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0 UNIVERSIDADE ESTADUAL DO PARANÁ UNESPAR CAMPUS DE UNIÃO DA VITÓRIA COLEGIADO DE MATEMÁTICA DALLAN MARCELO GREGÓRIO ENSINO EXPLORATÓRIO-INVESTIGATIVO DE MATEMÁTICA: Reflexões com futuros professores no campo das frações UNIÃO DA VITÓRIA 2014

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UNIVERSIDADE ESTADUAL DO PARANÁ – UNESPAR

CAMPUS DE UNIÃO DA VITÓRIA

COLEGIADO DE MATEMÁTICA

DALLAN MARCELO GREGÓRIO

ENSINO EXPLORATÓRIO-INVESTIGATIVO DE MATEMÁTICA: Reflexões com

futuros professores no campo das frações

UNIÃO DA VITÓRIA

2014

1

DALLAN MARCELO GREGÓRIO

ENSINO EXPLORATÓRIO-INVESTIGATIVO DE MATEMÁTICA: Reflexões com

futuros professores no campo das frações

Trabalho de Conclusão de Curso apresentado como requisito parcial para conclusão do Curso de Licenciatura em Matemática da Universidade Estadual do Paraná - UNESPAR, Campus de União da Vitória. Orientador: Ddo. Everton José Goldoni Estevam

UNIÃO DA VITÓRIA

2014

2

“Tudo aquilo que o homem ignora não existe

para ele. Por isso o universo de cada um se

resume ao tamanho do seu saber.”

Albert Einstein

3

Dedico esta, bem como todas as minhas demais conquistas, aos meus

amados pais Antonio Gregório (in memoriam) e Luiza Maria Falk Gregório; minhas

irmãs Claudia Alessandra Gregório e Lia Karine Gregório; minha querida esposa

Alcimara Aparecida Föetsch - Meus melhores e maiores presentes...

4

AGRADECIMENTOS

Quero agradecer em primeiro lugar a Deus, pela força e coragem que

depositou em mim durante toda esta jornada.

Aos professores do curso de Licenciatura em Matemática da UNESPAR,

Campus de União da Vitória, que cada um ao seu modo contribuiu para a minha

formação acadêmica.

Aos amigos e colegas que compartilham deste momento único de formação

e também àqueles que por qualquer motivo acabaram ficando pelo caminho,

agradeço pelo incentivo e companheirismo.

Sou grato, em especial, ao professor Everton José Goldoni Estevam, meu

orientador, com quem partilhei e aprimorei о broto daquilo que veio а se tornar esta

pesquisa.

A minha família: mãe, pai (in memoriam), irmãs, sogro, sogra e cunhados

que compreenderam minhas ausências e faltas e mesmo assim não mediram

esforços para me incentivar. A estes, rogo a Deus todas as noites por seu bem

estar.

Agradeço a minha querida esposa Alcimara A. Föetsch pela paciência, pelo

incentivo, pela força e principalmente pelo carinho. Valeram a pena toda distância,

sofrimento e renúncias que tivemos que fazer, pois hoje estamos colhendo, juntos,

os frutos do nosso empenho. Esta conquista é muito mais sua do que minha!

5

RESUMO: Mudanças na forma de ensinar estão sendo discutidas em todo o mundo nas últimas décadas. A adoção de metodologias que visam uma mudança na postura de professores e alunos, bem como suas interrelações, tem sido trazidas à tona nos cursos de licenciatura. Isto levou a gênese deste trabalho, que tem por objetivo analisar uma tarefa produzida à luz da metodologia do ensino exploratório-investigativo em três vieses: (i) estratégias de resolução; (ii) intencionalidades da tarefa; (iii) dificuldades na aplicação em sala de aula. Para tanto, utiliza-se da investigação matemática e resolução de problemas para compreender o ensino exploratório-investigativo enquanto uma perspectiva didática. Além disso, busca-se a compreensão do conceito matemático de fração ao longo da evolução humana e da ciência matemática, bem como suas concepções em termos didáticos. É apresentada uma tarefa que é desenvolvida com quinze acadêmicos de um Curso de Licenciatura em Matemática. As análises apontam as potencialidades do Ensino Exploratório-investigativo quando se refere a evidenciar os conhecimentos ou (in)compreensões que os alunos possuem acerca dos conceitos estudados. Revela que o fato de se conhecer a teoria não implica que seu uso seja simples. Ressalta-se ainda a diversidade de abordagens durante o processo de resolução e diferentes intencionalidades. Palavras-chave: Ensino Exploratório-investigativo, Investigação Matemática, Educação Matemática, Resolução de Problemas, frações.

6

LISTA DE ILUSTRAÇÕES

Quadro 01: Comparativo dos aspectos das pesquisas qualitativa e quantitativa ...... 13

Figura 01: Diagrama da interdependência das cinco práticas. .................................. 27

Quadro 02: Comparativo entre Resolução de Problemas, Investigação e Ensino

Exploratório-investigativo. ......................................................................................... 29

Figura 02 – Comparação de segmentos ................................................................... 32

Figura 03: Primeira possibilidade de dobras: dobra 1, dobra 2, dobra 3 ................... 41

Figura 04: Segunda possibilidade de dobras: dobra 1, dobra 2, dobra 3 .................. 41

Figura 05: Terceira possibilidade de dobras: dobra 1, dobra 2, dobra 3 ................... 42

Figura 06: Resolução questões 1 a 4 . ...................................................................... 43

Figura 07: Resolução questão 5 – Grupo 3 ............................................................... 44

Figura 08: Resolução questão 5 – Grupo 4 ............................................................... 44

Figura 09: Resolução questão 6 – Grupo 2. .............................................................. 45

Figura 10: Resolução questão 6 – Grupo 5. .............................................................. 46

Figura 11: Resolução questão 6 – Grupo 4. .............................................................. 47

Figura 12: Resolução questão 6 – Grupo 3. .............................................................. 48

Figura 13: Resolução questão 6 – Grupo 1. .............................................................. 48

Figura 14: Resolução questão 7 – Grupo 1. .............................................................. 49

Figura 15: Resolução questão 7 – Grupo 3. .............................................................. 49

Figura 16: Resolução questão 7 – Grupo 4. .............................................................. 50

Figura 17: Resolução questão 7 – Grupo 5 ............................................................... 50

7

SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO ......................................................................................................... 8

2 ENQUADRAMENTO METODOLÓGICO DA PESQUISA ..................................... 11

3 DISCUTINDO RESOLUÇÃO DE PROBLEMAS, INVESTIGAÇÃO E

EXPLORAÇÃO MATEMÁTICA ................................................................................ 16

3.1 RESOLUÇÃO DE PROBLEMAS ......................................................................... 17

3.1.1 Resolução de Problemas segundo George Polya ............................................ 19

3.1.2 Resolução de Problemas por Alan Schoenfeld ................................................ 20

3.1.3 Resolução de Problemas enquanto metodologia de ensino............................. 21

3.2 INVESTIGAÇÃO MATEMÁTICA ......................................................................... 23

3.3 ENSINO EXPLORATÓRIO-INVESTIGATIVO ..................................................... 24

3.4 CONTRAPONTO: RESOLUÇÃO, INVESTIGAÇÃO E ENSINO

EXPLORATÓRIO-INVESTIGATIVO ......................................................................... 28

4 ENSINO DE FRAÇÕES: UMA BREVE REFLEXÃO E A PROPOSIÇÃO DE

UMA TAREFA NOS MOLDES DO ENSINO-EXPLORATÓRIO ............................... 31

4.1 ORIGEM DAS FRAÇÕES ................................................................................... 31

4.2 ENSINO DE FRAÇÕES ...................................................................................... 35

4.2.1 Concepções de um número fracionário ............................................................ 35

4.3 TAREFA PARA O ENSINO DE FRAÇÕES ......................................................... 37

5 TAREFA APLICADA, TAREFA DISCUTIDA ........................................................ 40

6 CONSIDERAÇÕES FINAIS ................................................................................... 54

7 REFERÊNCIAS ...................................................................................................... 58

8

1 INTRODUÇÃO

Para pesquisar a verdade é preciso duvidar, quanto seja possível, de todas as coisas, uma vez

na vida. (René Descartes)

A utilização de metodologias de ensino alternativas1 tem sido foco de

inúmeras pesquisas na contemporaneidade, as quais vislumbram formas

diferenciadas e inovadoras para o processo de ensino (e aprendizagem) de

Matemática. Dentre elas, é possível destacar a Resolução de Problemas, a

Modelagem Matemática, a utilização de Jogos Matemáticos, a Etnomatemática, a

História da Matemática, o uso de Novas Tecnologias, o Ensino exploratório-

investigativo, as Investigações Matemáticas, entre outras. Estudando-as, podem-se

identificar algumas similitudes, principalmente nos papéis que desenvolvem cada um

dos agentes envolvidos, ou seja, parece convergente o encaminhamento para uma

mudança na forma como se comportam ou se relacionam professores e alunos,

deixando os primeiros de serem os únicos detentores do conhecimento para se

tornarem os mediadores do processo de aprendizagem. Aos alunos cabe assumir

um papel mais ativo em todo o processo, onde estes deverão construir seu

conhecimento com o auxílio ou orientação dos primeiros, ou seja, atores ativos no

processo de aprendizagem.

Obviamente pretender, em um único trabalho acadêmico, refletir sobre todas

essas metodologias seria no mínimo audacioso, uma vez que demandaria muito

tempo. Logo, o presente trabalho prioriza o estudo da perspectiva conhecida como

“Ensino Exploratório-investigativo da Matemática”, que, assim como as outras

metodologias alternativas, vislumbra um aluno mais autônomo, com menor

dependência do professor.

A importância de estudos desta magnitude se justifica pela sua contribuição

à ciência Matemática, especialmente aos licenciados em Matemática, pois

1 Compreende-se neste trabalho por metodologias alternativas de ensino em matemática aquelas em

que o aluno deixa de ser passivo e passa a ser o agente do processo de aprendizagem, contrariando, portanto, o método tradicional, que comumente chamamos de aula expositiva. Obviamente esta peça científica não visa promover um juízo de valor acerca das metodologias de ensino em matemática e sim promover uma discussão sobre o Ensino exploratório-investigativo da Matemática, conforme será discutido adiante.

9

favorecem o aprimoramento da prática letiva, já que fornecem subsídios e formas

alternativas para a utilização no dia a dia da sala de aula. Não é difícil observar que

a prática letiva, na grande maioria das escolas, ainda é pautada na tradicional aula

expositiva. O texto de D’ Ambrósio (1989) ressalta:

Sabe-se que a típica aula de Matemática a nível de primeiro, segundo ou terceiro graus ainda é uma aula expositiva, em que o professor passa para o quadro negro aquilo que ele julga importante. O aluno, por sua vez, copia da lousa para o seu caderno e em seguida procura fazer exercícios de aplicação, que nada mais são do que uma repetição na aplicação de um modelo de solução apresentado pelo professor. Essa prática revela a concepção de que é possível aprender Matemática através de um processo de transmissão de conhecimento. Mais ainda, de que a resolução de problemas reduz-se a procedimentos determinados pelo professor. (p. 01).

Apesar de o texto exposto ter vinte e cinco anos, sua veracidade no

momento atual é legítima, e sua constatação pode ser feita observando aulas nas

mais variadas escolas ou buscando em diversas publicações e pesquisas científicas

relacionadas ao tema. Isso posto, cabe refletir sobre essa prática letiva no sentido

de evidenciar que fatores contribuem para esse professor continuar a repetir esse

processo. Algumas possíveis respostas nos vêm diretamente à mente, como:

comodidade, falta de tempo, (des)conhecimentos, crenças, entre outras, mas uma

particularmente fica a enfileirar indagações e futuras reflexões: seria pelo fato de ele

não conhecer ou dominar outro método? Esses questionamentos já seriam mais que

suficientes para justificar inúmeras pesquisas que envolvam metodologias de ensino,

pois permitiriam identificar necessidades apresentadas pelos professores que atuam

em sala de aula. Entretanto, identificá-las não basta, é necessário apresentar

possibilidades de enfrentamento, de resolução ou diversificação nesse processo. Foi

justamente neste sentido que houve a gênese deste projeto, que visa trazer uma

contribuição quanto à utilização do Ensino exploratório-investigativo de Matemática

na Educação Básica.

Pautado nas afirmações acima chegou-se a uma questão central que norteia

a presente pesquisa:

Quais encaminhamentos futuros professores vislumbram e quais estratégias

pensam que os alunos utilizariam a partir de uma tarefa que objetiva explorar adição

e subtração de frações?

10

Assim chega-se ao objetivo geral da presente pesquisa que é: investigar o

que futuros professores de Matemática vislumbram em termos de resoluções e

perspectivas de ensino a partir de uma tarefa orientada sob o enfoque Ensino

Exploratório-investigativo de frações.

Visando a melhor estruturação e clareza na escrita desta pesquisa,

estruturou-se a mesma em quatro capítulos.

O primeiro discute seu enquadramento metodológico.

