1 direito aplicado a educação

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  • AutoresTefilo Bacha FilhoLeila de Almeida de Locco

    2009

    Direito Aplicado Educao

  • 2007 IESDE Brasil S.A. proibida a reproduo, mesmo parcial, por qualquer processo, sem autorizao por escrito dos autores e do detentor dos direitos autorais.

    Todos os direitos reservados.IESDE Brasil S.A.

    Al. Dr. Carlos de Carvalho, 1.482 Batel

    80730-200 Curitiba PR

    www.iesde.com.br

    B118 Filho, Tefilo Bacha. / Direito Aplicado Educao. / Tefilo Bacha Filho; Leila de Almeida de Locco. Curitiba : IESDE

    Brasil S.A. , 2009.100 p.

    ISBN: 978-85-7638-752-7

    1. Direito. 2. Educao. 3. Currculos Avaliao. I. Ttulo.

    CDD 340

  • Sumrio

    Origens do Direito Educacional brasileiro | 9A Carta Constitucional de 1824 | 11Constituio de 1891 1. Constituio Republicana | 13

    As leis educacionais em mbito nacional | 19A Legislao Educacional a servio da conservao ou da transformao? | 19Breve histrico das Leis de Diretrizes e Bases (1960-2000): Lei 4.024/61 e Lei 5.692/71 | 20Da Constituio Federal Lei 9.394/96 | 22Ranos e avanos da Lei 9.394/96 | 23As alteraes na LDB e suas repercusses na Educao Infantil e Ensino Fundamental | 24

    Diferentes mbitos da Legislao Educacional: nacional, estadual e municipal | 27Introduo | 27A Constituio Federal (1988), a Constituio Estadual (1989) e a Lei Orgnica Municipal (1990) | 28Os princpios | 28

    O Estatuto da Criana e do Adolescente (1990) e o Estatuto do Idoso (2003) | 31Educao no Estatuto da Criana e do Adolescente e o Estatuto do Idoso | 31

    A Educao Bsica na nova LDB | 37Concepo, etapas e modalidades | 37Educao Infantil | 38O Ensino Fundamental para nove anos: ao afirmativa, exigncias internacionais ou questo financeira? | 40A Educao Especial na Educao Infantil e no Ensino Fundamental | 43A Educao de Jovens e Adultos no Ensino Fundamental | 44

    Formao e carreira docente na legislao | 51Breve histrico | 51A valorizao dos profissionais do Ensino com o princpio constitucional | 52Os profissionais da Educao e a LDB | 52

  • As exigncias da formao | 52Os cursos regulares e a formao a distncia para os docentes | 53As incumbncias do profissional docente | 53

    A Proposta Pedaggica na Educao Infantil e Ensino Fundamental | 57Breve histrico | 57A elaborao da Proposta Pedaggica como expresso do princpio de gesto democrtica | 58A participao dos professores como direito e dever | 58O processo de elaborao e as orientaes estaduais | 59O acompanhamento e a avaliao da Proposta Pedaggica | 59

    Proposta Pedaggica do Ensino Mdio e da Educao Profissional | 63Introduo | 63Breve histrico | 64A identidade do Ensino Mdio | 64Aspectos Legais e Currculo | 65O Ensino Mdio e a Educao Profissional | 67

    Avaliao na escola e da escola | 71A avaliao formativa a servio da permanncia e da qualidade do ensino | 71Os aspectos legais da avaliao na LDB | 72O carter obrigatrio da recuperao no Ensino Fundamental | 73Avaliao institucional o Saeb/Aneb | 73

    O Regimento Escolar | 77Breve histrico | 77O Regimento Escolar como a Constituio da Escola | 77Aspectos legais do Regimento Escolar | 78As dimenses pedaggica, administrativa e disciplinar do Regimento Escolar | 78As normas internas | 79

    Polticas de Currculo e Legislao | 81As Polticas Nacionais de Currculo | 81Os Referenciais Curriculares Nacionais de Educao Infantil | 82Os Parmetros Curriculares Nacionais para o Ensino Fundamental | 83As adaptaes curriculares para a Educao Especial | 84As Diretrizes Curriculares Nacionais da Educao Infantil, Ensino Fundamental, Educao de Jovens e Adultos | 84

  • Planos de Educao | 89Breve histrico | 89Aspectos legais (CF/CE/LOM/LDB e Lei do Plano) | 90Diagnstico, diretrizes, objetivos e metas: estrutura do Plano | 90A Educao Infantil no PNE | 91O Ensino Fundamental no PNE | 92A Educao de Jovens e Adultos no PNE | 93A Educao Especial no PNE | 94

    Referncias | 97

  • Apresentao

    Esta a proposta de trabalho para os nossos encontros sobre Direi-to Aplicado Educao que pertence rea temtica de Formao Educa-cional e faz parte da Matriz Curricular de nosso curso.

    Fazemos, na condio de responsveis pela produo escrita, um chamamento inicial a todos vocs para que sejam receptivos a essa rea de conhecimento, dada a sua importncia na formao do educador, e assim possam usufruir suas contribuies.

    O material foi estruturado de modo a possibilitar uma caminhada pela realidade brasileira abrangendo as esferas municipal, estadual e fe-deral. Objetiva-se a insero gradativa no contexto das polticas pblicas brasileiras que tm na legislao educacional seu principal suporte.

    Toda a legislao aplicada educao ser um diferencial na sua formao. Portanto, venha conosco descobrir e refletir sobre o conjunto dos aspectos legais que orientam a estrutura e o funcionamento do nosso sistema de ensino e o papel do professor na escola bsica brasileira.

  • Origens do Direito Educacional brasileiro1

    Tefilo Bacha Filho*As origens do Direito Educacional, em nosso Pas, poderiam remontar a 1554, poca da criao do

    primeiro colgio, o Colgio de So Paulo, no povoado de Piratininga (atual cidade de So Paulo), pelos jesutas, tendo frente o Padre Jos de Anchieta, poca com 19 anos, j que, com o incio da primeira escola, surgem os direitos e obrigaes que so, na essncia, as fontes naturais do Direito.

    Mas, na verdade, o pilar bsico do Direito Educacional brasileiro o Alvar de D. Sebastio, datado de 1564, o qual fixava a destinao de uma parte dos direitos reais (redzima) para os empreendimentos missionrios, ou seja, para financiar o ensino que os jesutas desenvolviam no Brasil (MOTTA, 1997, p. 56). Alm desse Alvar, outros instrumentos jurdicos possuam disposies que regulavam o ensino no Brasil, como a Ratio studiorum, a Constituio da Companhia de Jesus e o Regimento das Misses (de 1686) cuja base doutrinal provinha dos jurisconsultos portugueses e franceses, alm das Ordenaes Afonsinas, Manuelinas e Filipinas.

    Cabe, aqui, uma digresso acerca dos Jesutas e da Ratio Studiorum. Os Jesutas (ou Compa-nhia de Jesus Societas Iesu) foram fundados por Incio de Loiola, nobre espanhol, em 1534, como uma ordem nova, diferente das or dens monsticas tradicionais, adaptada aos tempos modernos. Os jesutas pos suam vinculao direta com o papa, rgida disciplina militar e seu principal papel era na propagao da f crist. Atuaram principalmente no campo do ensino dos jovens, insistindo no pre-paro dos mestres e na uniformizao da ao pedag gica. Os princpios de sua ao educativa esto consignados na Ratio atque institutio studiorum, cujas caractersticas principais so: disciplina (vigi-lncia constante, obedincia e conceito de sano uniformizado) didtica (repetio, memo rizao, emulao, premiao, academias estudantis) e contedo (humanista, com nfase nos clssicos gre-gos e latinos, objetivando formar o bom sdito do Rei e o cristo devoto Igreja).

    Formado em Filosofia e Teologia pelo Instituto Marista de Campinas. Especialista em Pastoral Catequtica pelo ISPACC. Foi membro do con-selho Estadual de Educao do Paran e presidente da cmara de Educao Superior. 1 A principal fonte de pes quisa desse texto so os livros Direito Educacional, de Edivaldo Machado Boaventura (1996) e Introduo ao Direi-to Educacional, de Joo Roberto Moreira Alves (1997) ambas publicadas pelo Instituto de Pesquisas Avanadas em Educao (RJ).

    IONETE MARTINSRealce

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  • Havia uma clara diferena entre os objetivos do ensino na metrpole e na colnia. O Alvar de D. Sebastio afirmava que, em Portugal, o subsdio real aos jesutas impunha a obrigao de ensinar a to-dos, dentro do estatuto da instituio, ao passo que, no Brasil, obrigava que o ensino fosse ministrado apenas para formar sacerdotes que atuassem na catequese da nova terra (MOTTA, 1997, p. 104).

    Durante os sculos XVI, XVII e XVIII, a educao brasileira foi entregue, basicamente, aos religio-sos. Privilegiava-se o ensino da mesma f e da mesma lngua, que foram as bases da unidade nacional. Nessa poca so criados, alm do Colgio de So Paulo (1554) os do Rio de Janeiro (1568) de Olinda (1576) de Alcntara (1716) da Colnia do Sacramento (1717) de Fortaleza (1723) de Paranagu (1738) e de Santa Catarina (1750).

    Durante toda a fase da colonizao, as normas emanavam de Portugal. O ensino seguia, basica-mente, as linhas do Real Colgio de Artes de Coimbra, entregue direo dos jesutas, em 1555, pelo rei D. Joo III, cujos cursos eram organizados de acordo com a Ratio Studiorum. Pode-se perceber, facilmen-te, que toda a educao em Portugal e nas colnias se baseava nas rgidas regras da escolstica aristo-tlico-tomista.

    No sculo XVIII tem incio a crise do antigo regime, com o declnio de Portugal e o surgimento da Inglaterra como potncia mundial. Numa tentativa de modernizao do Estado absolutista, sob D. Jos I, o Marqus de Pombal implanta uma nova poltica econmica, voltada para a promoo do trabalho e da indstria, acompanhada de uma filosofia de secularizao dos setores da sociedade. Estabelece o predomnio do Direito Civil sobre o Direito Cannico e o controle do Estado sobre a Igreja. Uma das me-didas mais fortes foi a expulso dos jesutas do Reino, sob a acusao de conspirarem contra a Coroa.

    Por meio do Alvar de 28 de junho de 1759, Pombal implanta uma reforma geral da sociedade portuguesa, com mudanas na rea educacional, especialmente com a proibio, aos jesutas, de diri-gir os estudos e de adoo dos seus mtodos e livros. Nessa poca, os jesutas possuam 25 residncias, 36 misses e 17 colgios e seminrios maiores, sem contar numerosos seminrios menores e as chama-das escolas de ler e escrever (destinadas alfabetizao e catequese dos ndios). Tiveram seus livros e manuscritos destrudos e os bens confiscados, provocando um perodo de retrocesso para a educao e a cultura brasileira. A qualidade do ensino decai espantosamente e a uniformidade conseguida come-a a degradar-se.

    A Coroa encarrega-se, agora, de organizar o ensino. O Alvar de 1771 transfere as aulas de ler e escrever para a Real Mesa Censria e cria novo imposto o subsdio literrio para pagar os novos pro-fessores leigos. O modelo passa a ser o da Universidade de Coimbra.

    O curso de humanidades modificado para o sistema de escolas rgias de disciplinas isoladas. Os professores so mal pagos e mal preparados. Com a centralizao das decises no Reino, ocorre a dis-perso dos colgios. Para remediar a situao de degradao, so chamadas, para substituir os jesutas, outras ordens religiosas como os carmelitas, beneditinos e franciscanos.

