revista refil #3

27
artes gráficas | escola de belas artes | ufmg revista em formato laboratório ISSN 2176-9958

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Page 1: Revista Refil #3

artes gráficas | escola de belas artes | ufmg

revista em formato laboratório

ISSN

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artes gráficas | escola de belas artes | ufmg

revista em formato laboratório

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artes gráficas | escola de belas artes | ufmg revista em formato laboratório

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Page 4: Revista Refil #3

os fios da rede elétrica - que tecem tramas embaralhadas no espaço - as tampas de bueiro – identidades gráficas incrustadas em ferro, que se escondem de nós e que escondem cidades subterrâneas… - e tudo mais que contribui para a complexidade do universo urbano, em sua dimensão formal e sígnica.

A Refil – Revista em Formato Laboratório – chega ao seu terceiro número novamente com a tarefa de experimentar novos formatos para as publicações em arte, buscando desviar-se dos formatos tradicionais e expressar criati-vamente idéias sobre Artes Gráficas. Neste número, além da costumeira reflexão sobre as Artes Gráficas em seu sentido expandido,investigamos a potência política do “gráfico”, ao ocupar o imaginário simbólico das cidades. É sempre bom lembrar que estamos sempre guiados pelo desejo de contribuir para as pesquisas e a reflexão crítica realizadas na habilitação de Artes Gráficas, no curso de Artes Visuais da Escola de Belas Artes da UFMG. Uma habilitação que tem tentado construir um Atelier onde, entre outras frentes, o aluno é estimulado a pensar na natureza espacial do gráfico e a colocar seus trabalhos em contato (e por que não dizer, em um enfrentamento estético) com o universo urbano.

Para contribuir com essa leitura, convidamos pesquisadores que possuem intimidade com o assunto a escrever sobre as potencialidades e possibilidades expressivas da prática artística junto ao espaço urbano. São eles Maria Ivone doa Santos, André Mesquita e Priscila Lolata, todos interessados nas relações entre Arte, Artes Gráficas e ativismo. Aproveitamos ainda para revelar e divulgar a produção discente, através de alguns trabalhos produzidos na disciplina Atelier 2 de Artes Gráficas (que possui um módulo dedicado às intervenções urbanas) e de uma pes-quisa sobre o grapixo em Belo Horizonte, realizada e relatada por Bruno Rios, aluno da habilitação. Contamos ain-da com uma entrevista concedida pelo coletivo argentino Iconoclasistas, que, de maneira instigante, nos estimula a embaralhar ainda mais os (des)limites entre arte, design, ativismo e comunicação.

O projeto gráfico, realizado em parceria com os alunos da habilitação Bruno Rios e Matheus Ferreira, e foi pensado para trazer à tona a superfície poético-gráfica das cidades, criando uma espécie de publicação-objeto, cidade-maquete sobre a qual é possível se lançar uma visão panorâmica desta revista-lugar.

A NATUREZA DO GRÁFICO Que o gráfico está presente nas ruas, nas esquinas, e nos espaços públicos em geral é algo que sabemos, de antemão. O que talvez não nos atentamos ime-diatamente é que as cidades são espaços onde esta ocupação gráfica é também simbólica, e aí reside a maior potência desta aproximação. Trata-se da cons-tituição de um imaginário gráfico e comunicacional, que se nutre de um amplo espectro de possibilidades expressivas, não apenas os cartazes, faixas, panfletos e sinalizações, mas também a própria arquitetura - que projeta sombras geométricas e recorta o céu -,

É a partir dessa revista-lugar que desejamos a todos um bom passeio e uma ótima leitura, e agradecemos mais uma vez à Pós graduação da Escola de Belas Artes da UFMG, sem a qual não seria possível a realização desta publicação.

Brígida Campbell e Fernanda Goulart – editoras da Refil

Page 5: Revista Refil #3
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Anônimo, Nós somos o sítio que nos faz falta. Foto: Priscila Lolata

Algumas percepções

de gráficos na cidade

Priscila Lolata

Olhar a cidade hoje requer destreza. A superposição de informações dos meios de comunicação, principalmente da publicidade, proporcionam ao nosso olhar um emaranhado de formas e escritas que buscam injetar diretamente no nosso subconsciente valores primaz da sociedade capitalista: consumo, velocidade, insatisfação com o velho, dentre tantos outros.

