variaÇÃo linguÍstica: caso de alunos indÍgenas … · variaÇÃo linguÍstica: caso de alunos...

14
Web-Revista SOCIODIALETO www.sociodialeto.com.br Bacharelado e Licenciatura em Letras UEMS/Campo Grande Mestrado em Letras UEMS / Campo Grande ISSN: 2178-1486 Volume 4 Número 11 Novembro 2013 450 VARIAÇÃO LINGUÍSTICA: CASO DE ALUNOS INDÍGENAS XERENTE QUE CURSAM O ENSINO MÉDIO BÁSICO Maisa Coelho Parente (UFT) 1 [email protected] Odair Giraldin (UFT) 2 [email protected] Juscéia Aparecida Veiga Garbelini (UFT) 3 [email protected] RESUMO: Este trabalho apresenta análises das variações linguísticas em produções textuais por alunos indígenas Xerente; assim como refletir com esses e estabelecer mediação sobre a construção de enunciados em língua portuguesa. O povo Akw-Xerente se localiza na cidade de Tocantínia, no estado do Tocantins. A língua akwpertence ao tronco linguístico Macrô-Je e à família Jê. O território desse povo se divide em duas terras: Terra indígena Xerente e Funil, sendo localizado na margem direita a leste do rio Tocantins, estando distante 70 km de Palmas, capital do Tocantins. A escolha do tema foi motivada principalmente pelo contato com alunos indígenas Xerente que cursam o Ensino Superior também na Universidade Federal do Tocantins, que têm muita dificuldade em compreender alguns enunciados da língua portuguesa, principalmente porque os usuários dessa última “falam rápido demais”. Além disso, conhecer mais sobre a cultura e língua desse povo, contribuir para os estudos na área de Sociolinguística e refletir com esses alunos acerca das variantes encontradas. O trabalho desenvolveu-se nas aldeias Salto e Porteira e em visita ao Centro Educacional Fé e Alegria Frei Antônio, em Tocantínia-To, para coleta dos textos elaborados por 06 (seis) alunos Xerente. Sendo que lhes foram dados 03 (três) temas de escolha: “Natureza”, “Minha vida na escola” e “Minha aldeia”, sendo este último o escolhido. Além disso, utilizaram-se como recursos os materiais: computador, lápis, caneta, borracha e caderno de entrevista. Em: “Nas aldeia”, por exemplo, à variável < s > de marcação de plural correspondem duas variantes: presença do segmento ([s]) e sua ausência ([]). Por ser a palavra “aldeia” bimorfêmica, favorece ainda mais a ausência do segmento ([s]). Palavras-chave: Alunos Xerente. Variação Linguística. Língua Portuguesa. ABSTRACT: This paper presents analysis of linguistic variations in textual productions by Xerente indigenous students; as well as reflects about these mediation and set about building set in Portuguese. The people Akwe-Xerente is located at the city of Tocantínia in the state of Tocantins. The language belongs to the Akwe linguistic trunk Macro-Jê and Jê family. The territory of these people is divided into two lands: indigenous land Xerente and Funil, being located at the right bank to the east of the Tocantins River and is 70 km far from Palmas, capital of Tocantins. The choice for this theme was motivated mainly by the contact with indigenous students who study Xerente Higher Education at the Federal University of Tocantins as well, who have great difficulty in understanding some statements of the portuguese language, especially because portuguese speakers "speak too fast". This works aims also learn more about the culture and language of these people, contributing to studies in the area of sociolinguistics and reflect with these students about the variants found. This work was developed in the villages Salto and Porteira and during a visit to the Centro Educacional Fé e Alegria Frei Antônio in Tocantínia TO in 1 Graduada em Letras pela Universidade Federal do Tocantins 2 Doutor em Ciências Sociais pela Universidade Estadual de Campinas 3 Doutora em Linguística pela Universidade Federal de Minas Gerais

Upload: truongtruc

Post on 13-Nov-2018

227 views

Category:

Documents


0 download

TRANSCRIPT

Page 1: VARIAÇÃO LINGUÍSTICA: CASO DE ALUNOS INDÍGENAS … · VARIAÇÃO LINGUÍSTICA: CASO DE ALUNOS INDÍGENAS ... and Porteira and during a visit to the Centro Educacional Fé e Alegria

Web-Revista SOCIODIALETO • www.sociodialeto.com.br Bacharelado e Licenciatura em Letras • UEMS/Campo Grande M e s t r a d o e m L e t r a s • U E M S / C a m p o G r a n d e

I S S N : 2 1 7 8 - 1 4 8 6 • V o l u m e 4 • N ú m e r o 1 1 • N o v e m b r o 2 0 1 3

450

VARIAÇÃO LINGUÍSTICA: CASO DE ALUNOS INDÍGENAS

XERENTE QUE CURSAM O ENSINO MÉDIO BÁSICO

Maisa Coelho Parente (UFT)

1

[email protected]

Odair Giraldin (UFT)2

[email protected]

Juscéia Aparecida Veiga Garbelini (UFT)3

[email protected]

RESUMO: Este trabalho apresenta análises das variações linguísticas em produções textuais por alunos

indígenas Xerente; assim como refletir com esses e estabelecer mediação sobre a construção de

enunciados em língua portuguesa. O povo Akwẽ-Xerente se localiza na cidade de Tocantínia, no estado

do Tocantins. A língua akwẽ pertence ao tronco linguístico Macrô-Je e à família Jê. O território desse

povo se divide em duas terras: Terra indígena Xerente e Funil, sendo localizado na margem direita a leste

do rio Tocantins, estando distante 70 km de Palmas, capital do Tocantins. A escolha do tema foi motivada

principalmente pelo contato com alunos indígenas Xerente que cursam o Ensino Superior também na

