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Para onde vai o de hoje? Brasil ECONOMIA & DESENVOLVIMENTO PARA OS NOVOS TEMPOS Otaviano Canuto, Luiz Gonzaga Belluzzo, Milford Bateman e Marcelo Neri falam sobre o presente e o que pode ser o futuro do país EDITORIAL ANO 40 – Nº 284 – Novembro/Dezembro de 2015

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Revista Rumos - Novembro/Dezembro 2015

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Page 1: Rumos 284

Para onde vai o de hoje?Brasil

E C O N O M I A & D E S E N V O LV I M E N T O P A R A O S N O V O S T E M P O S

Otaviano Canuto, Luiz Gonzaga Belluzzo, Milford Bateman e Marcelo Neri falam sobreo presente e o que pode ser o futuro do país

EDITORIAL

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Brasil não é para principiantes”, com esta frase Antônio Car-los Jobim resumia a complexidade da história brasileira. Lon-ge de contradizer o músico, mas com a curiosidade de entender este país, Rumos foi ouvir economistas que atuam dentro e fora do Brasil. O momento pede calma e reflexão, e

as análises do diretor-executivo do Fundo Monetário Internacional (FMI), Otaviano Canuto, do professor Luiz Gonzaga Belluzo, do economista cro-ata Milford Bateman e do ex-ministro da Secretaria de Assuntos Estratégi-cos da Presidência da República, Marcelo Neri, indicam que é preciso olhar para além da superfície, buscar o debate das questões estruturais, para construir a base de um caminho consistente para o desenvolvimento.

Além desse especial sobre o Brasil atual, essa edição marca uma des-pedida. A Rumos, em 2016, terá um novo projeto gráfico, mais moderno e atraente, com fotos e gráficos, tornando mais agradável a leitura das reportagens e artigos. O novo visual é mais uma ação de reestruturação das ferramentas de comunicação da Associação Brasileira de Desenvol-vimento (ABDE), que passou por uma revisão de sua logomarca e, ago-ra, chegou a vez da principal publicação da organização, que faz 40 anos de edição em 2016. As comemorações já tiveram início na edição passa-da, com a estreia da seção Memória: neste número continuamos a visitar o acervo da Rumos e trouxemos um breve resumo dos principais temas debatidos no final da década de 1970, com capas que, mesmo passados mais de 30 anos, não perderam a sua atualidade.

Também nesta edição, a cobertura da Cerimônia de Entrega do Prê-mio ABDE-BID, edição 2015. Ocorrido em São Paulo, o evento reuniu importantes economistas para um debate sobre conjuntura econômica e desenvolvimento e premiou as melhores monografias inscritas no con-curso deste ano.

Terminamos 2015 com o convite para que o leitor continue a nos acompanhar em 2016, a quem presentearemos com uma nova forma de apresentar os grandes temas do desenvolvimento brasileiro. Boa leitura!

OAO LEITOR

Seção

RUMOS – 3 – Novembro/Dezembro 2015

S SUMÁRIO

FOMENTO46

LIVROS48

14OPINIÃO

Problemas do pensamento mágicoAntonio Delfim Netto

44PELO MUNDO

A história de um sistemaFernanda Feil e Andrej Slivinik

12EXTREMO SUL

Crédito para o bemdo meio ambiente

Sustentabilidade

42ARTIGO

Planejamento Estratégico doSistema Nacional de fomento

Paulo Cesar de Araujo Barcellos

28Para onde vai o Brasil de hoje?

REPORTAGEM CAPAIdeias

6EXPERTISE

Passado, presente e futuroMatías Molina

20RECONHECIMENTO

Experiências de sucessoPrêmio ABDE-BID 2015

10REPORTAGEMBalançoMicrocrédito e inclusão social

40REPORTAGEMCooperativasInovação, a chave para o futuro

ARTIGO8 Ricardo FigueiróLei de Responsabilidade Fiscal – um instrumento em favor do desenvolvimentoN

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16EMPREENDER

Destravar o crédito para os pequenos

Cidadania financeira

22RECONHECIMENTO

Sistemas Nacionais de Fomento:experiências comparadas

Monografia vencedora

24RECONHECIMENTO

Continuidades, rupturas e liçõesMonografia vencedora

4MEMÓRIA

Mensagens de uma décadaRumos 40 anos

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RUMOS – 5 – Novembro/Dezembro 2015 RUMOS – 4 – Novembro/Dezembro 2015

década de 1970 pode ter promovido uma revo-lução nos costumes, com a onda hippie, os movi-mentos pacifistas e a liberação sexual, mas, na economia brasileira, os debates giravam em tor-no de velhos problemas. É o que aparece nas

páginas das primeiras edições da Rumos, nos 19 números edi-tados no final desse decênio. Da descentralização das ações, aos pedidos de mais planejamento nos projetos e orientações para que tipo de desenvolvimento o país precisava, foram mui-tas folhas dedicadas à reflexão dos grandes temas nacionais.

Fiel no intuito de vocalizar as demandas das Instituições Financeiras de Desenvolvimento e os assuntos de interesse do corpo técnico das associadas, a Rumos buscou, nos primeiros anos de edição, publicar artigos de integrantes do sistema dis-tribuídos por todos os bancos do país. Eram recorrentes os chamados, no editorial de cada edição, para que instituições do Norte, Nordeste e Centro-Oeste enviassem suas contribui-ções. Isso porque um tema que aparece bastante é o do dese-quilíbrio entre as regiões do Brasil. Os diferentes níveis de desenvolvimento entre os estados e mesmo dentro dos esta-dos, entre capital e interior, foram tema de artigos e reporta-gens em cinco edições no universo de 19 números publicados na década de 1970. O desafio de integrar as políticas voltadas para o crescimento econômico das regiões e de promover um desenvolvimento harmônico nos estados não foi vencido, con-tinua a merecer destaque na revista nos dias de hoje. Tanto assim que, além de ser assunto, o desenvolvimento nacional foi definido com objetivo estratégico no Planejamento do Sis-tema Nacional de Fomento para 2016-2019.

Aliás, a importância da realização de planejamento foi outro tema constante nessa década. Era grande a preocupa-ção, diante de um cenário de inflação e de incertezas (Guerra Fria, Crise do Petróleo), de orientar as instituições e seus técni-cos sobre a pertinência de se ter um planejamento, ou seja, de

MMEMÓRIA

estruturar as ações vindouras com foco em realizar um objeti-vo. Em artigo publicado em 1977 (edição maio/junho – nº 5), o então secretário-geral da Secretaria de Planejamento da Pre-sidência da República, Elcio Costa Couto, destacava: “Opera-cionalmente, conciliar objetivos de desenvolvimento, mais ou menos permanentes, com a necessidade de proceder-se, con-junturalmente, a correções de rumo, redefinições de metas – em outros termos, compatibilizar, na prática, política de desen-volvimento, planejamento estratégico e planejamento tático – é tarefa certamente complexa. [...] É preciso, também, que se tenha a capacidade de transmitir com clareza e convicção à opi-nião pública o sentido das novas orientações táticas adotadas e sua consistência com os objetivos da política e da estratégia de desenvolvimento”.

Se o planejamento é de suma importância e de extrema complexidade, a Rumos continua a dar a sua contribuição ao comunicar com clareza, não só a melhor forma de construir esse planejamento, como ao apresentar os exemplos bem-sucedidos das instituições que o fizeram. A tentativa de trazer para as páginas da revista uma linguagem assertiva, que não esti-vesse carregada de jargões dos economistas, sempre foi um dos objetivos da publicação que permanece até hoje.

Em paralelo, também foi feito um exercício de prever o futuro: uma das mais memoráveis capas dessa década foi a que traz previsões para o ano de 1985, publicadaem julho/agosto de 1977. A ideia do artigo era oferecer aos leitores estimativas confiáveis sobre elementos macroeconômicos para que as ins-tituições pudessem refletir sobre os processos do presente. Era uma tarefa árdua construir cenários de longo prazo, diante de um momento político de exceção, e de economia com infla-ção e arrochos salariais.

Mais uma vez, questões que permanecem atuais conside-rando o atual momento da economia brasileira. Confira, ao lado, os destaques das edições da década de 1970.

A

Os grandes temas do país retratados nos primeiros números da revista Rumos já indicavam que as páginas da publicação seriam testemunhas do debate sobre o desenvolvimento nacional ao longo das décadas

Thais Sena Schettino

Mensagens de uma década

Quatro anos em quatro capas

Editora da revista Rumos e Gerente de Comunicação da ABDE.Formada em Comunicação Social, com mestrado e doutorado em Ciências Sociais pela Universidade Federal do Rio de Janeiro.

A edição número 6, de julho/agosto de 1977, ousava ao fazer uma sondagem sobre o futuro em busca de previsões relativas a alguns dos elementos macroeconômicos básicos. Produto Interno Bruto (PIB), inflação, taxa cambial foram alguns dos indicadores analisados no texto.

Sempre pertinente, a questão dos desequilíbrios regionais foi o assunto de capa da edição número 12,

de julho/agosto de 1978. Em análise, o difícil ajuste entre a atração de investimentos e o risco de guerra

fiscal entre os estados da federação. Na sequência, um artigo sobre desenvolvimento urbano, que envolve

planejamento e crescimento das cidades. Nesse número é ampliada a seção sobre estatística com a publicação embrionária do que seriam os relatórios do sistema de

informações da Associação, o InfoABDE.

Com uma pergunta bem atual: “A realidade é viável?”, a edição de janeiro/fevereiro de 1979 lançava uma série de reflexões a respeito do funcionamento e dos resultados dos diversos mecanismos utilizados pelo governo para gerir a economia do país, dentre os quais subsídios e incentivos fiscais. Destaque também para o tema da burocracia, com o caso sobre a compra de equipamentos por uma das instituições associadas que exigiu 6.964 atos burocráticos internos.

Tônica do final da década 1970, a inflação ganhou destaque na edição de maio/junho de 1979 (nº 17, ano 3)

com uma provocação: “Economia Brasileira, Inflação e Crescimento: uma falsa implicação”. Vários economistas

foram chamados a falar sobre como compatibilizar o crescimento econômico com as taxas de inflação. Com

“soluções variadas”, apontadas pelos especialistas para se encontrar o melhor caminho na economia, Rumos fechava sua

primeira década abrindo espaço para o debate sobre o desenvolvimento.

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RUMOS – 5 – Novembro/Dezembro 2015 RUMOS – 4 – Novembro/Dezembro 2015

década de 1970 pode ter promovido uma revo-lução nos costumes, com a onda hippie, os movi-mentos pacifistas e a liberação sexual, mas, na economia brasileira, os debates giravam em tor-no de velhos problemas. É o que aparece nas

páginas das primeiras edições da Rumos, nos 19 números edi-tados no final desse decênio. Da descentralização das ações, aos pedidos de mais planejamento nos projetos e orientações para que tipo de desenvolvimento o país precisava, foram mui-tas folhas dedicadas à reflexão dos grandes temas nacionais.

Fiel no intuito de vocalizar as demandas das Instituições Financeiras de Desenvolvimento e os assuntos de interesse do corpo técnico das associadas, a Rumos buscou, nos primeiros anos de edição, publicar artigos de integrantes do sistema dis-tribuídos por todos os bancos do país. Eram recorrentes os chamados, no editorial de cada edição, para que instituições do Norte, Nordeste e Centro-Oeste enviassem suas contribui-ções. Isso porque um tema que aparece bastante é o do dese-quilíbrio entre as regiões do Brasil. Os diferentes níveis de desenvolvimento entre os estados e mesmo dentro dos esta-dos, entre capital e interior, foram tema de artigos e reporta-gens em cinco edições no universo de 19 números publicados na década de 1970. O desafio de integrar as políticas voltadas para o crescimento econômico das regiões e de promover um desenvolvimento harmônico nos estados não foi vencido, con-tinua a merecer destaque na revista nos dias de hoje. Tanto assim que, além de ser assunto, o desenvolvimento nacional foi definido com objetivo estratégico no Planejamento do Sis-tema Nacional de Fomento para 2016-2019.

Aliás, a importância da realização de planejamento foi outro tema constante nessa década. Era grande a preocupa-ção, diante de um cenário de inflação e de incertezas (Guerra Fria, Crise do Petróleo), de orientar as instituições e seus técni-cos sobre a pertinência de se ter um planejamento, ou seja, de

MMEMÓRIA

estruturar as ações vindouras com foco em realizar um objeti-vo. Em artigo publicado em 1977 (edição maio/junho – nº 5), o então secretário-geral da Secretaria de Planejamento da Pre-sidência da República, Elcio Costa Couto, destacava: “Opera-cionalmente, conciliar objetivos de desenvolvimento, mais ou menos permanentes, com a necessidade de proceder-se, con-junturalmente, a correções de rumo, redefinições de metas – em outros termos, compatibilizar, na prática, política de desen-volvimento, planejamento estratégico e planejamento tático – é tarefa certamente complexa. [...] É preciso, também, que se tenha a capacidade de transmitir com clareza e convicção à opi-nião pública o sentido das novas orientações táticas adotadas e sua consistência com os objetivos da política e da estratégia de desenvolvimento”.

Se o planejamento é de suma importância e de extrema complexidade, a Rumos continua a dar a sua contribuição ao comunicar com clareza, não só a melhor forma de construir esse planejamento, como ao apresentar os exemplos bem-sucedidos das instituições que o fizeram. A tentativa de trazer para as páginas da revista uma linguagem assertiva, que não esti-vesse carregada de jargões dos economistas, sempre foi um dos objetivos da publicação que permanece até hoje.

Em paralelo, também foi feito um exercício de prever o futuro: uma das mais memoráveis capas dessa década foi a que traz previsões para o ano de 1985, publicadaem julho/agosto de 1977. A ideia do artigo era oferecer aos leitores estimativas confiáveis sobre elementos macroeconômicos para que as ins-tituições pudessem refletir sobre os processos do presente. Era uma tarefa árdua construir cenários de longo prazo, diante de um momento político de exceção, e de economia com infla-ção e arrochos salariais.

Mais uma vez, questões que permanecem atuais conside-rando o atual momento da economia brasileira. Confira, ao lado, os destaques das edições da década de 1970.

A

Os grandes temas do país retratados nos primeiros números da revista Rumos já indicavam que as páginas da publicação seriam testemunhas do debate sobre o desenvolvimento nacional ao longo das décadas

Thais Sena Schettino

Mensagens de uma década

Quatro anos em quatro capas

Editora da revista Rumos e Gerente de Comunicação da ABDE.Formada em Comunicação Social, com mestrado e doutorado em Ciências Sociais pela Universidade Federal do Rio de Janeiro.

A edição número 6, de julho/agosto de 1977, ousava ao fazer uma sondagem sobre o futuro em busca de previsões relativas a alguns dos elementos macroeconômicos básicos. Produto Interno Bruto (PIB), inflação, taxa cambial foram alguns dos indicadores analisados no texto.

Sempre pertinente, a questão dos desequilíbrios regionais foi o assunto de capa da edição número 12,

de julho/agosto de 1978. Em análise, o difícil ajuste entre a atração de investimentos e o risco de guerra

fiscal entre os estados da federação. Na sequência, um artigo sobre desenvolvimento urbano, que envolve

planejamento e crescimento das cidades. Nesse número é ampliada a seção sobre estatística com a publicação embrionária do que seriam os relatórios do sistema de

informações da Associação, o InfoABDE.

Com uma pergunta bem atual: “A realidade é viável?”, a edição de janeiro/fevereiro de 1979 lançava uma série de reflexões a respeito do funcionamento e dos resultados dos diversos mecanismos utilizados pelo governo para gerir a economia do país, dentre os quais subsídios e incentivos fiscais. Destaque também para o tema da burocracia, com o caso sobre a compra de equipamentos por uma das instituições associadas que exigiu 6.964 atos burocráticos internos.

Tônica do final da década 1970, a inflação ganhou destaque na edição de maio/junho de 1979 (nº 17, ano 3)

com uma provocação: “Economia Brasileira, Inflação e Crescimento: uma falsa implicação”. Vários economistas

foram chamados a falar sobre como compatibilizar o crescimento econômico com as taxas de inflação. Com

“soluções variadas”, apontadas pelos especialistas para se encontrar o melhor caminho na economia, Rumos fechava sua

primeira década abrindo espaço para o debate sobre o desenvolvimento.

Page 6: Rumos 284

Matías Molina – A imprensa, no Brasil e no exterior, enfrenta o impacto de uma renovação tecnológica e tenta adaptar-se, com dificuldades, ao mundo digital. Procura um novo modelo econômico. Ainda não o encontrou.

Rumos – E o papel do jornalista, muda? De que forma?Matías Molina – A função básica do jornalista não muda: informar corretamente e analisar com isenção. O que muda, radicalmente, é a maneira de fazê-lo.

Rumos – Quando a televisão começou a se popularizar, muitos temiam o fim dos jornais. O senhor pensa que vai acontecer o mesmo com a internet?Matías Molina –A mudança atual é muito diferente. Signi-fica adaptar a maneira de fazer jornal no mundo digital. Isto é, fazer jornal de acordo com os meios que a internet pos-sibilita.

Rumos – Na sua opinião, falta qualidade na informa-ção produzida pelos meios de comunicação on-line? A pressa tem sido inimiga da apuração?Matías Molina – Os atuais meios on-line brasileiros não têm condições de competir com a mídia tradicional; têm pouca informação exclusiva e sobrevivem reciclando e comentando as notícias dos outros meios de acordo com seu viés ideológico.

RUMOS – 6 – Novembro/Dezembro 2015 RUMOS – 7 – Novembro/Dezembro 2015

umos – O primeiro volume de História dos Jornais no Brasil cobre o período da corte portuguesa até a Independência e já foi lan-çado. O que podemos esperar de cada um destes volumes?

Matías Molina – Estou na etapa final do segundo volume, dedicado aos jornais diários do Rio de Janeiro de 1840 até hoje. Espero entregar os originais à editora ainda este ano. O terceiro, muito adiantado, é sobre os jornais diários de São Paulo, capital. E, se ainda tiver fôlego, pretendo escre-ver também sobre os jornais de outros estados.

Rumos – O que o motivou a fazer uma pesquisa pro-funda como esta e lançar um livro sobre a história dos jornais em um momento em que a imprensa passa por uma profunda crise?Matías Molina – Acho que é importante conhecer a imprensa que formou a opinião pública ao longo da história do Brasil. Estou escrevendo a história dos jornais. O fato de a imprensa enfrentar agora um período de mudanças não altera o passado.

Rumos – Mas concorda que estamos no curso de uma transição tecnológica que afeta o conteúdo? Depois de repassar toda a história dos jornais, o que o senhor pen-sa sobre a imprensa brasileira neste momento?

Por Ana Redig

Rumos – Quais são os desafios do jornalismo frente à internet?Matías Molina – Sobreviver sem deixar de cumprir com sua função de informar e analisar a atualidade. É um desafio extraordinário.

Rumos – A revista Rumos está completando 40 anos ininterruptos de vida. Que papel terão publicações setoriais e institucionais, como ela?Matías Molina – As publicações especializadas têm mais condições de enfrentar o futuro. Seu conteúdo é importante para um segmento específico do mundo dos negócios ou da sociedade. A pergunta que a Rumos deve se fazer é “Estamos nos preparando para os próximos 40 anos?”

R

E ENTREVISTA Matías Molina

O jornalista e historiador Matías Molina lançou, em fevereiro deste ano, o primeiro dos três volumes de História dos Jornais no Brasil (560 p.) pela Companhia das Letras. Seis meses antes, ele mergulhou em “todas as publicações sobre a imprensa brasileira de que se tem notícia”. O primeiro tomo trata “Da era Colonial à Regência (1500-1840)” e conta a história da instalação, evolução e desenvolvimento da imprensa no Brasil e de como ela foi ganhando cada vez mais peso nas disputas políticas. Os jornais do Rio de Janeiro serão o foco do segundo volume, e o terceiro será dedicado ao jornais de São Paulo. “Se eu ainda tiver fôlego, espero escrever também sobre outros estados”, revelou à Rumos nesta entrevista. Aos 77 anos, Molina, nascido em Madri e naturalizado brasileiro há 60 anos, permanece um obstinado pela informação precisa. Este, aliás, foi um de seus maiores legados para as equipes com as quais trabalhou na editora Abril, na Folha de S.Paulo e na Gazeta Mercantil, onde atuou sempre como editor.

Passado, presente e futuro

Re

na

to P

ara

da

Um dos mais respeitados jornalistas de economia do país, Matías Molina foi editor-chefe do grupo de revistas técnicas da editora Abril, onde lançou a revista Exame; editou a seção de economia da Folha de S.Paulo; e foi correspondente em Londres e editor-chefe da Gazeta Mercantil. Licenciou-se em história pela Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da Universidade de São Paulo (USP).

“A imprensa, no Brasil e no exterior, enfrenta o impacto de uma renovação tecnológica e tenta adaptar-se, com dificuldades, ao mundo digital. ”

“A função básica do jornalista não muda: informar corretamente e analisar com isenção. O que muda, radicalmente, é a maneira de fazê-lo.”

“A pergunta que a Rumos deve se fazer é: ‘estamos nos preparando para os próximos 40 anos?’”

Page 7: Rumos 284

Matías Molina – A imprensa, no Brasil e no exterior, enfrenta o impacto de uma renovação tecnológica e tenta adaptar-se, com dificuldades, ao mundo digital. Procura um novo modelo econômico. Ainda não o encontrou.

Rumos – E o papel do jornalista, muda? De que forma?Matías Molina – A função básica do jornalista não muda: informar corretamente e analisar com isenção. O que muda, radicalmente, é a maneira de fazê-lo.

Rumos – Quando a televisão começou a se popularizar, muitos temiam o fim dos jornais. O senhor pensa que vai acontecer o mesmo com a internet?Matías Molina –A mudança atual é muito diferente. Signi-fica adaptar a maneira de fazer jornal no mundo digital. Isto é, fazer jornal de acordo com os meios que a internet pos-sibilita.

Rumos – Na sua opinião, falta qualidade na informa-ção produzida pelos meios de comunicação on-line? A pressa tem sido inimiga da apuração?Matías Molina – Os atuais meios on-line brasileiros não têm condições de competir com a mídia tradicional; têm pouca informação exclusiva e sobrevivem reciclando e comentando as notícias dos outros meios de acordo com seu viés ideológico.

RUMOS – 6 – Novembro/Dezembro 2015 RUMOS – 7 – Novembro/Dezembro 2015

umos – O primeiro volume de História dos Jornais no Brasil cobre o período da corte portuguesa até a Independência e já foi lan-çado. O que podemos esperar de cada um destes volumes?

Matías Molina – Estou na etapa final do segundo volume, dedicado aos jornais diários do Rio de Janeiro de 1840 até hoje. Espero entregar os originais à editora ainda este ano. O terceiro, muito adiantado, é sobre os jornais diários de São Paulo, capital. E, se ainda tiver fôlego, pretendo escre-ver também sobre os jornais de outros estados.

Rumos – O que o motivou a fazer uma pesquisa pro-funda como esta e lançar um livro sobre a história dos jornais em um momento em que a imprensa passa por uma profunda crise?Matías Molina – Acho que é importante conhecer a imprensa que formou a opinião pública ao longo da história do Brasil. Estou escrevendo a história dos jornais. O fato de a imprensa enfrentar agora um período de mudanças não altera o passado.

Rumos – Mas concorda que estamos no curso de uma transição tecnológica que afeta o conteúdo? Depois de repassar toda a história dos jornais, o que o senhor pen-sa sobre a imprensa brasileira neste momento?

Por Ana Redig

Rumos – Quais são os desafios do jornalismo frente à internet?Matías Molina – Sobreviver sem deixar de cumprir com sua função de informar e analisar a atualidade. É um desafio extraordinário.

Rumos – A revista Rumos está completando 40 anos ininterruptos de vida. Que papel terão publicações setoriais e institucionais, como ela?Matías Molina – As publicações especializadas têm mais condições de enfrentar o futuro. Seu conteúdo é importante para um segmento específico do mundo dos negócios ou da sociedade. A pergunta que a Rumos deve se fazer é “Estamos nos preparando para os próximos 40 anos?”

R

E ENTREVISTA Matías Molina

O jornalista e historiador Matías Molina lançou, em fevereiro deste ano, o primeiro dos três volumes de História dos Jornais no Brasil (560 p.) pela Companhia das Letras. Seis meses antes, ele mergulhou em “todas as publicações sobre a imprensa brasileira de que se tem notícia”. O primeiro tomo trata “Da era Colonial à Regência (1500-1840)” e conta a história da instalação, evolução e desenvolvimento da imprensa no Brasil e de como ela foi ganhando cada vez mais peso nas disputas políticas. Os jornais do Rio de Janeiro serão o foco do segundo volume, e o terceiro será dedicado ao jornais de São Paulo. “Se eu ainda tiver fôlego, espero escrever também sobre outros estados”, revelou à Rumos nesta entrevista. Aos 77 anos, Molina, nascido em Madri e naturalizado brasileiro há 60 anos, permanece um obstinado pela informação precisa. Este, aliás, foi um de seus maiores legados para as equipes com as quais trabalhou na editora Abril, na Folha de S.Paulo e na Gazeta Mercantil, onde atuou sempre como editor.

Passado, presente e futuro

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Um dos mais respeitados jornalistas de economia do país, Matías Molina foi editor-chefe do grupo de revistas técnicas da editora Abril, onde lançou a revista Exame; editou a seção de economia da Folha de S.Paulo; e foi correspondente em Londres e editor-chefe da Gazeta Mercantil. Licenciou-se em história pela Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da Universidade de São Paulo (USP).

“A imprensa, no Brasil e no exterior, enfrenta o impacto de uma renovação tecnológica e tenta adaptar-se, com dificuldades, ao mundo digital. ”

“A função básica do jornalista não muda: informar corretamente e analisar com isenção. O que muda, radicalmente, é a maneira de fazê-lo.”

“A pergunta que a Rumos deve se fazer é: ‘estamos nos preparando para os próximos 40 anos?’”

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RUMOS – 9 – Novembro/Dezembro 2015

Lei de Responsabilidade Fis-cal (LRF) tornou-se razoavel-mente conhecida nos últimos tempos, ou, ao menos, muito

mencionada no bojo da polêmica sobre sua possível infringência pelas autorida-des federais. Não é nossa intenção entrar nesse debate, mas aproveitar a notorieda-de que a Lei Complementar nº 101 (sua denominação oficial) alcançou para des-tacar suas virtudes e a contribuição que ela vem dando para o aperfeiçoamento da gestão pública, desde que foi editada,

1em 4 de maio de 2000 . Embora extensa, com 75 artigos e

uma estrutura razoavelmente complexa, a LRF é de fácil compreensão porque lida, essencialmente, com o bom senso na administração dos recursos públicos. Isso está expresso claramente logo no primeiro artigo, ao dispor que a lei esta-belece normas de finanças públicas voltadas para a responsa-bilidade na gestão fiscal e que essa responsabilidade pressu-põe a ação planejada e transparente que possibilite prevenir riscos e corrigir desvios capazes de afetar o equilíbrio das con-tas públicas.

Isso vale para todos. A LRF alcança a União, os estados, o Distrito Federal e os municípios, e se estende a todos os Poderes e não apenas ao Executivo, mas também ao Legisla-tivo, inclusive os Tribunais de Contas, ao Judiciário e ao Ministério Público, bem como às respectivas administra-ções diretas, fundos, autarquias, fundações e empresas esta-tais dependentes.

A lei está assentada sobre quatro fundamentos: o planeja-mento, a transparência, o controle e a responsabilização.

No que toca ao primeiro, o administrador do recurso público é levado a melhor planejar sua utilização ao se com-prometer a observar metas, limites e condições para a gera-ção de despesas e a renúncia de receitas, a assunção de dívi-das, a realização de operações de crédito e a concessão de garantias.

cação e saúde, antes afetas aos estados e à União. Para dar con-ta desses novos encargos, os governos locais conseguiram ampliar suas receitas próprias (de 0,61% do PIB em 1988 para 2,33% em 2013) e passaram a receber maiores aportes de recursos de transferências constitucionais, o que levou

2suas Receitas Disponíveis a saltarem de 2,98% do PIB em 31988 para 6,87% em 2013 . Apesar de a arrecadação de

impostos ter aumentado relativamente mais que as transfe-rências no período, a dependência dos municípios às fontes externas de recursos continua muito elevada: dois de cada três reais de sua receita disponível em 2013 tinham como ori-gem as transferências constitucionais de recursos.

A LRF enfatiza o princípio federativo ao determinar que constituem requisitos essenciais da responsabilidade na gestão fiscal a instituição, previsão e efetiva arrecadação de todos os tributos de competência do ente da federação. Mas, apesar de a grande maioria dos municípios já vir cobrando seus tributos, o potencial arrecadatório está longe de ser alcançado. Com essa preocupação, a lei previu que a União preste assistência técnica e cooperação financeira aos municípios para a modernização das respectivas administrações, competindo às instituições financeiras federais financiar iniciativas nessa direção.

Em linha com essa diretriz, mas antes mesmo da lei, o BNDES instituiu o PMAT – Programa de Modernização da Administração Tributária e da Gestão dos Setores Sociais Básicos, para apoiar projetos de melhoria da gestão pública municipal, buscando o aumento das receitas e a redução do custo unitário dos serviços com administração geral, saúde e educação. As agências de fomento e os bancos de desenvolvi-mento estaduais são, naturalmente, os parceiros ideais do BNDES para fazer chegar às prefeituras os recursos do pro-grama. Entretanto, apesar de muitas instituições já terem se tornado agentes financeiros do PMAT, seu engajamento é, ainda, tímido.

As agências de fomento têm um papel a desempenhar no cumprimento da Lei de Responsabilidade Fiscal, e o fortaleci-mento dos municípios com o apoio do PMAT é o caminho.

AARTIGO

Quanto à transparência, ela se con-cretiza com a divulgação ampla, inclu-sive pela internet, de quatro relatórios de acompanhamento da gestão fiscal, que permitem identificar receitas e des-pesas: o Anexo de Metas Fiscais, o Ane-xo de Riscos Fiscais, o Relatório Resu-mido da Execução Orçamentária e o Relatório de Gestão Fiscal.

De posse dessas informações, os órgãos de controle, como os Tribunais de Contas, podem exercer uma ação fis-calizadora mais efetiva e contínua da ação governamental, possibilitando à sociedade como um todo acompanhar mais de perto seus resultados.

Finalmente, de pouco adiantariam as regras caso o seu descumprimento

não resultasse em sanções. E a própria LRF cuidou de estipu-lá-las como, por exemplo, a suspensão de transferências voluntárias e da permissão para a contratação de operações de crédito. Além disso, a lei prevê que os responsáveis pelos desvios sejam enquadrados em lei específica que trata dos cri-mes de responsabilidade fiscal.

Não cabe neste curto texto enumerar todos os dispositi-vos da LRF, mas podemos condensar todos os seus artigos em alguns poucos princípios:

a) os gastos não devem ultrapassar a arrecadação;b) a receita com a venda de patrimônio não deve ser usada para custear despesas correntes, mas para a diminuição da dívida ou para a compra de outro bem;c) uma obrigação permanente de gasto precisa ter uma fonte igualmente permanente de receita;d) as despesas com pessoal não devem ultrapassar os limi-tes prudenciais e jamais os máximos;e) se for necessário contrair dívidas bancárias, que se des-tinem a financiar investimentos fixos, observando sem-pre os limites e a capacidade de pagamento futuro das prestações.Como antes mencionado, a LRF trata, logo em seu primei-

ro artigo, de uma ação planejada da gestão fiscal e, para que isso aconteça, é necessário fixar metas para as receitas, as des-pesas, os resultados primário e nominal e o montante da dívi-da. As metas para o próximo ano e os dois anos seguintes pre-cisam ser incluídas na Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) de cada ente da Federação (União, estados e municípios) e podem ser revistas anualmente. É importante ressaltar a auto-nomia de cada ente para fixá-las e que elas passarão a condicio-nar todo o processo de orçamento e contabilidade. Assim, se ao longo de um ano houver uma frustração de receita, os gas-tos terão de ser cortados automaticamente para que a meta de resultado expressa na LDO seja assegurada.

Dois outros importantes conceitos estão contemplados na Lei de Responsabilidade Fiscal.

O primeiro é o de que cada governo tem que caber dentro de seu território, ou seja, um governo não pode mais financiar outro, renegociar dívidas ou rolar o que já tiver sido rolado. Na mesma linha, transferências voluntárias – da União para os stados, por exemplo – serão impedidas se o ente beneficiá-rio deixar de cobrar seus próprios impostos ou não atender os limites de pessoal e de dívida.

O segundo conceito é o de que cada governante tem que caber dentro de seu mandato. Uma prática antes muito usual e que trazia grandes dificuldades para os novos mandatários ficou impedida pela LRF, que passou a proibir, sob a pena de crime, a transferência de restos a pagar para o sucessor sem a suficiente disponibilidade de caixa. E mais, no último ano de mandato tem de ser adotado o regime de caixa, de modo que o gasto só possa ser assumido após a efetiva entrada das receitas.

Cabe, neste ponto, chamar a atenção para outro ponto da lei, que diz respeito aos municípios brasileiros e que deve inte-ressar às agências de fomento e bancos de desenvolvimento estaduais.

É sabido que a Constituição transferiu para os municípios a responsabilidade sobre importantes ações nas áreas da edu-

Ricardo Figueiró*

RUMOS – 8 – Novembro/Dezembro 2015

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d

Lei de Responsabilidade Fiscal – um instrumento em favor do desenvolvimento

As agências de fomento têm um papel

a desempenhar no cumprimento da Lei de

Responsabilidade Fiscal, e o fortalecimento

dos municípios com o apoio do PMAT

é o caminho.

* Ricardo Figueiró é economista e aposentado do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES). Atuou por seis anos na ABDE e foi Diretor de Operações da AgeRio (antiga InvesteRio). Foi um dos integrantes da equipe do BNDES que colaborou com o Ministério do Planejamento na preparação do ante-projeto da Lei de Responsabilidade Fiscal.

1 Este artigo foi elaborado a partir de trabalhos de José Roberto Afonso e Amir Khair, a quem o autor agradece.2 A Receita Disponível compreende a arrecadação própria mais e/ou menos a repartição constitucional de receitas tributárias e outros repasses compulsórios.3 Fonte: dados coletados por José Roberto Afonso, a partir da Secretaria do Tesouro Nacional, Secretaria da Receita Federal (SRF), Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), Ministério da Previdência, Caixa Econômica Federal, Conselho Nacional de Política Fazendária (Confaz) e balanços municipais.

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RUMOS – 9 – Novembro/Dezembro 2015

Lei de Responsabilidade Fis-cal (LRF) tornou-se razoavel-mente conhecida nos últimos tempos, ou, ao menos, muito

mencionada no bojo da polêmica sobre sua possível infringência pelas autorida-des federais. Não é nossa intenção entrar nesse debate, mas aproveitar a notorieda-de que a Lei Complementar nº 101 (sua denominação oficial) alcançou para des-tacar suas virtudes e a contribuição que ela vem dando para o aperfeiçoamento da gestão pública, desde que foi editada,

1em 4 de maio de 2000 . Embora extensa, com 75 artigos e

uma estrutura razoavelmente complexa, a LRF é de fácil compreensão porque lida, essencialmente, com o bom senso na administração dos recursos públicos. Isso está expresso claramente logo no primeiro artigo, ao dispor que a lei esta-belece normas de finanças públicas voltadas para a responsa-bilidade na gestão fiscal e que essa responsabilidade pressu-põe a ação planejada e transparente que possibilite prevenir riscos e corrigir desvios capazes de afetar o equilíbrio das con-tas públicas.

Isso vale para todos. A LRF alcança a União, os estados, o Distrito Federal e os municípios, e se estende a todos os Poderes e não apenas ao Executivo, mas também ao Legisla-tivo, inclusive os Tribunais de Contas, ao Judiciário e ao Ministério Público, bem como às respectivas administra-ções diretas, fundos, autarquias, fundações e empresas esta-tais dependentes.

A lei está assentada sobre quatro fundamentos: o planeja-mento, a transparência, o controle e a responsabilização.

No que toca ao primeiro, o administrador do recurso público é levado a melhor planejar sua utilização ao se com-prometer a observar metas, limites e condições para a gera-ção de despesas e a renúncia de receitas, a assunção de dívi-das, a realização de operações de crédito e a concessão de garantias.

cação e saúde, antes afetas aos estados e à União. Para dar con-ta desses novos encargos, os governos locais conseguiram ampliar suas receitas próprias (de 0,61% do PIB em 1988 para 2,33% em 2013) e passaram a receber maiores aportes de recursos de transferências constitucionais, o que levou

2suas Receitas Disponíveis a saltarem de 2,98% do PIB em 31988 para 6,87% em 2013 . Apesar de a arrecadação de

impostos ter aumentado relativamente mais que as transfe-rências no período, a dependência dos municípios às fontes externas de recursos continua muito elevada: dois de cada três reais de sua receita disponível em 2013 tinham como ori-gem as transferências constitucionais de recursos.

A LRF enfatiza o princípio federativo ao determinar que constituem requisitos essenciais da responsabilidade na gestão fiscal a instituição, previsão e efetiva arrecadação de todos os tributos de competência do ente da federação. Mas, apesar de a grande maioria dos municípios já vir cobrando seus tributos, o potencial arrecadatório está longe de ser alcançado. Com essa preocupação, a lei previu que a União preste assistência técnica e cooperação financeira aos municípios para a modernização das respectivas administrações, competindo às instituições financeiras federais financiar iniciativas nessa direção.

Em linha com essa diretriz, mas antes mesmo da lei, o BNDES instituiu o PMAT – Programa de Modernização da Administração Tributária e da Gestão dos Setores Sociais Básicos, para apoiar projetos de melhoria da gestão pública municipal, buscando o aumento das receitas e a redução do custo unitário dos serviços com administração geral, saúde e educação. As agências de fomento e os bancos de desenvolvi-mento estaduais são, naturalmente, os parceiros ideais do BNDES para fazer chegar às prefeituras os recursos do pro-grama. Entretanto, apesar de muitas instituições já terem se tornado agentes financeiros do PMAT, seu engajamento é, ainda, tímido.

As agências de fomento têm um papel a desempenhar no cumprimento da Lei de Responsabilidade Fiscal, e o fortaleci-mento dos municípios com o apoio do PMAT é o caminho.

AARTIGO

Quanto à transparência, ela se con-cretiza com a divulgação ampla, inclu-sive pela internet, de quatro relatórios de acompanhamento da gestão fiscal, que permitem identificar receitas e des-pesas: o Anexo de Metas Fiscais, o Ane-xo de Riscos Fiscais, o Relatório Resu-mido da Execução Orçamentária e o Relatório de Gestão Fiscal.

De posse dessas informações, os órgãos de controle, como os Tribunais de Contas, podem exercer uma ação fis-calizadora mais efetiva e contínua da ação governamental, possibilitando à sociedade como um todo acompanhar mais de perto seus resultados.

Finalmente, de pouco adiantariam as regras caso o seu descumprimento

não resultasse em sanções. E a própria LRF cuidou de estipu-lá-las como, por exemplo, a suspensão de transferências voluntárias e da permissão para a contratação de operações de crédito. Além disso, a lei prevê que os responsáveis pelos desvios sejam enquadrados em lei específica que trata dos cri-mes de responsabilidade fiscal.

Não cabe neste curto texto enumerar todos os dispositi-vos da LRF, mas podemos condensar todos os seus artigos em alguns poucos princípios:

a) os gastos não devem ultrapassar a arrecadação;b) a receita com a venda de patrimônio não deve ser usada para custear despesas correntes, mas para a diminuição da dívida ou para a compra de outro bem;c) uma obrigação permanente de gasto precisa ter uma fonte igualmente permanente de receita;d) as despesas com pessoal não devem ultrapassar os limi-tes prudenciais e jamais os máximos;e) se for necessário contrair dívidas bancárias, que se des-tinem a financiar investimentos fixos, observando sem-pre os limites e a capacidade de pagamento futuro das prestações.Como antes mencionado, a LRF trata, logo em seu primei-

ro artigo, de uma ação planejada da gestão fiscal e, para que isso aconteça, é necessário fixar metas para as receitas, as des-pesas, os resultados primário e nominal e o montante da dívi-da. As metas para o próximo ano e os dois anos seguintes pre-cisam ser incluídas na Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) de cada ente da Federação (União, estados e municípios) e podem ser revistas anualmente. É importante ressaltar a auto-nomia de cada ente para fixá-las e que elas passarão a condicio-nar todo o processo de orçamento e contabilidade. Assim, se ao longo de um ano houver uma frustração de receita, os gas-tos terão de ser cortados automaticamente para que a meta de resultado expressa na LDO seja assegurada.