Porém, há formas de desvios dessa imposição que controla a sociedade. São os dispositivos que emergem de uma estética urbana e que podem ser considerados micro-resistências ao poder instaurado. Algumas intervenções artísticas na cidade têm evidenciado uma confluência de percepções que, muitas vezes com poética, humor e ironia, dialogam com questões urgentes da cidade contemporânea e com a maneira com que as pessoas se relacionam com ela.

Nessas ações artísticas, elementos gráficos aparecem com força. O gráfico na cidade, em geral, pode ser expresso por inúmeras formas, panfletos, adesivos, cartazes, faixas, etc. Normalmente, essas linguagens estão vinculadas a informações de estímulo ao consumo, comunicados de serviços ou propaganda política. Mas uma quebra na condição desses suportes gráficos pode gerar uma pausa no condicionamento do dia-a-dia. São o caso de intervenções urbanas propostas por artistas/designers que se apropriam desses meios e fragmentam o cotidiano do citadino com inserções poéticas.

Andando pela rua, com pressa você recebe um panfleto com instruções, não crê muito no que vê, mas para e conferi. São instrução de como você pode usar o saquinho de pipoca na divulgação de suas idéias. Num procedimento semelhante ao que Cildo Meireles propôs na década de 1970, inserir frases ideológicas nas garrafas de Coca-Cola, porém com um suporte mais simples e popular. O panfletinho ensina, passo a passo, com ilustração, como difundir mensagens através de carimbos em saquinho de pipocas, que devem ser en aos entregues aos pipoqueiros. Detalhe: tem a recomendação de que sua idéia seja positiva e super criativa. Finalizando o conteúdo do papelzinho se lê, em grandes letras, a mensagem Acredite nas suas ações, com a logo do coletivo de arte GIA – Grupo de Interferência Ambiental.

Conteúdos mais sutis, com graus de subjetivações altos, também podem ser encontrados pelas cidades. Em Belo Horizonte, quadradinhos coloridos são fixados em ambientes cinzentos da cidade. Palavras como cor e imagem são gravadas nesses suspiros poéticos do espaço urbano. A força da coloração e a sutileza de uma mensagem escrita, com uma única palavra, provocam um impacto que descortina um lugar homogêneo, sem vibração, sem afeto. É na delicadeza do Poro que esse trabalho tem contundência.

Sobre um banco de praça vazio, uma frase compõe a paisagem e forma uma imagem a partir de sua afirmação: “nós somos o sítio que nos faz falta”. A ilustração, um pequeno coração vermelho. É desconcertante estar andando e enxergar provocação com tamanha sensibilidade. A mensagem, como um desabafo, é deixada ali, anonimamente, numa parede de Lisboa afirmando nossa composição e nossa falta.

Page 7: Revista Refil #3
Page 8: Revista Refil #3

Do lado de cá do Atlântico, em Salvador, num ponto de ônibus a frase “Meu endereço é em mim” está ali serena. A poesia, ou como a autora Karina Rabinovitz coloca, “um contratempo da poesia”, é alojada num lugar de espera. Espera essa, pausada pela sutileza da forma, uma caixinha de acrílico com papeizinhos dentro. Nesses bilhetinhos, um despertar do eu em profundidade.

Com a mesma doçura, mas com um simbolismo que revive nossa história, a artista canadense Shelley Miller insere nos muros da cidade painéis feitos de glacê. Dos grafites de Montreal à azulejaria de Salvador, as capas açucaradas dos bolos comemorativos se tornam revestimento de um espaço público horizontal. Aqui no Brasil, após montar seu doce painel, pinta com tinta azul um belo navio, como aqueles que transportavam os negros para trabalharem nas nossas lavouras de cana de açúcar. Há um misto de afeto e dor histórica. O painel fica ao tempo e com o passar dos dias a pseudo azulejaria segue derretendo e a tinta azul, anilina comestível, vai escorrendo como se chorasse. Uma poesia plástica embrenhada de simbolismo e beleza. Não há como negar, é lindo.

