responsabilidade civil extracontratual do estado e demais ... · responsabilidade civil do estado,...
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Sérgio Duarte da Costa Florindo
RESPONSABILIDADE CIVIL EXTRACONTRATUAL DO ESTADO E DEMAIS ENTIDADES PÚBLICAS
Mestrado em Direito: Ramo das Ciências Jurídico-Políticas
Trabalho realizado sob a orientação da
Professora Doutora Cristina Queiroz
2011
II
RESPONSABILIDADE CIVIL EXTRACONTRATUAL DO ESTADO E
DEMAIS ENTIDADES PÚBLICAS
III
RESUMO
O presente trabalho corresponde à dissertação de Mestrado em Ciências Jurídico-
Políticas, apresentada na Faculdade de Direito da Universidade do Porto, em Julho de 2011.
Trata-se de um estudo sobre a responsabilidade civil extracontratual do Estado e
demais entidades públicas pelos danos resultantes do exercício da função administrativa,
jurisdicional e político-legislativa.
Nesse âmbito, foi feita uma análise à evolução histórica do instituto, ao artigo 22.º da
Constituição da República Portuguesa e ao Regime actual resultante da Lei n.º 67/2007, de 31
de Dezembro, complementado com as soluções da doutrina e jurisprudência na interpretação
do referido preceito constitucional, antes e depois da entrada em vigor do novo Regime.
IV
ABSTRACT
This work corresponds to the Master's thesis in Legal and Political Science, presented
at the Faculty of Law, University of Porto, in July 2011.
It is about the tort of State and other public entities for damages resulting from the
exercise of administrative function, judicial, political and legislative.
In this context, an analysis was made to the history evolution of the institute, to the
22.º article from the Constitution of the Portuguese Republic and to the current arrangements
by Law n.º 67/2007 of December 31, supplemented with the solutions of the doctrine and
jurisprudence, in interpretation of that constitutional provision, before and after entry into
force of new Regime.
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"Os erros de grandes homens (...) são mais
fecundos que as verdades de pequenos"
F. Nietzsche
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NOTA PRÉVIA
O presente trabalho corresponde à dissertação de Mestrado em Ciências Jurídico-
Políticas, elaborada no ano lectivo de 2010/2011, e apresentada na Faculdade de Direito da
Universidade do Porto, em Julho de 2011.
Assim, não podia deixar de agradecer às pessoas que me incentivaram e
acompanharam durante esta longa caminhada com o seu apoio, paciência e sugestões.
Em primeiro lugar à minha mulher, pelo apoio constante, e sacrifícios nas horas que
me consumiram a fazer este trabalho, e por ter contribuído com leituras permanentes no
desenvolvimento do estudo que conduziu a esta dissertação.
Em segundo lugar aos meus pais, pela confiança depositada em mim e por todo o
apoio que me prestaram ao longo da minha vida e uma vez mais nesta etapa.
Por último, uma palavra de agradecimento muito especial à Professora Doutora
Cristina Queiroz, pela sua inteira disponibilidade, nas preciosas ajudas, sugestões e
correcções, que foi dando ao longo deste trabalho e pelo gosto que me soube incutir pela
pesquisa e pelo pensamento crítico.
Porto, Julho de 2011.
Sérgio Costa Florindo
1
INTRODUÇÃO
A responsabilidade civil do Estado e demais entidades públicas tem sido ao longo do
tempo, principalmente a partir do século passado, objecto de inúmeras discussões doutrinárias
e jurisprudenciais.
A escolha deste tema para a feitura de uma dissertação, no âmbito do Mestrado em
Direito, no ramo das Ciências Jurídico–Políticas, deve-se precisamente a esta riqueza de
problemas suscitados. Em boa parte resultante da não concretização através de uma lei
ordinária, durante um longo período de tempo, do princípio constitucional fundamental da
responsabilidade civil extracontratual do Estado e demais entidades públicas, previsto no
artigo 22.º da Constituição.
Ora, estes problemas suscitados tanto na jurisprudência como na doutrina pareceu-nos
justificar uma tentativa de análise, expressando a nossa modesta opinião, em virtude das
questões suscitadas.
A responsabilidade civil do Estado pode ser contratual ou extracontratual, consoante a
obrigação de indemnizar nasça ou não da violação de um dever estipulado num contrato.
Neste trabalho, cingir-nos-emos unicamente à responsabilidade civil extracontratual
do Estado e, dentro desta, analisaremos os danos decorrentes do exercício da função
administrativa, jurisdicional e político-legislativa.
Assim, começamos por fazer uma breve referência à evolução histórica anterior à
Constituição de 1976, analisando as várias Constituições, e, em especial, dedicaremos um
estudo mais pormenorizado ao Decreto-Lei n.º 48 051, de 21 de Novembro de 1967, uma vez
que foi esta lei ordinária que regulou, em parte, durante algum tempo, o regime da
responsabilidade civil do Estado, sendo também o principal foco da discórdia na doutrina.
Seguidamente, procederemos a uma análise ao artigo 22.º da Constituição, com
referência às soluções trazidas pela doutrina e pela jurisprudência, relacionadas com o seu
âmbito de aplicação, sem prejuízo da interpretação de outros preceitos constitucionais
directamente relacionados com o tema.
Por último, centraremos a nossa especial atenção no actual regime jurídico que regula
a responsabilidade civil extracontratual do Estado e demais entidades públicas previsto, em
anexo, à Lei n.º 67/2007, de 31 de Dezembro.
2
Esta lei, embora tardia, veio concluir e concretizar uma “lacuna” deixada em aberto,
pela Constituição de 1976, e em certa medida pôr um ponto final nas questões mais
controversas da doutrina e da jurisprudência.
Deste modo, analisaremos a responsabilidade por danos decorrentes do exercício da
função administrativa, que procedeu a algumas alterações ao anteriormente estipulado.
No entanto, as maiores alterações e inovações dizem respeito à responsabilidade por
danos decorrentes do exercício da função jurisdicional não isentas, da nossa parte, de alguma
crítica.
Por fim, faremos referência, com algum cuidado, à responsabilidade por danos
decorrentes do exercício da função político–legislativa, uma vez que o tema inspira muitas
dificuldades, a que o legislador, prudentemente, também não ficou imune.
Resta apenas aduzir, em jeito de conclusão, que naturalmente poderíamos ter abordado
outras questões, ou ainda desenvolver mais detalhadamente as abordadas, em razão do
interesse e da problemática da matéria em questão.
Fica no entanto a tentativa e o gosto por um tema ligado ao Direito Público
(Constitucional e Administrativo) que, mais do que nunca, se mantém na actualidade.
3
I. EVOLUÇÃO HISTÓRICA DA RESPONSABILIDADE CIVIL
EXTRACONTRATUAL DO ESTADO
Neste capítulo faremos uma breve abordagem histórica da evolução da
responsabilidade civil extracontratual do Estado, sendo de todo impossível procedermos a
uma investigação pormenorizada deste instituto pelas diferentes épocas e países.
Durante muitas épocas, em que o poder pertenceu ao Rei, o Estado era considerado
irresponsável – The King can do no wrong – ou seja, o Estado não tinha que indemnizar os
cidadãos pelos prejuízos que lhes causasse resultante da sua actuação1. Esta concepção
permaneceu até ao século XIX, bem como durante grande parte desse mesmo século.
Com o aparecimento dos regimes constitucionais, ainda vigorava por toda a Europa a
irresponsabilidade civil do Estado, argumentada principalmente no facto de estarmos perante
uma entidade soberana e criadora de direito 2.
Assim, e começando pelo nosso ordenamento jurídico, este foi evoluindo no sentido
da progressiva responsabilização do Estado, afastando assim a regra da irresponsabilidade3
por danos causados no exercício das suas funções - principalmente a função administrativa -
dando lugar a um princípio de responsabilidade civil extracontratual do Estado.
1. Da Constituição de 1822 à Constituição de 1976
As Constituições Portuguesas do século XIX não consagraram a responsabilidade do
Estado, quer de forma directa, ou indirecta, mas fizeram referência à responsabilidade dos
1 Cfr. Diogo Freitas do Amaral, Direito Administrativo, vol. III, Lisboa, 1989, pgs. 477 e 478. 2 Cfr. J.J. Gomes Canotilho, O problema da responsabilidade do Estado por actos lícitos, Coimbra,
Almedina, 1974, pag. 39 e ss. Segundo Maria José Rangel Mesquita esta solução de irresponsabilidade do Estado “aparecia como corolário da soberania do Estado e poderia ser aceitável na medida em que o Estado Liberal se caracterizava por um reduzido intervencionismo na vida social e económica. Com o inevitável incremento daquela intervenção e a crescente complexidade das suas funções, multiplicaram-se as ocasiões propícias e as actividades susceptíveis de causar danos aos particulares. Assim, a irresponsabilidade do Estado deixa de figurar como aceitável do ponto de vista social.” Maria José Rangel Mesquita, Responsabilidade Civil da Administração Pública, Coordenação de Fausto Quadros, Almedina, 2004, pg. 56.
3 Diogo Freitas do Amaral refere que: “Durante muito tempo, como é sabido, as leis e os juristas consideraram o Estado irresponsável: quer dizer, o Estado não tinha a obrigação de indemnizar os prejuízos que da sua actuação resultassem para os particulares (…) Seja porém como for, a verdade é que o Estado era em regra irresponsável. Isso mesmo resultava do nosso Código Civil de 1867, segundo o qual nem o Estado nem os funcionários públicos eram responsáveis pelas perdas e danos que causassem no desempenho das obrigações que lhes fossem impostas por lei, excepto se excedessem ou não cumprissem de algum modo as disposições da mesma lei (art.2399.º), caso em que responderiam pessoalmente como qualquer cidadão (art. 2400º).” Cfr. Diogo Freitas do Amaral, Direito Administrativo, III,. cit., pgs. 477 a 479. No mesmo sentido, António Manuel Hespanha, que, afirma de igual modo, a regra da irresponsabilidade do Estado por danos decorrentes do exercício das suas funções. Cfr. António Manuel Hespanha, História das Instituições, 1982 pgs. 316 e ss.
4
empregados públicos por “erros de ofício e abusos de poder” 4, “abusos e omissões que
praticarem no exercício das suas funções”5 ou “abuso ou omissão pessoal”6. Assim, qualquer
particular poderia requerer a responsabilidade dos funcionários públicos que, pela sua
actuação, no exercício de funções públicas, violassem a Constituição. A Carta Constitucional
de 1822, além de dispor sobre a responsabilidade dos empregados públicos, também
consagrou a responsabilidade dos juízes por “abuso de poder e prevaricações”, “ suborno,
peita, peculato e concussão” (artigos 123.º e 124.º)7.
No entanto, esta responsabilidade não era considerada uma verdadeira
responsabilidade do Estado, uma vez que este não era exclusivamente responsável, nem
solidariamente responsável com os seus funcionários. Estávamos perante uma
responsabilidade que não se transmitia ao Estado8.