    Com a vinda da famlia real portuguesa para o Brasil, em 1808, ocorrem vrias mudanas fun-damentais na economia e na sociedade brasileira. Nesse perodo, foram criadas a Academia Real da Marinha (1808); Academia Real Militar (1810), que so anexadas em 1832, formando os Institutos de Engenharia Militar, Naval e Civil; a Escola Militar (1858), a Escola Politcnica (1874), para formar para a carreira militar e engenheiros civis; os cursos mdicos e os cursos de economia, qumica e agricultura da Bahia e Rio de Janeiro, e os cursos jurdicos de So Paulo e Recife (1827).

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  • 11|Origens do Direito Educacional brasileiro

    Apesar das mudanas, mantm-se o carter elitista e aristocrtico do ensino, com nfase na Educao Superior destinada a formar letrados e eruditos, ou seja, para cumprir uma funo de enobre-cimento atravs do diploma. O ensino clssico e retrico, com desprezo pelas cincias e pela atividade manual. O bacharelismo, o vis pelas carreiras burocrticas e pelas profisses liberais so caractersticas marcantes, simbolizadas pelo anel de doutor e pelo discurso empolado.

    A Carta Constitucional de 1824O Brasil teve, ao longo de sua histria, sete constituies: uma no perodo monrquico e seis no

    perodo republicano. Geralmente, as mudanas constitucionais ocorrem no contexto de importantes modificaes sociais e polticas2.

    Proclamada a Independncia, D. Pedro I, ao inaugurar a Assemblia Constituinte e Legislativa, em 3 de maio de 1823, chamou a ateno para a necessidade de uma legislao especfica sobre a ins-truo. de reparar-se que diversos projetos surgiram, especialmente o Tratado de Educao para a Mocidade Brasileira, voltado para a educao popular, e o de criao de universidades em So Paulo e Olinda, para a formao de bacharis. Em 12 de novembro de 1823, D. Pedro I dissolve a Constituinte e outorga a primeira Constituio do Imprio.

    Primeira Constituio do Pas, outorgada por D. Pedro I. Mantm os princpios do liberalismo moderado.

    Principais medidas Fortalecimento do poder pessoal do imperador com a criao do Poder Moderador acima dos poderes Executivo, Legislativo e Judicirio. As provncias passam a ser gover-nadas por presidentes nomeados pelo imperador. Eleies indiretas e censitrias, com o voto restri-to aos homens livres e proprietrios de terra e condicionado a seu nvel de renda.

    Reformas Ato Adicional de 1834, que cria as Assemblias Legislativas provinciais. Legislao eleitoral de 1881, que elimina os dois turnos das eleies legislativas.

    No campo propriamente do Direito Educacional, a 1. Carta Magna brasileira a Constituio Imperial, outorgada por D. Pedro I, a 25 de maro de 1824 normatiza a Educao, determinando que a instruo primria seria gratuita e que a ela teriam acesso todos os cidados (art. 179: A instruo pri-mria gratuita a todos os cidados e a existncia de colgios e universidades, onde sero ensinados os elementos das cincias, belas-artes e artes).

    Em razo de condies socioeconmicas, a maioria das pessoas no conseguia chegar escola. As instituies de ensino eram, na realidade, um privilgio dos mais abastados (em 1867, apenas um d-cimo da populao em idade de frequentar o ensino primrio obtinha aquele grau de instruo).

    A Carta Constitucional de 1824 considerada a alma mater do Direito Educacional brasileiro porque estabeleceu os primeiros direitos e deveres em relao educao, dando aos cidados o di-reito de frequentarem as escolas. No entanto, nada nela consta no sentido de estabelecer a educao como um dever ou atribuio do Estado.

    2 Os dados sobre as Constituies brasileiras, fornecidos nos quadros, foram retirados da pgina do Professor Vicente Martins, da Universidade Estadual Vale do Acara UVA (Cear). Disponvel em: .

    IONETE MARTINSRealce

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  • A primeira lei nacional sobre a instruo pblica (Lei de 15 de outubro de 1827), que, de fato, foi a nica lei sobre Ensino Primrio at 1946, propunha a cria o de escolas de primeiras letras (reminiscn-cia das escolas de ler e escrever da Colnia) nas cidades, vilas e povoados mais populosos do Imprio, en-quanto a Constituio j falava em Ensino Primrio. Por essa lei d-se nossa liberao das antigas leis e alvars portugueses, na medida em que definiu a organizao e a padronizao da Educao nacional.

    Sobre ela, comenta Oliveira Motta (1997, p. 108):

    Foi, sem dvida alguma, um grande avano, pois as poucas e mal distribudas aulas rgias implantadas por Pombal, somadas s pobres escolinhas de ler, escrever e contar existentes pelo interior e mais os professores que davam aulas particulares, no formavam um sistema de ensino. Tal s se iniciou, efetivamente, no Imprio.

    Levando em conta que o sistema educacional no funcionou altura, o Ato Adicional Constituinte de 1834 promove a descentralizao da Educao e o fracionamento do ensino: a escola elementar e a se-cundria ficariam sob a responsabilidade das Provncias e o Ensino Superior permaneceria sob a juris-dio da Coroa. Ou seja, enquanto a educao da elite caberia Coroa, s Provncias ficava cominada a educao popular.

    O resultado disso foi a quebra de unidade pela existncia de dois sistemas incompletos. Por ou-tro lado, essa descentralizao fez com que, nas principais cidades, surgissem muitos colgios, desta-cando-se o Ginsio Baiano, o Liceu Paraibano, o Colgio Koeke de Petrpolis, os Colgios da Companhia de Jesus em Desterro, Itu e So Leopoldo e o Colgio Anchieta, de Nova Friburgo. Desenvolveu-se, tam-bm, o Colgio Caraa, de Minas Gerais, criado em 1820.

    Em 1837, fundado o Colgio Pedro II, nico autorizado a conferir grau de bacharel, que passa a ser o padro de ensino para as demais escolas secundrias do Pas e dita os rumos das instituies de Ensino Mdio, que se configura cada vez mais propedutico. Permanece sob a jurisdio da Coroa.

    Dessa forma, vieram os sistemas regionais de ensino, sendo uma fonte de Direito Educacional aplicvel dentro de cada jurisdio.

    No que se refere ao Ensino Superior, enquanto as ex-colnias espanholas j possuam duas deze-nas de universidades, as escolas superiores do Imprio eram assim avaliadas por Lauro de Oliveira Lima, em seu excelente livro Estrias da Educao no Brasil: de Pombal a Passarinho (1974):

    As aulas rgias (Pombal) salpicadas pelo imenso territrio como pimenta numa panela de feijoada, nem de longe re-presentavam um sistema, assim como no se podia chamar de educao as mirradas escolinhas de ler, escrever e contar, perdidas nas vilas indolentes mergulhadas em cem anos de solido. As escolas superiores do Imprio eram, apenas, um tipo de dramatizao para dar feitoria ar provisrio de corte, soluo muito parecida com a do adminis-trador contemporneo que sugeriu pintar as favelas de arco-ris [...] nas pocas de carnaval para subtra-las curiosida-de dos turistas bisbilhoteiros.

    Alm disso, at 1889 no havia uma Educao nacional organizada. O Poder Pblico, ao invs de criar escolas, controlava e realizava exames com exclusividade. Qualquer um poderia ensinar, mas a va-lidade do ensino, mesmo dos liceus estaduais, seria verificada por bancas examinadoras nomeadas pelo Governo Central. Uma soluo encontrada para suprir a ausncia de escolas foi, em 1873, criar os cha-mados exames parcelados, prestados nas provncias, que deram origem aos exames de madureza, mais tarde substitudos pelos exames supletivos.

    fato a ser ressaltado que, enquanto na Europa, especialmente pela forte in flun cia do iderio da Revoluo Francesa, o ensino passa a ser cada vez mais laico e oficial (ou seja, visto como problema e responsabilidade do Estado) no Brasil permanece, e se acentua, o carter privado e confessional (liga-do s ordens religiosas).

    12 | Direito Aplicado Educao

  • 13|Origens do Direito Educacional brasileiro

    Um dos setores que mais lutou pela escola pblica leiga e oficial foram os positivistas, que che-garam a criar alguns colgios leigos no Rio de Janeiro e na Bahia, ao lado do mais conhecido de todos, o Colgio Culto Cincia, na cidade de Campinas (SP). Aliando, na sua viso de mundo, a modernidade com a instruo pblica como pilares da unidade nacional, os positivistas obtiveram, em 1879, uma re-lativa vitria com a Lei Lencio de Carvalho, que permitia a liberdade de ensino e de credo religioso, mas que no chegou sequer a vigorar3.

    Constituio de 1891 1. Constituio Republicana Promulgada pelo Congresso Constitucional que elege Deodoro da Fonseca presidente. Tem es-

    prito liberal, inspirado na tradio republicana dos Estados Unidos.

    Principais medidas Estabelece o presidencialismo, confere maior auto nomia aos estados da federao e garante a liberdade partidria.

    Institui eleies diretas para a Cmara, o Senado e a Presidncia da Rep blica, com mandato de quatro anos. O voto universal e no -secreto para homens acima de 21 anos e vetado a mulheres, analfabetos, soldados e religiosos. Determina a separao oficial entre o Estado e a Igreja Catlica e elimina o Poder Moderador.

    Com a proclamao da Repblica, a 15 de novembro de 1889, d-se a promulgao da primeira Constituio Republicana (de 24 de fevereiro de 1891) a qual se omitiu em relao questo educacio-nal, prevendo apenas que:

    Art. 72. [...]

    6. Ser leigo o ensino ministrado nos estabelecimentos pblicos.

    Art. 35. Incumbe, outrossim, ao Congresso, mas no privativamente:

    [...]

    3.) Criar instituies de Ensino Superior e Secundrio nos Estados;

    4.) Prover a instruo secundria no Distrito Federal.

    Em 1891, a Lei 23 ordena a fuso do Ministrio da Instruo Pblica, Correios e Telgrafos com o da Justia e Negcios do Interior, de modo que o ensino voltou a ser dirigido por um departamento des-se ministrio, ainda que com fora poltica maior.

    Floriano Peixoto, em 1892, estabelece novas regras sobre a estrutura e o funcionamento das pou-cas faculdades brasileiras de ento. Durante o governo Campos Salles, d-se a estruturao de um sis-tema escolar brasileiro, centrado no Ensino Secundrio, mediante o Cdigo dos Institutos Officiaes de Ensino Superior e Secundrio (Decreto 3.890, de 1. de janeiro de 1892). Nesse mesmo perodo, d-se a

    3 A viso positi vista responsvel pela criao, logo aps a proclamao da Repblica, em 1889, do Ministrio da Instruo Pblica, Cor-reios e Telgrafos, tentativa inicial em estabelecer uma base nacional comum ligada moder ni dade: Educao e Tecno logia (correios e te-lgrafos). Foi instalado por Benjamin Constant e, apesar de sua vida curta (1889-1891), o Ministrio conseguiu fazer uma reforma profunda nos contedos do ensino oficial.

  • afirmao do ensino seriado, suprimem-se os preparatrios e implanta-se um sistema de fiscalizao para controlar os colgios particulares.

    A partir de 1894, com a posse de Prudente de Moraes, os republicanos idealistas so afastados do poder e a poltica governamental torna-se mais pragmtica e voltada para os interesses da cafeicultu-ra paulista.

    Nesse perodo, ocorrem duas grandes mudanas na legislao educacional: a Reforma Rivadvia (1911) e a Reforma Maximiliano (1915).