O segundo aborda a discussão teórica acerca da Resolução de Problemas,

Investigação Matemática e Ensino exploratório-investigativo da Matemática,

trazendo suas aproximações e distanciamentos, discutindo esses três aspectos

enquanto metodologias de ensino, e não como recurso didático.

O terceiro capítulo contempla a discussão sobre o campo da matemática em

que o trabalho se situa, isto é, as frações, suas origens na humanidade, suas

origens matemáticas e algumas formalizações. Discute-se ainda os aspectos ou

maneiras como podem ser vistas as frações, suas concepções didáticas. Ao seu

final apresenta-se a tarefa proposta para o ensino do conceito de fraçde operações

com frações (adição e subtração), a qual foi aplicada e discutida (aspectos já

elencados anteriormente) com alunos do 4.º Ano de um Curso de Licenciatura em

Matemática (futuros professores).

No quarto capítulo são apreciadas e relatadas as discussões oriundas das

atividades desenvolvidas com os alunos da licenciatura, onde são explicitadas as

impressões desses futuros professores quanto à abordagem das frações na

perspectiva do Ensino exploratório-investigativo de Matemática.

Finalmente, a quinta seção apresenta as considerações finais do trabalho,

na qual são apresentadas as contribuições que o mesmo trouxe a minha formação e

as conclusões acerca do objeto estudado.

11

2 ENQUADRAMENTO METODOLÓGICO DA PESQUISA

O aprender se concentra em dois pilares: a própria pessoa, como agente, e a escola, como lugar de

crescimento profissional permanente. (António Nóvoa)

Classificar uma pesquisa pode parecer uma tarefa relativamente fácil aos

olhos de um leitor despercebido, pois de modo geral, toda pesquisa refere-se num

dado momento a uma pesquisa bibliográfica de fontes primárias ou secundárias. No

entanto, no desenrolar dos trabalhos e de seus objetivos é que as sutis diferenças

aparecem e se faz necessário discutir alguns elementos relacionados às

metodologias empregadas.

Inicialmente se faz necessário elencar as diferenças entre pesquisas

qualitativas e quantitativas. De um modo geral, elas não são excludentes, ou seja,

uma não exclui a outra, mas podem dar suporte ou subsídios e de certa forma

acabam por se complementarem.

As pesquisas quantitativas são mais propícias para a apuração de opiniões e

atitudes explícitas e conscientes dos entrevistados, pois se utilizam de instrumentos

padronizados. As informações são colhidas por meio de questionários organizados e

estruturados permitindo projeções para a população entrevistada. Esta se utiliza de

um número maior de entrevistados frente à pesquisa qualitativa para prover maior

precisão em seus resultados, o que não implica que a pesquisa qualitativa apresente

menor precisão, mas na quantitativa enfoca-se a quantidade de elementos

entrevistados ou abordados. Os relatórios são apresentados de modo a contemplar

tabelas e gráficos que condensam os dados coletados (GODOY, 1995; GIL, 1999;

SILVEIRA; CÓRDOVA, 2009).

Por outro lado, as pesquisas qualitativas possuem caráter exploratório,

estimulam os entrevistados a pensar e falar livremente sobre algum tema, objeto ou

conceito, fazendo surgir aspectos subjetivos, atingindo motivações não explícitas, ou

mesmo não conscientes, de modo espontâneo. Não possuem como foco projetar

resultados para a população e sim para a amostra, sendo o número de entrevistados

ou pesquisados relativamente pequeno. Os dados ou informações são coletados

através de roteiros e são analisados posteriormente, de modo mais profundo ou

12

discutidos em grupos. O relatório a ser apresentado é confeccionado destacando

opiniões, comentários e frases mais relevantes que surgiram (GODOY, 1995; GIL,

1999; CÓRDOVA; SILVEIRA, 2009).

Godoy (1995, p. 58) apresenta algumas características de uma pesquisa

qualitativa, as quais acabam por embasar o presente trabalho: o ambiente é a

principal fonte direta dos dados e o pesquisador é o instrumento chave; possui

caráter descritivo; o processo é o foco principal de abordagem e não o resultado ou

o produto; a análise dos dados é feita de forma intuitiva e indutivamente pelo

pesquisador, não sendo necessário o uso de técnicas ou métodos estatísticos; e, por

fim, tem como preocupação maior a interpretação de fenômenos e a atribuição de

resultados. Ao contrário da pesquisa quantitativa, a pesquisa qualitativa não procura

enumerar e/ou medir os eventos estudados, nem emprega instrumental estatístico

na análise dos dados; ela envolve a obtenção de dados descritivos sobre pessoas,

lugares e processos interativos pelo contato direto do pesquisador com a situação

estudada, procurando compreender os fenômenos segundo a perspectiva dos

sujeitos, ou seja, dos participantes da situação em estudo.

Gil (1999, p. 43) apresenta ainda a definição de pesquisa exploratória, como

sendo um trabalho que envolve levantamento bibliográfico, entrevistas com pessoas

que tiveram (ou tem) experiências práticas com o problema pesquisado e análise de

exemplos que estimulem a compreensão. Possui ainda a finalidade básica de

desenvolver, esclarecer e modificar conceitos e ideias para a formulação de

abordagens posteriores. Dessa forma, este tipo de estudo visa proporcionar um

maior conhecimento para o pesquisador acerca do assunto, a fim de que esse possa

formular problemas mais precisos ou criar hipóteses que possam ser pesquisadas

por estudos posteriores, visando proporcionar uma visão geral de um determinado

fato, do tipo aproximativo.

Assim pode-se concluir que a pesquisa qualitativa visa a construção da

realidade, mas se preocupa com as ciências sociais em um nível de realidade que

não pode ser quantificado, trabalhando com o universo de crenças, valores,

significados e outros construtos profundos das relações que não podem ser

reduzidas à operacionalização de variáveis.

De outra forma, Córdova e Silveira (2009, p. 32) enfatizam que:

13

[...] os pesquisadores que utilizam os métodos qualitativos buscam explicar o porquê das coisas, exprimindo o que convém ser feito, mas não quantificam os valores e as trocas simbólicas nem se submetem à prova de fatos, pois os dados analisados são não-métricos (suscitados e de interação) e se valem de diferentes abordagens.

O mesmo autor (p. 32), citando Minayo (2001), sintetiza que a pesquisa

qualitativa trabalha com os significados, motivos, aspirações, crenças, valores e

atitudes, o que corresponde a um espaço mais profundo das relações, dos

processos e dos fenômenos que não podem ser reduzidos à operacionalização de

variáveis. A pesquisa qualitativa era inicialmente utilizada em estudos de

Antropologia e Sociologia, como contraponto à pesquisa quantitativa dominante, e

tem alargado seu campo de atuação a áreas como a Psicologia e a Educação. De

certa forma, sua principal crítica está no empirismo envolvido e na subjetividade,

dado o envolvimento emocional do pesquisador.

Sem perda de generalidade e elencando os principais aspectos inerentes às

pesquisas, Silveira e Córdova (2009, p. 33), citando Fonseca (2002), apresentam um

quadro comparativo dos dois métodos.

Aspecto Pesquisa

Quantitativa

Pesquisa

Qualitativa

Enfoque na interpretação do objeto Menor Maior

Importância do contexto do objeto

pesquisado Menor Maior

Proximidade do pesquisador em

relação aos fenômenos estudados Menor Maior

Alcance do estudo no tempo Instantâneo Intervalo maior

Quantidade de fontes de dados Uma Várias

Ponto de vista do pesquisador Externo à

organização

Interno à

organização

Quadro teórico e hipóteses Definidas

rigorosamente

Menos

estruturadas

Quadro 01: Comparativo dos aspectos das pesquisas qualitativa e quantitativa Fonte: Silveira e Córdova (2009, p. 33) apud Fonseca (2002).

Isto posto, faz-se ainda necessário levar em consideração alguns aspectos

salientados por Gerhardt et al (2009, p. 84) quanto à forma de proceder a análise, a

14

compreensão e a interpretação de um material qualitativo: é preciso superar a

tendência ingênua de pensar que a interpretação dos dados será mostrada

espontaneamente a quem pesquisa, quando na verdade é preciso penetrar nos

significados que os atores sociais compartilham na vivência de sua realidade.

Pautado no que fora exposto no parágrafo anterior, a presente pesquisa é

classificada como de cunho exploratório-qualitativo, pois procura aprofundar um

tema frente a uma teoria e depois discuti-lo com um grupo de pessoas em sala de

aula, de modo a elucidar suas percepções acerca dele.

Isto posto, é proposto como primeiro objetivo específico recorrer-se à coleta

de informações na literatura pertinente ao assunto, no caso Resolução de

Problemas, Investigação Matemática e Ensino exploratório-investigativo, e, por

conseguinte, como menciona Santos (2004, p. 28-29), essa ação caracteriza-se

como pesquisa bibliográfica, na qual busca-se em livros, artigos periódicos,

dicionários, websites, etc. levantar uma base teórica que fundamentará a

caracterização do objeto de estudo. Ruiz (2011, p. 57) destaca que “qualquer

espécie de pesquisa, em qualquer área, supõe e exige pesquisa bibliográfica prévia,

quer à maneira de atividade exploratória, [...], quer para justificar os objetivos e

contribuições da pesquisa”.

Como segundo objetivo específico busca-se apresentar um breve relato

histórico das frações (ente matemático explorado da pesquisa), e suas concepções,

para então elaborar uma tarefa2 pautada nos elementos apresentados no primeiro

objetivo, no caso o Ensino exploratório-investigativo, para o ensino de operações

com frações (adição e subtração) a alunos do Ensino Fundamental, a qual foi

aplicada e analisada juntamente com 15 acadêmicos do 4.º ano de um curso de

Licenciatura em Matemática.

Como terceiro objetivo, tem-se a análise dos dados e discussões realizadas

na sala de aula ao se desenvolver as atividades a etapa anterior, e para isso, faz-se

necessário, como enfatiza Santos (2004, p. 30), um grande equilíbrio intelectual por

parte do pesquisador e capacidade de observação, nas palavras do autor “olho

clínico”, e certa dose de parcimônia para que não incorra em erros nas

generalizações. Assim, buscou-se analisar os resultados obtidos na execução do

2 Na visão de Ponte (2005a, p. 01) uma tarefa pode ser enunciada explicitamente logo no início do

trabalho ou ir sendo constituída de modo implícito à medida que este vai decorrendo. É formulando tarefas adequadas que o professor pode suscitar a atividade do aluno. Ou seja, através da tarefa pode-se gerar uma atividade e não o contrário.

15

segundo objetivo à luz do referencial teórico do primeiro. Nesse capítulo exatamente

é que se dá o caráter qualitativo da presente pesquisa. Para as discussões quanto à

tarefa foram utilizadas 3 aulas de 50 minutos, cujas interações foram audiogravadas

de modo a possibilitar as análises posteriores.

16

3 DISCUTINDO RESOLUÇÃO DE PROBLEMAS, INVESTIGAÇÃO E

EXPLORAÇÃO MATEMÁTICA

A pesquisa é talvez a arte de se criar dificuldades fecundas e de criá-las para os outros. Nos lugares onde

havia coisas simples, faz-se aparecer problemas. (Pierre Bourdieu)

Sabe-se que na perspectiva piagetiana3, o aluno é autônomo em seu

desenvolvimento, ou seja, ao chegar a certo nível de amadurecimento cognitivo ele

possui as capacidades para construir seu conhecimento. Este fato pode induzir ao

pensamento de que eles (os alunos) não mais necessitariam do professor,

conclusão esta que obviamente é falsa, pois nesta perspectiva o professor assume

um novo papel, o de mediador do conhecimento. Assim, a utilização de

metodologias alternativas visa à autonomia dos alunos, ou seja, que os mesmos

possam aprender a traçar estratégias para seu aprendizado sem a ideia de que

conhecimento se transmite.

De outra forma, Lakomy (2008, p. 46) citando Coll (1995) enfatiza que o

aprendizado do aluno é fruto do desenvolvimento do seu cognitivo e requer dele

reflexão, criatividade, participação e auto-organização. Dá ênfase ainda ao

desequilíbrio, afirmando que o mesmo facilita a aprendizagem, e que os “erros” são

partes inerentes ao processo de aprendizagem, sendo necessário percebê-los como

resultado de concepções dos alunos e, portanto, não deve o professor minimizá-los

ou ignorá-los.

Uma vez que, sob este enfoque, os papéis do professor e do aluno sofrem

mudanças significativas (quando comparados ao ensino tradicional), outro

questionamento surge: como propor tarefas aos alunos que permitam a eles serem

agentes de seu aprendizado? Que possam, sob a orientação ou mediação do

professor, caminhar para o desenvolvimento de suas habilidades cognitivas?

Emergem das pesquisas contemporâneas possibilidades que vislumbram a

mudança na postura dos diferentes agentes envolvidos no processo de ensino e

3 A teoria do construtivismo psicogenético de Piaget é a base da concepção construtivista

desenvolvida para o processo de ensino-aprendizagem. É um referencial explicativo que interpreta o processo de ensino-aprendizagem como um processo social de caráter ativo, em que o conhecimento é fruto da construção pessoal e ativa do aluno (LAKOMY, 2008, p. 44-45).

