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ATITUDE Revista de Divulgação Científica da Faculdade Dom Bosco de Porto Alegre Construindo Oportunidades Ano XI - nº22 Janeiro/ Junho 2017

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ATITUDERevista de Divulgação Científica da Faculdade Dom Bosco de Porto Alegre

ConstruindoOportunidades

Ano XI - nº22Janeiro/

Junho2017

REVISTA ATITUDE - Construindo OportunidadesPeriódico da Faculdade Dom Bosco de Porto AlegreAno XI - No 22 - janeiro a junho de 2017Porto Alegre - Faculdade Dom Bosco de Porto Alegre.

ISSN 1809-5720

A REVISTA ATITUDE - Construindo Oportunidades tem por finalidade a produção e a divulgação do conhecimento nas áreas das ciências aplicadas produzido particularmente pelo seu corpo docente e colaboradores de outras instituições, com vistas a abrir espaço para o intercâmbio de ideias, fomentar a produção científica e ampliar a participação acadêmica na comunidade. O Conselho Editorial reserva-se o direito de não aceitar a publicação de matérias que não estejam de acordo com esses objetivos.Os autores são responsáveis pelas matérias assinadas.É permitida a cópia (transcrição) desde que devidamente mencionada a fonte.

Revista Atitude - Construindo Oportunidades – Revista de DivulgaçãoCientífica da Faculdade Dom Bosco de Porto AlegreAno XI, número 22, jan/jun 2017 – ISSN 1809-5720

Endereço para permuta:Rua Mal. José Inácio da Silva, 355Passo D’Areia - Porto Alegre - RS

Tel: (51) 3361.6700www.faculdade.dombosco.net

Porto Alegre, 2017

Diretor/DirectorProf. Dr. Edson Sidney de Ávila Júnior - [email protected]

Editor/EditorProf. Dr. Silvio Javier Battello Calderon - [email protected]

Comissão Editorial/Editorial BoardProf. Dr. Renato Ferreira Machado - [email protected]

Prof. Dr. Pe. Marcos Sandrini - [email protected]. Dra. Cristiane de Oliveira Pereira - [email protected]

Prof. Dr. Silvio Javier Battello Calderon - [email protected]

Comissão Científica/Scientific CommitteeProfa. Dra. Adriana Dreyzin de Klor (UNC/ Córdoba, Argentina) Profa. Me. Andressa Lacerda Capelli (FDB/Porto Alegre, RS)

Prof. Dr. José Noronha Rodrigues (Universidade dos Açores, Portugal) Prof. Me. Eduardo Viecelli (FDB/Porto Alegre, RS)

Prof. Dr. Carlos Garulo (IUS/Roma, Itália) Prof. Dr. Erneldo Schallenberger (UNIOESTE/Cascavel, PR) Prof. Dr. Fábio José Garcia dos Reis (UNISAL/Lorena, SP)

Prof. Dr. Friedrich Wilherm Herms (UERJ/Rio de Janeiro, RJ) Profa. Me. Neide Aparecida Ribeiro (UCB/Brasília)

Profa. Dra. Letícia da Silva Garcia (FDB/Porto Alegre, RS) Pesq. Dr. Manoel de Araújo Sousa Jr. (INPE-CRS/Santa Maria, RS)

Profa. Dra. Marisa Tsao (UNILASALLE/Canoas, RS) Prof. Dr. Nelson Luiz Sambaqui Gruber (UFRGS/Porto Alegre, RS)

Prof. Dr. Osmar Gustavo Wöhl Coelho (UNISINOS/São Leopoldo, RS) Prof. Dr. Stefano Florissi (UFRGS/Porto Alegre, RS)

Pesq. Dra. Tania Maria Sausen (INPE-CRS/Santa Maria, RS)

Avaliadores ad-hoc/Ad-hoc reviewersProf. Ms. Aécio Cordeiro Neves (FDB/Porto Alegre, RS)

Pesq. Ms. Camila Cossetin Ferreira (INPE-CRS/Santa Maria, RS) Prof. Dr. José Néri da Silveira (FDB/Porto Alegre, RS)

Prof. Ms. José Nosvitz Pereira de Souza (FDB/Porto Alegre, RS) Profa. Ms. Luciane Teresa Salvi (FDB/Porto Alegre, RS) Prof. Dr. Luís Carlos Dalla Rosa (FDB/Porto Alegre, RS)

Prof. Ms. Luiz Dal Molin (FDB/Porto Alegre, RS) Prof. Dr. Marcelo Schenk Duque (FDB/Porto Alegre, RS) Pof. Dr. Ricardo Alvarez (UM/Buenos Aires, Argentina)

Pesq. Ms. Silvia Midori Saito (INPE-CRS/Santa Maria, RS) Profa. Ms. Viviani Lopes Bastos (UCS/Caxias do Sul, RS)

Produção Gráfica/Graphics ProductionPropale*com

Rua Vinte e Quatro de Outubro 1330 – Auxiliadora – Porto Alegre – RS - CEP 90510-001 – Tel: (51) 3377.5297

Revisão:Diego Dornelles da Costa

SUMÁRIO

1. A convenção interamericana de restituição de menores e a guarda Compartilhada: estudo de uma caso concreto.Roberta Drehmer de Miranda

2. Principais assuntos abordados no relatório do auditor independente: Uma análise das empresas listadas no nível 1 e nível 2 da BM&FBOVESPA.Natália Airoldi; Garbiela Ramos Muniz; Sandra Belloli de Vargas

3. Las directrices del Comité de las Naciones Unidas Sobre Comercio y Desarrollo (UNCTAD) para la protección de los consumidores.Silvio Battello; Denise Artifon

4. Do Cerrado Mato-Grossense as terras lusitanas: a autogestão multicultural do conhecimento.Paula Cristina Pedroso Moi; Cecília Arlene Moraes

5. Implantação de custeio ABC no sistema indústria.Andressa Lacerda Capelli

6. Relações de parcerias: um estudo de caso para maximização da produtividade em uma empreda rural.Frederico Chaves Seger; Alexandre de Melo Abicht; Alessandra Carla Ceolin; Maurício Moreira e Silva Bernardes

7. Espaços religiosos encarcerados: novo arranjos na prisão.Gilnei Copini

8. Implementação de simulações computacionais de N-CORPOS.Filipo Novo Mor; Luis Fernando Fortes Garcia; Letícia Garcia

9. Breves linhas sobre a recepção do direito romano na europa Medieval.Débora Grivot

10. O impacto das redes sociais nas relações de trabalho e sua força probante. Laura Machado de Oliveira; Luciano Mallmann Cardoso

11. A utilização do material didático digital em uma escola particular: dados e observações iniciais. Gilson de Oliveira Cardoso Blanca Martín Salvago

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A Revista Atitude é uma publicação periódica da Faculdade Dom Bosco de Porto Alegre, que atualmente oferece à comunidade cinco cursos superiores: Administração, Ciências Contábeis, Sistemas de Informação, Engenharia Ambiental e Sanitária e Direito.

Nosso grande objetivo é ajudar as novas gerações a se posicionarem diante da vida como profissionais e cidadãos. Queremos ser fiéis à missão que nos foi deixada por Dom Bosco (1815-1888) de educar pessoas para serem “bons cristãos e honestos cidadãos”.

Fazemos parte de uma rede de Instituições de Educação Superior chamada IUS, ou seja, Instituições Universitárias Salesianas presente em quatro continentes com mais de 70 (setenta) Instituições. Todas com o mesmo objetivo, a mesma utopia, as mesmas metodologias, o mesmo desejo de encarnação no seu entorno.

A Revista Atitude já está em seu número 22. São onze anos de publicação ininterrupta de uma revista reconhecida e conceituada no âmbito nacional e internacional, com indexação no Qualis.

Professores, alunos, convidados estão presentes em suas páginas com o grande objetivo de defender, promover e alavancar a vida, cada vida, em todas as suas dimensões. Este é o sentido de nossa presença no mundo da educação superior.

REVISTA ATITUDE - Construindo Oportunidades!

APRESENTAÇÃO

Revista Atitude · Faculdade Dom Bosco de Porto Alegre · Ano XI - No 22 - janeiro a junho de 2017 98 A CONVENÇÃO INTERAMERICANA DE RESTITUIÇÃO DE MENORES E A GUARDA COMPARTILHADA: ESTUDO DE UMA CASO CONCRETO.

A CONVENÇÃO INTERAMERICANA DE RESTITUI-ÇÃO DE MENORES E A GUARDA COMPARTILHADA:

ESTUDO DE UM CASO CONCRETO

Roberta Drehmer de Miranda1

RESUMO

O presente trabalho tem como objetivo realizar um esforço interpretativo para conciliar as previsões existentes na Convenção Interamericana de Restituição de Menores, no que tange ao imediato retorno das crianças à residência habitual de origem em caso de sequestro pelo genitor, com o instituto da guarda compartilhada, a qual, a principio, tem sido aplicada como regra no sistema legislativo pátrio. Toda e qualquer decisão, ou acordo particular, entre genitores, nesta situação extrema, de retirada da criança do seu lar de origem, de forma unilateral, deve ser exercida à luz do princípio do superior interesse da criança, bem como das regras de proteção internacional de menores, prevista principalmente na Convenção Internacional dos Direitos da Criança.

PALAVRAS-CHAVE: Proteção Internacional da Criança - Restituição de Menores - Guarda Compartilhada - Superior Interesse da Criança.

ABSTRACT

This paper has the goal to realize an effort about the interpretation of the prescriptions in the Interamerican Convention on Child Restitution, about the immediatly return of the children to their habitual home, on origin, in case of crime by the parent, with the institute of shared parenting. In first place, this institute has been aplicated in Brazil as a rule. Nevertheless, all decision, or agreement, between parents, in this particular case, when the child is settled down from his home, must be realized motivated by the principle of the “superior interest of the child”, and with the application of the rules that protect the rights of children, that are prescripted especially in the International Convention of Child Rights.

KEYWORDS: International Protection of Child - Restitution Oo Child - Shared Parenting - Superior Interest of Child.

INTRODUÇÃO

Uma família em conflito, com filhos ainda sob o poder parental, sempre demanda especial atenção do profissional que trabalha com direito de família principalmente no que tange ao cui-

1 Doutora em Direito pela UFRGS. Mestre em Direito pela UFRGS. Bacharel em Direito pela UFRGS. Advogada. Professora da Faculdade Dom Bosco de Porto Alegre. E-mail: [email protected].

dado e à responsabilidade jurídica pelo sustento, educação e desenvolvimento integral da prole, numa situação fática pós-ruptura. A solução brasileira, por muito tempo, foi conferir esta res-ponsabilidade jurídica – traduzia pelo termo ou instituto jurídico “guarda” – a um dos genitores, e atribuir ao outro o dever de sustento e provento integral das necessidades dos filhos, por meio da constituição da obrigação alimentar. Atribuição, portanto, de guarda unilateral ao pai ou à mãe, e o direito de convivência (ou “visitas”, na terminologia já ultrapassada e revogada pelo Código Civil) aliado ao dever de prestação de alimentos ao outro que não detém a guarda.

Esta fórmula, quase que “mágica”, era utilizada pelo Judiciário quase como um expediente para todo e qualquer conflito ou ruptura familiar. Comumente se conferia à guarda para a mãe, tanto por uma questão de tradição ou costume cultural, como também diante das realidades fáticas de uma ausência “querida” dos pais no seu exercício da paternidade.

O Direito de Família sempre evolui quando permite estudos e abordagens interdisciplinares. Foram exatamente tais abordagens, ou pesquisas, que se puderam discutir, no âmbito da guarda de filhos, questões como alienação parental, princípio da proteção integral dos filhos e princípio do superior interesse da criança. Engana-se que pensa que ditos princípios e fenômenos decor-rem tão somente do Direito de Família, do ponto de vista dogmático e puro; para que se possa conferir um trato justo e equilibrado dos conflitos familiares, é necessário, sem nenhuma dúvida, a abordagem interdisciplinar.

No âmbito do Direito Internacional, pode-se verificar esse fundamento interdisciplinar nas Convencões Internacionais que visam proteger e conferir direitos às famílias. Uma das Convenções que merece maior destaque é a Convenção Internacional dos Direitos da Criança.

Dita Convenção prevê expressamente o princípio do superior interesse da criança como o norte de toda e qualquer busca de proteção ou solução frente a uma ruptura ou conflito familiar. Igualmente, por obrigar a todos os países signatários, e por ter status constitucional – pois sua natureza é de Tratado de direitos humanos – aplica-se, sim, com preferência hierárquica sobre a legislação nacional, em toda matéria prevista no teor da Convenção – aplicando-se, pois, a lei interna na omissão dos preceitos do Tratado.

A adesão do Brasil à Convenção é resultado tanto da transformação social gradual da demo-cracia estatal, que culminou na Constituição de 1988 (calcado na ampla proteção dos direitos individuais e sociais, mas principalmente na tutela dos direitos dos vulneráveis, dentre os quais se destacam a criança, o adolescente e o idoso), como também na necessidade do País de engajar-se no movimento mundial de defesa da infância, promovido principalmente pela ONU e entidades cooperadoras. Observe-se que o Brasil aderiu à Convenção antes da promulgação do Estatuto da Criança e do Adolescente, em 13 de julho de 1990, o que faz com que as duas legislações sejam complementares na regulamentação dos direitos da infância e adolescência previstos na Constituição de 1988.

Ora, quando o conflito familiar está circunscrito ao âmbito interno, no Brasil, e existir a ne-cessidade de convencionar-se a guarda de filhos, o Código Civil é claro ao expor que, mesmo na ausência de consenso, será aplicada a guarda compartilhada, ainda que exista, por exemplo, alguma medida de afastamento de um dos genitores do lar então conjugal - como ocorre nas medidas de

Revista Atitude · Faculdade Dom Bosco de Porto Alegre · Ano XI - No 22 - janeiro a junho de 2017 1110 A CONVENÇÃO INTERAMERICANA DE RESTITUIÇÃO DE MENORES E A GUARDA COMPARTILHADA: ESTUDO DE UMA CASO CONCRETO.

proteção conferidas por violência contra a mulher, sob o âmbito da Lei Maria da Penha. Apenas será conferida a guarda unilateral em casos específicos previstos na lei civil, como violência contra os filhos, ou quando o genitor expressamente manifestar que não deseja compartilhar a guarda.

Contudo, na ocorrência de disputa familiar internacional, onde se aplica, em primeiro lugar, a Convenção Internacional dos Direitos da Criança, chega-se a um aparente conflito de leis, ou de jurisdição, na medida em que a guarda compartilhada não está prevista em dita Convenção, bem como a hipótese de alienação parental. Por outro lado, a Convenção prevê a medida liminar de restituição de menores, que é aplicada em qualquer caso onde os filhos são retirados unilate-ralmente de seu domicílio, sem o conhecimento do outro genitor, ainda que se tenha constituído alguma guarda.

O presente trabalho, pois, visa explorar a contribuição dos preceitos da Convenção dos Direitos da Criança para a proteção da infância no Brasil, como corolário de um programa de democracia constitucional de tutela de vulneráveis, principalmente no que tange à guarda compartilhada, instituto mais razoável para o desenvolvimento da responsabilidade parental pós-divórcio ou ruptura marital. Este artigo também tratará do aparente conflito de leis envolvendo restituição de menores, e guarda compartilhada, onde podem existir duas decisões paralelas entre juízos distintos (o interno e o Internacional, ou o Juízo Estadual e o Juízo Federal), nas quais o princípio do superior interesse da criança também deve obedecer a lei aplicável.

O estudo e as conclusões deste artigo visam abordar o assunto a partir de um caso concreto envolvendo a restituição de menores requerida por um pai colombiano2, em face da mãe brasileira, situação na qual houve, por parte do juiz brasileiro, o deferimento liminar de medida protetiva, bem como a concessão em tutela de urgência da guarda unilateral em favor da genitora, em sede de ação de divórcio. Em contrapartida, foi deferido pelo juízo federal brasileiro a restituição dos filhos, em favor do genitor, bem como a proibição da genitora de viajar ou deslocar-se com os filhos fora do Brasil e também fora da circunscrição do domicílio das crianças.

1. A CONVENÇÃO INTERNACIONAL DOS DIREITOS DA CRIANÇA

A Convenção Internacional dos Direitos da Criança foi aprovada pela Assembléia Geral da ONU no dia 20 de novembro de 1989. O Brasil aderiu a Convenção em 26 de janeiro de 1990, com posterior ratificação pelo Congresso Nacional em 14.09.1990.

A Declaração de Genebra, em 1924, inaugurou as primeiras prescrições de proteção à infância. O princípio do interesse superior da criança3, presente na Declaração, foi adotado em diversos países, e, no caso do Brasil, no pioneiro Estatuto da Criança e do Adolescente4, depois sendo inserido em vários dispositivos do Código Civil5.

A criação do Fundo das Nações Unidas para a Infância (UNICEF), em 1947, foi mais um avanço

2 A nacionalidade e alguns dados informados foram alterados, de modo a preservar o segredo de justiça das partes.

3 SANTOS, Francisco Cláudio de Almeida. A proteção da criança e a Convenção da Haia de 1980. Palestra proferida na abertura do III Congresso de Direito de Família do IBDFAM/SP, em 27.08.2009.

4 Lei nº 8.069, de 13 de julho de 1990.

5 Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002.

na proteção internacional dos direitos da criança, por meio do incentivo de políticas internacio-nais, como também estimulo aos países efetivarem suas próprias políticas publicas em favor da infância. Em 1948, com a Declaração Universal dos Direitos do Homem, a proteção da infância é prevista, expressamente, no § 2.º do art.25, tornando inquestionável a primazia dos direitos da criança sobre quaisquer outros direitos civis.

Em 20 de novembro de 1959, foi aprovada a Convenção (específica) dos Direitos da Criança, ratificada no Brasil pelo Decreto nº 99.710, de 21 de novembro de 1990 (meses depois da promul-gação do Estatuto da Criança e do Adolescente), que estabeleceu os fundamentos e princípios dos direitos protetivos da infância da Declaração de Genebra. Em decorrência disto, o ano de 1979 foi o “Ano Internacional da Criança”, o qual colocou a infância como foco principal do sistema protetivo dos direitos humanos6.

2. ALGUMAS PONDERAÇÕES SOBRE A GUARDA COMPARTILHADA

O instituto da guarda pode ser definido como a responsabilidade jurídica sobre os direitos, deveres e obrigações dos filhos. Será constituído o instituto da guarda: a) quando houver ruptura marital entre os genitores, seja no casamento ou na união estável; b) nos casos em que os genitores não convivem juntos (namoro; relacionamento afetivo esporádico; ou nenhum relacionamento afetivo); c) nas situações em que a criança ou adolescente está em situação de risco, no qual aplica-se a guarda consoante as prescrições do Estatuto da Criança e do Adolescente.

No Código Civil de 1916 a guarda era prevista, em caso de ruptura (separação ou desquite, antes da Lei do Divórcio de 1977; após isso, separação de corpos, fática, judicial ou divórcio entre os genitores), para um dos genitores, posto que somente havia previsão para a guarda unilateral. No texto original do Código a preferência era da guarda conferida ao pai, visto que a esposa-mãe era considerada relativamente incapaz, e, portanto, na maioria dos casos, incapaz de exercer a guarda dos filhos.

Em outros casos, a mãe ficava como guardiã fática dos filhos, seja por abandono do marido--pai do lar, ou por desaparecimento deste. A guarda jurídica somente era dada á mãe em caso de falecimento do marido.

A evolução legislativa demonstra que, principalmente com a conquista dos direitos das mulheres, e a gradual proteção jurídica á infância, no que tange á guarda de filhos, o critério passou a ser muito mais do afeto que propriamente da segurança jurídica ou financeira da prole. A cultura da guarda materna estabeleceu-se, por se verificar que efetivamente a mãe era mais apta a exercer os cuidados com os filhos, já que o papel do pai, ou ofício da paternidade, passou a ser visualizado apenas como provedor do sustento dos filhos. A educação, o afeto, o acompanhamento dos filhos por toda a vida cabia à mãe, e dita situação muitas vezes era referendada pelo Judiciário por vontade e consentimento dos próprios pais.

Uma primeira alteração do Código se deu com a guarda alternada, a qual previa a possibilidade

6 A Convenção dos Direitos da Criança divide-se em quatro partes: preâmbulo; princípios gerais e direitos da criança e do adolescente; órgão de controle e constituição do Comitê para os Direitos da Criança; procedimentos de ratificações, adesões, reservas e emendas.

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de alternância da responsabilidade jurídica pelos filhos por períodos de tempo ou por tempo de-terminado. A guarda alternada demonstrou sua inaplicabilidade ao perceber-se, na prática, que seu exercício não era possível, em função da absoluta confusão para com a rotina dos filhos, os quais muitas vezes desconheciam quem era o seu verdadeiro guardião.

A guarda compartilhada (shared parenting7), na verdade, decorre não somente de uma evolução significativa dos direitos da criança e do adolescente, mas igualmente de um movimento social de “redescoberta da paternidade”, que vem crescendo desde meados dos anos 2000, no qual se verifica a busca cada vez maior, por parte dos pais genitores, de um convívio mais assíduo com os filhos, e de uma assunção, por igual, das responsabilidades parentais. De certa maneira, pode-se dizer que a guarda compartilhada “quebra o mito” da guarda maternal, e busca como finalidade última manter o mesmo poder parental, para o ex-casal, que existia durante o vínculo marital, também como uma forma de minimizar os prejuízos da ruptura marital em relação aos filhos.

No que tange á guarda compartilhada no Código Civil, este sofreu duas alterações legislativas significativas. A primeira alteração, ocorrida em 2008, pela Lei nº 11.698, inaugurava a guarda compartilhada no Código Civil. O conceito de guarda compartilhada, introduzido pela referida lei, no §1º do art. 1.583, dispõe, in verbis: “Compreende-se [...] por guarda compartilhada a responsabi-lização conjunta e o exercício de direitos e deveres do pai e da mãe que não vivam sob o mesmo teto, concernentes ao poder familiar dos filhos comuns” (grifamos).

A Lei de 2008 também previa, além do compartilhamento das responsabilidades e deveres para com os filhos, a aplicação da guarda compartilhada nas ações judiciais litigiosas entre os genitores, e, mediante a expressão “sempre que possível” do §2º do art. 1.584, orientava o julgador a aplicar este instituto da guarda somente nos casos em que houvesse um mínimo de consenso entre os pais. De certa forma, com essa redação legal, o Código ainda mantinha como “regra” a guarda unilateral, posto que a guarda compartilhada somente seria aplicada na hipótese de consenso entre os genitores. Inexistindo consenso, ou diálogo, aplicar-se-ia a guarda unilateral, porém, com um tempo maior de convivência (a regra é a convivência livre) por parte do genitor não-guardião.

Uma nova alteração legislativa mudou o sistema jurídico da guarda estabelecido em 2008. Em 2014, a Lei 13.058 modificou o regime da guarda compartilhada, inserindo novos elementos para sua constituição, efetivação e deferimento pelo juiz, como a previsão legal de equipe multidisciplinar e perícia psicológica em casos envolvendo violência. Além disso, modificou a redação do parágrafo segundo do já citado art. 1.584, determinando que, mesmo na hipótese de ausência de consenso entre os genitores, o juiz deverá aplicar a guarda compartilhada, quase que necessariamente.

A primeira vista, pode-se afirmar que a nova redação legal buscou, sim, implementar uma cultura mais forte da guarda compartilhada, instituindo-a como regra, em lugar da unilateral, ainda mais quando refere que a guarda exclusiva somente será deferida quando o genitor expres-samente afirmar, perante o juiz, que não deseja exercer dita guarda. A lei tem sua razão, e seu fundamento: a guarda compartilhada tem se mostrado o melhor para os interesses dos filhos, pois exige muito mais de seus pais, do que um regime de guarda unilateral, com direito de convivência.

7 A expressão em inglês demonstra que os primeiros exercícios e práticas judiciais de guarda compartilhada ocorreram nos Estados Unidos, principalmente nos casos em que as partes conseguiam, por meio de um processo colaborativo, chegar a um consenso acerca do melhor regime de cuidado para com os filhos. Neste sentido, a excelente obra coletiva organizada por FOLBERG, Jay. Joint Custody and Shared Parenting. London, The Guilford Press, 1991.

Ambos os pais são impulsionados a colocarem seus filhos como prioridade, e fazerem um es-forço para superar suas desavenças (o que não quer dizer instituir uma “amizade”, mas a simples tolerância já é vista como algo favorável), pois precisam decidir juntos aspectos fundamentais da vida da criança e do adolescente, e, se existe amor dos genitores para com sua prole, consegui-rão, sim, ultrapassar estes obstáculos. Com um mínimo de diálogo, é possível aprender a viver e exercer uma guarda compartilhada.

Contudo, não se pode afirmar, de forma categórica, que a guarda compartilhada, a partir da alteração legislativa de 2014, é uma regra no Brasil. Toda questão jurídica familiar, mesmo que tenha força impositiva pela lei, e carga de norma de ordem pública, requer a interpretação e a razoabilidade do julgador, no enfrentamento e aplicação daquela mesma regra do caso concreto analisado.

A guarda compartilhada, em princípio, é o melhor para os interesses dos filhos, pelo seu mecanismo, e pela sua finalidade; mas não necessariamente será o melhor para determinada familia, em um caso concreto particular. Nestes casos, o Judiciário tem recorrido ao instrumento da mediação, na qual pode-se, inclusive, estimular uma dada família a viver o diálogo e exercer o compartilhamento da guarda, num verdadeiro esforço pedagógico.

A guarda compartilhada pode ser deferida por decisão interlocutória (tutela de urgência) pelo juiz ou no ato sentencial. Pode, igualmente, exigir estudo social interdisciplinar e perícia psicoló-gica, principalmente nos casos onde existir evidências de condutas de alienação parental ou de qualquer forma de violência contra os filhos.

O trabalho pedagógico prévio sobre a guarda compartilhada também pode ser feito extrajudi-cialmente, por meio dos advogados e outros profissionais que trabalham com conflitos familiares (psicólogos, assistentes sociais, médicos, muitas vezes o próprio pediatra dos filhos, etc.). No caso dos advogados, poderão fazê-lo mediante mediação extrajudicial e por práticas colaborativas.

3. DO APARENTE CONFLITO ENTRE LEIS E DECISÕES JUDICIAIS: ESTUDO DE CASO CONCRETO SOBRE A CONVENÇÃO INTERAMERICANA DE RESTITUIÇÃO DE MENORES

Dentro de uma prática jurídica e jurisdicional de incentivo e aplicação da guarda comparti-lhada, pode-se cotejar este instituto com os princípios da Convenção Internacional dos Direitos da Criança e com a Convenção Interamericana de Restituição de Menores (aprovada em 15 de julho de 1989, e ratificada pelo Brasil pelo Decreto nº 1.212, de 03 de agosto de 1994) referente á medida liminar de restituição de menores, a qual traduz uma exceção à regra pátria da guarda compartilhada. A restituição de menores, como visto, é medida excepcional e grave a ser deferida, posto que se trata de situação ilícita em que um dos genitores retira a criança ou adolescente do país onde nasceu e tem domicílio, sem a comunicação ou anuência do outro genitor. Dita medida busca não somente evitar abusos por parte de um dos genitores no exercício do poder parental, como também não permitir a possível prática de trafico internacional de menores ou de sequestro dos mesmos, com o seu consequente desaparecimento.

Revista Atitude · Faculdade Dom Bosco de Porto Alegre · Ano XI - No 22 - janeiro a junho de 2017 1514 A CONVENÇÃO INTERAMERICANA DE RESTITUIÇÃO DE MENORES E A GUARDA COMPARTILHADA: ESTUDO DE UMA CASO CONCRETO.

A restituição de menores, prevista na Convenção Interamericana, no art. 11, prevê que os menores somente não serão restituídos no país de origem em duas hipóteses: 1) em caso de anuência do outro genitor; 2) em caso de ameaça ou violência com relação aos menores, por parte de um dos genitores. Ainda assim, a Convenção confere à autoridade do país onde se encontram os menores a discricionariedade, nestes casos, de restituir, ou não, os filhos ao genitor, no país de origem.

O caso concreto no qual este texto se embasa trata de uma situação real8. O pai colombiano casou-se com a mãe brasileira, na Colômbia. Seus dois filhos nasceram na Colômbia. A família residia em Bogotá, até o momento em que as desavenças entre o casal iniciaram.

O genitor percebeu que a mãe dos seus filhos passou a viajar constantemente para o Brasil, afirmando ter como intuito visitar sua família. No entanto, a mãe das crianças já estava realizando a sua mudança para a cidade de Florianópolis, local de residência de sua família, e, na última viagem ao Brasil, que tinha a passagem de retorno já comprada e emitida pelo pai dos menores, ela decidiu ficar e não retornou à Colômbia com os filhos.

A partir deste momento, o genitor não pode mais ver seus filhos. Ao viajar para Florianópolis, para ver as crianças, deparou-se com uma medida de afastamento da genitora, por violência doméstica (Maria da Penha), e não pode aproximar-se dos seus filhos, pois não havia autorização nem pela medida liminar de afastamento, nem pela própria ex-mulher.

Retornando à Colômbia, ligava todos os dias para a genitora para falar com seus filhos, e esta não autorizava nenhum contato. O pai, então, decidiu por invocar os preceitos da Convenção Internacional, e requereu, via Ministério das Relações Exteriores, o pedido administrativo de restituição dos filhos, por fundamento no sequestro dos mesmos.

O trâmite administrativo transcorreu com razoável rapidez e eficácia e, ao ser remetido à Justiça Federal de Santa Catarina, foi recebido pelo julgador que, liminarmente, deferiu a restituição dos filhos ao pai, e designou audiência de conciliação entre as partes. Ocorre que o julgador não teve conhecimento, nos autos, que existia uma medida liminar de deferimento de guarda unilateral em favor da genitora das crianças, concedida por juiz estadual, em sede de ação de divórcio.

No caso real, a audiência conciliatória ainda não foi realizada. Contudo, já é possível realizar uma análise da situação em conflito.

Ainda que tenha sido dada guarda unilateral pelo juiz estadual, o certo é que as prescrições da Convenção Internacional devem se sobrepor à lei interna. Primeiro, por uma questão de hierarquia entre normas: o status constitucional da Convenção prevalece sobre o Código Civil, e, portanto, deve esta decisão ser cumprida em lugar daquela. O segundo argumento reside na jurisdição: ainda que a decisão concedida pelo juiz estadual tenha sido anterior á do juiz federal, não há que se falar em prevenção do juízo, visto que o pedido administrativo de restituição de menores é a título Ministerial, com cunho Estatal (decorrente do poder de Estado-Nação), no qual existe direto interesse do Estado Brasileiro na devolução das crianças ao seu país de origem, sendo, portanto, de matéria de ordem pública e internacional que prevalece sobre a regra processual da prevenção do juízo.

8 A nacionalidade e alguns dados informados foram alterados, de modo a preservar o segredo de justiça das partes.

Contudo, a aplicação do princípio do superior interesse da criança pode justificar uma medida contrária por parte do juiz. Muitas vezes, a criança já está tão adaptada ao lugar em que vive, à escola, ao país em que se estabeleceu, que o julgador pode considerar que uma mudança brusca de país e de meio familiar pode ser prejudicial à sua integridade psicossocial e mantê-la onde está (talvez, inclusive, junto do genitor que a sequestrou, segundo a nomenclatura da Convenção).

Por essa razão, a Convenção Interamericana, com muita prudência, prevê rapidez na medida liminar de restituição, a fim de evitar com que o tempo exerça um papel prescricional no ato de violência do genitor, que retirou a criança do seu meio social, ou do seu lar, e a levou para outro ambiente, de forma arbitrária e unilateral. Ainda assim, como se trata de um conflito familiar, a análise deve ser caso a caso, sempre levando em conta o que for melhor para a integridade pessoal da criança, colocada em situação de constrangimento contra a sua própria vontade.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Os avanços na proteção internacional dos direitos da criança continuam, mas ainda não são o bastante. Lamentavelmente, até hoje observam-se violentos atentados aos direitos da criança, tanto em zonas de guerra (na Faixa de Gaza, na Siria, em Allepo) como nas grandes cidades, nas esquinas, embaixo das marquises de nossos condomínios urbanos. Pode-se afirmar, em lingua-gem coloquial, que existe “muita violência contra criança para pouca política pública de combate”.

Os casos de restituição de menores, como o que foi exposto neste trabalho, incrivelmente são frequentes na Justiça Federal brasileira. Isso pode significar várias situações concretas, das quais pode-se apontar duas, mais marcantes: violência contra a mulher, e contra as crianças (de modo a justificar a saída ou fuga do país de origem); ou sequestro por um dos genitores, que, descontente com a crise ou conflito conjugal, toma posse dos filhos unilateralmente e afasta as crianças da sua residência habitual.

Ainda que não seja o objeto deste trabalho, é necessário dizer que os juízes tem se mostrado muito sensíveis á situação da criança e de como ela está melhor atendida e acolhida, e pouco dogmáticos ou “automáticos” na pura e simples aplicação das prescrições da Convenção Intera-mericana. Contudo, é assente para qualquer juiz federal que não se pode relativizar a circunstância delituosa do sequestro, sendo também do superior interesse da criança o retorno ao seu lar de origem, do qual também tinha uma vida de acolhida e de pleno desenvolvimento. Assim, a melhor solução é a razoabilidade no caso concreto, que exigirá, para o julgador, o conhecimento profundo de questões de conflito familiar como também de proteção internacional dos direitos da criança.

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PRINCIPAIS ASSUNTOS ABORDADOS NO RELATÓRIO DO AUDITOR INDEPENDENTE: UMA

ANÁLISE DAS EMPRESAS LISTADAS NO NÍVEL 1 E NÍVEL 2 DA BM&FBOVESPA

Natália Airoldi1

Gabriela Ramos Muniz2

Sandra Belloli de Vargas3

RESUMO

O Novo Relatório do Auditor Independente passou a ser emitido no Brasil sobre as demonstrações contábeis com exercício findo de 31 de dezembro de 2016, com a finalidade de aumentar o valor informativo aos usuários, desenvolver a comunicação constante entre o auditor com a administra-ção e/ou a governança corporativa e restabelecer a confiança dos utiliza-dores das demonstrações financeiras. Diante disso, o objetivo do presente artigo é identificar quais são os principais assuntos mais tratados pelos auditores, nos relatórios emitidos para as companhias do Nível 1 e Nível 2 de governança corporativa da BM&FBOVESPA referente ao exercício de 2016. Para tanto, analisou-se 48 relatórios dos auditores independentes, nos quais foram evidenciados 158 principais assuntos, sendo que 22 se repetiram. Os resultados encontrados permitiram identificar que todos os relatórios avaliados estão de acordo com a NBC TA 701, ou seja, fo-ram levados em consideração assuntos que exigiram atenção significativa do auditor de acordo com as particularidades de cada empresa, e este requisito trouxe um impacto significativo ao relatório do auditor, ao dar maior transparência sobre a auditoria realizada. Concluiu-se que os as-suntos mais tratados pelos auditores são aqueles em que abrangem a pontualidade em comum entre as empresas, tais como: provisões, teste de impairment e reconhecimento da receita inserido em grande parte dos relatórios.

Palavras-chave: Auditoria. Novo Relatório auditor independente. Compa-nhias abertas.

ABSTRACT

The New Independent Auditor Report was issued in Brazil on the financial statements for the year ended December 31, 2016, with the purpose of in-creasing the information value to users, developing constant communication between the auditor and the management and or corporate governance and

1 Acadêmica do Curso de Ciências Contábeis na Faculdade Dom Bosco de Porto Alegre. E-mail: [email protected]

2 Graduada em Ciências Contábeis pela Faculdade Dom Bosco de Porto Alegre. E-mail: [email protected]

3 Mestre em Contabilidade e Professora do Curso de Ciências Contábeis da Faculdade Dom Bosco de Porto Alegre. E-mail: [email protected]

Revista Atitude · Faculdade Dom Bosco de Porto Alegre · Ano XI - No 22 - janeiro a junho de 2017 1918 PRINCIPAIS ASSUNTOS ABORDADOS NO RELATÓRIO DO AUDITOR INDEPENDENTE: UMA ANÁLISE DAS EMPRESAS LISTADAS NO NÍVEL 1 E NÍVEL 2 DA BM&FBOVESPA.

restore user confidence in financial statements. The objective this research was to identify which are the main subjects most treated by the auditors in the reports issued for BM & FBOVESPA Level 1 and Corporate Governance Level 2 companies for the year 2016. For this purpose, 48 reports of the indepen-dent auditors, in which 158 main subjects were highlighted, 22 of which were repeated. The results found allowed to identify that all the reports evaluated are in accordance with the NBC TA 701, that is to say, they took into account subjects that required significant attention of the auditor according to the par-ticularities of each company, and this requirement had a significant impact to the auditor’s report, by giving greater transparency about the audit performed. It was concluded that the subjects most treated by the auditors are those that cover the punctuality in common among the companies, such as: provisions, impairment test and revenue recognition inserted in most reports.

Keywords: Audit. New Independent Auditor’s Report. Public companies.

INTRODUÇÃO

O relatório do auditor independente é o produto principal do auditor e devido mudanças cons-tantes na sua estrutura, que iniciaram precisamente com a aprovação da NBC TA 700 – formação da opinião e emissão do relatório do auditor independente sobre as demonstrações contábeis, que começou a vigorar desde janeiro de 2010, deixando-o com a apresentação de assuntos específicos cada vez mais condizente à realidade das organizações.

A partir de então as diferentes maneiras de concepção referente à estrutura do relatório do auditor, abriram portas para estudos relacionados aos “parágrafos de outros assuntos” que pas-sou a ser inserido quando falta a apresentação ou a divulgação nas demonstrações de assuntos que podem ser relevantes para deixar a opinião do auditor compreensível (DAMASCENA; PAULO, 2013 p.108).

A auditoria independente retrata na emissão de seu relatório, o conjunto de procedimentos técnicos utilizados para a elaboração de sua opinião sobre as demonstrações contábeis, sendo uma referência para todos os usuários das informações, e de acordo com Silvestre, Sprenger e Kronbauer (2016), as demonstrações contábeis são instrumentos necessários para divulgar a situação econômica e financeira e representam o meio de comunicação entre as entidades e as partes interessadas. Desta forma a fidedignidade das informações são averiguadas através do trabalho de auditores independentes, onde são observados o cumprimento das normas contábeis.

As auditorias independentes realizadas de demonstrações contábeis que se encerram em 31 de dezembro de 2016, ou em períodos posteriores, e estão sujeitas a um conjunto de Normas Brasileiras de Contabilidade de Auditoria Independente (NBC TA). Este grupamento de normas compõem o chamado Novo Relatório do Auditor Independente (NRA), sendo publicado pelo Con-

selho Federal de Contabilidade (CFC).

O anúncio destas mudanças nas normas relacionadas ao relatório do auditor independente levou ao seguinte questionamento: Quais os principais assuntos de auditoria informados pelos audito-res externos em seus relatórios para as companhias listadas nos Níveis 1 e 2 da BM&FBOVESPA referentes ao exercício findo em dezembro de 2016? Para responder tal indagação, o presente trabalho tem como objetivo identificar quais os principais assuntos e o impacto da NBC TA 701 no NRA nas empresas listas na BM&FBOVESPA. Para tanto aplicou-se uma pesquisa qualitativa, descritiva e documental, utilizando como amostra as empresas listadas no Nível 1 e Nível 2 na bolsa de valores BM&FBOVESPA.

Desta forma, este documento se torna relevante, já que, as informações contidas em seu interior são de extrema importância para todos os usuários das demonstrações contábeis, pois aborda, de forma sucinta e objetiva, a forma de redação os principais assuntos apontados nos relatórios emitidos mediante ao novo grupo de normas para elaboração do NRA atualmente em vigor no Brasil, relatando os impactos na estrutura. A principal contribuição desta pesquisa será identificar que, através dos principais assuntos de auditoria, que são considerados os mais sig-nificativos na auditoria das Demonstrações Contábeis, cada empresa tenha seu relatório mais específico, contribuindo para aumentar o caráter informativo deste documento.

Dividiu-se o estudo, além desta, em cinco seções: a segunda será apresentada a revisão de literatura, destacando os principais aspectos que as legislações brasileiras apresentam sobre o tema. Na terceira seção será apresentada a metodologia utilizada para responder o objetivo. A quarta seção apresentará os resultados encontrados. Na quinta apresenta-se a conclusão e, por fim, as referências.

1.REVISÃO DA LITERATURA

A revisão da literatura a seguir é a etapa do trabalho onde serão apresentados os conteúdos orientadores desta pesquisa, discorrendo sobre normas e pesquisas fundamentais para o estudo do tema central, NRA.

1.1 NORMAS DE CONTABILIDADE DE AUDITORIA INDEPENDENTE

O auditor independente tem como objetivos “formar uma opinião sobre as demonstrações contábeis com base na avaliação das conclusões alcançadas pela evidência de auditoria obtida e expressar claramente essa opinião por meio de relatório por escrito” (CFC, 2016). Tal opinião é emitida através do Relatório do Auditor Independente, seguindo as Normas Brasileiras de Con-tabilidade (NBC).

O relatório do auditor independente antigamente denominado “parecer”, segue um padrão norte-americano desde 1972 quando a resolução CFC nº 321, de 14/04/1972 fez com que os au-ditores adotassem obrigatoriamente um padrão para a elaboração de seus “pareceres”. Desde então sofreu alterações em sua estrutura padronizada, em sua interpretação técnica e em suas

Revista Atitude · Faculdade Dom Bosco de Porto Alegre · Ano XI - No 22 - janeiro a junho de 2017 2120 PRINCIPAIS ASSUNTOS ABORDADOS NO RELATÓRIO DO AUDITOR INDEPENDENTE: UMA ANÁLISE DAS EMPRESAS LISTADAS NO NÍVEL 1 E NÍVEL 2 DA BM&FBOVESPA.

expressões como “relatório do auditor” e “práticas contábeis adotadas no Brasil”. Mas foi ape-nas quando aprovada a resolução CFC nº 1231/09, de 27/11/2009, que passou a vigorar a partir de 1º de janeiro de 2010, que trouxe a estrutura adotada no Brasil até então, com a aprovação da NBC TA 700 – Formação da opinião e emissão do relatório do auditor independente sobre as demonstrações contábeis, dentre outras normas que aperfeiçoaram a maneira da emissão de suas opiniões (SANTOS; PEREIRA, 2004).

Devido a necessidade de uma comunicação constante e eficaz entre os auditores, a admi-nistração e os órgãos de governança corporativa, a fim de refletir a veracidade se fez essencial uma estrutura específica ao invés de um conteúdo padronizado da opinião do auditor sobre as entidades, por este motivo justificou-se uma imprescindibilidade de um estudo específico dessa mudança do relatório.

Este relatório sofreu atualizações ao longo do ano de 2016, dando origem ao NRA que está ba-seado em seis normas principais. São elas: NBC TA 260 (R2) – Comunicação com os Responsáveis pela Governança; NBC TA 570 – Continuidade Operacional; NBC TA 700 – Formação da Opinião e Emissão do Relatório do Auditor Independente sobre as Demonstrações Contábeis; NBC TA 701 – Comunicação dos Principais Assuntos de Auditoria no Relatório do Auditor Independente; NBC TA 705 – Modificações na Opinião do Auditor Independente; e NBC TA 706 – Parágrafos de Ênfase e Parágrafos de Outros Assuntos no Relatório do Auditor Independente. Para fins de análise das informações obtidas e alcance do objetivo principal deste estudo, serão consideradas as NBC TA 700, 701, 705 e 706 (CFC, 2016).

A NBC TA 700 apresenta informações referentes à responsabilidade do auditor em formar uma opinião sobre as demonstrações contábeis, tratando da forma e do conteúdo do relatório como resultado da auditoria destas demonstrações. Esta norma objetiva fornecer aos usuários um relatório que estabelece equilíbrio entre a necessidade de consistência e comparabilidade do relatório, percebendo a inserção em um mercado globalizado, atendendo à necessidade de gerar valor ao relatório do auditor com informações mais relevantes (CFC, 2016).

O auditor deve assegurar que obteve segurança razoável de que as demonstrações contábeis estão livres de distorção relevante, independentemente se causada por fraude ou erro. Se o audi-tor identificar distorções relevante e a administração ou a governança corporativa decidirem que não queiram corrigir o que foi apontado pelo auditor, deveram ser identificadas como relevantes e se foram obtidas evidências de auditoria apropriada e suficientes para tal opinião (CFC, 2016).

O CFC informa que a NBC TA 701 trata da responsabilidade do auditor independente na comuni-cação dos principais assuntos de auditoria mencionados em seu relatório sobre as demonstrações contábeis. Conforme o CFC (2016) “Esta norma visa abordar o julgamento exercido pelo auditor sobre o que comunicar em seu relatório e também a forma e o conteúdo de tal comunicação”.

Os principais assuntos de que trata a norma são aqueles que o auditor julgar mais significativos na auditoria e que serão comunicados aos responsáveis pela governança. Dentre os principais assuntos devem ser consideradas as áreas com maior risco de distorção relevante, campos das demonstrações contábeis que obtenham estimativas com alto grau de incerteza e o impacto sobre a auditoria de fatos significativos ocorridos durante o período. A escolha destes assuntos

principais deve ser descrita de forma individualizada em seção específica do relatório do auditor.

As NBC TA 705 e 706 tratam sobre qual forma e conteúdo do relatório do auditor são afetados quando o auditor expressa uma opinião modificada ou inclui um parágrafo de ênfase ou de outros assuntos no seu relatório.

A NBC TA 705 – Modificações na Opinião do Auditor Independente estabelece três tipos de opiniões modificadas: opinião com ressalva, opinião adversa e abstenção de opinião. A opinião com ressalva acontece quando o auditor julgar que as demonstrações estão adequadas, porém há exceções, como a falta de informação que possa ser importante na fundamentação de sua opinião, a opinião adversa acontece quando verificar ao longo do trabalho de auditoria que há efeitos que isolados ou em conjunto possam mascarar resultados relevantes divergentes do que realmente devem constar nas demonstrações e a abstenção de opinião é quando não há a possibilidade de obter evidência de auditoria apropriada e suficiente para fundamentar uma opinião de auditoria sobre as demonstrações financeiras individuais e consolidadas.

A escolha sobre o tipo de opinião modificada resulta da natureza do assunto que deu origem à modificação, se as demonstrações contábeis como um todo apresentam distorções relevantes ou não consegue obter evidência de auditoria suficiente para concluir que não apresentam distorções relevantes. A norma NBC TA 706 dispõe sobre as comunicações adicionais incluídas no relatório do auditor independente, feitas em área específica do relatório do auditor chamado Parágrafo de Ênfase e/ou Parágrafo de Outros Assuntos.

Quando o auditor independente considerar necessárias para chamar a atenção dos usuários para assuntos fundamentais para o entendimento das demonstrações contábeis, ou para quais-quer assuntos que, divulgados ou não, sejam relevantes para os usuários entenderem a auditoria, as responsabilidades do auditor ou o seu relatório. Estas comunicações devem ser em caso de inclusão de parágrafos desta natureza, o auditor “deve comunicar-se com os responsáveis pela governança no que se refere a essa expectativa e à redação proposta desse parágrafo” (CFC, 2016).

Em suma, o NRA Independente visa alinhar a responsabilidade do auditor em emitir uma opi-nião sobre as demonstrações contábeis, considerando os principais temas a serem abordados, garantindo transparência na auditoria realizada e comunicação com a governança, permitindo aos usuários acessar mais informações que lhes permitam ter uma visão mais ampla e fiel sobre a realidade das entidades.

Estas normas foram incorporadas à Legislação Brasileira com o intuito de permitir que as informações fornecidas pelos auditores possam ser mais facilmente interpretadas por usuários estrangeiros, através do enquadramento às normas e padrões internacionais. Diante desta pa-dronização estabelecida, faz-se necessária a análise de estudos relacionados para compreensão do conteúdo foco desta pesquisa.

1.2 ESTUDOS RELACIONADOS

A padronização das Normas Brasileiras de Contabilidade às normas internacionais vem ocorrendo de forma gradual em diversos aspectos da contabilidade. Em relação à auditoria das

Revista Atitude · Faculdade Dom Bosco de Porto Alegre · Ano XI - No 22 - janeiro a junho de 2017 2322 PRINCIPAIS ASSUNTOS ABORDADOS NO RELATÓRIO DO AUDITOR INDEPENDENTE: UMA ANÁLISE DAS EMPRESAS LISTADAS NO NÍVEL 1 E NÍVEL 2 DA BM&FBOVESPA.

demonstrações contábeis, as mudanças ocorrem na execução do trabalho de auditoria, desde a abordagem aos papéis de trabalhos quanto aos testes e evidências de auditoria, mas principal-mente na emissão dos relatórios dos auditores independentes.

A pesquisa realizada por Santos et al. (2009) buscou analisar as principais diferenças e se-melhanças dos pareceres de auditoria de empresas listadas nas bolsas de valores brasileira (BM&FBOVESPA) e americana (NYSE). O estudo realizado trata-se de uma pesquisa descritiva e comparativa, de natureza documental, cujos dados foram coletados mediante aplicação da téc-nica de análise de conteúdo com abordagem qualitativa e foram analisadas as demonstrações contábeis de 26 empresas referentes ao período de 2004 a 2006, totalizando uma amostra de 156 pareceres analisados.

Os resultados mais significativos indicados na pesquisa foram que os pareceres americanos dão ênfase à eficácia dos controles internos; auditorias americanas publicam o parecer emitido por outra empresa sobre as demonstrações do ano anterior e dão enfoque às divergências entre as práticas contábeis americanas e brasileiras. Já os resultados relacionados aos pareceres emitidos no Brasil, todas as empresas tiveram publicadas a DFC e a DVA, mesmo não sendo obrigatórias na época. Não se identificou uma diferença significativa na quantidade de parágrafos e constatou uma semelhança entre os pareceres brasileiros e americanos (SANTOS et al., 2009).

De acordo com Garcia e Orth (2016), que realizaram uma pesquisa com o intuito de analisar e comparar os relatórios de auditoria independente sobre as demonstrações contábeis dos bancos listados na Bolsa de Valores de São Paulo (BM&FBOVESPA) com os de Buenos Aires (B.C.B.A.) emitidos após a adoção das normas internacionais de auditoria. O estudo através da análise de conteúdo, analisou 234 relatórios das 54 instituições financeiras listadas nas referidas bolsas de valores entre os anos de 2012 e 2015. Os resultados desta pesquisa apontaram que os relatórios emitidos em Buenos Aires possuem divergências entre as normas contábeis vigentes no país e as normas estabelecidas pelo Banco Central da República Argentina impactando na emissão de ênfase nos relatórios emitidos. Os parágrafos de outros assuntos, só foram identificados nos pareceres emitidos no Brasil em que é divulgado a DVA, e as justificativas para os parágrafos de ênfase que mais se repetiram no Brasil foram quanto aos créditos tributários registrados no ativo e a ênfase quanto a reapresentação dos valores correspondentes ao exercício anterior.

Silva, Aires e Almeida (2014) identificaram em seu estudo os fatos abordados nos parágrafos de ênfase e de outros assuntos dos relatórios de auditoria emitidos para as companhias abertas da BM&FBOVESPA relacionando-os, quanto às orientações estabelecidas nas normas brasileiras que regulam o tema. Os autores identificaram que os assuntos “critérios contábeis divergentes”, “reapresentação das demonstrações contábeis” e “incertezas de continuidade” foram os prin-cipais assuntos destacados nos parágrafos de ênfase e nos parágrafos de outros assuntos dos relatórios de auditoria.

O estudo de Roxo e Bonotto (2016), procurou analisar as principais alterações e impactos trazidos ao NRA independente com a modificação das Normas Brasileiras de Contabilidade que foram revisadas e alteradas em junho de 2016. Ficou evidenciado que as principais alterações foram uma grande mudança na estrutura do relatório com a inclusão dos principais assuntos, a

alteração no parágrafo de continuidade operacional e a transposição sendo apresentado primeiro o parágrafo de opinião do auditor. Essas alterações exigem que o auditor possua um julgamento profissional mais criterioso no decorrer de seu trabalho de auditoria, tendo em vista trazer aos relatórios uma personalização específica para cada empresa auditada, trazendo aos usuários das informações maior transparência e objetividade.

Veiga (2016), buscou examinar os efeitos esperados das alterações dos relatórios de auditoria na qualidade do trabalho do auditor na realidade Portuguesa. O estudo utilizou questionários e entrevistas semiestruturadas a analistas financeiros, revisores oficiais de contas e gestores para a coleta de dados. Foram realizadas oito entrevistas e obtidos 94 questionários respondidos. O resultado indicou que na percepção dos inquiridos, as alterações previstas para o relatório de auditoria têm um efeito positivo na redução das expectativas em auditoria em Portugal. As alte-rações consideradas pelos respondentes com maior efeito são: que a base da opinião do auditor deve estar posicionada logo após a opinião do auditor, sobressaindo-se também em suas opiniões os esclarecimentos evidenciados referentes as responsabilidades do auditor diante fatos que possam resultar em fraudes ou erros, a definição de materialidade e o esclarecimento sobre as deficiências de controle interno.

Conforme estudo realizado por Souza e Marques (2017), com o objetivo de identificar e analisar os principais assuntos de auditoria nos relatórios dos auditores. A pesquisa qualitativa, quanti-tativa e documental analisou através de uma análise de conteúdo de 171 principais assuntos de auditoria evidenciados nos relatórios divulgados em 2017 de 49 empresas que constam o IBO-VESPA no último trimestre de 2016. Evidenciaram que os principais assuntos reportados foram: recuperabilidade dos ativos, contingências, reconhecimento de receitas e projeção de resultados futuros para a realização de ativos. Constataram, também, que apenas duas empresas apresen-taram informações referente ao risco de descontinuidade, e que as empresas auditadas pelas Big Four e aquelas listadas em níveis diferenciados de governança apresentaram menores médias de principais assuntos de auditoria reportados.

Com base nos diversos estudos citados anteriormente, que se propuseram a analisar os rela-tórios de auditores independentes, constata-se que os relatórios de auditoria foram elaborados em conformidade com as regulamentações vigentes no período da pesquisa realizada. As diver-gências apontadas por Garcia e Orth (2016) podem ser atribuídas a comparação entre as normas vigentes no Brasil e na Argentina, objeto de estudo das autoras.

Na seção seguinte será apresentada a metodologia utilizada para atingimento deste objetivo.

3. METODOLOGIA

O presente estudo classifica-se como descritivo quanto aos seus objetivos, pois conforme Gil (2010) a pesquisa descritiva se propõe a descrever as características de determinada população ou fenômeno. Esta pesquisa pretende analisar os relatórios de auditoria independente sobre as demonstrações contábeis.

