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VARIAÇÃO LINGUÍSTICA E CONTEXTO COMUNICATIVO O fenômeno da variação linguística, apesar de ser inerente ao processo de evolução de qualquer língua, há pouco tempo é que vem ganhando espaço nas discussões em escolas e universidades. Nas últimas décadas, diversos trabalhos vêm sendo desenvolvidos no sentido de registrar as diversas variantes que existem em nosso português. Aliás, pode-se dizer, o português são muitos. Muito desse novo direcionamento dado ao estudo do português deve-se ao fato de os pesquisadores perceberem que a língua sofre influência constante do cenário social e cultural em que está inserida. Exemplo claro disso é o fato de pessoas mais escolarizadas falarem um português que se aproxima mais da norma padrão do que pessoas com menor grau de escolarização. No Brasil, um personagem que representa bem o brasileiro menos escolarizado e distante dos grandes centros urbanos é o Chico Bento, personagem de Maurício de Souza. Chico Bento, seus amigos e familiares utilizam uma língua que não privilegia as concordâncias (dizem as casa, ao invés de as casas), que troca o “l” pelo “r” (probrema, ao invés de problema), entre outras variações. Procure conhecer melhor as tirinhas e quadrinhos desse personagem, para ter mais clara essa percepção. No universo caipira, como o de Chico Bento, é muito comum que as pessoas utilizem, na fala, um “r” chamado, pejorativamente, de “r” caipira. Esse uso aparece muito na pronúncia da língua nos interiores do sul de Minas e no interior de São Paulo. Há também variantes muito modernas de nossa língua, como o chamado internetês, que é utilizado em ambientes de bate-papo e em redes sociais na internet. Uma característica muito marcante dessa variante é o fato de ela buscar simplificar a língua, abreviando palavras e grafando-as de maneira mais próxima à fala. Veja um exemplo de conversa: João diz: oi Pedro diz: blz? João diz: na paz e vc? Pedro diz: tudo trank João diz: oq vc ta fazendo? (...) Pedro diz: tenho q sair agora... João diz: flw Pedro diz: vlw, abc

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VARIAÇÃO LINGUÍSTICA E CONTEXTO COMUNICATIVO

O fenômeno da variação linguística, apesar de ser inerente ao processo de evolução de

qualquer língua, há pouco tempo é que vem ganhando espaço nas discussões em

escolas e universidades. Nas últimas décadas, diversos trabalhos vêm sendo

desenvolvidos no sentido de registrar as diversas variantes que existem em nosso

português. Aliás, pode-se dizer, o português são muitos.

Muito desse novo direcionamento dado ao estudo do português deve-se ao fato de os

pesquisadores perceberem que a língua sofre influência constante do cenário social e

cultural em que está inserida. Exemplo claro disso é o fato de pessoas mais escolarizadas

falarem um português que se aproxima mais da norma padrão do que pessoas com

menor grau de escolarização. No Brasil, um personagem que representa bem o brasileiro

menos escolarizado e distante dos grandes centros urbanos é o Chico Bento,

personagem de Maurício de Souza. Chico Bento, seus amigos e familiares utilizam uma

língua que não privilegia as concordâncias (dizem as casa, ao invés de as casas), que

troca o “l” pelo “r” (probrema, ao invés de problema), entre outras variações. Procure

conhecer melhor as tirinhas e quadrinhos desse personagem, para ter mais clara essa

percepção.

No universo caipira, como o de Chico Bento, é muito comum que as pessoas utilizem, na

fala, um “r” chamado, pejorativamente, de “r” caipira. Esse uso aparece muito na

pronúncia da língua nos interiores do sul de Minas e no interior de São Paulo.

Há também variantes muito modernas de nossa língua, como o chamado internetês, que

é utilizado em ambientes de bate-papo e em redes sociais na internet. Uma característica

muito marcante dessa variante é o fato de ela buscar simplificar a língua, abreviando

palavras e grafando-as de maneira mais próxima à fala. Veja um exemplo de conversa:

João diz: oi Pedro diz: blz? João diz: na paz e vc? Pedro diz: tudo trank João diz: oq vc ta fazendo? (...) Pedro diz: tenho q sair agora... João diz: flw Pedro diz: vlw, abc

Alguns pesquisadores dizem que o internetês tende a minimizar a língua pelo fato de a

situação de interação na internet se aproximar muito da situação de interação oral, em

que as respostas são quase que imediatas e a comunicação acontece em tempo real e

com agilidade.