17

aprendizagem, como Etnomatemática, História da Matemática, Investigação

Matemática, Resolução de Problemas, Jogos Matemáticos como metodologia de

ensino, uso da informática como metodologia. Dentre essas possibilidades

apresenta-se a seguir a discussão teórica sobre a Resolução de Problemas e a

Investigação Matemática, associadas ao Ensino exploratório-investigativo da

Matemática.

3.1 RESOLUÇÃO DE PROBLEMAS

A Resolução de Problemas é uma metodologia de ensino em Matemática

que tem como objetivo que o aluno aprenda Matemática através da resolução de

problemas, estabelecendo estratégias para a sua resolução. Algumas discussões

preliminares seriam suficientes para uma questão muito peculiar: o que é um

problema? Desta forma, visando elucidar, mas não exaurir tal discussão, apresenta-

se algumas considerações acerca do entendimento de alguns autores sobre o que é

um problema ou o que é um exercício. Dante (1989, p. 9) afirma que "problema é

qualquer situação que exija o pensar do indivíduo para solucioná-la”. Já Azevedo

(2002, p. 97) explica que:

[...] problema, para nós, é tudo aquilo que não sabemos fazer, mas que estamos interessados em fazer. Assim, problemas com enunciados, exercícios simples ou complexos ou ainda demonstrações, de qualquer natureza, que não sabemos fazer, constituem-se em problemas.

De fato, como é apresentado nas Diretrizes Curriculares de Matemática para

Educação Básica do Paraná,

Resolução de exercícios e resolução de problemas são metodologias diferentes. Enquanto na resolução de exercícios os estudantes dispõem de mecanismos que os levam, de forma imediata, à solução, na resolução de problemas isso não ocorre, pois, muitas vezes, é preciso levantar hipóteses e testá-las. Dessa forma, uma mesma situação pode ser um exercício para alguns e um problema para outros, a depender dos seus conhecimentos prévios (PARANÁ, 2006, p. 43).

18

Com base no que fora exposto acima há de se ter cuidado, pois um mesmo

enunciado ou tarefa pode ser para um determinado grupo de alunos um problema e

para outros apenas um exercício.

Sendo assim, Resnick e Collins (1996) contribuem para a discussão quando

apontam algumas características de problemas:

- sem algoritmização: não há um caminho conhecido, ou pelo menos grande parte

de sua resolução não é conhecida;

- complexos: requerem uma análise mais profunda, pois necessitam de vários

pontos de vista;

- exigentes: necessitam de grande trabalho mental, mesmo que o percurso seja

curto, tidos como difíceis;

- necessitam de lucidez e paciência: propõe desordem de ideias, sua resolução

precisa de padrões que possibilitem a construção do caminho;

- nebulosos: não apresentam todas as informações necessárias para sua

resolução, o que por vezes gera conflito entre as condições estabelecidas pelo

enunciado;

- não há resposta única: resolver um problema não significa necessariamente

buscar uma resposta, ao contrário poderiam ser encontradas uma, mais ou

nenhuma resposta.

Desta forma, sabendo que o objetivo do professor é a aprendizagem efetiva

de seu aluno do modo autônomo, os problemas devem ser bem formulados de modo

que instiguem nos alunos a reflexão e o estabelecimento de estratégias e planos de

ação para a sua solução, estimulem a criatividade e o pensar lógico durante sua

aplicação.

Dante (2009, p. 14-28) propõe uma subdivisão quanto à finalidade da

resolução de problemas, ou seja, apresenta o modo como ela pode ser

compreendida. Assim para o referido autor, a resolução de problemas pode ser feita

objetivando uma meta, ou seja, o motivo principal de se estudar a matemática é

resolver problemas. Pode objetivar o processo, cuja prioridade é a forma, o meio ou

o processo como o aluno formula a resolução e não a resposta em si. Ou ainda

objetivar desenvolver uma habilidade básica, “é como uma competência mínima”

(DANTE, 2009, p. 16), para que o aluno tenha e usufrua plenamente de sua

cidadania. Por fim, em uma perspectiva mais ampla compreende a resolução de

problemas como uma metodologia de ensino da matemática, ou seja, engloba e

19

enriquece as anteriores, fazendo com que os alunos venham a aprender através da

resolução de problemas, partindo de uma situação-problema para então ao resolver

essa situação o aluno venha a desenvolver ou compreender os conceitos envolvidos

no processo.

Frente ao exposto, apresenta-se a seguir algumas estratégias que podem

ser exploradas para a resolução de problemas segundo alguns precursores da

resolução de problemas

3.1.1 Resolução de Problemas segundo George Polya

George Polya foi um dos primeiros matemáticos a estruturar cientificamente

uma heurística para a resolução de problemas no campo específico da Matemática.

Ele sistematizou e encadeou determinados passos para a execução da resolução de

problemas. Este fato o aloca como referência em praticamente todos os trabalhos

relacionados à resolução de problemas e serve de referência base para

desenvolvimento do tema na contemporaneidade.

Polya (2006) define quatro fases para a resolução de um problema, que

podem ser assim elencadas e sinteticamente explicadas:

Compreensão do problema: questionamentos iniciais são necessários para a

perfeita compreensão do que se quer fazer. Esses questionamentos dão um

panorama de qual(is) possível(eis) caminho(s) seguir para a resolução. Desta

forma, podem ser pensados questionamentos como: Quais são os dados que

se possui? Qual é a incógnita? Quais são as condições? Existem informações

conflitantes? É possível satisfazer as condições? Alguns procedimentos

auxiliam nessa fase como a elaboração de figuras ou esquemas, subdividir

em partes o problema ou as informações;

Estabelecimento de um plano: já resolveu algum problema parecido?

Conhece teorema ou fórmulas que possam ajudar? Este enunciado parece

familiar? Por vezes é preciso recorrer a outros problemas auxiliares ou

particulares, caso não se consiga encontrar uma conexão em um tempo

razoável;

Execução do plano: verificar e encadear os procedimentos adotados na etapa

anterior, ou seja, executar aquilo que se previu. Caso não tenham sido feitas

boas escolhas na etapa anterior, faz-se necessário retornar à etapa anterior

20

ou refazê-la. Assim, ao desenrolar a estratégia, procura-se sempre enfatizar

se é possível mostrar que cada uma de suas fases está correta, para poder

corroborar sua decisão adotada no passo anterior e justificar sua resolução;

Retrospecto: é a fase em que o resolvedor deve examinar a solução ou

soluções encontradas enfatizando a sua argumentação e justificação para tal.

Algumas perguntas seriam interessantes de se fazer nesse momento: é

possível encontrar a solução de outro modo? Qual a natureza do problema e

da forma de resolução nesse caso em particular? é possível utilizá-lo em

outro problema? E qual a utilidade do resultado encontrado?

Polya (2006) ressalta que é fundamental a sua quarta etapa, o retrospecto,

pois ela permite uma depuração e abstração da solução. Na fase da depuração, o

foco é validar a argumentação utilizada, simplificando-a, podendo chegar a outras

maneiras de se resolver o problema, talvez mais simples. Na fase da abstração, o

objetivo é refletir sobre o processo da resolução, primando pela essência do

problema e do método de resolução empregado. Constatando se o mesmo lhe será

de valia em problemas futuros mais amplos ou semelhantes.

3.1.2 Resolução de Problemas por Alan Schoenfeld4

Schoenfeld (1985) coloca que o ensino da Matemática deve se dar por meio

da abordagem de Resolução de Problemas. Sua obra é pautada na análise de

protocolo de alunos solucionando problemas, baseado em trabalhos de psicologia

cognitiva, e dá mais ênfase à importância da metacognição e aos componentes

culturais envolvidos no aprendizado da matemática (isto é, sistemas de convicções)

do que na sua formulação original. Assim, o enfoque principal é que a heurística de

resolução é fator preponderante para um bom matemático, ou seja, não basta saber

a teoria, e sim saber resolver problemas matemáticos.

O pesquisador afirma existir quatro categorias ou habilidades a serem

desenvolvidas pelos alunos para obterem sucesso na Matemática:

(i) recursos: conhecimento de procedimentos e questões da Matemática;

(ii) heurísticas: estratégias ou técnicas utilizadas para a resolução de

problemas, por exemplo: trabalhar com o que foi ensinado ou elaboração de figuras;

4 Baseado na obra “Mathematical Problem Solving” de (1985).

21

(iii) controle: decisões sobre quando e quais recursos usar;

(iv) convicções: uma visão Matemática do mundo, que determina como

alguém aborda um problema.

Uma vez apresentados os aspectos de como resolver problemas segundo os

principais precursores nas estratégias e definições de etapas de resolução de

problemas, cabe uma breve reflexão sobre o uso da resolução de problemas

enquanto metodologia e não como recurso.

3.1.3 Resolução de Problemas enquanto metodologia de ensino

A resolução de problemas enquanto metodologia de ensino da matemática é

relativamente recente, como bem destaca Dante (2009, p.16):

Essa interpretação para a formulação e resolução de problemas é mais recente e mais frutífera em relação ao processo de ensino e aprendizagem da matemática, pois leva em conta as três interpretações anteriores e as enriquece com um componente metodológico importante, desencadeando conceitos e procedimentos por meio de situações-problema motivadoras e trabalhando com a problematização de situações e também com projetos e modelagem matemática. Em todas essas possibilidades (conceitos, procedimentos e atitudes) conteúdo e metodologia caminham de mãos dadas, são inseparáveis.

Convém ressaltar que quando o autor se refere a enriquecer as três

interpretações anteriores, refere-se às formas de ver a resolução de problemas já

apresentadas no início desta seção, ou seja, enquanto meta, processo ou habilidade

básica.

Nesta visão ou concepção, a Resolução de Problemas é o fator

preponderante no processo de ensino e aprendizagem da matemática, pois ela

deixa de ser uma ferramenta, um recurso metodológico para ser a metodologia em

si. Dante (2009, p. 17), citando os PCNs, concorda e elenca de modo resumido os

princípios ou características envolvidas nessa metodologia:

- a atividade, no nosso caso, a tarefa matemática parte não da definição, mas sim do

problema; as definições, conceitos ideias e métodos vêm a ser utilizados ou

descobertos através da exploração do problema;

- o problema não é um exercício, ou seja, só existe problema se o aluno for levado a

interpretar e traçar uma estratégia e uma estruturação do enunciado dado;

22

- a descoberta de elementos leva o aluno a avançar um passo, e assim

sucessivamente, como ocorreu na prática no decorrer da História da Matemática;

- o aluno não irá construir um conceito ao resolver um problema, mas sim um campo

de conceitos que acabam por ganhar sentido num campo de problemas;

- a resolução de problemas não deve ser desenvolvida em paralelo ou como a

aplicação da aprendizagem, mas como fator de orientação para a aprendizagem,

pois permite criar condições que geram o contexto em que se pode aprender e

compreender conceitos, procedimentos e atitudes matemáticas.

Paralelamente tem-se a visão de Onuchic (1999, p. 207-208) em que o

problema é tido como o fator preponderante a desencadear um processo de

construção do conhecimento. Neste aspecto, os problemas são propostos ou

formulados de modo que possam contribuir para a formação dos conceitos antes

mesmo de sua sistematização ou formalização em linguagem matemática. De outra

forma, a mesma autora afirma que os problemas podem ser vistos como um

processo que permite ao aluno interagir ou sair de uma situação concreta, real, indo

em direção ao abstrato (representação simbólica matemática). Ou seja, devem fazer

da compreensão o seu objetivo principal, e desta forma possivelmente mudariam a

sua concepção da ciência Matemática de simples ferramenta para algo mais geral,

um caminho para o pensar e o organizador de suas experiências. Assim, pode-se

conceber a resolução de problemas sob dois vieses, sendo o primeiro aquele em

que se descobre novos meios de se aprender e outro de também aplicar os

conhecimento e técnicas aprendidas anteriormente, dando significado ao

aprendizado contínuo e não fragmentado.

Dante (2009, p. 50-55) ressalta alguns cuidados quanto à proposição de

problemas no que se refere às características do problema. Afirma que o problema

deve ser desafiador ao aluno, motivá-lo e aguçar sua curiosidade para resolvê-lo. O

problema deve ser real para o aluno, tanto nos dados quanto na situação. O

problema deve ser de interesse do aluno, sendo que um problema que motive, ou

seja, interessante a um adulto pode não o ser à criança. O problema deve ser o

elemento desconhecido pelo aluno, o qual se busca a solução, e o meio como

resolver deve realmente ser desconhecido pelo aluno. Um problema não deve

consistir na simples aplicação de operações aritméticas. Deve possuir um nível

adequado de dificuldade, pois a inadequação deste aspecto pode desmotivar os

23

alunos ou frustrá-los quanto à tarefa proposta e assim criar certa aversão à

metodologia e também à disciplina.