A Constituição de 1933, de modo diferente das anteriores, não contemplava a
responsabilidade dos funcionários públicos por actos ilícitos praticados no exercício das suas
funções. Todavia, referia, entre os direitos dos cidadãos, o “direito de reparação de toda a
lesão efectiva conforme dispuser a lei, podendo esta, quanto a lesões de ordem moral,
prescrever que a reparação seja pecuniária” (artigo 8.º, n.º17). Ou seja, a Constituição vem
prever o direito à indemnização dos danos sofridos pelo cidadão, desde que haja fundamento
na lei. E a única lei, à data, que previa a responsabilidade civil do Estado era o Código Civil
de Seabra, com a redacção conferida ao artigo 2399.º pelo Decreto n.º 19126, de 16 de
Dezembro de 1930. Contemplava essa norma a responsabilidade solidária da administração
para com os seus funcionários por actos ilícitos praticados no exercício das suas funções.
Com o Código Administrativo de 1936-40 essa responsabilidade estendeu-se às Autarquias
Locais (artigos 366.º e 367.º). Consequentemente, até à entrada em vigor do Decreto-Lei n.º
48 051, de 21 de Novembro de 1967, a lei ordinária só fazia referência à responsabilidade da
4 Artigos 14.º e 17.º da Constituição de 23 de Setembro de 1822. 5 Artigos 145.º, 27.º e 28.º da Carta Constitucional de 29 de Abri de1826. 6 Artigos 15.º e 26.º da Constituição de 4 de Abril de 1838. 7 Cfr. Jorge Miranda, Manual de Direito Constitucional, Tomo IV, 4.ª ed., Coimbra Editora, 2008, pgs.
345 e 346. 8 Neste sentido, escreve Maria José Rangel Mesquita que: “A Constituição estabelece, pois, um
princípio geral de responsabilidade – pessoal e exclusiva – dos titulares de cargos públicos, que se vai manifestar em posteriores Constituições portuguesas.”, Cfr. Maria José Rangel Mesquita, Responsabilidade Civil, cit., pg. 88. Recorde-se que, historicamente, foi com o famoso acórdão Blanco, de 8 de Fevereiro de 1873, proferido pelo Tribunal de Conflitos Francês, que, pela primeira vez, se tentou fundar a obrigação de indemnizar os danos causados aos particulares por parte do Estado em princípios autónomos. E foi também com este acórdão que se estabeleceu a competência dos tribunais administrativos em matéria de responsabilidade do Estado.
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administração por factos ilícitos. Daí a doutrina entender que não havia um princípio geral no
direito português de responsabilidade civil do Estado9.
Conforme refere Jorge Miranda, só com a Constituição de 1976 é que o princípio da
responsabilidade do Estado conseguiria ser estabelecido com toda a amplitude10.
2. O Decreto-Lei n.º 48 051, de 21 de Novembro de 1967
Durante algum tempo, até à sua revogação pela Lei n.º 67/2007, de 31 de Dezembro, a
responsabilidade civil extracontratual do Estado e demais entidades públicas foi regulada pelo
Decreto-Lei n.º 48 051, de 21 de Novembro de 196711. Resultava claramente das suas normas
que o decreto era aplicável aos actos de gestão pública no exercício da actividade
administrativa, mas não por via subsidiária a actos praticados no exercício da função
jurisdicional e da função político-legislativa. Encontrava-se ainda prevista a sua entrada em
vigor em simultâneo com o Código Civil de 1966 que, no seu artigo 501.º, dispunha sobre a
responsabilidade civil por actos de gestão privada, isto é, toda a actuação do Estado em que
este age desprovido do seu “ius imperium”, e que é regulada de acordo com as normas de
direito privado. Assim, o Decreto-Lei n.º 48 051, de 21 de Novembro de 1967, veio
complementar e preencher a lacuna aberta com o Código Civil, na medida em que disciplinou
a responsabilidade do Estado por actos de gestão pública12. Segundo Marcello Caetano, são
actos de gestão pública os praticados pelo Estado nos termos do direito público e princípios e
regras do direito administrativo13.
Isto significa, no plano do direito processual, que na responsabilidade civil por actos
de gestão privada eram competentes os tribunais judiciais e, na responsabilidade civil por
actos de gestão pública, os tribunais administrativos. Não obstante, havia quem defendesse
que a competência para apreciar a responsabilidade do Estado, nas duas situações acima
referidas, devia pertencer sempre aos tribunais administrativos, uma vez que um dos sujeitos é
9 Cfr. Jorge Miranda, Manual de Direito Constitucional, IV, cit., pg. 346, e Maria José Rangel Mesquita,
Responsabilidade Civil, cit., pg. 94. 10 Cfr. Jorge Miranda, Manual de Direito Constitucional, IV, cit, pg. 346. 11 Para um estudo detalhado do Decreto-Lei 48 051, de 21 de Novembro de 1967, ver Diogo Freitas do
Amaral, A Responsabilidade da Administração no Direito Português, Lisboa, 1973, pgs. 29 e ss. Por último, J.J. Gomes Canotilho, O problema da responsabilidade do Estado, cit., pag. 63 e ss.
12 Maria José Rangel de Mesquita, Responsabilidade do Estado e demais Entidades Públicas: o Decreto-lei n.º 48051, de 21 de Novembro de 1967, e o artigo 22º da Constituição, Perspectivas Constitucionais, Nos 20 anos da Constituição de 1976, Organização, Jorge Miranda, vol. II, Coimbra Editora, 1997, pg. 362.
13 Marcello Caetano, Manual de Direito Administrativo, vol. I, Coimbra, 1991, pgs. 44 e 431 ss.
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sempre um ente público.14 Deste modo, o critério utilizado não era o da natureza da actividade
exercida, mas sim a natureza do sujeito que a exercia15.
Mas a principal novidade deste regime legal centra-se numa outra inovação. Prende-se
com a consagração, pela primeira vez, da responsabilidade administrativa pelo risco (artigo
8.º) e por factos lícitos (artigo 9.º), além da responsabilidade por factos ilícitos culposos
(artigos 2.º a 7.º)
Podemos, assim, sistematizar a responsabilidade do Estado e demais entidades
públicas, prevista neste diploma legal, em três modalidades:
- Responsabilidade subjectiva do Estado por facto ilícito culposo
- Responsabilidade objectiva do Estado pelo risco (factos casuais)
- Responsabilidade objectiva do Estado por facto lícito
2.1. Responsabilidade por facto ilícito culposo
Para que se efective a responsabilidade subjectiva do Estado por facto ilícito culposo e
a consequente obrigação de indemnizar, importa a verificação cumulativa de quatro
requisitos: o facto ilícito, a culpa, o dano e o nexo de causalidade entre o facto e o dano.
Relativamente a estes requisitos, a doutrina entende, sem prejuízo de algumas especificidades,
que o direito administrativo trata a matéria em questão da mesma forma que o direito das
obrigações constante dos artigos 483.º e ss. do Código Civil 16.
Esta modalidade encontra-se prevista nos artigos 2.º a 7.º desse diploma.
Preceitua o artigo 2.º o seguinte:
“1. O Estado e as demais pessoas colectivas públicas respondem civilmente perante
terceiros pelas ofensas dos direitos destes ou das disposições legais destinadas a proteger os
seus interesses, resultantes de actos ilícitos culposamente praticados pelos respectivos órgãos
ou agentes administrativos no exercício das suas funções e por causa desse exercício.
14 Guido Zanobini, Corso di diritto amninistrativo, vol. I, pgs. 338 e ss., citado por Diogo Freitas do
Amaral, Direito Administrativo, III, cit., pg. 488. 15 Cfr. Diogo Freitas do Amaral, Direito Administrativo, III, cit., pg. 488. 16 Cfr. Diogo Freitas do Amaral, Direito Administrativo, III, cit., pgs 501 e 502. Sobre o regime da
obrigação de indemnizar no direito civil, por todos, Antunes Varela, Das obrigações em Geral, Vol. I, Almedina, 1998, pgs. 543 a 653.
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“2. Quando satisfizerem qualquer indemnização nos termos do número anterior, o
Estado e as demais pessoas colectivas públicas gozam do direito de regresso contra os
titulares do órgão ou os agentes culpados, se estes houverem procedido com diligência e zelo
manifestamente inferiores àqueles a que se achavam obrigados em razão do cargo.”
Da análise do preceito resulta que o Estado e as demais entidade públicas são
exclusivamente responsáveis pelos danos praticados pelos seus funcionários contra terceiros,
no exercício das suas funções, e por causa desse exercício. No entanto, uma vez satisfeita a
indemnização, o Estado, poderá ou não accionar o direito de regresso contra o titular do órgão
ou agente, desde que haja por parte destes negligência grave (culpa leve), isto é, desde que
tenham “ procedido com diligência e zelo manifestamente inferiores àqueles a que se achavam
obrigados em razão do cargo.”
Por outro lado, preceitua o artigo 3.º o seguinte:
“1. Os titulares do órgão e os agentes administrativos do Estado e demais pessoas
colectivas públicas respondem civilmente perante terceiros pela prática de actos ilícitos que
ofendam os direitos destes ou as disposições legais destinadas a proteger os seus interesses,
se tiverem excedido os limites das suas funções ou se, no desempenho destas e por sua causa,
tiverem procedido dolosamente.
2. Em caso de procedimento doloso, a pessoa colectiva é sempre solidariamente
responsável com os titulares do órgão ou os agentes.”
Do n.º 1 deste artigo resulta a responsabilidade exclusiva dos titulares dos órgãos e dos
agentes do Estado, que tem lugar sempre que estes causem um dano a um terceiro fora do
exercício das suas funções, ou durante esse exercício, mas não por causa dele. Assim, o
lesado só pode responsabilizar o titular do órgão ou o agente do Estado pelos danos que tenha
sofrido.
No n.º 2 encontra-se prevista a responsabilidade solidária do Estado e demais pessoas
colectivas públicas. Para tanto, os titulares dos órgãos ou agentes administrativos devem
praticar o acto ilícito no exercício das suas funções, e por sua causa, e que a culpa revista a
forma dolosa. Consequentemente, o lesado pode accionar o Estado ou a pessoa colectiva à
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qual o funcionário público pertença, ou só este, ou ambos, a fim de ser indemnizado pelos
danos sofridos.
2.2. Responsabilidade administrativa
A responsabilidade administrativa ou responsabilidade objectiva do Estado e demais
entidades públicas pode revestir a modalidade de responsabilidade pelo risco e
responsabilidade por facto lícito.
A responsabilidade pelo risco está prevista no artigo 8.º, que preceitua o seguinte:
“O Estado e demais pessoas colectivas públicas respondem pelos prejuízos especiais
e anormais resultantes do funcionamento de serviços administrativos excepcionalmente
perigosos ou de coisas e actividades da mesma natureza, salvo se, nos termos gerais, se
provar que houve força maior estranha ao funcionamento desses serviços ou ao exercício
dessas actividades, ou culpa das vítimas ou de terceiro, sendo neste caso a responsabilidade
determinada segundo o grau de culpa de cada um.”
Assim, da análise do artigo resulta que, para haver responsabilidade, os prejuízos
sofridos têm de revestir um carácter especial e anormal, em virtude do funcionamento de
serviços excepcionalmente perigosos ou do exercício de actividades da mesma natureza17. Se
os danos forem comuns e normais, isto é, fazendo parte do risco da vida em sociedade, não há
obrigação de indemnizar por parte do Estado.
O Estado também não tem o dever de indemnizar, quando prove que houve força
maior estranha ao funcionamento do serviço ou da actividade.
