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  • 7/31/2019 Vfinal Ensaio Escrito Kodaly Ana 29jan2012

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    Mestrado em Ensino da Educao Musical no Ensino Bsico

    20011 / 2012

    Ensaio escrito

    Pedagogia Musical de Kodly

    Unidade Curricular: Correntes de Pedagogia

    Docente: Helena Caspurro

    Ana Isabel Santos | n 33269

    29 de Janeiro de 2012

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    NDICE

    1.BREVECONTEXTUALIZAOHISTRICO-PEDAGGICA 2

    2.CONCEITODELITERACIAMUSICAL 3

    3.PROCESSOEDESENVOLVIMENTODAAPRENDIZAGEM 4

    3.1.SEQUNCIADEAPRENDIZAGEM 4

    3.2.DESENVOLVIMENTODALITERACIAEVOCABULRIOMUSICAL 5

    4.ENSINO,INTERACOECOMUNICAOEMSALADEAULA:TCNICASESPECFICAS 6

    5.IMPLICAESEAPLICAESPARAAEDUCAOMUSICALNOENSINOBSICO 8

    6.PAPELEFUNESDIDCTICASDOSCANCIONEIROS 9

    REFERNCIAS BIBLIOGRFICAS 11

    SITESCONSULTADOS 11

    ANEXOS 12

    ANEXO 1. TCNICA DE GESTOS MANUAIS 12

    ANEXO 2. SISTEMA DE SLABAS RTMICAS 13

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    1.Brevecontextualizaohistrico-pedaggica

    O processo revolucionrio da educao, iniciado na viragem do sc. XVIII com a reflexo de pedagogos

    como J. J. Rousseau (1712-1778), em Frana, e J. H. Pestalozzi (1746-1827), na Sua, manteve-se ao longo

    dos sculos seguintes, dando origem a vrias correntes pedaggicas, como o mtodo de M. Montessori (1870-1952), que serviu de base a vrios estudos sobre o desenvolvimento psquico da criana (Torres, pp.37-38).

    A msica passou a assumir-se tambm como uma componente importante na formao do indivduo,

    sendo integrada no ensino genrico das escolas da maioria dos pases, ao longo dos scs. XIX e XX,

    proporcionando um espao de reflexo a vrios msicos e pedagogos para a aplicao de mtodos ou

    conceitos de literacia musical, tendo em conta os conhecimentos ento existentes sobre a psicologia e

    pedagogia infantil (idem, p. 39).

    Podem apontar-se como exemplos os trabalhos, princpios e mtodos desenvolvidos por Justine Ward(1879-1975), Edgar Willems (1890-1978), Carl Orff (1895-1982), Jacques-Dalcroze (1855-1950) e Zoltan

    Kodly (1882-1967).

    Para melhor compreender a extenso do trabalho desenvolvido por este ltimo, h que contextualizar os

    seus esforos na Hungria poltica e cultural da poca: o pas estava ligado poltica e economicamente ustria

    e monarquia de Hapsburg; a msica vienense dominava o cenrio musical das classes altas; a lngua falada

    pelos hngaros instrudos era o alemo; no Conservatrio (actualmente, Academia Franz Liszt), os mtodos de

    ensino eram alemes, as obras preferencialmente estudadas e executadas eram alems, o material utilizado

    para ensinar os mais novos derivava de melodias alems com letras pobremente adaptadas em hngaro ou de

    melodias novas com nenhuma semelhana com as melodias tradicionais; e, at os professores eram alemes

    ou austracos (Choksy, p.3; Cruz 1988, p.11).

    A forte vontade de preservao da identidade nacional levou Kodly, juntamente com Bartk, a seguir

    contra a corrente, procurando reconstruir a cultura musica hngara, abandonada e escondida durante sculos

    pela influncia de sucessivos invasores. Os dois amigos e colegas iniciaram, no princpio do sculo XX, um

    trabalho metdico e cientfico de recolha, anlise e classificao de melodias folclricas do seu pas, o qual

    catalisou o processo da redescoberta da msica nacional.