Dois outros importantes conceitos estão contemplados na Lei de Responsabilidade Fiscal.

O primeiro é o de que cada governo tem que caber dentro de seu território, ou seja, um governo não pode mais financiar outro, renegociar dívidas ou rolar o que já tiver sido rolado. Na mesma linha, transferências voluntárias – da União para os stados, por exemplo – serão impedidas se o ente beneficiá-rio deixar de cobrar seus próprios impostos ou não atender os limites de pessoal e de dívida.

O segundo conceito é o de que cada governante tem que caber dentro de seu mandato. Uma prática antes muito usual e que trazia grandes dificuldades para os novos mandatários ficou impedida pela LRF, que passou a proibir, sob a pena de crime, a transferência de restos a pagar para o sucessor sem a suficiente disponibilidade de caixa. E mais, no último ano de mandato tem de ser adotado o regime de caixa, de modo que o gasto só possa ser assumido após a efetiva entrada das receitas.

Cabe, neste ponto, chamar a atenção para outro ponto da lei, que diz respeito aos municípios brasileiros e que deve inte-ressar às agências de fomento e bancos de desenvolvimento estaduais.

É sabido que a Constituição transferiu para os municípios a responsabilidade sobre importantes ações nas áreas da edu-

Ricardo Figueiró*

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Lei de Responsabilidade Fiscal – um instrumento em favor do desenvolvimento

As agências de fomento têm um papel

a desempenhar no cumprimento da Lei de

Responsabilidade Fiscal, e o fortalecimento

dos municípios com o apoio do PMAT

é o caminho.

* Ricardo Figueiró é economista e aposentado do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES). Atuou por seis anos na ABDE e foi Diretor de Operações da AgeRio (antiga InvesteRio). Foi um dos integrantes da equipe do BNDES que colaborou com o Ministério do Planejamento na preparação do ante-projeto da Lei de Responsabilidade Fiscal.

1 Este artigo foi elaborado a partir de trabalhos de José Roberto Afonso e Amir Khair, a quem o autor agradece.2 A Receita Disponível compreende a arrecadação própria mais e/ou menos a repartição constitucional de receitas tributárias e outros repasses compulsórios.3 Fonte: dados coletados por José Roberto Afonso, a partir da Secretaria do Tesouro Nacional, Secretaria da Receita Federal (SRF), Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), Ministério da Previdência, Caixa Econômica Federal, Conselho Nacional de Política Fazendária (Confaz) e balanços municipais.

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RUMOS – 11 – Novembro/Dezembro 2015

orando de aluguel, sem renda fixa e com o conhe-cimento de consertar geladeiras, Marlene Alves Feitosa, 41 anos, não imaginava que um dia fosse conseguir financiamento e ter seu próprio negó-

cio. Em 2009, ela recebeu o primeiro crédito do Programa Amazônia Florescer. Comprou ferramentas e material de divulgação. Seis anos se passaram e, com o apoio progressivo do programa, ela mudou sua realidade.

Marlene, que mora na cidade de Ananindeua, no Pará, agora tem casa própria e montou a Refrigeração Santos, com sede e firma registrada. O lucro aumentou mais de 100%. “Foi uma porta que se abriu, não tinha como fazer emprésti-mo, nem comprovar renda”, comenta. Ela é uma das benefi-ciadas com a linha de microfinanças do Banco da Amazônia, que investe no empreendedorismo popular.

Em 2015, até o início do mês de novembro, o banco já havia aplicado cerca de R$ 83 milhões em 36.496 atendimen-tos para microfinanças. Comparando com cinco anos atrás, vê-se um crescimento de cinco vezes na quantidade de recur-sos investidos. Em 2011, foram 11.726 clientes atendidos com o valor total de R$ 13,7 milhões.

São dois os segmentos que o banco investe nessa área: Microempreendedor Individual (MEI) e Microcrédito Pro-dutivo Orientado (MPO), nas vertentes Urbana e Rural, por meio do Programa Amazônia Florescer.

Somente com MPO já foram atendidos, em 2015, 34.786 empreendedores com a aplicação de R$ 71,3 milhões. Inves-timentos que possibilitam que pequenos empreendedores consigam contribuir economicamente para a região.

É o caso também de Henrique Sousa de Castro, 47 anos, que no final de 2011 resolveu sair do sítio e morar na capital, em Porto Velho, Rondônia. Juntou a experiência de trabalhar como empregado na área comercial por 15 anos e a vivência de 12 anos no sítio trabalhando com madeira, para montar seu próprio negócio – a Din Din da Leste.

Henrique investiu no ramo alimentício, com a venda de produtos com frutas naturais, como polpas e sucos. Iniciou com a venda de R$ 70 a R$ 100 por dia. Cerca de um ano

Micro e Pequenas Empresas (Sebrae), no caso do MEI, que possibilita, mensalmente, a realização de palestras, a fim de orientar e apresentar os produtos e serviços.

Para o Amazônia Florescer, tanto na versão urbana quan-to na rural, a parceria é com a Associação de Apoio à Econo-mia Popular da Amazônia (Amazoncred), uma Organização da Sociedade Civil de Interesse Público (Oscip). A Amazon-cred fica responsável por operacionalizar os programas, no que se refere à prospecção de clientes, acompanhamento, ori-entação ao crédito e educação financeira.

A atuação do banco em conjunto com a Amazoncred pro-porciona a atuação alinhada ao PNMPO, do Ministério do Trabalho e Emprego. A Amazoncred conta com assessores de microfinanças. Eles são treinados para fazer o levanta-mento socioeconômico do cliente e definir o tamanho do cré-dito em função de sua capacidade de pagamento.

Ao optar pela metodologia de MPO, Cristina destaca a importância de o cliente ter esse acompanhamento no pró-prio local onde desenvolve sua atividade. São apresentados para ele temas relevantes como o empreendedorismo e a edu-cação financeira.

“Os clientes possuem dificuldades de deixar suas ativida-des para buscar o crédito; logo, o microcrédito necessita, para ser um efetivo instrumento de geração de emprego e renda, levar, além do crédito, orientação sobre como os clientes podem gerir melhor o seu negócio e evitar o superendivida-mento”, ressalta.

Desde dezembro de 2007, ano de sua criação, o Progra-ma Amazônia Florescer, nas duas vertentes, atendeu as necessidades de crédito de 150.222 empreendedores da região Norte. O total de recursos aplicados está na ordem de R$ 244,36 milhões.

Por meio do MEI, o banco já efetivou mais de 7.500 con-tratos com valores que ultrapassam os R$ 34,8 milhões. “As metas têm sido alcançadas, com o fortalecimento de uma rede de solidariedade e cooperação entre os microempreen-dedores do setor informal da economia”, comemora a geren-te de microfinanças e agricultura familiar.

depois, começou a ser beneficiado pelo Amazônia Florescer. Investiu em equipamentos e matéria-prima.

Hoje, há dias em que Henrique vende quase dez vezes mais em suas barraquinhas localizadas em pontos estratégi-cos da cidade. “Foi um bom apoio para crescer, e eu espero que continue assim”, pontuou. A esposa e os três filhos apoi-am Henrique nessa jornada.

O principal segmento apoiado pelo banco na área de microfinanças é o comércio, seguido por serviços e produção. As atividades mais comuns possuem relação com a venda de alimentos, confecções, cosméticos ou salões de beleza.

“Para o Banco da Amazônia, esses investimentos signifi-cam fazer a inclusão social de milhares de microempreende-dores por meio da inclusão financeira, gerando trabalho e ren-da e melhorando a qualidade de vida dessas pessoas”, destaca a gerente de microfinanças e agricultura familiar do Banco da Amazônia, Cristina Ferreira Alves Lopes.

Perspectivas – Para 2016, Cristina relata que o banco vai con-tinuar trabalhando para aperfeiçoar os processos, tornar o cré-dito mais rápido e desenvolver produtos e serviços para aten-der as necessidades dos clientes nesse segmento.

“Atualmente temos a abertura de conta corrente e em bre-ve estaremos lançando um seguro de vida, além do estímulo ao uso de domicílio bancário”, afirma. E acrescenta: “Outros produtos e serviços certamente serão desenhados para aten-der de forma mais completa as necessidades da clientela de baixa renda”.

A meta para o próximo ano é destinar R$ 104 milhões para microfinanças, sendo R$ 91 milhões para o MPO e R$ 13 milhões para o Microempreendedor Individual. A maioria dos clientes, como Marlene e Henrique, nunca tiveram acesso ao crédito de uma instituição financeira antes. Eles iniciam suas atividades com economia própria e apoio de parentes e amigos.

O empreendedor de pequenos negócios que tenha uma receita bruta anual de até R$ 120 mil/ano pode ser beneficia-do com os programas. O Amazônia Florescer trabalha com a

estratégia do crédito progressivo e sucessivo, aumentado de acordo com a pontualidade do cliente e capacidade de paga-mento.

Marlene, por exemplo, começou recebendo o crédito de R$ 600, em 2009. Este ano, o último empréstimo que fez já foi no valor de R$ 8 mil. Atualmente o limite máximo de valor para capital de giro ou investimento é de R$ 15 mil, seguindo o que determina o Programa Nacional de Microcrédito Pro-dutivo Orientado (PNMPO). A intenção é atender as neces-sidades de capital de giro e investimento. “O programa conta-biliza muitos casos de sucesso, clientes que estão conseguin-do desenvolver suas atividades e melhorar a vida da família”, comenta Cristina.

Números – No que se refere ao Programa Amazônia Flores-cer Urbano (MPO Urbano), está estimada a aplicação de R$ 77 milhões em 2015, com expectativa de atender cerca de 40 mil empreendedores. O investimento representa um cresci-mento de 12% comparado com o ano anterior, quando foi aplicado o montante de R$ 68,6 milhões.

Já o Programa Amazônia Florescer Rural (MPO Rural) trabalha com a expectativa de atender cerca de quatro mil agri-cultores, aplicando R$ 14 milhões em 2015. Com o MEI, deve ser investido o total de R$ 12 milhões este ano, cumprin-do a meta estabelecida. Na comparação com 2012, houve um aumento de 440% nesses investimentos.

A gerente Cristina ressalta que o olhar atento do banco nesta área representa também uma integração entre os pro-gramas do governo. Por exemplo, por meio do apoio aos beneficiários do programa bolsa família para entrarem no mercado de trabalho.

“Geramos também trabalho e renda, melhoramos a capa-cidade empreendedora dos clientes e estimulamos a forma-ção de uma rede que troca saberes, conhecimentos, experiên-cias e negócios”, completa.

Execução – Para execução dos programas, o Banco da Ama-zônia conta com a parceria do Serviço Brasileiro de Apoio às

RUMOS – 10 – Novembro/Dezembro 2015

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R REPORTAGEM

Microcrédito e inclusão social

BALANÇO

Banco da Amazônia contabiliza mais de 36 mil atendimentos para microfinanças em 2015 e mira em aperfeiçoar os processos paratornar o crédito mais rápido em 2016, para que continue cumprindoo papel de transformação das realidades locais A

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A empreendedora paraense Marlene Alves recebeu o primeiro crédito do Programa Amazônia Florescer em 2009. Seis anos depois, viu seu negócio crescer e o lucro aumentar mais de 100%.

Por Danile Rebouças

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RUMOS – 11 – Novembro/Dezembro 2015

orando de aluguel, sem renda fixa e com o conhe-cimento de consertar geladeiras, Marlene Alves Feitosa, 41 anos, não imaginava que um dia fosse conseguir financiamento e ter seu próprio negó-

cio. Em 2009, ela recebeu o primeiro crédito do Programa Amazônia Florescer. Comprou ferramentas e material de divulgação. Seis anos se passaram e, com o apoio progressivo do programa, ela mudou sua realidade.

Marlene, que mora na cidade de Ananindeua, no Pará, agora tem casa própria e montou a Refrigeração Santos, com sede e firma registrada. O lucro aumentou mais de 100%. “Foi uma porta que se abriu, não tinha como fazer emprésti-mo, nem comprovar renda”, comenta. Ela é uma das benefi-ciadas com a linha de microfinanças do Banco da Amazônia, que investe no empreendedorismo popular.

Em 2015, até o início do mês de novembro, o banco já havia aplicado cerca de R$ 83 milhões em 36.496 atendimen-tos para microfinanças. Comparando com cinco anos atrás, vê-se um crescimento de cinco vezes na quantidade de recur-sos investidos. Em 2011, foram 11.726 clientes atendidos com o valor total de R$ 13,7 milhões.

São dois os segmentos que o banco investe nessa área: Microempreendedor Individual (MEI) e Microcrédito Pro-dutivo Orientado (MPO), nas vertentes Urbana e Rural, por meio do Programa Amazônia Florescer.

Somente com MPO já foram atendidos, em 2015, 34.786 empreendedores com a aplicação de R$ 71,3 milhões. Inves-timentos que possibilitam que pequenos empreendedores consigam contribuir economicamente para a região.

É o caso também de Henrique Sousa de Castro, 47 anos, que no final de 2011 resolveu sair do sítio e morar na capital, em Porto Velho, Rondônia. Juntou a experiência de trabalhar como empregado na área comercial por 15 anos e a vivência de 12 anos no sítio trabalhando com madeira, para montar seu próprio negócio – a Din Din da Leste.

Henrique investiu no ramo alimentício, com a venda de produtos com frutas naturais, como polpas e sucos. Iniciou com a venda de R$ 70 a R$ 100 por dia. Cerca de um ano

Micro e Pequenas Empresas (Sebrae), no caso do MEI, que possibilita, mensalmente, a realização de palestras, a fim de orientar e apresentar os produtos e serviços.

Para o Amazônia Florescer, tanto na versão urbana quan-to na rural, a parceria é com a Associação de Apoio à Econo-mia Popular da Amazônia (Amazoncred), uma Organização da Sociedade Civil de Interesse Público (Oscip). A Amazon-cred fica responsável por operacionalizar os programas, no que se refere à prospecção de clientes, acompanhamento, ori-entação ao crédito e educação financeira.

A atuação do banco em conjunto com a Amazoncred pro-porciona a atuação alinhada ao PNMPO, do Ministério do Trabalho e Emprego. A Amazoncred conta com assessores de microfinanças. Eles são treinados para fazer o levanta-mento socioeconômico do cliente e definir o tamanho do cré-dito em função de sua capacidade de pagamento.

Ao optar pela metodologia de MPO, Cristina destaca a importância de o cliente ter esse acompanhamento no pró-prio local onde desenvolve sua atividade. São apresentados para ele temas relevantes como o empreendedorismo e a edu-cação financeira.

“Os clientes possuem dificuldades de deixar suas ativida-des para buscar o crédito; logo, o microcrédito necessita, para ser um efetivo instrumento de geração de emprego e renda, levar, além do crédito, orientação sobre como os clientes podem gerir melhor o seu negócio e evitar o superendivida-mento”, ressalta.

Desde dezembro de 2007, ano de sua criação, o Progra-ma Amazônia Florescer, nas duas vertentes, atendeu as necessidades de crédito de 150.222 empreendedores da região Norte. O total de recursos aplicados está na ordem de R$ 244,36 milhões.

Por meio do MEI, o banco já efetivou mais de 7.500 con-tratos com valores que ultrapassam os R$ 34,8 milhões. “As metas têm sido alcançadas, com o fortalecimento de uma rede de solidariedade e cooperação entre os microempreen-dedores do setor informal da economia”, comemora a geren-te de microfinanças e agricultura familiar.

depois, começou a ser beneficiado pelo Amazônia Florescer. Investiu em equipamentos e matéria-prima.

Hoje, há dias em que Henrique vende quase dez vezes mais em suas barraquinhas localizadas em pontos estratégi-cos da cidade. “Foi um bom apoio para crescer, e eu espero que continue assim”, pontuou. A esposa e os três filhos apoi-am Henrique nessa jornada.

O principal segmento apoiado pelo banco na área de microfinanças é o comércio, seguido por serviços e produção. As atividades mais comuns possuem relação com a venda de alimentos, confecções, cosméticos ou salões de beleza.

“Para o Banco da Amazônia, esses investimentos signifi-cam fazer a inclusão social de milhares de microempreende-dores por meio da inclusão financeira, gerando trabalho e ren-da e melhorando a qualidade de vida dessas pessoas”, destaca a gerente de microfinanças e agricultura familiar do Banco da Amazônia, Cristina Ferreira Alves Lopes.

Perspectivas – Para 2016, Cristina relata que o banco vai con-tinuar trabalhando para aperfeiçoar os processos, tornar o cré-dito mais rápido e desenvolver produtos e serviços para aten-der as necessidades dos clientes nesse segmento.

“Atualmente temos a abertura de conta corrente e em bre-ve estaremos lançando um seguro de vida, além do estímulo ao uso de domicílio bancário”, afirma. E acrescenta: “Outros produtos e serviços certamente serão desenhados para aten-der de forma mais completa as necessidades da clientela de baixa renda”.

A meta para o próximo ano é destinar R$ 104 milhões para microfinanças, sendo R$ 91 milhões para o MPO e R$ 13 milhões para o Microempreendedor Individual. A maioria dos clientes, como Marlene e Henrique, nunca tiveram acesso ao crédito de uma instituição financeira antes. Eles iniciam suas atividades com economia própria e apoio de parentes e amigos.

O empreendedor de pequenos negócios que tenha uma receita bruta anual de até R$ 120 mil/ano pode ser beneficia-do com os programas. O Amazônia Florescer trabalha com a

estratégia do crédito progressivo e sucessivo, aumentado de acordo com a pontualidade do cliente e capacidade de paga-mento.

Marlene, por exemplo, começou recebendo o crédito de R$ 600, em 2009. Este ano, o último empréstimo que fez já foi no valor de R$ 8 mil. Atualmente o limite máximo de valor para capital de giro ou investimento é de R$ 15 mil, seguindo o que determina o Programa Nacional de Microcrédito Pro-dutivo Orientado (PNMPO). A intenção é atender as neces-sidades de capital de giro e investimento. “O programa conta-biliza muitos casos de sucesso, clientes que estão conseguin-do desenvolver suas atividades e melhorar a vida da família”, comenta Cristina.

Números – No que se refere ao Programa Amazônia Flores-cer Urbano (MPO Urbano), está estimada a aplicação de R$ 77 milhões em 2015, com expectativa de atender cerca de 40 mil empreendedores. O investimento representa um cresci-mento de 12% comparado com o ano anterior, quando foi aplicado o montante de R$ 68,6 milhões.

Já o Programa Amazônia Florescer Rural (MPO Rural) trabalha com a expectativa de atender cerca de quatro mil agri-cultores, aplicando R$ 14 milhões em 2015. Com o MEI, deve ser investido o total de R$ 12 milhões este ano, cumprin-do a meta estabelecida. Na comparação com 2012, houve um aumento de 440% nesses investimentos.

A gerente Cristina ressalta que o olhar atento do banco nesta área representa também uma integração entre os pro-gramas do governo. Por exemplo, por meio do apoio aos beneficiários do programa bolsa família para entrarem no mercado de trabalho.

“Geramos também trabalho e renda, melhoramos a capa-cidade empreendedora dos clientes e estimulamos a forma-ção de uma rede que troca saberes, conhecimentos, experiên-cias e negócios”, completa.

Execução – Para execução dos programas, o Banco da Ama-zônia conta com a parceria do Serviço Brasileiro de Apoio às

RUMOS – 10 – Novembro/Dezembro 2015

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R REPORTAGEM

Microcrédito e inclusão social

BALANÇO

Banco da Amazônia contabiliza mais de 36 mil atendimentos para microfinanças em 2015 e mira em aperfeiçoar os processos paratornar o crédito mais rápido em 2016, para que continue cumprindoo papel de transformação das realidades locais A

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A empreendedora paraense Marlene Alves recebeu o primeiro crédito do Programa Amazônia Florescer em 2009. Seis anos depois, viu seu negócio crescer e o lucro aumentar mais de 100%.

Por Danile Rebouças

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RUMOS – 13 – Novembro/Dezembro 2015

Por Sarah Barros

Sustentabilidade

Para fomentar projetos amigáveis com o meio ambiente e socialmente relevantes, o programa BRDE PCS se baseia nas melhores práticas nacionais e internacionais em sustentabilidadeE E

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Banco Regional de Desenvolvimento do Extre-mo Sul (BRDE) lançou em novembro o Progra-ma BRDE PCS – Produção e Consumo Susten-táveis, como parte do Plano e da Política de Res-ponsabilidade Socioambiental (PRSA) elabora-

dos pela instituição em atendimento às diretrizes definidas pelo Banco Central para promover a adoção de medidas de sustentabilidade entre as instituições financeiras do Brasil. A iniciativa agrega conceitos e estratégias já consolidados naci-onal e internacionalmente em termos de desenvolvimento sustentável e, alicerçado em cinco eixos, irá possibilitar a ampliação das ações já desenvolvidas pelo banco em favor da preservação do meio ambiente e dará apoio a novos projetos de investimentos sustentáveis nos estados do Paraná (PR), Santa Catarina (SC) e Rio Grande do Sul (RS).

O programa contempla iniciativas nas áreas de Agrone-gócio Sustentável, Uso Racional e Eficiente da Água, Gestão de Resíduos e Reciclagem, Energias Limpas e Renováveis e Cidades Sustentáveis. O objetivo é levar ao mercado linhas de crédito com condições especiais, tais como prazos maiores de financiamento e redução de tarifas de cadastro, análise e fis-calização, além de spread mais baixo. “Com isso, conseguimos organizar a atuação socioambiental que o banco já desempe-nhava por meio de um programa abrangente”, avalia o dire-tor de Planejamento do BRDE, Luiz Noronha.

A origem do programa está no trabalho de adequação do BRDE à Resolução 4.327/2014, do Banco Central (BC), que dispõe sobre as diretrizes a serem observadas no estabeleci-mento e na implementação da Política de Responsabilidade Socioambiental e respectivo plano de ação pelas instituições reguladas pelo órgão. A norma não indica ações específicas a serem adotadas por cada tipo de entidade, mas estabelece princípios para que cada instituição considere as questões ambientais e sociais ligadas aos seus negócios e sua relação com clientes e usuários de seus produtos e serviços financei-ros e, ainda, com a própria comunidade interna à organização e as demais pessoas impactadas por suas atividades.

Ao aplicar as diretrizes do Banco Central à sua realidade,

o BRDE avaliou aspectos sociais e ambientais de sua atuação em três áreas: na atividade bancária propriamente dita, que tem o menor impacto socioambiental; na política operacional do banco, que se refere aos processos implementados para o financiamento de projetos e está sendo atualizada; e no fomento de projetos amigáveis com o meio ambiente, área em que o programa BRDE PCS está focado. “Todos os ban-cos, principalmente os de desenvolvimento, já fazem este tipo de fomento, mas não havia organização, ou seja, esses projetos não estavam sob um guarda-chuva institucional-mente adequado”, aponta Noronha.

Ao longo do processo de construção do programa, um dos parâmetros utilizados foi a nova agenda de desenvolvi-mento proposta pela Organização das Nações Unidas (ONU) neste ano, que elenca dezessete Objetivos de Desen-volvimento Sustentável (ODS). A agenda foi apresentada em setembro de 2015 e é uma evolução dos resultados obtidos por meio dos Objetivos de Desenvolvimento do Milênio (ODM). O décimo segundo item trata do Consumo e Produ-ção Sustentáveis, tema que dialoga com os demais objetivos listados pela organização internacional.

Das iniciativas já consolidadas no Brasil, o BRDE tomou parte na Agenda Ambiental na Administração Pública (A3P), desenvolvida pelo Ministério do Meio Ambiente (MMA) jun-to a instituições e órgãos públicos, à qual o banco aderiu em outubro deste ano. As diretrizes visam implantar a responsa-bilidade socioambiental nas atividades administrativas e ope-racionais da administração pública.

Para o diretor de Planejamento do BRDE, a adesão a essas agendas permite ao banco absorver conceitos e práticas já testadas por instituições que têm a área socioambiental mais estruturada e também dar a sua contribuição para o aper-feiçoamento e a aplicação destas práticas nos estados do Sul do Brasil, onde atua. “Resolvemos apostar em um conceito já disseminado nacional e internacionalmente por meio de uma agenda que tem a confiança inclusive dos investidores que reconhecem a importância de um programa concreto de sus-tentabilidade”, ressalta Noronha. Tal confiança já colocou o

BRDE sob a atenção de uma instituição francesa, com possi-bilidade de captação de recursos a taxas atrativas junto à Comunidade Europeia.

Eixos – Dos cinco eixos adotados pelo BRDE para reforçar sua carteira de empreendimentos social e ambientalmente sustentáveis, dois já faziam parte do portfólio de programas da instituição, pela sua importância estratégica: o de Energias Renováveis e o de Cidades Sustentáveis. No primeiro, o ban-co já atua fortemente, tendo lançado em maio deste ano o programa de financiamento BRDE Energia. Além de inves-timentos na geração de energias limpas e renováveis, o intui-to é também fomentar a adoção de práticas de eficiência ener-gética e redução do consumo, por meio da implantação de sis-temas e da compra de equipamentos em estabelecimento da indústria, de comércio e de serviços.

Para o BRDE Energia, serão alocados recursos de repas-ses de linhas do Banco Nacional de Desenvolvimento Eco-nômico e Social (BNDES) e mais R$ 60 milhões de recursos próprios do BRDE disponíveis para projetos nos três esta-dos do Sul. Outro marco da atuação do banco nesta área foi a assinatura, no final de novembro, de contratos e protocolos com empresas ligadas a empreendimentos de energia eólica, aproveitamento de biomassa e Pequenas Centrais Hidrelétri-cas no valor total de R$ 455 milhões.

Quanto às linhas voltadas para o financiamento de proje-tos que incentivem a aplicação de conceitos sustentáveis na gestão das cidades – o eixo Cidades Sustentáveis –, o setor público municipal dos estados do Sul brasileiro conta desde setembro com o BRDE Municípios. Por meio do programa poderão ser apoiados projetos de saneamento, melhoria na iluminação pública, mobilidade urbana e gestão de resíduos, entre outros. Ao todo, são R$ 450 milhões para investimento na região, sendo R$ 150 milhões para cada estado.

O Nos demais eixos, o BRDE mantém tratativas com orga-nismos nacionais e internacionais para fortalecer sua oferta de crédito. Em relação ao fomento de projetos que promo-vam o uso racional e eficiente da água, o banco já atua com recursos disponibilizados pelo BNDES e pretende agregar aportes de fundos estaduais de recursos hídricos da Agência Nacional de Águas (ANA). “Com isso, teremos uma melhor composição dos recursos, agregando valores captados de for-ma menos onerosa”, avalia Noronha.

Na área do Agronegócio Sustentável, o banco de desen-volvimento agregou as linhas de crédito já operadas princi-palmente para atendimento ao Plano Safra. Entre elas está o Programa ABC, oferecido pelo BNDES desde a safra 2010/2011. A estratégia de financiamento engloba iniciativas para a recuperação de pastagens e solos degradados, o plantio de florestas e a integração lavoura-pecuária-floresta.

Já no eixo Gestão de Resíduos e Reciclagem, destacam-se os esforços para atender a uma demanda típica do sul brasilei-ro, relacionada aos dejetos da criação de suínos, aves e gado leiteiro. Nesta área, o BRDE negocia com o Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa) recursos não reembolsáveis, o que possibilita oferecer melhores taxas de juros ao tomador do crédito.

Com este escopo, o programa do BRDE para a produção e o consumo sustentáveis se alinha às melhores práticas interna-cionais de desenvolvimento sustentável e se posiciona como parte ativa na construção de políticas que privilegiem critérios ambiental e socialmente responsáveis na concessão de crédito. “O que mais se discute em torno do conceito da sustentabili-dade é que cada um deve fazer a sua parte. No caso das institui-ções financeiras, e foi o que verificamos no BRDE, podemos renegociar taxas, alongar prazos e implementar melhorias administrativas e operacionais que viabilizem iniciativas com este perfil”, define o executivo.

RUMOS – 12 – Novembro/Dezembro 2015

Luiz Noronha: “Conseguimos organizar a atuação socioambiental que o banco já desempenhava por meio de um programa abrangente.”

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RUMOS – 13 – Novembro/Dezembro 2015

Por Sarah Barros

Sustentabilidade

Para fomentar projetos amigáveis com o meio ambiente e socialmente relevantes, o programa BRDE PCS se baseia nas melhores práticas nacionais e internacionais em sustentabilidadeE E

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Banco Regional de Desenvolvimento do Extre-mo Sul (BRDE) lançou em novembro o Progra-ma BRDE PCS – Produção e Consumo Susten-táveis, como parte do Plano e da Política de Res-ponsabilidade Socioambiental (PRSA) elabora-

dos pela instituição em atendimento às diretrizes definidas pelo Banco Central para promover a adoção de medidas de sustentabilidade entre as instituições financeiras do Brasil. A iniciativa agrega conceitos e estratégias já consolidados naci-onal e internacionalmente em termos de desenvolvimento sustentável e, alicerçado em cinco eixos, irá possibilitar a ampliação das ações já desenvolvidas pelo banco em favor da preservação do meio ambiente e dará apoio a novos projetos de investimentos sustentáveis nos estados do Paraná (PR), Santa Catarina (SC) e Rio Grande do Sul (RS).

O programa contempla iniciativas nas áreas de Agrone-gócio Sustentável, Uso Racional e Eficiente da Água, Gestão de Resíduos e Reciclagem, Energias Limpas e Renováveis e Cidades Sustentáveis. O objetivo é levar ao mercado linhas de crédito com condições especiais, tais como prazos maiores de financiamento e redução de tarifas de cadastro, análise e fis-calização, além de spread mais baixo. “Com isso, conseguimos organizar a atuação socioambiental que o banco já desempe-nhava por meio de um programa abrangente”, avalia o dire-tor de Planejamento do BRDE, Luiz Noronha.

A origem do programa está no trabalho de adequação do BRDE à Resolução 4.327/2014, do Banco Central (BC), que dispõe sobre as diretrizes a serem observadas no estabeleci-mento e na implementação da Política de Responsabilidade Socioambiental e respectivo plano de ação pelas instituições reguladas pelo órgão. A norma não indica ações específicas a serem adotadas por cada tipo de entidade, mas estabelece princípios para que cada instituição considere as questões ambientais e sociais ligadas aos seus negócios e sua relação com clientes e usuários de seus produtos e serviços financei-ros e, ainda, com a própria comunidade interna à organização e as demais pessoas impactadas por suas atividades.

Ao aplicar as diretrizes do Banco Central à sua realidade,

o BRDE avaliou aspectos sociais e ambientais de sua atuação em três áreas: na atividade bancária propriamente dita, que tem o menor impacto socioambiental; na política operacional do banco, que se refere aos processos implementados para o financiamento de projetos e está sendo atualizada; e no fomento de projetos amigáveis com o meio ambiente, área em que o programa BRDE PCS está focado. “Todos os ban-cos, principalmente os de desenvolvimento, já fazem este tipo de fomento, mas não havia organização, ou seja, esses projetos não estavam sob um guarda-chuva institucional-mente adequado”, aponta Noronha.

Ao longo do processo de construção do programa, um dos parâmetros utilizados foi a nova agenda de desenvolvi-mento proposta pela Organização das Nações Unidas (ONU) neste ano, que elenca dezessete Objetivos de Desen-volvimento Sustentável (ODS). A agenda foi apresentada em setembro de 2015 e é uma evolução dos resultados obtidos por meio dos Objetivos de Desenvolvimento do Milênio (ODM). O décimo segundo item trata do Consumo e Produ-ção Sustentáveis, tema que dialoga com os demais objetivos listados pela organização internacional.

Das iniciativas já consolidadas no Brasil, o BRDE tomou parte na Agenda Ambiental na Administração Pública (A3P), desenvolvida pelo Ministério do Meio Ambiente (MMA) jun-to a instituições e órgãos públicos, à qual o banco aderiu em outubro deste ano. As diretrizes visam implantar a responsa-bilidade socioambiental nas atividades administrativas e ope-racionais da administração pública.

Para o diretor de Planejamento do BRDE, a adesão a essas agendas permite ao banco absorver conceitos e práticas já testadas por instituições que têm a área socioambiental mais estruturada e também dar a sua contribuição para o aper-feiçoamento e a aplicação destas práticas nos estados do Sul do Brasil, onde atua. “Resolvemos apostar em um conceito já disseminado nacional e internacionalmente por meio de uma agenda que tem a confiança inclusive dos investidores que reconhecem a importância de um programa concreto de sus-tentabilidade”, ressalta Noronha. Tal confiança já colocou o

BRDE sob a atenção de uma instituição francesa, com possi-bilidade de captação de recursos a taxas atrativas junto à Comunidade Europeia.

Eixos – Dos cinco eixos adotados pelo BRDE para reforçar sua carteira de empreendimentos social e ambientalmente sustentáveis, dois já faziam parte do portfólio de programas da instituição, pela sua importância estratégica: o de Energias Renováveis e o de Cidades Sustentáveis. No primeiro, o ban-co já atua fortemente, tendo lançado em maio deste ano o programa de financiamento BRDE Energia. Além de inves-timentos na geração de energias limpas e renováveis, o intui-to é também fomentar a adoção de práticas de eficiência ener-gética e redução do consumo, por meio da implantação de sis-temas e da compra de equipamentos em estabelecimento da indústria, de comércio e de serviços.

Para o BRDE Energia, serão alocados recursos de repas-ses de linhas do Banco Nacional de Desenvolvimento Eco-nômico e Social (BNDES) e mais R$ 60 milhões de recursos próprios do BRDE disponíveis para projetos nos três esta-dos do Sul. Outro marco da atuação do banco nesta área foi a assinatura, no final de novembro, de contratos e protocolos com empresas ligadas a empreendimentos de energia eólica, aproveitamento de biomassa e Pequenas Centrais Hidrelétri-cas no valor total de R$ 455 milhões.

Quanto às linhas voltadas para o financiamento de proje-tos que incentivem a aplicação de conceitos sustentáveis na gestão das cidades – o eixo Cidades Sustentáveis –, o setor público municipal dos estados do Sul brasileiro conta desde setembro com o BRDE Municípios. Por meio do programa poderão ser apoiados projetos de saneamento, melhoria na iluminação pública, mobilidade urbana e gestão de resíduos, entre outros. Ao todo, são R$ 450 milhões para investimento na região, sendo R$ 150 milhões para cada estado.

O Nos demais eixos, o BRDE mantém tratativas com orga-nismos nacionais e internacionais para fortalecer sua oferta de crédito. Em relação ao fomento de projetos que promo-vam o uso racional e eficiente da água, o banco já atua com recursos disponibilizados pelo BNDES e pretende agregar aportes de fundos estaduais de recursos hídricos da Agência Nacional de Águas (ANA). “Com isso, teremos uma melhor composição dos recursos, agregando valores captados de for-ma menos onerosa”, avalia Noronha.

Na área do Agronegócio Sustentável, o banco de desen-volvimento agregou as linhas de crédito já operadas princi-palmente para atendimento ao Plano Safra. Entre elas está o Programa ABC, oferecido pelo BNDES desde a safra 2010/2011. A estratégia de financiamento engloba iniciativas para a recuperação de pastagens e solos degradados, o plantio de florestas e a integração lavoura-pecuária-floresta.

Já no eixo Gestão de Resíduos e Reciclagem, destacam-se os esforços para atender a uma demanda típica do sul brasilei-ro, relacionada aos dejetos da criação de suínos, aves e gado leiteiro. Nesta área, o BRDE negocia com o Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa) recursos não reembolsáveis, o que possibilita oferecer melhores taxas de juros ao tomador do crédito.

Com este escopo, o programa do BRDE para a produção e o consumo sustentáveis se alinha às melhores práticas interna-cionais de desenvolvimento sustentável e se posiciona como parte ativa na construção de políticas que privilegiem critérios ambiental e socialmente responsáveis na concessão de crédito. “O que mais se discute em torno do conceito da sustentabili-dade é que cada um deve fazer a sua parte. No caso das institui-ções financeiras, e foi o que verificamos no BRDE, podemos renegociar taxas, alongar prazos e implementar melhorias administrativas e operacionais que viabilizem iniciativas com este perfil”, define o executivo.

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Luiz Noronha: “Conseguimos organizar a atuação socioambiental que o banco já desempenhava por meio de um programa abrangente.”

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ma boa parte das dificuldades de comunicação e de entendimento entre os economistas decorre do fato que nunca colocam a clara diferença

entre os fins (a natureza da sociedade que cada um almeja) e os meios (instituições e os instrumentos) para construí-la e administrá-la. Temos duas questões hierarquizadas.

Primeiro, um problema político: a escolha dos objetivos da sociedade. Eles dependem da nossa “visão do mundo” no qual, inevitavelmente, temos que viver. De como vemos nossa inserção na sociedade e de como nossa ambição de explorar os limites das potencialidades de que somos porta-dores poderá ser realizada. É evidente que a sociedade “civi-lizada” que queremos é um imperioso ato de vontade. Dá o norte, mas a geografia é complicada. O caminho mais curto entre dois pontos não é, seguramente, a linha reta, o que nos deve prevenir contra a escolha de atalhos sugeridos por cére-bros peregrinos. Como nos advertiu Goya, “os sonhos da razão produzem monstros”...

Entendido que vivemos numa organização “capitalis-ta”, temos que reconhecer que ela não é nem “natural” nem “atemporal”. E mais, que o direito de propriedade que a sus-tenta não é uma criação divina para garantir a separação entre o trabalho e o capital. Ele confere ao sistema de preços relativos – que se formam “naturalmente” em mercados competitivos desde tempos imemoriais – o papel de coor-denador das atividades produtivas do homem. Finalmente, é preciso compreender que a brilhante e abstrata “teoria do equilíbrio geral” de J.M. Keynes, na qual não há papel eco-nômico para o Estado (e se aceita qualquer distribuição de renda), não é uma proposta para a construção de uma socie-dade “civilizada”.

Um Estado forte, constitucionalmente limitado, é fun-damental não apenas para garantir o direito de propriedade e o bom funcionamento dos “mercados”, mas também para controlar os inevitáveis abusos da organização do capital que distorcem os mercados. Infelizmente, as mudanças têm sido lentas pela influência do poder das finanças (lobismo e corrupção) que se infiltrou na administração pública. O “ca-pitalismo” continua caracterizado pela velha “trindade malé-fica”: a pobreza (que diminuiu), a “desigualdade” (que aumentou, ainda que haja controvérsia) e a “irregularidade

cíclica” (que explodiu), a que se referiu o prof. Paul Hugon, na FEA-USP, em 1949.

Uma vez escolhida a natureza política da sociedade, sua construção pode contemplar diferentes soluções. Temos um problema técnico sobre o qual vimos acumulando desde o século XVII preciosos conhecimentos de utilidade indis-putada para a boa administração econômica. Trata-se do estudo disciplinado dos mesmos problemas que afligem todas as sociedades, cujas soluções mudam porque combi-nam a evolução do pensamento abstrato com a experiência histórica e superam as consequências indesejadas e insuspe-itadas, das soluções anteriores. Por exemplo, no combate à inflação, o controle de preços e salários sempre foi uma here-sia, mas durante décadas nos países do socialismo “real” – e depois da Segunda Guerra nos capitalistas – foi considera-do “boa ciência” pelo então “mainstream”. Hoje é apenas um expediente inútil que pode ser muito custoso, como esta-mos vendo.

A experiência histórica levou 70 anos para demonstrar que a implantação do socialismo “real” não resolveu o pro-blema da “pobreza”. Apenas mitigou a “desigualdade” geral e aumentou a distância entre os que detinham o poder e os que lhe deviam obediência absoluta. Em compensação, corrigiu a “irregularidade” (as flutuações cíclicas ínsitas ao capitalismo), à custa da criação de dois problemas ainda pio-res: a dramática redução da eficiência produtiva (pela perda de coordenação da atividade econômica pelo bom funcio-namento dos mercados) e pela necessidade da mais com-pleta e trágica anulação da liberdade individual.

