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UNIVERSIDADE DO VALE DO RIO DOS SINOS – UNISINOS UNIDADE ACADÊMICA DE PESQUISA E PÓS-GRADUAÇÃO PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO NÍVEL MESTRADO IVAN CARVALHO BITTENCOURT FORMAÇÃO EM EDUCAÇÃO FÍSICA: UM ESTUDO SOBRE O PROFESSOR QUE SURGE DA CRISTALIZAÇÃO DA SEPARAÇÃO ENTRE GRADUADO E LICENCIADO SÃO LEOPOLDO 2011

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UNIVERSIDADE DO VALE DO RIO DOS SINOS – UNISINOS

UNIDADE ACADÊMICA DE PESQUISA E PÓS-GRADUAÇÃO

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO

NÍVEL MESTRADO

IVAN CARVALHO BITTENCOURT

FORMAÇÃO EM EDUCAÇÃO FÍSICA: UM ESTUDO SOBRE O PROFESSOR QUE SURGE DA CRISTALIZAÇÃO DA SEPARAÇÃO ENTRE GRADUADO E

LICENCIADO

SÃO LEOPOLDO

2011

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IVAN CARVALHO BITTENCOURT

FORMAÇÃO EM EDUCAÇÃO FÍSICA:

Um estudo sobre o professor que surge da cristalização da separação entre

graduado e licenciado

Dissertação apresentada como requisito parcial para a obtenção do título de Mestre em Educação pelo Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade do Vale do Rio dos Sinos – UNISINOS

Orientador: Prof. Dr. Luís Henrique Sommer

São Leopoldo

2011

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Catalogação na Publicação: Bibliotecária Fabiane Pacheco Martino - CRB 10/1256

B624f Bittencourt, Ivan Carvalho. Formação em educação física: um estudo sobre o

professor que surge da cristalização da separação entre graduado e licenciado / por Ivan Carvalho Bittencourt. – 2011.

93 f. : il. ; 30 cm.

Dissertação (mestrado) — Universidade do Vale do Rio dos Sinos, Programa de Pós-Graduação em Educação, 2011.

“Orientação: Prof. Dr. Luís Henrique Sommer.”

1. Professores de Educação Física – Formação. 2. Ensino – Legislação. 3. Educação Física – Estudo e ensino (Superior). I. Título.

CDU 371.13:796

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IVAN CARVALHO BITTENCOURT

FORMAÇÃO EM EDUCAÇÃO FÍSICA:

Um estudo sobre o professor que surge da cristalização da separação entre

graduado e licenciado

Dissertação apresentada como requisito parcial para a obtenção do título de Mestre em Educação pelo Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade do Vale do Rio dos Sinos – UNISINOS

Orientador: Prof. Dr. Luís Henrique Sommer

Aprovada em vinte e cinco de novembro de 2011.

BANCA EXAMINADORA

___________________________________________________________

Prof. Dr. Luís Henrique Sommer – UNISINOS

___________________________________________________________

Profª Drª Elí T. Henn Fabris - UNISINOS

___________________________________________________________

Prof. Dr. Nelson Schneider Todt – PUC/RS

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AGRADECIMENTOS

Agradeço a Deus, por todas as graças concedidas!

Ao meu orientador Profº Luís Henrique Sommer, pelos seus ensinamentos, rigor, camaradagem e generosidade.

À minha família, pela ajuda incondicional.

À minha esposa Lisiane, pela sua ajuda, amor e pela compreensão nas horas que não participei junto à família.

A todos os colegas que de uma forma ou de outra participaram na construção desta Dissertação.

À minha colega Iara, pela ajuda muito importante para seguir em frente.

A todos os funcionários da UNISINOS e em especial à Saionara e Loinir.

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RESUMO

A dissertação focaliza o modelo de formação ofertado aos futuros professores de educação física que decorre da separação licenciado – graduado, cristalizado pela Resolução 7/2004, que institui as Diretrizes Curriculares Nacionais para os cursos de graduação em Educação Física. Seus objetivos foram: a) avaliar e discutir os impactos da Resolução no que se refere à formação do professor de Educação Física; b) problematizar a questão da nomenclatura que se passa a utilizar a partir da referida resolução para nomear o que vínhamos chamando de bacharel em Educação Física; c) diagnosticar se há uma mudança em termos de aumento de qualidade da formação ofertada a partir da cristalização da separação entre licenciado e graduado em Educação Física; d) investigar se houve mudanças no trabalho do professor universitário que se ocupa da formação dos novos profissionais em educação Física; e) discutir os fatores sociais, econômicos e culturais que teriam condicionado a separação entre licenciado e graduado. O campo empírico da pesquisa foi composto por cursos de Educação Física de quatro universidades da região metropolitana de Porto Alegre e os sujeitos da pesquisa foram seis coordenadores de cursos. Os dados foram coletados por meio de entrevistas semiestruturadas. As análises foram feitas buscando regularidades nos discursos e demonstraram que: a) o núcleo da formação continua sendo a docência, tanto para a licenciatura quanto para a graduação; b) as mudanças, inclusive curriculares, são mais de superfície; c) o entendimento de que as pressões políticas não conseguiram afetar em profundidade a identidade dos cursos de Educação Física, uma vez que os documentos legais não têm todo o poder que poderíamos supor. Fica, pois, o entendimento extraído da maioria dos entrevistados, de que as mudanças na formação do professor em Educação Física não são significativas, uma vez que as bases epistemológicas dos saberes do campo e a articulação em torno da docência, isto é, dos processos de ensinar e aprender, continuam dando unidade aos processos formativos, inclusive dos graduados em Educação Física.

Palavras-chave : formação inicial de professores. educação física. licenciatura e graduação em educação física. legislação educacional.

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ABSTRACT

The dissertation focuses on the training model offered to future teachers of physical education that originate from unbundling licensed – graduate, crystallized by Resolution 7/2004, which established the National Curriculum Guidelines for Undergraduate Courses in Physical Education. Your objectives were: a) to evaluate and discuss the impact of the Resolution, concerning the training of teacher in Physical education; b) to analyse the issue of nomenclature that is going to be used from the Resolution above to nominate what was started calling a Bachelor's Degree in physical education; c) to diagnose whether there is a change in terms of increased quality of training offered from the crystallization of the separation between licensee and graduated in physical education; d) to investigate whether there were changes in the work of high level professor which deals with the training of new professionals in physical education; e) to discuss the social, economic and cultural factors that have conditioned the separation between license and graduated. The empirical field research was composed of physical education courses of four Universities of the metropolitan region of Porto Alegre and the search subject were six course coordinators. The data were collected by semi-structured interviews. The analyses were made seeking regularities in speeches and demonstrated: a) the core training remains the teaching process, both for the degree and the graduation; b) the changes, including curricula, are most superficially; c) the understanding that political pressures failed to affect deeply the identity of the physical education courses, since the legal documents does not have all the power that was expected. It is therefore an understanding extracted from the majority of respondents, that the changes in teacher training in physical education are not significant, since the epistemological bases of knowledge of the field and the articulation around teaching, that is, the processes of teaching and learning, continue to preserve unity to the formative process, including graduates Physical Education.

Keywords: Initial teacher education. physical education. graduate and degree in physical education. educational legislation.

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SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO .........................................................................................................7

2 A FORMAÇÃO DO PROFESSOR DE EDUCAÇÃO FÍSICA NO BRA SIL ............13

3 BACHAREL, GRADUADO, PROFESSOR: OS NOMES DO PROFIS SIONAL DE

EDUCAÇÃO FÍSICA.................................... .............................................................26

4 CAMINHOS PERCORRIDOS ................................................................................33

5 DISCUTINDO A FORMAÇÃO DO PROFESSOR DE EDUCAÇÃO FÍ SICA .........40

5.1 IMPACTOS DA RESOLUÇÃO 07/2004 SOBRE A FORMAÇÃO DO

PROFESSOR DE EDUCAÇÃO FÍSICA E A IDENTIDADE DO CURSO...................41

5.2 GRADUADO E PROFESSOR: TENSÕES ENTRE OS NOMES......................43

5.3 MUDANÇAS NA QUALIDADE DA FORMAÇÂO A PARTIR DA SEPARAÇÂO

GRADUADO-LICENCIADO.......................................................................................49

5.4. MUDANÇAS DE ÊNFASE NO TRABALHO DO PROFESSOR UNIVERSITÁRIO

PÓS-DIVISÃO DA EDUCAÇÃO FÍSICA ...................................................................55

5.5. FATORES QUE CONTRIBUÍRAM PARA A DIVISÃO LICENCIATURA –

GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO FÍSICA ...................................................................61

6 CONSIDERAÇÕES FINAIS ............................. ......................................................68

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS......................... ................................................73

APÊNDICE A – Roteiro de Entrevista .......................................................................77

ANEXO A – Resolução n° 03 de 16 de junho de 1987... ...........................................78

ANEXO B – Lei n° 9.696 de 1 de setembro de 1998.... .............................................82

ANEXO C - Resolução n° 7 de 31 de março de 2004.... ...........................................84

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1 INTRODUÇÃO

Sou graduado em Educação Física, formado em 1999 no atual Centro

Universitário da Igreja Metodista do Sul, obtendo como titulação Licenciatura Plena

em Educação Física, que habilita a trabalhar na educação escolarizada e nos

espaços não escolares. Em 2002 ingressei numa especialização em

Psicomotricidade na PUC-RS, recebendo o título de Especialista em

Psicomotricidade.

Minha experiência profissional se deu durante minha graduação, e por

motivos pessoais não atuei como professor de Educação Física. Entretanto, sempre

gostei de estar no meio acadêmico e, em 2009, ingressei no mestrado em educação

na Unisinos. Meus interesses iniciais giravam em torno da psicomotricidade na

educação infantil, mas meus movimentos dentro do Programa de Pós-Graduação

em Educação fizeram com que me centrasse em discussões sobre formação de

professores.

Mais especificamente, e articulado à minha formação inicial, meus interesses

giravam em torno da formação do professor de Educação Física. Esse interesse foi

amadurecendo no decorrer do processo de investigação, de tornar-me pesquisador.

Desde os tempos de graduação, recordo-me dos debates em torno dos significados

da Educação Física, seu objeto de trabalho, a especificidade de seus saberes e de

sua área de atuação. Percebo que, passados onze anos de minha titulação, esses

mesmos debates ainda estão na pauta das discussões acadêmicas e profissionais.

Recentemente, as discussões em torno da Educação Física têm sido

direcionadas para o debate sobre as modalidades de formação graduado em

Educação Física e licenciado em Educação Física. Essas discussões se fazem na

esteira da publicação da Resolução nº 7, de 31 de março de 2004, que institui as

Diretrizes Curriculares Nacionais para os cursos de graduação em Educação Física,

em nível superior de graduação plena (BRASIL, 2004). A referida resolução cristaliza

a figura do graduado em Educação Física no lugar do antigo bacharel em Educação

Física. Esse é exatamente o contexto, o pano de fundo da pesquisa empírica que

deu origem a esta dissertação de mestrado em Educação.

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Ao garimpar estudos recentes sobre a formação do professor de educação

física, constatei que há uma relativa diversidade de enfoques teórico-metodológicos

e de temáticas. O trabalho de Cruz (2009), denominado O embate de projetos na

formação de professores de educação física: além da dualidade licenciatura-

bacharelado, consiste em uma dissertação de mestrado em Educação, defendida na

Universidade Federal de Santa Catarina. A autora faz uma retomada dos embates

na formação dos professores entre os anos de 1987 e 2007 e advoga a necessidade

de se desenvolver uma proposta alternativa de formação que vá além do que

considera ser uma falsa dicotomia entre licenciatura e bacharelado.

Por outro lado, há uma série de estudos cujo foco está na formação de

professores de educação física a partir da análise de textos legais. É o caso, por

exemplo, do estudo de Müller (2006), que se centra no exame das reformas na

formação desse profissional, a partir da publicação da LDB 9394/96. Nessa

dissertação, intitulada Um olhar sobre as reformas curriculares dos cursos de

licenciatura em educação física: adequação legal ou reforma?, defendida na

Universidade Federal do Rio Grande do Sul, a autora pretendeu verificar as

reestruturações curriculares dos cursos de educação física, a partir da publicação da

Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB 9394/96), tendo como eixo de

análise a formação do professor crítico-reflexivo. Conceito que, é bom ressaltar, tem

uma longa história atrelada ao desenvolvimento das chamadas pedagogias críticas

e, como tal, vem sendo apropriado e ressignificado pelas mais diversas licenciaturas

e não só pela licenciatura em Educação Física. Também pertence a esse grupo de

pesquisas, que toma como corpus empírico textos legais, o estudo de Birk (2006),

Interesses e disputas no processo de formulação das diretrizes curriculares

nacionais para os cursos de graduação em Educação Física: as configurações das

relações sociais, que analisa disputas e interesses no processo de formulação das

Diretrizes Curriculares Nacionais para a formação de Graduação em Educação

Física.

Outro grupo de estudos localiza-se mais próximo do campo de estudos

Educação e Trabalho. É o caso, por exemplo, da dissertação de mestrado de Sousa

Sobrinho (2009), defendida na Universidade Federal do Ceará, que coloca em relevo

a lógica do capital como condicionante das forças sociais e aborda a regulação do

mercado através do Conselho Nacional de Educação Física. Também é o caso da

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dissertação de mestrado de Sofiste (2007), Profissional ou professor de educação

física? Interfaces de uma profissão regulamentada, defendida na Pontifícia

Universidade Católica de São Paulo, que tematiza a regulamentação da profissão

após a publicação da Lei nº 9.696/1998 que, entre outros aspectos, criou o Conselho

Federal de Educação Física. Nesse mesmo grupo, encontra-se a tese de doutorado

de Nozaki (2004), Educação física e reordenamento no mundo do trabalho:

mediações da regulamentação da profissão, que versa sobre o reordenamento do

trabalho a partir da regulamentação da profissão, dando destaque aos movimentos

dos trabalhadores frente aos conselhos estaduais de Educação Física.

Finalmente, há a tese de doutorado de Melo (2007), que não pode ser

classificada em nenhum dos grupos anteriores. Denominada Inovações pedagógicas

no currículo dos cursos de formação de profissionais de educação física:

contribuições teórico-metodológicas da prática pedagógica, a tese, defendida na

Universidade Federal de Pernambuco, focaliza os processos de inovação curricular

no curso de Educação Física de uma universidade federal, no contexto de

reformulação curricular ali desenvolvido.

No site da Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Educação

(ANPED), entidade científica que realiza anualmente reuniões para debater

trabalhos científicos da área da Educação, no período de 2005 a 2010, mais

precisamente no Grupo de Trabalho nº 8 – Formação de Professores - encontrei um

trabalho que se aproxima da temática e da problematização da dissertação que aqui

apresento. O trabalho, denominado O currículo dos cursos de educação física:

novas rupturas ou antigas continuidades?, de autoria de Paola Luzia Gomes

Prudente e Cláudio Lúcio Mendes, busca analisar os currículos para formação de

professores de Educação Física em cinco diferentes instituições, interrogando a

formação que advém de tais reformulações curriculares.

No Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade do Vale do

Rio dos Sinos (UNISINOS), nos últimos cinco anos nenhum trabalho foi encontrado

com o tema proposto para a pesquisa.

Analisando os trabalhos encontrados, a grande maioria trata-se de

dissertações e teses que estudam a formação de professores de Educação Física

em nível de Graduação e Licenciatura nos seus aspectos curriculares e discussões

de concepções de formação. Tais trabalhos trazem à tona um conjunto de debates

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que se alicerçam a partir da consideração das determinações da ordem do capital;

da consideração das relações de poder envolvidas nos interesses de diferentes

grupos; do foco nos efeitos das contínuas reformulações curriculares. Tais estudos,

aparentemente distintos, parecem ter um ponto em comum, que tem a ver com a

recorrente interrogação acerca de qual seria a melhor formação: Licenciatura em

Educação Física, Graduação em Educação Física ou uma formação ampliada?

Sem negar a relevância dos estudos acima citados, interessa-me investigar a

formação do professor de educação física que é instituída a partir da separação

entre as modalidades: graduado em Educação Física e licenciado em Educação

Física. Ambos decorrentes da publicação da Resolução Nº 7, de 31 de março de

2004, que institui as Diretrizes Curriculares Nacionais para os cursos de graduação

em Educação Física, em nível superior de graduação plena. Em outras palavras, o

foco está no modelo de formação ofertado aos futuros professores de educação

física, após a publicação da referida resolução. Apesar de eu estar ciente de que tal

resolução regula especificamente os currículos da chamada graduação em

Educação Física e não a licenciatura em Educação Física1, considero a hipótese de

que a publicação da resolução vem produzindo efeitos também sobre a licenciatura

em Educação Física.

Diferentemente do que eu propunha no projeto de dissertação2, a pesquisa

empírica foi alterada a partir das relevantes contribuições da banca avaliadora. Meu

foco continua basicamente o mesmo, e tem a ver com o modelo de formação de

professor de Educação Física que decorre da publicação da já referida resolução.

Entretanto, ao invés de escutar professores universitários, optei por escutar

coordenadores de cursos de Educação Física de quatro universidades gaúchas com

significativa trajetória na formação em Educação Física. A questão norteadora da

investigação que deu origem a esta dissertação pode ser assim sintetizada: Qual é o

1 A licenciatura em Educação Física é regulada pela Resolução 01 de 18 de fevereiro de 2002, que instituiu as Diretrizes Curriculares Nacionais para a formação de professores da Educação Básica, e a Resolução nº 2/2002 em 19 de fevereiro de 2002, que define que os cursos de licenciatura, de graduação plena, de formação de professores da Educação Básica deverão ter uma carga horária mínima de 2.800 horas, além de preceituarem uma determinada orientação curricular. 2 Quando da qualificação da dissertação, eu definia como campo empírico da pesquisa uma instituição de ensino superior gaúcha com larga tradição na formação de profissionais da área da Educação Física, e a coleta de dados seria feita junto a professores do curso de Educação Física dessa instituição, que nela atuam desde antes da publicação da Resolução nº 07/2004.

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modelo de formação ofertado aos futuros professores de educação física que

decorre da separação licenciado – graduado, cristalizada pelas Diretrizes

Curriculares Nacionais para os cursos de graduação em Educação Física (BRASIL,

2004).

Os objetivos da pesquisa desenvolvida, e, por conseguinte, desta dissertação,

foram: a) avaliar e discutir os impactos da Resolução 07/2004, no que se refere à

formação do professor de Educação Física; b) problematizar a questão da

nomenclatura que se passa a utilizar a partir da referida resolução para nomear o

que vínhamos chamando de bacharel em Educação Física; c) perceber se há uma

mudança em termos de aumento de qualidade da formação ofertada a partir da

cristalização da separação entre licenciado e graduado em Educação Física; d)

investigar se houve mudanças no trabalho do professor universitário que se ocupa

da formação dos novos profissionais em educação Física. Isto é, interrogar acerca

de uma possível mudança de ênfase, digamos de uma formação mais técnica,

reservado aos graduandos, para uma formação mais pedagógica, dirigida aos

licenciandos; e) discutir os fatores sociais, econômicos e culturais que teriam

condicionado a separação entre licenciado e graduado.

Esta dissertação está estruturada da seguinte forma: no capítulo 2 – A

formação do professor de Educação Física no Brasil – faço uma breve retomada

histórica dessa profissão, dando especial destaque a dois momentos. São eles: a

década de 1980, na qual é publicada a Resolução Nº 03/1987, que versa sobre

currículo e tempo de duração dos cursos de graduação em Educação Física nas,

então, duas modalidades – bacharelado e licenciatura plena – e o período

imediatamente posterior à publicação da Resolução Nº 07/2004; no capítulo 3 –

Bacharel, graduado, professor: os nomes do profissional de Educação Física -

desenvolvo uma discussão em torno da mudança de nomenclatura da modalidade

de formação bacharel, que é substituída por graduado, e localizo alguns dos debates

que ainda se fazem sobre essa temática, e os modos como eles vêm sendo

desenvolvidos em articulação com a formação de professores para a área. No

capítulo 4 – Caminhos percorridos, discuto as opções metodológicas e as trilhas que

percorri para o desenvolvimento da investigação, explicitando as formas como a

pesquisa empírica foi desenvolvida e, finalmente, no capítulo 5 - Discutindo a

formação do professor de educação física, procedo às análises propriamente ditas.

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Nesse capítulo as discussões estão organizadas em cinco sessões: 5.1 Impactos da

resolução 07/2004 sobre a formação do professor de educação física e a identidade

do curso; 5.2 Graduado e professor: tensões entre os nomes; 5.3 Mudanças na

qualidade da formação a partir da separação graduado-licenciado; 5.4 Mudanças de

ênfase no trabalho do professor universitário pós-divisão da educação física e 5.5

Fatores que contribuíram para a divisão licenciatura-graduação em educação física.

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2 A FORMAÇÃO DO PROFESSOR DE EDUCAÇÃO FÍSICA NO BRA SIL

Neste capítulo faço uma breve retrospectiva histórica da educação física no

Brasil, no que tange à formação de professores. Retrocedendo no tempo para

melhor entender o momento atual com relação às questões legais que giram em

torno da formação docente, abordarei os momentos históricos que marcaram a

profissão de professor de educação física no Brasil.

Conforme Quelhas e Nozaki (2006), em 1851, observou-se a necessidade da

formação de professores de educação física para o quadro do magistério no Brasil.

Esta formação deu-se por causa da reforma de ensino para a instrução primária e

secundária do Município da Corte, que abrangia a ginástica nos currículos das

escolas públicas de ensino primário. Em 1854, houve uma equiparação do professor

de educação física com os de desenho, música e dança, dando ao primeiro o título

de professor em vez de instrutores de ginástica, identificados estes como

trabalhadores não muito intelectualizados.

