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SÉRIE-ESTUDOS SÉRIE-ESTUDOS SÉRIE-ESTUDOS SÉRIE-ESTUDOS SÉRIE-ESTUDOS Periódico do Mestrado em Educação da UCDB eriódico do Mestrado em Educação da UCDB eriódico do Mestrado em Educação da UCDB eriódico do Mestrado em Educação da UCDB eriódico do Mestrado em Educação da UCDB

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Page 1: SÉRIE-ESTUDOS Periódico do Mestrado em Educação da UCDB · O artigo de Nilson Thomé, refere-se à obra “Senhores e Caçadores”, de Edward Thompson, e suas contribuições

SÉRIE-ESTUDOSSÉRIE-ESTUDOSSÉRIE-ESTUDOSSÉRIE-ESTUDOSSÉRIE-ESTUDOS

PPPPPeriódico do Mestrado em Educação da UCDBeriódico do Mestrado em Educação da UCDBeriódico do Mestrado em Educação da UCDBeriódico do Mestrado em Educação da UCDBeriódico do Mestrado em Educação da UCDB

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Série-Estudos – Periódico do Mestrado em Educação da UCDB, n. 18(dezembro 2004). Campo Grande : UCDB, 1995.

Semestral

ISSN 1414-5138

V. 23,5 cm.

1. Educação 2. Professor - Formação 3. Ensino 4. PolíticaEducacional 5. Gestão Escolar.

Indexada em:BBE - Biblioteca Brasileira de Educação (Brasília, Inep)EDUBASE - UNICAMPCLASE - Universidad Nacional Autónoma de México

Solicita-se permuta / Exchange is requested

Tiragem: 1.000 exemplares

Série-Estudos publica artigos na área de educação, com ênfase em educação escolar eformação de professores de caráter teórico e/ou empírico.

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Missão Salesiana de Mato GrossoUNIVERSIDADE CATÓLICA DOM BOSCO

Instituição Salesiana de Educação Superior

SÉRIE-ESTUDOSSÉRIE-ESTUDOSSÉRIE-ESTUDOSSÉRIE-ESTUDOSSÉRIE-ESTUDOS

PPPPPeriódico do Mestrado em Educação da UCDBeriódico do Mestrado em Educação da UCDBeriódico do Mestrado em Educação da UCDBeriódico do Mestrado em Educação da UCDBeriódico do Mestrado em Educação da UCDB

Série-Estudos – Periódico do Mestrado em Educação da UCDB. Campo Grande-MS, n. 18, p. 1-309, jul./dez. 2004.

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Chanceler:Chanceler:Chanceler:Chanceler:Chanceler: Pe. Dr. Afonso de CastroReitor: Reitor: Reitor: Reitor: Reitor: Pe. José MarinoniPró-Reitor Acadêmico: Pró-Reitor Acadêmico: Pró-Reitor Acadêmico: Pró-Reitor Acadêmico: Pró-Reitor Acadêmico: Pe. Jair Marques de Araújo

Série-Estudos – Periódico do Mestrado em Educação da UCDBPublicada desde 1995

Editora ResponsávelEditora ResponsávelEditora ResponsávelEditora ResponsávelEditora ResponsávelMargarita Victoria Rodríguez ([email protected])

UNIVERSIDADE CATÓLICA DOM BOSCOInstituição Salesiana de Educação Superior

Organização do Dossiê Dossiê Dossiê Dossiê Dossiê “Política, Gestão e Financiamento da Educação”: Regina Tereza Cestari de OliveiraDireitos reservados à Editora UCDB Editora UCDB Editora UCDB Editora UCDB Editora UCDB (Membro da Associação Brasileira das Editoras Universitárias- ABEU):::::Coordenação de Editoração: Ereni dos Santos BenvenutiEditoração Eletrônica: Glauciene da Silva Lima SouzaRevisão de Redação: Dulcília SilvaVersão e Revisão de Inglês: Barbara Ann NewmanBibliotecária: Clélia Takie Nakahata Bezerra - CRB n. 1/757Capa: Helder D. de Souza e Miguel P. B. Pimentel (Agência Experimental de Publicidade)

Av. Tamandaré, 6.000 - Jardim SeminárioCEP: 79117-900 - Campo Grande - MSFone/Fax: (67) 312-3373e-mail: [email protected]://www.ucdb.br/editorahttp://www.ucdb.br/editorahttp://www.ucdb.br/editorahttp://www.ucdb.br/editorahttp://www.ucdb.br/editora

Conselho EditorialConselho EditorialConselho EditorialConselho EditorialConselho EditorialAdir Casaro NascimentoLeny Rodrigues Martins TeixeiraMariluce BittarRegina Tereza Cestari de Oliveira

Pareceristas Pareceristas Pareceristas Pareceristas Pareceristas Ad HocAd HocAd HocAd HocAd HocEulália Henriques Maimone - UNIUBEMarisa Bittar - UFSCarIvan Russef - UCDBAntônio Jacob Brand - UCDBMarilena Bittar - UFMSAlda Maria do Nascimento Osório - UFMSEster Senna - UFMSAlexandra Ayach Anache - UFMS

Conselho CientíficoConselho CientíficoConselho CientíficoConselho CientíficoConselho CientíficoAmarílio Ferreira Junior - UFSCarCelso João Ferretti - UNISOEmília Freitas de Lima - UFSCarFernando Casadei Salles - UNISOGraça Aparecida Cicillini - UFUHamid Chaachoua - Universidade Joseph Fourier/FrançaHelena Faria de Barros - UCDBJorge Nagle - UMCJosé Luis Sanfelice - UNICAMP/UNISOLuís Carlos de Menezes - USPManoel Francisco de Vasconcelos Motta - UFMTVicente Fideles de Ávila - UCDBYoshie Ussami Ferrari Leite - UNESPSonia Vasquez Garrido - PUC/ChileSusana E. Vior - UNLu/Argentina

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EditorialEditorialEditorialEditorialEditorial

Continuando a proposta editorial, o número 18 traz para o leitor um Dossiê Dossiê Dossiê Dossiê Dossiê que discuteas políticas educacionais brasileiras no decorrer das últimas décadas do século XX e nosprimeiros anos do século XXI, organizado pela professora Regina Tereza Cestari de Oliveira.

A seção Ponto de VistaPonto de VistaPonto de VistaPonto de VistaPonto de Vista apresenta o artigo do professor Raúl Armando Menghini daUniversidad Nacional del Sur que analisa as políticas de avaliação institucional implantadasna Argentina, marco das reformas educacionais iniciadas na década de 1990, e discute asdimensões consideradas prioritárias para avaliação institucional da universidade.

A seção Artigos Artigos Artigos Artigos Artigos apresenta seis trabalhos:O primeiro texto, escrito por Camila Alberto Vicente de Oliveira e Alberto Albuquerque

Gomes discutem a complexa construção da identidade profissional do professor em suasvárias relações e determinações e a conseqüente produção do conhecimento docente.

No segundo artigo Regina Clare Monteiro analisa a Educação Transpessoal no contexto dofazer pedagógico levantando alguns pontos que auxiliam a análise teórica e prática deste enfoque.

O texto de Vânia Maria Lescano Guerra aborda o trabalho do professor de LínguaPortuguesa e as condições de produção do seu discurso, tendo como referencial epistemológicoa análise do discurso, fundamental na produção de Michel Foucault.

Na seqüência Elaine Ap. Machado de Agostino apresenta uma pesquisa em que avaliaa aplicação de procedimentos de ensino apoiada no recurso visual do organogramamontessoriano e no recurso aéreo da língua de sinais – LIBRAS e suas contribuições naprodução de textos construídas pelo aluno surdo.

O artigo de Nilson Thomé, refere-se à obra “Senhores e Caçadores”, de Edward Thompson,e suas contribuições teórico-metodológicas para a história da educação.

Por fim, Ivanilson Bezerra da Silva e Luiz Percival Leme Britto apresenta os resultadosobtidos pela pesquisa sobre a construção de conhecimento dos alunos do curso de pedagogiaem relação ao uso da biblioteca como estratégia na formação acadêmica.

Na seção Relato de PesquisaRelato de PesquisaRelato de PesquisaRelato de PesquisaRelato de Pesquisa apresenta-se o resultado da pesquisa: “Função educativada escola, conhecimento do aluno e o trabalho de construir a identidade profissionaldesenvolvido pelo docente” realizada pelas professoras Dáugima M. Santos Queiroz e HelenaFaria de Barros.

Na seção Resenha Resenha Resenha Resenha Resenha Antonio Hilário Aguilera Urquiza coloca-nos em contato com aobra Escola Indígena – palco das diferenças, 2º volume da “Coleção Teses e Dissertações emEducação” da Editora UCDB (2004) que discute conceitos como diferença e pluralidade e suasimplicações epistemólogicas nas políticas públicas e nas práticas pedagógicas/ educativas eda escola para as populações indígenas.

Conselho EditorialDezembro/2004

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SumárioSumárioSumárioSumárioSumário

Ponto de VistaPonto de VistaPonto de VistaPonto de VistaPonto de Vista

Evaluacion institucional universitaria: algunas posibles dimensiones para su analisis .... 11Raúl Armando Menghini

Dossiê “Política, Gestão e Financiamento da Educação”Dossiê “Política, Gestão e Financiamento da Educação”Dossiê “Política, Gestão e Financiamento da Educação”Dossiê “Política, Gestão e Financiamento da Educação”Dossiê “Política, Gestão e Financiamento da Educação”

Apresentação do Dossiê. .................................................................................................................................................... 29

Globalização e Estado: as iniciativas de transnacionalização da educação. ................................ 33Carlos Henrique de Carvalho, Wenceslau Gonçalves Neto

Perspectivas da gestão democrática da educação na elaboração de políticas públicas:a constituinte escolar de Mato Grosso do Sul ..................................................................................................... 49

Vera Maria Vidal Peroni

A gestão educacional em perspectiva histórica: em foco o estado da questão em MatoGrosso do Sul .............................................................................................................................................................................. 63

Nilce Aparecida da Silva Freitas Fedatto

Divisão do estado de Mato Grosso do Sul e o movimento de municipalização doensino na década de 1980 .............................................................................................................................................. 77

Nadia Bigarella

Implicações do público não estatal para a gestão escolar democrática, pelas vias doprograma Dinheiro Direto na Escola. ......................................................................................................................... 97

Terezinha Fátima Andrade Monteiro dos Santos

Programa Dinheiro Direto na Escola (PDDE) no contexto de redefinição do papel doEstado ............................................................................................................................................................................................ 113

Maria Ângela Bariani de Arruda Fachini, Regina Tereza Cestari de Oliveira

O Programa Dinheiro Direto na Escola (PDDE) como política educacional do EstadoContemporâneo ...................................................................................................................................................................... 127

Francisco Williams de Assis Soares Gonçalves, Liliene Xavier Luz, Rosana Evangelistada Cruz

Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) no financiamento do Ensino Médio ... 143Terezinha Pereira Braz

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Os efeitos das reformas educacionais no financiamento da educação: Análise dosrecursos disponíveis em 13 escolas públicas no Estado do Paraná, Brasil ................................ 161

Ana Lorena de Oliveira Bruel, Andréa Barbosa Gouveia, Ângelo Ricardo de Souza,Isabelle Alves Soares, Monica Ribeiro da Silva

O Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental e de Valorizaçãodo Magistério (FUNDEF) em Dourados, MS – Acompanhamento do impacto e avaliação(1998 a 2000) ......................................................................................................................................................................... 175

Maria Dilnéia Espíndola Fernandes

ArtigosArtigosArtigosArtigosArtigos

Apontamentos sobre o conceito de identidade profissional de professores .............................. 193Camila Alberto Vicente de Oliveira, Alberto Albuquerque Gomes

Considerações pedagógicas na abordagem transpessoal: passado e presente naeducação ..................................................................................................................................................................................... 203

Regina Clare Monteiro

Considerações sobre a atividade reflexiva na escola .................................................................................. 221Vânia Maria Lescano Guerra

O ensino da estruturação sintática para o aluno surdo ............................................................................ 233Elaine Ap. Machado de Agostino, Maria da Piedade Resende da Costa

A valorização dos Caçadores diante dos Senhores. Tributo a teoria e método deEdward Palmer Thompson .............................................................................................................................................. 247

Nilson Thomé

Usos da Biblioteca por estudante de Educação Superior ......................................................................... 265Ivanilson Bezerra da Silva, Luiz Percival Leme Britto

Relato de PesquisaRelato de PesquisaRelato de PesquisaRelato de PesquisaRelato de Pesquisa

Função educativa da escola, conhecimento do aluno e o trabalho de construir aidentidade profissional desenvolvido pelo docente ..................................................................................... 283

Dáugima M. Santos Queiroz, Helena Faria de Barros

ResenhaResenhaResenhaResenhaResenha

“Palco das diferenças”, a escola faz a diferença... .......................................................................................... 297Antonio H. Aguilera Urquiza

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Ponto de VistaPonto de VistaPonto de VistaPonto de VistaPonto de Vista

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Evaluacion institucional universitaria: algunasEvaluacion institucional universitaria: algunasEvaluacion institucional universitaria: algunasEvaluacion institucional universitaria: algunasEvaluacion institucional universitaria: algunasposibles dimensiones para su analisisposibles dimensiones para su analisisposibles dimensiones para su analisisposibles dimensiones para su analisisposibles dimensiones para su analisis

Raúl Armando Menghini

Mestre em Educação pela Universidad Nacional de Luján,Professor do Departamento de Humanidades. UniversidadNacional del Sur. Bahía Blanca.e-mail: [email protected]

ResumenResumenResumenResumenResumenEl presente artículo desarrolla una serie de dimensiones de análisis que podrían tenerse en cuenta a lahora de estudiar los procesos de evaluación institucional de las universidades. Estas dimensiones hansurgido de proyectos de investigación llevados a cabo sobre evaluaciones institucionales universitariasdesarrolladas en las universidades nacionales de Argentina. De esta manera, estas dimensiones conformanun dispositivo o herramienta que no tiene pretensiones de ser cerrado ni acabado, sino sólo una propuestatotalmente inacabada y mejorable. En tal caso, tiene la virtud de ser una construcción teórica surgida de larelación dialéctica con la empiria. El dispositivo incluye cuatro dimensiones centrales: unidad de análisis,sujeto evaluador, metodología y objetivos. A su vez, cada dimensión contiene subdimensiones que asumenvalores extremos, a la manera de polos de un continuum. El artículo incluye una breve descripción de lasituación argentina respecto de las evaluaciones institucionales universitarias, y algunas precisionesconceptuales que sirven de marco a las dimensiones que se presentan.

Palabras clavesPalabras clavesPalabras clavesPalabras clavesPalabras clavesEvaluación institucional; política de evaluación; evaluación de universidades.

AbstractAbstractAbstractAbstractAbstractThe paper in hand develops a series of dimensions of analysis which can be taken into account at themoment of studying the institutional evaluation of universities. Such dimensions have been the result ofresearch projects on institutional evaluations developed in Argentine National Universities. Thus, thesedimensions form a device or a tool that is not intended to be a finished product but an open proposal tobe improved. Therefore, it has the advantage of being a theoretical construction resulting from a dialecticalrelationship with empiricism. The device includes four main dimensions: unit of analysis, evaluatingsubject, methodology and objectives. Each dimension contains sub-dimensions bearing extreme valueslike the poles of a continuum. This paper includes a brief description of the Argentine situation withregard to university institutional evaluations and some concepts used as the frame of the dimensionspresented.

Key wordsKey wordsKey wordsKey wordsKey wordsInstitutional evaluation; evaluation policy; university evaluation.

Série-Estudos - Periódico do Mestrado em Educação da UCDB.Série-Estudos - Periódico do Mestrado em Educação da UCDB.Série-Estudos - Periódico do Mestrado em Educação da UCDB.Série-Estudos - Periódico do Mestrado em Educação da UCDB.Série-Estudos - Periódico do Mestrado em Educação da UCDB.Campo Grande-MS, n. 18, p. 11-25, jul./dez. 2004.

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12 Raúl Armando MENGHINI. Evaluacion institucional universitaria: algunas posibles...

A manera de introducciónA manera de introducciónA manera de introducciónA manera de introducciónA manera de introducción

Como es sabido, la obligatoriedad dela evaluación institucional de las universi-dades quedó legislada en la Ley deEducación Superior a partir de 1995. Paraese entonces, algunas universidadesnacionales, por cuenta propia o bien poriniciativa de las autoridades nacionales,habían comenzado a realizar algunasactividades en esta dirección. No se puededejar de tener en cuenta que, desde 1991,las universidades nacionales habían toma-do el tema –propuesto desde el Ministeriode Educación con fines de racionalidadpresupuestaria- y habían comenzado atratarlo en distintos encuentros, jornadas,talleres, etc. Inclusive, el tema mereciótratamiento en el seno del ConsejoInteruniversitario Nacional (CIN), que seexpresó a través de distintos AcuerdosPlenarios1.

Atento que la propuestagubernamental desde la Secretaría de Polí-ticas Universitarias (SPU) – expresada enlos resultados del Subproyecto 062 –, fueresistida por la comunidad universitaria na-cional, la estrategia del gobierno pasó pordesarticular la resistencia celebrandoconvenios con cada universidad por sepa-rado. Dice Susana Celman que “la estrategiapara quebrar la unidad del CIN consiste en‘proponer’ acuerdos bilaterales con cadaUniversidad para la realización deevaluaciones internas (asistidas por la SPU)y externas (a cargo de la SPU)” (1997:10).Las primeras universidades en concluir las

instancias del convenio fueron laUniversidad Nacional del Sur (UNS), laUniversidad Nacional de la Patagonia Aus-tral (UNPA) y la Universidad Nacional deCuyo (UNCu).

En el marco de las políticas generalesde ajuste presupuestario y las políticas es-pecíficas para el sector universitario, lasevaluaciones institucionales fueron miradascon desconfianza por la comunidaduniversitaria. El clima de sospecha ydesconfianza prácticamente fue generaliza-do y esto hizo que las experiencias, en sugran mayoría, fueran a ritmo lento, enalgunos casos se vieran interrumpidas y enotros no se iniciaran.

La constitución de la Comisión Naci-onal de Evaluación y AcreditaciónUniversitaria (CONEAU), en 1997, tal vezayudó a distender el clima de tensión e hizoque las evaluaciones institucionales enmarcha se fueran concluyendo y quealgunas universidades iniciaran susactividades de evaluación.

A continuación se presentaránalgunas precisiones conceptuales, sedetallarán los antecedentes de laconstrucción de un dispositivo dedimensiones de análisis y, finalmente, sepresentará al mismo en sus detalles.

Algunas precisionesAlgunas precisionesAlgunas precisionesAlgunas precisionesAlgunas precisionesconceptualesconceptualesconceptualesconceptualesconceptuales

Antes de centrarnos en el dispositivode análisis construido para analizar lasevaluaciones institucionales, conviene dejaren claro ciertos conceptos a la manera depuntos de partida sobre la organización

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universitaria, la evaluación y la política deevaluación.

Se parte de la idea de entender a launiversidad como una organizacióncompleja y débilmente acoplada. Alrespecto, Burton Clark entiende que “unaorganización de tipo universitario secompone de múltiples células deorganización colocadas horizontalmente ydébilmente articuladas en los nivelesoperativos, junto con un pequeño númerode niveles superiores de coordinación…Laforma predominante ha sido la estructuraplana de piezas débilmente acopladas yesto obliga a concebir la organizaciónacadémica en términos de una federacióno una coalición, antes que como un siste-ma unitario comúnmente conocido comoburocracia” (1991:41). Pero, además, juntoa esta descripción, se entiende a laorganización universitaria como un espaciopolítico y, en el caso de las universidadespúblicas, también esencialmente democrá-tico. Estas consideraciones le imprimen a laorganización una imagen dinámica quetiene atiende a los conflictos que se generanen el cruce de intereses de los distintossujetos y grupos que la componen.

Tener en cuenta y explicitar el tipo deorganización resulta imprescindible a lahora de pensar cómo formular una políticade evaluación institucional. En este senti-do, la evaluación institucional puede serentendida como “la evaluación centrada enlos procesos, programas y aspectospropiamente organizacionales de unainstitución” (Universidad Nacional del Lito-ral, 1995:179). El CIN, por otra parte, expresóque la evaluación institucional debe abar-

car “la ejecución de políticas y programasen forma orgánica y con la participaciónde todos los miembros de la comunidaduniversitaria” (Anexo del Acuerdo PlenarioN° 133/94). Y la CONEAU entiende que “laevaluación institucional supone un procesocomplejo para determinar el valor de algo,que implica una delicada tarea deinterpretación de un conjunto de elemen-tos que interactúan configurando unarealidad particular y significativa…”(1997:10). En definitiva, una evaluacióninstitucional debería incursionar en lasentrañas de la organización, susmanifestaciones y aspectos implícitos, inter-pretando las políticas y programas (deingreso, acceso docente, curriculares, deinvestigación, de extensión, de carrera do-cente, de gestión, de participación,presupuestaria, etc.), los procesos y resulta-dos generados con motivo de su aplicación,y las condiciones organizacionales que loshacen posibles.

No se puede dejar de considerar quela evaluación institucional de las universi-dades emerge en el marco de un Estadoque se ha definido como “evaluador”3 que,si bien se puede advertir aún su vigencia,en nuestro país tuvo sus manifestacionesmás extremas durante el decenio de los ‘90.“El Estado evaluador se refiere a uno de lospilares de la política neoliberal dominanteen el mundo actual, que basa la asignaciónde su presupuesto en ejercicios deevaluación” (de Alba, 1994:24). En este sen-tido, las evaluaciones institucionales puedenrevestir un carácter ligado al “control” o bienapuntar a emitir juicios de valor acerca detodos los componentes de la organización.

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14 Raúl Armando MENGHINI. Evaluacion institucional universitaria: algunas posibles...

Así, la obligatoriedad de la evaluacióninstitucional puede llevar a políticas yejercicios de evaluación que sólo buscan“burocratizar” esta actividad, o bien valersede la evaluación institucional como unaherramienta que puede posibilitar latransformación sustantiva de lasorganizaciones, en particular lo que hace alas estructuras de poder y las relaciones quese generan con motivo de éstas. Al respecto,Cantero entiende que “es indispensableavanzar, ir más allá del tipo de evaluaciónque la Ley asegura, para construir a partirde lo que la Ley permite” (1998:18).

Antecedentes del dispositivo deAntecedentes del dispositivo deAntecedentes del dispositivo deAntecedentes del dispositivo deAntecedentes del dispositivo deanálisisanálisisanálisisanálisisanálisis

El dispositivo de análisis fuesurgiendo con el avance de un proyecto deinvestigación que se centró en la evaluacióninstitucional de la UNS4. En ese proyecto setrató de inferir y caracterizar la política deevaluación institucional que había llevadoadelante la UNS en su primer proceso en-tre 1993 y 1995, que le había permitido serla primera universidad nacional en concluircon las actividades de evaluación.

La investigación supuso la revisiónde la normativa que había dado fundamen-to a la evaluación institucional y larealización de entrevistas a docentes, auto-ridades y miembros de la comisión que tuvoa su cargo la coordinación de la evaluación.En la confluencia del análisis de estainformación obtenida en el terreno y elmarco teórico-conceptual , fueronapareciendo algunas dimensiones quehacían al núcleo de una política de

evaluación. Así, se fueron generando unaserie de dimensiones que podían ser utili-zadas para inferir la política de evaluacióninstitucional. A medida que se avanzó enel proyecto, algunas de esas dimensionesse fueron reelaborando, algunas fueronsubsumidas en otras más generales, o bienreemplazadas o denominadas de otromodo, etc. Todo esto implicó tratar deestablecer una relación dialéctica entreteoría y empiria con vistas de ir lograndoun cuerpo de dimensiones que resultaranadecuadas para el objeto de estudio quese estaba tratando.

Por otra parte, esas dimensionesfueron asumiendo valores extremos, a lamanera de polos en un continuum. Estosvalores también se fueron construyendo enla búsqueda de términos que reflejaran dela mejor manera posible aquello quequerían representar. En algunos casos seutilizaron valores o categorías construidaspor otros autores, como en el caso de laparticipación, a la que se asignó los valo-res de “real” y “simbólica”5, pero en lamayoría de las dimensiones se fueron bus-cando valores que resultaran válidos, útilesy de relativa claridad.

Tanto las dimensiones como sus va-lores extremos tienen la virtud de haber sur-gido de la confrontación entre la realidad yel marco teórico como, asimismo, haber ser-vido para analizar la información, sea éstade tipo normativa como aquella obtenidade los propios actores institucionales.

Este dispositivo fue puesto a pruebaen una investigación posterior6, en la cualse continuó con la temática de la evaluacióninstitucional pero con un estudio compara-

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tivo de las primeras evaluaciones externarealizadas bajo la responsabilidad de laCONEAU. La utilización de las dimensionesde análisis permitió el análisis de losdocumentos producidos con motivo de lasevaluaciones institucionales y realizar ciertascomparaciones entre las mismas7, tratandode descubrir regularidades, tendencias, etc.

De esta manera, a continuación setrabajará sobre las dimensiones que, enúltima instancia, deberían definir unapolítica de evaluación institucional, a fin depoder dar respuesta a preguntas centralesde un proceso de evaluación institucional:qué se evalúa (unidad de análisis), quiénevalúa (el poder evaluador), cómo se evalúa(metodología) y para qué se evalúa(objetivos).

Conviene aclarar que el dispositivoque se presenta no pretende ser cerrado oacabado, sino que debe ser considerado demanera flexible y perfectible. Utilizado comouna receta puede llevar a visiones fragmen-tadas de las evaluaciones, o bieninterpretaciones forzadas de las mismas alquerer aplicar las dimensiones y sus valo-res de manera rígida. La experiencia reali-zada muestra que no todas lasdimensiones pueden ser abordadas con lamisma profundidad ni abarcando todas sussubdimensiones. Casualmente, la idea desocializar este dispositivo es ponerlo a

disposición para su revisión, enriquecimiento,crítica, etc.

Dimensiones de análisis de unaDimensiones de análisis de unaDimensiones de análisis de unaDimensiones de análisis de unaDimensiones de análisis de unapolítica de evaluaciónpolítica de evaluaciónpolítica de evaluaciónpolítica de evaluaciónpolítica de evaluacióninstitucionalinstitucionalinstitucionalinstitucionalinstitucional

1. Unidad de análisis: 1. Unidad de análisis: 1. Unidad de análisis: 1. Unidad de análisis: 1. Unidad de análisis: esta dimensiónremite a considerar cuál es/son la/s unidad/es de análisis que se tiene en cuenta a la horade proyectar e implementar una evaluacióninstitucional. Se trata del objeto que se quiereevaluar, aquél que se somete a evaluación osobre el cual se centra el juicio evaluador.

Partiendo de la idea de que, portratarse de una evaluación institucional, secontempla a la universidad comoinstitución, será necesario advertir si ésta estomada como una totalidad (tal comosugieren la bibliografía y los documentosconsultados) o bien como una sumatoriade partes. Por otra parte, se debería consi-derar si, a la hora de evaluar, se toman encuenta los procesos, los resultados, el con-texto y las condiciones. De aquí que lassubdimensiones seleccionadas para estadimensión son:- Estructura y funciones- Estructura y funciones- Estructura y funciones- Estructura y funciones- Estructura y funciones: la estructuratiene que ver con las partes y las relacionesque se establecen entre éstas. Si bien puedendestacarse grandes partes de la estructuraorganizacional universitaria, como serían lasFacultades (o Departamentos, en el caso dela UNS), la estructura cuenta con numero-sas partes que, a veces, no resulta sencilloenumerarlas en su totalidad dado quealgunas son más abarcativas o bien seencuentran subsumidas en otras mayores,o se entrecruzan. Esto hace a la complejidad

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16 Raúl Armando MENGHINI. Evaluacion institucional universitaria: algunas posibles...

de estas organizaciones que, como se hatratado en el capítulo 5, aparecen comodébilmente acopladas.

Las funciones, por otra parte, puedenremitir a las clásicas funciones sustantivasde las universidades: docencia, investigacióny extensión, o bien incluir otras comogestión, servicios, etc.

Si en la evaluación institucional setienen en cuentan todas las partesconstitutivas de la estructura, sus distintasfunciones y las relaciones entre ellas, sepodría inferir que se trata de una políticade evaluación que considera a la unidadde análisis como una totalidad de maneraintegradaintegradaintegradaintegradaintegrada, mientras que si sólo consideraalguna de las partes y funciones o bien nocontempla la totalidad sino como suma departes, prescindiendo de las relaciones en-tre éstas, la unidad de análisis sería toma-da de manera yuxtapuestayuxtapuestayuxtapuestayuxtapuestayuxtapuesta. De tomarsela unidad de análisis de manera integrada,se podría decir que esta política entiendeque el poder evaluativo se ejerce sobre latotalidad y no sólo sobre algunas partes yque, además, se toman en cuenta las rela-ciones y redes de poder al interior de laestructura y las funciones, con sus obviosconflictos. Cuando se yuxtaponen las par-tes, se divide la totalidad y se omiten lasrelaciones de poder, esto lleva almantenimiento del statu quo, soslayandoo tratando de evitar poner sobre el tapetelos conflictos.

Considerar la totalidad de lainstitución implicaría ir más allá de la meraestructura política formal, para atender a laíndole política real de la organización y, porlo tanto, no sólo a tener en cuenta el poder

estatuido jerárquicamente sino también ladinámica del poder que penetra en todaslas estructuras y relaciones.- - - - - Imagen de la organizaciónImagen de la organizaciónImagen de la organizaciónImagen de la organizaciónImagen de la organización: en relacióncon la subdimensión anterior, en este casose considera si la imagen que se tiene de laorganización hace referencia a sus aspec-tos meramente formales o bien tiene encuenta la complejidad de la misma e incor-pora el conflicto. Respecto de la imagen dela organización, la política de evaluacióninstitucional partirá de concebirla deconcebirla deconcebirla deconcebirla deconcebirla demanera estática y formalmanera estática y formalmanera estática y formalmanera estática y formalmanera estática y formal cuando serefiere al organigrama, las relacioneslineales y mecánicas entre las partes de laorganización; o de concebirla de maneraconcebirla de maneraconcebirla de maneraconcebirla de maneraconcebirla de maneradinámicadinámicadinámicadinámicadinámica cuando se consideran lasfuerzas que actúan dentro de laorganización y que motorizan la integración,la diferenciación, la centralización o ladescentralización, etc. La opción por una uotra imagen implica posturas distintas enla política de evaluación institucional: si laorganización se concibe de manera estáti-ca, resulta más sencillo manejar el procesoevaluativo desde el poder, ya que semuestra a la organización en sus aspectosformales, al estilo de una foto; si laorganización se concibe de maneradinámica, implica la voluntad de aceptarlos conflictos en el mismo procesoevaluativo, de ir más allá de lo formal y deponer también en discusión a la mismapolítica, a las características estructurales ya las relaciones de poder.- Aspectos que se consideran- Aspectos que se consideran- Aspectos que se consideran- Aspectos que se consideran- Aspectos que se consideran: aquí setiene en cuenta si la evaluación institucionalincluye el contexto, los procesos, lascondiciones y los resultados, o si sólo se

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consideran los resultados obtenidos en elmarco de la estructura y sus funciones. Así,se podría hablar de una política deevaluación abarcativaabarcativaabarcativaabarcativaabarcativa cuando consideratodos los aspectos descriptos, o una políti-ca de evaluación limitada limitada limitada limitada limitada cuando sólotiene en cuenta los resultados que seobtuvieron.

Una evaluación abarcativa implicaatender a la complejidad de todas lasactividades y tareas que se desarrollan enuna organización, así como al contexto enque se desenvuelve la institución y lascondiciones en que realiza sus actividades.Tanto el contexto cuanto las condicionestienen una estrecha relación con el compo-nente político, ya que expresan el resultadode la pugna por las posibilidades deobtención y asignación de recursos. Impli-ca, además, analizar las situaciones desdediversos parámetros que contemplen esacomplejidad sin reducirla y, menos aún,establecer una relación directa y unilinealentre acciones y resultados. Se podría decirque una política de evaluación abarcativaincluye lo político al considerar lacomplejidad de las acciones. Mientras que,cuando sólo se consideran los resultados,se oculta la complejidad y el componentepolítico y se toma una postura que intentareducir todas las acciones a su faz visibleen términos de productos obtenidos.

En esta subdimensión se deberíatener en cuenta el papel de la historiainstitucional. Considerar todos aquellos ele-mentos que hayan marcado la vidainstitucional (antigüedad de la universidad,de los departamentos, carreras; aperturas ycierres; existencia de conflictos

institucionales; etc.) permite tener unacomprensión contextualizada de laorganización. Cuando se incluyen los as-pectos históricos, se estaría ante una políti-ca de evaluación institucional que rescatala historia institucional para ayudar a lacomprensión de la dinámica interna que hallevado a la institución hasta la situaciónen que se encuentra. Se podría hablar deuna política de evaluación institucional decarácter históricahistóricahistóricahistóricahistórica. Mientras que si no setienen en cuenta la historia institucional, sehablaría de una política de evaluacióninstitucional ahistóricaahistóricaahistóricaahistóricaahistórica, porque laevaluación no da cuenta de dónde vienela situación actual. Sería como si lainstitución y su situación hubieran surgidopor generación espontánea o estuvieran enuna especie de bola de cristal. Políticamente,implica no reconocer la raíz histórica de losprocesos institucionales que dieron lugar ala situación que se evalúa y, por el contra-rio, asumir una postura pragmática que sólomira el presente y el futuro sin considerarque la historia es elemento fundamental detoda organización social y política.Implicaría una visión fundacional de laorganización que descarta la consideracióndel pasado.2. Sujeto evaluador2. Sujeto evaluador2. Sujeto evaluador2. Sujeto evaluador2. Sujeto evaluador: determinada launidad de análisis en tanto objeto que sesomete a evaluación y los aspectos que seincluyen en ésta, resulta necesario conside-rar quién es el sujeto o los sujetos queevalúan: qué relación tiene con el poderestatuido o el poder real, si se crea algunaestructura particular para evaluar y qué fun-ciones tiene, qué tipo de participación tienenlos sujetos en la evaluación, cuál es la

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calidad de esa participación, en qué mo-mentos del proceso de evaluación se per-mite o se obstruye la participación. Acontinuación se describen estassubdimensiones y los valores que podríaasumir una política de evaluación en estosaspectos.- Poder evaluador- Poder evaluador- Poder evaluador- Poder evaluador- Poder evaluador: teniendo en cuentaque la evaluación es un acto eminentemen-te político pero que, a su vez, tienenecesariamente un componente técnico,interesa analizar dónde o en quién/es resi-de el poder de evaluar, con todo lo que estepoder significa. Sin duda, los responsablesúltimos de la evaluación institucional sonlos miembros de los órganos de gobiernolegalmente constituidos, pero éstos puedendelegar en algún equipo, comisión, etc., laresponsabilidad más directa de lo que im-plica la evaluación. Tal vez se podría pen-sar que un equipo técnicamente especi-alizado podría realizar o llevar adelante unproceso de evaluación institucional que re-sultara válido en términos de fiabilidad yrigurosidad. Sin embargo, es posible quecarezca de legitimidad política o no logrelos consensos necesarios. Por otra parte, siel proceso de evaluación institucional que-da totalmente en manos de los órganosde gobierno, es posible que logrelegitimidad pero resulte poco válido al con-siderar su consistencia técnica, a no ser quese cuente con expertos en evaluación entresus integrantes. De allí que resulta difícil ladecisión política sobre la articulación deestos aspectos, de manera tal que no sediluya la responsabilidad que cabe a losórganos de gobierno como depositarios delpoder legal y, por lo tanto, de la soberanía

evaluativa.Se podría decir que la política de

evaluación institucional, teniendo en cuentael poder evaluador, es eminentementeeminentementeeminentementeeminentementeeminentementepolíticapolíticapolíticapolíticapolítica si la realizan los órganos degobierno de manera directa, mientras quesi la realizan órganos técnicos sería emi-emi-emi-emi-emi-nentemente técnicanentemente técnicanentemente técnicanentemente técnicanentemente técnica. Luego se analizaráqué tipo de funciones puede llegar a tenerese organismo técnico que lleva adelantela evaluación.- Tipo de estructura para evaluar- Tipo de estructura para evaluar- Tipo de estructura para evaluar- Tipo de estructura para evaluar- Tipo de estructura para evaluar: aquíinteresa la forma que adquiere la estructura:sea un programa, un proyecto, una oficina,una comisión, etc., y cual es la relación conlos órganos de gobierno. Esta estructurapuede ser dependientedependientedependientedependientedependiente de algún órganode gobierno, y podría estar integrada, o no,por miembros de algún órgano de gobierno.En este sentido, el órgano de gobierno sereserva la autoridad evaluativa y, a pesarde encargar la evaluación a un equipo, esteúltimo debe reportar al órgano de gobiernoquien, en última instancia, tiene a su cargolas principales decisiones. Cuando la políti-ca de evaluación prevé una estructuraindependienteindependienteindependienteindependienteindependiente, ésta asume prácticamenteel poder evaluador del órgano de gobierno.Se acepta lo que realiza el equipo ocomisión a libro cerrado, habiendo delega-do en ese equipo las principales decisiones.Ninguno de sus miembros sería integrantede los órganos de gobierno.- Funciones de la estructura- Funciones de la estructura- Funciones de la estructura- Funciones de la estructura- Funciones de la estructura: de acuerdocon la delegación que se realice, las funcio-nes que cumplan las estructurasencargadas de la evaluación institucionalpodrían ser abarcativasabarcativasabarcativasabarcativasabarcativas cuando se lespermite hacer y decidir todo lo que sea

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necesario a lo largo de todo el proceso deevaluación, o bien limitadaslimitadaslimitadaslimitadaslimitadas cuando sólopueden hacer sobre la base de lasdecisiones adoptadas por los órganos degobierno: actuarían en la etapa de laimplementación de la evaluación. En estasegunda opción, las funciones resultan li-mitadas a la capacidad de acción pero notienen injerencia en las decisiones,quedando éstas en manos de los órganosde gobierno que ejercen el poder evaluador.En cambio, cuando las funciones sonabarcativas (se trate de una estructuradependiente o independiente), la estructurapodría llegar a adoptar decisiones que laharían depositaria del poder evaluador delos órganos de gobierno. En últimainstancia, las funciones suelen estar previs-tas en la normativa y del mayor o menorgrado de detalle y especificación de ellas,dependerá que la estructura asuma funci-ones abarcativas o limitadas.- Tipo de participación- Tipo de participación- Tipo de participación- Tipo de participación- Tipo de participación: resulta funda-mental analizar la participación de losactores institucionales en el proceso deevaluación institucional. Aquí, en concreto,se hace hincapié en cuán abierto ha sido elproceso a la participación de los sujetos y,en tal caso, si todas las categorías desujetos han sido convocadas. Así, se podríahablar de una política de evaluación queentiende la participación de manera am-am-am-am-am-pliapliapliapliaplia cuando se convoca a todos los sujetosque integran la organización, en todas suscategorías y en cantidades significativas.Por otra parte, se hablaría de unaparticipación restringidarestringidarestringidarestringidarestringida cuando laparticipación queda limitada a ciertos gru-pos, sujetos o categorías de éstos, y en muy

pocas cantidades. Desarrollar unaevaluación institucional con participaciónamplia significa que se reconoce laimportancia de la opinión y trabajo de lasbases en distintos momentos del procesode evaluación y, para eso, se trata de incor-porar a la mayor cantidad de sujetos en elproceso, porque se entiende que de esamanera se logran mejores consensos y sele otorga legitimidad a toda la evaluacióninstitucional. Dicho de otra manera, signifi-ca adoptar una posición democrática acer-ca del acceso al conocimiento de la vidainstitucional: de sus políticas y programas,de las acciones y relaciones mediante lascuales se realizan, en qué condiciones y enqué contexto se trabaja. En síntesis, dealguna manera, que los sujetos se apropiende la organización. Si se restringe laparticipación, se impone la visión de laautoridad y se limita la legitimidad de todoel proceso.- Calidad de participación- Calidad de participación- Calidad de participación- Calidad de participación- Calidad de participación: se tiene encuenta si la participación es realrealrealrealreal o simbó-simbó-simbó-simbó-simbó-licalicalicalicalica, en términos de María Teresa Sirvent8.....

Si en la subdimensión anterior se consideróla cantidad de los sujetos que participan,aquí interesa en qué participan. Se puededecir que una política de evaluación queapunta a una participación real busca queésta se dé en los aspectos sustantivos delproceso de evaluación institucional, especi-almente en la adopción de decisiones. Si laparticipación es simbólica, no permite quelos sujetos avancen en cuestionessustanciales ni que puedan adoptardecisiones, sino que sólo se les permite par-ticipar sobre aspectos superficiales delproceso de evaluación y sobre cuestiones

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que ya han sido decididas de antemano.Una participación real podría permitir quelos sujetos (independientemente que esténen los órganos de gobierno o no) seapropien del proceso de evaluacióninstitucional y logren transformaciones dela organización. En este caso se estaríahablando de una evaluación eminentemen-te democrática que busca transformacionesde fondo de la organización. En el otro ex-tremo, cuando sólo se utiliza la participacióncomo discurso y se la limita, se podría hablarde una evaluación autoritaria que noapunta a la transformación sino almantenimiento del statu quo.- Momentos de la participación- Momentos de la participación- Momentos de la participación- Momentos de la participación- Momentos de la participación: vistala cantidad y la calidad de la participación,se debe considerar en qué momentos delproceso de evaluación institucional se dala participación. Si ésta se da a lo largo detodos los momentos o etapas del proceso,se podría decir que la política de evaluaciónapunta a una participación continuacontinuacontinuacontinuacontinua,mientras que si sólo se pretende laparticipación en algún momento o etapaconcreta se estaría hablando de unaparticipación puntualpuntualpuntualpuntualpuntual . Cuando laparticipación es continua, los sujetosparticipan aportando sus ideas en todos losmomentos para que las decisiones esténavaladas y legitimadas en la participación.Cuando la participación es puntual, en cam-bio, se la convierte en una herramienta a lacual se recurre en algún momento o etapaparticular, pero no interesa que se dé enotros momentos que quedarían reservadosa la decisión de alguna autoridad. Aquí sólose sale a buscar la participación en algúntema o punto particular en el cual se

necesita contar con el respaldo del consen-so, pero la participación se agota en esetema, no se permite ir más allá. Se podríadecir que cuando la participación es conti-nua, se puede dar un avance en cuestionessustantivas de la evaluación institucional.En cambio, cuando es puntual , laparticipación queda restringida a cuestionesmenores que no inciden en las decisionesfundamentales respecto del proceso.3. Metodología de evaluación3. Metodología de evaluación3. Metodología de evaluación3. Metodología de evaluación3. Metodología de evaluación: en estadimensión se consideran algunassubdimensiones que tienen que ver con losaspectos más metodológicos y técnicos deuna política de evaluación.- Tipo de información- Tipo de información- Tipo de información- Tipo de información- Tipo de información: si sólo se recogeinformación susceptible de cuantificación,se podría decir que la política de evaluaciónen cuanto a la información escuantificablecuantificablecuantificablecuantificablecuantificable. Y sería no cuantificableno cuantificableno cuantificableno cuantificableno cuantificablecuando se interesa por la información queproviene de los sujetos (conductasobservables, percepciones, opiniones,juicios, etc.), que no necesariamente sepueden cuantificar o volcar en cuadrosestadísticos. Esta segunda opción suponeaceptar la información sin reparos, con to-das sus consecuencias, dando cabida a lossujetos.

En el análisis del tipo de informaciónes ineludible explicitar las posibilidades decomprensión que abren los distintos nive-les de medición. Así, por ejemplo, la cantidadde estudiantes, de egresados, etc. ,corresponden a un nivel de medición derazones o proporciones; el porcentaje deprogramas que explicitan sufundamentación curricular y pedagógica, lasactividades, las formas de evaluación, los

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contenidos analíticos con su correspon-diente bibliografía obligatoria y general,pueden dar lugar a un nivel de mediciónintervalar (hasta 25%, 25 a 49%, 50 a 74%,75% y más); los juicios evaluativos acercade si un requisito se cumple nada, parcial-mente, satisfactoriamente, ampliamente, osi una actividad es insatisfactoria, pocosatisfactoria o satisfactoria, corresponden aun nivel de medición ordinal y la adjudi-cación de un número a cada uno de esosvalores es la asignación de un símbolo yno de una cantidad. Queda pendiente laexplicitación de los criterios sobre cuya basese adjudica uno u otro valor; la existencia oinexistencia de algún fenómeno da lugar aun nivel de medición nominal como, porejemplo, si se desarrollan actividadesexpresivas (musicales, teatrales, etc.).

Hay fenómenos empíricos cuyamedición válida y confiable requiere unadificultosa elaboración (observaciones declases o de prácticas) y otros que puedenubicarse en uno u otro valor luego de unacuidadosa interpretación (opiniones deentrevistadores, relaciones entre estructurasacadémicas, funcionamiento de los órganosde gobierno, etc.).

En último término, todo juicioevaluativo es subjetivo, lo que no es equi-valente a decir que es arbitrario, y lapretensión de cuantificación sin explicitaciónde los criterios que llevan a adjudicar unnúmero, sea como cantidad o como sím-bolo, además de subjetivo, es arbitrario.

La adjudicación de valores numéri-cos, como cantidades o como símbolos,puede ser un primer momento que lleve aplantearse preguntas para avanzar hacia

la comprensión evaluativa de unaorganización. Pero mientras no esténexplicitados los criterios sobre cuya base seadjudican, difícilmente puedan aportar algoa la comprensión.

Una evaluación institucional basadaen información cuantificada implica quesólo se pretende establecer en qué puntose encuentra una organización en los as-pectos cuantificables y la decisión políticade referirse sólo a ellos. Por otra parte, unaevaluación que recurra a información nocuantificada tiene abierto un amplio cam-po para los juicios evaluativos. En este caso,el problema técnico consiste en laconceptualización de los indicadores paraque sean válidos y confiables.

En cuanto a las técnicas para obtenerla información, éstas se subordinan al tipode información que se ha consideradonecesaria; por lo tanto, la técnica en símisma no agrega demasiado a la políticade evaluación.- Tipo de análisis- Tipo de análisis- Tipo de análisis- Tipo de análisis- Tipo de análisis: sobre la base de lainformación recogida, la política deevaluación podría buscar un tipo deanálisis de carácter sustantivosustantivosustantivosustantivosustantivo o bien decarácter externoexternoexternoexternoexterno. Cuando se hace unanálisis sustantivo, éste tiene en cuentacriterios epistemológicos explicitados relati-vos a los diseños curriculares, los procesode enseñanza y aprendizaje, lainvestigación, la extensión, laadministración, etc. , y se hace enprofundidad y con rigurosidad científica. Seponen en debate las concepciones de lasfunciones de la institución sin temor a lasconclusiones a que se podría arribar y sintemor a poner en juego las distintas

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instancias de poder. Cuando el análisis esexterno, éste se basa en criterios del senti-do común, la intuición y la experiencia, conlo cual es posible que no sea rigurosamentecientífico. Así, se realiza un análisis superfi-cial que puede encubrir la decisión de noprofundizar en las causas y, por sobre todo,de no cuestionar el poder estatuido.- Criterios- Criterios- Criterios- Criterios- Criterios: habría que considerar si loscriterios que se tienen en cuenta para evaluarson endógenosendógenosendógenosendógenosendógenos, en tanto que surgen y sedefinen en la misma institución, o bien sonexógenosexógenosexógenosexógenosexógenos, lo que supondría tomar loscriterios de agencias externas a la mismaorganización, como podrían ser entes de tiponacional (otra universidad, una asociaciónde facultades, etc.) o internacional (BancoMundial, UNESCO, etc.). Cuando la políticade evaluación pasa por la generación decriterios endógenos, se busca la legitimidadde la evaluación en estos criterios quedeberían contar con el consenso necesarioy no se persigue la intención de compararla institución con ningún parámetro exter-no o estándar. En cambio, cuando loscriterios son externos, éstos aparecen comogarantía de autoridad (por el organismo quelos generó) y la legitimidad radica en ellos,pero es posible que éstos no siempre seadapten a la realidad institucional y su con-texto. En general, los criterios exógenos sevinculan con la acreditación y los funda-mentos políticos de este proceso puedenser múltiples.- Tiempos- Tiempos- Tiempos- Tiempos- Tiempos: el proceso de evaluacióninsume tiempos que no se pueden dejarde considerar, especialmente si se pretendelograr la máxima participación. Una políti-ca de evaluación que considera tiempos

ampliosampliosampliosampliosamplios busca favorecer los procesos y laprofundidad de los análisis, sin abortar losdebates y posibles conflictos y, para ello,subordina los tiempos a las posibilidadesde los sujetos y su capacidad de producción,sin por ello dejar de poner ciertos plazos.Esto implicaría que los tiempos políticosestán subordinados a los tiempos de laorganización y de sus miembros. Cuandolos tiempos son restringidosrestringidosrestringidosrestringidosrestringidos, estos afectanla participación y los procesos que en éstase generan. Priman los tiempos políticosnormativos o externos (cambio de autori-dades, tiempos del Ministerio, etc.) por so-bre los tiempos que son necesarios para laorganización y para sus miembros.4. Objetivos de la evaluación4. Objetivos de la evaluación4. Objetivos de la evaluación4. Objetivos de la evaluación4. Objetivos de la evaluación: aquí sedistinguen la formulación de los objetivos,su difusión y el impacto de los mismossegún se refieran al mismo proceso deevaluación o al mejoramiento yplaneamiento institucional.- Formulación de los objetivos- Formulación de los objetivos- Formulación de los objetivos- Formulación de los objetivos- Formulación de los objetivos: cuandolos objetivos los formulan las autoridadesy/u órganos de gobierno se trata de objeti-vos oficialesoficialesoficialesoficialesoficiales porque emanan de laautoridad legal y se formalizan por escrito.Cuando los objetivos no se formulan de estamanera, serían implícitosimplícitosimplícitosimplícitosimplícitos y reflejarían losintereses de ciertos grupos de autoridad ono. Una política de evaluación que formu-la objetivos oficiales reconoce losnecesarios niveles de formalizacióninstitucional y otorga transparencia a susdecisiones y acciones. En cambio, una polí-tica de evaluación que no formula objeti-vos y apunta a objetivos implícitos tiende aocultar los motivos o intereses reales deciertos grupos que se encuentran en el po-

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der o bien son miembros de la organización.- Difusión de los objetivos- Difusión de los objetivos- Difusión de los objetivos- Difusión de los objetivos- Difusión de los objetivos: una vez for-mulados los objetivos hay que considerarcómo se difunden a todos los miembrosde la organización. De esta manera, sepuede decir que la política de evaluaciónrespecto de la difusión de los objetivospuede ser ampliadaampliadaampliadaampliadaampliada, cuando se buscanlos mecanismos para que los objetivos seandifundidos a todas las categorías de sujetos(docentes, alumnos, etc.); y sería restringidarestringidarestringidarestringidarestringidacuando, desde los órganos de gobierno ola estructura de evaluación, se difunden losobjetivos sólo a ciertos grupos o partes dela estructura organizacional. Una política dedifusión ampliada o restringida tiene quever con el reconocimiento a los miembrosde la organización como sujetos portado-res de derechos o bien como objetos queno tienen derecho a intervenir en la vidainstitucional y acceder al conocimiento desus acciones y objetivos.- Impacto de los objetivos- Impacto de los objetivos- Impacto de los objetivos- Impacto de los objetivos- Impacto de los objetivos: una políticade evaluación institucional podría perseguirobjetivos que sean limitados al mismolimitados al mismolimitados al mismolimitados al mismolimitados al mismoproceso de evaluaciónproceso de evaluaciónproceso de evaluaciónproceso de evaluaciónproceso de evaluación, o bien tiendanal mejoramiento y/o planeamientomejoramiento y/o planeamientomejoramiento y/o planeamientomejoramiento y/o planeamientomejoramiento y/o planeamientoinstitucionalinstitucionalinstitucionalinstitucionalinstitucional. Si se limitan a la evaluaciónen sí misma, se realimenta a sí misma perono genera efectos en la organización. Unapolítica de evaluación institucional que seformula objetivos con vistas a mejorar lainstitución, a su vez, puede formularse ob-jetivos que tiendan a transformartransformartransformartransformartransformar lainstitución, fundamentalmente lo que hacea las estructuras de poder y a las relacionesque se generan a partir de esa estructura.Una política de evaluación institucional quepretende estos objetivos es una

oportunidad para que los sujetos sereapropien de la institución. No se teme re-visar las estructuras y relaciones de poder,sino que se busca la posibilidad depotenciar la evaluación como instrumentode transformación política. En otro extremo,si sólo se persiguen objetivos de modificar–en términos de conservarconservarconservarconservarconservar la institución–, implica que sólo se busca mejorar perosin generar cambios en la estructura y lasrelaciones de poder que se dan en lainstitución. Se busca cambiar y mejorar so-bre aspectos superficiales de la institución,sobre lo que ya está. Una política deevaluación institucional que persigue estosobjetivos no genera transformacionessustantivas sino que sólo le interesamantener el statu quo y no permite que lossujetos se reapropien del proceso deevaluación y de la organización en símisma.

Notas:Notas:Notas:Notas:Notas:1 En el Anexo del Acuerdo Plenario 133/94 se expresa:“1) Es necesario que las Universidades Nacionalesy Provinciales consoliden los procesos de evaluaciónde la calidad como elemento imprescindible parasu planeamiento académico – institucional.2) La evaluación debe responder a un enfoque decarácter institucional o integral. Se centrará sobrela calidad universitaria, considerando todas las fun-ciones y aspectos que influyen en ella (docencia,investigación, extensión, gestión y servicios).3) Los criterios para evaluar la calidad universitaria,deben surgir de la definición que se haga de laUniversidad”.2 Se trata del documento “Evaluación para elmejoramiento de la calidad universitaria. Estrategia,procedimientos e instrumento”, elaborado bajo ladirección de Carlos Marquis y Víctor Sigal.3 En general, algunas de las características del nuevo

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tipo de estado se adscriben en: “La cancelación deprogramas, la privatización y desincorporación deempresas públicas, la des(re)regulación, la suspensióno recorte del gasto público, la innovación en lasformas de asignar los recursos públicos, ladescentralización, la corresponsabilidad ciudadanaen la gestión pública.. . rompen con estilosconsagrados de decisión y gestión y, de golpe, conlos nudos gordianos de la tradicional interlocuciónentre las organizaciones sociales y los poderesestatales. El nuevo patrón de policy making modifi-ca reglas (escritas o no), procedimientos (formales ono), expectativas (legales o no), concepciones(mesuradas o desmesuradas) de la relación entresociedad y gobierno. En esencia, se redefinen loslinderos del ámbito político y del ámbito privado;cuáles asuntos alcanzan el rango de interés públi-co y de agenda de gobierno, y cuáles asuntos sonde naturaleza privada o desahogar dentro del perí-metro de las interacciones libres particulares. ...Ocurre una redistribución del poder político y unreacomodo de la cultura política a consecuencia dela reducción, el reajuste, el “adelgazamiento” delestado. Al mismo tiempo, emergen nuevos actorespolíticos con organizaciones, ideas, prácticas ydiscursos alternativos, con líderes nuevos” (AguilarVillanueva, 1996: 19)4 La misma temática fue trabajada en la tesis demaestría: “Política de evaluación institucionaluniversitaria. El caso de la Universidad Nacional delSur”. Maestría en Política y Gestión de la Educación.Universidad Nacional de Luján. Director de tesis:

Dr. Carlos Borsotti.5 Estos valores son tomados de los estudios de MaríaTeresa Sirvent, desarrollados en varias de susproducciones. Cfr. Cultura popular y participaciónsocial. Miño y Dávila/Facultad de Filosofía y Letras,Universidad de Buenos Aires. 1999.6 El proyecto se denominó “La evaluación institucionalen las universidades nacionales” y fue dirigido porel Dr. Carlos Borsotti. Fue evaluado externamente ysubsidiado por la Universidad Nacional del Sur. Enél se incluyeron las evaluaciones de las siguientesuniversidades nacionales: del Centro de la Provinciade Buenos Aires, de Luján, del Litoral, de laPatagonia San Juan Bosco, de San Luis, de San Juan,de Tucumán, Santiago del Estero.7 Una síntesis de esa investigación puedeencontrarse en: Menghini, Raúl; Dominguez, Raúl;Lusarreta, Analía y Duhau, Juan: ¿Qué está pasandocon la evaluación institucional de las universidadesnacionales?. Ponencia presentada en el TercerEncuentro sobre la Universidad como Objeto deInvestigación. Universidad Nacional de La Plata.Octubre de 2002.Un estudio que toma la misma temática pero condistinto tipo de análisis se puede encontrar en CésarPeón y Carla Del Cueto: “La evaluación institucionaluniversitaria en Argentina (experiencias recientes:1997/2000)”. En KROTSCH, Pedro (Org.) Launiversidad cautiva. Ed. Al Margen. La Plata.8 SIRVENT, María Teresa (2000). Cultura popular yparticipación social. Una investigación en el barrio deMataderos (Buenos Aires). Miño y Dávila. Buenos Aires.

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Recebido em 07 de julho de 2004.Recebido em 07 de julho de 2004.Recebido em 07 de julho de 2004.Recebido em 07 de julho de 2004.Recebido em 07 de julho de 2004.Aprovado para publicação em 16 de agosto de 2004.Aprovado para publicação em 16 de agosto de 2004.Aprovado para publicação em 16 de agosto de 2004.Aprovado para publicação em 16 de agosto de 2004.Aprovado para publicação em 16 de agosto de 2004.

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Dossiê “Política, GestãoDossiê “Política, GestãoDossiê “Política, GestãoDossiê “Política, GestãoDossiê “Política, Gestãoe Financiamento dae Financiamento dae Financiamento dae Financiamento dae Financiamento daEducação”Educação”Educação”Educação”Educação”

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ApresentaçãoApresentaçãoApresentaçãoApresentaçãoApresentação

O Conselho Editorial da Revista Série Estudos, do Mestrado em Educação da Universi-dade Católica Dom Bosco, decidiu pela organização de um dossiê sobre “Política, Gestão eFinanciamento da Educação”, levando em conta a relevância do tema e a importância de secompreender as políticas públicas educacionais. Entende-se, neste sentido que: “Em um planomais concreto, o conceito de políticas públicas implica considerar os recursos de poder queoperam na sua definição e que têm nas instituições do Estado, sobretudo na máquina gover-namental, o seu principal referente (AZEVEDO, 1997, p. 5).

Assim, professores e pesquisadores de diferentes estados e instituições brasileiras, aten-dendo à proposta desse Conselho, encaminharam artigos com reflexões e análises, relaciona-dos à temática escolhida, reunidos nesse dossiê. Considera-se que os temas aqui apresenta-dos possibilitam uma visão das contradições inerentes à definição das políticas educacionaisbrasileiras no contexto global de transformações econômicas e sociais, acirradas pela crise docapital, ao longo das últimas décadas do século XX.

Como primeiro artigo, denominado “Globalização e Estado: as iniciativas detransnacionalização da educação”, Carlos Henrique de Carvalho e Wenceslau Gonçalves Neto,professores da Universidade Federal de Uberlândia, discutem criticamente a influência dosorganismos Internacionais multilaterais (Banco Mundial, Fundo Monetário Internacional, Or-ganização Mundial do Comércio, entre outros), no atual contexto do capitalismo, caracterizadopelo avanço da globalização econômica, financeira e comercial, no sentido de direcionar einfluenciar as políticas educacionais dos países em desenvolvimento, de modo específico, aspolíticas educacionais implementadas pelo Estado brasileiro, na década de 1990.

No texto seguinte “Perspectivas da Gestão Democrática da Educação na Elaboração dePolíticas Públicas: a constituinte escolar de Mato Grosso do Sul”, Vera Maria Vidal Peroni,professora da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, com uma importante reflexão sobrea gestão democrática da educação, relata a proposta de gestão educacional discutida noprocesso de Constituinte Escolar, no estado de Mato Grosso do Sul, no período de junho de1999 a junho de 2001.

O tema referente à gestão é também objeto de discussão do artigo intitulado “A GestãoEducacional em Perspectiva Histórica: em foco o estado da questão em Mato Grosso do Sul”, daprofessora Nilce Aparecida da Silva Freitas Fedatto, da Universidade Federal de Mato Grosso doSul. A autora discorre sobre a trajetória da gestão educacional no Brasil, apresentando um diag-nóstico relativo à situação de Mato Grosso do Sul, em dois momentos: o primeiro, no âmbito dosistema estadual de ensino e, o segundo, no âmbito do sistema municipal de ensino.

Com o título “Divisão do Estado de Mato Grosso do Sul e o Movimento de Municipalizaçãodo Ensino na Década de 1980”, Nadia Bigarella, da UNAES – Faculdade de Campo Grande e daUniversidade para o Desenvolvimento do Estado e Região do Pantanal (UNIDERP), faz umresgate histórico da política de municipalização do ensino de 1º grau (hoje, ensino fundamen-tal), como componente essencial da política de descentralização do ensino em Mato Grosso

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do Sul, desde sua implantação em 1979, no governo do primeiro governador do estado, HarryAmorim até a gestão do governador Marcelo Miranda Soares (1986 – 1990).

O Programa Dinheiro Direto na Escola (PDDE), entendido como expressão da políticaeducacional empreendida pelo governo do presidente Fernando Henrique Cardoso, que insti-tuiu a obrigatoriedade de unidades executoras, como entidades de direito privado, para orepasse direto de recursos às escolas, é tema de discussão de três artigos de pro-fessores, queintegram um grupo nacional de pesquisa. O primeiro estudo com o título “Implicações doPúblico não Estatal para a Gestão Escolar Democrática, pelas Vias do Programa Dinheiro Diretona Escola”, Terezinha Fátima Andrade Monteiro dos Santos, da Universidade Federal do Pará,objetiva analisar a relação existente entre o público não-estatal e a gestão escolar democráti-ca, por meio do Programa Dinheiro Direto na Escola (PDDE), enfatizando o papel das unidadesexecutoras, no caso, os conselhos escolares em Belém/PA.

No segundo estudo “Programa Dinheiro Direto na Escola (PDDE) no Contexto de Redefiniçãodo Papel do Estado”, Maria Ângela Bariani de Arruda Fachini, professora e técnica pedagógica daSecretaria de Estado de Educação de Mato Grosso do Sul e Regina Tereza Cestari de Oliveira,professora da Universidade Católica Dom Bosco, analisam o referido Programa no contexto daReforma do Estado, materializada no Plano Diretor da Reforma do Estado (1995), descrevendo oprocesso de implantação desse Programa e a constituição de unidades executoras, via Associa-ção de Pais e Mestres (APM), nas escolas públicas das redes municipal e estadual de ensino deCampo Grande, capital do estado de Mato Grosso do Sul, no período de 1995 a 2002.

No terceiro estudo “O Programa Dinheiro Direto na Escola (PDDE) como Política Educacio-nal do Estado Contemporâneo”, Francisco Williams de Assis Soares Gonçalves, Rosana Evangelistada Cruz, professores da Universidade Federal do Piauí e Liliene Xavier Luz, professora da Univer-sidade Estadual do Piauí, ao discutirem a relação entre o Programa Dinheiro Direto na Escola(PDDE) e a atuação do Estado Brasileiro, destacam o PDDE como exemplo de política focalizadae pontual, que explicita as ações dos governos que adotaram a política neoliberal nos Estadoscontemporâneos. Relacionam, também, o PDDE e Fundescola, em suas ações e vínculos, pro-pondo “que tanto o Fundescola quanto o PDDE operacionalizam os propósitos do Estado neoliberalda contemporaneidade, quais sejam: a eficiência, a administração gerencial, a desregulamentação”.

O dossiê se completa com os artigos que trazem à tona o financiamento da educação.Com o título “Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) no Financiamento do EnsinoMédio”, Terezinha Pereira Braz, professora da UNAES - Faculdade de Campo Grande e técnicada Secretaria de Estado de Educação de Mato Grosso do Sul, discute a participação do BancoInteramericano de Desenvolvimento (BID) no financiamento para o ensino médio, tomandocomo referência as políticas expressas no “Programa Melhoria e Expansão do Ensino Médio(Promed)”, no estado de Mato Grosso do Sul.

Os professores da Universidade Federal do Paraná, Andréa Barbosa Gouveia, ÂngeloRicardo de Souza e Ana Lorena de Oliveira Bruel, a professora da Rede Municipal de Curitibae da UNICENP, Monica Ribeiro da Silva, juntamente com Isabelle Alves Soares, Acadêmica dePedagogia da UFPR e bolsista de iniciação científica (IC-UFPR), no artigo “Os efeitos das refor-mas educacionais no financiamento da educação: análise dos recursos disponíveis em 13escolas públicas no Estado do Paraná, Brasil” apresentam alguns resultados da pesquisa

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denominada “Levantamento do Custo Aluno em Escolas com Condições de Qualidade noEstado do Paraná”, realizada no ano de 2004, analisando esses resultados no contexto dasreformas educacionais implementadas no decorrer dos anos 1990, enfatizando, de modo especial,um dos elementos norteadores da política educacional brasileira, ou seja, a descentralizaçãode recursos para a escola.

Por fim, Maria Dilnéia Espíndola Fernandes, professora da Universidade Federal deMato Grosso do Sul, com o título “O Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do EnsinoFundamental e de Valorização do Magistério (Fundef) em Dourados, MS – Acompanhamentodo Impacto e Avaliação (1998 a 2000) apresenta e analisa, com riqueza de dados econômico-financeiros e educacionais, extraídos de fontes oficiais, resultados da pesquisa sobre a implan-tação e Impacto do Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental e deValorização do Magistério–FUNDEF, no município de Dourados, estado de Mato Grosso do Sul.

A expectativa é que esse dossiê, pelas análises e apreciações críticas, contidas nosseus artigos, possa ser de grande utilidade a todos os professores e pesquisadores interes-sados no aprofundamento da discussão sobre as políticas públicas educacionais, entendidasno âmbito das políticas sociais, que se constituem estratégias governamentais, expressas emplanos, programas, projetos, resoluções, entre outros.

Concorda-se com a afirmação de que:Se é certo que as políticas educacionais são organizadas ou reorganizadas pelo Estado

no sentido de responder às mudanças qualitativas do mundo da produção capitalista e daexpansão do capital, também é certo que elas passam a ser objeto de demanda das classestrabalhadoras em busca do saber socialmente produzido (SANFELICE, 2003, p. 167).

Na atual forma histórica do capitalismo, em nome do que se denomina “crise do Estado”,preconizada pela ideologia neoliberal, verifica-se o recuo desse Estado no que diz respeito àimplantação e implementação de políticas sociais, mas não, obviamente, no que diz respeitoaos interesses do capital. A sociedade civil, por sua vez, continua a sua pressão, por exemplo,pela garantia do acesso de todos à escola, nos diferentes níveis e etapas de ensino, assimcomo pela sua permanência, pela gestão escolar participativa, pela ampliação e distribuiçãoeqüitativa de recursos públicos, enfim, pela definição de políticas sociais e conseqüente cons-trução de uma sociedade mais democrática.

Regina Tereza Cestari de OliveiraProfessora da UCDB e Organizadora do Dossiê

Referências:Referências:Referências:Referências:Referências:

AZEVEDO, Janete M. Lins. A educação como política pública. Campinas: Autores Associa-dos, 2002.

SANFELICE, José Luis. Estado e política educacional. In: LOMBARDI, José Claudinei (org.).Temas de pesquisa em educação. Campinas: Autores Associados; HISTEDBR; Caçador:UnC, 2003.

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Globalização e Estado: as iniciativas deGlobalização e Estado: as iniciativas deGlobalização e Estado: as iniciativas deGlobalização e Estado: as iniciativas deGlobalização e Estado: as iniciativas detransnacionalização da educação.transnacionalização da educação.transnacionalização da educação.transnacionalização da educação.transnacionalização da educação.

Carlos Henrique de Carvalho*Wenceslau Gonçalves Neto**

* Doutor em História pela USP. Professor do Programa deMestrado em Educação da UFU.e-mail: [email protected]

** Doutor em História pela USP. Professor do Programa deMestrado em Educação e do Programa de Mestrado emHistória da UFU.e-mail: [email protected]

ResumoResumoResumoResumoResumoO presente artigo procura delinear as principais iniciativas dos organismos internacionais multilaterais(Banco Mundial, Fundo Monetário Internacional, Organização Mundial do Comércio, dentre outros) nocampo da educação, com o objetivo de transformá-la em um instrumento de bens de serviço, ou seja, oprocesso educativo seguiria a mesma dinâmica do mercado globalizado, em razão do caráter transnacionalque a educação passaria a ter. Neste sentido, esses organismos passam a agir com o intuito de influenciare direcionar as políticas educacionais dos países em desenvolvimento, como pode-se evidenciar no atualcontexto brasileiro, por meio das políticas educacionais implementadas pelo Estado nos três níveis deensino (Superior, Médio e Fundamental) ao longo da década de 1990.

Palavras ChavePalavras ChavePalavras ChavePalavras ChavePalavras ChaveEducação; transnacionalização; política; estado.

AbstractAbstractAbstractAbstractAbstractThe article in hand seeks to delineate the main initiatives of multilateral international organisms (WorldBank, International Monetary Fund, World Trade Organization, amongst others) in the field of education,with the objective of transforming education into an instrument of service goods, that is to say, theeducational process would follow the same dynamics of the globalized market, because of the transnationalcharacter that education would start to have. In this way, these organisms start to act with the intentionof influencing and directing educational politics in developing countries, as can be seen in the currentBrazilian context, through the educational politics implemented by the State at three levels (Higher Education,Middle School and Fundamental School) throughout the decade of the 90’s.

Key WordsKey WordsKey WordsKey WordsKey WordsEducation; transnationalization; politics; state.

Série-Estudos - Periódico do Mestrado em Educação da UCDB.Série-Estudos - Periódico do Mestrado em Educação da UCDB.Série-Estudos - Periódico do Mestrado em Educação da UCDB.Série-Estudos - Periódico do Mestrado em Educação da UCDB.Série-Estudos - Periódico do Mestrado em Educação da UCDB.Campo Grande-MS, n. 18, p. 33-48, jul./dez. 2004.

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34 C.H. de CARVALHO e W.G. NETO. Globalização e estado: as iniciativas de...

INTRODUÇÃOINTRODUÇÃOINTRODUÇÃOINTRODUÇÃOINTRODUÇÃO

Globalização implica uniformização depadrões econômicos e culturais, no âmbitomundial. O termo globalização e os que oantecederam, no correr dos tempos, definem-se a partir de uma verdade mais profunda,isto é, a apropriação de riquezas do mundocom a decorrente implantação de sistemasde poder. Com a Revolução Industrial e a li-beração do Capitalismo para suas plenaspossibilidades de expansão, a globalizaçãodeu um salto qualitativo e significativo.

Para entender este salto, é preciso terpresente que; é intrínseco ao Capitalismo aapropriação e, por suposto, a expansão. Aampliação dos espaços de lucro conduziuà globalização. O mundo passou a ser vistocomo uma referência para obtenção de mer-cados, locais de investimento e fontes dematérias-primas.

Ao longo do século XX, a globali-zação do capital foi conduzindo à globa-lização da informação e dos padrões cul-turais e de consumo. Isso deveu-se nãoapenas ao progresso tecnológico, inerenteà Revolução Industrial, mas – e sobretudo –ao imperativo dos negócios. A tremenda cri-se de 1929 teve tamanha amplitude justa-mente por ser resultado de um mundoglobalizado, ou seja, ocidentalizado, face àexpansão do Capitalismo. E o papel da in-formação mundializada foi decisivo namundialização do pânico. Ao entrarmosnos anos 1980/1990, o Capitalismo, defi-nitivamente hegemônico, com a ruína dochamado Socialismo Real, ingressou naetapa de sua total euforia, sob o rótulo deNeo-Liberalismo.

A conjuntura internacional se desen-volve no contexto de declínio do sistemacapitalista. É a antítese da era de prosperi-dade vivida nas primeiras décadas do pós-guerra e a expressão do esgotamento dopadrão de acumulação de capital proveni-ente deste período. Configura-se uma situ-ação crítica caracterizada por taxas de cres-cimento econômico declinantes e elevadosníveis de desemprego em quase todos ospaíses onde predomina a economia demercado.

A crise econômica, que não deve serconfundida com as perturbações cíclicas dosistema provocadas pela superprodução,vem acelerando o processo de centraliza-ção e globalização do capital, traduzidos,principalmente pela onda de aquisições,incorporações e megafusões de empresas.Como resultado, seus efeitos têm maiorrepercussão mundial, assim como as políti-cas propostas como solução pelos setoresque encarnam os interesses do capital.

O cenário atual está caracterizadopelo avanço da globalização econômica,financeira e comercial, defendida pelos orga-nismos internacionais (FMI, Banco Mundi-al e Organização Mundial do Comércio).Trata-se de um processo em curso, coman-dado pelas grandes corporações trans-nacionais que procuram abrir novos mer-cados para sua produção e, ao mesmo tem-po, recuperar as taxas de lucro.

O ritmo e a natureza da inserção daseconomias nacionais à globalização sãodiferenciados e depende em grande medi-da de opções políticas e da correlação deforças entre os setores populares. O cresci-mento do sistema financeiro internacional

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constitui uma das principais característicasda globalização. Um volume crescente decapital acumulado é destinado à especu-lação, propiciada pela desregulamentaçãodos mercados financeiros. Nos últimos quin-ze anos o crescimento da esfera financeirafoi superior aos índices de crescimento dosinvestimentos, do PIB e do comércio exteri-or dos países desenvolvidos. O setor finan-ceiro passou a gozar de grande autono-mia em relação aos bancos centrais e insti-tuições oficiais, ampliando o seu controlesobre o setor produtivo. Fundos de pensãoe de seguros passaram a operar nessesmercados sem a intermediação das insti-tuições financeiras oficiais. O avanço dastelecomunicações e da informática aumen-tou a capacidade dos investidores realiza-rem transações no âmbito global. Cerca de1,5 trilhão de dólares percorre as principaispraças financeiras do planeta nas 24 horasdo dia. Isso corresponde ao volume do co-mércio internacional em um ano.

Da noite para o dia esses capitaisvoláteis podem fugir de um país para ou-tro, produzindo imensos desequilíbrios finan-ceiros e instabilidade política. As crises me-xicana, asiática, russa e Argentina, levaramas conseqüências da desregulamentaçãofinanceira para os chamados mercadosemergentes.

Por outro lado, as empresas trans-nacionais constituem o carro chefe daglobalização. Essas empresas possuem atu-almente um grau de liberdade inédito, quese manifesta na mobilidade do capital in-dustrial, nos deslocamentos, na terceirizaçãoe nas operações de aquisições e fusões. Aglobalização remove as barreiras à livre cir-

culação do capital, que hoje se encontraem condições de definir estratégias globaispara a sua acumulação.

O raio de ação das transnacionaisse concentra na órbita dos países desen-volvidos e alguns poucos países periféricosque alcançaram certo estágio de desenvol-vimento. No entanto, o caráter setorial ediferenciado dessa inserção tem implicado,por um lado, na constituição de ilhas deexcelência conectadas às empresastransnacionais e, por outro lado, na desin-dustrialização e o sucateamento de gran-de parte do parque industrial constituídono período anterior por meio da substitui-ção de importações.

As estratégias globais das trans-nacionais estão sustentadas no aumentode produtividade, possibilitado pelas novastecnologias e métodos de gestão da pro-dução. Tais práticas envolvem, igualmente,investimentos externos diretos realizadospelas transnacionais e pelos governos dosseus países de origem. A partir de 1985esses investimentos quase triplicaram e vêmcrescendo em ritmos mais acelerados doque o comércio e a economia mundial.

Para enfrentar a globalização, en-quanto estratégias de gestão organi-zacional, dever-se-á apresentar altos índi-ces de produtividade que, conseqüentemen-te, deverão incorporar também altos níveisde valor agregado ao produto final, porexemplo, o Japão na década de 1980. Atendência na gestão mundial é reduzir cus-tos, porque a corrida desenfreada portecnologia gera um aumento do custo deprodução. O processo de migração indus-trial, envolvendo fábricas de componentes

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e materiais básicos, pode ser notado facil-mente nos países do Sudeste Asiático e,mais recentemente, na América Latina.

Na esteira desse movimento econô-mico há o fenômeno do desaparecimen-to das fronteiras, fazendo com que o mapamundial embaralhe-se, parecendo refazer-se sob o signo do neoliberalismo; outrosapontando para um desfazer-se no caos.Está em curso o novo surto de universali-zação do capitalismo, bem como o seumodo de produção e o seu processocivilizatório. O mundo se transforma emuma imensa fábrica. A tecnologia agilizouos negócios, desterritorializou as coisas,povos e idéias. As empresas, corporaçõese conglomerados transnacionais tecem aglobalização em conformidade com a di-nâmica dos interesses que expressam ousimbolizam mais do que a mercadoria.Deste modo, a mundialização dos merca-dos de produção, ou forças produtivas,tanto provoca a busca da força de traba-lho barata em todos os cantos do mundo,como provoca migrações em todas as di-reções. Para Ianni (2001), “nômade é apalavra chave que define o modo de vida,o estilo cultural e o consumo dos anos2000” . Ainda segundo o autor , onomadismo será a forma suprema da or-dem mercantil, pois

O fenômeno da globalização, coloca nos-so mundo envolvido em várias malhasvisíveis e invisíveis, consistentes eesgarçadas, regionais e universais. Sãoprincipalmente sociais, econômicas, polí-ticas e culturais, tornando-se às vezes eco-lógicas, demográficas, étnicas, religiosas,lingüísticas. (...) A própria cultura encontraoutros horizontes de universalização, ao

mesmo tempo que se recria em suas sin-gularidades. O que era local e nacional,pode tornar-se também mundial. O queera antigo pode revelar-se novo, renova-do, moderno, contemporâneo, e que atin-ge não só as sociedades nacionais, mastambém os modos de vida e pensamentode indivíduos e coletividade. (IANNI, 2001,pp 24-26).

Dentro destas mudanças, oriundasdos novos modelos de vida provocadospelo globalismo, podemos analisar o seuimpacto na esfera educacional, partindo dopensamento de Santos (2001); ao utilizarconceitos que evidenciam múltiplas relaçõesdo global relacionado ao local e vice e ver-sa (Localismo Globalizado). É, então, o pro-cesso em que determinado fenômeno lo-cal é globalizado com sucesso (língua in-glês, fast food) é o processo do global so-bre/no local. Já Globalismo localizado é oimpacto específico nas condições locais pro-duzido pelos imperativos transnacionais,onde são desintegradas, desestruturadas e,eventualmente, reestruturadas sob forma deinclusão subalterna. Para Stoer (2001), olocalismo globalizada seria a escola oficial,gratuita e laica, a escola para todos. Já oGlobalismo Localizado, pode-se verificarnos imperativos educativos transnacionaise no impacto às práticas educativas e quese transformaram em meras repostas dashierarquias da reprodução e produção emescala mundial.

Assim, percebemos que o desenvol-vimento de modo capitalista de produção,em forma extensiva, adquire outro impul-so, com base nas novas tecnologias, cria-ção de novos produtos, variação interna-cional do trabalho e a divisão

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transnacional do trabalho, ultrapassamfronteiras geográficas, históricas e culturais,multiplicando-se, suas formas de articula-ção e contradição.

A nova divisão transnacional do tra-balho é bem a expressão dessa configura-ção atual, onde substitui-se o processo deprodução fordista pelo processo de produ-ção flexível. A transnacionalização do tra-balho se faz através da redistribuição dasempresas, corporações e conglomeradospor todo mundo. Em lugar da grande con-centração de indústrias, centros financeiros,organizações de comércio, agências depublicidade, verifica-se a redistribuição des-tas e outras atividades, por diferentes paí-ses e continentes. Exemplos dessa redis-tribuição pode ser observado a partir dotérmino da Segunda Guerra Mundial, ondepaíses com escassa tradição industrial,como Hong Kong e Cingapura, aparece-ram no cenário mundial como verdadeiros“milagres econômicos”.

Essas mudanças exigem que ofordismo, como padrão de organização dotrabalho e da produção, passe a combinarou ser flexibilizador dos processos de tra-balho e produção, produtividade, capacida-de de renovação e competitividade. Assim,os governos neoliberais, propõem noçõesde mercado livre comércio, redução do se-tor público e diminuição do intervencionis-mo estatal na economia e na regulação domercado, que segundo Torres (2000), sãomecanismos associados aos programas deajuste estrutural, definidos como um con-junto de medidas políticas recomendadaspelo Banco Mundial e pelo Fundo Mone-tário Internacional.

No Brasil, como nas demais naçõesda América Latina, os governantes, apoia-dos nas análises e estudos dos organismose agências internacionais, emprenham-seem inserir os países nesse processo deglobalização e rearticulação do capital. Osdiagnósticos realizados por esses organis-mos e agências indicam a necessidade demudanças não somente no padrão de de-senvolvimento dos países latinos america-nos, como também apontam para reformasestruturais no funcionamento ou na dinâ-mica intra-escolar.

11111 A crise da escola: (re)pensando a A crise da escola: (re)pensando a A crise da escola: (re)pensando a A crise da escola: (re)pensando a A crise da escola: (re)pensando aeducação na contemporaneidade.educação na contemporaneidade.educação na contemporaneidade.educação na contemporaneidade.educação na contemporaneidade.

Todas as mudanças, oriundas dostempos contemporâneos, caracterizadaspelo globalismo e pelo capital, que partedo pressuposto do “mercado como realida-de empírica central”, exigem, conseqüente-mente, transformações em todos os âmbi-tos da sociedade, com o objetivo de aten-der as suas políticas.

Neste cenário, marcado pelas novasmodalidades econômicas, nota-se o apro-fundamento de desigualdades, quer eco-nômicas ou sociais. Isto acontece devidoàs acelerações e exigências do mercado.Então, em face a essas demandas, questi-ona-se a ação estatal, provocando novosenfoques para o campo educativo. Traz àtona debates em torno do neoliberalismoe a privatização da educação, partindo doquestionamento da “eficiência do Estadona condução do sistema escolar e na suacapacidade de responder às demandaseducativas” (OLIVEIRA, 1995). Tendo como

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principal objetivo a redução do controle doEstado nos diversos âmbitos da sociedade,e, claro, dentro da educação, esses debates,tiveram maior força a partir dos anos 1960e 1970. Esta conjuntura mundial, voltadapara a privatização, qualifica a escola comoinadequada para atender as exigências deuma sociedade capitalista. No entanto, acrise dessa escola não deixa de ser o resul-tado da própria crise da sociedade capita-lista: em decorrência da “crise de caráter pla-netário que se explicita particularmente nosanos 70 tem suas raízes bem mais remo-tas. Contraditoriamente, a crise dos anos 70tem na sua gênese as estratégias de supe-ração da crise dos anos 30” (FRIGOTTO,2000, p. 69). Segundo Frigotto, a “interven-ção do Estado na economia não era umaescolha, mas imposição para a crise docapitalismo dos anos 30, a mudança doscapitalistas em face do trabalho, à educa-ção básica e à qualificação, na crise dosanos 70/90, também não é uma escolha”ambas as crises tiveram o mesmo propó-sito: solucionar tais dificuldades provocadaspela própria crise do capitalismo.

Percebe-se, assim, que em meio aosnovos e velhos contextos sociais, a realida-de educativa é um problema real, principal-mente no Brasil, caracterizado pelo atrasoem relação a educação básica. Essa reali-dade, como tantas outras em países daAmérica Latina ou do Continente Africano,levanta questões relacionadas com a edu-cação e a qualificação da força de traba-lho. Sobre esta situação Paiva (2000, p. 42)argumenta que “não há dúvida de que astransformações nas estruturas produtivase as mudanças tecnológicas colocam à

educação novos problemas”. Deste modo,temas como qualidade totalqualidade totalqualidade totalqualidade totalqualidade total, invadem ouniverso escolar e apontam, conformeFrigotto, para o entendimento de que “ocapital depende de trabalhadores com ca-pacidade de abstração e de trabalho emequipe” (FRIGOTTO, 2000, p. 153). Exige,também do trabalhador flexibilidade e ní-veis altos de formação para que o aluno/trabalhador atenda a tais imposições domercado.

Destarte, a crise da escola é percebi-da quando ela está aquém das necessida-des do mercado. Esta questão coloca empauta, principalmente, o papel da escolapública, vista como improdutiva e inferir, secomparado ao ensino privado. Declara-se,então, a crise do sistema escolar, materiali-zada pela falência da estrutura educacio-nal cristalizada pela má qualidade dos li-vros didáticos, pelos currículos, pela avalia-ção e pelos agentes educacionais: direto-res, professores, equipe técnica, etc.

Portanto, na perspectiva neoliberal,“os sistemas educacionais enfrentam, hoje,uma profunda crise de eficiência e produti-vidade, mais do que uma crise de quanti-dade, universalização e extensão” (SILVA &GENTILI, 1996, p.17). A crise da escola pas-sa a ser justificada pela ineficácia de seusprincipais agentes, constituindo, desta for-ma, numa crise gerencial, que provoca pro-blemas tais como: evasão, repetência eanalfabetismo funcional. Para esta aborda-gem a responsabilidade da crise escolar éatribuída aos sus agentes, como tambémao Estado, devido a sua ineficiência degerenciar as políticas educativas, dandovida a própria retórica neoliberal:

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não faltam escolas, faltam escolas melho-res, não faltam professores, faltam profes-sores mais qualificados; não faltam re-cursos para financiar as políticas edu-cacional, ao contrário, falta uma melhordistribuição dos recursos existentes. Sen-do assim, transformar a escola supõe umenorme desafio gerencial: promover umamudança substantiva nas práticas peda-gógicas, tornando-as mais eficientes; rees-truturar o sistema para flexibilizar a ofertaeducacional reformular o perfil dos pro-fessores, requalificando-os, implementaruma ampla reforma curricular, etc. (SILVA& GENTILLI, 1996, p.18)

A educação, vista como mercado pas-sa a ser a solução para a crise educacional,ou para a complexa relação trabalho-esco-la. A escola deve existir para responder astendências e possibilidades do mercado. Es-ses objetivos metamofoseiam o significadoda escola, ao visualizá-la como mera “fábri-ca de mercadorias”, consubstanciadas nosalunos. Neste aspecto, Gentili (1996), expõeuma estrita relação entre os princípios queregulam a lógica dos fast foods e os princí-pios que devem nortear as instituições edu-cacionais. Para as políticas neoliberais, estecaminho é o modelo “adequado” para(re)pensar e (re)estruturar a escola. Assim, elecaracteriza os fast foods, tomando as princi-pais estratégias dos McDonald’s, relacionan-do-as com a estrutura educacional, para ele,em ambos “a mercadoria oferecida deve serproduzida de forma rápida e de acordo comcertas e rigorosas normas de controle da efi-ciência e da produtividade” (1996, pp 28-41). Portanto, como o McDonald’s, a escoladeve caracterizar-se por:

Estratégias competitivas para atuar em taismercados, pois conhecimento se transfor-

mou na chave de acesso à sociedade.Desta forma, a escola tem a função depreparar o aluno para que atuem compe-titivamente no mercado de trabalho.

Estratégia competitiva inter-institucional(escola versus escola): a competitividadeem busca da qualidade de ensino e entreprofissionais (gerência como o profissio-nal do ano).

Essa política gerencial permite novasqualidades para a escola, e o único meiopara a ela sair da crise está na possibilida-de de consultar os especialistas, técnicoscompetentes dos organismos internacio-nais. No entanto, para Stoer (2003), a esco-la vista apenas como uma organizaçãoescolar, responsável pelo acesso a um mer-cado, colocando em risco a construção dacidadania, permitindo que apenas os seusagentes sejam inteiramente responsáveispelo fracasso escolar, sem se levar em con-ta às políticas educativas.

Por outro lado, toda esta realidadetambém apresenta a outra fase da moeda:a improdutividade da escola deve ser vistanão só como resultante das “falhas” dos re-cursos financeiros ou humanos, ou da in-competência, mas uma mediação necessá-ria e produtiva para a manutenção das rela-ções capitalistas de produções (FRIGOTTO,2001). Nesta visão, a escola também é es-paço ideológico das classes dominantes, ouseja, ainda é o espaço que permite prevale-cer diferenças com forma de dominação darelação capital e trabalho, fortalecendo asrelações sociais quanti-tativamente distinta,entre chefes e assalariados.

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2 A privatização e a influência2 A privatização e a influência2 A privatização e a influência2 A privatização e a influência2 A privatização e a influênciados organismos internacionais.dos organismos internacionais.dos organismos internacionais.dos organismos internacionais.dos organismos internacionais.

Para que possamos avançar em tor-no dessa temática, faz-se necessário o levan-tamento de alguns dados que, ao nossover, subsidiam a esta discussão:a) Banco Mundial em documento apresen-

tado, fala que o mercado educacional temgastos estimados em US$ 2 trilhões dedólares em sua estrutura.

b) As nações mais ricas do mundo – Esta-dos Unidos, Japão e União Européia –são responsáveis por 80% do que se in-veste em conhecimento no mundo.

c)Nos EUA, a educação é o quinto maiorcomércio de serviços do país, movimen-tando cerca de 9,4 bilhões de dólares noano de 1998. O país exporta 6 bilhõesde dólares e importa 1 bilhão em servi-ços educacionais.

d)De acordo com a revista Exame, a edu-cação movimenta 90 bilhões de reais porano no Brasil.

e)O Brasil é apontado nos documentos in-ternacionais como um exemplo de ex-pansão do ensino privado, principalmenteo superior, sendo que 70% das matrícu-las universitárias são de domínio priva-do sobre o público.

f) Em 1991, o Banco Mundial, propõe umareforma do ensino superior, justificandoque a universidade baseada em pesqui-sa é dispendiosa para os países do Ter-ceiro Mundo. (SIQUEIRA, 2002).

No campo educacional, os sistemasde organizações internacionais como aONU, UNESCO, OECE, ODCE, FMI e BancoMundial, vêm desempenhando um papel

determinante nas formulações de um pro-jeto unificado em favor de uma raciona-lidade técnica/científica, capaz de guiarcada país a exeqüibilidade de suas reco-mendações.

Segundo Siqueira (2002), desde adécada de 1980, o Banco Mundial se em-penha em que os países gastem menoscom a educação e saúde, em termos deenxugamento do Estado. Essa recomenda-ção, abre o mercado para o capital estran-geiro, e a educação passa a ser vista comoum grande setor de investimentos e lucros.A autora ressalta ainda que devido à po-pulação dos países desenvolvidos estaremenvelhecidas, e o fato de não cresceremtanto como nos países sub-desenvolvidos,estes últimos passaram a ser um mercadoem potencial com sua população crescentee de baixa escolaridade.

O foco maior de investimento estáno ensino superior, sendo que a educaçãobásica e o ensino infantil, ainda são vistoscomo áreas ligadas ao Estado e se definemcomo serviços fornecidos no exercício daautoridade governamental (fornecidos forada competição comercial). A oferta de cur-sos rápidos e lucrativos constitui-se um bomexemplo de que o ensino superior tende anão ser encarado como um serviço público,mas regulado por uma lógica de mercado.

A recomendação da OMC divide aeducação superior em quatro categorias:serviços de educação primária, serviços deeducação secundária, serviços de ensinosuperior (terciário) e educação de adultos.No documento, há a afirmativa de que aeducação é vista normalmente como umbem público, fornecida geralmente livre de

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encargos ou a preços que não refletem ocusto da profissão. Avançam na descriçãode que a educação existe também no itemde atribuição privada, com preços determi-nados livremente pelas instituições prove-doras. Deste modo, o papel de associarconsultoria com ajuda, sob a forma de con-cessão aos empréstimos financeiros, passaa ser tarefa do Banco Mundial, que parafazer acordos, passou a exigir, uma admi-nistração empresarial no setor educacional,reduzindo gastos. Isto fez com que a ofer-ta, principalmente no ensino superior, fossereduzida.

De acordo com a OMC, a Internet eeducação à distancia são apontada comoum setor ultra-dinâmico e como um gran-de contribuinte para as mudanças na edu-cação superior. Assinalam para a emergên-cia de acordos inovativos no campo insti-tucional entre instituições públicas e priva-das, dentro de fronteiras nacionais. No cam-po ensino superior, a tendência é acomercialização, favorecida pelo desenvol-vimento das novas tecnologias e estimula-da pela Organização Mundial do Comércio.

Segundo Dias (2002), o desenvolvi-mento da sociedade do conhecimento querepresentaria, se bem administrado, umgrande instrumento para dividir as rique-zas do mundo, corre o risco de se tornarum fator adicional de dominação por par-te de poucos e de exclusão da maioria.Acrescenta ainda que controlar a educaçãopode representar, em tempos de internet, ede novas tecnologias, lucros fabulosos. “Sig-nifica também – e isso é essencial – o con-trole sobre as mentes e representa uma páde cal fina sobre o que resta nestes tempos

de globalização, de soberania aos Estadosnacionais”.

3 Transnacionalização da3 Transnacionalização da3 Transnacionalização da3 Transnacionalização da3 Transnacionalização daeducação e suas implicações noeducação e suas implicações noeducação e suas implicações noeducação e suas implicações noeducação e suas implicações nocenário contemporâneo.cenário contemporâneo.cenário contemporâneo.cenário contemporâneo.cenário contemporâneo.

O reconhecimento de diplomas,credenciamento de escolas e qualidade noensino superior, são questões centrais numcenário de globalização da educação, re-fletida no crescimento de novas tecnologiasde informação e no surgimento de diver-sas formas de educação transnacional. As-sim, percebemos que o fenômeno daglobalização não poderia, de certa forma,deixar de exercer influência e predominân-cia no setor educativo. Portanto, não pode-mos falar de transnacionalização da edu-cação, sem antes pensarmos nas mudan-ças surgidas a partir da sociedade contem-porânea, do mundo capitalista e quaisimprecações e novas concepções estas re-alidades impõem sobre a educação, con-forme apresentamos nos tópicos anterio-res. Então, percebemos que o fenômenoglobal da escola para todos desenvolveu-se na Europa e se afirmou, sobretudo, nopós Segunda Guerra Mundial, universa-lizando esse modelo, a tal ponto de se afir-mar que não seja o melhor, mas como oúnico possível imaginávelúnico possível imaginávelúnico possível imaginávelúnico possível imaginávelúnico possível imaginável (NOVOA,1995).

Todas essas questões citadas, sãoreforçadas pelo Prof. José Maria Bricall, ex-presidente da Conferência de reitores euro-peus (CRE), ao apontar três grandes impac-tos do nosso tempo sobre o mundo daeducação:

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1) Emergências da sociedade do conheci-mento que está transformando a nature-za do trabalho e da organização da pro-dução.

2) O fenômeno da globalização que temconseqüências sobre as possibilidades decriação de emprego.

3) A revolução científico-tecnológica quecria uma nova cultura e que põe sobre amesa questões éticas e sociais urgentes.

O fenômeno da educação trans-nacional não é novo. Desde os anos 1970,o vai e vem de professores e estudantes noplaneta só aumenta. Depois da expansãodos anos 1960 e da diversificação nos anos1970, o ensino sofre, nas duas últimas dé-cadas uma mudança significativa com aintrodução de uma lógica e/ou retórica demercado na gestão dos sistemas de ensi-no superior, associada a uma mutação dopapel do Estado. Com isso, os financiamen-tos, contatos e todos os tipos de permutade informação e conhecimento, passam aser direcionados para uma concepção de“educação comparada”. Nóvoa (1995, p.22-24), baseia-se em quatro característicasprincipais: A primeira é a ideologia do pro-cesso, centrada na perspectiva de que ha-vendo melhoria dos sistemas educacionaishaverá desenvolvimento sócio-econômico.A segunda característica se apóia num con-ceito de ciência, de cunho positivista, ondese legitima a racionalização do ensino, efi-cácia das políticas educativas e o papel deestabelecer leis gerais de regulamentaçãodo ensino, a eficácia das políticaseducativas e o papel de estabelecer leisgerais de regulamentação e funcionamen-to dos sistemas educacionais. A terceira

característica é a idéia do Estado nação, quedecorre dos estudos sobre as diferenças esemelhanças entre dois ou mais países. Aquarta e última característica é a definiçãoe a análise dos métodos utilizados para orecolhimento dos dados a respeito dasações educativas, respondendo aos interes-ses de caráter intergovernamentais, respal-dados pelos acordos internacionais.

Considerar esses fatores possibilita-nos compreender a complexa relação daeducação como campo da transna-cionalização e a leitura dos problemas queexistentes no setor educativo. Pensar naglobalização remete-nos, conforme Santos(1995, p.256) para “o processo de forma-ção de um consenso ao nível mundial epara a emergência de uma ordem globalnormativa”. No entanto, para o cenárioeducativo, esta globalização está impreg-nada por duas relações:a)Cultura educacional mundial co-Cultura educacional mundial co-Cultura educacional mundial co-Cultura educacional mundial co-Cultura educacional mundial co-

mum: mum: mum: mum: mum: O desenvolvimento dos sistemaseducativos e das categorias curricularesnacionais – compreendidos através dautilização de modelos universais da Edu-cação, Estado e Sociedade.

b)Agenda de educação globalmenteAgenda de educação globalmenteAgenda de educação globalmenteAgenda de educação globalmenteAgenda de educação globalmenteestruturada: estruturada: estruturada: estruturada: estruturada: É a natureza mutável daeconomia capitalista mundial que cons-titui a força principal da globalização eque procura influenciar, embora haja efei-tos de mediação, os sistemas educativosnacionais.

Conforme observam Cortesão e Stoer,a ênfase sobre a educação recai nos se-guintes aspectos:a) A importância das forças supranacionais

ao determinar/delimitar a educação.

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b) A possibilidade de tanto os objetivos dapolítica nacional educativa como os seusprocessos poderem ser afetados por in-fluência externas, dado que existe umaênfase na natureza capacitadora – e nãosimplesmente no efeito no seu impacto –das forças supranacionais sobre os siste-mas educativos nacionais.

c) O reconhecimento de que os enqua-dramentos interpretativos nacionais sãodesenvolvidos supranacional que nacio-nalmente.

Portanto, o alvo da globalização é oexterno, abrangem os processos políticos,como também os processos educativos.Deste modo, para pensarmos natransnacionalização é imprescindível con-siderarmos como ocorre o processo deglobalização, pois a ela tenta aprofundarligações entre as mudanças na economiaglobal e mudanças na política e práticaeducativa. (ibid, p. 380). Com o intuito deestabelecer a diferença entre prática e polí-tica educativa, Santos estabelece o concei-to de “localismo globalizado”: a escola ofi-cial, gratuita e laica, a escola para todos, talcomo é um localismo europeu que rapida-mente se globalizou. Nesse caso, os meca-nismos internacionais aturam como agen-tes importantes para a intensificação darelação educação/globalização/transna-cionalização. Assim, os instrumentos deglobalização são caracterizados por:1.Harmonização: (Tratado)2.Disseminação: Atividades organizacionais.3.Estandartização: UNESCO – respeito pe-

los direitos humanos como condição paraser membro da comunidade.

