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Universidade de Lisboa
IGOT ‐ Instituto de Geografia e Ordenamento do Território
ANÁLISE MORFOMÉTRICA DAS REDES DE POLÍGONOS EM
PERMAFROST ‐ ADVENTDALEN, SVALBARD
José Miguel Martins Alpendre Cardoso
Dissertação
Mestrado em Sistemas de Informação Geográfica e Modelação Territorial Aplicados ao Ordenamento
2014
Universidade de Lisboa
IGOT ‐ Instituto de Geografia e Ordenamento do Território
ANÁLISE MORFOMÉTRICA DAS REDES DE POLÍGONOS EM
PERMAFROST ‐ ADVENTDALEN, SVALBARD
José Miguel Martins Alpendre Cardoso
Dissertação
Mestrado em Sistemas de Informação Geográfica e Modelação Territorial Aplicados ao Ordenamento
Orientadores:
Professor Doutor Gonçalo Brito Guapo Teles Vieira Doutor Pedro Miguel Berardo Duarte Pina
2014
i
Agradecimentos
Aos meus orientadores:
Ao Professor Doutor Gonçalo Vieira, pelo incentivo e confiança depositada em mim. E pelo
enorme contributo na realização da tese, do princípio ao fim.
Ao Doutor Pedro Pina, pelo apoio, disponibilidade, pelos conhecimentos transmitidos e por ter
acreditado sempre em mim.
Aos meus colegas do AntECC, pela companhia e convivência, e por todo o apoio demonstrado.
À Maura, pela contribuição com dados de base ao trabalho e pela companhia na campanha de
campo em Svalbard.
À Professora Doutora Hanne Hvidtfeldt Christiansen da UNIS ‐ The University Centre in
Svalbard, pelo apoio prestado na campanha de campo em Svalbard. O apoio logístico da UNIS,
como instituição acolhedora, foi fundamental para a realização das campanhas de campo.
A todos os amigos e família, de alguma forma, contribuíram para a realização deste trabalho,
pela amizade e incentivo. Um obrigado especial à amiga Rita pela ajuda preciosa!
Aos meus pais e à minha irmã que sempre me apoiaram e se orgulham de mim.
À Sara por ter estado sempre ao meu lado. Por ter‐me dado forças para levantar a cabeça nas
horas difíceis quando pensava que já não as tinha. Por tudo o que partilhámos e deixámos de
fazer, para que este trabalho fosse realidade.
Este trabalho teve o apoio da Fundação para a Ciência e a Tecnologia no âmbito do projecto
ANAPOLIS ‐ Análise de terrenos poligonais em Marte com base em análogos terrestres
(PTDC/CTE‐SPA/099041/2008). A campanha de campo em Adventdalen foi possível graças à
bolsa de estudos Arctic Field Grant, financiada pelo Svalbard Science Forum (SSF).
ii
Resumo
O permafrost dá origem a formas de relevo complexas e únicas, sendo os polígonos de
cunha de gelo o acidente geográfico mais amplo, mais visível e mais característico das planícies
com permafrost. Os polígonos são formados pela abertura de fracturas verticais por
contracção térmica, permitindo a infiltração de água de fusão e a sua posterior recongelação
no interior das fendas. Este fenómeno, que se repete em ciclos sazonais de
congelamento/descongelamento ao longo dos anos, levando ao incremento de cunhas de gelo
no interior das fracturas e ao desenvolvimento de redes de polígonos. A morfologia dos
polígonos de cunha de gelo é controlada, por vários factores ambientais, que determinam as
suas dimensões, forma e orientação, bem como pelo tempo desde o qual estes factores estão
activos.
Este estudo foi realizado nas redes poligonais do vale Adventdalen em Svalbard.
Parâmetros morfométricos das redes foram calculados para mais de 10.000 polígonos
identificados através de detecção remota em imagens de alta resolução (quatro bandas RGB +
NIR com 0,2 m / pixel). Paralelamente, várias destas áreas de polígonos foram estudadas in situ
em 2010, 2011 e 2012. Os parâmetros morfométricos e topológicos das redes foram
caracterizados e foram utilizadas análises estatísticas multivariadas (análise factorial,
classificação hierárquica e análise discriminante) para os classificar e identificar sua relação
com factores ambientais locais. Com base na similaridade morfométrica (dimensão, forma e
topologia) foram identificados seis grandes grupos de polígonos. A sua distribuição espacial em
Adventdalen, no que respeita à morfometria geral, indica uma diferenciação de Oeste para
Este. Os grupos localizados na parte ocidental do vale têm uma maior assimetria no tamanho
do polígono, enquanto mais a Este foi encontrada uma distribuição mais uniforme da área
média do polígono, bem como maiores dimensões globais dos polígonos.
A diferenciação espacial identificada sugere um controlo espacial na morfometria dos
polígonos, provavelmente influenciado por variáveis geoecológicas, que podem afectar o
crescimento e a forma dos polígonos. Os resultados da análise discriminante mostram que os
factores geoecológicos (e.g. geologia, geomorfologia, declividade, índice de umidade, distância
ao rio/mar) contribuem para classificar com sucesso mais de 80% dos polígonos dentro dos
seis principais grupos morfométricos.
Palavras‐chave: Permafrost; polígonos de cunha de gelo; redes poligonais; parâmetros
morfométricos; Adventdalen; Svalbard.
iii
Abstract
Permafrost gives rise to a number of unique and complex landforms, being ice‐wedge
polygons the most widespread, most visible, and most characteristic landform of lowland
permafrost terrain. The polygons are formed by the opening of vertical fractures by thermal
contraction, allowing the infiltration of melted water and its subsequent refreezing inside the
cracks. This phenomenon, which is repeated in seasonal cycles of freeze‐thaw over the years,
leads to increasing ice‐wedges within the fractures and the development of polygons
networks. The morphology of the ice‐wedge polygons is controlled by various environmental
factors which determine dimensions, shape, and orientation of polygons, as well as by the time
those factors have been active.
This study was conducted on the polygonal networks of Adventdalen in Svalbard.
Morphometrical parameters of the polygonal network were calculated for over 10,000
polygons identified using very‐high spatial resolution remote sensing imagery (four‐bands
RGB+NIR with 0.2 m/pixel). Several polygon areas were studied in the field in 2010, 2011 and
2012. Multivariate statistics (factor analysis, hierarchical classification and discriminant
analysis) were used to describe the polygon's morphometric parameters, and to determine
their relationship to local environmental controlling factors. Based on the morphometric
similarity (dimension, shape and topology) 6 major groups of polygons were identified. Their
spatial distribution in Adventdalen highlights a general morphometric zoning from west to
east. The groups located in the western part of the valley show a greater asymmetry in
polygon size, while in eastern areas a more uniform distribution of the mean polygon area and
larger overall polygon sizes were found.
The spatial zoning that was identified suggests a spatial control on polygon
morphometry, probably controlled by geoecological variables, which may affect the growth
and shape of polygons. The results from discriminant analysis show that geoecological factors
(e.g. geology, geomorphology, slope, wetness index, distance to river/sea) contribute to
successfully classifying more than 80% of the polygons within the 6 major morphometric
groups.
Key words: Permafrost; ice‐wedge polygons; polygonal networks; morphometric
parameters; Adventdalen; Svalbard.
iv
Índice
Agradecimentos ............................................................................................................................. i
Resumo .......................................................................................................................................... ii
Abstract ........................................................................................................................................ iii
Índice ............................................................................................................................................ iv
1. Contexto e objectivos ............................................................................................................ 1
2. Introdução ............................................................................................................................. 1
2.1. O ambiente periglaciário e as redes poligonais ............................................................ 1
2.1.1. Permafrost e camada activa .................................................................................. 3
2.1.2. Polígonos de cunhas de gelo e formação ............................................................. 6
2.1.3. Morfologia dos polígonos...................................................................................... 7
2.1.4. Desenvolvimento de uma rede poligonal ............................................................. 9
3. Quadro Físico de Adventdalen ............................................................................................ 11
3.1. Enquadramento geográfico ......................................................................................... 11
3.2. Enquadramento climático ........................................................................................... 13
3.3. Enquadramento geológico .......................................................................................... 13
4. Técnicas e Métodos ............................................................................................................. 16
4.1. Introdução ................................................................................................................... 16
4.2. Constituição de uma base de dados SIG para Adventdalen (Geodatabase) ............... 16
4.2.1. Mapas temáticos de base .................................................................................... 16
4.2.2. Ortorectificação das fotografias aéreas .............................................................. 21
4.2.3. O Modelo Digital de Terreno e modelos derivados ............................................ 23
4.2.4. Definição das redes de polígonos ....................................................................... 31
4.2.5. Geodatabase ....................................................................................................... 35
5. Resultados e discussão ........................................................................................................ 40
5.1. Introdução ................................................................................................................... 40
5.1.1. Caracterização morfométrica dos polígonos ...................................................... 40
5.1.2. Variáveis geoecológicas ....................................................................................... 43
5.2. Caracterização das redes poligonais ........................................................................... 44
5.2.1. Análise morfométrica das redes ......................................................................... 44
5.2.2. Análise geoecológica da diferenciação espacial morfométrica .......................... 50
5.3. Classificação e caracterização dos grupos morfométricos de redes de polígonos ..... 53
v
5.3.1. Classificação morfométrica das redes de polígonos ........................................... 53
5.3.2. Caracterização dos grupos morfométricos de redes de polígonos ..................... 58
5.4. Variáveis geoecológicas e a variabilidade morfométrica no fundo de Adventdalen .. 67
5.4.1. Relação dos grupos morfométricos com as variáveis geoecológicas ................. 67
6. Conclusões .......................................................................................................................... 75
7. Referências bibliográficas ................................................................................................... 78
1
1. Contextoeobjectivos
O presente trabalho está inserido no âmbito do projecto ANAPOLIS ‐ Análise de
Terrenos Poligonais em Marte com base em análogos terrestres (PTDC/CTE‐SPA/099041/2008)
que pretende contribuir para uma melhor caracterização dos terrenos poligonais de Marte
através da análise detalhada de análogos terrestres. Esta analogia é utilizada para minorar
limitações tecnológicas e científicas tendo em consideração que a informação disponível sobre
as redes poligonais de Marte resulta quase exclusivamente de produtos de detecção remota.
Os polígonos de cunha de gelo são complexas formas de relevo que têm sido objecto
dos mais variados estudos por serem excelentes indicadores da presença actual e passada de
gelo no solo através da preservação da informação climática nas cunhas de gelo como formas
de relevo relíquia no registo geológico (Levy et al. 2010). A sua interpretação, tanto na Terra
como em Marte, baseia‐se na investigação conjunta de áreas como a geomorfologia, física,
monitorização ambiental, reconstrução paleoclimática e geoquímica.
Este trabalho pretende analisar se os factores geo‐ecológicos de âmbito local
contribuem para as variações na geometria dos terrenos poligonais no vale Adventdalen em
Svalbard.
Os principais objectivos do trabalho são:
1) Obter informação relativa à geometria dos polígonos, bem como compilar numa
geodatabase toda a informação geográfica relativa às variáveis geo‐ecológicas;
2) Caracterizar a variabilidade morfométrica das redes poligonais;
3) Caracterizar o enquadramento geo‐ecológico da distribuição espacial das redes
poligonais;
4) Determinar a influência dos factores ambientais, e quais as variáveis geo‐ecológicas
mais relevantes, na predição da variabilidade morfométrica dos polígonos de Adventdalen.
Este estudo é um importante contributo para a compreensão da influência que os
factores ambientais poderão ter no desenvolvimento dos polígonos de cunha de gelo a nível
local.
1
2. Introdução
O permafrost, comummente entendido como um solo permanentemente gelado,
constitui um importante elemento da criosfera global (Harris et al. 2009) (Ballantyne & Harris
1994). Uma vez que é cientificamente definido como um solo que termicamente permanece
abaixo de 0°C por pelo menos dois anos (Permafrost Subcommission, NRC Canadá 1988 in
Harris et al. 2009), e por ter em amplas áreas do Ártico, um elevado teor em carbono orgânico,
é particularmente relevante para o estudo das alterações climáticas pela sensibilidade que
apresenta às mesmas (Haeberli &Hohmann 2008 in Harris et al. 2009). Os polígonos de cunha
de gelo representam a forma de relevo mas característica das planícies com permaforst
(French 2007), sendo estes o foco principal desta dissertação.
O presente capítulo apresenta uma introdução ao ambiente periglaciário,
nomeadamente no que diz respeito: (1) ao permafrost e camada activa; (2) aos polígonos de
cunha de gelo e sua formação; (3) à morfologia dos polígonos e (4) ao desenvolvimento de
redes poligonais. Por fim é apresentado o contexto em que se insere esta dissertação e os
objectivos correspondentes.
2.1. Oambienteperiglaciárioeasredespoligonais
Cerca de 77% da água doce da Terra encontra‐se congelada, estando a maior parte
desse gelo concentrado na Gronelândia e Antártida (Christopherson 2005). A esta porção da
hidrosfera e água subterrânea que se encontra permanente congelada, dá‐se a designação de
criosfera, que se encontra actualmente a sofrer significativas alterações (Christopherson
2005). De acordo com o mesmo autor, uma área de permafrost que não se encontre coberta
por glaciares é considerada periglaciária. Já segundo French (2007), existem dois critérios
fundamentais para diagnosticar ambientes periglaciários: o congelamento e a fusão do solo; e
a presença de permafrost. As áreas periglaciárias com permafrost ocupam cerca de 24% da
superfície terrestre do hemisfério Norte (French 2007), sendo que as mais extensas
encontram‐se no norte da Eurásia e na América do Norte (Figura 2‐1).
2
Figura 2‐1 Distribuição da criosfera na Terra (H. Ahlenius, UNEP/GRID‐Arendal, 2007).
Considerando a não uniformidade do clima periglaciário, French (2007) propõe cinco
grandes categorias de clima periglaciário, tendo por base os critérios de insolação,
temperatura e altitude. As referidas categorias são as seguintes: Climas do alto Árctico, Climas
continentais, Climas alpinos, Planalto Qinghai‐Xizang (Tibet) e Climas de baixa amplitude
térmica anual. French (2007) propõe ainda a adição de uma sexta categoria, que permita
contemplar o frio intenso, a falta de vento e aridez das áreas livres de gelo do continente
Antárctico.
3
A geomorfologia periglaciária tem sido considerada como uma subdisciplina da
geomorfologia relacionada com as formas de relevo e os processos das regiões frias não‐
glaciárias do mundo (Thorn & French 2006). Pode‐se considerar como foco da geomorfologia
periglaciária o estudo dos processos de congelamento, bem como do gelo no solo e formas
relacionadas, apresentando como fim último a criação de modelos de evolução da paisagem
de climas frios (Thorn & French 2006). Estes modelos incorporam pressupostos relacionados
com os processos envolvidos, velocidade de funcionamento e as taxas de erosão associadas, o
transporte e deposição, e a forma como a morfologia se altera ao longo do tempo (Thorn &
French 2006).
2.1.1. Permafrostecamadaactiva
A distribuição do permafrost é controlada por diversos factores específicos localmente
que incluem a condutividade térmica e difusão dos materiais da Terra, vegetação, cobertura
de neve e topografia, sendo o factor mais importante à escala local e regional o clima (French
2007).
O permaforst é geralmente classificado relativamente à sua extensão, podendo ser:
contínuo (90‐100%); descontínuo (50‐90%), esporádico (10‐50%) ou isolado (0‐10%). Por áreas
de permafrost contínuo entende‐se a região de frio mais severo e perene que,
aproximadamente, afecta todas as superfícies com excepção de algumas zonas descongeladas,
normalmente associadas a lagos ou rios. O permafrost descontínuo caracteriza‐se por manchas
não conectadas de permafrost. O permafrost esporádico ou isolado consiste geralmente na
presença muito restrita de permafrost ou ocorrendo em ilhas isoladas, muitas vezes ocorrendo
sob sedimentos orgânicos turfosos (French 2007). A Figura 2‐2 apresenta a distribuição do
permafrost no hemisfério Norte.
4
Figura 2‐2 Distribuição do permafrost no hemisfério Norte (Brown et al. 1998).
As características do permafrost encontram‐se representadas na Figura 1‐3. Uma das
principais é a existência de uma camada activa, correspondente ao sector do solo que congela
e funde sazonalmente e que se encontra acima do solo permanentemente gelado (French
2007). Temperaturas atmosféricas mais elevadas induzem o aquecimento do permafrost,
reduzindo a sua espessura e aumentando a espessura da camada activa. Por outro lado, nas
regiões com temperaturas mais baixas, o permafrost é mais espesso. A camada activa é um
sistema dinâmico e aberto, influenciado por perdas e ganhos de energia no ambiente
5
subsuperficial, e como tal, na generalidade o permafrost encontra‐se em desequilíbrio com as
condições ambientais e ajusta‐se activamente em relação às alterações climáticas
(Christopherson 2005). No permafrost importa ainda compreender as noções de topo do
permafrost, taliks e camada activa.
Figura 2‐3 Relação entre permafrost, a camada ativa e taliks (Ferrians et al., 1969, cortesia do United States Geological Survey in French 2007).
O limite superior do permafrost é designado por topo do permafrost, sendo o setor do
solo localizado acima deste, conhecido por camada activa (French 2007). Em certas áreas onde
o permafrost é herdado de condições climáticas passadas, pode existir uma zona descongelada
entre a base da camada que congela sazonalmente e o topo do permafrost, designada talik
(French 2007). Este é, aliás, o termo usado para designar também zonas descongeladas dentro
e abaixo do permafrost.