    Tanto Kodly como Bartk passaram a integrar as canes populares hngaras nas suas composies,

    desenvolvendo um novo estilo de composio, uma nova msica. Em simultneo, o pblico em geral no

    tinha muita compreenso em relao a este gnero de msica e, principalmente, Kodly ficou interessado em

    escrever para crianas. medida que ia escrevendo peas para coros de crianas, foi-se apercebendo que estas

    tinham dificuldade na leitura musical, da ter comeado a reflectir sobre como seria possvel alterar esta

    situao por forma a que fossem capazes de ler e compreender msica atravs do canto e da audio. Este foi

    o ponto de partida para o desenvolvimento das suas ideias sobre educao musical (Rodrigues, p.18).

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    Um dos ditos mais divulgados de Kodly mostra a sua convico sobre o facto de a msica ser de todos e

    para todos e da obrigao de aproximar a populao das artes e vice-versa. Esta ideia levou-o a orientar e a

    coordenar os esforos de muitos dos seus alunos de composio e etnomusicologia, formando uma equipa

    que, em poucos anos, alargou a Educao Musical a toda a populao escolar do pas. Kodly continou a

    incentivar a produo de material didctico por parte de outras pessoa e ele prprio visitou regularmente

    escolas e supervisionou essa produo, com o intuito de permitir a literacia musical de todos (Cruz 1998, p.3).

    2.Conceitodeliteraciamusical

    Segundo Cruz (ibidem), tm existido vrias maneiras de rotular o trabalho que Kodly desenvolveu no

    campo da educao musical, mas um dos mais apropriados ser aquele utilizado no Zoltn Kodly

    Pedagogical Institute of Music, em Kecskemt, cidade natal do prprio - Pedagogia de Kodly. Alis, os

    professores que a leccionam defendem que no se pretende uma cristalizao das ideias que foram

    revolucionrias na sua gnese e que estas devem ser contextualizadas temporal e geograficamente.Atravs dos escritos deixados por Kodly, alguns datados do incio do sc. XX, possvel elencar as

    ideias base da sua filosofia de educao, e at mesmo de uma filosofia de vida, algo desconcertante pela sua

    actualidade (Choksy, p.11):

    1. a literacia musical algo que todos podem e devem usufruir;

    2. o canto o alicerce de toda a educao musical;

    3. a educao musical deve comear na infncia;

    4. as canes tradicionais da cultura de cada pas so a lngua-natal musical das crianas e devem ser o

    veculo para a sua instruo musical;

    5. apenas msica de alto valor artstico (tradicional ou composta) deve ser utilizada no ensino.

    Ao contrrio de outros pedagogos, Kodly delegou, em parte, o desenvolvimento destas ideias a colegas,

    amigos e estudantes, nos quais se incluam Bela Bartk, Jen Adm, Benjmin Rajeczky, Gyorgy Krnyi,

    Antal Molnr, Lszlo Lajtha e Lajos Bardos (Choksy et al., p.51).

    No entanto, no deixou de acentuar a importncia da utilizao do d-mvel no treino musical e o valordo pentatonismo como ponto de partida para a instruo musical (Choksy, p. 8), o que ser abordado mais

    frente.

    Resumidamente, a pedagogia desenvolvida apoiava-se (e apoia-se) no seguinte material bsico (Torres,

    p.44):

    1. msica tradicional de lngua materna;

    2. msica tradicional estrangeira que apresente semelhanas com a do seu pas;

    3. msica erudita de qualidade, dando a conhecer a literatura musical hngara e de outros pases;

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    4. organizao cuidadosa de todo o material didctico por graus de dificuldade, sendo que o mesmo

    material poderia ser reutilizado em diferentes nveis de aprendizagem para aprendizagem de novos

    conceitos.

