revista manuelzao 22

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Confira o resultado do concurso “Premiando a Educação” Página 12 Aterro sanitário da RMBH provoca discussão sobre destino de lixo das cidades Página 08 Coordenador do curso de Geografia da Newton Paiva fala de preservação ambiental Pampulha: recuperando Pampulha: recuperando mais que um cartão postal mais que um cartão postal Página 12 Página 9 Escultura de August Zamoisky no Museu de Arte da Pampulha; ao fundo a lagoa

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Page 1: Revista Manuelzao 22

Confira o resultado doconcurso “Premiando aEducação”

Página 12

Aterro sanitário da RMBHprovoca discussão sobre destino de lixo das cidades

Página 08

Coordenador do curso deGeografia da Newton Paivafala de preservação ambiental

Pampulha: rrecuperandoPampulha: rrecuperandomais qque uum ccartão ppostal mais qque uum ccartão ppostal

Página 12

Página 9

Escultura de August Zamoisky no Museu de Arte da Pampulha; ao fundo a lagoa

Page 2: Revista Manuelzao 22

Outra visão

“Fico impressionado com a atitude das pessoas emamaldiçoar a chuva, logo que caem os primeiros pingosao iniciar o período chuvoso. Já me cansei de dizer paraessas pessoas quando perto de mim, que jogam "blas-fêmias à São Pedro", para que elas parem e pensem umpouco. Podem olhar à sua volta, no horizonte, para baixoe não verão nada que não dependa da água e é lógico dachuva. Nem mesmo o piche do asfalto exclui a água noseu manejo e aplicação, nem mesmo o próprio coletivoque a transporta, etc, etc. Há muito noto que a mídia tratao período chuvoso como tempo ruim. O repórter diz: " Otempo vai melhorar hoje". Quer dizer: Fará Sol.

Assim como se a chuva fosse o fim da picada, temporuim. O homem do campo tem outra visão, ele precisa dechuva, muita chuva, é claro que não quer tromba d'água.A mídia tem que rever esta postura, pois esta colocaçãovai de encontro total às necessidades do homem docampo. O ruralista é um batalhador, não tem férias, é umherói. Não se vê homem do campo pedindo Sol para ir àpraia tomar cerveja e bater pandeiro. O homem docampo não tem culpa do Poder deixar ou fazer vistasgrossas para pessoas carentes se aboletarem em barran-cos e lugares perigosos.

Essas pessoas vivem em risco 24 horas. É claro quenão precisa chover muito para mostrar isso. O homem docampo não é culpado das grandes cidades serem mal-projetadas e geridas, fazendo com que as águas, achandosó asfalto, cimento e córregos canalizados irão se jun-tando e bravamente procurando um mesmo desaguar,causando um dilúvio mais lá adiante. (...)

Arnaldo Vicente Pinto de Carvalho, BH/MG

Conscientização

“Parabenizo pela publicação Manuelzão, que paraminha surpresa já está no 5º ano. Oxalá tenha vida longae resultados palpáveis. Bem, no seu exemplar de nº 20,de setembro de 2002, li alguns artigos sobre os aspectosurbanos de capeamento do solo e me impressiono quehajam pessoas preocupadas com isso. Como cidadão deBH, entretanto, percebo que ainda estamos longe daconscientização das pessoas, e mais que isso, da efetivaação em prol do ambiente.

Dentro do meu mundinho, visualizo que no bairro daPompéia, que descobri há cerca de 8 anos, oriundo deum bairro que se encheu de prédios, está se extinguindoo espírito bucólico do verde, das casas com árvores fron-dosas e pomares apetitosos, das ruas calçadas de pedras,tidos como caducos e antiquados (pelos atuaismoradores, alguns, herdeiros dos idosos que se tornaraminválidos ou já cumpriram seu papel nesse mundo), paraserem substituídos pelo poderoso apelo do asfalto, carrosvelozes e prédios de apartamentos. A cidade urge, osespaços têm de ser tomados e a natureza subjugada, can-tam os poetas dos novos tempos.

Estou lamuriento? Pois vejam que no quarteirão quemoro da rua Antônio Justino, durante esses 8 anos, ape-nas, deram fim, com autorização da Prefeitura, em cercade 7 árvores, que não foram substituídas. E não serão.Atualmente, temos 5 árvores nos passeios. Imagino queessa epidemia seja geral, pois percebo que de dia claro,morcegos penduram-se nos galhos da árvore defronte àminha casa, às vezes pássaros exóticos, denotando odevastamento do verde em derredor.

Os meus vizinhos se vangloriam de terem ficadolivres das produtoras de folhas que em seu julgamentoapenas atrapalham a passagem das pessoas. Os passeios,realmente são estreitos. Quanto às ruas, querem a todocusto asfaltar. Na hora do almoço, nessas ruas estreitas,vejo passar céleres, carros com mães preocupadas emdeixar seus pombinhos nas escolas, para depois conti-nuarem "voando baixo". Imaginem se houver asfalto.Alego o incômodo da elevação da temperatura na pre-sença do asfalto, a segurança das pessoas, o filtro eamortecimento da quantidade e velocidade das águasque é a rua calçada. Olham-me como se fôsse um evan-gelizador de praça pública, e sorriem com desdém.

Aí, fico desanimado e ressuscito a máxima "sóbatendo com um gato morto até o gato miar".

Isso tem solução para essa vida, ainda?

Rubaiyát Pinheiro de Araujo Moreira, [email protected]

Manuelzão Belo Horizonte, Março / 2003

Contatos com o Projeto:Secretaria Geral - Neiliane C.Couto(31) 3248-9818/19Manuelzão vai à escola(31) 3248-9810Telefax (31) 3248-9817 e 9819 [email protected]

CoordenadoresApolo Heringer Lisboa-Coordenador geral Antônio Leite Alves, Marcus Vinicius Polignano, Antônio Thomáz Gonzaga da Mata Machado, Tarcísio Márcio de Magalhães Pinheiro. (Professores da UFMG)

Envie sua contribuição para o Jornal Manuelzão.

Redação e EdiçãoElton Antunes (MTb 4415 DRT/MG), Sílvia Araújo, Jonas Rodrigues,Louraidan Larsen, Luana Cury, Professora Maria Alice EmboavaTelefone: (31) 3248-9959

Projeto Gráfico e DiagramaçãoProcópio de Castro

FotosArquivo do Projeto Manuelzão, Breno Nunes, Carlos EduardoMascarenhas, Centro Universitário Newton Paiva, Cida Santos, PauloBem, Paulo Martins e Procópio de Castro ImpressãoSempre Editora

Tiragem100.000 exemplares

É permitida a reprodução de matérias e artigos, desde que citados afonte e o autor. Os artigos assinados não exprimem, necessáriamente,a opinião dos editores do jornal e do Projeto Manuelzão.

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E d i t o r i a l C a r t a sÁguas malditas: um julgamento equivocado

Do ponto de vista científico, é questionável aimpressão generalizada que ficou da relaçãocausa/efeito entre as chuvas de janeiro último e os

desabamentos de barracos, de pontes, de estradas e mortes naregião metropolitana de BH. A ilusão surgiria em razão daestreita associação cronológica entre os eventos: chuvas abun-dantes e os desmoronamentos, levando a um diagnóstico erra-do com sérias consequências práticas e ideológicas. A quasetotalidade das moradias da RMBH não desabou, nos esquece-mos. E as chuvas, dádivas dos céus, passam a serem malditas.

Recentemente, sofremos a ameaça do "apagão" e o povobrasileiro rezou pelas chuvas. As águas vieram abundantes,mas não estamos preparados para recebê-las. Pelo contrário,secularmente, fomos desarranjando o sistema geohidrológicoda Terra, sobretudo pelo desmatamento e impermeabilizaçãodo solo - devido ao não-saber generalizado no uso e ocupaçãodo território rural e urbano. A última grande intervenção nabacia do Arrudas, que foi o Prosam, seguiu o figurino ultra-passado das retificações e canalizações de córregos e imper-meabilização de ruas. A grande esperança que surge em BH éo Drenurbs (tratamento natural dos vales e saneamento ambi-ental com criação de parques lineares e mobilização para opovo assumir estas obras). O reenquadramento da bacia doIsidoro, já aprovado em audiência pública por iniciativa lou-vável da Secretaria do Meio Ambiente de BH, é outroexemplo positivo.

A cobertura da grande mídia (meios de comunicação demassa), foi negativa. Ela não dispõem de jornalismo qualifica-do nestas questões, informando mal e confundindo mais queesclarecendo. Foi sensacionalista, procurando culpados novarejo e bodes expiatórios institucionais. Alguns poucos entre-vistados fizeram a diferença. As prefeituras ficam na defensi-va, ora por falta de propostas mais abrangentes, ora porimpotência diante do vulto e natureza do problema acumuladoem um século, e das cobranças de medidas imediatas por todaparte. A situação assume conotação política imediatista,impossibilitando um debate sincero e construtivo. Corremos orisco de não aproveitar o momento para equacionar estaquestão.

O importante agora é fazer o balanço dos acontecimentose formular uma proposta daqui para frente. Os locais maisatingidos foram vilas e favelas - casebres nas beiras de córre-gos e morros - e estradas. As famílias que sobrevivem napobreza absoluta foram as principais vítimas. Mas poderia tersido no Centro da cidade, na Cidade Nova, nas Av. Prudente deMorais ou Prof. Morais, locais que obras caras em passadorecente deram uma trégua. Percebemos claramente a relaçãodas tragédias com erros na gestão ambiental urbana e com apolítica de segregação social e técnica que condicionam onosso crescimento econômico e a urbanização. Todas as áreasjunto aos córregos e encostas deveriam ser imediatamente ocu-

padas pelas administrações municipais, através de lei e comapoio da sociedade e do Judiciário, com projetos paisagísticossimples, preservando-as para outros usos, como lazer e expan-são de cheias, antes que sejam invadidas para construção demoradias inseguras.

Os problemas que atingem a RMBH reclamam de planeja-mento ambiental, com integração sistêmica de setores adminis-trativos municipais e estaduais, mais que de dinheiro nas secre-tarias de obras em cada município. O inchaço das periferias,devido ao êxodo rural, foi um fenômeno impressionante. O mer-cado econômico que atraiu a mão-de-obra rural para a indústria;o mercado imobiliário, que fez loteamentos totalmente sem sus-tentabilidade ambiental; as administrações municipais e estadu-ais, que não previram as consequências nem cuidaram do plane-jamento urbano (habitação, saneamento, educação), quetrataram os problemas sociais com visão eleitoreira, que reti-ficaram e canalizaram rios, matando-os junto com lixo e esgo-tos, as omissões e intervenções desastradas do pensamento dasuniversidades, dos partidos e da sociedade civil, são todos partedo problema que aflorou em janeiro. As águas das chuvas fun-cionaram como instrumento de controle de qualidade das inter-venções antrópicas de nossa civilização.

As águas estão no Gênesis. "A Terra era um vazio, sem nenhum ser vivente, e estava

coberta por um mar profundo. A escuridão cobria o mar, e oEspírito de Deus se movia por cima da água". Este Poseidonentão criou a luz, a terra firme, os seres viventes e a humanidade,ordenando a casa. Durante as longas madrugadas em torno de 15de janeiro e da condição ameaçadora das águas, todos queriam aluz do Sol, terra firme e viver em paz, como após o Dilúvio.

O conhecimento científico das leis naturais permite a subs-tituição do medo e do sentimento de culpa diante dos deusesenfurecidos do passado, pela possibilidade da gestão cons-ciente do ciclo geohidrológico no espaço territorial natural dabacia pluvi-fluvial, integrando participação social, educaçãoambiental, sustentabilidade econômica, social, ambiental,preservação da biodiversidade e dos ecossistemas naturais.Isto é do agrado dos deuses. A sintomática má relação com aságuas não tem mais sentido e reflete o nosso profundo malestar eco-civilizatório ao mesmo tempo que aponta o caminhoda superação das atuais limitações de nossa consciência. Aságuas permeiam todos os sistemas: geológico, vegetal, animal,social. São o fio da meada destes processos e eixo da inte-gração da história natural e social. Porisso, a tendência con-temporânea de situar a questão ambiental no centro da questãodo desenvolvimento e da ocupação do território, e de colocaras águas no centro da questão ambiental, traz consigo atendência de reformular o pensamento técnico-científico vici-ado no pensamento setorizado e especializado, sem nenhumalcance sistêmico. As águas assumem, asssim, transcendentalpapel metodológico na dinâmica das transformações de nossamentalidade civilizatória.

• OPINIÃO •

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As pessoas com mais de50 anos freqüente-mente lamentam

sobre o fato de que, em suainfância, os rios eram maislimpos e tinham peixes. Essaafirmativa seria mero saudosis-mo na base do "antigamente, avida era melhor" ou seria uma cons-tatação da realidade? A resposta é: issoé verdade. O que apresentamos, a seguir, pre-tende mostrar como essa degradação vem ocorrendo no passadorecente.

No Brasil, ao final dos anos 50, apenas 40 % da populaçãohabitava as cidades. Estas, por sua vez, não eram tão grandescomo são hoje. Belo Horizonte e sua região metropolitana - quetêm hoje população de 4,4 milhões de habitantes - possuíamapenas cerca de 1,0 milhão àquela época. E toda essa populaçãoconsome água e naturalmente produz resíduos - esgotos e lixo,cada vez mais significativos.

Até 1970, os serviços de saneamento não tinham planeja-mento definido. E muito menos disponibilidade de financia-mento. Algumas poucas cidades conseguiam verbas, mas aindaassim esbarravam em dificuldades operacionais. Foi quando oGoverno Federal instituiu o PLANASA - Plano Nacional deSaneamento, cujo objetivo era financiar a implantação deserviços de água e esgotos mediante a utilização de recursosfinanceiros do FGTS. Em Minas, a COPASA MG foi instituídapara fins de implantação e expansão dos serviços de saneamen-to básico, e em nível do Estado. Houve, assim, maior disponi-bilidade de recursos. Mas o déficit era tão grande, que foinecessário priorizar as demandas, dando-se ênfase - de início -

aos serviços de água. Numa comunidade carente de tais serviços, ninguém ques-

tiona o que tem que ser feito. Em primeiro lugar, é o abasteci-mento de água - em qualidade e quantidade adequadas. Um bomsistema de abastecimento pode resolver até 85% dos problemassanitários de uma comunidade. O que foi sendo construído, apartir daí, em sistemas de esgotos, ficava restrito às suas redescoletoras. Para a população atendida com água não havia do quereclamar, pois que "tirando a sujeira do meu pé, o problema estáresolvido" - conforme o dito popular.

Com o aumento da quantidade de água disponível por habi-tante e a rede coletora lançando os esgotos diretamente nos cur-sos d'água, a degradação dos córregos e rios piorou a olhos vis-tos. E num prazo relativamente curto

Se para a solução dos sistemas de água e esgotos, que con-tou com boa estrutura de gestão e recursos, se enfrentou tantasdificuldades, para a questão do "lixo" - também incluído nosaneamento básico das comunidades - a situação foi muito pior.A indigência de recursos colocou o lixo como o primo pobre dosaneamento urbano. A sua destinação final, na maioria dascidades, tem sido o velho "lixão" - sem qualquer controle sani-tário e ambiental e, em geral, localizado às margens dos cursosd'água.