Dante salienta, que se deve contornar algumas situações que podem

dificultar a compreensão de um problema por parte dos alunos, quais sejam: a

linguagem utilizada deve ser simples, clara e objetiva, frases curtas e concisas, ou

seja, adequada à idade dos alunos a que se proporá a tarefa; da mesma forma a

correta grafia matemática, pois em geral os alunos levam um tempo para assimilar o

significado de determinadas expressões que são utilizadas na matemática de seu

significado no uso cotidiano. Além do mais, a adequação se faz necessária quanto

ao “tamanho” (muito grandes) e à complexidade dos números envolvidos. Ajustados

esses elementos, a forma como se propõe os problemas aos alunos determina

maior ou menor dificuldade na sua resolução, bem como a sequência dos dados; em

geral, se os dados não são fornecidos na mesma sequência de sua utilização, o

problema se torna mais difícil; o número de condições e a complexidade; e as

operações e estratégias envolvidas.

Desta forma, se caracteriza a Resolução de Problemas enquanto

metodologia e não apenas como um recurso metodológico.

3.2 INVESTIGAÇÃO MATEMÁTICA

O senso comum pode implicar em algumas considerações errôneas ou

distorcidas sobre a Investigação Matemática, ou seja, ao pensarmos no vocábulo

“investigação”, pode parecer algo difícil, muito trabalhoso. Por outro lado, o ato de

investigar pode nos parecer vinculado ao processo de pensar, refletir sobre alguma

coisa que não se conhece, ou seja, descobrir.

Desta forma, pode-se inferir que uma investigação parte inicialmente do

levantamento e estruturação de um problema, para então procurar elementos que

permitam a sua resolução e, para tanto, segue-se um plano de modo: sistemático

(coletam-se dados e os interpreta, fazem-se inferências, e assim podem modificar ou

acrescentar os conhecimentos já existentes); organizado (especificação dos

detalhes relacionados ao estudo); e objetivo (as conclusões não são pautadas em

subjetividades, mas sim em conclusões pautadas em fatos, vistos, revistos,

analisados e avaliados).

24

Assim, uma aula pautada na metodologia de investigação Matemática é,

segundo Ponte, Brocardo e Oliveira (2009, p. 20-21), constituída em quatro

momentos distintos, mas que podem ser concomitantes, quais sejam:

1 – reconhecimento e exploração inicial: quando os alunos ou investigadores

devem reconhecer o problema e explorar, formular questionamentos pertinentes que

possam vir a direcionar a resolução do problema;

2 – formulação de conjecturas: fase que o aluno busca organizar os dados

coletados, organizar o pensamento e tecer conjecturas, hipóteses, elabora suas

ideias e afirmações sobre elas;

3 – teste e reformulação das ideias: aqui o aluno deve elaborar testes para validar

as suas ideias e suas hipóteses e, caso venham a ser falhas, reformulá-las. Ou seja,

refinamento das ideias;

4 – justificação e avaliação: nesta fase o aluno deve arguir, expor seu pensamento

do desenvolvimento da tarefa, relatar, fundamentar e justificar como e porque

chegou àquelas conclusões.

Ressaltam Ponte, Brocardo e Oliveira (2009, p. 22-24) que a Investigação

Matemática envolve tarefas que se relacionam muito próximas à Resolução de

Problemas. E relatam ainda o trabalho de Braumann (2002), para quem a

investigação pode ser desencadeada através de exercícios. Assumindo a diferença

entre problema e exercício já discutidas, destaca-se que em ambos os casos

(problemas e exercícios) o enunciado deixa claro o que se é pedido e o que se é

dado, não existindo margens para ambiguidades, ou seja, a solução ou o caminho a

ser percorrido é sabido, ou direcionado. Fato este que diferencia, de algum modo,

estas tarefas daquelas investigativas, pois nesta as opções estão mais abertas e

sem muito controle por parte do professor de onde as coisas se desencadearão,

pois partem da interpretação e das formulações das conjecturas de quem investiga.

3.3 ENSINO EXPLORATÓRIO-INVESTIGATIVO

Na mesma concepção adotada pelas outras metodologias discutidas e

apresentadas até aqui, o Ensino Exploratório-investigativo não prega que o aluno

será autodidata, mas que ele seja autônomo no desenvolvimento do seu saber.

Canavarro (2011, p. 11) destaca que:

25

O Ensino exploratório-investigativo da Matemática não advoga que os alunos descobrem sozinhos as ideias Matemáticas que devem aprender, nem tão pouco que inventam conceitos e procedimentos ou lhes adivinham os nomes. Muito menos advoga que isso acontece enquanto o professor espera tranquilamente sentado pelos rasgos iluminados e criativos dos seus alunos — não que estes não os tenham quando lhes é dada oportunidade. O Ensino exploratório-investigativo da Matemática defende que os alunos aprendem a partir do trabalho sério que realizam com tarefas valiosas que fazem emergir a necessidade ou vantagem das ideias Matemáticas que são sistematizadas em discussão colectiva. Os alunos têm a possibilidade de ver os conhecimentos e procedimentos matemáticos surgir com significado e, simultaneamente, de desenvolver capacidades Matemáticas como a resolução de problemas, o raciocínio matemático e a comunicação Matemática.

Isso posto, fica evidente a transformação nos papéis desenvolvidos pelo

professor e pelo aluno no processo de ensino-aprendizagem, e para que isso

aconteça, a referida autora ainda enfatiza:

[...] é crucial o papel e a acção do professor, que começa com a escolha criteriosa da tarefa e o delineamento da respectiva exploração Matemática com vista ao cumprimento do seu propósito matemático, orientado pelas indicações programáticas. Em aula, para além de gerir o trabalho dos alunos, o professor precisa de interpretar e compreender como eles resolvem a tarefa e de explorar as suas respostas de modo a aproximar e articular as suas ideias com aquilo que é esperado que aprendam. (CANAVARRO, 2011, p. 11).

Reiterando o exposto, Ponte (2005b) afirma que este ensino distingue-se do

ensino direto (ou tradicional), pelos papéis desempenhados pelo professor e pelos

alunos, pelas tarefas propostas e pela comunicação que é originada na aula. Em

outras palavras, as aulas tradicionais estão centradas na figura do professor,

enquanto que no Ensino Exploratório-investigativo, “a ênfase desloca-se da

atividade ‘ensino’ para a atividade mais complexa ‘ensino-aprendizagem’” (p. 13),

resultando assim a aprendizagem da interação ou do fato de os alunos trabalharem

com as tarefas e partilharem com colegas e professor.

Os autores Canavarro (2011) e Ponte (2005b) são enfáticos em concluírem

que nesse processo a aprendizagem ocorre em duas frentes distintas e simultâneas:

individual e coletivamente, em decorrência da interação dos alunos com o saber

matemático, envolvido na atividade Matemática em desenvolvimento, bem como da

relação entre aluno-aluno e aluno-professor, reforçando a discussão dos

significados.

26

Pode-se deduzir ou inferir que este método prioriza a criatividade do aluno, o

desenvolvimento de estratégias, o raciocínio lógico e a socialização de tal. A

discussão e o convencimento de suas estratégias para os demais.

Comparativamente a Resolução de Problemas e a Investigação Matemática

possuem etapas definidas e organizadas para sua melhor compreensão, e tal qual

as anteriores, o Ensino exploratório-investigativo é organizado em fases.

Stein e Smith (1998) estabelecem didaticamente três fases distintas de uma

aula pautada no ensino-exploratório:

- o lançamento da tarefa: o professor apresenta a tarefa Matemática (normalmente

um problema ou investigação) de modo bem claro, deve desafiar seus alunos,

encorajá-los, desafiá-los a buscar uma resposta, além de oferecer um ambiente e

recursos para a sua consecução;

- a exploração da tarefa pelos alunos: cabe ao professor acompanhar e apoiar o

desenvolvimento dos trabalhos dos alunos, possivelmente em grupos, enfatizam que

os comentários ou respostas feitas pelo professor não devem diminuir o nível de

exigência cognitiva da tarefa, não reduzindo as estratégias de resolução dos

diferentes grupos, não prejudicando ou inviabilizando as discussões que se

seguirão;

- a discussão e sistematização: é a fase onde alunos apresentam resultados,

discutem e apresentam suas estratégias empregadas na execução da tarefa, deve

ser amplamente explorada pelo professor.

Nota-se que há uma aproximação com a Resolução de Problemas ou a

Investigação Matemática, pois a tarefa proposta parte, de modo geral, da ideia de

um problema ou investigação e, na primeira fase o professor pode explicitar os

objetivos da tarefa proposta com maiores detalhes; na sua segunda fase, a

exploração pelos alunos, o enfoque é no papel do professor, pois este ao contribuir

no processo de desenvolvimento deve ser ativo. No entanto, com ressalvas, sua

postura não deve ser a de minimizar a exigência cognitiva da tarefa e sim de auxiliar

os alunos a encontrarem um caminho, mas sem fornecer as respostas. Em outras

palavras, cabe ao professor tecer perguntas ou comentários desafiantes, que levem

o aluno a pensar e refletir novamente sobre o que ele está fazendo, e não

simplesmente se está certo ou errado.

Por fim a terceira fase, a apresentação das atividades feita pelos alunos, se

assemelha com a resolução de problemas e a investigação matemática, pois é

27

nessa fase que os alunos farão ou promoverão por intermédio do professor as suas

arguições, discussões das estratégias adotadas para a resolução dos alunos, terão

de defender suas conjecturas, hipóteses formuladas, e sendo assim neste momento

em que se viabiliza a riqueza da aprendizagem por considerar a diversidade e

complexidade, uma vez que valoriza as possibilidades e resoluções de todos e se

estimula a socialização e interação social.

Stein e Smith (1998) enfatizam que para que a atividade se torne mais

produtiva, se faz necessário desenvolver cinco práticas para a execução da tarefa

como um todo, quais sejam: (i) antecipação das possíveis respostas dos alunos para

as tarefas; (ii) monitorar as respostas dos alunos enquanto os mesmos exploram a

atividade; (iii) selecionar alunos específicos para apresentação das resoluções

durante a fase de discussão; (iv) sequenciar as respostas dos alunos de modo a

criar uma lógica sequencial; (v) auxiliar nas discussões para o estabelecimento de

conexões matemática entre as diferentes resoluções apresentadas.

As mesmas apresentam um diagrama que apresenta a interdependência

entre as cinco práticas e sintetiza a ideia dos encaminhamentos, ou seja, uma fase

está de certa forma inserida na seguinte da qual mantém grande interdependência.

Figura 01: Diagrama da interdependência das cinco práticas. Fonte: Stein; Engle; Smith; Hughes (2008, p. 203) - Adaptado pelo autor.

Stein, Engle, Smith e Hughes (2008) discutem ainda um aspecto

interessante que denominam “episódio de ampliação” (extending episode), o qual

ocorre quando dentro da discussão o foco redireciona-se para outra ideia

Conexão

Sequenciação

Seleção

Monitoração

Antecipação

28

Matemática, os quais devem seguir seu curso, com a interação professor-aluno (o

primeiro incentivando ou questionando, desafiando o aluno). Pode-se, segundo as

autoras, existir três tipos de episódios de ampliação:

- encorajar a reflexão Matemática: estimular as ideias que os alunos têm, reforçar

a motivação nas discussões feitas por eles, desafiá-los;

- avançar nas ideias iniciais: trata-se do auxílio direcionando os alunos ao foco da

questão, ou seja, reinterpretar o que se pede, reforçar argumentos, etc.;

- promover o raciocínio matemático: fase de justificação de ideias e estratégias

adotadas para os demais e discussões.

Segundo Cengiz, Kline e Grant (2011), durante este processo a ação do

professor em cada uma das fases é chamada de ações instrucionais: ações de

provocações; ações de apoio; ações de ampliação. Enfatizam o papel de orientador

do professor frente aos alunos, principalmente nos aspectos relacionados à

sintetização5 das ideias oriundas das discussões.

Assim, segundo esses autores, o Ensino exploratório-investigativo da

Matemática é notadamente uma tarefa interativa, que não depende exclusivamente

da natureza da tarefa Matemática, dos objetivos, ou de vivências anteriores, mas

sim do modo com a interação entre professor-aluno acontece em vários momentos

da aula.

3.4 CONTRAPONTO: RESOLUÇÃO, INVESTIGAÇÃO E ENSINO

EXPLORATÓRIO-INVESTIGATIVO

As seções anteriores apresentaram de modo sucinto as características

principais inerentes à Resolução de Problemas, à Investigação Matemática e ao

Ensino Exploratório-investigativo. Nesta seção traz-se a comparação entre os três

visando a maior clareza entre as diferenças e similitudes que existem entre eles.

À luz do que foi citado anteriormente e elencado as características de cada

uma das metodologias apresentadas, chega-se ao Quadro 02:

5 Há de se ter certo cuidado com os termos sintetizar e sistematizar, ambos são aplicados para

expressar a mesma fase do ensino através do da metodologia de Ensino exploratório-investigativo, no entanto, o primeiro é utilizado pelos autores americanos, enquanto que o segundo pelos autores portugueses.

