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UNIVERSIDADE DO SUL DE SANTA CATARINA MARINA SÃO THIAGO SOARES A RESPONSABILIDADE CIVIL DO CIRURGIÃO DENTISTA: O DANO CAUSADO NAS CIRURGIAS DE HARMONIZAÇÃO OROFACIAL Florianópolis 2020

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UNIVERSIDADE DO SUL DE SANTA CATARINA

MARINA SÃO THIAGO SOARES

A RESPONSABILIDADE CIVIL DO CIRURGIÃO DENTISTA:

O DANO CAUSADO NAS CIRURGIAS DE HARMONIZAÇÃO OROFACIAL

Florianópolis

2020

MARINA SÃO THIAGO SOARES

RESPONSABILIDADE CIVIL DO CIRURGIÃO DENTISTA:

O DANO CAUSADO NAS CIRURGIAS DE HARMONIZAÇÃO OROFACIAL

Trabalho de Conclusão de Curso apresentado

ao Curso de Graduação em Direito, da

Universidade do Sul de Santa Catarina, como

requisito parcial para obtenção do título de

Bacharel em Direito.

Orientador: Profª M.a. Carla Fernanda Zanata Soares.

Florianópolis

2020

MARINA SÃO THIAGO SOARES

RESPONSABILIDADE CIVIL DO CIRURGIÃO DENTISTA:

O DANO CAUSADO NAS CIRURGIAS DE HARMONIZAÇÃO OROFACIAL

Este Trabalho de Conclusão de Curso foi

julgado adequado à obtenção do título de

Bacharel em Direito e aprovado em sua forma

final pelo Curso de Graduação em Direito, da

Universidade do Sul de Santa Catarina.

Florianópolis, 20 de novembro de 2020.

______________________________________________________

Professor e orientador Profª M.a. Carla Fernanda Zanata Soares

Universidade do Sul de Santa Catarina

______________________________________________________

Prof. Nome do Professor, titulação

Universidade do Sul de Santa Catarina

______________________________________________________

Prof. Nome do Professor, titulação

Universidade do Sul de Santa Catarina

TERMO DE ISENÇÃO DE RESPONSABILIDADE

RESPONSABILIDADE CIVIL DO CIRURGIÃO DENTISTA:

O DANO CAUSADO NAS CIRURGIAS DE HARMONIZAÇÃO OROFACIAL

Declaro, para todos os fins de direito, que assumo total responsabilidade pelo aporte

ideológico e referencial conferido ao presente trabalho, isentando a Universidade do Sul de

Santa Catarina, a Coordenação do Curso de Direito, a Banca Examinadora e o Orientador de

todo e qualquer reflexo acerca deste Trabalho de Conclusão de Curso.

Estou ciente de que poderei responder administrativa, civil e criminalmente em caso de

plágio comprovado do trabalho monográfico.

Florianópolis, 20 de novembro de 2020.

____________________________________

MARINA SÃO THIAGO SOARES

Dedico esse trabalho à minha família, em

especial aos meus pais, Carlos e Patrícia, que

construíram a fundação da minha vida,

lastreada em caráter, honestidade e ética. Aos

meus irmãos, Lucas e Joana, por me

desafiarem, sempre. Ao meu companheiro,

Felipe, por me dar tanto amor e nunca ter

largado a minha mão, nos momentos bons e

também nos difíceis.

AGRADECIMENTOS

Neste momento, olhando para a minha tortuosa trajetória acadêmica, eu poderia elencar

muitas pessoas a quem eu gostaria de agradecer, mas vou me ater àqueles que estiveram junto

comigo, como presença presente, sem os quais eu não estaria aqui apresentando este Trabalho

de Conclusão de Curso.

Eu agradeço aos meus pais, Carlos e Patrícia, por me darem a vida. Por na minha

educação terem me fornecido os instrumentos, as ferramentas, para encarar o mundo com olhar

crítico, analítico e por último, mas definitivamente não menos importante, um olhar otimista.

Obrigada por respeitarem meus limites, mas também por sempre terem me incentivando a

ultrapassá-los. Eu amo vocês!

Ao meu irmão, Lucas, por ser um exemplo de profissional resiliente, capaz e dedicado.

Saiba que és uma inspiração pra mim.

À minha caçula, minha princesa, minha melhor amiga, Joana, por ser essa pessoa

presente e amorosa na minha vida.

Ao meu cunhado, Vinícius, por ser tão diferente nas posições, mas tão parecido na

intensidade, no coração e na condição de estar de presença presente no viver a vida. Obrigada

por criticar e me fazer criticar.

Ao meu grande amor, Felipe, companheiro que eu escolhi para compartilhar a vida.

Agradeço pela parceria, pelo cuidado e, em especial nesse momento, por sempre ser o primeiro

a acreditar em mim: “se tu queres, tu podes, o que não te falta é competência”. Sem dúvida isso

fez toda a diferença! A minha trilha teria sido muito mais difícil, sem te ter ao meu lado.

À minha professora orientadora Carla, que eu quase enlouqueci nesse processo, eu

queria dizer que nunca, em momento algum, me senti sozinha. Obrigada por me respeitar,

obrigada por construir esse projeto junto comigo, com certeza esse trabalho ainda estaria na

minha cabeça, se eu não te tivesse como guia. Saiba que tens um lugar muito especial no meu

coração.

LISTA DE SIGLAS

CC - Código Civil

CD - Cirurgião Dentista

CDC - Código de Defesa do Consumidor

CF - Constituição Federal

CFO - Conselho Federal de Odontologia

CPC - Código de Processo Civil

DJSC - Diário de Justiça de Santa Catarina

DJESP - Diário de Justiça Especial

DTM - Disfunção Temporomndibular

MEC - Ministério da Educação

MS - Mandado de Segurança

NCC - Novo Código Civil

REsp - Recurso Especial

STJ - Superior Tribunal de Justiça

TJDF - Tribunal de Justiça do Distrito Federal

TJSC - Tribunal de Justiça do Estado de Santa Catarina

TJSP - Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo

UNESP - Universidade Estadual Paulista

UniFOA - Centro Universitário de Volta Redonda

“Viver, e não ter a vergonha de ser feliz. Cantar e cantar e cantar, a beleza de ser

um eterno aprendiz” (Gonzaguinha).

RESUMO

Este trabalho de conclusão de curso possui como objetivo debater as questões relacionadas à

possibilidade de insegurança jurídica gerada pela incerteza da caracterização da natureza

obrigacional da responsabilidade civil do cirurgião-dentista nas Cirurgias de Harmonização

Orofacial realizadas no Brasil, no período de 2019 até 2020. Desde o recente reconhecimento

da Harmonização Orofacial como sendo uma especialidade da Odontologia, é flagrante a

fragilidade da norma regulamentadora de tal atividade no Brasil, por possuir um vácuo no que

concerne a caracterização de sua natureza obrigacional para responsabilização civil do

profissional, gerando uma certa insegurança jurídica para o atendido, seja ele paciente ou cliente

que busca pelo trabalho estético, com base na confiança de um trabalho médico-odontológico.

Com abordagem monodisciplinar e dedutiva, o objetivo central do trabalho é verificar se há um

certo grau de insegurança jurídica na entrega serviço fornecido pelo cirurgião dentista, qual

seja, a cirurgia de harmonização orofacial, para o seu cliente/paciente, que se depreende da

forma como é regulamentada a atividade como uma especialidade odontológica pelas

Resoluções nº 198/2019 e nº 230/2020 combinadas e interpretadas em conjunto com a

Constituição Federal, Código Civil e Código de Defesa do Consumidor, bem como da análise

jurisprudencial e da produção acadêmica antecedente. A partir de Carlos Roberto Gonçalves,

Silvio Venosa, Maria Helena Diniz e Wander Pereira, da análise de uma certa parte da produção

acadêmica antecedente sobre o tema, e dos documentos que regulam o tema, surge a hipótese

de que a insegurança jurídica que pode existir na realização de tais espécies de cirurgia, pode

ser decorrente do fato de o tema ser recente, uma vez que a prática foi reconhecida como

especialidade odontológica apenas em 2019, caracterizando pouco tempo para sua

consolidação. Outra hipótese é a de que as legislações regulamentadoras do assunto não são tão

claras no sentido de definir se a obrigação é de meio ou de resultado, ou quando é de meio e

quando é de resultado, sendo possível realizar tal determinação apenas a partir de uma análise

combinada das Resoluções nº 198/2019 e nº 230/2020, com a Constituição, normas

infraconstitucionais presentes no Código Civil e no Código de Defesa do Consumidor. Como

conclusões percebe-se uma certa insegurança, gerada com origem na legislação vácua acerca

da atividade, sendo apenas possível chegar a uma caracterização da natureza obrigacional a

partir de uma análise combinada entre diversos dispositivos, bem como, com o apoio da

jurisprudência e do debate acadêmico.

Palavras-chave: Cirurgião-dentista. Responsabilidade Civil. Harmonização-Orofacial.

SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO................................................................................................................... 9

2 NOÇÕES GERAIS SOBRE RESPONSABILIDADE CIVIL ...................................... 13

2.1 ETIMOLOGIA E CONCEITO ........................................................................................ 13

2.2 PREVISÃO LEGAL DA RESPONSABILIDADE CIVIL NA CONSTITUIÇÃO

FEDERAL E NO CÓDIGO CIVIL .......................................................................................... 14

2.3 FUNDAMENTOS JURÍDICOS DA RESPONSABILIDADE CIVIL NO CÓDIGO DE

DEFESA DO CONSUMIDOR ................................................................................................ 17

2.4 ESPÉCIES DE RESPONSABILIDADE CIVIL ............................................................. 18

2.4.1 Paralelo entre responsabilidade civil e responsabilidade penal .............................. 18

2.4.2 Da responsabilidade civil objetiva, subjetiva, contratual e extracontratual ......... 19

2.5 PRESSUPOSTOS DA RESPONSABILIDADE CIVIL ................................................. 23

2.5.1 Da ação ou omissão qualificada juridicamente, culpa e dolo do agente ................ 23

2.5.2 Da necessidade de caracterização de nexo de causalidade e dano .......................... 25

2.6 A RESPONSABILIDADE CIVIL DO CIRURGIÃO DENTISTA ESPECIFICAMENTE

NO QUE CONCERNE ÀS CIRURGIAS DE HARMONIZAÇÃO OROFACIAL ................ 26

2.6.1 Princípios constitucionais e éticos da responsabilidade civil do cirurgião

dentista.....................................................................................................................................26

2.6.2 Previsão legal da responsabilidade civil no Código de Defesa do Consumidor

especificamente no que concerne ao cirurgião dentista ...................................................... 28

2.6.3 A responsabilidade civil objetiva e subjetiva, contratual e extracontratual

especificamente no que concerne ao cirurgião dentista ...................................................... 29

2.6.4 A natureza obrigacional da responsabilidade civil do cirurgião dentista como sendo

obrigação de meio ou obrigação de resultado ...................................................................... 30

3 A RESPONSABILIDADE CIVIL DO CIRURGIÃO-DENTISTA NO BRASIL A

PARTIR DO DEBATE ACADÊMICO ................................................................................ 32

3.1 O DEBATE SOBRE A RESPONSABILIDADE CIVIL DO CIRURGIÃO DENTISTA:

OBRIGAÇÃO DE MEIO ......................................................................................................... 32

3.2 A DISCUSSÃO ACERCA DA RESPONSABILIDADE CIVIL DO CIRURGIÃO

DENTISTA: OBRIGAÇÃO DE RESULTADO ...................................................................... 34

3.3 ARGUMENTOS ACERCA DA RESPONSABILIDADE CIVIL DO CIRURGIÃO

DENTISTA: OUTRAS ABORDAGENS ................................................................................ 44

4 EVIDÊNCIAS EMPÍRICAS DA RESPONSABILIDADE CIVIL DO CIRURGIÃO

DENTISTA NAS CIRURGIAS DE HARMONIZAÇÃO OROFACIAL ......................... 47

4.1 UMA ANÁLISE DA REGULAMENTAÇÃO GERAL DA ODONTOLOGIA – LEI Nº

5.081/66 .................................................................................................................................... 47

4.1.1 Principais aspectos da Resolução CFO-198/2019 ..................................................... 49

4.1.2 Elementos essenciais da Resolução CFO-230/2020 .................................................. 51

4.2 ANÁLISE DA JURISPRUDÊNCIA ACERCA DA RESPONSABILIDADE CIVIL DO

CIRURGIÃO DENTISTA NA CIRURGIA DE HARMONIZAÇÃO OROFACIAL ............ 52

4.2.1 O Reconhecimento da obrigação de resultado na jurisprudência brasileira ........ 53

4.2.2 O Reconhecimento da obrigação de meio na jurisprudência Brasileira ................ 58

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS ........................................................................................... 62

9

1 INTRODUÇÃO

O tema do presente trabalho de conclusão de curso é a análise da responsabilidade civil

do cirurgião dentista nas cirurgias de harmonização orofacial. Sabe-se que a responsabilidade

civil interfere diretamente nas relações sociais, já que está intimamente ligada aos bens das

pessoas. Como efeito dessa relação, aquele que comete ato ilícito, não deve permanecer imune,

uma vez que cada dia mais a sociedade se socorre do Poder Judiciário, para ver seus direitos

individuais ou coletivos garantidos.

Essa procura ocorre em decorrência do avanço cultural da sociedade contemporânea

brasileira, em especial da facilidade de acesso às informações veiculadas no país, sobretudo em

relação à política garantista de nossa Constituição Federal, norteada por seus princípios

fundamentais, em especial, aquele que sobreleva a dignidade da pessoa humana, o direito à

saúde e a vida.

Neste cenário, o profissional da odontologia atua diretamente, uma vez que, conforme

o juramento da graduação, seu objetivo primordial também é zelar pela saúde e vida dos

indivíduos que lhe forem confiados, notadamente, pelo seu bem estar físico e emocional.

Portanto, os profissionais desta área, devem ser responsabilizados, por suas eventuais condutas

que venham a ferir os direitos de seus pacientes.

Ainda que dificilmente um profissional da saúde irá ter a intenção de prejudicar um

paciente, em detrimento da própria profissão, essa possibilidade existe, e mesmo sem o fator

intenção, o mesmo possui a responsabilidade de arcar com sua ação se assim o fizer. Uma vez

que a responsabilidade civil, como um princípio jurídico geral, estabelece que todo homem

mentalmente são e mentalmente desenvolvido tem a obrigação de responder pelos danos que

produzir a outros. Estende-se, tal responsabilização, ao cirurgião dentista.

Destaque-se, nesse aspecto, o problema do presente trabalho evidencia-se uma vez que

atualmente, os indivíduos, sem qualquer distinção de sexo ou idade, buscam pela perfeição

estética e a beleza, amplamente, demonstrada nas redes de comunicações, o que acarretou o

aumento da procura pelos procedimentos/cirurgias de harmonização orofaciais, objetivando o

alcance do padrão de beleza desejado. Sendo assim, a referida prática, antes utilizada para tratar

os mutilados, caiu no domínio da sociedade vaidosa.

A regulamentação da prática existe, ainda que seja muito controversa, e é bastante

recente. A competência legal da profissão está prevista na legislação vigente, seja na Lei nº

5.081/66, que regula o exercício da Odontologia no Brasil, mas foi só em 2019 que a

10

Harmonização Orofacial foi regulamentada como especialidade odontológica por meio da

Resolução-CFO-198/2019.

Salienta-se que, ainda que seja uma prática bastante controversa, inclusive não

possuindo a aceitação da comunidade médica, a sociedade tem utilizado muito esse tipo de

procedimento/cirurgia. Vale frisar que a ferramenta de busca do Google registrou um aumento

de 540% (quinhentos e quarenta por cento) na pesquisa sobre harmonização orofacial de 2018

para cá, o que significa um aumento de 6 (seis) vezes na procura pelos procedimentos/cirurgias

no Brasil, com expressiva expansão no período de pandemia1.

Contudo, o resultado esperado pelos pacientes, nem sempre é alcançado e, desta forma,

na ânsia de ver seus direitos garantidos, abarrotam os Tribunais de todos os países, com ações

judiciais indenizatórias em face dos cirurgiões dentistas, sob a alegação de erro cirúrgico. Nesse

sentido pergunta-se: o dano causado nas cirurgias de harmonização orofacial realizadas por

cirurgiões dentistas caracteriza uma obrigação de meio ou de resultado? Como isso reflete na

entrega da prestação/serviço para o paciente?

A percepção deste problema no Direito Brasileiro chama atenção dos doutrinadores e

até mesmo de toda a população. É notável o aumento de pessoas insatisfeitas com seus

resultados, buscando de alguma forma ver o seu dano sanado, ou seja, o paciente busca através

do campo jurisdicional, a solução para resultado não atingido.

Ademais, os erros na área estão se tornando demasiadamente corriqueiros, pois se

identifica a imprudência, imperícia ou negligência na ocasião da realização dos procedimentos,

além da ausência de recursos seguros e aparelhagem adequada para efetivação da cirurgia.

Por outro lado, não podemos deixar de mencionar, que o erro também pode ocorrer por

parte dos pacientes, que descumprem as orientações do profissional dando causa ao posterior

resultado danoso.

Nessas circunstâncias, o objetivo geral deste trabalho é discutir e delimitar se a cirurgia

seria uma intervenção geradora de uma obrigação de meio ou de resultado, bem como sobre a

necessidade de determinação se a culpa dos dentistas é de natureza objetiva ou subjetiva, e

finalmente, sobre a possibilidade de responsabilização civil de tais profissionais.

Destarte, a responsabilidade civil tem sido ao longo dos séculos, uma das mais

importantes formas de reparação de danos materiais e morais a disposição da sociedade, pois,

1 Fonte: encontrado no endereço eletrônico https://atanews.com.br/noticia/35409/buscas-por-harmonizacao-

facial-crescem-540-nos-primeiros-meses-do-ano, acesso em: 18 de novembro de 2020.

11

através desse instituto, ela poderá discutir judicialmente, a recomposição dos prejuízos sofridos

durante ou após a intervenção cirúrgica.

A responsabilidade profissional do cirurgião-dentista pode repercutir, portanto,

concomitantemente em sanções penais, cíveis e administrativas, como sanções disciplinares

éticas no Conselho Federal ou Regional de Odontologia.

Ultrapassado isto, justifica-se a relevância do presente estudo de caso abordado neste

trabalho de conclusão de curso, uma vez que será analisada, especificamente, a atuação do

cirurgião dentista nas cirurgias de harmonização orofacial e sua responsabilização perante o seu

paciente, na hipótese de identificação de erro, durante o procedimento.

A fim de alcançar o objetivo geral do presente trabalho, os objetivos específicos são: a)

apresentar os princípios constitucionais que permeiam a responsabilidade civil; b) apresentar as

legislações pertinentes ao tema, quais sejam Código Civil, Código de Defesa do Consumidor,

Lei nº 5.081/66 e Resoluções nº 198/2019 e n º 230/2020; c) apresentar o modo como uma parte

da comunidade acadêmica e dos magistrados vem abordando o assunto.

O raciocínio empregado para o tratamento do tema, qual seja a responsabilidade civil

do cirurgião dentista nas cirurgias de harmonização orofacial, é o método dedutivo, de modo

que se parte do geral (teoria geral da responsabilidade civil) para analisar o singular (realização

de cirurgia de harmonização orofacial por cirurgiões dentistas). Quando ao campo da ciência,

trata-se de uma pesquisa monodisciplinar, uma vez que transita apenas do campo do direito

civil privado. Quanto aos seus objetivos, será uma pesquisa exploratória, no que consiste na

coleta de fontes primárias, como a Constituição Federal, Código Civil, Lei de regulamentação

da profissão do Odontólogo (Lei nº 5.081/66) bem como as resoluções de regulamentação da

especialidade de Harmonização Orofacial (Resoluções nº 198/2019 e nº 230/2020) e doutrina;

e secundárias, como artigos acadêmicos, monografia, dissertação; descritiva na medida em que

os dados coletados têm de ser tratados para que por fim possa se tornar explicativa, informando

as considerações acerca do tema. Quanto ao tipo de abordagem, trata-se de uma pesquisa

qualitativa, uma vez que após analisar os dados apresentados, confere ao trabalho um parecer

positivo ou negativo sobre o problema da pesquisa. Quanto aos procedimentos propriamente

técnicos foram empregados os métodos bibliográfico e documental, com consulta a doutrina,

manuais, artigos e publicações acadêmicas; e documental, por trazer elementos da Constituição

Federal de 1988, Código Civil, Código de Defesa do Consumidor, Lei nº 5.081/66 e Resoluções

nº 198/2019 e nº 230/2020.

O trabalho está dividido em cinco partes, quais sejam: três capítulos, uma conclusão e

as presentes considerações iniciais. No segundo capítulo, apresenta-se uma fundamentação

12

teórica, que aborda os conceitos da Responsabilidade Civil bem como a Responsabilidade Civil

quando aplicada especificamente ao profissional liberal Cirurgião Dentista, com base na

Constituição Federal, Código Civil e Código de Defesa do Consumidor. No terceiro capítulo, o

presente trabalho apresenta como a responsabilidade civil do cirurgião dentista nas cirurgias de

harmonização orofacial é abordada pela comunidade acadêmica, dividindo-se em três subitens:

os artigos que entendem por obrigação de meio; os artigos que entendem por obrigação de

resultado; os artigos que entendem que o tema é novo e merece mais tempo para melhor análise.

O quarto capítulo apresenta as regulamentações específicas da especialidade, quais sejam: as

Resoluções nº 198/2019 e nº 230/2020, bem como apresenta um apanhado de jurisprudências

acerca do tema, subdividida em dois itens: as jurisprudências que entendem por obrigação de

meio e as jurisprudências que entendem por obrigação de resultado.

