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1 UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU” FACULDADE A VEZ DO MESTRE A NEUROCIÊNCIA APLICADA ÀS PRÁTICAS PEDAGÓGICAS COM OS ALUNOS AUTISTAS DA REDE MUNICIPAL DE NITERÓI Por: Natalia Côrtes Velloso Theophilo Orientadora Profª Drª Marta Relvas Rio de janeiro 2011

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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU” FACULDADE A VEZ DO MESTRE

A NEUROCIÊNCIA APLICADA ÀS PRÁTICAS PEDAGÓGICAS COM OS ALUNOS AUTISTAS DA REDE MUNICIPAL DE NITERÓI

Por: Natalia Côrtes Velloso Theophilo

Orientadora

Profª Drª Marta Relvas

Rio de janeiro

2011

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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU” FACULDADE A VEZ DO MESTRE

A NEUROCIÊNCIA APLICADA ÀS PRÁTICAS PEDAGÓGICAS COM OS

ALUNOS AUTISTAS DA REDE MUNICIPAL DE NITERÓI

Apresentação de monografia à Universidade

Candido Mendes como requisito parcial para

obtenção do grau de especialista em

Neurociência Pedagógica

Por: Natalia Côrtes Velloso Theophilo

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AGRADECIMENTOS

Primeiramente a Deus por tudo o que somos, pela nossa vida e por olhar

sempre por nós.

Aos meus pais, Luiz e Justina, que sempre me estimularam, me deram força,

acreditaram em mim e por estarem sempre presente nessa jornada.

Na minha filha que é a pessoa mais preciosa da minha vida e que me dá ânimo

para seguir sempre em frente.

A professora Marta Relvas que sempre nos incentivou e instigou nossa

curiosidade para esse novo horizonte que se abriu.

A toda equipe de educação especial da Rede Municipal de Niterói por estar

sempre buscando o melhor para seus alunos e profissionais.

A Nelma Pintor que enquanto minha professora ainda na graduação me

instigou a escolher esse caminho e enquanto coordenadora me surpreende

com sua determinação, humildade e dedicação.

A Lucienne Souza que me ajudou muito e sempre com muita simpatia,

disposição e carinho

A minha aluna Daiana Manhães que me faz acreditar e querer sempre superar

obstáculos para dar o melhor de mim a ela.

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DEDICATÓRIA

A minha família, aos profissionais de educação, a

equipe de educação especial da Fundação Municipal

de Niterói e a todos os alunos especiais.

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RESUMO

Apesar de a síndrome do autismo ainda ser uma incógnita para a ciência, esta

vem progredindo através de estudos e pesquisas, com o objetivo de, entre

outras coisas, dar subsídios à população para entender e conviver socialmente

com os autistas.

Quando estes cidadãos conseguem ir para uma escola, na maioria das vezes,

esta e sua equipe não estão preparadas para a convivência e para a lida com

tais alunos.

A neurociência entra no campo da educação inclusiva para auxiliar e colaborar,

através de estudos sobre o cérebro, neste árduo trabalho. Ao promover o

conhecimento sobre o funcionamento do sistema nervoso central e o que é

comum a todos os cérebros, pode-se lidar melhor com algumas características

pessoais do aluno, explorando sua criatividade neste processo de

escolarização.

Compreender como a atividade cerebral processa a aprendizagem e o

comportamento, assim como a influência do meio em que vive e como a base

biológica age no processamento neurológico, facilitará e enriquecerá o trabalho

com alunos autistas.

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METODOLOGIA

Para a elaboração do trabalho optei pela pesquisa teórica que consiste

em um levantamento de material bibliográfico com dados já analisados por

meio de escritos publicados e meios eletrônicos, utiliza-se livros, revistas

científicas, sites da web e documentos academicamente legitimizados, sobre o

tema que desejo conhecer.

Usei também como base a pesquisa de campo que foi realizada através

de relatos, entrevistas e observações sobre o tema proposto.

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SUMÁRIO Introdução ---------------------------------------------------------------------------------------- 8 Capítulo I – Uma abordagem histórica sobre o autismo ---------------------------- 11 Capítulo II – Sistema Nervoso Central -------------------------------------------------- 20 Capítulo III – Neurociência e Autismo --------------------------------------------------- 30 Bibliografia -------------------------------------------------------------------------------------- 40 Anexos ------------------------------------------------------------------------------------------- 43 Pesquisa de campo --------------------------------------------------------------------------- 47

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INTRODUÇÃO

A inspiração para esse trabalho foi construída ao longo da minha

formação, onde passei a me interessar pela história da educação especial que

me despertou algumas inquietações. Inquietações essas que venho, até aqui,

compartilhar com meus possíveis leitores, como uma maneira de proporcionar

um encontro com uma realidade muitas vezes “evitada”, mas, que está

presente na vida e, portanto, como educadora, me sinto responsável por forjar

reflexões que contribuam para estabelecer relações de sentidos entre essa

realidade e o nosso “fazer” docente.

A história nos mostra que as crianças autistas sempre foram excluídas

pela sociedade e sofreram preconceitos pelo fato de apresentarem um

comportamento que foge dos padrões sociais, portanto, considero ser de

grande relevância resgatar essa história a fim de compreender porque, mesmo

com a apresentação dos novos referenciais de educação especial, que nos

indicam a importância de um projeto educativo inclusivo, existem, ainda,

escolas que não aceitam tais crianças.

A educação é uma construção diária e contínua do ser humano em seus

saberes e aptidões.

“Educação não é só ensinar, instruir, treinar, domesticar, é, sobretudo formar a autonomia do sujeito histórico competente, uma vez que, o educando não é o objetivo de ensino, mas sim sujeito do processo, parceiro de trabalho, trabalho este entre individualidade e solidariedade”. (DEMO,1996, p.16)

Lendo a afirmativa acima, observo que a educação é muito mais ampla e

complexa do que as pessoas normalmente especulam. O que nos leva a

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concluir que privar as crianças autistas da educação, é privá-las do processo

de aprendizagem que ocorre durante toda a vida.

É importante para toda comunidade escolar, encontrar subsídios para

nortear o trabalho com seus alunos autistas dentro de salas de aula dando

oportunidade a todos de desenvolverem habilidades e capacidades inerentes a

cada indivíduo. Por esse motivo, entendo que promover discussões que

mobilizem reflexões sobre as possibilidades de inclusão da criança autista não

só na escola, como na família e na sociedade é vital para se respeitar e

valorizar cada uma delas.

Nesse ponto entra a neurociência com uma ciência relativamente nova

que estuda o SNC e sua complexidade. Dialogando com a pedagogia, pois se

precisa de bases científicas para poder compreender melhor cada aluno.

A construção do conhecimento se dá dentro do cérebro e modifica

conforme o estímulo recebido, por isso a importância de todos os profissionais

da educação saberem pelo menos um pouco sobre tal funcionamento.

O autismo é um transtorno de neurodesenvolvimento com diversas

apresentações clínicas que variam de gravidade e recebem o nome de

transtorno do espectro autismo. O sinal mais comum aos transtornos é o déficit

na interação social, na comunicação e no comportamento.

Como ajudar os autistas a aproximarem-se de um mundo designificados e de relações humanas significativas? Que meios podemos empregar para ajudá-los a comunicarem-se, atrair sua atenção e interesse pelo mundo das pessoas para retirá-los do seu mundo ritualizado, inflexível e fechado em si mesmo? (RIVIÈRE, 1984 apud BEREHOFF, 1993, p. 15).

As pesquisas científicas têm explorado as alterações estruturais e do

funcionamento cerebral por meio de estudos de neuroimagem e modelos

animais. Além disso, estudos de genética molecular têm procurado explorar o

quadro. Estruturas como amígdala, cerebelo, neurônios espelhos entre outros

tem sido foco de estudos em pessoas com autismo.

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Muitas vezes, percebo que crianças autistas são excluídas da sociedade

pelo simples fato de serem diferentes. E por serem diferentes, as pessoas não

sabem como lidar e por isso têm medo, por terem medo, produzem

mecanismos de exclusão, negando-lhes o direito de convívio, discriminando-as

alegando justificativas que nada mais são do que uma forma de renegá-las.

Observando as práticas presentes em algumas escolas, apesar de já

termos dado passos bem largos, observo que ainda temos um longo caminho

pela frente, até que esse ideal de escola e inclusão seja alcançado.

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CAPÍTULO I

UMA ABORGAGEM HISTÓRICA SOBRE O AUTISMO

Historicamente, as pessoas com deficiências foram excluídas da

sociedade e impedidas de desenvolver suas capacidades e habilidades como

indivíduos e cidadãos, eram sempre rotuladas como doentes, incapazes,

estranhas, por influência de uma sociedade que culturalmente se baseia nos

princípios da beleza e da perfeição.

Na Antigüidade, as pessoas deficientes eram mortas quando nasciam

porque eram consideradas um empecilho para a sociedade pelo fato de serem

consideradas inúteis, seres que precisavam ficar fora do convívio de grupos

sociais .

Segundo Barthel (2003) os povos Sirionos (antigos habitantes das

Selvas da Bolívia), que por serem seminômades, não podiam se dar ao luxo de

transportar doentes e deficientes, abandonava-os à própria sorte; os Balis

(nativos da Indonésia), eram impedidos de manter relações amorosas com

pessoas que não fossem aceitas como normal e os astecas, por ordem de

Montesuma (um dos últimos reis astecas), ridicularizavam os deficientes.

Os hebreus viam na deficiência física ou sensorial uma espécie de

punição de Deus e impediam que estas pessoas prestassem qualquer tipo de

serviço religioso.

A Lei das XII Tábuas, na Roma antiga, autorizava os patriarcas a matar

seus filhos defeituosos, o mesmo ocorrendo em Esparta, onde os recém-

nascidos, frágeis ou deficientes, eram lançados do alto do Taigeto (abismo de

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mais de 2.400 metros de altitude, próximo de Esparta).

Paradoxalmente, os povos hindus consideravam os cegos com uma

maior sensibilidade interior, justamente pela falta de visão. Sendo assim, este

povo incentivava estas pessoas a ingressarem nas atividades religiosas.

Em alguns povos antigos o deficiente era tido como um estranho, muitas

vezes a deficiência era explicada como manifestação sobrenatural.