29

Caracterização Resolução de

problemas Investigação Matemática

Ensino exploratório-investigativo

Papel do aluno Aluno ativo, centro do processo cognitivo.

Ele quem interpreta as relações estabelecidas, expõe seu pensamento, suas reflexões e dialoga com professor e colegas

Aluno ativo, centro do processo cognitivo.

Ele quem interpreta as relações estabelecidas, expõe seu pensamento, suas reflexões e dialoga com professor e colegas

Aluno ativo, centro do processo cognitivo.

Ele quem interpreta as relações estabelecidas, expõe seu pensamento, suas reflexões e dialoga com professor e colegas

Etapas 4 fases: 1 – Compreender; 2 – Construir estratégias; 3 – Executar estratégia; 4 – Revisar a solução.

4 fases: 1 – Explorar e formular; 2 – Conjecturar; 3 – Testar e reformular; 4 – Justificar e avaliar.

4 fases: 1 – Lançamento; 2 – Exploração; 3 – Discussão; 4 – Sistematização;

Papel do professor

Assume um papel de Mediador, no qual deve: - acolher as respostas; - formular novas perguntas; - estimular a partilha das diversas estratégias para a consecução de um objetivo.

Assume um papel de Mediador, no qual deve: - desafiar os alunos; - avaliar o progresso dos alunos; -raciocinar matematicamente; - apoiar o trabalho dos alunos; -fornecer e recordar informações; - promover a reflexão dos alunos;

Assume um papel de Mediador, no qual deve: - desafiar os alunos; - avaliar o progresso dos alunos; -raciocinar matematicamente; - apoiar o trabalho dos alunos; -fornecer e recordar informações; - promover a reflexão dos

alunos;

Objetivo da Tarefa

Claro e completo Aberto Claro e completo ou aberto

Produto6 Conhecido/esperado Aberto Conhecido/esperado se a

proposta for fechada ou não conhecida quando a

proposta for aberta.

Quadro 02: Comparativo entre Resolução de Problemas, Investigação e Ensino Exploratório-investigativo. Fonte: Elaborado pelo autor, 2014.

No Quadro 02, nota-se que em alguns aspectos há uma grande

aproximação entre as três metodologias, principalmente no papel tangente ao

professor e aos alunos, quanto às fases, analisando em suas especificações nota-se

que há uma proximidade, pois apesar de os termos utilizados serem diferentes, ao

se analisar as suas funcionalidades as ações se tornam similares, e portanto, podem

ser pensadas como sinônimos. Já no enunciado das situações-problemas que dão

origem às tarefas há uma leve diferença, principalmente quando se analisa a

investigação matemática, enquanto que as outras o problema direciona a uma ou

algumas possíveis situações de resposta, nela isso é mais aberto, pois dependerá

6 Compreende-se por produto o “destino” da tarefa, ou seja, os resultados que se obtiveram com o

seu desenvolvimento. De outra forma, o fruto da tarefa matemática.

30

das escolhas das hipóteses dos alunos. Por conseguinte ao analisar o resultado da

tarefa se faz a mesma análise contida na sua proposição.

A denominação Ensino Exploratório-investigativo é adotada neste trabalho

em decorrência das características intrínsecas à ela e suas similitudes com a

Investigação Matemática. Assume-se a perspectiva de que o Ensino Exploratório-

investigativo se aproxima muito mais da Investigação Matemática enquanto

metodologia utilizando-se da técnica resolução de problemas, quando comparado

com a Resolução de Problemas e a Investigação Matemática.

31

4 ENSINO DE FRAÇÕES: UMA BREVE REFLEXÃO E A PROPOSIÇÃO DE UMA

TAREFA NOS MOLDES DO ENSINO-EXPLORATÓRIO

Ver é, por princípio, ver mais do que se vê... O invisível é o relevo e a profundidade do visível.

(Merleau-Ponty)

4.1 ORIGEM DAS FRAÇÕES

Buscar a origem de um conceito matemático envolve recorrer à história. No

entanto, segundo Santos (2009, p. 49-50), faz-se necessário relembrar que

didaticamente ela, a história, é encadeada em uma sequência de períodos datados

de modo quase linear, mas que isso não significa necessariamente que assim os

fatos ou acontecimentos ocorreram. Tal divisão se dá para uma melhor situação de

tempo-espaço geográfico do ocorrido, e que elas ainda podem variar de autor para

autor.

Considerando o parágrafo anterior, a origem das frações ou do conceito de

frações tal como conhecemos é de longa data. A ideia de fração remonta aos povos

egípcios por volta de 1.800 a.C. a 1.650 a.C.. Os egípcios deste período eram

notadamente desenvolvidos, tanto por suas engenharias e construções (pirâmides,

obeliscos) como pela agricultura (margens do Rio Nilo). Boyer e Merzbach (2012, p.

30) citam um trecho de Heródoto:

Sesóstris...repartiu o solo do Egito entre seus habitantes... Se o rio levava qualquer parte do lote de um homem... o rei mandava pessoas para examinar e determinar por medida a extensão extada da perda... Por esse costume, eu creio, é que a geometria veio a ser conhecida no Egito, de onde passou para a Grécia.

Relato idêntico a este apresentado é feito por Caraça (1951), quando ele

relata a necessidade de medir áreas com intuito de gerir as relações de compra e

venda ou mesmo pagamento de tributos sobre as áreas. Apresenta ainda o mesmo

relato de Heródoto – o pai da História, ao contar sobre como o Rei Sesóstris havia

repartido as terras de seu reino entre o seu povo. E conclui “[...] as relações do

32

indivíduo com o Estado, com base na propriedade, impuseram cedo [...] a

necessidade da expressão numérica da medição [...]” (p. 32).

Eves (2011, p. 66-77) menciona que a grande contribuição egípcia foi

constatada ao ser descoberto o Papiro de Moscou ou Golenischev (que hoje se

encontra no Museu de Belas Artes de Moscou, datado aproximadamente de 1.850

a.C.), onde constam notórias contribuições no campo da astronomia (os mais

antigos instrumentos que se conhece até a presente data), um misto de fio de prumo

e colimador. E o papiro de Rhind (1.650 a.C.), que continha uma espécie de manual

matemático com 85 problemas que foram copiados em escrita hierática7 de outro

trabalho mais antigo, sendo uma importante fonte primária da matemática egípcia na

qual descrevia os métodos de multiplicação, divisão, o uso de frações unitárias, o

emprego da regra de falsa posição, e solução que encontraram para determinar a

área de um círculo.

Caraça (1951, p. 29-37) apresenta interessante discussão sobre a origem

dos números racionais. Ao afirmar que “Medir e contar são as operações cuja

realização a vida de todos os dias exige com maior frequência” (p. 29), elenca

situações em que praticamos esses dois atos o tempo todo, seja numa atividade

corriqueira ou numa atividade mais elaborada. Mas o autor vai além e questiona: “o

que é medir?” e afirma que, todos sabemos o que é “comparar” grandezas de

mesma espécie, sejam elas comprimentos, pesos, volumes, etc. O exemplo

apresentado por ele é o seguinte: comparemos dois segmentos de reta, AB e o CD ,

e para fazê-lo procedemos assim:

Figura 02 – Comparação de segmentos Fonte: Caraça (1951)

7 Segundo a historiadora Lilian Aguiar, membro da Equipe Brasil Escola, a escrita do antigo Egito era

chamada de hieroglífica (vem do grego “hieróglifo”, que significa sinal sagrado) e era primitivamente pictográfica, isto é, cada símbolo representava um objeto. Essa escrita era constituída de mais de seiscentos caracteres. Além da escrita hieroglífica, os egípcios usavam dois outros sistemas de escritas. A escrita hierática, que era organizada em formato cursivo e usada para fins comerciais; e a escrita demótica, que foi usada nos últimos períodos, pois era uma forma mais simples e mais popular da escrita hierática. Disponível em http://www.brasilescola.com/historiag/a-escrita-antigo-egito.html.

33

A partir da Figura 02, constatamos que o segmento AB é maior que o CD .

Mas isso não é suficiente, ou seja, não basta compreender o conceito de maior do

que ou menor do que, e a partir deste raciocínio tem-se origem a outros

questionamentos, como: “quantas vezes cabe um comprimento no outro?” e disto

conclui-se que há de existir uma forma ou como o autor chama “termo de

comparação único” para todas as grandezas, pois caso não exista seria deveras

complicado realizar as operações de trocas que a sociedade exige. Caraça (1951)

afirma então ser necessário: estabelecer uma unidade de medida para a grandeza

que se trata, por exemplo: centímetros para comprimentos, gramas para pesos,

segundos para tempo; e responder ao questionamento de “quantas vezes?”, que

gera a criação de um número que represente este resultado quando comparado com

a unidade. A este número dá-se o nome de “medida da grandeza em relação a essa

unidade”. Conclui o autor que existe no que ele chama de problema de medida, três

fases e aspectos distintos: escolha da unidade; comparação com a unidade;

expressão do resultado desta por um número.

Caraça (1951) enfatiza adiante que se faz necessário por vezes subdividir a

unidade e explica da seguinte forma: em geral, se uma grandeza, medida com a

unidade u, mede m, e subdividimos u em n partes iguais, a medida da mesma

grandeza, com a mesma unidade u, exprime-se pela razão dos dois números, M e n,

onde M =m.n é o número de vezes que a nova unidade cabe na grandeza a medir.

Aritmeticamente:

nnmm :)( ou n

nmm

E segue na discussão enfatizando a problemática de se medir, até concluir

que o conjunto dos números inteiros seria, ou é, insuficiente para exprimir tais

valores e assim se faz necessário ampliá-lo, gerando um novo conjunto numérico.

Além do mais, quando se tem que a razão das grandezas produz um resultado

inteiro não há grandes dificuldades em compreender a subdivisão, ela surge “[...]

sempre que, e só quando, m não seja divisível por n, isto é, no caso da

impossibilidade da divisão” (p. 35). Definidas essas relações e pensamentos postos,

o autor define o novo campo numérico:

34

[...] os dois segmentos de recta AB e CD , em que cada um dos quais se

contém um número inteiro de vezes o segmento ABu contém m vezes e

CD contém n vezes o segmento u. Diz-se, por definição, que a medida do

segmento AB , tomando CD como unidade, é o número n

m, e escreve-

se:

1) CDn

mAB quaisquer que sejam os números inteiros m ou n (n não

nulo); se m for divisível por u, o número n

m coincide com o número inteiro

que é quociente da divisão; se m não for divisível por n, o número n

m diz-se

fracionário. O número n

m diz-se, em qualquer hipótese, racional – ao

número m chama-se numerador e ao número n denominador. Em particular, da igualdade 1) resulta que:

2) nn

1visto que, se CDnAB é também CD

nAB

1, e que

3) 1n

n porque as igualdades ABAB e AB

n

nAB são

equivalentes. (CARAÇA, 1951, p. 35-36).

Obviamente ao se ler o apresentado por Caraça conclui-se que o número

fracionário tem como gênese a necessidade de se medir. E medir é comparar

grandezas. Como apresentado, os egípcios já o faziam, mesmo sem ter o rigor

matemático da demonstração. Mas conheciam e aplicavam algumas de suas

propriedades. O que corrobora a ideia transmitida de como se dá a construção dos

conceitos matemáticos, eles surgem de uma necessidade humana, de se resolver

um problema, solucionar um dilema.

m

u

n

35

4.2 ENSINO DE FRAÇÕES

O Sistema de Avaliação da Educação Básica (SAEB, 2001) ressalta que o

conceito de número racional na representação fracionária precisa ser explorado em

situações problemas para proporcionar significado aos educandos, ou seja, muitos

alunos realizam operações com números fracionários mesmo sem ter a exata

clareza do que isso significa. De outro modo, operam números racionais sem ter

claro o conceito de número fracionário.

Nunes e Bryant (1997) enfatizam que o aprendizado dos educandos poderá

ser obtido com maior êxito quando explorados em situações problemas de naturezas

distintas. É justamente nesse sentido que se apresentam a seguir os possíveis

tratamentos ou abordagens que se pode dar aos números fracionários, visando a

esclarecer o conceito envolvido.

4.2.1 Concepções de um número fracionário

Um número fracionário ou um número racional é aquele em que se pode

escrever na forma p/q, sendo que p e q números inteiros com q diferente de zero,

notação esta, que os acadêmicos/alunos conhecem para representar uma fração

numericamente. Mas a questão que aqui quer se enfatizar é o que essa

representação numérica significa, ou quais os possíveis significados que ela pode

assumir? Uma vez compreendidas essas possibilidades, a elaboração de uma tarefa

visando a compreensão de frações pode ter mais significado aos alunos e assim

possibilitar a compreensão do(s) conceito(s) de fração(ões).