13

2 NOÇÕES GERAIS SOBRE RESPONSABILIDADE CIVIL

Nesta parte do trabalho se apresentam os principais conceitos e espécies de

Responsabilidade Civil, estes utilizados para posterior análise e abordagem do tema, quais

sejam: os conceitos deste instituto bem como suas principais características, abordados através

da ótica da doutrina vigente.

2.1 ETIMOLOGIA E CONCEITO

Conforme Carlos Roberto Gonçalves, a palavra responsabilidade origina-se do latim

respondere, que traduz a ideia de recomposição, de obrigação de restituir ou ressarcir o bem

prejudicado.

Não é de hoje que a doutrina enfrenta grande dificuldade para conceituar o instituto da

responsabilidade civil. De um lado, muitos doutrinadores baseiam sua definição no conceito de

culpa, do outro existem os que a consideram em seu sentido mais amplo, que é o caso de

Josserand, citado por José de Aguiar Dias (2006, p. 22), que “considera responsável aquele que

em definitivo suporta um dano.”

Para Caio Mário da Silva Pereira (1991, p. 11) a responsabilidade civil:

consiste na efetivação da reparabilidade abstrata do dano em relação a um sujeito

passivo da relação jurídica que se forma. Reparação e sujeito passivo compõem o

binômio da responsabilidade civil, que então se enuncia como o princípio que

subordina a reparação à sua incidência na pessoa do causador do dano

Para ele, a responsabilidade civil será configurada sempre quando houver a

subordinação de um sujeito passivo à determinação de um dever de ressarcimento, não

importando se o fundamento é a culpa, ou se é independente desta.

Já para Maria Helena Diniz (2007, p. 114) a responsabilidade civil é como:

a aplicação de medidas que obriguem alguém a reparar o dano moral ou patrimonial

causado a terceiros em razão de ato do próprio imputado, de pessoa por quem ele

responde, ou de fato de coisa ou animal sob sua guarda ou, ainda, de simples

imposição legal. Definição esta que guarda, em sua estrutura, a ideia da culpa quando

se cogita da existência de ilícito (responsabilidade subjetiva), e a do risco, ou seja, a

responsabilidade sem culpa (responsabilidade objetiva)

Para Silva (2008), o instituto faz referência a uma forma obrigacional que possui

natureza contratual, ainda que esse contrato seja verbal, e que constitui uma relação entre partes

onde um se caracteriza como devedor, ao passo que o outro o credor.

Na mesma linha de pensamento, Carlos Roberto Gonçalves (2014, p. 15):

Responsabilidade exprime ideia de restauração de equilíbrio, de contraprestação, de

reparação de dano. Sendo múltiplas as atividades humanas, inúmeras são também as

14

espécies de responsabilidade, que abrangem todos os ramos do direito e extravasam

os limites da vida jurídica, para se ligar a todos os domínios da vida social.

Ainda Carlos Roberto Gonçalves (2014) bem define que esse instituto trás uma ideia de

restauração do equilíbrio, uma vez existir uma contraprestação para a reparação de um dano

causado a outrem. Ou seja, ao responsável por ter infringido determinado dano, impõe-se as

devidas consequências não desejadas (resultantes de sua conduta danosa).

Para Fábio Ulhoa Coelho (2012), a responsabilidade civil classifica-se como obrigação

não negocial, mesmo quando exista relação contratual entre credor e devedor, para ele (2012,

p. 514):

Responsabilidade civil é a obrigação em que o sujeito ativo pode exigir o pagamento

de indenização do passivo por ter sofrido prejuízo imputado a este último. Constitui -

se o vínculo obrigacional em decorrência de ato ilícito do devedor ou de fato jurídico

que o envolva. Classifica-se como obrigação não negocial.

2.2 PREVISÃO LEGAL DA RESPONSABILIDADE CIVIL NA CONSTITUIÇÃO

FEDERAL E NO CÓDIGO CIVIL

Os Direitos e Garantias Fundamentais, encontram-se regulados no Título II entre os

artigos 5º ao 17 da Constituição Federal, destinados a constituir direitos, garantias e deveres aos

cidadãos que, segundo o doutrinador José Afonso da Silva (2013), estão reunidas em três

gerações ou dimensões: individuais, civis e políticos, sociais, econômicos e culturais; difusos

e coletivos.

São prerrogativas constitucionais basilares inerentes a todos, sendo dever do próprio

povo fiscalizar a presença desses direitos à vida social. Segundo Flávio Tartuce (2012, p. 87):

Sabe-se que o Título II da Constituição Federal, sob o título ‘Dos Direitos e Garantias

Fundamentais’, traça as prerrogativas para garantir uma convivência digna, com

liberdade e com igualdade para todas as pessoas, sem distinção de raça, credo ou

origem. Tais garantias são genéricas, mas também são essenciais ao ser humano, e

sem elas a pessoa humana não pode atingir a sua plenitude e, por vezes, sequer

sobreviver.

Após o advento da Constituição Federal o direito civil foi constitucionalizado, passando

a ter uma dinâmica de usar-se a Constituição para a interpretação dos dispositivos do Código

Civil. Segundo Flávio Tartuce (2013, p. 301):

(…) Direito Constitucional e o Direito Civil são interpretados dentro de um todo e não

mais isoladamente. Todavia, essa interpretação não quer dizer que haja uma fusão de

conceitos. A norma constitucional é uma regra geral voltada para a atuação do Estado

em face da sociedade. E tendo na sociedade uma regra específica para a atuação entre

particulares, nada é mais justo do que exigir que a interpretação dessas normas

específicas seja feita em harmonia com a regra geral. Pelo Direito Civil

Constitucional, há, assim, não uma invasão do direito constitucional sobre o civil, mas

15

sim uma interação simbiótica entre eles, funcionando ambos para melhor servir o todo

Estado/Sociedade, dando as garantias para o desenvolvimento econômico, social e

político, mas respeitadas determinadas premissas que nos identificam como seres

coletivos (…) O Direito Civil Constitucional nada mais é do que a harmonização entre

os pontos de interseção do Direito Público e do Direito Privado (…) Todavia,

destaque-se que, por tal caminho metodológico, o Direito Civil não perde a sua

identidade.

Também sobre o tema, responsabilidade civil sob a ótica do Direito Civil Constitucional,

Flávio Tartuce (2013) destaca que Gustavo Tepedino apresenta três princípios básicos que

possuem correlação direta com a responsabilidade civil.

O primeiro seria o princípio da dignidade da pessoa humana, previsto no inciso III do

art. 1º da Constituição Federal e consiste na consciência que o ser humano tem de seu próprio

valor ou, ainda, a convicção de que cada ser humano tem um lugar destinado na sociedade, o

que lhe é garantido pelo direito. Para Immanuel Kant (2004), a dignidade é o valor absoluto da

própria racionalidade humana. Enquanto as coisas têm preço, as pessoas possuem dignidade e

autonomia da vontade.

Alexandre de Moraes (2004, p. 52) conceitua que dignidade humana é:

(…) um valor espiritual e moral inerente à pessoa, que se manifesta singularmente na

autodeterminação consciente e responsável da própria vida e que traz consigo a

pretensão ao respeito por parte das demais pessoas, constituindo-se um mínimo

invulnerável que todo estatuto jurídico deve assegurar, de modo que, somente

excepcionalmente, possam ser feitas limitações ao exercício dos direitos

fundamentais, mas sempre sem menosprezar a necessária estima que merecem todas

as pessoas enquanto seres humanos.

Na mesma linha de raciocínio segue Ingo Wolfgang Sarlet (2001, p. 60), a dignidade da

pessoa humana é:

(…) a qualidade intrínseca e distintiva de cada ser humano que o faz merecedor do

mesmo respeito e consideração por parte do Estado e da comunidade, implicando,

neste sentido, um complexo de direitos e deveres fundamentais que assegurem a

pessoa tanto contra todo e qualquer ato de cunho degradante e desumano, como

venham a lhe garantir as condições existenciais mínimas para uma vida saudável, além

de propiciar e promover sua participação ativa e corresponsável nos destinos da

própria existência e da vida em comunhão com os demais seres humanos.

Importante frisar que o rol presente na Constituição Federal alberga nos dispositivos

referentes aos direitos fundamentais todos aqueles que prezam pela boa convivência e dignidade

da pessoa, estando ou não no texto constitucional.

Para reconhecer o caráter exemplificativo de tais direitos, o ordenamento jurídico

brasileiro estabelece uma cláusula geral de proteção da personalidade, qual seja a dignidade da

pessoa humana, fundamento da República Federativa do Brasil, previsto no artigo 1º, inciso III,

da Constituição Federal de 1988.

16

Nesse contexto, Gustavo Tepedino (1999, p. 48) defende:

Com efeito, a escolha da dignidade da pessoa humana como fundamento da

República, associada ao objetivo fundamental da erradicação da pobreza e da

marginalização, e de redução das desigualdades sociais, juntamente com a previsão

do parágrafo 2º do artigo 5º, no sentido de não exclusão de quaisquer direitos e

garantias, mesmo que não expressos, desde que decorrentes dos princípios adotados

pelo texto maior, configuram uma verdadeira cláusula geral de tutela e promoção da

pessoa humana, tomada como valor máximo pelo ordenamento.

O segundo princípio elencado por Flávio Tatuce (2013) é o da solidariedade, que está

previsto no inciso I do art. 3º da Constituição Federal, entre os objetivos fundamentais da

República.

Conforme entendimento de Maria Berenice Dias (2009), é por meio deste princípio que

é estabelecido o compromisso pelo qual as pessoas se obrigam umas pelas outras, em comunhão

de atitudes e sentimentos. Dispõe de conteúdo ético e compreende a fraternidade e a

reciprocidade.

Na mesma obra, o terceiro princípio abordado por Flávio Tartuce (2013) ao falar sobre

responsabilidade civil, é o princípio da isonomia ou da igualdade previsto no art. 5º, caput,

da Constituição Federal, em que “todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer

natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade

do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade” (BRASIL, 1988).

Sobre o tema ensina Gustavo Tepedino (2004, p. 37-38):

A rigor, as previsões constitucionais e legislativas, dispersas e casuísticas, não logram

assegurar à pessoa proteção exaustiva, capaz de tutelar as irradiações da personalidade

em todas as suas possíveis manifestações. Com a evolução cada vez mais dinâmica

dos fatos sociais, torna-se assaz difícil estabelecer disciplina legislativa para todas as

possíveis situações jurídicas de que seja a pessoa humana titular

Com o advento do novo Código Civil (2002) a característica da Responsabilidade Civil

foi alterada, conforme Tartuce (2018), uma vez que antes a responsabilidade civil era apenas

fundada na teoria da culpa (responsabilidade subjetiva), hoje o código tende a ser mais

objetivista, como já assinalado. O que não quer dizer que a partir dele não mais temos

responsabilidade subjetiva. Para Cavalieri (2010, p. 22-23):

Estou dizendo que temos agora um sistema de responsabilidade civil prevalentemente

objetivo, porque esse, repito, é o sistema que foi sendo montado ao a responsabilidade

subjetiva tenha sido inteiramente afastada. Responsabilidade subjetiva sempre

teremos, até o juízo final, mesmo não havendo lei prevendo-a, porque essa

responsabilidade faz parte da ética, da moral, do sentimento natural de justiça. Decorre

daquele princípio superior de direito, de que ninguém deve causar dano a outrem.

Então, vale ressaltar, sempre que não tivermos disposição legal expressa consagrando

a responsabilidade objetiva, persiste a responsabilidade subjetiva, como sistema

subsidiário, como princípio universal de direito; posso não responder objetivamente

por falta de previsão legal, mas, subjetivamente, se causar dano a outrem, vou ter

sempre que responder.

17

Visto isto, o Código prevê uma cláusula geral de responsabilidade subjetiva, e esta é

encontrada conjugando o art. 927 com o art. 186. Dispõe o art. 927: “Aquele que, por ato ilícito

(arts. 186 e 187), causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo”, conforme Cavalieri (2003,

p. 35):

Em outras palavras, aquele aquele que praticar ato ilícito, fica obrigado e indenizar.

O código colocou aqui muito bem que o fato gerador da responsabilidade civil, da

obrigação de indenizar é o ato ilícito, quer na responsabilidade subjetiva, quer na

responsabilidade objetiva. Quem praticar ato ilícito, causando dano a alguém, vai ter

que reparar, vai ter que indenizar.

Seguindo a linha de raciocínio, Cavalieri bem define “ato ilícito” para então clarear a

responsabilidade civil como um todo (2003, p. 36):

E aí vem a questão: mas quando é que alguém pratica ato ilícito? Nesse mesmo

dispositivo, o Código faz remissão aos arts. 186 e 187. Temos, então, que conjugar

esses dois artigos. O art. 927 contém uma norma incompleta, que vai ter que ser

completada através da conjugação com o art. 186. Vamos ter que ler os dois artigos

juntos - um completando o outro.

2.3 FUNDAMENTOS JURÍDICOS DA RESPONSABILIDADE CIVIL NO CÓDIGO DE

DEFESA DO CONSUMIDOR

Conforme Flávio Tartuce (2018) o Código de Defesa do Consumidor concentra a

abordagem da responsabilidade civil no produto e no serviço, nesse contexto, para ele (2018,

p. 448):

[...] surgem a responsabilidade pelo vício ou pelo fato, sendo o último também

denominado de defeito. Desse modo, quatro são as situações básicas de

responsabilidade civil tratadas pela Lei Consumerista) responsabilidade pelo vício do

produto; b) responsabilidade civil pelo fato do produto (defeito); c) responsabilidade

civil pelo vício do serviço; d) responsabilidade civil pelo fato do serviço (defeito). Tal

divisão é fundamental para compreender a responsabilidade civil dos fornecedores de

produtos e prestadores de serviços, podendo ser encontrada nas páginas da doutrina.

Importante destacar que, conforme Tartuce (2013, p. 445) a responsabilidade civil

adotada pelo Código de Defesa do Consumidor é em regra objetiva, seguindo a regra de

responsabilidade civil prevista no Código Civil.

Em seus artigos 12, 13, 14, 18, 19 e 20, o CDC expõe claramente essa responsabilidade

objetiva, inclusive solidária, entre os fornecedores de produto e os prestadores de serviço. A

única exceção, lembra Flávio (2018), constante na codificação é a relacionada aos profissionais

liberais que prestam serviço, já que somente respondem mediante prova de culpa

(responsabilidade subjetiva). Ela consta no §4º do art. 14: A responsabilidade pessoal dos

18

profissionais liberais será apurada mediante a verificação de culpa. A respeito da exceção,

veremos mais adiante.

2.4 ESPÉCIES DE RESPONSABILIDADE CIVIL

A doutrina majoritária classifica a responsabilidade civil a depender do aspecto em que

se a analisa.

Segundo Maria Helena Diniz (2007), quanto ao fato ensejador da responsabilidade, esta

pode ser contratual ou extracontratual. Em relação ao seu fundamento, a responsabilidade civil

pode se apresentar como subjetiva ou objetiva.

Sob um enfoque mais genérico, mister se faz diferenciar a responsabilidade civil da

responsabilidade penal, o que faremos a seguir.

2.4.1 Paralelo entre responsabilidade civil e responsabilidade penal

O Direito é uma ciência una e indivisível, pelo que a responsabilidade jurídica abrange

a civil e a penal. Assim, se faz necessário diferenciar as duas espécies.

Segundo Carlos Roberto Gonçalves (2019, p. 52):

[...] no caso de responsabilidade penal, o agente infringe uma norma de direito

público. O interesse lesado é o da sociedade. Na responsabilidade civil, o interesse

diretamente lesado é o privado. O prejudicado poderá pleitear ou não a reparação.

No mesmo raciocínio, esclarece o referido autor acerca de outros pontos

diferenciadores, tais como: a responsabilidade penal é pessoal, intransferível, o réu responde

com a privação de sua liberdade e independe do prejuízo causado à vítima, ou de sua vontade,

ao passo que a responsabilidade civil é facultativa e patrimonial.

Ainda nesse sentido, Gonçalves (2019, p. 54):

(...) a tipicidade é um dos requisitos genéricos do crime. É necessário que haja perfeita

adequação do fato concreto ao tipo penal. No cível, no entanto, qualquer ação ou

omissão pode gerar a responsabilidade civil, desde que viole direito ou cause prejuízo

a outrem (CC, art. 186).

É possível a coexistência dos dois institutos quando da realização do mesmo ato ilícito

gerar efeitos na esfera penal e cível. Se o agente causador do dano transgredir também uma lei

penal, responderá perante o lesado (patrimonialmente) e perante a sociedade (criminalmente),

assim nos ensina Carlos Roberto Gonçalves (2019, p. 53):

o fato danoso se revestiu de características que justificam o acionamento do

mecanismo recuperatório da responsabilidade civil e impõem a movimentação do

19

sistema repressivo da responsabilidade penal. Quando, porém, no fato de que resulta

o dano não se acham presentes os elementos caracterizadores da infração penal, o

equilíbrio rompido se restabelece com a reparação civil, simplesmente.

O Código Civil de 2002, em seu artigo 935, estabelece o princípio da independência das

responsabilidades de modo que o mesmo fato pode dar origem a sanções civis, penais e até

mesmo administrativas, podendo, inclusive, ser aplicadas cumulativamente.

Nas sábias palavras de Nelson Nery Junior (2006, p. 493) “[...] a coisa julgada penal não

interfere na área civil. Absolvição do réu no processo penal, por exemplo, não significa

automática liberação de responder na esfera civil” uma vez que diferentemente do direito civil,

o direito penal exige “[...] culpa em sentido estrito para a condenação, enquanto o direito civil

pode sancionar o devedor que tenha agido com culpa, ainda que no grau mínimo”.

Embora, haja independência entre a jurisdição penal e civil, é certo que, em

determinadas circunstâncias, a primeira possui efeito reflexo na segunda, conforme disposto no

artigo 63 do Código de Processo Penal e 91, inciso I do Código Penal, os quais estabelecem

que a sentença penal condenatória transitada em julgado poderá ser executada no juízo cível,

para efeitos de reparação do dano.

Ademais, conforme explica Silvio Venosa (2003) na impossibilidade de se identificar a

existência do fato e da autoria do ato ilícito perante a esfera cível, inquestionável que, se essas

questões forem apuradas pelo juízo criminal, não caberá nova discussão, pois a sentença fará

coisa julgada

No mesmo raciocínio, à luz do princípio da independência dos juízos, segundo Sílvio

de Salvo Venosa (2003, p. 19):

[...] a sentença penal absolutória, por falta de provas quanto ao fato, quanto à autoria,

ou a que reconhece uma dirimente ou justificativa, sem estabelecer a culpa, por

exemplo, não tem influência na ação indenizatória que pode revolver autonomamente

toda a matéria em seu bojo.

2.4.2 Da responsabilidade civil objetiva, subjetiva, contratual e extracontratual

O Código Civil Brasileiro adotou dois sistemas de responsabilidade, a responsabilidade

objetiva e a responsabilidade subjetiva. Essa última foi adotada pelo ordenamento como a regra

do sistema, sendo a outra exceção.

Essa classificação tem como base os fundamentos da responsabilidade e conforme os

ensinamentos de Nelson Nery Junior e Rosa Maria de Andrade Nery (2003) a responsabilidade

civil será caracterizada a partir da análise da conduta do agente (subjetiva) ou no fato da coisa

e/ou risco da atividade (objetiva), para eles na (2003, p. 240):

20

[...] responsabilidade objetiva o sistema fixa o dever de indenizar independentemente

da culpa ou dolo do agente. Na responsabilidade subjetiva há o dever de indenizar

quando se demonstra o dolo ou a culpa do agente, pelo fato causador do dano.

Na responsabilidade subjetiva, o dever de reparar o dano somente se configura quando

provada a culpa em sentido lato qual seja imprudência, negligência, imperícia ou dolo do

agente, do contrário, não haverá responsabilidade.

Nesse sentido, a culpa passa a ser pressuposto necessário para a configuração da

responsabilidade e à, consequente, reparação do dano, conforme aduz os artigos 186 e 927,

caput do Código Civil, institutos basilares da responsabilidade subjetiva, verbis: “aquele que,

por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a

outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito”, “ aquele que, por ato ilícito (arts.

186 e 187), causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo.”

Assim, para que haja o dever de indenizar na responsabilidade subjetiva, requer-se a

conjugação dos seguintes pressupostos: ação ou omissão do agente, prejuízo causado à vitima,

nexo causal entre esses dois elementos e a culpa do agente, de modo que incumbirá ao autor da

ação de indenização o ônus da prova.

Contudo, Maria Helena Diniz (2007) explica que a teoria da culpa ou subjetiva acabou

por não solucionar satisfatoriamente alguns casos. Por isso que, a corrente objetivista

desvinculou o dever de reparação do dano da ideia de culpa, baseando-o na atividade lícita ou

no risco, a fim de satisfazer o lesado na reparação do dano já que, por vezes, não é possível

demonstrar a culpa do agente.

Dessa forma, a responsabilidade objetiva é aquela que prescinde de culpa, ou seja, basta,

tão somente, a presença do nexo entre o prejuízo sofrido pela vítima e a ação ou omissão do

agente.

Ressalte-se, que a responsabilidade objetiva está prevista em vários dispositivos do

Código Civil, mas a disposição legal contida no parágrafo único do artigo 927, trata

especificamente, sobre o assunto, conforme descrito adiante: “Haverá obrigação de reparar o

dano, independentemente de culpa, nos casos específicos em lei, ou quando a atividade

normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza, riscos para o direito

de outrem” (BRASIL, 2002).

Diante disso, por intermédio do dispositivo supracitado, o Código Civil de 2002

introduziu em nosso ordenamento jurídico a denominada responsabilidade objetiva fundada na

teoria do risco, segundo a qual todo aquele que se beneficia de uma atividade, é responsável

pelo risco dela advindo, obrigando-se a indenizar, independentemente, de culpa.