Continuando com as referências de Barthel (2003), com a decadência do

Império Romano e o domínio da cultura greco-romana no período da Idade

Média, a crença no sobrenatural cresceu mais ainda. O homem era concebido

como um ser subordinado aos poderes advindos do bem e do mal, e nessa

interpretação, as pessoas deficientes eram vistas como pessoas possuídas

pelo demônio e, assim, eram sujeitas a castigos por grupos cristãos ou, em

raras exceções, receptoras de espíritos divinos adorados e passavam a ser

reverenciados como profetas.

Com o renascimento e a revalorização da cultura greco-romana, a busca

do conhecimento científico deu lugar à preocupação com o indivíduo e com as

soluções científicas para seus problemas. Após o Renascimento e durante o

Modernismo a medicina deu um grande avanço, fazendo com que os

estudiosos fossem a procura de novos horizontes que, até então, eram

desconhecidos.

Contudo, apenas no final do século XVII, foi que, a base dos hospitais

psiquiátricos de Bicêtre, por influência de Pinel, passou a soltar os “loucos” das

correntes e tratar os “doentes” de modo mais humanitário.

Com base nos relatos, observa-se que a história das pessoas com

deficiência foi bastante conturbada e discriminatória e consequentemente, com

as crianças autistas, não foi diferente.

Alguns relatos históricos indicam que sempre existiram crianças autistas.

Na Grécia Antiga elas eram submetidas à eutanásia por não serem

consideradas normais. Existe uma lenda irlandesa que fala das “crianças-

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fadas” cuja alma era roubada por duendes maus e as mães precisavam evitar

que isso acontecesse (Assumpção Junior, 2005).

Na história do autismo, há pesquisadores que tornaram-se importantes

por suas argumentações sobre a síndrome, o diagnóstico e as possíveis

causas.

O autismo é classificado como um distúrbio do desenvolvimento humano

e vem sendo estudado pela ciência a pelo menos seis décadas, porém,

grandes divergências e questões continuam sem resposta.

Para tratar do assunto, primeiramente é importante analisar a origem da

palavra.

Autismo é uma palavra de origem grega (autós), que significa por si

mesmo. É um termo usado, dentro da psiquiatria, para denominar

comportamentos humanos que se centralizam em si mesmo, voltados para o

próprio indivíduo.

Em 1847 Henry Maudsley foi o primeiro psiquiatra há ter interesse por

crianças com distúrbios mentais graves, descrevendo vários deles, inclusive o

Autismo. Já no século XX, Santis introduz o termo Demetria Precocíssima,

onde descreve casos de início muito precoce.

Em 1906, Plouller introduziu o termo autista na literatura psiquiátrica.

Mas foi em 1911, que Bleuler difundiu o termo autismo para referir-se ao

quadro de esquizofrenia, que consiste na limitação das relações humanas com

o mundo externo.

Na década de 1940, Léo Kanner, um psiquiatra austríaco residente nos

EUA, se dedicou a pesquisa e ao estudo de crianças que tinham um

comportamento um pouco estranho, ou melhor dizendo, bastante diferente das

outras crianças, comportamento esse que se caracterizava por estereotipias

(repetição de gestos, permanência em posições estranhas) e outros sintomas

aliados a uma grande dificuldade de se relacionar com outras pessoas.

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Em 1943, Kanner, descreveu o autismo pela primeira vez em um artigo

chamado “Alterações autistas do contato afetivo”, onde relatou o caso de onze

crianças estudadas por ele, que apresentavam fortes características de

distúrbio do desenvolvimento. Este informe foi publicado depois de uma

minuciosa investigação sobre a doença. O quadro de “autismo extremo,

obsessividade, estereotipias e ecolalia” dessas crianças estudadas foi

nomeada de “Distúrbios autísticos do contato afetivo”.

Algumas características desses grupos de crianças eram: isolamento

com o mundo externo, atrasos na aquisição do uso de linguagens, tendência a

atividades ritualizadas, problemas com alimentação e incapacidade de

desenvolver relações interpessoais.

Donald T. foi examinado pela primeira vez em outubro de 1938, com a idade de cinco anos e um mês. Antes da chegada da família, vinda de sua cidade natal, o pai enviou um histórico de trinta e três páginas datilografadas, que apesar de repleto de muitos detalhes obsessivos, fornecia uma excelente exposição dos antecedentes de Donald. Donald nasceu a termo em oito de setembro de 1933. Pesava aproximadamente três quilos e duzentos gramas ao nascer. Foi amamentado, recebendo alimentação suplementar até o fim do oitavo mês; houve freqüentes mudanças das fórmulas do leite. “Comer”, dizia o relatório, “foi sempre um problema para ele.” Ele nunca apresentou um apetite normal. “Ver as crianças comendo doces ou sorvete nunca foi uma tentação para ele”. A dentição ocorreu satisfatoriamente. Ele andou aos treze meses. Com um ano “ele era capaz de cantarolar sussurrando e cantar várias melodias com perfeição”. Antes dos dois anos, tinha “uma memória incomum para rostos e nomes, sabia o nome de um grande número de casas” de sua cidade. “Era encorajado pela família a aprender de cor e a recitar pequenos poemas e ele decorou até o Trigésimo Terceiro Salmo e as vinte e cinco perguntas e respostas do catecismo presbiteriano”. Seus pais observaram que “ele não estava aprendendo a fazer perguntas ou respondê-las a não ser que estas se referissem a rimas ou coisas deste tipo, e que, portanto, com freqüência ele não faria pergunta alguma, exceto com palavras isoladas”. Sua pronúncia era clara. Interessou-se por imagens “e em muito pouco tempo ficou conhecendo uma prodigiosa quantidade de ilustrações de uma coleção da Enciclopédia Compton”. Ele conhecia os retratos dos presidentes “e conhecia a maioria dos retratos de seus ancestrais e membros da parentela, tanto do lado materno quanto paterno”. Aprendeu com rapidez o alfabeto inteiro, “na ordem direta e inversa” e a contar até cem. Desde cedo foi observado que ele ficava mais feliz quando era deixado só, praticamente nunca chorou pedindo a mãe, nunca pareceu

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dar-se conta da volta do pai para casa e era indiferente às visitas de familiares mais próximos. “O pai fez uma menção especial ao fato de que Donald nem mesmo prestava a mínima atenção ao Papai Noel em traje completo.” (Kanner, 1943)

Através do trecho acima, fica claro que o perfil do autismo é definido por

alterações e desvios qualitativos na comunicação, na interação social e no uso

da imaginação, além de estar presente em idades muito precoces, tipicamente

antes do três anos.

O autismo angustia e intriga as pessoas, em especial a família, pois o

autista tem ao mesmo tempo uma aparência harmoniosa e um perfil irregular

de desenvolvimento, com o funcionamento de algumas áreas comprometidas e

outras não.

Hans Asperger, um médico também austríaco e formado pela mesma

universidade de Kanner, em 1944 escreveu um artigo com o nome de

Psicopatologia Autística da Infância, onde descreveu casos de crianças

semelhantes a de Kanner. Neste artigo ele falava que a idade comum de

manifestação era aos três anos ou mais e as características marcantes seria a

marcha tardia, fala precoce, grande dificuldade na interação social, pobreza de

contato de olho, limitação de empatia, prejuízo na comunicação verbal, fala

pedante e com pouca modulação e resistência à mudança. O médico não

considerou que houvesse grandes falhas no desenvolvimento cognitivo ou na

linguagem e confirmou falhas nas habilidades motoras. Quando Aspeger

comparou o seu escrito com o de Kanner, pode identificar diversas

semelhanças, porém ressaltou que suas crianças mostravam maior

inteligência, originalidade e espontaneidade incomuns do pensar.

Diferentemente do que aconteceu com o que Leo Kanner publicou, este

artigo demorou muitos anos para ser lido amplamente. O que se declara sobre

esta demora na difusão desse artigo, foi o fato dele ter sido escrito

originalmente em alemão.

Lorna Wing, tempos depois, analisou cada descrição feita por Aspeger e

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Kanner e criou o termo Síndrome de Aspeger. Foi a partir daí que começaram a

considerar a possibilidade de compreensão de ambas as descrições como um

conjunto de elementos variáveis em graus e propôs a expressão Espectum ou

Continuum de Desordem Autísticas.

O distúrbio autístico era confundido com a esquizofrenia, portanto,

Kanner fazia questão de diferenciar um do outro. Discordando de Bleuler

quando este afirmou em 1911 por entender não se tratar de uma doença

independente e sim de mais um dos sintomas da esquizofrenia, Bleuler

enfatizava a deteriorização emocional no quadro clínico da esquizofrenia,

ressaltando, no autismo, mais o distúrbio com relação à realidade do que com

ao contato afetivo. Contudo, Leo Kanner, constatou desde o início que o

esquizofrênico se isolava do mundo, mas algum dia ele já penetrou este mundo

o que não acontece com o autista que jamais conseguiu sequer penetar nesse

mundo mencionado por Bleuler.

A partir do seu escrito em 1948 em que constatava que as crianças

autistas eram, em sua maioria, de família que apresentava uma inteligência

acima da média e uma obsessão no ambiente familiar, Kanner, no ano de 1955,

passou a considerar a conduta dos pais em suas crises de personalidade,

como o principal fator para o desenvolvimento da síndrome na criança, ainda

na vida intra-uterina.

Em 1949, Kanner, passou a referir-se ao quadro como “Autismo Infantil

Precoce” e considerou-o como uma psicopatologia. Em 1954, salientava o

autismo como uma psicose, devido à falta de comprovações em exames

laboratoriais. Dois anos mais tarde, insistiu na consolidação conceitual da

síndrome, porém sentia necessidade de aprofundar o caso em nível biológico,

psicológico e social. Já em 1968, acrescentou às suas considerações, a

necessidade do diagnóstico diferencial com deficientes mentais e afásicos.

Trinta anos depois dos seus primeiros casos, propôs que novas expectativas

fossem estudadas por meio da bioquímica, afirmando a pertinência da

síndrome como parte do quadro das psicoses infantis.