Apesar de os números fracionários terem surgido da necessidade de se

medir ou comparar grandezas, com o passar do tempo e a sua sistematização eles

apresentam diferentes significados em diversos contextos, os quais podem ser

elencados da seguinte forma: parte-todo, um número, uma razão, um quociente,

uma probabilidade, um operador multiplicativo e uma medida. Cabe agora

apresentar uma breve reflexão sobre cada umas dessas possibilidades de

concepções para um número fracionário:

- parte-todo: para Merlini (2005), a ideia de um número fracionário como parte de um

todo tem origem quando se particiona um todo em m unidades, de modo que cada

unidade possa ser representada como sendo 1/m. Exemplificando para quantidades

36

contínuas, ter-se-ia um exemplo clássico como o da barra de chocolates dividida em

10 partes, na qual cada parte comporia 1/10 da barra inteira. E para as quantidades

discretas, tem-se que existem na cantina 5 tabletes de halls, 2 de morango e 3 de

eucaliptos, neste caso que fração representa os tabletes de halls de morango frente

ao total?;

- número na reta numérica: afirma Damico (2007) que nesta concepção a fração

está relacionada especificamente a notação a/b, representando um número na reta

numérica ou sua representação decimal. Como exemplo localizar aproximadamente

onde estaria localizada a fração 7/10 na reta numérica;

- fração como razão: é tida nos PCNs (1997) como a comparação entre duas

quantidades e uma grandeza, nas quais a quantidade é medida pela relação entre

duas variáveis. Por exemplo, a razão entre meninos e meninas de uma mesma sala.

- fração como quociente de dois números: Merlini (2005) explica que neste caso a

fração é associado ao específico de dividir, como por exemplo, um pacote de

bolachas a ser dividido entre 4 alunos. A fração resultante seria a parte que caberia

a cada um dos alunos, portanto 1/4;

- fração como operador multiplicativo: Teixeira (2008) instrui que esta percepção

está atrelada a uma transformação, ou seja, representa uma ação de um operador

sobre um número ou quantidade, alterando assim o seu valor no decorrer de sua

ação. Como exemplo temos o aluno x ganhou uma sacola cheia de balas, das quais

consumiu 4/5;

- fração como probabilidade: Moutinho (2005), expressa que neste caso a fração

adquire um papel de comparação entre o que é possível e o necessário. Ela poderia

ser compreendida como uma continuidade da parte-todo, ou mesmo no contexto de

medidas, mas aqui, é efetivamente a comparação entre as chances favoráveis e as

possíveis. Um exemplo bem simples seria ao lançar uma moeda, qual a chance de

se obter como resultado cara?;

- fração como medida: Damico (2007) afirma que a ideia é dividir uma unidade

(partes iguais) em subunidades e verificarmos quantas dessas partes caberão

naquilo que se quer medir.

Os PCNs (BRASIL, 1997) sugestionam que no segundo ciclo do Ensino

Fundamental se trabalhe pelo menos três significados: parte-todo, razão e quociente

e no terceiro ciclo sejam inseridos os outros significados. Assim essas abordagens

associadas à vivência das crianças possibilitariam a (re)construção dos

37

conhecimentos matemáticos necessários para resolver problemas no dia a dia

escolar ou não.

4.3 TAREFA PARA O ENSINO DE FRAÇÕES

A tarefa proposta parte de vários princípios, ou seja, aborda aspectos

inerentes ao que fora discutido até aqui, e condizem com o que é enaltecido por

Goldenberg (1999, p. 3):

[...] se um dos objectivos da educação matemática é fazer com que os alunos aprendam como é que as pessoas descobrem factos e métodos, deveriam também, durante uma parte significativa do tempo de aprendizagem, dedicar-se a essa mesma actividade: descobrir os factos. Não podemos apresentar factos e pôr os alunos simplesmente a aplicá-los ou a prová-los; assim como não podemos explicar técnicas e fazer com que os alunos se limitem a executá-las. O objectivo propriamente dito é que o aluno aprenda como ser um investigador perspicaz, e para isso tem que fazer investigação.

Essa citação é de certa forma contundente e muito significativa ao se

analisar o ensino na atualidade. Tendo essas considerações apresenta-se na

sequência uma tarefa visando explorar adição e subtração de frações com alunos do

ensino fundamental, utilizando-se de dobraduras em uma folha de papel através da

metodologia do Ensino exploratório-investigativo.

A tarefa a seguir apresentada possui como foco de abordagem desenvolver

uma atividade matemática no campo das frações, abordando algumas das suas

operações elementares. Seu encaminhamento pode ser considerado fechado, pois é

delimitada para que o aluno ao resolvê-la envolva conceitos de frações, portanto é

direcionada. Permite que o aluno explore possibilidades de representações ou

raciocínios diferenciados que envolvem os conceitos de números fracionários.

Dentre estes, permite mobilizar dois dos três conceitos de frações que são indicados

pelos PCNs (1997) para o ciclo fundamental: parte-todo e quociente de dois

números (MERLINI, 2005), e ainda envolver uma terceira concepção, a de operador

multiplicativo (TEIXEIRA, 2008).

Por outro lado, é possível perceber o princípio explicado por Caraça (1951)

para a origem das frações, quando se compara as parcelas em que foram

subdivididas a folha em suas diferentes dobras, e tenta-se saber quantas vezes uma

38

parcela cabe na anterior, por exemplo, e aqui há a mobilização da concepção de

razão (PCN, 1997).

Ao mobilizar esses aspectos a tarefa promove no aluno a reflexão, o

desenvolvimento de estratégias para a sua compreensão e resolução. Estimula o

raciocínio lógico. E a socialização destas com os demais alunos, promovendo a

argumentação e contra argumentação, estimula o debate e o fortalecimento da

aprendizagem, tendo em mente os aspectos elencados nos itens anteriores desta

pesquisa. Evidencia, dessa forma, o que Canavarro (2011) afirma ser necessário

acontecer, uma mudança de postura entre professores e alunos, partindo da escolha

adequada de uma tarefa e a partir das estratégias de resoluções e suas discussões

gerar um ambiente diferenciado para a aprendizagem.

Tarefa – Dobras de Papel

Em todos os passos, anote as suas reflexões e pensamentos para facilitar em sua

argumentação posterior ao discutirmos a tarefa.

1. De posse de uma folha de papel efetue uma dobra ao meio. Desdobre-a e

responda: em quantas partes a folha foi dividida?

2. Se tomarmos uma das partes da folha, como você representaria essa parte

numericamente?

3. Dobre a folha em sua primeira dobra e efetue uma nova dobra ao meio. Desdobre

as duas dobras e responda: em quantas partes a folha foi dividida agora?

4. E se tomarmos três dessas partes, como você as representaria numericamente?

5. Dobre a folha nas duas primeiras dobras e efetue uma nova dobra ao meio.

Desdobre as duas dobras e responda: em quantas partes a folha foi dividida agora?

Como você representaria numericamente três dessas partes?

6. Considerando as três partes do item 4 e as três partes do item 5, como você faria

a adição dessas partes? Qual será a parte resultante dessa adição? Explique seu

raciocínio.

7. Tomando o mesmo procedimento do item 6, retire as três partes do item 5 das

três partes do item quatro. Registre seu procedimento e explique seu raciocínio.

39

A tarefa foi resolvida e discutida com alunos do 4.º ano de um Curso de

Licenciatura em Matemática, quando foram debatidos aspectos referentes às

possíveis estratégias de resolução dos alunos, e dos procedimentos metodológicos

a serem adotados pelo professor quando da sua execução.

Tem-se como expectativa destas discussões a abordagem referente a

estratégias de resoluções que sejam apresentadas distintas maneiras de resoluções

e representações dos resultados obtidos. No aspecto tangente às intencionalidades

da tarefa espera-se que sejam elencadas o máximo de elementos que possam por

ventura serem abordados pela tarefa, mesmo que sem essa intencionalidade inicial.

Em referência as dificuldades no desenvolvimento da tarefa em sala de aula almeja-

se que se elenquem as alterações ou sugestões necessárias para o aprimoramento

da tarefa e sua aplicabilidade. A próxima seção contempla os resultados obtidos na

aplicação da tarefa e as conclusões das discussões realizadas em sala de aula.

40

5 TAREFA APLICADA, TAREFA DISCUTIDA

A educação é o estabelecimento de comportamentos que serão vantajosos para o

indivíduo e para outros em algum tempo futuro. B. F. Skinner

Uma vez elaborada a tarefa ela foi aplicada aos alunos do 4.º ano de um

Curso de Licenciatura em Matemática e, posterior ao seu desenvolvimento,

aconteceram as discussões sobre ela. Vislumbrando a organização e a melhor

compreensão destas, elencou-se três categorias para a análise, as quais são:

(i) estratégias de resolução: examinam-se as possíveis resoluções/raciocínios

utilizados pelos alunos para resolver os enunciados, além de analisar as

representações utilizadas nessas abordagens;

(ii) intencionalidades da tarefa: analisam-se as percepções dos futuros professores

acerca das possibilidades didáticas da tarefa relacionadas aos entes matemáticos

envolvidos; e

(iii) dificuldades no desenvolvimento da tarefa em sala de aula: quais os possíveis

entraves que podem surgir no seu desenvolvimento junto aos alunos e quais seriam

as possibilidades de ações/reações que minimizem estes.

As tarefas foram desenvolvidas em duplas/trios que aqui são denominados

Grupos, e totalizaram a quantia de cinco. As discussões ocorreram inicialmente

entre as duplas/trios e posteriormente com a turma toda. Para facilitar a

compreensão pelos demais das estratégias empregadas e raciocínios, solicitou-se

aos grupos que transcrevessem suas respostas/resoluções na lousa, para

socialização. Feito isso, iniciaram-se as discussões inerentes à tarefa. Analisando

essas resoluções e os pronunciamentos dos grupos é que busca-se identificar as

diferentes estratégias de resolução e representações, as intencionalidades da tarefa

e as possíveis dificuldades em seu desenvolvimento, interligando aos elementos

referentes ao ensino exploratório-investigativo tais como: a mudança do foco no

processo de ensino-aprendizagem que passa a ser o aluno e não o professor, o

desenvolvimento de estratégias de resoluções de problemas, a socialização e

41

argumentação com a coletividade e por fim a sistematização dos conceitos

envolvidos.

(i) Estratégias de Resolução

A primeira consideração apresentada pelo Grupo 1 foi quanto às dobras. No

mesmo momento o Grupo 5 reiterou o questionamento feito pelos colegas. Como

proceder quanto à forma (jeito) ou direção? Então foi indagado quais as formas que

haviam pensado? E assim, o grupo apresentou duas formas distintas de se dobrar o

papel, as quais são apresentadas a seguir:

Figura 03: Primeira possibilidade de dobras: dobra 1, dobra 2, dobra 3 Fonte: Autor, 2014.

Figura 04: Segunda possibilidade de dobras: dobra 1, dobra 2, dobra 3 Fonte: Autor, 2014.

Ao ser apresentada essa situação, aventaram-se os seguintes

questionamentos aos grupos, o fato do aluno “fazer uma dobra diferente”, conforme

apresentado pelo Grupo 1 (figuras 03 e 04) iria modificar as respostas dos alunos?

O que isso permitiria sob o enfoque da aprendizagem?

Então os Grupos refletiram por um momento e analisaram as dobras e de

modo unânime afirmaram que não, pois em ambos os casos ao efetuarem a primeira

dobra teria duas partes, na segunda, quatro e na terceira dobra oito partes. O que

realmente diferiam seria os tamanhos/formatos dos retângulos. Mas ainda assim,

seriam duas, quatro ou oito partes iguais de um todo que é a folha.

Durante as discussões ainda surgiu uma nova possibilidade de dobradura,

aventada pelo Grupo 1, que afirmou se caso a folha tivesse o formato de um

42

quadrado e não retângulo, poder-se-ia pensar em formar triângulos, como são

apresentadas pela Figura 05.

Figura 05: Terceira possibilidade de dobras: dobra 1, dobra 2, dobra 3 Fonte: Autor, 2014.

O Grupo 3, observou que sob esta perspectiva poderia se explorar a

resolução do aluno por ser diferente, enfatizando mais uma vez que a folha ao

mesmo tempo em que foi dobrada, no nosso caso, dividida em partes, formou

figuras distintas das anteriores ou demais resoluções (figura 03 e 04), e neste caso

em específico tem-se triângulos (figura 05), mas que da mesma forma que os

retângulos, o resultados obtidos na primeira dobra são dois triângulos, na segunda

quatro e na terceira oito triângulos de um todo, a folha.

As questões 1 e 3 eram relativamente simples, pois bastava aos alunos

contar as marcas das dobras na folha desdobrada, e portanto o resultado

apresentado pelos grupos foram os valores numéricos, dois, quatro e oito (partes em

que a folha ficou dividida).

Fato interessante, que para responder as questões 2 e 4 as quais

solicitavam que expressassem uma fração do todo da folha, as respostas foram

muito semelhantes, fato que suscitou em novo embate sobre as diferentes formas de

representação de uma fração. Observe a figura 06 com as resoluções das questões

1 a 4 de todos os grupos.