A formação de professores de educação física, segundo Quelhas e Nozaki

(2006), começou em 1914, ligada às escolas militares, com a primeira delas, a

escola de Educação Física da Força Pública de São Paulo, formando os primeiros

mestres de esgrima. Essa formação foi resultado da presença da Missão Militar

Francesa no Brasil em 1902, que veio com o objetivo de ministrar instrução militar à

Força Pública.

A década de 1920 foi um período de grande significado para a educação

física brasileira, pela adoção do Método Francês como modelo oficial de instrução de

tropa, e também como método oficial de educação física a ser proposto nas escolas

brasileiras. Em 1929 começa o funcionamento do curso provisório de Educação

Física que desencadeou a escola de Educação Física do Exército. Fernando de

Azevedo, um representante do movimento escolanovista, foi mentor dessa iniciativa,

e nela foram diplomados vinte professores civis, nesse curso provisório de cinco

meses de duração da escola de Educação Física (Quelhas e Nozaki, 2006).

As primeiras Escolas Superiores em Educação Física foram fundadas em

1939, decorrentes do Decreto Lei Nº 1.212/1939. São elas: Escola Nacional de

Educação Física e Desportos da Universidade do Brasil (ENEFED), situada no Rio

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de Janeiro e a Escola de Educação Física de São Paulo (CASTELLANI FILHO,

1998).

Quelhas e Nozaki (2006) comentam que em termos de conteúdos a formação

dos professores de educação física na modalidade licenciado se constitui de uma

forma diferenciada das outras licenciaturas. Segundo os autores (QUELHAS E

NOZAKI, 2006) para ingressar na ENEFED bastaria ter concluído o curso secundário

fundamental, enquanto na Faculdade Nacional de Filosofia (FNFI) o aluno precisaria

ter concluído o curso secundário complementar. A duração do curso de educação

física era de apenas dois anos, enquanto que para as demais licenciaturas eram

exigidos quatro anos de estudo. Pode-se dizer que no período correspondente ao

governo de Getúlio Vargas (1932-1945), a educação física iniciou um processo de

organização e regulamentação que ajudou na sua constituição (SILVA, 2009).

Com o Decreto-lei nº 8.270/1945, o curso de Educação Física passa de dois

para três anos e, em 1953, com a lei de equivalência nº 1.821/1953 a forma de

ingresso ao Ensino Superior de Educação Física foi alterada, sendo exigidos a

prestação de exames vestibulares e o diploma de conclusão do 2º ciclo do ensino

médio (FARIA JÚNIOR, 1987).

Em 1945 houve um redimensionamento da formação de professores de

Educação Física, em boa parte decorrente da nova divisão geopolítica que opunha o

mundo capitalista, liderado pelo EUA, e o mundo comunista, liderado pela extinta

URSS. Eram formados atletas de alto rendimento, buscando quebra de recordes e

desenvolvimento de técnicas que melhorassem o desempenho dos atletas,

principalmente russos e americanos (CRUZ, 2009).

No início da década de 1960, a formação em Educação Física era baseada

no tecnicismo, ou seja, formavam-se técnicos da área como sinônimos de

professores de Educação Física. Os técnicos, sem um curso de nível superior, foram

responsáveis por desenvolver a Educação Física em municípios brasileiros com

carências de professores formados em nível superior. A formação tecnicista

enfocava o esporte e, principalmente quatro modalidades esportivas (futebol,

basquetebol, voleibol e handebol), e objetivava formar para o “Alto Rendimento”

(CRUZ, 2009).

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A situação política em 1969 repercutiu na obrigatoriedade da Educação Física

no ensino superior, em um contexto no qual se dizia buscar garantir a ordem e a

segurança nacional, tendo como paradigma o esporte de rendimento (SILVA, 2009).

Quelhas e Nozaki (2006) comentam que até a década de 1970 os cursos de

Educação Física perduraram inalterados, se distanciando das demais licenciaturas.

Tais cursos eram obrigados a seguir às exigências do Conselho Federal de

Educação quanto ao currículo mínimo, o que impôs que as matérias pedagógicas

(Psicologia da Educação; Didática; Estrutura e Funcionamento do Ensino de 2º grau

e Prática de Ensino sob a forma de Estágio Supervisionado) viessem a se tornar

obrigatórias. A Resolução nº 69/69 do Conselho Federal de Educação (CFE) regia

os currículos da formação profissional em educação física, formulada com base no

Parecer nº 894/69 do CFE. No artigo 2º desse Parecer apresentavam-se as

disciplinas que obrigatoriamente constituíam os currículos: 1. Disciplinas básicas:

biologia, anatomia, fisiologia, cinesiologia, biometria e higiene. 2. Disciplinas

profissionais: socorros urgentes, ginástica, rítmica, natação, atletismo, recreação,

disciplinas pedagógicas de acordo com o parecer nº 672/69 do CFE – psicologia da

educação (abordando pelo menos os aspectos da adolescência e aprendizagem),

didática, estrutura e funcionamento do ensino de 2º grau, além da prática de ensino.

Segundo os autores (QUELHAS E NOZAKI, 2006) a regulamentação do

currículo mínimo dos cursos de educação física em 1969 estava voltada para a

formação do técnico esportivo. Como reflexo disso, temos o direcionamento para

uma formação que garantisse o título de Licenciado em Educação Física e Técnico

de Desportos, listando seis disciplinas básicas (todas da área biológica), seis

disciplinas profissionais e, também, as disciplinas pedagógicas. Com isso o aluno

que acrescentasse mais duas disciplinas de aspecto desportivo obtinha o Título de

Técnico Desportivo.

Stefane e Mizukami (2002) relatam que, nas décadas de 1970 e 1980 (1979 a

1984), o MEC organizou diversos seminários com o objetivo de discutir a formação

de professores para o ensino fundamental e médio, e também o currículo dos cursos

de Educação Física. Em Curitiba, no ano de 1983, foi realizado um seminário no

qual se discutiram as quatro áreas de conhecimento que constituíam o currículo

mínimo da educação física que eram: conhecimento do homem, conhecimento da

sociedade, conhecimento filosófico e conhecimento técnico.

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No ano de 1978 é criado o Colégio Brasileiro de Ciências do Esporte (CBCE),

ou seja, uma entidade científica da área da Educação Física que reúne

pesquisadores de todo o país (CRUZ, 2009). A referida autora comenta que em

meados de 1980 os estudos sobre a formação na área da educação física

começavam a emergir na forma de debates e eventos organizados, reunindo

pesquisadores, professores e estudantes em torno das mais diversas temáticas, em

publicações da área, focando as discussões sobre: O que é a educação física?

Taffarel (1993, p. 36) nos apresenta uma síntese desse contexto histórico:

Demarcaram-se posições diferenciadas, cada vez mais explicitadas, nas discussões sobre as funções sociais da Educação Física, sua ligitimidade e autonomia (BRACHT, 1992). Em um amplo espectro, ainda não muito bem delineado, encontram-se tanto os que defendem a Educação Física na perspectiva da aptidão física, da saúde, centrado suas argumentações enfaticamente nas dimensões biológicas e psicológicas, como os que questionam este papel e buscam explicações dentro de perspectivas sociológicas e psico-pedagógicas, além daqueles que buscam entender a Educação Física como componente da cultura corporal e esportiva. Ou seja, na busca de teorias explicativas para a Educação Física & Esportes encontra-se ora uma ênfase na dimensão biológica, ora na neuro-comportamental, ora na sócio-cultural.

Segundo Cruz (2009), em 1987, a Resolução 03/87 (BRASIL, 1987) institui a

separação entre licenciatura e bacharelado em Educação Física, ocasionando

também a definição dos locais de atuação profissional em espaços formais e não

formais. Espaço formal refere-se às escolas, e espaços não formais refere-se aos

locais fora da escola, como por exemplo, academias, entre outros.

Essa mesma autora comenta que alguns estudos abordavam que a

licenciatura não conseguia abranger todos os campos de atuação dos profissionais

da Educação Física. Isso é, espaço não escolar ou não formal. Para contemplar

esses espaços seria necessário o surgimento de novas modalidades. Destaco, a

seguir, uma passagem do texto de Taffarel (1993, p. 24) que aborda uma proposta

que foi base à Resolução 03/87, fragmentando a formação em Educação Física:

Outra proposta é defendida por OLIVEIRA (1988) que apresenta uma formação diferenciada entre Educação Física e Esporte. Parte da

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preparação profissional na USP e de estudos sobre mercado de trabalho, sugerindo que a USP ofereça cursos de Bacharelado em Educação Física, Licenciatura em Educação Física e Bacharelado em Esporte, e que a Escola Superior da Educação Física altere seu nome para “Escola de Educação Física e Esportes”. Esta proposta foi apresentada em 1984, no Seminário de Diretores de Escolas de Educação Física, do qual participou o então relator do processo de reestruturação dos Cursos de Graduação em Educação Física do Conselho Federal de Educação, Mauro Costa Rodrigues.

A resolução 03/87 (BRASIL, 1987) não contentou a todos os setores.

Segundo Cruz (2009), o segmento mais progressista da Educação Física identificava

um retrocesso para a profissão, em um contexto de redemocratização que a

sociedade brasileira atravessava nessa época. No ano de 1988, houve uma

contemplação do desporto com a nova Carta Magna, na seguinte passagem no Art.

217: “É dever do Estado fomentar práticas desportivas formais e não formais, como

direito de cada um” (BRASIL, 1988, p. 142). O esporte, citado na Constituição do

Brasil, adquire, de certa maneira, uma representatividade maior perante o campo do

saber da Educação Física, incidindo na forma de se pensar o desenvolvimento do

desporto no País, inclusive na formação de professores na área (CRUZ, 2009).

Cruz (2009) ainda comenta que a partir de 1990 a Educação e, mais

especificamente, a formação de professores de Educação Física sofre

transformações significativas devido ao Brasil adotar novos marcos regulatórios para

a reestruturação do Estado. Em geral, esses marcos na Educação são elaborados e

implementados, como no caso: Lei de Diretrizes e Bases da Educação (BRASIL,

1996) e Parâmetros Curriculares Nacionais (BRASIL, 1998), respectivamente LDB e

PCNs. Nesse período a classe mais conservadora que buscava a regulamentação

da profissão de Educação Física ganha força e, em 1998, é aprovada a Lei 9696/98

que cria o primeiro Conselho Profissional privado do país, o sistema CONFEF/CREF

– Conselho Federal de Educação Física e Conselho Regional de Educação Física.

A primeira Comissão de Especialistas (COESP) em Educação Física foi

criada nesse mesmo ano (1998), com o objetivo de enfrentar os problemas

causados pela Resolução 03/87, tais como a fragmentação da formação entre

Licenciatura e Bacharelado. Apresento logo abaixo a passagem do texto de Taffarel

e Lacks (2005) que faz referência à COESP:

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Diferente da Resolução 03/87, a proposta de diretrizes curriculares da comissão de especialistas estabelece que a formação superior em Educação Física deverá ser em curso de graduação que confere o título de “graduado em Educação Física” (extinguindo-se, portanto, as duas titulações, a de licenciado e a de bacharel), com aprofundamentos em campos de aplicação profissional, visando a atender às diferentes manifestações da “cultura do movimento” da sociedade, considerando as características regionais, de mercado, relacionadas com o campo de atuação profissional. [...] A estrutura curricular é composta por duas partes: conhecimento identificador da área e conhecimento identificador do tipo de aprofundamento (p. 90-91).

Os mesmos autores relatam que a segunda comissão da COESP reuniu a

comunidade acadêmica para trabalhar em cima das diretrizes aprovadas

anteriormente. Essa não apresentou nenhum problema em relação ao Parecer

009/20013. O sistema CONFEF ficou muito contrariado com a proposta anterior e

acreditava na divisão na formação.

Segundo o CONFEF, não havia sentido a proposta das DNCEF, que estabeleciam uma graduação com intervenção, tanto na área formal como na informal, consenso, entre os diretores das escolas de Educação Física e apresenta pela COESP da SESu/MEC. Já homologado o novo parecer, todas as áreas deveriam ter dois cursos específicos, um para a licenciatura e outro para o bacharelado (TAFFAREL; LACKS, 2005, p. 94).

No ano de 2004, com a Resolução 07/04 (BRASIL, 2004), foram aprovadas

as Diretrizes Curriculares Nacionais para Graduação em Educação Física (DCNEF)

(CRUZ, 2009). Pode-se constatar que com a Resolução 07/2004 (BRASIL, 2004) foi

mantida a ideia de divisão na formação entre licenciatura e bacharelado. Também foi

definido que o objeto da Educação Física é o movimento humano, bem como foram

citadas as competências que um professor deveria ter desenvolvido durante sua

formação (TAFFAREL; SANTOS JÚNIOR, 2010).

Conforme Taffarel et al. (2006), a formação dos professores de Educação

Física no Brasil é concebida em instituições universitárias e predomina a formação

3 Parecer CNE/CP/2001 Diretrizes Curriculares Nacionais para a Formação de Professores da Educação Básica em nível superior, curso licenciatura, de graduação plena.

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de licenciados. O ordenamento legal que rege esta formação é composto por:

Diretrizes para a formação em educação física na graduação – Resolução nº 7, de

31 de março de 2004 e Diretrizes para a formação de professores (Licenciatura),

para a educação básica – Resolução CNE/01 de 18 de fevereiro de 2002 (BRASIL,

2002a) e Resolução CNE/CP nº 2 de 19 de fevereiro de 2002 (BRASIL, 2002b).

Taffarel et al. (2006) ainda comenta que a formação nos cursos de Educação

Física apresenta problemas teóricos, epistemológicos, de financiamento público, de

oferecimento das condições objetivas para funcionamento dos cursos, curriculares,

além de problemas políticos. Outros autores que fazem críticas em relação à

formação de professores de educação física, como Quelhas e Nozaki (2006),

comentam que a divisão da formação em Educação Física em duas habilitações não

resolveria as suas principais disputas e também não acabaria com a hegemonia da

licenciatura plena.

Nesta primeira parte do texto abordei a questão do ordenamento legal para a

formação dos professores de educação física e o seu currículo de formação. A partir

deste momento entrarei nas discussões travadas sobre a formação de professores

de educação física entre a licenciatura e o bacharelado.

Para melhor explicar as mudanças que ocorreram no currículo de formação

do professor de educação física, a partir da resolução nº 03/87 (BRASIL, 1987),

cabe salientar que o currículo de formação em nível de graduação em educação

física tem a possibilidade de duas formações, a Licenciatura Plena e o Bacharelado.

Na Licenciatura Plena, o profissional poderá trabalhar tanto na área escolar

na educação básica, como também na área não escolar: clubes, academias,

parques, hospitais, entre outros e, no Bacharelado, poderá trabalhar somente na

área não escolar como citado acima.

Em suma, a resolução nº 03/87 (BRASIL, 1987) do Conselho Federal de

Educação trouxe flexibilizações para os currículos de formação do professor de

educação física. A Licenciatura em Educação Física teve um caráter ampliado, numa

formação geral na parte técnica e humana, possibilitando que as Instituições de

Ensino Superior (IES) gozassem de sua autonomia para organizar seus currículos

de formação optando tanto por uma formação mais técnica - o Bacharelado - como

por uma formação ampliada, no caso da Licenciatura, com o título Licenciatura

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Plena. Entende-se que o Licenciado é habilitado para dar aula em educação

escolarizada, como também na área não formal: academias, clubes, entre outros.

Conforme Quelhas e Nozaki (2006) a Resolução 03/87 do CNE foi o primeiro

ato que gerou a fragmentação da licenciatura em Educação Física. O Bacharelado,

destinado ao profissional habilitado a trabalhar nos campos não escolares, de certa

forma acabava descaracterizando-o como professor de educação física na educação

escolarizada e o caracterizava como profissional liberal, tentando assegurar-lhe

campos de trabalho que vinham sendo ocupados pelo professor de educação física.

Segundo os mesmos autores, o Conselho Federal de Educação Física

(CONFEF) persiste na lógica de fiscalização do bacharelado em Educação Física,

para que somente o graduado (bacharel) atue nos campos não escolares, gerando

intimidação e fazendo com que os cursos de formação em Educação Física

garantissem o bacharelado, em detrimento da supremacia, ainda, dos cursos de

licenciatura.

Na década de 1980, no cenário mundial, as políticas de desobrigação do

estado para com as conquistas sociais, bem como, o afrouxamento das relações de

trabalho, que acarretaram prejuízos para a classe trabalhadora, refletiu num

reordenamento do trabalho do professor e, consequentemente, da educação física

brasileira. Nessa época aumentava o número de academias de ginástica, uma vez

que o que seria dever do Estado – promover a manutenção da saúde – não era

efetivado. Com o argumento de promoção da saúde ou da melhoria estética do

corpo, houve uma grande aplicação do capital, abrindo-se um novo de nicho de

mercado para os professores de educação física (QUELHAS e NOZAKI, 2006).

Mesmo que a Resolução nº 03/87 tenha trazido alguns avanços para a

formação dos professores de Educação Física, especialmente no que diz respeito ao

aumento de áreas de conhecimento: filosófico, do ser humano, da sociedade e

técnico. Da implementação de monografia para a conclusão do curso. A exigência

da duração do curso de no mínimo quatro anos, e ampliação da carga horária de

1800 para 2880 horas-aulas –, não houve grandes avanços para a área (QUELHAS

e NOZAKI, 2006).

Com a aprovação da Resolução 07/2004 (BRASIL, 2004), houve a

fragmentação da formação profissional, criando-se agora a titulação de graduação

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em Educação Física em troca da antiga formação denominada bacharelado, o que

foi uma formação idealizada no papel, com a Resolução 03/87, separando a

formação. Hoje, surge outro papel de trabalhador, com a Resolução 07/04

precarizando as relações de trabalho em função das flexibilidades ideológicas, da

empregabilidade e do empreendedorismo (QUELHAS e NOZAKI, 2006).

Em síntese, os autores anteriormente citados apontam algumas críticas à

formação de professores de Educação Física na perspectiva fragmentada entre

licenciatura e bacharelado, que destaco a seguir:

a) Essa formação é, principalmente, regida pela lógica do capital.

Desconsidera como elemento central a formação pedagógica;

b) A Graduação (Bacharelado) em Educação Física não abrangerá o campo

de trabalho dito não-escolar;

c) os trabalhadores, para dar conta de sua existência precisam ocupar muitos

postos de trabalho, tanto o escolar como o não-escolar. Devida e

fragmentação da formação, as Diretrizes Curriculares não conseguem

efetivar um componente relevante na formação do trabalhador;

d) a intenção da Graduação em Educação Física é o domínio das práticas

corporais no meio não-escolar, trata-se de um domínio ideológico,

apresentando uma formação que não critique a precarização do trabalho

docente nos seus vários campos de atuação. Sob este ponto de vista se

tem o porquê do CONFEF fiscalizar os campos não-escolares para garantir

a Graduação nos seus vários cursos de formação;

e) considerando que há a necessidade de formação nos vários campos de

atuação, instituições optam por uma oferta dos dois cursos de formação,

no que é chamado modelo 3 + 1 ou através de distorções contábeis

tentando aglutinar o mesmo tronco formador para uma ou outra habilitação.

Tanto a Resolução 03/87 como a atual legislação, faz pensar que não haverá

mudanças significativas na formação.

Outros autores que fazem uma crítica a essa formação dividida são Taffarel e

Santos Júnior (2010). Eles comentam a dicotomia entre licenciatura x bacharelado

na formação em Educação Física. A seguir, cito uma passagem deste texto:

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Entre os argumentos utilizados, dantes como agora, para sustentar a proposta da fragmentação profissional entre Licenciatura e Bacharelado, encontramos o da diferença entre os locais de atuação profissional. Desconsidera-se, assim, que o que define a profissão são determinadas necessidades ou demandas sociais que podem ou não estar contempladas no processo de formação. Outro argumento sustentado é o de que o licenciado deveria ter, predominantemente, uma formação pedagógica, e o bacharel, uma formação enfaticamente científica – o que permitiu/permite interpretações equivocadas de que a formação pedagógica prescinde da ciência e vice-versa. Isto pode induzir, ainda, à consideração de que, no âmbito de atuação do professor de Educação Física, no interior da escola, não se trata com o conhecimento científico, e à de que não sejam necessárias as atitudes científicas. Ao discutir a questão do trabalho em Educação Física, Faria Júnior (1987: 228) pergunta sobre a possibilidade de um mesmo corpo de conhecimento fundamentar duas profissões distintas (Licenciatura e Bacharelado) e, ainda, de existirem dois corpos de conhecimentos, um correspondente ao magistério (Licenciatura) e outro Bacharelado. Pior ainda quando se opta pelas duas possibilidades sem o devido esclarecimento do que as diferencia já na formação; aqui as chances de um “tabarelado” são por demais concretas. O não esclarecimento destas questões (entre outras), a partir de elementos científicos, tem contribuído para uma formação que mais confunde que explica; que desqualifica mais que qualifica (p.32).

Em relação ao Bacharelado em Educação Física, Taffarel e Santos Júnior,

(2010) destacam que:

Na contramão deste processo (re)aparece a defesa do bacharelado. Não encontramos, ainda, nenhum argumento, nenhuma pesquisa que informe o que fundamenta a defesa do bacharelado além da posição obtusa dos confefianos querendo “abocanhar” esta fatia do mercado no confinamento de filiados. A ideia de conhecimentos diferenciados, de aprendizagens diferenciadas e, portanto, de formações diferenciadas não encontra correspondência na realidade. O bacharelado é sim um salto para trás na área da Educação Física, porque divide a categoria, cinde a formação de maneira abstrata e tenta aprisionar o debate no senso comum. Existem hoje, no Brasil, 874 cursos e habilitações em Educação Física. Destes apenas 211 IES oferecem apenas o bacharelado (a quase totalidade em IES privada), 182 oferecem licenciatura e Bacharelado, 489 oferecem apenas a licenciatura e 04 oferecem na modalidade EAD. Nas 182 que oferecem a dupla formação, pelos dados colhidos até agora, nada indica que tenham estruturas diferenciadas, nem corpo docente diferenciado o que põe em xeque a posição de formação diferenciada (p.34-35).