Universidade Federal do Tocantins, que têm muita dificuldade em compreender alguns enunciados da

língua portuguesa, principalmente porque os usuários dessa última “falam rápido demais”. Além disso,

conhecer mais sobre a cultura e língua desse povo, contribuir para os estudos na área de Sociolinguística e

refletir com esses alunos acerca das variantes encontradas. O trabalho desenvolveu-se nas aldeias Salto e

Porteira e em visita ao Centro Educacional Fé e Alegria Frei Antônio, em Tocantínia-To, para coleta dos

textos elaborados por 06 (seis) alunos Xerente. Sendo que lhes foram dados 03 (três) temas de escolha:

“Natureza”, “Minha vida na escola” e “Minha aldeia”, sendo este último o escolhido. Além disso,

utilizaram-se como recursos os materiais: computador, lápis, caneta, borracha e caderno de entrevista.

Em: “Nas aldeia”, por exemplo, à variável < s > de marcação de plural correspondem duas variantes:

presença do segmento ([s]) e sua ausência ([∅]). Por ser a palavra “aldeia” bimorfêmica, favorece ainda

mais a ausência do segmento ([s]).

Palavras-chave: Alunos Xerente. Variação Linguística. Língua Portuguesa.

ABSTRACT: This paper presents analysis of linguistic variations in textual productions by Xerente

indigenous students; as well as reflects about these mediation and set about building set in Portuguese.

The people Akwe-Xerente is located at the city of Tocantínia in the state of Tocantins. The language

belongs to the Akwe linguistic trunk Macro-Jê and Jê family. The territory of these people is divided into

two lands: indigenous land Xerente and Funil, being located at the right bank to the east of the Tocantins

River and is 70 km far from Palmas, capital of Tocantins. The choice for this theme was motivated

mainly by the contact with indigenous students who study Xerente Higher Education at the Federal

University of Tocantins as well, who have great difficulty in understanding some statements of the

portuguese language, especially because portuguese speakers "speak too fast". This works aims also learn

more about the culture and language of these people, contributing to studies in the area of sociolinguistics

and reflect with these students about the variants found. This work was developed in the villages Salto

and Porteira and during a visit to the Centro Educacional Fé e Alegria Frei Antônio in Tocantínia – TO in

1 Graduada em Letras pela Universidade Federal do Tocantins

2 Doutor em Ciências Sociais pela Universidade Estadual de Campinas

3 Doutora em Linguística pela Universidade Federal de Minas Gerais

Page 2: VARIAÇÃO LINGUÍSTICA: CASO DE ALUNOS INDÍGENAS … · VARIAÇÃO LINGUÍSTICA: CASO DE ALUNOS INDÍGENAS ... and Porteira and during a visit to the Centro Educacional Fé e Alegria

Web-Revista SOCIODIALETO • www.sociodialeto.com.br Bacharelado e Licenciatura em Letras • UEMS/Campo Grande M e s t r a d o e m L e t r a s • U E M S / C a m p o G r a n d e

I S S N : 2 1 7 8 - 1 4 8 6 • V o l u m e 4 • N ú m e r o 1 1 • N o v e m b r o 2 0 1 3

451

order to collect texts written by six (06) Xerente students. They were given three (03) subjects of choice:

"Nature", "My life in school" and "My village", the latter being chosen. Also, the used material resources

were: computer, pen, pencil, eraser and notebook interview. In: “Nas aldeia”, for example, the variable

<s> of plural correspond to two variants: the presence of the segment ([s]) and its absence ([∅]). Once the

word "aldeia" has two forms, it favors even more the absence of the segment ([s]).

Keywords: Xerente students. Linguistic variation. Portuguese.

1 INTRODUÇÃO

A construção desse artigo objetiva um passo para a conclusão do projeto de

pesquisa intitulado: “Ouvir, Fazer, Aprender: Estudo Comparativo dos Processos

Próprios de Ensino e Aprendizagem para os Akwẽ-Xerente, Krahô e Javaé”, além disso,

reflexões obtidas ao longo do contato com os povos Xerente. Este artigo analisa casos

de variação lingüística presentes nos textos de alunos indígenas Xerente, bem como

busca refletir sobre os eventos encontrados.

A motivação pela escolha do tema se deu principalmente pelo contato com

alunos indígenas Xerente que cursam o Ensino Superior também na Universidade

Federal do Tocantins, que têm muita dificuldade em compreender alguns enunciados da

língua portuguesa, principalmente porque os usuários dessa última “falam rápido

demais”. Além disso, conhecer mais sobre a cultura e língua desse povo, contribuir para

os estudos na área de Sociolinguística e refletir com esses alunos acerca das variantes

encontradas.

Dentro da Universidade tem que haver essa preocupação na relação desta com os

estudantes indígenas, pois esses alunos saem de suas aldeias, onde usavam sua língua

materna, no caso a língua akwẽ-xerente, de forma cotidiana. Quando chegaram à cidade

de Porto Nacional, no estado do Tocantins, onde se localiza o campus da Universidade

Federal do Tocantins, depararam com uma língua, que apesar de tê-la como segunda

língua, em relação à qual se sentem desnorteados.

Além disso, existe também a dificuldade de entender os textos que seus

professores universitários passam em sala de aula. Pois os assuntos abordados nesses

Page 3: VARIAÇÃO LINGUÍSTICA: CASO DE ALUNOS INDÍGENAS … · VARIAÇÃO LINGUÍSTICA: CASO DE ALUNOS INDÍGENAS ... and Porteira and during a visit to the Centro Educacional Fé e Alegria

Web-Revista SOCIODIALETO • www.sociodialeto.com.br Bacharelado e Licenciatura em Letras • UEMS/Campo Grande M e s t r a d o e m L e t r a s • U E M S / C a m p o G r a n d e

I S S N : 2 1 7 8 - 1 4 8 6 • V o l u m e 4 • N ú m e r o 1 1 • N o v e m b r o 2 0 1 3

452

textos, pelo menos na maioria deles, segundo relato dos próprios alunos indígenas, não

condizem com a realidade dos mesmos.