Grupo 1

Grupo 2 (1;2;3;4 na sequência)

43

Grupo 3

Grupo 4

Grupo 5

Figura 06: Resolução questões 1 a 4 . Fonte: Autor, 2014.

Assim, ao notar o “padrão” numérico das respostas dos alunos aconteceu o

seguinte diálogo:

Autor: Essa é a única forma que os alunos poderiam representar as frações? Grupo 3: Poderia ser de outras formas. Autor: Quais? Grupo 3: Através de representações pictográficas, por exemplo. Professor: E por que não usaram? Grupo 3: Por que assim é mais fácil. Professor: Mais fácil para quem? Autor: E se o aluno escrever meio, para dizer que se tem a metade da folha implica

que ele compreende o conceito de fração? Grupos: (silêncio...) Autor: Ou mesmo se ele escrever metade? Ou além, uma de duas? Grupos: Talvez... Grupo 3: Mas pense... É que meio é “natural” Autor: Meio é natural? Grupos: (risos...) Grupo 3: Não. (risos...) Autor: Então? Como assim? Grupo 3: É que eu quis dizer que é mais intuitivo.

44

O que pode-se inferir com essas resoluções é que os acadêmicos por já

conhecerem a representação mais usual, por assim dizer, das frações a utilizam por

considerarem “mais fácil”. Não que isso necessariamente seja verdadeiro, pois ao

aluno que estiver tendo o primeiro contato com as frações essa certamente não será

a mais usual, e sim a pictográfica ou mesmo a textual (no estágio de regência do

ano anterior pude empiricamente constatar este fato).

A questão 5, embora pareça semelhante às anteriores merece uma análise

em separado devido a algumas controvérsias no seu entendimento. Observe-se as

considerações feitas pelo Grupo 3 e Grupo 4 nas figuras 07 e 08, respectivamente.

Figura 07: Resolução questão 5 – Grupo 3 Fonte: Autor, 2014.

Figura 08: Resolução questão 5 – Grupo 4 Fonte: Autor, 2014.

Relembrando o enunciado da questão 5, temos: “5. Dobra a folha nas duas

primeiras dobras e efetue uma nova dobra ao meio. Desdobre as duas dobras e

responda: em quantas partes a folha foi dividida agora? Como você representaria

numericamente três dessas partes?”. O que o Grupo 3 (figura 07) e o Grupo 4 (figura

08) questionaram foi o fato de o enunciado solicitar que se desfizesse apenas duas

dobras e não todas as três dobras feitas, e assim tomasse três partes daquele papel

ainda dobrado ao meio. Notadamente, percebe-se que seria uma possibilidade de

raciocínio do aluno, no entanto, uma ótima oportunidade para algumas discussões.

45

Autor: É preciso desdobrar as três dobras? Grupo 4: Mas veja, se eu desdobrar apenas duas eu tenho três quartos. Autor: Três quartos de quanto? Grupo 4: Silêncio... Grupo 3: Mas veja acho que isso ficou confuso. Autor: Ok, mas isso abre uma possibilidade de discutir algo importante, certo? Grupo 4: O que? Grupo 3: Multiplicação de frações? Autor: Volto a perguntar, três quartos de quanto, vocês têm se desdobrarem apenas

duas vezes como no enunciado? Grupo 4: Três quartos de meio Autor: Então? Grupo 3: Hum... frações equivalentes... Grupo 4: Ah... tah... Autor: Três quartos de meio equivale a quanto do inteiro? Grupo 4: Três oitavos, e poderia trabalhar nas frações equivalentes.

Os grupos concluíram conjuntamente que embora o enunciado da questão 5

possa parecer errado, ao orientar que se desdobre uma vez a menos que o total de

dobras, ele é uma ótima oportunidade para se discutir alguns aspectos elementares

das frações, tais como: multiplicação de frações e frações equivalentes.

A questão 6, será analisada segundo as resoluções apresentadas pelos

grupos. Partindo de uma sequência de um entendimento controverso da operação

de adição para outras coerentes e interessantes para algumas conclusões.

Figura 09: Resolução questão 6 – Grupo 2. Fonte: Autor, 2014.

46

A figura 09 mostra uma falha conceitual na adição de frações, pois o grupo

apresenta os três quartos do todo, após representa os três oitavos e ao efetuar a

soma, chega-se ao valor de sete oitavos e ainda prosseguem afirmando que sete

oitavos é igual a oito oitavos, que no caso seria um inteiro, o que reforça o erro

conceitual da adição de frações e obtenção da unidade inteira novamente.

A figura 10 apresenta a resolução pertinente a questão 6 do Grupo 5 e

merece algumas considerações importantes sobre seus procedimentos, observe-a:

Figura 10: Resolução questão 6 – Grupo 5. Fonte: Autor, 2014.

Nota-se na figura acima, que a resolução apresentada é correta em ambas

as representações utilizadas. Quando analisada apenas os números, tem-se 3/4

equivalente a 6/8 e então adicionado de outros 3/8, resulta em 9/8, enquanto que na

representação pictográfica demonstra o Grupo perceber a geração de uma fração

imprópria através da sobreposição de uma parcela (note-se o segundo quadro da

direita para a esquerda da linha inferior da figura 10), e desta forma, denota assim a

percepção de que o resultado é superior a uma unidade inicial.

Convém ressaltar aqui que o fato do Grupo ter sobreposto uma unidade a

outra não implica que eles vislumbraram a possibilidade de se trabalhar com

números mistos, ou com a ideia da fração enquanto quociente, pois se a tivessem

compreendido com clareza, a representação pictográfica deveria ser diferente, pois

como resultado da soma das parcelas obteve-se um inteiro e mais 1/8, que então

deveria ser representado por uma figura dividida em oito partes, sendo tomadas dela

as oito e outra também dividida em oito partes mas da qual se tomava apenas uma.

O que fica evidenciado neste momento para este autor é que o fato de os números

mistos serem “aprendidos” apenas de modo conceitual (definição) no sexto ano e

sua representação não ser usual em livros didáticos em momentos posteriores ao

seu aprendizado contribui para os resultados aqui obtidos, bem como o conceito de

frações impróprias. E isto representa novamente uma lacuna conceitual das frações,

que mesmo sendo acadêmicos do final do ensino superior, ainda assim não há a

total clareza dos conceitos de fração. De outra forma, pode-se inferir que o grupo por

47

saber efetuar a operação com um algoritmo tinha a “falsa” percepção de que era

necessário ter mais uma parte além das oito existentes, pois o resultado da

operação é 9/8.

A resolução do Grupo 4 (figura 11) por sua vez, enfoca novamente duas

possibilidades, ainda atreladas a questão 5 com o fato de não se desfazer todas as

dobras feitas, fato este já discutido na questão anterior (lacuna conceitual de frações

equivalentes). No entanto, essa resolução revela possibilidades de

encaminhamentos dados pelos alunos frente ao entendimento deles na tarefa. E

aqui os grupos concordam que seria importante retomar o que já fora discutido sobre

a equivalência de frações, frações impróprias ou mesmo a fração enquanto um

quociente. Mesmo nas duas interpretações dadas pelo grupo geraria essas

situações para serem “exploradas” em sala de aula

Figura 11: Resolução questão 6 – Grupo 4. Fonte: Autor, 2014.

O grupo 3, por sua vez, apresenta pictograficamente 6/8 e 3/8, indicando

que sua adição resulta em 9/8, e para comprovar isso se utiliza do algoritmo de

adição de fração, no qual não necessariamente pode-se inferir se compreendem o

conceito de fração, e retorna-se a discussão ora apresentada sobre a lacuna

conceitual das frações impróprias ou dos números mistos. Note-se que na primeira

figura feita à esquerda pelo grupo representam os 3/4 da questão 4 de modo direto

como 6/8, não fica evidente a transformação para a equivalência, para então

representarem a adição de 6/8 com 3/4, assim como o grupo anterior apresenta a

sobreposição de uma unidade, sem utilizar-se de uma nova figura como já foi

elencado anteriormente.

48

Figura 12: Resolução questão 6 – Grupo 3. Fonte: Autor, 2014.

O grupo 1, conforme mostra a figura 13, ventilou a possibilidade de se usar

duas folhas, tentando facilitar o entendimento ou visualização dos alunos das

operações. Observe:

Figura 13: Resolução questão 6 – Grupo 1. Fonte: Autor, 2014.

Desta sugestão novas considerações nos grupos surgiram após o

questionamento do professor.

Professor: Por que não se pode usar duas folhas? Grupos: Silêncio... Professor: Qual o problema em se utilizar as duas folhas? Grupo 4: Devido a questão do conceito de fração como parte do todo Grupo 1: Ah é, aí ele pode pensar que não tem apenas 8 partes e sim somar as duas

folhas, e assim ter 16 partes. Autor: Então utilizar duas folhas pode? Grupos: Não!

Disto concluímos que a utilização de duas folhas para visualizar a operação

da adição seria confusa e truncada, podendo ocasionar na incompreensão ou

compreensão equivocada do conceito de fração (parte-todo). Isso pois analisamos

que se temos uma folha (todo) particionada em oito partes e delas tomamos três,

não seria de modo algum pela equivalência de frações o mesmo que tomar três de

dezesseis que se teria em duas folhas. Logicamente concluíram que a operação 3/4

+ 3/8 é diferente de 3/16 + 3/16, por exemplo.

A questão 7 era de raciocínio idêntico ao da sexta, no entanto, solicitava

deduzir a fração encontrada no item 5 da encontrada no item 4. O Grupo 1 (figura

14) adota uma abordagem pictográfica para expressar a subtração. Tomando a

49

fração encontrada no item 4, que é de três quartos, e deduz a encontrada no item 5.

No entanto, na sua representação utiliza diretamente a fração equivalente 6/8 na

qual marcam com “bolinhas” e expressam ao lado que aquilo é uma representação

do valor de 3/4 encontrado na questão 4, para então “riscarem” (com um x) nas

“bolinhas” que foram subtraídas ou tiradas e assim, fornecem uma nova

representação com o resultado da operação, portanto, três oitavos. Essa operação

permite perceber que o grupo tem a clareza da ideia de subtração.

Figura 14: Resolução questão 7 – Grupo 1. Fonte: Autor, 2014.

Procedimento parecido é apresentado pelo Grupo 3 (figura 15), no qual

elaboram uma espécie de “algoritmização” da subtração de forma pictográfica,

remetendo a ideia de exercícios do tipo “arme e efetue”, para explicar como fizeram

a operação. No entanto, essa representação evidencia um equívoco conceitual no

qual o aluno associa a subtração ao algoritmo de subtração e não necessariamente

a ideia de subtração. Pois a ideia de se subtrair está intrinsecamente atrelada ao

fato de se retirar algo/parte de alguma parcela/unidade, e neste caso tem-se na

representação duas parcelas (6/8 e 3/8).

Figura 15: Resolução questão 7 – Grupo 3. Fonte: Autor, 2014.

50

Observe os procedimentos adotados pelos acadêmicos do Grupo 4 (figura

16) no qual representaram a primeira porção 3/4, para então representá-la

novamente em sua porção equivalente 6/8 (note-se o contorno mais forte para a

representação dos 3/4) e então indicam a subtração realizada enumerando as

parcelas retiradas 3/8, tudo em uma única figura, demonstrando a percepção e

compreensão dos conceitos de subtração.

Figura 16: Resolução questão 7 – Grupo 4. Fonte: Autor, 2014.

A figura 17, apresenta a resolução do Grupo 5 que requer alguns cuidados

na sua análise, primeiro para o fato da compreensão do enunciado, que solicitava

subtrair 3/8 de 6/8, os alunos compreenderam de modo equivocado e fizeram a

subtração contrária, e aí que reside o maior equívoco conceitual: se o grupo deduziu

6/8 de 3/8 e obteve como resultado uma fração negativa, faz sentido a

representação pictográfica apresentada?

Figura 17: Resolução questão 7 – Grupo 5 Fonte: Autor, 2014.

A discussão das estratégias permitiu perceber que não existe um único

caminho a ser percorrido, e que os alunos se utilizam de inúmeros

raciocínios/modos para encontrar os resultados. Muito além de saber ou ter em

mente essas resoluções é saber explorar essas ideias a fim de que possa promover

uma diversidade de abordagens no processo de ensino utilizando de equívocos ou

das lacunas conceituais surgidas do no processo de resolução para discuti-las e

51

assim no momento das sintetização (STEIN; SMITH, 1998) propiciar um momento

rico de aprendizado.

A seguir, é apresentado as considerações sobre as intencionalidades da

tarefa, que possuem intrínseca ligação com as estratégias e possibilidades de

resoluções.

(ii) Intencionalidades da tarefa

Inicialmente o grupo afirmou que a intenção era trabalhar adição e subtração

de frações. A ideia de mobilização de conceito de frações não surgiu inicialmente

nos grupos e sim nas discussões posteriores. Fato esse que permite constatar que

ao se analisar uma tarefa é preciso ter muito cuidado, deve-se considerar as

possíveis estratégias de resolução. Como preconiza (STEIN; SMITH, 1998), é

necessário antever as situações para então poder ter clareza de intencionalidades,

obviamente isso não é simples, assim como analisar a tarefa.

