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UNIVERSIDADE FEDERAL DE PERNAMBUCO CENTRO ACADÊMICO DO AGRESTE NÚCLEO DE DESIGN CURSO DE DESIGN O Imaginário de Stanley Kubrick: Uma abordagem mito simbólica Desdobramentos no design gráfico e de produção Aluno: Santino Mendes da Silva Jr. Orientador: Eduardo Romero Lopes Barbosa CARUARU, 2016

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UNIVERSIDADE FEDERAL DE PERNAMBUCO

CENTRO ACADÊMICO DO AGRESTE

NÚCLEO DE DESIGN

CURSO DE DESIGN

O Imaginário de Stanley Kubrick: Uma abordagem mito simbólica

Desdobramentos no design gráfico e de produção

Aluno: Santino Mendes da Silva Jr.

Orientador: Eduardo Romero Lopes Barbosa

CARUARU, 2016

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SANTINO MENDES DA SILVA JR

O Imaginário de Stanley Kubrick: Uma abordagem mito simbólica

Desdobramentos no design gráfico e de produção

Monografia apresentada à Universidade Federal

de Pernambuco – Centro Acadêmico do Agreste

UFPE-CAA, como requisito parcial para obtenção

do título de Graduação em Design, sob orientação

do Professor Doutor Eduardo Romero Lopes

Barbosa.

CARUARU, 2016

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UNIVERSIDADE FEDERAL DE PERNAMBUCO

CENTRO ACADÊMICO DO AGRESTE

NÚCLEO DE DESIGN

SANTINO MENDES

O Imaginário de Stanley Kubrick: Uma abordagem mito simbólica

Desdobramentos no design gráfico e de produção

A comissão examinadora, composta pelo membros abaixo, sob a presidência do primeiro,

considera a(o) aluna(o) SANTINO MENDES

APROVADA(O)

Caruaru, 13 de Janeiro de 2016.

Professor Eduardo Romero Lopes Barbosa

Professora Sophia Costa

Professora Luciana Freire

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Catalogação na fonte:

Bibliotecária - Simone Xavier CRB/4-1242

S586i Silva Júnior, Santino Mendes da.

O imaginário de Stanley Kubrick: uma abordagem mito simbólica – desdobramentos no design gráfico e de produção. / Santino Mendes da Silva Júnior. - Caruaru: O Autor, 2016.

83f. ; 30 cm. Orientador: Eduardo Romero Lopes Barbosa. Monografia (Trabalho de Conclusão de Curso) – Universidade Federal de

Pernambuco, CAA, Design, 2016. Inclui referências bibliográficas 1. Kubrick, Stanley, 1928-1999. 2. Imaginário. 3. Design. I. Barbosa, Eduardo

Romero Lopes. (Orientador). II. Título

740 CDD (23. ed.) UFPE (CAA 2016-006)

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Dedicatória

Aos meus pais, Ana e Santino e meus irmãos Sergio, Silvio (In Memoriam) e Sandro (In

Memoriam). A estes dois últimos com carinho especial pelos seus desencarnes terem me

direcionado e impulsionado ao estudo do Design.

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AGRADECIMENTOS

Agradeço ao meu professor orientador Prof. Eduardo Romero pelo estímulo para as

atividades extracurriculares no campo da fotografia;

Às Professoras Luciana Freire, Glenda Cabral, Sophia Costa e Daniella Rodrigues pelo

apoio incondicional;

A Todos os Professores que durante o bacharelado, em maior ou menor escala, ajudaram

na formação do meu conhecimento;

Meu grande irmão extrauterino Marcelo Barbosa;

A Todos os membros do Fotolab e Usina;

Ao amigo Antônio Dias pela ajuda na diagramação;

Agradecimento especial para meu amigo Wolney Leite.

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Epígrafe

“O homem é corda estendida entre o animal e o Super-homem: uma corda sobre um abismo;

perigosa travessia, perigoso caminhar; perigoso olhar para trás, perigoso tremer e parar. O

que é de grande valor no homem é ele ser uma ponte e não um fim; o que se pode amar no

homem é ele ser uma passagem e um acabamento.”

(Friedrich Nietzsche)

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Resumo

Num primeiro momento, expõe-se o trajeto antropológico de Stanley Kubrick

(biografia) fazendo conexão com os escritos de Gaston Bachelard e das Estruturas

Antropológicas do Imaginário propostas por Gilbert Durand, buscando considerações

sobre o processo de construção das imagens mentais de Kubrick, que se materializam na

sua obra. A pesquisa segue com a análise das recorrências na obra de Stanley Kubrick,

identificando simbolismos para adentrarmos na consciência criante do poeta, extraindo ao

máximo seus significados. Desta primeira análise resultará no corte do objeto de estudo,

qual seja, o filme que mais agrupar recorrências e simbolismos da filmografia de Kubrick,

para posterior apreciação. Para tanto fez-se necessário adotar a metodologia da mitocrítica

do imaginário em detrimento das teorias semióticas, as quais, de procedimento

antagônico, isolam o objeto de estudo para a análise. Tal escolha advém da carga simbólica

que traz o artefato (obra cinematográfica). Toda a complexidade na feitura da obra

envolve esforço do autor em diversas esferas que se interligam. Considerar o objeto de

estudo isolado da influência do autor e do pesquisador incorreria num esmaecimento do

olho crítico, quiçá, numa deturpação das informações examinadas. Assim, essa pesquisa

traz à tona a discussão quanto à necessidade de aceitação de outros métodos de análise

na área de design, almejando obter novos prismas a serem considerados sobre artefatos

já, exaustivamente, discutidos de modo “cartesiano”. Nesse contexto, uma postura mais

abrangente, traria um enriquecimento das bases epistemológicas, proporcionando ao

artefato o espaço que requer como objeto de estudo. As análises sobre design gráfico e de

produção serão incluídas no corpo da pesquisa e terão como base a obra de Ellen Lupton

e Jennifer Cole Phillips, Novos Fundamentos do Design.

Palavras-chave: Kubrick. Imaginário. Design.

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Abstract

At first, it exposes the anthropological path of Stanley Kubrick (biography)

connecting with the writings of Gaston Bachelard and the anthropological structures of the

imaginary proposed by Gilbert Durand, seeking consideration of the process of construction

of mental images of Kubrick, who materialize in his work. The research continues with the

analysis of recurrences in the work of Stanley Kubrick, identifying symbolism for we enter the

consciousness of the poet, extracting the most of their meanings. This initial analysis will

result in cutting of the subject matter, namely the film that most recurrences group and

symbolism of Kubrick's filmography, for further consideration. For this purpose it was

necessary to adopt the imaginary methodology to the detriment of the semiotic theories,

which, of adversarial procedure, isolate the object of study for analysis. This choice stems

from the symbolic weight that brings the artifact (cinematographic work). All the complexity

in the making of the work involves the author's effort in various areas that are

interconnected. Consider the isolated object of study of the influence of the author and

researcher incur a washout critical eye, perhaps, a misrepresentation of the information

examined. Thus, this research brings up the discussion on the need for acceptance of other

methods of analysis in the design area, aiming to get new prisms to consider about artifacts

already exhaustively discussed the "Cartesian" mode. In this context, a more comprehensive

approach that bias, would bring an enrichment of the epistemological bases, giving the device

that requires the space as an object of study. Analyses of graphic design and production

design will be included in the body of research and will be based on the work of Ellen Lupton

and Jennifer Cole Phillips, New Fundamentals of Design.

Keywords: Kubrick. Imaginary. Design.

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Lista de fotografias

Fotografia 1: Fotografia vendida para a Revista Look. Kubrick tinha 16 anos de idade. ____________________ 17 Fotografia 2:Kubrick tocando bateria com sua banda de jazz. _______________________________________ 18

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Lista de Ilustrações

Ilustração 1 a 3: Material promocional de Laranja Mecânica _________________________________________ 21

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Lista de frames

Frame 1: Cena de Barry Lyndon filmada com lentes especiais de alta sensibilidade à luz. __________________ 22 Frame 2: Barry Lyndon. ______________________________________________________________________ 28 Frame 3: Laranja Mecânica. ___________________________________________________________________ 29 Frame 4: 2001: Uma odisseia no espaço. _________________________________________________________ 31 Frame 5: Nascido para matar. _________________________________________________________________ 33 Frame 6: Dr. Fantástico. ______________________________________________________________________ 35 Frame 7: A morte passou por perto. ____________________________________________________________ 37 Frame 8: De olhos bem fechados. ______________________________________________________________ 40 Frame 9: 2001 – Uma odisseia no espaço ________________________________________________________ 42 Frame 10: De olhos bem fechados. _____________________________________________________________ 44 Frame 11: 2001 – Uma odisseia no espaço ________________________________________________________ 46 Frame 12: Spartacus _________________________________________________________________________ 49 Frame 13: Laranja Mecânica ___________________________________________________________________ 51 Frame 14: Recorrência Simbólica da Guerra. ______________________________________________________ 54 Frame 15: Recorrência Simbólica do Jogo. _______________________________________________________ 55 Frame 16: Recorrência Simbólica do Xadrez. _____________________________________________________ 55 Frame 17: Recorrência Simbólica do Duplo/Ambivalência. ___________________________________________ 56 Frame 18: Recorrência Simbólica do Túnel._______________________________________________________ 57 Frame 19: Recorrência Simbólica do Amor/Morte. _________________________________________________ 58 Frame 20: Recorrência Simbólica do Teatro. _____________________________________________________ 58 Frame 21: Recorrência Simbólica do Banheiro. ____________________________________________________ 60 Frame 22: Recorrência Simbólica da Arma. _______________________________________________________ 61 Frame 23: Recorrência Simbólica da Máscara. ____________________________________________________ 62 Frame 24: Recorrência Simbólica da Trilha Sonora. ________________________________________________ 62 Frame 25: Jack e a maquete do labirinto. ________________________________________________________ 65 Frame 26: Padrão hexagonal aberto em frente a Danny. ____________________________________________ 66 Frame 27: Padrão hexagonal fechado à frente de Danny. ___________________________________________ 67 Frame 28: Superposição do primeiro e último frames. _____________________________________________ 68 Frame 29: Créditos inicias e mural de fotos. ______________________________________________________ 68 Frame 30: Superposição de símbolos. ___________________________________________________________ 69 Frame 31: O sangue simula um rosto de palhaço em Jack (cílios de Alex Delarge, em Laranja Mecânica). _____ 69 Frame 32: Danny parece presenciar o acordo entre Grady e Torrance. _________________________________ 70 Frame 33: Último e primeiro frames. ___________________________________________________________ 70 Frame 34: Assassinato após verticalidade. _______________________________________________________ 72 Frame 35: Primeira visão de Danny. ____________________________________________________________ 72 Frame 36: Parto do Super-Homem. _____________________________________________________________ 73 Frame 37: Danny fugindo pela janela do banheiro. ________________________________________________ 73 Frame 38: No quarto de Luís XVI. ______________________________________________________________ 74 Frame 39: Entrando no quarto nº 237.___________________________________________________________ 74

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Lista de figuras

Figura 1: Diagrama de recorrências. ...................................................................................................................... 50 Figura 2: Associação ao Minotauro. ....................................................................................................................... 63 Figura 3: Teseu no labirinto do Minotauro. ........................................................................................................... 64 Figura 4: Minotauro empunha seu machado. ........................................................................................................ 65

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Sumário

Introdução....................................................................................................................................... 14

Devaneios de Kubrick: Uma odisseia antropológica........................................................................ 16

O emergir das recorrências............................................................................................................. 25

O Iluminado e suas conexões ......................................................................................................... 53

Considerações sobre a pesquisa e o método.................................................................................. 76

Referências...................................................................................................................................... 78

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Introdução

O design se situa na área de Ciências Sociais Aplicadas, portanto, não se constitui

como uma ciência autônoma, fazendo-se necessário beber de outras ciências para formar

seu arcabouço teórico. Assim, o design é, antes de tudo, interdisciplinar. História da Arte,

Design, Sociedade e Cultura, Teoria da Comunicação, Sistemas de Representação

Tridimensional, Fotolinguagem, Moda e Cinema, Linguagem das Cores, são exemplos de

disciplinas componentes do currículo acadêmico do curso de graduação em design no

Centro Acadêmico do Agreste da Universidade Federal de Pernambuco - CAA-UFPE, e estas

ajudam a formar o profissional em design nas diferentes vertentes que o campo demanda.

Desse modo, o designer se valerá desse conhecimento erigido durante o curso para

desenvolver interfaces de artefatos com o público alvo, elaborar composições gráficas em

cartazes, promover unidade visual em projetos das mais variadas ordens etc. O designer é,

por assim conceituar, um comunicador!

A sétima arte, por se tratar de uma forma de comunicação audiovisual (com sua

linguagem predominantemente visual), vai se relacionar com o design. Dentre as ênfases

de design (moda, produto, gráfico), percebe-se que a construção da película envolve

profissionais para tratar de elaboração de figurino, composição de cenário, objetos de

cena, aplicação e seleção de cores, criação de efeitos especiais e animações, interfaces

digitais para divulgação etc. Esses aspectos visuais são abarcados pela direção de arte

(termo que lentamente cambia para production design, design de produção em

português), que, tendo como suporte o design gráfico, elabora a disposição de objetos,

mobiliário, atores, enfim, compõe visualmente o cenário.

Dentre outros diretores de cinema, Kubrick é ovacionado em seu meio como um

diretor brilhante e seu trabalho ingressou na cultura pop como referência visual, sendo

referendado, parodiado e associado diversas vezes em animações, filmes, séries etc. A sua

atenção despendida na feitura das cenas é refletida no perfeccionismo da construção das

imagens - repletas de simbolismos e compostas minuciosamente quanto aos elementos

constitutivos. Seus filmes trazem em seu bojo as particularidades da fotografia (ofício que

iniciou sua carreira), da perspectiva, e demais composições visuais que são estudadas no

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curso de graduação em design. A obra de Kubrick, com base no exposto até então, figura

como grande acervo no qual se escondem referências importantes a serem desbravadas

no tocante ao design gráfico e design de produção.