Um último exemplo: chegou a hora de reconhecer que o aumento da relação dívida bruta/PIB e a maior taxa de juro real do universo no Brasil não são culpas do “capitalis-mo”, como insiste em dizer uma esquerda infantilizada, porque a aritmética é a mesma no “capitalismo” e no socia-lismo “real”. São culpas exclusivas da má administração financeira resultante do voluntarismo ativo conduzido pelo mesmo pensamento “mágico” que hoje sugere que basta reduzir, “na marra”, os dois, e distribuir os “recur-sos” resultantes, para que tudo se acerte! O único problema é que o pensamento mágico não funciona, nem no socialis-mo “mágico”.

RUMOS – 14 – Novembro/Dezembro 2015

Antonio Delfim Netto

Professor Emérito da Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade (FEA-USP). Ex-ministro da Fazenda, da Agricultura e do Planejamento.

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O OPINIÃO

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Problemas do pensamento mágico

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RUMOSVAI MUDAR

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este momento de crise, o crédito é o oxigênio fun-damental para os pequenos negócios. A sentença, proferida pelo presidente do Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (Sebrae), Guilherme Afif Domingos, deu o tom de grande

parte das discussões durante o Fórum de Cidadania Financei-ra, realizado pela instituição em conjunto com o Banco Cen-tral (BC), em novembro. O tradicional evento, até então cha-mado Fórum de Inclusão Financeira, discutiu durante dois dias, em Brasília, temas como a inclusão dos pequenos negó-cios, o bem-estar financeiro, as tecnologias e o relacionamento do cidadão com o Sistema Financeiro Nacional.

Afif Domingos, ao abrir o evento, lembrou que o sistema financeiro brasileiro deu grande demonstração de estrutura durante a crise, em 2008 – enquanto o mundo ruía, o que sal-vou o país foi sua estrutura forte e já consolidada para oferta de crédito em grande escala. Devido aos anos de alta inflação, exemplificou o presidente, o país montou uma estrutura que permite transações financeiras de forma rápida, o que o colo-ca entre os pioneiros no mundo, com um dos mais avançados sistemas financeiros entre os países.

Contudo, esta “superestrutura” tem um efeito colateral: há grande concentração, por conta do ambiente regulatório. Apenas em duas instituições públicas e três privadas (cinco organizações, portanto) estão concentradas mais de 90% das operações do sistema. Nesse cenário, o país se apresenta bem no financiamento do consumo, mas ainda com grandes difi-culdades no financiamento à produção.

“Temos essas cinco grandes instituições de um lado, superconcentradas, e os pequenos empresários de outro. O que vemos é que os pequenos negócios têm bastante dificul-dade para acessar o sistema financeiro tradicional. Em 2015, apenas 17% dos microempresários contraíram empréstimos, e desses mais de 70% pegaram com o seu próprio fornece-dor, por meio de pré-datado; ou seja, fora do sistema bancá-rio”, comentou Afif Domingos, adiantando dados de um estudo do Sebrae sobre o tema.

O presidente ressaltou a importância, diante desse cená-rio de superconcentração e de dificuldade de acesso ao crédi-to pelos pequenos, do surgimento de alternativas, como as cooperativas, que podem reduzir as distâncias para que o cré-dito chegue na ponta. O modelo atual, frisou ele, aumenta a concentração de renda e representa enorme desafio para o

objetivo de se construir um cenário de cidadania financeira.“Precisamos lembrar que são as micro e pequenas empre-

sas que estão sustentando o emprego no país, enquanto as médias e grandes passam por dificuldades”, afirmou Afif Domingos. Para ele, é preciso que o Estado brasileiro se empenhe para melhorar o ambiente de negócios para os pequenos, de modo que possam se desenvolver com o míni-mo de burocracia e sem medo de novas barreiras.

“Por isso, estamos mobilizados em torno do programa Crescer Sem Medo, que estabelece uma rampa suave para as micro e pequenas empresas poderem alcançar novos patama-res”, comunicou Afif Domingos, em referência ao projeto de lei , que cria o que atualmente está em discussão no Senadoregime de transição no Supersimples e racionaliza a tributa-ção entre as faixas de faturamento das micro e pequenas, ela-borado ainda na época em que ele coordenava a Secretaria da Micro e Pequena Empresa, do governo federal. “O Sebrae estará na liderança das políticas públicas para micro e peque-nos empreendedores”, disse.

O diretor de Relacionamento Institucional do Banco Central, Luiz Edson Feltrim, lembrou que, ao longo de seis edições, o evento amadureceu o debate sobre a inclusão financeira, abrangendo também os aspectos da proteção ao consumidor de produtos e serviços financeiros e a educação financeira. A mudança da nomenclatura do fórum (“Cidada-nia Financeira”) segue esse caminho e marca a ampliação do escopo de atenções do evento.

“Não se trata de mera alteração de nome, mas de reconhe-cer que caminhamos para o objetivo mais desejado, o da cida-dania financeira. O entendimento do Banco Central é que os elementos da inclusão, proteção e educação contribuem tanto para a cidadania quanto para a eficiência do sistema financeiro e a estabilidade da economia. Queremos cidadãos empodera-dos a exercer sua cidadania financeira, para que consigamos construir uma sociedade com pessoas mais bem informadas e conscientes de seus direitos e deveres com relação à vida financeira”, afirmou Feltrim, que disse que o tema integrará, para o próximo quadriênio, um dos objetivos estratégicos do BC: promover a cidadania financeira e fortalecer o relaciona-mento com a sociedade e com os poderes instituídos.

O diretor destacou a “longa e exitosa” parceria do banco com o Sebrae, desde a promoção dos seminários de micro-crédito, em 2002, que também pavimentaram o caminho para

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muito parecida com o que era a das médias e pequenas empresas há alguns anos. Muitas vezes o sujeito vai ao ban-co como pessoa jurídica, mas a própria instituição indica que ele pegue o empréstimo como pessoa física, por ser mais simples e menos burocrático o processo. Ou seja, a grande maioria dos MEI saté entra no banco, o cliente está ali, mas as instituições financeiras não o trata como empre-sa”, avaliou Bedê.

Para Rafael Moreira, o sistema financeiro já evoluiu no relacionamento com as micro e pequenas empresas, mas ain-da é preciso avançar. Ele observou, com a pesquisa, que quan-to menor o porte do empreendimento, maiores as dificulda-des para obtenção do crédito. Parte por conta das burocracias do sistema, e parte também devido a alguns estereótipos erra-dos sobre o perfil desses empreendedores: ao contrário do que muitos pensam, 60% dos MEIs estão na classe média e possuem bom nível de escolaridade; a maioria não veio da informalidade, mas sim possuía emprego formal antes de montar seu próprio negócio; e os microempreendedores elen-cam os benefícios para o negócio como principal motivo para se formalizarem. “Quase 80% dos MEIs desejam virar microempresa, mas para isso eles necessitam de crédito”, dis-se, ressaltando que a maioria dos empresários busca crédito nas instituições públicas, embora a taxa de sucesso nos ban-cos privados seja maior. “Talvez por já serem clientes como pessoa física desses bancos”, opina Moreira.

Do lado das instituições financeiras, gerentes ouvidos no estudo afirmam que a falta de linhas de crédito específi-cas para esse perfil, do microempreendedor individual, são o maior entrave para a concessão de empréstimos. Além dis-so, citam também o fato de os negócios, em geral, serem mui-to novos e com baixo faturamento, com saldo médio em conta insuficiente.

Marco Aurélio Bedê apontou três caminhos possíveis para fazer essa convergência e incluir os microempreendedo-res como pessoas jurídicas, fazendo com que acessem servi-ços mais adequados para seus negócios: a redução dos juros,

a Cidadania Financeira ser o tema central do fórum. Segundo Feltrim, nos últimos oito anos aumentou em 45% a inclusão de novas pessoas no sistema financeiro, fazendo com que o Brasil figure em terceiro lugar no ranking sobre o tema entre os países emergentes. Ele destacou o papel dos correspon-dentes bancários, que foram responsáveis por mais de 2,5 milhões de transações em 2014 e também a crescente utiliza-ção do internet banking pelos usuários – 39% das operações financeiras hoje já são realizadas por esse canal. “Precisamos atuar em sinergia, por meio de parcerias com os setores públi-cos e privados, para tornarmos esse sistema ainda mais inclu-sivo”, destacou.

Dificuldades – A inclusão celebrada, no entanto, ainda care-ce de maior efetividade para contemplar os micro e pequenos empresários, tantas são as dificuldades elencadas por esses agentes para terem acesso ao crédito em instituições financei-ras. Assim ficou demonstrado em um estudo apresentado por Rafael Moreira e Marco Aurélio Bedê, analistas da Unidade de Gestão Estratégica do Sebrae.

O estudo, construído a partir de cinco pesquisas que medi-ram dados sobre o financiamento, a bancarização, o perfil dos microempreendedores individuais (MEIs), o relacionamento bancário e as justificativas das instituições bancárias, apontou que apenas 45% dos MEI possuem algum tipo de relaciona-mento com os bancos como pessoa jurídica. “E com isso, eles acabam pegando empréstimos como pessoa física, o que não é ideal”, explicou Rafael Moreira.

De acordo com Marco Aurélio Bedê, cerca de 80% dos empreendedores ouvidos utilizaram algum tipo de financia-mento nos últimos cinco anos, mas apenas 20% deles o fize-ram por via bancária. A maioria obtém crédito com seus pró-prios fornecedores, por meio de mecanismos como o pré-datado e o cartão de crédito, que possuem taxas de juros mui-tos maiores e condições piores do que o crédito para produ-ção ofertado pelos bancos.

“A situação dos microempreendedores individuais é

CIDADANIA FINANCEIRAE EMPREENDER

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Por Luciano Silva

Fórum revela cenário complicado para acesso dos microempreendedores ao crédito e aponta caminhos possíveis para vencer os desafios

RUMOS – 16 – Novembro/Dezembro 2015

Na abertura do encontro, o presidente do Sebrae, Guilherme Afif Domingos, lembrou que são as micro e pequenas empresas que estão sustentando o emprego no país durante este momento de crise econômica

Destravar o crédito para os pequenos

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este momento de crise, o crédito é o oxigênio fun-damental para os pequenos negócios. A sentença, proferida pelo presidente do Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (Sebrae), Guilherme Afif Domingos, deu o tom de grande

parte das discussões durante o Fórum de Cidadania Financei-ra, realizado pela instituição em conjunto com o Banco Cen-tral (BC), em novembro. O tradicional evento, até então cha-mado Fórum de Inclusão Financeira, discutiu durante dois dias, em Brasília, temas como a inclusão dos pequenos negó-cios, o bem-estar financeiro, as tecnologias e o relacionamento do cidadão com o Sistema Financeiro Nacional.

Afif Domingos, ao abrir o evento, lembrou que o sistema financeiro brasileiro deu grande demonstração de estrutura durante a crise, em 2008 – enquanto o mundo ruía, o que sal-vou o país foi sua estrutura forte e já consolidada para oferta de crédito em grande escala. Devido aos anos de alta inflação, exemplificou o presidente, o país montou uma estrutura que permite transações financeiras de forma rápida, o que o colo-ca entre os pioneiros no mundo, com um dos mais avançados sistemas financeiros entre os países.

Contudo, esta “superestrutura” tem um efeito colateral: há grande concentração, por conta do ambiente regulatório. Apenas em duas instituições públicas e três privadas (cinco organizações, portanto) estão concentradas mais de 90% das operações do sistema. Nesse cenário, o país se apresenta bem no financiamento do consumo, mas ainda com grandes difi-culdades no financiamento à produção.

“Temos essas cinco grandes instituições de um lado, superconcentradas, e os pequenos empresários de outro. O que vemos é que os pequenos negócios têm bastante dificul-dade para acessar o sistema financeiro tradicional. Em 2015, apenas 17% dos microempresários contraíram empréstimos, e desses mais de 70% pegaram com o seu próprio fornece-dor, por meio de pré-datado; ou seja, fora do sistema bancá-rio”, comentou Afif Domingos, adiantando dados de um estudo do Sebrae sobre o tema.

O presidente ressaltou a importância, diante desse cená-rio de superconcentração e de dificuldade de acesso ao crédi-to pelos pequenos, do surgimento de alternativas, como as cooperativas, que podem reduzir as distâncias para que o cré-dito chegue na ponta. O modelo atual, frisou ele, aumenta a concentração de renda e representa enorme desafio para o

objetivo de se construir um cenário de cidadania financeira.“Precisamos lembrar que são as micro e pequenas empre-

sas que estão sustentando o emprego no país, enquanto as médias e grandes passam por dificuldades”, afirmou Afif Domingos. Para ele, é preciso que o Estado brasileiro se empenhe para melhorar o ambiente de negócios para os pequenos, de modo que possam se desenvolver com o míni-mo de burocracia e sem medo de novas barreiras.

“Por isso, estamos mobilizados em torno do programa Crescer Sem Medo, que estabelece uma rampa suave para as micro e pequenas empresas poderem alcançar novos patama-res”, comunicou Afif Domingos, em referência ao projeto de lei , que cria o que atualmente está em discussão no Senadoregime de transição no Supersimples e racionaliza a tributa-ção entre as faixas de faturamento das micro e pequenas, ela-borado ainda na época em que ele coordenava a Secretaria da Micro e Pequena Empresa, do governo federal. “O Sebrae estará na liderança das políticas públicas para micro e peque-nos empreendedores”, disse.

O diretor de Relacionamento Institucional do Banco Central, Luiz Edson Feltrim, lembrou que, ao longo de seis edições, o evento amadureceu o debate sobre a inclusão financeira, abrangendo também os aspectos da proteção ao consumidor de produtos e serviços financeiros e a educação financeira. A mudança da nomenclatura do fórum (“Cidada-nia Financeira”) segue esse caminho e marca a ampliação do escopo de atenções do evento.

“Não se trata de mera alteração de nome, mas de reconhe-cer que caminhamos para o objetivo mais desejado, o da cida-dania financeira. O entendimento do Banco Central é que os elementos da inclusão, proteção e educação contribuem tanto para a cidadania quanto para a eficiência do sistema financeiro e a estabilidade da economia. Queremos cidadãos empodera-dos a exercer sua cidadania financeira, para que consigamos construir uma sociedade com pessoas mais bem informadas e conscientes de seus direitos e deveres com relação à vida financeira”, afirmou Feltrim, que disse que o tema integrará, para o próximo quadriênio, um dos objetivos estratégicos do BC: promover a cidadania financeira e fortalecer o relaciona-mento com a sociedade e com os poderes instituídos.

O diretor destacou a “longa e exitosa” parceria do banco com o Sebrae, desde a promoção dos seminários de micro-crédito, em 2002, que também pavimentaram o caminho para

RUMOS – 17 – Novembro/Dezembro 2015

muito parecida com o que era a das médias e pequenas empresas há alguns anos. Muitas vezes o sujeito vai ao ban-co como pessoa jurídica, mas a própria instituição indica que ele pegue o empréstimo como pessoa física, por ser mais simples e menos burocrático o processo. Ou seja, a grande maioria dos MEI saté entra no banco, o cliente está ali, mas as instituições financeiras não o trata como empre-sa”, avaliou Bedê.

Para Rafael Moreira, o sistema financeiro já evoluiu no relacionamento com as micro e pequenas empresas, mas ain-da é preciso avançar. Ele observou, com a pesquisa, que quan-to menor o porte do empreendimento, maiores as dificulda-des para obtenção do crédito. Parte por conta das burocracias do sistema, e parte também devido a alguns estereótipos erra-dos sobre o perfil desses empreendedores: ao contrário do que muitos pensam, 60% dos MEIs estão na classe média e possuem bom nível de escolaridade; a maioria não veio da informalidade, mas sim possuía emprego formal antes de montar seu próprio negócio; e os microempreendedores elen-cam os benefícios para o negócio como principal motivo para se formalizarem. “Quase 80% dos MEIs desejam virar microempresa, mas para isso eles necessitam de crédito”, dis-se, ressaltando que a maioria dos empresários busca crédito nas instituições públicas, embora a taxa de sucesso nos ban-cos privados seja maior. “Talvez por já serem clientes como pessoa física desses bancos”, opina Moreira.

Do lado das instituições financeiras, gerentes ouvidos no estudo afirmam que a falta de linhas de crédito específi-cas para esse perfil, do microempreendedor individual, são o maior entrave para a concessão de empréstimos. Além dis-so, citam também o fato de os negócios, em geral, serem mui-to novos e com baixo faturamento, com saldo médio em conta insuficiente.

Marco Aurélio Bedê apontou três caminhos possíveis para fazer essa convergência e incluir os microempreendedo-res como pessoas jurídicas, fazendo com que acessem servi-ços mais adequados para seus negócios: a redução dos juros,

a Cidadania Financeira ser o tema central do fórum. Segundo Feltrim, nos últimos oito anos aumentou em 45% a inclusão de novas pessoas no sistema financeiro, fazendo com que o Brasil figure em terceiro lugar no ranking sobre o tema entre os países emergentes. Ele destacou o papel dos correspon-dentes bancários, que foram responsáveis por mais de 2,5 milhões de transações em 2014 e também a crescente utiliza-ção do internet banking pelos usuários – 39% das operações financeiras hoje já são realizadas por esse canal. “Precisamos atuar em sinergia, por meio de parcerias com os setores públi-cos e privados, para tornarmos esse sistema ainda mais inclu-sivo”, destacou.

Dificuldades – A inclusão celebrada, no entanto, ainda care-ce de maior efetividade para contemplar os micro e pequenos empresários, tantas são as dificuldades elencadas por esses agentes para terem acesso ao crédito em instituições financei-ras. Assim ficou demonstrado em um estudo apresentado por Rafael Moreira e Marco Aurélio Bedê, analistas da Unidade de Gestão Estratégica do Sebrae.

O estudo, construído a partir de cinco pesquisas que medi-ram dados sobre o financiamento, a bancarização, o perfil dos microempreendedores individuais (MEIs), o relacionamento bancário e as justificativas das instituições bancárias, apontou que apenas 45% dos MEI possuem algum tipo de relaciona-mento com os bancos como pessoa jurídica. “E com isso, eles acabam pegando empréstimos como pessoa física, o que não é ideal”, explicou Rafael Moreira.

De acordo com Marco Aurélio Bedê, cerca de 80% dos empreendedores ouvidos utilizaram algum tipo de financia-mento nos últimos cinco anos, mas apenas 20% deles o fize-ram por via bancária. A maioria obtém crédito com seus pró-prios fornecedores, por meio de mecanismos como o pré-datado e o cartão de crédito, que possuem taxas de juros mui-tos maiores e condições piores do que o crédito para produ-ção ofertado pelos bancos.

“A situação dos microempreendedores individuais é

CIDADANIA FINANCEIRAE EMPREENDER

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Por Luciano Silva

Fórum revela cenário complicado para acesso dos microempreendedores ao crédito e aponta caminhos possíveis para vencer os desafios

RUMOS – 16 – Novembro/Dezembro 2015

Na abertura do encontro, o presidente do Sebrae, Guilherme Afif Domingos, lembrou que são as micro e pequenas empresas que estão sustentando o emprego no país durante este momento de crise econômica

Destravar o crédito para os pequenos

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o aperfeiçoamento dos mecanismos de garantias e o desenvolvimento de siste-mas adequados para atrair esse cliente a utilizar os serviços como pessoa jurídica.

Para o consultor do Departamento de Regulação do Sistema Financeiro do Banco Central, Cleofas Salviano Junior, não há hoje na regulação financeira qualquer dispositivo que seja restritivo a esse público ou que impeça os bancos de pensarem em produtos e serviços específicos a esse perfil. O que existe, na sua visão, é uma escolha das instituições financeiras por outros públicos e algumas dificuldades objetivas, como o número crescente de MEIs, com parcela significativa dos empreendedores com pouca experiência de mercado.

“Talvez isso explique o porquê do banco abordá-lo como pessoa física. Pode ser que, com o passar do tem-po, a evolução que ocorreu no atendimento às micro e pequenas, com sua incorporação ao sistema financei-ro, também aconteça aqui”, apostou Cleofas. Entre as micro e pequenas empresas, a taxa de relacionamento como pessoa jurídica com os bancos é de 84% entre as microempresas e 93% nas empresas de pequeno porte – mais que o dobro dos 45% relativos aos MEIs.

O consultor acredita que, embora a maior parte dos microempreendedores individuais tenha citado as taxas de juros como maior impeditivo para obtenção de crédito, o maior entrave está no acesso. E, do lado das instituições financeiras, a heterogeneidade dos empreendimentos tam-bém é um grande desafio. “Não adianta ter um único enfo-que porque são muito diversos os empreendedores. O siste-ma financeiro precisa propor soluções mais adequadas para esse público”, afirmou.

Opinião parecida tem o gerente da Unidade de Acesso a Mercados e Serviços Financeiros do Sebrae SP, Gustavo Mar-ques: “Achar que uma modelagem única vai resolver o pro-

RUMOS – 19 – Novembro/Dezembro 2015

fazendo com que este seja o perfil de cliente que mais cresça dentro do sistema atualmente. O relacionamento, contudo, ainda é insatisfatório.

A transição de pessoa física para pessoa jurídica, que é operada com a adesão do empreendedor ao MEI, no sistema bancário ainda está no meio do caminho, longe de se concretizar. Isso se deve a um desalinhamento grande dos dois lados: o pequeno tem a expectati-va de ter oferta muito grande de serviços e produtos; os bancos dizem que os clientes estão despreparados pois não são capazes de oferecer a documentação, a garantia e o planejamento financeiro. “Na prática, per-cebemos que a dificuldade é grande”, diz Comin.

Para superá-las, ele apresentou ao BC – representado pela chefe do Departamento de Inclusão Financeira, Elvira Cruvinel – um extrato de sugestões a partir do que foi discutido nos painéis do encontro destina-dos especialmente ao relacionamento dos pequenos negócios com as instituições financeiras. Foram quatro as propostas em eixos distintos: a) capacitação, pois uma parte do “desalinhamento” é devida a um

déficit nessa área, especialmente do pequeno empresário, mas também dos operadores; b) custo, com a construção de um pacote básico de tarifas para MEIs, a exemplo do que hoje ocorre com as pessoas físicas; c) garantias, pela regulamenta-ção das Cooperativas de Garantias, hoje as chamadas Socieda-des Garantidoras de Crédito; e d) harmonização das políticas de crédito para os pequenos tomadores.

“Estamos abertos a todas as propostas e temos muito tra-balho pela frente. Vamos procurá-los e fazer juntos, pois isso certamente vai fortalecer a agenda da cidadania financeira, nosso objetivo”, finalizou Elvira Cruvinel.

blema é um erro. Algumas questões precisam ser flexibiliza-das, é preciso pensar na especificidade, sair do macro e enxer-gar o micro”.

Ao lado do analista da Unidade de Gestão Estratégica do Sebrae, Kennyston Costa Lago, ele apresentou dados sobre a relação dos empreendedores com as instituições financeiras. De acordo com a pesquisa, são apontadas como dificuldades pelas instituições financeiras no atendimento a esses clientes a falta de garantias, inadimplência, ausência de um plano de negócios consistente e cadastro incompleto. “Diante dessas dificuldades, os gerentes de crédito de MEI e ME orientam os empresários a buscarem qualificação profissional em institui-ções como o Sebrae. Entendem que uma melhor educação

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E EMPREENDER CIDADANIA FINANCEIRA

financeira é possível aumentar a taxa de aprova-ção de crédito destes clientes”, indica o estudo.

Caminhos – Segundo Lago, se a orientação e qualificação também são papel das instituições financeiras, então o estágio atual possui pro-blemas. “As pessoas têm que chegar prontas aos bancos; se não estiverem, são mandadas para nós. E, nessa lógica, para o gerente não há problema com a instituição financeira: não foi ele que não concedeu o crédito, mas sim o cli-ente que não tem condições de tomá-lo”, comentou o coordenador.

Carlos Alberto dos Santos, sócio-diretor da Cosienergia, afirmou que há uma “disso-nância cognitiva” entre a oferta e a demanda por crédito, uma vez que para as instituições o problema é o cliente, enquanto para os clientes o entrave são as instituições. Os instrumentos de análise de risco tradicionais e as exigências de garantias fracassam ao abarcar esse público. Nos pequenos empreendimentos, muitas vezes a proprieda-de não está separada da gestão; não dá para separar o investi-mento do consumo; não há plano para crescer e se tornar média ou grande, mas sim é um negócio voltado para a sus-tentabilidade da família.

“Atuar nesse segmento com as mes-mas tecnologias destinadas aos médios ou grandes, ou mesmo à pessoa física, não é o ideal. É preciso aceitar a realidade, as dife-renças nesse modelo, e entender que se os pequenos têm mais resiliência na crise é porque, dentre outras coisas, misturam o capital e o trabalho”, afirmou.

Para o diretor administrativo da Asso-ciação Brasileira de Entidades Operadoras de Microcrédito e Microfinanças, Almir da Costa Pereira, o sistema financeiro brasilei-ro não cumpriu ainda o seu papel cidadão de massificar a oferta de crédito e micro-crédito para os empreendedores.

“O pequeno empresário sabe que pre-cisa de crédito, que ele é vital, mas não conhece os mecanismos, pois ele enten-de de negócio, não de banco. Precisamos de novos modelos de instituições finan-ceiras, novas ferramentas de crédito, novos produtos”, enumerou Pereira. “Se há dez anos, fórum após fórum, constatamos que a dificuldade no aces-so ao crédito é a grande responsável pela mortalidade das pequenas empresas, porque ainda não tratamos desse pro-blema de forma definitiva?”, completou.

Política Pública – O gerente de Acesso a Mercados e Servi-ços Financeiros do Sebrae, Alexandre Comin, lembrou que há um envolvimento cada vez maior dos microempreende-dores individuais e dos pequenos empresários com o sistema financeiro, por meio de contas correntes e cartão de crédito,

Luiz Edson Feltrim, diretor do Banco Central, comunicou no fórum que a Cidadania Financeira integrará um dos objetivosestratégicos do órgão para o próximo quadriênio.

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dificuldade no acesso ao crédito é a grande

responsável pela mortalidade das

pequenas empresas, porque ainda não tratamos desse

problema?”

Almir da Costa PereiraAssociação Brasileira de Entidades Operadoras de

Microcrédito e Microfinanças

Frente às dificuldades encontradas no sistema financei-ro tradicional, uma alternativa para obtenção de crédito pelos microempreendedores e pequenas empresas podem ser as cooperativas, que participaram do evento e apresenta-ram seus diferenciais em relação ao modelo convencional.

O presidente da Organização das Cooperativas Brasilei-ras (OCB), Márcio Lopes de Freitas, destacou que em 10% das cidades brasileiras a única alternativa dentro do sistema financeiro para obtenção de crédito são as cooperativas. Ele também contou que 75% das operações realizadas pelas cooperativas de crédito sãode até R$ 5 mil, o que significa que elas possuem atenção especial aos pequenos empreen-dimentos. “Este tema, da cidadania financeira, da inclusão dos pequenos, nos deixa muito a vontade”, brincou Freitas.

Na avaliação do gerente da Unidade de Políticas Públi-cas e Desenvolvimento Territorial do Sebrae, Bruno Quick, a atuação junto aos microempreendedores compreende

um espaço ainda pouco ocupado pelo cooperativismo de crédito. Ele destacou que os MEIs têm crescido cerca de 20% por ano, mas é um público que tem desconfiança do sis-tema financeiro tradicional.

“O cooperativismo de crédito consegue vencer barrei-ras por conta da proximidade, é a chamada ‘finança da loca-lidade’. A governança local é um grande diferencial: o que é emprestado no local fica ali e ajuda o desenvolvimento ter-ritorial”, destacou.

Ele defendeu que essa modalidade, que está formal-mente instituída no sistema financeiro, deve ser apoiada por políticas públicas, como ferramenta para o desenvolvimen-to econômico do país. “Temos um gap entre o crédito e os pequenos empreendedores, precisamos fortalecer essa pon-te que o cooperativismo de crédito pode representar”, afir-mou, destacando que o Banco Central, em seu espaço de regulação, tem sido bastante sensível a essa realidade.

Cooperativas como alternativa

Microempreendedores buscam orientação no Sebrae.

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o aperfeiçoamento dos mecanismos de garantias e o desenvolvimento de siste-mas adequados para atrair esse cliente a utilizar os serviços como pessoa jurídica.

Para o consultor do Departamento de Regulação do Sistema Financeiro do Banco Central, Cleofas Salviano Junior, não há hoje na regulação financeira qualquer dispositivo que seja restritivo a esse público ou que impeça os bancos de pensarem em produtos e serviços específicos a esse perfil. O que existe, na sua visão, é uma escolha das instituições financeiras por outros públicos e algumas dificuldades objetivas, como o número crescente de MEIs, com parcela significativa dos empreendedores com pouca experiência de mercado.

“Talvez isso explique o porquê do banco abordá-lo como pessoa física. Pode ser que, com o passar do tem-po, a evolução que ocorreu no atendimento às micro e pequenas, com sua incorporação ao sistema financei-ro, também aconteça aqui”, apostou Cleofas. Entre as micro e pequenas empresas, a taxa de relacionamento como pessoa jurídica com os bancos é de 84% entre as microempresas e 93% nas empresas de pequeno porte – mais que o dobro dos 45% relativos aos MEIs.

O consultor acredita que, embora a maior parte dos microempreendedores individuais tenha citado as taxas de juros como maior impeditivo para obtenção de crédito, o maior entrave está no acesso. E, do lado das instituições financeiras, a heterogeneidade dos empreendimentos tam-bém é um grande desafio. “Não adianta ter um único enfo-que porque são muito diversos os empreendedores. O siste-ma financeiro precisa propor soluções mais adequadas para esse público”, afirmou.

Opinião parecida tem o gerente da Unidade de Acesso a Mercados e Serviços Financeiros do Sebrae SP, Gustavo Mar-ques: “Achar que uma modelagem única vai resolver o pro-

RUMOS – 19 – Novembro/Dezembro 2015

fazendo com que este seja o perfil de cliente que mais cresça dentro do sistema atualmente. O relacionamento, contudo, ainda é insatisfatório.

A transição de pessoa física para pessoa jurídica, que é operada com a adesão do empreendedor ao MEI, no sistema bancário ainda está no meio do caminho, longe de se concretizar. Isso se deve a um desalinhamento grande dos dois lados: o pequeno tem a expectati-va de ter oferta muito grande de serviços e produtos; os bancos dizem que os clientes estão despreparados pois não são capazes de oferecer a documentação, a garantia e o planejamento financeiro. “Na prática, per-cebemos que a dificuldade é grande”, diz Comin.

Para superá-las, ele apresentou ao BC – representado pela chefe do Departamento de Inclusão Financeira, Elvira Cruvinel – um extrato de sugestões a partir do que foi discutido nos painéis do encontro destina-dos especialmente ao relacionamento dos pequenos negócios com as instituições financeiras. Foram quatro as propostas em eixos distintos: a) capacitação, pois uma parte do “desalinhamento” é devida a um

déficit nessa área, especialmente do pequeno empresário, mas também dos operadores; b) custo, com a construção de um pacote básico de tarifas para MEIs, a exemplo do que hoje ocorre com as pessoas físicas; c) garantias, pela regulamenta-ção das Cooperativas de Garantias, hoje as chamadas Socieda-des Garantidoras de Crédito; e d) harmonização das políticas de crédito para os pequenos tomadores.

“Estamos abertos a todas as propostas e temos muito tra-balho pela frente. Vamos procurá-los e fazer juntos, pois isso certamente vai fortalecer a agenda da cidadania financeira, nosso objetivo”, finalizou Elvira Cruvinel.

blema é um erro. Algumas questões precisam ser flexibiliza-das, é preciso pensar na especificidade, sair do macro e enxer-gar o micro”.

Ao lado do analista da Unidade de Gestão Estratégica do Sebrae, Kennyston Costa Lago, ele apresentou dados sobre a relação dos empreendedores com as instituições financeiras. De acordo com a pesquisa, são apontadas como dificuldades pelas instituições financeiras no atendimento a esses clientes a falta de garantias, inadimplência, ausência de um plano de negócios consistente e cadastro incompleto. “Diante dessas dificuldades, os gerentes de crédito de MEI e ME orientam os empresários a buscarem qualificação profissional em institui-ções como o Sebrae. Entendem que uma melhor educação

RUMOS – 18 – Novembro/Dezembro 2015

E EMPREENDER CIDADANIA FINANCEIRA

financeira é possível aumentar a taxa de aprova-ção de crédito destes clientes”, indica o estudo.

Caminhos – Segundo Lago, se a orientação e qualificação também são papel das instituições financeiras, então o estágio atual possui pro-blemas. “As pessoas têm que chegar prontas aos bancos; se não estiverem, são mandadas para nós. E, nessa lógica, para o gerente não há problema com a instituição financeira: não foi ele que não concedeu o crédito, mas sim o cli-ente que não tem condições de tomá-lo”, comentou o coordenador.

Carlos Alberto dos Santos, sócio-diretor da Cosienergia, afirmou que há uma “disso-nância cognitiva” entre a oferta e a demanda por crédito, uma vez que para as instituições o problema é o cliente, enquanto para os clientes o entrave são as instituições. Os instrumentos de análise de risco tradicionais e as exigências de garantias fracassam ao abarcar esse público. Nos pequenos empreendimentos, muitas vezes a proprieda-de não está separada da gestão; não dá para separar o investi-mento do consumo; não há plano para crescer e se tornar média ou grande, mas sim é um negócio voltado para a sus-tentabilidade da família.

“Atuar nesse segmento com as mes-mas tecnologias destinadas aos médios ou grandes, ou mesmo à pessoa física, não é o ideal. É preciso aceitar a realidade, as dife-renças nesse modelo, e entender que se os pequenos têm mais resiliência na crise é porque, dentre outras coisas, misturam o capital e o trabalho”, afirmou.

Para o diretor administrativo da Asso-ciação Brasileira de Entidades Operadoras de Microcrédito e Microfinanças, Almir da Costa Pereira, o sistema financeiro brasilei-ro não cumpriu ainda o seu papel cidadão de massificar a oferta de crédito e micro-crédito para os empreendedores.

“O pequeno empresário sabe que pre-cisa de crédito, que ele é vital, mas não conhece os mecanismos, pois ele enten-de de negócio, não de banco. Precisamos de novos modelos de instituições finan-ceiras, novas ferramentas de crédito, novos produtos”, enumerou Pereira. “Se há dez anos, fórum após fórum, constatamos que a dificuldade no aces-so ao crédito é a grande responsável pela mortalidade das pequenas empresas, porque ainda não tratamos desse pro-blema de forma definitiva?”, completou.

Política Pública – O gerente de Acesso a Mercados e Servi-ços Financeiros do Sebrae, Alexandre Comin, lembrou que há um envolvimento cada vez maior dos microempreende-dores individuais e dos pequenos empresários com o sistema financeiro, por meio de contas correntes e cartão de crédito,

Luiz Edson Feltrim, diretor do Banco Central, comunicou no fórum que a Cidadania Financeira integrará um dos objetivosestratégicos do órgão para o próximo quadriênio.

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“Se há dez anos sabemos que a

dificuldade no acesso ao crédito é a grande

responsável pela mortalidade das

pequenas empresas, porque ainda não tratamos desse

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Almir da Costa PereiraAssociação Brasileira de Entidades Operadoras de

Microcrédito e Microfinanças

Frente às dificuldades encontradas no sistema financei-ro tradicional, uma alternativa para obtenção de crédito pelos microempreendedores e pequenas empresas podem ser as cooperativas, que participaram do evento e apresenta-ram seus diferenciais em relação ao modelo convencional.

O presidente da Organização das Cooperativas Brasilei-ras (OCB), Márcio Lopes de Freitas, destacou que em 10% das cidades brasileiras a única alternativa dentro do sistema financeiro para obtenção de crédito são as cooperativas. Ele também contou que 75% das operações realizadas pelas cooperativas de crédito sãode até R$ 5 mil, o que significa que elas possuem atenção especial aos pequenos empreen-dimentos. “Este tema, da cidadania financeira, da inclusão dos pequenos, nos deixa muito a vontade”, brincou Freitas.

Na avaliação do gerente da Unidade de Políticas Públi-cas e Desenvolvimento Territorial do Sebrae, Bruno Quick, a atuação junto aos microempreendedores compreende

um espaço ainda pouco ocupado pelo cooperativismo de crédito. Ele destacou que os MEIs têm crescido cerca de 20% por ano, mas é um público que tem desconfiança do sis-tema financeiro tradicional.

“O cooperativismo de crédito consegue vencer barrei-ras por conta da proximidade, é a chamada ‘finança da loca-lidade’. A governança local é um grande diferencial: o que é emprestado no local fica ali e ajuda o desenvolvimento ter-ritorial”, destacou.

Ele defendeu que essa modalidade, que está formal-mente instituída no sistema financeiro, deve ser apoiada por políticas públicas, como ferramenta para o desenvolvimen-to econômico do país. “Temos um gap entre o crédito e os pequenos empreendedores, precisamos fortalecer essa pon-te que o cooperativismo de crédito pode representar”, afir-mou, destacando que o Banco Central, em seu espaço de regulação, tem sido bastante sensível a essa realidade.

Cooperativas como alternativa

Microempreendedores buscam orientação no Sebrae.

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estar aqui e divulgar esse trabalho. Esse Prêmio da ABDE e do BID é muito importante no sentido de fomentar discus-sões, reflexões sobre o Sistema Nacional de Fomento. Temos que ter dois focos, no curto prazo, para as questões mais urgentes de crédito, mas não podemos perder o foco de vis-lumbrar o futuro e de tentar construir um futuro melhor para o país”. Lavinia foi vencedora também na edição do Prêmio ABDE de 2014. Participaram das homenagens, ainda, os segundos, terceiros e quarto lugares das duas categorias.

Depois da homenagem aos vencedores, os presentes acompanharam um debate sobre a atual conjuntura econômi-ca e desenvolvimento sob a visão de dois economistas, o ex-diretor do Banco Central Alexandre Schwartsman e o profes-sor de Economia da Unicamp Pedro Paulo Zahluth Bastos. O mediador foi o professor da UFRGS Carlos Henrique Horn. Primeiro a falar, Schwartsman trouxe um panorama dos últi-mos anos da economia brasileira, destacando o aparente des-compasso entre o baixo índice de desemprego nos últimos anos e a queda na produção da indústria. Já Bastos enfatizou a

RUMOS 21 – Novembro/Dezembro 2015 �

ma cerimônia para festejar o desenvolvimento. Assim foi a entrega do Prêmio ABDE-BID de Monografias sobre o Sistema Nacional de Fomen-to (SNF), que aconteceu no dia 27 de novembro, à tarde, na sede do Sebrae-SP. O evento reuniu os

vencedores da edição de 2015 e os presidentes e os diretores das instituições associadas que acompanharam a premiação e, na sequência, o debate sobre conjuntura econômica e desenvolvimento.

Em seu discurso na abertura da cerimônia, o presidente da ABDE, Milton Luiz de Melo Santos, destacou a importân-cia do prêmio para o fomento e anunciou que a próxima edi-ção, que começará a receber as inscrições em fevereiro, será aberta a todos, em especial pesquisadores (ver boxe). “Isso deverá enriquecer ainda mais o teor dos trabalhos”, afirma Santos. Até agora, apenas colaboradores de instituições do Sistema Nacional de Fomento podiam participar.

Vencedora na categoria I, Financiando o Desenvolvi-mento, Ana Cláudia Além, doutora em economia e chefe do

U

PRÊMIO ABDE-BID E D IÇÃO 2 015

Cerimônia de entrega do Prêmio ABDE-BID de Monografias sobre o Sistema Nacional de Fomento reúne presidentes e diretores das Instituições Financeiras em uma tarde para discutir conjuntura econômica e desenvolvimento

Experiências de sucesso

Departamento de Pesquisas da Área de Pesquisa e Acompa-nhamento Econômico do BNDES, ao receber a placa de homenagem destacou que “o trabalho conjuga antiga e novas gerações do BNDES e mostra a importância que os Sistemas Nacionais de Fomento têm para o desenvolvimento dos países”. Ao finalizar o discurso, ressaltou “Vestimos mesmo a camisa do desenvolvimento. Esse prêmio veio coroar esse esforço”. Ela escreveu o artigo “Sistemas Nacionais de Fomento: experiências comparadas”, em conjunto com Rodrigo Ferreira Madeira, gerente no Departamento de Pesquisas Econômicas, e Ricardo Agostini Martini, econo-mista que atua no mesmo departamento do BNDES.

