rafael sampaio octaviano de souza - hcte/ufrj · a todos os que já intercederam perante o criador...

231
UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO - UFRJ CENTRO DE CIÊNCIAS MATEMÁTICAS E DA NATUREZA - CCMN PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM HISTÓRIA DAS CIÊNCIAS E DAS TÉCNICAS E EPISTEMOLOGIA - HCTE RAFAEL SAMPAIO OCTAVIANO DE SOUZA APONTAMENTOS SOBRE A INTELIGÊNCIA ANIMAL À LUZ DA PSICOLOGIA ARISTOTÉLICO-TOMISTA Rio de Janeiro 2018

Upload: others

Post on 22-Feb-2021

20 views

Category:

Documents


2 download

TRANSCRIPT

Page 1: RAFAEL SAMPAIO OCTAVIANO DE SOUZA - HCTE/UFRJ · a todos os que já intercederam perante o Criador por esta pobre alma. AGRADECIMENTOS Ao Criador, por tudo, e a todos aqueles que

UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO - UFRJ

CENTRO DE CIEcircNCIAS MATEMAacuteTICAS E DA NATUREZA - CCMN

PROGRAMA DE POacuteS-GRADUACcedilAtildeO EM HISTOacuteRIA DAS

CIEcircNCIAS E DAS TEacuteCNICAS E EPISTEMOLOGIA - HCTE

RAFAEL SAMPAIO OCTAVIANO DE SOUZA

APONTAMENTOS SOBRE A INTELIGEcircNCIA ANIMAL

Agrave LUZ DA PSICOLOGIA ARISTOTEacuteLICO-TOMISTA

Rio de Janeiro

2018

RAFAEL SAMPAIO OCTAVIANO DE SOUZA

APONTAMENTOS SOBRE A INTELIGEcircNCIA ANIMAL

Agrave LUZ DA PSICOLOGIA ARISTOTEacuteLICO-TOMISTA

Tese de Doutorado apresentada ao Programa

de Poacutes-Graduaccedilatildeo em Histoacuteria das Ciecircncias e

das Teacutecnicas e Epistemologia Universidade

Federal do Rio de Janeiro como requisito

parcial para a obtenccedilatildeo do tiacutetulo de Doutor em

Histoacuteria das Ciecircncias e das Teacutecnicas e

Epistemologia

Orientadora Profordf Drordf Maira Monteiro Froacutees

Rio de Janeiro

2018

S729 Souza Rafael Sampaio Octaviano de Apontamentos sobre a inteligecircncia animal agrave luz da psicologia Aristoteacutelico- Tomista Rafael Sampaio Octaviano de Souza ndash Rio de Janeiro 2018 229 f il 30 cm Orientadora Maira Monteiro Froacutees Tese (Doutorado) - Universidade Federal do Rio de Janeiro Centro de Ciecircncias Matemaacuteticas e da Natureza Programa de Poacutes-Graduaccedilatildeo em Histoacuteria das Ciecircncias e das Teacutecnicas e Epistemologia 2018 Referecircncias f 197-218 1 Aristotelismo-tomismo 2 Inteligecircncia 3 Animais natildeo humanos 4 Potecircncia estimativa 5 Testes de inteligecircncia I Froacutees Maira Monteiro II Universidade Federal do Rio de Janeiro Centro de Ciecircncias Matemaacuteticas e da Natureza III Tiacutetulo

CDD 1894

Dedico este trabalho

aos meus amados filhos e esposa

aos meus amados pais e irmatildeos

aos meus demais parentes e amigos queridos

aos mestres que me orientaram e ensinaram

a todos os que jaacute intercederam perante o

Criador por esta pobre alma

AGRADECIMENTOS

Ao Criador por tudo e a todos aqueles que intercederam e haveratildeo de

interceder de algum modo diante dlsquoEle por esta pobre alma

agrave minha esposa por seu amor por nossos filhos ndash e a eles ndash por tudo mais

aos meus pais por seu amor pela educaccedilatildeo pela vida e por esta tambeacutem

aos meus demais antepassados

agrave minha tatildeo querida orientadora fundamental neste percurso por tanta

confianccedila pelas orientaccedilotildees imprescindiacuteveis e luminosas

e por essas tambeacutem aos meus tatildeo queridos orientadores das etapas

anteriores

ao meu querido compadre e mestre tomista por tantas luzes

agrave minha tatildeo querida cunhada comadre que tatildeo carinhosamente se ocupou dos

ajustes finais

aos professores formais ou informais mestres e mestras que tive e tenho e

de quem palavras ou accedilotildees satildeo tijolos que estaratildeo cimentados neste ente

pela eternidade

ao HCTE pela oportunidade pelo enriquecimento e porque sem ele este

trabalho muito provavelmente natildeo existiria

aos professores das Bancas pelas dicas valiosas pela experiecircncia e agrave

CAPES pelos recursos

a todos os demais que de algum modo contribuiacuteram para a consumaccedilatildeo

desta jornada

ldquo eacute mau aquele amante popular que ama o corpo mais que a alma pois natildeo eacute ele constante por amar um objeto que tambeacutem natildeo eacute constante Com efeito ao mesmo tempo que cessa o viccedilo do corpo que era o que ele amava bdquoalccedila ele o seu vocirco‟ sem respeito a muitas palavras e promessas feitas Ao contraacuterio o amante do caraacuteter que eacute bom eacute constante por toda a vida porque se fundiu com o que eacute constanterdquo

Soacutecrates ndash O Banquete

RESUMO

SOUZA Rafael Sampaio Octaviano de Apontamentos sobre a inteligecircncia animal agrave luz da psicologia aristoteacutelico-tomista 2018 Tese (Doutorado em Histoacuteria das Ciecircncias e das Teacutecnicas e Epistemologia) ndash Programa de Poacutes-Graduaccedilatildeo Histoacuteria das Ciecircncias e das Teacutecnicas e Epistemologia Universidade Federal do Rio de Janeiro 2018

Para a psicologia aristoteacutelico-tomista apenas o ser humano eacute dotado de intelecto enquanto os outros animais estatildeo restritos agrave potecircncia estimativa e aos demais sentidos internos e externos No entanto muitas pesquisas comparativas sobre processos neurais e comportamentais apresentaram resultados que retratam a ampla gama de definiccedilotildees atualmente propostas para o termo rdquointeligecircnciardquo levando pesquisadores a sugerirem que muitos desses animais natildeo humanos seriam capazes de realizar inferecircncias raciociacutenios e ateacute abstraccedilotildees Algumas de suas contribuiccedilotildees mais representativas foram aqui revisadas e avaliadas de acordo com sua coerecircncia em relaccedilatildeo ao aristotelismo-tomismo Natildeo se verificou nenhuma incompatibilidade significativa na presente anaacutelise Sugerimos que consideraccedilotildees sobre os princiacutepios aristoteacutelicos-tomistas em pesquisas sobre inteligecircncia animal e outros campos afins podem contribuir para os debates sob a perspectiva interdisciplinar que vatildeo desde o acircmbito epistemoloacutegico ao desenvolvimento de vaacuterias disciplinas que envolvem o sujeito humano e outros entes que se propotildee que sejam inteligentes

Palavras-chave Aristotelismo-tomismo Inteligecircncia Animais natildeo humanos Potecircncia estimativa Testes de inteligecircncia

ABSTRACT

SOUZA Rafael Sampaio Octaviano de Apontamentos sobre a inteligecircncia animal agrave luz da psicologia aristoteacutelico-tomista 2018 Tese (Doutorado em Histoacuteria das Ciecircncias e das Teacutecnicas e Epistemologia) ndash Programa de Poacutes-Graduaccedilatildeo Histoacuteria das Ciecircncias e das Teacutecnicas e Epistemologia Universidade Federal do Rio de Janeiro 2018

For the Aristotelian-Thomist psychology only the human being is endowed with intellect while the other animals are restricted to an estimative power and the other internal and external senses However many comparative researches on neural and behavioral processes has presented results portraying the wide range of definitions currently proposed for the term intelligence leading researchers to suggest that many of these nonhuman animals would be able to make inferences reasoning and even abstractions Some of their most representative contributions have been here in reviewed and evaluated according to their coherence with regard to aristotelianism-thomism No significant incompatibility was verified in the present analysis We suggest that considerations of the aristotelian-thomism principles in research on animal intelligence and other related fields can contribute to the debates pertaining interdisciplinary perspective ranging from the epistemological scope to the development of various disciplines involving the human subject and other beings that are proposed be intelligent

Keywords Aristotelianism-Thomism Intelligence Non-human animals Estimative power Intelligence tests

LISTA DE TABELAS Tabela 1 - Caracteriacutesticas das potecircncias da alma que compotildeem o aparato

cognitivo

219

Tabela 2 - Testes e observaccedilotildees relacionados a invertebrados peixes e

aves

220

Tabela 3 - Testes e observaccedilotildees relacionados a Corvidae 221

Tabela 4 - Testes e observaccedilotildees relacionados a Elephantidae 222

Tabela 5 - Testes e observaccedilotildees relacionados a Carnivora ndash Canis lupus

familiaris

224

Tabela 6 - Testes e observaccedilotildees relacionados a Cetaceae ndash Delphinidae 225

Tabela 7 - Testes e observaccedilotildees relacionados a Primates 227

LISTA DE FIGURAS

Figura 1 - Esquema de sugestotildees para pesquisas futuras 195

SUMAacuteRIO

1 INTRODUCcedilAtildeO 12

2 JUSTIFICATIVA 53

3 MEacuteTODOS E OBJETIVOS 57

4 RESULTADOS E DISCUSSAtildeO 60

41 UMA CONSTRUCcedilAtildeO PARA A PSICOLOGIA ARISTOTEacuteLICO-TOMISTA 60

411 A subalternaccedilatildeo das ciecircncias 60

5 CONCEITOS FUNDAMENTAIS DO ARISTOTELISMO-TOMISMO 62

51 ATO E POTEcircNCIA 62

52 ESSEcircNCIA E ACIDENTE 63

53 AS QUATRO CAUSAS E AS CATEGORIAS 70

54 A ALMA SUAS POTEcircNCIAS E A GRADACcedilAtildeO ENTITATIVA 74

55 OS SENTIDOS 81

551 Sentidos externos 83

552 Sentidos internos 87

56 INTELECTO 92

6 INVESTIGACcedilAtildeO SOBRE A ATRIBUICcedilAtildeO DE INTELIGEcircNCIA AOS ANIMAIS 107

61 ELEPHANTIDAE 114

611 Observaccedilotildees de Campo 116

612 Estudos experimentais 119

62 CARNIVORA ndash CANIS LUPUS FAMILIARIS 123

63 CETACEAE ndash DELPHINIDAE 129

631 Observaccedilotildees de campo 130

632 Estudos experimentais 131

64 PRIMATES 135

641 Observaccedilotildees de campo 137

642 Estudos experimentais 139

7 A INTELIGEcircNCIA NOS ANIMAIS SEGUNDO O ARISTOTELISMO-TOMISMO 153

8 ANAacuteLISE DAS HABILIDADES COGNITIVAS SEGUNDO O MODELO

ARISTOTEacuteLICO-TOMISTA 160

81 INTERACcedilOtildeES COMPORTAMENTAIS 160

811 Interaccedilotildees em geral 160

812 Comportamento diante da morte de coespeciacutefico 161

813 Respostas a sinais humanos 162

82 TEORIA DA MENTE E COMPORTAMENTO DIANTE DE TELAS DE VIacuteDEO 163

83 METACOGNICcedilAtildeO 165

84 NOCcedilAtildeO DE MEIO E FIM E USO DE INSTRUMENTOS 166

841 Planejamento 168

85 IMITACcedilAtildeO E SINCRONIA 168

86 CORRELACcedilAtildeO DE FIGURAS OU SONS 169

87 COMPETEcircNCIA PARA APREENSAtildeO DE QUANTIDADES 171

88 APTIDOtildeES RELACIONADAS Agrave COMUNICACcedilAtildeO 172

89 AUTORRECONHECIMENTO 176

9 CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS E CONCLUSAtildeO 178

REFEREcircNCIAS 197

TABELAS 219

12

1 INTRODUCcedilAtildeO

Como definir a inteligecircncia Seria possiacutevel delimitaacute-la conceitualmente (e

neste caso atribuir-lhe eficazmente mais de um conceito) Poderia ela ser atribuiacuteda

a algum outro ente aleacutem do homem Muitos pensadores buscaram responder a

questotildees como estas desde pelo menos o advento da filosofia Por muito tempo se

propocircs predominantemente que o exerciacutecio do intelecto seria no que toca aos entes

sensiacuteveis um atributo exclusivo da alma humana apta agrave aquisiccedilatildeo de conhecimento

teoacuterico agrave apreensatildeo da realidade agrave da verdade Isto se deu pelo menos ateacute o final

do periacuteodo escolaacutestico em que vigorava um realismo moderado quando entatildeo os

alicerces dessa ideia passaram a ser gradualmente abandonados em razatildeo da

forccedila que ganhava o nominalismo e substituiacutedos por diversificadas correntes que se

desenvolveram e se puseram a reestruturaacute-la objetando inclusive contra a proacutepria

existecircncia do que se entendia por alma

Dentre as que se destacam estatildeo as idealistas que levantam duacutevidas sobre o

acesso mesmo do homem agrave realidade a verdades e as naturalistas estas realistas

ou mesmo de fundo idealista que restringem as explicaccedilotildees sobre a intelecccedilatildeo

exclusivamente a processos orgacircnicos Mas todos os principais filoacutesofos e cientistas

que representam tais visotildees alguns dos quais seratildeo citados no decorrer deste

trabalho natildeo discrepam de seus predecessores em relaccedilatildeo ao fato de que natildeo haacute

como especular satisfatoriamente sobre a inteligecircncia sem levar em conta a anaacutelise

da natureza da consciecircncia e a presenccedila de elementos como o pensamento e a

informaccedilatildeo esta uacuteltima incluindo sua transmissatildeo por parte do objeto e sua

captaccedilatildeo e processamento pelo sujeito que intelige E haacute igualmente consenso em

relaccedilatildeo ao fato de que o pensamento e a informaccedilatildeo bem como a consciecircncia e a

inteligecircncia mesma possuem objetos ou seja aquilo que eacute pensado aquilo a que se

refere a informaccedilatildeo aquilo de que se estaacute consciente e aquilo que eacute inteligido e

possuem sujeitos ou seja aquele que pensa aquele que deteacutem a informaccedilatildeo

aquele que estaacute consciente aquele que intelige

As divergecircncias entre as escolas supracitadas comeccedilam na interpretaccedilatildeo

sobre o que haacute de mais elementar na natureza desses sujeitos e objetos isto eacute

como jaacute apontado se satildeo ou natildeo reais ou se um o eacute e o outro natildeo o que pode

remeter imediatamente a questotildees sobre a natureza da informaccedilatildeo Em seguida

considerando a realidade do sujeito este recebe informaccedilotildees verdadeiras do mundo

13

agrave sua volta ou recebe informaccedilotildees falsas dele ou recebe informaccedilotildees parcialmente

verdadeiras e parcialmente falsas ou recebe informaccedilotildees sobre as quais natildeo tem

condiccedilotildees de emitir juiacutezo em relaccedilatildeo agrave sua veracidade ou falsidade Mesmo diante

das dificuldades que haacute em demonstrar no acircmbito cientiacutefico que os fenocircmenos

mentais envolvidos na cogniccedilatildeo apresentam caracteriacutesticas em comum com o seu

objeto a natureza dessas informaccedilotildees define assim a natureza do que ele pensa

Deste modo pensa em coisas reais e natildeo reais (ou pensa somente em coisas reais

se considera que todas sejam reais como pensamento) ou em coisas somente natildeo

reais ou em coisas que natildeo sabe serem ou natildeo reais E ao pensar potildee-se

consciente do que eacute real integral ou parcialmente ou do que natildeo o eacute

Considerando-se pois a realidade do sujeito e do objeto em um acircmbito

tangiacutevel independentemente das imensas dificuldades que haacute em demonstrar

cientificamente se os fenocircmenos mentais envolvidos na cogniccedilatildeo apresentam

caracteriacutesticas em comum com o objeto externo com o qual se relacionam1 a

informaccedilatildeo tem os sentidos daquele como porta de entrada e de algum modo torna-

se pensamento Como tal certa potecircncia sua eacute ampliada ao infinito como ilustram

bem estas palavras de Hume

Agrave primeira vista nada pode parecer mais ilimitado do que o pensamento humano que natildeo apenas escapa a toda autoridade e a todo poder do homem mas tambeacutem nem sempre eacute reprimido dentro dos limites da natureza e da realidade Formar monstros e juntar formas e aparecircncias incongruentes natildeo causam agrave imaginaccedilatildeo mais embaraccedilo do que conceber os objetos mais naturais e mais familiares Apesar de o corpo confinar-se num soacute planeta sobre o qual se arrasta com sofrimento e dificuldade o pensamento pode transportar-nos num instante agraves regiotildees mais distantes do Universo ou mesmo aleacutem do Universo para o caos indeterminado onde se supotildee que a Natureza se encontra em total confusatildeo Pode-se conceber o que ainda natildeo foi visto ou ouvido porque natildeo haacute nada que esteja fora do poder do pensamento exceto o que implica absoluta contradiccedilatildeo

2

Se a posse da informaccedilatildeo e o pensamento satildeo requisitos para que se esteja

consciente de algo tambeacutem o eacute o ato de conhecer Deve-se conhecer a informaccedilatildeo

para que possa ser pensada e entatildeo dela se esteja consciente E uma vez que algo

foi conhecido pode ter havido intelecccedilatildeo e obteve-se o entendimento

A inteligecircncia pois seraacute fundamental para que o pensamento possa

exercitar-se ilimitadamente e o faraacute em um jogo quase incessante com os sentidos