4. Implantação de interdependência: ONGs.

5. Imposição: Medidas obrigatórias associ-adas aos empréstimos para educação doBanco Mundial.

Para Cortesão e Stoer, a transnacio-nalização embora seja tema recente, estáligada sos fenômenos dos séculos XV e XVI,desde o início expansão marítima. (2001,p.383). O lema espalhado por todo impérioportuguês designava a educação eevangelização como forma de salvação.Assim, desenvolve em diversos cantos daterra a tentativa de identidade nacionalportuguesa, através da tentativa de exis-tência de um currículo único em todo oPortugal e o seu império, anulando muitasvezes a identidade cultural local da colô-nia. Mais tarde, embora de forma maiscivilizatória, a influência portuguesa juntoaos PALOPs (países de língua portuguesa).

Nestas influências transnacionais,Santos vai mais longe, ao afirmar as seme-lhanças de transnacionalização que ocorreentre o campo jurídico e o educativo e comoeste é influenciado pelo primeiro (Jurídico).Então, pensá-la significa olhar sobre a suaestrutura e os mecanismos externos que arodeiam, em especial a prática e a políticaeducativa. Olhar superficialmente, não pos-sibilita-nos desvendar véus e entender oque é importante ou secundário nestesmecanismos.

5 A OMCOMCOMCOMCOMC e a educação transnacional.

Preocupados com as orientaçõesdadas pelos organismos internacionais, arespeito da educação superior, no ano de1998, representantes de 180 países se reú-nem em Paris, a fim de aprovarem a De-

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claração Mundial sobre a Educação Supe-rior no Século XXI: visão e ação. Definiramno artigo 14 a educação como um serviçopúblico e, portanto, baseada nas necessi-dades sociais, incluindo o respeito às cultu-ras e a proteção do meio ambiente (artigo6º) A Declaração parte do princípio de queo acesso à educação, inclusive no ensinosuperior, é um direito humano, não poden-do ser tratada como mercadoria. Entretan-to, algumas semanas antes do inicio daCMES em Paris, o secretariado da OMC(Organização Mundial do Comércio) defi-nia novas regras e princípios para o ensinosuperior, totalmente na contra-mão do queseria discutido e aprovado pelos participan-tes da CMES. A decisão da OMC de incluiro ensino superior como um dos doze seto-res do serviço incluídos no AGCS (GATS eminglês) – Acordo Geral sobre o Comérciode Serviços, representa, na realidade, umelemento a mais na transformação que seopera no mundo desde 1989, quando doadvento do fim da Guerra Fria e do iniciode uma era de pensamento único e dedomínio das economias hegemônicas so-bre as culturas dos povos periféricos.

O chamado GATS (Acordo Geral doComércio de Serviços) pretende liberar astransações globais de serviços e acabar compotenciais barreiras para o comércio entrepaíses. Prevê para a educação quatro tiposde comércio:1) A provisão de um serviço que cruza fron-

teiras, como o ensino a distância e asuniversidades virtuais.

2) O consumo no exterior, envolvendo omovimento do consumidor ao país ondeo serviço é oferecido, como estudantes em

viagens para outros países para estudar.3) A presença comercial em outro país, quan-

do a instituição estabelece bases reais emoutro local para oferecer o serviço.

4) A presença de profissionais estrangeiros,como professores e pesquisadores, res-ponsáveis pela prestação dos serviços.

Defensores do GATS argumentam queas condições do mercado dirigem o preçoda educação para baixo e a qualidadepara cima. E que o mercado promoverá aeficiência e o rápido desenvolvimento dosetor; além de empregos. Defendem ainda,que a competição é uma motivação parainstituições tradicionais se renovarem e, quea internacionailização da educação facili-tará o estabelecimento de redes de profes-sores pelo mundo.

Um dos pontos mais debatidos e cri-ticados no GATS centra-se na forma de pre-ver o tratamento igualitário para todos osparceiros estrangeiro. Ou seja, se um paísautoriza competição estrangeira em deter-minada área, oportunidades idênticas de-vem ser dadas nesse mesmo campo paraprestadores de serviços a todos os paísesmembros da OMC. Outro ponto bastantediscutido relaciona-se alguns estados qui-serem liberar a operação de uma universi-dade estrangeira em seu território, deveráestender a ela o mesmo tratamento dadoàs suas universidades nacionais, por exem-plo: se um governo subsidia suas institui-ções públicas para garantir a educação gra-tuita ou manter baixas as mensalidades, omesmo subsídio deverá ser dado a umainstituição com fins lucrativos de fora dopaís. Para a OMC o assunto já está decidi-do: a educação, em particular o ensino

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superior, é servi;o, devendo seguir as regrasdo mercado.

Diante desse quadro, a OMC em1998, um mês antes da CMES em Paris,assinalava para a necessidade de;1) as distinções entre educação pública/pri-

vada, obrigatória/não obrigatória, nacio-nal/internacional, que confere/ e que nãoconfere graus.

2) Impacto possível das reformas institucio-nais, internacional e serviços educativos.

3)Função do ensino à distância nos paísesem desenvolvimento e contribuição pos-sível da reformas nas telecomunicações.

No Brasil, o MEC deu inúmeros si-nais de favorecimento a grupos privados e,ao mesmo tempo, apontava para odesfavorecimento do ensino público, obser-vado na decadência, sucateamento e crise,em todos os sentidos das universidadespúblicas. Para a OMC, a multiplicação decampus não localizados (sistemas de fran-quias), sugere que além de abrir o merca-do, devem os países em desenvolvimento,financiar os grupos estrangeiros para se ins-talarem nos mercados nacionais. Não men-cionam e nem se preocupam com a quali-dade dos serviços prestados, a educaçãoque as universidades de fora trazem édesqualificada e com cursos on line, alhei-os às realidades locais.

Em entrevista à folha dirigida, PabloGentili (2002), nos alerta que no sul do Bra-sil, as pessoas estão fazendo doutorado emEducação em Universidades européias.Denuncia ainda que a Universidade deSalamanca (Espanha), tem grande pene-tração no sul do país, só que nunca forama Salamanca, não falam espanhol, mas

fazem doutorado na instituição.No entanto, apesar de todas as re-

comendações propostas pela OMC, algu-mas dificuldades têm sido enfrentadas pe-los representantes da “indústria educativa”como, por exemplo, as restrições as imigra-ções e ao controle de divisa, ao reconheci-mento de diplomas, ao recrutamento deprofessores estrangeiros e a existência demonopólio governamentais e o não reco-nhecimento de instituições educativas es-trangeiras, limitando a concessão de graus.Diante disso, algumas medidas sãosugeridas pela OMC:a) Programas de intercâmbio;b) Acordos educativos liberais;c) Iniciativas relativas ao reconhecimento

de cursos, programas, estudos, diplomase graus, na educação terciária.

Apesar dessas evidências, acentua-se a tendência dos governos de estabele-cer novas regras com as universidades, es-timulando-as a buscar fundos para atingirseus objetivos. Isto implica menos controlegovernamental, mas também menos fun-dos e maior competição entre as institui-ções e reformas institucionais para cortarcustos e aumentar a lucratividade. Portan-to, torna-se imperativo que se tome o devi-do cuidado para com o sistema de ensinopúblico superior, impedindo que sejamdestruídos pela competição estrangeira e,a universidade, não perca seu caráter deinstituição promotora e provedora do co-nhecimento.

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6 Considerações finais6 Considerações finais6 Considerações finais6 Considerações finais6 Considerações finais

A continuidade não é a característicamais saliente da história. A sociedade globalvem sendo tecida por relações, processos eestruturas de dominação e apropriação,integração e antagonismo, sempre se depa-rando com diversidades, alteridades, desi-gualdades, tensões e contradições. O quedevemos considerar como significativos nostempos atuais, de acordo com Ianni (2001)“são as diferenças e não as semelhanças,os elementos de descontinuidade e não oselementos de continuidade”.

Considerando os argumentos e pres-supostos apresentados, entendemos que aeducação contemporânea teve os seguin-tes pontos como pressupostos:a)Reprodução da história humana numa

relação dialética entre a busca pelaemancipação e a luta conservadora darealidade;

b)Transmissão, qualificação, seleção elegitimação do saber;

c)Construção de um ser humano racional,moral individual e automatizado que seadapta à realidade e sua complexidade;

d)Formação de um instrumento/peça dosistema industrial de desenvolvimento,como mão-de-obra dependente econô-mica, política e socialmente.

Diante dessas prescrições, nas quaisa escola foi estabelecendo sua prática pe-dagógica, observamos que ela nega e ex-cluí, tanto do homem como da convivên-cia humana, qualquer probabilidade deuma ética comunitária que é diferenciadapela responsabilidade de uns para com os

outros e pelo meio em que vive. Portanto, omito de que a educação seria o motor dodesenvolvimento da liberdade do homem,é desmascarado diante dos desafios emarcas deixados por um modelo econô-mico excludente e seletivo. A realidade apre-sentada, perante as necessidades de avan-ço do modelo global, aponta-nos não só omundo econômico, como também para asrelações sociais e educativas, de uma polí-tica neoliberal e transnacional.

No entanto, percebemos que o ca-minho para a consolidação do princípio deigualdade e oportunidades educativas en-volve, por um lado, investimento na conso-lidação da escola pública (investimento fi-nanceiro, profissional e social) e, ao mes-mo tempo, investimento em novas formasde educação escolar, como a descentra-lização da escola pública e o desenvolvi-mento de parcerias da escola com outrasinstituições e entidades da comunidade en-volvida. Assim, é fundamental estimular ini-ciativas que promovam uma internacio-nalização do ensino superior baseada nacooperação solidária e, no âmbito indivi-dual e institucional, tomar medidas parafazer frente a esta nova situação que con-solida as injustiças e promove os esque-mas fracamente ditatoriais.

A educação, à mercê de práticasneoliberais, apenas corresponderá ao acrés-cimo do que já presenciamos, e com certe-za, deixará a escola mais excludente, seleti-va e discriminatória. Assim, a identidadedemocrática da escola nunca foi tão im-portante, como precisa ser (re)pensada naspolíticas e práticas educativas.

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Perspectivas da gestão democrática da educaçãoPerspectivas da gestão democrática da educaçãoPerspectivas da gestão democrática da educaçãoPerspectivas da gestão democrática da educaçãoPerspectivas da gestão democrática da educaçãona elaboração de políticas públicas: ana elaboração de políticas públicas: ana elaboração de políticas públicas: ana elaboração de políticas públicas: ana elaboração de políticas públicas: aconstituinte escolar de Mato Grosso do Sulconstituinte escolar de Mato Grosso do Sulconstituinte escolar de Mato Grosso do Sulconstituinte escolar de Mato Grosso do Sulconstituinte escolar de Mato Grosso do Sul

Vera Maria Vidal Peroni

Doutora em Educação pela PUC/SP. Professora da UFRGS/Faculdade de Educação / Pós-graduação em Educação.e-mail: [email protected]

ResumoResumoResumoResumoResumoO objetivo deste artigo é apresentar um debate acerca da gestão democrática na elaboração de políticaspúblicas, como contraposição ao que vem se materializando nas políticas educacionais nacionais, que deum lado centralizam e controlam, e de outro, descentralizam e se descomprometem. A teoria neoliberalpropõe esvaziar as instituições democráticas, permeáveis à correlações de forças e o que permanecer delasdeve ter a lógica de mercado para ser mais eficiente e produtiva. Por isso, ao invés de repassar asresponsabilidades para a sociedade, chamá-la para definir as responsabilidades do poder público é umaenorme inversão da pauta neoliberal e políticas como Orçamento Participativo, Constituinte Escolar devemestar no centro desse debate.

Palavras chavePalavras chavePalavras chavePalavras chavePalavras chavePolítica educacional; gestão democrática; constituinte escolar.

AbstractAbstractAbstractAbstractAbstractPerspectives of the Democratic Management of Education in the development of public policies: the ConstituentSchool of Mato Grosso do Sul.The aim of this article is to present a debate on democratic management inthe development of public policies as counterpoint to what is materializing in national educational policies,which on one hand centralize and control and on the other, decentralize and decompromise themselves.The neo liberal theory proposes emptying the democratic institutions, which are permeable to the correlationof forces and what remains of them must have the market logic in order to be more efficient and productive.Because of this, instead of transferring responsibilities to society, calling upon society to define theresponsibilities of public power which is an enormous inversion of the neo liberal guideline and policiessuch as Participatory Budget, School Constituent should be at the core of this debate.

Key wordsKey wordsKey wordsKey wordsKey wordsEducational policy; democratic management; school constituent.

Série-Estudos - Periódico do Mestrado em Educação da UCDB.Série-Estudos - Periódico do Mestrado em Educação da UCDB.Série-Estudos - Periódico do Mestrado em Educação da UCDB.Série-Estudos - Periódico do Mestrado em Educação da UCDB.Série-Estudos - Periódico do Mestrado em Educação da UCDB.Campo Grande-MS, n. 18, p. 49-62, jul./dez. 2004.

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O objetivo deste artigo é apresentarum debate acerca da gestão democráticana elaboração de políticas públicas, comocontraposição ao que vem se materiali-zando nas políticas educacionais1 nacio-nais, que de um lado centralizam e con-trolam, e de outro, descentralizam e sedescomprometem.

Os temas política educacional, ges-tão democrática e constituinte escolar, fo-ram propostos, para este artigo, porque jul-gamos estratégico conhecer a proposta degestão democrática do sistema escolar, quefoi discutida através do processo de Consti-tuinte Escolar no MS. Ali a comunidade es-colar pôde decidir qual deveria ser o seuplano para a rede estadual de educação.

No caso brasileiro, a atual políticaeducacional2 é parte do projeto de reformado Estado que, tendo como diagnóstico dacrise, a crise do Estado, e não do capitalis-mo, busca, racionalizar recursos, diminuin-do o seu papel que se refere às políticassociais. E dá-se em um contexto em que aproposta do governo federal para fazer fren-te à crise do capital baseia-se na atraçãode capital especulativo, com juros altos, oque tem aumentado as dívidas interna eexterna, provocando uma crise fiscal enor-me nos estados e municípios. Isso nos levaa crer que a proposta de descentralizaçãoapresentada pela União consiste, em todosos sentidos, em um repasse, para a socie-dade, das políticas sociais. Portanto, o queaparentemente seria uma proposta de Esta-do mínimo, configura-se como realidade deEstado mínimo para as políticas sociais ede Estado máximo para o capital.

É importante ressaltar como o eixo

das políticas educativas foi se redefinindo,nos anos 1980, centrado principalmente nademocratização da escola mediante a uni-versalização do acesso e a gestão demo-crática centrada na formação do cidadão.Nos anos 1990, ocorre a mudança dessacentralidade, passando-se a enfatizar aqualidade, entendida como produtividade.O eixo é a busca de maior eficiência e eficá-cia via controle de qualidade, da descen-tralização de responsabilidades, da terceiri-zação de serviços e da autonomia daescola.

Anos 1980: a crise econômicaAnos 1980: a crise econômicaAnos 1980: a crise econômicaAnos 1980: a crise econômicaAnos 1980: a crise econômicainternacional e a aberturainternacional e a aberturainternacional e a aberturainternacional e a aberturainternacional e a aberturapolítica na América Latinapolítica na América Latinapolítica na América Latinapolítica na América Latinapolítica na América Latina

Verificamos, que nos anos 1980, opaís vivia um processo de reabertura políticadepois da ditadura. Foi um momento degrande participação popular e de organi-zação da sociedade na luta pelos seus di-reitos. Nesse contexto, os eixos principaisda educação também estavam vinculadosà democracia, à gestão democrática, à par-ticipação da comunidade; enfim, parte domovimento que havia na sociedade, emque a classe que vive do trabalho começaa reivindicar por uma sociedade mais justae igualitária, principalmente através de polí-ticas sociais.

Borón salienta o descompasso entreo processo de abertura democrática, em queviviam os países da América Latina, e a criseda democracia, no chamado capitalismometropolitano, onde a ofensiva neoliberal, oprocesso de reestruturação produtiva e o deglobalização já estavam em curso:

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(...) a direção e o ritmo de nosso movimentohistórico parecem não sincronizar com osdo capitalismo metropolitano. O problemaé que a recuperação democrática da nos-sa região tropeça com um mercado mun-dial cujos centros dominantes se tornarammais cépticos acerca das virtudes da de-mocracia em seus próprios países e bas-tante indiferentes – quando nãodissimuladamente hostis – diante das ten-tativas de instituí-la nas sociedades depen-dentes. (...) Nossas democracias, portanto,devem ser ‘funcionais’ às políticas de ajus-te estrutural e à recomposição selvagemdo capitalismo (BORÓN, 1994, p. 24).

Vizentini observa, também, queo processo democrático na América Latinadeu-se em meio a uma profunda crise só-cio-econômica:

(...) particularmente na América do Sul,uma ‘onda democratizante’ contrastou coma crise sócio-econômica. No início da dé-cada eram visíveis os sinais de desgastedos regimes de segurança nacional, quese debatiam com a estagnação econômi-ca, elevado endividamento externo e ero-são de suas bases de sustentação política(VIZENTINI, 1992, p.26).

A década de 1980 na América Lati-na é perpassada pelo fim das ditaduras epela degradação econômico-social3. Issoprovocou uma perversa correlação primá-ria: ditadura igual à estabilidade e demo-cracia igual à instabilidade. Assim, as demo-cracias não seriam apenas inúteis, masnocivas.

A conseqüência para o processo de-mocrático, na América Latina, foi a chama-da ‘democracia sem adjetivos’, esvaziandoassim seu conteúdo:

No plano político ideológico a nova direitaviu-se obrigada a substituir a bandeira dos

direitos humanos pela defesa da demo-demo-demo-demo-demo-cracia cracia cracia cracia cracia e combate ao terrorismo. (...) Quan-to a questão da democracia, num mo-mento de ascenso conservador e de cres-cimento da crise econômica e dos confli-tos sociais, esta deveria ser salvaguarda-da , mas ‘sem adjetivos’, isto é nem popu-lar, social ou participativa, etc., apenas ademocracia como um valor universal. Re-alizar-se-iam eleições periódicas, e, nointerregno entre elas, limitar-se-ia a par-ticipação política no mínimo para nãodesestabilizá-la. Assim, a democracia ado-tava um conteúdo empobrecido, conser-vando e legitimando a desmobilizaçãopolítico-social dos regimes autoritários quesubstituía. Lutar por qualquer direito pas-sou a significar atentar contra a democra-cia (VIZENTINI, 1992, p. 21).

Durante a década de 1980, assisti-mos, no Brasil, à organização dos setoresda sociedade, originada no período dedistensão, transição e abertura democráti-ca que culminou com a Nova República.

Esse movimento não se dá apenaspelo poder das classes dominantes, outrasforças da sociedade se aliaram na luta pelademocracia. Muitas entidades nasceramneste período, como é o caso do PT e daCUT. Algumas tinham uma característicaclara de classe, outras não; mas se unirampara combater o inimigo comum que era aditadura, pois afinal:

O que fica de ditadura, aberta ou oculta-mente, é insuficiente para conferir ao ‘go-verno de transição’ a capacidade de semover autocraticamente ou, pelo menos,de resistir com êxito e impunemente àspressões das forças sociais demo-cratizantes e democratizadoras da socie-dade civil (FERNANDES, 1985, p. 31).

Caldeira (1986, p. 23) ressalta que,nas eleições de 1982, os partidos oposici-

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onistas ganham as eleições nos Estadosmais importantes econômica e politica-mente, iniciando assim uma nova fase noprocesso de transição política brasileira. Em1983, o governo brasileiro inicia negocia-ções com o FMI (Fundo Monetário Inter-nacional) e ainda neste ano implementauma política de arrocho salarial: reconhe-cia-se uma contradição entre a política eco-nômica do governo Figueiredo e o processode abertura. As graves perdas salariais pro-vocaram a reação dos trabalhadores, hou-ve uma tentativa de greve geral, coorde-nada pela Pró-CUT, que segundo o autorteve êxito parcial.

O autor salienta, ainda: “(...) temia-sea política de fechamento numa conjunturade exasperação reativa por parte dos tra-balhadores em face da política salarial im-posta” (CALDEIRA, 1986, p.23). Nesta con-juntura várias entidades da sociedade civilreuniram-se para articular uma campanha“que visava a desenvolver a organizaçãopopular pela consciência da cidadania”,que tinha como propostas fundamentaiseleições gerais em todos os níveis e a convo-cação da Constituinte. Começou, assim, acampanha pelas “Diretas Já”, com umamobilização popular suprapartidária. Noentanto, “a sucessão presidencial percorreuo rumo previsto pelos conservadores: a elei-ção indireta através do Colégio Eleitoral”.

Como bem analisou Fernandes(1985, p. 11), a Nova República marca a“continuidade que se estabeleceu entre aditadura e a ‘república’ que nasceu de seuventre”, havendo assim, apenas uma reor-ganização no poder, necessária para quea mesma classe continuasse dirigindo. Nes-

te sentido, O’donnel (1993) observa que oBrasil: “foi a transição mais protelada e pro-vavelmente a mais negociada (apesar denão pactada formalmente) que conhece-mos”. Fernandes (1985) nos dá mais ele-mentos de como ocorreu este período detransição:

O braço militar se desarmaria, continuan-do, porém, por trás da presidência, comouma retaguarda pronta para o ataque seos ‘inimigos da ordem’ chegassem a seerigir como obstáculo efetivo. A cúpulapolítica do principal partido da oposiçãoem aliança democráticaaliança democráticaaliança democráticaaliança democráticaaliança democrática com os libe-rais do regime, que, finalmente, descobri-ram que o seu ardor revolucionário ren-deria maiores dividendos se eles continu-assem à testa do governo. Por fim, o braçocivil, que se desengajara antes dos mili-tares, deixando o regime sem uma basesocial de sustentação política, abraçou acomposição política que garantia o gran-de capital nacional e estrangeiro uma tran-sição sem ousadias e sem turbulências.(FERNANDES, 1985, p. 19; grifo do autor)

Portanto, o Brasil viveu um processode abertura democrática compactuado comas forças da ditadura. Momento complica-do, pois quando esses países estavam sain-do da ditadura e conseguindo dar os pri-meiros passos no sentido de conquistassociais e de participação popular, esse pro-cesso foi atravessado pela ofensivaneoliberal, reestruturação produtiva e pelaglobalização, que já estavam em curso noresto do mundo. Este fator passa a serdeterminante no processo de correlação deforças internas no Brasil a partir de então.

Isso acarretou conseqüências àredefinição do papel do Estado, pois o quese materializou na Constituição de 1988,

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como um pacto nacional, foi o esboço deprojeto de nação, para um país que, apósuma ditadura, começava a pensar minima-mente no seu destino. Esse processo nãosó foi ‘atropelado’ pela conjuntura interna-cional, como também pelas forças nacio-nais que se sentiram ameaçadas pelas pe-quenas conquistas sociais pactuadas naConstituinte.

Com as eleições de 1989, este qua-dro se agravou:

O impacto das grandes mudanças ocorri-das na arena internacional surpreendeua nação brasileira num raro momento desua história política, o das eleições diretaspara o preenchimento do cargo de Presi-dente da República, que resultou na vitó-ria do candidato identificado com os ven-tos desestatizantes e que prometia con-duzir o país às fileiras do primeiro mundo(GONÇALVES, 1992, p. 164).

E para ser conduzido às fileiras doprimeiro mundo o país deveria se adequaràs exigências do receituário neoliberal: “aminimação do Estado é assim recomenda-da como condição prévia indispensávelpara que a economia brasileira se torneatraente aos olhos dos investidores estran-geiros” (GONÇALVES, 1992, p. 165).

Assim, o processo que vive atualmen-te o Brasil, se dá em um contexto cujas pro-postas neoliberais se tornaram hegemô-nicas internacionalmente.

No chamado “capitalismo metro-politano” a “política econômica conserva-dora dos neoliberais, com sua política deprivatização do setor estatal e dereestruturações favoráveis à tecnologia deponta, questiona também as conquistassociais obtidas ao longo de um século de

lutas trabalhistas (...)” (Vizentini 1992, p.21).Vizentini (1992, p.12) nos apresenta

alguns elementos conjunturais importantesque referenciam o processo de globalizaçãoe a ofensiva neoliberal. Ele aponta que,depois da Segunda Guerra Mundial, houveuma expansão das economias capitalistase foi um período de hegemonia dos Esta-dos Unidos, a chamada ‘Pax Americana’.

Na década de 1960, entretanto, omesmo autor considera que “começam asurgir sinais de esgotamento do modeloentão vigente, o que teve reflexos na eco-nomia mundial e nas relações internacio-nais”. Os Estados Unidos tiveram um gran-de desgaste político na guerra do Vietnã, eisto repercutiu na sua economia, provocan-do déficits orçamentários. O problema foi,em parte, enfrentado pelo governo norte-americano, decretando a inconvertibilidadedo dólar em relação ao ouro, em 1971.

Simplificadamente falando, o dólar inflacio-nava-se ao ser emitido em maior quanti-dade para cobrir o rombo orçamentário, oque depreciava as exportações do TerceiroMundo, valorizava as americanas e davainício a uma inflação mundial. Esse foi oponto de partida da crise econômica mun-dial do capitalismo(...). (VIZENTINI, 1992, p.12)

Os países do primeiro mundo reagi-ram a essa situação, alguns com maioresvantagens, como aponta Tavares:

a política de ajuste de balanço de paga-mentos dos EUA, bem como suas tentati-vas de manter a hegemonia do dólar, le-varam os demais países da OCDE, emparticular o Japão e a Alemanha, a for-mular respostas bem sucedidas dereestruturação industrial, provocandoacentuadas mudanças na divisão inter-nacional do trabalho. (TAVARES, 1993, p.21)

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A economista discute que esses paí-ses passaram por um acelerado processode reestruturação que só foi bem sucedido“onde as condições microeletrônicas, deorganização industrial e as políticas do Es-tado tiveram condições de serem compatibilizadas” (TAVARES, 1993, p.22), pois foium período de forte flutuação nas taxasde câmbio e juros com uma grande movi-mentação de capitais que, segundo a au-tora, “modificaram as condições de financi-amento do Estado e de rentabilidade dagrande empresa” isto forçou a competiçãointernacional, obrigando os países a umarápida transformação tecnológica.

Nesse embate internacional, o “carteldo petróleo” aumentou significativamenteo preço do produto em 1973, prejudicandoas ascendentes economias japonesa e eu-ropéia que não eram produtoras de com-bustíveis. Assim, “por sofisticados mecanis-mos Washington distribuía parte da contade seu complexo industrial militar (não maissuportada por sua economia) aos aliadosrivais e ao Terceiro Mundo” (VIZENTINI,1992, p.12).

As estratégias usadas para conter aqueda da taxa de lucro, segundo o próprioVizentini foram a inflação, a redução desalários, a utilização de mão de obra bara-ta, provenientes de países do terceiro mun-do, a transferência de indústrias para a pe-riferia e a revolução tecnológica.

Segundo Gonçalves (1993), o Tercei-ro Mundo sofreu também com o novoenquadramento das economias avança-das, pois durante a segunda revolução in-dustrial, os Estados imperialistas tiveramuma relação mais estreita com o mundo

asiático, africano e com a América Latina,já que precisavam da matéria-prima des-tes países para seu processo industrial. Alémda mão de obra barata, como já observa-mos. Atualmente, com o avanço tecno-lógico a situação se inverte. “A nova fasedo industrialismo dispensa as matériasprimas tradicionais, substituídas, por suavez, por contingentes reduzidos e de eleva-da qualificação científica” (BARROS NETOapud GONÇALVES, 1992, p.150). Segundoo autor aumenta assim, o “fosso que sepa-ra estes dois conjuntos”.

No Brasil, Gonçalves (1993, p. 62)destaca que houve “a coincidência da criseda dívida com a crise de legitimidade dopoder governamental, oriunda da transiçãodo Estado autoritário para o Estado demo-crático”.

Anos 1990: a ofensiva do capitalAnos 1990: a ofensiva do capitalAnos 1990: a ofensiva do capitalAnos 1990: a ofensiva do capitalAnos 1990: a ofensiva do capitale as redefinições no papel doe as redefinições no papel doe as redefinições no papel doe as redefinições no papel doe as redefinições no papel doEstadoEstadoEstadoEstadoEstado

Segundo Laurell (1995), os teóricosdo neoliberalismo apresentam o inter-vencionismo estatal4 como antieconômico,antiprodutivo, ineficaz e ineficiente, “umaviolação à liberdade econômica, moral epolítica, que só o capitalismo liberal podegarantir”. Assim, o bem estar social perten-ce ao âmbito privado, da família, comuni-dade e serviços privados; portanto, o Esta-do deve, então, intervir apenas para aliviara pobreza e produzir serviços que os priva-dos não querem ou não podem produzir.Conclui a autora: “o neoliberalismo opõe-se radicalmente à universalidade, igual-dade e gratuidade dos serviços sociais”

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(LAURELL, 1995, p. 162-163).Laurell (1995, p. 167-169) destaca

ainda, quatro estratégias de implantaçãoda política social neoliberal na AméricaLatina: corte dos gastos sociais, aprivatização, a centralização dos gastossociais públicos em programas seletivoscontra a pobreza e a descentralização. Nessecontexto, a descentralização se dá no sen-tido de repassar as responsabilidades queeram do serviço público estatal. Estas estra-tégias teriam como fim atingir os objetivosneoliberais de: remercantilizar os bens soci-ais; reduzir o gasto social público, e supri-mir a noção de direitos sociais.

Para a teoria neoliberal, não é o ca-pitalismo que está em crise, mas o Estado.A estratégia, portanto, é reformar o Estadoou diminuir sua atuação para superar acrise. O mercado é que deverá superar asfalhas do Estado. Portanto, a lógica domercado deve prevalecer, inclusive no Es-tado, para que ele possa ser mais eficientee produtivo.

Conforme o diagnóstico neoliberal, oEstado entrou em crise, tanto porque gas-tou mais do que podia para se legitimar, jáque tinha que atender as demandas dapopulação por políticas sociais, o que provo-cou a crise fiscal, quanto porque ao regula-mentar a economia, atrapalhou o livre an-damento do mercado. As políticas sociais,para a teoria neoliberal, são um verdadeirosaque à propriedade privada, pois são for-mas de distribuição de renda. Além de tam-bém atrapalhar o livre andamento do mer-cado, pois os impostos oneram a produção.

O papel do Estado para com as polí-ticas sociais é alterado, pois, com este diag

nóstico, duas são as prescrições: racionali-zar recursos e esvaziar o poder das insti-tuições. Já que instituições democráticas sãopermeáveis às pressões e demandas dapopulação, além de serem consideradascomo improdutivas, pela lógica de merca-do. Assim, para os neoliberais, a responsa-bilidade pela execução das políticas sociaisdeve ser repassada para a sociedade atra-vés da privatização (mercado) ou públiconão estatal (sem fins lucrativos). É o casodo Projeto de Reforma do Estado no Brasil,em que políticas sociais são consideradasserviços não-exclusivos do Estado e, assimsendo, de propriedade pública-não estatalou privada (BRASIL MARE, 1995).

Essa é uma questão básica, pois osprojetos de política educacional estão ba-seados nessa premissa, a de crise fiscal, e,portanto, propõem a racionalização de re-cursos, sendo a descentralização parte daestratégia para se atingir esse fim.

A política educacional brasileiraA política educacional brasileiraA política educacional brasileiraA política educacional brasileiraA política educacional brasileira

Descentralização, autonomia e parti-cipação são as bases fundamentais da pro-posta de gestão democrática construídahistoricamente pelos educadores e foramressignificadas nesse processo de rede-finição do papel do Estado para com aspolíticas sociais.

Ao analisarmos os projetos de políti-ca educacional, constatamos que aredefinição do papel do Estado está sematerializando nessa política, principalmen-te através da contradição Estado mínimo/Estado máximo, que se apresenta nos pro-cessos de centralização /descentralização

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dos projetos de política educacional, e, doconteúdo dos projetos de descentralização.

O movimento de centralização/des-centralização da política educacional, noqual é descentralizado o financiamento ecentralizado o controle, é parte da propos-ta de redefinição do papel do Estado, pro-posta pelo Plano Diretor da Reforma doAparelho do Estado.

Verificamos que, por um lado, o go-verno federal, com essas reformas, vem sedesobrigando do financiamento das políti-cas educacionais, pois tem que racionali-zar recursos, mas, por outro lado, ele objeti-va centralizar as diretrizes, principalmentemediante parâmetros curriculares nacionaise avaliação das instituições de ensino, pois,definir-se o que vai ser ensinado em todasas escolas do País e ter-se o controle, pormeio da avaliação institucional, tornam-seaspectos estratégicos neste período parti-cular do capitalismo.

Constatamos que as justificativaspara se reformar o Estado têm, como pre-missa, a crise fiscal e, que, mais do que umacrise fiscal vivemos uma crise do capital. Acrise fiscal é apenas uma das facetas des-sa crise, e, portanto, toda a estratégia dereforma do Estado proposta, além de resol-ver só parte do problema, fragiliza o Esta-do no que se refere às políticas sociais. Essaé uma questão importante, pois os proje-tos de política educacional estão baseadosnessa premissa, a de crise fiscal, e, portan-to, propõem a racionalização de recursos,sendo a descentralização parte da estraté-gia para se atingir esse fim.

De acordo com a caracterização doIPEA, a descentralização pode ser restrita

ao aparelho de Estado, dando-se tanto deuma esfera de governo para outra, comono interior da mesma esfera de governo.No segundo caso, ela se dá através daprivatização no sentido estrito, da tercei-rização de serviços de apoio à Administra-ção Pública, da transferência da exploraçãode um serviço público da administraçãopública para a gestão privada através dosinstitutos da concessão e da permissão(publicização, no enfoque do MARE), daparticipação da população nas decisõescoletivas, no planejamento e gestão dosserviços públicos e no controle social dasautoridades, instituições e organizaçõesgovernamentais ou, ainda, a descentrali-zação ampla combinando todas essas for-mas descritas (BRASIL, IPEA, 1994).

Verificamos que o Plano Diretor daReforma do Estado, encaminhado peloMARE, propõe a descentralização sob essemesmo enfoque, a publicização e a tercei-rização.

Verificamos, também, como o Esta-do está implementando essa proposta, naeducação, através da obrigatoriedade dasescolas terem unidades executoras parapoderem receber o dinheiro tanto do go-verno federal – Programa Dinheiro na es-cola – como do Banco Mundial – Progra-ma FUNDESCOLA. E, ao instituírem as uni-dades executoras, as escolas estão criandoorganizações sociais, que hoje recebem di-nheiro do governo federal, mas que, ao lon-go do tempo, dado os elementos que res-saltamos da diminuição do papel do Esta-do para com o financiamento das políticaspúblicas, e a educação é uma delas, cadavez mais, essas unidades executoras terão

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que captar recursos da sociedade para fi-nanciar a escola.

Isso tudo apesar do discurso oficialde descentralização e de autonomia daescola. A descentralização proposta é, ape-nas, no sentido de se responsabilizarem osmunicípios pelas matrículas do ensino fun-damental.

Essa centralização das políticas edu-cacionais fere a autonomia dos entes fede-rativos, estados e municípios, e também dasescolas. Afinal, no caso do município, queautonomia resta para elaboração de políti-cas, se já está definido que o recurso temque ser gasto X por cento no ensino fun-damental e não na educação infantil, es-pecial ou EJA; se as escolas obrigatoriamen-te tiveram que montar unidades executo-ras com CNPJ (Direito privado) senão nãoreceberiam dinheiro do PDDE; se o currícu-lo foi definido pelos PCNs e a avaliação foielaborada sem levar em consideração arealidade e a proposta pedagógica dasescolas?

Verificamos, assim, que foram res-significados, nos anos 1990, as bandeirasde luta dos educadores, como adescentralização, autonomia, participação,isto é, os pontos principais do que enten-demos por uma gestão democrática emeducação. Hoje, quando analisamos, porexemplo, o conceito de participação, perce-bemos que se trata de um repasse para asociedade de tarefas que deveriam ser doEstado, o mesmo acontecendo com adescentralização e a autonomia.

Precisamos, portanto, analisar o con-teúdo do projeto de descentralização, au-tonomia e participação que queremos

construir, o modelo que apresentam comoo único, na realidade, nem é um modelovitorioso, pois vive uma grande crise, e nemé único, é o projeto do capital.

Logo, quando falamos em participa-ção, essa participação tem que ser efetiva,isto é, temos que construí-la, pois temos queentender que historicamente as pessoasnão participaram nas decisões da socieda-de, da escola; portanto, deve ser uma metaa ser atingida e temos que pensar em comoenvolvê-las nas reais decisões da vida es-colar.

A democracia deve ser construídaquotidianamente, com uma coletivizaçãocada vez maior das decisões, como afirmaVieira:

Não há estágio democrático, mas há pro-cesso democrático pelo qual a vontade demaioria ou a vontade geral vai assegu-rando o controle sobre os interesses daadministração pública. (...) Qualquer con-ceito de democracia, e há vários deles,importa em grau crescente de coletivizaçãodas decisões (VIEIRA, 1998, p.12).

O Processo Constituinte Escolar noMato Grosso do Sul

E, é com esse princípio democrático,de coletivização das decisões que foiconstruído o plano da rede estadual deeducação do Mato Grosso do Sul (MS), noprocesso Constituinte Escolar, e eu tive oprivilégio de estar no MS neste período5 eviver intensamente este processo desde asua concepção em junho de 1999 até oCongresso Constituinte Escolar em junhode 2001, como assessora6. Foi um dos meusmaiores desafios profissionais, e apenashoje, três anos depois é que escrevo algu-mas poucas palavras a respeito. Sempre tive

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a sensação de que era algo tão complexoe importante que um dia eu escreveriasobre, mas quanto mais me distancio maispercebo a importância do que foi construídono MS, principalmente no momento de cri-se em que estamos vivendo, procurei deta-lhar na primeira parte.

Trazer para o debate a experiênciavivida no MS significa atuar no processode correlação de forças por projetos deeducação e concepção de gestão, cada vezmais inseridos na pauta da políticaeducacional.E, pensar na gestão democrá-tica do sistema é ainda um enorme desa-fio mesmo para os que acreditam nestaconcepção.

O conteúdo da Constituinte Escolarfoi inicialmente discutido no conselho polí-tico ampliado da Secretaria Escolar de Edu-cação, onde aproximadamente 50 pesso-as, entre elas, o Secretário, superintenden-tes, chefes de núcleo, técnicos, representan-tes do sindicato, do Conselho Estadual deEducação, da Universidade Estadual e osconsultores debateram qual seria o forma-to da Constituinte no estado. Foi decidido,entre outras importantes questões, queconstruiríamos coletivamente o plano darede estadual de educação do MS.

Em âmbito municipal, foram forma-das comissões e na capital foram formadascomissões regionais, para acompanhar otrabalho. As comissões municipais eramcompostas de representantes eleitos pelasescolas, representante do sindicato, movi-mentos sociais e do orçamento participativo.O objetivo era envolver a sociedade na cons-trução do plano estadual de educação, as-sim como ter uma instância intermediária

de articulação entre a Secretaria de Educa-ção e as escolas. As escolas também tinhamuma coordenação escolhida pela comuni-dade escolar.

Depois de desenhada, a muitasmãos, a proposta de Constituinte Escolarseguiu para as escolas e foi amplamentedebatida. Esse foi um momento crucial, poisenvolver a comunidade escolar neste pro-cesso de construção coletiva era um enor-me desafio.

Nesse primeiro momento, foi estru-turado o projeto e realizada a mobilizaçãoda comunidade. A estruturação inicial, poiso projeto foi realmente construído no de-correr de todo o processo já que, apesar deem outros locais como Porto Alegre, RioGrande do Sul, Belo Horizonte, terem tidoprocessos Constituinte, todos tiveramespecificidades, e tinham, em comum, ape-nas o princípio da participação.

No caso da Constituinte Escolar doMS, estávamos elaborando coletivamentea política educacional, seu plano para a redeestadual de educação, e não apenas osprincípios que norteariam tal construção.Isto quer dizer que tudo foi repensado: agestão, o currículo, a avaliação, a relaçãocom a comunidade. Os princípios já haviamsido eleitos com a proposta de governo quea população escolheu, e estavam expli-citados nos princípios da Escola Guaicuru.Isto quer dizer que não chegamos na esco-la perguntando se queriam ou não a de-mocratização do acesso, da gestão e aqualidade da educação; a questão eracomo construiríamos na prática, que políti-cas materializariam tais princípios.

Partíamos do pressuposto de que a

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comunidade escolar é quem materializa taisprincípios e só se efetiva o que ela realmentequer. Qualquer mudança só ocorre se aspessoas que concretizarão estas políticasestiverem realmente apropriadas e se sen-tirem sujeitos da proposta.

É importante observar que a equipeque foi para as escolas participou ativamen-te do processo de construção da proposta.E que ao mesmo tempo em que ocorria aConstituinte nas escolas, ocorria tambémna Secretaria de Educação.

O segundo momento teve como ob-jetivos, o diagnóstico da realidade e o levan-tamento de temáticas que foram apro-fundadas, no terceiro momento, com vistasà construção do plano. Para subsidiar essadiscussão foram elaborados dois cadernose um vídeo.

Nesse segundo momento, o desafioera dar elementos para a compreensão domomento particular do capitalismo e comoa política educacional nacional era partedeste movimento. Para que a participaçãofosse efetiva, a comunidade escolar teriaque entender a escola, inserida no atualcontexto, em sua totalidade, com as rela-ções que se estabelecem e não apenas osprojetos pontuais. Pois, para fazer um pla-no que realmente atendesse aos trabalha-dores, tínhamos que pensar a atual funçãosocial da escola com os trabalhadores inclu-sive se contrapondo à função social postapelo capital.

O capital, através de agentes, comoa UNESCO e o Banco Mundial, apontacomo função social da escola:• A formação de futuros trabalhadores que

atendam a novas demandas do capital

produtivo;• A produtividade, isto é, atingir o produto

– rendimento escolar – com o mínimo decustos;

• Evitar o caos social, em um período emque diminuem os postos de trabalho pelareestruturação produtiva e que o Estadose desresponsabiliza para com as políti-cas sociais, além do modelo de desen-volvimento do FMI e do governo federalde valorização do capital especulativo emdetrimento do capital produtivo, a socie-dade caminha para o caos, o que é nãoé interessante para o capital. A educação,mais uma vez na história, é vista comosuperadora das contradições do capital.

Enfim, essas são algumas das fun-ções sociais da escola para o capital, masqual é a função social da escola para aclasse que vive do trabalho? Este foi o gran-de eixo de discussão do segundo momen-to. Entender este período particular do capi-talismo e as políticas educacionais postaspelo capital para superá-la, debatendo am-plamente com a comunidade escolar.

Então, no segundo momento, fize-mos um processo de formação dos princi-pais fundamentos do capitalismo e do atualmomento de sua crise e suas principais es-tratégias: o neoliberalismo, a globalizaçãoe a reestruturação produtiva, e das políti-cas educacionais.

Ainda no segundo momento, atra-vés de uma metodologia de análise, bus-camos evidenciar os principais conflitos vivi-dos pela escola, entre os princípios de umaescola que queira a superação do capita-lismo e busque ter uma função social queatenda os trabalhadores, e as práticas co-

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tidianas da escola. Foram elencados os prin-cipais conflitos e os temas que deveriamser aprofundados para elaboração do pla-no para a rede estadual de educação.

Este foi momento em que a comuni-dade escolar pensou quais eram os seusprincipais problemas e elencou o que ne-cessitava aprofundar. De posse desse diag-nóstico, as equipes trabalharam na cons-trução das propostas de políticas específi-cas. A equipe de gestão elaborou sua pro-posta, a equipe do ensino médio, funda-mental, os ciclos, EJA, enfim, tudo foi deba-tido, inclusive a alimentação, os prédios,tudo deveria ser repensado e apresentadopropostas concretas para servirem de sub-sídios para o debate nas escolas.

Estas propostas retornaram para aescola no terceiro momento, em 16 cader-nos7.

As escolas debateram e fizeramemendas, que foram debatidas e votadaspor mais de 1.200 delegados na PlenáriaFinal do Congresso Constituinte, ocorridonos dias 26, 27 e 28 de junho de 2001.

Foi um momento importantíssimo eestratégico para a comunidade escolar es-tabelecer suas propostas, aprofundar a ges-tão democrática na escola, e, também, ga-rantir a participação efetiva de todos ossegmentos da comunidade escolar, nestemomento decisório para a educação noMato Grosso do Sul.

Gestão democrática esteve semprevinculada à eleição dos diretores, àrepresentatividade do conselho escolar e aorepasse de dinheiro para escola. Avinculação gestão/financiamento foi umdos avanços da gestão democrática. Sem

esses fatores, não podemos dizer que te-mos uma gestão democrática.

Mas, precisamos avançar, pois ges-tão democrática não é um produto; é umprocesso de construção. É importante res-saltar que a democracia é um processo lon-go, demorado, pois envolve o debate dediferentes concepções.Em um país em quehistoricamente ou não era possível partici-par ou a participação era apenas formal,construir uma cultura de participação é umdesafio enorme, assim como uma grandecontribuição social.

Mas, além de construir uma culturade participação, precisamos pensar quegestão democrática está intimamente vin-culada à qualidade do ensino. Além, é cla-ro, de democratizar o acesso, já que todosdevem ter acesso à escola. Essa escola deveter qualidade; ela só será considerada de-mocrática, se for de qualidade.Para pensa-mos em uma educação de qualidade, pre-cisamos investir em formação dos profes-sores e condições materiais para termos aestrutura básica para pensarmos o peda-gógico através de políticas educacionaisconstruídas coletivamente.

A gestão democrática tem sido maisvinculada à gestão escolar, mas, e a ges-tão do sistema? Como tem sido elaboradaa política educacional? Qual tem sido aparticipação efetiva dos educadores nesteprocesso de construção?

O que significa um processo coletivode construção de políticas, no momento emque, como já foi mencionada, a gestão estávinculada ao produto, como uma merca-doria? E a autonomia, entendida como umatransferência de responsabilidades, em que

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a escola se torna responsável pelo seu su-cesso e fracasso e os sistemas de ensinoapenas avaliam o produto final?

Momento em que, não por acaso, ademocracia foi esvaziada, sem adjetivos,como nos falava Vizentini (1992). Esvaziadacomo estratégia, já que é vista pela teorianeoliberal como uma das responsáveis pelacrise do Estado, que para atender a deman-da dos eleitores gasta em políticas sociais etrabalhistas provocando déficit fiscal e infla-ção. A proposta é esvaziar as instituiçõesdemocráticas, permeáveis á correlações deforças e o que permanecer delas deve ter alógica de mercado para ser mais eficiente eprodutiva. Por isso, ao invés de repassar asresponsabilidades para a sociedade, chamá-la para definir as responsabilidades do po-der público é uma enorme inversão da pau-ta neoliberal e as políticas como OrçamentoParticipativo, Constituinte Escolar e devemestar no centro desse debate.

Notas:Notas:Notas:Notas:Notas:1 Entendemos política educacional como o embateentre forças representantes das classes presentes nasociedade e não como ação tópica de governo. Portan-to, pesquisaremos como se movem neste contexto asforças representantes das classes sociais na formula-ção e implementação da política educacional.2 É importante analisar a política educacional atualno contexto da redefinição do papel do Estado, queestá inserida em um movimento maior do capitalis-mo que, na tentativa de superar sua crise, estabele-ceu como estratégias principais o neoliberalismo, a

globalização e a reestruturação produtiva.3 “Nas Américas, a ‘década perdida’ viu-se concreti-zada na redução do PIB per capita. De 1980 a 1988houve queda drástica na Argentina (de 3.359 para2.862 dólares), no México (de 2.872 para 2.588) noUruguai (de 3.2121 para 2.989), na Bolívia (de 983para 724) no Peru (de 1.716 para 1.503) na Guiana(de 1.215 para 995), na Nicarágua (de 1.147 para819) e na Costa Rica (de 2.394 para 2.235). Mas nãofoi perdida para todos: Chile aumentou o seu, de2.448 para 2.518, assim como Bahamas (de10.631para 11.317) e Barbados (de 3.994 para 4.233). NoBrasil, que viu seu PIB cair de 2.481 para 2.449dólares, a década foi marcada por uma aumentosignificativo do coeficiente de remessa dastransnacionais para suas matrizes, de 42%(1971-1981) para 65% (1982-1991). Enquanto isso, a mas-sa de lucro das empresas trasnacionais no país -mesmo com uma queda na taxa média de lucro, de11.2% para 6.9%, no mencionado período - aumen-tou entre as duas décadas, passando de 19.1 para20.7 bilhões de dólares” (GONÇALVES, 1993. in:DREIFUSS, 1996: nota p.12).4 Ver, também, OSBORNE, David. e GAEGLER, Ted.Reinventando o governo: como o espírito empreen-dedor está transformando o setor público. 8. ed.Brasília: MH Comunicações, 1995.5 Na época era professora da UFMS.6 Outros assessores atuaram neste processo comoLigia Klein e Gilberto Luís Alves.7 Educação de Jovens e Adultos e Educação Profissi-onal; Educação e Etnias Indígenas e Negros; Educa-ção Ambiental; Assessoria Técnica Escolar; Educaçãoe tecnologia; Portadores de Necessidades Especiais;Educação Básica do Campo; Função Social da Esco-la; Ensino Noturno; Violência Ética e Cidadania;Gestão democrática; Financiamento da Escola Pú-blica e Estrutura Física da Escola; Formação Conti-nuada; Grêmio Estudantil; Fundamentos de Currí-culo; Os trabalhadores da Educação.

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Recebido em 26 de agosto de 2004.Recebido em 26 de agosto de 2004.Recebido em 26 de agosto de 2004.Recebido em 26 de agosto de 2004.Recebido em 26 de agosto de 2004.Aprovado para publicação em 11 de outubrode 2004.Aprovado para publicação em 11 de outubrode 2004.Aprovado para publicação em 11 de outubrode 2004.Aprovado para publicação em 11 de outubrode 2004.Aprovado para publicação em 11 de outubrode 2004.

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A gestão educacional em perspectiva histórica: emA gestão educacional em perspectiva histórica: emA gestão educacional em perspectiva histórica: emA gestão educacional em perspectiva histórica: emA gestão educacional em perspectiva histórica: emfoco o estado da questão em Mato Grosso do Sulfoco o estado da questão em Mato Grosso do Sulfoco o estado da questão em Mato Grosso do Sulfoco o estado da questão em Mato Grosso do Sulfoco o estado da questão em Mato Grosso do Sul11111

Nilce Aparecida da Silva Freitas Fedatto

Doutora em Educação pela PUC/SP. Professora do Depar-tamento de Educação/Campus de Dourados-UFMS.e-mail: [email protected]

ResumoResumoResumoResumoResumoEste trabalho pretende apresentar, de forma panorâmica, a trajetória da gestão educacional no Brasil,delineando também o estado da questão no âmbito do sistema sul-mato-grossense de ensino e apresen-tando um diagnóstico da realidade da gestão da educação em municípios de Mato Grosso do Sul.

Palavras-chavePalavras-chavePalavras-chavePalavras-chavePalavras-chaveGestão democrática; administração da educação; educação em Mato Grosso do Sul.

AbstractAbstractAbstractAbstractAbstractThe following article presents, in a general way, the course of educational administration in Brazil.Moreover, it brings a description of the South Mato Grosso way of teaching and also shows how realeducational administration works in small towns and big cities of South Mato Grosso(Brazil).

Key WorksKey WorksKey WorksKey WorksKey WorksDemocratic administration; educational administration; education in the state of South Mato Grosso (Brazil).

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1 Considerações iniciais1 Considerações iniciais1 Considerações iniciais1 Considerações iniciais1 Considerações iniciais

Estas reflexões pretendem traçar atrajetória da gestão educacional no Brasile apresentar um diagnóstico da questãoem Mato Grosso do Sul.

Em fins dos anos de 1970 e iníciodos anos de 1980, o país começava a vi-ver uma efervescência social que culminouna abertura política e no desmantelamentodo regime autoritário iniciado em 1964.

Os movimentos de denúncia e resis-tência ao regime militar que emergiram noseio do sistema escolar público brasileiro,revelavam a face perversa do trato desti-nado à educação por esse regime. Assim,ao lado da luta pela democratização doensino e pela autonomia da escola e dasdenúncias sobre o sucateamento da esco-la pública, refletido na falta de verbas, noabandono dos prédios e na carência dequalificação dos profissionais; aglutinava-se também o movimento por reivindicaçõessalariais, por condições mais dignas de tra-balho e pelo reconhecimento dos trabalha-dores da educação como categoria profis-sional, portadora do direito à organizaçãosindical.

O movimento dos trabalhadores daeducação obteve projeção nacional e re-sultou na criação de entidades livres e au-tônomas, como a UTE/MG, a APEOESPe a CPERGS; pela primeira vez esses profis-sionais sentavam-se ao lado de outros tra-balhadores organizados, tais comometalúrgicos e bancários, e assumiam suacondição de trabalhadores. Também era aprimeira vez que a organização do traba-lho na escola era questionada pelos traba-

lhadores da educação de forma coletiva eorganizada.

Neste sentido é relevante destacaruma observação tecida por Ribeiro (1995:113):

(...) foi a necessidade de enfrentamentodas contradições, que se vão desenvol-vendo e se impondo à consciência dedeterminados setores da categoria quelevou muitos professores (...) avançar nograu de compreensão de sua condição deassalariado (...) [isto é,] vão entendendoque os seus interesses se integram aosinteresses da maioria dominada da popu-lação brasileira.

A questão central na agenda destanova visão dos trabalhadores em educa-ção reside na responsabilidade pela admi-nistração da escola.

Estando inserida a gestão da escolana ordem do dia, o movimento dos traba-lhadores da educação recolocou a escolaperante a sociedade e exigiu a redefiniçãode seu papel. Questionou-se o controle dotempo e dos conteúdos, centralizado noautoritarismo e no burocratismo das dire-ções. Passou-se a denunciar sua rígida di-visão do trabalho, pautada pela hierarquia,verticalização e discriminação, bem comoa falsa idéia de que a sociedade brasileiradesprezaria a escola pública. Com efeito,esses trabalhadores, organizados em asso-ciações científicas, culturais e de represen-tação de classe, exigiam o devido respeitopara com sua condição de profissionaissujeitos a um intenso processo deproletarização.

O movimento dos trabalhadores des-nudou a concepção de educação quepermeava a escola pública brasileira, des-

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colada da realidade social e calcada naneutralidade, na isenção e no hermetismo.O movimento demonstrou que a escola éuma instituição social produtora ereprodutora das relações sociais capitalis-tas, assumindo essa escola como “local detrabalho” que é organizado segundo umalógica objetiva, e introduzindo novas expe-riências que foram traduzidas em formasmais participativas e coletivas de organiza-ção (OLIVEIRA, 1994).

Diante dessa realidade e no bojo daexaustão do chamado “milagre econômi-co”, o governo autoritário respondeu às rei-vindicações da sociedade civil organizadacom o planejamento estatal, configuradono II Plano Nacional de Desenvolvimento(PND – 1975/1979) e principalmente, noIII Plano Nacional de Desenvolvimento(PND – 1980/1985). Esses planos para osetor educacional, denominado PlanoSetorial de Educação e Cultura (PSDEC),previam também sua democratização, to-davia como mais um dos instrumentos paraapaziguar o caos social provocado pormedidas econômicas excludentes.

Fruto do embate desses projetos di-ferenciados de sociedade e de educação,que confrontavam, de um lado, os educa-dores organizados e de outro, o governoautoritário, foi referendado o artigo 206,inciso VI, da Constituição do Brasil (1988):Gestão Democrática do Ensino Público, naforma da lei. Esta prescrição, “na forma dalei”, indicava que tal dispositivo deveria serregulamentado e desdobrado na nova LDB.Mas, para a frustração dos setores progres-sistas da educação brasileira, a nova Leide Diretrizes e Bases da Educação Nacio-

nal não criou mecanismos consistentes vi-sando a uma verdadeira gestão democrá-tica nas escolas públicas. Em dois momen-tos, depara-se com referências à gestãodemocrática na LDB: no artigo 3º, inciso VIII,que praticamente transcreve o dispositivoconstitucional, e no artigo 14, que remete aquestão aos sistemas de ensino e que “de-finirão as normas da gestão democrática(...) de acordo com as suas peculiaridades(...)”. A lei apresenta apenas duas exigênci-as: “a participação dos profissionais da edu-cação na elaboração do projeto pedagó-gico da escola”, sem indicar quais profissio-nais e que tipo de participação eles deve-rão ter, e “a participação das comunidadesescolar e local em conselhos escolares ouequivalentes”. No entanto, essas exigênciasaparecem no texto de lei de forma muitovaga e genérica.

Em que pesem os limites da LDBquanto à gestão democrática e mesmoantes de sua promulgação, quanto às no-vas experiências das formas maisparticipativas, alguns estados brasileiros,dentre eles, Minas Gerais (1983), Rio Gran-de do Norte (1985) e Mato Grosso do Sul(1991), criaram colegiados de escola comoresposta à reivindicação da participaçãoefetiva dos diferentes segmentos sociais nagestão da escola pública. As eleições dire-tas para os cargos de direção procuraramromper com um autoritarismo centralizadore clientelista, bem como inibir ou eliminar ainfluência de agentes políticos (vereadores,deputados, prefeitos, cabos eleitorais) nanomeação do diretor.

Nos anos de 1990, embora váriosestados tenham inscrito em suas Constitui-

r

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ções a obrigatoriedade da eleição comocritério de escolha dos diretores nas esco-las públicas (inclusive Mato Grosso do Sul),verificou-se um refluxo nas expectativascom a gestão democrática. Esse movimen-to deve ser entendido como desdobramen-to dos embates travados no âmbito esta-dual, decorrentes das alterações ocorridasnos padrões de intervenção estatal e queresultaram na emergência de novos meca-nismos e formas de gestão.

Tais embates situam-se no contextode mudanças tecnológicas e no reor-denamento das relações sociais ocorridassob a égide ideológica da globalização daeconomia, como sinalização objetiva do tri-unfo da política neoliberal que, redimen-sionando o papel do Estado, buscou mini-mizar sua atuação, redirecionando as polí-ticas sociais empreendidas e rearticulando,automaticamente, o papel social da edu-cação e da escola. A escola, nesse modelo,passou a ser entendida como importanteinsumo ao desenvolvimento.

Nesta nova perspectiva, a gestão re-querida é a Gerência de Qualidade Total naEducação, um novo modelo de gestão dotrabalho que transfere para a educação aadministração e a qualidade da educaçãopública segundo os critérios do mercado ecom seríssimas implicações para esse setor.

A introdução da Gerência de Quali-dade Total na Educação (GQTE), juntamen-te com o avanço das políticas neoliberais,buscava vincular o financiamento das es-colas públicas a uma política de avaliaçãodas escolas levando em conta apenas osaspectos ditos “técnicos da problemática”(FIDALGO, 1994: 74). Observa-se que os

critérios adotados pela proposta da GQTEdesenvolveram-se dentro dos quadros dochamado neo-tecnicismo: a educação pas-sou a ser vista como um problema exclusi-vamente técnico, portanto, não político. Aescola foi descontextualizada de seusdeterminantes sociais e econômicos, o queinviabilizou a construção de uma escolapara todos (FIDALGO, p. 74, 1994).

Considerando a educação como umdos setores submetidos às preocupaçõesdos organismos internacionais de financi-amento (Banco Mundial, BID, UNESCO), umnovo modelo de gerenciamento de educa-ção foi apresentado aos trabalhadores daeducação e à sociedade, também transplan-tado do mercado; trata-se do Plano de De-Plano de De-Plano de De-Plano de De-Plano de De-senvolvimento da Escolasenvolvimento da Escolasenvolvimento da Escolasenvolvimento da Escolasenvolvimento da Escola, mais conhe-cido pela sigla PDEPDEPDEPDEPDE. Esse modelo degerenciamento escolar tomou emprestadoda qualidade total alguns conceitos-chave,como: participação coletiva, objetivo co-mum, responsabilidade individual e de gru-po. Além disso, reaproveitou da “adminis-tração científica” a concepção de planeja-mento, desta feita denominado planeja-planeja-planeja-planeja-planeja-mentomentomentomentomento estratégicoestratégicoestratégicoestratégicoestratégico, porque parte do di-agnóstico da realidade escolar, orientadopela missão da escola em oferecer respos-tas de sua função social à sociedade.

Não é objetivo deste ensaio avaliaro PDE, nem se disporia de elementos teóri-cos para tanto. Contudo, para estimular odebate, é possível afirmar que esse modelode gerenciamento segue o receituárioneoliberal para as políticas sociais, inten-tando a desvinculação do financiamentodas escolas públicas das verbas estritamen-te estatais, propondo que as próprias esco-

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las, com base no conceito de escolas “pro-dutivas”, busquem ser financiadas com re-cursos privados, ou seja, com recursos dosusuários, os trabalhadores.

Após estas considerações iniciais so-bre a gestão da educação, passemos aosegundo item destas reflexões.

2 Breve retrospectiva da gestão2 Breve retrospectiva da gestão2 Breve retrospectiva da gestão2 Breve retrospectiva da gestão2 Breve retrospectiva da gestãoeducacional no Brasileducacional no Brasileducacional no Brasileducacional no Brasileducacional no Brasil

No âmbito da educação, pode-seafirmar que a Administração EscolarAdministração EscolarAdministração EscolarAdministração EscolarAdministração Escolar éuma criação norte-americana, aparecendocomo disciplina sistemática específica emfins do século XIX. Para entender e situar acentralidade da gestão escolar na agendado MEC e dos organismos internacionais,é importante conhecer as diversas fases daadministração do ensino no Brasil.

A história da construção do conheci-mento em administração, no Brasil, come-çou com RegimentoRegimentoRegimentoRegimentoRegimento de Tomé de Souza,promulgado por D. João III, que determi-nou os objetivos da povoação do Brasil.Quanto à história da administração esco-lar escrita, o seu início pode ser marcadocom um planejamento de Manoel daNóbrega, em 1554, para a ação dos jesuí-tas na sua tarefa de conversão. Foi esse oprimeiro programa educacional em quehavia idéias gerais e medidas práticas deapoio aos que se convertessem à fé cristã.

O primeiro sistema de ensino estatalfoi criado no Brasil pelo Marquês de Pom-bal em 1772. As denominadas reformaspombalinas “reservaram” para o ensino daColônia medidas fragmentadas e tardias.No que se refere à gestão da educação, foi

criada a Diretoria Geral de EstudosDiretoria Geral de EstudosDiretoria Geral de EstudosDiretoria Geral de EstudosDiretoria Geral de Estudos, cujoobjetivo era gerir os assuntos ligados aoensino. A atividade do diretor de estudosera estendida a todo o Império por inter-médio de diretores locais e comissários.

A transferência da Família Real parao Brasil, em 1808, e a emergência do Esta-do Nacional geraram a necessidade de semodificar o ensino herdado da Colônia,promovendo sua secularização. Com a pro-clamação da independência, em 1822, tra-tou-se de criar um Sistema Nacional deSistema Nacional deSistema Nacional deSistema Nacional deSistema Nacional deInstrução PúblicaInstrução PúblicaInstrução PúblicaInstrução PúblicaInstrução Pública.

Em razão das fortes pressões sepa-ratistas, a organização da educação, queera centralista por força da Constituição, foialterada, graças ao Ato Adicional deAto Adicional deAto Adicional deAto Adicional deAto Adicional de18341834183418341834, emenda constitucional que descen-tralizou a administração pública no país eacabou resultando, no que se refere ao sis-tema de instrução, na transferência da com-petência relativa às Escolas de PrimeirasLetras para os governos provinciais.

Quando se trata da leitura históricada gestão educacionalgestão educacionalgestão educacionalgestão educacionalgestão educacional, é possível men-cionar os Pareceres de Rui Barbosa (de1882, sobre o ensino secundário e superior,e de 1883, sobre o ensino primário), nosquais, pela primeira vez, apareceu a expres-são Administração EscolarAdministração EscolarAdministração EscolarAdministração EscolarAdministração Escolar como um dosproblemas pedagógicos brasileiros. Os Pa-receres conheceram tamanha repercussãoque o Imperador anunciou a criação de umórgão específico para tratar da InstruçãoInstruçãoInstruçãoInstruçãoInstruçãoPúblicaPúblicaPúblicaPúblicaPública.

No que diz respeito à administra-administra-administra-administra-administra-ção/gestão escolarção/gestão escolarção/gestão escolarção/gestão escolarção/gestão escolar, a Primeira Repúbli-ca não foi muito diferente do Império. AConstituição Republicana de 1891 conser-

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vou o princípio da descentralização do en-sino, instaurado pelo Ato Adicional de 1834.Vale ressaltar a extinção, em 1891, do Mi-nistério de Instrução Correios e Telégrafos(criado em 1890), considerado esdrúxulo eque tinha o objetivo de fazer a ligação na-cional, garantindo a presença oficial doEstado nas diversas áreas do país.

Durante a Primeira República, o Es-tado interveio também para criar órgãos denatureza consultiva e administrativa, como:Conselho Superior de Ensino; Departamen-to Nacional de Ensino e Serviço de Inspe-ção Profissional.

O Estado atuou de forma mais con-tundente no ensino secundário e superior,promovendo algumas mudanças, dentreelas, reformas comandadas por: BenjaminConstant (1890), Epitácio Pessoa (1901),Rivadavia Correa (1911), Carlos Maximiliano(1915) e João Luís Alves (1925).

Em 1932 a administração escolaradministração escolaradministração escolaradministração escolaradministração escolarvoltou à ordem do dia, no Manifesto dosPioneiros da Educação Nova. Ao denunciara falta de um sistema nacional de educa-ção, os pioneiros afirmavam: “depois de 43anos de regime republicano, no Brasil (...) asreformas não lograram criar um sistema deorganização escolar, à altura das necessida-des do país. Tudo fragmentário e desarticu-lado” (apud GHIRALDELLI JR.,1992: 54).

Na Era Vargas (1930-1945), vale res-saltar a criação do Ministério da Educaçãoe Saúde (1930). No âmbito da sociedadecivil, a Associação Brasileira de Educação ea Reforma Capanema, embora marcadapor reformas parciais, representaram as pri-meiras iniciativas na República para que aeducação brasileira fosse tomada como um

todo.Em relação à gestão escolar, pode-

se afirmar que a Era Vargas estabeleceuuma organicidade para a educação brasi-leira e pela primeira vez, diretrizes foramimpostas a todo o território nacional. NaRepública populista, a Lei de Diretrizes eBases representou um passo adiante rumoà unificação do sistema escolar e à suadescentralização.

Nos anos de 1960 e 1970, é relevantedestacar a mobilização dos educadorescom o fito de organizar a categoria, crian-do várias entidades, dentre elas, a ANPAE(Associação Nacional de Professores deAdministração da Educação), que desem-penhou e desempenha papel significativono âmbito da gestão escolar.

Os anos de 1970 iniciaram-se comas reformas de ensino do governo militar,pautadas que foram, do ponto de vista teó-rico, pela teoria do capital humano. Quantoà administração escolar, ela deveria nortear-se pelos princípios da “administração cien-tífica do trabalho”. O processo de trabalhona escola começou a ser mudado; a divi-são técnica do trabalho intensificou-se; sur-giram especialistas que aprofundaram adistância entre a concepção e a execução;os antigos “diretores de escola” foram subs-tituídos pela figura do administrador esco-lar. A gestão instaurada a partir desse perí-odo foi orientada por uma lógica produti-va, expressa nas normas e nos comporta-mentos assumidos no interior da escola.

Os anos de 1980 marcaram o iníciode uma efervescência social que culminoucom a abertura política e o desmantela-mento do regime militar.

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Nos anos de 1990, segundo Freitas(1997), em quatro momentos básicos ocor-reu o processo de configuração da políticaeducacional brasileira: na Constituição Fe-deral de 1988, quando se definiram, comdestaque para a presença da sociedade civilorganizada, as diretrizes gerais da educa-ção; na elaboração do Plano Decenal deEducação para Todos (1993), ocasião emque foram propostos objetivos, metas eestratégias de ação para a educação bási-ca; no lançamento do programa federal“Mãos à obra Brasil” (1994) e finalmente,em 1996, com a promulgação da nova Leide Diretrizes e Bases da Educação Nacio-nal – Lei nº 9.394/962.

Quanto à administração da educa-ção, tema que ora nos ocupa, ainda segun-do Freitas (1997), ocorreu o privilégio daracionalização administrativa e a tendên-cia à privatização, disfarçada sob o véu da“autonomia da escola”.

3 3 3 3 3 A gestão educacional em MatoA gestão educacional em MatoA gestão educacional em MatoA gestão educacional em MatoA gestão educacional em MatoGrosso do SulGrosso do SulGrosso do SulGrosso do SulGrosso do Sul

Do ponto de vista do real/concreto,não existe uma gestão em Mato Grossodo Sul e sim duas: uma estadual e outramunicipal. Para abordar essa duplicidade,num primeiro momento delineamos a ges-tão educacional no âmbito do sistema es-tadual de ensino e, num segundo momen-to, apresentamos um diagnóstico dos mu-nicípios sul-mato-grossenses.

A) A gestão educacional na rede estadual.

Mato Grosso do Sul é um estadonovo. Pode-se referir à administração siste-mática no estado a partir de 1979. É interes-sante observar que Mato Grosso do Sul nas-ceu para ser “modelo”, assim as propostasem todas as áreas de ação estatal deveriampautar-se por uma perspectiva modernizante.

Cabe então uma pergunta: qual aface democrática do país no momento decriação do estado? Durante os governosGeisel e Figueiredo, vivia-se o período queGermano (1993) denomina a açãoa açãoa açãoa açãoa açãoconsensualconsensualconsensualconsensualconsensual, pautada por vieses conserva-dores, mas com forte apelo popular; foi aépoca de criação do II PND e do III PND,ambos já referidos neste ensaio.

Quanto à gestão educacional, assis-tia-se à montagem de um aparelho admi-nistrativo que atendia aos princípios daracionalidade e da eficiência da adminis-tração científica. Todavia, para atribuir a essagestão um ar de modernidade, trocaram-se alguns “rótulos”. A título de exemplo, asDelegacias de EnsinoDelegacias de EnsinoDelegacias de EnsinoDelegacias de EnsinoDelegacias de Ensino passaram a serdesignadas por Agências de EducaçãoAgências de EducaçãoAgências de EducaçãoAgências de EducaçãoAgências de Educação.De modo geral, esse modelo de adminis-tração da educação permaneceu até o fi-nal da década de 1980 em todo o Brasil.

Assim como em muitos estados bra-sileiros, o movimento dos educadores deMato Grosso do Sul integrou-se na luta pelademocratização do ensino brasileiro. Gros-so modo, observa-se (infelizmente não hápesquisas que corroborem esta observação)que a bandeira de luta desse movimentonão foi a gestão democrática em seu senti-do mais amplo, reivindicando, por exem-

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plo, o direito de participação na definiçãode uma política educacional para o Esta-do. A luta dos educadores, no final da dé-cada de 1980, centrava-se na reivindicaçãopelo direito à eleição de diretor.

Na perspectiva das lideranças domovimento, a eleição de diretor era impor-tante para desencadear o processo de de-mocratização da escola, sendo suaimplementação um primeiro passo de umaimportante caminhada rumo à modificaçãoda relação de autoritarismo existente entrea Secretária de Educação do Estado (SED)e a escola.

A gestão democrática foi instituídanas escolas estaduais de Mato Grosso doSul pelo Decreto nº 5868, de 17/04/91, eincluía o Colegiado Escolar como um ór-gão deliberativo.

Em 1995, por ocasião da correlaçãodas forças eleitorais que chegaram ao po-der estatal, uma nova equipe técnica assu-miu a SED, e a gestão democrática sofreualgumas modificações, dentre as quais sedestacam: 1) a instituiçãoinstituiçãoinstituiçãoinstituiçãoinstituição do diretor-diretor-diretor-diretor-diretor-adjuntoadjuntoadjuntoadjuntoadjunto, evidenciando assim uma concep-ção de gestão baseada em um chefemonocrático e que a gestão democráticarequer modificações na própria organiza-ção do trabalho e na distribuição da auto-ridade e do poder na escola; 2) uma avali-ação escrita para os candidatos ao cargode diretor, com a atribuição de um ponto aser acrescido na média dos portadores dahabilitação em administração escolar.

Como não é objetivo deste ensaioanalisar a gestão educacional em MatoGrosso do Sul no período de 1995 a 1998,passa-se a discorrer sobre a nova fase da

gestão escolar do estado, compreendida nobiênio 1999-2002, que faz parte da Pro-Pro-Pro-Pro-Pro-posta de Educação do Governo Po-posta de Educação do Governo Po-posta de Educação do Governo Po-posta de Educação do Governo Po-posta de Educação do Governo Po-pular de Mato Grosso do Sul – 1999/pular de Mato Grosso do Sul – 1999/pular de Mato Grosso do Sul – 1999/pular de Mato Grosso do Sul – 1999/pular de Mato Grosso do Sul – 1999/2002 – Escola Guaicuru. Vivendo uma2002 – Escola Guaicuru. Vivendo uma2002 – Escola Guaicuru. Vivendo uma2002 – Escola Guaicuru. Vivendo uma2002 – Escola Guaicuru. Vivendo umanova liçãonova liçãonova liçãonova liçãonova lição. Numa leitura preliminar, logonas páginas 6 e 7 do documento, tem-se aimpressão de que a concepção de gestãodemocrática esboçada na proposta intentaultrapassar a concepção de que a eleiçãoeleiçãoeleiçãoeleiçãoeleiçãode diretor e do colegiadode diretor e do colegiadode diretor e do colegiadode diretor e do colegiadode diretor e do colegiado esgota a ques-tão, abrindo-se, inclusive, a possibilidade dacomunidade escolar participar da definiçãoda política educacional para o Estado.

É o caso da Constituinte Escolar, apre-sentada como “o instrumento estratégicode mobilização de todos os trabalhadoresda educação e sociedade em geral paraconstruirmos um projeto comprometidocom a transformação social (...) e a escolapública que desejamos para Mato Grossodo Sul” 3. O processo da Constituinte Escolardesencadeou um ciclo de debates no inte-rior das escolas da rede pública estadual.No entanto, para refletirmos sobre a escolae a educação hoje, sem ilusões metafísicas,é preciso apreendê-la como instituição deuma sociedade capitalista transnaciona-lizada e nesta perspectiva, o trabalhador daeducação como qualquer outro trabalha-dor capitalista que foi expropriado de seuobjeto de trabalho. Com base nessa refle-xão, são perceptíveis as dificuldades emvislumbrar a escola como um instrumentopossível para a transformação social.

Em outras palavras: transformar a es-cola, numa sociedade capitalista, em ins-trumento a favor da maioria requer maisque vontade política, requer aquilo que

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Saviani (1997: 235) denominou “estratégiada resistência ativa”, isto é, “a exigência deque a resistência se manifeste não apenasindividualmente, mas através de organiza-ções coletivas (...)”.

Quanto à democratização da gestãoescolar, objeto deste trabalho, é um dos te-mas da Proposta de Educação para MatoGrosso do Sul 1999 – 2002, inserida nas pá-ginas 16 e 17. São princípios gerais que seaplicam a qualquer proposta, de qualquerescola, de qualquer país ou estado. Emboraesses princípios sejam axiologicamente incon-testáveis, entendemos que a referida Propos-ta deva apresentar uma forma operacional,a fim de que ganhe em objetividade.

Tanto a comunidade acadêmicaquanto os estudiosos da gestão democrá-tica devem estar atentos, por exemplo, paracomo a Secretaria de Estado de Educaçãoconciliará os objetivos da Escola Guaicuru,os quais, segundo a bibliografia citada4, seassentam nos pressupostos de uma peda-gogia socialista, com as metas do Planode Desenvolvimento da Escola (PDE), am-plamente adotado e que se fundamentana teoria do capital do humano.

B) A rede municipal

Mato Grosso do Sul conta com 77municípios. Apesar de a Constituição esta-dual instituir em seu artigo 189, inciso VI, agestão democrática na escola pública, asLeis Orgânicas Municipais parecem buscaratender às correlações de forças locais.Muitos governantes, pouco comprometidoscom a democracia em seu sentido amplo eacostumados às práticas clientelistas e ao

favorecimento pessoal, argumentam que odemocrático seria eles próprios indicaremos diretores, uma vez que foram eleitos dire-tamente, estando credenciados para deci-dir em nome do povo e, por conseguinte,em nome de alunos e de professores.

Considerando isso, fez-se uma consul-ta a todas as Secretarias Municipais de Edu-cação, a fim de se estabelecer uma visãogeral da gestão educacional municipal. Essaconsulta foi feita por meio de uma carta pos-tada para as Secretarias, contendo a seguintequestão: qual a forma de provimento docargo de diretor nas escolas sob a jurisdiçãodaquela Secretaria? Foram oferecidas trêsopções: cargo de confiança, cargo efetivo(preenchido por concurso) e cargo eletivo(preenchido por eleição). Caso o preenchi-mento do cargo fosse via eleição, havia umaquestão complementar: as escolas contamtambém com o Colegiado Escolar ou equi-valente, como órgão deliberativo?

Das 77 correspondências postadas,3838383838 foram devolvidas com resposta à con-sulta. Portanto, houve quase 50% de devo-lução. Nos 3838383838 municípios cujas Secretariasatenderam à consulta, a questão apresen-ta-se da seguinte forma: em 28 deles, ouseja, em 73% dos 3838383838, o cargo de diretor éde confiança, sendo uma escolha do chefedo executivo; 10 desses municípios, ou seja,26%, têm o diretor eleito pela comunidadeescolar; constatou-se que, dentre os 3838383838municípios, não existe o cargo efetivo paradiretor (preenchido por concurso público).

As respostas das Secretarias Munici-pais de Educação revelam ainda outrosdados interessantes, como demonstra aTabela 1:

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– dos 38 municípios que enviaram respos-tas, em apenas 5 municípios a eleição dediretor é acompanhada por eleição deColegiado Escolar. Portanto, 33 municí-pios revelam desconexão entre o provi-mento do cargo de diretor por eleição eseu referente conselho consultivo edeliberativo, demonstrando que, apesarde eleito, o poder decisório no interior daescola está à mercê da concentração dopoder em um só cargo;

– 2 municípios informaram que os Conse-lhos estão em fase de implantação –Dourados e Tacuru;

– um município (Sete Quedas) informouque conta com Colegiado em apenasuma escola;

– 2 municípios informaram a previsão deeleição – Aparecida do Taboado (semdata definida) e Laguna Caarapã (mar-ço de 2000);

– 2 municípios indicaram a APM como ór-gão deliberativo - Angélica e Coxim.

De forma preliminar e mesmo provi-sória, a análise da gestão educacional emMato Grosso do Sul, tanto no sistema esta-dual como no municipal, revela-nos que aspropostas para a rede estadual sempre ser-viram como “modelo” a ser seguido pelasredes municipais. Contudo, com relação àgestão democrática, o que requer abrir mãode parcela significativa do poder sobre osrumos da educação pública, mesmo sen-do este um dispositivo constitucional, amaioria dos executivos municipais5 pareceresistir à inclusão desse princípio legal nasleis orgânicas do município.

Em suma, uma leitura possível des-sa assimetria entre a gestão educacionalestadual e a das redes municipais, é a deque, historicamente, o governo federal sem-pre ofereceu um padrão para todas as es-colas do país, provocando sua uniformiza-ção. Por sua vez, os estados consideravam-se impotentes para arcar totalmente comos destinos da educação e, mais recente-

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mente, os municípios viram-se responsáveispela educação fundamental no que diz res-peito às diretrizes pedagógicas (CONSTITUI-ÇÃO FEDERAL, 1998).

Quanto à gestão da escola, esta seliga diretamente à questão do poder locale, neste sentido, Maquiavel, no século XVI,já recomendava ao príncipe:

Não é de pouca importância para um prín-cipe a escolha de seus ministros, os quaisserão bons ou não segundo a prudênciado príncipe. E a principal opinião que sefaz da inteligência dele baseia-se na qua-lidade dos homens que o cercam: quan-do estes são eficientes e fiéis pode-se re-puta-lo sábio, porque soube descobrir-lhesa eficiência e mantê-los fiéis (...) (1983, 97;grifo nosso)

Podemos perceber na gestão demo-crática, que os dirigentes das escolas dei-xam de dever fidelidade ao príncipe (pre-feito), uma vez que seu compromisso mai-or passa a ser com a comunidade. Enfim,esse tipo de administração possibilita aemergência de lideranças descom-promissadas com o poder local, constituí-do a partir do poder político partidário eeconômico, rompendo com o “coronelismo”ainda reinando no interior do Brasil.

Diante da constatação de que noBrasil é prática corrente reivindicar o direitode votar e omitir-se na co-participação dasresponsabilidades do eleito, Boron nos en-sina:

(...) aderiram a uma concepção que sus-tenta que a democracia é um projeto quese esgota na normalização das institui-ções políticas. (...) instauram a democracia(que) se reduz à criação e instituciona-lização (...) de um sistema de regras dojogo (...) que só coloca problemas de

governabilidade e eficácia administrativa.(1994: 7)

Boron, desta feita citando José Num,também nos alerta para a necessária com-preensão dos efeitos do autoritarismo es-tatal sobre a sociedade civil e por exten-são, sobre a escola:

(...) uma coisa é conceber a democraciacomo um método para formulação de to-mada de decisões no âmbito estatal; e ou-tra (...) imaginá-la como uma forma de vida,como um modo cotidiano de relação (...)que orienta e que regula ao conjunto dasatividades de uma comunidade. Estou alu-dindo ao contraste entre uma democraciagovernada e uma democracia governante,isto, é genuína. (apud 1994: 9)

O alerta do autor acima refere ao fatode, geralmente, tendermos encarar, equi-vocadamente, a democracia como umaquestão de “engenharia política” e portan-to completamente dissociada dos interes-ses e valores que animam a luta dos ato-res coletivos. Dito de outra forma, uma “de-mocracia governada” ou “tutelada”, típicade sociedades fortemente marcadas pelopatrimonialismo, como a brasileira, eviden-cia a predominância de liderançaspersonalistas, votos clientelísticos com oconseqüente comportamento de lideradosque delegam a seus representantes podere exigem que resolvam seus problemasmais imediatos e urgentes.

Em resumo, nossa herança escra-vocrata nos legou um sistema de clientelae patronagem, uma ideologia do favor, queao estabelecer a preeminência da relaçãovertical acaba por mascarar formas de ex-ploração ainda vigentes com a conseqüentesubstituição dos direitos.

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É nesse modelo de organização so-cial que encontramos a escola. E por issomesmo, ela (a escola) tende, nas suas rela-ções de poder, reproduzir esta lógica socie-tária. Diante disso, vale a pena apostar einsistir nos mecanismos de participação,como por exemplo, o Colegiado Escolar, naconstrução de novos valores a partir da re-flexão crítica e criativa.

4 Considerações Finais4 Considerações Finais4 Considerações Finais4 Considerações Finais4 Considerações Finais

Do que se acabou de discutir e rela-tar, é possível observar que a situação deprecariedade da escola pública só poderáser superada com vontade política e com oprovimento de recursos imprescindíveis parasua administração. Neste sentido, a gestãodemocrática em Mato Grosso do Sul, mate-rializada na eleição de diretores e colegiadosescolares, não foi e não é suficiente. Noentanto, não se nega sua relevância, porquecontribuiu para que a população pudessecontar com um recurso que lhe possibilitouexercer alguma pressão para que o Estadoatuasse na direção desejada. Assim, a elei-ção para o cargo de diretor apresenta-secomo mais um instrumento das mediaçõestransformadoras das relações de poder nointerior da escola, ao contrário das outrasduas modalidades de provimento do car-go, uma vez que o diretor nomeado podeestar colocando seu compromisso políticoe social tão somente a serviço da burocra-cia estatal e do clientelismo político, e o di-retor concursado pode instalar-se na cômo-da posição da vitaliciedade.

Sabe-se também que por maior queseja o comprometimento do diretor e a sua

capacidade de articular-se com usuários eservidores para pressionar o Estado, esse éapenas um recurso para melhorar a escola.Há, mesmo que não aparente, um jogo deforças envolvidas na questão e que esca-pa ao controle do diretor eleito.

Também é preciso lembrar que quan-do se fala em democracia, gestão demo-crática, eleição para diretores, deve-se con-siderar que a participação e o envolvimentodas pessoas como sujeitos na conduçãodas ações é apenas uma possibilidade, nãouma garantia. No Brasil e especialmente emMato Grosso do Sul, sociedades com fortesmarcas tradicionalistas, sem uma culturadesenvolvida de participação social, é muitodifícil conseguir que os indivíduos não de-leguem a outros, tarefas que fazem partede sua obrigação como sujeitos partícipesda ação coletiva.

No caso da escola pública, a eleiçãopara diretor desfez o mito de que a demo-cratização e a participação eram inerentesao processo, trazendo à tona a correlaçãode forças no interior da escola, tida até en-tão como algo homogêneo e livre de dis-putas.

Enfim, parece não haver dúvida deque se o problema é a falta de tradiçãodemocrática, é insistindo no uso de meca-nismos de participação e de exercícios de-mocráticos que se conseguirá maiorenvolvimento de todos em suas responsa-bilidades.

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Notas:Notas:Notas:Notas:Notas:1 Palestra proferida no evento “Gestão da EducaçãoBásica: relações federativas, flexibilização e autono-mia”, promovido Departamento de Educação/Campusde Dourados-UFMS, em dezembro/1999.2 Cf., especialmente o Capítulo 1, FREITAS, Dirce NeiTeixeira de. A gestão educacional na interseção daspolíticas federal e municipal. Campo Grande, 1997.Dissertação (Mestrado em Educação) – Centro de

Ciências Humanas e Sociais, Universidade Federalde Mato Grosso do Sul.3 MATO GROSSO DO SUL. Secretaria de Estado deEducação. Constituinte Escolar - Construindo a es-cola cidadã. Campo Grande, ago. 1999, p. 9.4 Constam da bibliografia, por exemplo, obras como:O Capital, de Karl Marx, e o Manifesto do PartidoComunista, de Marx e Engels.5 Cf. Tabela 1, apresentada neste ensaio.

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Recebido em 07 de outubro de 2004.Recebido em 07 de outubro de 2004.Recebido em 07 de outubro de 2004.Recebido em 07 de outubro de 2004.Recebido em 07 de outubro de 2004.Aprovado para publicação em 08 de novembro de 2004.Aprovado para publicação em 08 de novembro de 2004.Aprovado para publicação em 08 de novembro de 2004.Aprovado para publicação em 08 de novembro de 2004.Aprovado para publicação em 08 de novembro de 2004.

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Divisão do estado de Mato Grosso do Sul e oDivisão do estado de Mato Grosso do Sul e oDivisão do estado de Mato Grosso do Sul e oDivisão do estado de Mato Grosso do Sul e oDivisão do estado de Mato Grosso do Sul e omovimento de municipalização do ensino namovimento de municipalização do ensino namovimento de municipalização do ensino namovimento de municipalização do ensino namovimento de municipalização do ensino nadécada de 1980década de 1980década de 1980década de 1980década de 198011111

Nadia Bigarella

Doutoranda em Educação pela UNICAMP. Professora dosCursos de Pedagogia da UNAES/MS e da UNIDERP.e-mail: [email protected]

ResumoResumoResumoResumoResumoEste artigo tem a finalidade de apresentar e comentar o movimento da política de municipalização doensino de 1º grau, hoje ensino fundamental, como componente essencial da política de descentralizaçãodo ensino em Mato Grosso do Sul desde sua instalação oficial, em primeiro de janeiro de 1979, com aposse do primeiro governador do Estado Harry Amorim Costa. Este resgate histórico, por intermédio depesquisa documental e bibliográfica é importante para compreender as lutas políticas entre centralizaçãoe descentralização, que interferiram na organização da estrutura do Poder Executivo. Em visão retrospecti-va, é possível depreender que existam embates na sociedade política do Estado, que provocaram a troca decinco governadores, entre os anos de 1980 a 1990, gerando a rotatividade de cinco secretários de educação,fato que causou vários problemas para o setor educativo.

Palavras-chavePalavras-chavePalavras-chavePalavras-chavePalavras-chaveCentralização; descentralização; municipalização.

AbstractAbstractAbstractAbstractAbstractThe purpose of this article is to present and to comment on the movement of the municipal policy inprimary education as the essential element in opposition to the decentralizaton policy organization inSouth Mato Grosso since the State was separated and officially established, on the first of January of 1979under its first governor Mr. Harry Amorim Costa. This Historical Background, through bibliographic researchis extremely important for the understanding of political conflicts between centralization and decentralizaton,which had strongly interfered in the organizational structure of the Executive Power. From a retrospectivepoint of view it is possible to conclude that there were conflicts among the Powers within the politicalsociety of the State, which caused the substitution of five governors between the years of 1980 and 1990,and also caused the dismissal of five secretaries of state for education in the State of South Mato Grosso,causing various problems for the educational sector.

Key wordsKey wordsKey wordsKey wordsKey wordsCentralization; decentralization; municipality.

Série-Estudos - Periódico do Mestrado em Educação da UCDB.Série-Estudos - Periódico do Mestrado em Educação da UCDB.Série-Estudos - Periódico do Mestrado em Educação da UCDB.Série-Estudos - Periódico do Mestrado em Educação da UCDB.Série-Estudos - Periódico do Mestrado em Educação da UCDB.Campo Grande-MS, n. 18, p. 77-95, jul./dez. 2004.

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INTRODUÇÃOINTRODUÇÃOINTRODUÇÃOINTRODUÇÃOINTRODUÇÃO

A descentralização do poder públicoestá presente na história desde o início daorganização do Estado brasileiro, mas so-mente nas décadas de 1980 a 2000 ga-nhou visibilidade como projeto político, pro-vocando discussões entre os grupos, o quedirigia o país e o outro que fazia oposiçãopolítica aos detentores do poder. Adescentralização também está associada aodebate sobre as políticas sociais, por isso, éindispensável compreender a descentra-lização do ensino, sob a forma de munici-palização, como um componente essenci-al da política de descentralização, fiscaliza-ção e controle da execução de políticaspúblicas2 educacionais. Logo, é fundamen-tal entender e diferenciar os conceitos dedescentralização e municipalização do en-sino como base norteadora para prosse-guir esta discussão.

Para discutir descentralização é ne-cessário compreender seu contrário: centra-lização. Centralizar é aproximar-se do cen-tro e descentralizar significa afastar-se docentro. Portanto, centralizar é aproximaçãodo poder central, enquanto que descentra-lizar é o distanciamento do poder central,ou seja, “as decisões e as definições deações para a alocação de recursos, emgraus variados de autonomia, seriam to-madas em instâncias outras que não ascentrais” (OLIVEIRA, 1999, p. 14).

Por conseguinte, “descentralizar, emsentido comum, é afastar do centro; des-centralizar, em sentido jurídico-administra-tivo é atribuir a outrem poderes da admi-nistração” (BOTH, 1997, p. 88). Descentrali-

zar “compreende a distribuição do poder àsjurisdições de âmbito territorial e a relaçãodas partes com o todo” [Exemplo: o Minis-tério da Educação distribui poderes para asSecretarias de Estado de Educação, ou, aSecretaria de Estado de Educação distribuipoderes para as escolas que estão integra-das a sua rede]3.

Desta forma, a descentralização di-fere da municipalização, apesar damunicipalização do ensino ser um compo-nente essencial da política de descen-tralização, mas não é descentralização; éapenas uma forma de descentralização,conceituada como transferência ou passa-gem de responsabilidades ou encargos etomadas de decisões [com a participaçãode representantes da sociedade civil] doEstado para os municípios, pela existênciade convênioconvênioconvênioconvênioconvênio: Estado e MunicípioEstado e MunicípioEstado e MunicípioEstado e MunicípioEstado e Município, emregime de colaboração, objetivando a defi-nição de prioridades e a melhoria da quali-dade do ensino.

Gestão de Harry Amorim costa eGestão de Harry Amorim costa eGestão de Harry Amorim costa eGestão de Harry Amorim costa eGestão de Harry Amorim costa ea municipalização (1979)a municipalização (1979)a municipalização (1979)a municipalização (1979)a municipalização (1979)

O Estado de Mato Grosso do Sul foicriado através da Lei Complementar nº 31,de 11 de outubro de 1977. Sua instalaçãooficial ocorreu em primeiro de janeiro de1979, com a posse do primeiro governa-dor do Estado Harry Amorim Costa, indica-do pelo presidente da República [ErnestoGeisel] (OLIVEIRA, 2000). Essa indicaçãoocorreu porque Harry Amorim Costa eraoriginário do Estado do Rio Grande do Sul[conterrâneo de Geisel]4 e estava alheio àsdivergências internas entre as duas facções

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da Aliança Renovadora Nacional (ARE-NA)5: independentes ou pedrossianistas eortodoxos6 disputavam o controle do apa-rato político-administrativo do Estado e adominação dos mecanismos clientelistaspor um dos segmentos da burguesia rural

[...] cujos interesses estavam voltados paraa atividade econômica mais tradicional daregião Sul do antigo Mato Grosso, a pecu-ária e, outra, cujos interesses passavampela introdução da racionalidade e datecnologia mais avançada na agriculturae pela industrialização do Estado (ROCHA,1992, p. 34).

Após pressão dos pedrossianistas eortodoxos sobre o Planalto, o PresidenteGeisel (1979), depois da aprovação do Se-nado, indicou um governador para MatoGrosso do Sul, para que se superasse asdisputas internas entre as duas alas políti-cas da ARENA, evitando assim, a crise inici-ada na sociedade política do novo Estado,já que Mato Grosso do Sul estava sendocriado para ser um Estado modelo, aquiseriam aplicadas novas técnicas de admi-nistração pública, pois

[...] na lógica do Planalto Central, guiadopela tecnocracia, seria esse o modelo quedaria conta de gerir o novo Estado, bemcomo controlá-lo politicamente de formaa ser mais um elemento para asseguraro projeto político de distensão do regimemilitar sem afetar interesses já consolida-dos (FERNANDES, 1996, p. 68).

Compactuando com o raciocínio doPlanalto Central, Harry Amorim Costa [queauto se definia como um simples técnicoapartidário (ROCHA,1992)] assume no diaprimeiro de janeiro de 1979 o posto degovernador do Estado, sem qualquer legi-timidade e com a intenção de fazer um

governo técnico. Em discurso oficial, prome-teu que seriam aplicadas novas técnicas emadministração pública, para tanto, a estru-tura do Poder Executivo seguiria as “diretri-zes, convencionalmente, recomendadas nocampo do desenvolvimento organizacional[...]” (OLIVEIRA, 2000, p. 271).

O Estado foi criado como forma deafiançar um projeto político pós-liberal, coma filosofia de “transformar problemas polí-ticos, sociais e econômicos em problemasadministrativos” (FERNANDES, 1996, p. 69).Por isso, o governo teria uma estrutura en-xuta com um número reduzido de funda-ções e setores administrativos descentrali-zados (diretos e indiretos), capazes de aten-der as obrigações e as responsabilidades,para com aos municípios. [A criação deMato Grosso do Sul, merece reflexão, poisimplicou na eleição de mais três Senadorese mais uma bancada na Câmara Federal,garantindo maior espaço de manobra paraa concretização dos objetivos políticos doGoverno Militar (ROCHA, 1992)].

O Estado de Mato Grosso do Sul,seria modelo para todo o Brasil, precisavater um plano de governo com o intuito derepresentar a modernização que o país al-mejava [desejo do Governo Militar paraperpetuar seus 20 anos de ditadura]. Paratanto, esse novo Estado deveria ser maisdinâmico, mais racional, mais flexível, maisdescentralizado, mais aberto de acordo comos padrões internacionais, como também,para facilitar o Estado a “efetivar o resgateda dívida socialdívida socialdívida socialdívida socialdívida social” (FOGAÇA, 2001, p.58,grifo nosso). [Ressalte-se uma grande con-tradição do Governo Militar ao defender oresgate da dívida social, já que, que este

r

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governo beneficiou a classe média duran-te a sua gestão em detrimento da classepobre].

É imbuído desse espírito que o go-vernador Harry Amorim Costa apresenta omodelo de organização do Poder Executi-vo, em discurso oficial, no ato de instala-ção do Estado de Mato Grosso do Sul

a) [...] a estrutura básica é normativa,orientadora, coordenadora e avaliativa, e,por isso mesmo leve e dinâmica.

b) A ação executiva, através de órgão vin-culado, é descentralizada porregionalização, em amplo apoio aos Mu-nicípios.

c) Setores afins, nas áreas psico-social eeconômica, são gerenciados de forma in-tegrada (ROCHA, 1992, p. 44).

O governador explica que os “seto-res afins” implicam a participação da co-munidade, incluindo as representaçõescredenciadas dos setores administrativos,sociais, políticos e empresariais. Participa-ção esta que seria assegurada por Conse-lhos Consultivos Regionais e Conselho Es-tadual para o Desenvolvimento Econômi-co e Social (ROCHA, 1992).

No discurso7 do governador HarryAmorim Costa, apareceram duas linhas dadoutrina neoliberal: estimular a iniciativaprivada e a estrutura de governo em ummodelo mais organizado, compacto, leve,flexível e aberto. Palavras facilmente encon-tradas na luta política e ideológica que setraça cotidianamente na mídia e nos con-frontos eleitorais.

Na gestão de Harry Amorim Costa, oPoder Executivo teria a incumbência de pla-nejar, orientar, supervisionar, coordenar e

controlar, pois a responsabilidade da execu-ção das atividades seria descentralizada edelegada às prefeituras. Para amparar legal-mente essas medidas, o Governo faria usode convênios [Estado para os municípios,pela existência de convênio, em regime decolaboração = MunicipalizaçãoMunicipalizaçãoMunicipalizaçãoMunicipalizaçãoMunicipalização] instru-mentos que tinham o objetivo de fortalecera coordenação de ações dos órgãos estadu-ais e municipais que exercessem atividadessemelhantes. A intenção era aumentar oempenho e investimentos no Estado, porisso, a abertura para a participação do setorprivado, mediante contrato ou concessões.Também serviria de modelo para a Reformado Estado que estava na pauta do GovernoFederal, devendo seguir as seguintes diretri-zes: planejamento participativo e sistêmico,fortalecimento do setor privado, descentra-lização e modernização da máquina dogoverno [diretrizes que só poderiam ser reali-zadas por um governo democrático e aber-to politicamente, assim o político e o econô-mico passaram ser questões centrais dadécada de 1980].

Por essas razões, o governo federal,da época, recrutou um grupo de técnicos, aidéia era ter na área de planejamento téc-nicos das diversas especialidades seguin-do as competências do Sistema de Desen-volvimento de Recursos Humanos (SDRH):pessoas das áreas: do planejamento, doorçamento, da educação, da saúde, do tra-balho e da promoção social, da cultura edo desporto.[Assim, Mato Grosso do Sul nãoteria uma Secretaria de Educação e sim umaFundação de Educação, a qual tinha porfinalidade administrar o ensino do Estadoassegurando uma máquina do governo

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dinâmica, econômica e eficaz, que tinhacomo representante não um secretário deeducação, mas um diretor-presidente daFundação, por ocasião, Antonio SalústioAreias] (ROCHA, 1992).