Deve-se ressaltar que os serviços e obras de esgotos são decusto mais elevado - e tecnicamente mais complexos - do que asestações de tratamento de água. No primeiro caso, as tubulaçõessão mais profundas, sofrem danificações com mais freqüência eas suas estações de tratamento - as ETEs - são cerca de seisvezes maiores em área física construída. Serviços e obras deesgotos demandam, portanto, investimentos e tarifas maioresque as de água. Na Europa, os custos da prestação dessesserviços são de 1,5 a 3,0 vezes superiores aos de água.

A nossa população no geral - evidentemente, por desco-nhecer esse fato - ainda apresenta alguma resistência em aderir

aos sistemas de esgotos públicos, devido ao valor da fatura daprestação de tais serviços. Exemplo disso, é o que acontece emLagoa Santa. A COPASA construiu ali, há cerca de quatro anos,um moderno e completo sistema de esgotos, inclusive cominterceptores na lagoa e estação de tratamento. Isso serviria paraenquadrar aquela cidade em melhores indicadores de IDH -Índice de Desenvolvimento Humano, tendo em vista as infra-estruturas existentes não só para esgotos como para água. E atéhoje, somente 40% da sua população aderiu aos serviços deesgotos..

No nosso país, e desde a década de 80-90, com o despertarde uma "consciência ambiental", a sociedade vem pressionandocada vez mais para a mudança do quadro geral relativo àdegradação do nosso meio ambiente. Mas vejamos que o con-trole da degradação ambiental não se restringe simplesmente aosaspectos do saneamento básico. Ao contrário, extrapola-os.

Na Grande BH, registram-se, recentemente, empreendi-mentos de vulto da COPASA através dos projetos e obras dasETEs Arrudas e Onça, cujo objetivo direto é a despoluição doRio das Velhas, sem contar outras de menor porte e finalidadesregionais, a exemplo do Sarandi na Pampulha. Por parte dosMunicípios, além dos aterros sanitários de sua iniciativa, realça-se a sua ação fiscalizadora sobre as infrações em geral cometi-das por particulares, e até mesmo por órgãos públicos.

Todavia, não se combate a degradação do meio ambiente sócom políticas, recursos financeiros, empreendimentos e açõesfiscalizadoras do poder público. É igualmente fundamental a"mudança de padrões culturais" do nosso povo, sem a qual asdemais ações perdem muito da sua relevância, e mesmo do seualcance. Por exemplo, vejamos que a Praça Sete de Setembro -coração geográfico de Belo Horizonte - é varrida oito vezes aodia e permanece suja, porque se joga lixo fora das lixeiras.

José Nelson de A. Machado - Diretor Nacional da ABES -Ass. Brasileira de Engenharia Sanitária e Ambiental

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José Nelson de A. Machado *

Saneamento no Brasil - há soluções possíveis• OPINIÃO •

Manuelzão Belo Horizonte, Março / 2003

Odebate do aterro sanitário em BH é um debatenacional. O Governo Federal pretende estabeleceruma política única, que englobe saneamento básico

e a política sobre o tratamento do lixo estará incluída. A idéia édar um enfoque global aos problemas do saneamento ambiental.O aterro sanitário só é necessário como destino final de resídu-os inaproveitáveis, após a transformação da matéria orgânica nacompostagem e dos materiais recicláveis pela indústria. E temosa obrigação de nos prepararmos para isto, como prioridade.

A concepção do grande aterro centralizado e universal, paraonde tudo é levado, que virou moda enquanto diretriz única parasuperar o lixão, independente se aderem ou não à biorremedi-ação, é coisa do passado, é cara, e deve ser enterrada. A popu-lação rejeita estas obras em seu bairro, como no caso do CapitãoEduardo, em BH, e está na hora de mudar o paradigma e proporalternativas tecnológicas e econômicas muito mais lógicas. Abase desta mudança é a gestão do lixo com mobilização social eeducação ambiental, no território da bacia hidrográfica. Nestesentido, a PBH precisa ouvir a sociedade e tomar uma decisãoarrojada, baseada na revisão de suas próprias premissas.

O chorume, produzido em grande quantidade nos aterros,está sendo enviado para os nossos rios. Seu grande volume epoder poluidor, medido em DBO (demanda bioquímica deoxigênio), não está sendo convenientemente tratado, por difi-culdades técnicas, por falta de investimentos, por má avaliaçãogeológica das possibilidades de tratamento. Mas, ainda quefosse tratado, a centralização nos grandes aterros sanitários geragrandes impactos com transporte e não dá retorno sócio-econômico, só despesas para sua manutenção.

A concessão municipal de aterro a empresas privadas gera oseguinte paradoxo: quanto mais lixo recolherem e levarem paraos aterros, maior o lucro da empresa; e ambientalmente, quere-

mos o contrário: reaproveitar e transformar a maior quantidadede lixo possível, gerar empregos, e desenvolver tecnologias,estimular empresas, descentralizar, economizar energia ematéria prima. A gestão do lixo é complexa, e inclui adiminuição do próprio volume de lixo produzido, através demudanças de hábitos sociais e de procedimentos industriais,inclui a legislação ambiental e uma política de incentivos aodesenvolvimento de empresas nesta nova área. Se as prefeiturasentregam esta gestão a uma empresa, quem irá tomar medidasradicais para mudar o modelo da gestão do lixo e ca-minhar paraimplantar a compostagem e a reciclagem? Teria sentido colocarbilhões de reais de dinheiro público nestas empresas enquantoos catadores poderiam se transformar numa grande categoriaprofissional em atividade social e ambientalmente importante,podendo dispor de equipamentos de transporte tecnologica-mente mais avançados que a tração muscular, para a maior pro-dutividade da coleta porta a porta, ou ponto a ponto, geradora deemprego através de cooperativas ou de pequenas novas empre-sas?

Nas grandes cidades do mundo a disputa pelo filão da cole-ta do lixo para aterramento está gerando corrupção e máfias,devido ao grande volume de lixo e dinheiro envolvido. Eles nãoestão preocupados em mudar o perfil sócio-ambiental daquestão. O próprio perigo do lixo hospitalar foi dramatizado,sendo que boa parte dele é lixo comum, e o próprio lixo domi-cilar tem muito de lixo hospitalar. A segregação do lixo hospita-lar com potencial infectante, que é mínimo, é fácil de resolver epoderá ir para o aterro residual. Sem falar no “lixo líquido” dedoentes, presentes nos esgotos domésticos e hospitalares, lança-dos hoje nos rios e aguardando solução. Não afasto a possibili-dade da empresa privada contribuir na questão do lixo, mas queseja priorizando a compostagem e a reciclagem, a geração deempregos para os catadores melhor equipados, descentralizan-do o destino final do lixo e estimulando a coleta binária, isto é,

lixo molhado e lixo seco. Lixo molhado é resto de comida e ou-tras matérias orgânicas, como podas de árvores e jardins; e lixoseco, são papéis, papelões, vidros, plásticos, latas, ferro. Bastariaque cada residência fosse estimulada a fazer esta simplesseleção binária e a coleta porta a porta seria adaptada a esta novacondição. O lixo seco não precisaria ser coletado todo dia, poisnão fermenta, nem produz chorume, e poderia esperar maistempo. Poucos itens não se adaptariam nesta formatação binária,como absorventes, pásticos e isopor com restos orgânicos.Problema a ser pensado . Já o entulho de construção, inerte, seriadestinado à reciclagem, ou para recuperação de voçorocas, ouconstrução de casas populares. Assim, os aterros residuais seri-am de menor porte e teriam vida longa, sem impacto importante.

Para tudo isto dar certo é preciso investir na mobilizaçãosocial, mas na mobilização social inteligente. Está aí a grande ecentral questão, não somente para a questão do lixo, quanto parao combate às epidemias, para a promoção da saúde, para admi-nistrar melhor a cidade, para alcançar a plena cidadania emtodas as frentes. No caso de BH e região metropolitana teríamosque iniciar agora a preparação da nova forma de gestão do lixo,modificar os pressupostos que hoje estão colocados pela admi-nistração pública, e explicar este problema para o governo, a po-pulação e os empresários, para que todos compreendessem o seupapel fundamental no equacionamento e solução deste grandeproblema da vida urbana. É fundamental incentivar osempresários; a formação de novas empresas voltadas para acompostagem e reciclagem do descarte, é um desafio da con-temporaneidade aos nossos empresários. E descentralizada-mente, pois a grande concentração seja de população, seja delixo, seja de esgotos, seja de carros, gera problemas sócio-ambi-entais incontornáveis.

Apolo Heringer Lisboa, Professor da Faculdade de Medicinada UFMG e coordenador do Projeto Manuelzão

Aterro sanitário é uma discussão nacionalApolo Heringer Lisboa *

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• MACACOS /NOVA LIMA •Manuelzão Belo Horizonte, Março / 2003

Uma nova proposta apresentada ao Copam(Conselho Estadual de Política Ambiental) pre-tende facilitar o diálogo entre mineradoras e as

comunidades em torno dos licenciamentos e dos impactosambientais que envolvem a atividade. E pode se tornar ummodelo para outras regiões cujos problemas exigem agili-dade e prevenção de conflitos. De autoria de Thomaz MataMachado, integrante do Projeto Manuelzão e representanteda sociedade civil no Copam, a nova proposta aparece nacategoria das Organizações Não-Governamentais, e sugereque as negociações se dêem nos debates informais e não nasaltas esferas do poder. A idéia é criar Comitê da Sub-baciado Ribeirão Macacos para sediar os debates entre as empre-sas e os moradores de regiões minerárias e todos os demaisagentes envolvidos, como prefeituras e orgãos estaduais,através do consenso nas decisões.

A idéia surgiu quando uma mineradora solicitou umanova licença para exploração na região de São Sebastião dasÁguas Claras (distrito de Nova Lima, mais conhecido comoMacacos), próximo ao ribeirão Macacos. "Houve um pedidode licenciamento para exploração na região e me lembrandodaquele acidente que no ano passado trouxe enormes prejuí-zos para Macacos, decidi tentar encontrar um caminho de

mediação entre as partes, que atue antes e não depois de umacidente ou conflito", explica Mata Machado.

Segundo o autor da proposta, os conflitos têm origem nouso dos recursos naturais. "O ribeirão Macacos tem usosbastante incompatíveis: de um lado a expansão urbana comseus condomínios de luxo e os moradores que não querem aatividade das mineradoras; do outro, as mineradoras, quemovimentam a economia local com a extração", diz . "Osmoradores usam a água para beber, as mineradoras precisamdela para lavar o minério", completa.

Para se diminuir os impactos ambientais causados pelamineração existem normas específicas que regulamentam aatividade. Cabe ao Copam, normatizá-las e fiscalizá-las. Maspara Mata Machado, resultados concretos dependem tambémdo diálogo. "As regras, na prática, adiantam pouco. Acho quea solução dos conflitos depende de um debate permanente, deuma gestão local da bacia. A idéia é criar um comitê da sub-bacia do ribeirão Macacos, onde os representantes dos con-domínios, da prefeitura, das mineradoras, da SecretariaEstadual de Meio Ambiente e outros atores envolvidos se sen-tem pra discutir os caminhos a seguir", defende. A própriaprefeitura de Nova Lima realizou um seminário em fevereirosobre a sub-bacia do ribeirão Macacos, iniciativa que a coor-denação do Projeto Manuelzão considerou correta: as sub-bacias do Velhas têm problemas urgentes para resolver e a

agilidade das iniciativas dá legitimidade para cobrar soluçõesdas instâncias superiores.

Para o representante do Instituto Brasileiro de Mineração(IBRAM) no Comitê da Bacia Hidrográfica do Rio das Velhas,José Maurício Ramos, a criação do sub-comitê não trarágrandes benefícios à bacia. "Apesar de ainda não conhecer aspolíticas e diretrizes que vão nortear tal comitê, a impressãoque tenho é de que o verdadeiro objetivo é fazer uma campa-nha contra as mineradoras sob o pretexto de estar lutando pelamelhoria da qualidade da água. Querem sim atribuir à mine-ração todos os danos da bacia. Além do mais, o CBH Velhas éo órgão competente para gerir quaisquer conflitos e decisõesque envolvam a bacia, é o comitê oficial e tem de ser respeita-do", defende.

A proposta esbarra na esfera da interpretação da lei poralguns. Para Mata Machado, governos e mineradoras precisamcompreender a contribuição das negociações locais e do incre-mento da participação social na dinamização do processodecisório. Sem dúvida, o CBH-Velhas é a instância delibera-tiva. No final de abril acontecerá um seminário para discutir aformação do comitê do ribeirão Macacos. Ele funcionarácomo instância local propositiva e co-gestora, a exemplo doque já acontece com o Comitê do rio Cipó e do ribeirão daMata. Estes comitês poderão pleitear o reconhecimento aoCBH-Velhas de seu papel complementar.

Osegundo encontro do comitê Cipó recebeu avisita de um grupo de alunos do curso deTurismo da Fumec - Fundação Mineira de

Educação e Cultura. A reunião aconteceu no dia 28 defevereiro último, na Escola Estadual José Ribeiro, emBaldim. Os alunos assistiram debates entre os integrantesdo comitê sobre o problema do recolhimento e destinofinal do lixo na região e a necessidade de se planejar o tu-rismo em toda região do Cipó.

O coordenador do curso, José Henrique, explicou queo turismo explorado de maneira racional é um dos maiorespropulsores da economia. No entanto, ele alertou aosmembros do comitê Cipó: "para a atividade turística sedesenvolver de forma sustentável é preciso que seja plane-jada".

Além disso, muitas vezes uma atração turística nãosignifica um potencial turístico. "Um município pode teruma cachoeira maravilhosa, mas que não tem estrada deacesso, estrutura de serviços, como hospedagem e alimen-tação, e condições de proteção ambiental", explica o pro-fessor.

Para avaliar o potencial turístico de Baldim, Santanado Riacho, Jaboticatubas e Santana do Pirapama, aFaculdade de Turismo da Fumec poderá firmar uma parce-ria com as quatro prefeituras. Segundo José Henrique otrabalho começará com um inventário turístico em queserão mapeados os "pontos positivos e negativos"de cadamunicípio. Depois disso será feito um diagnóstico em queserão propostos projetos para tornar o turismo sustentávelna região.

José Henrique diz que a confirmação da parceriadepende ainda de resposta da coordenação geral da Fumec."Pra gente será ótimo participar desse projeto", afirmaLiliane Alves Carmo, estudante do 5º período. Ela contaque seu interesse maior é justamente na área de planeja-mento turístico, considerando também o planejamentoambiental. "Na reunião do Comitê ficamos sabendo deproblemas internos, como o lixo. Posteriormente podemostrabalhar isso também", planeja Liliane.