O Objetivo Geral é estudar a obra de Stanley Kubrick, valendo-se do método do

imaginário proposto pelo filósofo francês Gaston Bachelard e das estruturas

antropológicas do imaginário propostas por Gilbert Durand, como instrumento

metodológico, identificando as recorrências constantes na obra, para, posteriormente,

analisar o filme O Iluminado e suas relações com a obra de Kubrick.

Especificamente, os objetivos dessa pesquisa versam sobre: 1. O trajeto

antropológico de Stanley Kubrick (biografia) buscando considerações sobre o processo de

construção das imagens mentais de Kubrick, que se materializam na sua obra; 2. Análise

das recorrências na obra de Stanley Kubrick, identificando seu simbolismos. Desta primeira

análise resulta o corte do objeto de estudo, qual seja, o filme que mais agrupar recorrências

e simbolismos de sua filmografia; 3. Análises sobre design gráfico, com base na obra de

Ellen Lupton e Jennifer Cole Phillips “Novos Fundamentos do Design”, e design de

produção (análises pontuais) associadas ao pensamento de Gaston Bachelard e Gilbert

Durand.

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Devaneios de Kubrick: Uma odisseia antropológica

Com fito na pesquisa, cabe-se desbravar os recônditos da mente kubrickiana,

buscando embasar e referendar a construção lógica que se segue. Para tanto, faz-se mister

uma leitura de seu trajeto antropológico1 para que o mesmo forneça as pistas necessárias

para o decodificar de sua linguagem visual, seu simbolismo imaginário.

Nascido no Bronx, NY, aos 26 de julho de 1928, Stanley Kubrick era proveniente de

família judaica, originários da Europa Central e vivia com seus pais, juntamente com sua

irmã mais nova. Não era tido como uma criança comum, sendo visto constantemente

lendo, hábito que herdara de sua mãe. Seu pai médico provia a renda familiar, tendo casa

própria e um laboratório de fotografia (sala escura), seu hobby. Pode-se dizer que os

Kubrick eram de classe alta naquela fase de reestruturação da economia.

Stanley nunca foi um aluno que externasse brilhantismo na escola, de fato, solicitava

todos os dias para fazer os exercícios, junto ao professor, para se livrar logo da lição.

Argumentava que não se sentia interessado por tudo aquilo2. Seu pai percebeu a

inquietação do filho e o iniciou no mundo do xadrez, atividade que o acompanharia até

seus últimos dias e que o proveria de instinto estratégico e mentalidade extremamente

analítica. Paralelamente ao xadrez, Kubrick desenvolvera afeição e habilidade na fotografia

(influenciado também por seu pai ao ganhar sua primeira câmera Graflex no aniversário3),

constituindo sua atividade de grande dedicação. A sala escura de seu pai também foi, sem

dúvida, um avanço para a formação de sua técnica fotográfica.

1 Entende-se por trajeto antropológico como a “maneira própria para cada cultura de estabelecer a relação existente entre sensibilidade (pulsões subjetivas) e o meio em que vive (tanto o meio físico como histórico)” (PITTA, Danielle. Iniciação à Teoria do Imaginário de Gilbert Durand, pg. 21). Assim, o trajeto antropológico é o somatório de todas as situações percebidas pelo sujeito trazendo em seu bojo a carga emocional, racional, subjetiva, cultural e histórica que o compõem, influenciando no meio social no qual inserido, ao mesmo tempo que esse meio o influencia, o molda, delimitando-o como indivíduo sociocultural. 2 Stanley Kubrick: Imagens de uma vida. Direção: Jan Harlan. Estados Unidos. 2001 3 CIMENT, Michel. Conversas com Kubrick. P. 27. São Paulo: Cosac Naify, 2013.

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Kubrick tirou muitas fotografias no seu período de secundarista, sendo eleito o

fotógrafo oficial da escola. Sempre pronto para captar imagens que lhe atraíssem,

registrou o semblante entristecido de um jornaleiro expondo a manchete da morte do

presidente Roosevelt. Vendeu a foto por 25 dólares para a revista ilustrada Look, para a

qual fez duas reportagens fotográficas, antes de ser efetivado como funcionário4.

Fotografia 1: Fotografia vendida para a Revista Look. Kubrick tinha 16 anos de idade.

Fonte: Dufourg, 2015

No período em que trabalhou para a Look pôde fazer experimentações e ampliou seu

conhecimento na área durante 4 anos. Durante esses anos, Kubrick empenhou-se em ler

obras de diversos campos do saber, visando satisfazer sua curiosidade inerente, a qual o

impeliu a ser ouvinte na Columbia University, em Nova York.

Outra paixão de Kubrick, menos notória, era pelo jazz, chegando a ser baterista

amador do estilo. Esse “amálgama” de atividades intensas o estava moldando com o

4 Idem.

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tempo. Sua sagacidade e estratégia estimulada pelo xadrez, seu senso de enquadramento

e plástica desenvolvido pela fotografia e o jazz pontuando seu apreço pelo ritmo,

montagem e sensibilidade artística5.

Fotografia 2:Kubrick tocando bateria com sua banda de jazz.

Fonte: Harlan, 2001.

No fim dos anos de 1940, Stanley está casado, vivendo em Greenwich Village e

estimula seu lado eclético assistindo aos filmes de arte no Museu de Arte Moderna de Nova

York. No início dos anos 1950, decide enveredar para sua paixão definitiva, o cinema. Inicia

sua carreira com um curta-metragem chamado Day of the Fight (1951), onde retrata o

cotidiano de um pugilista e sua saga de um dia de luta. Tão logo finalizou o trabalho, pediu

demissão da Look, dedicando-se com exclusividade à sétima arte6. Seu sustento advinha

da arrecadação que conseguia com seus curtas-metragens subsequentes, Flying Padre

(1951) e The Seafarers (1953), além de prêmios de campeonatos de xadrez.

Seu pai, uma vez mais apoiando o filho, custeou com o dinheiro do seguro de vida o

primeiro longa-metragem, Medo e Desejo7 (1953). O filme trata de uma guerra fictícia, onde

os soldados, recém-saídos dum acidente aéreo, se encontram em terras inimigas.

5 Ibidem. 6 Stanley Kubrick: Imagens de uma vida. Direção: Jan Harlan. Estados Unidos. 2001. 7 Stanley Kubrick: Imagens de uma vida. Direção: Jan Harlan. Estados Unidos. 2001. Cd 1.

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Posteriormente, insatisfeito com o amadorismo do primeiro trabalho, empenhou-se em

tirá-lo de circulação, tendo no mercado apenas cópias, porém a película serviu para expor

Kubrick como diretor e ajudar a pagar seu próximo projeto, A morte passou por perto.

Durante as gravações de A morte passou por perto (1955), conheceu sua segunda esposa,

Ruth Sobotka. Apesar de ressaltar sua capacidade como diretor, o filme não recupera o

valor investido.

Por volta de 1956, juntamente com James B. Harris, filho do proprietário da Flamingo

Films, distribuidora de cinema e televisão, fundam a Harris-Kubrick Pictures, quando

produzem O Grande Golpe (1956), longa-metragem lançado com apoio financeiro da United

Artists. O trabalho que segue é a película Glória feita de sangue (1958), com Kirk Douglas.

No processo conheceu Christiane. Mudou-se para Los Angeles onde casou-se, vindo a

mudar-se para Hollywood onde o casal teve duas filhas. Glória feita de sangue rendeu-lhe a

notoriedade que merecia, sendo cogitado posteriormente para dirigir, por indicação de

Kirk Douglas8, o épico Spartacus (1960). Tal decisão de dirigir um filme, o qual já haviam

sido iniciadas as filmagens, lhe ensinou algo importante – não voltaria a trabalhar em

projeto onde não tivesse controle total nos direitos e não tivesse poder de ingerência na

montagem do mesmo.

Em 1962, filmou na Grã-Bretanha Lolita (1962), numa volta à parceria com James B.

Harris. O filme foi inspirado num romance de Vladimir Nabokov e foi motivo de

controvérsia, por parte da comunidade moralista. A própria Igreja Católica emitiu nota

condenando o filme e divulgando que seria pecado assisti-lo.

Com o sucesso de Lolita e vivendo na Grã-Bretanha, Kubrick produz, sozinho, seu

próximo filme, Dr. Fantástico (1963), uma comédia satírica abordando o terror nuclear no

início da guerra fria, trazendo para interpretar três papeis diferentes, Peter Sellers (que

também trabalhou em Lolita). O designer de produção Ken Adams chegou a ser chamado

a atenção por Stanley sobre a possibilidade do FBI o procurar para averiguar suas

8 CIMENT, Michel. Conversas com Kubrick. P. 33. São Paulo: Cosac Naify, 2013.

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referências, devido à impressionante fidelidade na réplica do interior das aeronaves,

informação que era segredo militar9.

No final dos anos 1960, Kubrick estava com respaldo no segmento cinematográfico,

independente de Hollywood. Em 1968 lançou 2001 – Uma odisseia no espaço, o qual trouxe

inovações no campo de efeitos especiais, conseguindo um oscar por tal categoria. A

película dividiu opiniões. Alguns executivos da “velha guarda” não gostaram do filme,

achando-o enfadonho e muitos deles deixaram a sala de exibição antes do seu término. “É

o fim de Kubrick”, eles diziam. Porém, a obra estava à frente de seu tempo, conforme

palavras de Woody Allen: “Foi uma das poucas vezes na minha vida em que percebi que o

artista estava muito na minha frente”10. Ironicamente, a Igreja Católica premiou Stanley

com o Prêmio Católico Nacional pelo modo criativo como promoveu o encontro do homem

com o universo.

Após 2001 – Uma odisseia no espaço, Kubrick se dedicou a pesquisar sobre seu

personagem histórico favorito: Napoleão. Passou meses pesquisando e idealizando um

filme, porém, devido a um fiasco de bilheterias lançado recentemente, Waterloo, não

conseguiu apoio necessário para prosseguir com o projeto.

Mais uma polêmica vem a eclodir na vida de Kubrick após o lançamento da adaptação

do romance de Anthony Burgess para o cinema, Laranja Mecânica (1971). O filme traz um

futuro meio apocalíptico, demonstrando uma desestruturação da sociedade britânica. É

narrado também em primeira pessoa (artifício muito utilizado pelo diretor) pelo

personagem principal, Alexander DeLarge, um delinquente viciado em leite aditivado com

drogas e adepto da ultraviolência. Kubrick foi acusado de incitação à violência devido ao

fato de muitos jovens praticarem atos violentos inspirados no filme, inclusive homicídios.

Stanley recebia ameaças constantemente, chegando a ter sua família também ameaçada.

Resolveu por cobrar a interrupção da exibição da película na Inglaterra, onde o filme era

sucesso por 61 semanas. A Warner Brothers decidiu acatar a exigência de Kubrick, uma vez

que era preferível que ele não ficasse descontente com a empresa, que o teria para

9 Stanley Kubrick: Imagens de uma vida. Direção: Jan Harlan. Estados Unidos. 2001. Cd 1. 10 Stanley Kubrick: Imagens de uma vida. Direção: Jan Harlan. Estados Unidos. 2001. Cd 1.

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sucessivos filmes. Kubrick extrapolou sua função de diretor e trabalhou orientando a

produtora com material promocional para vender o filme, mesmo sem sua exibição na

Inglaterra. Na verdade, Stanley acompanhava a criação do material promocional de todos

seus filmes. É seu impulso para guiar o espectador ao ponto que ele quer que seja

interpretado de sua obra, numa mídia diferente, associada ao conteúdo de cada filme.

Ilustração 1 a 3: Material promocional de Laranja Mecânica

Fonte: Harlan, 2001.

O trabalho subsequente de Stanley foi Barry Lyndon (1975), filme que conta a história

de um alpinista social em busca de status e poder. O filme se passa no século XVIII. Kubrick

entrou em contato com John Calley, ex-presidente da Warner Brothers, procurando por

câmeras Mitchell B.N.C. especiais (tipo de câmeras que não se produziam mais). Calley

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mandou-lhe duas dessas câmeras que não estava utilizando, só depois percebendo que se

tratava de material raríssimo e de qualidade que não poderia ser copiada. Kubrick utilizou

as câmeras modificadas para aceitarem lentes Zeiss, produzidas especialmente para a

NASA para registro de fotografias de satélite. Seu desiderato era captar imagens com luz

natural e com pouca iluminação, proveniente de velas, em seu novo filme. A abertura do

diafragma era f: 0,7, permitindo registrar imagens belíssimas com pouca luz. A exemplo de

seus outros filmes, Kubrick se esmerou na seleção da trilha sonora clássica, característica

presente em outros de seus trabalhos, como em Laranja Mecânica. Apesar de ganhar alguns

prêmios e ter sua beleza reconhecida na Europa, o filme não foi um grande sucesso

comercial, sendo chamado de entediante pela crítica – isso deixou Kubrick entristecido11.

Frame12 1: Cena de Barry Lyndon filmada com lentes especiais de alta sensibilidade à luz.

Fonte: Kubrick, 1975.

O projeto que viria a seguir abordaria as duas frentes: o satisfaria artisticamente e

também a demanda que as bilheterias exigia. O Iluminado (1980) era um best-seller de

11 Stanley Kubrick: Imagens de uma vida. Direção: Jan Harlan. Estados Unidos. 2001. Cd 1. 12 Frame (moldura, em português) é um quadro estático que, postos em sequência com outros, criam a ilusão do movimento, em um produto audiovisual. É utilizado comumente em animações, colocados em sequência para transmitir a sensação de movimento. No cinema, são fotografias sequenciadas numa velocidade, em sua maioria, de 24 frames por segundo.

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Stephen King e Stanley assediou King para conseguir os direitos para fazer sua versão no

cinema. O filme tem forte carga de simbolismos e referências a outros trabalhos do diretor.

Expõe a jornada à loucura de um homem que se muda para um hotel com sua família e vê-

se num frenesi, transformando-se completamente. Várias “teorias da conspiração” foram

associadas à película, como o boato de que o homem não teria ido até a lua, sendo cogitado

que Kubrick teria produzido a alunissagem e os primeiros passos do homem no satélite

terrestre.

O Iluminado também trouxe opiniões divergentes da crítica, uns elogiando seu

caráter enigmático, outros condenando por se distanciar tanto do livro que o originou.