Os mesmos relatavam que têm muita dificuldade em escrever textos na língua

portuguesa e também ao que se refere à compreensão dos mesmos. Que eles não

tiveram um bom suporte no Ensino Médio, por isso possuem algumas deficiências,

sobretudo na escrita e compreensão de textos escritos na língua portuguesa. A partir

disso, surgiu o interesse de contribuir, ainda que de forma pequena, com reflexões para

tentar apontar pontos desses conflitos vivenciados por esses alunos, principalmente os

que cursam o Ensino Médio Básico.

A pesquisa deu-se através de consulta de bibliografia sobre o tema em foco,

(SOUSA FILHO, 2007; BORTONI-RICARDO, 2004; TARALLO, 2002;

NASCIMENTO, 2012; MOLLICA E BRAGA, 2003; CARVALHO, 2009; CALLOU

& LEITE, 2001). O trabalho desenvolveu-se em campo, nas aldeias Salto (Kripe) e

Porteira (Nrôzawi) e em visita ao Centro Educacional Fé e Alegria Frei Antônio, em

Tocantínia, Tocantins, para coleta de textos dissertativos elaborados por 06 (seis) alunos

Xerente que estudam no 3° Ano do Ensino Médio Básico, com idade entre 18 e 20 anos.

Os alunos que redigiram as redações residem nas aldeias: Kripe, Nrôzawi e

Aldeia Nova Mrãiwahã. Sendo que lhes foram dados 03 (três) temas de escolha:

“Natureza”, “Minha vida na escola” e “Minha aldeia”, sendo este último o escolhido.

Além disso, utilizou-se como recursos materiais: computador, lápis, caneta, borracha e

caderno de entrevista.

A partir dessa introdução, o trabalho está dividido em três outras partes. Na

primeira será apresentado um breve histórico sobre os povos Xerente e a educação

indígena, além de apresentar os estudos dos autores que fundamentaram essa pesquisa.

Na segunda, é feita uma reflexão sobre as variações lingüísticas detectadas nas redações

escritas por alunos indígenas Xerente e na última parte as considerações finais.

2 REFERENCIAL TEÓRICO

O povo Akwẽ-Xerente se localiza na cidade de Tocantínia, no estado do

Tocantins. A língua akwẽ pertence ao tronco lingüístico Macrô-Je e à família Jê. O

Page 4: VARIAÇÃO LINGUÍSTICA: CASO DE ALUNOS INDÍGENAS … · VARIAÇÃO LINGUÍSTICA: CASO DE ALUNOS INDÍGENAS ... and Porteira and during a visit to the Centro Educacional Fé e Alegria

Web-Revista SOCIODIALETO • www.sociodialeto.com.br Bacharelado e Licenciatura em Letras • UEMS/Campo Grande M e s t r a d o e m L e t r a s • U E M S / C a m p o G r a n d e

I S S N : 2 1 7 8 - 1 4 8 6 • V o l u m e 4 • N ú m e r o 1 1 • N o v e m b r o 2 0 1 3

453

território desse povo se divide em duas terras: Terra indígena Xerente e Funil, sendo

localizado na margem direita a leste do rio Tocantins, estando distante 70 km de

Palmas, capital do Tocantins.

Apesar do contato intenso que os Xerente têm com os não-índios, esse povo

como destacam alguns autores (Giraldin, 2010; Maybury-Lewis, 1979; Melo, 2010)

ainda conservam sua língua, cultura, pintura corporal e vários rituais.

Esse povo se organiza em duas metades exogâmicas: Wâhire e Doí. Essas

metades são regidas por um sistema de clãs patrilineares que se distribuem em: Wâhire,

Krozake e Kremprehi que estão ligados à metade Wâhire. Os vinculados a metade Doí

são: Kuzã, Kbazí e Krito (Farias, 1990).

Segundo Sousa Filho apud Martius (2007, p.40), “os Xavante falavam um

dialeto da língua Xerente”. Esses dois povos compartilharam o mesmo território entre o

Tocantins e Araguaia até meados do século XIX, quando o povo Xavante decidiu

abandonar a região e migrar para o oeste evitando assim, o contato com os não-índios

(Giraldin, 2004).

Não é de hoje que se tem implantado vários projetos escolares aos povos

indígenas. Como se sabe, até o fim do período colonial a educação indígena era de

responsabilidade de missionários católicos, que tinham como único objetivo catequizar,

evangelizar e tornar os indígenas “filhos de Deus”. E de acordo Nascimento apud Paiva

(2003):

Desde que chegaram ao Brasil os jesuítas estabeleceram escolas e

começaram a ensinar ler, escrever, contar e cantar e, no contexto

brasileiro, pertencendo à corte portuguesa como eixo social, “as letras

deviam significar adesão plena à cultura portuguesa”.

(NASCIMENTO, 2012 apud PAIVA, 2003, p. 29)

E até os dias de hoje, os currículos usados na educação indígena se parecem com

os empregados em escolas regulares. Não levando em consideração a cultura, a visão de

mundo desses povos. (Silva; Azevedo, 1995).