    No se pode aqui deixar de referir as mltiplas facetas de Kodly como linguista, comunicador,

    violoncelista, maestro, compositor, filsofo, crtico musical, politico cultural, etnomusiclogo e pedagogo,

    bem como o seu enorme legado como escritor em reas como a formao musical, msica e danas

    folclricas, etnografia ou histria da msica.

    No mbito da pedagogia, destacam-se 3 escritos que fazem parte do captulo III do Livro The selected

    writings of Zoltn Kodly (Bnis 1974), nomeadamente Ancient Traditions Todays Musical Life (1951),

    onde o pedagogo prope um plano para a eliminao da iliteracia musical, A Hundred Year Plan (1947), no

    qual estabelece um plano de implementao de um sistema eficiente de educao musical, e Music in the

    Kindergarten (1941), onde evidencia a importncia desta educao na pr-escola (Cruz 1998, p.8).

    3.Processoedesenvolvimentodaaprendizagem

    Kodly defendia que as crianas deviam descobrir a msica tradicional e as obras-primas por meio de

    uma sequncia iniciada no canto e conduzida at ao desenvolvimento de indivduos independentes

    musicalmente, capazes de ler e escrever msica com facilidade (Choksy et al., p.51).

    Neste captulo, aborda-se esse processo em detalhe e procura-se clarificar o papel do corpo, da audio,

    do canto e da prtica instrumental no desenvolvimento da literacia e vocabulrio musical enquadrados nesta

    pedagogia.

    3.1.Sequnciadeaprendizagem

    O processo de ensino/aprendizagem que se desenvolveu nas escolas hngaras teve, paralelamente a

    Kodly, fortes influncias de outros educadores como Pestalozzi e Kestenberg (1882-1962), ou at mesmo de

    Piaget (1896-1980), assumindo como base de trabalho a ideia de que a prtica musical antecede o uso dos

    smbolos, sempre na direco do concreto para o abstracto (Choksy, p.10).De acordo com Choksy (ibidem), a sequncia pedaggica para uma aprendizagem em qualquer nvel

    define-se do seguinte modo: ouvir cantar escrever ler criar. J Cruz (1985, p.6), refere a sequncia

    ouvir cantar ler escrever.

    No entanto, ambos concordam na enorme importncia dada ao canto como centro do conceito de

    educao desenvolvido por Kodly, bem como na ideia subjacente de que a teoria musical (ler e escrever) s

    pode aparecer depois da prtica musical, sendo esta a nica forma de dar sentido a explicaes tericas.

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    3.2.Desenvolvimentodaliteraciaevocabulriomusical

    Na Hungria, o mtodo de Kodly s aplicado a partir dos 3 anos, embora alguns seguidores nos EUA

    o faam com bebs, mas so excepes. Este pedagogo dizia que se a criana no fosse inundada, pelo menos

    uma vez, pela corrente musical entre os seis e os quinze anos, muito dificilmente a msica lhe viria a ser dealguma utilidade (Cruz 1988, p.10).

    De todas as competncias musicais, Kodly destaca a audio interior como uma das mais importantes e

    que consiste na capacidade de pensar os sons antes de os produzir. Tal como a memorizao, este tipo de

    audio tambm pode ser desenvolvida atravs de vrias tcnicas, sendo uma das mais recorrentes com

    crianas o jogo do esconder a cano, no qual, a um sinal do professor, as crianas continuam a cantar a

    cano interiormente, mantendo a pulsao regular.

    Ainda neste mbito, o prprio Kodly dizia que qualquer pessoa devia ser capaz de ler msica como l

    um livro: em silncio, mas imaginando o som (Kodly 1954, p.204 citado em Cruz 1995, p. 6). A tcnica

    central neste processo de desenvolvimento da audio interior consiste na solmizao relativa, funcionando,

    em simultneo, como utenslio para a aprendizagem da leitura e escritas musicais.

    Num contexto Kodlyiano, o movimento surge como acompanhamento natural do canto, j que o corpo

    se relaciona mais facilmente e naturalmente com a msica produzida por si do que com fontes externas, como

    gravaes, por exemplo.