Nas situações em que exista culpa do lesado ou de terceiro, a responsabilidade será
repartida de acordo com o grau de culpa de cada um.
Por último, a responsabilidade por facto lícito encontra-se prevista no artigo 9.º do
mesmo diploma, que preceitua o seguinte:
17 Diogo Freitas do Amaral dá como exemplo os seguintes casos: “danos causados por manobras,
exercícios ou treinos com armas de fogo por parte das forças armadas ou das forças de polícia; danos causados pela explosão de paióis militares ou de centrais nucleares; danos causados involuntariamente por agentes da polícia em operações de manutenção da ordem pública ou de captura de criminosos.” Diogo Freitas do Amaral, Direito Administrativo, III, cit., pg. 518.
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“ 1. O Estado e as demais pessoas colectivas públicas indemnizarão os particulares a
quem, no interesse geral mediante actos administrativo legais ou actos materiais lícitos,
tenham imposto encargos ou causado prejuízos especiais e anormais.
“ 2. Quando o Estado ou as demais pessoas colectivas públicas tenham, em estado de
necessidade e por motivo de imperioso interesse público, de sacrificar especialmente, no todo
ou em parte, coisa ou direito de terceiro, deverão indemnizá-lo.”
Segundo Gomes Canotilho, este artigo estabelece o princípio geral da indemnização
pelos prejuízos especiais e anormais resultantes de actos lícitos18.
Trata-se, pois, de situações em que o Estado actua ao abrigo da lei, mas a sua actuação
causa prejuízos especiais e anormais a terceiros, tendo o Estado a obrigação de indemnizar os
lesados. Este tipo de responsabilidade assenta numa ideia de igualdade entre todos os
cidadãos na repartição dos encargos públicos.
Refere, por último, Freitas do Amaral, como exemplos de responsabilidade por factos
lícitos: a expropriação por utilidade pública, requisição por utilidade pública, servidões
administrativas, ocupação temporária de terrenos adjacentes às estradas para execução de
obras públicas, existência de uma causa legítima de execução de sentença de um tribunal
administrativo proferida contra a administração, actuação da administração em estado de
necessidade, entre outros19.
18
J.J. Gomes Canotilho, O problema da responsabilidade do Estado, cit., pag. 90. 19 Diogo Freitas do Amaral, Direito Administrativo, III, cit. pg. 519.
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II. A CONSTITUIÇÃO DE 1976
1. Responsabilidade das entidades públicas
Com a Constituição de 1976 consagrou-se, no artigo 22.º, sob a epígrafe
“ responsabilidade das entidades públicas” 20, o princípio fundamental da responsabilidade
civil extracontratual do Estado e demais entidades públicas.
Preceitua esse artigo o seguinte:
“O Estado e as demais entidades públicas são civilmente responsáveis, em forma
solidária com os titulares dos seus órgãos, funcionários ou agentes, por acções ou omissões
praticadas no exercício das suas funções e por causa desse exercício, de que resulte violação
dos direitos, liberdades e garantias ou prejuízo para outrem.”
Segundo Jorge Miranda, este preceito configura-se como princípio geral. Isto decorre,
nas palavras do Autor, “do seu lugar sistemático, do confronto com as fórmulas precursoras
das Constituições anteriores e com as raras fórmulas paralelas de Constituições de outros
países, bem como da conexão íntima com outros artigos.” E prossegue, observando que, para
os efeitos do artigo 17.º da Constituição, este direito é de natureza análoga aos direitos,
liberdades e garantias, sendo directamente aplicável (artigo 18.º, n.º 1 da Constituição), se
bem que não imediatamente exequível quanto às formas jurisdicionais de efectivação21.
Este preceito constitucional abarca todas as funções do Estado (político-legislativa,
administrativa e a jurisdicional). E engloba tanto os danos patrimoniais como os danos não
patrimoniais resultantes do exercício dessas funções, responsabilizando tanto o Estado como
qualquer outra entidade pública. E visa dar efectividade a um outro princípio: o da tutela
jurisdicional efectiva, segundo o qual a todo o direito corresponde uma tutela junto do
tribunal competente, bem como o respectivo meio processual. Contém ainda, de forma clara,
o princípio da solidariedade do Estado para com os titulares dos seus órgãos, funcionários ou
agentes22.
20 Note-se que o artigo corresponde ao previsto no n.º1 do artigo 21.º na versão originária da
Constituição de 1976. Com a revisão constitucional de 1982 passou para o actual artigo 22.º. 21 Cfr. Jorge Miranda, Manual de Direito Constitucional, IV, cit., pgs. 347 e ss. 22 Ibidem.
11
O preceito, todavia, colocou vários problemas de compatibilização com a legislação
ordinária em vigor à época, nomeadamente o Decreto-Lei n.º 48 051, 21 de Novembro de
1967. Por conseguinte, alguns autores defenderam a inconstitucionalidade dos artigos 2.º e 3.º
desse Decreto-Lei face ao princípio da responsabilidade solidária previsto no artigo 22.º da
Constituição 23.
Por outro lado, discutia-se na doutrina o âmbito de aplicação do artigo 22.º, dado que
a formulação constitucional do princípio da responsabilidade civil do Estado revestiu uma
forma tão ampla que várias questões se podiam suscitar.
A este propósito, observa Maria José Rangel de Mesquita que as principais questões
suscitadas pelo artigo 22.º da Constituição prendem-se, designadamente: com a extensão da
responsabilidade quanto à natureza da função pública exercida; com a extensão da
responsabilidade quanto ao facto gerador do dano; com o sujeito ou entidade responsável; e,
por último, com a forma da responsabilidade 24.
Foi suscitada ainda a possibilidade de os lesados poderem invocar directamente o
artigo 22.º numa acção de indemnização a propor contra o Estado, mesmo na ausência de lei
ordinária.
Nesta linha de entendimento, refere Rui Medeiros, que os lesados têm direito a ser
indemnizados pelos danos que tenham sofrido por uma actuação legislativa ilícita e
censurável, mesmo nas situações de ausência de lei concretizadora25. Em idêntico sentido,
observam Gomes Canotilho e Vital Moreira: "Na falta de lei concretizadora, o artigo 22.º é
uma norma directamente aplicável, cabendo aos juízes e aos tribunais criar uma «norma de
decisão» (aplicação dos princípios gerais da responsabilidade da administração, observância
dos critérios gerais da indemnização e reparação de danos) tendente a assegurar a reparação
23 Ver Rui Medeiros, Ensaio sobre a responsabilidade civil do Estado por actos legislativos, Coimbra,
1992, pg. 122, e Maria da Glória Garcia, A Responsabilidade do Estado e demais Pessoas Colectivas Públicas, Conselho Económico e Social, Lisboa, 1997, pgs. 69 e 70.
24 Cfr. Maria José Rangel de Mesquita, Responsabilidade do Estado e demais Entidades Públicas, cit., pgs. 377 e 378. No mesmo sentido, escreveu João Castro Mendes: “ Será também uma particularidade do regime da figura em causa a que resulta do artigo 21.º, n.º 1, da Constituição? Prima facie, à letra, sim. Não avançamos mais porque a interpretação deste artigo nos deixa tantas dúvidas e preocupações que sentimos o terreno movediço demais para prosseguir.” Cfr. João Castro Mendes, Direitos, liberdades e Garantias – alguns aspectos gerais, Estudos sobre a Constituição, vol. I, Lisboa, 1977, pg. 111.
25 Ver Rui Medeiros, Ensaio sobre a responsabilidade civil do Estado, cit., pg. 122, e A responsabilidade civil pelo ilícito legislativo no quadro da reforma do Decreto-Lei n.º 48 051, Responsabilidade Civil Extracontratual do Estado, Trabalhos Preparatórios da Reforma, Gabinete de Politica Legislativa e Planeamento - Ministério da Justiça, Coimbra Editora, 2002, pg. 194.
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de danos resultantes de actos lesivos de direitos, liberdades e garantias ou dos interesses
juridicamente protegidos dos cidadãos."26
Não obstante, certos autores rejeitam a aplicabilidade directa do artigo, afirmando que
o mesmo se limitava a constitucionalizar o princípio geral da responsabilidade civil do
Estado. Como refere Barbosa de Melo, deixava “(…) ao legislador ordinário o poder de
estabelecer diferentes tipos de responsabilidade e de fixar os especiais pressupostos de cada
um deles.”27
Por último, o artigo 22.º da Constituição não deve ser interpretado isoladamente, mas
em conjugação com outros preceitos constitucionais, nomeadamente, com o artigo 117.º n.º 1,
relativamente à responsabilidade dos titulares de cargos políticos, com o artigo 271.º, sobre a
responsabilidade dos funcionários e agentes da administração e com o artigo 216.º n.º 2, que
remete para a lei as excepções à irresponsabilidade dos juízes 28.
2. Responsabilidade da função jurisdicional
Com a entrada em vigor da Lei n.º 67/2007, de 31 de Dezembro, o legislador veio dar
nova concretização não apenas ao disposto no artigo 22.º da Constituição, mas também a
outros preceitos que se relacionam com a responsabilidade decorrente do exercício da função
jurisdicional.
No artigo 27.º, n.º 5 consagra-se o dever de indemnizar nos casos de privação de
liberdade contra o disposto na Constituição e na lei, concretizando-se este preceito nos artigos
225.º e 226.º do Código do Processo Penal, que se referem a casos de privação de liberdade
ilegal ou injustificada.
Do mesmo modo, consagra o artigo 29.º, n.º 6, o dever de indemnizar nos casos de
erro judiciário, concretizado nos artigos 461.º e 462.º do Código do Processo Penal e nos
artigos 13.º e 14.º da Lei n.º 67/2007, de 31 de Dezembro.
Por último, o artigo 216.º, n.º 2 refere que os juízes não podem ser responsabilizados
pelas suas decisões, salvo as excepções legais.
26 Cfr. J.J. Gomes Canotilho e Vital Moreira, Constituição da República Portuguesa Anotada, 3.ª ed.,
Coimbra, 1993, p. 170. 27 Cfr. Barbosa de Melo, Responsabilidade civil extra-contratual - não cobrança de derrama pelo Estado,
Colectânea de Jurisprudência, ano XI, tomo 4, 1986, pg. 36. 28 Cfr. Jorge Miranda, Manual de Direito Constitucional, IV, cit., pag. 353.
13
E, já antes do regime actual, tanto a doutrina como a jurisprudência debateram-se com
a questão de saber se os magistrados podiam ser responsabilizados quando através das suas
decisões provocassem um dano injusto aos particulares.
A este propósito, refere Gomes Canotilho, que a questão da responsabilização dos
magistrados, tinha que impor um regime particularmente cauteloso, afastando, desde logo,
qualquer hipótese de responsabilidade por actos de interpretação de normas de direito e pela
valoração dos factos e respectiva prova, sob pena de se paralisar o funcionamento da justiça e
perturbar a independência dos juízes. E prossegue, observando que: “ (…) é, duvidoso que,
fora dos casos da responsabilidade penal e disciplinar do juiz, se possa admitir a
responsabilidade civil com a consequente possibilidade do direito de regresso por parte do
Estado.”29
Em alguns países da Europa há muito que já se consagrava a responsabilidade dos
magistrados.30
Em Portugal, a doutrina maioritária já entendia que face ao artigo 22.º da Constituição
o Estado era responsável pelos danos causados pelo exercício da função jurisdicional.