Em relação ao tipo de pesquisa classifica-se como documental. Para Marconi e Lakatos (2017)

Revista Atitude · Faculdade Dom Bosco de Porto Alegre · Ano XI - No 22 - janeiro a junho de 2017 2524 PRINCIPAIS ASSUNTOS ABORDADOS NO RELATÓRIO DO AUDITOR INDEPENDENTE: UMA ANÁLISE DAS EMPRESAS LISTADAS NO NÍVEL 1 E NÍVEL 2 DA BM&FBOVESPA.

a característica principal da pesquisa documental é utilizar como fonte de coleta de dados docu-mentos e ou materiais que não foram tratados analiticamente, ou seja, são as fontes primárias, nas quais o pesquisador vai desenvolver sua investigação e análise.

A amostra inicial é composta por 48 companhias abertas, listadas no segmento Nível 1 e Nível 2 de governança corporativa, da BM&FBOVESPA. A seguir, o Quadro 1 apresenta as empresas.

Quadro 1 – Empresas da amostra.

Fonte: elaborado pelas autoras.

Sendo subdivididas por 28 companhias listadas no segmento Nível 1 de governança corporativa, ou seja, aquelas entidades impostas a regras diferenciadas estabelecidas a seus administradores e acionistas. Estas entidades devem favorecer aos investidores transparência as informações, através de divulgações adicionais do que às exigidas em lei, como por exemplo a lista de eventos que se obriga a divulgar, compreendendo suas informações financeiras, data dos atos e eventos societários, etc.

Já no Nível 2 de governança corporativa é composto por 20 empresas. Conforme definição da BM&FBOVESPA, estas empresas são aquelas que têm o direito de manter as ações preferenciais,

além de assegurar aos detentores de ações ordinárias e preferenciais o mesmo direito concedido ao acionista controlador.

As 48 empresas apresentadas no Quadro 1, tiveram seus relatórios de auditoria independente do exercício de 2016 analisados, observando as exigências do NRA. As empresas possuem dife-rentes seguimentos e por este motivo, seus principais assuntos, atendendo as exigências da NBC TA 701 – Comunicação dos Principais Assuntos de Auditoria no Relatório do Auditor Independente, que foram apontados pelas empresas de auditoria foram específicos para suas atividades, por este motivo foram evidenciados 158 principais assuntos, sendo que 24 se repetem, que são aqueles que abrangem as pontualidades em comum entre as empresas.

A pesquisa realizada não levou em consideração os seguimentos das companhias, e sim a totalidade que obtiveram seus relatórios divulgados no exercício de 2016, afim de identificar se foram baseados nas NBC TA 700, 701, 705 e 706 que serão consideradas para o alcance do objetivo principal deste estudo, se as informações divulgadas estão condizentes, considerando também se a estruturação e modo em que foram publicados estão compreensíveis para todos os usuários, levando em consideração que os usuários podem ser investidores, especuladores, instituições financeiras ou qualquer outra pessoa que queira verifica-las seja qual for o motivo.

4. APRESENTAÇÃO E ANÁLISE DOS RESULTADOS

Nos 48 relatórios que foram analisados nesta pesquisa, 47 companhias tiveram seus relatórios emitidos sem ressalva, que ocorre quando as conclusões do auditor referente a elaboração das demonstrações contábeis estão de acordo com as NBC TA. Apenas o relatório da empresa OI S/A listada no Nível 1 foi emitido com abstenção de opinião, apresentando uma opinião modificada, conforme a NBC TA 705 – Modificações na Opinião do Auditor Independente, as demais.

Os principais assuntos de auditoria em concordância com a NBC TA 701 – comunicação dos principais assuntos de auditoria no relatório do auditor independente, seguindo os requisitos do NRA foram apresentados pelas empresas de auditoria em conformidade com cada companhia auditada, cabe ressaltar que o parágrafo de principais assuntos de auditoria passou a vigorar a partir da alteração do NRA.

Foram pontuadas as considerações do auditor ao julgar um assunto como importante no de-correr de seu trabalho de auditoria. A partir deste, foram obtidas as informações para a emissão da opinião, assim como notas explicativas em que se encontra, dependendo do assunto valores específicos julgados importantes. Identificou-se 158 assuntos que fundamentados. Após a leitura dos relatórios optou-se em agrupar os assuntos que se repetiram nos relatórios das empresas, o que resultou em 22 categorias específicas e uma genérica (outros assuntos – citados apenas por uma empresa), conforme apresentado no Quadro 2 a seguir:

Quadro 2 – Principais assuntos identificados nos relatórios de auditoria independente.

Empresas Nível 1 Empresas Nível 21. Banco Pan S.A. 1. Aes Tiete Energia S.A.2. Banco Estado Do Rio Grande Do Sul S.A. 2. Alupar Investimento S.A.3. Banco Bradesco S.A. 3. Azul S.A.4. Alpargatas S.A. 4 .Banco Abc Brasil S.A.5. Cia Brasileira De Distribuição 5 .Banco Indusval S.A.6. Cia Paranaense De Energia - Copel 6. Banco Pine S.A.7. Bradespar S.A. 7. Centrais Elet De Santa Catarina S.A.8. Cteep - Cia Transmissão Energia Elétrica Paulista 8. Cia Saneamento Do Paraná - Sanepar9. Braskem S.A. 9. Eletropaulo Metrop. Elet. Sao Paulo S.A.10. Cia Ferro Ligas Da Bahia - Ferbasa 10. Energisa S.A.11. Cia Energética De Minas Gerais - CEMIG 11. Forjas Taurus S.A.12. Cia Estadual De Distrib. Ener. Elet. -CEEE 12. Gol Linhas Aéreas Inteligentes S.A.13. Cesp - Cia Energética De São Paulo 13. Klabin S.A.14. Cia Fiação Tecidos Cedro Cachoeira 14. Marcopolo S.A.15. Centrais Elet Bras S.A. - Eletrobrás 15. Multiplan - Empreend Imobiliários S.A.16. Cia Estadual Ger.Trans.Ener.Elet-Ceee-Gt 16. Renova Energia S.A.17. Eucatex S.A. Industria E Comercio 17. Saraiva S.A. Livreiros Editores18. Fras-Le S.A. 18. Sul América S.A.19. Gerdau S.A. 19. Transmissora Aliança De Energia Elétrica S.A.20. Investimentos Itaú S.A. 20. Via Varejo S.A.21. Itaú Unibanco Holding S.A.22. Metalúrgica Gerdau S.A.23. Oi S.A.24. Paraná Banco S.A.25. Randon S.A. Implementos E Participações26. Suzano Papel E Celulose S.A.27. Usinas Sid De Minas Gerais S.A. Usiminas28. Vale S.A.

Revista Atitude · Faculdade Dom Bosco de Porto Alegre · Ano XI - No 22 - janeiro a junho de 2017 2726 PRINCIPAIS ASSUNTOS ABORDADOS NO RELATÓRIO DO AUDITOR INDEPENDENTE: UMA ANÁLISE DAS EMPRESAS LISTADAS NO NÍVEL 1 E NÍVEL 2 DA BM&FBOVESPA.

Fonte: elaborado pelas autoras.

O parágrafo de principais assuntos de auditoria tem como objetivo obrigar o auditor a regis-tar os principais assuntos abordados no seu relatório, pois esta classificação fundamenta-se no julgamento profissional do auditor, ou seja, são registrados os assuntos considerados mais significativos e que serviram para formar sua opinião. Percebeu-se, na amostra estudada, que se excluindo a categoria genérica (outros assuntos – citados apenas por uma empresa) o assunto as provisões foram citadas em 12% dos relatórios analisados, seguido pelo teste de impairment de ágio e ativo imobilizado mencionado em 7% dos relatórios, bem como, o reconhecimento da receita citado em 7% dos relatórios. Em uma pesquisa realizada pelo Instituto dos Auditores In-dependentes do Brasil (IBRACON) sobre os principais assuntos de auditoria identificando o teste do impairment como o assunto mais citado, ou seja, por 32% dos relatórios dos 546 analisados, diferente do resultado apresentado nesta pesquisa (IBRACON, 2017).

A receita ocupa o terceiro lugar nesta pesquisa e a segunda posição na pesquisa do IBRA-CON. As provisões ocupam o primeiro lugar nesta pesquisa e não são mencionadas na pesquisa do instituto. Cabe ressaltar que esta alteração passou a vigorar para os relatórios referente ao exercício de 2016, portanto, há poucas pesquisas sobre o assunto.

Não foi identificado em nenhum relatório das empresas com os seguimentos de governança corporativo assunto que se refere a Projeção de resultados futuros para a realização de ativos. A respeito das informações referentes ao risco de descontinuidade, também não foi identificado nos relatórios pertencentes a amostra utilizada na pesquisa, ou seja, não houve um julgamento por parte do auditor que obtivesse grau de incerteza sobre a adequação do uso, da base contábil de continuidade operacional na elaboração das demonstrações contábeis.

A categoria genérica – outros assuntos citados apenas por uma empresa representaram 34% dos principais assuntos de auditoria, ou seja, a categoria mais representativa reforçando o objetivo principal da alteração introduzida pelo NRA que é tornar o documento mais informativo e não um documento padronizado. Pode-se inferir que o NRA oportuniza uma maior e melhor comunicação entre a auditoria independente e a administração da empresa visando a melhora

Aquisição do controle

Legislação tributária aplicável ao Programa deIntegração Social - PIS e à Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social - Cofins

Perda do valor recuperável de ativos imobilizados -controladora e consolidado

Planos de benefícios pós emprego

Processo administrativo sancionador (CVM)

Recuperabilidade de tributos diferidos ativos

Valor justo de instrumentos financeiros

Valorização dos instrumentos financeiros econtabilidade de proteção (contabilidade de hedge) -controladora e consolidado

Imposto de renda e contribuição de diferidos

Instrumentos financeiros

Redução ao valor recuperável de empréstimos erecebíveis

Realização de créditos a recuperar de Imposto sobreCirculação de Mercadorias e Serviços - ICMS

Ambiente de tecnologia da informação

Créditos tributários

Investimento e outros ativos financeiros

Mensuração do valor justo

Mensuração da provisão para créditos de liquidaçãoduvidosa - PCLD

Redução a valores recuperáveis

Valor recuperável dos ativos

Reconhecimento da receita

Teste de impairment de ágio e ativo imobilizado

Provisões

Outros assuntos - citados apenas por uma empresa

Principais assuntos identificados

Total de assuntos identificados

Frequência

158

%

100%

1

2

3

4

5

6

7

8

9

10

11

12

13

14

15

16

17

2

2

2

2

2

2

2

2

3

3

3

3

4

4

4

5

6

1%

1%

1%

1%

1%

1%

1%

2%

2%

2%

2%

3%

3%

3%

5%

4%

18

19

20

21

22

6

6

11

11

19

54

4%

4%

7%

7%

12%

34%

Revista Atitude · Faculdade Dom Bosco de Porto Alegre · Ano XI - No 22 - janeiro a junho de 2017 2928 PRINCIPAIS ASSUNTOS ABORDADOS NO RELATÓRIO DO AUDITOR INDEPENDENTE: UMA ANÁLISE DAS EMPRESAS LISTADAS NO NÍVEL 1 E NÍVEL 2 DA BM&FBOVESPA.

na governança corporativa.

Fica evidente a qualquer usuário da informação a mudança da estrutura do relatório do auditor independente, que além da demasiada responsabilidade do auditor, houve também um impacto na estruturação do relatório, anteriormente composto por: parágrafo introdutório, responsabili-dade da administração sobre as demonstrações contábeis, responsabilidade do auditor, opinião do auditor, assinatura do auditor, data do relatório e endereço do auditor.

De acordo com o estudo realizado por Roxo e Bonotto (2016), nota-se esta reestruturação com o primeiro parágrafo tratando da opinião do auditor, seguido por: base para a opinião, principais assuntos de auditoria, outras informações que acompanham as demonstrações contábeis e o relatório do auditor, responsabilidades da administração pelas demonstrações contábeis, respon-sabilidade do auditor, assinatura do auditor, data do relatório e endereço do auditor. Estas alte-rações evidenciam que o auditor esteve mais criterioso no decorrer da elaboração dos relatórios, emitindo-os de maneira personalizada com comentários específicos para cada empresa auditada, reforçando a transparência e objetividade do relatório proporcionando maior fidedignidade nas informações disponibilizadas aos usuários.

Todos os 48 relatórios do exercício de 2016 analisados do Nível 1 e Nível 2 tiveram seus “prin-cipais assuntos” apontados pelas empresas de auditoria, cumprindo as novas exigências do NRA. Das empresas de auditoria emissoras dos NRAS do exercício de 2016, apenas três relatórios foram emitidos por outras empresas de auditoria que não sejam as Big Four, a empresa de auditoria que possuiu mais expressão foi a KPMG que foi a responsável por emitir sua opinião em 16 relatórios, sendo 12 do Nível 1 de governança corporativa e quatro do Nível 2 de governança corporativa, logo a Deloitte Touche Tohmatsu que emitiu sua opinião em 10 relatórios, sendo quatro para compa-nhias do Nível 1 de governança corporativa e seis do Nível 2 de governança corporativa e a Price Waterhouse Coopers que emitiu sua opinião em 10 relatórios, sendo sete para companhias do Nível 1 de governança corporativa e três do Nível 2 de governança corporativa, e pôr fim a ERNST & YOUNG que emitiu sua opinião em nove relatórios, sendo três para companhias do Nível 1 de governança corporativa e seis do Nível 2 de governança corporativa.

Gráfico 1- Empresas de auditoria.

Fonte: Elaborado pelas autoras.

O parágrafo de ênfase e de outros assuntos, conforme NBC TA 706 – Parágrafos de Ênfase e Parágrafos de Outros Assuntos no Relatório do Auditor Independente, também foram contrapos-tos nos relatórios emitidos no exercício de 2016 e fazem parte das exigências do NRA, abaixo o quadro ilustrativo com quais companhias apresentaram o parágrafo de ênfase e quais foram as evidências de cada uma, assim como seu seguimento:

Quadro 3 – Parágrafo de ênfase.

Fonte: elaborado pelas autoras.

O Parágrafo de outros assuntos não foi constatado no Banco Indusval & Partners S.A companhia do Seguimento Nível 2 da BM&FBOVESPA, 43 companhias apresentaram apenas a “Demonstra-ções do valor adicionado”. Nas companhias que possuem o seguimento corporativo do Nível 1, a Cia Paranaense de Energia – COPEL, Eucatex S.A e o Banco do Estado do Rio Grande do Sul S.A tiveram em seu parágrafo de outros assuntos a “Auditoria dos valores correspondentes ao exer-cício anterior”, o Banco Bradesco S.A evidenciou as “Demonstrações contábeis consolidadas”. No seguimento do Nível 2 apenas o Banco ABC Brasil S.A teve em seu parágrafo de outros assuntos as “Demonstrações financeiras individuais e consolidadas”.

Em termos de associação entre os tipos de relatórios, os relatórios emitidos do Brasil pelas empresas listadas no Nível 1 e Nível 2 de governança corporativa da BM&FBOVESPA, têm uma conformidade com o estudo realizado por Veiga (2016), sobre as auditorias realizadas em Por-tugal, pois apresentam a base da opinião do auditor logo após a opinião do auditor, destacando suas opiniões e esclarecimentos evidenciados referentes suas responsabilidades diante fatos que possam resultar em fraudes ou erros, a definição de materialidade e o esclarecimento sobre as deficiências de controle interno. Mesmo enfatizando nos relatórios a opinião do auditor referente

Braskem S.A. Lava Jato

Centrais Elétricas Brasileiras S.A Continuidade operacional de empresas controladas e coligadas

Renovação das concessões das usinas hidrelétricas de Jaguara e São Simão e Miranda

Riscos relacionados a leis e regulamentosRisco de continuidade da investida Renova Energia S.A.Reapresentação dos valores correspondentes

CTEEP – Cia de Transmissão de Energia Elétrica Paulista S.A

Lei nº 4.819/58

Centrais Elétricas de Santa Catarina S.AReapresentação dos valores correspondentes referentes ao exercício findo em 31 de dezembro de 2015

Renova Energia S.ADepreciação dos bens do ativo imobilizado destinados à geração de energia elétrica no regime de produção independente

Empresas Segmento Nível 1

Cia Energética de Minas Gerais – CEMIG

Empresas Segmento Nível 2

Revista Atitude · Faculdade Dom Bosco de Porto Alegre · Ano XI - No 22 - janeiro a junho de 2017 3130 PRINCIPAIS ASSUNTOS ABORDADOS NO RELATÓRIO DO AUDITOR INDEPENDENTE: UMA ANÁLISE DAS EMPRESAS LISTADAS NO NÍVEL 1 E NÍVEL 2 DA BM&FBOVESPA.

as deficiências e eficácias dos controles internos, ainda há uma diferença com as características dos relatórios emitidos pela bolsa de valores americana (NYSE), ao não ser publicado o parecer emitido por outra empresa sobre as demonstrações do ano anterior (Santos et al., 2009).

CONSIDERAÇÕES FINAIS

De acordo com a pesquisa realizada, observou-se que os Novos Relatórios do auditor inde-pendente das demonstrações contábeis auditadas das companhias listadas no Nível 1 e Nível 2 de Governança Corporativa da BM&FBOVESPA relativa ao exercício de 2016, os principais assuntos de auditoria informados pelos auditores externos estão conforme proposto na NBC TA 701 – Co-municação dos Principais Assuntos de Auditoria no Relatório do Auditor Independente, ou seja, percebe-se que estão respeitando a nova estruturação vigente à elaboração dos relatórios, essa é uma conclusão geral baseada no fato de que a totalidade da amostra desta pesquisa foram condizentes a norma de auditoria.

Com relação às empresas de auditoria, observou-se que as Big Four detêm participação ma-joritária na responsabilidade pela emissão dos relatórios de auditoria das empresas pesquisadas, pelas amostrar serem pertinentes ao exercício de 2016 que foi o primeiro ano da exigibilidade da aplicação a nova estrutura do Novo Relatório no Brasil, nos equiparando aos países que já vêm elaborando seus relatórios com tais clarezas aos usuários das informações, fica a necessidade de continuidade da pesquisa visando uma ampliação de dados analisados e comparações aos próximos anos decorrentes de principais assuntos que vêm sendo citados pelas empresas de auditoria, assim como das outras normas pertencentes ao Novo Relatório.

Por fim, a estrutura e as normas que integram o Novo relatório apresenta aos usuários as informações que são condizentes à companhia, porém, se faz transparecer todas as particula-ridades que os auditores julgam relevantes para a formação da sua opinião deixando exposta a companhia com o que foi levado em consideração na hora da auditoria, buscando resguardar os investidores de erros ou fraudes que possam estar sendo cometidos dentro das organizações e principalmente de sua continuidade, resultando em mais segurança e transparência.

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LAS DIRECTRICES DEL COMITÉ DE LAS NACIONES UNIDAS SOBRE COMERCIO Y DESARROLLO

(UNCTAD) PARA LA PROTECCIÓN DE LOS CONSUMIDORES1

Silvio Battello2

Denise Artifon3

RESUMO

La presente investigación tiene por objeto analizar los principales linea-mientos de las Directrices de Naciones Unidas para la Protección de los Consumidores (DNUPC) elaboradas en el ámbito del Comité de las Na-ciones Unidas sobre el Comercio y Desarrollo (UNCTAD). El trabajo está dividido en dos partes, en la primera se analizan los grandes lineamientos de las Directrices, en especial aquellos que sirvieron de inspiración para las legislaciones internas. En la segunda parte se verifican las propuestas de revisión presentadas por la UNCTAD en 2015.

Palavras-chave: UNCTAD; Consumidor; Directrices.

ABSTRACT

The aim of this research has been to analyse the main points of the The Uni-ted Nations Guidelines for Consumer Protection (UNGCP), elaborated by the United Nations Conference on Trade and Development (UNCTAD). The work has been organized in two parts. Firstly, the main guidelines of the directives are analysed, especially those which have been used as inspiration for the elaboration of internal laws. In the second part of the article, the proposal of revision presented in 2015 is examined.

Keywords: UNCTAD; Consumer; Directives.

INTRODUCCIÓN

Se acostumbra indicar como marco inicial de la moderna protección del consumidor el famoso

1 El presente estudio es una versión actualizada del capítulo 2 de la obra: BATTELLO CALDERON, Silvio Javier, SHINA, Fernando Ezequiel. Fundamentos para la Protección del Consumidor. San José: Editora Jurídica Continental, 2016.

2 Advogado na Argentina e Brasil. Pós-Doutor em Direito. Professor da Faculdade Dom Bosco de Porto Alegre, Brasil. E-mail: [email protected]

3 Advogada no Brasil. Doutoranda em Direito pela Universidade de Morón - UM, Argentina. Especialista em Direito do Consumidor pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul – UFRGS. Professora de Direito do Consumidor e Direito Imobiliário. E-mail: [email protected]

Revista Atitude · Faculdade Dom Bosco de Porto Alegre · Ano XI - No 22 - janeiro a junho de 2017 3534LAS DIRECTRICES DEL COMITÉ DE LAS NACIONES UNIDAS SOBRE COMERCIO Y DESARROLLO (UNCTAD) PARA LA PROTECCIÓN DE LOS CONSUMIDORES.

mensaje del Presidente de los Estados Unidos, John Fitzgerald Kennedy, que el día 15 de marzo de 1962, al dirigirse al Parlamento de su país, consagró determinados derechos que debían ser considerados fundamentales para los consumidores, tales como: el derecho a la seguridad, a la información, a la libre elección y ser oído. El pronunciamiento fue seguido por un movimiento universal a favor de la defensa de los consumidores., ya que a protección de los consumidores es una cuestión que trasciende a la legislación de cada país.

El Comité de las Naciones Unidas sobre Comercio y Desarrollo (UNCTAD) elaboró en el año 1985 un conjunto de normas generales que los Estados Miembros deben asegurar a los consu-midores. Se trata de una serie de reglas básicas conocidas como Directrices de Naciones Unidas para la Protección de los Consumidores (DNUPC). En síntesis, las directrices consisten en un conjunto de principios generales que no pueden estar ausentes en la legislación de ninguno de los países que pertenecen a la ONU. Las directrices fueron ampliadas en 19994, y 9 de julio 2015 la UNCTAD aprobó un borrador con nuevas actualizaciones.

La presente investigación tiene por objeto analizar los principales lineamientos de estas Di-rectrices. Para ello, el trabajo está dividido en dos partes, en la primera analizaremos los gran-des lineamientos de las Directrices, en especial aquellos que sirvieron de inspiración para las legislaciones internas. En la segunda parte verificaremos las propuesta de revisión presentadas por la UNCTAD en 2015.

1. LOS PRINCIPIOS GENERALES

Para una correcta interpretación de las Directrices establecidas por la ONU para la protección del consumidor, es necesario que tengamos presente cuales fueron los objetivos de la institución al abordar la materia. Entre tantos, podemos destacar ocho objetivos básicos: 1) Ayudar a los paí-ses a lograr o mantener una protección adecuada de sus habitantes en calidad de consumidores; 2) Facilitar las modalidades de producción y distribución que respondan a las necesidades y los deseos de los consumidores; 3) Instar a quienes se ocupan de la producción de bienes y servicios y de su distribución a los consumidores a que adopten estrictas normas éticas de conducta; 4) Ayudar a los países a poner freno a las prácticas comerciales abusivas de todas las empresas, a nivel nacional e internacional, que perjudiquen a los consumidores; 5) Facilitar la creación de grupos independientes de defensa del consumidor; 6) Fomentar la cooperación internacional en la esfera de la protección del consumidor; 7) Promover el establecimiento en el mercado de condiciones que den a los consumidores una mayor selección a precios más bajos; 8 Promover un consumo sostenible.

Estos objetivos atienden a los intereses y las necesidades de los consumidores de todos los países, en especial de los países en desarrollo; reconociendo que los consumidores afrontan a menudo desequilibrios en cuanto a capacidad económica, nivel de educación y poder de negocia-ción. Con esta referencias, veamos, a seguir, el contenido general de estos principios generales de protección establecidos en la Directrices.

4 Directrices de la Naciones Unidas para la protección del consumidor. Disponibles en: http://unctad.org/es/Docs/poditcclpm21.sp.pdf

1.1. EL DERECHO A LA SEGURIDAD.

La Directriz 11 de Naciones Unidas establece:

Los gobiernos deben adoptar o fomentar la adopción de medidas apropiadas, incluidos sistemas jurídicos, reglamentaciones de seguridad, normas nacionales o internacionales, normas voluntarias y el mantenimiento de registros de seguridad, para garantizar que los productos sean inocuos en el uso al que se destinan o normalmente previsible.”5

Es obligación de cada Estado controlar que los bienes y servicios que circulan en el mercado no sean peligrosos para los usuarios ni que contengan riesgos excesivos para su salud o sus bienes.

La mayoría de los Estados miembros del Comité de las Naciones Unidas sobre Comercio y Desarrollo (UNCTAD) han aprobado leyes y normas relativas a la inocuidad de los productos, que generalmente están incluidas en las leyes de protección del consumidor o las leyes sectoriales y se refieren a cuestiones que van desde las condiciones laborales hasta los productos nucleares. Ese marco jurídico suele integrar a los organismos de protección del consumidor junto con otras autoridades sectoriales pertinentes. Algunos países, como el Canadá, encomiendan enteramente la cuestión a la autoridad sanitaria, mientras que otros, como los Estados Unidos de América, han creado un organismo autónomo responsable de la inocuidad de los productos para los consumidores. Algunas jurisdicciones, como la Unión Europea, el Perú y Portugal, han establecido registros para garantizar que los productos sean inocuos en el uso al que se destinan o normalmente previsible6.

En caso de que los bienes sean en sí mismos riesgosos, (Por ejemplo, remedios, elementos cortantes, etc.) deben incluir instrucciones para su uso adecuado, y advertencias sobre los riesgos asociados a ese bien. Esta información es de vital importancia, porque muchos accidentes ocurren porque los usuarios no saben usar correctamente los bienes que adquieren.

1.2. LA PROTECCIÓN DE LOS DERECHOS ECONÓMICOS.

Con relación a este punto, Naciones Unidas, fijo los siguientes principios generales:

B. Promoción y protección de los intereses económicos de los consumidores

15. Las políticas de los gobiernos deben tratar de hacer posible que los consumidores obtengan el máximo beneficio de sus recursos económicos. También deben tratar de alcanzar las metas en materia de producción satisfactoria y normas de funcionamiento, procedimientos adecuados de distribución, prácticas comerciales leales, comercialización informativa y protección efectiva contra las prácticas que puedan perjudicar los intereses económicos de los consumidores y la posibilidad de elegir en el mercado.

16. Los gobiernos deben intensificar sus esfuerzos para impedir el empleo de prácticas que per-judiquen los intereses económicos de los consumidores, garantizando que los productores, los distribuidores y cuantos participan en la provisión de bienes y servicios cumplan las leyes y las normas obligatorias vigentes. Se debe dar aliento a las organizaciones de consumidores para que vigilen prácticas perjudiciales como la adulteración de alimentos, la comercialización basada en afirmaciones falsas o capciosas y los fraudes en la prestación de servicios.

5 Cf: UNCTAD, E/1999/INF/2/Add.2, resolución 1999/7, anexo.

6 Cf: UNCTAD, Informe sobre la aplicación de las Directrices de las Naciones Unidas para la protección del consumidor (1985-2013), TD/B/C.I/CLP/23, pág. 7.

Revista Atitude · Faculdade Dom Bosco de Porto Alegre · Ano XI - No 22 - janeiro a junho de 2017 3736LAS DIRECTRICES DEL COMITÉ DE LAS NACIONES UNIDAS SOBRE COMERCIO Y DESARROLLO (UNCTAD) PARA LA PROTECCIÓN DE LOS CONSUMIDORES.

17. Los gobiernos deben elaborar, reforzar o mantener, según proceda, medidas relativas al control de las prácticas comerciales restrictivas y otras de tipo abusivo que puedan perjudicar a los consumidores, así como medios para hacer efectivas esas medidas. Al respecto, los gobiernos deben guiarse por su adhesión al Conjunto de principios y normas equitativos convenidos multi-lateralmente para el control de las prácticas comerciales restrictivas, aprobado por la Asamblea General en su resolución 35/63, de 5 de diciembre de 1980.

18. Los gobiernos deben adoptar o mantener políticas que especifiquen las responsabilidades del fabricante para asegurar que los artículos satisfagan los requisitos normales de durabilidad, utilidad y fiabilidad y sean aptos para el fin a que se destinan y que el vendedor vele por que estos requisitos se cumplan. Las mismas políticas deben regir la prestación de servicios.

19. Los gobiernos deben alentar la competencia leal y efectiva a fin de brindar a los consumidores la posibilidad de elegir productos y servicios dentro del mayor surtido y a losprecios más bajos.

20. Los gobiernos deben velar, si procede, por que los fabricantes o minoristas aseguren la dispo-nibilidad adecuada de un servicio confiable posterior a la venta y de piezas de repuesto.

21. Los consumidores deben gozar de protección contra abusos contractuales como el uso de contratos uniformes que favorecen a una de las partes, la no inclusión de derechos fundamentales en los contratos y la imposición de condiciones excesivamente estrictas parala concesión de créditos por parte de los vendedores.

22. Las prácticas de promoción empleadas en la comercialización y la venta deben basarse en el principio del trato justo de los consumidores y deben satisfacer los requisitos jurídicos. Ello requiere el suministro de la información necesaria para que los consumidores puedan tomar decisiones bien fundadas e independientes, así como la adopción de medidas para asegurar la exactitud de la información suministrada.

23. Los gobiernos deben alentar a todos los interesados a participar en la libre circulación de información exacta sobre todos los aspectos de los productos de consumo.

24. Debe procurarse que los consumidores tengan más acceso a información inequívoca sobre los efectos de los productos y los servicios en el medio ambiente, recurriendo a medios como la elaboración de perfiles ambientales de los productos, la presentación de informes sobre el medio ambiente por parte de la industria, el establecimiento de centros de información para los consu-midores, la ejecución de programas voluntarios y transparentesde etiquetado ecológico y los servicios de consulta telefónica directa sobre los productos.

25. Los gobiernos, en estrecha colaboración con los fabricantes, los distribuidores y las organiza-ciones de consumidores, deben adoptar medidas contra las afirmaciones o la información capciosas en relación con el medio ambiente en las actividades de publicidad yotras actividades de comercialización. Debe fomentarse la elaboración de códigos y normasde publicidad adecuados para reglamentar y verificar las afirmaciones que se hacen en relación con el medio ambiente.

26. Los gobiernos deben, dentro de sus propios países, promover la formulación y aplicación por parte de las empresas, en colaboración con las organizaciones de consumidores, de códigos de comercialización y otras prácticas comerciales para asegurar una adecuada protección del con-sumidor. También pueden concertarse acuerdos voluntarios conjuntos por parte de las empresas, las organizaciones de consumidores y otras partes interesadas. Estos códigos deben recibir una publicidad adecuada.

27. Los gobiernos deben examinar periódicamente las normas jurídicas relacionadas con pesas y medidas y determinar la eficacia de sus mecanismos de aplicación.7

7 Cf: UNCTAD, E/1999/INF/2/Add.2, resolución 1999/7, anexo.

Los gobiernos deben ejercer control suficiente sobre el mercado para asegurar que los bienes y servicios que se comercializan sean confiables y tengan una duración mínima.

El mandato básico de los organismos de protección del consumidor existentes abarca la de-fensa de los intereses económicos de los consumidores, velando especialmente por las prácticas comerciales leales, la comercialización informativa y la protección frente a prácticas abusivas. En muchos países esas responsabilidades se comparten con las autoridades de la competencia. Además, de conformidad con la Directriz 16, existen varias iniciativas que fomentan las prácticas comerciales leales y persiguen las perjudiciales (como sucede en Costa Rica), entre las que des-tacan las comunicadas por los Estados Unidos en las que pueden participar las organizaciones de consumidores (previsto también por los art. 34 y 43 de la LDC de Costa Rica). Existen distintos medios de alentar a las organizaciones de consumidores a que ejerzan una labor de vigilancia, como los acuerdos de cooperación, el asesoramiento (en Costa Rica, por la Comisión Nacional de Consumidor) y los premios. La OCDE contribuye a la promoción y la protección de los intereses económicos de los consumidores en Estados que son o no son miembros de la OCDE por media-ción del Comité de Políticas del Consumidor, el Comité de Mercados Financieros, el Comité de Inversiones y el Comité de la Competencia8.

Se trata de evitar que ingresen al mercado bienes y servicios sin una calidad aceptable en términos de duración y confiabilidad. Asimismo, indica que los gobiernos deben asegurar que el mercado esté abastecido por distintos bienes que les permitan a los usuarios elegir entre diversas calidades y precios.

La mayor oferta de bienes sirve para proteger el consumo de los sectores más populares que son -al mismo tiempo - los más vulnerables. Es por eso que toda una sección de la ley 7.472 se ocupa de la transparencia de los mercados y de la lealtad comercial que los proveedores deben tener.

1.3. LA PROTECCIÓN CONTRA LOS ABUSOS CONTRACTUALES.

Entre otros principios generales, el organismo internacional presenta la directriz n° 21 que se refiere a los contratos entre proveedores y consumidores:

“Los consumidores deben gozar de protección contra abusos contractuales como el uso de con-tratos uniformes que favorecen a una de las partes, la no inclusión de derechos fundamentales en los contratos y la imposición de condiciones excesivamente estrictas para la concesión de créditos por parte de los vendedores.”9

Uno de los principales objetivos de los organismos de protección del consumidor es el de perseguir los abusos contractuales. A este respecto, suele regularse el uso de contratos uni-formes que favorecen a una de las partes (contratos de adhesión). Por ejemplo, México elaboró un contrato tipo destinado a los proveedores y distribuidores y exige que se registren todos los modelos de contratos de adhesión en el ámbito de las telecomunicaciones, mientras que Costa Rica (por medio del Decreto Nº 35867-MEIC que regula las tarjetas de crédito) enumeran los

8 Cf: UNCTAD, Informe sobre la aplicación de las Directrices de las Naciones Unidas para la protección del consumidor (1985-2013), TD/B/C.I/CLP/23, pág. 9 y 10.

9 Cf: UNCTAD, E/1999/INF/2/Add.2, resolución 1999/7, anexo.

Revista Atitude · Faculdade Dom Bosco de Porto Alegre · Ano XI - No 22 - janeiro a junho de 2017 3938LAS DIRECTRICES DEL COMITÉ DE LAS NACIONES UNIDAS SOBRE COMERCIO Y DESARROLLO (UNCTAD) PARA LA PROTECCIÓN DE LOS CONSUMIDORES.

requisitos aplicables a los contratos tipo financieros. Generalmente, la ley de protección o las regulaciones sectoriales prohíben excluir de los contratos derechos fundamentales y tienen en cuenta las condiciones de crédito abusivas10.

Además, hay un hecho que no podemos soslayar: la mayoría (por no decir la totalidad de los contratos de nuestros días son formularios impresos hechos por la compañía que ofrece el servicio o vende la cosa. El consumidor se limita a firmar esos formularios; ni siquiera los lee porque son tan largos y confusos y tediosos que resultan imposibles de entender. Es abundante decir que estos contratos son hechos a la medida de la empresa, y es muy frecuente (por no decir siempre) que contengan cláusulas abusivas perjudiciales para el usuario.

Como más adelante veremos, la ley 7.472 le dedica un capítulo especial a las llamadas cláusulas abusivas, mayormente escondidas en los contratos de adhesión (Ver art. 42 LDC).

1.4. EL DERECHO A OBTENER INDEMNIZACIONES.

Las Naciones Unidas saben que la reparación de los daños es un punto clave en el desarrollo del derecho del consumidor. También sabe que esas compensaciones son siempre escasas. Es decir, son insuficientes para el usuario afectado, y sumamente convenientes para el agente daña-dor que limita su responsabilidad al pago de indemnizaciones que muchas veces causan mucha gracia y muy poco efecto preventivo. Este es un punto central. Pensamos que cada uno de los países debe trabajar para lograr que su ordenamiento jurídico tenga un sistema indemnizatorio acorde a nuestros tiempos y a las particularidades propias de las relaciones de consumo.

Por eso en la directriz 32 de Naciones Unidas se ocupa del asunto:

Los gobiernos deben establecer o mantener medidas jurídicas o administrativas para permitir que los consumidores o, en su caso, las organizaciones competentes obtengan compensación mediante procedimientos oficiales o extraoficiales que sean rápidos, justos, poco costosos y asequibles. Al establecerse tales procedimientos deben tenerse especialmente en cuenta las necesidades de los consumidores de bajos ingresos.11

La experiencia ha mostrado que las empresas solo cumplen las normas obligatorias de protec-ción del consumidor si existe una alta probabilidad de que las infracciones de las normas básicas de protección del consumidor sean castigadas, o si el costo directo e indirecto de las sanciones entraña efectos comerciales importantes. En este sentido, la amenaza de sanciones de peso pa-rece ser de importancia decisiva para promover el cumplimiento de las leyes de protección del consumidor. Las autoridades encargadas de la protección del consumidor no solo se ocupan de aplicar la normativa de protección aplicando sanciones, sino también del bienestar de los con-sumidores. Así pues, las sanciones pueden ir acompañadas de medidas de compensación, como medidas correctivas o complementarias. Las medidas correctivas están orientadas a compensar a los consumidores y garantizar la reparación de los daños. Las medidas complementarias se refieren a las encaminadas a proteger los intereses generales de los consumidores, como la

10 Cf: UNCTAD, Informe sobre la aplicación de las Directrices de las Naciones Unidas para la protección del consumidor (1985-2013), TD/B/C.I/CLP/23, pág. 10.

11 Cf: UNCTAD, E/1999/INF/2/Add.2, resolución 1999/7, anexo.

salud y el medio ambiente12.

Cuando el producto o el servicio causa daños a los consumidores, éstos deben tener la po-sibilidad de ser indemnizados mediante un procedimiento legal, rápido, justo y adecuado a las necesidades del consumidor. Fundamentalmente, se debe crear un mecanismo de reclamaciones que sea gratuito que asegure el acceso a la justicia para todas las personas. Una de las directrices de las Naciones Unidas se ocupa de este tema.

El Art. 56 LDC de Costa Rica se hace eco de este tema, y en el segundo párrafo dispone: “...La Comisión nacional del consumidor siempre evacuará, con prioridad, las denuncias relacionadas con los bienes y servicios consumidores por la población de menores ingresos…” Más allá de las críticas que nos merece un texto tan genérico y poco preciso, nos parece importante señalar que la norma local se ajusta al pie de la letra al principio general establecido por el organismo internacional.

1.5. EL ACCESO A LA EDUCACIÓN.

No nos vamos a cansar de decir y repetir que la educación, es el tema central en materia de derechos del consumidor. Las directrices de las Naciones Unidas se ocupan en la directriz n° 35:

“Los gobiernos deben formular o estimular la formulación de programas generales de educación e información del consumidor, incluida la información sobre los efectos en el medio ambiente de las decisiones y el comportamiento de los consumidores y de las consecuencias, incluidos costos y beneficios, que pueda tener la modificación de las modalidades de consumo, teniendo en cuenta las tradiciones culturales del pueblo de que se trate. El objetivo de tales programas debe consistir en capacitar a los consumidores para que sepan discernir, puedan hacer elecciones bien fundadas de bienes y servicios, y tengan conciencia de sus derechos y obligaciones. Al formular dichos programas, debe prestarse especial atención a las necesidades de los consumidores que se encuentran en situación desventajosa, tanto en las zonas rurales como urbanas, incluidos los consumidores de bajos ingresos y aquellos que sean casi o totalmente analfabetos. Los grupos de consumidores, las empresas y otras organizaciones pertinentes de la sociedad civil deben participar en esa labor de educación.”13

La educación es el derecho más preciado que puede adquirir y desarrollar una persona. La única manera de lograr sujetos que realicen consumos eficaces y dichosos es la educación que debe darse en todos los niveles escolares.

De la misma manera que la información es esencial para los consumidores, sin buenos planes educativos ofrecidos y sostenidos desde el Estado, toda información es superflua. De poco o nada sirve informar situaciones que no van a ser comprendidas por los usuarios.

La información, como derecho del consumidor y obligación del proveedor, es mucho más que entregar una manual (generalmente muy mal traducido al idioma español) en una caja cerrada. Informar es asegurarse que el usuario tiene plena conciencia de las calidades del producto, sus limitaciones, sus riesgos y su duración.

12 Las medidas tendentes a garantizar compensación a los consumidores pueden adoptarse en procedimientos administrativos, judi-ciales o en sistemas alternativos de solución de controversias, en función de cada jurisdicción. Cabe observar que la ICPEN propugna una plataforma multilateral que combine la solución de controversias por vía administrativa y alternativa (www.econsumer.gov). Si bien la mayoría de las leyes de protección del consumidor habilitan a los organismos de protección del consumidor para que impongan medidas correctivas y complementarias, la compensación suele estar reservada al sistema judicial. Cf: UNCTAD, Informe sobre la aplicación de las Directrices de las Naciones Unidas para la protección del consumidor (1985-2013), TD/B/C.I/CLP/23, pág. 13.

13 Cf: UNCTAD, E/1999/INF/2/Add.2, resolución 1999/7, anexo.

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Como bien señala Ricardo Lorenzetti: “Desde una definición descriptiva, podríamos decir que el deber de informar alude a una conducta impuesta a alguien a fin de que aclare a otra persona rela-cionada o que puede relacionarse con él aspectos que conoce y que disminuye o pueden disminuir la capacidad de discernimiento o de previsión del otro si dichos datos no se suministran.”14

En efecto, informar al otro es advertir al otro acerca de las cuestiones adversas involucradas en un acto de consumo. Se informa bien cuando se dice que un producto no es eterno sino que, por el contrario, dura mucho menos de lo que imaginábamos; o cuando se hace notar que la ca-lidad prometida en la publicidad es completamente distinta a la que realmente tiene el producto encerrado en esa caja que estamos por adquirir. Informar es, como dice Lorenzetti, contarle al usuario algunas cosas referidas al bien o servicio que está por adquirir que pueden disminuir su voluntad de adquirirlo. Justamente por eso los proveedores disimula la información que sólo ellos conocen; y también, por ese mismo motivo, informar no es una gracia que se concede por piedad a los usuarios sino una obligación legal. Como bien lo explica el Juan Farina: “La información prevista por el art. 4° es obligatoria para el proveedor en todos los supuestos referidos a una relación de consumo, pues su objetivo es que el consumidor o usuario sepa en verdad qué va a adquirir, para qué sirve, cómo debe usarse o ingerirse, etc., pues de este modo podrá tomar una decisión razonable.” Compartimos la cita del jurista argentino: sin información adecuada, no hay decisión razonable.15 En los capítulos que siguen haremos un desarrollo más extenso de este tema.

Naciones Unidas, en las directrices que estamos viendo, le dedica especial consideración al tema educativo. Por eso se establece que los gobiernos deben formular programas generales de educación e información del consumidor. El objetivo de estos programas es capacitar a los consumidores para que puedan hacer elecciones bien fundadas al momento de realizar sus con-sumos. Asimismo, deben desarrollar una clara conciencia sobre sus derechos y obligaciones. Es evidente que los grupos sociales más carenciados son los que padecen mayores abusos y sufren más desventajas. Por eso, los programas de educación deben prestarse especial atención a las necesidades de los consumidores que se encuentran en situación desventajosa.

La mayoría de los Estados miembros del Comité de las Naciones Unidas sobre Comercio y De-sarrollo -UNCTAD- han adoptado programas con el objeto de contar con consumidores informados. Hay multitud de iniciativas interesantes, como sitios de información en Internet, cursos en línea, asesoramiento en línea, talleres e incluso educación del consumidor en el programa educativo de los ministerios de educación. Los Estados Unidos destacan por su amplio programa educativo que abarca todas las áreas mencionadas, especialmente activo en los medios sociales (Facebook, Twitter, Youtube y los blogs). Algunos países tienen unidades especializadas que cumplen esas funciones. Cada país ha establecido diferentes prioridades, que en su mayoría forman parte de las recomendaciones que figuran en las Directrices16. Sin embargo, hay también ejemplos de campañas de educación e información realizadas por organizaciones de consumidores, empresas y medios de comunicación.17

14 LORENZETTI, Ricardo Luis. Consumidores…, cit., pág. 205.

15 FARINA, Juan M. Defensa…, cit., pág. 161.

16 Cf: UNCTAD, Informe sobre la aplicación de las Directrices de las Naciones Unidas para la protección del consumidor (1985-2013), TD/B/C.I/CLP/23, pág. 15.

17 en Costa Rica se destacan los sitios organizados por las asociaciones Consumidores de Costa Rica (http://www.consumidoresdecos-tarica.org) y el de la Asociación de Consumidores Libres (http://www.consumidoreslibres.org).

1.6. EL ACCESO A LOS MEDICAMENTOS.

El tráfico de productos medicinales es uno de los rubros que mayor intervención estatal re-quiere. Las Naciones Unidas disponen, en la directriz 61, un principio general:

“Los gobiernos deben elaborar o mantener normas y disposiciones adecuadas y sistemas de regla-mentación apropiados para asegurar la calidad y el uso adecuado de los productos farmacéuticos mediante políticas nacionales integradas en materia de medicamentos, que pueden abarcar, entre otras cosas, la adquisición, la distribución, la producción, los mecanismos de concesión de licencias, los sistemas de registro y la disponibilidad de información fidedigna sobre los productos farmacéuticos. Al hacerlo, los gobiernos deben tener especialmente en cuenta la labor y las reco-mendaciones de la Organización Mundial de la Salud en materia de productos farmacéuticos. Para determinados productos, debe alentarse el uso del Sistema de certificación de la calidad de los productos farmacéuticos objeto de comercio internacional, de esa organización, y de otros sistemas internacionales de información sobre productos farmacéuticos. Se deben adoptar también, según proceda, medidas para fomentar el uso de los medicamentos con sus denominaciones comunes internacionales, aprovechando la labor realizada por la Organización Mundial de la Salud.”18

Si existe un consumo esencial, es el de los remedios que utilizamos cuando la enfermedad aparece. Esta situación afecta, sobre todo, a las personas mayores de edad. La intervención del Estado en este rubro es fundamental. Los gobiernos deben elaborar leyes apropiadas para ase-gurar la calidad y el uso adecuado de los productos farmacéuticos.

Se trata de un tema complejo, porque en la práctica aparecen en escena actores económicos de peso, como son los laboratorios farmacéuticos, protegidos por la legislación de la propiedad intelectual. Hay un conflicto de valores, entre a) el derecho al medicamento como un derecho fundamental, b) el derecho del consumidor y c) el derecho de la propiedad intelectual. Lo lógico sería respetar esa escala jerárquica, aunque en realidad, lo que vemos es la preponderancia de los derechos económicos (de los laboratorios) por sobre los derechos humanos del acceso a los medicamentos.

2. LAS NUEVAS DIRECTRICES DEL AÑO 2015

El 9 de julio de 2015, y a tono con el avance de los tiempos, las tecnologías y las nuevas nece-sidades de los usuarios, el Comité de las Naciones Unidas sobre Comercio y Desarrollo (UNCTAD) aprobó el texto final de borrador para actualizar las Directrices de Naciones Unidas de Protección al Consumidor (DNUPC)19, con el propósito de renovar el texto en concordancia con la evolución tecnológica, de las prácticas empresariales y de las nuevas inquietudes de los consumidores. De esa forma, al tratar de los Principios Generales, el párrafo 5 del borrador informa que las nece-sidades legítimas que las directrices procuran atender son las siguiente:

a) La protección de los consumidores frente a los riesgos para su salud y su seguridad; (b) La promoción y protección de los intereses económicos de los consumidores; (c) El acceso de los con-sumidores a una información adecuada que les permita hacer elecciones bien fundadas conforme a los deseos y necesidades de cada cual; (d) La educación del consumidor, incluida la educación sobre la repercusión ambiental social y económica que tienen las elecciones del consumidor; (e) La posibilidad de compensación efectiva al consumidor; (f) La libertad de constituir grupos u otras organizaciones pertinentes de consumidores y la oportunidad para esas organizaciones de hacer oír sus opiniones en los procesos de adopción de decisiones que las afecten; (g) La promoción de

18 UNCTAD, E/1999/INF/2/Add.2, resolución 1999/7, anexo.

19 Los debates y documentos de trabajo pueden ser consultados en: http://unctad.org/en/pages/MeetingDetails.aspx?meetingid=642

Revista Atitude · Faculdade Dom Bosco de Porto Alegre · Ano XI - No 22 - janeiro a junho de 2017 4342LAS DIRECTRICES DEL COMITÉ DE LAS NACIONES UNIDAS SOBRE COMERCIO Y DESARROLLO (UNCTAD) PARA LA PROTECCIÓN DE LOS CONSUMIDORES.

modalidades sostenibles de consumo. h) La protección de los consumidores que acceden a los servicios financieros; (i) La protección de los consumidores en el comercio electrónico y móvil; (j) La protección de los valores fundamentales de consumidores de privacidad, libertades indi-viduales y el libre flujo de información20.

2.1. LOS PRINCIPIOS DE BUENAS PRÁCTICAS EMPRESARIALES:

La Propuesta de 2015 agrega un Capítulo especial (IV) destinado a informar los principios de las buenas prácticas empresariales, aplicables tanto al comercio tradicional como al comercio electrónico, y son sistematizados, alfabéticamente, en el ítem 12 de la siguiente forma:

-Trato justo y equitativo: Las empresas deben relacionarse de manera justa y honesta con los consumidores en todos los estadios de su relación, de manera que sea una parte integral de la cultura de una empresa. Las empresas deben evitar prácticas que causen perjuicio al consumidor particularmente con respecto a grupos vulnerables o desfavorecidos de todos los géneros.

-Comportamiento profesional: Las empresas no deben someter a los consumidores a prácticas comerciales ilegales, no éticas, discriminatorias o engañosas, tales como tácticas abusivas de mercadotecnia, prácticas de cobro de deudas abusivas, u otras conductas impropias que pudieran perjudicar a los consumidores.

-Divulgación y transparencia: Las empresas deben proporcionar información completa y precisa a los consumidores acerca de los términos, las condiciones, las tarifas aplicables y los costos finales de bienes y servicios, suficientes para que los consumidores puedan tomar decisiones informadas. También deben orientar al consumidor cuando sea necesario. Las empresas deben actualizar la información sobre los bienes y servicios prestados a los consumidores, para que los bienes y ser-vicios sean claros y concisos y fáciles de entender, precisos y no engañosos. Las empresas deben garantizar un fácil acceso a esta información y no imponer molestias innecesarias, especialmente en relación a los términos y condiciones claves, independientemente de los medios tecnológicos utilizados.

-Educación y concienciación: Las empresas deben, en su caso, desarrollar programas y mecanis-mos adecuados para ayudar a los consumidores a desarrollar los conocimientos y habilidades para comprender adecuadamente los riesgos, incluidos los riesgos y las oportunidades financieras, y a tomar decisiones informadas y a saber cómo acceder a la ayuda cuando sea necesario.

-Protección de la privacidad: Las empresas involucradas en el comercio tanto en línea como fuera de ella deben proteger la información personal mediante mecanismos adecuados de control y seguridad y deben tomar las medidas necesarias para no divulgar información sin el conocimiento y consentimiento del consumidor. Estos mecanismos deben definir los objetivos para los que se puede reunir, procesar, custodiar, usar y divulgar los datos (especialmente a terceras partes).

-Gestión de reclamaciones: Las empresas deben proporcionar mecanismos de gestión de quejas a los consumidores que sean justos, fáciles de usar, rápidos y eficaces ante la resolución de con-troversias y sin costos o cargas innecesarias.

-Conflicto de intereses: Las empresas y sus agentes autorizados deben tener como objetivos trabajar en el interés de los consumidores y ser responsable de la defensa de la protección del consumidor.

-La cooperación con las autoridades de protección al consumidor: Las empresas deben cooperar con las autoridades de protección al consumidor de los Estados miembros en la resolución de quejas de los consumidores.21

20 Disponible en: http://unctad.org/meetings/en/SessionalDocuments/DITC_CCPB2015_ADHOC_DRES_en_revised_29.01.2015.pdf

21 Disponible en: http://unctad.org/meetings/en/SessionalDocuments/DITC_CCPB2015_ADHOC_DRES_en_revised_29.01.2015.pdf

2.2. EL COMERCIO ELECTRÓNICO:

El tema del comercio electrónico ha focalizado la atención de los organismos de protección del consumidor en los últimos años. La legislación a ese respecto varía considerablemente de un país a otro. Mientras que países como El Salvador, México y el Perú se basan en el derecho civil general para incorporar los asuntos de comercio electrónico, Chile, Colombia, Francia, la Federación de Rusia y los Estados Unidos, por ejemplo, tienen disposiciones especiales en las leyes de protección del consumidor, y otros países han elaborado una legislación específica22. Entre los países que han reglamentado el tema, una característica común de los derechos de los consumidores en el contexto del comercio electrónico es el derecho inalienable a la devolución de la mercancía, del dinero y/o la rescisión del contrato.

En cuanto a los medios para que el consumidor obtenga reparación en el comercio electrónico, la mayoría de las legislaciones nacionales prevén procedimientos judiciales ordinarios. Entre las medidas administrativas que pueden adoptarse al respecto, cabe señalar que Colombia prevé la posibilidad de adoptar medidas cautelares importantes, como bloquear el acceso a las páginas web por un período inicial de 30 días mientras se adelanta la investigación (art. 54, Ley 1480). En cuanto a las medidas alternativas de solución de controversias, se han adoptado varias iniciativas innovadoras. Chile promueve la mediación colectiva en las reclamaciones relativas al comercio electrónico (artículo 58, ítem f, Ley N° 19.496). En 2008, México estableció “Concilianet”, un medio de conciliación en línea (registró 4.000 reclamaciones, un 95% de las cuales se resolvió mediante conciliación). Algunos países, como El Salvador prevén procedimientos de arbitraje en relación con esta cuestión (artículo 119, Ley de Protección al Consumidor).

Las diversas experiencias nacionales indican la necesidad de establecer y aplicar normas internacionales y de potenciar la cooperación internacional. Para abordar estos temas, la UNC-TAD utilizó como principales antecedentes normativos de los trabajos de la Organización para la Cooperación y el Desarrollo Económicos (OCDE) y de la Comisión de las Naciones Unidas para el Derecho Mercantil Internacional (CNUDMI).

De la OCDE se utilizaron como referencia la Directrices para la Protección de los Consumi-dores en el Contexto del Comercio Electrónico, de 199923, que abordan los siguientes temas: la protección transparente y efectiva (secc. I), equidad en las prácticas empresariales, publicitarias y de mercadotecnia (secc. II), información en línea (secc. III) —que también incluye la informa-ción sobre la empresa, los bienes o servicios y las transacciones— así como el procedimiento de confirmación (secc. IV) y los pagos (secc. V). La solución de controversias y las cuestiones de la reparación y resarcimiento y privacidad se abordan en las secciones VI y VII, respectivamente, mientras que la educación y concienciación del consumidor figuran en la sección VIII. Estas direc-trices de la OCDE incluyen también secciones relativas a la aplicación y la cooperación mundial. Además de las Directrices, se han elaborado orientaciones adicionales sobre el comercio móvil (las orientaciones de la OCDE sobre las nuevas cuestiones de protección y empoderamiento del consumidor en relación con aspectos del comercio electrónico)24, suplantación de identidad en

22 Los tres últimos ítems, en destaque, no forman parte de las Directrices de 1999. Cf: UNCTAD, Informe sobre la aplicación de las Directrices de las Naciones Unidas para la protección del consumidor (1985-2013), TD/B/C.I/CLP/23, pág. 20.