Mesmo sendo uma variante muito praticada, o internetês não é entendido por uma boa

parte da população, que não reconhece os signos utilizados por causa de não ter contato

com eles. É o caso, por exemplo, das gerações com idade mais elevada e que não fazem

largo uso da internet. Isso prova que a língua é adaptada e reconhecida em situações

específicas de linguagem, sofrendo modificações de acordo com o ambiente em que é

posta em prática.

Em relação às faixas etárias, a língua também adquire diferenças, não apenas na forma

como é falada, mas também na conotação que as palavras recebem. Como exemplo,

podemos citar o uso dos termos irado e sinistro: antigamente, esses dois termos eram

recebidos com uma significação negativa, mas hoje acabam sendo positivamente

encarados pelos jovens, que dizem, por exemplo: “que calça irada” ou “que jogo sinistro”.

Há outros muitos exemplos que podem ser percebidos na observação do uso da língua no

dia-a-dia. Em cada espaço, a língua irá adquirir um contorno diferente, um sotaque

diferente, uma pronúncia diferente, enfim. Procure observar mais a língua que as pessoas

falam ao seu redor, para ficar cada vez mais íntimo dessas variações, que não são erros,

mas adaptações da língua a cada ambiente comunicativo.

ROCHA, Sílvio Rodrigo de Moura. Variação linguística e contexto comunicativo, 2012.

COMO O TEMA TEM SIDO TRATADO NO ENEM QUESTÃO 1 (ENEM) O texto a seguir é um trecho de uma conversa por meio de um programa de computador que permite comunicação direta pela internet em tempo real, como o MSN Messenger. Esse tipo de conversa, embora escrita, apresenta muitas características da linguagem falada, segundo alguns linguistas. Uma delas é a interação ao vivo e imediata, que permite ao interlocutor conhecer, quase instantaneamente, a reação do outro, por meio de suas respostas e dos famosos emoticons (que podem ser definidos como “ícones que demonstram emoção”). João diz: oi Pedro diz: blz?

João diz: na paz e vc? Pedro diz: tudo trank João diz: oq vc ta fazendo? (...) Pedro diz: tenho q sair agora... João diz: flw Pedro diz: vlw, abc Para que a comunicação, como no MSN Messenger, se dê em tempo real, é necessário que a escrita das informações seja rápida, o que é feito por meio de A) frases completas, escritas cuidadosamente com acentos e letras maiúsculas (como “oq vc ta fazendo?”). B) frases curtas e simples (como “tudo trank”) com abreviaturas padronizadas pelo uso (como “vc” – você – “vlw – valeu!). C) uso de reticências no final da frase, para que não se tenha que escrever o resto da informação. D) estruturas coordenadas, como “na paz e vc”. E) flexão verbal rica e substituição de dígrafos consonantais por consoantes simples (“qu” por “k”). QUESTÃO 2 (ENEM) A escrita é uma das formas de expressão que as pessoas utilizam para comunicar algo e tem várias finalidades: informar, entreter, convencer, divulgar, descrever. Assim o conhecimento acerca das variedades linguísticas sociais, regionais e de registro torna-se necessário para que se use a língua nas mais diversas situações comunicativas. Considerando as informações acima, imagine que você está à procura de um emprego e encontrou duas empresas que precisam de novos funcionários. Uma delas exige uma carta de solicitação de emprego. Ao redigi-la, você A) fará uso da linguagem metafórica. B) apresentará elementos não verbais. C) utilizará o registro informal. D) evidenciará a norma padrão. E) fará uso de gírias. Fonte: http://www.clicrbs.com.br/especial/vestibularclicRBS/01enemlinguagens.pdf. Acesso em 20/02/2012.