carl Jung (1983:67), os arquétipos, são os conteúdos arcaicos do próprio
inconsciente, são imagens simbólicas que se remetem a uma origem que se repete em
qualquer época, onde a forma de pensamento do homem já estaria impressa universalmente
num período anterior à compreensão consciente. Ou nas palavras de Jung eram as "formas
primitivas e inatas, representando uma herança do espírito humano".
Na fase escolar, o aluno começa a estruturar seu Ego e a se adaptar ao mundo social.
Os contos de fadas vão auxiliar na administração de suas pulsões do Id, do desejo sem
limites e a encontrar satisfação dentro das exigências do mundo externo governado pelo
Superego. O conto atua como um espelho, e segundo Laplanche e Pontalis, sua simbologia
está relacionada com a auto-estima, onde as histórias ouvidas utilizam-se da linguagem dos
símbolos para refletir a imagem que cada criança tem de sua psiquê inconsciente projetada
na consciência.
Os pais são a primeira fonte de relacionamento que os filhos imitam, repetindo o
modelo de aprendizado. A auto-imagem de suas necessidades, determinam o nível de sua
auto-estima que será vivenciada nos relacionamentos tanto emocionais, sociais quanto
pessoais futuros. O tipo de auto-estima vai determinar como a criança usa sua capacidade
ilimitada de ser humano, pois através dela, ela fará a projeção de suas realizações futuras.
Segundo Humphreys:
"A natureza da auto-estima passa por duas dimensões: o sentimento de ser capaz e o sentimento de ser amado.
O sentimento de ser capaz se refere ás reações que os pais têm diante do desempenho da criança, seja
punindo-os, repreendendo-os, comparando-os, diminuindo-os, elogiando-os, valorizando-os ou emitindo
mensagens positivas que estimulem a criança. No desafio de cada nova tarefa, de acordo com o autor, “o
sucesso e o fracasso por si mesmos não tem efeito sobre a motivação para o aprendizado, mas as reações, por
parte dos pais, professores e outros adultos significativos, ao fracasso e ao sucesso das crianças, têm sobre
elas um efeito devastador”. (HUMPHREYS, 2001:16,28).
A construção da individualidade é diretamente proporcional ao nível de sua auto-
estima. Quando a criança é motivada a aprender e a viver experiências, está mais suscetível
a buscar caminhos próprios de acordo com suas escolhas. Assim, vai assumindo viver um
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tipo de vida que corresponde a seus valores e desejos, e vai crescendo tornando-se um
adulto que visa sua auto-realização.
O valor próprio de uma criança vai sendo absorvido por ela através das mensagens
verbais e não-verbais dos pais, como o amor, a dedicação, o interesse e a preocupação que
têm com seus filhos. A criança que se sente importante para seus pais, vai desenvolver uma
elevada auto-estima desde que haja uma coerência verdadeira entre as mensagens verbais e
não-verbais trazidas pelos pais. A capacidade da criança de olhar o mundo como um espaço
significativo e seguro, depende em grande escala do tipo de relacionamento que tem com
seus primeiros objetos de amor. Uma criança que demonstra comportamentos
problemáticos sinaliza que existe um conflito com sua auto-estima, e que este conflito está
gerando uma insegurança. A interação entre a criança e seus pais, pode ser encorajadora,
onde ela se torna um ser valorizado para eles e assim, sua auto-estima se modifica com uma
estrutura segura.
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CAPÍTULO II
A IMPORTÂNCIA DOS CONTOS DE FADAS
Através dos contos de fadas as crianças criam habilidades para enfrentar as
dificuldades características do processo de maturação, ou de acordo com a teoria de Jung, o
processo de individuação. Quem ouve os contos de fadas se remete a um mundo diferente,
o campo do inconsciente. Na medida em que a história vai se desenrolando os elementos
ocultos vão tomando forma simbólica. Segundo Pavoni (1989:17), "os contos e mitos
descrevem simbolicamente a nossa história interna, o processo de individuação". De
maneira que toda a angústia gerada na estruturação da auto-estima que o adulto carregará
para toda vida, influenciará no campo social, afetivo e psicológico, afetando seu sentimento
de aceitação e respeito diante das pessoas que ele se relaciona, dificultando a organização
coerente da sua personalidade.
A personalidade do aluno quando está sendo formada, tem nos contos de fadas um
auxílio eficaz para ser o espaço imaginário que o possibilita projetar seus conteúdos hostis,
simbolizados pelas histórias na forma de monstros, entes familiares malvados e etc. Quando
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há uma identificação com um ou mais personagens do conto, o aluno vivencia a história na
fantasia, passando por um ciclo que Pavoni (1989:53) menciona como sendo
"medo/luta/vitória, problema/a busca da solução/solução", e vai ordenando suas dúvidas,
anseios e temores, compreendendo que tanto os sentimentos bons como os hostis fazem
parte de toda história, mas que principalmente, todo conflito tem solução. Por isso dá-se
importância ao um final feliz.
Por serem impregnados de símbolos, os contos de fadas tem uma função de ligação
entre o mundo real e o mundo imaginário. As diferentes civilizações que propagaram essa
tradição cultural e mesclavam o mito materialmente representado nos rituais de diferentes
sociedades, como assinala Noemí Paz assinala que a sociedade:
"É formada, em resumo, pela vigência inconsciente, no cerne da alma coletiva de uma estrutura mental
originária; de uma maneira de ver e de sentir o mundo que, ao expressar-se na linguagem, engendra as sagas,
os relatos maravilhosos, os contos de fadas". (PAZ, 1995: 9, 10).