Depois de Kanner, muitos outros pesquisadores foram surgindo, como

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Bruno Bettelheim que construiu para a psicanálise em 1944 a seguinte hipótese

sobre o autismo, segundo AMY (2001):

A criança encontra no isolamento autístico (como os prisioneiros de Dachau) o único recurso possível a uma experiência intolerável do mundo exterior, experiência negativa vivida muito precocemente em sua relação com a mãe e seu ambiente familiar. É por isso que fala de “crianças vítimas de graves pertubações afetivas” (o que por sinal é totalmente verdadeiro para certas crianças que ele acolheu, mas que não eram necessariamente autistas). (...) Bettelheim abriu as portas a teorias extremamente culpabilizantes para os pais, que se viram como a causa primeira do atraso de seus filhos. (p.35-36)

Tomando como base que o desenvolvimento psicológico dos autistas

teria se paralisado quando o bebê ainda estivesse prematuro e com isso o

corpo dele se separou do da mãe por algum momento gerando um grande

trauma, a psicanalista inglesa, Francês Tustin, chama os autistas de “crianças

encapsuladas”. Para ela, a criança autista era tomada de pânico, mesmo

parecendo passivo e indiferente, a criança luta contra suas angústias por meio

de asseguramento com o auxílio de objetos.

Em 1976, no livro publicado com estudo sobre autismo, Ritvo apresentou

a possibilidade de a síndrome ocorrer junto com outras patologias específicas,

em que o autismo seria a derivação de uma patologia exclusiva do Sistema

Nervoso Central.

Nesse contexto, surgem as diferentes posições entre a organicidade e

psicogenicidade.

Enquanto a organicidade afirmava que o autismo era decorrente dos

distúrbios globais de desenvolvimento das habilidades de comunicação verbal

e não verbal e da atividade imaginativa, a psicogenicidade descrevia o autismo

como decorrente de uma desorganização da personalidade no quadro das

psicoses.

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Em 1986, Gauderer baseando-se na definição da psicogenicidade,

defendeu a síndrome como inadequação do sujeito ao meio social ou uma

doença crônica como se fosse um mal incurável e inabilitável, de origem

orgânica, com fatores neurológicos de deterioração interacional.

Já em 1995, Sacks afirma sua oposição em relação ao autismo à ligação

com a esquizofrenia, como era proposto no início das investigações.

Concordando com Kanner, reafirma que o autista sofre a ausência de influência

externas, vive em total isolamento e seus sintomas se apresentam bem mais

cedo do que aparecem nos casos de esquizofrenia.

Atualmente, Segundo Gilberg (1990), o autismo é considerado como

uma síndrome comportamental com etiologias múltiplas em consequência de

um distúrbio de desenvolvimento, sendo caracterizado por déficit na interação

social visualizado pela inabilidade em relacionar-se com o outro, usualmente

combinado com déficits de linguagem e alterações de comportamento.

Até 1989, dizia-se, estatisticamente, que a síndrome acometia crianças

com idade inferior a três anos, com predominância de quatro a cada dez mil

nascidas. Manifestava-se, majoritariamente, em indivíduos do sexo masculino,

sendo a cada quatro casos confirmados, três do sexo masculino e um para o

feminino.

Recentemente, Gaspar (1998), um neuropediatra estudioso do autismo,

publicou que a cada dez mil crianças nascidas, vinte são autistas, não se

restringindo à raça, etnia ou grupo social. De causa ainda não especificamente

determinada, o aumento pode ser em virtude, também, de um maior e melhor

diagnóstico e de informações sobre a síndrome que atinge indivíduos de todos

os países do mundo.

Através desse breve percurso histórico, percebe-se que ainda há muito

que caminhar no sentido de entender o fenômeno autista. Por enquanto, o que

se tem de concreto é que se trata de um distúrbio invasivo do desenvolvimento

e que faz parte da constituição desse indivíduo, afetando a sua relação com o

mundo social. Caracteriza-se por alterações na interação social, na

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comunicação e no comportamento. Podendo se manifestar até mesmo antes

dos três anos e persiste durante a vida adulta.

Existem outros distúrbios do desenvolvimento que se enquadram no

perfil de problemas autísticos, mas que não incluem todas as suas

características. Além disso, esse transtorno não pode ser definido por um grau

de intensidade específico já que se apresenta por um espectro de sintomas

que variam qualitativamente de um sujeito para outro.

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CAPÍTULO II

SISTEMA NERVOSO CENTRAL

2.1 – Terminologia anatômica básica

A origem do Sistema Nervoso dá-se na formação do Tubo Neural O

Sistema Nervoso se desenvolve a partir da ectoderme. O folheto ectodérmico

da pele em desenvolvimento invagina-se ao longo da linha média de dorso, da

cabeça à cauda. À medida que o tubo é formado, o ectoderma se separa dele.

Este tubo neural torna-se o encéfalo e a medula espinhal.

As células da crista neural irá se diferenciar em certas células do

Sistema Nervoso Periférico. O mesoderme circunjacente formará o crânio

(para o encéfalo), a coluna vertebral (circunda a medula espinhal) e os

músculos relacionados. A notocorda (um cordão primitivo de sustentação para

o embrião) será absorvida pela coluna vertebral em desenvolvimento e

resquícios dela permanecerão como o núcleo dos discos invertebrais.

O sistema nervoso central começa como um tubo neural oco, dorsal. A

cabeça ou um terço cefálico do tubo passa por uma proliferação

significativamente maior que os dois terços caudais. Esta porção cefálica

tornar-se-á o encéfalo e a porção caudal, a medula espinhal.

Chama-se sistema nervoso central (SNC), ou neuroeixo, ao conjunto do

encéfalo e da medula espinhal dos vertebrados. Forma, junto com o sistema

nervoso periférico, o sistema nervoso, e tem um papel fundamental no controle

do corpo.

O sistema nervoso é um órgão de alta complexidade anatômica: opaco

por dentro, convoluto e, portanto, cheio de saliências e reentrâncias que

escondem umas às outras, variável entre as espécies animais e

extensamente conectado com estruturas da periferia corporal.

Ao observar a estrutura do sistema nervoso pode ver que eles têm

partes situadas dentro do cérebro e da coluna vertebral e outras distribuídas

por todo corpo. O primeiro nível de classificação do sistema nervoso divide-o

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em sistema nervoso central (SNC) que é definido como o conjunto dos

componentes do sistema nervoso contidos em caixas ósseas (o crânio e a

coluna vertebral) enquanto, o sistema nervoso periférico (SNP) apresenta seus

elementos distribuídos por todo o organismo. O segundo nível de classificação

dividi o SNC em encéfalo e medula espinhal. Já o terceiro nível de classificação

dividi o encéfalo em cérebro, cerebelo e tronco encefálico (que se divide em:

bulbo, situado caudalmente; mesencéfalo, situado cranialmente; e ponte,

situada entre ambos). Diante desta terceira classificação é possível observar a

diferença conceitual anatômica entre cérebro e encéfalo, embora muitas vezes

os dois termos são usados como sinônimos.

No SNC existem substâncias cinzenta e branca, o que difere é o modo

como ambas se distribuem em cada segmento do SNC. A substância cinzenta

é constituída por corpos celulares e forma centros nervosos enquanto a

substancia branca é constituída por cilindros - eixos revestidos de mielina. Na

espinhal medula a substancia cinzenta ocupa o eixo deste segmento do SNC e

é nesta substancia que vão ter origem os nervos raquidianos. A substancia

branca envolve completamente a substancia cinzenta e vai constituir diversos

feixes, uns ascendentes, que são sensitivos, outros descendentes, que são

motores.

É no sistema nervoso central que está a grande maioria das células

nervosas, seus prolongamentos e os contatos que fazem entre si. No sistema

nervoso periférico estão relativamente poucas células, mas um grande número

de prolongamentos chamados fibras nervosas, agrupados em filetes alongados

chamados nervos.

Os órgãos do SNC que se encontra alojado no canal raquídio são

protegidos por estruturas esqueléticas (caixa craniana, protegendo o

encéfalo; e coluna vertebral, protegendo a medula - também denominada

raque) e por membranas denominadas meninges, situadas sob a proteção

esquelética: dura-máter (a externa), aracnóide (a do meio) e pia-máter (a

interna). Entre as meninges aracnóide e pia-máter há um espaço

preenchido por um líquido denominado líquido cefalorraquidiano ou líquor.

E o SNP é constituído pelos nervos que ligam o SNC a todos os locais do

organismo humanos.

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O encéfalo é separado por dois hemisférios (hemisfério esquerdo e

hemisfério direito), separados no plano mediano ora por um sulco profundo

(o sulco longitudinal), ora por um sulco superficial quase imperceptível. Os

hemisférios apresentam dezenas de dobraduras que recebem o nome de

giros, circunvoluções ou folhas, separadas por sulcos ou fissuras.

2.2 – Estruturas neurais

Devido à complexidade do padrão de giros no encéfalo humano, os

anatomistas os agrupam em cinco regiões que recebem o nome de lobos, que

mesmo não tendo limites precisos dão uma idéia de localização regional.

Dentre esses cinco lobos, quatro são visíveis externamente (lobo frontal,

parietal, temporal e occipital) e um posicionado no interior de um dos grandes

sulcos do encéfalo, o sulco lateral (lobo da insula). Os hemisférios cerebrais

formam o assim denominado telencéfalo.

O lobo frontal está relacionado com as funções superiores; elaboração

do pensamento, planejameto, programação de necessidades individuais e

emoções, cognição, raciocínio, decisões, escolhas, valores, julgamentos,

iniciação dos movimentos voluntários e aprendizagem. Este lobo recebe

impulsos nervosos dos lobos parietal e temporal por meio de feixes de longas

fibras de associações situadas no giro cíngulo. O lobo frontal inclui três giros

frontais e três sulcos: giro orbital, a maior parte do giro frontal medial e,

aproximadamente, a metade do giro cíngulo; sulco pré-central, sulco frontal

superior, sulco frontal inferior.

O lobo parietal está relacionado à interpretação, à integração de

informações visuais e somatossensitivas primárias, principalmente o tato, a

sensação de dor, a lógica matemática, habilidade espacial, lúdico. Tudo que

chega ao cérebro é nesta área. Neste lobo inclui-se um giro e dois sulcos: giro

pós central, sulco pós central e sulco intraparietal.

O lobo temporal possui funções situadas em porções diferentes. A

parte posterior está relacionada com a recepção e decodificação de estímulos

auditivo (possibilitando o reconhecimento de tons específicos e intensidade do

som) que se coordenam com impulsos visuais; a parte anterios está

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relacionada com a atividade motora visceral (olfação e gustação) e com

alguns aspectos de comportamentos instintivos, no gerenciamento da

memória. Inclui-se três giros temporais e dois sulcos temporais: giro temporal

superior, giro temporal medial e giro temporal inferior; sulco temporal superior

e sulco temporal inferior.