    :: Reforma Rivadvia: Constituda por vrios decretos, todos de 5 de abril de 1911: Lei Orgnica do Ensino Superior e do Fundamental da Repblica; Regulamento do Colgio Pedro II; Regulamentos das Faculdades de Medicina e das Faculdades de Direito; Regulamento da Escola Politcnica. Essa reforma reduziu o papel do Estado na educao e im-plantou uma poltica liberal em relao ao ensino privado, fortalecendo-o e beneficiando o ensino confessional. Deu total autonomia aos sistemas estaduais e, praticamente, eliminou a fiscalizao e o controle federal sobre as escolas.

    :: Reforma Maximiliano: o Decreto 11.530, de 18 de maro de 1915. Total reorganizao do Ensino Secundrio e Superior, como reao reforma anterior e buscando a moralizao do ensino. Imps grande rigor nos exames vestibu-lares, reimplantou o ensino seriado, aumentando sua durao. Proibiu o reconhecimento de novas escolas particulares e criou restries para a equiparao de estudos. Mas essa reforma no perdura muito tempo, especialmente devido gripe espanhola (1918-1919) que motivou o acesso s faculdades sem exames e as promoes por decreto.

    A dcada de 1920 foi de profundas mudanas no setor econmico brasileiro, que tiveram forte re-percusso na vida poltica, com vrias manifestaes de insatisfao como o movimento tenentista, a Coluna Prestes, os movimentos messinicos, o cangao nordestino. Aliados crise econmica mundial de 1929, esses fenmenos resultaram nas Revolues de 1930 e 1932, culminando com a implantao da ditadura do Estado Novo, com Vargas, em 1937.

    Texto complementar

    A educao secundria(NEEDELL, 1993)

    Em geral, apenas as famlias de posses e posio tinham acesso Educao Secundria no Se-gundo Reinado (1840-1889) e na Repblica Velha (1889-1930). Com o passar do tempo, um nmero crescente de filhos de negociantes, burocratas do escalo inferior e profissionais liberais consegui-ram acesso aos colgios, mas a maioria dos nascidos fora do crculo das elites eram iletrados ou au-todidatas. Os motivos no chegam a ser surpreendentes. Os tutores e os poucos colgios existentes custavam caro, eram tradicionalmente considerados privilgio dos ricos, e, claro, tirariam jovens do campo, da loja ou de qualquer outro local onde estivessem contribuindo para a sobrevivncia eco-nmica de suas famlias. Em 1872, para adotarmos uma data intermediria, em uma populao es-timada pelo censo em 10 milhes de habitantes, o total de matrculas nas escolas primrias no pas-sava de 150 mil alunos.

    14 | Direito Aplicado Educao

  • 15|Origens do Direito Educacional brasileiro

    Durante a Monarquia e a Repblica Velha, os filhos dos fazendeiros ricos, grandes comerciantes e homens de negcios, dos burocratas do alto escalo e dos profissionais abastados eram educados primeiro em casa, pelos pais ou tutores (em geral, europeus). Quando atingiam a idade adequada, se-guiam para o colgio, que, em geral, encarnava a firmao da liderana cultural da capital do estado ou da provncia. Na primeira metade do sculo XIX, esses colgios costumavam empregar um ou dois europeus, religiosos ou leigos, e talvez franceses expatriados, como o Guinard que lecionou no Rio em 1837, e queixou-se: E eu estou condenado a passar uns trs ou quatro anos neste pas atrasado, no meio desta gente sem brio e sem vergonha!.

    Ainda durante a Monarquia, em especial, determinadas premissas so evidentes, no que diz respei-to ao tipo de educao fornecida. Contemplando apenas uma minoria, a instruo provoca no entanto um impacto urbanizador, obrigando essa minoria convivncia nas capitais provinciais importantes e na Corte. Alm disso, o ensino seguia padres eurocntricos definidos. Os mestres vinham quase sem-pre do Velho Mundo (em geral de origem ou influncia francesa); estudava-se em textos franceses, ou traduzidos desse idioma; presumia-se que o objetivo a alcanar era a aquisio da cultura europia. Le-vando-se em conta a origem de grande parte das escolas, dos professores e dos textos didticos, con-clui-se que a instruo seguia a receita da Frana da Restaurao: humanista, conservadora e catlica.

    Para as moas das famlias tradicionais, a situao permaneceu desanimadora durante a maior parte do sculo. Nas primeiras dcadas, pouca importncia se dava sua instruo. Mais tarde, passaram a receber ensinamentos em casa, ministrados por pais ou preceptores. Poucas frequentavam as aulas para pequenos grupos, organizadas por estrangeiros, ou se matriculavam nos colgios de freiras extremamente seletivos que, aos poucos, se firmaram. Outras seguiam com os pais para a Europa, onde eram educadas em escolas de conventos franceses.

    Partia-se do princpio de garantir aos rapazes a formao intelectual bsica necessria para um burocrata ou um poltico (base qual ele provavelmente adicionaria o bacharelado na faculdade de direito de Recife, ou na de So Paulo). O colgio fornecia tambm a cultura humanstica exigida de um cavalheiro europeu. A expectativa quanto educao das moas diferiam sobremaneira. Mesmo em 1898, a filha de Rui Barbosa, Adlia, foi descrita como [...] um dos ornamentos de nossa sociedade aristocrtica. Raras so as moas que em to tenra idade possam apresentar um cabedal to rico de instruo como ela. Diversas lnguas lhe so familiares, e no piano se revela insigne artista. Ou seja, o ensino das moas compreendia uma lista de refinamentos a atingir, com o intuito de melhorar sua reputao aos olhos de um possvel noivo e respectiva famlia.

    Nesse contexto, o Colgio Pedro II e o Collge de Sion so os mais representativos. Cada qual serviu, em sua poca, de modelo para a educao secundria dos rebentos da elite.

    (...)

    Nessas duas escolas, portanto, torna-se mais do que evidente a natureza e a orientao da educao formal da elite. Em ambas, um restrito nmero de crianas provenientes do mesmo gru-po social era reunido, iniciando um processo de integrao social com seus pares que prosseguiria, do mesmo modo e com as mesmas pessoas e suas famlias, pelo resto de suas vidas, a exemplo do que ocorrera na gerao de seus pais. Em ambas as escolas, tambm, elementos bsicos da socie-dade de classes neocolonial eram reforados obedincia disciplinada, crena na hierarquia social, e prticas e preconceitos culturais que correspondiam aceitao de um mundo dominado pelas potncias do Atlntico Norte.

  • No se deve esquecer de que, no caso, os extremos da estratificao brasileira eram acentu-ados por uma educao na qual as crianas ricas levavam uma vida inteiramente isolada e diferen-ciada dos setores mdios urbanos e das grandes massas de pobres, tanto no campo quanto nas cidades. Isso no ocorreria apenas porque essas crianas recebiam educao formal em determina-da escola (embora isso j bastasse para diferenci-las em termos de experincia scio-intelectual) nem simplesmente por serem segregadas e socializadas segundo linhas hierrquicas. Esses aspec-tos eram amplificados pelos efeitos de um ensino e de uma vivncia por princpios eurocntricos. Elas no eram apenas educadas, e sim europeizadas em maior ou menor grau.

    H algo de inevitavelmente alienante em uma educao que recorre s normas e modelos estranhos ao ambiente local. O impacto parece ainda mais problemtico, quando so levados em conta tambm os preconceitos da viso de mundo europia, intrnsecos a essa educao. Durante o sculo XIX, os europeus (e os franceses, provavelmente , em maior medida) tiveram como pressu-posto inquestionvel a superioridade de sua civilizao, perante a qual as culturas do que hoje se denomina Terceiro Mundo mereciam, necessariamente, apenas desprezo ou desdm. Em 1855, por exemplo, um titular brasileiro no exterior descobriu que um parisiense instrudo era capaz de reve-lar a mais assombrosa ignorncia sobre a Amrica do Sul, a ponto de no saber onde ficava o Rio de Janeiro. Em 1896, um jornalista parisiense no Rio escreveu sobre o carter nacional brasileiro, com sua apatia generalizada, a qual ele comparava, em seus efeitos [...] ao fatalismo dos muulmanos, e ao niilismo dos budistas. Em 1909, a companheira de Anatole France, a anfitri de um salo famo-so, comentou, quando seu amante partiu para uma srie de conferncias pela Amrica do Sul, que ele estava nos antpodas, rodeado de macacos, papagaios e selvagens. Assim, quando aprendiam, de maneira tanto implcita quanto explcita, a avaliar o Brasil segundo os padres europeus da po-ca, as crianas da elite eram eficientemente treinadas para desprezar seu prprio meio cultural e o das massas brasileiras.

    Atividades1. O Brasil teve sete constituies ao longo de sua histria, sendo uma no perodo monrquico e seis

    no perodo republicano.

    A primeira delas, a Carta Magna Brasileira, outorgada por D. Pedro I considerada a alma mater do Direito Educacional brasileiro.

    A partir do trecho responda:

    Qual a lei sobre instruo pblica que definiu a organizao e padronizao da educao nacio-nal? O que ela propunha?

    16 | Direito Aplicado Educao

  • 17|Origens do Direito Educacional brasileiro

    2. Aps a Proclamao da Repblica em 1889, foi promulgada a 1. Constituio Republicana, em 1891.

    a) O que previa essa constituio em relao questo educacional?

    b) A partir de 1894, com a posse de Prudente de Moraes, ocorreram duas grandes mudanas na legislao educacional. Quais foram elas? Anote as principais caractersticas de cada uma.

  • 18 | Direito Aplicado Educao

  • As leis educacionais em mbito nacional

    Leila de Almeida de Locco*

    A Legislao Educacional a servio da conservao ou da transformao?

    Quando os educadores so perguntados se gostam da rea de legislao a resposta invariavel-mente no! E voc, est nesse grupo? Muitos justificam sua rejeio dizendo que difcil de entender, em razo do palavreado tcnico-jurdico, que para especialistas, que est fora da realidade, que no cumprida, que est sempre sendo alterada, que difcil de ter acesso, entre outras.

    Estudante, h necessidade de superar essa postura negativa diante da legislao e buscar seu entendimento, considerando que a legislao um instrumental de luta de trabalho e o seu domnio amplia os espaos do professor, possibilita uma melhor leitura da re-alidade. A legislao no dada, construda, precisa ser entendi-da como uma expresso do contexto scio-poltico. Ns podemos

    participar dessa construo seja no interior da escola (Regimento Escolar), seja em outras esferas (muni-cipal/estadual/federal), seja participando no acompanhamento dos conselhos escolares. tambm pre-ciso entender a letra da lei, a redao dos dispositivos, que podem nos trazer armadilhas, sutilezas que precisam ser observadas com cuidado. Um exemplo disso a expresso no mnimo, que consta na Lei de Diretrizes e Bases da Educao (LDB-Lei 9.394/96), logo aps o ttulo Ensino Fundamental, ou logo aps o percentual de recursos que os municpios destinam Educao (25%, no mnimo).

    possvel participar da construo da

    legislao ou tarefa para especialistas?

    Doutora em Educao e Currculo pela Pontifcia Universidade Catlica de So Paulo (PUC-SP). Mestre em Educao: Superviso e Currculo pela PUC-SP. Graduada em Pedagogia pela Universidade Estadual de Ponta Grossa (UEPG).

  • Na Lei 5.692/71, utilizava-se o termo at. Ora, esse termo permite uma larga possibilidade e pode justificar o no-cumprimento dos percentuais, da a razo de ter sido escolhido no mnimo. Diz-se tam-bm que a forma de escrever a legislao deve manter um nvel equilibrado, nem to abrangente (que no oriente), nem to detalhada (que cerceie). No se usa sinnimo na legislao, ento, palavras dife-rentes querem dizer coisas distintas.