O aluno utiliza as imagens inconscientes contidas nos contos de fadas porque são da
mesma natureza e linguagem da psiquê infantil, onde os símbolos dão significado ao
conjunto de fatos e situações vividos na vida da criança, pois representam um agrupamento
de elementos através dos quais, uma forma onírica pode representar várias coisas ao mesmo
tempo está dentro de uma mesma história contada por diferentes pessoas. O diferencial
habita no ouvinte, na interpretação de cada aluno, pois a lógica é dada segundo a formação
de seu pensamento, como ele se organiza e se relaciona com as coisas e seres no mundo.
Como a criança ainda não tem seu pensamento lógico formado, o simbolismo do
conto de fadas é assimilado com maior facilidade do que na mente do adulto, pois seu
pensamento arcaico ligado à fantasia não está adaptado ao mundo racional. Com isso, as
histórias buscam integrar o indivíduo, passando por uma via mais facilitada na psiquê
infantil. De acordo com Freud e Oppenheim: "o folclore interpreta os símbolos oníricos da
mesma forma que a Psicanálise e deriva um grupo de sonhos de necessidades e desejos que
se tornaram imediatos" (Oppenheim, 1996:220).
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Os contos introduzem seres e objetos mágicos que se tornam indispensáveis para a
resolução dos problemas do herói. Só que esses mesmos seres podem ser vistos com
componentes bons ou ruins, há uma dualidade interna. Com isso, o aluno problematiza as
dificuldades que aparecem ao longo da história e ao mesmo tempo fortalece seu Ego ainda
em desenvolvimento, acreditando que tanto os personagens quanto ele mesmo, são capazes
de suportar as benevolências e agouros do futuro. Ao atingir seu objetivo final, o herói
transforma sua qualidade, mostrando que é um personagem diferente pois conseguiu
administrar o bem e o mal harmoniosamente. Assim como cada criança tem seu percurso
particular para o desenvolvimento de sua personalidade, o herói é um personagem solitário
e segue seu próprio destino. Na luta do herói contra as forças do mal, o Ego vence os
aspectos reprimidos e inconscientes da sua personalidade.
A compreensão do homem primitivo com relação a sua visão de vida e do mundo
passa por uma camada da psiquê arcaica muito mais sensível que o desenvolvimento
racional do homem moderno. No conto de fadas, esse modo de observar, contemplar e
viver primitivo, deixando seus registros por meio dos seres mágicos, do inconsciente,
valorizando assim as experiências mágicas, e que ajudará ao herói da história a solucionar
as respostas para seus problemas. Segundo Jung:
“A origem dos mitos remonta ao primitivo contador de histórias, aos seus sonhos e às emoções que a sua imaginação provocava nos ouvintes. Estes contadores não foram gente muito diferente daquelas a quem gerações posteriores chamavam poetas ou filósofos. Não os preocupava a origem das suas fantasias, só muito mais tarde é que as pessoas passaram a interrogar de onde vinha uma determinada história”. (JUNG, 1983:107)
O processo de iniciação mágica, da transformação do herói em um personagem
diferente é supervalorizado, que tem a função de extirpar o mal, devolvendo à criança o
reflexo de todos os seres humanos. Nos contos de fadas há sempre uma trajetória para que o
protagonista evolua, tendo que ultrapassar diversas barreiras que aparecem diante das
experiências que terá que enfrentar. As provas representam que ser vitorioso é conseguir
superar o medo, com perseverança para adquirir no final do seu percurso uma sabedoria,
independência, maturidade, preparando a criança para a passagem das transformações do
mundo infantil para o mundo adulto.
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O sagrado, que é o componente essencial do maravilhoso, do mundo mítico,
demonstra que a experiência que o protagonista vive é a busca da felicidade pela harmonia
desejada, e colocada subjetivamente no símbolo contido por trás da analogia feita do
conteúdo dos contos de fadas dentro da realidade primitiva e realidade moderna, por isso, o
símbolo ultrapassa os limites temporais. De acordo com Noemí Paz:
"Mito e conto de fadas são homólogos em termos de estrutura e significado, referindo-se ambos no plano
axial - ao rito de iniciação (...) os antigos ritos de iniciação transpuseram seu significado para o conto
maravilhoso, mais tarde chamado de conto de fadas" (PAZ, 1995:53).
O conto de fadas, como utiliza uma linguagem sensível e simbólica que muito se
assemelha a da criança, permite que suas emoções aparentemente confusas, características
da fase de crescimento, sejam explicadas de forma simples através da história, mostrando
como o herói trava as lutas internas e externas diante de determinada situação e sempre
encontra um modo para solucionar o problema e sair vitorioso. Esse fator gera confiança
nas escolhas infantis, mostrando que na vida os obstáculos são inevitáveis, mas que a
criança sempre será capaz de dominar seus medos e crescer à salvo para a maturidade.