Esse panorama educacional civilizatório e dominador só começou a ser

questionado na década de 80, por causa da consolidação dos movimentos indígenas

organizados que garantiam seus direitos na Constituição de 1988, como suas crenças,

costumes, línguas, cultura e etc. (Gerken; Oliveira, 2008). E, como destaca Nascimento:

Page 5: VARIAÇÃO LINGUÍSTICA: CASO DE ALUNOS INDÍGENAS … · VARIAÇÃO LINGUÍSTICA: CASO DE ALUNOS INDÍGENAS ... and Porteira and during a visit to the Centro Educacional Fé e Alegria

Web-Revista SOCIODIALETO • www.sociodialeto.com.br Bacharelado e Licenciatura em Letras • UEMS/Campo Grande M e s t r a d o e m L e t r a s • U E M S / C a m p o G r a n d e

I S S N : 2 1 7 8 - 1 4 8 6 • V o l u m e 4 • N ú m e r o 1 1 • N o v e m b r o 2 0 1 3

454

Uma das principais reivindicações dos povos indígenas, através do

movimento indígena, foi o direito à autodeterminação ou, em outras

palavras, a exigência de que as práticas formais educativas fossem

desenvolvidas pelos próprios indígenas, bem como que coubessem a

eles as definições de concepções de educação e processos próprios e

específicos de aprendizagem. (NASCIMENTO, 2012, p. 41)

E em 1996, nos artigos 23 e 26 da LDB (Lei de Diretrizes e Bases da Educação

Nacional) tornou possível a flexibilidade dos calendários e currículos escolares. E, além

disso, através da Resolução 03 e do Parecer 14, ambos documentos do Conselho

Nacional da Educação assinados em 1999, foram reconhecidos mais uma vez o caráter

intercultural e bilíngüe que deve ter a escolarização indígena.

Mas os conflitos continuam, pois apesar das conquistas dessas leis que

viabilizam o ensino indígena, na prática ainda não se estabeleceu definitivamente uma

política educacional que respeite a diversidade e assegure à população ameríndia o

direito de decidir sobre seus próprios projetos educacionais (Melo, 2010).

Mesmo tendo se consolidado as políticas educacionais voltadas aos povos

indígenas, muitos trabalhos de origem antropológica não se atentaram à educação desses

povos, por acreditar que o ambiente escolar não faz parte da cultura e cotidiano das

aldeias (Gerken e; Oliveira, 2008 apud Tassinari, 2001).

Sem dúvida, ocorre uma troca inevitável entre a população indígena e a escola,

pois de um lado se tem um povo que valoriza e tem a linguagem oral como

predominante e de outro a escola, que valoriza não só a linguagem oral, mas, sobretudo,

a escrita.

A educação escolar para os povos indígenas é ferramenta indispensável para o

asseguramento de sua autonomia devido a intensificação do contato com as agências

nacionais. A partir disso, necessita-se de uma formação adequada aos professores

indígenas, pois, como se nota, as políticas direcionadas a esses povos, muitas das vezes,

fica apenas no papel e quase nunca na prática (Nascimento, 2012).

A educação indígena brasileira sempre esteve mais interessada em impor a

língua portuguesa a reconhecer sua cultura, língua, mitos, rituais. Porém, o contato com

os não-índios é inevitável, e, consequentemente com a língua portuguesa.

Page 6: VARIAÇÃO LINGUÍSTICA: CASO DE ALUNOS INDÍGENAS … · VARIAÇÃO LINGUÍSTICA: CASO DE ALUNOS INDÍGENAS ... and Porteira and during a visit to the Centro Educacional Fé e Alegria

Web-Revista SOCIODIALETO • www.sociodialeto.com.br Bacharelado e Licenciatura em Letras • UEMS/Campo Grande M e s t r a d o e m L e t r a s • U E M S / C a m p o G r a n d e

I S S N : 2 1 7 8 - 1 4 8 6 • V o l u m e 4 • N ú m e r o 1 1 • N o v e m b r o 2 0 1 3

455

Além disso, percebe-se um grande números de alunos indígenas ingressos nas

universidades. O surgimento dessa grande demanda é devido à ideia de que a

escolarização, e, sobretudo, a linguagem escrita, pode garantir a defesa de seus

interesses e autonomia, sendo, portanto: “vista como instrumento indispensável na

interlocução com as instituições da sociedade envolvente, principalmente o Estado

(GERKEN; OLIVEIRA, 2008 apud KAHN; FRANCHETTO, 1994 apud TASSINARI,

2001).

Bortoni-Ricardo (2004) fala dos três ambientes onde a criança começa seu

processo de socialização, sendo: a família, os amigos e a escola, os quais a sociologia

chamou de domínios sociais. Aponta ainda que todos nós exercemos papéis sociais

diferentes, por exemplo, na aldeia, os índios exercem papéis de: caciques, pajés,

curadores, cantores, caçadores, pescadores, agricultores, pais, filhos, mães, etc. E desse

modo, temos diferenças lingüísticas, marcadas por papéis sociais distintos.

É importante refletir sobre os fenômenos existentes em nossa língua. Além de

sabermos em que tipo de comunidade lingüística estamos inseridos. A língua não é algo

pronto e acabado, ela está sempre em constante mudança. Por isso é importante

analisarmos essas variações presentes, e contribuir para os estudos nessa área.

Segundo Mollica e Braga (2003):

A sociolingüística é uma das subáreas da Línguistica e estuda a língua em

uso no seio das comunidades de fala, voltando a atenção para um tipo de

investigação que correlaciona aspectos lingüísticos e sociais. Esta ciência se

faz presente num espaço interdisciplinar, na fronteira entre língua e

sociedade, focalizando precipuamente os empregos lingüísticos concretos,

em especial os de caráter heterogêneo (MOLLICA; BRAGA, 2003, pg.09).