23 Disponible en: http://www.oecd.org/sti/consumer/34023811.pdf

24 Disponible en: http://www.oecd.org/sti/consumer/40879177.pdf

Revista Atitude · Faculdade Dom Bosco de Porto Alegre · Ano XI - No 22 - janeiro a junho de 2017 4544LAS DIRECTRICES DEL COMITÉ DE LAS NACIONES UNIDAS SOBRE COMERCIO Y DESARROLLO (UNCTAD) PARA LA PROTECCIÓN DE LOS CONSUMIDORES.

línea (recomendaciones de la OCDE en materia de suplantación de identidad en línea)25 y los ser-vicios de comunicación (recomendaciones de la OCDE para la protección y la emancipación de los consumidores de servicios de comunicación)26. Por fin, la importancia de los problemas especiales que plantea el comercio electrónico a los consumidores se tiene en cuenta en el capítulo 8 de las Líneas Directrices de la OCDE sobre Empresas Multinacionales27.

De los trabajos de la CNUDMI, La Ley Modelo sobre Firmas Electrónicas con las Guías de In-corporación al Derecho Interno (2001)28 ofrece un conjunto de reglas básicas comunes que rigen ciertos deberes de las partes interesadas en el proceso de autenticación y firma que pueden influir en la responsabilidad individual. Los problemas que se plantean en este ámbito preciso se derivan, en buena parte, por la incoherencia de las normas técnicas o la incompatibilidad del equipo o el software, por falta de interoperabilidad internacional.

A partir de los referidos antecedentes, la UNCTAD ha destacado la importancia de las nuevas tecnologías y el impacto que producen sobre la forma en que consumimos. En lo fundamental, la nueva directiva propuesta señala la necesidad de incrementar la información debida a los usuarios de este tipo de contratación:

“…Observando con satisfacción que el comercio electrónico puede ofrecer nuevos y cuantiosos beneficios a los consumidores, incluyendo comodidad, acceso a una gran variedad de bienes y ser-vicios, y la habilidad de reunir y comparar información sobre dichos bienes y servicios. Observando además que ciertas especificidades del comercio electrónico, tales como la facilidad y rapidez con la que las empresas y los consumidores se comunican y ponen sus intereses en riesgo, y por ello es importante que los consumidores y las empresas estén informadas y conscientes de sus derechos y obligaciones en el mercado electrónico…”29

En dos importantes directrices las Naciones Unidas pone en su justo contexto a las nuevas y asombrosas tecnologías que nos desbordan; ellas pueden ser utilizadas para el desarrollo de los consumidores o para aumentar el abusivo aprovechamiento que de ellos se suele hacer.

La tecnología puesta al servicio de la población es una verdadera bendición por los inestimables beneficios asociados a la ciencia. Pero, sin embargo, no debemos olvidar que la tecnología también puede ser causa y ocasión para mayores fraudes y abusos. Y por consecuencia, fueron propuestas cinco directrices para el comercio electrónico:

71. Los Estados Miembros deben promover los nuevos e importantes beneficios que el comercio electrónico ofrece a los consumidores, incluyendo la comodidad, el acceso a una amplia gama de productos y servicios, y la capacidad de reunir y comparar información sobre dichos productos y servicios. El comercio electrónico es cada vez más relevante para los consumidores en todo el mundo con computadoras, teléfonos móviles y dispositivos conectados que están transformando el mercado de consumo.

72. Los Estados miembros deben aprovechar las oportunidades que ofrece el comercio electróni-co, incluyendo el comercio móvil, para ayudar a facilitar el desarrollo económico y el crecimiento basado en las tecnologías de red emergentes. Los Estados Miembros deben trabajar para mejorar la confianza de los consumidores en el comercio electrónico mediante el continuo desarrollo de mecanismos transparentes y efectivos de protección al consumidor que garanticen un nivel de

25 Disponible en: http://www.oecd.org/sti/consumer/40879136.pdf

26 Disponible en: http://www.oecd.org/sti/consumer/40878993.pdf

27 Disponible en: http://www.oecd.org/daf/inv/mne/48004323.pdf

28 http://www.uncitral.org/pdf/spanish/texts/electcom/ml-elecsig-s.pdf

29 Disponible en: http://unctad.org/meetings/en/SessionalDocuments/DITC_CCPB2015_ADHOC_DRES_en_revised_29.01.2015.pdf

protección no sea menor al otorgado a otras formas de comercio.

73. Los Estados miembros deben revisar, cuando proceda, las leyes y marcos de protección al consumidor y adaptarlos a las características especiales del comercio electrónico, y garantizar que los consumidores y las empresas estén informados y sean conscientes de sus derechos y obligaciones en el mercado digital existente;

74. Los Estados miembros deben promover la oferta de productos de contenido digital en tér-minos no menos favorables que para otras formas de contenido. Las licencias deben permitir a los consumidores cambiar en tiempo, en espacio y en formato los productos de contenido digital, teniendo en cuenta las leyes aplicables nacionales y los tratados internacionales, en particular las que permitan el “uso justo” y el “uso privado”.

75. Los Estados Miembros tal vez deseen examinar las directrices y normas internacionales per-tinentes al comercio electrónico y las revisiones sobre las mismos, y, en su caso, adaptarlos a sus circunstancias económicas y sociales para que puedan adherirse a ellas, así como colaborar con otros Estados Miembros en su aplicación transfronterizas. Al hacerlo, los Estados Miembros tal vez deseen estudiar las Directrices para la Protección al Consumidor en el Contexto del Comercio Electrónico de la OCDE.30

2.3 OTROS TEMAS INCORPORADOS.

Además del comercio electrónico, el Capítulo V propuesto por el borrador de 2015 incluye otras directrices especiales sobre los siguientes temas: Resolución de conflictos y compensación (Di-rectrices 38 a 43); Prevención de conflictos y concienciación sobre mecanismos de resolución de conflictos dos Servicios Financieros (directrices 44 y 45); Estructuras internas para la protección del consumidor (directrices 46 a 49); Servicios financieros (directrices 76 a 80), etc. Debido a la extensión y complejidad de estas temas, serán abordados en estudios posteriores.

CONCLUSIÓN

La defensa de los consumidores responde tanto a razones económicas – derivadas de la forma de producción moderna y del tráfico mercantil – como a la adaptación de los textos constitucio-nales al estado actual de las sociedades occidentales, o lo que muchos llaman de sociedad del consumo. Es que el consumir se ha vuelto una condición de existencia digna en la sociedad. Por ello que la consideración y la calificación jurídica del acto de consumir y de las relaciones jurídicas del consumo imponen la necesidad del reconocimiento universal.

Para lograr una auténtica protección de los consumidores y usuarios es fundamental que las naciones sigan las Directrices de la ONU para la protección del consumidor y las incluyan en sus textos constituciones. Es solo con su inclusión que los derechos del consumidor se convierten en una cuestión de Estado.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

Bibliografía

30 Disponible en: http://unctad.org/meetings/en/SessionalDocuments/DITC_CCPB2015_ADHOC_DRES_en_revised_29.01.2015.pdf

Revista Atitude · Faculdade Dom Bosco de Porto Alegre · Ano XI - No 22 - janeiro a junho de 2017 4746LAS DIRECTRICES DEL COMITÉ DE LAS NACIONES UNIDAS SOBRE COMERCIO Y DESARROLLO (UNCTAD) PARA LA PROTECCIÓN DE LOS CONSUMIDORES.

BATTELLO CALDERON, Silvio Javier, SHINA, Fernando Ezequiel. Fundamentos para la Protección del Consumidor. San José: Editora Jurídica Continental, 2016.

FARINA, Juan M. Ley del Defensa del Consumidor y del Usuario. Buenos Aires: Astrea, 2008.

LORENZETTI, Ricardo Luis. Consumidores. Buenos Aires: Rubinzal – Culzoni, 2009.

Páginas de internet

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http://www.oecd.org/sti/consumer/34023811.pdf

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http://www.oecd.org/sti/consumer/40878993.pdf

http://www.oecd.org/daf/inv/mne/48004323.pdf

http://www.uncitral.org/pdf/spanish/texts/electcom/ml-elecsig-s.pdf

Documentos de trabalho

UNCTAD, Informe sobre la aplicación de las Directrices de las Naciones Unidas para la protección del consumidor (1985-2013), TD/B/C.I/CLP/23, pág. 7.

UNCTAD, E/1999/INF/2/Add.2, resolución 1999/7, anexo.

DO CERRADO MATO-GROSSENSE AS TERRAS LUSITANAS: A AUTOGESTÃO MULTICULTURAL DO

CONHECIMENTO

Paula Cristina Pedroso Moi1

Cecília Arlene Moraes2

RESUMO

A relevância da diversidade cultural e a gestão do conhecimento tende a imperar nas organizações, porque proporciona melhor relacionamento funcional e maior desempenho profissional em um mundo globalizado. O objetivo deste estudo descreve a estratégia de autogestão do conheci-mento, por meio do processo de intercâmbio estudantil internacional pelo espírito empreendedor de uma acadêmica do Curso de Administração que investiu em sua carreira profissional como estratégia de alçar outros es-tudos e experiências de cunho internacional na Universidade de Minho (UMinho), Braga, Portugal. Este estudo se apoia no empreendedorismo, inovação e gestão do conhecimento. Trata-se de uma pesquisa descritiva, participante, transversal que narra fatos vivenciados e de conhecimentos obtidos no exterior envolvendo a presença ativa da pesquisadora. O re-sultado desse estudo tende a incentivar atitude empreendedora de aca-dêmicos em busca da autogestão do conhecimento multicultural para se diferenciar no mercado competitivo.

PALAVRAS-CHAVE: Empreendedorismo. Autogestão. Gestão do Conheci-mento. Intercâmbio Educacional Internacional. Multiculturalismo.

ABSTRACT

The importance of cultural diversity and knowledge management tends to prevail in organizations because it provides better working relationship and greater professional performance in a globalized world. The purpose of this study describes the strategy of self-knowledge through the process of international student exchange by the entrepreneurial spirit of acade-mic administration course that invested in her career as a strategy to raise other studies and international nature experiences at the University of Mi-nho (UMinho), Braga, Portugal. This study is based on entrepreneurship, innovation and knowledge management. It is a descriptive, participant and transversal research which narrates experienced facts and knowledge obtained abroad involving the active presence of the researcher. The re-sult of this study tends to encourage entrepreneurial attitude of scholars in search of self-management of multicultural knowledge to differentiate

1 Mestranda em Agronegócios e Desenvolvimento Regional pela UFMT. E-mail: [email protected]

2 Doutora em Psicologia pela Pontifícia Universidade Católica de Goiás. E-mail: [email protected]

Revista Atitude · Faculdade Dom Bosco de Porto Alegre · Ano XI - No 22 - janeiro a junho de 2017 4948 DO CERRADO MATO-GROSSENSE AS TERRAS LUSITANAS: A AUTOGESTÃO MULTICULTURAL DO CONHECIMENTO.

themselves in the competitive market.

KEYWORDS: Entrepreneurship. Self-management. Knowledge manage-ment. International Educational Exchange. Multiculturalism.

INTRODUÇÃO

A gestão do conhecimento vem chamando atenção das organizações. Pois, se trata de uma área que proporciona maior desempenho profissional quando relacionada à teoria das organi-zações, sistemas de informação e gestão estratégica. Nesse sentido, a escolha da acadêmica do Curso de Administração em investir em sua carreira profissional se fundamentou no cenário de um mercado cada vez mais competitivo, globalizado que demanda por profissionais qualificados, somados ao espírito empreendedor.

De acordo com Mazza (2009), a vivência internacional é componente importante na análise dos sistemas nacionais de educação, estratégia de diferenciação no mercado de diplomas e na formação de setores profissionais. Num sentido mais amplo, Dalmolin et al. (2013) afirmam que, o intercâmbio pode ser entendido como forma de trocar informações, crenças, culturas, conhe-cimentos. Portanto, viver em outro país oportuniza conhecer hábitos diferentes e específicos, evidencia novas perspectivas e auxilia na superação de dificuldades. Pois, o intercambista precisa se adaptar ao ambiente, enfrentar desafios e crescer (SOUZA, 2008).

Seguindo esse pensamento, observa-se que as práticas vividas, pelo qual os intercambistas vivenciam, são extremamente importantes, agregando valores ao crescimento profissional e pes-soal, através do tripé ensino, cultura, e gestão do conhecimento. Contudo, Dalmolin et al (2013) afirmam a necessidade de estar preparado para este empreendimento, pois a iniciativa requer muita paciência, abnegação e capacidade de contornar os imprevistos. Além da distância de seus familiares, dos amigos, as variantes culturais, climáticas, de hábitos e de valores.

O intercâmbio também proporciona multiculturalismo, segundo Lima e Maranhão (2011), ad-vém da internacionalização do ensino superior, a partir de interações com pessoas de diferentes origens e culturas, ensejando alunos mais críticos e reflexivos, em busca de conhecer distintas visões sobre o mundo. Na ciência da Administração, de acordo com Rodrigues (2008), esse de-senvolvimento exigiu metáforas completamente novas para representar o potencial e intenções subjacentes a essas mudanças.

Quando Nonaka e Takeuchi (1996) sustentaram a metáfora da “companhia que cria conheci-mento”, afirmaram que as empresas aprendem não apenas por meio das mentes como também com seus “corpos”. Aprender significa ajustar a identidade ao novo conhecimento, uma vez que isso envolve compromisso emocional, discernimento e intuição. Está metáfora serve como lastro na justificativa e relevância da iniciativa internacional de autogestão do conhecimento acadêmico, com a pertinência da resiliência ao novo ambiente. O inesperado agrega valor ao processo, a conexão concreta com pessoas de diferentes etnias, crenças, valores e saberes, da paisagem inusitada e estruturas organizacionais distintas, transbordam em envolvimento emocional e transformação comportamental com elevada responsabilidade em ser no mundo.

Mintzberg, na visão de Terra (2005), foi um dos primeiros teóricos organizacionais a trazer a questão do real processo de aprendizado individual e da intuição para o centro das atenções da

teoria gerencial. Sua pesquisa mostrou que a intuição ou conhecimento implícito tem um papel fundamental sobre o processo real utilizado pelos gerentes na tomada de decisões, processa-mento e difusão de informação.

Como estudo de período transversal a experiência se realizou durante o período de seis me-ses no ano de 2014. Trata-se de um intercâmbio, proporcionado pelo Programa de Intercâmbio Internacional de Graduação (PIIG), oferecido pela Universidade Federal de Mato Grosso (UFMT). O subsidio deste programa prevê a isenção das taxas acadêmicas por parte da universidade anfitriã, sem gozo de bolsa auxílio para despesas de moradia, transporte e alimentação.

A idealização do projeto começou em agosto de 2013, logo após a publicação do Edital SECRI 004/2013 através da Secretaria de Relações Internacionais (SECRI) da UFMT, em 28 de maio de 2013. Aprovada no processo interno de seleção, o plano de estudos foi enviado à Secretaria de Relações Internacionais (SRI) da Universidade do Minho (UMinho). A condição de aceite de estu-dantes estrangeiros foi o cumprimento da matrícula em pelo menos 30 European Credit Transfer and Accumulation System (ECTS), ou seja, Sistema Europeu de Acumulação e Transferência de Créditos por período, desses, 60% dos ECTS foram ofertados pela Escola de Gestão da UMinho.

Portanto, este estudo tem o objetivo de analisar a atitude empreendedora inovadora no pro-cesso de autogestão do conhecimento de uma estudante do curso de Administração em edificar sua formação profissional com elementos diferenciados, ao agregar valor em seu currículo in-tercalado por saberes e vivências extraordinárias, na tentativa de ser um profissional competente diferenciado, requerido por mercado extremamente exigente e competitivo.

Para o cumprimento deste, o trabalho se divide em cinco partes, incluindo esta introdução. O próximo tópico trará um referencial teórico que aborda os temas sobre a globalização como consequência da pós-modernidade, o multiculturalismo como consequência da globalização, a gestão da diversidade cultural, o empreendedorismo e inovação e também sobre a gestão do conhecimento e o ensino da Administração. A terceira parte trará a metodologia seguida pelos resultados da análise da experiência através da literatura sobre a gestão do conhecimento. E por fim, as considerações finais.

2. FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA

Com o fim da União Soviética (1989-1991) segundo Ribeiro (2006), o sistema mundial passou por transformações, terminado o período da Guerra Fria e inaugurado o atual momento que pode ser chamado de “era da globalização realmente existente”, criando fluxos cada vez mais complexos de mercadorias, pessoas e informação, redefinindo as relações entre espaços globais fragmentados – o local e o global. Justamente, por ser um processo de integração cultural, social e econômica entre territórios distintos no planeta. Passos e Santos (2005) complementam – o fenômeno da globalização já se concretizou em nossa realidade social e econômica. Nesse sentido, torna-se necessário uma discussão sobre a consequência da pós-modernidade, que é a globalização.

2.1. GLOBALIZAÇÃO CONSEQUÊNCIA DA PÓS-MODERNIDADE

O conceito de globalização não descreve exclusivamente por um exato instante ou circunstância,

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mas sim por ser um processo. Nesse sentido, sua característica fundamental é estar em constante transformação e ascensão, fazendo com que no decorrer do tempo à integração mundial gerada seja cada vez maior. De acordo com Passos e Santos (2005), trata-se de um fenômeno interna-cional, cujo “início” foi superficialmente “decretado” após a chamada Guerra Fria; entretanto, ao contrário dessa noção popular, trata-se de um processo antigo que tomou grandes proporções em nossos dias, neste “terceiro milênio”. Segundo Ribeiro (2006), esse fenômeno reforçou as contradições entre segmentos étnicos e o poder do Estado-nação. Multiculturalismo e políticas da diferença foram internacionalizados, reforçando, assim, movimentos políticos “nativos” e a culturalização da política.

As recentes publicações demonstram a relevância do pós-modernismo e da investigação con-temporânea na teoria social, parecem convergir na conclusão de que existe o crescente declínio da preocupação com a moderna/pós-moderna problemática e sua substituição gradual pela noção de globalização (ALBROW, 1997; TOMLINSON, 2002).

A homogeneidade ao nível espacial produz uma incapacidade de conceber a contemporaneidade como uma ruptura radical com o passado, asseguram Lizardo e Strand (2010). A explicação é que há reticência de conceber o pós-moderno com um significado tão radical como uma ruptura com o moderno, a partir da “tradição” na teoria clássica, e por análise marxista da pós-modernidade como a lógica cultural do capitalismo (global). As mudanças daí decorrentes terão enorme impacto nos modos de aprender e fazer do ser humano. A revolução da informação poderá modificar de forma permanente a educação, o trabalho, o governo, os serviços públicos, o lazer, as formas de organizar a sociedade e, em última análise, a própria definição de entendimento humano (JAM-BEIRO, 1994).

Aprofundando mais o significado da perspectiva multicultural pós-colonial ou pós-moderna, Hall (2003) sugere que “há uma íntima relação entre o ressurgimento da ‘questão multicultural’ e o fenômeno do ‘pós-colonial’”. De acordo com Canen e Xavier (2011), a visão pós-colonial assume a condição das diásporas e dos deslocamentos que ocorrem no mundo pós-colonização, com forte influência na construção e reconstrução das identidades culturais. Nessa perspectiva, em virtude da globalização as identidades culturais são influenciadas pela troca de informação e costumes, gerando o multiculturalismo, assunto abordado na próxima seção.

2.2. MULTICULTURALISMO CONSEQUÊNCIA DA GLOBALIZAÇÃO

A expressão multiculturalismo advém do convívio harmônico entre uma diversidade de culturas e tenta explicar como sociedades tão diferentes convivem entre si. Segundo Canen e Oliveira (2002), esse tema tem sido trazido à tona nos debates atuais com intensidade. Referindo-se à necessidade de compreender a sociedade constituída de identidades plurais, com base na diversidade de etnia, gênero, classe social, padrões culturais e linguísticos, habilidades e outros marcadores identitário.

A questão da identidade foi discutida na teoria social por Hall (1999) afirmando que as velhas identidades, que por tanto tempo estabilizaram o mundo social, estão em declino. Surgem novas identidades fragmentando o indivíduo moderno, até aqui visto como um sujeito unificado. Assim, a chamada “crise de identidade” é vista como parte de um processo mais amplo de mudança,

que está deslocando as estruturas e processos centrais das sociedades modernas e abalando os quadros de referência que davam aos indivíduos uma ancoragem estável no mundo social. Ainda de acordo com o autor, o próprio processo de identificação, através do qual nos projetamos em nossas identidades culturais, tornou-se mais provisório, variável e problemático. O sujeito assume identidades diferentes em diferentes momentos, identidades que não são unificadas ao redor de um “eu” coerente.

De acordo com Canen e Oliveira (2002), o projeto multicultural, insere-se em uma visão pós--moderna de sociedade, onde a diversidade, a descontinuidade e a diferença são percebidas como categorias centrais, contrapondo-se à percepção moderna e iluminista da identidade como uma essência, estável e fixa, o multiculturalismo percebe-a como descentrada, múltipla e em processo permanente de construção e reconstrução.

Por certo, percebe-se então a globalização, vista de uma maneira generalizada, como parte integrante de um processo multicultural que por hora não se pode concluir se o caminho a seguir pela humanidade é de natureza positiva ou negativa. Pois, ao mesmo tempo em que desconstruí-mos identidades para transformar e melhorar a capacidade do ser humano, também deixamos aspectos culturais enterrados sobre inovações tecnológicas cada vez mais interligadas. Porém, com tanta diversidade de identidades e culturas ocasionadas pela globalização, se torna neces-sário uma gestão adequada da diversidade cultural, tema que será discutido no próximo tópico.

2.3. GLOBALIZAÇÃO CULTURAL: GESTÃO DA DIVERSIDADE CULTURAL

A cultura de uma nação é uma forma distintivamente moderna de identidade. Para Hall (1999), a lealdade e a identificação na era pré-moderna, ditas sociedades mais tradicionais, eram dadas à tribo, ao povo, à religião e à região, foram transferidas, gradualmente, nas sociedades ocidentais, à cultura nacional. Dessa e de outras formas, a cultura nacional se tornou uma característica-chave da industrialização e um dispositivo da modernidade.

No multiculturalismo a noção de cultura é um aspecto essencial para o desenvolvimento de uma análise das relações sociais e seus determinantes. Segundo Canen e Xavier (2011), esse fato implica um novo olhar sobre o papel constitutivo e central da cultura na sociedade e na formação das identidades. A identidade, de acordo com Hall (1999), surge não tanto da plenitude da identi-dade que já está dentro de nós como indivíduos, mas de uma falta de inteireza que é “preenchida” a partir de nosso exterior, pelas formas através das quais nós imaginamos ser vistos por outros.

Para Alves (2010), uma nova dinâmica foi intensificada nos fluxos informacionais e comuni-cacionais em todo o mundo, tendo em vista a totalidade dos processos que concorreram para engendrar a chamada globalização cultural. O crescimento dos mercados culturais mundiais e a expansão dos fluxos simbólicos globais, segundo Mattelart (2005), geraram a sensação generalizada de que o mundo estaria passando por um processo acelerado de homogeneização e padronização cultural. Acontecimento esse que, Jameson (2006) conceituou como explosão da cultura, pois a sensação de que a cultura estaria em todos os lugares ao mesmo tempo. Portanto, de acordo com Yúdice (2004), a globalização cultural estaria, assim, potencializando as antigas e já profundas assimetrias da divisão internacional do trabalho cultural.

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Em 2005, a União Europeia, sob a liderança do Ministério da Cultura francês, lançou um pro-grama de política cultural continental, assinado por 24 ministros europeus da cultura, com vista a desenvolver um minucioso mapeamento cultural do continente. Conforme Alves (2010), possuía como objetivo central preservar e promover essas diferenças culturais, chamando atenção para as identidades culturais locais do mesmo. Nesse sentido, em nome da defesa da diferença e da diversidade cultural foram criadas inúmeras instituições culturais e políticas (organizações na-cionais ligadas a entidades da sociedade civil, organizações não governamentais, locais, nacionais e transacionais, entidades de artistas, produtores culturais e governos em geral) empenhadas na luta pela defesa e promoção da identidade cultural e da diversidade cultural em âmbito local, nacional e transnacional, desdobrada na luta pela defesa e promoção de diversas formas de re-conhecimento identitário o sexual, étnico e racial.

As questões que envolvem a diversidade cultural brasileira, para Canen e Xavier (2011), têm sido alvo de inúmeros estudos na última década no cenário educacional, pois cada vez mais conceitos como diversidade, diferença, igualdade e justiça social têm se configurado como uma preocupação por parte daqueles que lutam por uma educação verdadeiramente cidadã. Paralelamente a esta preocupação, existe a apreensão em articular tais conceitos à formação de acadêmicos tornan-do-se um desafio premente para a educação e para as instâncias envolvidas nesse processo.

O tema diversidade cultural, segundo Fleury (2012), pode ser estudado em diferentes perspec-tivas: no nível da sociedade, no nível organizacional e no nível do grupo ou indivíduo. Os padrões culturais, expressando valores e relações de poder, precisam ser referenciados e analisados em todos os níveis. Focando ao nível organizacional, implicaria no ensino gestão da diversidade cul-tural na Administração, que de acordo com Tomlinson (2002), implica adotar um enfoque holístico para criar um ambiente organizacional que possibilite a todos o pleno desenvolvimento de seu potencial na realização dos objetivos da empresa. Considerando o enfoque mais pragmático, Fleury (2012) afirma que a gestão da diversidade cultural foi uma resposta empresarial à diversificação crescente da força de trabalho e às necessidades de competitividade. Para administrar toda essa diversidade, é necessária também a resiliência do empreendedor, para enfrentar disparidades com dinamismo e inovação. Portanto, no próximo tópico será discutida a relação entre o empreen-dedorismo e a inovação como dimensões psicológicas que afetam o comportamento dos agentes.

2.4. EMPREENDEDORISMO E INOVAÇÃO

A teoria do empreendedorismo se funda na teoria econômica, quando o economista Schumpeter (1982) tentou compreender o papel do empreendedor e o seu impacto na economia. O empreen-dedorismo está relacionado à inovação, em processo de criar algo novo ou de reinventar algo já existente. O conceito de empreendedorismo se intensificou no Brasil na década de 1990.

Na visão de Baron e Shane (2007, p. 7)

“O empreendedorismo envolve reconhecer a oportunidade para criar algo novo e isso não precisa ser um novo produto ou serviço ... pode se tratar de reconhecer uma oportunidade para desenvolver um novo mercado, usar uma nova matéria-prima ou desenvolver um novo meio de produção [...] o empreendedorismo requer a criação ou o reconhecimento de uma

aplicação comercial para uma coisa nova.”

Contudo, pesquisadores afirmam que ainda não há um conceito teórico universal ou teoria consolidada da identificação do que é “ser empreendedor”, assim Souza (2001, p.30) destaca que o conceito de empreendedorismo está em fase de criação, com metodologia para o desenvolvi-mento dessa competência, porque envolve bem mais do que a aquisição de conhecimento, mas o aprender a aprender, a ser, a fazer e, principalmente, a conviver.

Segundo Dornelas (2005), no mundo atual impera a era do empreendedorismo, considerado o marco significativo da revolução do século XX, porque são os empreendedores que eliminam barreiras comerciais, culturais, encurtam distâncias, globaliza e renova conceitos econômicos, cria novas relações de trabalho e novos empregos, quebra paradigmas e gera riqueza para a sociedade com uso de tecnologias formando teias com suas conexões.

Assim como nos Estados Unidos, Dornelas (2005) assegura que no Brasil o empreendedorismo está sendo tratado com a devida importância, em busca da formação profissional de candidatos a empreendedor. Escolas e universidades tende a criar cursos, disciplinas a respeito da temática, compreendendo que os empreendedores são os propulsores da economia e transformação social.

De abrangência mundial, o programa de pesquisa Global Entrepreneurship Monitor (GEM), iniciou em 1999 com 10 países, com o propósito de investigar anualmente o nível nacional da atividade empreendedora, em parceria com a London Business School, da Inglaterra e o Babson College, dos Estados Unidos. No mundo, mais de 80 países já participaram do programa GEM, conside-rado o maior estudo contínuo sobre a dinâmica empreendedora. Envolve a exploração do papel do empreendedorismo no crescimento econômico nacional e revela a riqueza das característi-cas associadas com atividade empreendedora. Segundo o Instituto de Brasileiro de Qualidade e Produtividade (IBQP) (2016), o GEM estuda, em nível detalhado, o comportamento dos indivíduos com respeito à criação e gerenciamento de novos negócios. Os dados e informações gerados pela pesquisa enriquecem sobremaneira o conhecimento sobre a atividade empreendedora, além do que é encontrado nos dados oficiais dos países.

Importante considerar que a intenção de empreender, envolve dimensões psicológicas que afetam o comportamento das pessoas. De acordo com Ajzen (1991) a teoria do comportamento planejado, tenta predizer e explicar o comportamento humano em contextos específicos postulando três determinantes que independem da intenção. O primeiro é a atitude para o comportamento, refere-se ao grau de avaliação pessoal, que poderá ser favorável ou desfavorável. O segundo, o fator social, ou seja, a pressão social, denominada de norma subjetiva, percebida no desempenho ou não do comportamento esperado. E, por último a percepção de controle comportamental, sua facilidade ou dificuldade em desempenhar um determinado comportamento.

Ajzen (1991) assegura que as crenças exercem papel relevante no comportamento, influen-ciando as intenções e as ações, por meio das crenças comportamentais que atua na atitude do comportamento, crenças normativas, base das normas subjetivas e as crenças de controle proveem as bases para a percepção do controle do comportamento. Com todo esse novo conhecimento sendo gerado, transformando o ser humano, é necessário filtrar e gerir informações no sentido

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de inovar e construir e o que é melhor para si, através da gestão do conhecimento, assunto dis-cutido na próxima seção.

2.5. GESTÃO DO CONHECIMENTO

A sociedade atual é considerada a “sociedade do conhecimento, na qual o conhecimento é o principal recurso para os indivíduos e para a economia geral” (DRUCKER, 1997). Observa-se uma inversão nos valores sociais com relação às instituições conservadoras (sociedade, comunidade e família), que representam o alicerce e a estabilidade na formação dos indivíduos.

Para Passos e Santos (2005), o momento é da sociedade de organizações, e a organização moderna é desestabilizadora, objetivando exclusivamente a inovação. Nessa perspectiva, os indi-víduos são atropelados por informações, inovações, competições, tensões, e impelidos a buscar o conhecimento necessário à sua interação social. Consequentemente, a gestão do conhecimento, no ponto de vista percebido por Leite (2007), surge e tem como habitat natural as organizações empresariais e, como objeto, o conhecimento organizacional. Portanto, a universidade, como o celeiro principal da produção do conhecimento científico, constitui um campo fértil para a apli-cação e o estudo da gestão do conhecimento. Contudo, ainda pouco se tem dito sobre a relação entre a comunicação científica e a gestão do conhecimento natural do ambiente acadêmico, o conhecimento científico.

Uma comunicação efetiva, segundo Ash (2000), é essencial para qualquer programa de gestão do conhecimento. Por um lado, segundo Leite (2007), a gestão do conhecimento como disciplina, sistematiza e torna mais efetivos os processos de comunicação. Em vista disso, Fujihara (2009) assegura que, a gestão do conhecimento deve servir como linha norteadora das ações estratégicas e por isso define-se a gestão estratégica do conhecimento como sendo a tarefa de identificar, desenvolver, disseminar e atualizar o conhecimento estrategicamente relevante para a empresa.

Como produto interdisciplinar, complexo e multifacetado, Alvarenga Neto (2008) reitera que o conhecimento permeia toda a organização e atinge todos os níveis estruturais da empresa: o operacional, o tático e o estratégico. Forma-se a rede da gestão do conhecimento, permeando todas as dimensões da empresa.

O fator essencial para acrescentar valor e criar vantagens competitivas para uma organização é a correta gestão da informação e a sua implantação na estratégia empresarial. Principalmente pelo fato de, auxiliar a empresa a identificar oportunidades e se preservar diante de ameaças. O mundo globalizado, segundo Passos e Santos (2005), tem na informação o seu “termômetro”. Obter informações é prioridade, tanto nos países desenvolvidos, como em países em desenvol-vimento, pelo fato de ser a informação o determinante principal para a construção de “sistemas sociais e econômicos”.

De acordo com Moore (1999), a sociedade baseada na informação apresenta as seguintes características: utiliza a informação como recurso econômico, pois é onde ocorre o maior uso da informação pelo público em geral; determina o desenvolvimento da informação na economia que tem como função satisfazer a demanda geral de meios e serviços de informação.

A questão maior, segundo Passos e Santos (2005), diante de uma sociedade abalizada na bus-ca incessante de informações, onde a globalização não impõe limites profissionais, o indivíduo deve buscar aperfeiçoamento constante, para continuarem inseridos no mercado de trabalho. O compartilhamento de informações e conhecimentos, de acordo com Alvarenga Neto (2008), ocorre com mais facilidade quando há uma formação de rede de relacionamento que permite a formação das redes de conhecimento. Afirma ainda que a Gestão do Conhecimento se consoli-dou como uma grande área que incorpora conceitos da Ciência da Informação, Administração e Ciência da Computação.

Como demonstra o resultado de sua pesquisa, Fujihara (2009) conclui que o nível estratégico é reconhecido na administração como o nível do topo da pirâmide, onde estão os principais exe-cutivos da organização e onde são tomadas as principais decisões da empresa no processo de planejamento estratégico. Além da participação de estrategistas e dirigentes que utilizam cons-tantemente métodos e técnicas da administração para facilitar o trabalho de pensar estrategica-mente. Prahalad e Hamel (1998) defendem que as empresas precisam ter aspiração amplamente compartilhada, envolvendo, inclusive, a geração mais jovem da empresa, em vez da decisão ser apenas da alta administração.

Particularmente nas economias em desenvolvimento, as matrizes estrangeiras, frequente-mente, fornecem tecnologia, e também são vistas como portadoras do Know-how administrativo e gerencial que falta aos gerentes e às organizações locais (CHILD; MARKOCZY, 1993). Nesse sentido, Klossek et al. (2008) conceituam a joint venture internacional (JVI) como uma combina-ção organizacional de colaboração envolvendo pelo menos três empresas distintas, sendo que no mínimo duas empresas devem ser sócias de países diferentes e uma é a própria joint venture. O objetivo da JVI de acordo com Eisele (1995) é o compartilhamento de riscos financeiros e de responsabilidade pela administração da pessoa jurídica independente. Segundo Lyles (2008), um elemento chave para aquisição de conhecimento é a capacidade de ensino da matriz: são essas condições que facilitam o compartilhamento do conhecimento e da tecnologia da matriz ou da parceira estrangeira.

3. METODOLOGIA

Acostumada ao cerrado mato-grossense a acadêmica do curso de Administração com espírito empreendedor cruzou o Atlântico para vivenciar o processo da gestão do conhecimento na Uni-versidade do Minho (UMinho) localizada no distrito de Braga, Portugal, para seu aperfeiçoamento profissional.

Este ensaio é uma Pesquisa Participante, transversal. Segundo Harguette (2011) a ideia de participação envolve a presença ativa do pesquisador e de certa população em projeto comum de investigação, simultaneamente é um processo educativo, produzido dentro da ação ao levar em consideração três componentes constitutivos da própria pesquisa participativa: o processo de investigação, de educação e de ação. É a metodologia que procura incentivar o desenvolvimento autônomo (autoconfiança) a partir das bases e relativa independência do exterior (BORDA, 1998).

A revisão bibliográfica foi realizada para sustentar a narração da experiência como intercambista

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internacional e seu processo de autogestão do conhecimento. Leite (2007), afirma que a gestão do conhecimento como disciplina, sistematiza e torna mais efetivos os processos de comunicação. Nesse sentido, a socialização do saber permite a viabilização da gestão do conhecimento, pois possibilita, dentre outros processos, a interação entre indivíduos e, por consequência, a criação, troca e compartilhamento do conhecimento.

O processo de autogestão do conhecimento nasceu do despertar da consciência da acadêmica, do mundo globalizado e da necessidade de aperfeiçoar seus conhecimentos. Após a publicação do Edital do Programa de Intercâmbio Internacional de Graduação (PIIG), oferecido pela Universidade Federal de Mato Grosso (UFMT), buscou por diversas fontes e virtualmente conhecer os locais prováveis que poderiam agregar valor a sua formação profissional.

Com a decisão do local, iniciou-se a investigação mais refinada do país, da cidade, de seus costu-mes e da Universidade de Minho (UMinho). As vivências, observações e atividades foram realizadas entre os anos de 2013 e 2014, subdividindo-se em duas etapas: o período de preparação – entre setembro de 2013 e janeiro de 2014 – e da mobilidade – entre fevereiro de 2014 e Julho de 2014.

No período de mobilidade, realizou-se o estudo em cinco disciplinas: 1. Administração e Polí-ticas da União Europeia; 2. Competências Sociais e Empregabilidade; 3. Gestão do Conhecimento e da Inovação; 4. Introdução à Gestão Financeira; e 5. Logística. Além, de participar de atividades como: palestras, cursos, workshops e visita técnica. Nestas atividades, buscou-se o conhecimen-to explícito, conceituado por Cassapo (2004), como um conhecimento “objetivo” e mais simples de ser codificado, ou seja, formalizado com palavras, números e fórmulas, para ser transmitido rapidamente e em grande escala. Geralmente, é percebido como teórico e sua transmissão pode ser realizada muito formalmente.

A busca pelo conhecimento continuou em outros dez países da União Europeia, do continente Africano e da América do Norte, objetivando a aprendizagem histórica e cultural de cada país. Através do conhecimento tácito, visto por Cassapo (2004) como, muito pessoal e difícil de ser codificado, ou seja, expresso por palavras. Por essência, é prático e é geralmente fruto de uma longa experiência e convivência. Sua transmissão é extremamente complexa, porque requer interações prolongadas, de acertos e erros.

O estudo pode ser considerado um farol, para acadêmicos, ao fomentar o sonho, o desejo de elevar sua competência profissional no exterior, pelo processo de autogestão do conhecimento, servindo de guia na narrativa das vivências internacionais realizadas.

4 RELATO DA EXPERIÊNCIA

A escolha pela Universidade no Minho considerou o posicionamento da universidade em ranking internacional de educação no ano de 2013, a UMinho ocupava a 76ª posição entre as 100 melhores universidades com menos de 50 anos a nível mundial, ranking este construído pela Times Higher Education. Já no ano de 2014, a UMinho reforçou a sua posição na 75ª colocação, porém, tornando-se a melhor universidade portuguesa.

No período de adaptação a nova rotina, a Secretaria de Relações Internacionais (SRI) da Uni-

versidade do Minho teve papel importante, foi a responsável pela recepção dos alunos estrangei-ros, introdução desse aluno ao sistema da universidade – que contemplava o acesso ao sistema acadêmico e a internet por todos os campus e alojamentos das universidades que compõem a União Europeia – e orientações da oferta de vagas nas residências universitárias.

4.1. A IMPORTÂNCIA DA ERASMUS STUDENT NETWORK (ESN) NO PROCESSO DE ADAPTAÇÃO EM PORTUGAL.

A Erasmus Student Network (ESN) é a maior associação de estudantes na Europa, nasceu em 16 de outubro de 1989, porém foi legalmente registrada em 1990. O programa Erasmus tem como objetivo apoiar e desenvolver o intercâmbio de estudantes em período de adaptação no novo ambiente, por meio de atividades nas seções locais, que incluem eventos culturais e sociais, tais como viagens para vários lugares dentro do país, noites de cinema, projetos linguísticos, festivais gastronômicos internacionais e por último, mas não menos importante, as festas. Além disso, muitas seções já introduziram sistemas de mentores, que ajudam os estudantes estrangeiros em sua integração acadêmica e nas atividades práticas.

A apresentação dessa associação aos estudantes estrangeiros foi realizada pela SRI, em data previamente marcada, em reunião de boas vindas. Os estudantes intercambistas, são denominados de Erasmus. Havia benefícios ao se associar a ESN Minho, gozavam de descontos em restaurantes, viagens e festas. Participando dessas atividades, a acadêmica pode conhecer outros alunos inter-cambistas brasileiros, como também de outras partes do mundo. Esta integração possibilitou a utilização de outros idiomas, como o espanhol e o inglês. No campo social e cultural a conquista de amizades, revelou conhecimentos geográficos e culturais de outras cidades portuguesas através das viagens disponibilizadas pela associação e atividades de voluntariado.

Em abril foi promovida a ação voluntária no Centro de Atendimento a Toxicodependentes (CAT), em Braga, Portugal. O local é estruturado, organizado, limpo e agradável, com atividades frequentes de saúde e de promoção social, as refeições são preparadas com esmero, o tratamen-to é respeitoso, para com pessoas com dependência química, buscando a sua ressocialização. As ações pautadas no CAT se inserem em três vertentes: saúde, social e ambiental. Em contato com as pessoas atendidas pelo Centro, evidenciou grande capacidade dos cidadãos portugueses atendidos, de pensamento e de expressão, falavam inglês fluente o que facilitou a compreensão por parte dos estudantes estrangeiros que não sabiam falar português. A experiência provocou profunda reflexão e foi muito gratificante.

A participação da ESN, no período de adaptação, no que tange a socialização, integração e ajuste na rotina da cidade de Braga foram de suma importância. Portanto, a relação de colaboração que envolveu a SRI, ESN e a própria estudante em um ambiente novo pode ser associada ao conceito de joint venture internacional (JVI) de Klossek et al. (2008), abordado no referencial teórico ante-riormente. Uma JVI envolve pelo menos três agentes distintos, sendo que estes devem pertencer a países diferentes e a outra parte é a própria joint venture, no caso a estudante. Algumas das motivações que estimulam o surgimento de uma JVI são as superações de obstáculos em um novo mercado/cenário a ser conhecido, as vantagens no desenvolvimento de novos conhecimentos e

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acesso a tecnologias, além de auxiliar a competição mais eficiente no mercado.

4.2. ATIVIDADES EXTRACLASSES, A EXPERIÊNCIA INOVADORA

As atividades extraclasse em Portugal foram realizadas através do programa de desenvolvimento de competências transversais da Escola de Economia e Gestão (EEG), da UMinho, chamado de EEGenerating Skills. Este programa pretende ser gerador de competências transversais, geradoras de oportunidades de sucesso individual e profissional. O desenvolvimento destas competências, úteis e aplicáveis transversalmente à generalidade das ocupações e áreas do conhecimento con-tribuiu para uma melhor integração e desempenho no mercado de trabalho.

Para participar, o intercambista deve se cadastrar na página do EEGenerating Skills, por meio do número de registro do aluno, obtido quando matriculado na instituição do sistema da comuni-dade europeia. Nesse sentido, os alunos podem verificar as atividades complementares que serão desenvolvidas durante o semestre, seguido de seu conteúdo e das vagas ofertadas. Depois da análise, os acadêmicos podem se inscrever nas atividades de seu interesse e esperar até a data final da inscrição, onde, podem ou não, obter a confirmação da participação, levando em conta a quantidade de vagas, a ordem de inscrição e as desistências ocorridas. Estas experiências foram valorosas no processo da construção de saberes.

Sugere-se que as Faculdades do Curso de Graduação em Administração brasileiras construam um ambiente virtual, onde possam planejar atividades extracurriculares para seus alunos, buscando a participação e o aprimoramento de suas competências profissionais. Pois, como descrito por Passos e Santos (2005), o “termômetro” do mundo globalizado é a informação. Nesse sentido, é prioridade fornecer informações e conhecimento aos estudantes pelo fato de estar na informação um determinante essencial na construção de “sistemas sociais e econômicos”. Por conseguinte, quando toda a informação é absorvida, analisada, gerida e transformada em conhecimento, traz resultados e se torna um diferencial para a carreira de um profissional. Resultados esses que serão descritos no próximo tópico.

5. RESULTADOS

No período de mobilidade, a discente em Administração obteve aprovação nas disciplinas cursadas, tendo como produto, o conhecimento adquirido e o aproveitamento em seu histórico escolar pelo Departamento de Administração da UFMT das disciplinas: Políticas e Administração Pública; Tópicos Emergentes em Administração; Gestão da Inovação Tecnológica; Administração Financeira e Orçamentária II; e Logística e Cadeia de Suprimentos.

Participou de atividades acadêmicas que resultaram em 28 horas de atividades complementares como: Palestra com Helena Veloso, licenciada em Gestão pela UMinho; palestra com Fernando Ribeiro Mendes, CEO da Fundação INATEL, licenciado e doutor em Economia; palestra com Paulo Mateus Pinto, CEO da LaRedoute Portugal & Espanha, licenciado em Economia pela Universidade de Coimbra; palestra com João Fernandes, que realizou a experiência internacional na Finlândia em 2008, e Margarida Freitas, na Dinamarca; participou do curso avançado da Ferramenta Excel,

do Workshop sobre as técnicas de estruturação e resolução de problemas e da visita técnica na empresa BOSCH, com a apresentação do sucesso sustentável da organização do Modelo de Excelência (EFQM), de estrutura de suporte para organizações europeias e do mundo, com o de-senvolvimento de cultura de excelência empresarial, acederem às boas práticas ao conduzirem a inovação e melhorarem os seus resultados.

Conheceu cidades de oito países no continente Europeu: Portugal, Espanha, França, Inglaterra, Holanda, Alemanha, Itália e Grécia; um país da América do Norte: Estados Unidos da América; e Marrocos, no continente Africano. Através das viagens, uniu história, arte, cultura e religião na construção da identidade cultural de cada nação, evidenciando o a dimensão multicultural que o intercâmbio acadêmico internacional proporcionou.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

O intercâmbio acadêmico, na visão de Oliveira e Pagliuca (2012), permite o proveito e vantagens que vão além do aprendizado, mas também no desenvolvimento psicológico, autoconfiança, ama-durecimento, independência, capacidade de relacionar-se e, sentir-se ‘um cidadão do mundo’. O paradigma da sociedade da informação no contexto da globalização, segundo Passos e Silva (2005), tem levado os indivíduos a constantes transformações, tanto no que se refere à sua formação profissional e ao convívio social, como em suas atitudes pessoais.

Nesse contexto, da sociedade organizada a “partir do paradigma do conhecimento” e da in-formação, o fator educação tem um papel fundamental, pois através dela é que se concretizará o “projeto da sociedade do conhecimento” capaz de promover a formação de indivíduos e garantir o pleno exercício da cidadania (ROCHA, 2000).

Como observação pessoal da acadêmica e baseada em sua experiência internacional, o inter-câmbio foi uma oportunidade de descoberta e transformação de seu próprio “eu”. A cada dia, obteve um aprendizado novo, desde uma nova palavra portuguesa ao seu vocabulário, até o treinamento na língua inglesa e espanhola requerido em suas relações interpessoais com outros estudantes. Além, de todo o conhecimento acadêmico adquirido durante as aulas. Afirma ainda, que o medo de se aventurar em uma nova etapa é comum e faz o ser humano crescer, porém a força interior e o espírito empreendedor devem sobressair. O mundo é menor do que nosso entendimento e quanto mais se vê e se conhece, percebe-se como o conhecimento individual é ínfimo perante o universo e que a sede pelo saber nunca será saciada. Sempre haverão perguntas para serem respondidas. Portanto, uma experiência como o intercâmbio acadêmico é uma forma indireta de fazer o mundo se mover.

Percebem-se duas dificuldades distintas, de acordo com Passos e Silva (2005), a do indivíduo que almeja sua estabilidade no momento globalizado, sujeito às pressões, e competições, ansioso para assimilar novas culturas e conhecimentos, e disposição para relegar sua própria história cultural, manter-se em condições de concorrer com o restante do mundo.

Este estudo é relevante, no propósito de mostrar aos alunos brasileiros a importância da auto-gestão do conhecimento, durante a vivência entre o relacionamento com pessoas de nacionalidades

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diferentes, proporcionando o uso de uma segunda língua, o aprendizado de uma nova cultura e ainda construir amizades, formando excelente rede de contato (network). Instiga e incentiva a realização de sonhos, bem como, esclarece os procedimentos requeridos para estudar no exte-rior e vivenciar este tipo de modalidade acadêmica, como forma de aperfeiçoar o conhecimento e elevar sua competência profissional.

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IMPLANTAÇÃO DE CUSTEIO ABC NO SISTEMA INDÚSTRIA

Andressa Lacerda Capelli1

RESUMO

O presente artigo propõe-se a abordar os conceitos de custeio ABC (custo baseado em atividades) no âmbito do Sistema Indústria, bem como nas unidades regionais. O trabalho compreende 1) introdução da proposta, juntamente com objetivos abordados; 2) conceituação de custos e do cus-teio ABC; 3) introdução dos conceitos metodológicos utilizados; 4) resul-tados que apresentam a dimensão do Sistema Indústria e a complexida-de de implantação desta metodologia em uma instituição de abrangência nacional, representada regionalmente e, de características específicas em sua atuação regional 5) conclusão da concepção do modelo de cus-teio ABC para a realidade do Sistema Indústria é considerada audaciosa pela dimensão da proposta, bem como os objetos resultantes do proces-samento são defesa de interesses, serviços, aprendizagem e capacitação empresarial para a Indústria Brasileira. Por fim, este trabalho objetiva o detalhamento do modelo de custeio ABC estruturado, bem como a me-todologia de implantação utilizada por uma consultoria de grande porte. O propósito deste trabalho resultou em uma interessante perspectiva de análise de implantação de custeio ABC.

PALAVRAS-CHAVE: Custeio baseado em atividades, Sistema Indústria, implantação de custeio ABC.

ABSTRACT

This article proposes to approach the concepts of ABC costing (cost based on activities) in the scope of the Industry System, as well as in the regional units. The work includes 1) introduction of the proposal, along with objec-tives addressed; 2) cost conceptualization and ABC costing; 3) introduc-tion of the methodological concepts used; 4) results that show the size of the Industry System and the complexity of implementing this methodology in an institution of national scope, represented regionally and of specific characteristics in its regional performance 5) conclusion of the conception of the ABC cost model for the reality of the System Industry is considered audacious by the size of the proposal, as well as the objects resulting from the processing are defense of interests, services, learning and business training for the Brazilian Industry. Finally, this work aims at detailing the structured ABC costing model, as well as the implementation methodolo-gy used by a large consulting firm. The purpose of this work resulted in an interesting perspective of the ABC costing analysis.

1 Mestre em Engenharia de Produção, UFRGS. Coordenadora do curso de Administração e Engenharia da Produção da Faculdade Dom Bosco de Porto Alegre. E-mail: [email protected]

Revista Atitude · Faculdade Dom Bosco de Porto Alegre · Ano XI - No 22 - janeiro a junho de 2017 6564 IMPLANTAÇÃO DE CUSTEIO ABC NO SISTEMA INDÚSTRIA.

KEYWORDS: Activity-based costing, Industry System, implementation of ABC costing.

INTRODUÇÃO

As empresas encontram-se em um ambiente cada vez mais competitivo que demanda maior informação, precisão e agilidade na tomada de decisão. A necessidade de maior controle e conhe-cimento dos custos das organizações torna-se imprescindível para uma melhor gestão e controle das operações e atuação no mercado.

A necessidade de atendimento de diversos clientes, realizando diferentes atividades gera um complexo ambiente para a gestão dos custos organizacionais, não mais se tratando de uma sim-ples equação de divisão dos custos fabris. Segundo Mauss e Costi (2006) a metodologia de Custeio Baseado em Atividades (ABC) surge com o objetivo de suprir a carência de informações de custos.

A ferramenta de custeio ABC objetiva direcionar corretamente os custos indiretos de uma organização, possibilitando a melhor visualização e compreensão dos custos de um determinado produto ou serviço. Esta é uma modelagem audaciosa e que se torna mais difundida com o passar do tempo, ao sensibilizar entusiastas que objetivam acuracidade dos custos de desenvolvimento, produção e atendimentos de seus clientes.

Entretanto, dada a complexidade deste modelo proposto, não é viável para toda e qualquer organização, pois este é um modelo pode onerar excessivamente a busca pela alocação adequada dos custos da empresa, pois necessitam de ferramentas e equipe adequada para seu uso, extração de informações e sua manutenção.

Cabe ressaltar que o custeio ABC não se classifica como um sistema de custos para fins con-tábeis, substituindo os sistemas existentes. Para Beureni; Roedel (2002, p.2) “é um sistema de custeio baseado na análise das atividades significativas desenvolvidas na empresa, com vistas à atribuição mais criteriosa dos gastos indiretos, seu controle mais efetivo e um melhor suporte ao processo decisório”.

O presente trabalho busca a compreensão da implantação de um sistema de custeio abc para uma organização do tipo Sistema indústria, composta pelas entidades Federação, SESI, SENAI e IEL.

1. CONCEITUANDO CUSTOS

A permanente necessidade de análise e aferição dos custos organizacionais resultam na ne-cessidade de detalhamento dos custos resultantes de um processo de geração de produtos e/ ou serviços. Para tanto, é importante esclarecer o conceito de custos em uma organização.

Segundo Niveiros, Rech, Queiros, Oliveira (2013, p.24) Apud Iudícibus e Marion (2000, p. 175) custos são “todos os gastos no processo de industrialização que contribuem com a transformação da matéria-prima (fabricação): mão-de-obra, energia elétrica, desgaste de máquinas utilizadas para a produção, embalagem, etc”, ou seja, refere-se ao processo de transformação de insumos

em produtos ou serviços de valor agregado.

Ainda, Niveiros, Rech, Queiros, Oliveira (2013, p.25) apud Santos (2000, p.29) “custos são gas-tos incorridos por uma empresa para manter a estrutura em condições de operar em função do planejamento de vendas”, em que se compreende que os custos não se resumem os insumos consumidos no processamento, mas também toda a estrutura e setores necessários para o fun-cionamento da empresa.

2.1. O CUSTEIO ABC

A metodologia de Custeio Baseado em Atividades está voltada para reduzir as distorções ge-radas pelo rateio arbitrário dos custos indiretos de uma organização (MARTINS, 2003).

Para Beureni e Roedel (2002, p.3), uma nova abordagem na gestão de custos focada na máxi-ma produtividade e na aferição dos controles sobre os custos indiretos é fundamental para uma organização preocupara na apuração de custos.

A sistemática de custeio ABC tem sido utilizada em empresas de diversos segmentos como: industriais e de serviços, pois, segundo Beureni e Roedel (2002, p.3) “trata como base de custeio as atividades desempenhadas dentro das empresas, facilitando consideravelmente a análise do negócio por processos e eliminando a arbitrariedade dos critérios de rateio”. Calesso (2010), esta metodologia tem como princípio identificar com clareza, por meio de rastreamento, o agente causador do custo, para lhe atribuir o devido valor.