Os polígonos são estruturas formadas devido à ocorrência de processos de contracção
térmica do permafrost abrindo fendas verticais que podem ser preenchidas por sedimentos
(sand‐wedges), ou por água líquida resultante da fusão do gelo e que posteriormente congela
(ice‐wedges), ou ambos os materiais (Ulrich 2011). Os polígonos formam‐se em ambientes de
permafrost contínuo e são o tipo mais comum de polígonos de contracção térmica nas regiões
árcticas mais húmidas (French 2007), caso de Svalbard, região foco deste trabalho.
6
2.1.2. Polígonosdecunhasdegeloeformação
De acordo com Härtel (2011) o terreno periglaciário terrestre é muitas vezes
caracterizado por redes mais ou menos regulares de padrões de fracturas com forma
poligonal. De acordo com a mesma autora, evidências demonstram que os referidos polígonos
são construídos pela interligação de fracturas causadas por tensões térmicas em solo
perenemente congelado, fornecendo evidências da ocorrência de permafrost nos casos em
que estas fendas são preenchidas com gelo.
O fenómeno associado com a fracturação é expresso no tamanho de polígonos, largura
da abertura da fractura e profundidade de penetração, na natureza dos sedimentos que
preenchem a fractura e na inter‐relação entre o tempo da formação da fractura com o tempo
de acumulação de sedimentos (Ulrich et al. 2011).
As fracturas propagam‐se lateralmente podendo formar outras células poligonais
delimitadas por outras fracturas, células estas que podem variar entre alguns decímetros de
diâmetro e alguns metros, sendo que raramente ultrapassam os dez metros (French 2007). O
tamanho vertical de cada fractura individual encontra‐se fortemente dependente do regime
climático e da entrada no seu interior de água, gelo ou areia, bem como de uma série de
outros factores que vão determinar a forma de cada polígono individual (Härtel 2011).
A formação de fracturas encontra‐se relacionada com a rápida redução da
temperatura do solo que consequentemente pode levar à sua contracção térmica provocando
a formação de fissuras e fendas. O fenómeno acontece quando a água dentro das fracturas ao
atingir a sua maior densidade a +4ºC começa a expandir‐se assim que o gelo é formado, mas
contrai a temperaturas abaixo de 0°C (French 2007). O coeficiente de expansão linear das
cunhas de gelo, dependente da temperatura, diminui rapidamente até 4 ºC, valor no qual a
água atinge o máximo de densidade. A continuação da redução da temperatura causa um
rápido aumento do coeficiente de expansão linear, isto é, o volume do material aumenta.
Quando o gelo é formado a 0°C ,o coeficiente diminui novamente e o gelo começa a contrair à
medida que a densidade aumenta (Härtel 2011).
É hoje relativamente claro que a fracturação ocorre geralmente durante o final do
Inverno e que não está necessariamente relacionada com a redução extrema da temperatura
mas sim a condições favoráveis definidas através da redução da temperatura a taxas de graus
por dia (Fortier & Allard 2004) e a presença de um revestimento isolante de neve para manter
grandes tensões. Contudo, pode e ocorre também sem a presença do revestimento de neve,
se as taxas de arrefecimento forem suficientemente elevadas (A.L. Washburn 1979).
Ainda de acordo com Härtel (2011), 90% das flutuações de temperatura no permafrost
ocorrem nos 10‐20 m mais superficiais, e abaixo disso, as temperaturas são geralmente
7
estáveis (Lachenbruch 1966 in Härtel 2011). Consequentemente, a formação de fendas ocorre
no topo do permafrost, ou na base da camada activa, o que explica porque se podem repetir
fendas e a sua reativação (Härtel 2011).
Após a formação das fissuras e fracturas a subsequente reactivação das fendas pode
provocar o crescimento lateral e vertical se material for transportado para o seu interior
impossibilitando o seu fecho (Härtel 2011). Comumente, este preenchimento das fendas
resulta da água descongelada sazonalmente a partir da parte superior da camada activa, que
preenche a fenda e congela, formando um veio de gelo, que pode em seguida ser reaberto nos
anos subsequentes e novamente preenchido. Este processo, após repetição ao longo de vários
anos de reabertura, preenchimento e congelamento produz as formas denominadas cunhas de
gelo (Figura 2‐4).
Figura 2‐4 Processo de fracturação e subsequente formação de cunhas de gelo estratificadas através da repetição
de ciclos de congelamento e fusão (adaptado de Lachenbruch 1962).
2.1.3. Morfologiadospolígonos
Mackay (2000) propôs um sistema de classificação de polígonos em termos de
morfologia e sequência de desenvolvimento (Figura 2‐5). O sistema de classificação morfológica
aplica‐se a áreas planas e mostra em perfil as fases progressivas de evolução desde um
polígono incipiente, até ao que se denomina de intermédio. Após a fase de crescimento é
representada a morfologia de aluimento denominada como Fase de Thermokarst. A sequência
de desenvolvimento mostra a subdivisão para um polígono primário, geralmente em áreas
planas e homogéneas, até à divisão terciária.
8
Figura 2‐5 Sistema de classificação para polígonos que ocorrem em áreas planas; as cunhas são ilustradas em
perfil, a formação normalmente progride de um polígono incipiente para um intermédio; a fase de thermokarst
(zonas com depressões, ou aluimento de solo associado à fusão) está dividida em polígonos High‐centred e
walled, (adaptado de Mackay 2000 in Lousada 2012).
Também Mackay (2000) apresenta uma representação do desenvolvimento de cunhas
de gelo epigenética, singenética e anti‐singenética no permafrost terrestre (Figura 2‐6). As
cunhas epigenéticas crescem em zonas estáveis onde a sedimentação e a erosão são baixas, ou
seja, as cunhas crescem mais em largura e menos em altura. As cunhas singenéticas crescem
para cima em áreas onde há degradação do permafrost por sedimentação ou alterações
climáticas evidentes. As cunhas anti‐singenéticas crescem para baixo, em locais de erosão e
remoção de material.
Figura 2‐6 Desenvolvimento de cunhas (a) epigenética, (b) singenética (c) anti‐singenética (Mackay 1990 adaptado de Härtel 2011).
9
2.1.4. Desenvolvimentodeumaredepoligonal
As cunhas de contracção térmica formam redes poligonais, ou tetragonais que cobrem
áreas extensivas do Árctico e sub‐Árctico (French 2007). As dimensões médias dos polígonos
formados em sedimentos não consolidados podem variar entre os 15 e 40m (French 2007). Em
rocha, os polígonos ou redes são menos desenvolvidos, mas onde ocorrem, têm geralmente
um diâmetro de 5‐15m (French 2007).
Relativamente ao desenvolvimento de redes poligonais French (2007) apresenta
também uma classificação de tipologias de acordo com a orientação dos polígonos e o tipo de
intersecção das cunhas, isto é, o valor do seu ângulo interno Figura 2‐7. Segundo o mesmo
autor, as pesquisas de Lachenbruch (1962, 1966) revelam que as redes devem exibir tendência
para formar ligações ortogonais ao longo do tempo. Isto significa que uma rede inicialmente
com mais ligações hexagonais tenderá a transformar‐ se numa rede com mais ligações
ortogonais. As redes orientadas com o declive do terreno surgem normalmente perto de
corpos de água (French, 2007).
Figura 2‐7 Tipologias de redes poligonais em terrenos de permafrost (adaptado de French 2007).
Uma implicação da rede hexagonal, e de intersecções angulares de 120°, é que as
fendas se desenvolvem numa série de pontos e que cada fenda se desenvolve mais ou menos
simultaneamente (French 2007), inferindo uma sequência evolutiva na qual as fendas
primárias são seguidas por fissuras secundárias que progressivamente dividem uma área,
demonstrando neste caso uma tendência para um padrão de intersecção ortogonal (French
2007). Lachenbruch (1966) classificou a rede poligonal resultante como “sistema ortogonal‐
aleatório” em contraste com um “sistema ortogonal‐orientado”, este comummente observado
na proximidade de grandes corpos de água (French 2007).
Como apontado por French (2007), o tamanho do padrão poligonal está condicionado
pela severidade do clima, sugerindo que gradientes de temperatura elevados causam redes
10
poligonais menores. Em adição, o autor reconhece ainda que a variabilidade espacial na
cobertura de neve e vegetação influencia a dinâmica da fracturação.
French (2007) apresenta como hipótese que os padrões hexagonais se desenvolvem
provavelmente melhor sobre material homogéneo sujeito a longos períodos de condições
climáticas frias ininterruptas e uniformes, enquanto que os padrões ortogonais são imaturos e
desenvolvem‐se sobre materiais heterogéneos que experimentaram alterações nas condições
climáticas.
11
3. QuadroFísicodeAdventdalen
3.1. Enquadramentogeográfico
Adventdalen é um vale, com cerca de 2250 km2, localizado na parte central da ilha de
Spitsbergen, pertencente ao Arquipélago de Svalbard, situado no Ártico (entre 74° e 81° N, e
10° a 35° E) (Figura 3‐1). A região é montanhosa, com uma altitude máxima a rondar os
1700m, é moderadamente glaciada e com uma sequência rochosa exposta com cerca de 3400
m de espessura (Major & Nagy 1972). Na ilha de Spitsbergen a topografia é dominada por
montanhas separadas por grandes vales que podem estar interligados. Os maiores vales são
Sassendalen, Reindalen, Colesdalen e Adventdalen.
Figura 3‐1 Enquadramento geográfico da área de estudo: localização do Arquipélago de Svalbard e
localização do vale de Adventdalen (rectângulo vermelho)
12
Figura 3‐2 Área de estudo ‐ Mapa topográfico do vale de Adventdalen, sendo visível a rede de drenagem
do rio Adventelva.
Adventdalen é um grande vale, de fundo plano e largo (Figura 3‐2). Está rodeado de
vertentes com declives acentuados onde ocorrem diversos processos que modelam a
paisagem. O rio Adventelva apresenta típicos canais entrançados, desenvolvendo‐se ao longo
de uma planície fluvioglaciária particularmente activa na primavera e no início do verão. No
fim desta última estação, o transporte de sedimentos é muito limitado devido à diminuição do
escoamento. No ano seguinte, com o início da fusão, os canais mudam de posição reiniciando‐
se a erosão e transporte (Piepjohn K. et al. 2012). É no vale de Adventdalen que se desenvolve
a cidade portuária de Longyearbyen, e onde se localiza a UNIS‐University Centre at Svalbard.
Figura 3‐3 Longyearbyen e ao fundo o vale de Adventdalen evidenciando o seu fundo plano e as vertentes côncavas.
13
3.2. Enquadramentoclimático
O clima em Svalbard é considerado ártico, em que a temperatura média anual do ar
varia entre cerca de –6 °C ao nível do mar até –15 °C nas altas montanhas (Hauber & Reiss
2011). Este tipo de clima apenas ocorre em latitudes polares e é caracterizado por dias muito
curtos, com fortes variações sazonais, grandes variações da temperatura média mensal, mas
poucas oscilações ao longo do dia (French 2007). Na região de Adventdalen, os meses mais frio
(Fevereiro) e mais quente (Julho) têm temperaturas médias de 6,2 ° C e ‐15,2 ° C,
respectivamente, sendo a temperatura média anual do ar para 1975‐2000 de ‐5,8 °C
(Christiansen 2005). Adventdalen, e em geral a parte central de Spitsbergen, considera‐se
como tendo uma variante de clima polar (semi) árido. É uma das regiões mais secas de
Svalbard, com uma precipitação anual de apenas cerca de 180 a 190 mm, predominantemente
sob a forma de neve (Christiansen 2005). O clima é, portanto, relativamente seco e associado à
baixa altitude, apenas 18% da superfície na região da cidade de Longyerbyen é coberta por
glaciares, o que é um valor relativamente baixo quando comparado com o resto de Svalbard,
onde os glaciares cobrem cerca de 60% da superfície (Sørbel et al.,2000). Nos Invernos de
Adventdalen, são comuns fortes ventos de sudeste, resultando numa redução da camada de
neve por deflação (Christiansen 2005).
O arquipélago de Svalbard está situado numa zona de permafrost contínuo (Brown et
al. 1998), em que a sua espessura varia entre 100 m nos vales maiores até 450 m nas
montanhas (Ulrich 2011). Em Svalbard estima‐se que o permafrost se tenha iniciado a formar
no Holocénico superior nos vales e nas zonas costeiras (Humlum et al. 2003). A temperatura
do permafrost em Svalbard varia entre ‐2,3 e ‐5,6 ° C (Christiansen et al. 2010), e a espessura
da camada activa varia de alguns decímetros e 1,5 m, dependendo da vegetação, da cobertura
de neve e das condições de superfície (Sørbel et al. 2001).
3.3. Enquadramentogeológico
O vale de Adventdalen é um vale largo que foi deglaciado há cerca de 10 Ka. A geologia
é caracterizada por arenitos do Jurássico e do Cretácico, siltitos e xistos. A maioria dos relevos
limítrofes ao vale pertence às formações de Helvetiafjellet e Carolinefjellet (Dallmann et al.
2001). No fundo do vale existem depósitos de granulometria fina, provavelmente derivados
pela deflação e deposição local de sedimentos fluviais, que vieram cobrir os terraços fluviais,
tendo sido interpretados como Loess por Bryant (1982) e Oliva et al. (2014). A cobertura
vegetal irregular, típica tundra ártica, é dominada por musgos, herbáceas e arbustos rasos e
14
nas áreas mais secas e expostas, que são afetados pela acção do vento, a vegetação é muito
escassa (Ulrich et al. 2011).
A área tem registos que variam entre o Pérmico e o Eocénico, e as rochas apresentam‐
se com idades gradualmente mais recentes para sul (Dallmann et al. 2001). Os depósitos do
Pérmico consistem sobretudo, em rochas marinhas carbonatadas, depositadas em ambientes
costeiros. Do Triássico ao Cretácico, os sedimentos são dominados por argilas e siltitos
marinhos, reflectindo assim várias sequências do desenvolvimento da bacia sob condições
maioritariamente estáveis em termos da plataforma (Dallmann et al. 2001). A região situa‐se
na margem norte de uma importante bacia do Terciário (CTB ‐ Central Tertiary Basin), no
promontório de uma falha inversa que atravessa Spitsbergen e que terá surgido no Eocénico
(Dallmann et al. 2001).
O período Quaternário está representado em Adventdalen por depósitos não
consolidados, de origem glaciária, fluvioglaciária e crioclástica (Major & Nagy 1972).
O fundo do vale de Adventdalen é caracterizado pela presença de pingos e de
polígonos de cunha de gelo. Os polígonos de cunha de gelo variam de 10 a 80m de diâmetro,
com fracturas de 1 a 6m de largura (Sørbel et al. 2001). As cunhas de gelo podem atingir 30 a
500 cm de largura e penetrar 1 a 2 m no interior do permafrost (Sørbel & Tolgensbakk 2002).
As várias redes poligonais com fendas de contracção térmica acompanham mais ou
menos a distribuição da rede de drenagem. As redes surgem predominantemente em zonas
relativamente planas, mas algumas encontram‐se em vertentes e elevações até 500m (Sørbel
& Tolgensbakk 2002). A sua distribuição surge em posições mais elevadas à medida que se
penetra no vale para montante. Matsuoka (1999) e Christiansen (2005) encontraram
evidências de que a contracção térmica de algumas redes poligonais continua ainda a ocorrer
presentemente.
15
Figura 3‐4 Polígonos de cunha de gelo numa das redes poligonais da área de estudo, no vale de Adventdalen.
16
4. TécnicaseMétodos
4.1. Introdução
O presente capítulo tem como objectivo descrever os principais métodos e técnicas
realizadas na integração de dados das variáveis numa geodatabase a utilizar no presente
trabalho, constituído pelos seguintes itens: (1) mapas temáticos de base (2) ortorrectificação
das fotografias aéreas (3) modelo digital de terreno e modelos derivados (4) definição das
redes de polígonos (5) geodatabase
4.2. Constituição de uma base de dados SIG para Adventdalen
(Geodatabase)
Para o presente trabalho procedeu‐se à integração dos mapas de base em ambiente
SIG, e foram utilizados, em formato raster, a fotografia aérea e os mapas temáticos
representativos da geologia e geomorfologia de Adventdalen.
4.2.1. Mapastemáticosdebase
O desenvolvimento do estudo científico da Terra na avaliação e compreensão dos
recursos naturais (geologia, geomorfologia, pedologia, ecologia, etc.) incitou a necessidade de
mapear estes elementos, originando os mapas temáticos. São mapas com um objectivo
específico dado que representam um único tema de informação (Burrough 1986).
Os mapas temáticos em formato raster representam uma estrutura de dados de fácil
manuseamento em ambiente SIG, de superfície bidimensional sobre a qual os dados
geográficos são representados não de forma contínua, mas sim de forma quantitativa, que
pode ter uma influência relevante na estimativa de comprimentos e de áreas quando o
tamanho das células da grelha é maior em relação aos elementos a ser representados
(Burrough 1986).
A integração dos mapas temáticos neste trabalho permitiu a interpretação espacial e
integração das unidades qualitativas em ambiente SIG. Através de análises espaciais a
informação relativa aos mapas foi integrada numa tabela de dados das variáveis preditivas,
permitindo realizar análises estatísticas.
No âmbito deste trabalho foram digitalizados o mapa geológico ‐ folha C9G (Major et
al. 2001) (Figura 4‐1) e o mapa geomorfológico ‐ folha C9Q (Tolgensbakk et al. 2001) (Figura 4‐2)
de Svalbard à escala 1:100 000 produzidos pelo Instituto Polar Norueguês (IPN). A digitalização
17
foi efectuada em scanner para grandes formatos e com uma resolução de 600 dpi, usando‐se o
formato tiff.