Após um hiato de sete anos desde O Iluminado, Kubrick voltaria a dirigir, dessa vez,

um filme sobre a Guerra do Vietnã – Nascido para Matar (1987). Stanley tinha planos de

trabalhar em algo sobre guerra que fosse imparcial, sem tender para o convencimento

antibelicista, e sim tratar a guerra como um fenômeno. Assim, pesquisou vasto material

sobre o tema, inclusive mais de cem horas em documentários em vídeo. O filme é

adaptação de The Short-timers, de Gustav Hasford, com quem, juntamente com Michael

Herr, escreveu o roteiro.

Mesmo com outros trabalhos cinematográficos abordando o mesmo tema terem

estreado pouco tempo antes, Nascido para Matar teve grande público por trazer, mais uma

vez, a assinatura de Kubrick às telas.

Por volta dos anos 1990, Kubrick estava engajado no projeto do filme Inteligência

Artificial, chegando a providenciar sketches retratando a composição visual da película.

Porém, entrou em contato com Steven Spielberg para oferecer-lhe a direção do longa-

metragem, argumentando que Spielberg teria mais sensibilidade para com o tema.

O período que se seguiu foi de reclusão, como de costume. A mídia reiterava

comentários sobre a excentricidade de Stanley, chamando-o de louco copiosamente.

Seu trabalho final, De olhos bem fechados (1999), o qual demorou 14 meses para ser

filmado, foi inspirado no conto Traumnovelle, de Artur Schnitzler.

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A película percorre os aspectos psicológicos de relacionamentos maritais, trazendo

para as telas, o então casal, Tom Cruise e Nicole Kidman.

Stanley Kubrick faleceu em 7 de março de 1999, de infarto, logo após finalizar os

cortes de De olhos bem fechados.

Kubrick tinha um ímpeto de fazer um filme definitivo para cada gênero que abordara

em sua carreira (guerra, drama, ficção científica, comédia, terror). Passeara por esses

gêneros impelido fortemente por seu espírito curioso. Nunca cedeu às exigências de

Hollywood em detrimento de sua vontade de fazer o que queria no cinema. Não é de se

espantar que nunca tenha ganhado da academia oscar de melhor diretor, pois figurava ao

lado de nomes ilustres como Orson Welles, Alfred Hitchcock, Charles Chaplin, Fritz Lang,

Howard Hawks etc, esses também insurgentes que não se curvavam ao bel prazer de

Hollywood.

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O emergir das recorrências

Após a compilação dos acontecimentos relevantes da história de vida de Stanley

Kubrick, o próximo passo é estudar sua obra cinematográfica, procurando, ao fim desta

seção, determinar elementos que proporcionem os símbolos recorrentes na arte de

Kubrick, para posterior análise. Pontos que foram expostos na seção anterior (como, por

exemplo, o jogo de xadrez), serão revisitados em sua obra, refletindo sua história de vida.

Para compreender a pesquisa que se segue, faz-se necessário um preâmbulo definindo a

teoria que norteia este estudo.

Os estudos sobre o imaginário tiveram início com Gaston Bachelard, filósofo francês,

o qual erigiu as bases para o Novo Pensamento Científico, a complexidade essencial. Os

elementos constitutivos da complexidade são o racionalismo e o realismo, contraditórios

por natureza, mostrando assim o maniqueísmo percebido entre o conhecimento objetivo

e o subjetivo. Bachelard visando alcançar uma epistemologia não-cartesiana, para

contrapor às bases em vigência do pensamento científico, priorizou as imagens poéticas

como formação do pensamento, as quais se compõem através dos elementos

fundamentais da natureza: fogo, terra, água e ar (FREITAS, 2000).

Nota-se o contraponto do método do imaginário em relação ao método da semiótica,

o qual funda-se no isolamento do objeto do estudo para uma leitura analítica dos

elementos constitutivos deste, ao passo que o método do imaginário reconhece ambos os

polos da relação pesquisador X objeto de estudo, presumindo a existência de uma mútua

influência entre eles.

Na obra A Poética do Devaneio (1960), Bachelard aponta que a abstração é o que

orienta a consciência criante do poeta, promovendo a concepção das imagens poéticas,

fonte indissolúvel do sujeito. Nesta pesquisa, essas imagens poéticas recorrentes se

apresentarão materializadas na obra de Kubrick, nos guiando para o objeto de estudo.

Entende-se por recorrência como a repetição de elementos simbólicos inconscientes do

sujeito, elementos esses que transmitem seu cerne, exteriorizando os símbolos, que são

reflexos do trajeto antropológico (conforme apontado na primeira nota de rodapé).

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Bachelard promoveu essa abertura no campo do imaginário, interstício este que não

fixava nenhum método específico ante a apreciação do artefato de arte sob esse novo

pensamento científico. Gilbert Durand (1921-2012), antropólogo francês discípulo de

Bachelard, estabeleceu As Estruturas Antropológicas do Imaginário (1997), ensaiando um

possível método preliminar de compreender como se dá a dinâmica do mito. Através da

recursividade, seria possível identificar os símbolos exteriorizados pelas recorrências

observadas ao longo da obra a ser estudada.

Ellen Lupton e Jennifer Cole Phillips propõem em sua obra Novos Fundamentos do

Design uma volta aos princípios fundamentais da escola Bauhaus, princípios estes que

ajudaram a formar o arcabouço intelectual do profissional de design no campo da

percepção visual. A Bauhaus inspirou novos pensadores do design como Albers e Moholy-

Nagy, os quais adaptaram esses fundamentos para novas mídias que surgiam com os

avanços da tecnologia, inspirando sucessivos educadores na estruturação de seus

pensamentos, tais como Gyorgy Kepes, Johannes Itten, Gui Bonsiepe, Armin Hoffamann,

Katherine McCoy, entre outros (LUPTON e PHILLIPS, 2008, pg. 8). Elementos como a

transparência e camadas são exemplos que refletem essas novas tecnologias,

principalmente na informática. Assim, a pesquisa se dará sob a luz desses novos

fundamentos visuais, permeando entre o design gráfico e o design de produção, para

decodificar as imagens compostas por Kubrick no cinema.

Stanley foi metódico durante sua carreira como diretor – extremamente

perfeccionista, chegava a gravar uma cena mais de uma centena de vezes para que

alcançasse o que procurava. Kubrick sabia o que queria retratar e transmitir em suas

películas. Seria sem sentido Kubrick ser tão perfeccionista na execução/produção de seus

filmes se não tivesse uma imagem preconcebida em sua mente, a qual serviria como

modelo a ser atingido. Poder-se-ia dizer tratar-se de “a imagem perfeita de Kubrick”.

Porém, não apenas num plano visual se manifestam as recorrências simbólicas na obra,

podendo estas assumirem noções não tão óbvias.

Kubrick, num nível mais conceitual, trabalhou a dualidade em seus filmes. Essa faceta

dupla pode ser apreendida mais notoriamente em referências diretas, como nas gêmeas

que surgem em O Iluminado (1980), porém, pode se fazer presente de modo menos

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veemente, como em Laranja Mecânica (1970), onde temos o delinquente Alex em oposição

ao novo bom Alex, praticamente lobotomizado pelo método Ludovico. A ironia da

dualidade é ressaltada em Nascido para Matar (1987), quando o soldado Joker é interpelado

pelo superior sobre o símbolo da paz em seu capacete, ao qual lhe é respondido tratar-se

da dualidade do homem, “uma coisa junguiana”. Em Medo e Desejo (1953), os protagonistas

e os inimigos são interpretados pelos mesmos atores, desempenhando dois papéis cada.

Em Glória feita de sangue (1957), como também em Spartacus (1960), temos a figura do

herói se contrapondo ao militar covarde. Em Lolita (1962), é sugerido que o prenome e o

nome do protagonista seria Sr. Humbert Humbert. Na sinfonia visual, 2001 – Uma odisseia

no espaço (1968), o duplo se traduz entre macaco e homem, entre homem e máquina. A

dualidade também é evidenciada em conceitos como nobreza e pobreza, em Barry Lyndon

(1975). Destarte, o termo dualidade pode ser substituído, sem perda de teor semântico,

por ambivalência, pois, segundo Ferreira13 (2013):

A ambivalência apresenta direções que, embora opostas, aproximam-se e harmonizam-se graças ao sonho e aos devaneios. No campo das imagens poéticas, a ambivalência é mais ativa, sutil e mais ampla do que a antítese das ideias, devido à indeterminação propiciada pela imaginação. Os polos da ambivalência tocam-se, harmonizam-se, aproximam-se, “contraem-se” no instante poético.

Ferreira (2013) ainda cita Bachelard:

O interesse que um sonhador dá às lutas de duas matérias indica uma verdadeira ambivalência material. Não se pode viver a ambivalência material senão dando alternadamente a vitória aos dois elementos. Se pudéssemos caracterizar a ambivalência de uma alma na mais simples de suas imagens, longe dos dilaceramentos da paixão humana, como tornaríamos compreensível o caráter fundamental da ambivalência!14

Essa ambivalência promove a dinâmica em sua obra, de modo a nos impelir a

perscrutarmos os polos desse universo maniqueísta, não se atendo apenas aos extremos,

mas absorvendo todo o meio que permeia a profundidade do ser humano.

13 FERREIRA, Agripina Encarnación Alvarez. Dicionário de imagens, símbolos, mitos, termos e conceitos bachelardianos. Livro eletrônico. Londrina: Eduel, 2013, 18. 14 FERREIRA apud BACHELARD, pg. 19, op. cit.

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Frame 2: Barry Lyndon.

Fonte: Kubrick, 1975.

Análise do Frame 2

O frame capturado enquadra Barry, sua Senhora com o filho e o enteado ao centro, à direita, seus asseclas, à esquerda, as amas da Condessa. A iluminação pretendida pelo diretor visava remontar cenários do séc. XVIII que apreendeu nas pesquisas de obras pictóricas da época. A luz ambiente é natural e proveniente de extensas janelas situadas no cômodo. Essa iluminação foi captada por lentes especiais, como dito anteriormente. O figurino se valeu também de peças originais inglesas do séc. XVIII, a pedidos de Stanley (LIMA, 2010)15. As cores em tons pastéis com paleta de brancos, vermelhos e azuis, castanhos e verdes seguem à vigência de moda da época.

O ambiente é uma biblioteca. Os livros dispostos na estante formam um grid, que “é uma rede de linhas.”16. O grid é formado por entrelaçamento de linhas horizontais e verticais, porém pode-se apresentar com elementos irregulares, circulares e angulosos. Manchas gráficas de livros, linhas-guia de softwares gráficos, uma página de história em quadrinhos são exemplos de grids. Designers trabalham grids para criação de leiautes, organizando informações e arranjando imagens, trabalhando elementos tanto simétricos como assimétricos (LUPTON e PHILLIPS, pg. 175). As pranchas cruzam com os feixes de linhas das lombadas dos livros provocando o efeito grid. O papel de parede apresenta padrões ornamentais simétricos que repetem-se formando a superfície. Esse fundamento é apontado por Lupton e Phillips como padronagem. A padronagem tem relação com a ornamentação utilizada no século XIX,

15 LIMA, Laura Ferrazza de. Disponível em < http://www.coloquiomoda.com.br/anais/anais/6-Coloquio-de-Moda_2010/71769_O_seculo_XVIII_no_cinema_-_a_recriacao_de_epoca_em_Bar.pdf> 16 LUPTON, Ellen; PHILLIPS, Jennifer Cole. Novos fundamentos do design. São Paulo: Cosac Naify, 2008. Pg. 174.

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porém, sendo desconsiderada pelos designers do século XX em favor da simplicidade. Com os avanços tecnológicos, trabalhos de design envolvendo a padronagem tem sido mais frequente. A padronagem consiste numa repetição de elementos que podem ser pontos, faixas e grids, ou ainda o cruzamento destes elementos. Essa repetição pode ser produzida por máquina ou código, seja através de um grid mecânico, um algoritmo digital ou pelo ritmo físico de uma ferramenta, por exemplo (LUPTON e PHILLIPS, 2008, pg. 185). Também é trabalhada no design de superfície.

Fundamentos: padronagem, grid, cor, linhas, planos, hierarquia, equilíbrio.

À cada película, aspectos de Kubrick são refletidos no nível mais elementar, sua

paixão pelo xadrez presente em alguns filmes, como, por exemplo, no Dr. Bowman

jogando com o computador HAL 9000 em 2001 - Uma odisseia no espaço; o Sr. Humbert

jogando com a companheira em Lolita; o padrão do tabuleiro no piso da residência

assaltada pelos protagonistas em Laranja Mecânica; a quadrilha reunida no Clube de Xadrez

em O Grande Golpe (1956). De acordo com o Dicionário de Símbolos de Jean Chevalier (1986,

pg. 67) o xadrez está relacionado à estratégia de guerra, ao conflito da peças negras e

brancas, um combate da sombra com a luz, os titãs contra os deuses. O xadrez simboliza

também o equilíbrio que as forças opostas resultam. O simbolismo do xadrez se coaduna

com a recorrência à dualidade/ambivalência abordada anteriormente.

Frame 3: Laranja Mecânica.

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Fonte: Kubrick, 1970.

Análise do Frame 3

Nesta cena de Laranja Mecânica, o uso de espelhos dá a impressão de expansão do ambiente,

provocando uma sensação de simetria. Sutis elementos desafiam quebrar essa simetria, forçando-a até

o ponto onde pode ser percebida. O uso de espelhos também provoca um efeito de multiplicação do

ponto de luz. O facho de luz da luminária que se encontra ao fundo se reflete no espelho esquerdo, que

reflete na porta.