Por outro lado, a jurisprudência mostrava-se bastante relutante em aceitar essa
responsabilidade.
Contudo, a evolução ao nível da jurisprudência, no sentido de uma maior
responsabilização da função jurisdicional, ocorre com o acórdão do Supremo Tribunal
Administrativo, de 7 de Março de 1989 31, no processo Garagens Pintosinho, Lda., no qual se
discutia se o atraso de cinco anos, desde o fim da audiência de julgamento, até ser proferida
a sentença, deveria ser considerado violação da disposição legal que previa unicamente um
prazo de três dias.
Refere expressamente, a este propósito, o referido acórdão que: “ o ordenamento
jurídico português prevê a responsabilidade civil extracontratual do Estado por danos
provenientes por factos ilícitos culposos resultantes da função jurisdicional (omissão de
pronúncia de sentença em prazo razoável)”, interpretando o artigo 22.º da Constituição de
modo a abranger os danos decorrentes da função jurisdicional.
29 J.J. Gomes Canotilho, Direito Constitucional e Teoria da Constituição, 7.ª ed., Almedina, 2003, pg.
509. 30 Designadamente, em França, a Lei de 5 de Julho de 1972, relativa á reparação de danos provocados
pelo funcionamento defeituoso da justiça. E também em Itália a Lei n.º 117, de 13 de Abri de 1988, na sequência de uma consulta por referendo realizado em 1987.
31 Cfr. Acórdão do STA de 7 de Março de 1989, htpp://www.colectaneadejurisprudencia.com.
14
Todavia, pouco tempo depois, o Supremo Tribunal Administrativo, por acórdão
proferido a 9 de Outubro de 1990, afastou-se dessa jurisprudência argumentando que o artigo
22.º da Constituição não abrangia a responsabilidade decorrente da função jurisdicional. E,
designadamente, tratando-se do exercício de funções judiciais de natureza penal, pelo que o
Decreto-Lei n.º 48 051, de 21 de Novembro de 1967, não se podia aplicar supletiva ou
extensivamente. A função jurisdicional não integrava a chamada “Administração”, e os actos
judiciais não se inseriam na qualificação de actos de gestão pública32.
Em consequência, a doutrina maioritária criticou o aresto, principalmente a
interpretação restritiva que fez do artigo 22.º da Constituição, sublinhando que o preceito em
causa se refere a acções e omissões praticadas pelos titulares dos órgãos do Estado,
funcionários ou agentes, no exercício de suas funções, incluindo a jurisdicional, e por causa
desse exercício, sendo os juízes titulares de órgãos jurídico-públicos33. Entendia, ainda, que os
lesados podiam invocar o artigo 22.º da Constituição, e o Estado ser directamente
responsabilizado pela violação dos direitos liberdades e garantias ou interesses juridicamente
protegidos.
No entanto, houve alguma dificuldade nessa construção jurídica, em virtude da
ausência de lei ordinária que regulasse os pressupostos da responsabilidade do Estado por
danos praticados pelo exercício da função jurisdicional34.
Deste modo, a doutrina considerou que o artigo 9.º, n.º 1 do Decreto-Lei n.º 48051, de
21 de Novembro de 1967, relativo à responsabilidade civil da administração, devia ser
interpretado de forma a poder ser aplicado por analogia aos casos de responsabilidade pelo
exercício da função jurisdicional. A sua não aplicação contrariava o disposto nos artigos 18.º,
n.º 1 e 22.º da Constituição, tendo como consequência a inconstitucionalidade superveniente
dessa norma35.
Nesse sentido, começaram os tribunais a interpretar a lei de acordo com a
interpretação da doutrina.
32 Cfr. Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, de 9 de Outubro de 1990,
htpp://www.colectaneadejurisprudencia.com. 33 J.J. Gomes Canotilho, Anotação ao Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, de 7 de Março de
1989, in: Revista de Legislação e Jurisprudência, Ano 123, nº. 2799, pgs 293 e ss., e J.J. Gomes Canotilho e Vital Moreira, Constituição da República Portuguesa Anotada, 3.ª ed., cit., pg. 168.
34 Cfr. Salvador da Costa, Carreira dos Juízes - Perspectivas de Futuro/Responsabilidade Civil por Danos Derivados do Exercício da Função Jurisdicional”, http:// www.justiçaindependente.net, Lisboa, 2009, pg. 9.
35 Ibidem.
15
A este respeito, o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 8 de Julho de 1997,
referente a um pedido de indemnização, em virtude de decisões proferidas com violação da lei
aplicável e com inobservância do especial dever de cuidado exigível ao julgador, reconheceu
a responsabilidade do Estado por danos decorrentes do exercício da função jurisdicional 36.
Refere o aresto, que essa responsabilidade se encontra prevista expressamente nos artigos
27.º, n.º 5 e 29.º, n.º 6 da Constituição. E conclui que, de modo similar, ao que acontece com a
responsabilidade por danos decorrentes do exercício da função administrativa, se deverá
aceitar uma responsabilidade emergente pela má organização do sistema judicial, a par de
uma outra responsabilidade referente ao mau desempenho das funções pelos agentes
judiciários. Acresce, ainda, que o artigo 22.º deve ser visto em paralelo com outros preceitos
constitucionais, nomeadamente, face ao disposto nos artigos 52.º, n.º 3, e 62.º, n.º 2, devendo
ser estendido o regime ditado pelo artigo 18.º, n.º 3, designadamente, a sua aplicação directa,
independentemente da existência de lei ordinária que o concretize. Todavia, impõe-se
complementar esse princípio constitucional com os princípios gerais da responsabilidade
civil.
Deste modo, o Supremo Tribunal de Justiça começou a interpretar a lei de acordo com
o que a doutrina maioritariamente já preconizava, o que se transformou em significativa
tendência jurisdicional37.
36 Processo n.º 97A774, in: Colectânea de Jurisprudência, Ano V, Tomo II, 1997, pgs. 153 a 159. 37 Cfr. Salvador da Costa, Carreira dos Juízes, cit., pg. 9. Entre outros, ver acórdãos do Supremo
Tribunal de Justiça de 3 de Dezembro de 1998, de 20 de Outubro de 2005 e de 17 de Junho de 2008, htpp://www.dgsi.pt.
16
III. O REGIME ACTUAL
O Regime actual da responsabilidade civil extracontratual do Estado e demais
entidades públicas é hoje regulado pela Lei n.º 67/2007, de 31 de Dezembro 38.
Este Regime entrou em vigor em 30 de Janeiro de 2008 e regula os danos decorrentes
do exercício da função administrativa, jurisdicional e político-legislativa, concretizando na
prática o princípio fundamental da responsabilidade do Estado previsto no artigo 22.º da
Constituição 39.
Esta Lei procura dar resposta aos princípios constitucionais com o intuito de adaptar o
regime da responsabilidade civil extracontratual do Estado e demais entidades públicas à
Constituição da República Portuguesa.
Com alterações significativas, o novo Regime revogou40 o Decreto-Lei n.º 48 051, de
21 de Novembro de 1967. Mas ao contrário deste último aplica-se não só ao regime da
responsabilidade por danos decorrentes do exercício da função administrativa, mas também
na relação com outras funções do Estado, pondo termo à querela doutrinária e jurisprudencial
quanto ao âmbito material de aplicação do artigo 22.º da Constituição.
38 Que aprovou, em anexo, o Regime da Responsabilidade Civil Extracontratual do Estado e demais
Entidades Públicas, tendo o n.º 2 do artigo 7.º, por sua vez, sido alterado pela Lei n.º 31/2008, de 17 de Julho. 39 O novo Regime teve como antecedente a Proposta de Lei n.º 95/VIII, aprovada na generalidade, com
o voto favorável de todos os partidos representados na Assembleia da República, em 30 de Novembro de 2001. Foi apresentada juntamente com mais duas Propostas - Propostas de Lei n.º 92/VIII e 93/VIII - que no seu conjunto correspondiam à denominada reforma da justiça administrativa. As duas últimas propostas deram origem ao Código de Processo nos Tribunais Administrativos e ao Estatuto dos Tribunais Administrativos e Ficais, que entraram em vigor no dia 1 de Janeiro de 2004. A nova lei sobre a responsabilidade do Estado e demais entidades públicas só viria a entrar em vigor 4 anos mais tarde.
Na nova legislatura, um grupo de deputados apresentou, em 16 de Outubro de 2002, o Projecto de Lei n.º 148/IX, igual à Proposta de Lei anterior, projecto aprovado na generalidade em Novembro de 2002.
Por outro lado, o Governo apresentou à Assembleia da República em Setembro de 2003 a Proposta de Lei n.º 88/IX, de conteúdo igual, também aprovada na generalidade.
Os referidos projecto e proposta não chegaram a ser votados na especialidade, por motivo da demissão do Governo, com a consequente caducidade das iniciativas legislativas.
A propósito deste processo, João Caupers escreveu o seguinte:” Duas vezes aprovada, na generalidade, na Assembleia da República, por duas vezes sucumbiria ingloriamente em resultado de dissoluções do parlamento. Dizia-se, até, que dava azar aos governos, que não sobreviviam à tentativa de a concretizar.” João Caupers, A responsabilidade do Estado e outros entes públicos, http://www.fd.unl.pt, capítulo VIII, pg. 5.
No entanto, depois de tantos contratempos, foi aprovada em 12 de Outubro de 2007 e promulgada em 10 de Dezembro do mesmo ano, a Proposta de Lei n.º 56/X, subscrita pelo XVII Governo Constitucional, não sem antes ter sido vetada pelo Presidente da República, o que obrigou a Assembleia da República a confirmar o voto por maioria absoluta dos deputados em efectividade de funções.
40 A que se deverá acrescentar o disposto nos artigos 96.º e 97.º da Lei n.º 169/99, de 18 de Setembro, que integravam normas relativas à responsabilidade funcional das autarquias locais e responsabilidade pessoal dos respectivos titulares de órgãos e agentes.
17
João Caupers refere que se trata “de uma importantíssima inovação, tardia, mas
essencial ao aprofundamento da qualidade do Estado de Direito. Não está em causa que as
responsabilidades do Estado-legislador e do Estado-juiz devam ser apuradas mediante a
aplicação de princípios e regras que não são, nem podem ser, totalmente idênticos às do
Estado-administrador. Muito menos se contesta que o apuramento daquelas responsabilidades
se deva necessariamente revestir da mais cuidadosa ponderação, em domínios em que a
imprudência pode ser fatal ao bem que se pretende preservar.” 41
Ora, o que está em causa prende-se com a necessidade de reparar os prejuízos
causados pelo Estado aos particulares, independentemente de quem os pratica, uma vez que
ninguém pode ficar imune a esse dever de reparação 42.
1. Responsabilidade por danos decorrentes do exercício da função
administrativa
A responsabilidade por danos decorrentes do exercício da função administrativa
encontra-se prevista nos artigos 7.º a 11.º do novo regime introduzido pela Lei n.º 67/2007, de
31 de Dezembro, sem prejuízo das disposições gerais previstas nos artigos 1.º a 6.º.