    Estes movimentos vo evoluindo em complexidade conforme a idade das crianas: na idade pr-escolar,

    comeando com aces simples (andar, correr, saltar), utilizando percusso corporal para enfatizar aspectos

    rtmicos (joelhos, mos), realizando jogos ou passos tradicionais simples em canes especficas; com os mais

    velhos, usando movimentos, coreografias e jogos mais complexos, tais como a escolha de pares, as danas em

    crculo, em linha ou a formao de arcos, por exemplo (Choksy, p.41).

    Tal como j foi referido, o canto surge em Kodly como a pedra basilar, citando-se a este propsito uma

    frase que usou repetidas vezes: Devemos direccionar grandes massas para a Msica. Uma cultura

    instrumental nunca poder ser uma cultura de massas (...). Tem na sua garganta um instrumento com um

    timbre muito mais rico do que qualquer violino do mundo, se souber us-lo. (Cruz 1988, p.10).

    O acto de cantar confere uma vivncia mais completa porque todo o corpo participa - atravs do

    movimento ou ponto de vista fisiolgico (respirao e ressonncias interiores) -, facilitando o

    desenvolvimento da audio interior, codificando e transmitindo emoes, criando relaes emocionais.

    Por outro lado, e graas ao canto, as crianas/jovens adquirem uma aptido para a leitura que lhes

    permitir, mais tarde, aceder mais facilmente s obras de referncia dos chamados gnios musicais e

    conhecer composies em menos tempo e com menor esforo.

    Refira-se ainda que Kodly defendia o ensino das canes sem recorrer ao piano como acompanhamento,apontando as seguintes razes: o uso continuado do piano impede as crianas de gozar e trabalhar a

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    independncia no canto; impede a natural descida na afinao da melodia; e a afinao temperada do

    instrumento no contribui para uma entoao correcta.

    No que respeita aprendizagem instrumental, Kodly afirmava que uma criana no deveria comear a

    aprender um instrumento sem antes saber ler msica (Szonyi, p.14) e defendia a importncia de se conhecer

    apriori muito repertrio musical, a fonte de vocabulrio para a compreenso musical do que se iria tocar. Esta

    compreenso, que engloba a audio, leitura e escrita musical, deveria corresponder ao nvel de dificuldade do

    repertrio instrumental.

    Numa palestra intitulada O que um Bom Msico?, Kodly observou que este deveria ter um ouvido,

    uma inteligncia, um corao e uma mo bem treinados, e que estas caractersticas deveriam ser

    desenvolvidas em constante equilbrio, ou seja, no interessa s ter uma mo bem treinada quando se constata

    que se conseguem os mesmos resultados, em menos tempo e com menos esforo, se forem atendidas as

    restantes trs (Cruz 1995, pp.5-6).

    4.Ensino,interacoecomunicaoemsaladeaula:tcnicasespecficas

    A pedagogia de Kodly tem a caracterstica nica de ter sido desenvolvida no s pela experincia de

    observao em sala de aula, mas tambm pelos contributos de ideias e tcnicas de outros sistemas

    educacionais.De Inglaterra, e por ter constatado a qualidade excepcional de muitos coros em Inglaterra, Kodly levou a

    tcnica da solmizao relativa, desenvolvida por Sarah Glover (1786-1867) e John Curwen (1816-1880), que

    consistia num sistema de sinais manuais com correspondncia a slabas funcionais do solfejo (sistema do d

    mvel ou Tonic sol-fa).

    Nesse sistema, cada grau da escala tem um nome que no corresponde a uma altura especfica, o que

    revela ser um meio eficiente para entender a funo de cada grau em vrias tonalidades, uma vez que a tnica

    funciona como uma ncora aural para a dominante, subdominante e restantes funes tonais, ou seja, as

    slabas da solmizao designam a relao dos sons entre eles (ver Anexo 1).