Projeto quer diálogo entre todos os envolvidosLuana Fleury

Estudante de Jornalismo do Centro Universitário Newton Paiva

Cidades da bacia do Cipó discutem parceria com Turismo da Fumec

Sílvia Araújo e Carolina SilveiraEstudante de Comunicação da UFMG

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Córrego do Brejinho em BH ganha novos parceiros

Itabirito terá um Comitê Manuelzão na zona rural

Os alunos da 5ª série da Escola Estadual AnitaBrino Brandão, no Bairro Jaraguá, expuseramum trabalho mostrando a poluição, assorea-

mento e ocupação indevida das margens do córrego doBrejinho, na Pampulha, afluente do ribeirão da Onça. Aexposição aconteceu no dia 13 de dezembro durante umafeira de cultura realizada no colégio e demonstra que omeio escolar está preocupado com a causa ambiental.

O trabalho foi coordenado pela professora de Ciências,Marina Ramos Vilela, e contou com a participação de 36alunos. Ele foi o resultado de uma visita ao córrego doBrejinho, orientada pela bióloga Jane Boaventura, mem-bro do Comitê Manuelzão do Córrego do Brejinho e quefez uma exposição para os alunos sobre as atuaiscondições e a importância de reverter a situação. O traba-lho também mostrou um pouco da fauna e da flora do cór-rego e uma pequena apresentação teatral foi realizada paraos pais e demais alunos mostrando os perigos da poluiçãoe do mau uso da água. Toda a escola foi envolvida emtorno do tema através de concursos de redação e desenho.

. "Eu gostei muito dotrabalho, foi bom para agente conhecer um poucomais do Brejinho, seusbichos, suas plantas, suasnascentes. Foi muito legal",diz o aluno Diego LuanBaptista. Os alunosaceitaram muito bem asatividades, como atesta amãe de uma das alunas daclasse, Eloisa HelenaCampos, dizendo que suafilha chegou em casa eufóri-ca após a visita. A professo-ra Marina Campos diz quepretende continuar traba-lhando com educação ambi-ental, porém não pode afir-mar que o trabalho terá con-tinuidade neste colégio, poisserá transferida em 2003.

Odistrito de São Gonçalo do Bação, em Itabirito,vive a expectativa da formação do Comitê dosRibeirões Saboeiro e Carioca, afluentes do rio

Itabirito. Membros da comunidade, professores daUniversidades Federais de Minas Gerais e de Ouro Preto,estagiários do Internato em Saúde Coletiva da Faculdadede Medicina fazem parte de uma comissão que organiza onovo Comitê. Esta iniciativa tem apoio da Secretaria deSaúde, da Emater e da Secretaria de Meio Ambiente deItabirito, coordenados pelos representantes do ProjetoManuelzão Ronald Guerra (Ronim) e Mauro Antônio deSouza, dentista residente em São Gonçalo do Bação.

Desde 12 de setembro passado, quando foi apresenta-da a proposta em uma reunião, a coordenação realizouencontros que aconteciam na maioria das vezes quinzenal-mente, nos quais discutia propostas, apresentava planos deação e estudava órgãos ambientais e políticos que poderi-am ajudar em uma melhor atuação do comitê. Ao final, emreunião realizada dia 22 de fevereiro com a comunidade

de São Gonçalo do Bação, apresentaram o resultadodessas discussões.

Ronald Guerra explica que em Itabirito já existe umesforço para cuidar das questões que envolvem o rio demesmo nome. Mas, segundo ele,essa atuação não é muito efetiva,pois tem uma participação essen-cialmente urbana e o distrito deSão Gonçalo do Bação é predo-minantemente agrícola. "Apos-tamos nesse comitê para termosuma atuação mais rural doProjeto Manuelzão na área", afir-ma Roninho.

No dia 15 de março haveráum Seminário para apresentaçãooficial do comitê à sociedade.Aberto a toda a população deItabirito, o evento irá contar comconvidados como ApoloHeringer Lisboa, coordenador-

chefe do Manuelzão, representantes da UniversidadeFederal de Ouro Preto e da EMATER (Empresa deAssistência Técnica e Extensão Rural de MG), além demembros do comitê e da prefeitura de Itabirito.

Marco Antônio PessoaEstudante de Comunicação da UFMG

Ana Fazito e Ingrid AguiarEstudantes de Comunicação da UFMG

Assoreamento da nascente da cabeceira doribeirão Carioca, provocado por mineração de caolim

Nascente córrego Brejinho coberto por taboal emantiga visita de alunos e membros do Comitê Manuelzão

• COMITÊS •Manuelzão Belo Horizonte, Março / 2003

Rochas sedimentares formadas essecialmente porCarbonato de Cálcio. Esse é o principal tipo derelevo que origina a formação das chamadas

regiões cársticas. Utilizado para designar rochas que se dis-solvem com facilidade, o termo carste deriva da palavraservo-croata karst e está relacionado às paisagens calcárias.

Embora o termo seja pouco conhecido pela população, asregiões cársticas estão mais próximas do que muitos podemimaginar. Localizada a cerca de 30 km ao norte de BeloHorizonte, o Carste de Lagoa Santa é considerado o berço dapaleontologia, arqueologia e espeleologia. "A região possuiuma grande riqueza paleontológica, com preservação de fós-seis humanos e animais" afirma a conselheira do ProjetoManuelzão e professora do Departamento de Geologia doInstituto de Geociencias da UFMG, Maria Giovana Parizzi.Grande parte da área cárstica situa-se no interflúvio do riodas Velhas, a leste, e ribeirão da Mata, a oeste-sudoeste.

Por meio do processo de corrosão química, a água origi-na e modela as formas do carste. O alto grau de solubilidadedo Carbonato de Cálcio, aliado à passagem de água no localacarreta a formação de grandes feições nas rochas originan-do vazios, como cavernas e grutas. Segundo Parizzi, essa "éuma dinâmica natural, não implica necessariamente na açãodo homem. Desde que haja água infiltrando vão se forman-do vazios e grutas".

ProblemasAtividade de mineração, pixação, acúmulo de lixo e

quebra das estalactites são os principais fatores dedegradação das cavernas e grutas da região cárstica deLagoa Santa. A atividade de mineradoras pode causar danosirreparáveis, por desviar o fluxo de cursos d'água e deposi-tar detritos no local, e rupturas com as detonações de explo-sivos.

A população que reside em regiões deste tipo deve tercuidado para, quando da construção de suas moradias,

averiguar as condições do solo para que não ocorram proble-mas futuros. "Há reclamações de moradores sobre pequenostremores de terra. Na verdade é o solo se acomodando"ressalva Parizzi. Isso ocorre devido ao alto grau de solubili-dade do solo cárstico. A ocorrência de fluxos d'água alterasua rigidez e causa as acomodações.

Outro risco grande é a poluição da água. Os grandesvazios existentes propiciam o surgimento de uma redehidrográfica interna, com extensos canais subterrâneos,transportando a água poluída para diversos locais e conta-minando rios e lagoas. "Em geral a população não tem cons-ciência disso", alerta Parizzi.

A implantação de uma Área de Proteção Ambiental naregião (APA Carste Lagoa Santa) reflete a necessidade de sepreservar e valorizar o local, não somente pela suaimportância turística, mas também pelo elevado valorhistórico. A região é considerada uma das mais importantesdo país, seja pelo pioneirismo no estudo de sua composição,seja pela quantidade de cavernas por área.

Regiões cársticas, conhecer para preservarPedro Amorim Corrêa

Estudante de Comunicação da UFMG

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Vida de estagiário não é fácil, dizem. É um meio-termo entre o profissional e o estudante commuitas responsabilidades. Ninguém contesta é

que o estágio é fundamental, pois é através dele que o estu-dante coloca em prática o que aprende na sala de aula.Muitas vezes o estágio é decisivo para a formação profis-sional do aluno e abre novos horizontes para o mercado detrabalho. Foi o que aconteceu com Tiago Resende.

"O homem não vê a natureza como aliada dele, mas comoproduto", afirma Tiago Resende Alves, aluno do 7º período docurso de Geografia da Newton Paiva e estagiário do ProjetoManuelzão. Para Tiago, a mudança ainda é pequena, se se levarem conta as atrocidades que continuam sendo cometidas contraa natureza. "A preocupação com a questão ambiental e a preser-vação da natureza ainda é recente, uma corrente que surgiu a par-tir de 1970 e, apesar da força dos movimentos ambientalistas edos profissionais da área, ainda tem muito a evoluir", afirma.

Tiago vê com bons olhos a educação ambiental, mas crêque, sozinha, ela não traz muitos resultados. "A educaçãoambiental dá um suporte bom, mas há outros fatores quedevem ser levados em conta, principalmente a educação patri-monial, que é o trabalho das culturas, valores e tradições

locais. Para você levaruma pessoa a preservarum bem natural, temprimeiro de resgatar osvalores daquele lugar ese adequar à linguagemdessas pessoas, fundarum canal de comuni-cação com elas. Nãoadianta implementarum programa se nãohouver a participaçãoda comunidade", afir-ma.

Para o estudante, o Projeto Manuelzão é louvável justa-mente porque ouve a comunidade antes de propor mudançase está à frente do tempo porque atua no campo da prevenção."O Manuelzão escuta as comunidades locais através decomitês regionais. A população se sente valorizada e querparticipar das iniciativas. Ela sabe que sua opinião é impor-tante. Além disso, o projeto está mostrando ao mundo quenão adianta remediar os diagnósticos; é preciso atacar a fonte

do problema. Se um morador tem uma horta irrigada comágua contaminada e passa mal, não adianta ele ir ao posto etomar um remédio para infecção intestinal, amanhã ele podeestar passando mal de novo".

Hoje, dentro do estágio no Manuelzão, Tiago mantém umtrabalho de pesquisa, em conjunto com outras pessoas, emRibeirão das Neves. O interesse pela cidade começou hámuito tempo, quando seu grupo de estudos resolveu escolherJustinópolis, distrito de Neves, como objeto de estudo. "Aregião é super carente, com vários impactos devido à ocu-pação desordenada que ocorreu a partir de 1970. Há váriosloteamentos irregulares e um lixão que fica a menos de dezmetros de um importante curso d'água", conta. O diagnósti-co da bacia do ribeirão das Neves acabou se tornando amonografia de conclusão do curso de Tiago.

Para o estudante, o estágio transformou até mesmo a visãode formação profissional. "Eu via a faculdade como ummecanismo formador para o mercado de trabalho, não pensa-va em fazer pesquisa. Hoje, vejo que o aluno tem de ter umachance de fazer pesquisa, desenvolver algo que ele goste, nãoapenas executar uma ordem que recebe. No estágio nós cri-amos, produzimos, e isso nos orgulha", comemora.

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Corinto e Joaquim Felício: saúde com informação de qualidade

Fabiana Lopes Faria, de 16 anos, entra no consultóriosentindo dores. Atenciosa, a médica a recebe e per-gunta o que ela tem. "Arranhei minha perna em

uma folha de zinco há uns quatro dias. Achei que ia sarar, masagora deu uma íngua e eu estou sentindo muita dor paraandar", conta a adolescente. Esse é um dos muitos casos quea estagiária de medicina Joana Luiza de Lima, 24 anos, e acolega Carolina Tavares Marques, de 25, atendem diaria-mente, como estagiárias do “Internato Rural” da UFMG, nomunicípio Joaquim Felício, que tem pouco mais de 3700habitantes.

Mal começa a nossa conversa e já chega outra paciente:dona Brasilina Ferreira da Silva, de 58 anos, que sente dor nopeito e diz que o nariz está escorrendo. Também sente febrealgumas vezes mas não consegue detectar a temperatura, jáque não tem dinheiro para comprar um termômetro - e essa éapenas uma das dificuldades que os pacientes carentesenfrentam. "Muitos exames que não são feitos aqui têm queser requisitados nas cidades mais próximas e isso pode levaraté meses", explica Joana Luiza.

Os estagiários também têm de aprender a lidar com obaixo nível de instrução da população. "Tivemos umapaciente que infeccionou o pé depois de furá-lo em um prego.Teríamos de fazer uma pequena cirurgia para limpar o local.Ela se recusou e não tomou nenhum remédio. Chegamos a irà casa dela mas não adiantou", lembra Carolina. Outro prob-lema, também ligado à questão social, é a dificuldadeeconômica. "Muitos pacientes da zona rural não voltam aoconsultório porque não podem pagar a passagem do ônibus -R$ 2,70 -, que vem só até o centro da cidade”, completa aestudante.

Joaquim Felício é um município calmo, uma típica cidadedo interior, com problemas ambientais e de saúde cujasolução depende principalmente da conscientização e da me-lhora da qualidade de vida da população. "Várias crianças têmvermes, as mães deixam os filhos brincarem descalços naterra e acham que não há problemas nisso. Muitos moradorespreferem não beber a água da Copasa por acharem que não éboa", conta Joana.

No entanto, para o secretário de Saúde e Meio Ambientedo município, João Carlos da Silva, a qualidade de vida dos

moradores está melhorando significativamente. "Nós temosempenhado recursos na área da saúde, levando saneamentobásico à população e já temos um aterro sanitário pronto parasubstituir um lixão que trazia mau-cheiro e doenças - mas nãoestamos com nenhum caso de dengue e não temos registros dedoenças como Tuberculose e Hanseníase há mais de um ano",afirma.

O posto de saúde da cidade consegue atender de formasatisfatória os casos básicos. Outros exames e tratamentos dedoenças como a AIDS, ainda que raros, são mandados aMontes Claros. Como em qualquer outra cidade pequena dointerior, a melhoria da saúde depende de investimentos. Numacidade onde a função pública, a agricultura de subsistência eo trabalho artesanal são as únicas formas de renda, esse obje-tivo esbarra na falta de recursos.

A alguns quilômetros dali encontramos uma outra cidade.Corinto, bem maior que Joaquim Felício, com um expressivocomércio onde lojas, bares e pizzarias se destacam. Mesmoassim, também convive com vários problemas na área dasaúde, principalmente quando se fala da zona rural. "Lá, onível sócio-econômico da população agrava os problemas",explica Wanda Cardoso, estagiária do “Internato Rural” emCorinto. "As pessoas acham, por exemplo, que a água geladajá está tratada. Como na zona rural não existe posto de saúde,improvisamos um em uma escola velha e trabalhamos com oque temos", acrescenta a estudante Juliana Brandão.

Mas, para Wanda Cardoso, trabalhar no interior tem um

diferencial importante: "o retorno do paciente é muito maior;se ele for bem atendido, vai voltar e se consultar com você.Não é como num posto de saúde de Belo Horizonte, onde aconsulta tem de ser rápida porque sempre há filas de espera eonde cada vez que esse paciente voltar, vai ser atendido porum médico diferente. Trabalhando em uma cidade pequena, omédico pode conhecer o seu paciente a fundo, cria um víncu-lo com ele", afirma.

Juliana e Wanda produzem, em conjunto com a equipe darádio municipal, um programa semanal sobre os problemas desaúde e seus respectivos tratamentos. Cada programa abordauma doença e o critério de escolha dos temas é a observação:"com base nos problemas que a gente detecta na população éque escolhemos o tema", diz Juliana.