1 TALLIS 2010 p 118

2 HUME 2001 p 21-22

14

especialmente com a memoacuteria Bachelard conseguiu expressar isto com excelecircncia

em suas elucubraccedilotildees que assumiram como limiar a chama de uma vela

A chama eacute um mundo para o homem soacute []3 A chama ela sozinha pode

concretizar o ser de todas as suas imagens o ser de todos os seus fantasmas []

4 Existe um parentesco entre a lamparina que vela e a alma

que sonha Tanto para uma quanto para a outra o tempo eacute lento Tanto no devaneio quanto na luz fraca encontra-se a mesma paciecircncia Entatildeo o tempo se aprofunda as imagens e as lembranccedilas se reuacutenem O sonhador inflamado une o que vecirc ao que viu conhece a fusatildeo da imaginaccedilatildeo com a memoacuteria Abre-se entatildeo a todas as aventuras da fantasia aceita a ajuda dos grandes sonhadores e entra no mundo dos poetas Por conseguinte a fantasia da chama tatildeo unitaacuteria a princiacutepio torna-se de abundante multiplicidade []

5 Com as imagens literaacuterias da chama o surrealismo tem

alguma garantia de ter uma raiz de realidade As imagens mais fantaacutesticas da chama se convergem Transformam-se por meio de notaacutevel privileacutegio em imagens verdadeiras []

6 A chama nos leva a ver em primeira matildeo

temos mil lembranccedilas sonhamos tudo atraveacutes da personalidade de uma memoacuteria muito antiga e no entanto sonhamos como todo mundo lembramo-nos como todo mundo se lembra ndash entatildeo seguindo uma das leis mais constantes da fantasia diante da chama o sonhador vive em um passado que natildeo eacute mais unicamente seu no passado dos primeiros fogos do mundo

7

Assim o processo de intelecccedilatildeo implicaria a absorccedilatildeo transformaccedilatildeo

combinaccedilatildeo alimentaccedilatildeo e a possibilidade de emissatildeo de informaccedilotildees

Tallis aponta a importacircncia da interpretaccedilatildeo reconhecendo-a como ldquoatividade

fundamental da consciecircncia humanardquo8 e diz que haacute vaacuterios sentidos alguns

demasiado especializados atribuiacutedos ao termo ldquoinformaccedilatildeordquo mas explica que se

ldquoser informado eacute aprender algo que natildeo se conhecia antesrdquo entatildeo a palavra poderia

ser compreendida como ldquoalgo que resolve uma incerteza sobre como as coisas satildeo

ou sobre como seratildeordquo9

Dentre os significados fornecidos pelo Dicionaacuterio Aulete para a palavra

ldquoinformaccedilatildeordquo encontram-se

Accedilatildeo ou resultado de informar(-se) [] Conjunto de dados sobre algo ou algueacutem [] Relato de acontecimentos ou fatos transmitido ou recebido

3 BACHELARD 1989 p 12

4 Ibid p 13

5 Ibid p 19

6 Ibid p 13

7 Ibid p 11

8 ldquofundamental activity of human consciousnessrdquo TALLLIS 2010 p 104

9 ldquo[] to be informed is to learn something one did not know before []rdquo e ldquo[] something that

resolves an uncertainty about how things are or how they are going to berdquo TALLIS 2010 p 90

15

Explicaccedilatildeo dada para uma determinada finalidade [] Fil Na teoria hilemoacuterfica accedilatildeo pela qual a forma daacute ser ou informa a mateacuteria

10

E dentre os significados fornecidos pelo Dicionaacuterio Priberam figuram ldquoAto ou

efeito de informar [] Notiacutecia (dada ou recebida) [] Indagaccedilatildeo [] Esclarecimento

dado sobre os meacuteritos ou estado de outrem (Tambeacutem usado no plural)rdquo11

O Aulete fornece as seguintes definiccedilotildees para ldquoinformarrdquo ldquoDeixar algueacutem

ciente de (fatos notiacutecias acontecimentos) COMUNICAR [] Tomar ciecircncia de

INTEIRAR(-SE) Dar conhecimento de ser instrutivo para [] Levar orientaccedilatildeo a

[] Ministrar ensinamentos a [] Servir de base ou fundamentordquo12

E assim define o termo o Priberam ldquoDar informaccedilotildees a ou a respeito de []

Avisar [] Dar parecer sobre [] Dar forma a [] Tomar corpo engrossar

desenvolver-se [] Tomar informaccedilotildees [] Procurar notiacutecias [] Tomar forma []13

Le Coadic assim define informaccedilatildeo

A informaccedilatildeo eacute um conhecimento inscrito (gravado) sob a forma escrita (impressa ou numeacuterica) oral ou audiovisual A informaccedilatildeo comporta um elemento de sentido Eacute um significado transmitido a um ser consciente por meio de uma mensagem inscrita em um suporte espacial-temporal impresso sinal eleacutetrico onda sonora etc Essa inscriccedilatildeo eacute feita graccedilas a um sistema de signos (a linguagem) signo este que eacute um elemento da linguagem que associa um significante a um significado signo alfabeacutetico palavra sinal de pontuaccedilatildeo

14

A partir da citaccedilatildeo acima Le Coadic define em nota de rodapeacute o termo

ldquoconhecimentordquo

Um conhecimento (um saber) eacute o resultado do ato de conhecer ato pelo qual o espiacuterito apreende um objeto Conhecer eacute ser capaz de formar a ideia de alguma coisa eacute ter presente no espiacuterito Isso pode ir da simples identificaccedilatildeo (conhecimento comum) agrave compreensatildeo exata e completa dos objetos (conhecimento cientiacutefico) O saber designa um conjunto articulado e organizado de conhecimentos a partir do qual uma ciecircncia ndash um sistema de relaccedilotildees formais e experimentais ndash poderaacute originar-se

A palavra ldquopensamentordquo eacute assim definida pelo Aulete

Accedilatildeo ou resultado de pensar [] Capacidade ou atividade de formular eou evocar ideias juiacutezos conceitos etc REFLEXAtildeO [] Cada produto dessa atividade mental IDEIA [] Linha conceitual caracteriacutestica de um intelectual

10

INFORMACcedilAtildeO 2017 11

Ibid 12

Ibid 13

Ibid 14

LE COADIC 1996 p 5

16

de um grupo ou de uma eacutepoca [] Mente cabeccedila maneira de pensar Expressatildeo resumida de uma ideia em forma de frase

15

Estatildeo entre as definiccedilotildees de ldquopensamentordquo no Dicionaacuterio Priberam ldquoAto

faculdade de pensar [] Ideia reflexatildeo consideraccedilatildeo [] Intenccedilatildeo [] Conceito

opiniatildeo [] Esboccedilo da primeira ideia ou invenccedilatildeo de um artista [] A ideia capital de

um escrito e cada uma das mais notaacuteveis nele contidasrdquo16

Lalande comenta que

Essa palavra em cada um de seus sentidos pode-se aplicar seja ao conjunto de fatos considerados (pensamento) seja a cada um destes separadamente (um pensamento) [] Em um sentido mais amplo envolve todos os fenocircmenos do espiacuterito [] Mais ordinariamente se diz de todos os fenocircmenos cognitivos (por oposiccedilatildeo aos sentimentos e agraves vontades) [] Em sentido mais proacuteprio diz-se do entendimento e da razatildeo na medida em que permitem compreender que constitui a mateacuteria do conhecimento na medida em que percebem um grau de siacutentese mais elevado que a percepccedilatildeo a memoacuteria ou a imaginaccedilatildeo

17

Retomando o Aulete dentre as definiccedilotildees apresentadas para o verbo

ldquopensarrdquo constam

Elaborar ideias ou raciociacutenios MEDITAR REFLETIR [] Ter como intenccedilatildeo COGITAR TENCIONAR [] Procurar lembrar-se recordar-se [] Preocupar-se com [] Julgar supor [] Formar imagem mental de IMAGINAR PREVER [] Ter o mesmo ponto de vista opiniatildeo [] Tratar convenientemente ou cuidar Pensamento opiniatildeo juiacutezo

18

E entre as definiccedilotildees de ldquopensarrdquo no Priberam ldquoFormar ideias [] Refletir []

Raciocinar [] Ser de parecer [] Tencionar [] Ter no pensamento Imaginar

julgar [] Planear [] Dar penso alimento a [] Pensamento opiniatildeo juiacutezordquo19

Assim o pensamento pelo menos em acircmbito conceitual ou seja conforme

as definiccedilotildees adotadas e os entes aos quais satildeo aplicados como se veraacute mais

adiante pode estar ou natildeo associado agrave inteligecircncia Para esta o Dicionaacuterio Aulete

Digital fornece dentre os significados possiacuteveis os seguintes

15

PENSAMENTO 2017 16

Ibid 17

ldquoCe mot dans chacun de ses sens peut sapliqueur soit agrave lensemble des faits consideacutereacutes (la penseacutee) soit agrave chacun deux pris agrave part (une penseacutee) [] Au sens le plus large il envelope tous les pheacutenomegravenes de lesprit [] Plus ordinairement se dit de tous les pheacutenomegravenes cognitifs (par oposition aux sentiments et aux volitions) [] Au sens le plus propre se dit de lentendement et de la raison en tant quils permettent de comprendre ce qui constitue la matiegravere de la connaissance en tant quils reacutealisent un degreacute de syntegravese plus eacuteleveacute que la perception la meacutemoire ou limaginationrdquo LALANDE 1997 p 752

18 PENSAR 2017

19 Ibid

17

Faculdade de entender de compreender INTELECTO [] Penetraccedilatildeo de espiacuterito percepccedilatildeo clara e faacutecil DISCERNIMENTO JUIacuteZO [] Interpretaccedilatildeo do sentido de um texto um livro uma frase etc [] Conformidade de sentimentos e de intenccedilotildees [] Destreza habilidade para escolher os meacutetodos e obter um bom resultado [] Psi Capacidade de resolver situaccedilotildees novas e problemaacuteticas em circunstacircncias em que o instinto o conhecimento e o haacutebito natildeo podem ajudar

20

Dentre aqueles fornecidos pelo Dicionaacuterio Priberam da Liacutengua Portuguesa

para a palavra constam ldquoConjunto de todas as faculdades intelectuais (memoacuteria

imaginaccedilatildeo juiacutezo raciociacutenio abstraccedilatildeo e concepccedilatildeo) [] Qualidade de inteligente

[] Compreensatildeo faacutecil [] Habilidaderdquo21

E Lalande fornece dentre outras definiccedilotildees

Conjunto de todas as funccedilotildees que tecircm por objeto o conhecimento no sentido mais amplo da palavra (sensaccedilatildeo associaccedilatildeo memoacuteria imaginaccedilatildeo entendimento razatildeo consciecircncia) [] (Em oposiccedilatildeo agrave intuiccedilatildeo e agrave sensaccedilatildeo) sinocircnimo de compreensatildeo conhecimento conceitual e racional [] (Em oposiccedilatildeo ao instinto) atividade voluntaacuteria adaptaccedilatildeo refletida dos meios aos fins

22

Segundo De Libera a palavra ldquointeligirrdquo proveacutem do latim ldquointelligererdquo que por

sua vez eacute composta por dois eacutetimos um deles eacute ldquolegererdquo que pode significar

ldquoreunirrdquo ldquorecolherrdquo um dos significados da palavra grega ldquolegocircrdquo (λέγω) o outro eacute

ldquointerrdquo que significa ldquoentrerdquo23

De Libera observa tambeacutem que

Significar entender compreender estes significados natildeo representam um problema para o tradutor jaacute que a linguagem vernaacutecula os separou muitas vezes em termos que evoluiacuteram de diferentes maneiras com exclusatildeo de outros usos A palavra intellectus abrange aleacutem das esferas do significado e da compreensatildeo quase todas as noccedilotildees relativas ao pensamento sua atividade e agraves suas condiccedilotildees de possibilidade Eacute aiacute onde estatildeo as dificuldades Como um termo fundamental da psicologia antiga e medieval a palavra intellectus e a seacuterie de termos que derivam dela ou se relacionam com ela (intelligere intellectualis intelligibilis) levantam problemas particulares mas natildeo insoluacuteveis para o tradutor

24

20

INTELIGEcircNCIA 2017 21

Ibid 22

ldquoEnsemble de toutes les fonctions qui ont pour objet la connaissance au sens le plus large du mot (sensation association meacutemoire imagination entendement raison conscience) [] (Oposeacute agrave intuition et agrave sensation) synonyme dentendement connaissance conceptuelle et rationnelle [] (Oposeacute agrave instinct) activiteacute volontaire adaptation reacutefleacutechie de moyens agrave des finsrdquo LALANDE 1932 p 388-389

23 DE LIBERA 2004 p 493

24 ldquoTo mean to understand to comprehend these different meanings do not pose a problem

for the translator since vernacular language has often separated them out into terms that have evolved in different ways to the exclusion of other uses The word intellectus covers in addition to the spheres

18

Apoacutes apontar como problema mais grave o fato de que a palavra

ldquoentendimentordquo (ldquounderstandingrdquo ldquoentendementrdquo e ldquoVerstandrdquo em inglecircs francecircs e

alematildeo respectivamente) passou a ser aceita para traduzir ldquointellectusrdquo mas sem ter

precedente no peripatetismo e no escolasticismo e que assim ldquoA transformaccedilatildeo de

lsquointellectusrsquo em lsquoentendimentorsquo (lsquounderstandingrsquo lsquoentendementrsquo) marca uma ruptura

na histoacuteria das teorias da almardquo25 ele entatildeo assinala que ldquointellectusrdquo tornou-se

sinocircnimo do ldquonousrdquo aristoteacutelico ideia distinta de ldquoratiordquo somente depois das

traduccedilotildees latinas do De Anima De Libera afirma ainda haver pelo menos dez

significados de ldquointellectusrdquo encontrados no vocabulaacuterio escolaacutestico indicando que

haacute entre eles certa interconexatildeo e entatildeo os elenca

[] (1) o nous peripateacutetico entendido no sentido de ldquosubstacircnciardquo (2) o mesmo no sentido de ldquofaculdaderdquo [] ou ldquofaculdade de conhecimentordquo[] (3) a faculdade de conhecimento natildeo sensiacutevel ou suprassensiacutevel mas natildeo distinta de ldquoratiordquo (isto eacute sem levar em conta a distinccedilatildeo entre conhecimento intuitivo e conhecimento discursivo) (4) uma atividade cognitiva um ato de conhecimento intelecccedilatildeo ou inteligecircncia (sinocircnimo intellegentia) (5) a faculdade de conhecimento intuitiva natildeo sensiacutevel que penetra na essecircncia iacutentima das coisas (de acordo com a etimologia medieval que reuacutene intelligere e legere intus []) (6) o ldquohabitus dos princiacutepiosrdquo distinto de prudentia sapientia e scientia mas tambeacutem de ratio e synteresis [] o grego nous tocircn archocircn [νοῦς τῶν ἀρχῶν] e o latino habitus principiorum[] (7) inspeccedilatildeo intelectual [] sinocircnimo de intellegentia e que tem por antocircnimo ratio (8) concepccedilatildeo compreensatildeo interpretaccedilatildeo entendimento ou significado [] (9) uma representaccedilatildeo natildeo sensiacutevel [] ou uma noccedilatildeo sinocircnimo de ratio no sentido de uma foacutermula de definiccedilatildeo [] (10) significaccedilatildeo ou significado [] sinocircnimo de ratio (no sentido da foacutermula de definiccedilatildeo foacutermula-logos sensus significatio virtus vis [ldquoforccedila expressiva ou impactordquo] de uma palavra)

26

of meaning and of understanding almost all of the notions relating to thought its activity and its conditions of possibility This is where the difficulties lie As a fundamental term of ancient and medieval psychology intellectus and the series of terms that are derived from or related to it (intelligere intelectualis intelligibilis) pose particular if not insoluble problems for the translatorrdquo DE LIBERA 2004 p 492

25 ldquoThe transformation of intellectus into lsquounderstandingrsquo (entendement) marks a break in the

history of theories of the soulrdquo DE LIBERA 2004 p 493 26

ldquo(1) the Peripatetic nous understood in the sense of lsquosubstancersquo (2) the same in the sense of lsquofacultyrsquo[] or lsquofaculty of knowledgersquo[] (3) the nonsensible or suprasensible faculty of knowledge but not distinct from ratio (that is without taking into account the distinction between intuitive knowledge and discursive knowledge) (4) a cognitive activity an act of knowledge intellection or intelligence (synonym intellegentia) (5) the nonsensible intuitive faculty of knowledge which penetrates the intimate essence of things (according to the medieval etymology bringing together intelligere and legere intus [] (6) the lsquohabitus of principlesrsquo as distinct from prudentia sapientia and scientia but also from ratio and synteresis [] the Greek nous tocircn archocircn [νοῦς τῶν ἀϱχῶν] and the Latin habitus principiorum [] (7) intellectual inspection [] synonymous with intellegentia and the antonym of which is ratio (8) conception comprehension interpretation understanding or meaning [] (9) a nonsensible representation [] or a notion synonymous with ratio in the sense of a definitional formula [] (10) significance or meaning [] synonymous with ratio (in the sense of the definitional formula logos-formula sensus significatio virtus vis [ldquoexpressive force or impactrdquo] of a word)rdquo DE LIBERA 2004 p 493

19

Observa em seguida que o significado original da tradiccedilatildeo greco-latina uso

este que tambeacutem tem Guilherme de Moerbeke no seacuteculo XIII principal autor das

traduccedilotildees de Aristoacuteteles do grego para o latim naquele periacuteodo largamente

utilizadas por Santo Tomaacutes de Aquino como exemplo de emprego neste periacuteodo da

palavra intellectus eacute epinoia [ἐπίνοια] traduzida entatildeo comumente por opinio e que

eacute entendida pelo sentido geral ou comum de ldquointeligecircnciardquo como tambeacutem por

ldquopensamentordquo ldquoimaginaccedilatildeordquo ldquoreflexatildeordquo ldquoalgo que vem agrave menterdquo As palavras dianoia