    Kodly no fez nenhuma referncia especfica ao uso de sinais manuais nos seus escritos, mas estes

    aparecem pela primeira vez impressos num livro de Jeno Adm a pedido do prprio Kodly. Actualmente,

    estes gestos foram largamente difundidos, funcionando como um bom sistema de representao visual das

    relaes tonais e de memorizao de padres meldicos (Choksy, p.10).

    O pedagogo considerava que o processo de solmizao relativa facilitava a transposio e adaptava-se

    melhor s vozes dos cantores, tendo desenvolvido vrios cadernos pedaggicos para interiorizao dos

    intervalos, por meio de um sistema lgico que desenvolvia o ouvido interno e a entoao exacta do canto. As

    combinaes intervalares aplicadas por ele so em tudo semelhantes aos algoritmos conhecidos no ensino daslnguas estrangeiras, onde cada motivo retomado diversas vezes em lugares diferentes, dando, assim,

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    inmeras oportunidade s crianas de reconhecer, comparar, corrigir e memorizar (Kokas 1982, p.1 citada em

    Cruz 1995, p. 7).

    Outra das adaptaes realizadas, e que usada como tcnica em Kodly, deriva do trabalho do msico e

    professor francs Emile-Joseph Chev (1804-1864) e consiste num sistema de slabas rtmicas como forma

    de expressar correctamente as duraes em voz audvel que auxilia a leitura e escrita de ritmos (ver Anexo

    2).

    Este sistema ajuda as crianas a interiorizar o ritmo como som e amplamente utilizado em nveis mais

    baixos de aprendizagem. Da aplicao deste mtodo, observou-se que, na Hungria, no correspondente ao 4

    ano, as crianas j conseguem ler melodias com o ritmo correcto sem antes terem de o cantar (Choksy, p.10).

    A sequncia pela qual o ritmo e as frases meldicas devem ser introduzidas tambm foi especificada por

    Kodly.

    Obviamente, este sistema no escusa os alunos de aprenderem o nome real das figuras, que ajuda a

    identificar, classificar e discutir aspectos rtmicos, isto , um no incompatvel com o outro, mas o primeiro

    permite uma flexibilidade muito maior na aprendizagem.

    Paralelamente a este sistema, pode ainda ser utilizado um sistema de notao numrica, no qual os

    nmeros so atribudos ao grau da escala e utilizados na aprendizagem e canto de intervalos/melodias ou para

    indicar o baixo, terceira ou quinta dos acordes quando so cantados (Szonyi, p.20).

    Da Sua, mais precisamente do trabalho de Emile Jacques-Dalcroze, Kodly incorporou certos aspectos

    da Eurritmia, como sejam as aces de andar na pulsao, bater ritmos corporalmente ou realizar ostinatos

    rtmicos, com a particularidade de serem exerccios aplicados sem acompanhamento ao piano, s com o canto,

    ao contrrio do mtodo de Dalcroze, e pelas razes que j foram apontadas no captulo anterior.

    Actualmente, na Hungria, o piano s utilizado em exerccios para a compreenso do conceito de rpido

    e lento, em pulsaes regulares. De Dalcroze tambm utilizada a escala do mesmo nome vrias escalas

    pentatnicas cantadas ascendente e descendentemente, com incio e fim na mesma nota (idem, pp.22-23).

    Sobre o uso do pentatonismo, Kodly sublinha que a instruo musical deve comear por a,

    especialmente porque as crianas no tm que se preocupar com meios-tons, conseguindo, deste modo, umaentoao correcta mais rapidamente.

    Todas as tcnicas e sistemas referidos so utilizados em sala de aula para pr em prtica os princpios da

    pedagogia de Kodly, numa linha de evoluo de complexidade. Por exemplo, os alunos devem iniciar a

    prtica musical com repertrio pentatnico, depois com o modal e diatnico at chegarem ao atonalismo, do

    mesmo modo que os elementos meldicos e rtmicos devem ser introduzidos progressivamente at se chegar

    leitura e grafismo musical. Szonyi descreve em pormenor os elementos musicais e a ordem pela qual

    costumam ser ensinados de acordo com os princpios de Kodly (pp. 30-31).