Luana CuryEstudante de Jornalismo do Centro Universitário Newton Paiva

Estagiário amplia formação profissional com trabalho comunitário

Estagiários de Saúde Coletiva da UFMG apostam em interlocução com a comunidade para melhorar atendimento

• ESTUDANTES •Manuelzão Belo Horizonte, Março / 2003

Corinto se prepara agora para receber o PSF,Programa de Saúde da Família, que promete melhorar oquadro da saúde para os 24.546 habitantes. A prefeituratambém está tentando, através de um convênio, fazercom que o único hospital da cidade, que é particular,passe a atender toda a população. Tanto em JoaquimFelício quanto em Corinto, a minimização dos proble-mas depende de esforços integrados, do poder público eda sociedade civil.

A mudança começa também nas escolas, com o tra-balho dos comitês locais do projeto Manuelzão. EmCorinto, cada escola adotou uma nascente. "Os meninosvisitam a nascente, cercam os limites dela e a vigiampara ninguém jogar lixo", conta Márcia Lúcia Diniz,coordenadora do comitê local - as crianças sabem que asaúde depende também da qualidade da água queingerem. Em Joaquim Felício um problema são os resí-duos deixados nos cursos dágua pelas tradicionaislavadeiras, que lavam roupa nos rios. Uma reunião mar-cada com elas tinha por objetivo mostrar que há formasambientalmente corretas de se exercer o ofício.Ninguém compareceu.

Mas a batalha não pára por aí. Desistir seria fácildemais. Joana, Carolina, Wanda e Juliana sabem disso.Sabem também que a conscientização da população,através da educação, virá a longo prazo. Mas elas sairãodo Internato com a sensação de ter contribuído sen-sivelmente para a melhoria da qualidade de vida dessaspessoas, deixando frutos para o futuro.

Mudança depende de mobilização

A estagiária de medicina Joana Luiza de Lima exam-ina Fabiana Faria, em Joaquim Felício

O estudante de GeografiaTiago Resende, da Newton Paiva

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Depois de muita discussão e até mesmo da sus-pensão temporária das eleições, teve fim o pro-cesso eleitoral que selecionou os novos mem-

bros do Comitê da Bacia Hidrográfica do Rio das Velhas,com um mandato válido por dois anos. Ao todo, 28 repre-sentantes titulares e respectivos suplentes irão compor oComitê. Cada segmento tem sete representantes titulares esete suplentes. A discussão em torno da representatividade,que marcou as recentes eleições, será retomada nas reuniõesdo Conselho Estadual de Recursos Hídricos, para evitarinconvenientes nas próximas.

Previstas para os dias quatro e cinco de dezembro do anopassado, elas eleições acabaram sendo interrompidas empleno andamento, depois de um recurso contrário ao proces-so, apresentado por Sérgio Menin Teixeira de Souza, repre-sentante da Sociedade Mineira de Engenheiros, e PatríciaHelena Gambogi Bóson, representante da AssociaçãoBrasileira de Recursos Hídricos - ambos conselheiros doConselho Estadual de Recursos Hídricos.

"Eles alegaram que os órgãos e entidades que estavamconcorrendo na categoria de sociedade civil teriam de teruma maior representatividade na área, uma ação intensivano âmbito de recursos hídricos e de meio ambiente, o que,para eles, os concorrentes não tinham", lembra o ex-secretário estadual de meio ambiente, Celso Castilho de

Souza. Tal argumento foi vivamente repudiado pela maioriados segmentos e visto como menosprezo ao processo socialem curso.

O ex-secretário chegou a expedir uma resolução prorro-gando o mandato dos então membros e suspendendo os tra-balhos eleitorais. Mas após uma reunião com um grandenúmero de representantes da sociedade civil e do poderpúblico municipal, o secretário acompanhado de assessoresdecidiu revogar sua própria resolução e marcar nova datapara a escolha dos membros. "Entendi que a discussão nãocabia naquele momento; a representatividade - ou a ausên-

cia dela - teria de ser discutidaainda no processo de triagem epré-seleção, pelo órgão compe-tente. Se no momento da pré-seleção não houve nenhumamanifestação contrária à escolhadesses candidatos, não caberiafazê-lo depois, quando aseleições estavam acontecendo",afirma Celso Castilho.

O coodenador do ProjetoManuelzão, Apolo Heringer,disse que louva a atitude do ex-secretário de Meio Ambiente deMinas Gerais: “ele teve a dig-nidade de revogar sua própriaresolução publicada no Diário

Oficial reconhecendo a razão da maioria dos delegadosque exigia a continuidade do processo eleitoral”.

A eleição dos novos membros do CBH Velhas aconte-ceu no dia 11 de dezembro, quando foram escolhidos, deacordo com a legislação, os representantes do poder públi-co municipal e estadual, das empresas usuárias de água eda sociedade civil organizada. O Comitê da BaciaHidrográfica do Rio das Velhas, assim composto, é umórgão deliberativo e normativo e define, entre outrascoisas, o plano de investimentos em meio ambiente para abacia.

Ocomitê da bacia do Rio das Velhas, em parceriacom a Secretaria Municipal de Meio Ambiente ea Companhia de Saneamento de Minas Gerais

(Copasa), está realizando o Projeto de Reenquadramento dosCorpos D'água da Bacia Hidrográfica do Ribeirão Isidoro.Localizada nas regiões de Venda Nova,Pampulha e Norte de Belo Horizonte, a baciasofre com a degradação ambiental decorrenteda ocupação humana. Procuram-se soluçõesviáveis para reverter esta situação e manter apreservação das áreas menos degradadas.

Iniciado em 1997 pela FundaçãoEstadual do Meio Ambiente (FEAM), oreenquadramento posteriormente passou aser conduzido pelo Comitê do Rio dasVelhas, criado em 1998. O projeto propõe adivisão da bacia em 108 trechos de acordocom a região onde se situam, os problemasda área e o uso das águas. Foi feita uma clas-sificação conforme as condições e caracterís-ticas ambientais de cada trecho e não umaúnica para toda a bacia.

A proposta é divida em três etapas. Naprimeira, já realizada, foi feita uma identifi-cação dos atuais usos dos corpos d'água(nascentes, lagoas, córregos e rios) e dosusos futuros, definidos de acordo com con-sultas populares realizadas em cada um dos108 trechos. "A gente pode discutir com apopulação o que ela quer das águas" diz opresidente do Comitê do Rio das Velhas,Paulo Maciel Júnior. Na segunda fase serãorealizadas avaliações laboratoriais das águas

para comparar a qualidade atual dos corpos d'água com a quese quer atingir. As ações necessárias para atender os obje-tivos propostos na primeira fase serão executadas na terceirafase do projeto.

Os organizadores reiteram a importância da participaçãopopular para o sucesso desta ação e os moradores parecemter encampado o projeto, como pôde ser visto na audiênciapública realizada no dia 26 de novembro de 2002 no

auditório Instituto Santo Inácio no Bairro Planalto, com aparticipação do Projeto Manuelzão. Na reunião, que contoucom um grande público, diversos representantes de organi-zações de moradores manifestaram seu apoio. SegundoManuelo Leonor Neto, presidente da associação do BairroRio Branco, a população está se conscientizando e mobi-lizando para a preservação das nascentes e o cuidado com olixo e o esgoto.

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CBH Velhas: polêmica em torno do processo eleitoral

Marco Antônio Pessoa e Gésio Passos Estudantes de Comunicação da UFMG

Luana Cury Estudante de jornalismo do Centro Universitario Newton Paiva

Renquadramento propõe novo futuro para bacia do ribeirão Isidoro

Eleição para comitê de bacia hidrográfica é garantida depois de mobilização de entidades civis e prefeituras

• COMITÊS •Manuelzão Belo Horizonte, Março / 2003

Participantes da reunião do CBH-Velhas

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Ainda não está definido como Belo Horizonte vaidestinar o seu lixo daqui a alguns anos. Empouco mais de um ano, a vida útil da Central de

Tratamento de Resíduos Sólidos, onde é depositado o lixoproduzido na cidade, alcançará o limite previsto em seu pro-jeto original. Apesar de não ser exato o tempo de esgota-mento do aterro, a única certeza que se tem até o momentoé a necessidade de um novo local para receber o lixo semcomprometer o meio ambiente.

Desde 1972, a Central de Tratamento, localizada na BR-040 na saída de Brasília, recebe o resíduo urbano gerado nomunicípio. De acordo com a gerente de monitoramento daCentral de Tratamento, Patrícia Dayrell, cerca de quatro miltoneladas de lixo são levadas diariamente para o aterro. Paraprolongar a vida útil do aterro, a Secretaria Municipal deLimpeza Urbana (SMLU) contava com a construção de umanova unidade de tratamento no bairro Capitão Eduardo,região Nordeste da capital, adquirida pela prefeitura háquase três décadas. Entretanto, o local foi recentementetransformado em Área de Proteção Ambiental, inviabilizan-do a execução do projeto.

O Secretário Municipal de Limpeza Urbana, CláudioVilela, vê com dificuldade a disponibilidade de área em BeloHorizonte para a implantação de outro aterro, já que as poucasáreas onde ainda não há ocupação urbana são de grandeimportância ambiental. Diante deste fato e da falta de recursospara investimento imediato, a prefeitura decidiu por adotar umregime de concessão, deixando a cargo das empresas concor-rentes a escolha e compra do terreno, a infra-estrutura deimplantação do aterro, além das negociações com o municípioescolhido. "Existem áreas potenciais para a implantação de umnovo aterro em Contagem, Ribeirão das Neves, Santa Luzia eSabará", afirma Vilela.

Para o Projeto Manuelzão estas dificuldades podem ajudara encontrar outra solução: “investir na mobilização socialinteligente apostando na compostagem e reciclagem, namudança de mentalidade das indústrias e de hábitos dos con-sumidores”, diz o professor Apolo Heringer, coordenador doProjeto. Para ele, o aterro necessário teria um caráter residual,complementar a outras opções conjugadas e descentralizadas,de dimensões e custos bem menores. E haveria tempo paranegociar um cronograma de implantação da nova proposta.

PolêmicaO edital para definir a empresa que terá a concessão do

tratamento do lixo da capital pelos próximos 25 anos foi lança-do no final de novembro, e a abertura da licitação estava mar-cada para 27 de janeiro. No entanto, o processo foi adiado peloTribunal de Contas do Estado, devido a irregularidades técni-cas no texto do edital. Como se não bastasse, a denúncia doenvolvimento de pessoas ligadas à prefeitura com uma dasempresas que pretende construir o aterro colocou em dúvidaaté que ponto o aterro da BR-040 está realmente esgotado.

Em entrevista ao jornal Estado de Minas em 17/02, odoutor em engenharia hidráulica e de saneamento e ex-consul-tor da SLU Luiz Mário Queiroz Lima, afirmou serdesnecessária a construção de um novo aterro. Segundo ele, avida útil do aterro pode ser prolongada por 20 anos, através depequenas intervenções. O engenheiro apontou a falta de inves-timento da prefeitura como principal causa da atual situação, esugeriu a implantação de estações de tratamento de líquidos egases que já estavam previstas no projeto original, mas que nãochegaram a entrar em operação.

O engenheiro arquiteto Cássio Versiani Velloso, diretor deoperações da SLU no período de janeiro de 1993 a dezembrode 1996, esclarece que a prefeitura de BH chegou a fazer umgrande investimento na tecnologia de biorremediação, técnicautilizada para acelerar o processo de decomposição do lixo,que chegou a ser implantada na Central de Tratamento de BHatravés de uma consultoria prestada por Luiz Mário. Porém, oprocesso da decomposição do lixo não ocorreu da forma e notempo esperado, dada a dimensão do volume de lixo do aterro.Com isso, a massa de lixo que supostamente ficaria estabiliza-da no tempo previsto, podendo ser retirada do aterro da BR-040, precisou continuar no local, ocupando espaço.

De acordo com Cássio, ainda é possível a deposição delixo no aterro da BR-040 acima da altura que a preencheria ovale onde foi construído o aterro, prevista no projeto inicial.Porém, há limitações que devem ser cuidadosamente estu-dadas, como a capacidade de suporte do solo, além do acidentena paisagem que seria formado com a "montanha" de lixo, quepode gerar problemas com a comunidade do entorno. Nãosendo esta uma solução indicada, é "imprescindível e inadiávela construção de um novo aterro", afirma Velloso.

Esgotamento do aterro sanitário de Belo Horizonte reabre polêmica sobre melhores alternativas para destinação de resíduosSara Abreu e Jonas Rodrigues

Estudantes de Comunicação da UFMG

Região metropolitana aguarda definição sobre o lixo

Volume de lixo pode ser minimizado

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• POLÍTICAS PÚBLICAS •Manuelzão Belo Horizonte, Março / 2003

No Brasil, apenas 5% da massa total dos resíduosurbanos não é passível de reciclagem, reuso oucompostagem. Em Belo Horizonte, assim como

na média das cidades brasileiras, mais da metade do lixodomiciliar urbano é constituído por materiais orgânicos,passiveis de se transformarem em fertilizantes do solo, peloprocesso da "compostagem". Outra parte importante dessesresíduos é composta de materiais recicláveis, que compõemaproximadamente 30% do peso total do lixo, mas represen-tam uma parcela muito maior em volume, ocupando grandesespaços no aterro.

Um outro dado importante diz respeito ao tratamentodado ao entulho da construção. De acordo com dados daSLU, cerca de 50% das 4 mil toneladas de lixo que chegamdiariamente à Central de Tratamento é composta por materi-ais provenientes da construção civil. Patrícia Dayrell lembraque o entulho não precisa ser aterrado, e pode ser totalmentereaproveitado na fabricação de materiais para a execução deobras. A prefeitura conta com duas unidades de reciclagem

de entulho, nos bairros Estoril e Pampulha, que juntas reci-clam cerca de 350 toneladas de entulho por dia.

Na visão do Projeto Manuelzão, a forma mais eficaz dese prolongar a vida útil dos aterros ainda é a redução daquantidade de lixo produzida. "O aterro sanitário só énecessário como destino final de resíduos inaproveitáveis,após a transformação da matéria orgânica na compostageme dos materiais recicláveis pela indústria", diz o coordenadordo projeto, professor Apolo Heringer.

Apolo questiona ainda a concessão municipal de aterrosà iniciativa privada, já que a gestão do lixo visando adiminuição de seu volume vai de encontro aos lucros dasempresas, que vem justamente da quantidade de lixo reco-lhida. "Não afasto a possibilidade da empresa privada con-tribuir na questão do lixo, mas que seja priorizando aredução do volume do lixo produzido pela sociedade,a com-postagem e a reciclagem, a geração de empregos para oscatadores, e descentralizando o destino final do lixo", con-clui.