O lobo occipital é rodeado anteriormente pelo lobo parietal e lobo

temporal em ambas as superfícies lateral e medial do hemisfério. Localiza-se

posteriormente a uma linha imaginária que une a incisura pré-occipital ao

sulco parieto-occipital e repousa sobre a tenda do cerebelo. Este lobo realiza

o processamento da informação visual a partir da recepção dos estímulos que

ocorre nas áreas primárias que leva informações para serem apreciadas e

decodificadas nas áreas secundárias e de associação visual. Inclui-se dois

giros e três sulcos: giro occipital superior, giro occipital inferior, sulco occipital

transverso, sulco occipital lateral e sulco semilunar.

O lobo da insula é uma área adicional do córtex cerebral que não é

normalmente incluída nos cinco lobos clássicos do córtex cerebral é a ínsula,

que se situa sobreposta à zona em que o telencéfalo e o diencéfalo se

fundiram aquando do desenvolvimento embrionário. A ínsula pode ser visível

se se afastar o opérculo que a envolve na zona do sulco lateral, ou se se

retirar parte da zona envolvente. Suas principais funções são fazer parte do

sistema límbico e coordenar emoções, além de ser responsável pelo paladar.

Este lobo só pode ser visto quando se abre o sulco lateral e se removem as

margens dele ou quando se corta o encéflao nos planos adequados. A ínsula

é constituída por quatro giros curtos separados por sulcos rasos (parte

anterior) e por um giro longo que é divido na sua extremidade superior (parte

posterior), um sulco central que separa estas duas porções (anterior e

posterior) e ainda um sulco circular que delimita esta estrutura.

2.3 - Neuroanatomia do Sistema Nervoso Central

Como já foi falado acima, o SNC compreende o encéfalo e a medula

espinhal.

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O encéfalo encontra-se localizado no interior do crânio, protegido por

um conjunto de três membranas, que são as meninges. A dura–máter, a

camada mais externa, é espessa, dura e fibrosa, e protege o tecido nervoso

do ponto de vista mecânico. A aracnoide, a camada intermédia, é mais fina,

sendo responsável pela produção do líquido cefalorraquidiano.

A pia-máter, a camada mais interna, é muito fina e é a única membrana

vascularizada, sendo responsável pela barreira sangue-cérebro.

O encéfalo é constituído por um conjunto de estruturas especializadas

que funcionam de forma integrada para assegurar unidade ao comportamento

humano e é a mais complexa estrutura biológica conhecida. o encéfalo é um

conjunto de estruturas que estão anatomicamente e fisiologicamente ligadas,

sendo elas:

• Bulbo raquidiano - a porção inferior do tronco encefálico, juntamente

com outros órgãos como o mesencéfalo e a ponte, que estabelece

comunicação entre o cérebro e a medula espinhal. É o ponto de

passagem dos nervos que ligam a medula ao cérebro. Contém grupos

de neurónios especializados no controlo de funções fisiológicas vitais,

como o ritmo cardíaco, a respiração, a pressão arterial, ou funções

motoras básicas como engolir. Esta região também influencia o sono e a

tosse.

• Hipotálamo - é uma região do encéfalo dos mamíferos (tamanho

aproximado ao de uma amêndoa) localizado sob o tálamo, formando

uma importante área na região central do diencéfalo, tendo como função

regular determinados processos metabólicos e outras atividades

autônomas. Desempenha um papel fundamental na regulação da

temperatura do corpo, da fome, da sede, do comportamento sexual, na

circulação sanguínea e no funcionamento do sistema endócrino

(regulação hormonal).

• Corpo caloso - é uma estrutura do cérebro localizada na fissura

longitudinal que conecta os hemisférios cerebrais direito e esquerdo.

Sua função é permitir a transferência de informações entre um

hemisfério e outro fazendo com que eles atuem harmonicamente.

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• Cérebro - é o principal orgão e centro do sistema nervoso composto de

duas grandes classes de células, neurônios e células das glia. É o

centro da maioria das atividades conscientes e inteligentes e é composto

pelos hemisférios cerebrais direito e esquerdo, unidos pelo corpo caloso.

O hemisfério esquerdo é responsável pela linguagem verbal, pelo

pensamento lógico e pelo cálculo. O hemisfério direito controla a

percepção das relações espaciais (distâncias entre objetos), a formação

de imagens e o pensamento lógico, entre outros.

• Tálamo - é uma região de substância cinzenta (núcleos de neurônios)

do encéfalo. São duas massas neuronais situadas na profundidade dos

hemisférios cerebrais. É a zona onde chegam a maior parte das fibras

sensitivas e aqui as informações sensoriais são retransmitidas para as

respectivas áreas do córtex cerebral.

• Formação reticular -É uma região evolucionária antiga, que apresenta

uma estrutura intermediária entre a substância branca e a substância

cinzenta. Ocupando a parte central do tronco encefálico, a formação

reticular se projeta cranialmente um pouco para dentro do diencéfalo, e

caudalmente à porção mais alta da medula espinhal. Assim, a formação

reticular é aparentemente uma área difusa com células e fibras que as

cruzam em diferentes direcções e que forma a parte central do tronco

cerebral. É toda a zona do tronco cerebral onde não existe nenhum

núcleo específico e é por alguns autores designada de pântano

neuronal. É uma parte do cérebro que é envolvida em ações como o

ciclo de despertar/sono e a filtragem de estímulos sensoriais para

discriminar os estímulos relevantes dos estímulos irrelevantes. Sua

principal função é ativar o córtex cerebral.

• Cerebelo - O cerebelo é a maior massa do encéfalo que se encontra

dorsal à ponte e à medula oblonga , formado com essas estruturas a

cavidade do quarto ventrículo. Situa-se abaixo do tentório do cerebelo

na fossa posterior do crânio, separado do cérebro por um folheto da

dura-máter é uma zona dorsal e desempenha um papel importante na

manutenção do equilíbrio e na coordenação da atividade motora. Esta

região recebe ordens do cérebro sobre os músculos e “ajusta-as” para

uma melhor atuação motora.

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A medula espinhal é a porção alongada do sistema nervoso central, é a

continuação do encéfalo, que se aloja no interior da coluna vertebral em seu

canal vertebral, ao longo do seu eixo crânio-caudal. A medula espinhal tem a

forma de um cordão arredondado e dela se originam 31 pares de nervos

espinhais. A medula pode ser dividida em 6 partes: cervical superior, dilatação

cervical, dorsal, lombar, cone terminal e filamento terminal. Os nervos

espinhais que saem pelas vértebras recebem o nome das vértebras, por

exemplo, os nervos torácicos saem entre as vértebras torácicas.

A medula espinhal não é apenas um condutor de impulsos nervosos. Os

circuitos neuronais medulares são importantes na produção dos movimentos

musculares, pois eles exercem o controle direto sobre os músculos. Ela tem a

função de conduzir impulsos nervosos das regiões do corpo até o encéfalo,

produzir impulsos e coordenar atividades musculares e reflexos.

2.4 – Funcionamento do Sistema Nervoso Central

Sendo um sistema integrativo por excelência, o sistema nervoso

funciona como um todo, com a cooperação integrada de todos os seus

elementos e o resultados desse funcionamento integrado é mais complexo do

que a simples soma de suas partes constituintes.

O sistema nervoso é responsável pelo ajustamento do organismo ao

ambiente. Sua função é perceber e identificar as condições ambientais

externas, bem como as condições reinantes dentro do próprio corpo e elaborar

respostas que adaptem a essas condições. É formado principalmente por

neurônios e células glias.

O neurônio é o principal componente do sistema nervoso. Considerada sua

unidade anatomo-fisiológica, estima-se que no cérebro humano existam

aproximadamente 15 bilhões destas células, responsável por todas as funções

do sistema e è formado por:

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• corpo do neurônio (soma) constituído de núcleo e pericário, que dá

suporte metabólico à toda célula;

• axônio (fibra nervosa) prolongamento único e grande que aparece no

soma. É responsável pela condução do impulso nervoso para o próximo

neurônio, podendo ser revestido ou não por mielina (bainha axonial) ,

célula glial especializada,

• dendritos que são prolongamentos menores em forma de ramificações

(arborizações terminais) que emergem do pericário e do final do axônio,

sendo, na maioria das vezes, responsáveis pela comunicação entre os

neurônios através das sinapses. Basicamente, cada neurônio, possui

uma região receptiva e outra efetora em relação a condução da

sinalização.

Os corpos celulares dos neurônios estão concentrados no sistema nervoso

central e também em pequenas estruturas globosas espalhadas pelo corpo, os

gânglios nervosos. Os dentritos e o axônio, genericamente chamados fibras

nervosas, estendem-se por todo o corpo, conectando os corpos celulares dos

neurônios entre si e às células sensoriais, musculares e glandulares.

O neurônio, que é uma célula extremamente estimulável; é capaz de

perceber as mínimas variações que ocorrem em torno de si, reagindo com uma

alteração elétrica que percorre sua membrana. Essa alteração elétrica é o

impulso nervoso.

As células nervosas estabelecem conexões entre si de tal maneira que

um neurônio pode transmitir a outros os estímulos recebidos do ambiente,

gerando uma reação em cadeia.

Além dos neurônios, o sistema nervoso apresenta-se constituído pelas

células glia, ou células gliais, cuja função é dar sustentação aos neurônios e

auxiliar o seu funcionamento. As células da glia constituem cerca de metade do

volume do nosso encéfalo.

Neurônios diferem de outras células em um aspecto muito importante:

eles processam informações. Eles devem desencadear informações sobre o

estado interno do organismo e seu ambiente externo, avaliar esta informação e

coordenar atividades apropriadas à situação e às necessidades correntes das

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pessoas.

A informação é processada por um evento conhecido como impulso

nervoso. O impulso nervoso é a transmissão de um sinal codificado de um

dado estímulo ao longo da membrana do neurônio, a partir do ponto em que

ele foi estimulado.

O estímulo provoca, assim, uma onda de despolarizações e

repolarizações que se propaga ao longo da membrana plasmática do neurônio.

Essa onda de propagação é o impulso nervoso, que se propaga em um único

sentido na fibra nervosa. Dentritos sempre conduzem o impulso em direção ao

corpo celular, por isso diz que o impulso nervoso no dentrito é celulípeto. O

axônio por sua vez, conduz o impulso em direção às suas extremidades, isto é,

para longe do corpo celular; por isso diz-se que o impulso nervoso no axônio é

celulífugo.