[διανοία] que se refere ao pensamento discursivo agrave faculdade discursiva traduzida

entatildeo por rationalitas e ratio e to dianoegravetikon [τὸ διανοητιϰόν] que significa ldquorazatildeo

discursivardquo contrastam com os sentidos de ldquopensamentordquo em geral ou de

pensamento ldquointuitivordquo e de ldquorazatildeo intuitivardquo respectivamente de Intellectus como

noacuteecircsis [νόησις] Tambeacutem a palavra intelligentia era usada como intellegentia no

periacuteodo medieval em que aparece mais a forma legocirc que tem por significado ldquolerrdquo27

Esse significado tambeacutem estaacute na construccedilatildeo etimoloacutegica alternativa que era muitas

vezes empregada no mesmo periacuteodo intra ou intus mais legere28 como menciona

acima De Libera e pela qual Tomaacutes de Aquino demonstrava certo apreccedilo

significando ldquoler dentrordquo para explicar que a inteligecircncia ou intelecto conheceria o

iacutentimo das coisas29

No cenaacuterio cientiacutefico contemporacircneo as teorias sobre a inteligecircncia

foram enquadradas em dois tipos as teorias impliacutecitas e as teorias expliacutecitas

As teorias impliacutecitas30 satildeo definiccedilotildees e explicaccedilotildees para a inteligecircncia que os

pesquisadores colhem de pessoas que natildeo satildeo estudiosas do assunto

especialistas ou seja satildeo extraiacutedas do senso comum que variam conforme a faixa

etaacuteria e a cultura Delas emergem fatores como a capacidade de resolver

problemas aptidatildeo verbal competecircncia social compreensatildeo de si e do proacuteximo

respeito dentre outras habilidades cognitivas

Jaacute as teorias expliacutecitas satildeo as definiccedilotildees e conceitos formulados e publicados

pelos proacuteprios pesquisadores a maioria enquadrada em trecircs grandes abordagens

a) a das teorias psicomeacutetricas com raiacutezes fincadas nos trabalhos de Galton

que se fundamentam em anaacutelises da estrutura da inteligecircncia dos possiacuteveis

27

DE LIBERA 2004 p 494 28

Ibid p 493 29

TOMAacuteS DE AQUINO 1988 p 92 30

DWECK LEGGETT 1988

20

elementos que a compotildeem e que seratildeo objeto dos famosos testes de mediccedilatildeo de

inteligecircncia como os de Binet e Simon Cattel Stern Wechsler etc

b) a das teorias cognitivas que se originaram da proposta de Lee J

Cronbach de 1957 feita agrave American Psychological Association de unir as duas

disciplinas da psicologia cientiacutefica a experimental e a diferencial e sobre a qual se

desenvolvem estudos concernentes agraves diferenccedilas individuais que segundo

Sternberg partem do pressuposto de que ldquoa inteligecircncia eacute composta por um

conjunto de representaccedilotildees mentais (por exemplo proposiccedilotildees e imagens) de

informaccedilatildeo e de um conjunto de processos mentais que podem operar sobre as

representaccedilotildeesrdquo31

c) e a das teorias bioloacutegicas que abordam comportamentos inteligentes

baseados nas funccedilotildees neurofisioloacutegicas que os produzem

Sternberg parece propor ainda uma subdivisatildeo da cognitiva como mais uma

grande abordagem a cognitiva conceitual Tais teorias segundo afirma se

relacionam ldquocom o modo com que os processos cognitivos operam em vaacuterios

contextos ambientaisrdquo32 e tecircm como exemplos a sua proacutepria Teoria Triaacuterquica e a

famosa Teoria das Inteligecircncias Muacuteltiplas de Gardner

Algumas das principais teorias da inteligecircncia na abordagem psicomeacutetrica

estatildeo listadas em Pal e colaboradores33 dentre as quais destacamos

a) a dos dois fatores de Spearman o fator G uma habilidade mais geral inata

e o que mais fornece explicaccedilatildeo para a inteligecircncia ndash que da visatildeo desta de

Spearman Piaget34 cita os trecircs momentos essenciais a saber a apreensatildeo da

experiecircncia a educaccedilatildeo das relaccedilotildees e a educaccedilatildeo dos correlatos para entatildeo

acrescentar que eacute necessaacuterio que haja intermediaccedilatildeo de uma assimilaccedilatildeo

construtiva para a apreensatildeo da experiecircncia ndash e o fator S que representa

aquisiccedilotildees a partir do ambiente variando segundo as atividades de um mesmo

indiviacuteduo

b) a teoria dos multifatores de Thorndike ndash proponente dos trecircs tipos de

inteligecircncia (1) social (2) mecacircnica e (3) abstrata que estatildeo relacionadas agrave

31

ldquo[] intelligence is composed of a set of mental representations (eg propositions images) of information and a set of mental processes that can operate on the representationsrdquo STERNBERG 2004 p 323

32 ldquo[] cognitive processes operate in various environmental contextsrdquo STERNBERG 2004

p 323 33

PAL et al 2004 34

PIAGET 1972 p 127

21

capacidade de aprender a compreender e a administrar respectivamente (1)

homens mulheres crianccedilas as relaccedilotildees em geral (2) objetos e recursos naturais

(3) ideias e siacutembolos ndash35 que lista quatro fatores ou conjuntos de habilidades

requeridas para a atividade mental a saber a aptidatildeo para lidar com o niacutevel de

dificuldade de uma tarefa a capacidade de lidar com determinado nuacutemero de tarefas

em determinado grau de dificuldade o nuacutemero de situaccedilotildees em cada niacutevel agraves quais

o indiviacuteduo eacute capaz de responder e a velocidade com que ele responde

c) a teoria de Thurstone dos grupos independentes entre si ndash constituiacutedo por

sete fatores principais ou ldquohabilidades mentais primaacuteriasrdquo36 a saber compreensatildeo

verbal (W) orientaccedilatildeo espacial (S) raciociacutenio indutivo (R) aptidatildeo numeacuterica (N)

fluecircncia verbal (V) memoacuteria associativa (M) e velocidade perceptiva (P) ndash37 que

possuem como nuacutecleo um fator primaacuterio compartilhado por operaccedilotildees mentais deles

especiacuteficas e que daacute a elas unidade psicoloacutegica e funcional e as diferencia das de

outros grupos

d) o modelo de estrutura tridimensional do intelecto de Guilford no qual ele

classifica o trabalho intelectual de acordo com o conteuacutedo que pode ser visual

auditivo simboacutelico semacircntico ou comportamental com a operaccedilatildeo mental

envolvida que pode ser a cogniccedilatildeo a retenccedilatildeo de memoacuteria o registro de memoacuteria

a produccedilatildeo divergente e a produccedilatildeo e avaliaccedilatildeo convergente e com o produto

resultante da operaccedilatildeo classificado em unidades classes relaccedilotildees sistemas

transformaccedilotildees e implicaccedilotildees

e) a teoria hieraacuterquica de Vernon que estabelece quatro niacuteveis hieraacuterquicos

para os elementos da inteligecircncia numa tentativa de conciliar a teoria de Spearman

cujos fatores G e S encontram-se no primeiro e quarto niacuteveis respectivamente e a

de Thurstone cujos elementos estatildeo no terceiro niacutevel (o segundo refere-se a fatores

como as habilidades verbo-numeacuterico-educacionais e as fiacutesico-praacutetico-mecacircnico-

espaciais)

f) e a teoria fluida e a teoria cristalizada de Cattel que tratam a inteligecircncia

respectivamente como uma capacidadede pensar abstratamente e resolver

problemas adquirida pela potencialidade geneacutetica e como um conhecimento que

resulta de uma aprendizagem anterior inclusive resultante da experiecircncia

35

THORNDIKE 1920 36

ldquoPrimary mental abilitiesrdquo 37

SCHAIE 2004

22

Da abordagem psicomeacutetrica emergem assim duas subdivisotildees a partir de

Spearman a fatorial na qual se destacam o proacuteprio autor e Thurstone cujas

divergecircncias implicam basicamente a posiccedilatildeo e a importacircncia que cada um atribui

aos elementos isolados que compotildeem a inteligecircncia e a multidimensional que

tentaraacute conciliar as duas visotildees Esta tambeacutem apresenta duas subdivisotildees a dos

modelos natildeo hieraacuterquicos que tem como representantes Thorndike e Guilford e a

dos modelos hieraacuterquicos como os de Vernon e Cattel38

Pal e colaboradores39 listam ainda algumas das abordagens cognitivas como

a) a bastante conhecida teoria de Gardner das muacuteltiplas inteligecircncias a

inteligecircncia linguiacutestica a loacutegico-matemaacutetica a espacial a musical a cinesteacutesico-

corporal a interpessoal a intrapessoal a naturalista e a existencialista

b) a teoria triaacuterquica de Sternberg que distingue trecircs habilidades intelectivas

a analiacutetica ou componencial a praacutetica ou contextual e a criativa ou experiencial

c) e a teoria da inteligecircncia emocional popularizada por Daniel Goleman em

sua obra ldquoInteligecircncia Emocionalrdquo lanccedilada em 1995 e que recebeu muitos modelos

como o de Salovey e Mayer40 sendo assim definida por Cherniss41 ldquoInteligecircncia

emocional refere-se a um conjunto de habilidades que envolvem o modo com que

pessoas percebem expressam entendem e controlam suas proacuteprias emoccedilotildees bem

como as emoccedilotildees dos outrosrdquo42

E destoutro modo definem Salovey e Mayer ldquo[] o subconjunto de

inteligecircncia social que envolve a capacidade de monitorar os sentimentos e as

emoccedilotildees proacuteprios e do outro para discriminar entre elas e usar essa informaccedilatildeo

para orientar os pensamentos e as accedilotildees de algueacutemrdquo43

Da psicologia cognitiva destaca-se tambeacutem a teoria dos modelos mentais

(ldquoMental Models Theoryrdquo) Segundo Johnson-Laird seu principal proponente cada

modelo mental seria fruto da resposta a trecircs perguntas pelas quais se busca saber

38

SILVA 2003 39

PAL et al 2004 40

SALOVEY MAYER 1990 41

CHERNISS 2004 42

ldquoEmotional intelligence refers to a set of abilities that involve the way in which people perceive express understand and manage their own emotions as well as the emotions of othersrdquo CHERNISS 2004 p 315

43 ldquo[] the subset of social intelligence that involves the ability to monitor onersquos own and

otherrsquos feelings and emotions to discriminate among them and to use this information to guide onersquos thinking and actionsrdquo SALOVEY MAYER 1990 p 189

23

(1) a forma das representaccedilotildees mentais e as questotildees sobre se as imagens diferem dos conjuntos de proposiccedilatildeo (2) os processos mentais subjacentes ao raciociacutenio comum e a questatildeo de quais regras de inferecircncia eles incorporam e (3) a representaccedilatildeo do significado de palavras e a questatildeo de saber se elas dependem de um dicionaacuterio decomposicional

44 ou de um

conjunto de postulados de significado45

A teoria baseia-se assim em trecircs princiacutepios

Primeiro cada modelo mental representa o que eacute comum a um conjunto distinto de possibilidades [] Segundo os modelos mentais satildeo icocircnicos ou seja sua estrutura na medida do possiacutevel corresponde agrave estrutura do que eles representam [] Terceiro os modelos mentais que se baseiam em descriccedilotildees representam o que eacute verdadeiro agrave custa do que eacute falso

46

Parte entatildeo do pressuposto principal de que o ldquoos indiviacuteduos raciocinam

tentando visualizar as possibilidades compatiacuteveis com o que sabem ou acreditamrdquo47

Essas possibilidades caracterizam os modelos mentais que vatildeo sendo conectados

e reconectados entre si realizando inferecircncias no processo de intelecccedilatildeo

Por fim no tocante agrave abordagem bioloacutegica Silva descreve brevemente as

principais teorias que buscam variaacuteveis bioloacutegicas que subjazem agrave inteligecircncia

a) a de Hebb que distingue trecircs tipos de inteligecircncia o tipo A ou seja um

potencial inato o tipo B que diz respeito ao funcionamento do ceacuterebro e o tipo C

que se refere agravequela que pode ser mensurada pelos testes de inteligecircncia

b) a de Halstead que propocircs quatro fatores ou habilidades determinados

biologicamente o integrativo de campo o de abstraccedilatildeo o de potecircncia e o direcional

todos relacionados ao funcionamento do coacutertex dos lobos frontais

44

Parte de um ldquoprinciacutepio de composicionalidade (principle of compositionality)rdquo de Frege de que ldquoo significado de um constituinte sintaticamente complexo tal como uma sentenccedila eacute uma funccedilatildeo composicional dos significados de suas partesrdquo Assim esse tipo de dicionaacuterio decompotildee as palavras em elementos semacircnticos com o fim de que se caracterize ldquoas relaccedilotildees de significado entre as palavrasrdquo Respectivamente ldquo[] the meaning of a complex constituent such as a sentence is a compositional function of the meanings of its partsrdquo e ldquo[] meaning relations between wordsrdquo ANTHONY 1983 p 26

45 ldquo[] (1) the form of mental representations and the questions of whether images differ from

sets of proposition (2) the mental processes that underlie ordinary reasoning and the question of what rules of inference they embody and (3) the representation of meaning of words and the question of whether they depend on a decompositional dictionary or a set of meaning postulatesrdquo JOHNSON-LAIRD 1980 p 73

46 ldquoFirst each mental model represents what is common to a distinct set of possibilities []

Second mental models are iconic that is their structure as far as possible corresponds to the structure of what they represent [] Third mental models based on descriptions represent what is true at the expense of what is falserdquo Id 2013 p 132

47 ldquoThe principal assumption of the theory is that individuals reason by trying to envisage the

possibilities compatible with what they know or believerdquo Ibid p 131

24

c) e a de Luria que sugeriu haver trecircs grandes unidades no ceacuterebro

relacionadas agrave inteligecircncia uma de ativaccedilatildeo no tronco cerebral e nas estruturas do

ceacuterebro meacutedio uma sensorial de entrada nos lobos temporais e uma de

organizaccedilatildeo e planejamento no coacutertex frontal48

Aleacutem das tentativas supracitadas William Stern autor do famoso teste de

Quociente de Inteligecircncia forneceu uma definiccedilatildeo para o termo ldquointeligecircnciardquo que

segundo sugere ldquodiferencia claramente inteligecircncia de outras capacidades

mentaisrdquo49 ldquoInteligecircncia eacute uma capacidade geral de um indiviacuteduo conscientemente

ajustar seu pensamento a novas exigecircncias eacute adaptabilidade mental geral a novos

problemas e condiccedilotildees de vidardquo50

Wechsler por sua vez na deacutecada de quarenta assim a conceituou

Inteligecircncia eacute a capacidade agregada ou global do indiviacuteduo agir intencionalmente para pensar racionalmente e lidar efetivamente com seu ambiente Ela eacute global porque caracteriza o comportamento individual como um todo e eacute um agregado porque eacute composta de elementos ou habilidades que embora natildeo sejam completamente independentes satildeo qualitativamente diferenciaacuteveis

51

E mais recentemente o Mainstream Science on Intelligence redigido por um

grupo de pesquisadores acadecircmicos e publicado primeiramente no Wall Street

Journal em 13 de dezembro de 1994 definiu-a assim

Inteligecircncia eacute uma capacidade mental bastante geral que entre outras coisas envolve a habilidade de raciocinar planejar resolver problemas pensar abstratamente compreender ideias complexas aprender rapidamente e aprender com a experiecircncia Natildeo eacute meramente a aprendizagem literaacuteria uma habilidade estritamente acadecircmica ou o talento para um bom desempenho em testes Ao contraacuterio o termo reflete uma capacidade mais ampla e mais profunda de compreender o mundo agrave nossa volta ndash ldquocompreenderrdquo ldquocaptar o sentidordquo das coisas ou ldquocalcularrdquo o que fazer Inteligecircncia assim definida pode ser medida e os testes de inteligecircncia medem-na bem Eles natildeo medem criatividade caraacuteter personalidade ou outras diferenccedilas importantes entre indiviacuteduos nem se propotildeem a isto

52

48

SILVA 2003 p 67-68 49

ldquo[] differentiates intelligence clearly from other mental capacitiesrdquo STERN 1914 p 3 50

ldquoIntelligence is a general capacity of an individual consciously to adjust his thinking to new requirements it is general mental adaptability to new problems and conditions of liferdquo STERN 1914 p 3

51 ldquoIntelligence is the aggregate or global capacity of the individual to act purposefully to think

rationally and to deal effectively with his environment It is global because it characterizes the individuals behavior as a whole it is an aggregate because it is composed of elements or abilities which though not entirely independent are qualitatively differentiablerdquo WECHSLER 1944 p 3

52 Intelligence is a very general mental capability that among other things involves the ability

to reason plan solve problems think abstractly comprehend complex ideas learn quickly and learn

25

Silva poreacutem diz ldquonatildeo estaacute totalmente claro o que os testes de inteligecircncia

realmente medem [] eles natildeo produzem uma entidade uacutenicardquo53

Antes de expor o rol de teorias Pal e colaboradores mostram que o problema

eacute ainda mais grave

Haacute diferentes teorias sobre a inteligecircncia e nenhuma delas concorda com as demais Cada abordagem de pensamento vem agrave tona com sua proacutepria perspectiva e seus proacuteprios pressupostos frequentemente contradizendo pelo menos uma teoria anterior

54

E vatildeo aleacutem

Ateacute que uma clara definiccedilatildeo de inteligecircncia possa ser dada as teorias continuaratildeo natildeo sendo capazes de explicaacute-la A probabilidade de tal definiccedilatildeo surgir poreacutem eacute virtualmente zero pois sempre haveraacute alternativas por dar-se e assim as teorias da inteligecircncia estatildeo limitadas a serem contraproducentes