Figura 4‐1 Mapa geológico de Svalbard ‐ folha C9G ‐ Adventdalen. Instituto Polar Norueguês (IPN),
elaborado à escala 1:100 000.
18
Figura 4‐2 Mapa geomorfológico de Svalbard ‐ folha C9Q ‐ Adventdalen. Instituto Polar Norueguês (IPN),
elaborado à escala 1:100 000.
Para utilizar estes mapas como fonte de informação e juntamente com outros dados
espaciais foi necessário proceder a um processo de georreferenciação, que consistiu em
ajustar os mapas para o sistema de coordenadas utilizado no projecto WGS 1984 UTM Zone
33N. Para este processo foi usado o sofware ArcGIS 10 através de uma ferramenta que
consiste na obtenção de valores x e y para um ponto específico, designado ponto de controlo.
Estes são locais que oferecem uma feição física perfeitamente identificável, tanto no mapa a
georreferenciar como na informação base, como intersecções de estradas, edifícios, pista de
aeroporto, entre outros, cuja identificação permitiu alinhar e ajustar no espaço bidimensional
os mapas geológico e geomorfológico.
A georreferenciação dos mapas temáticos teve como referência o mosaico construído
para obter o maior ajustamento possível entre todos os arquivos raster e criar também uma
maior relação nos formatos vectoriais a produzir.
Digitalizaçãodasunidadesgeológicasegeomorfológicas
A obtenção das variáveis geologia e geomorfologia implicou a vectorização manual das
respectivas unidades no software ArcGIS com base nos mapas previamente digitalizados,
cobrindo toda a distribuição espacial dos polígonos (Figura 4‐3 e Figura 4‐5).
19
Como resultado da vectorização para Adventdalen estão representadas 8 unidades
geológicas estão representadas as idades geológicas para cada unidade) e 11 unidades
geomorfológicas.
A vectorização desta cartografia temática tem sempre algum erro cartográfico associado, uma
vez que a informação raster original está à escala de 1:100 000 e a informação é processada
para uma escala muito maior. Isto significa que a imprecisão associada à menor escala de
trabalho da informação original provoca erros na informação processada a maior escala.
Figura 4‐3 Unidades geológicas de Adventdalen. Vectorização elaborada a partir do mapa geológico de
Svalbard, do Instituto Polar Norueguês (IPN), elaborado à escala 1:100 000.
20
Figura 4‐4 Tabela litoestratigráfica de Svalbard, cortada para o Período geológico de interesse (adaptado
de (Dallmann et al. 2001)
21
Figura 4‐5 Unidades geomorfológicas de Adventdalen. Vectorização elaborada a partir do mapa
geomorfológico de Svalbard, do Instituto Polar Norueguês (IPN), elaborado à escala 1:100 000.
Os mapas geológico e geomorfológico foram utilizados como variáveis ambientais
neste trabalho com o pressuposto que o substrato e, consequentemente, o tipo de sedimentos
exercem influência na dinâmica geomorfológica e na formação dos polígonos de tundra,
influenciando também a retenção de água, e apresentando diferentes propriedades
termofísicas que originam diferentes comportamentos no processo de congelação (A.L.
Washburn 1979).
4.2.2. Ortorectificaçãodasfotografiasaéreas
A fotografia aérea constitui o objecto de base na detecção remota, e é utilizada desde
sempre para estudos de fotointerpretação geológica e geomorfológica (Vergara 1971) com a
finalidade de identificar e classificar objectos, contribuindo para a interpretação da sua
génese. O processo de interpretação implica a realização de tarefas como detecção,
reconhecimento e identificação, análise, classificação e determinação da exactidão (Vergara
1971, Fonseca & Fernandes 2004).
A utilização de uma fotografia aérea de elevada resolução possibilita a realização da
delimitação geométrica dos polígonos com grande pormenor e qualidade. Para o objectivo
deste trabalho, a identificação da geometria dos polígonos ao longo de Adventdalen contou
22
como informação base com um total de 53 imagens aéreas, em formato bruto, adquiridas ao
Instituto Polar Norueguês (IPN), referentes a uma campanha fotogramétrica realizada em
Julho de 2009. Cobrindo cerca de 20km de extensão do vale, as imagens têm uma resolução de
0,2 metros por pixel e 4 bandas espectrais, três no visível (RGB) e a quarta no infravermelho
próximo.
Dado que as imagens estavam em formato bruto, e apresentam uma sobreposição
entre 40% e 60%, foi necessário realizar um processamento prévio de ortorrectificação para as
posicionar correctamente em termos geográficos, constituindo um mosaico contínuo ao longo
do vale (Figura 4‐6).
Ortorrectificação
Muitos factores contribuem para a qualidade geométrica de uma imagem de detecção
remota. A introdução de distorções geométricas durante a captura da imagem é inevitável e
contribui para os erros de posicionamento geográfico. A geometria de aquisição de imagem, o
relevo da área da imagem, a fidelidade do sensor óptico e a estabilidade posicional do sensor
desempenham um papel na quantidade e tipo de erros que são introduzidos (EXELIS 2013).
A ortorrectificação é um processo que remove as distorções geométricas e produz uma
imagem com uma geometria planimétrica, tal como um mapa. O processo consiste também
em atribuir às imagens ortorrectificadas um sistema de coordenadas terrestre e a escala da
imagem é constante ao longo de toda a imagem. As imagens ortorrectificadas deverão estar
também livres de qualquer tipo de artefactos, tal como, objectos inclinados ou elementos
lineares enviesados devido ao deslocamento do relevo. Estas propriedades fazem de uma
ortofotografia um mapa preciso e uma ferramenta adequada para aplicações que necessitam
de informações sobre a posição exata de uma área específica e uma medição precisa de
elementos.
A ortorrectificação foi realizada no âmbito da dissertação de mestrado “Análise
Geométrica e Topológica de Redes Poligonais de Contracção Térmica em Adventdalen,
Svalbard, Noruega” (Lousada 2012). Foi usado um conjunto de informação auxiliar de
referência, nomeadamente os parâmetros internos da câmara relacionados com a calibração:
a distância focal, as coordenadas do ponto principal e as características do sistema de lentes
da câmara; juntamente com os parâmetros de orientação exterior das imagens, que indicam a
posição e orientação da câmara no voo para cada imagem, através das coordenadas centrais
de projecção do centro da imagem (x0, y0, z0) e os ângulos de rotação fotogramétricos omega,
phi, kappa, (ω,Φ,κ). Estes parâmetros foram a base ao processo de atribuição de coordenadas
23
correctas a cada uma das imagens juntamente com o Modelo Digital de Terreno (MDT) ASTER
GLOBAL DEM, com 30m de resolução por pixel, da área de estudo como fonte de informação
sobre o relevo, utilizado para que as deformações causadas por este sejam corrigidas.
A ortorrectificação realizada das 53 fotografias aéreas e após a criação do mosaico
(Figura 4‐6), por meio do software ENVI, produziu um erro resultante variável de imagem para
imagem e visível especialmente nas áreas de sobreposição, correspondentes aos cantos, onde
o erro pode variar entre 1 e 2 metros. Este erro é menorizado na região central das imagens,
visto que foram utilizadas as coordenadas centrais de cada imagem nos parâmetros de
orientação exterior.
Figura 4‐6 Mosaico das fotografias aéreas de Adventdalen ortorrectificadas.
4.2.3. OModeloDigitaldeTerrenoemodelosderivados
Grande parte da informação utilizada para estudos no âmbito das ciências naturais é
susceptível a ser georreferenciada e consequentemente objecto de análise em ambiente SIG,
facultando um melhor e exaustivo reconhecimento da superfície terrestre. Com esta premissa,
foram utilizadas variáveis extraídas através de métodos computacionais a partir do MDT, como
também dos mapas temáticos digitais. De referir que o MDT descrito neste ponto é diferente
ao utilizado no processo ortorrectificação (ver capítulo 4.2.2), dado que foi adquirido
24
posteriormente ao IPN um MDT com resolução espacial de 20m por pixel e precisão estimada
de 5m. Este novo MDT permitiu derivar variáveis com um melhor detalhe e resolução,
importante para obter uma análise estatística mais minuciosa.
CaracterísticasdoModeloDigitaldeTerreno
O MDT é a peça chave da análise geomorfométrica e cada vez mais utilizado para
análise visual da topografia, paisagem e formas de relevo, para a modelação de processos à
superfície, bem como fonte de informação para elaboração de variáveis preditivas (Hjort
2006).
O MDT do IPN foi fornecido em formato raster, ou seja como produto final, e sendo
este formato o mais adequado para a representação espacial da elevação do terreno e análise
espacial, não foi necessário realizar tarefas de preparação e de tratamento (Figura 4‐7).
De acordo com Wilson & Gallant (2000) o MDT utilizado, com uma resolução espacial
de 20m, corresponde a uma topo‐escala de pormenor, de grande importância na solução de
problemas ambientais com aplicabilidade nas áreas de modelação espacial hidrológica, das
propriedades do solo, correcções topográficas a dados de detecção remota e na extracção de
aspectos topográficos da radiação solar. Em ambientes periglaciários a altitude permite inferir
factores ambientais como a variação da temperatura, a neve, energia potencial gravítica,
intensidade da radiação, intensidade do vento, nebulosidade, vegetação ou distribuição de
humidade (Etzelmüller & Sulebak 2000, Hjort 2006).
25
Figura 4‐7 Modelo Digital de Terreno do Instituto Polar Norueguês, com resolução espacial de 20m, para
Adventdalen.
ModelodeDeclives
O modelo de declives de Adventdalen foi gerado através das ferramentas do Spatial
Analyst do ArcGIS 10 (Figura 4‐8), e utilizada, no presente trabalho como variável ambiental.
O declive é um dos atributos topográficos mais frequentemente usado nos mais
diversos estudos, nomeadamente em estudos geomorfológicos e periglaciários (Hjort 2006).
Esta informação constitui uma forma de caracterização do terreno que permite relacionar com
a dinâmica do escoamento superficial, por influenciar a distribuição da neve e
consequentemente a espessura da camada activa (Florinsky 1998).
26
Figura 4‐8 Modelo de declives para Adventdalen. Elaborado a partir do Modelo Digital de Terreno do
Instituto Polar Norueguês, com resolução espacial de 20m.
Modelodeexposições
O relevo e a respectiva orientação das vertentes influenciam a quantidade de radiação
solar recebida na superfície e portanto a temperatura, a direcção do escoamento da água
superficial, bem como a forma e quantidade da acumulação da neve, o que faz com que numa
região de permafrost contínuo a camada activa seja normalmente mais fina (isolamento da
neve) nas vertentes viradas a Norte (French 2007, Florinsky 1998).
O modelo de exposições foi, igualmente, gerado através das ferramentas do Spatial
Analyst do software ArcGIS 10 (Figura 4‐9).
27
Figura 4‐9 Modelo de exposições das vertentes de Adventdalen. Elaborado a partir do Modelo Digital de
Terreno do Instituto Polar Norueguês, com resolução espacial de 20m.
A classificação das exposições é determinada em unidades de graus, e para este
trabalho, foi atribuído uma reclassificação de acordo com a direcção ordinal da inclinação da
superfície, respeitando o esquema de classificação padrão (Tabela 4‐1):
Tabela 4‐1 Correspondência da classificação das exposições (em graus) e a direcção ordinal de inclinação da
superfície.
Intervalo da exposição cardial (°)
Direcção da exposição cardial
‐1 Plano
[0 ‐ 22,5[ Norte
[22,5 ‐ 45[ Nordeste
[45 ‐ 135[ Este
[135 ‐ 180[ Sudeste
[180 ‐ 225[ Sul
[225 ‐ 270[ Sudoeste
[270 ‐ 315[ Oeste
[315 ‐ 337,5[ Noroeste
[337,5 ‐ 360[ Norte
28
Modelodecurvaturadoterreno
O modelo de curvatura do terreno é uma ferramenta utilizada para descrever as
características físicas da topografia, para compreender os processos de erosão e de
acumulação de água. Este modelo foi portanto utilizado para determinar as superfícies
convexas, côncavas ou planas, tendo em mente o conceito de que as superfícies côncavas
representam áreas de acumulação, tanto de sedimentos, como de água e de neve,
influenciado a espessura do solo e a distribuição da humidade e da própria neve (Hjort 2006,
Etzelmüller & Sulebak 2000)
O modelo foi calculado através das ferramentas do Spatial Analyst do software ArcGIS
10 a partir do MDT (Figura 4‐10). Seguidamente através da ferramenta Raster Calculator do
mesmo software, o modelo foi reclassificado em três classes de acordo com a classificação
descrita por Wilson & Gallant(2000):
‐ Valores positivos: superfície convexa
‐ Valores próximos de 0: superfície rectilínea
‐ Valores negativos: superfície côncava
Figura 4‐10 Modelo de curvatura do terreno para Adventdalen. Elaborado a partir do Modelo Digital de
Terreno do Instituto Polar Norueguês, com resolução espacial de 20m.
29
Modelodeteordehumidadenosolo‐WetnessIndex(SWI)
Foi também calculado o mapa do teor de humidade no solo do SAGA (SWI) (Böhner et
al. 2002) através do módulo Terrain Analysis do programa SAGA GIS (Figura 4‐11). Este índice
descreve a tendência de acumulação de água através da identificação do padrão de
escoamento a partir de cada uma das células e respectiva área de contribuição a montante da
célula. É utilizado para quantificar o controlo topográfico nos processos hidrológicos e indicar a
distribuição espacial da humidade e saturação do solo (Sørensen et al. 2006). A análise deste
índice pode também dar indicações acerca da possível profundidade do nível freático, da
distribuição do ar frio durante episódios com inversão térmica e da distribuição espacial da
matéria orgânica (Wilson & Gallant 2000). Quanto maiores os valores observados, maior é a
presença de água no solo, bem como o teor de humidade.
Figura 4‐11 Modelo de teor de humidade no solo para Adventdalen. Elaborado a partir do Modelo
Digital de Terreno do Instituto Polar Norueguês, com resolução espacial de 20m.
Modelodaheterogeneidadedoterreno‐TerrainRuggednessIndex(TRI)
O TRI é um índice que permite a medição objectiva da heterogeneidade do terreno
através do cálculo da diferença média da elevação entre o pixel central e os oito pixels
circundantes. Este índice reflecte o potencial do relevo para a acumulação da neve, a
concentração de matéria orgânica (Florinsky 1998) e ainda a variação da radiação solar
recebida, que varia com a rugosidade do terreno (Etzelmüller & Sulebak 2000). Quanto menor
30
for o valor de TRI, menor é a rugosidade e mais regular é o terreno (Riley et al. 1999) (Figura
4‐12). Por fim referir que o TRI foi calculado através do módulo Terrain Analysis do software
SAGA GIS.
Figura 4‐12 Modelo do índice de heterogeneidade do terreno para Adventdalen. Elaborado a partir do
Modelo Digital de Terreno do Instituto Polar Norueguês, com resolução espacial de 20m.
Distânciaàslinhasdeáguaeàlinhadecosta
A maior ou menor proximidade a corpos de água com elevada disponibilidade hídrica,
como lagos e rios, condiciona a temperatura e tipo de substrato, tendo influência no
desenvolvimento e espessura do permafrost (Migoń 2010). Como tal, torna‐se importante
identificar os principais locais com elevada disponibilidade de água no estado líquido em
Adventdalen, nomeadamente o rio Adventelva e respectivos afluentes, e proceder à respectiva
vectorização.
Já a distância à linha de costa é utilizada como indicador de continentalidade, com
reflexos nas temperaturas do ar e precipitação, mesmo numa distância de poucos quilómetros,
influenciando as propriedades do permafrost (Campbell & Claridge 2009).
Para a vectorização do rio Adventelva e afluentes foi utilizado um processo automático
através das ferramentas do Spatial Analyst do ArcGIS 10 e aprimorado por interpretação visual
do mapa topográfico à escala 1:100.000 e respectiva digitalização manual (Figura 4‐13). Para a
vectorização por interpretação visual da linha de costa, foi utilizado o mesmo mapa. Com estes
31
limites digitalizados, procedeu‐se à medição da distância mais curta, em linha recta, entre
estes e centróide de cada polígono, através da ferramenta Join Data do ArcGIS 10.
Figura 4‐13 Linhas de água e linha de costa mais próxima do vale de Adventdalen e representação da
distância do centróides dos polígonos à linha de costa. Os elementos Linha de água e Linha de costa foram
vectorizados através do mapa topográfico à escala 1:100.000.
4.2.4. Definiçãodasredesdepolígonos
Usando como referência base os ortofotomapas, foi efectuada manualmente a
digitalização vectorial dos polígonos (Lousada 2012) através do programa ArcGIS 10,
identificando ao longo de Adventdalen mais de 10.000 polígonos (Figura 4‐14). No mesmo
trabalho, Lousada (2012) evidencia que a vectorização de cada polígono só foi realizada
quando era evidente a expressão das cunhas de gelo à superfície e não confundido com outro
tipo de lineamentos, e só foram considerados os polígonos que estavam nitidamente fechados
(todas as suas arestas visíveis na íntegra). As 4 bandas dos ortos permitiram uma utilização
tanto em cor verdadeira como em falsa cor, facilitando uma melhor identificação das cunhas
dos polígonos.