O padrão de tabuleiro de xadrez se mostra óbvio ao longo do piso da residência - o fundamento de

linhas e planos. Linha e plano são dois dos três elementos constitutivos do design. De fato, percebe-se

que ponto, linha e plano são as unidades mínimas que compõem qualquer outro grafismo utilizado no

design, seja na tipografia, textura, formas, etc. A linha pode ser conceituada como um ponto em

movimento, ou ainda, uma série infinita de pontos (LUPTON e PHILLIPS, pg. 15-16). Nesse contexto, a

linha possui comprimento, mas não tem largura. As linhas podem se apresentar nos trabalhos de design

paralelas, diagonais, curvas, formando texturas e até sendo sugerida em manchas tipográficas e

elementos gráficos. As linhas que compõem as vigas do teto da antessala seguem diminuindo

gradativamente criando a perspectiva espacial. O plano é uma linha em movimento e possui tanto

comprimento, como largura. Pode se apresentar em diversos formatos e são percebidos por toda parte,

através de paredes, tetos, manchas gráficas, outdoors, etc. o plano fica bem evidente nas paredes, nos

espelhos e no piso.

Fundamentos: linhas, planos, cor, enquadramento, assimetria.

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Não apenas o jogo de xadrez, especificamente, mas também nota-se na obra de

Kubrick, a disputa, de um modo geral. As lutas de boxe presentes em A morte passou por

perto (1954) e em Barry Lyndon; o judô na tela da TV em 2001 – Uma odisseia no espaço, os

duelos em Spartacus e Barry Lyndon; o pingue-pongue em Lolita, a corrida de cavalos em O

grande golpe (CIMENT, 2013, pg. 65) são alguns dos exemplos. Essa disputa se dá não

apenas no plano físico, como também no psicológico – o jogo entre Humbert e Charlotte

em Lolita, por exemplo, traduz um conflito onde o protagonista tenta resolver sua situação

com a companheira e a enteada; HAL 9000 vs. Dr. Bowman é um retrato do antagonismo

homem x máquina em 2001 – Uma odisseia no espaço. Enfim, o dinamismo da ambivalência

se materializa em forma de jogo, seja no xadrez, no boxe, na corrida de cavalos, no duelo,

no pingue-pongue, etc.

Conforme Chevalier (1986)17, o jogo simboliza uma luta contra a morte, os elementos,

as forças hostis e contra si mesmo. Mesmo em suas diversas modalidades, o jogo associa-

se às noções de totalidade, regra e liberdade, numa busca pela ordem em detrimento da

anarquia. É a escolha da cultura em contraponto ao estado da natureza, do voluntário ao

espontâneo.

Frame 4: 2001: Uma odisseia no espaço.

17 Op. cit. Pg. 610.

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Fonte: Kubrick, 1968.

Análise do Frame 4

Na cena, o Dr. Bowman joga xadrez com HAL 9000. Nessa captura, a iluminação vem, exclusivamente,

dos monitores. O ambiente escuro passa um aspecto solitário, como a situação pede. A posição da

câmera enquadra os elementos (protagonista, tabuleiro de xadrez, o “olho interface” de HAL, e alguns

monitores), e o rosto do Dr. Bowman é focado em ¼ do perfil, por atrás, com a luz proveniente do

tabuleiro delineando sua face.

À frente do Dr. Bowman estão monitores com gráficos nas telas. Diagramas são meios gráficos de

representação, envolvendo, em sua maioria, números, sequências, relações e o passar do tempo. Tais

informações seria ininteligíveis se expostas em tabelas ou listas, ou, pelo menos, seriam incompletas. Os

diagramas são estruturas organizadas graficamente que permitem a interação de todos esses dados, de

modo a deixar mais fluida e compreensível a totalidade informacional. São aplicáveis em diversas

representações abarcando hierarquias e estruturas lineares ou não. Com um olhar um pouco mais

aprofundado, podemos perceber que outros fundamentos do design visitados nessa pesquisa confluem

para a elaboração de diagramas, por exemplo, linhas, planos e pontos nos gráficos do frame em

questão, além de camadas, cor, hierarquia etc. O estudioso de diagramas Edward R. Tuft pregava que

todo o floreio desnecessário nos diagramas contradiziam o caráter objetivo do diagrama, propondo

uma desvinculação do design gráfico e informacional. Lupton e Phillips (2008, pg. 199) refutam o

pensamento de Tuft por tolher por demais as possibilidades que podem agregar o design informacional

e o gráfico. Quanto mais ‘ferramentas’ dispomos para representar diagramas, mais completos podem

estes se tornar, e transmitir uma quantidade de dados bem maior, de acordo com a necessidade do que

se quer representar.

Fundamentos: diagrama, planos, hierarquia.

Seguindo essa questão conflituosa, Kubrick abordou, em sua obra, a forma de

violência institucionalizada, ou melhor, a guerra. Tanto em seus trabalhos da fase inicial

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(Medo e Desejo e Glória feita de sangue), como prosseguindo em Dr. Fantástico (1964),

Spartacus e Barry Lyndon, e ainda trazendo o tema à tona em Nascido para matar.

Num sentido ideal, a guerra teria conotações nobres, uma vez que visam a destruição

do mal, o restabelecimento da justiça e da harmonia18. Chevalier (1986) faz alusão à guerra

como função dos kshatryias, que são uma das castas do hinduísmo que compreende postos

de militares de alta patente e governantes. Khrisna, assim como Buddha, seriam

kashatryias, inclusive o próprio budismo se vale da imagem do guerreiro amplamente.

Porém, tanto nesse caso como no cristianismo, a guerra representa uma batalha interior,

onde o homem enfrenta a si mesmo num esforço para domar suas inclinações más,

incorrendo num combate entre trevas e luz. É uma guerra santa (apesar do antagonismo

que a justaposição dos vocábulos transparece), todavia, as armas e os conflitos são de

ordem espiritual (CHEVALIER, 1986).

Frame 5: Nascido para matar.

Fonte: Kubrick, 1987.

18 CHEVALIER, Jean; GHEERBRANT, Alain. Diccionario de los símbolos. Barcelona: Herder,1986, 545-546.

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Análise do Frame 5

A externa se vale da luz natural num pôr do sol. A iluminação mais difusa acentua os tons pastéis dos

fardamentos militares e das paredes do templo onde encontram-se. Nessa cena, percebemos um

enquadramento com um ponto de fuga levemente deslocado para a direita, na linha do horizonte.

O enquadramento é um limite. Esses limites estão constantemente presentes no campo visual e são

praticamente impossíveis de serem dispensados pelo designer. Molduras em quadros, margens de

páginas de livros, bordas de janelas em interfaces digitais, telas de dispositivos móveis e câmeras digitais,

janelas na parede da casa, pires ao redor de uma xícara, são exemplos de enquadramentos da vida

cotidiana. Designers contemporâneos tendem a omitir a moldura com dimensões perceptíveis, por

exemplo, no uso de imagens sangradas no campo do design editorial. Porém, mesmo sangrando as

fotografias ainda persistem as dimensões da página onde foi impressa, causando o efeito que o

profissional desejar. Num projeto bem executado, a interface de enquadramento, seja ela explícita ou

sugerida, trabalha numa sinergia “silenciosa” com o objeto ou imagem que delimita, à medida em que

o compartimenta, chama atenção para o interior da composição, cumprindo sua função e deixando de

ser percebida (LUPTON & PHILLIPS, pg. 100). O próprio frame em análise já sofre um enquadramento

forçadamente pelo formato em que foi filmado. As tarjas pretas aos lados indicam não ser em formato

wide screen. O enquadramento circular do frame dirige o olhar do espectador para o ambiente onde

estão os soldados, colocando-os como principais elementos visuais na captura. Mais ao fundo, outro

enquadramento circular revela o plano do horizonte. O enquadramento dentro de outro

enquadramento, que por sua vez, está enquadrado na tela do cinema, direciona o olhar do espectador

para o que realmente está nos planos do diretor evidenciar.

Fundamentos: enquadramento, linhas, textura.

Ocorre uma repetição à referência ao rifle feita em Glória feita de sangue e em Nascido

para Matar, ambos filmes de guerra. No primeiro caso, o oficial dirige-se ao recruta

ressaltando que o rifle é o melhor companheiro do soldado. Em Nascido para Matar, a arma

é colocada em um altar pelo instrutor perante o grupo. O simbolismo que a arma traz é

apontado por CHEVALIER como o oponente do monstro, que pode se tornar o monstro.

“Forjada para lutar contra o inimigo pode ser desviada de seu objetivo e servir para

dominar o amigo, ou a outrem. (...) A ambiguidade da arma reside em simbolizar, ao mesmo

tempo, o instrumento da justiça e da opressão, a defesa e a conquista.” (CHEVALIER, 1986,

pg. 139). Em sonhos, as armas podem simbolizar conflitos internos.

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Frame 6: Dr. Fantástico.

Fonte: Kubrick, 1964.

Análise do Frame 6

O frame capturado é do filme Dr. Fantástico (1964). Nota-se que o foco da câmera está na placa com os dizeres Peace is our profession (Paz é a nossa profissão, em português) em médio plano. A arma em primeiro plano, desfocada nos limites de sua dimensão, permite que seja visualizada a placa ao fundo, numa pequena faixa de translucidez. A fumaça provocada pela combustão da pólvora gera uma nuvem translúcida que, ora está densa, ora está suave. A transparência pode ser entendida como o grau de opacidade que determinado elemento gráfico ou material detém. Uma folha de transparência de retroprojetor pode ter grau de opacidade próximo a zero, assim como uma folha sulfite tem grau de opacidade próximo a 100. Esse recurso é bastante enriquecedor nos trabalhos desenvolvidos por designers de todas as ênfases: na moda, o uso de seda e outros tecidos translúcidos, em produto, com aplicações de superfícies vítreas de diferentes cores e texturas, e, por fim, no design gráfico, com uso de papel vegetal, pastel seco esfumaçado e nas ferramentas de programas gráficos, que regulam o graus de opacidade dos objetos. A fusão de imagens no cinema é um exemplo onde a transparência se mostra, por menor que seja o tempo em que uma imagem e a subsequente ocupam o mesmo espaço. A transparência também se evidencia no cinema nos recursos de fade in e fade out, quando as imagens tendem a ganhar ou perder sua opacidade em relação com o fundo (LUPTON & PHILLIPS, pg. 147).

Fundamentos: transparência, escala, hierarquia.

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Seguindo com recorrências presentes em sua obra, uma que salta os olhos é a

teatralidade. O palco, cenário de tantas tragédias e desventuras, surge em A morte passou

por perto, no flashback em que mostra a irmã da protagonista bailando na extensão do

estrado. A teatralidade também pode ser apreciada na peça encenada em Lolita. Em Glória

feita de sangue temos a tímida moça que canta para os soldados no tablado; ou, como pano

de fundo para as doentias façanhas da gangue de Billy Boy em Laranja Mecânica. O palco

também ambientaliza a cena do mágico em Barry Lyndon.

Conforme Chevalier (1986)19, Antonin Arthaud propôs uma diferenciação entre o

teatro oriental de tendência metafísica e o teatro ocidental de tendência psicológica. Desse

modo, ficam bem distintas as tendências de cada teatro, ou seja, o divino e o profano. Na

Índia, como os shastra ensinam, o teatro é o quinto veda, o nãtyaveda criado por Brahma e

serve para a edificação de todos, uma vez que os quatros primeiros veda não podem ser

ouvidos pelo povo de baixa natalidade. É um compêndio dos símbolos, através dos quais

devem perceber o caminho da virtude. É a representação da luta eterna entre os deva e os

asura20. Essa forma de liturgia muito marcante na arte teatral da Ásia, apesar da

classificação de Arthaud, também se faz presente, ao menos um pouco, no teatro clássico

grego. A tragédia ateniense é um exemplo, uma vez que trata-se de uma representação

dramática homenageando uma divindade. Por sua vez, os mistérios medievais

representam os três mundos: o Céu, a Terra e o Inferno – anjos, homens e demônios,

simbolizando os estados do ser. De modo geral, o teatro é uma representação do mundo

que se manifesta diante dos olhos do espectador21. A experiência vivenciada pelo

espectador é a catarse, fenômeno que purifica seu espírito ao se transportar para o ator,

identificar-se com os personagens, e compartilhar dos mesmos sentimentos. Nesse

sentido, o teatro simboliza uma libertação do espectador, trazendo à superfície o cerne do

ser que estava nas profundezas do inconsciente.

Numa associação ambivalente, pode-se identificar os polos que a interpretação

teatral carrega: num dos polos está a pessoa do ator, com sua individualidade e

personalidades próprias e características; no outro polo encontra-se o personagem, o qual

19 Op. Cit. Pag. 981. 20 Op. Cit. Pag. 981. 21 Op. Cit. Pag. 981.

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traz características diversas da do ator, o qual terá que incorporá-lo e assumir sua

identidade.

Frame 7: A morte passou por perto.

Fonte: Kubrick, 1954.

Análise do Frame 7

Segundo Lupton e Phillips (2008, pg. 215), o tempo e o movimento são conceitos que se entrelaçam: o

movimento se trata de um tipo de mudança, e toda mudança se desenvolve no tempo. No âmbito do

design, esse fundamento é trabalhado, sobretudo, no cinema e na televisão, seja através de filmes ou

animações, partindo do princípio da persistência retiniana, quando os frames são expostos em fração

de segundo, causando a impressão de movimento. A internet também é um ambiente de divulgação de

animações de diversas ordens como giffs e animações feitas em softwares gráficos, como textos em

movimento para atrair usuários. Porém, não apenas imagens “dinâmicas” são suporte para o designer

transmitir a sensação de tempo e movimento. Imagens estáticas também podem sugerir essa sensação

de movimento em desenvolvimento perpetuado na composição, como por exemplo: fotografias

sobrepostas com certo grau de transparência, podem indicar que o modelo está se mexendo; fotografias

em longa exposição permitem que pontos de luz e objetos iluminados em movimentos sejam registrados

pelo sensor; e, até mesmo, o storyboard, que é uma etapa precedente à feitura da animação, onde

indica as sequências de movimento, enquadramento, montagem, composição da imagem. O frame

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capturado transmite bem o fundamento de tempo e movimento, caracterizado pela desfocagem nos

membros da bailarina e pela sua posição.

Fundamentos: tempo e movimento, ritmo e equilíbrio, enquadramento.

Seguindo a recorrência do teatro, as máscaras também são associadas à obra de

Kubrick. Em diversos filmes seus, como O grande golpe, Laranja Mecânica, Barry Lyndon, De

olhos bem fechados (1999), a máscara surge como um elemento de reconfiguração da

personalidade do personagem, libertando-o dos grilhões que balizam suas condutas.