    A legislao ainda deve ter uma redao que ultrapasse os limites temporais, pois seno teria que estar em constante reformulao. Ela passvel de alteraes que podem ocorrer pelo acrscimo, su-presso ou troca.

    certo que o conhecimento da legislao pode implementar mudanas ou empecilhos. Nos ins-trumentaliza para defender nossos alunos, suas famlias, nossa carreira, nossa educao e para elabo-rar propostas.

    Existe uma hierarquia na legislao, a saber: decreto-lei, lei, resoluo, deliberao, parecer, por-taria.1

    A legislao obedece a uma estrutura prpria, exi-ge uma linguagem objetiva e compe-se de ttulos, cap-tulos, sees, artigos, pargrafos, alneas, incisos. A leitura atende a determinadas recomendaes. Alguns dispositi-vos so auto-aplicveis, enquanto outros dependem de re-gulamentao.

    A proposta aqui o entendimento da legislao, sua interpretao, explicao e no a simples memorizao. Que tal mudarmos nossa atitude de rejeio, de afastamen-to, de no enfrentamento e assumir a legislao educacio-nal como nosso instrumental de trabalho?

    Breve histrico das Leis de Diretrizes e Bases (1960-2000): Lei 4.024/61 e Lei 5.692/71

    Como foram apresentadas, as leis educacionais so resultados do contexto socioeconmico da poca, portanto so construdas. Sero mais ou menos conservadoras ou transformadoras, dependen-do da correlao de foras existentes na sociedade brasileira naquele dado momento histrico. At a dcada de 1960 vigoravam as Leis Orgnicas distintas e voltadas para cada uma das ofertas, assim, que tivemos Leis Orgnicas para o Ensino Primrio, para o Ensino Secundrio, para o Ensino Normal, entre outras. No havia ainda, uma lei que estabelecesse as Diretrizes (grandes linhas de orientao) e Bases (as referncias para a estrutura e o funcionamento). Era preciso para garantir unidade, uma LDB que abrangesse todas as ofertas educacionais. O perodo que antecedeu a aprovao da 1. Lei de Diretrizes e Bases 4.024/61, caracterizou-se pelo confronto entre a escola pblica e privada, entre educadores ca-tlicos e laicos. As discusses e tramitao se prolongaram por longos treze anos, considerando que

    1 Observe que na estrutura da LDB aparece no final um ttulo relativo s Disposies Gerais e outro para as Disposies Transitrias.

    preciso cuidado na interpretao da

    legislao! Recomenda-se relacion-la ao contexto

    em que foi escrita e o atual para que no venha

    a beneficiar poucos em detrimento de muitos.

    20 | Direito Aplicado Educao

  • 21|As leis educacionais em mbito nacional

    tiveram incio aps 1946, com a aprovao da Constituio Federal da poca, ou seja, seu percurso, por mais de uma dcada, fez com que essa lei j nascesse velha. Ressalte-se ainda que a LDB 4.024/61 vi-gorou durante mais uma dcada.

    Essa lei trouxe como avanos a flexibilizao dos currculos, a garantia de equivalncia de estudos e, principalmente, a descentralizao. Foi essa lei que instituiu os sistemas estaduais de ensino, crian-do os Conselhos Estaduais de Educao e Secretarias Estaduais de Educao. A exemplo da organizao dos estados, os municpios tambm foram instituindo as suas Secretarias Municipais. Porm, algumas dificuldades foram encontradas. A Educao Pr-Escolar e a Educao Especial eram apenas incentiva-das, e ainda existiam barreiras entre o primrio e o ginsio, o Exame de Admisso, os Testes Seletivos para ingressar no Ensino Profissionalizante e, finalmente, o Vestibular eliminatrio. Havia uma crtica muito contundente essa lei, que reproduzia a organizao da sociedade em classes. O Ensino Primrio, Ensino Mdio e Ensino Superior, eram divididos em classes. O primrio era para a classe pobre, o Ensino Mdio para a classe mdia e o Ensino Superior para a classe alta. Essa situao era ilustrada por uma pi-rmide que tinha em sua base muito alunos que iam sendo eliminados pelas barreiras de modo que bem poucos chegavam at o Ensino Superior. A Ps-Graduao no constava na estrutura. Havia tam-bm uma distino no Ensino Mdio. Existia o curso cientfico e o clssico para quem seria doutor e ou-tros cursos para os que deveriam (por sua origem de classe) permanecer no patamar de tcnicos.

    Tanto no cenrio internacional como no nacional, mudanas mais aceleradas foram ocorrendo. Internamente, passamos por um perodo democrtico com a LDB e com a organizao de movimen-tos populares. Paulo Freire, um dos nossos maiores educadores, construiu um mtodo para alfabetizar os adultos em pouco tempo, visando sua libertao, sua emancipao. Escreveu o livro Pedagogia do Oprimido. Paralelamente os estudantes e trabalhadores organizavam-se, mas o movimento de demo-cratizao foi interrompido com o Golpe Militar, em 31 de maro de 1964.

    A Lei 4.024/61 comea a ser questionada, no serve mais para os objetivos desta sociedade que vive um momento de exceo: a ditadura. Alguns dizem que a lei envelheceu precocemente, outros di-zem que enfraqueceu diante da fase pela qual passava o Pas. Assim, em 1968 foi aprovada a Lei 5.540, apenas para o Ensino Superior. Quebrava-se, portanto, a primeira Lei de Diretrizes Bsica nica. Tem-se agora duas leis para o sistema educacional brasileiro: a lei nova e o que restou da LDB (Ensino Primrio e Mdio). Mas outras e grandes alteraes estavam por vir e uma nova Lei de Diretrizes e Bases, a Lei 5.692/71, foi aprovada, abrangendo o Ensino de 1. e 2. graus. Em cada grau (a nova nomenclatura) uma grande mudana. No 1. grau houve a juno do Ensino Primrio (4 anos) com o primeiro ciclo do Ensino Secundrio, o Ginasial (4 anos). O 1. grau foi ampliado para 8 anos de durao, atendida a faixa etria de 7 a 14 anos. No 2. grau o ensino tornou-se compulsoriamente profissionalizante, no haven-do mais a distino de cursos. Temos agora s um tipo de 2. grau, o profissionalizante.

    Superou-se os quatro anos e ampliaram-se as ofertas. Nessa lei, as escolas tiveram que se reorga-nizar para fazer frente s novas tarefas. Extinguiu-se o Exame de Admisso. Os Testes Seletivos perma-neceram somente para os Colgios com alta demanda e em determinados cursos. O Vestibular agora unificado e baseado no Ncleo Comum do Currculo.

    Os professores e tcnicos foram chamados para um processo de reciclagem. Em alguns estados foram implantados os Centros de Treinamento. As metodologias adotadas, pelo menos em alguns cen-tros, foram a Instruo Programada, Dinmicas de Grupos e o Mtodo de Projetos.

    A Educao Pr-Escolar deveria ser zelada e a Educao dos Excepcionais comea a ser organiza-da. A lei estabelece os requisitos mnimos de qualificao para atuar em cada um dos graus.

  • Institui-se a carreira do professor, articulada a sua qualificao, porm independente do nvel de atuao. A orientao era municipalizar o ensino de 1. grau, a esfera estadual atenderia o ensino de 2. grau e a Unio o Ensino Superior. Aps uma dcada de implantao, os problemas com a profissionali-zao compulsria comearam a surgir: os excedentes no mercado de trabalho, a falta de recursos ma-teriais, de recursos financeiros e de professores qualificados para a parte profissionalizante. Dizia-se poca que no era a escola que deveria ser profissionalizante, mas o ensino. J estava em curso, depois de uma dcada, uma nova alterao na legislao com repercusses no Ensino de 2. grau. Tratava-se da Lei 7.044/82 que acabava com a obrigatoriedade da profissionalizao, possibilitando a retomada dos cursos de educao geral.

    As crticas ao modelo profissionalizante vinham, principalmente, das escolas particulares que no tinham interesse nesse tipo de ensino, pois sua clientela tem aspiraes de continuidade. Para tanto preciso de slida formao geral para fazer frente ao vestibular unificado. Os alunos da escola pbli-ca, embora com outro modelo, o de habilitaes bsicas, continuariam sua formao integrada no 2. grau e a demanda ao Ensino Superior, provinda da escola pblica, continuaria reprimida.

    Da Constituio Federal Lei 9.394/96Viveu-se nos meados da dcada de 1980 uma situao poltica de abertura gradual. Iniciaram-se

    as discusses para a elaborao de uma nova Constituio, e a partir dela a sociedade se organiza para que o processo seja o de Constituinte, com a participao de toda a sociedade. Porm a Constituinte s foi possvel com representantes do poder Legislativo Senadores e Deputados Federais. Os edu-cadores, organizados em Comits, Fruns e Associaes passaram a se reunir e fazer propostas para a rea de Educao. Um evento de destaque foi a Conferncia Brasileira de Educao CBE realizada em Goinia, em setembro de 1986, de onde saiu a Carta de Goinia com Diretrizes e Propostas para o Captulo da Educao na Constituio.

    A Constituio Federal aprovada em 1988 foi considerada a Constituio Cidad, e na rea edu-cacional colocou a educao na condio de direito de todos: das crianas em idade pr-escolar, de 0 a 6 anos, dos portadores de deficincias, dos jovens e adultos. Tornou o Ensino Fundamental um direi-to subjetivo do cidado. Estabeleceu deveres para o Estado, para a famlia e para a sociedade. O Ensino Mdio dever ser progressivamente obrigatrio e gratuito. A Educao de Jovens e Adultos (EJA) dever ser ofertada preferentemente no ensino regular. Essa mesma orientao vale para a Educao Especial que deve atender desde a Educao Infantil (0 a 6 anos).2 Os recursos para a educao foram aumenta-dos e houve a restrio deles para as escolas privadas que foram caracterizadas. Importantes conquis-tas foram os princpios de acesso e permanncia, a gesto democrtica e a valorizao dos profissionais da Educao. O Plano Nacional de Educao (PNE), plurianual e abrangendo todos os nveis, foi um im-portante avano.

    2 Com essa determinao constitucional, fica instituda a incluso dos alunos.

    22 | Direito Aplicado Educao

  • 23|As leis educacionais em mbito nacional

    Sabe-se que apesar de alguns dispositivos serem auto-aplicveis seo da Educao, na Constituio Federal, deveria merecer uma Regulamentao sob a forma de lei. Assim que houve a pro-mulgao da Constituio Federal, tambm se iniciaram os trabalhos no mbito dos Estados com a mes-ma estratgia da Constituinte. Essa elaborao se encerrou um ano aps, em 1989.

    Igual sistemtica foi realizada nos municpios durante o ano de 1990, sendo aprovadas as Leis Orgnicas Municipais.

    Constatou-se uma tendncia reproduo nos textos estaduais e municipais, o que representou uma estratgia para fortalecer os avanos conquistados pela sociedade brasileira.

    Neste mesmo ano foi aprovado o Estatuto da Criana e do Adolescente, mais um estgio de or-ganizao da sociedade brasileira.

    Estava montado o cenrio para o reincio das discusses para a nova LDB. Havia um ponto de consenso: deveria ter novamente uma nica lei para todo o sistema de ensino. A sociedade civil orga-nizada conseguiu com lutas e sacrifcios chegar com um projeto a Cmara dos Deputados Federais. O primeiro foi encampado pela Deputada ngela Amim, o segundo pelo Deputado Jorge Hage. Em razo das mudanas na correlao de foras na sociedade brasileira, pois neste perodo houve alteraes no Congresso Nacional e vrios obstculos para a aprovao dos projetos em tramitao, estes entraves fa-voreceram o Ministrio da Educao (MEC), que conseguiu encaminhar um Projeto com caractersticas mais conservadoras com o nome e o legado do senador Darcy Ribeiro. No confronto dos dois projetos de lei muitas conquistas se perderam e, em 24 de dezembro de 1996, oito anos depois da aprovao da Constituio Federal, tivemos a aprovao da Lei de Diretrizes e Bases da Educao, Lei 9.394.