A propagação rápida dos impulsos nervosos é garantida pela presença

da bainha de mielina que recobre as fibras nervosas. A bainha de mielina é

constituída por camadas concêntricas de membranas plasmáticas de células

da glia, principalmente células de Schwann. Entre as células gliais que

envolvem o axônio existem pequenos espaços, os nódulos de Ranvier, onde a

membrana do neurônio fica exposta.

Nas fibras nervosas mielinizadas, o impulso nervoso, em vez de se

propagar continuamente pela membrana do neurônio, pula diretamente de um

nódulo de Ranvier para o outro.

Um impulso é transmitido de uma célula a outra através das sinapses. A

sinapse é uma região de contato muito próximo entre a extremidade do axônio

de um neurônio e a superfície de outras células. Estas células podem ser tanto

outros neurônios como células sensoriais, musculares ou glandulares.

As terminações de um axônio podem estabelecer muitas sinapses

simultâneas. Na maioria das sinapses nervosas, as membranas das células

que fazem sinapses estão muito próximas, mas não se tocam. Há um pequeno

espaço entre as membranas celulares (o espaço sináptico ou fenda sináptica).

Quando os impulsos nervosos atingem as extremidades do axônio da

célula pré-sináptica, ocorre liberação, nos espaços sinápticos, de substâncias

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químicas denominadas neurotransmissores ou mediadores químicos, que tem

a capacidade de se combinar com receptores presentes na membrana das

célula pós-sináptica, desencadeando o impulso nervoso. Esse tipo de sinapse,

por envolver a participação de mediadores químicos, é chamado sinapse

química. Em alguns tipos de neurônios, o potencial de ação se propaga

diretamente do neurônio pré-sináptico para o pós-sináptico, sem intermediação

de neurotransmissores. As sinapses elétricas ocorrem no sistema nervoso

central, atuando na sincronização de certos movimentos rápidos.

Os cientistas já identificaram mais de dez substâncias que atuam como

neurotransmissores, como a acetilcolina, a adrenalina (ou epinefrina), a

noradrenalina (ou norepinefrina), a dopamina e a serotonina.

As diferentes partes do corpo precisam funcionar em conjunto. Para

realizar estas funções, o corpo humano depende de mecanismos de

coordenação e controle das suas funções orgânicas, e que entra em ação o

tempo todo, dependente ou independente da nossa vontade. Quase todo o

mecanismo de coordenação e controle das funções orgânicas funciona graças

ao Sistema Nervoso (SN).

Formado por bilhões de células nervosas, o nosso Sistema Nervoso

funciona como uma grande rede de comunicações, em que as mensagens têm

a forma de sinais químicos e elétricos num movimento incessante pelo corpo.

A noção de Vygotsky sobre o desenvolvimento intelectual dos seres humanos

ocorre em função da interação com o meio pode ser chamada de atividade

psicossocial e para que ela ocorra é necessário ter seus sistemas funcionando

em perfeitas condições para que esta relação com o meio seja plena em todos

os sentidos. O SN é quem comanda esta relação através da sensibilidade

responsável por receber as informações do ambiente (visual, auditiva, táctil,

olfativa, gustativa e magnoelétrica, esta última carece demais estudos físicos

quânticos), através da associação (atenção, memória, praxia, gnosia,

linguagem, reflexos, etc...) e através da motricidade que permite respondermos

ao ambiente (motricidade esquelética, cardíaca e lisa, e secreções e etc...).

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CAPÍTULO III

NEUROCIÊNCIA E AUTISMO

3.1 – Uma breve introdução

Há mais de 70 anos cientistas de todo mundo se dedicam a estudar

aquela que é uma das mais enigmáticas desordens neurológicas: o autismo.

Embora muitos avanços tenham sido feitos na área clínica, os mecanismos

moleculares, genéticos e neurobiológicos desse distúrbio permanecem em

grande parte desconhecidos. Novos estudos, entretanto, parecem dar

esperança para se recomendar tratamentos e medicamentos mais eficazes em

um futuro próximo.

Segundo Relvas (2009), o autismo é um distúrbio do desenvolvimento

complexo e de origem orgânica (lesão encefálica) e sua causa específica é de

componente genético. Devido a sua complexidade, apresenta etiologias

múltiplas e se caracteriza por graus variados de gravidade. Caracteriza-se por

uma tríade: alteração na comunicação social, no comportamento e na

linguagem. Os diferentes graus de possibilidades motivaram a expressão

transtornos globais do desenvolvimento (TGDs), que constituem o espectro dos

transtornos autistas.

A revista Mente e Cérebro (2010) diz que o autismo é uma doença

orgânica que afeta a mente e com grandes indícios de que seja genético,

porém sua herança não está completamente elucidada.

Rotta, Ohlweiler e Riesgo (2006), afirmam que se por um lado não se

possa discutir a importância dos fatores biológicos na causa do autismo, por

outro, não existe um marcador biológico para essa patologia tornando o

diagnóstico e o conhecimento de seus limites uma decisão clínica um tanto

arbitrária.

Os critérios utilizados para o diagnóstico do autismo estão presentes no

Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais da associação

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Americana de Psiquiatria (DSM-IV) e no Código Internacional de Doenças (CID

10). Cada um desses critérios utilizados para diagnosticar autismo tem um grau

elevado de especificidade em grupos de diversas faixas etárias e entre

indivíduos com habilidades cognitivas de linguagens distintas. As divisões

estabelecidas por ambos, são uma tentativa de atender a necessidade

científica de pesquisa e os serviços que supram tais necessidades.

Continuando com as referências de Rotta, Ohlweiler e Riesgo (2006), o

principal fator proposto pelos critérios para o diagnóstico de autismo e dos

distúrbios relacionados, é o de reduzir as divergências clínicas a respeito das

delimitações desses distúrbios. Essa delimitação se prende a um nível

comportamental (tipologia) ou biológico (etiologia). As pesquisas sobre soa

aspectos biológicos são relacionadas ao estudo das possibilidades etiológicas

que constituem os fatores extrínsecos pré, peri e/ou pós-natais podendo estar

associado ou não em diferentes combinações com aspectos genéticos ou

intrínsecos.

As várias patologias associadas ao autismo, suportam a hipótese de que

as manifestações comportamentais que definem este complexo de sintomas

podem ser secundárias a uma grande variedade de insultos ao cérebro. A

heterogenicidade desse distúrbio pode ser devida a etiologias distintas ou a

uma combinação de fatores, tais como etiologia, predisposição genética e

fatores ambientais.

A idéia predominante é que deve haver uma associação genética e

ambiental que responda pelo transtorno. Alterações anatômicas no cerebelo,

hipocampo, córtex, amígdala, septo e corpos mamilares têm sido descritas em

autistas. (Revista Mente e Cérebro, 2010).

3.2 - Alterações cerebrais

Como podemos observar na figura abaixo, o cérebro do autista possui o

tronco cerebral (região imediatamente acima da medula espinhal) mais curto

que de outras pessoas; o núcleo facial é menor que o normal e junto com o

corpo trapezóide estão mais próximas do núcleo hipoglosso e a oliva inferior

além de não apresentar oliva superior. É como se uma faixa de tecido não

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existisse. Tais mudanças poderiam ocorrer apenas no início da

gestação.

(MENTE E CÉREBRO, 2010).

Os estudos realizados nas últimas décadas no cérebro de autistas,

revelam alterações anatômicas das regiões cerebrais e sugerem a origem do

transtorno na vida pré-natal. Tais pesquisas apontam que os danos anatômicos

originados na vida perinatal podem desempenhar papel primário na etiologia do

autismo. Contudo, ainda não existe uma causa concreta sobre o autismo.

Embora existam diversos estudos com a intenção de desvendar os

fatores genéticos à doença, a etiologia do autismo continua desconhecida.

Algumas pesquisas fazem uma comparação entre o volume dos lobos

cerebrais de crianças normais e autistas onde foi percebido que o volume da

substância branca nos lobos frontal, temporal e parietal e de substância cinza

nos lobos frontal e temporal se desenvolveram em uma menor velocidade nos

pacientes autistas que tenham de 2 a 11 anos de idade. Nos autistas de idade

superior a essa não ocorre essa diferença.

Um estudo realizado por meio do PET (Positron Emission Tomography)

comparou o fluxo sanguíneo no córtex cerebral de crianças normais e autistas

onde nos autistas teve uma diminuição significativa do fluxo sanguíneo nos

centros de associação auditiva dos lobos temporais, sendo essa alteração

detectada em 76% das crianças autistas estudadas.

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Aparentemente, nos casos de autismo, o desenvolvimento cerebral

segue um curso anormal nos primeiros anos de vida. Dado que o primeiro ano

de vida é crucial no desenvolvimento cerebral e na aprendizagem, os cientistas

especulam que este período de rápido crescimento cerebral é um fator

preponderante na emergência da sintomatologia das crianças com autismo

(Courchesne et al, 2003). Assim, este crescimento cerebral rápido e

desordenado pode fazer com que se estabeleçam conexões sinápticas de

forma não adaptativa. Consequentemente, as crianças podem perder a

capacidade de relacionar os eventos de forma que estes tenham significado.

Estudos comprovam a existência de alterações neuroanatómicas em

crianças com autismo. As estruturas cerebrais mais afetadas são: hipocampo,

amígdala, cerebelo, córtex cerebral, sistema límbico, corpo caloso, gânglios

basais e tronco cerebral.

Existem défices no hemisfério esquerdo do lobo frontal durante a

realização de tarefas que implicam o uso de funções executivas. Nas tarefas

em que são necessárias funções visuo-perceptivas a lateralização parece

normal (Rinehart et al, 2002). Inversão da assimetria típica no córtex frontal

relacionado com a linguagem (nos indivíduos autistas, é maior do lado direito).

Também foram encontradas diferenças de simetria no giro fusiforme temporal

posterior. Os cientistas sugerem que estas alterações estruturais estão

relacionadas com os défices ao nível social característicos das perturbações do

espectro autista uma vez que estas áreas do cérebro estão relacionadas com a

linguagem e processamento social (Herbert et al, 2003). Investigações recentes

apontam para uma relação entre o aumento do volume do lobo frontal e as

alterações ao nível do cerebelo (Carper & Courchesne, 2002). Estudos

sugerem que a disfunção do lobo frontal influencia a sintomatologia no autismo

(Hashimoto et al, 2002), nomeadamente a pobre integração neuronal no lobo

pré-frontal (Murphy et al, 2002). A disfunção no córtex frontal esquerdo parece

ter implicações ao nível cognitivo e comportamental (Gomot et al, 2002).