No Oriente, o simbolismo da máscara varia segundo seus usos. Os principais tipos de

máscaras são as teatrais, as carnavalescas e as funerárias, estas mais presentes na cultura

egípcia. As máscaras teatrais são relacionadas às danças sagradas, sendo uma

manifestação do “Eu Universal”. A personalidade do mascarado não sofre uma alteração

drástica, indicando que o “eu” é imutável. Nelas a divindade é representada pelo rosto do

sol. Já as máscaras carnavalescas revelam aspectos mais inferiores, mais satânicos,

operando uma catarse em quem as utiliza. Exemplificando, as máscaras utilizadas por Alex

e seus droogs em Laranja Mecânica (...) representam “uma rejeição da civilização em prol

do gozo animal, uma espécie de pânico mental que se transforma aqui em ira

destruidora.”22. As máscaras funerárias são um arquétipo imutável ao qual o morto tem

que se reintegrar. O uso da máscara, nesse caso, não traz perigo, desde que o morto tenha

alcançado certo grau de evolução espiritual23.

As máscaras podem assumir capacidades e significados diferentes a cada civilização.

Podem ter poderes curandeiros em determinado povo, ou podem ter ligações com ritos

agrários, funerários e iniciáticos como nas civilizações africanas.

Para Chevalier (1986):

22 CIMENT, Michel. Pg. 63. 23 Op. cit. 695

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As máscaras, às vezes, se revestem de um poder mágico: protegem aqueles que as usam dos malfeitores e bruxos; inversamente, servem também aos membros de sociedades secretas para impor sua vontade assustando.24

Não apenas isso, como também servindo de instrumento de possessão – tem a

capacidade de apreender a força do animal no momento de sua morte25. A máscara

transforma o corpo do dançarino, dá-lhe suporte de vida e lhe concede o animus. Porém,

perigos podem rodear quem a usa. A máscara, como um condutor de energias vitais, pode

vir a se apoderar do usuário que está sob sua tutela. É necessário que o mascarado prepare-

se previamente para entrar em contato com a máscara, passando por algumas privações,

purificando-se em banhos, celebrando sacrifícios e orando26.

A máscara se relaciona com a questão interpretativa do teatro, uma vez que se trata

da persona. Segundo Jung (BALLONE, 2005), a introversão e a extroversão envolvem a

orientação para onde o indivíduo direciona sua energia, seja para o seu mundo interior

(introvertidos), seja para o exterior (extrovertidos). Essas características não são

absolutas, podendo uma pessoa introvertida na sala de aula ser mais extrovertida em seu

lar, por exemplo. Essa “troca” de personalidades, de máscaras, ocorre comumente na

sociedade. A dualidade permanece oculta no ser social, velada e surda, porém, evidencia-

se ao agir de modo diverso de acordo com o ambiente ou com quem se está relacionando,

ao mudar de máscaras. O uso de máscaras no frame seguinte envolve a anulação de uma

persona, socialmente adequada aos padrões do sistema, para o nascimento de uma

identidade fora desses padrões, onde a liberdade de seus atos será ampla o suficiente para

essa nova persona exteriorizar seu âmago. Nesse sentido, devido à quantidade de

personas que dispõe o ser humano, poder-se-ia dizer que a ambivalência se expande para

uma polivalência, mas stricto sensu, a ambivalência reside na “permuta” de personas: ou

se está usando uma, ou outra.

24 Op. cit. Pg. 697. Tradução nossa do original: “Las máscaras a veces se revisten de una potencia mágica: protegen a aquellos que las llevan contra los malhechores y los brujos; inversamente, sirven también a los miembros de las sociedades secretas para imponer su voluntad assustando”. 25 Op. cit. Pg. 697 26 Op. cit. Pg. 697

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Frame 8: De olhos bem fechados.

Fonte: Kubrick, 1999.

Análise do Frame 8

A iluminação do ambiente é propositadamente mínima, transmitindo um ar sombrio. As penumbras

envolvem todo o redor dos personagens, enfatizando as trevas a engoli-os. A posição das sombras nas

máscaras entregam a posição do ponto de luz (acima).

Percebe-se que o enquadramento do frame delimita os elementos visuais, de modo que uma ordem de

apreciação das máscaras, por parte do espectador, direciona seu olhar. A hierarquia no design envolve

uma ordem, uma concatenação visual dos elementos visuais, propositada e previamente planejada pelo

designer (no caso, pela fotografia de Kubrick). Os elementos variam visitando os outros fundamentos de

design, como cor, textura, escala, valendo-se o designer desses artifícios para transmitir a mensagem do

modo pretendido. No frame em pauta, a máscara em tons avermelhados chama a atenção tanto pela

cor, como pela forma e pela escala. Seguindo como um arco, o olhar do espectador passa a fitar a

máscara central, em médio plano, convergindo para a máscara à esquerda, mais distante. Exemplos de

hierarquia são recorrentes em projetos de design, seja no editorial, com as seções e subseções, ou no

campo digital, onde as diferentes formatações de textos e links guiam o usuário visando uma melhor

navegabilidade (LUPTON & PHILLIPS, pg. 115).

Fundamentos: hierarquia, cor, escala, textura.

Percebe-se que a ambivalência/dualidade é a recorrência predominante na obra de

Kubrick e é refletida em várias simbologias e níveis diferentes. Essa estrutura se coaduna

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com o regime diurno da imagem (DURAND, 1997), uma vez que os opostos se distinguem

em polos. Além da recorrência à ambivalência, outras se fazem presentes. As recorrências

elencadas e analisadas deste ponto em diante não estão ligadas diretamente à

ambivalência, porém estão intuídas nos filmes de Kubrick.

Dentre todos os filmes de Stanley Kubrick, apenas 2001 – Uma odisseia no espaço e De

olhos bem fechados não traz o comentário na película. Desde seus trabalhos iniciais nos

curtas-metragens, Kubrick acrescentou comentários, que funcionam como um recurso

para evitar as gravações de cenas de exposição (CIMENT, pg 79). Nos comentários

objetivos, um locutor imparcial narra o texto de modo a contextualizar a obra, tolhendo a

liberdade dos personagens, guiando o espectador para o que deve ser o foco do que o

artista quer mostrar. No caso em específico de Barry Lyndon, o narrador antecipa qualquer

suspense ou surpresa no desenvolver da trama, suprimindo a tensão e enfatizando a força

do destino na queda anunciada de Barry. Em A morte passou por perto, Lolita e Laranja

Mecânica o relato é feito subjetivamente, sendo a primeira pessoa do protagonista da

película. O comentário ambientaliza os filmes como um contador de histórias o convida

para adentrar ao mundo da fantasia. Esse é mais um recurso que Kubrick se vale para

conduzir o espectador ao que ele quer que seja visto, digerido e interpretado.

Uma recorrência estética que veio a se tornar a marca registrada de Kubrick é o

enquadramento da câmera na perspectiva de um ponto de fuga. No processo de criação,

Kubrick dedicava atenção especial imaginando a experiência audiovisual do ponto de vista

do espectador. Com rigor visual, Kubrick procurava a imersão do espectador na cena e,

para tanto, determinava não só o local onde a câmera deveria ficar, como também as lentes

a serem usadas. Essa acuidade na perspectiva é um reflexo de sua experiência como

fotógrafo. A sensação de adentrar em um túnel é transmitida em diversas cenas.

O termo túnel é associado a passagem. A passagem consiste no local por onde se

percorre e que liga um ponto a outro. É a transição do homem ao Super-homem. A

ambivalência se dá nesse elo entre os polos que se unem através do túnel.

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Frame 9: 2001 – Uma odisseia no espaço

Fonte: Kubrick, 1968.

Análise do Frame 9

A cena se passa nos dutos de comunicação da espaçonave Discovery. Essa perspectiva de um ponto de

fuga propicia a imersão do espectador no filme e foi bastante recorrente em sua obra. A iluminação

indireta da cena se faz presente ao longo do caminho, entre os compartimentos. Desse modo, as

sombras são minimizadas. Os tons de branco e os planos pretos nas laterais, teto e piso deste túnel

octogonal faz com que a atenção se direcione para o astronauta. A cor vermelha do traje do astronauta

faz o contraponto com a frieza da máquina, sugerindo a paixão imbuída nos seres humanos (homem X

máquina).

A cor é um recurso que exprime diversas sensações. Sua relação com o sentido da audição, por exemplo,

se ratifica com o uso do termo escala cromática, para indicar a sequência, ascendente ou descendente,

de tons e semitons, em contrapartida, não é insólito o uso de expressões como cores vibrantes, gritantes.

A cor transmite informação, podendo o designer destacar o objeto com variações de matizes e contraste,

como também o camuflar, utilizando tons próximos de um matiz no círculo cromático.

A cor envolve um fenômeno óptico, onde uma fonte de luz incide em determinado objeto, que reflete

essa luz. A quantidade de luz incidida no objeto afetará como será percebida a cor. Devido ao complexo

sentido da visão do ser humano, as cores sofrem compensações pelo sistema ocular. Cores podem

parecer diferentes ao lado de outras. No frame em questão, a iluminação branca difusa ressalta a cor

vermelha do traje espacial, ao passo que, se a iluminação fosse laranja, por exemplo, o peso do

vermelho do traje teria menor impacto visual.

Além desses melindres visuais, ainda é de grande valia ao designer conhecer as diferentes conotações

que a cor assume dependendo da cultura em que está atuando. A exemplo, na cultura ocidental, o

branco representa castidade e pureza, ao que na cultura oriental traduz o luto (LUPTON & PHILLIPS, pg.

71).

Fundamentos: cor, linhas, planos, ritmo observado.

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Kubrick fez, ao longo de sua obra, uma relação do banheiro como o cômodo

desnudador da máscara humana. As cenas desenvolvidas no banheiro em alguns de seus

filmes são propositais e representam momentos em que os conflitos psicológicos dos

personagens atingem o ápice. O banheiro, de fato, é o local onde o homem está mais

próximo de sua origem primal. O banheiro é um símbolo de negação do homem, segundo

o próprio diretor27. Tais situações ocorreram em Lolita, quando o professor Humbert

assimila a morte de sua companheira; Em Dr. Fantástico, é o local onde o General Jack

Ripper comete suicídio; onde o Dr. Bowman chega ao crepúsculo da vida em 2001 – Uma

odisseia no espaço; Em Laranja Mecânica Alex Delarge canta no banheiro, revelando ser o

agressor da esposa de seu recente salvador; Em Barry Lyndon, quando o protagonista

consegue reatar com sua senhora; Em O Iluminado, com o clímax da loucura fervilhando o

juízo de Jack Torrance prestes a matar sua esposa refugiada no banheiro; Em Nascido para

Matar o soldado Pyle executa seu instrutor e se mata no sanitário; por fim em De olhos bem

fechados, com os dramas de Bill Hardford e sua esposa no cômodo.

A recorrência pode ser sintetizada pelo termo “banho”, uma vez que se dá no

cômodo e há recursividade do banho em outras películas do diretor.

Apesar de atualmente ser considerado um hábito de higiene, o banho já foi

condenado, no passado, por enfatizar um apego exagerado com o corpo gerando, por

conseguinte, a sensualidade. Nos primeiros séculos do cristianismo não houve, de início,

desaprovações para com o banho, porém, devendo-se evitar os banhos quentes, pois eram

considerados uma busca à sensualidade. Logo, padres e conselheiros posicionaram-se

contra o hábito que julgavam imoral28, principalmente os banhos quentes, os quais

excitavam os sentidos e atentavam contra a castidade.

27 MILETI, Saulo. B9. Disponível em: <http://www.b9.com.br/21766/entretenimento/no-banheiro-com-stanley-kubrick/> Acesso em: 29 de jul. de 2015. 28 Chevalier. Pg. 175

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Clemente de Alexandria29 chegou a classificar os banhos em 4 classes: por prazer,

para aquecer, para limpar-se ou por questões de saúde (este mais plausível). Para as

mulheres eram aceitáveis banhos, desde que não fossem muito frequentes.

O banho tem um caráter purificador em muitas civilizações, fazendo relação com o

batismo e penitência. No catolicismo, o batismo é um simbolismo da expurgação dos

pecados pagãos do batizado. O contato com a água durante o ato põe em contato o

inconsciente, com fito na purificação e renascimento. É um processo de redenção.

Kubrick fez a conexão entre o banho e banheiro, o actus e o locus. A redenção

almejada pelos personagens degringola após os momentos crucias no banheiro.

Frame 10: De olhos bem fechados.

Fonte: Kubrick, 1999.

29 Idem.

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Análise do Frame 10

A cena se dá em um amplo banheiro, com a iluminação através de abajur que se encontra ao lado direito. A disposição dos objetos seguem a perspectiva kubrickiana: o vaso sanitário e o bidê encontram-se sobre a linha de fuga sugerida pelo encontro da parede esquerda com o piso; a poltrona e o móvel à direta encontram-se na linha de fuga simétrica à do vaso. Propositalmente, as linhas convergem para o protagonista (ponto de fuga) da película localizado ao centro, ao fundo.

No ambiente do frame, apesar das cores, são as texturas quem chamam para si boa parte da responsabilidade de transmitir as sensações. Textura, segundo Lupton & Phillips, “é o grão tátil das superfícies e substâncias.” (2008, pg. 53). A textura se exterioriza tanto de modo táctil, quanto visual. As experiências do ser humano com o mundo, desde infante, promovem a fusão entre o tato e a visão. Ao conhecer o ambiente que o rodeia, o bebê experimenta diversas sensações transmitidas pelos mais variados materiais: a mamadeira demanda uma ação em conjunto com as duas mãos para segurá-la, decorrente do grau de aspereza material; superfícies como tapetes provocam sensações diversas de assentos de sofá, lençóis e fraldas, mesmo se tratando de substâncias têxteis, provocam as terminações nervosas da pele de maneira distinta. E à medida que o repertório do pequeno humano em crescimento vai se enriquecendo, associa a percepção táctil à visual. Após determinada idade, a criança não precisa tocar para saber que um muro chapiscado tem alto grau de rugosidade e pode ferir a pele. A quantidade de significados que as texturas podem informar são praticamente ilimitados, principalmente quando o designer as trabalha em contrapontos: áspera/macia, rugosa/polida etc. Tal como assumir características diversas se justapostas com outras: um determinado material rústico pode apresentar uma superfície mais suave se colocado ao lado de uma imagem de queda de cachoeira, com gotas d’água suspensas, ao passo que o mesmo material rústico terá seu caráter áspero acentuado ladeado de uma superfície de um lago calmo, mesmo envolvendo as mesmas substâncias.