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    5.ImplicaeseaplicaesparaaEducaoMusicalnoEnsinoBsico

    De acordo com Kodly, o essencial na concepo do ensino da msica a educao esttica: a msica no

    centro da educao da criana. O facto de cantar, de fazer msica de modo activo, torna possvel, pelo

    desenvolvimento sistemtico das capacidades, a assimilao do contedo da arte e tambm o aperfeioamentoautnomo das suas capacidades (Kokas 1982, p.1 citada em Cruz 1995, p.8).

    Nos seus escritos, destacou variadas vezes a importncia da utilizao, nos primeiros anos do ensino da

    msica (pr-escolar e incio do ensino bsico), de repertrio adequado a cada pas, isto , msica tradicional

    nacional ou composta a partir dela. A prioridade seria d-la a conhecer s crianas antes das msicas

    tradicionais de outros pases ou grupos culturais (Cruz 1998, p.3).

    Assim sendo, o enquadramento curricular destes princpios comea na utilizao das canes tradicionais

    como principal ferramenta de ensino. Aps serem introduzidos os rudimentos fundamentais a partir destascanes em lngua materna, as crianas podero ento ser apresentadas a obras consideradas geniais da msica

    erudita, que representam uma fonte inesgotvel para uma slida educao musical (Szonyi, p.14, 30).

    Por outro lado, o desenvolvimento do vocabulrio musical e das competncias musicais (canto, ritmo,

    sentido da forma, audio meldica, audio interior, memria musical, leitura e escrita) deve ser feito em

    ligao com o material musical em estudo, sempre adequando a tessitura e a letra s faixas etrias.

    Neste contexto, o professor deve ser, antes de mais, um bom msico, que encara o acto de ensinar msica

    como uma actividade musical, colando-se lgica interna da prpria msica. Conclui-se que o ensino da

    msica deve ser proporcionado por professores especialistas e no generalistas, e que estes devem ter em

    conta os objectivos adequados aos anos que leccionam, os contedos a seleccionar, o melhor material e

    mtodo a utilizar.

    Qualquer adaptao do mtodo de Kodly deve ter em ateno as particularidades do repertrio

    tradicional nacional e a sua aplicabilidade, o que exige um conhecimento algo profundo das tcnicas utilizadas

    e uma comparao com o material deixado por Kodly e o modo como aplicado. No se deve correr o risco

    de dar demasiado nfase a certos elementos em detrimento de outros, como verificou Szonyi nas suas viagens

    a alguns pases que aplicavam incorrectamente o mtodo.

    No caso portugus, as tcnicas apresentadas pela pedagogia de Kodly podem ser um valioso contributo

    no ensino das canes tradicionais, conforme apresentado no livro de Rosa Torres, que aplica actividades

    observadas nas escolas hngaras em material retirado dos cancioneiros portugueses. Estas actividades

    baseiam-se no desenvolvimento meldico, na improvisao meldica, no desenvolvimento rtmico e auditivo,

    na leitura musical, na transposio e na forma (pp. 57-75).

    laia de exemplo, refira-se o que sugerido numa actividade de desenvolvimento rtmico: os alunos

    devem trabalhar previamente as frases rtmicas da cano com as respectivas slabas rtmicas, atravs decartes apresentados pelo professor, e usando um carto para cada compasso; com os vrios cartes seguidos,

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    um em cada aluno, o professor pode apresentar todo o ritmo da cano; logo que possvel, o ritmo aplicado

    aos sons anteriormente estudados, iniciando-se uma prtica global (Torres, p.58).