    Ranos e avanos da Lei 9.394/96Foi o autor Pedro Demo (1996) quem expressou de forma clara a condio da nova LDB, que che-

    gou com ranos e avanos.

    Um dos avanos foi o alargamento da Educao Bsica com a insero da Educao Infantil, como a primeira etapa da Educao Bsica e o Ensino Mdio como a etapa final. A Educao Especial e a Educao de Jovens e Adultos foram fortalecidas e devem ser ofertadas, preferencialmente, na rede regular de ensino. Novas exigncias foram apresentadas quanto qualificao dos professores para a Educao Infantil e os Anos Iniciais do Ensino Fundamental. J os recursos financeiros no ficaram res-tritos apenas s escolas pblicas e podem, com ressalvas, ser aplicados nas instituies privadas.

    Na colocao da Educao como direito de todos, chamou a ateno a nova ordem com relao aos deveres: a famlia aparece em primeiro lugar, enquanto o Estado est em segundo. Muitos acredi-tam que seja um enfraquecimento, uma retirada das obrigaes do Estado, colocando nfase na res-ponsabilidade da famlia e da sociedade.

    O princpio da gesto democrtica foi aprovado apenas para as instituies pblicas.

  • As alteraes na LDB e suas repercusses na Educao Infantil e Ensino Fundamental

    As leis no so eternas, imutveis. Devem acompanhar as mudanas ou ainda podem ser altera-das, visando seu aperfeioamento.

    A nova LDB j passou por algumas alteraes. Uma delas foi com relao ao ensino religioso. A proposta inicial foi a de retirar o nus, os custos do ensino religioso do Estado, mas a mobilizao dos que ainda defendem o ensino religioso no currculo das escolas pblicas teve foras para recoloc-la como parte integrante da Educao Bsica, e assim voltou a ser mantida pelo Estado.

    Existe a dubiedade na redao em relao educao fsica que no continha a palavra obrigat-ria e alguns Estados a retiraram da Matriz Curricular, alegando que era facultativa. facultativa sim, mas para os alunos do curso noturno. Houve o acrscimo da palavra obrigatria para no causar dvidas. Assim mesmo permaneceu a dvida para o ensino noturno, at que, outra legislao foi aprovada, ex-plicitando a obrigatoriedade tambm para os estabelecimentos que ofertam o ensino noturno.

    A Lei 9.394/96 tambm recebeu incluses, a saber: a comunicao das faltas dos alunos para o Conselho Tutelar, a insero do estudo do tema transversal sobre os afro-descendentes.

    Atividades1. Entreviste pelo menos uma pessoa que estudou na Lei 4.024/61 e outra na Lei 5.692/71 e estabe-

    lea as diferenas.

    24 | Direito Aplicado Educao

  • 25|As leis educacionais em mbito nacional

    2. Interprete o artigo 205 da Constituio Federal, individualmente, e depois em dupla, e complete sua interpretao.

    3. Pesquise no site do MEC:

    a) As alteraes ocorridas no Captulo da Educao na Constituio Federal.

  • b) As leis que j alteraram a LDB.

    26 | Direito Aplicado Educao

  • Diferentes mbitos da Legislao Educacional:

    nacional, estadual e municipal

    IntroduoO Estado brasileiro republicano organizado como uma federao, ou seja, um conjunto de es-

    tados, enquanto unidades federativas, que, por sua vez, dividem-se em municpios. Em razo dessa or-ganizao poltico-administrativa, a legislao tambm acompanha essas esferas. Assim que temos uma legislao em nvel nacional, sendo a maior delas, a Constituio Federal de 1988. Na estrutura do Sistema Nacional de Ensino faz-se presente rgos de carter legislativo, consultivo e deliberati-vo o Conselho Nacional de Educao e o MEC com natureza de rgo executivo. Tanto um como ou-tro legislam nesse mbito. Essa organizao se reproduz nos estados com os Conselhos Estaduais de

    Educao e as Secretarias Estaduais de Educao. Na esfera municipal a organizao deveria ser a mesma, mas no h tradio dos municpios se constiturem em sistemas e, em razo disso, no possuem Conselhos Municipais de Educao. No que se refere ao rgo executivo os munic-pios se assemelham aos estados e possuem suas Secretarias Municipais de Educao. E o seu Municpio sistema ou preferiu continuar vincu-lado ao Sistema Estadual?

    No curioso que, mesmo

    tendo direito, os municpios no se

    tornaram sistemas?

  • A Constituio Federal (1988), a Constituio Estadual (1989) e a Lei Orgnica Municipal (1990)

    Considerando cada lei na sua esfera, estas so as leis maiores. H uma hierarquia e uma interde-pendncia entre elas. As alteraes nas esferas superiores implicam em mudanas nas demais esferas.

    Tanto a Constituio Federal como a Estadual e a Lei Org nica Municipal foram elaboradas pelo processo de Constituinte e possibilitam a participao da socieda-de civil organizada. H, porm, uma questo a ser ressalta-da1... o acesso a esses documen tos. De incio ocorreram vrias tiragens da Constituio Federal, mas nunca o su-ficiente para que cada um dos cidados tenham acesso a ela. As instituies pblicas e, no caso, as escolas rece-bem exemplar(es). preciso, no entanto, acompanhar as alteraes que foram ocorrendo ao longo desta dcada e meia, sob pena de nos desatualizarmos.

    Ao longo do curso retomaremos sempre esses documentos legais. Neste momento destacamos os princpios, os deveres e as incumbncias para serem dissentidas.

    Os princpiosNossa constituio apresenta um conjunto de princpios que norteiam toda a educao brasileira.

    Esses mesmos princpios esto presentes nas Constituies Estaduais e nas Leis Orgnicas, no Estatuto da Criana e do Adolescente e na Lei de Diretrizes e Bases. So eles, portanto, que vo garantir a unida-de nas polticas educacionais atravs das orientaes que esto respaldadas numa educao com pers-pectiva democrtica.

    So alguns princpios: o acesso e a permanncia, a gratuidade, a liberdade de aprender, ensinar a pluralidade de idias e concepes pedaggicas, a gesto democrtica e a qualidade do ensino, valori-zao dos profissionais do ensino.

    A legislao em seus diferentes mbitos afirma a igualdade de condies para o acesso e permanncia. Nas dcadas anterio-res havia uma preocupao muito grande com o acesso no sentido de vaga, oportunidade educacional. Gradativamente houve a cons-tatao de que no era suficiente ter a vaga, mas deveria assegu-rar condies iguais para o aluno permanecer na escola. A evaso, o abandono, passou a ser uma constante preocupao e nossos ndi-ces de permanncia se mostravam bastante precrios.

    1 Com relao aos novos municpios, houve uma tendncia de reproduzir a legislao do municpio em me.

    Voc deve estar pensando... Por que a

    Lei Orgnica Municipal? Uma das explicaes o

    fato do municpio, na sua organizao, no ter o

    poder judicirio, a exemplo do Estado e do Municpio.

    A escola pblica realmente gratuita

    ou uma gratuidade entre capas,

    considerando que j pagamos impostos...

    28 | Direito Aplicado Educao

  • 29|Diferentes mbitos da Legislao Educacional: nacional, estadual e municipal

    Constata-se ainda que a reprovao causa o abandono e nem sempre contribui para a melhoria do padro de qualidade, outro princpio a ser garantido. Para garantir o acesso e permanncia fez-se ne-cessrio a gratuidade do ensino nos estabelecimentos oficiais. Esse princpio, que na grande maioria das vezes, tem um entendimento restrito s anuidades precisa ser repensado. Esse princpio, para ser con-cretizado, tem que vir acompanhado de outras aes, tais como os programas de material didtico, uni-forme, transporte escolar, merenda escolar.

    Os princpios da liberdade e da pluralidade de concepes pedaggicas so idias consagradas e j presentes no texto da Lei 4.024/61, so idias a serem defendidas por todos ns educadores que acre-ditamos numa educao democrtica e de igual qualidade para todos.

    Esses princpios de pluralismo e liberdade tm condies de efetivao atravs de outro princpio, o de gesto democrtica do ensino pblico.2

    Bastante significativa a presena da valorizao dos profissionais de ensino como um dos prin-cpios.

    Atividades1. Pesquise a situao do seu municpio. Ele constituiu um Sistema Municipal e, portanto, possui um

    Conselho Municipal de Educao ou no?

    2. Visite a Cmara Municipal do seu Municpio e solicite a Lei Orgnica Municipal. Observe sua orga-nizao, localize e leia pelo menos a parte referente educao.

    2 Esse princpio no abrange as escolas particulares, o que considerado um rano, que foi mantido nas demais leis educacionais.

  • 3. E quanto Constituio Estadual? Voc j teve acesso a ela. Procure na sua escola, na Prefeitura, na Cmara Municipal ou tente acessar via internet.

    4. Escolha um dos princpios constitucionais e analise comparativamente com a Constituio do seu Estado e com a Lei Orgnica do seu Municpio.

    30 | Direito Aplicado Educao

  • O Estatuto da Criana e do Adolescente (1990) e o

    Estatuto do Idoso (2003)

    Educao no Estatuto da Criana e do Adolescente e o Estatuto do Idoso

    O final da dcada de 1980 caracterizou-se pela abertura e alguns avanos da sociedade brasileira.

    A elaborao da nova Constituio Federal pelo processo de Constituinte foi um deles, culmi-nando com a sua promulgao no ano de 1988, assegurando, entre outros, os direitos das crianas e dos adolescentes. Mas, felizmente no parou por a, estava em andamento a elaborao do Estatuto da Criana e do Adolescente (ECA). Havia uma exigncia da sociedade brasileira, inclusive de organismos internacionais para que se estabelecesse esse documento legal para proteger crianas e adolescentes da explorao e dos maus tratos, para assegurar direitos sade, educao, famlia, proteo etc. A lei 8.069 de 13 de julho/1990 promulgou o Estatuto da Criana e do Adolescente1. Esse documento desti-nou educao um captulo, o IV intitulado do Direito Educao, Cultura, ao Esporte e ao Lazer, onde aparecem, confirmando o estabelecido na Constituio Federal, o direito educao, os princpios e os deveres constitucionais (CF, art. 53 ao 59). Alguns acrscimos foram de mxima importncia. Entre eles o direito matrcula prxima a sua residncia (CF, art. 53, V). Para viabilizar essa proposta os rgos edu-cacionais que tiveram que reorganizar o cadastro dos alunos que j estavam na rede, assim como reo-rientar a chamada escolar (CF, art. 54, 3.), para os alunos novos.2

    1 Publicado no Dirio Oficial da Unio em 16/7/1990.2 Chamada escolar o procedimento exigido pela legislao nacional (LDB) que os sistemas estaduais e municipais tm que realizar, convo-cando os alunos novos para ingressarem no Ensino Fundamental, considerando a idade pela legislao.

  • Houve uma racionalizao dos procedimentos e vagas foram organizadas para a distribuio das oportunidades educacionais prximas residncia do aluno. Isso facilita o acesso e a permanncia do aluno na escola, ou seja, assegura o seu direito educao gratuita. No precisar de transporte aumen-ta as possibilidades dos alunos serem atendidos na rede pblica. Outra conquista foi a possibilidade dos alunos contestarem os critrios avaliativos. Historicamente a avaliao tem sido espao, instrumento de poder do professor da escola. At ento, os alunos e pais poderiam solicitar, baseados no Regimento Escolar, somente a reviso de provas. A participao de alunos no Conselho de Classe ainda rara. Os pais e os alunos nem sempre tem conhecimento que o Conselho Escolar a instncia maior no m-bito da escola para contestao. Existem ainda as instancias alm da escola os rgos regionais3, as Secretarias Estaduais de Educao, as Secretarias Municipais de Educao e os Conselhos Estaduais de Educao.