A função da textura no campo do design, quase sempre, se dá visualmente. Em projetos como cartões de visita, por exemplo, pode-se explorar a sensação táctil através do papel utilizado, se tem partes envernizadas etc, mas, principalmente no meio digital, a experiência do observador é ótica. No frame em análise, o ambiente torna-se mais enriquecido sensorialmente com a variação de texturas – do mármore do piso, das escamas dos dragões, da manta aveludada sobre a prostituta, das vestes de seda ao chão, do revestimento da poltrona, da cortina parecendo papel amassado no topo da janela ao fundo, da polidez da porcelana do vaso sanitário, dos detalhes em madeira dos móveis e molduras. São elementos discretos que atingem o espectador sutilmente e dão um ar de aconchego ao sofisticado banheiro.

Fundamentos: textura, cor, linhas, planos, enquadramento.

Uma característica bastante vanguardista de Kubrick era o uso contrastante da

música clássica como trilha sonora em cenas inusitadas. Esse contraste sonoro adiciona

mais valor à trilha, fazendo-a imperar como um personagem nas sequências, como

exemplos: o balé cósmico embalado pela valsa O Danúbio Azul (1867), de Johan Strauss, em

2001 – Uma odisseia no espaço; O confronto entre as gangues em Laranja Mecânica

contrastando com o fundo sonoro extrapola a dimensão da cena, como a evolução de uma

dança violenta dos cavaleiros, de Prokofiev.

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Frame 11: 2001 – Uma odisseia no espaço

Fonte: Kubrick, 1968.

Análise do Frame 11

Nesta cena, a elipse mais longa do cinema se desdobra ao homem primata arremessar o osso, que dá

lugar à estação espacial na órbita terrestre. A iluminação é proveniente do Sol, localizado “acima” da

estação. A simetria está relacionada ao equilíbrio, harmonia, e é uma característica dos seres vivos para

possibilitar mobilidade. A simetria pode se apresentar tanto na horizontal como na vertical e diagonal.

Peças gráficas que prezam pela simetria tendem a transmitir sensação de estabilidade. Qualquer

alteração nos elementos dessa estabilidade pode vir a alterar o equilíbrio da composição. Em

composições gráficas onde pretende-se adicionar dinamismo às mesmas, é preferível evitar o equilíbrio

em prol de um arranjo assimétrico. A inclinação da estação provoca nos sentidos do espectador a

desorientação e a solidão do vácuo espacial.

As estrelas ao fundo compõem o frame com pontos brancos. Ao lado da linha e do plano, o ponto é um

dos elementos constitutivos do design. As conceituações acerca do ponto são plurais. Pode-se dizer, em

termos geométricos, como a intersecção de duas linhas; uma localização no espaço determinada por

um par ordenado (x, y) e é desprovido de massa (LUPTON & PHILLIPS, 2008, pg. 14). Em linguagem

gráfica, o ponto pode ser a menor quantidade de grafismo capaz de se tornar minimamente visível,

como também um agrupamento de elementos visuais. Numa abordagem mais abstrata, as linhas de

fuga dos frames da obra de Kubrick sugerem um ponto que visualmente não está representado, mas

atrai o foco do espectador. Os caracteres numa página de livro são pontos, que se tornam linhas ao se

agruparem, que por sua vez formam a mancha gráfica como plano. Mais ou menos próximos uns dos

outros, podem dotar de diferentes tonalidades uma gravura, a exemplo da técnica do pontilhismo30.

30 Técnica surgida na metade do séc. XIX bastante utilizada por pintores neo-impressionistas, também conhecida como “Pintura de Pontos”. Consiste na justaposição de pontos numa ilustração onde, de acordo com a distância entre eles, passavam a ideia de volume, texturas etc. < http://www.infoescola.com/artes/pontilhismo/>

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Sozinho num layout branco pode significar a totalidade da informação, indicando solidão, equilíbrio ou

introspecção. Ao lado de elementos em maior escala podem perder a função de protagonista e

complementar a composição, como um astro de dimensões maiores atraem satélites e cometas. No

design digital, o ponto é ferramenta para diversos trabalhos, inclusive de animações, como nos pontos

de articulação da interpolação de movimentos no After Effects. A própria estação espacial poderia ser

considerada um ponto, a depender da distância em que é observada. No frame, com o fundo preto e

os pontos brancos, a negritude do espaço aparenta ameaçar engoli-los. Em caso contrário, fundo branco

e pontos pretos, os pontos se mostrariam mais atrativos visualmente.

Fundamentos: assimetria, ponto, linhas, planos, textura.

Os títulos de seus filmes, com tradução literal (Fear and Desire/Medo e Desejo, Killer’s

Kiss/Beijo do Assassino, The Killing/A matança, Dr. Strangelove/Dr. Amor estranho), indicam

uma ligação entre amor e morte que está no centro das tramas. De fato, podemos apontar

o dono da boate em A morte passou por perto abraçando a dama enquanto vibra com a

sangrenta luta de boxe do protagonista; o gângster que executa sua esposa infiel em O

grande golpe; a paixão desenfreada de Humbert por Lolita é um processo de

autodestruição; Alex Delarge e suas vítimas femininas em Laranja Mecânica; Spartacus mata

seu amigo Antoninus para livrar-lhe de tormento maior e lhe diz “Eu te amo”; na mesma

película, Varinia, esposa de Spartacus, chega aos pés da cruz que o ostenta e fala-lhe:

“Morra logo, meu amor!” (CIMENT, pg. 55).

O amor tem origens variadas dependendo da ótica da mitologia que o simboliza.

Segundo a cosmologia órfica, a noite e o vazio figuram no centro da origem do mundo e o

amor eclode de um ovo parido pela noite, cujas metades das cascas quebradas formam o

Céu e a Terra. Eros, deus do amor, surge como filho de Afrodite e tem como representação

a imagem do cupido, o qual, dotado de beleza extraordinária, domina a razão do mais sábio

ser31.

De modo simbólico, o amor é a união dos opostos (coincidentia contrariorum).

Segundo Chevalier (1986), “é a pulsão fundamental do ser, a libido que empurra toda a

existência a realizar-se na ação. É quem atualiza as virtudes do ser.”32. O amor supera essa

contradição através da síntese dessas forças diferentes. Um exemplo é quando está

31 Chevalier Pg. 91. 32 Idem. Tradução nossa do original: “Es la pulsión fundamental del ser, la libido que empuja toda existencia a realizarse en la acción, Es él quien actualiza las virtualidades del ser”.

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simbolizado pela cruz, através da intersecção da linha vertical e com a horizontal, o símbolo

chinês Yin-yang. O amor é uma busca para a unificação dos opostos em um único ser. Se

está pervertido, ao invés de ser um centro unificador, o amor se torna divisão e morte. A

perversão consiste em anular o valor do outro, submetendo-o à sua vontade, forçada e

egoisticamente, em detrimento da evolução conjunta dos dois.

Na ótica de Chevalier (1986)33, a morte engendra o fim absoluto de algo positivo e

vivo: seja um ser humano, um animal irracional, uma planta, uma amizade, uma aliança, etc.

Apesar de possuir esse espectro de destruidora da existência, a morte propicia novos

caminhos, novos mundos. Os ritos de passagem cursam uma fase de morte anterior para

que uma nova vida desponte – revelação e introdução. A morte, que também é mudança,

substitui as forças negativas que aprisiona pelas forças ascensionais da mente, almejando

os céus. Existe aqui, também, uma ambivalência, haja vista que as forças contrárias (vida e

morte) coexistem e coabitam o ser vivo, que já nasce com o estigma da morte.

A morte é personificada pelo deus Thanatos, que é filho da noite e irmão do sono. É

comumente representada por um esqueleto coberto por uma mortalha negra, trazendo

uma foice, porém, de acordo com a cultura em questão, pode surgir em forma de dança

macabra, túmulos, animais negros, como corvos, abutres, serpentes, corujas etc.

Assim, conclui Chevalier (1986):

A morte tem, de fato, várias significações. Libertadora das penas e das preocupações, não é um fim em si mesma; abre o acesso ao reino do espírito, a vida verdadeira: mors janua vitae (a morte porta da vida). No sentido esotérico, simboliza a mudança profunda que sofre o homem por efeito da iniciação. Se não morre em seu estado de imperfeição, se fecha todo o processo iniciático (WIRT, 188).34

33 Chevalier. Pg 731. 34 Chevalier, pag. 732. Tradução nossa do original: “La muerte tiene, en efecto, varias significaciones. Liberadora de las penas y las preocupaciones, no es un fin en sí misma; abre el acceso al reino del espíritu, a la vida verdadera: mors janua vitae (la muerte puerta de la vida). En sentido esotérico, simboliza el cambio profundo que sufre el hombre por efecto de la iniciación. El profano debe morir para renacer a la vida superior que confiere la iniciación. Si no muere en su estado de imperfección, se le veda todo progresso iniciático (WIRT, 188)”

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Frame 12: Spartacus

Fonte: Kubrick, 1960.

Análise do Frame 12

Pelo frame, identificamos a posição da fonte de iluminação à esquerda, o pôr do sol, simbolizando o

crepúsculo da vida de Spartacus, que definhará até a morte na cruz. O diretor optou por enquadrar a

cena buscando mostrar o castigo de Crasso sobre os insurgentes, para agregar dramaticidade à mise-

en-scène.

A escala tem diferentes significados conforme a área do conhecimento: escala tonal na música, escala

como meio de medição de grandezas na física etc. No desenho técnico, a escala é o recurso empregado

para representar objetos, prédios, localidades, estruturas em geral, de modo a preservar a proporção.

Plantas baixas e mapas cartográficos, por exemplo, vêm com a indicação da escala utilizada (por

ex.:1:50; 1:200). No design, a escala se apresenta tanto objetivamente como subjetivamente (LUPTON

& PHILLIPS, pg. 41). Situação em que a escala atua objetivamente, temos, como exemplo, os protótipos

de artefatos de design, os quais devem estar em escala 1:1. Porém, no aspecto subjetivo, a escala, assim

como outros fundamentos de design, é relativa. Numa composição gráfica, elementos podem se

sobressair em relação a outro dependendo da intenção do designer. Este corre o risco de produzir um

leiaute monótono usando elementos de tamanhos iguais. Elementos de diferentes dimensões podem

sugerir profundidade e dinâmica ao projeto, ainda mais associando-se a outros fundamentos como cor

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e textura. Objetos diminutos podem gerar um efeito de ilusão de ótica se muito próximos do observador,

justapostos a um objeto de dimensões maiores, porém mais distante. No frame, os diversos elementos

verticais (cruzes, árvores, edificações) apresentam-se em diferentes tamanhos. Gradativamente, as

cruzes, e demais elementos com dimensões aproximadas entre si, parecem diminuir ao longo da estrada,

dando ênfase ao protagonista.

Fundamentos: escala, linhas, planos, textura, enquadramento.

Diante do exposto, infere-se que a ambivalência é a recorrência que mais se

manifesta no compêndio de películas de Stanley Kubrick. Esta irá tocar as demais

repetições de alguma maneira, e essas repetições, algumas hão de sobrepor-se, como o

xadrez, que é um jogo (figura 1).

Figura 1: Diagrama de recorrências.

Fonte: Autoria própria.

Kubrick foi construindo sua obra com o passar dos anos e, ao mesmo tempo, se

reinventando. À cada película, Kubrick preocupou-se em inovar e surpreender. As

referências a seus próprios filmes despontam em outros, por exemplo, no LP da trilha

sonora de 2001 – Uma odisseia no espaço na prateleira da loja de discos em Laranja Mecânica

(frame 13). Algumas películas fazem referências a filmes que a precederam: em Lolita,

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Quilty, envolto em uma toga, brada: “Sou Spartacus”; as explosões nucleares do fim de Dr.

Fantástico anunciam o início de 2001 – Uma odisseia no espaço; o close nos olhos do feto

astral remete aos olhos de Alex em Laranja Mecânica; as roupas da época vitoriana dos

espectadores de Alex fazem alusão a Barry Lyndon (CIMENT, pág. 51).

Frame 13: Laranja Mecânica

Fonte: Kubrick, 1971.

Para Michel Ciment:

Um dos sinais da modernidade de Kubrick: seu gosto pela surpresa e pela mudança. Mais ainda do que alguns temas evidentes de sua trilogia futurista (a ameaça nuclear, a conquista do espaço, o problema da violência), é isso o que assinala sua originalidade. Ele parece ser movido pelo desejo de surpreender a si mesmo e aos outros. Desde Lolita, busca constantemente decepcionar nossa expectativa. O que há de mais oposto a Dr. Fantástico – com seu tom farsesco ferino, a dimensão atribuída a seus atores para criar caricaturas incisivas, o rigor implacável de seu roteiro – do que o devaneio poético de uma experiência não verbal de 2001: Uma odisseia no espaço? Por sua vez, Laranja mecânica é a antítese de 2001, como que por um movimento dialético que a cada nova etapa nega a precedente. E o fracasso de crítica de Barry Lyndon nos países anglo-saxões poderia ser explicado, em parte, pela decepção dos críticos diante de uma história de amor e de guerra tão desprovida de sexo e de ultraviolência quanto Laranja

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mecânica era saturada desses elementos. Como se Kubrick tivesse uma obsessão em contradizer a si mesmo, em fazer de cada nova obra a crítica da obra anterior. (CIMENT, pág. 49)

Essa metalinguagem que Kubrick utilizava propiciava sua reinvenção. Tal qual a face

oculta mutável do símbolo o resignifica com o tempo, Kubrick se reinventou, tornando-se,

ele próprio, sua matéria prima.