Verificou-se disfunção no lobo temporal, manifestada pela tendência de

reações exageradas e comportamentos anormais em resposta a estímulos

auditivos. (Zibovicius et al, 2000). Os estudos que investigam as alterações na

maturação do córtex auditivo nos dois hemisférios mostram que há diferenças

entre os indivíduos com autismo e os grupos de controlo (Roberts et al, 2003).

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O sistema límbico está relacionado com a memória e aprendizagem. A

amígdala está relacionada com as emoções e comportamento social (Daener

et al, 2002) e com o processamento de estímulos tais como as emoções

sociais (Adolphs et al, 2002). Investigações demonstraram que as células da

amígdala dos indivíduos com autismo são menores e existem menos espaços

entre elas (Bauman & Kemper,2003). O cerebelo ajuda a planearmos o que vai

acontecer a seguir em termos de movimento, pensamentos e emoções. É um

modulador das funções cerebrais e atua no processamento da linguagem,

planejamento motor e sequenciação temporal (Bauman & Kemper, 2003).

Constatou-se o aumento do volume cerebelar nas pessoas com autismo

(Brambilia, et al,. 2003). Os investigadores, também sugerem que o cerebelo

influencia a atenção durante a realização de uma tarefa (Townsend et al, 2001).

Alterações electrofisiológicas sugerem défices na atenção espacial nos

indivíduos com autismo (o que reflete a influência do cerebelo na função dos

lobos frontal e temporal).

3.3 – Neurônios espelhos

Recentes descobertas sobre os neurônios-espelho, um dos achados

mais importantes das neurociências nos últimos tempos. Espalhados por partes

fundamentais do cérebro: região frontal – onde as ações são planejadas,

decididas e executadas. Pode abrigar os neurônios-espelhos que imitam a

ação de outras pessoas, possivelmente relacionados ao aprendizado; região

parietofrontal - Área que conjuga a tomada de decisão da região frontal com os

cinco sentidos humanos. Também está relacionada às emoções.

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(http://www.katiachedid.com.br/content.php?News&ID=61)

Segundo a revista Mente e Cérebro (2010) Giacomo Rizzolatti e seus

colegas da Universidade de Parma, Itália, descobriram a função dos neurônios

espelhos nos anos 90 ao observar o funcionamento neuronal de um macaco.

Instalaram fios numa área de seu cérebro que é responsável pelo movimento.

Sempre que o macaco pegava ou movia um objeto, determinadas células

cerebrais disparavam. O monitor em que os eletrodos estavam ligados

registrava a área de localização desses neurônios e emitia um sinal. Como era

verão, um dia um aluno entrou no laboratório tomando um sorvete. Quando o

rapaz levou a casquinha à boca, o monitor começou a apitar. Foi quando os

cientistas se espantaram: o macaco permanecia imóvel. A cena voltou a se

repetir com outros alimentos, como amendoins e bananas. Portanto, a resposta

de seus neurônios-espelhos só podia vir da ação de outra pessoa. Os

cientistas perceberam que as células cerebrais disparavam quando o macaco

via ou ouvia alguém fazer algo ou, ainda, quando ele mesmo realizava uma

tarefa. Assim chegaram às primeiras conclusões sobre a capacidade dos

neurônios-espelhos.

Nos macacos, o papel dos neurônios-espelhos limita-se a prever ações

direcionadas: nos seres humanos tudo indica que essa classe de células

nervosas habilita o ser humano a enxergar a si mesmo como seu semelhante o

enxerga, e esse dom é essencial na autopercepção e na introspecção.

No final da década de 90, notou-se que esses neurônios pareciam

desempenhar exatamente as mesmas funções que, nos autistas, estariam

desintegradas. Se esse circuito neuronal estiver de fato associado à

interpretação de intenções complexas, sua ruptura explicaria a falta de

habilidade social que caracteriza pessoas que sofrem deste distúrbio.

A comprovação por exames eletroencefalográficos (EEG) de que a

emissão de impulsos elétricos pelos neurônios no córtex pré-motor suprime as

ondas um revelou-se um excelente método para estudar o sistema de

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neurônios-espelho em autistas. Para tanto, pesquisadores como Eric

LAltschuler e Jamie Pineda da Universidade da Califórnia, monitoraram ondas

um em crianças autistas e crianças de um grupo de controle: ambos os grupos

foram instruídos para executar movimentos musculares voluntários e em

seguida assistir no vídeos aos mesmos movimentos. O EEG detectou a

supressão das ondas um quando a criança fazia um gesto voluntário, tal como

se nota em crianças sadias. Mas, quando ela observava outra pessoa

desempenhar a ação, não ocorria a supressão. Assim o sistema de comando

motor estava intacto, mas seu sistema de neurônios –espelho, deficiente .

Outros pesquisadores confirmaram tais resultados por meio de

diferentes técnicas de monitoramento da atividade neural. Na Finlândia, Riitta

Hari descobriu tal deficiência nestes neurônios por meio da

magnetoencefalgrafia, que mede campos magnéticos produzidos por correntes

eletricas no cérebro. Já Mirella Dapretto da Universidade da Califórnia em Los

Angeles, optou pela ressonância magnética funcional onde registrou redução

da atividade dos neurônios-espelho no córtex pré-frontal de autistas. A técnica

de estimulação magnética transcraniana que induz correntes elétricas no córtex

motor a produzir movimentos musculares, foi a opção adotada por Hugo

Théoret na Universidade de Montreal para estudar a atividade de tais

neurônios.

A atividade dos neurônios-espelho é reduzida no córtex pré motor de

autistas, o que talvez explique a dificuldade deles para perceber intenções

alheias. Disfunções dessas células nervosas no córtex do giro cíngulo anterior

e no córtex insular possivelmente são a causa de sintomas afins, como

ausência de empatia. Deficiências no giro angular podem redundar em

problemas de linguagem. Quem sofre do distúrbio costuma apresentar

alterações estruturais no cerebelo e no tronco encefálico.

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(Revista Mente e Cérebro)

O resultado de tais estudos é a confirmação incontestável da tese de

que pessoas com autismo sofrem de disfunção do sistema de neurônios-

espelho.

3.4 – Linguagem

A criança que tem um processo de desenvolvimento normal, adquire a

linguagem em uma forma espontânea e natural, tornando-se, desde muito

cedo, a principal interveniente no processo de comunicação. A interação entre

o bêbe a os seus pais permite o desenvolvimento de uma primeira linguagem,

com bases sócio/afetivas, que se revela extremamente eficaz no ato de

comunicação. È notório para estudiosos das primeiras relações que os bebês

vê “munidos de um dispositivo” de procura e convocação de outro ser humano.

A região cerebral responsável pela identificação de faces humanos é uma das

únicas que já estão prontas desde o nascimento. O bebê busca pelos rostos

humanos e ao encontrar se coloca em um estado de disposição inata para a

relação e a comunicação. Como foi visto anteriormente, a interação dos

neurônios espelhos com a área de Broca e motora primária, é entendida como

base para aprendizagem. A observação de ações realizadas por outros é

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reproduzida internamente, principalmente nos bebês, que para eles é tudo

novo, uma descoberta.

Desde muito cedo, portanto, o conteto com o outro molda a mente

humana, uma combinação não linear e em constante retoalimentação de

características inatas e daquilo que o ambiente o ferece á criança. Mas, isso

não ocorre com os bebês autistas, que na maior parte do tempo desvia do

contato visual. Quando isso não ocorre, o primeiro elo para a constituição da

linguagem está deficiente.

Nos dois primeiros anos de vida ocorre o crescimento mais acentuado

do cérebro: o peso do cérebro duplica, há aumento importante do volume da

substância branca e do graus de mielinização e um aumento menor do volume

da substância cinzenta (Paus et al., Utsunomiya et al., 1999). Além disso, há

aumento importante do volume hipocampal (Saitoh et al., 2001; Utsunomiya et

al., 1999). Até os oito anos de vida ocorre um aumento lento do volume da

substância cinzenta pré-frontal que depois se acelera entre oito e quatorze

anos (Kanemura et al., 2003). A rápida formação de sinapses inicia-se nos

primeiros meses de vida pós-natal e atinge o máximo de densidade

aproximadamente aos três meses no córtex sensorial, e entre dois e três anos

e meio no córter frontal (Huttenlocher and Dabholkar, 1997; Rakic et al., 1994).

È importante salientar que os cuidados dos pais, ambiente, etc. Influenciam e

modelam este desenvolvimento: padrão de formação sináptica, formação dos

espinhos dentríticos, alterações na densidade sináptica regional, emergência

de habilidades frontais.

A linguagem é o sistema de simbolização prototípico. O estudo da

aquisição da linguagem é um excelente paradigma para a compreensão do

desenvolvimento da cognição em seres humanos (Vygotsky, 1998). A função

da linguagem tem maior parte dos substratos neurais localizados no hemisfério

cerebral dominante. Na imensa maioria dos indivíduos (mais de 90%) este é o

hemisfério cerebral esquerdo. A expressão verbal depende da área de Broca

localizada no giro frontal inferior; no córtex das bordas posteriores do sulco

temporal superior encontra-se na área de Wernicke classicamente responsável

pela compreensão e interpretação simbólica da linguagem.

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Estudos neurocientíficos sobre sutismo têm mostrado anormalidades

cerebrais nos autistas justamente nas regiões liagdas às funções expressivas e

interpretativas da linguagem como a pouca atividade próxima a àrea de

Wernicke e alterações na área 44 de Broca. (Mente e Cerébro, 2010).

Brodin (2005) afirma que tradicionalmente a linguagem no autismo é

descrita como “incapacidade em usar a comunicação interativa”, com

caractarísticas “ecolálicas”. Essa descrição é usada no diagnóstico e

supostamente no prognóstico do desenvolvimento linguístico da criança autista.