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Esses mesmos autores, numa análise da formação em Educação Física,

falam que, independente do local de atuação da educação física (na escola ou fora

dela), o que une e identifica os trabalhadores é a docência e fazem duras críticas ao

sistema CONFEF/CREF (ver legislação em anexo B), comentando que a ação desse

conselho, atende a interesses de reserva de mercado, e atuam na coerção de

professores para filiarem-se ao mesmo, garantindo sua sobrevivência. Para

exemplificar os debates travados em torno das Diretrizes Curriculares Nacionais

para a Educação Física, trago Taffarel e Lacks (2005):

A partir da crítica às diretrizes defendidas pelo CONFEF, durante a 54ª Reunião da SBPC, o CBCE consegue aprovar a deliberação de enviar carta ao CNE (a seu presidente, ao vice-presidente da Câmara Superior e ao coordenador das diretrizes da área da saúde), solicitando a não aprovação do projeto de Resolução que versava sobre as DCNEF, e ao Ministro da Educação, solicitando a revogação da homologação do Parecer n. 138/2002. Ainda durante o período de 15 a 18 de julho de 2002, o CONFEF realizou, no Rio de Janeiro, o II Fórum de Diretores dos Cursos de Educação Física. Nesse evento, foi articulado um documento para os mesmos destinatários da carta do CBCE, subscrito por, aproximadamente, 90 das também, aproximadamente, 120 instituições de ensino superior presentes. O CNE realizou reuniões nos dias 5 a 7 de agosto de 2002 e acolheu uma solicitação do Ministério do Esporte, decidindo não aprovar o projeto de Resolução sobre as diretrizes propostas pelo CONFEF, dispondo-se, ainda, a reabrir as discussões sobre as DCNEF. A estratégia seria elaborar outra minuta das diretrizes e coloca-las em discussão (p. 95).

Atualmente, travam-se disputas de posições em relação ao processo de

formação de professores ou profissionais de Educação Física, dependendo de onde

estamos falando. Conforme Taffarel e Santos Júnior (2010),

[...] para a formação de professores de Educação Física com a aprovação das diretrizes, através da Resolução 07, de 31 de março de 2004, que privilegiaram áreas de conhecimento e diferentes formações e habilitações, foi mantida a ideia da divisão na formação. Foi definido também que o objeto da Educação Física é o movimento humano e foram destacadas as competências a que um professor deveria ter desenvolvido durante sua formação. Nas diretrizes a

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questão das competências é justificada a partir do argumento da exigência de “novas demandas do mercado de trabalho”. O modelo de competência tem o objetivo de preparar novas gerações para a lógica da competitividade, da empregabilidade e da adaptação individual aos processos sociais (FREITAS, 2002, p. 156). Além disso, limita o processo ensino-aprendizagem em uma dimensão técnico-instrumental, uma vez que o papel do professor é atender a desempenhos específicos. É, portanto, retirada sua autonomia do trabalho docente e materializada a proletarização do educador. (p.36).

A formação do Licenciado em educação física o habilita para o exercício da

docência, ele é professor de Educação Física. O Graduado é habilitado para

trabalhar em espaços não escolares e nessa opção de formação é chamado

comumente de profissional de educação física. Mas esta questão da nomenclatura

não é assim muito tranquila. Habitualmente, o formado em Educação Física, tanto na

Licenciatura como na Graduação, é chamado de professor, independentemente de

onde exerce a profissão.

Muitas dúvidas são geradas em torno do tipo de formação que se recebe nas

instituições de ensino superior e ao local de trabalho. Como referi nas páginas

iniciais desta dissertação, na pesquisa de Cruz (2009) defendida na Universidade

Federal de Santa Catarina, há uma longa e consistente discussão acerca da

dualidade licenciatura x bacharelado. O autor aponta para a existência de uma falsa

dualidade na formação e destaca a necessidade de romper com a lógica

hegemônica, ou melhor, ir além dos interesses do capital, sugerindo uma formação

em licenciatura ampliada que abranja todos os segmentos de mercado do

profissional da área de Educação Física.

Segundo Cruz (2009) a formação em Educação Física vai além dessa

dualidade entre licenciatura e bacharelado. Em suma, há muita discussão sendo

feita em torno da formação do professor de Educação Física, de qual é a melhor

opção, se é uma formação específica, generalista ou ampliada.

• Anteriormente à publicação das diretrizes curriculares para a formação

de Graduação em Educação Física, em 1998, foi criado o CONFEF

(Conselho Federal de Educação Física) e seus respectivos Conselhos

Regionais (CREF’s), através da Lei 9696 de 1º de setembro de 1998,

órgão fiscalizador dos profissionais e espaços que trabalham com

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atividades físicas e movimento humano. Conforme Quelhas e Nozaki

(2006), o CONFEF faz uma intensa fiscalização dos profissionais que

atuam fora da escola para saber se são registrados nos seus

respectivos conselhos regionais para que isso garanta a continuidade

dos cursos de graduação em Educação Física nas várias Instituições

de Educação Superior.

Várias discussões são travadas desde a criação dos CREF’s e, para Quelhas

e Nozaki (2006), esses Conselhos foram criados em torno da lógica do capital e da

reserva de mercado. Este, não oferece as garantias trabalhistas conquistadas com

muito esforço por pessoas ao longo da história da classe operária, através de

organizações sindicais e grupos civis organizados em nosso país.

De todo o modo, a fragmentação na formação geraria uma fragilização da

identidade profissional que seria a docência. Para Cruz (2009) a formação em

Educação Física foi passada de geração para geração através da intencionalidade

humana e, em especial, nas licenciaturas em Educação Física das instituições de

nível superior tem sido construída a prática corporal (CRUZ, 2009).

No próximo capítulo desenvolvo uma discussão acerca da questão da

nomenclatura graduado em educação física (antigo bacharel). Creio que a mudança

de nomenclatura de bacharel em educação física para graduado em educação física

têm gerado muitas confusões no meio acadêmico e profissional.

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3 BACHAREL, GRADUADO, PROFESSOR: OS NOMES DO PROFIS SIONAL DE

EDUCAÇÃO FÍSICA

Como já referido, atualmente a formação em Educação Física divide-se em

Licenciatura e Graduação. A licenciatura habilita exclusivamente para trabalhar em

escolas de educação básica e o Graduado, antigo bacharel, para trabalhar fora da

escola em espaços tais como: academias, clubes, hospitais, praças, entre outros.

Essas palavras iniciais são para explicar para o leitor a situação da formação do

curso de educação física a fim de entender o que está acontecendo na legislação

atual.

A partir da publicação da Resolução nº 03/87 a formação em educação física

obteve alguns avanços, tais como o trabalho de conclusão de curso; o estudo das

áreas do ser humano, sociedade, filosófico e técnico; o aumento da carga horária.

Tais aspectos incidiram em contínuas reformulações curriculares e, mesmo assim,

esses avanços não significaram muito para a área (QUELHAS; NOZAKI, 2006).

Atualmente, na questão da formação Bacharel em Educação Física, conforme

Resolução do Conselho Nacional de Educação 07/2004, o termo Bacharel foi

mudado para Graduado em Educação Física, gerando confusões de nomenclatura e

atuação deste profissional. Conforme Taffarel e Santos Júnior (2010), “um museu de

grandes novidades, que mais confunde que esclarece e que não serve como

instrumento para alavancar um processo de formação de professores de Educação

Física calcado numa perspectiva emancipatória” (p.28).

Conforme Cruz (2009) o termo Bacharel está encoberto pelo termo Graduado

apresentado pela Resolução 07/2004 do CNE. Para Dalmas (2008), a resolução

07/2004 do CNE consolida a divisão dos cursos em licenciatura e graduação, e

avalia como inadequado esse termo por ser a licenciatura também uma graduação.

Para Matias (2006), a denominação de Graduado em vez de Bacharel em

Educação Física tem uma explicação: seria uma maneira de evitar que o curso de

Graduado em Educação Física fosse confundido com o curso de ensino médio na

Europa.

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O Conselho Federal de Educação Física (CONFEF) também se manifestou

em relação ao termo Graduado em Educação Física na sua revista de Educação

Física, em texto escrito por Steinhilber (2006), presidente do CONFEF:

O Sistema CONFEF/CREFs, após o estabelecimento das Diretrizes Curriculares que orientam a formação de profissionais e professores para a área da Educação Física no Brasil, tem recebido um grande número de solicitações indagando qual a opção que os ingressantes nos cursos superiores deveriam escolher para sua formação superior em Educação Física. A cada ano os alunos chegam aos cursos superiores mais jovens e em dúvida quanto ao curso e as possíveis inserções profissionais que ele possibilitará. De modo geral, são duas as opções de saída para todo o ensino superior: a licenciatura e o bacharelado. Cada uma delas com perfil de formação e intervenção profissional próprios. As licenciaturas visam preparar o profissional para atuar como docente na educação básica, já os bacharelados excluem de sua formação a possibilidade de atuar na educação básica. O CONFEF manifestou-se oficialmente e foi publicada, na revista E.F. nº 15, ano V março de 2005, matéria a respeito da formação e atuação. Recomendamos também a leitura dessa matéria que pode ser encontrada no portal do CONFEF. Cabe à União, privativamente, legislar sobre as diretrizes e bases da educação nacional (art. 22, XXIV da Constituição Federal). Assim sendo, o Ministério da Educação MEC e o Conselho Nacional de Educação - CNE, estabeleceram duas formações distintas: LICENCIATURA E BACHARELADO. Para que o candidato a Profissional de Educação Física faça sua escolha de acordo com seus interesses e perspectivas, alertamos que tais modalidades de formação são específicas, com aprendizagens, áreas de conhecimento e habilidades diferentes, ensejando, portanto, intervenções profissionais diversas, que não se confundem. Dessa forma, oficialmente, uma das possibilidades de saída dos cursos superiores em Educação Física, especificamente o que é tratado na Resolução CNE 7/2004, é a graduação ou bacharelado em Educação Física, como ocorre em praticamente todas as outras áreas de formação acadêmica. Não se desconhece que o uso do termo graduação em substituição ao termo bacharelado tem gerado inúmeras confusões no meio universitário e suscitado apreensão entre os futuros profissionais. Ao optar pelo uso da terminologia graduação, o CNE seguiu encaminhamento contrário ao do CONFEF e de outros formadores de opinião, envolvidos na discussão das Diretrizes Curriculares Nacionais para a formação em Educação Física. É inegável que o CONFEF não pode se insurgir contra a legislação vigente no país. Importa salientar que o CONFEF e a Profissão Educação Física têm que conviver, oficialmente, com essa imposição. Entretanto, para facilitar a compreensão geral e melhor orientar as pessoas e entidades que têm solicitado esclarecimentos a este órgão, o Conselho Federal utilizará a designação de bacharelado em referência ao termo graduação, instituído pelo CNE. Esse procedimento faz-se necessário, pois o senso comum e os poderes legislativos, executivos e judiciários entendem o significado

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do termo bacharel. Além disso, graduação refere-se a toda e qualquer formação em nível superior (graduação = Grau do ensino superior destinado aos alunos que tenham concluído o segundo grau e obtido classificação no vestibular, dicionário Aurélio). (p.19).

A mudança dos termos, Graduação ou Bacharelado em Educação Física,

está gerando controvérsias, mas conforme o ordenamento legal, o Bacharelado é

um curso de graduação em nível superior que tem duração de 4 (quatro) anos, o

mesmo tempo destinado à formação do Graduado em Educação Física

regulamentado pela Resolução 07/2004 do CNE. Mas o que é Graduado?

Anteriormente foi colocada a explicação na citação conforme o dicionário Aurélio.

Será que o termo é somente uma forma ou existe alguma intenção? Pesquisando

por estudos que abordassem a discussão do termo Graduado em Educação Física,

não foi encontrado nenhum texto que se debruçasse sobre esta mudança, somente

discussões que julgam que o uso dessa nomenclatura é inapropriado. Entretanto,

me parece que a discussão ainda não se esgota na nomenclatura e vai além,

passando por interesses de classes, e pela ordem do capital.

A questão de nomenclatura na Educação Física é bem antiga, e até a década

de 1940 os profissionais da área eram referidos como instrutores que lecionavam

nas escolas, configurando-lhes um grau inferior na hierarquia da escola. Essa

situação só foi mudada a partir da criação da Escola Nacional de Educação Física e

Desportos, na Universidade do Brasil, através do Decreto – Lei nº 1212, de 17 de

abril de 1939. Posterior a essa data foi conferido aos egressos do curso superior de

Educação Física o título de Licenciado em Educação Física e, consequentemente,

fariam jus à denominação de professor de Educação Física (STEINHILBER,

SARTORI, PEREIRA e SILVA, 1998).

Segundo os autores citados anteriormente, as Instituições de Ensino Superior

de Educação Física demonstraram-se sensíveis às necessidades de seus egressos

se ajustarem às mudanças de mercado de trabalho. Dessa forma, ocorreu a criação

do Bacharelado a partir do disposto no Parecer 215/87, do Conselho Federal de

Educação (CFE) e da Resolução 03 de 16 de junho de 1987 do mesmo Conselho.

Decorrente destas mudanças na formação em Educação Física surge a

denominação Profissional de Educação Física, designada aos egressos dos cursos

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de graduação das escolas de Educação Física, visto que se refere à área de

formação e atuação, não mais exclusivamente ao ensino formal.

Barros (1995) relata que é confundida com frequência a atividade do

professor do ensino de 1° e 2° graus, hoje ensino f undamental e médio, com a

atividade profissional do técnico esportivo de equipes de competição. O profissional

de Educação Física, historicamente, é conhecido como “professor”, devido à

possibilidade somente do grau de licenciado na área, não tendo a formação em

bacharelado, que atualmente se dispõe.

É dado ao perfil do profissional de Educação Física o nome de professor.

Educador é a palavra que procurava identificar esse perfil. Primeiramente o

profissional ou professor de Educação Física e do Esporte deveria ser um

“educador”, mesmo não tendo, essa palavra, um sentido amplo que abranja todos os

campos de atuação do profissional de Educação Física. Educador era a palavra que

privilegiava o professor (licenciado) em Educação Física (BARROS, 1995).

Esse mesmo autor refere que a Resolução 03/87 do Conselho Federal de

Educação desencadeou um amadurecimento acadêmico e profissional da área. A

percepção de que a Educação Física é reconhecida somente como licenciatura, não

estava mais atendendo as necessidades da sociedade brasileira por serviços

especializados nessa área. Pode-se dizer que se tornou significativa a identificação

da Educação Física como área de estudo acadêmico, reflexo da experiência como

Departamento acadêmico nas Universidades e, principalmente, dos programas de

mestrado em Educação Física, iniciados no Brasil em 1977.

Marinho (1983 apud VERENGUER, 1997) deixa clara sua insatisfação com a

expressão professor de Educação Física. Segundo o autor, além de pejorativa e

estigmatizada, a expressão não dialoga com o alto grau de conteúdo científico dos

cursos de graduação. O autor pensa que uma denominação mais erudita e

respeitosa – cinesiologia e cinesiólogo – dignificaria a área. Preciso destacar que

não concordo com a afirmação de que o nome “Educação Física” destoe dos

conhecimentos e da prática na área. Penso que a profissão, independentemente do

nome que lhe seja dada, se dignifica pela seriedade e comprometimento dos

profissionais que atuam na educação física.

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Outro autor que relata a questão da confusão com os nomes associados com

a Educação Física e o nome da profissão é Massa (2002, p. 30):

Em um levantamento realizado por Newell (1990), constatou-se o uso de mais de 70 diferentes terminologias para denominar os departamentos responsáveis pelos cursos associados à Educação Física nas universidades norte-americanas e no resto do mundo, ressaltando a grande confusão que ainda prevalece em nossa área. Segundo Tricoli (1993), nomes de áreas distintas como o Esporte, a Dança, a Ginástica, a Recreação, a Reabilitação e a Fisioterapia, entre outros, passaram a ser utilizados no lugar de Educação Física. A confusão é tão generalizada que, para Antunes (1993), Tricoli (1993) e Zeigler (1982), embora o termo Educação Física seja de conhecimento mundial, nem mesmo as pessoas envolvidas com ele, seja no ambiente profissional ou acadêmico, apresentam um consenso a respeito do seu significado. Em contrapartida, se perguntamos a qualquer cidadão o que faz ou que é a Engenharia ou a Medicina, é muito provável que obtenhamos respostas semelhantes e coerentes.

O autor (2002) relata que são poucos os interessados em resolver essa

questão de nomenclatura da Educação Física no Brasil. Talvez por uma questão de

tempo continue nas faculdades o nome Educação Física ou Educação Física e

Esportes. O autor ainda questiona a relação direta entre a nossa titulação e a

atuação profissional nos cursos de pós-graduação. Comenta que temos muito a

discutir em termos de pós-graduação, não apenas a nomenclatura.

Essa pluralidade de nomes da Educação Física, conforme Massa (2002) traz

concomitantemente a segmentação da área e o seu futuro. Segundo ele (MASSA,

2002) essa correlação entre nomes e segmentação da área continuará até que os

docentes e profissionais, em um número maior, passem a pensar esta problemática

sob outra ótica, sem pessoalidades e vaidades como tem ocorrido. Fazendo uma

comparação com a camada de ozônio e o comportamento dos países ao debaterem

sobre a divisão de responsabilidades para evitarem a destruição do globo terrestre,

nenhum país de fato assume a responsabilidade por tomar atitudes reais para

solucionar um problema, que na realidade é de todo o mundo. É como na Educação

Física, aqueles que se acham filiados em um departamento, com suas certezas,

estão congelados diante das discussões acadêmicas e profissionais frente ao

problema. Da mesma forma que a camada de ozônio pode trazer prejuízos

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irreversíveis ao mundo, a falta de reflexão pode trazer danos irreversíveis para a

Educação Física.

Por outro lado, em Amaral e Pereira (2005), encontramos uma discussão

referente à identidade do professor de Educação Física e à licenciatura. Os autores

abordam a questão de conceitos de docência e de profissional. Compreendem que a

docência é algo que é direcionado pela educação, objetivamente relacionada às

necessidades da sociedade atual.

A dissertação de Mestrado de Vargas (2010), fala exatamente sobre a falta de

identidade consensual do professor de Educação Física. Nesse estudo o autor

destaca que há profissionais que decidiram pela área por identificação com o ato

educativo, mas, ao mesmo tempo, notou uma grande ambivalência ao observar

professores de Educação Física que se apropriavam dos próprios alunos com

habilidades técnicas em uma modalidade esportiva para dar aula em seu lugar.

A denominação Graduado em Educação Física conforme Mendes (2010) é

conferido ao Educador Físico que trabalha em instituição de ensino, e é tido como

professor pela lei (Consolidação das Leis do Trabalho – CLT) em seus artigos de nº

317 a 324, que regulamenta as atribuições do professor de profissão, e a pessoa

que atua em outra instituição que não seja de ensino é enquadrado como instrutor.

A seguir transcrevo uma passagem da dissertação de Mendes (2010, p. 51,

negritos do autor) que exemplifica a situação de nomenclatura na área:

A lei parece tão incoerente e vacilante em determinar a diferenciação de professor de profissional de Educação Física , pois, embora tenha definido como critério o professor ser apenas o Educador Físico atuante em estabelecimento de ensino, ora reconhece que o atuante fora deste tipo de estabelecimento também pratica atividades de ensino [...] Agrava o quadro as decisões diferentes mesmo em casos semelhantes [...] Nota-se insipiência e leviandade quanto ao que seria a competência do Educador Físico, já que atribui funções precípuas a esta profissão ao fisioterapeuta - [...] e ainda, afirmações que depreciam o Educador Físico e subestimam seu trabalho, como se no exercício de sua função não fossem necessárias orientações, esclarecimentos e ensinamentos aos alunos, além de elaboração de aulas, o que constitui “ensino”.

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Segundo a dissertação de mestrado de Sofiste (2007, p.107), pode-se dizer

que as principais diferenças entre professor e profissional de Educação Física,

seriam as seguintes:

Professor de Educação Física Profissional de Educaç ão Física

Tem a educação como fim da sua

atividade profissional

Tem a saúde como fim da sua atividade

profissional e a educação como um meio

para atividade profissional que atua na

prevenção de doenças e melhoria da

qualidade de vida.

A sua intervenção profissional é

pedagógica no ensino das práticas

culturais de movimentos, tendo a

atividade física, esportiva e de lazer

como conteúdos tanto no âmbito formal

de ensino como no âmbito não-formal.

A sua intervenção do profissional é a

docência, o treinamento desportivo, a

avaliação física, a orientação de

atividades física, a gestão desportiva, a

preparação física, a recreação e lazer

tanto no âmbito não-formal como no

âmbito formal de ensino.

Procura desenvolver uma formação

humana que promova uma discussão

dos aspectos sociais pautados no

conhecimento das ciências humanas.

A formação está apoiada nos

conhecimentos da área da saúde.

Fonte: Sofiste (2007)

Em suma, o nome do profissional de Educação Física toma determinados

significados dependendo do contexto em que o profissional se encontra e a própria

identidade da Educação Física. No próximo capítulo descrevo a metodologia

utilizada para o desenvolvimento da pesquisa empírica que deu origem a esta

dissertação de mestrado.

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4 CAMINHOS PERCORRIDOS

Há um célebre texto de Renato Janine Ribeiro (1999) denominado Não há

pior inimigo do conhecimento que a terra firme. Ali, o autor faz uma análise mais

ampla da qualidade da produção de teses e dissertações em Ciências Humanas,

apontando para a falta de ousadia dos estudantes dessa área, especialmente no

que se refere à negativa em se deixar envolver pelo novo, pelo que se pode

descobrir na construção de uma dissertação ou uma tese. De modo especial o autor

faz uma ácida crítica especialmente às sessões metodológicas de tais trabalhos.