21

Nos dizeres de Carlos Roberto Gonçalves (2019, p. 60):

a responsabilidade civil desloca-se da noção de culpa para a ideia de risco, ora

encarada como “risco-proveito”, que se funda no princípio segundo o qual é reparável

o dano causado a outrem em consequência de uma atividade realizada em benefício

do responsável (ubi emolumentum, ibi onus); ora mais genericamente como “risco-

criado”, a que se subordina todo aquele que, sem indagação de culpa, expuser alguém

a suportá-lo.

Assim, em termos gerais, a lei determina que, em algumas situações específicas, o autor

do dano será obrigado a indenizar a vítima, mesmo sem ter agido culposamente, ou porque a

culpa é presumida, ou porque a responsabilidade de indenizar decorre do risco de sua atividade.

De tal modo, com o advento da responsabilidade objetiva, restou à vítima, em

determinadas situações, tão somente, comprovar o nexo de causalidade entre o dano e a ação

ou omissão do agente, vez que a análise da culpa foi descartada, para efeitos da

responsabilização. Enquanto que, na responsabilidade subjetiva, a verificação e a demonstração

da culpa são imprescindíveis, para o deslinde da questão.

Ultrapassado isto, acerca da análise da característica da natureza contratual e

extracontratual, conforme Maria Helena Diniz (2007) o dever de reparar um dano causado pode

originar-se do inadimplemento de uma obrigação previamente firmada entre as partes ou pode

decorrer da inobservância da lei.

No primeiro caso, diz-se que a responsabilidade daquele que ocasionou o prejuízo a

outrem é contratual e no segundo, extracontratual ou aquiliana.

Nos dizeres de Carlos Roberto Gonçalves (2019, p. 55):

na responsabilidade extracontratual, o agente infringe um dever legal, e, na contratual,

descumpre o avençado, tornando-se inadimplente. Nesta, existe uma convenção

prévia entre as partes que não é cumprida. Na responsabilidade extracontratual,

nenhum vínculo jurídico existe entre a vítima e o causador do dano, quando este

pratica o ato ilícito.

Observa-se que esses dois institutos foram diferenciados pelo Código Civil ao

prescrevê-los em artigos distintos. No entanto, o referido diploma legal omitiu qualquer

parâmetro diferenciador entre as duas espécies de responsabilidade. Verifica-se que a

responsabilidade extracontratual encontra-se disciplinada nos artigos 186 a 188 e 927 a 954, e

a responsabilidade contratual nos artigos 389 e seguintes, e 395 e seguintes.

Para José de Aguiar Dias (1987) ainda que o Brasil e muitos outros países tenham

acolhido a tese dualista ou clássica em seus ordenamentos jurídicos, muitos são os adeptos da

teoria unitária ou monista que criticam essa dualidade de tratamento entre a responsabilidade

contratual e extracontratual sob o fundamento de que os seus efeitos são iguais já que três são

22

as condições para a configuração da responsabilidade: o dano, o ato ilícito e o nexo causal entre

os dois primeiros elementos.

Silvio de Salvo Venosa (2003, p. 21) adota uma posição mais extrema ao afirmar que a

distinção entre os dois institutos é apenas de cunho didático já que “quem transgride um dever

de conduta, com ou sem contrato, pode ser obrigado a ressarcir o dano. O dever violado será o

ponto de partida, não importando se dentro ou fora de uma relação contratual.”

Segundo o Jurista Rodrigues (1993, p. 09), a diferença básica entre a responsabilidade

contratual e a extracontratual é que

[...] na hipotese de responsabilidade contratual, antes de a obrigação de indenizar

emergir, existe, entre o inadimplente e seu co-contratante, um vínculo jurídico

derivado da convenção; na hipotese da responsabilidade ex- tracontratual, nenhum

liame jurídico existe entre o agente causador do dano e a vítima até que o ato daquele

ponha em ação os princípios geradores de sua obrigação de indenizar.

Carlos Roberto Gonçalves (2019) afirma que a tendência das codificações modernas é

aproximar os dois institutos de modo que os aspectos comuns a ambas sejam regulados por um

regime uniforme. Exemplifica o referido doutrinador que o código alemão e português já

adotaram essa postura por uma vez que incluem diversas disposições com caráter geral sobre o

dever de indenização, ficando de fora da regulamentação apenas aspectos mais específicos das

variantes de responsabilidade.

De qualquer forma é inegável a existência de características específicas dessas duas

espécies de responsabilidade e, para o supracitado doutrinador, a distinção mais significativa

refere-se ao ônus da prova.

Na responsabilidade contratual, é o devedor que deverá provar, ante o inadimplemento,

a existência de alguma das excludentes do dever de indenizar: culpa exclusiva da vítima, caso

fortuito ou força maior, pois, caso contrário, será condenado a ressarcir os prejuízos causados

à vítima.

No entanto, se a responsabilidade resultar da prática de um ato ilícito (responsabilidade

aquiliana, artigo 186 do Código Civil), o ônus da prova recairá sobre a vítima do ato, cabendo

a ela provar que o dano ocorreu por culpa do agente.

A par dessas distinções, há outra diferença no que diz respeito aos pressupostos. A

responsabilidade extracontratual exige-se para sua configuração a existência de uma ação ou

omissão do causador do dano, a ocorrência de um dano moral ou patrimonial à vítima, o nexo

de causalidade entre o dano e a ação do agente e por fim, a culpa. Na responsabilidade contratual

requer-se como pressupostos a existência de um contrato válido e seu posterior descumprimento

por alguma das partes.

23

2.5 PRESSUPOSTOS DA RESPONSABILIDADE CIVIL

O artigo 186 do Código Civil, informativo da responsabilidade aquiliana, estabelece a

regra geral do sistema, qual seja: “Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou

imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete

ato ilícito.”

Da análise desse artigo, depreende-se que os pressupostos necessários para a

configuração da responsabilidade civil extracontratual são: 1) ação ou omissão qualificada

juridicamente; 2) culpa ou dolo; 3) nexo de causalidade; e, 4) o dano experimentado pela vítima.

2.5.1 Da ação ou omissão qualificada juridicamente, culpa e dolo do agente

O primeiro pressuposto da responsabilidade civil exige para sua configuração uma ação

ou omissão qualificada juridicamente, isto é, o ato praticado pelo autor do dano deve ser ilícito

e assim, decorrer de culpa ou dolo, ou lícito por decorrer do risco da atividade, responsabilidade

essa que prescinde a culpa lato sensu.

Nos dizeres de Maria Helena Diniz (2012, p. 56):

[...] a ação, elemento constitutivo da responsabilidade, vem a ser o ato humano,

comissivo ou omissivo, ilícito ou lícito, voluntário e objetivamente imputável, do

próprio agente ou de terceiro, ou o fato de animal ou coisa inanimada, que causa dano

a outrem, gerando o dever de satisfazer os direitos do lesado.

No tocante à omissão do agente, Carlos Roberto Gonçalves (2019) assevera que é

necessário observar dois requisitos: a) existência do dever jurídico de praticar determinado fato

(de não omitir); e, b) demonstração de que, com a sua prática, o dano poderia ter sido evitado.

O dever jurídico de agir, ou seja, de não se omitir pode decorrer de lei, como por exemplo, o

dever de prestar socorro às vítimas de acidente de automóvel imposto a todo condutor (art. 176,

I do Código de Trânsito Brasileiro) ou de convenção, como ocorre no dever de guarda, de

vigilância, de custódio ou, por fim, de alguma situação especial de perigo.

Acerca da culpa, o já citado artigo 186 do Código Civil estabelece a culpa, em sentido

amplo, como elemento necessário à configuração da responsabilidade civil, à qual engloba-se

o dolo e a culpa em sentido estrito nas seguintes expressões, respectivamente: “ação ou omissão

voluntária” e “negligência ou imprudência”.

À luz da teoria subjetiva adotada pelo sistema brasileiro, a vítima deve provar o dolo ou

a culpa em sentido estrito (negligência, imprudência e imperícia) do agente para obter a

reparação do dano. Excepcionalmente, o nosso direito positivo admite em situações pré-

24

estabelecidas o ressarcimento independentemente da comprovação da culpa lato sensu pela

vítima, como são os casos de responsabilidade objetiva fundada na teoria do risco ou decorrente

de culpa presumida.

Numa definição simplificada, Rui Stoco (2004, p. 133) diz que “o dolo é a vontade

dirigida a um fim ilícito; é um comportamento consciente e voltado à realização de um

desiderato.”

Em relação à culpa em sentido estrito, continua o referido doutrinador, “traduz o

comportamento equivocado da pessoa, despida da intenção de lesar ou de violar direito, mas da

qual se poderia exigir comportamento diverso, posto que erro inescusável ou sem justificativa

plausível e evitável para o homo medius.” Assim, entende-se que quando o erro for escusável

ou plenamente justificável pelas circunstâncias, não haverá a culpa em sentido estrito.

A culpa em sentido estrito abrange a imprudência, a negligência e a imperícia. Em linhas

gerais, a imprudência é a ação sem as devidas cautelas; negligência é a inobservância das

normas impostas a todo homem médio; imperícia é a falta de habilidade ou inaptidão para a

prática de determinado ato que requer um conhecimento específico.

Nos ensinamentos de Rui Stoco (2004, p. 132):

a culpa pode empenhar ação ou omissão e revela-se através da imprudência:

comportamento açodado, precipitado, apressado, exagerado ou excessivo;

negligência: quando o agente se omite deixa de agir quando deveria fazê-lo e deixa de

observar regras subministradas pelo bom senso, que recomendam cuidado, atenção e

zelo; e imperícia: a atuação profissional sem o necessário conhecimento técnico ou

científico que desqualifica o resultado e conduz ao dano.

O caput do artigo 944 do Código Civil fixa o valor da indenização pela extensão do

dano, estabelecendo assim, a regra segundo a qual, nos dizeres de Nelson Nery Junior (2003)

seria dizer que “[...] quem estiver obrigado a reparar um dano deve recompor a situação pessoal

e patrimonial do lesado ao estado anterior, para torná-la como era se o evento maléfico não

tivesse se verificado” (BRASIL, 20020), ou seja, o evento impõe ao responsável do dano (com

ou sem culpa) a obrigação de repará-lo.

O Código Civil, embora não tenha feito nenhuma distinção entre os graus de culpa

(levíssima, leve e grave), estabeleceu no parágrafo único do supracitado artigo, um juízo de

equidade segundo o qual: “se houver excessiva desproporção entre a gravidade da culpa e o

dano, poderá o juiz reduzir, equitativamente, a indenização” (BRASIL, 2002). Assim, o referido

artigo confere ao juiz o poder de agir equitativamente.

25

2.5.2 Da necessidade de caracterização de nexo de causalidade e dano

O nexo de causalidade é um dos pressupostos da responsabilidade civil, sem o qual não

há o que se falar em dever de indenizar.

A obrigação de reparar um dano somente nasce se, além da existência dos demais

pressupostos, houver um nexo causal entre o fato ilícito e o dano produzido, conforme se extrai

do já mencionado artigo 186 do Código Civil. A obrigação de indenizar é atribuída àquele que,

por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a

outrem.

Ausente esse liame de causa e efeito entre a conduta do agente e o resultado danoso, não

há o dever de indenizar. Nesse sentido, afirma Rui Stoco (2004, p. 637) que “o nexo causal se

torna indispensável, sendo fundamental que o dano tenha sido causado pela culpa do sujeito” ,

quando se tratar de responsabilidade subjetiva, ao passo que, na responsabilidade objetiva, à luz

da teoria do risco, haverá o dever de indenizar quando se demonstrar o nexo causal entre a

conduta culposa ou não do agente e o resultado danoso.

Sobretudo, a respeito do resultado danoso, o dano é mais do que um pressuposto da

responsabilidade civil, é seu verdadeiro objeto, de modo que se não houver a existência de um

prejuízo, a ação de indenização perderá sua razão de ser. Só haverá responsabilidade civil se

houver um dano a reparar.

Com amplitude, explica Agostinho Alvim, citado por Carlos Roberto Gonçalves (2019,

p. 390):

[...] dano, em sentido amplo, vem a ser a lesão de qualquer bem jurídico, e aí se inclui

o dano moral. Mas, em sentido estrito, dano é, para nós, a lesão do patrimônio; e

patrimônio é o conjunto das relações jurídicas de uma pessoa, apreciáveis em dinheiro.

Aprecia-se o dano tendo em vista a diminuição sofrida no patrimônio. Logo, a matéria

do dano prende-se a da indenização, de modo que só interessa o estudo do dano

indenizável.

O dano, sendo o prejuízo sofrido pela vítima, pode ser patrimonial (também chamado

de dano material), ou extrapatrimonial (denominado dano moral).

O primeiro refere-se ao dano que afeta somente o patrimônio da vítima e engloba tanto

os danos emergentes, como os lucros cessantes, conforme se extrai do artigo 402 do Código

Civil: “salvo as exceções expressamente previstas em lei, as perdas e danos devidas ao credor

abrangem, além do que ele efetivamente perdeu, o que razoavelmente deixou de lucrar” (brasil,

2002).

26

O dano moral (extrapatrimonial) é a lesão que não produz qualquer efeito patrimonial,

provocando prejuízos ao ofendido no âmbito de sua dignidade. Trata-se de uma verdadeira

ofensa aos direitos da personalidade.

2.6 A RESPONSABILIDADE CIVIL DO CIRURGIÃO DENTISTA ESPECIFICAMENTE

NO QUE CONCERNE ÀS CIRURGIAS DE HARMONIZAÇÃO OROFACIAL

No ano de 1966 foi publicada a Lei nº 5.081/66 que regulamenta o exercício da

odontologia em todo o território nacional. A partir deste momento houve a desvinculação

odontologia-medicina, passando a odontologia a ser uma profissão autônoma e regulamentada.

O artigo 2 da referida lei, estabelece:

Art. 2º. O exercício da Odontologia no território nacional só é permitido ao cirurgião-

dentista habilitado por escola ou faculdade oficial ou reconhecida, após o registro do

diploma na Diretoria do Ensino Superior, no Serviço Nacional de Fiscalização da

Odontologia, na repartição sanitária estadual competente e inscrição no Conselho

Regional de Odontologia sob cuja jurisdição se achar o local de sua atividade.

Sendo assim, somente será permitido o exercício do cirurgião dentista àquele que

estiver habilitado por meio de uma faculdade oficial, ou reconhecimento de diploma

(CAIXETA, 2008).

Conforme o artigo 2º, da Resolução CFO 198/2019, entende-se por Harmonização

Orofacial como um apanhado de procedimentos realizados pelo profissional aqui estudado, o

cirurgião-dentista, em sua área de atuação, que são responsáveis pelo equilíbrio estético e

funcional facial.

No que concerne a regulamentação da prática de Cirurgia de Harmonização Orofacial

como especialização da odontologia, foram editadas as Resoluções CFO 198/2019 e 230/2020,

ambas serão melhor abordadas no Capítulo 04 do presente trabalho.

Para analisar o presente tópico, é necessário antes realizar brevemente o apanhado de

conceitos já abordados nos itens anteriores, mas de forma pontual no tocante a

Responsabilidade dos Cirurgiões Dentistas especificamente.

2.6.1 Princípios constitucionais e éticos da responsabilidade civil do cirurgião dentista

Para Wander Pereira (2014) realizar a análise que o presente trabalho demanda, faz-se

necessário entender quais os princípios constitucionais aplicáveis à prática da odontologia, uma

vez que é a Constituição Federal que rege as diretrizes e princípios do ordenamento jurídico

brasileiro. Para ele (Pereira, 2014):

27

[...] destaca-se o princípio constitucional da dignidade da pessoa humana, que é em

última instância o arcabouço da proteção dos direitos individuais e o primeiro

fundamento apresentado pela Carta Magna, que destaca no Art. 1º a dignidade

juntamente com a soberania e a cidadania. Sendo assim, esse princípio deverá nortear

a interpretação dos direitos e garantias trazidos para os indivíduos pelo texto da

Constituição Federal.

Na mesma linha de raciocínio, estabelece o artigo 9º, III do Código de Ética

Odontologica: “inciso III – zelar e trabalhar pelo perfeito desempenho ético da Odontologia e

pelo prestígio e bom conceito da profissão; e ressalta no inciso VII – zelar pela saúde e pela

dignidade do paciente”.

Pereira (2014) também ressalta outro princípio constitucional a ser considerado quando

da análise da responsabilidade civil dos cirurgiões dentistas, qual seja o da igualdade/isonomia,

estabelecido no artigo 5º, I da Constituição, que de igual forma é observado no artigo 2º do já

citado Código de Ética: “Art. 2º. A Odontologia é uma profissão que se exerce em benefício da

saúde do ser humano, da coletividade e do meio ambiente, sem discriminação de qualquer forma

ou pretexto”

Necessário também frisar o artigo 170 da Constituição Federal, V, onde, conforme

Pereira (Pereira, 2014) “[...] veio consagrado o princípio que prima pela defesa do consumidor

para possibilitar e assegurar a todos a existência digna conforme os ditames da justiça social”.

Define Nunes (2000, p.53):

O mercado de consumo, aberto à exploração, não pertence ao explorador, ele é da

sociedade e em função dela; de seu benefício, é que se permite sua exploração; como

decorrência disso, o explorador tem responsabilidades a saldar no ato exploratório; tal

ato não pode ser expoliativo; se lucro é uma decorrência lógica e natural da exploração

permitida, não pode ser ilimitado; encontrará resistência e terá de se refreado toda vez

que puder causar dano ao mercado e à sociedade; excetuando os casos de monopólio

do Estado, o monopólio, o oligopólio e quaisquer outras práticas tendentes à

dominação do mercado estão proibidos; assim e principalmente, o lucro é legítimo,

mas o risco é exclusivamente do empreendedor. Ele escolheu arriscar-se: não pode

repassar esse ônus para o consumidor.

Definição em que, conforme entende Pereira (Pereira, 2014), tem-se o arcabouço para

a responsabilidade apresentada o Codigo de Defesa do Consumidor, onde, em “[...] outras

palavras, significa que o fornecedor deverá responder pelos danos causados, independente da

comprovação de culpa.

28

2.6.2 Previsão legal da responsabilidade civil no Código de Defesa do Consumidor

especificamente no que concerne ao cirurgião dentista

Como já citado anteriormente, ainda que o Código de Defesa do Consumidor tenha

adotado predominantemente a responsabilidade civil objetiva, o próprio, em seu artigo 14, §4º,

trouxe uma exceção a essa regra, quando institui que para os profissionais liberais, dentre eles

para os dentistas, a responsabilização será subjetiva, ou seja, deverá ser comprovada a

existência de culpa (negligência, imperícia e imprudência) para se exigir indenização. Para

Wander Pereira (Pereira, 2014):

A responsabilidade civil à qual está sujeito o cirurgião-dentista quando atua como

profissional liberal é subjetiva, ou seja, conforme descrito anteriormente, exige como

requisitos, além do dano e do nexo causal, a comprovação da configuração da culpa.

(...) Dessa forma, não se pode apenas enfatizar a existência do dano causado, sem

traçar uma correlação entre a culpa do cirurgião-dentista frente a tais lesões. Deve-se

ter, de forma efetiva, a comprovação da responsabilidade do profissional liberal.

Para Paranhos (2007), visto isto e tendo como base que o Código de Defesa do

Consumidor considera o paciente como um consumidor e o profissional dentista como como

um fornecedor de serviços, e dessa forma quando este causar qualquer tipo de dano e

descumprir o contrato que outra foi estabelecido este terá o dever de reparar os danos se

comprovado a sua responsabilidade.

No entendimento de Silvio de Salvo Venosa (2015), ainda que no Brasil a odontologia

seja uma profissão autônoma, sem qualquer vínculo “formal” com a medicina, a

responsabilidade civil dos dentistas, quando no exercício da profissão, está disposta no mesmo

artigo que fala da responsabilidade civil dos médicos, qual seja o artigo 14 §4º do Código de

Defesa do Consumidor:

Art. 14. O fornecedor de serviços responde, independentemente da existência de

culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à

prestação dos serviços, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre

sua fruição e riscos. § 4° A responsabilidade pessoal dos profissionais liberais será

apurada mediante a verificação de culpa.

Destaca também o autor Nery Junior (1992), no que diz respeito à responsabilidade civil

dos profissionais liberais, que a mesma trata-se de responsabilidade “[...] subjetiva, fundada na

culpa (art. 14, §4º), para cuja verificação incide o princípio do maior favor ao consumidor, que

é o da inversão do ônus da prova (art. 6º, VIII)”.

Lembra Pereira (Pereira, 2014) que:

Deve-se ressaltar que a exceção excepcionada pelo Código de Defesa do Consumidor

foi baseada na especificidade com que o serviço desses profissionais liberais é

prestado, peculiaridade que pode ser observada principalmente no que concerne à

29

atividade laboral do dentista, pois, repetidas vezes, as relações dos pacientes com esse

profissional são pautadas na pessoalidade e na confiança.

Conclui-se, portanto, que a obrigação de reparar, conforme Wander (Pereira, 2014):

[...] se faz assim necessária, mediante a verificação da existência de culpa, baseada

não apenas e tão somente na previsão legal, mas na valoração do prejuízo material e

na tentativa de amenizar o dano moral que teve de suportar a paciente em questão.

Portanto, é imprescindível entender a extensão do dano, tanto moral quanto material,

para valorar qualquer tipo de quantia a título de indenização, não podendo por esse motivo, ser

um valor fixo.

2.6.3 A responsabilidade civil objetiva e subjetiva, contratual e extracontratual

especificamente no que concerne ao cirurgião dentista

Para Wander (2014), é essencial determinar se a realização do contrato do profissional

do cirurgião dentista com o seu paciente aconteceu de forma direta ou indireta (por via de

hospital, convênio odontológico, etc). Para ele (Pereira, 2014):

Quando o dentista forma um vínculo com o paciente sem intermediários, ou seja,

contrata diretamente com o paciente, sua responsabilidade será subjetiva. Porém, se o

contato com o paciente ocorrer por intermédio de alguma pessoa jurídica, esta

responderá de maneira objetiva.