55

A Task Force on Intelligence da American Psychological Association (APA)

em artigo que serviu como reaccedilatildeo a outra polecircmica envolvendo a publicaccedilatildeo de The

Bell Curve ndash Intelligence and Class Structure in American Life em 1994 parece

reforccedilar a afirmaccedilatildeo anterior

Os indiviacuteduos diferem-se uns dos outros na habilidade de compreender ideias complexas de adaptar-se efetivamente ao ambiente aprender a partir da experiecircncia encontrar vaacuterias formas de raciocinar superar obstaacuteculos mediante a reflexatildeo Embora essas diferenccedilas individuais possam ser substanciais elas nunca satildeo completamente consistentes as caracteriacutesticas intelectuais de uma pessoa variaratildeo em diferentes ocasiotildees em diferentes domiacutenios e julgaratildeo com diferentes criteacuterios Os conceitos de lsquointeligecircnciarsquo satildeo tentativas de esclarecer e organizar esse complexo conjunto de fenocircmenos

56

from experience It is not merely book learning a narrow academic skill or test-taking smarts Rather it reflects a broader and deeper capability for comprehending our surroundings - catching on making sense of things or figuring out what to do

Intelligence so defined can be measured and intelligence tests measure it well [] They do not measure creativity character personality or other important differences among individuals nor are they intended to GOTTFRESON 1997 p 13

53 SILVA 2003 p 49

54 ldquoThere are different theories about intelligence none of which agree with each other Every

aproach to thinking comes up with itrsquos own different perspective and assumptions often contradicting at least one earlier theoryrdquo PAL et al 2004 p 181

55 ldquoUntil a clear-cut definition of intelligence can be given theories will continue not to be able

to explain it The likelihood of such a definition occurring is virtually zero as there will always be alternatives given and so theories of intelligence are bound to be self-defeatingrdquo PAL et al 2004 p 185

56 Individuals differ from one another in their ability to understand complex ideas to adapt

effectively to the environment to learn from experience to engage in various forms of reasoning to

26

Piaget tambeacutem aponta para as dificuldades de conceituaccedilatildeo no que chama

linha inferior cuja demarcaccedilatildeo afirma natildeo superar a arbitrariedade e entatildeo

descreve algumas definiccedilotildees de inteligecircncia

Para alguns como Claparegravede e Stern a inteligecircncia eacute uma adaptaccedilatildeo mental agraves circunstacircncias novas Claparegravede opotildee assim a inteligecircncia ao instinto e ao haacutebito que satildeo adaptaccedilotildees hereditaacuterias e adquiridas agraves circunstacircncias que se repetem mas o faz a partir do tateamento empiacuterico mais elementar (fonte dos tateamentos interiorizados que caracterizam ulteriormente a busca da hipoacutetese) Para Buumlhler que divide tambeacutem as estruturas em trecircs tipos (instinto adestramento e inteligecircncia) essa definiccedilatildeo eacute demasiado ampla a inteligecircncia soacute aparece com os atos de compreensatildeo suacutebita (Aha-Erlebnis) enquanto que o tateamento pertence ao adestramento Koumlhler reserva igualmente o termo ldquointeligecircnciardquo para os atos de reestruturaccedilatildeo brusca excluindo o tateamento Eacute inegaacutevel que este aparece desde a formaccedilatildeo dos costumes mais simples os quais satildeo em si mesmos no momento de sua constituiccedilatildeo adaptaccedilotildees agraves circunstacircncias novas Por outro lado a proposiccedilatildeo a hipoacutetese e o controle cuja reuniatildeo caracteriza tambeacutem a inteligecircncia segundo Claparegravede encontram-se jaacute em germe nas necessidades nos ensaios e nos erros e na sanccedilatildeo empiacuterica proacuteprios das adaptaccedilotildees sensoacuterio-motoras menos evoluiacutedas

57

Mas em seguida indica ser possiacutevel fornecer conceituaccedilotildees fundamentando-

se na direccedilatildeo em que estaacute orientado seu desenvolvimento58 e complementa ldquo[]

sem insistir sobre as questotildees de fronteiras que se convertem em questatildeo de

etapas ou de formas sucessivas de equiliacutebriordquo59

Silva fornece uma orientaccedilatildeo que parece reduzir um pouco mais a

inquietaccedilatildeo que pode ser gerada por essa ao menos aparente impossibilidade de

overcome obstacles by taking thought Although these individual differences can be substantial they are never entirely consistent A given persons intellectual performance will vary on different occasions in different domains as judged by different criteria Concepts of intelligence are attempts to clarify and organize this complex set of phenomena NEISSER 1996 p 77

57 ldquoPara algunos como Claparegravede y Stern la inteligecircncia es una adaptacioacuten mental a las

circunstancias nuevas Claparegravede opone asiacute la inteligecircncia al instinto y al haacutebito que son adaptaciones hereditarias o adquiridas a las circunstancias que se repiten pero la hace partir del tanto empiacuterico maacutes elemental (fuente de los tanteos interiorizados que caracterizan ulteriormente la buacutesqueda de la hipoacutetesis)

Para Buumlhler que divide tambieacuten las estructuras en tres tipos (instinto adiestramiento e inteligencia) esa definicioacuten es demasiado amplia la inteligencia soacutelo aparece con los actos de comprensioacuten suacutebita (Aha-Erlebnis) en tanto que el tanteo pertenece al adiestramiento Koehler reserva igualmente el teacutermino de inteligencia a los actos de reestructuracioacuten brusca excluyendo el tanteo Es innegable que eacuteste aparece desde la formacioacuten de las costumbres maacutes simples las cuales son en siacute mismas en el momento de su constitucioacuten adaptaciones a las circunstancias nuevas Por otra parte la proposicioacuten la hipoacutetesis y el control cuya reunioacuten caracteriza tambieacuten la inteligencia seguacuten Claparegravede se encuentran ya en la sancioacuten empiacuterica proacuteprios de las adaptaciones senso-motrices menos evolucionadasrdquo PIAGET 1972 p 21-22

58 Ibid p 21-22

59 ldquo[] sin insistir sobre las cuestiones de fronteras que convierten en cuestioacuten de etapas o

de formas sucesivas de equilibriordquo Ibid p 22

27

buscar-se um conceito satisfatoacuterio para ldquointeligecircnciardquo ao indicar que haacute duas

caracteriacutesticas que estatildeo presentes em praticamente todas as definiccedilotildees da palavra

ldquoa habilidade para aprenderrdquo e ldquoa habilidade para adaptar-se ao ambienterdquo60

E mediante essa habilidade para aprender uma vez que seja detentor de

certo conhecimento sujeito do pensamento o ente animado pode-se tornar

consciente do objeto da informaccedilatildeo Mas eis aqui outro objetivo intimamente

relacionado ao da inteligecircncia que tambeacutem sempre se mostrou aacuterduo para os

pesquisadores no decorrer da histoacuteria o de estabelecer consensos sobre a

conceituaccedilatildeo do que se conhece por ldquoconsciecircnciardquo

Dentre os significados apresentados pelo Dicionaacuterio Aulete Online para a

palavra consciecircncia encontram-se

Atributo que permite a uma pessoa a percepccedilatildeo com certo grau de objetividade do que se passa em torno de si (o mundo exterior) e dentro de si proacuteprio (o mundo interior ou subjetivo) [] Pext O conhecimento a percepccedilatildeo desse atributo [] Capacidade de julgar o que eacute correto e o que natildeo eacute de acordo com valores morais e de conhecimento [] Conhecimento noccedilatildeo percepccedilatildeo (de situaccedilotildees fatos conceitos especiacuteficos) [] Percepccedilatildeo e conhecimento da proacutepria atividade (psiacutequica ou fiacutesica) Sensibilidade ou preacute-disposiccedilatildeo para perceber situaccedilotildees problemas processos etc ligados a temas de interesse social ideoloacutegico poliacutetico etc Sua consciecircncia ecoloacutegica o fazia revoltar-se com o desmatamento criminoso [] Fil Psic Com base em conceito do filoacutesofo alematildeo Nietzsche e adotado na psicanaacutelise a faculdade de autopercepccedilatildeo objetiva limitada pela accedilatildeo das pulsotildees e emoccedilotildees do ser humano [] Med Estado em que o sistema nervoso estaacute capacitado aos processos de percepccedilatildeo reflexatildeo accedilatildeo compatiacutevel comportamento coerente etc Corresponde comumente ao estado de quem domina suas capacidades de perceber (ver ouvir) pensar e agir [] Psi Niacutevel de atividade mental no qual se tem percepccedilatildeo dos processos internos e externos (em oposiccedilatildeo ao niacutevel da inconsciecircncia ou da subconsciecircncia)

61

E dos significados apresentados pelo Dicionaacuterio Priberam encontram-se

ldquoFaculdade da razatildeo de julgar os proacuteprios atos ou o que eacute certo ou errado do ponto

de vista moral [] Cuidado atenccedilatildeo esmero [] [Medicina] Estado do sistema

nervoso central que permite pensar observar e interagir com o mundo exteriorrdquo62

Segundo Pianigiani o termo ldquoconsciecircnciardquo que vem do latim conscientia eacute

composto de cum uma partiacutecula de intensidade mais scire que significa ldquosaberrdquo63

Lewis trata assim a etimologia da palavra

60

SILVA 2003 p 48 61

CONSCIEcircNCIA 2017 62

Ibid 63

PIANIGIANI 1907 p 357

28

A palavra grega oida e a latina cio significam ldquoeu seirdquo O verbo grego pode ser composto com o prefixo sun ou xun (sunoida) o latino com cum que em composiccedilatildeo torna-se con- dando-nos conscio Sun e cum isolados significam a preposiccedilatildeo ldquocomrdquo E agraves vezes eles mantecircm esse significado quando se tornam prefixos de modo que sunoida e conscio podem significar ldquoConheccedilo conjuntamente compartilho (com algueacutem) o conhecimento dissordquo Mas agraves vezes eles teriam uma forccedila vagamente intensa de modo que os verbos compostos significariam simplesmente ldquoeu conheccedilo bemrdquo e talvez finalmente um pouco mais do que ldquoeu seirdquo Cada verbo tem uma sucessatildeo de palavras relacionadas Com sunoida vai o substantivo suneidesis e (o seu sinocircnimo) o particiacutepio neutro para suneidos e o particiacutepio masculino suneidocircs Com conscio o nome conscientia e o adjetivo conscius [] o duplo valor dos prefixos pode afetar todos estes de modo que suneidesis e conscientia possam ser o estado (ou o ato) de compartilhar o conhecimento ou simplesmente o conhecimento consciecircncia

64 apreensatildeo ndash e mesmo algo como mente ou pensamentordquo

65

Balibar observa que o emprego do termo grego suneidecircsis se deu por uma

retroversatildeo a partir dos romanos e no periacuteodo heleniacutestico eacute que se desenvolveu

como ldquoa maneira com que o indiviacuteduo lsquo[sozinho] consigo mesmorsquo avalia a dignidade

de sua conduta e o valor de sua pessoa nesta vida ou em antecipaccedilatildeo agrave morterdquo 66

Jaacute na Europa conscientia desenvolveu-se historicamente em duas direccedilotildees nas

quais se pode interpretar a partiacutecula cum ldquopor um lado a direccedilatildeo que conota

apropriaccedilatildeo e alcance (conhecer bem estar bem informado sobre) por outro lado a

que conota um compartilhamento privado ou secreto67

E prossegue

Daiacute em diante houve a ideia de um conhecimento reservado a poucas pessoas que cada uma confiava a si mesma Esse significado levou agrave representaccedilatildeo fundamental de um testemunho interno dado a si mesmo e finalmente agrave ideia de um julgamento que eacute feito dentro de noacutes no que diz respeito aos nossos atos e pensamentos Esta eacute a fonte de uma autoridade que se pode opor agrave de qualquer instituiccedilatildeo de imediato o mestre interior e uma garantia de autonomia Esta uniatildeo de contraacuterios a

64

ldquoAwarenessrdquo 65

ldquoGreek oida and Latins cio mean lsquoI knowrsquo The Greek verb can be compounded with the prefix sun or xun (sunoida) the Latin with cum which in composition becomes con- giving us conscio Sun and cum in isolation mean lsquowithrsquo And sometimes they retain this meaning when they become prefixes so that sunoida and cocircnscio can mean lsquoI know together with I share (with someone) the knowledge thatrsquo But sometimes they had a vaguely intensive force so that the compound verbs would mean merely lsquoI know wellrsquo and perhaps finally little more that lsquoI knowrsquo Each verb has a train of related words With sunoida goes the noun suneidesis and (its synonym) the neuter participle to suneidos and the masculine participle suneidocircs with cocircnscio the noun conscientia and the adjective conscious [] the double value of the prefixes may affect all these so that suneidesis and conscientia could be either the state (or act) of sharing knowledge or else simply knowledge awareness aprehension ndash even something like mind or thoughtrdquo LEWIS 1967 p 181

66 ldquo[] the way in which the individual lsquo[alone] with himselfrsquo evaluates the worthiness of his

conduct and the value of his person in this life or in anticipation of deathrdquo BALIBAR 2004 p 175 67

ldquo[] on the one hand the direction that connotes apropriation and achievement (know well be well informed about) on the other hand the one that connotes a private or secret lsquosharingrsquordquo Ibid

29

que a tradiccedilatildeo agostiniana iria dar um peso ontoloacutegico persistiu ateacute o nosso tempo

68

Balibar aponta a identificaccedilatildeo por parte dos Padres da Igreja do termo

ldquoconscientiardquo na alma que confronta seu Criador sendo entatildeo juiacuteza e julgada e seu

desenvolvimento no periacuteodo escolaacutestico com o surgimento do termo synderesis

originado de uma construccedilatildeo sobre anaacutelises equivocadas da palavra suntecircrecircsis

[συντήρησις] encontrada em Satildeo Jerocircnimo que teria dado agrave conscientia um uso

duplo como faculdade tanto ativa como passiva respectivamente como ldquoum traccedilo

da criaccedilatildeo divinardquo e como algo ldquoque opera sob condiccedilotildees de pecado depois da

Quedardquo69 E este mesmo termo syntheresis mais conscientia e conclusio teriam

formado um esquema que influenciaria importantes filoacutesofos posteriores mesmo

apoacutes o primeiro ter caiacutedo em desuso a partir do periacuteodo da Reforma prevalecendo

os sentidos de testemunho interior da moralidade e de sinal da graccedila divina Balibar

indica isto como o iniacutecio da formaccedilatildeo em trecircs episoacutedios da expressatildeo

ldquoautoconsciecircnciardquo70 que afirma ser a ldquoexpressatildeo privilegiada da ideia filosoacutefica da

lsquosubjetividadersquo no Ocidenterdquo71 na qual testemunha-se o que chama ldquoinvenccedilatildeo

europeia da consciecircnciardquo Atribui o primeiro episoacutedio aos debates em torno do termo

ldquoliberdade de consciecircnciardquo no periacuteodo da Reforma o segundo ldquoa uma identificaccedilatildeo

do lsquoeursquo com a atividade da mente reflexiva agrave qual Locke deu o nome de

lsquoconsciousnessrsquordquo72 e o terceiro ao seacuteculo XVIII em que teria havido reinterpretaccedilatildeo

dos princiacutepios do conhecimento e da moralidade73

Nesse segundo episoacutedio o termo ldquoconsciousnessrdquo cristaliza o sentido de

percepccedilatildeo de si da proacutepria mente e do que se passa nela74 Balibar ressalta que no

capiacutetulo 27 do livro II de ldquoEnsaio Sobre o Entendimento Humanordquo de Locke estaacute o

68

ldquoFrom that point on there was the idea of a knowledge reserved for a few people each of whom lsquoconfided in himselfrsquo This meaning led to the fundamental representation of an internal testimony given to oneself [] and finally to the idea of a judgment that is made within us with regard to our acts and thoughts This is the source of an authority that can be oposed to that of any institution at once the interior master and a guarantee of autonomy This union of contraries to which the Augustinian tradition was to give an ontological weight has persisted down to our own timerdquo BALIBAR 2004 p 175

69 Respectivamente ldquo[] a trace of divine creationrdquo e ldquo[] operating under conditions of sin

after the Fallrdquo Ibid p 175 70

ldquoSelf-consciousnessrdquo 71

Respectivamente ldquo[] the privileged expression of the philosophical idea of subjectivity in the Westrdquo e ldquoEuropean invention of consciousnessrdquo Ibid p 175

72 ldquo[] an identification of the lsquoselfrsquo with the mindrsquos reflective activity to which Locke gave the

name lsquoconsciousnessrsquordquo Ibid p 175 73

Ibid p 175 74

Ibid p 180

30

uacutenico emprego do termo ldquoself-consciousnessrdquo pelo filoacutesofo75 realizado no seguinte

contexto

[] sou o mesmo eu mesmo [same my self] agora enquanto escrevo (consista eu [I] completamente na mesma substacircncia material ou imaterial ou natildeo) que eu [I] fui ontem Com efeito quanto a esse ponto de ser o mesmo eu [self] natildeo importa se esse eu presente [present self] eacute constituiacutedo pela mesma ou por diferentes substacircncias desde que eu esteja tatildeo preocupado e seja tatildeo justamente responsaacutevel por qualquer accedilatildeo feita haacute mil anos associada a mim agora por essa autoconsciecircncia [self-consciousness] quanto eu sou pelo que fiz no uacuteltimo momento O eu [self] depende da consciecircncia Eu [self] eacute a coisa consciente pensante (seja ela feita de qualquer substacircncia se espiritual ou material simples ou composta isso natildeo importa) que eacute sensciente ou consciente de prazer e dor capaz de ser feliz ou miseraacutevel e assim que estaacute preocupada com si mesma [it self] tanto quanto sua consciecircncia se estende