As quatro questões primeiras na percepção dos grupos, poderiam ser

utilizadas para a introdução do conceito de fração parte-todo, e a notação de

frações, seja ela pictográfica ou numérica (a/b).

A questão 5, tem um aspecto interessante quanto a sua estrutura, pois nela

pode estar contida uma forma de se introduzir a operação de multiplicação de

frações. No entanto, para a sua consecução, os grupos sugeriram algumas

alterações, tais como: evitar colocar dois questionamentos (Grupo 1) em uma

mesma questão, sob a alegação de que os alunos em geral responderiam apenas

ao primeiro. Portanto, dividí-la em duas questões seria uma alternativa. Além disso,

sugeriram que, se o objetivo real deste enunciado não era trabalhar com

multiplicação de frações, então deveria indicar para desfazer todas as dobras e não

apenas duas como estava indicado na tarefa.

Aqui evidenciou que os Grupos não perceberam a possibilidade de se

trabalhar com frações equivalentes com o enunciado da tarefa, e esta era a

intencionalidade inicial.

Já as questões 6 e 7, podem ser utilizadas com a intenção de trabalhar

frações equivalentes, e as operações de adição e subtração de frações com

denominadores diferentes.

52

Um fato interessante que nenhum dos grupos salientou é a possibilidade de

se pensar em um número misto, a partir do resultado da adição das frações

realizadas na questão 6, cujo resultado perfaz o total de nove oitavos, portanto

poder-se-ia pensar no número misto de um e um oitavo, ou ainda explorar a ideia de

frações impróprias ou ainda a ideia de fração como quociente.

Quando questionados sobre qual seria a série indicada para a aplicação

desta tarefa, os grupos foram unânimes em apontar o sexto ano do Ensino

Fundamental. No entanto, não fizeram objeção em utilizá-la em turmas mais

avançadas.

Alguns outros encaminhamentos e questões peculiares a linguagens ou

possíveis entraves que o professor possa encontrar na aplicação desta tarefa é

apresentado no tópico a seguir, que versa sobre essas questões.

(iii) Dificuldades no desenvolvimento da tarefa em sala de aula

Um primeiro aspecto elencado durante as discussões sobre os entraves diz

respeito à extensão da tarefa, e sobre isso os grupos opinaram que a mesma seria

extensa demais para ser desenvolvida com uma turma em uma única aula, e assim

o ideal seria ter pelo menos duas aulas (conjugadas) para a sua exploração. Outra

possibilidade seria o seu fracionamento em duas aulas separadas; o Grupo 4

teorizou que poderia incorrer na perda de significados ou na ligação entre os itens

realizados na aula anterior, e que seria necessário retomá-los na aula seguinte antes

da continuidade. Ao se questionar os demais sobre essa situação, concordaram com

o Grupo 4.

O Grupo 3 sugestionou que a tarefa fosse dividida em partes, de acordo com

as intencionalidades, por exemplo, abordar cada aspecto de uma vez, e não todos

ao mesmo tempo (adições e subtrações, frações equivalentes). Pois salienta o grupo

que na questão 6, por exemplo, o aluno necessita retornar as questões 4 e 5. E essa

linguagem poderia fazer com que os alunos não compreendessem exatamente o

enunciado da tarefa e assim comprometer seu desenvolvimento, o que poderia ser

um fator de complicação para os alunos.

Interessante fazer uma reflexão sobre esse posicionamento dos

acadêmicos, ao indicarem o fracionamento das tarefas remetem a algo que está

muito enraizado em nossas concepções de aprendizagem, muito disto em

53

decorrência da forma ou da escola que frequentamos em nossa formação, na qual

se “divide” o conhecimento em várias partes e espera-se que o aluno ao final do

processo “junte” ou mobilize as ligações existentes entre elas, mesmo em situações

que estão intimamente interligados os conceitos empregados. Ou seja, por que é

necessário discutir estes aspectos separados? Por que então se utilizar de todo o

contexto para explorar tais características?

O grupo 1 em sua análise achou a linguagem das questões 6 e 7

inadequadas ao sexto ano, e que isso talvez geraria problemas de compreensão.

Portanto, como solução a utilização de uma linguagem um pouco acessível.

Como sugestão, apresento a nova redação:

6 – Tome as três partes encontradas na questão 4 e adicione as três partes

encontradas na questão 5. Explique como fez.

7 – Tome as três partes encontradas na questão 4 e subtraia as três partes

encontradas a questão 5. Explique como fez.

Outra situação apontada pelo Grupo 2, foi a questão de se trabalhar as

operações de adição e subtração de frações diretamente com frações de

denominadores distintos. Ou seja, em nenhum momento a tarefa utiliza a adição ou

subtração de frações com mesmos denominadores. E isso ao ver deles geraria um

conflito na compreensão. Como solução disto, sugeriram que fosse adicionado um

enunciado antes que permitisse ao aluno adicionar frações de mesmo denominador.

Como consideração final solicitou-se que os mesmo afirmassem se haviam

gostado da tarefa e se em um futuro a utilizariam ou suas ideias para o ensino de

frações. Os Grupos elencaram algumas de suas características tais como:

atratividade; uso das dobraduras e material manipulável; e os questionamentos

pertinente a tarefa que permitem uma abordagem ampla para o ensino de frações.

De modo geral, elogiaram a tarefa e demonstraram interesse futuro na sua

utilização.

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6 CONSIDERAÇÕES FINAIS

A única coisa que se aprende e realmente faz diferença no comportamento da pessoa que

aprende é a descoberta de si mesma. Carl Rogers

As discussões oriundas da aplicação e análise da tarefa analisada foram

imensamente proveitosas, tanto nos aspectos relativos às possíveis estratégias de

resolução, como intencionalidades.

Permitiram perceber que mesmo sendo a tarefa uma proposta para uso no

ensino fundamental, 6.º ano, ao ser desenvolvida por acadêmicos ela permite

evidenciar alguns equívocos conceituais, ainda persistentes nas concepções deles.

Ou de outra forma, reflete a forma como de fato, “aprenderam” as frações, de modo

algoritmitizado, simplificado, sem a devida preocupação com seus significados ou do

significado do seu conceito.

A elaboração de uma tarefa sob os moldes do Ensino Exploratório-

investigativo requer muita atenção, estudo e dedicação. Está presente nas análises

de modo claro que o fato de antever as resoluções dos alunos permite que o

professor ao mediar a aprendizagem explore os equívocos conceituais que possam

por ventura aparecer. E mais, ao escolher ou elaborar uma tarefa a análise

superficial pode levar a incoerências em sua aplicação, isto é manifestado nas

intencionalidades da tarefa, quando inicialmente pensava-se apenas que ela serviria

para trabalhar com as operações de adição e subtração de frações.

Outro aspecto importante que ao desenvolver a pesquisa foi o fato que

mesmo tendo compreendido as fases, os processos e as posturas a serem adotadas

sob esta perspectiva de ensino-exploratório, o fato é que a seu desenvolvimento não

é tão simples, requer muita prática e clareza, para que se possa fazer os

questionamentos corretos aos alunos/acadêmicos para que não incorra no

comprometimento das intencionalidades ou objetivos da tarefa. Desta forma, não

basta conhecer a metodologia, acredito que somente praticando é que se consiga ao

longo do tempo obter resultados cada vez melhores e ter a ciência ou consciência

das atitudes a serem tomadas, pois do contrário ainda é muito forte e enraizado em

nossos hábitos os “velhos hábitos” da escola que nos formou.

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Mesmo ainda que a utilização tenha se dado de forma meio “imatura”,

entenda-se por imatura sem a devida experiência em sua utilização, o Ensino

Exploratório-investigativo gera uma riqueza de possibilidades, pois traz à tona em

seus resultados o que os alunos/acadêmicos compreendem ou não compreendem

acerca de um dado conceito, no caso aqui epigrafado, o conceito de frações. Desta

forma permite, tanto a professores quanto aos alunos/acadêmicos, que ao

discutirem as estratégias adotadas ver e refletir sobre as suas compreensões

inerentes ao assunto, e nesse processo minimizem as lacunas existentes na

educação.

Dito isto, reflito sobre a atividade letiva, e concluo que ela é fascinante para

aqueles que a amam e a desempenham com afinco e dedicação. É encantador

poder ensinar e aprender ao mesmo tempo. Poucas profissões no mundo permitem

essa interação e mutualidade. Ao decidir retornar aos bancos da universidade tinha-

se a convicção de que o caminho para se construir um mundo novo, mais justo e

correto perpassa pelas escolas, pela educação e pela formação do cidadão. E

agora, findando esse processo, tenho a certeza que a mudança está nas mãos dos

professores.

Ao desenvolver esta pesquisa nota-se quão fundamental é o papel do

professor, pois ao discorrer sobre as características das metodologias que aqui se

chama de alternativas, percebe-se uma mudança circunstancial na postura do

professor, onde o mesmo deixe o papel de “catedrático” ou centro do saber e

assume uma postura de orientador das “descobertas” dos alunos, sendo que estes

também têm seus papéis alterados, deixando de serem passivos para se tornarem

agentes de seu aprendizado e, portanto, construtores do conhecimento de uma

forma mais autônoma.

Obviamente não há garantias de aprendizado dos alunos sob qualquer

enfoque ou metodologia utilizada, no entanto, reitero que se não há garantia da

forma como está posta a educação porque então continuar insistindo num modelo

que a priori sabe-se que não funciona? Seria então interessante buscar alternativas,

opções que tragam um novo enfoque, uma nova visão da construção do

conhecimento, e o Ensino Exploratório-investigativo da matemática é uma dessas

oportunidades. Os resultados aqui encontrados apresentam de modo nítido as

possibilidades de, através dele, formar alunos/acadêmicos mais críticos, pensantes

e autônomos, que possam construir seu conhecimento e desenvolvam a

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compreensão dos conceitos envolvidos e não meramente a decorador de fórmulas

ou expressões/algoritmos.

Outro aspecto importante a salientar é o fato que através do Ensino

Exploratório-investigativo os alunos/acadêmicos podem experimentar de modo

análogo a evolução do conhecimento científico, que nasce de um problema ou de

uma situação para a qual não se tem todo o ferramental ou aparato para resolver, e

então partindo dela buscar elementos ou meios de solucioná-la.

No aspecto tangente às frações, há de se considerar ainda que a grande

maioria tem um contato com o vocábulo fração, pois é comum ouvir frases do tipo:

“uma fração de segundos”. No entanto, isso não significa que se compreenda

exatamente o que elas representam, analogamente seria como um leigo conseguir

se comunicar, mas ao mesmo tempo não é capaz de redigir um texto, por exemplo.

Isso leva a concluir que o termo fração é de uso cotidiano, pertencente ao

senso comum, mas já o seu(s) significado(s) é por vezes desconhecido(s) pela

grande maioria dos alunos, inclusive os do ensino superior.

Como possível estratégia para reduzir a lacuna existente entre o conceito

em si e sua compreensão surge o desenvolvimento de atividades semelhantes a que

aqui foi analisada coletivamente com acadêmicos de um curso de Licenciatura em

Matemática. Isto porque a mesma está pautada na exploração de situações que

levam os alunos a pensar e raciocinar sobre suas ações e, além disso, utiliza-se de

elementos palpáveis (folhas para dobras), e assim passam a

desenvolver/compreender a matemática ali existente e relacionar com outras

situações que já vivenciaram. Obviamente isso não ocorre de modo direto. É

necessária a mediação do professor, mas que, diferentemente do ensino tradicional

(clássico) neste caso não se apresenta um conceito para depois uma definição e

uma sequência de exercícios para fixação e sim a rica possibilidade de

experimentação/exploração do conceito através desta tarefa.

Prova maior das suas potencialidades da exigência cognitiva que gera essas

tarefas que mesmo aplicando em uma turma de graduação uma tarefa destinada ao

ensino fundamental ela gerou a possibilidade de visualizar as coerências e

incoerências na compreensão dos conceitos relacionados a frações. Desta forma,

acredita-se que a chave para o sucesso do Ensino Exploratório-investigativo é o

conflito que leva a argumentação sobre os diferentes pontos de vista dos membros

da sala, quando da devida sequenciação elaborada pelo professor. E desta forma,

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além de se aprender matemática, aprende-se elementos essenciais ao convívio

social, como a interação entre os seres, ao respeito mútuo, a pensar sobre as

considerações alheias, a aprender a convencer, ou seja, persuadir com

argumentação.

Por fim, encerrando o que ora aqui é exposto e refletindo sobre a questão

central desta pesquisa concluiu-se coletivamente que o Ensino Exploratório-

investigativo é uma forma dinâmica, atrativa e proveitosa de se explorar de modo

diferenciado situações-problemas baseadas em tarefas estrategicamente

definidas/elaboradas que levem os alunos/acadêmicos a desenvolver atividades

matemáticas de modo mais eficiente, permitindo corroborar as ideias defendidas

pelos autores precursores da sua formalização teórica.

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