Cabe observar que a concepção demunicipalização estava ligada a uma açãopolítica menos burocratizada, permitindomaior flexibilidade e mais democracia naescola. Idéias antagônicas as do regimeque assumira o poder através de um golpede estado [governo centralizador]. Além dis-so, o governo militar determinou uma ca-dência acelerada ao desenvolvimento eco-nômico com uma dinâmica moderna. Con-traditoriamente ao movimento dinâmico,acentuaram-se as tendências centraliza-doras.

Essa contradição sinaliza uma crisefiscal nos sistemas econômico e social,embora ainda não aparente, mas que sus-citava uma reforma do Estado como priori-dade no ementário do Governo Federal,substituindo as diversas versões doestadismo e do nacionalismo prevalecen-tes nos anos de 1950 a 1970, por projetosde “aparatos estatais com menor poder deintervenção direta na economia e na vidasocial” (SILVA apud BIGARELLA, 2004, p.60).

Os municípios, como comunidadesbásicas e celulares da nação, seriam forta-lecidos, tornando-se capazes de influir noprocesso decisório e na execução das pro-postas da SDRH, pois segundo o Sistema eAdministração de Projetos Ltda (Projed)8 oajustamento das políticas sociais seria umaboa opção para reverter o saldo inaceitá-vel no campo do bem - estar social, já quetais resultados eram conseqüência de po-

líticas sociais fragmentadas e impediam queo homem adquirisse hábitos, valores, ca-pazes de fazer com ele se desenvolvessecomo pessoa plena. Por esse motivo, as “[...]comunidades básicas e celulares da naçãoeram vistas como receptáculos naturais eprimeiros das aspirações e anseios do ho-mem do meio rural, bem como de suas re-clamações” (PROJED, 1978 apud ROCHA,1992, p. 48). Assim os municípios teriammaior chance de verificar as falhas na exe-cução dessas propostas e fazer as corre-ções necessárias, planejar melhor seu orça-mento, para suprir suas necessidades. Umavez que, para o Projed, um município bemaparelhado teria mais êxito em fixar o ho-mem no meio rural.

O discurso da descentralização acon-teceria por intermédio da execução dasações pelos municípios [convênios com osmunicípios], pois a idéia era determinar pla-nos, programas e transferir recursos finan-ceiros para que as prefeituras os executas-sem, pois o Governo que tomava posseacreditava que “[...] o dinheiro público apli-cado mais perto da comunidade seria me-lhor fiscalizado, mais bem administrado [...]”(ROCHA, 1992, p. 48-49).

Quanto à escola, foi eleita pelo go-verno como a base ideal para abrigar osprogramas sociais, porque era uma insti-tuição que tinha várias unidades espalha-das por vários municípios no Estado e es-tava sempre em contato com a populaçãodo interior. É evidente que também econo-mizariam com construções, mobílias, funci-onários, água, luz. Afinal, o governo queriagerir o novo Estado com uma máquinaenxuta, leve e compacta, perseguindo as

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premissas da racionalização e eficiência daAdministração, não dos serviços.

Foi o projeto elaborado pelo PoderExecutivo para as políticas sociais do Esta-do, via Secretaria de Desenvolvimento deRecursos Humanos (SDRH), que desagra-dou às elites políticas sul-mato-grossenses,cuja história política foi construída atravésdo clientelismo político somado a fatoresde ordem econômica. As ações descentrali-zadoras ameaçavam essa elite, no momen-to em que a SDRH, por meio de suas Fun-dações, iria agir diretamente com os prefei-tos em cada municípios [regime de colabo-ração entre Estado e municípios], sem preci-sar recorrer aos deputados estaduais e seuscorreligionários que, “[...] em função da novaprática do Governo não eram mais o vín-culo entre o município e a liberação de ver-bas” (FERNANDES, 1996, p. 74).

Segundo Fernandes (1996), a socie-dade política do Estado estava desconten-te com essa outra forma de se fazer políti-ca, que era diferente da política feita noEstado. O argumento usado para justificaresta dissonância era que a descentralizaçãodas políticas sociais afastaria estes grupospolíticos de suas bases eleitorais. O queculminou em um embate entre os doismodos de fazer política, levando à quedado Governador Harry Amorim Costa. A partirdessa data iniciou-se o desmantelamentode parte do Poder Executivo e sua“feudalização”9.

É importante ressaltar que a divisãodo Estado de Mato Grosso deveria dar con-ta de não criar entreveros políticos, pois ogoverno central estava preocupado com aseleições para Presidente da República que

aconteceria em 1985. “Assim sendo, o Gover-no Central deveria conciliar os interesses di-vergentes gestados no novo Estado”(FERNANDES, 1996, p. 80), pois, “[...] duas fac-ções que se digladiavam em torno da nome-ação para governador, mas que na verdadeia além, estava em disputa qual setor da eco-nomia teria a hegemonia política naquelemomento” (FERNANDES, 1996, p. 71).

Com a queda de Harry Amorim Cos-ta, as forças políticas locais conseguiramimpedir que o outro titular da SDRH se tor-nasse forte, como o antigo10 e tambémimpediram essa secretaria de explorar al-guns setores da Administração Pública, con-forme interesses eleitorais.

Assim, o Estado de Mato Grosso doSul traz em seu bojo os planos do GovernoCentral somado à herança política de suaselites que travaram uma queda-de-braçono processo de consolidação do Estado,acirrando cada vez mais as lutas entre asduas facções, que disputavam “[...] qual osetor da economia teria a hegemonia polí-tica naquele momento” (FERNANDES, 1996,p. 71), o que resultando no esfacelamentodos planos do Governo Central.

Gestão de Marcelo Miranda Soares ea municipalização (1979 – 1980)

Com a saída do Governador HarryAmorim Costa, no dia 13 de junho de 1979,é nomeado para assumir o cargo de go-vernador Marcelo Miranda Soares, que fi-gurava na ala dos independentes oupedrossianistas com estreita ligação comos setores médios urbanos e industriais(FERNANDES, 1996).

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Ainda na esteira dos acontecimen-tos, as diferenças acentuadas dos interes-ses econômicos entre as duas facções difi-cultavam a escolha de um político paraassumir o cargo de governador. A fim degarantir a continuação da prática da do-minação pela posse do Aparelho do Esta-do, pois sem o controle deste estavamameaçados a desaparecerem do cenáriopolítico os três senadores arenistas, PedroPedrossian, Saldanha Derzi e MendesCanale, que deixaram de lado suas diver-gências e conseguiram a exoneração dogovernador Harry Amorim Costa e a no-meação de Marcelo Miranda Soares11

(FERNANDES, 1996).Portanto, Marcelo Miranda Soares

representava, naquele momento, um Esta-do com base política forte e unida, assegu-rando o relaxamento das tensões entre ospolíticos, o que facilitaria o processo daseleições diretas para governador do Esta-do, e para presidente da República, em1984, assegurando para o Poder Executi-vo “espaço de manobra cada vez maior emaior liberdade de ação para concretizaçãode seus próprios objetivos políticos, seminterferências desastrosas ou perturbadoras”(ROCHA, 1992, p. 31), da oposição e daspróprias hostes12 governamentais.

No pouco tempo que esteve à frentedo Governo, Marcelo Miranda Soares des-monta a estrutura administrativa do Esta-do, formada pela equipe técnica de HarryAmorim Costa. Naquele momento, a priori-dade era mudar a máquina administrativadas políticas sociais, que estavam sendoguiadas pelos princípios da centralização,com o objetivo de satisfazer as elites políti-

cas e suas bases eleitorais. Em vista disso,foi extinta a SDRH e suas fundações, queforam substituídas por Secretarias do Esta-do (FERNANDES, 1996). [Essa arquiteturavinha atender às duas alas arenistas quecontinuavam travando embates para as-sumir o maior controle da máquina gover-namental, através da indicação dos secre-tários, pois cada secretaria assumidacorrespondia à automação do poder.Assim, a Secretaria do Estado de Educaçãofoi criada. O primeiro Secretário nomeadoem agosto de 1979, foi o professor HérculesMaymone, representante do grupo dos or-todoxos, que permaneceu no cargo ape-nas por cinco meses e foi substituído porJuvêncio César da Fonseca, representa dosindependentes].

Perseguindo a consolidação do pro-jeto de desenvolvimento de Mato Grossodo Sul, a recém criada Secretaria de Estadode Educação precisava resolver o proble-ma dos recursos financeiros, que eram “rela-tivamente ineficientes”. Para tanto, precisa-ria tomar algumas medidas racionaliza-doras: modernização tecno-administrativa,descentralização dos serviços educacionaise revitalização do serviço de estatística. To-das essas medidas, segundo o secretáriode Educação da época, Hércules Maymone,tiveram que ser tomadas para evitar o des-perdício de recursos humanos, financeirose materiais e duplicação de esforços paraos mesmos fins (MATO GROSSO DO SUL,1980).

Por conta dessas medidas, o secre-tário Hércules Maymone desvia-se de suaspromessas iniciais, pois, ao assumir o car-go, disse que a educação em Mato Grosso

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do Sul seria o principal instrumento para oengrandecimento do homem, porém suasações à frente da secretaria de Educação oapartavam das suas primeiras intenções. Defato, naquele momento, o importante erareduzir gastos da máquina pública, por isso,o governo queria descentralizar serviços.Porém essa medida desagradou a socie-dade política: não apenas seus adversários,como também seus correligionários: os in-dependentes. Desagrado que resultou nasua queda. Enfim, foi substituído pelo go-vernador Pedro Pedrossian, que nessa épo-ca era líder dos independentes (FERNAN-DES, 1996).

Em suma, a sociedade política sul-mato-grossense queria um Estadocentralizador, porém, capaz de conciliar osseguimentos regionais e setoriais da eco-nomia, harmonizar as discórdias políticas.O Governo Federal queria o governo doNovo Estado, agindo como um mediadorentre as alas políticas, que lutavam pelosseus próprios interesses. A preocupação doGoverno Central era com as eleições dire-tas que iriam acontecer em 1984, logo, ogoverno precisava do apoio das duas alaspolíticas. A municipalização era percebidacomo uma ameaça porque fragmentava opoder, atravancava a cultura do clientelismo,embora o governador Marcelo MirandaSoares em documento oficial, afirmasse ocontrário:

Procurei, igualmente, dotar as PrefeiturasMunicipais de nosso Estado, de instrumen-tos institucionais e administrativos, nocontexto das técnicas racionais de Admi-nistração Pública, para que elas pudes-sem absorver dinâmica e eficazmente os

melhores resultados das ações no campoeconômico e social. Com estas ações te-nho então buscado uma sempre eficientealocação de recursos estaduais, estimu-lando a consciência e a responsabilidadedos seus retornos, fazendo também, comque os nossos Municípios participem, cadavez mais efetivamente, no fortalecimentoda produção agropecuária do Estado(MATO GROSSO DO SUL, 1980, p. 5).

Quanto ao investimento na área daeducação, em 1979, visando à ampliaçãoe à melhoria das redes físicas estaduais emunicipais, o governo proporcionou cercade 10 mil novas vagas na zona rural e 26mil na urbana (MATO GROSSO DO SUL,1980).

Com relação às atividades adminis-trativas, no exercício do governador Mar-celo Miranda Soares, em documento oficial,enfatizou-se que consistia em um conjuntoarticulado de órgãos que “[...] atuamdescentralizadamente no desempenho dasatividades de recrutamento, seleção, avalia-ção de mérito, treinamento, controle funci-onal, cadastro, pagamento, classificação decargos, concessão de benefícios e vanta-gens, e normatização da área do pessoalcivil do Estado” (MATO GROSSO DO SUL,1980, p. 126).

Todavia, a gestão de MarceloMiranda não retribuiu, tal como a de HarryAmorim Costa, às expectativas do GovernoCentral, que desejava um partido forte eunido; de modo que o sucessivo desenten-dimento entre a elite política acarretaram aexoneração de mais um governador.

Vale ressaltar que outro conflito queprejudicou a gestão de Marcelo Mirandafoi com a categoria dos professores, em

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razão de melhores salários. Por conseguin-te, precisava-se unir as classes trabalhado-ras em torno do projeto de desenvolvimen-to de Mato Grosso do Sul, como se esseprojeto fosse capaz de beneficiar a todosindistintamente [Nesse momento JuvêncioCésar da Fonseca estava à frente da Secre-taria de Educação].

Em suma, várias disputas internasdentro do partido do governo levaram aeste desfecho, entre elas: “[...] a tentativa deMarcelo Miranda de afirmar-se como líderdo partido13. Com esse objetivo, vinha per-correndo os municípios com seus assesso-res e inaugurando obras” (ROCHA, 1992,p. 41). Fato que desagradou muito a essaelite política14 do Estado.

Assim, com discurso descentralizador,mas com atitudes centralizadoras, MarceloMiranda Soares saiu do Governo [substitu-ído por Pedro Pedrossian], no dia 30 denovembro de 1980, afirmando em docu-mento oficial “[...] inaugurei um período detranqüilidade e justiça, necessário ao esta-belecimento de prioridades e reivindicaçõesao Governo Federal como uma das condi-ções de criação de alternativas descentra-lizadoras para consolidação deste Estadoque floresce” (MATO GROSSO DO SUL, 1980,p. 9-10).

Em verdade, em decorrência dosembates entre os integrantes da classe po-lítica de Mato Grosso do Sul, daquela épo-ca, aconteceu uma ciranda de governado-res, que será descrita nas próximas seções,só parando em 1983, com a posse do go-vernador Wilson Barbosa Martins.

Municipalização no governo PedroPedrossian (1980-1982)

O governo de Pedro Pedrossian teveinício no dia sete de novembro de 1980, émarcado por um período cuja crise econô-mica iniciada em 1970 se aprofundou, e oGoverno Federal, após perceber os limitesdo milagre econômico, criou o II Plano Na-cional de Desenvolvimento (II PND), que seiniciou em 1974 e se propunha a comple-tar o processo de industrialização, propor-cionando a implantação do setor de bensde produção, que até então eram incipien-tes ou inexistentes. Para tanto, houve a ne-cessidade de recursos externos por causado aumento de importação e problemasna balança comercial, devido à diminuiçãodas condições de crédito internacional e dadesaceleração da economia brasileira. Tam-bém a retração dos recursos externos obri-gou o governo a usar as empresas estataispara captação de mais recursos.

O esquema de acumulação dosgrandes capitais, que se sustentava graçasaos recursos externos e/ou públicos, acarre-tou a sobrecarga do Estado, que tinha aresponsabilidade sobre os outros setoresque estavam mais precários, gerando comessa atuação grande concentração de ri-quezas e renda, resultando em uma carên-cia crônica de financiamento de longo pra-zo e um inchaço especulativo do mercadofinanceiro, impossibilitando a formação deuma base financeira nacional (GOLDENSTEIN,1994).

Nesse período, o Estado de MatoGrosso do Sul, tal como o resto do país,sentia os resultados da crise econômica15,

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que contribuía para as condições materiaisde vida da população sul-mato-grossense,que tinha um grande número de pessoasno campo, e que em busca de melhorescondições financeiras, começavam a mi-grar para as cidades maiores, e acabavamse alojando nas periferias e favelas(FERNANDES, 1996).

Simultâneo à crise econômica, esta-va em curso um processo de industrializa-ção após a divisão do Estado (1979), oca-sionando a elevação populacional dos cen-tros urbanos, pois geralmente, muitas pes-soas saíam do campo para as periferias doscentros urbanos. Esse processo resultou namudança de um Estado de industrializa-ção emergente, alterando a agricultura desubsistência em agricultura organizadaobjetivando as exportações de seus produ-tos (arroz, soja e trigo). Frigoríficos e indús-trias de beneficiamento de grãos se insta-laram no Estado (KASSAR, 2000).

Ressalte-se que a crise econômicacomprometeu os recursos que seriam envi-ados pelo Governo Federal para instituir oEstado de Mato Grosso do Sul e a arreca-dação era insuficiente para cobrir as des-pesas com obras e a folha de pagamentodos funcionários. Portanto, o Estado deMato Grosso do Sul traz na sua história acrise financeira.

Nesse contexto, Pedro Pedrossianassume o governo, com o objetivo de fazeruma política educacional voltada para ocontrole dos descontentes com a fragilida-de do atendimento às carências da popu-lação pobre.

Por isso, nesse governo, segundoMensagem à Assembléia Legislativa (1981,

s/n), as atividades de assistência à comuni-dade foram desenvolvidas no sentido deauxiliar financeiramente as entidades co-munitárias que atuavam junto aos carentes.

Outra ação desse Governo foi o proje-to Panelão, que tinha o objetivo de eliminara figura do intermediário, buscando na fontealimentos básicos que eram entregues àpopulação a preço de custo. Com essasações, o governo afirmaria a sua políticasocial baseado no modelo da política dogoverno central que tentava “[...] implemen-tar a proposta de construir uma política edu-cacional para uma sociedade, que pretendiatornar-se democrática” (SENNA, 2000, p. 25).

Quanto à educação, segundo Men-sagem à Assembléia Legislativa (1982), asdiretrizes que norteavam as ações do setoreducacional discutiam alguns aspectos con-siderados principais: a expansão das opor-tunidades educacionais, com reforma, cons-trução e ampliação de unidades escolarese adequação de seus equipamentos; a ele-vação do índice de produtividade do ensi-no, com capacitação de recursos humanos;a dinamização do sistema de atendimentotécnico-pedagógico às Agências Regionaisde Educação e a implantação do sistemade informações Estatísticas para a Educa-ção, com o objetivo de fornecer subsídiospara o planejamento educacional. [Nestagestão, quem assumiu a pasta da Secreta-ria de Educação foi a Professora MarizaSerrano, que permaneceu um ano e quatromeses no cargo de Secretária e foi substitu-ída pelo professor Fauze Scaff Gattas Filho,que permaneceu à frente dessa secretariaaté o término do mandato de PedroPedrossian] (MATO GROSSO DO SUL, 1982).

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No sentido de possibilitar o desen-volvimento das ações educativas, foramconcedidos suprimentos para despesas depronto pagamento das escolas da RedeEstadual de Ensino; o rendimento dametodologia e das diretrizes curriculares doensino de 1º grau (hoje ensino fundamen-tal) e a implantação de Sistemas de infor-mações Estatísticas Educacionais. Essasações partiam da idéia do ajustamento ra-cional da alocação de recursos e dos gas-tos correspondentes ao ensino de 1º grau,implicava na centralização de verbas dire-tamente nas mãos do Governo Estadual,afirmando a centralidade do Estado porintermédio das Agências Regionais de Edu-cação, que distribuía merenda escolar a 215mil alunos em todo o Estado com a ajudade convênios com as Prefeituras Municipais(MATO GROSSO DO SUL, 1981).

O governador Pedro Pedrossian, emsua gestão, lançou o projeto assistencialGuatambu, implementado por meio de umconjunto de ações rápidas, com o objetivode melhorar as condições de vida de 26mil pequenos produtores rurais e de suasfamílias, estimulando-os a permanecer nocampo. Por isso, a elaboração de [...] proje-tos educacionais para capacitar 125 pro-fessores rurais, na área de saneamentoambiental e higiene e 14 supervisores deAgências Regionais de Educação, além de20 monitores e 10 especialistas. Foram ha-bilitados 400 professores, sendo 100 leigos,220 em Letras e Estudos Sociais e 80 emtécnica e operação agrícola (MATO GROS-SO DO SUL, 1981).

Ainda na área técnico-pedagógica, foiprestada assistência aos serviços de aten-

dimento ao excepcional de diversos muni-cípios do Estado, por meio de sessões deestudo, visitas e reuniões. Prestou-se apoioaos órgãos municipais de educação no to-cante à proposição curricular e elaboraçãoe produção de materiais de ensino-apren-dizagem, além da prestação de assistênciatécnico-administrativa e implementação dosistema de supervisão intermediária, porintermédio das Agências Regionais de Edu-cação (MATO GROSSO DO SUL, 1982).

Ao final desse governo (1982), perce-be-se que a Secretaria de Educação, ao ele-ger suas estratégias de ação, elencou a par-ticipação dos municípios e diversos órgãosregionais, como também a participação dacomunidade, mas essas ações não podemser consideradas municipalização, porque aparticipação da comunidade, segundo Ro-cha (1992) ficou limitada às mães dos alu-nos do ensino pré-escolar, que uma vez acada mês disponibilizavam seu dia paraexecutar serviços domésticos na escola. Tam-bém a participação dos municípios e órgãosregionais aconteceu apenas no cumprimentode tarefas, pois a estrutura administrativa es-tadual era centralizada, tolhia o poder dedecisão das Secretarias e municípios. Portan-to, a centralização política e a centralizaçãodos recursos financeiros já estavam em cenaantes da divisão do Estado [Logo, não acon-teceu um movimento a favor damunicipalização, porque não aconteceutransferência de responsabilidades ou encar-gos e tomadas de decisões, com a participa-ção efetiva da sociedade civil, do Estado paraos municípios, pela existência de convênioconvênioconvênioconvênioconvênio,configurando um regime de colaboração:Estado +Estado +Estado +Estado +Estado + Município = Municipalização Município = Municipalização Município = Municipalização Município = Municipalização Município = Municipalização].

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É importante sinalizar que o ano de1982 foi influenciado pelas expectativas daseleições de 15 de novembro, que levaria àsurnas 55 milhões de eleitores em todo o Bra-sil. Em virtude do uso abusivo da máquinagovernamental, os partidos de situação fi-caram em desvantagem, enquanto os parti-dos de oposição venceram 66% do territórionacional. Mato Grosso do Sul, como a mai-oria dos Estados brasileiros elegeu o Gover-nador Wilson Barbosa Martins, do Partidodo Movimento Democrático Brasileiro(PMDB) (BITTAR, 1998), que era um políticoexcluído pelo Governo Militar de 1964.

Governo Wilson Barbosa MartinsGoverno Wilson Barbosa MartinsGoverno Wilson Barbosa MartinsGoverno Wilson Barbosa MartinsGoverno Wilson Barbosa Martins(1983-1986)(1983-1986)(1983-1986)(1983-1986)(1983-1986)

Inicia-se em 1983 o governo WilsonBarbosa Martins, político ligado ao Partidodo Movimento Democrático Brasileiro(PMDB), partido de oposição que não ques-tionava a ordem de dominação, tampou-co a relação entre capital e trabalho;opunha-se, sim, a forma de fazer governodo então governador Pedro Pedrossian(FERNANDES, 1996).

Nessa época, Mato Grosso do Sulvivia a euforia de que “sua maioridade polí-tica teve início no pleito de 15 de novembrode 1982, com a eleição, diretamente peloseu povo, do governador do Estado” (ESTA-DO DE MATO GROSSO DO SUL, 1984, p. 2).

Por outro lado, vivia a preocupaçãocom a situação difícil em que o Estado seencontrava. As dificuldades iam além doque a comissão de transição supunha, exi-gindo um planejamento de emergência, talera a defasagem nos cálculos (MATO GROS-

SO DO SUL, 1984). Em Mensagem à As-sembléia, o governador Wilson BarbosaMartins denunciou:

As dívidas encontradas, vultosas para acapacidade de endividamento do Estado,de tão difusas, ainda hoje, quase um anodecorrido, surpreendem, vez por outra, ossetores especializados do Planejamento;[...] o ócio administrativo levara à paralisa-ção total de todas as obras do governo; oscompromissos internos, pelainadimplência, criaram um estado de des-crédito [...]; o funcionalismo, com mesesde atraso no seu pagamento, não tinhaânimo, [...] para o desempenho de seuimportante mister (MATO GROSSO DO SUL,1984, p. 3-4).

Por isso, o governo decidiu primeira-mente equilibrar as finanças do Estado, de-finir criteriosamente as prioridades do gas-to público, sem desperdícios no custeio enos investimentos, objetivando o melhoruso dos recursos, cada vez mais escassos(MATO GROSSO DO SUL, 1984). [Nessa con-juntura que emerge a ilusão: PedroPedrossian constrói, endivida o Estado eWilson é eleito para arrumar a casa, pagaras dívidas contraídas pela gestão anterior]16

Esse governo que se declarou comoum governo democrático, logo, geraria po-líticas educacionais democráticas, que exi-giam mecanismos institucionais que enco-rajassem a participação política nos proces-sos decisórios, diminuindo a influência doExecutivo. A tarefa mais difícil, naquelemomento, para o governo, seria manter ocontrole da elaboração e execução daspolíticas do Estado (BITTAR, 1998); pois,para implementar um projeto político queprivilegiasse o desenvolvimento, era preci-

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so harmonia, tranqüilidade social e respon-sabilidade (MATO GROSSO DO SUL, 1994).

Nessa direção, o governo recém-empossado afirmava estar voltado parauma gestão austera e racional na adminis-tração dos negócios públicos. Uma gestãocujas ações seriam alicerçadas nos seguin-tes princípios:

a) [...] adoção do planejamento participativoe sistêmico, como método e instrumentode integração, celebridade e racionaliza-ção da administração pública;

b) predominância do interesse social naprestação dos serviços públicos, com prio-ridade dos mais carentes;

c) descentralização das atividades admi-nistrativas e executivas do governo edesconcentração espacial de suas açõesdelegando a execução de projetos e ativi-dades, em particular da área social [...](MATO GROSSO DO SUL, 1983, p. 39).

Esses princípios nos remetem ao pas-sado, ao governo de Harry Amorim Costae sua equipe de técnicos e especialistas, quetentaram descentralizar as ações do PoderExecutivo, abarcando os municípios. Aexemplo da Saúde, o governo procuroumelhorar a qualidade dos seus serviçosnorteando-se por princípios dedesconcentração e descentralização (MATOGROSSO DO SUL, 1983).

O então governador Wilson Barbo-sa Martins, justificava as ações do seu go-verno, assegurando que a aspiração doPoder Executivo era procurar os

[...] melhores níveis de qualidade de vidapara todos os segmentos da população [...]conferir ao desenvolvimento o máximo deconotação qualitativa, tendo em vista obem estar integral [e mais] ‘tornar efetiva

a proposta democrática de participaçãoparticipaçãoparticipaçãoparticipaçãoparticipaçãocrescente dos diversos segmentos sociaisno processo decisório do Governo’ (MATOGROSSO DO SUL, 1983, p. 10).

Em relação à educação, o governa-dor pretendia “[...] melhorar o perfil da distri-buição de renda, a partir do democráticoprocesso de ascensão social; pois seria, se-gundo ele, a marca de uma nova épocana história da política de nosso Estado deMato Grosso do Sul”, (MATO GROSSO DOSUL, 1983). Para viabilizar essa concepçãode educação, Wilson Barbosa Martins no-meou como Secretário de Educação Leo-nardo Nunes da Cunha, apoiado pelos pro-fessores e estudantes comunistas, pois erauma figura de destaque na luta contra oGoverno Militar, por sua postura democrá-tica e por sua formação humanista(BITTAR,1998)

O ano de 1985 foi marcado por umlento, mas progressivo processo deredemocratização do país, de abertura po-lítica, de otimismo e populismo simultâne-os. A mobilização de todas as forças paraa modernização do país estava presente, aeconomia diversificava as importações eacelerava a concentração de renda nasmãos de poucos. Nesse período, a políticada descentralização foi vista como o cami-nho que iria ajudar a construção da demo-cracia em todos os setores da sociedadebrasileira (BOTH apud BIGARELLA,2004).

Nessa conjuntura, o governo estavaencaminhando suas ações para atingirobjetivos de ordem social e política, tendoem vista o bem-estar integral e ainda paraefetivar a proposta democrática de partici-pação dos diversos segmentos sociais no

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processo decisório do governo; para tanto,colocaria os setores sociais entre suas priori-dades (ROCHA, 1992). No entanto, WilsonBarbosa Martins foi influenciado pelo cli-ma de transformação democrática e refor-çada pelo seu lema de campanha “vamosgovernar juntos”, que propunha a participa-ção da sociedade civil na condução da polí-tica educacional em todos os níveis [muni-cipal, estadual e federal] (BITTAR, 1998).

Para Wilson Barbosa Martins, demo-cracia implicava voto direto e participaçãoda comunidade, definição do II Plano Es-tadual de Educação (II PEE). A partir dessaconcepção, foram organizados alguns pro-jetos da Secretaria de Educação Estadual:a participação dos professores, alunos e dacomunidade escolar na discussão dos pro-blemas e das propostas educacionais, aparticipação dos professores e dos estudan-tes no Conselho Estadual de Educação.Entretanto, algumas passagens desse Pla-no sugerem que, no âmbito da educação,foi travada uma luta entre as forças libe-rais, progressistas e tradicionais, todas inte-grantes do governo Wilson Barbosa Martins(BITTAR, 1998).

Enfim, a Secretaria de Educação vol-tou suas ações para efetivar a gerência daescola pública de forma racional; para dis-cutir, planejar e resolver o problema dasvagas ociosas nas zonas rural e urbana; epara prover cada escola de um fundo demanutenção, que fosse administrado pelaprópria escola de acordo com suas neces-sidades (MATO GROSSO DO SUL, 1983).Contudo, a Secretaria de Educação conti-nuou centralizada, e nada ocorreu pelamunicipalização, apesar de Leonardo

Nunes da Cunha afirmar que a nomeaçãodos dirigentes escolares deveria ser atravésde um consenso entre governo e socieda-de civil [sociedade políticasociedade políticasociedade políticasociedade políticasociedade política + socieda-+ socieda-+ socieda-+ socieda-+ socieda-de civil = Estado, de civil = Estado, de civil = Estado, de civil = Estado, de civil = Estado, Gramsci (1978) traz oconceito de Estado, que abrange a socie-dade política que corresponde ao núcleogovernamental que exerce o domínio legale a sociedade civil que se constitui de agru-pamentos com interesses comuns que seorganizam para defender seus interesses].

Ao final do governo de Wilson Bar-bosa Martins, Marcelo Miranda, tambémdo PMDB, inicia a sua campanha pautadaem promessas para a após a posse, afir-mando como diretrizes principais de seu go-verno a transformação do Estado produtore exportador de matéria-prima para um Es-tado Industrializado e a garantia de aces-so e permanência da criança na escola,valorização do magistério e modernizaçãoe autonomia administrativa da escola(MATO GROSSO DO SUL, 1983). Com essediscurso, Marcelo Miranda Soares cheganovamente ao Governo do Estado do MatoGrosso de Sul.

Gestão de Marcelo Miranda Soares(1986 – 1990)

Em 1986, Marcelo Miranda Soaresretornou ao governo, já havia governadoo Estado de agosto de 1979 a novembrode 1980, após a exoneração de HarryAmorim Costa. O Partido do MovimentoDemocrático Brasileiro (PMDB), ao qual ogovernador pertencia, elegeu em 1986, 26governadores em todo o Brasil, de formadicotômica e populista, usando o Plano

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Cruzado como plataforma (FERNANDES,1996).

No seu segundo governo, MarceloMiranda Soares apresentou projeto de go-verno para uma sociedade democrática,moderna, liberal e elencou três princípioscomo meta: legalidade, impessoalidade emoralidade. Em suma, prometeu que oPoder Executivo praticaria suas ações noâmbito das leis constitucionais, jamaisusando o Estado para favorecer parentes,amigos ou eleitores, demarcando os limi-tes entre o público e o privado para estirparo clientelismo de uma vez por todas. O ob-jetivo era racionalizar a administração, complanejamento participativo e descentraliza-ção como principais ferramentas para umgoverno moderno e democrático; pois, Mar-celo Miranda pretendia desencadear açõesvisando à modificação da estrutura produ-tiva do Estado. Nesse sentido a diretriz fun-damental de seu governo foi a de transfor-mar as características de Mato Grosso doSul, de Estado produtor de matéria-primapara um Estado industrial (ROCHA, 1992).

Segundo o discurso oficial, a moder-nização da economia do Estado tinha oobjetivo de melhorar as condições de vidada população sul-mato-grossense; o docu-mento mensagens do governador Marce-lo Miranda Soares à Assembléia Legislativa,expressa como prioridade das ações gover-namentais o III Plano Estadual de Educa-ção 1988/1991 (MATO GROSSO DO SUL,1989, p. 8).[Vale lembrar, que nessa gestão,estiveram à frente da Secretária de Estadode Educação dois secretários: o primeiroAleixo Paraguassu Neto, que tomou a de-cisão de dar continuidade ao trabalho de

Leonardo Nunes da Cunha, pois Para-guassu é contrário a descontinuidade (EN-TREVISTA, 2004 apud BIGARELLA, 2004).O segundo Secretário, Deputado Valter Pe-reira assumiu essa secretaria, priorizando aparte burocrática, planejamento e à orga-nização e método, pouco se preocupoucom a área pedagógica (ROCHA,1992)].

Os princípios do III Plano Estaduaisde Educação (III PEE) tinham por objetivouma escola pública que atendesse a popu-lação da zona rural, aos assentamentosagrários e às periferias das cidades. Umaescola pública que se preocupasse com osfilhos da classe trabalhadora, por isso aformulação de uma política educacionalcomprometida com o processo de transfor-mação da realidade, de forma crítica e cole-tiva e, a urgência de uma efetiva democrati-zação da escola pública em termos de quan-tidade e qualidade (III PEE, 1988/1991).

Sob esse ponto de vista, a escola dodiscurso seria orientada por três princípios:universalização do ensino, valorização doeducador e democratização administrativa,que seriam sustentadas pelas diretrizes: “ga-rantia de acesso e permanência da criançana escola, valorização do pessoal adminis-trativo, valorização do educando e dos pro-fessores, autonomia da escola e moderni-zação administrativa” (III PEE, 1988/1991,p. 28-36).

Apesar de realçar a relevância daparticipação da comunidade, como formade oposição às práticas burocráticas etecnicistas, o segundo Secretário, Deputa-do Valter Pereira, priorizou a parte burocrá-tica deixando em segundo plano a áreapedagógica, demonstrando a fragilidade de

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um III PEE que se encerrava em seu âmbi-to setorial, isolado de um plano global, sembuscar a articulação com as demais esfe-ras sociais, econômicas e governamentaisque determinam a prática concreta realiza-da no seio da escola pública, perdendo devista a existência de uma realidade social,política e econômica que influenciava e, àsvezes inviabilizava o alcance dos objetivosde uma comunidade educativa. Entre o ditoe o feito nota-se que naquele momentohistórico as práticas autoritárias aindapermeavam as relações com a comunida-de escolar constituem-se em sérios obstá-culos às garantias constitucionais dos indi-víduos à viabilização de uma escola públi-ca democrática (ROCHA, 1992).

Vale dizer, a Secretaria de Educaçãoestava ciente de que a política educacionalnão dispunha de mecanismos para efeti-var suas ações, pois a política educacionaldependia de relações de poder no âmbitodo Estado, logo, as decisões sobre o querealizar dependiam das relações com ou-tros poderes e seus respectivos interesses(IIIPEE, 1988/1991).

Assim, o governo não conseguiu ra-cionalizar a administração por meio de umplanejamento participativo e de açõesdescentralizadoras para, com isso, fazer umagestão moderna, racional e democrática.[Por conta disso, nesta gestão não aconte-ceram processos de parceria através deconvênios entre Estado e municípios, inter-rompendo o tímido movimento munici-palizador que até então vinha ocorrendo].

Marcelo Miranda Soares deixa ogoverno em dezembro de 1991, envolvidoem um incidente que foi notícia nacional,

quando foi afastado da “governadoria portrabalhadores da Polícia Civil, da Saúde edo Magistério, que, demonstrando o nívelde organização, ocuparam a governadoriapor trinta dias como afronta ao poder eprotesto por cinco meses de salários atra-sados” (FERNANDES, 1996, p. 88). Diantede tais circunstâncias, Pedro Pedrossian foieleito no primeiro turno, com 68% dos vo-tos, assumindo o governo do Estado pelaterceira vez com um novo discurso: moder-nização e reciclagem (ROCHA,1992). [Pri-meiro mandato aconteceu em 1965, quan-do o Estado ainda era uno; o segundo em1980, após a exoneração de MarceloMiranda e o terceiro em 1991].

Nessa conjuntura de incertezas, e naausência de políticas federais de salvaguar-da, Mato Grosso do Sul entrava na décadade 1990, sem dinheiro em caixa, ainda sobo impacto dos mal-sucedidos ajustesmacroeconômicos, situação que exigia ur-gentes medidas, para que se superasse agrave crise que afetava a administraçãopública estadual. No ano de 1992, o Go-vernador Pedro Pedrossian (1991/1994),tendo a frente da Secretaria de Estado deEducação a Professora Leocádia AglaéPetry Leme (1991/1994) deu início ao Pro-grama de Descentralização e Fortalecimentodo Ensino de 1º Grau (hoje ensino funda-mental), através da Lei nº 1.331, de 11 dedezembro de 1992, que facultou a parceriaentre o Estado e os municípios, possibili-tando a municipalização de 35 escolas emtodo o Estado, e no período de 1993 a1994.

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Considerações FinaisConsiderações FinaisConsiderações FinaisConsiderações FinaisConsiderações Finais

A análise do movimento demunicipalização do ensino, na década de1980, demonstrou através dos documen-tos produzidos pela Secretaria de Estadode Educação e pelos estudos bibliográficos,que essa política desenhou-se em um mo-vimento tímido e não avançou em relaçãoao regime de colaboração de cooperaçãoentre os sistemas [Estados e municípios],pois o Estado e os municípios não entra-ram em sintonia em busca da melhoria daqualidade do ensino.

Verificou-se também, que as concep-ções político-partidárias e sócio-econômicas,somadas às disputas da sociedade políti-ca do Estado provocaram a troca de cincogovernadores no Estado de Mato Grossodo Sul, entre os anos de 1980 a 1990. Arotatividade de governadores gerou arotatividade de secretários de educação,causando vários problemas para o setoreducativo, uma vez que cada secretárioqueria caracterizar a sua gestão. Além dis-so, a troca constante do pessoal do primei-ro escalão ocasionou a descontinuidadeadministrativa prejudicando o processo demunicipalização.

Portanto, o movimento da política demunicipalização do ensino no Estado deMato Grosso do Sul, na década de 1980,não conseguiu concretizar um regime decolaboração entre Estado e municípios vi-sando melhorar as condições do ensino,visto que, a municipalização do ensino sóacontecerá com a transferência de respon-sabilidades e tomadas de decisões atravésda existência de convênio entre Estado eEstado eEstado eEstado eEstado e

MunicípioMunicípioMunicípioMunicípioMunicípio, em regime de colaboração,com a participação de representantes dasociedade civil e com a melhora da quali-dade do ensino.

NotasNotasNotasNotasNotas1 Este artigo é parte da dissertação de mestradointitulada Materialização da Polít ica deMunicipalização do Ensino Fundamental no Estadode Mato Grosso do Sul nos anos de 1993 a 2002,defendida dia 24/09/2004, orientada pela Profª DrªEster Senna, da Universidade Federal de Mato Gros-so do Sul (UFMS).2 “Políticas públicas são aqui entendidas como o‘Estado em ação’; é o Estado implantando um proje-to de governo, através de programas, de ações vol-tadas para os setores específicos da sociedade”(HOFLING, 2001, p. 31).3 Vale lembrar que o uso das interpolações [ ] aolongo do texto é proposital, na tentativa de dar maisênfase aos comentários e tentar estabelecer ummelhor diálogo com o leitor.4 Ernesto Geisel, militar e presidente da Repúblicaentre março de 1974 e março de 1979, nasceu emBento Gonçalves, Rio Grande do Sul, a 3 de agostode 1908.5 Fundada em 4 de abril de 1966 para apoiar ogoverno, quando foi instaurado o sistema bipartidáriopelo do Ato Institucional nº 2, de 27 de outubro de1965, e do Ato Complementar nº 4. A ARENA foiextinta em 29 de novembro de 1979, com o fim dobipartidarismo aprovado pelo Congresso Nacional.6 A ala ortodoxa, assim chamada, por ser fiel aosobjetivos do golpe de 1964, tinha sua expressão eco-nômica assentada na pecuária extensiva, voltadapara o corte. Entre seus representantes destacavam-se José Fragelli, ex-governador de Mato Grosso(1971-74) e os Senadores Rachid Saldanha Derzi eAntônio Mendes Canale. A ala dos independentes,articulada por Pedro Pedrossian, já considerado oprimeiro governador de Mato Grosso do Sul, repre-sentava os interesses de outra fração da burguesiarural, interessada em implementar transformaçõesna agropecuária, implicando racionalidade e usode tecnologias mais avançadas. Oriundo das cama-

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das médias urbanas, Pedrossian representava tam-bém os interesses da nascente burguesia industrial(Rocha, 1992, p. 30).7 O Governador Harry Amorim Costa, termina seudiscurso oficial, dizendo: Enfim, o modelo de orga-nização do Poder Executivo, daí resultante, leve, com-pacto, flexível e aberto, persegue as premissas daracionalização e da eficiência administrativa [...],cumprindo seus encargos na área social e apoiandoe estimulando a iniciativa privada nos setores pro-dutivos da economia, possam as ações do Governoencontrar-se com os anseios e as aspirações maissentidas do povo sul-mato-grossense (CORREIO DOESTADO, 1979, apud ROCHA, 1992, p. 44).8 A Projed foi contratada pelo Governo de Mato Grossodo Sul para planejar, estruturar e operacionalizar oSistema de Desenvolvimento de Recursos Humanos.9 Expressão usada por Rocha (1992, p. 39) que sig-nifica: regime resultante de enfraquecimento dopoder central, e que une estreitamente autoridadee propriedade da terra, estabelecendo entre vassalose suseranos uma relação de dependência.10 O Secretário da SDRH, no governo Harry Amorim

Costa era Romeu Martins.11 O Presidente Figueiredo exonerou Harry AmorimCosta e nomeou Marcelo Miranda Soares, que tomaposse dia 29 de junho de 1979. (ROCHA, p. 37).12 Termo usado em discursos militares, que signifi-ca inimigo.13 Partido Democrático Social (PDS).14 Pedro Pedrossian, Mendes Canale, RachidSaldanha Derzi, João Leite Schimit e José Fragelli.15 As crises econômicas iniciadas entre 1973 e 1975,mantiveram-se ciclicamente durante esses últimos30 anos, devido ao desmoronamento da economiados países ricos, extremamente capitalizados e queacabou resultando na crise do processo de acumu-lação. Dessa maneira, o capital, que antes era in-vestido na produção industrial, migrou para as bol-sas de valores, predominantemente em operaçõesmundiais (VIEIRA, 2000).16 Cf. BIGARELLA, Nadia. Materialização da políticade municipalização do Ensino Fundamental no esta-do de Mato Grosso do Sul nos anos de 1993 a 2002.Dissertação (Mestrado em Educação) – Universida-de Federal de Mato Grosso do Sul (UFMS), 2004.

ReferênciasReferênciasReferênciasReferênciasReferências

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Recebido em 06 de outubro de 2004.Recebido em 06 de outubro de 2004.Recebido em 06 de outubro de 2004.Recebido em 06 de outubro de 2004.Recebido em 06 de outubro de 2004.Aprovado para publicação em 10 de novembro de 2004.Aprovado para publicação em 10 de novembro de 2004.Aprovado para publicação em 10 de novembro de 2004.Aprovado para publicação em 10 de novembro de 2004.Aprovado para publicação em 10 de novembro de 2004.

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Implicações do público não estatal para a gestãoImplicações do público não estatal para a gestãoImplicações do público não estatal para a gestãoImplicações do público não estatal para a gestãoImplicações do público não estatal para a gestãoescolar democrática, pelas vias do programaescolar democrática, pelas vias do programaescolar democrática, pelas vias do programaescolar democrática, pelas vias do programaescolar democrática, pelas vias do programaDinheiro Direto na Escola.Dinheiro Direto na Escola.Dinheiro Direto na Escola.Dinheiro Direto na Escola.Dinheiro Direto na Escola.

Terezinha Fátima Andrade Monteiro dos Santos

Doutora em Educação pela UNIMEP. Professora do Progra-ma de Mestrado em Educação e Graduação em Pedago-gia da UFPA.e-mail: [email protected]

O principal papel do intelectual é o de desconstruir evidências (pelo desvelamento dos mecanis-mos ideológicos que a produzem), implodir a unanimidade (pela exposição das fissuras existen-tes em construções que se pretendem sólidas) e apelar à mudança (que, no fundo, é apelar aoexercício da liberdade humana). Nada disso é fácil.

(Benjamin, 2000)

ResumoResumoResumoResumoResumoO texto trata do resultado de acúmulos teóricos e reflexões sobre o público-não estatal e a gestão democrá-tica, a partir do projeto de pesquisa sobre o Programa Dinheiro Direto na Escola, pela via das unidadesexecutoras (Conselhos Escolares em Belém), criadas para gerenciar tais recursos financeiros e objetivadialogar com aqueles que se interessam pela temática e buscam uma sociedade mais democrática eparticipativa. No texto procurou-se estabelecer nexos entre as políticas focalizadoras implementadas nosúltimos anos e a diminuição do papel do Estado brasileiro, na direção de seu encolhimento, que é umatendência mundial, com o concurso das organizações não governamentais enquanto instituições impor-tantes para a sociedade. Tais organizações são identificadas com o “Terceiro Setor”.

Palavras-chavePalavras-chavePalavras-chavePalavras-chavePalavras-chavePúblico não-estatal; terceiro setor; gestão democrática.

AbstractAbstractAbstractAbstractAbstractThis paper presents the results of accumulated theoretical knowledge and reflections on non-state publicand democratic management, beginning from a research project on the “Money Direct to the SchoolProgram”, through the executive units (School Councils in Belém), created to manage such financialresources and aims at holding talks with those that are interested in the thematic and seek a moredemocratic and participatory society. The text sought to establish connections between politics implementedin recent years and the decrease of the role of the Brazilian State, in the direction of their reduction, whichis a world tendency, with the concourse of non governmental organizations as important institutions forsociety. Such organizations are identified as the “third sector”’.

Key wordsKey wordsKey wordsKey wordsKey wordsNon-State public; third sector; democratic management.

Série-Estudos - Periódico do Mestrado em Educação da UCDB.Série-Estudos - Periódico do Mestrado em Educação da UCDB.Série-Estudos - Periódico do Mestrado em Educação da UCDB.Série-Estudos - Periódico do Mestrado em Educação da UCDB.Série-Estudos - Periódico do Mestrado em Educação da UCDB.Campo Grande-MS, n. 18, p. 97-112, jul./dez. 2004.

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Concordamos com as palavras deBenjamin e acrescentaríamos que além deapelar à mudança, precisamos participardessa mudança ativamente, não só naspráticas sociais como na dinâmica de nos-sas vidas privadas, fazendo uma autocríticade nosso papel como professor universitá-rio, pesquisador, cidadão e partícipe da luta,sobretudo, para impedir que a lei do maisforte e da competitividade nos aprisione enos distancie uns dos outros, na direção datransformação da sociedade brasileira.

Uma das questões que hoje se trans-formou em unanimidade tanto para o go-verno FHC (PDRE, MARE, 1995) como paraos empresários e até para alguns teóricosda educação, como Castro (1995) e da eco-nomia é a importância atribuída ao públi-co não-estatal como saída para a situaçãode crise do Estado e suas instituições, comoa escola pública.

Já virou até senso-comum que assoluções encaminham na direção não maisdo mercado ou do Estado, mas da socie-dade civil organizada, que engloba açõesvariadas, atores diversificados e organiza-ções, identificadas como Terceiro Setor quetêm como ponto em comum não pertence-rem ao mercado ou ao Estado. Este Tercei-ro Setor aparece como novo representantedo interesse público, conforme análises deGandini e Riscal (2002).

O título deste texto sugere uma per-gunta, que permita indicar o nexo existen-te entre o público não estatal e a gestãoescolar democrática: qual a relação entreesses pólos? Para tentar construir uma res-posta, comecemos pela busca em decifrartal relação, a partir da conceituação do

público estatal, recortando-o pela via doPrograma Dinheiro na Escola, como focodo trabalho. Isto nos remete para identifi-car no Estado a chave principal para ras-gar o emaranhado desse embate.

Pautamo-nos pelo conceito de Esta-do ampliado de Gramsci, que envolve asociedade política (aparelhos de domina-ção e coerção para manutenção da ordem)e sociedade civil (aparelhos de ideologia1,privados de hegemonia). Sociedade civil,portanto é compreendida como o conjun-to de aparelhos “privados”, por meio dosquais um bloco de classe luta pelahegemonia (domínio e direção).

Sobre o conceito de Estado amplia-do de Gramsci, Coutinho (1988) faz umadiscussão coerente e bem articulada defen-dendo sua aplicação à realidade brasileira,como base em seis pontos, principalmente:1) Se no Brasil a sociedade permanecesse

subalterna tal conceito se aproxima maisdas sociedades orientais, onde o Estadoé mais forte;

2) se a compreensão enviezar pela consi-deração de que a distinção realizada porGramsci é estática, a conclusão seria deque a formação social brasileira seria nosmoldes “oriental” e, não se poderia utili-zar tal conceito de Estado ampliado.

3) Gramsci não faz a análise estática, por-que, entende que a “ocidentalidade” deuma formação social é para ele o resulta-do de um processo histórico, e daí umasociedade oriental, pode se tornar ociden-tal, passando a ser um Estado ampliado,onde há uma justa relação entre Estadoe sociedade civil;

4) as diferenças existentes entre socieda-

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des ocidentais e orientais, mas tambémpelas diferenças entre as consideradasocidentais, que também passaram porperíodos de fragilidade dos movimentospopulares e outros pela intensa sociali-zação da política;

5) o processo vivido nas sociedades ociden-tais da Europa, pode verificar-se em ou-tros lugares do mundo e

6) se aceita “a idéia de que a ociden-talização é fenômeno potencialmenteuniversal”, no Brasil ora se viveu a orien-talização, ora a ocidentalização, sendoque esta prevaleceu, em 1945, com aqueda da ditadura Vargas, apesar de al-guns retrocessos, houve um predomínio,intensificado no período de 1955-64. Emoutras palavras, há uma relação maisequilibrada entre Estado e sociedade civil.

Nos anos de chumbo (1964-1985) asociedade civil foi solapada e ao mesmo tem-po fortalecida, com a forte intervenção e cen-tralização do Estado, em todos os setoresda vida nacional por meios de aparelhosrepressivos e de uma tecnocracia organizada,arrogante e pragmática. O Estado precisavade um mínimo de consenso, porque não dis-punha de organismos capazes de obter ahegemonia real na sociedade civil, daí a to-lerância dos militares a existência do Parla-mento, onde o Movimento Democrático Bra-sileiro – MDB, representava o celeiro de to-das as forças organizadas descontentes coma situação de exceção vivida pelo Brasil, um“bloco democrático” de oposição, que en-volvia desde políticos conservadores, liberaise até de esquerda, que se uniram em tornoda bandeira das eleições diretas e democra-cia. (COUTINHO 1988)

Segundo Coutinho (op.cit. p.124) oconsenso às vezes conseguido pelos mili-tares foi passivo:

O regime, em suma, era “desmobilizador”.Sua legitimidade ideológica não era dotipo fascita. Tratava-se, antes, de uma es-pécie de “ideologia da antiideologia”, ouseja, de um pragamatismo tecnocráticoque contrapunha a “eficiência” às ideolo-gias em geral, aos conflitos políticos, acu-sados de “dividir a nação” e, portanto, depôr em risco a “segurança” requerida pe-los militares como condição para o de-senvolvimento econômico.

Com a crise do “Milagre Econômico”de 1974 e as eleições parlamentares de1974, 1978 e 1982 a legitimação da dita-dura começou a naufragar, com a grandevitória das forças de oposição, perdendoassim o apoio das classes média e da pró-pria burguesia.

Segundo Francisco de Oliveira (2002)os movimentos sociais atingiam o Estadoem sua maior debilidade que eram as polí-ticas sociais e políticas públicas. Era movi-mento contra o custo de vida, contra a faltade transportes, habitação, dentre outros, tra-vados numa “guerra de guerrilha”, desgas-tando a capacidade do Estado autoritário.

A sociedade civil volta, portanto, àtona se organizando e se ampliando, pormeio de operários, mulheres, estudantes,segmentos da classe média e setores em-presariais, e a maior expressão disso, foi omovimento “Pelas diretas Já”, que chegoua reunir num grande comício em São Pau-lo, em 16 de abril de 1984 , cerca de 1.700milhões de pessoas. Tais eventos se disse-minaram pelo Brasil como todo, de Norte aSul. A Emenda Dante de Oliveira que re-

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estabelecia eleições diretas não foi aprova-da no Congresso Nacional e em 1985 foieleito pelo Colégio Eleitoral o PresidenteTancredo Neves, tendo como Vice-PresidenteJosé Sarney:

Então pelas vias transversais da “revolu-ção passiva”, o Brasil tornou-se uma soci-edade “ocidental”. (COUTINHO, id. p.125)

Logo, o conceito de Estado amplia-do é uma possibilidade importante de aná-lise da realidade brasileira, guardando suasespecificidades.

Na atualidade, as discussões sobreo Estado, de um modo geral giram em tor-no de, pelo menos, duas posições: A pri-meira, uma vertente defendida pelos seg-mentos mais progressistas, onde se inclu-em Francisco de Oliveira, Emir Sader,Gaudêncio Frigotto e alguns movimentosorganizados como o MST, que considera oEstado como essencial porque representaa possibilidade do asseguramento e garan-tia dos direitos de cidadania e por isso hánecessidade de alargamento de suas fron-teiras e se direciona para a necessidade doEstado servir ao bem-comum, via planeja-mento de políticas públicas sinalizadas paraas demandas da sociedade no exercício desua função social pública. (Estado social).

Uma outra vertente que defende adiminuição do tamanho do Estado, repre-sentada por Bresser Pereira (1998), ReisVelloso (1988), prescrições objetivadas noConsenso de Washington, porque a socie-dade civil organizada têm maiores condi-ções de propiciar e estimular o atendimentoàs necessidades sociais, considerando asexpectativas e iniciativas individuais, comuma nova alternativa (Estado Mínimo). A

primeira vertente reserva ao Estado, alémde outras funções, um caráter público efeti-vo, porque nem tudo que é estatal tem sidopúblico no Brasil e vice-versa, porque háoutros espaços públicos construídos na lutapor melhores condições de vida, dentreoutros. Tome-se como exemplo do estatalnão público, as escolas de educação bási-ca mantidas pelo Estado, que não exercemseu papel, ao não oferecer um ensino dequalidade a todos que a ela procurem.

Há, por outro lado, organizações pri-vadas que desenvolvem ações públicascomo o Movimento Rural dos Trabalhado-res Sem Terra -MST, Central Única de Traba-lhadores - CUT e Departamento Intersindicalde Estatísticas e Estudos Sócio-Econômicos– DIEESE por exemplo, e alguns outros mo-vimentos sociais que, na luta, vem contribu-indo para a conquista de alguns direitos dostrabalhadores brasileiros. Nesse momento seincorpora uma outra discussão essencialpara o estabelecimento de nexos entre opúblico não estatal e a gestão escolar, quese refere à sociedade civil (entendida comoo Terceiro Setor) na orientação neoliberal.

Uma outra questão nos inquieta, oque efetivamente é este “público” ? No senti-do dicionarizado pode ser usado comoadjetivo, qualificando algo, aí seu significa-do é de relativo à governança de um país;que serve para o uso de todos, dentre outros.Como substantivo refere-se ao povo emgeral. Verifica-se que em todas as acepçõesse refere a todos, indistintamente. O termo“privado” significa particular, de uso restrito,em contraposição ao público.(Bueno, 1972).

Já as categorias “público e privado”possuem significados diferentes, dependen-

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do da época, expressando concepções demundo distintas. Na Grécia Antiga, o priva-do era relativo à família e o público se refe-ria à política, o ambiente da vida social,onde não existia a liberdade:

...em que a força e a violência eramjustificadas em termos de luta para ven-cer a necessidade. Assim, subjugar escra-vos, reinar sobre eles e a família era algointeiramente aceitável como condiçãopara libertar-se da necessidade e alcan-çar a liberdade. (BRUNO, 2002. p. 20)

O público, na Grécia, entendido comoo comum, é o mundo criado pelos homensem inter-relação, onde só podiam se incor-porar os homem livres, porque só estes eramiguais, por terem condições de comandar,eram constituídos pelos senhores, os gre-gos homens, excluindo as mulheres, osbárbaros - os estrangeiros. Só participavamda polis das cidades-Estado, os cidadãos.

Nas sociedades modernas, porexemplo, o público está relacionado àgovernança de um país, ao poder público,ao Estado, portanto. A categoria “privado”significa particular, que se distingue do pú-blico. Na sociedade capitalista, o público écontraditoriamente privado. Há uma rela-ção de promiscuidade entre tais esferas. Tra-ta-se de organizar o poder privado (de umaclasse) na forma de poder público.(Estado).O Estado brasileiro, historicamente, tem sidoprivatizado, porque representa os interessede uma classe hegemônica. As políticaspúblicas têm surgido a reboque do econô-mico e em geral visam a corrigir distorçõescausadas pelas políticas anti-sociais dedesenvolvimento capitalista.

O padrão de financiamento públicobrasileiro, por meio de políticas de interven-

ção para reprodução do capital e da forçade trabalho têm se expressado, por diferen-tes mecanismos: renúncias de impostos etaxas, os incentivos fiscais, creditícios, alfan-degários, subsídios para ciência e tecno-logia, programas destinadas a necessida-des básicas da população, como educação,saúde, habitação, transporte, seguro desem-prego, dentre outros. Hoje, em menores pro-porções este padrão perdura, com tendên-cia a ser ampliado com o denominadopúblico não-estatal. O empresariado brasi-leiro sempre se valeu do Estado para resol-ver suas crises e aumentar suas lucrativida-des: veja-se o socorro aos usineiros do Nor-deste, aos bancos, dentre outros. Na verda-de, a apropriação dos lucros é privada e asocialização do financiamento é pública,com os recursos da nossa riqueza social,que é pública, num cenário em que tudo étransformado em mercadoria, adquirível nomercado.

Para Oliveira (1981), a conversão doTesouro Público em pressuposto da ativi-dade econômica, com uma profundaimbricação do Estado com as grandescorporações transnacionais que é a carac-terística mais saliente do capitalismo atuale do Estado moderno, confundindo as fron-teiras entre o público e o privado, daí a cri-se do capital significar a crise do Estado.Provavelmente sem a “mão amiga” do Es-tado, o Brasil não teria chegado a ser a 8ªeconomia mundial. Foi durante a ditaduraque o País mais cresceu economicamente.

A sociedade civil transformada ideo-logicamente em Terceiro Setor passou afazer parte das agendas de discussões apartir dos anos noventa, com a reestrutu-

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ração capitalista no Brasil, ingressando nes-te, por meio das prescrições do Consensode Washington2, para publicização, en-quanto transferência de questões públicasde responsabilidade do estado para a es-fera privada. (MONTAÑO, 2002). Observa-se que a sociedade civil é compreendidano terreno das abstrações, e enquanto tal,opõe-se ao Estado, defendendo que elapoderá e deverá, por conta própria, tomariniciativas e desenvolver ações de interessecomum, sem esperar pelo paternalismodesse aparelho de poder, que é o Estado.(BRUNO, op. cit. p. 27).

Em decorrência da situação de carên-cias acentuadas vividas pelos segmentosmenos favorecidos, ao lado da elevação dosníveis de violência, da depredação da nature-za e dos valores humanizantes, como a ética,a responsabilidade, a justiça e a solidarieda-de, esta última hoje entendida muito maiscomo uma disposição altruísta, voluntarista,da boa vontade do indivíduo, de uma orga-nização ou empresa, já virou senso comum anecessidade se buscar as parcerias da em-presa privada, das ONGs para desenvolverações de mitigação ou resolução das ques-tões sociais.. Houve, portanto, um deslocamen-to de uma solidariedade social politizada paraoutra representada pelas Organizações NãoGovernamentais:

Tecnicamente formuladas, com os gover-nos, dispensando a base ampliada da par-ticipação popular. Desse modo, diferentespráticas de responsabilização e compro-misso desenham um conflito potencialque diferencia internamente as múltiplasorganizações que constituem a emergên-cia daquilo que se entende por socieda-de civil no Brasil... (PAOLI, 2002 p. 378).

Os ideólogos da emergência do Ter-ceiro Setor como remédio poderoso parasuperação da crise do Estado utilizam-sede argumentos convincentes para demons-trar que a participação solidária é a únicachance para que todos se unam em bene-fício do bem comum, onde cada um devefazer sua parte, a partir da recontextua-lização de conceitos como participação,controle social, autonomia, descentralização,há muito buscados pelas esquerdas brasi-leiras, capturando assim até alguns intelec-tuais antes altamente críticos, que adiscordância hoje, chega a ser um desafioou algo ultrapassado.

Tais orientações se materializaram emreformas, que no Brasil a partir dos anos94 foram direcionadas pelo Ministro BresserPereira, que defende ardentemente o projetodo governo. Para operacionalizar a denomi-nada publicização, foram definidas central-mente três medidas, como parte das refor-mas, consideradas por ele como indispen-sáveis para seus objetivos: a descentra- a descentra- a descentra- a descentra- a descentra-lização, a organização social e a par-lização, a organização social e a par-lização, a organização social e a par-lização, a organização social e a par-lização, a organização social e a par-ceriaceriaceriaceriaceria. (BRESSER PEREIRA, 1998).

As reformas propostas e quase to-das já implementadas até agora no Brasil,encaminham na direção do encolhimentodo Estado em sua função social, em favorda empresa privada, ou seja, é o Estadomínimo para atender os direitos de cidada-nia e máximo para apoiar e/ou beneficiaro capital:

... a reforma do estado deve ser entendidadentro do contexto da redefinição do pa-pel do Estado, que deixa de ser o respon-sável direto pelo desenvolvimento econô-mico e social pela via da produção de bens

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e serviços, para fortalecer-se na funçãode promotor e regulador desse movimen-to. (NETO ET ALMEIDA, 2000, p. 37)

Para Montaño (op. cit p. 205), o Ter-ceiro Setor envolve muitas instituições e or-ganizações, como ONGs sem fins lucrati-vos, instituições filantrópicas, empresas ci-dadãs e outras. Já havendo no Brasilregistradas 400 mil ONGs, 4 mil fundaçõese 220 mil entidades ditas “sem fins lucrati-vos”. Portanto, não é algo a subestimar, mastentar desvendar seus meandros e trilhas.

Hoje, é certo que a sociedade civilmudou estando mais organizada e em con-dições de desenvolver com eficiência/efi-cácia políticas públicas e tem condições deexercitar o controle público do Estado, em-bora contraditoriamente algumas relacio-nadas aos movimentos de trabalhadores,vêm sendo refreadas, sistematicamente,minando seus espaços públicos de açãopolítica. Nesse particular, precisamosintermediar a discussão enfatizando que hádiferenças significativas entre as própriasorganizações da sociedade civil, cujos per-fis são muitas vezes radicalmente divergen-tes, distanciando-se uma das outras, sen-do bastante heterogêneas política e social-mente. Por exemplo, não se pode compa-rar instituições como o Instituto Brasileirode Análises Sociais e Econômicas (Rio deJaneiro), o DIEESE, as diversas fundaçõesde empresas privadas, os movimentos eco-lógicos, os Movimentos dos Sem-Teto ouSem Terra e a União Democrática Ruralista.O único ponto em comum dentre todas épertencerem à esfera privada, enquantoorganizações não governamentais.

Para tentar costurar a discussão,

buscaremos enveredar pela história recen-te do Brasil para compreendermos as ori-gens dessa nova pauta em que se incluinecessariamente o papel das ONGs comouma alternativa de mitigação da crise es-trutural vivida pelo capitalismo modernohegemônico no mundo, na sua fase dereestruturação produtiva.

Nos anos oitenta, a atmosfera demo-crática que invadiu o Brasil trouxe ao ce-nário de luta a incorporação de novas pau-tas de discussão das forças de oposiçãoao regime autoritário instalado desde 1964,como a questão da importância da socie-dade civil para superação da ordem vigen-te. A concepção de sociedade civil era bas-tante abrangente, englobando tudo quenão era do Estado, considerando desdeforças políticas, movimentos eclesiais debase, passando pelos organizações sindi-cais combativas até instituições de empre-sários mais progressistas que se opunhamao regime autoritário.Todos como atoresessenciais na volta à democracia. Na ver-dade, a sociedade civil significava resistên-cia à ditadura e ainda não se incorporavano conceito de Terceiro Setor, este hoje as-sociado à idéia de “sem fins lucrativos e nãogovernamental” o que, para Fernandes(1994, p. 32):

São palavras articuladoras, mais do queconceitos objetivos. Dizer ‘sociedade civil’supõe uma cultura democrática que aindaestá por ser estabelecida. Pensar o “terceirosetor” significa reunir sob uma mesma clas-se conceitual atividades tão distintas que,no passado, costumavam ser vistas comocontraditórias ou mesmo antagônicas.

Consideramos uma articulação frá-gil e frouxa para dar conta da complexida-

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de da questão do Terceiro Setor, porque en-volve instituições e organizações variadasque diretamente podem não visar lucros,mas no limite, o essencial para algumas éjustamente a expansão de seus consumi-dores, como é o caso, por exemplo, dos pro-gramas de responsabilidade social desen-volvidos por grandes empresas. Além doque contribuem para redução da idéia depúblico a duas categorias apenas, a dosconsumidores e dos empregados de suasempresas.

Para Marx (1982), a expressão soci-edade civil surgiu no século XVIII e é aoum mesmo tempo, fonte e expressão dodomínio da classe burguesa e que depoisa organização que resulta do intercâmbioe relações e que constitui em qualquer épo-ca as bases do Estado foi também desig-nada pela mesma terminologia. Portanto,Gramsci (op. cit.) aponta noutra direção afir-mando que a sociedade civil, contraditoria-mente, nas suas formas de organização,pode participar da construção da hege-monia para as classes subalternas. É nestesentido que estamos tentando desvelar arelação entre o público não estatal e ges-tão escolar democrática, começando porfazer um recorte histórico.

A luta pela democracia no Brasil dosanos de exceção se pautava nas formas clás-sicas de exercício da cidadania política, pormeio de partidos políticos e eleições diretas,como se isso bastasse para se ter uma soci-edade democrática, onde os sujeitos pudes-sem participar do processo de decisão sobreseus destinos, sobretudo aqueles que sem-pre estiveram excluídos da participação e,conseqüentemente pudessem ver atendidas

as demandas por políticas públicas. Alémdisso, as esquerdas entraram despreparadasna luta política dos anos oitenta, sem pos-suir um projeto nacional, em contraposiçãoao processo hegemônico neoliberal, sem sedar conta de que a democracia de mercadonão distribui riquezas e nem garante os di-reitos de cidadania.

Conforme já analisamos anterior-mente, os partidos políticos tinham noMovimento Democrático Brasileiro – MDB,o celeiro de todas as forças de oposição aoregime vigente no Brasil, à época, que en-volvia desde políticos conservadores, libe-rais e intelectuais de esquerda, que se uni-ram em torno da bandeira das eleições di-retas e democracia. (COUTINHO 1984).

Com a ampliação da abertura demo-crática, via eleições de prefeitos e governa-dores supostamente comprometidos como projeto democrático, as contradições eambigüidades dessas forças eclodiram,dada a variedade de interesses, agora maisvisíveis entre atores de diversas matizespolítico-ideológicas. As respostas que a so-ciedade desejava não tinham condições deser dadas. As demandas sociais expressaspelo conjunto dos trabalhadores e da clas-se empresarial se chocaram por represen-tarem interesses opostos, até então nãorevelados no movimento de oposição aoregime ditatorial, de vez que todas as cor-rentes de oposição se uniam em um mes-mo bloco. (COUTINHO, op. cit.).

Os diferentes atores aliados na lutapela democratização brasileira, até meadosdos anos oitenta, com a volta das eleiçõesdiretas, garantia dos direitos civis se distan-ciam e se expressam pelos seus interesses:

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os “empresários progressistas” não vêm ra-zões para qualquer cooperação; o “sindica-lismo autêntico” passa a se ocupar de suasquestões corporativas diante à precarizaçãocrescente do trabalho (COSTA, 2002) e aodesemprego estrutural.

Até mesmo dentro da própria socie-dade civil mais ampla, seus diversos seg-mentos demonstram interesses diferencia-dos nem sempre compatíveis ou quasesempre incompatíveis entre si, como o movi-mento ecológico, o movimento dos negros,das mulheres, dos trabalhadores rurais e dosruralistas. Cada vez mais se visibilizando asdisputas de projetos que se contrapõem,ainda que com discursos similares, porquenão se deve perder de vista que se vivenuma sociedade capitalista cindida em clas-ses sociais e, portanto, a sociedade civil en-globa classes diferenciadas. Mesmo dentrode alguns movimentos, como o das mu-lheres, o ecológico há posições antagônicas,a ligação se dá apenas pela questão dogênero, de etnia, da preocupação com anatureza. É um terreno pantanoso e ambí-guo, para demarcar as ações de interven-ção em direção da substituição do espaçopúblico, representado pelo Estado.

COSTA (2002) em seus estudos so-bre o público não estatal destaca algunspontos importantes sobre as organizaçõesda sociedade civil, como esfera diferente doEstado e do mercado, cujo campo de açãoé multifacetado e complexo, com ênfase emsuas diferenças e formas múltiplas com queestabelecem relações com outros agentessociais, assim resumidos:• a crítica neoliberal contra o Estado inter-

vencionista;

• a criação de inúmeras ONGs, muitas ve-zes até em substituição do Estado, dis-putando poder para ser aquinhoado comrecursos públicos, gerando a competiçãocom outras instituições, obrigando estasúltimas a barganharem parcerias muitasvezes nocivas à sociedade civil;

• as parcerias de responsabilidade socialdas empresas, que servem, de modo ge-ral, como instrumento para a elevaçãodas vendas, com o aumento dos consu-midores;

• a atuação do governo federal na regula-mentação do Terceiro Setor, criando crité-rios e condições específicas para que ins-tituições possam ser consideradas de in-teresse público, com vistas a aproveitaros recursos mobilizatórios da sociedadecivil, transferindo a responsabilidade es-tatal para as instituições privadas, comseus problemas criados pela carências fi-nanceiras e co-responsabilizando-as pe-los insucessos;

• a internacionalização de muitas ONGsque passam a ser orientadas de fora paradentro do País.

Como se pode observar, a questãodo Terceiro Setor está envolvida num ema-ranhado de cenários, atores sociais e movi-mentos, que nos remetem ao nosso pontode partida destas reflexões, que é a relaçãoentre o público não estatal e a gestão de-mocrática da escola, para tentar visibilizaros nexos existentes, que aparentementeinexistem.

Veja-se, portanto, a partir de 1988, porconta das prescrições Constitucionais e ori-entações de descentralização, autonomiae parcerias, algumas medidas de democrati-

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zação da gestão foram incorporadas nasescolas públicas, dentre as quais se desta-cam: as eleições diretas para diretor esco-lar, a criação de colegiados escolares emcada escola, a indicação de formulaçãocoletiva do projeto político-pedagógico;maior autonomia com a liberação de re-cursos financeiros diretamente para as uni-dades educacionais, dentre outras.

Há diversos problemas em tais ori-entações às Escolas: Primeiro, a obrigato-riedade de implementação de tais medidasacaba por invalidar suas finalidades dedemocratização da gestão, porque não seimpõe democracia, constrói-se, conquista-se. Nesse particular, nossas pesquisas reve-lam que efetivamente tais medidas passama ser meras formalidades legais, mas, aomesmo tempo parecem estar servindo paraa consecução de um novo modelo de es-cola, na direção de se transformar numainstituição empreendedora e competitiva, talqual as empresas de sucesso.

O estado brasileiro juntamente coma iniciativa privada e instituições comoUndime, Consed e Unesco têm impulsio-nado citada direção, com a criação de dife-rentes mecanismos, como, por exemplo oPrêmio nacional de referência em gestãoescolar, cujo objetivo precípuo oficial é me-lhorar a gestão e qualidade do ensino, paraque as escolas incorporem uma cultura daauto-avaliação e práticas bem-sucedidas degestão e especialmente uma culturagerencial. No Sistema Estadual de Ensino,por intermédio da Secretaria Executiva deEducação – SEDUC hoje, no Pará muitovem se falando e se defendendo e atéimplementando ações nas escolas de “em-

preendedorismo” (criar caminhos para osucesso)3, como saída para a escassez depostos de trabalho e melhoria das condi-ções de vida, sobretudo das populaçõesmenos favorecidas, tradicionais usuáriosdas escolas públicas. Já foram realizadaspalestras e reuniões para os gestores esco-lares estaduais estimularem em suas uni-dades, tais princípios.

Os Conselhos Escolares ou qualqueroutra Unidade Executora4 com personali-dade jurídica, como uma espécie de orga-nização no padrão de ONGs devem se res-ponsabilizar pela decisão e execução dasações escolares e, sobretudo pela captaçãode recursos que lhes assegure a manuten-ção das unidades escolares e na medidaem que conseguem ter sucesso em tal meta,são colocados pelo Estado, como vitrinespara as outras unidades, no estímulo à com-petição, por meio de diferentes estratégias,como a criação de ranking, prêmios de ges-tão, etc, obrigando as escolas a funciona-rem como organizações sociais e buscaremqualquer tipo de parcerias, que muitas vezeschegam a ferir suas autonomias, em nomeda melhoria de suas condições materiais.

Os argumentos embasadores da cri-ação desses colegiados são, dentre outros,pela emergência de tornar a gestão maiságil, flexível e eficiente, bem como paraaumentar a participação dos cidadãos epropiciar o controle social do público. (BRA-SIL/FNDE, 2003).

As Unidades Executoras, no caso doPará, os Conselhos Escolares além de se-rem responsáveis pela gestão administrati-va, financeira e pedagógica dos recursosadvindos dos cofres públicos e da comuni-

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dade escolar, de entidades privadas e decampanhas escolares poderão buscar acaptação de recursos para suas unidades,em complementaridade e/ou substituiçãodo Estado.(BRASIL, 1997).

Na verdade, tais Conselhos Escolarespoderão servir de mantenedores da unida-de escolar, no melhor exemplo de ONGs,do Terceiro Setor. Isto poderá gerar o serviçopúblico não estatal e o Estado poderá terespaços objetivos para se desobrigar desua responsabilidade com a educação. OPrograma Dinheiro Direto na Escola é umexemplo emblemático dessa ideologia de

abertura e fomento às ações em parcerias,criado em 1995, como programa de assis-tência financeira do Fundo Nacional deDesenvolvimento da Educação – FNDE aosSistemas Públicos de Ensino, para o atendi-mento à escolaridade obrigatória pelaConstituição (o fundamental). É destinadoàs escolas públicas, além das escolas deeducação especial, mantidas por Organiza-ções Não-Governamentais, desde que regis-tradas no Conselho Nacional de Assistên-cia Social – CNAS. Varia de R$600,00 atéR$-19.000,00 divididos entre despesas decusteio e capital, conforme quadro abaixo:

Quadro 1 – Recursos do PDDE conforme número de alunos Matriculados - Região Norte,Nordeste e Centro-Oeste.

Seus recursos provêm do salário edu-cação, como principal fonte e são distribuí-dos nas unidades escolares anualmente, emúnica parcela, segundo o número de alu-nos matriculados. Em pesquisa realizada5,os dados revelaram que os sujeitos escola-res consideram o financiamento escolar

muito importante para a manutenção, de-senvolvimento e melhoria das condições deinstalações e de trabalho das escolas, emseu cotidiano.

O PDDE é um exemplo, como já nosreportamos anteriormente, de descen-tralização estímulo às parcerias, sobretudo

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por dois motivos: primeiro, porque os recur-sos repassados são reduzidos, não cobrin-do as necessidades da escola e, segundo,porque a autonomia concedida aoscolegiados impulsiona-os para a buscapela captação de novos recursos capazesde viabilizar a manutenção das unidadesescolares para se autofinanciarem, numprocesso de descentralização da opera-cionalização das ações da Escola, numanova forma de administração pública, cal-cada no modelo gerencial da empresa pri-vada, que tem como princípios a eficiência,a eficácia e a produtividade. Tal direcio-namento poderá trazer sérias implicaçõespara o processo de democratização da ges-tão escolar

Por outro lado, contraditoriamente, seesses colegiados escolares funcionarem efe-tivamente como espaço de decisões coleti-vas na Escola podem enfrentar tais rela-ções com organização capaz de pressionaro Estado para o atendimento de suas de-mandas e garantia de um ensino públicode qualidade para todos, além de desem-penharem um papel educativo político damais alta relevância, na luta pelas transfor-mações sociais. Pode ser um importanteespaço de controle social.

Tais medidas implantadas (Conse-lhos Escolares com personalidade jurídica,as parcerias) podem representar uma for-ma de retirada das condições para que ossujeitos escolares possam decidir efetiva-mente seus destinos, num processo de cons-trução democrática participativa, porquequem financia determina suas condicio-nalidades e regras, que deverão ser obede-cidas, sob pena de sofrerem sanções, por

descumprimentos dos contratos, similar àrelação entre entes comerciais. Isto, entre-tanto, não significa ser contrário às parceri-as, a discordância se dá quando essas ser-vem para substituir a presença do Estadoe assim dificultarem a gestão escolar de-mocrática, porque quem financia definesuas prioridades, o que é diferente quandoos recursos são públicos, advindos de nos-sa riqueza social, ainda que também defi-nam suas orientações. Mas, o ponto princi-pal é a despolitização dos espaços de par-ticipação existentes na escola.

A nosso ver, o mais preocupante datransformação dos direitos em serviços, deinteresse comum, que podem ser realiza-dos pelos parceiros privados é o empobre-cimento político, porque a benfeitores só seagradece pelas regras civilizadas de bemviver na sociedade, sem necessidade deembate, da luta, podendo gerar uma figu-ra passiva e não um cidadão participativo,como sinaliza Paoli (op. cit. p. 386):

... as ações que se movem longe do am-plo debate político que costuma aparecer,em qualquer teoria política moderna,como a fonte de criatividades antagônicase dialogantes que formam o centro deuma decisão pública e democrática sobrea alocação dos recursos materiais e sim-bólicos de uma sociedade.

Sai-se, portanto, do campo da lutapolítica pela cidadania efetiva e justiça so-cial para um ativismo civil voltado para asolidariedade social, com tempo e espaçomarcado, despolitizada, bem diferente daluta por direitos sociais, porque estes seexigem e aqueles se agradece, com grati-dão. A solidariedade passa a ser sinônimode cidadania. Está havendo no Brasil, uma

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substituição da ações do Estado pela atu-ação das ONGs, sobretudo nas áreas desaúde pública e da educação, que devemser responsabilidade do Estado, prescritasem Lei. A sociedade civil organizada, emsuas diferentes frentes, está atuando nocampo da solidariedade social.

Para Sader (2000, p.83), “reafirmar aimportância do Estado não se confundecom uma nostalgia do Estado tradicional...”,porque efetivamente há nuances diferen-tes hoje, mas as condições perversas, vio-lentas e contraditórias das instituições ca-pitalistas permanecem. O capitalismo viveem processo de inovação, exatamente parase manter, daí defender-se a importânciado Estado para minimizar seus impactos.

Aliás, considera-se a sociedadecivil,por meio de suas formas de organiza-ção, com possibilidades de participação nocontrole do Estado e na construção de con-dições para as transformações sociais, en-quanto espaço de lutas.

As associações da sociedade civil consti-tuem apenas uma força propulsora detransformações no arcabouço institucionaldemocrático, o qual deve sofrer perma-nentemente aperfeiçoamentos e adapta-ções, se se pretende atenuar as tensõesinevitáveis entre lei e a ordem, as institui-ções democráticas e reivindicações soci-ais em mutação. (MONTAÑO, op. cit.)

Para Coutinho, citando Gramsci(2002), o movimento social é espaço de al-ternativas como uma luta de tendências, cujofim não se encontra definido por nenhumdeterminismo econômico, mas resulta da lutaentre vontades coletivas e organizadas.

Portanto, as organizações não gover-namentais são instituições importantes para

a sociedade e para as mudanças requeridaspelo conjunto dos trabalhadores, mas nãosão as identificadas com as relações demercado, como as fundações empresariaisou outras similares, com seus programasde responsabilidade social, focalizados noaumento de consumidores, com suas be-las campanhas solidárias veiculadas namídia hegemônica, ao mesmo tempo quesonegam impostos, pagam salários indig-nos e exploram seus trabalhadores.

Refere-se a um outro tipo de organi-zações não governamentais ou outra for-ma de organização da esquerda social,como se refere Stédile (líder do MST), ementrevista recente, concedida à Revista Crí-tica Social, onde as identifica como perten-centes a setores pastorais da Igreja, a mo-vimentos populares, a agrupamentos polí-ticos até aos intelectuais, dentre outros,desde que participem do processo de lutapara as mudanças da sociedade vigente,mantendo assim seu caráter público, emdireção a um projeto comum. Tais organi-zações podem atuar no reforço a políticaspúblicas na área social, com sua capacida-de de auto-organização com a criação deespaços públicos próprios onde desenvol-vem suas ações públicas.

Esse movimento de luta encampadopelo denominado “Terceiro Setor”, numaoutra perspectiva e circunstâncias, poderácontribuir para o controle social do Estado,o que:

...irá requerer igualmente o conscientecultivar – não em indivíduos isolados, masem toda a comunidade de produtores,qualquer que seja sua ocupação – deuma incomprometível consciência crítica,

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associada a um intenso compromisso comos valores de uma humanidadesocialista...(MÉSZÁROS, 1987 p. 72).

Precisamos continuar na luta,pelo fortalecimento de espaços públicos,nos quais os Conselhos Escolares poderãoser incluídos como um locus importante,para estimular o controle democrático daescola, com vistas nas transformaçõesrequeridas por amplos segmentos da soci-edade, para que possamos re-construir opúblico em novas bases democráticas:

Ao se tornar “obra de todos e de cada um”,o público deixa de ser confundido simples-mente com os aparelhos do Estado e daburocracia. Na óptica da democracia popu-lar, ser público é diferente de agir “em pú-blico”, de entrar na esfera pública, não selimita a ser interlocutor de uma “razão co-municativa” lingüisticamente correta. Alémdas demonstrações verbais e administrati-vas, o público popular é o conjunto daspráticas sociais que criam uma comunida-de ético-política onde se superam concre-tamente as injustiças, a exploração, a ex-clusão e se reparte o trabalho, a produção,a distribuição de bens do planeta, o acessoigualitário ao conhecimento mais avança-do. (SEMERARO, 2002, p. 222)

NotasNotasNotasNotasNotas1 Ideologia para Gramsci é entendida como “o signi-ficado mais alto de uma concepção de mundo, quese manifesta implicitamente na arte, no direito, naatividade econômica, em todas as manifestações devida individuais e coletivas” (GRAMSCI, 1981, p. 16).2 Expressa-se por intermédio de um conjunto de prin-cípios de desenvolvimento econômico, enquanto re-comendações aos países. São 10 seus princípios depolítica econômica, sintetizados em orientações polí-ticas: reformas macroeconômicas incluindo a fiscal;racionalização e controle dos gastos públicos; libera-ção financeira; liberação de importações, redução detarifas alfandegárias; incentivo a indústrias competi-tivas; estímulo à iniciativa privada, por meio dasprivatizações e investimentos diretos; desregulamentação e garantias de direito de propriedade.3 Uma associação, sem fins lucrativos (também cha-mada de Associação de Pais e Mestres), Caixa Esco-lar, Conselho Escolar, Círculo de Pais e Mestres,Cooperativa Escolar, etc) composta por pessoas dacomunidade, interessadas em promover o bomfuncionamento da escola pública e melhorar a qua-lidade do ensino, com participação ativa e sistem[Ática na sua gestão. (BRASIL, 2002, p.8).4 ... mesmo não existindo emprego para todo mun-do, existem, de fato, diversas oportunidades no mer-cado, mas que só podem ser percebidas se a pes-soa tiver um olhar empreendedor, habilidade pararealizar marketing pessoal, vender seu próprio ne-gócio e saber cultivar uma rede de relacionamen-tos”. (BRAGA, RYON, 2004, p.7).5 Trata-se de pesquisa nacional sobre o ProgramaDinheiro Direto na Escola – PDDE, parcialmente fi-nanciada pelo CNPq, cuja coordenação geral é daProf. Dra. Vera Peroni da Universidade Federal doRio Grande do Sul.

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Programa Dinheiro Direto na Escola (PDDE) noPrograma Dinheiro Direto na Escola (PDDE) noPrograma Dinheiro Direto na Escola (PDDE) noPrograma Dinheiro Direto na Escola (PDDE) noPrograma Dinheiro Direto na Escola (PDDE) nocontexto de redefinição do papel do Estadocontexto de redefinição do papel do Estadocontexto de redefinição do papel do Estadocontexto de redefinição do papel do Estadocontexto de redefinição do papel do Estado

Maria Ângela Bariani de Arruda Fachini*Regina Tereza Cestari de Oliveira**

* Mestre em Educação pela UFMS. Professora e TécnicaPedagógica da Secretaria de Estado de Educação de MatoGrosso do Sul.e-mail: [email protected]

** Doutora em Educação pela UNICAMP. Professora doPrograma de Pós-Graduação-Mestrado em Educação daUCDB.e-mail: [email protected]

ResumoResumoResumoResumoResumoO objetivo deste artigo é discutir os fundamentos do Programa Dinheiro Direto na Escola (PDDE), comoexpressão da política educacional brasileira empreendida nos anos 1990, no contexto de redefinição dopapel do Estado, para, em seguida, descrever o processo de implantação deste Programa nas redes muni-cipal e estadual de ensino de Campo Grande, capital do estado de Mato Grosso do Sul, no período de 1995a 2002.

Palavras-chavePalavras-chavePalavras-chavePalavras-chavePalavras-chaveReforma do Estado; Política Educacional; Programa Dinheiro Direto na Escola.

AbstractAbstractAbstractAbstractAbstractThe aim of this article is to discuss the fundamentals of the “Money Direct to the School Program” as anexpression of Brazilian educational politics undertaken in the decade of the 90’s, within the context of theredefinition of the role of the State, in order to follow this up with the description of the implantationprocess of this Program in the municipal and state teaching networks in Campo Grande, state capital ofSouth Mato Grosso, in the period between 1995 and 2002.

Key wordsKey wordsKey wordsKey wordsKey wordsState reform; educational politics; Money Direct to the School Program.

Série-Estudos - Periódico do Mestrado em Educação da UCDB.Série-Estudos - Periódico do Mestrado em Educação da UCDB.Série-Estudos - Periódico do Mestrado em Educação da UCDB.Série-Estudos - Periódico do Mestrado em Educação da UCDB.Série-Estudos - Periódico do Mestrado em Educação da UCDB.Campo Grande-MS, n. 18, p. 113-125, jul./dez. 2004.

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114 M.A.B.A. FACHINI e R.T.C. de OLIVEIRA. Programa Dinheiro Direto da Escola (PDDE)...

Programa Dinheiro Direto na EscolaPrograma Dinheiro Direto na EscolaPrograma Dinheiro Direto na EscolaPrograma Dinheiro Direto na EscolaPrograma Dinheiro Direto na Escola(PDDE) no contexto de redefinição do(PDDE) no contexto de redefinição do(PDDE) no contexto de redefinição do(PDDE) no contexto de redefinição do(PDDE) no contexto de redefinição dopapel do Estadopapel do Estadopapel do Estadopapel do Estadopapel do Estado

O ponto de partida para o desenvol-vimento da temática deste artigo é o en-tendimento de que política educacional, “dizrespeito às medidas que o Estado, no casoo governo brasileiro, toma relativamenteaos rumos que se deve imprimir à educa-ção no país. No âmbito do organogramagovernamental, essas medidas se situamna chamada ‘área social’, configurando,pois, uma modalidade da ‘política social”(SAVIANI, 1998, p. 1). De modo específico,essas medidas materializam-se em decre-tos, leis, resoluções, planos, projetos, progra-mas, entre outros.

As políticas educacionais brasileirasdos anos 1990 para melhor compreensãodevem ser vistas no contexto global docapitalismo, da crise econômica e políticados anos 1970-1980, que se expressa emuma série de mediações até a nova orga-nização da ordem mundial, claramenteperceptível a partir desses anos marcadospor intenso processo de globalização daeconomia, da cultura e das formas de vida.

Como nos diz Ianni (1999, p. 13):Está em curso o novo surto deuniversalização do capitalismo, como modode produção e processo civilizatório. O de-senvolvimento do modo capitalista de pro-dução, em forma extensiva e intensiva,adquire outro impulso, com base em no-vas tecnologias, criação de novos produtos,recriação da divisão internacional do tra-balho e mundialização dos mercados. Asforças produtivas básicas, compreendendoo capital, a tecnologia, a força de trabalho ea divisão transnacioanal do trabalho, ultra-passam fronteiras geográficas, históricas e

culturais, multiplicando-se assim as suasformas de articulação e contradição.

O Plano Diretor da Reforma doO Plano Diretor da Reforma doO Plano Diretor da Reforma doO Plano Diretor da Reforma doO Plano Diretor da Reforma doEstadoEstadoEstadoEstadoEstado

Nesse contexto, o governo do presi-dente Fernando Henrique Cardoso apresen-ta, em 1995, o documento Plano Diretor daReforma do Aparelho do Estado (PDRAE)1

brasileiro elaborado pelo extinto Ministérioda Administração e da Reforma do Estado(MARE), em que afirma:

O grande desafio histórico que o País sedispõe a enfrentar é o de articular umnovo modelo de desenvolvimento quepossa trazer para o conjunto da socieda-de brasileira a perspectiva de um futuromelhor. Um dos aspectos centrais desseesforço é o fortalecimento do Estado paraque sejam eficazes sua ação reguladora,no quadro de uma economia de merca-do, bem como os serviços básicos quepresta e as políticas de cunho social queprecisa implementar (BRASIL, 1995a, p. 5).

E continua:É preciso agora, dar um salto adiante nosentido de uma administração que cha-maria de ‘gerencial’, baseada em concei-tos atuais de administração e eficiência,voltada para o controle dos resultados edescentralizada para poder chegar ao ci-dadão, que, numa sociedade democráti-ca, é quem dá legitimidade às institui-ções e que, portanto, se torna ‘cliente pri-vilegiado’ dos serviços prestados pelo Es-tado (BRASIL, 1995a, p.6).

Conforme explicitado na proposta daReforma do Estado, utilizando as palavrasde Peroni (2003, p. 60),

o cidadão é adjetivado, é o cidadão-clien-te, o que, portanto, de acordo com as leisde mercado, não inclui todos os cidadãos,

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pois os clientes dos serviços do Estadoserão apenas os contemplados pelo nú-cleo estratégico e por atividades exclusi-vas. As políticas sociais não serão con-templadas, pois são considerados peloMare, serviços não-exclusivos do Estadoe, assim sendo, de propriedade públicanão-estatal ou privada (...).

A necessidade da Reforma do Esta-do brasileiro é justificada, no documento,como uma saída para a crise de ordem fis-cal devendo ser entendida “dentro do con-texto da redefinição do papel do Estado,que deixa de ser o responsável direto pelodesenvolvimento econômico e social, pelavia da produção de bens e serviços, parafortalecer-se na função de promotor e re-gulador desse desenvolvimento” (BRASIL,1995a, p. 11).

No entanto, é preciso assinalar que“(...) a crise não é apenas econômica, mastambém política e social, sendo, portanto,indiscutível a centralidade do problema doEstado e da luta de classes. Estamos emmeio a uma crise estrutural que não abarcaapenas um aspecto” (PERONI, 2003, p. 65).

O Plano deixa claro que reformar oEstado significa “transferir para o setor pri-vado as atividades que podem ser contro-ladas pelo mercado. Daí a generalizaçãodos processos de privatização de empre-sas estatais”. Salienta, ainda, um outro pro-cesso: “a descentralização da execução deserviços que não envolvem o exercício dopoder do Estado, mas devem ser subsidia-dos pelo Estado, como é o caso dos servi-ços de educação, saúde, cultura e pesquisacientífica”, denominando esse processo de“publicização” (BRASIL, 1995a, p. 11-12).

Nos termos de Bresser Pereira (1998,

p. 61) “uma outra forma de conceituar areforma do Estado em curso, é entendê-lacomo um processo de criação ou de trans-formação de instituições de forma a aumen-tar a governança e a governabilidade”, des-tacando três elementos: a privatizaçãoprivatizaçãoprivatizaçãoprivatizaçãoprivatizaçãocomo um processo de transformar umaempresa estatal em privada; a terceiriza-terceiriza-terceiriza-terceiriza-terceiriza-çãoçãoçãoçãoção um processo de transferir para o setorprivado serviços auxiliares e a publici-publici-publici-publici-publici-zaçãozaçãozaçãozaçãozação, de transformar uma organizaçãoestatal em uma organização de direito pri-vado, mas pública não-estatal.

E acrescenta:O resultado dessa reforma será um Esta-do mais eficiente, que responda a quemde fato deve responder: o cidadão. Logo,será um Estado que estará agindo emparceria com a sociedade e de acordo comos seus anseios. Será um Estado menosvoltado para a proteção e mais para a pro-moção da capacidade de competição. Seráum Estado que não utilizará burocratasestatais para executar os serviços sociaise científicos, mas contratará competitiva-mente organizações públicas não-estatais(BRESSER PEREIRA, 1998, p. 89).

O referido Plano explicita, claramen-te, a existência de um campo público não-estatal, em que o Estado abandona o papelde “executor” ou prestador de serviços soci-ais, mantendo-se, entretanto, no papel de“regulador” e provedor. “Como promotordesses serviços o Estado continuará asubsidiá-los, buscando, ao mesmo tempo,o controle social direto e a participação dasociedade” (BRASIL, 1995a, p. 12).

É preciso aqui esclarecer a própriacompreensão do que seja a “esfera dopúblico”. Recorre-se, inicialmente, ao Novo

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Dicionário Aurélio (1986) e verifica-se queo adjetivo públicopúblicopúblicopúblicopúblico expressa: “do ou relati-vo, ou procedente ou destinado ao povo, àcoletividade; que serve para uso de todos;comum; relativo à governança de um país;manifesto; notório”. Enquanto o adjetivoprivadoprivadoprivadoprivadoprivado designa: “que não é público; par-ticular; favorito; confidente”.

Diante desses significados, o termopúblico,público,público,público,público, que se origina do latim publicu,refere-se ao que é popular, aos interessescoletivos e o termo privadprivadprivadprivadprivado, por sua vez,do latim privatu, assume o sentido de ne-gação em relação ao primeiro, e, assim, seopõe ao público.

As categorias públicopúblicopúblicopúblicopúblico e privadoprivadoprivadoprivadoprivado deorigem grega, porém que nos foram trans-mitidas em sua versão romana (HABERMAS,1984), vão se alterando ao longo dos dife-rentes períodos históricos que expressamconcepções de mundo distintas. Com aconstituição da sociedade moderna, a ca-tegoria histórica públicopúblicopúblicopúblicopúblico assume um ou-tro significado, ou seja, relaciona-se ao po-der público, que é o Estado.

Inicialmente, ao longo de toda a IdadeMédia, foram transmitidas as categoriasde público e de privado nas definições doDireito Romano: a esfera publica como‘res pública’. É verdade que elas só pas-sam a ter novamente uma efetiva aplica-ção processual jurídica com o surgimentodo Estado Moderno e com aquela esferada sociedade civil separada dele(HABERMAS, 1984, p. 14-15).

Cabe esclarecer, também, qual o sen-tido em que se toma aqui o termo Estado.Trata-se do Estado enquanto instituiçãoformada na modernidade para gerir o modode produção capitalista que nasce da deca-

dência do modo de produção feudal, ou seja:O Estado Moderno, ou o Estado nacionalconstitui-se com as tarefas de definir,ampliar e consolidar sua base territorial,o país; de instituir e fixar no país a nação,sua base humana, considerando-lhe uni-dade; de estabelecer, como cimentos des-sa unidade, a língua, a cultura e a educa-ção, tornando-as orgânicas em relação aotodo nacional; e de fornecer a legitimidadeinstitucional da sociedade, considerada emseus aspectos políticos, econômicos e pro-priamente sociais, mediante o ordena-mento jurídico” (CASTANHO, 2001, p. 22-23).

No sentido moderno, o Estado cons-titui-se na organização da sociedade paraa produção capitalista, abarcando em umadimensão ampla, o conjunto dos organis-mos públicos e privados de dominaçãoburguesa. Esse entendimento correspondeà concepção ampliada de Estado desen-volvida por Gramsci (1984) segundo a qual“Estado = sociedade política + sociedadecivil, isto é, hegemonia revestida de coer-ção”. Assim, a noção geral de Estado abran-ge a sociedade política, correspondendobasicamente ao núcleo governamental queexerce o domínio legal através dos meca-nismos de coerção sobre toda a sociedade,bem como a sociedade civil compreenden-do os aparelhos privados de hegemonia.

Pelas considerações acima fica evi-dente que a sociedade política é constituídapelo conjunto dos organismos públicosmantidos pelo Estado (sociedade política).Segundo essa concepção, o governo não seconfunde com o Estado, na medida em quenão constitui o Estado no todo. Enquanto asociedade civil abarca o conjunto dos apa-relhos privados de hegemonia tanto da clas-se dominante como da classe trabalhadora.

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Mas, o problema de fundo é então:o que existe de novo em torno do papel doEstado brasileiro e do conceito de público,no atual contexto histórico?

Na sociedade contemporânea, deli-mitar os conceitos de “esfera pública” e de“esfera privada”, requer um certo cuidado,pois como nos lembra Saviani (1985, p. 15),na sociedade capitalista, fundada na pro-priedade privada dos meios de produção,o público é sempre ainda que de modocontraditório, privado. “Trata-se, com efeito,de apresentar os interesses privados (daclasse dominante) como expressão ‘genuí-na’ do interesse público (do conjunto dasociedade). Em outras palavras, trata-se deorganizar o poder privado (de uma classe)na forma de poder público (o Estado)”.

Na verdade, o Plano Diretor da Re-forma do Estado (1995) apresenta mudan-ças conceituais nas concepções de públicoe estatal, como analisam Gandini e Riscal(2002, p. 48-49) mostrando que “antes anoção de coisa pública era identificada como interesse estatal, o que permitia ao Esta-do exercer seu controle ‘legal’ inclusive so-bre setores da esfera privada”. Agora, comesse Plano “o que é denominado exclusi-vamente público é identificado como orga-nização burocrática, o Estado que se apre-senta prioritariamente como arrecadador econtrolador de impostos”

Essas mudanças conceituais podemser evidenciadas, ainda, na afirmação deCardoso (1998, p. 6-7) ao referir-se às pro-postas de um novo paradigma de gover-no, da seguinte forma:

Para ser simples e direto, todos eles par-tem de uma constatação: o mercado é uma

realidade inescapável, aloca recursos ebenefícios sob o imperativo da eficiênciacapitalista, racionalizadora na técnicaorganizacional e produtiva (fundindo ci-ência, tecnologia e organização da produ-ção) e acumuladora de riquezas. Mas nãoé o mercado que garante, como subpro-duto, a redistribuição de rendas ou bem-estar social (a seguridade-saúde, assistên-cia social e previdência) e a coesão dasociedade. Estes elementos tambéminescapáveis, não só como imperativomoral das sociedades contemporâneas,mas como fatores de equilíbrio e coesãosocial, requerem ação pública.