Assim, a cidade vai sendo reconfigurada. Ao observarmos ela, na medida do corpo, tem-se muito mais para ver. Detalhes desapercebidos revelam condições e poéticas de um espaço que se movimenta e superpõe informações. Mas há de se ser safo, deslumbrar as sutilezas e absorver as poéticas urbanas. Priscila Lolata é curadora e crítica de arte. Mestre em história

da arte, desenvolve atualmente no doutorado, em urbanismo contemporâneo - UFBA, pesquisa sobre intervenção artística na

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Page 9: Revista Refil #3
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Page 11: Revista Refil #3

(...) saltar no fim da linha, andar sem medono centro da cidade proibida,em meio à multidão que nem notavaque eu não lhe pertencia - e de repente,anônimo entre anônimos, notareufórico que sim, que pertenciaa ela, e ela a mim - , entrar em becos,travessas, avenidas, galerias,cinemas, livrarias (...)lugares que antes eu nem conheciaabriam-se em esquinas infinitasde ruas doravante prolongáveis.

antonio cídero

Page 12: Revista Refil #3

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rant

e a

cris

e da

AID

S no

s Es

tado

s U

nido

s, b

usca

ndo

agir

dir

etam

ente

sob

re e

sta

conj

untu

ra.

Rec

ente

men

te, o

art

ista

arg

entin

o Ju

an C

arlo

s R

omer

o co

meç

ou a

real

izar

um

a in

terv

ençã

o ur

bana

que

con

sist

e em

col

ar p

ela

cida

de

um c

arta

z co

m a

fras

e “A

gora

Tod

os S

omos

N

egro

s”. T

rata

-se

de a

pena

s um

a en

tre

as

vári

as a

ções

que

est

ão a

cont

ecen

do n

este

m

omen

to, g

erad

as a

par

tir d

e um

a co

nvoc

atór

ia

para

dar

, fre

nte

às h

omen

agen

s do

s fe

stej

os

André Mesquita é pesquisador das relações entre arte,

política e ativismo. Mestre pelo departamento de História Social

da USP e atualmente doutorando no mesmo departamento com

um estudo sobre “mapas e diagramas dissidentes”.

Page 13: Revista Refil #3

Tempo e espaço reciprocamente se substituem, numa total integração.

Page 14: Revista Refil #3

uma

reaç

ão p

oste

rior.

Aind

a qu

e em

term

os

com

unic

acio

nais

se

trab

alhe

com

ess

a te

nsão

, go

stam

os m

ais

de p

ensa

r sob

re n

ossa

s cr

iaçõ

es c

omo

mod

alid

ades

abe

rtas

, com

o pa

nora

mas

am

plos

ond

e as

div

ersi

dade

s su

bjet

ivas

pod

em s

er a

ncor

adas

e re

tom

adas

de

dife

rent

es m

anei

ras,

não

com

um

sen

tido

únic

o, e

sim

atr

avés

de

mui

tos

sent

idos

am

plia

dos,

que

des

pert

em, i

nclu

sive

, pr

ovoc

açõe

s qu

e se

quer

ent

reví

amos

.

Nes

se s

entid

o, a

art

e é

uma

form

a a

mai

s de

cria

ção,

que

faz

part

e de

um

rese

rvat

ório

de

recu

rsos

dos

qua

is n

os a

prop

riam

os c

om

liber

dade

par

a em

pree

nder

mod

alid

ades

co

mun

icac

iona

is q

ue, p

or s

ua v

ez, l

iber

amos

pa

ra q

ue o

utro

s(as

) as

reto

mem

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s ad

icio

nem

em

seu

s pr

óprio

s di

scur

sos,

esp

aços

e

prát

icas

.

refill_

No

text

o de

apr

esen

taçã

o do

site

dos

Ic

onoc

lasi

stas

, voc

ês fa

lam

em

: com

unic

ação

, in

form

ação

, im

agem

, rep

rese

ntaç

ões

gráfi

cas,

o

visu

al, a

cria

tivid

ade,

o im

agin

ativ

o, a

es

tétic

a...

e vo

cês

não

usam

a p

alav

ra A

rte.