Apesar de eu não ter nenhuma pretensão de que esta dissertação sirva de

modelo para quem quer que seja, tomo desse autor a idéia de que “a ‘questão de

método’ só tem sentido ser escrita por último. O método é algo que nós vamos

construindo à medida que pesquisamos [...]. Só ao término do trabalho é que

sabemos como ele funcionou” (RIBEIRO, 1999, p. 190-191).

De todo o modo, é necessário retomar alguns pontos que definiram, ou ao

menos ajudaram a definir, os rumos da pesquisa que desenvolvi. Neste sentido

lembro-me da leitura do livro Pesquisa em educação: abordagens qualitativas, de

Lüdke e André (1986, p. 1) no qual as autoras destacam que “para se realizar uma

pesquisa é preciso promover o confronto entre dados, as evidências, as informações

coletadas sobre determinado assunto e o conhecimento teórico acumulado a

respeito dele”. Espero que eu tenha conseguido, ao menos parcialmente, ter sido fiel

a esses princípios. A pesquisa que deu origem a esta dissertação é assumidamente

de natureza qualitativa, e, como tal, não tem valor estatístico. Além disso, as

possibilidades de generalização de suas asserções de conhecimento são restritas.

Norteado pela pergunta sobre o modelo de formação ofertado aos futuros

professores de educação física que decorre da separação licenciado – graduado,

cristalizada pela Resolução 7/2004, que institui as Diretrizes Curriculares Nacionais

para os cursos de graduação em Educação Física (BRASIL, 2004), delimitei que o

campo empírico da investigação seria composto por cursos de Educação Física

estabelecidos há tempo significativo no cenário gaúcho. Além de uma longa tradição

na formação de profissionais da Educação Física havia a questão da exequibilidade

da investigação empírica. Isso me fez selecionar universidades gaúchas e, apesar

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de eu tentar compor o campo empírico com seis universidades, a apenas quatro

delas foi-me possibilitado o acesso. Duas delas situadas em Porto Alegre e as outras

duas localizadas na microrregião da grande Porto Alegre. Mais precisamente, como

já referi nas páginas iniciais desta dissertação, meus interlocutores foram

coordenadores de cursos das seguintes universidades: Universidade do Vale do Rio

dos Sinos, Pontifícia Universidade Católica de Porto Alegre, Universidade Metodista

do Brasil e Universidade Feevale. Nas duas primeiras universidades, entrevistei

tanto o coordenador do curso de Licenciatura como o coordenador do curso de

Graduação em Educação Física. Nas duas últimas universidades, apenas uma

pessoa coordenava Licenciatura e Graduação em Educação Física.

Deste modo, foram seis os sujeitos de pesquisa que me concederam

entrevistas. A modalidade de entrevista foi a semiestruturada e realizada face a face,

com o recurso da gravação integral. Uma vez transcritas as entrevistas, defrontei-me

com o considerável volume de sessenta e duas páginas digitadas em espaço

simples que acabaram se constituindo no meu corpus de análise da pesquisa.

Trabalhar sobre essa massa documental foi um desafio, sobretudo por conta de

duas longas entrevistas que destoavam do restante, uma delas com vinte e quatro

páginas, e outra com quinze páginas. Somente essas duas já davam margem para

discussões muito rigorosas acerca do estado atual da formação em cursos

superiores de Educação Física.

A opção pela técnica da entrevista semiestruturada foi ratificada pela minha

leitura de André (1986, p. 34), que refere “que o tipo de entrevista mais adequado

para o trabalho de pesquisa que se faz atualmente em educação aproxima-se mais

dos esquemas mais livres, menos estruturados”. Isso se justificaria pela natureza

das informações que se desejaria “obter, e os informantes que se quer contatar, em

geral professores, diretores, orientadores, alunos e pais, são mais convenientemente

abordáveis através de um instrumento mais flexível” (ANDRÉ, 1986, p. 34), Tal

flexibilidade foi potencializada pelo fato de as mesmas terem sido feitas face a face.

De um lado, os dados foram bastante ricos, de outro, isso me impôs um desafio

maior que tinha a ver com o tratamento que eu deveria dar a esses dados.

Uma vez de posse das transcrições das entrevistas, o desafio consistia em

agrupar as respostas em busca de regularidades discursivas. O trabalho consistiu,

então, em organizar as entrevistas em um quadro comparativo. Isto é, distribuí as

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respostas em uma grande tabela e dediquei-me, em alguns casos, sobretudo

naquelas entrevistas mais profícuas, a garimpar as respostas a cada uma das

questões. Nesse processo trabalhei com marcadores de textos de diferentes cores

de modo a identificar partes do texto em que os entrevistados remetiam mais

diretamente às questões, ou tópicos, da entrevista, conforme modelo abaixo:

Quadro 1 - IMPACTOS NA FORMAÇÃO DO PROFESSOR

Entrevistado 1 Entrevistado 2 Entrevistado 3

a resolução 07, no meu modo de ver, ela regulamenta muito mais os cursos chamados de Bacharelado do que propriamente a Licenciatura em Educação Física, porque a Licenciatura de Educação Física hoje ela está tratada num bojo comum à toda Licenciatura brasileira no âmbito, digamos, do cotidiano da formação e já de algumas iniciativas num campo de estágios não obrigatórios dos alunos e inclusive os primeiros profissionais que estão saindo, ainda num universo de campo de trabalho que não está totalmente decantado, eu acho que tem, digamos, trazido já alguns impactos de apreensão. O que eu quero dizer com isso: como na Educação Física, historicamente um profissional de Educação Física estava habilitado para atuar dentro da escola e fora da escola, esta resolução ela passa a impedir isso. Então, sem dúvida nenhuma, essa resolução ela é limitadora no desenho histórico da formação do profissional de Educação Física IMPACTO NEGATIVO

O contexto histórico que ela aconteceu é após a resolução do Conselho Nacional de Educação 01 de 2002. O que é a resolução 01 de 2001? É a que institui as diretrizes curriculares nacionais para a formação de professores da Educação Básica em nível superior, curso de licenciatura de graduação plena. Qual é a história que a gente tinha na EF e na educação brasileira? O candidato entrava num curso de graduação em EF, de licenciatura em EF. Passava o curso inteiro - e aí uma coisa que se chamou de licenciatura ampla: ele habilitava tanto prá trabalhar em escola como prá trabalhar fora da escola. Muitas vezes o que a gente via nos cursos era: o cara queria ser técnico de futebol, professor de ginástica de academia, trabalhar com alguma modalidade esportiva, trabalhar com idosos em ambientes comunitários, que não é escola. Ou seja, a pessoa queria a formação dela voltada para campos da cultura que não a escola. Ele não queria ser professor, recebia o título de professor e acabava dentro da escola. IMPACTO POSITIVO

em relação ao curso de Ef houve um impacto muito grande no início desta divisão, porque se estava acostumado a ter um curso de licenciatura de atuação ampla, que permitia que o formado, o egresso pudesse atuar tanto na escola quanto na academia e nós tínhamos uma realidade de profissional bastante grande de pessoas que tinham a sua atuação na escola, o seu concurso público e que faziam também a atuação com clubes esportivos, com academias e até mesmo com personal. IMPACTO POSITIVO

Entrevistado 4 Entrevistado 5 Entrevistado 6

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eu considero que a divisão dos cursos em bacharelado e licenciatura um tanto quanto desnecessária porque mesmo após essa mudança, essa divisão, a gente observa dois cursos muito parecidos na maioria das instituições. As diferenças entre eles são muito pequenas. Então isso me parece algo muito mais político do que algo que tenha trazido algum resultado prático no final das contas. Na verdade, a formação do professor de EF hoje, obviamente ela tem a inclusão de algumas disciplinas diferentes no curso de bacharelado do que aquelas do curso de licenciatura. Mas, se tu for fazer uma avaliação final dos dois profissionais formados, eles não tem uma diferença curricular tão grande. Eles não saem do curso com diferenças tão significativas. Obviamente o bacharel ele tem uma carga de estudo um pouco mais longa porque a gente tem uma carga horária um pouco maior. Tu consegue aprofundar algumas coisas um pouco mais no bacharel, mas acho que se colocasse uma avaliação final pros dois, acho que o resultado não seria tão...a diferença não seria tão significativa dentro disso.

SEM IMPACTOS PRÁTICOS

eu avalio que foi um impacto muito negativo, ele continua sendo bastante questionável, não acredito totalmente nessa separação, tanto que se nós pensarmos que outras licenciaturas, por exemplo, a Biologia, tu te formas bacharel e depois tu complementas a tua ação com licenciado, com a licenciatura e na EF acabou que as licenciaturas acabaram ficando menores em carga horária do que os bacharelados que existe uma obrigatoriedade de 3.200 horas. De certa maneira eu entendo também que isto desqualifica a licenciatura, o espaço de trabalho na escola, que já culturalmente é desvalorizado. Então, eu acho que o impacto foi negativo desde a sua implementação, ainda continua em discussão o impacto na formação dos professores em particular na identidade do curso de EF em geral, eu acho que tem uma justificativa do Conselho que me parece interessante que é o fato de separar licenciatura de bacharelado traria melhores professores para a escola porque quem fizesse licenciatura é porque queria efetivamente ser professor de escola. Aqui na PUC nós identificamos que isto não se efetivou na prática, porque especificamente na PUC nós tínhamos, hoje não mais, mas nós tínhamos, na época, licenciatura à noite e bacharelado pela manhã. IMPACTOS NEGATIVOS

Para a questão da identidade foi ruim, porque o professor de EF sempre foi tratado como um só. Não é divisível. Ele não é licenciado ou bacharel. Nós que ainda somos formados pela plena, eu não consigo me diferenciar de um professor licenciado ou graduado, mas caiu e foi justamente quando eu comecei a trabalhar aqui no curso na questão da divisão, fui ser coordenador da licenciatura e hoje sou coordenador dos dois. Então, na questão da identidade ficou muito ruim. Mas, na formação eu acho que é um acréscimo, por quê? Sempre vou dar o exemplo o qual eu vivi. Tu foi aluno nosso aqui, tu sabe. [...]. Então, na questão da identidade foi ruim, mas na questão da formação foi melhor. O que que precisa se adequar é a questão do mercado de trabalho. O mercado tem que se adaptar a essa nova realidade. E sempre deixando muito claro que eu nunca fui a favor da divisão. Acho que a EF perde. Voltando bem para a especificidade da tua pergunta: enquanto profissão e identidade a gente perde, mas enquanto formação a gente ganha. [...]

IMPACTOS POSITIVOS E NEGATIVOS

Quadro elaborado pelo autor desta dissertação

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Feito esse trabalho mais “braçal”, fui extraindo o que me parecia essencial

nas respostas e progressivamente sintetizando as falas dos sujeitos da pesquisa.

Tenho consciência de que essa foi uma operação arriscada, sobretudo naquelas

duas entrevistas mais longas, onde a análise de contexto desenvolvida pelos

entrevistados tinha grande profundidade e riqueza de conhecimentos.

Para a formulação da entrevista, levei em conta certas precauções extraídas

de Flick (2004, p. 106), que afirma que “uma característica dessas entrevistas é que

questões mais ou menos abertas sejam levadas à situação de entrevista na forma

de um guia da entrevista”. De fato, esse foi o procedimento adotado, de modo que

as questões foram respondidas em um ambiente de liberdade tanto para os

entrevistados como para o entrevistador. Nesse processo, incorporei a noção de que

“o ponto de partida do método é a suposição de que os inputs que caracterizam

entrevistas ou questionários padronizados, e que restringem o momento, a

sequência ou modo de lidar com os tópicos, obscurecem, ao invés de esclarecer, o

ponto de vista do sujeito” (FLICK, 2004, p. 106). Além disso, fui a campo entendendo

que:

as questões de pesquisa não vêm do nada. Em muitos casos, originam-se na biografia pessoal do pesquisador e em seu contexto social. A decisão acerca de uma questão específica depende essencialmente dos interesses práticos do pesquisador e do seu envolvimento em certos contextos” (FLICK, 2004, p. 64).

Posição corroborada por Ribeiro (1999), ao refletir sobre o tema das

pesquisas em Ciências Humanas:

o tema escolhido para a pesquisa é difícil, digamos, e por vezes tentador; em suma (pelo menos em Humanas), os assuntos que escolhemos têm a ver com nosso desejo, o que explica que a um só tempo nos atraiam e nos atemorizem. Mas será correto, será, sobretudo,enriquecedor, esvaziar de pronto o temor, a dificuldade, a ansiedade que um tema em nós suscita? (RIBEIRO, 1999, p. 190).

Como disse, não tenho a pretensão de ser modelo para quem quer que seja,

mas talvez essa postura sugerida pelos autores, de modo especial por Ribeiro

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(1999), tenha condicionado a obtenção de entrevistas consistentes e ricas em dados

que espero tenha podido dar um tratamento minimamente rigoroso, ainda que o

risco de generalizações apressadas tenha me acompanhado durante toda a

atividade analítica. E isso é tão mais verdadeiro se eu considerar as especificidades

das duas entrevistas mais longas e consistentes.

Com já referi, o gravador foi utilizado como recurso para a coleta dos dados.

As entrevistas foram transcritas e analisadas tendo como unidades de análise os

eixos principais em torno dos quais se estruturaram as questões. Esse procedimento

fez-me focalizar melhor o que eu considerava essencial na investigação. Assim, já

na primeira fase de tratamento dos dados centrei minha atenção nas seguintes

unidades que acabaram nomeando cada uma das sessões do capítulo analítico:

a) Impactos da resolução 07/2004 sobre a formação do professor de

educação física e a identidade do curso;

b) Graduado e professor: tensões entre os nomes;

c) Mudanças na qualidade da formação a partir da separação graduado-

licenciado;

d) Mudança de ênfase no trabalho do professor universitário pós-divisão da

educação física;

e) Fatores que contribuíram para a divisão licenciatura-graduação em

educação física

Estou ciente de que ao fazer essa opção acabei deixando em segundo plano

discussões que emergiram das falas dos entrevistados. Ainda que muitas delas

sejam absolutamente relevantes, sobretudo no que se refere a uma análise de

contexto mais ampla, os prazos para a conclusão desta dissertação condicionaram a

minha fidelidade estrita aos eixos de análise que definiram previamente o esquema

da entrevista.

Ao desenvolver minhas análises qualitativas pretendi seguir outras

precauções sugeridas por Mayring (2003 apud FLICK, 2004), que pontua que a

primeira etapa do tratamento dos dados consiste em definir o material e separar as

entrevistas ou partes delas que sejam importantes na solução da questão de

pesquisa. Na segunda etapa, analisa-se a situação da coleta de dados. A terceira

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etapa seria uma caracterização formal do material. E por último, a quarta etapa

consiste na definição e direção da análise dos textos selecionados. Aqui, como

referi, a direção de análise foi condicionada pela estrutura mesma da entrevista, que

manteve uma relação de fidelidade com os objetivos da investigação.

Assim, de modo sucinto, e em sintonia com esses objetivos, a entrevista4

privilegiou discussões em torno dos impactos da Resolução 07/2004 sobre os

processos de formação dos professores de Educação Física e sobre o curso de

Educação Física; um debate em torno da nomenclatura instituída por tal resolução

(graduado e licenciado); uma avaliação de possíveis mudanças qualitativas nos

processos formativos por conta da entrada em vigor dessa resolução; uma

discussão sobre o trabalho do professor universitário que atua tanto no curso de

graduação como no curso de licenciatura em Educação Física e, finalmente, uma

retomada dos fatores mais amplos que teriam condicionado a publicação da

Resolução 07/2004.

No próximo capítulo vou procurar explorar todos esses aspectos, uma vez

que eles funcionaram como eixos de minha investigação.

4 O roteiro da entrevista encontra-se em anexo.

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5 DISCUTINDO A FORMAÇÃO DO PROFESSOR DE EDUCAÇÃO FÍ SICA

Neste capítulo procedo as análises das entrevistas que me foram concedidas

por seis coordenadores de cursos de Educação Física de quatro universidades da

região metropolitana de Porto Alegre, com longa tradição na formação em Educação

Física. Mais especificamente, dois coordenadores do curso de licenciatura em

Educação Física, dois coordenadores do curso de graduação em Educação Física e

dois professores que coordenam ambos os cursos (graduação e Licenciatura) em

suas respectivas universidades. Deste modo, o campo empírico foi composto por

quatro diferentes universidades. Como já referi, vale destacar que foram longas

entrevistas (de modo especial, duas delas), o que redundou em transcrições

bastante extensas e ricas em detalhes, o que me leva a dizer que, sem dúvida,

muitos aspectos não serão contemplados nesta dissertação. Lembrando que o

problema de pesquisa interroga o modelo de formação que estaria sendo oferecido

aos futuros professores de educação física, a partir da publicação da Resolução

07/2004, que institui as Diretrizes Curriculares Nacionais para os cursos de

graduação em Educação Física, em nível superior de graduação plena, sendo que

meu foco ficará centrado nas discussões sobre a licenciatura em Educação Física.

Neste sentido, apesar de estar ciente de que a referida resolução se refere às

Diretrizes Curriculares Nacionais exclusivamente para os cursos de graduação em

Educação Física, e não se refere à licenciatura5 em Educação Física, o foco está em

avaliar possíveis alterações nos modelos formativos na licenciatura, que decorreriam

da cristalização da separação entre graduado e licenciado.

Registro, também, que as análises que desenvolvo nesta dissertação são

uma entre tantas formas que poderiam ser feitas. Como refere Moraes (2003), um

texto pode ter múltiplas significações dependendo da leitura que se faz do material

5 Ao contrário da graduação em Educação Física, a licenciatura em Educação Física não tem Diretrizes Curriculares Nacionais. O funcionamento desses cursos subordina-se à Resolução 01 de 18 de fevereiro de 2002, que instituiu as Diretrizes Curriculares Nacionais para a formação de professores da Educação Básica , em nível superior, curso de licenciatura de graduação plena, que aponta características gerais dos cursos de Licenciatura, sem especificar áreas de conhecimento; e à Resolução nº 2/2002 em 19 de fevereiro de 2002, que define que os cursos de licenciatura, de graduação plena, de formação de professores da Educação Básica deverão ter uma carga horária mínima de 2.800 horas, distribuídas em no mínimo três anos letivos e que a respectiva carga horária deverá ser composta por: Práticas de Ensino; Estágios Supervisionados; Atividades Acadêmico-Científico-Culturais; Aulas propriamente ditas.

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(corpus). Estas são análises desenvolvidas a partir das discussões que me apropriei

ao longo do processo de construção desta dissertação e também são indissociáveis

das experiências e conhecimentos inerentes ao processo de pesquisa do qual ela

resulta.

5.1 IMPACTOS DA RESOLUÇÃO 07/2004 SOBRE A FORMAÇÃO DO

PROFESSOR DE EDUCAÇÃO FÍSICA E A IDENTIDADE DO CURSO

No que se refere aos impactos da resolução 07/2004 sobre a formação do

professor de Educação Física, os entrevistados divergem em suas avaliações. Há

um primeiro grupo que aponta para impactos negativos. Os argumentos são

variados e vão desde avaliações que indicam uma ruptura na identidade do

profissional de educação física, ao afirmar que “historicamente um profissional de

Educação Física estava habilitado para atuar dentro da escola e fora da escola, esta

resolução ela passa a impedir isso. Então, sem dúvida nenhuma, essa resolução ela

é limitadora no desenho histórico da formação do profissional de Educação Física”

(E1)6, passando por uma compreensão de que a resolução acabou contribuindo para

uma desvalorização do magistério, uma vez que, “[...] as licenciaturas acabaram

ficando menores em carga horária do que os bacharelados, [...] isto desqualifica a

licenciatura, o espaço de trabalho na escola, que já culturalmente é desvalorizado.

Então, eu acho que o impacto foi negativo desde a sua implementação” (E5).

Dois entrevistados defendem que há somente impactos positivos. Nas

palavras de um deles: “do ponto de vista de atuação profissional, [...] qualificou [...]

porque acabou tendo uma ênfase maior nas disciplinas pedagógicas prá quem faz

licenciatura, e pro bacharelado uma ênfase maior nas disciplinas que vão ter um

peso maior na sua formação e futura atuação” (E3). Na mesma direção, outro

entrevistado dá exemplos da insuficiência da formação àqueles que não buscavam o

curso de Educação Física para atuarem na escola: “[...] o cara queria ser técnico de

futebol, professor de ginástica de academia, trabalhar com alguma modalidade

esportiva, [...] em ambientes [...], que não é escola. [...] a pessoa queria a formação

6 Para preservar as identidade individuais e institucionais dos sujeitos de pesquisa, a partir deste momento adoto o código E1= Entrevistado 1; E2 = entrevistado 2, e assim sucessivamente.

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[...] voltada para campos da cultura que não a escola. Ele não queria ser professor,

recebia o título de professor e acabava dentro da escola” (E2).

Há também argumentos de ordem prática, como os referidos à possibilidade

de abertura de mercado de trabalho para os graduados, em especial para suas

atuações na área da saúde, cujo ingresso se daria mediante concurso público. Esse

é o caso de um dos entrevistados que, apesar de avaliar os impactos

negativamente, admite que “[...] existem pessoas também animadas com essa

separação pela área do lado do Bacharelado, por quê? Porque na área da saúde, o

profissional de Educação Física ele é um dos catorze profissionais da área da saúde

e os concursos públicos que estão sendo abertos na área da saúde, eles trazem

como exigência um profissional da área da saúde” (E1). Posição corroborada por

outro crítico da separação, que destaca que “em todos os editais que se abrem prá

trabalhos interdisciplinares na área da saúde, no SUS, nos programas da família,

enfim, eles exigem o bacharel em Enfermagem, bacharel em Serviço Social,

bacharel (sic) em Educação Física” (E5). Então, apesar de esses dois entrevistados

não concordarem com a separação licenciado – graduado, reconhecem que no

campo da atuação profissional o momento é favorável para o ingresso dos

graduados no serviço público na área da saúde.