Para Bittar (1991) quando há no contexto o uso de máquinas, aparatos perigosos etc,

inserindo risco, se deve deslocar para o âmbito da teoria objetiva. No entanto, para Pereira

(Pereira, 2014):

Apesar do entendimento de Bittar (1991), deve-se ressaltar que o juiz deverá analisar

o caso concreto, para estabelecer de forma segura qual o tipo da responsabilidade

adequada a ser invocada, se deverá ser a subjetiva ou a responsabilidade objetiva para

melhor fornecer uma prestação jurisdicional às partes.

Embora o direito civil, com o advento do código de 2002, tenha priorizado a

responsabilidade civil objetiva, não deixou de lado a subjetiva, sendo importante averiguar a

culpa como elemento essencial. Neste tom afirma Caio Mario da Silva Pereira (1997, p. 391):

A abolição total do conceito da culpa vai dar num resultado antissocial e amoral,

dispensando a distinção entre o lícito e o ilícito, ou desatendendo à qualificação da

boa ou má conduta, uma vez que o dever de reparar tanto corre para aquele que

procede na conformidade da lei, quanto para aquele outro que age ao seu arrepio.

Já a respeito da natureza contratual ou extracontratual, Pereira (2014) esclarece que

majoritariamente a doutrina aponta a responsabilidade civil do profissional liberal, aqui tratado

como o cirurgião dentista, é contratual, ainda que não exista um contrato escrito. Para o autor

(Pereira, 2014):

30

Entre o profissional da odontologia e seu cliente/paciente, se articula um liame

contratual, e esse contrato terá os seguintes elementos essenciais: a prestação de

serviços pelo dentista e, do outro lado, a satisfação do pagamento dos honorários pelo

paciente.

Na mesma linha, destaca Venosa (2015) que a responsabilidade civil do cirurgião-

dentista por ser em regra de resultado, trata-se de uma atividade tipicamente contratual, para o

autor (2015, p. 174-175):

[…] Observe, no entanto, que a responsabilidade do dentista geralmente é contratual,

por sua própria natureza. Com frequência, o dentista assegura um resultado ao

paciente. Sempre que o profissional assegurar o resultado e este não for atingido,

responderá objetivamente pelos danos causados ao paciente. No entanto, nem sempre

a responsabilidade do odontólogo será de resultado [...]

Venosa (2015) esclarece que, ainda que seja a regra, o profissional poderá não responder

por uma obrigação contratual, no entanto apenas em casos de atendimento de emergência, por

exemplo, quando não há um acordo anterior, em razão do estado de saúde do paciente. Mas nos

demais casos, permanece o entendimento de que a obrigação se dá por contrato, ainda que

verbal.

2.6.4 A natureza obrigacional da responsabilidade civil do cirurgião dentista como

sendo obrigação de meio ou obrigação de resultado

Wander Pereira (Pereira, 2014) entende que quando fala-se em responsabilidade

profissional, é necessária uma análise anterior no que diz respeito à natureza da obrigação

assumida, pra ele “[...] esse questionamento deve ser corretamente respondido para que haja

uma boa prestação jurisdicional, portanto, o tipo obrigacional torna-se uma questão de alta

relevância em um julgamento”. Para ele (Pereira, 2014) diferenciar se a obrigação será de meio

ou de resultado, requer “[...] avaliar como se deu a forma de contratação dos serviços e quais

são as possibilidades de se atingir o resultado esperado da obrigação estabelecida no contrato”.

Para Wander (2014), existe a necessidade de análise do caso individualmente, sem

aplicar a caracterização do tipo de obrigação (como de resultado) a todos os

procedimentos/cirurgias realizados pelos cirurgiões dentistas, para que não se incorra em

injustiças, já que os próprios procedimentos possuem características e objetivos diferentes.

Segundo Diniz (1998, p. 253), “em regra, a obrigação de resultado, para problemas estéticos,

mas pode ser de meio em especialidades como periodontia e endodontia”.

Para Araújo (1991) as especialidades que caracterizam obrigação de resultado seriam a

dentística restauradora, odontologia legal, ortodontia, prótese dentária e radiologia, enquanto

31

que, especialidades como cirurgia e traumatologia buço-maxilofaciais, endodontia,

odontopediatria, patologia bucal, periodontia e prótese buço-maxilo-facial têm seu

enquadramento de acordo com o caso concreto, para esse autor somente as especialidades de

prótese buço-maxilo-facial e cirurgia e traumatologia buço-maxilo-faciais são caracterizadas

como obrigação de meio e de acordo com França (1993, p. 128):

Considera-se como obrigação de resultado as especialidades: prótese (em geral),

ortodontia, dentística, radiologia, estomatologia, odontologia em saúde coletiva e

patologia; como obrigação de meio: endodontia, periodontia, implantodontia, cirurgia

e traumatologia buco-maxilo-facial; quanto à odontopediatria, considera-se como

obrigação de meio e de resultado, dependendo da área de atuação do profissional.

Pereira (2014) sabiamente lembra que, mesmo com os avanços tecnológico no que

concerne as práticas e técnicas na área da saúde, aqui especificamente na área da odontologia,

os resultados nem sempre dependem único e exclusivamente do profissional dentista (Pereira,

2014):

[...] às vezes, o cirurgião-dentista não tem condições de afirmar com certeza que irá

realizar um tratamento alcançando o resultado almejado e estabelecido no plano de

tratamento, deve-se enfatizar que, assim como os médicos, os dentistas estão lidando

com seres humanos que respondem de formas singulares e especiais de acordo com

as condições de cada organismo, por vezes observa-se que para o mesmo tipo de

tratamento tem-se inúmeras modalidades de respostas, diferenciando-se de um

paciente para o outro.

Por outro lado, pode-se afirmar que as obrigações de resultado serão todas aquelas que

o cirurgião-dentista mediano tem a capacidade e o controle de atingir o fim desejado, essa

obrigação fica facilmente identificável naqueles tratamentos estritamente estéticos, em que o

resultado prometido ao paciente deverá ser satisfeito, cumprindo-se com a obrigação do

resultado contratado.

Assim sendo, a prestação que não consiste em um resultado certo e determinado a ser

atingido pelo odontólogo, mas tão somente exige uma prática prudente e diligente do

profissional em benefício do paciente/cliente, em outras palavras, os meios necessários e

tendentes a produzir o objetivo desejado, de forma que a inexecução da obrigação pode ser

caracterizada pela omissão do dentista em tomar certas prevenções, sem se preocupar com o

resultado final, será caracterizado como de meio.

Nesse sentido, feitas as considerações acerca dos principais conceitos das principais

categorias de análise essenciais ao tratamento do tema dessa pesquisa: a realização da cirurgia

de harmonização orofacial pelos cirurgiões dentistas, resta-nos, adiante, fazer um balanço da

produção acadêmica antecedente na perspectiva de verificar como a academia esta tratando do

tema, para a partir deste ponto podermos adquirir ferramentas para debate-lo.

32

3 A RESPONSABILIDADE CIVIL DO CIRURGIÃO-DENTISTA NO BRASIL A

PARTIR DO DEBATE ACADÊMICO

Este capítulo consiste em um pequeno apanhado de produções acadêmicas

antecedentes a este trabalho, de forma que se procura demonstrar informações sobre o que

ocorreu nos últimos anos no campo do Direito Civil, no tocante a responsabilização dos

cirurgiões dentistas nas cirurgias de harmonização orofacial no Brasil. Para tal coleta foi

utilizada a plataforma do Google Acadêmico, detentor de um grande acervo de artigos

acadêmicos. Também foi utilizada a plataforma JusBrasil, para a coleta de artigos publicados

pelos acadêmicos do Direito. As palavras chaves usadas foram “responsabilidade civil do

dentista nas cirurgias de harmonização orofacial”; “responsabilidade civil do dentista”; e

“responsabilidade civil profissionais da saúde”.

3.1 O DEBATE SOBRE A RESPONSABILIDADE CIVIL DO CIRURGIÃO DENTISTA:

OBRIGAÇÃO DE MEIO

Na defesa pela linha de pensamento onde imputa-se ao dentista a responsabilidade civil

calcada na prestação obrigacional com natureza de meio, o artigo intitulado “A prestação

obrigacional do dentista como obrigação de resultado: sistematização e análise crít ica dos

argumentos”, publicado pela revista Saúde, Ética & Justiça (2012) os autores Sergio Domingos

Pittelli e Márcia Vieira da Motta iniciam levantando a grande discussão travada, onde tem-se a

intenção de definir a natureza da obrigação do profissional cirurgião-dentista (meio ou

resultado) no exercício da profissão. Poderam (2012, p. 25):

Atendo-nos à primeira delas, registramos que é usual e constitui mesmo uma

característica dos textos nos quais se discute a natureza da obrigação do dentista a

tentativa de classificar as especialidades da profissão segundo a dicotomia em apreço,

tomando-se, portanto, a especialidade como critério.

Os autores (2012) trazem a baila a definição de Souza (2011), sobre a classificação das

especialidades odontológicas a serem classificadas como especialidades com obrigação de

natureza de resultado, onde tomou como base de sua análise a Resolução CFO nº 63/2005 que

define em seu artigo 39 as especialidades odontológicas oficiais. Esclarecem que (2012, p. 27):

Esse autor classificou as seguintes especialidades como de obrigação de resultado, de

um total de 18 estabelecidas naquela norma: dentística restauradora, odontologia em

saúde coletiva, odontologia legal, patologia bucal e radiologia.

Tal tentativa de classificação é bastante criticada uma vez considerarem os autores

(2012, p. 27):

33

[...] impropriedade da atitude de qualificar especialidades e não procedimentos, uma

vez que uma mesma especialidade pode eventualmente albergar tantos procedimentos

“de meio” quanto procedimentos “de resultado” e é ao procedimento que se pode

atribuir essa condição e não à especialidade.

Ainda nesta linha, os autores (2012, p. 27) criticam o posicionamento de relacionar fim

estético do procedimento com obrigação de resultado, para eles ainda que relacionado a áreas

como “[...] dentística restauradora e às proteses dentárias, áreas em que o elemento estético é

de significativa importância, entendemos que não se pode atribuir ao profissional a obrigação

de resultado certo.”

Por fim, concluem os autores (2012) nesta mesma toada, determinando e refutando as

bases de teorias que tendem a imputar aos profissionais cirurgiões-dentistas obrigação de

resultado, frisando que (2012, p. 29):

[...] nenhuma delas se sustenta: especialidade não pode ser tomada como critério

idôneo para a distinção em questão, argumentos estritamente estéticos tampouco,

conforme já amplamente demonstrado na literatura pertinente, entre eles os artigos

citados (4*, 5*, 6*) e as noções sobre a simplicidade e regularidade dos procedimentos

odontológicos não se sustentam com base nos fatos.

Na mesma linha do anterior, o artigo “Ortodontia como atividade de meio ou

resultado?”, publicado pela Revista Dental Press de Ortodontia e Ortopedia Facial (2008), os

autores Erivaldo Lopes Kátia Ferrer, Maria Helena de Almeida e Renato de Almeida relembram

Santos (2005), que em seu artigo discorreu sobre a impossibilidade de enquadrar a prestação

obrigacional do cirurgião-dentista nas obrigações de resultado, uma vez nãos ser possível

garantir um resultado ao paciente, uma vez que (2008, p. 39):

[...] que cada organismo responde biologicamente de forma diferente de outro,

ressaltando que não há obrigação legal para que o cirurgião-dentista atinja um

resultado, conforme inciso II do Art 5º da Constituição Federal (CF) que ressalta que

ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer nada se não em virtude da lei. Como

não existe no Brasil uma lei onde o cirurgião-dentista seja obrigado a atingir resultado,

este não pode ser condenado com base na “obrigação de resultado.

Os autores (2008) concluem no mesmo sentido, alegando não ser possível enquadrar a

ortodontia como atividade de resultado, mas sim de meio, mais uma vez levantado o argumento

de que não é possível garantir ao paciente um resultado específico uma vez depender de muitos

fatores exteriores a atuação do profissional (2008, p. 41):

O resultado do tratamento ortodôntico não depende somente do profissional, sendo

dependente da cooperação do paciente e também de fatores biológicos e psicológicos

individuais, que podem limitar a ação da terapêutica ortodôntica. O ortodontista pode

ser responsabilizado civilmente somente quando incorrer em imprudência,

negligência, imperícia ou propaganda enganosa.

34

3.2 A DISCUSSÃO ACERCA DA RESPONSABILIDADE CIVIL DO CIRURGIÃO

DENTISTA: OBRIGAÇÃO DE RESULTADO

Como contraponto ao item anterior, há os que defendem a natureza de prestação

obrigacional de resultado aos cirurgiões-dentistas no exercício de sua profissão, para a

imputação da responsabilidade civil.

Sá (2017), em seu artigo “A responsabilidade civil no exercício da Odontologia:

Atividade de meio ou de resultado?” analisa como se dá a responsabilidade do dentista no

exercício da profissão e procura entender em quais situações o profissional deverá responder

civilmente por danos e prejuízos causados a terceiros.

Apoiado no doutrinador Silvio de Salvo Venosa, o autor ressalta que ainda que a

odontologia seja no Brasil uma profissão autônoma e desvinculada da medicina, a

responsabilização dos dentistas encontra-se no campo da responsabilidade civil dos médicos

(art. 4º, §14, CDC), ou seja, como regra geral será subjetiva e dependerá de culpa.

O autor ainda, de acordo com a obra de Venosa, em regra a responsabilidade do cirurgião

dentista será de resultado, caracterizando-se como uma atividade tipicamente contratual.

Conforme Sá (2017, p. 03):

[...] Venosa ressalta ainda em sua obra, que a responsabilidade civil do cirurgião-

dentista, em regra, é de resultado, ou seja, é uma atividade tipicamente contratual,

principalmente se considerarmos os inúmeros tratamentos de rotina, como obturações

e outras atividades que buscam prevenir doenças dentárias, conhecidas pelos

profissionais da área como atuações de profilaxia.

No artigo, Sá pondera que, ainda que seja a regra, nem toda a atividade do odontólogo

será de resultado, a exemplo da traumatologia bucomaxilofacial que merece exame

individualizado, no entanto afirma que (2017, p. 04):

[...] é importante ressaltar que, nos casos em que a atividade do odontólogo for de

resultado e tal resultado não for alcançado no procedimento, o profissional deverá

indenizar o paciente por eventuais danos causados, vez que os objetivos relativos ao

tratamento são previsíveis, podendo a indenização abarcar danos materiais, morais e

até mesmo estéticos.

Por fim, conclui que ainda que não se aplique em todo o exercício da atividade

profissional do dentista, de acordo com o atual entendimento de jurisprudência e doutrina, em

regra a obrigação do dentista será de resultado, devendo o profissional ser responsabilizado

civilmente caso o procedimento/cirurgia não apresente o resultado esperado, ficando nesses

casos caracterizado o descumprimento contratual.

35

Ainda assim, frisa que o insucesso no resultado não caracteriza a responsabilidade

objetiva do dentista, uma vez que (2017, p. 09):

A responsabilidade continuará a ser subjetiva nos termos do artigo 14, § 4º do CDC,

mas com culpa presumida do profissional, o que significa que o ônus da prova é

invertido e caberá ao dentista afastar sua responsabilidade contratual, provando que

não agiu com negligência, imprudência ou imperícia, ou que o insucesso se deu por

culpa exclusiva do paciente.

Na mesma linha de Sá (2017), os autores Castro, Daruge Junior, Francesquini Júnior

Schmidt e Ulbricht (2016), em seu artigo “Tratamento odontologico estéticos: obrigação de

resultado?”, ponderam que ainda que de forma geral o posicionamento da responsabilização

dos profissionais da saúde ser de meio, a doutrina vem mitigando tal entendimento nos casos

das cirurgias estéticas. Conforme o artigo (2016, p. 06):

[...] a doutrina já vinha mitigando este entendimento nos casos das cirurgias estéticas,

tendo em vista que estas intervenções são ditadas mais pela vaidade e complexos

psicológicos do paciente do que por necessidades orgânicas (MATIELO, 1998), de

forma que o profissional obriga-se ao resultado prometido (KFOURI NETO, 1998),

chegando mesmo ao extremo de se falar, no caso específico da odontologia, que

somente nas hipóteses de prótese bucomaxilofacial e cirurgia e traumatologia

bucomaxilofaciais é que o profissional não teria obrigação de resultado

(ROMANELLO NETO, 1998).

Os autores trazem ainda a diferenciação de erros de diagnóstico e tratamento, sendo

esses respectivamente a má interpretação de dados obtidos ou desinteresse/omissão em obtê-

los e escolha de tratamento impróprio ou defeituoso (COUTINHO, 2010).

Nesse sentido, ponderam (2016, p. 06):

Os erros e defeitos nos tratamentos estéticos seguem as diferenciações acima, ou seja,

ou há imprudência, imperícia ou negligência no diagnóstico para fins de realização de

procedimento estético (tanto da viabilidade de realização do procedimento quanto do

tipo de procedimento escolhido), ou ocorre alguma das modalidades de culpa acima

citadas na realização do tratamento estético; em ambos os casos, ocasionando dano ao

paciente, de ordem material, moral ou estético.

Em ato contínuo, ensinam que o posicionamento tradicional de que na relação paciente

- dentista a obrigação assumida seria de meio foi mitigado pelo STJ (REsp nº1238746/MS) no

caso do tratamento possuir caráter estético, estendendo o entendimento aplicado para

responsabilização médica, nas cirurgias plásticas, aos procedimentos odontológicos estéticos,

onde o profissional assume a obrigação como sendo de resultado, uma vez que tanto finalidade

estética e funcional podem (e devem) ser alcançadas com previsibilidade. Frisam os autores,

portanto, que resta necessário e importante identificar se são tratamentos estéticos, ou não, para

fins de configurar a obrigação de resultado.

Por fim, levantam as consequências legais da decisão (2016, p. 15):

36

As consequências legais da interpretação conferida pelo colendo Tribunal são duas: a

primeira, de natureza material, que é a presunção de culpa nas hipóteses de erros em

tratamentos estéticos na seara odontológica, e a segunda, de natureza processual, ou

seja, há a inversão do ônus da prova durante o processo judicial de conhecimento, nos

termos do preceituado no artigo 6º, inciso VIII do Código de Defesa do Consumidor

(BRASIL, 1990).

Os autores concluem (2016) no sentido de que não se pode falar em responsabilidade

pelo resultado quando o objetivo do tratamento não for de exclusivamente estético.

No artigo publicado na Revista de Odontologia da Universidade de São Paulo (2008) os

autores Melissa Kato, Suzana Goya, Silvia Peres, Arsenio Peres e José Roberto Bastos debatem

a respeito da natureza da responsabilidade civil referente às atividades do cirurgião dentista,

segundo eles (2008, p. 67):

A natureza da responsabilidade civil gerada no caso de erro profissional de cirurgião-

dentista, geralmente é de natureza contratual. Segundo o Novo Codigo Civil3 (NCC)

brasileiro, no ato em que o profissional aceita alguém como paciente estabelece-se

entre as partes um contrato de trabalho (Gomes, Candelária e Silva, 1997 apud Kfouri

Neto5, 2003), mesmo se este for de natureza verbal (contrato de locação de serviço).

Conforme os autores (2008), quando o paciente busca o cirurgião-dentista para a

utilização de seus serviços profissionais, estabelecendo todos os critérios para que o serviço

ocorra, há neste contexto um consenso verbal de vontades em se aplicar o tratamento, restando

evidente a natureza contratual da relação. Salvo em situações excepcionais (2008, p. 68):

[...] Entretanto, excepcionalmente, tal responsabilidade pode ser de natureza

extracontratu- al, e isso ocorre no caso de o profissional participar de um atendimento

de emergência. Entretanto, a ocorrên- cia de tal exceção é muito rara em Odontologia.

Também ponderam os autores que quando analisada a fonte geradora da obrigação,

nota-se ser gerada em nada mais do que um acordo de vontade entre as partes, o que caracteriza

a relação contratual entre cirurgião-dentista e paciente. No artigo (2008, p. 68):

É através do contrato que surgem as obrigações contraídas que não serão cumpridas

por um dos contratantes. A responsabilidade extracontratual tem sua fonte na lei,

estabelecida basicamente no Artigo 186 do NCC (“Aquele que, por ação ou omissão

voluntária, negligência ou por imprudência violar direito e causar dano a outrem,

ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito”).

Discutem, ainda, acerca da tipificação da obrigação do cirurgião-dentista, delimitando

as diferenças entre obrigações de meio e resultado (2008, p. 69):

[...] na obrigação de resultado, o profissional (contratante), obriga-se a atingir

determinado fim, desejado pelo paciente. O que interessa é o resulta- do final, não

importando a diligência demonstrada durante o tratamento. Por conseguinte, se tal fim

não for alcançado, não terá cumprido sua obrigação. Consegue o resultado ou deve

arcar com as consequências. Sendo a obrigação de resultado, basta ao lesado

demonstrar, além da existência do contrato, independente das suas razões, cabendo ao

devedor provar o caso fortuito ou de força maior, quando se exonerará da

responsabilidade.

37

No artigo “Implicações Jurídicas do erro profissional: a responsabilidade civil do

cirurgião-dentista”, publicado na Revista da Universidade Vale do Rio Verde (2013) os autores

Aline Reis, Carlos Eduardo Reis e Maria Élida Sá discorrem a respeito das espécies de

responsabilidade civil do cirurgião dentista, bem como as consequências advindas de seu

eventual insucesso. Conforme pensam (2013, p. 87):

[...] com o advento da Lei no. 8078, de 11 de setembro de 1990, (Codigo de Defesa

do Consumidor), o cirurgião-dentista passou a ser considerado fornecedor de serviços.

Isso acirrou os debates sobre a questão, bem como elevou o número de casos levados

ao Poder Judiciário, no sentido de ressarcimento de danos por erro profissional.