Podemos sistematizar a responsabilidade da função administrativa, individualizando
duas modalidades:
- Responsabilidade por facto ilícito (artigo 7.º a 10.º)
- Responsabilidade pelo risco (artigo11.º)
Para que se efective a responsabilidade da administração por facto ilícito, e a
consequente obrigação de indemnizar, importa a verificação cumulativa de quatro requisitos:
o facto ilícito (acções e omissões), a culpa43, o dano e o nexo de causalidade.
Nos termos deste novo Regime, existe responsabilidade exclusiva do Estado quando o
titular do órgão, funcionário ou agente, através de sua acção ou omissão ilícita, tenha actuado
41 Cfr. João Caupers, A responsabilidade do Estado, cit., pg. 6. 42 Ibidem. 43 A culpa pode revestir a forma de dolo ou negligência (culpa grave ou culpa leve). Nos termos do n.º1
do artigo 8.º da Lei n.º 67/2007, de 31 de Dezembro, há culpa grave quando o titular do órgão, funcionário ou agente tenha actuado com diligência e zelo manifestamente inferiores àqueles a que se encontrava obrigado em razão do cargo. Há culpa leve quando essa actuação tenha sido efectuada com diligência e zelo inferiores, mas não manifestamente inferiores aqueles a que se encontrava obrigado. O artigo 10.º, n.º 1 e 2 do novo Regime estabelece uma presunção de culpa leve na prática de actos jurídicos ilícitos, com vista a facilitar a responsabilização do Estado.
18
no exercício da função administrativa, e por causa desse exercício, com culpa leve,
provocando, desse modo, danos na esfera jurídica do particular (artigo 7.º, n.º1).
A nosso ver, andou bem o legislador em responsabilizar apenas o Estado. Caso
contrário, o funcionário poderia viver sob constante pressão de ser responsabilizado pela sua
actuação, podendo resultar numa baixa produtividade dos serviços44.
Do mesmo modo, existe responsabilidade exclusiva do Estado quando os danos não
tenham resultado do comportamento concreto do titular do órgão, funcionário ou agente, ou
não seja possível provar a respectiva autoria, em virtude de um funcionamento anormal do
serviço (artigo 7.º, n.º 3 e 4)45.
Por outro lado, o Estado é solidariamente responsável para com os titulares dos seus
órgãos, funcionários e agentes, quando estes hajam actuado com dolo ou culpa grave, no
exercício das suas funções e por causa desse exercício (artigo 8.º, n.º2).
De fora da responsabilidade exclusiva ou solidária do Estado ficam unicamente os
actos pessoais cometidos pelos titulares dos órgãos, funcionários ou agentes no exercício das
suas funções, mas não por causa desse exercício.
Estas disposições legais alteraram significativamente o regime da responsabilidade
que se encontrava previsto nos artigos 2.º e 3.º do Decreto-Lei n.º 48 051, de 21 de Novembro
de 1967. Diferentemente do que se encontra agora estipulado, previa-se a situação de o
“funcionário público” ser responsabilizado, pessoal e exclusivamente, no caso de ter excedido
os limites das suas funções46.
Ora, como já referimos, a doutrina pronunciou-se pela inconstitucionalidade
superveniente do artigo 3.º do Decreto-Lei n.º 48 051, de 21 de Novembro de 1967. Assim,
parece que o legislador ao instituir a responsabilidade solidária do Estado para com os
titulares dos órgãos, funcionários ou agentes, teve o cuidado de compatibilizar este Regime
44 No mesmo sentido, Carla Amado Gomes, Três Textos sobre o Novo Regime da Responsabilidade
Civil Extracontratual do Estado e Demais Entidades Públicas, Lisboa, 2008, pg. 35; e Margarida Cortez, Contributo para uma reforma da lei da responsabilidade civil da Administração, Responsabilidade Civil Extra-Contratual do Estado, Trabalhos Preparatórios da Reforma, Gabinete de Politica Legislativa e Planeamento - Ministério da Justiça, Coimbra Editora, 2002, pg. 259.
45 Estamos aqui em presença da chamada culpa do serviço ou falta do serviço, tradução da expressão francesa faute du service, que na definição de Jean Rivero corresponde a um facto “anónimo e colectivo de uma administração em geral mal gerida, de tal modo que é difícil descobrir os seus verdadeiros autores.”, citado por Diogo Freitas do Amaral, Direito Administrativo, III, cit., pg. 503.
46 Refere Carlos Alberto Fernandes Cadilha, que deve entender-se por “actos que tenham excedido o limite das suas funções” não os actos pessoais, mas os actos praticados no exercício das suas funções ou por causa desse exercício, mas que envolvam abuso de autoridade ou excesso de poder, bem como os casos extremos de incompetência ou de desvio de procedimento e em geral os actos dirigidos á satisfação de interesses pessoais. Cfr. Carlos Alberto Fernandes Cadilha Regime da Responsabilidade Civil Extracontratual do Estado e demais Entidades Públicas, Anotado, Coimbra, 2008, pgs. 108 e 109, nota 136.
19
com o disposto no artigo 22.º da Constituição, alargando por essa via a regra da solidariedade
às actuações praticadas com culpa grave. Em consequência, o particular lesado, pode
demandar o Estado ou o, agente ou trabalhador, ou os dois ao mesmo tempo. Se só demandar
o Estado, este terá de exercer o direito de regresso. Note-se, que, ao contrário do regime
anterior, o direito de regresso é obrigatório, e impõe à secretaria do tribunal em que o Estado
tenha sido condenado que remeta certidão da sentença à entidade competente para o exercício
desse direito de regresso (artigo 6.º).
A segunda modalidade da responsabilidade da administração é a responsabilidade pelo
risco, que se encontra prevista no artigo 11.º. Esta afirma que o Estado responde pelos danos
que haja causado aos particulares, no decurso de actividades, coisas ou serviços
administrativos especialmente perigosos, salvo se provar que houve força maior ou concorrer
culpa do lesado. Estamos aqui no âmbito da responsabilidade objectiva na qual o Estado
causa prejuízos aos particulares, independentemente de culpa.
Resulta, do texto da nova lei, claramente, significativas alterações e inovações face ao
regime anterior 47. Desde logo, abandonando a qualificação de excepcional perigosidade da
actividade e funcionamento dos serviços administrativos, substituindo-a pela especial
perigosidade. Em segundo lugar, o novo Regime abandona a qualificação dos prejuízos como
especiais e anormais, deixando assim de estabelecer qualquer limitação indemnizatória.
A este propósito, observa Carla Amado Gomes, que essas alterações introduzidas
consubstanciam um sinal positivo dado pelo legislador ao juiz no sentido da liberalização da
concessão de indemnizações 48.
Todavia, essas alterações podem ter efeitos perversos, uma vez que a lei não enumerou
o que se deva entender por actividade e coisa especialmente perigosa. É que o juiz, habituado
ao regime anterior, bastante restritivo, pode não encontrar na lei qualquer estímulo ou
incentivo que o obrigue a visualizar outras situações possíveis. Ou, inversamente, multiplicar
as situações, com efeitos prejudiciais para o erário público 49.
Por último, o novo Regime introduziu a responsabilidade solidária do Estado e demais
entidades públicas para com terceiro, nas situações em que este tenha uma intervenção
culposa, e, desse modo, concorrido para a produção ou agravamento dos danos50.
47 Artigo 8.º do Decreto-Lei n.º 48 051, de 21 de Novembro de 1967. 48 Cfr. Carla Amado Gomes, Três Textos sobre o Novo Regime, cit., pgs. 84. 49 Idem, pg. 84 e 85. 50 Cfr. artigo 11.º, n.º 2, do regime anexo à Lei n.º 67/2007, de 31 de Dezembro.
20
2. Responsabilidade por danos decorrentes do exercício da função jurisdicional
A responsabilidade por danos decorrentes do exercício da função jurisdicional
encontra-se prevista nos artigos 12.º a 14.º, do Capítulo III, do novo Regime da
responsabilidade civil extracontratual do Estado e demais entidades públicas.
Estamos aqui perante uma grande inovação que concretiza na sua plenitude os
princípios consagrados nos artigos 22.º, 27.º, n.º 5 e 29.º, n.º 6 da Constituição.
No artigo 12.º do novo Regime, sob a epígrafe “regime geral”, consagra-se a
responsabilidade da administração da justiça, nos seguintes termos:
“ Salvo o disposto nos artigos seguintes, é aplicável aos danos ilicitamente causados
pela administração da justiça, designadamente por violação do direito a uma decisão judicial
em prazo razoável, o regime da responsabilidade por factos ilícitos cometidos no exercício da
função administrativa”.
Comentando esta disposição, observa Carlos Fernandes Cadilha que a mesma
estabelece, como princípio geral, a aplicação à responsabilidade por danos causados pela
administração da justiça do regime da responsabilidade por factos ilícitos cometidos no
exercício da função administrativa51. No preceito encontram-se excepcionadas as situações de
responsabilidade por erro judiciário e responsabilidade dos magistrados. Consequentemente, a
norma abrange unicamente situações resultantes do deficiente funcionamento da justiça que
não resultem directamente de actos jurisdicionais em sentido próprio52.
O preceito refere, a título exemplificativo, o caso dos danos provocados pela violação
do direito a uma decisão judicial em prazo razoável. Esse direito encontra-se consagrado no
n.º 4 do artigo 20.º da Constituição e no artigo 6.º da Convenção Europeia dos Direitos do
Homem, à luz do qual o Estado português tem sofrido várias condenações ao longo dos anos.
São vários os factores que podem influenciar a demora de uma decisão judicial. Esta
tanto pode ficar a dever-se à falta de meios ou ao excessivo volume de serviço dos tribunais,
por motivo de deficiências organizativas imputáveis à administração, como ao desleixo ou
negligência dos magistrados, ou às duas causas em simultâneo.
51 Cfr. Carlos Alberto Fernandes Cadilha, Regime da Responsabilidade Civil, Anotado, cit., pgs. 195 e
196. 52 Idem, pg. 197.
21
A definição de prazo razoável varia em função de vários critérios, tendo o Tribunal
Europeu dos Direitos do Homem adoptado, entre outros, os critérios da natureza da jurisdição
em causa, o comportamento das partes e das autoridades competentes, a complexidade da
causa e a actividade dos advogados.
No Acórdão Ruotolo, de 27 de Fevereiro de 1992, ficou decidido que o prazo
razoável consubstancia uma situação de facto, recaindo sobre o Estado requerido o ónus de
provar os motivos justificativos do atraso53.
Além da situação referida, podemos identificar outras enquadráveis na previsão geral
do artigo 12.º, designadamente situações praticadas por quaisquer operadores judiciários
(funcionários judiciais, magistrados do Ministério Público e magistrados judiciais), às quais
se aplica o regime da responsabilidade por danos decorrentes do exercício da função
administrativa. Como exemplos, Carlos Fernandes Cadilha refere, entre outros, os actos de
expediente, situações de incumprimento de prazos, despachos meramente dilatórios, infracção
de regras processuais e deficiente tramitação processual54.
Deste modo, se os operadores judiciários actuarem ilicitamente, com dolo ou culpa
grave, e dessa forma causarem danos a um particular, respondem solidariamente com o
Estado (artigo 8.º, nºs. 1 e 2 da Lei n.º 67/2007, de 31 de Dezembro). Por outro lado, o Estado
responde em exclusivo se a actuação da administração da justiça derivar de culpa leve. Neste
caso o lesado goza da presunção da existência de culpa da administração (artigo 10.º, n.º 2 da
Lei n.º 67/2007, de 31 de Dezembro)55.