Lavinia Barros de Castro, doutora em economia e ciências sociais e que atua na Área de Pesquisa e Acompanhamento Econômico do BNDES, foi a vencedora na categoria II, Melhores Práticas do Sistema Nacional de Fomento, com o artigo “Continuidades, rupturas e lições: quatro experiências BNDES de Cenários para Planejamento Estratégico”. Ao subir ao palco, Lavinia agradeceu a todos. “É uma alegria

Livro distribuído na Cerimônia de Entrega do Prêmio ABDE de Monografias. A publicação está disponível para download.

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atuação do governo brasileiro com a adoção de políticas anticí-clicas frente à crise econômica de 2008, mostrando que o país conseguiu fazer frente ao cenário internacional adverso. Ao final, o professor Horn fez perguntas aos palestrantes e convi-dou os presentes a participarem do debate.

De acordo com o presidente da ABDE, o objetivo desse debate era mostrar pontos de vista diferentes sobre a econo-mia e, dessa forma, fazer com que os convidados e premiados pudessem tirar suas próprias conclusões sobre os problemas que o país vem atravessando e as possíveis soluções. “O deba-te foi enriquecedor e atingiu plenamente seu objetivo”, diz Santos.

Confira, nas próximas páginas, os artigos referentes aos dois trabalhos vencedores

do Prêmio ABDE-BID 2015..

Mais participantes, novas categorias As inscrições para a edição 2016 do Prêmio ABDE-

BID de Monografias sobre o Sistema Nacional de Fomento começam mais cedo, em fevereiro, e poderão ser realizadas até agosto do mesmo ano. Mas essa não é a única novidade. Para 2016, foram criadas novas categorias e aberta a participação todos os segmentos da sociedade. Na categoria I, “Desenvolvimento em Debate”, podem participar membros de universidades, institutos de pes-quisa, instituições associadas à ABDE ou interessados na temática. Já na categoria II, “Financiamento: Desafios e Soluções”, somente podem concorrer empregados, con-cursados ou não, diretores e estagiários das instituições associadas à ABDE, neles incluídos os aposentados da instituição. Nesta categoria estão dois grupos: A) Bancos públicos federais, bancos cooperativos, Finep e Sebrae; e B) Bancos de desenvolvimento controlados por estados da federação, bancos públicos comerciais estaduais com carteira de desenvolvimento e agências de fomento. Mais informações estarão disponíveis a partir de fevereiro de 2016, no site da ABDE.

Edição 2016

RECONHECIMENTORECONHECIMENTO

Os economistas Alexandre Schwartsman, Carlos Henrique Horn e Pedro Paulo Zahluth Bastos debatem sobre a conjuntura brasileira e desenvolvimento.

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estar aqui e divulgar esse trabalho. Esse Prêmio da ABDE e do BID é muito importante no sentido de fomentar discus-sões, reflexões sobre o Sistema Nacional de Fomento. Temos que ter dois focos, no curto prazo, para as questões mais urgentes de crédito, mas não podemos perder o foco de vis-lumbrar o futuro e de tentar construir um futuro melhor para o país”. Lavinia foi vencedora também na edição do Prêmio ABDE de 2014. Participaram das homenagens, ainda, os segundos, terceiros e quarto lugares das duas categorias.

Depois da homenagem aos vencedores, os presentes acompanharam um debate sobre a atual conjuntura econômi-ca e desenvolvimento sob a visão de dois economistas, o ex-diretor do Banco Central Alexandre Schwartsman e o profes-sor de Economia da Unicamp Pedro Paulo Zahluth Bastos. O mediador foi o professor da UFRGS Carlos Henrique Horn. Primeiro a falar, Schwartsman trouxe um panorama dos últi-mos anos da economia brasileira, destacando o aparente des-compasso entre o baixo índice de desemprego nos últimos anos e a queda na produção da indústria. Já Bastos enfatizou a

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ma cerimônia para festejar o desenvolvimento. Assim foi a entrega do Prêmio ABDE-BID de Monografias sobre o Sistema Nacional de Fomen-to (SNF), que aconteceu no dia 27 de novembro, à tarde, na sede do Sebrae-SP. O evento reuniu os

vencedores da edição de 2015 e os presidentes e os diretores das instituições associadas que acompanharam a premiação e, na sequência, o debate sobre conjuntura econômica e desenvolvimento.

Em seu discurso na abertura da cerimônia, o presidente da ABDE, Milton Luiz de Melo Santos, destacou a importân-cia do prêmio para o fomento e anunciou que a próxima edi-ção, que começará a receber as inscrições em fevereiro, será aberta a todos, em especial pesquisadores (ver boxe). “Isso deverá enriquecer ainda mais o teor dos trabalhos”, afirma Santos. Até agora, apenas colaboradores de instituições do Sistema Nacional de Fomento podiam participar.

Vencedora na categoria I, Financiando o Desenvolvi-mento, Ana Cláudia Além, doutora em economia e chefe do

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PRÊMIO ABDE-BID E D IÇÃO 2 015

Cerimônia de entrega do Prêmio ABDE-BID de Monografias sobre o Sistema Nacional de Fomento reúne presidentes e diretores das Instituições Financeiras em uma tarde para discutir conjuntura econômica e desenvolvimento

Experiências de sucesso

Departamento de Pesquisas da Área de Pesquisa e Acompa-nhamento Econômico do BNDES, ao receber a placa de homenagem destacou que “o trabalho conjuga antiga e novas gerações do BNDES e mostra a importância que os Sistemas Nacionais de Fomento têm para o desenvolvimento dos países”. Ao finalizar o discurso, ressaltou “Vestimos mesmo a camisa do desenvolvimento. Esse prêmio veio coroar esse esforço”. Ela escreveu o artigo “Sistemas Nacionais de Fomento: experiências comparadas”, em conjunto com Rodrigo Ferreira Madeira, gerente no Departamento de Pesquisas Econômicas, e Ricardo Agostini Martini, econo-mista que atua no mesmo departamento do BNDES.

Lavinia Barros de Castro, doutora em economia e ciências sociais e que atua na Área de Pesquisa e Acompanhamento Econômico do BNDES, foi a vencedora na categoria II, Melhores Práticas do Sistema Nacional de Fomento, com o artigo “Continuidades, rupturas e lições: quatro experiências BNDES de Cenários para Planejamento Estratégico”. Ao subir ao palco, Lavinia agradeceu a todos. “É uma alegria

Livro distribuído na Cerimônia de Entrega do Prêmio ABDE de Monografias. A publicação está disponível para download.

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atuação do governo brasileiro com a adoção de políticas anticí-clicas frente à crise econômica de 2008, mostrando que o país conseguiu fazer frente ao cenário internacional adverso. Ao final, o professor Horn fez perguntas aos palestrantes e convi-dou os presentes a participarem do debate.

De acordo com o presidente da ABDE, o objetivo desse debate era mostrar pontos de vista diferentes sobre a econo-mia e, dessa forma, fazer com que os convidados e premiados pudessem tirar suas próprias conclusões sobre os problemas que o país vem atravessando e as possíveis soluções. “O deba-te foi enriquecedor e atingiu plenamente seu objetivo”, diz Santos.

Confira, nas próximas páginas, os artigos referentes aos dois trabalhos vencedores

do Prêmio ABDE-BID 2015..

Mais participantes, novas categorias As inscrições para a edição 2016 do Prêmio ABDE-

BID de Monografias sobre o Sistema Nacional de Fomento começam mais cedo, em fevereiro, e poderão ser realizadas até agosto do mesmo ano. Mas essa não é a única novidade. Para 2016, foram criadas novas categorias e aberta a participação todos os segmentos da sociedade. Na categoria I, “Desenvolvimento em Debate”, podem participar membros de universidades, institutos de pes-quisa, instituições associadas à ABDE ou interessados na temática. Já na categoria II, “Financiamento: Desafios e Soluções”, somente podem concorrer empregados, con-cursados ou não, diretores e estagiários das instituições associadas à ABDE, neles incluídos os aposentados da instituição. Nesta categoria estão dois grupos: A) Bancos públicos federais, bancos cooperativos, Finep e Sebrae; e B) Bancos de desenvolvimento controlados por estados da federação, bancos públicos comerciais estaduais com carteira de desenvolvimento e agências de fomento. Mais informações estarão disponíveis a partir de fevereiro de 2016, no site da ABDE.

Edição 2016

RECONHECIMENTORECONHECIMENTO

Os economistas Alexandre Schwartsman, Carlos Henrique Horn e Pedro Paulo Zahluth Bastos debatem sobre a conjuntura brasileira e desenvolvimento.

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objetivo do artigo é propor um desenho dos siste-mas nacionais de fomento (SNFs) de dez países, demonstrando suas principais características e sua relevância para o desenvolvimento. Um SNF é

constituído, em cada país, pelo conjunto de instituições finan-ceiras de desenvolvimento (IFDs) atuando no seu território de maneira complementar, permeando variados segmentos e ins-trumentos financeiros.

Os SNFs, compostos na sua maioria por IFDs públicas, são dinâmicos e se modificam ao longo do tempo para responder aos novos desafios do desenvolvimento econômico. Os focos de atuação dos SNFs são, em geral, segmentos tradicionalmente carentes de financiamento de longo prazo, como agricultura, infraestrutura, exportações, MPMEs, economia verde, inova-ção e habitação. Além do financiamento em montante e prazo apropriados para estes segmentos, os SNFs dispõem de outros instrumentos como a provisão de garantias, investimento em capital de risco, assistência técnica, entre outros.

O espaço limitado desse texto não permite uma descrição dos SNFs dos dez países, mas algumas observações e conclu-sões do trabalho são apontadas a seguir. O levantamento efe-tuado delineou o SNF dos países baseado em definições oficia-is, trabalhos acadêmicos e associações de classe, buscando o maior número de IFDs possível. Os SNFs francês e sul-coreano são abordados com maior detalhamento. Estas duas experiências são exemplos de SNFs que se adaptaram ao longo da trajetória de desenvolvimento, mas ao mesmo tempo repre-sentam experiências distintas. Enquanto o SNF francês é mais concentrado em uma instituição principal e de grande porte – a Caisse des dépôts et consignations –, o sul-coreano, apesar de ter uma IFD de destaque, o Korean Development Bank, é mais especializado, contendo um grande número de institui-ções para atender vários segmentos e setores.

Foi possível verificar a existência de mais de cem IFDs nos dez SNFs descritos. Tal profusão ilustra sua relevância nos diversos estágios de desenvolvimento nacional. Na maioria dos países, há uma instituição principal, de grande porte, que atua em diversos segmentos. No entanto, a trajetória de desen-volvimento de cada nação e as suas características políticas e econômicas determinam os segmentos apoiados, os instru-mentos utilizados e a quantidade de IFDs do SNF.

Na Alemanha e no Brasil, há uma rede importante de IFDs

Ana Cláudia AlémRodrigo Ferreira MadeiraRicardo Agostini Martini

Sistemas Nacionais de Fomento: experiências comparadas

regionais. O Brasil possui 26 IFDs regionais e estaduais, e a Ale-manha, 17. Na China, apesar de não serem definidas oficial-mente IFDs regionais, existem instituições de investimento regionais que recebem recursos da principal IFD chinesa, o China Development Bank.

No Japão, Coreia do Sul, Índia e México, por sua vez, observa-se a presença de IFDs mais especializadas. Na Índia, existem oportunidades para a racionalização de instituições, visto que muitas IFDs atuam no mesmo segmento, com ins-trumentos sobrepostos. Na França e na Itália, houve um pro-cesso de concentração das IFDs, com muitas se tornando sub-sidiárias da IFD principal. Cabe destacar a criação do Banque publique d’investissement, na França (MPMEs), em 2013, e o fortalecimento da Cassa depositi e prestiti, na Itália, em 2012.

Há diversos casos de mais de uma IFD atuando no mesmo segmento, mas com diferenciação de instrumento. Isto é observado, por exemplo, no segmento de exportações do

Japão, Coreia do Sul, Espanha e China, onde crédito, garantias e seguros são divididos entre duas IFDs. Também na Espanha e na Coreia do Sul existem instituições voltadas para crédito e outras para garantias para MPMEs.

Na Europa, é comum que as export credit agencies sejam pri-vadas: atuam no setor de seguros e são agentes do governo para a provisão de garantias para as exportações. Na Ásia, além das garantias providas pelos Eximbanks públicos, o setor de seguros para o comércio internacional também é controlado pelo governo. Por fim, nos países desenvolvidos é comum a existência de IFDs de cooperação financeira internacional, que apoiam projetos nos países em desenvolvimento, tanto em parceria com o setor privado, quanto com governos.

As informações e conclusões do artigo apontam para a completude dos SNFs, independente do estágio de desenvol-vimento da economia, e, portanto, podem contribuir para a reflexão do caminho a ser seguido pelo SNF brasileiro.

Ana Cláudia Além Doutora em Economia pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). Economista do BNDES desde 1993 e professora do IBMEC/RJ.

Ricardo Agostini MartiniMestre em Economia pelo Centro de Desenvolvimento e Planejamento Regional da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG). Atua no Departamento de Pesquisa Econômica do BNDES.

MONOGRAFIA: Vencedores / Categoria I ABDE-BID Prêmio

2015

Rodrigo Ferreira MadeiraMestre em Economia pela UFRJ. Atualmente é gerente no Departamento de Pesquisas Econômicas do BNDES.

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Os vencedores da categoria, Rodrigo, Ricardo e Ana Cláudia, recebem placas de homenagens das mãos de Luciano Schweizer, especialista líder do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID).

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objetivo do artigo é propor um desenho dos siste-mas nacionais de fomento (SNFs) de dez países, demonstrando suas principais características e sua relevância para o desenvolvimento. Um SNF é

constituído, em cada país, pelo conjunto de instituições finan-ceiras de desenvolvimento (IFDs) atuando no seu território de maneira complementar, permeando variados segmentos e ins-trumentos financeiros.

Os SNFs, compostos na sua maioria por IFDs públicas, são dinâmicos e se modificam ao longo do tempo para responder aos novos desafios do desenvolvimento econômico. Os focos de atuação dos SNFs são, em geral, segmentos tradicionalmente carentes de financiamento de longo prazo, como agricultura, infraestrutura, exportações, MPMEs, economia verde, inova-ção e habitação. Além do financiamento em montante e prazo apropriados para estes segmentos, os SNFs dispõem de outros instrumentos como a provisão de garantias, investimento em capital de risco, assistência técnica, entre outros.

O espaço limitado desse texto não permite uma descrição dos SNFs dos dez países, mas algumas observações e conclu-sões do trabalho são apontadas a seguir. O levantamento efe-tuado delineou o SNF dos países baseado em definições oficia-is, trabalhos acadêmicos e associações de classe, buscando o maior número de IFDs possível. Os SNFs francês e sul-coreano são abordados com maior detalhamento. Estas duas experiências são exemplos de SNFs que se adaptaram ao longo da trajetória de desenvolvimento, mas ao mesmo tempo repre-sentam experiências distintas. Enquanto o SNF francês é mais concentrado em uma instituição principal e de grande porte – a Caisse des dépôts et consignations –, o sul-coreano, apesar de ter uma IFD de destaque, o Korean Development Bank, é mais especializado, contendo um grande número de institui-ções para atender vários segmentos e setores.

Foi possível verificar a existência de mais de cem IFDs nos dez SNFs descritos. Tal profusão ilustra sua relevância nos diversos estágios de desenvolvimento nacional. Na maioria dos países, há uma instituição principal, de grande porte, que atua em diversos segmentos. No entanto, a trajetória de desen-volvimento de cada nação e as suas características políticas e econômicas determinam os segmentos apoiados, os instru-mentos utilizados e a quantidade de IFDs do SNF.

Na Alemanha e no Brasil, há uma rede importante de IFDs

Ana Cláudia AlémRodrigo Ferreira MadeiraRicardo Agostini Martini

Sistemas Nacionais de Fomento: experiências comparadas

regionais. O Brasil possui 26 IFDs regionais e estaduais, e a Ale-manha, 17. Na China, apesar de não serem definidas oficial-mente IFDs regionais, existem instituições de investimento regionais que recebem recursos da principal IFD chinesa, o China Development Bank.

No Japão, Coreia do Sul, Índia e México, por sua vez, observa-se a presença de IFDs mais especializadas. Na Índia, existem oportunidades para a racionalização de instituições, visto que muitas IFDs atuam no mesmo segmento, com ins-trumentos sobrepostos. Na França e na Itália, houve um pro-cesso de concentração das IFDs, com muitas se tornando sub-sidiárias da IFD principal. Cabe destacar a criação do Banque publique d’investissement, na França (MPMEs), em 2013, e o fortalecimento da Cassa depositi e prestiti, na Itália, em 2012.

Há diversos casos de mais de uma IFD atuando no mesmo segmento, mas com diferenciação de instrumento. Isto é observado, por exemplo, no segmento de exportações do

Japão, Coreia do Sul, Espanha e China, onde crédito, garantias e seguros são divididos entre duas IFDs. Também na Espanha e na Coreia do Sul existem instituições voltadas para crédito e outras para garantias para MPMEs.

Na Europa, é comum que as export credit agencies sejam pri-vadas: atuam no setor de seguros e são agentes do governo para a provisão de garantias para as exportações. Na Ásia, além das garantias providas pelos Eximbanks públicos, o setor de seguros para o comércio internacional também é controlado pelo governo. Por fim, nos países desenvolvidos é comum a existência de IFDs de cooperação financeira internacional, que apoiam projetos nos países em desenvolvimento, tanto em parceria com o setor privado, quanto com governos.

As informações e conclusões do artigo apontam para a completude dos SNFs, independente do estágio de desenvol-vimento da economia, e, portanto, podem contribuir para a reflexão do caminho a ser seguido pelo SNF brasileiro.

Ana Cláudia Além Doutora em Economia pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). Economista do BNDES desde 1993 e professora do IBMEC/RJ.

Ricardo Agostini MartiniMestre em Economia pelo Centro de Desenvolvimento e Planejamento Regional da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG). Atua no Departamento de Pesquisa Econômica do BNDES.

MONOGRAFIA: Vencedores / Categoria I ABDE-BID Prêmio

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Rodrigo Ferreira MadeiraMestre em Economia pela UFRJ. Atualmente é gerente no Departamento de Pesquisas Econômicas do BNDES.

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Os vencedores da categoria, Rodrigo, Ricardo e Ana Cláudia, recebem placas de homenagens das mãos de Luciano Schweizer, especialista líder do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID).

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MONOGRAFIA: Vencedores

RUMOS – 25 – Novembro/Dezembro 2015

T écnicas de cenários para Planejamento Estratégico partem do princípio de que o futuro é uma condição no tempo que é “diferente do que hoje existe”. Ao contrário de projeções que inferem o futuro a partir

do passado, cenários pretendem conjecturar, não sobre os ele-mentos de continuidade, mas sim sobre possíveis rupturas e quebras de padrão. O objetivo é retirar os tomadores de deci-são de suas zonas de conforto, de suas rotinas, a fim de promo-ver uma reflexão que abra o leque de alternativas estratégicas. Não se pretende, contudo, predizer o porvir – o que seria tare-fa inócua. O benefício dos cenários está em criar situações limi-tes, a fim de permitir tanto a ação preventiva, para evitar ou ate-nuar futuros indesejáveis, quanto a ação proativa, aquela que contribui para a realização do futuro almejado.

Os integrantes do Sistema Nacional de Fomento são importantes atores de transformações estruturais, econômi-cas e sociais no país. Como outras instituições públicas, pos-suem rotinas enraizadas, estrutura hierárquica bem definida, convenções e crenças compartilhadas. Tudo isto amplia os desafios do Planejamento Estratégico – o que torna o exercí-cio de cenários, defendemos, ainda mais relevante. Neste intuito, esta monografia investiga quatro experiências de Pla-nejamento Estratégico do BNDES que se utilizaram de téc-nicas de cenários, buscando ressaltar continuidades, ruptu-ras e aprendizados.

A primeira experiência estudada data de 1984. Lembremos que no início dos anos 1980 vivemos uma série de choques externos (segundo choque do petróleo, choque dos juros ame-ricanos e a moratória mexicana). Duas convenções, que até então orientavam a gestão macroeconômica, se romperam: 1) a “convenção do crescimento”, segundo a qual o Brasil estava fadado não apenas a crescer, mas a fazê-lo em elevadas taxas; e 2) a “convenção da estabilidade garantida”, isto é, a crença de que a inflação era indolor, dado o amplo sistema de indexação (Castro, A.B. 2012). Neste contexto, o BNDES adotou uma postura ousada. Apostou que o Brasil estaria preparado para o cenário “Retomada”, indo de encontro à avaliação consensual de que a restrição externa se configurava como um “obstáculo intransponível”. Seguindo as premissas de Godet (1977), recu-sou-se o uso de modelos econométricos, em prol de uma visão

Lavinia Barros de Castro

“prospectiva” na direção de um futuro desejável, considerado plausível. Embora os anos 1980 sejam associados à “década perdida”, entre 1984 e 1987 o PIB brasileiro cresceu, em média, 6,1% – próximo ao previsto. A inflação, porém, absolu-tamente não se comportou como se supunha.

A segunda experiência do uso de cenários ocorreu em 1987, quando o Brasil adotava estratégias de estabilização hete-rodoxas. A incerteza predominava e as políticas industriais esta-vam relegadas a segundo plano. Todos os esforços do governo se dirigiam para o combate à inflação. Neste contexto, o docu-mento “Cenários para a economia brasileira até o ano 2000”, publicado em 1987, apresentou, dentre outros, o cenário “Integração Competitiva”. Nele, reconhecia-se o fim de um ciclo de desenvolvimento e a necessidade de o país, simultane-amente, alargar o mercado interno e impulsionar o comércio exterior. O cenário “Integração Competitiva” se tornou uma nova “visão” para o país, ainda que tenha sido utilizado, já no contexto do governo Collor, numa agenda de abertura, privati-zação e Estado Mínimo, que não era sua concepção original.

As duas outras experiências do uso de cenários (iniciadas em 2007 e 2012) refletem a maior complexidade e tamanho do banco. Desde o princípio, visavam à construção da “missão e visão do banco”, do mapa corporativo, seguido de uma “estra-tégia em cascata”, a fim de definir metas e indicadores corpo-

rativos, numa lógica Balanced Scorecard (BSC). Partindo de quatro cenários Mundo-Brasil, discutiu-se uma matriz de ame-aças e oportunidades – o que inspirou o primeiro mapa estra-tégico da instituição. No momento da revisão do exercício (concluído em 2014), foram utilizados modelos de consistên-cia macroeconômica e houve detalhamento qualitativo de cada cenário – o que deu maior profundidade às discussões. No mapa corporativo, reconheceu-se a necessidade de ampliar o diálogo com outras instituições de governo, o que revela um desejo do banco de resgatar sua capacidade de influenciar a for-mulação estratégica do país.

Ao longo da monografia, pretendemos não apenas com-partilhar a experiência do BNDES, mas defender o uso de cenários como prática de gestão, especialmente em institui-ções que se dedicam ao longo prazo, como as que integram o Sistema Nacional de Fomento. Cenários podem ser particular-mente úteis para refletir e escolher melhores formas de fomentar as janelas de oportunidade do desenvolvimento.

Referência:CASTRO, A.B (2012). Do Desenvolvimento Renegado ao Desafio Sinocêntrico – Reflexões de Antonio Barros de Castro sobre o Brasil. Org. Castro, A.C e Castro, L.B. Rio de Janeiro: Elsevier.

Lavinia Barros de CastroDoutora em Economia pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ, 2009) e Doutora em Ciências Sociais pela Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro (UFRRJ), com sanduíche na Universidade de Berkeley, Califórnia. É economista do BNDES desde 2001.

Continuidades, rupturas e lições: quatro experiências BNDES de Cenários para Planejamento Estratégico

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ABDE-BID Prêmio

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Lavinia, vencedora da categoria, recebe a placa de homenagem das mãos do presidente da ABDE, Milton Luiz de Melo Santos.

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MONOGRAFIA: Vencedores

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T écnicas de cenários para Planejamento Estratégico partem do princípio de que o futuro é uma condição no tempo que é “diferente do que hoje existe”. Ao contrário de projeções que inferem o futuro a partir

do passado, cenários pretendem conjecturar, não sobre os ele-mentos de continuidade, mas sim sobre possíveis rupturas e quebras de padrão. O objetivo é retirar os tomadores de deci-são de suas zonas de conforto, de suas rotinas, a fim de promo-ver uma reflexão que abra o leque de alternativas estratégicas. Não se pretende, contudo, predizer o porvir – o que seria tare-fa inócua. O benefício dos cenários está em criar situações limi-tes, a fim de permitir tanto a ação preventiva, para evitar ou ate-nuar futuros indesejáveis, quanto a ação proativa, aquela que contribui para a realização do futuro almejado.

Os integrantes do Sistema Nacional de Fomento são importantes atores de transformações estruturais, econômi-cas e sociais no país. Como outras instituições públicas, pos-suem rotinas enraizadas, estrutura hierárquica bem definida, convenções e crenças compartilhadas. Tudo isto amplia os desafios do Planejamento Estratégico – o que torna o exercí-cio de cenários, defendemos, ainda mais relevante. Neste intuito, esta monografia investiga quatro experiências de Pla-nejamento Estratégico do BNDES que se utilizaram de téc-nicas de cenários, buscando ressaltar continuidades, ruptu-ras e aprendizados.

A primeira experiência estudada data de 1984. Lembremos que no início dos anos 1980 vivemos uma série de choques externos (segundo choque do petróleo, choque dos juros ame-ricanos e a moratória mexicana). Duas convenções, que até então orientavam a gestão macroeconômica, se romperam: 1) a “convenção do crescimento”, segundo a qual o Brasil estava fadado não apenas a crescer, mas a fazê-lo em elevadas taxas; e 2) a “convenção da estabilidade garantida”, isto é, a crença de que a inflação era indolor, dado o amplo sistema de indexação (Castro, A.B. 2012). Neste contexto, o BNDES adotou uma postura ousada. Apostou que o Brasil estaria preparado para o cenário “Retomada”, indo de encontro à avaliação consensual de que a restrição externa se configurava como um “obstáculo intransponível”. Seguindo as premissas de Godet (1977), recu-sou-se o uso de modelos econométricos, em prol de uma visão

Lavinia Barros de Castro

“prospectiva” na direção de um futuro desejável, considerado plausível. Embora os anos 1980 sejam associados à “década perdida”, entre 1984 e 1987 o PIB brasileiro cresceu, em média, 6,1% – próximo ao previsto. A inflação, porém, absolu-tamente não se comportou como se supunha.

A segunda experiência do uso de cenários ocorreu em 1987, quando o Brasil adotava estratégias de estabilização hete-rodoxas. A incerteza predominava e as políticas industriais esta-vam relegadas a segundo plano. Todos os esforços do governo se dirigiam para o combate à inflação. Neste contexto, o docu-mento “Cenários para a economia brasileira até o ano 2000”, publicado em 1987, apresentou, dentre outros, o cenário “Integração Competitiva”. Nele, reconhecia-se o fim de um ciclo de desenvolvimento e a necessidade de o país, simultane-amente, alargar o mercado interno e impulsionar o comércio exterior. O cenário “Integração Competitiva” se tornou uma nova “visão” para o país, ainda que tenha sido utilizado, já no contexto do governo Collor, numa agenda de abertura, privati-zação e Estado Mínimo, que não era sua concepção original.

As duas outras experiências do uso de cenários (iniciadas em 2007 e 2012) refletem a maior complexidade e tamanho do banco. Desde o princípio, visavam à construção da “missão e visão do banco”, do mapa corporativo, seguido de uma “estra-tégia em cascata”, a fim de definir metas e indicadores corpo-

rativos, numa lógica Balanced Scorecard (BSC). Partindo de quatro cenários Mundo-Brasil, discutiu-se uma matriz de ame-aças e oportunidades – o que inspirou o primeiro mapa estra-tégico da instituição. No momento da revisão do exercício (concluído em 2014), foram utilizados modelos de consistên-cia macroeconômica e houve detalhamento qualitativo de cada cenário – o que deu maior profundidade às discussões. No mapa corporativo, reconheceu-se a necessidade de ampliar o diálogo com outras instituições de governo, o que revela um desejo do banco de resgatar sua capacidade de influenciar a for-mulação estratégica do país.

Ao longo da monografia, pretendemos não apenas com-partilhar a experiência do BNDES, mas defender o uso de cenários como prática de gestão, especialmente em institui-ções que se dedicam ao longo prazo, como as que integram o Sistema Nacional de Fomento. Cenários podem ser particular-mente úteis para refletir e escolher melhores formas de fomentar as janelas de oportunidade do desenvolvimento.

Referência:CASTRO, A.B (2012). Do Desenvolvimento Renegado ao Desafio Sinocêntrico – Reflexões de Antonio Barros de Castro sobre o Brasil. Org. Castro, A.C e Castro, L.B. Rio de Janeiro: Elsevier.

Lavinia Barros de CastroDoutora em Economia pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ, 2009) e Doutora em Ciências Sociais pela Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro (UFRRJ), com sanduíche na Universidade de Berkeley, Califórnia. É economista do BNDES desde 2001.

Continuidades, rupturas e lições: quatro experiências BNDES de Cenários para Planejamento Estratégico

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ABDE-BID Prêmio

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Lavinia, vencedora da categoria, recebe a placa de homenagem das mãos do presidente da ABDE, Milton Luiz de Melo Santos.

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RUMOS – 28 – Novembro/Dezembro 2015 RUMOS – 29 – Novembro/Dezembro 2015

Avistar o futuro

umos – Este ano, duas agências de classifica-ção de risco emitiram alertas sobre o Brasil e vemos, na imprensa de forma geral, nacional e internacional, uma avaliação muito negativa

sobre o país. O Brasil deixou de ser um ator positivamen-te considerado no exterior? Otaviano Canuto – Definitivamente, nós não somos a bola da vez, mas ao mesmo tempo há um compasso de espera de investidores em potencial aguardando um primeiro sinal que permita ver com clareza para onde vai a economia brasileira. A segunda questão que também observo é a seguinte: o peso sis-têmico da economia brasileira é suficiente hoje para impedir qualquer pessoa de ignorar o que se passa no Brasil, o que não é necessariamente o caso com alguns outros países até próxi-mos geograficamente de nós. Então, o Brasil não pode ser ignorado.

Há uma percepção de que existem vários setores atraen-tes com potencial no Brasil, que dependem da articulação em setores públicos e privados, e os investidores estão enxergan-do [após as denúncias de formação de cartel e corrupção] uma mudança que tende a ocorrer de arranjos, de abertura de

espaços comparativos, e estão animados com isso. Por outro lado, só vão fazer algo quando ficar claro em que medida as novas regras do jogo vão permitir que eles participem. O mundo está olhando e ansioso por encontrar janelas de opor-tunidades, desde que o país consiga estabilizar a situação e dizer para onde vai.

Rumos – O governo vem insistindo na tese do ajuste, mas tem encontrado dificuldades. É possível vislumbrar uma possibilidade de que essa adequação aconteça e que haja um reordenamento da economia? Canuto – É preciso estar claro que ajuste do setor público é quando vier uma discussão e ações efetivas no que diz respei-to à previdência, à desvinculação de receitas nominais, a redu-zir ou a eliminar a vinculação de vários outros gastos públi-cos ao salário mínimo; é quando vier uma revisão dos pro-gramas para ver quais deles têm de fato uma relação custo-eficácia que justifica, como foi o Bolsa Família. Esse progra-ma que sofreu diversos tipos de avaliação, inclusive de agên-cias multilaterais do Brasil, quando se comprovou que é um instrumento de política pública, de política social, barato e

Diretor-executivo do Fundo Monetário Internacional (FMI), depois de ter atuado 12 anos no Banco Mundial, o economista Otaviano Canuto esteve no Brasil e conversou com a Rumos. Nessa entrevista, ele fala sobre a crise econômica internacional, que agora atinge os mercados emergentes, sobre a situação fiscal brasileira, e avalia qual o papel das instituições financeiras de desenvolvimento neste momento.

RUMOS – 28 – Novembro/Dezembro 2015

omo já é tradição, a última edição do ano da Rumos traz um conjunto de entrevistas para uma reflexão sobre 2015 e o futuro do país. Quatro economistas, com atuações dentro e fora do país,

falam da situação brasileira e analisam instrumentos de financiamentos comuns em várias sociedades. São opiniões, por vezes contundentes, de como somos vistos e o que devemos ver acontecer para consolidarmos o desenvolvi-mento sustentável.

“Definitivamente, não somos a bola da vez”, assim, assertivo, o economista e diretor-executivo do Fundo Monetário Internacional (FMI), Otaviano Canuto, começa a entrevista e, aos poucos, vai revelando suas preocupações com o Brasil de hoje, que, na sua visão, é fechado para o comércio internacional e tem um ambiente de negócios ruim. Observador privilegiado de outros países, como China e América Latina, Canuto convida a “abrir as caixinhas”e a inaugurar debates que estão esquecidos, como o da diminui-ção da burocracia e da revisão tarifária.

O professor Luiz Gonzaga Belluzzo relembra suas afirmações de dois anos atrás, quando foi entrevistado por Rumos, e reforça sua preocupação com o cenário fiscal brasileiro, ainda que considere que essa foi uma questão superdimensionada, com viés político, e que teve resposta inadequada do governo. Para o futuro, enumera uma série de iniciativas e estratégias que o país deve adotar para voltar a

viver tempos mais fecundos – mesmo que possua algum ceticismo diante da instabilidade do cenário político atual.

Na sequência, o economista croata Milford Bateman expõe de forma crítica o seu olhar sobre uma das modalida-des de financiamento mais utilizadas no país: o microcrédito. Ainda que não conheça em profundidade as experiências brasileiras, sua análise baseada nos casos da Bósnia, do México e da Colômbia, instiga a pensar mais amplamente sobre o tema e a ver no que a situação brasileira traz de contribuição para a reflexão mundial sobre os pequenos financiamentos produtivos orientados. Ao final, ele indica que talvez estejamos caminhando para uma nova crise mundial.

E é sobre a crise e a mudança de cenários, a entrevista com o economista e ex-ministro da Secretaria de Assuntos Estratégicos, Marcelo Neri. Para ele, a diminuição no ritmo de crescimento da economia brasileira tem afetado as classes A, B e C e que a crise é metropolitana. Preocupado com a situação atual do país, Neri cita que “ainda que os dois lados da ‘Belíndia’ estejam mais próximos do que nunca nos últimos anos”, o antagonismo brasileiro está forte.

Em resumo, nas próximas 11 páginas, a economia brasileira e os mecanismos de desenvolvimento são desnudados, por meio de opiniões variadas que muito contribuem para pensar para onde vai o Brasil de hoje. Boa leitura!

Quatro economistas, com atuações nacional e internacional, falam sobre economia, conjuntura e mecanismos de financiamento. Análises sobre o Brasil de hoje, com acertos e tropeços

Para observadoresatentos

Otaviano Canuto Avistar o futuro página 29

Luiz Gonzaga BelluzzoVer para crerpágina 32

Milford BatemanUm outro olharpágina 34

Marcelo NeriReajustar o focopágina 37

José

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Por Jader Moraes e Thais Sena SchettinoPor Thais Sena Schettino

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Avistar o futuro

umos – Este ano, duas agências de classifica-ção de risco emitiram alertas sobre o Brasil e vemos, na imprensa de forma geral, nacional e internacional, uma avaliação muito negativa

sobre o país. O Brasil deixou de ser um ator positivamen-te considerado no exterior? Otaviano Canuto – Definitivamente, nós não somos a bola da vez, mas ao mesmo tempo há um compasso de espera de investidores em potencial aguardando um primeiro sinal que permita ver com clareza para onde vai a economia brasileira. A segunda questão que também observo é a seguinte: o peso sis-têmico da economia brasileira é suficiente hoje para impedir qualquer pessoa de ignorar o que se passa no Brasil, o que não é necessariamente o caso com alguns outros países até próxi-mos geograficamente de nós. Então, o Brasil não pode ser ignorado.

Há uma percepção de que existem vários setores atraen-tes com potencial no Brasil, que dependem da articulação em setores públicos e privados, e os investidores estão enxergan-do [após as denúncias de formação de cartel e corrupção] uma mudança que tende a ocorrer de arranjos, de abertura de

espaços comparativos, e estão animados com isso. Por outro lado, só vão fazer algo quando ficar claro em que medida as novas regras do jogo vão permitir que eles participem. O mundo está olhando e ansioso por encontrar janelas de opor-tunidades, desde que o país consiga estabilizar a situação e dizer para onde vai.

Rumos – O governo vem insistindo na tese do ajuste, mas tem encontrado dificuldades. É possível vislumbrar uma possibilidade de que essa adequação aconteça e que haja um reordenamento da economia? Canuto – É preciso estar claro que ajuste do setor público é quando vier uma discussão e ações efetivas no que diz respei-to à previdência, à desvinculação de receitas nominais, a redu-zir ou a eliminar a vinculação de vários outros gastos públi-cos ao salário mínimo; é quando vier uma revisão dos pro-gramas para ver quais deles têm de fato uma relação custo-eficácia que justifica, como foi o Bolsa Família. Esse progra-ma que sofreu diversos tipos de avaliação, inclusive de agên-cias multilaterais do Brasil, quando se comprovou que é um instrumento de política pública, de política social, barato e

Diretor-executivo do Fundo Monetário Internacional (FMI), depois de ter atuado 12 anos no Banco Mundial, o economista Otaviano Canuto esteve no Brasil e conversou com a Rumos. Nessa entrevista, ele fala sobre a crise econômica internacional, que agora atinge os mercados emergentes, sobre a situação fiscal brasileira, e avalia qual o papel das instituições financeiras de desenvolvimento neste momento.

RUMOS – 28 – Novembro/Dezembro 2015

omo já é tradição, a última edição do ano da Rumos traz um conjunto de entrevistas para uma reflexão sobre 2015 e o futuro do país. Quatro economistas, com atuações dentro e fora do país,

falam da situação brasileira e analisam instrumentos de financiamentos comuns em várias sociedades. São opiniões, por vezes contundentes, de como somos vistos e o que devemos ver acontecer para consolidarmos o desenvolvi-mento sustentável.

“Definitivamente, não somos a bola da vez”, assim, assertivo, o economista e diretor-executivo do Fundo Monetário Internacional (FMI), Otaviano Canuto, começa a entrevista e, aos poucos, vai revelando suas preocupações com o Brasil de hoje, que, na sua visão, é fechado para o comércio internacional e tem um ambiente de negócios ruim. Observador privilegiado de outros países, como China e América Latina, Canuto convida a “abrir as caixinhas”e a inaugurar debates que estão esquecidos, como o da diminui-ção da burocracia e da revisão tarifária.

O professor Luiz Gonzaga Belluzzo relembra suas afirmações de dois anos atrás, quando foi entrevistado por Rumos, e reforça sua preocupação com o cenário fiscal brasileiro, ainda que considere que essa foi uma questão superdimensionada, com viés político, e que teve resposta inadequada do governo. Para o futuro, enumera uma série de iniciativas e estratégias que o país deve adotar para voltar a

viver tempos mais fecundos – mesmo que possua algum ceticismo diante da instabilidade do cenário político atual.

Na sequência, o economista croata Milford Bateman expõe de forma crítica o seu olhar sobre uma das modalida-des de financiamento mais utilizadas no país: o microcrédito. Ainda que não conheça em profundidade as experiências brasileiras, sua análise baseada nos casos da Bósnia, do México e da Colômbia, instiga a pensar mais amplamente sobre o tema e a ver no que a situação brasileira traz de contribuição para a reflexão mundial sobre os pequenos financiamentos produtivos orientados. Ao final, ele indica que talvez estejamos caminhando para uma nova crise mundial.