Não obstante ‘ação pública’ não é a mesmacoisa que ‘ação estatal’ ou burocrática,nem os objetivos de distribuição de rendae de desconcentração da propriedade sãoalcançados por meio das ‘nacionalizações’ou do controle estatal de produção’.

Diante do exposto, cabe perguntar: Atéque ponto a concepção de público não-esta-tal vem se materializando em propostas paraa educação? Quais as implicações dessa con-cepção para a escola pública brasileira?

O Programa Dinheiro Direto naO Programa Dinheiro Direto naO Programa Dinheiro Direto naO Programa Dinheiro Direto naO Programa Dinheiro Direto naEscola (PDDE)Escola (PDDE)Escola (PDDE)Escola (PDDE)Escola (PDDE)

É nesse cenário mais amplo que ogoverno federal cria, em 1995, o Programade Manutenção e Desenvolvimento doEnsino Fundamental (PMDE), com denomi-nação alterada para Programa DinheiroDireto na Escola (PDDE), pela Medida Pro-visória nº 1.784, de 14 de dezembro de1998 que se justifica pela necessidade deadotar medidas racionalizadoras, menosburocráticas, de modo que os recursos che-guem com mais agilidade e diretamente àsescolas, conforme Resolução FNDE nº 12,

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de 10 de maio de 1995 (BRASIL, 1995b).O Programa tem como objetivo re-

passar, diretamente às escolas públicas doensino fundamental e organizações não-governamentais sem fins lucrativos, queatuem com educação especial, dinheiropara custeio e manutenção de suas ativida-des, com recursos oriundos do salário-edu-cação2, distribuídos pelo FNDE (Fundo Na-cional de Desenvolvimento da Educação)segundo o número de alunos matriculados.

Os recursos, inicialmente, deveriamser repassados para a Secretaria Estadualou Municipal de Educação ou para a uni-dade executora das escolas, sendo desti-nados apenas ao custeio das despesas dasescolas e poderiam ser usados na manu-tenção e conservação do prédio escolar,aquisição de material necessário ao funci-onamento da escola, capacitação e aper-feiçoamento de profissionais da educação,avaliação da aprendizagem, implemen-tação do projeto pedagógico, aquisição dematerial didático/pedagógico e desenvol-vimento de atividades educacionais diver-sas (BRASIL, 1995b).

A partir de 1997, com base na idéia“de que a própria comunidade é quem sabeaplicar o dinheiro para resolver os seusproblemas”, para que esses recursos che-guem diretamente às escolas, passa-se aexigir que cada instituição escolar crie a suaUnidade Executora. Em outras palavras,para as escolas, com mais de 99 alunos,receberem os recursos precisam criar,obrigatoriamente, uma Unidade Executo-ra, ou seja, uma “entidade de direito priva-do, sem fins lucrativos, representativos dacomunidade escolar (caixa escolar, conse-

lho escolar, associação de pais e mestres,etc.), responsável pelo recebimento e exe-cução dos recursos financeiros recebidospelo FNDE (...)” (BRASIL, 1997a).

A Unidade Executora, portanto,tem como função administrar recursostransferidos por órgãos federais, estadu-ais, municipais, advindos da comunidade,de entidades privadas e provenientes dapromoção de campanhas escolares, bemcomo fomentar atividades pedagógicas daescola (BRASIL, 1997a, p.11).

Entre as funções específicas estão, porexemplo, prestar assistência ao aluno ca-rente, manutenção e conservação física daescola e dos equipamentos, da limpeza desuas instalações e integração escola-famí-lia-comunidade (BRASIL, 1997a, p.11). Issosignifica que a Unidade Executora, além dosrecursos repassados pelo Programa, deveadministrar recursos provenientes de umaoutra fonte, ou seja, oriunda de promoçãode arrecadação de campanhas organiza-das pela comunidade escolar.

A Resolução FNDE/CD nº12/1995apresenta os valores totais que deveriamser recebidos, sendo que com a Resolu-ção FNDE/CD nº 03 de 1997 (art. 2º) es-ses valores passaram a ser divididos en-tre despesas de custeio e de capital. Comesse dinheiro, a escola pode adquirir ma-terial permanente, fazer sua manutençãoe conservação, capacitar e aperfeiçoar osprofissionais da educação, contratar seto-res para elaborar processos e indicadoresde avaliação da aprendizagem,implementar seu projeto pedagógico edesenvolver atividades pedagógicas diver-sas (BRASIL, 1997b).

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Como se pode verificar no quadro nº 1,as regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste rece-bem um valor maior do que as regiões Sul,Sudeste e o Distrito Federal. No caso dessas

últimas regiões, por exemplo, para uma escolade 1.501 a 2000 alunos receber R$10.000,00,significa a quantia de R$ 5,00 aluno/ano, as-sim mesmo se ela tiver 2.000 alunos.

Apesar da exiguidade dos recursos,faz-se necessário que a Unidade Executoraseja inscrita no Cadastro Geral de Contribu-intes (CGC), do Ministério da Fazenda e, as-sim, poder abrir conta bancária e participarde benefícios, como: subvenções, isenção doImposto de Renda, além de assinatura deconvênios com órgãos governamentais.

A Resolução FNDE/CD nº 03, de 27de fevereiro de 2003 reedita as resoluçõesanteriores reafirmando que:

O Programa Dinheiro Direto na Escola-PDDE consiste na transferência, pelo Fun-do Nacional de Desenvolvimento da Edu-cação–FNDE, de recursos financeiros, con-signados em seu orçamento, em favor dasescolas públicas do ensino fundamental

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das redes estadual, do Distrito Federal emunicipal, destinados à cobertura de des-pesas de custeio, manutenção e de pe-quenos investimentos, de forma a contri-buir, supletivamente, para a melhoria físi-ca e pedagógica dos estabelecimentos deensino beneficiários (Art. 1º).

Conforme a referida Resolução osrecursos financeiros devem ser repassadosàs escolas públicas do ensino fundamen-tal das redes estadual, do Distrito Federal emunicipal.

No entanto, em 27 de março de2004 é editada a Resolução FNDE/CD nº10 em vigor, atualmente, incluindo, explici-tamente, o repasse dos recursos, também,às instituições privadas de educação espe-cial, ao afirmar em seu artigo 1º que o Pro-grama Dinheiro Direto na Escola (PDDE)consiste na transferência, pelo FNDE, de re-cursos financeiros, consignados em seu or-çamento em favor das escolas, assimespecificadas:• públicas das redes estaduais, distrital e

municipais no ensino fundamental, inclu-sive nas modalidades especial e indígena;

• privadas de educação especial, mantidaspor Organizações Não-Governamen-tais(ONG), ou outras entidades similiares,sem fins lucrativos e inscritos no Conse-lho Nacional de Assistência Social (CNAS).

Desse modo, ao afirmar que por uni-dade executora “entende-se a entidade ouinstituição responsável pelo recebimento,execução e prestação de contas dos recur-sos transferidos, pelo FNDE”, amplia essacompreensão, da seguinte forma:• Unidade Executora Própria (Uex) – enti-

dade de direito privado, sem fins lucrati-vos, representativa da comunidade esco-

lar dos estabelecimentos de ensino pú-blicos beneficiários do PDDE (caixa esco-lar, associação de pais e mestres, conse-lho escolar ou similar);

• Entidade Executora (EEx) – prefeituramunicipal e secretarias de educação es-tadual e do Distrito Federal, ao recebe-rem e executarem os recursos do PDDE,destinados às escolas públicas que nãoinstituíram as Uex;

• Entidade Mantenedora (EM) – Organiza-ção Não-Governamental (ONG), ou ou-tra entidade similar, sem fins lucrativos einscrita no CNAS, responsável pela ma-nutenção de escolas privadas de educa-ção especial beneficiários do PDDE (art.3º, § 2º).

O dinheiro continua a ser repassadoàs escolas uma vez por ano, tendo comobase o número de alunos matriculados noensino fundamental, extraído do censo es-colar do ano anterior. Além disso, os valo-res estabelecidos em 1997 não sofreram,até o momento, nenhum reajuste.3

Processo de Implantação doProcesso de Implantação doProcesso de Implantação doProcesso de Implantação doProcesso de Implantação doPDDE no Município de CampoPDDE no Município de CampoPDDE no Município de CampoPDDE no Município de CampoPDDE no Município de CampoGrande/MSGrande/MSGrande/MSGrande/MSGrande/MS

No caso de Mato Grosso do Sul4, deacordo com informações prestadas pelaSecretaria de Estado de Educação foramcriadas Unidades Executoras, por meio dasAssociações de Pais e Mestres/ APMs, emescolas da rede estadual de ensino, nos 77municípios do estado. De modo específico,em Campo Grande, capital do estado, es-sas Unidades foram criadas nas 80 esco-las existentes nessa rede de ensino (dispo-

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nível em www.fnde.gov.brwww.fnde.gov.brwww.fnde.gov.brwww.fnde.gov.brwww.fnde.gov.br. Acesso em 06/02/2004).

Considera-se importante, aqui, abrirum parêntese e assinalar que na gestãodo governador José Orcírio Miranda (1999-2002), a Secretaria de Estado de Educação,formulou sua proposta de educação paraa rede Estadual de Ensino, sob o título “Es-cola Guaicuru: vivendo uma nova lição”,assentada em três grandes eixos: “a quali-dade social da educação”, “a democratiza-ção do acesso” e a “democratização da ges-tão” (MATO GROSSO DO SUL, 2001, p. 3).

Com o objetivo de concretizar a pro-posta, abriu várias frentes de trabalho, es-tando entre elas, o Movimento Constituin-te Escolar, entendido como “um instrumen-to estratégico de mobilização de todos ostrabalhadores da educação e da socieda-de em geral para a construção coletiva deum projeto educacional comprometido coma transformação social e com a formaçãodo cidadão na sua acepção mais plena”,tendo em vista a construção do Plano deEducação para a Rede Estadual de Ensinode Mato Grosso do Sul”(MATO GROSSO DOSUL, 2001, p. 3).

As sugestões emanadas dos Semi-nários escolares e das propostas das Políti-cas Educacionais da Secretaria de Estadode Educação constituíram-se em objeto deanálise, debate e aprovação no CongressoEstadual da Constituinte Escolar, com aparticipação de delegados nos fóruns dedebates e decisões, realizado de 26 a 28de junho de 2001, em Campo Grande/MS.

No elenco de temas destaca-se a“Gestão Democrática”, apontando, principal-mente, “para a necessidade de uma gestão

genuinamente colegiada, na qual os parescompreendam esta função social da escolae atuem de forma a representar cada seg-mento partícipe da comunidade escolar”.

Com base no entendimento de queo Colegiado Escolar5 deva ser o principalinstrumento da gestão escolar, exercendoseu papel como órgão consultivo, delibe-rativo e avaliativo, tanto nas questões admi-nistrativas, como nas pedagógicas ou fi-nanceiras, entende que:

O destinatário dos repasses financeirosdas verbas públicas federais ou estaduais,nessa lógica, seria o Colegiado Escolar, aquem cabe geri-los democraticamente,ouvindo a comunidade escolar, tendocomo parâmetro a legislação vigente. OColegiado Escolar passaria a ser a Unida-de Executora, com caráter jurídico, paraque este possa, junto à comunidade es-colar, planejar, aplicar e acompanhar ogerenciamento de todos os recursos pú-blicos destinados à Educação (MATO GROS-SO DO SUL, 2001, p. 51 e 52).

Assim é encaminhada para votaçãoa proposta do colegiado escolar como uni-dade executora, nos seguintes termos:

1a. O Colegiado Escolar, unidade executorada unidade escolar, passará a gerenciar osrecursos públicos federais e estaduais, como objetivo de fortalecer a gestão colegiada;

1b. Os Colegiados Escolares passarão agerenciar os recursos públicos federais eestaduais, juntamente com a APM;

1c. Manter o gerenciamento dos recursospúblicos pela APM e as funções avaliativas,deliberativas e consultivas pelo ColegiadoEscolar (MATO GROSSO DO SUL, 2001, p.51 e 52).

No processo de votação os congres-sistas decidem pelo segundo item, que

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expressa uma forma de conciliação entreos demais apresentados. Assim, “os Colegi-ados Escolares passarão a gerenciar os re-cursos públicos federais e estaduais, junta-mente com a APM”. Isso quer dizer que aAPM, uma sociedade civil com personali-dade jurídica de direito privado, continuasendo a Unidade Executora da escola, en-quanto o colegiado apesar de formado porrepresentantes dos diferentes segmentos daescola, não tem caráter jurídico.

A rede municipal de Campo Gran-de/MS6, por sua vez, conta, atualmente, com84 escolas de ensino fundamental (76 loca-lizadas na área urbana e oito situadas naárea rural). Segundo informações da Secre-taria Municipal de Educação, 83 escolascriaram a sua Unidade Executora, de for-ma gradativa, principalmente a partir de1997, por meio das APMs, sendo que parasomente uma escola da área rural (commenos de 99 alunos), o dinheiro é deposi-tado em conta específica, executada pelaprópria Secretaria (disponível emwww.fnde.gov.brwww.fnde.gov.brwww.fnde.gov.brwww.fnde.gov.brwww.fnde.gov.br. Acesso em 06/02/2004).

Um ponto a ser destacado é que umprocesso de descentralização financeira derecursos às escolas municipais de CampoGrande, inicia-se com a Lei Orgânica Muni-cipal que em seu artigo 170, inciso V, deter-mina a criação de um fundo de manuten-ção às escolas da rede municipal de ensi-no, também segundo tipologia.

Observa-se que esse mecanismo detransferência de recursos para a escola efe-tivou-se a partir do ano 2000, com a Reso-lução SEMED nº 27, de 24 de março de2000, que estabelece critérios para a trans-ferência de recursos financeiros às unidades

escolares da Rede Municipal de Ensino. Oart. 2º define o Regime de Adiantamentoque consiste na transferência de recursosàs unidades escolares para despesas como:manutenção, conservação e pequenos re-paros da unidade escolar; aquisição dematerial de consumo necessário ao funcio-namento da escola; implementação de pro-jetos pedagógicos, mediante a apresenta-ção trimestral de seu plano de aplicação,enquanto o art. 3 dispõe que o valor derecursos às escolas ‘é calculado sobre oquantitativo de matrículas, no exercício. Tra-ta-se, no entanto, de recursos provenientesdo próprio município que não se confun-dem com os recursos recebidos do PDDE.

Registre-se, que a prestação de con-tas das Unidades Executoras tanto das es-colas da rede estadual, como das escolasda rede municipal foram aprovadas nos úl-timos anos, ou seja, de 1999 a 2002 (dis-ponível em www.fnde.gov.br. www.fnde.gov.br. www.fnde.gov.br. www.fnde.gov.br. www.fnde.gov.br. Acesso em06/02/2004).

Pode-se dizer que a obrigatoriedadeda criação de uma Unidade Executora pararecebimento de recursos pela escola abreespaço para a ampliação do setor públiconão-estatal na educação, explicitada noPlano Diretor da Reforma do Estado (1995),uma vez que além de receber e administraresses recursos cabe a essas unidades captá-los de alguma forma, o que implica trans-ferir a responsabilidade do Estado para asociedade civil.

A esse respeito Oliveira (1997-p. 7) aodiscutir sobre as formas de Política Educaci-onal implementada nos anos 1990 no Bra-sil, enfatiza que na educação brasileira aprivatização, mesmo sendo um componente

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essencial da concepção neoliberal de ges-tão de Estado, não se constitui a principalproposta, “ao menos se entendermos por‘privatização’ a transferência da proprieda-de das escolas do setor estatal para o priva-do”. Chama a atenção, no entanto, para odebate que se concentra em questões como:

a concepção de gestão do sistema escolar,a distribuição de responsabilidades entreos diferentes níveis da administração pú-blica, e a transformação das escolas emunidades autônomas que, no longo prazo,podem ter o sentido de privatização, masque, no curto prazo, apresentam como ca-racterística mais importante, a redução dosuporte estatal e o fortalecimento de for-mas privadas de financiamento do siste-ma educacional (OLIVEIRA, 1997, p.7).

Ainda, segundo o autor, essas formasde política educacional podem ser classifica-das, conforme suas características, em qua-tro tipos: importação de mecanismos degestão da empresa privada; concentraçãode recursos; transferência de responsabilida-de, além de o Estado ‘abdicar’ da gestão.Considera esta última “a mais ambiciosaproposta para reduzir o suporte público paraa educação e a que é mais explícita naperspectiva da privatização”, e que tem sidobuscada de três formas: transformação daescola em cooperativa, transformação daAPM em organização de direito privado eestímulo para cada escola obter recursosdiretamente (OLIVEIRA, 1997, p. 7-9).

A criação de Unidades Executoras deforma obrigatória, pela escola, portanto, es-pelha a tendência à privatização apontadapelo citado autor. Tal tendência irá, certa-mente, trazer mudanças para a gestão daescola pública brasileira.

Finalmente, a implantação de Unida-des Executoras em todas as escolas da redeestadual e da rede municipal de CampoGrande/MS, via Associação de Pais e Mes-tres (APM), o que significa 100% de adesãoa esse tipo de descentralização de recursos,evidencia um processo que se assemelha àconstituição de Organização Social (OS), nosmoldes definidos pelo Plano da Reforma doEstado (1995) e que pode se constituir emespaço do público não-estatal na educação.

Notas:Notas:Notas:Notas:Notas:1 Documento elaborado pelo Ministério da Adminis-tração e Reforma do Estado e aprovado, em 21 desetembro de 1995, pela Câmara da Reforma do Esta-do. Esta era composta e presidida pelo Ministro Chefeda Casa Civil (Clóvis Carvalho) e pelos Ministros daFazenda (Pedro Malan), do Trabalho (Paulo Paiva),do Planejamento e Orçamento (José Serra), do Estadomaior das Forças Armadas (Gen. Benedito OnofreBezerra Leonel) além do Ministro da Administraçãoe Reforma do Estado (Luiz Carlos Bresser Pereira).2 O salário-educação foi instituído pela Lei nº 4440,de 27 de outubro de 1964, sendo uma contribuiçãosocial correspondente a 2,5% da folha de pagamentodas empresas vinculadas à Previdência Social. Nocaso do estado de Mato Grosso do Sul, a Lei nº 2.088,de 10 de abril de 2000, assinada pelo governadorJosé Orcírio Miranda dos Santos, do PT, regulamentaa redistribuição da quota estadual do salário-educa-ção para o estado, além de dar outras providências.3 A Resolução FNDE/CD nº10, de 22 de março de2004 (art. 5º) acrescenta um fator de correção aonúmero de alunos matriculados.4 O Estado de Mato Grosso do Sul situa-se na Re-gião Centro-Oeste e foi criado no governo do presi-dente Ernesto Geisel (1974-1979), por meio da LeiComplementar nº 31, de 11 de outubro de 1977, apartir da divisão do Estado de Mato Grosso. A insta-lação do Governo Estadual de Mato Grosso do Sulocorreu em primeiro de janeiro de 1979. Possui 78municípios distribuídos numa área de 358.158,7 Km

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e conta com uma população de 2.075.275 habitan-tes (IBGE, 2000).5 O Decreto Estadual nº 5.868, de 16 de abril de1991 estabelece que “cada unidade escolar contarácom um Colegiado Escolar, órgão de naturezadeliberativa, responsável pelas ações de coordena-ção e avaliação das atividades administrativas e peda-gógicas da unidade escolar (art.9º)”, integrado pelodireto da unidade escolar (membro nato e secretárioexecutivo), até três representantes da coordenaçãopedagógica, dos pais, dos alunos, dos professores e

dos funcionários administrativos (art. 10), sendo queseus membros deverão ser eleitos pelas respectivascategorias para um mandato de dois anos, sendopermitida a reeleição (art. 10, parágrafo único).6 O Município de Campo Grande, localizado geo-graficamente na região central de Mato Grosso doSul, com uma área de 8.096 Km, ocupa 2,26% daárea total do Estado. Segundo o Censo Demográficoo volume populacional atingiu um total de 663.621habitantes, sendo o 23º (vigésimo terceiro) no con-texto nacional (IBGE, 2000).

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Recebido em 04 de outubro de 2004.Recebido em 04 de outubro de 2004.Recebido em 04 de outubro de 2004.Recebido em 04 de outubro de 2004.Recebido em 04 de outubro de 2004.Aprovado para publicação em 29 de outubro de 2004.Aprovado para publicação em 29 de outubro de 2004.Aprovado para publicação em 29 de outubro de 2004.Aprovado para publicação em 29 de outubro de 2004.Aprovado para publicação em 29 de outubro de 2004.

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O Programa Dinheiro Direto na Escola (PDDE)O Programa Dinheiro Direto na Escola (PDDE)O Programa Dinheiro Direto na Escola (PDDE)O Programa Dinheiro Direto na Escola (PDDE)O Programa Dinheiro Direto na Escola (PDDE)como política educacional do Estadocomo política educacional do Estadocomo política educacional do Estadocomo política educacional do Estadocomo política educacional do EstadoContemporâneoContemporâneoContemporâneoContemporâneoContemporâneo11111

Francisco Williams de Assis Soares Gonçalves*Liliene Xavier Luz**Rosana Evangelista da Cruz***

*Mestre e doutorando em educação pela Unicamp. Profes-sor do CCE/UFPI.e-mail: [email protected]

**Mestre e doutoranda em educação pela Unicamp. Pro-fessora do CCE/UESPI.e-mail: [email protected]

***Mestre em educação pela USP. Professora do CCE/UFPI.e-mail: [email protected]

ResumoResumoResumoResumoResumoEste artigo tem por objetivo analisar a relação entre o Programa Dinheiro Direto na Escola (PDDE) e oEstado contemporâneo no contexto das reformas políticas e educacionais, influenciadas pelo avanço doneoliberalismo no Brasil. Inicialmente, versa sobre o processo de redefinição do papel do Estado no Brasile seus reflexos nas políticas públicas, tendo como marco central o Plano Diretor de Reforma do Aparelhodo Estado (PDRAE). A seguir, apresenta alguns aspectos do processo de implementação do ProgramaDinheiro Direto na Escola (PDDE), a partir da legislação que o institui e o regulamenta e sua articulaçãocom as reformas do Estado contemporâneo. Por último, aborda a articulação entre os projetos dos organis-mos internacionais e a política educacional, tendo como referência a relação entre o PDDE e o Fundo deFortalecimento da Escola (Fundescola), em processo de execução desde 1998.

Palavras-chavePalavras-chavePalavras-chavePalavras-chavePalavras-chaveEstado contemporâneo; reforma do Estado; política educacional.

AbstractAbstractAbstractAbstractAbstractThis article aims at analyzing the relationship between the “Money Direct to the School Program” (PDDE) andthe contemporary State in the context of educational and political reforms, influenced by the advancement ofneoliberalism in Brazil. Initially, it will concern the process of the redefinition of the role of the State in Braziland its consequences in public politics, having the State System Reformation Management Plan (PDRAE) asa central guidepost. Next, it will present some aspects of the implementation process of the “Money Direct tothe School Program” (PDDE), from the legislation that set it up and regulate it and its articulation with thereforms of the contemporary State. Finally, the article approaches articulation between the projects of theinternational organisms and educational politics, having as reference the relationship between the PDDE andthe “School Strengthening Fund” – (Fundo de Fortalecimento da Escola -Fundescola), ongoing since 1998.

Key wordsKey wordsKey wordsKey wordsKey wordsContemporary State; state reformation; educational politics.

Série-Estudos - Periódico do Mestrado em Educação da UCDB.Série-Estudos - Periódico do Mestrado em Educação da UCDB.Série-Estudos - Periódico do Mestrado em Educação da UCDB.Série-Estudos - Periódico do Mestrado em Educação da UCDB.Série-Estudos - Periódico do Mestrado em Educação da UCDB.Campo Grande-MS, n. 18, p. 127-142, jul./dez. 2004.

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A redefinição do papel do EstadoA redefinição do papel do EstadoA redefinição do papel do EstadoA redefinição do papel do EstadoA redefinição do papel do Estadono Brasil e seus reflexos sobreno Brasil e seus reflexos sobreno Brasil e seus reflexos sobreno Brasil e seus reflexos sobreno Brasil e seus reflexos sobreas políticas públicasas políticas públicasas políticas públicasas políticas públicasas políticas públicas

Em 1995, com o início da primeiragestão do Governo Cardoso (1995-1998),temos uma indicação mais ou menos pre-cisa do que deveria ser o Estado no Brasile de quais seriam suas funções. Institui-se,a partir daí, um verdadeiro aparato lexicalque pretende dar substância a perspecti-vas minimalistas, explicitadas no discursode descentralização e desobrigação de fun-ções antes destinadas ao Estado. É nesteuniverso que a concepção de público, antespertinente ao âmbito estatal, aparece parademarcar um outro tipo de organizaçãosocial, concretizada pelo que se conven-cionou denominar de público não-estatal.

São esses fundamentos que irãonortear as diretrizes, ações e relações entreas esferas governamentais e entre Estadoe Sociedade no Plano Diretor de Reformado Aparelho do Estado (PDRAE), elabora-do em 1995 pelo recém-criado Ministériode Administração e Reforma do Estado(MARE). O Plano sintetiza os propósitos doGoverno do Brasil, desde o início dos anosde 1990, de reconceber o papel do Estado,retirando-lhe obrigações importantes paraa conquista de uma sociedade menos de-sigual, veiculando também o ideárioneoliberal que se opunha à capacidadeinterventiva do Estado como implemen-tador de políticas de corte social.

O ideário neoliberal tem origem apósa segunda guerra mundial e seu apogeunos anos de 1990. Surge como reação con-tra as políticas de regulação estatal na

economia e as políticas de intervenção naárea social, na medida em que a interfe-rência do Estado se constitui um limite àlivre concorrência do mercado. Seus princi-pais expoentes são F. Hayek, representanteda escola austríaca, M. Friedman, da esco-la de Chicago e J. Buchanan, da escola deVirgínia ou public choice. As proposiçõesneoliberais, segundo Negrão (1996), foramexplicitadas no Consenso de Washington,fruto de uma reunião, ocorrida em 1989,envolvendo o governo dos EUA, técnicosdo Banco Mundial, do FMI e do BID e eco-nomistas de perfil liberal, com o objetivo dedebater as reformas econômicas que deve-riam ser adotados pelos países da AméricaLatina, envolvendo reformas pautadas nadiminuição do papel e tamanho do Estadona sociedade, na desregulamentação dasrelações trabalhistas e na abertura econô-mica e comercial.

Em consonância com o referidoideário, em linhas gerais, o Plano Diretor deReforma do Aparelho do Estado esboça ointuito de reformar o Estado e faz uma críticaà organização anterior, considerada buro-crática e maléfica à vida nacional. A partirdessa posição, define como objetivo “criarcondições para a reconstrução da adminis-tração pública em bases modernas e racio-nais”, tendo como eixo uma administraçãopública gerencial (BRASIL, 1995, p. 10).

O Plano apresenta um estudo deviés modernizador, que examina o modelopolítico do Estado nacional, asseverandoque, em um primeiro momento, organizou-se nos marcos do patrimonialismo e compráticas clientelísticas e nepóticas. Em se-guida, tomou uma feição excessivamente

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burocrática, em que a rigidez das estruturasformais do Estado não lhe permitiu formu-lar diagnósticos precisos, escolhas acerta-das e políticas de intervenção necessáriasa um novo padrão de desenvolvimento. Fazum rápido diagnóstico do Estado Brasilei-ro, da sua possível atuação como “Estadode Bem-Estar”, da crise fiscal do WelfareState2 propondo-se a ser um marco para asuperação dos modelos anteriores e prota-gonista de um novo padrão de política es-tatal, então racional pela finalidade expres-sa de redução e flexibilização das estrutu-ras do Estado.

É nessa perspectiva que se erigem,no referido Plano, as idéias de organizaçõessociais como organizações de direito priva-do, mas prestando serviços consideradospúblicos. São estas organizações sociais quevão compreender o que se chama públiconão-estatal ou processo de publicização,cabendo ao Estado fiscalizar, controlar aavaliar, pois o Estado “... deixa de ser o res-ponsável direto pelo desenvolvimento eco-nômico e social pela via da produção debens e serviços, para fortalecer-se na funçãode promotor e regulador desse desenvolvi-mento” (BRASIL, 1995, p.17).

Representando a via legal da refor-ma do Estado na contemporaneidade, oPlano considera a Constituição de 1988 umretrocesso burocrático e um obstáculo àmodernização das organizações estatais.Suas críticas recaem sobre direitos conquis-tados e garantidos constitucionalmentecomo o Regime Jurídico Único para todosos servidores civis. Esses direitos são descri-tos como forma de engessamento do apa-relho estatal e aumento dos gastos públi-

cos, acelerando ainda mais a crise fiscal.(BRASIL, 1995, passim).

Combinado a essa justificativa, ou-tras atividades tradicionalmente vinculadasàs funções do Estado são questionadasquanto à exclusividade na sua execução epassam a ser definidas como serviços nãoexclusivos do Estado, devendo este atuarsimultaneamente com outras organizaçõespúblicas não-estatais ou privadas. Estes ar-gumentos constituem a essência da refor-ma administrativa que dá centralidade àmudança na política de recursos humanos,à reforma da previdência e ao ajuste fiscal,expressões do discurso de eficiência do Es-tado e de eficácia do mercado, componen-tes da reforma política do Estado contem-porâneo.

Esses elementos consubstanciam,por sua vez, a reorganização do Aparelhodo Estado em quatro setores: a) núcleo es-tratégico, composto pelos poderes Legisla-tivo e Judiciário, o Ministério Público e o Po-der Executivo (Presidente da República, mi-nistros, auxiliares e assessores diretos, res-ponsáveis pelo planejamento e formulaçãodas políticas públicas); b) atividades exclu-sivas (tributação, policiamento, previdênciabásica, cumprimento de normas sanitáriase de trânsito, compra de serviços de saúdepelo Estado, controle do meio ambiente,subsídio à educação básica, serviço de emis-são de passaportes, serviço de desempregoetc.); c) serviços não exclusivos (direitos hu-manos fundamentais, como os de saúde eeducação); e d) produção de bens e serviçospara o mercado (o setor de infra-estrutura).

Apresentados esses setores compo-nentes, o Plano propõe que se dê uma no-

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va racionalidade à estrutura do Estado,enfatizando mais o papel do núcleo estra-tégico, através da diminuição do tamanhodo setor de atividades exclusivas, da am-pliação do setor de serviços não exclusivosatravés de um programa de “publicização”e intensificação do processo de privatizaçãodo setor de bens e serviços para o mercado.

É importante revelar que o Planoguarda certa singularidade, pois, pela primei-ra vez, um governo brasileiro no período pós-militar formula um documento cujo propó-sito é a assimilação dos padrões definidospor forças político-econômicas externas(hegemônicas no Estado contemporâneo,representadas pelo neoliberalismo) de redu-ção da capacidade de gestão do Estado ede atribuição de responsabilidades a outrosentes sociais, intitulados aqui de organiza-ções sociais. Fato que, segundo autores comoKing (1988), mesmo nos países onde se vei-culou a proposta de desobrigação do Esta-do com políticas de corte social, não aconte-ceu o que os neoliberais estavam aprego-ando, em virtude da resistência em favor doEstado de Bem-Estar.3

O Plano expressa a visão dominan-te nos Estados pós-Welfare State, que reve-la o modo categórico de pensar um Esta-do para a sociedade brasileira pertinente àvacilante social-democracia autóctone.Como se não bastasse, o PDRAE apontapara uma pretensa irreversibilidade de suaimplementação:

Será considerado, para efeitos deste do-cumento, o curto prazo até o final desteano de 95, o médio prazo, o período com-preendido entre os anos de 96 e 97, e olongo prazo, o final deste governo, ou seja,

o início de 99. ... o objetivo é consolidar oprocesso de mudança, a partir da idéia desua irreversibilidade, dotando o aparelhodo Estado de uma estrutura com um graude flexibilidade tal que permita enfrentaros desafios de ajustamento que certamen-te serão impostos, porém, ainda,imprevisíveis... (BRASIL, 1995, p. 69).

A idéia de irreversibilidade permite-nos asseverar que o propósito é mesmo ode que o Estado saia de cena e que as for-ças sociais sejam dirigidas pela lógica domercado, conduzidas pela condutagerencial da eficiência e das relações de tro-ca nos serviços prestados pelo poder públi-co. Aqui, a onda liberalizante desconheceou não leva em conta o tipo de sociedadecivil esboçada pelas elites que aprisiona-ram o Estado sob seus interesses, aspectobem analisado por Nogueira (1998). Aocontrário, orienta-se pelas exigências e con-dições dos organismos internacionais definanciamento impostos aos países emdesenvolvimento– cujo diagnóstico é simi-lar4 para todos estes países, secundarizandoo modus vivendi projetado historicamentepor cada cultura nacional em particular.

Essa realidade produz efeitos perver-sos, sobretudo em países com alto grau dedependência das políticas viabilizadas pelopoder público. O preocupante é que, nestecontexto, o que se considera política eficazé um conjunto de ações pontuais e focali-zadas que não mais nos permite observara totalidade de determinado problema oudemanda social. Como lembra e subscreveDraibe (1993): a privatização, a descentra-lização e a focalização constituem as prin-cipais orientações das reformas de proteçãosocial para os países latino-americanos.

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A desconsideração do papel do Es-tado na implementação de políticas públi-cas ocorre sob forte desigualdade social,elevado grau de concentração de renda e,conseqüentemente, altos índices de pobre-za, o que resulta em contínuas demandaspor assistência pelas camadas popularesao poder público. Ademais, além de reduziro escopo das políticas, diminui-se tambéma sua abrangência e sua natureza público-gratuita. Este é o modelo que se pretendeinstaurado, oficialmente, desde 1995, o qualvem orientando as políticas educacionaisnos últimos anos. Cabe perguntar: que re-lações se estabelecem entre o PDDE e aspolíticas de reforma do Estado?

O Programa Dinheiro Direto naO Programa Dinheiro Direto naO Programa Dinheiro Direto naO Programa Dinheiro Direto naO Programa Dinheiro Direto naEscola (PDDE) e a reforma doEscola (PDDE) e a reforma doEscola (PDDE) e a reforma doEscola (PDDE) e a reforma doEscola (PDDE) e a reforma doEstadoEstadoEstadoEstadoEstado

O Programa Dinheiro Direto na Es-cola (PDDE) guarda profundas relações como processo de reforma do Estado iniciadonos anos 90, uma vez que a definição daspolíticas públicas para a educação no Bra-sil, desde então, ocorre em meio ao proces-so de contenção de recursos financeiros naárea social, sendo o PDDE parte de um con-junto de reformas no campo da educaçãopara os países latino-americanos, articula-das com os interesses econômicos externos.

Implantado em 1995, ainda sob adesignação de Programa de Manutençãoe Desenvolvimento do Ensino Fundamen-tal (PMDE) e sob responsabilidade do Fun-do Nacional de Desenvolvimento da Edu-cação (FNDE), o PDDE constitui-se num dosmais importantes programas de financia-

mento do ensino fundamental com carac-terísticas de descentralização.5 Sua abran-gência compreende escolas públicas doensino fundamental, das redes estadual emunicipal e as escolas de educação espe-cial mantidas por organizações não gover-namentais sem fins lucrativos.

A descentralização — um dos mais im-portantes eixos das reivindicações popula-res dos anos 70 e 80 contra a hierarquiza-ção do poder no regime militar — transcendepara o universo da política hegemônica,ganhando outra significação no bojo dasreformas dos anos 90.

A nova retórica da descentralizaçãoque pretende estimular a participação dasociedade na esfera pública tem como fina-lidade a aproximação entre financiamentoe administração, tanto nas relações do po-der público com o mercado quanto na trans-ferência de responsabilidades para os mu-nicípios e para a escola, no caso da educa-ção. Assim, pode-se justificar a restrição dofinanciamento público para a educação, ale-gando que os problemas educacionais nãodecorrem da falta de recursos, mas da faltade uma melhor administração dos mesmos.Para Krawczyk (2002), a descentralização nassuas diferentes dimensões (para o mercado,para o Município e para a escola) consolidaum dos principais eixos da reforma educaci-onal em curso da América Latina, caracteri-zando uma nova organização e gestão dosistema educativo e da escola.

O PDDE é pertinente, ainda, aos pro-pósitos da reforma do Estado em curso, porfocalizar determinadas ações no âmbito daescola e por ser um programa de carátersuplementar, uma vez que o governo federal

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não pretende assumir o custeio total dasatividades de manutenção e desenvolvimen-to das escolas beneficiadas pelo Programa.Atitude similar pode ser observada no argu-mento utilizado para justificar o baixo percapita dos recursos destinados pelo FNDEpara a manutenção do Programa Nacionalde Alimentação Escolar. Desta feita, o Pro-grama estimula a autonomia gerencial daprópria dotação de recursos federais para amanutenção das escolas, tal como expres-sam seus objetivos, quais sejam:

... concorrer para a elevação da qualidadedo ensino fundamental, reforçando a au-tonomia gerencial e a participação socialdas unidades escolares, bem como con-tribuir para a melhoria da infra-estruturafísica e pedagógica das escolas por meiodo repasse de recursos financeiros, emcaráter suplementar (BRASIL, 2001c, p. 1).

Esses objetivos exigem a transforma-ção dos Conselhos Escolares, Associaçõesde Pais e Mestres e Caixa Escolar em enti-dades de direito privado denominadas Uni-dades Executoras (UEx),6 exigência legalpara recepção e gestão dos recursos do PDDEpela escola. Do mesmo modo, o PDDE temmotivado Secretarias de Educação a institu-írem programas próprios, com característicase critérios similares e com a utilização damesma estrutura administrativa: as UEx,como é o caso dos programas da rede esta-dual do Piauí e da rede municipal de Teresina(GONÇALVES, LUZ, CRUZ, 2003).

Segundo documento do FNDE, queorienta acerca do Programa Dinheiro Dire-to na Escola:

As unidades executoras, comumente cha-madas de Caixa Escolar, Associação de Paise Mestres ou Conselho Escolar constituem-

se em associações civis, sem fins lucrativos,que assumem a função tradicionalmenteexercida pelos estados e municípios. Elaspassam a responsabilizar-se pelo recebi-mento e execução dos recursos financeirostransferidos pelo FNDE, caracterizando, dessemodo, a desconcentração decisória e funci-onal (BRASIL, 2001c, p.2). (grifos nossos).

Além do aparato jurídico e institucio-nal, o Governo federal, como ator principalde um novo modelo de gestão, comple-menta sua ação no processo de implemen-tação do PDDE através de aparato técnico,elaborando documentos que orientam asescolas-alvo a iniciar seu processo de orga-nização e inserção no Programa. São docu-mentos que explicitam as responsabilida-des das esferas de governo, o quadro deexigências e orientações relacionadas à uti-lização e distribuição dos recursos, a consti-tuição e funções das UEx (Resolução FNDEnº 10/2004). Mais especificamente, a or-ganização do Programa ocorre via FNDE,o qual disponibiliza os recursos diretamen-te para as escolas através de suas UEx, quedevem possuir CNPJ, conta bancária, consti-tuirem-se como órgãos deliberativos compoder de compra, após a tomada de preçosem estabelecimentos comerciários ou pres-tadores de serviços, conforme a situação.

No que concerne ao processo deavaliação, este se restringe, normalmente,à prestação de contas que, em um primei-ro momento, deve ser feita junto ao depar-tamento financeiro da Secretaria de Edu-cação, de acordo com a dependência ad-ministrativa da escola (estadual ou munici-pal). Estas instâncias “a posteriori” prestamcontas ao FNDE, até o dia 28 de fevereirodo ano seguinte ao do recebimento dos

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recursos, sendo que o repasse seguinte estácondicionado à prestação de contas refe-rente ao ano anterior. Esta conotação daavaliação corrobora a natureza contábil doprograma e a concepção quantitativistaque tem predominado nas avaliações dosistema educacional, sem preocupaçãocom os aspectos qualitativos de natureza

pedagógica que fomentam a dinamicidadedo processo educativo.

Em relação aos recursos destinadosàs escolas pelo PDDE, destaca-se que de1995 a 2004 não houve qualquer acrésci-mo na tabela de repasse dos recursos paraas escolas, permanecendo inalterado, con-forme expressa o quadro a seguir:

A Resolução do FNDE nº 10, de 22/03/04, que versa sobre a necessidade decorreção dos repasses de forma a diminuira defasagem de valores na distribuição dosrecursos por alunos matriculados, alteroua tabela de forma a inserir um fator de cor-reção com o objetivo de contornar asdisparidades verificadas nos repasses paraescolas de mesma classe, mas com matrí-culas diferenciadas.

Na atual organização o Valor Base,ou parcela mínima, a ser destinado a cadaescola será aquele definido pelo númerode matrículas apuradas no Censo Escolar,sendo igual ao limite inferior de cada inter-

valo de Classe de Número de Alunos, noqual o estabelecimento de ensino estejasituado, conforme tabela acima. Desta for-ma, a escola receberá, como repasse anualdo PDDE, o valor mínimo estipulado na ta-bela, conforme a classe em que a escolaesteja situada (número de matrículas), maiso excedente de matrículas (o que ultrapas-sou o número mínimo da classe) multipli-cado pelo fator de correção, qual seja, R$1,30 (um real e trinta centavos). Por exem-plo, as escolas que tenham 251 matrículas,receberão o repasse anual de R$ 3.900,00(três mil e novecentos reais), caso estejamlocalizadas nas regiões Norte, Nordeste ou

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Centro-Oeste. Entretanto, outras escolas dasmesmas regiões que tenham 400 matrícu-las, receberão os R$ 3.900,00 (três mil enovecentos reais) mais R$ 193,70 (cento enoventa e três reais e setenta centavos),resultado da multiplicação de 149 matrícu-las excedentes por R$ 1,30 (um real e trintacentavos).

Outro aspecto importante do PDDE éa determinação prévia dos critérios para aaplicação dos recursos financeiros, limitan-do a autonomia da escola definir suas prio-ridades. Entretanto, mesmo com as limitações,observa-se um crescente processo de ade-são das escolas ao Programa, pois, de 1995para 2002, ocorreu um acréscimo de 36%nos recursos destinados ao PDDE. Além dis-to, verifica-se um processo intenso de cria-ção de UEx, uma vez que houve um efetivoaumento, superior a 650%, no número deescolas que contam com este tipo de orga-nização no período analisado (BRASIL,2004g). A diferença no percentual de au-mento de recursos e de UEx justifica-se pelofato de as escolas, mesmo não tendo UEx,receberem os recursos pelas suas Secretari-as de Educação, entretanto, considerandoque não houve aumento na tabela de re-passes no período analisado, presume-seque o aumento de 36% esteja pautado noaumento no número de alunos contempla-dos pelo programa (8%) e na inclusão deOrganizações Não-Governamentais (ONGs)que atendem a educação especial na basede repasses do PDDE (BRASIL, 2004g).

Quanto às fontes de recursos para oPDDE, em 2004, conforme dados sistema-tizados pela Diretoria Financeira do FNDE,verificamos a seguinte distribuição: contri-

buição do Salário-Educação (23%); Produtoda Aplicação dos Recursos à Conta do Sa-lário-Educação (15%); contribuição do Salá-rio-Educação referente à contrapartida deempréstimos internacionais (37%) e Produ-to da Aplicação dos Recursos à Conta doSalário-Educação das contrapartidas (24%)(BRASIL, 2004e).

Além dessas fontes ordinárias doPDDE destinadas às escolas de Ensino Fun-damental, no ano de 2004, o Programapassou a ser encaminhado, também, paraescolas de Ensino Médio situadas em mu-nicípios em situação de emergência, quetenham sido prejudicadas pelas fortes chu-vas causadoras de enchentes em vários es-tados do País.7 Para custear esta modali-dade, o FNDE destinou recursos ordináriosdo Tesouro Nacional e recursos da Manu-tenção e Desenvolvimento do Ensino, ouseja, parte dos 18% obrigatórios da Uniãopara a educação, conforme determina oartigo 212 da Constituição Federal (BRASIL,2004f), o que significa que o ensino médioestá à mercê dos parcos recursos destina-dos ao ensino fundamental e pouco evi-denciado nas reformas do governo federal.

Dois aspectos fazem-se relevantes emerecem destaque sobre as fontes de re-cursos do PDDE: 1) o alto percentual de re-cursos advindos das aplicações do Salário-Educação e 2) a utilização de parte dos re-cursos do Salário-Educação como contra-partida de empréstimos internacionais.

O primeiro, incide sobre o percentualconsiderável de 39% de recursos advindosdos resultados de aplicações (BRASIL,2004e). Isto motiva a seguinte ilação: possi-velmente esta realidade justifique- se pelo

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fato dos recursos do PDDE serem encami-nhados para as escolas, normalmente, nosegundo semestre de cada ano, conformeverificado nas escolas pesquisadas, perma-necendo, portanto, aplicado até o períodode liberação.

O segundo, extremamente relevantepara a compreensão da forma de organiza-ção do PDDE e dos elementos que evidenci-am a linha política adotada no processo deimplantação e implementação do mesmo,refere-se aos recursos provenientes do Salá-rio-Educação, que assumem o papel decontrapartida de empréstimos internacionais(37%), conforme evidenciado acima. Essainformação fornecida pelo FNDE (BRASIL,2004e) revela uma faceta do PDDE em suainter-relação com outro programa do gover-no federal em parceira com o Banco Mundi-al: o Fundo de Fortalecimento da Escola(Fundescola), o qual discutiremos a seguir.

O Fundescola e o PDDE: ações,O Fundescola e o PDDE: ações,O Fundescola e o PDDE: ações,O Fundescola e o PDDE: ações,O Fundescola e o PDDE: ações,relações e articulaçõesrelações e articulaçõesrelações e articulaçõesrelações e articulaçõesrelações e articulações

Desde a década de 1970, o BancoMundial estabelece parcerias com o gover-no federal para o financiamento de proje-tos educacionais.8 Porém, no contexto dasreformas da década de 90, o Banco Mun-dial ampliou sua importância no âmbito dadefinição de políticas públicas nos paísesem desenvolvimento. Esta influência ocor-reu, não apenas pelas parcerias consubs-tanciadas em projetos de “cooperação inter-nacional”, através dos quais o Banco efetivaempréstimos para a área social, mas princi-palmente pelas diretrizes vinculadas à libe-ração dos mesmos. São diretrizes pautadas

na indução de políticas caracterizadas comocompensatórias, retirando-lhe o caráter dedireito social. Desse modo, estimula-se aexecução de ações focalizadas apenas paradeterminados segmentos da sociedade, osmais pobres, com vistas a compensar o cres-cimento das desigualdades sociais, servin-do para a contenção da pobreza e para aprevenção de conflitos decorrentes da pró-pria luta de classes.

É nesse cenário que o Fundescolaganha visibilidade como o programa demaior relevo na parceria financeira entre oGoverno Federal e o Banco Mundial paraa educação, tanto pelas diretrizes fixadasno eixo das reformas como pela quantida-de de projetos/ações a ele associados.9 Seufoco de investimento são as chamadasZonas de Atendimento Prioritário (ZAP), asquais compreendem as microrregiões emunicípios mais populosos dos estadosparticipantes, definidos por meio de dadosdemográficos publicados pelo Instituto Bra-sileiro de Geografia e Estatística (IBGE).

O Ministério da Educação (MEC) de-senvolve o Programa em parceria com assecretarias estaduais e municipais de edu-cação das regiões Norte, Nordeste e Cen-tro-Oeste, abrangendo 384 municípios de19 Estados, atingindo cerca de 8 mil esco-las. Seu objetivo é “promover um conjuntode ações para a melhoria da qualidade dasescolas de ensino fundamental, ampliandoa permanência das crianças nas escolaspúblicas, assim como a escolaridade” (Brasil.FNDE, 2004c, p. 1) das referidas regiões.

A missão do Fundescola, segundodocumento divulgado em meio eletrônico,é promover, em regime de parceria e respon-

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sabilidade social, eficácia, eficiência e eqüi-dade no ensino fundamental público da-quelas regiões, viabilizando, por meio daoferta de serviços, produtos e assistênciatécnico-financeira inovadores e de qualida-de, que focalizam o ensino-aprendizageme as práticas gerenciais das escolas e se-cretarias de educação (BRASIL, 2004c). As-sim, no âmbito da parceria com os sistemaseducacionais, suas diretrizes gerais associ-am-se a uma determinada concepção deeducação e de sociedade que favorece ospadrões mercantis nos conteúdos pedagó-gicos, valorizando ainda mais os interesseshegemônicos do mercado no interior dasociedade.

Para executar as ações, o Fundescolaconta com o montante de US$ 1,3 bilhãoentre os recursos federais e do Banco Mun-dial, sendo desenvolvido em três etapas(Fundescola 1, Fundescola 2 e Fundescola 3).

O Fundescola 1 funcionou de 1998a 2001, nas regiões Norte e Centro-Oeste.10

A ênfase desta etapa era a atuação nodesenvolvimento de iniciativas voltadaspara o fortalecimento da gestão escolar edo processo de ensino-aprendizagem, comvistas a aumentar as taxas de participação,aprovação e conclusão dos estudantes. Oscomponentes desenvolvidos foram: 1) Pa-drões Mínimos de Funcionamento das Es-colas; 2) Processo de Desenvolvimento daEscola; 3) Planejamento e Provisão de Va-gas; 4) Gestão e Desenvolvimento dos Sis-temas Educacionais.

O Fundescola 2, cuja execução estáprevista até o final de 2004, expandiu aatuação para a região Nordeste, desenvol-vendo iniciativas voltadas para a escola e

para o planejamento estratégico das secre-tarias, tendo por objetivo melhorar os re-sultados educacionais das crianças matri-culadas em escolas de ensino fundamen-tal atendida pelo Projeto. Os componentesdesenvolvidos são: 1) Elevação das Esco-las aos Padrões Mínimos de Funcionamen-to; 2) Estabelecimento de um Processo deDesenvolvimento da Escola; 3) Promoçãoda Comunicação e Mobilização Social; 4)Fortalecimento dos Sistemas e ProgramasNacionais de Informações Educacionais; 5)Gestão e Desenvolvimento Institucional deSistemas Educacionais; 6) Administração doProjeto e Atividades Piloto.

O Fundescola 3, em implementaçãode outubro de 2002 a outubro de 2006,tem como característica a consolidação dosProjetos anteriores, uma vez que não prevêa inserção de novos municípios ou Esta-dos. Os componentes desenvolvidos são:1) Elevação das escolas aos padrões míni-mos de funcionamento; 2) Estabelecimen-to de um processo de desenvolvimentobaseado na escola e 3) Fortalecimento dosistema educacional.

Na relação entre PDDE e Fundescola,é importante destacar que o PDDE é indi-cado como um dos produtos esperados nacontemplação dos objetivos do Fundescola1. Desse modo, o PDDE situava-se no com-ponente Padrões Mínimos de Funciona-mento das Escolas, no Subcomponente Fi-nanciamento das Necessidades Operacio-nais nas Escolas, cujo objetivo era financiarinvestimentos em melhorias escolares deforma a garantir um padrão mínimo dequalidade do ensino e contribuir para a re-dução das desigualdades sócio-educacio-

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nais entre as regiões do País (BRASIL. FNDE,2004a).

No Fundescola 2, o PDDE também éindicado como um produto esperado dassuas ações que, além da vinculação àmelhoria do desempenho dos sistemaspúblicos de ensino fundamental, visa ao“fortalecimento das escolas e das institui-ções públicas por elas responsáveis, combase em uma estrutura coordenada degerenciamento e inserida em um contextode mobilização e controle social” (BRASIL.FNDE, 2004b). Neste sentido, o PDDE estáinserido no Componente Elevação das Es-colas aos Padrões Mínimos de Funciona-mento, como produto do SubcomponentePromoção da Autonomia da Escola.

Compreendendo que o PDDE é umprograma que adota a perspectiva de polí-tica educacional negociada com os orga-nismos internacionais, tudo indica a suacontinuidade no Fundescola 3 e, ainda, asua possível ampliação. Assim, conformeexpresso nas portarias de regulamentaçãodo Programa, citadas anteriormente, obser-va-se a inclusão do PDDE no processo deorientação e acompanhamento dentre asações desenvolvidas nas Zonas de Atendi-mento Prioritário (ZAP), as unidades esco-lares incluídas nas ações desenvolvidaspelo programa.

Além das ações fiscalizadoras reali-zadas pelo FNDE, pelo Tribunal de Contasda União, pela Secretaria de Controle Inter-no do Poder Executivo e pelo MinistérioPúblico Federal, o PDDE é acompanhado efiscalizado pelo Fundescola, fato reforçadopela Resolução do FNDE nº 10, de 22 demarço de 2004, a qual determina que os

gestores escolares deverão também enca-minhar o Formulário de Detalhamento deAções e Despesas para o Fundescola.

A relação do PDDE com o Fundes-cola não se restringe à fiscalização, umavez que a Resolução referida anteriormen-te determina que as escolas que participamde ações do Fundescola deverão direcionara aplicação dos recursos para a aquisiçãode bens e contratação de serviços com vis-tas ao alcance dos padrões mínimos defuncionamento, conforme definido pela Di-reção Geral do Programa. Este tipo de rela-ção deve ser intensificada uma vez que, pormeio da Portaria nº 1.859, de 24 de junhode 2004, o MEC determinou a transferên-cia da gestão do Fundescola para o FNDE,com o seguinte propósito:

... conferir maior racionalidade gerenciale administrativa aos programas e projetosda área de educação, com o sentido deampliar a eficiência, a eficácia e a trans-parência no uso dos recursos, o propósitode implantar a gestão unificada e unifor-mizar os procedimentos gerenciais dosprojetos do MEC financiados com recur-sos externos, visando a prevenir disper-são e pulverização de esforços e meios ea eliminar superposições e duplicidade deações... (BRASIL, 2004d; grifos nossos).

A justificativa adotada para a trans-ferência do Fundescola denota a possibili-dade de imprimir nas demais atividadesdesenvolvidas pelo FNDE o mesmo mode-lo gerencial propagado pelo Fundescolanas escolas e Secretarias de Educação dasZonas de Atendimento Prioritário, portantoampliando sua influência sobre os Estadose escolas não atendidos pelo Programa.

Outras ações do Fundescola no âm-

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bito da autonomia e gestão das escolasutilizam critérios similares aos da estruturado PDDE, uma vez que o Projeto de Ade-quação dos Prédios Escolares (PAPE), o Pro-grama de Melhoria da Escola (PME) e oPlano de Desenvolvimento da Escola (PDE)também utilizam o sistema de UEx dasEscolas para o repasse dos recursos, o quelhes imputa obrigações e impõe, igualmen-te, às mesmas a execução de ações que,até então, estavam sob responsabilidadedas Secretarias de Educação, porém comuma complexidade maior, em virtude doscritérios rígidos e burocráticos no processode prestação de contas e pelo maior volu-me de recursos.

Importante se faz não perder de vis-ta que, nos projetos do Fundescola, ocor-reu a introdução de novos elementos naatuação cotidiana da direção escolar, reme-tendo para o âmbito de sua responsabili-dade atividades complexas, a exemplo deorçamentos de materiais e de mão de obra,compra e contratação de serviços, fiscaliza-ção de ações no âmbito da rede física daescola, da merenda, do material de consu-mo, dentre outros, sem eximi-la da respon-sabilidade com as demais ações regularesda escola como: controle de matrícula, ad-ministração de pessoal, integração com acomunidade, acompanhamento de açõeseducacionais da escola e sem oferecer umaestrutura adequada para os gestores exe-cutarem tais ações (CRUZ, 2004).

As ações propostas pelo PDDE, nes-se sentido, circunscrevem-se ao campo dofinanciamento. Embora o Programa façareferências a atividades didático-pedagógi-cas, ante à escassez de recursos e à tentati-

va do Poder Público de subtrair responsabi-lidades, torna-se evidente que a função dasUEx além de gerenciar recursos pode su-gerir atuais e futuras responsabilidades pelacondução das escolas ainda públicas. A tí-tulo de exemplo, o documento publicadoem 1995 pelo Banco Mundial (Prioridadese Estratégias para a Educação) aponta co-mo solução, para os inúmeros problemasvivenciados pela escola, a maior autonomiadas mesmas, de forma a responsabilizá-laspelo uso eficaz dos insumos educacionais,envolvendo uma maior participação dafamília na sua administração e supervisão.

Na prática, há um efetivo impedimen-to da autonomia da escola na gestão dosrecursos, sem contar com a impossibilidadede sua participação no processo de defini-ção do montante desses recursos. Assim, asuposta descentralização do PDDE caracte-riza-se pela divisão de responsabilidades,mantendo-se os níveis e padrões de hierar-quia nas relações de poder existentes.

Considerações finaisConsiderações finaisConsiderações finaisConsiderações finaisConsiderações finais

O presente escrito teve como propó-sito analisar a relação entre o ProgramaDinheiro Direto na Escola (PDDE) e a atua-ção do Estado Brasileiro em meio à lógicade reformas preconizadas pelo neolibera-lismo e formalizadas, oficialmente, no PlanoDiretor de Reforma do Aparelho de Estado,em 1995, no primeiro Governo Cardoso(1995-1998). Para tal, elegeu-se o PDDEcomo exemplo de política focalizada e pon-tual, que exemplifica as ações dos gover-nos que adotaram a política neoliberal nosEstados contemporâneos.

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Em outro momento, buscou-se rela-cionar PDDE e Fundescola, em suas açõese vínculos, explicitando os marcos de atua-ção do Estado neoliberal no Brasil e seusefeitos sobre as políticas educacionais. Aposição proposta é de que tanto oFundescola quanto o PDDE operaciona-lizam os propósitos do Estado neoliberalda contemporaneidade, quais sejam: a efici-ência, a administração gerencial, a desre-gulamentação.

O texto, em sua argumentação, bus-ca evidenciar a existência de significativosvínculos do PDDE com os marcosregulatórios do Estado contemporâneo, osquais resultam do processo de alteraçãodas formas produtivas e educativas,condicionando mudanças nas relações eco-nômicas e políticas e estabelecendo umamaneira diferente do Estado inserir-se narealidade social. Nesse processo, sobressa-em os agentes do capital financeiro (porvezes, seus ideólogos) que adentram o cam-po das políticas públicas, fortalecidos pelosreferenciais teóricos que se mostram apa-rentemente novos, eficazes, avançados edesenvolvidos.

NotasNotasNotasNotasNotas1 Este artigo é fruto de uma pesquisa nacionalintitulada “Programa Dinheiro Direto na Escola: umaproposta de redefinição do papel do Estado na edu-cação?”, a qual envolve cinco Estados (Rio Grandedo Sul, São Paulo, Mato Grosso, Piauí e Pará), sob acoordenação da Profª. Drª Vera Maria Vidal Peroni,da UFRGS. A pesquisa tem por objetivo analisar doPDDE como uma das expressões da redefinição dopapel do Estado na Educação, problematizando suasconseqüências para a gestão educacional.2 O Welfare State, ou Estado do Bem-Estar Social, foi

uma forma de regulação social, difundida no pós-segunda guerra mundial, caracterizada pela “emer-gência de uma intensa e progressiva intervençãoplanejada na economia para evitar a fúria da de-sordem produzida pelo mercado”, quando o Estadopassou a controlar áreas estratégicas da economia(energia, telecomunicações, petróleo, minérios), as-sumindo, em algumas situações, o papel de produ-tor direto, além de subsidiar certos setores e res-ponder, por meio de políticas sociais, demandas daclasse trabalhadora organizada em sindicatos(FRIGOTTO, 1996, p. 81).3 A este respeito, consultar, dentre outros, os trabalhosde Rosar e Krawczyk (2001), King (1988), Vianna (1997).4 Cf. Maria de Fátima Rosar e Nora Krawczyk (2001).5 Somente com a Medida Provisória nº 1784, de 14de dezembro de 1998 e reafirmada pela MedidaProvisória nº 2100-32, de 24 de maio de 2001, oPrograma assume a denominação de ProgramaDinheiro Direto na Escola.6 A Resolução nº 10 do FNDE, de 22/03/2004,conceitua Unidade Executora como a entidade ouinstituição responsável pelo recebimento, execuçãoe prestação de contas dos recursos recebidos doFNDE, existindo três tipos: Unidade Executora Pró-pria (UEx) – entidade de direito privado, sem finslucrativos, representativa da comunidade escolar dosestabelecimentos públicos; Entidade Executora (EEX)– prefeituras ou secretarias de educação que rece-bem os recursos das escolas que não dispõem deUEx e Entidade Mantenedora (EM) – ONGs, semfins lucrativos, registrados no CNAS, responsávelpelas escolas de educação especial.7 Resolução do FNDE n. 06, de 19/03/04.8 Podemos destacar os projetos Melhoria e Expansãodo Ensino Técnico de 2º Grau Industrial e Agrícola(1971-1978); Cooperação Técnica às Secretarias Esta-duais de Educação do Norte e Nordeste (1974-1979);EDURURAL (1980-1987); Monhangara (1983-1992);Projeto Nordeste para a Educação Básica (1994-1999)e Fundo de Fortalecimento da Escola (Fundescola),os quatro últimos voltados para o ensinofundamental.9 Atualmente estão em processo de execução asseguintes ações do Fundescola: Planejamento Es-tratégico da Secretaria; Sistema de Apoio à Elabora-

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ção do Plano de Carreira do Magistério Público; Sis-tema Integrado de Informações Gerenciais (SIIG),Plano de Desenvolvimento da Escola (PDE), Projetode Melhoria da Escola (PME), Escola Ativa (aprendi-zagem rural em salas multisseriadas) Programa deGestão da Aprendizagem Escolar (Gestar), Progra-ma de Apoio à Leitura e à Escrita (Praler), ProgramaMelhoria do Rendimento Escolar, Microplane-jamento, Espaço Educativo, Padrões Mínimos de Fun-cionamento das Escolas (PMFE), Levantamento da

Situação Escolar (LSE), Projeto de Adequação do Pré-dio Escolar (PAPE), Mobiliário e Equipamento Esco-lar, Atendimento Rural, Programa de Apoio aos Se-cretários Municipais de Educação (Prasem), Encon-tro dos Conselheiros do FUNDEF, Encontros pelaJustiça na Educação, Comunicação.10 O Nordeste não foi inserido no Fundescola 1 de-vido a estar em processo de conclusão o ProjetoNordeste para a Educação Básica, também financi-ado pelo Banco Mundial.

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Recebido em 05 de outubro de 2004.Recebido em 05 de outubro de 2004.Recebido em 05 de outubro de 2004.Recebido em 05 de outubro de 2004.Recebido em 05 de outubro de 2004.Aprovado para publicação em 04 de novembro de 2004.Aprovado para publicação em 04 de novembro de 2004.Aprovado para publicação em 04 de novembro de 2004.Aprovado para publicação em 04 de novembro de 2004.Aprovado para publicação em 04 de novembro de 2004.

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Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID)Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID)Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID)Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID)Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID)no financiamento do Ensino Médiono financiamento do Ensino Médiono financiamento do Ensino Médiono financiamento do Ensino Médiono financiamento do Ensino Médio

Terezinha Pereira Braz

Doutoranda em Educação pela FEUSP. Professora da UNAESe Técnica da Secretaria de Estado de Educação de MS.E-mail: [email protected]

ResumoResumoResumoResumoResumoEsta análise prende-se ao trajeto dos recursos do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID), desdesuas raízes, no Contrato de Empréstimo nº 1052/OC-BR assinado em 24 de novembro de 1997 pelaRepública Federativa do Brasil e pelo BID, até o seu desdobramento em Mato Grosso do Sul, por meio daspolíticas do Ministério de Educação e Cultura, desenvolvidas na Rede Estadual de Mato Grosso do Sul, em“Programa Melhoria e Expansão do Ensino Médio” (PROMED/Escola Jovem). Isso impõe explicitar, por meiodos estudos produzidos sobre o tema em questão, as determinações mais amplas desse financiamento,nascidas de Acordos de Cooperação entre o Brasil e o Banco Mundial, a que se vincula o BID, elucidandoa relação do Brasil com esse organismo internacional, no longo percurso traçado desde a década de 1930até a execução das ações do PROMED no Mato Grosso do Sul. A relação dos países em desenvolvimentocom o Banco Mundial é o pano de fundo para que se compreenda os acordos de empréstimo, suasimplicações e conseqüências.

Palavras-chavesPalavras-chavesPalavras-chavesPalavras-chavesPalavras-chavesFinanciamento; Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID); Ensino Médio.

AbstractAbstractAbstractAbstractAbstractThis analysis accompanies the course of the resources from the Interamerican Bank of Development (BID)from its roots, in the Loan Contract No. 1052/OC-BR signed on 24th of November, 1997 by the FederativeRepublic of Brazil and by the Interamerican Bank of Development, up to its unfolding in South MatoGrosso, through the politics of the Ministry of Education and Culture, developed in the State Network ofSouth Mato Grosso, in the “Improvement and Expansion of Middle School Program”. This requires makingexplicit, through studies produced on the theme in question, the most ample determinations of thisfinancing, born from the Cooperation Agreements between Brazil and the World Bank, to which theInteramerican Bank for Development is linked, elucidating the relation of Brazil to this internationalorganism, on the long route traced since the decade of the 30’s until the execution of the actions ofPROMED in South Mato Grosso. The relationship of the developing countries with the World Bank is thebackground for uderstanding the loan agreements, their implications and consequences.

Key wordsKey wordsKey wordsKey wordsKey wordsFinancing; Interamerican Bank for Development (BID); Middle School.

Série-Estudos - Periódico do Mestrado em Educação da UCDB.Série-Estudos - Periódico do Mestrado em Educação da UCDB.Série-Estudos - Periódico do Mestrado em Educação da UCDB.Série-Estudos - Periódico do Mestrado em Educação da UCDB.Série-Estudos - Periódico do Mestrado em Educação da UCDB.Campo Grande-MS, n. 18, p. 143-159, jul./dez. 2004.

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1 I1 I1 I1 I1 Introduçãontroduçãontroduçãontroduçãontrodução

Este artigo discute a participação doBanco Interamericano de Desenvolvimen-to (BID) no financiamento do ensino mé-dio. Tomam-se como referências para elu-cidar a discussão as ações do ProgramaProgramaProgramaProgramaProgramaMelhoria e Expansão do Ensino Mé-Melhoria e Expansão do Ensino Mé-Melhoria e Expansão do Ensino Mé-Melhoria e Expansão do Ensino Mé-Melhoria e Expansão do Ensino Mé-dio – (PROMED/Escola Jovem)dio – (PROMED/Escola Jovem)dio – (PROMED/Escola Jovem)dio – (PROMED/Escola Jovem)dio – (PROMED/Escola Jovem)1, emMato Grosso do Sul financiadas por esseorganismo internacional no período de1997 a 2004. Analisa-se o trajeto dos re-cursos do BID, desde o seu nascedouro, noContrato de Empréstimo nº 1052/OC-BRassinado em 24 de novembro de 1997 pelaRepública Federativa do Brasil e o BID eseu desdobramento em MS, por meio daspolíticas do PROMED/MEC (Ministério deEducação e Cultura). Isso impõe explicitar,com o concurso da teoria produzida sobreo tema, as determinações mais amplasdesse financiamento nascido de Acordosde Cooperação entre o Brasil e o BancoMundial, a que se vincula o BID, elucidan-do a relação do Brasil com esse organis-mo internacional, no longo percurso tra-çado desde a década de 30 até a execu-ção das ações do PROMED no Mato Gros-so do Sul. A relação dos países em de-senvolvimento com o Banco Mundial é opano de fundo para que se compreendaos acordos de empréstimo, suas implicaçõese conseqüências.

2 A execução do PROMED em2 A execução do PROMED em2 A execução do PROMED em2 A execução do PROMED em2 A execução do PROMED emMato Grosso do SulMato Grosso do SulMato Grosso do SulMato Grosso do SulMato Grosso do Sul

A participação de um organismo in-ternacional no financiamento do EnsinoMédio em Mato Grosso do Sul tem suasraízes no Contrato de Empréstimo nº1052/OC-BR assinado em 24 de novem-bro de 1997 pela República Federativa doBrasil e o BID, com a finalidade de coope-rar na execução do Programa de Expan-são da Educação Profissional – (PROEP).O PROEP incluiu dois subprogramas: a)Implantação de Pol í t icas Globais ,Implantação de Pol í t icas Globais ,Implantação de Pol í t icas Globais ,Implantação de Pol í t icas Globais ,Implantação de Pol í t icas Globais ,com a finalidade de equipar o MEC cominstrumentos e mecanismos necessáriospara apoiar a implantação da Reforma daEducação Profissional nos estados e mu-nicípios e escolas profissionais participan-tes do Programa e, ainda, sensibilizar e in-formar a opinião pública sobre o desen-volvimento da reforma e, b) Planos Es-Planos Es-Planos Es-Planos Es-Planos Es-taduais e Projetos Escolarestaduais e Projetos Escolarestaduais e Projetos Escolarestaduais e Projetos Escolarestaduais e Projetos Escolares, com afinalidade de executar pré-investimento einvestimento dos estados e das escolasparticipantes do Programa. É dentro destesubprograma que o BID dá o primeiro pas-so no sentido de financiar o Ensino Mé-dio em MS com o PROMED – Projeto Es-cola Jovem2.

Em novembro de 1997, o MEC soli-cita ao Governo de Mato Grosso do Sul aelaboração de um PPI (Plano de Pré-Inves-timento), destinando recursos para a ela-boração dos Planos de Trabalho da Secre-taria Estadual de Educação – PEP (Planode Reforma da Educação Profissional) ePEM (Plano de Reforma e Expansão do En-sino Médio), como condição de recebimen-

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to dos recursos destinados ao PROMED. Osrecursos, no montante de R$ 100.000,00(cem mil reais) para o PEM, foram gastosna elaboração de um Projeto de Investi-mento (PI), para o desenvolvimento dasações do PROMED, que foram executadaspela Secretaria de Educação do Estado deMato Grosso do Sul em convênio com aAgência de Cooperação Internacional, aOrganização das Nações Unidas para aEducação, a Ciência e a Cultura – UNESCO.Entretanto, analisando um documento desetembro de 1998, denominado Contratode Prestação de Serviços, constatou-se quefoi alocada a quantia de R$ 120.000,00(cento e vinte mil reais) com a elaboraçãodo PI, ou seja, 20% a mais do que o pre-visto. Posteriormente, em 1999, este PI foirecusado pelo MEC e devolvido ao Estadopara ser refeito.

Refeito e aprovado em novembro de2000, o novo PI tem como objetivo imple-mentar a reforma curricular e expandir oatendimento no ensino médio no Estado,visando à melhoria de sua qualidade e àampliação de seu grau de cobertura, comoforma de garantir maior eqüidade social. Aexecução orientou-se por meio das seguin-tes políticas: Fortalecimento Institucional daSecretaria de Educação; Qualidade Socialda Educação; Plano de Disseminação e Di-fusão; Democratização do Acesso; Desen-volvimento Curricular; e Racionalização,Expansão da Rede Escolar e Melhoria do

Atendimento.Esse PI previu, de início, para Mato

Grosso do Sul, investimentos da ordem deR$ 9.571.615,74 (nove milhões, quinhentose setenta e um mil e seiscentos e quinzereais e setenta e quatro centavos), sendoR$ 4.756.195,90 (quatro milhões setecen-tos e cinqüenta e seis mil e cento e noven-ta e cinco reais e noventa centavos), re-cursos do projeto Escola Jovem (MEC/BID),e R$ 4.815.419,84 (quatro milhões, oito-centos e quinze mil e quatrocentos e de-zenove reais e oitenta e quatro centavos),recursos da contrapartida estadual de acor-do com os tetos e requisitos definidos peloMEC para o desenvolvimento do Programa.

No entanto, o Parecer Final nº 16/00, que aprovou o PI, recomendou a assi-natura de convênio com o MS no valor totalde R$ 7.257.979,00 (sete milhões, duzen-tos e cinqüenta e sete mil e novecentos esetenta e nove reais), para as várias cate-gorias de despesa apresentadas, sendo aContrapartida Estadual R$ 3.433.523,00(três milhões quatrocentos e trinta e três mile quinhentos e vinte e três reais) e o aportefinanceiro do BID R$ 3.824.456,00 (três mi-lhões, oitocentos e vinte e quatro mil e qua-trocentos e cinqüenta e seis reais) (MEC,Parecer nº 016/00, p. 5).

Observa-se que a aprovação do PIse dá com a redução dos recursos em24,2%, distribuídos nas várias categorias dedespesa constantes da Tabela 1:

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O Plano de Trabalho na sua primeirafase3 sela o compromisso de execução doPROMED em Estado de Mato Grosso doSul, no período de dezembro de 2000 adezembro de 2002. A aplicação previstanão foi cumprida, pois o Plano de Trabalhofoi aprovado e deferido pelo MEC em 22de novembro de 2000 e o recurso foi em-penhado em 29 de dezembro desse mes-mo ano, tornando impossível o cumprimen-to da previsão de aplicação.

Situações como essa e outras, discri-minadas a seguir, levaram à celebração deseis Termos Aditivos ao Convênio, repro-gramando o tempo de aplicação dos re-cursos financeiros, assim como o cumpri-mento de metas.

As razões alegadas pela Coordena-ção da Educação Básica da SED para acelebração de tantos Termos Aditivos de-vem-se a inúmeros fatores: falta de previ-são dos recursos no Orçamento do ano2000, falta de recursos no momento em queesses eram solicitados, burocracia a serobedecida para a aplicação dos recursos,

morosidade nas licitações realizadas pelaSecretaria de Fazenda, lentidão dos técni-cos da SED em planejar a aplicação, difi-culdade em prestar contas ao MEC e, prin-cipalmente, trocas de equipes técnicas porocasião de mudanças de secretários esta-duais e ministros e o tempo levado paraque cada Termo Aditivo chegasse a ser pu-blicado.

Constatou-se que até a data da pres-tação de contas do 1º e 2º Termos Aditivosao Convênio PROMED/259/00 ao MECforam aplicados 25,5% do total dosre-cursos previstos (R$ 7.257.979), a partirde 2000; sendo, 30,9% da parte previstado Concedente – BID (R$ 3.824.456,00) e19,5% do valor previsto para o Estado/MScomo contrapartida (R$ 3.433.523,00).

O limite de análise do ConvênioPROMED/259/00, neste artigo só foi possí-vel até o Termo Aditivo 2°, pois, embora aSED já tenha solicitado o 6° Termo Aditivo,a prestação de contas para o MEC só foifechada até a 2ª parcela, em 2003.

Para finalizar este item, apresenta-se

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um Quadro Síntese dos recursos oriundosdas duas fontes de financiamento do Ensi-no Médio de Mato Grosso do Sul que sãoos recursos oriundos do empréstimo do

Banco Mundial, analisados neste trabalhoe os advindos da fonte estadual, compara-tivamente.

Conforme se pode ver na Tabela 2, oquantitativo da Fonte 12 (internacional-BID) aplicado no Ensino Médio é bastanteirrisório em relação ao quantitativo de re-cursos estimados da Fonte 00 (estadual)aplicados pelo Estado do MS nessa mes-ma etapa de ensino. Observa-se que osvalores do empréstimo são liberados anoa ano. Conforme se pode analisar pelosdados do quadro de 2001 e 2002, os re-cursos internacionais correspondem a0,26% e 3,4% dos gastos estaduais com oEnsino Médio nos respectivos anos.

3 A questão vista pelo olhar da3 A questão vista pelo olhar da3 A questão vista pelo olhar da3 A questão vista pelo olhar da3 A questão vista pelo olhar dateoria que trata do financiamentoteoria que trata do financiamentoteoria que trata do financiamentoteoria que trata do financiamentoteoria que trata do financiamentodo Ensino Médiodo Ensino Médiodo Ensino Médiodo Ensino Médiodo Ensino Médio

A leitura da teoria produzida sobre otema em questão não só permitiu perceberque as políticas desencadeadas no EnsinoMédio de Mato Grosso do Sul no período

aqui delimitado se dão sob orientações edeterminações de políticas mais amplasnascidas dentro de Acordos de Coopera-ção entre o Brasil e o Banco Mundial comotambém contribuíram para elucidar a rela-ção do Brasil com esse organismo interna-cional no longo percurso traçado desde adécada de 1930 até a execução das açõesdo PROMED no Mato Grosso do Sul. Noentanto, a relação dos países em desen-volvimento com o Banco Mundial é o panode fundo para que se compreenda os acor-dos de empréstimo, suas implicações e con-seqüências.

Nessa perspectiva, é José LuisCoraggio que investiga as propostas doBanco Mundial no contexto da globaliza-ção, buscando seus fundamentos e o sen-tido das políticas sociais.

Partindo de uma afirmação do pró-prio Banco Mundial de que sua contribui-ção para ajudar os governos é menos com

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recursos do que com idéias, veiculadas pormeio de “políticas educativas adequadasàs especificidades dos seus países”, o autoranalisa a validade, condições e conseqü-ências dessas idéias e dos empréstimos quevêm junto com elas.

A primeira constatação é que há umahomogeneidade discursiva, embora o pro-posto seja focar as especificidades dos pa-íses que financiam. Detecta, ainda, sinais deque outros atores estão envolvidos nessaspolíticas operando ativamente e, portanto,co-responsáveis pelos resultados, atribuin-do a diversidade das políticas a atores lo-cais e, portanto, rompendo com a idéia deque a responsabilidade pelas políticas na-cionais de educação sejam resultado e res-ponsabilidade exclusiva de um “monolíticoBanco Mundial”. Entende o autor que cons-titui um campo ainda inexplorado os limi-tes e as possibilidades da relação entre oBanco Mundial, os governos e as socieda-des da América Latina.

Aponta contradições entre a propos-ta do Banco Mundial de alívio à pobreza,nos marcos da reforma do Estado e do pre-domínio do mercado, isto é, nos marcos doneoliberalismo, questionando a eficácia depolíticas focalizadas na pobreza e reivindi-cando outro enfoque de desenvolvimento.A seguir, analisa os possíveis sentidos dapolítica social orientada para investir recur-sos públicos nas pessoas, para que todostenham o mínimo. Essa é uma política, dizo autor, que conduz à formação de capitalhumano de baixo custo para o capital epromove a eqüidade à custa do empobre-cimento dos setores médios urbanos, semafetar os mais ricos. Um outro ponto é que

são políticas direcionadas a compensarconjunturalmente os efeitos da revoluçãotecnológica e econômica que caracterizama globalização e garantem o ajuste estru-tural, liberando as forças do mercado e aca-bando com a cultura dos direitos univer-sais a bens e serviços básicos outrora asse-gurados pelo Estado. Acabam tornando-sepolíticas ineficientes que fomentam oclientelismo político. E o terceiro ponto, im-portante, apontado pelo autor, é que taispolíticas sociais são formuladas parainstrumentalizar a política econômica maisdo que para continuá-la ou compensá-la eo faz por meio da descentralização, “dei-xando nas mãos da sociedade civil com-petitiva a alocação de recursos, sem medi-ação estatal” e introjetando nas funçõespúblicas os valores e critérios do mercado.Diz Coraggio que, embora esses três senti-dos estejam presentes e se entrelacem nodiscurso técnico e no senso comum dosagentes educativos, deve-se lutar para cons-truir sentidos mais avançados para as polí-ticas públicas; e que seus resultados atuaisnão são apenas simples expressão da von-tade do mais poderoso, nem são apenasinspiradas pelo novo conservadorismo dadireita, mas adquirem fôlego pela ausên-cia de iniciativa e pelo comportamento de-fensivo de outras forças sociais e políticas.

A partir dessas premissas, o autor pas-sa a discutir as políticas sociais no contextodo mercado mundial, deixando ver que naótica da globalização a idéia do êxito paraindivíduos, setores sociais e países não su-põe cooperação ou solidariedade, mas o tri-unfo na competição com os outros. O mes-mo discorre sobre o que é a competitividade

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nos marcos do neoliberalismo e aponta osesforços da América Latina para conseguircompetitividade e as conseqüênciasadvindas, para, então, apontar os limites àglobalização e as propostas do Banco Mun-dial para que o capitalismo supere esses li-mites. Como limites aponta os desequilíbriosecológicos e a intensificação dosdesequilíbrios sociais, para em seguida apre-sentar as estratégias do Banco Mundial parasuperá-los: 1. promover o trabalho – uso pro-dutivo mais abundante dos pobres – medi-ante um conjunto de estratégias que inclui,por exemplo, infra-estrutura física e inova-ção tecnológica e 2. fornecer aos pobres osserviços sociais básicos, em especial saúdeprimária, planejamento familiar, nutrição eeducação básica. Coraggio (2000, p. 86) afir-ma que esse tipo de estratégia mostra por-que o Banco Mundial, “que tradicionalmen-te direcionou investimentos para infra-estru-tura e crescimento econômico, aparece cadavez mais como uma agência propulsora doinvestimento em setores sociais e na refor-ma do conjunto das políticas sociais”). A se-guir, questiona a eficiência dessa políticasocial “para todos” que não inclui empregoe, portanto, renda para todos, na qual os ser-viços básicos destinados aos pobres são gra-tuitos e de má qualidade e os serviços maisamplos, de melhor qualidade, são ofereci-dos aos demais por meio do mercado. Se-gundo Coraggio, a eqüidade desses servi-ços levaria a distribuição do gasto social atomar outras formas, saindo do foco da ren-da e de sua distribuição para o do aumentona massa de renda real disponível, garan-tindo sua efetividade para modificar a vidae as expectativas da população.

O autor afirma, ainda, que com baseno suposto de uma perfeita concorrência,os organismos internacionais exercem for-te pressão para impor aos países a quememprestam e assessoram, polít icasmacroeconômicas, interferindo também naspolíticas sociais, sobretudo para reduzir etornar mais eficiente o gasto público, o queindica subordinação das políticas sociais aoobjetivo econômico da competitividade,afetando assim, a soberanias desses paí-ses. Afirma que o desenvolvimento huma-no não pode ser visto como um resultadopossível da competitividade senão comoseu resultado e propõe uma competitivida-de sustentável, cujas unidades de interven-ção não sejam os segmentos de baixa ren-da sob os quais as políticas incidem, mascomunidades heterogêneas completas.

Sobre os fundamentos da políticaeducacional do Banco Mundial, Coraggioafirma que o marco teórico-metodológicodessa política é a teoria econômica neoclás-sica, que supõe a perfeita concorrência, o queseria um reducionismo economicista queesteve presente no Banco desde a décadade 1970, quando já estavam elaboradastodas as receitas que hoje podem ser vistascomo respostas às crises do sistema educa-cional, e cujo enfoque já era o de assemelhara escola ao formato empresarial. Isso signi-fica, segundo o autor, que estamos receben-do uma assessoria para reformar nossos sis-temas educacionais, baseada em uma teo-ria questionável, que é parte da ideologianeoliberal e neoconservadora dominante.

Marília Fonseca (2000) pesquisado-ra que trata do financiamento concedidopelo Banco Mundial aos projetos econô-

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micos e políticos brasileiros faz um estudoacerca da relação entre esse banco e osgovernos brasileiros, no sentido de demons-trar que a educação brasileira, desde osacordos MEC-BIRD, transformou-se em ex-periência de cooperação internacional.

Uma retrospectiva feita pela autorademonstra que a partir dos anos 1930 acooperação entre educadores brasileiros eamericanos se constitui como um estágiode intensa integração que acaba com ainterferência na universalização do ensinobásico, trazida pela Lei de Diretrizes e ba-ses da Educação Nacional de 1961. Afir-ma Fonseca que o Banco Mundial vemprestando auxílio sob a forma de coopera-ção técnica para a educação junto aospaíses chamados de Terceiro Mundo, des-de a década de 1970.

Demonstra ainda o caminho dosacordos MEC-USAID desde a “Aliança parao Progresso” que provinha assistência aoprocesso de desenvolvimento do TerceiroMundo, envolvendo desde assessorias deuniversidades norte-americanas, produçãode material didático e formação de profes-sores em instituições americanas, até alte-rações nas leis educacionais brasileiras. Aautora relata os descontentamentos e resis-tências sociais gerados por esse processo,o que acarretou a interrupção das ativida-des pelo governo federal em 1963.

Essas atividades são retomadas deforma intensiva pelos governos militares, apartir de 1964, por meio do Decreto nº 200/67 que inspirou o 1º Plano Setorial de Edu-cação, cujos objetivos e metas correspon-diam a ações de grande impacto e cunhomeramente quantitativo, além da criação

de entidades descentralizadas e autôno-mas como o CENAFOR, por exemplo, queprevia a formação a curto prazo de gerenteseficientes e autônomos que promovessema modernização dos setores econômicos.

Devido aos descontentamentos ge-rados pelos acordos bilaterais, no final dosanos 1960, por iniciativa do próprio gover-no americano, esses são substituídos porcontribuições a agências multilaterais, comoo BID e o BIRD, que passam a partir dadécada de 1970 a desenvolverem as açõesde cooperação técnica5. Com isso, o finan-ciamento da educação passa a ser conce-bida segundo o modelo de co-financiamen-to, o que significa que o Banco não empres-ta diretamente, mas ressarce o país por in-vestimentos antecipados (ou contrapartida)efetuados segundo cronograma acordadopreviamente com o BIRD e aplicados emprojetos que incluem desde construção erecuperação de espaços escolares até trei-namento de professores e aquisição deequipamentos e materiais didáticos.

Segundo Fonseca (2001), no co-fi-nanciamento, os créditos concedidos sãoparte de projetos econômicos mais amplose passam a integrar a dívida externa dopaís, acarretando pesados encargos e pré-condições financeiras e políticas próprias dofinanciamento comercial. Em razão disso,esse processo passou a ser questionado poralguns países beneficiários, gerando umapolêmica divisão de opiniões em âmbitointernacional. No Brasil, no período 1970-1990, a cooperação dá-se por meio de trêsprojetos de co-financiamento desenvolvidosno âmbito do Ministério da Educação e pordois desenvolvidos com o Ministério do

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Trabalho. E essa modalidade de financia-mento que está vigente, ainda hoje, no acor-do entre o MEC e o BID, que resulta noacionamento das políticas do PROMED.

A autora chama a atenção para ofato de que, para receber o crédito do BIRD,o país tem que desembolsar um montantemuito maior, sem contar com os custos re-ferentes ao pagamento de juros e taxas decompromisso. Tendo em vista que os proje-tos educacionais têm exigido quase o do-bro do tempo previsto para sua execução,esta última taxa pode representar um au-mento do custo dos projetos e, por conse-qüência, da dívida, considerando, ainda, adespesa com ajuste de câmbio.

Também ressalta essa autora umconjunto de dificuldades no processo dedesenvolvimento dos acordos, como porexemplo, o acesso aos dados financeirosdos acordos; a fragmentação das informa-ções distribuídas em diferentes órgãos exe-cutores; os diferentes valores que integramo pool de moedas, o que interfere, de al-gum modo, no cálculo dos encargos inter-nacionais; a exigência de sigilo dos acor-dos que contribui para a irredutibilidade doconhecimento sobre os custos de um pro-jeto; e o tempo de negociação dos proje-tos, que implicam custos indiretos.

Nesse sentido, após o estudo da ex-periência de co-financiamento desenvolvi-da pelo Brasil-Banco Mundial por duasdécadas, conclui a autora que isso se cons-tituiu em um processo caro, complexo doponto de vista administrativo e ineficazquanto aos resultados educacionais.

Maria Sylvia Simões Bueno (2002),discute a educação básica no emaranha-

do das políticas nacionais, evidenciandocomo essas políticas são determinadas porum contexto global, no qual agênciascomo o Banco Mundial, o BIRD e o BIDaparecem como, mais do que financiadoras,fomentadoras e estimuladoras dessas po-líticas para os países ditos “em desenvolvi-mento”, entre eles, o Brasil. Essa reflexãoganha relevância na medida em que permi-te a compreensão de uma questão intrigan-te que não houvera sido esclarecida pelosdocumentos oriundos do PROMED, qualseja: porque o financiamento do ensino mé-dio no Brasil está colocado dentro de umprograma para a educação profissional?

Segundo a autora, no âmbito daspolíticas internacionais, as idéias vão evo-luindo de uma preocupação com a forma-ção tecnológica para a separação que aLDB realizou entre educação profissional eensino médio, instância que sempre se ca-racterizou como de caráter dúplice e, porisso mesmo, um nível estratégico do siste-ma educacional, por preparar o jovem, si-multaneamente, para o ensino superior epara o mercado de trabalho.

Afirma Bueno (2002, p. 126-127) quea grande fonte de inspiração para as refor-mas operadas e que provocou tal cisão foia literatura veiculada pelos organismos in-ternacionais, em especial, estudos, docu-mentos e recomendações do Banco Mun-dial, do BID e de organismos articulados àUNESCO. A autora aponta o relatório Issuesin brazilian secondary education, 1989, e oestudo do Banco Mundial, 1987, intitulado“O financiamento da educação em paísesem desenvolvimento”, como importantessubsídios definidores da separação entre

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ensino médio e educação profissional. Arede de argumentos que deságua nessacisão vai desde as funções distorcidas dasescolas técnicas federais, passa pela deca-dência das redes estaduais e municipais deensino, por uma suposta “boa qualidade”da rede privada e desemboca na recomen-dação para se melhorar o custo/efetividade,incrementar a participação do setor privadoe separar o ensino técnico do acadêmico.

À parte as discussões, consensos edissensos entre técnicos nacionais e interna-cionais, fica valendo não só o estudo doBanco Mundial de 1987, mas as diretrizesdo mesmo Banco sugeridas no texto de1992, intitulado Educación técnica yformación profesional, cujas idéias perpas-sam o Plano decenal de educação paraPlano decenal de educação paraPlano decenal de educação paraPlano decenal de educação paraPlano decenal de educação paratodostodostodostodostodos. Bueno evidencia, porém, que é nodocumento Planejamento político-estra-Planejamento político-estra-Planejamento político-estra-Planejamento político-estra-Planejamento político-estra-tégicotégicotégicotégicotégico – 1995-1998, publicado pelo MECem 1995, que se estabelece o novo moldedo que será aprovado posteriormente pelaLDB (p. 131). A seguir, em julho de 1995:

O MEC dá andamento a um processo denegociação com o BID (projeto BR-0247),que espelha o perfil das transformaçõesdesencadeadas para o ensino médio e aeducação profissional [...] esse início deacordo financeiro assinala a necessidadeurgente de viabilizar, com qualidade, al-ternativas de oferta e expansão do ensinode 2º grau, bem como novas formas degestão e diversificação dos cursosprofissionalizantes (BUENO, 2000, p. 132).

Embora nesse documento haja umaceno para a separação entre ensino mé-dio e educação profissional, inspirada peloBanco Mundial, sua definição clara só apa-rece na proposta encaminhada pela

Semtec/MEC ao Congresso em março de1996, dando origem ao PL 1603/96 (p.134). Nesse meio de tempo, o acordo finan-ceiro com o BID (projeto BR-0247) sofreuma série de reformulações para se ade-quar com mais precisão a essa separaçãoentre ensino médio e educação profissio-nal, no qual a reforma do ensino profissio-nal é dimensionada como pré-requisito paraa reforma do ensino médio e ponto de par-tida para um programa de racionalizaçãode custos previstos para a separação deambas as modalidades educacionais, se-gundo a autora.

O financiamento é assumido na prá-tica por um acordo que prevê um valor to-tal de 500 milhões de dólares, comprome-tendo-se o BID com 60% dos recursos, taxaque está corrigida para 50% no plano definanciamento datado de 12/9/2004, levan-do a autora à conclusão de que:

[...] a nova LDB parece vir apenas referen-dar um programa e andamento, prepara-do pela Semtec com assistência diretaespecializada do BID, consultoria contra-tada pela Unesco e apoio técnico daOklahoma State Universty: um plano de-talhado de ação com datas previamenteacordadas (BUENO, 2000, p. 135).

Nesse sentido, as reflexões de Buenodeixam claras as instâncias envolvidas eas circunstâncias que explicam estar o fi-nanciamento do ensino médio, originalmen-te, dentro de um programa de financiamentodo ensino profissional.

Nicholas Davies é mais um autor quediscute a questão, reivindicando que o fi-nanciamento da educação passa necessa-riamente pela compreensão do “Estado docapital” que, não sendo um bloco

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monolítico, espelha não só as diferenças edivergências das classes dominantes, mas,em escala bem menor, também os interes-ses e ações das classes trabalhadoras. Oautor diz que o capitalismo, na sua crise dereprodução do capital em escala mundial,demandou as políticas neoliberais e inten-sificou sua ofensiva mundial no sentido deconquistar novos espaços para sua repro-dução por meio da orientação e direção doBanco Mundial e do FMI (Fundo Monetá-rio Internacional). No que diz respeito aoEstado brasileiro, nessa mesma perspecti-va econômica aponta sua subordinaçãoaos centros hegemônicos do capitalismo ediz que a ofensiva do capital começa coma eleição de Collor de Melo e se amplia econsolida com o presidente HenriqueFernando Cardoso:

[...] cujas políticas propuseram a reduçãodo papel do Estado na economia e emoutros setores como a educação, com baseno diagnóstico de ineficiência e má ges-tão do Estado, cujo déficit seria sanadopela melhor gestão e/ou redução dos gas-tos estatais e/ou seu direcionamento parasetores supostamente mais carentes e/oude retorno econômico mais seguro.(DAVIES, 2002, p. 158).

Quando discute os desafios de or-dem conjuntural que interferem no financi-amento do ensino médio, demonstra queo governo federal, quando aciona as me-didas contidas na Emenda Constitucional14, como as verbas do FUNDEF (Fundo deManutenção e Desenvolvimento do Ensi-no Fundamental), destinadas ao ensinofundamental (60% dos 25% oriundos deimpostos), segue orientação do BancoMundial segundo a qual deve-se priorizar

essa etapa da educação básica com maiortaxa de retorno econômico e maior poten-cial de alívio à pobreza, entre outras medi-das. A intenção, afirma Davies, não é au-mentar gastos públicos no setor social, masapenas redistribuí-los. Essa priorização doensino fundamental, além dos prejuízospara diversos outros setores e níveis deensino, afeta o ensino médio, na medidaem que apenas 10% dos impostos não vin-culados ao FUNDEF são destinados a essenível de ensino.

Prossegue o autor afirmando que adefinição dos 10% não se baseia em ne-nhum estudo que comprove esse percen-tual ser suficiente para garantir a expan-são quantitativa e qualitativa do ensinomédio. Nesse sentido, programas como oPROMED – Escola Jovem, do MEC teriamno máximo uma intenção supletiva, consi-derando que, os 500 milhões de dólaresemprestados pelo BID, os 450 milhões dacontrapartida dos governos estaduais e os50 milhões com que entra o Tesouro Naci-onal é uma quantidade irrisória.

Davies chama ainda a atenção paraas experiências passadas que nunca gera-ram uma receita significativa para o ensi-no médio, e para o desperdício e corrupção,endêmicos dos governos, atentando que aLei de Responsabilidade FiscalLei de Responsabilidade FiscalLei de Responsabilidade FiscalLei de Responsabilidade FiscalLei de Responsabilidade Fiscal é, naverdade, de Responsabilidade com osResponsabilidade com osResponsabilidade com osResponsabilidade com osResponsabilidade com osCredoresCredoresCredoresCredoresCredores, pois seu único objetivo é garan-tir o pagamento da dívida pública externae interna:

[...] mediante a contenção de certos (nãotodos) gastos estatais e não o uso maisracional do dinheiro público, que, por fal-ta de controle social efetivo, continuará

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sendo abocanhado em proporções cres-centes pelas várias frações do capital (so-bretudo o financeiro) e pelos vários seto-res da burocracia estatal (sobretudo osprivilegiados, como os da Fazenda, Judici-ário e militares) com maior poder de bar-ganha e/ou mais estratégicos para a or-dem burguesa (DAVIES, 2002, p. 171).

Mediante o exposto, a dificuldadeaventada pelo autor é que a expansão doensino médio venha a acontecer com fortedeterioração da qualidade, em decorrênciada ocupação dos espaços ociosos das es-colas de ensino fundamental, sobretudo nonoturno, e da contratação de professoresem regime precário, especialmente. Enten-de, ainda, que há um descompasso, difícilde ser acertado, entre crescimento de ma-trículas (2,472 milhões, em 1991 para18,468 milhões, em 2001) e os 10% dosimpostos não vinculados destinados aoensino médio. Além do que, segundo Davies,é pouco provável que tal porcentagem ve-nha a ser efetivamente destinada totalmen-te para o ensino médio já que, em muitosestados, como é o caso da Bahia, Paraná,Rio de Janeiro e São Paulo, os governosestaduais consomem parte dessa fatia noensino superior. No caso de Mato Grossodo Sul, são aplicados em torno de 50% dos10% destinados ao Ensino Médio.

É, porém, com a análise da pesqui-sadora Angela Carvalho de Siqueira (2000,p. 1). que a crítica às políticas desenca-deadas pelo Banco Mundial tornam-secontundentes, porque ela é realizada a partirde documentos escritos por atores do pró-prio Banco. A autora faz uma exposiçãodetalhada do discurso que perpassa essesdocumentos, apontando, inicialmente, a

mudança de direção dos mesmos em fun-ção de um descontentamento internacio-nal face às prescrições do Banco Mundialpara os países em desenvolvimento. Segun-do Siqueira, fica patente que a mudançado discurso inclui o temor de sérios confli-tos e distúrbios sociais. Segundo Heyneman,1998 (in: Siqueira, 2000, p. 1), as escolasdeveriam ensinar, “os exemplos de paísese grupos que seguem as leis e as conse-qüências e penalidades para os que as de-sobedecem”.

A autora aponta que o discurso dosvários documentos6 vai, progressivamente,fechando a idéia de que os países em de-senvolvimento devem se preocupar emdesenvolver políticas voltadas para as séri-es iniciais para, depois de resolvido esseproblema, ir gradualmente ampliando oleque de oferta até atingir o ensino superior.Demonstra, ainda, que se delineia no discur-so dos documentos uma defesa clara detodas as formas de transferências de recur-sos públicos para os indivíduos e as insti-tuições privadas, baseada na idéia da “livreescolha” dos estudantes, a quem, para isso,são oferecidos empréstimos administrados,todavia, por bancos comerciais e tratadoscomo quaisquer outras dívidas comerciais.

É, entretanto, no “Documento Estra-tégia para o Setor Educacional”, de 1999 ena idéia do “Banco de Administração doConhecimento” que a análise de Siqueirase concentra, mostrando que o documentoacima traz um enfoque extremamente co-mercial, não se preocupando com análisesque considerem o custo/benefício, nem coma melhoria da capacidade administrativagovernamental. O principal objetivo, diz

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Siqueira, parece ser o de ajudar a abrir osetor educacional como nova opção de in-vestimento para firmas privadas/comerciaiscom interesse na educação. O documentoadvoga, ao invés de formação, o treinamen-to de professores por meio do ensino a dis-tância, com o uso da internet como formareduzir custos educacionais e a utilizaçãode tecnologias como principal instrumentopara a reforma curricular.