O papel do sistema de custeio baseado em atividades não é somente diferenciar-se do sistema de custeio baseado em volume apenas pela mudança das bases de alocação de custos indiretos, mas também pela identificação que faz dos custos por atividade e pela maneira como aloca os custos aos produtos, através de maior número de bases.

Beureni e Roedel (2002, p.4) apud Chalos (1992) enfatizam que o princípio básico do custeio ABC é o fato de que “atividades consomem recursos e produtos consomem atividades. Isto signi-fica que custos nos negócios devam ser primeiro acumulados no nível de atividades e de lá então para determinado produto. Os custos acumulados sob uma atividade são determinados para o produto usando direcionador de custo”.

Calesso (2010, p.24), afirma que

a idéia básica é atribuir primeiramente os custos ás atividades e, posteriormente atribuir os custos das atividades aos produtos. Sendo assim, primeiramente faz-se o rastreamento dos custos que cada atividade causou, atribuindo-lhes estes custos e, posteriormente verificam-se como os portadores finais de custos consumiam serviços das atividades, atribuindo-lhes os custos definidos.

Martins (2003) distingue a existência de dois tipos de direcionadores: de recursos e de atividades, sendo importante compreender que cada um aplica-se a uma situação específica. O direcionador de recursos é utilizado para identificar os recursos consumidos pelas atividades realizadas na empresa, em que estas necessitam de recursos para custear sua execução. O direcionador de atividades, ainda, para Martins (2003), tem o papel de identificar como os produtos consomem as

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atividades, sendo a serventia das atividades custear os produtos.

Niveiros, S.I; Rech, I.J; Queiros, P.F; Oliveira, J.R. de. (2013, p.26) observam que a metodolo-gia em questão “permite um rastreamento, a fim de identificar, classificar e mensurar como as atividades consomem recursos e como os produtos consomem as atividades mais relevantes no processo de produção...” objetivando especificamente em “oferecer resultados que possibilitem a tomada de decisões e definindo as ações que direcionarão a empresa, tornando-se, assim, mais uma ferramenta para auxiliar o gestor”.

O custeio ABC pode ser um grande aliado ao alto escalão ou ao nível gerencial, pois permite perceber onde os recursos estão sendo alocados na empresa e na realização de determinadas atividades ou processos, oportunizando a otimização dos recursos e tarefas organizacionais com enfoque estratégico para melhor atender a missão e visão propostos pela empresa. Calesso (2010, p.25) corrobora afirmando que a importância desta sistemática se dá, pois “proporciona informações gerenciais que auxiliam os tomadores de decisão, como por exemplo, os custos das atividades, que proporcionam aos gestores atribuírem responsabilidades aos responsáveis pelas mesmas”.

Mauss e Costi (2006, p.3) enfatizam que diferencial do método de custeio ABC, em relação aos demais, “está na forma de como alocar os custos indiretos aos produtos. Esta forma resulta em uma técnica diferenciada para se calcular os custos de determinado objeto, que pode ser: produtos, linhas de produtos, serviços, clientes”, entre outros.

Em relação aos custos indiretos, nesta sistemática, “são calculados de forma que estes se-jam atribuídos a um objeto onde realmente tenham sido consumidos, através da análise de uma relação de causa e efeito, e do rastreamento das causas que deram origem a aqueles custos” (Mauss e Costi 2006, p.3).

Segundo Corbari e Macedo (2012, p.42) os objetos de custos “é qualquer item, como produtos, clientes, [...] para o qual os custos são medidos e atribuídos”.

A partir do exposto, compreendem-se que a metodologia de custeio baseada em atividades utiliza-se das variáveis como recursos que são direcionados ás atividades, por meio de direciona-dores de recursos, atividades que consomem recursos, direcionadores de custos que repassam os custos para os produtos e serviços resultantes do processo organizacional da empresa, que também são denominados objetos de custos.

3. PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS

Os procedimentos metodológicos sugerem o entendimento e aprofundamento de como proce-der à realização da implantação da sistemática de custeio ABC para o Sistema Indústrias. Neste contexto, foi aplicado o método de Estudo de Caso (YIN, 1994). Para tanto, utilizou-se os seguintes meios de coleta de dados:

A) Investigação documental, sendo uma importante fonte de dados, em que as informações podem tomar diversas formas como: cartas, memorandos, agendas, atas de reuniões, documentos administrativos, estudos formais (BRESSAN, 2000). Yin (1994) considera relevante a utilização de

documentos, para corroborar e aumentar a evidência de outras fontes de dados;

B) Dados arquivados, que podem ser de serviços, organizacionais, de levantamentos, lista de nomes. Os dados arquivados podem ser usados com outras fontes de informações, tanto para verificar a exatidão como para avaliar dados de outras fontes (YIN, 1994), pois não garantem precisão e acurácia;

C) Observação participante, que é um tipo especial de observação na qual o observador deixa de ser um membro passivo e pode assumir vários papéis na situação do caso em estudo, podendo participar e influenciar os eventos em estudo (YIN, 1994).

4. RESULTADOS

A implantação da metodologia de custeio ABC no Sistema Indústria realizou-se a partir do acompanhamento da Consultoria denominada “Beta”. Esta propõe o desenvolvimento da implan-tação de um sistema ABC, através da identificação dos pilares da figura 01.

Água, Luz, MP, Vender, Comprar, Produtos, Clientes, Salários etc. Contabilizar etc. Mercados etc.

Figura 1 – Pilares do custeio ABCFonte: Beta (2006, p. 86).

Segundo a consultoria Beta (2006, p.88), os direcionadores de custos (cost drivers) “identificam a maneira como os produtos consomem atividades, sendo importante também para custear produtos, ou seja, indica a relação entre as atividades e os produtos”. Ainda, Beta (2006, p. 88) entende que uma empresa pode ter uma grande quantidade de atividades diferentes e, conseqüentemente, de direcionadores na mesma proporção e, “a chave para a redução do número de direcionadores é a classificação de atividades, que podem ser agrupadas em grupos homogêneos baseados em características similares se tais atividades forem logicamente relacionadas ou tiverem o mesmo quociente de consumo para todos os produtos”. Complementa-se que uma vez que as ativida-des estão classificadas em um grupo homogêneo de custo, “estas têm o mesmo quociente de consumo, os direcionadores de cada atividade atribuem os custos aos produtos exatamente nas mesmas proporções. Isso significa a necessidade de apenas um direcionador e o uso de taxas de grupo” (BETA 2006, p. 88).

A partir dos esclarecimentos conceituais adotados pela consultoria Beta, elucidam-se os as-

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pectos sobre a empresa foco da implantação da sistemática de custeio ABC, denominada Sistema Indústria. A presente implantação abranger as quatro entidades com personalidades jurídicas distintas e desenvolvem negócios, denominadas, conforme Beta A (2008, p. 3 e 4):

• Confederação Nacional da Indústria (CNI): entidade sindical de grau superior, tendo por finalidade representar e defender os interesses da indústria brasileira e a prestação de ser-viços associados a essas funções. A CNI tem como filiadas as 27 Federações das Indústrias (uma em cada estado e no Distrito Federal), que, por sua vez, são constituídas por Sindicatos e estes por empresas industriais, formando todo um sistema confederativo sindical. A missão da CNI está definida na Constituição Federal, na CLT e em seu Estatuto.

• Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial (SENAI), serviço social autônomo de natureza jurídica privada, com a missão de formação profissional e serviços tecnológicos à indústria, vinculado ao sistema confederativo sindical descrito na alínea “a” e composto de um Depar-tamento Nacional (SENAI/DN) e 27 Departamentos Regionais (um em cada estado e um no Distrito Federal). A missão do SENAI está definida no Decreto-Lei nº 4.048/42 e no seu Regi-mento, aprovado pelo Decreto nº 494/62.

• Serviço Social da Indústria (SESI), serviço social autônomo de natureza jurídica privada, com a missão de realizar educação, saúde e lazer, vinculado ao sistema confederativo sindical descrito na alínea “a” e composto de um Departamento Nacional (SESI/DN), um Conselho Nacional (SESI/CN) e 27 Departamentos Regionais (um em cada estado e um no Distrito Federal). A missão do SESI está definida no Decreto-Lei nº 9403/46 e no seu Regulamento, aprovado pelo Decreto nº 57.375/65.

• Instituto Euvaldo Lodi (IEL/NC) (Núcleo Central), sociedade civil, criada pelas entidades indicadas nas alíneas acima, com a finalidade de prestação de serviços de capacitação em-presarial e de apoio à pesquisa e à inovação tecnológica. A missão do IEL está definida em seu Estatuto. As Federações criaram Núcleos Regionais dos Institutos Euvaldo Lodi em 27 unidades da Federação.

Evidencia-se a estrutura elucubrada do Sistema Indústria, através da figura 02, que permite a visualização da estrutura da empresa foco da implantação da sistemática de custeio ABC.

Figura 2 – Organograma Sistema Indústria.Fonte: Beta B (2008, p. 2).

A partir da caracterização da personalidade constituinte do Sistema Indústria, é esclarecido que o presente artigo aborda a implantação de uma sistemática de custeio ABC baseado em um modelo para as vinte e sete unidades de cada uma das quatro funções do Sistema Indústria (FIERGS, SENAI, SESI e IEL), bem como para a instituição direcionadora destas unidades, deno-minado Sistema Indústria, orientador nacional da atuação destas atividades junto á indústria.

É importante ressaltar que a estrutura do Sistema Indústria, figura 02, percebida através do organograma da instituição, não representa, de maneira idêntica, a estrutura disponível nas vinte e sete unidades regionais, pois há diversidades horizontais entendidas e representadas nas diferentes situações regionais.

É possível destacar que, a partir da complexidade de um modelo de custeio ABC e, a diferen-ciação da estrutura organizacional do Sistema Indústria acaba por resultar em uma proposta de implantação caracterizada por ineditismo absoluto, dadas as variáveis complicadoras tanto do modelo de custos, quanto da estrutura local da implantação do modelo. A implantação está calcada na estruturação de um único modelo de custeio ABC nacional, ou seja, integrando as vinte e sete unidades regionais e a organização direcionadora, denominada Sistema Indústria.

A implantação do modelo de custeio ABC para o Sistema Indústria é uma proposta audaciosa e calcada em um minucioso planejamento, objetivando mitigar possíveis riscos e dificuldades enfrentadas neste tipo de delineamento, passíveis de impasses catastróficos e impactos irrever-síveis. As etapas consideradas pela consultoria Beta estão na figura 03.

Revista Atitude · Faculdade Dom Bosco de Porto Alegre · Ano XI - No 22 - janeiro a junho de 2017 7170 IMPLANTAÇÃO DE CUSTEIO ABC NO SISTEMA INDÚSTRIA.

Figura 3 – Fases da implantação do custeio ABC no Sistema IndústriaFonte: Beta A (2008, p. 5).

A primeira etapa descrita na figura 03, denominada planejamento do trabalho, realizou-se em um período de dois meses, entre o efetivo início do projeto de implantação, datado de sete de março de 2008 e, finalizado em nove de maio de 2008. A finalização da etapa caracteriza-se pela estruturação de um planejamento detalhado das atividades em desenvolvimento pelos próximos dez meses e incluiu a proposição e posicionamento dos aspectos: cronograma de atividades, matriz de riscos a serem enfrentados, plano de comunicação, plano de responsabilidades e plano de gerenciamento das mudanças, em que alguns documentos caracterizam-se como restritos ao acesso.

Entretanto, ainda nesta primeira fase, torna-se importante clarificar o plano de responsabi-lidades, que necessita do apoio e representação das unidades regionais, ilustrado na figura 04:

Objetivando um melhor desempenho e alinhamento dos representantes regionais, definiu-se um perfil de equipe de profissionais para representar a unidade regional, em que os parâmetros estão representados em patrocinador, coordenador e representante nas figuras 5, 6 e 7:

Figura 4 – Plano de responsabilidades e representação das unidades regionais.Fonte: Beta C (2008, p. 32).

Figura 5 – Plano de responsabilidades: Patrocinador Custeio ABC na unidade regional (DR).Fonte: Beta C (2008, p. 33).

Figura 6 – Plano de responsabilidades: Coordenador Custeio ABC na unidade regional (DR).Fonte: Beta C (2008, p. 34).

A segunda etapa descrita na figura 03, denominada mapeamento dos objetos de custos, em que, segundo Beta C (2008, p. 21) “objeto de custo é tudo o que a empresa deseja custear”. Para Beta D (2008, p. 2) os objetos de custos do Sistema Indústria são “resultado dos levantamentos realizados com os gestores das unidades organizacionais da CNI, do SENAI-DN, do SESI-DN e

Patrocinador doProjeto no Estado

Perfil• Cargo de alta direção dentro do DR.• Influência politica e abertura nas entidades (SESI,-

SENAI, IEL, Federação).Responsabilidades• Fornecer apoio politico e estratégico à Equipe do

Projeto.Envolvimento• Pontual

Coordenador/Assessor do

Projeto no Estado

Perfil• Conhecer a estrutura de custos• Ter noções de custeio e orçamento• Transitar dentro das 4 Entidades.Responsabilidades• Integrar a Equipe de Projeto.• Participar da ratificação de objetos de custos.• Levantar/participar no levantamento dos direciona-

dores e atividades.• Facilitar, por meio de articulação, as entrevistas e o

levantamento de informações.• Assessorar na comunicação da importância do projeto

para os dirigentes das Entidades regionais.• Comunicar o andamento do projeto à alta direção do

Estado e à Equipe Projeto

Envolvimento• Dedicação de 25-75%, dependendo da equipe do

Estado e da fase do projeto.

Revista Atitude · Faculdade Dom Bosco de Porto Alegre · Ano XI - No 22 - janeiro a junho de 2017 7372 IMPLANTAÇÃO DE CUSTEIO ABC NO SISTEMA INDÚSTRIA.

do IEL-NC”. Ressaltando que estes resultados de mapeamento de objetos de custos também “incorporam as sugestões e as contribuições recolhidas durante os workshops de ratificação dos objetos de custos com os representantes das entidades das Unidades Federativas que compõem as regiões Sul e Sudeste” Beta D (2008, p. 2). Na figura 08, é esclarecida a estrutura o modelo estrutural de objetos custos, subdivididos em até cinco níveis.

Figura 7 – Plano de responsabilidades: Representante Custeio ABC na unidade regional (DR).Fonte: Beta C (2008, p. 35).

Figura 8 – Estrutura de objetos de custos.Fonte: Beta D (2008, p. 2).

Compreende-se, a partir da figura 08, que os objetos de custos de nível I representam as entidades CNI/ Federação, SENAI, SESI e IEL. Os demais níveis (II a V) são os desdobramentos dos produtos e serviços prestados pelas entidades que compõem o nível I (BETA D, 2008).A saída resultante da segunda etapa para cada uma das entidades (CNI/Federação, SENAI, SESI e IEL) é o desenvolvido um dicionário de objetos de custos. Beta D (2008, p. 4) enfatiza que “além da estruturação de acordo com seus respectivos níveis, os dicionários apresentam um descritivo para cada um dos objetos de custos levantados. O conjunto formado pelos dicionários de cada entidade compõe o dicionário final de objetos de custo”. E, entende-se que essa “estrutura de

objetos de custos permitirá que os gestores das entidades tenham alinhamento nacional dos produtos e serviços ofertados pelas entidades que compõem o Sistema Indústria, respeitando a particularidade de todas as Unidades Federativas” (BETA D, 2008, p. 4). Ainda, segundo Beta D (2008) a estruturação permitirá a consolidação dos custos conforme os diferentes produtos e serviços oferecidos e seus respectivos desdobramentos, do nível mais analítico (produtos das unidades) ao nível mais macro (Sistema Indústria).Consultoria Beta D (2008), esclarece que os dicionários, bem como as atividades e os direcionadores de custos, são resultados dos levantamentos efetuados com os gestores das unidades organiza-cionais das entidades que compõem o Sistema Indústria. Esses documentos foram submetidos à validação dos respectivos representantes das entidades das Unidades Federativas.Objetivando clarificar a estrutura desenvolvida, ilustram-se os resultados desta fase nas figuras 09, 10, 11 e 12, sendo Federação, SENAI, SESI e IEL, respectivamente. É importante ressaltar que se escolhe apresentar somente um exemplo de objetos de custos de cada uma das entidades, devido à extensão do modelo.

Figura 9 – Estrutura de objetos de custos: Federação.Fonte: Beta D (2008, p. 4)

Revista Atitude · Faculdade Dom Bosco de Porto Alegre · Ano XI - No 22 - janeiro a junho de 2017 7574 IMPLANTAÇÃO DE CUSTEIO ABC NO SISTEMA INDÚSTRIA.

.

Figura 10 – Estrutura de objetos de custos: SENAI.Fonte: Beta D (2008, p. 18).

Figura 12 – Estrutura de objetos de custos: IEL.Fonte: Beta D (2008, p. 8).

A terceira etapa descrita na figura 03, denominada mapeamento das atividades e dos dire-cionadores de segundo grau. Esta etapa compreende a definição de atividades realizadas pelo Sistema Indústria e pelas vinte e sete unidades regionais, nas dimensões de Federação, SESI, SENAI e IEL. Os direcionadores de custos entre as atividades e objetos de custos, denominados de direcionadores de segundo grau (2º), são identificados nesta etapa, juntamente com a identi-ficação das atividades.

A consultoria Beta C (2008, p. 20) define o conceito de atividade, em que esta “descrevem o que

a organização faz, a maneira como o tempo é gasto e os resultados alcançados. É a combinação de pessoas, tecnologias, insumos e processos para gerar um determinado produto/ serviço”. Ainda, “direcionadores de custo (cost drivers) são medidores do consumo dos recursos pelas atividades e das atividades pelos objetos de custo” (BETA C, 2008, p. 23).

Para Beta C (2008), as atividades são definidas de acordo com a sua relevância na operação das unidades organizacionais. As Atividades são alocadas aos objetos de custos, mapeados na segunda etapa, através da definição da correlação das atividades com os objetos de custos e, os direcionadores, a partir de sua definição, mensuram o consumo das atividades pelos objetos de custos, sendo possível visualizar esta relação na figura 13.

Figura 13 – Relação entre atividades, direcionadores e objetos de custos.Fonte: Beta C (2008, p. 26).

A Consultoria Beta C detalha um exemplo da relação entre atividades, direcionadores de segundo grau e os objetos de custos, conforme figura 14. Este exemplo condiz a uma unidade organizacional voltada á gestão de recursos humanos, em que é caracterizada por ser uma área comum para as quatro entidades – Federação, SESI, SENAI e IEL e, é pertencente ao centro de serviços compartilhados (CSC).

Figura 14 – Unidade de RH do CSC: atividades, direcionadores e objetos de custos.Fonte: Beta C (2008, p. 27).

O mapeamento de atividades buscou detalhar o que é executado no Sistema Indústria e unidades

Revista Atitude · Faculdade Dom Bosco de Porto Alegre · Ano XI - No 22 - janeiro a junho de 2017 7776 IMPLANTAÇÃO DE CUSTEIO ABC NO SISTEMA INDÚSTRIA.

regionais em um nível intermediário, ou seja, mais detalhado que um processo e mais abrangente que uma tarefa. Elucida-se esta preocupação através do exemplo selecionado, ilustrado na figura 15.

A realização do mapeamento de cada uma das áreas/ gerências inseridas em cada uma das quatro entidades que compõem o Sistema Indústria e as vinte e sete unidades regionais, utilizaram--se de formulários padrão, em que foram divididos conforme: formulário de atividades Federação, SESI, SENAI, IEL e CSC (centro de serviços compartilhados). Segundo Beta C (2008), a diferença entre os formulários eram os objetos de custos destinos, em que o formulário SESI, figura 16, previa o destino das atividades para os objetos de custos do SESI, mapeados na segunda etapa.

Figura 15 – Nível de detalhamento das atividades: processo de compras (CSC).Fonte: Beta C (2008, p. 44).

Figura 16 – Formulário de mapeamento de direcionadores de 2º grau: SESI.Fonte: Beta C (2008, p. 47).

O formulário dos CSC, figura 17, previa o destino da realização das atividades para as quatro

entidades do Sistema Indústria e das unidades regionais.

Figura 17 – Formulário de mapeamento de direcionadores de 2º grau: CSC.Fonte: Beta C (2008, p. 47).

O resultado desta terceira etapa de mapeamento de atividades e direcionadores de custos de segundo grau foi a identificação de, aproximadamente, mil e quinhentas atividades realizadas nas vinte e sete unidades regionais e no Sistema Indústria e, duzentos e trinta e sete direcionadores de custos de segundo grau.

A quarta etapa descrita na figura 03, denominada mapeamento dos recursos e dos direciona-dores de primeiro grau, em que a execução se deu pela consultoria Beta, através de atividades interna de análise dos centros de custos utilizados por unidades regionais e pelo Sistema Indústria. Para a consultoria Beta C (2008, p. 19), “recursos são todos os gastos necessários para gestão e operação do negócio [...] e, os recursos dão origem às despesas/ custos na demonstração de resultados das Entidades”.

A consultoria Beta C (2008, p. 24) considera “os recursos serão identificados pelo balancete das Entidades (plano de contas de despesas)”. A forma de alocar os recursos às atividades é realizada através de “os recursos utilizados são apropriados às unidades organizacionais através de direcionadores de custos. Posteriormente, os recursos são alocados nas atividades das uni-dades através do esforço de trabalho em cada uma delas. Finalmente, chega-se aos custos das atividades” (BETA C, 2008, p. 24). Consolida-se esta etapa na figura 18.

Figura 18 – Quarta etapa: mapeamento de recursos e direcionadores de custos de primeiro grau.Fonte: Beta C (2008, p. 24).

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Objetivando a simplificação deste complexo modelo de custeio ABC, a consultoria Beta optou pela determinação dos direcionadores de custos de primeiro grau, sendo estes determinados e não permitem alteração, após a validação do Sistema Indústria, pelas unidades regionais. Ilustra-se esta definição através da figura 19.

Figura 19 – Quarta etapa: Alocação de recursos á unidades organizacionais e á atividades.Fonte: Beta C (2008, p. 25).

A seqüência de atividades desta implantação de custeio ABC no Sistema Indústria e unidades regionais foram a identificação de software de mercado para suporte á modelagem desenvolvida e, a preparação de um plano de implementação nas quatro entidades (Federação, SESI, SENAI e IEL) dos softwares, juntamente com o modelo de custeio ABC estruturado. O plano de implementação prevê a inclusão das vinte e sete unidades regionais e o Sistema Indústria.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

O presente artigo objetivou abordar a conceituação do custeio ABC e, a implantação desta metodologia em um ambiente organizacional de característica política e de alta complexidade, pois os produtos característicos do processo produtivo do Sistema Indústria são defesa de inte-resses, serviços, aprendizagem e capacitação empresarial para a Indústria Brasileira. O aspecto da ausência física de produtos amplia a necessidade de dedicação e empenho na estruturação da implantação da modelagem proposta.

A implantação de custeio ABC no Sistema Indústria necessitou de entendimento de vinte e sete realidades de atividades, direcionadores e de objetos de custos, objetivando compreender e integrar as diversas realidades regionais representadas por quatro entidades (Federação, SESI, SENAI e IEL) em cada região.

No intuito de representar uma parcela do trabalho realizado pela equipe da Consultoria Beta, por mais de dez meses, optou-se pela inclusão parcial do modelo de custeio ABC implantado, em que se utilizou parte dos modelos elaborados para cada uma das quatro entidades regionais, sendo suficiente para percepção e compreensão do leitor, em relação á realidade gerada pelo modelo de custeio ABC no Sistema Indústria. Ainda, acredita-se na plena contribuição deste trabalho para a compreensão da estratégia de implantação de um sistema de custeio ABC, sendo possível assimilar o passo à passo elaborado para obtenção deste significativo modelo.

A partir do exporto, entende-se que, a partir das etapas apresentadas para a implantação do sistema de custeio ABC no Sistema Indústria, é possível oportunizar futuros trabalho, abordando especificamente os temas de: critérios de mapeamento de atividades, direcionadores de custos e, também de objetos de custos.

O presente trabalho atingiu o objetivo proposto de detalhar a implantação do sistema de custeio ABC, bem como a metodologia de implantação utilizada por uma consultoria de grande porte no Sistema Indústria e nas unidades regionais.

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RELAÇÕES DE PARCERIAS: UM ESTUDO DE CASO PARA MAXIMIZAÇÃO DA PRODUTIVIDADE EM UMA

EMPRESA RURAL

Frederico Chaves Seger1

Alexandre de Melo Abicht2

Alessandra Carla Ceolin3

Maurício Moreira e Silva Bernardes4

RESUMO

Nos dias atuais e, cada vez mais, o administrador rural precisa possuir o conhecimento das condições de mercado e dos recursos naturais disponí-veis para obter êxito em sua atividade. O presente estudo objetivou identi-ficar como desenvolver relações de parceria para maximizar a produtivi-dade e diminuir as áreas ociosas da propriedade em uma empresa rural - a Granja Santa Helena - situada no estado do Rio Grande do Sul. Após uma estruturada fundamentação teórica aplicada em prol da temática, a pesquisa caracterizou-se como exploratória e bibliográfica, de natureza qualitativa. Foram utilizadas, como instrumentos e ferramentas de pes-quisa, entrevistas de classificação aberta e roteiro semiestruturado com oito experts do segmento agrícola. As entrevistas, cujas respostas foram dimensionadas por meio da análise de conteúdo, visam clarear e estrutu-rar as possíveis dificuldades a serem enfrentadas pela organização, na in-serção ao mercado agrícola. Esse estudo se justifica pela oportunidade de minimizar a sobrecarga de tarefas do proprietário da Granja Santa Helena e alavancar a rentabilidade de suas terras. Após a análise, a implantação de uma parceria agrícola mostra-se uma solução viável para a empresa.

PALAVRAS-CHAVE: Empresa Rural; Agronegócio; Parceria Rural; Ca-deias Produtivas.

ABSTRACT

Nowadays, and ever more, the rural administrator must have knowledge of market conditions and of natural resources available to succeed on his/hers business. This study aimed to identify how to develop partnership relationships to maximize productivity and reduce idle areas of the prop-erty in an agricultural enterprise - Granja Santa Helena - located in the

1 Graduado em Administração de Empresas pela Faculdade Dom Bosco de Porto Alegre (FDB).

2 Doutorando em Design – PG-Design pela UFRGS. Mestre em Agronegócios pela UFRGS. Graduado em Administração de Empresas pela ULBRA-SM. Coordenador dos Cursos de Administração e CST em Gestão Comercial da Faculdade CNEC Gravataí. Professor do Curso de Administração da Faculdade Dom Bosco de Porto Alegre. Consultor empresarial junto ao SEBRAE-RS.

3 Doutora e Pós-doutora em Agronegócios pela UFRGS. Mestra em Ciências da Computação pela UFRGS. Graduada em Ciência da Com-putação pela UPF. Professora do Departamento de Administração da UFRPE.

4 Pós-doutor em Design pelo IIT. Doutor e Mestre em Engenharia Civil pela UFRGS. Graduado em Engenharia Civil pela UFAL. Professor Associado do PG-Design da UFRGS.

Revista Atitude · Faculdade Dom Bosco de Porto Alegre · Ano XI - No 22 - janeiro a junho de 2017 8382 RELAÇÕES DE PARCERIAS: UM ESTUDO DE CASO PARA MAXIMIZAÇÃO DA PRODUTIVIDADE EM UMA EMPREDA RURAL.

state of Rio Grande do Sul. After a structured theoretical foundation that was applied in favor of the thematic, our research was characterized as exploratory and bibliographical and of a qualitative nature. We used open classification interviews and semi structured script, as instruments and research tools, we perform with eight experts from the agricultural seg-ment. The interviews, whose answers were dimensioned by the content analysis, were intended to clarify and to structure the possible difficulties to be faced by the organization, in its insertion on the agricultural market. This study is justified by the opportunity to minimize the task overload of the owner of Granja Santa Helena and boost the profitability of his land. Af-ter the analysis the implementation of an agricultural partnership proves to be a feasible solution for the enterprise.

KEYWORDS: Agricultural Enterprise; Agribusiness; Agricultural Partner-ship; Productive Chains.

INTRODUÇÃO

A fim de buscar uma solução de médio prazo para maximizar a produtividade nas terras da Granja Santa Helena, foi elaborado um estudo para viabilizar a implantação de uma parceria agrícola na propriedade.

Este estudo baseia-se em reduzir os custos atuais da empresa, fundamentar os dados obti-dos através das pesquisas, adequar 1/3 das terras da propriedade para o exercício da atividade agrícola e definir um parceiro ou grupo de parceiros potenciais para desenvolver esta parceria.

A Granja Santa Helena, situada na cidade de Caçapava do Sul, no Rio Grande do Sul (RS) atua no setor de agronegócios, especificamente exercendo a atividade de pecuária em suas terras. Conforme a Classificação Nacional de Atividades Econômicas (CNAE) a empresa está incluída na Classe 0162-8 – Serviços Relacionados com a Pecuária. A propriedade é pertencente a um montante de 3.242 estabelecimentos agropecuários ou produtores individuais da cidade, segundo levan-tamento do censo agropecuário de 2006 do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).

Com base nas informações coletadas junto à empresa, o presente artigo busca compreender como desenvolver relações de parceria para maximizar a produtividade das terras na Granja Santa Helena.

A fim de atender a este objetivo, foi elaborado um diagnóstico organizacional da Granja Santa Helena, visando implantar parcerias agrícolas na propriedade. Também são objetivos desse estudo, propor a adaptação de recursos para investir em mão de obra, visando amenizar a sobrecarga de tarefas, alcançar informações estratégicas e premissas para inserção da empresa no segmento e analisar a viabilidade e rentabilidade da implantação de uma Parceria Rural na fazenda.

1. REFERENCIAL TEÓRICO

2.1. SOBRE A PROPRIEDADE INVESTIGADA

A Granja Santa Helena está situada na rodovia federal BR-153, no município de Caçapava do Sul, no Rio Grande do Sul/Brasil. Atualmente, a propriedade conta com uma área 268,8 hectares e cria em suas terras vacas Nelore, touros reprodutores Zebu, éguas e cavalos da raça Crioulo.

A atividade principal da empresa compreende a criação e reprodução de bovinos, de forma natural, e posterior venda para recria. Somente novilhos machos e vacas inférteis são negociados, de forma que as terras fiquem preenchidas por vacas com possibilidade de reprodução.

A venda de novilhos machos (com até dois anos de idade) da raça Nelore é a atividade principal da propriedade e é regida por um contrato de exclusividade. Com menor frequência ocorre a venda de equinos para pequenos produtores da região.

A Granja Santa Helena subdivide-se em quatro faixas de terra, sendo três destas destinadas à reprodução e engorda de gado, podendo-se denominar, sob olhar empresarial, de setor produtivo da empresa.

São 231,20 hectares de terra, ou seja, 86% do total produtivo da propriedade, para a execução da principal atividade econômica da organização. O setor administrativo e de suporte da Granja Santa Helena, compreendido por 37,6 hectares possui 14% da área total da empresa. O conjunto das cinco forças competitivas serve de auxílio ao gestor no desenvolvimento de uma estratégia competitiva, assim como nas metas e objetivos estratégicos da organização (Quadro1).

Quadro 1: Instrumento para avaliação da intensidade da concorrência

Fonte: Elaborado pelos autores, adaptado de SILVEIRA, 1996.

Com base nos dados apresentados no quadro1, observa-se que o setor da pecuária, na qual a

Revista Atitude · Faculdade Dom Bosco de Porto Alegre · Ano XI - No 22 - janeiro a junho de 2017 8584 RELAÇÕES DE PARCERIAS: UM ESTUDO DE CASO PARA MAXIMIZAÇÃO DA PRODUTIVIDADE EM UMA EMPREDA RURAL.

Granja Santa Helena está inserida, possui rentabilidade convidativa, porém alto custo de investimen-to. Relativo à ameaça de novos entrantes, as barreiras financeiras tornam-se o maior empecilho.

O hectare de terra está cada vez mais valorizado e escasso, aumentando as dificuldades para os novos entrantes do segmento. O acesso à tecnologia encontra-se em grau intermediário, com tendência de melhora, pois existe uma maior aceitação dos produtores rurais referente à informatização de sua gestão, gerando resultados mais concisos e informações estruturadas dos processos.

A concorrência e a disponibilidade de produtos iguais são intensas, elevando a oferta ao mer-cado. Relativo ao índice de ameaça de integração para trás, apesar das adversidades citadas, existem muitos compradores para o setor. Esta alta demanda faz com que o índice permaneça equilibrado no diagnóstico.

Para o suprimento de insumos e produtos agropecuários, existe uma relação extensa de fornecedores especializados. O poder de barganha do cliente (indústria) alcança números favo-ráveis para obtenção de descontos e melhores condições de compra. Relativo à disponibilidade de produtos substitutos é instaurada uma nova barreira. A diversidade de carnes de animais para consumo e a carne de soja elevam o índice na planilha de forças competitivas.

2.2. AGRONEGÓCIO E ADMINISTRAÇÃO RURAL

Segundo Davis e Goldberg (apud Batalha, 2007) o agribusiness conceitua-se como a “soma das operações de produção e distribuição de suprimentos agrícolas, das operações de produção nas unidades agrícolas, do armazenamento, processamento e distribuição dos produtos agríco-las e itens produzidos a partir deles”. Os autores completam que as atividades do agronegócio pertencem a uma extensa rede de agentes econômicos do setor.

Na amplitude da atividade agroindustrial, explica Pereira (1996), o agronegócio não se restringe somente às atividades agrícola, pecuária ou rural. Ele ultrapassa estes limites, sendo desenvol-vido desde a indústria que produz os equipamentos e implementos agrícolas, o beneficiamento e seleção de sementes e mudas, a programação do plantio, o financiamento da atividade, até a negociação e atendimento aos compradores.

Para Lemes (1996), o agronegócio tem importância destacada em países possuidores de gran-des extensões territoriais e condições climáticas como o Brasil.

O conceito geral de Administração Rural, segundo Antunes e Flores (2008), é relacionado à necessidade de controlar e gerenciar um número superior de atividades que possam ser desen-volvidas dentro de uma propriedade do setor agropecuário. Conforme Crepaldi (2009), o conjunto de atividades que facilitam aos produtores rurais na tomada de decisões ao nível de sua empresa agrícola, visando obter o melhor resultado econômico e mantendo a produtividade da terra, defi-nem a Administração Rural. Existe uma necessidade constante de atualização de gestão no setor rural, pois a gestão da atividade rural possui peculiaridades próprias, além da variabilidade do mercado e suas respectivas características.

Nantes e Scarpelli (2007), especificam que as principais dificuldades do empreendedor estão relacionadas com as variações climáticas, à perecibilidade da produção, à sazonalidade produtiva, ao ciclo biológico dos animais e vegetais e ao desempenho natural alcançado do empreendimento.

Para Antunes e Flores (2008), a administração rural moderna é representada pela implantação do Pentágono Administrativo. Este conceito é composto de cinco etapas de adequação para que a organização obtenha sucesso na tomada de decisões e aumento de rentabilidade nas atividades econômicas desenvolvidas: 1ª Fase - Adequação para Coleta de Dados no Campo: Treinamento de gestor e subordinados e aquisição de instrumentário para correta absorção de dados; 2ª Fase - Adequação para Processamento em Hardware: Entende-se como a aquisição de computadores e periféricos para armazenamento de dados e utilização de softwares; 3ª Fase - Adequação para Processamento de Software: Investimento na aquisição de softwares necessários para o proces-samento e apresentação de resultados dos dados obtidos; 4ª Fase - Adequação de Apropriação dos Dados: Realização de treinamentos específicos para utilização e manuseio corretos dos softwares; 5ª Fase - Adequação de Avaliação dos Resultados Obtidos: Etapa de suma importância a ser executada pelos proprietários ou gestores do empreendimento rural. O futuro econômico da empresa fica condicionado a esta fase, pois é o momento decisivo da tomada de decisões e aplicação de mudanças estratégicas.

Referente à administração agropecuária, segundo Neves (2005), a fazenda atual apresenta uma arquitetura diferenciada do modelo tradicional. São conjuntos de contratos e agentes articulados, com insumos, revendas, prestadoras de serviços e técnicos especializados.

Quanto ao papel do administrador rural, de acordo com Crepaldi (2009), esse deve possuir o conhecimento das condições de mercado e dos recursos naturais disponíveis, sendo estes os elementos básicos para o desenvolvimento de sua atividade econômica. O gestor do empreen-dimento rural, conforme Nantes e Scarpelli (2007), deve combinar as ações de coleta de dados, geração de informações, tomada de decisões e praticar as atitudes decorrentes para minimizar prejuízos e alavancar a empresa.

Para os autores Antunes e Flores (2008) é preciso executar com êxito as seguintes tarefas: planejar, organizar, designar pessoal, dirigir e principalmente controlar. Quanto maior for o con-trole do administrador perante a parte operacional da empresa, menores serão os custos e maior será a produtividade, resultando em maximização de lucratividade da propriedade.

2.3. CADEIAS PRODUTIVAS

A sucessão de operações de transformação dissociáveis, segundo Morvan (apud Batalha, 2007), capazes de serem desmembradas e ligadas por um encaixe técnico, definem o termo Cadeia de Produção. É também o conjunto de relações comerciais que estabelecem um fluxo de troca entre fornecedores e clientes, em todas as etapas de transformação, conforme o autor.

Conforme Batalha (2007), o primeiro procedimento para destacar uma Cadeia de Produção Agroindustrial (CPA) é identificar o produto final. Deste modo, segundo o autor, ocorre o processo de ligação entre as operações técnicas, comerciais e logísticas, necessárias para a produção do

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determinado produto.

Genericamente, a Cadeia de Produção Agroindustrial (CPA) pode ser subdividida em três macrosegmentos, segundo Batalha (2007): Comercialização (serviços), Industrialização (agroin-dústrias) e Produção de matérias-primas (agricultura/pecuária). Na prática, os limites de divisão dos processos não são facilmente identificáveis, existindo grande variabilidade para cada tipo de insumo transformado.

No Brasil, de acordo com Zylbersztajn (2005), o conceito de Cadeia de Agronegócios se fir-mou no início dos anos 1990. Passou-se a discutir todo o processo da CPA, inclusas as etapas de suprimento e distribuição da Cadeia. Os programas de estudo e pesquisa dos departamentos de Economia Agrícola, segundo o autor, foram aperfeiçoados e passaram a focalizar o agribusiness como um todo.

Para Zylbersztajn (2005), apesar do recente aprofundamento no tema, existem dificuldades na construção de cadeias de produção ou na própria reconstrução de cadeias de agronegócios em declínio. A utilização do conceito de cadeia de produção, conforme Batalha (2007), busca identi-ficar os elos fragilizados do processo, através da análise de políticas públicas e privadas. Para o autor, “o sucesso de uma cadeia de produção agroalimentar é o resultado do desenvolvimento harmonioso de todos os agentes que atuam na cadeia”.

2.3.1. SISTEMAS AGROINDUSTRIAIS

Neves (2005) relata que a análise dos Sistemas Agroindustriais é de suma importância, tanto para as empresas do agronegócio, quanto para a sociedade como um todo. A partir do aprofun-damento deste estudo, completa o autor, haveria concreta contribuição para desenvolvimento de coordenação do sistema e elaboração de ações coletivas para os participantes do sistema, refletindo em maior satisfação para o consumidor final.

O Sistema Agroindustrial (SAI) pode ser considerado o conjunto de atividades que concorrem para a produção de produtos agroindustriais, desde a produção dos insumos até a chegada do produto final ao consumidor. Ele não está associado a nenhuma matéria-prima ou produto final específico (BATALHA, 2007, p. 10).

Para Batalha (2007), o Sistema Agroindustrial pode ser segmentado em seis conjuntos de fato-res: Agricultura, pecuária e pesca; Indústrias Agroalimentares; Distribuição agrícola e alimentar; Comércio Internacional; Consumidor; e Indústrias e serviços de apoio.

Já, a atividade agroindustrial, segundo Lemes (1996) define a atividade agroindustrial como o beneficiamento de produtos agrícolas, produção de embriões em rebanhos e transformação de produtos zootécnicos, agrícolas e florestais.

Para Batalha (2007), as agroindústrias devem trabalhar com fontes de insumos diversificadas, incorporar inovações que ampliem a vida útil das matérias-primas e anexar tecnologias para ampliação do ciclo de safra e proteção da produção das incertezas climáticas.

O complexo agroindustrial, segundo Megido e Xavier (1995), elege o consumidor final como o

fator determinante para o sucesso competitivo de um produto agropecuário, vinculado a todo o sistema de pesquisa, produção e distribuição devidamente estruturado.

2.3.2. ATIVIDADE PECUÁRIA

Para Santos et al (2002), a atividade pecuária define-se como a arte de criar e tratar o gado. Estes animais, criados no campo, são destinados para abate, consumo doméstico, serviços na lavoura, reprodução, leite e fins industriais e comerciais.

Existem dois sistemas de produção na pecuária: extensivo e intensivo. Marion e Segatti (2010) definem que no sistema extensivo os animais são mantidos em áreas de pasto natural e sem alimentação suplementar, cujo rendimento é normalmente baixo. Para a pecuária intensiva, os autores relatam que se consegue maior rendimento e rentabilidade em pequenas áreas com o processo intensivo de engorda.

Para Marion (1996), visando facilitar a classificação dos animais, o rebanho bovino é dividido nas seguintes categorias: Bezerro: recém-nascido da vaca, de zero a 12 meses de idade; Novilha: de 13 meses de idade até a primeira parição; Novilho: de 13 meses até o abate; Garrote: macho inteiro até a entrada na reprodução; Vaca: novilha após a primeira parição; Touro: garrote de 25 a 35 meses passa para esta categoria; e Boi: bovino adulto, castrado e manso, empregado para serviços agrícolas.

O cálculo do número de animais por hectare, segundo Marion (1996), em consulta ao EMBRAPA – Pelotas (RS), objetiva transformar os animais de diferentes categorias em uma unidade-padrão, para facilitar o rateio dos custos indiretos, conforme Quadro 2. As unidades podem sofrer pequenas variações de acordo com a região ou raça do animal.

Quadro 2: Tabela de Unidade Animal – Pecuária.

Fonte: Elaborado pelos autores, adaptado de MARION, 1996.

As atividades exercidas pelos pecuaristas nas empresas rurais modernas são acompanhadas por investimentos em inovação tecnológica, genética dos animais e alimentação do rebanho. Para Crepaldi (2009), as atividades da pecuária são classificadas por: Cria: sua principal tarefa é a produção do bezerro que é vendido após o desmame (período igual ou inferior a 12 meses); Recria: a partir do bezerro desmamado (de 13 a 23 meses de idade), produzir e vender o novilho magro para engorda; e Engorda: atividade conhecida como invernista, durando de 24 a 36 meses,

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onde o novilho magro é transformado em novilho gordo para venda posterior.

Conforme Santos et al (2002), os principais índices de desempenho animal são: Índice de Fer-tilidade (IF): relação do número de fêmeas em cobertura que após determinado período ficaram prenhas; Índice de Fecundidade (IFec): forma de medir o resultado das fêmeas em cobertura que conseguiram parir bezerros vivos; Taxa de Mortalidade (TM): animais mortos por acidentes e doenças sobre o total do plantel da mesma raça; Índice de Rendimento (IR): do total de animais vendidos a peso-vivo, relacionados a carcaça (peso-morto); Densidade: forma de avaliar o rendi-mento por unidade de área, relacionado com os animais existentes na propriedade.

Quanto a contabilidade rural, pelo ponto de vista de Iudícibus (1980), para a contabilidade “qualquer indivíduo, empresa, grupo de empresas, ou entidades, setor ou divisão, desde que efetue atividade econômica, e que seja tão importante, a critério dos donos do capital, que justifique um relatório separado e individualizado de receitas e despesas, de investimentos e de retornos, de metas e de realizações, pode tornar-se uma entidade contábil”.

Para Crepaldi (2009) a Contabilidade Rural é um instrumento da função administrativa das entidades rurais que visa controlar o patrimônio, apurar o resultado e prestar informações sobre este patrimônio e resultados.

Ainda pouco explorada como ferramenta de processo decisório de uma Empresa do Agrone-gócio, a contabilidade rural é uma tendência real para a transição de uma propriedade moderna.

No Brasil, segundo Marion e Segatti (2010), não é necessário a constituição de pessoa jurídica para a exploração da atividade agropecuária. Sob o ponto de vista de Crepaldi (2009), a efetiva utilização da Contabilidade Rural esbarra na dificuldade de separação dos custos produtivos e dos gastos pessoais do empresário rural.

A tarefa de transformar dados consistentes e reais em informações gerenciais para tomada de decisão, conforme Crepaldi (2009), ainda é um privilégio para poucos produtores rurais. Estes empreendedores possuem a necessidade de saber onde e de que forma estão sendo alocados os recursos.

2.4. PARCERIA RURAL

O sistema de parceria rural é uma forma de ação coletiva lavrada pelo proprietário e parceiro ou grupo de parceiros. Conforme Barros (1999), a parceria rural é instituto do direito agrário, onde existe uma forte intervenção do Estado nestas relações. Os sujeitos desta ação são regidos pela Constituição Federal e pelo Estatuto da Terra, que fixa substancialmente as normas fundiárias.

Art. 4° PARCERIA RURAL é o contrato agrário pelo qual uma pessoa se obriga a ceder à outra, por tempo indeterminado ou não, uso específico de imóvel rural, parte ou partes do mesmo, incluindo, ou não, benfeitorias, outros bens e/ou facilidades, com o objetivo de nele ser exercida atividade de exploração agrícola, pecuária, agroindustrial, extraída ou mista; e/ou lhe entrega animais para cria, recria, invernagem, engorda ou extração de matérias primas de origem animal, mediante partilha de riscos de caso fortuito e de força maior do empreendimento rural e dos frutos, produtos ou lucros havidos nas proporções que estipularem, observando os limites percentuais da lei (art. 96, VI, ESTATUTO DA TERRA, 1964).

Para Marion e Segatti (2010) ocorre a parceria rural quando há contribuição do proprietário da terra no negócio, seja com o capital fundiário ou capital de exercício, formando associação a terceiros. Esta sociedade, segundo os autores, pode formar-se de duas maneiras: o capitalista (proprietário) entra com o capital e geralmente com a gestão do negócio; e o de trabalho (parceiro) entra com a execução das tarefas.

Este formato de organização, conforme Batalha (2007), pode apresentar uma solução adequada principalmente para pequenos produtores rurais. Visando inserção e permanência em cadeias produtivas e racionalização de custos e trabalhos, a parceria é uma relação bilateral e proporciona ganhos a ambas as partes envolvidas.

Muitas parcerias surgem de modo informal e até ilegal no Brasil. Propriedades familiares e pequenos produtores rurais, leigos no assunto, executam a parceria agrícola livres de normas e contratos. Para Crepaldi (2009), a falta de conhecimento na utilização desta modalidade é a principal dificuldade da solução das parcerias rurais em maior escala e a níveis empresariais. Cabe às práticas participativas o estabelecimento claro de objetivos e rendimentos proporcionais aos pactuantes parceiros.

A parceria agrícola, modelo mais difundido no Brasil, consiste na cessão do imóvel rural para a prática de atividade de produção vegetal (CREPALDI, 2009).

O objeto do contrato de parceria rural, segundo Barros (1999), é a “cedência de um imóvel rural a outrem, parte ou partes do mesmo, incluindo ou não benfeitorias” para que seja executada a atividade de exploração rural. Marion (1996) define que, na ciência do Direito Agrário, qualquer modalidade de contrato requer, basicamente, pessoa capaz, objeto lícito e forma prescrita no Estatuto da Terra. Conforme o art. 92 VI do Estatuto da Terra, a “posse ou uso temporário da terra serão exercidos em virtude de contrato expresso ou tático” estabelecido perante a lei.

3. MÉTODO DE PESQUISA

3.1 CLASSIFICAÇÃO DA PESQUISA

A pesquisa desenvolvida neste trabalho classifica-se como exploratória-bibliográfica de na-tureza qualitativa. Marconi e Lakatos (1999) definem que a pesquisa de caráter exploratória ob-jetiva a formulação de questões ou de um problema com três finalidades: desenvolver hipóteses, aproximar o pesquisador do tema e clarificar conceitos.

Para Roesch (1999) a prática da pesquisa bibliográfica implica na “seleção, leitura e análise de textos relevantes ao tema do projeto, seguida de um relato por escrito”. Segundo Marconi e Lakatos (1999), abrange toda bibliografia já tornada pública em relação ao tema de estudo, visando colocar o pesquisador em contato direto com o material escrito, dito ou filmado.

De acordo com Vergara (2010) a pesquisa qualitativa tem como objetivo explorar um am-biente, visando ao levantamento de informações para definição de problemas ou oportunidades de melhorias. Já a pesquisa descritiva expõe características de determinada população ou de

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determinado fenômeno.

Como estratégias serão utilizadas aquelas propostas por Vergara (2010), ou seja, pesquisa do-cumental para obtenção de informações sobre a empresa tais como a melhor área da propriedade para arrendamento e atividade econômica a ser exercida pela parceria agrícola.

3.2. DEFINIÇÃO DO PÚBLICO-ALVO, PLANO DE COLETA E ANÁLISE DE DADOS

Para atender as necessidades do trabalho, o público-alvo da pesquisa foi composto por oito produtores rurais do ramo agrícola, na faixa dos 44 a 62 anos de idade, com experiência de 5 a 30 anos no setor e que trabalham no segmento de arroz ou soja e arroz. Esses produtores, experts dos segmentos de arroz e soja, foram selecionados de modo que se tornem informantes estratégicos.

O instrumento de coleta de dados para a fundamentação da pesquisa foi realizada por meio de entrevista com roteiro semiestruturado em profundidade, apresentando questões ordenadas de forma lógica para maximizar a eficácia da análise. A coleta ocorreu no primeiro semestre de 2015.

O plano de análise de dados foi definido como conteúdo categorial simples, onde os dados coletados foram inseridos em uma grade de análise aberta. A grade proporciona uma visualiza-ção global das respostas obtidas e permite uma análise conjunta mais eficiente. Segundo Bardin (1977), a análise de conteúdo é o conjunto de técnicas de análise das comunicações que utiliza procedimentos sistemáticos e objetivos de descrição do conteúdo das mensagens. É apresentada como ferramenta potencial para transformar as respostas qualitativas coletadas em desenvol-vimento teórico.

4. APRESENTAÇÃO E ANÁLISE DE DADOS

Nesta etapa do trabalho são expostas a apresentação e análise dos dados obtidos por meio das entrevistas.

4.1 ENTREVISTAS COM EXPERTS: O MERCADO AGRÍCOLA

Para uma empresa ou produtor rural infiltrar-se no segmento agrícola, segundo os entre-vistados, são necessários altos investimentos ou desenvolver uma relação de parceria com um parceiro potencial. Dentre as barreiras de entrada citadas pelos produtores entrevistados estão: disponibilidade de terras à venda cada vez mais escassa, investimento significativo em benfeitorias e implementos agrícolas, liberação das certidões ambientais obrigatórias e recursos financeiros para o capital de giro.

Já, para as barreiras de saída do segmento, a maioria dos entrevistados citou a depreciação acelerada do maquinário agrícola, em virtude do alto volume de horas de trabalho na lavoura. A saída da atividade, na maioria das vezes, segundo os produtores torna-se danosa, devido à bai-xa liquidez da maior parte dos ativos descritos anteriormente, onde alguns itens chegam a ter valor de sucata. A terra deixa de ser item especulativo para se tornar instrumento de produção,

podendo ocorrer maior desvalorização no caso do comprador desejar exercer atividade diferente na propriedade.

Com relação a manutenção da empresa ou produtor rural na atividade agrícola, foi citado por seis dos oito produtores (75% do público-alvo) que o maior empecilho é a emissão das certidões ambientais. Quanto maior o volume de produção, maior a dificuldade e burocracia junto aos ór-gãos estaduais.

Sendo questionados sobre quais certidões ambientais necessárias para o segmento, os entrevistados responderam que a variedade das licenças reflete do ciclo da cadeia produtiva da organização, sendo elas: Sistema RENASEM: cadastro no Registro Nacional de Sementes e Mudas, para a produção de sementes de arroz/soja; Licença de Operação de Irrigação: autoriza efetuar o bombeamento de água de um canal ou arroio; Certidão de Registro no Cadastro Flo-restal: declaração do consumo de lenha semestral da propriedade para secagem do arroz/soja; Licença de Operação do Secador: autoriza o funcionamento do secador de grãos da propriedade; Registro no INMETRO: necessidade de inspeção entressafras no caso de possuir balança para pesagem das cargas; Contrato de Expurgo registrado no CREA (Conselho Regional de Engenharia e Agronomia do RS): serviço de desratização e controle de pragas nos silos armazenadores de grãos; Anotação de Responsável Técnico (ART) junto ao CREA: aval de um Engenheiro para as licenças do secador, irrigação e expurgo.

A atividade agrícola engloba incertezas como qualquer segmento, porém foi unânime o prin-cipal fator de risco: a instabilidade da natureza. A escassez de chuvas, segundo os entrevistados, acarreta na diminuição do nível dos arroios e canais, dificultando o bombeamento de água para irrigação. Por outro lado, o excesso de chuva ou temporais na época da colheita, reflete no inchaço dos grãos e sua queda ao solo, diminuindo severamente o rendimento da área.

A incerteza que também acompanha a atividade, segundo os produtores, é a variabilidade da demanda do mercado. Quanto maior a safra, menor o preço de venda do produto e mais dificuldade de barganhar com os clientes, no caso, empresas beneficiadoras de grãos.

Em um mercado considerado conservador, onde os conhecimentos e teorias são, geralmente, passadas de pais para filhos, a tecnologia está sendo inserida gradativamente. Quando questio-nados sobre inovações tecnológicas no campo, a maioria dos produtores relatou a evolução dos implementos agrícolas. As colheitadeiras, semeadeiras e tratores de são equipados com cabines com diferenciais como ar-condicionado e GPS. As ferramentas de gestão, como softwares espe-cíficos já estão sendo utilizados em escritórios instalados nas próprias fazendas para cinco dos oito produtores entrevistados (63% da amostra).

A mão de obra especializada ainda é um empecilho para os produtores. A principal dificuldade é localizar operadores de máquinas agrícolas e especialistas para coordenação dos trabalhos em silos armazenadores e secadores de grãos, conforme relato dos entrevistados. Outro fator levantado por alguns produtores é a rotatividade de pessoal. Por haver o período entressafras e grande concorrência do setor, os empregados rurais não costumam permanecer na organização por grandes períodos.

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4.2 ENTREVISTAS COM EXPERTS: CUSTOS E INFORMAÇÕES ESTRATÉGICAS

No decorrer deste tópico são demonstrados os principais resultados obtidos por meio das entrevistas, os quais poderão auxiliar no projeto de implantação de área agrícola na Granja Santa Helena.

As respostas dos entrevistados ficaram dentro de parâmetros semelhantes, chegando-se a conclusão de que não existe uma “receita mágica” para o plantio de grãos, e sim a exigência de muita determinação e investimento.