Aterro na BR-040, em Belo Horizonte: polêmicacom relação ao esgotamento da capacidade

Apolo Heringer: repensar o papel do aterro sanitário

Page 9: Revista Manuelzao 22

Adegradação que afeta háanos a lagoa da Pampulha,situada na região Norte

de Belo Horizonte, compromete asegurança e o lazer dos habitantesda capital mineira. O assoreamen-to agrava os riscos de inundaçãonos períodos de chuva. O mau-cheiroe a sujeira prejudicam o turismo e asatividades recreativas na orla. Pararesolver esses problemas, o Programa deRecuperação e Desenvolvimento Ambiental da Bacia daPampulha - Propam promove o saneamento ambiental e oresgate do acervo paisagístico. O programa foi idealizadoem 1995, mas apenas em 2001 começou a ser implantado.

A bacia da Pampulha integra a bacia do ribeirão daOnça, que deságua no rio das Velhas, município de SantaLuzia. Sua área abrange 97 Km2, sendo 44% em BeloHorizonte e 56% em Contagem. São oito os afluentes quedeságuam na lagoa. Segundo o gerente do Propam em BeloHorizonte, Weber Coutinho, o ribeirão Sarandi e os córregosRessaca e Água Funda são seus principais poluidores.

A degradação da lagoa da Pampulha pode acarretar,segundo Coutinho, a redução de sua vida útil. A lagoa podeter apenas mais 10 ou 15 anos de vida. Dos 18 milhões dem3 de água iniciais, a lagoa passou a ter 13 milhões em1957, quando ocorreu o rompimento da barragem, chegandoaos 9 milhões atuais, ou seja, metade da quantidade inicial.

Coutinho acredita que as sucessivas administrações con-fiaram em uma possível estabilização do problema. A faltade recursos era apontada, também, como justificativa paraos reduzidos esforços de recuperação da lagoa.

PropamO Propam tem como objetivo acabar definitivamente

com a poluição que afeta a lagoa da Pampulha. O programachegou a ser visto como a maior e mais eficaz iniciativa derecuperação ambiental da história do estado de MinasGerais, por ter suas ações concentradas nas causas dadegradação da lagoa. Dividido em três vertentes, um de seusprojetos trata de Saneamento Ambiental, enquanto umsegundo visa colaborar com a recuperação da lagoa atravésda dragagem de sedimentos acumulados, a recuperação dasilhas e da orla e tratamento dos cursos d'água. O terceiro

sub-programa trata de planejamento e gestão ambi-ental.

Algumas obras, como a criação de um novovertedouro e a intervenção no ribeirão do EngenhoNogueira e no córrego Jaraguá, já foram concluídas.Estão em fase de execução a Estação de Tratamento deEsgoto(ETE Onça), a dragagem de sedimentos do fundo dalagoa, a intervenção no ribeirão Pampulha, a urbanização epaisagismo da região, com previsão de serem concluídos em2004. "Em cinco anos já estariamos visualizando uma situ-ação bem melhor, mas para recuperar a Pampulha dez anosseria para estarmos realmente seguros", comenta Coutinho.Para o biólogo e coordenador do subprojeto SOS Rio dasVelhas do Projeto Manuelzão, Carlos BernardoMascarenhas "A solução, na verdade, é o tratamento doesgoto antes dela cair na água". E completa: "O ideal é tiraros moradores das encostas, tirar o esgoto, plantar vegetaçãonas margens, plantar gramas e árvores".

O engenheiro Paulo Maciel Júnior, afirmou em umaentrevista ao Jornal Manuelzão em abril de 1999, que oPropam resolveria de vez a questão ambiental da Pampulhae que o cenário da lagoa seria completamente diferente até oano de 2004, segundo perspectiva própria. Porém, apesardos avanços notados na região e a conclusão de obras públi-cas, alguns problemas, como a falta de orientação e edu-cação ambiental da comunidade, podem ser vistos na região."Famílias estão invadindo as áreas com casas. Isso é umproblema muito sério, porque a população realmente debaixa renda não respeita, ela invade o leito dos córregos",afirma Coutinho.

HistóriaA lagoa da Pampulha foi inaugurada em 1938 e reinau-

gurada em 1958. Seu objetivo era abastecer a região Nortede Belo Horizonte e amenizar os efeitos das chuvas. Nadécada de 40, o espaço foi transformado em um centro delazer e turismo, por sua agradável paisagem, que atraía habi-

tantes de todos os cantos da cidade. Ocomplexo arquitetônico, idealizado pelo

então prefeito Juscelino Kubitschek, foiconcebido pelo arquiteto OscarNiemeyer e é considerado uma obra-prima.

Com o passar dos anos, o cresci-mento urbano desordenado acarretou

a impermeabilização do solo de diver-sas áreas, devido, por exemplo, ao asfal-

tamento e à ocupação de encostas. Alémdisso, as chuvas carrearam terra de obras e

áreas desmatadas para dentro da Pampulha. A lagoaficou sobrecarregada, processo agravado pela redução desua capacidade de armazenamento e pelo rompimento dabarragem, em 1958. O lançamento direto de esgotos nalagoa e o grande acúmulo de lixo em suas margens preju-dicaram a qualidade e a pureza das águas. A grande quanti-dade de carga orgânica acumulada afetou também o ecossis-tema aquático. "O processo de eutrofização ocorrido nalagoa fez com que muitos peixes morressem devido àescassez de oxigênio presente na água", afirmaMascarenhas.

Segundo Weber Coutinho, "a poluição da Pampulhacomeçou a ser percebida com mais rigor na década de 70".Por volta de 1979, foram instalados interceptores de esgotona margem direita da lagoa. Os prefeitos começaram a fazerdragagens, mas colocavam na própria lagoa a terra retiradade dentro dela, o que deu origem a uma ilha. "A lagoa fun-ciona hoje como amortecimento dos picos de cheia", obser-va o gerente do Propam. O seu completo assoreamento rep-resenta, segundo Coutinho, um desastre para a capital.

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• POLÍTICAS PÚBLICAS •Manuelzão Belo Horizonte, Março / 2003

Carolina Silveira/Pedro Amorim CorrêaEstudantes de Comunicação da UFMG

Com o apoio do Propam, a PUC-Minas e o ProjetoManuelzão realizaram um estudo comparativo entre aatual pesca experimental e amadora na represa daPampulha e a registrada em 1992. Os resultadosmostraram que houve uma notável perda na riqueza ediversidade da ictiofauna local. A redução de quase50% no número de espécies de peixes (foram encon-tradas 11 espécies, contra 20 em 1992) é lamentável,porém não irrecuperável. A lagoa da Pampulha aindatem grande importância para a pesca de subsistência.

Pesca local

Iniciativas do Propam buscam recuperar espaço vital para qualidade de vida e a história de Belo Horizonte

Obras iniciam revitalização da bacia da Pampulha

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Na natureza, tudo segue um ciclo, onde o que é restohoje será a base para uma nova vida amanhã. Acompostagem é um processo no qual o homem

passa a ajudar nesseciclo, trazendo bene-fícios para todos.Através da com-postagem, aquiloque normalmenteiria para o lixo étransformado emadubo, devolvendocomponentes essen-ciais ao solo. Parafazer isso, misturam-se os restos orgâni-cos com materialpalhoso, como sobras de poda ou casca de arroz, evitando aserragem, que absorve umidade em excesso. É essencial que olixo seja separado previamente e só os restos orgânicos sejamutilizados. A mistura é colocada em um recipiente onde é revi-rada com freqüência, devendo ser mantida sempre úmida.

"Os melhores recipientes são a caixa de madeira comfrestas, igual às caixas de fruta, ou então o tambor de óleo. Elesdevem ser divididos em dois compartimentos, para que sejamais fácil revirar o material", explica a engenheira sanitaristada Secretaria Municipal de Limpeza Urbana de Belo

Horizonte (SMLU), Maeli EstrelaBorges.

Além de adubo, o composto é tam-bém corretor de solo, trazendo a elemais porosidade, umidade e microor-ganismos importantes para o cresci-mento dos vegetais. Segundo a biólogaJane Pimenta, "na maioria das vezes, acompostagem deixa de ser feita porfalta de informação das pessoas, poisnão é um processo complicado. Tanto que antigamente, eramuito comum fazer isso em casa".

Por meio de uma parceria entre as donas-de-casa e aEmater a compostagem doméstica urbana vem sendo retoma-da, ainda que necessite de orientação técnica especializada eum investimento inicial um pouco elevado. "Nós temos pro-cessos de compostagem no meio urbano de excelente quali-dade", comenta o engenheiro agrônomo Fernando Cassimiro,da Emater-MG (Empresa de Assistência Técnica e ExtensãoRural do Estado de Minas Gerais). Ele ressalta que até empequenas hortas é possível manter um aparelho destinado àcompostagem.

A compostagem urbana é realizada utilizando materiaissimples, como o mato da capina de rua e restos de comida.Mas sendo um processo de decomposição, há a preocupaçãocom possíveis problemas que isso possa acarretar em umacasa. Por isso Cassimiro ressalta que devido à grande quanti-dade de capim e esterco seco utilizada no processo, o maucheiro, principal temor das donas-de-casa, é eliminado, assim

como a presença exagerada de moscas. O engenheiro tambémalerta para a necessidade do composto ficar sob o Sol e emlocal bastante ventilado. "Seguindo nossas orientações edeixando bater sol o tempo todo, o mau cheiro desaparece".

No verão o composto demora cerca de 70 dias para ficarpronto. Já no inverno, o processo é um pouco mais demorado,pois as bactérias decompõe a matéria orgânica lentamente.Neste período, o composto precisa de até 120 dias para serusado como adubo em hortas e vasos ornamentais, devendoser misturado à terra do plantio.

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Rodrigo Campanella e Vinicius UtschEstudantes de Comunicação da UFMG

A compostagem na SMLU é feita com 40% de mate-rial palhoso e 60% de resíduo orgânico. Se a parteorgânica não for muito úmida, deve ser cortada empedaços de até 2 cm para a mistura. Sendo mais úmida,são necessários pedaços maiores. O material palhosodeve ter pedaços de 5 a 8 cm.

Compostagem na SMLU

Lixo pode ser fonte de vidaProcesso de compostagem transforma restos de comida em adubo de qualidade e pode ser feito em casa

• COMPOSTAGEM •Manuelzão Belo Horizonte, Março / 2003

Oribeirão da Mata está na região central de Minase forma uma sub-bacia do rio das Velhas. Comárea de 770,1 km² e abrigando uma população

aproximada de 435 mil habitantes, a bacia convive comproblemas sanitários, desemprego, condições impróprias deassentamentos humanos e destruição ou super exploraçãodos recursos naturais. Um plano de diretrizes de açõesencomendado pelo poder público e a iniciativa privadatraduz a atual situação da bacia e propõe ações para a recu-peração desse importante afluente do Velhas, renovando asesperanças de vê-lo novamente povoado por peixes.

O ribeirão passa por dez municípios da região metropoli-tana: Capim Branco, Matozinhos, Esmeraldas, Ribeirão dasNeves, Pedro Leopoldo, Confins, Vespasiano, São José daLapa, Lagoa Santa, Santa Luzia. Altamente degradado, elerecebe esgotos doméstico e industrial. A qualidade das águasda bacia é ruim, de acordo com o IQA, Índice de Qualidadeda Água, monitorado pela Fundação Estadual do MeioAmbiente, FEAM, e o índice de contaminação por tóxicos éalta, segundo dados de 2001.

A proposta de plano diretor da bacia do rio das Velhas,concluída pelo Prosam (Programa de Saneamento Ambientaldas bacias do Arrudas e do Onça) em 1999, já apontava paraa degradação do curso d"água. O Comitê do Rio das Velhasconcluiu que seria importante fazer um estudo mais detalha-do dessa sub-bacia. Esse estudo foi encomendado pelo CBH,com patrocínio da Copasa, Belgo Mineira e Soeicom.Segundo o relatório da empresa contratada, "...com relação àinfra-estrutura urbana, quase todas as cidades da bacia têmcomo principais problemas as deficiências dos sistemas desaneamento. Na grande maioria dos municípios não existetratamento de esgoto, os efluentes são jogados diretamente

nos cursos d'água. Também em quase todos predominam oslixões a céu aberto."

Ainda segundo o relatório, "Nas áreas rurais a preocu-pação também é significante. Nelas, a pressão sobre o meioambiente também se verifica, nas regiões onde são utilizadastécnicas de manejo inadequadas para campos de cultura epastoreio. A mata ciliar ocorre hoje em pequenas faixas dosrios da bacia." O plano de diretrizes de ação propõe açõescorretivas e de fiscalização para a minimização dosimpactos, entre as quais a revegetação, o repovoamento doscursos d'água com espécies animais e vegetais e adiminuição da carga poluidora nos corpos d'água com aimplantação de interceptores e ETEs.

O plano foi apresentado às comunidades locais, prefeitose indústrias através de dez pré-audiências organizadas peloProjeto Manuelzão nas dez cidades cortadas peloribeirão da Mata. O plano foi aceito em sua integri-dade, recebendo pequenas complementações e ofi-cializado em uma audiência pública final ocorridaem dezembro passado em Pedro Leopoldo, quandotambém foi proposto solicitar a oficialização doComitê do Ribeirão da Mata como sub-comitê doCBH-Velhas. Nas audiências a comunidade apre-sentou denúncias sobre as atividades de extração decalcário e areia por grandes e pequenas empresas,loteamentos irregulares, desmatamento, falta decontrole de efluentes industriais e domésticos epoluição atmosférica por parte das cimenteiras.

Para o chefe da divisão de Meio Ambiente dePedro Leopoldo, Mauro Lobato Martins, "aaprovação do plano de recuperação da bacia doRibeirão da Mata representa um grande avanço narevitalização da bacia, porque pressupõe uma gestãointegrada de todos os agentes - comunidade, enti-

dades públicas e privadas - na adoção de um conjunto demedidas sócio-ambientais em prol desses cursos d'água. Nãoobstante, permite romper com a idéia do território municipalcomo campo exclusivo de ação, exigindo uma visão de tota-lidade em que as ações serão cooperativas e vistas comocomplementares", define.

O próximo passo é levar o plano de diretrizes de ações àaprovação do CBH Velhas. "Estamos apenas esperando aaprovação final para começar a buscar os recursos. O proje-to está orçado em 90 milhões e temos a previsão de dez anospara sua efetiva implantação", explica Valter Vilela,secretário do CBH Velhas e superintendente da Copasa. " Arecuperação do Mata é essencial, se ele não for tratado, nãoadianta fazer mais nada à jusante. Recuperar o ribeirão daMata significa dar mais vida ao Velhas", reforça.

Plano de ações orienta trabalho de revitalização no ribeirão da MataLuana Cury

Estudante de Jornalismo do Centro Universitário Newton Paiva

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Comitê do São Francisco aprova Carta de Princípios

OProjeto Manuelzão, representado pelo ProfessorApolo Heringer, apresentou uma Carta dePrincípios à diretoria provisória que encerra seus

trabalhos e ao novo Comitê da Bacia Hidrográfica do RioSão Francisco, que assume e que foi integralmente aprovadapor seus membros. A apresentação foi feita na reunião, rea-lizada em novembro de 2002, na cidade de Brasília.