O Documento Estratégia para o Se-tor Educacional também lista as principaisáreas de reforma que o Banco irá apoiar:a) padronização do conhecimento a seralcançado (standards), currículo e avaliaçãode resultados; b) gestão e descentralização;c) provedores e financiadores não gover-namentais.

O mesmo documento informa, ain-da, que, para incentivar essas metas, coloca-rá à disposição ex-ministros de educação eoutros funcionários de alto escalão, estudosdetalhados de casos de países com experi-ências bem sucedidas, além de um inter-câmbio de informações via internet, enfa-tizando as oportunidades de investimentoem educação em países clientes. Fica paten-te no documento a visão comercial, na qualpaíses são denominados clientes para osquais a educação deve ser entregue comoum pacote pronto e cujos empréstimos etrabalhos do Banco são referidos no docu-mento como “o negócio educacional doBanco” (WORLD BANK, 1999).

Em tal “negócio” a educação não étratada como um direito humano e socialque deva ser vista como um processo pro-fundo de observação, leitura, análise, avali-ação e proposição de alternativas, mas

como um tópico rápido e descartável quepode ser entregue em sua casa por qual-quer empresa educacional de sua “esco-lha” a preço mais acessível. Segundo aautora, o documento adverte os paísespara que sigam essa tendência, denomi-nando de inteligentes aqueles que embar-cam em tal proposta, afirmando que os queassim não fizerem correm o risco de fica-rem para trás.

Essa exposição de Siqueira vemacompanhada de uma crítica sobre os pro-blemas e dificuldades que essa ótica de tra-tar a educação como um negócio descar-tável traz, ferindo a idéia de que educar éconstruir uma visão de mundo baseadanos direitos humanos e sociais e na digni-dade da pessoa, pela observação da reali-dade local e de seus problemas diários, naqual se busque ler a palavra para ler omundo como ensina Paulo Freire. Indagaa autora:

Mas quem são os clientes que o bancomenciona que devem ser escutados nes-sa perspectiva mais comercial e dirigidapara o mercado? São apenas os em pos-tos de alto-escalão nos governos, funcio-nários que comungam idéias semelhan-tes, formados em economia, técnicas demedidas educacionais, etc, principalmen-te em universidades americanas ou trei-nados em alguns cursos oferecidos peloBanco Mundial e seus associados, comoos bancos de desenvolvimento regional?(SIQUEIRA, 2000, p. 8).

Outro questionamento importantediz respeito à falta de acesso dos pesqui-sadores aos documentos internos de polí-tica ou de estudo do Banco. Embora pormeio do Sistema de Administração do Co-nhecimento Educacional (EKMS –

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Education Knowledge Management System)o mesmo se advogue o título de Banco doConhecimento, supõe a autora que, comotal, ele devesse ser aberto e democrático e,no entanto, muitos documentos são man-tidos em segredo, inacessíveis ao conheci-mento público. O EKMS atua mais comoum filtro que ignora contextos e promoveo conhecimento que deseja ver adotado.

4 Conclusão4 Conclusão4 Conclusão4 Conclusão4 Conclusão

Dos estudos acima, se depreende quede longo prazo os efeitos das interferênci-as do Banco Mundial na educação brasi-leira se fazem sentir, de forma desastrosapor seus equívocos, pretensões descabidase políticas inflexíveis e agressivas. Pauta-das na Teoria do Capital Humano7 essaspolíticas julgam que o desenvolvimento dospaíses “de Terceiro Mundo” rumo ao statusde Primeiro Mundo, deve-se ao atrelamentode suas forças produtivas ao mercado. Issoexplicita a razão de toda a ênfase que temsido dada, desde os acordos MEC-USAIDaté as políticas atuais, à educação profissi-onal, como consta da Lei de Diretrizes eBases da Educação Nacional, 1996.

Não por acaso, as políticas do PEMdecorrem do PROMED, não por acaso, ofinanciamento é tão irrisório no ensinomédio e tão amarrado ao ensino funda-mental, pois essa é em potencial a força detrabalho que deve ser preparada para che-gar aos cursos profissionalizantes básicos,técnicos e tecnológicos. Esses últimos, extre-mamente estimulados pelas políticas minis-teriais e largamente incorporados pelas ins-tituições de ensino superior privadas, pode-

rão a longo prazo substituir os cursos degraduação, aligeirando o conhecimentotécnico e obliterando o conhecimento cien-tífico e a pesquisa no interior das universi-dades.

Do ponto de vista do Estado de MatoGrosso do Sul, diante do que foi apresenta-do, percebe-se o que a análise anterior jáconfirmou, pois as dificuldades enfrentadaspela Secretaria de Educação em trabalharcom o financiamento do Banco Mundialdecorre dos resultados precários em relaçãoao custo-benefício oriundo do descompassoentre os prazos de liberação dos recursos peloMEC e o tempo necessário para a execuçãodos gastos e para as prestações de contaparciais desses gastos exigidas pelo MEC,confirmando as idéias expostas anteriormen-te acerca do desnecessário encarecimentodos custos educacionais.

Um outro componente dificulta, en-carece e retarda a execução das ações, qualseja, a morosidade própria da Secretaria doEstado, que muitas vezes inviabiliza o gas-to do dinheiro. O prazo de licitação ou deaprovação de termos aditivos, por exem-plo, leva em torno de 8 a 9 meses e de 3 a4, respectivamente, fazendo com que, mui-tas vezes, o dinheiro precise ser devolvidoao MEC, pelo não cumprimento dos pra-zos planejados para o seu uso. Mais umexemplo: a proposta curricular que foi ela-borada, dentro das exigências do PEM em2002 só agora, em meados 2004, foipublicada para ser distribuída às escolas.Todos esses fatores aliam-se à contínua tro-ca de secretários e suas equipes técnicas, oque exige de 8 a 10 meses para que asações desenvolvidas pelas equipes anteri-

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ores sejam entendidas, revogadas e repla-nejadas de acordo com as vontades danova equipe, num sinal de profundo desres-peito com o dinheiro público e com a escola,que tem vivido a reboque de situaçõescomo as aqui expostas.

Embora em termos de quantitativofinanceiro seja irrisório (o Estado do MS re-cebe do PROMED/BID, 0,38% do total ge-ral distribuído a vários estados da federa-ção) a repartição do empréstimo do Bancopelo MEC a cada estado da União, diantedo que os estados têm que despender, onível de interferência nos rumos da educa-ção brasileira desse organismo internacio-nal é decisivo para o formato que o siste-ma educacional brasileiro vem adquirindohistoricamente. Mato Grosso do Sul nãofoge a isso. Todas as ações desencadeadasno Estado a partir do PROMED seguem asdeterminações do MEC dentro da ótica doBanco Mundial. A nossa vivência comoconsultora da Secretaria de Educação tra-balhando com essas políticas bem como ateoria produzida pelos pesquisadores daárea demonstra isso sobejamente.

NotasNotasNotasNotasNotas1 O PROMED/Escola Jovem é um desdobramento doContrato de Empréstimo nº 1052/OC-BR, assinadoem 24 de novembro de 1997 pela República Fede-rativa do Brasil e o Banco Interamericano de De-senvolvimento com a finalidade de cooperar paraexecução do Programa de Expansão da EducaçãoProfissional - PROEP. Nesse Contrato de Emprésti-mo, o Ministério da Educação e Cultura lançou oPROEP (Programa de Expansão da Educação Profis-sional) que incluiu dois subprogramas: a) Implan-tação de Políticas Globais que tem a finalidade deequipar o MEC com instrumentos e mecanismos

necessários para apoiar a implantação da Reformada Educação Profissional nos estados e municípiose escolas profissionais participantes do Programa e,ainda, sensibilizar e informar a opinião pública so-bre o desenvolvimento da reforma e, b) Planos Esta-duais e Projetos Escolares, com a finalidade de exe-cutar pré-investimento e investimento dos estadose das escolas participantes do Programa. É dentrodeste subprograma que o Ensino Médio da RedeEstadual de Mato Grosso do Sul dá o primeiro pas-so no sentido de financiar o Ensino Médio em MS apartir da LDB, com o Programa Melhoria e Expan-são do Ensino Médio – PROMED, financiado peloBIRD, que o MEC denominou Projeto Escola Jovem.2 A política de financiamento do BID para o PROMED– Projeto Escola Jovem em todo o país é de quinhen-tos milhões de dólares dos Estados Unidos da Amé-rica, incluindo nesse montante 50% recursos do pró-prio BID e 50% das Unidades Federadas que aderi-ram ao Programa, constituindo a contrapartida naci-onal. Do valor financiado pelo Banco, a quantia dedois milhões e quinhentos mil dólares (US$ 2.500.000)é destinada a atender despesas de inspeção e super-visão geral do Banco. O Empréstimo impõe a amorti-zação ao Mutuário, mediante o pagamento de pres-tações semestrais em setembro e março de cada anoa partir de 2001, com juros calculados sobre saldosdevedores diários, a uma taxa anual a ser calculadasemestralmente, de acordo com sua política sobretaxas de juro. Nessa política a República Federativado Brasil e o Banco Interamericano de Desenvolvi-mento negociam a assinatura de um novo Contratode Empréstimo, nº 1225/OC – BR, firmado em 03/2000, com vigência em aberto, agora, para a execu-ção da 1ª fase do PROMED.3 Anexo I desse Convênio (nº 259/00/PROMED),aprovado em 21/11/2000.4 Anexo I desse Convênio (nº 259/00/PROMED),aprovado em 21/11/2000.5 De 1962 a 1969, a contribuição norte-americana paraas agências multilaterais era da ordem de 7% do totaldos investimentos do país para a assistência econômi-ca. Esta taxa cresceu para 23,6% entre 1970-1979.SCHOULTZ, 1981, p. 269. In: FONSECA, 1995, p. 91.6 Os documentos analisados por Siqueira são:- “Decentralization of Education. Deman-side

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financing” (Descentralização da Educação. Financi-amento baseado na demanda de Patrinos andariasingam, 1997/1999);- “Assessing aid: What doesn’t and Why” (Avaliandoa cooperação internacional: o que funciona, o quenão funciona e por quê, de Dollar and Pritchett,1998);

- Education Investment – EdInvest, (Serviço de Infor-mação de Investimento em Educação- Coordena-dor: Harry Anthony Patrinos).7 SCHULTZ, Theodore W. O capital humano: investi-mentos em educação e pesquisa. Rio de Janeiro:Zahar, 1973.

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_____. Parecer de Aprovação do Termo Aditivo pelo Conselho Diretor do Programa demelhoria e Expansão do Ensino Médio– PROMED. Brasília: MEC/SEMTEC, 2001.

Recebido em 18 de agosto de 2004.Recebido em 18 de agosto de 2004.Recebido em 18 de agosto de 2004.Recebido em 18 de agosto de 2004.Recebido em 18 de agosto de 2004.Aprovado para publicação em 29 de setembro de 2004.Aprovado para publicação em 29 de setembro de 2004.Aprovado para publicação em 29 de setembro de 2004.Aprovado para publicação em 29 de setembro de 2004.Aprovado para publicação em 29 de setembro de 2004.

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Os efeitos das reformas educacionais noOs efeitos das reformas educacionais noOs efeitos das reformas educacionais noOs efeitos das reformas educacionais noOs efeitos das reformas educacionais nofinanciamento da educação: Análise dos recursosfinanciamento da educação: Análise dos recursosfinanciamento da educação: Análise dos recursosfinanciamento da educação: Análise dos recursosfinanciamento da educação: Análise dos recursosdisponíveis em 13 escolas públicas no Estado dodisponíveis em 13 escolas públicas no Estado dodisponíveis em 13 escolas públicas no Estado dodisponíveis em 13 escolas públicas no Estado dodisponíveis em 13 escolas públicas no Estado doParaná, BrasilParaná, BrasilParaná, BrasilParaná, BrasilParaná, Brasil

Ana Lorena de Oliveira Bruel*

Andréa Barbosa Gouveia**

Ângelo Ricardo de Souza***

Isabelle Alves Soares****

Monica Ribeiro da Silva*****

* Mestre em educação pela UFPR. Professora da Rede Muni-cipal de Curitiba e UNICENP.e-mail: [email protected]** Doutoranda em educação pela USP. Professora do Setorde Educação da UFPR.e-mail: [email protected]*** Doutorando em educação pela PUC/SP. Professor doSetor de Educação da UFPR.e-mail: [email protected]**** Acadêmica de Pedagogia e bolsista de iniciação cien-tífica da UFPR.e-mail: [email protected]**** Doutoranda em educação pela PUC/SP. Professora Setorde Educação da UFPR.e-mail: [email protected]

ResumoResumoResumoResumoResumoUma das estratégias das reformas educacionais implementadas ao longo dos anos 1990 foi o incentivo porparte do poder público para que as escolas procurassem formas criativas de resolver seus próprios problemas,particularmente aqueles referentes à sua manutenção cotidiana. A captação de recursos financeiros junto àcomunidade, de formas variadas, criando alternativas de financiamento local (Carnoy & Castro, 1997; Casassus,1995), é uma das principais ações nesta área. A partir dos dados da pesquisa sobre custo aluno/ano em escolaspúblicas de qualidade, realizada para o INEP–Instituto Nacional de Pesquisas Educacionais, este trabalhoanalisa o impacto dos recursos administrados diretamente pelas escolas no custo aluno/ano e a fonte destesrecursos. Das 13 escolas analisadas no Estado do Paraná, , , , , Brasil, podemos indicar que os recursos administra-dos diretamente pelas escolas têm um impacto muito pequeno em relação ao custo aluno/ano, sendo que asua participação, na maioria dos casos, não ultrapassa os 7% deste custo total, basicamente porque os princi-pais custos da educação pública (salários, especialmente) são pagos diretamente pela administração pública.

Palavras-chavePalavras-chavePalavras-chavePalavras-chavePalavras-chaveFinanciamento da educação; custo aluno; políticas educacionais.

Série-Estudos - Periódico do Mestrado em Educação da UCDB.Série-Estudos - Periódico do Mestrado em Educação da UCDB.Série-Estudos - Periódico do Mestrado em Educação da UCDB.Série-Estudos - Periódico do Mestrado em Educação da UCDB.Série-Estudos - Periódico do Mestrado em Educação da UCDB.Campo Grande-MS, n. 18, p. 161-173, jul./dez. 2004.

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IntroduçãoIntroduçãoIntroduçãoIntroduçãoIntrodução

O objetivo deste artigo é apresentaralguns dos resultados da pesquisa “Levan-tamento do Custo Aluno em Escolas comCondições de Qualidade no Estado doParaná”, realizada em 2004 e que contoucom apoio financeiro e técnico do INEP –Instituto Nacional de Estudos e PesquisasEducacionais Anísio Teixeira, do Ministérioda Educação. Os resultados que tratamosaqui se referem a um dos elementoscomumente elencados como característicosdas reformas educacionais implementadasao longo dos anos 1990, qual seja, adescentralização de recursos para as esco-las e seus desdobramentos no financiamen-to local da educação, para tanto, analisa-mos os recursos disponíveis em treze esco-las públicas no Estado do Paraná, Brasil,selecionadas para a pesquisa.

Para a compreensão desses efeitos énecessária uma especial atenção aos movi-mentos provocados nas escolas com o ad-vento de reformas educacionais que trazem

a lógica da descentralização no seu interior,entendendo esta lógica como a expressãomais acabada de um padrão que visahomogeneizar a gestão educacional. Logo,para efeitos didáticos, numa primeira partevoltamos as atenções para este aspectopadronizador das reformas educacionais (noBrasil e na América Latina), depois procura-mos desenvolver uma breve discussão sobreas fontes dos recursos administrados pelasescolas e, por fim, apresentamos as relaçõese possíveis explicações acerca da composi-ção dos custos das escolas e do financia-mento local a partir de elementos que subsi-diam a discussão sobre os impactos queexercem os recursos administrados direta-mente pelas escolas sobre o custo total dofinanciamento de suas ações.

O padrão da descentralizaçãoO padrão da descentralizaçãoO padrão da descentralizaçãoO padrão da descentralizaçãoO padrão da descentralização

A educação no Brasil, como de restoem quase toda a América Latina e Caribe,desde o final dos anos 1980, passou porsignificativas alterações na sua organiza-

AbstractAbstractAbstractAbstractAbstractOne of the 1990’s educational reforms strategies were the public actions that provoked schools to look forcreative ways to solve their own problems, specially those problems concerned with their day to daymaintenance. The getting of financial resources along with the local community in various ways, creatingalternatives of local financing(Carnoy & Castro, 1997; Casassus, 1995) is one of the most important actionsin this area. Considering the research data on the student cost per capita/per year in public schools,carried out by INEP– National Institute for Educational Research, this study analyzes the impact of directadministration by the schools on the studend cost per capita/per year and it analyzes too where theseresources came from. In the 13 schools analyzed in Parana state, Brazil, the resources administrateddirectly by the schools have a small impact on the student cost per capita/per year seeing that theirparticipation, in the majority of schools, does not transcend 7% of the total cost, basically because the maincosts of public education (especially salaries) are paid directly by public administration.

Key wordsKey wordsKey wordsKey wordsKey wordsFinancing of Education; student costs; educational politics.

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ção, no que tange à gestão do sistema deensino, através de reformas na normatiza-ção, na administração, na definição de cur-rículos nacionais, na constituição de siste-mas de avaliação e, certamente, no finan-ciamento. A operacionalidade que o finan-ciamento da educação permite, isto é, o fatodo financiamento ser uma das principaispeças executivas da engrenagem da políti-ca educacional, coloca-o no centro das pre-ocupações dos reformistas, uma vez quepara cambiar os rumos da política educacio-nal, faz-se absolutamente necessária umamudança nos padrões de financiamento e/ou de gestão financeira da educação.

Por conta disso, no Brasil, a reformano financiamento da educação teve duasgrandes frentes: a) a reconstrução de con-ceitos e políticas do financiamento dos sis-temas de ensino, especialmente com a apro-vação da Emenda Constitucional 14/96 eda Lei Federal 9.424/96, respectivamentecriadora e reguladora do FUNDEF – Fundode Manutenção e Desenvolvimento do En-sino Fundamental e Valorização do Magis-tério; b) a construção, incentivo e priorizaçãode mecanismos de financiamento local, ar-ticulando – no âmbito da instituição esco-lar – um modelo de gestão escolar e meca-nismos de administração de problemas docampo financeiro, produzindo uma formadiferente de lidar com essa questão paraboa parte das escolas brasileiras.

A metodologia utilizada de formamais comumente para o desenvolvimentodesse segundo braço das reformas no finan-ciamento da educação no Brasil foi o incen-tivo à constituição de mecanismos de trans-ferências de responsabilidades financeiras

para as escolas, conhecidos como descen-tralização1 Na realidade, a descentralizaçãopassou a figurar como verdadeira alternati-va a qualquer problema de gestão do siste-ma de ensino a ponto de ser confundidaenquanto recurso das reformas, “fazendodela o próprio objetivo das ações implanta-das” (SOUZA, 2003). Isto é, a discussão so-bre qualidade do ensino público, a adminis-tração dos recursos materiais e instalaçõesescolares, o calendário escolar e, até por ve-zes, a contratação de docentes, temas tãocomplexos, estariam resolvidos com ummecanismo simples: descentralizar, transfe-rindo a responsabilidade sobre esses proble-mas às próprias escolas e municípios.

Há várias formas, no Brasil e naAmérica Latina, de descentralização finan-ceira, constituídas de acordo com as políti-cas nacionais e/ou locais e, ainda, conside-rando a história educacional e tradição nagestão escolar de cada um desses países.Contudo, muitas das políticas que envol-vem programas de descentralização se ma-terializam como formas de desresponsabi-lização do poder público para com a educa-ção. A associação entre estes dois proces-sos, descentralização e desresponsabiliza-ção do poder público, apesar de comum,nem sempre é verdadeira. Os exemplos dapolítica de vouchers no Chile nos anos 1980e da Escola Cooperativa, em Maringá-PR,no Brasil no início dos anos 1990, são al-guns dos exemplos citados pela literatura,mas que, no nosso entender, tratam-se maisde mecanismos de privatização propria-mente dita do que de descentralização.

Algumas destas possibilidades dedescentralização financeira atingem direta-

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mente as escolas, no caso do Brasil as esco-las passaram a ser chamadas para assumirresponsabilidades sobre as diversas facesdos problemas mais cotidianos que as afli-giam. O procedimento para tanto é viacontrato de gestão, no qual entidades pri-vadas, constituídas especialmente para estefim ou não, à margem das escolas, assu-mem a responsabilidade pela administra-ção de parte das tarefas até então reserva-das ao poder público e recebem uma quan-tia de recursos financeiros públicos para ocumprimento dessas tarefas.

Por detrás da discussão sobre a efi-ciência da descentralização financeira nodesenvolvimento da educação está o sérioproblema sobre o incremento da qualida-de de ensino, para o qual a descentralizaçãoparece não ser uma ferramenta muito ade-quada. Afinal, a relação financiamento-qua-lidade não pode ser analisada de maneiratão linear, como por muito tempo se dedi-caram em afirmar os documentos oficiais(CASASSUS, 2002, p. 43). De imediato, umdos dados efetivamente comprovados dadescentralização em toda a América Lati-na foi a grande ampliação do número dealunos matriculados, isto é, aumentou-se oacesso à escolarização formal. Isto advém,certamente, dos resultados promovidospela descentralização financeira, uma vezque – na maioria dos casos – a escola e/ou municipalidade2 recebe recursos finan-ceiros a partir de cotas estabelecidas combase no número de alunos matriculados.Todavia, com o aumento de alunos matri-culados, e com redução de recursos dispo-níveis no nível nacional – grande objetivodas reformas educacionais na região

(CASASSUS, 2001), é evidente que as esco-las e/ou municípios tiveram de buscar ou-tras fontes de captação de recursos. Numprimeiro movimento, as comunidades ten-dem a colaborar financeiramente com asescolas. Mas no médio prazo, como verifica-do em alguns países latino-americanos, háuma sentida retração nesta lógica alternati-va de financiamento (CARNOY & CASTRO,1997). E, ainda segundo este último raciocí-nio, se há um aumento no número de matrí-culas e uma diminuição dos recursos nacio-nais disponíveis para a educação pública,parece bastante evidente que haverá me-nos recursos disponíveis por aluno, isso im-plicaria em queda nas condições de ofertada qualidade de ensino, seja pensando naassociação entre condições para a qualida-de de ensino e salário docente, ou insumos,ou número de alunos por turma, etc.

Neste quadro de retração das condi-ções de qualidade frente à expansão doacesso à escola, no que se refere à descen-tralização financeira em particular, é possívelidentificar sensíveis contradições entre o queas escolas demandavam – agilidade naresolução de problemas materiais, autono-mia na gestão financeira para que esta esti-vesse a serviço do seu próprio projeto peda-gógico, possibilidade de participar da deci-são sobre o que são os insumos básicosao funcionamento da escola – e o que opoder público de fato implementou – pro-gramas de descentralização na maioria dasvezes vinculados a despesas de pequenamonta e pouco discutidos com as escolas.

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As fontes dos recursosAs fontes dos recursosAs fontes dos recursosAs fontes dos recursosAs fontes dos recursosadministrados localmenteadministrados localmenteadministrados localmenteadministrados localmenteadministrados localmente

No Brasil, programas de descen-tralização financeira têm sido implantadosdesde o final dos anos 1980, mas estãopresentes, de maneira mais marcante, apartir de 1995, quando o próprio governofederal criou o PDDE–Programa DinheiroDireto na Escola,,,,, e incentivou, com isto, oconjunto de estados e municípios da fede-ração a fazer o mesmo. Este programa, fi-nanciado com recursos do FNDE – FundoNacional de Desenvolvimento da Educação,repassa, observando o número de alunospor escolas3, recursos diretamente às insti-tuições de ensino fundamental. O repasseé feito uma vez ao ano, e com tais recursoselas podem custear material de consumo,pequenos reparos e adquirir, com parte dodinheiro, alguns bens de capital.

Esse programa do governo federal,como a maioria dos seus equivalentes nosestados e municípios brasileiros, por um lado,veio fazer eco às principais linhas políticaspostas na educação contemporânea, eviden-ciadas – entre outros elementos – na exi-gência da “função fiscalizadora dos pais dosalunos”, através da implantação de uma“gestão compartilhada”, que permitiria a con-cessão (BARROSO, 1996) de uma autono-mia financeira, dentre outros aspectos pró-prios do mundo da administração técnica eeficiente, muito próximos às razõesexplicitadas nos documentos dos organis-mos internacionais de financiamento. Toda-via, por outro lado, a despeito de encontrarressonância com a política internacional,esses programas voltam-se, de alguma

forma, para a objetividade da escola públi-ca, apresentando elementos que se propõema alterar a sua organização, particularmenteno que se refere à gestão dos recursos fi-nanceiros e que, por diversas vezes, são ne-cessidades das escolas públicas historica-mente não (ou mal) atendidas pelo poderpúblico. Vale dizer, o recebimento de recursosfinanceiros pelas escolas, se trouxe proble-mas para a sua gestão, no sentido da ampli-ação das tarefas que agora elas têm de exe-cutar a mais, também, concorreu para ga-rantir, mesmo que precariamente, um peque-no aporte de dinheiro para a solução de pro-blemas mais imediatos que não eram resol-vidos a contento pelo poder público até en-tão, em que pese isto tudo poder, de algumaforma, representar o descomprometimentodo poder público com a manutenção da es-cola nos moldes que ela necessita, como vere-mos mais adiante, ao analisarmos os dadosempíricos das escolas investigadas.

Nas escolas brasileiras, a tradicionalAssociação de Pais e Mestres – APM4, insti-tuição de direito privado constituída à mar-gem da escola pública, tem sido, via de re-gra, a instância mais utilizada para a efeti-vação da descentralização, assumindo afunção daquilo que o Ministério da Educa-ção chama de Unidade Executora – UEx.Normalmente, essa associação assina umcontrato com o poder público, denominado“Contrato de Gestão”, recebe os recursospúblicos e os aplica, segundo normas dodireito público, em diversos bens e serviçosna escola e, ao final de um dado período,presta conta da aplicação do recurso.

Todavia, para além dos recursos que opoder público remete à escola, esta pesquisa

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buscou analisar os recursos arrecadados pe-las próprias escolas. Àqueles recebidos dopoder público, denominamos de recursosrecursosrecursosrecursosrecursostransferidostransferidostransferidostransferidostransferidos e a esses outros, amealhadospelas escolas junto às suas comunidades,denominamos recursosrecursosrecursosrecursosrecursos próprios próprios próprios próprios próprios.

Os recursos próprios são constituídospor diversas fontes, pois depende da criati-vidade e capacidade arrecadadora de cadaescola. A APM, por ser entidade de caráterassociativo, pode cobrar contribuição dosseus associados, que são, normalmente, osprofissionais que trabalham na escola e osfamiliares dos alunos. Todavia, é muito maiscomum a cobrança de taxas dos familiaresdos alunos do que dos professores5. O Esta-do do Paraná, para evitar mais abusos nacobrança desta taxa, regulamentou-a naproposta de reorganização dos estatutosdas APM (agora denominadas de APMF,pois incluem os funcionários não-docentes),estabelecendo que tais taxas anuais nãopoderiam ultrapassar o valor de 10% dosalário mínimo mensal e que não poderi-am ser cobradas em ação consorciada àmatrícula (PARANÁ, 2003).

Há muitas outras alternativas de ar-recadação praticadas nas escolas. Festas,bazares, bingos, rifas e sorteios em geral,venda de espaços publicitários, prestaçãode serviços, parcerias com o setor privadoda economia local, doações em geral, den-tre outras. De toda forma, e para concluireste tópico mesmo que brevemente, háuma discussão de fundo no que se refereàs fontes dos recursos financeiros adminis-trados pelas escolas públicas, que se refereao status desses recursos, se ele é públicoou se ele é privado.

É comum entendermos que os recur-sos públicos são aqueles transferidos pelopoder público. Se os demais recursos arre-cadados pelas escolas não são transferi-dos pelo poder público, logo não são públi-cos, portanto são privados. Todavia, a ques-tão não é tão simples assim. A escola pú-blica mesmo não sendo responsável pelaarrecadação de recursos financeiros públi-cos, função esta da fazenda pública, quan-do assume esta tarefa, normalmente é pararesponder a alguma necessidade que estálatente ou explícita e que precisaria seratendida pelo poder público central. A esco-la, normalmente, não arrecada para fazercaixa com objetivo de financiar atividadesestranhas à sua função social. O que signi-fica que as necessidades da escola pública,que deveriam ser sanadas pelo poder pú-blico direta ou indiretamente (com açõesdiretas ou com recursos transferidos), aca-bam tendo sua solução orquestrada pelaprópria escola que com isso financia a simesma. É fato que na maioria das escolasesse recurso arrecadado é formalmente ar-recadado pela APM, que é uma instituiçãoprivada, logo este dinheiro é privado. Mas,também é fato que na mesma maioria, asAPM são instituições de “fachada”, isto é,são a justificativa legal para a escola públi-ca, instituição que não tem autonomia jurí-dica, poder arrecadar e administrar recursosfinanceiros, sendo que normalmente são osdirigentes escolares os reais gestores finan-ceiros desses e de todos os recursos finan-ceiros que passam em espécie pela escola.

Frente a isto parece ser possível, pelomenos, duas formas de interpretação des-te recurso: Primeiro compreendê-lo como

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privado, uma vez que, é um recurso arreca-dado de forma alheia àquelas consagra-das como legítimas para a formação dofundo público (impostos, taxas...), o que con-tribui para criar no interior da escola públi-ca uma lógica de gestão estranha a suanatureza e, de certa forma, contribui parauma “desnecessidade do público” (OLIVEI-RA, 1999). Em segundo lugar, poderíamospensar nestes recursos de um modo quepudesse reconstruir a própria natureza daescola como espaço público. Desta segun-da forma, poderíamos chamá-lo de quasequasequasequasequasepúblicopúblicopúblicopúblicopúblico (HABERMAS, 1984) já que ape-sar de ser arrecadado fora dos mecanismosformais, só chegam à escola em decorrên-cia da natureza pública da escola. Estaaparente contradição revela a falta de com-preensão e de consenso sobre o conceitode público nas sociedades contemporâne-as. Desta forma, se compreendermos os re-cursos arrecadados pela escola como re-cursos privados, teremos que combater suapresença no interior da escola. Se compre-endermos tais recursos como recursos qua-se públicos, precisaríamos discutir a neces-sidade da comunidade, e quiçá o própriopoder público, controlar sua arrecadação esua aplicação. De uma ou de outra forma,o que está em questão é que não enfren-tar tal debate, contribui para o enfraqueci-mento do sentido de público como espaçode direito de todos, financiado indiretamen-te por todos. Agrega-se a isto a necessida-de de dimensionar o impacto real dos re-cursos arrecadados diretamente pelas es-colas na sua manutenção efetiva, os da-dos acerca da relação entre os recursos ar-recadados diretamente e o custo aluno ano

em escolas com condições de qualidade,que serão discutidos a seguir, revelam quea manutenção das escolas exclusivamen-te com recursos públicos não demandariaum esforço do Estado muito mais expressi-vo do que o atual.

Os recursos administrados pelasOs recursos administrados pelasOs recursos administrados pelasOs recursos administrados pelasOs recursos administrados pelasescolasescolasescolasescolasescolas

É importante destacar que a pesqui-sa se dedicava ao levantamento de todo ocusto aluno das escolas selecionadas e nãoapenas à análise dos recursos administra-dos diretamente por elas. Este aspecto foitambém analisado por se tratar de um fatormuito importante na compreensão do fun-cionamento das escolas públicas.

As escolas da amostra foram selecio-nadas a partir da indicação feita pelo INEPatravés do IEE–Índice de Escolha de Escolas,que leva em conta um conjunto de fatoresque poderiam indicar a presença de con-dições de qualidade de ensino. Acrescenta-mos a este índice, as informações fornecidaspelos informantes privilegiados (Secretariasda Educação, Sindicatos) que poderiam con-firmar ou não a indicação daquelas escolase, por fim, ainda fizemos o contato diretocom as escolas para verificar a receptividadeà equipe de pesquisadores, bem como paraverificar, mesmo que preliminarmente, se ascondições de qualidade estavam minima-mente asseguradas. Das treze escolaspesquisadas, doze foram selecionadas comeste procedimento e uma foi a partir de ou-tras referências do INEP, por se tratar de es-cola rural. Podemos dizer que todas se en-caixaram naquele padrão de escola pública

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com condições de qualidade, porém não po-demos compará-las linearmente seja em re-lação à qualidade do ensino ofertado, sejaem relação à gestão, ou à lida com as ques-tões financeiras, pois se tratam de perfis es-colares um tanto distintos6.

Os resultados da pesquisa que aqui tra-tamos são dedicados, como já comentamos,à análise dos recursos financeiros administra-dos diretamente pelas escolas e, de pronto, valea pena observar o conjunto de valores dessesrecursos, explicitados na tabela a seguir.

Das treze escolas estudadas, os da-dos de duas delas não são muito confiáveisou são incompletos para o objeto aqui emquestão. A Escola Técnica da UFPR, não nosinformou os recursos financeiros realmenteadministrados pela escola, informando-nosapenas os recursos orçados pela União pa-ra a sua manutenção, logo ficamos sem ainformação de quanto esta escola de fatoadministra, apesar de ser provável que aescola arrecade, via Fundação da UFPR. A

Escola Municipal João Sperandio, em Arau-cária, preferiu não nos informar a quantiade recursos financeiros que arrecada, maspelas entrevistas ao longo da pesquisa fi-cou evidente que esta prática de arrecada-ção está ali presente, mas como no outrocaso, não temos como analisar a participa-ção deste recurso próprio na composiçãodo custo da escola.

As demais onze escolas nos informa-ram com grau razoável de precisão, a par-

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tir dos seus registros financeiros, o movi-mento financeiro completo ocorrido no anode 2003, base da pesquisa. Mesmo sendouma exigência legal apenas para os recur-sos transferidos de fontes públicas, as esco-las mantém registros cuidadosos de todaa sua movimentação financeira, incluindoaquela proveniente dos recursos próprios,arrecadados pelas próprias escolas.

Entre todas as escolas, apenas umanão pratica qualquer forma de arrecadação,trabalhando exclusivamente com recursostransferidos pelo poder público. As outrastodas, de alguma forma, além do repassede fonte pública, ainda arrecadam algumdinheiro junto às suas comunidades.

Antes de observar com mais cuidadoesses casos, vale registrar que todas as trezeescolas trabalham com recursos transferidose, na maioria das escolas (exceção feita àEscola Técnica da UFPR e aos Centros deEducação Infantil Durvalina de Assis eMonsenhor Kimura), há mais de uma fontepública enviando-lhes dinheiro, pois trata-sede instituições que atendem ao ensino funda-mental e, desta forma, recebem recursos doPDDE, bem como são escolas que compõemredes de ensino que têm seus próprios pro-gramas de descentralização financeira7.

As escolas que mais arrecadam sãotambém as maiores em número de alunosmatriculados, o que pode ser explicado pelonúmero de famílias contribuintes com as jámencionadas taxas associativas, que é oexpediente mais freqüentemente utilizadonas escolas estudadas e o de maior partici-pação na composição dos recursos próprios.

As onze escolas com dados passíveisde serem analisados apresentam variações

que vão de zero a quase cem mil reais dearrecadação anual. O que somado ao con-junto de recursos transferidos perfaz totaisque variam de 5.000 a mais de 142.000reais administrados diretamente pelas esco-las. A divisão per capita deste recurso variaentre 27 reais e 276 reais. Esses númerostodos, contudo, não são grandes se compa-rados com o custo total das escolas emquestão, uma vez que na maioria absolutadas escolas a proporção dos recursos admi-nistrados diretamente pelas escolas, so-mando todas as fontes, não ultrapassa os7% do quanto custa mantê-las funcionan-do normalmente durante um ano.

Ao longo da investigação, tivemosvários depoimentos de diferentes sujeitosquanto à insuficiência dos montantes de re-cursos repassados pelo poder público e anecessidade das escolas buscarem comple-mento na comunidade escolar. Tal fato é namaior parte das vezes indicado como umproblema, posto que isto representa um es-forço a mais que a escola precisa fazer parabuscar condições melhores de realizar suatarefa específica. Todavia, apesar da maioriadas escolas precisar recorrer à comunidadepara complementar os recursos para o seucotidiano, posto que a maior parte destesrecursos é destinada a material de consumo,um número significativo de escolas tem nopoder público a sua principal fonte de recur-sos. Nossa hipótese é que a análise destesdados pode demonstrar que o esforço pú-blico que precisa ser feito para dotar as es-colas de autonomia de gestão financeira8

para o seu cotidiano não é muito grande.O gráfico 1 apresenta duas escolas que

administram apenas recursos públicos. Evi-

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dencia que em outras seis escolas o montan-te de recursos de origem pública é maior queos de outras origens e que em apenas trêsescolas os recursos da comunidade são mai-ores que os recursos públicos. Este menor gru-po é constituído por escolas estaduais quepassaram por forte processo de descen-tralização na última década, mas sem a devi-da contra-partida financeira do Estado. Emduas dessas três escolas (Colégio NewtonGuimarães e Instituto de Educação de Ma-ringá), observamos que há longa prática dearrecadação de recursos pela escola a pontode se cobrar valores para diversas atividadesda escola, colocando em cheque o seu cará-ter público. De toda forma, nessas escolas, ape-sar dos entrevistados se referirem, sobretudona segunda, a divergências de pais ou de alu-nos acerca dos mecanismos de arrecadaçãode recursos, tais práticas são parte da dinâmi-ca escola. Certamente, a possível qualidadede ensino ofertada por essas escolas não édependente desses recursos, pois eles repre-

sentam pouco no conjunto das principais ru-bricas da escola, mesmo assim, as escolas empauta avaliam que esta prática de grandearrecadação é muito importante para a suamanutenção nos termos em que elas acredi-tam que devem se organizar.

Compreender os efeitos dos processosde descentralização exige que também se con-sidere o que as escolas esperam de sua pró-pria organização. Durante as entrevistas reali-zadas os diretores das escolas, principalmente,evidenciaram a importância dos recursos arre-cadados por outras fontes como aqueles quepermitem à escola organizar a chegada dosalunos (consertar a pintura, limpar a caixad’água...) coisas comuns, porém o destaque éda urgência que tais coisas se façam antes dosalunos chegarem, tipo de preocupação que osprogramas de descentralização nem sempreincorporam. Destaca-se isto aqui para reforçara necessidade de debater não só o montantedo recurso, discussão fundamental, mas tam-bém a que expectativas ele deve atender.

Gráfico 1Gráfico 1Gráfico 1Gráfico 1Gráfico 1: : : : : Recursos administrados pelas escolas do Paraná em percentuais por fonte–2003

Fonte: MEC/INEP/DTDIE/Pesquisa Custo Qualidade.

* Não é possível calcular vistoque a escola só informou osrecursos orçados e não os re-almente administrados pela

escola.

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Enfim a análise dos dados da pesqui-sa nos permite indicar algumas questõescomo conclusões ou como indicações parao aprofundamento das pesquisas sobreesta temática: a) A participação financeirada comunidade, mesmo quando incentiva-da, não é suficiente para a manutenção daescola, posto que os maiores investimen-tos necessários ao funcionamento da es-cola continuam exclusivamente públicos(pessoal docente e não docente); b) As es-colas têm vivido mais experiências de ges-tão de recursos públicos e os recursos pri-vados, na maioria das vezes, não são osmais importantes; c) As escolas não tratamos recursos de forma diferenciada, ou seja,para as escolas os recursos não são públi-cos ou privados, eles são recursos da esco-la. Desta forma, apesar de realizarem osgastos respeitando as regras da adminis-tração pública, no caso dos recursos prove-nientes desta fonte, e terem mais autono-mia de aplicação do que com os demaisrecursos, a maioria das escolas mantém umbalanço organizado de forma similar parao conjunto dos recursos. d) O esforço pú-blico que tem sido feito para dotar as esco-las de autonomia de gestão financeira paraa adequada manutenção das condiçõespara um ensino de qualidade não tem semostrado suficiente. Tendo em vista os da-dos trabalhados na pesquisa, pode-se con-cluir que a opção do poder público peladescentralização, nos moldes que se apre-senta atualmente, está mais vinculada àuma dada concepção de administração daeducação pública, a partir de uma raciona-lidade mais política do que pedagógica oumesmo financeira, uma vez que para a

constituição/manutenção das condições dequalidade, o investimento financeiro nãoseria tão grande e o retorno pedagógicopoderia ser compensador do esforço a mai-or. e) A questão do controle público sobreos recursos administrados diretamente pe-las escolas precisa ser ampliada para oconjunto dos recursos, ou ao menos, a dis-cussão disto precisa entrar na pauta daspesquisas, para retomar o conceito de pú-blico e para avaliar a pertinência e a realnecessidade de outras fontes de recursosno interior da escola pública.

NotasNotasNotasNotasNotas1 Vários autores afirmam que não se trata de “des-centralização”, mas sim de “desconcentração” (RIVAS,1991; CASASSUS, 1995; e mesmo nós em SOUZA,2001 e 2003). De toda forma, para este artigo tratare-mos deste mecanismo de transferência de responsa-bilidades do centro do poder público para às escolascomo descentralização, uma vez que este é o termoutilizado pelos próprios gestores públicos, cuja polí-tica é aqui analisada.2 Utiliza-se a expressão “Escola e/ou Municipalidade”porque em alguns países latino-americanos ecaribenhos, a descentralização atingiu mais direta-mente a escola, em outros países atingiu mais omunicípio.3 O PDDE transfere recursos uma vez ao ano apartir de um cálculo que não é per capita, mas levaem conta o número de alunos e a região do paísna qual se localiza a escola.4Há várias denominações para essas associações, quevariam conforme a região do país: APM, APP (parapais e professores), APPF (para pais, professores efuncionários), Caixa Escolar, Cooperativa Escolar, etc.5 É comum, apesar da contrariedade apregoada nalei e por vezes manifesta pelo poder público, a co-brança desta taxa associativa no momento da(re)matrícula do aluno, caracterizando verdadeira-mente em uma taxa de matrícula em escola públi-ca, recolhida com freqüência por família, indepen-

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172 A.B. GOUVEIA; A.R. de SOUZA; A.L.O. BRUEL; M.R. da SILVA e I.A. SOARES. Os efeitos das...

dente do número de filhos matriculados..6 O relatório completo da pesquisa está publicadoem CD-Rom, no qual apresentamos a organizaçãodas escolas e os custos a partir da seguinte tipologia:escolas de educação infantil, escolas de ensino fun-damental de pré a 4ª série, escolas de ensino funda-mental completo, escolas de ensino fundamental emédio, escola de ensino especial, escolas com cur-sos de formação profissional.7 Tais programas são criados e regulamentadosem cada município. Em 2003, a situação era a se-guinte: em Maringá, os Centros de Educação Infan-

til recebiam dois repasses de R$ 600,00 por anopara despesas de pequena monta. Curitiba, as es-colas recebiam R$ 2,00/aluno/mês somados commais 10% referentes a possibilidade de aumentode demanda e os recursos eram repassados a cadatrês meses. Londrina, as escolas recebiam R$ 3,50/aluno/mês. Em Araucária, o valor repassado erade R$ 1,53/aluno/mês.8 Entendemos aqui que a autonomia de gestão fi-nanceira implica recursos públicos em quantidadesuficiente para a escola não precisar recorrer a for-mas de arrecadação própria.

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Série-Estudos... Campo Grande-MS, n. 18, p. 161-173, jul./dez. 2004. 173

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Recebido em 21 de outubro de 2004.Recebido em 21 de outubro de 2004.Recebido em 21 de outubro de 2004.Recebido em 21 de outubro de 2004.Recebido em 21 de outubro de 2004.Aprovado para publicação em 05 de novembro de 2004.Aprovado para publicação em 05 de novembro de 2004.Aprovado para publicação em 05 de novembro de 2004.Aprovado para publicação em 05 de novembro de 2004.Aprovado para publicação em 05 de novembro de 2004.

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O Fundo de Manutenção e Desenvolvimento doO Fundo de Manutenção e Desenvolvimento doO Fundo de Manutenção e Desenvolvimento doO Fundo de Manutenção e Desenvolvimento doO Fundo de Manutenção e Desenvolvimento doEnsino Fundamental e de Valorização do MagistérioEnsino Fundamental e de Valorização do MagistérioEnsino Fundamental e de Valorização do MagistérioEnsino Fundamental e de Valorização do MagistérioEnsino Fundamental e de Valorização do Magistério(FUNDEF) em Dourados, MS – Acompanhamento do(FUNDEF) em Dourados, MS – Acompanhamento do(FUNDEF) em Dourados, MS – Acompanhamento do(FUNDEF) em Dourados, MS – Acompanhamento do(FUNDEF) em Dourados, MS – Acompanhamento doimpacto e avaliação (1998 a 2000)impacto e avaliação (1998 a 2000)impacto e avaliação (1998 a 2000)impacto e avaliação (1998 a 2000)impacto e avaliação (1998 a 2000)

Maria Dilnéia Espíndola Fernandes

Doutora em educação pela UNICAMP. Professora da UFMS/CPDO/DED e do Programa de Pós-Graduação.e-mail: [email protected]

ResumoResumoResumoResumoResumoEste trabalho é parte integrante da pesquisa nacional “O Fundo de Manutenção e Desenvolvimento doEnsino Fundamental e de Valorização do Magistério (Fundef) – acompanhamento do impacto e avaliação(1998 a 2000)” realizada em vários Estados da Federação Brasileira. No âmbito do estado de Mato Grosso doSul esta pesquisa analisou o Fundef no estado e nos municípios de Campo Grande, Corumbá, Douradose Ponta Porã. Apresenta-se, nesta investigação, a análise do Fundef por meio das receitas e das despesasem manutenção e desenvolvimento do ensino fundamental em Dourados, isto se faz a partir dos BalançosGerais de Contas de Governo do município, que demonstram quais foram as prioridades na elaboração eexecução da política educacional do município no período de 1998 a 2000.Agencia Financiadora: Fundação Ford e Associação Nacional de Política e Administração da Educação (ANPAE)

Palavras-chavePalavras-chavePalavras-chavePalavras-chavePalavras-chaveFinanciamento da educação; Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental e de Valori-zação do Magistério (Fundef); municipalização do ensino fundamental.

AbstractAbstractAbstractAbstractAbstractThis study is an integral part of national research on “The Maintenance and Development Fund ofFundamental Teaching and the Valorization of Teaching in Dourados, MS – the follow up of the impact andevaluation (1998 to 2000)” carried out in several Brazilian States. Within the ambit of South Mato Grossothis research analyzed the FUNDEF in the municipal administrations of Campo Grande, Corumbá, Doura-dos and Ponta Porã. In this research an analysis of the FUNDEF is presented, considering the revenue andexpenses of maintenance and development of fundamental teaching in Dourados, after the GeneralBalances of Expenses presented by the municipal government, showing what the priorities were in theelaboration and applying of the teaching policies of the local administration from 1998 to 2000.Financing Agency: Ford Foundation and National Association of Politics and Teaching Administration.(ANPAE)

Key wordsKey wordsKey wordsKey wordsKey wordsFinancing Teaching; Maintenance and Development Fund for Fundamental Teaching and for the Valorizationof Teaching (FUNDEF); municipalization of fundamental teaching.

Série-Estudos - Periódico do Mestrado em Educação da UCDB.Série-Estudos - Periódico do Mestrado em Educação da UCDB.Série-Estudos - Periódico do Mestrado em Educação da UCDB.Série-Estudos - Periódico do Mestrado em Educação da UCDB.Série-Estudos - Periódico do Mestrado em Educação da UCDB.Campo Grande-MS, n. 18, p. 175-190, jul./dez. 2004.

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1 Introdução1 Introdução1 Introdução1 Introdução1 Introdução

Dentre as alterações na legislação edu-cacional brasileira promovida pelo governofederal, principalmente na segunda metadedos anos 1990, destaca-se, aqui, aquela insti-tuída pela Emenda Constitucional nº 14, de12 de setembro de 1996, que alterou o artigo60 do Ato das Disposições ConstitucionaisTransitórias, o Fundo de Manutenção e Desen-volvimento do Ensino Fundamental e de Va-lorização do Magistério (Fundef).

Por um lado, a promulgação destaLei demonstra a adesão do governo fede-ral brasileiro às orientações dos organismosinternacionais no que tange à redefiniçãodas políticas educacionais nacionais, dadoque, financiar a educação num “cenário deescassez de recursos, pode ser por meio depolíticas de fundos” (cf. CEPAL, 1992, p. 45).

Por outro lado, trata-se de resolverquestões do financiamento da educaçãobrasileira, na perspectiva de responder asdemandas internas deste processo, criadaspelo próprio poder executivo nacional, pois,conforme Pinto (1999, p. 85-6):

A redação original do artigo 60 do Ato dasDisposições Constitucionais Transitórias(ADCT) determinava que os poderes pú-blicos deveriam aplicar pelo menos ametade de seus gastos constitucionais emeducação [...] com a universalização doensino fundamental e a erradicação doanalfabetismo. Ora, o que acontece? En-quanto, de uma forma geral, os estados eos municípios cumpriam a ConstituiçãoFederal, o governo federal se recusava afazê-lo. Em estimativa que fizemos no anode 1996, considerando os gastos declara-dos da União com ensino fundamental[...] constata-se que esta esfera de governo

deixou de aplicar 1,7 bilhões de reais nestenível de ensino. Qual foi a saída entãoencontrada pelo governo federal? Mudara Constituição.

Nesse contexto, pretende-se, aqui,desvelar os impactos da política educacio-nal emanada pelo governo federal em inter-seção com a instância municipal, enfatizan-do-se a experiência do município de Doura-dos, no estado de Mato Grosso do Sul, noperíodo de 1998 a 2000, na sua execuçãodo Fundef por meio do seu fundo público.

2 Características sócio-2 Características sócio-2 Características sócio-2 Características sócio-2 Características sócio-econômicas e demográficas doeconômicas e demográficas doeconômicas e demográficas doeconômicas e demográficas doeconômicas e demográficas domunicípio de Douradosmunicípio de Douradosmunicípio de Douradosmunicípio de Douradosmunicípio de Dourados

O município de Dourados, localiza-do a sudoeste de Mato Grosso do Sul, fazparte da fronteira do Brasil com o Paraguai.Inicialmente, colonizada por mineiros e gaú-chos no final do século XIX e início do sé-culo XX, continua ainda a receber contin-gentes populacionais de todo o País(FERNANDES, 1995, p. 135-6).

O Plano Decenal Educação para To-dos – 1993/2003 (DOURADOS, SEMED,1994, p.14), quando aborda a formaçãopopulacional da cidade, aponta que

Em 1870, ex-combatentes da Guerra doParaguai fixaram-se nesta região, até entãohabitada por índios Guarani e seus sub-grupos: Kaioyá, Nandeva e Mybia – senho-res absolutos das terras que iam do Rioda Prata até o Pantanal. A partir de entãopaulistas e mineiros instalam-se na região.

Em 1882, foi instalada na região a Com-panhia Mate-Laranjeira que explorou60.000 km² de ervais nativos, utilizando-se de mão-de-obra indígena e paraguaia,em todo o sul do estado.

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Em 1893, chegaram os primeiros gaúchos,fugitivos da Revolução Federalista, queampliaram as áreas de pecuária.

[...] com a criação da Colônia NacionalAgrícola de Dourados, em 1943, pelo en-tão presidente Getúlio Vargas, ocorreu umgrande surto migratório chegando, a estaregião, agricultores vindos do Paraná, SãoPaulo e Minas Gerais e de estados doNordeste, que disseminaram a cultura docafé e do algodão, abrindo grandes fren-tes de trabalho.

Em 1960, Dourados contava com 80.668habitantes, quando chegaram agriculto-res gaúchos trazendo o plantio da soja edo trigo. Com isto, os minifúndios cede-ram lugar às grandes fazendas, expulsan-do do campo os trabalhadores e peque-nos produtores que incharam a área ur-bana do município ou migraram para onorte do estado.

Nos anos 1970 e 1980, com o intui-to de incentivar e incrementar a fronteiraagrícola do País, o município de Douradospassa a compor no estado de Mato Gros-so do Sul, a região destinada a ser maisum “Celeiro Agrícola” proposto pelos Pla-nos Nacionais de Desenvolvimento (PNDs)1.Esta expansão agrícola visa não só rever ahorizontalização do setor agro como, tam-bém, aprimorar sua verticalização. Confor-me Abreu (2001), esse processo trata-se

[...] de uma reorganização da agriculturabrasileira e, conseqüentemente, da agricul-tura do Sul mato-grossense, no sentidodo avanço da fronteira agrícola, no dizerda SUDECO, mas que estava subordinadoà indústria. Esse era um processo previsto,em 1971, na política de planejamento doGoverno Federal e nas “Ações para a Agri-cultura e Abastecimento”, tendo servidopara orientar a programação da SUDECO(p.70). Esta situação contribuiu para pro-

mover uma reconfiguração espacial, dife-renciada da existente até então, na suaporção austral. As pequenas proprieda-des, resultado do loteamento da ColôniaAgrícola de Dourados (CAND) e de outrosprojetos de colonização privada, em boaparte, foram vendidas, consolidando umaoutra estrutura fundiária, agora baseadana média e grande propriedades, para ainstalação da agricultura moderna (p. 238).

Segundo Abreu (2001), é a própriaSUDECO que propõe a denominação deregião da “Grande Dourados”,

[...] onde, extensas áreas de campos lim-pos, ocupados com a pecuária extensiva,foram arrendadas pelos “granjeiros” gaú-chos, que, em virtude da crise fundiáriado Sul do País e às facilidades promovi-das pelo Poder Público, para lá se dirigi-ram, introduzindo a agricultura mecani-zada e capitalizando, de tal maneira a pro-dução, que consubstanciou-se novas for-mas de produção e novas relações de tra-balho no campo e nas cidades (p. 238).

Ainda para esta autora, este é omomento de acelerado crescimento urba-no da região, pois, em Dourados:

No ano de 1970, a sua população urbanarepresentava 39,9%, passando a 79,6%, em1980 e em 1991, já era 90% da populaçãototal. É o que Silva (2000) chamou de “re-produção do padrão desenvolvimentista deurbanização”, baseado no esvaziamentodo campo, na urbanização acelerada e nocrescimento urbano concentrado. Obvia-mente, um processo decorrente da amplia-ção das lavouras de soja, na “Região daGrande Dourados”, mas principalmentepela participação do Poder Público na ra-cionalização e direcionamento das políticasde desenvolvimento em pauta, entre asquais podem citar-se, no caso do exemploapontado, o PRODEGRAN e o PROSUL(ABREU, 2001, p. 239).

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Em 2000, a estimativa da populaçãodo município de Dourados é de 168.349habitantes, com uma taxa de urbanizaçãoda ordem de 91,19% (MATO GROSSO DOSUL, 2000).

Diante das mudanças do padrão deocupação do espaço e do desenvolvimentoeconômico, marcados pela forte presençado Estado na região e no município, interes-sa desvelar o comportamento do setor edu-cacional, prioritariamente no ensino funda-mental, a partir dos anos 1990 quando,para o setor, é esta a etapa da educaçãobásica que passa a ser prioridade segundoa legislação e os planos educacionais, comose pode observar a seguir.

3 Educação: orientações legais e3 Educação: orientações legais e3 Educação: orientações legais e3 Educação: orientações legais e3 Educação: orientações legais eadministrativas no município deadministrativas no município deadministrativas no município deadministrativas no município deadministrativas no município deDouradosDouradosDouradosDouradosDourados

Depois de promulgada a Constitui-ção Federal de 1988, uma das tarefas queesta impõe aos estados e municípios é aconstrução de suas Constituições Estadu-ais para os primeiros e, para os segundoscabe a elaboração das Leis Orgânicas Mu-nicipais. No caso do município de Dourados,sua Lei Orgânica Municipal (LOM) é pro-mulgada em 1990.

Em que pesem as análises que apon-tam a Lei 9.424/96 – Fundo de Manutençãoe Desenvolvimento do Ensino Fundamentale de Valorização do Magistério (Fundef) –como o grande indutor da municipalizaçãodo ensino fundamental no País, em Doura-dos, é a partir de sua LOM que pode-se en-contrar as primeiras diretrizes deste proces-so (cf. CALLEGARI, C; CALLEGARI, N, 1997).

Conforme Freitas (1997), a LOM deDourados explicita:

[...] o critério de focalização da política edu-cacional no Ensino Fundamental, entendi-do este como compromisso educacionalcentrado na faixa etária de 7 a 14 anos deidade. Esse critério de focalização baliza agestão educacional que se intenta discipli-nar, com esta Lei, no âmbito deste municí-pio, sendo indicativo de como o municípiose posiciona, neste momento, em relaçãoao processo de municipalização, retoma-do com a Constituição Federal de 1988 ereforçado como política voltada para a re-forma do Estado (p. 88-9).

Vale ressaltar que, nos anos de 1989a 1992, o município de Dourados priorizaem seus planos educacionais a ampliaçãoda rede física. Segundo Freitas (1997),“observou-se uma ampliação de 5.600 va-gas diurnas, no período de 1989 a 1992,com a construção de oito Centros de Edu-cação Unificada (CEU)” (p. 124).

Para além das iniciativas do municí-pio e coerente com o processo em curso dedesconcentração2 dos sistemas educacio-nais, tem-se também a atuação do estadode Mato Grosso do Sul incentivando e reali-zando ações por meio de seus programasno município, no que se refere à municipa-lização do ensino fundamental.

Nessa perspectiva, em 1991, a Secre-taria de Estado de Educação institui o Pro-grama Descentralização e Fortalecimento doEnsino de Primeiro Grau, implementado apartir de 1992..... Tal programa justifica-se, con-forme a Secretaria de Estado de Educação,em respeito à Constituição Federal de 1988que, “estabelece claramente as responsabili-dades quanto aos graus de ensino, caben-do ao Município compromisso fundamental

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com o 1º Grau e ao Estado o compromissocom a oferta de 1º e 2º Graus”3.

O município de Dourados4 é o quemais obtêm unidades escolares transferidaspor tal programa, perfazendo um total dequatro escolas.

De fato em Dourados, nos anos quevão de 1991 a 1997, o sistema educacionalpassa por reformas significativas. É o perí-odo em que segundo Freitas (1997), noaspecto legal se tomam medidas que visamà estruturação e funcionamento da Secreta-ria Municipal de Educação com a promulga-ção da Lei nº 1.845, de 15 de março de1993; busca-se a reestruturação e funciona-mento das unidades escolares com os Re-gimentos Escolares de 1996; implanta-se aracionalização da gestão educacional pormeio da institucionalização do PlanoPlurianual de Educação e, em seguida, doPlano Decenal de Educação de Douradose, ainda, a democratização da gestão dasUnidades Escolares com a eleição de dire-tores, conforme a Lei nº 1.925, de 12 deagosto de 1994.

Nesse cenário, um dado interessan-te é que o município de Dourados, para re-duzir os recursos para a Manutenção eDesenvolvimento do Ensino (MDE5), se an-tecipa ao estado de Mato Grosso do Sul6.A LOM (Art. 230) dispõem para financiarMDE o percentual da ordem de 30% dareceita de impostos mais as transferênciasintergovernamentais. Em 23 de janeiro de1997, o Legislativo Municipal aprova aEmenda à LOM nº 07, que indica que opercentual de recursos para financiar MDEé da ordem de 25% da receita de impostosmais as transferências intergovernamentais.

Ainda em 1997, pela Lei nº 2.154,de 25 de setembro, é instituído o SistemaOficial de Ensino do Município de Dourados,denominado doravante de Sistema Munici-pal de Ensino de Dourados, que compre-ende “[...] as instituições do ensino funda-mental, médio e de educação infantil, cria-das e mantidas pelo Poder Público Munici-pal [e, também,] as instituições de educa-ção infantil, criadas e mantidas pela inicia-tiva privada [e, ainda,] os órgãos munici-pais de Educação7”.

Assim, a Lei nº 2.156, de 20 de outu-bro de 1997, cria o Conselho Municipal deEducação de Dourados (COMED).

Diante do exposto, é possível afirmarque no município de Dourados há, desde1990, uma série de ajustes por parte do Es-tado que induzem e concretizam a munici-palização do ensino fundamental. Dessaforma, quando começa a vigorar o Fundefem 1998, as condições objetivas e subjeti-vas da municipalização do ensino funda-mental já estão garantidas por meio dasações do poder público.

Segundo o Ministério da Educação(MEC), ao comentar sobre a “importantemodificação na participação dos governosestaduais e municipais no atendimento aoensino fundamental”, destaca que: “em1997 os municípios atendiam 40,7% dosalunos e os estados, 59,3%. Em 1999, es-sas participações foram de 49,4% e 50,6%,respectivamente”. No município de Doura-dos, a média de participação no atendi-mento ao ensino fundamental é superior àmédia nacional apontada pelo MEC: Dou-rados é responsável nos anos 1998, 1999e 2000, por 56,7%, 55,3% e 56,1% do

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180 Maria Dilnéia Espíndola FERNANDES. O Fundo de Manutenção e Desenvolvimento...

atendimento ao ensino fundamental.A propósito, o movimento das ma-

trículas iniciais no ensino fundamental nas

dependências administrativas estadual emunicipal tem o seguinte comportamentono município nos anos de 1996 a 2000:::::

Por tal comportamento registrado natabela 3.1 nos anos que vão de 1996 a2000, visualiza-se que na rede estadual deensino há uma queda de 939 matrículasou menos 6,4% no ensino fundamental.Enquanto isso, no mesmo período, para arede municipal verifica-se um aumento de1.170 matrículas no ensino fundamentalque, em termos percentuais, foi de mais7,17%, o que corrobora a análise feita noitem anterior sobre a municipalização des-ta etapa da educação básica. Também éimportante ressaltar que o município deDourados tem uma taxa de universalizaçãodo ensino fundamental da ordem de 97%(MATO GROSSO DO SUL, 2000).

Em 1996 e 2000, a rede estadual deensino apresenta um número de 537 e 589servidores, respectivamente. Nota-se umaumento de 9,7% em seu quadro de servi-dores técnicos administrativos. Os docen-

tes, que em 1996 somam 726, passam aser em 2000, em número de 938 funções,percebe-se um aumento da ordem de29,20% nesta categoria de trabalhadores.Observa-se um aumento da ordem de25,2% no total do seu quadro de pessoalnestes anos (BRASIL, 2001).

Na rede municipal de ensino, nomesmo período, verifica-se que o aumentono total do quadro de pessoal é da ordemde 29,5%. Dessa forma, a rede municipalde ensino em relação aos servidores técni-cos administrativos aumenta este quadroem 24%; na função docente o aumento éda ordem de 35,98% (BRASIL, 2001).

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Série-Estudos... Campo Grande-MS, n. 18, p. 175-190, jul./dez. 2004. 181

4 Impacto e avaliação do Fundef4 Impacto e avaliação do Fundef4 Impacto e avaliação do Fundef4 Impacto e avaliação do Fundef4 Impacto e avaliação do Fundefno município de Douradosno município de Douradosno município de Douradosno município de Douradosno município de Dourados(1998-2000)(1998-2000)(1998-2000)(1998-2000)(1998-2000)

4.1 As receitas do município deDourados (1996-2000)

Os recursos do Fundo de Manuten-ção e Desenvolvimento do Ensino Funda-mental e de Valorização do Magistério(Fundef), jurídico e legalmente, se originamda vinculação constitucional de recursos,Artigo 212 da Constituição Federal Brasilei-ra8. Tal Fundo estabelece uma subvincu-lação de recursos para o ensino fundamen-tal, de modo que, Estados, Distrito Federale Municípios devem, a partir de 1998, apli-car, nesta etapa da educação básica, 15%do seu percentual de recursos para MDE.

Diante disso, os recursos do Fundefsão distribuídos em cada unidade federada,entre o governo estadual e os governosmunicipais, isso se faz com base no númerode alunos matriculados nas respectivas re-des de ensino fundamental conforme osdados do censo escolar. Dessa forma, omontante financeiro que resulta desta equa-ção – valor custo/aluno/ano –, estabelecidopor lei pelo número de matrículas no ensi-no fundamental, é repassado, automatica-mente, para contas únicas e específicas dosgovernos estaduais, do Distrito Federal e dosmunicípios, vinculados ao Fundo (art. 3º).

Percebe-se, ainda, que, por sua natu-reza contábil, os recursos do Fundef se com-põem de 15% de impostos tais como: Im-posto sobre as Operações Relativas à Cir-culação de Mercadorias e sobre a Presta-ção de Serviço de Transporte Interestadual

e Intermunicipal e de Comunicação (ICMS),Fundo de Participação dos Municípios(FPM), Fundo de Participação dos Estados(FPE) e do Imposto sobre Produtos Indus-trializados (IPI-Exportação). Ao Banco doBrasil cabe retirar automaticamente 15%dos recursos provenientes das contribuiçõesdesses impostos, depositando-os nas con-tas do Fundo.

Quanto ao cálculo de distribuiçãodos recursos do Fundef, verifica-se que esteé feito sobre o número de matrículas doano anterior, acrescentando-se uma estima-tiva de novas matrículas feitas pelo MEC(Decreto 2.264/97). Essa estimativa, de for-ma geral, não tem correspondido ao nú-mero real de novas matrículas, ficando es-tas, portanto, sem recursos do Fundo.

De acordo com a Lei nº 9.424/96, aUnião complementará os recursos do Fun-do sempre que, no âmbito de cada Estadoe do Distrito Federal, não alcançar o valormínimo por aluno definido nacionalmente(art. 6º). Os recursos do Fundo tambémdevem empregar o percentual mínimo de60% para a remuneração dos profissionaisem efetivo exercício do magistério no ensi-no fundamental público (art. 7º). Os 40%restantes podem ser gastos com qualquerdespesa do ensino fundamental, desde querealizadas com a MDE, conforme o artigo70, incisos I a VIII da Lei de Diretrizes e Ba-ses da Educação Nacional, nº 9.394/96.

Cabe ressaltar que a instituição doFundef fere o princípio de autonomiaexercida pelas entidades subnacionais, àmedida que lhes retira a liberdade de apli-car, cada uma dessas entidades, opercentual que lhe conviria em MDE na-

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quelas etapas da educação básica que sãode suas competências de acordo com oregime de colaboração instituído tambémpela Constituição Federal de 1988, em seuArtigo 211 (cf. CURY, 2000).

De fato, em termos de fundo público,as receitas do Fundef se originam da recei-ta de impostos. Por isso mesmo, antes deproceder às análises sobre o impacto doFundef no município de Dourados por meiodos documentos contábeis e financeiros des-te período, é de extrema relevância a adver-tência que aponta o Balanço Geral da Pre-feitura Municipal de 2001, em seu item 4,“Demonstração das Variações Patrimoniais”:

[...] há que se fazer alguns comentáriosadicionais, em razão de que o BalançoGeral de Dourados, relativo ao exercíciode 2000, não oferece a desejada consistên-cia, dado que foram registrados fatoscontábeis que não correspondem com arealidade, o que nos leva a pressupor queo seu fechamento se fundamentou emcontas de chegar, tão somente para cum-prir formalidades junto ao Tribunal deContas do Estado9.

Verifica-se que, pela tabela 4.1, de1996 a 2000, os recursos oriundos de im-postos próprios do município apresentamqueda constante nestes anos. Assim, os R$19.348.693,16 de receita própria em 1996,significaram menos 17,16% em 1997, me-nos 23,37% em 1998, menos 18,07% em1999 e menos 45,81% em 2000.

A tabela mostra ainda que as receitasdo município de Dourados nestes anos secompõem, em sua maior parte, das transfe-rências constitucionais tanto da União quan-to do estado de Mato Grosso do Sul. Dessamaneira, elas significam em 1996, 1997 e1998 73% da receita total do município.

Destaca-se o papel desempenhadopelo estado de Mato Grosso do Sul no ce-nário econômico nacional, cuja economiaé caracterizada como sendo de base agrá-ria, o que resulta em um processo desiguale combinado de baixa capacidade de arre-cadação tributária, devido a isso, dependen-te dos mecanismos construídos pela Uniãono que tange ao poder de acúmulo do seufundo público estadual.

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No sistema tributário nacional, a re-partição das receitas tributárias da União edos estados para os municípios assumem,as vezes, proporções muito importantes,pois dão o tom orçamentário das receitase despesas às municipalidades.

Observa-se então como resultadodessa sistemática, que tais transações finan-ceiras, podem vir a ser o maior montantede recursos disponíveis no acúmulo e co-bertura do fundo público. Conseqüente-mente, este processo se reproduz nos mu-nicípios do estado.

Para MDE, este processo é significati-vo à medida que a origem de seus recursosestá percentualmente vinculada à arrecada-ção de impostos do estado e do município,portanto, sofre flutuações para menos ou paramais, ao sabor das oscilações da economia.

A propósito, voltando às receitas domunicípio de Dourados, em 1999 e 2000,este quadro de dependência ainda é mais

acentuado, o que representa em 1999, 79%e em 2000, 85% do recurso financeiro totaldo município.

Ao se considerar em separado as trans-ferências da União e do estado, verifica-se queem relação à União, as mesmas representamem 1996, 23%, em 1997, 33%, em 1998, 44%,em 1999, 49% e em 2000, 51%. Quanto aoestado, estes recursos transferidos significamem 1996, 50%, em 1997, 40%, em 1998, 29%,em 1999, 30% e em 2000, 34%.

Da tabela 4.2, registre-se que o mon-tante que financia MDE em 1996, no mu-nicípio de Dourados, é o valor de R$21.419.425,54, pois este é o último ano quevigora o dispositivo da LOM de 30% dareceita de impostos.

Em termos percentuais para o finan-ciamento de MDE observa-se o seguintecomportamento no município: em 1997, aoinvés dos R$ 18.006.144,70 tem-se parafinanciar MDE R$ 9.410.871,64 o que re-

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presenta uma perda de 52,26%; em 1998ao invés de R$ 16.268.205,66 dispõe-separa financiar MDE 9.071.633,80 o que indi-ca uma perda de 55,76%; em 1999, ao in-vés de R$ 22.711.461,67 para financiar MDEobtém-se 13.202.628,10 o que aponta parauma perda de 58,13%; e, finalmente, em2000, ao invés de R$ 21.141.114,05 parafinanciar MDE tem-se R$ 11.347.087,03 oque demonstra uma perda de 53,67% derecursos para financiar MDE.

Diante desses dados financeiros,pode-se afirmar que os dispositivos jurídi-co-legais de ajustes, tais como a Emendanº 07 à LOM no município, regulam umimpacto de redução de recursos para MDEsignificativo. Ou seja, 30% da receita deimpostos nos anos que vão de 1988 a 2000seria um valor da ordem de R$78.126.926,08 financiando MDE. A Emen-da nº 07 reduz este montante de recursospara R$ 43.032.220,57, uma vez que é esteo valor que de fato financia MDE no muni-cípio. Isso significa em valores percentuais

menos 55% de recursos para tal financia-mento nesses anos.

Destaca-se que estes ajustes jurídico-legais efetivados tanto por parte do esta-do, quanto por parte do município se dãono ano que antecede a implantação doFundef qual seja, em 1997, o que leva arefletir sobre as estratégias e táticas do Es-tado no que tange ao seu padrão de acú-mulo e cobertura para o financiamento daspolíticas sociais, dentre elas a política educa-cional. De fato, as aprovações das emen-das às respectivas Constituição Estadual eLOM significam, a curto prazo, umadesoneração do estado à medida que estasituação permite reduzir recursos para o fi-nanciamento de MDE.

Como mostra a Tabela 4.3, a base deincidência de composição do Fundef oscilaconforme a arrecadação dos impostos, masnota-se a interferência nesta flutuação da LeiKandir, bem como a concentração de recur-sos no Fundo de Participação do Município(FPM). Embora, o FPM tenha permanecido

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praticamente constante de 1996 a 2000, oICMS transferido pelo estado oscila signifi-cativamente. Tomando-se como base 100%o ano de 1996 para o ICMS, em 1997, esteimposto significa 64,4%; em 1998, 31%; em1999, 60% e em 2000, 74,5%. A contribui-ção para o Fundef, contudo, se consideradocomo base 100% o ano em que entra emvigor, 1998, tem-se um aumento deste anopara 1999 de 27,6% e de 1999 para 2000de 9,6%. Assim, observa-se que a contribui-ção do município para o Fundef significa em

1998, 49,44% das suas receitas a seremaplicadas em MDE; em 1999, 43,35% e, em2000, 55,26%.

Como parte das receitas provenien-tes de transferências da União para a edu-cação, nota-se em 1997, pela primeira vez,os recursos do Programa Nacional de Ali-mentação Escolar (PNAE), oriundos do Fun-do Nacional de Desenvolvimento da Edu-cação (FNDE). Ressalte-se que esses recur-sos são específicos para o Programa Me-renda Escolar e não integram MDE.

Como evidencia a tabela 4.4, os re-cursos desse programa no município apre-sentam uma queda de 26,8% entre os anosde 1997 a 2000. Considere-se que o mon-tante de recursos total por ano do Progra-ma Merenda Escolar é estabelecido de acor-do com o número de alunos matriculadosno ano anterior na educação infantil e noensino fundamental. O valor per capita des-se programa nesses anos é de R$ 0,07 poraluno da educação infantil e de R$ 0,13por aluno do ensino fundamental.

Em 2000, acresce-se às receitas domunicípio as transferências provindas daUnião pelo Programa Dinheiro Direto naEscola (PDDE), que representa 1,6% do re-curso total para a educação. Ainda, em2000, quando considerados todos os repas-ses da União para a educação (PNAE, PDDE

e Programas e Projetos Educacionais), ob-têm-se 7,5% de recursos da União em rela-ção ao total das receitas para a educaçãodo município.

4.2 As despesas em MDE no4.2 As despesas em MDE no4.2 As despesas em MDE no4.2 As despesas em MDE no4.2 As despesas em MDE nomunicípio de Dourados (1996 amunicípio de Dourados (1996 amunicípio de Dourados (1996 amunicípio de Dourados (1996 amunicípio de Dourados (1996 a2000)2000)2000)2000)2000)

A análise das despesas realizadas nafunção “Educação e Cultura”, do Balanço Or-çamentário de Dourados, nos anos de 1996a 2000, indica que esses dispêndios, em re-lação ao total de despesas de cada ano, fo-ram de 21,29% em 1996, 22% em 1997,26,9% em 1998 – ano da implantação doFundef –, 30,4% em 1999 e 25,6% em 2000.

O relevante neste caso é que, pelanatureza contábil dos documentos anali-

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sados, não é possível identificar o que defato se gasta em MDE e o que é verdadei-ramente despesas na cultura, à medida quetal conta expressa, sem distinção, o totaldo dispêndio municipal nesta função.

Resolve-se parcialmente esta questãopor meio da análise da peça “Unidade Orça-mentária” da Secretaria Municipal de Educa-ção, quando, de forma mais detalhada, sãodescritas as despesas por programas, o quepode ser observado na tabela 4.5.

Visualiza-se, pela tabela 4.5, que em1997 as despesas com o ensino fundamen-tal chegam a 68,41% na unidade orçamen-tária da Secretaria Municipal de Educação.Em 1998, quando começa a vigorar oFundef, percebe-se que tal conta passa arepresentar 86,38% dos seus dispêndios.Em 1999, essa situação orçamentária sig-

nifica 87,1% das suas despesas e, em 2000,essa realidade de orçamento significa80,4% de gastos com o ensino fundamental.Esses valores confirmam a focalização dapolítica educacional do município no ensi-no fundamental, não obstante, ser de suaresponsabilidade tanto esta etapa da edu-cação básica, quanto a educação infantil.

Percebe-se que estes números se ex-pressam dessa forma devido o município serreceptor de recursos do estado pelo Fundef.Os valores financeiros são passados ao mu-nicípio conforme o número de matrículas noensino fundamental, o que põem em relevoo seu processo de municipalização no quediz respeito a esta etapa da educação básica.Em relação às despesas com pessoal, estasrepresentam em 1999, 55% e em 2000, 63,3%do total do orçamento do Fundef.

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Verifica-se, pela tabela 4.6, que os va-lores do custo/aluno/ano em Dourados tive-ram de 1998 para 1999 um aumento daordem de 36,7%. Já, de 1999 para 2000apresenta-se uma queda da ordem de 40%deste valor. Tal oscilação que poderia serresultado de como a receita do fundo públi-co no município se comporta, não obstante,remete-se a análise da dificuldade de seplanejar/orientar a política educacional nes-te cenário, pois, as conquistas representa-das para a educação com um valor de cus-to/aluno/ano de R$ 1.243,71 tornam-seefêmeras, quase que fictícias quando, de umano para outro há uma queda deste valorde forma tão significativa. Qual seja, de fatoé impossível manter um padrão de quali-dade de política educacional num quadrode tanta incerteza financeira e monetária.

Evidencia-se que a política educaci-onal em Dourados do início dos anos de1990 a 2000 tem como eixo delineador/delimitador a focalização no ensino funda-mental. Esta opção de política educacionalaponta para o município desafios que numfuturo próximo terá que responder, pois acentralidade no ensino fundamental podecolocar em risco a possibilidade da cons-trução de uma educação básica de quali-dade, bem como a sua universalização. Al-

guns dados já apontam esta situação: omunicípio atendeu, em 2001, 1.179 criançasnos centros de educação infantil e, 2.722crianças na pré-escola de unidades esco-lares. Esse atendimento de 3.901 criançasna educação infantil, confirma o déficit his-tórico que o município tem para com a pri-meira etapa da educação básica. O aten-dimento para a educação infantil em nú-meros relativos, significa atender 19% dapopulação de 0 a 6 anos. Se for considera-do, entretanto, o atendimento para criançasde 0 a 4 anos, tem-se um percentual daordem de 5,5% na educação infantil do mu-nicípio. Ainda, conforme o Instituto Nacio-nal de Estudos e Pesquisas Educacionais(INEP), em 1996, o município convivia comuma taxa de 10,9% de analfabetismo en-tre pessoas com mais de 15 anos de idade.

Ressalte-se aqui, que, embora, omunicípio tenha priorizado o atendimentoao ensino fundamental mesmo antes dapromulgação da Lei do Fundef, o que seconstata por meio da análise das suas re-ceitas e despesas é que muito mais do queafirmar que administra-se num quadro deescassez, o mais impactante para esta pri-oridade educacional eleita pelo município,enquanto política pública de educação, éde fato o caráter oscilatório na sua arreca-

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dação de impostos, pois, a continuar estasituação o planejamento educacional cons-trói-se num quadro de grandes incertezassem conseguir garantir o valor do custo/aluno/ano como algo constante, bem comoprejudica a previsão de reajustes reais anoa ano para este valor.

NotasNotasNotasNotasNotas1 Para uma avaliação minuciosa dos Planos Nacio-nais de Desenvolvimento elaborados no país noperíodo de 1975 a 1985, ver GOLDENSTEIN, Lidia.2 Para uma análise conceitual deste termo, verCASSASUS, Juan.3 MATO GROSSO DO SUL. Secretaria de Estado deEducação. Uma proposta de educação para MS –relatório final, 1991-1994, p. 15.4 Escolas estaduais municipalizadas em Dourados

em 1993: Franklim L. Azambuja, M. R. de A. R. Câ-mara, Weimar Gonçalves Torres e Joaquim Murtinho.5 A partir de então neste texto usar-se-á MDE sempreque se referir a Manutenção e Desenvolvimento doEnsino.6 A redução da vinculação constitucional de recur-sos para MDE em Mato Grosso do Sul deu-se pelaaprovação da Emenda Constitucional nº 06, de 07de julho de 1997.7 DOURADOS (MS). Secretaria Municipal de Educa-ção de Dourados. Lei nº 2.154, de 25 de setembrode 1997. Institui o Sistema Oficial de Ensino do Mu-nicípio de Dourados-MS, e dá outras providências.8 Dispõem o Artigo 212 da CF/1988: “A União aplicará,anualmente, nunca menos de dezoito, e os Estados,o Distrito Federal e os Municípios, vinte e cinco porcento, no mínimo, da receita resultante de impos-tos, compreendida a proveniente de transferências,na manutenção e desenvolvimento do ensino”.9 DOURADOS (MS). Secretaria Municipal de Fazen-da. Balanços Gerais de 2001.

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Recebido em 07 de agosto de 2004.Recebido em 07 de agosto de 2004.Recebido em 07 de agosto de 2004.Recebido em 07 de agosto de 2004.Recebido em 07 de agosto de 2004.Aprovado para publicação em 19 de outubro de 2004.Aprovado para publicação em 19 de outubro de 2004.Aprovado para publicação em 19 de outubro de 2004.Aprovado para publicação em 19 de outubro de 2004.Aprovado para publicação em 19 de outubro de 2004.

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ArtigosArtigosArtigosArtigosArtigos

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Apontamentos sobre o conceito de identidadeApontamentos sobre o conceito de identidadeApontamentos sobre o conceito de identidadeApontamentos sobre o conceito de identidadeApontamentos sobre o conceito de identidadeprofissional de professoresprofissional de professoresprofissional de professoresprofissional de professoresprofissional de professores

Camila Alberto Vicente de Oliveira*Alberto Albuquerque Gomes**

* Mestranda do Programa de Mestrado em EducaçãodaUNESP/Presidente Prudente.e-mail: [email protected].

** Professor da UNESP/Presidente Prudente. Pesquisadorda Unidade de Investigação e Desenvolvimento, Observa-tório de Políticas de Educação e de Contextos Educativosda Universidade Lusófona de Humanidades e Tecnologias.e-mail: [email protected]

ResumoResumoResumoResumoResumoRefletir sobre a identidade profissional do professor exige que se discuta como um profissional, que em suahistória recente tem sido vítima de políticas salariais desastrosas e submetido a condições de trabalho e deformação totalmente inadequadas, pode construir sua identidade. Além disso, tem se exigido do professor, deforma paradoxal, um compromisso com a autoformação, além da formação profissional obtida nos cursos deformação de professores. Considerando que a identidade profissional do professor constrói-se, pelo sentimen-to de pertença a uma comunidade de professores, pelas práticas sociais dos sujeitos e pela articulação dasesferas do conhecimento, das normas e valores profissionais e dos saberes pedagógicos, defendemos que istopassa, necessariamente, pela reconstrução das relações dialógicas entre estas esferas.

Palavras-chavePalavras-chavePalavras-chavePalavras-chavePalavras-chaveIdentidade; formação de professores.

AbstractAbstractAbstractAbstractAbstractTo reflect on a teacher’s professional identity requires that we discuss some issues as to how a professional,who in their recent history has been a victim of disastrous salary policies and submitted to inadequateconditions of work and training can construct their identity. Furthermore, it has been demanded from theteachers, paradoxically, a commitment with their own professional education, beyond that acquired inteacher training courses. We consider that the teacher’s professional identity is built on the feeling ofbelonging to a community of teachers, by the social practices of these people and by the articulation ofknowledge spheres, by the professional norms and values and by pedagogical knowledge. We defend thatall these things receive influences from the reconstruction of the dialogical relations of these spheresmentioned.

Key wordsKey wordsKey wordsKey wordsKey wordsIdentity, teacher training.

O desenvolvimento do autoconhecimento não significa a prática de um exercício isolado. A auto-

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exploração, assim como toda autonomia,é um processo de busca, compreensão econstrução pessoal no contexto das rela-ções.

José Contreras

IntroduçãoIntroduçãoIntroduçãoIntroduçãoIntrodução

A cultura do sucesso e do fracassoescolar têm sido, há algumas décadas, ofoco central e o cenário das pesquisas edu-cacionais. Nesse palco, vários atores têmmerecido destaque ao longo dos anos: oraa sociedade, ora o aluno carente. Atualmen-te, o professor tem sido eleito como prota-gonista dessa tragédia em atos.

É evidente em publicações e even-tos específicos da área educacional, a pre-ocupação com a formação, a prática, aavaliação do professor. A formação do pro-fessor, como um momento privilegiadopara formar um profissional preparadopara a mudança da escola e a superaçãodo fracasso escolar, apresenta-se comotema de pesquisa e mesmo de programasde pós-graduação1.

Nossa preocupação com essas dis-cussões originou-se no Núcleo de Ensino2,projeto em parceria com o Centro Específi-co de Formação e Aperfeiçoamento doMagistério – Cefam – de Presidente Pruden-te, que tinha como objetivo principal amelhoria da formação de professores emnível médio, nesse estabelecimento de en-sino, através de trabalho coletivo e com-partilhado dos professores que ali atuavam.

Apesar do esforço para garantir aparticipação dos professores (inclusive combolsas concedidas pela Fapesp), apenasparte do grupo de professores interessava–

se e comprometia-se efetivamente com oprojeto coletivo. Destes, apenas alguns pro-fessores participavam de forma aberta àsmudanças de atitudes, buscando um tra-balho de melhor qualidade que se refletis-se no bom desempenho profissional dofuturo professor que estavam formando.

A vivência nesse projeto, rica em diá-logos e aprendizados, revelou as facetas deuma formação profissional, que apesar denutrir a esperança de transformação daescola, não tem acompanhado o ágil de-senvolvimento do espaço, do tempo e dasnecessidades do trabalho do professor.

Refletir sobre a identidade profissio-nal desses atores – os professores – quefazem parte desse grande espetáculo, e quesegundo Esteve (1996), continuam repre-sentando papéis como os gregos, com umaretórica toda especial, porém, num cenáriohigh-tech com arranha-céus, carros e pes-soas que transitam sem sequer se olharem,exige que se discuta como um profissionalque em sua história recente tem sido víti-ma de políticas salariais desastrosas e sub-metido a condições de trabalho e de for-mação totalmente inadequadas, podeconstruir sua identidade profissional.

Além disso, tem se exigido do profes-sor, de forma paradoxal, um compromissocom a autoformação, além da sua forma-ção profissional obtida nos cursos de forma-ção de professores. Paradoxal por que se-gundo Hargreaves (2004, p. 23), “Os pro-fessores cujas vidas profissionais estão sujei-tas a um exame excessivo queixam-se deerosão da autonomia, de criatividade per-dida, flexibilidade restrita e reduzida capaci-dade de exercerem o seu julgamento profis-

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sional”. Como falar em autoformação, emidentidade profissional diante dessa “desau-torização” da qual é vítima o professor?

O que significa identidade?O que significa identidade?O que significa identidade?O que significa identidade?O que significa identidade?

O que pode parecer um problemamenor, ou seja, a origem etimológica da pa-lavra identidade e a questão conceitual so-bre se a identidade do professor é umaidentidade do professor é umaidentidade do professor é umaidentidade do professor é umaidentidade do professor é umaauto-construção ou uma construção co-auto-construção ou uma construção co-auto-construção ou uma construção co-auto-construção ou uma construção co-auto-construção ou uma construção co-letivaletivaletivaletivaletiva representa a oportunidade de fazeruma revisão sobre a questão da qual estamostratando, para ir além da adjetivação ou douso indiscriminado das palavras.

De origem latina – identitatem - apalavra identidade designa, segundoBueno (1968): “igualdade entre duas coi-sas, seres ou pessoas”.

Essa definição do termo nos permiteafirmar que identidade deve ser entendida,preferencialmente, como categoria coletiva,ou seja, algo só identificável em relação aoutro que tenha características semelhan-tes. Para o professor, construir sua identi-dade depende daquilo que considere comoo ideal para a sua profissão.

A identidade do professor corres-ponde aos seus valores e crenças, os quaisconsidera em relação ao aluno, a escola ea educação.

Como já anunciamos, outra questão,que à primeira vista, pode ser reduzida apura semântica nos alerta para um olharmais detalhado: a identidade é do profes-sor ou a identidade está no professor?

A interpretação fiel do termo identi-dade mais a conjunção “do” remete-nos aesse conceito como algo inato. Ser profes-

sor, e se identificar como tal, pode ser vistocomo um dom, uma vocação, com um viésum tanto messiânico.

Quando se usa identidade “no” pro-fessor o termo passa a ser interpretadocomo algo que só é produzido fora da pes-soa-professor. Qualquer um que passe poruma formação, ou no limite, venha a serdesignado docente, pode fazê-lo sem cons-trangimentos.

Acreditamos que para além da gra-mática a identidade profissional do profes-sor precisa ser entendida como a combina-ção de fatores inerentes à pessoa: desejo,vontade, dedicação e fatores externos queotimizam a vontade de ser professor: forma-ção e condições de trabalho adequadas.

Breves comentários sobreBreves comentários sobreBreves comentários sobreBreves comentários sobreBreves comentários sobreidentidade profissional deidentidade profissional deidentidade profissional deidentidade profissional deidentidade profissional deprofessoresprofessoresprofessoresprofessoresprofessores

Para discutirmos a identidade profis-sional dos professores há a necessidade defazermos uma revisão sobre esse conceitoreunindo trabalhos realizados por estudio-sos do tema e sua repercussão na forma-ção dos profissionais da educação.

Já apontamos que identidade doprofessor precisa ser entendida coletiva-mente, para além da pessoa enquanto con-dição inata: o docente só pode se compre-ender na profissão quando inserido emcategoria maior, uma categoria profissional.

Para Libâneo (2001) o professor éum profissional cuja especificidade é a artede ensinar. Para isso, tem em sua formaçãoinicial um momento privilegiado para apre-ender um conjunto de habilidades, conhe-

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cimentos e requisitos que são essenciaispara o exercício de sua função. A isso, oautor dá o nome de “profissionalidade” edessa conquista serão derivadas outrasduas etapas de sua formação: a “profissio-nalização” e o “profissionalismo”.

O autor (2001) nos coloca que a pro-fissionalização refere-se a condições parao bom exercício da docência: formação (ini-cial e continuada) e condições de trabalho(salário, recursos físicos e materiais) adequa-das. Já o profissionalismo refere-se ao de-sempenho competente do professor no quetange os deveres e responsabilidades quesão inerentes a sua profissão, bem como, oseu comportamento ético e político.

Nesse estudo, Libâneo defende quepara garantir a profissionalidade docente,o ensino como atividade específica do pro-fessor e da escola, a busca por melhor for-mação e condições de trabalho e pelo re-torno do significado social do ser professordeve se dar simultaneamente. Libâneo(2001, p.65) coloca:

Se o professor perde o significado do tra-balho tanto para si próprio como para asociedade ele perde a identidade com asua profissão. O mal-estar, a frustração, abaixa auto-estima, são algumas conseqü-ências que podem resultar dessa perdade identidade profissional.

Portanto, para Libâneo (2001), aconstrução e o fortalecimento da identidadeprofissional deve fazer parte do currículodos cursos de formação continuada e, ainda,fazer parte da formação continuada já queé no contexto do trabalho docente que aidentidade do professor se consolida.

Ainda para Libâneo (2001, p. 68),identidade profissional é:

o conjunto de conhecimentos, habilida-des, atitudes e valores que definem e ori-entam a especificidade do trabalho do pro-fessor. Sabemos que a profissão de pro-fessor vai assumindo determinadas carac-terísticas – isto é – determinada identida-de – conforme necessidades educacionaiscolocadas em cada momento da históriae em cada contexto social (PIMENTA apudLIBÂNEO, 2001, p.68)

Para atuar conforme as necessidadeshistóricas contemporâneas, outras competên-cias, além das tradicionais como saber ensi-nar são colocadas para o professor mo-dificando seu papel. Para acompanhar essatransformação no mundo, no trabalho e naidentidade docente o autor sugere a avalia-ção das competências e saberes necessáriospara atuação do professor pelos cursos deformação inicial e continuada de professoresestreitando a relação entre a qualificação doprofessor e sua identidade profissional.

Já Pimenta (2000) trata da questãoda identidade como algo pertencente à for-mação do professor, seja ela inicial ou conti-nuada. Formação entendida como um pro-cesso dinâmico no qual o professor (ou ofuturo professor) esteja consciente das singu-laridades da atividade docente e possa, apartir do conhecimento acumulado e desuas práticas éticas e políticas, apontar cami-nhos para que o aluno transite nos desafioscolocados atualmente pela sociedade e, maisdo que isso, o professor possa ser capaz deproblematizar sua prática em contínuo pro-cesso de construção de sua identidade.

Para essa autora a identidade doprofessor é um processo de construção quereflete o contexto e momentos históricos,respondendo, dessa forma, às novas de-

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mandas colocadas pela sociedade. A neces-sidade da construção da identidade docen-te - através de uma formação problema-tizadora da prática pedagógica – “é o queconferirá significado à atividade docente noseu cotidiano a partir de seus valores, deseu modo de situar-se no mundo (...), dosentido que tem em sua vida o ser profes-sor” (PIMENTA, 2000, p.19). Para que esseprocesso de construção, historicamente si-tuado, se construa a autora acrescenta que:

Uma identidade profissional se constrói,pois, a partir da significação social da pro-fissão; da revisão constante dos significa-dos sociais da profissão; da revisão dastradições. Mas também da reafirmação daspráticas consagradas culturalmente e quepermanecem significativas. Práticas queresistem a inovações porque prenhes desaberes válidos às necessidades da reali-dade. Do confronto entre as teorias e aspráticas, da análise sistemática das práti-cas à luz das teorias existentes, da cons-trução de novas teorias.

Segundo a autora (2000, p. 19), “mo-bilizar os saberes da experiência” seria en-tão, o passo primeiro para a construção daidentidade docente. Isto é, todo aluno delicenciatura já passou por pelo menos dezanos de escolarização. Nesse período, tevecontato com diversos professores, com lin-guagens, posturas éticas, políticas e peda-gógicas e relações interpessoais muito parti-culares. Evidentemente que não se podeabrir mão desses “saberes” na formação dosprofessores.

O futuro professor provavelmente le-vará para sua sala de aula traços do tra-balho de professores que foram presentesna sua formação humana. É o começo daidentificação profissional e apenas isso, não

é suficiente. É preciso pois, mobilizar outrosdois saberes: os saberes do conhecimentoe os saberes pedagógicos que são, tam-bém, fundamentais para a construção daidentidade do professor.

Os saberes do conhecimento referem-se aos conhecimentos que cada licenciatu-ra tem por objeto de estudo. Identificar osconhecimentos de cada área das ciênciascom aqueles que serão usados pelo pro-fessor se dá pela certeza de que o conheci-mento não se resume em informações, mas,“conhecer significa estar consciente do po-der do conhecimento para a produção davida material, social e existencial da huma-nidade” (PIMENTA, 2000, p.22).

Os saberes pedagógicos, para alémdas formas de lidar com o aluno, a motiva-ção e as formas de avaliar o processo ensi-no-aprendizagem, se referem à reinvençãoda prática pedagógica a partir da práticasocial da educação. Esses saberes colabo-ram com a prática do professor principal-mente se forem requisitados a partir de umproblema do cotidiano da sala de aula noqual se busca um suporte teórico (o saberpedagógico seria usado para resolvê-lo).

Considerar a mobilização dos sabe-res da experiência, dos saberes do conheci-mento e dos saberes pedagógicos comofundamental para a formação de profes-sores é para Pimenta (2000) uma formade valorizar a construção da identidadedocente e forma-lo para uma prática refle-xiva que faz parte de um projeto maior deformação humana no qual a identidade doprofessor – assumir-se como tal – é condi-ção para a formação permanente e amelhoria das escolas.

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Para Carrolo (1997, p. 23), o númerocrescente de pesquisas que tem a identida-de do professor como objeto de estudo re-vela a crise da profissão e a busca por umaidentidade mostra-se como um comporta-mento novo e uma forma de superar o“mal-estar” comum na sociedade contem-porânea. Parte dessa preocupação com aconstrução da identidade do docente éderivada da forma técnica como os profes-sores estavam sendo formados deixandoà margem “a dimensão reflexiva da socia-lização profissional, cujo horizonte é o de-senvolvimento da identidade profissionaldo docente”.

Prosseguindo em sua análise, o au-tor afirma que não é simples, em uma pes-quisa em ciências humanas, definir identi-dade e outro complicador é a definição determinologias, a epistemologia e a opera-cionalização do termo. Em professores, adificuldade em se definir sua identidade éainda mais visível, pois “representam umgrupo profissional sobre o qual incidemvários riscos de descaracterização” como: aperda do status e do reconhecimento soci-al, a falta de definição do papel da escolaem relação às novas exigências colocadaspara o trabalho do professor e a falta depercepção pelos próprios professores dadimensão do seu trabalho e o questiona-mento do sentido do que faz e como osoutros avaliam suas ações.

Outro apontamento realizado peloautor, e que destacamos, refere-se à visãoda identidade como produto da socializa-ção. Para Carrolo (1997 p.27): “o seu me-canismo (da identidade) se assenta na du-pla transação que o indivíduo realiza - uma

transação externa do sujeito com o mundoexterior e outra do sujeito consigo mesmo”.

É nesse encontro entre a onto-gênese do indivíduo e a socialização quese dá a construção da identidade:

A “identidade para si” ou “desejada” temdeste modo subjacente um processo bio-gráfico. E a “identidade para outrem” ou“atribuída” tem subjacente um processorelacional. A articulação entre estas duasfaces heterogêneas é a chave do proces-so da construção da identidade profissio-nal (CARROLO, 1997, p.27).

Analisar a identidade docente emuma perspectiva sociológica significa paraCarrolo, (1997, p. 29), “considerar comoobjetos de estudos privilegiados as origenssociais e as histórias de vida dos professo-res, a formação e as instituições de forma-ção (...) numa ponderada articulação entreos dois processos identitários, biográfico erelacional”.

Teodoro (1998) é outro autor que temse preocupado como estudo da identida-de e da formação docentes. Parte da mes-ma convicção de Carrolo (1997), de que háa identidade individual - biográfica - e aidentidade coletiva-relacional.

Contudo, além dos fatores contem-porâneos que geram a crise de identidadedo professor e o levam a desenvolver ca-racterísticas do “mal-estar docente”, Teodoro(1998) enfatiza que não se pode ignorar ahistória da educação e das escolas nessaanálise, isto é, a forma como se institui ademocratização das escolas e as formas deorganização sindical e de controle da for-mação docente são fontes de crise e “mal-estar docente”. Em Portugal, enquanto es-pera-se a real democratização da escola,

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os professores continuam sendo presti-giados e bem aceitos socialmente, masapresentam baixa auto-estima:

Esta imagem social da profissão docentenão é, todavia, assumida pelos própriosprofessores, que mostram, enquanto gru-po profissional, uma auto-estima bastan-te baixa, manifestando em finais da déca-da de 80, uma elevada intenção de aban-donar a docência (TEODORO, 1998, p.7).

Para Teodoro (1998), o estudo e oentendimento da crise na identidade doprofessor e na formação de professorespode apoiar-se na história da educação ena compreensão de que a identidadeconstruída por cada geração é feita combase em categorias e posições herdadasda geração anterior, buscando a transfor-mação e a reconstrução dessa identidade.

Sobre esse aspecto, buscamos apoioem Sanches (2004), que afirma que as pro-fundas transformações provocadas peloneoliberalismo, especialmente adesregulamentação das políticas públicase a privatização de serviços como educa-ção e saúde, tarefas do tradicional Estado-Nação, repercutiram fortemente no interiorda escola, principalmente no que diz res-peito à apresentação de novas demandas.