Po

rque

? Co

mo

você

s vê

m o

s se

us tr

abal

hos

dent

ro d

o un

iver

so d

a Ar

te?

iconoclasistas

_Pen

sam

os n

ossa

prá

tica

a pa

rtir

da id

éia

de u

m la

bora

tório

, o q

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os

abre

um

hor

izon

te d

e fe

rram

enta

s qu

e no

s nu

trem

par

a ge

star

recu

rsos

(art

ístic

os,

com

unic

acio

nais

, pol

ítico

s et

c) e

libe

rá-l

os

para

o u

so c

omum

. Foc

amos

na

idéi

a de

co

mun

icaç

ão -

que

é co

mum

a to

das

essa

s fe

rram

enta

s - p

ois

é o

que

busc

amos

: ger

ar

disp

ositi

vos

cont

ra-h

egem

ônic

os d

e liv

re

circ

ulaç

ão p

ara

a pr

átic

a po

lític

a em

um

am

plo

espe

ctro

de

prop

osta

s. E

m v

ez d

e ar

te

(pal

avra

que

tem

um

sen

tido

mui

to fo

rte

e qu

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edia

tam

ente

rem

ete

- pre

conc

eitu

osam

ente

, cl

aro

- a u

m u

nive

rso

“ele

vado

”, a

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a di

men

são

prát

ica

“des

cont

amin

ada”

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pr

odut

ores

“ilu

min

ados

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refe

rimos

pen

sar

em fe

rram

enta

s e

prát

icas

art

ístic

as o

nde

o qu

e se

bus

ca p

rinci

palm

ente

é in

terp

elar

a

um(a

) e a

out

ro(a

), pr

ovoc

ar-l

hes

uma

com

oção

que

de

algu

ma

man

eira

os

faça

se

pos

icio

nare

m e

, no

mel

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os c

asos

, im

puls

ione

um

a pr

átic

a tr

ansf

orm

ador

a.

r_Pa

ra v

ocês

qua

l ser

ia o

pap

el d

a ar

te?

E co

mo

você

s re

laci

onam

com

unic

ação

e a

rte?

i_N

ão g

osta

mos

de

pens

ar e

m te

rmos

de

“fun

ções

” ou

“pa

péis

”, p

ois

isso

impl

ica

conf

erir

eficá

cia

a um

a fe

rram

enta

, ant

even

do

ENTREVISTA_ICONOCLASISTAS

Um “Laboratório de Comunicação e Recursos Contra Hegemônicos de Livre Circulação”, assim se denomina o coletivo argentino Iconoclasistas, que - através de recursos (palavra potente, mas pouco usada em nosso vocabulário artístico) de investigação e de Design Gráfico - tentam romper com as estratégias de comunicação capitalista, ativando e reinventando o imaginário político e (geo)gráfico das cidades. Com trabalhos que incentivam práticas colaborativas e de resistência, os artistas (palavra estrategicamente não utilizada por eles, como veremos) argentinos efetivamente contribuem para o entendimento do potencial crítico, estético e político das Artes Gráficas e das Artes Visuais, em seu campo expandido. Sem perder a ternura.

Page 15: Revista Refil #3

#

Page 16: Revista Refil #3

inve

stig

açõe

s ac

adêm

icas

. Nes

te c

aso

clar

amen

te re

aliz

amos

um

a m

istu

ra d

e in

form

açõe

s, e

em

ger

al p

rocu

ram

os n

os

guia

r ass

im, m

as d

epen

de s

empr

e do

tipo

de

info

rmaç

ão d

ispo

níve

l com

rela

ção

a um

a te

mát

ica

(por

exe

mpl

o co

m re

laçã

o ao

s ep

isód

ios

de a

ssas

sina

tos

de jó

vens

pob

res

pela

s fo

rças

pol

icia

is -

que

aqui

é c

ham

ado

“gat

illo

fáci

l” - s

ó ex

iste

um

a co

orde

nado

ra

que

se d

á ao

trab

alho

de

reun

ir e

sist

emat

izar

es

ses

caso

s, e

todo

s os

ano

s ap

rese

nta

um

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rme

disp

onib

iliza

do li

vrem

ente

)n

* ”Or

gani

zar

el p

esim

ism

o no

es

otra

cos

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e tr

ansp

orta

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era

de la

pol

ítica

a la

met

áfor

a m

oral

y

desc

ubri

r en

el á

mbi

to d

e la

acc

ión

polít

ica

el á

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to

de la

s im

ágen

es.”