Vale destacar, também, a resposta de um dos coordenadores de curso que

avalia que os efeitos da resolução foram tanto positivos quanto negativos,

demarcando que “na questão da identidade foi ruim, mas na questão da formação foi

melhor” (E6). Argumenta o coordenador que essa divisão acabou tornando os

estágios mais específicos, direcionados para o campo de trabalho futuro, o que, no

caso da licenciatura, possibilitou aprofundar suas questões, que tem a ver com a

atuação na escola. Ressalta, porém que “para a questão da identidade foi ruim,

porque o professor de Educação Física sempre foi tratado como um só. Não é

divisível. Ele não é licenciado ou bacharel. [...] Então, na questão da identidade ficou

muito ruim” (E6). Apenas um entrevistado não vê efeitos práticos da referida

resolução sobre os processos formativos:

[...] a gente observa dois cursos muito parecidos na maioria das instituições. As diferenças entre eles são muito pequenas. Então isso me parece algo muito mais político do que algo que tenha trazido algum resultado prático no final das contas. Na verdade, a formação

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do professor de Educação Física hoje, obviamente ela tem a inclusão de algumas disciplinas diferentes no curso de bacharelado do que aquelas do curso de licenciatura. Mas, se tu for fazer uma avaliação final dos dois profissionais formados, eles não tem uma diferença curricular tão grande. Eles não saem do curso com diferenças tão significativas (E4).

Especificamente no que se refere aos efeitos sobre a identidade do Curso

de Educação Física, os entrevistados fazem uma análise crítica da resolução,

apontando que ela confronta as bases epistemológicas da educação física, fazendo

“uma secção entre a área da educação, da área da saúde, da área do lazer, da área

do esporte e que eu acho que isso na verdade não colabora com as últimas

reflexões na área da Educação Física no seu aspecto epistemológico” (E1); não se

harmoniza com as novas configurações do mundo do trabalho, na medida em que

ele “está cada vez mais configurado num processo de flexibilidade. É um processo

de flexibilização muito forte, aonde (sic) a gente percebe a extinção de algumas

ocupações profissionais e o surgimento de outras ocupações profissionais” (E1);

produz alguns poucos efeitos considerando que “de uma certa forma se criou uma

diferenciação, dando [...] algum enfoque um pouco maior em algumas áreas da ação

não escolar e algum enfoque um pouco mais escolar dentro de algumas áreas que

são mais específicas da docência” (E4).

5.2 GRADUADO E PROFESSOR: TENSÕES ENTRE OS NOMES

No que tange às impressões sobre os nomes que são dados para os

profissionais de Educação Física, na sua grande maioria as opiniões são

convergentes ao considerarem o termo graduado como inadequado para se referir

ao que se chamava bacharel em Educação Física, podendo gerar confusões. Essa

discussão acerca dos nomes do profissional da área já aparece na dissertação de

Mendes (2010), ainda que ela se debruce sobre a distinção entre professor e

profissional de Educação Física. Apesar de o foco nesta seção estar nas tensões

entre os nomes graduado e professor, vale a pena transcrever o debate perpetrado

por Mendes (2010) acerca das implicações da lei que regula a formação em

Educação Física:

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A lei parece tão incoerente e vacilante em determinar a diferenciação de professor de profissional de Educação Física, pois, embora tenham definido como critério o professor ser apenas o Educador Físico atuante em estabelecimento de ensino, ora reconhecem que o atuante fora deste tipo de estabelecimento também pratica atividades de ensino [...] Agravam o quadro as decisões diferentes mesmo em casos semelhantes [...] Nota-se insipiência e leviandade quanto ao que seria a competência do Educador Físico, já que atribuem funções precípuas a esta profissão ao fisioterapeuta - [...] e ainda, afirmações que depreciam o Educador Físico e subestimam seu trabalho, como se no exercício de sua função não fossem necessárias orientações, esclarecimentos e ensinamentos aos alunos, além de elaboração de aulas, o que constitui “ensino” (MENDES, 2010, p. 51).

Como já referi, as opiniões são muito parecidas por parte dos entrevistados

no que se refere ao entendimento de que graduado é um termo que na realidade

não diz muito quando o que está em jogo é nomear o profissional em Educação

Física que atua na área não escolar: “O termo graduado aqui no Brasil criou um

paradoxo, criou um conceito, deu um título que na verdade chove no molhado. O

graduado é o que? O graduado em Educação Física é aquele que tem o título

superior de Educação Física” (E1).

O mesmo entrevistado entende que o termo graduado em Educação Física foi

utilizado para se diferenciar de outras profissões da área da saúde

internacionalmente, por achar que este teria maior projeção externa se usasse esse

nome. Em suas palavras a adoção dessa nomenclatura “foi mais para consumo

externo do que para consumo interno” (E1), referindo ao panorama de globalização

que envolve o trânsito de profissionais entre nações:

O nome graduação, [...] tem muito a ver com a necessidade de adequar o nome e a carga horária com outros nomes e cargas horárias de países internacionais. Então, o relator botou o termo graduado prá melhor enquadrar os profissionais da saúde em relação a outros países, só que em nível interno criou um descompasso. Porque o nome graduado em nível interno do Brasil não é a melhor terminologia. Só que foi colocado graduado não para o consumo interno. [...] Só que em nível interno, o consumo interno pelo graduado na verdade não tem impacto, tanto é que muitas pessoas propuseram, na resolução da Educação Física, mudar o nome de graduado para bacharel em Educação Física porque é o nome que tem mais tradição. Então, eu diria hoje, que o termo graduado – a

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resolução quando diz graduado, ela na verdade não explica nada, mas de maneira cultural o que as pessoas já têm utilizado: a resolução 1 e 2 é a resolução que basicamente legisla sobre a questão do licenciado e a resolução 07 é aquela que basicamente legisla sobre o bacharel. Apesar de a resolução especificar ‘graduado’ em Educação Física (E1).

Outros entrevistados vão afirmar que o graduado é, antes de tudo, professor,

pois seu ofício é ensinar: “o profissional de Educação Física é um professor de

Educação Física. Ele é um professor. Qual é o objeto da Educação Física? O objeto

são os jogos, as culturas do movimento humano. [...] e o que é que eu faço com

essa cultura do movimento humano: eu ensino isso” (E2). Outro argumento utilizado

tem a ver com o entendimento de que o lugar de atuação não condiciona

necessariamente à existência da docência: “nós entendemos que todo graduado em

Educação Física é professor. Independente se vai trabalhar na escola ou na

academia” (E5) e “...a gente está fazendo uma reformulação curricular, não prá

agora, prá daqui um ano e nós vamos botar alguma disciplina que possa tratar essa

questão da didática” (E6).

Nessa discussão acerca da pertinência ou não do uso do nome graduado,

somente um entrevistado se manifestou afirmando que o termo não interfere na

questão da identidade e do trabalho prático do profissional de Educação Fisica:

Não vejo problemas no termo graduado, vejo como um termo correto, e se a gente for pensar no termo pensando no Direito e na Medicina, as pessoas são graduadas naquela área do conhecimento e a gente percebe que é muito forte isto na Medicina e no Direito, eles terminam a faculdade e querem ser chamados de doutores. [...] Se tu estás numa escolinha de iniciação esportiva, por exemplo, tu vai ter aquela figura de professor. Não vai ser de técnico ou orientador. Prá criança tu vai ter aquela figura de professor. Não vejo que atrapalhe ou que afete alguma coisa neste sentido (E3).

Porém, como já referi, os outros entrevistados são contrários ao termo por

acharem um nome inadequado para referir-se ao profissional em Educação Física e

manifestam-se de diferentes formas para demonstrar suas posições, “então me

parece que o profissional de Educação Física ou o professor de Educação Física ele

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é professor. Isso o que é que quer dizer? Quer dizer que nos currículos da

graduação em Educação Física as disciplinas pedagógicas têm que estar presentes”

(E2). O mesmo entrevistado se manifesta no sentido de que o fazer do professor é

educar, ao comparar a profissão de professor com outras formações de nível

superior, “educar todo mundo é um pouco capaz de educar, o pedreiro educa, o

dentista educa, mas o profissional de Educação Física é diferente porque o metier

dele, o fazer dele é educar. O meu fazer não é construir parede nem consertar

dentes. O meu fazer é educar” (E2).

Seguindo nesta linha trago outra manifestação de um entrevistado que

comenta também o termo graduado em relação a outras profissões, “então, o termo

graduado não vale só pra Educação Física. O médico é graduado em Medicina, o

psicólogo é graduado em Psicologia, o matemático é graduado em Matemática.

Todos são graduados, mas eles são o quê? Licenciados ou bacharéis?” (E5).

Um entrevistado aborda a questão legal, que o termo graduado poderá

provocar depois que o profissional se forma, e irá atuar na sua área, “eu vejo que

essa nomenclatura traz até legalmente uma série de possibilidade de recurso dos

professores que saem formados porque ela não define. Ela não diz: ‘tu és bacharel,

tu és licenciado’. Ela te coloca como graduado” (E4). Da mesma forma, a pessoa

que trabalha com a Educação Física, ainda continua sendo chamado de “professor”

independente de local que atue, “é, dentro de uma academia, quando o aluno te

procura tu é o professor da academia, não mudou a nomenclatura. Na escola, na

escolinha esportiva ou no clube, quando tu tá trabalhando com criança,

principalmente com criança, tu é o professor” (E4).

Segundo um dos entrevistados o uso do termo “graduado” gera distintas

interpretações que podem incidir em confusões: “o termo graduado [...] não se refere

à questão de ser professor ou não. Ele pode ser graduado em licenciatura e ser

professor, ser graduado em Educação Física e não ser professor, não lhe parece

paradoxal? Não, porque ele pode ser graduado em Educação Física, licenciado em

Educação Física e ser professor, bem como ele pode ser graduado bacharel” (E5).

Nota-se, pois, a confusão que reina acerca da adoção do nome graduado

estabelecido pela Resolução 07/04 ao invés de bacharel. Vale destacar que mesmo

que a legislação tenha normatizado tal nomenclatura, na universidade de um dos

entrevistados continua-se colocando bacharel em Educação Física, “no diploma vai

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sair bacharel em Educação Física. Ainda que na resolução fale em graduado,

graduação em Educação Física, a gente está usando o termo bacharelado” (E5).

Outra questão é a confusão que a adoção do nome gera na relação com a

profissão. Como já vimos, graduação é toda formação de nível superior. Não se

sabe, assim de qual das formações se está falando, pois a Licenciatura em

Educação Física também é um curso de graduação. Ao concluir o curso, o

profissional em Educação Física tem tanto a formação técnica quanto a pedagógica

no seu currículo, tudo visando trabalhar com pessoas. Este vai trabalhar como

educador, passando conhecimentos e orientações nas diferentes áreas de atuação

que cabem à sua responsabilidade profissional, tais como: esporte, luta, ginástica,

entre outras.

Quando, por exemplo, o Graduado em Educação Física está atuando como

treinador de uma escolinha de futebol, ele leva consigo tudo o que aprendeu na sua

formação - a parte técnica e metodológica. Conseguir explicar para seus alunos

como se joga futebol é a parte pedagógica, é a forma didática de ensinar, é a

educação propriamente dita. Desta maneira, o Graduado não deixa de ser um

professor, pois ele ensina, educa, tem uma didática de como passar a técnica. Existe

um professor e um aluno, o qual se está aprendendo numa relação pedagógica. Em

uma das entrevistas se verificou uma situação que em parte remonta esta situação:

Eu acho que o termo graduado não condiz com a realidade da situação do professor. Ele é um professor. Inclusive nós temos trazido muito essa questão prá academia aqui, que é a questão seguinte: não é porque o professor está ministrando uma aula de musculação que ele não é professor. Ali tem um processo pedagógico, ali tem uma sequência pedagógica. Tem que ter uma didática, tem que ter uma aproximação com o aluno. [...] Então eu acho que o termo graduado não é adequado, acho que é professor. É bacharel em Educação Física, é professor. No momento em que tu coloca graduado e tira o professor, parece que tira a responsabilidade de estar transmitindo alguma coisa. O professor é um facilitador do processo e ele não deixa de ser porque está na academia ou porque está numa aula individual com o aluno. Ali tem processo pedagógico (E6).

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Independente do local em que o profissional de Educação Física esteja

atuando, ele não deixa de ser professor. A formação tanto do licenciado como do

graduado é caracterizada por disciplinas que formam basicamente professores para

atuar na escola e fora dela. O que caracteriza a Educação Física é a docência.

Conforme Taffarel e Santos Júnior (2010, s.p.):

a Educação Física caracteriza-se, histórica e essencialmente, pelo trabalho pedagógico, ou seja, pelo processo de intervenção pedagógica. Portanto, a docência é à base de sua formação acadêmica e a ação, o princípio estruturante do conhecimento científico necessário ao currículo.

Analisando todas as entrevistas percebo que cinco pessoas concordam que a

nomenclatura graduado em Educação Física é inadequada e somente uma pessoa

discorda. Os seus argumentos em relação à crítica que fazem à adoção do termo

graduado podem ser distintas, indo desde o entendimento de que o termo não diz

nada até a confusão de não saber de quem se está falando.

Para finalizar esta seção faço uma breve retomada das reflexões feitas

através da questão de pesquisa sobre os nomes do profissional de Educação Física.

Graduado em Educação Física, conforme a Resolução 07/04, é todo profissional de

nível superior, e este é exclusivamente formado para atuar no campo não formal, ou

seja, não dentro da área escolar.

O Licenciado em Educação Física também é um curso de nível superior,

porém é para atuar somente na área escolar. Daí a confusão de quem se está

falando, porque ambos são cursos de graduação com atuação em espaços

diferentes. Na opinião dos entrevistados, bacharel seria o melhor termo para

diferenciar uma habilitação da outra sem gerar ambiguidades.

O que fica, especialmente a partir do depoimento de um dos entrevistados, é

que a adoção do termo graduado foi a maneira utilizada pelo legislador para

diferenciar internacionalmente um grau técnico perante as outras profissões, fazendo

com que a parte da saúde em Educação Física ganhasse uma projeção para fora do

país. Mas, internamente, criou-se um descompasso pela questão da nomenclatura.

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De todo o modo, compartilho o entendimento de que o que une as duas

formações em Educação Física é o sentido pedagógico. Ambas as formações têm

uma forte base pedagógica e por isto independentemente de quem falamos, o que

as une é o ofício de ensinar. E mesmo após a publicação da Resolução 07/04 que

normatiza o termo graduado, ainda há universidades que usam “Bacharel” nos

diplomas dos alunos que concluem o curso de, agora chamado oficialmente,

graduação em Educação Física.

5.3 MUDANÇAS NA QUALIDADE DA FORMAÇÂO A PARTIR DA SEPARAÇÂO

GRADUADO-LICENCIADO

Será que a separação da formação em Educação Física, imposta a partir da

publicação da Resolução 07/04, que apontou as Diretrizes Curriculares Nacionais

para a graduação em Educação Física, deixando a Licenciatura sob a regulação da

Resolução 01 de 18 de fevereiro de 2002 e à Resolução nº 2/2002 em 19 de

fevereiro de 2002, ensejou mudanças qualitativas na formação dos professores de

Educação Física?

Dos seis sujeitos da pesquisa, três deles pensam que houve um incremento

qualitativo para ambas as formações, um não acredita na qualificação após

separação e comenta que os processos se qualificaram mais pela gestão do que

pelo processo em si de mudança, “[...], não pela separação, mas pelo processo de

amadurecimento da gente, da questão de montar um currículo, uma proposta

pedagógica de um curso é sempre um processo de discussão, amadurecimento, as

coisas, às vezes, são feitas muito rápidas” (E5). Um entrevistado comenta que o

graduado ganhou algumas coisas e o licenciado perdeu nesta divisão, quando diz:

“[...] eu acho que neste caso, o licenciado perdeu um pouco com essa divisão. O

bacharel pelo seu lado, ele ganhou algumas coisas. Porque muitos cursos tinham

estágio escolar e talvez um estágio não escolar. Agora, toda a carga de estágios do

bacharel está focada para a área não escolar” (E4). Por outro lado, em uma das

entrevistas, a questão dos processos de mudança na separação entre graduado-

licenciado, não foi respondida diretamente, mas de uma forma figurada:

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Eu diria que existe uma batata quente na mão dos gestores. Os gestores das instituições superiores de Educação Física tem essa batata quente na mão que é traçar essa diferença porque historicamente não existia essa diferença. Hoje, todo o coordenador de curso, o diretor de curso tem esse desafio na sua instituição de traçar essa diferença. O que a gente tem visto é que uma boa parte das iniciativas dessa diferença é disciplinas, ou seja, três, quatro disciplinas diferentes uma de outra que vai estar dando o traço diferencial do licenciado e do bacharel (E1).

Na avaliação do mesmo entrevistado, hoje é possível afirmar que a maioria

das instituições oferece a graduação e a licenciatura, mas os processos qualitativos

são colocados de uma forma que “[...] se você me pergunta como é que este modelo

curricular qualitativamente se diferencia, eu diria que daria um bom objeto de estudo,

no sentido de perceber como é que as instituições têm feito isso” (E1). Assim, o

entrevistado deixa claro que este é um bom e necessário objeto para o

desenvolvimento de pesquisas futuras.

Interessante salientar que com essa divisão na formação em Educação

Física, percebo que se criou uma secção, digamos assim, na formação, mais ainda

quando o profissional se forma e ocupa os postos de trabalho. A formação para

ambos os cursos em Educação Física são para trabalhar com pessoas nas mais

variadas formas de manifestação humana, esporte, luta, dança, jogo, recreação,

entre outras. Com a divisão, seus campos de atuação ficaram específicos, mas sua

formação não se diferencia significativamente, como já abordado anteriormente por

um entrevistado, “uma boa parte das iniciativas dessa diferença é disciplinas, ou

seja, três, quatro disciplinas diferentes uma de outra que vai estar dando o traço

diferencial do licenciado e do bacharel” (E1).

Sendo assim, cria-se uma falsa impressão de que o professor que atua na

escola é muito diferente daquele que trabalha no clube, por exemplo. O seu

instrumento de trabalho é o seu conhecimento. Passa a informação de uma forma

pedagógica para as pessoas. A educação é a premissa de seu fazer laboral,

independente onde esteja ou atue. Coloco novamente esta situação para dar ênfase

à questão de que todos são professores, por crer que seja importante e até para

melhor entendimento de situações que possam ser confundidas com as do professor

de Educação Física Escolar.

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Na visão de outro entrevistado a melhora na qualidade acontece para ambos

os cursos, por ser oportunizadas aos acadêmicos, situações de trocas de

conhecimentos entre cursos:

Num caso concreto, as licenciaturas, por exemplo, prá te dar um dado: as licenciaturas elas têm disciplinas comum com todos os cursos da área pedagógica. Então promovem um encontro entre os futuros professores da escola básica já na formação e uma forte carga de estágios e de práticas. E no bacharelado em Educação Física a gente tem uma forte carga de disciplina compartilhada com a área da saúde. Então o nosso aluno, ao longo do curso já compartilha disciplinas de base com a Nutrição, a Fisioterapia, a Enfermagem, com outros cursos da área da saúde. E já faz estágios e práticas se integrando com o Sistema Único de Saúde, com o Sistema de Esporte e Lazer e Assistência Social das cidades (E2).

Da mesma forma um dos entrevistados, conclui que ambos os cursos em

Educação Física obtiveram ganhos tanto na parte técnico-pedagógica como também

na área da saúde. E com esta divisão “[...] a comunidade saiu ganhando porque ela

está sendo atendida por um profissional que está mais especializado na área. Então

ela está sendo atendida por um bacharel hoje que tem mais condições em termos de

formação do que o antigo licenciado com atuação ampla” (E3). Aqui vale destacar

que o uso do nome bacharel por parte do entrevistado não parece ser um lapso,

mas sim revela o entendimento de que a mudança foi mais de superfície. E isso é

tão mais verdadeiro se lembrarmos que uma das universidades continua atribuindo o

título de bacharel mesmo após a publicação da referida resolução que cristaliza o

título graduado em Educação Física.

Outra situação é o tempo maior que ficou destinado para o estágio do

graduado após a divisão da Educação Física. Passou para trezentos e vinte horas, e

ainda saiu de um estágio que acontecia na escola para ser realizado na área não

escolar.

Voltando-se para esta ótica, o curso de graduação teria ganhado

especificidade no seu estágio. Na realidade, até a divisão do curso, as primeiras

práticas profissionais dos graduados eram efetivadas no contexto real do trabalho,

depois de formados, na academia, entre outros locais, porque antes disto eram nas

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escolas que aconteciam os estágios dos antigos bacharéis. Isto aparece, em outras

palavras, na avaliação de um dos entrevistados:

No meu entender, o bacharel tem, neste sentido, alguns ganhos prá sua atuação específica. Não que eu considere necessária a divisão. Acho que a formação ampla prás duas áreas cumpria com o objetivo dela de uma forma bastante interessante, mas como a divisão veio, eu vejo esta característica. O bacharel ganhou porque ele tem algumas coisas mais específicas. Diminuiu-se a carga pedagógica do curso de bacharelado (E4).

Esse entendimento é compartilhado por outro entrevistado:

E aí a gente tem especificamente uma disciplina de didática no curso de bacharelado. Mas, em contrapartida, a licenciatura tem outras disciplinas: Psicologia da Educação, Psicologia da Aprendizagem, Organização da Educação Básica, então se dá um enfoque na licenciatura muito mais pedagógico do que no bacharelado. As questões técnicas ficaram muito mais privilegiadas no curso de bacharelado (E4).