    6.PapelefunesdidcticasdosCancioneiros

    Em Portugal, o movimento de preocupao com a msica popular tem incio na transio entre o sc. XIX

    e XX, com as transcries musicais a serem realizadas por via oral. Este mtodo no continha o registo de

    pormenores rtmicos ou meldicos mas os resultados deram origem a documentos importantes enquanto

    memria da msica portuguesa, h sculos inalterada nos meios rurais. Desta poca ficaram os registos de

    autores como Csar das Neves, Gonalo Sampaio, Antnio Marvo ou Armando Lea (idem, p.28).Apenas em meados do sc. XX, com a possibilidade de registos udio, que surgem trabalhos pioneiros

    em termos de etnomusicologia, nos quais as canes so muitas vezes acompanhadas de um estudoetnogrfico e anlise musical, como acontece relativamente s recolhas de Rodney Gallop, Verglio Pereira,

    Fernando Lopes-Graa, Michel Giacometti em colaborao com este ltimo, e Joo Ranita Nazar.

    Apontam-se de seguida alguns exemplos de Cancioneiros portugueses (idem, pp.30-34):

    - Cancioneiro Minhoto (Sampaio, G., 1991);

    - Cancioneiro Musical de Vilarinho da Furna (Dias, M., 1983);

    - Cancioneiro Popular Portugus (Giacometti, M., e Lopes-Graa, F., 1981);

    - Cancioneiro de Cinfes (Pereira, V., 1950);

    - Cantares do Povo Portugus (Gallop, R., 1960);

    - Cancioneiro Alentejano (Mavo, A., 1955);

    - Cancioneiro Tradicional e Danas Populares Mirandesas I (Martins, F., 1987).

    Fernando Lopes-Graa, que dedicou a sua vida recolha e tratamento da cano tradicional portuguesa,

    considera que esta contm as razes musicais que definem a cultura do povo portugus e uma realidade

    especfica, revestida de caractersticas especiais, que revela a tradio e a vida do povo. Referindo-se

    importncia deste tipo de cano, Lopes-Graa afirma que esta (citado em Weffort 2006, p.24):

    companheira da vida e de trabalhos do povo portugus, a cano segue-o do bero at ao tmulo,

    exprimindo-lhes as alegrias e as dores, as esperanas e as incertezas, o amor e a f, retratando-lhe

    fielmente a fisionomia, o gnero de ocupaes, o prprio ambiente geogrfico, de tal maneira ela, a

    cano, o homem e a terra, onde uma floresce e o outro labuta, e ama, e cr, e sonha, e a que entrega por

    fim o corpo, formam uma unidade, um todo indissolvel. Nasce uma vergntea na famlia, e logo a me

    acalenta o novo nado, cantando-lhe suavemente: Vai-te embora, papo, de cima desse telhado, deixa

    dormir o menino um soninho descansado...

    As canes tradicionais apresentam normalmente uma linguagem simples e os textos de pendor afectivoou ambincia familiar torna-as, na maior parte das vezes, mais motivantes e compreensveis que outras

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    canes. No se deixe de referir que apesar de muitas delas serem de fcil leitura, outras existem que so

    bastante elaboradas: tambm disto que vive a riqueza do patrimnio musical cantado.

    Por outro lado, indiscutvel que a lngua materna est intimamente ligada a estas canes, incorporando

    a sua acentuao natural, melodia e ritmo. Da que, semelhana do que preconizava Kodly, as canes

    tradicionais devam, de facto, ser utilizadas ao nvel educativo como base do conhecimento e desenvolvimento

    musical da criana.

    Os cancioneiros portugueses apresentam um potencial enorme e so uma fonte imensa de material

    riqussimo, quer em termos musicais quer ao nvel do texto. Da anlise que Torres faz sobre quase todos os

    cancioneiros publicados at 1986, constata-se que existe material didctico mais que suficiente para o estudo

    diversificado do ritmo, compasso, forma, harmonia, escalas e tonalidades.

    Este tipo de material pode ser utilizado de vrias maneiras: atravs do canto no acompanhado, do canto

    com acompanhamento instrumental (instrumental Orff, por exemplo, compondo arranjos consoante o nvel de

    escolaridade), canto com movimento (danas tradicionais ou coreografias com passos e figuras simples). O

    trabalho artstico das canes tradicionais pode tambm dar origem a performances dentro e fora do contexto

    escolar.