    Um dos aspectos direcionados aos educadores foi o direito do aluno de ser respeitado por seus professores, educadores. Esse novo direito das crianas e adolescentes, enquanto alunos, trouxe mu-danas no relacionamento professor/aluno, educador/aluno. Sabe-se que no cotidiano das escolas nem sempre o aluno , ou foi, respeitado. Em determinadas circunstncias os alunos tm sido expostos constrangimentos com relao a uniformes, materiais didticos, desempenho nas disciplinas, ou ainda tm sofrido discriminaes de vrias ordens (raa, classe, caractersticas biolgicas etc.).

    Essa questo tornou-se o principal ponto de rejeio dos educadores que entendem ter perdido sua autoridade e se tornado refns de alunos e pais. Dizem que so ameaados pelos alunos, que per-deram sua autonomia em sala de aula, alm de ficarem intranquilos!

    A questo disciplinar nas escolas teve que ser revista para adequar-se aos preceitos do ECA. Os Regimentos Escolares foram reformulados e medidas como a expulso de alunos est sendo vedada, a suspenso foi repensada, sendo estabelecidas determinadas condies.

    No ECA est previsto o Conselho Tutelar, rgo municipal que faz o acompanhamento do cumpri-mento dos dispositivos contidos nessa lei. A escola teve que aprender a relacionar-se com esse rgo, que est ligado Promotoria Pblica. o poder judicirio acompanhando o cumprimento do direito dos cidados responsveis pelas crianas e adolescentes. Para respaldar o ECA foram estabelecidos r-gos municipais, estaduais e federais (Lei 8.242/91), rgos defensores dos direitos das crianas e ado-lescentes nas diferentes instncias. No Municpio temos o Conselho Municipal dos Direitos da Criana e do Adolescente (Contiba); no estado, o Conselho Estadual dos Direitos da Criana e do Adolescente (CEDCA) e o Conselho Nacional dos Direitos da Criana e do Adolescente (Conanda). Esses rgos pos-suem um meio prprio para divulgar suas atividades.

    O Estatuto da Criana e do Adolescente j sofreu vrias alteraes.

    A sociedade brasileira, que respondeu afirmativamente s exigncias por uma sociedade mais humana com a aprovao do Estatuto da Criana e do Adolescente em 1990, passou a ser exigida quan-to questo dos Idosos.

    A prioridade, poca, era a populao de crianas e adolescentes, considerando que o Brasil era considerado um pas de populao jovem. Ocorre que a populao envelheceu, a esperana de vida foi aumentando gradativamente e no tnhamos o respaldo de um Estatuto para os Idosos.

    De acordo com Picheth (2004, p.10):

    3 No Paran o rgo regional chamado de Ncleo Regional de Ensino, e em So Paulo, de Delegacias de Ensino.

    32 | Direito Aplicado Educao

  • 33|O Estatuto da Criana e do Adolescente (1990) e o Estatuto do Idoso (2003)

    o assunto foi pela primeira vez debatido em 1976, em Braslia, no I Seminrio Nacional de Estratgias Polticas para o Idoso, no Governo Geisel, promovido pelo Ministrio de Previdncia e Assistncia Social. Entretanto, demorou 18 anos para que surgisse uma lei imprimindo necessidade de ateno ao idoso, a Lei 8.842, de 4 de janeiro de 1994, a qual es-tabelece a Poltica Nacional do Idoso e cria o Conselho do Idoso. A falta de vontade poltica do governo com a ampla divulgao de sua poltica e programas para desenvolv-la, impossibilitou a sua execuo.

    Foi necessria mais de uma dcada para que tivssemos a aprovao do Estatuto do Idoso, sob o 10.741 de 1. de outubro de 2003.

    A exemplo do ECA, o Estatuto do Idoso tambm destina um espao, um captulo para a educao.

    Reafirma o direito de todos educao, especialmente, os idosos. Recomenda que os procedi-mentos e recursos sejam adequados a condio especfica dos idosos. Estudos sobre o envelhecimento devem passar a fazer parte dos currculos, em nosso caso dos currculos de formao.

    Atividades1. Retome os princpios (art. 205) e os deveres (art. 208) da Constituio Federal e estabelea com-

    parao com o contido no ECA.

  • 2. Entreviste um professor do Ensino Fundamental e levante sua opinio a respeito do ECA.

    3. Leia pelo menos o captulo referente Educao no Estatuto do Idoso e colha o depoimento de uma pessoa idosa a respeito da nossa rea, a educacional.

    34 | Direito Aplicado Educao

  • 35|O Estatuto da Criana e do Adolescente (1990) e o Estatuto do Idoso (2003)

    4. Consulte pelo menos um site relacionado ao ECA e outro relacionado ao idoso, e relacione suas contribuies para sua formao.

    5. Procure sites sobre o ECA e o Estatuto do Idoso e realize as seguintes atividades: visite, descreva a estrutura, as contribuies, escolha um texto ou notcia, leia e comente.

  • 6. Levante endereos eletrnicos, telefones relacionados aos rgos de sua cidade e Estado que de-fendem os direitos das crianas, adolescentes e idosos.

    7. Faa uma visita ao Conselho Tutelar em seu municpio e pesquise como feito o encaminhamen-to dos alunos, quando so as eleies e quais os requisitos exigidos.

    36 | Direito Aplicado Educao

  • A Educao Bsica na nova LDB

    Concepo, etapas e modalidadesUm importante avano na nova Lei de Diretrizes e Bases da Educao (LDB) foi a concepo de

    Educao Bsica.

    No sistema brasileiro de ensino esse conceito aparecia restrito ao chamado hoje de Ensino Fundamental, e nem a Educao Infantil nem o Ensino Mdio faziam parte desse nvel.

    O cenrio internacional j vinha apontando como tendncia a exigncia de cada vez mais educao, seja na fase inicial (Educao Infantil), seja ampliando o Ensino Fundamental, seja asse-gurando o Ensino Mdio, como Educao Bsica.

    Muitos educadores defendem tambm o Ensino Superior como um nvel bsico (SAVIANI, 1997). O alargamento finalmente atinge a Ps-Graduao que est estruturada e comporta os cursos de aperfei-oamento, especializao, mestrado, doutorado e ps-doutorado. Mas essa tendncia atinge ainda a dimenso horizontal com o aumento da jornada diria (4 horas no mnimo para Ensino Fundamental) e dos dias letivos (200 dias para o Ensino Fundamental, Mdio e Superior).

    Constata-se tambm o aumento de escolas de tempo integral no ensino fundamental e a oferta de creches em perodo integral.

    A LDB tambm aponta para a oferta progressiva do Ensino Fundamental em horrio integral.

    Houve, portanto, o alargamento da Educao Bsica que hoje abrange desde a Educao Infantil (0 a 5 anos), o Ensino Fundamental (6 a 14 anos), at o Ensino Mdio (15 anos em diante). Sero 17 anos de educao no mnimo a serem ofertadas obrigatoriamente pelo poder pblico.

    A Educao Bsica deveria abranger tambm o Ensino Superior ao qual

    todos deveriam ter direito (SAVIANI).

  • No momento, apenas o Ensino Fundamental obrigatrio, devendo o Ensino Mdio ser universa-lizado progressivamente para ento se tornar obrigatrio.

    Em face desse alargamento da Educao Bsica, surgem as etapas, sendo a Educao Infantil a primeira etapa, o Ensino Fundamental a segunda etapa e o Ensino Mdio a etapa final. Essas eta-pas possuem finalidades prprias, porm em articulao com as etapas posteriores, sem obstcu-los entre elas.

    O Processo Seletivo entre o Ensino Mdio e o Ensino Superior, ainda permanece e se mostra dispu-tado quando se trata de Instituies Pblicas (Federais e Estaduais).

    A organizao da Educao Bsica se completa com as modalidades que permeiam as etapas e atendem, ora as especificidades da idade (Educao de Jovens e AdultosEJA), ora as necessidades dos alunos (Educao EspecialEE), ora a forma das ofertas (Educao DistnciaEAD), ora a natureza das ofertas (Educao ProfissionalizanteEP) ou ainda a diversidade da clientela (Educao IndgenaEJ).

    Cada uma dessas modalidades est presente na legislao, seja com sees ou mesmo com arti-gos, explicitando as peculiaridades. Constata-se que as modalidades agora fazem parte da estrutura or-ganizacional da LDB, esto, portanto institucionalizadas. Algumas modalidades extrapolam a Educao Bsica e alcanam o Ensino Superior (EAD, EE, EI), outras esto presentes em todas as etapas (EE), en-quanto outras alcanam apenas determinadas etapas (EJA, EP).

    Educao InfantilA Educao Infantil constitui-se em uma etapa da Educao Bsica, abrangendo a faixa etria

    de 0 a 6 anos1. Foi um dos grandes avanos, uma verdadeira conquista da sociedade brasileira, respal-dada nas leis maiores como a Constituio Federal, o Estatuto da Criana e do Adolescente, a Lei de Diretrizes e Bases da Educao Nacional e o Plano Nacional da Educao. Em nvel estadual est presen-te na Constituio Estadual e nos municpios na Lei Orgnica Municipal.

    Nas leis educacionais anteriores (4.024/61 e 5.692/71) a Educao Infantil aparecia como pr-pri-mrio e pr-escolar2, respectivamente, e devendo ser zelada e incentivada. Era comum o atendimento s na faixa dos 6 anos atravs do prezo na rede pblica sendo que s as particulares que j vinham ofertando o Jardim de Infncia (Jardim I, II e III), abrangendo alunos de 4 a 6 anos.

    A Constituio Federal, no artigo 208, estabelece como dever do Estado com a educao, entre outros, o atendimento em creche e pr-escola s crianas de 0 a 6 anos. No artigo 211, pargrafo 2., reza que os municpios atuaro prioritariamente no Ensino Fundamental e pr-escolar. Essa educao , portanto, incumbncia do municpio, devendo o Estado e a Unio atuarem concorrentemente, ou seja, colaborando com recursos, apoio tcnico entre outros.

    A nomenclatura Educao Infantil s foi consagrada na Lei de Diretrizes e Bases que reservou uma seo para a Educao Infantil. Essa lei considerou a Educao Infantil como etapa da Educao Bsica

    1 Com a ltima alterao a faixa etria de 0 a 5 anos.2 A terminologia pr-escolar pode causar dvidas. na faixa de 4 a 6 anos ou todo o atendimento antes da escolarizao que se inicia o Ensino Fundamental.

    38 | Direito Aplicado Educao

  • 39|A Educao Bsica na nova LDB

    e manteve a separao entre creche e pr-escola, apresentando a diviso da faixa etria 0 a 3 anos e 4 a 6 anos. Essa separao tem sido considerada como um rano da legislao.

    A Educao Infantil direito de todos, mas no obrigat-ria, cabendo famlia a deciso de encaminhar ou no a criana. Nos estabelecimentos oficiais sua oferta gratuita, em obedin-cia legislao que coloca a gratuidade como um de seus prin-cpios.

    Em razo do atendimento em creches, antes da Constitui-o Federal e da LDB serem ofertadas em outras Secretarias que no a da Educao, foi preciso de um perodo de transio para regularizar essa situao.

    A LDB estabeleceu um prazo de trs anos para essa regu-larizao e que portanto j expirou.