Wal

ter

Benj

amin

inte

rnet

(mui

tos

são

tam

bém

impr

esso

s e

dist

ribuí

dos

de m

ão e

m m

ão) e

é im

poss

ível

co

nhec

erm

os a

der

iva

dess

es m

ater

iais

. Às

veze

s to

mam

os c

onhe

cim

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por

que

nos

escr

evem

, nos

con

tam

, nos

man

dam

foto

s ou

crô

nica

s. O

utra

s ve

zes

cruz

amos

com

pr

oces

sos

repr

oduz

idos

em

obr

as d

eriv

adas

, na

rua,

em

pub

licaç

ões

ou n

a in

tern

et m

esm

o.

Mas

o in

tere

ssan

te é

a li

berd

ade

com

a q

ual

eles

se

mov

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cam

inho

pró

prio

que

tom

am

a pa

rtir

das

reap

ropr

iaçõ

es e

inqu

ieta

ções

de

outr

os, e

sse

é um

dos

gra

ndes

pot

enci

ais

da

livre

cria

ção

que

nos

deix

a m

uito

feliz

es.

r_Pa

ra a

pro

duçã

o do

mat

eria

l voc

ês

tem

ace

sso

a um

a sé

rie d

e in

form

açõe

s es

trat

égic

as. O

nde

você

s co

nseg

uem

es

sas

info

rmaç

ões

e co

mo

se d

á o

seu

proc

essa

men

to?

i_É

impo

rtan

te e

scla

rece

r que

nos

sos

trab

alho

s nã

o pr

eten

dem

ser

“ac

adêm

icos

”,

mas

tent

am o

fere

cer u

m p

anor

ama

da

situ

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a p

artir

de

ferr

amen

tar g

ráfic

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mun

icac

iona

is q

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irvam

com

o in

trod

ução

ao

tem

a, c

omo

uma

base

par

a tr

abal

hos

post

erio

res

(de

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ism

o, d

e or

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zaçã

o, d

e ofi

cina

s et

c).

Bus

cam

os d

ifere

ntes

font

es d

e in

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ação

(o

ficia

is e

alte

rnat

ivas

) e c

ontr

asta

mos

os

dado

s pa

ra te

r um

pan

oram

a da

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, en

tão

sele

cion

amos

as

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es d

e ac

ordo

com

o

tipo

de m

ater

ial q

ue s

e pr

eten

de e

labo

rar.

Reco

rrem

os à

inte

rnet

, aos

livr

os e

às

hist

ória

s or

ais

dos

prot

agon

ista

s. P

or e

xem

plo:

na

real

izaç

ão d

os m

apas

de

saqu

es d

os b

ens

com

uns

(Atla

s Co

lect

ivo)

fize

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ofic

inas

de

map

eam

ento

pel

a pr

ovín

cias

da

Arge

ntin

a, c

om

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imen

tos

soci

ais

orga

niza

dos,

par

a re

sist

ir

à de

pred

ação

de

seus

terr

itório

s. A

info

rmaç

ão

que

saiu

des

ses

proc

esso

s de

inte

rcâm

bio

e so

cial

izaç

ão c

olet

iva

se c

ompl

etou

com

mão

de

ferr

amen

tas

artís

ticas

, cria

tivas

, co

mun

icac

iona

is (s

tenc

il, fl

yers

, car

taze

s,

inte

rven

ções

urb

anas

, mos

tras

itin

eran

tes,

vi

deos

, pub

licaç

ões,

pos

tere

s et

c), t

ambé

m

tent

amos

reto

mar

div

erso

s es

tado

s de

ân

imo

no m

omen

to d

e co

mun

icar

(ale

gria

, ap

oder

amen

to, f

úria

, res

istê

ncia

, hum

or...