Neste sentido, refere Guilherme da Fonseca que: “ (…) a cláusula de remissão implica
que se deva atender às acções ou omissões ilícitas, cometidas com culpa leve, envolvendo só
a responsabilidade exclusiva do Estado (…) sendo que se presume “a existência de culpa leve
na prática de actos jurídicos ilícitos” por aplicação dos artigos 8.º n.º 1 e 2, e 10.º n.º 2 56.”
53 Cfr. Ireneu Cabral Barreto, A Convenção Europeia dos Direitos do Homem Anotada, 3.ª ed., 2005, pgs. 144 e ss..
54 Cfr. Carlos Alberto Fernandes Cadilha, Regime da Responsabilidade Civil, Anotado, cit., pg. 197. 55 Em sentido contrário, Carlos Alberto Fernandes Cadilha refere que: “… não estando especialmente
prevista qualquer presunção de culpa, contrariamente ao que sucede no domínio da responsabilidade pelo exercício da função administrativa, nem sendo aplicável, por remissão, a presunção de culpa a que se referem os nºs 2 e 3 do artigo 10.º - que se reportam a situações não directamente transponíveis para a responsabilidade da função jurisdicional -, a exigência do carácter ilícito da conduta implica que deva ser o lesado a efectuar, nos termos gerais, a prova de culpa.”, Carlos Alberto Fernandes Cadilha, Regime da Responsabilidade Civil, Anotado, cit., pg. 198.
56 Guilherme da Fonseca, A Responsabilidade Civil por Danos Decorrentes do Exercício da Função Jurisdicional, Julgar, n.º5, Maio/Agosto de 2008, pg. 54.
22
A responsabilidade por erro judiciário, encontra-se prevista no artigo 13.º, que dispõe:
“1. Sem prejuízo do regime especial aplicável aos casos de sentença penal
condenatória injusta e de privação injustificada da liberdade, o Estado é civilmente
responsável pelos danos decorrentes de decisões jurisdicionais manifestamente
inconstitucionais ou ilegais ou injustificadas por erro grosseiro na apreciação dos
respectivos pressupostos de facto.
“2. O pedido de indemnização deve ser fundado na prévia revogação da decisão danosa pela jurisdição competente.”
A norma referida abrange a responsabilidade resultante das decisões jurisdicionais
propriamente ditas 57, quando padeçam de uma incorrecta aplicação do direito.
Assim, o n.º 1 começa por ressalvar o regime especial aplicável aos casos de sentença
penal condenatória injusta e de privação injustificada de liberdade.
Relativamente ao primeiro regime especial (regime previsto nos artigos 461.º e 462.º
do Código de Processo Penal), o tribunal de revisão que absolver o arguido/lesado deve fixar
uma indemnização, a pagar pelo Estado, ficando este sub-rogado no direito do arguido contra
os responsáveis pelos factos que tiveram determinado a decisão revista. Isto é, se o juiz tiver
agido com dolo ou culpa grave o Estado goza do direito de regresso contra ele (artigo 14.º nº
2 do Regime actual).
No que concerne à privação da liberdade injustificada, os pressupostos da obrigação
de indemnizar decorrem da verificação das seguintes circunstâncias: ter sido ilegal (prisão ou
detenção), a mesma ser devida a erro grosseiro na apreciação dos pressupostos de facto de que
dependia e se ter comprovado que o arguido não foi agente do crime ou actuou
justificadamente. Se o arguido tiver concorrido com dolo ou negligência para a privação da
sua liberdade, o dever de indemnizar cessa (regime previsto no artigo 225.º do Código de
Processo Penal)58.
Por outro lado, a 2.ª parte do n.º 1 do artigo 13.º prevê expressamente que para haver
responsabilidade pelos danos resultantes de decisões jurisdicionais estas deverão decorrer de
57 Cfr. Carlos Alberto Fernandes Cadilha, Regime da Responsabilidade Civil, Anotado, cit., pg. 203. 58 O Tribunal Constitucional, no Acórdão n.º 12/2005, de 12 de Janeiro, publicado no Diário da
República, II Série, n.º 122, de 28 de Junho de 2005, declarou não ser inconstitucional o artigo 225º, nº 2, do Código de Processo Penal na parte em que fazia depender a indemnização por “prisão preventiva que, não sendo ilegal, vinha a revelar-se injustificada” da existência de um “erro grosseiro na apreciação dos pressupostos de facto de que dependia.”
23
“erro manifesto de apreciação” de que resulte inconstitucionalidade ou ilegalidade ou
injustificadas por “erro grosseiro” na apreciação dos respectivos pressupostos de facto.
A este propósito, observa Salvador da Costa que o advérbio de modo
“manifestamente” não se aplica às decisões jurisdicionais injustificadas por erro grosseiro na
apreciação dos respectivos pressupostos de facto, argumentando que a expressão manifesta
deriva do verbo manifestar, com raiz no latim manifestare, com o sentido de declarar ou
revelar, e do modo como se encontra expressa na lei com função de adjectivo, que significa o
que é evidente ou inequívoco. E conclui que a lei delimita genericamente o erro judiciário no
chamado critério da evidência, que já era seguido pela jurisprudência59.
Por outro lado, Guilherme da Fonseca é de parecer que o advérbio “manifestamente”
qualifica quer as decisões de que resulte inconstitucionalidade ou ilegalidade, quer as
injustificadas por erro grosseiro.60
Assim, os juízes não podem através das suas decisões jurisdicionais violar de forma
clara e inequívoca a lei ou a Constituição, sob pena de o Estado ser responsabilizado.
E se a decisão jurisdicional violar o direito comunitário?
Nessa situação nada obsta a que o erro judiciário resulte de indevida interpretação e ou
aplicação do direito comunitário61. Além de que, o ordenamento jurídico português não pode
ignorar a jurisprudência do Tribunal de Justiça. Este último, no acórdão Klöber, considerou
ser o Estado responsável por facto da função jurisdicional que viole o direito comunitário 62.
Um outro pressuposto da obrigação de indemnizar por parte do Estado resulta da
prolação de decisões jurisdicionais injustificadas por erro grosseiro na apreciação dos
respectivos pressupostos de facto. A este propósito, refere Carlos Fernandes Cadilha, que se
trata de um erro sobre a matéria de facto, que tanto poderá respeitar a um erro na apreciação
das provas como a um erro sobre a fixação dos factos materiais da causa63.
Por fim, no n.º 2 do artigo 13.º, prevê-se como pressuposto processual para que ocorra
responsabilidade pelo exercício da função jurisdicional que a decisão danosa seja previamente
revogada pela jurisdição competente, isto é, o particular terá que recorrer da decisão ferida de
erro judiciário e só requerer a indemnização contra o Estado se o tribunal de recurso revogar a
decisão do tribunal a quo.
59 Cfr. Salvador da Costa, Carreira dos Juízes, cit., pg.18. 60 Guilherme da Fonseca, A Responsabilidade Civil, cit., pg. 68. 61 Cfr. Carla Amado Gomes, Três Textos sobre o Novo Regime, cit., pgs. 115 e ss. e Carlos Alberto
Fernandes Cadilha, Regime da Responsabilidade Civil, Anotado, cit., pg. 214. 62 Acórdão de 30 de Setembro de 2003, processo n.º C-224/01, http://eur-lex.europa.eu. 63 Cfr. Carlos Alberto Fernandes Cadilha, Regime da Responsabilidade Civil, Anotado, cit., pg. 214.
24
Não obstante, existem situações em que o particular não poderá recorrer, por a lei o
não prever, como sejam, decisões proferidas em última instância de recurso ou por razões de
alçada64. Parece-nos que o legislador quis limitar aqui o direito à indemnização, com o
argumento de que os juízes são independentes e apenas sujeitos à lei, prevenindo a
banalização das acções de responsabilidade contra o Estado com fundamento em erro
judiciário. Os juízes poderiam, justificadamente, ter receio de errar, com as devidas
consequências para o sistema judiciário.
Por último, sob a epígrafe “Responsabilidade dos magistrados”, dispõe o artigo 14.º o
seguinte:
“1. Sem prejuízo da responsabilidade criminal em que possam incorrer, os
magistrados judiciais e do Ministério Público não podem ser directamente responsabilizados
pelos danos decorrentes dos actos que pratiquem no exercício das respectivas funções, mas,
quando tenham agido com dolo ou culpa grave, o Estado goza do direito de regresso conta
eles.
“2. A decisão de exercer o direito de regresso sobre os magistrados cabe ao órgão
competente para o exercício do poder disciplinar, a título oficioso ou por iniciativa do
Ministro da Justiça.”
Retira-se da análise deste preceito o princípio constitucional, já anteriormente referido,
de que os juízes não podem ser directamente responsabilizados pelas suas decisões, salvas as
excepções consignadas na lei 65.
Todavia, se actuarem no exercício das suas funções com dolo ou culpa grave,
encontram-se sujeitos ao exercício do direito de regresso por parte do Estado. O mesmo se
diga em relação aos magistrados do Ministério Público, por actos ou omissões resultantes do
exercício da acção penal.
Consequentemente, esta norma introduz um desvio ao regime da responsabilidade
civil por danos decorrentes do exercício da actividade administrativa, no qual, havendo dolo
ou culpa grave, os funcionários públicos respondem solidariamente com o Estado.
64 Embora subsista o recurso para o Tribunal Constitucional, nos termos do artigo 70.º da Lei n.º 28/82, de 15 de Novembro (Organização, funcionamento e processo do Tribunal Constitucional), em processo de fiscalização concreta da constitucionalidade e da legalidade.
65 Artigo 216, n.º 2 da CRP.
25
O direito de regresso, não constitui novidade, uma vez que já assim dispunham os
Estatutos dos Magistrados Judiciais e do Ministério Público.
De referir que, consoante os casos, cabe ao Conselho Superior da Magistratura, ao
Conselho Superior dos Tribunais Administrativos e Fiscais e ao Conselho Superior do
Ministério Público, a decisão de exercer o direito de regresso, sendo igualmente atribuída a
iniciativa ao Ministro da Justiça.
Na opinião de Matos Fernandes, a intervenção por parte do Ministro da Justiça é
susceptível de ser vista como uma intromissão nas competências dos órgãos dos Conselhos
Superiores66.
Somos da opinião que se trata mais de um privilégio do que de uma intromissão, uma
vez que em relação aos funcionários púbicos, como já se referiu, o direito de regresso é
obrigatório. Em relação aos magistrados o direito de regresso encontra-se dependente da
vontade dos Conselhos Superiores ou do Ministro da Justiça. Pelo que se sabe nunca o Estado
exerceu o direito de regresso.
Note-se que, não podendo os magistrados ser directamente demandados pelos
particulares, as sentenças em que o Estado for condenado não importam caso julgado para os
magistrados, já que estes não foram chamados ao processo para deduzir oposição.
Consequentemente, o Estado terá que intentar a respectiva acção de regresso contra o
magistrado, podendo este defender-se com todos os meios legais à sua disposição67.
Por último, faltará referir a ressalva constante do n.º 1 do artigo 14.º quanto aos casos
de responsabilidade criminal. Isto é, casos em que os magistrados no exercício das suas
funções, tenham praticado algum crime, e, em consequência, causem danos aos particulares.