76

Esse pensamento indica Balibar77 que relaciona intimamente a consciecircncia e

a autoconsciecircncia agrave memoacuteria e agrave responsabilidade que daacute azo a problematizaccedilotildees

envolvendo o eu (self) e a consciecircncia (consciousness) demarca o ponto de partida

dos conflitos que seratildeo gerados na filosofia moderna e que culminam na distinccedilatildeo

na liacutengua inglesa entre os termos ldquoawarenessrdquo e ldquoconsciousnessrdquo que grosso modo

implicam respectivamente o ter consciecircncia de algo e o ter consciecircncia de que se

tem consciecircncia de algo (que eacute inerente ao ente humano)

Lalande78 opotildee-se agrave ideia de certeza e realidade no acircmbito da definiccedilatildeo de

consciecircncia e sugere que seja abusivo o entendimento desta encontrado por

exemplo em Kant e em Schopenhauer como todo conhecimento imediato da

realidade Ele fornece a seguinte definiccedilatildeo que diz ser somente aproximada

ldquoIntuiccedilatildeo (mais ou menos completa mais ou menos clara) que tem o espiacuterito de seus

estados e de seus atosrdquo79 bem como uma das classificaccedilotildees possiacuteveis do termo

que compreende a consciecircncia espontacircnea que se refere agrave consciecircncia como

pensamento que antecede a distinccedilatildeo entre o saber e o conhecer e na qual natildeo se

diferencia o ato consciente do ato de que se eacute consciente e consciecircncia reflexiva

que ldquosupotildee uma oposiccedilatildeo entre aquele que conhece e aquilo que eacute conhecido e

uma anaacutelise do objeto desse conhecimentordquo80

75

BALIBAR 2004 p 181 76

LOCKE 2015 p 181 77

BALIBAR 2004 p 181 78

LALANDE 1932 79

ldquoIntuition (plus ou moins complegravete plus ou moins claire) qursquoa lrsquoesprit de ses eacutetats et de ses actesrdquo Ibid p 127

80 Ibid p 127-128

31

Como resultado do desenvolvimento das anaacutelises envolvendo o termo alguns

autores reduziram a consciecircncia a simples processos orgacircnicos outros defenderam

que ela seja de algum modo independente do ceacuterebro outros afirmaram que ela tem

base orgacircnica mas se desenvolve para algo mais

Eis as palavras de Chalmers defensor desta uacuteltima hipoacutetese

A experiecircncia consciente eacute ao mesmo tempo a mais familiar do mundo e a mais misteriosa De nenhuma outra coisa temos um conhecimento mais direto que da consciecircncia mas natildeo eacute claro absolutamente como reconciliaacute-la com todo o resto do que sabemos [] Conhecemos a consciecircncia de uma forma muito mais iacutentima do que o resto do mundo mas compreendemos a este uacuteltimo muito melhor do que compreendemos a consciecircncia

81

Ainda assim haacute um bom nuacutemero de tentativas de conceituaccedilotildees e definiccedilotildees

como esta de Damaacutesio

A consciecircncia como usualmente a concebemos de seus niacuteveis elementares aos mais complexos eacute o padratildeo mental unificado que reuacutene o objeto e o self [] A consciecircncia eacute um fenocircmeno inteiramente privado de primeira pessoa que ocorre como parte do processo privado de primeira pessoa que denominamos mente

82

O pesquisador baseia-se em quatro fatos por ele constatados para estruturar

sua teoria

a) o de que ldquoalguns aspectos dos processos da consciecircncia podem ser

relacionados agrave operaccedilatildeo de regiotildees e sistemas cerebrais especiacuteficos abrindo

caminho para a descoberta da arquitetura neural que sustenta a consciecircnciardquo

b) o de que ldquoa consciecircncia e o estado de vigiacutelia assim como a consciecircncia e a

atenccedilatildeo baacutesica podem ser distinguidosrdquo

c) o de que ldquoa consciecircncia e a emoccedilatildeo natildeo satildeo separaacuteveisrdquo

d) o de que ldquoa consciecircncia natildeo eacute um monoacutelito pelo menos natildeo nos seres

humanos ela pode ser separada em tipos complexo e simples e os dados

neuroloacutegicos deixam clara a separaccedilatildeordquo83

81

ldquoLa experiencia consciente es al mismo tiempo lo maacutes familiar del mundo y lo maacutes misterioso De ninguna otra cosa tenemos un conocimiento maacutes directo que de la conciencia pero al mismo tiempo es un tema que para la ciencia ha sido muy difiacutecil para estudiar y conceptualizar varias disciplinas han intentando estudiar este fenoacutemeno una de ella es la filosofiacutea la cual se ha propuesto encontrar una teoriacutea y una explicacioacuten satisfactoria de la conciencia CHALMERS 1999 p 25

82 DAMAacuteSIO 1999 p 30 e 33

83 Ibid p 39-40

32

Ao tipo simples ele denomina ldquoconsciecircncia centralrdquo e ao tipo complexo ele

denomina ldquoconsciecircncia ampliadardquo O primeiro tipo confere ao organismo apenas o

senso de localizaccedilatildeo imediata no tempo e no espaccedilo ou seja no aqui e no agora o

segundo daacute ao organismo uma identidade e uma pessoa dando-lhe a ciecircncia do

passado e do futuro e depende da memoacuteria funcional e da operacional do

raciociacutenio e da linguagem

No acircmbito da etologia cognitiva84 e a fim de verificar o alcance da

consciecircncia e inclusive da inteligecircncia em animais natildeo humanos Herman85

considerou quatro domiacutenios para classificar os dados que obteve com sua equipe no

The Dolphin Institute sobre o desempenho cognitivo e a resposta racional em

espeacutecimes de golfinhos-nariz-de-garrafa (Tursiops truncatus) e inclusive para

classificar as descobertas e ldquoilustrar a flexibilidade comportamental do golfinho que

se estende ateacute mesmo para comportamentos incomuns inovadoresrdquo86 Satildeo eles

a) o declarativo (semacircntico ou representacional)

b) o processual

c) o social

d) o do self

A cada um corresponde uma pergunta cuja resposta afirmativa foi

obtida das observaccedilotildees feitas pelo pesquisador e sua equipe indicando que tais

espeacutecimes apresentam algo que possa ser entendido como sinal de inteligecircncia e

inclusive de consciecircncia segundo as definiccedilotildees atuais Satildeo elas respectivamente

a) ldquoSeraacute que o golfinho mostra conhecimento ou entendimento sobre as

coisasrdquo

b) ldquoSeraacute que o golfinho exibe competecircncia para significados operaccedilotildees ou

meacutetodosrdquo

c) ldquoSeraacute que o golfinho revela consciecircncia social e responsividade nas

interaccedilotildees ou nas relaccedilotildees sociaisrdquo

d) ldquoSeraacute que o golfinho apresenta conhecimento ou consciecircncia (awareness)

de si mesmordquo87

84

GRIFFIN 1994 85

HERMAN 2006 86

ldquoto illustrate the behavioural flexibility of the dolphin that extends even to unusual innovative behavioursrdquo Ibid p 442

87 Respectivamente does the dolphin display knowledge or understanding about things

does the dolphin exhibit competency in means operations or methods does the dolphin reveal

33

Herman ali entende a consciecircncia de si ou autoconsciecircncia como um

conceito multidimensional razatildeo pela qual escolheu duas outras facetas dela para

estudar que implicam a indagaccedilatildeo de se os animais tecircm consciecircncia de seus

proacuteprios comportamentos e tambeacutem de suas proacuteprias partes corporais o que ateacute

entatildeo lhe parecia natildeo ter sido feito em razatildeo de ainda segundo ele as pesquisas

anteriores terem-se limitado a experimentos com espelhos para verificaccedilatildeo do

autorreconhecimento com resultados positivos Mantendo a ideia de Burghardt e

Bekoff88 de que a consciecircncia apresenta vaacuterios niacuteveis alguns anos depois Herman89

reuniu novamente informaccedilotildees de estudos anteriores que apontam para a presenccedila

em golfinhos de autoconsciecircncia e consciecircncia corporal do ego corporal

experienciado subjetiva e objetivamente corroborando o trabalho anterior

Seguindo a mesma esteira de Damaacutesio Ades descreve um pouco mais a

distinccedilatildeo supramencionada dos dois tipos de consciecircncia um o ldquoawarenessrdquo que

ldquose constitui no contato imediato entre o indiviacuteduo e seu contexto interno ou externo

Eacute um dar-se conta de que algo existerdquo e outro o ldquoconsciousnessrdquo ou a consciecircncia

capaz de reflexatildeo exclusivo dos humanos que

[] envolve um desdobramento eacute um dar-se-conta do dar-se-conta o indiviacuteduo eacute capaz de designar e de descrever o seu conhecimento das coisas Pode-se supor que tome como objeto o proacuteprio fato de estar consciente Estabelece implicitamente uma distinccedilatildeo entre o objeto percebido e sua percepccedilatildeo do objeto diferencia-se a si mesmo (como fonte do conhecer) daquilo que eacute conhecido Trata-se de uma consciecircncia capaz de ser comunicada em niacutevel simboacutelico isto eacute que pode ser dita

90

Com isto Ades sugere que os animais ou ao menos alguns deles tambeacutem

possuem algum tipo de consciecircncia Baseia-se ele em propostas como a de Griffin

(1994) considerado o fundador da Etologia Cognitiva

Uma razatildeo para suspeitar de que os animais natildeo humanos apresentam pensamentos conscientes eacute que a estrutura baacutesica e o funcionamento dos neurocircnios e sinapses satildeo muito similares ateacute onde sabemos nos animais com sistema nervoso central organizado Natildeo haacute evidecircncias convincentes de que caracteriacutesticas especiacuteficas da neuroanatomia macroscoacutepica sejam essenciais para o pensamento consciente no entanto eacute melhor manter uma mente aberta para a possibilidade de haver consciecircncia em todos os

social awareness and apropriate responsiveness in social interactions or relations does the dolphin exhibit knowledge or awareness of itself HERMAN 2006 p 442

88 BURGHARDT BEKOFF 2009

89 HERMAN 2012

90 ADES 1997

34

animais que exibem comportamento versaacutetil ou se comunicam de forma a sugerir que eles possam estar expressando pensamentos ou sentimentos

91

Fundamenta-se pois o autor na hipoacutetese de que ldquoo comportamento e a

consciecircncia no homem e em outros animais resultam integralmente de eventos que

ocorrem em seus sistemas nervosos centraisrdquo92 seguindo a mesma linha do filoacutesofo

John Searle que afirma ldquo[] a consciecircncia assim como a intencionalidade satildeo

processos bioloacutegicos causados por processos neurais de niacutevel mais baixo que

ocorrem no ceacuterebro e nenhuma das duas coisas eacute redutiacutevel a algo distintordquo93

Muitos estudos como se veraacute no desenvolvimento deste trabalho parecem

corroborar a hipoacutetese acima defendida por Griffin e Ades mas mais ainda em

vaacuterias correntes de pesquisa mais recentes tecircm-se atribuiacutedo o termo inteligecircncia em

algum grau a diversas espeacutecies de animais por estas apresentarem muitas das

habilidades elencadas pelos estudiosos das ciecircncias cognitivas

Jaacute o fazia Aristoacuteteles considerado o pai da metodologia cientiacutefica do meacutetodo

comparativo precursor da proacutepria biologia94 em um sentido especiacutefico que seraacute o

objeto principal deste trabalho provavelmente tenham-no feito antes de Aristoacuteteles

jaacute que os estudos dos seres viventes se datildeo desde tempos imemoriais e o fizeram

durante os seacuteculos que se seguiram como se nota por exemplo nos estudos de

Tomaacutes de Aquino de seu mestre Alberto Magno de alguns dos filoacutesofos aacuterabes

medievais e de outros grandes naturalistas e em filoacutesofos ainda posteriores como

Descartes que por sua vez se apresenta nesse percurso com uma marcante e

controversa ressalva digna de nota

Teria afirmado o filoacutesofo que os animais natildeo humanos seriam como

maacutequinas autocircmatos por seus processos orgacircnicos mas incomparavelmente

superiores a qualquer aparato construiacutedo pelo homem e apontando que natildeo

apresentam linguagem nem raciocinam o que fez parecer a muitos ter negado aos

animais natildeo somente isto mas inclusive a presenccedila de consciecircncia e ateacute mesmo de

sentimentos e sensaccedilotildees Alguns autores poreacutem como Cottingham95 respondem a

91

GRIFFIN 1994 p 4 92

Ibid p 4-5 93

ldquoTanto la conciencia como la intencionalidad son procesos bioloacutegicos causados por procesos neuronales de nivel maacutes bajo que tienen lugar en el cerebro y ninguna de las dos cosas es reductible a algo distintordquo SEARLE 1992 p 2

94 MAYR 2000 p 25 87-88 Diz Mayr ldquoIn almost any portion of the history of biology one has

to start with Aristotle []rdquo 95

COTTINGHAM 1978

35

isto alegando que natildeo haacute motivos suficientes para inferir que a ausecircncia de

racionalidade implicaria um mecanicismo tatildeo exacerbado que chegasse a esse

ponto

Hume96 poreacutem ao tratar do tema em sua Investigaccedilatildeo Acerca da Natureza

Humana atribui certo tipo de raciociacutenio aos animais que diz tratar-se de um

raciociacutenio experimental instintivo de poder mecacircnico sem relaccedilotildees de ideias e que

o homem tambeacutem possui ainda que natildeo se limite a ele Hume desenvolve sua tese

partindo da analogia e da inferecircncia no sentido de que se algueacutem como diz

observa a circulaccedilatildeo em um animal como a ratilde ou o peixe presumiraacute que o mesmo

processo ocorre em outros animais Diz entatildeo que tal como os homens os animais

[] apreendem muitas coisas da experiecircncia e inferem que os mesmos eventos resultaratildeo sempre das mesmas causas Mediante este princiacutepio familiarizam-se com as propriedades a partir de seu nascimento acumulam conhecimentos sobre a natureza do fogo da aacutegua da terra das pedras das altitudes das profundidades etc e daquilo que resulta de sua accedilatildeo Aqui se distingue claramente a ignoracircncia e a inexperiecircncia do jovem frente agrave astuacutecia e agrave sagacidade dos velhos que tecircm aprendido por uma longa observaccedilatildeo a evitar o que os fere e a perseguir o que lhes proporciona bem-estar e prazer

97

Ressalta em seguida que o adestramento deixa isto ainda mais evidente

explicando que

[] o animal infere um fato que ultrapassa aquilo que impressiona imediatamente seus sentidos [] esta experiecircncia estaacute completamente fundada na experiecircncia passada visto que a criatura espera do objeto presente os mesmos resultados que em sua observaccedilatildeo sempre tem visto derivar de objetos semelhantes

98

Explica em seguida que essa inferecircncia natildeo se funde em nenhum processo

racional mas que se daacute por induccedilatildeo do costume que apoacutes a impressatildeo de

determinado objeto nos sentidos faz com que a imaginaccedilatildeo conceba aquilo que lhe

estaacute associado ou seja concebendo um em razatildeo do surgimento do outro Hume

chama ldquocrenccedilardquo ao modo como isto se daacute e denomina ldquoinstintordquo uma capacidade

nos animais de aperfeiccediloar e superar em muito com a praacutetica e a experiecircncia certas

aptidotildees ordinaacuterias

96

HUME 2001 p 128-132 97

Ibid p 129 98

Ibid p 130

36

Na esteira de filoacutesofos como Hume e ainda que sob a influecircncia cartesiana o

termo inteligecircncia veio a ser mais significativamente atribuiacutedo a animais natildeo

humanos a partir do seacuteculo XIX como se observa na obra de Darwin ldquoThe Descent

of Man and Selection in Relation to Sexrdquo escrito em 1871 e quando o tema passou

a ser tratado inclusive em laboratoacuterio de modo mais especializado Esta obra de

Darwin precedeu outra que passou a ser considerada precursora da moderna

etologia lanccedilada no ano seguinte ldquoThe Expression of Emotions in Man and

Animalsrdquo em que o naturalista trata inicialmente das reaccedilotildees instintivas dos animais

natildeo humanos relacionadas agraves emoccedilotildees dos movimentos voluntaacuterios e involuntaacuterios

dos atos consequentes do reflexo sejam os inatos sejam aqueles adquiridos por

costume ou por associaccedilotildees que reaparecem mediante as mesmas causas que o

originaram99 e em seguida e antes de abordar o tema em relaccedilatildeo aos humanos

com o que concluiraacute seu estudo descreve as reaccedilotildees emocionais nos animais

tendo documentado expressotildees como o prazer a alegria o afeto a coacutelera a dor

etc que pareceram ser mais evidentes nos macacos

Em ldquoThe Descent of Manrdquo Darwin defende que haacute inteligecircncia nos animais100

e narra uma seacuterie de casos em que afirma haver neles memoacuteria como o de um catildeo

que teve e que natildeo via haacute cinco anos e ao reencontraacute-lo o animal o seguiu como

fazia em outros tempos diz ele pelo encontro ter ldquo[] instantaneamente despertado

em seu espiacuterito uma seacuterie de antigas associaccedilotildees []rdquo ou das formigas que diz

reconhecerem membros do mesmo grupo apoacutes separaccedilatildeo de quatro meses101

afirma haver neles tambeacutem imaginaccedilatildeo o que exemplifica com o fato de outros

autores que diz serem suficientemente confiaacuteveis terem constatado catildees gatos

cavalos e aves sonhando e certa aptidatildeo para o raciociacutenio102 Por raciociacutenio aqui

entende ldquofazer pausas deliberar e resolverrdquo103 E pouco adiante critica aqueles que

levantam barreiras inalcanccedilaacuteveis entre os animais e os homens o que objetaria agrave

sua teoria evolucionista e cita dentre outras caracteriacutesticas atribuiacutedas nessa visatildeo

aos animais como a consciecircncia proacutepria a ausecircncia de linguagem da faculdade de

abstraccedilatildeo e de ideias gerais reconhecendo que essas duas uacuteltimas encontram

plena exclusividade nos homens pois ldquoningueacutem supotildee que um animal inferior reflita