Quando questionados sobre os custos para a exploração agrícola de uma área, os produtores relataram as seguintes despesas gerais: sementes, irrigação (incluso energia elétrica), secagem, armazenagem, manutenção de implementos agrícolas, defensivos/ inseticidas e gastos com pes-soal. Conforme Crepaldi (2009), a atividade agrícola é subdivida em cinco etapas: preparo do solo, preparo para o plantio, plantio de sementes, colheita e produtos colhidos para beneficiamento.

O calendário agrícola no Rio Grande do Sul, conforme os entrevistados, é estável e pontual. Este fator se deve ao clima de quatro estações bem definidas no estado. Sobre este assunto, os produtores foram incisivos: o plantio de arroz ocorre entre os meses de setembro e dezembro, e o semeio da soja entre setembro e janeiro. Já, a colheita dos grãos ocorre entre novembro e abril para o arroz, e para a soja, entre janeiro e maio. Quanto mais tardia a colheita do arroz e soja, de acordo com os entrevistados, menor o teor de umidade dos grãos, ocasionando em melhores rendimentos e afastando possíveis descontos de cargas.

A entressafra consiste no período em que existe escassez do produto no mercado, ou seja, nos meses em que as plantas estão germinando e amadurecendo. Os afazeres nesta época, citados pelos produtores, baseiam-se em controlar as pragas com defensivos, adubar áreas pouco de-senvolvidas e ficar atento às negociações do mercado de grãos.

Os rendimentos de uma área efetiva de cultivação agrícola dependem de múltiplos fatores, citados anteriormente nesta análise. Porém, existe uma média teórica ou projeção de safra presentes no conhecimento dos produtores rurais. O rendimento é definido em Kg por hectare (10.000 m²). Questionados sobre o assunto, as respostas dos entrevistados ficaram entre os se-guintes parâmetros: Rendimento médio de lavoura de arroz: entre 7.000 kg e 8.000 kg por hectare plantado; e Rendimento médio de lavoura de soja: entre 2.400 kg e 3.600 kg por hectare plantado.

Conforme Lemes (1996), a soja e o arroz fazem parte das culturas temporárias. Ou seja, são aquelas que disponibilizam apenas uma colheita, com curto período de vida. Já Marion (1999), define que as culturas temporárias “são aquelas sujeitas ao replantio após a colheita”. Dentre os custos expostos, despesas com irrigação, secagem e armazenagem foram apontadas como as de maior relevância e tiveram sua participação definida na receita bruta, conforme a figura 1. Com base nas respostas obtidas, foram realizadas médias aritméticas simples para os Custos A (Irrigação), Custos B (Secagem), Custos C (Armazenagem) e Custos D (Outros Custos). A média aritmética simples consiste na divisão da soma das observações coletadas pelo número quanti-tativo delas, conforme Neto (2008).

Figura 1: Custos médios da Atividade Agrícola

Fonte: Elaborado pelos autores.

Ou seja, a cada R$ 1.000,00 de receita bruta, R$ 440,00 compreenderiam a margem de lucro bruto da atividade, segundo os entrevistados. As despesas com secagem consumiriam 20% do montante, liderando os custos listados anteriormente. Os outros custos, como manutenção de maquinário, folha de pagamento, insumos agrícolas e sementes representariam 9% da receita da propriedade.

Dentre os produtores entrevistados, cinco relataram que participam de Contrato de Parceria Agrícola para exercer a atividade, totalizando 62% do público-alvo. E três produtores (38%) não participam de parcerias agrícolas. Aos entrevistados que responderam positivamente à indagação anterior, foi questionado como era o funcionamento desta parceria. De modo geral, as respostas coletadas mostraram-se muito semelhantes e parametrizadas. Os produtores não são proprietários das terras, sendo assim, tem a obrigação de quitar os frutos da parceria após a colheita dos grãos.

Este formato de organização, conforme Batalha (2007), pode apresentar uma solução adequada principalmente para pequenos produtores rurais. Visando inserção e permanência em cadeias produtivas e racionalização de custos e trabalhos, a parceria é uma relação bilateral e proporciona ganhos a ambas as partes envolvidas.

O pagamento dos frutos da parceria é definido em sacas por hectare constante no Contrato de Parceria Rural, assinado e registrado pelo proprietário e parceiro. As sacas de arroz compreen-dem em 50 kg do produto, enquanto a saca de soja confere 60 kg. Os custos com a produção, conforme os entrevistados são assumidos na totalidade pelo parceiro e benfeitorias realizadas na propriedade podem sofrer rateio através de um acordo pré-definido.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Por meio da fundamentação teórica e dos resultados encontrados ficou evidente que a pro-dução mista para a propriedade rural se mostra vantajosa e pode solucionar algumas incertezas do segmento.

Revista Atitude · Faculdade Dom Bosco de Porto Alegre · Ano XI - No 22 - janeiro a junho de 2017 9594 RELAÇÕES DE PARCERIAS: UM ESTUDO DE CASO PARA MAXIMIZAÇÃO DA PRODUTIVIDADE EM UMA EMPREDA RURAL.

O empreendimento rural moderno explora a diversidade do setor e atua com a produção mista, apresentando capacitação gerencial, adequação tecnológica e desempenho econômico (Nantes e Scarpelli, 2007).

Em conjunto com a pesquisa executada, foram propostas estratégias para a solução da situação problemática apresentada, como readequar os custos com a atividade pecuária e investir em mão de obra para desafogar a sobrecarga de tarefas.

A partir da análise, foi constatado que a implantação de uma Parceria Rural, para exercer a atividade Agrícola na Granja Santa Helena, mostra-se uma oportunidade rentável de maximizar a produtividade das suas terras.

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Revista Atitude · Faculdade Dom Bosco de Porto Alegre · Ano XI - No 22 - janeiro a junho de 2017 9796 ESPAÇOS RELIGIOSOS ENCARCERADOS: NOVO ARRANJOS NA PRISÃO.

ESPAÇOS RELIGIOSOS ENCARCERADOS: NOVOS ARRANJOS NA PRISÃO

Gilnei Copini1

RESUMO:

O presente artigo tem como objetivo principal o enfoque nas percepções que as manifestações religiosas produzem nos apenados que, possuem vinculo religioso, que poderá ser desde laços estabelecidos externamente à penitenciária, como também aqueles produzidos a partir de contatos estabelecidos internamente com a interação com grupos religiosos. As narrativas e ressignificações frutos dos processos de conversão religiosa dos presos que possuem de algum modo vínculos religiosos poderão ser distintas das vistas nos olhares consubstanciados por apenados que não as possuem, tendo em vista que, embora dado a priori, as religiosidades são vistas por alguns como instrumentos de neutralização do eu, porém, de outro lado, podem ser instrumentos de alteridade, principalmente no reconhecimento do outro.

PALAVRAS-CHAVE: prisões; religiosidades; espaço; territorialidades.

ABSTRACT:

The main objective of this article is to focus on the perceptions that the religious manifestations produce in those who suffer from religious affi-liation, which may be from ties established externally to the penitentiary, as well as those produced from contacts established internally with the interaction with religious groups . The narratives and resignifications re-sulting from the processes of religious conversion of the prisoners who have somehow religious ties may be different from those seen in the eyes consubstantiated by those who do not have them, given that, although gi-ven a priori, religiosities are seen by some As instruments of neutraliza-tion of the self, but, on the other hand, can be instruments of otherness, especially in the recognition of the other.

KEYWORDS: Prisons; Religions; space; Territorialities.

INTRODUÇÃO

O tema abordado parte da premissa que o sistema penitenciário não alcança seus fins estabe-lecidos do ponto de vista legal, especificamente no que se refere à pena privativa de liberdade a

1 Graduando em Direito na Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul, e-mail: [email protected].

ser cumprida pelos apenados, uma vez que, para aquém de ser infrutífero no seu projeto corretivo estabelecido, traz efeitos em sinal contrário, sendo um instrumento de estigma e mortificação dos seus apenados. Além disso, verifica-se que a pena, no binômio teórico/prático, possui uma dicotomia, pena ficta versus pena real, pois, enquanto está é verificada na realidade do sistema penitenciário, aquela é apenas a previsão, em abstrato, do que, em tese, deveria ser os fins da pena.

Verifica-se, também, em decorrência e conjuntamente, que o sistema penal é um meio de “etiquetamento”2, para além do já estabelecido anteriormente, dos apenados, visto que o estigma já pressuposto é consolidado no seu aprisionamento, logo, o inverso da previsão legal da pena é sedimentado.

A partir deste marco inicial, constata-se a participação de diversos entes na confluência de agentes que atuam, direta ou indiretamente, no cumprimento da pena pelo apenado, o papel das instituições religiosas entra em cena nesse vácuo, no qual o dever estatal acaba por, de uma forma ou outra, desaparecendo, elas passam a atuar diretamente na realidade social e política do apenado.

Busca-se, então, analisar, sabendo que se está circunscrito a uma instituição total, lida de acordo com as ideias de mortificação e deterioração do eu nas palavras de Goffman3, sendo visto esse processo realizado pela instituição como um instrumento em que o apenado ser social e político, desde as suas atividades mais complexas às mais simples ou vulgares, que, conforme Goffman, é efetivada em uma gradação de três etapas, quais sejam, iniciando-se pelo conheci-mento das “regras da casa”, perpassando à aquisição delas, com o caráter sancionatório através dos castigos aplicados nas “violações às normas internas da instituição”.

Esse processo, enquanto pode ser visto de um lado como uma constante reificação do apenado, pode ser, de outro lado, com o qual trabalharemos, um processo que traz em si uma trajetória que será vivenciada pelo interno, adquirindo um determinado habitus, que é peculiar da instituição total, porém, e em especial do núcleo que há o campo interacional com as instituições religiosas. Isto é, embora a prisão, por si só, tenha um habitus sui generis, o estabelecido no campo4 que as religiões possuem um papel central é diverso, em certa forma, do que está posto na instituição no seu todo.

Conforme Dias5, os apenados que estabeleceram alguma relação religiosa passam a deter um comportamento que os distingue dos demais apenados, sendo, inclusive, de maior controle e contingenciamento, uma espécie de capilarização do controle total estabelecido pela instituição penal, pois, uma vez realizada a conversão para “o evangelho”, o preso acaba se apartando da massa carcerária6, submetendo-se a inúmeras práticas religiosas que lhe atribuem uma nova

2 BARATTA, Alessandro. Criminologia Crítica e Crítica do Direito Penal: Introdução à Sociologia do Direito Penal. 2ª ed. Rio de Janeiro. Freitas Bastos: Instituto Carioca de Criminologia, 1999. p. 85 et. seq.; BATISTA, Vera Malaguti. Introdução Crítica à Criminologia Brasileira. Rio de Janeiro: Revan, 2011. p. 73. et. seq; ANITUA, Gabriel Ignácio. Historias de Los Pensamientos Criminológicos. Buenos Aires: Del Puerto, 2005. p. 363 et. seq.

3 GOFFMAN, Erwin. Manicômios, prisões e conventos. 4a ed. São Paulo. Ed. Perspectiva, 1978. p. 49 a 52.

4 BOURDIEU, Pierre. O poder simbólico. Lisboa: DIFEL / Rio de Janeiro: Ed. Bertrand Brasil. S.A. p. 64-65.

5 DIAS, Camila Caldeira Nunes. A igreja como refúgio e a Bíblia como esconderijo – Religião e violência na prisão. São Paulo. Ed Huma-nitas, 2008. p. 219.

6 O termo “massa carcerária” será utilizado para distinguir todos os apenados, sem distinção, com os apenados que são especificados por grupos, especificamente os que possuem vinculo religioso, que, via de regra, são grupos que mantém um vinculo entre si, como um relativo afastamento do restante dos apenados, lidos, então como “massa carcerária”.

Revista Atitude · Faculdade Dom Bosco de Porto Alegre · Ano XI - No 22 - janeiro a junho de 2017 9998 ESPAÇOS RELIGIOSOS ENCARCERADOS: NOVO ARRANJOS NA PRISÃO.

identidade7 (ressignificação).

Logo, as narrativas e ressignificações dos presos que possuem de algum modo, e isso pode ser proveniente de relações estabelecidas intra ou extramuros, vínculos religiosos poderão ser distintas das vistas nos olhares consubstanciados por apenados que não as possuem, tendo em vista que, embora dado a priori, as religiosidades são vistas por alguns como instrumentos de neutralização do eu, porém, de outro lado, podem ser instrumentos de alteridade, em algum sentido, principalmente no reconhecimento do outro, como também de tensionamento a partir de uma certa aquisição de autonomia8.

Do ponto de vista metodológico, em razão do trabalho estar em processo na sua fase inicial, foram realizadas entrevistas semiestruturadas e não-estruturadas com interlocutores religio-sos – pastores, especificamente – no interior do estabelecimento penal, até então. A partir dos referidos já é possível verificar alguns pontos sobre os processos de conversão promovidos e, principalmente, a delimitação do que denomino espaço prisional religioso como resultados da apropriação de determinados pavilhões e galerias por grupos religiosos, caracterizando-se em novas territorialidades formadas.

Dessa forma, busca-se analisar os processos de conversão como vetor para atribuição e (re) criação de significações nas práticas individuais e coletivas dos apenados que tomam contato com as religiosidades no interior da prisão.

1. DEMARCAÇÃO DAS PRISÕES E RELIGIOSIDADES NO CENÁRIO CONTEMPORÂNEO

Para abordar sistematicamente este trabalho é necessário de antemão estabelecer alguns pressupostos, como um fio condutor para a pesquisa socioantropológica que se pretende realizar. Salienta-se, primeiramente, que a pesquisa será feita em um campo revestido de caráter totalitá-rio, no qual o eu, lido como a consciência de si e para si, é negado a todo o momento, alcançando o seu ápice na sua mortificação consolidada9.

Os estudos e as análises acerca das prisões e instituições penais têm como ponto de partida meados dos anos 60, principalmente a partir de grupos urbanos marginalizados, o que vai ao en-contro das teorias subculturais. Como referenciais para respectivos estudos e análises têm-se algumas obras tidas como essenciais para o entendimento da temática.

A primeira obra de relevância é Outsiders, livro de Howard Becker, que foi publicado em 1963. Becker10 desenvolve na obra uma análise que versa sobre o comportamento desviante, estabele-ce uma ideia do que se trata o desvio, como uma abordagem produzida por distintos grupos em diferentes espaços e tempos em suas interações.

7 JUNGBLUT, Airton Luiz. Deus e nós, o diabo e os outros: a construção da identidade Religiosa da Igreja Universal do Reino de Deus. Cadernos de Antropologia.. PPGAS - UFRGS. 1992. 45 - 62. GOFFMAN, Erwin. Estigma - notas sobre a manipulação da identidade deterio-rada. 4a ed. Rio de Janeiro: Ed. Guanabara.

8 RODRIGUES. Gilse Elisa. Transgressão, controle social e religião: um estudo antropológico sobre práticas religiosas na penitenciária feminina do estado do rio grande do sul. Porto Alegre. UFRGS. Debates do NER, ano 6, n. 8, p. 17, jul./dez. 2005. Et. Negociando crenças: um estudo antropológico sobre conversão religiosa em uma penitenciária feminina. Dissertação (Mestrado em Antropologia Social)–PPGAS, Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, 2002.

9 P. 66.

10 BECKER. Howard S. Outsiders: Estudos de sociologia do desvio. 1a ed. Rio de Janeiro. Jorge Zahar Ed. 2008.

Outra obra de muita importância para o tema é o estudo realizado por Goffman11, Manicômios, prisões e conventos, com publicação em 1961. O autor possui um referencial teórico que é muito importante para a compreensão da instituição penal como uma instituição, que, dentre uma de suas funções, é a mortificação do eu, tendo em vista seu caráter hermético e formalmente admi-nistrado por técnicos, com a restrição de liberdade dos apenados o ponto principal.

Por fim, mas não menos importante, é a obra de Michel Foucault12, que traz estudos sobre poder e vigilância sobre os corpos internos, tendo como centro a análise de algumas instituições disciplinadoras. Vigiar e Punir é a obra que coloca a prisão como objeto de estudo central, uma vez que propõe uma revisão de toda a formação histórica das prisões. Foucault enxerga a prisão, nesta perspectiva, como sendo um local que conflui diversos mecanismos de controle que são estruturados e ligados com a finalidade de “reeducar” ou docilizar, nas palavras de Foucault, os corpos dos detentos, físico e psicologicamente, almejando sua punição, embora, em tese, fala-se em ressocialização. Como o próprio Foucault13 aborda, “a disciplina fabrica assim corpos submissos e exercitados corpos “dóceis”. A disciplina aumenta as forças do corpo (em termos econômicos de utilidade) e diminui essas mesmas forças (em termos políticos de obediência)”.

A partir disso, perpassando a crítica às instituições penais, entra-se na esfera que está locali-zado o objeto da análise, fazendo uma abordagem também com as teorizações sobre as funções da pena, que podem variar no seu caráter preventivo especial e geral, como retribucionista.

À luz de uma leitura constitucional, a pena só pode ser vista no seu caráter preventivo e especial, visto que seu caráter retribucionista - o qual, em síntese, estabelece que a negação da negação é a afirmação, conforme o silogismo hegeliano, ou seja, uma vez o direito refutado pelo crime, a pena nega o crime, logo afirma o direito – não possui lastro constitucional em razão da negação do apenado como sujeito de direito, sendo um simples objeto.

Portanto, em tese, deve ser lida a pena na sua face preventiva especial e geral, positiva ou ne-gativamente. A pena na sua face especial positiva vai ao encontro da ideia da correção do apenado, buscando-se a sua ressocialização junto à sociedade, enquanto a negativa busca, sob o manto da segurança pública, neutralizar o apenado, o que, em certa medida, está ancorado na perspectiva de docilização ou mortificação do eu14. Na sua outra face, a pena está pautada na prevenção geral, negativa ou positiva, que possui a “sociedade” como objeto, uma vez que, enquanto a negativa visa “coagir” futuros “predispostos” a cometer delitos sob uma “ameaça indireta”, a positiva busca uma (re)integração do corpo social, de forma simbólica em certo ponto, mas com um matiz de natureza estrutural-funcionalista15.

Embora, superficialmente, já tenha sido realizada uma pequena distinção entre pena ficta e a pena real, é necessário ressalvar novamente que a abordagem desta pesquisa está no encontro da pena real, e não a ficta, pois não há como confluir ambas para um mesmo campo, uma vez que são, quase em absoluto, antípodas uma da outra. Logo, o caráter preventivo geral e especial

11 GOFFMAN, Erwin. Manicômios, prisões e conventos. 4a ed. São Paulo. Ed. Perspectiva, 1978.

12 FOUCAULT, Michel. Vigiar e punir: nascimento da prisão. 27a ed. Petrópolis. Ed. Vozes, 1987.

13 Ibidem. P. 212.

14 DOS SANTOS. Juarez Cirino. Direto Penal: Parte Geral. 3ed. Curitiba: ICPC. Lumen Juris. 2008. P. 499-501.

15 DURKHEIM, Émile. As regras do método sociológico. 3ª ed. São Paulo: Martins fontes. 2007. P. 57-59.

Revista Atitude · Faculdade Dom Bosco de Porto Alegre · Ano XI - No 22 - janeiro a junho de 2017 101100 ESPAÇOS RELIGIOSOS ENCARCERADOS: NOVO ARRANJOS NA PRISÃO.

da pena é quase inexistente, por isso a lacuna criada para o preenchimento das instituições re-ligiosas que atuam nessa esfera.

Desse modo, lançando mão das premissas que trazem uma base de campo de partida, as pes-quisas realizadas até o momento sobre a temática que a respectivo projeto ora em pauta pretende discorrer foram realizadas em penitenciárias que são distintas à penitenciária que a pesquisa tem por objetivo, que será o Presídio Central de Porto Alegre, por isso, até o momento, no que se refere a dados coletados o material é apriorístico, não sendo, portanto, de certa forma, validado pelo campo empírico. O que se pode, no entanto, afirmar em relação à atuação das instituições religiosas na esfera prisional é apenas um ponto dentro de uma macroestrutura de crescente demanda do campo religioso, que, conforme Bourdieu16 é um espaço social marcado pelas relações de disputa entre especialistas e leigos (estes últimos entendidos num duplo sentido: os estranhos ao sagrado e ao corpo administrador do sagrado) e entre os diversos especialistas entre si pela imposição e definição do religioso e das distintas maneiras de desempenhar as ações religiosas e, consequentemente, pelas disputas em tomo da acumulação de capitais religiosos.

Por isso, verifica-se que, embora as religiões de matriz (neo)pentecostal sejam predominantes em âmbito prisional, outras matrizes são verificadas em tal âmbito, conforme:

Investigando quais eram as igrejas que os detentos afirmavam participar (pergunta 30), pude notar que as combinações de igrejas frequentadas são as mais diversas. No entanto, é possí-vel descrever algumas “regras”: a primeira delas é a de que os frequentadores de igrejas de orientação pentecostal raras vezes também frequentavam a Igreja Católica, sendo o inverso (católicos frequentando cultos evangélicos) uma situação mais comum; a segunda, que o espi-ritismo kardecista apareceu como uma opção religiosa (principal ou secundária) socialmente mais aceita que as religiões de matriz afro-brasileira (em especial, candomblé e umbanda) neste universo prisional. Com relação aos pentecostais, encontrei tanto casos de detentos que não participavam de outra igreja além daquela na qual foram batizados, como casos em que o detento frequenta simultaneamente um a igreja tida como “mais rígida”’ (como a Igreja Pentecostal Deus é Amor, por exemplo) e uma “menos rígida” com relação ao comportamento (como a IURD). O que se apresentou como mais recorrente, no entanto, é algum vínculo com a Assembleia de Deus. Sendo a igreja pentecostal brasileira mais antiga (sua fundação data de 1911, em Belém do Pará) e também a que estava “instalada” nas unidades penais pesquisa-das havia mais tempo (cerca de dez anos), a AD ocupava uma posição privilegiada no campo pesquisado. Não foi possível determinar o número de detentos que frequentavam a AD, mas foi possível verificar como esta igreja era reconhecida como uma igreja “consolidada” [...]17.

O mesmo é verificado em Bicca (2005), na pesquisa para a dissertação de mestrado no Pro-grama de Pós-Graduação em Antropologia Social da Universidade Federal do Rio Grande do Sul:

O Estrela do Cárcere surgiu como muitos outros grupos da Assembleia de Deus, que tem como uma de suas principais características o incentivo a pequenos núcleos de fieis em lugares onde não se tenha uma igreja sede. Esses grupos podem iniciar as reuniões nas suas próprias casas e não necessariamente precisam da presença de um pastor. Com o tempo e a adesão de novos fieis, poderão ser incorporadas a uma comunidade maior ou, ainda, a um pastor de-signado pelas lideranças da igreja para conduzi-los e assim constituir uma nova congregação. [...] Historicamente a Assembleia de Deus, desde o seu nascimento ate os dias de hoje, tem pregado a necessidade de conversão prioritariamente junto às comunidades periféricas e marginalizadas da sociedade. Como consequência os presídios configuraram em um terreno fértil para a atuação dos pastores no combate ao “mal” e na busca de novos fieis18 [...].

16 BOURDIEU, Pierre. A economia das trocas simbólicas. 6ª ed. São Paulo. Ed. Perspectiva, 2007. P. 28-30.

17 SCHELIGA, Eva Lenita. E me visitastes quando estive preso: sobre a conversão religiosa em unidades penais de segurança máxima. Dissertação (Mestrado em Antropologia social) – PPGAS, Universidade Federal de Santa Catarina, Florianópolis, 2000. P. 148-149.

18 BICCA, Alessandro. Os eleitos do cárcere: etnografia sobre violência e religião no sistema prisional gaúcho. Dissertação (Mestrado em Antropologia Social) – PPGAS, Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre. 2005. P. 9-10.

Nesse sentido, Rodrigues (2005) expõe qual a ideia de uma pesquisa que aborde essa temática:

Tendo como ponto de partida essa constatação, iniciei no ano de 2000, dentro do programa de Pós-Graduação em Antropologia Social da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, um estudo, de caráter etnográfico, contemplando as relações estabelecidas entre mulheres aprisionadas e agentes de instituições religiosas que atuavam dentro da Penitenciária Femi-nina do Estado do Rio Grande do Sul. Minha intenção naquele momento era compreender as possibilidades que tais relações estariam trazendo para as mulheres em privação de liber-dade, no que se refere à reorganização de suas trajetórias e biografias através de elementos retirados da linguagem religiosa19.

Embora as pesquisas anteriores possuam pontos em comum entre si, há também pontos que não estabelecem congruência entre si, uma vez que podem, ou não, os grupos de apenados com vínculos religiosos estarem separados dos outros apenados que não possuem vínculos religiosos, isso irá depender da penitenciária em que estiverem.

De fato, as religiosidades, nas suas mais diversas correntes, são caracterizadas como um fato social, uma vez que a qualquer espaço e tempo são verificadas manifestações religiosas, desde as sociedades primitivas ou mecânicas, até as sociedades complexas ou orgânicas20. Não se pode, pois, negar a historicidade que está presente no papel de fundo de todas as movimentações religiosas, embora, em algum sentido, possa ser falado em secularização21, e, principalmente, em laicidade, porém, o poder espiritual imbrincado com o temporal foi uma constante por uma largo lastro histórico e politico.

Sobrestando a ênfase na abordagem acerca das manifestações religiosas e suas especificida-des, ressalvo que na respectiva pesquisa irei fazer uso de vários conceitos utilizados nas Ciências sociais, como conceitos de habitus, agentes, campo22 que serão essenciais para a abordagem sistêmica e apontamentos da pesquisa.

A partir de tais conceitos facilitar-se-á a compreensão do objeto da respectiva, que serão as narrativas, (inter)faces e ressignificações dos apenados como frutos dos discursos e atividades religiosas que são internalizadas por si, pois o enfoque busca ressaltar as individualidades, não tergiversando a coletividade, no entanto. Narrativas, pois irão ser buscadas as mais distintas percepções dos apenados e agentes do corpo técnico-administrativo; (inter)faces porque serão uma consequência das percepções a partir das narrativas dos internos, o “inter” é proposital no sentido em que não se pode prever que todas as narrativas sejam sinônimas entre si, o que, de fato, negaria a singularidade que é intrínseca a cada ser possuidor de sensores políticos e sociais; ressignificações como fruto da “conversão”, que deve ser lida com várias ressalvas já dadas a priori, tendo em vista que estamos a falar em um processo de transformação do sujeito com di-mensões e significados próprios, são alterações nas suas biografias, um contexto de rupturas nas trajetórias de cada singularidade23, ou seja, uma proposição que está para além de uma simples

19 RODRIGUES. Gilse Elisa. Transgressão, controle social e religião: um estudo antropológico sobre práticas religiosas na penitenciária feminina do estado do rio grande do sul. Porto Alegre. UFRGS. Debates do NER, ano 6, n. 8, p. 11, jul./dez. 2005.

20 Nesse sentido, ibidem Durkheim.

21 Trabalho, neste ponto, a secularização como o alcance por uma sociedade qualquer do desenlace, do ponto de vista temporal e espiritual, de uma religião em específica, ou seja, não há, formalmente, uma religiosidade que é tida como regra pragmática, tampouco vinculada ao ente oficial.

22 Bourdieu, p. 59-65.

23 Utilizo o termo interlocutor em referência aos postores, obreiros e outros representantes de instituições religiosas que realizem trabalhos de pregação, estudos e distribuição de qualquer religiosidade no estabelecimento.

Revista Atitude · Faculdade Dom Bosco de Porto Alegre · Ano XI - No 22 - janeiro a junho de 2017 103102 ESPAÇOS RELIGIOSOS ENCARCERADOS: NOVO ARRANJOS NA PRISÃO.

conversão cartesiana como se fosse uma moeda que possui apenas o verso e a frente.

É em razão dessas três esferas de percepções que a síntese paira sobre a metáfora utilizada no titulo “ovelhas (des)protegidas do projeto de pesquisa, pois, conforme foi supracitado, as correntes (neo)pentecostais detêm um predomínio nesse campo, sendo seus evangelizadores chamados, informalmente, de “pastores”, como também a previsão bíblica que faz referência ao rebanho de ovelhas, que são os “fiéis”, os quais podem, ou não, buscar no campo religioso uma forma de conversão, convencimento ou simples guarida protetiva perante a instituição total do cárcere, por isso a duvida que permanece em curso sobre essa proteção, ou não, que passam a receber.

2. RELIGIOSIDADES PULVERIZADAS E CONCENTRADAS: UMA BREVE SÍNTESE DO ESTADO DA ARTE RELIGIOSO NO PRESÍDIO CENTRAL DE PORTO ALEGRE

A participação de instituições religiosas, através de interlocutores24 que exercem o papel de representante de cada confissão, não é obstada pela administração da Cadeia Pública de Porto Alegre, desde que preenchidos os requisitos dispostos na LEP, bem como a Lei nº 9.982, de 14 de julho de 2000 e a Resolução nº 08 de 09 de novembro de 2011, as quais regulamentaram a assis-tência religiosa. O procedimento que as instituições religiosas realizam para ingressar na Cadeia Pública e passar a exercer suas atividades é, incialmente, entrar em contato com a Assessoria que verificará se o interlocutor pertence a uma determinada instituição religiosa, bem como o preenchimento dos requisitos, se verificados esses pontos será realizado o credenciamento e, posteriormente, passará para a análise da Direção que irá autorizar ou não a entrada do grupo ou interlocutor religioso.

Atualmente, como dito, contabilizam-se 13 (treze) representações religiosas que prestam assistência na Cadeia Pública, das quais a presença, sobretudo de confissões evangélicas, é a característica desse matiz religioso, com a verificação de territorialidades que são constituídas como nas galerias 2 e 3 do Pavilhão J. Verifiquei, também, que houve duas representações que afastarem-se, uma por vontade própria, enquanto a outra foi por determinação da própria admi-nistração da Cadeia Pública.

As representações, a título ilustrativo, atuais são as seguintes: Assembleia de Deus; Igreja Batista Filadélfia; Igreja Internacional da Graça de Deus, Pentecostal Deus é Amor; Pentecostal Só Cristo tem Poder; Igreja Católica – Igreja São Jorge e Pastoral Carcerária -; Grupo Apoio Espiritual; Igreja Universal do Reino de Deus; Assembleia de Deus Ministério da Restauração; Igreja Evangélica Encontros de Fé; Assembleia da Glória de Deus; e Igreja Ministério Profético da Palavra Divina.

Por outro lado, a matriz Umbanda que por um determinado tempo se fez presente na galeria 3 do H não está mais exercendo atividades na Cadeia Pública, em razão da falta de interesse em permanecer com os trabalhos, conforme as informações repassadas pela Soldada Lizandra. Aliás, em relação à Umbanda há uma característica peculiar que a trouxe à Cadeia Pública se diferenciando das demais, pois não procurou se credenciar, e sim foi procurada pela Assistente

24 Utilizo o termo interlocutor em referência aos postores, obreiros e outros representantes de instituições religiosas que realizem trabalhos de pregação, estudos e distribuição de qualquer religiosidade no estabelecimento.

Social Marluza, mediante pedido da Direção que foi contata por presos da 3 do H para receber assistência de um grupo umbanda.

Embora o interesse deste grupo específico de apenados, o grupo Umbanda não permaneceu com suas atividades, razão pela qual não há, atualmente, credenciamento oficial de represen-tações de matrizes afro-brasileiras na Cadeia Pública. Outra representação que não está mais presente é a Espírita Atena Roveda, que se tratava de uma moça que semanalmente distribuía passes e realizava atividades culturais com cunho religioso junto aos apenados da galeria 3 do H, que, por razões de segurança da casa depois da ocorrência de alguns episódios, não mais obteve autorização para realizar as atividades.

Para além da atuação oficial das confissões mencionadas, todos os pavilhões e suas respec-tivas galerias têm atividades religiosas realizadas autonomamente pelos presos, inclusive sendo verificadas manifestações afro-brasileiras em alguns pavilhões, “de vez em quando a gente escuta uma batucada que vem de algum pavilhão”, nas palavras de um soldado que informalmente con-versei. Não só, os presos, por vezes, em determinados pavilhões parecem ter preferência em se organizar autônoma e coletivamente para as atividades religiosas, não havendo discriminação e exclusão de um preso que é fiel de outra religião participar de semanalmente no pátio do pavilhão.

Essa linha foi a que pude detectar em diálogo com um ex-apenado vinculado à Assembleia de Deus, do Pavilhão D, que afirmou existirem vários grupos autônomos de religiosos naquele setor, com um número aproximado de 400 (quatrocentos) evangélicos – sem distinção entre as diversas correntes -, 100 (cem) católicos e 15 (quinze) umbandas. Neste pavilhão, os encontros dos evangélicos são realizados diariamente, pois entre eles há um interno que é pastor, enquanto que, do ponto de vista da assistência prestada por pastor externo, ocorre 02 (duas) vezes encontro com grupo que não é filiado à sua corrente, não há desavenças e conflitos entre fiéis de distintas religiões, porém o tratamento dispensado entre os que seguem a mesma é diferente, conhecem-se entre si como “irmãos”, responsabilizam-se para com o outro de forma diferenciada, isto é, há um ar de certa co-responsabilização numa ótica de alteridade.

Em paralelo, há atividades realizadas diariamente por interlocutores religiosos externos que atuam na Cadeia Pública, realizadas diretamente nos pavilhões com a “massa carcerária” ou na capela também com apenados de todos os pavilhões de forma indiscriminada. Destaca-se, nesta categoria, a ação do Grupo Apoio Espírita nas segundas-feiras à tarde das 13h30min às 16h na capela a todos que possuem interesse, como também, no mesmo local, cultos realizados nas sextas-feiras pela manhã por interlocutores da IURD. Há encontros realizados semanalmente, nas quartas-feiras à tarde, também, no Pavilhão E pela IURD, enquanto que os cultos na Cozinha Geral pelo Pastor Mauro, da Igreja Ministério da Restauração, nas terças-feiras à tarde das 18 h às 20h, e pelo Pastor Jeferson nos domingos reservado apenas aos apenados locados na Cozinha Geral. Além desses encontros há outros que são realizados a critério dos interlocutores religiosos que irão liderar as atividades, por isso não há uma taxatividade na previsão dos encontros.

Durante o curso da pesquisa, pude detectar nuances em relação à atuação de certos pastores nas atividades religiosas e, especificamente no que diz respeito à liderança que exercem sobre os apenados, vistos como “pai” para muitos ou alguém que traz “uma palavra de conforto”. Desses

Revista Atitude · Faculdade Dom Bosco de Porto Alegre · Ano XI - No 22 - janeiro a junho de 2017 105104 ESPAÇOS RELIGIOSOS ENCARCERADOS: NOVO ARRANJOS NA PRISÃO.

pastores destaco o Pastor Mauro e Sérgio Cortez, da Igreja Ministério da Restauração, o Pastor Jeferson, da IURD, a Pastora Rita, da Igreja da Graça de Deus, e o Pastor Elton, da Igreja Batista Filadélfia, os quais são as principais referências, enquanto lideranças externas, perante o corpo de apenados, o que é corroborado pela Soldada Lizandra.

Outro dado que julgo relevante é a tentativa de (re)inserção de setores da Igreja Católica na Ca-deia Pública, uma vez que, a partir do início dos anos 2000, perdeu força face à “massa carcerária” para os grupos evangélicos que conseguiram apropriar de forma rápida as prisões brasileiras. Hoje, a Igreja Católica embora presente com interlocutores da São Jorge, está com um grupo da Pastoral Carcerária em contato com os apenados da galeria 1 do E, por se tratar de galeria que possui o público em processo de desintoxicação, os quais são julgados como “mais tranquilos” para começo das atividades de assistência religiosa.

Há, na Cadeia Pública, um grupo denominado de Narcóticos Anônimos (NA), que se reúne semanalmente nas segundas-feiras à noite, das 18h às 19h a fim de prestar assistência no pro-cesso de desintoxicação dos apenados, porém, contrariamente ao que foi constatado por Vargas (2005b, p. 23) não se caracterizam como um grupo religioso, ainda que seus membros possam ser fiéis – e são - de determinadas confissões religiosas. O fator que exclui, na minha análise, o grupo da esfera religiosa é o despojamento em relação à determinada confissão que não é revela-da, não há uma organização/instituição religiosa por trás, como ocorre com as outras confissões verificadas na Cadeia Pública.

Da pulverização25 das atividades e religiosidades circunscritas que permeiam o ambiente prisional interliga-se à construção de territorialidades26 religiosas, que é o caso das galerias 2 e 3 do Pavilhão J, ambas com 53 (cinquenta e três) apenados cada, todos evangélicos e locados em espaço destinado apenas a membros convertidos “irmãos”, os quais recriam suas vivências e significações com a ruptura que ocorre no momento da suas saídas da “massa carcerária” para junto com os “irmãos”, em um setor só dos “irmãos” e para os “irmãos”.

Enquanto que nas galerias 2 e 3 do J a característica que os vinculam é a conversão religiosa, na Cozinha Geral, que ampara 31 (trinta e um) presos trabalhadores religiosos ou tão somente trabalhadores a característica que prepondera nos seus liames de contato é, imediatamente, serem trabalhadores da Cozinha Geral, porém o fundo religioso que paira sobre as sociabilida-des é pujante, uma vez que geralmente os presos trabalhadores da cozinha possuem contato constante com as religiosidades. Não há como afirmar que ocorre conversão em todos os presos trabalhadores da Cozinha Geral, mas a afirmação que a maior parte deles de uma forma ou outra trazem subjetividades arraigadas em certas religiosidades é possível, principalmente pelo amplo contato com religiosos internos e externos.

A abertura concedida às representações religiosas é controlada pela administração da Cadeia Pública com acompanhamento, mas sem a intervenção direta nas atividades até o momento em que há fatores que impedem a continuidade das atividades, conforme o caso da Espírita Atena Roveda.

25 Utilizo o termo como sinônimo de capilarização e descentralização.

26 Trabalho em relação ao conceito de territorialidade com a literatura de Raffestin (1993), que a sintetiza como o produto do processo de territorialização de espaços por atores sociais, coletivamente ou não. Neste aspecto dos pavilhões e galerias da Cadeia Pública, são produções e arranjos construídos e resultantes de ações coletivas, ou seja, ocorre a perfectibilização de novas identidades coletivas que emergem a partir das territorializações dos espaços.

No entanto, o referido respaldo institucional concedido pela assessoria e setores operacionais da Cadeia Pública não se restringe apenas ao credenciamento, autorização e acompanhamento, transpõe para o campo do trabalho em conjunto em relação a algumas demandas dos apena-dos, uma vez que as baixas condições matérias de manutenção do estabelecimento penal gera a necessidade da participação de vários atores sociais para viabilizá-la, principalmente no que tange às doações de produtos de higiene e acolhimento familiar prestado pelos grupos religiosos externos que atuam na prisão.

A exemplo do afirmado, a Igreja Ministério da Restauração, de acordo com a Soldada Lizandra, é quem mais adquire matérias de higiene aos apenados, enquanto a IURD é a que prefere prestar assistência às famílias em ocasiões festivas, como Festa de Páscoa, de Natal, da Criança, inclusive batismos aos (às) filhos (as) dos apenados. Trata-se do exercício de marketing que lhe caracteriza, há uma sobreposição dos interesses de conversão religiosa em face da tentativa de um processo de ressocialização dos apenados, destacando-se como a corrente religiosa que perfectibiliza sua atuação na efetividade dos processos de conversão.

Dentro desse contexto, as múltiplas redes de sociabilidades internas às diferentes galerias enquanto espaços constantemente (re) elaborados são criadas e (re) criadas, com cristalizações de espaços religiosos no todo ou em parte com territorialidades religiosas que determinam os as-pectos e vivencias dos presos que (sobre) vivem no espaço prisional enquanto “espaço de espaços”.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Até o momento, tendo em vista que a pesquisa está somente no seu início, verifiquei situações semelhantes e outras diversas no que diz respeito às manifestações religiosas no Presídio Central de Porto Alegre – atualmente, Cadeia Pública de Porto Alegre -, especificamente em relação aos presos do Pavilhão J, que é destinado na primeira e segunda galerias exclusivamente aos “irmãos”, enquanto que os demais pavilhões e galerias que possuem espaços religiosos com forte presença.

Os pontos de maior distinção diz respeito à questão das regras e codificações que são veri-ficadas nas práticas diárias dos presos do J, os quais delimitam e observam todos os seus atos e falas a partir da religiosidade, isto é, dedicam basicamente a totalidade do seu dia à religião, desde simples estudos às limitações e proibições que são determinadas pelas normas implícitas e explícitas que o fator religioso que rege as relações sociais do local impõe.

Por outro lado, esse ponto não é totalmente verificado ao serem analisados os outros pavilhões que possuem inseridos em si espaços religiosos, muito embora o papel de fundo das relações estabelecidas, às vezes, ocorre a partir do fenômeno religioso. Ocorrem proibições e limitações, porém em menor percentual, isso porque o espaço religioso não é o único presente naquele espaço macroestrutural que conjuga diversos espaços em si. As religiosidades são um dos fenômenos – ou territorialidades – presentes, mas não a única e a que rege todas as relações do local.

Além disso, os processos de conversão são idênticos em lato sensu, distintos stricto sensu, uma vez que, na delimitação do espaço religioso do J são constantes e impositivos, enquanto nos demais é atenuado, são facultadas as práticas, atividades e narrativas que no J são vistas como

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obrigatórias.

REFERÊNCIAS

ANITUA, Gabriel Ignácio. Historias de Los Pensamientos Criminológicos. Buenos Aires: Del Puerto, 2005.

BARATTA, Alessandro. Criminologia Crítica e Crítica do Direito Penal: Introdução à Sociologia do Direito Penal. 2ª ed. Rio de Janeiro. Freitas Bastos: Instituto Carioca de Criminologia, 1999.

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Revista Atitude · Faculdade Dom Bosco de Porto Alegre · Ano XI - No 22 - janeiro a junho de 2017 109108 IMPLEMENTAÇÃO DE SIMULAÇÕES COMPUTACIONAIS DE N-CORPOS.

IMPLEMENTAÇÃO DE SIMULAÇÕES COMPUTACIONAIS DE N-CORPOS

Filipo Novo Mor1

Luis Fernando Fortes Garcia2

Letícia Garcia3

RESUMO

Destinado a desenvolvedores sem experiência na área da programação cientifica, este artigo tem por objetivo descrever quais as características necessárias a um código de simulações de n-corpos de forma que este atenda aos requisitos básicos do ponto de vista físico, de maneira que as simulações resultantes possam ser utilizadas na representação de fenô-menos físicos reais. Para tal, o problema de n-corpos será descrito do ponto de vista físico, bem como as estruturas de programação que imple-mentam estas regras. Finalmente, será analisada a forma de validação das simulações, a partir do monitoramento da energia do sistema de par-tículas e da dinâmica do movimento destas durante a evolução da simula-ção e também, possíveis alternativas de otimização do código a partir do uso de implementações paralelas.

ABSTRACT

Intended for beginners on scientific programming area, this paper aims to describe what are characteristics required by a n-body code in order to attend the physical basic constraints, in a manner in which the resulting simulations may be used to represent real world physical phenomena. For that, the n-body problem will be described from its physical point of view, as well as the programming structures needed to implement those phy-sical features. Finally, it will be discussed how to evaluate the resulting simulations, from monitoring the energy of the particle system and the kinematic of those particles during the running simulation and also alter-native optimizations based on parallelizing the code.

1. SOBRE O PROBLEMA DE N-CORPOS

Proposto inicialmente por Sir Isaac Newton (1643-1727) em seu “Philosophiae naturalis princi-pia mathematica” de 1687, o problema de n-corpos trata da relação gravitacional entre sistemas contendo duas ou mais partículas no espaço. Estudando o problema com um sistema com apenas

1 Bacharelado em Sistemas de Informação - Faculdade Dom Bosco de Porto Alegre (FDBPOA); E-ail: [email protected]

2 Bacharelado em Sistemas de Informação - Faculdade Dom Bosco de Porto Alegre (FDBPOA); E-mail: [email protected]

3 Bacharelado em Sistemas de Informação - Faculdade Dom Bosco de Porto Alegre (FDBPOA); E-mail: [email protected]

duas partículas, Newton foi capaz de comprovar matematicamente que as leis dos movimentos celestes propostas por Johanes Kepler (1571-1630) estavam corretas. A partir de então, tornou--se possível a utilização das equações de movimento para a descrição e predição de orbitas dos corpos celestes, como por exemplo de planetas e cometas.

Considerando-se um sistema de partículas livre no espaço e sem receber a influencia de ne-nhuma força externa ao sistema, este conjunto de partículas sofrera a ação da força de gravidade de suas próprias partículas. O calculo desta força foi definido por Newton como a Lei da Gravitação Universal, que é mostrada na fórmula 1:

(1)

Onde:

Uma vez que o sistema é composto por dois ou mais corpos, cada partícula recebe a influencia gravitacional de todas as outras componentes do sistema, de forma que pode-se calcular a força exercida sobre uma partícula especifica somando-se a atração sofrida por esta a partir da força gerada por todas as demais partículas do sistema, como mostrado na fórmula 2:

(1)

Nesta fórmula, o versor que dá a direção da força já foi normalizado, resultando no expoente cubico mostrado no termo mais a direita.

Para o cálculo da energia do sistema de partículas, soma-se o valor das energia cinética e potencial de cada uma das partículas. A energia cinética (Ek) é calculada de acordo com a fórmula 3, onde v representa a velocidade da partícula.

Revista Atitude · Faculdade Dom Bosco de Porto Alegre · Ano XI - No 22 - janeiro a junho de 2017 111110 IMPLEMENTAÇÃO DE SIMULAÇÕES COMPUTACIONAIS DE N-CORPOS.

(3)

Já a energia potencial (Ep) do sistema de partículas é calculada pela fórmula 4.

(4)

Desta forma, a energia total do sistema de partículas (E) é dada pela fórmula 5.

(5)

Um outro aspecto físico importante é o comportamento da energia. De acordo com a relação dada pelo Teorema do Virial, as energias cinética e potencial devem respeitar a relação mostrada na fórmula 6 a partir do momento em que o sistema de partículas atingir o ponto de equilíbrio dinâmico [Thornton e Marrion, 2004].

(6)

2. ASPECTOS COMPUTACIONAIS

Um algoritmo destinado ao processamento de simulações de n-corpos deve executar os se-guintes passos:

1. Calcular a energia inicial do sistema de partículas.

2. Calcular a aceleração sofrida por cada uma das partículas;

3. Calcular e atualizar a velocidade de cada partícula.

4. Calcular e atualizar a posição de cada partícula no espaço.

5. Monitorar a energia do sistema e a propagação de erros de calculo.

6. Atualizar o tempo da simulação em um passo de tempo.

O cálculo da energia inicial do sistema deve ser realizado para que o valor resultante possa ser utilizado como referencia durante o processamento da simulação e a fim de monitorar-se o comportamento da energia do sistema. Em uma situação ideal, o valor da energia do sistema deve ser constante (pois quando uma partícula ganha energia cinética perde energia potencial na mesma proporção, e vice-versa). No entanto, devido a erros de aproximação gerados no cálculos de ponto flutuante e pelos algoritmos utilizados, dificilmente consegue-se um valor absolutamente constante. Observa-se que este problema ocorre mesmo quando o processamento é realizado em dispositivos aderentes ao padrão de aritmética para ponto flutuante IEEE 754 (sejam estes uma CPU ou GPU, por exemplo). Esta situação ocorre pois mesmo o padrão citado admite diferentes métodos de arredondamento, podendo gerar-se resultados diversos ao serem utilizados tipos de dados com precisões diferentes, ou ainda, ao utilizar-se de algoritmos com métodos de cálculo diversos, como por exemplo o método serial, o paralelo ou o FMA (Fused Multiply Add) [Whitehead e Fit-Florea, 2010].

A forma mais simples de implementação de um algoritmo de n-corpos, considerando-se uma execução sequencial (em CPU) é o armazenamento das partículas componentes do sistema em um vetor onde cada elemento corresponde a uma estrutura contendo: a posição da partícula nos três eixos, a velocidade da partícula nos três eixos e sua massa. A partir desta estrutura de dados proposta, o código a seguir mostra uma sugestão de rotina para o calculo da energia cinética do sistema de partículas:

double CalculaKinetic(particuleData* ArrayHead, int n)

{

double EK = 0.0;

int i;

for(i=0; i<n; i++)

{

double v2 = (ArrayHead[i].vX * ArrayHead[i].vX) +

(ArrayHead[i].vY * ArrayHead[i].vY) +

(ArrayHead[i].vZ * ArrayHead[i].vZ);

EK += ArrayHead[i].Mass * v2;

}

Revista Atitude · Faculdade Dom Bosco de Porto Alegre · Ano XI - No 22 - janeiro a junho de 2017 113112 IMPLEMENTAÇÃO DE SIMULAÇÕES COMPUTACIONAIS DE N-CORPOS.

EK = EK / 2.0;

return (EK);

}

O parâmetro ArrayHead é um ponteiro para um vetor de estruturas, enquanto o parâmetro n indica a quantidade de elementos existentes no vetor.

Já o cálculo da energia potencial é um pouco mais complexo, pois exige o cálculo da acelera-ção sofrida pelas partículas, o que significa que para se descobrir o valor da energia potencial de uma partícula em especifico, deve-se calcular a atração existente entre esta partícula e todas as demais componentes do sistema, como mostrado no código a seguir. Novamente, o parâmetro ArrayHead indica um vetor de estruturas contendo as partículas do sistema, enquanto o parâme-tro n indica a quantidade existente de partículas. Já o parâmetro eps (epson) é o valor do fator de suavização, que será explicado adiante.

double CalculaPotential(particuleData* ArrayHead, int n, double eps)

{

double XDist = 0.0;

double YDist = 0.0;

double ZDist = 0.0;

double Epot = 0.0;

double DistanceSQR = 0.0;

int i,j;

for(i = 0; i < n; i++)

{

for(j = i+1; j < n; j++)

{

XDist = (ArrayHead[i].PosX - ArrayHead[j].PosX)

* (ArrayHead[i].PosX - ArrayHead[j].PosX);

YDist = (ArrayHead[i].PosY - ArrayHead[j].PosY)

* (ArrayHead[i].PosY - ArrayHead[j].PosY);

ZDist = (ArrayHead[i].PosZ - ArrayHead[j].PosZ)

* (ArrayHead[i].PosZ - ArrayHead[j].PosZ);

DistanceSQR = XDist + YDist + ZDist;

EPot -= (ArrayHead[i].Mass * ArrayHead[j].Mass)

/ sqrt(DistanceSQR + (eps*eps));

}

}

return (EPot);

}

O vetor é percorrido de forma eficiente, evitando que uma posição seja comparada com ela mesmo.

Finalmente, para que seja conhecido o valor total da energia do sistema, basta somar-se os valores calculados para as energias cinética e potencial, como mostrado no código a seguir.

double CalculaEnergia(particuleData* ArrayHead, int n, double eps)

{

double EK = CalculaKinetic (ArrayHead, n);

double EP = CalculaPotential(ArrayHead, n, eps);

double ETot = EK + EP;

return (ETot);

}

Do ponto de vista computacional, o fator de suavização (epson) citado anteriormente tem por função evitar que a distância entre duas partículas atinja o valor zero, o que causaria um erro na rotina de cálculo das distâncias, conforme mostra a figura 1.

Revista Atitude · Faculdade Dom Bosco de Porto Alegre · Ano XI - No 22 - janeiro a junho de 2017 115114 IMPLEMENTAÇÃO DE SIMULAÇÕES COMPUTACIONAIS DE N-CORPOS.

Figura 1. Evolução da força versus distância no tempo.

Nesta figura, verifica-se que com a diminuição da distância r, o valor da força f tende a cres-cer. Quando a distância atinge o valor zero (em t2), além do valor da força de atração entre as partículas tender ao infinito, há a execução de uma divisão por zero, de acordo com a formula 3 mostrada anteriormente.

Esta característica, aliada ao fato de que as partículas representadas são virtuais, ou seja, não apresentam nenhuma informação a respeito de seu raio ou dimensões físicas, faz com que a técnica aqui descrita represente um algoritmo não colisional. Desta forma, nunca ocorre uma “colisão real” entre duas partículas. Para a implementação de um algoritmo colisional, ou seja, capaz de tratar adequadamente os encontros entre partículas, há a obrigatoriedade da represen-tação das dimensões físicas de cada partícula, bem como no tratamento da troca e dissipação de energia resultante em tais eventos.

2.1. INTEGRAÇÃO E PASSO DE TEMPO.

Para simular a dinâmica gravitacional do sistema de partículas, o algoritmo deve executar o cálculo das acelerações sofridas por cada uma das partículas, atualizando em seguida suas velocidades e posições no espaço. Com a força de aceleração devidamente calculada (de acordo com a fórmula 2), procede-se ao calculo e atualização da velocidade da partícula, multiplicando-se o valor da aceleração pelo passo de tempo (Δtempo, ou delta tempo), que representa o período de tempo no qual a partícula deve evoluir (movimentar-se) pelo sistema de partículas. O valor resultante deste cálculo deve ser acumulado junto ao valor atual da velocidade da partícula, nos três eixos cartesianos. Finalmente, com a velocidade atualizada, procede-se a atualização da posição da partícula, multiplicando-se a velocidade pelo passo de tempo novamente. O código a seguir implementa o algoritmo aqui descrito.

void ForceCalculation(particuleData* PartI, particuleData* PartJ, int n, double eps)

{

double XDist;

double YDist;

double ZDist;

double DistanceSQR;

double Rinv;

double Rinv3;

XDist = (PartI->PosX - PartJ->PosX) * (PartI->PosX - PartJ->PosX);

YDist = (PartI->PosY - PartJ->PosY) * (PartI->PosY - PartJ->PosY);

ZDist = (PartI->PosZ - PartJ->PosZ) * (PartI->PosZ - PartJ->PosZ);

DistanceSQR = XDist + YDist + ZDist;

Rinv = 1.0 / sqrt(DistanceSQR + (eps*eps));

Rinv3 = Rinv * Rinv * Rinv;

PartI->fX -= PartJ->Mass * XDist * Rinv3;

PartI->fY -= PartJ->Mass * YDist * Rinv3;

PartI->fZ -= PartJ->Mass * ZDist * Rinv3;

}

double EvolveNBody(particuleData* ArrayHead, double dt, int n, double eps)

{

int i,j;

Revista Atitude · Faculdade Dom Bosco de Porto Alegre · Ano XI - No 22 - janeiro a junho de 2017 117116 IMPLEMENTAÇÃO DE SIMULAÇÕES COMPUTACIONAIS DE N-CORPOS.

for(i = 0; i < n-1; i++)

{

ArrayHead[i].fX = 0.0;

ArrayHead[i].fY = 0.0;

ArrayHead[i].fZ = 0.0;

for(j = 0; j < n; j++)

{

// we don’t have to calculate the node against itself, right?

if(ArrayHead[i].ID != ArrayHead[j].ID)

{

ForceCalculation(&(ArrayHead[i]), &(ArrayHead[j]), n, eps);

}

}

}

for(i = 0; i < n; i++)

{

// updating velocities

ArrayHead[i].vX += ArrayHead[i].fX * dt;

ArrayHead[i].vY += ArrayHead[i].fY * dt;

ArrayHead[i].vZ += ArrayHead[i].fZ * dt;

// updating positions

ArrayHead[i].PosX += ArrayHead[i].vX * dt;

ArrayHead[i].PosY += ArrayHead[i].vY * dt;

ArrayHead[i].PosZ += ArrayHead[i].vZ * dt;

}

return dt;

}

3. MONITORANDO O COMPORTAMENTO DA ENERGIA.

Uma vez implementado o código capaz de processar a simulação, torna-se vital o monitora-mento da energia do sistema de partículas, a fim de que seja possível verificar se os parâmetros físicos estão sendo respeitados (o que pode validar ou não a simulação processada). De uma forma geral, a energia deve obedecer a relação definida pelo Teorema do Virial, conforme já descrito na fórmula 6. Pode-se gerar um gráfico a fim de visualizar o comportamento da energia. A figura 2 mostra o gráfico do comportamento da energia correspondente a simulação de um istema de partículas organizado na forma de uma esfera composta por 395 partículas, evoluído por 100 unidades de tempo e com um passo de tempo de valor igual a 0.0005.