Os limites da existência humana em vez de serem evitados pelos contos de fadas,
são justamente valorizados como o exemplo da morte. Geralmente os contos já apresentam
inicialmente o começo de uma história com uma problemática desse tipo, como em
Cinderela em que inicia a história com sua a menina já órfã materna. Assim, a angústia
decorrente de sentimentos que toda criança está sujeita a passar, já está exposto nos contos,
simplificando a problemática existencial de forma benéfica para a criança, dando sugestões
diversas para ela lidar com os problemas e suas perdas naturais ao longo da vida, inclusive
de sua condição de criança para atingir um novo estágio de desenvolvimento. Essa
segurança alcançada será o suporte emocional necessário para que ela crie laços afetivos
significativos.
A literatura dos contos de fadas além de possuir conteúdos inconscientes, revela os
ideais, valores e padrões que uma determinada sociedade possui e, com o estímulo
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fornecido pela leitura, o aluno vai incorporando em sua mente essa tradição. Segundo Nelly
Novaes Coelho:
“No povo (ou no homem primitivo) e na criança, o conhecimento da realidade se dá através do sensível, do
emotivo, da intuição... e não através do racional ou da inteligência intelectiva, como acontece com a mente
adulta e culta. Em ambos predomina o pensamento mágico, com sua lógica própria. Daí que o popular e o
infantil se sintam atraídos pelas mesmas realidades” (COELHO, 2000:41).
Como a criança é um ser ainda em formação, seu pensamento lógico e racional
ainda está sendo construído, e por isso, sua capacidade de compreender a linguagem escrita
é limitada. Como esta é composta de símbolos que representam e dão sentido ao afeto e às
coisas nomeáveis ou não, sua elaboração mental é rudimentar, não há uma relação direta
entre o presente e o futuro, a história lida vincula diretamente com o seu presente, porque o
presente é concreto, é de acordo com sua experiência sensorial com o afeto direcionado às
suas vivências.
O aluno passa por diversas fases. Até os três anos de idade, ele começa a nomear a
realidade à sua volta, é o início do desenvolvimento da linguagem através do afeto
direcionado às coisas do seu mundo, em que o adulto transmite sua influência. O
desenvolvimento psicológico da criança é auxiliado pelas imagens que ele observa no livro
e imagina o desenrolar da história, mesmo ainda possuindo poucos recursos de
compreensão da linguagem escrita, que ainda é abstrata. Essas representações vão
fornecendo os meios para que o aluno faça a associação adequada entre a imagem e a
palavra cifrada, tornando-se um leitor. A partir dos três anos, o aluno entra na fase
egocêntrica, tendo seu interesse voltado para a comunicação verbal e para linguagem,
começando a adaptar-se ao mundo concreto através das imagens do seu ambiente familiar.
Entre os seis e sete anos, o aluno começa a envolver-se com os grupos sociais, inicia a
alfabetização e a racionalização da realidade.
Nesta fase ainda predominam os traços de caráter e comportamentos definidos,
como o bom e mau, forte e fraco, belo e feio. Entre os oito e nove anos de idade, há um
desenvolvimento do pensamento lógico que vai começando a organizar-se em formas
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concretas, e uma tendência aos questionamentos e a dinâmica interrogativa. Aos dez e onze
anos, o aluno passa a aprofundar sua percepção de mundo, fazendo uma leitura do texto
utilizando-se da reflexão, aumentando seu engajamento com os grupos e utilizando uma
linguagem mais elaborada. Entre os doze e treze anos, o aluno já domina completamente o
mecanismo da leitura e da escrita, e seu pensamento crítico se desenvolve com uma
reflexão mais abrangente sobre o texto.
O aluno desenvolve a capacidade de percepção do mundo a sua volta nomeando as
coisas, dentro de uma dinâmica de comunicação entre a linguagem visual, escrita e entre
pessoas, passando pelo crivo do valor afetivo que ele vai atribuir às percepções,
estimulando sua criatividade, organizando seu mundo interno e externo e dando significado
à vida. Coelho aponta:
“Lembra a Psicanálise que a criança é levada a se identificar com o herói bom e belo, não devido à sua
bondade ou beleza, mas por sentir nele a própria personificação de seus problemas infantis: seu inconsciente
desejo de bondade e de beleza e, principalmente, sua necessidade de segurança e proteção. Identificada com
os heróis e as heroínas do mundo do maravilhoso, a criança é levada, inconscientemente, a resolver sua
própria situação – superando o medo que a inibe e ajudando-a a enfrentar os perigos e as ameaças que sente à
sua volta e assim, gradativamente, poder alcançar o equilíbrio adulto” (COELHO, 2000:55).
O herói ao se deslocar para outro ambiente, estranho e desconhecido, vai criar
forças para lutar pelo seu objetivo, incentivando assim as crianças a terem coragem de
deixarem tanto o corpo como a mentalidade infantil, para lutarem contra suas crises
existenciais, porque pelo exemplo do herói, esse “lugar estranho” vale a pena, pois se o
herói conseguiu atingir seu objetivo saindo do meio familiar, e possui uma estrutura interna
para tal ato, valorizando assim seus recursos internos, as potencialidades da criança
aumentam sua auto-estima.