Assumem também os autores, a respeito do tema, ser de suma importância lembrar que

um ato ilícito odontológico ocorre ainda que a conduta do cirurgião-dentista seja involuntária,

uma vez que tal ato resulta de (2013, p. 88):

[...] imperícia (quando o cirurgião dentista, sem a devida qualificação técnica, ou seja,

sem os conhecimentos necessários para desenvolver tal intervenção faz o atendimento

fora do ramo de sua competência causando dano), imprudência (caracterizada pela

atuação precipitada, de maneira intempestiva e sem se preocupar com os resultados

adversos e nocivos que aquela conduta sem os devidos cuidados poderá causar) ou

negligência (entendida como descuido, falta de atenção, omissão displicente, podendo

ser entendida como a falta de cuidados e precauções que a profissão exige).

Os autores (2013) também defendem que a responsabilidade civil do cirurgião-dentista

decorre de obrigação de resultado, uma vez ser demasiadamente frequente na área a procura

desse tipo de profissional decorrente de uma preocupação estética, ou seja, quando um paciente

procura por esse serviço, seja na colocação de um aparelho para correção dentária, seja coroas

de porcelana ou implantes dentais, resta evidente a busca de um resultado específico estético,

não lhe bastando apenas a obrigação de meio. Resta apenas necessário, portanto, diferenciar o

que são obrigações de meio ou de resultado, para imputar a devida responsabilização civil aos

profissionais, conforme os autores (2013, p. 89):

Assim, a diferença que existe entre a obrigação de meio e a de resultado, é que na

primeira o profissional não se responsabiliza e não tem como prever como será o

resultado final do tratamento, pois ele pode variar de acordo como o organismo de

cada paciente. Porém, caso seja previsível o resultado, ou se o dentista prometer ao

paciente uma possibilidade de resultado ele deverá cumprir sob pena de ter que

indenizar o dano e/ou a insatisfação do paciente. Nessa modalidade de obrigação de

resultado o cirurgião-dentista está automaticamente assumindo a responsabilidade de

atingir e alcançar uma expectativa dada ao seu cliente, que normalmente, fica

preestabelecido no plano de tratamento proposto. Se o paciente entender que o

resultado obtido não atingiu e não coincidiu com aquele anunciado pelo dentista, ele

poderá levar seu caso para decisão em uma lide judicial.

38

No mesmo tom dos demais autores, o trabalho acadêmico “A responsabilidade Civil do

Odontologista especializado em Harmonização Orofacial” (2018), publicado pelo Instituto

Braga de Odontologia e Pesquisa pelo autor Paulo Carvalhosa, pondera que nos casos concretos

o profissional cirurgião-dentista, seja ele graduado, pós-graduado ou até mesmo especialista,

que agir no trato com o seu paciente com imperícia, negligência ou imprudência, em todos os

seus desdobramentos, incorre em ato ilícito passível de indenização. Conforme o autor (2018,

p. 33):

[...] age em relação ao seu paciente: com impericia, qual seja, mediante falta de especial

habilidade, ou experiência ou de previsão no exercício de sua determinada função,

enquanto profissão, arte e ofício; com negligencia, qual seja, omissão voluntária de

diligência ou de cuidado, ou ainda, falta ou demora no prevenir ou obstar um dano; ou

imprudencia, qual seja, a atuação intempestiva e irrefletida no praticar uma ação ou

omissão sem as necessárias precauções, agindo com precipitação, inconsideração, ou

inconstancia; faz com que o profissional incorra em ato ilícito indenizável.

Ainda acrescenta haver a possibilidade de caracterização de não somente dano moral,

mas como dano material, nos casos em que (2018, p. 36):

[...] alguém sofreu danos estéticos decorrentes de procedimentos de harmonização

facial, o que já constitui dano de monta no patrimônio imaterial da pessoa lesada,

causando-lhe sofrimento moral, emocional e psíquico, e por conta destes danos

estéticos, deixou ela de trabalhar por determinado período de tempo, ou por ter, no

caso de uma modelo, por exemplo, pessoa de imagem pública, portanto, não mais

podendo ela exercer sua profissão, dado o dano estético, deixando a mesma de auferir

valor pecuniário servente para a subsistência propria e de sua família, o autor do dano,

além de responder pelo dano moral a que deu causa, responde também pelos danos

materiais infligidos à pessoa, pelo ato ilícito.

Ensina ainda, o autor, acerca dos elementos necessários para tipificação da

responsabilidade civil do cirurgião dentista (2018, p. 37):

No caso do Cirurgião Dentista, para que incorra em responsabilidade civil,

necessariamente, devem ocorrer os seguintes elementos que tipificam a

responsabilidade civil, ou seja: a ação ou a omissão culposa do agente, a existência do

dano, e a determinação concreta e precisa do nexo de causalidade entre ato ou a

omissão lesante e o dano.

Carvalhosa (2018) ressalta ainda que, em linhas gerais, pode-se definir como obrigações

de meio aquelas odontológicas necessárias, ou seja, que tendem a restaurar estruturas e funções

(comprometidas ou perdidas), mas sem a existência de uma promessa de resultado, seja a

remissão dos sinais, sintomas, anatomias, funcionalidades comprometidas, entre outros, com a

intervenção do processo odontológico. Para ele (2018, p. 58):

Assim sendo, nas obrigações de meios, a responsabilidade civil (e por vezes, penal e

administrativa), não surge em virtude do resultado não alcançado, mas sim de conduta

odontologica eivada de negligência, imprudência ou imperícia no proceder.

39

Já as obrigações de resultado funcionam de maneira diferente, para o autor (2018, p. 58)

muitas vezes os pacientes procuram o cirurgião-dentista para fins “parcial ou puramente

estéticos, sem que haja patologia evidente”, neste tipo de obrigação a promessa de resultado

ocorre de forma expressa ou tácita, o que importa dizer que (2018. p. 57):

Na obrigação de resultado, se impõe anecessidade de se atingir um certo fim pré-

determinado, objetivado, prometido, que o Odontologista se comprometeu, expressa

ou tacitamente, realizar.

No trabalho acadêmico “Conhecimento do cirurgião dentista sobre as implicações

judiciais embutidas na cirurgia estética de bichectomia”, publicado pela Faculdade Maria Milza

(2018) e escrito pelo autor Jorge Vinicius Santana dos Santos, o autor bem define por dano

estético, aquele que consistir em uma deformidade aparente que não existia antes do

procedimento cirúrgico, neste caso realizado por cirurgiões-dentistas. Para o autor, tal

deformidade pode ser (2018, p. 22):

[...] responsável pela desfiguração/deformação da vítima, induzindo a sentimentos de

inferioridade em relação as demais pessoas. Já o dano psíquico, baseia-se nas

transformações de personalidade, com sintomas de inibições, depressões e bloqueios.

Este dano acarreta em incapacidade do lesado de relacionar-se socialmente de forma

saudável (MAGALHAES, 1980; VENOSA, 2003).

No mesmo tom dos autores anteriormente citados, Santos (2018) ressalta que os

cirurgiões-dentistas são passíveis de responsabilização civil, segmentada em obrigações de

meio e obrigações de resultado. Para ele as obrigações de meio são aquelas em que não há

previsibilidade de resultado, uma vez que existem diversos fatores, externos a execução do

profissional, que influenciam no resultado da cirurgia e/ou procedimento. Entende, portanto,

que (2018, p. 24):

Desta forma, na obrigação de meio, os profissionais não se responsabilizam pelo

resultado final obtido pelo paciente. Já as obrigações de resultados são representadas

pelas situações em que o resultado final é previsível ou situações em que os dentistas

prometem aos pacientes uma possibilidade de resultado. Sendo assim, os mesmos

deverão cumprir as promessas sob pena de indenização de dano e/ou insatisfação dos

pacientes.

No artigo “Responsabilidade do cirurgião-dentista frente ao código de Defesa do

Consumidor”, publicado pela UniFOA (2010) pelos autores Enio Figueira e Giselle Trindade

os autores ponderam que para haver a responsabilização do cirurgião dentista, é necessária a

ocorrência de cinco situações concomitantemente, quais sejam: 1. O agente cirurgião dentista

legalmente habilitado, uma vez que “[...]requer o agente, que necessariamente deverá ser um

cirurgião-dentista legalmente habilitado, não ficando, entretanto, isentos de penas, aqueles que

participam de práticas ilegais” (2010, p. 65); 2. O ato profissional, que pode ser “[...] por ação

40

ou omissão, é a segunda condição para que ocorra a materialização; tais atos obedecem às

normas e dispositivos específicos da Legislação” (2010, p. 65); 3. A ausência de dolo, o que

caracteriza que o profissional não agiu de forma proposital, tratando-se de “[...] culpa

profissional praticada sem a intenção de prejudicar, nas condições consagradas juridicamente

nas suas três espécies da imprudência, negligência ou imperícia” (2010, p. 65) ; 4. A existência

de dano, uma vez que para responsabilizar civilmente o profissional no exercício de sua

profissão “[...] será necessário, então, que haja a ocorrência de uma consequência danosa ou

um prejuízo para seu paciente”(2010, p. 65); 5. O nexo causal, ou seja, demonstração de causa

e efeito, sendo necessário para a responsabilização a demonstração de (2010, p. 65) “[...] uma

relação direta ou indireta entre o ato profissional e o dano produzido. O nexo causal é, portanto,

a configuração de que, sem a ação ou a omissão do profissional, não haveria ocorrido o prejuízo

ou o dano ao paciente.”

Quando do tocante a relação cirurgião dentista - paciente, os autores trazem à baila o

Código do Consumidor (2010, p. 67):

Dentre os profissionais englobados pelo dever de indenizar pelo Codigo de Defesa do

Consumidor, está o cirurgião-dentista, ou seja, fornecedor, definido em seu art 3o a

este cunho, sendo este um profissional liberal, que exerce uma atividade remunerada,

incluído neste conceito devido a seu serviço caracterizar-e como relação de consumo,

escolhido pelo consumidor “intuitu personae”, ou seja, a escolha se baseou em relação

de confiança e competência acreditados pelo paciente, este último, destinatário final

do serviço prestado, interpretado no artigo 2o do CDC, para que se caracterize como

consumidor.

Ainda ponderam que com o advento do supracitado Código, surgiram orientações mais

concretas e direcionadas quando do tocante aos erros médicos e odontológicos, orientando a

que direito o consumidor deve recorrer. Pois, conforme entendem (2010. p. 69):

[...] por esse Codigo, é dado ao consumidor uma proteção essencial, uma garantia de

efetivação da relação de consumo, a facilidade de sua defesa pela inversão do ônus da

prova a seu favor, cabendo ao cirurgião dentista provar que as alegações deste não são

verdadeiras.

Na mesma linha, segue o artigo “A Obrigação de Resultado nas Ações de

Responsabilidade Civil do Cirurgião-dentista no Brasil, em 2017”, publicado na Revista

Brasileira de Odontologia Legal - RBOL (2017) e escrito pelos autores Maria da Conceição

Lyra, Mariana Pereira e Jamully Musse, onde as autoras buscaram fazer um estudo

jurisprudencial sobre o entendimento jurídico brasileiro acerca do dilema entre:

responsabilidade de meio x responsabilidade de resultado dos profissionais odontólogos.

Acerca do tema, sustentam que o aumento dos processos judiciais movidos em face dos

profissionais cirurgiões-dentistas no Brasil, por seus pacientes, por motivo de insatisfação do

41

serviço prestado são considerados pelos autores (2017, p. 53) “[...] um dos temas que mais

afligem a classe odontológica, uma vez que envolvem pedidos de indenização, por seus

pacientes, devido à insatisfação com o tratamentos executado”. Segundo as autoras (2017, p.

53):

Por tal motivo, este estudo buscou analisar as jurisprudências nos Tribunais de Justiça

dos estados brasileiros, nos processos de responsabilidade civil envolvendo o CD,

considerando o número de ações judiciais, a distribuição por Estado e o entendimento

dos Magistrados de 1º e 2º Graus sobre a condenação ou não do CD, sobre a obrigação

contratual de meio ou de resultado e sobre as especialidades odontológicas.

Ressaltam também que é importante saber, identificar, a existência de um contrato

formal, ou não, uma vez que (2017, p. 53)

[...] se existe contrato, é no âmbito dos seus limites que será apurado o

inadimplemento. Se não há contrato, e a culpa decorre de um dever de conduta, é

neste agir do profissional que a culpa deve ser aferida. No entanto, em toda

responsabilidade profissional, ainda que exista um contrato, ou não, há sempre um

campo de conduta a ser examinado, inerente à profissão como ressalta Venosa

(2006). Enfim, o dever de indenizar pelo dano derivado da falha no tratamento

odontológico sobrevirá tanto da relação convencionada entre as partes, como da

que ocorreu sem contrato. Porém, quando a responsabilidade é dita contratual,

o descumprimento do contrato, por si só, cria a presunção de responsabilidade

do devedor, no caso o CD.

Finalmente, sobre a caracterização do tipo de obrigação, esclarecem que há a incidência

de obrigação de meio, quando nada mais é exigido senão a utilização dos meios adequados.

Acerca disso, exemplificam (2017, p. 54)

[...] É o exemplo comum do médico, que se obriga a envidar todos os esforços no

sentido de aplicar os meios indispensáveis à cura ou sobrevida do paciente, sem

que isto implique a obrigação de assegurar a própria cura ou o resultado benéfico.

Já quando se tratar de uma obrigação de resultado, as autoras esclarecem que o

profissional irá exonerar-se dela apenas nas hipóteses em que o fim prometido é alcançado, o

que quer dizer que não alcançando o profissional será visto como inadimplente, o que imputa

obrigação de responder pelos danos decorrentes do ato.

Sobre a grande maioria das cirurgias, enfatizam (2017, p. 54):

Oportuno destacar que, em regra, aos cirurgiões-dentistas é imputada a obrigação de

resultado. Esta afirmação foi demonstrada nesta pesquisa em que, excluindo os

recursos que não faziam referência ao tipo de obrigação, a maioria dos magistrados

considerou a obrigação do CD como de resultado (n=64) e apenas 16 magistrados

consideraram como de meio.

Por fim, concluem as autoras que (2017, p. 56):

[...] das análises das jurisprudências nos processos de responsabilidade civil do CD, a

obrigação do CD foi reafirmada como sendo, em sua maioria, de resultado,

principalmente quando a estética é envolvida [...].

42

No artigo “A Responsabilidade Civil e o Cirurgião- Dentista : direitos e obrigações”,

publicado pela Revista Cathedral (2020) e escrito por Cleiciane Aguiar, Vivian Souza e Marcela

Pereira, as autoras bem definem que a responsabilidade civil surge por motivo de uma quebra

contratual, uma violação obrigacional ou dano causado a terceiro, o que, dentro do campo da

odontologia, pode ser observado pelo uso de técnicas erradas, por exemplo.

Para elas (2020, p. 27):

O Cirurgião-dentista está mais propenso a sofrer certos riscos por conta da profissão

que exerce, pois o serviço prestado está relacionado com a expectativa paciente -

cliente. Então, o profissional responderá tanto por ação ou omissão inerentes a sua

obrigação de meio ou resultado.

Trazem a baila o Código de Defesa do Consumidor no tocante a responsabilidade

subjetiva do profissional cirurgião-dentista está estabelecido no princípio da culpa, ou seja

(2020. p. 31):

Não havendo culpa por parte do Cirurgião-dentista, inexiste o dever de indenizar. Esta

espécie de responsabilidade pode ser inserida como subjetiva na Odontologia,

conforme o Código de Defesa do Consumidor (CDC) em seu Art. 14, parágrafo 4°,

responderá o fornecedor de serviços, independentemente da presença da culpa, para

reparação dos prejuízos causados aos seus consumidores por defeitos relacionados à

prestação dos serviços, assim como inadequada utilização e riscos ou por

informações insuficientes. Para os profissionais liberais, a responsabilidade será

apurada por meio da verificação da culpa.

Desta forma, concluem as autoras (2020) que com esta definição, baseada neste

princípio, ou seja, um cenário de vinculação de relação de consumo, o profissional dentista

passa a figurar como prestador de serviço e o paciente, como consumidor.

Ainda, seguindo no mesmo sentido dos demais autores aqui citados, e elucidando ainda

mais detalhadamente o caso (2020, p. 31):

Segundo o CFO (2012), são consideradas especialidades odontológicas de meio:

cirurgia e traumatologia buco-maxilo-facial, endodontia, odontopediatria,

periodontia, ortodontia, prótese buco-maxilo-facial, odontologia do trabalho,

odontologia para PNE, odontogeriatria e ortopedia funcional dos maxilares.

Ao passo que, na obrigação de resultado existe a vinculação do profissional a alcançar

um determinado resultado (diferentemente da obrigação de meio anteriormente citada). Ainda

frisam que por força de contrato o profissional cirurgião dentista está submetido, obrigado, a

alcançar um resultado. Não o alcançando, deverá responder pelos danos resultantes de tal

inadimplemento.

Esclarecem ainda que (2020, p. 32):

E as especialidades de obrigação de resultado no que tange o CFO (2012) são:

dentística restauradora, odontologia em saúde coletiva, odontologia legal, patologia

bucal e radiologia. Com isso, a obrigação de meio é o próprio exercício do

profissional, na obrigação de resultado será a consequência da ação.

43

Por fim, no trabalho acadêmico “Reflexões sobre a responsabilidade civil do cirurgião-

dentista”, publicado pela revista Arch. Health Invest (2019), e escrito por Victor Colucci Netto,

o autor frisa a importância de distinguir o conceito de obrigação da noção de responsabilidade,

uma vez que, para ele (2019, p. 192) “[...] obrigação é sempre um dever jurídico originário,

ao passo que responsabilidade é um dever jurídico sucessivo, consequente à violação

do primeiro”, esclarece que (2019, p. 192):

Se alguém se compromete a prestar serviços profissionais a outrem, assume uma

obrigação, um dever jurídico originário. Se não cumprir a obrigação, violará o dever

jurídico originário, surgindo daí a responsabilidade, o dever de recompor o prejuízo

pelo não cumprimento da obrigação.

Na mesma linha dos demais, também defende a importância da distinção entre obrigação

de meio e resultado para a imputação de responsabilidade civil ao cirurgião-dentista, uma vez

que será desta definição é que tem origem a diferença a respeito do ônus da prova da culpa em

um processo.

Diferencia ambas, determinando que a obrigação de meio se dá quando o profissional,

que figura como devedor da obrigação, compromete-se a (2019, p. 196) “[...] empregar seus

conhecimentos, meios técnicos para a obtenção de determinado resultado, sem, no entanto,

responsabilizar - se por ele”. O autor bem exemplifica (2019, p. 196)

É o caso, por exemplo, dos advogados, que não se obrigam a vencer a causa, mas sim

a bem defender os interesses dos clientes de acordo com o emprego de todos os meios

técnicos disponíveis; bem como o caso dos médicos, que não se obrigam a curar, mas

tratar bem os enfermos, fazendo uso dos meios, consistentes em seus conhecimentos

científicos.

Ao passo que para Netto (2019) será caracterizada como obrigação de resultado quando

o profissional, que novamente figura como devedor da obrigação, se vincula a um resultado

específico. Nesses casos, portanto, o profissional apenas não será responsabilizado quando

(2019, p.196):

Não logrando êxito em atingir o resultado a que se comprometeu, o profissional é

considerado inadimplente e obrigado a responder pelos prejuízos decorrentes do

insucesso. Exemplo clássico de obrigação dessa natureza é a assumida pelo

transportador, que promete tacitamente, ao vender o bilhete de passagem, levar o

passageiro são e salvo a seu destino. Outro exemplo clássico é a obrigação do médico

no caso da cirurgia plástica estética, há o compromisso com um resultado específico

previsto ou esperado, ensejando obrigação de resultado.

Frisa o autor que, tendo presente a caracterização da obrigação de resultado (2019, p.

196):

[...] a não obtenção desse resultado importa o inadimplemento das obrigações

assumidas e a responsabilidade pelo dano ocasionado. Não se eximirá da

responsabilidade provando apenas ausência de culpa. Incumbe ao inadimplente o ônus

44

de demonstrar que o dano se verificou por força maior, caso fortuito externo, culpa

exclusiva da vítima ou, ainda, fato exclusivo de terceiro [...]

Ainda especificamente sobre a responsabilidade civil dos dentistas, discorre que a

mesma (2019, p. 197):

[...] decorreria de uma obrigação de resultado, e justifica sua posição no fato de que

os procedimentos de tratamento dentário são mais regulares, específicos, localizados.

A obturação de uma cárie, o tratamento de um canal, a extração de um dente, são

procedimentos que exigem uma técnica específica, mas que permitem se assegurar a

obtenção de um resultado específico. Assim, segundo o jurista, ao desempenhar estas

atividades o profissional odontólogo compromete-se com um resultado a entregar, e

não apenas com a aplicação da melhor técnica e meios científicos.

Por fim conclui que verificar-se que resta caracterizada a responsabilidade do cirurgião

dentista como sendo subjetiva, com classificação da obrigação como sendo de natureza de

resultado e não de meio.

3.3 ARGUMENTOS ACERCA DA RESPONSABILIDADE CIVIL DO CIRURGIÃO

DENTISTA: OUTRAS ABORDAGENS

Há também, os estudos que indicam não haver consenso na caracterização da natureza

da obrigação imputada ao cirurgião-dentista no exercício de sua profissão, necessitando de mais

estudos e tempo para enfim chegar em tal definição.

No artigo “Estudo da percepção de cirurgiões-dentistas quanto à natureza da obrigação

assumida na prática odontologica”, publicado pela Revista de Odontologia da UNESP (2006),

os autores Cléa Garbin, Artênio Garbin e Ricardo Lelis ponderam que o Código de Defesa do

Consumidor, em seu artigo 3º, bem define fornecedores como sendo “[...] todas as pessoas

físicas ou jurídicas que desenvolvem atividades de produção, comercialização, distribuição de

produtos ou prestação de serviços”, restando evidente caracterizar o cirurgião-dentista como

um prestador de serviços odontológicos, enquadrando-se perfeitamente no conceito de

fornecedor, de modo que pode ser acionado judicialmente. Nesta relação, figura o paciente

como o consumidor, que é definido pelo citado codigo como “[...] toda pessoa física ou jurídica

que adquire ou utiliza produtos ou serviços como destinatário final”.

