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AT03 - Eleições e Representação Política Coordenador: Yan de Souza Carreirão (UFSC) 3ª Sessão: Sessão A / 2º Dia: Competição política, estratégias e recursos. Voto, dinheiro e diferenças regionais nas eleições brasileiras: recursos financeiros e políticos para candidatos a deputado federal em 2010 Emerson U. Cervi [email protected] Resumo: O paper analisa perfil partidário, desempenho eleitoral e receitas declaradas de campanhas de 4,1 mil candidatos a Deputado Federal em 2010 para verificar a relação entre condições políticas, recursos financeiros e voto. A hipótese presente na literatura e já testada em outros trabalhos é que candidatos com mais dinheiro têm maiores chances de eleição, porém, isso precisa ser relativizado pelas regras de disputa e especificidades locais. Devido às desigualdades regionais brasileiras, o trabalho propõe uma análise mais detida sobre os efeitos dessas desigualdades regionais na relação entre dinheiro e voto em disputas proporcionais. A proposta é agregar às variáveis políticas propriamente ditas, informações sobre características sócioeconômicas estaduais para verificar os efeitos do financiamento de campanha, pois se considera que apenas variáveis políticas não são suficientes para explicar o efeito do dinheiro nas disputas eleitorais em âmbito nacional. Os resultados iniciais mostram que nas regiões mais desenvolvidas economicamente, as doações de pessoas jurídicas são mais fortemente relacionadas com o voto, enquanto em Estados menos desenvolvidos, as transferências partidárias ganham relevância. Palavras- chave: eleição, deputados federais, 2010, financiamento, campanhas. 1. Introdução Estudos eleitorais são cada vez mais utilizados pela ciência política para interpretação das complexidades da democracia representativa. Como já apontaram Taagepera e Shugart (1989) no século passado, parte-se de quantidades bem definidas e

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AT03 - Eleições e Representação Política Coordenador: Yan de Souza Carreirão (UFSC)

3ª Sessão: Sessão A / 2º Dia: Competição política, estratégias e recursos.

Voto, dinheiro e diferenças regionais nas eleições brasileiras: recursos financeiros e políticos para candidatos a deputado

federal em 2010

Emerson U. Cervi [email protected]

Resumo: O paper analisa perfil partidário, desempenho eleitoral e receitas declaradas de campanhas de 4,1 mil candidatos a Deputado Federal em 2010 para verificar a relação entre condições políticas, recursos financeiros e voto. A hipótese presente na literatura e já testada em outros trabalhos é que candidatos com mais dinheiro têm maiores chances de eleição, porém, isso precisa ser relativizado pelas regras de disputa e especificidades locais. Devido às desigualdades regionais brasileiras, o trabalho propõe uma análise mais detida sobre os efeitos dessas desigualdades regionais na relação entre dinheiro e voto em disputas proporcionais. A proposta é agregar às variáveis políticas propriamente ditas, informações sobre características sócioeconômicas estaduais para verificar os efeitos do financiamento de campanha, pois se considera que apenas variáveis políticas não são suficientes para explicar o efeito do dinheiro nas disputas eleitorais em âmbito nacional. Os resultados iniciais mostram que nas regiões mais desenvolvidas economicamente, as doações de pessoas jurídicas são mais fortemente relacionadas com o voto, enquanto em Estados menos desenvolvidos, as transferências partidárias ganham relevância.

Palavras- chave: eleição, deputados federais, 2010, financiamento, campanhas.

1. Introdução

Estudos eleitorais são cada vez mais utilizados pela ciência política para interpretação

das complexidades da democracia representativa. Como já apontaram Taagepera e

Shugart (1989) no século passado, parte-se de quantidades bem definidas e

mensuráveis de votos, vagas e de candidatos para se chegar a noções mais complexas

do sistema democrático como um todo. Portanto, em última análise, estudar eleições

é uma forma indireta de fazer inferências sobre a saúde dos sistemas democráticos.

No caso desse paper, além de quantidade mensuráveis de votos, utiliza-se também,

como variável explicativa do resultado da disputa, quantidades mensuráveis de

recursos financeiros investidos em campanhas. O tratamento empírico dado aos

resultados eleitorais, com análise matemática de números e criação de índices

comparativos é principal instrumento utilizado nas pesquisas atuais dessa área. Nesse

sentido, Peña afirma que “los datos de votos y de asientos por partido han podido

agregarse en indicadores simples que pretenden explicar em un único dato las

distribuciones o diferencias observadas” (2005, p. 235). Embora recentes, os estudos

de financiamento de campanha têm se desenvolvido no Brasil nos últimos anos. Uma

análise sobre o montante de recursos disponibilizados na campanha de 2010 no Brasil

pode ser encontrada em Speck e Mancuso (2011). Há duas formas predominantes de

abordar o tema do financiamento de campanhas: i) a partir de uma visão

economicista, onde o importante é entender qual a origem dos recursos e montantes

destinados ao financiamento das eleições no país; e ii) com uma abordagem política,

onde o que interessa é compreender possíveis efeitos dos recursos financeiros sobre

os resultados das disputas. No primeiro caso, recursos financeiros formam a variável

dependente, a ser explicada; enquanto que no segundo, elas explicam – ainda que em

parte – o desempenho de candidatos e partidos políticos. Este trabalho filia-se ao

segundo grupo de abordagens, utilizando a variável “financiamento de campanha”

como explicação para o desempenho eleitoral dos candidatos a deputado federal no

Brasil em 2010.

A questão aqui é discutir até que ponto é possível medir a influência de montantes

distintos de recursos financeiros na obtenção de votos pessoais por candidatos em

disputas proporcionais – bancadas estaduais na Câmara de Deputados. Parte-se da

hipótese já testada em trabalho anterior (Cervi, 2010) para candidaturas majoritárias

de que o tipo de financiamento tem relação com as chances de eleição do candidato.

Político com mais recursos de empresas tendem a ter um volume maior de dinheiro na

campanha e a conquistar mais votos individuais, aumentando as chances de vitória.