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O Iluminado e suas conexões

O Iluminado (The Shining, em inglês) foi produzido nos EUA/Inglaterra e lançado em

1980, pela Warner Bros. Kubrick se baseou no livro homônimo de Stephen King para

elaborar, juntamente com a romancista americana Diane Johnson, o roteiro do mesmo, e

traz em seus papéis principais Jack Nicholson, Shelley Duvall e Danny Lloyd (como o

“Iluminado”). Este filme de Kubrick foi escolhido para a análise cinematográfica por trazer

todas as recorrências simbólicas estudadas na seção anterior em seu decorrer. Durante a

sinopse, as recorrências serão apontadas de acordo com a cronologia do filme. Em seguida,

serão evidenciados pontos acerca das mensagens subliminares presentes no filme O

Iluminado, baseados no documentário Quarto 237: O Labirinto de Kubrick (ASCHER, 2012), e

suas conexões com 2001: Uma odisseia no espaço. As linhas que se seguem contem spoilers.

Jack Torrance (Nicholson) é um ex-professor que decide enveredar pela carreira de

escritor. Ele recebe uma proposta para ser caseiro do Hotel Overlook, situado em região

montanhosa do Estado do Colorado e de difícil acesso no período invernal. Jack vê o

convite como uma oportunidade para isolar-se do mundo e trabalhar em seu livro. Porém,

um acontecimento sinistro ambientado no hotel é-lhe informado: um assassinato

perpetrado por Grady, zelador do hotel, nos anos 1920, onde ele matou a esposa e suas

duas filhas, vindo a cometer suicídio em sequência. Mesmo assim, Jack aceita e,

juntamente com sua família (sua esposa Wendy e seu filho sensitivo Danny), viajam para o

Hotel Overlook, local onde devem se isolar por cinco meses, período em que fica fechado

devido à interdição das estradas pelas nevascas.

O Hotel Overlook foi construído sobre um cemitério indígena. Essa é uma das pistas

que Rodney Ascher seguiu para produzir seu documentário Quarto 237 – O Labirinto de

Kubrick35. Segundo Ascher, O Iluminado é um filme que trata, em sua essência, da sangrenta

expulsão dos índios norte-americanos de suas terras pelo homem branco, e traz em seu

bojo mensagens subliminares por toda a obra. Kubrick teria entrado em contato com

agências de publicidade para assimilar o método que era utilizado por elas visando aplicar

ao filme. Um quadro com a pintura de um índio usando um chapéu de búfalo pode ser visto

35 ASCHER, Rodney. Quarto 237 – O Labirinto de Kubrick. EUA. 2012

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na parede do lounge do hotel quando os Torrance estão fazendo um tour. No frame 14

(onde Danny encontra-se no salão de jogos do hotel), logo à direita, um cartaz com um

cowboy está afixado. Essas informações, sutilmente colocadas no cenário, representam a

recorrência da guerra, abordada, juntamente com as demais repetições, na seção anterior.

Outros sinais relativos a índios aparecem nos rótulos das latas de fermento em pó na

despensa da cozinha do hotel – Calumet, significa “Cachimbo da Paz”.

Frame 14: Recorrência Simbólica da Guerra.

Fonte: Kubrick, 1980.

Enquanto Wendy vai com Jack receber instruções sobre o maquinário que devem

operar durante a estadia, Dick Halloran, chef da cozinha do hotel, leva Danny para tomar

um sorvete. Durante a conversa, Dick revela também ser sensitivo como o garoto,

percebendo de imediato seu dom. Ao ser interpelado por Danny sobre o quarto nº 237, Dick

exalta-se, advertindo o garoto a não adentrar o quarto.

A família se estabelece e logo passa-se um mês na nova moradia. Apesar do retiro,

Jack experimenta de um bloqueio criativo no andamento de seu livro. Em momentos como

esse, ele se distrai com sua bola pelo hall do hotel (frame 15). Nesse frame, ocorre a

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representação da recorrência ao jogo. Na parede, atrás da trajetória da bola, uma estátua

de touro faz referência ao tema oculto.

Frame 15: Recorrência Simbólica do Jogo.

Fonte: Kubrick, 1980.

Em diversas partes do hotel será possível observar painéis com fotografias dispostas

em mural. Esses murais são representações do tabuleiro de xadrez (frame 16), tanto pelo

formato aproximado, como pelo fato de serem fotos em preto e branco (alusão às casas e

às peças do jogo).

Frame 16: Recorrência Simbólica do Xadrez.

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Fonte: Kubrick, 1980.

Com o passar do tempo, o humor de Jack vai se alterando, perdendo a paciência com

sua esposa facilmente, tendo acessos de raiva. Uma mudança gradativa vai se operando na

psique de Jack, que vai se envolvendo mais e mais nessa densa atmosfera. Danny, ao

transitar com seu velocípede pelos corredores do hotel, se depara novamente com as

gêmeas, representação do duplo/ambivalência (frame 17).

Frame 17: Recorrência Simbólica do Duplo/Ambivalência.

Fonte: Kubrick, 1980.

Ignorando os avisos do Sr. Halloran, Danny encontra a porta do quarto nº 237 aberta

e entra no cômodo. Nesse momento, Jack é acometido por pesadelos sombrios, sendo

desperto pela sua esposa. Aterrorizado, Jack conta ter sonhado que tinha matado e

esquartejado Wendy e Danny. Em seguida, Danny aparece com hematomas no pescoço

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indicando possível tentativa de estrangulamento. Wendy desconfia ter sido obra de seu

marido e sai dos aposentos. Incorporando a aura tenebrosa do local, Jack transita pelos

corredores do Hotel Overlook, liberando sua frustração. Neste frame 18, a perspectiva

“kubrickiana” de um ponto de fuga central se caracteriza a representação do túnel.

Frame 18: Recorrência Simbólica do Túnel.

Fonte: Kubrick, 1980.

Ao entrar no salão de festas, Jack se prostra no bar e tem um colóquio com o

bartender Lloyd, o qual surge diante de si. Nesse colóquio, Torrance desabafa suas neuras

para o barman que o escuta pacientemente. Nesse momento, Wendy, em prantos,

encontra Jack e diz ter visto uma mulher no quarto nº 237 e que a mesma tentou

estrangular Danny. Após relutar, Jack decide investigar. Enquanto isso, longe dali, o Sr.

Halloran tem um contato psíquico emanado por Danny, no exato momento em que Jack

entra no quarto.

Jack entra no banheiro do quarto nº 237 e encontra uma mulher despida na banheira.

Ela se posta em frente dele e começam a se abraçar. Nesse frame 19 a relação amor/morte

se evidencia, uma vez que a mulher mostra ser um cadáver em putrefação.

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Frame 19: Recorrência Simbólica do Amor/Morte.

Fonte: Kubrick, 1980.

Apesar da experiência fantasmagórica, Jack não revela qualquer acontecimento no

referido quarto e cogita que o próprio Danny estaria se auto infligindo as agressões com

base em seu histórico “estranho”. Ao ventilar a possibilidade de tirar Danny do hotel,

Wendy incendeia a ira de Jack que se põe a vociferar um discurso de ódio para a esposa,

condenando a ideia. Caminhando pelo hotel, Jack entra novamente no salão de festas, que

está, incompreensivelmente (uma vez que deveriam estar sozinhos no hotel) cheio de

hóspedes festejando. A teatralidade está presente no frame 20, com a banda que está no

estrado, no fundo, ao centro.

Frame 20: Recorrência Simbólica do Teatro.

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Fonte: Kubrick, 1980.

Enquanto Jack vai até o balcão para tomar um drinque servido pelo barman Lloyd, o

Sr. Halloran entra em contato com o distrito policial de Denver, pedindo para comunicar-

se com os moradores confinados. Jack se serve de um bourbon e sai pelo salão, quando,

sem querer, é atingido por um garçom que derrama bebidas em sua roupa. Com receio de

manchar a roupa do hóspede, o garçom convida Jack para irem ao banheiro para limparem

a vestimenta. Uma vez no cômodo, Jack interpela o garçom qual seu nome, ao que este

responde: Delbert Grady. Jack percebe se tratar do mesmo homem que matou a esposa e

filhas no hotel. O garçom, então, sugere o contrário – Jack seria o Sr. Grady. O garçom

desperta a loucura encapsulada na mente de Jack ao contar que Danny está trazendo uma

pessoa para aquela situação: o Sr. Halloran, e, ainda, o induz a matar a família.

Entrementes, Dick Halloran se dirige para o hotel, através de uma estrada

extremamente perigosa devido à neve. Jack desativa o rádio, impedindo comunicação com

o posto policial. Wendy decide procurar Jack para saber como ele está, porém, vai com um

bastão de baseball, por precaução. Ao chegar no lounge, encontra datilografado na folha

inserida na máquina de escrever: “Tanto trabalho e sem divertimento fazem de Jack um

menino maçante”. Wendy se desespera ao perceber que todo esse tempo confinado no

Hotel Overlook, Jack apenas escrevera tal frase, copiosamente, todas as folhas empilhadas

sobre a escrivaninha. Nesse momento, Jack aparece e começa a fazer perguntas sobre o

que fazer com Danny. Em suas declarações, Jack expõe estar incomodado com a falta de

atenção de sua esposa para com ele e sua condição, dedicando-se apenas a Danny. A

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situação vai entrando num crescendo de euforia, até que Wendy consegue atingir Jack na

cabeça. Com o marido inconsciente, Wendy pôde leva-lo para a despensa, onde o tranca.

No interior da despensa, Jack conversa com Grady, o qual (misteriosamente) está do

lado de fora. Após Jack afirmar que matará sua família, Grady o liberta de seu claustro.

Armado de um machado, Jack dirige-se para o quarto de sua esposa e põe-se a

desferir golpes na porta, obrigando Wendy e Danny a se esconderem no banheiro. Wendy

consegue passar Danny pela janela do banheiro para o exterior do hotel, enquanto que ela

permanece no banheiro, impossibilitada de passar pelo mesmo diminuto espaço. Jack

consegue abrir um rombo na porta do cômodo, momento antológico do filme no meio

cinematográfico (Frame 21) da recorrência ao banheiro.

Frame 21: Recorrência Simbólica do Banheiro.

Fonte: Kubrick, 1980.

Nesse momento, Jack escuta o barulho do trator de Halloran chegando ao local. Jack

decide trancar Wendy no banheiro e eliminar Dick antes. Transitando pelos corredores,

Dick se torna alvo fácil para Jack, que o executa com um golpe de machado no peito. Na

cena que se segue, Jack, visivelmente transtornado, caminha claudicando de uma perna,

empunhando o machado, a arma (frame 22).

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Frame 22: Recorrência Simbólica da Arma.

Fonte: Kubrick, 1980.

Wendy consegue fugir do banheiro, e vai ao encalço de Jack, que está atrás de Danny.

Danny segue pela área externa e coberta de neve do hotel, com Jack rastreando seus

passos. Danny entra num gigantesco labirinto, construído em proporções humanas, na

área externa do hotel. Enquanto a frenética perseguição se desenvolve, Wendy tem visões

de fantasmas e rios de sangue no interior do hotel.

A neve denuncia o percurso de Danny para seu algoz. Sagazmente, a Danny incorre a

ideia de voltar os passos antes de uma bifurcação e se esconder entre as cercas vivas que

formam as paredes do labirinto. Jack, ao chegar no fim da trilha, resolve tomar uma das

bifurcações. Aproveitando o desvio de atenção de Jack, Danny volta pelo caminho

percorrido até então, valendo-se da trilha deixada por ele e seu pai para achar a saída do

labirinto.

Sem orientação, Jack vê-se perdido no labirinto com seu rastro cobrindo o rastro

inicial, perdendo-se. Enquanto isso Danny encontra sua mãe e fogem usando o trator do

Sr. Halloran. Na manhã seguinte, jaz um Jack Torrance congelado em meio ao labirinto,

com feições similares a uma máscara (frame 23).

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Frame 23: Recorrência Simbólica da Máscara.

Fonte: Kubrick, 1980.

Na sequência final, um plano enquadrando uma das paredes do Hotel Overlook, com

um mural de fotografias em preto e branco no centro, a câmera vai se aproximando, com

uma canção dos anos de 1920 como fundo musical, contrastante para uma película de

terror como O Iluminado (trilha sonora, frame 23). À medida que a câmera fecha numa das

fotografias do passado do Hotel Overlook, em primeiro plano vemos Jack Torrance, que

era Delbert Grady.

Frame 24: Recorrência Simbólica da Trilha Sonora.

Fonte: Kubrick, 1980.

No frame 14, o cartaz localizado do lado esquerdo, próximo à sirene vermelha, se

trata de um esquiador (no início do filme, é explicado para Jack Torrance que não era viável

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a prática de ski nas imediações devido ao problema da interdição das estradas), porém, no

documentário Quarto 237 – Labirinto de Kubrick, é ventilada a hipótese de se tratar do ser

mitológico Minotauro. Devido ao tamanho exacerbado do tronco do esquiador e a posição

das pernas (lembrando pernas de animal quadrúpede) a associação com o Minotauro é

perceptível. Até mesmo as sombras do taco formam uma cauda na silhueta (figura 1).

Figura 2: Associação ao Minotauro.

Fonte: Kubrick, 1980.

O Minotauro é uma figura mitológica, oriunda da Grécia Antiga, com cabeça de touro

e corpo de homem. Sua origem remonta ao episódio quando o rei de Creta, Minos, fez um

acordo com Poseidon, Deus dos Mares, para conseguir o reinado. Minos deveria sacrificar

um touro branco saído dos mares, porém, ficou encantado com o animal e sacrificou outro

em seu lugar36. Poseidon, tomado de fúria, faz com que a esposa de Minos, Pasífae, se

apaixonasse pelo touro e engravidasse do mesmo. Nasceu assim o Minotauro. Minos,

desesperado, incumbe a Dédalos a façanha de criar um labirinto enorme, no subsolo de seu

castelo, para confinar o Minotauro. O rei Minos alimentava o monstro com jovens

atenienses aprisionados – 7 homens e 7 mulheres37 - todos os anos, por três anos, quando

Teseu, rei de Atenas, surge e decide enfrentar a criatura. Munido de uma espada encantada

e um novelo de lã dado por Ariadne, filha de Minos, Teseu amarra a lã e entra no labirinto,

marcando o caminho (figura 2). Conseguindo se esconder entre as paredes, Teseu ataca o

36 http://www.suapesquisa.com/musicacultura/minotauro.htm 37 Chevalier, 1986, pg. 713.