E é sobre a crise e a mudança de cenários, a entrevista com o economista e ex-ministro da Secretaria de Assuntos Estratégicos, Marcelo Neri. Para ele, a diminuição no ritmo de crescimento da economia brasileira tem afetado as classes A, B e C e que a crise é metropolitana. Preocupado com a situação atual do país, Neri cita que “ainda que os dois lados da ‘Belíndia’ estejam mais próximos do que nunca nos últimos anos”, o antagonismo brasileiro está forte.

Em resumo, nas próximas 11 páginas, a economia brasileira e os mecanismos de desenvolvimento são desnudados, por meio de opiniões variadas que muito contribuem para pensar para onde vai o Brasil de hoje. Boa leitura!

Quatro economistas, com atuações nacional e internacional, falam sobre economia, conjuntura e mecanismos de financiamento. Análises sobre o Brasil de hoje, com acertos e tropeços

Para observadoresatentos

Otaviano Canuto Avistar o futuro página 29

Luiz Gonzaga BelluzzoVer para crerpágina 32

Milford BatemanUm outro olharpágina 34

Marcelo NeriReajustar o focopágina 37

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Por Jader Moraes e Thais Sena SchettinoPor Thais Sena Schettino

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com alto resultado. Posso falar com segurança sobre o Bolsa Família, mas não necessariamente sobre outros programas que foram criados. É preciso submeter cada um à avaliação dos benefícios e dizer “isso vale a pena” ou “isso está demais, encolhe”; isso sim é que vai ser o ajuste estrutural. Mas para fazer a transição, é preciso evitar a deterioração fiscal agora, de imediato, pelo terceiro ano seguido.

Rumos – O cenário externo também está conturbado. Como isso está afe-tando o país e quais as oportunidades que este quadro pode proporcionar? Canuto – Do ponto de vista da conjun-tura, a China e a normalização da crise política monetária norte-americana são os dois grandes desafios. Eu estaria menos preocupado com a segunda por-que tem tido um processo tão antecipado que, a não ser que a própria normaliza-ção dos Estados Unidos saia muito daquilo que é esperado, essa questão está mais ou menos precificada. O risco, por conta do impacto, não por conta da pro-babilidade do evento, estaria maior na China. Não tem nada de surpreendente na desaceleração chinesa; a dúvida ape-nas é qual será o patamar em que a China, no seu novo padrão de crescimento, vai se estabilizar. E, também, o outro ponto de discórdia é quanto à probabilidade de que a transição se dê de maneira mais ou menos caótica por conta do legado de endividamento dos últimos três anos. Existe um trabalho feito pelo Banco Mundial em conjunto com um think-tank ligado ao Partido Comunista da China, c h a m a d o “ C h i n a 2 0 3 0 ” ( d i s p o n í v e l e m

cument/China-2030-complete.pdf – em inglês) e está tudo lá: o modelo glorioso dos últimos 30 anos está exausto, é hora de mudar. Os chineses já sabiam que o país ia ter que mudar para outro padrão; primeiro, menos dependente de investimento bruto e mais dependente do consumo domés-tico; segundo, eles perceberam claramente que teriam que transitar para um padrão de produção que não fosse simples-mente a entrada em segmentos intensivos de mão de obra qualificada nas cadeias produtivas; e terceiro, também sabi-am que o espaço enorme que adquiriram via manufacturing ia ter que encontrar outras opções, ou seja, caminhar na dire-ção de ser mais dependente de serviços. E as coisas encai-xam: mais dependente de serviços, mais dependente de con-sumo pessoal doméstico e menos dependente de simples-mente produzir coisas com base em mão de obra qualificada inseridas em cadeias produtivas em que a China é um elo. Essa é a direção a que eles têm que ir. Porém, a dificuldade é a travessia, saber como é que se chega lá.

Rumos – O senhor vê o Acordo Transpacífico (TPP) e a Parceria Transatlântica (TTIP) como ameaçadoras ao Brasil, uma vez que o país não está integrado a esses arranjos de comércio internacional recentemente anun-ciados?Canuto – Vejo sim como realmente ameaçador. Não vejo grande discussão sobre isso no Brasil, mas não é de estranhar, porque, entre os pares, o Brasil é a economia mais fechada

comercialmente do mundo. Somos um país ultrafechado comercialmente. Somos abertos financeiramente, somos abertos ao investimento direto externo; somos um país aberto em outros aspec-tos, mas no comércio somos um dos paí-ses mais fechados. Temos um baixo coe-ficiente de importação e exportação, um número reduzidíssimo de empresas que exportam. É impressionante como o Bra-sil, com 200 milhões de habitantes, tenha o mesmo número de firmas exportado-ras em termos absolutos que a Noruega, que é um país de cinco milhões de habi-tantes.

Rumos – O que falta para a abertura do comércio brasileiro? Canuto – No mínimo, criar as condi-ções de enfrentar os outros problemas que se manifestam por meio da dificul-dade dos juros baixarem e devido à vola-tilidade macroeconômica. Hoje, o Brasil é um dos poucos países do mundo que recorre a tarifas. O mundo lá fora já abo-

liu as tarifas comerciais, que deixaram de ser significantes. Existem outros mecanismos de apoio à produção local, como subsídios, mas incluir imposto na importação? Até as políticas de conteúdo nacional que existem não são tão ambi-ciosas como a nossa e se fazem acompanhar de compromis-so dos beneficiários, que não é o nosso caso. Não tem outro país que recorra tanto a isso atualmente.

Rumos – O nosso ambiente de negócios, foco das recla-mações de muitos empresários, é um entrave? Canuto – O problema é que os economistas, quando lidam no Brasil com ambiente de negócio, dão ênfase a questões do tipo avaliação de risco do impacto do setor privado. Como se um ambiente de negócio ruim fosse algo que incomoda empresário, ou que empresário não gosta, e esse é o aspecto menos importante. O mau do ambiente de negócio é que ele significa desperdício de recursos, daquilo que os economistas chamam de produtividade total dos fatores. Um ambiente de negócios ruim significa dizer que tem macroeco-nomicamente um efeito negativo grande, porque é pessoal, capital, grana, equipamentos, cujo emprego não é em coisas que geram valor, mas sim em enxugar gelo. Cito um exemplo

RUMOS – 30– Novembro/Dezembro 2015 RUMOS – 31 – Novembro/Dezembro 2015

que está na cabeça de todo mundo: o tempo gasto para se pagarem impostos no Brasil, independentemente da carga tri-butária, o tempo para fazer a tarefa é o triplo do equivalente dos nossos vizinhos. Isso significa dizer, macroeconomica-mente, que tem muitas pessoas talentosas e inteligentes ocu-padas com uma atividade que não agrega valor nenhum. Esse pessoal poderia fazer outras atividades ao invés disso. E essa bandeira não é muito comprada no Brasil.

Rumos – Para encerrar, é fato o papel estratégico que as Instituições Financeiras de Desenvolvimento tiveram em 2008 e 2009, com alguma saturação em 2012. Qual o papel que essas instituições podem ter hoje no país; que contribuição elas podem dar? Canuto – Uma contribuição enorme. O contraste é grande entre a necessidade de investimentos, particularmente em infraestrutura, e o que existe em termos de disponibilidade de financiamento privado, porque é um problema de com-posição entre as necessidades, não só no Brasil, mas no mun-do. Existe necessidade de financiamento de longo prazo e com características de risco e retorno bem específicos; e exis-te o desejo de aplicar dinheiro, mas em setores e projetos que tenham liquidez e que tenham outras características. Quan-

do vemos, por exemplo, o fluxo de capital para economias emergentes em movimento depois de 2008, de 2009 a 2013 a recuperação foi rápida. E lá entre 2002 e 2003, a evolução de fluxo de capital de longo prazo para economias emergentes em desenvolvimento já tinha voltado à trajetória pré-crise. Ledo engano. Teve uma mudança na composição muito importante, qual seja nesse período o financiamento bancá-rio fica estagnado e cai. Essa operação toda é bônus. Então, no total parece que está tudo bem, mas na composição tem redução de empréstimo bancário e aumento de bônus, sendo que para projetos de investimento bônus não é a forma mais adequada.

O mundo tem carência enorme de instituições fazendo o que faz o BNDES. O ideal é que se encontre um espaço em que esse banco ou qualquer outro banco de desenvolvimen-to tenha o tempo inteiro uma carteira na linha com um pou-co de risco, comprando aquilo que o mercado não está dis-posto a comprar imediatamente, e depois, quando isso come-ça a amadurecer, o banco de desenvolvimento vende aquilo, sai e usa o espaço que tiver para fazer outros projetos. Logo, essas instituições são fundamentais, mas desde que tenham um papel de dar adicionalidade ao que o mercado oferece e não substituir o mercado.

A China se prepara para uma revisão na direção de sua economia, após ver o início do esgotamento do modelo de crescimento adotado nos anos de 2010.

O mau do ambiente de negócio é que ele significa desperdício

de recursos com bônus de materiais

do país, o que é desperdício daquilo que os economistas

chamam de produtividade total

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Rumos – O cenário externo também está conturbado. Como isso está afe-tando o país e quais as oportunidades que este quadro pode proporcionar? Canuto – Do ponto de vista da conjun-tura, a China e a normalização da crise política monetária norte-americana são os dois grandes desafios. Eu estaria menos preocupado com a segunda por-que tem tido um processo tão antecipado que, a não ser que a própria normaliza-ção dos Estados Unidos saia muito daquilo que é esperado, essa questão está mais ou menos precificada. O risco, por conta do impacto, não por conta da pro-babilidade do evento, estaria maior na China. Não tem nada de surpreendente na desaceleração chinesa; a dúvida ape-nas é qual será o patamar em que a China, no seu novo padrão de crescimento, vai se estabilizar. E, também, o outro ponto de discórdia é quanto à probabilidade de que a transição se dê de maneira mais ou menos caótica por conta do legado de endividamento dos últimos três anos. Existe um trabalho feito pelo Banco Mundial em conjunto com um think-tank ligado ao Partido Comunista da China, c h a m a d o “ C h i n a 2 0 3 0 ” ( d i s p o n í v e l e m

cument/China-2030-complete.pdf – em inglês) e está tudo lá: o modelo glorioso dos últimos 30 anos está exausto, é hora de mudar. Os chineses já sabiam que o país ia ter que mudar para outro padrão; primeiro, menos dependente de investimento bruto e mais dependente do consumo domés-tico; segundo, eles perceberam claramente que teriam que transitar para um padrão de produção que não fosse simples-mente a entrada em segmentos intensivos de mão de obra qualificada nas cadeias produtivas; e terceiro, também sabi-am que o espaço enorme que adquiriram via manufacturing ia ter que encontrar outras opções, ou seja, caminhar na dire-ção de ser mais dependente de serviços. E as coisas encai-xam: mais dependente de serviços, mais dependente de con-sumo pessoal doméstico e menos dependente de simples-mente produzir coisas com base em mão de obra qualificada inseridas em cadeias produtivas em que a China é um elo. Essa é a direção a que eles têm que ir. Porém, a dificuldade é a travessia, saber como é que se chega lá.

Rumos – O senhor vê o Acordo Transpacífico (TPP) e a Parceria Transatlântica (TTIP) como ameaçadoras ao Brasil, uma vez que o país não está integrado a esses arranjos de comércio internacional recentemente anun-ciados?Canuto – Vejo sim como realmente ameaçador. Não vejo grande discussão sobre isso no Brasil, mas não é de estranhar, porque, entre os pares, o Brasil é a economia mais fechada

comercialmente do mundo. Somos um país ultrafechado comercialmente. Somos abertos financeiramente, somos abertos ao investimento direto externo; somos um país aberto em outros aspec-tos, mas no comércio somos um dos paí-ses mais fechados. Temos um baixo coe-ficiente de importação e exportação, um número reduzidíssimo de empresas que exportam. É impressionante como o Bra-sil, com 200 milhões de habitantes, tenha o mesmo número de firmas exportado-ras em termos absolutos que a Noruega, que é um país de cinco milhões de habi-tantes.

Rumos – O que falta para a abertura do comércio brasileiro? Canuto – No mínimo, criar as condi-ções de enfrentar os outros problemas que se manifestam por meio da dificul-dade dos juros baixarem e devido à vola-tilidade macroeconômica. Hoje, o Brasil é um dos poucos países do mundo que recorre a tarifas. O mundo lá fora já abo-

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Rumos – O nosso ambiente de negócios, foco das recla-mações de muitos empresários, é um entrave? Canuto – O problema é que os economistas, quando lidam no Brasil com ambiente de negócio, dão ênfase a questões do tipo avaliação de risco do impacto do setor privado. Como se um ambiente de negócio ruim fosse algo que incomoda empresário, ou que empresário não gosta, e esse é o aspecto menos importante. O mau do ambiente de negócio é que ele significa desperdício de recursos, daquilo que os economistas chamam de produtividade total dos fatores. Um ambiente de negócios ruim significa dizer que tem macroeco-nomicamente um efeito negativo grande, porque é pessoal, capital, grana, equipamentos, cujo emprego não é em coisas que geram valor, mas sim em enxugar gelo. Cito um exemplo

RUMOS – 30– Novembro/Dezembro 2015 RUMOS – 31 – Novembro/Dezembro 2015

que está na cabeça de todo mundo: o tempo gasto para se pagarem impostos no Brasil, independentemente da carga tri-butária, o tempo para fazer a tarefa é o triplo do equivalente dos nossos vizinhos. Isso significa dizer, macroeconomica-mente, que tem muitas pessoas talentosas e inteligentes ocu-padas com uma atividade que não agrega valor nenhum. Esse pessoal poderia fazer outras atividades ao invés disso. E essa bandeira não é muito comprada no Brasil.

Rumos – Para encerrar, é fato o papel estratégico que as Instituições Financeiras de Desenvolvimento tiveram em 2008 e 2009, com alguma saturação em 2012. Qual o papel que essas instituições podem ter hoje no país; que contribuição elas podem dar? Canuto – Uma contribuição enorme. O contraste é grande entre a necessidade de investimentos, particularmente em infraestrutura, e o que existe em termos de disponibilidade de financiamento privado, porque é um problema de com-posição entre as necessidades, não só no Brasil, mas no mun-do. Existe necessidade de financiamento de longo prazo e com características de risco e retorno bem específicos; e exis-te o desejo de aplicar dinheiro, mas em setores e projetos que tenham liquidez e que tenham outras características. Quan-

do vemos, por exemplo, o fluxo de capital para economias emergentes em movimento depois de 2008, de 2009 a 2013 a recuperação foi rápida. E lá entre 2002 e 2003, a evolução de fluxo de capital de longo prazo para economias emergentes em desenvolvimento já tinha voltado à trajetória pré-crise. Ledo engano. Teve uma mudança na composição muito importante, qual seja nesse período o financiamento bancá-rio fica estagnado e cai. Essa operação toda é bônus. Então, no total parece que está tudo bem, mas na composição tem redução de empréstimo bancário e aumento de bônus, sendo que para projetos de investimento bônus não é a forma mais adequada.

O mundo tem carência enorme de instituições fazendo o que faz o BNDES. O ideal é que se encontre um espaço em que esse banco ou qualquer outro banco de desenvolvimen-to tenha o tempo inteiro uma carteira na linha com um pou-co de risco, comprando aquilo que o mercado não está dis-posto a comprar imediatamente, e depois, quando isso come-ça a amadurecer, o banco de desenvolvimento vende aquilo, sai e usa o espaço que tiver para fazer outros projetos. Logo, essas instituições são fundamentais, mas desde que tenham um papel de dar adicionalidade ao que o mercado oferece e não substituir o mercado.

A China se prepara para uma revisão na direção de sua economia, após ver o início do esgotamento do modelo de crescimento adotado nos anos de 2010.

O mau do ambiente de negócio é que ele significa desperdício

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 umos – Há dois anos, o senhor conversou com a revista e já estava colocada, na ocasião, a questão fiscal. Na época, o senhor sinaliza-va que o país precisava fazer um esforço nes-

sa área. O senhor considerou também que a inflação controlada e a manutenção do nível de empregos não são incompatíveis com o ajuste fiscal. Então, qual seria sua avaliação hoje sobre esse tema do ajuste? Como o senhor interpreta a condução que o governo está dando para essa temática? Luiz Gonzaga Belluzzo – Na minha avaliação, em primei-ro lugar houve convergência de três decisões: primeiro, a con-versão dos preços que estavam atrasados. Nessa época, um ponto que me preocupava era o preço da gasolina. Estava preocupado com a Petrobras e o que aconteceu foi que hou-ve uma simultaneidade. A correção das tarifas no mesmo momento em que se deu um choque de preços, fato que está levando a inflação nas proximidades de 10%. E com a pers-pectiva da inflação em 201 terminar acima da meta, entre 66,5 e 7%, o que é uma ironia porque a política monetária pro-mete, ou pretende colocar a inflação na meta com o choque de juros. Portanto, teve o choque de juros e de tarifas e ainda a desobrigação cambial que contribuiu com menor intensi-dade, mas tem influído na inflação. E isso resultou no quê? Numa queda do PIB. Está implícito, por detrás de todas essas decisões, a ideia, uma ideia trágica para a economia, que os agentes têm expectativas racionais. Ou seja, eles sabem exatamente qual é a trajetória de equilíbrio dentro da economia. Saber exatamente qual é a trajetória, e os desvios dessa trajetória são sempre causados por choques externos, inclusive por choques provocados pela política econômica do governo, porque o sistema na realidade tenderia sempre a se aproximar da sua trajetória ótima. Logo, em toda a con-cepção, se construiu essa ideia, um tanto quanto rudimentar, de confiança. Se o governo aponta nas suas decisões para a

O professor de Economia da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) Luiz Gonzaga Belluzzo conversou com a Rumos e, dois anos após a entrevista à revista em que revelou preocupação com o cenário fiscal do país – antes, portanto, do tema ganhar a centralidade na pauta política e econômica brasileira –, ele revê suas declarações e traça um panorama sobre a realidade atual, indicando quais as estratégias e ações que o país pode adotar para se livrar das amarras e voltar a trilhar um

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solução da questão fiscal, por exemplo, de remover esse incô-modo de política fiscal, o setor privado naturalmente vai recuperar confiança. Porém, o que observamos é exatamen-te o inverso disso.

Ocorreu um choque de juros muito forte, uma desvalori-zação, que no primeiro momento provoca incômodo para as empresas, sobretudo se elas estão endividadas em moeda estrangeira, como estão, se existe uma contração da oferta de crédito, o mercado começa a ficar líquido, os bancos aumen-tam a taxa de juros para os tomadores privados, estes tam-bém passam a temer a contratação de novos empréstimos, eles ajustam pelas quantidades, pelo desemprego, conside-ram a redução do nível de atividade e a receita fiscal cai por-que o nível de atividade cai. As empresas veem que os consu-midores também estão reduzindo seu gasto, e isso gera um processo complicado que depois é difícil sair dele. A isso se soma a situação da Petrobras e da Lava Jato que mobilizou um setor todo da economia brasileira. E eu não vejo nin-guém se mexer com propósito de solucionar isso. Não é tão complicado se compreender que um fato é punir essas pes-soas que cometeram esses malfeitos, e outro é inviabilizar o setor inteiro, que é o que está acontecendo. Rumos – Era possível melhorar o cenário fiscal brasilei-ro de outra forma e não da maneira como foi feito? Belluzzo – Vamos por partes. Eu agora sigo a máxima do Mark Twain “o que causa problemas não é o que você não sabe, é o que você tem certeza que sabe”. Isso se aplica muito aos economistas brasileiros. No período eleitoral, o debate público foi muito conduzido em torno da catástrofe que era a situação fiscal do governo. E, digo que a situação era delica-da porque a economia já estava desacelerando e os efeitos dessa quebra no ritmo estavam sendo sentidos na receita fis-cal, além das desonerações que foram extemporâneas, mas a situação não era catastrófica, era difícil, demandava cuidado,

RUMOS – 33 – Novembro/Dezembro 2015

porém foi precipitada por um aviso de um ajuste fiscal drás-tico e não preciso nem dizer pelo choque de juros. Então, na verdade transtornou as expectativas em vez de pacificá-las.

Esse quadro traçado dessa maneira teve uma diferença grande na disputa eleitoral. A disputa eleitoral polarizou mui-to o debate. Tudo isso deprimiu muito a expectativa, inclusi-ve o setor privado teve que tomar decisões que acabaram agravando o quadro e impedindo que o ajuste fiscal se fizes-se de uma maneira mais tranquila.

Rumos – Na sua avaliação, o governo tinha como esca-par disso?Belluzzo – Bem, esse é um jogo entre o setor privado. O governo podia ter evitado, por exemplo, dar esse choque de tarifa da maneira que ocorreu. Esse choque brusco de tari-fas agravou as expectativas e, na verdade, produziu danos, por exemplo, na renda real dos consumidores e em boa par-te das famílias que tinham conseguido melhorar o seu padrão de vida. E por quê? Porque se queria colocar a infla-ção na meta, como se isso fosse o dogma da Santíssima Trin-dade. E quem é que acredita que a inflação vai para a meta de 4,5%, não é? Ninguém.

Rumos – Com poder de investimento bastante reduzi-do, a situação fiscal em alguns estados e municípios está deteriorada. Alguns analistas dizem que sentire-mos saudade de 2015. Existe alguma perspectiva de melhoria no curto prazo?

Belluzzo – Num certo momento de tempo, fazer projeções assim, sejam elas catastróficas, sejam elas otimistas, é ruim, não se deve fazer isso. É preciso levar em consideração que a economia brasileira, quando avaliada sua inserção externa, perdeu posição até, principalmente por conta do declínio da indústria brasileira. Então, um dos grandes problemas que o Brasil tem certamente é o declínio da indústria precoce. Nós tivemos uma desindustrialização precoce desde o Plano Real, em meados de 19994, e isso se agravou realmente nos anos 2000. O Brasil perdeu posição, deixou o câmbio valori-zado muitos anos, agora está sofrendo uma valorização que é necessária.

Então, o mundo mudou, o capitalismo mudou muito, e temos que pensar e ajustar nossa estratégia nacional, se é que nós temos capacidade de ter uma, mas eu sempre dou o exemplo da China. A China tem uma estratégia nacional de integração à economia internacional e foi bem-sucedida. Agora, está com uns pequenos problemas do próprio cres-cimento dela. É preciso encontrar uma forma de discutir a inserção do Brasil na economia mundial com a retomada do processo de industrialização agora ajustado às novas condi-ções. Muita coisa vai se reverter ou se transformar diante da crise. Por exemplo, não acredito que o sistema financeiro continue com esse grau de integração. O Brasil tem condi-ções de fazer um processo de reestruturação positiva e isso precisa ser feito com muito pragmatismo, nada de pondera-ções ideológicas.

Rumos – Em nossa última entrevista, conversamos sobre o papel reservado às instituições financeiras de desenvolvimento, cujo conjunto forma o Sistema Naci-onal de Fomento. Passados dois anos, qual o papel que o senhor enxerga para essas instituições nesse momento que a economia precisa ser reorganizada e uma nova estratégia de desenvolvimento precisa ser traçada? Belluzzo – Tem um assunto que é pouco mencionado, o Brasil é sócio do banco dos Brics (ver Rumos nº 276 . O país )não se mobiliza para usar o banco como um agente impor-tante de desenvolvimento de crédito para os projetos importantes, inclusive para capitalizar a Petrobras para pou-par o Tesouro, por exemplo. O que acontece é que não há uma tomada de atitude, tem uma série de projetos lá no ban-co e nós não nos valemos. É preciso que haja mobilização, inclusive porque o banco dos Brics foi inspirado no desem-penho do BNDES. Portanto, o país tem que se aproveitar dessa estrutura de bancos públicos e dessa disposição que fez com o banco dos Brics, que isso pode ajudar a aliviar um pouco e até sustentar a estratégia de investimento. Não vejo outra maneira que possa tirar a economia dessa situação difí-cil em que se encontra.

Ver para crer

Por Jader Moraes

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 umos – Há dois anos, o senhor conversou com a revista e já estava colocada, na ocasião, a questão fiscal. Na época, o senhor sinaliza-va que o país precisava fazer um esforço nes-

sa área. O senhor considerou também que a inflação controlada e a manutenção do nível de empregos não são incompatíveis com o ajuste fiscal. Então, qual seria sua avaliação hoje sobre esse tema do ajuste? Como o senhor interpreta a condução que o governo está dando para essa temática? Luiz Gonzaga Belluzzo – Na minha avaliação, em primei-ro lugar houve convergência de três decisões: primeiro, a con-versão dos preços que estavam atrasados. Nessa época, um ponto que me preocupava era o preço da gasolina. Estava preocupado com a Petrobras e o que aconteceu foi que hou-ve uma simultaneidade. A correção das tarifas no mesmo momento em que se deu um choque de preços, fato que está levando a inflação nas proximidades de 10%. E com a pers-pectiva da inflação em 201 terminar acima da meta, entre 66,5 e 7%, o que é uma ironia porque a política monetária pro-mete, ou pretende colocar a inflação na meta com o choque de juros. Portanto, teve o choque de juros e de tarifas e ainda a desobrigação cambial que contribuiu com menor intensi-dade, mas tem influído na inflação. E isso resultou no quê? Numa queda do PIB. Está implícito, por detrás de todas essas decisões, a ideia, uma ideia trágica para a economia, que os agentes têm expectativas racionais. Ou seja, eles sabem exatamente qual é a trajetória de equilíbrio dentro da economia. Saber exatamente qual é a trajetória, e os desvios dessa trajetória são sempre causados por choques externos, inclusive por choques provocados pela política econômica do governo, porque o sistema na realidade tenderia sempre a se aproximar da sua trajetória ótima. Logo, em toda a con-cepção, se construiu essa ideia, um tanto quanto rudimentar, de confiança. Se o governo aponta nas suas decisões para a

O professor de Economia da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) Luiz Gonzaga Belluzzo conversou com a Rumos e, dois anos após a entrevista à revista em que revelou preocupação com o cenário fiscal do país – antes, portanto, do tema ganhar a centralidade na pauta política e econômica brasileira –, ele revê suas declarações e traça um panorama sobre a realidade atual, indicando quais as estratégias e ações que o país pode adotar para se livrar das amarras e voltar a trilhar um

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solução da questão fiscal, por exemplo, de remover esse incô-modo de política fiscal, o setor privado naturalmente vai recuperar confiança. Porém, o que observamos é exatamen-te o inverso disso.

Ocorreu um choque de juros muito forte, uma desvalori-zação, que no primeiro momento provoca incômodo para as empresas, sobretudo se elas estão endividadas em moeda estrangeira, como estão, se existe uma contração da oferta de crédito, o mercado começa a ficar líquido, os bancos aumen-tam a taxa de juros para os tomadores privados, estes tam-bém passam a temer a contratação de novos empréstimos, eles ajustam pelas quantidades, pelo desemprego, conside-ram a redução do nível de atividade e a receita fiscal cai por-que o nível de atividade cai. As empresas veem que os consu-midores também estão reduzindo seu gasto, e isso gera um processo complicado que depois é difícil sair dele. A isso se soma a situação da Petrobras e da Lava Jato que mobilizou um setor todo da economia brasileira. E eu não vejo nin-guém se mexer com propósito de solucionar isso. Não é tão complicado se compreender que um fato é punir essas pes-soas que cometeram esses malfeitos, e outro é inviabilizar o setor inteiro, que é o que está acontecendo. Rumos – Era possível melhorar o cenário fiscal brasilei-ro de outra forma e não da maneira como foi feito? Belluzzo – Vamos por partes. Eu agora sigo a máxima do Mark Twain “o que causa problemas não é o que você não sabe, é o que você tem certeza que sabe”. Isso se aplica muito aos economistas brasileiros. No período eleitoral, o debate público foi muito conduzido em torno da catástrofe que era a situação fiscal do governo. E, digo que a situação era delica-da porque a economia já estava desacelerando e os efeitos dessa quebra no ritmo estavam sendo sentidos na receita fis-cal, além das desonerações que foram extemporâneas, mas a situação não era catastrófica, era difícil, demandava cuidado,

RUMOS – 33 – Novembro/Dezembro 2015

porém foi precipitada por um aviso de um ajuste fiscal drás-tico e não preciso nem dizer pelo choque de juros. Então, na verdade transtornou as expectativas em vez de pacificá-las.

Esse quadro traçado dessa maneira teve uma diferença grande na disputa eleitoral. A disputa eleitoral polarizou mui-to o debate. Tudo isso deprimiu muito a expectativa, inclusi-ve o setor privado teve que tomar decisões que acabaram agravando o quadro e impedindo que o ajuste fiscal se fizes-se de uma maneira mais tranquila.

Rumos – Na sua avaliação, o governo tinha como esca-par disso?Belluzzo – Bem, esse é um jogo entre o setor privado. O governo podia ter evitado, por exemplo, dar esse choque de tarifa da maneira que ocorreu. Esse choque brusco de tari-fas agravou as expectativas e, na verdade, produziu danos, por exemplo, na renda real dos consumidores e em boa par-te das famílias que tinham conseguido melhorar o seu padrão de vida. E por quê? Porque se queria colocar a infla-ção na meta, como se isso fosse o dogma da Santíssima Trin-dade. E quem é que acredita que a inflação vai para a meta de 4,5%, não é? Ninguém.

Rumos – Com poder de investimento bastante reduzi-do, a situação fiscal em alguns estados e municípios está deteriorada. Alguns analistas dizem que sentire-mos saudade de 2015. Existe alguma perspectiva de melhoria no curto prazo?

Belluzzo – Num certo momento de tempo, fazer projeções assim, sejam elas catastróficas, sejam elas otimistas, é ruim, não se deve fazer isso. É preciso levar em consideração que a economia brasileira, quando avaliada sua inserção externa, perdeu posição até, principalmente por conta do declínio da indústria brasileira. Então, um dos grandes problemas que o Brasil tem certamente é o declínio da indústria precoce. Nós tivemos uma desindustrialização precoce desde o Plano Real, em meados de 19994, e isso se agravou realmente nos anos 2000. O Brasil perdeu posição, deixou o câmbio valori-zado muitos anos, agora está sofrendo uma valorização que é necessária.

Então, o mundo mudou, o capitalismo mudou muito, e temos que pensar e ajustar nossa estratégia nacional, se é que nós temos capacidade de ter uma, mas eu sempre dou o exemplo da China. A China tem uma estratégia nacional de integração à economia internacional e foi bem-sucedida. Agora, está com uns pequenos problemas do próprio cres-cimento dela. É preciso encontrar uma forma de discutir a inserção do Brasil na economia mundial com a retomada do processo de industrialização agora ajustado às novas condi-ções. Muita coisa vai se reverter ou se transformar diante da crise. Por exemplo, não acredito que o sistema financeiro continue com esse grau de integração. O Brasil tem condi-ções de fazer um processo de reestruturação positiva e isso precisa ser feito com muito pragmatismo, nada de pondera-ções ideológicas.

Rumos – Em nossa última entrevista, conversamos sobre o papel reservado às instituições financeiras de desenvolvimento, cujo conjunto forma o Sistema Naci-onal de Fomento. Passados dois anos, qual o papel que o senhor enxerga para essas instituições nesse momento que a economia precisa ser reorganizada e uma nova estratégia de desenvolvimento precisa ser traçada? Belluzzo – Tem um assunto que é pouco mencionado, o Brasil é sócio do banco dos Brics (ver Rumos nº 276 . O país )não se mobiliza para usar o banco como um agente impor-tante de desenvolvimento de crédito para os projetos importantes, inclusive para capitalizar a Petrobras para pou-par o Tesouro, por exemplo. O que acontece é que não há uma tomada de atitude, tem uma série de projetos lá no ban-co e nós não nos valemos. É preciso que haja mobilização, inclusive porque o banco dos Brics foi inspirado no desem-penho do BNDES. Portanto, o país tem que se aproveitar dessa estrutura de bancos públicos e dessa disposição que fez com o banco dos Brics, que isso pode ajudar a aliviar um pouco e até sustentar a estratégia de investimento. Não vejo outra maneira que possa tirar a economia dessa situação difí-cil em que se encontra.

Ver para crer

Por Jader Moraes

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RUMOS – 34 – Novembro/Dezembro 2015 RUMOS – 35 – Novembro/Dezembro 2015

umos – O senhor tem defendido que o micro-crédito cria barreiras para o desenvolvimento sustentável. Por que acredita que este não é um instrumento eficaz para a superação da

pobreza?Milford Bateman – A ideia do microcrédito, na sua origem, é em função de políticas de desenvolvimento. De fato, o microcrédito nasceu em Recife, no Brasil, como um grande programa nos anos 1960. Mas se desenvolveu com apoio do governo dos Estados Unidos e de outros que estavam preo-cupados com os movimentos agrários, os grupos de esquer-da e a teologia da libertação. A política de microcrédito era uma forma de mostrar: “olhe, não fique aí tentando mudar ou revolucionar o status quo, há condições de se desenvolver”. Então, a ideia deles inicialmente foi a de pegar alguns progra-mas existentes, mudando-os um pouco, adaptando-os e man-dando um recado para o mundo que iriam instalar um capita-lismo para os pobres. Por este motivo, as instituições ameri-canas de desenvolvimento trouxeram a ideia de que de fato os pobres não precisavam procurar desafiar o status quo, mas que eles mesmos podiam aceder ao capitalismo deles.

Outro ponto da minha crítica é que esse modelo está base-ado num erro fundamental: Muhammad Yunus (ver Rumos nº 281) assumiu que uma pessoa pobre com um pequeno crédi-to poderia ser capacitada para produzir algo e a seguir não haveria nenhum problema em vender esse produto na comu-

Economista e professor na Universidade de Juraj Dobril, na Croácia, Milford Bateman veio ao Brasil a convite do Banco de Desenvolvimento de Minas Gerais e da ABDE para participar do Seminário Microcrédito Produtivo Orientado, patrocinado pelo Sebrae, em Belo Horizonte. Com uma visão crítica a respeito do microcrédito como ferramenta para a redução da pobreza e incentivo ao desenvolvimento, ainda que sem se ater ao caso específico do Brasil, que não foi foco de suas pesquisas até então, Bateman fala livremente sobre como analisa a concessão de crédito para microempreendedores e sobre o risco de retirar os investimentos dos segmentos que podem garantir efetiva transformação social, com a indústria. Um olhar crítico para refletir!

microcrédito, todos eles estão tentando vender os mesmos produtos e não têm condição de realização. E pelo fato de que há tanta competição, precisam baixar o preço para pode-rem ficar livres do estoque, dos produtos que produziram. Então, eles sobrevivem marginalmente. Os únicos beneficiá-rios na realidade são dois: as instituições de microcrédito e uma camada da sociedade, classe média, que vai nesses bair-ros e compra produtos a preços imbatíveis. Contudo, obser-va-se que o nível de pobreza nessas áreas está piorando.

O segundo ponto é saber o que é que reduz o nível de pobreza. Nos países do Ocidente, foi possível conseguir reduzir a pobreza. Em parte, alcançamos isso por termos investido recursos financeiros em grandes organizações, uti-lizando tecnologia, trabalhando, pagando bons salários, desenvolvendo novos produtos e inovadores, e talvez exportando. Essas companhias começaram a se estabelecer e crescer, e por conta desse crescimento, conseguimos redu-zir a pobreza. Essa foi a maneira com que foi possível redu-zir a pobreza, por meio de investimento privado. O proble-ma com o microcrédito é que de fato ele acabou sendo uma parte grande do sistema financeiro. O que essa modalidade faz é pegar esse recurso financeiro inteiro investindo no pior setor, enquanto os projetos das melhores empresas não têm acesso a investimento.

Darei um exemplo relevante: o México sempre foi um país mais pobre, que nos anos 1950 desenvolveu novas polí-ticas de industrialização, para substituição de importações, desenvolvidas por um economista argentino chamado Raúl Prebisch. O argumento foi de que era preciso investir nessas empresas industrializadas, inovadoras, para que elas pudes-sem se desenvolver e dessa forma melhorar a situação da eco-nomia. Então, por muito tempo, o México se desenvolveu de forma lenta, mas começou a se transformar em uma econo-mia mais sofisticada. Mas houve uma mudança na política associada ao Consenso de Washington, e o México acabou optando por não mais sustentar ou desenvolver sistematica-mente as empresas de desenvolvimento, e deixar para o setor financeiro a decisão se quer apoiar essas indústrias ou não. O sistema financeiro privado avaliou que essas empresas eram mais arriscadas e não lhe dariam o retorno pretendido. Enfim, pegaram a poupança, o recurso financeiro, e investi-ram no microcrédito. O México hoje tem milhões desses changarros (vendinhas familiares) e o setor industrial está em contração. Isso é um grande problema no Peru, na Colôm-bia e em muitos outros países. É um país rico, mas o dinheiro não está indo para as empresas que estariam reduzindo a pobreza, mas as instituições financeiras privadas estão pegando recursos e investindo nesses changarros. É um pro-blema de longo prazo e de curto prazo também.

Rumos – O senhor citou as instituições financeiras pri-vadas, mas no Brasil há um predomínio da concessão do microcrédito por instituições públicas. Essa é uma realidade também encontrada em outros países? Bateman – Não. Na maioria dos países, o microcrédito é pro-

Um outro olhar

Por Jader Moraes

videnciado mais por empresas realmente centralizadas no lucro, tais como bancos de investimento, porque os bancos privados podem fazer um grande lucro. No México, o Banco Compartamos é o maior banco de microcrédito, aplicando taxa de juros de até 195%. Isso gera um enorme resultado para o banco. Mas os clientes, as mulheres de um modo geral, não conseguem sair da pobreza por conta dessas altíssimas taxas de juros. Então, de fato, tem um impacto negativo sobre a pobreza. Está se observando nos últimos anos um grande crescimento da taxa de inadimplência do microcrédito. Em alguns lugares, as famílias têm até oito ou nove empréstimos. Não há redução da pobreza, mas sim um aumento de endivi-damento dos pobres. Ao mesmo tempo, evidentemente, quem providencia esse microcrédito pode ganhar muito dinheiro: quando o negócio [do pequeno empresário] que-bra, “então tudo bem, isso é uma coisa da vida”.

Outro exemplo vem da Bósnia. Os presidentes e gerentes seniores das instituições de microcrédito começaram a ganhar muito dinheiro. Em poucos anos, os indivíduos mais bem pagos na Bósnia eram os presidentes das instituições de microcrédito, e a indústria não conseguiu se reerguer. Os cli-entes dessas instituições, que pagam juros da ordem de 40, 45%, não têm nada que possam fazer para tornar isso um negócio sustentável. Então, de fato, tudo isso é sobre como fazer dinheiro, lucro com microcrédito e não o desenvolvi-mento real.

Há muitos estudos atuais, que estão sendo feitos por estu-dantes que estavam anunciando grandes reduções da pobreza por meio do microcrédito, e hoje dizem que tudo estava errado, não há evidência da redução de pobreza. É um choque para mui-tas pessoas que normalmente estavam apoiando a ideia do microcrédito, mas a realidade é crua.

Rumos – Gostaríamos de compreender: o modelo brasi-leiro de concessão de microcrédito é majoritariamente estatal e com taxas de juros que certamente não chegam aos 195% que o senhor citou; ao contrário, taxas de juros baixas e subsidiadas. A esse modelo cabem as mesmas críticas que o senhor tem feito às experiências interna-cionais, tão distintas? Bateman – Cabem sim, com certeza, porque têm as mesmas falhas fundamentais comparando com outros modelos. Vamos supor que eu queira abrir um salão, então vou querer 500 dólares e vou acreditar nele. Começo o meu negócio, faço a minha propaganda para atrair clientes. Esses clientes caem do céu ou vêm captados de outros negócios similares na região? Eu começo um negócio, tenho meu próprio emprego, tenho assistente, mas o outro cabeleireiro concorrente tem uma diminuição dos clientes dele, o que reduz, por exemplo, um emprego. Assim, não é uma criação de empregos: dois aqui e dois menos ali. A ideia de resolvermos a pobreza por meio do aumento de outros pequenos negócios similares na mesma comunidade não tem muita lógica. Mas se eu sou um político, vou ter que dizer aos pobres que nós estamos fazendo alguma coisa para resolver. Logo, vou mostrar o resultado

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nidade local. O problema nas comunidades pobres não é que elas não tenham acesso a pequenos comércios, mas sim que elas não têm poder aquisitivo para poder comprar esses pro-dutos. Ao visitar hoje os países pobres, a primeira coisa que se observa é que de fato eles têm enormes quantidades de negó-cios., como padarias e outros comércios. Quando se pergunta quais são os problemas básicos, eles respondem: “mas eu não tenho clientes”. Muhammad Yunus errou na ideia de que enquanto as pessoas pobres pudessem produzir algo, elas poderiam melhorar as condições. Esse é o problema nas comunidades pobres: não é o de fornecimento de pequenos itens de consumo, mas é de demanda. Todo o conceito de Muhammad Yunus foi estabelecido em cima de um erro e se desenvolveu com esse fundamento, até a situação atual em que se observa que no México, Colômbia e outros países encontramos muitas pessoas produzindo, mas que não estão conseguindo vender.