A partir da compreensão de Nelly Novaes Coelho (2000:43), quando o aluno atinge
a maturidade de um pensamento reflexivo, lógico e abstrato, a literatura infanto-juvenil vai
possibilitá-la desenvolver seu intelecto. Para a compreensão da linguagem do maravilhoso e
do mundo mágico, ela precisa amadurecer seu pensamento, pois só desta forma conseguirá
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assimilar os símbolos que estão por trás da literatura, e serem auxiliadas por eles para
ampliar a visão que tem de si mesmos, do mundo, e estruturar sua personalidade. A autora
discorre sobre o conteúdo universal dos contos de fadas apontando como sendo “devido à
verdade geral que expressam e ao meio metafórico com que foram concretizados, podem
ser continuamente atualizados” (COELHO, 2000:44). Em seu conteúdo existem todos os
processos pelos quais o aluno passa desde a infância até a fase madura, seus conhecimentos
de mundo, seus anseios, temores, dúvidas, questionamentos, julgamentos, construindo a sua
auto-imagem e a imagem que o mundo tem dele.
A criança vivencia através da trajetória dos personagens o que mais tarde terá que
viver na vida real, a realidade mundana que é dual. Se sua auto-estima estiver sendo
construída com a compreensão que é inerente à vida humana o sentimento de conquista e
derrota, de acontecimentos bons e outros ruins, de pessoas que elas terão que conviver que
têm aspectos bons e maus; assim o grau de dualidade poderá ser benéfico ou não,
dependendo da assimilação das experiências infantis. Uma auto-estima forte apresenta
características de fraqueza também, assim como a criança perceberá seu grande herói
possuidor de admiradas virtudes e concomitantemente de fraquezas que lhes aproxima do
Ser Humano real. Com isso, ela não sentirá as crises existenciais, dúvidas e medos
característicos da fase de crescimento como aspectos de si mesmo menosprezáveis, e sim,
um dos aspectos de sua personalidade que interage também com suas virtudes.
O conto de fadas oferece um distanciamento das verdades prontas e absolutas, e o
aluno vai dando seu próprio julgamento de valor quanto às ações dos personagens - porque
a esses são permitidos todos os tipos de vivências, que ao projetar para seu mundo real, ela
vai solidificando sua auto-estima para suportar com maturidade as ambivalências da vida,
sem deixar de ter uma visão una de si mesmo. Essa opção de valores só é permitida quando
o aluno atinge uma capacidade de reflexão, sendo necessário para isso, que os personagens
tenham características fixas. Portanto, a criança aprende com os contos de fadas, a ver a
vida como um processo de transformações diárias e que o que estão lendo se assemelham
com sua vida real.
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CAPÍTULO III
O TRABALHO PSICOPEDAGÓGICO COM HISTÓRIAS
Quando o aluno não tem a oportunidade de ouvir histórias, experimentar, mesmo
que mentalmente novas formas de abordar uma temática que ele mesmo está passando, há a
omissão da oportunidade de se desenvolver como um adulto mais integrado e equilibrado.
No mundo globalizado, a televisão ocupa grande parte do tempo que a criança antigamente
experimentava ouvindo histórias de seus avós e amigos. Essas histórias são desvalorizadas
e substituídas por jogos de computador que criam um vício cíclico de ansiedade e
isolamento, permitindo um embotamento da criatividade infantil. Na modernidade,
simbolizada pelo consumo e padronização dos brinquedos, a sensibilidade da criança é
deixada de lado e o que é absorvido geralmente é um conteúdo distorcido, bem distante do
que os contos de fadas se propõem a fazer. Nestes últimos, a enigmática do símbolo é
mantida para que a criança através de sua mente consiga codificá-lo segundo seu
entendimento individual, e assim, traduza sua esfera subjetiva em algo real que vive no seu
dia-a-dia, e assim possa ter uma melhor compreensão do mundo que a rodeia.
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As crianças, quando brincam espontaneamente, expressam os ritos infantis, e por
ainda não possuírem uma mente racional, estão mais ligadas às formas primitivas
originárias. A reprodução dos conteúdos assimilados e revelados ao professor, demonstra
que o aluno está se aproximando de suas reminiscências primitivas inconscientes. Essas
reminiscências que ficam gravadas na memória da criança como fragmentos, podem
reaparecer mais tarde como imagens afetivas, tornando-se talvez adultos com distúrbios
psicológicos. É importante que seja feito uso de diferentes técnicas baseadas nos contos de
fadas, permitindo que o aluno reelabore suas questões de forma consciente. Assim, o aluno
se tornará capaz de decifrar os símbolos que estão por trás dos contos de fadas, e elaborar
sua personalidade de forma mais integrada, ao fazer uma associação dos símbolos do conto
aos conteúdos de sua própria história, que é também universal. Assim, a criança vai se
identificando e revivendo na fantasia as imagens que ficaram marcadas e que agora
tomaram outro sentido.
O conto de fadas é uma forma de arte dentre tantas outras usadas por diversos
profissionais. O homem sempre encontrou na arte a melhor forma de deixar suas marcas,
pois através dela ele pode expressar seu inconsciente. Na simbologia (que está por trás) dos
contos de fadas, o imaginário infantil toma um sentido, pois se conecta com o conteúdo
coletivo, organizando a psiquê inconsciente. Quando a fantasia é estimulada através da arte,
a imaginação e a criatividade são desenvolvidas, pois são fornecidos ao pensamento os
elementos necessários para que as idéias surjam e uma visão diferenciada da maneira de
resolver uma determinada situação que esteja gerando conflito para a criança. Com isso, a
arte tende a aprimorar a mente humana, e o campo de visão do aluno deixa de ser limitado,
partindo dele próprio a autonomia de começar a elaborar suas saídas, ajustando o quanto
antes o mundo real à fantasia vivida no acompanhamento da história ouvida ou lida. Devido
a esse processo de assimilação e ajuste feito pela criança dos seus conteúdos inconscientes,
ela poderá dar sentido a seu mundo infantil, ultrapassando seus conflitos internos de forma
mais harmônica e galgando os passos para o pensamento racional de um adulto melhor
integrado.