99

Sobre os reflexos adquiridos por costume cf DARWIN sd b) p 50 e quanto ao que mais se diz DARWIN sd b) passim

100 DARWIN sd a) p 22

101 Ibid p 28-29

102 Ibid p 29

103 ldquo[] hacer pausas deliberar y resolverrdquo Ibid p 29

37

sobre a vida e a morte nem outros assuntos parecidosrdquo104 jaacute que as aptidotildees

mentais em noacutes alcanccedilaram um niacutevel superior que diz implicar o uso plenamente

desenvolvido da linguagem105 Acrescenta tambeacutem agraves duas o senso moral

consciecircncia moral106 embora sugira que na fidelidade aos companheiros em

especial na do catildeo em relaccedilatildeo ao dono ndash o que exemplifica com o fato de aquele

natildeo roubar alimento na presenccedila deste ndash haja algo que se pareccedila muito com a

moralidade Por outro lado reconhece que esses animais aos quais chama

inferiores possuem personalidade e defende que haja algum tipo de consciecircncia107

Darwin apresenta entatildeo uma seacuterie de exemplos a partir dos quais infere haver o que

chama ldquoracionalidaderdquo nos animais alguns dos quais descreveremos brevemente

mais adiante

O termo inteligecircncia passou a ser especialmente atribuiacutedo aos animais natildeo

humanos com o surgimento de linhas de pesquisa como a etologia que tecircm como

proposta uma compreensatildeo que se sobrepotildee a um mecanicismo que apontam nos

trabalhos e nas teses de pesquisadores behavioristas renomados como na do

reflexo condicionado de Pavlov na do condicionamento operante de Skinner e na do

associacionismo e na lei do efeito de Thorndike que no final do seacuteculo XIX publicava

suas pesquisas sobre a chamada inteligecircncia animal apoacutes uma bateria de testes108

Em seu trabalho apresentado em 1898 que se tornou um marco para os

estudos do comportamento animal e inclusive para o desenvolvimento da psicologia

behaviorista Thorndike elogia o trabalho de Morgan Lloyd publicado havia pouco

menos de uma deacutecada Este diria o seguinte das associaccedilotildees que fundamentaratildeo

natildeo soacute o trabalho de 1898 mas tambeacutem a visatildeo behaviorista e que jaacute haviam sido

percebidas por Aristoacuteteles em especial das criadas artificialmente

No treinamento de animais (e de crianccedilas mais jovens) foram estabelecidas associaccedilotildees artificiais agradaacuteveis ou dolorosas em conexatildeo com certas accedilotildees Introduziram-se aversotildees e apetecircncias anormais na constituiccedilatildeo mental Este processo em muito depende da plasticidade da constituiccedilatildeo Na ausecircncia de tal plasticidade eacute impossiacutevel estabelecer novas associaccedilotildees

109

104

ldquoNadie supone que un animal inferior reflexione sobre la vida y la muerte ni otros asuntos parecidos []rdquo DARWIN sd a) p 43

105 Ibid p 32 e 43

106 Ibid p 48-49

107 Ibid p 43-44 e 49

108 TOURINHO 2009

109 ldquoIn the training of animals (and young children) artificial associations pleasurable or

painful have to be established in connection with certain actions Abnormal apetences and aversions

38

Com base em diversos estudos de outros pesquisadores com elefantes

raposas catildees e outros animais reconhecendo por exemplo que os catildees

comunicam certos desejos seus aos humanos que elefantes podem quebrar partes

vegetais para utilizaacute-las como instrumento para remover sanguessugas do corpo ou

espantar moscas110 etc Lloyd apontou trecircs tipos de inferecircncia sendo as duas

primeiras perceptivas e a terceira conceitual a ldquoinferecircncia inconsciente em

construccedilatildeo imediatardquo a ldquoinferecircncia inteligente que lida com construccedilotildees e

reconstruccedilotildees e a ldquoinferecircncia racional que implica anaacutelise e isolamentordquo111 e nesse

sentido chamava inteligentes certos animais negando nestes a presenccedila de ideias

abstratas112

Voltando a Thorndike este chegou a admitir consciecircncia nos animais mas

restringindo-a agraves impressotildees dos sentidos aos impulsos aos sentimentos e aos

atos corporais de um indiviacuteduo113 negando expressamente a possibilidade de estar

relacionada a ideias ou a impulsos livres114 O pesquisador realizou experimentos

com catildees galinhas mas especialmente com gatos que eram colocados em uma

caixa que tinha um dispositivo com fio e alavanca o qual era tocado acidentalmente

pelo animal que entatildeo via a caixa ser aberta possibilitando o acesso ao alimento a

recompensa fora dela Na seccedilatildeo seguinte o animal mostrava ter aprendido como

abrir a caixa mas natildeo repetia intencionalmente e de forma imediata o feito diante

de mudanccedilas no dispositivo

O pesquisador distinguiu as reaccedilotildees nos animais que satildeo realizadas sem

experiecircncia preacutevia das que satildeo construiacutedas com a experiecircncia que satildeo o objeto de

seu estudo e que se datildeo por processos associativos diante da ausecircncia do

pensamento abstrato que conceitua e infere que caracteriza o ente humano115

Depois de apontar limitaccedilotildees dos estudos anteriores aos seus sobre a

chamada inteligecircncia animal cujos meacutetodos segundo ele se baseavam na questatildeo

ldquoo que eles fazemrdquo parte da pergunta que acrescenta agrave anterior e agrave ldquocomo eles

have to be introduced into the mental constitution In this process much depends on the plasticity of the constitution In the absence of such plasticity it is impossible to establish new associationsrdquo LLOYD 1891 p 343

110 Ibid p 345 e 370

111 Respectivamente unconscious inference on immediate construction intelligente

inference dealing with constructs and reconstructs e rational inference implying analysis and isolation Ibid p 362

112 Id 1898 p 348

113 THORNDIKE 1898 p 84

114 Ibid p 108

115 Ibid p 1

39

fazem issordquo como proposta para novo meacutetodo ldquolsquoo que eles sentem enquanto

agemrdquo116 e conclui sobre as associaccedilotildees formadas que observou em laboratoacuterio

que ldquosatildeo absolutas e o que quer que delas se possa deduzir eacute certordquo117 e ainda que

embora elas

sejam tais que natildeo poderiam ter sido anteriormente experimentadas ou fornecidas por hereditariedade ainda natildeo satildeo tatildeo distantes do curso ordinaacuterio da vida do animal Elas significam simplesmente a conexatildeo de um determinado ato com uma determinada situaccedilatildeo resultante do prazer e esse tipo geral de associaccedilatildeo eacute encontrado normalmente atraveacutes da vida do animal

118

Com base nisto a definiccedilatildeo da lei do efeito viria a ser apresentada na

republicaccedilatildeo da obra em 1911

Das vaacuterias respostas agrave mesma situaccedilatildeo aquelas que satildeo acompanhadas ou seguidas de perto pela satisfaccedilatildeo do animal seratildeo mantidas iguais as outras coisas mais firmemente conectadas com a situaccedilatildeo de modo que quando [a situaccedilatildeo] repetir-se seraacute mais provaacutevel que voltem a ocorrer aquelas que satildeo acompanhadas ou seguidas de perto pelo desconforto do animal teratildeo mantidas iguais as outras coisas suas conexotildees com aquela situaccedilatildeo enfraquecidas de modo que quando [a situaccedilatildeo] repetir-se seraacute menos provaacutevel que voltem a ocorrer Quanto maior a satisfaccedilatildeo ou o desconforto maior o fortalecimento ou enfraquecimento do viacutenculo

119

Thorndike denomina instinto ldquoqualquer reaccedilatildeo que um animal tem sem

experiecircncia em relaccedilatildeo a uma situaccedilatildeordquo120 E por ldquoimpulsordquo ele entende

[] a consciecircncia que acompanha uma inervaccedilatildeo muscular uma parte daquele sentimento do ato que vem de ver a si mesmo mover do sentimento do corpo do sujeito em uma posiccedilatildeo diferente etc Eacute o sentimento direto do fazer enquanto distinto da ideia do ato realizado obtida atraveacutes do olho etc [] por impulso eu nunca me refiro ao motivo do ato No discurso popular pode-se dizer que aquela fome eacute o impulso que faz o

116

Respectivamente ldquowhat they dordquo ldquohow they do itrdquo ldquolsquowhat they feelrsquo while they actrdquo THORNDIKE 1898 p 5

117 ldquoThey are absolute and whatever can be deduced from them is surerdquo Ibid p 7

118 ldquo[] altough the associations formed are such as could not have been previously

experienced or provided for by heredity they are still not too remote from the animalrsquos ordinary course of life They mean simply the connection of a certain act with a certain situation and resultant pleasure and this general type of association is found troughout the animalrsquos life normallyrdquo Ibid p 7-8

119 Traduzido por Tourinho 2011 ldquoThe Law of Effect is that Of several responses made to the

same situation those which are accompanied or closely followed by satisfaction to the animal will other things being equal be more firmly connected with the situation so that when it recurs they will be more likely to recur those which are accompanied or closely followed by discomfort to the animal will other things being equal have their connections with that situation weakened so that when it recurs they will be less likely to occur The greater the satisfaction or discomfort the greater the strengthening or weakening of the bondrdquo Id 1911 p 118

120 ldquo[] any reaction which an animal makes to a situation without experiencerdquo Id 1898 p 14

40

gato arranhar Isso nunca seraacute usado aqui A palavra lsquomotivorsquo sempre denotaraacute esse tipo de consciecircncia

121

Pavlov por sua vez defendeu a visatildeo de que instinto nada mais eacute do que

reflexo respostas do organismo a estiacutemulos sejam eles externos ou internos e a

justifica com comparaccedilotildees entre a complexidade de comportamentos ditos

instintivos como por exemplo a construccedilatildeo de um ninho por uma ave com a

complexidade exigida por efeitos que resultam de determinados estiacutemulos

nervosos122

E define assim reflexo baseando-se na visatildeo de Descartes

Um estiacutemulo externo ou interno recai sobre um ou outro receptor nervoso e daacute origem a um impulso nervoso esse impulso nervoso eacute transmitido ao longo das fibras nervosas para o sistema nervoso central e aqui por causa das conexotildees nervosas existentes daacute origem a um novo impulso que passa ao longo das fibras nervosas que saem para o oacutergatildeo ativo onde excita uma atividade especial das estruturas celulares Assim um estiacutemulo parece estar conectado de necessidade a uma resposta definida como a causa com o efeito Parece oacutebvio que toda a atividade do organismo deve obedecer a leis definidas

123

Acrescenta a esse tipo de reflexo inato que principalmente se relaciona a

atividades de tecidos e oacutergatildeos particularmente outro que ocorre no sistema

nervoso relacionado ao comportamento instintivo dos animais que afirma tratar-se

das ldquoreaccedilotildees inevitaacuteveis a estiacutemulos perfeitamente definidosrdquo124 e entatildeo explica o

que chamou reflexo condicionado

Com uma compreensatildeo completa de todos os fatores envolvidos os novos reflexos de sinalizaccedilatildeo estatildeo sob o controle absoluto do experimentador eles procedem de acordo com leis tatildeo riacutegidas como as de qualquer outro processo psicoloacutegico e devem ser considerados como sendo em todos os

121

ldquo[] means the consciousness accompanying a muscular inervation a part from that feeling of the act wich comes from seeing oneself move from feeling onersquos body in a different position etc It is the direct feeling of the doing as distinguished from the idea of the act done gained through eye etc by impulse I never mean the motive to the act In popular speech you may say that hunger is the impulse wich makes the cat claw That will never be the use here The word motive will always denote that sort of consciousnessrdquo THORNDIKE 1898 p 14-15

122 PAVLOV 1927 p 9-11

123 ldquoAn external or internal stimulus falls on some one or other nervous receptor and gives rise

to a nervous impulse this nervous impulse is transmitted along nerve fibres to the central nervous system and here on account of existing nervous connections it gives rise to a fresh impulse which passes along outgoing nerve fibres to the active organ where it excites a special activity of the cellular structures Thus a stimulus apears to be connected of necessity with a definite response as cause with effect It seems obvious that the whole activity of the organism should conform to definite lawsrdquo Ibid p 7

124 ldquo[] the inevitable reactions to perfectly definite stimulirdquo Ibid p 9

41

sentidos uma parte da atividade fisioloacutegica dos seres viventes Eu denominei esse novo grupo de reflexos ldquoreflexos condicionadosrdquo para distingui-los dos reflexos inatos ou natildeo condicionados O termo ldquocondicionadordquo tem sido em geral cada vez mais empregado e eu penso que seu uso eacute plenamente justificado jaacute que comparado com os reflexos inatos esses novos reflexos realmente dependem de muitas condiccedilotildees tanto em sua formaccedilatildeo como na manutenccedilatildeo de sua atividade fisioloacutegica

125

Pavlov analisou os efeitos reflexos em animais especialmente em catildees a

partir de estiacutemulos positivos ou negativos que por exemplo despertavam a

salivaccedilatildeo tanto no estado de normalidade como no estado hipnoacutetico126 ou a partir

de situaccedilotildees em que o animal estava impedido de mover-se127 Realizou tambeacutem

experimentos com chimpanzeacutes observando que os animais criavam associaccedilotildees

inicialmente por tentativa e erro que eram reforccediladas com a obtenccedilatildeo da

recompensa (alimento) e demonstravam gradualmente aprimoramento resultante

de anaacutelise e do aprendizado obtendo pleno sucesso na realizaccedilatildeo da tarefa128

Neste contexto teceu criacuteticas a certas conclusotildees de Koumlhler e Yerkes em que

sugeriam ao contraacuterio de Pavlov e em oposiccedilatildeo agraves conclusotildees de Thorndike haver

certa racionalidade nos chimpanzeacutes testados a partir de publicaccedilotildees de seus

trabalhos que marcaram certo pioneirismo na busca por inteligecircncia nos grandes

macacos Koumlhler e Yerkes seguiram com as pesquisas com grandes macacos a

esteira de John B Watson fundador do behaviorismo e um dos poucos

pesquisadores tal como Margaret Washburn que tratavam da psicologia comparada

no despontar do seacuteculo XX129

Koumlhler deu iniacutecio a uma seacuterie de testes especialmente com chimpanzeacutes a

partir de indagaccedilotildees como esta

Esses seres mostram muitas caracteriacutesticas humanas em seu comportamento ldquocotidianordquo o que faz levantar a questatildeo de se eles natildeo se comportam com inteligecircncia e insight sob condiccedilotildees que requerem tal

125

ldquoWith a complete understanding of all the factors involved the new signalizing reflexes are under the absolute control of the experimenter they proceed according to as rigid laws as do any other physiological processes and must be regarded as being in every sense a part of the physiological activity of living beings I have termed this new group of reflexes conditioned reflexes to distinguish them from the inborn or unconditioned reflexes The term conditioned is becoming more and more generally employed and I think its use is fully justified in that compared with the inborn reflexes these new reflexes actually do depend on very many conditions both in their formation and in the maintenance of their physiological activityrdquo PAVLOV 1927 p 25

126 Id 1984 p 77-82

127 Ibid p 11-12

128 Ibid p 128-129

129 DEWSBURY 2013

42

comportamento Essa questatildeo expressa o primeiro pode-se dizer novo interesse na capacidade intelectual dos animais

130

Nelas emprega o termo ldquointeligecircnciardquo ldquono sentido em que a palavra eacute aplicada

ao homemrdquo131 ainda que natildeo se trate de algo bem definido mas que

superficialmente se reconheccedila como tal diferenciando-se de outros tipos de

comportamentos em especial nos proacuteprios animais Koumlhler explica entatildeo que o

emprego do termo se daacute em estudos como aqueles que realizou quando diante de

circunstacircncias que impedem o curso comum para atingir um determinado fim como

a realizaccedilatildeo de uma tarefa o ente toma um caminho diferente para resolver a

situaccedilatildeo diferentemente de quando o ente toma o caminho direto inquestionaacutevel

que ldquoclaramente surge naturalmente fora de sua organizaccedilatildeordquo132

Os experimentos que realizou partiram de testes mais simples que exigiam

somente movimentos do proacuteprio animal como para encontrar uma abertura em um

recinto que pudesse contornar e chegar ao alimento tornando-se gradualmente

mais complexos ao que passariam a reconhecer obstaacuteculos como uma caixa que

impedia o animal de alcanccedilar alimento fora da jaula e mesmo precisar da utilizaccedilatildeo

de outro objeto ou seja de um instrumento para alcanccedilar a recompensa do outro

lado da grade da jaula fosse por exemplo de cordas que precisava movimentar

para trazer a comida para perto ou de varas para alcanccedilar diretamente o alimento

e em testes posteriores trazer outra vara maior que ao contraacuterio da primeira

utilizada alcanccedilaria o objeto ou ainda de uma vara que teria de ser encaixada em

outra com uma abertura para alcanccedilar a recompensa mais distante etc Outros

experimentos envolveram caixas que deveriam ser empilhadas para que o animal

alcanccedilasse o alimento previamente suspendido no teto do local pelo

experimentador e mesmo com o auxiacutelio de uma vara

Yerkes por sua vez publicou muitas obras a principal com sua esposa um

grande tratado sobre os grandes antropoides no qual eles agregaram aos

resultados de seus estudos precedentes os de muitos outros pesquisadores

envolvidos com o tema desde os seacuteculos anteriores mas com bastantes referecircncias

130

ldquoThese beings show so many human traits in their lsquoeverydayrsquo behaviour that the question naturally arises whether they do not behave with intelligence and insight under conditions wich require such behaviour This question expresses the first one may say naive interest in the intelectual capacity of animalsrdquo KOumlHLER 1927 p 1