is

so s

im; n

ós e

vita

mos

o d

ram

a ou

a m

isér

ia

porq

ue n

ão q

uere

mos

par

alis

ar, m

as s

im

luta

r com

ale

gria

rebe

lde,

ape

sar d

e tu

do)

e co

nstr

uir r

ecur

sos

reto

man

do d

iver

sas

form

as c

omun

icat

ivas

(de

cunh

o m

ais

jorn

alís

tico

ou m

ais

liter

ário

e p

oétic

o, a

inda

qu

e de

sejá

ssem

os a

prof

unda

r um

pou

co m

ais

nest

e úl

timo,

ou

seja

, est

á tu

do n

a m

ão! É

uma

ques

tão

de im

agin

ar, e

xper

imen

tar e

cria

r se

m li

mite

s!

r_Co

mo

equi

libra

r a le

veza

do

otim

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o e

expl

osiv

idad

e do

pen

sam

ento

crít

ico?

i_N

ão p

odem

os p

ensa

r abs

trat

amen

te s

obre

is

so, e

sim

em

cad

a m

omen

to h

istó

rico

em

que

vive

mos

. E n

ão p

ensa

ríam

os s

obre

is

so s

ozin

hos,

mas

em

art

icul

ação

ativ

a e

part

icip

ando

da

rede

de

solid

arie

dade

s e

afet

os li

gado

s ao

s m

ovim

ento

s so

ciai

s e

agru

pam

ento

s em

todo

paí

s. L

o qu

e te

mos

cl

arez

a é

que

é pr

ecis

o ev

itar a

par

alis

ia, a

al

iena

ção

e a

indi

fere

nça

em q

ualq

uer d

este

s ex

trem

os. Q

uere

mos

enc

ontr

ar, j

unta

r, m

escl

ar

e at

ivar

col

etiv

amen

te.

r_Vo

cês

dese

nvol

vem

um

a sé

rie d

e ofi

cina

s e

trab

alho

s co

labo

rativ

os e

m p

arce

rias

com

os

mov

imen

tos

soci

ais.

Gos

taría

mos

de

sabe

r qu

ais

são

os d

esdo

bram

ento

s de

ste

trab

alho

. Qu

ais

são

as re

spos

tas

e os

resu

ltado

s qu

e vo

cês

cons

egue

m m

ensu

ram

?

i_M

uita

s ve

zes

desc

onhe

cem

os o

s de

sdob

ram

ento

s do

s tr

abal

hos.

Ger

amos

pr

oces

sos

livre

s qu

e fic

am à

dis

posi

ção

na

r_Pa

ra v

ocês

toda

art

e é

polit

ica?

i_Si

m, e

nqua

nto

impl

ica

uma

tom

ada

de

posi

ção

- ativ

a, c

rític

a, in

dole

nte,

cín

ica

etc

- fr

ente

às

cond

içõe

s só

cio

hist

óric

as, a

trav

és

das

quai

s é

gera

da a

prá

tica

do c

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r. Va

le d

izer

, de

que

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eira

o m

undo

em

que

vi

vem

os n

os a

trav

essa

de

cabo

a ra

bo e

com

o no

s da

mos

con

ta d

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situ

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, pen

sand

o-a

em d

ifere

ntes

nív

eis

da v

ida,

que

vão

dos

m

ais

cotid

iano

s e

gera

is à

s in

stân

cias

do

pens

amen

to in

terio

r e à

s in

quie

taçõ

es s

obre

a

vida

.

r_N

o ví

deo

“Cor

azon

es”

há u

ma

fort

e ca

rga

de a

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e h

umor

. Apr

ovei

tand

o a

fras

e de

B

enja

min

* que

est

á em

“Re

ceta

par

a un

a pi

eza

de a

gita

ción

”, o

pes

sim

ism

o ta

mbé

m p

ode

ser

orga

niza

do c

om a

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, poe

sia

e hu

mor

?