Figura 2. Gráfico da energia de um sistema esférico de partículas.

Na figura 2 pode-se verificar que a relação virial dada pela fórmula 6 foi respeitada. Os dois grandes picos (e vales) visualizados na extrema esquerda do gráfico correspondem a duas grandes retações e expansões do sistema de partículas, logo no início da simulação. Após este período de grande atividade, verifica-se no gráfico que o sistema entrou em relativo equilíbrio, fase esta chamada de equilíbrio dinâmico. A relação virial é válida apenas a partir do momento em que esta fase é atingida (embora no gráfico em questão a relação parece ter sido respeitada durante toda a simulação).

Na figura 3 pode-se visualizar 3 momentos da evolução do sistema de partículas cujo gráfico foi mostrado anterioremente.

Revista Atitude · Faculdade Dom Bosco de Porto Alegre · Ano XI - No 22 - janeiro a junho de 2017 119118 IMPLEMENTAÇÃO DE SIMULAÇÕES COMPUTACIONAIS DE N-CORPOS.

Figura 3. Evolução de um sistema de partículas semiesférico.

Na figura 3a, é mostrado o sistema de partículas no momento t0 da simulação, quando a energia inicial do sistema é calculada e antes de se iniciar o cálculo das forças de atração e atualização das posições das partículas. Já na figura 3b, é mostrado o sistema de partículas já em evolução, no momento da primeira contração mostrada no gráfico. Finalmente, a figura 3c mostra o sistema de partículas já em equilíbrio dinâmico, com a maior parte das partículas orbitando o centro de massa do sistema.

4. CONDIÇÕES INICIAIS E UNIDADES DE N-CORPOS.

Além das regras físicas já descritas, há um outro importante fator que deve ser levado em consideração no processamento de simulações de n-corpos: as condições iniciais. De fato, na área das ciências físicas, é comum o uso de sistemas de unidades de medidas que sejam adequa-dos a representação das grandezas envolvidas nos problemas estudados. Da mesma forma, nas simulações de n-corpos, faz-se necessária a representação das grandezas relacionadas (como massa, força, gravidade, energia, etc.) dentro de escalas que tornem possível a representação de fenômenos físicos.

Existem ainda outros fatores que levam a exigência do uso de unidades específicas, como por exemplo a medida do tempo de relaxação do sistema de partículas, mas este estudo foge do escopo deste trabalho e portanto, não será abordado.

Para simulações de n-corpos, o sistema de medidas utilizado é o sistema de Unidades de N-Corpos [Heggie e Mathieu, 1986]. Este sistema define:

• G = 1

• M = 1

• E = -1/4

Onde, G é a força da gravidade, M é a massa total do sistema de partículas e E é a energia inicial do sistema. Por este motivo não viu-se nenhum parâmetro relativo a força da gravidade nos códigos mostrados neste trabalho.

Para a geração das condições iniciais, pode-se criar um código externo ao simulador, ou ainda utilizar-se de códigos pré-existentes para a geração, como por exemplo o utilitário mkplummer, contido no pacote do programa NEMO (do autor Peter Teuben), que é capaz de gerar esferas de Plummer já escaladas para as unidades de n-corpos.

5. IMPLEMENTAÇÃO PARALELA

Conforme descrito na seção 2.1, para a execução de uma simulação de n-corpos exige-se a comparação de todas as partículas entre si, a fim de atualizar-se a força de atração entre elas. Na prática, isso significa um algoritmo com complexidade assintótica igual a O(n^2). Dependendo da quantidade partículas a serem utilizadas na simulação, o tempo de processamento pode ser muito alto, tornando-a execução da simulação impraticável. De fato, a maior simulação de n-corpos já realizada (2015) processou cerca de 550 bilhões de partículas em um super computador japonês com mais de 60 mil nodos de processamento, tendo sido gastos cerca de 11 milhões de horas de CPU (ISHIYAMA, ENOKI, et al., 2015).

Para otimizar o tempo de execução, a alternativa é utilizar-se de paralelismo. Mesmo para simulações com pequena quantidade de partículas, o paralelismo pode ser vantajoso. Dependendo do hardware disponível, pode ser possível a aceleração do código de forma relativamente simples.

Uma primeira abordagem é a otimização dos laços aninhados, responsáveis pela comparação de todas as partículas do sistema. Se inicialmente são criados dois lações aninhados independentes, pode-se diminuir a complexidade assintótica desses simplesmente criando-se uma dependencia do laço interno com o laço mais externo, conforme mostra a figura 3.

Revista Atitude · Faculdade Dom Bosco de Porto Alegre · Ano XI - No 22 - janeiro a junho de 2017 121120 IMPLEMENTAÇÃO DE SIMULAÇÕES COMPUTACIONAIS DE N-CORPOS.

Figura 3. Trecho de código contendo dependência no laço interno.

Pode-se verificar que o laço mais interno agora implementa uma dependência da da sua variável de controle j com a variável de controle i, do laço mais externo.

Esta alteração, apesar de pequena, garante uma diminuição da complexida assintótica de 0(n^2 ) para em função da diminuição da quantidade de iterações do laço interno, que cai, desta forma, aproximadamente pela metade. Para visualizar de forma intuitiva o impacto que esta alteração gera, a figura 4 demonstra um pequeno trecho de código e o resultado de sua execução.

Figura 4. visualização do funcionamento da otimização proposta.

Nesta imagem, cada “estrela” escura representa uma iteração do laço mais interno, enquanto uma “estrela” mais clara representa uma iteração que deixou de ser executada pelo laço mais interno devido a otimização.

Finalmente, uma outra otimização possível é a paralelização do código para arquiteturas com vários núcleos, seja esta em nível de CPU (multicore – múltiplos núcleos) ou de aceleradores como as placas de aceleração gráfica ou aceleradores manycore (vários núcleos) como as placas Xeon Phi da Intel. Abstraindo-se detalhes de codificação inerentes a arquitetura escolhida e conside-rando-se a execução em hardware de categoria SIMD (Single Instruction, Multiple Data – Instrução Única, Múltiplos Dados), o algoritmo de n-corpos paralelizado terá complexidade assintótica igual a Ο(n^2/p), sendo n o número de partículas e p o número de unidades de processamento.

6. ALGUNS RESULTADOS.

A fim de demonstração, realizamos a comparação de algumas versões de nosso código, im-plementadas da seguinte forma: “naive”, representando a codificação convencional em linguagem C com laços aninhados independentes; “smart”, código em C otimizado com a utilização de laços aninhados dependentes; “omp” otimização da versão “naive” com o uso de diretivas OpenMP para execução em CPU multicore; e finalmente versão “CUDA”, desenvolvida em linguagem C com uso de biblioteca CUDA para execução em uma placa de aceleração gráfica.

Figura 5. Comparação dos resultados.

Os tempos de execução de cada versão do código, bem como as taxas de aceleração (speed up) obtidas podem ser visualizadas na figura 5. Para um entendimento mais completo, realizou--se a comparação dos custos de execução dos códigos testados em um ambiente virtualizado, chegando-se a tabela mostrada na figura 6.

Figura 6. Custos estimados para execução na Amazon.

Todos os testes foram realizados com sistemas contendo 16 mil partículas e cerca de 1000 iterações. Os resultados numéricos obtidos a partir de todos os códigos testados foram equiva-lentes entre sí e validados de acordo com os requisitos explicados na seção 3.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A implementação de um código para a simulação de problemas de n-corpos é simples, desde que sejam tomadas algumas precauções no que se refere ao monitoramento do comportamento físico do sistema de partículas, especialmente no tocante ao comportamento da energia do sis-tema. Além disso, deve-se atentar as regras físicas descritas. Ainda, o uso de uma sistema de partículas com condições iniciais corretamente escaladas para unidades de n-corpos, garantirá o sucesso da simulação. Além disso, pode ser necessária a realização de ajustes nos parâmetros da simulação (como por exemplo no valor do passo de tempo e mesmo do fator de suavização) de forma que o sistema de partículas evolua da forma esperada, lembrando que ao iniciar-se a simulação, espera-se que o sistema entre em colapso gravitacional (e não em expansão, o que demonstraria algum problema no cálculo das forças de atração entre as partículas).

Revista Atitude · Faculdade Dom Bosco de Porto Alegre · Ano XI - No 22 - janeiro a junho de 2017 123122 IMPLEMENTAÇÃO DE SIMULAÇÕES COMPUTACIONAIS DE N-CORPOS.

Finalmente, a utilização de otimizações baseadas na paralelização do código pode gerar economia substancial, devido principalmente, a diminuição drástica observada nos tempos de execução das versões paralelizadas para arquiteturas manycore.

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BREVES LINHAS SOBRE A RECEPÇÃO DO DIREITO ROMANO NA EUROPA MEDIEVAL

Débora Grivot1

RESUMO

O presente trabalho tem o propósito de realizar um breve resumo do per-curso histórico do Direito Romano na Idade Média, como forma de resga-tar a historicidade do fenômeno jurídico e compreender as bases termino-lógicas e metodológicas do direito atual.

PALAVRAS-CHAVE: Direito Romano. Recepção do Direito Romano. Idade Média.

ABSTRACT

This paper has the purpose of making a brief summary of the historical course of the Roman Law in the Middle Ages, as a way to rescue the his-toricity of the juridical phenomenon and to understand the terminological and methodological bases of the current law.

KEYWORDS: Roman Law. Reception of the Roman Law. Middle Ages.

Sabe-se que entre o século VI e o século XI na Europa ocidental cada referência ao Direito Romano na verdade referia-se ao direito bárbaro2 como o Código Visigótico3 e por isto não refle-tiam o Direito Romano clássico, mas aquele dito “vulgar”. Nesta época o Direito Romano estava subjugado as manifestações locais, aos costumes regionais4.

Durante a Idade Média o ocidente europeu verificou aquilo que se soe denominar “Recepção

1 Professora de Direito Romano e História do Direito na Faculdade Dom Bosco de Porto Alegre. Professora de Direito Romano e História do Direito nas Faculdades Integradas São Judas Tadeu de Porto Alegre. Doutora em Direito (UFRGS), mestre em Direito (UFRGS).

2 GOMES da SILVA, Nuno J. Espinosa. História do Direito Português. vol. 1, Lisboa: Fundação Caloust Gulbenkian, 1992, p.38: “Desde muito cedo que Roma é submetida à pressão dos povos bárbaros que estanciavam para lá das fronteiras do império. Todavia, a potencia militar de Roma e a sua política assimiladora, iam-se mostrando suficientes para conjugar o perigo que aquela pressão representava. Mas no fim do século IV e início do século V a força da declinante Roma mostrar-se-á incapaz de constituir barreira às penetrações dos povos bárbaros, e em toda a parte, as fronteiras romanas são violadas.”

3 DOMINGO, Rafael et alii, Textos de Derecho Romano. , pg. 499. Na época visigótica as fontes do direito estavam constituídas pelos costumes germânicos, o Direito Romano vulgar, e em 506 vem editada a Lex Romana Visigothorum.

4 STEIN, Peter. Il Diritto Romano nella Storia Europea. Milano: Raffaello Cortina Editore, 2001, pg. 43: ““All’inizio del médio Evo, il sistema dei tribunali imperiali caratterizzato da giudici di professione che rappresentavano un apparato statale in grado di fare eseguire le loro sentenze, scomparve. In sostituzione si iniziò a fare ricorso a organi giudicanti costituiti da gruppi di uomini liberi, scelti dalla cerchia degli abitanti del luogo, i quali cercavano di comporre le controversie bella maniera meno dirompente possibile per la vita della comunita. Tali assemblee di uomini liberi dovevano stabilire quali fossero le regole consuetudinarie rilevanti per il caso del quale erano state investite. Le regole non venivano applicate rigidamente ma costituivano una sorta di substrato in base al quale le dispute venivano risolte, spesso facendo ricorso a compromessi. L’individuo, anziché avere la sensazione di appartenere a un impero mondiale, aveva ora piuttosto quella di essere membro di una comunità di persone aventi la medesima origini e i medesimi costumi.”

Revista Atitude · Faculdade Dom Bosco de Porto Alegre · Ano XI - No 22 - janeiro a junho de 2017 125124 BREVES LINHAS SOBRE A RECEPÇÃO DO DIREITO ROMANO NA EUROPA MEDIEVAL.

do Direito Romano”5. Trata-se de um fenômeno complexo manifestado da seguinte forma: um povo permite voluntariamente que uma cultura estrangeira (cultura romana) penetre na sua vida sem que tenha sido a ela submetido ou dominado. Por outro lado, tal evento não se deu de forma uniforme em toda a Europa6. O que mais vai nos importar é aquela vivenciada pela cultura alemã, que será o berço da nossa tradição. Mas não só ela, também o contributo dato pelos pensadores franceses na mudança de paradigma do pensamento, fomentando a criação do pensamento ju-rídico moderno.

Uma das consequências mais importantes da Recepção do Direito Romano nas diversas cul-turas europeias se traduz numa concepção de que o Direito Romano ainda tem plena vigência, ou melhor, “autoridade cientifica”. É a ratio scripta (a razão escrita); “a revelação jurídica”; a última palavra em questões de direito. Nunca mais deixará de ser invocado: ou como norma em vigor; ou como norma supletiva ou subsidiária; ou como norma ou princípio de orientação7. É então que surge o nascimento do Ius Romanum.

Assim, em que pese o Direito Romano ter vivenciado um período de eclipse, quando substi-tuído pelos costumes locais e pelo direito costumeiro dos povos germânicos (especificamente os bárbaros), renasceu diante da Recepção, e infiltrou o seu raciocínio na base do pensamento jurídico pré-moderno8.

E então o Direito Romano difunde-se na Idade Média como “o direito comum”, o ius commune. Esta fórmula se conecta à definição de que o Direito Romano é comum a todos os povos como foi o direito das gentes. E em se tratando do ius gentium que se contrapunha ao ius civile, também o ius commune se contrapõe ao ius proprium, isto é, o direito próprio de cada uma dos diversos povos, mas todos submetidos ao império do pensamento romano.

Ainda neste ponto histórico há de haver referência ao fenômeno da união do poder da Igreja e o Império9. O papel que o direito canônico exercerá naquele contexto social será de extrema importância para a formação do pensamento jurídico porque é a partir dele que será composto o “espírito” do qual o “corpo” é o Direito Romano10. É a impregnação de ideias jurídicas especifi-

5 MEIRA, Silvio, História e Fontes do Direito Romano, São Paulo: Saraiva, 1966, pg. 230: “Apesar da destruição do Império do Ocidente pelas invasões bárbaras o Direito Romano foi a pouco se infiltrando nas diversas regiões ocidentais, onde povos bárbaros utilizavam seus princípios.”

6 CRUZ, Sebastião. Direito Romano. Lições. I - Introdução. Fontes. Coimbra: Livraria Almedina, 1969, pg. 95: “A recepção não se processa de um modo igual para os diversos países; foi diferente quanto à forma e variável quanto à intensidade; mas quase nenhum país europeu deixou de receber a sua influência. Os efeitos da recepção também são muito diferentes. Vão desde a assimilação dumas quantas formas de pensar-jurídico romano (como na Inglaterra) até à consagração e adopção de muitas normas concretas e de toda a construção dos conceitos jurídicos do Ius Romanum (como na Alemanha).”.

7 CRUZ, Sebastião. Direito Romano. Lições. I - Introdução. Fontes. Coimbra: Livraria Almedina, 1969, pg. 95.

8 BOBBIO, Norberto, O Positivismo Jurídico, São Paulo: Ícone Editora, 1995, pg. 30: “Foi graças ao fenômeno da Recepção que o Direito Romano penetrou profundamente na sociedade alemã, basta pensar que ainda no final do século XIX – antes das grandes codificações ocorridas no século XX – aplicava-se nos tribunais germânicos o direito do Corpus Iuris – naturalmente modernizado e adaptado às dife-rentes exigências sociais.”

9 LOPES, José Reinaldo Lima. O Direito na História. São Paulo: Max Limonad, 2000, pg. 71: “Para compreender-se a importância que a Igreja detém nos séculos V a XI é preciso destacar duas coisas: 1) o vazio político, ou incompletude política da civilização medieval e 2) as instituições eclesiásticas que passam a existir. O vazio político medieval só existe quando o comparamos quer com a estrutura romana quer com a estrutura estatal moderna. Paolo Grossi explica que a tipicidade medieval reside acima de tudo neste vazio sobre aquela incompletude do poder jurídico medieval.”

10 WIEACKER, Franz. História do Direito Privado Moderno. 3ª edição, Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 2004, pg. 121: “As primeiras aplicações do Direito Romano na Alemanha foram quase sempre mediadas pela Igreja e também pela canonística. A influencia imediata também sobre o mundo secular, destas influencias resulta da competência dos tribunais eclesiásticos mesmo para as causae saeculares; por outro lado, o facto de estes tribunais aplicarem também o Direito Romano, resulta do permanente intercâmbio entre ius civile e ius canonicum, desde cedo conhecido. Isto é comprovado, também para a Alemanha, através da alta frequência de estudantes alemães nas faculdades de direito francesas e italianas já desde o século XIII e através da verificação contemporânea de que nove décimos dos estudan-tes – que mais tarde seriam identificados como bolonheses – da suíça alemã aparecem em influentes cargos da administração da Igreja.

camente eclesiásticas no direito privado geral.11

Assim, o direito canônico exercerá enorme importância na construção da cultura jurídica europeia, e influenciará de forma inigualável as suas instituições, principalmente no que tange à organização judiciária e o processo12. Além disto, contribuiu da mesma forma para a criação do instituto da “pessoa jurídica”, já que a Igreja deveria ser considerada uma entidade distinta de cada um dos seus membros, e ainda cuidar de não misturar os patrimônios.

No contexto histórico da Baixa Idade Média, iniciou-se um processo de retorno aos livros, de estudo e ensino jurídico, e dará lugar à recuperação de textos de direito. Será o labor dos glo-sadores de Bolonha que dará causa ao “entusiasmo” com o Direito Romano, e será chamado de “renascimento do Direito Romano”, movimento cultural que pretende colocar o Direito Romano como a lex do Império13.

Com este “renascimento” não significa, como poderia parecer, que se tenha perdido por completo o contato com o Direito Romano e que então ele ressurgisse. O verdadeiro sentido da expressão é cunhado no reencontro com Direito Romano através do seu estudo; do estudo dos textos genuinamente compilados por Justiniano. Este movimento cultural encontra a sua “sede” na escola de Bolonha, mas irá se irradiar para toda a Europa14.

O trabalho destes estudiosos de Bolonha foi denominado Glosa, pela qual se entendia a simples explicação gramatical, de caráter exegético, das palavras ou frases que suscitassem dificuldades na sua interpretação15. O principal valor e consequência deste movimento cultural foi sem dú-

Provavelmente, esta descoberta vale para todas as regiões alemãs (sobretudo para as do norte dos Alpes). Devemos, portanto contar, desde cedo na Baixa Idade Média, com uma ampla infiltração de canonistas e do direito canônico nos diferendos laicos, sobretudo na medida em que eles estivessem dependentes dos tribunais religiosos (incluindo a jurisdição arbitral). Em virtude da competência do oficialato da Igreja para a elaboração dos negócios jurídicos, ainda mesmo depois do surgir de um notariado profano, uma vez que na Alemanha, ao contrario do que acontecia na Itália, a formação dos notários estava nas mãos do aparelho eclesiástico. Os documentos públicos cedo se tornaram, por esta via, também na Alemanha, num eficaz instrumento da romanização, sobretudo no domínio do direito obrigacional e sucessório.”

11 WIEACKER, Franz. História do Direito Privado Moderno. 3ª edição, Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 2004, pg. 122: “O quadro ficará incompreensível se se deixar de atender (como é tendência dos historiadores do direito privado) ao papel pioneiro da administração eclesiástica na instituição de uma técnica jurídica na administração geral do Estado. A cúria papal precedeu o poder imperial, mas também os reinos da Europa ocidental na racionalização e na jurisdicionalização da vida pública em relação a negociação política, a administração geral e a administração financeira. Estas administrações centrais eram já suas discípulas pelo facto de que os peritos de uma administração por protocolos, serviços burocráticos e actos reduzidos a escritos nas cúrias profanas do Império da Borgonha, da França e da Alemanha, eram, desde há muito, os clérigo.”

12 LOPES, José Reinaldo Lima. O Direito na História. São Paulo: Max Limonad, 2000, pg. 100: “É no campo da jurisdição e do processo que a influência do direito canônico torna-se dominante. É certo que há uma influencia quanto à disciplina do matrimonio e dos contratos, bem como na formulação da teoria da personalidade jurídica. Quando nos deparamos, porém, com o processo canônico vemos a distinção fundamental que separa a Europa continental da tradição inglesa. Em boa parte, o desenvolvimento do direito inglês distingue-se do nosso justamente porque na Inglaterra o processo canônico nunca foi incorporado nas cortes régias, que se desenvolveram antes da canonística. Já no continente, é o processo canônico que precede a organização das cortes régias, e assim as influencia.”

13 GOMES da SILVA, Nuno J. Espinosa. História do Direito Português. vol. 1, Lisboa: Fundação Caloust Gulbenkian, 1992, pág. 141: “A luta entre o Império e o Papado é forte incentivo a que, cada vez mais, o Direito Romano seja considerado a lex do Império Medieval; o contraste com a Igreja leva a necessidade de um fortalecimento das estruturas do Império, e consequentemente, a um maior debruçar-se sobre o seu ordenamento jurídico.”

14 CRUZ, Sebastião. Direito Romano. Lições. I - Introdução. Fontes. Coimbra: Livraria Almedina, 1969, pg.96 “O nascimento da ciência jurídica em Bolonha está integrado no movimento cultural geral da Europa, que durante o século XI avançou até as camadas mais pro-fundas da cultura antiga. É uma consequência fatal dessa movimentação. Todavia, pelo menos dois factores ajudaram (ou facilitaram) a criação deste entusiasmo cientifico pelo estudo do Corpus Iuris, com uma intensidade totalmente nova: 1. a influencia da ciência jurídica do oriente (nessa altura, sécs. VI a XI, em época de esplendor), sentida quer através da escola de Ravena e da cultura de Veneza e de Milão, quer directamente; 2. a descoberta em Pisa, no século XI dum manuscrito completo do Digesto, que despertou em Irnério uma apaixonante curiosidade cientifica, levando-o a fazer um estudo consciencioso sobre este texto. Estavam lançadas as bases das investigações sobre o Corpus Iuris... [esse precioso manuscrito do Digesto, que data dos fins do séc. VI esteve em Pisa até 1406, ano em que foi trazido como troféu da derrota desta cidade, para a biblioteca laurenciana de Florença, onde se encontra. Em virtude destes factos, é conhecido por littera pisana, mas sobretudo porlittera florentina.”

15 GOMES da SILVA, Nuno J. Espinosa. História do Direito Português. vol. 1, Lisboa: Fundação Caloust Gulbenkian, 1992, pág. 143: “Frente a textos que se acham escritos num latim que não é a língua dos tempos medievais, a primeira dificuldade está no compreender o sentido literal desses textos. A glosa, a princípio, geralmente interlinear (nota entre linhas) vai, dado o seu grande desenvolvimento, tornar-se marginal (à margem do texto). As vezes, ainda, em superior grau de teorização, toma o nome de apparatus. Também os glosadores envidam os seus esforços na obtenção de fórmulas breves – e modo de definição – (regulae, brocarda, generalia) ou já mesmo fazendo uma expo-

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vida anunciar a toda a Europa a importância do Direito Romano16. Os expoentes foram Irnério e Acúrsio; este último que fez a Magna Glosa, ou simplesmente Glosa, dando nome ao movimento. Foi uma esplendorosa obra, fiel ao texto justinianeu, de interpretação analítica daqueles axiomas jurídicos. Porém, não sistemática, com objetivo apenas teórico dogmático, com o intuito maior de demonstrar a racionalidade do Direito Romano, mais do que colocá-lo em prática17.

Depois, o Comentário sucederá à Glosa, iniciando o movimento dos comentadores18, que tra-balharam sobre a Glosa e dela teceram os seus comentários, utilizando o método dialético ou escolástico. Segundo Sebastião Cruz, estes são os verdadeiros fundadores da ciência jurídica, pois o comentário penetra no sentido da norma, enquanto que a glosa se preocupa unicamente com a littera daquela. Além disto, o comentário já é um tratado ordenado sobre os institutos concretos e por isto procurava atualizar e harmonizar o Direito Romano, que somado ao direito canônico explicita o direito comum, estabelecendo um sentimento de unidade espiritual e fundando uma verdadeira ciência jurídica europeia19. O expoente desta escola foi Bártolo de Sassoferrato, que também deu nome à escola.

A próxima fase é a chamada escola culta de Bourges, ou jurisprudência humanista (ou ele-gante) ou ainda, mos gallicus. Foram precursores Alciato, Virgilio de Ayatta e Cujacio. Tal escola é marco do espírito do renascimento e traduz-se num estudo histórico-crítico do material das fontes jurídicas romanas20.

Segundo Koschaker, foi esta escola que criou e elaborou a ideia da moderna personalida-de21. Foi também neste marco histórico que a interpretação teve função criadora, já que desde o

sição sistemática do texto (summae); enfim, dedicam ainda a sua atenção à analise de certas hipóteses reais ou imaginárias (quaestiones, casus) que por vezes suscitam controvérsias entre mestres (dissensiones dominorum).

16 KOSCHAKER, P. Europa y el Derecho Romano. Madrid: Editorial Revista de Derecho Privado, 1955, p.132: “Por esta razón, la ciencia del derecho romano creada por los glosadores, adquirió en seguida carácter y alcance europeos, cualidad esta que perduró a través de los siglos. Estoy convencido de la verdad invariable de mi tesis: ‘aunque el derecho romano hubiera sido mil veces más perfecto de lo que en realidad fue, no hubiera acudido un solo estudiante a oír a los glosadores en Bolonia si aquel Derecho no hubiera sido, al propio tiempo el derecho del Imperium Romanum. Cierto que se tropieza frecuentemente con la afirmación de que la difusión prodigiosa del derecho romano en Europa se debe a sus excelsas cualidades intrínsecas, a la circunstancia de ser el Derecho técnicamente más perfecto que el mundo ha conocido. Con esto se pretende justificar la recepción del derecho romano así como la moderna enseñanza romanistica.”

17 MARTINS, Argemiro Cardoso Moreira, O Direito Romano e seu Ressurgimento no Final da Idade Média, in: Fundamentos de História do Direito, Antonio Carlos Wolkmer (organizador) 2ª ed. Belo Horizonte: Del Rey, 2001, pg. 209: “A exegese erudita dos textos clássicos afastava os glosadores da vida jurídico-legislativa de seu tempo; isso em uma época de grande surto mercantil, como foram os séculos XIII e XIV. Assim, surgiu a necessidade de tornar o Direito Romano clássico aplicável, como forma de integrá-lo aos diversos direitos locais, em especial os estatutos das cidades italianas, mais diretamente vinculados aos interesses da burguesia mercantil. Foi esta tarefa levado a termo pelos juristas chamados de consiliadores, práticos, ou comentadores.”.

18 GOMES da SILVA, Nuno J. Espinosa. História do Direito Português. vol. 1, Lisboa: Fundação Caloust Gulbenkian, 1992: “Não se pense, todavia, que isso acontece de um momento para outro. Não há, com efeito, uma brusca cesura mas sim lento e gradual desenvolvimento que se vai verificar por toda a metade do século XIII em seguida ao aparecimento da Magna Glosa: conhecem os juristas desta época o co-mentário e o método dialético, não se podendo dizer, a no entanto, que tal gênero literário e processo de investigação sejam já dominantes, como virão a ser depois. Por isso cada vez mais entre as escolas de glosadores e comentadores há quem autonomize o período chamado dos juristas pós-acursianos.” GOMES e Silva, Nuno, História do Direito Português, vol. 1, Lisboa: Fundação Caloust Gulbenkian, 1992, pg. 144.

19 CRUZ, Sebastião. Direito Romano. Lições. I - Introdução. Fontes. Coimbra: Livraria Almedina, 1969, pg. 98.

20 STEIN, Peter. Il Diritto Romano nella Storia Europea. Milano: Raffaello Cortina Editore, 2001, pg. 98: “I professori umanisti di Bourges erano convinti che il diritto fosse suscettibile di essere esposto allo stesso modo delle altre disciplini scientifiche in particolare attraverso procedimenti logiche dall’universale al particolare. I precedenti giuristi erano notoriamente stati sospettosi nei confronti di questo metodo e si erano mantenuti tenacemente fedeli all’ordine tradizionale dei testi. Cicerone, che era divenuto un idolo degli umanisti, già nell’an-tichità aveva cercato, senza successo, di presentare il diritto civile come una scienza (ius civile in artem redactum). Gli umanisti erano determinati a realizzare il sogno di Cicerone. La sola parte del Corpus Iuris disposta in un ordine razionale erano le Istituzioni. Esse non avevano ricevuto grande attenzione da parte dei commentatori ma da questo momento in poi avrebbero ricoperto un ruolo fondamentale nei tentativi di rappresentare il diritto civile in una forma più sistematica. Il manifesto del gruppo di Bourges fu un breve trattato di Fran-çois Duaren sull’insegnamento e su apprendimento del diritto (Epistola de Ratione Docendi Discendique Iuris, 1544). Dopo avere criticato i metodi di insegnamento allora diffusi, egli sostene che il diritto dovesse essere esposto nello stesso modo delle altre scienze, ricorrendo a procedimenti logici da ciò che è universale e comune a ciò che è particolare. A questo fine egli raccomandò l’approccio delle Istituzione più veloce e più sistematico come migliore di ogni altro. Tra i pochi umanisti che, dalla fase di semplice stesura di programmi di giunsero a produrre una reale resistemazione del diritto, vi furono François Connan e Hugo Doneau.”

21 KOSCHAKER, P. Europa y el Derecho Romano. Madrid: Editorial Revista de Derecho Privado, 1955, pág. 167: “El humanismo, al situar el ideal formativo del hombre, en el estudio de la antigüedad pagana, lo secularizó, independizándolo de la Iglesia y liberándolo de todas las

surgimento da norma romana até os idos de 1500 a sua aplicação assumiu novas formas. Daí o porquê da tensão que lhe será consequência: tensão entre o Direito Romano e a razão, entre o texto romano e a interpretação criadora22.

Depois, vem a escola do Direito Natural, que foi influenciada e criada nos moldes do movimen-to Iluminista. Para esta vertente o direito era um produto da razão humana, igual para todos os povos e comum a todos os tempos. Seu precursor foi Hugo Grócio e a ele Leibniz e Thibaut. Esta escola, para além de abalar os estudos de Direito Romano, favoreceu o movimento codificador e a reação das legislações nacionais contra a vigência deste. Mas como leciona Sebastião cruz, foi a Alemanha quem salvou os estudos e a vigência do Direito Romano desta crise. Era talvez o único país que estava assim preparado para criar uma nova escola, que provocasse um outro “renascimento” do Direito Romano23.

É o advento da escola Histórica Alemã24, que embora tivesse outros expoentes teve como pai K. F. Von Savigny. Segundo tal corrente o direito não é um mero produto da razão, mas a mani-festação da consciência popular25. O direito não era somente uma construção racional como os juristas do direito natural o tinham apresentado, mas resultado da tradição. As instituições de cada nação como a língua e o direito, por exemplo, refletiam este caráter do povo e deveriam mudar de sociedade para sociedade. O direito cresce “silenciosamente” como manifestação de forças que operam dentro do sujeito e não pela vontade arbitrária do legislador26. A sistematização de Savigny era uma generalização daquele modo de considerar a história do Direito Romano como um ideal, mas acessível apenas às nações nobres, referindo-se ao povo alemão.

Dentre as principais feições que esta escola tomou destacam-se as de (a) afirmar que não existe um direito único para todos os lugares e tempos27; (b) afirmar que o direito não é fruto

ataduras medioevales que lo constreñían. Creó y elaboró la idea de la moderna personalidad, esto es, de una personalidad que al menos en lo que atañe a las cosas del espiritu, no se somete a autoridades extrañas, sino que halla en sí misma la medida y el canon ejemplares. De este modo logró establecer e fundamento del moderno concepto de la ciencia, de una ciencia que no trabaja con verdades que le han sido impuestas, sino que se afana por descubrir ella misma la verdad, disponiendo de todos los medios a su alcance, y sin limitación alguna en lo que respecta a la elección y uso de éstos.”.

22 GOMES da SILVA, Nuno J. Espinosa. História do Direito Português. vol. 1, Lisboa: Fundação Caloust Gulbenkian, 1992, p. 220: “Na tensão que existe entre o texto e a interpretação criadora, há, pois, quem sugira o regresso ao texto, e quem aponte o caminho do seu abandono. Mas deve, também, referir-se que, no Humanismo, existiu uma tendência sistemática que visava uma nova ordem expositiva dos conceitos e institutos contidos no Corpus; pretendia substituir-se a ordem justinianéia e, bem assim, os métodos de exposição medievais. Queria romper com os esquemas didáticos tradicionais.”

23 CRUZ, Sebastião. Direito Romano. Lições. I - Introdução. Fontes. Coimbra: Livraria Almedina, 1969, p. 100.

24 WIEACKER, Franz. História do Direito Privado Moderno. 3ª edição, Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 2004, pg. 410: “A escola Histórica do direito é, essencialmente, não uma criação do romantismo – por muito latamente que se possa conceber este movimento geral de viragem da cultura alemão por volta de 1800, movimento desde logo difícil de limitar. Exacto é apenas que a fundação da escola coincidiu com o maior florescimento do romantismo e que dois movimentos permaneceram em constante intercambio através da cultura geral da época.”

25 CRUZ, Sebastião. Direito Romano. Lições. I - Introdução. Fontes. Coimbra: Livraria Almedina, 1969, p. 101: “Em relação ao Direito Romano, a escola histórica alemã tomou duas direcções cientificas distintas: a) Histórico-crítica, defendendo a necessidade absoluta de preparar boas edições de textos. Neste aspecto verifica-se uma continuação do humanismo jurídico do século XVII propugnado pela escola do mos gallicus; e os representantes desta orientação da escola histórica afirmam-se como historiógrafos puros ou filólogos do Direito Romano – Mommsen, Bruns, Karlowa, Gradenwitz, Bluhme, Lenel, Ferrini, Scialoja, Perozzi, Bonfante, Segrè, etc. b) Dogmático-Pandec-tistica, adaptando cientificamente o ius privatum romano (representado, sobretudo pelas Pandectae de Justiniano) às bem complexas e por vezes bastante diversas relações privadas modernas. Daí a designação desta orientação científica – usus modernus Pandectarum, ou simplesmente Pandectistica. Representantes mais notáveis são Ihering, Brinz, Dernburg, Pucha, Vangerow e sobretudo Windscheid. A pandectística entregou-se a um doutrinarismo jurídico que ainda hoje assombra pela sua agudeza e engenho. Da pandectistica nasceu o BGB de 1900, um dos melhores códigos de todos os tempos e que é, sem dúvida, a maior consagração do Direito Romano.”

26 STEIN, Peter. Il Diritto Romano nella Storia Europea. Milano: Raffaello Cortina Editore, 2001, pg. 98. “Nella prima fase di una società il diritto non è sufficientemente tecnico per essere posto nella forma di un Codice; nella fase declinante di una società l’esperienza per realizzare un codice manca. La sola fase in cui è possibile la codificazione è dunque quella intermedia nella quale vi sono la massima partecipazione popolare e un elevato livello di esperienza tecnica espressa non dai legislatori, ma dai giuristi teorici. Ma precisamente in ragione di queste fattori una tale età non ha necessità di un codice.”

27 BOBBIO, Norberto. O Positivismo Jurídico. São Paulo: Ícone Editora, 1995, p. 51: “O direito não é uma ideia da razão, mas sim um produto da historia. Nasce e se desenvolve na história, como todos os fenômenos sociais, e portanto varia no tempo e no espaço.”.

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de uma avaliação e de um cálculo racional, mas que este nasce de um sentimento de justiça28; (c) demonstrar um pessimismo antropológico, manifestado pela descrença na possibilidade do progresso humano e na eficácia das reformas, o que deveria acarretar na conservação dos ordenamentos existentes e na desconfiança das novas instituições jurídicas que se quisessem impor à sociedade29; (d) pelo amor ao passado, como uma verdadeira tentativa de realizar uma nova “recepção” do Direito Romano na Alemanha30; (e) e principalmente pelo sentido da tradição, segundo o qual é preciso reavaliar uma forma articular de produção jurídica que é o costume, porque este representa na sua substancia a expressão de uma tradição, que se formam e se desenvolvem conforme a evolução da sociedade: o costume é a tradição e a cultura do povo31.

Os legados mais intensos da escola Histórica, segundo Franz Wieacker, foram (a) o sistema pandectista, que aplicado originariamente por Hugo e Heise, foi adotado por Savigny e (b) o método de construção sistemática e conceitual, bem como a dedução lógica da decisão jurídica a partir do sistema e dos conceitos32.

Como Norberto Bobbio ensina, a escola Histórica vai preparar terreno para o desenvolvimento do Positivismo Jurídico, segundo o qual o direito natural não será mais concebido como um sis-tema normativo autossuficiente, como um conjunto de regras distinto e separado do sistema do direito positivo, mas sim como um conjunto de considerações filosóficas sobre o próprio direito positivo33. É com o terreno fértil deste pensamento filosófico que a civilística alemã demonstra o seu caráter sistemático e sistematizador, característica de uma orientação formalista, da teoria metodológica que foi concebida pela “Pandectística”34.

Para a Pandectística, os conceitos têm caráter sistemático, mas não só isto: têm também ca-ráter valorativo já que viabilizam princípios que são permanentemente válidos sobre a correção do direito de forma tal que a sua aplicação deve conduzir a uma aplicação dita “justa”35. Foi com este

28 BOBBIO, Norberto. O Positivismo Jurídico. São Paulo: Ícone Editora, 1995, p. 51: “Há sempre um sentimento do justo e do injusto gravado no coração do homem e que se exprime diretamente através das formas jurídicas primitivas, populares, as quais se encontram nas origens da sociedade, por baixo das incrustações artificiais sobre o direito criadas pelo estado moderno.”

29 BOBBIO, Norberto. O Positivismo Jurídico. São Paulo: Ícone Editora, 1995, p. 52: “A escola histórica se opõe ao projeto de codificar o direito germânico julgando não apropriadas à civilização e ao povo alemães a cristalização do direito numa única coletânea legislativa. Os expoentes desta escola venceram sua batalha contra os fautores do direito posto pelo legislador, o que é tão verdadeiro que a codificação acontecerá um século depois relativamente a outros países, isto é, no principio do século XX.”

30 BOBBIO, Norberto. O Positivismo Jurídico. São Paulo: Ícone Editora, 1995, p. 52: “De fato, aos olhos dos juristas partidários do histo-ricismo, a recepção parecia uma tentativa de inspiração tipicamente iluminista de transplantar na Alemanha um direito estrangeiro, não adequado ao povo alemão, um direito que era ilusório e arbitrário pretender considerar como ratio scripta.”

31 BOBBIO, Norberto. O Positivismo Jurídico. São Paulo: Ícone Editora, 1995, p. 52: “O costume é um direito que nasce direito que nasce diretamente do povo e exprime o sentimento e o “espírito do povo” (Volksgeist). Acaba, de tal modo, subvertida a clássica relação entre as duas fontes de direito, aquela refletida (a lei) e aquela espontânea (o costume), visto que geralmente se considera a primeira preva-lentemente sobre a segundo.”

32 WIEACKER, Franz. História do Direito Privado Moderno. 3ª edição, Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 2004, pg. 475: “Savigny postulava na “Methodenlehre” uma ‘estrutura’ interna, uma ‘unidade do tratamento, um conteúdo comum, tarefa comum para uma ciência jurídica que não esteja submetida a qualquer acaso’. (...) A escola histórica renovou a ciência jurídica ao conceituá-la, à sua maneira, como histórica; com isto, ela apontou deliberadamente para uma nova dogmática jurídica e não para a investigação histórica.”.

33 BOBBIO, Norberto. O Positivismo Jurídico. São Paulo: Ícone Editora, 1995, p. 46: “A filosofia do direito positivo ou a jurisprudência é o conhecimento racional por meio de conceitos daquilo que pode ser direito no Estado”.

34 WIEACKER, Franz. História do Direito Privado Moderno. 3ª edição, Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 2004, p. 492: “A justificação programática para essa missão deu-a Puchta quando (na sequência do “Beruf” de Savigny) atribuiu à ‘cientificidade’ da ciência jurídica da actualidade a ao jurista por ela formado um monopólio da aplicação e desenvolvimento do direito. Para Puchta, era também correto deduzir novas normas a partir do ‘desenvolvimento’ dos conceitos lógicos e legitimar assim o processo ‘de construção do direito’ da jurisprudência construtiva. Seguidamente, sobretudo por Jhering, Gerber e Laband prosseguiram na elaboração do método construtivo da pandectistica e transportaram-no para outras disciplinas, sobretudo para o direito público.”

35 WIEACKER, Franz. História do Direito Privado Moderno. 3ª edição, Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 2004, p. 495: “Os conceitos jurídicos (v.g. direito subjetivo, direito das coisas, acessoriedade do direito de garantia, elasticidade da propriedade) não têm apenas um valor ordenador de caráter sistemático, pedagógico ou semântico (como foi reconhecido em todas as épocas) – por força do qual eles, tal como as unidades de conta ou os símbolos matemáticos, sirvam para a compreensão cientifica, v.g., no ensino ou na fundamentação técnica das decisões – mas gozam de uma realidade directa. Neles se autonomizam princípios permanentemente validos sobre a correção do

cenário que surgiu o BGB – Bürgerliches Gesetzbuch, o Código Civil Alemão, que se apresentava numa estrutura rigorosa com uma verdadeira renúncia à casuística, sobretudo na implantação do principio da abstração e na consagração das cláusulas gerais36. Além disto, apresentava a sua sistemática colocação de uma Parte Geral antevendo os pressupostos de uma Parte Especial. Esta sistemática foi a que chegou até o Código Civil de 191637 e logo recepcionada novamente no Código Civil de 2002 e onde se sustentou os princípios da melhor doutrina brasileira do direito privado. O direito brasileiro, como sucessor legítimo do direito ocidental, recebeu direta influência do con-teúdo de Direito Romano recepcionado na Idade Média, e do qual apresenta a sua principal marca.

Foi Sebastião Cruz38 quem melhor definiu a viagem temporal e espacial que fez o Direito Romano e que parte dela se pretendeu registrar aqui. Disse ele que se fosse lícito, em Direito, servirmo-nos duma comparação, poderíamos afirmar que o Ius Romanum é semelhante a uma árvore. Nasce pequenina; vai-se desenvolvendo, começa a florescer; principia a frutificar, pouco, bastante, muito, muitíssimo. Depois, a frutificação diminui; e quando já não produz mais frutos, encontrando-se, porém num estado de boa conservação, é cortada (a codificação) para ser transformada em boa madeira, que será utilizada nas melhores construções (jurídicas) de todo o mundo.

7. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

BOBBIO, Norberto. O Positivismo Jurídico. São Paulo: Ícone Editora, 1995.

CRUZ, Direito Romano. Lições. I - Introdução. Fontes. Coimbra: Livraria Almedina, 1969.

GOMES da SILVA, Nuno J. Espinosa, História do Direito Português. vol. 1, Lisboa: Fundação Ca-loust Gulbenkian, 1992.

KOSCHAKER, P. Europa y el Derecho Romano. Madrid: Editorial Revista de Derecho Privado, 1955.

LOPES, José Reinaldo Lima. O Direito na História. São Paulo: Max Limonad, 2000.

MARTINS, Argemiro Cardoso Moreira, O Direito Romano e seu Ressurgimento no Final da Idade Média, in: Fundamentos de História do Direito, Antonio Carlos Wolkmer (organizador) 2ª ed. Belo Horizonte: Del Rey, 2001

direito, de tal modo que a sua aplicação lógica (tal como a de uma frase esteriotipada ou de uma fórmula correcta da física) deve conduzir necessariamente a uma decisão correcta (i.e., justa).”

36 WIEACKER, Franz. História do Direito Privado Moderno. 3ª edição, Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 2004, p. 546: “O legislador conseguiu afastar-se noutros casos, de forma mais feliz, da tormentosa escolha entre uma abstração empobrecedora e uma casuística acanhada, através das chamadas cláusulas gerais, isto é, através de linhas de orientação que dirigidas ao juiz o vinculam e ao mesmo tempo lhe dão liberdade. As clausulas gerais constituíram uma notável e muitas vezes elogiada concessão do positivismo à auto-respon-sabilidade dos juízes e a uma ética social transpositiva, cujo padrão propulsor para o legislador foi constituído pela organização dada pelo praetor romano ao judex para determinar o conteúdo da decisão de acordo com a bona fides. O legislador transformou o seu trabalho – através da referencia à boa-fé, aos bons costumes, aos hábitos do trafego jurídico, à justa causa, ao caráter desproporcionado, etc. – em algo mais apto para as mutações e mais capazes de durar do que aquilo que era de esperar. A jurisprudência civilista alemã mostrou-se suficientemente adulta para satisfazer as exigências que as cláusulas gerais colocam à ‘obediência inteligente’ do juiz quando ela, a partir das crises da primeira guerra mundial, começou com uma calma e reflectida ponderação, a preencher as cláusulas gerais com nova ética jurídica e social, e assim, adaptar a ordem jurídica burguesa à evolução social. Assim ela adquiriu uma função totalmente nova do direito judicial posterior à segunda guerra mundial.”

37 LOPES, José Reinaldo Lima. O Direito na História – Lições Introdutórias. São Paulo: Max Limonad, 2000, pg. 302: “Teixeira de Freitas rejeitou o modelo francês. Ele era um erudito e profundo conhecedor da ‘ciência jurídica’ que se fazia na Alemanha. Terminou, por isso mesmo, muito original.”

38 CRUZ, Sebastião. Direito Romano. Coimbra: Livraria Almedina, 1969, pg. 117.

Revista Atitude · Faculdade Dom Bosco de Porto Alegre · Ano XI - No 22 - janeiro a junho de 2017 131130 BREVES LINHAS SOBRE A RECEPÇÃO DO DIREITO ROMANO NA EUROPA MEDIEVAL.

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O IMPACTO DAS REDES SOCIAIS NAS RELAÇÕES DE TRABALHO E SUA FORÇA PROBANTE

Laura Machado de Oliveira1

Luciano Mallmann Cardoso2

RESUMO:

As redes sociais têm impactado de forma direta as relações de trabalho atuais, servindo muitas vezes forma indistinta como prova para empre-gados e empregadores nos dissídios surgidos, criando assim uma nova dinâmica nas relações de trabalho e no processo trabalhista. Devido a omissão legislativa trabalhista, é utilizado o Código de Processo Civil para o deslinde da questão probatória, em que autoriza qualquer meio de prova como instrumento hábil em um processo. Assim, em função do impacto ocasionado em tais relações, será analisada qual será sua força probante nos dissídios trabalhistas.

PALAVRAS-CHAVE: Internet; Redes sociais; meios de prova; justiça do trabalho.

ABSTRACT:

Social networks have impacted directly to current labor relations, often serving interchangeably as proof for employees and employers in labor disputes that have arisen, creating a new dynamic in labor relations and labor process. According to the labor legislative omission is used the Code of Civil Procedure for the disentangling of evidential matter in authori-zing any evidence as an effective instrument in a process. Thus, due to the impact caused in such relationships will be analyzed what the evidential weight in labor disputes.

KEYWORDS: Internet; Social networks; evidence; work justice.

INTRODUÇÃO

Na presente pesquisa tem-se como objetivo estudar o impacto das redes sociais nas relações de trabalho e sua força probante. A sociedade moderna esta cada vez mais conectada, as redes sociais estão presentes na vida de quase todos os brasileiros, tornando-se item indispensável para

1 Laura Machado de Oliveira: Professora da Faculdade Dom Bosco de Porto Alegre. Mestra pela UFRGS em Direito do Trabalho. Advogada especialista em Direito e Processo do Trabalho. Autora de diversos artigos trabalhistas. Citada reiteradamente em acórdãos do TST. Autora do livro “O direito do trabalho penitenciário” pela Lumen Juris.

2 Luciano Mallmann Cardoso: advogado do Pinheiro Machado Advogados Associados. .

Revista Atitude · Faculdade Dom Bosco de Porto Alegre · Ano XI - No 22 - janeiro a junho de 2017 133132 O IMPACTO DAS REDES SOCIAIS NAS RELAÇÕES DE TRABALHO E SUA FORÇA PROBANTE.

a “sobrevivência” no mundo atual, um fenômeno inexplicável e de intangível alcance, que impacta em todos os contemporâneos círculos de convivência e, inclusive, nas relações de trabalho.

A CLT publicada em 1942 no tocante aos meios de prova é praticamente insubsistente, pois de seus poucos artigos, a maioria tratam da oitiva testemunhal, e desse modo, o direito processual comum surge como balizamento para o impasse havido, ocorrendo uma grande problemática em relação ao magistrado em função do seu amplo poder discricionário, pois poderá aceitar ou não publicações em redes sociais como provas. Assim, surge a seguinte indagação: de que forma as redes sociais alteraram as relações de trabalho e qual o valor probante que esta possui na justiça especializada, já que não possui expressa previsão legal?

Com a popularização da internet e a larga utilização de smartphones, acessíveis assim por grande parcela da população, as redes sociais, tais como: Facebook, Instagram, Twitter, MySpace, Google+, LinkedIn e outras, as relações interpessoais do chamado “mundo moderno” tornaram-se ainda mais céleres e dinâmicas, causando grande impacto nas relações de trabalho e seus dissí-dios propostos junto à Justiça Especializada, pois largamente estas redes sociais estão servindo de prova, tanto para empregadores como para empregados, sendo tema latente nos tribunais, nas mais controvertidas matérias.

Nas relações de trabalho a utilização destas ferramentas não poderia ser diferente, pois são aplicadas diariamente no intuito de auxiliar a produtividade, buscando assim otimizar o tempo e integrar as informações, perdendo muitas vezes os limites de razoabilidade e proporcionalidade de seu uso, os quais com frequência extrapolam as normas convencionadas entre as partes.

Além disso, algumas ferramentas de relacionamento social servem também como “murais de publicações”, aonde de forma desenfreada se expõe sentimentos, angústias, decepções e opiniões sobre diversos temas e pessoas, fundamentados sobre o preceito de liberdade do pensamento e da livre manifestação, esquecendo assim o direto da vida privada e intimidade dos outros, incor-rendo em muitas faltas graves as quais podem inclusive servir como motivos justificadores de rescisões de contrato de trabalho por justa causa.

Muitas destas ferramentas estão servindo de prova em dissídios propostos na Justiça do Trabalho. Muitas testemunhas estão sendo contraditadas por alegação de vinculo de amizade ou inimizade com as partes envolvidas na relação processual, sendo utilizado como prova o rol de “amigos” do Facebook, tendo assim a necessidade do referido estudo. Algumas demissões por justa causa estão sendo efetivadas por empresas e reconhecidas pelos órgãos julgadores, por ter o funcionário utilizado o Facebook para denegrir e depreciar a imagem de seu empregador.

No presente trabalho seguindo o método dedutivo, inicialmente, serão estudados os números das redes sociais através de recentes pesquisas, e após, o resultado que tais números se trans-cendem dentro das relações de trabalho para encarar-se de que modo a doutrina e jurisprudência têm enfrentado o tema. Do mesmo modo, será analisada a liberdade de expressão do empregado dentro das relações de trabalho.

Inicialmente, serão abordados os dados que traduzem a importância das redes sociais na atual sociedade, e logo após, a forma que isso será abordado no contexto probatório e a sua consequente força em situações específicas na justiça do trabalho.

1. A INTERNET E AS REDES SOCIAIS

Primeiramente, antes de se adentrar nas redes sociais, insta tratar da internet como uma fer-ramenta tecnológica, que poderia ser tratada de forma tão importante como a invenção da roda, pois se pode levar as pessoas para qualquer lugar, mas com a enorme diferença que na internet a pessoa não sai fisicamente do lugar.

Marcel Leonardi explana a respeito do atual comportamento da sociedade através do nasci-mento da internet:

[…] a utilização e a dependência dos diversos serviços e facilidades oferecidos pela Internet modificaram radicalmente o comportamento humano. A visão original do principal criador da Word Wide Web era a de um espelho que refletisse as relações sociais. Nem mesmo ele imaginou que boa parte da interação humana passaria a ocorrer por meio da Internet3.

Grandes corporações que antes tinham dificuldade em monitorar as atividades desenvolvidas e a produtividade de sua equipe, atualmente, possuem grandes aliados. Diversos são os aplicativos que permitem de forma on-line através localização de GPS, saber precisamente todos os trabalhos realizados ou aqueles que deixaram de ser prestado, trazendo assim uma maior efetividade em seu controle, fato este que na elaboração da legislação trabalhista sequer poderia ter sido imaginado.

Atualmente, se tem dúvidas, mas afinal, o que é uma rede social? Toda e qualquer forma de relacionamento social é uma forma de rede social? Raquel Recuero explica:

Sites de redes sociais foram definidos por Boyd & Ellison (2007) como aqueles sistemas que permitem i) a construção de uma persona através de um perfil ou página pessoal; ii) a interação através de comentários; e iii) a exposição pública da rede social de cada ator4.

Dessa forma, não é qualquer aplicativo de celular ou qualquer página da internet que se transforma em rede social, como é o caso do Whatsapp: ele é apenas um aplicativo de troca de mensagens, não há a construção de uma pessoa através de um perfil e a interação através de comentários públicos, ou ao menos comentários que ficariam disponíveis para a visualização dos amigos.