131 ldquo[] in the sense in wich the word is aplied to humanrdquo Ibid p 1

132 ldquo[] which clearly arises naturally out of their organizationrdquo Ibid p 3-4

43

ao trabalho de Koumlhler Ao destacar a inteligecircncia especialmente em orangotangos e

chimpanzeacutes relata casos curiosos como o de um orangotango do seacuteculo XVIII que

aprendeu a rodar a chave e a abrir a porta depois de ver o pesquisador fazecirc-lo133 E

aleacutem disso forneceu inclusive algumas sugestotildees para futuros estudos como para

a comprovaccedilatildeo do autorreconhecimento de macacos em espelhos algo que diz jaacute

vinha sendo bastante relatado134

Em paralelo e nos anos seguintes Skinner desenvolveria principalmente os

estudos de Thorndike e Pavlov realizando pesquisas especialmente com ratos e

pombos envolvendo reforccedilo positivo e negativo ou recompensa e puniccedilatildeo135 Ele

define inicialmente comportamento como ldquoparte da atividade total de um

organismo eacute o que um organismo estaacute fazendo ndash mais precisamente que eacute

observado por outro organismordquo ao que acrescenta ldquoeacute aquela parte do

funcionamento de um organismo que estaacute empenhada em agir ou estabelecer

relaccedilotildees com o mundo exteriorrdquo chegando entatildeo ao corolaacuterio

Por comportamento entatildeo refiro-me simplesmente ao movimento de um organismo ou de suas partes em um quadro de referecircncia fornecido pelo proacuteprio organismo ou por vaacuterios campos de forccedila ou objetos externos Eacute conveniente falar disso como a accedilatildeo do organismo sobre o mundo exterior e frequentemente eacute desejaacutevel lidar com um efeito em vez de com o proacuteprio movimento como no caso da produccedilatildeo de sons

136

Seus experimentos com animais consistiram basicamente em modelar neles

gradualmente novos comportamentos por meio de condicionamento que ele

entende como

[] um tipo de mudanccedila na forccedila do reflexo onde a operaccedilatildeo realizada sobre o organismo para induzir a mudanccedila eacute a apresentaccedilatildeo de um estiacutemulo de reforccedilo em certa relaccedilatildeo temporal com o comportamento Diferentes tipos de reflexos condicionados surgem porque um estiacutemulo de reforccedilo pode ser apresentado em diferentes tipos de relaccedilotildees temporais

137

133

YERKES R M YERKES A W 1929 p 176 134

Ibid p 171 135

CARVALHO NETO MAYER 2011 136

Respectivamente ldquo[] part of the total activity of an organismo [] is what an organism is doing ndash or more accurately what it is observed by another organism to be doingrdquo ldquois that part of the functioning of an organism which is engaged in acting upon or having commerce with the outside worldrdquo e ldquoBy behavior then I mean simply the movement of an organism or of its parts in a frame of reference provided by the organism itself or by various external objects or fields of force It is convenient to speak of this as the action of the organism upon the outside world and it is often desirable to deal with an effect rather than with the movement itself as in the case of the production of soundsrdquo SKINNER 1938 p 6

137 ldquoLet conditioning be defined as a kind of change in reflex strength where the operation

performed upon the organism to induce the change is the presentation of a reinforcing stimulus in a

44

Este condicionamento conhecido como ldquocondicionamento operanterdquo daacute-se a

partir de estiacutemulos que provocavam a repeticcedilatildeo de determinado comportamento

Essa repeticcedilatildeo gera o reforccedilo ou ldquoreforccedilamentordquo que entatildeo resulta na modificaccedilatildeo

comportamental Grande parte de seus experimentos eram realizados tambeacutem em

uma espeacutecie de caixa que passou a ser conhecida como ldquocaixa de Skinnerrdquo

Consistiam por exemplo em fazer um rato aprender a a partir de um estiacutemulo

como uma luz piscando ou um sinal sonoro pressionar com determinada

intensidade uma barra com apenas uma das patas dianteiras para que entatildeo se

abrisse um recipiente de onde poderia retirar o alimento como recompensa Para

isto cada movimento realizado aleatoriamente pelo animal na direccedilatildeo deste

propoacutesito era recompensado ateacute que ele o aprendesse gerando o que Skinner dizia

ser uma cadeia de reflexos um movimento determinado era realizado repetido

reforccedilado e entatildeo se passava para o movimento seguinte138

A partir de seus estudos ele definiu outros termos fundamentais como

ldquorespondenterdquo ou seja o comportamento de resposta a um estiacutemulo provocado e

ldquooperanterdquo sobre o qual inicialmente ele se restringe a dizer que eacute aquele que natildeo eacute

respondente139 mas posteriormente acrescenta que ldquoum operante eacute definido por

suas consequecircnciasrdquo140 e o define como ldquoUma classe da qual uma resposta eacute uma

instacircncia ou membro []rdquo e entatildeo explica como um conjunto de contingecircncias eacute

aquilo que o caracteriza

[] satildeo sempre instacircncias que satildeo contadas na determinaccedilatildeo da frequecircncia e a partir dessa frequecircncia a probabilidade de uma resposta ser inferida A probabilidade eacute frequentemente tomada no entanto como a medida da forccedila de um operante A forccedila da resposta natildeo tem significado salvo como uma propriedade de uma instacircncia como sua forccedila ou velocidade Eacute sempre uma resposta sobre a qual um determinado reforccedilo eacute contingente mas o eacute sob propriedades que definem a adesatildeo a um operante

141

certain temporal relation to behavior [] Different types of conditioned reflexes arise because a reinforcing stimulus may be presented in different kinds of temporal relationsrdquo SKINNER 1937 p 1

138 Id 1938 p 48-55

139 Ibid p 19

140 SKINNER 1969 p 128

141 ldquoAn operant is a class of which a response is an instance or member [] it is always

instances which are counted in determining frequency and from that frequency the probability of a response inferred The probability is frequently taken however as the measure of the strength of an operant Strength of response has no meaning except as a property of an instance such as its force or speed It is always a response upon which a given reinforcement is contingent but it is contingent upon properties which define membership in an operant Thus a set of contingencies defines an operantrdquo Ibid p 132

45

Os estudos de Skinner com animais passaram a ser empregados

posteriormente em humanos no acircmbito da educaccedilatildeo escolar por meacutetodos como o

da Instruccedilatildeo Direta (Direct Instruction) e o da Aprendizagem para o Domiacutenio

(Mastery Learning) o que veio a gerar uma seacuterie de controveacutersias e protestos nos

Estados Unidos142

Segundo Tourinho poreacutem eacute Skinner quem rompe com o mecanicismo

naquela corrente de pesquisa

[] eacute apenas com Skinner que o selecionismo como modo causal encontra uma elaboraccedilatildeo refinada na ciecircncia do comportamento uma elaboraccedilatildeo que articula as relaccedilotildees entre filogecircnese ontogecircnese e cultura como niacuteveis de seleccedilatildeo do comportamento e que operam ora em uma mesma direccedilatildeo ora em direccedilotildees conflitantes sobrepondo-se uns aos outros Foi a elaboraccedilatildeo skinneriana que definitivamente afastou o mecanicismo assinalando a bidirecionalidade variabilidade e dependecircncia muacutetua das relaccedilotildees entre respostas e estiacutemulos e o caraacuteter probabiliacutestico da determinaccedilatildeo das primeiras uma perspectiva ainda natildeo inteiramente explorada na proacutepria ciecircncia do comportamento

143

E paralelamente aos estudos de Skinner avanccedilavam as pesquisas sobre o

comportamento animal na chamada ldquorevoluccedilatildeo cognitivardquo dos anos 60 e 70144

quando inclusive iniciavam os estudos de pesquisadores como Jane Goodal ndash que

forneceu valiosas contribuiccedilotildees para a primatologia estudando em campo os

chimpanzeacutes de Gombe na Tanzacircnia ndash passava assim a ser reconhecida como

disciplina cientiacutefica a linha de pesquisa conhecida por etologia termo proposto pelo

zooacutelogo Isidoire Geoffroy Saint-Hilaire em 1854145 formalmente inaugurada com os

trabalhos de Konrad Lorenz Nikolaas Tinbergen e Karl von Frisch Nesse acircmbito a

inteligecircncia animal ganha um novo enfoque com as pesquisas de Donald Griffin que

dentro da etologia desenvolveu a etologia cognitiva na busca em meio agrave entatildeo

presente visatildeo em que se analisava melhor fatores como expectativas desejos e

crenccedilas por parte dos animais por sinais de consciecircncia nestes146 Mas somente na

uacuteltima deacutecada do seacuteculo XX eacute que a busca pela consciecircncia passou a tornar-se uma

aacuterea mais ativa de pesquisa147

142

ISERBYT 2000 143

TOURINHO 2011 144

SHETTLEWORTH 2010 p 6 145

CAMPAN 2019 146

GRIFFIN 1994 p viii 147

SHETTLEWORTH 2010 p 6

46

Feuerbacher148 faz referecircncia agraves pesquisas sobre os processos cognitivos e

comportamentais dos catildees que resume e ilustra as mudanccedilas de perspectiva

ocorridas no seacuteculo passado e que vieram culminar no atual enfoque adotado pelos

estudiosos que buscam compreender a chamada inteligecircncia animal Explica a

pesquisadora complementando o que se diz logo acima que soacute mais recentemente

em fins da deacutecada de noventa essas pesquisas passaram a enfocar as

caracteriacutesticas que aos catildees satildeo uacutenicas Antes o faziam em torno de processos que

natildeo lhes eram uacutenicos e de caracteriacutesticas natildeo necessariamente uacutenicas que podem

ser usadas para o estudo de fenocircmenos mais gerais ndash que a pesquisadora

exemplifica com o estudo da diversidade de raccedilas no acircmbito morfoloacutegico e

comportamental com o fim de examinar se alguns dos efeitos sobre o

comportamento provecircm de fatores atuantes na morfologia de modo concomitante ndash

razatildeo porque ela sugere natildeo haver conexotildees diretas nessa nova abordagem com os

trabalhos cientiacuteficos publicados anteriormente que representam uma tradiccedilatildeo cujo

fim se deu nos anos oitenta Acrescenta que isto explica o porquecirc de os trabalhos

anteriores a essa nova abordagem serem por vezes tatildeo pouco citados embora natildeo

desprezados pelo fato de trazerem contribuiccedilotildees importantes

Nesse acircmbito aleacutem da ordem Carnivora da qual os catildees fazem parte outras

ordens da classe Mammalia tecircm recebido algum destaque nas uacuteltimas deacutecadas tais

como Proboscidea Cetacea e Primates149 e inclusive certas aves em especial os

passeriformes da famiacutelia corvidae150 Esses animais apresentam alta complexidade

em seus atos e processos cognitivos observados em suas interaccedilotildees com os

demais membros dos grupos em que vivem com outros grupos da mesma espeacutecie

com presas e predadores e outros animais com os quais estabelecem associaccedilotildees

etc aleacutem dos observados em suas interaccedilotildees com os entes humanos

Por cogniccedilatildeo assim entende Shettleworth151

Cogniccedilatildeo se refere aos mecanismos pelos quais os animais adquirem processam armazenam e agem em relaccedilatildeo agrave informaccedilatildeo do ambiente Isso inclui percepccedilatildeo aprendizagem memoacuteria e tomada de decisatildeo O estudo de cogniccedilatildeo comparada eacute portanto relacionado com o modo como os

148

FEUERBACHER 2011 149

LOCKE 2013 GRIFFIN 1994 p 106 209 211-232 239 258 MCINTYRE 2002 p 31 COREN 2006 passim

150 EMERY 2006

151 SHETTLEWORTH 2010

47

animais processam informaccedilatildeo a comeccedilar por como a informaccedilatildeo eacute adquirida pelos sentidos

152

Ao que se pode agregar o que diz Dyer

Uma abordagem cognitiva do comportamento garante um papel causal importante para mecanismos internos em que dados sensoriais satildeo organizados para formar representaccedilotildees mais ou menos detalhadas de eventos e relaccedilotildees no mundo exterior

153

Maturana e Varela explicam que

[] o sistema nervoso participa dos fenocircmenos cognitivos de duas maneiras complementares relacionadas com seu modo particular de operaccedilatildeo como uma rede neural com clausura operacional e como parte de um sistema metacelular A primeira e mais oacutebvia se daacute pela ampliaccedilatildeo do domiacutenio de estados possiacuteveis do organismo resultado da enorme diversidade de configuraccedilotildees sensoacuterio-motoras que o sistema nervoso permite e que eacute a chave de sua participaccedilatildeo no funcionamento do organismo A segunda ocorre quando se abrem para o organismo novas dimensotildees de acoplamento estrutural tornando-lhe possiacutevel associar uma grande diversidade de estados internos agrave diversidade de interaccedilotildees de que participa A presenccedila ou ausecircncia do sistema nervoso eacute o que determina a descontinuidade existente entre organismos com uma cogniccedilatildeo relativamente limitada e aqueles capazes de uma diversidade em princiacutepio ilimitada como o homem

154

E uma vez que o aacutepice do processo cognitivo eacute a expressatildeo da inteligecircncia

Gallegos155 a descreve com base principalmente em alguns trabalhos de Vigostky

Pavlov e Luria em criacutetica agrave hipoacutetese supramencionada de Gardner como ldquo[] uma

construccedilatildeo unitaacuteria mas natildeo uniacutevoca indissoluvelmente ligada ao pensamento que

manteacutem relaccedilotildees sistecircmicas com diversas formas de atividade psiacutequicardquo156

Ele distingue-a de outras funccedilotildees da psique dentre as quais cita percepccedilatildeo

memoacuteria pensamento e linguagem afirmando que a inteligecircncia eacute uma construccedilatildeo

teoacuterica e que por isso ela parece ser uma propriedade do pensamento ndash o qual no

homem eacute capaz de estabelecer relaccedilotildees por meio de operaccedilotildees caracterizadas por

152

ldquoCognition refers to the mechanisms by which animals acquire process store and act on information from the environment These include perception learning memory and decision-making The study of comparative cognition is therefore concerned with how animals process information starting with how information is acquired by the sensesrdquo SHETTLEWORTH 2010 p 4

153 ldquoA cognitive aproach to behavior grants an important causal role to internal mechanisms

whereby sensory data are organized to form more or less detailed representations of events and relationships in the outside worldrdquo DYER 1994 p 66

154 MATURANA VARELA 1995 p 201-202

155 GALLEGOS 2013

156 ldquo[] la inteligencia es un constructo unitario pero no uniacutevoco indisolublemente ligado al

pensamiento que mantiene relaciones sisteacutemicas con diversas formas de actividad psiacutequicardquo Ibid

48

discriminar generalizar e categorizar ndash e natildeo algo que exista por si razatildeo pela qual

se pode dizer que os animais natildeo humanos pensam e a eles pode-se atribuir

inteligecircncia Mas a inteligecircncia diz possui certa funccedilatildeo que caracteriza como

adaptativa

[] jaacute que permite modificar nossa conduta em funccedilatildeo da valoraccedilatildeo dos resultados obtidos Esta valoraccedilatildeo pode ser um simples mecanismo de associaccedilatildeo entre estiacutemulos e respostas assim como um complexo processo de anaacutelise e siacutentese

157

No homem esse processo que nele e nos animais encontra seu substrato

material nos processos neurais de anaacutelise e siacutentese descritos por Pavlov e que se

estrutura de um modo particular em cada indiviacuteduo eacute muito mais desenvolvido

dando-se em contextos soacutecio-culturais e por meio da linguagem a qual sob a

perspectiva vigotskyana faraacute a mediaccedilatildeo da internalizaccedilatildeo de toda funccedilatildeo

psicoloacutegica que tem origem externa e prossegue confere agrave mente humana a

capacidade de abstraccedilatildeo de compreender natildeo somente os sinais de natureza

sensorial mas como diz sinais de sinais por anaacutelise e siacutentese de sinais

Deste modo afirma a inteligecircncia predomina sobre o instinto no homem ao

passo que no animal o instinto predomina sobre a inteligecircncia

Gallegos conclui levantando a hipoacutetese de que a inteligecircncia seria um produto

do ceacuterebro em seu todo em que

[] os loacutebulos preacute-frontais como terceira unidade funcional podem exercer uma funccedilatildeo organizadora codificadora e sinalizadora da informaccedilatildeo enquanto que os loacutebulos occipital temporal e parietal como segunda unidade funcional realizam funccedilotildees de integraccedilatildeo

158

E diz tambeacutem Griffin

[] processos cognitivos possuem dentre outros atributos representaccedilotildees incluindo memoacuterias expectativas e antecipaccedilotildees Realizam-se combinaccedilotildees internas dessas representaccedilotildees para que resultem em decisotildees e classificaccedilotildees de objetos em relaccedilatildeo a desejos e crenccedilas Ou seja os animais querem algumas coisas temem outras esperam que determinadas accedilotildees levem a certos resultados

159

157

ldquo[] ya que permite modificar nuestra conducta en funcioacuten de la valoracioacuten de los resultados obtenidos Esta valoracioacuten puede ser un simple mecanismo de asociacioacuten entre estiacutemulos y respuestas asiacute como un complejo proceso de anaacutelisis y siacutentesisrdquo GALLEGO 2013

158 ldquo[] los loacutebulos prefrontales como tercera unidad funcional pueden ejercer una funcioacuten

organizadora codificadora y signalizadora de la informacioacuten en tanto que los loacutebulos occipital temporal y parietal como segunda unidad funcional realizan funciones de integracioacutenrdquo Ibid