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É importante que a interpretação das histórias seja dada pela própria criança, sendo
que o contador de histórias não deve preocupar-se se o sentido que foi atribuído ao conto o
satisfaz racionalmente, porque a tarefa de traduzir o símbolo em signos lingüísticos já é um
enquadramento do sentido sensível e intuitivo da criança; forçando-a a limitar-se em um
formato material da palavra. Existem sentimentos que não são passíveis de tradução, assim
como revelar o que seria verdadeiro sobre a associação do que a criança faz entre
determinado conto ouvido e sua compreensão do mesmo. Pavoni aponta que "a
característica do símbolo é a de permanecer, indefinidamente sugestivo, complexo"
(1989:27).
A intuição é indispensável para que o campo psicológico possa interpretar os
símbolos apresentados através dos contos de fadas expostos à livre associação da criança.
Para Jung (1983: 162): "só se pode verdadeiramente conhecer e explicar quando se
reduzem as intuições a uma apreciação exata dos fatos e das suas conexões lógicas". Nem
sempre as associações suscitam interpretação corretas, por isso é de extrema importância
que o trabalho seja feito em conjunto com outras técnicas como o desenho, sessões de
vídeo, utilização de material reciclado e de sucata, entre outras atividades com base em
histórias dos contos de fadas.
A atemporalidade apresentada através por exemplo do "Era uma vez" ou "Numa
terra distante", transmite uma idéia da trama em que os acontecimentos não acontecem na
realidade presente, concreta, pois o tempo e lugar dos contos de fadas navegam na mesma
freqüência e localização que o inconsciente cria na imaginação de quem está associando a
história. O processo de externalizar os conteúdos hostis corporificando-os na figura de
monstros, bruxas e animais, organizam seus medos e ansiedades que ela vivencia na
turbulenta mente cheia de emoções contraditórias.
O conto convence que suas informações devem ser levadas em consideração pela
mente infantil, pois no momento que ela se identifica com o herói, ele é o responsável por
conduzir a trama até ser triunfado, emitindo um juízo de valor moral positivo ou negativo
24
para a criança ou a harmonia de sentimentos que a criança pretende. Segundo Bruno
Bethelheim:
"O herói do conto de fadas mantém-se por algum tempo isolado, asssim como a criança moderna com freqüência se sente isolada. O herói é ajudado por estar em contato com coisas primitivas - uma árvore, um animal, a natureza - da mesma forma como a criança se sente mais em contato com essas coisas do que a maioria dos adultos. O destino destes heróis convence a criança que, como eles, ela pode se sentir rejeitada e abandonada no mundo, tateando no escuro, mas, como eles, no decorrer de sua vida ela será guiada passo a passo e receberá ajuda quando necessário. Hoje, ainda mais do que no passado, a criança necessita o reasseguramento oferecido pela imagem do homem isolado que, contudo, é capaz de conseguir relações significativas e compensadoras com o mundo a seu redor". (BETHELHEIM, 1998: 20)
25
CAPÍTULO IV
OS MECANISMOS IDEOLÓGICOS DE MASSA
A existência de diferentes técnicas usadas pelos meios de comunicação como a
propaganda, rádio, imprensa e televisão, exercem grande influência na transformação do
comportamento e atitudes dos indivíduos frente às verdades criadas por essas técnicas
persuasivas que são fonte de confusão e que distorcem a idéia de conhecimento. Conforme
assinala Guareschi (1999), o sistema ideológico que mantêm o conteúdo das informações
que são produzidas, encobre interesses particulares. Amaral (1997), mostra que a sociedade
atual se corrompeu diante do sistema capitalista tecnológico, perdendo sua força e crença
em ideais próprios. Assim, os indivíduos se acomodam às técnicas empregadas pelo
capitalismo, no sentido de produzir bens que incentivam o consumismo e, ao mesmo
tempo, são distribuídos universalmente.
Como aponta Marcuse (1962), quando cria a expressão “liberdade de escolha pré-
fabricada”, esse fato mostra que as intenções das diferentes técnicas estão resumidas no
crescimento econômico através da fabricação de bens em grande escala, visando uma
26
sociedade em massa, que assim como as grandes empresas, também não estão se
importando com a qualidade do que é produzido.
A manipulação ideológica da sociedade por meio da organização da vida, ensino e
religião, contribui para formar atitudes, desejos e hábitos que irão reproduzir as atuais
formas de relação de produção existentes, mostrando que essa ideologia possui um caráter
de natureza social, fazendo com que as relações capitalistas de exploração também sejam
consumadas. A linguagem mercantilista dá sentido ao sujeito realizar a atividade de troca,
dando assim um destino aos objetos que são consumidos como fazendo parte de um ato
natural.
Entra em cena o que Guareschi (1999) chama de “fetichismo” dessa articulação, no
momento em que o sujeito não consegue mais fazer a separação entre a essência real do
objeto e a imagem produzida pelo fetiche. A sociedade vive dentro de uma realidade e de
uma razão tecnológica onde os meios de comunicação assumem um papel dominante, com
força própria e liberdade de ação em todos os campos possíveis.