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Minotauro de surpresa e regressa, salvando alguns jovens atenienses que ainda estavam

vivos no labirinto38.

Figura 3: Teseu no labirinto do Minotauro.

Fonte: Mitografias.

Segundo Chevalier (1986), o Minotauro (figura 3) simboliza o estado psíquico de

perversidade do rei Minos e também o amor culpado por parte de Pasífae, e, na ânsia para

adormecer esse sentimento nefasto, novos pecados são cometidos com os sacrifícios. O

novelo de lã com que Ariadne presenteia Teseu representa a força espiritual que “ilumina”

o caminho do rei de Atenas para sair do labirinto.

38 http://www.suapesquisa.com/musicacultura/minotauro.htm

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Figura 4: Minotauro empunha seu machado.

Fonte: Mitologia Grega.

Nesse contexto, Jack seria o Minotauro. O próprio hotel pode ser considerado o

labirinto. O labirinto na área externa do hotel não existe no livro de King, foi ideia de

Kubrick incluí-lo no roteiro, dessa forma, a associação se mostra mais clara, e Danny acaba

por ser Teseu, não se valendo da lã, mas da neve para se guiar de volta.

Frame 25: Jack e a maquete do labirinto.

Fonte: Kubrick, 1980.

Os subtextos presentes no filme O Iluminado estão em vários níveis durante a obra.

Mensagens subliminares são apresentadas no já referido documentário de Rodney Ascher,

sugerindo ligações com o holocausto nazista (a máquina de escrever de marca alemã, a

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recorrência do número 42, ano em que se iniciou a segunda guerra, 2 x 3 x 7 geram como

produto 42). Não à toa Kubrick associaria o horror do holocausto a um filme de terror.

Outra cena emblemática faz alusão às especulações de que Stanley Kubrick teria

encenado as imagens do homem na lua, em 1969. Na cena em que Danny está brincando

sobre o padrão hexagonal do corredor do segundo pavimento do hotel, ocorre uma

inversão do padrão onde ele se encontra, dando a impressão de que o hexágono se fechou

como uma passarela de foguete (frames 26 e 27). Ao levantar-se, Danny mostra o suéter

com a estampa da Apolo 11. Outra associação que Kubrick teria forjado as imagens da

alunissagem do homem seria o quarto misterioso – quarto nº 237 (em inglês, ROOM Nº 237

– as letras maiúsculas formariam um anagrama de MOON ROOM, “quarto da lua”, em

inglês). A princípio, Kubrick explicou não ter usado o número do quarto 217 (original do

livro) devido ao receio que o proprietário do hotel tinha de que os hóspedes tivessem medo

de ocupar o quarto, porém, no documentário propõe-se que Stanley trocou para ser mais

uma mensagem subliminar – a distância aproximada da Terra para a Lua é de 237.000

milhas (sistema métrico usado nos EUA)39.

Frame 26: Padrão hexagonal aberto em frente a Danny.

Fonte: Kubrick, 1980.

39 ASCHER, Rodney. Labirinto de Kubrick. 2012.

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Frame 27: Padrão hexagonal fechado à frente de Danny.

Fonte: Kubrick, 1980.

Os produtores do documentário “Labirinto de Kubrick” empreenderam pesquisas

sobre análises do filme, e encontraram no site “The MSTRMND” uma frase dizendo que “O

Iluminado” deveria ser visto de trás para frente40, não num sentido literal, mas apontando

pistas. Muitas referências ao inverso se repetem na película: na cena em que Wendy leva o

café da manhã para Jack, parte dela se desenvolve através do espelho do quarto; Danny

escrevendo com batom a palavra ‘assassinato’ ao contrário na porta; Wendy subindo as

escadas de costas antes de golpear Jack com o taco de baseball; Danny voltando os passos

no labirinto. Então, foi feita uma projeção do filme sobre ele mesmo, porém ao contrário.

Logo no início, vemos a superposição dos frames, que, juntos, parecem formar um convite

para o baile no Salão Dourado do Hotel Overlook (frame 28).

40 Idem.

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Frame 28: Superposição do primeiro e último frames.

Fonte: Ascher, 2012.

O nome de Nicholson nos créditos iniciais coincide com o veículo e a foto no mural

(frame 29).

Frame 29: Créditos inicias e mural de fotos.

Fonte: Ascher, 2012.

Wendy vendo os escritos de Jack superpostos à máquina de escrever alemã (frame

30).

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Frame 30: Superposição de símbolos.

Fonte: Ascher, 2012.

O rosto de Jack sobre o corpo das gêmeas mortas (frame 31).

Frame 31: O sangue simula um rosto de palhaço em Jack (cílios de Alex Delarge, em Laranja Mecânica).

Fonte: Ascher, 2012.

Cena do banheiro superposta à Danny entrando no quarto. A superposição dos

frames sugere a presença de fantasmas na película, mas, mesmo sem a superposição, o

recurso da fusão de cenas paulatinamente também prova esse efeito fantasmagórico, à

medida que a transparência dos frames se interagem.

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Frame 32: Danny parece presenciar o acordo entre Grady e Torrance.

Fonte: Ascher, 2012.

O fim remete ao começo (frame 33).

Frame 33: Último e primeiro frames.

Fonte: Ascher, 2012.

Uma dimensão edipiana se repete em algumas obras de Kubrick. Essa

desestruturação da família com base no mito de édipo (onde o filho há de tomar o lugar do

pai, como que em um eterno retorno) se faz presente no próprio O Iluminado, ao Jack,

incisivamente, questionar Wendy sobre suas responsabilidades com o contrato assumido.

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Nesse ponto aflora um ódio pelo filho, o qual assimilou todas as atenções de Wendy para

si. Esse aspecto psicológico também se evidenciou em Lolita, na figura da mãe que reprime

a filha, vendo nela uma pretensa concorrente para com o Sr. Humbert. Barry Lyndon

também trava conflito com seu enteado Lorde Bullingdon, e até em 2001: Uma odisseia no

espaço vemos o novo substituir o velho na ascensão da “criança das estrelas”.

Uma característica já atribuída à obra cinematográfica de Stanley Kubrick é essa

metalinguagem, essa retroalimentação, autoconstrução e recorrência simbólica que está

impregnada em seus filmes. Elementos aparentemente dissociados uns dos outros que na

verdade formam um todo (exemplo: em 2001 temos o homem no espaço, referenciado

pelo mendigo em Laranja Mecânica, que eram temas da atualidade então).

A correspondência mais consistente entre películas da obra de Kubrick se dá entre

2001 e O Iluminado. Essa equivalência pode se pronunciar em diferentes níveis e

associações.

Em 2001, a aparição do monólito leva a uma reação em cadeia de acontecimentos que

propiciaria na evolução do homem primitivo no homo sapiens. Foi logo após a “descoberta”

do monólito pela tribo que operaram as mudanças: o uso do osso como ferramenta,

extensão do próprio corpo, e, principalmente, o erguer-se do homem! O ato de verticalizar-

se é uma simbologia sobre almejar os céus e tal ato, consequentemente, libera as mãos. O

caráter dessa ascensão é logo posto à prova (de acordo com a visão de Kubrick) ao ser um

assassinato o primeiro ato (após começar a comer carne) do homem ereto (frame 34). Em

contrapartida, aos habitantes do Hotel Overlook, a visão dos espectros também é uma

reação em cadeia, onde, inicialmente, apenas Danny os vê, em seguida Jack, até que, por

fim, Wendy visualiza-os (frame 35).

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Frame 34: Assassinato após verticalidade.

Fonte: Kubrick, 1968.

Frame 35: Primeira visão de Danny.

Fonte: Kubrick, 1980.

Após ser “trancado” por fora no cosmo pelo computador HAL 9000, o Dr. Bowman

tem que valer-se do vácuo para poder entrar novamente à Discovery por um

compartimento externo (frame 36). A simbologia desse ato, pelo entendimento de Ciment

(2013) remete 41 não apenas ao Super-Homem que Nietzche idealizava em Assim falou

Zaratustra (2003) (poema sinfônico homônimo – de Richard Strauss para 2001), como

também a própria autofecundação na concepção do “feto astral”. A relação com O

41 CIMENT, Michel. Pg. 98

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Iluminado se dá quando Wendy passa Danny pela janela do banheiro, que desce deslizando

pela rampa de neve ao longo da parede externa do hotel (frame 37).

Frame 36: Parto do Super-Homem.

Fonte: Kubrick, 1968.

Frame 37: Danny fugindo pela janela do banheiro.

Fonte: Kubrick, 1980.

O astronauta Dr. Bowman encontra o crepúsculo da sua vida ao adentrar o quarto de

Luís XVI, após viajar através do infinito. No clímax de 2001, ele se encontra, ainda mais

velho, e, pela última vez, o monólito surge em frente a ele, moribundo sobre a cama. É o

ponto em que o feto astral é concebido e brota para as estrelas, também representando o

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nascimento do Super-Homem (frame 38). Correlato ao quarto de Luís XVI está o quarto nº

237. Danny entrar no quarto foi a centelha que desencadeou a loucura crescente de

Torrance, posto que o desenvolver da película toma rumo irrecuperável para Jack (frame

39).

Frame 38: No quarto de Luís XVI.

Fonte: Kubrick, 1968.

Frame 39: Entrando no quarto nº 237.

Fonte: Kubrick, 1980.

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Ainda acerca das correlações entre os dois filmes, Ciment42 (2013) infere que ambas

as obras são divididas em quatro movimentos análogos:

O primeiro movimento apresenta uma paisagem grandiosa de montanha, floresta

e lagos, onde os personagens estão perdidos, esmagados, dominados (ver “A

aurora da humanidade”). O segundo movimento, no hotel Overlook, Mostra o

diretor confiando a Jack a missão de vigiar seu estabelecimento durante vários

meses. A mesma cordialidade, as mesmas relações sociais estereotipadas que nas

cenas que precedem a partida da Discovery na Lua. O terceiro movimento prende

nossos três passageiros em um lugar fechado, isolado do resto do mundo, onde

devem cuidar das máquinas e se comunicar com o exterior por telefone e

mensagens de rádio, antes que o sistema se transmissão se desregule. O

Overlook, como a nave espacial, permite a Kubrick combinar sensações

contraditórias de agorafobia e de claustrofobia, e, a seus personagens, se dedicar

aos jogos e aos esportes (Danny com seu velocípede e suas flechinhas, Jack com

sua bola), antes que o responsável número um caia na loucura homicida. (...) O

quarto movimento, enfim, sem falas, como o primeiro (em um equilíbrio

semelhante ao que regia a Odisseia no espaço), é uma viagem de iniciação, de

morte e de transfiguração, dessa vez dentro do labirinto, e que termina no

passado, com uma música nostálgica dos anos 1920.

A conexão do filme O Iluminado com 2001 – Uma odisseia no espaço é um exemplo

mais direto da interligação entre as obras de Stanley Kubrick. À medida que construía sua

filmografia, Kubrick ampliava seu universo usando da recursividade como molde para

transmitir os seus devaneios.

42 CIMENT, Michel. Pg. 101-102.

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Considerações sobre a pesquisa e o método

Os estudos em design, mais comumente utilizados, envolvem análises com base na

semiótica, que estuda a teoria geral das representações, englobando os signos e seus

sistemas significantes. Tais análises, em sua generalidade, isolam o objeto de estudo do

contexto no qual está inserido para ser decodificado em sua essência para ser apreendido

seu significado.

O método de análise proposto pela semiótica mostra-se inadequado levando em

consideração os objetivos para explorar o artefato (película) desta pesquisa. Abordar, de

forma isolada, o sem número de informações constantes da película incorreria numa

imperfeição, ou numa negligência quanto aos diversos aspectos apresentados pela obra.

Sob esse prisma, tais análises pecam por ignorar elementos de grande carga de

significados e simbolismos que agregam e dialogam com o objeto de estudo, se tornando

parte dele, mesmo que indiretamente. Gaston Bachelard, filósofo francês, expôs seus

pensamentos acerca do uso de um método não linear, o método do Imaginário. Este

método não apenas envolve o contexto histórico, social, econômico etc do objeto de

estudo, como também leva em conta a experiência de vida do pesquisador, estará tanto

sendo afetado pelo objeto, como também infere a ele sua bagagem psicológica,

imaginária, florescendo uma sinergia entre ambos, que resulta numa análise mais completa

e poética.

Em suas palavras, Bachelard, na primeira página da introdução d’A Poética do Espaço

(2008) explicou, com poder de síntese ímpar, como se dá a dinâmica de suas teorias:

Quando, no decorrer das nossas observações, tivermos que mencionar a relação

imagem poética nova com um arquétipo adormecido no inconsciente, será

necessário compreendermos que essa relação não é propriamente causal. A

imagem poética não está submetida a um impulso. Não é o eco de um passado. É

antes o inverso: pela explosão de uma imagem, o passado longínquo ressoa em

ecos e não se vê mais em que profundidade esses ecos vão repercutir e cessar.

Por sua novidade, por sua atividade, a imagem poética tem um ser próprio, um

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dinamismo próprio. Ela advém de uma ontologia direta. É com essa ontologia que

desejamos trabalhar.

De acordo com esse pensamento, analisar isoladamente um objeto, um evento, seja

ele qual for, incorreria numa negação tácita de uma relação com a imagem poética que há

muito o precedeu. A obra de Kubrick se desenvolve em si mesma, tal qual o fundamento

de design em camadas, como folhas de acetato sobrepostas cada qual influenciando no

todo e, ao mesmo tempo, trazendo sua carga própria de significado. O filme O Iluminado

relaciona-se, quase diretamente, com outros trabalhos do diretor, apresentando

associações em níveis simbólicos. Sua apreciação é, de certo modo, um aprofundamento

em busca do cerne da imagem poética nova de Kubrick, ainda no campo de sua

ressonância, porém um pouco mais próximo da percussão.

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