Divulgam-se também slogans que sim-bolizam a apropriação das políticaseducativas pelos ditames da economia:sociedade de aprendizagem; devolução daautonomia às escolas pelo Estado; e o alar-gamento da esfera privada com a devolu-ção das actividades do Estado para as ini-ciativas privadas (SANCHES, 2004, p. 41).

Este reordenamento sustenta-se numconjunto de idéias como por exemplo,mercado educacional, democracia do con-sumidor, articulação entre escolarização e

mercado de trabalho, melhores desempe-nhos nos rankings nacionais e internacio-nais, racionalidade e redução de custos, etc.Os professores, como atores desse espetá-culo, têm sido chamados como se fossemparceiros, para a construção do currículo,gestão da escola e gestão de conflitos so-ciais que explodem no interior da escola,ao mesmo tempo em que são vítimas dofundamentalismo de mercado que os ex-clui como diferentes, e uma forma de con-trole mais perversa ainda do que as for-mas tradicionais, por que se faz de formaremota: o professor se sabe vigiado e con-trolado por um olho invisível, tal qual um“big brother”.

Diante do exposto, cabe perguntarque atributos configuram a nova identidadeprofissional do professor. Segundo Sanches(2004), são numerosas e complexas as no-vas atribuições e competências dos profes-sores, todas elas transcendendo e se acres-centando às funções clássicas centradas natransmissão de saberes em vez de dar lugarà criatividade e inovação. Em outras pala-vras, para a reconstrução identitária dosprofessores, tem se exigido que além dassuas históricas atribuições profissionais,devem superar e suprir a falência do Estadoe da sociedade na solução de problemassociais em novos contextos de grande com-plexidade. Problemas relacionados à con-duta de crianças e adolescentes, antes res-tritos ao ambiente familiar, adentraram aescola e dela se espera as soluções.

Como se vê, a conjugação de fato-res como o desgaste do modelo tradicio-nal de formação docente (aquele em quese forma normativamente sem se preocupar

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com a realidade que encontrará), a crise darepresentatividade sindical, as novas exigên-cias que se fazem em relação à escola, atransposição de uma lógica de mercadopara o interior da escola, reflete-se negativa-mente na constituição (ou re-constituição)da identidade profissional do professor.

Parece-nos que os professores têmsua identidade fundamentada muito maisnos problemas e dificuldades enfrentadoscotidianamente, no cinismo em relação àprofissão, na vontade de abandonar a pro-fissão e na resistência a qualquer tipo demudança do que em atributos como do-mínio de conteúdos, responsabilidade so-cial, compromisso com as gerações maisjovens, profissionalismo, dentre outros.

Não é impreciso indicar que discutirindisciplina, baixos salários, gestores autori-tários e alunos com dificuldades de aprendi-zagem é o que reúne os professores e osfazem compreender-se como atores ence-nando uma tragédia ensaiada fora dosmuros da escola, na qual a identidade pro-fissional do professor ocupa lugar poucoprivilegiado onde não se enxerga o fim doespetáculo. A antiga comunidade de profes-sores, cujo sentido de afinidade, “contribuíapara integrar e tornar próximos os professo-res” (SANCHES, 2004, p.46), deu lugar auma categoria profissional dispersa incapazde partilhar os significados da profissãodocente.

Da identificação ouDa identificação ouDa identificação ouDa identificação ouDa identificação ou(des)identificação do professor(des)identificação do professor(des)identificação do professor(des)identificação do professor(des)identificação do professorcom sua profissãocom sua profissãocom sua profissãocom sua profissãocom sua profissão

Como iniciamos esse texto falandode cenário e palco, podemos prosseguirnessa linha, afirmando que o ator-professor,para se identificar com seu papel deve levarem consideração o momento e o contextohistórico no qual se desenrola a trama,além dos demais personagens, no caso es-pecífico, outros atores-professores, atores-gestores, atores-alunos, atores-familiares.Nesse sentido, é preciso considerar que aspráticas sociais dos sujeitos a partir de suaformação escolar e do contexto social emque se dá, a vivência cotidiana na escola,as relações com o produto de seu trabalhoe as relações com outros sujeitos envolvidoscom a escola desempenham papel funda-mental na constituição ou fragmentação daidentidade profissional do professor. Assimcomo todos os sujeitos sociais, a identidadedo professor se constrói a partir da conjuga-ção de inúmeros fatores. (SANCHES, 2004)

As novas exigências e condições quese impõem ao professor têm sido fatoresdecisivos na desagregação da comunida-de de professores, no exacerbamento doindividualismo profissional e no crescentecinismo em relação ao “ser professor”.

Partindo do pressuposto de que aidentidade profissional do professor deveser assegurada pelo sentimento de perten-ça a uma comunidade de professores; pe-las práticas sociais dos sujeitos e pela arti-culação das esferas do conhecimento, dasnormas e valores profissionais e dos sabe-

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res pedagógicos, defendemos que a(re)construção da identidade profissional doprofessor passa necessariamente pela re-construção das relações dialógicas entreessas esferas, em novas bases, uma vez queassim, como na cantiga de roda, a identi-dade que o professor tinha era de vidro ese quebrou, o amor que tinha à profissãoera pouco e se acabou. Ciranda, cirandinha,vamos todos cirandar...

NotasNotasNotasNotasNotas1 O Programa de Pós- Graduação da FCT/UNESP–Presidente Prudente tem como área de concentra-ção a formação de professores.2 Projeto de pesquisa e extensão intitulado “Forma-ção de professores das séries iniciais do Ensino Fun-damental no Cefam de Presidente Prudente”, do De-partamento de Educação (FCT/UNESP) em parceriacom o Cefam e financiamento da Fapesp (atravésdo Projeto Melhoria do Ensino Publico) e da Fun-dunesp encerrado em dezembro de 2001 coorde-nado pela Professora Drª Yoshie Ussami Ferrari Leite.

ReferênciasReferênciasReferênciasReferênciasReferências

BUENO, Francisco da Silveira. Grande dicionário etimológico-prosódico da língua portu-guesa. São Paulo: Saraiva, 1968.

CARROLO, Carlos. Formação e identidade profissional dos professores. In: ESTRELA, Ma-ria Teresa (org). Viver e construir a profissão. Porto: Porto Editora, 1997. p.22-50

ESTEVE, José Manuel. O mal-estar docente – a sala de aula e a saúde dos professores.Bauru: Edusc, 1996.

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TEODORO, Antonio. Crise de identidade nos papéis e na formação de professores. Quatrotópicos a partir de uma leitura sociológica. 3o Encontro Ibérico e História da Educação - Braga:Junho de 1998, p.1-8. Disponível em http://www.ulusofona.pt/. Acesso em 30 julho de 2003.

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TEXTO CONSULTADO

HARGREAVES, Andy. Ser professor na era da insegurança. In: ADÃO, Aurea & MARTINS,Édio (Orgs.). Os professores: identidades reconstruídas. Lisboa: Edições UniversitáriasLusófonas, 2004, p. 13 - 36.

Recebido em 04 de agosto de 2004.Recebido em 04 de agosto de 2004.Recebido em 04 de agosto de 2004.Recebido em 04 de agosto de 2004.Recebido em 04 de agosto de 2004.Aprovado para publicação em 17 de setembro de 2004.Aprovado para publicação em 17 de setembro de 2004.Aprovado para publicação em 17 de setembro de 2004.Aprovado para publicação em 17 de setembro de 2004.Aprovado para publicação em 17 de setembro de 2004.

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Considerações pedagógicas na abordagemConsiderações pedagógicas na abordagemConsiderações pedagógicas na abordagemConsiderações pedagógicas na abordagemConsiderações pedagógicas na abordagemtranspessoal: transpessoal: transpessoal: transpessoal: transpessoal: passado e presente na educaçãopassado e presente na educaçãopassado e presente na educaçãopassado e presente na educaçãopassado e presente na educação

Regina Clare Monteiro

Doutora em Educação pela UNICAMP. Assessora Acadê-mica da UNIFAN. Professora do Programa de Mestrado emEducação da UNESPAR.e-mail: [email protected]

ResumoO enfoque transpessoal, que chega a nós da Educação por intermétio da Psicologia, vem ganhando cadavez mais espaço na concepção de mundo e de vida. No Brasil, um número crescente de escolas ofereceum ensino preocupado com a visão integral do ser humano (do aprendente), retomando clássicos daPedagogia como Rousseau, Steiner, Montessori, Decroly, entre outros, atendendo a uma demanda demercado extraordinariamente significativa. Entretanto, há raras publicações científicas ou acadêmicas, emnosso país, sobre Educação Transpessoal que possam fundamentar este fazer pedagógico. Este trabalhoprocura levantar alguns pontos de partida para que outros estudos auxiliem a estabelecer um caminho,teórico e prático, para este enfoque.

Palavras-ChavePalavras-ChavePalavras-ChavePalavras-ChavePalavras-ChaveEducação; transpessoal; prática docente.

AbstractAbstractAbstractAbstractAbstractThe transpersonal focus, that comes to us from Education by means of Psychology, is gaining more andmore attention in the conception of world and life. In Brazil, a growing number of schools offer teachingconcerned with an integral vision of the human being (the learner), taking up the classics in Pedagogysuch as Rousseau, Steiner, Montessori, Decroly, amongst others, attending to an extraordinarily significantmarket demand. However,scienfitic or academic publications are rare in our country on TranspersonalEducation which can found this pedagogical concept. This study seeks to bring up some starting points sothat other studies can help to establish the way, theoretical and practical, for this focus.

Key wordsKey wordsKey wordsKey wordsKey wordsEducation; transpersonal; teaching practice.

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Nossas pressuposições sobre o mun-do como que esfumaçam a nossa visão,nebulando as experiências, os pensamen-tos, as crenças e as atitudes. Essa fumaça éproduzida pelas premissas e axiomas fun-damentais que temos sobre a Natureza eo Homem, certezas da vida que raras vezesquestionamos.

Mas uma visão de mundo é neces-sária a todo ser humano. Para os antropó-logos, todas as culturas abraçam algumavisão de vida que forneça, a seus membros,a sensação de que ocupam o seu lugar noTodo; para os psicólogos, é imprescindívelaos indivíduos uma visão geral, na qualpossam orientar-se. Em uma cultura, ou noindivíduo, a visão de mundo pode abran-ger aquilo que é conhecido pela ciêncianaquele tempo e local, acrescido de idéiasreligiosas e filosóficas.

A visão de mundo do Ocidente aindapredominante formou-se ao redor do mate-rialismo do século XIX, mesclada com idéiasmais recentes como a Relatividade, deEinstein, e o Princípio da Incerteza, deHeisenberg. Baseada no chamado Redu-cionismo do século XIX, que resultou naanálise dos objetos em seus componentescada vez menores, esta visão de mundo temdado origem à fragmentação, tanto na con-cepção do mundo, como na do indivíduo.

A mente é olhada como mera fun-ção do cérebro e a consciência vista comoum subproduto da evolução física. Segun-do esta visão, o mundo adquire um carátermaterial, físico, e parece ser constituído deunidades isoladas, independentes, que apa-rentam uma desconexão inerente. Para ofísico David Bohm (1992), este tipo de

pensamento é um dos principais fatores naatitude divisionista que permeia o mundocontemporâneo. O nosso impulso para rom-per a realidade em fragmentos, que perce-bemos através dos sentidos, é reforçadopela linguagem que enfatiza as diferenças.Assim como vemos objetos separados, dis-tintos, vemos também pessoas diferentes,que parecem ter uma identidade exclusi-vamente própria, enquanto indivíduosauto-enclausurados. Questionada por pen-sadores, esta visão separatista da realida-de vem convergindo para outra, possivel-mente mais ampliada, que procura mos-trar como o progresso na ciência, especial-mente no âmbito da natureza da matéria,torna obsoleto o enfoque divisionista, esta-belecido na mente humana. Mas, apesardas convincentes evidências, nossos hábi-tos, profundamente arraigados em umavisão fragmentada da realidade, são difí-ceis de serem rompidos. Resistimos às mu-danças porque é algo que se situa alémda esfera da percepção consciente e daescolha. Aceitamos por tanto tempo os con-ceitos separatistas, com base nas impres-sões sensoriais, enquanto realidade final,que os limites estabelecidos por eles firma-ram-se como invioláveis.

Esta visão fragmentada tambémpermeia o conceito sobre si mesmo. Cres-cemos considerando-nos pessoas separa-das, independentes em nossos própriosmundos interiores. Até mesmo entre os maisesclarecidos a tendência mais acentuada éa de viver no meio de uma esfera autocen-trada, atribuindo importância básica aos in-teresses e benefícios pessoais, às energiasgastas no fomento do seu mundo particu-

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lar, freqüentemente em prejuízo de tercei-ros (nem que seja pela omissão e descom-promisso). Os ideais de individualismo ecompetição baseiam-se nesta visão quenos serviu durante a maior parte de nossahistória. Entretanto, os novos caminhos dapolítica, da economia, enfim, das ciênciasem geral, levam-nos a reconhecer o plane-ta como uma ‘aldeia global’, na qual nãose pode estar separado um do outro. Acomunicação internacional instantânea, ocomércio mundial, reservas decrescentes derecursos naturais do planeta, superpopu-lação, entre outros, são alguns dos fatores,extremamente conhecidos, que deveriamimpulsionar o homem para uma inter-rela-ção harmoniosa. Entretanto, a ênfase nasdistinções entre raças, nações, grupos étni-cos, classes sociais, famílias, indivíduos, im-pede um trabalho conjunto para o bemcomum e até mesmo para a sobrevivência.

Compartilhando e interagindo cons-tantemente, ainda que cada um de nós sejaum indivíduo independente, constituímosuma única humanidade, e as divisões emgrupos e nações são menos fundamentaisdo que a unidade e, se o anseio pela trans-formação, pela sensação de ‘inteireza’ é his-tórico, e até ontológico, o termo que o iden-tifica, atualmente, também não é recente.Em alguns dicionários de filosofia encon-tra-se a palavra ‘holismo’ — do grego ‘holosholosholosholosholos’= todotodotodotodotodo — cuja criação é atribuída a JanChristian Smuts, filósofo e estadista sul-afri-cano, autor do livro ‘Holism and Evolution’,publicado em 1926.

Nesta obra Smuts postulava um prin-cípio organizador de Totalidade, sustentan-do a existência de uma tendência holística,

integradora e fundamental no universo. Suaobra foi tida como visionária e passariadespercebida se o psicanalista Alfred Adler,extremamente influenciado por ela, não olançasse na Europa. Tratava-se de uma obrapioneira, muito à frente do seu tempo e, seualcance não poderia ter sido, como de fatonão o foi, plenamente compreendido nasua época.

Anos depois de Smuts, o escritorArthur Koestler (1969) desenvolveu o con-ceito de “hólon” — “o termo que proponhoseria ‘hólonhólonhólonhólonhólon’, do grego holos = todo, com osufixo ononononon que, como em próton próton próton próton próton ou nêu-nêu-nêu-nêu-nêu-trontrontrontrontron, sugere uma partícula ou parte” (p.67)— referindo-se à dinâmica todo-e-as-partes.O paradigma representado pelos termos“todo” e “parte”, está arraigado, adverte oescritor, em nossos hábitos inconscientes depensamento. Quando a libertação desseshábitos for possível, uma grande diferençaem nossa visão mental poderá surgir.

Uma visão holística, ou transpessoal,não é uma teoria completamente definida,mas constitui uma visão unificada, em ní-veis variados, que integram harmoniosa-mente muitas colocações centrais em umavisão global da unidade, considerando ouniverso como uma grande hierarquia deunidades, cada uma seguindo sua própriatrajetória de desenvolvimento histórico.Cada padrão, seja um organismo, umacomunidade ou o sistema solar, possui suaprópria ordem interna e faz parte de umaordem mais ampla, levando-nos àsconstatações de Gregory Bateson (1998),para quem o universo é reconhecido comoum Sistema de sistemas, um Grande Pa-drão de padrões. São ‘todos’ dinâmicos,

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reconfigurando-se constantemente na me-dida em que as mudanças, em algum dosníveis, repercutem através dos demais. Esseprocesso de integração progressiva não selimita ao nível biológico, afinal organismosfazem parte de um todo social: as coisasvivas pertencem a famílias, comunidades,populações.

Epistemologicamente, a ciência e oprocesso científico deveriam estar condu-zindo a humanidade à estabilidade e con-solidação do mundo em seu todo, já que étida como uma das mais perfeitas obrashumanas.

Entretanto, o triunfo da razão, pro-duzindo o ‘racionalismo científico’ dissociouo conhecedor do conhecimento e do co-nhecido. A ênfase na quantificação levouà perda da dimensão qualitativa. SegundoRubem Alves (1986,p.33), o quantificávelpode ser conhecido com precisão e mani-pulado com eficácia; é gerenciável, domi-nado pela ciência e produzido pela admi-nistração e pela política. Mas, dimensõesqualitativas da vida - felicidade, alegria deviver, saúde mental, bem estar físico, etc -não podem ser medidas; desafiam as defi-nições precisas. “Andam por aí como se fos-sem o suave sopro do Espírito; não sabe-mos de onde vêm e nem para onde vão..”.

Se a luta entre a qualidade e a quan-tidade é antiga, foi com a revolução cientí-fica que, efetivamente, exilou-se a qualida-de. Não mais objeto de preocupação daciência, passou a pertencer a artistas, poe-tas, religiosos e alguns “filósofos anacrôni-cos/visionários”.(ALVES, l986, p.33)

No cientificismo a vida humanaacontece no contexto de uma realidade

objetiva sobre a qual não se tem poder.Essa mentalidade e percepção do Univer-so propiciaram à nossa civilização ociden-tal aqueles aspectos que são característi-cos da era moderna: idéias de progressoaliadas à ideologia do “bem estar para to-dos”. Assim, o último século presenciou umextraordinário progresso científico etecnológico, com sua ênfase no empirismoe no controle dos eventos naturais. Porém,este mesmo período evidenciou a ingênuacrença progressista como insustentável,porquanto presenciou, também, guerrasnefastas e suas desastrosas conseqüências.

Para Crema (l989), isto se deve aofato de, certamente, não haver ocorrido umacorrespondente evolução ética-psíquica-es-piritual. A evolução do ser humano não sedeve a uma mecânica causal, mas a esfor-ços conscientes, dentro de uma perspectivade ação e responsabilidade. A evolução hu-mana é uma ‘evolução da consciência’, “re-presentando uma árdua conquista emnada parecida com o fruto de um confor-tável decreto da Natureza”.(CREMA, 1989,p.24-25)

A flexibilidade é um elemento essen-cial para a evolução. Modelos rígidos deestruturas sociais e padrões de comporta-mento, onde a sociedade não conseguemais adaptar-se a situações cambiantes,tendem a incapacitar o processo criativo deevolução cultural. A sociedade entra emcolapso e desintegra-se. As civilizações emcrescimento exibem variedade e versatilida-de ilimitadas; as que estão em processo dedesintegração mostram uniformidade eausência de inventividade. E, na dinâmicadessa crise, durante esse processo de de-

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sintegração, a criatividade da sociedade –sem capacidade de resposta a desafios -procura novos movimentos que reafirmemseu potencial criador. Unger (1990) refere-se a tais movimentos como “emergentes”,porquanto, além de emergirem da crise decivilização, fazem também emergir algumasquestões de fundo, repensando relaçõescomo: ser humano/natureza, homem/mu-lher, o sagrado, autonomia e heteronomia,unidade e diferença, enquanto eixos dosurgimento de novos valores para a atua-ção social. Destaca, nisso, um caráterreestruturador do cultural e do político con-tido nesses movimentos.

Uma transição relacionada com va-lores culturais envolve uma mudança pro-funda no pensamento, na percepção e nosvalores que compõem uma determinadavisão da realidade, convidando a uma tran-sição conceitual, valorativa e atitudinal.

A fragmentação que se instalou noHomem, a partir da “ilusão” da separati-vidade, especialmente entre conhecedor,conhecimento e conhecido é negada pelafísica quântica quando esta demonstraque, em última instância, só existe espaçoonde não há fronteira alguma. Isso nos levaa constatar que toda fronteira, toda frag-mentação, é criação da mente analítica doHomem. Mas, embora tudo o que existaseja expressão de uma unidade fundamen-tal, isto não implica que todas as coisassejam similares. Vivemos num mundo decontrastes - luz e sombra, crescimento edecadência-. Contínuo e indiferenciado emsi mesmo, o Uno mesmo assim contém apossibilidade de todas as diferenças e opos-tos, numa infinidade de relacionamentos.

Sujeito e objeto, espírito e matéria, constitu-em, assim, aspectos de uma unidade naqual estão sintetizados. São polos essenci-ais à manifestação, na qual um não pode-ria existir sem o outro, mas a lógica bináriaexige que algo seja isto ou aquilo. Geral-mente estipulamos categorias bemdelineadas e definidas para depois pressu-pormos que a Natureza se adapta aos nos-sos conceitos. Muitos opostos são apenasrelativos, conceitos abstratos que pertencemao mundo do pensamento. As nossas men-tes dicotomizam e estabelecem dualidades,através das quais vemos, então, a totalida-de não fragmentada da Natureza. No pro-cesso de tentar conhecer a realidade comoum objeto, pensamos à respeito de nósmesmos, o sujeito, como fundamentalmenteseparado e distinto de tudo o mais. Ora, aFísica vem dizer que sujeito e objeto nãopodem ser divorciados um do outro. Na fí-sica quântica descobriu-se que os cientis-tas que fazem medições, nunca conseguemseparar-se completamente daquilo que estásendo medido. Assim, o observador, emseus conceitos e instrumentos subjetivos,interage com o observado, para quem ouniverso é ‘participativo’, e nele a consciên-cia humana necessariamente interage,mesmo ao tentar apenas observar.

Apesar desta perspectiva, temos oprofundo hábito inconsciente de nos sepa-rarmos, enquanto sujeito, de tudo o mais.Disto resulta a visão que temos de nósmesmos, enquanto ilhas de percepção se-paradas e isoladas. O novo posicionamentodas diversas ciências vem mostrar que háoutra maneira de olhar para os mundosinterior e exterior; uma forma de conhecer

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que não separa o conhecedor do conheci-do, o sujeito do objeto.

O Homem, como componente cen-tral da evolução, possui uma característicaexclusiva, a habilidade de poder observara si próprio, seus pensamentos e sentimen-tos, afastando-se mentalmente da situaçãoimediata e avaliando-a: é aautoconsciênciaautoconsciênciaautoconsciênciaautoconsciênciaautoconsciência. Esta capacidade condu-ziu a outras habilidades singularmente hu-manas. Aumentou enormemente o poderde escolha, baseado no planejamento e naprevisão do futuro. A escolha conduz a umgrau de responsabilidade totalmente novopara com as nossas ações.

A autoconsciência concede-nos opoder de nos tornarmos agentes da evolu-ção. Podemos escolher os nossos sentimen-tos e pensamentos internos, temos a possi-bilidade de autocontrole e autodireção, oque, por sua vez, permite certo grau de con-trole sobre o nosso ambiente e o nossomundo. É uma evolução auto-induzidaatravés das próprias decisões e esforços.Muito embora o pleno desenvolvimento daautoconsciência e escolha ainda não se-jam aparentes, somos capazes, em certamedida, de escolher aquilo que desejamosexprimir e ser, e, por conseguinte, aquiloque o nosso mundo será. O ser humanopode começar a dirigir conscientemente suaprópria evolução, enquanto espécie ou en-quanto indivíduo.

Neste mundo dinâmico, governadopelo princípio universal do movimento, ondenada permanece inalterado, o homem tam-bém necessita de flexibilidade, para acom-panhar o fluxo da corrente da vida. Contu-do, a mudança interna não precisa ser aci-

dental e ao acaso; pode ser um crescimen-to no qual o ser se movimenta para níveismais elevados de integração e maturida-de. Às vezes ficamos agudamente consci-entes da necessidade de crescimento emudança ao enfrentarmos uma crise, apósa qual não podemos permanecer comoéramos. Mas, em certa medida, está sem-pre presente uma pressão interior na dire-ção do crescimento evolutivo em um uni-verso em constante expansão, muito em-bora submersa pelas atividades cotidianasdo homem. A grande questão de fundo éque, não podendo mais responder, comexatidão aos problemas que hoje enfrentaa humanidade, faz-se necessária uma novavisão de mundo. E esta, pelo caminhar daprópria ciência, precisa ser integrativa,sistêmica, inter-relacionada, porque assimsão as dificuldades que se apresentam emnosso momento histórico. Talvez um marcoessencial que se coloca frente às dificulda-des que a humanidade hoje enfrenta, sejade que elas protagonizam uma crise depercepção, porque tentamos, em vão, con-tinuar aplicando os conceitos de uma vi-são de mundo obsoleta (mecanicista) auma realidade que já não pode mais sercompreendida em função desses conceitos,numa abordagem que busque soluçõespara os específicos problemas da épocaatual, levando-se em conta a experiênciado passado.

Ainda não é possível vislumbrar umaestrutura completamente estabelecida -conceitual ou institucional- para a formula-ção de um novo paradigma, mas os alicer-ces já estão sendo fixados. Como? Por or-ganizações, comunidades e indivíduos que

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estão desenvolvendo formas de pensamen-to e conseqüentes ações (locais, setoriaisou globais), que traduzem essas interaçõesconstantes e até paradoxais. Na verdade,parece que o espírito da época atual estácheio de paradoxos: diz que uma partículaé, ao mesmo tempo, todas as partículas –BootstrapBootstrapBootstrapBootstrapBootstrap11111 —; faz com que o ‘todo’ com-ponha todos os eventos, mas ao mesmotempo os reflita – holografia2 -; é pragmáti-co e transcendental; valoriza o esclareci-mento e o mistério, a interdependência e aindividualidade. É uma lógica que parecechocar não apenas o senso comum, masas habituais estruturas de pensamento doscientistas modernos.

Mas, se o anseio pela transformação,pela sensação de ‘inteireza’ é histórico, e atéontológico, esse encontro entre as corren-tes, em busca de soluções, torna-se impra-ticável sem a participação da Educação.

Uma educação para o homem comoum todo

Determinar os fundamentos e a metade uma pedagogia não é trabalho fácil.Lanz (l990) diria que é porque a pedago-gia teve um curto período de autonomia.Originada como uma disciplina da filoso-fia, assim viveu por muito tempo e, nos diasatuais, faz ‘empréstimos’ da psicologia, dapsiquiatria, da biologia, da cibernética e deoutras ciências. Para o autor húngaro, issodemonstra que a pedagogia “perdeu” devista seu objetivo primitivo: a formação doser humano.

Os pensadores da educação moder-na conceituam que seu verdadeiro papel é

estimular as pessoas para que desenvol-vam seus poderes de pensamento, encora-jando o dom da curiosidade intelectual. Oatual sistema educacional serve à instru-ção; tem por objetivo fornecer ao homem oconhecimento e uso dos objetos necessári-os para sua vida profissional. Mesmo as-sim, reconhece-se que a educação-instru-ção não sabe exatamente quais suas me-tas pedagógicas, se materiais, cognitivas,sociais ou afetivas. E, ainda que este siste-ma, enfatizando a instrução, tencione pre-parar profissionalmente os educandos, oque se observa, enquanto resultado, é queo produto das escolas tradicionais édespreparado para as exigências da vidaprofissional, e ainda mais para as exigênci-as da vida social. Como fomos preparadospara encarar o simples fato de, dia apósdia, vivermos a vida? Uma educação paraa vida é uma educação que se comprome-te com a auto-investigação.

O modelo educacional moderno, sa-turado de racionalismo, empiricismo, me-canicismo, há tempos percebeu a necessi-dade de retomar o lado humano da edu-cação. E é interessante descobrir que umaeducação para a vida, para a sensação de‘inteireza’, já foi preconizada por ícones daconcepção pedagógica de todos os tempos.

Rousseau foi o primeiro a fazer umapelo à educação dos sentimentos, segui-do por outros, como Decroly, Dewey,Montessori, Piaget - que enfatizaram oaprendizado através do fazer - e aindaSteiner, com a ênfase no desenvolvimentoda intuição e daquilo que hoje se denominaeducação na abordagem transpessoal (jun-ção das quatro funções psíquicas de Jung3:

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razão, sensação, intuição e sentimento).Retomemos, em linhas gerais, o pen-

samento de alguns destes grandes auto-res que tanto contribuíram, e ainda contri-buem, para a Educação. Alguns foram con-temporâneos e ‘trocavam’ informações en-tre si, como Decroly e Dewey, por exemplo.Decroly também influenciou substancial-mente a obra de Celestin Freinet, com suasidéias sobre os centros de interesse.

Neste estudo, assim como no exíguoespaço possível de um artigo4, serão abor-dadas as concepções pedagógicas deRousseau, Decroly, Montessori e Steiner, peloembasamento teórico que representampara a proposta transpessoal em educa-ção Entretanto, Dewey, Piaget, Freinet, entreoutros, também trazem significativa contri-buição à educação que se pretende “intei-ra”, trazendo ao centro da discussão, maisuma vez, a necessidade de se pensar o serhumano de forma integral.

1 Rousseau

Jean Jacques Rousseau nasceu emGenebra, Suíça (1712-1778) e deixou vári-as obras, das quais se destacam: Discursosobre a origem da desigualdade entre oshomens; Do contrato social, e a obra ro-manceada Emílio ou Da Educação (1762).

Em Emilio, Rousseau retrata o queentende por ‘educação natural’. Um jovemé educado dentro da concepção naturalis-ta, acompanhado por um preceptor ideal eafastado da sociedade, consideradacorruptora. A concepção naturalista apre-sentada por Rousseau não significa o re-torno a uma vida selvagem, primitiva, iso-

lada, mas afastada dos costumes da aris-tocracia da época, da vida artificial que gi-rava em torno das convenções sociais. ParaRousseau, a educação deveria levar o ho-mem a agir por interesses naturais e nãopor imposição de regras exteriores e artifici-ais, pois só desta maneira, o homem pode-ria ser o dono de si próprio. Condenava,assim, a educação puramente intelectu-alista que, fatalmente, levaria os jovens aum ensino formal e livresco.

Rousseau acreditava que o homemnão se constitui apenas de intelecto, masdo que ele chamou de ‘disposições primiti-vas’, que seriam as emoções, os sentidos,os instintos e os sentimentos. Por existiremantes do pensamento elaborado, estas ‘dis-posições primitivas’ são, para Rousseau,mais dignas de confiança, do que os hábi-tos de pensamento que foram forjados pelasociedade e impostos ao indivíduo.

Na Europa do séc. XVIII prevaleciamas idéias de que a educação da criançadeveria ser voltada aos interesses do adul-to e da vida adulta. Rousseau queriacombatê-las, introduzindo a concepção deque a criança é um ser com característicaspróprias em suas idéias e interesses e nãodeveria, portanto, ser vista como um adul-to em miniatura.

Contrário à concepção então vigen-te de que a educação é o processo peloqual a criança adquire conhecimentos, ati-tudes e hábitos armazenados pela civiliza-ção, sem transformá-los, Rousseau traz aidéia de que cada fase da vida possui ca-racterísticas próprias. Ou seja, tanto o ho-mem como a sociedade se modificam e aeducação é o elemento fundamentalmente

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necessário para adaptação a essas modifi-cações. Essa ‘constante’ transformação re-tira da educação o caráter, preconizado naépoca, de preparação para a vida. ParaRousseau, a vida prepara para a vida. Averdadeira educação não vem de fora, masda expressão livre da criança no seu con-tato com a natureza e, ousamos acrescen-tar, com a sociedade e o mundo, em cons-tante transformação.

Nesse postulado, ao contrário da rí-gida disciplina e do uso excessivo da me-mória, Rousseau propõe serem trabalhados,com a criança, o brinquedo, o esporte, aagricultura, a linguagem, o canto, a aritmé-tica e a geometria, estes últimos considera-dos por ele como instrumentos de varia-dos ofícios, vinculando o seu conhecimen-to a uma utilização prática e cotidiana, ouseja, estas atividades propiciariam, à crian-ça, medir, contar, pesar, desenvolvendo,assim, conteúdos e informações relaciona-dos à vida e aos seus interesses.

Para Rousseau, a verdadeira fina-lidade da educação era ensinar a criança aviver e a aprender a exercer a liberdade.Desafiou as convenções, ao afirmar que acriança não é educada para Deus, nempara a vida em sociedade, mas sim, para simesma. Rousseau dizia que “viver” era oque desejava ensinar às crianças para que,quando saíssem de suas mãos, não fossemmagistrados, soldados ou sacerdotes.Desejava que fossem, antes de tudo,Homens.

2 Decroly

O médico Ovide Decroly, nascido naBélgica (1871-1932), iniciou seu trabalhona Educação com crianças deficientes men-tais. Da transição da medicina para a edu-cação, criou uma disciplina chamada‘pedotecnia’, com enfoque nas atividadespedagógicas dirigidas ao conhecimento daevolução física e mental das crianças.

Fortemente influenciado porRousseau, Decroly é considerado o primeiroeducador a pensar a “Educação Holística”,por sua definição de que as crianças apre-endem o mundo com base em uma visãodo todo. A partir das idéias de Rousseau,sobre a natureza intrínseca do ser huma-no, Decroly concebeu o conceito de que anecessidade gera o interesse e só este levaao conhecimento. Assim como Rousseau,acreditava que a escola deveria centrar-seno aluno, e não no professor, e preparar ascrianças para viver em sociedade, ao invésde fornecer-lhes simplesmente, conhecimen-tos destinados a sua formação profissional.

Embora tenha escrito muitas obras,Decroly nunca sistematizou seu método,cuja fundamentação era a possibilidadeconcreta do aluno conduzir seu próprioaprendizado e, portanto, aprender a apren-der. Mesmo sem a sistematização, algumaspropostas pedagógicas de Decroly continu-am vivas em nossas salas de aula, como aglobalização de conhecimentosglobalização de conhecimentosglobalização de conhecimentosglobalização de conhecimentosglobalização de conhecimentos e oscentros de interessecentros de interessecentros de interessecentros de interessecentros de interesse.

Para Decroly, o Princípio daPrincípio daPrincípio daPrincípio daPrincípio daGlobalizaçãoGlobalizaçãoGlobalizaçãoGlobalizaçãoGlobalização baseia-se na idéia centralde sua pedagogia, tal seja a de que as cri-anças apreendem o mundo com base em

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uma visão do todo, podendo organizá-lo,posteriormente, em partes que darão ordemao caos. Ou seja, ao invés de um conheci-mento isolado de sílabas e letras, a apren-dizagem da leitura seria mais frutífera sebaseada em atividades de associação designificados e discursos completos. Um co-nhecimento evoca o outro e assim por di-ante, o que será denominado por Decrolyde ‘caráter global da vida intelectual’. As-sim, o educador deve estar atento para quecada trabalho da criança seja uma realexpressão de seu pensamento, sem cópi-as, sem pré-definição.

Como é de conhecimento da maio-ria dos educadores, os Centros de Inte-Centros de Inte-Centros de Inte-Centros de Inte-Centros de Inte-resseresseresseresseresse são grupos de aprendizado organiza-dos de acordo com a faixa etária dos alu-nos. Decroly baseou sua concepção nasetapas da evolução neurológica infantil,convencido de que as crianças dispõem decondições biológicas suficientes, quandoentram na escola, para desenvolver conhe-cimentos de seu interesse, desde que a es-trutura altamente alienante do sistema es-colar não lhes retire o inato ‘espírito de ob-servação’. A partir dos centros de interesse,os alunos é que escolhem o que queremaprender e constroem, assim, o próprio cur-rículo, seguindo a curiosidade e não a divi-são de temas e disciplinas imposta pelaestrutura escolar. Um bom exemplo da inter-disciplinaridade tão perseguida nas esco-las e nas concepções atuais de educação.

Os métodos e atividades vinculadosà pedagogia proposta por Decroly funda-mentam-se no desenvolvimento de três atri-butos da criança: a observação, a asso-observação, a asso-observação, a asso-observação, a asso-observação, a asso-ciação e a expressãociação e a expressãociação e a expressãociação e a expressãociação e a expressão. A observação é

entendida como uma atitude constante emtodo o processo educativo, baseada naconcepção de que o interesse é que leva àaprendizagem. A associação permite queo conhecimento, adquirido pela observação,seja entendido em termos de tempo e es-paço. A expressão, obviamente é a exter-nalização, a ‘materialização’ e o comparti-lhamento do aprendizado adquirido pelacriança, seja ele através da linguagem, daexpressão corporal, do desenho, da constru-ção, da arte. Enfim, para Decroly, a expres-são do conhecimento não se baseava ape-nas na ‘palavra’. Por isso pregava a inclusãode atividades ao ar livre (jogos, brincadeiras,exercícios...), criticando a supervalorização dotrabalho intelectual e da expressão verbal.O conhecimento apreendido como um todo,pode, e deve, se expressar como um todo:corpo, mente, emoção, arte.

3 Montessori

Assim como seu contemporâneoDecroly, Maria Montessori, a primeira mu-lher a se formar em Medicina na Itália(1870-1952), defendia o respeito às neces-sidades e interesses de cada criança, a par-tir de estágios de desenvolvimento corres-pondentes às faixas etárias, acreditandoque, ao não contrariar a natureza humana,seu método se tornava mais eficiente doque os tradicionais.

Montessori e Decroly tinham muitoem comum. Ambos beberam da fonte deRousseau, formaram-se em medicina edirecionaram-se para a neurologia. Ambostrabalharam com deficientes mentais noinício e, a partir deste trabalho, criarammétodos que aplicaram à educação de

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crianças consideradas ‘normais’. A diferençafica por conta do atendimento: no métodomontessoriano a criança tem um atendi-mento individual, na sala de aula; Decrolypreferia o trabalho em grupo, já que a es-cola deveria, em sua concepção, prepararpara o convívio em sociedade. Outra dife-rença refere-se ao ‘ambiente’ escolar. ParaDecroly a escola era uma ‘oficina’ que traba-lhava com elementos reais do cotidiano dacriança. Montessori, em seu método, preco-niza que a atividade pedagógica deve serdesenvolvida em ambientes preparados, afim de tornar produtivos os impulsos natu-rais das crianças. O espaço interno, nas esco-las montessorianas, é preparado cuidadosa-mente de forma a permitir, aos alunos, movi-mentos livres, facilitando o desenvolvimentoda independência e da iniciativa pessoal.Assim, embora os ambientes sejam estimu-lantes (e estimulados, uma vez preparadospara este fim), a educação, para Montessori,é uma conquista da criança; acreditava naauto-educação do aluno, na capacidade doser humano de ensinar a si mesmo, se lheforem dadas as condições para tanto.

Embora muitos já tenham ouvidofalar do método montessoriano, associadocorretamente à educação infantil, a verda-de é que talvez uma boa parcela dos edu-cadores não o conheça profundamente.Grosso modo, individualidade, atividade eliberdade do educando constituem as ba-ses de sua teoria, que enfatizava ser, o indi-víduo, sujeito e objeto do ensino. Para ela,a educação transcende os limites doacúmulo de informações, permeia a forma-ção integral do aluno e o prepara para avida. Seu método, assim como sua concep-

ção pedagógica, baseiam-se na crença dopotencial criativo desde a primeira infânciaque, associado ao desejo de aprender, pro-picia o conhecimento.

A formação médica de Montessoricertamente contribuiu para o aspecto bio-lógico do seu método pedagógico. Seusfundamentos teóricos constituem-se emcompletas informações científicas sobre odesenvolvimento infantil e sua prática ins-pira-se na natureza, enfocando a evoluçãomental da criança em sintonia com o seucrescimento biológico. Essa associação le-vava à identificação de fases definidas, con-sideradas mais adequadas a determinadostipos de aprendizado e assimilação de con-teúdos específicos.

Entretanto, assim como Rousseau ouDecroly, Maria Montessori acreditava quea educação, como a vida, deveria conduziro aluno além dos limites das conquistasmateriais. Para a educadora, cada criança,cada aluno, cada ser humano, possui seulugar no mundo, onde pode desenvolverum trabalho gratificante, contribuir para apaz e, principalmente, trabalhar seu interiordesenvolvendo sua capacidade de amar.Tal grupo de indivíduos independentes, cri-ativos, devotos ao respeito pela natureza epelos outros, só poderia conduzir a umacomunidade pacífica. A meta coletiva é con-sidera, por seus estudiosos, como a finali-dade maior da educação montessoriana.

4 Steiner

Rudolf Steiner (1861-1925) estudouCiências Naturais e Matemática, mas tam-bém se aprofundou em temas político-so-ciais, literatura e filosofia. Amante de

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214 Regina Clare MONTEIRO. Considerações pedagógicas na abordagem transpessoal:...

Goethe, Steiner dedica-se a pesquisar e pu-blicar trabalhos filosóficos sobre a questãoespiritual do homem. Sua obra A FilosofiaA FilosofiaA FilosofiaA FilosofiaA Filosofiada Liberdadeda Liberdadeda Liberdadeda Liberdadeda Liberdade traz analogias entre as expe-riências sensoriais e as experiências espiri-tuais do homem, propondo uma metodo-logia científica. Este método rigoroso de in-vestigação, cuja contribuição é inédita, per-mite a incursão tanto no campo do físico-sensível quanto no plano espiritual, abrin-do espaço para estudos sobre o ser huma-no e o universo (e todas as relações e inter-relações possíveis e existentes entre ambos),numa visão global (holística), a respeito daorigem, do desenvolvimento das metas dosseres e do mundo. Centrando seu estudono homem, Steiner desenvolve a Antropo-sofia, na qual o ser humano é entendidocomo um microcosmo, onde vibram e pul-sam todos os processos do universo. A An-troposofia é um caminho de conhecimen-to que possibilita rigorosas e comprováveisrespostas a todos os campos relacionadosao homem e ao seu mundo.

Pode-se afirmar que a base da inves-tigação científica de Steiner é a idéia do ho-mem como unidade. A partir dela, produziuinúmeras obras que influenciaram todos ossetores do conhecimento humano: a Peda-gogia, a Medicina, a Arquitetura, a Agricul-tura, a Organização Social, entre outras.

Os fundamentos teóricos que consti-tuem a Antroposofia merecem um estudoaprofundado, digno da significativa contri-buição oferecida por Steiner, com seus es-tudos, à questão do Homem. Para os finsdeste trabalho, limitar-nos-emos a estaspoucas palavras, passando a enfocar a suacontribuição para a Pedagogia.

Na Educação, a ênfase nas dimen-sões humanas do pensar, sentir e a vonta-de, formularam as bases para a Pedago-gia Waldorf, cujo nome vem da referênciaa uma fábrica de cigarros, a Waldorf/Astória,na Alemanha, propriedade de um amigo,para cujos operários Steiner proferiu pales-tras sobre temas sociais e educativos. Taispalestras geraram nos funcionários da fá-brica o desejo de que seus filhos tivessemacesso a uma educação escolar adequa-da às necessidades do desenvolvimentohumano na modernidade. Emil Molt, pro-prietário da fábrica de cigarros, pede aSteiner que organize essa escola, a partirde sua concepção sócio-antropológica. Em1919, em Sttutgart, nasce a primeira EscolaWaldorf (hoje são aproximadamente 1000,em todo o mundo), após intensos estudosde Steiner e sua equipe de professores so-bre Pedagogia, Didática e Metodologia.

As máximas da Revolução Francesa– Liberdade, Igualdade e Fraternidade –representam as diretrizes básicas adotadaspor Steiner para compor sua pedagogia.Para ele, Liberdade era o princípio básico areger a vida cultural-espiritual de todos osseres humanos; a Igualdade consistia noalicerce fundamental da questão jurídico-legal e a Fraternidade deveria, imprescin-divelmente, sustentar a atividade econômi-ca. Na Pedagogia Waldorf, o desenvolvi-mento, na criança, das bases para um pen-samento claro, preciso, isento de preconcei-tos e dogmas, leva-la-á a liberdade; a igual-dade é conquistada com o estímulo aossentimentos autênticos, não massificados,que desenvolvam o respeito aos demais eaos direitos e obrigações que, por sua vez,

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sustentarão, responsavelmente, a frater-nidade na vida econômica futura. Essa vi-são de homem e de sociedade nutre a açãopedagógica das Escolas Waldorf, passan-do por sua organização institucional deautogestão colegiada e pela interação só-cio-comunitária de suas unidades. Esta con-cepção reforça sua crença de que uma so-ciedade só poderá desenvolver-se de for-ma sadia, respondendo adequadamente àssolicitações de sua época, se levar em con-ta as dimensões essenciais do ser huma-no, absolutamente representadas pelosprincípios básicos da Liberdade, Igualdadee Fraternidade.

Para Rudolf Steiner, a problemáticasocial e ecológica com que deveriam seconfrontar as gerações do século XX, nãopoderia ser enfrentada com a simples aqui-sição de conhecimentos científicos e técni-cos. Entendia que era necessário um pen-samento vivo e global, que permitisse aoshomens agir com independência e capaci-dade de iniciativa, buscando uma atuaçãosustentada na responsabilidade social, numinteresse ativo por todos os aspectos davida, numa vontade e ação comprometi-das com o social. Esse homem, preconiza-do pela Pedagogia Waldorf, é visto, assim,como uma unidade harmônica físico-anímico-espiritual, com uma essência indi-vidual única e um corpo físico como suaimagem e instrumento. Se para esta con-cepção pedagógica, o ser humano não estádeterminado, exclusivamente, pela heran-ça e pelo ambiente, o homem é então en-tendido como portador inato de predispo-sições e capacidades aptas a se desenvol-verem, ao longo de sua vida. Os setênios,

etapas de 7 anos, representam princípiosgerais evolutivos próprios a cada fase dedesenvolvimento do homem. Cada umadestas etapas de sete anos traz momentosdiferenciáveis de aprendizado, nos quaissurgem, naturalmente, interesses, perguntaslatentes e necessidades concretas que irãopermitir, ao educando, encontrar respostasdadas pelo seu ‘interior’, em concordânciacom seu físico.

Para a concretização dessa conquis-ta gradual de consciência, a ação pedagó-gica deve promover e facilitar a aprendiza-gem, organizando conteúdos curricularesadequados ao tempo e ao ritmo de cadafase evolutiva, ou cada setênio.

A educação proposta pela Pedago-gia Waldorf, assim como as concebidas porRousseau, Decroly e Montessori (entre ou-tros), propõe a transcendência da meratransmissão de conhecimentos, preconizan-do o desenvolvimento integral do ser hu-mano. A aprendizagem deve, necessaria-mente, ser uma ‘resposta’ aos interesses enecessidades dos educandos. Uma apren-dizagem de fato significativa, segundoSteiner, tem como meta a formação da von-tade e o estímulo à sensibilidade e ao inte-lecto, cultivadas pela ciência, pela arte e porvalores morais e espirituais. A PedagogiaWaldorf define o ensino como o entrelaça-mento de pontos de vista científicos e esté-tico-artísticos, com o respeito profundo pelooutro e pela natureza, num espírito de ad-miração ante o mundo, possível a partir deuma religiosidade livre e verdadeira.

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216 Regina Clare MONTEIRO. Considerações pedagógicas na abordagem transpessoal:...

Considerações FinaisConsiderações FinaisConsiderações FinaisConsiderações FinaisConsiderações Finais

A Albert Einstein é atribuída a seguin-te frase: “se enxerguei tão longe, foi porqueme apoiei em ombros gigantes”. A concep-ção pedagógica transpessoal apóia-se em‘gigantes’ da Educação, pensadores queousaram criar propostas que desafiavamos paradigmas estabelecidos em sua épo-ca. Isso nos faz perceber que a luta pelamudança de visão de mundo, pelo reco-nhecimento do homem enquanto ser inte-gral, é antiga e, ao mesmo tempo, atual.

Na sociedade contemporânea, sob odomínio do conceito mecanicista, desde omomento em que as crianças começam ater noções de linguagem, inicia-se a deter-minação de normas de comportamento, nointuito de ‘ajudá-las’ a evitar ‘erros’ (que namaioria são nossos) e a proporcionar-lhesuma vida melhor. Entretanto, apesar des-sas normas, 95% do aprendizado que acriança recebe é uma estampa direta da-quilo que somos. Jung (1982) disse que acriança vive no lado sombrio dos pais, olado emocional que não expressamos visi-velmente em nossas ações, mas que senti-mos profundamente em nosso interior. Acriança vive em nossa vida emocional, cap-ta-a e a reflete. Assim, pais e educadoresacabam passando a maior parte do tem-po transmitindo mensagens ambíguas,porque imitando o que vê/percebe/sente,a criança vai se tornando o que somos, mastenta, desesperadamente, seguir nossasnormas para se tornar aquilo que dizemosque ela deve ser.

A expressão de uma educaçãotranspessoal, uma educação voltada para

a pessoa como um todo - num mundocomo um todo - infere a autoconstruçãodo indivíduo.

Para Maria Montessori (l980), a realtarefa da educação - o único trabalho doeducador - é ajudar o homem a auto-construir-se no período oportuno, para dar-lhe a chance de ascender a “algo grande”.E esse auxílio na autoconstrução do ho-mem é o cerne da consciência educacionalna perspectiva transpessoal.

É importante destacar que só o modonão-dual é capaz de dar o ‘conhecimentoda realidade’. Essa integração da identida-de e da não identidade implica uma novalógica que ultrapassa a lógica formal danão contradição. É uma visão que traz con-seqüências epistemológicas perturbadoras,pois envolve conceitos novos, já que a edu-cação tradicional institucionaliza a frag-mentação. No nível do ser, estabeleceu-sea ilusão entre o sujeito e o objeto e o co-nhecimento passou a ser um processo pro-gressivo de registro externo ao homem, atra-vés da catalogação de dados, hojecomputadorizados. Essa distinção, por con-dicionamento e educação, levou à frag-mentação das funções psíquicas que Jung(1982) estabeleceu em sua análise: sensa-ção, sentimento, razão e intuição. Estas, porsua vez, acarretaram a fragmentação nocampo epistemológico, em quatro ramosdistintos, com pouca ou nenhuma relaçãoentre si: a ciência, a arte, a filosofia e a reli-gião. Para Weil (1990), o principal papel doenfoque holístico será reunir as funçõespsicológicas no plano individual, e agruparas quatro partes do conhecimento atravésda transdisciplinaridade.

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Para Sanfelice (l986) o fenômenoeducativo não está isento de implicaçõesdecorrentes das relações mantidas com otodo social que o produz. Este ‘todo social’determina o que se materializa ou não noato pedagógico e a relação com o que ocor-re a nível coletivo é imprescindível para ocrescimento a nível individual. Mas o quevamos vendo é que a educação convenci-onal dificulta o pensar independente. Elafabrica, segundo um modelo, um tipo deser humano padronizado, em busca de se-gurança, status (real ou simbólico) e con-forto, com um mínimo de reflexão: um pen-sador intelectual não tem pensar próprio,porque repete frases, pensa dentro de umarotina, ajusta-se a um padrão. O que asescolas expressam é exclusivamente “ensi-no” e este dirige-se às funções intelectuaise sensoriais, exclusivamente. Não desper-tando a inteligência “integral” do indivíduo,o ensino induz a adaptar-se a padrões, éuma iniciação prolongada demais e, comisso, acaba se defasando. É um respondera um padrão de aceitação social que exige,cada vez mais, uma permanência prolon-gada nas escolas, que passam a ser ‘fábri-cas de ensino’ a fornecerem um atestadode adesão a algum código de semelhançaaceitável, vedando, ao educando, a com-preensão de si mesmo como um processototal (processo que é entendido na concep-ção transpessoal como um alargamentoprogressivo das fronteiras humanas). É uma‘educação’ que nos oferece, de forma sutile insistente, uma fuga de nós mesmos. Pes-soas em conflitos consigo mesmas relacio-nando-se, conflituosamente, com outros.

Se a ênfase dada pelo ensino atual

é a razão, em uma proposta pedagógicatranspessoal tende-se a despertar, e desen-volver, tanto a razão quanto a intuição, asensação e o sentimento, na procura deuma harmonia entre as funções da psique.O ensino, enfatizando o conteúdo de umprograma, propõe um exercício constanteda mente. O exercício leva à eficiência, masnão à integração. Uma mente exercitada éo prolongamento do passado e a reprodu-ção dos mesmos níveis da sociedade emque estamos inseridos. Ora, qualquer ‘pro-longamento’ do passado inibe a descober-ta do novo. Para a proposta transpessoal,cada situação da existência é uma oportu-nidade de aprendizagem; sem uma integralcompreensão da vida, os problemas indivi-duais e coletivos tendem a crescer, em pro-fundidade e extensão. Nesta abordagem,o homem ignorante não é o sem instrução,mas aquele que não conhece a si mesmo;é insensato o homem, intelectualmente cul-to, pensar que os livros, o saber e a autori-dade podem dar-lhe a ‘compreensão’. Acompreensão só pode vir com oautoconhecimento, que é o conhecimentoda totalidade do processo psicológico doindivíduo. Na abordagem transpessoal, aeducação, no sentido genuíno, é a compre-ensão de si mesmo, pelo indivíduo, porqueé dentro de cada um de nós que se con-centra a totalidade da existência.

Uma nova abordagem da Educaçãodepende, primeiramente, de uma atuaçãodiferenciada de seus professores, mas issosó é possível se houver uma integração totalcom a visão de mundo da atualidade. Se,como vimos, a autoconstrução é um fatorbásico, necessita começar por aqueles que

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irão auxiliar os mais jovens a empreenderuma viagem interior, em busca de si próprio.

A necessidade de se construir a uni-dade é que se impõe na consciência e von-tade do educador, impulsionando e deter-minando sua ação. Educar, sob esta luz,convida à reflexão do ser, a um aproximar-se lentamente a esta percepção para queeste possa ser captado em sua mudança(transformação) permanente; é tocar o sere agir a partir dele, de suas exigências, deseu modo especial de estar no mundo enão a partir de nossos pré-juízos, pré-con-ceitos ou angústias.

O indivíduo, o ser humano, é que for-ma a comunidade, a sociedade. Sentir-seaparteado desta sociedade é uma ilusão, éirreal. Efetuando-se uma mudança radicalem si mesmo, efetua-se uma mudança naestrutura e na natureza da sociedade: ope-rando-se uma revolução fundamental, ope-ra-se uma revolução social.

NotasNotasNotasNotasNotas11111 Na tentativa de integrar todas as novas e revoluci-onárias descobertas, a pesquisa em Física acabouconduzindo a uma tentativa filosófica chamada abor-dagem bootstrap (Geoffrey Chew e outros). Segundoo Físico Basarab Nicolescu o nome representa o“empenhar-se em levantar-se com as próprias bo-tas”. É uma filosofia que abandona a idéia de cons-tituintes fundamentais da matéria, não aceitandonenhuma constante, lei ou equação fundamental.O universo é descrito como uma “teia dinâmica deeventos inter-relacionados”, cuja estrutura é deter-minada pela coerência total de todas as suas interrelações. Outra descoberta interessante é a postula-da pelo físico Gabor, em 1948, denominada de Teo-ria Holográfica. Essa teoria só pôde ser confirmadano início da década de 60 com o surgimento doraio laser, e valeu ao físico o Prêmio Nobel de l97l.

A holografia baseia-se na reconstrução de ondas, oque possibilita uma espécie de fotografia denomi-nada holograma, cuja imagem reconstituída é inteirae tridimensional. Para o físico, o que assombra amente cartesiana é que, ao se cortar o hologramaao meio, a unidade da imagem é reconstituída emcada pedaço; e se o processo da divisão é repetido,cada parte do holograma conterá, praticamente, aimagem inteira, e assim indefinidamente. A evidên-cia é que não apenas as partes estão no todo, comotambém o todo está contido nas partes. Sobre otema ver, entre outros, Wilber, Ken. (Org.) Oparadigma holográfico, Cultrix, l994 e TALBOT, Michel.O universo holográfico. Best Seller, 1991.22222 A holografia é um método de fotografia sem lentesno qual o campo ondulatório da luz espalhada porum objeto é registrado numa chapa sob a forma deum padrão de interferência. Quando o registro foto-gráfico — o holograma — é exposto ao raio laser, opadrão ondulatório original regenera-se e uma ima-gem em três dimensões aparece. Não havendo len-tes focalizadoras, a chapa tem a aparência de umpadrão de espirais destituído de qualquer significa-do. Qualquer pedaço do holograma pode reconstruira imagem inteira . Seu princípio é bem descrito pelobiólogo Lyall Watson: “Se você deixar cair um seixonum tanque, ele produzirá uma série de ondas re-gulares que se dirigirão para fora em círculos con-cêntricos. Deixe cair dois seixos idênticos dentro dotanque em pontos diferentes e você obterá dois con-juntos de ondas semelhantes, que se moverão umem direção ao outro. Onde as ondas se encontrarem,haverá interferência entre elas. Se a crista de umaatingir a crista da outra, elas trabalharão em conjun-to e produzirão uma onda reforçada cuja alteração éduas vezes maior que a de qualquer uma delas. Sea crista de uma coincidir com o vale da outra, elasse cancelarão e produzirão uma zona isolada de águatranqüila. Na verdade, ocorrerão todas as possíveiscombinações das duas, e o resultado final é umacomplexa distribuição de ondulações conhecida comopadrão de interferência. As ondas luminosas com-portam-se exatamente da mesma maneira. O maispuro tipo de luz disponível a nós é aquele produzidopor um laserlaserlaserlaserlaser, que emite um feixe no qual todas asondas são de uma mesma freqüência, como aque-

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las que seriam produzidas por um seixo ideal numtanque perfeito. Quando dois feixes de laser se to-cam, eles produzem um padrão de interferência deondulações luminosas e escuras que pode ser gra-vado numa chapa fotográfica. E se um dos feixes, emvez de vir diretamente do laser, refletir-se primeironum objeto como, por exemplo, um rosto humano, opadrão resultante será de fato muito complexo, masainda pode ser gravado. Essa gravação será umholograma do rosto.” (Wilber, l994, p.22)3 Entre todos os discípulos de Freud, provavelmenteCarl Gustav Jung foi quem mais contribuiu para aexpansão do sistema psicanalítico. Era consideradoo príncipe herdeiro da psicanálise, mas separou-sedo mestre por dificuldades teóricas irreconciliáveisque desafiavam a teoria freudiana em seu âmago.Profundamente enraizados na fisiologia e na bio-química do corpo, os processos psicológicos anali-sados por Freud baseavam-se no conhecimento doorganismo humano como uma complexa máquinabiológica. Jung, em contrapartida, não se preocupa-va em explicar fenômenos psicológicos em termosde mecanismos específicos, mas tentava, antes, com-preender a psique em sua totalidade, especialmen-te suas relações com o meio ambiente mais vasto.Suas idéias acerca dos fenômenos mentais aproxi-mavam-se muito da concepção sistêmica. Ele via apsique como um sistema dinâmico auto-regulador,caracterizado por flutuações entre pólos opostos. Asconcepções de inconsciente são o que represen-tam a diferença fundamental entre as psicologias

de Jung e Freud. Enquanto para Freud, o inconscien-te era predominantemente de natureza pessoal,contendo elementos que nunca tinham sido consci-entes e outros que foram esquecidos ou reprimidos,Jung, embora reconhecesse esses aspectos, acredi-tava que o inconsciente era muito mais que isso,considerava-o a própria fonte da consciência, susten-tando que desde o início de nossas vidas temosnosso inconsciente e não somos, ao nascer, umatábula rasa como acreditava Freud. A mente consci-ente, para Jung, vem de uma psique inconsciente,que é mais antiga do que ela e continua funcionan-do juntamente com ela ou mesmo apesar dela. Dis-tinguiu, assim, duas esferas na psique inconsciente:um inconsciente pessoal, pertencente ao indivíduo,e um inconsciente coletivo, que representa um es-trato mais profundo da psique, comum a toda ahumanidade. O conceito de Jung de inconscientecoletivo é o elemento que distingue sua psicologiada de Freud e de todas as outras. Subentende umvínculo entre o indivíduo e a humanidade comoum todo que não pode ser entendido dentro deuma estrutura mecanicista de pensamento, mas intei-ramente compatível com a concepção sistêmica damente, ou seja, com uma visão holística de mundo.4 4 4 4 4 Aos grandes pensadores que cito a seguir, e aoscolegas estudiosos de suas concepções, seguem asdesculpas pela generalização das informações, como desejo de que elas ‘abram o apetite’ dos leitorespara as obras destes pioneiros da Educação centradanos interesses e no potencial dos educandos.

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Recebido em 07 de outubro de 2004.Recebido em 07 de outubro de 2004.Recebido em 07 de outubro de 2004.Recebido em 07 de outubro de 2004.Recebido em 07 de outubro de 2004.Aprovado para publicação em 31 de outubro de 2004.Aprovado para publicação em 31 de outubro de 2004.Aprovado para publicação em 31 de outubro de 2004.Aprovado para publicação em 31 de outubro de 2004.Aprovado para publicação em 31 de outubro de 2004.

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Considerações sobre a atividade reflexiva na escolaConsiderações sobre a atividade reflexiva na escolaConsiderações sobre a atividade reflexiva na escolaConsiderações sobre a atividade reflexiva na escolaConsiderações sobre a atividade reflexiva na escola

Vânia Maria Lescano Guerra

Doutora em Lingüística e Língua Portuguesa pela UNESP.Professora do Programa de Mestrado em Letras da UFMS/Três Lagoas.e-mail: [email protected]

ResumoResumoResumoResumoResumoO objetivo deste ensaio é tecer comentários sobre a fala e o trabalho do professor de Língua Materna,Língua Portuguesa, e as condições de produção de seu discurso, que envolvem o eu-aqui-agora, a institui-ção escolar, o próprio professor e a sua formação, e o aluno, investigando o vai-e-vem constante entre odiscurso escolar e outros discursos que intervêm nele. O arcabouço teórico do trabalho fundamenta-se nosestudos da Análise do Discurso, de linha francesa, em que é tarefa do lingüista olhar os mecanismos dasinstituições de ensino, lugar de constituição do sujeito (FOUCAULT, 1980, 1985 e 1986), questionar a“verdade” de nossos discursos consagrados, cultivados e examinar a constituição das relações de ensino eaprendizagem que justifica o dizer do professor e sua ação; e nas teorias sobre o Professor Reflexivo(BARCELOS, 2001, GARDNER, 2000 e NEVES, 2001).

Palavras-chavePalavras-chavePalavras-chavePalavras-chavePalavras-chaveEscrita; leitura; lingüística.

AbstractAbstractAbstractAbstractAbstractThe goal of this research is to weave comments on the speech and work of the Mother Tongue/PortuguesLanguage teacher, and conditions for the production of his discourse which involves his “here-and-now”,his school institution, the teacher himself and his training, and the student, investigating the constantcoming and going between the school discourse and other discourses which interfere in it. The theoreticalframework itself is based on Discourse Analyse study, in which it is the task of the Linguist to look at theinstitutional mechanism of teaching, the place where the subject constitutes himself (FOUCAULT, 1980,1985, 1986), to call into question the “truth” about our consecrated and cultivated discourses, and toexamine the constitution of the teaching relationship that justifies the teacher’s method of speaking andhis/her actions; and on the theories of the Reflective Teacher (BARCELOS, 2001, GARDNER, 2000 andNEVES, 2001).

Key wordsKey wordsKey wordsKey wordsKey wordsWriting; reading; linguistics.

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222 Vânia Maria Lescano GUERRA. Considerações sobre a atividade reflexiva na escola

IntroduçãoIntroduçãoIntroduçãoIntroduçãoIntrodução

É notório que o ensino da LínguaPortuguesa (Língua Materna) há muito tem-po vem sendo objeto de preocupação en-tre os estudiosos da área. Nas últimas dé-cadas, ele tem sido amplamente discutido;evidentemente, trata-se de uma problemá-tica ampla e complexa, já que se situa nocontexto do ensino público, visto em suaconjuntura maior.

A insuficiência da escola fundamen-tal, como um espaço especializado em Edu-cação, é um tema que preocupa toda a so-ciedade. Os profissionais envolvidos na for-mação dos alunos de nível superior sentemmais profundamente o fracasso da escolari-dade. São eles que recebem os produtosda educação fundamental e média, e co-nhecem as falhas da universidade e os em-pecilhos a serem vencidos para diminuir oueliminar essa problemática. ConformeFoucault,

[...] “a chamada crise da universidade nãodeve ser interpretada como perda de força,mas pelo contrário, como multiplicação ereforço de seus efeitos de poder no meiode um conjunto multiforme de intelectuaisem que praticamente todos são afetadospor ela e a ela se referem” (1985, p. 09).

A implementação de transformaçõesno ensino da Língua Portuguesa implica aaplicação de medidas que, certamente, de-verão atingir todo esse contexto mais am-plo. Ou inversamente, certos problemasobservados no ensino de línguas só pode-rão ser adequadamente solucionados me-diante a modificação de determinados as-pectos do sistema escolar brasileiro, vistode uma perspectiva global.

Este texto faz parte de uma pesqui-sa em que analisamos o discurso e a práti-ca dos professores de LP (LM), ex-alunosdo curso de Letras da UFMS, interessando-nos como esses professores trabalham narede pública do ensino fundamental.

No intuito de melhorar a formação(o que nos parece ser um trabalho interativoe dinâmico) temos por meta, por meio des-te ensaio, mostrar ao leitor a necessidadede o professor repensar crenças, concep-ções, valores, ideais, modos de ação, proce-dimentos, hábitos. Para tal, é importante queo docente reflita sobre suas práticas e teori-as. Tanto uma como a outra devem forne-cer-lhe subsídios para que ele se coloqueno lugar de sujeito do seu próprio trabalhoe seja capaz de reformulá-lo onde julgarnecessário.

Consideramos que questionar o queé evidente leva-nos a considerar que semhistória não há sentido nem sujeito. Temospor propósito, ainda, examinar os aspectosideológicos e discursivos que permeiam afala do professor em aulas de Língua Ma-terna (LM) de escola pública no nível fun-damental. Para tanto, a Escola, como ins-tituição responsável pelo ensino formal, éo lugar ideal para estudarmos os discur-sos que atravessam esse espaço e seus efei-tos de sentido na sala de aula de ensinofundamental.

1 Em discussão, as práticas1 Em discussão, as práticas1 Em discussão, as práticas1 Em discussão, as práticas1 Em discussão, as práticasescolaresescolaresescolaresescolaresescolares

Embora muitas sejam as pesquisasque têm trazido importantes contribuiçõespara uma melhor compreensão das rela-

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ções de ensino no nível fundamental e noensino superior, ainda há muito a ser inves-tigado, em especial, a complexa relação deideologia e de poder que subjaz as aulasde leitura e de produção de textos em Lín-gua Portuguesa (LP) e as concepções teóri-cas que determinam a prática pedagógicanas escolas públicas (GUERRA, 2002).

Tomar consciência da impossibilida-de de neutralidade das relações de ensinoimplica perguntar quem são os agentes doconhecimento, em que situação histórica seinsere e quais seus interesses políticos re-ais. A partir disso, a afirmação de que aescola não tem clareza de sua finalidadeimplica considerar que:a) as práticas pedagógicas de LP e os con-

teúdos decorrem de interesses outros quenão os dos alunos;

b) os interesses, sejam de uma classe se-jam de outra, se estabelecem sempre nonível político-ideológico e

c) os professores não têm claro que seusobjetivos não se realizam com tais práti-cas e conteúdos.

O problema torna-se mais dramáti-co quando se verifica que a prática escolaré essencialmente oral, com poucas e maldirigidas atividades específicas de leitura ede escrita, e praticamente nenhuma refle-xão sobre o que se escreveu ou sobre ostrabalhos de reescritura.

Sob o argumento de que é precisoorganizar material didático acessível ao alu-no e oferecer-lhe textos para que desenvol-va o gosto pela leitura, boa parte do mate-rial didático e da chamada literatura infanto-juvenil colocada à disposição do aluno écomposta de textos colados na oralidade,

com marcado reducionismo sintático e se-mântico, o que pressupõe uma competên-cia mínima de leitura e pura ação mecâni-ca de decodificação gráfica. Podemos afir-mar que a prática escolar de Língua Portu-guesa, quando não é totalmente oral, é in-termediada por um tipo de literatura, sejade informação seja de ficção, em que seidentifica uma forte inclinação à sintaxe daoralidade e uma grande simplificação naexposição dos objetos, fenômenos, fatosque se pretende estar ensinando.

A prática de produção de texto serelaciona com a apresentação da norma,com destaque para a correção dos errosde ortografia, concordância e regência ver-bal. Efetivamente, ensina-se redação ape-nas para fixar a norma, ainda que nemsempre se assuma explicitamente tal pers-pectiva.

Tem-se a caracterização da redaçãocomo um gênero escolar, que se subdivideem dissertação, narração e descrição, des-vinculado do exercício efetivo da leitura eda escrita. À redação se atribui o papel deverificação da capacidade de escrita dosalunos. A concepção subjacente é a de quea leitura e a escrita são habilidades inde-pendentes do domínio dos discursos, e queo sujeito pode adquiri-las com treino e as-similação de regras apenas.

2 O saber nos limites da2 O saber nos limites da2 O saber nos limites da2 O saber nos limites da2 O saber nos limites dainstituiçãoinstituiçãoinstituiçãoinstituiçãoinstituição

Especialmente no trabalho pedagó-gico nos limites da escola, gastamos gran-de parte de nosso tempo dominando emanipulando vários tipos de sistemas de

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símbolos – linguagem falada e escrita, dia-gramas, desenhos, equações lógicas e as-sim por diante. Sabemos que esses siste-mas não ocorrem naturalmente. Eles forame continuam sendo desenvolvidos paratransmitir, de forma sistemática, informaçõesculturalmente significativas. Historicamente,os sistemas de símbolos parecem ter surgi-do precisamente para codificar os signifi-cados em relação aos quais as inteligênciashumanas são mais sensíveis. Inteligênciatomada como um potencial biopsicológicopara processar informações que pode serativado num cenário cultural para solucio-nar problemas ou criar produtos que sejamvalorizados numa cultura. Elas podem serativadas ou não, dependendo dos valoresde uma cultura específica, das oportunida-des disponíveis nessa cultura e das deci-sões individuais tomadas por pessoas e/ou suas famílias, seus professores e outros(GARDNER, 2000).

Com relação a cada inteligência hu-mana, há sistemas de símbolos, tanto soci-ais quanto particulares, que permitem queos sujeitos transitem em certos tipos de sig-nificados. Os homens isolam acontecimen-tos e são capazes de fazer inferências sobreeles, desenvolvendo símbolos lingüísticos epictóricos que podem facilmente captar osignificado dos acontecimentos. Em outrostermos, os sistemas de símbolos podem ter-se desenvolvido exatamente por se ajusta-rem rapidamente às formas relevantes deinteligências.

Diante disso, é preciso que o profes-sor de Língua Portuguesa tenha claro que,no âmbito escolar, há pelo menos duas in-teligências – a lingüística e a lógico-mate-

mática. A primeira envolve sensibilidadepara a língua falada e escrita, a habilidadede aprender línguas e a capacidade de usara língua para atingir certos objetivos. Os pro-fessores, os escritores, os poetas estão entreaqueles de inteligência lingüística elevada.Já a segunda envolve a capacidade de ana-lisar problemas com lógica, de realizar ope-rações matemáticas e investigar questõescientificamente. Ter uma mistura de inteli-gência lingüística com lógico-matemáticaé sem dúvida uma bênção para os alunose para qualquer pessoa que precise se sub-meter a situações de testes regularmente.

Goleman (1996) descreve uma sériede capacidades que têm a ver com conheci-mento de emoções, controle de emoções esensibilidade para os estados emocionaispróprios e de outros. No entanto, quando oestudioso fala de inteligência emocionalcomo se isso acarretasse um conjunto decomportamentos recomendados (empatia,consideração ou esforço para que uma fa-mília ou comunidade funcione melhor), eleabandona o âmbito da inteligência, numsentido estritamente acadêmico, e entra nasesferas distintas dos valores e da políticasocial.

Confundir inteligências com outrosresultados desejados é particularmenteobservado quanto se trata de inteligênciaspessoais. Essas distorções e aplicaçõesindevidas sugerem uma compreensão rasado que acontece nas relações de ensino:rotulam-se alunos, a partir de “suas” inteli-gências, discutem-se terminologias, taiscomo “altamente lingüístico” ou “espacial-mente deficiente”, e os aprendizes assimrotulados podem ser vistos como capazes

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de trabalhar ou aprender somente de de-terminadas maneiras, uma caracterizaçãoque quase nunca é verdadeira.

Por essas razões, é importante que oprofessor de Língua Portuguesa consideretrês proposições básicas: a) não somos to-dos iguais; b) não temos o mesmo tipo demente; c) a educação funciona de modomais eficaz se essas diferenças antes foremlevadas em consideração do que ignora-das ou negadas. Isso sugere que, prova-velmente, qualquer abordagem para o en-sino uniforme de Língua Portuguesa sóservirá otimamente a uma pequena por-centagem de aprendizes.

Na verdade, em educação o desafioà escola consiste exatamente nisso: agoraque se sabe das enormes diferenças nomodo como as pessoas adquirem e repre-sentam o conhecimento, pode-se fazer des-sas diferenças o ponto central do ensino edo aprendizado. Se se ignorar isso, pode-sepassar a perpetuar um sistema de atendi-mento a uma elite – tipicamente àquelesque aprendem melhor de uma determina-da maneira, em geral lingüística ou lógico-matemática. Por outro lado, caso sejam le-vadas a sério essas diferenças, cada sujei-to pode ser capaz de desenvolver plena-mente seu potencial intelectual e social.

Tais reflexões encaminham-se para avalorização do entendimento conceitual delíngua, de ensino de linguagem, de gramá-tica, de leitura e de escrita, em detrimentoda acumulação de fatos, em relação aoconteúdo acadêmico de LP: desconfia-se docânone e de um currículo nuclear, uma vezque se acredita que se pode chegar à com-preensão por meio de uma variedade de

disciplinas, e que ela depende da explora-ção profunda antes de um número limita-do de tópicos do que de uma ampla co-bertura.

É pertinente que o professor tenhaem mente que os sujeitos não são iguais,nem as inteligências. Uma das observaçõesmais freqüentes em todas as culturas é quealgumas crianças sobressaem em determi-nadas atividades. Há crianças que apren-dem mais cedo do que as outras da mes-ma idade a falar, cantar, memorizar músi-cas, se orientar em terreno desconhecido,dominar e vencer jogos físicos ou mentais.

Gardner (2000) afirma que em qual-quer período histórico, há muita gente pro-duzindo trabalhos imaturos em determina-do âmbito, ou então dominando esse âm-bito, em geral com o sistema de símbolosmais usado no momento. Do muito que seproduz, o campo escolhe algumas obrasque se destacam. Em última instância, muitopoucas dentre essas modificam realmentea estrutura ou o conteúdo de um âmbito, esão elas e os sujeitos que as realizaram quepodem ser considerados criativos, no senti-do principal. Criatividade representa essen-cial e inevitavelmente o julgamento de umacomunidade: a única forma de avaliar demodo confiável se uma pessoa é criativa éobservar o destino das obras que ela criou.

Se se considera que o professor deLíngua Portuguesa tem que ser um líder (elesabe falar bem, sabe contar uma históriaeficaz e costuma escrever bem), pode-sepostular que ele apresenta grande talentopara refletir regularmente sobre seu rumo esuas ações. Na direção de que o professorprecisa conhecer as crenças das pessoas,

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não apenas suas mentes, o foco está naslições que ajudam os alunos a entenderseus pontos fortes e seus pontos fracos, eoutras que os ajudam a entender os outrose a trabalhar em grupo na escola.

Resumindo, temos algumas manei-ras de se passar da formulação dos objeti-vos aos procedimentos (e nenhuma é in-trinsecamente melhor do que outra), no quediz respeito às abordagens do professor,segundo Gardner (op.cit.):1)aprender mais sobre a teoria abordada e

a respectiva prática;2)formar grupos de estudos, dando especi-

al atenção às necessidades de determi-nada escola;

3)visitar instituições que estejam implemen-tando idéias de teorias recentes, interagircom professores, auxiliares, pais e alunos,o que provoca questionamentos e desen-cadeia idéias que podem ser implemen-tadas localmente;

4)assistir a conferências que apresentem asidéias das práticas eficazes dos exposito-res; e mesmo que a reunião (ou a oficina)não chegue a ser estelar, nelas se podeconhecer pessoas e estabelecer uma liga-ção com elas e seu trabalho;

5)planejar e lançar atividades, práticas ouprogramas oriundos de um mergulho nomundo da teoria e das recentes aborda-gens, em que é necessário ser corajosoporém razoável para construir dando tem-po para reflexão.

Tais práticas podem parecer óbvias,mas quando os professores de Língua Por-tuguesa se interessam por novas idéias,muitas vezes eles cometem erros desneces-sários. Testam atividades recomendadas

sem entender, sem questionar seus funda-mentos, ou são demasiado ambiciosos edepois ficam desanimados quando nãoalcançam resultados imediatos. Ou, o queé mais comum, julgam o sucesso inteira-mente por provas inúteis e quase nuncafazem a pergunta difícil para saber que da-dos podem convencer um pai ou uma dire-toria de escola céticos. Do mesmo modo,até programas bem feitos e nitidamente efi-cazes às vezes são abandonados porqueseus adeptos não sabem defendê-los deforma convincente.

Em qualquer contexto, é preciso sa-ber prever as críticas mais prováveis, e terrespostas razoáveis. Não se deve ficar nadefensiva; na verdade, deve-se ouvir cuida-dosamente as críticas, ver o que têm de pro-cedente, e tentar aprender com elas.

Um pouco de reflexão revela a desi-gualdade essencial da educação uniforme.A escola uniforme parte da premissa de quetodos os indivíduos são iguais e, portanto,que a educação uniforme atinge todos elesde forma igual e eqüitativa.

Como educadores, enfrentamos umaescolha inevitável: ignorar essas diferençasou reconhecê-las. Isso significa aprendersobre a origem, os interesses, as preferênci-as, as experiências e os objetivos de cadaum, não para estereotipar ou pré-ordenar,mas antes para garantir que as decisõeseducacionais sejam tomadas com basenum perfil atualizado do aprendiz. Algunsalunos têm dificuldade em dominar umaatividade, como a leitura, porque não con-seguem aprender da “maneira uniformiza-da” disponível nas escolas.

Pode ser difícil pensar em educação,

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configurada individualmente numa turmade cinqüenta alunos do ensino fundamen-tal de escola pública, nem todos dóceis oumotivados como se gostaria, mas isso nãoé impossível. Entre as atitudes possíveis, aescola pode:1) coletar o máximo de dados sobre como

o aluno lê e dividir esse conhecimentocom o professor e com o aprendiz, e, maistarde, o aprendiz mesmo pode dar muitainformação;

2) ser flexível na hora de designar o profes-sor para as turmas, para que possa ha-ver mais compatibilidade entre professo-res e alunos;

3) ter um sistema eficaz de transmissão deinformações, para que os professores doano seguinte saibam o máximo possívelsobre os novos alunos e, ainda, garantirque os professores tenham acesso rápi-do a essa informação e possam atualizá-la conforme necessário.

Quando se trata de compreensão detextos, por exemplo, a ênfase recai sobreas vivências que podem ser observadas,criticadas, aprimoradas. Isso porque focali-zar a vivência marca imediatamente umamudança importante: em vez de dominaro conteúdo, o aprendiz pensa o porquê deum conteúdo estar sendo ensinado e comoapresentar melhor a compreensão daque-le conteúdo de uma forma acessível aosseus interlocutores. Quando os alunos per-cebem que terão de aplicar conhecimentose demonstrar percepções em público, elesassumem uma postura mais ativa em rela-ção ao material, procurando exercitar-se.

No ensino da escrita e da leitura, osinimigos da compreensão são os roteiros e

os estereótipos. Os aprendizes acreditamlogo que as coisas acontecem de maneirastípicas, evocam esses roteiros mesmo quan-do não há cabimento e se esquecem deque a compreensão exige um envolvimentomais intenso e mais extenso com os mun-dos histórico, social e pessoal. A esse res-peito articulamos os estudos de Barcelos:

“A aprendizagem reflexiva, de maneirasemelhante ao conceito de ensino refle-xivo dos professores, diz respeito àconscientização dos alunos sobre comoeles aprendem uma língua. Aprender re-flexivamente significa abrir a discussão arespeito de crenças, estratégias e estilosde aprendizagem aos alunos, para queeles mesmos possam refletir entre eles ecom seus professores sobre sua culturade aprender” (2001, p. 86).

Nessa direção, Neves alerta-nos que“É isso o que a escola não consegue pro-ver nas suas atividades de língua escrita:uma situação real, uma situação de vidacondicionando o uso lingüístico” (2001, p.02). Em relação a tais questões, ousamosaqui tecer algumas considerações.

3 Em busca de abordagens3 Em busca de abordagens3 Em busca de abordagens3 Em busca de abordagens3 Em busca de abordagensreflexivas…reflexivas…reflexivas…reflexivas…reflexivas…

Uma primeira abordagem envolveobservar e aplicar as práticas de instituiçõesque conseguiram levar à compreensão.Uma segunda abordagem propõe que osobstáculos à compreensão sejam atacadosde frente. Lida-se diretamente com os pró-prios erros de concepção. Se existe um raci-ocínio estereotipado, o aprendiz pode serestimulado a olhar cada acontecimentohistórico ou cada texto por meio de múlti-

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plas perspectivas. E ainda é preciso estimu-lar a compreensão assinalando conceitua-ções inadequadas e solicitando aos alunosque reflitam sobre as conseqüências. Aospoucos, os alunos vão aprendendo amonitorar a própria aprendizagem e assimdesenvolver estratégias de compreensão.

É importante deixar claro que chegarà compreensão é um desafio e há uma va-riedade de meios que podem ajudar. Umaabordagem genérica pareceria justificável,uma vez que é razoável abordar um pro-blema em termos de constituintes básicos.Alguns métodos podem de fato dar certocom todos os alunos, ou pelos menos coma grande maioria. Mas as cabeças huma-nas não funcionam da mesma maneira eos aprendizes não têm todos os mesmospontos fracos e os mesmos pontos fortes.A consciência disso pode influir muito namaneira do professor de Língua Maternade ensinar e de avaliar o que os alunosaprenderam em gramática, por exemplo.

É certo que, devido a suas origensculturais, suas histórias e suas experiênciasidiossincráticas, os alunos não chegam àescola como uma tábula rasa, nem podemser alinhados unidimensionalmente ao lon-go de um único eixo de realização intelec-tual. Embora essa variação complique o tra-balho do professor de Língua Portuguesa,ela pode realmente tornar-se uma aliadapara o ensino eficaz. Quando os professo-res são capazes de usar diferentes aborda-gens pedagógicas, eles conseguem atingirmais alunos, com maior eficácia. Um pon-to de entrada que pode envolver o aluno ecolocá-lo no centro do tópico são as narra-tivas, uma vez que os alunos gostam de

aprender sobre tópicos por meio de históri-as, veículos lingüísticos que apresentamprotagonistas, conflitos, problemas a seremsolucionados, objetivos a serem alcançadose tensões, muitas vezes, acalmadas.

Outro ponto de entrada para muitosalunos, sobretudo as crianças, é abordar umtópico por meio de uma atividade na qualse envolvam completamente – em que po-dem construir alguma coisa, manipular mate-riais ou realizar experiências. Muitas pessoasaprendem melhor em grupo, no qual podemassumir diferentes papéis, observar a pers-pectiva de outros, interagir regularmente ecomplementar-se umas às outras.

A perspectiva de um ponto de entra-da coloca o aprendiz diretamente no cen-tro de um tópico disciplinar, despertandoseus interesses e assegurando um compro-misso cognitivo para exploração mais pro-funda. Mas o ponto de entrada não neces-sariamente inculca formas ou modos es-pecíficos de compreensão. O professor (ouo aluno) é desafiado a construir analogiasinstrutivas, tiradas de conteúdos que ele jáentende, que possam transmitir aspectosimportantes do tópico menos conhecido.

As analogias constituem um cami-nho para a articulação de facetas importan-tes de um assunto para pessoas pouco fa-miliarizadas com ele. Elas podem ser pode-rosas mas também podem induzir a erroou sugerir um paralelo descabido. Um pro-fessor deve decidir se a analogia é apropri-ada e assegurar que as partes que podeminduzir a erro não distorçam ou prejudiquema compreensão última do aluno. As metá-foras também podem ser invocadas parailuminar novos tópicos.

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É certo que os pontos de entrada ini-ciam a conversa e boas analogias transmi-tem partes reveladoras do conceito emquestão, porém o desafio de transmitir acompreensão central permanece. Os profes-sores de Língua Portuguesa tradicionalmen-te têm confiado em duas abordagens apa-rentemente opostas no ensino da gramáti-ca, da leitura ou da escrita: ou dão instru-ções explícitas – em geral didáticas – e ava-liam a compreensão em termos do domíniolingüístico do conteúdo (Substantivo é... Asorações subordinadas dividem-se em...) oufornecem muita informação e esperam quede algum modo os alunos façam sua pró-pria síntese (Com base em suas leituras,nossa ida à biblioteca municipal e os vári-os exercícios em sala, o que você faria se...).Alguns professores usam as duas aborda-gens, simultânea ou sucessivamente.

Temos que reconhecer que não podehaver uma fórmula para as abordagens.Cada assunto é diferente, portanto cadatópico deve ser considerado em termos desua própria idéia nuclear, sua rede de con-ceitos, questões, seus problemas e susce-tibilidades e erros de concepção específicos.

Em seguida, é preciso reconhecer queos tópicos não existem isoladamente, elestêm origem nos conteúdos já existentes ounos emergentes, e por eles são em partedefinidos. Exemplos familiares, não escolhi-dos aleatoriamente, ajudaram os estudio-sos a definir tópicos no passado, e mostra-ram-se eficazes pedagogicamente com mui-tos alunos. Embora o valor desses exem-plos tenha sido comprovado, considerá-los,apenas, não garante a compreensão.

É essencial o professor de Língua

Portuguesa reconhecer que um conceito sópode ser bem compreendido se a pessoarepresentar suas características nucleares dediversas maneiras. Os múltiplos modos derepresentação usam vários sistemas de sím-bolos, esquemas, estruturas, indo além dasanalogias, e, assim, professores e aprendi-zes podem procurar fazer representações omais precisas e abrangentes possível. E ámedida que cada representação necessari-amente realça certas características do tó-pico enquanto minimiza outras, o objetivoúltimo é sintetizar as várias representaçõescom o máximo de abrangência. Para isso,é preciso que o professor de Língua Portu-guesa dedique algum tempo a um tópico,retrate o tópico de várias maneiras, tantopara ilustrar suas complexidades comopara atingir todos os aprendizes, a fim deque essas abordagens invoquem explicita-mente um leque de habilidades e interesses.

Acreditamos que nossas considera-ções estão intimamente ligadas ao prazerde ensinar – a oportunidade de revisitar umtópico e considerar novas maneiras detransmitir seus componentes para diferen-tes sujeitos com o máximo de contundênciae precisão. E tendo determinado quais tó-picos exigem atenção sustentada, pode-seexplorar um conjunto de abordagens pe-dagógicas de Língua Portuguesa, escolhen-do não apenas pontos de entrada que atrai-am o interesse e a atenção de uma varie-dade de alunos mas também exemplos,analogias e metáforas que transmitampartes do tópico de maneira clara. Finalmen-te, procura-se um conjunto de descrições li-teralmente adequadas que, reunidas, apre-sentem um conjunto de representações rico

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e diferenciado do tópico. E à medida queessas representações envolvem uma gamade sistemas simbólicos, elas são mais pro-veitosas para os aprendizes.

Promover o desenvolvimento demúltiplas representações bem como ofere-cer muitas oportunidades para vivênciaspodem revelar ao aluno e a outros em quemedida o conteúdo foi dominado. O pro-fessor de Língua Portuguesa precisa serimaginativo e pluralista, se espera estimu-lar representações de compreensãoreveladoras. As vivências podem ser tãovariadas quanto as facetas do tópico e ashabilidades dos alunos. Uma variedade devivências sancionadas não só oferece a ummaior número de alunos a oportunidadede mostrar o que entenderam, como tam-bém garante que não haja uma única “to-mada” de um tópico dominando indevi-damente a compreensão que o aluno temdaquele tópico.

Professores de leitura e de produçãode textos podem levar o aluno a lidar comdesafios por meio de debates com os cole-gas, com experiências que sondem diferen-tes aspectos do processo em pauta, a par-tir de entrevistas ou mesmo da imagina-ção do aprendiz.

Parafraseando Gardner (2000), valedizer que conhecimento não é o mesmoque moralidade, mas, se quisermos evitarerros passados e tomar rumos positivos, pre-cisamos entender que uma parte importan-te da compreensão é saber quem somos eo que podemos fazer; uma parte dessa res-posta encontra-se na biologia – as raízes eas sujeições de nossa espécie – e outraparte na história – o que as pessoas fizeram

e são capazes de fazer. Os alunos precisamsaber sobre esses tópicos não porque caemnas provas, mas antes porque ajudam aidentificar as possibilidades humanas.

Considerações finaisConsiderações finaisConsiderações finaisConsiderações finaisConsiderações finais

Em última análise, o que fica é queprofessor precisa sintetizar seu conhecimen-to para ele mesmo. As vivências de com-preensão que realmente importam são asque o professor realiza como sujeito daeducação num mundo imperfeito, que elepode afetar positiva ou negativamente.

Tem-se que considerar que os alunosaprendem primeiro com os exemplos deadultos a seu redor, uns merecedores deadmiração e outros não. A atenção cons-tante a exemplos pode aumentar a incidên-cia de sujeitos que acabarão ligando ca-pacidades hoje consideradas científica eepistemologicamente separadas.

Dessa forma, entende-se que “a ati-vidade metalingüística não pressupõe ape-nas o uso da linguagem, mas também odesenvolvimento de uma certa consciênciae uma atenção especial para decidir quan-do é apropriado, correto ou positivo anali-sar seus componentes e refletir sobre suascombinações” (TEBEROSKY, 1992, p.157)

Kato (1988) diz que a escolha ade-quada da teoria gramatical pelo professorde Língua Portuguesa não se resume ape-nas a uma questão de método, mas sim aestipulação de que saber sobre a língua ésocialmente relevante e interessante parao aluno.

Nessa direção é pertinente indagarque relação se estabeleceria entre o estudo

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formal da língua e o exercício das habilida-des de expressão e de comunicação, asquais também são fundamentais. Além dis-so, se o que se quer é permitir a conscienti-zação do aluno sobre seu próprio saberlingüístico, não há vínculo necessário entreesse objetivo e o ensino da gramática.

Para Perini, é possível desenvolver ahabilidade de ler e escrever bem sem sabergramática, mas ele vê duas outras razõesque justificam o ensino formal de uma gra-mática descritiva do português no ensinofundamental: um componente cultural eum componente de formação de habilida-des. Seu argumento mais forte está no com-ponente de formação de habilidades:

“as habilidades de raciocínio, de observa-ção, de formulação e testagem de hipótesesão um pré-requisito à formação de sujei-tos capazes de aprender por si mesmos,criticar o que aprendem e criar conheci-mento. Uma contribuição que o ensinode gramática encerra reside na possibili-dade de ajudar o desenvolvimento das ha-bilidades mencionadas: o ensino grama-tical pode ser um dos meios pelos quaisnossos aprendizes crescerão e se liberta-rão intelectualmente” (1995, p. 31-32).

Sabe-se que o caráter essencialmen-te conteudístico e normativo ou corretivodo ensino da leitura e da escrita, o princípioda acumulação progressiva, a repartição dotempo em atividades definidas correspon-dem exatamente à atual postura pedagó-gica. É nessa redução da dispersão e daheterogeneidade das formas de interlocu-ção que a presença do professor de LínguaPortuguesa e do seu material didático maisse impõe. Ela determina as falas e os com-portamentos possíveis, instituindo uma voz

fixa e norteadora de todas as ações nasala de aula. Além disso, o professor é apre-sentado como portador do conhecimentoverdadeiro e necessário, de modo que cabeao aluno apenas aprender. O fato de oprofessor trazer também as respostas aosexercícios e de usar um estilo de interlocuçãodireta com o aluno transforma esse profes-sor em gerente da aula.

O entendimento dessa relação depoder (em que o professor é a versão auto-rizada que corresponde à visão de mundodas forças sociais dominantes) passa pelapercepção da existência de uma culturaescolar na qual os diversos indivíduos en-tram, trabalham e adaptam seus valoresaos valores, crenças, expectativas e com-portamento da instituição, produzindo de-terminados efeitos ideológicos.

Nos estudos foucaultianos (1980, p.131), a construção do ideológico parte deque “a verdade está circularmente ligada asistemas de poder, que a produzem e aapóiam e a efeitos de poder que ela induze a reproduzem”. Para esse estudioso, discur-so é inerentemente libertador ou opressivo.A condição libertadora de qualquer discursoé uma questão de investigação histórica,não de proclamação teórica. O trabalho des-se filósofo tem influenciado profundamen-te o pensamento em muitos campos da teo-ria social, incluindo, bastante recentemente,a educação. Em parte, a magnitude dessainfluência advém do grau em que suas idéi-as são convincentes e persuasivas. Portan-to, se existe uma relação entre verdade epoder, todos os discursos podem ser vistosfuncionando como regimes de verdade.

Para Foucault (1986, p.130), a escola

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232 Vânia Maria Lescano GUERRA. Considerações sobre a atividade reflexiva na escola

produz sujeitos que levam consigo “todo umconjunto de técnicas, todo um corpo de pro-cessos e de saber, de descrições, de receitase dados”. As atividades das disciplinas esco-lares e a aplicação regular de exames pelosistema governamental aparecem comouma espécie de vigilância de atitudes.

No entanto, mesmo que o desempe-nho de cada um possa ser controlado, me-dido, a produtividade dependerá tanto doconjunto de ações particulares que devemser realizadas por todas as pessoas que, di-

reta ou indiretamente, constituem a organi-zação da instituição, como da motivação queas impele a interagir coletivamente ou a re-sistir sistematicamente às transformações.

Para finalizar, nesse movimento demudança, a informação e a comunicaçãoocupam papel primordial. E, na era da co-municação, a habilidade de decodificar einterpretar informação, a partir do contextosocial e histórico, surge atrelada ao domí-nio cultural de áreas diversas do saber, oque nos reporta imediatamente à educação.

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Recebido em 15 de julho de 2004.Recebido em 15 de julho de 2004.Recebido em 15 de julho de 2004.Recebido em 15 de julho de 2004.Recebido em 15 de julho de 2004.Aprovado para publicação em 03 de setembro de 2004.Aprovado para publicação em 03 de setembro de 2004.Aprovado para publicação em 03 de setembro de 2004.Aprovado para publicação em 03 de setembro de 2004.Aprovado para publicação em 03 de setembro de 2004.

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O ensino da estruturação sintática para o alunoO ensino da estruturação sintática para o alunoO ensino da estruturação sintática para o alunoO ensino da estruturação sintática para o alunoO ensino da estruturação sintática para o alunosurdosurdosurdosurdosurdo

Elaine Ap. Machado de Agostino*Maria da Piedade Resende da Costa**

* Mestre em Educação Especial pela UFSCAR. Técnica daPrefeitura Municipal de São Carlos e professora da E.E.Sebastião de Oliveira Rochae-mail: [email protected]

**Doutora em Psicologia pela USP. Professora do Progra-ma em Educação da UFSCAR.e-mail: [email protected].

ResumoResumoResumoResumoResumoNo contexto da Educação Especial, vários são os estudos e pesquisas envolvendo a dificuldade da aquisiçãoda linguagem escrita pelo surdo. O presente estudo teve como objetivo analisar a produção de frasesconstruídas pelo aluno surdo para avaliar a eficácia de um procedimento de ensino apoiado no recursovisual do organograma montessoriano e no recurso aéreo da língua de sinais – LIBRAS. Os resultadospermitiram concluir a eficácia do procedimento de ensino.

Palavras-chavePalavras-chavePalavras-chavePalavras-chavePalavras-chaveSurdez; construção sintática; recursos visuais e aéreos.

AbstractAbstractAbstractAbstractAbstractWithin the context of Special Education, there are various studies and research involving the difficulty ofthe aquisition of writing for the deaf. The present study aimed at analyzing the production of phrasesconstructed by the deaf student to evaluate the effectiveness of a teaching procedure, supported by thevisual resource of the Montessori organization chart and the aerial resource of sign language – LIBRAS.The results concluded the effectiveness of the teaching procedure.

KeywordsKeywordsKeywordsKeywordsKeywordsDeafness; syntactical construction; visual and aerial resources.

Série-Estudos - Periódico do Mestrado em Educação da UCDB.Série-Estudos - Periódico do Mestrado em Educação da UCDB.Série-Estudos - Periódico do Mestrado em Educação da UCDB.Série-Estudos - Periódico do Mestrado em Educação da UCDB.Série-Estudos - Periódico do Mestrado em Educação da UCDB.Campo Grande-MS, n. 18, p. 233-245, jul./dez. 2004.

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IntroduçãoIntroduçãoIntroduçãoIntroduçãoIntrodução

A surdez é caracterizada, segundodocumentos oficiais do Ministério da Edu-cação e Cultura – MEC, como sendo “aperda maior ou menor da percepção nor-mal dos sons”. No que diz respeito à aqui-sição da linguagem e da fala, “o déficit au-ditivo pode ser definido como perda emdecibéis, na zona conversacional (freqüên-cia até 500 – 1000 – 2000 hertz) para omelhor ouvido” (BRASIL, 2003, p. 19).

Já na área da saúde e quanto aosaspectos educacionais, os indivíduos comdéficits de audição podem ser considera-dos parcialmente surdos (deficientes audi-tivos) se apresentarem surdez leve e mode-rada (até 70 dB ) e surdos se apresentaremsurdez severa e profunda (acima de 70 dB)(BRASIL, 2003).

A surdez, mais que uma deficiênciatambém é uma questão social, pois interfe-re diretamente nas relações pessoais e eco-lógicas, muitas vezes impondo barreiras quedificultam a comunicação e o desenvolvi-mento acadêmico destes indivíduos.

A problemática que norteia a comu-nicação da comunidade surda recai, nosdias atuais, sobre três orientações impor-tantes para o desenvolvimento educacio-nal desta população. São elas: o oralismo,a comunicação total e o bilingüismo(PETRECHEN, 2001 e BATISTA, 2002).

Adeptos do oralismo defendem astécnicas que permitem ao surdo comunicar-se através da fala. Algumas das principaistécnicas são: a) leitura labial, habilidadepara identificar a palavra falada através dadecodificação dos movimentos orais do

emissor; b) fonoarticulação, ensino da fala,que depende da leitura dos lábios, da cap-tação tátil e do treinamento auditivo; e c)treinamento auditivo, treinamento da dis-criminação do estímulo sonoro (COSTA,1994).

Segundo Costa (1994), a comunica-ção total reconhece todas as necessidadesde comunicação da criança surda. Mas, deacordo com Sá (1999), enquanto aborda-gem educacional visa facilitar o processoensino-aprendizagem de uma língua pelautilização de todo e qualquer recurso pos-sível.