Estamos aqui no âmbito dos crimes contra a administração da justiça, previstos no Código
Penal, nos quais se incluem os crimes de suborno (artigo 336.º), favorecimento pessoal (artigo
367.º), denegação da justiça e prevaricação (artigo 369.º), violação do segredo de justiça
(artigo 371.º), corrupção (artigos 372.º a 374.º) e peculato (artigo 377.º). Assim, se os
magistrados praticarem algum destes crimes podem ser directamente responsabilizados pelos
lesados, em pedido de indemnização civil deduzido no próprio processo-crime ou em
processo civil autónomo 68.
66 Cfr. Matos Fernandes, Apontamentos sobre a Responsabilidade Civil por Danos Decorrentes do
Exercício da Função Jurisdicional, Curso de preparação para o CEJ, da Universidade Portucalense, 2008, pg. 7. 67 A acção de indemnização contra magistrados encontra-se regulada em processo especial, previsto nos
artigos 1083.º e ss. do Código de Processo Civil. 68 Cfr. artigos 71.º e 72.º do Código de Processo Penal.
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3. Responsabilidade por danos decorrentes do exercício da função político-
legislativa
A responsabilidade por danos decorrentes do exercício da função político-legislativa,
encontra-se prevista no artigo 15.º, do Capítulo IV, do novo Regime.
Esta norma deve ser conjugada com os artigos 22.º (responsabilidade das entidades
públicas), 117.º (responsabilidade dos titulares de cargos políticos) e 157.º (responsabilidade
dos deputados) da Constituição.
Preceitua o n.º 1 do artigo 15.º, da Lei em análise, o seguinte;
“O Estado e as regiões autónomas são civilmente responsáveis pelos danos anormais
causados aos direitos ou interesses legalmente protegidos dos cidadãos por actos que, no
exercício da função político-legislativa, pratiquem, em desconformidade com a Constituição,
o direito internacional, o direito comunitário ou acto legislativo de valor reforçado.”
Antes de mais, importa questionar quem são as entidades que praticam actos no
exercício da função política-legislativa.
Ora, nos termos dos artigos 161.º, 164.º e 165.º da Constituição, a Assembleia da
República tem competência política e legislativa.
Por outro lado, nos termos dos artigos 182.º, 197.º e 198.º da Constituição, o Governo
é o órgão de condução da política geral do país 69, e tem competência legislativa quer em
matérias não reservadas à Assembleia da República, quer em matérias de reserva relativa
mediante autorização desta.
Por último, nos termos dos artigos 225.º a 234.º da Constituição, as Regiões
Autónomas (Assembleias Legislativas Regionais), têm também competência política e
legislativa, relacionadas com matérias específicas das regiões.
Assim, são estas as entidades que actuam no exercício da função político-legislativa.
Por conseguinte, o preceito em análise abrange os actos praticados pela Assembleia da
República, Governo e Assembleias Legislativas Regionais que, no exercício das suas funções,
causem danos anormais aos cidadãos, em virtude da sua desconformidade com a Constituição,
o direito internacional, o direito comunitário ou acto legislativo de valor reforçado.
69 Cfr. artigo 182.º da CRP.
27
Segundo Marcelo Rebelo de Sousa, a função legislativa possui um conteúdo político,
visto que os actos políticos “exprimem opções sobre a definição e prossecução dos interesses
essenciais da colectividade”70, e operam “sobretudo de forma indirecta, por intermédio dos
actos legislativos”71. Só assim se compreende que o preceito em análise se refira ao “conceito
unitário de função político-legislativa.” 72
A responsabilidade do Estado por facto da função legislativa tem como pressupostos
da obrigação de indemnizar o facto ilícito (acção ou omissão legislativa), a culpa, o dano e o
nexo de causalidade entre o facto e o dano.
O facto ilícito traduz-se na violação de direitos ou interesses legalmente protegidos
dos cidadãos, resultante de um acto legislativo desconforme com uma norma de valor
hierárquico superior, sejam normas constitucionais, internacionais (v.g., Tratados,
Convenções, Direito Comunitário) ou de valor reforçado73.
Por outro lado, o facto ilícito pode resultar da omissão de providências legislativas
necessárias para tornar exequíveis normas constitucionais, dependendo, neste caso, da prévia
verificação de inconstitucionalidade por parte do Tribunal Constitucional74.
A propósito do ilícito legislativo violador do direito comunitário, há que referenciar a
jurisprudência do Tribunal de Justiça da União Europeia.
Assim, tanto o acórdão Francovich75 como o acórdão Brasserie du pêcheur/
Factortame76, representaram quer uma grande evolução para o direito comunitário quer para a
responsabilidade dos Estados por danos resultantes da função legislativa 77.
O primeiro dos acórdãos fixou a responsabilidade de um Estado-membro pela não
transposição de uma directiva da qual resulte, segundo o Tribunal de Justiça, “(…) prejuízos
causados aos particulares pelas violações do direito comunitário que lhes sejam imputáveis”.
70 Marcelo Rebelo de Sousa, Lições de Direito Administrativo, vol. I, Lisboa, 1999, pg. 8. 71 Cfr. Carlos Alberto Fernandes Cadilha, Regime da Responsabilidade Civil, Anotado, cit., pg. 241. 72 Idem, pg. 242. Sobre a equiparação do acto político individual ao acto normativo, para efeito do
controlo de constitucionalidade pelo Tribunal Constitucional, ver Cristina Queiroz, Os Actos Políticos no Estado de Direito: o problema do controlo jurídico do poder, Coimbra, Almedina, 1990, pg. 189.
73 Cfr. Carlos Alberto Fernandes Cadilha, Regime da Responsabilidade Civil, Anotado, cit., pgs. 248 e 249.
74 Cfr. artigo 15.º n.º 3 e 5 do Regime actual, que concretiza o princípio da responsabilidade do Estado não só por acções, mas também por omissões, consagrado no artigo 22.º da Constituição. Neste caso, o lesado só poderá interpor a acção de responsabilidade por facto da função legislativa nos tribunais administrativos, se anteriormente alguma das entidades referidas no artigo 283.º da Constituição requererem ao Tribunal Constitucional a verificação de inconstitucionalidade por omissão, tendo o Tribunal anteriormente se pronunciado em sentido afirmativo.
75 Processos apensos C-6/90 e C-9/90, in: http://eur-lex.europa.eu. 76 Processos apensos C-46/93 e C-48/93, in: http://eur-lex.europa.eu. 77 Cfr. Rui Medeiros, A responsabilidade civil pelo ilícito legislativo, cit., pg. 199.
28
Já o segundo acórdão, mais relevante para o tema em questão, diz respeito à violação
por parte de um Estado-membro de disposições comunitárias directamente aplicáveis. Tendo
o Tribunal de Justiça afirmado que, mesmo nos casos de os Estados-membros gozarem uma
larga margem de apreciação para a implementação de escolhas normativas, comparável às
instituições comunitárias, é de admitir a responsabilidade do Estado-Legislador pela violação
do direito comunitário78.
Prosseguindo a análise do artigo 15.º do Regime actual, o n.º 2 preceitua o seguinte:
“A decisão do tribunal que se pronuncie sobre a inconstitucionalidade ou ilegalidade
de norma jurídica ou sobre a sua desconformidade com convenção internacional, para
efeitos do número anterior, equivale, para os devidos efeitos legais, a decisão de recusa de
aplicação ou a decisão de aplicação de norma cuja inconstitucionalidade, ilegalidade ou
desconformidade com convenção internacional haja sido suscitada durante o processo,
consoante o caso.”
Do preceito retira-se que o lesado poderá interpor uma acção de responsabilidade civil
contra o Estado por danos decorrentes do exercício da função legislativa, directamente nos
tribunais administrativos79, não necessitando de previamente a norma ser declarada
inconstitucional ou ilegal pelo Tribunal Constitucional80. Claro que, da decisão do tribunal
administrativo cabe recurso para o Tribunal Constitucional, nos termos do artigo 280.º da
Constituição e 70.º, n.º 1 da Lei do Tribunal Constitucional.
Isto, sem prejuízo, de previamente o Tribunal Constitucional declarar a norma
inconstitucional ou ilegal com força obrigatória geral81, e posteriormente o lesado interpor a
acção de responsabilidade contra o Estado pelo ilícito legislativo no tribunal administrativo.
78 Idem, pg. 200. 79 São competentes os tribunais administrativos, nos termos do artigo 15.º, n.º 2 do Regime em anexo à
Lei n.º 67/2007, de 31 de Dezembro, do artigo 4.º, n.º 1, al. g), do Estatuto dos Tribunais Administrativos e Fiscais e artigo 37.º, n.º 2 al. f) do Código de Processo nos Tribunais Administrativos.
80 A propósito da jurisdição competente, Carla Amado Gomes refere, criticamente, que, com a reforma da justiça administrativa, nomeadamente do Estatuto dos Tribunais Administrativos e Fiscais, os tribunais administrativos além de julgarem as causas de Direito Administrativo, se apresentam como “foro comum do contencioso jurídico-público, abarcando toda a competência de apreciação de litígios que envolvam entidades que prossigam funções de natureza pública, independentemente do direito que apliquem, desde que não se encontrem, expressa e fundamentadamente afectos a outros tribunais (Tribunal de Contas, Tribunal Constitucional).” Carla Amado Gomes, Três Textos sobre o Novo Regime, cit., pgs. 96 e 97.
81 Nos termos do artigo 281.º da Constituição, o Tribunal Constitucional, no âmbito da fiscalização abstracta sucessiva da constitucionalidade e da legalidade, aprecia e declara, com força obrigatória geral, a inconstitucionalidade e ilegalidade de normas a pedido de diferentes entidades aí referenciadas.
29
Antes da entrada em vigor do novo Regime, Maria Lúcia Amaral contrariamente ao
entendimento da doutrina maioritária, rejeitava a possibilidade do lesado poder intentar uma
acção de responsabilidade por factos ilícitos do legislador, uma vez que estaríamos a admitir
um controlo atípico da constitucionalidade, contrariando, deste modo, o disposto nos artigos
277.º a 283.º da Constituição 82.
Por outro lado, refere Carla Amado Gomes, que o preceito, não prevê um novo recurso
de inconstitucionalidade, mas tão só “(a) propositura de acção administrativa comum na qual
se deduz um pedido de simples apreciação com vista ao reconhecimento de uma pretensão,
filiada em normas ou princípios jurídico-administrativos, cuja existência (ou exercício) se
encontra perturbada por norma alegadamente inconstitucional/ilegal, cumulado com um
pedido indemnizatório, subsidiário.”83
No n.º 4 do artigo 15.º do Regime actual, o legislador afastou o conceito tradicional de
culpa, tal como se encontra previsto no artigo 497.º do Código Civil, uma vez que o mesmo
“se coaduna mal com a liberdade de conformação inerente à função política e com o
contraditório inerente ao pluralismo parlamentar.” 84
Assim, além da “diligência e aptidão que seja razoável exigir”85 ao autor do ilícito,
“atendendo às circunstâncias concretas de cada caso” 86, o legislador introduziu alguns
critérios não taxativos para a apreciação da existência e da extensão da responsabilidade,
como sejam, o “grau de clareza e precisão da norma violada”, o “tipo de
inconstitucionalidade” e “o facto de terem sido adoptadas ou omitidas diligências
susceptíveis de evitar a situação de ilicitude.”