Pode-se dizer, que a Sociolinguística examina as relações entre as estruturas

sociais e o funcionamento do código lingüístico e posteriormente localiza a fonte das

mutações. E a linguagem é concebida como criação do falante que a usa, no meio social

em que vive (Carvalho, 2009).

Para o estruturalismo, a língua é apenas um objeto homogêneo, isso implica

dizer que não existe variação. Já na Sociolinguística Variacionista a heterogeneidade da

Page 7: VARIAÇÃO LINGUÍSTICA: CASO DE ALUNOS INDÍGENAS … · VARIAÇÃO LINGUÍSTICA: CASO DE ALUNOS INDÍGENAS ... and Porteira and during a visit to the Centro Educacional Fé e Alegria

Web-Revista SOCIODIALETO • www.sociodialeto.com.br Bacharelado e Licenciatura em Letras • UEMS/Campo Grande M e s t r a d o e m L e t r a s • U E M S / C a m p o G r a n d e

I S S N : 2 1 7 8 - 1 4 8 6 • V o l u m e 4 • N ú m e r o 1 1 • N o v e m b r o 2 0 1 3

456

língua é inerente ao sistema lingüístico e integrante da competência lingüística dos

falantes.

A Sociolinguística Variacionista estuda a língua em uso em uma comunidade

linguística. Cada comunidade de fala possui características linguísticas que a distingue

das outras comunidades, ou seja, a língua é heterogênea e dinâmica, ela está sempre em

constante mudança.

Sabe-se também, que existem várias possibilidades de fala a nossa disposição.

Essas várias formas linguísticas têm como nome de variantes e ao seu conjunto a

Sociolinguística denominou de variáveis.

Sabemos que vivemos em um país plurilíngüe, onde existem várias comunidades

lingüísticas. Temos em torno de 180 línguas indígenas (Mollica e Braga 2003), e que

muitos sequer sabem dessa realidade. Essas variações lingüísticas enriquecem nossa

língua e cultura, e se todas as pessoas tivessem traços lingüísticos iguais não haveria

motivo para realizarmos um estudo sociolingüístico em nossa sociedade.

As mudanças que ocorrem em nosso léxico estão ligadas a nossa fala em uso,

pois como se sabe a língua é heterogênea e dinâmica. A partir daí, podemos afirmar que

na língua em uso sempre está se criando normas e as inventando. E segundo Carvalho:

A gênese do léxico de uma língua, para ser percebida em toda a sua extensão,

não pode ser estudada por uma visão sincrônica da linguagem. É necessário

uma visão diacrônica, para identificar-se a criação dos termos vernáculos e a

adoção dos estrangeirismos (CARVALHO, 2009, Pg. 21)

Entende-se por sincronia, como uma língua se encontrada em uma época

específica. E diacronia é uma observação da língua, mas em sua história e permanente

mudança. Sabe-se também que os alunos indígenas precisam da língua portuguesa para

resolverem seus problemas, tanto dentro como fora da aldeia, pois esta é a língua oficial

do Brasil.

As variações lingüísticas podem ocorrer de forma mais intensa ou não, isso vai

depender em que ambiente estamos. É o que Bortoni-Ricardo chama de monitoração, e

que geralmente nos eventos ligados à escrita seu grau de monitoração linguística é

maior.

Page 8: VARIAÇÃO LINGUÍSTICA: CASO DE ALUNOS INDÍGENAS … · VARIAÇÃO LINGUÍSTICA: CASO DE ALUNOS INDÍGENAS ... and Porteira and during a visit to the Centro Educacional Fé e Alegria

Web-Revista SOCIODIALETO • www.sociodialeto.com.br Bacharelado e Licenciatura em Letras • UEMS/Campo Grande M e s t r a d o e m L e t r a s • U E M S / C a m p o G r a n d e

I S S N : 2 1 7 8 - 1 4 8 6 • V o l u m e 4 • N ú m e r o 1 1 • N o v e m b r o 2 0 1 3

457

O poder econômico e político de um estado, cidade ou país, conferem também

maior prestígio de suas variedades lingüísticas. Portanto, as variedades lingüísticas

usadas por pessoas desfavorecidas socioeconomicamente tendem ser estigmatizadas

pela sociedade. A mesma autora defende a ideia de uma pedagogia sensível, que quando

o professor depara com a utilização de uma regra não padrão por um aluno, o mesmo

tem que ter dois componentes: identificação e conscientização da diferença.

O primeiro é muitas vezes prejudicado porque muitos professores desconhecem

algumas regras, e o segundo, o professor deve alerta seu aluno, que ele próprio deve

monitorar seu estilo, porém sem constrangê-lo, e prejudicar assim, seu processo de

ensino-aprendizagem.

Bortoni-Ricardo (2004) propõe três linhas para entendermos o português

brasileiro: contínuo de urbanização, contínuo de oralidade-letramento e contínuo de

monitoração estilística.

No primeiro contínuo, a autora pede para imaginarmos uma linha e explica que

em uma das pontas estão situados os falares rurais isolados e na outra ponta os falares

urbanos, e que com o passar dos anos sofreram várias influências, como da escrita, por

exemplo. E entre eles fica uma zona rurbana, que é constituída por migrantes de origem

rural que preservam, ainda, aspectos lingüísticos e culturais de seus antecedentes.

No segundo contínuo, Bortoni-Ricardo fala de dois eventos: de letramento e

oralidade. O evento de letramento, na nossa linha imaginária fica na ponta da

urbanização, e na outra ponta, temos o evento de oralidade. No evento de letramento os

falantes são subsidiados por textos escritos, e no segundo evento, a autora dá como

exemplo, uma conversa com os amigos em um bar, porém se um dos falantes declamar

um poema, esse deixa de ser um evento de oralidade e passa a ter influências de um

evento de letramento.