O maior problema é que a ideologia confere significados coerentes às atitudes
reprodutivas do sistema de dominação da massa pelos meios de comunicação. Assim, os
sujeitos não têm a consciência de suas ações, participando ao mesmo tempo como autores e
cúmplices desse circuito ideológico, não tendo a idéia correta de organização social. Logo,
as informações distorcidas são recebidas pelos consumidores como a expressão da
realidade do que está acontecendo como valor de realidade no mundo (Guareschi, 1999).
A mídia com seu império que reúne emissoras de rádio e televisão, casas
publicadoras, indústrias produtoras de filmes, jornais e revistas criou um sistema de
comunicação onde as mensagens correspondem ao conteúdo investido por multinacionais
nos gastos com pesquisas de opinião pública e de mercado. Com isso, a organização
internacional econômica se cerca de todos os aspectos conhecedores dos interesses das
populações, e assim a manobra de seus desejos e atitudes pode ser facilmente controlada.
27
O estímulo à comercialização e exportação dos filmes, financiando a formação de
opinião pública contrária a uma alternativa diferente da organização social. As notícias
saem no produto final com um conteúdo distorcido, cheias de enxertos sugestivos que
chegarão aos consumidores repletos de comprometimentos ideológicos, educacionais,
econômicos, sociais e políticos. Por isso, alguns temas nas propagandas de rádio e televisão
são massivamente repetidos como a violência e o crime, formando assim a opinião de seus
espectadores quanto ao juízo de valor sobre cada assunto que terá uma carga positiva ou
negativa diante dos inimigos criados “ficticiamente” pela própria mídia.
Podemos concordar com Guareschi (1999), quando conclui que a consagração ou
destruição da própria pessoa assim é facilmente colocada, recebida e assimilada pela
sociedade que não questiona as imposições provenientes dos meios de comunicação. O
papel político dos meios de comunicação busca aplacar as tentativas de nascimento de
grupos revolucionários que contestem suas medidas adotas. Para isso, eles recorrem a uma
forte fiscalização dos tipos de filmes, literatura e impressos circulantes dentro da sociedade,
manipulando os dados e distorcendo as informações que são impregnadas de conteúdos
ideológicos, reprimindo assim a possibilidade de autonomia e tornando-o rejeitado pela
opinião pública.
Na colocação de Guareschi (1999), a imprensa tem uma grande parcela de culpa
com relação a colocação da informação para o público de forma positiva ou negativa,
distorcendo as notícias, impedindo que as idéias críticas possam surgir para motivar
mudanças no quadro existente, destituindo o valor de sua importância e influenciando a
opinião pública. Os meios de comunicação de massa incentivam os movimentos políticos
de interesse, fortalecendo a permanência da legitimação imperialista.
Desse modo, o consumo é retro-alimentado cada vez que cria uma dependência dos
programadores de terem clientes para exporem seus produtos que serão alvo dos
consumidores finais – os indivíduos.
28
A existência de uma intenção organizadora do campo sócio-econômico incentiva a
“homogeneização cultural e ideológica do mundo” e, esse mecanismo resulta no fenômeno
do consumismo. A tecnologia moderna utilizada para a venda dos produtos, carrega em si
um conteúdo ideológico que procura seduzir seus clientes e despertar o desejo de obtenção
de determinado bem. Cresce o valor do objeto à medida que a propaganda deposita grandes
capitais na formulação de técnicas persuasivas com o intuito de despertar o desejo nos
consumidores.
O aparato ideológico dos meios de comunicação de massa funciona de maneira a
promover necessidades e desejos nos indivíduos e, enquanto introjetam essas mensagens, se
incumbem de produzir bens culturais que vão atender a essa demanda nova criada,
formando assim um círculo vicioso de compra e venda. O incentivo ao consumo de bens
particulares inverte a possibilidade de se pensar em produção em nível grupal em função de
comportamentos singulares.
O tipo de comunicação globalizada fornecida pelas emissoras de televisão, procura
homogeneizar as diferenças entre culturas de muitos países. Esse material funciona através
de uma base imperialista que controla o consumo de produtos e as programações e, acabam
por fazer que os países se estruturem segundo esse sistema de interesses criado,
descuidando de sua identidade e individualidade cultural para serem totalmente
manipulados pelos meios de comunicação de massa.
A sociedade está sendo medida de acordo com sua capacidade de distribuição das
informações. A tecnologia, hoje, tem mais valia do que os próprios conhecimentos do ser
humano, porque a informação transformou-se em capital que gera desenvolvimento
econômico. Nos tempos modernos, a diferença entre os homens é medida por sua
capacidade de produzir idéias em velocidade cibernética, deixando à margem do poder da
informação.
Sendo a informação o requisito moderno fundamental para que a comunicação
possa ser realizada, seu meio de controle deve ser avaliado segundo a maneira como o
29
sujeito se relaciona com a quantidade de conteúdos trazidos, ao longo da velocidade que as
mudanças estão sendo produzidas.