Questionam, os autores (2006) que a obriga assumida pelo profissional é um “[...] tema

de grande conflito e polêmica, inexistindo um consenso entre cirurgiões-dentistas, juristas e

pesquisadores da área”. Conforme pensam (2006): “A dependência da resposta biologica do

paciente ou até a sua colaboração para o sucesso do tratamento odontológico têm feito alguns

juristas perceberem que, na Odontologia, não pode haver previsibilidade de resultados”.

45

Na mesma linha, discorrem os autores que (2006, p.214):

[...] embora a percepção de alguns juristas venha inclinando-se para a obrigação de

meio, a prática odontológica, para o direito, assume, via de regra, obrigação de

resultado. Dessa forma, sabendo-se que o êxito de um tratamento odontológico está

na dependência não só da adoção de uma técnica correta e atualizada pelo profissional,

mas também da resposta biológica do paciente ante a terapêutica adotada e, ainda, dos

hábitos e cuidados adotados por este, acreditamos que, a princípio, todas as

especialidades deveriam ser consideradas como meio, devendo-se, obviamente,

apurar a conduta do cirurgião-dentista observando-se a sua documentação.

Ao final do trabalho, concluem na mesma linha de pensamento, onde afirmam que

embora a maioria dos cirurgiões-dentistas tenha afirmado que a Odontologia deveria assumir

obrigação de meio, não há ainda um consenso quanto a isso.

Na mesma linha do trabalho anterior, o artigo “Responsabilidade civil e ética do

ortodontista”, publicado pela Revista Dental Press Ortodontia e Ortopedia Facial (2004), os

autores Bruno Minervino e Omásio Teixeira questionam nos tempos modernos houve uma

mudança da relação médico paciente deslocando-se “[...] verticalmente a posição impositiva e

imperial do médico, para assumir um comportamento mais horizontalizado, mais democrático”.

O que consideram ter havido na área da saúde como um todo, afetando diretamente, também, a

relação do profissional cirurgião-dentista com seu paciente (2004, p. 90):

Essa globalização gera uma busca de conhecimento por parte dos pacientes. O mesmo

procura conhecer melhor o seu caso, através de informações específicas, busca o

saber, investiga, questiona o ortodontista, indaga a respeito de seu tratamento como

um todo. E é dever do profissional fornecer todas as informações necessárias.

Os autores discorrem sobre a relação contratual da relação entre o cirurgião-dentista e

seus pacientes, sendo “[...] o contrato é o ato resultante do acordo de vontades entre duas ou

mais pessoas, a respeito de um certo e determinado assunto”.

Sobre a obrigação de meio, para eles (2004) essa nada mais é do que a própria relação

contratual (2006, p. 91):

A obrigação de meio é a própria relação contratual, sem que para isso se atinja

determinado resultado. Isto é, existem fatores fora do alcance do contratado, de difícil

resolução que impedem que ele alcance o êxito total ao término do tratamento. São os

contratos que estabelecem obrigação de meios. Assim, o contratado se compromete a

utilizar-se de todos os meios ao seu alcance, para realizar os objetivos previstos no

contrato, mas, sem precisar alcançar na íntegra o resultado final

Já a respeito da obrigação de meio, bem caracterizam que a mesma se dá quando o

contratado obrigou-se com um resultado no momento da contratação do serviço prestado pelo,

o que quer dizer (2004, p. 92):

[...] é quando o contratado se obrigou, no momento da aquisição da obrigação, a

executar determinado trabalho, sendo essa promessa o objeto da celebração do

contrato. Nem o fato do serviço ser de execução incerta ou impossível, poderá

aproveitar o devedor, pois a promessa de obtenção do resultado pretendido pelo credor

46

foi determinada na celebração do contrato, e é o devedor, melhor que ninguém, por

ter o conhecimento científico, que pode avaliar ou não a obtenção de êxito na execução

do tratamento proposto inicialmente.

No entanto, após bem definir as características das obrigações, concluem que pela

análise da jurisprudencial, conclui-se que (2004, p. 95):

[...] ambas as obrigações de meio e fim, têm fundamentação jurídica. Com isso, não

se define em um contrato a modalidade obrigacional, apesar de existir uma tendência

a considerar os procedimentos odontológicos como de fim. Contudo, essa corrente

jurídica não deve prosperar sem que haja discussão significativa sobre o tema.

Resta evidente, portanto, que ainda que em maior número sejam aqueles acadêmicos

que já se posicionam com relação ao tema, acreditam já ser possível uma determinação da

natureza obrigacional da Responsabilidade Civil do Cirurgião Dentista, ainda existe uma

parcela que acredita que o tema é recente e demanda ainda mais tempo, estudo, para tal

determinação, sob pena de incorrer em injustiça perante os profissionais. Para melhor

esclarecer, portanto, trataremos no próximo tópico evidências empíricas (leis, resoluções e

jurisprudências) para nortear o presente estudo.

47

4 EVIDÊNCIAS EMPÍRICAS DA RESPONSABILIDADE CIVIL DO CIRURGIÃO

DENTISTA NAS CIRURGIAS DE HARMONIZAÇÃO OROFACIAL

A partir deste ponto passa-se a apresentar e discutir os efeitos da Lei nº 5.081/1966 e

Resoluções nº CFO-198/2019 e 230/2020 para a caracterização da Responsabilidade Civil do

Cirurgião Dentista pelo dano causado nas Cirurgias de Harmonização Orofacial.

Para tanto, utilizou-se análise jurisprudencial acerca das decisões dos Tribunais a

respeito da caracterização da natureza obrigacional do profissional enquadrando-a como

obrigação meio ou de resultado.

4.1 UMA ANÁLISE DA REGULAMENTAÇÃO GERAL DA ODONTOLOGIA – LEI Nº

5.081/66

De acordo com a Lei 5.081/66, compete aos cirurgiões dentistas, nos termos do art. 6º,

o seguinte:

Art. 6º Compete ao cirurgião-dentista: I - praticar todos os atos pertinentes a

Odontologia, decorrentes de conhecimentos adquiridos em curso regular ou em

cursos de pós-graduação; II - prescrever e aplicar especialidades farmacêuticas de

uso interno e externo, indicadas em Odontologia; III - atestar, no setor de sua atividade

profissional, estados mórbidos e outros, inclusive, para justificação de faltas ao

emprego.IV - proceder à perícia odontolegal em fôro civil, criminal, trabalhista e em

sede administrativa; V - aplicar anestesia local e truncular; VI - empregar a analgesia

e a hipnose, desde que comprovadamente habilitado, quando constituírem meios

eficazes para o tratamento; VII - manter, anexo ao consultório, laboratório de prótese,

aparelhagem e instalação adequadas para pesquisas e análises clínicas, relacionadas

com os casos específicos de sua especialidade, bem como aparelhos de Raios X, para

diagnóstico, e aparelhagem de fisioterapia; VIII - prescrever e aplicar medicação de

urgência no caso de acidentes graves que comprometam a vida e a saúde do paciente;

IX - utilizar, no exercício da função de perito-odontólogo, em casos de necropsia, as

vias de acesso do pescoço e da cabeça. (grifo nosso)

Conforme é possível depreender do dispositivo acima citado a competência na atuação

do cirurgião depende de expressa colocação. Conforme o texto da lei, compete ao profissional

colocar em prática todos aqueles atos pertinentes ao exercício da odontologia, quando

adquiridos em cursos de graduação e/ou pós-graduação, devidamente regulamentados e

reconhecidos da área. Ainda pode prescrever medicações, desde que indicadas no campo da

odontologia, aplicar analgesia, fornecer atestados odontológicos (tanto de estados mórbidos

quanto ausência no emprego), realizar perícia odontolegal, possuir anexo ao consultório

laboratório e outros utilizados para o devido diagnóstico bem como, em casos de necropsia,

utilizar as vias de cabeça e pescoço.

48

Nesse sentido a lei também regulamenta as situações de impedimento da prática

profissional do cirurgião dentista, conforme segue:

Art. 7º. É vedado ao cirurgião-dentista: a) expor em público trabalhos odontológicos

e usar de artifícios de propaganda para granjear clientela; b) anunciar cura de

determinadas doenças, para as quais não haja tratamento eficaz; c) exercício de mais

de duas especialidades; d) consultas mediante correspondência, rádio, televisão ou

meios semelhantes; e) prestação de serviço gratuito em consultórios particulares; f)

divulgar benefícios recebidos de clientes; g) anunciar preços de serviços, modalidades

de pagamento e outras formas de comercialização da clínica que signifiquem

competição desleal.

É inequívoca a intenção de impor limites à área de atuação quando observados os citados

dispositivos. E, para a presente análise, é importante comentar que determinada a área de

atuação pela lei supracitada e, uma vez extrapolados os limites impostos, poderá incorrer em

ato ilícito o profissional cirurgião dentista, resultando em um dever de indenizar.

Ademais, no momento em que há permissões e vedações, em um campo onde há uma

ação de um profissional, prestando um serviço, em especial esse tipo de atividade (intervenção

cirúrgica invasiva) a possibilidade de incorrer em erro, cometer ato ilícito, e gerar um dano é

palpável.

Conforme explicado no segundo capítulo, Cavalieri bem definiu o dever de indenizar

como aquele que extrai-se da leitura e análise conjugada dos artigos 927, 186 e 187 do Código

Civil, qual seja, os artigos 186 e 187 definem o que entende-se por ato ilícito ao passo que o

927 nos dá a consequência lógica. Compilando-os, entende-se que art. 186: “[...] aquele que por

ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência [...]”, bem como, art. 187: “[...] aquele

que é titular de um direito que, ao exercê-lo, excede manifestadamente os limites impostos pelo

seu fim econômico ou social, pela boa-fé ou pelos bons costumes [...]”, art. 927: “[...] causar

dano a outrem, fica obrigado a repará-lo” (BRASIL, 2002).

Ainda importante mencionar que, conforme bem defendeu Wander Pereira, sendo

subjetiva a responsabilidade civil do cirurgião dentista, nos moldes do artigo 14, §4º do Código

de Defesa do Consumidor, faz-se necessário não apenas o a presença do dano, mas também a

correlação entre dano e nexo de causalidade, originado necessariamente no ato ilícito.

Vale ressaltar que a presente lei, que regulamenta a profissão dos dentistas, por ter sido

publicada no ano de 1966, não prevê em seu corpo de texto nada relacionado a natureza

obrigacional do cirurgião dentista especificamente nas cirurgias de harmonização orofacial,

uma vez que à época sequer existia essa prática, no entanto, como norma regulamentadora, é

ela que nos dá chão, nos dá contexto, para então nos próximos tópicos abordar o tema de

maneira mais específica.

49

4.1.1 Principais aspectos da Resolução CFO-198/2019

A Resolução publicada em janeiro de 2019, conforme o seu primeiro artigo bem explica,

veio para regulamentar/reconhecer a prática de Harmonização Orofacial como sendo uma

especialidade do campo da odontologia.

O segundo artigo da resolução trás o relevante conceito do que se trata tal cirurgia,

conceito já abordado no segundo capítulo do presente trabalho mas faz-se importante relembrar,

qual seja: o apanhado de procedimentos, cirúrgicos ou não, realizados pelo profissional

cirurgião-dentista em sua área de atuação, responsáveis pelo equilíbrio facial, tanto estético

quanto funcional.

De forma mais específica:

Art. 3º. As áreas de competência do cirurgião-dentista especialista em Harmonização

Orofacial, incluem: a) praticar todos os atos pertinentes à Odontologia, decorrentes de

conhecimentos adquiridos em curso regular ou em cursos de pós-graduação de acordo

com a Lei 5.081, art. 6, inciso I; b) fazer uso da toxina botulínica, preenchedores

faciais e agregados leucoplaquetários autólogos na região orofacial e em estruturas

anexas e afins; c) ter domínio em anatomia aplicada e histofisiologia das áreas de

atuação do cirurgião-dentista, bem como da farmacologia e farmacocinética dos

materiais relacionados aos procedimentos realizados na Harmonização Orofacial; d)

fazer a intradermoterapia e o uso de biomateriais indutores percutâneos de colágeno

com o objetivo de harmonizar os terços superior, médio e inferior da face , na

região orofacial e estruturas relacionadas anexas e afins; e) realizar procedimentos

biofotônicos e/ou laserterapia, na sua área de atuação e em estruturas anexas e afins;

e, f) realizar tratamento de lipoplastia facial, através de técnicas químicas, físicas

ou mecânicas na região orofacial, técnica cirúrgica de remoção do corpo adiposo de

Bichat (técnica de Bichectomia) e técnicas cirúrgicas para a correção dos lábios

(liplifting) na sua área de atuação e em estruturas relacionadas anexas e afins. (grifo

nosso)

Ou seja, em resumo as áreas de competência, traduzidas em procedimentos faciais, que

os cirurgiões dentistas são aptos a realizar são: o uso da toxina botulínica e preenchedores

faciais, intradermoterapia (infiltração de materiais) e o uso de biomateriais indutores

percutâneos de colágeno, bem como procedimentos de laserterapia, realizar tratamento de

lipoplastia facial, técnica de bichectomia e técnicas cirúrgicas para a correção dos lábios

(liplifting).

Ato contínuo, nota-se, quando comparado ao artigo 6º da Lei nº 5.081/66, um

alargamento da área de atuação do cirurgião dentista, no que concerne a aplicação de técnicas

voltadas a estética da face, ou seja, esse profissional passou a não ser mais responsável apenas

pela saúde bucal, mas sim pela harmonia estética da face como um todo.

Cruzando com os conceitos aqui estudados, nota-se que a responsabilidade civil desse

profissional decorre da própria natureza da atividade, ou seja, uma vez o mesmo pratica

qualquer uma das atividades listadas ele incorre em risco de errar ou acertar, esse erro ou acerto

50

pode prejudicar ou beneficiar o seu paciente/cliente, e determinar como os conceitos

determinantes que compões a responsabilidade civil são extremamente necessários para

entender a extensão e até onde esse profissional terá o dever de indenizar.

Visto isto, já é sabido da necessidade da determinação a respeito da natureza da

obrigação, como sendo de meio o de resultado, para definir e delimitar o dever de indenizar

desses profissionais, bem como rememorando o que bem definiu Wander Pereira, no segundo

capítulo do presente estudo, em regra para problemas oriundos de cirurgias odontológicas

estéticas deve entender-se como uma obrigação de resultado com natureza contratual, uma vez

que, ofertado um resultado estético específico (é fácil notar com a chuva de publicações e

propagandas que recebe-se diariamente acerca desses procedimentos cirúrgicos), e analisado o

campo de atuação previsto no artigo 3º, ora analisado, resta pouco espaço para dúvida do

comprometimento do profissional com o resultado específico.

Ainda bem defendeu, como sendo de resultado, o acadêmico Mauricio Kennedy Sá, no

capítulo terceiro, elucidando que ainda que não se aplique em todo o exercício da odontologia,

em regra tanto jurisprudência, quanto doutrina, vem apontando para o entendimento de que será

de resultado a obrigação do cirurgião dentista neste tipo de atividade.

Sobre o registro do especialista, resta importante frisar quem terá o direito:

Art. 9º. Também terá direito ao registro como especialista em Harmonização Orofacial

o cirurgião-dentista que: a) apresente, a qualquer tempo, o certificado de conclusão ou

comprove a efetiva coordenação de curso de especialização nesta área iniciado antes

da vigência desta norma e regulamentado pelo MEC; b) possuindo especialidade

registrada em Cirurgia e Traumatologia Bucomaxilofacial, comprove, em até 180

(cento e oitenta) dias, atuação efetiva em harmonização orofacial nos últimos 5(cinco)

anos; c) possuindo qualquer outra especialidade registrada, comprove, em até 180

(cento e oitenta) dias, atuação efetiva nos últimos 5 (cinco) anos e a realização de

cursos, que totalizem no mínimo 360 (trezentas e sessenta) horas, e que contenham

conteúdos práticos com pacientes na área de preenchedores faciais e toxina

botulínica, fios faciais, lipoplastia facial, agregados leuco-plaquetários autólogo,

mesoterapia e indutores percutâneos de colágeno e fototerapia facial. (grifo

nosso)

Resta claro no dispositivo acima citado que, além daqueles que possuem curso de pós-

graduação específico na área de harmonização orofacial, aqueles cirurgiões dentistas que

comprovadamente possuírem prática anterior a publicação da norma específica, ou certificações

de cursos regulamentados pelo MEC pertinentes a área, também poderão ter seu registro como

especialista em Harmonização Orofacial.

Ainda nessa parte do texto da resolução, é possível traçar um paralelo com a

característica notória da cirurgia de harmonização orofacial como sendo de embelezamento.

Nota-se do dispositivo supracitado que poderá ter sua especialização reconhecida aquele que

51

possuir prática em preenchedores faciais, uso de botox, lipoplastia facial, dentro outros

elencados, procedimentos cirúrgicos sabidamente procurados e adquiridos por motivos

estéticos, vendidos como serviços com um fim específico.

Nesse momento faz-se importante recapitular novamente o já explicado no capítulo

segundo do presente trabalho, quando Wander Pereira bem define que, entre o profissional

cirurgião dentista e seu cliente/paciente há uma relação baseada na prestação de serviços pelo

dentista e, por outro lado, a satisfação e pagamento pelo serviço por parte do cliente/paciente,

articulando-se uma relação evidentemente contratual, que visa um resultado específico, na

presente análise do artigo 9º, depreende-se que o mesmo em grande parte das vezes é, como o

é nas cirurgias plásticas, um resultado puramente estético.

4.1.2 Elementos essenciais da Resolução CFO-230/2020

A recente Resolução publicada em agosto de 2020 veio para regulamentar o artigo 3º

da Resolução CFO-198/2019, citada no item anterior, e traz esclarecimentos sobre o que é

vedado ao Cirurgião Dentista, conforme segue:

Art. 1º. Fica vedado ao cirurgião-dentista a realização dos seguintes procedimentos

cirúrgicos na face: a) Alectomia; b) Blefaroplastia; c) Cirurgia de castanhares ou

lifting de sobrancelhas; d) Otoplastia; e) Rinoplastia; e, f) Ritidoplastia ou Face

Lifting. Art. 2º. Fica vedado também ao cirurgião-dentista a realização de publicidade

e propaganda de procedimentos não odontológicos e alheios à formação superior em

Odontologia, a exemplo de: a) Micro pigmentação de sobrancelhas e lábios; b)

Maquiagem definitiva; c) Design de sobrancelhas; d) Remoção de tatuagens faciais e

de pescoço; e) Rejuvenescimento de colo e mãos; e, f) Tratamento de calvície e outras

aplicações capilares. Art. 3º. Fica vedado ao cirurgião-dentista a realização de

procedimentos em áreas anatômicas diversas de cabeça e pescoço.

Analisando a Resolução, dos artigos 1º ao 3º, há uma lista de proibições com relação a

procedimentos e posturas do profissional dentista, tais como procedimentos cirúrgicos de

lifting, rinoplastia, otoplastia, atribuições específicas dos cirurgiões plásticos, bem como

quaisquer procedimentos em outras áreas diversas da cabeça e pescoço.

Bem como é vedado também a publicidade e propaganda de procedimentos alheios a

odontologia, tais como micropigmentação, design de sobrancelhas, entre outros.

Frisa-se, os dispositivos presentes na Resolução vedam determinados procedimentos

cirúrgicos mais invasivos, ou seja, o cirurgião dentista poderá fazer lifting facial não invasivo

(com inserção de linhas condutoras) ou enzimático (inserção de enzimas que agem de forma

local), restando sob responsabilidade médica (cirurgião plástico) as cirurgias abertas nesse

sentido. No entanto, ainda que de formas diferentes, técnicas diferentes e custos diferentes, o

52

objetivo de ambas é o mesmo: o lifting facial. Não descaracterizando em momento algum o

objetivo estético da mesma, altera apenas o “modo”, não o “motivo”.

Novamente recapitulando o capítulo segundo do trabalho, bem definiu Bittar como

sendo obrigação de resultado aquelas com caráter estético, aquelas que fogem da área da saúde

bucal e entram a área das cirurgias estéticas, sendo aquelas que o cirurgião dentista mediano

tem a possibilidade e controle em atingir um resultado, um fim desejado, devendo entregar

satisfação ao seu cliente/paciente que adquiriu esse serviço contratado.

Resta importante ressaltar, antes de seguirmos para o seguinte tópico, acerca da

inexistência, conforme visto nos artigos das normas regulamentadoras citados no presente item,

de dispositivo prevendo a responsabilidade civil do dentista e a caracterização da natureza

obrigacional, como sendo de meio ou de resultado.

As Resoluções limitam-se a determinar o que é Harmonização Orofacial, a área de

atuação do cirurgião dentista, o que é permitido e o que não é, restando uma imensa lacuna de

incerteza, quanto a responsabilidade civil dos profissionais no exercício dessa atividade. E,

ainda que a Resolução 230/2020 tenha surgido na clara intenção de preencher vácuos, tornar

menos obscuro, delimitar a área de atuação, ainda assim ela não preenche essa lacuna.

No entanto, resta evidente após a análise dos dispositivos, com a ótica do que foi

apreendido da pesquisa do trabalho como um todo que: ultrapassados os limites da área de

competência, ou, ainda que na área, houver um dano causado, com nexo de causalidade

presente, o que significa dizer que sem a intervenção não haveria dano, e presente a

caracterização de obrigação de resultado, uma vez a relação ser contratual e haver um

comprometimento por parte do profissional e expectativa gerada, por parte do paciente/cliente,

não resta dúvida a presença de todos os elementos necessários para o dever de indenizar.