No último contínuo, a mesma autora fala que podemos situar na nossa linha,

interações mais espontâneas e aquelas planejadas que exigem mais atenção de quem

está falando, ou seja, estilos mais monitorados e estilos menos monitorados.

Page 9: VARIAÇÃO LINGUÍSTICA: CASO DE ALUNOS INDÍGENAS … · VARIAÇÃO LINGUÍSTICA: CASO DE ALUNOS INDÍGENAS ... and Porteira and during a visit to the Centro Educacional Fé e Alegria

Web-Revista SOCIODIALETO • www.sociodialeto.com.br Bacharelado e Licenciatura em Letras • UEMS/Campo Grande M e s t r a d o e m L e t r a s • U E M S / C a m p o G r a n d e

I S S N : 2 1 7 8 - 1 4 8 6 • V o l u m e 4 • N ú m e r o 1 1 • N o v e m b r o 2 0 1 3

458

2.1 ALGUMAS REFLEXÕES ACERCA DOS DADOS COLETADOS

Os alunos indígenas falam a língua portuguesa somente quando estão em contato

com os não-índios, e que quando estão na escola com seus amigos, também Xerente,

falam somente na sua língua materna. O uso de empréstimos da língua portuguesa pelos

Xerente é inevitável, principalmente por questão territorial, pois os Xerente estão em

constante contato com os moradores de Tocantínia. Os próprios Xerente afirmam que “a

língua portuguesa é muito forte” (Parente; Giraldin; Garbelini, 2010).

Mas com tudo isso, os alunos indígenas não estão perdendo sua língua materna.

A relação com os não-índios, de acordo os mesmos, é boa, não havendo brigas e

ocorrendo respeito mútuo. Já alguns alunos não-índios têm muita dificuldade em

entender a cultura desse povo.

A pesquisa constatou que os alunos indígenas Xerente do 3° Ano do Ensino

Médio Básico possuem grande dificuldade em interpretar textos escritos na língua

portuguesa, e entender a gramática. Disseram também: “Quando vocês falam rápido

demais, a gente não entende quase nada”.

A seguir serão comentadas algumas variações linguísticas mais recorrentes em

trechos das 06 (seis) redações elaboradas pelos alunos indígenas Xerente:

1. “Nas aldeia, é muito diferente a nossa língua xerente (...)”. (Aluno Xerente).

2. “Os ancião ficam na warã, com eles nós aprendemos valorizar o que é nosso (...)”.

Nos fragmentos 1 e 2, à variável < s > de marcação de plural correspondem duas

variantes: presença do segmento ([s]) e sua ausência ([ ]) (Tarallo, 2002). Por ser a

palavra “aldeia” e “ancião” bimorfêmicas, favorecem ainda mais a ausência do

segmento ([s]). Essa tendência de flexionamos apenas o primeiro elemento do sintagma

nominal, se explica porque no português brasileiro dispensamos a redundância na

comunicação, e que quando a forma de um plural de um nome for mais diferente,

tendemos a usar a marca do plural (Bortoni-Ricardo, 2004).

3. “(...) Nas aldeias é prática não deixa as tradições (...).” (Aluno Xerente).

4. “(...) É importante preserva a nossa cultura (...)”.

Page 10: VARIAÇÃO LINGUÍSTICA: CASO DE ALUNOS INDÍGENAS … · VARIAÇÃO LINGUÍSTICA: CASO DE ALUNOS INDÍGENAS ... and Porteira and during a visit to the Centro Educacional Fé e Alegria

Web-Revista SOCIODIALETO • www.sociodialeto.com.br Bacharelado e Licenciatura em Letras • UEMS/Campo Grande M e s t r a d o e m L e t r a s • U E M S / C a m p o G r a n d e

I S S N : 2 1 7 8 - 1 4 8 6 • V o l u m e 4 • N ú m e r o 1 1 • N o v e m b r o 2 0 1 3

459

Ocorreu uma supressão do /r/ no infinitivo verbal “deixar” e “preservar” nos

fragmentos 3 e 4. Essa variação geralmente acontece porque é muito normal os falantes

suprimirem o /r/ na oralidade, dessa forma, reflete também na escrita. O professor deve

chamar a atenção dos alunos para a diferença entre o sistema oral e escrito. Pois em

quase todo o Brasil, o /r/ pós-vocálico tem uma tendência a supressão, principalmente

nos infinitivos verbais (correr >corrê; almoçar >almoçá; desenvolver >desenvolvê;

sorrir > sorri) (Bortoni-Ricardo, 2004).

5. “A aldeia fica no mato, mas é um lugar muito bonita, e os índios gostam de viver

nele, porquê a aldeia é melhor para se viver e plantar muitas coisas para nossa

alimentação, plantar feijão, milho, mandioca, arroz (...)”. (Aluna Xerente).

Existem dois gêneros na língua portuguesa: masculino e feminino. Pertencem ao

gênero masculino todos os substantivos a que se pode antepor o artigo o (Cunha e

Cintra, 2008). No caso acima o adjetivo “bonita” não está concordando em gênero com

o sintagma nominal “um lugar” e o mesmo aconteceu com o pronome “nele”, cujo

também não concorda em gênero com o sintagma nominal “aldeia”. O “porquê” usado

pela aluna é uma variação bastante ocorrente nos textos dos alunos, principalmente por

se tratar de um homófono. E sua função gramatical funciona como um substantivo,

significando: “o motivo”, “a razão”.

6. “(...) Assim somos realmente feliz, de ter escolas indígenas, infermarias (...)”.

É muito comum no português brasileiro flexionarmos apenas o primeiro

sintagma nominal, nesse caso, o aluno obedeceu a regra da concordância geral, que

concorda em número com o elemento mais próximo, no caso a palavra “realmente”.