Darei um exemplo de alguns anos atrás: nos bairros de Medellín (Colômbia), toda rua tem muitos locais que ven-dem, mesmo nas casas têm um pequeno comércio para a rua e todos vendendo os mesmos produtos – cerveja, refrigeran-te, itens de higiene. Nós [o grupo de sua pesquisa] conversá-vamos com as pessoas e perguntávamos qual era o problema. Alguns deles estavam lá há 20 anos. Eles falaram: “Há 20, éra-mos poucos e conseguíamos vender o suficiente para poder sobreviver”. Mas, hoje, com todo mundo tendo acesso a

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umos – O senhor tem defendido que o micro-crédito cria barreiras para o desenvolvimento sustentável. Por que acredita que este não é um instrumento eficaz para a superação da

pobreza?Milford Bateman – A ideia do microcrédito, na sua origem, é em função de políticas de desenvolvimento. De fato, o microcrédito nasceu em Recife, no Brasil, como um grande programa nos anos 1960. Mas se desenvolveu com apoio do governo dos Estados Unidos e de outros que estavam preo-cupados com os movimentos agrários, os grupos de esquer-da e a teologia da libertação. A política de microcrédito era uma forma de mostrar: “olhe, não fique aí tentando mudar ou revolucionar o status quo, há condições de se desenvolver”. Então, a ideia deles inicialmente foi a de pegar alguns progra-mas existentes, mudando-os um pouco, adaptando-os e man-dando um recado para o mundo que iriam instalar um capita-lismo para os pobres. Por este motivo, as instituições ameri-canas de desenvolvimento trouxeram a ideia de que de fato os pobres não precisavam procurar desafiar o status quo, mas que eles mesmos podiam aceder ao capitalismo deles.

Outro ponto da minha crítica é que esse modelo está base-ado num erro fundamental: Muhammad Yunus (ver Rumos nº 281) assumiu que uma pessoa pobre com um pequeno crédi-to poderia ser capacitada para produzir algo e a seguir não haveria nenhum problema em vender esse produto na comu-

Economista e professor na Universidade de Juraj Dobril, na Croácia, Milford Bateman veio ao Brasil a convite do Banco de Desenvolvimento de Minas Gerais e da ABDE para participar do Seminário Microcrédito Produtivo Orientado, patrocinado pelo Sebrae, em Belo Horizonte. Com uma visão crítica a respeito do microcrédito como ferramenta para a redução da pobreza e incentivo ao desenvolvimento, ainda que sem se ater ao caso específico do Brasil, que não foi foco de suas pesquisas até então, Bateman fala livremente sobre como analisa a concessão de crédito para microempreendedores e sobre o risco de retirar os investimentos dos segmentos que podem garantir efetiva transformação social, com a indústria. Um olhar crítico para refletir!

microcrédito, todos eles estão tentando vender os mesmos produtos e não têm condição de realização. E pelo fato de que há tanta competição, precisam baixar o preço para pode-rem ficar livres do estoque, dos produtos que produziram. Então, eles sobrevivem marginalmente. Os únicos beneficiá-rios na realidade são dois: as instituições de microcrédito e uma camada da sociedade, classe média, que vai nesses bair-ros e compra produtos a preços imbatíveis. Contudo, obser-va-se que o nível de pobreza nessas áreas está piorando.

O segundo ponto é saber o que é que reduz o nível de pobreza. Nos países do Ocidente, foi possível conseguir reduzir a pobreza. Em parte, alcançamos isso por termos investido recursos financeiros em grandes organizações, uti-lizando tecnologia, trabalhando, pagando bons salários, desenvolvendo novos produtos e inovadores, e talvez exportando. Essas companhias começaram a se estabelecer e crescer, e por conta desse crescimento, conseguimos redu-zir a pobreza. Essa foi a maneira com que foi possível redu-zir a pobreza, por meio de investimento privado. O proble-ma com o microcrédito é que de fato ele acabou sendo uma parte grande do sistema financeiro. O que essa modalidade faz é pegar esse recurso financeiro inteiro investindo no pior setor, enquanto os projetos das melhores empresas não têm acesso a investimento.

Darei um exemplo relevante: o México sempre foi um país mais pobre, que nos anos 1950 desenvolveu novas polí-ticas de industrialização, para substituição de importações, desenvolvidas por um economista argentino chamado Raúl Prebisch. O argumento foi de que era preciso investir nessas empresas industrializadas, inovadoras, para que elas pudes-sem se desenvolver e dessa forma melhorar a situação da eco-nomia. Então, por muito tempo, o México se desenvolveu de forma lenta, mas começou a se transformar em uma econo-mia mais sofisticada. Mas houve uma mudança na política associada ao Consenso de Washington, e o México acabou optando por não mais sustentar ou desenvolver sistematica-mente as empresas de desenvolvimento, e deixar para o setor financeiro a decisão se quer apoiar essas indústrias ou não. O sistema financeiro privado avaliou que essas empresas eram mais arriscadas e não lhe dariam o retorno pretendido. Enfim, pegaram a poupança, o recurso financeiro, e investi-ram no microcrédito. O México hoje tem milhões desses changarros (vendinhas familiares) e o setor industrial está em contração. Isso é um grande problema no Peru, na Colôm-bia e em muitos outros países. É um país rico, mas o dinheiro não está indo para as empresas que estariam reduzindo a pobreza, mas as instituições financeiras privadas estão pegando recursos e investindo nesses changarros. É um pro-blema de longo prazo e de curto prazo também.

Rumos – O senhor citou as instituições financeiras pri-vadas, mas no Brasil há um predomínio da concessão do microcrédito por instituições públicas. Essa é uma realidade também encontrada em outros países? Bateman – Não. Na maioria dos países, o microcrédito é pro-

Um outro olhar

Por Jader Moraes

videnciado mais por empresas realmente centralizadas no lucro, tais como bancos de investimento, porque os bancos privados podem fazer um grande lucro. No México, o Banco Compartamos é o maior banco de microcrédito, aplicando taxa de juros de até 195%. Isso gera um enorme resultado para o banco. Mas os clientes, as mulheres de um modo geral, não conseguem sair da pobreza por conta dessas altíssimas taxas de juros. Então, de fato, tem um impacto negativo sobre a pobreza. Está se observando nos últimos anos um grande crescimento da taxa de inadimplência do microcrédito. Em alguns lugares, as famílias têm até oito ou nove empréstimos. Não há redução da pobreza, mas sim um aumento de endivi-damento dos pobres. Ao mesmo tempo, evidentemente, quem providencia esse microcrédito pode ganhar muito dinheiro: quando o negócio [do pequeno empresário] que-bra, “então tudo bem, isso é uma coisa da vida”.

Outro exemplo vem da Bósnia. Os presidentes e gerentes seniores das instituições de microcrédito começaram a ganhar muito dinheiro. Em poucos anos, os indivíduos mais bem pagos na Bósnia eram os presidentes das instituições de microcrédito, e a indústria não conseguiu se reerguer. Os cli-entes dessas instituições, que pagam juros da ordem de 40, 45%, não têm nada que possam fazer para tornar isso um negócio sustentável. Então, de fato, tudo isso é sobre como fazer dinheiro, lucro com microcrédito e não o desenvolvi-mento real.

Há muitos estudos atuais, que estão sendo feitos por estu-dantes que estavam anunciando grandes reduções da pobreza por meio do microcrédito, e hoje dizem que tudo estava errado, não há evidência da redução de pobreza. É um choque para mui-tas pessoas que normalmente estavam apoiando a ideia do microcrédito, mas a realidade é crua.

Rumos – Gostaríamos de compreender: o modelo brasi-leiro de concessão de microcrédito é majoritariamente estatal e com taxas de juros que certamente não chegam aos 195% que o senhor citou; ao contrário, taxas de juros baixas e subsidiadas. A esse modelo cabem as mesmas críticas que o senhor tem feito às experiências interna-cionais, tão distintas? Bateman – Cabem sim, com certeza, porque têm as mesmas falhas fundamentais comparando com outros modelos. Vamos supor que eu queira abrir um salão, então vou querer 500 dólares e vou acreditar nele. Começo o meu negócio, faço a minha propaganda para atrair clientes. Esses clientes caem do céu ou vêm captados de outros negócios similares na região? Eu começo um negócio, tenho meu próprio emprego, tenho assistente, mas o outro cabeleireiro concorrente tem uma diminuição dos clientes dele, o que reduz, por exemplo, um emprego. Assim, não é uma criação de empregos: dois aqui e dois menos ali. A ideia de resolvermos a pobreza por meio do aumento de outros pequenos negócios similares na mesma comunidade não tem muita lógica. Mas se eu sou um político, vou ter que dizer aos pobres que nós estamos fazendo alguma coisa para resolver. Logo, vou mostrar o resultado

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Darei um exemplo de alguns anos atrás: nos bairros de Medellín (Colômbia), toda rua tem muitos locais que ven-dem, mesmo nas casas têm um pequeno comércio para a rua e todos vendendo os mesmos produtos – cerveja, refrigeran-te, itens de higiene. Nós [o grupo de sua pesquisa] conversá-vamos com as pessoas e perguntávamos qual era o problema. Alguns deles estavam lá há 20 anos. Eles falaram: “Há 20, éra-mos poucos e conseguíamos vender o suficiente para poder sobreviver”. Mas, hoje, com todo mundo tendo acesso a

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daquele que começou, que expandiu, para mostrar o que pode ser feito, mas sobre os outros que tiveram que fechar não se faz muita publicidade.

Rumos – Provavelmente é difícil mensurar em todo o uni-verso de contemplados quantos de fato são bem-sucedidos.Bateman – Existem estudos em alguns países que observam a taxa de sucesso. O Banco Mundial fez uma avaliação com um grupo de pessoas que começaram um micronegócio. Um ano depois, detectaram que 50% já haviam falido, porque quando se é pobre, se é desesperado, tenta-se vender qual-quer coisa para buscar sair da pobreza. Ou seja, o pobre tenta vender um produto e não dá certo; aí, pega outro microcrédi-to para tentar outra coisa para poder sobreviver; e assim pros-segue. Trabalhei na Bósnia antes do advento do microcrédito e depois, e a transformação foi muito triste, porque a Bósnia era uma economia industrial bem-sucedida. As atividades mudaram e se encontra nas ruas uma quantidade enorme tipi-camente de vendas com uma mesa na rua, e não é isso que os bósnios queriam depois da guerra. Eles queriam que as gran-des empresas voltassem com novas tecnologias e outras ini-ciativas neste sentido, mas o Banco Mundial direcionou para o microcrédito. Os bósnios têm um bom termo para isso para essa transformação, que é africanização. Eles transfor-maram uma economia industrial em algo que parece que qual-quer pessoa está tentando comprar ou vender ou produzir alguma coisa.

Rumos – Mudando um pouco o tema, queríamos conhecer sua análise, como economista, da situação glo-bal sete anos após o início da crise. Recentemente, uma pesquisa mostrou que a concentração de renda tem aumentado. Os países emergentes, que estavam de algu-ma forma blindados, também estão vivendo um

momento difícil agora. Como o senhor vê esse cenário? Bateman – A maioria de nós economistas, diga-mos heterodoxos, diria que um novo crash está anunciado, talvez em algum momento no ano que vem, e isso será causado pelo fato de que nós não corrigimos os problemas que ocasiona-

ram o evento em 2008. Os problemas causados à época foram por causa dos setores financeiros dos centros em Nova York e em Londres, e não fomos capazes de mudá-los, alterá-los. Depois de alguns anos, esses setores voltaram a fazer até pior do que estavam praticando antes. Os governos deram a eles muitos recursos para poder cobrir as perdas que tiveram. Esses recursos que foram dados para poder resgatar os bancos com problemas foram utilizados, depois, em outros locais em todo o mundo. Os bancos utilizaram esses recursos para investir nas economias e podiam ofertar taxas de juros muito baixas. Muitas pessoas no mundo usaram esses recursos baratos para investir em várias situações e especular, especialmente no Brasil. Quando as taxas de juros começam a subir, o que de fato aconteceu nos Estados Uni-dos, todos esses empréstimos que foram contratados a taxas muito baixas vão entrar em falência. Como disse Warren Buf-fett, “só quando a maré está baixa é que você pode ver quem de fato está utilizando uma sunga e quem não”. Quando as taxas básicas de juros subirem, neste momento vamos saber que investimentos realmente foram rentáveis e quais não foram. A situação é muito ruim, até o FMI está dizendo que estão muito preocupados com essa situação, e é porque não melhoramos o sistema financeiro.

Rumos – É possível pensar em alternativas? Bateman – Sim. O Brasil tem ótimos bancos de desenvolvi-mento e não são especulativos. O norte da Itália tem coopera-tivas financeiras fantásticas. Os países da Escandinávia tam-bém têm bancos muito bons e estáveis. O FMI fez um estudo sobre essas cooperativas financeiras, o efeito da crise sobre elas e elas foram muito mais resilientes após a crise. Por exemplo, no caso do Canadá, onde trabalhei, muitas pessoas estão sain-do dos grandes bancos para utilizar pequenos bancos coopera-tivos. O problema talvez não sejam os bancos comerciais, e sim os bancos financeiros.

umos – O microcrédito pode ser um instru-mento de desenvolvimento econômico das populações em vulnerabilidade social?Marcelo Neri – É sempre difícil chegar ao pobre,

em qualquer circunstância, mas principalmente com crédito, que não tem por objetivo dar boa oportunidade, mas sim fazer com que as pessoas aproveitem a boa oportunidade. A estrutura de programas que temos hoje cria facilidade em ter-mos de infraestrutura, especialmente agora com o aplicativo de celular [em referência ao projeto lançado recentemente pelo governo federal para beneficiários do Bolsa Família], que dá escala e torna relativamente viável a utopia de chegar aos mais pobres. O problema do Brasil talvez seja de que esta-mos muito focados nos pobres e talvez devêssemos olhar para os 40% mais pobres e não para os 5%, que é o conceito de prosperidade partilhado das metas da Organização das Nações Unidas (ONU).

Rumos – O senhor tem defendido que os governos devem assumir um papel mais enfático para proporcio-nar acesso ao mercado pelos mais pobres. Pode explicar como acredita que isso deve ser feito?Neri – O Bolsa Família está estruturado nos pilares de transfe-rência de renda, acesso aos serviços públicos e de geração de renda e inclusão produtiva. Teríamos que pensar em um quar-to pilar, de acesso ao mercado financeiro ou de bens, com a questão de defesa do consumidor, de educação financeira, por-que estamos lidando com pessoas pobres, muitas com baixa educação. Nos últimos anos, especialmente durante a crise eco-nômica mundial e também um pouco depois, demos os pobres aos mercados consumidores; falta agora dar “merca-dos decentes” aos pobres: dar possibilidade de escolha de pou-pança, de crédito, de seguro, por meio de ações estruturadas. Precisamos ser menos avessos e experimentar, tomando os cui-dados necessários. Nesse sentido, os programas estaduais ou

Reajustar o foco

O economista Marcelo Neri chegou a declarar, nos últimos anos, que o Brasil era o espelho do mundo – em termos, sobretudo, de ascensão dos mais pobres, ainda que a desigualdade permanecesse latente. Preocupado com a dimensão da crise política e também com as consequências da crise econômica nas regiões metropolitanas brasileiras, ele considera que, neste momento, ficamos para trás. Para um futuro mais próspero, o ex-ministro de Assuntos Estratégicos da Presidência da República acredita que o país deve ampliar o foco ao olhar para a população mais pobre e sugere uma receita: depois de oferecer os pobres ao mercado de consumo, o país devia se esforçar para oferecer um “mercado decente” aos pobres.

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Exemplo de pequeno estabelecimento comercial em Bangladesh. Para Bateman, por meio do microcrédito houve um aumento no número de empreendimentos como esse, que acabam competindo entre si pela clientela.

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daquele que começou, que expandiu, para mostrar o que pode ser feito, mas sobre os outros que tiveram que fechar não se faz muita publicidade.

Rumos – Provavelmente é difícil mensurar em todo o uni-verso de contemplados quantos de fato são bem-sucedidos.Bateman – Existem estudos em alguns países que observam a taxa de sucesso. O Banco Mundial fez uma avaliação com um grupo de pessoas que começaram um micronegócio. Um ano depois, detectaram que 50% já haviam falido, porque quando se é pobre, se é desesperado, tenta-se vender qual-quer coisa para buscar sair da pobreza. Ou seja, o pobre tenta vender um produto e não dá certo; aí, pega outro microcrédi-to para tentar outra coisa para poder sobreviver; e assim pros-segue. Trabalhei na Bósnia antes do advento do microcrédito e depois, e a transformação foi muito triste, porque a Bósnia era uma economia industrial bem-sucedida. As atividades mudaram e se encontra nas ruas uma quantidade enorme tipi-camente de vendas com uma mesa na rua, e não é isso que os bósnios queriam depois da guerra. Eles queriam que as gran-des empresas voltassem com novas tecnologias e outras ini-ciativas neste sentido, mas o Banco Mundial direcionou para o microcrédito. Os bósnios têm um bom termo para isso para essa transformação, que é africanização. Eles transfor-maram uma economia industrial em algo que parece que qual-quer pessoa está tentando comprar ou vender ou produzir alguma coisa.

Rumos – Mudando um pouco o tema, queríamos conhecer sua análise, como economista, da situação glo-bal sete anos após o início da crise. Recentemente, uma pesquisa mostrou que a concentração de renda tem aumentado. Os países emergentes, que estavam de algu-ma forma blindados, também estão vivendo um

momento difícil agora. Como o senhor vê esse cenário? Bateman – A maioria de nós economistas, diga-mos heterodoxos, diria que um novo crash está anunciado, talvez em algum momento no ano que vem, e isso será causado pelo fato de que nós não corrigimos os problemas que ocasiona-

ram o evento em 2008. Os problemas causados à época foram por causa dos setores financeiros dos centros em Nova York e em Londres, e não fomos capazes de mudá-los, alterá-los. Depois de alguns anos, esses setores voltaram a fazer até pior do que estavam praticando antes. Os governos deram a eles muitos recursos para poder cobrir as perdas que tiveram. Esses recursos que foram dados para poder resgatar os bancos com problemas foram utilizados, depois, em outros locais em todo o mundo. Os bancos utilizaram esses recursos para investir nas economias e podiam ofertar taxas de juros muito baixas. Muitas pessoas no mundo usaram esses recursos baratos para investir em várias situações e especular, especialmente no Brasil. Quando as taxas de juros começam a subir, o que de fato aconteceu nos Estados Uni-dos, todos esses empréstimos que foram contratados a taxas muito baixas vão entrar em falência. Como disse Warren Buf-fett, “só quando a maré está baixa é que você pode ver quem de fato está utilizando uma sunga e quem não”. Quando as taxas básicas de juros subirem, neste momento vamos saber que investimentos realmente foram rentáveis e quais não foram. A situação é muito ruim, até o FMI está dizendo que estão muito preocupados com essa situação, e é porque não melhoramos o sistema financeiro.

Rumos – É possível pensar em alternativas? Bateman – Sim. O Brasil tem ótimos bancos de desenvolvi-mento e não são especulativos. O norte da Itália tem coopera-tivas financeiras fantásticas. Os países da Escandinávia tam-bém têm bancos muito bons e estáveis. O FMI fez um estudo sobre essas cooperativas financeiras, o efeito da crise sobre elas e elas foram muito mais resilientes após a crise. Por exemplo, no caso do Canadá, onde trabalhei, muitas pessoas estão sain-do dos grandes bancos para utilizar pequenos bancos coopera-tivos. O problema talvez não sejam os bancos comerciais, e sim os bancos financeiros.

umos – O microcrédito pode ser um instru-mento de desenvolvimento econômico das populações em vulnerabilidade social?Marcelo Neri – É sempre difícil chegar ao pobre,

em qualquer circunstância, mas principalmente com crédito, que não tem por objetivo dar boa oportunidade, mas sim fazer com que as pessoas aproveitem a boa oportunidade. A estrutura de programas que temos hoje cria facilidade em ter-mos de infraestrutura, especialmente agora com o aplicativo de celular [em referência ao projeto lançado recentemente pelo governo federal para beneficiários do Bolsa Família], que dá escala e torna relativamente viável a utopia de chegar aos mais pobres. O problema do Brasil talvez seja de que esta-mos muito focados nos pobres e talvez devêssemos olhar para os 40% mais pobres e não para os 5%, que é o conceito de prosperidade partilhado das metas da Organização das Nações Unidas (ONU).

Rumos – O senhor tem defendido que os governos devem assumir um papel mais enfático para proporcio-nar acesso ao mercado pelos mais pobres. Pode explicar como acredita que isso deve ser feito?Neri – O Bolsa Família está estruturado nos pilares de transfe-rência de renda, acesso aos serviços públicos e de geração de renda e inclusão produtiva. Teríamos que pensar em um quar-to pilar, de acesso ao mercado financeiro ou de bens, com a questão de defesa do consumidor, de educação financeira, por-que estamos lidando com pessoas pobres, muitas com baixa educação. Nos últimos anos, especialmente durante a crise eco-nômica mundial e também um pouco depois, demos os pobres aos mercados consumidores; falta agora dar “merca-dos decentes” aos pobres: dar possibilidade de escolha de pou-pança, de crédito, de seguro, por meio de ações estruturadas. Precisamos ser menos avessos e experimentar, tomando os cui-dados necessários. Nesse sentido, os programas estaduais ou

Reajustar o foco

O economista Marcelo Neri chegou a declarar, nos últimos anos, que o Brasil era o espelho do mundo – em termos, sobretudo, de ascensão dos mais pobres, ainda que a desigualdade permanecesse latente. Preocupado com a dimensão da crise política e também com as consequências da crise econômica nas regiões metropolitanas brasileiras, ele considera que, neste momento, ficamos para trás. Para um futuro mais próspero, o ex-ministro de Assuntos Estratégicos da Presidência da República acredita que o país deve ampliar o foco ao olhar para a população mais pobre e sugere uma receita: depois de oferecer os pobres ao mercado de consumo, o país devia se esforçar para oferecer um “mercado decente” aos pobres.

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Exemplo de pequeno estabelecimento comercial em Bangladesh. Para Bateman, por meio do microcrédito houve um aumento no número de empreendimentos como esse, que acabam competindo entre si pela clientela.

RR REPORTAGEM Especial Ideias

Page 38: Rumos 284

municipais ligados ao Bolsa Família podem rapidamente construir essa infra-estrutura e testar, ao invés de tentarmos acertar na escala do Brasil, e ver até que ponto o programa funciona, quais são os efeitos. Acho que essa é uma agenda em que o Brasil está muito atrás. Avaliamos pouco aquilo que fazemos.

Rumos – Nos últimos anos, o senhor tem se dedicado à discussão sobre a classe média emergente brasileira. Como a crise que o país vive tem afe-tado esse segmento?Neri – Há três anos, publiquei um livro em que, com dados até 2009, fiz proje-ção para a classe média até 2014, e a eco-nomia teve brutal desaceleração nesse período. Mas, para minha surpresa, as projeções se revelaram até relativamen-te próximas, pois até 2014 o mercado de trabalho brasileiro permaneceu aqueci-do. Houve brutal reversão disso a partir de 2015, principalmente nas áreas metropolitanas, onde a renda está cain-do 6,5% per capita, uma queda muito pior do que a do Produto Interno Bruto (PIB). Contudo, se olharmos para o Bra-sil como um todo, surpreendentemente a queda é pequena. Acredito que há crise metropolitana, em que a classe C e as classes A e B devem estar sofrendo rever-sões, mas no plano nacional estamos parecidos com a situa-ção do fim dos anos 1990 – aquelas sucessivas crises exter-nas russa, asiática, culminando na crise do real –, quando a pobreza nacional e a própria classe C não mudaram de pata-mar. O que é um bom resultado, dado que a situação está difí-cil. Na década de 1990, o nome cunhado foi “crise de desem-prego metropolitana”; agora estamos voltando a viver isso. Em 1999 houve uma desvalorização real forte, então exis-tem semelhanças com o quadro atual, mas acredito que hoje a situação é mais complicada por causa da questão política e da questão emocional ou subjetiva, que depende de confian-ça e de popularidade do governo eleito, algo que não está acontecendo.

Há, também, um sentimento da população e uma polari-zação da sociedade brasileira que acentua as dificuldades. Se olharmos em termos objetivos, a sociedade brasileira nunca foi tão pouco polarizada em termos de renda e educação, os dois lados da “Belíndia” estão mais próximos do que nunca estiveram, ainda que permaneçam muito separados. Mas em um sentido psicológico, no sentido da cabeça das pessoas, existe um antagonismo forte, que está se refletindo na parte política e na parte econômica. Vivermos uma tensão eleito-ral no ano de eleição é muito custoso para o país, pois temos eleição de dois em dois anos, mas é natural. Agora, não dá

para viver mais três anos nessa situação, o custo é muito alto. Acho que a nossa situação é muito complicada.

Rumos – Um dos efeitos mais graves da crise tem sido o aumento da taxa de desemprego, especialmente entre os mais jovens. O quanto esse dado o preocupa?Neri – O desemprego mais alto dos jovens é até comum, mesmo fora de momentos de crise, porque o jovem ain-da não tem experiência, está em uma fase de experimentação, então tem difi-culdades de encontrar emprego. O que preocupa mais é o aumento da taxa de desemprego em geral. Essa taxa mede um pouco a temperatura das frustra-ções, e essa é uma das frustrações entre os jovens. Existem poucas políticas para a juventude, e poucas políticas na escala do problema. Quando atacamos os desafios desse segmento, fazemos de maneira um pouco artesanal, sem tes-tes. Isso é um problema, pois estamos com a maior juventude que o país já teve e jamais terá; o Brasil está no auge do bônus educacional e não consegue dire-cionar esses desafios.

Rumos – Em 2014, o senhor afirmava que o Brasil era o espelho do mundo, em referência às desigualdades, mas também à ascensão recente. Continuamos como espelho e essa crise que estamos vivendo também refle-te um pouco do que o mundo vive?Neri – Na fotografia sim, continuamos espelho; mas, se olharmos por um período maior, como em um filme, éramos muito próximos até 2013, a renda média brasileira era 94% da renda média mundial, o crescimento era de 3,5% e 3,6%, respectivamente; mas hoje o Brasil está pior do que o mundo em termos de movimento. A fotografia deve ser parecida por-que não muda tanto, o Brasil acaba sendo uma boa fotogra-fia, mas agora realmente o país descolou: neste momento de crise estamos crescendo menos do que o mundo.

RUMOS – 38 – Novembro/Dezembro 2015 RUMOS – 39 – Novembro/Dezembro 2015

Para discutir as experiências brasileiras de microcrédito e refletir sobre o papel desse mecanismo para o desenvolvi-mento econômico, a Associação Bras i le i ra de Desenvolvimento (ABDE), com patrocínio do Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (Sebrae), realizou o Seminário de Microcrédito Produtivo Orientado, na sede do Banco de Desenvolvimento de Minas Gerais (BDMG), em Belo Horizonte, no dia 23 de outubro.

O primeiro debate do evento foi mediado pelo presiden-te do BDMG e vice-presidente da ABDE, Marco Aurélio Crocco Afonso, com a participação dos economistas Marcelo Neri e Milford Bateman (ambos foram entrevista-dos pela Rumos, como o leitor conferiu nas páginas 34 a 38 desst edição).

Neri destacou a necessidade de avaliações e de alinha-mento de inovações na concessão do microcrédito, indicando como bom exemplo o CrediAmigo, do Banco do Nordeste, considerado por ele o “Grameen brasileiro”, em referência ao banco de microcrédito concebido pelo economista Muhammad Yunus em Bangladesh. Para o sucesso do microcrédito, Neri lembrou a importância do alinhamento entre os atores envolvidos, níveis de governo, apoios microempresariais e oferta de serviços financeiros.

O professor Milford Bateman, por sua vez, apresentou uma visão mais crítica sobre o microcrédito. De acordo com ele, o conceito de microcrédito é baseado em um equívoco, tendo em vista que a pobreza não é um problema de abastecimento, mas de demanda. Bateman afirmou que o mecanismo não pode ser encarado como alicerce de uma política verdadeira de desenvolvimento, pois ele não se sustenta no longo prazo.

Política pública – No segundo painel, mediado pelo geren-te da unidade de acesso a mercados e serviços financeiros do Sebrae, Alexandre Comin, os professores da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP), Carlos Eduardo Carvalho, e da Universidade de Brasília (UnB),

Franco de Matos, fizeram uma avaliação sobre o papel do microcrédito como política pública.

Para Carvalho, a concessão de microcrédito é uma políti-ca pública no Brasil porque o mercado financeiro não atende às necessidades dos mais pobres e porque as grandes institui-ções financeiras privilegiam atuações pró-cíclicas, seletivas e concentradoras. Carvalho defende que os subsídios públicos sejam explicitados de forma mais clara para a sociedade e que a mensuração de resultados seja ampliada.

Já Franco de Matos apresentou os resultados de uma pes-quisa sobre a política e a atividade de microcrédito como ins-trumentos de geração de trabalho e renda e inclusão produti-va. O estudo identificou a necessidade de revisão e harmoni-zação do marco legal da política de microcrédito e do Programa Nacional de Microcrédito Produtivo Orientado (PNMPO). De acordo com Matos, a orientação aos empre-sários é tão importante quanto o acesso ao crédito.

Experiência internacional – O terceiro painel apresentou duas instituições financeiras latino-americanas e foi media-do pelo especialista líder da divisão de mercados de capitais em instituições financeiras do BID, Luciano Schweizer. Pedro Villabon Gonzalez, do Bancóldex, falou sobre a atua-ção do banco de desenvolvimento empresarial do governo colombiano, que possui 15% dos clientes da carteira classifi-cados como microempresas e outros 37% como pequenas e médias. Ignacio Trigueros, do Bansefin, explicou como fun-ciona o banco social do México, instituição que chega a comunidades onde outros bancos comerciais não têm pre-sença e possui uma cobertura de serviços financeiros que atende 38% dos municípios mexicanos.

Microcrédito no Brasil – O secretário-executivo da ABDE, Marco Antonio de Araujo Lima, mediou o último painel, dedicado a instituições financeiras brasileiras que ofe-recem o microcrédito. Em um leque de várias modalidades distintas de instituições, participaram Paulo Antonio Ribeiro, do Banco Cooperativo do Brasil (Bancoob); Paulo Roberto Monteiro, do BNDES; Manoel Neto, do Banco do Nordeste; Rodrigo Herval, da Agência de Fomento de Santa Catarina (Badesc); e Márcia Fernandes, do Banco do Brasil (BB). Eles explicaram sobre as características dos programas de microcrédito em suas instituições, quais são os desafios e os principais resultados já alcançados.

Todas as apresentações realizadas no seminário estão disponíveis no site da ABDE.

Seminário debate papel do microcrédito

Mesa de abertura do evento, com as presenças de Alexandre Comin (Sebrae), Marco Aurélio Crocco Afonso (BDMG), Milton Luiz de Melo Santos (Desenvolve SP-ABDE) e Luciano Schweizer (BID).

Texto com colaboração de Wagner Concha (Comunicação BDMG).

Marcelo Neri participou, junto com Milford Bateman, do Seminário

ABDE sobre Microcrédito Produtivo Orientado. Confira a cobertura

do evento na página ao lado.

[...] a sociedade brasileira nunca foi

tão pouco polarizada em termos de renda e

educação, os dois lados da “Belíndia”

estão mais próximos do que nunca

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municipais ligados ao Bolsa Família podem rapidamente construir essa infra-estrutura e testar, ao invés de tentarmos acertar na escala do Brasil, e ver até que ponto o programa funciona, quais são os efeitos. Acho que essa é uma agenda em que o Brasil está muito atrás. Avaliamos pouco aquilo que fazemos.

Rumos – Nos últimos anos, o senhor tem se dedicado à discussão sobre a classe média emergente brasileira. Como a crise que o país vive tem afe-tado esse segmento?Neri – Há três anos, publiquei um livro em que, com dados até 2009, fiz proje-ção para a classe média até 2014, e a eco-nomia teve brutal desaceleração nesse período. Mas, para minha surpresa, as projeções se revelaram até relativamen-te próximas, pois até 2014 o mercado de trabalho brasileiro permaneceu aqueci-do. Houve brutal reversão disso a partir de 2015, principalmente nas áreas metropolitanas, onde a renda está cain-do 6,5% per capita, uma queda muito pior do que a do Produto Interno Bruto (PIB). Contudo, se olharmos para o Bra-sil como um todo, surpreendentemente a queda é pequena. Acredito que há crise metropolitana, em que a classe C e as classes A e B devem estar sofrendo rever-sões, mas no plano nacional estamos parecidos com a situa-ção do fim dos anos 1990 – aquelas sucessivas crises exter-nas russa, asiática, culminando na crise do real –, quando a pobreza nacional e a própria classe C não mudaram de pata-mar. O que é um bom resultado, dado que a situação está difí-cil. Na década de 1990, o nome cunhado foi “crise de desem-prego metropolitana”; agora estamos voltando a viver isso. Em 1999 houve uma desvalorização real forte, então exis-tem semelhanças com o quadro atual, mas acredito que hoje a situação é mais complicada por causa da questão política e da questão emocional ou subjetiva, que depende de confian-ça e de popularidade do governo eleito, algo que não está acontecendo.

Há, também, um sentimento da população e uma polari-zação da sociedade brasileira que acentua as dificuldades. Se olharmos em termos objetivos, a sociedade brasileira nunca foi tão pouco polarizada em termos de renda e educação, os dois lados da “Belíndia” estão mais próximos do que nunca estiveram, ainda que permaneçam muito separados. Mas em um sentido psicológico, no sentido da cabeça das pessoas, existe um antagonismo forte, que está se refletindo na parte política e na parte econômica. Vivermos uma tensão eleito-ral no ano de eleição é muito custoso para o país, pois temos eleição de dois em dois anos, mas é natural. Agora, não dá

para viver mais três anos nessa situação, o custo é muito alto. Acho que a nossa situação é muito complicada.

Rumos – Um dos efeitos mais graves da crise tem sido o aumento da taxa de desemprego, especialmente entre os mais jovens. O quanto esse dado o preocupa?Neri – O desemprego mais alto dos jovens é até comum, mesmo fora de momentos de crise, porque o jovem ain-da não tem experiência, está em uma fase de experimentação, então tem difi-culdades de encontrar emprego. O que preocupa mais é o aumento da taxa de desemprego em geral. Essa taxa mede um pouco a temperatura das frustra-ções, e essa é uma das frustrações entre os jovens. Existem poucas políticas para a juventude, e poucas políticas na escala do problema. Quando atacamos os desafios desse segmento, fazemos de maneira um pouco artesanal, sem tes-tes. Isso é um problema, pois estamos com a maior juventude que o país já teve e jamais terá; o Brasil está no auge do bônus educacional e não consegue dire-cionar esses desafios.

Rumos – Em 2014, o senhor afirmava que o Brasil era o espelho do mundo, em referência às desigualdades, mas também à ascensão recente. Continuamos como espelho e essa crise que estamos vivendo também refle-te um pouco do que o mundo vive?Neri – Na fotografia sim, continuamos espelho; mas, se olharmos por um período maior, como em um filme, éramos muito próximos até 2013, a renda média brasileira era 94% da renda média mundial, o crescimento era de 3,5% e 3,6%, respectivamente; mas hoje o Brasil está pior do que o mundo em termos de movimento. A fotografia deve ser parecida por-que não muda tanto, o Brasil acaba sendo uma boa fotogra-fia, mas agora realmente o país descolou: neste momento de crise estamos crescendo menos do que o mundo.

RUMOS – 38 – Novembro/Dezembro 2015 RUMOS – 39 – Novembro/Dezembro 2015

Para discutir as experiências brasileiras de microcrédito e refletir sobre o papel desse mecanismo para o desenvolvi-mento econômico, a Associação Bras i le i ra de Desenvolvimento (ABDE), com patrocínio do Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (Sebrae), realizou o Seminário de Microcrédito Produtivo Orientado, na sede do Banco de Desenvolvimento de Minas Gerais (BDMG), em Belo Horizonte, no dia 23 de outubro.

O primeiro debate do evento foi mediado pelo presiden-te do BDMG e vice-presidente da ABDE, Marco Aurélio Crocco Afonso, com a participação dos economistas Marcelo Neri e Milford Bateman (ambos foram entrevista-dos pela Rumos, como o leitor conferiu nas páginas 34 a 38 desst edição).

Neri destacou a necessidade de avaliações e de alinha-mento de inovações na concessão do microcrédito, indicando como bom exemplo o CrediAmigo, do Banco do Nordeste, considerado por ele o “Grameen brasileiro”, em referência ao banco de microcrédito concebido pelo economista Muhammad Yunus em Bangladesh. Para o sucesso do microcrédito, Neri lembrou a importância do alinhamento entre os atores envolvidos, níveis de governo, apoios microempresariais e oferta de serviços financeiros.

O professor Milford Bateman, por sua vez, apresentou uma visão mais crítica sobre o microcrédito. De acordo com ele, o conceito de microcrédito é baseado em um equívoco, tendo em vista que a pobreza não é um problema de abastecimento, mas de demanda. Bateman afirmou que o mecanismo não pode ser encarado como alicerce de uma política verdadeira de desenvolvimento, pois ele não se sustenta no longo prazo.

Política pública – No segundo painel, mediado pelo geren-te da unidade de acesso a mercados e serviços financeiros do Sebrae, Alexandre Comin, os professores da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP), Carlos Eduardo Carvalho, e da Universidade de Brasília (UnB),

Franco de Matos, fizeram uma avaliação sobre o papel do microcrédito como política pública.

Para Carvalho, a concessão de microcrédito é uma políti-ca pública no Brasil porque o mercado financeiro não atende às necessidades dos mais pobres e porque as grandes institui-ções financeiras privilegiam atuações pró-cíclicas, seletivas e concentradoras. Carvalho defende que os subsídios públicos sejam explicitados de forma mais clara para a sociedade e que a mensuração de resultados seja ampliada.

Já Franco de Matos apresentou os resultados de uma pes-quisa sobre a política e a atividade de microcrédito como ins-trumentos de geração de trabalho e renda e inclusão produti-va. O estudo identificou a necessidade de revisão e harmoni-zação do marco legal da política de microcrédito e do Programa Nacional de Microcrédito Produtivo Orientado (PNMPO). De acordo com Matos, a orientação aos empre-sários é tão importante quanto o acesso ao crédito.

Experiência internacional – O terceiro painel apresentou duas instituições financeiras latino-americanas e foi media-do pelo especialista líder da divisão de mercados de capitais em instituições financeiras do BID, Luciano Schweizer. Pedro Villabon Gonzalez, do Bancóldex, falou sobre a atua-ção do banco de desenvolvimento empresarial do governo colombiano, que possui 15% dos clientes da carteira classifi-cados como microempresas e outros 37% como pequenas e médias. Ignacio Trigueros, do Bansefin, explicou como fun-ciona o banco social do México, instituição que chega a comunidades onde outros bancos comerciais não têm pre-sença e possui uma cobertura de serviços financeiros que atende 38% dos municípios mexicanos.

Microcrédito no Brasil – O secretário-executivo da ABDE, Marco Antonio de Araujo Lima, mediou o último painel, dedicado a instituições financeiras brasileiras que ofe-recem o microcrédito. Em um leque de várias modalidades distintas de instituições, participaram Paulo Antonio Ribeiro, do Banco Cooperativo do Brasil (Bancoob); Paulo Roberto Monteiro, do BNDES; Manoel Neto, do Banco do Nordeste; Rodrigo Herval, da Agência de Fomento de Santa Catarina (Badesc); e Márcia Fernandes, do Banco do Brasil (BB). Eles explicaram sobre as características dos programas de microcrédito em suas instituições, quais são os desafios e os principais resultados já alcançados.