i_Po

de e

dev

e. S

egui

ndo

esta

idéi

a de

lanç

ar

Page 17: Revista Refil #3

#

Page 18: Revista Refil #3

Pergunto-me o que de fato sou e o que faço. Lancei-me no espaço urbano e desenhei linhas de fuga para praticar a arte. Trabalho atualmente em duas Frações localizadas, Dilúvio e Camelódromo,1 que delimitei como lugares de estudo, ambas em Porto Alegre. A primeira é extensa (16 km de um arroio retificado que atravessa a cidade) e a segunda é intensa e condensada (atividade que se iniciou como comércio informal na praça XV e que hoje se encontrafixada num lugar a ela destinado).

Mantenho-me numa linha de tensão. O que eu faço nestas duas frações é arte! O que eu faço nestas duas Frações será arte? Três questões centrais e suas ramificações me impulsionam e as pratico, seja em exposições ou ações públicas: O que foi pensado? O que construído? O que resiste ao tempo? Repito mentalmente quando estou diante do espelho

todos os dias, ao escovar os dentes: “Eu sou uma artista”. Escrevo esta frase na minha agenda, em intervalos aleatórios e nos apontamentos da pesquisa, para que eu a encontre ao longo do ano. Não se trata somente de lembrar-me que tenho duas Frações de trabalho na cidade de Porto Alegre, mas, sobretudo de lembrar-me que as observarei pelo prisma da arte, dada minha circunstância primeira.

EXERCÍCIO DE AUTO-ANÁLISE

Maria Ivone dos Santos

Procuro, neste exercício de auto-análise, observar quando o urbano passou a me afetar, ou melhor, quando estas questões passaram a me trabalhar. Talvez eu deva relatar uma ferida que se abriu no dia em que percebi que a minha cidade, Vacaria, chegou às bordas dos campos de cima da serra.

1 Informações, acesso a documentação e aos textos da pesquisa As extensões da memória: a experiência artística e outros espaços: http://www6.ufrgs.br/escultura/pesquisa/index.htm

Page 19: Revista Refil #3

... “assim que no caminho me deparavam lugares conhecidos, depois novos, desconhecidos, ou outros que eu só conseguia lembrar-me inexatamente, a cidade tornou-se em minhas mãos um livro, no qual eu lançava ainda rapidamente alguns olhares, antes que ele me desaparecesse no baú do depósito por quem sabe quanto tempo.” walter benjamin

Page 20: Revista Refil #3

Lembro-me das conversas nervosas em família e dos nossos medos de perder o torrão natal para abrigar a expansão da área industrial. Aflora a memória os ruídos de moto-serra e as nuvens de serragem que passamos a respirar na granja Monte Claro, quando tivemos a frente desapropriada. Lembro da barreira de árvores que foi plantada na área em frente da casa e do galpão, para isolar a cidade que avançava a passos largos em direção a terras, arroios e matos. Lembro do fogo das queimadas dos vizinhos que matizavam nossa colina. Lembro da pedreira de basalto, linda imponente, aos poucos sendo comida por uma concessão dada à prefeitura. O que dela resta hoje me pertence e tenho a minha prospecção própria enquanto eu viver e irei lutar para estancar esta ferida. Por quanto tempo?

Eu também vi se degradar o córrego que atravessava a minha cidade natal e no qual era depositado o lixo. Sapatos desparceirados boiavam seguidos de sacos e outros objetos não identificados. Cachorros esquálidos lambiam os pés de mendigos e bêbados e a vegetação das bordas segurava tudo o que vinha pela corrente, criando volumes multicoloridos e heterogêneos ao longo das margens.

Quando percorro a Fração Localizada: Dilúvio, em Porto Alegre sinto-me em zona de negociação política e escuto Perec e Lefebvre. Ali não sou a proprietária, mas pratico o espaço e o observo, a sós ou em grupo, sem ser geógrafa e tampouco historiadora. Ajo enquanto artista e encosto-me, acaricio, ausculto as vozes e tempos de lugares urbanos, nutrindo-me dos saberes daqueles que deles se ocupam. Cotejo a realidade movida pelas três perguntas centrais: O que foi sonhado? O que foi construído? O que resiste ao tempo? Caminho e desenvolvo táticas, métodos e narrativas ancoradas no real.