O bilingüismo utiliza, simultanea-mente, duas modalidades de Língua: a oral-auditiva (Língua majoritária) e a gestual-visual (Língua de Sinais). Esta orientação,mesmo que atingida parcialmente, seriamais apropriada às necessidades da pes-soa surda, cuja potencialidade a habilita aum desenvolvimento pleno da linguagem(FERREIRA-BRITO, 1989).

Entretanto, apesar da orientação es-colhida para ensinar o surdo, o fato é queeste deverá desenvolver habilidades pararealizar a escrita da Língua majoritária.

Segundo Vygotsky (1993), a lingua-gem escrita é, inicialmente, um simbolismode segunda ordem, porque representa ossons da fala, sendo nesse sentido secun-dária à linguagem oral. Escreve-se o quese fala e como se fala, ou seja, externa-se opensamento graficamente.

Independentemente da fase, etapa,ou nível de desenvolvimento em que se en-contra, cada criança tem uma dinâmica pró-pria de pensar a escrita (PETRECHEN,2001).

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De acordo com Batista, (2002, p.183),“para crianças oralistas a fonologia é umcaminho inevitável à fala interna como me-diadora para a escrita, permitindo que todoo léxico oral, possa ser transcrito e utilizadona escrita”. Como menciona esta autora, se-ria necessário que procedimentos com crian-ças bilingües utilizassem alternativas de esti-mulação para se adquirir o processamentolexical sem utilizar a fonologia.

Vários são os estudos que compro-vam as dificuldades na estruturação gra-matical da linguagem escrita pelo alunosurdo. “A escrita dos aprendizes surdos, fal-samente rotuladas como esquisitices, aber-rações ou desvios são construções perfei-tamente normais, produtos de um longoprocesso histórico” (COSTA, 2001, p. 88).Essas construções gramaticais são falhasquanto à análise morfossintática da Línguamajoritária, entretanto, se forem analisadassegundo a gramática da Língua de Sinais,pelo menos no que diz respeito à ordena-ção dos elementos gramaticais, esta pro-dução gráfica fará sentido.

Estudiosos como Costa (1992),Padovani (1997) Silva e Costa (1998), Sil-va (1998) e Brazorotto (2002), que investi-garam e analisaram a estruturação grama-tical dos surdos constataram as dificuldadesdestes indivíduos em relação à compreen-são da análise e da construção sintática.

Para Chomsky (1978, p.35), “todagramática adequada de uma Língua devetornar possível representar o fato de quecertos elementos fazem parte integrante detodas as frases dessa Língua ao passo queoutros se podem acrescentar facultativa-mente”. Para o aluno surdo esta questão é

bastante complicada, pois estes não com-preendem a relação entre os elementos dafrase, nem mesmo esta flexibilidade de al-guns deles.

Historicamente, as considerações aseguir dizem respeito a procedimentos queenfatizam o aspecto visual como ponto departida para o ensino da estruturação gra-matical, uma vez que a visualização garan-tirá ao surdo, elementos concretos que olevem a compreensão desta estrutura.

Perelló (1972), relatando formas deensino para o aluno surdo menciona queWing, em 1883, propôs um sistema de es-critura de frases que utilizou números e le-tras para representar a função dos compo-nentes da frase e Stirrs, em 1870, utilizoucores diferentes para escrever os elemen-tos gramaticais.

Montessori, uma estudiosa clássicada literatura educacional, publicou em 1926,um método sobre o ensino para criançasportadoras de deficiência mental na Itália,o qual utilizava um organograma de figurasgeométricas coloridas como símbolos pararepresentar os elementos gramaticais, osquais, objetivavam fixar na memória a fun-ção de cada palavra (MONTESSORI, 1965).

Fitzgerald (1966), surda pré-lingual eprofessora de surdos, afirma que a criançasurda necessita de um apoio visual paraacompanhar a estruturação da sentençaporque é incapaz de ouvir seus erros deconstrução. Tomando como base sua afir-mação, criou um artifício que tem por fina-lidade ensinar a estruturação da linguagem,ou seja, uma chave (Fitzgerald Key), a qual,utilizava também símbolos corresponden-tes aos elementos gramaticais

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Perdoncini e Yvon (1963), realizaramum longo estudo a respeito das condiçõesdas comunicações normais e deficitárias.Para o ensino da estruturação da lingua-gem com a representação gráfica da frase,os citados autores sugerem a aplicação deseu organograma da linguagem.

Don Antonio Delgado, em 1970, pro-pôs um novo procedimento para o ensinoda estruturação frasal conhecido comoOrganifrase, o qual, utilizava figuras geo-métricas coloridas, tendo como finalidadeestruturar o pensamento lógico-sintático dosurdo (citado em PERELLÓ, 1972 ).

No caso específico do indivíduo sur-do, desenvolve-se muito mais a percepçãovisual, pois este é o canal de comunicaçãocom o mundo exterior. Então, é natural queprocedimentos para o ensino da leitura eescrita, os quais devam basear-se em conte-údos contextualizados, utilizem de recursosvisuais para atingir a produção sintática.

Este estudo fundamentou-se na ne-cessidade de se utilizar recursos visuais parao ensino da estruturação gramatical parao aluno surdo baseando-se nos aspectosestruturados por Montessori em seu orga-nograma da linguagem gráfica, a partir daseguinte questão: Será que a estruturaçãogramatical proposta por Montessori em seuorganograma para deficientes mentaispode ajudar o aluno surdo a melhorar suaconstrução gramatical, inserindo nesta pro-posta o suporte lingüístico da Língua Bra-sileira de Sinais – LIBRAS?

A importância do recurso visual parao domínio da linguagem gráfica pelo alu-no surdo pôde ser percebida em todos osestudos mencionados. Sendo assim, este

estudo objetivou:• aplicar um procedimento de ensino, o

qual, reuniu aspectos da estruturação gra-matical proposta por Montessori (recur-sos visuais geométricos), aliado à gravu-ras (recursos visuais contextualizados) eà LIBRAS (recurso visual aéreo), visandoa compreensão da construção da cons-trução de frases no que diz respeito à or-denação dos elementos gramaticais;

• analisar a produção das frases quanto àordenação, coerência e coesão;

• avaliar a eficácia do procedimento de en-sino.

MétodoMétodoMétodoMétodoMétodo

Participaram deste estudo cinco cri-anças surdas, de ambos os sexos que fre-qüentavam a segunda e a terceira série doensino fundamental. Os alunos seleciona-dos estudavam em uma escola do ensinoregular em um período e, no outro, a salade recursos da rede municipal de ensino,desde a pré-escola para ambas as modali-dades, sem haver retenção do período letivo.

Para fins de identificação, os partici-pantes foram tratados no estudo como: P1,P2, P3, P4 e P5.

Na seleção dos participantes foramadotados os seguintes critérios: (a) apresen-tar surdez neurossensorial bilateral (severaou profunda), congênita ou adquirida nafase pré-lingüística; (b) apresentar idade cro-nológica de sete a dez anos; (c) não apre-sentar domínio da estruturação gramatical;e (d) não apresentar outros problemas deordem cognitiva. Estes dados podem serobservados na tabela 1a e 1b.

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Foram utilizados materiais rotineiros(de consumo, como fitas VHS), materiaisespecíficos como: gravuras, figuras geomé-tricas coloridas do organogramamontessoriano, fichas contendo a grafiadas palavras-chaves de cada gravura e

caixa com divisórias para armazenar as fi-chas; e equipamentos (câmera de vídeo).

Quanto ao local e situação o estudofoi realizado em domicílio, estando presen-te na ocasião da coleta de dados a pesqui-sadora e o aluno.

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Utilizou-se instrumentos como fichasde acompanhamento, fichas de registro deatividades desenvolvidas, fichas de desem-penho diário, caderno de registro de cam-po, a produção gráfica dos alunos e oorganograma montessoriano para docu-mentar a coleta de dados.

No que se refere ao procedimento, acoleta de dados foi realizada em oito eta-pas, a saber:1.Seleção dos participantes conforme os

critérios pré-estabelecidos.2.Solicitação da autorização dos pais para

a coleta de dados, para as filmagens epara divulgação deste material.

3.Autorização junto ao Comitê de Éticapara a realização da coleta de dados.

4.Definição, junto com as famílias, dos ho-rários e o local mais apropriado em do-micílio para a realização das sessões deaprendizagem.

5.Aplicação da avaliação inicial, a qualobjetivou verificar o domínio da constru-ção sintática.

6.Aplicação do programa de ensino (pro-cedimento de intervenção).

7.Aplicação da avaliação final , a qualobjetivou verificar o domínio da constru-ção sintática após a aplicação do proce-dimento de intervenção.

8.Aplicação da avaliação de generalização,realizada seis meses após o término daintervenção, objetivou verificar a fixaçãodo procedimento de ensino.

Ainda, no procedimento para a cole-ta de dados foi realizada a aplicação daprogramação de ensino. Esta contemplouo ensino da construção sintática aliado aoorganograma montessoriano e a Língua

de Sinais – LIBRAS. A etapa foi realizadaem 15 sessões com duração de 30 minu-tos, duas vezes por semana. O programaseguiu a seguinte seqüência de passos: 1)observação das gravuras; 2) sinalização dasgravuras em LIBRAS; 3) sinalização daspalavras-chaves em LIBRAS; 4) soletraçãodas palavras-chaves através da dactilologia;5) associação das palavras-chaves com asfiguras geométricas do organograma; 6)associação das palavras-chaves com a cai-xa de divisórias; 7) construção das frasesno organograma; 8) produção da grafiadas frases no caderno; 9) recolocação daspalavras-chaves na caixa com divisórias; e10) sinalização das frases mediante a ob-servação das gravuras.

Os dados obtidos com a coleta fo-ram analisados sob os aspectos qualitati-vos e quantitativos, seguindo os mesmoscritérios em cada etapa do procedimento,ou seja, na avaliação inicial, na interven-ção, na avaliação final e na avaliação degeneralização.

ResultadosResultadosResultadosResultadosResultados

Análise dos dados coletados possi-bilitou obter os seguintes resultados:

Quanto à avaliação inicial, a qualteve como objetivo verificar o domínio daescrita de frases e da LIBRAS, os dadostranscritos na tabela 1 revelam o nível deconhecimento dos alunos.

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Como se pode observar, nenhum dosparticipantes demonstrou ter domínio sobrea estruturação gramatical, uma vez que, osmesmos não escreveram nenhuma palavrana sessão de avaliação inicial. O conheci-mento parcial demonstrado sobre a LIBRAS( no que diz respeito ao contexto das gravu-ras apresentadas) foi apenas com adactilologia (alfabeto manual). Observa-seque somente P1 conhecia os sinais das pa-lavras casa e bola. P4 não fez uso de ne-

nhum gesto correspondente ao contexto dasgravuras.

Quanto à intervenção, que compre-endeu a aplicação do programa de ensino,analisou-se os dados de desempenho dosparticipantes, qualitativa e quantitativa-mente, em cada sessão de aprendizagem,comparando-os de per si e com os demaisparticipantes. A figura 1 mostra o índice dedesempenho dos participantes em cada ses-são de aprendizagem

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Através do quadro da figura 1 po-de-se observar a média de desempenhodos participantes em cada sessão de apren-dizagem, constatando-se a evolução naaquisição da estruturação sintática já àpartir das primeiras sessões do procedi-mento.

Quanto à avaliação final, a qual obje-tivou verificar a aquisição da construção sin-tática por parte dos alunos, esta demonstroua eficácia do procedimento de ensino, poiso índice de desempenho dos participantesficou na média de 80% a 90%, como podeser observado no gráfico da figura2.

Ao observar o gráfico da figura 2,constata-se que todos os participantes tive-ram um bom desempenho, uma vez que aavaliação final não utilizou o recurso visualdo organograma e o recurso da LIBRAS.

Quanto à avaliação de generaliza-ção, feita seis meses após o término da in-tervenção, esta mostrou que a diminuiçãodos índices de desempenho nesta sessão

se deu a problemas de contextualização ecom o léxico gráfico, uma vez que as gra-vuras e as palavras-chaves apresentadas,não foram as mesmas do programa deensino. Entretanto, com exceção de P2, osdemais participantes apresentaram índicesde desempenho melhores em relação aosobtidos na avaliação inicial, como pode-seobservar na figura 3.

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O gráfico da figura 4, mostra os índi-ces de desempenho dos participantes quan-to às avaliações inicial, final e de generali-

zação, permitindo a comparação de per sie com os demais participantes.

É possível observar no gráfico da fi-gura 4 que os participantes fizeram aquisi-ções em todo o procedimento de ensino.Os índices obtidos com a sessão de genera-lização reiteraram a eficácia do procedimen-to, uma vez que, com exceção de P2, osdemais participantes obtiveram índices aci-ma dos encontrados na avaliação inicial,mesmo sem terem tido contato com o pro-cedimento por um período de seis meses.

A aplicação do procedimento de en-sino e a análise do mesmo propiciou refle-tir sobre as questões que envolvem a cons-trução de frases do aluno surdo, questõesestas que vão desde o domínio do léxicográfico até a complexidade da estruturaçãogramatical e a eficiência dos recursos utili-zados para isto.

Observando-se os dados de desem-

penho dos participantes na programaçãode ensino pôde-se constatar que os mes-mos apresentaram dificuldades em comumna execução das tarefas em cada sessãode aprendizagem. Levando-se em conta osaspectos da caracterização dos participan-tes como sexo, grau de perda auditiva, usodo AASI, estes dados não interferiram nosresultados. Já o aspecto da etiologia dasurdez poderia ter contribuído para os re-sultados obtidos, pois não se pode preci-sar, por exemplo, se houve perdas quantoao aspecto da memória auditiva. P2 e P3são portadores de surdez adquirida, ou seja,tiveram acesso, nos primeiros anos de vida(0 a 2 anos), à linguagem oral, sem fazeruso da mesma. Os participantes P1, P4 eP5 são portadores de surdez congênita.Porém, afirmar que este dado tenha con-

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tribuído ou não para o desempenho dosparticipantes na programação de ensinonão foi possível, uma vez que P3 obteve omelhor desempenho em todo o procedi-mento e P2 o pior desempenho. Aspectosque podem ter contribuído para os resulta-dos foram a idade cronológica dos partici-pantes, a seriação escolar e o nível educa-cional em que se encontravam. P3 em rela-ção aos demais participantes apresentouidade superior à faixa etária adequada àsérie em que cursava no ensino regular (dezanos e oito meses na 3ª série), apresentan-do, portanto, maior maturidade. P1 e P3estavam num nível educacional superior(silábico alfabético), o que também propor-cionou-lhes uma melhor compreensão so-bre o procedimento.

Considerando-se os recursos aéreose visuais, a utilização da LIBRAS na progra-mação de ensino mostrou-se eficaz no au-xílio à contextualização das gravuras, o quevem confirmar o estudo de Pinheiro (1994),quando diz que o uso de sinais dactiloló-gicos e gestos favorece a aquisição lingüís-tica do sujeito, facilitando a aquisição daestruturação da linguagem escrita.

Quanto ao recurso visual do orga-nograma pôde-se constatar que ao térmi-no da aplicação do programa de ensino,todos os participantes dominavam a cons-trução sintática, realizando–a na seqüên-cia correta (ASVC). A eficácia do recurso vi-sual no procedimento de ensino reitera es-tudos como de Fitzgerald (1966), o qual,ressalta a importância do recurso visualpara a estruturação gramatical pelo alunosurdo. A referida autora apontou a necessi-dade do recurso visual como apoio para a

estruturação da sentença, uma vez que estealuno é incapaz de perceber seus erros deconstrução. Quando o aluno não podeperceber estes detalhes através da lingua-gem oral é preciso apresentar a ele um su-porte, no caso, o recurso visual.

O organograma aliado à LIBRAS, de-monstrou também ser eficaz para a cons-trução sintática do aluno surdo, o qual pôdeassociar as palavras escritas aos seus res-pectivos elementos gramaticais, assimilan-do sua função gramatical. Portanto, o orga-nograma não visa apenas construir frases,mas objetiva construir frases, nas quais, aspalavras são associadas a sua função sin-tática, como defende Montessori (1926,p.226), quando diz que “cada parte do dis-curso na frase tem uma função específicaa realizar”.

Outros estudiosos como Perdoncinie Yvon (1963) e Delgado (1970, citado emPerelló, 1972), apontam para a necessida-de do recurso visual suportivo à aquisiçãoda estruturação gramatical, confirmandoassim o que este procedimento de ensinopôde observar em seus resultados.

Parece que a contextualização, atra-vés das gravuras, como apoio visual, noprocesso da construção gramatical, atuoucomo agente facilitador no aspecto da com-preensão do programa de ensino, mostran-do-se também eficaz.

O recurso visual para a construçãosintática do aluno surdo se configura emum instrumento que viabiliza aspectos im-portantes desta estruturação complexa, fa-zendo com que este aluno memorize-os efixe-os, como mostra os estudos deMontessori (1926) e Fitzgerald (1966).

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No que diz respeito aos aspectos daconstrução da sintaxe pelo aluno surdo, osresultados mostraram que as dificuldadescom o léxico gráfico e as regras gramaticaisforam evidenciados pôr todos os participan-tes na programação de ensino. Os partici-pantes desconheciam a grafia das palavras-chaves e o uso da dactilologia não garantiua fixação dos mesmos. A falta de conheci-mento do léxico gráfico levou o aluno surdoa não identificar a palavra-chave correspon-dente ao elemento gramatical da frase,quando o recurso visual das fichas conten-do a grafia dos mesmos foi retirado.Padovani (1997), constatou dificuldadessemelhantes quando analisou redações dealunos surdos, no qual, o resultado encon-trado com o uso das estruturas lingüísticascomo dificuldade com o léxico foram “naseleção dos elementos gramaticais, na or-denação dos elementos gramaticais selecio-nados para a construção frasal, com a con-cordância verbal e com a omissão de ver-bos” (p. 89). Quanto às regras gramaticaisobservou-se que esta não é adquirida me-canicamente, pois nenhum dos alunos do-minavam estes aspectos, apesar da sérieque freqüentavam no ensino regular.

O aluno surdo não fazendo uso dalinguagem oral apresenta dificuldades aoconstruir suas frases, que geralmente sãofeitas de forma inadequada, ou seja, utili-zando elementos gramaticais errôneos oumesmo omitindo-os, como foi evidenciadopor Padovani (1997), Silva (1998) ePetrechen (2001).

Para Batista (2002), procedimentoscom crianças bilingües deveriam utilizar al-ternativas que estimulassem a aquisição

do processamento lexical.Na maioria das vezes, o aluno surdo

enfrenta dificuldades com os enunciadosdas atividades a serem realizadas, isto por-que não domina e não tem compreensãosobre os léxicos que compõem estas sen-tenças. Para compreender-se melhor estasituação enfrentada por este aluno, é sóimaginar-se tentando ler um texto em umalíngua estrangeira que não se domina to-talmente. Os léxicos, aos quais não se do-mina fazem falta na interpretação destetexto, contribuindo para a incompreensãoda mensagem.

Porém, para o aluno surdo a ques-tão da construção sintática é bem maiscomplexa como nos mostra Costa (2001)e Brazorotto (2002). Para estas autoras éevidente a dificuldade encontrada por estealuno para dominar a escrita da línguamajoritária.

Ao analisar o estudo como um todo,foi possível verificar que na etapa da avali-ação inicial os alunos apresentaram as con-dições adequadas para a intervenção, poisnão dominavam a construção sintática.Quanto a aplicação do programa de ensi-no pôde-se observar o desenvolvimentogradual dos participantes que ao términodo mesmo dominavam o procedimento sa-tisfatoriamente. Já na sessão de avaliaçãofinal, foram ressaltadas as dificuldades en-contradas pelos alunos para a execuçãodas tarefas, sendo dificuldades estas con-firmadas na sessão de generalização.

Ao analisar o estudo como um todo,foi possível verificar que na etapa da avali-ação inicial os alunos apresentaram as con-dições adequadas para a intervenção, pois

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244 E.A.M. de AGOSTINO E M.P.R. da COSTA. O ensino da estruturação sintática para o...

não dominavam a construção sintática.Quanto a aplicação do programa de ensi-no pôde-se observar o desenvolvimentogradual dos participantes que ao términodo mesmo dominavam o procedimento sa-tisfatoriamente. Já na sessão de avaliaçãofinal, foram ressaltadas as dificuldades en-contradas pelos alunos para a execução

das tarefas, sendo dificuldades estas con-firmadas na sessão de generalização.

Concluíndo, a análise qualitativa equantitativa permitiu constatar que o pro-cedimento de ensino aplicado neste estu-do foi eficaz, demonstrando ao final domesmo o domínio da construção sintáticapelos participantes.

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Recebido em 15 de julho de 2004.Recebido em 15 de julho de 2004.Recebido em 15 de julho de 2004.Recebido em 15 de julho de 2004.Recebido em 15 de julho de 2004.Aprovado para publicação em 28 de agosto de 2004.Aprovado para publicação em 28 de agosto de 2004.Aprovado para publicação em 28 de agosto de 2004.Aprovado para publicação em 28 de agosto de 2004.Aprovado para publicação em 28 de agosto de 2004.

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A valorização dos A valorização dos A valorização dos A valorização dos A valorização dos Caçadores Caçadores Caçadores Caçadores Caçadores diante dos diante dos diante dos diante dos diante dos SenhoresSenhoresSenhoresSenhoresSenhores.....

Tributo a teoria e método de Edward PalmerTributo a teoria e método de Edward PalmerTributo a teoria e método de Edward PalmerTributo a teoria e método de Edward PalmerTributo a teoria e método de Edward PalmerThompsonThompsonThompsonThompsonThompson

Nilson Thomé

Doutorando em educação pela UNICAMP. Professor daUniversidade do Contestado/SC.e-mail: [email protected]

ResumoResumoResumoResumoResumoEste artigo refere-se a obra “Senhores e Caçadores”, de Edward Thompson (1924-1993). Contempla a nossaadmiração pessoal por este intelectual inglês que entendeu ser possível produzir trabalhos em História“nos silêncios de Marx”. Nos seus escritos, inovou ao esboçar uma teoria para o estudo da cultura popular.Aqui, encontramos mais uma amostra da nascente da nova História Cultural, ou História Social da Cultura(numa vertente neomarxista), com a valorização da cultura popular nos estudos históricos forjados “a partirde baixo”. O estilo de Thompson abre novos caminhos também para trabalhos em História da Educação.

Palavras-ChavesPalavras-ChavesPalavras-ChavesPalavras-ChavesPalavras-ChavesHistoriografia. História Cultural. Edward Palmer Thompson.

AbstractAbstractAbstractAbstractAbstractThis article refers to the work “Senhores e Caçadores” (Lords and Hunters) by Edward Thompson (1924-1993). It contemplates our personal admiration for this English intellectual who understood it to be possibleto produce works on History “in the silences of Marx”. In his writings, he innovated when sketching a theoryfor the study of popular culture. Here, we find one more sample of the birth of the new Cultural History, orSocial History of Culture (in a neomarxist source), with the valorization of popular culture in historicalstudies wrought “from the bottom up”. The style of Thompson also opens up new ways for studies in theHistory of Education.

Key wordsKey wordsKey wordsKey wordsKey wordsHistoriography. Cultural History. Thompson, Edward Palmer.

Série-Estudos - Periódico do Mestrado em Educação da UCDB.Série-Estudos - Periódico do Mestrado em Educação da UCDB.Série-Estudos - Periódico do Mestrado em Educação da UCDB.Série-Estudos - Periódico do Mestrado em Educação da UCDB.Série-Estudos - Periódico do Mestrado em Educação da UCDB.Campo Grande-MS, n. 18, p. 247-263, jul./dez. 2004.

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248 Nilson THOMÉ. A valorização dos Caçadores diante dos Senhores. Tributo a teoria...

IntroduçãoIntroduçãoIntroduçãoIntroduçãoIntrodução

Estamos diante do livro “Senhores eCaçadores. A Origem da Lei Negra” 2. Nestetrabalho, mais um clássico da historiografia,Edward Palmer Thompson reconstrói a lutaentre os agricultores simples e a burocraciada floresta na Inglaterra, com a vigênciada “Lei Negra” em 1723 (só anulada em1823, cem anos depois), que permite a apli-cação da pena capital a cidadãos em maisde cinqüenta diferentes tipos de crimes ede penas diversas a quase 250 diferentesdelitos. Como ele diz, uma “lei má, formula-da por maus legisladores e ampliada pe-las interpretações de maus juízes” (p. 359).A partir deste enfoque, reexamina a socie-dade inglesa do Século XVIII, descrevendoa violência e a corrupção ali dominante3.No segundo momento do livro, ao tratarda corrupção política e do descontentamen-to popular na Inglaterra naquele tempo, faza sua interpretação do direito, rejeitando anoção da lei como simples máscara para adominação de uma classe.

Thompson analisa a estratégia de resis-tência de caçadores, predadores e de ou-tros homens e mulheres que viviam dacoleta e da caça nas florestas e parquesda nobreza. Com os Black Acts, de 1723,haviam sido definidos e criminalizadosdezenas de atos, para os quais previa-sea pena capital. Estas pessoas mascaradas(usavam carvão para esconder o rosto, daía origem do Black) pilhavam os parques.Se suas armas fossem apreendidas, elesvoltavam à noite para toma-las, ameaçandoos guardas florestais ou os subornando.Thompson resgata, daí, a humilhação pú-blica à qual as autoridades eram subme-tidas, pois se não conseguiam protegersuas propriedades, como governariam o

Estado? Tal prática não era um simplesroubo, pois fundava-se em um direitoanterior e era partilhada e justificada co-letivamente e, ao mesmo tempo, desmo-ralizava as autoridades. De fato, uma prá-tica estava sendo criminalizada. Além domais, tais práticas eram produtos do con-flito entre formas de propriedade, noçõesde direito ao uso da terra e seus produtos,gerados pela imposição de uma nova or-dem (MUNHOZ, Internet, 1997).

Segundo Thompson, este seu traba-lho “não se limita a recuperar um episódioque se perdera para o conhecimento histó-rico. Também recupera um episódio que nãofoi do conhecimento de seus contemporâ-neos” (p. 17). Aqui, mais uma vez, ele traba-lha na interconexão de uma História Socialcom uma História Cultural. Para EricHobsbawm4, Thompson está entre os maissignificativos autores de história social deque se tem notícia. E para produzir estecurto trabalho, recorremos às obras de vá-rios outros intelectuais5 e historiadores que,assim, entrando no texto, participam danossa tentativa de interpretar “Senhores eCaçadores”.

Thompson nas Vertentes daThompson nas Vertentes daThompson nas Vertentes daThompson nas Vertentes daThompson nas Vertentes daHistóriaHistóriaHistóriaHistóriaHistória

Ao produzirmos História, entende-mos ter liberdade para usar diferentesreferenciais teóricos ou nos valer de dife-rentes metodologias, de acordo com asnecessidades das diferentes pesquisas. EmIntrodução à Pesquisa em Ciências Sociais;a Pesquisa Qualitativa em Educação,Augusto Nibaldo Silva Triviños lembra PedroDemo ao expor que o pesquisador

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tem ampla liberdade teórico-metodológicapara realizar seu estudo. Os limites desua iniciativa particular estarão exclusiva-mente fixados pelas condições de exigên-cia de um trabalho científico. Este, repeti-mos, deve ter uma estrutura coerente,consistente, originalidade e nível deobjetivação capazes de merecer a aprova-ção dos cientistas num processointersubjetivo de apreciação (TRIVIÑOS,1987, p. 133).

A fim de melhor compreender a po-sição de teórica de Thompson, então,voltemo-nos à lembrança das matrizes daciência da História, que são diferentes en-tre si por conterem, entre outras característi-cas, de modo geral6, estas:- No Positivismo- No Positivismo- No Positivismo- No Positivismo- No Positivismo: a valorização do factual

documentado, a cronologia linear do tem-po histórico, o ordenamento de início-meio-fim, a relevância a personagens ofi-ciais, o uso excessivo da heurística e dacrítica nos documentos e, o destaquepara aspectos político-administrativos;

- No Marxismo- No Marxismo- No Marxismo- No Marxismo- No Marxismo: a aplicação de métodocientífico, o uso da lógica, a busca da iden-tidade coletiva, a interdisciplinaridade, ochamamento às contradições peladialética, o suporte e embasamento teó-rico, a valorização do movimento, a posi-ção do historiador como agente ativo e,o destaque para o aspecto econômico;

- Na Escola dos Annales (École desNa Escola dos Annales (École desNa Escola dos Annales (École desNa Escola dos Annales (École desNa Escola dos Annales (École desAnnales):Annales):Annales):Annales):Annales): o advento da Micro-História,os novos objetos de investigação, a va-lorização da história oral, a inserção dohistoriador no fluxo dos acontecimentos,o chamamento ao inusitado, o estudodas mentalidades coletivas, osquestionamentos sobre o passado a partir

do presente e a constante problemati-zação. Surge a História das Mentalidades;

- Na Nova História:Na Nova História:Na Nova História:Na Nova História:Na Nova História: o respeito à narrativaliterária, a eleição do cotidiano como obje-to, a incorporação de outras abordagens,a problematização de documentos, o cha-mamento a sujeitos e a espaços excluí-dos, a interdisciplinaridade, a crítica con-testatória e o destaque para o aspectosocial. A New History, norte-americana,criada por Robinson na década de 1920,contemporânea à Escola dos Annales, veioa dominar a História Intelectual, sofrendoa concorrência da História das Idéias.

Se observarmos a pluralidade daNova História, nela encontraremos a His-His-His-His-His-tória Cultural tória Cultural tória Cultural tória Cultural tória Cultural que, para uns, trata-se umanova vertente, nova corrente, novo campoou novo setor, enquanto que, para outros,seria uma variação dos Annales ou da NewHistory. De qualquer forma, ela surge timi-damente e vem se destacando a partir dostrabalhos de Carlo Ginzburg, Roger Chartiere Edward Thompson, sendo caracterizadapela preocupação com as questões popu-lares, valorização das estratificações e dosconflitos sócio-culturais e, pela recusa doconceito vago de mentalidades.

No seio do materialismo histórico, a preo-cupação com a História Social da Culturatem tido muitos desdobramentos. A Esco-la Inglesa do Marxismo – com autorescomo Thompson, Eric Hobsbawam eCristopher Hill – especializou-se por exem-plo em uma tríplice articulação entre aHistória Cultural, a História Social e a His-tória Política. Seus trabalhos remontam àdécada de 1960. A renovação dos estudosculturais trazida pela escola Inglesa temsido fundamental para repensar o Mate-rialismo Histórico – particularmente para

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flexibilizar o já desgastado esquema deuma sociedade que seria vista a partir deuma cisão entre infra-estrutura e super-estrutura. Com os marxistas da escola In-glesa, o mundo da Cultura passa a serexaminado como parte do “modo de pro-dução”, e não como um mero reflexo dainfra-estrutura econômica de uma socie-dade (BARROS, 2004, p. 62).

Para Fontana7 no repensar do ma-terialismo histórico “sobreviveu à crise osetor mais vivo do chamado ‘marxismoocidental’, o que tinha como modelos ho-mens do porte de Eric Hobsbawm, CristipherHill ou E. P. Thompson, enquanto algunsdos seus cultivadores experimentaram ca-minhos novos, sem abdicar dos seus prin-cípios progressistas” Fontana citaHimmefarb8, segundo a qual “estes marxis-tas, embora tivessem deixado na sua mai-or parte o Partido Comunista depois de1956, não haviam participado de atos dearrependimento como muitos dos seus co-legas franceses, o que fazia com que conti-nuassem sob suspeita”.

Fundador do valor da história “a par-tir de baixo”, usando a literatura como fon-te para a história social e econômica,Edward Thompson foi9 e ainda é o histori-ador contemporâneo britânico mais conhe-cido fora da Inglaterra. Christopher Hill en-tende que sua influência mundial sobre osestudantes de História tem sido incalculá-vel10. Na obra aqui enfocada, Thompsonrepete o procedimento metodológico, usa-do em outros trabalhos, de olhar de baixopara cima, como ele mesmo escreve: “...par-ti da experiência de humildes moradoresdas florestas...” (p. 17).

Vale destacar que as diversas corren-

tes e tendências marxistas influíram bas-tante sobre os rumos da História. Antes daPrimeira Guerra Mundial (1914-1918), tive-mos o predomínio do critério gerencial naliteratura, com a primeira geração de mar-xistas, como Plekhanov, Kautski, Meheringe Labriola. Depois, tivemos a segunda ge-ração de marxistas, como Hilferding, Trotski,Lênin, Bukharin, Bauer e Rosa deLuxemburgo, corrente esta que tentou de-cifrar as leis fundamentais do capitalismoem seu estágio imperialista e produzir umateoria política marxista.

Após 1918, assistimos a diferencia-ção entre o marxismo soviético e o marxis-mo do ocidente, num processo de lentamaturação do marxismo ocidental, quepassou a ser percebido só depois de 1945,ou seja, em seguida a Segunda GuerraMundial. Destacam-se os clássicos deLukács e Gramsci, “em rota de colisão como dogmatismo e empobrecimento teóricodo marxismo típicos da Terceira Internacio-nal”11, e a teoria crítica da Escola de Frank-furt, com Theodor Adorno, Max Horkheimer,Herbert Marcuse, Erich Fromm, Borkenau,Neuman, Walter Benjamin e JürgenHabermas, com produções que incidemsobre as perspectivas de uma nova Histó-ria Cultural. Justamente Georg Lukács(1885-1971) e Antonio Gramsci (1891-1937), foram os teóricos que abriram trilhasna historiografia para uma História Cultu-ral alicerçada nos fundamentos do materi-alismo histórico, caminho palmilhado porThompson. Pertencente à linhagem da His-tória Social Inglesa, Edward Thompson, “émobilizado para alicerçar teoricamente asoperações investigativas ao lado do filóso-

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fo alemão Walter Benjamin e do cientistasocial inglês Raymond Williams”12.

Marc Bloch e Georges Lefebvre de-monstraram as possibilidades de umahistoria intelectual comprometida com aanálise, ora dos grandes movimentos cole-tivos, ora das psicologias individuais. A elesseguiu-se a estrela de Fernand Braudel. Amaioria dos “annalistas” – integrantes daEscola (revista) de Annales, da França – nãoera simpática à História das Idéias. Nestemovimento, tomou força a História dasMentalidades. Havia neles a descrençaquanto a validade da aplicação do méto-do quantitativo à história intelectual.

A partir dos anos 70, dá-se uma inflexãocom a adoção de pressupostos estrutura-listas oriundos da filosofia, da lingüísticae da etnologia que desembocará naautodenominada “Nova História”, a qualse converteu no pivô do atual debate teó-rico e metodológico no campo da Históriaao se contrapor à historiografia que vi-nha sendo praticada, seja na perspectivatradicional à qual se atribuía a influênciapositivista, seja na perspectiva crítica deorientação marxista ou tributária da Esco-la dos Annales das fases lideradas porLucien Febvre e Marc Bloch e, depois, porFernand Braudel (SAVIANI, 1998, p. 11).

Falcon13 alerta para o considerávelnúmero de referências que marcam o perí-odo de 1960/70 a 1990/95, de consolida-ção da História das Idéias, em função denovas tendências então presentes nahistoriografia ocidental. Surgiu a NewIntellectual History nos EUA e na Grã-Bretanha, a História Social das Idéias ouHistória Sócio-cultural na França e nos EUA,a História das Mentalidades na França, bemcomo a proposta de Chartier, de uma His-

tória Cultural, propostas estas confrontadascom os novos pensamentos dos pós-mo-dernos.

A História Social surgiu como oposição àhistória tradicional – essencialmente po-lítica, episódica, linear e evolucionista -,buscando desenvolver seus próprios ca-minhos metodológicos, configurando cadavez mais as abordagens socioculturais, so-bretudo por meio de sua aproximação coma Antropologia. Dessa “matriz” foi se deli-neando a História das Mentalidades, vistapela maior parte dos historiadores comoo movimento impulsionador da HistóriaCultural, tal como a conhecemos atual-mente (FONSECA, 2003, p. 51).

Em decorrência da tradição de seguirmodelos de sociedades consideradas maisevoluídas, assim, a História Cultural chegouao Brasil.

Reconhecer o alto nível da pesquisa emhistória cultural atualmente feita no Bra-sil não significa eximi-la de críticas. É pos-sível constatar, em vários trabalhos, umcerto ecletismo teórico que vimos ser típi-co (...). Misturas de Ginzburg com Foucault,deste último com Thompson, nada dissoé estranho a vários trabalhos realizadosna pesquisa universitária brasileira. (...).Nada disso desmerece, porém, a vitalida-de desse campo de estudos, tal como temsido realizado no Brasil. (...). Sem prejuízode outros campos de investigação históri-ca, vários deles também muito atualizadosquanto aos métodos e referências teóri-cas, a história cultural veio para ficar(VAINFAS, 1997, p. 162).

Em novembro de 2000, no pronun-ciamento intitulado de “O Cultivo de umaHistoriografia Engajada com a História e aMemória da Educação Brasileira”, a ProfªMarta Maria de Araújo, da UFRN, falou aodo II Congresso Brasileiro de História da

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Educação, promovido pela Associação Bra-sileira de História da Educação, aprecian-do a produção histórica da Educação apartir do conjunto dos resumos dos traba-lhos apresentados no evento. Lembrou que

há de se reconhecer que a hegemoniada historiografia francesa, especialmenteas contribuições de Roger Chartier, aindaprevalecem nos estudos da história daeducação no Brasil. De toda maneira,como bem sabem os historiadores, o gran-de êxito da historiografia francesa dosAnnales advém de sua abertura para odiálogo com as ciências sociais, sem perdero contato com o conhecimento histórico.

Não obstante, os resumos do II CBHE for-necem indícios suficientes do desponta-mento do interesse dos historiadores daeducação pela historiografia inglesa, es-pecialmente pelo pensamento de EdwardThompson, por oferecer noções e premis-sas capazes de alicerçar interpretaçõessobre movimentos sociais de resistências,comportamentos e hábitos comunitários,histórias de vida e experiências de insti-tuições e de seus agentes sociais na or-ganização da cultura. Geralmente, EdwardThompson costuma ser apresentado comopertencendo a uma linhagem dahistoriografia inglesa que combina a his-tória social britânica (empirista) e maxismo(Vainfas, 1997).

Considerando o II CBHE como uma amos-tra do que está sendo produzido no cam-po da história da educação no Brasil, cabeafirmar que a atividade historiadora daeducação brasileira continua demonstran-do uma vitalidade extraordinária para ins-pirar pesquisa de objetos, temas e domí-nios de conhecimentos afinados comreferenciais da história cultural e com oprocedimento interdisciplinar (ARAÚJO,2002).

Nos silêncios de MarxNos silêncios de MarxNos silêncios de MarxNos silêncios de MarxNos silêncios de Marx

Militante comunista, intelectual eativista pelo desarmamento nuclear, EdwardThompson é considerado “pai da versãomarxista da história cultural”, ele que, naInglaterra, esboçou uma teoria para o es-tudo da cultura popular nos moldes mar-xistas. Sobre este “marxista tradicional”,como ele se considerava, ou “neo-marxis-ta”, como alguns críticos das suas obrasrotulam-no ainda hoje, Pesavento diz que

centralizando a crítica tanto no que consi-derava uma postura positivista de análisedo marxismo, denunciando o viés econo-micista e mecanicista da análise, quantono que chamou de idealismo althusseri-ano, em que a teoria desconsiderava ouprescindia da realidade empírica, EdwardThompson introduziu inovações nos planosda teoria, do método, da temática e dasfontes a serem utilizados pela história. Mes-mo mantendo uma análise classista, comoseria de esperar dentro do marxismo,Thompson abandonou a clássica definiçãomarxista-leninista, que identificava a classepela posição ocupada junto aos meios deprodução. Alargou o conceito, entendendoque a categoria deveria ser apreciada noseu fazer, no acontecer histórico, na suaexperiência como classe. Cabia ao historia-dor surpreender os nexos entre pequenasalterações de hábitos, atitudes, palavras,ações, de atitudes que iam mudando aolongo do tempo. (...). O historiador passavaa explorar, assim, os chamados silênciosde Marx, nos domínios do político, dos ritos,das crenças, dos hábitos. (PESAVENTO,2003, p. 28-29).

No dizer de Pedro Benítez Martín,Thompson seguiu a Marx em sua concep-ção materialista da História, “pero eliminóalgunos de los presupuestos ilustrados

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Série-Estudos... Campo Grande-MS, n. 18, p. 247-263, jul./dez. 2004. 253

propios de la modernidad que Marx habíaheredado elevándolos a la más altadignidad (moderna). Thompson no com-partía las ambiciones cientificistas propiasdel siglo XIX que sudejeron a Marx; por estecamino desarrolló alguns de su mejores crí-ticas al marxismo” (1995, p. 11). Este críticoespanhol diz ainda:

Thompson puede ser considerado em ciertosentido como um excelente seguidor dela teoria leninista de “torcer el bastón emsentido contrario”, que supo adaptarseperfectamente a la coyuntura específicaen la que escribó, sufriendo de esse modosus consecuencias. Por um lado, su excesode celo há deslizado em ocasionespeligrosamente su obra hacia el terrenodel empirismo, el indeterminismo y aunel culturalismo. Pero además Thompsonha sucumbido con cierta frecuencia anteel mismo sectarismo doctrinal que éldenunciaba, y en su obra son demonizadosotros discursos radicales y revolucionarioscon los que se debería haber dialogado(p. 12-13).

Nas atividades acadêmicas, mostra-mos que tem a História a função de, tam-bém, fornecer cientificamente à sociedadea explicação da sua origem e do seu de-senvolvimento marcado por transforma-ções. Também para isso, a História relacio-na-se com as mais diversas disciplinas eciências que também estudam o homem,como: Antropologia, Sociologia, Geografia,Economia, Filosofia e Etnologia, ou mesmocom sub-campos de outras áreas, em es-pecial: Arqueologia, Lingüística, Demografia,Genealogia, Heráldica, Numismática,Paleontologia, Diplomacia, Paleografia, en-tre outras. É o que fazem os historiadoresseguidores da nova História Cultural. Num

dos capítulos do livro Sobre História, aoquestionar se a História progrediu, EricHobsbawm menciona que:

Em essência, o que assistimos durante oséculo XX é justamente o que os histori-adores ortodoxos da década de 1890 re-jeitavam por completo: uma aproximaçãoentre a história e as ciências sociais. Éclaro que a história não pode ser maisque parcialmente subordinada sob o títu-lo de uma ou talvez outra ciência social.Não que isso impeça alguns historiado-res de se concentrarem em problemas quepoderiam ser e também são abordadospor, digamos, demógrafos ou economis-tas de orientação historicista. De qualquermodo, não impede. Claro que a aproxima-ção não se dá apenas por um dos lados.Se os historiadores progressivamente re-correram a várias ciências sociais em bus-ca de métodos e modelos explicativos, asciências sociais progressivamente tentaramse historicizar e com isso recorreram aoshistoriadores (HOBSBAWM, 2002, p. 75).

Na introdução de “Senhores e Caça-dores”, Thompson mostra a preocupaçãopelo inicial questionamento, explicando que“Coloquei-me a tarefa de abordar por meiode fontes muitas vezes impróprias, as se-guintes questões; ...”(p. 25) e enumera-as. EmOs Annales: a Renovação Teórico-Metodológica e “Utópica” da História pelaReconstrução do Tempo Histórico (1998), aoabordar as inovações trazidas à Históriapela Escola dos “Annales”, como a valori-zação do problema, o historiador mineiroJosé Carlos Reis destacou que a granderenovação teórica propiciada pela recons-trução do tempo histórico pelos “Annales”foi a história-problema. Entende que elaveio-se opor ao caráter narrativo da histó-ria tradicional. Ela veio reconhecer a impossi-

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bilidade de se narrar os fatos tal como sepassaram. Reis reconhece que não há his-tória sem teoria. A pesquisa histórica é averificação de respostas-hipóteses possíveisa problemas postos no início. Nela, o histo-riador sabe que escolhe seus objetos nopassado e interroga-os a partir do presente.Para ele,

o historiador escolhe, seleciona, interro-ga, conceitua, analisa, sintetiza, conclui. Apartir da posição do problema, o historia-dor distribui suas fontes, atribui-lhes osentido e organiza as séries de dados queele terá construído. O texto histórico é oresultado de uma explícita e total cons-trução teórica e não o resultado de umanarração objetivista [...]. A organização dapesquisa é feita pelo problema que a sus-citou; este vai guiar na seleção dos docu-mentos, na seleção e construção das séri-es de eventos relevantes para a constru-ção das hipóteses.

Rompendo com a narração, a história tor-nou-se uma empresa teórica, que segueo caminho de toda ciência: põe proble-mas e levanta hipóteses e demonstra-ascom uma documentação bem criticada ecom uma argumentação conceitual rigo-rosa (REIS, 1998, p. 39).

Neste sentido, é apreciável a técnicaempregada pelo historiador EdwardThompson, ao retratar os movimentos so-ciais e o cotidiano das classes popularesinglesas do Século XVII em meio ao pro-cesso de industrialização14.

Como marxista, no método empre-gado na construção desta história, ele man-tém o eixo econômico, mas não se atémapenas ao econômico, extravasa-o aoadentrar no eixo cultural, navegando so-bre usos e costumes “naquela ilha e na-

quele tempo” (expressão dele, original, àpágina 355), valorizando tradições popu-lares, alcançando atuais interpretações so-bre direito e lei pesquisados. Não integra o“clube do uso do nós”, muito comum; usa aprimeira pessoa do singular: “Eu acho, eupenso, eu entendo que..”. Não se limita aexplicações em notas-de-rodapé, indo dire-to aos assuntos secundários ou comple-mentares no corpo do texto, interagindo nasimbiose entre a História e o leitor destaHistória produzida. Narra, analisa, comen-ta e critica o conteúdo das fontes.

A história conduzida por problemas e hi-póteses, por construções bem elaboradase explícitas, representou a mais profundarenovação teórica da história. O historia-dor mudou de posição e de disposição: seantes ele era proibido, em tese, de apare-cer na pesquisa, o que é uma interdiçãoimpossível de ser cumprida, agora, ele éobrigado a “aparecer” e a explicitar a suaestrutura teórica, documental e técnica eo seu lugar social e institucional (REIS,op. cit.).

O historiador faz parte da História queele constrói. Depois de abordar o assuntoO exercício da lei, como que conversandocom o leitor, Thompson pede licença paraentrar no título O domínio da lei, justifican-do “...como os leitores deste estudo podemse sentir incitados a algumas reflexões ge-rais sobre o direito e as tradições britânicas,talvez possamos nos permitir a mesma in-dulgência” (p. 548). Num outro ponto, ex-plicando-se ao leitor, ele expõe: “Nessemomento, entramos numa história quepode ser para sempre inescrutável, devidoaos motivos torpes dos atores principais eà opacidade das fontes, e principalmente

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de uma imprensa fortemente censurada.Contudo, o episódio ilustra claramente asoperações da influência e dependêncianuma sociedade paternalista integrada...” (p.225).

Depois de cinco anos de pesquisa,Thompson concluiu o texto de “Senhores eCaçadores” 15 em abril de 1975. Em ne-nhum momento ele nega pertencer à tradi-ção marxista, a ela referindo-se por diver-sas vezes, como aqui:

Ela (a lei) floresce na forma de um mar-xismo sofisticado, mas (em última instân-cia) altamente esquemático, que, paranossa surpresa, parece brotar das pega-das daqueles que, entre nós, pertencema uma tradição marxista mais antiga. Desseponto de vista, a lei é por definição, e tal-vez de modo mais claro do que qualqueroutro artefato cultural ou institucional, umaparcela de uma “superestrutura” que seadapta por si às necessidades de umainfra-estrutura de forças produtivas e re-lações de produção (p. 349).

José Honório Rodrigues escreveu16

que a História precisa olhar a floresta e nãoapenas as árvores, oferecendo uma inter-pretação generalizadora que ajude os vi-vos a compreender as raízes do presente. Enesta sua obra, Thompson diz que “...tivede começar pelo começo e reconstruir aadministração da floresta em 1723. (...) As-sim, mais uma vez, foi preciso reconstruir ocontexto episcopal antes de se poder veros Negros dentro dele” (p. 16). Este olharpara o todo da floresta e não apenas paraas partes que a compõem, expressão tan-to de Rodrigues como de Thompson, vemde encontro ao pensamento marxista, queindica a compreensão do singular a partir

da apreensão do universal. Busca-se a to-talidade e se enfoca a universalidade dotema, disposto no campo maior, para al-cançar a particularidade e analisar sua sin-gularidade no campo restrito. SegundoCarlos Jamil Cury, “a categoria da totalida-de justifica-se enquanto o homem não bus-ca apenas uma compreensão particular doreal, mas pretende uma visão que seja ca-paz de conectar dialeticamente um proces-so particular com outros processos e, en-fim, coordená-lo com uma sínteseexplicativa mais ampla” (Cury, 2000, p. 27).

Uma História deve ser total, da sociedadetotal, sob pena de não ser compreendidae se limitar a uma simples enumeraçãode fatos, números ou leis. A História, paraser total, deve não apenas enunciar fatose acontecimentos, mas buscar as relaçõesentre eles, desde as transformações eco-nômicas às manifestações literárias, jurí-dicas ou mesmo artísticas. A História deum povo constitui um todo indivisível, sobpena de se transformar em mera divaga-ção artística ou literária, sem nenhumacontribuição ao futuro desse povo(BASBAUM, 1957, p. 7).

As particularidades de ThompsonAs particularidades de ThompsonAs particularidades de ThompsonAs particularidades de ThompsonAs particularidades de Thompson

Em “Senhores e Caçadores”, pode-mos apreciar visivelmente a técnica empre-gada por Thompson para produzir sua His-tória. Dentre as muitas anotações que fize-mos para seguir o raciocínio do seu méto-do, destacamos algumas, sobre as quaisdiscorremos.

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Uso de inferências

Na exaustiva pesquisa empreendida,Thompson foi a fundo na busca de fonteshistóricas fidedignas, que ele revela, tantono prefácio, como nas referências. Sobreelas, diz: “Cada fonte me levava a outra;mas também cada problema levou-se aoutro” (p. 16). “O caráter e possíveis limi-tações deste estudo só podem ser enten-didos à luz das fontes utilizadas e dascuriosas ausências nelas encontradas” (p.395).

A análise precedente dependeu em gran-de parte de um tecido complexo de infe-rências17, muitas vezes derivadas de evi-dências fragmentárias. A estrutura da ex-plicação histórica oferecida depende parci-almente da lógica, e apenas parcialmentedos fatos. Algumas identificações podemestar erradas, embora eu duvide muitoque esteja errada a identificação geral dacomposição social e do conflito. Poderiamse fazer mais identificações... (p. 143).

Mesmo assim, nem sempre as fon-tes revelaram tudo o que o historiador bus-cava. “Embora seja bastante, constante-mente as fontes falham no ponto exatoonde esperaríamos que revelassem maisdados sobre...” (p. 395). Daí porque recorreuàs inferências.

Não considero o trabalho de inferência, apartir de fontes que os quantificadoreschamam de literárias, como uma ativida-de historiográfica inferior. (...). ...a ausênciade fontes prontas obrigou-me a procuraradiante evidências próximas, e esse capí-tulo de inferências e conjecturas custou-me mais semanas de pesquisa e maissemanas de trabalho para dispô-las emalguma ordem de qualquer outra partedo livro (p. 144).

Opinião própria

Quando ele coloca que “evitei, até ofinal do livro, qualquer descrição geral des-sa sociedade que pudesse ter vindo a mimatravés das interpretações de outros histo-riadores” (p. 17), deixa claro porque ficouconhecido como polêmico, ao criticar obrasde seus colegas com pontos-de-vista dife-rentes dos seus. Por exemplo, no capítulonono, páginas 248-254, tratando da políti-ca da Lei Negra, Thompson não poupa crí-ticas a Pat Rogers (autor de “The WalthamBlacks and The Black Act”, em 1974) sobrea sua interpretação dos acontecimentos des-te mesmo tema, dizendo estar fugindo doperigo da “contaminação” de juízos de valore interpretações de Rogers sobre os Negros.

Ficou internacionalmente famosa apolêmica de Thompson com Perry Anderson,autor de “Teoría, Política e Historia; un de-bate con Thompson” (Madrid: Siglo XXI,1985), em debate público sobre os mode-los para a construção da história da socie-dade inglesa. Quando Anderson publicou“Origins of the present crises”, na revista“New Left”, Thompson respondeu com “ThePeculiarities of the English”18. Em outromomento da sua vida, delineando duas tra-dições divergentes no marxismo, Thompson(da corrente do materialismo histórico), tam-bém irrompeu contra Althusser (da linhastalinista-estruturalista). Sobre a investidacontra o formalismo teórico de Althusser e,defendendo a narrativa em História, assimDecca menciona Thompson:

Esta formalização do conhecimento histó-rico recebeu uma crítica violenta de umnotável historiador inglês, E. P. Thompson,

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um radical e polemista, muito afeito aosefeitos retóricos da argumentação. E nãopensem que ele perdeu o seu tempo debom polemista com adversários insignifi-cantes. Julgou importante desmontar oedifício formalista de Althusser na análi-se da história, como também julgou deci-sivo abrir polêmica com Ronald Reagan,a respeito do desarmamento nuclear.Thompson, este marxista peculiar, que,segundo o Citation Index, é o historiadormais citado no século XX e está entre os250 autores mais citados em todos os tem-pos, nunca deixou de lado os elementosexpressivos da narrativa histórica, estavaconvencido dos efeitos de verdade sobreos eventos humanos mobilizados pelo usointeligente da linguagem. Sabia muitobem que a linguagem é instituinte e que,portanto, a narrativa histórica não deveriadesprezar esta sua dimensão construtiva.A história, para este historiador, é herdei-ra da narratividade, que, em sua formatextual e letrada, faz submergir aliteralidade e a narratividade das tradiçõesorais... (DECCA, 1998, p. 23-24).

Thompson tanto polemiza como con-corda com outros autores. Aceita uma afir-mativa sobre os negros da floresta, deHobsbawm, por exemplo, quando diz que“Esses negros não são absolutamente ban-didos sociais (na acepção de E. J .Hobsbawm) e tampouco rebeldes rurais,mas apresentam alguns traços de ambosos tipos. São florestanos armados...” (p. 77).

Sobre a lei:

A segunda parte da obra deThompson é um verdadeiro “tratado” sobredireito e lei. A temática, complexa, para sercompreendida, precisa ser lida por inteira,como ele expõe. Excelente texto para inter-pretação por estudantes de Direito. Partes

do texto não explicam o todo. Mesmo as-sim, extraímos que:

A lei é nitidamente um instrumento daclasse dominante de facto: ela define edefende as pretensões desses dominan-tes aos recursos e à força de trabalho –ela diz o que será propriedade e o queserá crime – e opera como mediação dasrelações de classe com um conjunto deregras e sanções adequadas, as quais, emúltima instância, confirmam e consolidamo poder da classe existente. Portanto, odomínio da lei é apenas uma outra más-cara do domínio de uma classe (p. 350).

E mais:Mostrei neste estudo uma oligarquia polí-tica a forjar leis duras e opressivas, paraservir aos seus interesses próprios. Mostreijuízes que, tanto quanto os bispos, esta-vam sujeitos a influência política, cujo sensode justiça era uma farsa e cuja interpretaçãodas leis só servia para ampliar seu viés declasse intrínseco. Na verdade, acho que esteestudo mostrou que, para muitos a elitedirigente da Inglaterra, as regras jurídicaseram um incômodo a ser manipulado etorcido da maneira que conseguissem, eque a lealdade de homens como Walpole,Hardwicke ou Paxtons à retórica da lei era,em larga medida, uma farsa. Mas dissonão concluo que o domínio da lei em sifosse uma farsa. Pelo contrário, as restri-ções ao poder impostas pela lei parecem-me um legado tão considerável quantoqualquer herança transmitida pelas lutasdo século 17 ao século 18, e uma realiza-ção cultural autêntica e importante da bur-guesia agrária e mercantil, com o apoiodos pequenos agricultores e artesãos”. (...).Insisto apenas no ponto óbvio, negligenci-ado por alguns marxistas modernos, de queexiste uma diferença entre o poder arbitrá-rio e o domínio da lei. Devemos expor asimposturas e injustiças que podem se ocul-tar sob essa lei (p. 357).

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Lembrando Robin Hood:

Voltando ao capítulo quinto, neleThompson expõe o governo real simuladoda floresta, com o “Rei John” eleito pelopovo. O líder seria a lendária figura do ci-dadão “Robin Wood”, atuante na Inglater-ra antes da vigência da Lei Negra (p. 179-185). Aqui, onde se nota o uso da literaturacomo fonte, diz ele que

...tampouco há qualquer evidência quan-to à identidade do rei John. As baladas deRobin Hood ainda passavam de boa emboca, mas esse Robin Hood de carne eosso retirou-se, talvez para alguma pro-priedade na floresta, para ser esquecidodurante 250 anos, sem deixar atrás de si(até onde pudemos descobrir) nenhumalenda, nenhuma lembrança popular, nemsequer uma canção” (p. 185).

Pela forma como produziu o livro,desmascarando os “Senhores” e relevandoos “Caçadores”, resgatando o outro ladodos acontecimentos, Edward Thompsonbem que poderia ser chamado de “o RobinHood da historiografia moderna”, não peloviés do mito da Floresta, mas pelo real daHistória.

A História pelo outro lado

Para melhor entender Thompson naprodução de História precisaríamos, antes,mencionar extratos de outras obras suas,no mínimo, o livro “Costumes em Comum.Estudos sobre a cultura popular tradicional”(São Paulo: Cia. das Letras, 1998), mais “AFormação da Classe Operária Inglesa”, nosseus três volumes (Rio: Paz e terra, 1987)19

e, ainda, “As Peculiaridades dos Ingleses eOutros Artigos” (Campinas: IFICH/

UNICAMP, 1998). Não muitas são as suasobras traduzidas para o português, em com-paração à língua espanhola; em citaçõesde autores espanhóis, encontramos men-ções a mais de vinte obras, entre livros eartigos em revistas, às quais não tivemosacesso por dificuldades aqui. Todavia, umamplo estudo biográfico dele ou uma aná-lise de todas as suas obras, não é o objeti-vo do presente artigo20.

É em “Senhores e Caçadores” queEdward Thompson mostra melhor sua for-ma de produzir História “vista de baixo”,numa estratégia de valorização dos feitosdos povos oprimidos (contra as atitudes dosopressores), dos dominados (contra os ins-trumentos usados pelos dominadores), ali-ando a narrativa à crítica para expor acorrupção política e o descontentamentopopular na sociedade inglesa do séculoXVIII e desenvolvendo, ao mesmo tempo,uma interpretação diferente da lei e do di-reito. Por isso, recomendamos a leitura des-ta obra, não apenas a historiadores ou afi-cionados por História, mas – principalmen-te – a professores, advogados, juristas,ambientalistas, ecologistas e legisladores –que encontrarão, a cada parágrafo, a ex-posição de fatos extensivos a uma realida-de bem atual no nosso Brasil.

Em trabalho recente de doutora-mento, Telmo Marcon faz referência à im-portância atual à história popular, enten-dendo-a como história cultural-popular, ouseja, construída a partir das experiências degrupos populares. Para ele:

Os sujeitos que tradicionalmente ficaramà margem das pesquisas históricas pas-sam a ser valorizados em suas experi-

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ências particulares, visto que o ponto departida não é mais o universal e nem odominante. Esta metodologia foi propostae implementada por vários historiadores,merecendo destaque as pesquisas deThompson, especialmente aquela sobre aLei Negra. Esse trabalho é um bom exem-plo de pesquisa orientada por uma con-cepção de história que trabalha na pers-pectiva dos grupos populares (MARCON,2003, p. 31).

ConclusãoConclusãoConclusãoConclusãoConclusão

No seu texto, especificamente,Thompson pouco menciona a escola21 ou aeducação “nesta ilha e naquele século”. En-tretanto, com estilo diferente do habitual, elealinhava um modelo, com teoria e métodopróprios, incomum, para – em tese – se historiartambém a educação. É o que estamos ten-tando fazer no desenvolvimento da pesqui-sa para a nossa tese de doutoramento emHistória da Educação na UNICAMP, sob abatuta do Prof. Dr. José Luís Sanfelice, centradana Região do Contestado e tendo por refe-rência a Guerra do Contestado22, a partir dopressuposto de que “é inegável uma mudan-ça no perfil da pesquisa em História da Edu-cação no Brasil e a influência que a HistóriaCultural tem tido nela”23.

A pesquisa prende-se a uma tentati-va de construir a História da Educação noContestado, sem descuidar da suavinculação a outros fenômenos – sociais,políticos, econômicos e culturais – e variá-veis que contribuem para sua compreen-são e que consideramos de fundamentalimportância para entendermos o processoeducacional catarinense, paranaense e re-gional, uma vez que, nesta História, duran-

te a primeira parte do período estudado, aEducação serviu às oligarquias dos doisEstados como instrumento de dominaçãoe, na segunda parte, às oligarquias cata-rinenses.

Com a pesquisa, estudamos a evo-lução histórica da Educação da Região doContestado24 a contar do Império, durantea Primeira República e a Segunda Repúbli-ca – a coronelista e a populista – até porvolta da Redemocratização de 1946, a partirde fontes originais, analisando as contradi-ções entre as classes dominantes e domi-nadas, entre os interesses das oligarquiase as necessidades da população, e entre ouso do ensino para fins políticos e a buscada instrução para a inclusão e a ascensãosocial.

Mais especificamente pretendemos:investigar os registros históricos de alfabe-tização e escolarização do Estado doParaná, relacionados ao ContestadoParanaense, bem como os dos municípiosparanaenses da região, caso a caso, até oano de 1917; transplantar para a Históriade Santa Catarina as informações sobre aInstrução Pública e a Educação praticadanas escolas confessionais dos núcleos co-loniais, nas subvencionadas e nas particu-lares, atinentes ao território obtido doParaná em 1917; estudar os aspectosevolutivos da Educação no Estado de San-ta Catarina durante a República e as con-tradições existentes na Região do Contes-tado entre a minoria dominante e a maio-ria dominada, durante o coronelismo, opopulismo e a entrada do neocoronelismo;e, associar os fatos relacionados à Instru-ção (oficial e comunitária) e às políticas

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educacionais adotadas pelos respectivosgovernos, com as evidências concretas en-contradas no dia-a-dia do passado dasescolas públicas, as subvencionadas e asparticulares.

Propositadamente, deixamos por úl-timo a menção a interessante abordagemsobre “História da Educação e História Cul-tural”, feita por Thais Nivia de Lima e Fon-seca25 , quando ela expõe sua visão sobrea História Cultural a partir de Roger Chartiere de Carlos Ginzburg (por ela citados, entreoutros expoentes, como os autores identifi-cados com as raízes da História Cultural),deixando de mencionar outros, como EricHobsbawam e, principalmente, EdwardThompson e, assim, sem destacar a liga-ção do inglês com a História Cultural e apossibilidade de se utilizar seus referenciaisteórico-metodológicos em inovadoras pro-duções em História da Educação. Eis o de-safio de Thais:

A contribuição que a História Cultural,como campo dotado de aportes teórico-metodológicos, pode dar ao avanço daHistória da Educação está no descorti-namento de dimensões ainda pouco ex-ploradas, fora da escola e da escolarização,bem como a imposição corajosa de novosolhares sobre essa que é uma dimensãojá tradicional. Urge (...) também um esfor-ço de análise mais apurado sobre a pro-dução em História da Educação que seproclama afinada com a História Cultural,movimento necessário para a reflexão crí-tica de nossa própria ação como historia-dores. Que esse exercício de análise pos-sa instigar tanto os que desejem se enve-redar nos caminhos da História da Edu-cação, quanto os que, já estando neles,sintam que é possível e necessáriorevitalizá-los (FONSECA, op. cit., p. 72).

Revitalizar caminhos da História daEducação com pressupostos da HistóriaCultural no campo do Social e na vertentemarxista, conforme instrui EdwardThompson – e ele mostra isso ser possívelnos moldes de “Senhores e Caçadores” –trabalhando na perspectiva dos grupospopulares, geralmente formados por seg-mentos de dominados, assim valorizados,é um atraente desafio!

NotasNotasNotasNotasNotas1 Professor na Universidade do Contestado – Campusde Caçador (SC). Graduado em História. Mestre emEducação. Doutorando em História da Educação naUniversidade Estadual de Campinas – UNICAMP.2 THOMPSON, Edward Palmer. Senhores e caçado-res. A Origem da Lei Negra. Trad. Denise Bottmann.2 ed. Col. Oficinas da História. Rio: Paz e Terra, 1997.3 Vale a pena conhecer este instrumento do Estadopara a defesa da propriedade britânica, a “Lei Negrade Waltham” na íntegra, disposta neste livro comoapêndice, entre as páginas 363 e 373. Não apenasporque esta lei foi o alvo de Thompson, mas, tam-bém, porque ela revela uma outra faceta da socie-dade inglesa, pouco conhecida entre nós.4 HOBSBAWN, Eric. Sobre História. São Paulo: Cia.das Letras, 2002, p. 97.5 Indicamos, por exemplo, a leitura de WILLIANS,Raymond. Cultura e Sociedade. São Paulo: Nacio-nal, 1969, e de MARTÍN, Pedro Benítez. E. P. Thompsony la historia. Un compromiso ético y político. Madrid:Talasa, 1995.6 Já expomos estas características em Uma novaHistória para o Contestado. Caçador: UnC, 2004.7 FONTANA, Josep. História depois do fim da História. Trad. Antonio Penalves Rocha. Bauru (SP): Edusc,1998, p. 13.8 HIMMEFARB, Getrude. Apud FONTANA,Josep, op. cit.9 Thompson faleceu em 1993, aos 69 anos de idade.10 HILL, Christopher, na introdução de As Peculiari-dades dos ingleses e outros artigos, p. 3.11 FALCON, Francisco. História das Idéias. In Domí-nios da História. Rio: Campus, 1997, p. 108).

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12 Ver a conferência O Cultivo de uma historiografiaengajada com a história e a memória da educaçãobrasileira, da Profª Dra. Marta Maria de Araújo, daUFRN, no 2º Congresso Brasileiro de História daEducação, da Associação Brasileira de História daEducação (SBHE) em novembro de 2002.13 FALCON, Francisco, op. cit., p. 103.14 Ver: THOMPSON, Edward. A formação da classetrabalhadora na Inglaterra.15 Título original: “Whigs and Hunters“.16 Ver: RODRIGUES, José Honório. História e histori-adores do Brasil. 1965, p. 14.17 Inferência: É uma indução. É admissão da verda-de de uma proposição que não é conhecida direta-mente, em virtude da ligação dela com outras pro-posições já admitidas como verdadeiras.18 Ver: THOMPSON, Edward. As peculiaridades dosingleses e outros artigos. Trad. Antonio Luigi Negroe Sérgio Silva. 3. ed. revista e ampliada. Col. TextosDidáticos n. 10, v. 1. Campinas: IFICH, Unicamp, jan.1998. A primeira parte, das quatro que compõem apublicação, também ficou conhecida como “A Misé-ria da Teoria“ (Rio: Zahar, 1981).19 Crítico da ideologia dominante, Edward Thompsoné mais conhecido no Brasil pela obra “Formação daclasse operária inglesa”, pois, nos três livros que acompõem (I - A árvore da liberdade, II - A maldiçãode Adão e III - A força dos trabalhadores), marcou ahistoriografia social contemporânea, recriando asexperiências de vida dos trabalhadores ingleses emostrando que esta classe operária tomou parteativa na sua própria formação. A obra foi publicadaoriginalmente na Inglaterra em 1963, consagrandoThompson como grande historiador.20 Sugerimos, por exemplo, a leitura de Artigo Frag-mentos de um possível diálogo com Edward PalmerThompson e com alguns de seus críticos, do Prof.

Sidnei Munhoz, publicado na Revista de HistóriaRegional. Ponta Grossa, v. 2, n. 2, p. 153-185, inver-no. Pode ser acessado no endereço: www.rhr.uepg.br/v2n2/sidnei.htm.21 Por exemplo, à página 55, ele menciona a exis-tência de uma “escola de caridade” em Windsor sóao tratar do pároco Waterson.22 Conflito que aconteceu entre 1913 e 1916, envol-vendo, de um lado, a população sertaneja (cabocla)e, do outro, forças militares e civis. A História consi-dera que foi um destacado evento histórico, resul-tante da revolta da população regional à ordem vi-gente, ou seja, uma insurreição da população cabo-cla contra os governos do Paraná e de Santa Catarina.23 FONSECA, Thais Nivia de Lima e. História da edu-cação história cultural. In: VEIGA, Cynyhia Greive,FONSECA; Thais Nivia de Lima e. (org.). História ehistoriografia da educação no Brasil. Belo Horizon-te: Autêntica, 2003, p. 61.24 O “Território Contestado” compreende toda a áreageográfica no tempo presente integrante das regi-ões Sul e Sudoeste do Estado do Paraná e do Nortee Oeste do Estado de Santa Catarina, objeto da “Ques-tão de Limites”, tendo por fronteiras: ao Norte, osrios Negro e Iguaçu; ao Sul, os rios Canoas eUruguai; a Leste, ora a Serra Geral, ora o RioCanoinhas, o Rio Timbó, o Rio do Peixe ou o RioMarombas; e a Oeste, a Argentina. Já a “Região doContestado” é a área geográfica localizada dentrodo Território Contestado, hoje no Centro-Oeste doEstado de Santa Catarina, habitada pelo Homem doContestado, onde ocorreu a Guerra do Contestado,limitada: ao Norte, pelos rios Negro e parte do Iguaçu;ao Sul, pelos rios Canoas e parte do Uruguai; aLeste, pela Serra Geral; e a Oeste, pela Serra daTaquara Verde e pelo Vale do Rio do Peixe.25 FONSECA, Thais Nivia de Lima e. op. cit., p. 72.

Referências BibliográficasReferências BibliográficasReferências BibliográficasReferências BibliográficasReferências Bibliográficas

ARAÚJO, Marta Maria de. O Cultivo de uma historiografia engajada com a história e amemória da educação brasileira. In: II Congresso Brasileiro de História da Educação.Natal: Associação Brasileira de História da Educação (SBHE), 2002.

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Recebido em 06 de agosto de 2004.Recebido em 06 de agosto de 2004.Recebido em 06 de agosto de 2004.Recebido em 06 de agosto de 2004.Recebido em 06 de agosto de 2004.Aprovado para publicação em 07 de outubro de 2004.Aprovado para publicação em 07 de outubro de 2004.Aprovado para publicação em 07 de outubro de 2004.Aprovado para publicação em 07 de outubro de 2004.Aprovado para publicação em 07 de outubro de 2004.

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Usos da Biblioteca por estudante de EducaçãoUsos da Biblioteca por estudante de EducaçãoUsos da Biblioteca por estudante de EducaçãoUsos da Biblioteca por estudante de EducaçãoUsos da Biblioteca por estudante de EducaçãoSuperiorSuperiorSuperiorSuperiorSuperior

Ivanilson Bezerra da Silva*Luiz Percival Leme Britto**

* Teólogo. Graduando em Pedagogia na Uniso.e-mail: [email protected]

** Professor do Programa de Pós-graduação da Uniso. Pre-sidente da Associação de Leitura do Brasil.e-mail: [email protected].

ResumoResumoResumoResumoResumoO estudante de Ensino Superior passa por várias estratégias de aprendizagem durante o processo deformação acadêmica. Porém, delimitou-se neste trabalho a atenção ao uso da Biblioteca como estratégiasde construção do conhecimento e espaço interdisciplinar capaz de contribuir para uma prática educacionalde ensino e pesquisa. Neste sentido, tem como preocupação central analisar os modos como o estudantede Educação Superior usa a biblioteca e o efeito disto em sua formação. Os dados foram estruturadosconforme resultados do questionário aplicado a alunos do curso de Pedagogia da Universidade de Sorocaba.

Palavras-chavesPalavras-chavesPalavras-chavesPalavras-chavesPalavras-chavesBiblioteca Universitária; estudante de ensino superior; hábito de estudo.

AbstractAbstractAbstractAbstractAbstractA university student goes through various learning strategies during his academic training. However, inthis study, attention is focussed on the use of the library as a strategy for the construction of interdisciplinaryknowledge capable of contributing to an educational practice based on investigation. In this way, ourcentral concern is the analysis of how students utilize the library and the effect that it may have in theirformation. The data were collected with the use of questionnaires, interviews and direct observation ofpedagogy students in the University of Sorocaba.

Key WordsKey WordsKey WordsKey WordsKey WordsUniversity Library, university student, habits of study

Série-Estudos - Periódico do Mestrado em Educação da UCDB.Série-Estudos - Periódico do Mestrado em Educação da UCDB.Série-Estudos - Periódico do Mestrado em Educação da UCDB.Série-Estudos - Periódico do Mestrado em Educação da UCDB.Série-Estudos - Periódico do Mestrado em Educação da UCDB.Campo Grande-MS, n. 18, p. 265-279, jul./dez. 2004.

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O presente artigo faz parte de ummacro-projeto de pesquisa, desenvolvido naUniversidade de Sorocaba, que visa inves-tigar compreender as estratégias de apren-dizagem em atividades de estudos por es-tudantes universitários.

A partir desta idéia propõe-se anali-sar: como o estudante universitário usa aBiblioteca e o efeito disto na sua formação.Portanto, a pesquisa elaborada, insere-senum contexto de investigação sobre hábi-to de estudo. Esta compreensão nos reme-te para o universo bibliotecário, que supõeum lugar em que o estudante de EnsinoSuperior desenvolva hábitos de estudo erealize pesquisa.

A relevância do problema é eviden-ciado à medida que se compreende que oconhecimento não somente se constrói noespaço interativo da sala de aula, mas tam-bém, dentro do espaço científico-socialmaior que é a instituição e as relações quenela se estabelecem.

Destaques-se que este trabalho teescopo limitado, restringindo-se a um perfilde Curso superior – os dados foram colhi-dos em uma universidade comunitária, deperfil regional1.

Além disso, Deve-se considerar asenormes transformações por que passa oEducação Superior no Brasil, em função dasmudanças no modo de produção e acu-mulação do capital e do significativo cres-cimento do nível médio da escolaridade dobrasileiro nos últimos 25 anos, o que impli-cou a necessidade de o trabalhador inves-tir em sua formação escolar para poderbuscar a posição no mercado de trabalho.

Finalmente, compõe este quadro a

advertência de Silva Jr. e Sguissardi (2001)de que não há efetivamente investimentoem pesquisa e construção de conhecimen-to na maior parte das Instituições de Ensi-no Superior no Brasil, prevalecendo a pes-quisa limitada a algumas IES estatais, asquais encontram cada vez mais dificulda-des de manter seu nível de atuação.

São muitos os estudos atuais sobreuniversidade que apontam o carátermercantilista que ela vem adquirindo (cf.Bittar 2002; Silva JR. E Squisardi 2001;Catani 2002; Chauí 2001; Britto 2003; Cas-tanho 2002, entre outros). Este caráter temsido construído em função das políticaseducacionais estabelecidas nos últimosanos. Segundo a maioria dos estudos, auniversidade vem deixando de ser agênciade construção crítica do saber, para seragência de produção de mão de obra qua-lificada para o mercado econômico.

Tal constatação demonstra que ocrescimento estrondoso do Ensino Superi-or privado não implicou avanço na pesqui-sa nem e uma política pedagógica eficien-te e apropriada aos segmentos sociais quevieram sendo incorporados à EducaçãoSuperior.

A questão central deste trabalho fun-damenta-se em duas questões: 1. Por queé difícil estabelecer um comportamento aca-dêmico-científico apropriado, em particularem IES periféricas? e 2. Quais são e de ondevêm as dificuldades de estudar, ler e pro-duzir do estudante de Ensino Superior?

A resposta à primeira pergunta seriaa de que o estudante de Educação Superi-or divide seu tempo de formação com ou-tros afazeres, como, por exemplo, o traba-

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lho, limitando-se a estar na faculdade notempo-aula. Espera-se que o estudante denível superior possa ter uma experiênciaacadêmica que o capacite para aplicar seuconhecimento. Neste sentido, a sala de aulanão pode ser o único ou privilegiado espa-ço de formação.

Parte-se do pressuposto que o conhe-cimento é uma construção social. Nestesentido, compreende-se que o conhecimen-to é construído à medida que o sujeitointerage com o seu meio social e cultural.Dois autores importantes podem ser evo-cados para justificar esta afirmativa. Emprimeiro lugar, temos as contribuições deVigotsky, para quem, segundo Oliveira, “ohomem transforma-se de biológico em só-cio-histórico, num processo em que a cultu-ra é parte essencial da constituição da na-tureza humana” (Oliveira 1997, p. 14).

O ser humano não está isolado. Éparte integrante de um processo histórico-social. Então, sua relação com o mundo éuma relação mediada. Vygotsky diferencioudois elementos mediadores: os instrumen-tos e o signos. A mediação é um processoque o sujeito sofre em sua relação social,resultando da maneira que internaliza o queocorre no mundo à sua volta.

É através da relação interpessoalconcreta com outros homens que a pes-soa interioriza as formas culturalmenteestabelecidas de funcionamento psicológi-co. Portanto, a interação, seja diretamentecom outros membros da cultura, seja atra-vés dos diversos elementos do ambienteculturalmente estruturado, fornece a maté-ria-prima para o desenvolvimento psicoló-gico do indivíduo (Oliveira, 1997, p. 38).

Britto, referindo-se do pensamento deVigotsky, afirma que

a aprendizagem é vista como um proces-so impregnado pelas formas culturais eque tem lugar num contexto de relação ede comunicação interpessoal. Ao dar des-taque ao papel do outro como mediadorentre o sujeito que aprende e o objeto doconhecimento, Vygotsky salienta o papelda escola – e, especificamente, do profes-sor no processo de aprendizagem e dedesenvolvimento humano. A escola e aoprofessor, enquanto agentes sociais, cabeo papel de criar condições para que seproduza uma interação construtiva entreaquele que aprende e o objeto de conhe-cimento (2002, p. 6)

Outro fator relevante a considerar ésão as capital cultural herdado pelo estu-dante universitário em seu contexto sócio-familiar. Para Bourdieu (2002, p.5), o desem-penho ou sucesso escolar do aluno nãoestá relacionado ao seu potencial individu-al, mas ao seu contexto histórico social, paraser mais específico à sua origem social.

A noção de capital cultural impôs-se,primeiramente, como hipótese indispensá-vel para dar conta da desigualdade de de-sempenho escolar de crianças provenien-tes das diferentes classes sociais, relacionan-do o sucesso escolar, ou seja, os benefíciosespecíficos que as crianças das diferentesclasses e frações de classe podem obter nomercado escolar, à distribuição do capitalcultural entre as classes de frações de clas-se (Bourdieu, 2002, p.73). Bourdieu notadiferença significativa nas oportunidades detrabalho em função das disposições soci-ais.. Os privilegiados pelo capital cultural ti-veram fácil acessão profissional, compara-tivamente aos que não tiveram esta opor-

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tunidades e se viram obrigados a subme-ter-se a trabalhar em profissões pouco pri-vilegiadas.

Na sociologia de Bourdieu, o indiví-duo, conforme a análise de Cláudio Noguei-ra e Maria Alice Nogueira (2002, p.7): “é umator socialmente configurado em seus mí-nimos detalhes. Os gostos mais íntimos, aspreferências, as aptidões, as posturas cor-porais, a entonação da voz, as aspiraçõesrelativas ao futuro profissional, tudo seriasocialmente constituído.”

O uso da bibliotecaO uso da bibliotecaO uso da bibliotecaO uso da bibliotecaO uso da biblioteca

A Biblioteca constitui o maior espa-ço interdisciplinar da Universidade, tendoimportante papel informacional (Campello,2002, p.10). Não estamos falando no livrosomente como instrumento capaz de influ-enciar a formação do estudante, mas deum conjunto interdisciplinar de informaçãono espaço da Biblioteca que pode trazerbenefícios para a formação acadêmica.

Parte-se da idéia de que há um este-reótipo comportamental acadêmico navida universitária, que seria a obriga-toriedade do uso da biblioteca. Cabe, con-tudo, indagar: O que leva realmente o estu-dante universitário à Biblioteca? É a curio-sidade acadêmica? É a necessidade inte-lectual? É a obrigatoriedade escolar? É ocomportamento individual?

Quando falamos do perfil do estu-dante universitário, pressupomos que esteseja um sujeito “letrado”, que passou pelosvários níveis de escolarização. Isto implicadizer que é adquiriu certo grau de autono-mia e participação social e que tenha ha-

bilidades intelectuais que o ajudem a seposicionar na história e no universo acadê-mico. Em outras palavras deveria apresen-tar um alto nível de alfabetismo, entendidocomo o estado ou a condição de queminterage com diferentes discursos, saberese comportamentos articulados em funçãoda cultura escrita . Quanto maior for o nívelde alfabetismo, maior será a freqüência demanipulação de textos, a de realização deleitura autônoma, a interação com discur-sos menos contextualizados ou mais auto-referidos, a convivência com domínios deraciocínio abstrato, a produção de textospara registro, comunicação ou planejamen-to. Enfim, maiores serão a capacidade e asoportunidades do sujeito de realizar tare-fas que exigem monitoração, inferênciasdiversas e ajustamento constante.

O uso da Biblioteca pelo estudantede ensino superior está diretamente relacio-nado aos referenciais acima apresentados.Ao dispor deste recurso, o sujeito teria aces-so a um conhecimento diferente daqueleque encontra no espaço-aula. Porém, o usomeramente periférico, complementar aoque se faz em classe, trará pouco benefício,provavelmente solidificando a falta de habi-lidade de uso de mecanismos formais dacultural.

O que se está postulando é que sim-plesmente estar na biblioteca não torna oaluno um pesquisador. A diferença está namaneira de utilizar os produtos culturais deforma crítica, autônoma e criativa. Subtende-se que o uso da Biblioteca pode ser umhábito específico de estudo e produção detrabalho do universitário. Esta relação podeproduzir um conhecimento acadêmico mais

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criativo e critico, pois o levaria a um univer-so cultural interdisciplinar mais amplo e di-versificado. A Universidade pode ser umveículo que colabore na construção do co-nhecimento do estudante. Pode motivar apesquisa, desenvolvendo aquilo que ospesquisadores vem chamando de ensino-pesquisa (Castanho, Balzan, Lima, Veiga2002). Para isso, não basta a iniciativa demotivar o estudante a ser um pesquisador.Faz-se necessário analisar este tem estahabilidade, observando se ele desenvolveuesta habilidade no decorrer do seu proces-so de alfabetismo.

O pensador italiano Antonio Gramscipropõe uma visão muito relevante a res-peito da educação:

Assim, escola criadora não significa escolade inventores e descobridores; ela indicauma fase e um método de investigação ede conhecimento, e não um ‘programa’predeterminado que obrigue à inovação eà originalidade a todo custo. Indica que aaprendizagem ocorre notadamente graçasa um esforço espontâneos e autônomo dodiscente, e no qual o professor exerce ape-nas uma função de guia amigável, comoocorre ou deveria ocorrer na universidade.Descobrir por si mesmo uma verdade, semsugestões e ajudas exteriores, é criação(mesmo que a verdade seja velha) e de-monstra a posse do método; indica que, dequalquer modo, entrou-se na fase da ma-turidade intelectual na qual se podem des-cobrir verdades novas... Por isso, nesta fase,a atividade escolar fundamental se desen-volverá nos seminários, nas bibliotecas, noslaboratórios experimentais, é nela que se-rão recolhidas as indicações orgânicas paraorientação profissional (1985, p. 125).

Na universidade, o aluno está inseri-do num contexto formativo que não se re-

duz à sala de aula. Seria de esperar que eletivesse várias oportunidades intelectuais eculturais fora do espaço-aula, tendo con-tato com atividades formativas tais como:estudo em grupo, pesquisa científica, pa-lestras, semana cultural, teatro, orientaçõesacadêmicas, biblioteca, Internet, atividadespolíticas e outras.

Por estas e outras razões, a Universi-dade tem um papel relevante na constru-ção do conhecimento e na formação cultu-ral do aluno. Ela não se restringe à sala deaula. Ela vai além deste micro-universo cul-tural e de formação intelectual. O proble-ma é que quase sempre, o aluno restringesua vida acadêmica à sala de aula. Seucomportamento não vai além daquilo queé exigido pelo professor. Há professores enão são poucos, que limitam e restringemo aluno a ousar outros vôos no universoacadêmico, pois estes passam a maior partedo seu tempo dentro da sala de aula.

Vejamos o pensamento de PedroDemo a respeito da pesquisa:

Importante é distinguir entre pesquisacomo princípio científico e como princípioeducativo. Estou trabalhando aqui sobre-tudo o segundo sentido, porque se tratade propedêutica básica, não de atividadeprofissional da pesquisa. quer dizer, es-tou propondo pesquisa como estratégiafundamental de aprendizagem recons-trutiva e de gestação da autonomia dosujeito, para que possa produzir conheci-mento do qual seja a referência central(Demo, 2000, p. 94).

A elaboração própria torna-se, então,atividade estratégica, em primeiro lugarporque reflete a capacidade reconstrutiva,de onde surge o impulso para a autono-

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mia. O que não se elabora, fica ainda fora,adere por imitação, ou seja, não entra. Nes-te sentido, elaboração própria é a base daaprendizagem ativa, através da qual o alu-no tenta, sob a orientação do professor,fazer-se autor, ter idéias próprias, argumen-tar com autonomia, entrar em polêmicascom capacidade de argumentar, proporprojetos próprios.

A pesquisaA pesquisaA pesquisaA pesquisaA pesquisa

Limitamo-nos, neste primeiro momen-to, a pesquisar o curso de Pedagogia daUniversidade de Sorocaba, que trata-se deuma Universidade comunitária, de caráterregional. Tal proposta de pesquisa foi de-senvolvida com estudantes da Universida-de de Sorocaba do curso de Pedagogia do2º Período, 5º Período e 6º Período,totalizando 45 alunos, sendo que 27 delespertencem ao 2º período, 9 alunos perten-cem ao 5º e 9 deles pertencem ao 6º perí-odo. Os alunos do 2º período estudam demanhã. Os dos 5º e 6º período estudam àtarde. Os alunos do 5º e 6º período for-mam uma só turma.

Para fazer o levantamento empírico,foram aplicados dois questionários. O pri-meiro objetivou caracterizar o perfil do es-tudante universitário em seu contexto fa-miliar, econômico e social. O segundoobjetivou caracterizar seu comportamentono uso da biblioteca. O questionário foiaplicado com a aquiescência dos profes-sores. A priori, foi feita uma explicação dasperguntas contidas no questionário. Porém,mesmo realizando este procedimento hou-ve respostas prejudicadas pela incom-

preensão, ou talvez, por não serem as ques-tões suficientemente claras.

Análise do questionárioAnálise do questionárioAnálise do questionárioAnálise do questionárioAnálise do questionário

Neste primeiro momento, é válidoreconstruir o perfil social dos alunos anali-sados. Os dados obtidos foram através daaplicação de um questionário contendo 15questões. Esta parte do trabalho estáestruturada da seguinte maneira. Na primei-ra parte, temos o objetivo de caracterizar operfil do estudante universitário: estado ci-vil, renda familiar, grau de escolaridade dospais e o grau de escolaridade deles. Na se-gunda parte, o objetivo é mostrar os dadosobtidos da relação aluno – biblioteca.

A maioria dos estudantes são casa-dos. 99% são mulheres, uma característicaprópria do curso de Pedagogia. A rendafamiliar gira em torno de 6 a 10 saláriosmínimos. Apenas 3,5% dos alunos do 2o

período afirmam ganhar mais de 20 salári-os mínimos. 50% dos alunos do 5o períodoafirmam ganhar de 11 a 20 salários. Istomostra que os estudantes analisados en-quadram num grupo social de classe mé-dia baixa.

Em relação à escolaridade dos pais,obtivemos os seguintes resultados: 7% dosalunos do 2o período afirmam que seus paisfizeram pós-graduação. Em relação aospais dos alunos do 5o período, 14,2% afir-mam que seus pais têm pós-graduação.Em relação aos pais dos alunos do 5o perí-odo 37,5% não foram à escola e 37,5%completaram a 4a série do ensino funda-mental.

O índice de pais que cursaram ensi-

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no superior é baixo nas três turmas anali-sadas. no 2o período, 13% apenas cursaramo ensino superior. No 5o período, 12,5% fi-zeram o curso superior. Na turma do 6ºperíodo, não há apontamentos. Uma fatonos chama atenção. No 6o período 14,2%de pais fizeram pós-graduação. Um fatorrelevante à presente pesquisa é que os paisdas três turmas apresentam baixa escola-ridade.

Vejamos os dados concernentes aograu de escolaridade das mães. No 2o perí-odo apenas 3,5% das mães não foram àescola; no 5o período 25%. No 2o período,20 % não completaram a 4a série do ensi-no fundamental. No 5o período, 12,5% nãocompletaram este nível de ensino e 28,5%do 6o período não completaram. Apenas23% das mães dos alunos do 2o períodocompletaram o ensino médio, contra 28,5%das mães dos alunos do 6o o período.

O que se observa é que o grau deescolaridade dos pais dos alunos analisa-dos é baixo. Isto impõe duas considerações:a realidade histórico-cultural dos alunosuniversitários analisados é fatordeterminante nas habilidades culturais eacadêmicas deles; e os alunos oriundos decontexto histórico-familiar de baixa escola-ridade demonstram mais dificuldades noprocesso de ensino-aprendizagem.

Hipoteticamente, quanto maior a es-colaridade de uma pessoa, mais habilida-des sociais, pessoais, culturais e acadêmi-cas ela terá. Podemos dizer que quanto maisalfabetizada for a pessoa mais capaz elaserá de se situar no seu contexto social ecultural (Ribeiro, 2003). A comparação donível de escolaridade dos pais com os o

nível de escolaridade dos alunos analisa-dos representa um salto gigantesco. De certaforma, tais alunos, oriundos de contextofamiliar de baixa escolaridade, representamparcela significativa de nossa amostra.

Sendo baixa a escolaridade dos pais,pressupõe-se que eles pouco investiram naformação cultural dos seus filhos. É possí-vel afirmar que, segundo (Bourdieu, 1998),quanto mais escolaridade uma pessoa tem,maior serão suas habilidades com os bensculturais. Isto significa dizer que a escolari-dade é fator determinante nos hábitos cul-turais de qualquer pessoa. Em outras pala-vras, quanto mais maturidade intelectualuma pessoa tiver, sua geração terá maisoportunidades de compreender a importân-cia dos bens culturais.

Vejamos em seguida a origem aca-dêmica dos estudantes analisados. A mai-oria dos alunos analisados, em média ge-ral 80%, é oriunda da escola pública. A for-mação acadêmica influencia em muito ashabilidades dos alunos. É de esperar quequanto maior o acesso aos processos deformação cultural, quanto maior a alfabeti-zação e o alfabetismo da pessoa, maiorserá sua capacidade de se inserir numasociedade cultural de cultura escrita.

É certo que as escolas privadas, poratender uma clientela hipoteticamente di-ferenciada e com maiores recursos procu-ram maneiras de oferecer um ensino demelhor qualidade, dado caráter extrema-mente competitivo do capitalismo contem-porâneo. Em contrapartida, as escolas pú-blicas, que dependem exclusivamente dasiniciativas governamentais, estão produzin-do alunos numa situação de plena desi-

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gualdade, ainda que se reconheça o esfor-ço de muitos educadores em praticaremuma educação de qualidade. Chamamosesta desigualdade de desigualdade cultural.

Com este perfil dos alunos analisa-dos, passemos para o segundo aspecto dapesquisa, que se refere ao uso que estu-dante universitário faz da Biblioteca. Estasegunda parte tem como objetivo caracte-rizar a postura do estudante universitáriodiante da biblioteca.

Atualmente, a questão em torno daleitura tem sido muito discutida. Galvão(2003), em estudo comparativo de escola-ridade e alfabetismo entre gerações distin-tas. revela que 63% dos entrevistados tive-ram pais que não liam e 72% mães quenão liam. Constata-se, desse modo, umgrau de reprodução no que se refere aosusos da leitura e da escrita, entre as dife-rentes gerações: quanto maior o nível dealfabetismo do entrevistado, mas provavel-mente teve pais e mães que sabiam ler – eler bem. (Galvão 2003:128).

É inquestionável que existe relaçãomuito forte entre o grau de escolaridade dospais com o grau de escolaridade dos alu-nos analisados. Neste sentido, a atual pes-quisa corrobora com os estudos em tornodo assunto. Pra Batista, “ as famílias dosdocentes pouco dotadas de capital cultu-ral, particularmente pouco dotadas dessascompetências, disposições e crenças queconstituem um leitor, não podem elas mes-mas transmiti-las a seus membros. (Batista1998, p. 35).

Pode-se dizer que as estratégias fa-miliares para a reprodução do capital cul-tural não acontecem, ou acontece menos

intensamente, nas famílias de pouco capi-tal cultural. Cabe perguntar: A relação alu-no e biblioteca seria norteada pela sua he-rança cultural?

Os dados obtidos mostram que oaluno universitário freqüenta a biblioteca.No 2o período, 70% afirmam que usam abiblioteca com freqüência. Dos alunos do5o período, 75% afirmam que usam a bibli-oteca com freqüência. Em relação ao 6o

período, 52,2% utilizam a biblioteca comfreqüência. Em comparação aos outrosperíodos, o 6o período demonstrou que suafreqüência à biblioteca é inferior, um resul-tado no mínimo estranho, já que era deesperar que quanto maior for escolarida-de do estudante, maior seria sua participa-ção nos mecanismos capazes de ajudá-loem sua formação.

Quando ao modo de uso biblioteca:(sozinho ou em grupo), do 2o período,53,3% afirmaram que vão sozinhos à Bi-blioteca e 30% vão em grupo. Do 5o perío-do, 62,5% dos alunos afirmaram que vãosozinhos à biblioteca e 25% vão em grupo.Do 6o período, 71,4% afirmaram que vãosozinhos à biblioteca. Se fizermos uma com-paração com a tabela 6, observa-se que afreqüência dos alunos analisados à biblio-teca está relacionada ao próprio horário deestudo. Apenas 10,2% dos alunos do 2o

período afirmaram que utilizam a bibliote-ca à noite, ou seja, fora do horário de salade aula. A biblioteca é utilizada durante operíodo de estudo. Parece que existe daparte do professor a preocupação em utili-zar os recursos da Biblioteca como estraté-gia de ensino. Este dado sugere tambémque a relação do estudante com a univer-

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sidade tende a se limitar ao tempo de aula,sem outras vivências acadêmicas, à exce-ção daqueles que fazem estágio ou inicia-ção científica.

Os estudantes analisados demons-traram que o estudo individual é um hábi-to mais freqüente no contexto universitá-rio. Apesar de representar uma estratégiaacadêmica, o estudo individual priva o alu-no universitário de manter uma relaçãodialógica mais intensa no processo de en-sino-aprendizagem com os demais.

Quanto ao tempo de uso da biblio-teca. Dos alunos do 2o período, 23,5% afir-mam que usam a biblioteca durante 30minutos, 43,5% afirmam que utilizam a bi-blioteca mais de uma hora. Dos alunos do5o período, 37,5% utilizam a biblioteca maisde uma hora, enquanto que 26,5% dos alu-nos do 6o período utilizam mais de umahora. estes dados que os alunos do 2o pe-ríodo têm freqüência maior e utilizam pormais tempo a biblioteca. 62,5% dos univer-sitários do 5o período freqüentam mais deuma vez na semana a biblioteca. Em rela-ção ao 6o período, a pesquisa revelou que28,6% freqüentam a biblioteca mais deuma vez na semana. Outro dado interes-sante é que 30% dos estudantes do 2o pe-ríodo afirmam que vão à biblioteca somentequando solicitados.

Pode-se pressupor pelo menos trêspossibilidades: os 5o e 6o períodos utilizama biblioteca apenas para retirar livros; os 5o

e 6o período utilizam a biblioteca apenaspara fazer consultas bibliográficas; 3) osestudantes não têm verdadeira compreen-são da importância da biblioteca para suaformação acadêmica e intelectual, uma vez

que a maior parte afirma que a bibliotecaé um veículo capaz de ajudá-la em sua for-mação. Então, por que a freqüência nãocorresponde com o valor que dão à biblio-teca?

Pode-se postular que, apesar da im-portância biblioteca na sua formação, o usoque o estudante faz dela está aquém decapacitá-lo, uma vez que sua freqüênciaparece estar meramente relacionada a con-sultas bibliográficas ou a empréstimos delivros para fotocópias. Isto sugere que éconsistente a tese de que a cultura acadê-mica se sustenta em utilizar a fotocópia departes de livros para realização de traba-lhos ou de estudos direcionados por pro-fessores. Esta cultura da não aquisição delivros pode ser alimentada pelos própriosprofessores, que selecionam textos de di-versos livros com a finalidade de expor suadisciplina, o que implicaria uma metodolo-gia bastante praticista e disciplinar.

Dos alunos do 6o período, 28,6% afir-mam que usam a biblioteca raramente,14,2% afirmam que utilizam a bibliotecasomente quando solicitados, e 28,6% afir-mam usar a biblioteca uma vez na sema-na. São índices muito baixos para o nívelde escolaridade.

Em relação ao que o estudante lê nabiblioteca, o suporte livro foi o mais desta-cado: 66,5% dos alunos do 2o período afir-mam que lêem livros, do 5o período 87,5%e do 6o período 57,1%. Os alunos não con-seguiram mencionar os últimos livros queleram da biblioteca, visto que 46,5% dosestudantes do 2o período afirmaram queemprestam de 1 a 5 livros por semestre. Dosestudantes do 5o período, 25% afirmaram

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que emprestam de 1 a 5 livros por semes-tre. Em relação aos alunos do 6o período,42,8 afirmaram que emprestam de 1 a 5livros por semestre. Como, então, não foramcapazes de mencionar os últimos livros li-dos, conforme solicitado no questionário?

A pesquisa também procurou anali-sar como aluno universitário avalia os re-cursos oferecidos pela Biblioteca. Dos estu-dantes do 2º período, 47% afirmaram queos recursos oferecidos pela biblioteca sãoótimos; 25% dos estudantes do 5o períodofizeram a mesma afirmação, contra 28,6%dos do 6o período. Porém, a maioria do 5o

período e do 6o período afirmam que osrecursos oferecidos são razoáveis.

Quanto à avaliação da importânciada biblioteca, 63,4% dos alunos do 2o perío-do afirmam que a biblioteca é indispensá-vel, do 5o período 75%, em contrapartidaapenas 28,6% dos alunos do 6o períodoafirmam que a biblioteca é indispensável,sendo que 57,1% destes alunos afirmamapenas que é necessária. Este dado é intri-gante se levarmos em consideração a idéiade que quanto mais avançado em seus es-tudos acadêmicos, maiores seriam as habi-lidades de construção do conhecimento, oque incluiria um uso mais diversificado debibliografia e, conseqüentemente, maior usoda Biblioteca. No entanto, os alunos do 6o

período, conforme não parecem dar valorà Biblioteca. Isto sugere uma postura acadê-mica aquém da que se esperaria de univer-sitários prestes a terminar a graduação.