    A lei educacional ainda coloca as finalidades da Educao Infantil (LDB, art. 29) a saber o desen-volvimento integral da criana at seis anos de idade, em seus aspectos fsico, psicolgico, intelectual e social, complementando a ao da famlia e da comunidade.

    A avaliao mereceu destaque na seo destinada Educao Infantil onde se determina que ela deva acontecer com os objetivos de acompanhamento e registro. No deve servir para classificar nem para efeito de promover para a primeira srie do Ensino Fundamental.

    A questo da avaliao traz um problema, o da articulao, entre a etapa da Educao Infantil e do Ensino Fundamental. Na parte da alfabetizao tambm ocorre esse problema: alfabetizar, ou no, uma polmica e um confronto que se consta entre as rede pblicas e particulares. Estas antecipam o processo. Enquanto as pblicas so orientadas para trabalhar com o ambiente alfabetizador.

    Um avano da legislao foi a exigncia da formao para os professores que vo atuar na Educao Infantil, idntica a das demais etapas da Educao Bsica. Apesar de ainda no ser obrigat-rio, a preferncia que seja em nvel Superior, graduao plena, podendo ser na modalidade a distncia e ou como treinamento de servio. A formao mnima admitida pela legislao ainda em nvel Mdio, na modalidade normal que pode ser presencial e ou a distncia.

    A Educao Infantil possui uma demanda acumulada e, portanto, precisaria de um aporte de re-cursos bastante grande. No entanto, o municpio primeiro tem que atender o Ensino Fundamental que a prioridade um, tendo destinao de recursos j estipulada dentro dos 25% atravs do Fundo de Manuteno e Desenvolvimento do Ensino Fundamental e de Valorizao do Magistrio (Fundef). Dessa forma, para a Educao Infantil e outras questes restam os 10%. A esperana para solucionar essa si-tuao a aprovao do Fundo de Manuteno e Desenvolvimento da Educao Bsica e de Valorizao dos Profissionais da Educao (Fundeb), uma das metas do Ministrio da Educao (MEC) e do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Ansio Teixeira (INEP), e que dever atender todas as eta-pas da Educao Bsica e no s o Ensino Fundamental.

    O projeto de lei estabelecendo o fundo para a Educao Bsica tramita no Congresso Nacional. Ocorre que houve um veto retirando as crianas de 0 a 3 anos, o que causou reao da sociedade orga-nizada e dos educadores.

    A Educao Infantil, segundo a LDB, ofertada em

    complementao ao da famlia que tem responsabilidades com relao educao de

    seus filhos.

  • Tanto educadores como economistas acreditam na formao oferecida na Educao Infantil, sendo que as pesquisas apontam que as crianas que passam pela Educao Infantil tm melhor desempenho no Ensino Fundamental, inclusive permanecem mais tempo nesta etapa. A Educao Infantil deve ser vista como um direito e at como um investimento! Convidamos voc a defend-la na sua comunidade!

    O Ensino Fundamental para nove anos: ao afirmativa, exigncias internacionais ou questo financeira?

    Historicamente a sociedade brasileira tem lutado pela educao como um de seus direitos bsi-cos. O direito educao tem estado presente nas Constituies Federais e na legislao educacional. Assim que na primeira Lei de Diretrizes e Bases, a de 4.024/61, o Ensino Primrio tinha durao de quatro anos, podendo se estender at os seis anos.

    Essa proposio j anunciava que quatro anos eram os possveis no momento, mas no eram suficientes para oferecer aos brasileiros os fundamentos bsicos de uma educao elementar. Acrescente-se ainda as barreiras existentes para a continuidade, sendo o Exame de Admisso a primeira e talvez a mais temida.

    A implantao da Lei de Diretrizes e Bases Lei 5.692/71, destinada apenas ao 1. e 2. graus, trouxe uma importante alterao ao unir o antigo ensino primrio (quatro anos) com o 1 ciclo de ensino secundrio, o ginasial de quatro anos num nico grau, o 1., com oito anos de durao. O Exame de Admisso foi extinto e o sistema de ensino ganhou em articulao e continuidade, ou seja, ficou mais democrtico.

    sempre bom lembrar do contexto sociopoltico em que essas Reformas Educacionais ocor-reram. O Brasil estava vivenciando o perodo da ditadura militar que possibilitou uma alterao, de tal porte que, no entanto, exigiu mltiplas condies para se concretizar: recursos fsicos, huma-nos, materiais e financeiros.

    Justificou-se na poca que a ampliao era uma exigncia da sociedade brasileira que precisava sair do atraso (o Brasil era considerado um pas de terceiro mundo) e se incorporar a um novo momen-to de mudanas internacionais. Em termos operacionais, a quem caberia tal tarefa? Ao municpio? es-fera Estadual? Unio?

    bom recordar que os estados, a partir da dcada de 1960 assumiam a maior responsabilidade com redes que envolviam tanto a zona rural (escolas primrias multisseriadas), como as escolas da zona urbana, grupos escolares, ginsio e at colgios que ofertavam cursos cientficos e clssico, e cursos no ramo profissionalizante: o ensino agrcola, o industrial, o comercial e o ensino normal.

    Essa significativa alterao da durao do ensino de 1. grau para oito anos veio acompanhada do processo de municipalizao e o(s) Estado(s), embora em ritmo diferente, foram gradativamente desmontando sua rede de escolas rurais e transferindo suas turmas/escolas primrias da cidade para os municpios.

    Nesse momento, os municpios comearam a implantar a continuidade do 1. grau, ou seja, as Sries Finais, de forma gradativa. Ocorria ainda o encaminhamento dos alunos concluentes das Sries

    40 | Direito Aplicado Educao

  • 41|A Educao Bsica na nova LDB

    Iniciais das escolas municipais para as escolas estaduais que ofertavam o antigo ginasial, agora Sries Finais do 1. grau (5. a 8. srie). Foram momentos de falta de vagas, de luta, de organizao e reorgani-zao para atender a demanda reprimida. A passagem agora estava livre, desde que houvesse a vaga, a oportunidade. Em muitos casos sacrificavam-se as turmas da pr-escola para ampliar as vagas de 1. a 4. srie e 5. a 8. srie do Municpio(s) e Estado(s) que tiveram que trabalhar de forma colaborativa.

    Embora em plena ditadura, houve por assim dizer a democratizao das oportunidades educa-cionais, para um ensino de 1. grau ampliado com o dobro da durao anterior. A questo quantidade estava sendo resolvida, mas e a qualidade? Foram mais de 20 anos para reconhecer e beneficiar uma parcela maior de brasileiros ainda com percentuais desiguais de escolarizao, consideradas as diferen-tes regies, estados, municpios, zonas rural e urbana, os jovens e os adultos, os cidados com necessi-dades educativas especiais, inclusive.

    Durante esse perodo os municpios receberam esse novo encargo, mas no tiveram aporte de re-cursos pela via da descentralizao para cumprir com essa nova incumbncia, agora ampliado de modo que no chegou a ser universalizado.

    Ao final da dcada de 1980, o contexto brasileiro apresenta outras caractersticas, um proces-so de abertura poltica vai se consolidando. A sociedade civil se organiza para a construo da nova Constituio Federal, que foi elaborada pelo processo de Constituinte com a participao de Deputados e Senadores.

    Aprovada em 1988 e tida como uma Constituio Cidad, consagra a educao como direito de todos e direito subjetivo na etapa do Ensino Fundamental.

    Agora, cada um, individualmente, pode reivindicar esse direito que faz parte de acordos e documentos internacionais, capitaneados pela Unesco-ONU. Este movimento de Constituinte se repetiu nos Estados no ano de 1989 e nos municpios no ano de 1990. As proposies para a rea da Educao se reproduzi-ram e firmaram o entendimento da educao como direito de todos e dever do Estado, da famlia e da sociedade.

    Na esteira da nova Constituio, educadores organizados inicialmente em Comits e depois em Fruns em Defesa da Escola Pblica, Gratuita e Universal, prosseguiram as discusses com vistas a uma nova e nica LDB que deveria regulamentar o captulo da Constituio Federal relativo Educao.

    No final de 1996, com a aprovao da Lei 9.394, so mantidos os deveres constitucionais e pro-pe-se o Ensino Fundamental com oito anos, no mnimo, colocando-se a ampliao como real possi-bilidade, ao mesmo tempo em que se coloca como facultativa a entrada de alunos nesta etapa com 6 anos de idade. Estavam abertas as portas para ampliao do Ensino Fundamental.

    Essa nova LDB tambm estabeleceu que o Plano Nacional de Educao devesse ser uma lei. Aprovado em 2001, a Lei do Plano Nacional de Educao 10.172, fixou como uma das metas para o Ensino Fundamental a ampliao dessa etapa para nove anos de durao, sendo condio para tanto, a universalizao do atendimento de oito anos.

    No 2. semestre de 2004, o MEC/Inep vem a pblico divulgar as propostas para que se d um cho-que de qualidade na Educao Bsica. Dentre elas est a ampliao do Ensino Fundamental para nove anos com a antecipao do ingresso dos alunos j aos 6 anos. Justificava-se a proposio com o argu-mento de que as crianas que j foram iniciadas na alfabetizao se desenvolvem melhor no decorrer da etapa do Ensino Fundamental.

    Voc sabia que o cidado brasileiro tem

    direito subjetivo ao Ensino Fundamental?

  • Alguns estados comearam a experienciar essa proposta, seja antecipando o ingresso sem, no entanto, ampliar o tempo de durao, seja de forma plena, antecipando e ampliando.

    Em maio do ano de 2005, foi aprovada a Lei 11.114 que trouxe obrigatrio o ingresso para os alunos de 6 anos. Nessa lei, a ampliao para nove anos no foi firmada, fazendo-se necessria uma nova lei. Em 2006, pela Lei 11.274 foi ampliada a durao e estabelecido o prazo de cinco anos para a implantao do Ensino Fundamental com nove anos. Essa legislao acabou por alterar tambm a Educao Infantil que passar a ser de 0 a 5 anos. A ampliao dos nove anos recaiu sobre a fase ini-cial dessa etapa que passa agora a ter cinco anos de durao (6 a 10 anos). Isso significa que ser pre-ciso mais professores nos Anos Iniciais. Essa mudana positiva para a Educao Bsica considerando que o Estado (municpio) ter que ofertar em carter obrigatrio e garantido mais um ano de Ensino Fundamental que direito subjetivo do cidado brasileiro. Garantem-se tambm recursos financeiros do Fundef enquanto se aprova o Fundeb que estende os recursos para todas as etapas da Educao Bsica. Assim que os alunos de 6 anos de agora em diante tero vagas asseguradas na rede pblica, diferentemente da situao anterior, pois as vagas na pr-escola no tm sido suficientes. Isso tem gerado a fila de espera, a interveno do Conselho Tutelar. Enquanto isso, os alunos de famlias com maior poder aquisitivo com 6 anos de idade j frequentavam a 1. srie do Ensino Fundamental na rede particular de ensino, aps uma Educao Infantil que antecipa via de regra o processo de alfabe-tizao que se inicia no Jardim II e se completa no Jardim III.

    A ampliao do Ensino Fundamental para nove anos vir, de certa forma, colocar os alunos da escola pblica em p de igualdade, pelo menos no que se refere idade. Na si-tuao anterior, esses alunos dependiam de vaga para aden-trar com 6 anos, quando esta idade era facultativa. Somente depois que todos os alunos com 7 anos estivessem sendo atendidos que isso poderia ser concretizado. Haveria tam-bm a antecipao da participao desses alunos de 6 anos

    nos Programas Sociais do Governo, Merenda Escolar, Transporte Escolar, Material Didtico, Bolsa-Famlia, que no atingem a Educao Infantil, ficando mais fcil o controle das crianas de risco, inclusive as que fazem parte do PETI (Programa de Erradicao do Trabalho Infantil).