4.2 ANÁLISE DA JURISPRUDÊNCIA ACERCA DA RESPONSABILIDADE CIVIL DO

CIRURGIÃO DENTISTA NA CIRURGIA DE HARMONIZAÇÃO OROFACIAL

Como já demonstrado, há uma dissonância grande entre doutrinadores, quando da

caracterização da natureza da obrigação a ser imputada ao cirurgião dentista que causar dano a

outrem em procedimento cirúrgico, em especial na harmonização orofacial, que como

levantado no item anterior é uma especialidade ainda que muito recente, muito procurada pela

população.

A análise jurisprudencial aqui feita, nos trás conceitos e diretrizes do que entendem hoje

os tribunais acerca do tema, para nos guiarem a uma conclusão factível, no presente trabalho.

53

Para tanto, trouxemos dois grupos de decisões: reconhecimento da obrigação de meio e

reconhecimento da obrigação de resultado

4.2.1 O Reconhecimento da obrigação de resultado na jurisprudência brasileira

Conforme exaustivamente demonstrado no trabalho, as obrigações de resultado são

aquelas em que o profissional (cirurgião dentista) compromete-se com o seu paciente a chegar

em um resultado específico após o procedimento cirúrgico, ou seja, existe uma expectativa com

relação a um resultado específico por ambas as partes, em especial o paciente, que está

contratando o serviço.

No sentido de determinar a natureza obrigacional como sendo obrigação de resultado,

entendeu em decisão o Tribunal de Justiça do estado de São Paulo - TJSP:

78081593 - APELAÇÃO. INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS E MATERIAS.

Prestação de serviços odontológicos. Sentença de procedência. Insurgência do réu.

Implante dentário. Relação inserta no âmbito do direito do consumidor. Obrigação

de resultado. Aquele que se submete a procedimento de próteses ou implantes

dentários está interessado diretamente no resultado. Laudo pericial elaborado pelo

IMESC, por cirurgião dentista. Conclusão pela falha na prestação de serviços, bem

como existência de nexo causal entre os fatos narrados na inicial e os danos relatados

pela autora. Devolução integral dos valores pagos ao réu. Valores desembolsados a

título de reparação dos serviços prestados. A quantia. Indenizatória deve ser parcial,

se limitar à diferença entre o preço dos serviços. Pagos ao requerido com os gastos

pelo novo procedimento realizado. Responsabilidade civil pelos danos morais

configurada. Indenização bem fixada, que não comporta reparos. Sentença

parcialmente reformada. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO. (TJSP; AC

1030678-30.2014.8.26.0506; Ac. 14076815; Ribeirão Preto; Terceira Câmara de

Direito Privado; Relª Desª Maria Salete Corrêa Dias; Julg. 21/10/2020; rep. DJESP

26/10/2020; Pág. 2019) (grifo nosso)

Nesta primeira decisão analisada, o desembargador reconheceu a natureza obrigacional

do cirurgião dentista como sendo obrigação de resultado, uma vez ser evidente que alguém, que

contrata um serviço, submetendo-se a um procedimento/cirurgia de próteses ou implantes

dentários, sem sombra de dúvidas está na expectativa de um resultado específico, este acordado

entre partes quando da contratação do serviço. Assim, e cumprindo os requisitos previstos em

lei (responsabilidade civil subjetiva), evidencia-se a obrigação de resultado e o dever de

indenizar do profissional.

Neste mesmo sentido decidiu em outro processo o mesmo tribunal:

54

48801579 - CIVIL. PROCESSUAL CIVIL. CONSUMIDOR. AÇÃO

INDENIZATÓRIA POR DANOS MORAIS E MATERIAIS. TRATAMENTO

ODONTOLÓGICO. PRELIMINAR. IRREGULARIDADE FORMAL DO APELO

ADESIVO. REJEIÇÃO. MÉRITO. IMPLANTE DENTÁRIO. OBRIGAÇÃO DE

RESULTADO. RESPONSABILIDADE CIVIL SUBJETIVA COM CULPA

PRESUMIDA DO DENTISTA. CLÍNICA ODONTOLÓGICA. HOSPITAL.

RESPONSABILIDADE OBJETIVA. ÓBITO DA PACIENTE. CAUSA MORTE

AFETA ÀS PATOLOGIAS SISTÊMICAS. CONDUTA ILÍCITA E NEXO

CAUSAL NÃO DEMONSTRADOS. DANOS MORAIS E MATERIAIS

AFASTADOS. RECURSO ADESIVO DO RÉU PROVIDO. SENTENÇA

REFORMADA. MÉRITO DO APELO PRINCIPAL DO AUTOR PREJUDICADO.

SUCUMBÊNCIA REDISTRIBUÍDA. HONORÁRIOS RECURSAIS FIXADOS. 1.

Segundo o Enunciado Administrativo n. 3 do STJ, aos recursos interpostos com

fundamento no CPC/2015 (relativos a decisões publicadas a partir de 18 de março de

2016), como é o caso dos autos, devem ser exigidos os requisitos de admissibilidade

recursal na forma do novo CPC. Nessa situação, por inteligência do Enunciado

Administrativo n. 7 do STJ, é possível o arbitramento de honorários sucumbenciais

recursais, com base no art. 85, § 11, do CPC/15. 2. Ostentando o recurso adesivo do

réu fundamentos de fato e de direito hábeis, em tese, a rechaçar a conclusão da

sentença (CPC/15, art. 1.010, II; CPC/73, art. 514, II), rejeita-se a preliminar de

irregularidade formal do apelo. 3. Se, em relação aos médicos, a regra é a obrigação

de meio, no que respeita aos dentistas a regra é a obrigação de resultado. E assim

é porque os processos de tratamento dentário são mais regulares, específicos, e

os problemas menos complexos. Dessa forma, quando um cliente manifesta interesse

para a colocação de aparelho corretivo dos dentes, de jaquetas de porcelana e,

modernamente, pelo implante de dentes, está um busca de um resultado, não lhe

bastando mera obrigação de meio (CAVALIERI FILHO, Sergio. Programa de

responsabilidade civil, 2012, pp. 429-430). 3.1. Embora se cuide de obrigação de

resultado, por força do art. 14, § 4º, do CDC, cumpre destacar que a responsabilidade

do dentista é de cunho subjetivo com culpa presumida, incumbindo ao profissional

autônomo o ônus da prova quanto à inexistência de culpa nas modalidades

imprudência, negligência e imperícia. 4. No que tange à clínica odontológica, sua

responsabilidade, em regra, é de cunho objetivo quanto à falha de serviço cuja

atribuição lhe é afeta (hospedagem, internação, serviços auxiliares etc.), conforme art.

14 do CDC e 186, 927, 932, III, e 933 do CC. Todavia, se o hipotético equívoco

atribuído deriva da imperícia/imprudência/negligência imputada ao profissional nela

atuante, como é o caso dos autos, e não de falha havida no seu serviço específico, a

responsabilidade da clínica, embora solidária devido à cadeia de fornecimento do

serviço, somente se configura quando comprovada a conduta culposa daquele. 5. A

responsabilidade civil do hospital também é de natureza objetiva, conforme art. 14 do

CDC e 186, 927, 932, III, e 933 do CC, em razão do risco da atividade desenvolvida,

sendo necessária a análise da conduta do profissional dentista atuante no caso concreto

e a sua relação com o nosocômio. [...] (TJDF; APC 2015.03.1.021063-2; Ac.

101.9693; Primeira Turma Cível; Rel. Des. Alfeu Machado; Julg. 24/05/2017;

DJDFTE 12/06/2017) (grifo nosso)

Esta jurisprudência é interessante. Ainda que o desembargador tenha julgado procedente

o recurso adesivo do réu, no sentido de afastar o dever de indenizar, houve o reconhecimento

da obrigação de resultado do cirurgião dentista com responsabilidade subjetiva, lastreada na

culpa presumida.

Neste sentido, com a inversão do ônus da prova, o réu demonstrou no processo que não

há provas da existência de nexo de causalidade ou prova de negligência, imprudência ou

imperícia do profissional para que o dano causado a paciente (óbito) seja devido a cirurgia. O

55

que significa dizer que não existia nada de diferente que o cirurgião dentista, dentro de suas

atribuições, poderia ter feito para que o dano não tivesse ocorrido.

No entanto, todo o raciocínio que levou a isenção de responsabilidade, foi realizado com

lastro na responsabilidade subjetiva com caracterização da natureza obrigacional como sendo

de resultado.

Também no sentido de reconhecer a obrigação a natureza obrigacional como sendo de

resultado, decidiu em outro processo o mesmo tribunal:

77046805 - DIREITO DO CONSUMIDOR. RESPONSABILIDADE CIVIL.

CLÍNICA ODONTOLÓGICA. CIRURGIÃO DENTISTA. IMPLANTE

DENTÁRIO. FALHA NA PRESTAÇÃO DO SERVIÇO. OBRIGAÇÃO DE

RESULTADO. DEVER DE INDENIZAR. DANOS MATERIAL E MORAL

COMPROVADOS. SENTENÇA MANTIDA. I. Em se tratando de implante dentário,

a obrigação em regra é de resultado e assim cabe à clínica odontológica demonstrar

a inexistência de falha na prestação dos serviços, sobretudo quando o ônus da prova é

invertido com base no artigo 6º, inciso VIII, do Código de Defesa do Consumidor. II.

Se as provas dos autos, com destaque para a perícia, são conclusivas quanto à falha

na prestação dos serviços, deve ser mantida a indenização dos danos morais e

materiais causados ao consumidor. III. Traduz dano moral a afetação da integridade

física e psíquica oriunda de falha na prestação do serviço odontológico que resultou

em dores, agravamento de disfunção mandibular e submissão do consumidor a

tratamento corretivo. lV. Dadas as particularidades do caso concreto, não pode ser

considerada exorbitante compensação do dano moral arbitrada em R$ 3.000,00. V.

Recurso desprovido. (TJDF; APC 00341.53-31.2016.8.07.0001; Ac. 122.3264;

Quarta Turma Cível; Rel. Des. James Eduardo Oliveira; Julg. 11/12/2019; Publ. PJe

30/01/2020) (grifo nosso)

Na decisão de Recurso ora analisada, houve entendimento de que a sentença deveria ser

mantida no que diz respeito ao dever de indenizar do cirurgião dentista, uma vez que houve

falha na prestação do serviço e que a obrigação do cirurgião dentista, em regra, tratando-se de

cirurgia de implante, deve ser vista como uma obrigação de resultado, não de meio.

O Tribunal de Justiça de Santa Catarina - TJSC entendeu no mesmo sentido:

67164142 - AÇÃO INDENIZATÓRIA POR DANOS MATERIAIS, MORAIS E

ESTÉTICOS. ERRO ODONTOLÓGICO. Extração de dente "siso". Paciente que, já

meses após a cirurgia, continuou a sentir fortes dores na região lateral da face e perda

da amplitude do grau de abertura da boca. Procedimento cirúrgico que, no caso,

implica a assunção de obrigação de resultado pelo cirurgião-dentista.

Responsabilidade subjetiva com culpa presumida do profissional. Réu que não se

desincumbiu do ônus de demonstrar a ausência de culpa ou a ocorrência de alguma

circunstância excludente de causalidade. Obrigação de indenizar evidenciada.

Danos materiais. Dever de ressarcimento das despesas do paciente com exames,

deslocamento e sessões de fisioterapia. Condenação que deve abranger ainda as

despesas futuras, a serem aferidas em fase de liquidação de sentença. Dano estético.

Inocorrência. Ausência de demonstração do caráter permanente ou duradouro das

lesões suportadas. Ônus que incumbia ao autor. Dano moral. Abalo anímico

presumido em razão das circunstâncias do caso. Quantum fixado em R$ 5.000,00

(cinco mil reais). Observância aos parâmetros da razoabilidade e da

proporcionalidade. Sentença reformada em parte. Redistribuição dos ônus

sucumbenciais. Recurso parcialmente provido. (TJSC; AC 0004359-

53.2010.8.24.0113; Camboriú; Terceira Câmara de Direito Civil; Relª Desª Maria do

Rocio Luz Santa Ritta; DJSC 01/11/2019; Pag. 211) (grifo nosso)

56

Novamente entendeu o tribunal que o procedimento cirúrgico realizado pelo

profissional cirurgião dentista “implica a assunção de obrigação de resultado” e

responsabilidade subjetiva, sendo necessário ao réu demonstrar a inexistência de nexo de

causalidade ou culpa. Presente o dever de indenizar.

Na mesma linha, decidiu o Tribunal de Justiça do estado de São Paulo:

81196003 - RESPONSABILIDADE CIVIL. TRATAMENTO ODONTOLÓGICO

ESTÉTICO. Inserção de implantes, colocação de prótese de cerâmica, coroas de

porcelana e fisioterapia. Responsabilidade subjetiva do cirurgião dentista e

objetiva da clínica, mas submetida à configuração da culpa do odontólogo. Obrigação

de resultado, por se tratar de procedimentos estéticos relativamente simples, a

impor responsabilidade presumida do profissional liberal. Serviço mal executado,

impedindo a adequada limpeza da prótese, causando ferimento do freio labial e

agravando doença mandibular da paciente (DTM). Restituição dos valores pagos pelo

protocolo de cerâmica e fisioterapia. Impossibilidade de restituição dos valores

relativos aos implantes e coroas de porcelana, realizados corretamente e com proveito

à paciente. Dano moral configurado. Ofensa a direito de personalidade, decorrente do

sofrimento e angústia resultantes do longo e ineficaz procedimento odontológico.

Manutenção do quantum fixado na r. Sentença. Dano estético não verificado. Prótese

sem defeitos visíveis e passíveis de fácil correção. Multa por litigância de má-fé

rejeitada. Sucumbência recíproca mantida. Sentença mantida. Recursos improvidos.

(TJSP; AC 1006785-22.2017.8.26.0565; Ac. 13006048; São Caetano do Sul; Primeira

Câmara de Direito Privado; Rel. Des. Francisco Loureiro; Julg. 23/10/2019; DJESP

30/10/2019; Pág. 1917) (grifo nosso)

Este julgado, ainda mais explicitamente, expõe a obrigação de resultado vinculada aos

procedimentos estéticos (como nos casos de responsabilização civil do médico cirurgião

plástico).

Outro exemplo de entendimento similar no Tribunal de Justiça de Santa Catarina:

67147566 - APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS

MATERIAIS, MORAIS E ESTÉTICOS. Erro em tratamento odontológico. Cirurgia

prévia implante dentário unitário. Surgimento de cavidade buco-nasal após o

procedimento cirúrgico. Sentença de parcial procedência. Agravo retido. Pleito de

juntada de prontuário da autora referente a procedimento posterior realizado com

outro profissional dentista. Desnecessidade. Laudo pericial produzido no bojo da

instrução. Prova oral e documental que se mostram suficientes ao deslinde da

controvérsia. Agravo conhecido e desprovido. Apelação do réu. Dentista.

Profissional liberal. Responsabilidade civil subjetiva. Art. 14, § 4º, do Código de

Defesa do Consumidor. Obrigação, via de regra, de resultado. Dever do prestador

de serviço de comprovar a adoção da melhor técnica ao caso concreto, além de prestar

todas as informações necessárias ao pós operatório. Obrigação de amparo em caso de

intercorrências relacionadas ao evento. Negligência do cirurgião-dentista que

contribuiu para o dano, devendo responder na medida de sua culpabilidade. Ato ilícito

configurado. Danos morais e materiais. Reparação devida com fundamento no art. 5º,

V e X, da Constituição Federal e arts. 186, 927 e 944, todos do Código Civil brasileiro.

Danos morais. Manutenção do quantum indenizatório, à luz dos critérios da

razoabilidade, da proporcionalidade e da adequação. Importe que não se revela

exorbitante ou desproporcional à ofensa imposta à autora, que se viu com uma

Cavidade entre a boca e o nariz logo após a cirurgia e não teve o suporte necessário

para o desfecho da intercorrência. Danos materiais. Cálculo correto efetuado pela

sentença. Pleiteada adequação do dies a quo dos consectários legais. Correção

monetária fixada com acerto. Juros de mora. Relação contratual. Incidência a partir

57

da citação, nos termos do art. 405 do Código Civil. Sentença reformada apenas no

ponto. Recurso conhecido e parcialmente provido. (TJSC; AC 0023501-

72.2007.8.24.0008; Blumenau; Quarta Câmara de Direito Civil; Rel. Des. Luiz Felipe

Schuch; DJSC 19/09/2019; Pag. 184) (grifo nosso)

Corroborando com a tese dos demais, o desembargador enquadrou o cirurgião dentista

como profissional liberal, enquadrando-o no artigo 14, §4º do CDC, aplicando a caracterização

de natureza obrigacional de resultado, o que resulta no dever de indenizar.

64734760 - APELAÇÕES CÍVEIS. Ação de indenização por danos materiais, morais

e estéticos. Tratamento odontológico (implantes e próteses) inexitoso. Sentença de

parcial procedência. Preliminares. Decadência. Inaplicabilidade do prazo do artigo 26

do Código de Defesa do Consumidor. Reparação pelos danos causados por defeito ou

falha na prestação do serviço. Exegese dos artigos 14, § 4º e 27, ambos do mesmo

código. Prescrição interrompida. Consumidora que, desde o término dos

procedimentos, passou a frequentar seguidas vezes os consultórios dos réus buscando

solucionar os problemas. Lapso quinquenal não exaurido. Prefaciais afastadas.

Mérito. Obrigação de resultado. Intervenção com objetivo de reparação

funcional e estética. Inadimplemento que gera obrigação de reparar os danos

advindos da prestação de serviço falha. Responsabilidade civil e solidária do

cirurgião-dentista e do protético. Laudo pericial que indica resultado insatisfatório,

com próteses quebradas e soltas, além de problemas estéticos e funcionais.

Responsabilidade pelos danos evidenciada. Dever de indenizar mantido. Insurgência

do espólio contra os danos materiais. Alegação de que teriam sido ocasionados em

razão das próteses. Ausência de condenação. Não conhecimento. Ausência de

interesse recursal. Dano estético comprovado. Indivíduo marcado por alteração física

que provoca reação. Danos morais evidenciados. Pleito de redução. Cabimento. Valor

além dos parâmetros da câmara. Elementos que indicam correção à redução. Binômio

proporcionalidade/razoabilidade. Sentença reformada. Ônus sucumbencial.

Redistribuição. Parte autora que decaiu do pedido de dano material. Proporcionalidade

já verificada. Pronunciamento judicial favorável. Recurso do espólio não conhecido

também neste ponto. Prequestionamento. Desnecessidade de discorrer sobre todos os

dispositivos mencionados pela parte durante o trâmite processual. Recurso do espólio

conhecido em parte e parcialmente provido. Recurso do outro réu conhecido e

parcialmente provido. (TJSC; AC 2011.000738-3; Capital; Quinta Câmara de Direito

Civil; Rel. Des. Jairo Fernandes Gonçalves; Julg. 19/06/2015; DJSC 16/07/2015; Pág.

260) (grifo nosso)

Mais uma vez, a decisão é no sentido de reconhecer a responsabilidade civil lastreada

na obrigação de resultado do cirurgião dentista, uma vez que o tipo de cirurgia / procedimento

é realizada com a expectativa de um resultado específico, não podendo ser enquadrada como

mera obrigação de meio, retirando toda e qualquer responsabilidade para com o resultado do

profissional em comento.

Fica claro nas decisões neste item demonstradas a tendência atual dos tribunais de

justiça do Brasil a entenderem no sentido da responsabilidade subjetiva (teoria da culpa)

lastreadas no art.14, §4º do CDC, que aborda sobre a responsabilidade civil dos profissionais

liberais, com a caracterização da natureza obrigacional como sendo de resultado, uma vez que,

em especial nos tratamentos estéticos de harmonização orofacial, os pacientes de cirurgiões

58

dentistas procuram por um resultado específico, sendo este o compromisso do profissional para

a realização da cirurgia/procedimento.

4.2.2 O Reconhecimento da Obrigação de Meio na Jurisprudência Brasileira

Como abordado, as obrigações de meio são aquelas em que o profissional cirurgião-

dentista não compromete-se com um resultado específico, sem compromisso é com o meio,

com o procedimento em si, sem avançar com o seu paciente o resultado que terá após a cirurgia.

Dessa forma, entendeu o Tribunal de Justiça do Distrito Federal - TJDF:

48976922 - CIVIL E CONSUMIDOR. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS

MATERIAIS E MORAIS. CIRURGIÃO DENTISTA. RESPONSABILIDADE

SUBJETIVA. CLÍNICA ODONTOLÓGICA. RESPONSABILIDADE OBJETIVA

QUE EXIGE A DEMONSTRAÇÃO DE FALHA NA PRESTAÇÃO DO SERVIÇO.

PRESSUPOSTOS DA RESPONSABILIDADE CIVIL. NÃO COMPROVAÇÃO.