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15/01/2011 às 23:41

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ANEXOS

Classificação Internacional de Doenças (CID-10) publicada pela Organização Mundial de Saúde

(WHO - World Health Organization)

CRITÉRIOS PARA DIAGNÓSTICO DO AUTISMO (CID-10) (WHO 1992)

Pelo menos 8 dos 16 itens especificados devem ser satisfeitos.

a. Lesão marcante na interação social recíproca, manifestada por pelo menos três dos próximos cinco itens: 1. dificuldade em usar adequadamente o contato ocular, expressão facial, gestos e postura corporal para lidar com a interação social. 2. dificuldade no desenvolvimento de relações de companheirismo. 3. raramente procura conforto ou afeição em outras pessoas em tempos de tensão ou ansiedade, e/ou oferece conforto ou afeição a outras pessoas que apresentem ansiedade ou infelicidade. 4. ausência de compartilhamento de satisfação com relação a ter prazer com a felicidade de outras pessoas e/ou de procura espontânea em compartilhar suas próprias satisfações através de envolvimento com outras pessoas. 5. falta de reciprocidade social e emocional.

b. Marcante lesão na comunicação: 1. ausência de uso social de quaisquer habilidades de linguagem existentes. 2. diminuição de ações imaginativas e de imitação social. 3. pouca sincronia e ausência de reciprocidade em diálogos. 4. pouca flexibilidade na expressão de linguagem e relativa falta de criatividade e imaginação em processos mentais. 5. ausência de resposta emocional a ações verbais e não-verbais de outras pessoas. 6. pouca utilização das variações na cadência ou ênfase para refletir a modulação comunicativa. 7. ausência de gestos para enfatizar ou facilitar a compreensão na comunicação oral.

c. Padrões restritos, repetitivos e estereotipados de comportamento, interesses e atividades, manifestados por pelo menos dois dos próximos seis itens: 1. obsessão por padrões estereotipados e restritos de interesse. 2. apego específico a objetos incomuns. 3. fidelidade aparentemente compulsiva a rotinas ou rituais não funcionais específicos. 4. hábitos motores estereotipados e repetitivos. 5. obsessão por elementos não funcionais ou objetos parciais do material de recreação.

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6. ansiedade com relação a mudanças em pequenos detalhes não funcionais do ambiente.

d. Anormalidades de desenvolvimento devem ter sido notadas nos primeiros três anos para que o diagnóstico seja feito.

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Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais da Associação Americana de Psiquiatria (DSM-IV, 1994)

CRITÉRIOS PARA DIAGNÓSTICO DO AUTISMO

A. Um total de seis (ou mais) itens de (1), (2), e (3), com pelo menos dois de (1), e um de cada de (2) e (3).

1. Marcante lesão na interação social, manifestada por pelo menos dois dos seguintes itens:

a. destacada diminuição no uso de comportamentos não-verbais múltiplos, tais como contato ocular, expressão facial, postura corporal e gestos para lidar com a interação social.

b. dificuldade em desenvolver relações de companheirismo apropriadas para o nível de comportamento.

c. falta de procura espontânea em dividir satisfações, interesses ou realizações com outras pessoas, por exemplo: dificuldades em mostrar, trazer ou apontar objetos de interesse.

d. ausência de reciprocidade social ou emocional.

2. Marcante lesão na comunicação, manifestada por pelo menos um dos seguintes itens:

a. atraso ou ausência total de desenvolvimento da linguagem oral, sem ocorrência de tentativas de compensação através de modos alternativos de comunicação, tais como gestos ou mímicas.

b. em indivíduos com fala normal, destacada diminuição da habilidade de iniciar ou manter uma conversa com outras pessoas.

c. ausência de ações variadas, espontâneas e imaginárias ou ações de imitação social apropriadas para o nível de desenvolvimento.

3 . Padrões restritos, repetitivos e estereotipados de comportamento, interesses e atividades, manifestados por pelo menos um dos seguintes itens:

a. obsessão por um ou mais padrões estereotipados e restritos de interesse que seja anormal tanto em intensidade quanto em foco.

b. fidelidade aparentemente inflexível a rotinas ou rituais não funcionais específicos.

c. hábitos motores estereotipados e repetitivos, por exemplo: agitação ou torção das mãos ou dedos, ou movimentos corporais complexos.

d. obsessão por partes de objetos.

B . Atraso ou funcionamento anormal em pelo menos uma das seguintes áreas, com início antes dos 3 anos de idade:

1. interação social.

2. linguagem usada na comunicação social.

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3. ação simbólica ou imaginária.

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PESQUISA DE CAMPO

O último quantitativo realizado em 2010 pela Rede Municipal de

Educação de Niterói constou de 49 alunos com laudo de autismo incluídos no

sistema educacional.

O trabalho realizado com os alunos especiais fica a cargo da equipe de

educação especial que tem como coordenadora a Profª Nelma Pintor. A equipe

sempre faz uma entrevista com os responsáveis pelo aluno, procuram

encaminhar para as diversas entidades parceiras e após isso é feita uma

avaliação que detectará se o aluno é ou não severamente comprometido. Se o

aluno não for severamente comprometido é encaminhado a escola junto com

as coordenadoras responsáveis pelo pólo da escola em que este será inserido

para que junto com a escola tracem um melhor caminho para a sua efetiva

inclusão. Os que são bem comprometidos são encaminhados para o projeto

EIDE, Espaço Integrado de Desenvolvimento de Estimulação, criado pela

coordenadora da Equipe de Educação Especial da Rede Municipal de Niterói,

para atender alunos com comprometimentos severos, onde se desenvolve um

trabalho de estimulação e socialização com os alunos até o momento de

encaminhá-los as escolas municipais e incluí-los em seu grupo de referência,

com o acompanhamento de um professor de apoio e também tendo

atendimento em Sala de Recursos.

A equipe de educação especial conta com uma fonoaudióloga

doutoranda em neurociência chamada Lucienne Souza que desenvolve um

trabalho de articulação da pedagogia com a neurociência e que neste ano de

2011 irá montar um plano de educação individualizado para os alunos autistas.

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Entrevista realizada com Lucienne Souza

1) Quantos alunos com laudo são atendidos pela rede e como é realizado o

trabalho com eles?

No último quantitativo realizado em 2010 contamos 49 alunos autistas com

laudo, porém existe alguns que ainda estão em avaliação para confirmar ou

não o laudo de autismo. O trabalho com os alunos com pouca severidade é

incluí-los diretamente na escola, onde a equipe de educação especial dá todo o

suporte necessário e resolve juntamente com a escola da necessidade ou não

de um professor de apoio. Já os alunos mais comprometidos vão para o EIDE

e só saem de lá para escola com um professor de apoio eu irá juntamente com

a equipe e a escola determinar um currículo mais efetivo para esse aluno.

2) Onde entra a neurociência neste trabalho?

Na busca pelo entendimento do alunos com sua complexidade (linguagem,

motora, cognitivo, afetivo). A neurociência estuda o micro para se chegar ao

macro o que é fundamental para entender o funcionamento do SNC. Estudo

também como que os medicamentos usados pelos alunos podem afetar os

mecanismos sinápticos e as alterações na população neuronal que podem ou

não se ligar ao quadro de autismo. Sem contar nas leituras constantes sobre tal

assunto.

3) Quais os pontos positivos e negativos da proposta pedagógica da rede para

esses alunos?

Positivos – Valorização da educação especial, dos profissionais, dos alunos e

das salas de recursos. Uma equipe que está sempre aberta ao diálogo e que

oferece oportunidades de formação continuada.

4) Para você, qual o ponto mais difícil na educação especial?

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Sinceramente é fazer com que a neurociência seja acessível para todos os

professores de educação. Muitos professores querem tudo pronto, não querem

ter trabalho para pensar, ajudar e flexibilizar o currículo dos alunos especiais.

Tento mostrar a pluralidade e fazer com que eles se tornem um professor

pesquisador, mobilizado a entender o aluno.

5) Como que é o seu trabalho enquanto única neurocientista na rede?

Bom, é fazer tudo o que já foi falado anteriormente, como avaliação dos alunos,

ajudar na criação de um currículo individual e possível de intervenções

plausíveis ao desenvolvimento dos alunos assim como a capacitação dos

professores.

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Relato da professora de apoio Natalia Theophilo sobre sua aluna autista

Este relato descreve como ocorreram os primeiros passos no processo

de inclusão escolar da adolescente autista de 13 anos, até o momento de sua

“descoberta” em seu lar. Cito a palavra “descoberta”, pois seu mundo era

constituído apenas de sua família, vivendo em sua casa com pouco contato

social, praticamente interagindo apenas com seus familiares, por ter dificuldade

de relacionar-se com outras pessoas.

A aluna Daiana,desde os 3 anos recebia atendimento de fonoaudiologia,

psicologia, terapia ocupacional e brinquedoteca. Aos 9 anos iniciou a atividade

escolar na parte da tarde, porém quando mudaram o seu horário para a parte

da manhã, ela não se adaptou e apresentou um comportamento agressivo.

Devido a isso, não teve continuidade no atendimento e ela permaneceu em

casa até os 13 anos quando ingressou no EIDE.

Em 2009 Daiana chegou ao EIDE com um laudo médico no qual

constava atraso global de desenvolvimento. Entrou na sala toda desajeitada,

balançando o corpo, repetindo palavras e frases simples, chamando por Daniel

(seu pai). Estava nervosa, muito agitada. Parecia ter medo, receio de tudo e de

todos, não permitindo o toque, dificuldade de interação com as pessoas e o

meio. Somente se tranqüilizando no instante em que sua mãe retornou à sala e

assim foi realizada a avaliação inicial, a fim de verificar quais seriam suas

necessidades, habilidades, potencialidades e necessidades educacionais.

Constamos que apresentava compreensão do entorno, certa autonomia e

independência, boa percepção visual e auditiva, boa memória, coordenação

motora desenvolvida. Reconhecia e escrevia seu primeiro nome e algumas

letras, utilizando a letra bastão. Manifestava seus desejos, interesse e vontades

demonstrando satisfação e insatisfação, mudança de humor, ora tranqüila, ora

(quando não conseguindo o que queria) muito agitada, com comportamento

agressivo, dificuldade no convívio social, no estabelecer contato, problema de

relacionamento, porém já obedecia a algumas ordens. Mostrava um

vocabulário simples, dificuldade de articular alguns fonemas, ecolalia

acentuada, esteriotipias, tinha dificuldade no brincar. Demonstrava interesse e

desejo de estar na escola, talvez pela questão de sua irmã mais nova já

freqüentar a escola.