Também é muito comum, por a escrita ser um reflexo da fala, escrevermos de acordo

com a pronúncia. No caso, o aluno escreveu “infermarias”, por assimilação, pois os

fonemas /e/ e /i/ tem características fonológicas parecidas (Callou e Leite, 2001).

7. “(...) Agente não podemos esquecer dos mais velhos (...)”.

Page 11: VARIAÇÃO LINGUÍSTICA: CASO DE ALUNOS INDÍGENAS … · VARIAÇÃO LINGUÍSTICA: CASO DE ALUNOS INDÍGENAS ... and Porteira and during a visit to the Centro Educacional Fé e Alegria

Web-Revista SOCIODIALETO • www.sociodialeto.com.br Bacharelado e Licenciatura em Letras • UEMS/Campo Grande M e s t r a d o e m L e t r a s • U E M S / C a m p o G r a n d e

I S S N : 2 1 7 8 - 1 4 8 6 • V o l u m e 4 • N ú m e r o 1 1 • N o v e m b r o 2 0 1 3

460

Homófonas são palavras que possuem sons iguais, mas escrita diferente. Por

esse motivo, são as que os alunos mais têm dificuldade na escrita, pois na oralidade a

pronúncia é a mesma. Foi o que aconteceu no caso de “agente”, pois o aluno não fez

distinção entre o pronome e o substantivo. Além disso, tem a falta de concordância entre

o sujeito e o verbo. O pronome “nós” está perdendo cada vez mais espaço para a

variante “a gente”, porém os alunos por seguirem a regra geral de concordância,

flexionam o verbo concordando com a 1ª pessoa do plural, como estão habituados fazer

com o pronome “nós.

8. “(...) Passa idéias que apredemos dos índios antepassados (...)”.

Como acontece no fragmento 3, a supressão do /r/ é muito recorrente nos

infinitivos verbais, nada mais é do que o reflexo da fala na escrita. Em “apredemos”, o

aluno suprimiu a letra /n/, ocorrendo uma síncope.

9. “(...) Na aldeia tem escola tem emfermaria (...)”.

Nesse caso, o aluno por talvez desconhecer a regra que se usa a letra /m/

somente diante de /p/ e /b/, e por a letra /m/ também ser nasal, fez a troca do /n/ por /m/.

Pois na oralidade não diferenciamos os sons de tais fonemas, assim os aplicamos na

escrita. (Callou e Leite, 2001).

10. “(...) as conseqüências ocorridas são um proplema para a sociedade indígena.”

Nesse caso, alguns alunos trocam os fonemas /p/ e /b/ por terem o mesmo ponto

e modo de articulação, ou seja, os dois fonemas são bilabiais e plosivos. No entanto, se

diferenciam pelo vozeamento, sendo que o fonema /p/ é desvozeado e o /b/ vozeado.

Dessa forma ocorreu nesse fragmento um metaplasmo por permuta de traço. (Callou e

Leite, 2001).

11. “(...) Existem com seumodede viver, e com sua cultura (...)”.

“Mode” é a forma arcaica da palavra “modo”, esse arcaísmo é mais usado na

zona rural e raramente pronunciado pelos falantes da zona urbana. O uso por esse aluno

Page 12: VARIAÇÃO LINGUÍSTICA: CASO DE ALUNOS INDÍGENAS … · VARIAÇÃO LINGUÍSTICA: CASO DE ALUNOS INDÍGENAS ... and Porteira and during a visit to the Centro Educacional Fé e Alegria

Web-Revista SOCIODIALETO • www.sociodialeto.com.br Bacharelado e Licenciatura em Letras • UEMS/Campo Grande M e s t r a d o e m L e t r a s • U E M S / C a m p o G r a n d e

I S S N : 2 1 7 8 - 1 4 8 6 • V o l u m e 4 • N ú m e r o 1 1 • N o v e m b r o 2 0 1 3

461

se explica porque muitos alunos, mesmo aqueles que estudam na cidade residem na

zona rural, onde essa variante e usada de forma mais intensa.

12. “(...) Não se preocupa com nada só ajudar as pessoa (...)”.

13. “(...) Por essa razão somos feliz, sempre vivendo com nossa cultura (...)”

Assim como acontecem nos fragmentos 3, 4 e 8, “preocupa”, houve a supressão

do fonema /r/ nesse infinitivo verbal. E no fragmento 13, ocorreu a marcação do plural

apenas no primeiro elemento do sintagma nominal, evitando a redundância no

enunciado, e que também ocorreu nos fragmentos 1,2 e 6.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

É muito importante que os alunos e professores indígenas tenham conhecimento

do uso da língua portuguesa, para que os mesmos possam se apropriar desse

conhecimento e buscar melhorias ao que se refere ao próprio processo educacional. E

como destaca Bortoni-Ricardo (2004, pg. 75): “A escola é, por excelência, o locus – ou

espaço – em que os educandos vão adquirir, de forma sistemática, recursos

comunicativos que lhes permitam desempenhar-se competentemente em práticas sociais

especializadas”.

Evidentemente, os professores indígenas Xerente necessitam saber mais sobre

seus aspectos sócio-culturais, pois é uma forma de fortalecer suas próprias identidades,

mas também, tem que haver a preocupação de saber sobre os aspectos sócio-culturais de

sua segunda língua, no caso, a língua portuguesa. Sendo que esse povo fica em intenso

contato com os não-índios, surge então a necessidade de preparar os alunos indígenas

para lidarem com essa sociedade.