As redes sociais podem ter diversos fins, reunindo grupos de pessoas com interesses coliga-dos, ou simplesmente para usufruir serviços e vantagens da rede. Causam grandes inquietações nas relações de trabalho, nas quais empregados e empregadores ainda estão descobrindo seus limites e efeitos, frente às infinitas possibilidades que trazem esta nova forma de se relacionar, as quais estão sendo implementadas a passos largos, destarte Cristiane Maria Freitas de Mello a respeito do assunto:

É inquestionável a crescente substituição do diálogo oral pela comunicação nas redes sociais, sobretudo entre jovens. Paulatinamente, as pessoas estão usando as redes sociais como veí-culo da própria fala cotidiana, o que revela uma transformação comportamental que merece ser analisada com cautela pelo Judiciário5.

3 LEONARDI, Marcel. Tutela e privacidade na internet. São Paulo: Saraiva, 2012. p. 28.

4 RECUERO, Raquel. Redes Sociais na internet. Porto Alegre: Sulina. 2009. p. 102.

5 MELLO, Cristiane. Direito de crítica do empregado nas redes sociais e a repercussão no contrato de trabalho. São Paulo 2015, Editora: LTr. p. 124.

Revista Atitude · Faculdade Dom Bosco de Porto Alegre · Ano XI - No 22 - janeiro a junho de 2017 135134 O IMPACTO DAS REDES SOCIAIS NAS RELAÇÕES DE TRABALHO E SUA FORÇA PROBANTE.

É inegável que com o advento das redes sociais a sociedade passou por transformações signi-ficativas, as quais também foram sentidas nas relações de trabalho criando um fenômeno ainda desconhecido e pouco estudado. Em muito a dinâmica da comunicação foi aperfeiçoada, deu-se um significativo salto na globalização, aproximando pessoas que mesmo distante a milhares de quilômetros, as quais independentes de seu fuso horário ou onde possam estar, passam a ficar conectadas com um simples toque.

Sob uma falsa sensação de liberdade os horários foram dilatados, passou-se a “fazer mais em menos tempo”, o gerenciamento e gestão das atividades são feitos a distância em “real-time”, e de forma muito eficaz. Passa-se a estar conectado de forma inconsciente, a mesma informação de um simples “check-in” causa tranquilidade a familiares, mas inquietações para empregadores, pois, nunca foi tão fácil produzir prova sem o ponto eletrônico de que está à disposição do empregador.

Quase toda a coletividade, de certa forma, está conectada por redes sociais, atualmente pessoas e empresas relacionam-se de forma dinâmica e frenética, com sede de informações, constituindo assim grandes conglomerados virtuais os quais giram em torno de objetivos e inte-resses comuns, sem a existência de uma linha hierárquica, estando todos participantes em uma mesma linha horizontal.

Levando ao entendimento de que importante ponto a ser observado nas relações mantidas através das redes sociais é que diante do livre arbítrio de fazer parte deste grupo, exercendo um caráter democrático de participação, os vínculos sociais são fortalecidos frente aos interesses e objetivos comuns.

1.2. AS TRANSFORMAÇÕES DA SOCIEDADE COM O ADVENTO DAS REDES SOCIAIS

As redes sociais, criadas através da existência da internet, possibilita uma vivência universal sem precedentes. É inegável o avanço tecnológico e nos grandes centros é praticamente impossível viver imaginando os dias atuais sem a internet, sendo um meio indispensável de acesso para todos.

Porém, com todos os dados trafegando em uma mesma base, nunca ocorreu tamanha exibi-ção da população, seja pela exposição voluntária, seja pelo fato que mesmo fazendo transações individuais, tudo está a vista de quem, caso porventura, queira descobrir. Acerca do assunto, Alessandro Hirata assevera:

Além disso, há uma ameaça à privacidade percebida em relação a colocar demasiada in¬for-mação pessoal nas redes sociais, permitindo produzir um perfil do comportamento de um indivíduo. Com isso, criam-se verdadeiros arquivos de informações de cada usuário, com os mais diferentes dados sobre o seu com¬portamento social, econômico e pessoal; tais infor-mações podem ser utilizadas para os mais diversos fins. Mesmo que esses dados sejam públicos, a sua coleta e posterior organização e classifica¬ção para a utilização em fins – comerciais, por exemplo – levam à importante questão sobre a invasão de privacidade. Vale lembrar ainda que tais dados, mesmo depois de apagados pelos usuários de redes sociais, permanecem sob controle dessas redes, que os armazenam para fins econômicos seus e de terceiros6.

6 HIRATA, Alessandro. O facebook e o direito à privacidade. Revista de Informação Legislativa. Brasília, v. 51, n. 201, p. 17-27, jan./mar. 2014. p. 20.

O autor ainda explica uma ação movida por Max Schrems em face do Facebook, que após muitas tentativas, conseguiu um CD do site com 1.200 páginas, com todas as suas informações ocorridas na rede social. Absolutamente tudo que Max fez em sua rede social, estava lá armaze-nado, inclusive fatos que acreditava ter “deletado”, os quais o Facebook continuava armazenando. Da mesma forma que temos uma ferramenta que nos ajuda desde os meios profissionais até os pessoais, nunca se pode invadir a esfera privada de alguém com tamanha facilidade.

No Brasil, na pesquisa realizada pela Secretaria de Comunicação Social do Gabinete da Presi-dência da República em 2014, apontou que é de 51% o percentual de entrevistados que ainda não utilizam a internet. Contudo, entre os usuários, a exposição é intensa e com um padrão semelhante: 76% das pessoas acessam a internet todos os dias, com uma exposição média diária de 4h59 de 2ª a 6ª feira e de 4h24 nos finais de semana. Os dados mostram que 65% dos jovens com até 25 anos acessam internet todos os dias. Entre os que têm acima de 65 anos, esse percentual cai para 4%. Ou seja, o uso da internet é muito mais frequente entre os jovens. A pesquisa ainda demonstra:

O uso de aparelhos celulares como forma de acesso à internet já compete com o uso por meio de computadores ou notebooks, 66% e 71%, respectivamente. O uso de redes sociais influencia esse resultado. Entre os internautas, 92% estão conectados por meio de redes sociais, sendo as mais utilizadas o Facebook (83%), o Whatsapp (58%) e o Youtube (17%)7.

Há pesquisas que demonstram que os efeitos das redes sociais pode ser tão devastador a ponto de ser equiparado com uma droga nociva. A pesquisa, realizada pela Universidade de Bergen, na Noruega, foi publicada no periódico Psychological Reports, conforme segue:

A pesquisadora descobriu vários fatores sobre a dependência em Facebook, como suas prin-cipais vítimas: as mulheres e os mais jovens. Pessoas tímidas, ansiosas e inseguras social-mente também estão no páreo. De acordo com Cecilie, indivíduos com essas características de personalidade têm maior facilidade em se comunicar por meio das mídias sociais do que pessoalmente. Já pessoas mais organizadas e ambiciosas são menos suscetíveis à depen-dência, segundo a pesquisa.De acordo com o estudo, os sintomas do vício em Facebook são semelhantes aos da depen-dência química. Mas como descobrir se você é ou não viciado na rede? Em janeiro de 2011, a pesquisadora realizou testes com 423 estudantes, sendo 227 mulheres e 196 homens. A partir disso, criou um teste, batizado de “Escala Bergen para o Vício em Facebook”, para identificar os dependentes8.

Assim, a carência de se estar conectado o tempo todo, a ânsia por novidades e exposição se realizadas em caráter demasiado e sem controle, podem ensejar a necessidade de tratamento médico, pois se caracterizado o vício, outros auxílios serão devidos para o tratamento da pessoa. Isso mostra o caráter perverso da internet na vida privada, podendo causar transtornos em várias áreas sociais.

1.4. A NOVA DINÂMICA DA RELAÇÃO DE EMPREGO COM O ADVENTO DAS REDES SOCIAIS

7 BRASIL. Presidência da República. Secretaria de Comunicação Social. Pesquisa brasileira de mídia 2015: hábitos de consumo de mídia pela população brasileira. – Brasília: Secom, 2014. Disponível em: <http://www.secom.gov.br/atuacao/pesquisa/lista-de-pesquisas-quan-titativas-e-qualitativas-de-contratos-atuais/pesquisa-brasileira-de-midia-pbm-2015.pdf>. Acesso em 24 maio 2017.

8 REDAÇÃO ÉPOCA. Você é viciado em Facebook? A ciência responde; faça o teste e descubra. Época on-line, Disponível em: <http://revistaepoca.globo.com/Ciencia-e-tecnologia/noticia/2012/05/voce-e-viciado-em-facebook-ciencia-responde-faca-o-teste-e-descubra.html>. Acesso em: 24 maio 2017.

Revista Atitude · Faculdade Dom Bosco de Porto Alegre · Ano XI - No 22 - janeiro a junho de 2017 137136 O IMPACTO DAS REDES SOCIAIS NAS RELAÇÕES DE TRABALHO E SUA FORÇA PROBANTE.

Seria inocência demais imaginar que tamanha importância com o nascimento e consequente crescimento da internet, aliado ao fato da explosão das redes sociais, não traria reflexos no mundo do direito, em especial relações que tendem a perdurar no tempo, que são as relações de emprego.

Marcelo Oliveira Rocha aborda em seu livro, escrito em 2004, sem o “boom” das redes sociais, mas sob a égide dos novos desafios trazidos com a internet, as novas situações criadas entre empregado e empregado com o advento do seu uso nas relações de trabalho:

Trata-se de um problema trabalhista decorrente da mais nova tecnologia conhecida. A polê-mica vem crescendo rapidamente nos países avançados, onde a grande maioria das pessoas trabalha no computador. Na realidade brasileira esse problema também se encontra acen-tuado. Extrai-se das informações obtidas pelos meios de comunicação, inclusive da própria Internet, revelações de usos mais absurdos, que vão desde a pornografia até os negócios pessoais, passando pelos bate-papos, piadinhas, notícias dos sindicatos, convites para re-uniões, divulgação de poesias, receitas culinárias, temas de espiritualismo, comunicações de aniversários, nascimentos, casamentos e falecimentos, dentre outros. Existem vários problemas gerados pelo uso indevido dos computadores. O primeiro deles é a sobrecarga da memória e da rede. Em segundo lugar, há o tempo subtraído do trabalho que é usado para preparar e enviar mensagens ou “surfar” na Internet. Em terceiro lugar, o tempo gasto por todos os empregados que têm de ler enormes quantidades de mensagens. Tudo isso reduz a produtividade do trabalho9.

O autor, logo após, continua com seus pensamentos, alegando que o uso da internet é mais discreto quando comparados com outros meios que poderiam causar prejuízo ao empregador, como o telefone, fax, xerox, mas agora com a internet capturar o empregado que está navegando na internet e não trabalhando, com certeza virou tarefa muito mais difícil. Para estancar esse mal, o autor traz as seguintes soluções:

Com o intuito de frear essa atividade, grande número de empresas já definiu normas proibindo o uso do computador para toda e qualquer atividade que saia da rotina de trabalho. Algumas colocam um aviso na primeira tela de forma que, todos os dias, ao abrir o computador, o em-pregado é lembrado da proibição. Outras vão além e informam que as operações dos usuários são diariamente monitoradas com aquele fim. E as mais avançadas já instalaram softwares complexos que fazem isso automaticamente, emitindo, inclusive, as punições aos infratores, a exemplo do que fazem os radares do trânsito com os motoristas imprudentes10.

Por sua vez, Rafael Fernandes Maciel explica que não há como se desprender da atual ten-dência mundial da intercomunicação, bem pelo contrário, o empregador deverá estar adepto às atuais relações:

As políticas que se preocupam em orientar e tratar adequadamente os riscos oriundos do uso da tecnologia da informação não raramente apenas relacionam proibições vinculadas à segurança de dados, deixando de tratar as mídias sociais e seus impactos à reputação do negócio. Não basta à corporação definir regras ou proibições para uso das redes sociais durante o horário de trabalho. Proibir seu uso é ir contra as tendências mais modernas de networking empresarial, além de pouco efetivo. Isso porque o acesso às redes sociais é cada vez mais originado de dispositivos móveis, nada adiantando o bloqueio via desktops ou redes wireless da companhia. Além desse impedimento técnico, o bloqueio total gera antipatia com os colaboradores e pode ser fator relevante no incremento dos negócios. Por exemplo: como os vendedores da sua empresa podem ficar sem interagir nas redes sociais? Eles precisam explorar ao máximo esses relacionamentos, incrementando a rede de contatos e, consequen-

9 ROCHA, Marcelo Oliveira. Direito do Trabalho e Internet. São Paulo: Universitária de Direito, 2005. p. 169-170.

10 ROCHA, Marcelo Oliveira. Direito do Trabalho e Internet. São Paulo: Universitária de Direito, 2005. p. 170.

temente, aumentando as vendas11.

Ou seja, bloquear não adianta, as redes sociais deverão ser uma aliada, principalmente na área comercial, vista a visibilidade ofertada por essas ferramentas de contato, além do fato de “trancar” o acesso aos sites das redes sociais ser praticamente inútil, pois se o empregado quiser, ele as acessa pelo celular, dispositivo que atualmente é de porte pessoal básico.

Para tentar prevenir, Alan Balaban explica que em razão da impossibilidade de previsão de todos os fatos que possam vir ocorrer nas relações de trabalho, empregado e empregador devem adotar o bom-senso como balizador de suas relações, e ainda como forma de se resguardar:

[…] a melhor forma de resolver qualquer problema no pacto laboral envolvendo meios tecno-lógicos é a necessidade de que seja elaborado um contrato de trabalho escrito entre empre-gado e empregador, com cláusulas especificas em face do trabalho que será desenvolvido e incluindo os meios tecnológicos que serão utilizados.Ainda, deve ser criado um regulamento interno da empresa que explique exatamente como aquele meio tecnológico deve ser utilizado. O que pode? O que não pode? Como deve ser utilizado?Por fim, após criar os mecanismos acima, os empregadores devem respeitar o seu empre-gado, tanto em seu íntimo como em sua pessoa, não ultrapassando qualquer limite do que está pactuado, bem como, o empregado deve respeitar os mesmos diplomas para que tenha garantido todos os seus direitos12.

Dessa forma, deveria ser instituído um meio termo, nem proibir, mas também não poderia se deixar a situação de qualquer forma, sem aviso e controle algum patronal. O empregador deverá perceber, de acordo com a natureza da atividade exercida (existem atividades que são necessárias concentrações máximas do funcionário, e nenhuma informação poderá retirar o seu foco, nesses casos sim, se defende a total proibição do uso da internet, ou inclusive de telefones), se pode ser permitido certo acesso dos empregados aos meios de comunicação conectados à internet, e notar como que ocorre a dinâmica empresarial com a liberdade do empregado em acessar tais con-teúdos que não guardariam relação direta com o serviço. Assim, de acordo com o caso concreto, poderá se analisar se há exacerbada utilização da internet para outros fins, deturpando o horário de trabalhado que deveria ser destinado aos desígnios do empregador.

1.5. A LIBERDADE DE PENSAMENTO DO EMPREGADO NAS REDES SOCIAIS

Desde o surgimento do Estado Liberal, sempre tem sido objeto de dúvidas e indagações acerca de até onde a liberdade de pensamento poderá ir. A liberdade de pensamento não se apresenta de uma única forma, mas se traduz em liberdade de consciência, liberdade de crença, liberdade de manifestação do pensamento e a liberdade de expressão, todas elas garantidas na Constituição Federal como direitos fundamentais no art. 5º, IV, IV e IX. Antes mesmo da Constituição, através da Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, já foi consagrado tal ideia desde 1789.

Adentra-se em um assunto mais complexo, devendo se debruçar sobre a questão da existência ou não da liberdade de pensamento do empregado frente à fidúcia que se presume na relação de trabalho e o poder diretivo do empregador e de sua honra e imagem, tema este que tem apre-

11 MACIEL, Rafael Fernandes. A importância de se instituir uma política de uso das redes sociais nas empresas. Jornal Trabalhista Consulex. Brasília, v. 29, n. 1429, 04/06/2012. p. 11.

12 BALABAN, Alan. Bom-senso na utilização dos meios tecnológicos no ambiente de trabalho. Jornal Trabalhista Consulex. Brasília, v. 29, n. 1452, 12/11/2012. p. 13.

Revista Atitude · Faculdade Dom Bosco de Porto Alegre · Ano XI - No 22 - janeiro a junho de 2017 139138 O IMPACTO DAS REDES SOCIAIS NAS RELAÇÕES DE TRABALHO E SUA FORÇA PROBANTE.

sentado grandes divergências de entendimento nos tribunais. A respeito do assunto, o TST em matéria elucidativa a respeito do tema, explica tal garantia individual:

A liberdade de pensamento é caracterizada como direito da personalidade. Trata-se de garan-tia individual que protege a sociedade contra o arbítrio e as soluções de força. O ministro do Tribunal Superior do Trabalho Alexandre Agra Belmonte, porém, observa que essa liberdade pode sofrer restrições na relação de trabalho, desde que se levem em conta três critérios: a necessidade da regra imposta, a adequação dessa regra e a proporção em que ela é imposta. “O principal critério é que a liberdade de pensamento e expressão do empregado não pode atentar contra a finalidade principal da empresa”, explica. “Para além disso, é livre e protegida contra qualquer regulação abusiva”13.

Assim, o Ministro entrevistado na matéria, Alexandre Agra Belmonte, expõe que são necessá-rios três critérios para o cerceamento da liberdade de pensamento, que seria a necessidade de regra imposta, a adequação e a proporção da regra no caso concreto. Deverá ser analisada qual a principal finalidade da empresa e se a manifestação do funcionário está ferindo tal fim. Caso a resposta para esse dilema seja negativa, o empregado estará livre para se manifestar, assim como acobertado com o seu direito e garantia fundamental de liberdade.

Cristiane Maria Freitas de Mello traz que:

O Exercício do direito de crítica do empregado nas redes sociais, sem cometimento de crimes e evitando o abuso com a utilização de termos excessivos, insultosos e desnecessários, ten-dentes a afetar o regular funcionamento da organização do trabalho ou o correto cumprimento do contrato, é pleno, dada a importância da liberdade de expressão no Estado Democrático, como refração do pensamento e da consciência, e para a preservação do direito de identidade do empregado14.

Sustentando assim que as críticas realizadas pelo trabalhador nas redes sociais, desde que devidamente fundadas, podem ser realizadas pelos empregados e não devem ser utilizadas con-tra este, o qual estaria sob guarida do texto constitucional, frente ao principio de liberdade de expressão e manifestação dos pensamentos.

Alexandre Agra Belmonte escreveu de forma bastante elucidativa sobre o tema:

O relacionamento do trabalhador com a empresa ou seus dirigentes e colegas de trabalho é de natureza pessoal, não lhe cabendo tornar público assuntos que não dizem respeito ao conhe-cimento alheio. A relação de trabalho é estabelecida com base na reserva de informações e na fidúcia que deve orientar o relacionamento interno. Revelar estratégias, segredos empresarias ou ofender a imagem do empregador podem levar diretamente à despedida, por justa causa15.

Trazendo desta forma que as redes sociais não podem ser entendidas como “campo sem li-mite”, aonde tudo seria possível ser dito, sem a devida responsabilização, devendo assim em sua visão, ser este o entendimento aplicado aos contratos de trabalho.

Outro ponto que poderia se relacionar ao fato da liberdade de pensamento do empregado, está a sua privacidade, porém, na verdade, acredita-se no presente estudo que tais circunstâncias não

13 Tribunal Superior do Trabalho. TrabalhoXliberdade de pensamento, uma relação delicada. Disponível em: <http://www.tst.jus.br/materias-especiais/-/asset_publisher/89Dk/content/id/3253359>. Acesso em 09 maio 2017.

14 MELLO, Cristiane. Direito de crítica do empregado nas redes sociais e a repercussão no contrato de trabalho. São Paulo 2015, Editora LTr, p. 125.

15 BELMONTE, Alexandre Agra. Os problemas e limites do uso das redes sociais no ambiente de trabalho. v. 9, n. 53, mar./abr., 2013. Porto Alegre: LexMagister. p. 59–65.

se misturam, pois como afirmado Sandra Lia Simón a respeito da privacidade ou vida privada:

Vida privada é tudo aquilo que o indivíduo quer ocultar do conhecimento público e intimidade seria tudo aquilo que ele quer deixar apenas o seu próprio âmbito pessoal, oculto também de pessoas de seu convívio mais próximo16.

Assim, para essa pesquisa, não seria o fato de se discutir a sua privacidade, pois no momento que há a formação do perfil social público na internet, onde há o acesso às informações da pessoa na rede social, deixa-se de falar nisto, e em razão disso, é mais pertinente o debate a respeito da liberdade de pensamento.

1.6. O PODER DIRETIVO DO EMPREGADOR

O empregador possui o seu poder de comando, que nada mais é a qualidade conferida a ele para controlar as ordens no contrato de trabalho. Cinthia Machado de Oliveira e Leandro do Amaral Dorneles abordam a respeito dos poderes patronais e quais as atribuições decorrentes desse poder de comando:

Os poderes patronais de manifestam-se através de cinco prerrogativas básicas juridicamente alcançáveis ao empregador, a saber:

a) Poder de regulamentar a relação de emprego – ao empregador cabe decidir acerca de algumas prerrogativas inerentes à melhor execução dos serviços, no que o contrato de tra-balho revela sua face adesiva. As empresas podem estabelecer regulamentos, versando, por exemplo, sobro o plano de cargos e salários, normas disciplinares e outros.b) Poder de dirigir a prestação pessoal de serviços – o empregador, ou aquele por ele desig-nado, determina a prestação de serviços de seus empregados, especificando, distribuindo e orientando o cumprimento das tarefas determinadas.c) Poder de fiscalização – intrinsicamente ligado aos anteriores, […] a prerrogativa fiscalizató-ria concretiza-se através do controle e supervisão de tarefas, podendo ser exercida inclusive através de revistas (não íntimas ou câmeras de vigilância, desde justificadas […]d) Poder punitivo (poder disciplinar) – talvez a manifestação mais incisiva do poder de comando. Se ao empregador cabe a fiscalização, também a ele cabe a punição dos empregados que não acatam suas ordens. O poder punitivo basicamente se manifesta através da (d.1) advertência, (d.2) suspensão disciplinar de até 30 dias (art. 474, CLT) e (d.3) despedida por justa causa (art. 482, CLT).e) Poder de adequar a prestação de serviço às necessidades da atividade – é o chamado jus variandi do empregador. Consiste na autonomia que o empregador possui de determinar, de forma unilateral, alterações circunstanciais na prestação de serviços, de forma a adequá-la às necessidades empresariais.17

Para o presente estudo, o poder disciplinar é o que merece maior atenção, pois é o momento que o empregador poderá aplicar sanções ao empregado pelo uso das redes sociais. As formas em que se manifestam o poder punitivo poderão ser verificadas através das três punições: advertência (sem previsão legal, geralmente prevista em negociação coletiva ou regulamentos empresarias); suspensão do contrato de trabalho por até 30 dias consecutivos (art. 474 CLT) e a mais temida de todas: a despedida por justa causa encontrada no art. 482 CLT.

É justamente esse o momento do ponto de encontro no presente trabalho, quando que o uso das

16 SIMÓN, Sandra Lia. A proteção constitucional da intimidade e da vida privada do empregado. São Paulo: LTr, 2000. p. 101.

17 OLIVEIRA, Cínthia Machado de. DORNELES, Leandro do Amaral D. de. Direito do trabalho. 3.ed. Porto Alegre: Verbo Jurídico, 2016. p. 51-52.

Revista Atitude · Faculdade Dom Bosco de Porto Alegre · Ano XI - No 22 - janeiro a junho de 2017 141140 O IMPACTO DAS REDES SOCIAIS NAS RELAÇÕES DE TRABALHO E SUA FORÇA PROBANTE.

redes sociais levará à utilização do poder de comando empresarial a ponto do empregado sofrer alguma espécie de punição, e se isso poderá ser levado em consideração caso seja instaurada uma demanda judicial para apreciação das condutas. Tal punição deverá atender a imediatidade, conforme Alice Monteiro de Barros ensina:

Configura-se renúncia ou perdão tácito quando o empregador toma ciência do comportamento faltoso do empregado e mesmo assim permite que ele trabalhe por um lapso de tempo relati-vamente longo, não comprovando estivesse neste período aguardando investigação contínua, cautelosa e criteriosa, a fim de, depois, romper o ajuste. O prazo para aferição da atualidade ficará ao prudente arbítrio do juiz, esclarecendo-se que devem sopesar-se, na sua avaliação, as dimensões da empresa e a sua complexidade organizacional.18

Assim, quando o empregador tiver conhecimento do ato, se for no mesmo momento da publi-cação, ou em situação posterior, imediatamente, deverá advertir o funcionário, pois se não assim fizer, configurará o perdão tácito e a possibilidade de reversão da justa causa em juízo.

2. O IMPACTO DAS REDES SOCIAIS NAS RELAÇÕES DE TRABALHO E SEUS AS-PECTOS PROBATÓRIOS

2.1. A PROVA: IMPORTÂNCIA, CONCEITUAÇÃO E FINALIDADE

Sergio Pinto Martins aduz:

A prova tem natureza processual, de ser apresentada no processo, como é forma de demons-trar os negócios jurídicos praticados pelas partes. Sua natureza é mista, pois a prova pode ser feita extrajudicialmente.O objetivo da prova é convencer o juiz a respeito dos fatos da causa.19

O direito de ação todas as pessoas possuem, porém, para se sair vitorioso, a questão probatória assume grande relevo, pois é nela que irá se basear, demonstrar quem que efetivamente possui o direito no caso concreto. Amauri Mascaro do Nascimento explana a respeito de sua finalidade:

A prova tem a finalidade de transportar, para o processo judicial, a realidade externa dos fatos que geraram a demanda, traduzindo-os, para que possam ser conhecidos pelo juiz e para que sirvam de base para os debates entre as partes. Como meio destinado a levar para o processo a reconstituição dos fatos, poderá ter falhas e não cumprir com exatidão esse fim, situação na qual haverá a verdade real (concreta) diferente da realidade formal (imaginária), e está prevalecerá. De nada adianta ter ocorrido um fato se não pode ser provado.20

Ou seja, a verdade formal (dos autos) deverá estar o mais próximo possível da verdade material (do mundo dos fatos), se isto for possível, é claro, para que o processo transmita o que de mais verdadeiro ocorreu em busca da correta aplicação da justiça.

18 BARROS, Alice Monteiro de. Curso de direito do trabalho. 11.ed. São Paulo: LTr, 2017. p. 580.

19 MARTINS, Sérgio Pinto. Direito processual do trabalho. 36.ed. São Paulo: Atlas, 2015. p. 328.

20 NASCIMENTO, Amauri Mascaro. Curso de direito processual do trabalho. 28.ed. São Paulo: Saraiva, 2013. p. 620.

2.2. MEIOS DE PROVA ADMITIDOS NO PROCESSO DO TRABALHO

O princípio do devido processo legal, previsto no art. 5º, LIV da Carta Magna, combinado com o inciso LV do mesmo artigo, dão a abertura constitucional para o direito à prova. A CLT (de 1943) de forma escassa dedicou somente 13 artigos, em sua Seção IX, para tratar sobre provas, sendo que pelo princípio da oralidade, 12 destes artigos versam sobre a prova testemunhal e depoimento pessoal das partes, restando para somente o art. 830 abordar o tema da prova documental. Há dois artigos tratando da perícia (arts. 826 e 827). A CLT em nada prevê a respeito da inspeção judicial.

A grande problemática se faz presente quando o juiz, frente a seu amplo poder discricionário conferido pelo art. 765 CLT, decide por aceitar ou não publicações em redes sociais como provas, as quais passam a ter reflexo direto em todo o curso do processo.

Fazendo um comparativo com o CPC, que vem servindo nos casos omissos de forma subsidiária conforme autorização expressa da CLT em seu artigo 769. O direito processual comum foi muito mais abrangente em abordar a questão da prova. O CPC prevê sete meios de prova: ata notarial (seção III, art 384); depoimento pessoal e confissão (seção IV e V, arts. 385 e seguintes); exibição de documento ou coisa (seção VI, art. 396 e seguintes); documental (seção VII e VIII, arts. 405 e seguintes); testemunhal (seção IX, arts. 442 e seguintes); pericial (seção X, arts. 464 e seguintes) e inspeção judicial (seção XI, arts. 481 e seguintes). Rol muito maior que o da CLT.

Além disso, mesmo o código ainda formulado em 1973 trouxe de forma abrangente em seu art. 332 a seguinte redação:

Art. 332 CPC/73. Todos os meios legais, bem como os moralmente legítimos, ainda que não especificados neste Código, são hábeis para provar a verdade dos fatos, em que se funda a ação ou a defesa.

O novo CPC seguindo o mesmo entendimento, trouxe o que segue:

Art. 369 NCPC. As partes têm o direito de empregar todos os meios legais, bem como os moralmente legítimos, ainda que não especificados neste Código, para provar a verdade dos fatos em que se funda o pedido ou a defesa e influir eficazmente na convicção do juiz.

Ou seja, o CPC traz exemplos de prova, pois ele não a conceitua, não caracteriza o que seria prova, e informa que podem ser empregados todos os meios legais e moralmente legítimos. Então qualquer coisa, desde que atendidas as especificações do art. 369, poderá ser uma prova. Desta forma se deduz de que as redes sociais podem servir como prova para formar o convencimento do juiz para que assim este possa perseguir a verdade real.

Mauro Schiavi explica a respeito de quais meios de prova poderão ser utilizados e qual a mo-tivação para qualquer meio de prova ser praticado:

[…] além dos meios de prova elencados no Código de Processo Civil, há a admissão de qual-quer meio moralmente legítimo de prova, vale dizer: o meio probatório que não atente contra moral e os bons costumes. Com isso, nota-se a amplitude probatória que consagra o Código de Processo Civil, a fim de facilitar o acesso do cidadão à Justiça e a possibilidade de demonstrar a veracidade de suas alegações em juízo. De outro lado, como é princípio fundamental da nova codificação processual civil, o contraditório deve ser observado com ênfase na fase probatória, possibilitando às partes o direito de influir eficazmente na convicção do juiz21.

21 SCHIAVI, Mauro. Manual de direito processual do trabalho. 11.ed. São Paulo: LTr, 2016. p. 669.

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O autor, na continuação de seus pensamentos, cita novamente o art. 369 CPC supracitado, que consagra o princípio da atipicidade das provas, permitindo que sejam aceitos outros meios de prova, desde que moralmente legítimos. Logo após, continua ao explicar a diferença entre meio e fonte da prova:

Enquanto os meios de prova são os instrumentos legais ou admissíveis em Direito para se demonstrar a veracidade das alegações em juízo, as fontes da prova são os fatos naturais ou humanos que tenham relevância na esfera jurídica, bem como as coisas corpóreas ou incorpó-reas existentes na natureza ou criadas pelo homem, das quais se originam os meios de prova22.

A partir do explanado, por exemplo, o facebook seria a fonte de prova, e o meio de prova seria a ata notarial que daria fé pública para o conteúdo postado/publicado em tal rede social.

Por sua vez, Amauri Mascaro do Nascimento explica:Meio de prova é expressão de duplo significado.Tanto pode designar a atividade do juiz ou das partes para a produção das provas, como também os instrumentos ministrados ao juiz no processo para formar o seu convencimento.A palavra “prova” tem sido utilizada tanto para designar a atividade como instrumento. Podem existir meios de prova que nada provem, entendido o meio como atividade. Como também podem existir instrumentos que não demonstrem. Parece-nos que ambos os sentidos se en-trelaçam, e que por meio de prova ser entendida a fonte de onde emana a convicção do juiz23.

A argumentação trazida pelo autor se encaixa melhor no atual contexto legislativo brasileiro, pois realmente, há confusão terminológica a respeito do que seria prova, não existindo, na verda-de, uma situação específica que se pode utilizar de forma exclusiva a palavra em comento, sendo quase uma utopia buscar um sentido único para uma questão tão utilizada.

A discussão no meio jurídico sobre a possibilidade de utilização das publicações realizadas em redes sociais servirem como prova na Justiça não é recente, tendo em 2012 a OAB/SP pro-posto um grande debate entre os advogados de seu Estado, o qual teve como tema central o questionamento se mensagens postadas em redes sociais poderiam servir como prova, por ter a Constituição Federal expresso em seu Art. 5º. inciso LVI que: “são inadmissíveis, no processo, as provas obtidas por meios ilícitos;” tendo naquela época ficado divido as opiniões, aonde de um lado sob forte argumento constitucional sustentava-se que a prova constituída entre particulares não poderia se fazer presente nos autos flagrante era a ilicitude de sua obtenção, tendo do outro lado argumentos afirmativos de sua utilização, por entender que as redes sociais não poderiam ficar a margem do ordenamento jurídico, mas sim a seus serviços.

Desta forma tem-se o primeiro grande questionamento: as provas obtidas unilateralmente nas redes sociais seriam ilícitas? Grande parte dos magistrados, juristas e operadores do direito entendem que não, defendendo assim esta tese Alamiro Velludo Salvador Netto em entrevista concedida a Revista da OAB/SP, conforme segue:

Ocorre que as mensagens postadas em redes sociais destinam-se exatamente ao público em geral, rompendo com um paradigma simples de relações confidenciais ou privadas. A dinâmica de muitos sítios eletrônicos é exatamente permitir a livre manifestação do pensamento a qual-quer um, conferindo ao cidadão o poder de atingir um número ilimitado de pessoas. Outros, ainda que restritos a pessoas previamente selecionadas, igualmente outorga a possibilidade

22 SCHIAVI, Mauro. Manual de direito processual do trabalho. 11.ed. São Paulo: LTr, 2016. p. 669-670.

23 NASCIMENTO, Amauri Mascaro. Curso de direito processual do trabalho. 28.ed. São Paulo: Saraiva. 2013. p. 633.

de exposição e manifestação, devendo ser utilizado com responsabilidade e parcimônia24.

Sendo indubitável o entendimento de que as redes sociais servem como prova e para o livre convencimento do juiz, sendo que de forma preventiva, devem ser adotadas algumas cautelas para que se tenha a eficácia e robustez pretendida, devendo assim tais publicações serem transcritas através de ata notarial e outros meios para que torne a prova confiável e válida, conforme será abordado nos próximos itens.

2.2.1. DOCUMENTO ELETRÔNICO

A respeito do documento eletrônico, surgiria a dúvida se o publicado nas redes sociais poderá ser considerado como um documento eletrônico, pois a legislação não faz considerações do que seria um documento eletrônico. Atualmente, os documentos eletrônicos estão previstos como meios de prova típica previsto no art. 439 até 441 do CPC, novidade em comparação ao CPC/73. O art. 11 da Lei 11.419 de 2006 também trata do assunto, mas sem denominar o que seria.

Antônio Marques explica o que seria um documento eletrônico:

No concernente ao documento eletrônico, uma vez que não se prende ao meio físico em que está gravado, possuindo autonomia em relação a ele, nada mais representa que uma sequência de bits que, traduzida por meio de um determinado programa de computador, seja representativo de um fato. Desta forma, percebe-se que os documentos eletrônicos possuem os mesmos elementos que um documento escrito em suporte de papel, contendo, entretanto, os seguintes aspectos: a) constam em suporte material (disquete, circuitos, chips de memória, redes); b) contêm uma mensagem, em que está escrita em linguagem convencional de dígitos binários ou bits, entidades magnéticas que os sentidos humanos não podem perceber diretamente; c) estão escritos em um idioma ou código determinado; e d) podem ser atribuídos a uma pessoa determinada com a qualidade de autor, mediante uma assinatura digital ou chave eletrônica25.

Então, de acordo com o autor, os dados constantes nas redes sociais seriam um documento eletrônico. Mas será que apenas assim as redes sociais seriam um meio de prova? Não teria outra forma?

No próprio site nacional dos Notários e Registradores do Brasil, aparece a duvida, afinal, o que consta nas redes sociais, poderá ser considerado um documento eletrônico?

Então, se a parte interessada pretender provar, em processo físico, a verdade de um fato por meio de vídeo do youtube, gravações telefônicas, textos de sites ou de rede social (facebook, linkedin etc.) ou qualquer outro tipo de gravação em mídia, deverá converter o documento eletrônico à forma impressa. Como convertê-los em escritos sem perder a força probante? O novo CPC também inovou nesse aspecto. Trouxe, em seu bojo, de forma expressa, a ata notarial como meio de prova […]26.

Dessa forma, para o presente estudo o contido nas redes sociais não seria um documento eletrônico como trazido pelo CPC, pois esse seria um documento do word, excel, uma música,

24 Jornal do Advogado, OAB/SP – Ano XXXVIII – Set/2012 – N. 376, p. 10-11.

25 MARQUES, Antônio Terêncio G. L. A Prova Documental na Internet. Curitiba: Juruá, 2006. p. 126-127.

26 ANOREG-BR - Associação dos Notários e Registradores do Brasil. Documentos eletrônicos no novo CPC. Disponível em: <http://www.anoreg.org.br/index.php?option=com_content&view=article&id=28239:documentos-eletronicos-no-novo-cpc&catid=64&Itemid=184>. Acesso em 01 jun. 2017.

Revista Atitude · Faculdade Dom Bosco de Porto Alegre · Ano XI - No 22 - janeiro a junho de 2017 145144 O IMPACTO DAS REDES SOCIAIS NAS RELAÇÕES DE TRABALHO E SUA FORÇA PROBANTE.

algo que efetivamente estaria gravado em alguma memória e poderia ser retirado de um Hard Disk Drive (HD). Já um e-mail, uma rede social, algo que é acessado de qualquer lugar em sua integralidade, sem salvamentos no HD, o meio de prova mais inteligente a ser utilizado, conforme afirmado pelo próprio site dos notários, é a ata notarial, conforme será explicada abaixo, novidade trazida como meio de prova típico no novo CPC.

2.2.2. ATA NOTARIAL

Outro meio que poderia se mostrar com mais convicção o alegado nas redes sociais é a ata notarial. A ata notarial já existia na sistemática do CPC de 1973, porém, a sua previsão se encon-trava no art. 982 § 1º, sobre o inventário e partilha, assim como no 1124-A, § 2º, versando sobre a separação consensual. A atividade é do tabelião, conforme determina a Lei n° 8.935 de 1994: “Art. 3º Notário, ou tabelião, e oficial de registro, ou registrador, são profissionais do direito, dotados de fé pública, a quem é delegado o exercício da atividade notarial e de registro.”

Atualmente, a ata notarial está disposta no capítulo das provas, recebimento um tratamento melhorado. De acordo com a redação do CPC:

Art. 384 NCPC. A existência e o modo de existir de algum fato podem ser atestados ou docu-mentados, a requerimento do interessado, mediante ata lavrada por tabelião.Parágrafo único. Dados representados por imagem ou som gravados em arquivos eletrônicos poderão constar da ata notarial.

Conrado di Mambro Oliveira explica o instituto:

[…] o tabelião é um espectador atencioso e imparcial dos fatos que presencia ou das situações que lhe constem, representando-os na ata notarial com maior exatidão. Deve presenciar os fatos e relatá-los na ata notarial de maneira veraz e objetiva, sem apreciações pessoais nem valoração desses fatos, excetuando aquelas que necessitam da aplicação do juízo estrito para atender à finalidade da ata. Ser objetivo envolve avaliar os fatos relevantes e irrelevantes, desprezando estes e descrevendo aqueles27.

Assim, o analisado deverá ser apenas relatado sem juízo de valor, apenas uma análise nua e crua do fato, e no caso das redes sociais, conferindo assim a um simples documento captado de uma fonte não segura, que é o computador, a declaração de veracidade por quem se tem fé pública. É uma forma de prova pré-constituída, dando segurança de sua conservação ao interessado em fazer prova aquilo em ocasião futura, dando fidedignidade ao documento.

O autor começa a polêmica em torno desse meio de prova em função das críticas existentes a respeito da unilateralidade na produção probatória, dificultando a ampla defesa e o contraditório, trazendo, inicialmente, o seguinte acórdão:

Quanto à ata notarial, não pode prevalecer, vez que se trata de documento produzido de forma unilateral, não submetido ao crivo do judiciário, e sem a possibilidade de contraditório, ferindo, desse modo, o devido processo legal28.

27 OLIVEIRA, Conrado Di Mambro. A ata notarial, o processo do trabalho e o NCPC. Revista LTr: Legislação do Trabalho. São Paulo, v. 80, n. 02, fev. 2016. p. 167.

28 MINAS GERAIS. Tribunal Regional do Trabalho da 3ª Região. 6ª Turma. Processo n. 00554-2013-134-03-00-9 RO. Des Rel. Jorge Berg de Mendonça. Data: 04/02/2014. Disponível em: <https://www.trt3.jus.br/>. Acesso em 29 maio 2017.

Logo após, critica o entendimento acima firmado:

Ora, em que pese a ata notarial ter sempre um solicitante, isso jamais poderá significar que o documento foi produzido de forma unilateral por um dos litigantes, pois quem o confeccionou não é a parte interessada, mas o tabelião de notas, no cumprimento de seu ofício e sob as penas da lei. O instrumento não é particular, e sim de natureza pública.Portanto, quando se questiona a origem da ata notarial ou a sua neutralidade, a rigor, não se está questionando a parte processual que a juntou aos autos, mas colocando-se em xeque a isenção, a imparcialidade e o trabalho do próprio tabelião29.

O presente estudo se filia ao entendimento firmado pelo autor, pois a parte contrária, no seu momento oportuno, poderá se defender do apresentado pela parte que se valeu da ata notarial.

Em acórdão que tratava da ausência do reclamante na audiência de prosseguimento em que foi apresentado atestado médico declarando a sua impossibilidade de comparecimento, foi comprovado que o reclamante, na mesma ocasião, estava em um parque turístico na cidade de Resende/RJ. O empregador realizou os “prints” das telas as quais foram conferidas autenticidades através da ata notarial, e conforme ressaltado pelo TRT, citado e ratificado no acórdão do TST, abaixo transcrito:

[…] os reclamados peticionaram informando que, no período de dez dias de repouso indicado no atestado, ao contrário de estar em casa de repouso como deveria, o reclamante estava em parque turístico situado no município de Resende (RJ), em companhia de amigos, em bares e restaurantes, inclusive consumindo bebida alcoólica. Para corroborar suas afirmações jun-taram cópias do ‘facebook’ do reclamante feitas através de “ata notarial” (quando o tabelião acessa o endereço da página ou site e verifica seu conteúdo, atestando data, horário, endereço e sua veracidade). […]Insurge-se o recorrente contra a pena aplicada, arguindo sua incapacidade física e psicológica para comparecimento nessa Justiça Especializada, asseverando que se tratava de um ato judicial de grande pressão psicológica. Em suma, suas argumentações não o levam a êxito. Diz que os diálogos do ‘facebook’ não induzem a nenhuma prática condenável por parte do recorrente e que as fotos incluídas não são atuais. Todavia, esquece-se de que não são meras cópias, mas, sim, cópias autenticadas por tabelião, das quais se conclui que o autor não estava impossibilitado de comparecer à audiência designada30. (grifou-se)

Assim, os próprios julgadores, nesse caso, desembargadores e ministros, conforme citado e grifado acima, deram ainda mais importância para o postado nas redes sociais, em função da ata notarial, ou seja, realmente, o documento probatório demonstrado é fiel ao publicado na rede social. Sendo assim, inegável a força probatória da rede social, ainda mais demonstrada através da ata notarial que é o meio adequado para tal visualização.

2.3. A FORÇA PROBANTE DOS ATOS PRATICADOS NAS REDES SOCIAIS E SUA ADMISSÃO COMO PROVA NA JUSTIÇA DO TRABALHO

É visível que as redes sociais podem e devem servir como meio de prova na justiça do trabalho nas mais variadas causas em função da importância e transparência que possuem na moder-nidade. Fabiano Zavanella explica que atualmente vivemos em um constante reality show, pois, conforme for o número de postagens e tempo que a pessoa encontra-se online, realmente, temos

29 OLIVEIRA, Conrado Di Mambro. A ata notarial, o processo do trabalho e o NCPC. Revista LTr: Legislação do Trabalho. São Paulo, v. 80, n. 02, fev. 2016. p. 168.

30 Tribunal Superior do Trabalho. 4ª Turma. Processo n. 2079-25.2010.5.02.0032 AIRR. Min Rel. João Oreste Dalazen. 13/08/2014. Dis-ponível em: <http://www.tst.jus.br/>. Acesso em 06 jun. 2017.

Revista Atitude · Faculdade Dom Bosco de Porto Alegre · Ano XI - No 22 - janeiro a junho de 2017 147146 O IMPACTO DAS REDES SOCIAIS NAS RELAÇÕES DE TRABALHO E SUA FORÇA PROBANTE.

a sensação que se está o tempo todo sendo observado:

Nessa linha, as redes sociais atuam como uma pseudo aproximação ou forma moderna de relacionamento, mas as limitações são evidentes e aqui talvez resida um maior cuidado ou necessidade de regramento por parte das empresas e, sobretudo, bom senso das pessoas, que se expõe de forma demasiada criando estereótipos ou preconceitos que pela velocidade da informação, depõe contra a sua imagem e o por vezes até o caráter e poucos não são os casos, aliás, bastante rotineiro, em que departamentos de pessoas nas empresas sérias e organizadas triam o modo de vida, as preferências, convicções, postura do candidato, através das redes sociais, antes de definir por sua contratação. O mundo, inevitavelmente, é um imenso reallity show, mas o julgador e principalmente o processo do trabalho, ainda detém a árdua tarefa, mesmo se tratando de um ramo patrimonial, perseguir a verdade ou se aproximar ao máximo dela para harmonizar e dar a sociedade o sentimento de pacificação social que é premissa fundamental e função do Poder Judiciário31.

Já é conhecida a prática do fato alegado pelo autor, que as empresas antes mesmo da con-tratação do empregado já fazem uma varredura da vida do empregado, seja em função de pedir certidões negativas criminais, ou pela apresentação carta de recomendação, telefones dos últimos empregadores para referência, mas atualmente, outro dado tem sido alvo de consulta: as páginas das redes sociais, pois ali é possível perceber muitas informações da vida pessoal. Dessa forma, não apenas poderá servir como meio de prova, mas também como maneira de avaliar a vida da pessoa antes mesmo de uma possível contratação. A magnitude que alcança uma publicação em uma rede social exorbita diversas áreas de convivência.

Ronaldo Lemos aborda o fato que todo o conjunto deverá ser reinterpretado em razão da nova realidade que está surgindo com as novas formas de inter-relação:

[…] não cabe insistir no modelo de análise jurídica tradicional, de procurar no ordenamento jurídico posto as normas jurídicas aplicáveis a essa situação, sem qualquer precedente his-tórico. O que interessa é apreender todos os ângulos da questão, no sentido de que, ainda que as normas jurídicas aplicáveis sejam identificadas, sua eficácia resta gravemente com-prometida por uma impossibilidade institucional do aparato adjudicante de conseguir fazer valer a aplicação de tais normas. Nesse sentido, inevitavelmente, devem-se considerar as transformações institucionais necessárias para que tal eficácia seja alcançada, ou conside-rar se faz ainda algum sentido a manutenção dessas estruturas normativas tradicionais. Em outras palavras, a questão começa a tornar-se relevante quando se inicia a partir do ponto em que a chave é se a nova realidade deve adaptar-se ao velho direito ou se o velho direito deve adaptar-se à nova realidade32.

Trazendo à tona o ensinado pelo autor, não adianta tentar encaixar de forma plena as redes sociais no atual ordenamento jurídico, deverá ser feita uma releitura dos artigos de acordo com o atual estágio encontrado com as novas relações sociais, assim como que isso se transformará na vivência e andamento de um processo.

Abaixo, há os principais exemplos que poderão ocorrer em juízo versando a respeito das redes sociais. Como a vivência na internet é muito dinâmica, sempre existirão novos fatos além dos aqui apontados, pois seria impossível prever e tratar todas as problemáticas ocorridas nas relações de trabalho através das redes sociais.

31 ZAVANELLA, Fabiano. Amizades em redes sociais x testemunho em processo trabalhista. ADV - Advocacia dinâmica - informativo. Rio de Janeiro, n. 09, 03/03/2013. p. 144.

32 LEMOS, Ronaldo. Direito, tecnologia e cultura. Rio de Janeiro: FGV. 2005. p. 13.

2.3.1. CONTRADITA DE TESTEMUNHA POR AMIZADE INTIMA COMPROVADA POR AMIZADE NO FACEBOOK

No art. 447, § 3º Do CPC há a previsão que não poderão depor como testemunha o amigo íntimo da parte. Seguindo a mesma sorte, o art. 829 da CLT prevê o mesmo entendimento, podendo a pessoa ali ser ouvida como informante, não prestando compromisso legal em falar com a verda-de. Assim, por muitas vezes se pergunta se a amizade virtual no Facebook seria suficiente para demonstrar a suspeição da testemunha alegada na lei, visto que a lei não conceitua o que seria, de fato, uma amizade íntima. As redes sociais, de certa forma, alteraram até o conceito da palavra amizade. Grande perigo podem trazer visões radicais sobre o tema, pois se sabe que o direito positivado não acompanha as transformações da sociedade devendo ser empregada a correta interpretação das palavras ali empregadas, pois como exemplo que a CLT em seu art. 829 traz que: “A testemunha que for parente até o terceiro grau civil, amigo íntimo ou inimigo de qualquer das partes, não prestará compromisso, e seu depoimento valerá como simples informação.” Sendo que a visão de amigo intimo empregada em 1943 é bastante diferente das amizades mantidas atualmente nas redes sociais.

A respeito do fenômeno, Rodrigo Martini explica qual seria a intenção do legislador na época da realização da CLT, assim como no CPC:

A amizade íntima imaginada pelo legislador no século passado, certamente envolve uma relação de afinidade bem maior que a experimentada pela geração cibernética. As mídias sociais podem ser vistas como uma forma moderna de relacionamento, um novo padrão de sociabilidade, mas, em muitas vezes criam uma falsa ideia de aproximação. Seria temeroso admitir, que pelo simples fato de a testemunha ser incluída na rede social da parte, e até mesmo existir uma troca de mensagens ou fotografias em comum entre elas, a tornasse suspeita para depor em juízo, lhe retirando totalmente a isenção de ânimo, e possibilitando o acolhimento da contradita realizada pela parte contrária33.

Trazendo assim a compreensão de que ao se acolher tal tese de contradita, a parte somente poderia levar a juízo uma pessoa que não estivesse no seu rol de “amigos virtuais” cerceando completamente a produção de provas, pois seria uma inocência se imaginar que a testemunha não tenha nenhuma proximidade com a parte, sob o ponto de vista de desconhecer os fatos do qual se pretende provar.

A respeito do caso concreto, deverá ser analisado com cautela caso a caso, pois com certeza o amigo íntimo da parte deverá estar entre seu rol de amigos virtuais, mas a premissa contrária não é verdadeira, pois não há como se considerar amigos íntimos todos os seus amigos virtuais. Conforme se inclina boa parte do trabalho, apenas uma análise casuística poderá nos dar a solução para afinal, se a amizade virtual, poderá, ou não, comprometer o compromisso da testemunha.

Sergio Ferreira Pantaleão explica como que o fato, caso ocorra, deverá se pautar:

A impugnação da testemunha deve ser pautada de provas robustas.

Comprovação de fotos em que a testemunha e reclamante aparecem em festas, viagens, eventos e etc., ou mensagens em que ambos pactuam agendas em finais de semana ou que confessam a condição de amigos próximos, podem ser objetos de prova.O próprio reclamante pode deixar provas em redes sociais que eventualmente seja contra-

33 MARTINI, Rodrigo. Amizade nas redes sociais e a justiça do trabalho. Jornal Trabalhista Consulex. Brasília, v. 30, n. 1475, 29/04/2013. p. 09,

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ditório ao que esteja alegando em reclamatória, prova esta que pode ser considerada como confissão em favor da empresa.[…]Assim como todo tema contraditório no direito do trabalho e diante da falta de normatização a respeito, cabe aos magistrados analisar caso a caso, a fim de julgar a lide de acordo com sua convicção, observados os entendimentos das cortes superiores, bem como o disposto no art. 4º da Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro – LINDB (antiga LICC): “Art. 4º Quando a lei for omissa, o juiz decidirá o caso de acordo com a analogia, os costumes e os princípios gerais de direito”34.

Conforme se inclina boa parte do trabalho, apenas uma análise casuística poderá nos dar a solu-ção para afinal, se a amizade virtual, poderá, ou não, comprometer o compromisso da testemunha.

Abaixo, segue trecho de uma sentença na qual ouve a oitiva como informante, justamente pelo manifesto carinho com a autora nas redes sociais:

A Senhora Geilza, convidada pela reclamante como testemunha, somente foi ouvida como informante, tendo em vista que negou qualquer forma de amizade com a reclamante, tendo sido comprovado pela 1ª reclamada, através de fotos públicas de rede social (fl. 186), que re-clamante e Geilza mantêm amizade íntima, pois das fotos adunadas aos autos, em que somente estão reclamante e Geilza, constam as legendas “minha amiga irmã”, “é amor demais!” nos dizeres da reclamante. Assim, neste tópico e nos demais não será levada em consideração quaisquer das informações benéficas à reclamante prestadas pela Senhora Geilza, tendo em vista a cristalina parcialidade35.

No presente caso, foi comprovada a amizade íntima das partes através de provas produzidas por elas próprias.

Já nesse outro acórdão, o presenciado foi outro, conforme a ementa:

SUSPEIÇÃO DE TESTEMUNHA. RELACIONAMENTO EM REDE SOCIAL. AMIZADE ÍNTIMA NÃO CARACTERIZADA. VALIDADE DA PROVA. No atual estágio de desenvolvimento das tecnolo-gias num mundo globalizado e cada vez mais conectado, tornou-se corriqueiro as pessoas manterem contato por meio de redes sociais. Todavia, essa forma de contato virtual, com postagens banais, troca de fotos e mensagens superficiais, nem de longe tem a densidade daquilo que o senso comum conceitua como amizade, muito menos íntima. Em suma, não induz suspeição, mero relacionamento virtual estabelecido entre reclamante e testemunha, como usuários do sistema de comunicações. A intimidade a ponto de obstar o compromisso e a oitiva da testemunha deve ser robustamente comprovada, decorrente de laços estreitos plasmados na convivência, capazes de comprometer a isenção de quem vai depor, o que não ocorreu no caso em tela. Assim, apesar de supostamente serem “amigas” através do facebook (fato sequer comprovado nos autos), ainda existisse, essa relação virtual não enseja que se dê guarida à pretensão recursal de invalidar o depoimento da testemunha, nos termos dos artigos 829, da CLT, 405, §3º, do antigo CPC, e 447, §3º, do NCPC36.

No último caso, não foi comprovada a amizade séria e efetiva entre a testemunha e a parte, e em que pese a reclamada ter recorrido para a tentativa da reversão do entendimento do primeiro grau, os desembargadores mantiveram o compromisso da testemunha.

Chega-se a conclusão de que necessita o juiz perseguir a verdade dos fatos, não podendo sim-

34 PANTALEÃO, Sérgio Ferreira. Rede social – Empresas podem usar as redes sociais para impedir favorecimentos em depoimentos. Disponível em: <http://www.granadeiro.adv.br/clipping/2017/05/24/rede-social-empresas-podem-usar-as-redes-sociais-impedir-favo-recimentos-depoimentos>. Acesso em: 24 maio 2017.