32
Figura 4‐14 Modelo digital de terreno de Adventdalen. A) Limites dos vários grupos de polígonos
digitalizados e redes poligonais B) Pormenor dos polígonos digitalizados (ortofotomapa como fundo).
O mapeamento dos polígonos demonstrou ser uma tarefa árdua e morosa, devido à
distribuição espacial dos campos poligonais ao longo dos cerca de 20km do vale. A primeira
dificuldade foi localizar os polígonos durante o varrimento visual dos ortofotomapas, entre as
escalas 1:7 500 e 1:10 000. Estas escalas de análise foram definidas pois permitiam um bom
equilíbrio entre o tempo despendido e uma boa resolução espacial. Outra dificuldade, apesar
da boa qualidade dos ortofotos e das 4 bandas espectrais, foi identificar a expressão das
cunhas de gelo à superfície, que nem sempre era evidente, tornando difícil a interpretação da
geometria dos polígonos. Dado que os maiores erros posicionais estão localizados nas orlas
das imagens ortorrectificadas e que cada uma destas tem uma sobreposição entre 40 a 60%, a
digitalização dos polígonos foi direccionada para a zona central de forma a reduzir o erro
espacial.
A validação da delimitação dos polígonos através das ferramentas SIG foi efectuada
através de reconhecimento de campo. Foi escolhida uma rede para ser utilizada como
referência, sobre a qual foi realizado intensivo trabalho de campo em 2010 e 2011 e depois
estendido a outras redes em 2012. O trabalho de campo realizado foi importante para
perceber que a utilização das imagens IPN para cartografar todas as redes poligonais de
A)
B)
33
Adventdalen é válida e que embora apresente desvantagens, estas são compensadas pela
facilidade de uso e fidelidade do mapeamento (Lousada 2012).
A Figura 4‐15 ilustra a campanha de campo de 2012 no vale de Adventdalen, na qual tive
oportunidade de participar.
Figura 4‐15 Fotografias da campanha de campo de 2012 no vale de Adventdalen
A análise em ambiente SIG da distribuição dos polígonos permitiu identificar áreas com
redes poligonais bastante extensas e com grande número de polígonos, concentradas
especialmente no fundo do vale, bem como redes menores dispersas, principalmente em
sectores de vertente (Figura 4‐14). Nestes sectores de vertente, mais erodidos e
consequentemente mais irregulares, a delimitação dos seus contornos é mais dificultada. Com
base nesta organização, e tendo por objectivo estudar o conjunto de polígonos que formam as
redes poligonais, aqueles foram agrupados originando 36 redes poligonais. As redes poligonais
foram delineadas de acordo com a distribuição espacial e concentração dos polígonos,
podendo estas incluir vários “clusters” de polígonos. Para o estudo foram apenas consideradas
34
as redes que possuem um número de polígonos superior a 25, e nas quais todos os polígonos
apresentam vizinhos, facultando redes poligonais mais completas e estatisticamente mais
significativas.
Parâmetrosmorfométricosparacaracterizaçãodasredespoligonais
A forma como a fracturação ocorre é controlada por diversos factores ambientais e vai
determinar a dimensão, a forma e topologia dos polígonos (Ulrich 2011).
Para cada um dos polígonos digitalizados de acordo com a sua geometria e relação
espacial foram calculados três tipos de parâmetros morfométricos (Tabela 4‐2):
‐ Parâmetros de dimensão: Correspondem às propriedades geométricas num plano
planimétrico dos polígonos
‐ Parâmetros de forma: Caracterizam o formato específico dos polígonos
‐ Parâmetros topológicos: Estes parâmetros expressam como os polígonos estão
relacionados fisicamente uns com os outros dentro de uma rede poligonal. Para o cálculo dos
parâmetros topológicos foi utilizado um algoritmo desenvolvido por Bandeira et al. (2008) que
cria um processo automatizado para identificar dentro do campo de polígonos os vizinhos e
classificar a valência dos vértices. Foram excluídos da análise morfométrica todos os polígonos
com um número de vizinhos igual a zero, correspondendo a polígonos isolados ou das camadas
exteriores/limítrofes das redes poligonais.
35
Tabela 4‐2 Parâmetros de dimensão, forma e topológicos integrados no estudo dos polígonos.
Parâmetros
Unidades ou Escala
Fonte / Cálculo
Dim
ensão
Área (A) metro² ArcGIS
Eixo Maior (E>) metro ArcGIS
Eixo Menor (E<) metro ArcGIS
Eixo Médio (Em) metro 2
Perímetro (P) metro ArcGIS
Form
a
Alongamento (Al) de 0 a 1
Compacidade (C) de 0 a 1 2√
Circularidade (Cc) de 0 a 1
Topologia Vértices (Vt) numérico Algoritmo
Vizinhos (Vz) numérico Algoritmo
4.2.5. Geodatabase
A geodatabase é uma forma comum de organização de dados e uma estrutura de
gestão do ArcGIS. Tem como objectivo criar um repositório central de dados permitindo
organizar todo o tipo de informações geográficas em temas de dados estruturados com
conteúdos e representações de camadas temáticas específicas. O armazenamento de dados
numa geodatabase fomenta uma melhor organização da informação espacial e melhora as
capacidades de gestão de dados. A estrutura da geodatabase reflecte esta organização
definindo a forma como os elementos geográficos são representados para cada tema,
agrupando os dados individuais em conjunto de dados, designados por feature classes,
atributos, conjuntos de dados matriciais e relações espaciais entre conjuntos de dados. O
design da geodatabase permite visualizar cada conjunto de dados com os seus elementos
geográficos (pontos, linhas e polígonos) e correspondentes tabelas de atributos.
Para este trabalho todos os elementos descritos nas secções anteriores foram
compilados e armazenados numa base de dados com a mesma referência espacial para
36
permitir um fácil acesso e edição da informação, constituindo a geodatabase de Adventdalen
(Figura 4‐16).
Feature datasetIceWedge_Adventdalen
Polygon feature class Poligonos
Point feature class Poligonos_centroides
Polygon feature class Redes_poligonais
Feature datasetVariaveisAmbientais
Polygon feature class Geologia_100k
Polygon feature class Geomorfologia_100k
Line feature class RiosAdventdalen_LinhaCosta
TableStats_Redes
TablePoligonos_Parametros
Relationship class
One to one
Stats_to_Redes
Relationship class
One to many
ParametrosMorfometricos
Relationship class
One to many
Polygon_to_Point
Relationship class
One to many
RedeID_to_Points
Relationship class
One to many
Geology_to_PolygonsGeomorphology_to_PolygonRiosAdventdalen_LinhaCosta
Estruturada Geodatabase
Raster datasetVariaveisAmbientais
Raster datasetMapaCurvaturaTerreno
Raster datasetMapaDeclives
Raster datasetMapaExposicaoCardeal
Raster datasetMapaGeologico_100k
Raster datasetMapaGeomorfológico_100k
Raster datasetMapaTerrainRuggednessIndex
Raster datasetMapaTopográfico_100k
Raster datasetMapaWetnessIndex
Raster datasetMDT
Figura 4‐16 Design da Geodatabase e respectiva estrutura
Estruturadabasededados‐Polígonos
De modo a caracterizar cada um dos polígonos e a integrar os dados na geodatabase,
usou‐se o ponto central de cada polígono para extrair os parâmetros morfométricos, a
informação espacial e topográfica. Os dados foram incluídos num único elemento geográfico,
passando assim todos os atributos, relevantes para a análise estatística, a estar conciliados
numa única tabela.
A Figura 4‐17 apresenta a estrutura do conjunto de dados, tabelas de atributos e
respectivas relações espaciais referentes aos elementos geográficos que representam os
polígonos de cunha de gelo e as redes poligonais.
37
Figura 4‐17 Estrutura do conjunto de dados para os polígonos de cunha de gelo
Estruturadabasededados‐Variáveisambientais
Todos os parâmetros ambientais obtidos para este estudo foram agrupados na geodatabase. A
Figura 4‐18 representa a estrutura do conjunto de elementos geográficos, com as respectivas
tabelas de atributos, descrição dos subtipos e relações espaciais. O esquema e descrição dos
layers temáticos utilizados como variáveis ambientais são apresentados na
Figura 4‐19.
38
Figura 4‐18 Estrutura do conjunto de dados para as variáveis ambientais
39
Figura 4‐19 Esquema dos layers temáticos utilizados na geodatabase
40
5. Resultadosediscussão
5.1. Introdução
Os processos geomorfológicos à superfície são controlados pelas características do
terreno e do clima e, em particular, pelo respectivo contexto geomorfológico. Significa
portanto que as formas à superfície dependem de factores ambientais, que controlam a
configuração não ao acaso de algumas estruturas. Deste modo, o estudo dos factores que
controlam a presença das formas de relevo e os processos geomorfológicos nas regiões
periglaciárias constitui um tema importante na investigação em geomorfologia periglaciária
(Ballantyne e Harris, 1994).
O crescimento da utilização de métodos estatísticos para a interpretação de relações
existentes entre uma variável dependente e variáveis preditivas, juntamente com a evolução
das ferramentas SIG, tem facilitado um rápido desenvolvimento da modelação espacial
aplicada à geomorfologia (Luoto e Hjort, 2004; Melo, 2009).
O presente capítulo tem por objectivo compreender a relação geomorfométrica dos
polígonos com as condições ambientais por meio de estatística multivariada baseada em
dados de alta resolução obtidos por detecção remota, e em dados topográficos modelados em
ambiente SIG.
5.1.1. Caracterizaçãomorfométricadospolígonos
O estudo dos fenómenos associados à formação de polígonos de cunha de gelo
sempre despertou interesse na comunidade científica devido a estes poderem conter
informação sobre climas e processos geomorfológicos passados (Lanchenbruch 1966). Nas
últimas décadas prosperaram os estudos acerca destas estruturas devido à existência de
geoformas semelhantes em Marte ( Mangold 2005; Bandeira et al. 2008; Levy et al. 2010;
Haltigin et al. 2010; Ulrich et al. 2011; Pina & Vieira 2012). O primeiro passo da maioria dos
estudos passa por caracterizar a morfometria dos polígonos e redes poligonais, dado que a
morfologia dos polígonos está relacionada com as dinâmicas climáticas locais e regionais,
reflectindo‐se nas diferenças de tamanho, forma e topologia (Ulrich 2011).
Para este trabalho, foi igualmente caracterizada a geomorfometria dos polígonos em
estudo, para o qual foram seleccionados um total de 9220 polígonos (após a exclusão das
formações com um número de polígonos inferior a 25 e número de vizinhos nulo). A
caracterização morfométrica dos polígonos foi realizada partindo dos parâmetros descritos na
metodologia e resumidos na Tabela 5‐1.
41
Tabela 5‐1 Características estatísticas dos parâmetros morfométricos dos polígonos de Adventdalen
A dimensão dos polígonos em Adventdalen apresenta uma grande amplitude, com
áreas entre os 5m2 e os 17500m2, no entanto a média (408m2) indica que os polígonos de
maiores dimensões são menos frequentes (Figura 5‐1).
Parâmetros Mínimo Máximo Média Desvio Padrão
Dim
ensão
Área (A) 5,74 17665,91 408,30 502,66
Eixo Maior (E>) 4,12 190,48 26,31 13,71
Eixo Menor (E<) 1,49 135,49 17,84 9,25
Eixo Médio (Em) 3,04 162,99 22,08 11,18
Perímetro (P) 11,25 548,99 75,86 38,17
Form
a
Alongamento (Al) 0,19 1,00 0,69 0,14
Compacidade (C) 0,48 0,96 0,85 0,05
Circularidade (Cc) 0,23 0,92 0,72 0,09
Topologia
Vizinhos (Vz) 1 16 4,94 2,28
Vértices (Vt) 1 13 4,06 1,79
Valência dos vértices Percentagem
Trivalentes 78%
Tetravalente 21%
Pentavalentes 1%
42
Figura 5‐1 Caracterização geomorfométrica – números de polígonos e respectivos parâmetros de circularidade e média do número de vértices tetravalentes ‐ para o número total de polígonos estudados.
A Figura 5‐1 mostra um gráfico com a dimensão, circularidade e média dos vértices
tetravalente dos polígonos de Adventdalen (divididos através do método de classificação
Natural Breaks). A análise do gráfico permite ter uma percepção sobre a distribuição do
número de polígonos, relativamente aos restantes parâmetros. A grande maioria dos
polígonos tem uma dimensão pequena ou pequena/média (75 a 150; 300 a 500m2), sendo
que, por exemplo, quase 1800 polígonos apresentam uma área apenas entre 75 e 150m2. O
gráfico permite verificar que para polígonos menores, maior é o número de vértices
tetravalentes; a circularidade não apresenta variações muito visíveis mas tende a ser
ligeiramente superior nos polígonos menores (para o último intervalo de grandeza este
parâmetro é considerado um outlier por ser só 1 polígono). No que respeita ao número de
vértices, o padrão observado parece estar de acordo com a bibliografia, uma vez que está
descrito que a fracturação secundária origina polígonos de menores dimensões e uma maior
frequência de vértices tetravalentes, sendo este um indicador da ortogonalidade das redes
poligonais (Lanchenbruch 1966, French 2007). O inverso, ou seja, a diminuição da tetravalência
dos vértices com o aumento do tamanho da dimensão, vai ao encontro da teoria da formação
de polígonos, em que os primeiros polígonos formados são de maiores dimensões com um
menor número de vizinhos para partilhar os vértices e à medida que a repetição do
congelamento e descongelamento sazonal forma novas fracturas dentro dos polígonos,
711
1794
1610
1084
1675
947
705
425
177
6823 1
0,00
0,20
0,40
0,60
0,80
1,00
1,20
0
200
400
600
800
1000
1200
1400
1600
1800
2000
Área (m²)
Circularidade
Média de vértices Tetravalentes por polígono
Número de polígonos
Área (m²)
Circularidad
e e M
édia de vértices
Tetravalentes
Número de polígonos
43
originando a sua subdivisão em polígonos menores e consequentemente um maior número de
vizinhos com quem partilhar os vértices. Esta última condição não se verifica totalmente pela
análise do gráfico, dado que a partir da classe de áreas [1000‐1500[, o número de
tetravalentes começa a aumentar. Isto poderá dever‐se a um problema de amostragem, pelo
facto de as classes de maiores dimensão apresentam um reduzido número de polígonos em
comparação com as classes de dimensão mais pequenas.
Uma elevada percentagem de polígonos mais pequenos e com maior número de
tetravalentes (Figura 5‐1) pode ainda ser um indicador da fase de evolução das redes
poligonais. Os polígonos com mais tetravalentes geralmente apresentam uma menor variação
no tamanho dos polígonos, parecendo que tendem a estabilizar ou regularizar a fracturação.
5.1.2. Variáveisgeoecológicas
Não existe um critério universal para a selecção de variáveis preditivas para as análises
estatísticas, pelo que para este trabalho, a compilação das variáveis foi baseada na bibliografia
e na compreensão global dos processos ambientais que estão na origem e desenvolvimento
dos polígonos (Capítulo 2.1). Assim, como variáveis independentes foram utilizados os
modelos elaborados no Capítulo 4.2.3, nomeadamente o MDT, declive, exposição das
vertentes, curvatura do terreno, Wetness Index, Terrain Ruggedness Index, distância às linhas
de água e à linha de costa, geologia e finalmente a geomorfologia (Tabela 5‐2). Para a análise
estatística foram integradas variáveis independentes contínuas e também categóricas. As
variáveis geologia e geomorfologia foram analisadas como variáveis categóricas, em que cada
uma das unidades foi inserida individualmente na base de dados, sendo para cada ponto
central dos polígonos atribuído um valor de presença (1) ou ausência (0). As outras variáveis
categóricas, como a exposição e a curvatura do terreno, foram reclassificadas de acordo com o
descrito no capítulo 4.2.3.
44
Tabela 5‐2 Variáveis preditivas utilizadas na análise estatística
Parâmetros Classificação da variável
Unidades ou Escala Fonte / Cálculo
Altitude contínua metros MDT
Declive contínua graus MDT
Exposição Cardial categórica orientação MDT
Curvatura do Terreno categórica curvatura MDT
SWI contínua numérico MDT
TRI contínua numérico MDT
Distância às linhas de água contínua metros ArcGIS
Distância ao mar contínua metros ArcGIS
Geologia categórica Unidade geológica Mapa Geológico
Geomorfologia categórica Unidade
geomorfológica
Mapa
Geomorfológico
5.2. Caracterizaçãodasredespoligonais
5.2.1. Análisemorfométricadasredes
O estudo morfométrico realizou‐se com a totalidade dos polígonos em estudo, distribuídos pelas 36 grandes redes poligonais definidas (Tabela 5‐3).