Cada vez mais que o mundo moderno globaliza e expande seus destinos, mais os
seres humanos tornam-se máquinas que respondem ao seu poder, sem a preocupação de se
conscientizarem de suas atitudes. Essa crise da linguagem, da imagem dos instrumentos
ideológicos e das representações com que atuam na realidade, resulta na forma atual
fragmentada da personalidade do sujeito globalizado (Kumar, 1997). Nesse sentido, tanto a
imagem como a realidade, se fundem numa única coisa, tornando-se inseparáveis a
visualização do que é da ordem do real ou do imaginário. Com isso, a realidade torna-se
uma experiência instável e incerta e a cultura assume o papel de organizadora do campo
social.
A forma como a informação é hoje processada satisfaz as necessidades individuais e
específicas, orientando o indivíduo de acordo com a tecnologia desenvolvida pelos meios
de comunicação. A mídia realiza trocas de dados e a manipulação dos mesmos, assim o
verdadeiro sentido da realidade é perdido em prol da criação de imagens irreais,
imaginárias e simulações constantes.
A era da informação faz com que a subjetividade humana deixe de ser autônoma,
individual e distinta, dissolvendo o significado da razão de ser diferente, para tomar uma
existência padrão. A identidade pessoal se perde na ideologia que penetra em todos os
ramos da sociedade, onde a globalização rege o coro da harmonia indissociável (Kumar,
1997).
O conformismo neste sentido peca por não mais ter o que significar, já que a falta de
crítica reina em um mundo regido pelo poder da comunicação que manipula uma população
passiva. A tecnologia inseriu o consumismo como uma estratégia planejadora da vida social
e cultural do sujeito, pois a oferta de produtos que tentam aplacar a necessidade que a
pessoa tem de sair de casa para buscar no campo social aparatos que o satisfaça, mostra
mais uma vez o forte apelo das propagandas da mídia.
30
O indivíduo que se adapta à sociedade e que se deixa ser atraído pelo consumismo
exacerbado, cede aos apelos dos veículos de comunicação, que para persuadirem o sujeito,
“tomam” os interesses sociais como interesses individuais, mostrando que ao se criticar a
cultura, ele estará se criticando, como se estivesse ligado à consciência por algum tipo de
fusão, tendo a característica de retirar do próprio homem o poder de sua singularidade.
Segundo Amaral (1997), “a ideologia se remete ao domínio psicológico e do
profundo, e atingindo essas dimensões da personalidade, estariam produzindo determinadas
configurações psicológicas”. A tendência à homogeneização, desvaloriza o processo de
singularização, alienando as relações humanas. A ideologia autoritária vai “minando” as
bases da formação racional e objetiva das massas, fazendo uma fusão entre o individual e o
social, tornando a consciência individual apenas um mero produto, e desvalorizando cada
vez mais as culturas.
A personalidade das massas modernas apresenta em seu substrato uma grande
“dose” de narcisismo, que é confrontado pela atitude de conversão à ideologia política,
devido a capacidade dos sujeitos de se diferenciarem subjetivamente do conteúdo
manipulador dos veículos de comunicação. Para que a massa se identifique com a imagem
que é transmitida para ela, é necessário que haja uma percepção do narcísico, simbolizando
o objeto em modelo da imagem da própria pessoa ou da massa.
A produção cultural da atualidade mostra o retorno da ideologia, onde a
manipulação é realizada e a mente das pessoas vai sendo moldada segundo esses princípios.
Para que haja a produção da cultura e ela não caia numa fusão com os mecanismos
ideológicos autoritários, existe a necessidade de sublimação dos mecanismos de
idealização, caso contrário, esses fatores juntamente com o narcisismo podem levar a
civilização à barbárie.
Portanto, a globalização pode ser vista tanto pelo ponto de vista da oportunidade de
troca de informações, ampliando os conhecimentos, como também uma ameaça, na medida
em que se fragmenta quanto mais se amplia e, conseqüentemente, tende a diluir-se. O tipo
31
de produção oferecida pelos meios de comunicação pretende incentivar ao consumismo,
fazendo crescer uma sociedade instável e fazendo com que a vida contemporânea seja
esboçada por processos ideológicos que invadem massivamente o pensamento do homem
da atualidade.
32
CONCLUSÃO
Os contos de fadas permitem que a criança consiga se desenvolver com a
personalidade de um adulto com maturidade psicológica, quando a vida tem um significado
existencial que ultrapasse os obstáculos que são inerentes à vida humana. A auto-estima
trabalhada tanto com os pais em relação à criança, quanto ela e seu meio social, é um fator
que promove a autovalorização da personalidade em desenvolvimento, no período em que o
aluno está caminhando para um processo complexo que é o da individualidade.
Os contos de fadas se conectam diretamente com o inconsciente infantil, e dão
subsídios para que a criança consiga lidar com esses conteúdos desconhecidos de forma
racional, mas que são sentidos e projetados na imaginação por determinado conto que a
desperta interesse e a auxilia com opções de resolução de seus conflitos.
A criança que atinge a maturidade torna-se capaz de estabelecer relacionamentos
pessoais e sociais sadios para sua vida, ajudando-a a crescer como pessoa humana. Esse
sentimento de independência, de ser capaz de compreender e encontrar soluções para seus
problemas é a constatação de um adulto em formação que estrutura sua personalidade de
forma segura, confiante e com uma vida plena de significados por ela atribuída.