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A partir dessa avaliação foi direcionado o trabalho que seria

desenvolvido individualmente, estabelecendo prioridades e metas respeitando

o seu momento, as suas potencialidades, mas também estabelecendo limites,

a fim de determinar quais seriam as habilidades necessárias e úteis a serem

desenvolvidas com a aluna. Partindo do seguinte princípio: estabelecer uma

relação afetiva, melhorar a comunicação e o convívio social, estimulando o

contato físico, o toque, a afetividade e a confiança entre aluna-professora. A

aluna teria 45 minutos de atendimento, duas vezes por semana, pois era o

tempo limite que ela conseguia ficar na sala. Começando com um trabalho

individualizado, depois incluindo num grupo com mais crianças até o momento

de encaminhá-la para a escola, sempre observando o seu comportamento e

mudança de atitudes. Trabalho realizado com persistência e repetição de

ações, pois houve situações difíceis, muitas crises acarretando momentos de

agressividades. E nesses momentos víamos uma mãe envergonhada, triste,

talvez com receio de mais uma vez ouvir a seguinte frase: “__Não podemos

mais ficar com sua filha.” Porém isso não ocorreu, com essa mãe que é muito

comprometida com a condição da filha, mas que não sabia lidar com a

situação.

Daiana participava das atividades com satisfação, rindo, brincando, interagindo

com a mediadora, mas repentinamente mudava de comportamento ficando

irritada, desconcentrada, impaciente, teimosa, ansiosa, agressiva,

apresentando um vocabulário pejorativo. Quando as crises eram fortes agredia

a si mesma e

às pessoas ao seu redor. Momento depois voltava ao normal criticando a si

mesma pelo fato ocorrido. A aluna apresentava muitas dificuldades na

socialização, na aceitação do NÃO e do DEPOIS, cuspia, batia e tinha alguns

rompantes de raiva quando quebrava os objetos que estivessem por perto. No

trabalho realizado com a aluna, focava-se muito a tranqüilidade, calma,

serenidade e carinho como forma de deixá-la o mais confortável possível na

realização das suas atividades que enfatizavam bastante a concentração,

memória e coordenação motora, assim como as AVD. Obtivemos respostas

positivas, pois ela começou a identificar, a aceitar, a interagir com as pessoas,

demonstrando gostar do ambiente, as crises diminuíram e assim foi sugerida a

inclusão dela na escola para conviver com alunos de sua idade.

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No ano passado, a aluna passou a freqüentar a sala de recurso (duas

vezes por semana) da escola municipal a qual está matriculada, porém houve

problemas de adaptação ao ambiente e de comportamento fazendo com que

parasse de frequentar a escola. Situação que fez com que sua mãe a levasse

novamente para casa, pois desacreditou da possibilidade de ver a sua filha na

escola, participando juntamente com os demais alunos e a comunidade escolar.

Assim após algumas conversas com sua mãe, a menina retornou participando

das atividades somente no EIDE.

Atualmente está sendo incluída novamente no espaço escolar com

novas oportunidades.

Já neste ano com a contratação de professores de apoio NEE, o rumo

dessa história começa a mudar.

Primeiramente, a aluna e a nova professora continuam no EIDE para

melhor se conhecerem e construir uma referência. Com o passar do tempo e o

bom entrosamento entre elas, começa a se pensar na inclusão escolar, fato

este, que seria efetivo pouco tempo depois.

“O professor de apoio tem sido descrito na literatura

especializada como um educador que atua com o grupo e

constitui um recurso de auxilio para o colega professor regente,

no sentido de participar do planejamento e da avaliação das

atividades” (HANKO, 1993).

A fala de Hanko nos faz ver o que seria o papel do professor de apoio,

mas que nem sempre acontece, devido aos contratempos da própria educação,

no caso a pública, quanta complexidade do trabalho com alunos que são

severamente comprometidos.

Antes de falar na inclusão escolar é preciso deixar bem claro a diferença

entre inclusão e integração escolar. Integração escolar é a inserção do

indivíduo na escola onde se espera que ele se adapte ao ambiente já

estruturado. Já a inclusão tem um sentido mais amplo, significa o direito ao

exercício da cidadania e a inclusão escolar é apenas uma parcela deste

processo.

“A inclusão educacional trata do direito à educação, comum a

todas as pessoas e o direito de receber a educação, sempre

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que possível, junto com as demais pessoas nas escolas

regulares”. (SERRA, 2004)

A escola em que a aluna Daiana está matriculada foi um pouco

resistente quando se iniciou o processo de inclusão da aluna. Mas já

esperávamos por isso, pois a maioria das escolas mostra certa resistência

neste quesito.

A aluna tem horário reduzido, pois por enquanto não tem possibilidades

de ficar em horário normal, porém seu horário vai aumentando gradativamente.

Tentamos ficar o máximo de tempo possível dentro de sala, seu conteúdo

curricular é aquilo que a estimula e que se possa dali tirar uma aprendizagem

efetiva, sempre usa a princípio o concreto e as atividades de sucesso são

sempre repetidas, tendo em vista que a aprendizagem se dá por repetição.

O período de concentração da aluna, assim como dos autistas em geral,

é muito pequeno e é bem difícil ela se dispor a fazer o que não quer. Por isso, é

necessário ter paciência e perseverança, para repetir as atividades quantas

vezes forem necessárias, pois aos poucos, o tempo de trabalho irá aumentar.

A aluna possui boa memória e tem interesse em aprender. Demonstra

vontade de aprender a escrever, o que está começando a fazer. Já conhece as

letras, alguns nomes e copia tudo que é escrito. Agora começamos a trabalhar

com a soletração e ela está se saindo muito bem.

Apresenta interesse em trabalhar com nomes próprios de pessoas de

sua convivência e assim aproveito para trabalhar além da escrita, a

matemática, jogos que envolvam os nomes, seu relacionamento com cada um

deles envolvendo o sentimento e por fim a utilização de diversos materiais para

essa escrita e reconhecimento. Acho importante ela estar em contato com

diversos materiais e texturas.

Gosto muito de trabalhar centro de interesse com ela, sempre procuro

perceber o que mais interessou a ela nas atividades propostas, ou alguma

novidade que ela tenha trazido e assim monto atividades em cima disso. Com

isso, sua aprendizagem se dá de forma mais prazerosa e significativa.

Vale ressaltar também a importância da sensibilidade que o professor

deve ter para que o aluno autista não se sinta ansioso e/ou frustrado em

algumas atividades, quando perceber que isso irá acontecer é necessário que

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se interrompa a atividade proposta. E quando o aluno acertar, fizer bem feito, é

importante também o reforço positivo.

A professora de apoio encontra na professora da sala de recursos uma

companheira de trabalho. O atendimento da aluna na sala de recursos é feita

uma vez por semana e ela demonstra interesse e satisfação em estar lá.

Como se pode perceber a inclusão não é muito fácil é um processo que

demanda tempo, paciência, persistência e qualidade. É um processo no qual

não cabem fórmulas e regras prontas. È viver um dia de cada vez. A inclusão

supõe mudanças e transformações que não ocorrem somente no ambiente

escolar, mas também dentro de cada profissional que lá trabalham. Novas

estruturas na escola precisam ser construídas, como a metodologia, a maneira

de ensinar e aprender, o currículo e a avaliação. A inclusão torna visível o que é

oculto no currículo.

È de fundamental importância à formação inicial e continuada dos

professores que vão estar em contato direto com tais alunos, assim como a

criação de espaços dialógicos na escola para se poder sanar e/ou facilitar a

superação dos medos, das dúvidas, troca de experiências, idéias e da

ressignificação da prática pedagógica.

A educação inclusiva precisa levar em conta os desejos dos seus alunos

e não a rotulação destes.

Para promover a educação à pessoa com autismo, é preciso, antes de

qualquer coisa, promover a transformação na vida pessoal e profissional do

professor como forma de inovar o processo educativo junto ao aluno com

autismo, é preciso acreditar que isso é possível, saber reconhecer os limites e

potenciais de cada um.

“Educação não é só ensinar, instruir, treinar, domesticar, é

sobretudo formar a autonomia do sujeito histórico, competente,

uma vez que, o educando não é o objetivo de ensino, mas sim

sujeito do processo, parceiro de trabalho, trabalho este entre

individualidade e solidariedade”. (DEMO, 1996, p.16)

Para que a educação escolar aconteça é necessária uma mudança de postura

em relação à deficiência, uma quebra de paradigmas e reformulação do nosso

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sistema de ensino, uma educação de qualidade que garanta a permanência a

todos os alunos.

Contudo, mesmo sabendo que a escola está longe de ser inclusiva de

fato, busco diariamente no trabalho com a Daiana, superando qualquer

obstáculo, o seu crescimento pessoal e a aprendizagem efetiva.

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Relatório do responsável sobre o desenvolvimento da aluna

Segundo Adriana, antes de freqüentar o EIDE, Daiana apresentava um

comportamento bastante agressivo, não se comunicava através de conversas,

apenas gritava muito e tinha grande dificuldade de aceitar o NÃO. Também

tinha muita resistência às pessoas e cuspia muito, sem nenhum motivo.

Aos 13 anos, quando iniciou seu atendimento no EIDE, percebeu uma

grande mudança no comportamento da filha que demonstrava interesse em

estar lá.

No EIDE seu comportamento social teve grandes avanços, sendo

possível sair com a filha sem ter problemas ou frustrações.

A resistência quanto à aceitação do NÃO teve uma melhora, a

importância da conversa e da imposição de limites foi fundamental para esse

desenvolvimento.

Pontua a importância da referência que ela fez a professora Sônia Rosa

para que pudesse desconstruir seu mundo ritualizado e fazer novas

construções satisfatórias na maioria das vezes.

Ao iniciar o processo de inclusão escolar, Adriana se surpreendeu com a

adaptação da filha que sempre apresentou dificuldades com a mudança de

rotina.

Está notando que a filha tem estado mais tranqüila, maleável e

interessada na construção da leitura e escrita.

Mostra satisfação em relação ao trabalho da professora Natalia

Theophilo com sua filha, dando destaque a afetividade que sua filha apresenta

com a professora.

OBS: Noto que há bastantes dificuldades da mãe em relatar os processos de

desenvolvimento da sua filha, as respostas são praticamente a mesma para

todas as perguntas.

Mas é inegável que a responsável está satisfeita tanto com o avanço no

desenvolvimento da sua filha, como com as profissionais que estão a frente

deste trabalho.

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Algumas fotos da aluna Daiana

Atendimento na sala de recursos

Usando a imaginação

Atividade motora

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Cognição

Música

Na sala de aula

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Autorização da mãe para divulgação de imagem e divulgação