A Carta foi elaborada pelo professor Apolo, coordenadordo Projeto Manuelzão, com a assessoria de LetíciaFernandes, advogada e secretária executiva do Projeto. Aidéia central do documento é efetivar a integração entre agestão ambiental e a gestão das águas. "Nós temos umapolítica nacional de recursos hídricos e outra para o meioambiente, queremos unir as políticas, as atividades e a

gestão", diz Letícia. Após ter sido aprovada, a Carta foi incluída na pauta da

solenidade, que empossou a diretoria definitiva do CBH SãoFrancisco. E nesta mesma reunião o documento foi incorpo-rado pelo Comitê. "O fato da declaração ter tido umaaceitação tão grande deu ainda maior visibilidade e credibi-lidade ao Projeto Manuelzão, legitimando-o como uma figu-ra importante dentro do Comitê", afirma Letícia.

Além de ser um documento normativo, a Carta dePrincípios é um compromisso ético do Comitê com a revita-lização do Rio São Franciso. Para se chegar ao formato apre-sentado, foram considerados os objetivos, as finalidades e oscompromissos do Comitê. Também foi feito um apanhado dalegislação ambiental e da Declaração da Rio 92, selecionan-do os artigos que mais se adequariam às particularidades eaos propósitos do Comitê.

A idéia de propor esta carta nasceu da polarização quehouve no Comitê Provisório entre representantes ligados aosetor produtivo - sobretudo hidrelétrico, de irrigação e mi-nerador - e ambientalistas. Os primeiros pensam a águacomo recurso hídrico, visão economicista que desdenha apreservação ambiental como importante para preservar suaqualidade e quantidade. Com a Carta, a distância conceitualentre as duas visões foi equacionada.

A coordenação do Projeto pretende aproveitar a expe-riência para os Comitês Manuelzão. Na reunião de fundaçãodo Comitê do Ribeirão Arrudas, formado no fim do ano pas-sado, foi elaborada uma Carta de Princípios para o próprioComitê do Arrudas, tendo como base a apresentada emBrasília. A médio e longo prazo, o Projeto pensa em incenti-var todos os seus comitês a aprovarem suas cartas de princí-pios.

Carolina SaloméEstudante de Comunicação da UFMG

Prefeitura de Belo Horizonte em parceria com aCopasa e o Projeto Manuelzão, realizou oSeminário para a criação do Comitê da Bacia do

Ribeirão da Onça. A reunião aconteceu no dia 25 defevereiro no Auditório Santo Inácio, bairro Planalto. O obje-tivo central do encontro foi discutir propostas para a consti-tuição de um comitê e a indicação de um grupo provisórioque encabece os trabalhos até a criação do definitivo.

Estiveram presentes o novo diretor metropolitano daCopasa, médico e vereador Juarez Amorim, o diretor anteri-or, Rômulo Perilli, Marília Bouchardet, técnica da Copasa,os secretários das regionais da PBH- Norte, Nordeste ePampulha, além de líderes comunitários e dos ComitêsManuelzão. Auditório cheio, com quase 200 participantes.

O ribeirão da Onça nasce em Contagem e deságua no riodas Velhas. A sua bacia ocupa quase metade do território deBelo Horizonte, e, junto com a bacia do ribeirão Arrudas,forma a principal rede de drenagem fluvial da cidade. Abacia do ribeirão da Onça atravessa as regiões Norte,Nordeste, Noroeste, Venda Nova e Pampulha. Apesar daimportância que o rio tem para a cidade, ele vem sofrendointensamente com erosão, destruição da mata ciliar e apoluição de suas águas.

A reunião contou com a presença de representantes daprefeitura, Copasa, Projeto Manuelzão, órgão estaduais,comitês dos afluentes do ribeirão da Onça, empresas queatuam na região da bacia, prefeituras de Santa Luzia eContagem, UFMG, ONG´s, além da sociedade civil. Oseminário buscou integrar todas as ações e objetivos dosComitês Manuelzão locais, usuários, órgão governamen-tais e prefeituras. Já existem comitês em vários dos aflu-entes do ribeirão da Onça, mas não um que trabalhe deforma unificada diretamente com o rio.

O coordenador geral do Projeto Manuelzão ApoloHeringer abriu o encontro com uma palestra onde reafir-mou a importância das águas e da sua preservação para avida do ser humano e contou um breve histórico doProjeto Manuelzão. Apolo também ressaltou a relevânciaque o ribeirão do Onça tem para Belo Horizonte.Segundo ele "está nascendo um comitê de extremaimportância para todo o povo da região metropolitana eda bacia do rio das Velhas". Para Apolo, se o comitê pro-visório que começar a nascer a partir do seminário fun-

cionar bem de acordo com o designa a lei, ele poderáfacilmente ser oficializado como subcomitê do Comitê doRio das Velhas.

Ao final da reunião decidiu-se pela formação de umacomissão provisória constituído por representantes doProjeto Manuelzão, um de cada comitê dos afluentes doribeirão da Onça, das regionais, da Secretaria Municipalde Meio Ambiente, do Propam, além de outros órgãosmunicipais, como o Drenurbs usuários como a Copasa e

algumas grandes indústrias, poder público de Contagem eSanta Luzia.. As pessoas que farão parte desta comisãoserão indicadas posteriormente pelas instituições citadas.Esta comissão deverá trabalhar até novembro de 2003,ocasião esta, em que será criado o comitê definitivo.Durante o seminário também foi exposta uma coleção deutensílios feitos de material reciclado, uma iniciativa daRegional Pampulha que visa ensinar a população comoreutilizar objetos diminuindo a produção de lixo.

Seminário discute a formação do Comitê do Ribeirão da Onça

• COMITÊS •Manuelzão Belo Horizonte, Março / 2003

Proposta, que estabelece compromissos éticos para revitalização do rio, foi apresentada pelo Projeto Manuelzão

Marco Antônio PessoaEstudante de Comunicação da UFMG

Trecho do ribeirão da Onça, no bair-ro Ribeiro de Abreu

O rio Taquaraçu nasce na cidade de Caeté, atravessa osmunicípios de Nova União, Taquaraçu de Minas e deságuano rio das Velhas, em Santa Luzia. Para constituir umcomitê de sua bacia, envolvendo representantes dos trêsmunicípios, foi realizado um seminário no dia 22 defevereiro. O evento foi organizado pela equipe do projetoManuelzão e por lideranças locais. Segundo Marcílio deOliveira Castro, do grupo de mobilização do Projeto, cercade 80 pessoas participaram da reunião, onde decidiu-seformar uma comissão.

No seminário foram apresentadas as diretrizes gerais

para o trabalho conjunto que será realizado entre os trêsmunicípios. No dia 8 de março último foi organizada aprimeira reunião com a comissão provisória já formada. Os27 integrantes da comissão, divididos entre sociedadecivil, usuários de água e poder público, receberam o"Documento Base", elaborado pela coordenação doProjeto durante o segundo grande encontro dos ComitêsManuelzão.

O seminário ocorreu em Nova União e a reunião dacomissão em Taquaraçu. A proposta é de realizar encontrosmensais sediados, alternadamente, pelas três cidades.

Comitê do rio Taquaraçu

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Saiu o resultado do concurso "Premiando a Educação Ambiental"

Aos 32 anos, ele já chegou à frente da coordenaçãode um curso universitário. Marcelino Santos deMorais, coordenador do curso de Geografia do

Centro Universitário Newton Paiva, graduado e mestre emGeografia Física pela UFMG, além de coordenar e orientarprojetos acadêmicos na área ambiental, também mantém umprojeto de iniciação científica que procura retomar os passosde Peter Lund, traçando uma reconstituição ambiental daépoca em que Lund esteve em Minas Gerais. Marcelino tam-bém coordena o núcleo do Projeto Manuelzão na NewtonPaiva, e não para por aí: "sempre vai haver temas a se traba-lhar dentro da Geografia. Sei que a Geografia é fundamentalpara a elaboração de projetos que possam trazer melhoria naqualidade de vida das pessoas e incentivar uma conscientiza-ção ambiental", afirma.

Jornal Manuelzão - Porque você optou profissional-mente pela Geografia?

Marcelino - Bem, eu fazia o curso de Engenharia deMinas e não conseguia lincar a Engenharia às questões soci-ais. Através de alguns amigos que faziam Geologia eu co-nheci e me aproximei da Geografia. Foi paixão à primeiravista. Acabei abandonando a Engenharia. Encontrei o que euqueria na Geografia: um trabalho bastante ligado à natureza,porém sem se desvincular das questões sociais. Esse caráterholístico da Geografia é que me atraiu. Minha formação foitotalmente voltada para a área acadêmica, pensando em con-tinuar dentro de uma universidade. Na Newton, além delecionar, tive a oportunidade de trabalhar com uma das coisasque mais gosto: a pesquisa científica.

Fale um pouco sobre esse projeto.Eu e um grupo de professores dos cursos de História e

Turismo estamos retomando os passos de Peter Lund, o pai daPaleontologia Brasileira, em Minas Gerais. Na parte geográfi-ca estamos fazendo uma reconstituição ambiental para deli-near como era o ambiente na época em que Lund esteve aqui,e como esse ambiente é hoje. A parte histórica e turística seincumbiu do levantamento sócio-cultural dessa região para ofuturo planejamento turístico tendo como objeto de consumoturístico a vida e obra de Peter Lund no Estado.

Como surgiu a idéia de pesquisar o trabalho de Lund?Tudo começou em um projeto de extensão que tinha por

objetivo fazer o levantamento do turismo científico na região

de Lagoa Santa. Esse projeto durou um ano e ao fim dele nósconcluímos que o assunto merecia uma continuidade e apro-fundamento da pesquisa. Foi onde surgiu o projeto deIniciação Científica.

Você acredita na educação ambiental como forma deresolver grande parte dos problemas ambientais ?

Não acho que seja a educação ambiental o caminho,acredito sim na Educação no sentido mais amplo da palavra.Hoje não podemos mais pensar a ciência de um modo frag-mentado. Os profissionais que trabalham diretamente com omeio ambiente são fundamentais no processo de conscienti-zação e encaminhamento de soluções, mas se eles nãotiverem o suporte dos profissionais da saúde, da educação, eaté mesmo da área econômica, não teremos soluções. Comoeu posso pregar educação ambiental numa região de mine-ração onde o principal produto de degradação é o principalproduto econômico? A solução para questões como esta devepartir de um esforço coletivo, uma integração de forças dasdiversas áreas. É um trabalho interdisciplinar.

Em que consiste o Cema e como é o trabalho donúcleo do Manuelzão na Newton?

O Cema é o Centro de Estudos do Meio Ambiente, umcentro de extensão que vai para o terceiro ano, onde os alunos

experimentam na prática o que é dado em sala de aula. Hojedamos um suporte ao Parque das Mangabeiras, temos umprojeto na Gruta de Maquine e o Pró-Nascente, que é um tra-balho de mapeamento, diagnóstico e manejo das nascentes domunicípio de Pimenta. Tivemos a grande oportunidade deimplementar a parceria com o Projeto Manuelzão, através deum núcleo que funciona no Cema desde o final do ano pas-sado e que está nos proporcionando um trabalho super inte-ressante em Ribeirão das Neves.

Como é o trabalho em Neves e quais foram os princi-pais problemas diagnosticados?

A comunidade local tem problemas condizentes com asclasses sociais mais oprimidas: saúde, educação, desem-prego. Estamos diagnosticando a situação ambiental paraapresentar possíveis soluções que possam ser concretizadaspelo poder público em conjunto com a sociedade. Agora,estamos fechando a primeira parte do mapeamento doribeirão Café, que é um curso totalmente degradado porpoluição proveniente de esgoto doméstico, assoreamentocausado pelos loteamentos clandestinos e dejetos de animaisvindos de propriedades rurais onde não existe a preocupaçãoambiental. Chama atenção a percepção ambiental da popu-lação sobre o seu meio. Grande parte dos entrevistados nãoenxerga o ribeirão Café como um curso de água e sim comoesgoto. Isso porque a comunidade não é local, essas pessoasnão nasceram em Neves, nunca viram o Café limpo. Nossopróximo objeto de estudo é o Cacique. Além do diagnósticoda situação ambiental vamos entrar um pouco na área daassistência. A partir do final deste mês, estaremos colocandoà disposição da população os cursos de saúde da NewtonPaiva, através de pequenas ações sociais.

A população mais carente sofre mais com adegradação ambiental?

Sim, pois eles estão em contato direto com o lixo, o esgo-to, a erosão. Essa população sofre com a falta de educação,que por sua vez permite a degradação ambiental. Por não terdiscernimento, essas populações sofrem as conseqüências doque elas mesmas causam.

O que representa uma universidade estar abraçando acausa do Projeto Manuelzão?

Isso mostra a responsabilidade social da universidade.Nós devemos essa responsabilidade à comunidade. É na uni-versidade que se faz pesquisa, que se encontram novos ca-minhos.

"Incentivar professores a desenvolverprojetos ligados ao meio ambiente". Essefoi o objetivo do segundo concurso"Premiando a Educação Ambiental nabacia do rio das Velhas", segundo GilmaraLopez, que faz parte da equipe do"Manuelzão vai à escola" responsável peloconcurso em parceria com a SecretariaEstadual de Educação.

Sessenta e cinco projetos de váriascidades do alto, médio e baixo rio dasVelhas atenderam aos pré-requisitos doedital. Puderam participar do concursotodos os professores das redes estadual emunicipal dos 51 municípios localizadosna bacia.

Ano passado, o concurso premiou 40professores. Dessa vez, são 80 os contem-plados. Puderam se inscrever até cincoprofessores por projeto. A comissão jul-

gadora foi composta por representantes daSecretaria Estadual de Educação e doProjeto Manuelzão.