Um estudo que tratou da participação de empresas no financiamento eleitoral

brasileiro, porém, de forma distinta da abordada aqui é o de Santos (2011). Nesse

trabalho o autor aponta a participação de grandes empresários como candidatos nas

disputas proporcionais fazendo parte de uma estratégia partidária. Nesse caso, os

partidos garantiriam proximidade com empresas financiadoras a partir de seus

próprios candidatos/empresários. Aqui, o objetivo é saber como o conjunto de

candidatos, empresários ou não, faz a composição de doações para as suas

campanhas.

Um segundo ponto relevante para a análise desenvolvida aqui é a consideração dos

efeitos distintos de recursos financeiros para candidatos de diferentes regiões do País.

Partimos do princípio de que em função das desigualdades econômicas e de

desenvolvimento das unidades da Federação, os recursos financeiros apresentam

efeitos distintos para os candidatos de diferentes regiões, ainda que sejam de mesmos

partidos ou com mesmas posições ideológicas. Portanto, o que se pretende é avançar,

dando continuidade a esta linha de pesquisas sobre financiamento de campanhas e

impacto eleitoral do dinheiro, com a relativização por características socioeconômicas

regionais.

A partir daqui o texto está dividido em duas partes: no próximo tópico são

apresentados os dados e realizados os testes para verificar a validade das hipóteses

apresentadas acima. Para isso, o trabalho utiliza informações oficiais de duas fontes

distintas do TSE (Tribunal Superior Eleitoral): i) prestação de contas dos concorrentes a

deputado federal em 2010, e ii) resultados de votações individuais de todos os

candidatos que chegaram ao final da disputa. Isso permite trabalhar com um universo

de 4,1 mil concorrentes com informações disponíveis. No tópico seguinte são

apresentadas algumas considerações finais a respeito dos “achados” empíricos..

2. Materiais e métodos

As informações analisadas aqui foram obtidas do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) e

resultaram da junção de dois bancos de dados distintos. Um deles apresenta as

votações individuais de todos os candidatos que disputaram as eleições de 2010 para

deputado federal no Brasil. O outro é o banco de dados com informações sobre

doadores de campanha, a partir das prestações de contas feitas pelos concorrentes e

partidos políticos ao final da campanha. A unidade de análise, portanto, é o candidato.

Como nem todos prestaram contas ao TSE das finanças de campanha, foram

considerados aqueles para os quais havia informação de prestação de contas no

website do TSE em fevereiro de 2011. Isso resulta em 4.124 candidatos com

informações disponíveis para serem analisadas, dos quais, 513 foram eleitos. Como a

unidade de análise é o candidato, aqui serão inseridos sempre os votos nominais e os

recursos declarados como doações para as campanhas individuais, sendo, portanto,

desconsiderados os votos de legenda e os recursos doados a comitês financeiros de

diretórios partidários regionais. O total de candidatos analisados aqui somou 88,6

milhões de votos nominais, mais de 80% dos votos válidos para deputado federal

naquele ano. Representa uma média de 21,4 mil votos por concorrente. Em relação às

doações financeiras diretas para as candidaturas, foram R$ 909,1 milhões declarados

pelos concorrentes, um média de R$ 225,9 mil1 por candidatura individual.

Uma primeira distinção a ser feita na relação entre recursos e votos pessoais em

eleições proporcionais é entre os eleitos e não-eleitos. Em 2010, para deputado

federal no Brasil, os 3.511 candidatos derrotados arrecadaram R$ 334,7 milhões e

tiveram 29,6 milhões de votos; enquanto os 513 eleitos arrecadaram R$ 574,4 milhões.

Percebe-se claramente uma concentração de recursos arrecadados pelos candidatos

eleitos, pois apesar de representarem cerca de 1/7 do total de concorrentes, foram

responsáveis por cerca de 2/3 das doações individuais. Essa mesma diferença é

percebida na distribuição de votos nominais, pois enquanto os não-eleitos somaram

29,7 milhões de votos, os eleitos fizeram 58,9 milhões de votos. Com isso, a relação

proporcional entre receita e voto manteve-se muito próxima nos dois grupos.

Enquanto os não-eleitos tiveram R$ 11,6 por voto em média, os eleitos arrecadaram a

1 Vale ressaltar que no website do TSE consta que 101 dos 4124 candidatos a deputado federal

declararam não ter recebido nenhum recurso individual para a disputa, portanto, não fazem parte das

médias apresentadas aqui.

média de R$ 9,7 por voto. Ou seja, eleitos fazem mais votos e têm mais recursos para

fazer campanha. No entanto, não estamos ainda fazendo relações de dependência

entre as duas variáveis.

Considerando que os eleitos arrecadam mais que os não-eleitos e obtém mais votos

em comparação à arrecadação total dos derrotados, é possível pensar que existem

outras variáveis intervenientes que não apenas recursos financeiros para a obtenção

de votos pessoais. O tipo de campanha que o candidato faz pode ser um indicativo de

“rendimento” dos recursos na transformação em votos. Uma das variáveis a considerar

é se o candidato faz parte de uma coligação de partidos ou não. Dependendo da

coligação, ele precisará mais ou menos de votos individuais para ser eleito. Nesse caso,

ajustes partidários podem influenciar a relação entre recursos financeiros e votos.

Além disso, consideramos que as disputas regionais para as bancadas na Câmara de

Deputados são organizadas a partir da disputa presidencial, com candidatos se

favorecendo da proximidade com o concorrente melhor avaliado à presidência da

república pelos eleitores. Considerando que essas duas hipóteses têm sentido lógico,

os candidatos serão organizados em três grupos distintos – considerando a relação

com a candidatura vitoriosa à presidência da república em 2010: i) candidatos a

deputado em coligações sem o PT; ii) candidatos a deputado em coligações com o PT;

e iii) candidatos a deputado pelo PT sem coligação.