Todas as apresentações realizadas no seminário estão disponíveis no site da ABDE.

Seminário debate papel do microcrédito

Mesa de abertura do evento, com as presenças de Alexandre Comin (Sebrae), Marco Aurélio Crocco Afonso (BDMG), Milton Luiz de Melo Santos (Desenvolve SP-ABDE) e Luciano Schweizer (BID).

Texto com colaboração de Wagner Concha (Comunicação BDMG).

Marcelo Neri participou, junto com Milford Bateman, do Seminário

ABDE sobre Microcrédito Produtivo Orientado. Confira a cobertura

do evento na página ao lado.

[...] a sociedade brasileira nunca foi

tão pouco polarizada em termos de renda e

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Por Jader Moraes

endo o Banco Cooperativo do Brasil (Bancoob) como anfitrião, o país recebeu pela primeira vez o Congresso da Confederação Internacional dos Bancos Populares (CIBP), que chegou à sua 29ª

edição reunindo mais de 350 participantes, de diferentes naci-onalidades, no Rio de Janeiro, entre os dias 18 e 20 de outubro. Em debate, a inovação, considerada elemento fundamental para que cooperativas e bancos populares se adaptem aos novos tempos e aos novos clientes, jovens e tecnológicos.

Na abertura do encontro, o chefe de Gabinete da Diretoria de Organização do Sistema Financeiro e Controle de Opera-ções de Crédito Rural do Banco Central, José Reynaldo de Almeida Furlani, explicou que no sistema financeiro brasileiro não há a figura do banco popular, como em outros países, mas esse modelo assemelha-se ao que aqui se denominam os ban-cos cooperativos. Ele expôs a estrutura do sistema cooperativo de crédito no país e falou sobre as novas classificações de coo-perativa de crédito, a partir da Resolução nº 4.434, deste ano, que, entre outros temas, instituiu nova classificação.

No país, explicou Furlani, existem quatro confederações de cooperativas de crédito, que juntas possuem mais de 7,5 milhões de cooperados. Nos últimos cinco anos, essas coope-rativas registraram expansão de 75% e hoje já representam 19% da rede de atendimento de crédito no país.

Uma das principais instituições financeiras desse sistema é o Bancoob, que abriu o primeiro painel do evento, por meio de seu presidente Marco Aurelio Almada. Em sua fala, Almada fez um histórico da atuação das cooperativas de crédito no país desde os primeiros grupos em 1902 até a consolidação da orga-nização sistêmica das cooperativas, iniciado em 2010, com estí-mulo do Banco Central.

Essa consolidação, explicou Almada, tem como base três pilares: a verticalização, com o surgimento dos bancos, que deram escala ao trabalho das cooperativas; o marco regulató-rio, que aperfeiçoou o sistema e aproximou as cooperativas do órgão regulador; e a criação das entidades sistêmicas de prote-ção, como as auditorias cooperativas e o Fundo Garantidor.

“Nesses últimos anos, crescemos mais do que os bancos tradicionais, que estão majoritariamente concentrados nas grandes metrópoles, enquanto 70% das cooperativas estão nas pequenas cidades”, afirmou Almada, reforçando que ser um

COOPERATIVAS

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Congresso internacional reúne bancos populares e cooperativos de dife-rentes lugares do mundo para debater os desafios do segmento em tem-pos tecnológicos; no Brasil, setor cresceu mais de 75% nos últimos cinco anos

banco da localidade é uma vantagem competitiva das coopera-tivas, que têm buscado estar unidas. “Temos trabalhado para construir pontes em nosso sistema cooperativo, pois acredita-mos que nosso país precisa de entidades financeiras que equili-brem condições comerciais competitivas com elementos de economia social, como é o nosso caso”, completou.

Ao lado do presidente do Sistema de Crédito Cooperativo (Sicredi), Edson Nassar, Almada elencou os desafios que estão colocados para o sistema cooperativo de crédito atualmente: crescer em relevância no Sistema Financeiro Nacional, aumentar a participação em regiões metropolitanas, expandir a presença no segmento de pessoas jurídicas – especialmente pequenos negócios – e criar canais digitais de atendimento, entre outros.

Para Edson Nassar, existem grandes oportunidades para o setor cooperativo brasileiro, uma vez que a taxa de bancariza-ção no país é de 60% da população economicamente ativa, enquanto em países desenvolvidos ultrapassa os 97%. Para res-ponder ao desafio de integrar-se à nova geração, dos Millenni-als [jovens imersos no ambiente tecnológico, nascidos após a década de 1980] ele lembrou que as ferramentas colaborativas que hoje fazem sucesso entre os jovens (por meio de aplicati-vos e sites como o Airbnb, de hospedagens, e o Waze e o Moo-vit, de transportes) estão profundamente sintonizadas com o espírito das cooperativas. “Se pensarmos bem, colaboração é o nosso DNA, está no centro do conceito de cooperativismo. Somos modernos e estamos conectados a esses novos tem-pos”, afirmou Nassar.

Inovação – O principal tema do encontro foi a inovação e um dos principais painelistas convidados, o norte-americano Geor-ge Hofheimer, executivo do Instituto de Pesquisas Filene, orga-nização especializada em análises sobre o futuro das cooperati-vas de crédito, tratou de desmistificar o assunto. De acordo com ele, a inovação caracteriza-se por processos que atendam a novas necessidades ou que resolvam antigos problemas de formas completamente novas.

Hofheimer lembrou que as instituições financeiras pos-suem desafios específicos para inovar, pois são diferentes de outros segmentos, principalmente por serem altamente regu-ladas, fazerem função intermediária e serem gestoras de risco –

R REPORTAGEM

RUMOS – 40 – Novembro/Dezembro 2015 RUMOS – 41 – Novembro/Dezembro 2015

e a inovação, explicou, é justamente correr riscos. “Precisamos ser ainda mais criativos para lidar com nosso público”, avaliou, afirmando que apoiar ideias inovadoras exige paciência – uma grande ideia não precisa ser executada imediatamente. “Apos-te na ideia, faça um protótipo, convide pessoas para opinar, tes-te... e só então desenvolva”, ensinou, referindo-se a esses pas-sos como o “processo da inovação”.

“Esse processo começa com insights e trabalhar com eles é essencial, muitas vezes ajudam a encontrar novos perfis ino-vadores dentro do corpo funcional. No DNA das instituições cooperativas está o olhar para os problemas sob a ótica do con-sumidor, essa é a sua essência. E é daí que nascem os insights”, afirmou, dando um último conselho aos presentes: “Se algum projeto não for bem-sucedido, não existe uma culpa nele. Esse fracasso, ao contrário, pode ter gerado ideias que poderão ser-vir para outras experiências”.

Citando exemplos de empresas fora do sistema bancário que hoje já oferecem empréstimos rápidos aos pequenos negó-cios nos Estados Unidos, em ambiente digital e em processo rápido, Hofheimer chamou a atenção para a necessidade de reinvenção das instituições de crédito. “Hoje, o cliente compa-ra o serviço, não a empresa; o que significa que ele não vai com-parar um sistema cooperativo com outro sistema cooperativo, mas sim os serviços que estes oferecem com outros serviços que ele utiliza”, explicou.

Relatos e ações de diferentes países – França, Alemanha, Marrocos, Itália, Argentina, entre outros – foram apresenta-dos durante o encontro e expuseram modelos bem-sucedidos de inovação na área de atendimento e crédito.

Para Dirk Vater, especialista em serviços financeiros, tam-bém palestrante do encontro, a crescente digitalização do mun-do é uma tendência da sociedade e os diferentes setores da eco-nomia devem se adaptar a essa mudança, gostem ou não das tecnologias. “No setor bancário esse processo é mais lento por-que há uma regulação mais forte. Mas isso não vai segurar esse movimento de digitalização, e vemos que os bancos já estão se transformando. Em todo o mundo, mais de 50% das transa-

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Inovação, a chavepara o futuro

ções bancárias são pela internet. No Brasil, ainda são pouco mais de 30%, mas vai crescer.”

Vater destacou que hoje a mudança no comportamento dos clientes acontece de forma muito mais acelerada do que no passado e a agência física está perdendo o lugar de mono-pólio na relação dos clientes com a instituição financeira. Para se adaptarem à mudança do negócio, que em pouco tempo será majoritariamente digital, as empresas devem criar expe-riências para os clientes que sejam baseadas na tecnologia; redefinir o papel da área de Tecnologia da Informação (TI) como vital para o negócio, com a alocação dos “melhores cére-bros” da empresa nesse setor; e se organizarem como empre-sas inovadoras.

Desafios – Thomas Puschmann, diretor do Instituto de Enge-nharia de Negócios St. Gallen (Suíça), defendeu em sua palestra que a inovação tem que acontecer em três dimensões: nos siste-mas de TI; na estratégia, com novos modelos de negócio; e tam-bém em um nível organizacional, o que envolve a mudança da cultura das instituições – esse é justamente o ponto mais difícil.

Assim como Hofheimer, Puschmann lembrou que muitas empresas e startups fora do sistema bancário tradicional já estão oferecendo serviços do setor financeiro, como paga-mentos online, financiamentos e investimentos.

“Qual o impacto disso para o sistema bancário? Temos que analisar essas tecnologias de perto, nos prepararmos para a era digital e nos perguntarmos se nossos sistemas estão pre-parados para essa nova etapa. É fundamental uma aproxima-ção com as startups, antes que tenhamos que correr atrás delas”, alertou.

Atento aos alertas e expressando as grandes preocupações do sistema nos próximos anos, especialmente para tornar o modelo de negócio mais conhecido pelos cidadãos, o presi-dente do CIBP, Mohamed Benchaaboun, acredita que a inova-ção será uma alavanca para bancos populares e cooperativos, pois as instituições possuem capacidade de se antecipar para implantar esse modelo de banco digital.

Marco Aurelio Almada, diretor-presidente do Bancoob, destacou o processo de consolidação do sistema cooperativo de crédito nos últimos anos. Ele participou doprimeiro painel do evento, dedicado às experiências brasileiras.

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Por Jader Moraes

endo o Banco Cooperativo do Brasil (Bancoob) como anfitrião, o país recebeu pela primeira vez o Congresso da Confederação Internacional dos Bancos Populares (CIBP), que chegou à sua 29ª

edição reunindo mais de 350 participantes, de diferentes naci-onalidades, no Rio de Janeiro, entre os dias 18 e 20 de outubro. Em debate, a inovação, considerada elemento fundamental para que cooperativas e bancos populares se adaptem aos novos tempos e aos novos clientes, jovens e tecnológicos.

Na abertura do encontro, o chefe de Gabinete da Diretoria de Organização do Sistema Financeiro e Controle de Opera-ções de Crédito Rural do Banco Central, José Reynaldo de Almeida Furlani, explicou que no sistema financeiro brasileiro não há a figura do banco popular, como em outros países, mas esse modelo assemelha-se ao que aqui se denominam os ban-cos cooperativos. Ele expôs a estrutura do sistema cooperativo de crédito no país e falou sobre as novas classificações de coo-perativa de crédito, a partir da Resolução nº 4.434, deste ano, que, entre outros temas, instituiu nova classificação.

No país, explicou Furlani, existem quatro confederações de cooperativas de crédito, que juntas possuem mais de 7,5 milhões de cooperados. Nos últimos cinco anos, essas coope-rativas registraram expansão de 75% e hoje já representam 19% da rede de atendimento de crédito no país.

Uma das principais instituições financeiras desse sistema é o Bancoob, que abriu o primeiro painel do evento, por meio de seu presidente Marco Aurelio Almada. Em sua fala, Almada fez um histórico da atuação das cooperativas de crédito no país desde os primeiros grupos em 1902 até a consolidação da orga-nização sistêmica das cooperativas, iniciado em 2010, com estí-mulo do Banco Central.

Essa consolidação, explicou Almada, tem como base três pilares: a verticalização, com o surgimento dos bancos, que deram escala ao trabalho das cooperativas; o marco regulató-rio, que aperfeiçoou o sistema e aproximou as cooperativas do órgão regulador; e a criação das entidades sistêmicas de prote-ção, como as auditorias cooperativas e o Fundo Garantidor.

“Nesses últimos anos, crescemos mais do que os bancos tradicionais, que estão majoritariamente concentrados nas grandes metrópoles, enquanto 70% das cooperativas estão nas pequenas cidades”, afirmou Almada, reforçando que ser um

COOPERATIVAS

T

Congresso internacional reúne bancos populares e cooperativos de dife-rentes lugares do mundo para debater os desafios do segmento em tem-pos tecnológicos; no Brasil, setor cresceu mais de 75% nos últimos cinco anos

banco da localidade é uma vantagem competitiva das coopera-tivas, que têm buscado estar unidas. “Temos trabalhado para construir pontes em nosso sistema cooperativo, pois acredita-mos que nosso país precisa de entidades financeiras que equili-brem condições comerciais competitivas com elementos de economia social, como é o nosso caso”, completou.

Ao lado do presidente do Sistema de Crédito Cooperativo (Sicredi), Edson Nassar, Almada elencou os desafios que estão colocados para o sistema cooperativo de crédito atualmente: crescer em relevância no Sistema Financeiro Nacional, aumentar a participação em regiões metropolitanas, expandir a presença no segmento de pessoas jurídicas – especialmente pequenos negócios – e criar canais digitais de atendimento, entre outros.

Para Edson Nassar, existem grandes oportunidades para o setor cooperativo brasileiro, uma vez que a taxa de bancariza-ção no país é de 60% da população economicamente ativa, enquanto em países desenvolvidos ultrapassa os 97%. Para res-ponder ao desafio de integrar-se à nova geração, dos Millenni-als [jovens imersos no ambiente tecnológico, nascidos após a década de 1980] ele lembrou que as ferramentas colaborativas que hoje fazem sucesso entre os jovens (por meio de aplicati-vos e sites como o Airbnb, de hospedagens, e o Waze e o Moo-vit, de transportes) estão profundamente sintonizadas com o espírito das cooperativas. “Se pensarmos bem, colaboração é o nosso DNA, está no centro do conceito de cooperativismo. Somos modernos e estamos conectados a esses novos tem-pos”, afirmou Nassar.

Inovação – O principal tema do encontro foi a inovação e um dos principais painelistas convidados, o norte-americano Geor-ge Hofheimer, executivo do Instituto de Pesquisas Filene, orga-nização especializada em análises sobre o futuro das cooperati-vas de crédito, tratou de desmistificar o assunto. De acordo com ele, a inovação caracteriza-se por processos que atendam a novas necessidades ou que resolvam antigos problemas de formas completamente novas.

Hofheimer lembrou que as instituições financeiras pos-suem desafios específicos para inovar, pois são diferentes de outros segmentos, principalmente por serem altamente regu-ladas, fazerem função intermediária e serem gestoras de risco –

R REPORTAGEM

RUMOS – 40 – Novembro/Dezembro 2015 RUMOS – 41 – Novembro/Dezembro 2015

e a inovação, explicou, é justamente correr riscos. “Precisamos ser ainda mais criativos para lidar com nosso público”, avaliou, afirmando que apoiar ideias inovadoras exige paciência – uma grande ideia não precisa ser executada imediatamente. “Apos-te na ideia, faça um protótipo, convide pessoas para opinar, tes-te... e só então desenvolva”, ensinou, referindo-se a esses pas-sos como o “processo da inovação”.

“Esse processo começa com insights e trabalhar com eles é essencial, muitas vezes ajudam a encontrar novos perfis ino-vadores dentro do corpo funcional. No DNA das instituições cooperativas está o olhar para os problemas sob a ótica do con-sumidor, essa é a sua essência. E é daí que nascem os insights”, afirmou, dando um último conselho aos presentes: “Se algum projeto não for bem-sucedido, não existe uma culpa nele. Esse fracasso, ao contrário, pode ter gerado ideias que poderão ser-vir para outras experiências”.

Citando exemplos de empresas fora do sistema bancário que hoje já oferecem empréstimos rápidos aos pequenos negó-cios nos Estados Unidos, em ambiente digital e em processo rápido, Hofheimer chamou a atenção para a necessidade de reinvenção das instituições de crédito. “Hoje, o cliente compa-ra o serviço, não a empresa; o que significa que ele não vai com-parar um sistema cooperativo com outro sistema cooperativo, mas sim os serviços que estes oferecem com outros serviços que ele utiliza”, explicou.

Relatos e ações de diferentes países – França, Alemanha, Marrocos, Itália, Argentina, entre outros – foram apresenta-dos durante o encontro e expuseram modelos bem-sucedidos de inovação na área de atendimento e crédito.

Para Dirk Vater, especialista em serviços financeiros, tam-bém palestrante do encontro, a crescente digitalização do mun-do é uma tendência da sociedade e os diferentes setores da eco-nomia devem se adaptar a essa mudança, gostem ou não das tecnologias. “No setor bancário esse processo é mais lento por-que há uma regulação mais forte. Mas isso não vai segurar esse movimento de digitalização, e vemos que os bancos já estão se transformando. Em todo o mundo, mais de 50% das transa-

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Inovação, a chavepara o futuro

ções bancárias são pela internet. No Brasil, ainda são pouco mais de 30%, mas vai crescer.”

Vater destacou que hoje a mudança no comportamento dos clientes acontece de forma muito mais acelerada do que no passado e a agência física está perdendo o lugar de mono-pólio na relação dos clientes com a instituição financeira. Para se adaptarem à mudança do negócio, que em pouco tempo será majoritariamente digital, as empresas devem criar expe-riências para os clientes que sejam baseadas na tecnologia; redefinir o papel da área de Tecnologia da Informação (TI) como vital para o negócio, com a alocação dos “melhores cére-bros” da empresa nesse setor; e se organizarem como empre-sas inovadoras.

Desafios – Thomas Puschmann, diretor do Instituto de Enge-nharia de Negócios St. Gallen (Suíça), defendeu em sua palestra que a inovação tem que acontecer em três dimensões: nos siste-mas de TI; na estratégia, com novos modelos de negócio; e tam-bém em um nível organizacional, o que envolve a mudança da cultura das instituições – esse é justamente o ponto mais difícil.

Assim como Hofheimer, Puschmann lembrou que muitas empresas e startups fora do sistema bancário tradicional já estão oferecendo serviços do setor financeiro, como paga-mentos online, financiamentos e investimentos.

“Qual o impacto disso para o sistema bancário? Temos que analisar essas tecnologias de perto, nos prepararmos para a era digital e nos perguntarmos se nossos sistemas estão pre-parados para essa nova etapa. É fundamental uma aproxima-ção com as startups, antes que tenhamos que correr atrás delas”, alertou.

Atento aos alertas e expressando as grandes preocupações do sistema nos próximos anos, especialmente para tornar o modelo de negócio mais conhecido pelos cidadãos, o presi-dente do CIBP, Mohamed Benchaaboun, acredita que a inova-ção será uma alavanca para bancos populares e cooperativos, pois as instituições possuem capacidade de se antecipar para implantar esse modelo de banco digital.

Marco Aurelio Almada, diretor-presidente do Bancoob, destacou o processo de consolidação do sistema cooperativo de crédito nos últimos anos. Ele participou doprimeiro painel do evento, dedicado às experiências brasileiras.

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m dos principais elementos motivadores de minha colaboração para a formulação do Planeja-mento Estratégico do Sistema Nacional de Fomento 2016-2019 foi o fato de esta iniciativa

ter sido decorrente de um compromisso prioritário assumido pela Diretoria da ABDE recentemente eleita.

Este compromisso das lideranças é uma das premissas basilares do sucesso de qualquer processo de planejamento estratégico, e que, neste caso, se mostra ainda mais relevante por tratar-se de um “sistema”, composto por diferentes insti-tuições e lideranças, cuja complementaridade de atuação e de estratégias passa a ser planejada.

Para tanto, este processo de Planejamento Estratégico uti-liza-se de uma metodologia eminentemente participativa, e focada na construção conjunta tanto das suas diretrizes, como dos demais elementos que a compõem (objetivos, indi-cadores, metas, iniciativas/plano de ação), tendo como refe-rência o conceito de “Balanced Scorecard de Segunda Gera-ção”, que criei há cerca de 15 anos, e venho aprimorando, como sendo uma proposta de superação dos principais pro-blemas e barreiras comumente encontradas em práticas de implementação da gestão da estratégia pelas organizações.

Neste sentido, entendemos que outro elemento basilar para o sucesso de um processo de planejamento estratégico é a adoção de uma metodologia adequada que, além de promover a participação efetiva do maior número possível de colabora-dores, possibilite que esta participação ocorra de forma estru-turada e dinâmica, em um curto prazo. Neste caso, de cerca de 3 a 4 meses, garantindo assim mais tempo para seu processo de implementação, diferentemente da maioria dos casos nos quais tal processo costuma se alongar por cerca de 12 a 24 meses, o que, muitas vezes, torna sua execução inviável.

Por meio desta participação efetiva, são coletadas as dife-rentes percepções dos atores envolvidos, e a partir daí é defi-nida uma estratégia que considere as especificidades, a cultu-ra e os valores das instituições, desenvolvendo assim, prelimi-narmente, o que costumo chamar de “estratégia para a for-mulação, implementação e gestão da estratégia”.

No caso do planejamento estratégico em curso, do SNF, esta estratégia preliminar foi sendo construída e adotada desde

dali, do compromisso de cada uma daquelas lideranças (e cada vez mais também de suas equipes).

Com base no material decorrente destas primeiras reu-niões com as lideranças, que foi complementado com contri-buições de suas equipes, elaboramos uma primeira proposta de Mapa Estratégico, conforme apresentado a seguir:

Após mais algumas rodadas de reuniões, foram definidas descrições para cada um destes objetivos estratégicos, para os quais, na sequência, se definiram “fatores críticos de monito-ramento”, seguidos de uma lista preliminar de indicadores, que foram priorizados e para os quais foram definidas metas que, por sua vez, passaram a servir de referência para a defini-ção das iniciativas estratégicas, assim como da intensidade do esforço necessário para alcançá-las.

Finalmente estas iniciativas de curto, médio e longo pra-zos (subdivididas em “estruturantes” e “estratégicas”) foram sistematizadas na forma de projetos, com suas respectivas definições de prazos, entregas, responsabilidades etc., e que passaram a incorporar o Plano Estratégico do SNF, que foi apresentado e validado recentemente na Assembleia Geral da ABDE, do dia 26 de novembro, e passa agora à sua etapa de implementação, em que o compromisso de todos os inte-grantes do SNF passa a ser ainda mais fundamental.

AARTIGO

a nossa primeira reunião, quando os dirigentes da ABDE com-ponentes do SNF definiram em assembleia uma lista de cinco diretrizes estratégicas. A partir daí, tivemos uma nova reunião de Planejamento, com uma “Assembleia ampliada”, na qual rea-lizamos uma dinâmica de “Planejamento Desestruturado”, com o objetivo de alinhamento conceitual e conhecimento por todas as lideranças da metodologia que seria adotada no processo.

Neste primeiro momento, buscamos o ali-nhamento de entendimento até mesmo do conceito e da importância de elaboração de um processo de planejamento, cuja impor-tância creio ser facilmente reconhecida pela compreensão de seu contrário: o improviso. Assim, entendemos que planejar significa, antes de tudo, atuar de forma não improvisa-da. Significa pensar antes de agir, preparar-se sistematicamente para a ação, de forma não impensada e/ou improvisada, definindo uma estratégia para tanto.

A origem da palavra estratégia, populari-zada em uma cena do filme Tropa de Elite, nos sinaliza a importância de sua adoção, especi-almente em um “sistema” como o SNF. A palavra estratégia tem origem na palavra gre-ga strategos, cujo significado é “a arte do gene-ral”, típica daquele líder que, ao se afastar do centro da batalha, passou a ter esta visão gene-ral, uma visão ampla/geral, por meio da qual é possível identificar a contribuição de cada parte para o sucesso daquela batalha (para o alcance dos objetivos), assim como as intera-ções necessárias entre estas partes para o alcance dos objetivos.

A partir deste entendimento, avançamos no exercício de coleta de percepções das lide-ranças da ABDE, representantes do SNF, sobre suas expectativas e contribuições para o processo de Planejamento Estratégico que se iniciava, cujo sucesso dependeria, a partir

Paulo Cesar de Araujo Barcellos

RUMOS – 42 – Novembro/Dezembro 2015

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Planejamento Estratégico do Sistema Nacional de Fomento

Assessor da Presidência do BNDES, criador do “Balanced Scorecard de Segunda Geração” e de

diversos conceitos e metodologias correlatos

Bru

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Mor

gado

MAPA ESTRATÉGICO Dimensões Proposta Preliminar de Mapa Estratégico para o Sistema Nacional de Fomento – SNF

Integração / Articulação Interna Relacionamento Externo Gestão / Governança

Fomento aoDesenvolvimento

Competência

SustentabilidadeFinanceira

Relacionamento,Integração eGovernança

Contribuir para a formulação e execução deuma Política Nacional de Desenvolvimento,

integrada para as regiões

Ser o promotor da agenda defomento ao desenvolvimento

Articular o desenvolvimento depolíticas de fonte de recursos que

viabilizem a atuação das IFDs

Desenvolver e aperfeiçoarmecanismos de garantias

Aprimorar instrumentos degestão de riscos

Apoiar a elaboração de Planosde Desenvolvimento

Fortalecer a articulação entre asinstituições pertencentes ao SNF

Identificar práticasbem-sucedidas de fomento

ao desenvolvimento

Aprimorar a estrutura internade governança e gestãodos integrantes do SNF

Aprimorar os mecanismos decompartilhamento de informações

Prospectar oportunidades deinvestimento junto a governos

e sociedade

Ampliar a disponibilidade de competênciasnecessárias à atuação do SNF

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RUMOS – 43 – Novembro/Dezembro 2015

m dos principais elementos motivadores de minha colaboração para a formulação do Planeja-mento Estratégico do Sistema Nacional de Fomento 2016-2019 foi o fato de esta iniciativa

ter sido decorrente de um compromisso prioritário assumido pela Diretoria da ABDE recentemente eleita.

Este compromisso das lideranças é uma das premissas basilares do sucesso de qualquer processo de planejamento estratégico, e que, neste caso, se mostra ainda mais relevante por tratar-se de um “sistema”, composto por diferentes insti-tuições e lideranças, cuja complementaridade de atuação e de estratégias passa a ser planejada.

Para tanto, este processo de Planejamento Estratégico uti-liza-se de uma metodologia eminentemente participativa, e focada na construção conjunta tanto das suas diretrizes, como dos demais elementos que a compõem (objetivos, indi-cadores, metas, iniciativas/plano de ação), tendo como refe-rência o conceito de “Balanced Scorecard de Segunda Gera-ção”, que criei há cerca de 15 anos, e venho aprimorando, como sendo uma proposta de superação dos principais pro-blemas e barreiras comumente encontradas em práticas de implementação da gestão da estratégia pelas organizações.

Neste sentido, entendemos que outro elemento basilar para o sucesso de um processo de planejamento estratégico é a adoção de uma metodologia adequada que, além de promover a participação efetiva do maior número possível de colabora-dores, possibilite que esta participação ocorra de forma estru-turada e dinâmica, em um curto prazo. Neste caso, de cerca de 3 a 4 meses, garantindo assim mais tempo para seu processo de implementação, diferentemente da maioria dos casos nos quais tal processo costuma se alongar por cerca de 12 a 24 meses, o que, muitas vezes, torna sua execução inviável.

Por meio desta participação efetiva, são coletadas as dife-rentes percepções dos atores envolvidos, e a partir daí é defi-nida uma estratégia que considere as especificidades, a cultu-ra e os valores das instituições, desenvolvendo assim, prelimi-narmente, o que costumo chamar de “estratégia para a for-mulação, implementação e gestão da estratégia”.

No caso do planejamento estratégico em curso, do SNF, esta estratégia preliminar foi sendo construída e adotada desde

dali, do compromisso de cada uma daquelas lideranças (e cada vez mais também de suas equipes).

Com base no material decorrente destas primeiras reu-niões com as lideranças, que foi complementado com contri-buições de suas equipes, elaboramos uma primeira proposta de Mapa Estratégico, conforme apresentado a seguir:

Após mais algumas rodadas de reuniões, foram definidas descrições para cada um destes objetivos estratégicos, para os quais, na sequência, se definiram “fatores críticos de monito-ramento”, seguidos de uma lista preliminar de indicadores, que foram priorizados e para os quais foram definidas metas que, por sua vez, passaram a servir de referência para a defini-ção das iniciativas estratégicas, assim como da intensidade do esforço necessário para alcançá-las.

Finalmente estas iniciativas de curto, médio e longo pra-zos (subdivididas em “estruturantes” e “estratégicas”) foram sistematizadas na forma de projetos, com suas respectivas definições de prazos, entregas, responsabilidades etc., e que passaram a incorporar o Plano Estratégico do SNF, que foi apresentado e validado recentemente na Assembleia Geral da ABDE, do dia 26 de novembro, e passa agora à sua etapa de implementação, em que o compromisso de todos os inte-grantes do SNF passa a ser ainda mais fundamental.

AARTIGO

a nossa primeira reunião, quando os dirigentes da ABDE com-ponentes do SNF definiram em assembleia uma lista de cinco diretrizes estratégicas. A partir daí, tivemos uma nova reunião de Planejamento, com uma “Assembleia ampliada”, na qual rea-lizamos uma dinâmica de “Planejamento Desestruturado”, com o objetivo de alinhamento conceitual e conhecimento por todas as lideranças da metodologia que seria adotada no processo.

Neste primeiro momento, buscamos o ali-nhamento de entendimento até mesmo do conceito e da importância de elaboração de um processo de planejamento, cuja impor-tância creio ser facilmente reconhecida pela compreensão de seu contrário: o improviso. Assim, entendemos que planejar significa, antes de tudo, atuar de forma não improvisa-da. Significa pensar antes de agir, preparar-se sistematicamente para a ação, de forma não impensada e/ou improvisada, definindo uma estratégia para tanto.

A origem da palavra estratégia, populari-zada em uma cena do filme Tropa de Elite, nos sinaliza a importância de sua adoção, especi-almente em um “sistema” como o SNF. A palavra estratégia tem origem na palavra gre-ga strategos, cujo significado é “a arte do gene-ral”, típica daquele líder que, ao se afastar do centro da batalha, passou a ter esta visão gene-ral, uma visão ampla/geral, por meio da qual é possível identificar a contribuição de cada parte para o sucesso daquela batalha (para o alcance dos objetivos), assim como as intera-ções necessárias entre estas partes para o alcance dos objetivos.

A partir deste entendimento, avançamos no exercício de coleta de percepções das lide-ranças da ABDE, representantes do SNF, sobre suas expectativas e contribuições para o processo de Planejamento Estratégico que se iniciava, cujo sucesso dependeria, a partir

Paulo Cesar de Araujo Barcellos

RUMOS – 42 – Novembro/Dezembro 2015

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Planejamento Estratégico do Sistema Nacional de Fomento

Assessor da Presidência do BNDES, criador do “Balanced Scorecard de Segunda Geração” e de

diversos conceitos e metodologias correlatosB

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MAPA ESTRATÉGICO Dimensões Proposta Preliminar de Mapa Estratégico para o Sistema Nacional de Fomento – SNF

Integração / Articulação Interna Relacionamento Externo Gestão / Governança

Fomento aoDesenvolvimento

Competência

SustentabilidadeFinanceira

Relacionamento,Integração eGovernança

Contribuir para a formulação e execução deuma Política Nacional de Desenvolvimento,

integrada para as regiões

Ser o promotor da agenda defomento ao desenvolvimento

Articular o desenvolvimento depolíticas de fonte de recursos que

viabilizem a atuação das IFDs

Desenvolver e aperfeiçoarmecanismos de garantias

Aprimorar instrumentos degestão de riscos

Apoiar a elaboração de Planosde Desenvolvimento

Fortalecer a articulação entre asinstituições pertencentes ao SNF

Identificar práticasbem-sucedidas de fomento

ao desenvolvimento

Aprimorar a estrutura internade governança e gestãodos integrantes do SNF

Aprimorar os mecanismos decompartilhamento de informações

Prospectar oportunidades deinvestimento junto a governos

e sociedade

Ampliar a disponibilidade de competênciasnecessárias à atuação do SNF

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om este artigo, chegamos ao fim da série Pelo Mun-do. Nesses últimos dois anos, a coluna apresentou experiências diversas de Instituições Financeiras de Desenvolvimento, cujo papel destacado no financiamento ao investimento se mostrou rele-

vante para o processo de desenvolvimento, tanto no caso das economias emergentes, quanto no das desenvolvidas. Se, por um lado, os exemplos relatados demonstraram a heteroge-neidade no formato dos diversos sistemas de fomento, expli-cada por suas especificidades nacionais, por outro, evidencia-ram o compromisso compartilhado por todos com o fomen-to ao desenvolvimento. Como pudemos observar por meio dos artigos publicados, as décadas que marcaram o auge do período desenvolvimentista foram excepcionalmente proe-minentes na criação de bancos públicos e de desenvolvimen-to, em grande parte das economias do mundo, verificando-se ligação entre tais instituições e o crescimento de seus países.

No Brasil, especificamente, a criação de instituições finan-ceiras públicas teve início ainda no século XIX, com o Banco do Brasil, em 1808, e a Caixa Econômica Federal, idealizada em 1861. No entanto, foi apenas a partir de meados do século XX que se estabeleceram instituições voltadas exclusivamente para o financiamento produtivo, com o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico (BNDE), em 1952, mais tarde transformado em Banco Nacional de Desenvolvimento Eco-nômico e Social (BNDES), e as instituições federais voltadas para o desenvolvimento regional, notadamente o Banco do Nordeste do Brasil (BNB), inaugurado em 1954, e o Banco da Amazônia, em 1966. Adicionalmente, a questão do financia-mento ao desenvolvimento local foi atendida com a criação de 48 instituições financeiras públicas estaduais, com atuação marcadamente associada a políticas articuladas em torno do BNDES. A formação deste sistema de instituições voltadas ao financiamento produtivo de longo prazo tornou-se o ali-cerce do processo de industrialização da economia brasileira.

Na década de 1990, a parcela estadual desse sistema de ins-tituições bancárias públicas sofreu significativa mudança, no âmbito das reformas do setor financeiro. Duas iniciativas tive-ram importante impacto sobre a configuração original do Sis-tema Nacional de Fomento: o Programa de Estímulo à Rees-truturação e ao Fortalecimento do Sistema Financeiro Nacio-nal (Proer), que promoveu forte processo de fusões e incor-porações de bancos, e o Programa de Incentivo à Redução do Setor Público Estadual na Atividade Bancária (Proes), que atuou para equacionar os desequilíbrios patrimoniais dos ban-cos. Como resultado, as instituições financeiras públicas esta-duais foram reestruturadas ao optarem pelo saneamento, pri-vatização ou mesmo extinção. Esse processo de reorganiza-ção do sistema originou, no fim da década, as agências de fomento – instituições financeiras não bancárias, controladas pelos estados e submetidas ao controle do Banco Central. Configurou-se, neste contexto, a atual formatação do Sistema Nacional de Fomento – bancos públicos federais, bancos de desenvolvimento controlados por estados da federação, ban-cos cooperativos, bancos públicos comerciais estaduais com carteira de desenvolvimento, agências de fomento, a Finep e o Sebrae – instituições cuja finalidade consiste no fomento ao desenvolvimento.

As reformas da década de 1990 causaram, a princípio, redução considerável no papel deste importante alicerce do processo de desenvolvimento nacional, tendência revertida com a crise financeira global, que teve início no biênio 2007-2008. Na verdade, a crise e as políticas implantadas para sua superação, no Brasil e no exterior, reanimaram o debate em torno da importância dos países instituírem sistemas nacio-nais de fomento robustos. Isto porque a crise lembrou da natureza pró-cíclica do mercado de crédito, com oferta farta em momentos de crescimento econômico, quando há con-fiança por parte dos agentes, e contração nos períodos de recessão, quando há perda de confiança. No período recente,

o governo brasileiro agiu por meio das instituições financeiras públicas de forma a garantir a continuidade da oferta de crédito, tornando-se vital para evitar uma ruptura mais abrupta no nível de atividade produtiva. Em função disso, o Sistema Nacional de Fomento brasileiro voltou a ganhar espaço na economia do país.

Ainda que a função anticíclica dos sistemas nacionais de fomento seja a mais discutida desde o rompimento da crise, esta não é a única razão a jus-tificá-los. Em primeiro lugar, siste-mas nacionais de fomento fortes são também importantes instrumentos de mitigação das falhas inerentes ao mercado creditício, já que garantem o bom funcionamento dos sistemas financeiros, minimizando suas incompletudes, tais como assimetria e imperfeição das informações exis-tentes entre os agentes econômicos envolvidos em suas operações; eleva-do risco da oferta de crédito de longo prazo; falta de interesse, por parte do setor privado em projetos que, apesar das externalidades positivas, acabam combinando baixo retorno econômi-co e alto risco; além de falhas específi-cas aos sistemas financeiros de eco-nomias em desenvolvimento - mercados de capitais e acio-nários fracos e setor bancário voltado ao financiamento de curto prazo.

Em segundo lugar, cabe observar que parte destas falhas decorre da tendência concentradora do crédito, tanto em ter-mos de setores econômicos, quanto em termos regionais. O sistema financeiro é concentrador por natureza, ou seja, ten-de a convergir para setores e regiões com maior dinamismo, o que acaba reforçando o padrão econômico vigente. A exis-tência de Instituições Financeiras de Desenvolvimento, especialmente daquelas com vocação regional, é um impor-tante mecanismo para a desconcentração do crédito e con-sequente promoção do desenvolvimento local. Outra importante função é a promoção da inclusão financeira, atin-gindo áreas, setores ou fragmentos da população que não são de interesse direto do setor privado. Em outras palavras, sistemas nacionais de fomento são fundamentais para a des-

concentração geográfica e social do acesso ao crédito.

Em terceiro lugar, estes sistemas garantem segurança e solvência ao mer-cado financeiro, tanto de forma indire-ta, por meio de adequada regulamenta-ção, quanto de forma direta, por meio das instituições financeiras de desen-volvimento, que atuam como instru-mentos moderadores do sistema priva-do, induzindo padrão de custos de pro-dutos e reforçando a regulação sobre tarifas e spreads. Neste âmbito, enquan-to membros de um sistema concorren-cial, as instituições financeiras de desenvolvimento contribuem para a eficiência alocativa do crédito.

Em resumo, as diversas funções dos sistemas nacionais de fomento for-necem sólidos argumentos em defesa de seu papel enquanto agentes de polí-ticas públicas, atuando como braços financeiros de seus estados controlado-res e, desta forma, como promotores do desenvolvimento.

Voltando ao Brasil, se não há mais dúvidas quanto à importância de um Sis-tema Nacional de Fomento, ainda res-tam desafios para sua consolidação. Aci-ma de tudo, as instituições que o com-põem devem ser aprimoradas pela

incorporação permanente de boas práticas de gestão e gover-nança, agindo em consonância com as diretrizes estabelecidas por seus controladores e em linha com seus respectivos planos de desenvolvimento. Tais instituições devem dispor das com-petências necessárias para sua atuação, contando com quadro funcional adequado e preparado para os desafios enfrentados por instituições com vocação tão específica. Sua sustentabili-dade financeira deve ser garantida por meio de fontes de recursos compatíveis com suas atribuições e necessidades. Desta forma, poderemos dar continuidade e aprofundar a con-tribuição do Sistema Nacional de Fomento para a formulação e para a execução de políticas nacionais e regionais de desen-volvimento. Com estes objetivos, a ABDE implantará, ao lon-go dos próximos quatro anos, o Planejamento Estratégico do Sistema Nacional de Fomento, colaborando, cada vez mais, para sua efetiva consolidação e para sua centralidade na pro-moção da agenda do desenvolvimento.

RUMOS – 44 –Novembro/Dezembro 2015 RUMOS – 45 – Novembro/Dezembro 2015

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Fernanda é formada em economia pela Universidade de São Paulo (USP), mestre na mesma área pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul e gerente de Estudos Econômicos da ABDE.Andrej é economista, formado pela Universidade de Campinas (Unicamp), e mestre pela mesma instituição. Foi pesquisador da Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas (Fipe), da Universidade de São Paulo (USP). É técnico da Gerência de Estudos Econômicos da ABDE.