A diferença na formação dos cursos em Educação Física, pelo que percebo,

está em algumas disciplinas e consequentemente desta forma podem qualificar o

curso dependendo talvez de como ele já fosse estruturado antes da divisão.

Comento isto em relação ao que um entrevistado relata acerca da questão da

mudança em virtude da separação dos cursos: “então, a nossa situação é que a

gente entende hoje que não houve uma mudança qualitativa no processo formativo,

o que a gente fez foi inserir algumas disciplinas, que claro qualificam, mas nós temos

a mesma formação nos cinco primeiros semestres” (E5).

Sendo assim, ainda que pareça paradoxal, há o entendimento de que os

processos qualificaram-se pelo acréscimo de disciplinas e não por terem os cursos

uma nova configuração que decorreu da sua separação. Os cursos de graduação e

licenciatura, como mencionado em outro momento, são muito parecidos, possuindo

uma grande parte de seu currículo composto por disciplinas iguais para ambos os

cursos. Isto faz com que não se tenha cursos totalmente separados para cada um,

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ficando a separação mais em termos formais, de nomenclatura, do que na sua

prática. Vejamos um depoimento que ratifica esse entendimento:

Os últimos três semestres [...] se diferenciam basicamente em relação aos estágios [...] a gente aprofundou algumas disciplinas no bacharelado. Isso qualifica o processo formativo? Eu acho que qualifica, mas eu acho que a nossa mudança curricular qualificou tanto para um curso quanto para o outro, por essa inclusão de disciplinas que nós não tínhamos antes. Existe ainda a possibilidade de neste processo que a gente fez, de se por acaso der uma revirada na história toda da separação, se voltarmos a ter um licenciado amplo, uma licenciatura ampla, plena, como a gente chamava antes, prá nós vai ser muito fácil reestruturar o currículo porque significa para o licenciado fazer os estágios previstos no bacharelado e mais umas três ou quatro disciplinas e pro bacharel fazer só os estágios da licenciatura (E5).

Com a explicação deste entrevistado, percebo que a licenciatura ampla, a

antiga formação não se diferencia muito da atual formação separada. Mas com a

separação, talvez os mecanismos com os quais que se configura um curso ou outro

podem mudar por um processo de transformação no momento. Continua o mesmo

entrevistado: “[...] houve uma mudança qualitativa, não pela separação, mas pelo

processo de amadurecimento da gente, da questão de montar um currículo, uma

proposta pedagógica de um curso é sempre um processo de discussão,

amadurecimento, as coisas, às vezes, são feitas muito rápidas” (E5).

Um entrevistado comenta de outra forma a questão da separação dos cursos.

As suas palavras me fazem entender que a ênfase que se dá a um curso ou outro é

decorrente da separação. E que isto de certa forma melhorou a formação para

ambos, pela otimização do tempo de carga horária dos cursos. É o que interpreto a

partir da seguinte afirmação: “O bacharelado nós sentimos que agora ele está

entrando nos trilhos. Até pela questão das áreas de estágio. Porque nós só

tínhamos estágio em escola. Eu acho que a gente vai conseguir agregar maiores

ganhos, mas eu acredito que pros dois foi bom essa separação a nível (sic) de

qualidade” (E6).

Interessante destacar a situação quando da divisão da formação em

Educação Física na universidade desse último entrevistado. Na realidade,

inicialmente, os cursos eram bem divididos, possuindo cada curso sua disciplina, por

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exemplo: o basquete da graduação e o basquete da licenciatura e esta situação

ainda continua, mas com desejo de unificar em uma disciplina para ambos os

cursos. Ao mesmo tempo em que se quer unificar a disciplina, foi comentado pelo

coordenador que isso ainda não ocorreu, justamente em função de a separação

possibilitar um aprofundamento em cada curso de Educação Física. Atualmente os

cursos não são tão separados e os acadêmicos tem um trânsito melhor entre as

disciplinas da graduação e da licenciatura, é o que percebo conforme as palavras a

seguir:

Agora a gente vê uma integração maior, no início era bem separado. Agora os alunos transitam tranquilamente nas aulas, nas disciplinas. E nós temos disciplinas pros dois, nós não chegamos ainda no ponto de fazer uma disciplina, por exemplo, de basquete, única entre os dois cursos. Isso não aconteceu ainda. A tendência é que aconteça, mas hoje não aconteceu, justamente pela questão do aprofundamento (E6).

Por outro lado, um entrevistado comenta uma situação, a partir da separação,

que tem a ver com a identidade dos cursos:

“[...] é como se a gente estivesse vivenciando uma esquizofrenia da Educação Física. [...] A gente quer se perceber diferente, então a gente tem que dizer que licenciado e bacharel são diferentes e ao mesmo tempo quando você se afasta, quando tenta separar as duas facetas você é sempre chamado a ter que responder: afinal de contas o que é Educação Física?” (E1).

Essa passagem revela que a separação tem relação com a identidade da

Educação Física. Mesmo que tenha se efetivado uma divisão na Educação Física,

uma formação que é chamada de Graduação e outra que é a Licenciatura, as duas

são Educação Física, mas há dois enfoques, são dois cursos. Ao mesmo tempo

quando se pergunta o que é Educação Física, acaba-se respondendo uma coisa só.

Assim a separação não pode ser de tal ordem a ponto de não saber o que é

Educação Física e nem aproximar muito para que não se justifique a separação. É o

que percebo na passagem: “ao mesmo tempo você tem que trabalhar numa lógica

analítica e ao mesmo tempo numa lógica sintética, ou seja, você não pode separar

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tanto ao ponto de perder o que é a Educação Física e ao mesmo tempo você não

pode igualar tanto que não justifique a separação dos dois” (E1).

Analisando todas as entrevistas, percebo que no geral as opiniões convergem

acerca do entendimento de que os processos formativos melhoraram para ambos os

cursos em Educação Física, não querendo dizer que antes da divisão eles não eram

qualificados. Mas, depois da divisão, os cursos continuam ainda generalistas porque,

“[...] a legislação não diz isso. A legislação continua primando pelo generalista. Ou

seja, mesmo separando licenciado e bacharel, a legislação diz que é uma formação

inicial generalista. Então, tanto o licenciado é generalista quanto o bacharel é

generalista” (E1).

Outra observação relevante é que os processos qualitativos também não se

fazem exclusivamente pela imposição das legislações. Melhor dizendo, o diferencial

parece estar nas gestões que estão dispostas a fazer a diferença nos períodos que

estão dirigindo os cursos, como a situação apontada pelo entrevistado ao afirmar “eu

não sei até que ponto a separação qualificou. Acho que a qualidade está na

responsabilidade dos gestores de estar sempre pensando nisso, na melhor formação

pros alunos” (E5).

5.4. MUDANÇAS DE ÊNFASE NO TRABALHO DO PROFESSOR UNIVERSITÁRIO

PÓS-DIVISÃO DA EDUCAÇÃO FÍSICA

Nesta seção analiso as entrevistas procurando perceber se houve uma

mudança no trabalho do formador dos profissionais de Educação Física – o

professor universitário – depois da divisão entre graduado e licenciado. Interessou-

me, sobretudo, identificar possíveis mudanças de ênfase no ensino dirigido para

ambos. Haveria uma abordagem mais técnica para os graduandos e mais

pedagógica para os licenciandos?

Nenhum entrevistado comenta claramente que exista uma ênfase maior na

parte técnica ou pedagógica para um curso ou outro. Os seus comentários são mais

específicos de como suas instituições administraram a divisão da formação e a

características particulares de cada instituição. Como vimos anteriormente, a partir

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da separação dos cursos, há o entendimento de que eles ganharam em

especificidade para atuação na área escolar e não escolar. Mas a divisão na

formação não quer dizer que os cursos são inteiramente separados:

Na verdade, esta separação licenciatura e bacharelado, ela não é uma separação abissal, ou seja, nós não temos um curso inteiro de licenciatura e um curso inteiro de bacharelado, não. Aliás, isso não acontece na grande maioria das instituições do Brasil. Os cursos de Educação Física no Brasil tem praticamente um mesmo corpo curricular. Eu poderia até arriscar o seguinte: 80% dos cursos de licenciatura e bacharelado são comuns (E1).

Desta maneira, vinte por cento do currículo é que é diferente nos cursos de

Educação Física. Quer dizer, comparando com toda uma formação, uma pequena

parte da matriz curricular é específica, o restante é igual para ambos os cursos.

Sendo assim, olhando para este dado de que a distinção entre os cursos é pequena,

penso que ficaria difícil dar uma ênfase técnica para o graduado e uma ênfase

pedagógica para o licenciado.

Fazendo um comparativo com a formação em Educação Física antes da sua

divisão regulamentada pela Resolução 07/04, temos o comentário de um dos

entrevistados: “[...] antes nós tínhamos um curso de licenciatura formalmente, só que

a gente vê isto na literatura, inclusive fortemente demarcado, mesmo sendo um

curso de licenciatura, na prática as aulas eram para bacharelado” (E1).

Atualmente, o professor de nível superior encontra-se frente a um desafio,

que é o de ter em sala de aula alunos que trazem conhecimentos dialogados com

outras áreas. Agora o formador não tem mais somente alunos do campo genérico da

Educação Física. Ele tem alunos dos cursos de graduação e licenciatura na mesma

aula, e esses trazem suas indagações discutidas em outros campos de formação da

pedagogia e da saúde. Isso faz com que as aulas se tornem mais ricas, segundo o

que relata o mesmo entrevistado:

Agora, para o professor, o desafio amplia-se, porque ele não tem um aluno somente do campo de Educação Física que ele estava acostumado. Ele começa a ver alunos que trazem para a sala de aula concepções de outros professores de outras áreas ou de outras realidades. Então as aulas passaram a ter interesses mais

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heterogêneos. E isso faz com que o professor, que dê aula, tenha que perceber a sua necessidade de dialogar com pessoas mais plurais. Esse seria o desafio (E1).

Na universidade desse entrevistado, ele comenta uma situação bem

interessante sobre a questão de ênfase que é dada nos cursos de Educação Física.

Essa ênfase sai um pouco da lógica das disciplinas no meu entender. Ela foca no

objetivo da Educação Física, do que a Educação Física se utiliza de conhecimento

para desenvolver seu trabalho com as pessoas. Mais especificamente, é o

movimento humano que é o grande guarda-chuva, digamos assim, de todo o

ferramental que o professor de Educação Física utiliza como ponto inicial para dar

continuidade no seu fazer pedagógico, laboral. O coordenador dessa universidade

dialoga com uma carreira da Educação Física. Existe a divisão na formação, mas se

criam meios para que o aluno que ingressa na Educação Física tenha uma trajetória

de modo que ele se forme nas duas áreas, tanto a graduação como a licenciatura. A

ênfase que é dada nos cursos é o movimento humano com a especificidade para

cada campo de atuação:

[...] a carreira de Educação Física, aqui, estuda o movimento humano no contexto das culturas corporais, nas perspectiva da Educação, Saúde, Esporte e Lazer. Esse é o nosso objeto de formação, de estudo. Na licenciatura, este mesmo objeto de estudo dá ênfase na área da Educação. Então é isto que eu tenho dito. A gente não dá ênfase à escola. A gente dá ênfase à educação [...] No bacharelado ele também dá conta do mesmo objeto, ou seja, estuda o movimento humano no contexto das culturas corporais de movimento esporte, ginástica, luta, jogo e dança dando ênfase à dimensão da saúde, esporte e lazer. Na dimensão da saúde, fazemos um diálogo com o sistema único de saúde (E1).

Retomando a questão das ênfases, a escola é o campo de atuação para o

Licenciado em Educação Física, a educação que é o fulcro, o objetivo maior da

formação, “[...] e quando a gente dá ênfase na educação, a gente continua aberto à

perspectiva de dizer que existe uma instituição que é uma instituição prioritária,

tradicional na área da Educação que se chama escola” (E1). E para o graduado a

ênfase não é só o esporte, também é a saúde e o lazer. Em seu labor, os

formadores se utilizam do conhecimento da cultura do movimento humano como

meio para chegar à parte específica que é a ênfase, citada anteriormente.

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Um dos entrevistados tem a opinião de que há uma separação de fato nas

aulas, “[...] os cursos são totalmente separados, o bacharelado não tem contato em

sala de aula com o mesmo aluno da licenciatura, existe uma diferença bastante

grande no enfoque que é dado na aula. Porque os exemplos todos são focados em

uma área específica” (E4).

Esta situação citada anteriormente é inversa ao depoimento de outro

entrevistado quando refere a existência de alunos da graduação e da licenciatura na

mesma sala de aula, o que impõe estratégias plurais para atender às especificidades

do grupo de alunos. Em outros termos, há sim, na opinião dele, mudança de ênfase,

mas em aulas compartilhadas por graduandos e licenciandos, que demandam

relações com os campos de trabalhos futuros de ambas as titulações:

A gente tem, em sala de aula, alunos das duas titulações. [...] O que é mais reclamado pro aluno é no momento da exemplificação, no momento que ele tá abordando – tipo assim: aquilo que eu estou explicando se aplica em quê na escola. Se o professor só dava exemplo para o contexto da escola, hoje ele tem que dar este exemplo tanto prá escola quanto pra fora da escola prá que o aluno consiga se ver. [...] O professor está desafiado a tentar pensar na sua área de conhecimento, no seu objeto de estudo, na sua disciplina, como é que o seu objeto de estudo dialoga com campos de atuação diferentes? Então está posto para os profissionais de Educação Física este desafio: de conseguir vislumbrar nas suas disciplinas, que já desenvolviam antes, como é que ela se aplica, como é que ela dialoga – porque nem todas as abordagens das disciplinas são necessariamente aplicativas – mas todas as disciplinas têm campos conceituais que necessariamente tem algo a dizer do mundo real pro futuro licenciado, pro futuro bacharel (E1).

Em outras palavras, na citação anterior, o entrevistado comenta que as

disciplinas que são dadas para os cursos de graduação e de licenciatura podem ser

iguais e por vezes não são aplicativas, tais como: a bioquímica, cinesiologia, entre

outras. Entretanto há disciplinas que são aplicativas como: os esportes e as lutas.

Mas todas as disciplinas são importantes para a formação do futuro graduado e

licenciado em Educação Física. Por exemplo, os esportes podem ser trabalhados

tanto na escola como fora dela, com objetivos e abordagens diferentes dependendo

do que o professor queira trabalhar. Por exemplo, na escola poderá ser trabalhado o

vôlei com as crianças com o viés educativo. Desenvolver o espírito cooperativo,

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criando uma regra que ditasse a necessidade de a bola ser tocada por todos os

jogadores antes de ser arremessada para o lado adversário. Este é um exemplo de

criação de uma regra para desenvolver a cooperação, concentração, entre outras

coisas. Já o vôlei que é trabalhado com as mesmas crianças, por exemplo, num

clube, poderá desenvolver o treinamento, o desempenho do passe e do saque. Não

quer dizer que o professor que trabalhe com o esporte, não esteja também

educando. Quer dizer que a intenção, o objetivo alvo é o desempenho, mas todas as

coisas estão presentes e sendo desenvolvidas como: o esporte e a educação.

Outro dado relevante é abordado por um dos entrevistados. É a questão do

curso de licenciatura em Educação Física após a divisão da formação que, no seu

entendimento “[...] é um pouco menos qualificado que aquele curso anterior de

licenciatura plena que tinha. Porque tinha mais tempo prá desenvolver outros

conteúdos que até são colocados nos PCNs como atividades a serem utilizadas

dentro da escola, mas que o tempo de 2800 horas não te permite colocar” (E4).

Existe uma redução no tempo de formação para o licenciado, para duas mil e

oitocentas horas, que é o mínimo exigido pela legislação, não querendo dizer que

não possa ser mais que o mínimo.

Desta forma, por uma questão de custo e permanência de um aluno que

ingressa num curso de licenciatura em uma universidade particular, na qual paga

seus estudos, não é interessante que demore muito para se formar. Realidade

diferente da universidade pública, em que o aluno não paga para se formar. Essa é

uma realidade comentada por esse mesmo entrevistado:

A gente fala em 2800, é o mínimo prá formação, mas hoje em dia se tu for pensar num curso prá ele ter sobrevida no mercado, se tu fizer um curso de licenciatura com 3200 horas o aluno não vem prá cá. Ele vai prá um outro que tem menos tempo, porque ele se forma antes e gasta menos. Então, as universidades, principalmente as privadas, elas não têm possibilidade de oferecer um curso com carga horária superior ao mínimo. Então se fores avaliar todas as faculdades privadas, a grande maioria delas usa a carga horária mínima. Quem pode ir um pouco além é a universidade pública (E4).

Para outro entrevistado a divisão entre graduado-licenciado não muda o trato

com as disciplinas. A formação não muda entre os cursos, todos são todos

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professores, “mas o papel do licenciado e do bacharel na discussão interna das

disciplinas, prá mim é a mesma. Eu trato sempre como professores. Inclusive brinco,

quando chego em aula eu digo: ‘bom dia professores!’ Não faço diferença” (E5). Esta

situação de não diferenciar o aluno da graduação do aluno da licenciatura, na

abordagem das disciplinas, me faz pensar que a divisão dos cursos realmente se

caracterizou mais por uma aplicação legal dos campos de atuação do que na

formação, e esse entendimento é corroborado pela seguinte passagem:

[...] os professores que supervisionam os estágios do bacharelado, as cobranças são as mesmas: é processo pedagógico, é a forma que tu trata o aluno, que orientações tu dá, quer dizer as exigências didático-pedagógicas do bacharel e do licenciado são as mesmas, o que muda é o campo de atuação [...]ele recebe exatamente a mesma formação, o licenciado e o bacharel. A grande diferença vai depender do aluno. Se ele não fizer um bom trabalho na escola é porque ele não aprendeu, não se preparou, não estudou suficientemente [...] a formação é exatamente igual. A diferença, como eu estou te colocando, é pontual em alguma disciplina de algumas áreas técnicas (E5).

Outra situação apontada por um dos entrevistados tem a ver com a conquista

de espaços dos graduados na área da saúde. O Ministério da Saúde nomeia

graduado, e não licenciado em Educação Física e por esta razão precisa-se desta

formação, por correr o risco de perder este espaço de trabalho:

[...] eu fiquei sensibilizada pelo posicionamento daquele professor que falou da abertura do espaço de trabalho pro bacharel junto ao Ministério da Saúde prá atuação no Sistema Único de Saúde. Fiquei sensibilizada, agora eu não sei se todas as faculdades de Educação Física do Brasil resolvessem, tomassem a decisão de só oferecerem licenciatura ampliada, se o Ministério da Saúde não ficaria pressionado e teria que colocar nos seus editais a contratação de licenciados. Hoje são só bacharéis. Então se hoje a gente não forma bacharel, a gente perde este espaço que foi trabalhado. Agora, eu acho que se houver uma movimentação coletiva da área da Educação Física como um todo, talvez a gente pudesse pressionar e retornar à licenciatura plena (E5).

A divisão entre graduado e licenciado tem suas particularidades, como já

vimos ao longo desta dissertação. Os professores formadores na grande maioria são

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os mesmos que formam os graduados e licenciados em Educação Física. As

diferenças são muito poucas entre um curso e outro e praticamente oitenta por cento

das matrizes curriculares de ambos os cursos são iguais. A maneira de dar aula, as

cobranças, a pedagogia, a didática parece ser igual para os dois cursos. O que

poderá mudar é uma ou outra disciplina mais específica para cada curso.

Para finalizar esta seção, destaco uma passagem de um dos entrevistados

onde percebo a situação atual do professor universitário que forma graduados e

licenciados em Educação Física. Vale destacar que essa a opinião é a prática do

coordenador de um curso de uma das universidades, que segue a máxima de que

graduado e licenciados são antes, e acima de tudo, professores:

A gente tem tentado minimizar as diferenças. Quanto mais a gente aproximar a formação do licenciado com a do bacharel, nós entendemos que é melhor. Nós só separamos licenciatura e bacharelado por uma questão legal. Porque aqui todos que fazem parte do nosso grupo de professores, ninguém concorda com a separação de licenciatura e bacharelado porque entendemos que sempre seremos professores (E5).

5.5. FATORES QUE CONTRIBUÍRAM PARA A DIVISÃO LICENCIATURA –

GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO FÍSICA

Nesta seção final abordarei os possíveis fatores que levaram à divisão entre

licenciatura e graduação na Educação Física. Destaco que um dos entrevistados faz

toda uma análise de contexto mais ampla, demonstrando profundo conhecimento do

processo que levou à separação na formação em Educação Física. De todo o modo,

nos depoimentos do conjunto de entrevistados não há propriamente uma opinião

consensual, o que me levou a dar atenção a cada um dos relatos de modo a traçar

um panorama o mais próximo possível das respostas. Apenas o entrevistado há

pouco referido discute de modo criterioso e detalhado os aspectos sociais,

históricos, econômicos e culturais que estiveram envolvidos na divisão da formação

em Educação Física. Começo então a análise por esse entrevistado, para quem a

motivação da separação foi a necessidade de ter um corpo de professores mais

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qualificado, pois “no Brasil se carecia de professores com maior formação

pedagógica. Então, diante dessa carência dessa formação pedagógica, de uma

melhor qualificação pedagógica, se criou a legislação das licenciaturas, e a

Educação Física entra nisso” (E1). O entrevistado refere que a separação se deu, no

contexto de reformulação das licenciaturas, por “um motivo social. [...] Se identificou

na área da educação de que os licenciados formados pelos cursos universitários,

cursos superiores não apresentavam perfil adequado para o contexto da escola”

(E1). Mais precisamente, o entrevistado coloca a separação no bojo da publicação

das Resoluções 01/2002 e 02/2002 que versam sobre todas as licenciaturas do

Brasil. A Educação Física, por ser também um curso de licenciatura enquadrou-se

nessas Resoluções. Num primeiro momento foi essa questão da separação:

[...] outras vezes, sim, a Educação Física tentou se separar. Tentou regulamentar a sua profissão e na regulamentação da profissão trazer outras nuances que justificassem a regulamentação. Para você ter uma ideia, na briga pela regulamentação, chegou um determinado momento que o nome Educação Física não era o melhor nome (E1).