A tabela 1 a seguir mostra os resultados para cada um dos três grupos subdivididos

entre os concorrentes eleitos e não-eleitos em 2010 no que diz respeito ao

financiamento e votos. Na última coluna da direita é possível perceber que a relação

entre recursos arrecadados e votos obtidos segue aproximadamente o mesmo padrão

nos três grupos de candidatos. Em todos os casos os não-eleitos apresentam médias

que ultrapassam as dos eleitos na relação entre Reais e votos. A menor diferença fica

entre candidatos que estavam em coligações sem o PT, com R$ 10,59 por voto para os

329 eleitos e R$ 11,46 por voto para os 3.172 não eleitos. A diferença aumenta um

pouco nos concorrentes que fizeram parte de coligação com o PT2. Enquanto os 405

2 Aqui também estão inclusos os candidatos do PT em Estados em que o partido fez coligação para

deputado federal.

não-eleitos apresentaram uma relação de R$ 11,80 por voto, os 171 eleitos por

coligações com PT tiveram R$ 8,36 por voto, de média. O grupo que apresenta as

maiores diferenças é o dos candidatos petistas que não se coligaram com outros

partidos. Neste, enquanto os não-eleitos tiveram R$ 13,67 por voto, de média, os

eleitos ficaram em R$ 9,46. Embora a média dos petistas eleitos não-coligadas seja

maior que a dos coligados a outros partidos, esses resultados mostram que a

proximidade ao PT tendeu a maximizar o rendimento do recurso financeiro, ou seja,

estar próximo do partido que elegerá o presidente aumenta a possibilidade de

transformação de recursos financeiros em votos. Porém, isso só vale para os

concorrentes eleitos, para os não-eleitos, as médias ficam muito próximas entre os

três grupos.

Tab. 1 – distribuição de votos e receitas por desempenho dos candidatos a deputado federal em 2010

Número de candidatos

Média de votos nominais

Média de receitas (R$)

Relação R$/voto

Coligação sem PT

Não eleito 3.172 7.263 83.241 11,46

Eleito 329 109.826 1.163.999 10,59

Teste de dif. de médias t =65,842 (0,000) t = 47,059 (0,000)

Coligação com PT

Não eleito 405 14.696 173.493 11,80

Eleito 171 125.647 1.051.034 8,36

Teste de dif. de médias t=19,569 (0,000) t=15,459 (0,000)

PT não coligado

Não eleito 34 19.564 267.578 13,67

Eleito 13 103.965 984.535 9,46

Teste de dif. de médias t=8,318 (0,000) t=3,895 (0,001)

A tabela 1 também apresenta os resultados dos testes de diferenças de médias para os

votos nominais e receitas em cada um dos grupos. Percebe-se que os coeficientes são

todos significativos e altos, porém, comparativamente é possível notar que as

diferenças são maiores nos votos nominais do que nas médias das receitas. Isso

significa que enquanto os eleitos conseguem mais votos que os não-eleitos, as

diferenças das receitas médias dentro de cada grupo são menores. Isso reforça a ideia

de que apesar de existirem efeitos da proximidade com PT para as distribuições de

votos, elas são menores no que diz respeito aos efeitos da arrecadação financeira

entre eleitos e não-eleitos. Uma possibilidade explicativa para essa diferença é que

desigualdades regionais, principalmente econômicas, já que tratam de recursos para

campanhas, possam causar a “distorção” na transformação de receitas em votos. É

possível pensar isso no caso brasileiro devido as diferenças de nível de

desenvolvimento econômico entre Unidades da Federação e mesmo entre as grande

regiões do País. O teste de diferenças de médias (ANOVA) para as receitas de eleitos e

não-eleitos por regiões do País mostrou que as diferenças são mais fortes entre os

eleitos do que os não-eleitos. No primeiro grupo, a estatítica F é de 25,915 (sig. 0,000),

enquanto que para os últimos a estatítisca F ficou em 3,110 (sig. O,014). A tabela 2 a

seguir mostra as significâncias estatísticas para as diferenças entre regiões.

Tab. 2 – Diferença de média (ANOVA) para financiamento de campanha entre candidatos

Eleito Não-eleito

(I) Região (J) Região Diferença média (I-J)

Sig. (I) Região (J) Região Diferença média (I-J)

Sig.

NORTE

NORDESTE 23894,33 1,000

NORTE

NORDESTE -70268,3 1,000

CENTRO-OESTE -49628,2 0,320 CENTRO-OESTE -1,17E+06 0,000

SUDESTE 8669,506 1,000 SUDESTE -767440,546* 0,000

SUL -11484,5 1,000 SUL -344546 0,170

NORDESTE

NORTE -23894,3 1,000

NORDESTE

NORTE 70268,26 1,000

CENTRO-OESTE -73522,561* 0,010 CENTRO-OESTE -1,10E+06 0,000

SUDESTE -15224,8 1,000 SUDESTE -697172,286* 0,000

SUL -35378,8 0,709 SUL -274278 0,395

CENTRO-OESTE

NORTE 49628,23 0,320

CENTRO-OESTE

NORTE 1168985,275* 0,000

NORDESTE 73522,561* 0,010 NORDESTE 1098717,015

* 0,000

SUDESTE 58297,736* 0,034 SUDESTE 401544,7 0,078

SUL 38143,74 1,000 SUL 824439,449* 0,000

SUDESTE

NORTE -8669,51 1,000

SUDESTE

NORTE 767440,546* 0,000

NORDESTE 15224,83 1,000 NORDESTE 697172,286* 0,000

CENTRO-OESTE -58297,736* 0,034 CENTRO-OESTE -401545 0,078

SUL -20154 1,000 SUL 422894,721* 0,011

SUL

NORTE 11484,49 1,000

SUL

NORTE 344545,8 0,170

NORDESTE 35378,82 0,709 NORDESTE 274277,6 0,395

CENTRO-OESTE -38143,7 1,000 CENTRO-OESTE -824439,449* 0,000

SUDESTE 20154 1,000 SUDESTE -422894,721* 0,011

Dentre os eleitos há uma homogeneidade maior nas médias de recursos por região do

País. As diferenças mais fortes são entre candidatos da região centro-oeste e nordeste

e centro-oeste e sudeste. Nos dois casos, em média, os eleitos do centro-oeste tiveram

receitas R$ 73,5 mil e R$ 58,2 mil superiores a nordeste e sudeste, respectivamente.

Isso demonstra que entre os deputados federais eleitos em 2010 o volume de recursos

arrecadados para as campanhas foram muito próximos, independente da região em

que disputavam. Já entre os não-eleitos as diferenças significativas são maiores. Os

derrotados do centro-oeste e sudeste arrecadaram mais que os do norte, nordeste e

sul. Os do norte e nordeste tiveram menos recursos, em média, do que os das demais

regiões.