35 MINAS GERAIS. Tribunal Regional do Trabalho da 3ª Região. 11 VT. Processo n. 0002015-46.2013.503.0011. Juíza: Lilian Piovesan Ponssoni. 25/05/2015. Disponível em: <http://www.trt3.jus.br/>. Acesso em 24 maio 2017.

36 SÃO PAULO. Tribunal Regional da 2ª Região. 4ª. Turma. Processo n. 0000027-84.2014.5.02.0042 RO. Des. Rel. Ricardo Artur Costa e Trigueiros. Disponível em: <http://www.trtsp.jus.br/>. 31/05/2016. Acesso em 24 maio 2017.

plesmente acatar a contradita de testemunha por simplesmente serem amigos ou terem trocado mensagens em redes sociais sob pena de comprometer a verdade dos fatos.

2.3.2. DESÍDIA POR USO DAS REDES SOCIAIS

A desídia é umas das formas encontradas como falta grave, ensejadoras da extinção do contrato de trabalho por justa causa do empregador. Está no art. 482, alínea “e” da CLT. De acordo com o conceituado por Maurício Godinho Delgado:

Trata-se de tipo jurídico que remete à ideia de trabalhador negligente, relapso, culposamente improdutivo. A desídia é a atenção reiterada, o desinteresse contínuo, o desleixo contumaz com as obrigações contratuais. Para autorizar a resolução culposa do contrato, exige, assim, regra geral, a evidenciação de um comportamento repetido e habitual do trabalhador, uma vez que as manifestações da negligência tendem a não ser tão graves, caso isoladamente consideradas37.

Assim, o empregado, em contato contínuo com as redes sociais, poderá se transformar em um desidioso, visto que falta atenção no desempenho de suas funções, torando-se desleixado, pois está o tempo todo “de olho” em suas redes socais, nos serviços de mensagens oferecidos por elas, postando em sua linha do tempo, ou apenas averiguando a vida alheia.

Ana Emília Garcia e Valdir Garcia dos Santos Júnior abordam qual que seria a matemática do tempo utilizado pelo empregado durante a sua jornada de trabalho com matérias que em princípio, não guardam relação com as suas obrigações contratuais:

Se tomado com exemplo que uma postagem despende cerca de três minutos e um empregado tem cerca de 10 postagens por dia, além da navegação regular na rede, acrescida da observação de outras postagens, tem-se que o tempo gasto com as redes sociais pode chegar a 20% da jornada de trabalho, sem contar a natural desatenção provocada no restante do tempo, já que o Facebook envia um alerta das novas postagens dos amigos no exato momento em que elas são feitas, o que deixa o internauta sempre alerta acerca dos novos conteúdos38.

Abaixo, encontra-se ementa de um vigilante que sofreu a extinção do contrato de trabalho por justa causa por acesso a sites no horário de serviço, entre eles o extinto Orkut, antiga rede social que acabou sendo substituída pelo Facebook:

A conduta do reclamante verificada efetivamente possui gravidade suficiente para a aplicação da pena de demissão por justa causa em ato único. Isso porque utilizou-se do computador da empresa para acessar sítios de conteúdo indevido, incorrendo não só em mau procedimento, como também em desídia, tendo em vista que não exerceu sua função de vigilância durante toda a noite.[…] Aliás, quanto à proibição de uso da internet, a norma da empregadora apresenta-se per-feitamente razoável, por se tratar de empresa que presta serviços de vigilância, cujo trabalho, em razão de sua natureza, exige atenção constante.39

Por evidente, se o empregado é contratado para prestar seus serviços, ele deverá presta-los com a máxima atenção, sem desviar para diversos interesses contidos na internet. O empregador, de acordo com o poder disciplinar já explicado, pode e deve aplicar as sanções devidas para coibir

37 DELGADO, Maurício Godinho. Curso de direito do trabalho. 15.ed. São Paulo: LTr, p. 1332.

38 GARCIA, Ana Emilia Bressan; SANTOS JÚNIOR, Valdir Garcia dos. A utilização das redes sociais na jornada de trabalho e a caracteri-zação do ato de desídia nos contratos de trabalho. Revista do instituto de direito brasileiro. Ano 2. 2013, nº 6, p. 5717.

39 RIO GRANDE DO SUL. Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região. Processo n. 01380-2008-403-04-00-5 RO. Des. Relª Ana Rosa Pereira Zago Sagrilo. Data 25/06/2009. Disponível em: <http://www.trt4.jus.br/portal/portal>. Acesso em 29 maio 2017.

Revista Atitude · Faculdade Dom Bosco de Porto Alegre · Ano XI - No 22 - janeiro a junho de 2017 151150 O IMPACTO DAS REDES SOCIAIS NAS RELAÇÕES DE TRABALHO E SUA FORÇA PROBANTE.

tal prática, sendo realizada a dosimetria punitiva de acordo com o caso concreto.

2.3.3. DEMISSÃO POR JUSTA CAUSA EMBASADA POR ATO LESIVO EM PUBLICAÇÃO EM FACEBOOK

Caso atual envolvendo o tema diz respeito de um empregado chamado Jonathan despedido por justa causa pelo seu empregador, o Comércio de Veículos e motocicletas Jundiaí. A alegação da falta grave ocorreu em razão do reclamante ter “curtido” comentários ofensivos à empresa realizados por outro funcionário chamado Felipe, conforme trecho retirado do acórdão:

“A justa causa decorre do fato de que na rede social Facebook você compactuou com as pu-blicações gravemente ofensivas à honra, integridade e moral da empresa BM Motos, de seus funcionários e da sócia, Dra. Daniela Magalhães, as quais foram inseridas pelo ex-funcionário Felipe Constantino.” O teor da conversa pela rede social Facebook foi juntado às fl. 36/37 e comprova várias ofensas a honra da Sra. Daniela Magalhães, sócia proprietária da ré (fl. 46/62), bem como houve ofensa a empresa e aos funcionários. A participação do recorrente no diálogo foi confirmada em seu depoimento pessoal: “que reconhece os diálogos retratados nos documentos juntados pela reclamada, como sendo os que o depoente manteve com o interlocutor constante dos referidos documentos”. […]O fato é grave, posto que se sabe o alcance das redes sociais, isso sem contar que o recorrente confirma que outros funcionários da empresa também “eram seus amigos” no Facebook. A liberdade de expressão não permite ao empregado travar conversas públicas em rede social ofendendo a sócia proprietária da empresa, o que prejudicou de forma definitiva a continuidade de seu pacto laboral, mormente quando se constata que seu contrato de trabalho perdurado por pouco mais de 4 meses. Por fim, a atitude do reclamante foi à causa da rescisão, não houve perdão tácito e dupla punição40.

Ao analisar o caso, a juíza Patrícia Martins asseverou que a participação do recorrente no diálogo foi confirmada em seu depoimento pessoal. “Efetivamente as ofensas foram escritas pelo ex-funcionário, no entanto, todas foram ‘curtidas’ pelo recorrente, com respostas cheias de onomatopeias que indicam gritos e risos.” A Juíza convocada manteve a sentença, enquadrando o funcionário na alínea “k” do art. 482 da CLT que versa a respeito do cometimento do ato lesivo da honra ou da boa fama ou ofensas físicas praticadas contra o empregador e superiores hierárqui-cos, levando assim ao entendimento de que “curtir” uma publicação seria um ato de cumplicidade com a publicação realizada, reforçando assim sua intenção, devendo desta forma também ser responsabilizado pelo ato.

Clocemar Lemes e Poliana Jacques ainda dissertam a respeito, dosando a liberdade do em-pregado e a fiscalização do empregador:

Importante referir, que não são simples comentários do empregado que podem ensejar puni-ções, deve realmente haver ofensa ao empregador, algo que realmente denigra sua imagem, que efetivamente afete seu poder diretivo até mesmo com relação aos outros empregados.Fica claro, portanto, com base no exposto, que na relação de trabalho o empregador tem limites à sua liberdade de expressão e que esses limites decorrem do seu poder diretivo, por outro lado, permanece o direito do empregado de expressar suas opiniões, surgindo assim uma divergência de interesses e direitos, e a busca pelo equilíbrio é que garantirá harmonia na relação.41

40 CAMPINAS. Tribunal Regional do Trabalho da 15ª Região. 5ª Turma. Processo n. 0000656-55.2013.5.15.0002 RO. Juíza Rel. Patrícia Glugovskis Penna Martins. 13/02/2014. Disponível em <http://portal.trt15.jus.br/>. Acesso em 24 maio 2017.

41 SILVA, Clocemar LEMES da; JACQUES, Poliana. A possibilidade de demissão por justa causa por ofensa ao empregador nas redes sociais. Revista Fórum Justiça do Trabalho. Porto Alegre, v. 33, n. 391, p. 40-61, jul. 2016. p. 47.

O dano ocasionado em razão da publicação do empregado deverá ser forte e robusto o sufi-ciente para abalar tanto a relação, como, inclusive, afetar demais funcionários da empresa. Não será qualquer comentário que poderá ocasionar uma advertência, suspensão ou até justa causa.

Abaixo, nesse outro julgado, houve a divulgação de fotos, violando segredo da empresa, con-forme trecho da ementa abaixo:

RESCISÃO DO CONTRATO DE TRABALHO. DISPENSA POR JUSTA CAUSA. ARTIGO 482, ALÍNEA “G”, DA CLT. DEMONSTRAÇÃO INEQUÍVOCA DE FALTA GRAVE. VIOLAÇÃO DE SEGREDO DA EMPRESA CARACTERIZADA. […] é patente que o autor publicou no seu facebook informações de cunho sigiloso, o que implica quebra de fidúcia e, portanto, atrai a incidência do disposto no artigo 482, g, da CLT”. III - Nesse passo, asseverou que “é indene de dúvidas de que o re-clamante tinha ciência de que era proibido tirar e publicar fotos do estaleiro, ainda que tenha impugnado o termo de confidencialidade, pois, todas as testemunhas ouvidas no processo confirmaram a ciência da aludida obrigação”. […]42

Conforme afirmado pelo magistrado, para a publicação nas redes sociais, existe um ato consciente e voluntário, e assim, retira qualquer espécie de culpa, sendo uma conduta dolosa a praticada pelo empregado. Sendo assim, por fato incontroverso das redes sociais tratarem-se de meio legal e moralmente legítimo, sendo aplicada a hermenêutica necessária, tem-se válida a aceitação deste meio de prova, aonde já remansa pacífico o entendimento de que em todos os ramos do direito as redes sociais servem sim para formar o convencimento do juiz, em especial na justiça do trabalho.

2.3.4. DEMISSÃO POR CONDUTA PESSOAL DO EMPREGADO DESVINCULADA DO EMPREGO POSTADA EM REDE SOCIAL

Em 2009, quando as redes sociais ainda não possuíam tanta força quanto atualmente, uma professora do ensino fundamental sofreu a demissão do seu trabalho por dançar de forma sen-sual43 em um vídeo publicado no Youtube, que até hoje poderá ser facilmente acessado.

Outro caso com enorme repercussão ocorreu quando uma professora da PUC/RJ publicou e comentou em seu Facebook44 que o aeroporto parecia “aeroporto ou rodoviária?” ironizando uma pessoa que ali se encontrava, e acabou sendo afastada do cargo de direção após a publicação.

Infelizmente, não há doutrina especializada em relação ao âmbito processual dos casos acima, e muito menos foram encontradas notícias atualizadas do desfecho de cada caso. Não é a toa que as referências às matérias são todas realizas por notícias da imprensa. Em que pese não existirem doutrinadores acerca do assunto, a sua menção demonstram a importância daquilo que publicamos nas redes sociais, e conforme já citado, alcançando as mais diversas formas de convívio, até mesmo o ambiente laboral.

Na verdade, nem se sabe se tais casos viraram ações trabalhistas, até caso virasse, acredita-se

42 BRASIL. Tribunal Superior do Trabalho. 5ª Turma. Processo n. 544-92.2015.5.17.0121 AIRR. Min. Rel Antônio José de Barros Levenha-gen. 26/11/2016. Disponível em: <http://www.tst.jus.br/>. Acesso em 05 jun. 2016.

43 ARAÚJO, Glauco. GLOBO. Professora que aparece em vídeo sensual na web quer voltar a dar aula. Disponível em: <http://g1.globo.com/Noticias/Brasil/0,,MUL1291222-5598,00-PROFESSORA+QUE+APARECE+EM+VIDEO+SENSUAL+NA+WEB+QUER+VOLTAR+A+DAR+AULA.html.>. 03 set. 2009. Acesso em 06 jun. 2017.

44 ESTADÃO. Professora é afastada da PUC-Rio por ironizar passageiro. Disponível em: <http://www.estadao.com.br/noticias/geral,pro-fessora-e-afastada-da-puc-rio-por-ironizar-passageiro,1131398>. 17 fev. 2014. Acesso em 06 jun. 2017.

Revista Atitude · Faculdade Dom Bosco de Porto Alegre · Ano XI - No 22 - janeiro a junho de 2017 153152 O IMPACTO DAS REDES SOCIAIS NAS RELAÇÕES DE TRABALHO E SUA FORÇA PROBANTE.

que com o jornalismo que cativa esse tipo de notícia, o julgamento seria alvo de holofotes, servindo de matérias sensacionalistas, e provavelmente o juiz tornaria o caso em segredo de justiça para não causar ainda mais tumultos do que os já existentes. Atualmente, no Brasil principalmente, as notícias surgem como uma bomba, depois caem no esquecimento, não permitindo um acom-panhamento dos fatos.

E por último, tem-se o caso da empregada que postou fotos em seu Facebook na 16ª Meia Maratona do Rio de Janeiro, porém, nesse mesmo período, ela estava afastada da empresa em função de atestado médico de 15 dias. O ocorrido ocasionou a extinção do contrato de trabalho da empregada, conforme ementa:

JUSTA CAUSA - ATESTADO MÉDICO FALSO Enfim, uma coisa é certa. A autora se encontrava no evento esportivo, conforme fotos apresentadas, certamente postadas pela própria autora na internet. Tais imagens convencem que a autora estava bem disposta, e não doente com necessidade de 15 dias de afastamento. Entendo que, de fato, em função dos atestados médicos falsos houve quebra de confiança que justifica a justa causa45.

De acordo com o desembargador, houve quebra da fidúcia contratual em razão da mentira realizada pela empregadora e a apresentação dos atestados médicos falsos, que não obstante tentava reverter a justa causa em juízo.

2.3.5. INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS POR PUBLICAÇÃO REALIZADA PELO EMPREGADOR

E por fim, não apenas condutas praticadas pelo empregado, mas também pelo empregador são objetos de prova na justiça do trabalho, conforme acórdão abaixo:

Ademais, quanto à reconhecida violação aos direitos da personalidade da reclamante, o print da postagem feita pelo preposto da 1ª reclamada no Facebook (Id 7206978), corroborado pelo depoimento da testemunha, demonstra que o superior hierárquico da autora, ao “fazer piadi-nhas” com os operadores empregados e, especificamente quanto à autora, tê-la chamado de “porca e balofa”, evidentemente extrapolou os limites do exercício do poder diretivo, expondo a autora a situação vexatória e humilhante perante seus colegas de trabalho, comprovando abuso que excede a esfera da tolerância e deve ser reprimido pelo Poder Judiciário, ante o seu conteúdo discriminatório e preconceituoso, sendo evidente a lesão à honra, subjetiva e objetiva, e à imagem da reclamante, do que exsurge o dever de indenizar (arts. 186, 187 e 927 do CCB)46.

No presente caso, o chefe da empregada, no caso a reclamante da ação, foi ofendida no Fa-cebook, e em razão disso, foi deferido pagamento da indenização por danos morais em função da violação da honra, subjetiva e objetiva, e à imagem da reclamante, conforme preceitua além dos artigos já citados pelo magistrado, o art. 5º, X da Constituição Federal.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A internet se transformou em um meio imediato e inédito de troca de informações rápidas a qual jamais foi alcançada por outro meio de comunicação, tendo o mundo como um todo sofrido

45 Tribunal Regional do Trabalho da 1ª região. 9ª Turma. Processo n. 0001703-74.2012.5.01.0039 RO. Rel. Des. Ivan da Costa Alemão Ferreira. 23/09/2014. Disponível em: <http://www.trt1.jus.br/>. Acesso em 05 jun. 2017.

46 Tribunal Regional do Trabalho da 3ª Região. 6ª Turma. Processo n. 0011666-19.2016.5.03.0037 RO. Rel. Des. Rogério Valle Ferreira. 23/05/2017. Disponível em: <https://www.trt3.jus.br/>. Acesso em 05 jun. 2017.

uma mutação após o seu desenvolvimento, sendo um avanço irreversível para a sociedade. O nú-mero de exemplos relacionados ao tema jamais poderiam ser traduzidos em apenas um pequeno artigo, visto que a dinâmica que ocorre nas relações de trabalho exorbita o nível de conhecimento doutrinário e jurisprudencial hoje existente, pois o surgimento de novas formas de comunicação entre aplicativos e sites na internet é uma tendência verticalmente crescente, que apenas irão se multiplicar e proliferar através do tempo.

Assim como é indubitável a presença e a permanência da internet em todas as vidas contem-porâneas, também é ressaltado o fato que apenas no caso concreto, de acordo com um exame casuístico, que será avaliado que ponto a conduta praticada ofendeu ou prejudicou o empregador, de acordo com aspectos probatórios colhidos nas redes sociais. Não existindo assim uma fórmula mágica, mas sim, análise pormenorizada a respeito do ocorrido para se sopesar as consequências do ato praticado.

Desta forma, no presente estudo, tentou-se de maneira concisa abordar como que, atualmente, ocorre a produção probatória atual de acordo com o permear das redes sociais nas dinâmicas laborais. Os magistrados encaram a situação de acordo com o caso concreto, pois apenas com a situação fática concretizada é que poderá ser realizado um estudo a respeito da admissibilidade ou não de tal meio de prova, e assim, inevitavelmente, o aparecimento uma enorme insegurança jurídica diante do fato de não se saber o que é ou não permitido no mundo virtual.

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A UTILIZAÇÃO DO MATERIAL DIDÁTICO DIGITAL EM UMA ESCOLA PARTICULAR: DADOS E

OBSERVAÇÕES INICIAIS.1

Gilson de Oliveira Cardoso2

Blanca Martín Salvago3

RESUMO:

Esta pesquisa tem por objetivo identificar os benefícios e desafios decor-rentes da utilização do material didático digital em sala de aula para apri-morar o processo educativo de uma escola particular da cidade de Rio do Sul, em Santa Catarina, além de observar se já existe ou não melhora no desempenho dos alunos após a sua utilização, a partir da análise das notas quantitativas. Para tal finalidade, foi realizado um breve resgate his-tórico, a fim de se descobrir como foi desenvolvido o processo de implan-tação do material didático digital e também a coleta das notas dos alunos a partir do sistema de registro utilizado pela escola.

PALAVRAS-CHAVE: 1 Material Didático Digital. 2 Didática. 3 Avaliação

ABSTRACT:

This research aims to identify the benefits and challenges arising from the use of digital teaching material in the classroom to improve the educatio-nal process of a private school in the city of Rio do Sul, in Santa Catarina, in addition to observing wether or not there is improvement in the students’ performance after its use, from the analysis of the quantitative notes. For such purpose, a brief historical rescue was carried out in order to discover how the digital teaching material implantation process was developed and also the collection of students’ grades from the registration system used by the school.

KEYWORDS: 1 Digital Teaching Material. 2 Teaching. 3 Evaluation

1 Trabalho de Conclusão do Curso de Pós-graduação Lato Sensu em Gestão Escolar da Universidade Católica Dom Bosco. Campo Grande, 2015.

2 Licenciado em Filosofia pela Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul, PUC-RS; pós-graduado em Gestão Estratégica de Pessoas pela Pontifícia Universidade Católica do Paraná, PUC-PR e em Gestão Escolar pela Universidade Católica Dom Bosco, UCDB. Atualmente exerce a função de Cordenador Pastoral do Colégio e da Faculade Dom Bosco de Porto Alegre. E-mail: [email protected]

3 Professora orientadora do Trabalho de Conclusão de Curso. Bacharel em Teologia pela Faculdade de Teologia de Granada (Espanha). Licenciada em letras pela Universidade católica Dom Bosco (Campo Grande – MS). Mestre em Ciências Bíblicas pelo Pontifício Instituto Bíblico de Roma (Itália). Coordenadora Pedagógica da UCDB Virtual. Membro do GETED – Grupo de Estudos e Pesquisa de Tecnologia Educacional e Educação a Distância. E-mail: [email protected]

Revista Atitude · Faculdade Dom Bosco de Porto Alegre · Ano X - No 20 - agosto a dezembro de 2016 159158 A DEFINIÇÃO DO CONTRATO E SEUS ALCANCES NOS CÓDIGOS CIVIS ARGENTINO E BRASILEIRO

INTRODUÇÃO

O tema Material Didático Digital é relevante na discussão atual sobre Tecnologias Digitais de Informação e Comunicação – TDIC4. Isto porque em todas as épocas históricas é sempre um grande empenho adaptar a educação às novas tecnologias que vão surgindo. E na época atual não é diferente. O processo de inclusão digital, a partir da inserção de computadores e internet nas escolas, facilitou e aperfeiçoou o uso da tecnologia, melhorando também o acesso às informações e aos processos de comunicação. No entanto, o empenho está em disponi-bilizar para alunos e professores um material de apoio que atenda às diversas expectativas: pedagógica, de acessibilidade, funcionalidade, atualidade, praticidade, etc.

Neste início de terceiro milênio é comum a presença das TDIC`s, que possibilitam inovação e interação em diversos ambientes da sociedade, incluindo o da educação. Essas tecnologias trazem consigo muitas facilidades, mas também introduzem novas exigências e competências no paradigma educacional, impondo adaptações.

Atento a esta problemática, desde o ano de 2013 a escola observada nesta pesquisa conta com o apoio de uma editora que atua na implantação gradativa do material didático digital – MDD – para os alunos. Atualmente, a proposta da editora contempla uma plataforma de apoio para alunos, professores e profissionais de gestão. Sendo assim, os dados e observações que serão apresentados são relevantes não só para uma escola específica, mas também para outras instituições educacionais que utilizam ou pretendem utilizar materiais didático digitais em sua proposta educativa.

Como educadores, somos geralmente preparados para avaliar somente a aprendizagem dos alunos, lançamos, aqui, outro desafio: avaliar a escola como um todo, buscando identi-ficar como está o seu funcionamento, isto é, como estão sendo desenvolvidas as atividades que levam os alunos a aprenderem e a se tornar cidadãos. Como está o desempenho dos professores? A participação dos pais? A gestão da escola? Quais fatores e situações que precisam ser mudados, pois estão insuficientes? Quais os que estão bem e, por isso, pre-cisam ser difundidos e servir de exemplo? (FERNANDES, 2002, p. 115).

Esta observação de Fernandes serve de base para indicar a real intenção do presente artigo: aprimorar o processo educativo. Para tanto, é necessário reforçar aos professores e aos gestores educacionais que a centralidade do seu trabalho está no aluno e que a função da escola é garantir uma formação que o considere em sua totalidade, proporcionando-lhe uma melhora na qualidade de vida. Para que isto aconteça não basta apenas aperfeiçoar processos internos e práticas pedagógicas; é necessário que haja orientação a fim de que estes processos e práticas ultrapassem a aprendizagem baseada na assimilação de conhecimentos e que os alunos apliquem o conhecimento em sua vida concreta.

Cabe ressaltar que esta pesquisa não possui a pretensão de ser um fim em si mesmo. Ao contrário, com base nos resultados apresentados pretende-se criar condições para a realização de estudos mais aprofundados sobre o tema em questão.

4 Todas as palavras que permitam a utilização de siglas passarão a ser escritas através destas, após uma primeira utilização por extenso.

1. O MATERIAL DIDÁTICO DIGITAL NA SALA DE AULA

Se a preocupação primeira deste artigo fosse descrever o atual cenário histórico social, talvez uma das palavras que mais se adequasse seria mudança. É forte a percepção de que acontecimentos, fatos e tecnologias utilizadas pelas pessoas mudam muito rapidamente.

Vive-se um período de transformações sem precedentes na história da humanidade. Este tem recebido muitas denominações – Era do conhecimento, sociedade do conhecimento, sociedade em rede, sociedade da comunicação, para citar apenas alguns. O elemento comum entre esses diferentes modos de nomear o cenário atual refere-se ao papel cen-tral do conhecimento na organização social e econômica atual, o que tende a redefinir a centralidade da instituição escolar. Sempre que a sociedade defronta-se com mudanças significativas em suas bases sociais e tecnológicas, novas atribuições passam a ser exigidas à escola (VIEIRA e PENIN, 2002, p. 13).

Neste sentido é que se vê uma preocupação no campo educacional em relação aos materiais pedagógicos e didáticos, que devem ser adequados a um cenário cada vez mais tecnológico. Aparece neste contexto a utilização do material didático digital.

Para se entender adequadamente o que é um material didático digital, é oportuno ter pre-sente o conceito de Tecnologias Digitais de Informação e Comunicação – TDIC. Belloni (2001), quando utilizava ainda o termo “Tecnologia da Informação e Comunicação – TIC”, dizia que “são o resultado da fusão de três grandes vertentes técnicas: a informática, as telecomuni-cações e as mídias eletrônicas. As possibilidades são infinitas e inexploradas, e vão desde as ‘casas ou automóveis inteligentes’ até os androides reais e virtuais para finalidades diversas” (BELLONI, 2001, p. 21).

A importância da utilização dessas tecnologias justifica-se quando “as sociedades contempo-râneas já estão a exigir um novo tipo de indivíduo e de trabalhador em todos os setores sociais e econômicos: um indivíduo dotado de competências técnicas múltiplas, habilidade no trabalho em equipe, capacidade de aprender e de adaptar-se a situações novas.” (BELLONI, 2001, p. 22).

Para orientar esse novo indivíduo, presume-se também um novo perfil de professor, capaz de corresponder às expectativas da nova sociedade tecnológica e seus atores.

Do livro e do quadro de giz à sala de aula informatizada e online a escola vem dando saltos qualitativos, sofrendo transformações que levam de roldão um professorado mais ou menos perplexo, que se sente muitas vezes despreparado e inseguro frente ao enorme desafio que representa a incorporação das TIC ao cotidiano escolar. Talvez sejamos ainda os mesmos educadores, mas certamente nossos alunos já não são os mesmos. (BELLONI, 2001, p. 27).

Kenski (2003, p. 56) comenta que:

na sociedade da informação, o uso das TIC’s reflete em todas as áreas do conhecimento humano, trazendo significativas mudanças na forma de agir e de fazer educação: o com-partilhamento de informações e as múltiplas possibilidades de comunicação e interação imediatas garantem que escolas, universidades, instituições educacionais e culturais, empresas e organizações de todo o mundo possam produzir e utilizar cooperativamente conhecimentos, produtos, serviços e conteúdos nas mais diferenciadas áreas científicas.

Segundo Carneiro (2002, p. 32):

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o paradigma educacional emergente requer a inserção de novas práticas curriculares e metodologias inovadoras, para fazer frente às necessidades de uma sociedade globalizada, que altera padrões de vida das pessoas, seja na maneira de se comunicar, nas habilidades profissionais de atuação ou na forma de aquisição do conhecimento e do pensar.

A utilização do computador e de outras tecnologias como recurso de aprendizagem permite a criação de materiais didáticos que reúnem várias mídias5 e a ampliação do conhecimento de forma interativa. Os materiais digitais, que se utilizam dessas tecnologias, possibilitam que através dos recursos digitalizados, diversas fontes de informações e de conhecimentos sejam criadas e socializadas.

Para Lévy (1999), digitalizar uma informação (um texto, uma imagem ou o som) significa traduzi-la em números. Por exemplo, se fizermos com que um número corresponda a cada letra do alfabeto, qualquer texto pode ser transformado em uma série de números e uma imagem pode ser transformada em pontos (ou pixels), que são descritos por dois números que especificam as coordenadas sobre o plano e outros três números que analisam a intensidade de cada um dos componentes de sua cor.

A informação digitalizada pode ser processada automaticamente, com grau de precisão quase absoluto, muito rapidamente e em grande escala quantitativa. Nenhum outro pro-cesso a não ser o processamento digital reúne, ao mesmo tempo, essas quatro qualidades. (LÉVY, 1999, p. 54).

Isto explica porque há uma quantidade crescente de informações sendo digitalizadas e, cada vez mais, sendo produzidas diretamente desta forma. Acompanhar todas as novidades e se adequar àquilo que melhor corresponda às necessidades educativas tratam-se de um verdadeiro desafio. E como será que a escola irá responder a este desafio? Segundo Belloni (2001, p. 95):

integrando as tecnologias de informação e comunicação ao cotidiano da escola, na sala de aula, de modo criativo, crítico, competente. Isto exige investimentos significativos e transformações profundas e radicais em: formação de professores; pesquisa voltada para metodologias de ensino; nos modos de seleção, aquisição e acessibilidade de equipamentos, materiais didáticos e pedagógicos, além de muita, muita criatividade.

Uma das preocupações que surgem com a utilização do material didático digital tem a ver com o esgotamento dos sentidos e a perda da sensibilidade, fruto do bombardeio de imagens e sons que este meio apresenta. O excesso de informações e estímulos pode dificultar a reflexão. Para que o aluno utilize este material de forma ativa e crítica em meio à rapidez e mistura de informações (verbais, visuais e sonoras), é necessário desenvolver a habilidade de análise e síntese de modo simultâneo.

1.1. OBSERVAÇÕES SOBRE O MATERIAL DIDÁTICO DIGITAL, APONTADAS PELOS PROFESSORES.

5 A palavra mídia deriva da palavra meio, do latim médius, significando aquilo que está no meio ou entre dois pontos. A partir dessa definição e trazendo para o contexto educativo, pode-se dizer que uma mídia educacional é um meio através do qual se transmite ou se constrói conhecimentos. Dentre as mídias utilizadas no processo ensino-aprendizagem temos o material impresso, a televisão e o rádio. Além disso, tem-se a informática como uma das principais mídias utilizadas na atualidade, tendo a particularidade de ser uma mídia multimídia, uma vez que agrega recursos de diversos tipos.

No início do ano de 2014 a escola iniciou o processo de implantação do material didático digital com as turmas do 6º ano da Educação Fundamental e do 1º ano do Ensino Médio. Tal processo de implantação vem ocorrendo de modo gradativo, em duas novas turmas a cada ano. No mês de setembro de 2014 os professores que utilizaram o novo material em suas aulas fizeram alguns apontamentos práticos sobre a sua utilização. Esses apontamentos fo-ram encaminhados ao serviço de suporte da editora responsável e no fim de 2014 um técnico entrou em contato com a escola a fim de compreender as situações e propor alternativas que as solucionassem. Esta ação trabalho resultou um relatório, no qual constam questões que necessitavam de melhorias6:

• Alguns links e vídeos não abrem; esse é um motivo de grande descontentamento e desqualificação do material por parte dos alunos, pois cada vez que um link ou vídeo não abre é feito contato com a editora, sendo necessário que a unidade seja deletada e baixada novamente. Com isso o aluno precisa sair da sala e perder aula.

• As senhas dos alunos precisam estar sendo trocadas constantemente.

• Dois alunos marcam as mesmas respostas em seus respectivos cadernos interativos; um obtém a mensagem “parabéns” enquanto o outro recebe a mensagem “reveja o conteúdo”.

• Ao digitar a senha para acesso do caderno interativo, geralmente é necessário refazer a ação para que o sistema a reconheça.

• Modificação no tempo do exercício determinado pelo professor.

• Erros de grafia.

• O conteúdo do material digital é o mesmo do material impresso, o que desmotivou os alunos para o uso do MDD. Os alunos utilizam mais o impresso pela facilidade no transporte e manuseio.

• Muitas atividades do caderno interativo são mecânicas e não levam o aluno à reflexão.

Todas estas observações fizeram com que a equipe da editora trabalhasse no aprimora-mento do material elaborado. Nota-se que tais questões, de ordem prática, são relativamente fáceis de solucionar. No entanto, o real desafio encontrado na escola diz respeito à capacitação dos professores para encontrarem a forma mais adequada e significativa para seus alunos ao utilizarem o material didático digital. Por exemplo, o fato de os alunos preferirem utilizar o material impresso ao digital demonstra a necessidade de desenvolver nos professores a capa-cidade de estimular e orientar os alunos para a utilização correta do material didático digital.

Belloni (2001) lembra-se dos “modos de aprendizagem mediatizada”, que apontam a utili-zação cada vez maior das tecnologias de produção, estocagem e transmissão de informações e o redimensionamento do papel do professor. “O professor tende a ser amplamente mediati-

6 Por questão didática, os apontamentos enviados pelos professores no relatório foram reorganizados antes de comporem o pre-sente artigo.

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zado, como produtor de mensagens inscritas em meios tecnológicos, destinadas a estudantes à distância, e como usuário ativo e crítico e mediador entre estes meios e o aluno.” (BELLONI, 2001, p. 27)

Ainda Belloni (2001), no que se refere à elaboração de tecnologias pedagógicas, sugere a preocupação com as formas de apresentação dos conteúdos didáticos, previamente selecionados e elaborados e com metodologias de ensino e estratégias de utilização de materiais de ensino/aprendizagem que potencializem ao máximo as possibilidades de aprendizagem autônoma.

Já para Davis e Grosbaum (2002, p. 77):

os gestores precisam trabalhar com os professores a concepção de escola que desejam implementar e, de acordo com essa concepção, como se definirá o projeto pedagógico da escola e a prática de seus professores, de maneira a promover a aprendizagem continua de seus alunos.

1.2. IMIGRANTES E NATIVOS DIGITAIS

Termos comuns utilizados nos estudos sobre educação na atualidade são “Nativos Digitais” e “Imigrantes Digitais”. Usa-se o termo Nativo Digital para definir a geração que nasceu por volta da década de 90 e que cresceu tendo a internet como parte natural de seu ambiente cul-tural e cognitivo. Computadores, celulares, videogames, webcams e várias outras tecnologias fazem parte do cotidiano dessa geração, passando do status de ferramentas para o status de linguagem comum.

Já o termo Imigrante Digital é utilizado para definir as gerações anteriores, formado pelas pessoas que têm mais de 30 anos e que foram pegas já em idade adulta pelo advento da internet. Eles viram várias das tecnologias atuais se desenvolverem e se incluírem em seu cotidiano. Os Imigrantes sempre precisarão fazer um esforço adicional para conseguir assimilar aquilo que os Nativos fazem com tanto conforto e facilidade, isto é, a capacidade de pensar e agir usando as ferramentas inovadoras digitais.

É importante perceber esta distinção porque, em geral, professores imigrantes têm alunos nativos. Mais do que a diferença de geração, existe uma diferença de linguagem. Neurocientistas do mundo todo reconhecem que, quando se aprende uma língua estrangeira na infância, esse aprendizado é arquivado em uma parte diferente do cérebro do que quando aprendemos uma língua já na idade adulta. Ou seja, além da diferença de linguagem, ainda existe uma diferença na maneira como se processam e se armazenam as informações.

O que se observa na prática é que a maioria dos professores imigrantes tenta ensinar os alunos nativos usando a mesma linguagem com a qual foram ensinados. Talvez não seja mais novidade que uma nova linguagem é necessária; o que escolas precisam aprender, então, é adaptar os conteúdos curriculares para esse novo tipo de linguagem.

2. O DESEMPENHO NAS AVALIAÇÕES DOS ALUNOS

A utilização do MDD faz parte de um momento de transição da escola, com grande investi-mento em novas tecnologias. Esse novo material é composto pelo livro digital e pelo caderno interativo. Os recursos apresentam navegação fácil e intuitiva, incorporam várias linguagens e favorecem o estudo colaborativo.

O MDD vem alterando o modo como alunos e educadores enxergam a sala de aula e o próprio processo de ensino e aprendizagem. Sua utilização traz uma nova dinâmica para as aulas, sendo que o laboratório de informática perde um pouco da sua importância e a sala de aula passa a ser um ambiente multimídia, em que a tecnologia é incorporada às demais ferramentas de forma natural. Os conceitos podem ser explorados pelos educadores usando tanto o conteúdo que é apresentado no livro digital, quanto todo o conteúdo que é oferecido pela web.

A partir desta ideia, é preciso saber se, de fato, a mudança observada no cotidiano das au-las tem surtido efeito positivo no desempenho dos alunos. E isto só é possível através de uma avaliação ampla e significativa.

A avaliação desperta tanta resistência na maior parte das pessoas porque, tradicionalmente ela tem sido usada como um instrumento de controle para adequar as características dos indivíduos às exigências de determinadas situações ou circunstancias. Só que o problema não é da avaliação, mas do uso que dela se faz. Na verdade, avaliar é condição essencial de qualquer ato intencional. Se implementamos algo, com determinados objetivos, como saber se os resultados esperados foram alcançados? (DAVIS e GROSBAUM, 2002, p. 104)

O processo de avaliação é um processo complexo, pois deve levar em conta os diversos fatores que podem influenciar a aprendizagem dos alunos. Existem hoje muitas concepções teóricas e muitas práticas distintas do que é avaliar (DAVIS e GROSBAUM, 2002, p. 105). Inde-pendente disto, o professor não avalia o aluno apenas pelo seu desempenho em uma prova específica, pois isto é só um instrumento a serviço da aprendizagem; antes, deve estar atento ao longo de todo o percurso de um determinado assunto ou aprendizado, a fim de mostrar para cada aluno quais são os seus pontos fortes e fracos.

Segundo Davis e Grosbaum (2002):

O sucesso de uma escola é medido pelo desempenho de seus alunos. Se os alunos, cada um no seu ritmo, conseguem aprender continuamente, sem retrocessos, a escola é sábia e respeitosa. Se suas crianças e jovens são frequentadores assíduos das aulas, seguros de sua capacidade de aprender e interessados em aprender os problemas que os professores lhes propõem, ela esta cumprindo o papel de torná-los pessoas autônomas, capazes de aprender pela vida toda. Se os alunos estão sabendo ouvir, discordar, discutir, defender seus valores, respeitar a opinião alheia e chegar a consensos, ela pode se orgulhar de estar formando cidadãos. (DAVIS e GROSBAUM, 2002, p. 77)

E ainda, segundo a avaliação, as autoras dizem o seguinte:

É ela quem indica a gestores e professores onde estão seus tropeços e qualidades, onde é preciso investir mais e onde se pode caminhar com segurança. Sem avaliação não sa-beríamos se nossos objetivos estão sendo atingidos. Ela mostra quais são os conteúdos em que os alunos estão enfrentando maiores dificuldades e que precisam ser repensado pelos professores. (DAVIS e GROSBAUM, 2002, p. 103)

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Toda avaliação deve assumir os papéis de função diagnóstica para o professor, permitindo que este conheça o que o aluno aprendeu, fornecendo informações sobre os pontos fracos e fortes do aluno, e demonstrando se o ensino atingiu ou não as metas previstas e também de função diagnóstica para o aluno, possibilitando uma autoanálise de seu progresso, informan-do-o sobre o que ainda não domina e motivando-o para a aprendizagem.

• O processo de avaliação dos alunos na escola pesquisada tem como objetivo:

• Proporcionar ao aluno condições de fazer uma síntese das experiências educativas vividas durante certo período.

• Promover a ação consciente e crítica para que professor e aluno interajam no processo ensino-aprendizagem.

• Fornecer à Direção e Macroprocessos dados necessários ao processo de planejamento escolar.

• Proporcionar ao corpo docente meios para melhorar a eficiência e eficácia de seu trabalho.

• Possibilitar ao professor, pais e alunos, diagnosticar e acompanhar o seu progresso e estimular seu crescimento pessoal.

Nos processos para avaliação do aproveitamento, os aspectos qualitativos preponderam sobre os quantitativos. Assim, a escola considera a avaliação de qualidade aquela que apresenta:

• Desenvolvimento pessoal - Aprender a Ser: desenvolver as condições para a construção e enriquecimento da identidade pessoal e coletiva. É a aprendizagem síntese de todas as outras e implica no desenvolvimento de si próprio. Passa pelo cultivo e desenvolvi-mento de todas as potencialidades da pessoa.

• Desenvolvimento intelectual - Aprender a Saber: desenvolver a pessoa preparando-a para discernir e enfrentar as mudanças da sociedade em constante transformação. É a aprendizagem relacionada com o domínio dos instrumentos do conhecimento, com-preensão e descoberta.

• Desenvolvimento de aptidões - Aprender a Fazer: desenvolver a pessoa para a aquisição de habilidades e competências práticas.

Quanto aos critérios de avaliação, a orientação da escola é que todo professor realize a cada bimestre ao menos uma avaliação com peso um, relacionada ao Ser; duas avaliações com peso seis, ligadas ao campo do Saber e duas avaliações com peso dois, relacionadas ao Saber Fazer. No caso das avaliações serem provas tradicionais, estas deverão conter no mínimo três tipos de questões distintas (objetivas, dissertativas, lacuna, múltipla escolha, relação, etc.) e a indicação dos conhecimentos, habilidades e atitudes que estão sendo avaliadas. Os alunos cujas avaliações não atingiram média sete deverão obrigatoriamente participar do apoio pedagógico.

Quando o percentual de notas inferiores a sete for acentuado, o professor deve organizar uma forma de fazer a retomada do conteúdo com toda a turma. Os resultados da avaliação são comunicados às famílias no final de cada bimestre, através de Informativo de Aproveitamento Escolar, contendo notas que podem variar de um a dez.

Estas informações apresentadas sobre práticas de avaliação servem para reforçar o fato de que a observação das notas quantitativas dos alunos não servirá, em momento algum, como uma fonte isolada de leitura ou interpretação de dados. Ela é uma ação importante e útil dentro do processo de adaptação da escola às novas tecnologias e que também está alinhada a um processo muito maior e significativo de avaliação dos alunos e professores.

2.1. O DESEMPENHO QUANTITATIVO DOS ALUNOS ANTES E DEPOIS DA UTILIZAÇÃO DO MA-TERIAL DIDÁTICO DIGITAL - MDD

A análise quantitativa das notas foi realizada a partir das turmas do sexto ano da Educação Fundamental – EF ao terceiro ano do Ensino Médio - EM. Cabe ressaltar que o processo de implantação do MDD na escola é gradativo, tendo iniciado em 2014 com as turmas do sexto ano da EF e primeiro ano do EM. Em 2015 expandiu-se para as turmas do sétimo ano do EF e segundo ano do EM. Sendo assim, as turmas do oitavo e nono ano da EF e terceiro ano do EM ainda não utilizam o MDD.

Foram observadas as notas bimestrais das disciplinas de Português, Matemática, História e Geografia de todas as turmas ao longo de cinco anos antes da utilização do MDD e também as notas a partir de sua utilização, nas turmas que já iniciaram o processo. Tais disciplinas são comuns a todas as turmas e períodos observados. Fizeram parte da análise apenas as notas dos alunos matriculados em todos os bimestres observados. Aqueles que se tornaram alunos após o primeiro bimestre observado ou que deixaram de ser antes do último bimestre observado, não foram considerados.

A partir destes critérios, 96 alunos tiveram suas notas observadas. Os dados coletados permitiram fazer dois tipos de observação diferentes e, por hora, importantes: de cada aluno individualmente e das turmas entre si.

Quando observadas as notas individuais dos alunos, constatou-se que entre aqueles que já utilizam o MDD (53 alunos, de 4 turmas diferentes), 30 (56,6%) apresentaram melhoras na média após a utilização do material, sendo que destes, 9 apresentaram uma melhora de até 10%; 9 uma melhora entre 10,1% e 20% e 12 alunos uma melhora acima de 20%. Os demais, 23 alunos (43,4%), apresentaram uma média menor após a utilização, sendo 19 alunos com uma diminuição de até 10% e 4 alunos com uma diminuição entre 10,1% e 20%.

Para efeito de comparação, observou-se também as notas das turmas que não utilizam ainda o MDD (43 alunos, de 3 turmas diferentes) durante o mesmo período de utilização pelas outras turmas. Constatou-se que 12 alunos (28%) apresentaram melhoras de até 10% na média, enquanto que 31 alunos (72,%) apresentaram uma média menor, sendo que destes, 25

Revista Atitude · Faculdade Dom Bosco de Porto Alegre · Ano X - No 20 - agosto a dezembro de 2016 167166 A DEFINIÇÃO DO CONTRATO E SEUS ALCANCES NOS CÓDIGOS CIVIS ARGENTINO E BRASILEIRO

apresentaram uma diminuição de até 10% e 6 alunos, uma diminuição acima de 10%. Ou seja, enquanto que, no mesmo período, alunos que utilizaram o MDD e que apresentaram melhoras nas médias representam 56,6%, este número desce para 28% entre os que não utilizaram. E quando observados os alunos que apresentaram uma média menor, temos 43,4% entre aque-les que utilizaram o MDD e 72,% entre os que não utilizaram. De modo simplificado, temos:

MÉDIAS APÓS O INÍCIO DA UTILIZAÇÃO DO MDD NA ESCOLA

Tabela 1: Observação das médias após o início da utilização do MDD na escola.

Quando observadas as quatro turmas que já utilizam o MDD, notou-se que metade (sexto ano do EF e primeiro ano do EM) apresentou melhoras de aproximadamente 20% nas médias e metade (7 ano EF e 2 ano EM) apresentou diminuição de aproximadamente 5% nas médias após o início da utilização. Chama a atenção neste dado o fato de que as turmas que apresentam diminuição nas médias são aquelas que iniciam o segundo ano de utilização do MDD, enquanto as que mostraram melhoras são as que iniciam agora a utilização do mesmo material.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Fica claro que o curto período de utilização do MDD pela escola não permite ainda levantar algum dado estatístico efetivo quanto ao desempenho dos alunos ou mesmo justificativas e propostas de encaminhamentos. Para tanto, será necessário o término da implantação em todas as turmas e mais um ciclo de pelo menos cinco anos de utilização. No entanto, pretendeu-se mostrar alguns dados e observações iniciais que possam auxiliar no processo de implantação, uma vez que a própria editora responsável por esta implantação vem trabalhando em melhorias a partir de dados e informações apresentadas pela escola.

É importante ter presente algumas ideias que Davis e Grosbaum (2002) apontam como sendo importantes para aprender: a história pessoal do aluno deve ser considerada; o autoconceito do aluno influi em sua capacidade de aprender; a aprendizagem deve ser significativa; elogios são uma arma poderosa; as aprendizagens precisam ser repetidas; a aprendizagem é mais sólida quando se conhecem os erros.

Sendo assim, muito mais significativa que a observação do desempenho quantitativo dos alunos ao longo do tempo é a preocupação em analisar se, de fato, o material didático digital adotado pela escola cumpre o objetivo primeiro que é o de promover uma educação de qualidade centrada na pessoa do aluno. Nesta preocupação estão inseridas, além das notas dos alunos: a correta utilização do material pelo professor, uma didática adequada para aproveitar todas

as ferramentas e formas de interação e uma avaliação séria e propositiva por parte da equipe pedagógica. Lembramos aqui a ideia de Fernandes (2002), ao comentar que se queremos fazer uma avaliação consistente e coerente não podemos nos limitar à avaliação da aprendizagem. É preciso avaliar a escola e os fatores externos a ela, que influenciam nesse processo.

Surgem ainda, como pano de fundo das observações apresentadas neste artigo e, talvez como proposta para uma nova empreitada, algumas questões propositivas, como por exem-plo: como despertar a curiosidade dos alunos para temas e tarefas cada vez mais complexos, com aparatos e tecnologias também complexos e, por vezes, longe do seu interesse? Como qualificar os professores para serem pacientes e competentes para lidar com os erros dos alunos e com as suas próprias dificuldades diante das novas tecnologias digitais de informa-ção e comunicação? Como receber a aprendizagem como um processo desafiante, no qual as tarefas precisam ser interessantes e valer à pena para professores e alunos? Como selecionar e adquirir materiais didáticos e pedagógicos significativos nesta era da tecnologia? E, talvez a questão mais importante de todas: como ser uma escola propositiva, que ensina a criticidade e a autonomia diante do esgotamento dos sentidos e da perda da sensibilidade?

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Média maior

56,6%

28%

Alunos que utilizam o MDD

Alunos que não utilizam o MDD

Média menor

43,4%

72%

Revista Atitude · Faculdade Dom Bosco de Porto Alegre · Ano XI - No 22 - janeiro a junho de 2017 169168 A DEFINIÇÃO DO CONTRATO E SEUS ALCANCES NOS CÓDIGOS CIVIS ARGENTINO E BRASILEIRO

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A REVISTA ATITUDE - Construindo Oportunidades é uma publicação semestral de acesso irrestrito que publica artigos científicos originais e inéditos nas áreas de Ciências Sociais Aplica-das. A submissão de manuscritos é gratuita e por demanda espontânea, e a seleção dos artigos é feita a partir da recomendação de avaliadores ad-hoc, escolhidos entre os pares da comunidade técnico-científica nacional e internacional.

A Revista está aberta a colaborações do Brasil e do exterior. A pluralidade de abordagens e perspectivas é incentivada.

Podem ser publicados artigos de desenvolvimento teórico e artigos baseados em pesquisas empíricas (de 10 a 15 páginas, incluindo tabelas e figuras, etc.), Resumos de Teses, Dissertações, Monografias, Resenha Bibliográfica e Comunicações Técnicas (máximo de duas páginas).

A aceitação e publicação dos textos implicam a transferência de direitos do autor para a Revista.

Não são pagos direitos autorais.

Os textos enviados para publicação serão submetidos a dois avaliadores ad-hoc, da área de conhecimento, sendo um pelo menos com a titulação de doutor.

Os artigos deverão ser encaminhados para o Núcleo de Editoração (Ned) com as seguintes características:

• Para avaliação dos artigos submetidos, deve-se considerar a seguinte estrutura:

— Introdução com apresentação do(s) objetivo(s).

— Desenvolvimento (referencial teórico e, se aplicável, método, apresentação e discus-são dos resultados).

— Conclusões (em caráter opcional, recomendações).

— Referências bibliográficas.

• Em folha de rosto deverão constar o título do artigo, o(s) nome(s) completo(s) do(s) autor(es), acompanhado(s) de breve currículo, relatando experiência profissional e/ou acadêmica, endereço, números do telefone, do fax e e-mail.

• A primeira página do artigo deve conter o título (máximo de dez palavras).

• O resumo em português (máximo de 250 palavras) e as palavras-chave (mínimo de três e máximo de cinco), assim como os mesmos tópicos vertidos para uma língua estrangeira (inglês - title, abstract, key-words), com recuo nos lados esquerdo e direito de 1 cm.

• A formatação do artigo, gráficos, tabelas e quadros devem ser editados no Microsoft Word for Windows em tamanho A4 (210x297 mm). As margens espelho superior: 3,0 cm; inferior: 3,0 cm; esquerda: 2,4 cm e direita: 1,6 cm; em layout: cabeçalho: 1,6 cm, rodapé: 2,8 cm

NORMAS EDITORIAIS

Revista Atitude · Faculdade Dom Bosco de Porto Alegre · Ano XI - No 22 - janeiro a junho de 2017 171170

com alinhamento vertical superior; em duas colunas de 8,1 cm com espaçamento interno de 0,8 cm e espaçamento de 1,5 linha.

• Fonte para o texto Arial 12 e tabelas Arial 10; títulos de tabelas e figuras em Arial 10, em negrito; e demais títulos Arial 11, em negrito.

• Todas as referências bibliográficas devem ser citadas no corpo do texto pelo sistema autor-data. As referências bibliográficas completas deverão ser apresentadas em ordem alfabética no final do texto, de acordo com as normas da ABNT (NBR-6.023). Todas as citações no texto devem estar em letras minúsculas e nas referências, em maiúsculas. Os títulos das publicações devem ser apresentados em itálico.

• Diagramas, quadros e tabelas devem ser numerados sequencialmente, apresentar título e fonte, bem como ser referenciados no corpo do artigo.

• Quanto às figuras: devem ser inseridas sem a opção “flutuar sobre o texto” e as mesmas devem ter todos seus elementos agrupados.

• As ilustrações, fotografias e desenhos gráficos devem ser submetidos em formato JPEG, com resolução mínima 300 dpi, em tons de cinza e inseridos no texto. À exceção das tabelas, todas as demais ilustrações serão tratadas como Figura e referidas sempre por extenso (Figura ou Tabela). Devem ser elaboradas de modo adequado a sua publicação final, já que a dimensão das menores letras e símbolos não deve ser inferior a 2 mm depois da redução. Ilustrações em cores são aceitas, mas o custo de impressão é de responsabilidade do autor.

• As citações no interior do texto devem obedecer as seguintes normas: um autor (Linsen, 1988); dois autores (Vergara e Vermonth, 1960); três ou mais autores (Larrousse et al., 1988). Trabalhos com mesmo(s) autor(es) e mesma data devem ser distinguidos por su-cessivas letras minúsculas (Exemplo: Scouth 2000a,b), o mesmo ocorrendo com trabalhos de múltiplos autores que tenham em comum o primeiro deles. Não utilizar op. cit. nem apud. Devem ser evitadas citações a informações pessoais e de trabalhos em andamento.

• Os artigos deverão ser enviados em CD, acompanhado de duas vias impressas ou via e-mail, em arquivo eletrônico anexo, desde que não ultrapasse a 8 Mb. O autor receberá a confirmação de recebimento.

• Os artigos serão selecionados de acordo com a sua relevância, originalidade e qualidade científica.

Toda submissão deverá estar adequada às normas da revista ATITUDE e aprovada por todos os autores do trabalho.

• Os trabalhos enviados para a publicação serão analisados, primeiramente, por um dos membros da Comissão Editorial, que decidirá pela sua pertinência para as áreas de Ciências Sociais. Posteriormente, os manuscritos serão enviados a pelo menos dois avaliadores ad-hoc, que farão uma revisão cega. Os pareceres dos avaliadores deverão discorrer sobre os seguintes pontos do manuscrito: atendimento das normas de publicação estipuladas; pertinência na área; relevância dos resultados; adequação científica da redação; atualização da literatura utilizada; clareza dos objetivos, da metodologia e dos resultados; e susten-

tabilidade da discussão pelos resultados obtidos e na literatura científica. O parecer final poderá ser: aceito sem modificação; aceito com modificações; ou recusado. O(s) autor(es) serão informados da decisão, assim que ela for tomada.

• Os artigos que tiverem recomendação de alteração serão remetidos ao autor para as devidas providências e será necessário o reenvio de nova cópia impressa em um mês e outra em disquete ou CD ou e-mail para a Comissão Editorial.

• A aceitação final do manuscrito será condicionada à concretização das modificações so-licitadas pelo pareceristas ou com a devida justificativa do(s) autor(es) para não fazê-la. O Conselho Editorial da Revista Atitude fará revisões de linguagem no texto submetido, quando necessário.

• Toda responsabilidade do conteúdo do artigo é do(s) autor(es).

• Cada artigo submetido à Revista Atitude receberá cinco exemplares da revista.

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ATITUDE nº 20