Todos os projetos foram feitos paraserem aplicados com os estudantes decada escola. "Houve professores quedesenvolveram seus projetos juntamentecom seus alunos", conta Gilmara. Assimcomo o ano passado, o prêmio para osprofessores será uma estadia em pousa-da na Serra do Cipó, onde haverá umprograma de vivência ecológica. Umacarta de premiação ou agradecimentoserá enviada aos participantes, juntocom uma ficha técnica de avaliação esugestões para o aprimoramento e con-tinuidade do trabalho nos próximosanos. A carta dirigida aos premiadosestará informando sobre o prazo decontato com o Projeto Manuelzão, aprogramação das atividades na Serra doCipó e data do evento. Confira o resul-tado do concurso:

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• ENTREVISTA •Manuelzão Belo Horizonte, Março / 2003

Louraidan LarsenEstudante de Comunicação da UFMG

“A solução deve partir de um esforço coletivo”Luana Cury

Estudante de Jornalismo da Newton Paiva

Marcelino Santos de Morais, coordenador do curso de Geografia do Centro Universitário Newton Paiva

1)"Projeto Multidisciplinar - Educação Ambiental": E. E. Pedro de Alcântara Nogueira/Ribeirão dasNeves2)"Poluição das Águas": E. E. Geraldo Teixeira da Costa/Santa Luzia3)"Projeto Nascentes, o brotar da vida em nossas mãos": E. E. Dom Velloso/Ouro Preto4)"Projeto Grande Sertão Veredas": Escola Municipal José Madureira Horta/Belo Horizonte5)"Água: Um Tesouro a ser Preservado": E. E. Interventor Alcides Lins / Curvelo6)"Projeto Vida": E.E. José Mendes Correa/Belo Horizonte7)"Projeto O Novo Velhas": Escola Pré-escolar Pequeno Universo/Curvelo8)"Renascer com o Velhas":Escola Pré-escolar Pequeno Universo/Curvelo9)"Água: Necessidade Vital. Como conservá-la?" Escola Pré-escolar Pequeno Universo/Curvelo10)"Projeto de Educação Ambiental": E.M. Carlos Drummond de Andrade / Belo Horizonte11)"O Homem e suas Relações Políticas e Ambientais":E.M. Padre Joaquim Saturnino de Freitas/ Caeté12)"Que fazer e Como tratar o lixo e os esgotos das cidades": E.M.Bemvinda Pinto Rocha / NovaLima13)"Projeto de Educação Ambiental" : E.M. Fernando Dias Costa / Belo Horizonte14)"Água: Fonte da Vida": E. E. Afonso Soares de Freitas / Augusto de Lima15)"Água - Revitalizar": E.E. São Vicente de Paula / Curvelo16)"Água: Um Tesouro em Perigo": E.M. Doutor Sabino Barroso / Contagem17) "SOS Córrego Santo Antônio" - Impactos Ambientais em Curvelo - E. E. Bolívar de Freitas/Curvelo18) "SOS Córrego Santo Antônio" - Navegando pelo Rio São Francisco: E. E. Bolívar deFreitas/Curvelo19) "Água Fonte da Vida" :E. E. de Guaicuí /Várzea da Palma20) "Educar para preservar": E.M. Jeliomar Brandão / Prudente de Morais.

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Educação ambiental, tema pouco falado e ouvidoantes da década de 70, agora ela está em voga. Ohomem descobriu que não pode mais usufruir

indiscriminadamente da natureza, percebeu, e já passava dahora, que seu bem-estar e saúde dependem da preservaçãoda natureza. Os recursos naturais agradecem. Hoje, nãobasta gostar da natureza, a lição, nas escolas de ensino fun-damental, é aprender a preservá-la para o amanhã. E as cri-anças demonstram que estão aprendendo muito bem o deverde casa.

Domingo, sete da manhã. Maura Frias, professora daquarta série do ensino fundamental, pula da cama e vai fazero café. Está atrasada para sair de casa. Mas domingo não édia de dormir até mais tarde? Não. Hoje é um domingo espe-cial. "Vamos levar as crianças ao Zoológico", explica ela emtom animado. Pedro, de nove anos, está empolgado: moran-

do em um pequeno apartamento em um bairro carente deContagem, ele tem poucas oportunidades de entrar em con-tato com a natureza. "Eu nunca vi a girafa nem o leão. Euacho o leão o mais bonito", confessa ele.

A mãe de Pedro, a doméstica Ceuslene da Silva, de ape-nas 23 anos, é mais uma vítima da má distribuição de rendae apesar da falta de instrução, sabe que a educação ambien-tal é importante. "Lá em casa a gente não joga lixo no cór-rego que passa perto, a gente põe na sacola e espera o ca-minhão. Eu também sempre falo com o Pedro que não podejogar lixo no chão", conta ela. Pedro, por sua vez, já sabe oque é coleta seletiva e reciclagem. "As professoras ensinama gente a reciclar o papel e lá na escola tem uma lixeira pravidro, uma pra papel, e outra que a gente joga latinha", diz.

Maura acredita que os alunos aprendem mais quandoextrapolam os limites da sala de aula. "eles vêem os animaisde perto, vêem o que a poluição é capaz de causar e apren-dem algumas regras para preservar o meio ambiente. Vão ao

Zoológico, a grutas e aoMuseu de HistóriaNatural, onde aprendemsobre a passagem dosdinossauros sobre a Terrae as diversas espécies.Mas damos preferênciaaos lugares que nãocobram entrada, pois osalunos são carentes eacabam não indo se ocusto é alto", explica aprofessora.

Podemos encontrarum problema semelhanteao vivido por Maura emRibeirão das Neves, ondegrande parte dos alunosda rede pública é carente.Lá, frente aos inúmerosproblemas ambientais, aeducação ambiental se fazainda mais necessária.

Mas como colocá-la em prática? Para resolver este desafio,os professores da cidade estão contando com a ajuda dosprofessores e alunos do curso de Pedagogia do CentroUniversitário Newton Paiva.

As alunas do 3º período de Pedagogia, juntamente coma professora Carla Pádua, foram convidadas a integrarem oprojeto pelo vice-coordenador do Manuelzão, ProfessorPolignano. Com muita vontade de trabalhar, as alunas jáestão com vários projetos montados. Já formularam váriasperguntas sobre ecologia e também sobre o Manuelzão."Elas estão criando o Show do Manuelzão, um jogo para ascrianças aprenderem e também se interessarem pelo proje-to, uma forma de educar brincando", afirma a professoraCarla.

Bastante interessada pelo projeto, a estudante Thaís daCosta desenvolveu dois projetos que pretende concretizarjunto ao Manuelzão. Uma gincana pedagógica e um vídeogame, que, se aprovado, vai integrar diversos outros cursos."É um projeto bastante ousado, mas que se colocado emprática, vai beneficiar não só o Manuelzão, mas a todos osalunos que participarem do projeto".

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Sábado quente, céu azul, e cerca de 260 professoresda rede pública reunidos para aprender mais sobrecomo trabalhar a educação ambiental nas escolas.

O evento, chamado "Caravana Eco-pedagógica", aconteceuno dia 09 de Novembro de 2002, no Colégio Estadual, emBelo Horizonte. Uma realização do Projeto Manuelzão eSecretaria Estadual da Educação em parceria com Copasa,Newton Paiva e as ONGs "Vibra mais" e "Amigos daNatureza".

Pela manhã aconteceram as palestras e à tarde, as ofici-nas pedagógicas. O objetivo da "Caravana" foi fazer ligaçãoentre o conteúdo e a prática e capacitar professores paratornar a educação ambiental mais lúdica. "Nas nossas parce-rias com a comunidade escolar, os professores apresentarama necessidade de um elo entre o conteúdo do plano curricu-lar e a prática na comunidade. Então nós resolvemos fazerum dia de vivências", comentou Monalise Martins, uma daspedagogas que colaboraram com o Projeto Manuelzão nestaocasião.

Todas as escolas públicas da Região Metropolitana deBH foram convidadas a enviar professores para participar

gratuitamente. onze oficinasforam organizadas por profis-sionais do Manuelzão, daFEAM, de ONGs e daCopasa: "Ecologia integral","Meio ambiente, meu meiode vida", "Jogos e brin-cadeiras em educação ambi-ental", "Matemática ambien-tal", "Comunicação ambien-tal", "Lixo que vira tudo","Ecologia humana", "Pro-jetos em educação ambien-tal", "Bacia hidrográfica","Mobilização ambiental" e"Plantio Poético".

No ciclo de palestras,pela manhã, o Prof. ApoloLisboa discursou sobre pro-blemas ambientais e sociais, contou a história de Manuelzãoe "causos" divertidos. O Prof. Marcos Polignano falou sobreos desafios e objetivos da educação ambiental. E HugoWerneck, conhecido ambientalista mineiro, hoje com mais

de 80 anos, ensinou como a educação ambiental pode seraprendida com as crianças e pessoas humildes. Ele afirmouque "a educação ambiental é gratuita. É de quem sente, nãode quem sabe".

Caravana eco-pedagógica capacita professores

Lívia Furtado Estudante de Comunicação da UFMG

Luana CuryEstudante de Jornalismo da Newton Paiva

• MANUELZÃO VAI À ESCOLA •Manuelzão Belo Horizonte, Março / 2003

Palestras e oficinas sobre educação ambiental são oferecidass a professores da rede pública da RMBH

Trabalho de educação ambiental ganha fôlego em Neves

Participantes de oficina na “Caravana Eco-Pedagógica

A estudante Thaís da Costa e a professora Carla Pádua

Alunos em trabalho de campo: aprendizado que extrapola a sala de aula

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Você que mora em Belo Horizonte, ou visitou a cidadeentre os dias 21 de dezembro do ano passado e 3 dejaneiro desse ano, pôde ver o Projeto Manuelzão em out-doors espalhados por vários cantos da cidade. Foram 15placas, cedidas pela JZ outdoor. "Pretendemos continuarnossa parceria com o Projeto Manuelzão", conta RosaZiller, diretora comercial da JZ. Rosa diz que sua empre-sa "está sempre ciente das questões ambientais", o queserve como exemplo para outros empresários se inte-grarem à causa Manuelzão.

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O Projeto Manuelzão está firmando uma parceria com oSindicato dos Médicos de Minas Gerais, Sinmed/MG, quepode fortalecer as relações que envolvem saúde e meioambiente. Uma das prioridades visadas pelas duas entidadesé o estabelecimento de uma visão mais sistêmica, que equa-cione as lutas dos médicos por melhores condições de tra-balho e vida com o atendimento dos interesses da popu-lação. Além disso, esse trabalho pode alavancar um movi-mento em direção aos Agentes Comunitários de Saúde e oPrograma de Saúde da Família, pelo importante papel queeles podem desempenhar caso adotem uma visão da pro-moção da saúde aliada ao meio ambiente.

Um outro ponto destacado na parceria é o papel chaveque assume a água como eixo de monitoramento de saúde,meio ambiente e mobilização social, além de sua relaçãocom a qualidade de vida e o movimento pela Saúde Coletivano Brasil, que ainda é confundida como Saúde Pública. OSindicato se propõe ainda a trabalhar com base nos comitêsde bacias hidrográficas, pelo papel assumido pela água nademarcação do território.

Manuelzão em out doors

Sindicato dos Médicos discuteparceria com Manuelzão

• ACONTECE •Manuelzão Belo Horizonte, Março / 2003

O Projeto Manuelzão manifesta seu pesar pela mortede Ney Soares, reitor do Centro Universitário de BeloHorizonte, Uni-BH. Ney Soares faleceu no dia 24 dedezembro ultimo, aos 67 anos. A Uni-BH é uma insti-tuição parceira em vários trabalhos do Manuelzão.

Os estagiários da Faculdade de Medicina que atuam no dis-trito da Barra do Guaicuí, na foz do rio das Velhas, irão realizaroutros trabalhos na localidade, além do atendimento clínico.Durante três dias por semana, eles pretendem desenvolveratividades nas escolas e no comitê Manuelzão local.Apresentada na última reunião, dia 19 de fevereiro, essa pro-posta "começou a ser colocada em prática já na semanaseguinte", segundo o vice-coordenador do Projeto Manuelzão,Antônio Leite. Agora, é esperar para ver os resultados.

Quem abastecer o carro em algum dos municípios dabacia do rio das Velhas pode ter uma surpresa. Cerca de 120postos de combustíveis distribuídos ao longo da bacia foramequipados com expositores do jornal do Projeto. A iniciati-va surgiu de uma parceria entre o Projeto Manuelzão e oSindicato do Comércio Varejista de Derivados de Petróleodo Estado de Minas Gerais (Minaspetro). Segundo o presi-dente do sindicato, Paulo Miranda, a parceria é reflexo danecessidade de os postos também "abraçarem a causa domeio ambiente".

Postos de combustíveisdistribuem Jornal do Projeto

Estagiários em Barra do Guaicuí

Prêmio em Ouro PretoO Projeto Manuelzão foi homenageado pelo 6º Troféu

Uni-BH Comunidade na categoria meio ambiente, em 28 denovembro passado, em Ouro Preto. O fundador do ProjetoManuelzão no município, Ronald Carvalho Guerra (Ronin),recebeu a premiação junto com alunos da UniversidadeFederal de Ouro Preto que participam do "Manuelzão vai àescola". Segundo Ronin, "o Projeto vem se destacando naárea ambiental na região há algum tempo". Em 2001 oProjeto Manuelzão também foi homenageado. A promoçãoé da TV Uni-BH Inconfidentes e o prêmio foi entreguedurante a solenidade oficial de aniversário da emissora . Asentidades que atuam na região indicam os candidatos e ostelespectadores em Ouro Preto e Mariana votam nas trêsentidades que vão ser premiadas. Em outubro passado oProjeto também foi homenageado pela Sociedade OperáriaSão José, nas comemorações do seu centenário.

Polícia ambientalO professor Apolo Heringer Lisboa, da coordenação do

Projeto Manuelzão, recebeu no dia 20 de fevereiro último,homenagem da 7ª Companhia de Polícia Militar de MeioAmbiente pelas ações em prol da causa ambiental na área dacompanhia no ano de 2002. O comandante Aryone Juarez deAlmeida Júnior entregou uma placa ao professor Apolo nafesta de comemoração dos cinco anos da companhia queaconteceu no quartel do Prado.

Ex-ministro assumesecretaria de MeioAmbiente

O ex-ministro do Meio Ambiente, José Carlos Carvalho,tomou posse no início de fevereiro como secretário de MeioAmbiente e Desenvolvimento Sustentável de Minas Gerais.Carvalho inicia sua segunda gestão na secretaria, onde foium dos responsáveis por sua criação. Em seu discurso, onovo secretário disse que transferirá para esta secretaria aresponsabilidade política e normativa dos órgãos vincula-dos, além de promover a integração dos órgãos ambientaisno Estado. Essa ação se dará, inicialmente, através da unifi-cação do sistema de licenciamento ambiental do Estado,criando uma única base de dados. Esse trabalho teve iníciona gestão dos ex-secretários Paulino Cícero de Vasconcellose Celso Castilho. Carvalho também revela grande com-preensão sobre o trabalho com bacias hidrográficas.

CopasaJá na Companhia de Saneamento de Minas Gerais

(Copasa), tomou posse como presidente, no dia 14 defevereiro, o administrador de empresas Mauro RicardoMachado Costa. Juntamente com ele foram indicados osnovos diretores da empresa: Carlos Gonçalves de OliveiraSobrinho (diretoria Técnica e de Meio Ambiente), CarlosMegale Filho (diretoria de Operações Leste), CássioDrummond de Paula Lemos (diretoria de OperaçõesSudoeste), George Hermann Rodolfo Tormin (diretoriaFinanceira, Administrativa e de Relações com Investidores),Geraldo David Alcântara (diretoria de Operações Centro -Norte) e Juarez Amorim (diretoria de OperaçõesMetropolitana). Nesta última diretoria, Amorim substituiRômulo Perilli, que na avaliação da coordenação do ProjetoManuelzão teve atuação destacada na adoção de um novaabordagem para questão da água por parte da Copasa.

O novo presidente da Copasa passou os últimos quatroanos como presidente na Fundação Nacional de Saúde(Funasa) e em sua posse destacou a importância da empresater uma ação efetiva na questão do saneamento básico, comdestaque para as questões ambientais. Em seu discurso, eledestacou que "é dever do Estado e direito do Cidadão o aces-so a serviços públicos essenciais que possibilitem melhoriada qualidade de vida da população".