Até aqui, encontramos que a proporção de recursos arrecadas e votos obtidos entre

candidatos eleitos e não-eleitos é bastante próxima, ficando em R$ 11,00 por voto

para os derrotados e R$ 9,00 por voto para os vitoriosos. Também demonstramos que

a principal diferença está no volume de recursos arrecadados entre os dois grupos.

Enquanto os eleitos representam 1/7 do total de candidatos a deputado federal em

2010, eles foram responsáveis por 2/3 das receitas declaradas ao TSE. Essa

concentração de recursos remete a melhores condições de disputas, já que a

transformação de Reais em votos é muito parecida entre os dois grupos de

concorrentes. Também testamos as relações de votos e receitas entre eleitos e não-

eleitos controlados pela proximidade à candidatura vitoriosa para presidência da

república. Dividimos os candidatos em três grupos: concorrendo em coligação sem o

PT, em coligação com o PT e sendo do PT mas não-coligado. Os resultados foram que

para os três casos os candidatos eleitos tiveram mais doações que os não-eleitos e isso

se deu na mesma proporção. Portanto, a variável “política” de controle não se

mostrou útil para explicar diferentes relações entre recursos financeiros e votos

individuais.

O passo seguinte foi verificar se existem diferenças nas receitas de candidatos por

região do País, considerando-se as diferenças no desenvolvimento econômico regional

brasileiro. Aqui, os testes estatísticos mostraram que entre os candidatos não-eleitos

as diferenças regionais foram maiores que os eleitos. Significa dizer que o grupo dos

513 eleitos tem uma receita média que é equivalente a todas as regiões do País,

enquanto no caso dos não-eleitos as diferenças regionais são mais significativas. Dado

que até aqui ficou estabelecido que o diferencial entre eleitos e não-eleitos está no

total das receitas, a partir de agora passamos a analisar a composição dos recursos

declarados pelos candidatos. Seguindo a categorização do TSE, dividimos o conjunto

de receitas em quatro tipos: i) transferências dos partidos, que são os recursos

transferidos pelo diretório nacional e diretórios regionais, assim como de outros

políticos para a conta do candidato a deputado federal. ii) recursos de pessoas físicas,

que são oriundos de doações de eleitores, ou seja, pessoas que decidem contribuir

com a campanha individual de determinado concorrente. iii) recursos de pessoas

jurídicas, que reúnem as doações de empresas, entidades, organizações não-

governamentais, ou seja, doadores com CNPJ (cadastro nacional de pessoas jurídicas).

iv) recursos próprios, por fim, são os recursos introduzidos nas campanhas a partir das

finanças do próprio candidato ou de empresas controladas por ele. A tabela 3 a seguir

mostra a distribuição dos valores médios em Reais de cada tipo de doador, além de

indicar as participação proporcional de cada um deles para candidatos eleitos e não-

eleitos.

A primeira informação importante aqui é que os maiores doadores, tanto para eleitos

quanto para não-eleitos são as “pessoas jurídicas”. Enquanto os não-eleitos que

declararam receita apresentaram uma média de R$ 206,4 mil de arrecadação

individual, os eleitos ficaram em R$ 1,1 milhão de média. No caso dos não-eleitos, as

pessoas jurídicas doaram em média R$ 87,0 mil para cada um dos 1.216 candidatos

que declararam esse tipo de receita. Já para os 481 eleitos, a média ficou em R$ 546,8

mil por concorrente. Em segundo lugar vieram as transferências partidárias para a

composição das receitas individuais. Em 2010 tivemos a média de R$ 58,8 mil de

transferências de partidos para candidatos derrotados e R$ 350,5 mil para eleitos. As

doações de pessoas físicas e os recursos próprios tiveram participações menores na

composição das receitas de campanha. No primeiro caso, a média ficou em R$ 24,9 mil

para os derrotados e R$ 125,7 mil para os eleitos. Já os recursos próprios

representaram em média R$ 35,6 mil por não-eleito, contra R$ 107,8 mil para os

eleitos.

Duas informações precisam ser destacadas. A primeira é a profunda desigualdade dos

valores médios de transferências partidárias para candidatos derrotados e eleitos. Se

os outros três tipos de doações dependem mais das características individuais, espera-

se que a organização partidária garanta algum grau de isonomia entre todos os

concorrentes – principalmente para corrigir desequilíbrios que possam ser gerados

pelas características específicas de cada candidato. Nesse sentido, as transferências

partidárias deveriam “compensar” as divergências de receitas individuais. De acordo

com a tab. 3, os eleitos tiveram, em média, cerca de cinco vezes mais transferências de

seus partidos que os candidatos não-eleitos. Uma proporção muito próxima das

doações de pessoas físicas, cinco reais de média nos eleitos para cada real doado a um

derrotado. No caso das pessoas jurídicas a desproporção aumenta um pouco,

passando para seis vezes mais nos eleitos em relação aos derrotados. Os recursos

próprios apresentam as menores desproporções médias, com cerca de três vezes mais

para os eleitos em relação aos não-eleitos.

Tab. 3 – Distribuição dos tipos de origens na composição das receitas de campanhas

Total R$ Transferências

do partido Pessoa física

Pessoa jurídica

Recursos próprios

NÃO ELEITO

N 3.511 861 2.002 1.216 2.118

Média 206.475,40 58.881,91 24.910,25 87.028,29 35.654,95

Propor. 1,00 0,29 0,12 0,42 0,17

ELEITO

N 513 357 487 481 423

Média 1.131.116,71 350.552,09 125.784,54 546.883,79 107.896,29

Propor. 1,00 0,31 0,11 0,48 0,10

A segunda informação relevante é o número de candidatos que declararam ter

recebido cada um dos tipos de doações. Dos 3.511 concorrentes derrotados que

prestaram contas ao TSE, 2.118 (60,0%) declararam ter investido recursos próprios em

suas campanhas, 2.002 (57,0%) tiveram doações de pessoas físicas. Em terceiro lugar

veem os doadores jurídicos, com 1.216 (34,6%) e, por último, as transferências

partidárias, com 861 (24,5%) declarantes não-eleitos. Por outro lado, entre os 513

eleitos, o maior percentual de doadores nas declarações ficou com pessoas físicas, 487

(94,9%) candidatos, seguido por pessoas jurídicas, com 481 (93,7%) de candidatos com

doadores declarados. Em seguida estão os recursos próprios, com 423 (82,4%) de

eleitos e as transferências partidárias, com 357 (69,5%) de declarações. As

transferências partidárias estão presentes nos menores números de declarações tanto

de não-eleitos quanto de eleitos, porém, no segundo caso elas representam

proporcionalmente quase o dobro da declarações no derrotados (de 69,5% para

34,6%, respectivamente). Essas diferenças percentuais indicam que os eleitos tendem

a ter uma diversificação maior de tipos de doadores que os não-eleitos.