45
Tabela 5‐3 Análise descritiva dos parâmetros morfométricos das redes poligonais
A1 A2 A3 A4 A5 A6 A7 A8 A9 A10 A11 A12 A13 A14 A15 A16 A17 A18
N 53 39 160 92 29 768 121 2186 69 92 909 144 42 258 76 62 402 31
Área média (m²) 1427,04 1406,56 528,6 288,88 226,92 197,9 747,26 170,32 376,75 299,25 327,23 552,55 975,61 352,41 443,09 640,54 618,64 473,47
Área total (m²) 75633 54856 84575 26577 6581 151989 90419 372315 25996 27531 297448 79566 40976 90922 33675 39713 248694 14678
Perímetro 141,92 153,3 89,11 68,97 60,32 52,4 103,03 52,27 77,24 68,31 70,9 89,71 116,64 74,3 82,93 100,66 94,78 82,85
Eixo médio 40,83 44,38 25,58 19,84 17,15 15,21 30,29 14,98 22,39 19,68 20,53 26,01 34,45 21,79 23,81 28,88 27,83 24,32
Alongamento 0,67 0,63 0,65 0,67 0,7 0,7 0,7 0,7 0,66 0,7 0,67 0,66 0,72 0,7 0,67 0,7 0,69 0,67
Compacidade 0,83 0,8 0,82 0,84 0,84 0,85 0,85 0,85 0,85 0,83 0,85 0,83 0,85 0,86 0,84 0,83 0,86 0,86
Circularidade 0,7 0,65 0,68 0,71 0,71 0,72 0,72 0,72 0,73 0,69 0,73 0,69 0,73 0,74 0,7 0,7 0,73 0,74
Média nº de Vértices 3,4 3,51 3,96 3,43 2,9 4,48 3,11 4,33 3,68 4,2 4,49 3,6 3,12 4,73 3,21 2,98 3,85 2,48
% VERT3 Valências 78,33 76,64 84,23 83,54 85,71 74,06 86,17 66,33 87,4 73,06 73,73 86,71 84,73 87,88 72,54 89,19 91,99 74,03
% VERT4 Valências 21,67 23,36 15,77 16,46 14,29 25,94 13,83 33,04 12,6 26,94 25,78 12,33 15,27 12,12 27,46 10,81 8,01 25,97
% VERT5 Valências 0 0 0 0 0 0 0 0,62 0 0 0,49 0,96 0 0 0 0 0 0
Média nº de Vizinhos 4,132 4,333 4,588 4 3,31 5,639 3,537 5,815 4,145 5,326 5,691 4,118 3,595 5,306 4,092 3,306 4,162 3,129
A19 A20 A21 A22 A23 A24 A25 A26 A27 A28 A29 A30 A31 A32 A33 A34 A35 A36
N 54 65 75 44 466 604 223 302 528 140 271 46 161 382 52 41 183 50
Área média (m²) 503,31 99,1 582,98 452,35 744,52 493,87 536,18 501,91 604,87 737,82 606,93 538,01 481,27 374,94 620,61 646,58 493,29 142,25
Área total (m²) 27179 6441 43723 19903 346948 298299 119569 151578 319371 103295 164477 24748 77485 143226 32272 26510 90272 7113
Perímetro 88,6 39,79 97,22 85,14 106,58 83,19 91,8 87,46 96,04 105,87 96,13 91,83 87,2 73,26 97,99 98,61 86,8 44,86
Eixo médio 26,2 11,61 28,45 24,23 31,47 24,37 26,92 25,67 28,04 31,14 28,08 26,62 25,47 21,34 28,85 28,44 25,5 13,26
Alongamento 0,71 0,7 0,67 0,67 0,68 0,7 0,7 0,68 0,68 0,67 0,68 0,71 0,69 0,68 0,71 0,72 0,68 0,72
Compacidade 0,86 0,86 0,85 0,84 0,85 0,86 0,85 0,85 0,85 0,85 0,85 0,87 0,85 0,85 0,87 0,87 0,85 0,86
Circularidade 0,75 0,74 0,72 0,71 0,73 0,73 0,72 0,73 0,73 0,73 0,73 0,76 0,73 0,73 0,75 0,75 0,73 0,75
Média nº de Vértices 3,63 3,2 2,75 3 4,16 3,77 4,49 3,89 4,39 3,32 3,85 2,63 3,6 4,26 2,17 2,63 2,52 3,52
% VERT3 Valências 91,84 80,77 96,12 90,91 89,26 85,94 89,61 85,97 82,41 89,68 83,13 96,69 83,42 85,98 92,92 88,89 90,46 75
% VERT4 Valências 8,16 19,23 3,88 9,09 10,74 14,06 10,39 13,61 16,73 10,32 16,87 3,31 16,58 14,02 7,08 11,11 9,54 25
% VERT5 Valências 0 0 0 0 0 0 0 0,43 0,86 0 0 0 0 0 0 0 0 0
Média nº de Vizinhos 3,926 3,815 2,853 3,273 4,603 4,298 4,955 4,457 5,203 3,664 4,498 2,717 4,193 4,853 2,327 2,927 2,76 4,4
46
Os valores médios dos parâmetros morfométricos permitem verificar que ao longo do
fundo de vale de Adventdalen, existe grande variedade nas características das redes
poligonais. Veja‐se o caso do número de polígonos que as constituem (A5 = 29 e A8 = 2186),
ou da diversidade de tamanhos, variando entre 91m2 (A20) e 1427m2 (A1). Relativamente ao
parâmetro dimensão, o facto mais interessante é a existência de duas redes poligonais (A1 e
A2) com valores muito superiores às restantes, sendo as únicas em que os polígonos têm uma
área média superior a 1000m2. Este facto pode dever‐se aos polígonos de grandes dimensões
apresentarem nesta rede cunhas mais degradadas ou cobertas por vegetação dificultando a
interpretação correcta por detecção remota da geometria dos polígonos, mas também pode
ser uma consequência das condições ambientais e topográficas. A existência de polígonos de
grandes dimensões pode sugerir que não ocorreu fracturação secundária, seja por ser uma
zona em que a actividade de fracturação esteja inactiva ou menos activa, ou por a área em
questão não reunir as condições de temperatura, topografia e/ou de tipo de solo, não
permitindo a ocorrência de novas fracturas.
A caracterização topológica baseada na variável Número de Vizinhos apresenta para
todas as 36 redes uma média de 4 vizinhos por polígono, embora exista uma grande amplitude
de valores, variando estes entre 2,33 (A33) e 5,815 (A8). Observa‐se também que o Número de
Vizinhos é maior com o aumento do número de polígonos da rede (Figura 5‐2). De acordo com
Weaire (1974 ) e Pina et al. (2008), o Número de Vizinhos tem a tendência para aproximar‐se
de 6 com o incremento do número de polígonos, isto por ser o valor determinado por uma
rede infinita trivalente. Esta tendência verifica‐se para as redes de Adventdalen, suportada por
84% destas apresentarem uma natureza trivalente.
47
Figura 5‐2 Relação entre o número de polígonos por rede poligonal e o Número de Vizinhos para as redes de Adventdalen
Outro resultado interessante que a análise descritiva permitiu observar, revelou‐se
analisando a distribuição espacial dos valores médios dos valores de dimensão e de forma de
cada uma das redes, permitindo observar uma diferenciação espacial entre as redes de
polígonos a Oeste e as redes mais a Este (Figura 5‐3 e Figura 5‐4). Esta divisória situa‐se
sensivelmente no sector central do vale, dividindo as redes em dois grupos, formando mais a
Oeste um sector constituído por 15 redes, totalizando 5038 polígonos e outro, mais a Este,
com 4182 polígonos distribuídos por 21 redes.
48
Figura 5‐3 Variação espacial da variável Área das redes poligonais de Adventdalen
A Figura 5‐3 e a Figura 5‐5 permitem observar a variação espacial dos valores médios
da variável Área, é perceptível que o sector mais a Oeste apresenta uma maior assimetria de
tamanho dos polígonos que constituem as redes, em que 3 das suas redes apresentam os 3
maiores registos e a maioria das restantes representam as médias mais baixas. O sector a Este
tem uma distribuição mais uniforme da Área média dos polígonos, observando‐se que as redes
em termos de área têm tamanhos médios semelhantes e não sofrem grandes oscilações.
Figura 5‐4 Variação espacial da variável Compacidade das redes poligonais de Adventdalen
49
Outra variável em que a diferenciação das redes é visível é a Compacidade. Analisando
a distribuição do parâmetro é evidente a separação entre os dois sectores, verificando‐se que
o sector Este apresenta valores médios de compacidade mais elevados que o sector a Oeste
(Figura 5‐4 e Figura 5‐5). De referir, que tendo em conta todo o espectro do parâmetro, os
valores apresentados para a zona Este são bastante elevados, indicando que estes apresentam
uma forma globalmente mais compacta e um pouco mais arredondada.
Figura 5‐5 Diferenciação espacial das redes poligonais (A1 a A36) de Adventdalen reflectida nos parâmetros Área e Compacidade.
Relativamente à variável topológica Número de Vizinhos, de acordo com a distribuição
dos valores médios (Tabela 5‐3) não existe uma diferença evidente entre os sectores Oeste e
Este, apresentando ambas uma distribuição heterogénea e valores médios de Número de
Vizinhos por polígono de 4,5 para o sector Oeste e 3,8 para o sector Este. Já a variável Número
de Vértices Tetravalentes apresenta valores médios mais elevados para o sector Oeste, em que
20% dos vértices são tetravalentes, sendo que para o sector a Este os mesmos representam
13% dos casos. Uma maior frequência de vértices tetravalentes, para o sector Oeste, expressa
uma actividade contínua da fracturação por contracção térmica na subdivisão progressiva do
polígono (Ulrich 2011), formando polígonos de forma regular e de menores dimensões
(Lanchenbruch 1966), o que se verifica para a maioria deste sector (ver Figura 5‐3 e Figura
5‐5).
0,78
0,79
0,8
0,81
0,82
0,83
0,84
0,85
0,86
0,87
0,88
0
200
400
600
800
1000
1200
1400
1600Área média (m²)Compacidade Oeste Este
50
5.2.2. Análisegeoecológicadadiferenciaçãoespacialmorfométrica
Mediante a observação da diferenciação espacial mencionada no subcapítulo anterior,
procedeu‐se à análise de possíveis variações geoecológicas ao longo de Adventdalen que
expliquem a diferenciação morfométrica encontrada. Para tal, foi realizada a análise estatística
descritiva das variáveis geoecológicas para as 36 redes poligonais, mostrando a Tabela 5‐4 os
valores médios para cada um dos sectores. A análise dos valores aponta também para uma
distinção das variáveis geoecológicas ao longo do vale.
51
Tabela 5‐4 Áreas médias das variáveis geoecológicas nas redes de polígonos dos sectores Oeste e Este de Adventdalen
Sector Oeste
Sector Este
Geologia %
Depósitos fluviais e fluvioglaciários 61,77 0,69
Formação Rurikfjellet: argilito e siltito, arenito na zona superior 1,91 27,05
Depósitos marinhos costeiros 35,29 0
Formação Firkanten: arenito, siltito e argilito, com camadas carboníferas 1,03 0
Formação Helvetiafjellet: arenito, siltito e argilito limitados, carvão pontualmente
0 4,76
Formação Agardhfjellet: argilito negro e siltito, algum arenito na zona inferior 0 64,26
Formação De Geerdalen: arenito e argilito 0 0,95
Formação Knorringfjellet: arenito, argilito e conglomerado 0 2,29
Geomorfologia %
Material fluvial, pré‐recente 67,43 0,14
Material fluvial, recente 24,33 12,65
Pingo 5,4 0
Material fluvioglaciário 0 22,04
Material de solifluxão 2,27 18,27
Till 0,22 13,23
Material de meteorização (crioclastia), autóctone 0 31,98
Material de meteorização (crioclastia), alóctone 0 1,55
Material de depósitos eólicos 0,3 0,13
Material marinho, material de praia 0,05 0
Exposição %
Este 7,06 0,31
Nordeste 12,64 0,66
Noroeste 14,46 19,86
Norte 14,86 21,55
Oeste 17,5 8,76
Sudeste 5,38 6,47
Sudoeste 19,31 16,86
Sul 8,8 25,55
Curvatura %
Côncavo 46,94 49,10
Convexo 51,38 50,31
Plano 1,68 0,59
Outras (valor médio)
Altitude (m) 11,52 131,54
Declive (º) 1,16 5,58
SWI (escala numérica) 15,88 11,88
TRI (escala numérica) 0,5 2,21
Distância às linhas de água (m) 580,03 614,57
Distância ao mar (m) 4878,12 17169,15
52
O sector a Oeste localiza‐se mais próximo da linha de costa e na zona mais plana do
vale, tendo uma altitude média a de cerca de 10m, estando as redes intercaladas na rede de
drenagem, que neste sector é mais densa. De acordo com Sørbel & Tolgensbakk (2002) para
esta secção, onde os polígonos se encontram mais próximos do nível do mar, a sua idade deve
ser relativamente nova, dado que estas áreas só muito recentemente emergiram devido à
ocorrência de um ressalto isostático, quando o nível do mar desceu para a posição actual há
cerca de 4300 anos (Lønne & Nemec 2004). Em termos geológicos as redes deste sector
desenvolvem‐se em depósitos do Quaternário, essencialmente não consolidados marinhos
costeiros (35%) ou fluviais e fluvioglaciários (62%) (Major et al. 2001). Em termos
sedimentológicos, os depósitos marinhos costeiros apresentam uma grande variedade
granulométrica, podendo ser constituídos por argila, silte, areias e cascalho (Major & Nagy
1972). Os depósitos fluviais e fluvioglaciários são muito similares entre si (Sørbel et al. 2001), e
constituídos por material ordenado de areia, cascalho e no caso dos fluviais, podendo conter
seixos rolados (Sørbel et al. 2001). Relativamente à exposição do terreno, as redes apresentam
uma primazia pelas orientações Sudoeste (19%) e Oeste (18%).
Relativamente ao sector Este, as condições geoecológicas distinguem‐se das do sector a Oeste,
apresenta maiores valores médios de altitude (132m) e declives mais acentuados (média de
6º). Embora muitos polígonos sejam encontrados em Svalbard com declives até 25° (Sørbel &
Tolgensbakk 2002), este factor, juntamente com uma maior rugosidade do terreno, pode
contribuir para um menor número de polígonos neste sector. A exposição dos polígonos
denota uma preferência pelas orientações Sul, Norte e Noroeste, que deverá estar relacionada
com a própria orientação do vale. A maior altitude deste sector contribui também para que
não exista deposição Quaternária, essencialmente fluvial, e as unidades geológicas presentes
são a Formação Agardhfjellet a uma altitude mais elevada (64%) e a Formação Rurikfjellet
(27%), para as altitudes mais baixas deste sector. Estas representam uma sequência marinha
de argilito pertencente ao subgrupo Janusfjellet, com idades compreendidas entre o Jurássico
Médio (168,3 Ma) e o Cretácico Inferior (129,4 Ma) (Dallmann et al. 2001). As litologias
presentes nas duas formações são argilito, siltito e arenito, sendo que as quantidades de siltito
e arenito apresentam uma relação proporcional com a altitude (Major & Nagy 1972), portanto
maiores na Formação Agardhfjellet. Para as altitudes mais elevadas de Adventdalen, os
polígonos em termos geomorfológicos ocorrem principalmente em material de meteorização
(crioclastia), autóctone, e de acordo com Sørbel & Tolgensbakk 2002, o desenvolvimento de
polígonos neste material só ocorre onde o leito rochoso subjacente é de Idade Cretácica ou
mais antiga, tal como se verifica para esta secção. A unidade material de meteorização
53
autóctone representa sedimentos que não foram afectados por processos gravíticos (Sørbel et
al. 2001).
A análise sedimentológica das redes poligonais (Lanchenbruch 1966) veio demonstrar
relações com a variação granulométrica e o estágio de desenvolvimento da rede,
concretamente, uma correlação positiva entre a dimensão do detritos e a dimensão das redes,
onde locais com maior composição de depósitos de granulometria fina apresentam padrões
mais pequenos e regulares. Isto vai ao encontro do observado na Figura 5‐5, em que para o
sector Oeste, a dimensão média dos polígonos apresenta valores mais baixos (excluindo a A1 e
a A2 que são redes poligonais anormalmente grandes para a espectro existente em
Adventdalen), e apoiado pelos estudos sedimentológicos efectuados por Ulrich (2011), Oliva et
al. (2014) para redes poligonais em Adventdalen. Estes sugerem que no sector Oeste, os
polígonos desenvolvem‐se em sedimentos de natureza mais siltosa e de granulometria mais
homogénea, enquanto para o sector Este apresentam materiais de granulometria mais
grosseira e heterométrica, constituídos por areia e cascalho.
5.3. Classificação e caracterização dos grupos morfométricos de
redesdepolígonos
5.3.1. Classificaçãomorfométricadasredesdepolígonos
a) Análise em Componentes Principais
Não são conhecidos estudos de classificação das redes de polígonos terrestres no que
respeita à sua morfometria. Procurou‐se, neste capítulo, criar grupos que espelhassem as
semelhanças morfométricas entre as 36 redes poligonais identificadas em Adventdalen. O
primeiro passo consistiu em identificar, de entre a totalidade das variáveis morfométricas
estudadas, quais as que mais contribuem para a definição de diferentes grupos baseados na
similaridade morfométrica de cada uma das redes poligonais, através da aplicação de uma
análise factorial para o conjunto de valores médios das 36 redes.
54
Tabela 5‐5 A) Resultados da análise factorial para os grupos morfométricos de Adventdalen. A) Valores próprios da matriz de correlação amostral, juntamente com a proporção de variância explicada por cada factor e a proporção de variância acumulada pelos factores, B) Matriz dos loadings, indicando o peso de cada variável para cada factor
A) Variação total
explicada B)
Matriz dos factores após rotação
Factor
Valores Próprios
Factor
Total % da
Variância Cumulativo
% 1 2 3
1 5,96 45,83 45,83 Área ,95 ,09 ,18
2 3,57 27,44 73,28 Eixo Médio ,97 ,04 ,24
3 1,70 13,09 86,37 Eixo Menor ,95 ,00 ,28
4 ,86 6,65 93,02 Eixo Maior ,97 ,06 ,21
5 ,65 4,98 97,99 Perímetro ,97 ,05 ,22
6 ,23 1,78 99,77 Alongamento ‐,63 ‐,47 ,39
7 ,03 ,21 99,98 Compacidade ‐,46 ‐,66 ,56
8 ,00 ,01 99,99 Circularidade ‐,45 ‐,66 ,56
9 ,00 ,00 100,00 Vértices ‐,36 ,82 ,42
Método de extração: Análise de Componentes Principais.
Vert3 ‐,21 ,61 ,62
Vert4 ‐,40 ,69 ‐,17
Vert5 ‐,18 ,44 ,11
Vizinhos ‐0,41 0,86 0,25
Os três primeiros factores cumulativamente correspondem a 86% da variância
morfométrica total, sendo que o primeiro equivale a 45,83%, o segundo a 27,44% e o terceiro
a 13,09%, o que reflecte uma elevada capacidade explicativa (Tabela 5‐5 A). De acrescentar
que os dois primeiros factores revelam uma maior afinidade por dois tipos de parâmetros
morfométricos, os de dimensão e os topológicos (Tabela 5‐5 B). O primeiro factor, de acordo
com o peso atribuído às diferentes variáveis, apresenta scores fortemente positivos para as
variáveis de dimensão (superiores a 0,9) (Figura 5‐6), e deste modo pode‐se afirmar que os
parâmetros dimensionais são os que mais contribuem para a definição dos diferentes grupos
morfométricos.
O segundo factor apresenta uma maior influência dos parâmetros topológicos, sendo
que as variáveis número de vértices e número de vizinhos são as que mais contribuem para a
definição do factor, com pesos superiores a 0,80 (Figura 5‐6). As outras variáveis que
contribuem também positivamente são o número de vértices trivalentes seguido dos vértices
tetravalentes.
55
Figura 5‐6 Gráfico de projecção das variáveis para os 2 primeiros factores resultantes do método de Análise de Componentes Principais
Relativamente ao terceiro factor principal, observa‐se que são os parâmetros de
forma, circularidade (0,56) e compacidade (0,56), juntamente com os vértices trivalentes (0,62)
que têm o maior peso.
b) Análise hierárquica ascendente
Com o objetivo de classificar as redes segundo as suas características morfométricas
procedeu‐se à análise hierárquica para os valores médios de cada uma das áreas de redes,
resultando um dendrograma que exprime o grau de similaridade morfométrico dentro e entre
os agrupamentos naturais formados do conjunto das 36 áreas de redes (Figura 5‐7).
O dendrograma resultante permite observar diversos níveis de agrupamentos até à
distância de ligação 25, expressando a relação morfométrica entre todas as redes poligonais. A
escolha da medida de distância mais adequada para formar os clusters morfométricos baseou‐
se na análise das relações entre os agrupamentos e respectivo número de redes que os
constitui, e com a premissa de evitar que a separação entre os agrupamentos corresponda a
grandes distâncias de ligação para não perder a identidade morfométrica, ou que reflictam
uma homogeneidade interna muito grande impossibilitando um diferenciação morfométrica.
Por tal, decidiu‐se cortar o dendrograma à distância de ligação 5, formando uma classificação
das 36 redes em 6 grupos morfométricos (Figura 5‐7).
A descrição estatística das redes (Tabela 5‐6) permite verificar, tal como a análise
factorial indicou, que para a classificação morfométrica obtida, os principais critérios de
diferenciação são os parâmetros de dimensão. Esta diferenciação é explícita nos dois maiores
agrupamentos representados no dendrograma (Figura 5‐7) à distância de ligação 25. O
56
agrupamento na zona inferior (Tipo A) do dendrograma é constituído pelos grupos
morfométricos 3 e 4, apresentando valores de dimensão média dos polígonos das redes de
336 e 167 m2 respectivamente, contrastando com o agrupamento superior (Tipo B),
constituído pelos grupos morfométricos 1, 2, 5 e 6, que apresentam dimensões médias
superiores a 500m2. No próximo subcapítulo serão analisadas com mais detalhe as
características morfométricas de cada grupo e a sua distribuição espacial.
57
Figura 5‐7 Dendrograma de similaridade morfométrica para as 36 redes poligonais de Adventdalen, calculado pelo método de Ward, com base numa matriz de distâncias euclidianas. A linha vermelha representa o corte à distância de ligação 5 definindo 6 clusters
morfométricos (GM1 a GM6)
GM1
GM2
GM3
GM4
GM6
GM5
Agrupamento de redes
poligonais de menores
dimensões (Tipo A)
Área média <350m2
Agrupamento de redes
poligonais de maiores
dimensões (Tipo B)
Área média > 450m2
58
5.3.2. Caracterizaçãodosgruposmorfométricosderedesdepolígonos
A Tabela 5‐6 e a Figura 5‐9 descrevem as características morfométricas e geoecológicas
para cada um dos grupos morfométricos. A distribuição espacial das redes poligonais
classificadas para cada grupo morfométrico está representada na Figura 5‐8.
GrupoMorfométrico1(GM1):
O grupo morfométrico 1 é constituído por apenas duas redes, uma com 39 e a outra
com 53 polígonos, apresentando as redes poligonais de maiores dimensões, com a média de
Área superior a 1400m2. Os polígonos destas redes podem ser designados por gigantes, tendo
em conta o espectro dimensional para Adventdalen, apresentando uma Área média superior a
1400m2. O tamanho dos polígonos que definem o grupo reflecte‐se nos parâmetros de forma,
com valores baixos, indicando baixas circularidade e compacidade. O número de vizinhos por
polígono para este grupo é o mais baixo, podendo indicar que os polígonos são bastante
recentes não existindo ainda uma fracturação secundária, ou então, encontram‐se numa zona
em que os polígonos não estão activos ou têm menor actividade. O trabalho de Sørbel &
Tolgensbakk (2002), afirma que para as áreas mais costeiras, onde o permafrost foi formado
mais recentemente, os polígonos são mais novos, dando força à hipótese sugerida de as
dimensões maiores dos polígonos e respectivo baixo número de vizinhos deste grupo
morfométrico se dever a uma idade mais recente dos polígonos (a Figura 5‐8 evidencia a
localização costeira do GM1).
Este grupo, por ser o mais próximo da linha de costa é também o mais ocidental, e
sujeito a maior controlo climático. Apresenta também vários outros factores que o distingue
dos demais, nomeadamente a menor altitude, ~6m, e a menor declividade, ~0,6°. Por outro
lado apresenta os maiores valores de teor de SWI e maior percentagem de superfície plana,
2,25% (Figura 5‐9). Localizado na extremidade Oeste do vale, os polígonos localizam‐se sobre
depósitos do Quaternário de proveniência costeira ou fluvial, sendo estes últimos de origem
pré‐recente, ou seja, depósitos localizados em superfícies sem condições fluviais activas
presentemente (Dallmann et al. 2001, Sørbel et al. 2001).
59
Tabela 5‐6 Estatística descritiva dos parâmetros morfométricos para os 6 grupos morfométricos de redes de polígonos de Adventdalen, definidos na análise hierárquica
Variáveis morfométricas
N redes
Área Eixo
Médio Eixo
Menor Eixo
Maior Perímetro Alongamento Compacidade Circularidade Vértices Vert3 Vert4 Vert5 VIZINHOS
Gru
po M
orfo
mét
rico
GM1
Min
2
1406,56 40,83 32,69 48,96 141,92 0,63 0,80 0,65 3,40 2,66 0,74 0,00 4,13
Max 1427,04 44,38 34,32 54,45 153,30 0,67 0,83 0,70 3,51 2,69 0,82 0,00 4,33
Média 1416,80 42,60 33,51 51,70 147,61 0,65 0,82 0,67 3,45 2,68 0,78 0,00 4,23
Desvio Padrão 14,48 2,52 1,15 3,88 8,05 0,03 0,02 0,03 0,08 0,02 0,06 0,00 0,14
GM2
Min
12
443,09 23,81 19,41 28,21 82,85 0,65 0,82 0,68 2,48 1,84 0,09 0,00 2,72
Max 552,55 26,92 22,09 31,87 91,83 0,71 0,87 0,76 4,49 4,02 0,88 0,03 4,96
Média 499,83 25,39 20,52 30,27 87,22 0,69 0,85 0,72 3,40 2,93 0,47 0,00 3,88
Desvio Padrão 34,37 1,00 0,96 1,17 3,19 0,02 0,01 0,02 0,63 0,60 0,22 0,01 0,73
GM3
Min
6
288,88 19,68 15,36 23,93 68,31 0,66 0,83 0,69 3,43 2,87 0,46 0,00 4,00
Max 376,75 22,39 18,30 26,47 77,24 0,72 0,86 0,74 4,73 4,16 1,16 0,02 5,69
Média 336,58 20,93 16,84 25,02 72,16 0,69 0,85 0,72 4,13 3,38 0,75 0,00 4,89
Desvio Padrão 37,66 1,09 1,16 1,06 3,41 0,02 0,01 0,02 0,49 0,46 0,31 0,01 0,69
GM4
Min
5
99,10 11,61 9,48 13,74 39,79 0,70 0,84 0,71 2,90 2,48 0,41 0,00 3,31
Max 226,92 17,15 13,60 20,70 60,32 0,72 0,86 0,75 4,48 3,32 1,43 0,03 5,82
Média 167,30 14,44 11,76 17,12 49,93 0,71 0,85 0,73 3,68 2,78 0,90 0,01 4,60
Desvio Padrão 49,44 2,10 1,56 2,65 7,88 0,01 0,01 0,01 ,69 ,33 0,41 0,01 1,10
GM5
Min
4
737,82 30,29 24,95 35,60 103,03 0,66 0,85 0,72 3,11 2,64 0,34 0,00 3,54
Max 975,61 34,45 26,87 42,04 116,64 0,70 0,85 0,73 4,16 3,71 0,48 0,00 4,60
Média 801,30 31,84 25,50 38,18 108,03 0,68 0,85 0,73 3,43 3,00 0,42 0,00 3,85
Desvio Padrão 116,27 1,81 0,92 2,74 5,94 0,02 0,00 0,00 ,50 ,50 0,06 0,00 0,50
GM6
Min
7
582,98 27,83 22,43 33,15 94,78 0,67 0,83 0,70 2,17 2,02 0,11 0,00 2,33
Max 646,58 28,88 23,62 35,01 100,66 0,72 0,87 0,75 4,39 3,62 0,73 0,04 5,20
Média 617,31 28,37 22,82 33,92 97,34 0,69 0,85 0,73 3,23 2,86 0,37 0,01 3,61
Desvio Padrão 21,80 0,40 0,48 0,61 1,95 0,02 0,01 0,02 0,80 0,61 0,24 0,01 1,03
60
Figura 5‐8 Distribuição das redes de polígonos classificadas em grupos morfométricos ao longo de Adventdalen e áreas totais ocupadas pelos polígonos de cada GM para os sectores Oeste
e Este do vale.
61
GrupoMorfométrico2(GM2):
O grupo morfométrico 2 integra 12 redes de polígonos, sendo por isso o grupo que
inclui o maior número de redes e, dentro do Tipo B (agrupamento de maiores dimensões), é o
que tem menores dimensões, apresentando valores médios para a variável Área de 500m2. A
Figura 5‐8 mostra uma predominância das redes poligonais deste grupo no sector Este do vale.
Os valores da análise descritiva indicam uma grande heterogeneidade dos valores das
variáveis, que pode dever‐se ao elevado número de redes que constitui o grupo. Os
parâmetros de forma mostram uma grande amplitude, indicando que os polígonos destas
redes apresentam formas variadas, desde o mais compacto e circular, ao mais alongado
(alongamento ‐ 0,65 a 0,71; compacidade ‐ 0,82 a 0,87; circularidade ‐ 0,68 a 0,76). Igualmente
se observa esta amplitude de valores para outros parâmetros, como é o caso do número de
vértices trivalentes (1,84‐4,02), em que este grupo apresenta os valores mínimo e máximo
mais baixo e mais elevado, respectivamente, de todos os grupos morfométricos. A
heterogeneidade deste grupo morfométrico torna difícil distingui‐lo dos demais, sendo as
variáveis de dimensão as que melhor o caracterizam e definem.
Do ponto de vista geoecológico a heterogeneidade continua a persistir, apresentando
uma grande variedade de unidades geológicas como (Figura 5‐9). A Formação geológica
Agardhfjellet é a mais representativa do grupo, estando presente para as redes mais a Este (9
redes) (como analisado no capítulo 5.2.2) juntamente com a unidade geomorfológica material
de meteorização autóctone. Já para o sector Oeste (3 redes) as unidades geológicas são
representadas por depósitos marinhos e fluviais, que de acordo com o mapa geomorfológico
são constituídos por material fluvial pré‐recente e recente (materiais localizados nas planícies
e leques aluviais activos (Sørbel et al. 2001)). A exposição para os polígonos deste grupo
apresenta uma predominância N ‐ NW, relevante no sentido que as superfícies com maior
exposição N têm, em média para Adventdalen, uma temperatura do ar menor em 2,6°C que as
superfícies com exposição predominantemente para Sul (Armbruster et al. 2007).
62
Figura 5‐9 Representação gráfica e descritiva das variáveis geoecológicas para cada um dos grupos morfométricos
Curvatura
Altitude (m) 5,64 15,87 845,21
Declive (º) 0,63 0,31 2423,28
Altitude (m) 105,11 12,76 614,62
Declive (º) 5,25 2,06 14309,70
Altitude (m) 32,94 15,53 369,44
Declive (º) 1,80 0,76 7862,98
Geologia Geomorfologia ExposiçõesGM 1
Distância às linhas de água
Distância ao mar (m)TRI (escala)
SWI (escala)
SWI (escala)
TRI (escala)
GM 2
Distância às linhas de água
Distância ao mar (m)
GM 3
Distância às linhas de água
Distância ao mar (m)
SWI (escala)
TRI (escala)
Depósitos marinhos costeiros (DM)
Depósitos fluviais e gláciofluviais (DF)
Formação Carolinefjellet: arenito, siltito e argilito (FC)
Formação Helvetiafjellet: arenito, siltito e argilitolimitados, carvão pontualmente (FH)
Formação Rurikfjellet: argilito e siltito, arenito nazona superior (FR)
Formação Agardhfjellet: argilito negro e siltito,algum arenito na zona inferior (FA)
Formação Knorringfjellet: arenito, argilito econglomerado (FK)
Formação De Geerdalen: arenito e argilito (FG)
Unidades Geológicas:
Material de meteorização (crioclastia),autóctone W(aut)Material de meteorização (crioclastia),alóctone (Wall)
Till (Till)
Material de solifluxão (MS)
Material fluvial, recente (MFr)
Material fluvial, pré-recente (MFpr)
Material fluvioglaciário (Mfg)
Material de depósitos eólicos (Mde)
Unidades Geomorfológicas:
63
Curvatura
Altitude (m) 46,92 14,60 421,68
Declive (º) 1,50 0,64 9574,23
Altitude (m) 59,25 14,60 798,56
Declive (º) 2,73 1,11 10907,21
Altitude (m) 141,78 11,57 709,48
Declive (º) 5,71 2,25 16946,29
GM 6
SWI (escala) Distância às linhas de água (m)
TRI (escala) Distância ao mar (m)
GM 5
SWI (escala) Distância às linhas de água (m)
TRI (escala) Distância ao mar (m)
Geologia Geomorfologia ExposiçõesGM 4
SWI (escala) Distância às linhas de água (m)
TRI (escala) Distância ao mar (m)
Figura 5‐9 Representação gráfica e descritiva das variáveis geoecológicas para cada um dos grupos morfométricos (continuação)
Depósitos marinhos costeiros (DM)
Depósitos fluviais e gláciofluviais (DF)
Formação Carolinefjellet: arenito, siltito e argilito (FC)
Formação Helvetiafjellet: arenito, siltito e argilitolimitados, carvão pontualmente (FH)
Formação Rurikfjellet: argilito e siltito, arenito nazona superior (FR)
Formação Agardhfjellet: argilito negro e siltito,algum arenito na zona inferior (FA)
Formação Knorringfjellet: arenito, argilito econglomerado (FK)
Formação De Geerdalen: arenito e argilito (FG)
Unidades Geológicas:
Material de meteorização (crioclastia),autóctone W(aut)Material de meteorização (crioclastia),alóctone (Wall)
Till (Till)
Material de solifluxão (MS)
Material fluvial, recente (MFr)
Material fluvial, pré-recente (MFpr)
Material fluvioglaciário (Mfg)
Material de depósitos eólicos (Mde)
Unidades Geomorfológicas:
64
GrupoMorfométrico3(GM3):
O grupo morfométrico 3 está inserido no agrupamento das redes de menores
dimensões (Tipo A) e é o que apresenta uma Área média maior (337m2) dentro do mesmo. É
constituído por 6 redes poligonais, localizadas maioritariamente no sector Oeste (Figura 5‐8),
encontrando‐se apenas uma delas no sector Este. As variáveis de forma apresentam valores
médios muito semelhantes aos restantes GM (exceptuando o GM1), indicando que as redes
são muito semelhantes entre si. Relativamente aos parâmetros topológicos verifica‐se que,
entre todos os GM, é o que tem maiores valores médios de 3 variáveis, o número de vértices
por polígono (4,13), o número de vértices trivalentes (3,38) e o número de vizinhos (4,89). Estes
resultados sugerem uma concordância com a interpretação descrita no subcapítulo 5.1.1, em
que Weaire 1974, Pina et al. 2008 afirmam que o Número de Vizinhos tem a tendência para
aproximar‐se de 6 com o incremento do número de polígonos, isto por ser o valor
determinado por uma rede infinita trivalente.
Das variáveis ambientais estudadas salienta‐se a unidade geológica depósitos fluviais e
gláciofluviais, estando presente em 67% dos polígonos deste grupo (Figura 5‐9), sendo estes
maioritariamente de origem fluvial pré‐recente (66%). Espacialmente é o GM que se encontra
mais intricado na rede de linhas de água do vale (Figura 5‐8) e apresenta valores elevados de
teor de humidade no solo (Figura 5‐9).
GrupoMorfométrico4(GM4):
Comparando com todos os grupos morfométricos, o GM4 apresenta valores
dimensionais muito baixos (Tabela 5‐6), com uma Área média de 167,3 m2, e um Perímetro de
quase 50m. A reduzida dimensão dos polígonos reflecte‐se nos outros dois parâmetros
morfométricos, os de forma e os topológicos. Para as variáveis de forma (alongamento,
compacidade e circularidade) os valores médios são dos mais elevados e denotam uma maior
homogeneidade e consequente menor variabilidade dos polígonos. Para os parâmetros
topológicos este GM é o que apresenta o maior número de vértices tetravalentes por polígono
(1,43). A relação de valores descrita é alusiva ao modelo definido por Lanchenbruch 1966 e
French 2007, e expressa que a fracturação progressiva nas redes deste GM formou polígonos
cada vez mais pequenos, mais compactos e circulares, originando redes de padrão mais
regular e ortogonal e uma maior frequência de vértices tetravalentes.
No que respeita à área total ocupada existe um claro predomínio da distribuição para
o sector Oeste, constituído por 3 das 5 redes pertencentes a este grupo (Figura 5‐8).
65
Relativamente às variáveis ambientais este grupo, em termos gerais, é concordante
com os restantes grupos com redes predominantes no sector Oeste (GM1 e GM3), revelando
baixa altitude, declive e rugosidade do terreno. As unidades geológicas predominantes são os
depósitos fluviais e gláciofluviais e os depósitos marinhos costeiros (Figura 5‐9). Relativamente
à curvatura do terreno este é o GM com maior percentagem de superfícies côncavas (~60%).
GrupoMorfométrico5(GM5):
O grupo morfométrico 5 é composto por 4 redes de polígonos, sendo o grupo com a
segunda maior Área média (800m2), e é também dos mais homogéneos, denotando muita
pouca variabilidade para os parâmetros de forma e topologia. Quanto à forma, a Tabela 5‐6
indica que os polígonos deste GM têm uma circularidade e compacidade alta, com valores
médios de 0,85 e 0,73, respectivamente. Os parâmetros topológicos, em geral, apresentam
valores com muito pouca variabilidade (Tabela 5‐6).
Espacialmente este GM apresenta duas redes em cada sector e localiza‐se
exclusivamente na margem direita do rio (Figura 5‐8), portanto nos terraços Norte do vale,
conferindo uma exposição predominantemente orientada para Sul (~42%) e Sudoeste (~40%)
(Figura 5‐9). Neste caso, ao contrário do GM2, estas exposições contribuem para um aumento
médio da temperatura localmente de cerca de 2,6°C, chegando a verificar‐se em certas zonas
uma diferença térmica de 6,6° para declives com exposição para Sul (Armbruster et al. 2007).
Geologicamente, as redes deste GM distribuem‐se sobre a Formação Agardhfjellet no sector
Este, e sobre depósitos fluviais e gláciofluviais a Oeste (Figura 5‐8 e Figura 5‐9).
GrupoMorfométrico6(GM6):
O grupo morfométrico 6 é composto por 7 redes de polígonos e relativamente às suas
propriedades dimensionais, verifica‐se que é o terceiro grupo com maior Área média dos
polígonos (617 m2) com a característica de apresentar pouca variabilidade dimensional dos
polígonos que o constituem (Mín. 583m2 ‐ Máx. 647m2) (Tabela 5‐6). Quanto às variáveis de
forma, salienta‐se que tanto a compacidade (0,87) como a circularidade (0.75) apresentam
valores máximos elevados relativamente aos outros GM. Por fim, para as variáveis topológicas,
este grupo apresenta uma grande variabilidade do número de vértices e de vizinhos,
apresentando para esta última variável o valor mínimo (2,33) mais reduzido, e o máximo (5,20)
mais elevado de todos os GM.
As redes do grupo estão exclusivamente localizados no sector Este sendo o grupo com
maior continentalidade (Figura 5‐8) e apresentam preferência pelas formações geológicas
66
Agardhfjellet (55%) e Rurikfjellet (29%). Comparativamente com todos os outros grupos, tem a
maior percentagem de superfície convexa (58%), maior altitude média (141m) e declive
(5,71°), e inversamente tem o menor índice de teor de humidade do solo (11,57) (Figura 5‐9).
O mapeamento dos grupos morfométricos no fundo do vale Advent e a análise da sua
distribuição espacial (Figura 5‐8) destaca uma relação de alguns grupos com a diferenciação
espacial morfométrica Oeste e Este mencionada anteriormente.
Começando pelo agrupamento do Tipo A (GM com polígonos de menores dimensões),
verifica‐se que a distribuição do GM3 encontra‐se quase na sua totalidade no sector mais a
Oeste (468.474m2) contabilizando 5 redes poligonais, e 1 rede mais a Este. Para o GM4 esta
relação espacial não é tão evidente, visto que a zona Oeste tem 3 redes e o sector mais a Este
tem apenas 2 redes. De salientar que estas duas últimas redes são constituídas por um número
muito reduzido de polígonos, dando maior expressividade ao sector Oeste (Área total =
530.885m2) como representativa das redes poligonais do Tipo A.
Por sua vez, o agrupamento do Tipo B (GM com polígonos de maiores dimensões)
demonstra uma preferência espacial diferente no conjunto dos grupos morfométricos que o
constituem. Analisando caso a caso, o GM1, constituído pelos polígonos gigantes e com duas
redes, ocorre somente no extremo ocidental do vale. As redes poligonais do GM2 estão
localizadas na sua maioria no sector Este (9 redes), estando escassamente representadas a
Oeste (3 redes), ocupando 823.711m2 e 197.816m2 respectivamente. Já o GM5 não apresenta
uma diferenciação longitudinal clara, estando as suas 4 redes equitativamente distribuídas
pelos dois sectores, Este‐Oeste. Por fim, o GM6, com 7 redes poligonais, apresenta uma
distribuição espacial exclusiva a Este, ocupando uma área total de 874.760m2. Resumindo,
para os GM do Tipo B, no sector Este surgem 18 redes, enquanto no sector Oeste ocorrem
apenas 7. Verifica‐se deste modo uma predominância espacial das redes poligonais do Tipo B
para o sector Este.
A organização espacial dos tipos de redes pode revelar‐se importante na análise sobre
a existência de uma relação dos diferentes grupos morfométricos com as variáveis
geoecológicas, e se estas exercem influência no crescimento e na forma dos polígonos. Esta
questão será abordada a seguir.
67
5.4. Variáveis geoecológicas e a variabilidade morfométrica no
fundodeAdventdalen
5.4.1. Relaçãodosgruposmorfométricoscomasvariáveisgeoecológicas
Para avaliar o efeito de cada uma das variáveis geoecológicas na classificação
morfométrica obtida no subcapítulo 5.3.1, aplicou‐se uma análise de variância (One‐way
ANOVA), depois de sujeitar os dados a transformação logarítmica. Esta transformação permite
obter uma distribuição mais simétrica, e contribui para a obtenção de melhores resultados
através de vários métodos de análise estatística (Field 2005). A utilização da ANOVA permite
uma avaliação objectiva do significado de cada variável, sendo mais que uma simples análise
descritiva das médias, constituindo a base para seleccionar as variáveis a aplicar,
posteriormente numa análise discriminante.
O resultado da ANOVA (Tabela 5‐7) mostra que todas as variáveis são estatisticamente
significativas para a classificação morfométrica (p < 0,05), pelo que a selecção de variáveis a
utilizar foi feita com base no valor estatístico de F. Este índice é a razão entre a variação
explicada pelo modelo e a variação explicada pelos factores não sistemáticos, e menores
valores de F (mais próximo de 0), por definição, representam um efeito não significativo (Field
2005). Por esta razão e através da observação do intervalo de valores das variáveis, não foram
incluídos na análise discriminante as variáveis com os menores valores de F (neste caso F < 10),
respectivamente as variáveis de exposição Este e Noroeste, e as referentes à curvatura do
terreno, convexo, côncavo e plano.
Após a remoção das variáveis mencionadas da base de dados, foi calculada a função
discriminante para 28 variáveis geoecológicas que caracterizam cada um dos 9220 polígonos,
classificados nos 6 grupos morfométricos. De referir que o processo de análise excluiu
automaticamente duas variáveis do modelo (Material marinho, material de praia, e a
Formação Knorringfjellet), de modo a optimizar a discriminação. O resultado da análise
permitiu identificar funções baseadas na combinação linear das variáveis com capacidade de
previsão, fornecendo a melhor discriminação entre grupos.
68
Tabela 5‐7 Parâmetros estatísticos e resultados na análise de variância (One‐way ANOVA) das variáveis geoecológicas segundo os grupos morfométricos
1 2 3 4 5 6 F p
Geologia %
Depósitos fluviais e fluvioglaciários
Média 0,58 0,08 0,74 0,02 0,79 0,04 2054,89 0,00
D.P. 0,50 0,26 0,44 0,13 0,41 0,19
Depósitos marinhos costeiros Média 0,36 0,12 0,05 0,86 0,00 0,00 2479,85 0,00
D.P. 0,48 0,32 0,22 0,35 0,00 0,00
Formação Carolinefjellet: arenito, siltito e argilito
Média 0,07 0,00 0,00 0,00 0,00 0,00 127,28 0,00
D.P. 0,25 0,00 0,00 0,00 0,00 0,00
Formação Helvetiafjellet: arenito, siltito e argilito limitados, carvão pontualmente
Média 0,00 0,00 0,00 0,00 0,00 0,05 86,11 0,00
D.P. 0,00 0,00 0,00 0,00 0,00 0,22
Formação Rurikfjellet: argilito e siltito, arenito na zona superior
Média 0,00 0,14 0,00 0,07 0,00 0,32 339,26 0,00
D.P. 0,00 0,35 0,00 0,26 0,06 0,46
Formação Agardhfjellet: argilito negro e siltito, algum arenito na zona inferior
Média 0,00 0,67 0,21 0,02 0,21 0,60 580,90 0,00
D.P. 0,00 0,47 0,41 0,13 0,40 0,49
Formação Knorringfjellet: arenito, argilito e conglomerado
Média 0,00 0,00 0,00 0,03 0,00 0,00 44,88 0,00
D.P. 0,00 0,00 0,00 0,16 0,00 0,00
Formação De Geerdalen: arenito e argilito
Média 0,00 0,00 0,00 0,01 0,00 0,00 18,41 0,00
D.P. 0,00 0,00 0,00 0,10 0,00 0,00
Geomorfologia
Material fluvial, pré-recente Média 1,00 0,11 0,72 0,00 0,78 0,00 2049,71 0,00
D.P. 0,00 0,32 0,45 0,00 0,41 0,00
Material fluvial, recente Média 0,00 0,23 0,06 0,52 0,00 0,04 566,79 0,00
D.P. 0,00 0,42 0,24 0,50 0,05 0,19
Pingo Média 0,00 0,00 0,00 0,00 0,01 0,00 14,58 0,00
D.P. 0,00 0,00 0,00 0,00 0,11 0,00
Material fluvioglaciário Média 0,00 0,28 0,00 0,00 0,09 0,14 212,85 0,00
D.P. 0,00 0,45 0,00 0,00 0,29 0,35
Material de solifluxão Média 0,00 0,13 0,00 0,29 0,06 0,17 147,87 0,00
D.P. 0,00 0,34 0,00 0,45 0,24 0,38
Till Média 0,00 0,03 0,04 0,10 0,02 0,17 117,01 0,00
D.P. 0,00 0,16 0,19 0,30 0,13 0,38
Material de meteorização (crioclastia), autóctone
Média 0,00 0,21 0,14 0,04 0,03 0,48 378,56 0,00
D.P. 0,00 0,40 0,35 0,20 0,17 0,50
Material de meteorização (crioclastia), alóctone
Média 0,00 0,01 0,03 0,00 0,00 0,00 32,62 0,00
D.P. 0,00 0,08 0,18 0,00 0,00 0,06
Material de depósitos eólicos Média 0,00 0,00 0,00 0,04 0,00 0,00 49,56 0,00
D.P. 0,00 0,07 0,00 0,19 0,00 0,00
Material marinho, material de praia
Média 0,00 0,00 0,00 0,01 0,00 0,00 11,00 0,00
D.P. 0,00 0,00 0,00 0,08 0,00 0,00
Exposição
Norte Média 0,17 0,15 0,06 0,29 0,12 0,19 62,01 0,00
D.P. 0,38 0,36 0,23 0,45 0,33 0,39
Nordeste Média 0,20 0,05 0,82 0,23 0,08 0,01 94,12 0,00
D.P. 0,40 0,21 0,27 0,42 0,26 0,07
Este Média 0,10 0,16 0,47 0,08 0,05 0,01 26,19 0,00
D.P. 0,30 0,12 0,21 0,27 0,22 0,09
Sudeste Média 0,13 0,03 0,06 0,06 0,07 0,77 9,73 0,00
D.P. 0,34 0,18 0,24 0,24 0,26 0,27
Sul Média 0,05 0,20 0,15 0,02 0,17 0,26 52,00 0,00
D.P. 0,23 0,40 0,35 0,15 0,38 0,44
Sudoeste Média 0,04 0,24 0,22 0,04 0,21 0,17 40,20 0,00
D.P. 0,21 0,42 0,42 0,19 0,40 0,38
69
A análise determinou cinco funções discriminantes estatisticamente significativas e respectivos
valores próprios (Tabela 5‐8). Estes valores representam o rácio da variação entre os grupos pela variação
dentro dos grupos, quanto mais afastados de 1, maior é a variação entre grupos explicada pela função
discriminante. Deste modo observa‐se que a função 1 é responsável por 52% da variância dos dados entre
grupos, a função 2 por 27%, e com menor discriminação, as funções 3, 4 e 5 com 11%, 7% e 3%,
respectivamente.
Tabela 5‐8 Funções discriminantes resultantes da análise discriminante aplicada às variáveis geoecológicas dos polígonos classificados segundo o grupo morfométrico
Função Discriminante
Valores Próprios
% Cumulativo
%
1 2,68 52,3 52,3
2 1,38 27,1 79,4
3 0,57 11,1 90,5
4 0,34 6,6 97,1
5 0,14 2,9 100,0
Para determinar a relação entre uma variável e a respectiva função discriminante foram analisados
os coeficientes canónicos estandardizados (Tabela 5‐9), dado que estes são os únicos que permitem avaliar a
comparação e a interpretação dos coeficientes discriminantes (Geraldo 2005). Os coeficientes canónicos
Oeste Média 0,15 0,17 0,22 0,06 0,16 0,13 24,34 0,00
D.P. 0,36 0,38 0,41 0,24 0,36 0,33
Noroeste Média 0,15 0,15 0,17 0,22 0,14 0,16 6,40 0,00
D.P. 0,36 0,36 0,37 0,41 0,35 0,37
Curvatura Côncavo
Média 0,55 0,49 0,42 0,51 0,43 0,43 9,72 0,00
D.P. 0,50 0,50 0,49 0,50 0,49 0,50
Convexo Média 0,42 0,50 0,56 0,46 0,54 0,56 8,19 0,00
D.P. 0,50 0,50 0,50 0,50 0,50 0,50
Plano Média 0,02 0,01 0,02 0,03 0,03 0,01 8,88 0,00
D.P. 0,15 0,08 0,15 0,16 0,17 0,09
Altitude (m) Média 5,55 106,64 41,85 23,40 26,38 130,72 1438,05 0,00
Outras (valor médio)
D.P. 0,68 66,83 51,93 30,23 37,08 44,92
Declive (º) Média 0,66 4,15 2,08 1,35 1,01 4,94 637,67 0,00
D.P. 0,46 3,46 3,09 0,96 1,68 3,14
SWI (escala numérica) Média 15,83 13,37 15,13 15,02 16,12 12,22 906,50 0,00
D.P. 0,37 2,27 2,83 0,98 1,57 1,94
TRI (escala numérica) Média 0,32 1,63 0,86 0,57 0,42 1,95 640,22 0,00
D.P. 0,15 1,30 1,26 0,36 0,65 1,17
Distância às linhas de água (m) Média 835,67 553,67 421,27 562,05 484,99 678,08 161,23 0,00
D.P. 124,22 380,25 210,50 148,73 263,58 367,05
Distância ao mar (m) Média 2396,79 15159,76 9236,36 6268,68 6631,83 16810,71 1547,70 0,00
D.P. 186,28 5046,52 5458,98 4256,05 4885,40 2733,81
70
expressam a medida relativa da importância das variáveis geoecológicas, e quanto maior for o coeficiente de
uma variável numa função, maior será a sua contribuição na discriminação entre os grupos.