    Com essa medida haver uma unidade poltico-pedaggica com relao ao Ensino Fundamental, um menor distanciamento entre a escola pblica e privada e ainda uma melhor articulao entre a Educao Infantil e o Ensino Fundamental (no haveria mais razo de ser para as classes de alfabetiza-o alternativa ainda utilizada por alguns estados da Federao).

    Certo que enfrentar-se- um perodo de transio, tanto a Educao Infantil como o Ensino Fundamental tero que rever seus Projetos Pedaggicos. A LDB vigente possui instrumentos legais para fazer frente a esta situao; seja pela organizao em ciclos, que vai se consolidando, seja pelas figuras de classificao e reclassificao. Entende-se que por um bom perodo de tempo haver dificuldades para os alunos que tiverem que trocar de rede e o sistema tem que estar atento a essas questes.

    Algumas famlias ficaro em dificuldades, pois perdero um ano de perodo integral ofertado em Centros de Educao Infantil, j que o Ensino Fundamental ofertado em horrio integral em pou-cas instituies (CAICs/CEIs). preciso tambm atentar para a questo da idade que no est fixada em nvel nacional, mas dever ser objeto de regulamentao em nvel de sistema estadual, pelos encami-nhamentos do MEC.

    A ampliao de Ensino Fundamental para 9 anos

    abrangendo a faixa dos 6 aos 14 uma poltica

    afirmativa?

    42 | Direito Aplicado Educao

  • 43|A Educao Bsica na nova LDB

    Haver repercusses, sem dvida, no processo de formao inicial e continuada dos professores e dos pedagogos para fazer frente a essas mudanas. O Tempo uma categoria curricular que vem sen-do objeto de estudo e a tendncia trabalhar com um tempo flexvel superando o tempo rgido, consi-derando-se as novas contribuies nos estudos sobre ciclos de formao humana. Dever ocorrer ainda uma reviso das polticas de currculo do Ministrio da Educao (Referenciais Curriculares Nacionais para a Educao Infantil e Parmetros Curriculares Nacionais Ensino Fundamental, Anos Iniciais), nos Estados e Municpios, inclusive no seu sistema de Avaliao SAEB/ANEB e a Prova Brasil que abrange to-dos os alunos da faixa inicial.

    importante ressaltar que se faz necessria uma ampla discusso com a sociedade, com as fam-lias e com rgos envolvidos, pois essas alteraes so recentes e no tem sido alvo dessas discusses, nem de propagandas, nem de divulgao sistemtica, nem de material informativo. Em se implantan-do essa ampliao, uma sistemtica de acompanhamento e avaliao deve ser proposta para ir se fa-zendo os ajustes no decorrer da implantao.

    A legislao nacional exigiu a regulamentao dos nove anos elaboradas nas Unidades da fede-rao que estabeleceram as suas orientaes, seja nos seus Planos Estaduais de Educao, seja atra-vs dos seus Conselhos Estaduais de Educao. Em razo do prazo para essa implantao, possvel a convivncia com dois sistemas o de oito anos e o de nove anos. O ano de 2007 , portanto, um marco, pois o ano da implantao dessa poltica considerada afirmativa para as classes populares.

    A Educao Especial na Educao Infantil e no Ensino Fundamental

    A Constituio Federal abre o captulo da educao dizendo que a educao direito de to-dos. Se voc pensou, entre outros nos jovens, adultos, idosos, trabalhadores e nas pessoas com ne-cessidades especiais, voc acertou.

    A Educao Especial, agora na condio de modalidade, segundo os preceitos constitucionais, deve ser ofertada desde a Educao Infantil, e de preferncia na rede regular de ensino. Isso significa que a le-gislao d respaldo Incluso. O Estatuto da Criana e do Adolescente confirma o direito das crianas e adolescentes com necessidades educativas especiais, que pode ser permanente ou transitrio.

    Da mesma forma, a LDB destina uma seo Educao Especial. Nela trata das ofertas, da exi-gncia de adequar contedos procedimentos, recursos materiais e didticos. A incluso no Ensino Fundamental realiza-se de acordo com a proposta dos estados e municpios, j h algum tempo, apro-ximadamente trs dcadas. O mais comum era a classe especial na rede pblica de Deficincia Auditiva, Deficincia Mental e Deficincia Visual, que contava com professores que fizeram o Curso de Estudos Adicionais em Educao Especial (Deficincia Auditiva DA, Deficincia Motora DM e Deficincia Visual DV).

    Outra alternativa era a escola especializada atravs das APAEs, que via de regra atendia a Deficincia Mental. Os alunos com deficincia auditiva e visual eram atendidos em outras escolas espe-cializadas. Nesses trinta anos foi sendo estruturado o Ensino Especial para os alunos considerados in-fra-dotados, embora a legislao abrangesse tambm os superdotados, que praticamente no foram

  • atendidos. Novamente a legislao coloca como alunos especiais no s os alunos com limitaes, mas os que possuem altas habilidades.

    Os professores precisam estar capacitados ou especializados para atend-los de forma a contem-plar no s as suas limitaes, mas valorizar as suas potencialidades.

    H muita discusso em torno da incluso de alunos especiais na rede regular de ensino. Quando no h atendimento diferenciado, o aluno pode estar em nome da incluso, sendo excludo.

    Outra reivindicao a diminuio do nmero de alunos na turma. Nesse processo de incluso muito importante a participao da famlia!

    A Educao de Jovens e Adultos no Ensino FundamentalDos antigos Exames de Madureza at a Educao de Jovens e Adultos de hoje foi um longo per-

    curso para aqueles que no tiveram acesso educao regular na idade estipulada ou que no perma-neceram no sistema educacional por razes diversas.

    A trajetria da Educao de Jovens e Adultos expressa tambm a discriminao para com esse cidado que est nessa faixa de idade e nessa modalidade de ensino.

    Na Lei 5.692/71 houve a implantao do Ensino Supletivo que ofertava tanto cursos, como exames com idades diferen-ciadas. Na legislao atual a proposta de cursos e exames con-tinua, mas houve uma diminuio na exigncia da idade para prestar os exames.

    A Idade na Educao de Jovens e Adultos (EJA): aspectos legais

    Lei Idade

    (LO

    CCO

    , 200

    5)

    LDB 5.692/71

    Maiores de 15 anos Curso Ensino de 1. grau

    Maiores de 18 Curso Ensino de 2. grau

    Maiores de 18 anos Exame Ensino de 1. grau

    Maiores de 21 anos Exame Ensino de 2. grau

    Lei 9.394/96

    Maiores de 15 anos Exame Ensino Fundamental

    Vedada 14 anos completos

    Maiores de 18 anos Exame Ensino Mdio

    Vedada 17 anos completos

    DCNEJAResoluo 1/2000

    15 anos completos Exame Ensino Fundamental

    (art. 4. I e IIV)

    18 anos completos Exame Ensino Mdio

    (art. 4., VII)

    Voc concorda que a Educao de Jovens e

    Adultos que vem sendo ofertada seja de baixa

    qualidade?

    44 | Direito Aplicado Educao

  • 45|A Educao Bsica na nova LDB

    A EJA que vem sendo ofertada no tem a mesma qualidade e considerada de segunda catego-ria, em razo disso, h a preferncia pela oferta no ensino regular. E tem sido uma das principais pol-micas a respeito da EJA.

    Outra questo bastante relevante a proposta da legislao de oferta a Educao de Jovens e Adultos preferencialmente na rede regular. Isso significa para alguns um avano, pois eles tero um ensino como os demais, presencial. Existe uma outra corrente de pensamento que entende que a EJA deva ser ofertada de vrias maneiras na modalidade a distancia com as variaes de semi-presencial por exemplo.

    Dada a sua especificidade com relao ao mtodo e recursos didticos, estruturao prpria com calendrios diferenciados, a EJA possui um espao nos rgos ligados Educao (MEC, CNE, SEEDs, SMEDs) com equipes de especialistas.

    preciso tambm todo um trabalho de articulao entre os alunos do ensino regular e da Educao a Distncia e entre um etapa e outra. A EJA tem ocupado vrios outros espaos que no a es-cola e tem sido motivo de projetos em parceria com empresas e instituies outras. Este pode ser um campo de trabalho para voc, enquanto estagirio e futuramente como professor!

    Observe que foi colocado que existem projetos que inicialmente so de Alfabetizao. Antes eram mais comuns as Campanhas ou Movimentos como o Mobral (Movimento Brasileiro de Alfabetizao), que por serem passageiros foram amplamente criticados, principalmente pelo uso de recursos huma-nos no-qualificados, muitas vezes na condio de voluntrios e recebendo por aluno alfabetizado, o que causou na poca inmeros problemas. Percebe-se que ocorreram avanos na Educao de Jovens e Adultos, mas essa modalidade tem ficado ainda com poucos recursos para fazer frente demanda por educao que aparece como uma exigncia do novo contexto scio-poltico, do processo de mundia-lizao em que vivemos. necessria a certificao para manter o posto de trabalho ou para o proces-so de requalificao.

    Os estudiosos da rea da Educao e trabalho afirmam que a Educao Profissionalizante de-pende cada vez mais da elevao da escolarizao para ter retorno, sucesso.

    Texto complementar

    Lei vai instituir Ensino Fundamental de nove anos(JORNAL 30 DE AGOSTO, 2005)

    A mobilizao nacional para a implantao dos nove anos comeou em 2003. Ela foi ampliada em 2004 quando o MEC, em parceria com o Conselho Nacional de Secretrios de Educao (Consed) e a Unio Nacional dos Dirigentes Municipais de Educao (Undime), pro-moveu sete encontros regionais para discutir a ampliao. Os encontros foram em Belo Ho-rizonte (MG), Campinas (SP), Florianpolis (SC), So Lus (MA), Recife (PE), Rio Branco (AC) e

  • Goinia (GO). Da pauta constaram assuntos como fundamentao legal, orientaes pedag-gicas, avaliao da implantao do programa e resultados.

    Em novembro de 2004, um encontro nacional sobre o ensino de nove anos debateu temas su-geridos nos encontros regionais, entre eles, polticas pblicas da Educao Bsica, polticas de fi-nanciamento, qualidade social da educao, direito infncia na escola, tempo e espao do Ensino Fundamental, elaborao de programas e projetos educacionais.

    Matrculas Dados da Secretaria de Educao Bsica indicam que o Ensino Fundamental de nove anos est parcialmente implantado em 22 estados e no Distrito Federal. Na regio sul, so 344 966 matrculas do Paran, Santa Catarina e Rio Grande do Sul. Na regio Centro-Oeste so 387 437 matrculas em Mato Grosso, Gois e no Distrito Federal. Mato Grosso do Sul no est no sistema.

    Atividades1. Examinar a Linha do Tempo dos nove anos e colocar a sua opinio, justificando.

    2. Procure em sites ligados Educao informaes sobre Ensino Fundamental com nove anos.

    46 | Direito Aplicado Educao

  • 47|A Educao Bsica na nova LDB

    3. Entrevistar pelo menos um casal de pais de alunos de 6 anos de escolas pblicas e um de escola particular, para colher suas opinies.

    4. Pesquise notcias de jornal e artigos sobre a ampliao do Ensino Fundamental. Resuma a contri-buio e no esquea de colocar as fontes.

    5. Levante dados do seu municpio que envolvam os alunos de 6 anos (Educao Infantil Jardim III e de 1. srie).

  • 6. Levante a situao do seu Municpio (PME) e do seu Estad