Graf. 1 – Participação do tipo de doador nas campanhas dos candidatos eleitos e não-eleitos

a deputado federal em 2010

O gráfico 1 acima representa as proporções de participação de cada tipo de doador na

composição média das doações de candidatos eleitos e não-eleitos em 2010. Ao

contrário das descrições anteriores, ele permite comparar os tipos de doadores dentro

de cada subgrupo. No caso de não-eleitos, as diferenças são menores, variando de

0,12 de participação de pessoas físicas até o máximo de 0,42 de pessoas jurídicas para

cada Real doado. Já os eleitos tiveram extremos mais distantes, variando de 0,10 de

participação de recursos próprios até 0,48 de pessoas jurídicas. Em termos

comparativos, os não-eleitos contaram com participação maior de doações de pessoas

físicas e de recursos próprios que os eleitos. Já estes últimos tiveram mais

transferências partidárias e doações de pessoas jurídicas.

Em linhas gerais a descrição feita até aqui nos permite afirmar que a composição das

receitas dos candidatos eleitos é distinta dos não-eleitos. Os primeiros recebem mais

de transferências partidárias e doações de pessoas jurídicas, investindo menos

recursos próprios. Já os derrotados contaram com maior participação de recursos

próprios e doações de pessoas jurídicas.

Feitas as análises preliminares, a partir daqui realizaremos os testes para estabelecer

níveis de relação e possíveis determinações entre origem do recurso, obtenção de

votos e maior ou menor possibilidade de se eleger – controlando por região do País.

A primeira regressão é entre votação nominal e volume de recursos da campanha.

Como é de se esperar, a relação é significativa, com estatística F 2.612,45 (0,000) e r2

de 0,394, ou seja, o modelo que considera o total de recursos explica 39,4% das

variações das votações nominais dos candidatos. O coeficiente Beta (B) da regressão

para total de receitas é de 0,056, o que significa que, no modelo, aproximadamente

cada real a mais da campanha, obtém-se 1/20 de voto. Como já identificamos que a

relação entre recursos e voto é mais forte entre os não-eleitos do que entre eleitos, é

possível imaginar que a explicação da variação de votos por recursos seja mais forte no

primeiro grupo do que no segundo.

O próximo passo é analisar os efeitos individuais dos tipos de doadores para os

resultados das votações. Aqui, como os valores originais (em R$) apresentam grandes

variações, gerando heteroquedasticidade – uma quebra o pressuposto da

homoquedasticidade para análises de regressão – que impede a aplicação dos modelos

de regressão. Por isso, optou-se por trabalhar com as transformações dos valores em

logaritmos de R$ para os tipos de doadores. Os resultados do modelo como um todo e

dos tipos de doadores encontram-se sumarizados na tabela 4 a seguir.

Olhando para as estatísticas do modelo como um todo (segunda parte da tab. 4)

percebe-se que para os três casos os resultados são significativos, com estatística F e

nível de significância indicando validade estatística. Apesar disso, o poder explicativo

dos modelos varia bastante. Na regressão que inclui todos os candidatos, as variações

dos tipos de doadores explicam 33,8% das mudanças nas votações nominais (r2 0,338).

Esse potencial explicativo diminui quando são incluídos no modelo apenas os

candidatos eleitos, caindo para 29,8% de explicação. Por outro lado, a capacidade

explicativa cresce bastante ao se considerar apenas os candidatos derrotados,

passando para 68,1% de determinação sobre o voto.

Tab. 4 – principais estatísticas da regressão entre votos nominais e tipos de doadores

Variáveis explicativas

Todos Eleitos Não-eleitos

B Sig. B Sig. B Sig.

Log. TPartido 12.067,51 0,000 3.736,03 0,491 7.704,17 0,000

Log. PFísica 13.702,35 0,000 8.986,29 0,182 5.329,80 0,014

Log. PJurídica 24.079,37 0,000 20.150,93 0,000 9.654,71 0,000

Log. Recpróprios 410,90 0,000 -3.993,13 0,056 2.543,42 0,001

R2 modelo 0,338 0,298 0,681

Estatística F 67,602 6,480 55,540

Sig. 0,000 0,000 0,000

Analisando os coeficientes individuais das variáveis explicativas, percebe-se que a

relação mais forte se dá entre doações de pessoas jurídicas e votos nominais. É o único

que se apresenta significativo nos três modelos, tendo o maior Beta em todos eles. As

transferências partidárias não são significativas para os eleitos, sendo a segunda em

termos explicativos para os não-eleitos. As transferências de pessoas físicas são menos

fortes para os votos nominais de não-eleitos em relação às transferências partidárias.

Além disso, elas não são significativas para votos nominais dos eleitos. Os recursos

próprios são significativos e positivos para os não-eleitos, porém, ficam no limite da

significância (0,056) para intervalo de confiança de 95%, com coeficiente Beta negativo

no caso dos eleitos. Isso significa a existência de uma relação inversa entre volume de

recursos próprios e votos nominais dos eleitos, quanto mais recursos próprios, menos

votos para os eleitos.

Resultados do teste de regressão mostram um impacto positivo e forte das doações de

pessoas jurídicas para as votações nominais tanto de eleitos, quanto de não-eleitos. Os

demais tipos de doadores apresentam relações distintas para os dois tipos de

candidatos. Entre os derrotados, as transferências partidárias tiveram impacto maior,

seguidas de doações de pessoas físicas e, por último, recursos próprios. Já entre os

eleitos, os resultados não foram estatisticamente significativos para nenhuma das três

modalidades de doadores, embora os coeficientes apontem um peso maior para as

doações de pessoas físicas, seguidas de transferências partidárias. Por último, em

sentido inverso, estão os recursos próprios. Os impactos comparativos podem ser

visualizados no gráfico 2 a seguir. Ele mostra como os tipos de doadores têm impacto

sobre a obtenção de votos nominais, evidenciando a importância de recursos de

pessoas jurídicas para os dois tipos de candidatos, embora, para os eleitos a diferença

de doações de empresas em relação às demais modalidades é maior que entre os não-

eleitos.