AUSÊNCIA DO DEVER DE INDENIZAR. SENTENÇA MANTIDA. 1. De acordo

com o artigo 14, § 4º do Código de Defesa do Consumidor, a responsabilidade dos

profissionais liberais, entre eles o cirurgião dentista, é subjetiva, ou seja, para sua

caracterização, imperiosa é a comprovação de conduta culposa. 2. No que tange à

clínica odontológica, há de se destacar que a responsabilidade da pessoa jurídica

fornecedora de serviços odontológicos ostenta natureza objetiva sob a modalidade do

risco da atividade, não sendo pautada pela teoria do risco integral, emergindo dessa

modulação que, aferido que não houvera defeito na prestação dos serviços que

fomentara de forma especificada nem falha imputável aos profissionais que

conduziram o tratamento fomentado à paciente, não se aperfeiçoa o nexo de

causalidade passível de enlaçar os atos praticados por seus prepostos ao resultado

danoso experimentado pela consumidora, rompendo o liame indispensável à

germinação da obrigação indenizatória (CDC, art. 14) (Acórdão n.763647). 3. A

obrigação decorrente de contrato de prestação de serviços odontológicos,

mormente em hipóteses como a dos autos, em que acertados os procedimentos

para a correção de diversos problemas dentários e gengivais da Autora, é, em

regra, de meio e não de resultado. 4. Não se comprovando a má prestação dos

serviços odontológicos, notadamente em face da conclusão do expert de que não

houve imprudência, negligência ou imperícia das Apeladas, não há que se falar em

dever de indenizar, haja vista a ausência dos respectivos pressupostos. Apelação Cível

desprovida. (TJDF; Proc 07392.22-66.2017.8.07.0001; Ac. 119.4071; Quinta Turma

Cível; Rel. Des. Ângelo Passareli; Julg. 14/08/2019; DJDFTE 23/08/2019) (grifo

nosso)

No presente caso, ainda que reconhecida pelo desembargador a responsabilidade

subjetiva, calcada no artigo 14, §4º do CDC, o mesmo reconheceu como sendo de meio a

natureza obrigacional do cirurgião dentista. Assim sendo, e não restando caracterizada os

pressupostos para responsabilizar o profissional (imprudência, imperícia ou negligência), o

exime do dever de indenizar o paciente.

Na mesma linha segue a decisão do Tribunal de Justiça do Distrito Federal-TJDF:

48600343 - CIVIL E PROCESSO CIVIL. APELAÇÃO CÍVEL. OBRIGAÇÃO DE

FAZER. MAGISTRADO. REMOÇÃO. VIOLAÇÃO DO PRINCÍPIO DA

IDENTIDADE FÍSICA DO JUIZ. PERÍCIA. QUESITOS. APRESENTAÇÃO.

PRAZO. CIRURGIA ORTOGNÁTICA. IMPRUDÊNCIA NÃO CONSTATADA.

59

DANOS MATERIAIS E MORAL. AUSÊNCIA DE NEXO DE CAUSALIDADE. 1.

O artigo 132 do Código Civil prevê. "o juiz, titular ou substituto, que concluir a

audiência julgará a lide, salvo se estiver convocado, licenciado, afastado por qualquer

motivo, promovido ou aposentado, casos em que passará os autos ao seu sucessor. 2.

O princípio do juiz natural não é absoluto, razão pela qual a sentença somente será

declarada nula nas hipóteses em que seja demonstrado efetivo prejuízo às partes. 3. A

teor do artigo 421, §1º do Código de Processo Civil, o juiz nomeia o expert e fixa

prazo para a entrega do laudo, incumbindo às partes, dentro de cinco dias, indicar

assistente técnico e apresentar os quesitos. Referido prazo não é peremptório, podendo

ser ampliado, desde que o perito não tenha iniciado a perícia. 4. Para que tenha ensejo

a responsabilização da parte, é imprescindível perquirir se estão presentes os três

elementos configuradores do cabimento da reparação civil, a saber, conduta, dano e

nexo causal, atraindo a incidência do artigo 186 do Código Civil. 5. Incontroversa a

ausência de nexo de causalidade entre a conduta e o evento danoso, eis que o

contrato de prestação de serviços odontológicos constitui obrigação de meio e não

de resultado. 6. Não há de se imputar responsabilidade ao cirurgião-dentista se ele se

resguardou orientando o paciente a seguir uma dieta restrita após a realização do

procedimento. 7. Recurso desprovido. (TJDF; Rec 2010.03.1.027039-9; Ac. 817.342;

Segunda Turma Cível; Rel. Des. Mario-Zam Belmiro; DJDFTE 10/09/2014; Pág.

82) (grifo nosso)

Na decisão ora apresentada ainda há um ponto diferente, uma vez que o desembargador

afasta o dever de indenizar do profissional, vez que no seu entender inexistente o nexo de

causalidade no contexto, uma vez que o contrato de prestação de serviços odontológico por

regra irá constituir obrigação de meio, não de resultado.

Também neste sentido seguiu o entendimento do Tribunal de Justiça de São Paulo-

TJSP:

96282573 - RESPONSABILIDADE CIVIL DE CIRURGIÃO DENTISTA. AÇÃO

DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS E MORAIS. I-. Nulidade do

processo por violação ao direito de defesa do réu. Não reconhecimento. Oferta de

várias impugnações aos laudos apresentados nos autos. Alegação afastada. II-

Tratamento odontológico que envolvia extrações, remoção de massa óssea,

implantação de pino para fixação de prótese, que deve ser reputado como

obrigação de meio e não de resultado. Insucesso, reconhecido pelo laudo, que não

pode ser atribuído à conduta profissional do réu. Trabalho técnico que não contrastou

a adequação do procedimento adotado pelo requerido. Necessidade, à luz do disposto

no art. 14, par. 4º, do CDC, da comprovação da culpa do profissional liberal, ônus a

cargo da autora. Falta de prova da culpa do réu reconhecida, com a improcedência da

indenizatória. SENTENÇA REFORMADA. APELO DO RÉU PROVIDO,

PREJUDICADO O ADESIVO DA AUTORA. (TJSP; APL 0055272-

58.2008.8.26.0564; Ac. 7639968; São Bernardo do Campo; Terceira Câmara de

Direito Privado; Rel. Des. Donegá Morandini; Julg. 10/06/2014; DJESP 01/07/2014)

(grifo nosso)

Novamente afastada a obrigação de indenizar do profissional, uma vez que o

desembargador entende que a natureza obrigacional do profissional dentista como sendo de

meio. Não restando claro a culpa subjetiva do réu, afasta-se o dever de indenizar.

Por fim, também entendeu nesse sentido o Superior Tribunal de Justiça-STJ:

11770501 - ADMINISTRATIVO. OMISSÃO INEXISTENTE.

RESPONSABILIDADE CIVIL. OBRIGAÇÃO DE MEIO, E NÃO DE

60

RESULTADO. ERRO MÉDICO. NEXO DE CAUSALIDADE. REEXAME DE

PROVAS. SUMULA 07/STJ. MATÉRIA CONSTITUCIONAL. COMPETÊNCIA

DO STF. 1. O acórdão recorrido não está eivado de omissão, pois resolveu a matéria

de direito valendo-se dos elementos que julgou aplicáveis e suficientes para a solução

da lide. 2. O Superior Tribunal de Justiça vem decidindo que a relação entre

médico e paciente é de meio, e não de fim (exceto nas cirurgias plásticas

embelezadoras), o que torna imprescindível para a responsabilização do profissional

a demonstração de ele ter agido com culpa e existir o nexo de causalidade entre a sua

conduta e o dano causado responsabilidade subjetiva, portanto. 3. O Tribunal a quo,

amparado no acervo fático-probatório do processo, afastou a culpa do cirurgião-

dentista, e, consequentemente, erro médico a ensejar a obrigação de indenizar,

ao assentar que não houve equívocos por parte da equipe médica na primeira fase do

tratamento e que as complicações sofridas pela requerente não decorreram da placa

de sustentação escolhida pelo profissional de saúde. Assim, concluiu que a conduta se

mostrara coerente com o dever profissional de agir, inexistindo nexo de causalidade

entre os atos do preposto da União e os danos experimentados pela autora. 4. Fica

nítido que a convicção formada pelo Tribunal de origem decorreu dos elementos

existentes nos autos. Rever a decisão recorrida importaria necessariamente no

reexame de provas, o que é defeso nesta fase recursal, nos termos da Súmula 07/STJ.

5. Alegações de violação de dispositivos e princípios constitucionais não podem ser

analisadas em Recurso Especial, por serem de competência exclusiva do Supremo

Tribunal Federal, nos termos do art. 102 da Carta Magna. 6. Recurso Especial

conhecido em parte e não provido. (STJ; REsp 1.184.932; Proc. 2010/0043325-8; PR;

Segunda Turma; Rel. Min. Castro Meira; Julg. 13/12/2011; DJE 16/02/2012) (grifo

nosso)

Este julgado também é bastante interessante, uma vez que o Ministro faz o paralelo da

obrigação de meio e resultado, comparando médicos e dentistas (como profissionais da saúde e

liberais). Ele enfatiza que, em regra, a natureza da obrigação do médico é de meio, com exceção

das cirurgias plásticas embelezadoras, que são com natureza de resultado, e acaba por afastar a

responsabilidade de indenizar do cirurgião dentista, uma vez a obrigação também ser de meio.

Importante frisar que este julgado muito contribui com o entendimento do presente

tema, uma vez que note-se, ele é de 2012, onde o presente debate acerca das cirurgias em suma

embelezadores de harmonização orofacial, como já visto no item anterior, ainda não estavam

regulamentadas. Mas já abre espaço para que façamos esse paralelo, entre as cirurgias de

harmonização orofaciais, como sendo estéticas e as cirurgias plásticas, que possuem fim

estético, portanto, obrigação de resultado, um dos raciocínios a ser empregado para chegar na

resposta problema do presente Trabalho de Conclusão de Curso.

Interessante também evidenciar que após a análise das jurisprudências, realizando o

comparativo entre esses dois grandes grupos de decisões, nota-se que a problemática vem sido

resolvida pelo poder judiciário, não pelo poder legislativo. Ou seja, resta evidente o modo como

o poder judiciário está precisando agir precipuamente no sentido de corrigir o erro praticado

não só pelo cirurgião dentista, mas preencher o vácuo, a fragilidade, da lei no que diz respeito

a determinação da responsabilidade civil do cirurgião dentista na cirurgia de harmonização

orofacial ser obrigação de meio ou resultado. Tal determinação deveria ter sido efetuada pelo

61

poder legislativo, mas, uma vez não feita, o que resta é pedir socorro ao judiciário para que

determine, defina, a fim de que se possa buscar a reparação dos danos decorrentes dessa prática.

62

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Respeitando a metodologia a que esse trabalho se propõe, ou seja, trabalhar do aspecto

geral do tema, para o singular, onde pretende responder a pergunta problema que originou a

presente pesquisa, o capítulo primeiro aborda os conceitos gerais da responsabilidade civil, sua

fundamentação legal, até restringir um pouco mais, aplicando-a para a realidade específica do

objeto aqui estudado, qual seja: a responsabilidade civil do profissional cirurgião dentista nas

cirurgias de harmonização orofaciais.

No primeiro capítulo esclareceu-se que tal instituto possui previsão constitucional bem

como infraconstitucional, aqui focados no Código Civil e Código de Defesa do Consumidor.

Conforme bem definido pelos autores abordados, tais como Maria Helena Diniz e Carlos

Roberto Gonçalves, o instituto nada mais é do que a previsão legal para que um sujeito (no

presente estudo o cirurgião dentista) possa vir a ser responsabilizado, quando um ato seu gerar

dano a terceiro, objetivando restaurar o status quo anterior a sua intervenção, restaurar o

equilíbrio e remediar o dano decorrente do ato ilícito.

Também foi no primeiro capítulo, com base no que bem defendeu Tartuce, que

procurou-se esclarecer que a relação do cirurgião dentista com seus pacientes/clientes é

decorrente de contrato, ainda que verbal, e que nesta relação os profissionais figuram como

prestadores de serviço, enquanto o paciente/cliente figura como consumidor na relação

contratual. Sendo prestador de serviço e também enquadrado como profissional liberal, restou

evidente a partir do primeiro capítulo que o cirurgião dentista responde subjetivamente, por via

da teoria da culpa.

Ainda que de forma geral, buscou-se também introduzir as Resoluções regulamentares

a respeito da prática da cirurgia de harmonização orofacial, enquanto especialização

odontológico, apenas para bem definir, no início do trabalho, o que se entende por

harmonização orofacial como o conjunto de procedimentos e/ou cirurgias a serem praticados

pelo cirurgião dentista, com o objetivo de buscar o equilíbrio estético e também funcional da

face.

Após a análise dos aspectos gerais da responsabilidade civil, ao final do capítulo

primeiro ainda restou a dúvida quanto a natureza da obrigação, como sendo de meio ou de

resultado, uma vez que foi observado que em nenhum dispositivo estudado até o final do

capítulo havia qualquer disposição determinando e assentando qualquer tipo de entendimento.

Mas um ponto evidenciou-se valioso para a presente análise do tema, que é aquilo que

depreende-se com a leitura analítica do conceito de harmonização orofacial retirado da

63

resolução regulamentadora da prática: busca de equilíbrio estético e funcional. Entende-se,

desde já, a definição por si só apontar para uma possível resposta. Há, na definição, a busca por

um resultado específico, o equilíbrio estético e funcional da face.

No segundo capítulo foram coletados trabalhos acadêmicos, artigos, com as mais

diversas formas de entender o tema, para compreender a partir da análise dos mesmos, qual o

norte que a produção acadêmica antecedente pode proporcionar para responder a pergunta

problema da presente pesquisa. Em suma, a produção acadêmica dividiu-se em dois principais

tópicos: os acadêmicos que entendem a caracterização da natureza obrigacional como sendo de

meio, e os que entendem ser de resultado.

Depreende-se da leitura dos mesmos que, a diferença central entre os dois tipos de

obrigação é que enquanto na obrigação de meio não há comprometimento, por parte do

profissional, com relação ao resultado objetivo após a cirurgia, na obrigação de resultado é o

oposto, há esse acordo, há essa expectativa criada naquele que procurou pelo serviço prestado

pelo cirurgião dentista.

Ainda há, aqueles acadêmicos que, como mencionado no segundo capítulo, preferem

ainda não se posicionar, o que é compreensível uma vez a prática ser bastante recente, e por

vezes é necessário entender melhor como será o decorrer. Em contrapartida, devido ao grande

volume de ações judiciais decorrentes deste tipo de situação, é flagrante a necessidade de

definição, para enfim procurar preencher as lacunas deixadas pelas normas regulamentadoras

da prática e trazer pouco mais de segurança jurídica para aqueles que necessitam do socorro

jurídico para terem seus danos reparados.

Importante frisar também do mesmo capítulo, ainda que exista em suma esses dois

grandes grupos, divididos entre caracterizar a obrigação como sendo de meio ou de resultado,

resta evidente o volume maior de acadêmicos que tendem a encarar a natureza da obrigação dos

cirurgiões dentistas nas cirurgias de harmonização orofacial como sendo obrigação de

resultado, uma vez estar presente a expectativa de um resultado específico por esse ser possível

de se prever.

No último capítulo, isto é, no quarto capítulo, buscou-se coletar e analisar evidências

empíricas acerca do tema, quais sejam: as regulamentações específicas da especialidade

odontológica de harmonização orofacial (Lei nº 5.081/66 e Resoluções nº 198/2019 e nº

230/2020), bem como a análise de um apanhado de jurisprudências acerca do tema.

Na análise, tanto da Lei nº 5.081/66, que efetua a Regulamentação Geral da

Odontologia, quanto das Resoluções nº 198/2019 e nº 230/2020, que regulamentam a

especialidade de Harmonização Orofacial, nota-se uma vasta lista, com imenso detalhamento

64

para a área de atuação do dentista, o que ele está apto, ou não, as vedações para a prática, cursos,

graduações, especializações, no entanto resta flagrante a ausência de qualquer determinação,

regulamentação expressa no que concerne a Responsabilidade Civil desses profissionais na

pratica dessa especialização. A dúvida que ficou nos demais capítulos, restou configurada com

o estudo de tais documentos: não há previsão expressa, restando aquele já citado vácuo de

incertezas.

Ato contínuo, na análise das jurisprudências, depreende-se dois pontos importantes. O

primeiro ponto é novamente a fragmentação em dois grandes grupos, o primeiro onde entende-

se a caracterização da obrigação como sendo de natureza de resultado e a outra como sendo de

meio. No entanto, mais uma vez a situação se repete, e o número de julgados encontrados que

tendem a defender a ideia de que a obrigação do cirurgião dentista deve ser encarada como

obrigação de resultado.

Interessante ressaltar, também, que uma análise rápida das datas dos julgados nota-se

uma espécie de linha do tempo, onde as decisões mais antigas tendem a interpretar a natureza

obrigacional como sendo de meio, enquanto as decisões mais recentes, tendem a caracterizar

tal obrigação como sendo de resultado. Tal análise, em conjunto com o depreendido do estudo

da produção acadêmica antecedente, leva a crer há uma tendência de que que os tribunais

possam estar caminhando para uma espécie de entendimento uno.

Por fim, este estudo evidenciou que para responder a pergunta que norteia o presente

trabalho, qual seja: o dano causado nas cirurgias de harmonização orofacial realizadas por

cirurgiões dentistas caracteriza uma obrigação de meio ou de resultado? Como isso reflete na

entrega da prestação/serviço para o paciente? É necessário partir de uma análise combinada,

que passa pelos princípios Constitucionais e pela fundamentação legal presente no Código

Civil, e no Código de Defesa do Consumidor, aplicando-os as Resoluções nº 198/2019 e nº

230/2020, que regulamentam a especialidade de Harmonização Orofacial, conjuntamente com

o que foi depreendido da análise da produção acadêmica antecedente e de como a jurisprudência

tem abordado o tema.

Nesse sentido, discutiu-se e delimitou-se se a cirurgia é uma intervenção geradora de

uma obrigação de meio ou de resultado, bem como debateu-se sobre a necessidade de

65

determinação de culpa dos dentistas, e sobre se possui natureza objetiva ou subjetiva, e

finalmente, argumentou-se sobre a possibilidade de responsabilização civil de tais profissionais.

Partindo de uma análise constitucional, nota-se que sobrelevar no presente tema o

princípio da dignidade humana, o direito à vida e a saúde, com os quais o profissional cirurgião

dentista compromete-se em defender com a prática da sua profissão.

Quando o dentista fornece o serviço de uma cirurgia de harmonização orofacial, e a

mesma não cumpre com o seu objetivo, causando um dano a alguém, conforme o que foi

depreendido ao longo do estudo, o mesmo comete ato ilícito passível de indenização, ou seja,

o profissional incorre nos artigos nº 186, 187 e 927 do Código Civil, desta forma, resta

caracterizada a responsabilidade civil do mesmo. Ato contínuo, resta claro que, conforme o

artigo nº 14, §4º do Código de Defesa do Consumidor, por ser profissional liberal, ele responde

subjetivamente pelo seu ato, independente de culpa, pela teoria da culpa presumida.

Demonstrado o dano e o nexo de causalidade entre cirurgia e dano, é necessário ainda

delimitar o tipo relação que existe entre cirurgião dentista e seu cliente/paciente, se contratual

ou extracontratual. Com a análise do que dizem os doutrinadores bem como da análise da

produção academia antecedente nota-se que o entendimento é quase uníssono, quando a

característica contratual da relação. Diz-se quase, uma vez que sempre existiram as

divergências, os contrapontos, mas grande parte dos intelectuais e acadêmicos do direito

entendem por haver uma relação contratual. O que faz sentido, uma vez que existe uma

contratação de um serviço específico (objeto do contrato), possuindo um tempo específico para

sua finalização (prazo), que recebe um pagamento em contrapartida.

Visto isto, partindo da teoria do direito no segundo capítulo, verticalizando para a

academia, no que se relaciona com a produção acadêmica antecedente, para enfim chegar no

singular, tema do trabalho proposto, conclui-se que, de fato, na Lei Regulamentadora nº

5.081/66 da profissão do odontologista, bem como nas Resoluções nº 198/2019 e nº 230/2020,

que regulamentam a especialização de harmonização orofacial, não há previsão expressa e clara

a respeito da natureza obrigacional do cirurgião dentista nas cirurgias de harmonização

orofacial, deixando um vácuo a respeito do tema. Fazendo com que seja necessário socorrer-se

aos demais livros regulamentadores (Constituição Federal, Código Civil e Código de Defesa do

Consumidor) para a sua análise e posterior determinação.

Vejamos, é perfeitamente visível a dualidade de personas daquele que figura como

atendido (consumidor, que busca o serviço) na dicotomia entre ser paciente e ser cliente. É

perfeitamente compreensível a insegurança gerada, afinal, não há previsão expressa da

66

característica / natureza obrigacional, seja de meio ou de resultado, e, sendo ambas, em que

situações uma ou outra.

Com o auxílio não apenas dos institutos presentes nos livros jurídicos supracitados,

quais seja Constituição Federal, Código Civil e Código de Defesa do Consumidor, mas também

dos acadêmicos e magistrados que abordaram o tema, é possível observar que cirurgia médico

odontológica estética vem sido considerada tanto pela doutrina quanto pela jurisprudência

majoritária, como obrigação de resultado, uma exceção, vez que a regra para os profissionais

da saúde é a de meio.

Enquanto cliente, o mesmo busca, contrata um serviço estético, objetivando um

resultado específico. Ora, nós somos bombardeados diariamente com propagandas e

publicações de cirurgias embelezadoras realizadas em consultórios odontológicos, é de se

estranhar que alguém procure um tratamento médico-odontológico-estético como esses,

objetivando uma deformidade, quiçá um resultado que não aquele ofertado pelos próprios

profissionais. Seria no mínimo incoerente, um profissional ter apenas o bônus da maravilha de

uma cirurgia estética bem sucedida (case de sucesso), mas não se responsabilizar quando o

resultado ofertado não for atingido.

Conclui-se, portanto, por toda a análise feita, que é possível caracterizar natureza

obrigacional da responsabilidade civil do cirurgião dentista nas cirurgias de harmonização

orofacial como sendo de resultado, com base em todo o estudo realizado, mas trazendo uma

ressalva, no que concerne a necessidade de uma legislação mais clara e específica sobre o tema,

uma vez ser necessário trazer mais segurança àqueles que precisam socorrer-se ao poder

judiciário para terem seus direitos preservados.

É importante frisar que, nesse sentido, a segurança se dá tanto para o cliente/paciente,

como também aos proprios cirurgiões dentistas, que precisam ter clareza de “a que” e “como”

respondem, perante seus atos na prática dessa atividade. Uma vez que é uma situação muito

complexa e instável ficar na dependência única e exclusivamente da interpretação do

magistrado, sem que se tenha uma legislação expressa sobre o tema.

67

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