Por conseguinte, não basta a existência de um ilícito legislativo para haver
responsabilidade por facto da função legislativa. É preciso também haver nexo de causalidade
82
Refere Maria Lúcia Amaral que: “a ser consagrada e regulada por lei este novo tipo de responsabilidade estadual, ela não deverá ser mais do que uma responsabilidade subsidiária, a ser desencadeada por acções de indemnização intentadas por particulares depois de ter sido proferida, pelo Tribunal Constitucional, sentença de inconstitucionalidade da lei com força obrigatória geral; e responsabilidade que se destina ainda a ressarcir apenas aqueles prejuízos que tenham sido sentidos pelos privados durante o período de tempo que mediou entre a entrada em vigor da lei inconstitucional e a declaração da sua inconstitucionalidade e que a eficácia retroactiva da mesma declaração não tenha podido, por si só, eliminar.” Maria Lúcia Amaral, A responsabilidade do Estado-legislador: Reflexões sobre uma reforma, Responsabilidade Civil Extra-Contratual do Estado, Trabalhos preparatórios da Reforma, Gabinete de Politica Legislativa e Planeamento - Ministério da Justiça, Coimbra Editora, 2002, pgs. 217 e 218. Ver da mesma Autora, Responsabilidade do Estado e dever de indemnizar do legislador, Coimbra Editora, 1998, pgs. 419 a 467.
83 Cfr. Carla Amado Gomes, Três Textos sobre o Novo Regime, cit., pgs. 125 e 126. 84 Cfr. Proposta de Lei n.º 95/VIII - Exposição de Motivos, in: Responsabilidade Civil Extra-Contratual
do Estado, Trabalhos Preparatórios da Reforma, Gabinete de Politica Legislativa e Planeamento - Ministério da Justiça, Coimbra Editora, 2002, pg. 15.
85 Cfr. artigo 10.º, n.º 1 do novo Regime. 86 Cfr. artigo 15.º, n.º 4 do novo Regime.
30
entre o facto ilícito legislativo e os danos anormais sofridos pelo lesado e aferir o grau de
culpa do autor da lesão.
Por último, o n.º 6 do artigo 15.º prevê a redução equitativa do montante da
indemnização, em virtude de razões de interesse público de excepcional relevo, quando os
lesados forem em grande número. Exemplo disso são os “processos em massa”, previstos no
artigo 48.º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos, que normalmente dizem
respeito a litígios entre a função pública e o Estado. O fundamento desta redução está
claramente relacionado com questões de tesouraria do Estado, pois só estas assumem o
“excepcional relevo”, caso contrário, punha-se em causa o direito à indemnização por parte do
lesado. Note-se que a Constituição contém idêntica solução no artigo 282.º, n.º 4, onde o
Tribunal Constitucional pode fixar os efeitos da declaração de inconstitucionalidade ou
ilegalidade com alcance mais restrito, por razões de segurança jurídica, de equidade ou
interesse público de excepcional relevo, devidamente fundamentadas.
4. Indemnização pelo sacrifício
Por último, impõe-se uma breve referência ao instituto da indemnização pelo
sacrifício, que a Lei n.º67/2007, de 31 de Dezembro, resolveu autonomizar em relação à
responsabilidade da função administrativa.
A indemnização pelo sacrifício corresponde ao que o regime anterior designava por
responsabilidade por facto lícito87, e encontra-se prevista no artigo 16.º do novo Regime.
Consiste esta numa indemnização aos particulares, como consequência da imposição de
encargos ou danos especiais e anormais, por parte do Estado, na prossecução do interesse
público.
O legislador ao autonomizar este instituto quis abarcar não apenas, como no regime
anterior, a função administrativa, mas toda e qualquer função do Estado. Nesse sentido, refere
Maria José Rangel de Mesquita, que: “A indemnização aos particulares pelo sacrifício
reporta-se à imposição de encargos ou danos especiais e anormais causados por razões de
interesse público e independentemente da função do Estado em causa.88”
Do mesmo modo, o legislador autonomizou o instituto da indemnização pelo sacrifício
no direito processual ao prever no artigo 37.º do Código de Processo nos Tribunais
87 Artigo n.º 9 do Decreto-Lei n.º 48 051, de 21 de Novembro de 1967. 88 Cfr. Maria José Rangel de Mesquita, O Regime da Responsabilidade Civil Extracontratual do Estado
e Demais Entidades Públicas e o Direito da União Europeia, Almedina, 2009, pg. 25.
31
Administrativos – Acção Administrativa Comum – tanto a acção de responsabilidade civil das
pessoas colectivas89 como a acção de condenação ao pagamento de indemnizações
decorrentes da imposição de sacrifícios por razões de interesse público90. Só assim se
compreende a opção do legislador em inserir o instituto num capítulo autónomo do Regime
actual para claramente o distinguir relativamente às outras formas de responsabilidade do
Estado.
89 Cfr. artigo 37.º, n.º 2 alínea f) do Código de Processo nos Tribunais Administrativos. 90 Cfr. artigo 37.º, n.º 2 alínea g) do Código de Processo nos Tribunais Administrativos.
32
CONCLUSÕES
Antes do estabelecimento do Estado de Direito Democrático e Constitucional vigorava
o princípio da irresponsabilidade civil do Estado. O Estado era uma entidade soberana,
autónoma e exclusiva que não necessitava de responder pelos erros dos seus órgãos,
funcionários ou agentes.
Com a Constituição de 1976 consagrou-se, no artigo 22.º, sob a epígrafe
“ responsabilidade das entidades públicas”, o princípio fundamental de responsabilidade civil
extracontratual do Estado e demais entidades públicas.
Contudo, só com a entrada em vigor da Lei n.º 67/2007, de 31 de Dezembro, é que se
concretizou, na prática, o princípio fundamental da responsabilidade do Estado previsto no
artigo 22.º da Constituição.
Com alterações significativas, o novo Regime jurídico revogou o desactualizado
Decreto-Lei n.º 48 051, de 21 de Novembro de 1967. Mas ao contrário deste último aplica-se
não só ao regime da responsabilidade civil por danos decorrentes do exercício da função
administrativa, mas também em relação ao regime da responsabilidade civil por danos
decorrentes do exercício da função jurisdicional e da função político-legislativa.
Relativamente à responsabilidade por danos decorrentes do exercício da função
administrativa, o novo Regime alterou significativamente os artigos 2.º e 3.º do Decreto-Lei
n.º 48 051, de 21 de Novembro de 1967. Diferentemente do que se encontra agora estipulado,
previa-se a situação de o “funcionário público” ser responsabilizado, pessoal e
exclusivamente, no caso de ter excedido os limites das suas funções.
Deste modo, o legislador ao instituir a responsabilidade solidária do Estado para com
os titulares dos órgãos, funcionários ou agentes, teve o cuidado de compatibilizar o novo
Regime com o disposto no artigo 22.º da Constituição, alargando por essa via a regra da
solidariedade às actuações praticadas com culpa grave.
Relativamente à responsabilidade por danos decorrentes do exercício da função
jurisdicional, o novo Regime introduziu inovações relevantes que concretizaram na sua
plenitude os princípios consagrados nos artigos 22.º, 27.º, n.º 5 e 29.º, n.º 6 da Constituição.
Em primeiro, o novo Regime estabeleceu como princípio geral a aplicação à
responsabilidade por danos causados pela administração da justiça do regime da
responsabilidade por factos ilícitos cometidos no exercício da função administrativa.
33
Em segundo, o novo Regime prevê expressamente que para haver responsabilidade
pelos danos resultantes de decisões jurisdicionais estas deverão decorrer de erro manifesto de
apreciação de que resulte inconstitucionalidade ou ilegalidade ou injustificadas por erro
grosseiro na apreciação dos respectivos pressupostos de facto.
No entanto, pergunta-se se não seria mais importante um maior rigor no recrutamento
e formação dos magistrados, do que o aumento da sua responsabilização.
Aliás, parece-nos que o legislador quis limitar o direito à indemnização, com o
argumento de que os juízes são independentes, e se encontram apenas sujeitos à lei,
prevenindo a banalização das acções de responsabilidade contra o Estado com fundamento em
erro judiciário.
Relativamente à responsabilidade por danos decorrentes do exercício da função
político-legislativa, o novo Regime também introduziu grandes novidades.
O lesado poderá interpor uma acção de responsabilidade civil contra o Estado por
danos decorrentes do exercício da função legislativa, directamente nos tribunais
administrativos, não necessitando de previamente a norma ser declarada inconstitucional ou
ilegal pelo Tribunal Constitucional.
Por outro lado, além da diligência e aptidão que seja razoável exigir ao autor do ilícito,
atendendo às circunstâncias concretas de cada caso, o legislador introduziu alguns critérios
não taxativos para a apreciação da existência e da extensão da responsabilidade, como sejam,
o grau de clareza e precisão da norma violada, o tipo de inconstitucionalidade e o facto de
terem sido adoptadas ou omitidas diligências susceptíveis de evitar a situação de ilicitude.
O novo Regime prevê ainda a redução equitativa do montante da indemnização, em
virtude de razões de interesse público de excepcional relevo, quando os lesados forem em
grande número.
Por fim, o novo Regime autonomizou o instituto da indemnização pelo sacrifício, face
à responsabilidade da função administrativa.
O legislador ao autonomizar este instituto quis abarcar não apenas, como no regime
anterior, a função administrativa, mas toda e qualquer função do Estado.
Assim, em jeito de conclusão, só nos resta esperar que o novo Regime consiga dar
uma resposta mais eficaz a todos os problemas suscitados pela actuação “irresponsável” do
Estado. Todavia, os seus resultados são uma incógnita a que só o futuro poderá responder.
34
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38
ÍNDICE
RESUMO ................................................................................................................................ III
ABSTRACT ............................................................................................................................. IV
NOTA PRÉVIA ....................................................................................................................... VI
INTRODUÇÃO ......................................................................................................................... 1
I - EVOLUÇÃO HISTÓRICA DA RESPONSABILIDADE CIVIL EXTRACONTRATUAL
DO ESTADO ............................................................................................................................ 3
1. Da Constituição de 1822 à Constituição de 1976 ............................................................. 3
2. O Decreto-Lei n.º 48 051, de 21 de Novembro de 1967 .................................................. 5
2.1. Responsabilidade por facto ilícito culposo .................................................................. 6
2.2. Responsabilidade administrativa ................................................................................. 8
II - A CONSTITUIÇÃO DE 1976 ........................................................................................... 10
1. Responsabilidade das entidades públicas ....................................................................... 10
2. Responsabilidade da função jurisdicional ...................................................................... 12
III - O REGIME ACTUAL ..................................................................................................... 16
1. Responsabilidade por danos decorrentes do exercício da função administrativa ........... 17
2. Responsabilidade por danos decorrentes do exercício da função jurisdicional .............. 20
3. Responsabilidade por danos decorrentes do exercício da função político-legislativa .... 26
4. Indemnização pelo sacrifício .......................................................................................... 30
CONCLUSÕES ........................................................................................................................ 32
BIBLIOGRAFIA ...................................................................................................................... 34