Graf. 2 – Relação da participação por tipo de doadores nos votos nominais (log/1000)

Até aqui, ao compararmos grupos distintos (eleitos e não-eleitos) encontramos

algumas similaridades e outras diferenças. A principal similaridade é o efeito das

doações de pessoas jurídicas para os votos nominais dos dois tipos de candidatos,

ainda que para os eleitos esse efeito seja duas vezes maior que para os não-eleitos.

Evidente que essa relação pode carregar um “efeito de memória” em si mesma, em

outras palavras, empresas podem doar mais para candidatos mais conhecidos/viáveis

eleitoralmente e isso potencializaria a obtenção de votos nominais deles. A discussão

aqui não é se um real de empresas tem mais valor que um real de pessoas físicas para

as campanhas individuais, mas qual o efeito que a concentração de determinados

recursos tem sobre os votos nominais obtidos pelos concorrentes. Os testes dividindo

candidatos em dois grupos não permitem responder a questão anterior.

O volume total de recursos para as disputas mostrou-se altamente relacionado com o

resultado eleitoral. Quanto mais dinheiro na campanha, maior a chance de vitória,

independente da região do País em que o candidato se encontre. Sendo assim, a seguir

serão comparados os efeitos dos tipos de doadores sobre todos os candidatos,

subdivididos entre eleitos e não eleitos. Como a substituição da variável dependente

“número de votos nominais” contínua por uma variável dependente binária “eleito ou

não-eleito” viola o pressuposto básico da regressão linear optou-se pelos modelos

logísticos binários a partir daqui. Neles, a variável dependente sempre é binária –

possuir ou não possuir determinada característica. No caso, ter sido ou não eleito,

codificados como 1 (um) e 0 (zero), respectivamente. As variáveis explicativas

continuam sendo as transformações logarítmicas para os totais de recursos oriundos

dos quatro tipos de doadores para as campanhas individuais. Os resultados dos testes

não mostram mais os impacto das variáveis independentes sobre a mudança na

dependente, mas quais as chances de passar de não-eleito para eleito (0 para 1) com a

variação nas unidades das variáveis independentes. A tabela 5 a seguir apresenta os

resultados para todos os candidatos do Brasil.

Tab. 5 – Regressão Binária para tipo de doadores por resultado da disputa Variáveis explicativas

de não-eleito para eleito

Sig. Exp. (B) % chance

Log. T. Partido 0,000 1,937 93,7

Log. P. Física 0,000 2,058 105,8

Log. P. Jurídica 0,000 2,481 148,1

Log. Rec. Próprios 0,005 1,192 19,2

R2 (Cox e Snell) 0,302

Ajuste do modelo 73,7%

O coeficiente de determinação r2 de Cox e Snell para o modelo é de 30,2% (0,302), o

que indica que apenas 1/3 da mudança de não-eleito para eleito é explicada pelo

conjunto de variáveis ligadas ao tipo de financiadores, portanto, a maior parte da

explicação não está contida nessas variáveis. O modelo encontra-se razoavelmente

ajustado, com um percentual de ajuste de 73,7%. Os coeficientes mostram que o tipo

de doador com maior impacto na mudança de não-eleito para eleito foi “pessoa

jurídica”, com 148,1% mais de chances de passar para eleito conforme aumentam as

unidades dessa variável. O menor impacto foi a fonte “recursos próprios”, com apenas

19,2% de chances de mudança para eleito com o crescimento de um log dessa variável.

Demonstrados os diferentes impactos por tipo de doador, resta saber se essas

diferenças são mantidas ou não entre candidatos de diferentes regiões do País. Para

tanto, foram produzidos modelos de regressão logística binária para os concorrentes

de cada uma das cinco regiões brasileiras. A tabela 5 sumariza os principais resultados.

Em relação à capacidade preditiva dos modelos em geral, os ajustes variam de 60,9%

para o Norte, até 82,5% no Sul, indicando razoável força explicativa dos preditores

reunidos. Já os coeficientes de determinação variam bastante entre as regiões. O

menor coeficiente fica na região norte, com 10,4% apenas de determinação, enquanto

o maior fica no Centro-oeste, com 52,7%. As outras três regiões variam de 40,4%,

34,8% e 38,6% para nordeste, sudeste e sul, respectivamente.

Tab. 5 – Regressão binária para tipo de doador por resultado e região do País Norte Nordeste Centro-oeste Sudeste Sul

Log. TPart.

Sig. 0,593 0,011 0,139 0,015 0,529

Exp (B) 1,200 4,294 4,377 1,817 1,290

% chance 20,0 329,4 337,7 81,7 29

Log. PFísic.

Sig. 0,236 0,001 0,694 0,017 0,102

Exp (B) 1,558 6,220 1,530 2,253 3,095

% chance 55,8 522,0 53,0 125,3 209,5

Log. PJuríd.

Sig. 0,163 0,030 0,039 0,000 0,003

Exp (B) 1,562 2,855 8,650 3,117 7,178

% chance 56,2 185,5 765,0 211,7 617,8

Log. R.Próp.

Sig. 0,284 0,002 0,052 0,597 0,345

Exp (B) 1,190 1,792 1,692 1,054 1,204

% chance 19,0 79,2 69,2 5,4 20,4

R2 Cox e Snell 0,104 0,404 0,527 0,348 0,386

Ajuste do Modelo 60,9% 78,5% 82,2% 77,9% 82,5%

A tabela 5 acima permite comparar os efeitos em percentuais de chances de mudança

do grupo de não-eleitos para eleitos tanto entre as regiões do País, quanto a

participação de cada tipo de doador em uma mesma região. Por exemplo, a

participação das transferências dos partidos políticos tem um impacto maior na região

centro-oeste (337,7% de chance) e nordeste (329,4% de chance) do que nas demais

regiões. Assim, se olharmos apenas para a coluna dos resultados da região norte,

perceberemos que os percentuais de chance de eleição aumentam com o crescimento

da participação de pessoas jurídicas (56,2% de chance a mais) e pessoas físicas (55,8%

de chance a mais) de se eleger do que das outras duas fontes de recursos.