Para que fins o estudante de ensinosuperior utiliza a biblioteca? Sobre estaquestão, 25,9% dos alunos dos 2o períodoapontaram a necessidade intelectual como

maior motivação e 33,3% dos alunos apon-taram o trabalho de conclusão de cursocomo último recurso para utilização da bi-blioteca, sendo que 40,9% do total dos alu-nos do 2o período, não responderam ade-quadamente a esta pergunta.

Dos alunos do 5o período, 22,2%apontaram a tarefa escolar individual comoa principal motivação para o uso da biblio-teca e 33,3% apontaram o trabalho de con-clusão de curso como menor motivaçãopara o uso da biblioteca, sendo que 55,5%não responderam apropriadamente à ques-tão. Dos alunos do 6o período 22,2% apon-taram a tarefa escolar individual e 33,4%apontaram o trabalho em grupo como prin-cipal meio de utilização da biblioteca, e44,4% dos alunos não souberam responder.

Comparando os três períodos, obser-va-se que os alunos do 2o período pare-cem mais motivados em utilizar a bibliotecapara a construção do conhecimento queos estudantes dos 5o e 6o períodos, já queas respostas destes estão associadas aobrigatoriedade do uso da biblioteca paraexecutar trabalhos acadêmicos individuaise em grupos. A questão é: por que os alunosmais próximos de completar seu períodode formação não desenvolvem uma com-preensão mais exeqüível da biblioteca? Istorevelaria um comportamento acadêmicoanormal, uma vez que apresentam um com-portamento diferente do que se esperaria.

Por último, vejamos a concepção queo estudante universitário tem da Bibliote-ca. Dos alunos do 2º período, 33,3% apon-taram a biblioteca como um lugar de pes-quisa; 22,2% apontaram a biblioteca comolocal de formação intelectual e 44,5% não

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souberam responder a questão. Dos alu-nos do 5º período, tivemos os seguintesdados: 33,3% afirmam que a biblioteca éum espaço de pesquisa e 11,2% afirmamque a biblioteca é um espaço de estudo,55,5% não responderam adequadamenteà pergunta. Dos alunos do 6o período,33,3% afirmaram que a biblioteca é umlugar de pesquisa, 22,3% afirmam que abiblioteca é um lugar de leitura e 44% nãosouberam responder.

Para um razoável número de estu-dantes dos três períodos, a biblioteca é umlugar de pesquisa. A concepção que têmda biblioteca é correta enquanto constru-ção teórica, porém errônea em sua práxis,conforme se verifica pelas demais respos-tas (pesquisa, aqui, deve ser busca de textopara empréstimo). A porcentagem maiorestá atrelada aos estudantes que não sou-beram responder as questões, o que suben-tende que tais alunos não têm facilidadepara lidar com questões mais complexas.

Análise de três depoimentosAnálise de três depoimentosAnálise de três depoimentosAnálise de três depoimentosAnálise de três depoimentossobre a importância dasobre a importância dasobre a importância dasobre a importância dasobre a importância dabibliotecabibliotecabibliotecabibliotecabiblioteca

Neste tópico, procederemos à análi-se de algumas narrativas dos alunos acer-ca da importância da biblioteca na sua for-mação acadêmica. Podemos partir do pres-suposto que existe um comportamento doaluno universitário em relação ao uso quefaz da biblioteca. Em geral ficou evidenteque os alunos compreendem a importân-cia da biblioteca na sua formação.

O primeiro caso permite que constru-amos a cosmovisão do aluno a respeito

da sua compreensão da biblioteca:Para ter acesso a livros, pois não dis-

ponho recursos econômicos para adquiri-los”. (Paula)

Esta é, sem dúvida, a realidade demuitos estudantes universitários de univer-sidades periféricas e de cursos de menorprestígio. O uso da biblioteca por este alu-no está associado a sua condição econô-mica. Paula é casada e possui renda fami-liar de 5 salários mínimos; seu pai comple-tou a 8ª série e sua mãe completou o ensi-no médio. Afirma que o ensino fundamen-tal foi cursado em escola pública e o ensi-no médio em escola particular. Afirmar pos-suir 50 livros, algo relevante neste universo,ainda que demasiado limitado em outros.Quanto ao tempo de uso da biblioteca, afir-mou que utiliza para seleção do materialdesejado. Sobre os fins que utiliza a biblio-teca apontou o empréstimo de livros comosendo mais importante. Afirma, finalmente,que a biblioteca é um lugar de pesquisa.Podemos assumir que Paula possui umacompreensão limitada da Biblioteca. Seucomportamento acadêmico no espaço dabiblioteca está relacionado a empréstimosde livros, devido sua dificuldade econômi-ca. Outro fator relevante é que Paula tem-po de uso da Biblioteca: não permanecemais do que o suficiente para a retirada dolivro. Possivelmente, um livro esteja relacio-nado à disciplina cursada.

No segundo caso, temos o seguintedepoimento:

Quando necessário, pois procuro se-lecionar livros para a minha biblioteca par-ticular”. (Marlene)

Marlene é casada e afirma ter renda

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familiar de 6 a 10 salários mínimos. Seupai fez pós-graduação e sua mãe comple-tou a 4a série. Cursou o ensino fundamen-tal em escola particular e o ensino médioem escola pública. Seu uso da bibliotecaestá relacionado a seu período de perma-nência na Faculdade. Afirma que perma-nece aproximadamente durante 30 minu-tos na biblioteca, tempo certamente insufi-ciente para elaboração de um trabalho in-dividual ou em grupo. Afirma que tem 30livros em casa, número relativamente pe-queno para um estudante universitário. Afir-ma também que a biblioteca é um veículocapaz de ajudá-la em sua formação acadê-mica. Diz possui o hábito de adquirir livrospara a formação da sua própria biblioteca.

No terceiro caso, temos o seguinterelato:

Não pelo simples uso, mas pela ne-cessidade de conhecimento pessoal.(Gabriela)

Gabriela afirma que tem renda famili-ar de 11 a 20 salários mínimos. Seus pais ini-ciaram, mas não completaram o curso supe-rior. Afirmou que estudou predominantementeem escola pública, tanto no ensino fundamen-ta como no médio. Possui um acervo de 50livros. Utiliza a biblioteca no período da tarde,ou seja, no mesmo período em que estuda.Seu tempo de permanência na biblioteca éde 3 horas, o que parece não ser real, poisutiliza a biblioteca no mesmo período queestuda. Para ela, a biblioteca é um veículocapaz de ajudá-la em sua formação acadê-mica. Sugere ser uma pessoa com concep-ção acadêmica amadurecida.

Os que se pode concluir dos três ca-sos? 1. que o capital econômico e cultural

influenciam a concepção do estudante deensino superior quanto ao uso da bibliote-ca; 2. que a relação dos estudantes com osbens de consumo culturais determinam seumodus operandis na universidade; e. 3. queos alunos quanto mais escolarizados, me-lhor sabem utilizar as estratégias de cons-trução do seu conhecimento.

Enfim, podemos afirmar que os alu-nos analisados, apesar de compreenderema importância da biblioteca em sua forma-ção acadêmica, não utilizam a bibliotecacomo estratégia de construção do saber.Seu uso está relacionado à exigência aca-dêmica, assumindo, desta forma, caracte-rística meramente curricular.

Considerações finaisConsiderações finaisConsiderações finaisConsiderações finaisConsiderações finais

A Educação Superior é um universoacadêmico que possibilita várias formas deconstrução do conhecimento. A biblioteca,dentro deste universo, é uma estratégiausada pelos estudantes na elaboração dostrabalhos acadêmicos, lugar de pesquisaescolar (entenda-se realização de tarefaestabelecida pelo docente), lugar de estu-do em grupo, lugar onde se adquire conhe-cimento. Como tal, teria grande influênciana formação intelectual do estudante uni-versitário, possibilitando-o construir umapostura crítica diante da sua realidade his-tórico-social.

Na medida que se aprofunda a aná-lise, observa-se que os estudantes, apesarde reconhecerem o valor da biblioteca, com-preendem-na como um instrumento suple-mentar e não como uma centro de forma-ção. Seu uso está relacionado ao tempo de

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formação acadêmica, podendo demonstraro fato de que a ela é usada por obrigaçãocurricular.

Fica claro em nossa pesquisa que oprocesso de maturidade acadêmica deter-mina a relação que o estudante estabelececom os agentes de formação cultural. Éevidente também que o aluno em contatocom o academicismo acaba desenvolven-do potencialidades que não foram desen-volvidas previamente, possivelmente pelafalta de herança cultural desenvolvido nocontexto familiar.

O ensino superior no Brasil vem pas-sando por um processo de transformação,adquirindo um modelo competitivo, no sen-tido de prioritariamente formar sua cliente-la para o mercado de trabalho. As políticasgovernamentais impõem um modo de serpara a universidade que a descaracterizacomo lugar de pesquisa, criticidade, criativi-dade e autonomia. Isto afeta o comporta-mento acadêmico dos estudantes, que, porsi mesmos, não desenvolveram durante suatrajetória de escolarização hábitos de estu-dos relevantes para sua formação.

É nesta conjuntura que o estudantede ensino superior vem sendo educado. Porisso, não basta uma mudança no sentidode motivar os estudantes a desenvolver oensino-pesquisa. É necessária uma mudan-ça radical no modelo curricular, na sua or-ganização, na política acadêmica, no pro-cesso de ensino e aprendizagem, no con-texto formativo e nas manifestações soci-ais e culturais da Universidade.

O estudante universitário como sersocialmente constituído é carregado devalores ideológicos que foram internaliza-

dos em sua vida através da sua relaçãocom o mundo. Nas palavras de Britto:

Este estudante possui característicaspróprias formadas em seu contexto social.Neste sentido, pode se dizer que suas difi-culdades em desenvolver estratégias deaprendizagem estão relacionadas a suaherança familiar, herdada no decorrer doseu desenvolvimento. Pesquisas recentestêm revelado que alunos oriundos de fa-mílias pobres têm mais dificuldades emdesenvolver os mecanismos de construçãodo conhecimento.

Portanto, cabe ao educador e a univer-sidade a responsabilidade de desenvolveruma educação democrática, comprometidacom a vida e para a vida, capaz de fomentaro pensamento crítico, desenvolver a autono-mia, despertar a criatividade, gerar transfor-mação pessoal e social. Num projeto destanatureza, a biblioteca deve ser mais que lu-gar de estudo ou de oferta dos livros ado-tados nas disciplinas dos diferentes cursos.

NotasNotasNotasNotasNotas1 Britto e Torezan (2002, p. 14), em seu estudo iden-tificam cinco perfis básicos de IES, os quais devemser tomados como referência, já que podem havercominações. São eles: 1. As grandes universidadespúblicas, que se constituem em referência de Edu-cação Superior e modelo de pesquisa, tais como:USP, Unicamp, UFRJ, UFMG, UFPE, UFRGS;. 2. Asuniversidades públicas regionais e as universida-des históricas, que se aproximam do modelo dasuniversidades de referência: UNESP, UFPR, UFCE,PUC-SP, PUC-RJ, PUC-RS; 3. Universidadesconfessionais e comunitárias, que buscam mode-los político-pedagógicos alternativos e enfrentamquestões específicas de gestão e financiamento:,MACKENZIE, UNIMEP, UNIJUÍ, UNOCHAPECÓ, PUC-Campinas/SP, e UNISO; 4. Universidades particulares

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de grandes centros urbanos, tais como UNIBAN, UNIP,UNIB, Estácio de Sá, UNIRIO, que se caracterizam porter fins lucrativos expressos e, portanto, se constituí-

rem em formas de investimento de capital; e 5. cCursos superiores isolados de interior, fundacionaisou privados, que atendem públicos locais.

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Recebido em 03 de setembro de 2004.Recebido em 03 de setembro de 2004.Recebido em 03 de setembro de 2004.Recebido em 03 de setembro de 2004.Recebido em 03 de setembro de 2004.Aprovado para publicação em 05 de outubro de 2004.Aprovado para publicação em 05 de outubro de 2004.Aprovado para publicação em 05 de outubro de 2004.Aprovado para publicação em 05 de outubro de 2004.Aprovado para publicação em 05 de outubro de 2004.

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Relato de PesquisaRelato de PesquisaRelato de PesquisaRelato de PesquisaRelato de Pesquisa

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Função educativa da escola, conhecimento doFunção educativa da escola, conhecimento doFunção educativa da escola, conhecimento doFunção educativa da escola, conhecimento doFunção educativa da escola, conhecimento doaluno e o trabalho de construir a identidadealuno e o trabalho de construir a identidadealuno e o trabalho de construir a identidadealuno e o trabalho de construir a identidadealuno e o trabalho de construir a identidadeprofissional desenvolvido pelo docenteprofissional desenvolvido pelo docenteprofissional desenvolvido pelo docenteprofissional desenvolvido pelo docenteprofissional desenvolvido pelo docente

Dáugima M. Santos Queiroz*Helena Faria de Barros**

* Doutora em Educação pela UNESP-Marília/SP. Professorado Programa de Mestrado em Educação da UCDB.e-mail: [email protected]

** Doutora em Educação pela UFSM. Professora do Mestradoem Educação da UCDB.e-mail: [email protected]

ResumoResumoResumoResumoResumoA função educativa da escola constitui, hoje, a essência do trabalho docente: a aprendizagem é sempremudança; no ensino há que se considerar o conhecimento experiencial do aluno e, por último, o trabalhodocente supõe sólida identidade profissional do professor. Este trabalho representa o empenho ou relaci-ona essas idéias postas a reflexão dos professores envolvidos pelo conhecimento experiencial dos alunos,conhecimento este revelado pelas respostas dadas a: “o que é ser professor ?” (em que consiste a profissãodocente?). Com os resultados pôde-se obter subsídios para planejar a disciplina Formação de Professores,Prática e Profissionalização Docente no Mestrado em Educação da Universidade Católica Dom Bosco deCampo Grande – MS, no ano de 2004.

Palavras-chavePalavras-chavePalavras-chavePalavras-chavePalavras-chaveFunção da escola, experiência do aluno e trabalho docente .

AbstractAbstractAbstractAbstractAbstractThe educational function of the school is today, the essence of the Teacher’s work; learning always meanschange; in education, the pupil’s experiential knowledge is to be considered and, lastly, teaching takes forgranted a solid professional identity of the Teacher. This study represents theeffort or relates these ideas placed in reflection by the Teachers involved in the pupil’s experientialknowledge, this knowledge being revealed by the answers to the question : “What is it to be a Teacher?”(What does the teaching profession consist of?) With the results it was possible to obtain elements for theplanning of the subject: Teacher Training, Teaching Practice and Profissionalization in the Master’s DegreeCourse in Education at the Dom Bosco Catholic University in Campo Grande – MS, in the year 2004.

Key WordsKey WordsKey WordsKey WordsKey WordsSchool Function , Student experience, and Teaching.

Série-Estudos - Periódico do Mestrado em Educação da UCDB.Série-Estudos - Periódico do Mestrado em Educação da UCDB.Série-Estudos - Periódico do Mestrado em Educação da UCDB.Série-Estudos - Periódico do Mestrado em Educação da UCDB.Série-Estudos - Periódico do Mestrado em Educação da UCDB.Campo Grande-MS, n. 18, p. 283-293, jul./dez. 2004.

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284 D.M.S. QUEIROZ e H.F. de BARROS. Função educativa da escola, conhecimento do...

IntroduçãoIntroduçãoIntroduçãoIntroduçãoIntrodução

Algumas s s s s idéias sustentam e dãocoerência ao presente trabalho. São elas: afunção educativa da escola constitui, hoje,a essência do trabalho docente nas socie-dades de orientação capitalista, como abrasileira; a aprendizagem é sempre mu-dança conceitual, procedimental ouatitudinal; no ensino, ou seja, nas tentati-vas para “fazer aprender”, há que se consi-derar o conhecimento experiencial apresen-tado pelo aluno e, por último, o trabalhodocente supõe e exige formação que refli-ta a construção sólida da identidade pro-fissional do professor.

Esta pesquisa representa o empe-nho de professores em relacionar essas idéi-as postas à sua reflexão pelo conhecimen-to experiencial dos alunos, conhecimentoeste revelado pelas respostas dadas à ques-tão o que é ser professor? (em que consistea profissão docente?). A mesma questãofoi oferecida a turmas diferentes: Licencia-tura em Filosofia (3º Ano), Normal Superior(3º Ano) e ingressantes do Mestrado emEducação da Universidade Católica DomBosco de Campo Grande–MS, no ano 2004.As intenções eram fazer um balanço dapercepção da profissão pelos licenciandos,e analisar o conhecimento experiencial dosalunos e aproveitá-lo na programação dedisciplinas. Desejava-se apreender a repre-sentação que possuíam em relação ao fa-zer docente, uma vez que duas turmas sãode concluintes dos cursos e, outra, de quemdeve cursar a disciplina Formação de Profes-sores Prática Docente e Profissionalização.

1 As idéias: função educativa da1 As idéias: função educativa da1 As idéias: função educativa da1 As idéias: função educativa da1 As idéias: função educativa daescola, o conhecimento experi-escola, o conhecimento experi-escola, o conhecimento experi-escola, o conhecimento experi-escola, o conhecimento experi-encial do aluno e aprendizagemencial do aluno e aprendizagemencial do aluno e aprendizagemencial do aluno e aprendizagemencial do aluno e aprendizagemvista como mudança conceitualvista como mudança conceitualvista como mudança conceitualvista como mudança conceitualvista como mudança conceitual

A função educativa da escola consisteem provocar a reconstrução do conheci-mento experiencial dos alunos, resultantedos processos mais gerais de socialização,vividos por eles na sociedade mais ampla,nos outros grupos sociais que não a escola.

Tem-se por certo que duas são asfunções postas à escola pelas sociedadescontemporâneas caracterizadas pela rigideze riqueza da produção e comunicação dasinformações: a função social (de socializa-ção) que é cumprida com a transmissão/aquisição da cultura, como qualquer outrainstituição, e a função educativa que definea escola, caracterizando-a, especificando-a.

Essas funções distinguem-se, opõem-se e completam-se. Falando sobre elasPèrez-Gomez (1995, p. 346) afirma que:

a instituição escolar, agora, mais do quenunca, pela onipresença e potencialidadedos poderosos meios de comunicação demassas, que universalizam os princípiosda cultura hegemônica na qual se socia-lizam as novas gerações, deve cumprir naatualidade, uma clara função de contras-te, de interrogação, que pretende provo-car a reflexão e possibilitar os processosindividuais e grupais de reconstrução ra-cional de experiência e de pensamento.

A função educativa da escola é, as-sim, hoje, considerada indispensável, isto é,é aquela que precisa ser bem cumprida demodo a não comprometer a convivênciademocrática e o desenvolvimento pessoalque se almeja.

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A escola se distingue por este seucaráter educativo, mediador, reflexivo, fren-te às influências múltiplas que recebe cadapessoa na interação social espontânea, noconvívio cotidiano e frente às formas comque cada pessoa interpreta e atua na reali-dade social, lembrando, com os antropólo-gos, que toda ação social é, simultaneamen-te, ato físico e significação.

Reforçando esta idéia o mesmo au-tor Pèrez-Gomez (1995, p. 348) diz que:

a escola, de um lado, frente a manuten-ção e agudeza cada vez maior dos dese-quilíbrios sociais produzidos pelas socieda-des de livre-mercado, deverá intensificaressa sua função de contraste, crítica,questionamento, reflexão, de modo que,ao menos, possa compensar, em parte, osefeitos produzidos nos indivíduos e grupos,as carências econômicas e culturais doscontextos sociais. Por outro lado, a escolaespecializa e peculiariza sua prática porseu caráter mediador e reflexivo questio-nando os influxos de todo tipo que o indi-víduo recebe em suas trocas espontâneasdentro de um cenário social concreto.

Portanto, a escola deve questionar aformação humana, o valor e a importânciadas influências recebidas em cada instânciasocial procurando criar um ambiente devivências e intercâmbios que possibilitama reflexão, a percepção de contrastes e areconstrução pessoal de conceitos, compor-tamentos, princípios.

Assim, por sua função socializadora,a escola busca, como todo o tecido social,formar atitudes e valores válidos para omercado de trabalho (já que a sociedade émarcadamente capitalista) tais como com-petição, individualismo, desejo de sucesso,concorrência. E, por sua função educativa,

busca formar pessoas solidárias, comempatia, participativas, pensantes, críticas,criativas. Constitui tarefa difícil, conciliar es-sas funções no dia a dia da sala de aula,mas, possível, com professor de formaçãoconsistente.

O essencial do trabalho a ser realiza-do nos cursos de formação de professoresé, portanto, fazer com que os futuros do-centes percebam essa contradição e criemmeios, usem estratégias para enfrentá-la.

O significado e abrangência do pa-pel da escola hoje (o jogo desse duplo ob-jetivo) devem estar claros para os profes-sores que, num esforço consciente, sejamcapazes de encontrar alternativas de supe-ração do conflito.

O conhecimento experimental do alu-no é o ponto de partida para esse trabalhodocente. Analisá-lo, contestá-lo, enriquecê-lo,interpretá-lo na perspectiva de outras visõese enfoques é que constitui o ato de ensinar,hoje, e o objetivo educativo da escola.

Santos (1994, p. 47), sobre este tema,diz que:

O valor das representações pessoais, ree-merge, não apenas por serem entendidascomo um valor em si, mas, porque a suaconsciencialização pode reverter em pro-veito da pessoa e da construção do seuconhecimento. Elas são entendidas agoracomo o motor de conhecimento científico,nomeadamente, quando constituem umcentro de rupturas conscientemente as-sumidas.

Igualmente, Gomes-Granell, concor-da que: Esse conhecimento experiencialcompreende crenças, concepções prévias outeorias pessoais que alguns autores cunha-ram de teorias implícitas devido ao seu ca-

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ráter não-acessível ou pouco acessível àconsciência (1997) p. 16).

Esta mesma autora citada, continu-ando, explica que as pesquisas mostraramque, em geral, o raciocínio dos seres huma-nos não obedece à aplicação das leis dalógica formal e que o conhecimento cotidia-no parece ser mais representativo da cogni-ção humana que o formal e o pensamentocotidiano é fruto da experiência social dire-ta e se adquire mediante participação naspráticas culturais habituais em determina-da sociedade (GOMES - GRANELL, 1997).

A terceira idéia que alicerçou o tra-balho aqui relatado é a de que a aprendi-zagem é sempre mudança conceitual. Oparadigma da mudança conceptual, noqual se inscrevem muitas das recentes in-vestigações em educação, leva em contaas representações dos alunos que se cons-tituem na escola como alternativa aos con-ceitos científicos e é passagem obrigatóriapara um ensino bem sucedido. Radica naidéia de que o aluno, para adquirir um novoconceito, tem de estar consciente das suasconcepções alternativas e ativamenteempenhado no processo de mudançaconceptual. Esta e a idéia anterior se com-pletam, se entrelaçam.

Diz-se que a escola em sua funçãoeducativa deve procurar mudar os concei-tos, os procedimentos e atitudes que os alu-nos trazem ao chegar à escola. Por estarazão, também, se diz que a ação do pro-fessor consiste em fazer com que o alunocaminhe do senso comum, da experiência,do cotidiano para o conhecimento mais sis-tematizado, formal, científico. A escola devetrabalhar o conhecimento experiencial e

fazer a mediação e contraste dele com oconhecimento científico que deve serensinado, lembrando-se que este últimoconstitui, também, aspectos da cultura quea sociedade criou e valoriza para seremadquiridos por todas as pessoas, indistin-tamente, se se pretende um viver democráti-co e um desenvolvimento pessoal das pos-sibilidades de todos e de cada um dos ato-res sociais. Há que se provocar e permitiruma (re)interpretação desse conhecimentoexperiencial.

Vergnaud (1988) mostrando quantofoi avançada a idéia de Vygotsky sobre azona de desenvolvimento proximal declaraque existem atividades que o aluno é ca-paz de exercer com a ajuda de outrem, semser capaz de fazê-las sozinho.A criança nãopoderá enriquecer suas competências esuas concepções senão na vizinhança, rela-tivamente estreita, de seu repertório atualde competências e conhecimentos. A idéiade atividade com ajuda de outrem é, evi-dentemente, uma idéia fecunda.

É ainda desse mesmo autor:É preciso muitas vezes desestabilizar pro-fundamente as concepções dos alunospara fazê-los compreender fenômenos econceitos novos ou fazê-los adquirir com-petências novas. A história das ciências edas técnicas nos ensina que há revolu-ções intelectuais. A didática nos ensinaque é preciso, muitas vezes, organizarrupturas importantes na progressão doconhecimento dos alunos e colocar emdestaque que essas rupturas demandamdesestabilizar, muitas vezes, as convicçõesexplícitas ou implícitas dos alunos(VERGNAND, 1989, p. 116).

A operacionalização dessas idéias sóé feita com sucesso por profissional que

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conseguir construir, em si e para si, a identi-dade profissional.

Recorre-se a autores vários para acompreensão da natureza e importânciadessa identidade profissional.

Assim, para Sá-Chaves (2000, p. 54):“O exercício profissional da docência, tendocomo unidade estruturante e referencial oato pedagógico, apresenta, relativamente àoutras profissões, uma especificidade que odiferencia e identifica como uma práxis social,cultural, científica e eticamente legitimada”.

E essa mesma autora completa: “Fa-lar em natureza específica significa que o atopedagógico tal como o ato clínico ou jurídi-co se traduz numa especificidade dos sabe-res científicos e técnicos e na especificidadedas circunstâncias e condições da práticapedagógica” (SÁ-CHAVES, 2000, p. 55).

Também Dubar (1997, p. 13) mostraque: “Identidade é aquilo que a pessoa temde mais precioso e a sua perda é sinônimode alienação, de sofrimento, de angustia emorte’’.

O autor está se referindo tanto à iden-tidade pessoal como à identidade social,profissional. Ele, na mesma página, acres-centa que: “(...) não se faz a identidade daspessoas sem elas e, contudo, não se podedispensar os outros para forjar a própriaidentidade”.

Borba (1999) apoiada em Dubarexplica, igualmente, que:

o sujeito na cotidianeidade apresenta-sesimultaneamente como “ser particular” ecomo “ser genérico” e só uma unidadedialética entre essas duas dimensõespoderá favorecer a construção de umaidentidade reflexiva, que contenha em si ainfinitude do humano (...). (...) Neste interagir

do sujeito, elementos de objetividade e desubjetividade medeiam determinadas rela-ções, em que o sujeito é ao mesmo temposujeito, autor, narrador e personagem...

Completando, Carrolo (1997) afirmaque a aquisição da identidade profissionaldocente supõe, de um lado, o percursobiográfico percorrido, a história pessoal vivi-da pelo candidato à docência e a perspecti-vação pessoal que faz do espaço de forma-ção, ou seja, depende das condições e pro-cessos oferecidos e, principalmente, da im-plicação pessoal nesses processos. É a es-fera subjetiva da identidade. Por outro lado,implica, ao mesmo tempo, na definição daidentidade atribuída por outrem, traduzidapelo ponto de vista dos colegas e forma-dores, acerca da dinâmica relacional e daavaliação do perfil profissional e pelo reco-nhecimento (deles) do ajustamento doscandidatos à profissão. É a esfera objetiva,social da identidade profissional.

Esse perfil da profissão se forma apartir da aquisição de conhecimentos espe-cíficos e para Tardif, Lessard, Lehaye (1991)os conhecimentos da profissão integram:saberes das disciplinas, saberes curriculares,profissionais técnicos e os da experiência.Para esses autores, uns, não são produzidospelos professores, mas ele os adquire paraserem reproduzidos a seguir. Por esta razãoos docentes mantém para com eles uma“relação de exterioridade”. Com os saberesda experiência, ao contrário, mantém os pro-fessores uma relação de “interioridade” porconstruí-los, eles próprios, ao longo de suastrajetórias profissional e pessoal. Os saberesda experiência convalidam e integram os de-mais, submetendo-os à prática.

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Portanto, o conhecimento profissio-nal do professor caracteriza-se pela nature-za complexa, ampla, multifacetada e inte-gra uma variedade de formas e categori-as. E, com Sá-Chaves e Alarcão (2000, p.64) pode-se dizer que: “o saber do profes-sor é preenchido por vários conhecimentosou saberes que respondem a uma série deinterrogações: o que ensinar, a quem, por-que, para quê, como, quando?

As idéias levantadas até aqui devemcompor, em cada profissional do ensino,uma unidade de saberes para que possam,efetivamente, serem utilizadas no cotidia-no. Essa unidade é chamada de perfil pro-fissional da docência.

2 A Pesquisa: O que é ser professor2 A Pesquisa: O que é ser professor2 A Pesquisa: O que é ser professor2 A Pesquisa: O que é ser professor2 A Pesquisa: O que é ser professor

A partir das idéias acima desenvol-vidas decidiu-se buscar o conhecimento

experiencial dos graduandos do 3º Ano deLicenciatura em Filosofia (29 alunos), estu-dantes do 3º Ano do Normal Superior (28)e ingressantes no Programa de Mestradoem Educação 2004 (20 alunos), todos daUniversidade Católica Dom Bosco de Cam-po Grande-MS.

Foi-lhes apresentada a questão pararesponderem por escrito: O que é ser pro-fessor? (em que consiste o trabalho do-cente?).

A intenção era obter dados que re-tratassem a representação da profissão quepossuíam e ainda, obter subsídios paraorientação, no mestrado, da disciplinaFormação de Professores e Prática Docen-te e profissionalização, a ser oferecida.

Com as respostas obtidas pôde-seestabelecer categorias que são apresenta-das na tabela a seguir:

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Das percentagens acima chama aatenção a importância que os alunos dostrês cursos atribuem à transmissão de co-nhecimentos pelo professor. Essa seria afunção específica do docente. Há que setrabalhar com esses alunos as funções desocialização e a educativa da escola paraque compreendam o papel de mediação ede questionamento que a escola deve ter.Do modo como afirmam põem a escolaem competição com os meios de comuni-cação, no que deverá sair perdendo. A fun-ção questionadora é a que é específica einconfundível da escola.

A ênfase no ensino como transmis-são de informações nas respostas dos alu-nos faz lembrar Roldão (1999, p. 114),quando diz:

O que caracteriza e distingue o ato deensinar, desde o tempo de nossos ante-passados gregos, escravos feitos pedagogosna antiga Roma, passando pelasdiversíssimas formas e finalidades queensinar tem assumido em sociedades eépocas diferentes, é a difícil competênciade fazer aprender.

E continua esta mesma autora, que:pensando em termos de profissionalidadeo professor pode ser definido, no essenci-al, como aquele que ensina, porém, mui-to freqüentemente, por razões históricasesse termo tem o significado de mera açãoexpositiva, divorciada ou desinteressada daaprendizagem. Fazer aprender exige cons-ciência de que a aprendizagem ocorre nooutro e só é significativa se consistir numtrabalho pessoal de apropriação do saberativamente (ROLDÃO, 1999, p. 115).

Assim, é preciso perceber que o pro-fessor trabalha na mediação entre a pes-soa que aprende e o conteúdo a ser apren-

dido. O trabalho consiste em ensinar à al-guém, algo.

Chama a atenção, igualmente, o va-lor que os três cursos atribuem às qualida-des pessoais do professor. Isto revela umaconcepção conservadora do fazer docentecomo dependente de atributos inatos e nãouma profissão em que à ação didática sefunde o saber teórico para resultar na práxispedagógica.

Essa visão dialética do trabalho do-cente aparece nas respostas dos alunos dostrês cursos e de modo destacado nas dosmestrandos, o que é sumamente louvável.Revelam ter alguma compreensão do queCandau (1991) aponta como característi-cas de qualquer profissão: ser um trabalhointelectual; consistir numa atividade ou ser-viço público único, essencial que deve serreconhecido pelo público em geral; a exis-tência de um código de ética no qual o ser-viço público é colocado acima do ganhoparticular; e gozar de certa autonomia paradesenvolver o trabalho.

Catorze por cento dos alunos doNormal Superior, nove por cento dos de Fi-losofia e quarenta por cento dos domestrado evidenciam saber que a docênciaé um fazer específico, que há uma identi-dade profissional a buscar. As respostasdadas mostram que essa percepção não écompleta, mas, pelo menos, há uma com-preensão incipiente a ser desenvolvida.

Estabelecendo-se comparação comtodo o grupo essas porcentagens represen-tam parte pequena dele.

A identidade profissional, o fazer do-cente, os problemas de profissionalizaçãodo magistério e a proletarização da

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docência, a formação docente, o professorenquanto profissional reflexivo e pesquisa-dor da própria prática merecem ser dis-cutidos com todos os alunos. Esse é con-tudo o grupo de profissionais que pode serreconhecido como tendo realmente for-mado a identidade profissional. Causa per-plexidade, porém, o verificar que apenas14% (catorze por cento) dos licenciandosdo Normal Superior e 9,0% (nove por cen-to) dos do Curso de Filosofia aparecemcomo aptos nesta identidade profissionaldocente.

A contribuição social da profissãopara a formação do cidadão e para avivência democrática aparece valorizada demodo especial pelos licenciandos de Filo-sofia. Seria a tônica humanista do curso aresponsável por essa relevância? Seria ametodologia de ensino utilizada que esta-beleceu esta ênfase? Esse destaque se devea todas ou algumas disciplinas pelas suasprogramações? São questões que merecempesquisas.

Por último, o idealismo ingênuo e aimprecisão das respostas constituem ma-terial especial de reflexão com os alunospara se evitar uma alienação ou formaçãodocente imprópria.

São exemplos dessas categorias:

1 - Ensinar é transmitir:

“Ser professor é transmitir os conhe-cimentos adquiridos”.

“É ser responsável pela transmissãode conhecimentos e pela estimulação daprodução deles”.

2 - Qualidades pessoais:

“Ser professor é ter humildade paraaprender e ensinar, sem esperar algo emtroca”.

“É ser paciente, dedicado, atencioso,gostar de seu trabalho”.

3 - Ensinar é arte, é dom:

“Ser professor é ter a arte de ensinar”.“Ensinar requer dom”.

4 - Idealismo Ingênuo:

“Antes de qualquer coisa ser profes-sor é ser um ser humano perfeito nas ho-ras certas e ao mesmo tempo ter o direitode errar”.

“Caminho de pedras para quem optaapenas como meio de ganhar a vida, ca-minho de rosas para quem ama o que faz”.

5 - Imprecisão:

“Ser professor deveria ser a profissãomais digna que existe, pois, todas as ou-tras dependem desta”.

“Para o professor hoje ser uma pes-soa de nome muitas vezes tem que se sa-crificar e não ser reconhecido como verda-deiro profissional”.

6 - Ofício da sobrevivência:

“Ser um profissional ou, como diziameu avô, ter um ofício, é o mesmo que serforjado para executar uma atividade parasobreviver dela”.

“Meio pelo qual o ser humano de-senvolve uma atividade para sua subsis-tência”.

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7 - Função social:

“É a atividade que visa o aperfeiçoa-mento do ser humano como colaboradore construtor da sociedade”.

“É promover o desenvolvimento hu-mano como cidadão mediante regrasestabelecidas pela sociedade”.

8 - Trabalho profissional:

“Profissão docente é uma atividadeintencional, organizada e sistemática comvistas à aprendizagem de determinadosconhecimentos, atitudes, valores e habilida-des por parte dos alunos”.

“Requer ou pressupõe uma compe-tência técnica que se constitui em conheci-mento de determinados conteúdos a seremensinados; competência humana que seestabelece na relação cotidiana entre pro-fessor e aluno; competência política que éo compromisso profissional frente à diver-sidade cultural da clientela com a qual tra-balha, com vistas à aquisição de conheci-mentos e posicionamento político frente àsociedade na qual está inserido”.

O senso comum, verificou-se, predo-mina no entendimento da questão propos-ta e as afirmações das respostas constituemo conhecimento experiencial disponível parase poder fazer o aluno caminhar, ir além.

3 Algumas considerações3 Algumas considerações3 Algumas considerações3 Algumas considerações3 Algumas considerações

As respostas obtidas revelaram gran-de dispersão de conhecimentos, pouco con-senso, destaque a aspectos pontuais dofazer docente, o que torna evidente um co-nhecimento profissional sem conveniente

unidade. Revelaram ausência de profundi-dade e consistência no que diz respeito aodomínio da identidade da profissão.

Farto material se oferece para uma(re)orientação da formação do professornas licenciaturas estudadas. Há que se com-pletar a programação das disciplinas demodo que se concentre em possibilitar apercepção da especificidade da profissão;há que se compreender a ação pedagógi-ca como um “fazer aprender” pela própriametodologia de ensino a ser utilizada comesses alunos respondentes, pois, há que sepôr em discussão o conhecimentoexperiencial que apresentaram; há que secolocar esses alunos em contato com a re-alidade-escola para que tenham a oportu-nidade de refletir sobre o que lá fizeram ouviram, e cheguem, assim, a adquirir oumudar o conhecimento experiencial queportam. Como ainda era início do ano leti-vo, um trabalho de complementação deconceitos, procedimentos, atitudes e valo-res pôde ser desencadeado.

Em relação ao Mestrado em Educa-ção foram as respostas aproveitadas comosubsídios à programação da disciplina For-mação de Professores, trabalho e profis-sionalização docente como se desejava.

A seleção e organização dos conteú-dos adequados às dificuldades encontra-das foi possível. Pensou-se em três gran-des unidades para serem discutidas: aprofissionalização docente, a identidade esaberes do professor e a formação docen-te-inicial, o cuidado com a entrada na pro-fissão e a formação continuada. A ordemde apresentação das unidades foi, também,considerada como importante.

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Pensou-se, igualmente, numa meto-dologia de ensino capaz de levar os mes-trandos a refletirem sobre as próprias respos-tas, a partir de leituras de textos selecionadose de relatos de experiência sobre a formaçãodocente. Discussão, diálogo, troca de experi-ência foram valorizados. Suas afirmações fo-ram consideradas problemas a discutir.

Com a pesquisa pôde-se confirmarque as idéias orientadoras ao trabalho são,de fato, necessárias à formação docente eque nesta formação todas as disciplinas sãoresponsáveis e, por isso, devem se voltarpara o esforço de conseguir que cada aspi-rante à profissão elabore para si a identi-dade profissional do professor. Essa identi-dade compreende: um corpo de conheci-mentos formais validados pela prática, pro-

cedimentos técnicos específicos, atitudes evalores referentes à profissão além de umareconhecida autonomia no trabalho.

Como afirma Pèrez-Gomez (1995, p.340):

Esses aspectos, imprescindíveis na identi-dade e prática profissional se encontramestreitamente relacionados e mutuamen-te exigidos. O profissional reclama auto-nomia para o desenvolvimento de suaatividade porque é o depositário de umconhecimento especializado e “experto”que legitima a racionalidade de seus di-agnósticos e de suas práticas. Por outrolado, a contrapartida de responsabilidadeque assume perante a sociedade pelaqualidade do seu trabalho com o grupo(ou no grupo) não pode ser outra quenão o exercício autônomo (funçãoeducativa) de sua prática.

ReferênciasReferênciasReferênciasReferênciasReferências

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Recebido em 10 de setembro de 2004.Recebido em 10 de setembro de 2004.Recebido em 10 de setembro de 2004.Recebido em 10 de setembro de 2004.Recebido em 10 de setembro de 2004.Aprovado para publicação em 27 de outubro de 2004.Aprovado para publicação em 27 de outubro de 2004.Aprovado para publicação em 27 de outubro de 2004.Aprovado para publicação em 27 de outubro de 2004.Aprovado para publicação em 27 de outubro de 2004.

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“Palco das diferenças”, a escola faz a diferença...“Palco das diferenças”, a escola faz a diferença...“Palco das diferenças”, a escola faz a diferença...“Palco das diferenças”, a escola faz a diferença...“Palco das diferenças”, a escola faz a diferença...

Antonio H. Aguilera Urquiza

Doutorando em Antropologia pela Universidade deSalamanca/Espanha. Professor da Faculdade Estácio de Sá.e-mail: hilá[email protected]

NASCIMENTO, Adir Casaro. Escola indígena: palco das diferenças. Coleção Teses e Dis-sertações em Educação. vol. 2. Campo Grande: UCDB, 2004.

A obra Escola Indígena – Palco dasDiferenças, 2º volume da “Coleção Teses eDissertações em Educação” da UCDB Edi-tora (2004), é apresentada pela própria au-tora, professora Adir Casaro Nascimento,como um estudo do conceito de diferença,o qual adquire um caráter epistemológicoa ser tomado e vivido, como um eixo curri-cular que promova o diálogo, a mediaçãoreflexiva, o apropriar-se da pluralidade semque haja a dissolução étnica, provocandoassim, a necessidade de uma reinvençãoda escola para as populações indígenas epor conseqüência a ressignificação das prá-ticas pedagógicas/ educativas.

Vivendo o presente de uma ordemmundial globalizada e assentada no mo-vimento de capitais virtuais, torna-se dupla-mente desafiador falar e apresentar um tex-to que trata da diferença, dentro da reali-dade indígena. Inclusive porque este cená-rio das contradições sociais, que emerge dochão da economia, reflete-se, como nãopoderia deixar de ser, também no campoda educação, nos projetos pedagógicos, deforma ainda mais acentuada, quando tra-

tamos da educação indígena.O conceito de diferença, talvez seja

uma das grandes questões colocadas àsciências sociais na atualidade, pois se tratade um dado da própria realidade humana,ou seja, o que nos une de fato, são nossasdiferenças. Todos reconhecem a diferençacomo um dos traços mais significativos dacultura contemporânea, afinal, a diferençanão é só compatível com o ser humano,mas é sua própria condição.

Como ponto de partida podemosdizer que o termo diferença procede da lín-gua latina differentia que designa a quali-dade de ser diferente, ou seja, aquele quenão é igual, que não coincide, que difereou diverge1. Esta aproximação inicial aoconceito, através da filologia, não nos reve-la toda a riqueza semântica do termo, so-bretudo porque, na atualidade da reflexãodentro das ciências sociais, relacionamosdiferença mais à diversidade do que à de-sigualdade, uma vez que “a diferença iden-tifica e a desigualdade deforma”.

Tendo em vista a corajosa opção fei-ta pela autora ao longo de sua vida aca-

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dêmica pelas minorias, neste caso a etniaGuarani/Kaiowá, é evidente que ela adote,ao longo do seu texto, a posição óbvia deque diferença não é sinônimo de desigual-dade; ou melhor, com diferenças muitas ve-zes escondemos desigualdades. A tentativaé justamente, através de um estudo crítico,detectar os mecanismos que acobertam asdesigualdades, em nome das diferençasculturais, a partir do contexto da educação.

Reconhecer a diferença cultural nasociedade e na escola traz como primeiraimplicação, para a prática pedagógica, oabandono de uma perspectiva historica-mente monocultural, que seria tratar todosos alunos como idênticos, com saberes enecessidades semelhantes, o que o eximede diferenciar o currículo e a relação peda-gógica que se estabelece em sala de aula.Mais contraditório, porém, quando esse tra-tamento homogeneizador ocorre dentro deuma escola indígena.

Na perspectiva da educação, o reco-nhecimento da diversidade cultural gera, emum primeiro momento, atitudes e práticasmulticulturais, ou seja, a busca do diálogoe a tentativa de que o outro seja reconheci-do em sua diferença. Entretanto, como nãobasta reconhecer a diferença, é necessárioestabelecer uma relação, ou melhor, umainter-relação entre as pessoas de culturasdiferentes para justamente permitir um en-tendimento recíproco, o que chamamos deeducação intercultural.

Profundamente relacionada à ques-tão da diferença, na prática pedagógica, ainterculturalidade em seus projetos educa-tivos favorece que a cultura própria e outrasculturas interajam e se enriqueçam de ma-

neira dinâmica e recíproca, contribuindopara plasmar na realidade social uma coe-xistência em condições de respeito e valori-zação mútuos, de equidade e igualdade,fundamentadas no intercâmbio de sabe-res, conhecimentos e no reconhecimento dooutro como diferente, porém não inferior.

Ao tratar da Escola Indígena: palcodas diferenças, conjuntamente às questõesdo protagonismo, autonomia e alteridade,a autora vai realizando, dialeticamente, umdebate profícuo acerca da atual realidadedas escolas indígenas no Estado do MatoGrosso do Sul, particularmente as Guarani/Kaiowá e as várias tentativas de implanta-ção de uma educação indígena propostapelo Governo Federal, concretizada noRCNEI (Referencial Curricular Nacional paraEducação Indígena), a qual sugere que sejaintercultural, específica, diferenciada, bilíngüee comunitária. Neste caso, a proposta deinterculturalidade surge como o caminhoque deverá conduzir ao respeito pelas dife-renças culturais, produzidas no processo decontato entre culturas distintas.

A presente publicação - adaptada desua tese doutoral2, porém, sem mudançassubstancias - está organizada em três ca-pítulos, que percorre desde a fundamenta-ção teórica do próprio conceito de diferen-ça, passando pela emergência do índio eda educação escolar indígena, até chegarna discussão das propostas atuais de im-plantação oficial de uma educação indíge-na. O que mais chama a atenção em todoeste percurso, é a habilidade da autora dedialogar uma refinada pesquisa teórica comuma particular e atenta pesquisa empírica,fruto de vários anos de experiência, diálo-

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Série-Estudos... Campo Grande-MS, n. 18, p. 297-300, jul./dez. 2004. 299

go e presença entre as populações indíge-nas Guarani/Kaiowá.

“A questão indígena e a diferença”.Trata-se de um primeiro capítulo dedicadoàs questões metodológicas e conceituais,ressaltando a complexidade da relação en-tre o índio, a escola e a diferença. Neste sen-tido relembramos aqui, em palavras de Sil-va (2002:66)3 algumas impertinências,como por exemplo: A diferença não temnada a ver com o diferente. A redução dadiferença ao diferente equivale a uma redu-ção da diferença à identidade. (...) A diferençanão tem nada a ver com a diferença entrex e y, mas com o que se passa entre x e y.

No segundo capítulo “Quem é o ín-dio que quer escola?” a autora retoma opercurso de emergência do índio e da edu-cação escolar indígena no cenário nacio-nal, pondo em destaque a situação do ín-dio contemporâneo em sua condição desujeito histórico, possuidor de uma identi-dade construída sob o jugo da coloniza-ção. Este mesmo índio, por outro lado, éapresentando pela autora, como sujeitohistórico, que consciente de sua condiçãode minoria que tem direitos, reivindica par-ticipar de um processo de interculturalidadee de convivência, em pé-de-igualdade, coma sociedade não-índia.

Apesar das mudanças que se intro-duziram na nova constituição de 1988, eos atuais movimentos indígenas no Brasile na América Latina por direitos, na verda-de, as relações interétnicas seguem refor-çando a situação subordinada dos índiosem relação à sociedade mais ampla. Navida cotidiana das comunidades indígenasvive-se um constante choque cultural e uma

grande falta de respeito pela diferença.Geralmente não há, nestas relações, equi-dade, valorização positiva, aceitação nemrespeito pelas culturas indígenas.

Muitos, em nome de um certo res-peito à diferença, acabam produzindo umnovo apartheid cultural que, visando a cri-ar igualdade, reafirmam a separação. A his-tória mostra-nos que igual desenvolvimen-to e separação jamais conseguiram coexis-tir. Com separação não há igualdade, háapartheids. “A igualdade só existe quandohá possibilidade de se compararam as coi-sas” (SOUSA SANTOS, 2001, p. 22)4.

No terceiro capítulo “Educação Esco-lar Indígena: mas o que é e onde está adiferença?” Nascimento realiza algo nãomuito comum em estudos teóricos: ela trazpara a frente do palco das discussões aprópria fala dos protagonistas originais daquestão: os professores indígenas e lideran-ças. A partir das falas destes personagensa autora vai reconstituindo com apoio teó-rico de Certeau, Perrenoud, Giroux, SousaSantos, Bakthin e outros, a questão dosprocessos educativos entre os alunos indí-genas das escolas Guarani/Kaiowá. Umavez mais se comprova que uma educaçãoespecífica e diferenciada representa o ca-minho para o reconhecimento da cidada-nia plena, para o respeito a diferencia e paraa busca de um futuro com maiores possi-bilidades de igualdade social.

A autora tece as considerações finaisde seu livro afirmando os limites e as pos-sibilidades de concretização da categoriadiferença nas escolas públicas para as co-munidades indígenas, ou melhor, chega àconclusão de que, na prática, não é possí-

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300 Antonio H. Aguilera URQUIZA. “Palco das direfenças”, a escola faz a diferença...

vel a existência de um significado preesta-belecido para o conceito de diferença. Empalavras da própria autora:

(...) a diferença, embora possa ser umacategoria que rompa com os modelos cris-talizados, terá que ser sempre construída,reelaborada. A diferença, enquanto umateoria da educação, será sempre dinâmica,dialética e superadora. (...) o conceito dediferença e especificidade também depen-derá das particularidades, das singulari-dades, das histórias e das perspectivas defuturo de cada comunidade (pp. 175-6).

Retomando, de certa forma, a traje-tória inicial do livro, podemos concluir afir-mando, mais uma vez, que instituída emum panorama de negação da diferença, aeducação dos índios, desde sua origem noPeríodo Colonial até final do século XX,esteve marcada por ações de catequese,civilização e integração. Até bem pouco tem-po, grande parte das escolas indígenas “ti-nham como tarefa principal a transforma-ção do ‘outro’ em algo ‘similar’ que, por de-finição, será sempre inferior ao original” (SIL-VA Y AZEVEDO, 1995:151)5. Neste sentido,independente da cultura em que se desen-volve, uma proposta de educação intercul-

tural teria que assumir o objetivo de contri-buir para a construção de uma relaçãoigualitária e de intercambio entre os gru-pos em contato. A educação interculturalsurge, desta maneira, na raiz dos conflitose das demandas sociais e políticas das co-munidades indígenas, que consideram queseus direitos como cidadãos democráticosnão são respeitados nem reconhecidos.

NotasNotasNotasNotasNotas1 FERREIRA, Aurélio Buarque de Holanda. Novo di-cionário Aurélio da Língua Portuguesa. 2. Ed. Rio deJaneiro: Nova Fronteira. 1986.2 Apresentada ao Programa de Pós-Graduação emEducação da Universidade Estadual Paulista Júliode Mesquita Neto, Campus de Marília – NASCIMEN-TO, Adir Casaro. Educação escolar indígena: em buscade um conceito de educação diferenciada.3 SILVA, Tomás Tadeu. Identidade e diferença: Imper-tinências. In: Educação & Sociedade. RevistaQuadrimestral de Ciência da Educação. CEDES: Cam-pinas/SP. n. 79, ano XXIII, agosto/2002.4 SOUZA SANTOS, Boaventura. Dilema do nosso tem-po: globalização, multiculturalismo e conhecimen-to. Educação & Realidade, Porto Alegre: UFRS, Fa-culdade de Educação, vol. 26, n. 1, p. 13-32, 20015 SILVA, Luiz Heron da & AZEVEDO, José Clóvis de.(org.). Reestruturação Curricular. Petrópolis: Vozes, 1995.

Recebido em 05 de outubro de 2004.Recebido em 05 de outubro de 2004.Recebido em 05 de outubro de 2004.Recebido em 05 de outubro de 2004.Recebido em 05 de outubro de 2004.Aprovado para publicação em 01 de novembro de 2004.Aprovado para publicação em 01 de novembro de 2004.Aprovado para publicação em 01 de novembro de 2004.Aprovado para publicação em 01 de novembro de 2004.Aprovado para publicação em 01 de novembro de 2004.

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Normas para publicação na Revista Série-Estudos –Normas para publicação na Revista Série-Estudos –Normas para publicação na Revista Série-Estudos –Normas para publicação na Revista Série-Estudos –Normas para publicação na Revista Série-Estudos –Periódico do Programa de Mestrado em EducaçãoPeriódico do Programa de Mestrado em EducaçãoPeriódico do Programa de Mestrado em EducaçãoPeriódico do Programa de Mestrado em EducaçãoPeriódico do Programa de Mestrado em Educaçãoda UCDBda UCDBda UCDBda UCDBda UCDB

1) SÉRIE-ESTUDOS – Periódico do Programa de Mestrado em Educação da UniversidadeCatólica Dom Bosco – está aberta à comunidade acadêmica e destina-se à publicaçãode trabalhos que, pelo seu conteúdo, possam contribuir para a formação e odesenvolvimento científico, além da atualização do conhecimento na área específicada educação.

2) As publicações deverão conter trabalhos da seguinte natureza:• Artigos originais, de revisão ou de atualização que envolvam abordagens teóricas

e/ou práticas referentes à pesquisa, ensino e extensão e que atinjam resultadosconclusivos e significativos.

• Traduções de textos não disponíveis em língua portuguesa, que constituamfundamentos da área específica da Revista e que, por essa razão, contribuam paradar sustentação e densidade à reflexão acadêmica.

• Entrevistas com autoridades na área específica da Educação, que vêm apresentandotrabalhos inéditos, de relevância nacional e internacional, com o propósito de mantero caráter de atualidade da Revista.

• Resenhas de produções relevantes que possam manter a comunidade acadêmicainformada sobre o avanço das reflexões na área educacional.

3) A publicação de trabalhos deverá passar pela aprovação do Conselho de Pareceristasda Revista.

4) Caberá ao Conselho Editorial da Revista selecionar trabalhos com base nestas normase encaminhá-los para os pareceristas da área.

5) A entrega de originais para a Revista deverá obedecer aos seguintes critérios:§ Os trabalhos deverão conter, obrigatoriamente: título em português; nome(s) do(s)

autor(es), identificando em nota de rodapé o endereço completo e o eletrônico, atitulação e a instituição a que pertence(m);

§ Os artigos deverão conter, ainda, resumo em português (máximo dez linhas) e abstractfiel ao resumo, acompanhados, respectivamente, de palavras-chave e key words,ambas em número de três;

§ Nas citações, as chamadas pelo sobrenome do autor, pela instituição responsávelou título incluído na sentença devem observar as normas técnicas da ABNT – NBR

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10520, agosto 2002. Exemplos: Saviani (1987, p. 70). (SAVIANI, 1987, P. 70);§ As notas explicativas devem ser usadas para comentários, esclarecimentos ou

explanações, que não possam ser incluídos no texto e devem constar no final dotexto, antes da referência bibliográfica.

§ A referência bibliográfica, no final do texto, em ordem alfabética, deve seguir asNormas Técnicas da ABNT, NBR 6023, agosto 2002. Os elementos essenciais ecomplementares da referência devem ser apresentados em seqüência padronizada,de acordo com o documento. O nome do autor, retirado do documento, deve serpor extenso.

6) Os trabalhos deverão ser encaminhados dentro da seguinte formatação: uma cópia emdisquete, editor Word for Windows 6.0 ou superior; duas cópias impressas, com textoelaborado em português e rigorosamente corrigido e revisado, devendo ser uma delassem identificação de autoria; limite aproximado de cinco a vinte laudas para artigos,cinco laudas para resenhas, dez laudas para entrevistas e quinze laudas para traduções;a fonte utilizada deve ser Times New Roman, tamanho 12, espaço entrelinhas 1,5.

7) Eventuais ilustrações e tabelas com respectivas legendas devem ser apresentadasseparadamente, com indicação, no texto, do lugar onde serão inseridas. Todo materialfotográfico deverá ser em preto e branco.

8) Os artigos recusados ficarão à disposição dos autores na Editora.9) Ao autor de artigo aprovado e publicado serão fornecidos, gratuitamente, três

exemplares do número correspondente da Revista.10) Uma vez publicados os trabalhos, a Revista se reserva todos os direitos autorais,

inclusive os de tradução, permitindo, entretanto, a sua posterior reprodução comotranscrição e com a devida citação da fonte.

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Lista de periódicos que fazem permuta com aLista de periódicos que fazem permuta com aLista de periódicos que fazem permuta com aLista de periódicos que fazem permuta com aLista de periódicos que fazem permuta com aRevista Série-EstudosRevista Série-EstudosRevista Série-EstudosRevista Série-EstudosRevista Série-Estudos

PERMUTPERMUTPERMUTPERMUTPERMUTAS NACIONAISAS NACIONAISAS NACIONAISAS NACIONAISAS NACIONAIS

1) Akrópolis – Revista de Ciências Humanas da UNIPAkrópolis – Revista de Ciências Humanas da UNIPAkrópolis – Revista de Ciências Humanas da UNIPAkrópolis – Revista de Ciências Humanas da UNIPAkrópolis – Revista de Ciências Humanas da UNIPAR AR AR AR AR / Universidade Paranaense- UNIPAR / Umuarama-PR

2) Argumento - Revista das Faculdades de Educação, Ciências e Letras eArgumento - Revista das Faculdades de Educação, Ciências e Letras eArgumento - Revista das Faculdades de Educação, Ciências e Letras eArgumento - Revista das Faculdades de Educação, Ciências e Letras eArgumento - Revista das Faculdades de Educação, Ciências e Letras ePsicologia Padre Anchieta Psicologia Padre Anchieta Psicologia Padre Anchieta Psicologia Padre Anchieta Psicologia Padre Anchieta / Sociedade Padre Anchieta de Ensino / Jundiaí-SP

3) Asas da Palavra Asas da Palavra Asas da Palavra Asas da Palavra Asas da Palavra / Universidade da Amazônia - UNAMA / Belém-PA4) AAAAAvesso do Avesso do Avesso do Avesso do Avesso do Avesso vesso vesso vesso vesso / Fundação Educacional Araçatuba / Araçatuba-SP5) Biomassa e EnergiaBiomassa e EnergiaBiomassa e EnergiaBiomassa e EnergiaBiomassa e Energia / Universidade Federal de Viçosa / Viçosa-MG6) Bolema – Boletim de Educação Matemática Bolema – Boletim de Educação Matemática Bolema – Boletim de Educação Matemática Bolema – Boletim de Educação Matemática Bolema – Boletim de Educação Matemática / UNESP – Rio Claro / Rio Claro-SP7) Boletim de Educação Matemática e Ciência e Educação Boletim de Educação Matemática e Ciência e Educação Boletim de Educação Matemática e Ciência e Educação Boletim de Educação Matemática e Ciência e Educação Boletim de Educação Matemática e Ciência e Educação / Universidade Estadual

Paulista / Rio Claro-SP8) Caderno Brasileiro de Ensino de Física Caderno Brasileiro de Ensino de Física Caderno Brasileiro de Ensino de Física Caderno Brasileiro de Ensino de Física Caderno Brasileiro de Ensino de Física / Universidade Federal de Santa Catarina –

UFSC / Florianópolis-SC9) Caderno Catarinense de Física Caderno Catarinense de Física Caderno Catarinense de Física Caderno Catarinense de Física Caderno Catarinense de Física / Universidade Federal de Santa Catarina / Florianópolis-

SC10) Caderno de Estudos e Pesquisas Caderno de Estudos e Pesquisas Caderno de Estudos e Pesquisas Caderno de Estudos e Pesquisas Caderno de Estudos e Pesquisas / Universidade Salgado de Oliveira – UNIVERSO /

São Gonçalo -RJ11) Cadernos da Escola de Direito e Relações Internacionais Cadernos da Escola de Direito e Relações Internacionais Cadernos da Escola de Direito e Relações Internacionais Cadernos da Escola de Direito e Relações Internacionais Cadernos da Escola de Direito e Relações Internacionais / Faculdades do Brasil

– UniBRasil / Curitiba-PR12) Cadernos Cadernos Cadernos Cadernos Cadernos / Centro Universitário São Camilo / São Paulo-SP13) Cadernos da Graduação Cadernos da Graduação Cadernos da Graduação Cadernos da Graduação Cadernos da Graduação / Universidade Federal do Ceará - UFC / Fortaleza-CE14) Cadernos de Educação Cadernos de Educação Cadernos de Educação Cadernos de Educação Cadernos de Educação / UNIC – Universidade de Cuiabá / MT15) Cadernos de Educação Cadernos de Educação Cadernos de Educação Cadernos de Educação Cadernos de Educação / Universidade Federal de Pelotas - UFPel / RS16) Cadernos de Educação Especial Cadernos de Educação Especial Cadernos de Educação Especial Cadernos de Educação Especial Cadernos de Educação Especial / Universidade Federal de Santa Maria - UFSM / RS17) Cadernos de Pesquisa Cadernos de Pesquisa Cadernos de Pesquisa Cadernos de Pesquisa Cadernos de Pesquisa / Universidade Federal do Maranhão / São Luís-MA18) Caderno de Pesquisa Caderno de Pesquisa Caderno de Pesquisa Caderno de Pesquisa Caderno de Pesquisa / Fundação Carlos Chagas / São Paulo-SP19) Cadernos de Pesquisa - TCadernos de Pesquisa - TCadernos de Pesquisa - TCadernos de Pesquisa - TCadernos de Pesquisa - Turismo urismo urismo urismo urismo / Faculdades de Curitiba / Curitiba-PR20) Cadernos de Pesquisa em Educação PPGE Cadernos de Pesquisa em Educação PPGE Cadernos de Pesquisa em Educação PPGE Cadernos de Pesquisa em Educação PPGE Cadernos de Pesquisa em Educação PPGE / Universidade Federal do Espírito Santo

- UFES / Vitória-ES21) Cadernos do Centro Universitário São Camilo Cadernos do Centro Universitário São Camilo Cadernos do Centro Universitário São Camilo Cadernos do Centro Universitário São Camilo Cadernos do Centro Universitário São Camilo / Centro Universitário São Camilo /

São Paulo-SP22) Cadernos de Psicologia Social do TCadernos de Psicologia Social do TCadernos de Psicologia Social do TCadernos de Psicologia Social do TCadernos de Psicologia Social do Trabalho rabalho rabalho rabalho rabalho / Universidade de São Paulo - USP / SP23) Cadernos do UNICEN Cadernos do UNICEN Cadernos do UNICEN Cadernos do UNICEN Cadernos do UNICEN / Universidade de Cuiabá - UNIC / MT

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24) Caderno Interciências de Pesquisa e Extensão Caderno Interciências de Pesquisa e Extensão Caderno Interciências de Pesquisa e Extensão Caderno Interciências de Pesquisa e Extensão Caderno Interciências de Pesquisa e Extensão / Universidade Ibirapuera / Moema-SP

25) Caesura Caesura Caesura Caesura Caesura / Universidade Luterana do Brasil – ULBRA / Canoas-RS26) Cesumar Saúde Cesumar Saúde Cesumar Saúde Cesumar Saúde Cesumar Saúde / Centro Universitário de Maringá / Maringá-PR27) Cesur em Revista Cesur em Revista Cesur em Revista Cesur em Revista Cesur em Revista / Faculdade do Sul de Mato Grosso / Campo Grande-PR28) Ciências da Educação Ciências da Educação Ciências da Educação Ciências da Educação Ciências da Educação / Centro Universitário Salesiano - UNISAL / Lorena-SP29) Conhecendo a Enfermagem Conhecendo a Enfermagem Conhecendo a Enfermagem Conhecendo a Enfermagem Conhecendo a Enfermagem / Universidade do Sul de Santa Catarina / Tubarão-SC30) Diálogo Diálogo Diálogo Diálogo Diálogo / Centro Universitário La Salle - UNILASALLE / Canoas-RS31) Diálogo Educacional Diálogo Educacional Diálogo Educacional Diálogo Educacional Diálogo Educacional / Pontifícia Universidade Católica do Paraná – PUCPR / PR32) Educação – Revista de Estudos da Educação Educação – Revista de Estudos da Educação Educação – Revista de Estudos da Educação Educação – Revista de Estudos da Educação Educação – Revista de Estudos da Educação / Universidade Federal de Alagoas -

UFAL /Maceió-AL33) Educação & Realidade Educação & Realidade Educação & Realidade Educação & Realidade Educação & Realidade / Universidade Federal do Rio Grande do Sul – UFRGS / RS34) Educação e Filosofia Educação e Filosofia Educação e Filosofia Educação e Filosofia Educação e Filosofia / Universidade Federal de Uberlândia – UFU / MG35) Educação e PesquisaEducação e PesquisaEducação e PesquisaEducação e PesquisaEducação e Pesquisa / Universidade de São Paulo – USP / SP36) Educação em Debate Educação em Debate Educação em Debate Educação em Debate Educação em Debate / Universidade Federal do Ceará / Fortaleza-CE37) Educação em Foco Educação em Foco Educação em Foco Educação em Foco Educação em Foco / Universidade Federal de Juiz de Fora - UFJF / MG38) Educação em Questão Educação em Questão Educação em Questão Educação em Questão Educação em Questão / Universidade Federal do Rio Grande do Norte – UFRN / RN39) Educação em Revista Educação em Revista Educação em Revista Educação em Revista Educação em Revista / Universidade Federal de Minas Gerais / UFMG / MG40) Educação UNISINOSEducação UNISINOSEducação UNISINOSEducação UNISINOSEducação UNISINOS / Universidade do Vale do Rio dos Sinos – UNISINOS / São Leopoldo-

RS41) Educar em Revista Educar em Revista Educar em Revista Educar em Revista Educar em Revista / Universidade Federal do Paraná – UFPR / Curitiba-PR42) Educativa Educativa Educativa Educativa Educativa / Universidade Católica de Goiás – UCG / GO43) Em Aberto Em Aberto Em Aberto Em Aberto Em Aberto / Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais / Brasília-DF44) Ensaio – Pesquisa em Educação em Ciências Ensaio – Pesquisa em Educação em Ciências Ensaio – Pesquisa em Educação em Ciências Ensaio – Pesquisa em Educação em Ciências Ensaio – Pesquisa em Educação em Ciências / Universidade Federal de Minas

Gerais – UFMG / MG45) Ensaio Ensaio Ensaio Ensaio Ensaio / Fundação Cesgranrio / Rio de Janeiro-RJ46) Ensino em Re-vista Ensino em Re-vista Ensino em Re-vista Ensino em Re-vista Ensino em Re-vista / Universidade Federal de Uberlândia – UFU / MG47) Espaço Pedagógico Espaço Pedagógico Espaço Pedagógico Espaço Pedagógico Espaço Pedagógico / Universidade de Passo Fundo / RS48) Estudos – Revista da Faculdade de Ciências Humanas Estudos – Revista da Faculdade de Ciências Humanas Estudos – Revista da Faculdade de Ciências Humanas Estudos – Revista da Faculdade de Ciências Humanas Estudos – Revista da Faculdade de Ciências Humanas / Universidade de Marília

- UNIMAR / Marília-SP49) Estudos - Estudos - Estudos - Estudos - Estudos - Universidade Católica de Goiás – UCG / GO50) Foco – Revista do Curso de Letras Foco – Revista do Curso de Letras Foco – Revista do Curso de Letras Foco – Revista do Curso de Letras Foco – Revista do Curso de Letras / Centro Universitário Moura Lacerda / Ribeirão

Preto-SP51) Fragmentos de Cultura Fragmentos de Cultura Fragmentos de Cultura Fragmentos de Cultura Fragmentos de Cultura / Universidade Católica de Goiás – UCG / GO52) Gestão e Ação Gestão e Ação Gestão e Ação Gestão e Ação Gestão e Ação / Universidade Federal da Bahia / Salvador-BA53) Ícone Ícone Ícone Ícone Ícone / Centro Universitário do Triangulo / Uberlândia-MG54) Inter-ação Inter-ação Inter-ação Inter-ação Inter-ação / Universidade Federal de Goiás – UFG / GO55) Intermeio – Revista do Mestrado em Educação Intermeio – Revista do Mestrado em Educação Intermeio – Revista do Mestrado em Educação Intermeio – Revista do Mestrado em Educação Intermeio – Revista do Mestrado em Educação / Universidade Federal de Mato

Grosso do Sul - UFMS / Campo Grande-MS56) Justiça e Sociedade Justiça e Sociedade Justiça e Sociedade Justiça e Sociedade Justiça e Sociedade / Universidade do Oeste Paulista / Presidente Prudente-SP57) Letras Contábeis Letras Contábeis Letras Contábeis Letras Contábeis Letras Contábeis / Faculdades Integradas de Jequié - FIJ / Jequié-BA58) Letras de Hoje Letras de Hoje Letras de Hoje Letras de Hoje Letras de Hoje / Pontificia Universidade Católica do Rio Grande do Sul – PUCRS / RS

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59) Linguagem em Discurso – Revista Científico-literária dos Cursos de MestradoLinguagem em Discurso – Revista Científico-literária dos Cursos de MestradoLinguagem em Discurso – Revista Científico-literária dos Cursos de MestradoLinguagem em Discurso – Revista Científico-literária dos Cursos de MestradoLinguagem em Discurso – Revista Científico-literária dos Cursos de Mestradoem Ciências da Linguagem e de Graduação de Letras da Unisul - em Ciências da Linguagem e de Graduação de Letras da Unisul - em Ciências da Linguagem e de Graduação de Letras da Unisul - em Ciências da Linguagem e de Graduação de Letras da Unisul - em Ciências da Linguagem e de Graduação de Letras da Unisul - Universidadedo Sul de Santa Catarina – UNISUL / Tubarão-SC

60) Linhas Críticas Linhas Críticas Linhas Críticas Linhas Críticas Linhas Críticas / Universidade de Brasília – UnB / DF61) Métis Métis Métis Métis Métis / Universidade de Caxias do Sul - UCS / RS62) Movimento Movimento Movimento Movimento Movimento / Universidade Federal Fluminense – UFF / Niterói-RJ63) Natureza e Artifício Natureza e Artifício Natureza e Artifício Natureza e Artifício Natureza e Artifício / Sociedade Civil de Educação Braz Cubas / Mogi das Cruzes-SP64) NuancesNuancesNuancesNuancesNuances / Universidade Estadual Paulista – UNESP / SP65) Os Domínios da Ética Os Domínios da Ética Os Domínios da Ética Os Domínios da Ética Os Domínios da Ética / Universidade de Minas Gerais / Belo Horizonte-MG66) Palavra – Revista Científ ica do Curso de Comunicação Social da Unisul -Palavra – Revista Científ ica do Curso de Comunicação Social da Unisul -Palavra – Revista Científ ica do Curso de Comunicação Social da Unisul -Palavra – Revista Científ ica do Curso de Comunicação Social da Unisul -Palavra – Revista Científ ica do Curso de Comunicação Social da Unisul -

Universidade do Sul de Santa Catarina – UNISUL / Tubarão-SC67) Paradoxa Paradoxa Paradoxa Paradoxa Paradoxa / Universidade Salgado de Oliveira – UNIVERSO / Rio de Janeiro-RJ68) PerCurso: Curitiba em TPerCurso: Curitiba em TPerCurso: Curitiba em TPerCurso: Curitiba em TPerCurso: Curitiba em Turismo urismo urismo urismo urismo / Faculdades de Curitiba / PA69) Perspectiva – Revista do Centro de Ciências da Educação Perspectiva – Revista do Centro de Ciências da Educação Perspectiva – Revista do Centro de Ciências da Educação Perspectiva – Revista do Centro de Ciências da Educação Perspectiva – Revista do Centro de Ciências da Educação / Universidade Federal

de Santa Catarina / Florianópolis-SC70) Philósophos – Revista de Filosofia Philósophos – Revista de Filosofia Philósophos – Revista de Filosofia Philósophos – Revista de Filosofia Philósophos – Revista de Filosofia / Universidade Federal de Goiás - UFG / GO71) Phrónesis – Revista de Ética Phrónesis – Revista de Ética Phrónesis – Revista de Ética Phrónesis – Revista de Ética Phrónesis – Revista de Ética / Pontifícia Universidade Católica – PUC-Campinas-SP72) Poiésis – Revista Científica em Educação Poiésis – Revista Científica em Educação Poiésis – Revista Científica em Educação Poiésis – Revista Científica em Educação Poiésis – Revista Científica em Educação / Universidade do Sul de Santa Catarina

– UNISUL / Tubarão-SC73) Presença – Revista de Educação, Cultura e Meio Ambiente Presença – Revista de Educação, Cultura e Meio Ambiente Presença – Revista de Educação, Cultura e Meio Ambiente Presença – Revista de Educação, Cultura e Meio Ambiente Presença – Revista de Educação, Cultura e Meio Ambiente / Universidade

Federal de Rondônia - UNIR / Porto Velho-RO74) Pró-Discente Pró-Discente Pró-Discente Pró-Discente Pró-Discente / Universidade Federal do Espírito Santo - UFES / ES75) Pro-Posições Pro-Posições Pro-Posições Pro-Posições Pro-Posições / Faculdade de Educação - UNICAMP / SP76) Psicologia Clínica Psicologia Clínica Psicologia Clínica Psicologia Clínica Psicologia Clínica / Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro – PUCRJ / RJ77) Psicologia da Educação Psicologia da Educação Psicologia da Educação Psicologia da Educação Psicologia da Educação / Pontifícia Universidade Católica de São Paulo – PUCSP / SP78) Publicações ADUFPB Publicações ADUFPB Publicações ADUFPB Publicações ADUFPB Publicações ADUFPB / Universidade Federal da Paraíba / João Pessoa-PB79) Revista 7 Faces Revista 7 Faces Revista 7 Faces Revista 7 Faces Revista 7 Faces / Fundação Comunitária de Ensino Superior de Itabira - FUNCESI / MG80) Revista AlcanceRevista AlcanceRevista AlcanceRevista AlcanceRevista Alcance / Universidade do Vale do Itajaí - UNIVALI / Itajaí-SC81) Revista Ambiente e Educação Revista Ambiente e Educação Revista Ambiente e Educação Revista Ambiente e Educação Revista Ambiente e Educação / Fundação Universidade Federal do Rio Grande / Rio

Grande-RS82) Revista Anamatra Revista Anamatra Revista Anamatra Revista Anamatra Revista Anamatra / Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho83) Revista Baiana de Educação Física Revista Baiana de Educação Física Revista Baiana de Educação Física Revista Baiana de Educação Física Revista Baiana de Educação Física / Salvador-BA84) Revista Brasileira de Educação Especial Revista Brasileira de Educação Especial Revista Brasileira de Educação Especial Revista Brasileira de Educação Especial Revista Brasileira de Educação Especial / Universidade Estadual Paulista / Marília-SP85) Revista Brasileira de Estudos PedagógicosRevista Brasileira de Estudos PedagógicosRevista Brasileira de Estudos PedagógicosRevista Brasileira de Estudos PedagógicosRevista Brasileira de Estudos Pedagógicos / Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas

Educacionais / MEC / DF86) Revista Brasileira de gestão de NegóciosRevista Brasileira de gestão de NegóciosRevista Brasileira de gestão de NegóciosRevista Brasileira de gestão de NegóciosRevista Brasileira de gestão de Negócios / Fundação Escola do Comercio Álvares

Penteado / São Paulo-SP87) Revista Brasileira de TRevista Brasileira de TRevista Brasileira de TRevista Brasileira de TRevista Brasileira de Tecnologia Educacional ecnologia Educacional ecnologia Educacional ecnologia Educacional ecnologia Educacional / Associação Brasileira de Tecnologia

Educacional / Brasília-DF88) Revista Caatinga Revista Caatinga Revista Caatinga Revista Caatinga Revista Caatinga / Escola Superior de Agricultura de Mossoró / RN89) Revista Cadernos Revista Cadernos Revista Cadernos Revista Cadernos Revista Cadernos / Centro Universitário São Camilo / São Paulo-SP90) Revista Cadernos de Campo Revista Cadernos de Campo Revista Cadernos de Campo Revista Cadernos de Campo Revista Cadernos de Campo / Universidade de São Paulo – USP / SP

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91) Revista Cesumar Revista Cesumar Revista Cesumar Revista Cesumar Revista Cesumar / Centro Universitário de Maringá / Maringá-PR92) Revista Ciências Humanas Revista Ciências Humanas Revista Ciências Humanas Revista Ciências Humanas Revista Ciências Humanas / Universidade de Taubaté - UNITAU / SP93) Revista Cientifica Revista Cientifica Revista Cientifica Revista Cientifica Revista Cientifica / Centro Universitário de Barra Mansa / Barra Mansa-RJ94) Revista Ciência e Educação Revista Ciência e Educação Revista Ciência e Educação Revista Ciência e Educação Revista Ciência e Educação / UNESP – Bauru / Bauru-SP95) Revista Científica da Unicastelo Revista Científica da Unicastelo Revista Científica da Unicastelo Revista Científica da Unicastelo Revista Científica da Unicastelo / Universidade Camilo Castelo Branco - Unicastelo

/ São Paulo-SP96) Revista Colloquim e Justiça e SociedadeRevista Colloquim e Justiça e SociedadeRevista Colloquim e Justiça e SociedadeRevista Colloquim e Justiça e SociedadeRevista Colloquim e Justiça e Sociedade / Universidade do Oeste Paulista / Presidente

Prudente-SP97) Revista Contrapontos – Revista do Mestrado em Educação Revista Contrapontos – Revista do Mestrado em Educação Revista Contrapontos – Revista do Mestrado em Educação Revista Contrapontos – Revista do Mestrado em Educação Revista Contrapontos – Revista do Mestrado em Educação / Universidade do

Vale do Itajaí98) Revista da Educação Física Revista da Educação Física Revista da Educação Física Revista da Educação Física Revista da Educação Física / Universidade Estadual de Maringá / Maringá-PR99) Revista da Faculdade Christus Revista da Faculdade Christus Revista da Faculdade Christus Revista da Faculdade Christus Revista da Faculdade Christus / Faculdade Christus / Fortaleza-CE100)Revista da Faculdade de EducaçãoRevista da Faculdade de EducaçãoRevista da Faculdade de EducaçãoRevista da Faculdade de EducaçãoRevista da Faculdade de Educação / Universidade do Estado de Mato Grosso /

Cáceres-MT101)Revista da FRevista da FRevista da FRevista da FRevista da FAEEBA Educação e Contemporaneidade AEEBA Educação e Contemporaneidade AEEBA Educação e Contemporaneidade AEEBA Educação e Contemporaneidade AEEBA Educação e Contemporaneidade / Universidade do Estado da

Bahia / Salvador-BA102)Revista da FRevista da FRevista da FRevista da FRevista da FAPAPAPAPAPA A A A A / Faculdade Paulistana - FAPA / São Paulo-SP103)Revista da Faculdade de Santa CruzRevista da Faculdade de Santa CruzRevista da Faculdade de Santa CruzRevista da Faculdade de Santa CruzRevista da Faculdade de Santa Cruz / União Paranaense de Ensino e Cultura /

Curitiba-PR104)Revista de Administração Revista de Administração Revista de Administração Revista de Administração Revista de Administração / Centro de Ensino Superior de Jataí - CESUT / GO105)Revista de Ciências Sociais e Humanas Revista de Ciências Sociais e Humanas Revista de Ciências Sociais e Humanas Revista de Ciências Sociais e Humanas Revista de Ciências Sociais e Humanas / Centro de Ciências Sociais e Humanas /

Universidade Federal de Santa Catarina / Florianópolis-SC106)Revista de Contabilidade do IESPRevista de Contabilidade do IESPRevista de Contabilidade do IESPRevista de Contabilidade do IESPRevista de Contabilidade do IESP / Sociedade de Ensino Superior da Paraíba / João

Pessoa-PB107)Revista de Direito Revista de Direito Revista de Direito Revista de Direito Revista de Direito / Universidade de Ibirapuera / São Paulo-SP108)108)108)108)108) Revista de Divulgação Cultural / Revista de Divulgação Cultural / Revista de Divulgação Cultural / Revista de Divulgação Cultural / Revista de Divulgação Cultural / Fundação Universidade Regional de Blumenau

- FURB / SC109)Revista de Educação Revista de Educação Revista de Educação Revista de Educação Revista de Educação / Pontifícia Universidade Católica de Campinas, PUC-Campinas /

SP110)Revista de Educação CEAP Revista de Educação CEAP Revista de Educação CEAP Revista de Educação CEAP Revista de Educação CEAP / Centro de Estudos e Assessoria Pedagógica – CEAP /

Salvador / BA111)Revista de Educação Pública Revista de Educação Pública Revista de Educação Pública Revista de Educação Pública Revista de Educação Pública / Universidade Federal de Mato Grosso – UFMT / MT112)Revista de Letras Revista de Letras Revista de Letras Revista de Letras Revista de Letras / Universidade Federal do Ceará / Fortaleza-CE113)Revista de Negócios Revista de Negócios Revista de Negócios Revista de Negócios Revista de Negócios / Fundação Universidade Federal de Blumenau - FURB / SC114)Revista de Psicologia Revista de Psicologia Revista de Psicologia Revista de Psicologia Revista de Psicologia / Universidade Federal do Ceará - UFC / Fortaleza-CE115)Revista do CCEI Revista do CCEI Revista do CCEI Revista do CCEI Revista do CCEI / Universidade da Região da Campanha / Bagé-RS116)Revista do Centro de Educação Revista do Centro de Educação Revista do Centro de Educação Revista do Centro de Educação Revista do Centro de Educação / Universidade Federal de Santa Maria / Santa

Maria-RS117)Revista do Instituto de Pesquisas e Estudos Revista do Instituto de Pesquisas e Estudos Revista do Instituto de Pesquisas e Estudos Revista do Instituto de Pesquisas e Estudos Revista do Instituto de Pesquisas e Estudos / Instituição Toledo de Ensino – ITE /

Bauru-SP118)Revista do Mestrado em Educação Revista do Mestrado em Educação Revista do Mestrado em Educação Revista do Mestrado em Educação Revista do Mestrado em Educação / Universidade Federal de Sergipe - UFS / São

Cristóvão-SE

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119)Revista do Programa de Pós-Graduação em Educação Revista do Programa de Pós-Graduação em Educação Revista do Programa de Pós-Graduação em Educação Revista do Programa de Pós-Graduação em Educação Revista do Programa de Pós-Graduação em Educação / Universidade Federal deSanta Maria - UFSM / RS

120)Revista dos Expoentes Revista dos Expoentes Revista dos Expoentes Revista dos Expoentes Revista dos Expoentes / Universidade de Ensino Superior Expoente - UniExp / Curitiba-PR

121)Revista Educação Revista Educação Revista Educação Revista Educação Revista Educação / Porto Alegre-RS122)Revista Educação e Movimento Revista Educação e Movimento Revista Educação e Movimento Revista Educação e Movimento Revista Educação e Movimento / Associação de Educação Católica do Paraná /

Curitiba-PR123)Revista Educação e Realidade Revista Educação e Realidade Revista Educação e Realidade Revista Educação e Realidade Revista Educação e Realidade / Universidade Federal do Rio Grande do Sul / Porto

Alegre-RS124)Revista Ensaios e Ciências Revista Ensaios e Ciências Revista Ensaios e Ciências Revista Ensaios e Ciências Revista Ensaios e Ciências / Universidade para o Desenvolvimento do Estado e da

Região do Pantanal / Campo Grande-MS125)Revista EspaçoRevista EspaçoRevista EspaçoRevista EspaçoRevista Espaço / Instituto São Paulo de Estudos Superiores / São Paulo126)Revista Estudos Lingüísticos e Literários Revista Estudos Lingüísticos e Literários Revista Estudos Lingüísticos e Literários Revista Estudos Lingüísticos e Literários Revista Estudos Lingüísticos e Literários / Universidade Federal da Bahia / Salvador-

BA127)Revista Fórum Crítico da Educação Revista Fórum Crítico da Educação Revista Fórum Crítico da Educação Revista Fórum Crítico da Educação Revista Fórum Crítico da Educação / Instituto Superior de Estudos Pedagógicos -

ISEP / Rio de Janeiro-RJ128)Revista Fronteiras – Estudos Midiáticos Revista Fronteiras – Estudos Midiáticos Revista Fronteiras – Estudos Midiáticos Revista Fronteiras – Estudos Midiáticos Revista Fronteiras – Estudos Midiáticos / Universidade do Vale do Rio dos Sinos -

UNISINOS / São Leopoldo-RS129)Revista Horizontes Revista Horizontes Revista Horizontes Revista Horizontes Revista Horizontes / Universidade São Francisco - USF / Bragança Paulista-SP130)Revista Idéias & Argumentos Revista Idéias & Argumentos Revista Idéias & Argumentos Revista Idéias & Argumentos Revista Idéias & Argumentos / Centro Universitário Salesiano de São Paulo - UNISAL131)Revista Informática na Educação – TRevista Informática na Educação – TRevista Informática na Educação – TRevista Informática na Educação – TRevista Informática na Educação – Teoria e Prática eoria e Prática eoria e Prática eoria e Prática eoria e Prática / Universidade Federal do Rio

Grande do Sul - UFRGS / RS132)Revista Intertemas Revista Intertemas Revista Intertemas Revista Intertemas Revista Intertemas / Associação Educacional Toledo - Presidente Prudente-SP133)Revista Integração Revista Integração Revista Integração Revista Integração Revista Integração / Universidade São Judas Tadeu / São Paulo-SP134)Revista Jurídica da FURB Revista Jurídica da FURB Revista Jurídica da FURB Revista Jurídica da FURB Revista Jurídica da FURB / Fundação Universidade Regional de Blumenau – FURB / SC135)Revista Jurídica – FOA Revista Jurídica – FOA Revista Jurídica – FOA Revista Jurídica – FOA Revista Jurídica – FOA / Associação Educativa Evangélica / Anápolis-GO136)Revista Jurídica da Universidade de Franca Revista Jurídica da Universidade de Franca Revista Jurídica da Universidade de Franca Revista Jurídica da Universidade de Franca Revista Jurídica da Universidade de Franca / Universidade de Franca / Franca-SP137)Revista Jurídica Cesumar Revista Jurídica Cesumar Revista Jurídica Cesumar Revista Jurídica Cesumar Revista Jurídica Cesumar / Centro Universitário de Maringá / Maringá-PR138)Revista Mimesis Revista Mimesis Revista Mimesis Revista Mimesis Revista Mimesis / Universidade do Sagrado Coração / Bauru-SP139)Revista Montagem Revista Montagem Revista Montagem Revista Montagem Revista Montagem / Centro Universitário “Moura Lacerda” / Ribeirão Preto – SP140)Revista O Domínio da ÉticaRevista O Domínio da ÉticaRevista O Domínio da ÉticaRevista O Domínio da ÉticaRevista O Domínio da Ética / Fundação Centro de Analises, Pesquisas e Inovações

Tecnológicas / Manaus-AM141)Revista O Eixo e a Roda Revista O Eixo e a Roda Revista O Eixo e a Roda Revista O Eixo e a Roda Revista O Eixo e a Roda / Universidade Federal de Minas Gerais / Belo Horizonte-MG142)Revista Paidéia Revista Paidéia Revista Paidéia Revista Paidéia Revista Paidéia / Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de Ribeirão Preto / Ribeirão

Preto-SP143)Revista Pedagogia Revista Pedagogia Revista Pedagogia Revista Pedagogia Revista Pedagogia / Universidade do Oeste de Santa Catarina - UNOESC / SC144)Revista Plures Revista Plures Revista Plures Revista Plures Revista Plures / Centro Universitário Moura Lacerda / Ribeirão Preto-SP145)Revista Prosa Revista Prosa Revista Prosa Revista Prosa Revista Prosa / Universidade para o Desenvolvimento do Estado e da Região do Pantanal

/ Campo Grande-MS146)Revista Psicologia Argumento Revista Psicologia Argumento Revista Psicologia Argumento Revista Psicologia Argumento Revista Psicologia Argumento / Pontifícia Universidade Católica do Paraná – PUCPR

/ PR147)Revista Quaestio Revista Quaestio Revista Quaestio Revista Quaestio Revista Quaestio / Universidade de Sorocaba - UNISO / Sorocaba-SP

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148)Revista Recriação (Revista de Referencia de Estudos da Infância eRevista Recriação (Revista de Referencia de Estudos da Infância eRevista Recriação (Revista de Referencia de Estudos da Infância eRevista Recriação (Revista de Referencia de Estudos da Infância eRevista Recriação (Revista de Referencia de Estudos da Infância eAdolescência) Adolescência) Adolescência) Adolescência) Adolescência) / Universidade Federal de Mato Grosso do Sul / Campo Grande-MS

149)Revista Reflexão e Ação Revista Reflexão e Ação Revista Reflexão e Ação Revista Reflexão e Ação Revista Reflexão e Ação / Universidade de Santa Cruz do Sul – UNISC / RS150)Revista Semina Revista Semina Revista Semina Revista Semina Revista Semina / Universidade de Passo Fundo / Passo Fundo-RS151)Revista Sociedade e Cultura Revista Sociedade e Cultura Revista Sociedade e Cultura Revista Sociedade e Cultura Revista Sociedade e Cultura / Departamento de Ciências Sociais / Goiânia-GO152)Revista TRevista TRevista TRevista TRevista Tecnologia da Informação ecnologia da Informação ecnologia da Informação ecnologia da Informação ecnologia da Informação / Universidade Católica de Brasília - UCB / Brasília-

DF153)Revista TRevista TRevista TRevista TRevista Teoria e Prática eoria e Prática eoria e Prática eoria e Prática eoria e Prática / Universidade Estadual de Maringá / Maringá-PR154)Revista TRevista TRevista TRevista TRevista Trilhas rilhas rilhas rilhas rilhas / Universidade da Amazônia - UNAMA / Belém-PA155)Revista UNIABEU Revista UNIABEU Revista UNIABEU Revista UNIABEU Revista UNIABEU / Associação Brasileira de Ensino Universitário – UNIABEU / Belford

Roxo-RJ156)Revista Unicsul Revista Unicsul Revista Unicsul Revista Unicsul Revista Unicsul / Universidade Cruzeiro do Sul - Unicsul / SP157)Revista UNIFIEO Revista UNIFIEO Revista UNIFIEO Revista UNIFIEO Revista UNIFIEO / Centro Universitário – FIEO / Osasco-SP158) Scientia Scientia Scientia Scientia Scientia / Centro Universitário Vila Velha – UVV / Vitória-ES159) Seqüência 45 – Revista do Curso de Pós-Graduação em Direito da UFSC Seqüência 45 – Revista do Curso de Pós-Graduação em Direito da UFSC Seqüência 45 – Revista do Curso de Pós-Graduação em Direito da UFSC Seqüência 45 – Revista do Curso de Pós-Graduação em Direito da UFSC Seqüência 45 – Revista do Curso de Pós-Graduação em Direito da UFSC /

Universidade Federal de Santa Catarina - UFSC / SC160) T e C AmazôniaT e C AmazôniaT e C AmazôniaT e C AmazôniaT e C Amazônia / Universidade de Minas Gerais / Belo Horizonte-MG161) TEIAS – Revista da Faculdade de Educação da UFRJ TEIAS – Revista da Faculdade de Educação da UFRJ TEIAS – Revista da Faculdade de Educação da UFRJ TEIAS – Revista da Faculdade de Educação da UFRJ TEIAS – Revista da Faculdade de Educação da UFRJ / Universidade do Estado do

Rio de Jáneiro / Rio de Janeiro-RJ162) TTTTTextura – Revista de Educação, Ciências e Letras extura – Revista de Educação, Ciências e Letras extura – Revista de Educação, Ciências e Letras extura – Revista de Educação, Ciências e Letras extura – Revista de Educação, Ciências e Letras / Universidade Luterana do

Brasil - ULBRA / Canoas-RS163) Tópicos Educacionais Tópicos Educacionais Tópicos Educacionais Tópicos Educacionais Tópicos Educacionais / Universidade Federal de Pernambuco - UFPE / Recife-PE164)UNESC em Revista UNESC em Revista UNESC em Revista UNESC em Revista UNESC em Revista / Revista do Centro Universitário do Espírito Santo – UNESC /

Colina-ES165)UniCEUB em Revista UniCEUB em Revista UniCEUB em Revista UniCEUB em Revista UniCEUB em Revista / Centro Universitário de Brasília - UniCEUB / Brasília-DF166)UniCiência - Revista Científica da UEG UniCiência - Revista Científica da UEG UniCiência - Revista Científica da UEG UniCiência - Revista Científica da UEG UniCiência - Revista Científica da UEG / Fundação Universidade Estadual de Goiás

– UEG / Anápolis-GO167) UNICiências UNICiências UNICiências UNICiências UNICiências / Universidade de Cuiabá - UNIC / MT168) Unimar Ciências Unimar Ciências Unimar Ciências Unimar Ciências Unimar Ciências / Universidade de Marília -UNIMAR / Marília-SP169)UNIP Press – Boletim Informativo da Universidade Paulista UNIP Press – Boletim Informativo da Universidade Paulista UNIP Press – Boletim Informativo da Universidade Paulista UNIP Press – Boletim Informativo da Universidade Paulista UNIP Press – Boletim Informativo da Universidade Paulista / Universidade

Paulista - UNIP / São Paulo-SP170)Universa Universa Universa Universa Universa / Universidade Católica de Brasília - UCB / DF171)UNOPUNOPUNOPUNOPUNOPAR Científica – Ciências Humanas e Educação AR Científica – Ciências Humanas e Educação AR Científica – Ciências Humanas e Educação AR Científica – Ciências Humanas e Educação AR Científica – Ciências Humanas e Educação / Universidade Norte do

Paraná - UNOPAR / Londrina-PR172)VVVVVer a Educação er a Educação er a Educação er a Educação er a Educação / Universidade Federal Pará – UFPA / Belém-PA173)Veritas – Revista de Filosofia Veritas – Revista de Filosofia Veritas – Revista de Filosofia Veritas – Revista de Filosofia Veritas – Revista de Filosofia / Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul

- PUCRS / RS174)Virtus – Revista Científica em Psicopedagogia Virtus – Revista Científica em Psicopedagogia Virtus – Revista Científica em Psicopedagogia Virtus – Revista Científica em Psicopedagogia Virtus – Revista Científica em Psicopedagogia / Universidade do Sul de Santa

Catarina – UNISUL / Tubarão-SC175)Zetetiké Zetetiké Zetetiké Zetetiké Zetetiké / UNICAMP / Campinas-SP

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PERMUTPERMUTPERMUTPERMUTPERMUTAS INTERNACIONAISAS INTERNACIONAISAS INTERNACIONAISAS INTERNACIONAISAS INTERNACIONAIS

01) AILA – International Association of Applied LinguisticAILA – International Association of Applied LinguisticAILA – International Association of Applied LinguisticAILA – International Association of Applied LinguisticAILA – International Association of Applied Linguistic / Open university / Unitedkingdom – Ukrainian

02) Anagramas. Rumbos y Sentidos de la Comunicación Anagramas. Rumbos y Sentidos de la Comunicación Anagramas. Rumbos y Sentidos de la Comunicación Anagramas. Rumbos y Sentidos de la Comunicación Anagramas. Rumbos y Sentidos de la Comunicación / Universidad de Medellín /Medellín – Colômbia

03) Anthropos – Venezuela Anthropos – Venezuela Anthropos – Venezuela Anthropos – Venezuela Anthropos – Venezuela / Instituto Universitario Salesiano “Padre Ojeda” (IUSPO) –Venezuela

04) Confluencia: ser y quehacer de la educación superior mexicana / Confluencia: ser y quehacer de la educación superior mexicana / Confluencia: ser y quehacer de la educación superior mexicana / Confluencia: ser y quehacer de la educación superior mexicana / Confluencia: ser y quehacer de la educación superior mexicana / ANUIES -Asociación Nacional de Universidades e Instituciones de Educación Superior / México

05) Cuadernos de Administración Cuadernos de Administración Cuadernos de Administración Cuadernos de Administración Cuadernos de Administración / Pontifícia Universid Javeriana / Bogota – Colombia06) Infancia en eu-ro-pa Infancia en eu-ro-pa Infancia en eu-ro-pa Infancia en eu-ro-pa Infancia en eu-ro-pa / Associación de Maestros Rosa Sensat. / Barcelona - España07) Revista de Investigaciones de la Unad Revista de Investigaciones de la Unad Revista de Investigaciones de la Unad Revista de Investigaciones de la Unad Revista de Investigaciones de la Unad / Universidad Nacional Abierta y a Distancia

– Unad / Bogotá – Colombia08) Learner Autonomy: New Insights Learner Autonomy: New Insights Learner Autonomy: New Insights Learner Autonomy: New Insights Learner Autonomy: New Insights / ALAB – Associação de Lingüística Aplicada do

Brasil – Belo Horizonte-MG09) Lexis Lexis Lexis Lexis Lexis / Asociación de Institutores de Antioquia – Adida / Medellín - Colombia10) Nexos Nexos Nexos Nexos Nexos / Universidad EAFIT / Medellín - Colombia11) Padres/Madres de alumnos/alumnas Padres/Madres de alumnos/alumnas Padres/Madres de alumnos/alumnas Padres/Madres de alumnos/alumnas Padres/Madres de alumnos/alumnas / CEAPA / Madrid - España12) Política y Sociedad Política y Sociedad Política y Sociedad Política y Sociedad Política y Sociedad / Universidad Complutense de Madrid / Madrid – España13) Proyección investigativa Proyección investigativa Proyección investigativa Proyección investigativa Proyección investigativa / Universidad de Córdoba / Montería – Colombia14) Revista Contextos EducativosRevista Contextos EducativosRevista Contextos EducativosRevista Contextos EducativosRevista Contextos Educativos / Universidad de La Rioja / La Rioja – España15) Revista de ciencias humanas Revista de ciencias humanas Revista de ciencias humanas Revista de ciencias humanas Revista de ciencias humanas / Universidad Tecnológica de Pereira / Risaralda –

Colombia16) Revista de La CEPRevista de La CEPRevista de La CEPRevista de La CEPRevista de La CEPA A A A A / Comisión Economica para América Latina y El Caribe / Santiago -

Chile17) Revista de pedagogía Revista de pedagogía Revista de pedagogía Revista de pedagogía Revista de pedagogía / Universidad Central de Venezuela / Caracas - Venezuela18) Revista Universidad EAFIT Revista Universidad EAFIT Revista Universidad EAFIT Revista Universidad EAFIT Revista Universidad EAFIT / Universidad EAFIT / Medellín - Colombia19) Revolución EducativRevolución EducativRevolución EducativRevolución EducativRevolución Educativa al Ta al Ta al Ta al Ta al Tableroableroableroableroablero / Centro Administrativo Nacional (CAN) / Bogota –

Colombia20) Salud Pública de México Salud Pública de México Salud Pública de México Salud Pública de México Salud Pública de México / Instituto Nacional de Salud Pública / Cuernavaca, Morelos,

México21) Santiago: revista de la Universidad de OrienteSantiago: revista de la Universidad de OrienteSantiago: revista de la Universidad de OrienteSantiago: revista de la Universidad de OrienteSantiago: revista de la Universidad de Oriente / Universidad de Oriente / Santiago

de Cuba - Cuba22) Signos Universitarios Signos Universitarios Signos Universitarios Signos Universitarios Signos Universitarios / Universidad del Salvador / Buenos Aires - Argentina23) Thélème - Thélème - Thélème - Thélème - Thélème - Revista Complutense de Estudios Franceses Revista Complutense de Estudios Franceses Revista Complutense de Estudios Franceses Revista Complutense de Estudios Franceses Revista Complutense de Estudios Franceses / Universidad Complutense

Madrid / Madrid – España

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