Com base nas reflexões dos fragmentos acima, a pesquisa constatou que os

informantes escrevem da maneira como falam, e que, mesmo sendo essa pesquisa de

porte pequeno, ficou comprovando que independente da idade, sexo ou etnia e mesmo

Page 13: VARIAÇÃO LINGUÍSTICA: CASO DE ALUNOS INDÍGENAS … · VARIAÇÃO LINGUÍSTICA: CASO DE ALUNOS INDÍGENAS ... and Porteira and during a visit to the Centro Educacional Fé e Alegria

Web-Revista SOCIODIALETO • www.sociodialeto.com.br Bacharelado e Licenciatura em Letras • UEMS/Campo Grande M e s t r a d o e m L e t r a s • U E M S / C a m p o G r a n d e

I S S N : 2 1 7 8 - 1 4 8 6 • V o l u m e 4 • N ú m e r o 1 1 • N o v e m b r o 2 0 1 3

462

esses alunos estando em constante contanto com as regras gramaticais na escola, a

variação acontece.

Através desse trabalho, foi possível conhecer mais sobre as variações

lingüísticas na língua portuguesa pelos alunos indígenas Xerente e contribuir, ainda que

de forma muito pequena, como um estudo sociolingüístico.

REFERÊNCIAS

BORTONI-RICARDO, Stella Maris. Educação em língua materna: a

sociolingüística na sala de aula – Stella Maris Bortoni-Ricardo – São Paulo: Parábola

Editorial, 2004.

BRASIL, LDB. Lei 9394/96 – Lei de diretrizes e bases da educação nacional.

Disponível em: www.planalto.gov.br. Acesso em 14 de Abr. 2012.

CALLOU, Dinah; LEITE, Yonne. Iniciação à fonética e à fonologia. Rio de Janeiro:

Jorge Zahar Editor, 2001.

CARVALHO, Nelly. Empréstimos lingüísticos. São Paulo: Ed. Ática, 1989.

CONSELHO NACIONAL DE EDUCAÇÃO. Câmera de Educação Básica. Resolução

n. 3, 10 de novembro de 1999: Fixa diretrizes nacionais para o funcionamento das

escolas indígenas e dá outras providências. Disponível em: http://www.mec.gov.br.

Acesso em 14 de abr. 2012.

CUNHA, Celso; CINTRA, Lindley. Nova gramática do português contemporâneo /

Celso Cunha, Luís F. Lindley Cintra. – 5. Ed. – Rio de Janeiro: Lexikon, 2008.

FARIAS, Agenor J. T. Fluxos sociais xerente – organização social e dinâmica entre as

aldeias. 1990. 140 f. Dissertação de Mestrado. Universidade de São Paulo, São Paulo.

GERKEN, Carlos Henrique de Souza; OLIVEIRA, Wilder Barbosa de. Educação e

diversidade cultural: oralidade e letramento no contexto cultural dos xakriabá. S/d. Disponível em: http://www.anped.org.br/reunioes/30ra/trabalhos/GT10-3120--

Int.pdf. Acesso em: 07 abr. 2012.

GIRALDIN, Odair. Povos indígenas e não-indígenas: uma introdução à história das

relações interétnicas no Tocantins. In GIRALDIN, Odair. A (Trans)formação

histórica do Tocantins. 2.ed. Goiânia: Ed. UFG, 2004. p. 109-135.

MELO, Valéria Moreira Coelho. Diversidade, meio ambiente e educação: uma

reflexão a partir da sociedade Xerente. 2012. 113 f. Dissertação de Mestrado –

Universidade Federal do Tocantins, Palmas.

MOLLICA, Maria Cecília; BRAGA, Maria Luiza. Introdução à Sociolinguistica: o

tratamento da variação. São Paulo: Contexto, 2003.

Page 14: VARIAÇÃO LINGUÍSTICA: CASO DE ALUNOS INDÍGENAS … · VARIAÇÃO LINGUÍSTICA: CASO DE ALUNOS INDÍGENAS ... and Porteira and during a visit to the Centro Educacional Fé e Alegria

Web-Revista SOCIODIALETO • www.sociodialeto.com.br Bacharelado e Licenciatura em Letras • UEMS/Campo Grande M e s t r a d o e m L e t r a s • U E M S / C a m p o G r a n d e

I S S N : 2 1 7 8 - 1 4 8 6 • V o l u m e 4 • N ú m e r o 1 1 • N o v e m b r o 2 0 1 3

463

NASCIMENTO, André Marques do. Português intercultural: fundamentos para a

educação linguística de professores e professoras indígenas em formação superior

específica numa perspectiva intercultural. 2012. 477 f. Tese de Doutorado –

Universidade Federal de Goiás, Goiânia

PARENTE, Maisa; GIRALDIN, Odair; GARBELINI, Juscéia Aparecida Veiga.

Palavras da língua portuguesa adaptadas a língua akwe-xerente. In: Sociedade

Brasileira para o Progresso da Ciência - Cerrado: água, alimento e energia, 63ª Reunião,

Goiânia, 2011. Disponível em:

http://www.sbpcnet.org.br/livro/63ra/resumos/resumos/4919.htm. Acesso em 25 abr.

2012.

SILVA, Marcio Ferreira; AZEVEDO, Marta Maria. In: SILVA, Aracy Lopes da Silva.

ET al. (orgs). A temática indígena na escola: novos subsídios para professores de 1º

e 2º graus. Brasília, 1995. P. 151-165.

SOUSA FILHO, Sinval Martins de. Aspectos Morfossintáticos da Língua Akwe-

Xerente (Jê). 2007. 320 f. Tese de Doutorado – Universidade Federal do Goiás,

Goiânia.

TARALLO, Fernado. A pesquisa sociolingüística. São Paulo: Ática, 7ª Ed., 2002.

Recebido Para Publicação em 07 de setembro de 2013.

Aprovado Para Publicação em 23 de novembro de 2013.