Começando a análise pelos níveis de significância dos tipos de doações por região,

percebe-se que no norte nenhum dos coeficientes é significativo – todos ficam acima

de 0,050. No nordeste, todos são significativos. No centro-oeste, apenas pessoas

jurídicas e recursos próprios são significativos. No sudeste, apenas recursos próprios

não apresenta significância estatística. Por fim, na região sul, recursos de pessoas

jurídicas são os únicos com relação significativa com a variável ter sido ou não eleito

deputado federal. As diferenças nos níveis de significância das variáveis em cada um

dos modelos mostra que não é possível comparar diretamente os efeitos dos recursos

sobre os votos e, por consequência, sobre a eleição de candidatos de todas as regiões

do País. Quando não se consideram as distinções, os efeitos acabam se anulando e

encobrindo as reais relações entre dinheiro e voto. Por exemplo, na região norte, o

efeito do montante de recursos e do tipo de doadores é bem menor que na região

sudeste, o que não significa que não haja monetarização das campanhas no Norte. Ao

contrário, mostra que as diferenças de recursos totais e da origem dos recursos são

menores entre eleitos e derrotados do que no sudeste.

Dando continuidade à análise dos efeitos individuais dos tipos de financiadores por

resultado eleitoral e região do País, a menor chance de ocorrência (no caso de a

eleição do candidato) foi de recursos próprios na região sudeste, apenas 5,4% de

chance. Em seguida, os menores efeitos são de transferências partidárias no Norte,

com 20,0% e recursos próprios na região sul, com 20,4%. Já os maiores efeitos foram

para doações de pessoas jurídicas no centro-oeste, com 765,0% de chances a mais de

ser eleito conforme aumento o log. de doações dessa fonte e 617,8% para pessoas

jurídicas na região sul. Em seguida estão as doações de pessoas físicas no nordeste

com 522,0% de chance a mais.

Em resumo, pode-se dizer que no norte – uma região menos desenvolvida

economicamente - os recursos de campanha explicam menos a eleição de um

deputado federal. A explicação, nesse caso, está em outras variáveis que não a

monetarização da campanha. No nordeste, embora também seja menos desenvolvido

economicamente, os recursos de campanha apresentam maiores índices explicativos

para o desempenho dos candidatos, com destaque para os impactos de doações de

pessoas físicas e de transferências partidárias para os eleitos. O centro-oeste foi a

região que apresentou os maiores impactos dos tipos de financiadores, com

predomínio das transferências de pessoas jurídicas para a eleição de deputados

federais. Em segundo lugar ficaram as transferências partidárias. Algo parecido

aconteceu na região sul, com forte predomínio do impacto das doações de pessoas

jurídicas sobre os eleitos, porém, com a diferença de que nessa região as

transferências partidárias não impactaram nos resultados das disputas. O sudeste foi a

região onde os tipos de doadores apresentaram efeitos mais proporcionais. As

transferências partidárias tiveram impacto um pouco menor que as doações de

pessoas físicas, que por sua vez ficaram um pouco atrás das doações de empresas.

Logo abaixo, o gráfico 3 permite visualizar todos esses impactos comparativamente.

Graf. 3 – Comparação dos % de chance de eleição para tipo de doador por região do País

A imagem acima deixa claro que o tipo de doador tem impacto distinto nas disputas

para deputado federal em todas as regiões do País. Excetuando o Norte, onde as

diferenças são pequenas e pouco significativas, nas outras quatro existem relações

entre origem do recurso e maior chance de eleição. No nordeste, essa relação favorece

as doações de pessoas físicas, pois são elas que apresentam maior impacto no

resultado de eleição. Nas outras três regiões (centro-oeste, sudeste e sul), embora em

proporções distintas, as doações de pessoas jurídicas são as que mais explicam o

resultado positivo para os candidatos.

Para finalizar a análise proposta neste paper, é possível pensar em uma relação entre o

volume de recursos totais nas campanhas e a maior importância de doações vindas de

empresas. O princípio geral é que o volume de recursos doado por pessoas físicas

sempre é menor que o das empresas e que em regiões onde existam mais empresas

ou onde elas estejam mais dispostas a fazer doações, as receitas dos candidatos

crescem de maneira exponencial, gerando as desigualdades nas condições de eleição.

A tabela 6 a seguir mostra as médias, medianas e desvios dos recursos arrecadados

pelos candidatos a deputado federal em 2010, separando-os entre eleitos e não-

eleitos. Nela, fica evidente que nas regiões de maior importância de doações de

pessoas jurídicas (centro-oeste, sul e sudeste) as diferenças entre eleitos e não eleitos

são substancialmente maiores do que no norte e nordeste.

Tab. 6 – Medidas de tendência central e dispersão das receitas de candidatos por região e resultado (em milhares de reais)

Região Resultado Média Mediana Desvio Padrão

NORTE Não-eleito 989,58 15,47 225,36

Eleito 700,98 567,03 582,11

NORDESTE Não-eleito 750,64 9,00 193,55

Eleito 771,24 586,98 624,35

CENTRO-OESTE Não-eleito 148,58 25,94 378,33

Eleito 1.869,96 1.689,40 1.105,03

SUDESTE Não-eleito 90,28 8,12 287,45

Eleito 1.468,42 1.191,77 1.102,16

SUL Não-eleito 110,44 7,69 446,61

Eleito 1.045,52 966,81 740,44

A menor diferença entre os recursos recebidos pelos eleitos e não-eleitos se dá no

nordeste, onde as médias de Reais declarados por candidato em cada grupo são muito

próximas (R$ 750,6 mil para derrotados, contra 771,2 mil para eleitos). Mas, como os

desvios são muito grandes, essas médias não representam nada. Melhor é analisar a

partir das medianas, que dividem os conjuntos em dois grupos com mesmo número de

candidatos cada um. No nordeste, o valor que separa a metade que recebeu menos da

que recebeu mais entre os derrotados é de R$ 9 mil reais, enquanto que entre os

eleitos a metade com menos recursos ficou em até R$ 586,9 mil reais. Ou seja, a

mediana dos recursos arrecadados pelos eleitos do nordeste é 65 vezes maior que a

mediana dos derrotados. Na região norte, a relação entre as medianas é de apenas 36

vezes em favor dos eleitos (mediana de R$ 567,0 mil para R$ 15,47 mil entre eles). No

centro-oeste a diferença entre as medianas fica em 65 vezes. O sudeste é a região que

apresenta a maior diferença entre medianas de receitas dos eleitos e não-eleitos,

passando de 148 vezes. Em seguida vem a diferença de medianas na região sul, em

138 vezes a mais em favor dos eleitos, contra os derrotados.