A ABDE implantará, ao longo dos próximos

quatro anos, o Planejamento Estratégico do

Sistema Nacional de Fomento, colaborando,

cada vez mais, para sua efetiva

consolidação e para sua centralidade

na promoção da agenda do

desenvolvimento.

“Fernanda FeilAndrej Slivnik

A história de um Sistema

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om este artigo, chegamos ao fim da série Pelo Mun-do. Nesses últimos dois anos, a coluna apresentou experiências diversas de Instituições Financeiras de Desenvolvimento, cujo papel destacado no financiamento ao investimento se mostrou rele-

vante para o processo de desenvolvimento, tanto no caso das economias emergentes, quanto no das desenvolvidas. Se, por um lado, os exemplos relatados demonstraram a heteroge-neidade no formato dos diversos sistemas de fomento, expli-cada por suas especificidades nacionais, por outro, evidencia-ram o compromisso compartilhado por todos com o fomen-to ao desenvolvimento. Como pudemos observar por meio dos artigos publicados, as décadas que marcaram o auge do período desenvolvimentista foram excepcionalmente proe-minentes na criação de bancos públicos e de desenvolvimen-to, em grande parte das economias do mundo, verificando-se ligação entre tais instituições e o crescimento de seus países.

No Brasil, especificamente, a criação de instituições finan-ceiras públicas teve início ainda no século XIX, com o Banco do Brasil, em 1808, e a Caixa Econômica Federal, idealizada em 1861. No entanto, foi apenas a partir de meados do século XX que se estabeleceram instituições voltadas exclusivamente para o financiamento produtivo, com o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico (BNDE), em 1952, mais tarde transformado em Banco Nacional de Desenvolvimento Eco-nômico e Social (BNDES), e as instituições federais voltadas para o desenvolvimento regional, notadamente o Banco do Nordeste do Brasil (BNB), inaugurado em 1954, e o Banco da Amazônia, em 1966. Adicionalmente, a questão do financia-mento ao desenvolvimento local foi atendida com a criação de 48 instituições financeiras públicas estaduais, com atuação marcadamente associada a políticas articuladas em torno do BNDES. A formação deste sistema de instituições voltadas ao financiamento produtivo de longo prazo tornou-se o ali-cerce do processo de industrialização da economia brasileira.

Na década de 1990, a parcela estadual desse sistema de ins-tituições bancárias públicas sofreu significativa mudança, no âmbito das reformas do setor financeiro. Duas iniciativas tive-ram importante impacto sobre a configuração original do Sis-tema Nacional de Fomento: o Programa de Estímulo à Rees-truturação e ao Fortalecimento do Sistema Financeiro Nacio-nal (Proer), que promoveu forte processo de fusões e incor-porações de bancos, e o Programa de Incentivo à Redução do Setor Público Estadual na Atividade Bancária (Proes), que atuou para equacionar os desequilíbrios patrimoniais dos ban-cos. Como resultado, as instituições financeiras públicas esta-duais foram reestruturadas ao optarem pelo saneamento, pri-vatização ou mesmo extinção. Esse processo de reorganiza-ção do sistema originou, no fim da década, as agências de fomento – instituições financeiras não bancárias, controladas pelos estados e submetidas ao controle do Banco Central. Configurou-se, neste contexto, a atual formatação do Sistema Nacional de Fomento – bancos públicos federais, bancos de desenvolvimento controlados por estados da federação, ban-cos cooperativos, bancos públicos comerciais estaduais com carteira de desenvolvimento, agências de fomento, a Finep e o Sebrae – instituições cuja finalidade consiste no fomento ao desenvolvimento.

As reformas da década de 1990 causaram, a princípio, redução considerável no papel deste importante alicerce do processo de desenvolvimento nacional, tendência revertida com a crise financeira global, que teve início no biênio 2007-2008. Na verdade, a crise e as políticas implantadas para sua superação, no Brasil e no exterior, reanimaram o debate em torno da importância dos países instituírem sistemas nacio-nais de fomento robustos. Isto porque a crise lembrou da natureza pró-cíclica do mercado de crédito, com oferta farta em momentos de crescimento econômico, quando há con-fiança por parte dos agentes, e contração nos períodos de recessão, quando há perda de confiança. No período recente,

o governo brasileiro agiu por meio das instituições financeiras públicas de forma a garantir a continuidade da oferta de crédito, tornando-se vital para evitar uma ruptura mais abrupta no nível de atividade produtiva. Em função disso, o Sistema Nacional de Fomento brasileiro voltou a ganhar espaço na economia do país.

Ainda que a função anticíclica dos sistemas nacionais de fomento seja a mais discutida desde o rompimento da crise, esta não é a única razão a jus-tificá-los. Em primeiro lugar, siste-mas nacionais de fomento fortes são também importantes instrumentos de mitigação das falhas inerentes ao mercado creditício, já que garantem o bom funcionamento dos sistemas financeiros, minimizando suas incompletudes, tais como assimetria e imperfeição das informações exis-tentes entre os agentes econômicos envolvidos em suas operações; eleva-do risco da oferta de crédito de longo prazo; falta de interesse, por parte do setor privado em projetos que, apesar das externalidades positivas, acabam combinando baixo retorno econômi-co e alto risco; além de falhas específi-cas aos sistemas financeiros de eco-nomias em desenvolvimento - mercados de capitais e acio-nários fracos e setor bancário voltado ao financiamento de curto prazo.

Em segundo lugar, cabe observar que parte destas falhas decorre da tendência concentradora do crédito, tanto em ter-mos de setores econômicos, quanto em termos regionais. O sistema financeiro é concentrador por natureza, ou seja, ten-de a convergir para setores e regiões com maior dinamismo, o que acaba reforçando o padrão econômico vigente. A exis-tência de Instituições Financeiras de Desenvolvimento, especialmente daquelas com vocação regional, é um impor-tante mecanismo para a desconcentração do crédito e con-sequente promoção do desenvolvimento local. Outra importante função é a promoção da inclusão financeira, atin-gindo áreas, setores ou fragmentos da população que não são de interesse direto do setor privado. Em outras palavras, sistemas nacionais de fomento são fundamentais para a des-

concentração geográfica e social do acesso ao crédito.

Em terceiro lugar, estes sistemas garantem segurança e solvência ao mer-cado financeiro, tanto de forma indire-ta, por meio de adequada regulamenta-ção, quanto de forma direta, por meio das instituições financeiras de desen-volvimento, que atuam como instru-mentos moderadores do sistema priva-do, induzindo padrão de custos de pro-dutos e reforçando a regulação sobre tarifas e spreads. Neste âmbito, enquan-to membros de um sistema concorren-cial, as instituições financeiras de desenvolvimento contribuem para a eficiência alocativa do crédito.

Em resumo, as diversas funções dos sistemas nacionais de fomento for-necem sólidos argumentos em defesa de seu papel enquanto agentes de polí-ticas públicas, atuando como braços financeiros de seus estados controlado-res e, desta forma, como promotores do desenvolvimento.

Voltando ao Brasil, se não há mais dúvidas quanto à importância de um Sis-tema Nacional de Fomento, ainda res-tam desafios para sua consolidação. Aci-ma de tudo, as instituições que o com-põem devem ser aprimoradas pela

incorporação permanente de boas práticas de gestão e gover-nança, agindo em consonância com as diretrizes estabelecidas por seus controladores e em linha com seus respectivos planos de desenvolvimento. Tais instituições devem dispor das com-petências necessárias para sua atuação, contando com quadro funcional adequado e preparado para os desafios enfrentados por instituições com vocação tão específica. Sua sustentabili-dade financeira deve ser garantida por meio de fontes de recursos compatíveis com suas atribuições e necessidades. Desta forma, poderemos dar continuidade e aprofundar a con-tribuição do Sistema Nacional de Fomento para a formulação e para a execução de políticas nacionais e regionais de desen-volvimento. Com estes objetivos, a ABDE implantará, ao lon-go dos próximos quatro anos, o Planejamento Estratégico do Sistema Nacional de Fomento, colaborando, cada vez mais, para sua efetiva consolidação e para sua centralidade na pro-moção da agenda do desenvolvimento.

RUMOS – 44 –Novembro/Dezembro 2015 RUMOS – 45 – Novembro/Dezembro 2015

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Fernanda é formada em economia pela Universidade de São Paulo (USP), mestre na mesma área pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul e gerente de Estudos Econômicos da ABDE.Andrej é economista, formado pela Universidade de Campinas (Unicamp), e mestre pela mesma instituição. Foi pesquisador da Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas (Fipe), da Universidade de São Paulo (USP). É técnico da Gerência de Estudos Econômicos da ABDE.

A ABDE implantará, ao longo dos próximos

quatro anos, o Planejamento Estratégico do

Sistema Nacional de Fomento, colaborando,

cada vez mais, para sua efetiva

consolidação e para sua centralidade

na promoção da agenda do

desenvolvimento.

“Fernanda FeilAndrej Slivnik

A história de um Sistema

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RUMOS – – Novembro/Dezembro 2015 46 RUMOS – – Novembro/Dezembro 2015 47

O Banco de Desenvolvimento de Minas Gerais (BDMG) apoiou a expansão da Expocaccer Coo-perativa dos Cafe-icultores do Cer-rado, em Patrocí-nio. A organiza-ção investiu R$ 25 milhões – sendo R$ 22 milhões financiados pelo banco – na construção de uma nova planta industrial e de armazenagem de café, numa área total de 105 mil metros quadrados.

A obra, prevista para ser finalizada em três etapas, teve a primeira e a segunda etapas concluídas, sendo que essas foram financiadas pelo BDMG, em uma área de 70 mil metros quadrados. A terceira etapa ocupará o restante do ter-reno. Os recursos também foram utilizados na aquisição de novas máquinas. A expansão gerou 75 novos empregos e aumentou a capacidade de produção da cooperativa para 400 mil toneladas por ano, contribuindo para o desenvolvi-mento regional do Alto Paranaíba, Noroeste e Triângulo Mineiro.

A Expocaccer possui 555 cooperados nos 55 municípios da Região do Cerrado Mineiro e é uma das dez maiores coo-perativas do setor no Brasil.

F FOMENTO

O governo do estado de São Paulo, por meio da Agên-cia de Desen-volvimento Pau-lista (Desenvol-ve SP), e a gesto-ra de fundos Bra-sil Plural lança-ram, no fim de novembro, o Fundo Infra-Paulista, um fun-do de investimento para a realização de projetos de infraes-trutura em municípios paulistas. A iniciativa pretende atrair investidores para aplicar recursos em projetos como portos, aeroportos, geração de energia limpa, entre outros. O fundo poderá ter patrimônio de até R$ 1 bilhão e receberá projetos a partir de janeiro de 2016.

Os projetos deverão ser elaborados e realizados pela ini-ciativa privada e precisarão demonstrar sustentabilidade financeira e elevado interesse público.

Segundo Milton Luiz de Melo Santos, presidente da Desenvolve SP, a estruturação do fundo InfraPaulista pode significar um marco no desenvolvimento da infraestrutura paulista e servir de exemplo para outros estados. “O gover-no de São Paulo sai na frente ao utilizar fundos de investi-mento como instrumentos de desenvolvimento. É uma solu-ção moderna para aumentar a competitividade, incentivar o crescimento e melhorar a qualidade de vida da população”, diz Santos.

Microcrédito, construindo histórias no Paraná é o título do livro lançado pelo Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (Se-brae/PR) e a Agência de Fomento do Paraná (Fomento Paraná) durante Encontro Estadual de Agentes, promovido em parceria entre as duas instituições.

O livro conta um pouco da história do Pro-grama de Microcrédito no estado, com base no depoimento de agentes de crédito e de empre-endedores que foram financiados ao longo dos

16 anos de existência da agência de fomento. “É um grande momento para apresentar este livro que traz tantas histórias inspiradoras, de pessoas maravilhosas e que batalharam mui-to”, disse a autora, Irene Viotti.

O Encontro de Agentes reuniu pouco mais de 200 agen-tes de crédito e de desenvolvimento que atuam em todo o Paraná, como funcionários de prefeituras, em agências do tra-balhador ou secretarias voltadas ao desenvolvimento econô-mico, federações comerciais e industriais e sociedades de garantia de crédito.

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BDMG financia a cooperativa dos cafeicultores do Cerrado

Desenvolve SP coordena fundo de investimento para infraestrutura

A Agência de Fomento de Ala-goas (Desenvol-ve) teve sua apre-sentação do pro-jeto desenvolvi-do para o setor que envolve a cadeia produtiva d a m a n d i o c a como um dos sete trabalhos selecionados para a 7ª Conferência

Brasileira de Arranjos Produtivos Locais (CBAPL). Este foi o único projeto selecionado da Região Nordeste.

O trabalho apresentado, “Dinamização sustentável do cluster da mandioca no estado de Alagoas”, teve como objeti-vo considerar a convergência setorial com a tecnologia e a eco-nomia criativa para este arranjo produtivo. O projeto da agên-cia alagoana é resultado do diagnóstico feito pelo presidente da instituição, Antonio Pinaud, ao se deparar com a proble-mática do fechamento das casas de farinha, fonte de renda e sobrevivência de milhares de famílias do interior.

Segundo Pinaud, o maior atrativo do projeto é o foco nas ações voltadas para a chamada Economia Verde. Em todo o estado de Alagoas existem cerca de 200 casas de farinha e aproximadamente 20 mil produtores de mandioca. Com a aplicação do projeto será possível realizar ações coletivas e integradoras para gerar renda e emprego nessas localidades. O projeto será foco também de publicação especial pelo Instituto de Pesquisas Econômicas Aplicadas (Ipea).

Projeto da Desenvolve é destaque em evento nacional de APLs

A Finep e o DNB, maior grupo finan-ceiro da Noruega, assinaram uma Carta de Intenções, que resultará em um Memoran-do de Entendimentos, durante a abertura do seminário Brasil-Noruega, em novem-bro, no Rio. Claudio Guimarães Junior, diretor Financeiro e de Controladoria da Finep, e Katrine Trovik, diretora do DNB na América do Sul, firmaram o acordo.

O documento pretende estabelecer uma cooperação de negócios entre as insti-tuições. A expectativa é de que a Finep pos-sa investir em projetos de inovação de empresas norueguesas que atuem no Brasil e, em contrapartida, o DNB fornecerá garantias bancárias internacionais. O Brasil é o mais importan-te parceiro comercial da Noruega na América Latina.

“Nossos países compartilham uma história de 170 anos de parceria. Nossa intenção é aprofundar ainda mais essa longa e proveitosa amizade, e que possamos trabalhar juntos no

desenvolvimento de novas soluções para desafios em comum, tanto em áreas mais tra-dicionais, como petróleo e gás, até energias renováveis, dentre outras”, afirmou o prín-cipe herdeiro da Noruega, Haakon. O presi-dente do BNDES, Luciano Coutinho, tam-bém presente na abertura, disse que “a con-tribuição da Noruega é fundamental, e esta ocasião é muito importante para que reno-vemos nossa longa cooperação, e ir além, com novas ideias, aproveitando a excelente oportunidade de termos aqui mais de 150

líderes de negócios brasileiros e noruegueses reunidos”.Para a ministra de Comércio e Indústria do Noruega, Moni-

ca Mæland, “o momento de desafios econômicos no mundo inteiro nos leva, ainda mais, a superar dificuldades e desenvol-ver tecnologias, produtos e métodos, e sempre há novas áreas para interação. O diálogo entre nossos países se traduzirá em negócios mais numerosos e mais fortes”, finalizou.

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Finep assina acordo com grupo financeiro da NoruegaFomento Paraná e Sebrae lançam livro sobre o microcrédito

Para o diretor-superintendente do Sebrae/PR, Vitor Tio-queta, a parceria com a Fomento Paraná para capacitar os agentes de crédito é muito importante para o momento atual. Segundo ele, o acesso ao crédito é fundamental para o micro e o pequeno empreendedor poder sobreviver.

O presidente da agência de fomento, Juraci Barbosa, des-tacou a importância dos agentes de crédito adotarem uma pos-tura proativa em seus respectivos municípios, indo à procura dos empreendedores, ofertando o crédito, apoiando aqueles que nos procuram para acelerar os processos. “O crédito é uma mola propulsora, que precisa ser bem utilizada. Por isso mantemos a parceria com o Sebrae, para oferecer o crédito subsidiado, mediante a qualificação do empreendedor”, afir-ma Barbosa.

Doze empreende-dores de comunidades com UPPs do Rio de Janeiro receberam, no dia 7 de dezembro, o Prêmio Empreendedor 2015, promovido pela Agência Estadual de Fomento (AgeRio). Realizada no Theatro Municipal, a cerimônia elegeu negócios que integram o Pro-grama de Microcrédito Produtivo Orientado. Ao todo, foram distribuídos R$ 82 mil em prêmios, em cinco categorias, além de cursos de capacitação oferecidos pelo Sebrae/RJ.

“Queremos oferecer o prêmio todos os anos para incenti-var as categorias. Atuamos junto com o empreendedor, ori-entando, para que ele gere emprego e renda na sua comunida-de. Temos as melhores taxas de juros do mercado e a taxa de inadimplência de apenas 3,65%. Nosso programa de micro-crédito já cresceu 40% em 2015 e vamos continuar crescen-do”, disse o presidente da AgeRio, Domingos Vargas.

AgeRio premia empreendedores das comunidades

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O Banco de Desenvolvimento de Minas Gerais (BDMG) apoiou a expansão da Expocaccer Coo-perativa dos Cafe-icultores do Cer-rado, em Patrocí-nio. A organiza-ção investiu R$ 25 milhões – sendo R$ 22 milhões financiados pelo banco – na construção de uma nova planta industrial e de armazenagem de café, numa área total de 105 mil metros quadrados.

A obra, prevista para ser finalizada em três etapas, teve a primeira e a segunda etapas concluídas, sendo que essas foram financiadas pelo BDMG, em uma área de 70 mil metros quadrados. A terceira etapa ocupará o restante do ter-reno. Os recursos também foram utilizados na aquisição de novas máquinas. A expansão gerou 75 novos empregos e aumentou a capacidade de produção da cooperativa para 400 mil toneladas por ano, contribuindo para o desenvolvi-mento regional do Alto Paranaíba, Noroeste e Triângulo Mineiro.

A Expocaccer possui 555 cooperados nos 55 municípios da Região do Cerrado Mineiro e é uma das dez maiores coo-perativas do setor no Brasil.

F FOMENTO

O governo do estado de São Paulo, por meio da Agên-cia de Desen-volvimento Pau-lista (Desenvol-ve SP), e a gesto-ra de fundos Bra-sil Plural lança-ram, no fim de novembro, o Fundo Infra-Paulista, um fun-do de investimento para a realização de projetos de infraes-trutura em municípios paulistas. A iniciativa pretende atrair investidores para aplicar recursos em projetos como portos, aeroportos, geração de energia limpa, entre outros. O fundo poderá ter patrimônio de até R$ 1 bilhão e receberá projetos a partir de janeiro de 2016.

Os projetos deverão ser elaborados e realizados pela ini-ciativa privada e precisarão demonstrar sustentabilidade financeira e elevado interesse público.

Segundo Milton Luiz de Melo Santos, presidente da Desenvolve SP, a estruturação do fundo InfraPaulista pode significar um marco no desenvolvimento da infraestrutura paulista e servir de exemplo para outros estados. “O gover-no de São Paulo sai na frente ao utilizar fundos de investi-mento como instrumentos de desenvolvimento. É uma solu-ção moderna para aumentar a competitividade, incentivar o crescimento e melhorar a qualidade de vida da população”, diz Santos.

Microcrédito, construindo histórias no Paraná é o título do livro lançado pelo Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (Se-brae/PR) e a Agência de Fomento do Paraná (Fomento Paraná) durante Encontro Estadual de Agentes, promovido em parceria entre as duas instituições.

O livro conta um pouco da história do Pro-grama de Microcrédito no estado, com base no depoimento de agentes de crédito e de empre-endedores que foram financiados ao longo dos

16 anos de existência da agência de fomento. “É um grande momento para apresentar este livro que traz tantas histórias inspiradoras, de pessoas maravilhosas e que batalharam mui-to”, disse a autora, Irene Viotti.

O Encontro de Agentes reuniu pouco mais de 200 agen-tes de crédito e de desenvolvimento que atuam em todo o Paraná, como funcionários de prefeituras, em agências do tra-balhador ou secretarias voltadas ao desenvolvimento econô-mico, federações comerciais e industriais e sociedades de garantia de crédito.

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BDMG financia a cooperativa dos cafeicultores do Cerrado

Desenvolve SP coordena fundo de investimento para infraestrutura

A Agência de Fomento de Ala-goas (Desenvol-ve) teve sua apre-sentação do pro-jeto desenvolvi-do para o setor que envolve a cadeia produtiva d a m a n d i o c a como um dos sete trabalhos selecionados para a 7ª Conferência

Brasileira de Arranjos Produtivos Locais (CBAPL). Este foi o único projeto selecionado da Região Nordeste.

O trabalho apresentado, “Dinamização sustentável do cluster da mandioca no estado de Alagoas”, teve como objeti-vo considerar a convergência setorial com a tecnologia e a eco-nomia criativa para este arranjo produtivo. O projeto da agên-cia alagoana é resultado do diagnóstico feito pelo presidente da instituição, Antonio Pinaud, ao se deparar com a proble-mática do fechamento das casas de farinha, fonte de renda e sobrevivência de milhares de famílias do interior.

Segundo Pinaud, o maior atrativo do projeto é o foco nas ações voltadas para a chamada Economia Verde. Em todo o estado de Alagoas existem cerca de 200 casas de farinha e aproximadamente 20 mil produtores de mandioca. Com a aplicação do projeto será possível realizar ações coletivas e integradoras para gerar renda e emprego nessas localidades. O projeto será foco também de publicação especial pelo Instituto de Pesquisas Econômicas Aplicadas (Ipea).

Projeto da Desenvolve é destaque em evento nacional de APLs

A Finep e o DNB, maior grupo finan-ceiro da Noruega, assinaram uma Carta de Intenções, que resultará em um Memoran-do de Entendimentos, durante a abertura do seminário Brasil-Noruega, em novem-bro, no Rio. Claudio Guimarães Junior, diretor Financeiro e de Controladoria da Finep, e Katrine Trovik, diretora do DNB na América do Sul, firmaram o acordo.

O documento pretende estabelecer uma cooperação de negócios entre as insti-tuições. A expectativa é de que a Finep pos-sa investir em projetos de inovação de empresas norueguesas que atuem no Brasil e, em contrapartida, o DNB fornecerá garantias bancárias internacionais. O Brasil é o mais importan-te parceiro comercial da Noruega na América Latina.

“Nossos países compartilham uma história de 170 anos de parceria. Nossa intenção é aprofundar ainda mais essa longa e proveitosa amizade, e que possamos trabalhar juntos no

desenvolvimento de novas soluções para desafios em comum, tanto em áreas mais tra-dicionais, como petróleo e gás, até energias renováveis, dentre outras”, afirmou o prín-cipe herdeiro da Noruega, Haakon. O presi-dente do BNDES, Luciano Coutinho, tam-bém presente na abertura, disse que “a con-tribuição da Noruega é fundamental, e esta ocasião é muito importante para que reno-vemos nossa longa cooperação, e ir além, com novas ideias, aproveitando a excelente oportunidade de termos aqui mais de 150

líderes de negócios brasileiros e noruegueses reunidos”.Para a ministra de Comércio e Indústria do Noruega, Moni-

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O presidente da agência de fomento, Juraci Barbosa, des-tacou a importância dos agentes de crédito adotarem uma pos-tura proativa em seus respectivos municípios, indo à procura dos empreendedores, ofertando o crédito, apoiando aqueles que nos procuram para acelerar os processos. “O crédito é uma mola propulsora, que precisa ser bem utilizada. Por isso mantemos a parceria com o Sebrae, para oferecer o crédito subsidiado, mediante a qualificação do empreendedor”, afir-ma Barbosa.

Doze empreende-dores de comunidades com UPPs do Rio de Janeiro receberam, no dia 7 de dezembro, o Prêmio Empreendedor 2015, promovido pela Agência Estadual de Fomento (AgeRio). Realizada no Theatro Municipal, a cerimônia elegeu negócios que integram o Pro-grama de Microcrédito Produtivo Orientado. Ao todo, foram distribuídos R$ 82 mil em prêmios, em cinco categorias, além de cursos de capacitação oferecidos pelo Sebrae/RJ.

“Queremos oferecer o prêmio todos os anos para incenti-var as categorias. Atuamos junto com o empreendedor, ori-entando, para que ele gere emprego e renda na sua comunida-de. Temos as melhores taxas de juros do mercado e a taxa de inadimplência de apenas 3,65%. Nosso programa de micro-crédito já cresceu 40% em 2015 e vamos continuar crescen-do”, disse o presidente da AgeRio, Domingos Vargas.

AgeRio premia empreendedores das comunidades

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RUMOS – 49 – Novembro/Dezembro 2015

difícil caminho até a estabilização, a consolidação de um novo regime na economia, o papel das políticas anticíclicas durante a crise econômica mundial, o agra-

vamento dos desequilíbrios macroeconômicos em 450 páginas, o livro Economia brasileira no período 1987-2013 reconta a trajetó-ria recente da economia brasileira, a partir dos relatos e inter-pretações da análise de conjuntura no Ipea. A obra, que já nasce como importante documento histórico, foi elaborada com a reunião dos principais arquivos publicados pelo grupo de con-juntura do instituto nas últimas três décadas.

“O objetivo é relembrar as coisas que aconteceram, ver como o grupo as entendia e jogar luzes: o que é novo? O que é recorrente? O que achamos que havíamos superado, mas ain-da está presente? Um dos gran-des méritos do livro é que ele pode servir a um debate poste-rior, pois destacamos também as sugestões e prescrições de políti-ca que estão explicitadas na aná-lise”, afirmou, durante o lança-mento da obra, o organizador do livro, Fernando Ribeiro, que atu-almente coordena o Grupo de Estudos de Conjuntura (Gecon) do Ipea.

O livro apresenta e discute, em ordem cronológica, os prin-cipais fatos econômicos, a evo-lução dos indicadores e as mais destacadas medidas de política econômica adotadas, guiando os leitores na montagem de um quadro bastante nítido do com-portamento da política econô-mica brasileira em cada período. Foram selecionadas 20 notas téc-nicas, entre as mais expressivas publicadas nesse intervalo de tempo, além das séries anuais de 32 indicadores econômicos. “Este é um aspecto importante, pois atualizamos os dados e, portanto, temos agora os núme-ros mais corretos, o que é muito interessante para quem quiser fazer análise histórica sem incorrer em alguns erros que nor-malmente acontecem nestas análises devido à confusão com

L LIVROS Especial

números do passado e sua desatualização”, disse Ribeiro.A história do grupo de conjuntura do Ipea, que teve dife-

rentes nomes desde que surgiu, data do ano de 1979, quando técnicos do instituto ficaram responsáveis por organizar reu-niões regulares para debater o desempenho de curto prazo da economia. Era um trabalho pioneiro no Brasil à época, que envolvia pessoas da alta hierarquia do governo – os então Ministérios do Planejamento e da Fazenda, o Banco Central do Brasil, entre outras.

Ribeiro conta que houve resis-tência à existência do grupo, que possuía certa autonomia para inclu-sive fazer análises críticas à condu-ção econômica do país pelo gover-no, quando preciso. No entanto, essas resistências foram superadas, pois, além de grande repositório de conhecimento teórico e aplicado sobre a economia, o Ipea desenvol-veu com o tempo importante repu-tação de senso crítico quanto aos caminhos da política econômica. Desde então, o instituto passou a ter um grupo permanente de pesquisa-dores no Rio de Janeiro, que se tor-nou um dos mais longevos da histó-ria da organização.

“O sucesso do trabalho sempre repousou na excelência na área de pesquisa: a realidade alimentando a pesquisa e a pesquisa alimentando o entendimento da realidade. E esse é um trabalho que exige um esforço de dividir o tempo e a atenção entre o que acontece no “tempo real”, que é a conjuntura em si, e o que aconte-ce no campo da pesquisa; sempre tivemos que transitar dentro desses dois mundos de uma maneira rápi-da”, definiu o organizador.

Para ele, um dos grandes desa-fios vencido nos boletins do grupo foi combinar o rigor técnico exigido

pela academia com uma linguagem razoavelmente acessível para o público em geral. Outro objetivo perseguido – e, em sua opi-nião, conquistado – foi “evitar que as análises de conjuntura do Ipea se ‘contaminassem’ pelos chamados ‘consensos de merca-do’”. Outro ponto interessante registrado pelo livro, destacou

Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) edita livro em que resgata as análises de seu grupo de conjuntura econômica de 1987 até 2013, expondo os caminhos da economia brasileira nesse período

O

Registro da história econômica brasileira

Cinco passos: da inflação crônica aos desequilíbrios macroeconômicos

Ribeiro, é uma notável evolução tanto no número quanto na qua-lidade dos dados apresentados pelo grupo.

“O último desafio é a questão de ter um foco variável, por-que a conjuntura cada hora está mais preocupada com deter-minados aspectos, mas manter preocupações estruturantes permanentes. Não só sobre a situação econômica atual, mas sobre questões fundamentais para o desenvolvimento brasile-iro, tentado fazer interação entre o curto e o longo prazo. Por exemplo, as análises sempre tiveram preocupação com a cons-trução e consolidação de ambiente propício ao desenvolvi-

RUMOS – 48 – Novembro/Dezembro 2015

Economia Brasileira no período 1987-2013: relatos e interpretações da análise de conjuntura no IpeaFernando José da S. P. Ribeiro (org.)Ipea, 450 p., 2015.

mento sustentável do país; com a pobreza e distribuição de ren-da, que embora não sejam temas de conjuntura especificamen-te, sempre foram recorrentes; com a centralidade da questão fiscal, inflação e dívida externa; e, por fim, com as considera-ções de economia política – a viabilidade ou não de fazer deter-minadas ações e as restrições políticas à adoção de determina-das iniciativas têm que ser levadas em conta para a elaboração de uma análise mais realista”, pontuou.

O livro pode ser lido na íntegra no site do Ipea, no endereço: http://www.ipea.gov.br/

O papel das políticas anticíclicas e o agravamento dos desequilíbrios macroeconômicos (2009-2013) – de autoria de Leonardo Mello de Carvalho, técnico de Planejamento e Pesquisa da Diretoria de Estudos e Políticas Macroeco-nômicas do Ipea.

O prefácio do livro é escrito pelo primeiro coordena-dor do grupo de conjuntura do Ipea, José Cláudio Ferreira da Silva, que é mestre e doutor em economia pela Escola de Pós-Graduação em Economia da Fundação Getulio Vargas (EPGE/FGV), com pós-doutorado na Universi-dade de Berkeley, Estados Unidos. Ele destaca que discutir conjuntura não era tradição no instituto, que se dedicava a estudos de longo prazo e, por isso, os trabalhos foram enca-rados como algo “menor” em um primeiro momento den-tro da própria instituição.

Aos poucos, os trabalhos passaram a ser mais elabora-dos e bem considerados pelo corpo técnico ministerial até que as análises passaram a ser divulgadas para toda a socie-dade, fato iniciado em 1987 e que permanece até hoje.

“O que até então era de acesso restrito ao governo, e a poucos mais, passou a ser público, tornando amplamente conhecidas a seriedade e a qualidade das informações reu-nidas pelo Grupo de Acompanhamento Conjuntural (GAC) e dos textos produzidos por seus membros”, comenta em seu texto.

Além de considerações sobre os desafios da análise de conjuntura e anexos como estatísticas econômicas, o indi-cador para a indústria e artigo sobre a efetividade do salá-rio mínimo como um instrumento para reduzir a pobreza no Brasil, dentre outros, o livro traz as análises sobre o cenário econômico brasileiro nos últimos trinta anos divi-didas em cinco períodos bem demarcados, com um capí-tulo para cada espaço de tempo:

Inflação crônica, estagnação e instabilidade: o difícil caminho até a estabilização (1987-1994) – de autoria de Pau-lo Mansur Levy, técnico de Planejamento e Pesquisa da Diretoria de Estudos e Políticas Macroeconômicas do Ipea;

Plano Real, consolidação da estabilidade, crise inter-nacional e desequilíbrios (1994-1998) – de autoria de Estê-vão Kopschitz Xavier Bastos, técnico de Planejamento e Pesquisa do Ipea;

Ajuste interno e externo e a consolidação de um novo regime de política econômica (1999-2003) – de autoria de Fernando J. Ribeiro;

Da retomada do crescimento à crise financeira inter-nacional (2004-2008) – Maria Andréia Parente Lameiras, técnica de Planejamento e Pesquisa do Ipea; e

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difícil caminho até a estabilização, a consolidação de um novo regime na economia, o papel das políticas anticíclicas durante a crise econômica mundial, o agra-

vamento dos desequilíbrios macroeconômicos em 450 páginas, o livro Economia brasileira no período 1987-2013 reconta a trajetó-ria recente da economia brasileira, a partir dos relatos e inter-pretações da análise de conjuntura no Ipea. A obra, que já nasce como importante documento histórico, foi elaborada com a reunião dos principais arquivos publicados pelo grupo de con-juntura do instituto nas últimas três décadas.

“O objetivo é relembrar as coisas que aconteceram, ver como o grupo as entendia e jogar luzes: o que é novo? O que é recorrente? O que achamos que havíamos superado, mas ain-da está presente? Um dos gran-des méritos do livro é que ele pode servir a um debate poste-rior, pois destacamos também as sugestões e prescrições de políti-ca que estão explicitadas na aná-lise”, afirmou, durante o lança-mento da obra, o organizador do livro, Fernando Ribeiro, que atu-almente coordena o Grupo de Estudos de Conjuntura (Gecon) do Ipea.

O livro apresenta e discute, em ordem cronológica, os prin-cipais fatos econômicos, a evo-lução dos indicadores e as mais destacadas medidas de política econômica adotadas, guiando os leitores na montagem de um quadro bastante nítido do com-portamento da política econô-mica brasileira em cada período. Foram selecionadas 20 notas téc-nicas, entre as mais expressivas publicadas nesse intervalo de tempo, além das séries anuais de 32 indicadores econômicos. “Este é um aspecto importante, pois atualizamos os dados e, portanto, temos agora os núme-ros mais corretos, o que é muito interessante para quem quiser fazer análise histórica sem incorrer em alguns erros que nor-malmente acontecem nestas análises devido à confusão com

L LIVROS Especial

números do passado e sua desatualização”, disse Ribeiro.A história do grupo de conjuntura do Ipea, que teve dife-

rentes nomes desde que surgiu, data do ano de 1979, quando técnicos do instituto ficaram responsáveis por organizar reu-niões regulares para debater o desempenho de curto prazo da economia. Era um trabalho pioneiro no Brasil à época, que envolvia pessoas da alta hierarquia do governo – os então Ministérios do Planejamento e da Fazenda, o Banco Central do Brasil, entre outras.

Ribeiro conta que houve resis-tência à existência do grupo, que possuía certa autonomia para inclu-sive fazer análises críticas à condu-ção econômica do país pelo gover-no, quando preciso. No entanto, essas resistências foram superadas, pois, além de grande repositório de conhecimento teórico e aplicado sobre a economia, o Ipea desenvol-veu com o tempo importante repu-tação de senso crítico quanto aos caminhos da política econômica. Desde então, o instituto passou a ter um grupo permanente de pesquisa-dores no Rio de Janeiro, que se tor-nou um dos mais longevos da histó-ria da organização.

“O sucesso do trabalho sempre repousou na excelência na área de pesquisa: a realidade alimentando a pesquisa e a pesquisa alimentando o entendimento da realidade. E esse é um trabalho que exige um esforço de dividir o tempo e a atenção entre o que acontece no “tempo real”, que é a conjuntura em si, e o que aconte-ce no campo da pesquisa; sempre tivemos que transitar dentro desses dois mundos de uma maneira rápi-da”, definiu o organizador.

Para ele, um dos grandes desa-fios vencido nos boletins do grupo foi combinar o rigor técnico exigido

pela academia com uma linguagem razoavelmente acessível para o público em geral. Outro objetivo perseguido – e, em sua opi-nião, conquistado – foi “evitar que as análises de conjuntura do Ipea se ‘contaminassem’ pelos chamados ‘consensos de merca-do’”. Outro ponto interessante registrado pelo livro, destacou

Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) edita livro em que resgata as análises de seu grupo de conjuntura econômica de 1987 até 2013, expondo os caminhos da economia brasileira nesse período

O

Registro da história econômica brasileira

Cinco passos: da inflação crônica aos desequilíbrios macroeconômicos

Ribeiro, é uma notável evolução tanto no número quanto na qua-lidade dos dados apresentados pelo grupo.

“O último desafio é a questão de ter um foco variável, por-que a conjuntura cada hora está mais preocupada com deter-minados aspectos, mas manter preocupações estruturantes permanentes. Não só sobre a situação econômica atual, mas sobre questões fundamentais para o desenvolvimento brasile-iro, tentado fazer interação entre o curto e o longo prazo. Por exemplo, as análises sempre tiveram preocupação com a cons-trução e consolidação de ambiente propício ao desenvolvi-

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Economia Brasileira no período 1987-2013: relatos e interpretações da análise de conjuntura no IpeaFernando José da S. P. Ribeiro (org.)Ipea, 450 p., 2015.

mento sustentável do país; com a pobreza e distribuição de ren-da, que embora não sejam temas de conjuntura especificamen-te, sempre foram recorrentes; com a centralidade da questão fiscal, inflação e dívida externa; e, por fim, com as considera-ções de economia política – a viabilidade ou não de fazer deter-minadas ações e as restrições políticas à adoção de determina-das iniciativas têm que ser levadas em conta para a elaboração de uma análise mais realista”, pontuou.

O livro pode ser lido na íntegra no site do Ipea, no endereço: http://www.ipea.gov.br/

O papel das políticas anticíclicas e o agravamento dos desequilíbrios macroeconômicos (2009-2013) – de autoria de Leonardo Mello de Carvalho, técnico de Planejamento e Pesquisa da Diretoria de Estudos e Políticas Macroeco-nômicas do Ipea.

O prefácio do livro é escrito pelo primeiro coordena-dor do grupo de conjuntura do Ipea, José Cláudio Ferreira da Silva, que é mestre e doutor em economia pela Escola de Pós-Graduação em Economia da Fundação Getulio Vargas (EPGE/FGV), com pós-doutorado na Universi-dade de Berkeley, Estados Unidos. Ele destaca que discutir conjuntura não era tradição no instituto, que se dedicava a estudos de longo prazo e, por isso, os trabalhos foram enca-rados como algo “menor” em um primeiro momento den-tro da própria instituição.

Aos poucos, os trabalhos passaram a ser mais elabora-dos e bem considerados pelo corpo técnico ministerial até que as análises passaram a ser divulgadas para toda a socie-dade, fato iniciado em 1987 e que permanece até hoje.

“O que até então era de acesso restrito ao governo, e a poucos mais, passou a ser público, tornando amplamente conhecidas a seriedade e a qualidade das informações reu-nidas pelo Grupo de Acompanhamento Conjuntural (GAC) e dos textos produzidos por seus membros”, comenta em seu texto.

Além de considerações sobre os desafios da análise de conjuntura e anexos como estatísticas econômicas, o indi-cador para a indústria e artigo sobre a efetividade do salá-rio mínimo como um instrumento para reduzir a pobreza no Brasil, dentre outros, o livro traz as análises sobre o cenário econômico brasileiro nos últimos trinta anos divi-didas em cinco períodos bem demarcados, com um capí-tulo para cada espaço de tempo:

Inflação crônica, estagnação e instabilidade: o difícil caminho até a estabilização (1987-1994) – de autoria de Pau-lo Mansur Levy, técnico de Planejamento e Pesquisa da Diretoria de Estudos e Políticas Macroeconômicas do Ipea;

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Ajuste interno e externo e a consolidação de um novo regime de política econômica (1999-2003) – de autoria de Fernando J. Ribeiro;

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Ano 40 – Nº 284 Novembro/Dezembro 2015

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