Reitor da Unibh

Para tratar de assuntos relacionados ao cuidado dos córre-gos e suas nascentes e de outros temas ligados ao meio ambi-ente ocorreu o 1º Seminário Manuelzão, Santa Luzia e o Riodas Velhas. O evento ocorreu na cidade de Santa Luzia, a 40Km de Belo Horizonte, em novembro passado.

"Traçamos linhas de ação para a melhoria dos córregos",conta Maria Amália Lopes, a "Maná", coordenadora doComitê Manuelzão na cidade. Ela lembra que já existe umaparceria entre a Prefeitura de Santa Luzia, a Copasa e ocomitê para a proteção das nascentes. Durante o seminário,surgiu a idéia de se formar sub-comitês por região, de acordocom a localidade dos córregos.

Os alunos da 3ª e 4ª série do ensino fundamental da EscolaMunicipal D. Pedro II lançaram livro que conta a história dedois peixes, que conversam a respeito da situação do rio dasVelhas. O evento ocorreu no dia 18 de novembro do ano pas-sado. A escola fica no povoado de Taquaraçu de Baixo, emSanta Luzia, a 40 Km de Belo Horizonte

O livro foi produzido pelos alunos, sob a orientação daprofessora Patrícia Pereira e a supervisão da diretora,Solimar Bernadete, e da supervisora da escola, Targina Cruz."O objetivo foi aproximar a realidade do Projeto Manuelzãoàs crianças", explica Maná. "Queremos conscientizar e sen-sibilizar os alunos para a preservação ambiental", diz.

Seminário em Santa Luzia

Alunos lançam livro

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A virtude da prudência

Em abril começam as obras de revitalização dos córregosCardoso e Santa Terezinha, região leste de Belo Horizonte. Oprojeto consiste na implantação de redes coletoras e inter-ceptoras de esgoto, na construção de ruas e na recuperaçãode nascentes. O financiamento para a obra de 8,9 milhões dereais será fornecido pelo BNDES, Banco Nacional deDesenvolvimento Econômico e Social.

A recuperação do córrego Santa Terezinha é resultado deuma luta antiga dos moradores do bairro Alto Vera Cruz.Fundadores do primeiro comitê Manuelzão, em 1997, a po-pulação já buscava, há anos, soluções para os problemas daregião. "A gente fazia levantamento das pessoas que moramna beira do córrego, mas não sabia para onde levar", lembraAlcides Pereira de Souza, membro do comitê.

Segundo Valdete da Silva Cordeiro, coordenadora doCentro de Ação Comunitária do Alto Vera Cruz, o comitêtornou possível a sua vontade de "reunir os órgãos públicose a comunidade para discutir a melhoria do córrego SantaTerezinha". Hoje participam das reuniões do comitê repre-sentantes da Copasa, SLU, Regional Leste, Urbel e Sudecap.

Um trabalho já realizado pelo Comitê, em parceria coma SLU, foi a limpeza do lixo que era jogado no córrego. Hojeo caminhão de limpeza passa três vezes por semana e a maio-ria da população não joga mais lixo e entulho no rio.

Mas o esgoto que cai direto no córrego continua sendoum grave problema. Os moradores que construíram suascasas nas margens e no leito do Santa Terezinha semprereclamam das inundações na época das chuvas e do maucheiro insuportável no período de estiagem.

O comitê conseguiu elaborar um projeto de recuperação

do córrego Santa Terezinha junto à Sudecap. Depois a popu-lação participou de duas audiências públicas para buscar averba necessária a execução da obra. "Na última audiência,em dezembro do ano passado, nós não fomos falar, fomosouvir, saber quando ia sair o dinheiro para a implementaçãodo projeto", conta Valdete. O financiamento saiu no mesmomês.

A parte mais delicada de toda a obra será a remoçãodessas famílias que moram no entorno do córrego. Osmoradores, muitos em áreas de risco, querem sair de suascasas, porém temem que o dinheiro oferecido pelo Proas,programa da prefeitura de Bh que reassenta famílias emáreas de risco ou de execução de obras públicas, não sejasuficiente para comprar uma nova moradia. O orçamento doBNDES indica cerca de 10 mil reais como valor para cadacasa indenizada.

Sílvia AraújoEstudante de Comunicação da UFMG

Alimentos transgênicos causam polêmica; impactoambiental é uma das grandes preocupações

Manuelzão Belo Horizonte, Março / 2003

Córrego Santa Terezinha recuperado, uma conquista do comitê

A soja e o milho são os principais ali-mentos transgênicos desenvolvidos em paísesque permitem sua produção

Daqui a alguns anos, pode ser que esteja à vendaem algum supermercado perto de sua casa umamaçã branca. Produzida com o suposto objetivo

de possuir maior valor nutricional ou por ser mais resistentea pragas, essa maçã será um alimento transgênico.Conhecidos também como Organismos GeneticamenteModificados (OGM), esses alimentos possuem algum tipode modificação em sua cadeia genética.

Embora a legislação brasileira proíba a produção e acomercialização de transgênicos, já estão em andamentouma série de pesquisas relacionadas a eles. "Atualmente,temos o mamão, o feijão e a batata resistentes a vírus", contaEdson Watanabe, pesquisador da Embrapa Indústria deAlimentos do Rio de Janeiro. A Embrapa possui 40 centrosde pesquisas espalhados por todo o Brasil e vários OGM´sestão em desenvolvimento. "Temos que provar que eles sãoseguros", diz.

Impacto ambiental Uma das maiores preocupações em relação aos trans-

gênicos é ambiental. "Quando apareceram os agrotóxicos,também se falava que teríamos um ganho enorme de produ-tividade, além de alimentos sadios. Hoje, sabemos os riscosque eles apresentam à sociedade", diz o professor e um doscoordenadores gerais do Projeto Manuelzão, TarcísioPinheiro. Ele fala que não se pode prever qual o impacto ostransgênicos poderiam provocar na flora e na fauna local.

Segundo o professor, não se trata de ir contra inovaçõestecnológicas, mas de ter uma certeza sobre as implicaçõesque essas novas técnicas poderiam trazer no meio ambiente."Quando se introduz espécies exóticas à natureza, é difícilsaber os efeitos desse impacto. E a preocupação doManuelzão é sempre de preservar o meio ambiente", afirma.

As conseqüências ambientais podem ser diversas. UmOGM ainda não bem conhecido, por exemplo, poderia"escapar" e cruzar com outras linhagens. Ele se espalhando,dentre outros efeitos, causaria a redução da biodiversidade."Embora esse risco seja pequeno, ele existe", afirma o pro-fessor do Departamento de Fitopatologia da UniversidadeFederal de Viçosa (UFV), Luiz Maffia.

ONG´sNo mundo todo cresce a desconfiança por parte de

organismos não governamentais a respeito dos benefícios

dos alimentostransgênicos. "Esse'barulho' das ONG´stem uma razão de ser.Muitos dos dados e políticassão traçados 'em gabinete', semtransparência para a sociedade", alerta o pro-fessor Tarcísio. Para ele, as ONG´s cumprem umpapel importante de vigilância social, "pois trazem à tonaquestões obscuras".

Os efeitos dos alimentos transgênicos sobre a saúde daspessoas, são também pouco conhecidos até então. "O fabri-cante desses alimentos precisará provar que esse produtonão irá trazer nenhum prejuízo à saúde humana", dizTarcísio. Para o professor, não podemos esperar que um ali-mento cause algum dano à saúde, para só depois preocupar-mos em saber se determinado produto foi mesmo o respon-sável por tal dano. "Temos que inverter essa relação", afir-ma.

Para Maffia, entretanto, o que mais o preocupa na éticada produção desses alimentos é o aspecto econômico.Segundo o professor, empresas transnacionas poderiam vira dominar esse mercado, o que causaria monopólio no setor."Os grandes financiamentos e as pesquisas estariam maisinteressados nos efeitos positivos dos transgênicos do que osadversos", acredita Tarcísio.

Polêmicas à parte, hoje, a soja e o milho são os princi-

pais produtos transgênicos existentes nos países em que épermitido sua produção. É certo que ainda não existemtomates amarelos, muito menos maças brancas, e nem sesabe se existirão. Isso só o tempo, a tecnologia e a aceitaçãoda população dirá.

Louraidan LarsenEstudante de Comunicação da UFMG

• CONSCIÊNCIA •

No Brasil, existe um órgão federal que regulamenta econtrola pesquisas sobre transgênicos e derivados. AComissão Técnica Nacional de Biossegurança (CTNbio)funciona como uma agência reguladora em assuntos queenvolvem o uso dessa tecnologia.

"Caso no futuro seja permitido sua comercialização,um alimento transgênico sofrerá todo um monitoramen-to, que comprove segurança total, antes de ser liberado",afirma Tânia Zucchi, assessora na área de Biotecnologiada CTNbio. Há dois anos, um tipo de soja transgênica,tolerante a um herbicida chamado Roundup, foi libera-da pela CTNbio, após comprovação alimentar e ambi-ental do produto. Porém, uma liminar barrou sua co-mercialização.

Embora seja também proibida a importação de ali-mentos transgênicos, há aqueles que entram no país deforma ilegal. "O risco do contrabando é muito grande, e

não há como controlar. Podemos estar consumindocoisas que nem sabemos de onde vem", afirma Tânia.Existem ainda produtos que entram de modo legal, pormeio de um ingrediente de alimentos industrializados enão rotulados.

Neusa Brunoro, nutricionista, professora daUniversidade Federal de Viçosa (UFV), foi uma das orga-nizadoras do II Simpósio sobre Alimentos Transgênicos.O evento, em que estiveram presente Tânia, Maffia eEdson Watanabe, ocorreu em outubro do ano passadona UFV. Para Neusa, "cada técnica em si não é ruim ouboa por si só, é uma questão de saber como ela será uti-lizada".

A atual ministra do Meio Ambiente, Marina Silva,adotou uma postura de precaução: irá acompanhar aspesquisas, promover discussões e só decidir quandohouver segurança quanto aos transgênicos.

Brasil tem orgão de controle

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Odia-a-dia do Projeto Manuelzão é feito de per-sonagens que muitas vezes passam desperce-bidos. São pessoas que também contribuem para

a revitalização do rio das Velhas, e dedicam-se a atividadesque vão desde atender um telefonema a organizar os comitês.Um desses personagens é o motorista Gilson Alves de Souza,que está no projeto desde sua criação, em janeiro de 1997.

Gilson trabalha há 12 anos na Universidade Federal deMinas Gerais. Começou com o transporte central e, há 7anos, passou a trabalhar na Faculdade de Medicina, peloInternato Rural. Nessa época, conheceu o Professor ApoloHeringer que, pouco tempo depois, o levou para fazer partedo recém-criado Projeto Manuelzão. Desde então, ele seocupa principalmente com afunção de motorista, trans-portando os integrantes doprojeto para os municí-pios que compõem abacia do Velhas.Contudo, outras tarefascomo levantamento depatrimônio e dis-

tribuição de jornais também fazem parte de sua rotina.Em relação às atividades que realiza, Gilson é categóri-

co: "só tem coisas boas". Para ele, o clima de trabalho ébastante tranqüilo apesar do ritmo corrido, e os partici-pantes do Manuelzão são como uma família. Quando ques-tionado sobre o que mudou em sua vida após sua entradano projeto, não teve dúvidas: "passei a ter uma preocu-pação maior pelas questões do meio ambiente. Criei umaconsciência ambiental".

Vida em famíliaMaior do que seu interesse pela preservação dos rios é

o de sua filha Daniela. "Apesar dos 11 anos, ela entendemuito mais de meio ambiente do que eu" - comenta Gilson,que é casado há 16 anos. Quando está com a família, gostade passar o tempo cuidando dos pássaros e de seus cachor-rinhos. Pescar, entretanto, não está entre seus passatemposfavoritos: "Se depender de mim, os peixes vão permanecerno rio", brinca.

Gilson considera sua vida praticamente definida. Faltaapenas realizar o sonho de ter um sítio, em que possa desen-volver as atividades de que gosta, como cuidar de plantas eanimais. Esse sonho é possivelmente uma herança dos 11anos em que viveu no meio rural em sua terra natal, TeófiloOtoni. Logo depois, mudou-se para a região de Venda Nova,em Belo Horizonte, onde reside até hoje.

No princípio de sua vida na capital, Gilson trabalhava nocomércio, auxiliando um tio em supermercados e restau-

rantes. Durante esse período, teve a carteira assinadacomo motorista, o que dificultou a obtenção de

um novo emprego na área comercial apósa falência do negócio de seu

tio. Felizmente, em pouco tempo conseguiu emprego noramo dos transportes, no qual permanece até hoje.

Passageiro ilustreGilson conta com orgulho que teve o privilégio de co-

nhecer Manuel Nardy, o Manuelzão, quando ainda era nova-to na Faculdade de Medicina. Certa ocasião, o professorApolo pediu para que Gilson o buscasse em Andrequicé, dis-trito de Três Marias, e o trouxesse a Belo Horizonte.Recomendou muita cautela, pois Manuelzão era uma "jóiapreciosa". Além disso, pediu que o motorista não corresse naviagem, e que acompanhasse o ilustre passageiro durante asparadas.

Chegando no distrito, foi fácil encontrar Manuelzão."Era um senhor grandão, bem alto e magrelão, com aquelabarba, bengalinha e tudo". Assim Gilson descreveu seu novoamigo. Logo que ele entrou no carro, conferiu as horas.Quando Gilson entrou na BR, Manuelzão "esticou opescoção" para olhar a velocidade. O motorista estranhouaquelas atitudes, já que Apolo havia dito que ele estava bemvelho, não ouvia nem enxergava bem.

A viagem prosseguiu, e Gilson não se esqueceu de quenão poderia correr. Foi um percurso tranqüilo, durante o qualos dois conversaram bastante. Gastou quase o dobro do tempopara chegar à casa de Apolo, em Belo Horizonte. O professorlogo perguntou a Manuelzão a que horas eles haviam partido.Ele respondeu, Apolo conferiu o relógio e disse: "Vocês real-mente fizeram uma boa viagem". Após esse primeiro contato,Manuelzão pediu ao professor para que todas as suas viagensfossem feitas com Gilson, pois havia gostado muito dele.

Gilson conta que um dos momentos maistristes de sua vida foi a morte de Manuelzão. Já

em seus últimos dias, quando estava internado noHospital Felício Rocho, quase não enxergava, ape-

sar de manter os olhos abertos. Distinguia as pessoasatravés do contato, apertando a

mão de quem reconhecia.Nesses últimos momentos,Gilson e Apolo foram visitá-lo. Já no quarto do hospital,Apolo disse: "Manelzão, esseé o Gilson, o motorista". Aoestender a mão em direção aele, Gilson se emocionou:"Eu senti a pressão da mãodele, eu senti. Logo depoisele nos deixou". Gilson selembra de Manu-elzão deforma saudosa. "É uma pes-soa inesquecível, imortal".

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Os caminhos percorridos por um motorista que dedica boa parte de sua vida ao Projeto ManuelzãoCaroline Delmazo e Jonas Rodrigues

Estudantes de Comunicação da UFMG

AVANÇANDO O SINAL VERDE• PERFIL•

Manuelzão Belo Horizonte, Março / 2003