Voltando para as médias, percebe-se que as diferenças de médias entre eleitos e não-

eleitos no norte e nordeste são muito pequenas, inclusive na região norte os

derrotados apresentaram uma média de recursos maior que os eleitos. Já nas outras

três regiões - centro-oeste, sudeste e sul – as médias de recursos individuais dos

candidatos eleitos são cerca de 10 vezes maiores que as médias de arrecadações dos

derrotados.

3. Notas Conclusivas

A primeira conclusão possível a partir da discussão feita anteriormente é que assim

como em eleições majoritárias, na disputa proporcional para Deputado Federal em

2010 os recursos financeiros de campanha apresentaram forte relação com a obtenção

de votos pessoais. Com isso, não se pretende afirmar a existência de uma relação

determinista, tal qual: quanto mais dinheiro, mais voto individual e maiores chances

de vitória. Em primeiro lugar porque os votos pessoais não são garantia de vitória.

Apenas cerca de 5% dos deputados federais são eleitos com seus próprios votos. Nove

em cada dez parlamentares dependem em parte dos votos obtidos pelos demais

candidatos do partido ou da coligação. No entanto, maior número de votos individuais

coloca o concorrente nas primeiras posições da lista partidária. No entanto, é preciso

considerar os altos coeficientes positivos da regressão entre volume de recursos

declarados e votos obtidos nas eleições de 2010. Na média, os eleitos declararam ter

recebido cerca de cinco vezes mais recursos para campanha do que os derrotados.

Em segundo lugar, assim como já constatado nas eleições majoritárias para prefeitos

de capitais do Brasil em 2008, a origem dos recursos também tem uma forte relação

com a obtenção de votos pessoais. Candidatos que recebem maiores percentuais de

doações de pessoas jurídicas tendem a converter os recursos em mais votos do que os

de pessoas físicas, doações de partidos políticos e utilização de recursos próprios.

Assim, concorrentes que recebem mais financiamento de pessoas jurídicas têm

montante de recursos maior à disposição da campanha e tendem a estar mais

presentes no grupo dos eleitos.

Por fim, o “achado” relevante do paper pode ser definido como o fato de que em se

tratando de financiamento de eleições nacionais não é possível fazer comparações

sem ponderação de todo o território nacional. Devido as desigualdades de

desenvolvimento e de poder econômico dos Estados de diferentes regiões, é preciso

considerar que o impacto dos recursos financeiros em campanhas eleitorais também

será distinto. Essa distinção se dá inicialmente em relação ao montante de recursos.

Enquanto no nordeste a média de recursos dos eleitos é significativamente menor que

a média do sudeste e centro-oeste, esta última região apresenta as maiores médias de

arrecadação de recursos financeiros candidatos eleitos e derrotados do país. Há

também diferenças na composição dos recursos dos candidatos por região. No centro-

oeste e no sul o peso das doações de pessoas jurídicas para eleição de um deputado

federal é muito maior que na comparação com as demais regiões. No sudeste também

predominam as doações de pessoas jurídicas, embora a diferença destas para pessoas

físicas seja bem menor. Já o nordeste é a única região onde as doações de pessoas

físicas têm maior peso na obtenção de votos individuais dos eleitos. Já na região norte

o peso das doações de pessoas jurídicas e físicas é equivalente, não apresentando

diferenças significativas.

Uma ressalva importante aos “achados” diz respeito à opção de tratamento dos dados

por regiões e não por Unidades da Federação, que são os distritos eleitorais nos quais

se elegem as bancadas de deputado. Apesar de reconhecer que as diferenças por

Estado podem gerar explicações mais ricas e detalhadas sobre o efeito comparativo da

monetarização das campanhas, a opção pelas regiões deveu-se às limitações que um

baixo número de casos por Unidade da Federação geraria para as técnicas de análise

utilizadas no trabalho – na maioria dos casos inviabilizando as análises de regressão

realizadas aqui.

As notas conclusivas desse trabalho exploratório demonstram que ainda existem

questões a serem respondidas sobre o impacto das doações e do financiamento de

campanha para o desempenho eleitoral. Um dos desdobramentos necessários é a

análise por Unidade da Federação, que, como antecipado acima, além de apresentar

grande variabilidade dentro das regiões é, em última análise, o distrito eleitoral no

qual os concorrentes fazem campanha para obter uma vaga à Câmara de Deputados.

4. Referências bibliográficas

CERVI, Emerson U. Financiamento de Campanha e desempenho eleitoral no Brasil: análise das contribuições de pessoas jurídicas, físicas e partidos políticos às eleições de 2008 nas capitais de Estado. Revista Brasileira de Ciência Política, nº 4, julho-dezembro 2010. P. 135-167.

PEÑA, Ricardo. El Número de Autonomías y La Competitividad Electoral. Politica y Cultura, otoño, 2005. N. 24 p. 233 a 255.

SANTOS, Rodrigo D. Grandes empresários e sucesso eleitoral nas eleições de 2002, 2006 e 2010. Paper apresentado no 35º Encontro Anual da Anpocs, Caxambu-MG, 2011.

SPECK, Bruno W. & MANCUSO, Wagner P. O financiamento político nas eleições brasileiras de 2010: um panorama geral. Paper apresentado no 35º Encontro Anual da Anpocs, Caxambu-MG, 2011.

TAAGEPERA, Rein e SHUGART, M.S. Shugart. Seats & Votes: The effects & determinats of Electoral Systems. New Haven: Yale University Press, 1989.

Website consultado:

www.tse.gov.br