Dei-me conta, porém, que ajo em dois planos. Tenho as ações rasteiras, dans le temps, sendo animadas pela minha biografia, enquanto trabalha em mim outro plano mais afastado, que me fez incursionar por zonas de sentimentos hors le temps. Estes dois planos formalmente não se tocam, mas se alimentam mutuamente. Se as três questões e as práticas de reconhecimento territorial in loco, me permitem ancorar pontos de dúvida no espaço urbano, de forma a nele agir enquanto sujeito histórico, nas Cartografias de um contato eu rastreio o desejo que as move e as destaco. Tenho na cabeça sentimentos que me trabalham, mas meu coração em carne viva dói em mim enquanto rastejo. Eu sou uma artista e estou no mundo. Eu sou uma artista e dele me afasto.Porto Alegre, 6 de setembro de 2010

Maria Ivone dos Santos - Artista plástica, professora no Instituto de Artes da UFRGS e coordenadora do Programa Formas de Pensar a Escultura

Page 21: Revista Refil #3

A paisagem é apenas uma abstração

Page 22: Revista Refil #3

#

Renato Almeida Júnia Fatorelli e Renato GaiaClarice LacerdaDaniela MoreiraTrabalhos realizados por alunos do atelie 2 de artes gráficas

Page 23: Revista Refil #3

#

DiogoDroschi e DanielHazanPlínio Alcântra Rafael CamargosRita VianaTrabalho ColetivoHenrique Teixeira

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O GRAPIXOBruno Rios

O grapixo, como o próprio nome indica, guarda re-lações diretas entre o grafite e a pixação, principal-mente a pixação paulista, carregando consigo as características de verticalidade e tratamento nos traços encontrados em São Paulo.

A pixação carrega desde o seu nascimento uma carga de subversão, encontrada na maneira como ela se insere, nas formas e nos lugares da paisagem urbana. Sendo por vezes apontada com aversão pela sociedade, onde parâmetros de belo/feio, público/privado podem ser relativizados.

O grafite (graffiti) passa pelo mesmo repúdio em seu aparecimento nas grandes capitais, no entanto sendo absorvido e aceito pela massa de maneira mais rápi-da. Encontra-se hoje numa posição de aceitação que o permite transitar entre as artes plásticas, o design, a publicidade, chegando ao desenvolvimento de projetos onde toma para si o papel de antídoto da pichação, lem-brando aqui que ambos surgiram como métodos sub-versivos.

O grapixo se torna potente à medida que usufrui da es-trutura da tipografia e do grafismo da pixação, inserin-do-os na aceitação pública através de um tratamento cromático advindo do grafite. Encontra-se aí seu poten-cial discursivo, metalingüístico e estético.

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REALIZAÇÃO: Núcleo de Produção em Artes Gráficas da Escola de Belas UFMG

APOIO: Gramma (ateliê, reflexão e memória das artes gráficas), Pós Graduação EBA-UFMG e Gráfica O Lutador

EDITORAS: Brígida Campbell e Fernanda Goulart

Expediente:PROJETO GRÁFICO: Brígida Campbell, Bruno Rios e Matheus Ferreira

ARTIGOS: Priscila Lolata, Maria Ivone dos Santos, André Mesquita e Bruno Rios

TRADUÇÃO ENTREVISTA: Fernanda Goulart e Sara Stradioto.

Contato: [email protected]

A versão eletrônica pode ser baixada em: http://www.revistarefil.wordpress.com/

A montagem desta revista foi feita manualmente. Desculpem as imperfeições.

Pode ser reproduzida deste que citada a fonte

FOTOS: Brígida Campbell, Bruno Rios, Dereco, Lorena Borges e Matheus Ferreira

Agradecimentos: Fernando Mencarelli, Pós Graduação EBA/UFMG, Zina, alunos que participaram do mutirão, Sara Stradioto e gráfica O Lutador.

BH - outubro de 2010

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Cada lugar é a sua maneira o mundo