O conto propicia através do estímulo da imaginação infantil, que a criança deixe-se
levar pelo conteúdo de seu inconsciente, trabalhando suas questões de maneira
aparentemente fantástica, como ocorre com os personagens na história. O conto ensina que
os sentimentos ambivalentes e contraditórios que a mente infantil em desenvolvimento
apresenta, vão sendo integrados em uma unidade de personalidade mais harmônica,
33
fazendo com que seus sentimentos mais complexos não sejam sentidos com tanta dor e
confusão. O processo de fantasiar incentiva a criança a acreditar nas possibilidades do
futuro, pois se não acreditarem que o futuro será possível e positivo, não conseguirá tornar-
se um adulto maduro, dotado de uma personalidade equilibrada e sentido-se um ser humano
feliz.
As histórias desenvolvem os recursos internos da criança capazes de se tornarem o
suporte para enfrentar a visão complexa do mundo, pois ainda não formaram uma
personalidade segura e coerente. O sentimento de independência e autonomia sobre suas
dificuldades é projetado no herói. O aluno vai aprendendo ao longo do seu
desenvolvimento a agir independentemente, selecionando os caminhos que irá seguir,
tomando suas próprias decisões. Esse herói é vivido intensamente em sua imaginação, onde
o aprendizado que o protagonista assegura é a certeza de um final feliz, e a obtenção de
uma sabedoria sobre o mundo almejada por todo adulto.
A construção de uma moral na formação do indivíduo também pode ser elaborada
com o auxílio dos contos de fadas em que ao longo do desenrolar da história, são
apresentadas as ambigüidades entre bem e mal corporificadas em animais, personagens e
ações, permitindo que o aluno alicerce seus valores morais, codificando-os dentro de sua
personalidade. Como o aluno passa por diferentes crises ao longo do seu desenvolvimento,
a resolução dos seus conflitos pode ser encontrada através da identificação da trajetória que
diferentes personagens passam na história, e assim, cada aspecto particular de
caracterização de um determinado personagem com suas ações e reações diante do contexto
apresentado na história, fornecem um espelho sugestivo da obtenção de visões
diferenciadas sobre cada situação.
Os instrumentos utilizados pelos meios de comunicação têm efeitos ideológicos
servindo como difusores de valores que controlam a capacidade do aluno na
contemporaneidade de formar uma consciência que estruture sua mente infantil. A
tendência atual à padronização tem sido um instrumento utilizado pela sociedade para
34
evitar a diferença individual de cada sujeito, porque sem diferenças, a criança não se sente
marginalizada, mas ao mesmo tempo não encontra espaço para sua expressão singular.
Os instrumentos ideológicos são usados para domesticar as massas, fazendo com
que a sociedade se submeta a um movimento cultural que se coloca como a expressão da
“verdade do sujeito”, na forma das propagandas fornecidas pela mídia, as conseqüências
para as crianças pós-modernas, que são colocadas em uma cultura investida de objetos
descartáveis, promove uma mente em que os limites temporais e espaciais caminham para
uma constante mudança. Assim, os meios de comunicação tomam cada vez mais uma
posição de poder e a produção de informações afetam a possibilidade de um convívio
harmonioso socialmente.
Portanto, a importância dos contos de fadas e sua inserção no mundo atual
globalizado, estão para além dos benefícios educacionais ou morais. Os meios de
comunicação modificam a capacidade crítica e formadora de opinião da criança, e a criança
encontra nos contos de fada a ajuda necessária para criar meios para enfrentar as
dificuldades de um futuro incerto, fazendo a vida valer a pena, e os obstáculos serem vistos
como algo a ser superado ao longo da trajetória de seu crescimento.
35
BIBLIOGRAFIA CONSULTADA
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São Paulo: Estação Liberdade, 1997.
BETHELHEIM, B. A Psicanálise dos contos de fadas. 12 ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra,
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36
KATAFIASZ, K. Terapia da auto-estima. São Paulo: Paulus, 1996.
KUMAR, K. Da sociedade pós-industrial à sociedade pós-moderna: novas teorias
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PAVONI, A. Os contos e os mitos no ensino: uma abordagem junguiana. São Paulo:
EPU, 1989.
PAZ, N. 10 ed. Mitos e Ritos de iniciação nos contos de fadas. São Paulo:
Cultrix/Pensamento, 1995.
37
ÍNDICE
FOLHA DE ROSTO 02
AGRADECIMENTO 03
DEDICATÓRIA 04
RESUMO 05
METODOLOGIA 06
SUMÁRIO 07
INTRODUÇÃO 08
CAPÍTULO I
O COMPLEXO DE ÉDIPO E A FORMAÇÃO DA AUTO-ESTIMA 09
CAPÍTULO II
A IMPORTÂNCIA DOS CONTOS DE FADAS 14
CAPÍTULO III
O TRABALHO PSICODIAGNÓSTICO COM HISTÓRIAS 21
CAPÍTULO IV
OS MECANISMOS IDEOLÓGICOS DE MASSA 25
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FOLHA DE AVALIAÇÃO
Nome da Instituição: UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES
Título da Monografia: GLOBALIZAÇÃO: A ESTRATÉGIA PSICOPEDAGÓGICA DOS
CONTOS INFANTIS
Autor: Andréa Fabíola Lira Waldemar
Data da entrega: 01 de outubro de 2003.
Avaliado por: Conceito:
Avaliado por: Conceito:
Avaliado por: Conceito:
Conceito Final: