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Relatório da campanha de 2003 de desmontagem e recuperação da parte exposta do navio Arade I

Eric Rieth, Paulo Rodrigues e Francisco Alves

Trabalhos do CNANS, 19 Lisboa, Fevereiro de 2004 Adaptação gráfica: Francisco Alves, a partir da linha gráfica dos “Trabalhos do CIPA”.

Eric Rieth et al. Relatório da campanha de 2003 de desmontagem e recuperação da parte exposta do navio Arade I

Trabalhos do CNANS, 19 Lisboa, Fevereiro 2004

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Índice

Introdução ………………………………………………………………………….……….....… 3

Objectivos gerais da missão ……………………………………………………….……… ……. 5

Descrição dos trabalhos ………………………………...……………………………………….. 5

A fase preparatória da intervenção - trabalhos de sucção e limpeza do sítio …………....……… 5

A primeira fase da intervenção – registo e desmontagem dos elementos da estrutura transversal do navio …….………………………………..……….… 5

A fase inicial de registo …………………………………………………………….…………… 5

A fase inicial de desmontagem …………………………………..……....................................... 11

A segunda fase da intervenção – registo e desmontagem dos elementos da estrutura longitudinal do navio ………........................................................… 13

A segunda e última fase de registo ……………………………………..……………………… 13

A segunda e última fase de desmontagem …………………………………….……..........…… 16

Apontamento sobre a organização do estaleiro e da logística ……………….…………..….…. 16

Documentação fotográfica …………………………...…………………….…..………...…….. 20

Catálogo fotográfico de segurança preliminar …………………………….………...…...…….. 21

Eric Rieth et al. Relatório da campanha de 2003 de desmontagem e recuperação da parte exposta do navio Arade I

Trabalhos do CNANS, 19 Lisboa, Fevereiro 2004

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Introdução Os destroços do navio dito Arade 1, localizados em 2001durante a 1ª campanha no âmbito do projecto ProArade, promovido pelo CNANS, dispensam apresentação por terem vindo a ser objecto de pormenorizados relatórios e comunicações1.

No início da 2ª campanha, em 2002, dirigida por Filipe Castro, quando os vestígios foram de novo postos a descoberto, verificou-se que apesar dos dispositivos de protecção e cobertura colocados no final da campanha de 2001, eles patenteavam uma acentuada degradação, especialmente por ataque do taredo (taredo navalis),

No final da campanha de 2002 – em que se descobriu subsistir uma outra parte estrutural do navio, na continuidade da primeira, mas dela totalmente separada por ruptura e enterrando-se profundamente no lodo (Fig. 1) – a par do reforço das medidas de protecção dos vestígios, o CNANS decidiu que a missão do ano seguinte seria consagrada à desmontagem da parte exposta do casco do navio, descoberta em 2001. Garantir-se-iam assim dois objectivos prioritários: em primeiro lugar, suster radicalmente a degradação daqueles vestígios; em segundo, facultar o respectivo registo arqueográfico em laboratório, por fotografia de pormenor e desenho à escala 1:1, o que, como se sabe, proporciona um acrescido rigor de análise e de execução documental.

Em 2003, na impossibilidade de Filipe Castro de estar presente na 3ª campanha do projecto ProArade, por insuperáveis razões pessoais, o CNANS convidou Eric Rieth, do CNRS-Université de Paris 1-Musée de la Marine, e habitual consultor científico do CNANS no domínio da arqueologia e da arquitectura naval, a dirigir a campanha visando a desmontagem arqueológica em questão.

A equipa de intervenção, dirigida por Eric Rieth contou com a participação de Paulo Rodrigues, João Alves, Miguel Aleluia e Emanuel Perez, do CNANS, Paulo Camargo, do Museu de Arqueologia e Etnologia da Universidade de S. Paulo (MAE-USP), e Andreia Machado, conservadora do Museu Municipal de Portimão. A par dos recursos proporcionados pelo IPA-CNANS, a campanha contou, mais uma vez, com o apoio da Câmara Municipal de Portimão e do seu Museu, assim como do Instituto Portuário do Sul e da Capitania do Porto de Portimão.

1 Francisco Alves – Acerca dos destroços de dois navios descobertos durante as dragagens de 1970 na foz do rio Arade (Ferragudo, Lagoa). In “As Rotas Oceânicas - Sécs XV-XVII” (4as Jornadas de História Ibero-Americana - Portimão, 7 a 9 de Maio de 1998): 29-92. Coordenação de Maria da Graça Mateus Ventura. Edições Colibri. Lisboa, 1999. Filipe Castro – The Arade 1 Ship 2002 Field Season. Volume 1 – The Site. Ship Lab Report 3. Texas A&M University – Department of Anthropology – Nautical Archaeology Program. December 2002. Filipe Castro – The Arade 1 Ship 2002 Field Season. Volume 2 – The Ship. Ship Lab Report 5. Texas A&M University – Department of Anthropology – Nautical Archaeology Program. January 2003. Filipe Castro – The Arade 1 Ship 2002 Field Season. Volume 3 – The Artifacts. Ship Lab Report 6. Texas A&M University – Department of Anthropology – Nautical Archaeology Program. January 2003. Gilson Rambelli, Flávio Rizzi Calippo e Paulo F. Bava de Camargo – Participação brasileira na campanha de arqueologia subaquática do projecto Arade (ProArade) 2002, Portugal. Museu de Arqueologia e Etnologia da Universidade de São Paul (MAE-USP). São Paulo, Abril 2003. José Bettencourt, Patrícia Carvalho e Pedro Caleja – Relatório dos trabalhos efectuados em 2002 no âmbito do projecto ProArade nos sítios Arade B2 e C. Lisboa, Maio de 2003. Pº CNANS 2001/095. Francisco Alves, Eric Rieth, Filipe Castro, Gilson Rambelli, Alberto Machado – As campanhas de 2002 e 2003 no âmbito do projecto ProArade. Ponto da situação. II Encontro de Arqueologia do Algarve (Silves, 17 e 18 de Outubro de 2003). No prelo.

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Objectivos gerais da missão Considerou-se desde início que a desmontagem dos elementos da parte exposta do casco do navio só podia ser concretizada após a realização de dois tipos de registo arqueográfico in situ: por um lado, o perfil axial da estrutura e os perfis internos de secções transversais do casco em vários pontos da carena, contíguos aos pares cavernas-braços, por outro, a realização da planimetria do casco.

As operações de registo levadas a efeito antes da desmontagem dos elementos estruturais implicaram por sua vez a sua completa etiquetagem, em observância das numerações adoptadas nos anos anteriores. Por sua vez, as tábuas de casco tiveram de ser etiquetadas de novo depois de concluída a desmontagem da maioria das cavernas.

Descrição dos trabalhos A fase preparatória da intervenção - trabalhos de sucção e limpeza do sítio Os trabalhos subaquáticos preparatórios tiveram início na tarde de dia 26 de Junho2. No dia seguinte, após dois turnos de trabalho de sugadora, foi retirada a manta de geotextil que cobria directamente os destroços, afim de impedir a aproximação dos vermes marinhos às estruturas do navio. Assim, os dois seguintes foram inteiramente dedicados a retirar pequenas camadas de areia que ainda se encontravam em determinados locais dos destroços, de modo a que no início da semana seguinte fosse possível começar os trabalhos de registo e de desmontagem.

No domingo 29 de Junho, data da chegada de Eric Rieth a Lisboa, estavam assim concluídos os trabalhos preliminares de limpeza do sítio, encontrando-se tudo preparado para o início do programa de trabalhos previsto.

No dia seguinte, Eric Rieth, João Alves e Paulo Rodrigues chegaram a Portimão e fizeram o ponto da situação, programando os trabalhos a efectuar. Nesse mesmo dia Miguel Aleluia, concluíra a limpeza de pormenor da jazida.

A primeira fase da intervenção – registo e desmontagem dos elementos da estrutura transversal do navio A fase inicial de registo A 1 de Julho deu-se assim início à primeira fase da intervenção, que consistiu no registo e desmontagem dos elementos da estrutura transversal do navio. Esta fase começou com a realização do perfil longitudinal da quilha, com as cavernas ainda in situ. Esta operação obrigou à materialização de um eixo longitudinal através de uma barra graduada (Figs. 2 e 3), a partir da qual, com um fio-de-prumo e um metro articulado, foram realizadas as medições verticais permitindo reconstituir o perfil do eixo longitudinal desta parte do navio (Figs. 4, 5 e 6). Nesse mesmo dia teve também início o registo dos perfis transversais (ver posicionamento na Fig. 1). O primeiro perfil foi realizado ao nível do braço B4, e até ao dia 7 de Julho foram feitos mais 5

2 À superfície, sobre o sítio, tiveram de ser substituídas as bóias de sinalização, bem como os cabos que servem para delimitar a área de trabalho, uma vez que os do ano anterior estavam completamente entrelaçados, formando um amontoado de cabos e de mexilhão. No fundo, junto da jazida, foram instaladas duas sugadoras, após o que se iniciaram os trabalhos de sucção da areia que se encontrava depositada sobre os destroços do navio.

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Fig. 3 – A barra axial, de referência, utilizada no registo arqueográfico.

Fig. 2 – Vista longitudinal do casco.

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cortes transversais ao nível da caverna C4, do braço B9, da caverna C9, da caverna C13 e do braço B14 (Fig. 7).

Os cortes transversais foram efectuados através da utilização de uma segunda barra, em forma de “T”, que encaixava transversalmente na primeira, que havia sido colocada sobre a quilha do navio (Figs. 8 e 9). As medidas foram tiradas verticalmente, de modo a registar os pontos do perfil do casco com a ajuda de um metro articulado e de um fio de prumo e, longitudinalmente,

Fig. 4 e 5 – Desenho do perfil axial/longitudinal.

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Fig. 6 – Perfil longitudinal sobre o eixo da quilha.

Fig. 7 – Perfis transversais.

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através de uma fita aderente ao topo da barra transversal, de modo a registar-se a distância entre aqueles pontos Os cortes transversais foram efectuados através da utilização de uma segunda barra, em forma de “T”, que encaixava transversalmente na primeira, que havia sido colocada sobre a quilha do navio.. A barra longitudinal, além de servir de apoio à barra transversal, permitia posicionar os perfis transversais no plano geral do casco.

Depois da realização de cada perfil colocava-se um prego na quilha e um outro junto à extremidade do casco, materializando assim a linha transversal correspondente (Figs. 10 e 11)3.

Figs. 10 e 11 – Materialização dos perfis efectuados.

3 No dia 5 de Julho Annabel Worthington integrou a equipa de registo dos cortes transversais.

Figs. 8 e 9 – O esquadro deslizante na barra longitudinal usado para a realização dos perfis transversais e dos levantamentos planimétricos.

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Desde o primeiro dia, todas as peças do casco que o requeriam começaram também a ser re-etiquetadas (Fig. 12), tendo-se iniciado a desmontagem das primeiras cavernas, situadas a leste, junto à extremidade de proa. Para o efeito foram utilizadas etiquetas com 8x5cm em PVC (denso) branco. Nas etiquetas das cavernas, além do habitual número de identificação da peça, foi desenhada uma seta no topo, que indicava a zona de junção da caverna ao braço ou do braço à caverna – de modo a facilitar a ulterior observação em laboratório. As etiquetas foram fixadas no topo das peças com pregos de latão, com leitura da proa para a popa (Fig. 13).

Figs. 12 e 13 - Etiquetagem dos elementos da estrutura.

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Deste modo, entre 1 e 7 de Julho, nos locais onde tinham sido feitos os cortes transversais, foram desmontadas todas as peças da estrutura transversal, à excepção do braço B4, caverna C4, braço B9, caverna C9, caverna C13, braço B14, por se ter decidido deixar algumas peças da estrutura transversal in situ, devido à necessidade de manter o casco coeso durante as operações de registo planimétrico do tabuado de casco. Deste modo, ficaram in situ as cavernas e os braços correspondentes aos locais dos cortes transversais (ver Fig. 11). Por razões de segurança, além das supra citadas peças, a caverna C15 foi também deixada in situ, uma vez que o casco, na extremidade oeste, se encontrava bastante degradado e com pouca coesão.

A fase inicial de desmontagem Para efectuar a desmontagem do cavername foi necessário recorrer a ferramenta própria. Graças à experiência adquirida em 1998 na desmontagem de dois cascos de madeira de navios do século XVI/XVII, na baía de Angra do Heroísmo (‘Angra C’ e ‘Angra D’)4 – em que o CNANS contou com a colaboração de um dos maiores especialistas mundiais na matéria, Peter Wadell do Serviço de Parques do Canadá5 –, o CNANS preparara várias cunhas em aço inox (Fig. 14) e em teflon (Figs. 15 e 16), e adquirira diversas serras, dois macacos de automóvel e um pé de cabra.

Tendo em conta que as peças encontradas da estrutura transversal deste navio foram fixadas entre si e ao casco exclusivamente por intermédio de cavilhas de madeira (tal como no navio ‘Angra C’), o trabalho foi muito moroso e cansativo. De referir que, na totalidade dos casos de navios descobertos em Portugal com pregadura de ferro dominante, a desmontagem foi sempre

4 Catarina Garcia, Paulo Monteiro e Francisco Alves – Estratégias e metodologias da intervenção arqueológica subaquática no quadro do projecto de construção de uma marina na baía de Angra do Heroísmo (Terceira, Açores). “Revista Portuguesa de Arqueologia”, 2,2: 199-210. IPA. Lisboa, 1999. 5 Peter Waddell – The disassembling of a 16th Century Galleon. “International Journal of Nautical Archaeology and Underwater Exploration”, 15.2: 137-148. London, 1986.

Fig. 14 a 16 – Chapa de aço com um topo afiado para o seccionamento de cavilhas de madeira e desencaixe de peças do cavername com auxílio de cunhas de teflon.

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facilitada pelo facto de aquela pregadura se encontrar totalmente oxidada, a separação das peças entre si fazendo-se normalmente sem grande esforço.

O processo de desmontagem iniciava-se com uma limpeza bastante minuciosa da zona e das peças a remover. Uma vez postos a descoberto os contornos das peças a desmontar, eram colocadas diversas cunhas de nylon entre a base das peças e o casco, de forma a conseguir-se passar a folha da serra ao longo de toda a base da peça. Sublinhe-se que a união entre cada tábua de casco e o cavername era assegurada por uma cavilha e que as cavernas e os braços também estavam fixos entre si por meio de cavilhas de madeira. Por essa razão, em média, em cada mergulho apenas se conseguiam desmontar três peças da estrutura transversal.

Depois de serradas todas as cavilhas da base da caverna, tinha de se fazer o mesmo relativamente às cavilhas transversais que fixavam a caverna ao braço. Depois de concretizada esta operação, nas extremidades de cada caverna era colocadas uma cunha de aço inox que acabava por cortar uma ou outra cavilha que tivesse resistido à serra. Só depois, com a ajuda de um pé de cabra, é que se conseguia libertar cada peça do seu sítio.

As cavernas e os braços, depois de desmontados, eram deixados nas proximidades, com sacos de areia em cima. Posteriormente, uma outra equipa envolvia cada uma das peças em película aderente e colocava-lhes junto às extremidades um troço de alcatifa, com 20cm de largura, enrolada de forma a proteger o local onde eram colocadas as cintas que serviam para as içar para a superfície.

Por fim, depois de desembarcadas (Figs. 17 a 20), as peças individuais desmontadas foram

Figs. 17 a 20 – Fases de descarregamento das peças recuperadas.

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transportadas no atrelado da carrinha do CNANS entre o cais de embarque e os tanques construídos junto aos contentores do estaleiro de retaguarda (Figs. 21 e 22). Antes de entrarem na água todas as peças eram fotografadas para registo de inventário preliminar.

A segunda fase da intervenção – registo e desmontagem dos elementos da estrutura longitudinal do navio A segunda e última fase de registo A segunda fase dos trabalhos, com a exposição total do tabuado após a remoção da quase totalidade dos elementos do cavername, teve lugar entre o dia 7 e o dia 14 de Julho. Esta fase constou de três importantes tarefas: a primeira, relacionou-se com a actualização da etiquetagem de todas as tábuas de casco que, pela primeira vez, se encontravam totalmente a descoberto e que revelaram uma realidade um pouco diferente da apreendida em anos anteriores. No entanto, a etiquetagem realizada seguiu o critério que havia sido estabelecido no ano anterior. A segunda tarefa prendeu-se com a realização do registo em plano de todo o tabuado de casco (Fig. 23). Finalmente, a terceira tarefa constou da desmontagem do tabuado de casco e da quilha do navio (Figs. 24 e 25).

Refira-se ainda que esta segunda fase veio a implicar a construção de um segundo tanque para acondicionar todo o tabuado de casco desmontado antes de ser transportado para as instalações do CNANS em Lisboa.

A etiquetagem foi feita por Eric Rieth, no último mergulho da manhã do dia 7 de Julho. Na sequência, para se ter uma leitura correcta e objectiva de todas as tábuas de casco identificadas, Eric Rieth fez um croqui documentando a etiquetagem feita.

Os trabalhos de etiquetagem do casco tiveram em conta duas importantes características construtivas presentes nestes destroços: a mesma fiada de tábua de casco possuía diversas pranchas; e a separá-las existiam diversas escarvas (adiante serão caracterizadas).

Figs. 21 e 22 – Tanque montado na zona de instalações de campanha para colocar as peças recuperadas em banho de conservação preliminar.

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As etiquetas, idênticas às precedentemente referidas, foram colocadas de forma a serem lidas do eixo para o bordo e da proa para a popa.

A nomenclatura utilizada para designar as tábuas respeitou o critério escolhido por Francisco Alves em 2001 e reformulado por Luís Filipe Castro em 2002. Assim, atribuiu-se o mesmo número a cada fiada de tábuas, contadas a partir da quilha. As peças foram designadas por ST4E (1). ST e E repetindo a designação de estibordo em inglês (starbord) e em português; o 4 é o

Figs. 24 e 25 – O tabuado de casco e a quilha do navio em fase de desmontagem.

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número correspondente à fiada da tábua; e o 1, assim como os sucessivos números entre parêntesis, indicavam o lugar de determinada prancha na sequência da fiada de tábua de casco. Refira-se que esta realidade, de diversas pranchas por fiada, em 2002 não era perceptível, já que o casco se encontrava coberto pelo cavername.

Uma vez etiquetadas todas as tábuas de casco, teve início a segunda tarefa que, como já foi acima referido, constou na realização do desenho do tabuado de casco em plano.

O sistema de registo do tabuado de casco foi idêntico ao utilizado para registar os perfis transversais. Uma barra longitudinal dotada de uma fita métrica servia de ponto de fixação e de referência da barra transversal. A partir da barra transversal, tomavam-se todas as medidas dos pontos de junção das tábuas de casco. Assim, juntando as diversas fiadas de medidas transversais, tiradas de 50 em 50cm, obteve-se o desenho em plano dos cerca de 7,5m de comprimento do tabuado de casco. Nalguns casos, foi necessário apertar a malha de certas fiadas de medidas transversais. Nessas zonas do casco, sobretudo onde se encontravam as juntas/escarvas das tábuas de casco, tiravam-se fiadas de medidas de 20 em 20cm.

Tendo em conta que se tratava de uma missão de cariz definitivo e com pouco tempo para a sua realização, havia toda a conveniência em verificar os dados recolhidos no terreno no próprio dia, o mais tardar na manhã seguinte, pelo que a informação recolhida no mergulho da manhã era confirmada no mergulho da tarde, após ter sido transposta para papel milimétrico entre os dois mergulhos.

Nesta fase, registaram-se também as medidas correspondentes aos pontos em que tinham sido feitos os perfis transversais, para os posicionar na planta geral, de modo a poder verificar-se, ulteriormente, na fase de estudo, a evolução das formas dos elementos in situ.

A segunda e última fase de desmontagem Entre 10 e 14 de Julho teve lugar a desmontagem do resto do tabuado de casco e da quilha. Este trabalho começou pelas peças da estrutura transversal que ainda se encontravam in situ, desmontando-se assim as peças B 4, C 4, C 9, B 14 e C 15 (uma vez que as peças C13 e B 9, junto às quais se realizaram os outros cortes transversais já tinha sido recuperadas), e as primeiras tábuas de casco, as ST 7 E (1), ST 7 E (2) e ST 6 E (1), seguindo-se as restantes e a quilha. De referir que tal como no caso das peças da estrutura transversal, nenhuma das tábuas de casco foi desmontada sem se ter previamente verificado que estava devidamente etiquetada.

No dia 15 de Julho o sítio intervencionado foi devidamente coberto com areia. Simultaneamente, em terra, uma outra equipa preparava todas as madeiras recuperadas e conservadas em tanques com água, assim como o material logístico de escavação subaquática e o de gabinete, a fim de serem transportadas para o CNANS. No dia seguinte, 16 de Julho, o estaleiro foi encerrado, com a partida de toda a equipa para Lisboa6.

Apontamento sobre a organização do estaleiro e da logística A base logística, tal como em 2002, foi montada nas proximidades da entrada lateral do Porto Comercial de Portimão e consistiu em quatro contentores alugados pela Câmara Municipal de Portimão, utilizados, respectivamente, como cozinha, casa de banho, dormitório e sala de reuniões.

6 À excepção do Emanuel Perez, do CNANS-Algarve.

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No cais, junto ao local de embarque, desde o ano anterior, tinham sido colocados outros dois contentores, propriedade do CNANS, que serviram de oficina, armazém, local de depósito do material de mergulho e de local de enchimento de garrafas, que funcionaram, portanto, como ponto de apoio logístico da campanha.

Junto a estes dois últimos contentores havia sido colocado um pontão, com dez metros de comprimento e três de largura, para servir de local de acostagem às embarcações da missão.

Durante a missão foram utilizadas duas embarcações do CNANS, a lancha Circe como principal embarcação de apoio ao mergulho (Fig. 26), e o pneumático Big Nemo, que serviu de reforço ao transporte das madeiras.

A alimentação dos elementos da equipa foi assegurada através da celebração de um contrato estabelecido pela Câmara Municipal de Portimão com uma empresa de cattering, que diariamente levava ao Porto Comercial o pequeno-almoço, o almoço e o jantar.

Relativamente ao horário de funcionamento do dia de trabalho, estipulou-se que a alvorada era dada às 7.30 horas, ao que se seguia o pequeno-almoço. Às 8.30 horas tinham lugar os últimos preparativos do dia de trabalho no terreno (colocação do material de mergulho, de escavação e de apoio ao registo arqueológico nas respectivas embarcações).

Fig. 26 – A lancha Circe, do CNANS, que serviu de apoio à campanha.

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O dia de trabalho no terreno consistia em dois mergulhos de uma hora por dia, realizados pelos elementos presentes, organizados em três equipas, separados pela refeição do almoço. Com efeito, considerou-se que a melhor solução era a realização de mergulhos com a duração de uma hora, já que permitia a realização de dois mergulhos por dia, deixando tempo suficiente para organizar e passar a limpo toda a informação recolhida durante cada mergulho.

Assim, por volta das 9:00/9:15, duas equipas de mergulho partiam nas duas embarcações. Este grupo era constituído por cinco elementos, quatro correspondentes a duas equipas e um quinto exclusivamente com funções de apoio de superfície. O apoio de superfície foi sempre assegurado por Emanuel Perez, que se encontrava impossibilitado de mergulhar. Para além do apoio de superfície, este elemento tinha a seu cargo o enchimento das garrafas, assim como a preparação do material de apoio à realização da escavação e de registo arqueológico.

A primeira equipa entrava na água entre as 9:45 e as 10:00 horas e a segunda uma hora depois. A primeira equipa regressava a terra no Big Nemo, enquanto que a terceira já se encontrava no cais de embarque e, com aquela embarcação, partia para fazer o último mergulho da manhã. De seguida, todos os elementos da equipa encontravam-se na base logística, almoçavam em conjunto, faziam uma curta pausa para um descanso de 30 a 40 minutos e colocavam a documentação em ordem.

À tarde, no terreno, o esquema organizativo era semelhante.

Depois de terminados os trabalhos de terreno tinham lugar os trabalhos de retaguarda. Efectuava-se a passagem ordenada para papel da totalidade da informação recolhida ao longo do dia e sua respectiva organização (Fig. 27).

Fig. 27 – Trabalhos diários de retaguarda.

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A partir da segunda fase dos trabalhos, realizou-se a fotografia de todas as peças recuperadas durante o dia, assim como a sua arrumação nos tanques de água. Quotidianamente eram preenchidas as fichas de missão. O dia de trabalho só ficava concluído após a realização de uma reunião, onde era feito o balanço do trabalho produzido e se preparava o dia seguinte, mediante a inventariação e a distribuição pelas equipas das tarefas a realizar.

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Documentação fotográfica

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Catálogo fotográfico de segurança preliminar