    Destaca-se ainda a importncia que o simples acto de cantar tem na formao global da criana

    enquanto indivduo em vrias vertentes, a saber:

    - formao vocal;

    - desenvolvimento da memria auditiva (atravs da imitao de frases musicais com e sem texto);

    - incremento no vocabulrio portugus;

    - desenvolvimento do nvel intelectual (interioriza, compreende e aplica os conceitos musicais

    vivenciados);

    - desenvolvimento do sentido esttico;

    - maior socializao (pratica msica vocal ou vocal/instrumental em conjunto);

    - conhecimento do patrimnio portugus (regies, localidades, plantas, animais, contexto social e

    cultural);

    - coordenao motora (danas regionais, coreografias com passos e figuras simples);

    - comparao com outros estilos musicais.

    Todas estas questes podem ser trabalhadas recorrendo aos cancioneiros, tesouros vivos da memria do

    povo portugus.

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    Referncias bibliogrficas

    Chosky, L. (1981). The Kodly context: Creating an environment for musical learning. N. Jersey: Prentice-

    Hall.

    Choksy, Lois et al. (1986). Teaching Music in the Twentieth Century. Englewood Cliffs, New Jersey:

    Prentice-Hall, Inc., pp.51-53.

    Cruz, C. B. da (1988). Zoltn Kodly Um novo conceito de Formao Musical e a sua aplicao nas escolas

    hngaras.Revista da Associao Portuguesa de Educao Musical: APEM, 56, pp.10-14.

    Cruz, C. B. da (1995). Conceito de Educao Musical de Zoltn Kodly e Teoria de Aprendizagem Musical

    de Edwin Gordon: uma abordagem comparativa.Revista da Associao Portuguesa de Educao Musical:

    APEM, 87, pp.4-9.Cruz, C. B. da (1998). Sobre Kodly e o seu Conceito de Educao Musical: abordagem geral e indicaes

    bibliogrficas.Revista da Associao Portuguesa de Educao Musical: APEM, 98, pp.3-9.

    Rodrigues, H. (1992). Pedagogia Kodly: entrevista a Peter Erdei. Revista da Associao Portuguesa de

    Educao Musical: APEM, 74, pp.18-19.

    Szonyi, E. (1983). Kodlys Principles in Practice: An Approach to music education through the Kodly

    method(4 Ed. Rev.). London, Bonn, Johannesburg, New York, Paris, Sydney, Toronto, Budapest: Boosey

    & Hawkes.

    Torres, R. M. (1998). As Canes Tradicionais Portuguesas no Ensino da Msica: contribuio da

    metodologia de Zoltn Kodly. Lisboa: Editorial Caminho.

    Weffort, A. B. (2006).A cano popular portuguesa em Fernando Lopes - Graa. Lisboa: Caminho.

    Sites consultados

    Classics for kids. Training: Rhythm symbols and names. Acedido a 26 Janeiro 2011 em

    http://www.classicsforkids.com/teachers/training/rchart.asp

    Kodly Music Institute of Australia. Rhythm Syllables. Acedido a 25 Janeiro 2011 em

    http://www.kodaly.org.au/rhythm-syllables.html.

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    ANEXOS

    Anexo 1. Tcnica de gestos manuais

    Fonte: Choksy, 1981, p.9.

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    Anexo 2. Sistema de slabas rtmicas

    Smbolos rtmicos e respectivos nomes

    Fonte: http://www.classicsforkids.com/teachers/training/rchart.asp

    Exemplos de padres rtmicos aplicando o sistema de slabas rtmicas

    Fonte: http://www.kodaly.org.au/rhythm-syllables.html

    1. Padres com a durao de uma pulsao (diviso mtrica simples)

    2. Padres com a durao de dois tempos (diviso mtrica simples)

    3. Padres de diviso mtrica composta