A separação, na avaliação desse mesmo entrevistado teria sido determinada

por outras questões, como o fator histórico. Ele destaca que desde a década de

1970 a Educação Física já iniciava as tentativas de regulamentação da profissão

como uma forma de proteger os espaços das atividades físicas para o professor de

Educação Física:

[...] a regulamentação da profissão vem muito mais como estratégia da área da Educação Física em resguardar o seu campo e os seus territórios de atuação. Eu diria, quer dizer, eu tenho algumas restrições sobre a lógica da regulamentação, mas eu acho que, sem dúvida nenhuma, é justificável regulamentar. Por quê? Porque essas são as armas que estão postas no mundo e no território profissional [...] é uma luta que [na qual] a regulamentação é a primeira arma (E1).

Essa questão é diretamente relacionada com disputas entre corporações

profissionais, ela decorre, na opinião desse mesmo entrevistado da “necessidade de

regulamentar para garantir atuações e campos de atuação faz com que a Educação

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Física tente melhor qualificar os seus profissionais para fora do trabalho ou fora do

âmbito escolar. [...]” (E1). Vale a pena transcrever um longo trecho da entrevista

desse mesmo entrevistado, dada a riqueza de argumentos que ajudam a compor um

quadro de inteligibilidade do processo que deu origem à separação que está em

discussão:

Se a educação precisa de alguém mais qualificado na área da educação e a Educação Física para justificar a regulamentação da profissão no campo não formal precisa de alguém com melhor qualificação para inclusive fazer frente aos fisioterapeutas, aos médicos, etecetera, então a Educação Física também tinha que cuidar com maior apuração os seus conhecimentos. Isso é um dado interesse e inclusive está em nível de senso comum que é o seguinte: bom, por que o médico sabe mais do que o fisioterapeuta, do que o engenheiro, do que o profissional de Educação Física. Ah, porque ele consegue saber o nome de todos os órgãos e sistemas do corpo humano. Ora, então você começa a perceber uma falsa polêmica e que, infelizmente, historicamente isto se cristaliza é o de achar o seguinte: aquele que tem uma maior eloquência prá dizer nome de músculos, de ossos, de órgãos ele sabe mais do que o outro. Isso inclusive tem se adotado como constrangimentos, é uma política de constrangimento. Então se alguém tem mais disciplinas de anatomia e de fisiologia, ele conhece mais anatomia e fisiologia do que o outro. Ora, se ele conhece mais do que o outro então ele é melhor profissional do que o outro. Então, na verdade, no campo de atuação não escolar, a Educação Física passa a ter que disputar com os fisioterapeutas dores musculares, como é que acontece o processo da circulação linfática. Então o profissional de Educação Física para se legitimar neste campo de atuação não escolar ele tem que ter maior conhecimento e linguagem desse campo. Ora, isso faz com que também se justifique de que ele tem que ter uma formação diferenciada do licenciado” (E1).

Por outro lado, a questão econômica, que poderia justificar a separação em

Educação Física, na avaliação de outro entrevistado:

[...] é uma medida antieconômica. Essa política é tudo menos econômica. Por quê? Porque primeiro ela é mais cara. Mais cara no sentido de que se antes você tinha um curso que em 3 anos e meio, quatro anos e meio que é o que diz a resolução 03 e que na prática, a maioria não concluiu o curso em 4 anos e meio e ia prá cinco, sete anos (E1).

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Depois da divisão, na realidade, para o profissional atuar nos dois campos da

Educação Física, terá que se dedicar por mais tempo a sua formação, e isto gerará

custos de pagar a universidade. Desta forma, antes da divisão, se formava na

licenciatura ampla, geralmente em quatro anos e saía habilitado para atuar na

escola e fora dela. Então, pós-divisão da Educação Física, ficou significativamente

mais caro obter as duas habilitações.

A divisão da Educação Física no fator cultural, ainda parece-me muito

recente. E aparentemente ainda é desconhecida para muitas pessoas, conforme um

dos entrevistados: “Culturalmente essa separação ainda inexiste, por incrível que

pareça. Ainda não aconteceu essa separação. Isso é um desafio maior. A sua

pesquisa traz uma questão que é a ficha começar a cair durante algum bom tempo”

(E1).

A separação foi imposta pelas legislações, mas ainda não se têm dados

concretos, de como está na prática à atuação dos profissionais de Educação Física,

e:

[...] o Conselho, ele está fazendo a fiscalização de quem é licenciado e de quem é bacharel nas atuações e o Conselho, em nenhum lugar do Brasil, fez um estudo sobre quantos profissionais de Educação Física existem com bacharelado estritamente ou com licenciatura estritamente e que dão conta do campo de atuação (E1).

Na questão histórica, outro entrevistado comenta a situação atual em que se

encontra a Educação Física com a divisão na formação. Esse momento é a “[...]

possibilidade que é nos qualificarmos para atuar com mais fundamento na área da

saúde e nos qualificarmos prá atuar a partir da cultura da Educação Física e do fazer

do professor de Educação Física e nos qualificarmos para atuar com mais foco e

objetividade na Educação Básica” (E2).

Um dos entrevistados, não respondeu essa questão sobre os fatores que

levaram à separação entre graduado e licenciado de uma forma muito consistente:

“eu não sei te precisar muito bem estes debates porque neste período que estava

realmente acontecendo eu não estava tão envolvida e não estava tão apropriada

desta questão” (E3).

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A questão política que envolve a separação na formação em Educação Física

é o único fato que foi comentado por dois entrevistados. O Conselho Regional de

Educação Física – (CREF) é o órgão que regula a atuação do profissional de

Educação Física fora da escola. E a necessidade da divisão na formação, é “[...]

muito mais por uma necessidade política, depois da regulamentação da profissão do

que por uma necessidade da própria categoria” (E4).

A regulamentação da profissão de Educação Física foi o que balizou a

divisão. Criando-se posteriormente a divisão na formação “[...] em virtude da

regulamentação da profissão. Isso exigiu uma categoria para que o Conselho tivesse

ingerência” (E4). Esta categoria é a dos profissionais em Educação Física,

graduados, que podem atuar somente fora da escola e, consequentemente, são

fiscalizados pelo Conselho de Educação Física.

Na opinião desse mesmo entrevistado, porém, a regulamentação da profissão

de Educação Física trouxe junto a possibildade de se dizer de quem é o campo não

formal das atividades físicas, e dessa forma “a regulamentação, sim, vem de uma

necessidade profissional. A regulamentação. Os professores de Educação Física

necessitavam de um espaço de trabalho regulamentado, porque qualquer

profissional entrava numa academia e dava aula” (E4).

Porém esta regulamentação na Educação Física, de certa forma, impôs a

divisão na formação, que poderia ser de outra forma, como percebo nessa

passagem:

[...] No meu entender poderia ter trânsito livre para as duas categorias. Te formou numa ou noutra [...] os cursos poderiam ser um só. Tu trabalharias na escola, não precisava do CREF. Tu vai trabalhar fora, tu precisas do Conselho. Então, desta forma tu poderia regulamentar de uma forma mais simples. Não impondo uma divisão na formação do professor. Acho que houve uma ingerência política na formação do professor, que tirou da universidade o poder de decidir qual é a melhor forma de formar aquele profissional (E4).

Outro entrevistado também relata sua opinião acerca da questão política da

divisão na formação em Educação Física, quando diz que: “[...] a que eu atribuo

essa separação? Eu não atribuo a nenhum destes aspectos. A questão da

separação foi uma questão política de constituição dos Conselhos de Educação

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Física” (E5). A criação dos Conselhos em Educação Física foi uma maneira de

controle das atividades físicas, principalmente nas academias. Com a justificativa

que qualquer pessoa poderia trabalhar nessa área. Mas este, objetivo, buscado pelo

Conselho de Educação Física, de proteger a sociedade dos supostos profissionais

sem diploma que atuam nas academias não encontra eco na realidade para um dos

entrevistados:

[...] Acho que havia necessidade de um controle da atuação do profissional nas academias, especialmente, porque eles se constituem como Conselho com essa bandeira: ‘tem muita gente não habilitada trabalhando nas academias, precisamos controlar’, eu concordo com isso. O que eles vêm fazendo não é isto. Eles não vêm controlando, eles não fiscalizam (E5).

Esse mesmo entrevistado não vê nenhum problema histórico em relação ao

mercado de trabalho da Educação Física. Para a questão da divisão do campo de

trabalho que o Conselho restringe e fiscaliza a atuação do profissional de Educação

Física, a opinião é a seguinte:

[...] o que regula o mercado é a competência do profissional. Aspectos econômicos? Não. Culturais? Acho que não. Acho que muito frequentemente os professores que iam para a escola eram professores que não queriam trabalhar na escola, mas aí não conseguiam se empregar ou não queriam ficar trabalhando a vida inteira numa academia, surge um concurso público, eles fazem um concurso e entram na escola e são o que a gente chama de professor “rola bola”. Eles não queriam dar aula, mas a garantia de um emprego público faz com que eles vão prá escola. Isso acontecia antes porque havia a possibilidade de trabalhar nos dois campos e eu acho que vai continuar acontecendo hoje. [...] Não é essa separação que qualifica mais o professor que vai prá escola ou o cara que ficou fora da escola (E5).

Então, na visão desse último entrevistado, os fatores que desencadearam a

divisão na formação em Educação Física, foram os fatores políticos. E por falta de

mobilização por parte dos professores, a separação passou sem uma maior

discussão. O Conselho Federal de Educação Física foi o grande ícone nesse

movimento da divisão na formação dos professores de Educação Física. Esta

situação é exemplificada nessa passagem:

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[...] da separação, eu entendo que são fatores políticos e só conseguiram isto porque os professores que estão nas universidades, nas instituições de classe da Educação Física, no momento da instituição dessa separação, eles não tiveram interferência firme no Congresso Nacional, que é onde isto foi votado. Os caras do Conselho Federal, especialmente o Steinhilber, ele conhecia muitos políticos, ele foi muito bom nisso. Ele soube arquitetar, fazer um lobby muito bem feito e convencer pessoas que não são da área. Enfim, foi tudo aprovado. Não houve uma discussão maior por culpa nossa, nós não nos mobilizamos em função do excesso de tarefas que temos, quando vimos a coisa estava feita... (E5).

Por outro lado, um dos entrevistados, considera que um dos fatores que

influenciaram a divisão na Educação Física foi o social: “[...] tem uma questão muito

da sociedade a divisão. [...] Eu não acompanho as discussões via MEC, não

acompanho nenhuma discussão nesse sentido. Mas estamos tranquilos, vamos

continuar trabalhando com as duas formações. Se tiver que voltar atrás, prá nós não

tem problema nenhum” (E6). Esse entrevistado adiciona a questão social à cultural

no momento em que expõe “[...] que há uma questão cultural aí e eu acho que é a

questão econômica fica num segundo plano. Eu atribuiria à questão social e à

questão cultural. Estão muito juntas essas questões” (E6).

A divisão da formação em Educação Física, na avaliação dos entrevistados,

foi decorrente de alguns fatores. E, entre estes, a questão política foi a posição de

dois entrevistados e as outras, são de ordens diferentes que abordei nesse texto,

mas não tiveram um consenso, são opiniões que dependem da realidade de cada

coordenador de curso. Então, entre os fatores culturais, sociais, econômicos e

políticos, esse último foi o que se mais destacou como tendo provocado a divisão na

formação em Educação Física.

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6 CONSIDERAÇÕES FINAIS

É hora de colocar um ponto final nesta dissertação. Sem dúvida posso ter

deixado lacunas no processo investigativo e certamente não cheguei a explorar os

dados em toda a sua riqueza, em todo o seu potencial. Reconheço também que há

algumas fragilidades teóricas que decorreram do fato de que a perspectiva teórica

dominante na maior parte das publicações sobre a Educação Física em geral, e

formação de professores de educação física em particular, é a marxista. Sem

pretender fazer qualquer juízo de valor sobre isso, tal perspectiva dominante acabou

dificultando minha interlocução com a ampla produção da área. A questão central

que me movia tentava acessar um panorama mais micro, que tinha a ver com os

modos de recepção, em especial da Resolução 7/2004 (BRASIL, 2004), por parte de

coordenadores de cursos de Educação Física de universidades da microrregião da

grande Porto Alegre.

Em certo sentido, pode-se afirmar que a investigação que originou esta

dissertação seja um micro estudo, uma vez que se centrou em “situações muito

particulares, abrangendo um número pequeno de sujeitos [...] referindo-se a uma

porção muito restrita da realidade” (ANDRÉ, 2010, p. 177). Isso me parece

parcialmente verdadeiro, porque ainda que os sujeitos da pesquisa sejam em

número relativamente reduzido, as discussões que eles catalisam têm a ver com um

panorama muito mais amplo, que são as reformulações dos cursos e da formação

do professor de Educação Física a partir da publicação da sistematicamente referida

Resolução 7/2004 (BRASIL, 2004).

Norteado pela interrogação acerca da formação do professor de educação

física que é instituída a partir da separação entre as modalidades: graduado em

Educação Física e licenciado em Educação Física. Ambos decorrentes da

publicação da Resolução Nº 7, de 31 de março de 2004, procurei focalizar o modelo

de formação ofertado aos futuros professores de educação física, após a publicação

da referida resolução.

Especificamente no que se refere aos objetivos da investigação, creio que foi

possível discutir a avaliar os impactos da referida resolução sobre a formação do

professor de Educação Física. Lembro que não houve unanimidade nas respostas a

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essa questão por parte dos sujeitos da pesquisa. Os argumentos vão desde a

constatação de que houve uma ruptura na identidade do profissional de educação

física, consequentemente há o entendimento de que a resolução acaba limitando o

campo de atuação do formado (licenciado e graduado), passando pelo entendimento

de que resultou uma desvalorização efetiva do magistério e do trabalho na escola,

até avaliações de que os impactos foram positivos, por conta da regulação estrita do

mercado de trabalho para os graduados, inclusive no que se refere à possibilidade

de o graduado fazer concursos públicos na área da saúde. Por outro lado, é preciso

destacar a opinião de um dos entrevistados que não vê efeitos práticos sobre os

processos formativos de ambos os profissionais (licenciado e graduado), uma vez

que os efeitos sobre os currículos dos cursos são, em sua opinião, insignificantes.

No que se refere ao objetivo de problematizar a questão da nomenclatura que

se passa a utilizar a partir da referida resolução para nomear o que vínhamos

chamando de bacharel em Educação Física, as opiniões são convergentes ao

considerarem o termo graduado como inadequado para se referir ao que se

chamava bacharel em Educação Física, podendo gerar confusões. Os seus

argumentos em relação à crítica que fazem à adoção do termo graduado podem ser

distintas, indo desde o entendimento de que o termo não diz nada, passando pela

idéia de que essa foi uma decisão para consumo externo, até o entendimento de

que o nome gera uma grande confusão, uma vez que graduado é todo aquele que

conclui um curso superior. Novamente, há uma posição dissonante, que não vê

nenhum problema no uso dessa terminologia.

Outro objetivo da pesquisa foi diagnosticar se há uma mudança em termos de

aumento de qualidade da formação ofertada a partir da cristalização da separação

entre licenciado e graduado em Educação Física. De novo não há unanimidade

nessa discussão. Alguns entrevistados afirmam que houve um incremento qualitativo

para ambas as formações, outro não acredita na melhora da qualidade após a

separação e comenta que os processos se qualificaram mais pela gestão do que

pelo processo em si de mudança, outro aponta que essa questão daria uma boa

pesquisa, dando a idéia de que a fase é de experiência, enquanto outro assume que

a mudança é extremamente positiva para a comunidade que estaria sendo atendida

por um profissional (graduado) mais especializado na área. Aqui cabe ressaltar

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também o entendimento de que os processos qualitativos não decorrem

exclusivamente da imposição de leis, e sim dos gestores qualificados dos cursos.

No que se refere ao objetivo de investigar se houve mudanças no trabalho do

professor universitário que se ocupa da formação dos novos profissionais em

Educação Física. Isto é, interrogar acerca de uma possível mudança de ênfase,

digamos, de uma formação mais técnica, reservado aos graduandos, para uma

formação mais pedagógica, dirigida aos licenciandos, a divisão na formação em

Educação Física parece não ter feito com que com que o trabalho do professor

universitário desse uma maior ênfase técnica para o graduado e uma maior ênfase

pedagógica para o licenciado. Os cursos em Educação Física não pioraram ou

melhoraram. Mas é relevante, pelo que os entrevistados relatam, que pós-divisão os

cursos não são caracterizados por ter uma formação inteiramente separada entre

graduação e licenciatura. O que se destaca é a ênfase que talvez seja dada a um

curso ou outro em algumas disciplinas apenas. Novamente essa questão da ênfase

deriva antes do amadurecimento dos gestores e professores formadores do que da

divisão instituída pela legislação. O que fica dessa questão é a noção de que o

professor, que atua junto a graduando e licenciandos, em suas aulas não pode

somente tomar como exemplos apenas o campo da educação escolar nessas

disciplinas que são, em sua imensa maioria, compartilhadas por estudantes das

duas formações.

Quanto ao objetivo que buscava analisar os fatores que contribuíram para a

divisão licenciatura-graduação em educação física, não se percebe um consenso

nas respostas. Entretanto, ressaltam-se as vozes eloquentes de dois entrevistados

que afirmam que as questões políticas foram determinantes para a separação na

formação, sendo entendido como o lobby do Conselho Federal de Educação Física

no Congresso Nacional. Temos, pois, a força de corporações que nos últimos

tempos tem tentado inclusive ampliar seu poder fiscalizador e normativo para o

campo profissional dos professores de Educação Física, como é exatamente o caso

do Conselho Regional de Educação Física do Rio Grande do Sul 7.

7 Refiro-me aos acontecimentos recentes de constrangimento de professores em seus locais de trabalho, por parte do Conselho Regional de Educação Física do Rio Grande do Sul. Quando não comprovado o registro no Conselho, os professores são notificados, recebendo prazo para regularização e, até mesmo, sendo ameaçados de uso da força policial para retirá-los do ambiente de trabalho. O Sinpro (Sindicato dos Professores do Estado do Rio Grande do SUL) emitiu parecer

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Concluindo, o professor, ou a formação do professor de educação física que é

instituída a partir da separação entre as modalidades graduado em Educação Física

e licenciado em Educação Física parece ainda exigir que seja tomada como objeto

de pesquisas longitudinais. Se considerarmos o conteúdo das entrevistas aqui

analisadas, nos damos conta que ainda estamos temporalmente muito próximos da

mudança instituída pela Resolução 7/2004 (BRASIL, 2004) para fazermos uma

avaliação mais consistente acerca da formação que decorreria dessa legislação. O

que fica é o entendimento de que o núcleo da formação continua sendo a docência.

E isso, pelo menos se consideramos a maioria dos depoimentos, parece se estender

para a formação, a graduação em Educação Física. Para além de maior ou menor

concordância dos coordenadores de cursos com os preceitos da lei, sobretudo com

o nome que substitui o antigo bacharelado; para além da maior ou menor

identificação com as corporações profissionais, o que fica é a compreensão de que

as mudanças, inclusive curriculares, são mais de superfície. O que parece

dominante é o entendimento de que as pressões políticas não conseguiram afetar

em profundidade a identidade dos cursos de Educação Física, uma vez que os

documentos legais não tem todo o poder que poderíamos supor.

Os formadores procuram não diferenciar muito os cursos, e sim aproximá-los

não fazendo distinção entre graduando e licenciando, encarando-os como

professores com as mesmas exigências nos processos formativos, e às vezes pelo

mesmo professor que forma graduados e licenciados. A diferença no modelo de

formação é pontual em algumas disciplinas mais técnicas e o estágio curricular na

área não-escolar, reservada aos graduandos. Na realidade, oitenta por cento dos

cursos são iguais e se por acaso, este voltar à formação antiga, por exemplo, de

uma licenciatura ampla, cabe ao licenciado fazer os estágios previstos para o

graduado e mais algumas disciplinas. E para o graduado fazer somente os estágios

do curso de licenciatura.

Fica, pois, o entendimento extraído da maioria dos entrevistados, de que as

mudanças na formação do professor em Educação Física não são significativas,

uma vez que as bases epistemológicas dos saberes do campo e a articulação em

apontando a ilegalidade de tais atos, uma vez que não é obrigatório o registro de professores junto ao Conselho, e está entrando com denúncia junto à procuradoria do Ministério Público Federal no mês de novembro. (Disponível em: http://www.sinprors.org.br/arquivos/9_11_2011_parecer_complementar_e.pdf)

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torno da docência, isto é, dos processos de ensinar e aprender continua dando

unidade aos processos formativos, inclusive dos graduados em Educação Física.

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APÊNDICE A – Roteiro de Entrevista

1) Como você avalia os impactos da Resolução 07/2004 (Diretrizes Curriculares Nacionais para a Ed. Física) na formação de professores de Educação Física, em particular, e na identidade do curso de Educação Física, em geral?

2) Qual sua avaliação do termo graduado em Educação Física? Ele não é professor? Mas ser graduado em Educação Física e não ser professor não lhe parece meio paradoxal?

3) Há uma mudança qualitativa nos processos formativos a partir dessa separação Graduado-Licenciado? Para quem? Para os graduados? Para os licenciados? Para ambos?