Tabela 5‐9 Coeficientes canónicos estandardizados para cada uma das variáveis geoecológicas classificadas segundo o grupo morfométrico e respectiva relação com as funções discriminantes
Coeficientes canónicos estandardizados da função discriminante
1 2 3 4 5
Geologia
Depósitos fluviais e fluvioglaciários 0,186 1,940 3,611 1,296 -0,473
Formação Rurikfjellet: argilito e siltito, arenito na zona superior
0,611 1,797 0,969 0,620 0,330
Depósitos marinhos costeiros -0,505 1,207 2,219 0,077 ,399
Formação Carolinefjellet: arenito, siltito e argilito 0,002 0,104 0,166 -0,005 0,625
Formação Helvetiafjellet: arenito, siltito e argilito limitados, carvão pontualmente
0,257 0,605 0,570 0,413 0,113
Formação Agardhfjellet: argilito negro e siltito, algum arenito na zona inferior
1,881 2,117 1,080 0,474 0,289
Formação De Geerdalen: arenito e argilito 0,011 0,000 0,025 0,011 -0,004
Geomorfologia
Material fluvial, pré-recente 1,681 ,728 -,163 -,938 1,875
Material fluvial, recente 0,551 0,436 0,033 -0,297 0,453
Pingo 0,273 0,073 -0,029 -0,104 0,138
Material fluvioglaciário 0,534 0,346 -0,258 0,041 0,562
Material de solifluxão 0,334 0,152 -0,156 0,445 0,429
Till 0,310 0,014 -0,077 0,548 0,475
Material de meteorização (crioclastia), autóctone 0,486 0,164 0,022 0,936 0,666
Material de meteorização (crioclastia), alóctone 0,204 -0,086 0,193 0,136 0,158
Material de depósitos eólicos 0,028 0,016 -0,036 0,005 0,082
Exposição
Norte -0,007 -0,029 0,018 -0,100 0,069
Nordeste 0,041 -0,019 0,015 0,029 0,059
Este 0,081 0,067 0,056 -0,106 -0,105
Sul 0,037 0,108 0,133 -0,182 -0,053
Sudoeste -0,071 0,189 0,132 -0,133 0,065
Oeste -0,007 -0,029 0,018 -0,100 0,069
Outras
Altitude -0,368 0,734 -1,311 -0,593 -0,542
Declive -0,164 0,238 -0,089 -0,303 -0,208
SWI -0,570 0,387 -0,386 -0,392 -0,799
TRI -0,041 0,142 -0,119 0,006 0,063
Distância às linhas de água 0,069 -0,214 -0,076 0,100 0,372
Distância ao mar -0,936 0,966 3,675 -0,330 0,473
71
O melhor modelo discriminante, a Função 1, indica a variável Formação Agardhfjellet (1,881) como a
que mais contribui positivamente para a discriminação dos grupos, juntamente com a variável
geomorfológica material fluvial pré‐recente (1,681). Já a variável com maior peso negativo, ou seja, que
contribui mais de forma inversa, é a distância ao mar. Isto indica que esta última está inversamente
correlacionada com a Formação Agardhfjellet, o que faz sentido uma vez que esta formação está presente a
maiores altitudes e mais longe da costa.
Os coeficientes canónicos estandardizados mostram que as variáveis geológicas depósitos fluviais e
fluvioglaciários, depósitos marinhos, as Formações Rurikfjellet e Agardhfjellet, mais as variáveis altitude e
distância ao mar (todos com valores superiores a 0,7), são as que constituem os preditores mais
significativos para as funções discriminantes 2 e 3 (Tabela 5‐9).
Para a função discriminante 4 as variáveis com maior contribuição positiva são os depósitos fluviais e
fluvioglaciários (1,296) e o material de meteorização autóctone (0,936), e com peso discriminatório negativo
a variável material fluvial, pré‐recente (‐0,938). E finalmente a função 5, já com pouco peso discriminatório
no modelo (2,9%), referir a variável que mais contribui inversamente, ou seja com peso negativo, é o índice
de humidade do solo.
De referir que às variáveis de exposição não revelaram coeficientes canónicos relevantes (Tabela
5‐9), não tendo portanto peso na discriminação da morfometria dos polígonos.
Tabela 5‐10 Análise das funções discriminantes para os respectivos grupos morfométricos
Grupo Morfométrico
Função
1 2 3 4 5
1 1,546 -2,103 -2,039 -0,800 3,567
2 -0,663 1,227 -0,265 -0,845 -0,072
3 0,798 -0,122 1,451 -0,023 0,147
4 -3,884 -2,174 0,020 0,026 -0,080
5 1,575 -0,761 -0,522 0,108 -0,195
6 -0,943 1,508 -,255 1,038 0,141
72
Figura 5‐10 Coeficientes canónicos das funções 1 e 2 e funções 2 e 3, para os 6 grupos morfométricos e respectivo centróide do grupo
A Tabela 5‐10 apresenta os valores médios discriminantes de cada grupo morfométrico para cada
uma das funções, designados por centróide do grupo. Quanto maior for a diferença dos valores médios dos
grupos para cada uma das funções, menor será o erro na classificação. A Figura 5‐10 mostra os coeficientes
canónicos das funções 1 e 2 e das funções 2 e 3, para os 9220 polígonos classificados nos 6 grupos
morfométricos e quanto maior for a distância entre os centróides do grupo maior é a discriminação.
A análise da Tabela 5‐10 e da Figura 5‐10 indica que a função 1 discrimina essencialmente o GM4,
dos GM 3, 5, e 1, sendo que estes 3 aparecem muito próximos. Os grupos parecem ter sido principalmente
diferenciados pelos parâmetros dimensionais, uma vez que o GM4 apresenta polígonos de dimensões muito
mais inferiores aos restantes grupos referidos (Tabela 5‐6).
A forte discriminação do GM4 pode ser, numa primeira análise, explicada pela área ocupada e
distribuição ao longo do vale, i.e, este GM está praticamente concentrado no sector Oeste e com a maior
área total ocupada (do sector) (Figura 5‐8), o que lhe pode conferir elevada homogeneidade de
características, mais facilmente explicadas pelas variáveis ambientais.
De acordo com os coeficientes canónicos as variáveis mais discriminantes para o factor 1 são a
formação Agardhfjellet e material fluvial, pré‐recente. Analisando então as unidades geológicas e
geomorfológicas que caracterizam cada grupo, a percentagem de formação Agardhfjellet poderá estar na
explicação da diferenciação entre o GM4 (6%) e o GM5 (50%); o GM3 apresenta também uma baixa
percentagem desta unidade. Sendo o GM4 e o GM3 os que têm menor dimensão média de polígonos, pode
indicar que a maior presença da formação Agardhfjellet não privilegia a fracturação secundária, originando
73
polígonos de maiores dimensões. Este facto é verificado pelas elevadas percentagens desta formação para
os GM2, 5 e 6, caracterizados por terem polígonos de maiores dimensões (estes grupos foram classificados
no agrupamento do Tipo B). Relativamente à presença de polígonos na unidade material fluvial, pré‐recente,
esta diferencia o GM4 (20%) dos GM1 (100%) e GM3 (66%). Esta variação entre o GM4 e o GM1 poderá
explicar a diferença na dimensão dos polígonos, que correspondem aos mais pequenos e aos maiores
respectivamente. No entanto, esta diferença dimensional não se verifica entre o GM4 e o GM3 (ambos com
polígonos de reduzidas dimensões), o que poderá estar a ser compensado pela facto de o GM4 apresentar
também percentagens consideráveis de materiais com a mesma origem e granulometria semelhante
(material fluvial, recente 34%). O GM3 e GM4 para além de serem os que apresentam polígonos de menor
dimensão, evidenciam ainda dos mais elevados valores médios de vértices tetravalentes por polígono (0,75 e
0,90 respectivamente); ou seja, os resultados parecem indicar que é a combinação dos materiais fluviais que
privilegia a fracturação progressiva levando a formar polígonos menores e a consequente tetravalência.
De referir que os centróides mostram que o GM1 apresenta valores discriminatórios elevados em
todas as cinco funções, positivos ou negativos. Este facto vem mais uma vez evidenciar a presença de
outliers neste grupo, que pode distorcer a análise dos resultados. Seria interessante, em estudos futuros,
compreender este melhor este grupo morfométrico e de forma pode estar a enviesar os restantes
resultados.
A função 2, com uma capacidade discriminatória mais baixa (27%), distingue o GM 2 e 6 dos GM 1 e
4. Esta diferença é principalmente devida às variáveis formação Agardhfjellet (com o coeficiente mais
elevado para a função 2 (2,117) e depósitos fluviais e fluvioglaciários (1,940), o que parece discriminar uma
distribuição Este/Oeste, que se deve à distribuição espacial das unidades geológicas referidas (i.e: GM 2 e 6
encontram‐se predominantemente no sector Este, onde se encontra a formação Agardhfjellet. Os GM 2 e 6
são de facto grupos morfometricamente muito semelhantes, pertencendo ambos ao Tipo B (grandes
dimensões), o que mais uma vez parece indicar que esta formação geológica não privilegia a fracturação
secundária; também fortemente evidenciado pelo reduzido número de vértices tetravalentes (GM2 0,47,
GM6 0,37). Já os GM 1 e 4 estão associados a materiais de granulometria mais fina (depósitos fluviais e
fluvioglaciários), e isso explica a dimensão reduzida dos polígonos do GM4 (a falta de evidência para o GM1
pode dever‐se a ser um grupo "outlier").
Esta relação entre a localização de materiais de granulometria mais fina nas partes mais baixas do
vale e a presença de polígonos mais pequenos vs formações de granulometria mais homógenea nas áreas
médias do vale e com polígonos maiores já foi referenciada para Svalbard (Ulrich et al. 2011) e está de
acordo com a sugestão de Lanchenbruch (1966).
A função 3 apresenta pouca capacidade discriminante, o que é também visível na projecção dos
coeficientes canónicos na Figura 5‐10, verificando‐se apenas algum distanciamento entre o GM1 e o GM3.
74
De referir que a variável distância à linha de costa apresenta valores discriminatórios elevados para
as três primeiras funções, o que pode estar a reflectir os zonamentos Este/Oeste, bem como a distribuição
espacial das unidades geológicas e geomorfológicas.
Tabela 5‐11 Predição obtida a partir da análise discriminante aplicada aos parâmetros geoecológicos que caracterizam cada um dos polígonos em função dos grupos morfométricos
Resultados da Classificação
Grupo
Morfométrico
Grupo predito
1 2 3 4 5 6 Total
Grupo actual
1 80 (87,0%) 0 0 0 12 (13,0%) 0 92
2 0 1085 (53,5%) 120 (5,9%) 25 (1,2% 322 (15,9%) 476 (23,5%) 2028
3 0 39 (2,2%) 1439 (79,9%) 78 (4,3%) 196 (10,9%) 50 (2,8%) 1802
4 0 15 (1,6%) 0 817 (89,6%) 0 80 (8,8%) 912
5 0 76 (2,6%) 57 (1,9%) 0 2725 (92,25%) 97 (3,3%) 2955
6 0 79 (5,5%) 46 (3,2%) 4 (0,3%) 0 1302 (91,0%) 1431
80,8% dos grupos originais corretamente classificados
O modelo discriminante realizado para os 9220 polígonos estudados discrimina correctamente
80,8% da classificação respeitante aos 6 grupos morfométricos formados, sendo que todos os grupos, com
excepção do grupo 2, apresentam valores superiores a 75%, já o grupo 2 somente 53,5% é correctamente
predito (Tabela 5‐11). A baixa percentagem de predição verificada para o GM2 poderá dever‐se à sua
elevada heterogeneidade morfométrica (Capítulo 5.3.2).
Avaliando as análises efectuadas, os dados apontam para uma forte relação da geometria dos
polígonos com os diversos factores ambientais de âmbito local, evidenciada pela classificação com sucesso
de 80% dos polígonos nos respectivos grupos. Este estudo permitiu identificar a variável geológica Formação
Agardhfjellet e a unidade geomorfológica Material fluvial, pré‐recente como as variáveis que melhor
diferenciam os grupos morfométricos, juntamente com as variáveis depósitos fluviais e fluvioglaciários e
ainda a distância à linha de costa.
75
6. Conclusões
Para mais de 10.000 polígonos identificados ao longo de Adventdalen foram
calculadas, em ambiente SIG, as suas características morfométricas com o propósito de
determinar a relação da variabilidade dimensional dos polígonos com os factores locais de
controlo ambiental. Estas características foram o ponto de partida para construir uma
geodatabase com todos os elementos geográficos e atributos relativos aos polígonos de cunha
de gelo e respectivas redes poligonais, como também de todo o conjunto das variáveis
geoecológicas adquiridas e calculadas. A geodatabase foi um importante instrumento para a
fluência das análises realizadas, permitindo um fácil acesso, análise e edição da informação.
A análise descritiva utilizada permitiu caracterizar os polígonos mapeados ao longo de
Adventdalen, consoante os parâmetros de dimensão, forma e topologia. Os resultados
permitiram realçar que existe uma grande amplitude dimensional, com áreas entre os 5m2 e os
1750m2, para um valor médio de 408m2 indicando uma maior predominância dos polígonos de
menor e média dimensão. Verificou‐se também que os polígonos de menores dimensões
(<300m2) estão associados a um maior número de vértices tetravalentes por polígono (>0,60),
o que é um indicador de redes de padrão ortogonal.
O desenho das redes poligonais facultou a identificação de uma diferenciação espacial
morfométrica, entre o sector mais a Este do vale e o sector correspondente ao fundo do vale
mais para Oeste. Para as 21 redes localizadas no sector Este verifica‐se que têm pouca
variabilidade dimensional, sendo predominante as áreas entre 375 m2 e 650m2. Já as variáveis
de dimensão para o sector mais a Oeste revelam que as 15 redes poligonais presentes têm
uma maior assimetria. Para este sector observa‐se a existência de duas redes poligonais (A1 e
A2) com dimensão dos polígonos muito superior (>1400m2), e as restantes redes
tendencialmente são constituídas por polígonos de menor dimensão (8 redes com dimensão
de Área de polígono < 400m2). Verifica‐se que o número de vizinhos por polígono é maior no
sector Oeste (4,5 contra 3,8) para as redes com maior número de polígonos e de menores
dimensões. Para estas redes revela‐se também uma maior frequência de vértices
tetravalentes, o que expressa uma actividade contínua de fracturação secundária promovendo
uma subdivisão progressiva, constituindo polígonos de menores dimensões e de forma regular.
As condições geo‐ecológicas de Adventdalen espelham também a diferenciação entre o sector
Este e o Oeste, reforçando a ideia de que a variabilidade morfométrica é influenciada pelas
condições locais.
76
Para determinar quais os factores geoecológicos que exercem uma maior influência
para determinadas características morfométricas, foi criada por meios estatísticos uma
classificação das redes poligonais em grupos baseado nas similaridades morfométricas. Os 6
grupos morfométricos resultantes apresentam uma predisposição espacial e revelam que são
os parâmetros dimensionais e topológicos que melhor definem as redes poligonais. A
caracterização dos grupos morfométricos definidos, de destacar o GM1 por apresentar
polígonos de dimensões excepcionalmente grandes. Estes polígonos, apesar da sua dimensão,
apresentam um número elevado de vértices tetravalentes, o que em teoria não seria
esperado, dado que a prevalência de vértices tetravalentes está associada à fracturação
secundária que origina polígonos de menores dimensões. Seria interessante, em estudos
futuros, uma análise mais detalhada deste sector, com levantamentos detalhados de terreno
que permitam aferir variáveis não integradas no presente trabalho.
Com o objectivo de analisar os factores geoecológicos que exercem uma maior
influência na predição das diferentes características morfométricas dos polígonos que
constituem os grupos morfométricos, procedeu‐se a uma análise estatística discriminante. O
melhor modelo discriminante, (Função 1 responsável por 52% da variância), indica a variável
Formação Agardhfjellet (1,881) como a que mais contribui positivamente para a discriminação
dos grupos, juntamente com a variável geomorfológica material fluvial pré‐recente (1,681).
Verificou‐se que a função 1 discriminou essencialmente o GM4, dos GM 3, 5, e 1. A função 2,
com uma capacidade discriminatória mais baixa (27%), distingue os GM 2 e 6 dos GM 1 e 4. De
uma forma geral, a discriminação dos grupos evidenciou potenciais relações entre a dimensão
média dos polígonos, a tetravalência, a distribuição e as unidades geológicas e/ou
geomorfológicas onde aqueles se encontram.
Os resultados do modelo discriminante realizado para a totalidade dos polígonos
estudados, permitiram predizer correctamente cerca de 80% da classificação respeitante aos 6
grupos morfométricos. Com excepção do grupo morfométrico 2, todos os restantes grupos
apresentam valores discriminantes superiores a 75%.
Deste modo os resultados deste estudo parecem indicar uma forte relação da
geometria dos polígonos com os factores ambientais, tendo sido identificadas como as
variáveis mais discriminantes a Formação geológica Agardhfjellet e depósitos fluviais e
fluvioglaciários, juntamente com a unidade geomorfológica Material fluvial, pré‐recente, e
ainda a distância à linha de costa.
De destacar a importância e utilidade dos Sistemas de Informação Geográfica para este
tipo de estudos de redes poligonais em permafrost, permitindo efectuar uma análise
quantitativa espacial de um número significativo de redes e de polígonos, situação que até ao
77
momento não tem praticamente expressão na literatura. A utilização de ferramentas SIG
possibilitou assim, a integração espacial e manipulação dos dados vectoriais dos polígonos e
redes poligonais. Permitiu também integrar dados de variáveis ambientais em formato raster e
realizar processamentos geográficos para obter nova informação relevante. A combinação
através de relações espaciais de dados em formato raster com informação vectorial
permitiram construir bases de dados completas e rigorosas, que constituíram o suporte para a
análise estatística das condicionantes geo‐ecológicas na morfometria dos polígonos.
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