4) Como fica o trabalho do professor universitário que atua tanto na formação de graduados como de licenciados? Há uma mudança de ênfase, digamos, de uma formação mais técnica, reservado aos graduandos, para uma formação mais pedagógica, dirigida aos licenciandos?

5) Há que fatores (sociais, históricos, econômicos, culturais) você atribui a separação graduado – licenciado imposta pela Resolução Nº 7/2004?

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ANEXO A – Resolução n° 03 de 16 de junho de 1987

CONSELHO FEDERAL DE EDUCAÇÃO

(*) RESOLUÇÃO Nº 03, DE 16 DE JUNHO DE 1987

Fixa os mínimos de conteúdo e duração a serem observados nos cursos de graduação em Educação

Física (Bacharelado e/ou Licenciatura Plena).

O Presidente do Conselho Federal de Educação, no uso de suas atribuições legais e

com base no que dispõe o Artigo 26 da Lei 5.540/68, tendo em vista o Parecer

215/87, homologado pelo Sr. Ministro da Educação, em 10/6/87,

RESOLVE:

Art. 1º A formação dos profissionais de Educação Física será feita em curso de

graduação que conferirá o titulo de Bacharel e/ou Licenciado em Educação Física.

Art. 2º Os currículos plenos dos cursos de graduação em Educação Física serão

elaborados pelas instituições de ensino superior, objetivando:

a) possibilitar a aquisição integrada de conhecimentos e técnicas que permitam uma

nos campos da Educação Escolar (pré-escolar, 1º, 2º e 3º graus) e Não-Escolar

(academias, clubes, centros comunitários/condomínios etc),

b) desenvolver atitudes éticas, reflexivas, críticas, inovadoras e democráticas;

c) prover o aprofundamento das áreas de conhecimento, de interesse e de aptidão

do aluno, estimulando-o ao aperfeiçoamento continuo;

d) propiciar a auto-realização do estudante, como pessoa e como profissional.

Art. 3º Os currículos plenos para os cursos de graduação em Educação Física terão

duas partes:

a) Formação Geral (humanística e técnica)

b) Aprofundamento de Conhecimentos

§ 1º Na Formação Geral serão consideradas as seguintes áreas de conhecimento:

a) De cunho humanístico.

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CONHECIMENTO FILOSÓFICO

- compreendido como conhecimento filosófico o resultado de reflexão sobre a

realidade, seja no nível da práxis,a própria existência cotidiana do profissional de

Educação Física, relacionada com eventos históricos, sociais, políticos, econômicos,

seja no nível da teoria, apresentação rigorosa através das ciências dessa mesma

práxis. O conhecimento filosófico deve consistir na articulação da práxis pedagógica

com as teorias sobre o homem, a sociedade e a técnica.

CONHECIMENTO DO SER HUMANO

- entendido como o conjunto de conhecimentos sobre o ser humano, durante todo

seu ciclo vital, no que concerne aos seus aspectos biológicos e psicológicos, bem

como sua interação com o meio ambiente, face à presença ou ausência de

atividades de Educação Física.

CONHECIMENTO DA SOCIEDADE

- entendido como a compreensão da natureza social das instituições, sistemas e

processos, com vistas a uma efetiva contribuição da Educação Física para o

desenvolvimento do indivíduo e da sociedade, considerando-se especificamente a

realidade brasileira.

b) De cunho técnico (que deverá ser desenvolvido de forma articulada com os

conhecimentos das áreas de cunho humanístico acima referidas).

CONHECIMENTO TÉCNICO

- entendido como o conjunto de conhecimentos e competências para planejar,

executar, orientar e avaliar atividades da Educação Física, nos campos da Educação

Escolar e Não –Escolar contribuindo para a geração e a transformação do próprio

conhecimento técnico.

§ 2º Cada Instituição de Ensino Superior (IES), partindo dessas quatro áreas, elenco

de disciplinas da parte de Formação Geral do currículo pleno, considerando as

peculiaridades de cada região e os perfis profissionais desejado (Bacharelado e/ou

Licenciatura Plena).

§ 3º A parte do currículo pleno denominada Aprofundamento de Conhecimento

deverá atender aos interesses dos alunos, criticar e projetar o mercado de trabalho

considerando as peculiaridades de cada região e os perfis profissionais desejados.

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Será composto por disciplinas selecionadas pelas IES e desenvolvidas de forma

teórico-prática, permitindo a vivência de experiências no campo real de trabalho.

§ 4º As IES deverão estabelecer os marcos conceituais fundamentais dos perfis

profissionais desejados, elaborar os ementas, fixar a carga horária para cada

disciplina, e sua respectiva denominação, bem como enriquecer o currículo pleno,

contemplando as peculiaridades regionais.

Art. 4º O curso de graduação em Educação Física terá a duração mínima de 4 anos

(ou 8 semestres letivos ) e máxima de 7 anos (ou 14 semestres letivos),

compreendendo uma carga horária de 2.880 horas/aula.

§ 1º Desse total de 2.880 horas/aula, pelo menos 80% (oitenta por centro) serão

destinadas à Formação Geral e o máximo de 20 % (vinte por centro) para

Aprofundamento de Conhecimentos.

§ 2º Desses 80% das horas destinadas à Formação Geral, 80% deverão ser

dedicados às disciplinas vinculadas ao Conhecimento Técnico.

§ 3º No mínimo de 2.880 horas/aula previstas, estão incluídas as destinadas ao

Estágio Supervisionado e excluídas as correspondentes às disciplinas que são ou

venham a ser obrigatórias, por força de legislação específica (ex. EPB).

Art. 5º O Estágio Curricular, com a duração mínima de um semestre letivo, será

obrigatório tanto nas Licenciaturas como nos Bacharelados, devendo, para estes,

ser complementado com a apresentação de uma monografia (“Trabalho de

Conclusão”).

Art. 6º A adaptação do currículo baixado pela Resolução 69/69 ao currículo ora

aprovado far-se-á por via regimental, segundo os recursos e interesses de cada

Instituição, dentro do prazo máximo de 2 anos, a partir da data da publicação desta

Resolução.

Parágrafo único. As adaptações regimentais das instituições de ensino superior, que

mantém cursos de Educação Física, serão apreciadas pelos respectivos Conselhos

de Educação.

Art. 6º - A Adaptação do currículo baixado pela Resolução 69/69 ao currículo ora

aprovado far-se-á por via regimental, segundo os recursos e interesse de cada

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instituição, até o prazo máximo de janeiro de 1990, sem prejuízo de sua

implantação, em 1989, nas entidades que assim possam proceder.

Parágrafo único – As adaptações regimentais a que se refere o caput deste artigo

serão apreciadas pelos respectivos Conselhos de Educação. (Nova Redação dada

pela Resolução nº 03/88-CFE)

Art. 7º Os graduados em Educação Física (bacharéis e/ou licenciados), através de

cursos específicos realizados a nível de especialização, poderão habilitar-se à

titulação de Técnico Desportivo.

Art. 8º A presente Resolução entra em vigor na data de sua publicação, revogada a

Resolução 69, de 6/11/69, deste Conselho, e demais disposições em contrário.

FERNANDO AFFONSO GAY DA FONSECA

(*) Republicada por ter saído com incorreção do original.

(Of. nº 575 / 87)

Publicado no DOU de 10.09.1987

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ANEXO B – Lei n° 9.696 de 1 de setembro de 1998.

LEI Nº 9.696, DE 1 DE SETEMBRO DE 1998

Dispõe sobre a regulamentação da Profissão de Educação Física e cria os respectivos

Conselho Federal e Conselhos Regionais de Educação Física.

O PRESIDENTE DA REPÚBLICA Faço saber que o Congresso Nacional decreta e

eu sanciono a seguinte Lei:

Art. 1° O exercício das atividades de Educação Físi ca e a designação de Profissional

de Educação Física é prerrogativa dos profissionais regularmente registrados nos

Conselhos Regionais de Educação Física.

Art. 2° Apenas serão inscritos nos quadros dos Cons elhos Regionais de Educação

Física os seguintes profissionais:

I - os possuidores de diploma obtido em curso de Educação Física, oficialmente

autorizado ou reconhecido;

II - os possuidores de diploma em Educação Física expedido por instituição de

ensino superior estrangeira, revalidado na forma da legislação em vigor;

III - os que, até a data do início da vigência desta Lei, tenham comprovadamente

exercido atividades próprias dos Profissionais de Educação Física, nos termos a

serem estabelecidos pelo Conselho Federal de Educação Física.

Art. 3° Compete ao Profissional de Educação Física coordenar, planejar, programar,

supervisionar, dinamizar, dirigir, organizar, avaliar e executar trabalhos, programas,

planos e projetos, bem como prestar serviços de auditoria, consultoria e assessoria,

realizar treinamentos especializados, participar de equipes multidisciplinares e

interdisciplinares e elaborar informes técnicos, científicos e pedagógicos, todos nas

áreas de atividades físicas e do desporto.

Art. 4° São criados o Conselho Federal e os Conselh os Regionais de Educação

Física.

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Art. 5° Os primeiros membros efetivos e suplentes d o Conselho Federal de

Educação Física serão eleitos para um mandato tampão de dois anos, em reunião

das associações representativas de Profissionais de Educação Física, criadas nos

termos da Constituição Federal, com personalidade jurídica própria, e das

instituições superiores de ensino de Educação Física, oficialmente autorizadas ou

reconhecidas, que serão convocadas pela Federação Brasileira das Associações

dos Profissionais de Educação Física - FBAPEF, no prazo de até noventa dias após

a promulgação desta Lei.

Art. 6° Esta Lei entra em vigor na data de sua publ icação.

Brasília, 1 de setembro de 1998; 177° da Independên cia e 110° da República.

FERNANDO HENRIQUE CARDOSO

Edward Amadeo

Este texto não substitui o publicado no D.O.U de 2.9.1998

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ANEXO C - Resolução n° 7 de 31 de março de 2004

RESOLUÇÃO N° 7 DE 31 DE MARÇO DE 2004

CONSELHO NACIONAL DE EDUCAÇÃO

CÂMARA DE EDUCAÇÃO SUPERIOR

Institui as Diretrizes Curriculares Nacionais

para os cursos de graduação em Educação

Física, em nível superior de graduação plena.

O Presidente da Câmara de Educação Superior do Conselho Nacional de

Educação, tendo em vista o disposto no Art. 9º, do § 2º, alínea “c”, da Lei 9.131, de

25 de novembro de 1995, e com fundamento no Parecer CNE/CES 58/2004, de 18

de fevereiro de 2004, peça indispensável do conjunto das presentes Diretrizes

Curriculares Nacionais, homologado pelo Senhor Ministro de Estado da Educação

em 18 de março de 2004, resolve:

Art. 1º A presente Resolução institui as Diretrizes Curriculares Nacionais para

o curso de graduação em Educação Física, em nível superior de graduação plena,

assim como estabelece orientações específicas para a licenciatura plena em

Educação Física, nos termos definidos nas Diretrizes Curriculares Nacionais para a

Formação de Professores da Educação Básica.

Art. 2º As Diretrizes Curriculares Nacionais para a formação de graduados em

Educação Física definem os princípios, as condições e os procedimentos para a

formação dos profissionais de Educação Física, estabelecidos pela Câmara de

Educação Superior do Conselho Nacional de Educação, para aplicação em âmbito

nacional na organização, no desenvolvimento e na avaliação do projeto pedagógico

dos cursos de graduação em Educação Física das Instituições do Sistema de Ensino

Superior.

Art. 3º A Educação Física é uma área de conhecimento e de intervenção

acadêmico-profissional que tem como objeto de estudo e de aplicação o movimento

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humano, com foco nas diferentes formas e modalidades do exercício físico, da

ginástica, do jogo, do esporte, da luta/arte marcial, da dança, nas perspectivas da

prevenção de problemas de agravo da saúde, promoção, proteção e reabilitação da

saúde, da formação cultural, da educação e da reeducação motora, do rendimento

físico-esportivo, do lazer, da gestão de empreendimentos relacionados às atividades

físicas, recreativas e esportivas, além de outros campos que oportunizem ou

venham a oportunizar a prática de atividades físicas, recreativas e esportivas.

Art. 4º O curso de graduação em Educação Física deverá assegurar uma

formação generalista, humanista e crítica, qualificadora da intervenção acadêmico-

profissional, fundamentada no rigor científico, na reflexão filosófica e na conduta

ética.

§ 1º O graduado em Educação Física deverá estar qualificado para analisar

criticamente a realidade social, para nela intervir acadêmica e profissionalmente por

meio das diferentes manifestações e expressões do movimento humano, visando a

formação, a ampliação e o enriquecimento cultural das pessoas, para aumentar as

possibilidades de adoção de um estilo de vida fisicamente ativo e saudável.

§ 2º O Professor da Educação Básica, licenciatura plena em Educação Física,

deverá estar qualificado para a docência deste componente curricular na educação

básica, tendo como referência a legislação própria do Conselho Nacional de

Educação, bem como as orientações específicas para esta formação tratadas nesta

Resolução.

Art. 5º A Instituição de Ensino Superior deverá pautar o projeto pedagógico do

curso de graduação em Educação Física nos seguintes princípios:

a) autonomia institucional;

b) articulação entre ensino, pesquisa e extensão;

c) graduação como formação inicial;

d) formação continuada;

e) ética pessoal e profissional;

f) ação crítica, investigativa e reconstrutiva do conhecimento;

g) construção e gestão coletiva do projeto pedagógico;

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h) abordagem interdisciplinar do conhecimento;

i) indissociabilidade teórico-prática;

j) articulação entre conhecimentos de formação ampliada e específica.

Art. 6º As competências de natureza político-social, éticomoral, técnico-

profissional e científica deverão constituir a concepção nuclear do projeto

pedagógico de formação do graduado em Educação Física.

§ 1º A formação do graduado em Educação Física deverá ser concebida,

planejada, operacionalizada e avaliada visando a aquisição e desenvolvimento das

seguintes competências e habilidades:

- Dominar os conhecimentos conceituais, procedimentais e atitudinais

específicos da Educação Física e aqueles advindos das ciências afins, orientados

por valores sociais, morais, éticos e estéticos próprios de uma sociedade plural e

democrática.

- Pesquisar, conhecer, compreender, analisar, avaliar a realidade social para

nela intervir acadêmica e profissionalmente, por meio das manifestações e

expressões do movimento humano, tematizadas, com foco nas diferentes formas e

modalidades do exercício físico, da ginástica, do jogo, do esporte, da luta/arte

marcial, da dança, visando a formação, a ampliação e enriquecimento cultural da

sociedade para aumentar as possibilidades de adoção de um estilo de vida

fisicamente ativo e saudável.

- Intervir acadêmica e profissionalmente de forma deliberada, adequada e

eticamente balizada nos campos da prevenção, promoção, proteção e reabilitação

da saúde, da formação cultural, da educação e reeducação motora, do rendimento

físico-esportivo, do lazer, da gestão de empreendimentos relacionados às atividades

físicas, recreativas e esportivas, além de outros campos que oportunizem ou

venham a oportunizar a prática de atividades físicas, recreativas e esportivas.

- Participar, assessorar, coordenar, liderar e gerenciar equipes

multiprofissionais de discussão, de definição e de operacionalização de políticas

públicas e institucionais nos campos da saúde, do lazer, do esporte, da educação,

da segurança, do urbanismo, do ambiente, da cultura, do trabalho, dentre outros.

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- Diagnosticar os interesses, as expectativas e as necessidades das pessoas

(crianças, jovens, adultos, idosos, pessoas portadoras de deficiência, de grupos e

comunidades especiais) de modo a planejar, prescrever, ensinar, orientar,

assessorar, supervisionar, controlar e avaliar projetos e programas de atividades

físicas, recreativas e esportivas nas perspectivas da prevenção, promoção, proteção

e reabilitação da saúde, da formação cultural, da educação e reeducação motora, do

rendimento físico-esportivo, do lazer e de outros campos que oportunizem ou

venham a oportunizar a prática de atividades físicas, recreativas e esportivas.

- Conhecer, dominar, produzir, selecionar e avaliar os efeitos da aplicação de

diferentes técnicas, instrumentos, equipamentos, procedimentos e metodologias

para a produção e a intervenção acadêmico- profissional em Educação Física nos

campos da prevenção, promoção, proteção e reabilitação da saúde, da formação

cultural, da educação e reeducação motora, do rendimento físico-esportivo, do lazer,

da gestão de empreendimentos relacionados às atividades físicas, recreativas e

esportivas, além de outros campos que oportunizem ou venham a oportunizar a

prática de atividades físicas, recreativas e esportivas.

- Acompanhar as transformações acadêmico-científicas da Educação Física e

de áreas afins mediante a análise crítica da literatura especializada com o propósito

de contínua atualização e produção acadêmico-profissional.

- Utilizar recursos da tecnologia da informação e da comunicação de forma a

ampliar e diversificar as formas de interagir com as fontes de produção e de difusão

de conhecimentos específicos da Educação Física e de áreas afins, com o propósito

de contínua atualização e produção acadêmico-profissional.

§ 2º As Instituições de Ensino Superior poderão incorporar outras

competências e habilidades que se mostrem adequadas e coerentes com seus

projetos pedagógicos.

§ 3º A definição das competências e habilidades gerais e específicas que

caracterizarão o perfil acadêmico-profissional do Professor da Educação Básica,

licenciatura plena em Educação Física, deverá pautar-se em legislação própria do

Conselho Nacional de Educação.

Art. 7º Caberá à Instituição de Ensino Superior, na organização curricular do

curso de graduação em Educação Física, articular as unidades de conhecimento de

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formação específica e ampliada, definindo as respectivas denominações, ementas e

cargas horárias em coerência com o marco conceitual e as competências e

habilidades almejadas para o profissional que pretende formar.

§ 1º A Formação Ampliada deve abranger as seguintes dimensões do

conhecimento:

a) Relação ser humano-sociedade

b) Biologia do corpo humano

c) Produção do conhecimento científico e tecnológico

§ 2º A Formação Específica, que abrange os conhecimentos identificadores

da Educação Física, deve contemplar as seguintes dimensões:

a) Culturais do movimento humano

b) Técnico-instrumental

c) Didático-pedagógico

§ 3º A critério da Instituição de Ensino Superior, o projeto pedagógico do

curso de graduação em Educação Física poderá propor um ou mais núcleos

temáticos de aprofundamento, utilizando até 20% da carga horária total, articulando

as unidades de conhecimento e de experiências que o caracterizarão.

§ 4º As questões pertinentes às peculiaridades regionais, às identidades

culturais, à educação ambiental, ao trabalho, às necessidades das pessoas

portadoras de deficiência e de grupos e comunidades especiais deverão ser

abordadas no trato dos conhecimentos da formação do graduado em Educação

Física.

Art. 8º Para o Curso de Formação de Professores da Educação Básica,

licenciatura plena em Educação Física, as unidades de conhecimento específico que

constituem o objeto de ensino do componente curricular Educação Física serão

aquelas que tratam das dimensões biológicas, sociais, culturais, didático-

pedagógicas, técnicoinstrumentais do movimento humano.

Art. 9º O tempo mínimo para integralização do curso de graduação em

Educação Física será definido em Resolução específica do Conselho Nacional de

Educação.

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Art. 10. A formação do graduado em Educação Física deve assegurar a

indissociabilidade teorico-prática por meio da prática como componente curricular,

estágio profissional curricular supervisionado e atividades complementares.

§ 1º A prática como componente curricular deverá ser contemplada no projeto

pedagógico, sendo vivenciada em diferentes contextos de aplicação acadêmico-

profissional, desde o início do curso.

§ 2º O estágio profissional curricular representa um momento da formação em

que o graduando deverá vivenciar e consolidar as competências exigidas para o

exercício acadêmico-profissional em diferentes campos de intervenção, sob a

supervisão de profissional habilitado e qualificado, a partir da segunda metade do

curso.

I - o caso da Instituição de Ensino Superior optar pela proposição de núcleos

temáticos de aprofundamento, como estabelece o Art. 7º, § 1º desta Resolução,

40% da carga horária do estágio profissional curricular supervisionado deverá ser

cumprida no campo de intervenção acadêmico-profissional correlato.

§ 3º As atividades complementares deverão ser incrementadas ao longo do

curso, devendo a Instituição de Ensino Superior criar mecanismos e critérios de

aproveitamento de conhecimentos e de experiências vivenciadas pelo aluno, por

meio de estudos e práticas independentes, presenciais e/ou a distância, sob a forma

de monitorias, estágios extracurriculares, programas de iniciação científica,

programas de extensão, estudos complementares, congressos, seminários e cursos.

§ 4º A carga horária para o desenvolvimento das experiências aludidas no

caput deste Artigo será definida em Resolução específica do Conselho Nacional de

Educação.

Art. 11. Para a integralização da formação do graduado em Educação Física

poderá ser exigida, pela instituição, a elaboração de um trabalho de curso, sob a

orientação acadêmica de professor qualificado.

Art. 12. Na organização do curso de graduação em Educação Física deverá

ser indicada a modalidade: seriada anual, seriada semestral, sistema de créditos ou

modular.

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Art. 13. A implantação e o desenvolvimento do projeto pedagógico do curso

de graduação em Educação Física deverão ser acompanhados e permanentemente

avaliados institucionalmente, a fim de permitir os ajustes que se fizerem necessários

a sua contextualização e aperfeiçoamento.

§ 1º A avaliação deverá basear-se no domínio dos conteúdos e das

experiências, com vistas a garantir a qualidade da formação acadêmico-profissional,

no sentido da consecução das competências político-sociais, ético-morais, técnico-

profissionais e científicas.

Art. 14. A duração do curso de graduação em Educação Física será

estabelecida em Resolução específica da Câmara de Educação Superior.

Art. 15. Esta Resolução entra em vigor na data de sua publicação, revogadas

as disposições em contrário.

EDSON DE OLIVEIRA NUNES

Em exercício

Publicado no D O U em 5 de abril de 2004.