159 GRIFFIN 1994 p viii

49

E para isso muitos animais natildeo humanos possuem aptidotildees para

comunicaccedilatildeo relativamente complexas se comparadas com as humanas como o

reconhecimento de siacutembolos o uso de ferramentas a vocalizaccedilatildeo a tomada de

decisatildeo e a capacidade de improviso etc160 que naturalmente potencializam seu

desempenho na luta diaacuteria pela sobrevivecircncia aleacutem das que aparecem mediante o

conviacutevio com os entes humanos

Ilustram isto bem os relatos de Darwin de histoacuterias que ouviu ou que ele

mesmo presenciou Conta o naturalista que os macacos americanos de Rengger

receberam ovos e inicialmente quebraram-nos com pouco jeito perdendo grande

parte do conteuacutedo mas pouco depois passaram a quebraacute-los cuidadosamente sobre

uma superfiacutecie dura retirando os pedaccedilos de cascas com os dedos Em outro

episoacutedio a esses mesmos animais foram dados um objeto cortante e em outra

ocasiatildeo torrotildees de accediluacutecar em envelopes de papel nos quais foram posteriormente

inseridas vespas Os animais depois de feridos passaram a pegar o objeto com

cuidado e a aproximar os envelopes dos ouvidos antes de abrirem161 Rengger

ensinou um de seus animais a abrir um tipo de noz com uma pedra tal como fazem

os chimpanzeacutes na natureza e o macaco passou a fazer o mesmo com outras frutas

de casca dura Outro destes macacos a quem ele ensinou a abrir o fruto com um

bastatildeo passou a usar este objeto para mover objetos pesados

Darwin relata tambeacutem que ele mesmo viu um orangotango colocar um pedaccedilo

de pau em uma abertura segurar a outra extremidade e fazer do objeto uma

alavanca Conta em seguida o interessante relato de Brehm segundo o qual um

grupo de macacos gelada (Theropithecus gelada) na Abissiacutenia em conflito com

outro de babuiacutenos (Papio hamadryas) desprendia das montanhas grandes pedras

que rolavam abaixo para atingirem os adversaacuterios que fugiam ainda que depois

retornassem para travar batalha corporal Tambeacutem Brehm relata que participou de

um ataque com armas de fogo a um grupo de babuiacutenos em que estes fizeram rolar

tantas pedras da montanha que aos caccediladores natildeo restou alternativa senatildeo bater

em retirada162

Haacute tambeacutem relatos com catildees de caccedila que segundo ouviu jamais haviam

matado a caccedila ateacute entatildeo No primeiro o catildeo de caccedila de Colquhoun foi buscar dois

160

ADES 1997 TELES 2005 HERMAN 2006 MCINTYRE 2002 passim GRIFFIN 1994 passim

161 DARWIN sd a) p 30-31

162 Ibid p 34-35

50

patos atingidos nas asas mas sem conseguir trazecirc-los ao mesmo tempo matou um

e trouxe o outro vivo No seguinte contou-lhe o coronel Hutchinsson que em caso

semelhante uma perdiz foi morta e outra caiu ferida Esta ao tentar fugir foi

capturada pelo catildeo que ao deparar com a morta parou e depois de tentar trazer

ambas naquele estado sem sucesso ateacute que matou a que estava viva e entatildeo

cumpriu a tarefa163

Para aleacutem destes relatos Darwin afirma que a linguagem articulada somada

(jaacute que por exemplo o papagaio tambeacutem a tem) agrave aplicaccedilatildeo de sons

correspondentes a ideias definidas seria uma habilidade exclusiva do homem ainda

que este se expresse de modo semelhante a outros animais por voz e gesticulaccedilotildees

em expressotildees mais simples de sentimentos como dor medo e surpresa Mas a

estes atribui tambeacutem algo anaacutelogo agrave linguagem e menciona como exemplos seis

tipos de sons vocais diferentes que caracterizam comunicaccedilatildeo emocional por Cebus

azarae do Paraguai que despertam nos demais cada um reaccedilotildees equivalentes ao

som emitido e cinco tons distintos no latido de catildees que satildeo facilmente

reconheciacuteveis por criadores o da caccedila o da coacutelera o de desespero por estar preso

em algum recinto o de gozo por sair para passear e o grito de suacuteplica quando pede

para que abram a porta Destaca poreacutem as aves que aleacutem de expressarem suas

emoccedilotildees pelo canto ensinam aos descendentes os cantos de chamados entre si

que o exercitam de modo rudimentarmente parecido com o que fazem os humanos

e aponta casos de aves que na ausecircncia dos progenitores aprenderam cantos de

chamado distintos daqueles observados em sua espeacutecie164

Diz o naturalista ainda haver sentimento do belo nos animais como nas aves

que exibem suas plumagens coloridas agraves fecircmeas concluindo que tal beleza eacute

admirada por estas165 e ressalta a sociabilidade verificada em muitos deles como

na tristeza diante da separaccedilatildeo (como de filhotes de seus pais de catildees de seus

donos) caracterizada pela expressatildeo de suas emoccedilotildees como nos alertas que

alguns datildeo aos coespeciacuteficos em situaccedilotildees de perigo (como golpes com as patas no

solo que se observam em coelhos e carneiros aleacutem da vocalizaccedilatildeo destes)

inclusive com o posicionamento de uma sentinela algo verificado entre certas aves

em focas e macacos como no auxiacutelio exemplificado pela remoccedilatildeo de ectoparasitas

163

DARWIN sd a) p 31 164

Ibid p 36-37 165

Ibid p 44

51

de companheiros como fazem os macacos os cavalos etc na caccedila em grupo

realizada por predadores como o lobo e na proteccedilatildeo de outros membros do grupo

Aqui Darwin traz mais um relato envolvendo babuiacutenos da Abissiacutenia em mais

um episoacutedio que lhe contou Brehm no qual os macacos que natildeo estavam na

montanha foram atacados pelos catildees de caccedila quando entatildeo machos mais velhos

desceram para socorrer os companheiros Havia restado somente um filhote que ao

ver-se cercado pelos catildees foi socorrido e carregado por apenas um dos maiores

machos do grupo Os catildees surpreendidos pelo gesto deste natildeo se moveram166

Vale mencionarmos ainda por fim os casos narrados de um pelicano de dois

ou trecircs corvos e de um galo todos cegos em situaccedilotildees distintas que eram

alimentados por seus respectivos companheiros de bando Darwin sustenta que

casos assim satildeo suficientemente raros de modo que natildeo se poderia atribuir o gesto

somente a algum instinto167

Diante desses quadros diz o pesquisador que o fato de os animais natildeo terem

faculdade de abstrair nem possuiacuterem ideias gerais natildeo configura uma barreira

intransponiacutevel entre eles e os homens168

Ades169 poreacutem aponta para as dificuldades de se compreender a inteligecircncia

e a consciecircncia nos animais em razatildeo das distinccedilotildees entre a nossa natureza e a

deles uma vez que natildeo escapamos de todo da tendecircncia de analisaacute-los ancorados

em nossas proacuteprias medidas Eis o que ele chama ldquointuiccedilatildeo antropomoacuterficardquo

Esta configuraria portanto um obstaacuteculo para a identificaccedilatildeo da chamada

teoria da mente em sua aplicaccedilatildeo no acircmbito interespeciacutefico A atribuiccedilatildeo desta aos

animais natildeo humanos foi sugerida por Premack e Woodruff que a definem assim

Ao afirmarmos que um indiviacuteduo tem uma teoria da mente estamos dizendo que o indiviacuteduo imputa estados mentais a ele mesmo e a outros (a coespeciacuteficos bem como a indiviacuteduos de outras espeacutecies) Um sistema de inferecircncias deste tipo eacute propriamente visto como uma teoria em primeiro lugar porque tais estados natildeo satildeo diretamente observaacuteveis e em segundo lugar porque o sistema pode ser usado para fazer prediccedilotildees especificamente sobre o comportamento de outros organismos

170

166

DARWIN sd a) p 52 167

Ibid p 53 168

Ibid p 32 169

ADES 1997 170

ldquoIn saying that an individual has a theory of mind we mean that the individual imputes mental states to himself and to others (either to conspecifics or to other species as well) A system of inferences of this kind is properly viewed as a theory first because such states are not directly observable and second because the system can be used to make predictions specifically about the behavior of other organismsrdquo PREMACK WOODRUFF 1978 p 515

52

Desenvolveram-se muitas pesquisas a partir desse pressuposto algumas das

quais seratildeo abordadas no corpo deste estudo

53

2 JUSTIFICATIVA

Despontam diante de tudo o que se viu ateacute aqui algumas indagaccedilotildees como

onde realmente estariam os limites entre a inteligecircncia humana e a dos demais

animais em todos esses apontamentos e segundo as mais diversas definiccedilotildees

Haveria de fato uma continuidade gradativa como defende Darwin ou haacute uma

lacuna natildeo preenchiacutevel entre a mente que abstrai e a que natildeo abstrai De que modo

esses limites se relacionam com os dois tipos baacutesicos de consciecircncia

supramencionados Seriam esses tipos tambeacutem continuamente gradativos

Uma vez que estamos lidando com problemas relacionados agrave natureza de

entes distintos isto de algum modo nos remete agrave linha de investigaccedilatildeo relacionada

ao ser ou seja agrave ontologia ou metafiacutesica que pensadores do seacuteculo passado

como Poper assumiram ter elementos vaacutelidos para o conhecimento humano no

caso testaacuteveis (ou falseaacuteveis) e em relaccedilatildeo agrave qual de um modo diferente do que

aqui se pretende fazer este mesmo pensador reconheceu a necessidade de

recorrer como algo complementar agrave ciecircncia moderna apontando para a necessidade

de haver limites bem estabelecidos entre uma e outra171

Grene por sua vez sugere que o aristotelismo poderia contribuir para a

resoluccedilatildeo de problemas filosoacuteficos na biologia como na localizaccedilatildeo de um problema

filosoacutefico de uma estrutura na natureza de um fenocircmeno no entendimento dos

fundamentos desta ciecircncia com base no conceito de eidos (que no aristotelismo-

tomismo traduz-se por ldquoformardquo mas Grene aponta para outros conceitos como

ldquoprinciacutepio organizadorrdquo ldquopadratildeo de accedilatildeo fixardquo ldquocoacutedigordquo etc) Este forneceria por

exemplo a demonstraccedilatildeo de que a proacutepria biologia natildeo poderia ser reduzida agrave fiacutesica

ou agrave quiacutemica tendo em vista que a compreensatildeo de um sistema organizado deve-se

dar considerando-se as partes enquanto organizadas no sistema e natildeo enquanto

partes isoladas172

Como se disse anteriormente Aristoacuteteles eacute considerado o pai da metodologia

cientiacutefica e deu os primeiros passos para as ciecircncias bioloacutegicas atuais mas mais

ainda apresentou aquela que provavelmente foi a primeira doutrina psicoloacutegica

aleacutem de ter sido tambeacutem provavelmente o primeiro a apresentar uma metafiacutesica

sistematizada estabelecendo com seu esquema de subalternaccedilatildeo das ciecircncias os

171

POPER 2001 p 37-40 172

GRENE 1972

54

limites na divisatildeo das disciplinas segundo os modos de abstraccedilatildeo E com diz

Anthony Kenny173 se a fiacutesica a quiacutemica e a biologia de Aristoacuteteles encontram

espaccedilo hoje somente na histoacuteria das ideias a eacutetica a epistemologia a metafiacutesica e

a filosofia da mente aristoteacutelicas continuam integrando os estudos filosoacuteficos ndash e

Kenny sugere que continuaratildeo a fazecirc-lo de modo perene

Aristoacuteteles nasceu em Estagira por volta de 384 e 383 aC e aos vinte anos

viajou para Atenas onde ingressou na Academia de Platatildeo onde permaneceu por

cerca de vinte anos Apoacutes a morte de Platatildeo foi para Assos na Aacutesia Menor onde

fundou com outros platocircnicos uma Escola e permaneceu por trecircs anos deslocando-

se em seguida para Mitilene Dali foi chamado por Filipe da Macedocircnia para educar

Alexandre e alguns anos depois retornou para Atenas onde comprou as edificaccedilotildees

para fundar sua Escola tambeacutem chamada Liceu ou Periacutepato de onde sairia a maior

parte de sua produccedilatildeo Morreu em 322 aC no exiacutelio em Caacutelcis apoacutes ser envolvido

como reacuteu na morte de Alexandre174

Dentre os seus principais comentadores destaca-se Santo Tomaacutes de Aquino

considerado o maior dos filoacutesofos teoacutelogos medievais cujos escritos segundo

Broadie

[] estatildeo sendo cada vez mais estudados por membros da vasta comunidade filosoacutefica e suas ideias vecircm sendo trabalhadas nos debates filosoacuteficos atuais nos campos da loacutegica loacutegica filosoacutefica da metafiacutesica da epistemologia da filosofia da mente da filosofia moral e da filosofia da religiatildeo

175

O pesquisador menciona ainda que os escritos tomistas vecircm sendo aplicados

cada vez mais fora do ambiente eclesiaacutestico inclusive na filosofia do direito o que se

daacute por exemplo em razatildeo de seu notaacutevel conhecimento em relaccedilatildeo agraves leis naturais

exposto na Summa Theologiae de modo diz completo e detalhado176

Kenny177 tambeacutem menciona esse interesse crescente em sua obra entre

cristatildeos e natildeo cristatildeos impressionados com seu gecircnio filosoacutefico inclusive por ter

sido muito pouco explorada nos seacuteculos anteriores ao que atribui dois motivos O

primeiro eacute a sua dimensatildeo Ele fornece dados correspondentes a nada menos que

173

KENNY 1994 p 5 174

REALE ANTISERI 2003 p 187-189 175

[] are increasingly studied by members of the wider philosophical community and his insights put to work in present-day philosophical debates in the fields of philosophical logic metaphysics epistemology philosophy of mind moral philosophy and the philosophy of religion BROADIE 1995 p 43

176 BROADIE 1995 p 47

177 KENNY 1994 p 10-12

55

uma produccedilatildeo de 8686577 palavras em menos de cinquenta anos considerando-

se somente os escritos comprovadamente autecircnticos (se se inclui os escritos de

autoria duvidosa a obra chega a cerca de onze milhotildees de palavras) e estima que

em seu ano mais produtivo Tomaacutes de Aquino tenha produzido cerca de trecircs milhotildees

de palavras o que faz com que sejam plausiacuteveis os testemunhos de que sua

produccedilatildeo se dava por ditado simultaneamente dentro de um periacuteodo a diferentes

secretaacuterios

O outro motivo que Kenny afirma para a pouca atenccedilatildeo que a produccedilatildeo

tomista recebeu nos seacuteculos que seguiram seu surgimento foi a falsa ideia de que

sua integridade filosoacutefica estaria comprometida pela fidelidade de Santo Tomaacutes agrave

ortodoxia de sua religiatildeo Mas Kenny o defende justamente ao apontar que como

profundo conhecedor da filosofia aristoteacutelica tomou o devido cuidado para fazer as

devidas distinccedilotildees entre aquilo em que acreditava enquanto teoacutelogo o que era

objeto de suas investigaccedilotildees teoloacutegicas e aquilo em que acreditava enquanto

filoacutesofo o que era objeto de suas investigaccedilotildees filosoacuteficas

Tomaacutes de Aquino nasceu em Roccasecca sul do Laacutecio no ano de 1221 Foi

educado em Montecassino e em Naacutepoles onde entrou para a ordem dominicana

contrariando seus familiares Em Colocircnia teve como mestre Alberto Magno o

precursor do aristotelismo no ocidente medieval e que tambeacutem realizou

investigaccedilotildees sobre os animais Foi entatildeo convidado para lecionar na Universidade

de Paris onde obteve o tiacutetulo de magister em teologia e uma caacutetedra Passou pelas

principais universidades do continente falecendo em Liatildeo em 1274 aos 53 anos de

idade178

O pensamento de Aristoacuteteles e Tomaacutes de Aquino expresso em algumas

disciplinas como a metafiacutesica e a fiacutesica partem de princiacutepios semelhantes de

fundamentaccedilatildeo empiacuterica desde aqueles considerados evidentes ou seja que

prescindem de demonstraccedilatildeo e desenvolvem-se de modo muito similar segundo a

epistemologia aristoteacutelica o que justifica o emprego do termo ldquoaristotelismo-

tomismordquo Esses princiacutepios expressam relaccedilotildees cujos conceitos satildeo fundamentais

para a compreensatildeo desta doutrina a qual se enquadra no chamado ldquorealismo

moderadordquo que segundo Reale e Antiseri ldquorecorre ao poder de abstraccedilatildeo do

178

REALE ANTISERI 2005 p 211-212

56

intelecto para explicar os universaisrdquo179 cuja apreensatildeo eacute o elemento central que

distingue os homens dos demais animais

Segundo as investigaccedilotildees filosoacuteficas sob a oacuteptica aristoteacutelico-tomista grosso

modo esses demais animais seriam dotados de uma potecircncia estimativa que serve

como meio de orientaccedilatildeo para o alcance dos fins aos quais estaacute ordenada a sua

natureza sensitiva Mas ainda que eles possam distinguir entre os entes e percebam

caracteriacutesticas que lhes satildeo proacuteprias natildeo chegariam a ser tal como os humanos

em que essa potecircncia estimativa eacute mais desenvolvida e por isso chamada

cogitativa dotados de intelecto Seu ato cognitivo estaria restrito agraves potecircncias dos

sentidos internos

A pesquisadora doutora e professora da St Johnrsquos University Marie I George

aponta que nesse campo o aristotelismo-tomismo tem recebido pouca ou nenhuma

atenccedilatildeo180 Ela analisou alguns casos como a identificaccedilatildeo de formato cor e

material de um objeto pelo papagaio Alex o processo para um macaco chegar ao

uso de um graveto como instrumento para retirada de alimento em um orifiacutecio menor

que seu dedo e o ensino de comunicaccedilatildeo por lexigramas e linguagem de sinais

fornecendo explicaccedilotildees como diz mais econocircmicas pelas quais aponta as

associaccedilotildees dos sentidos e natildeo algo que implicaria intelecccedilatildeo tal como o entende o

aristotelismo-tomismo A pesquisadora aponta entatildeo a necessidade de distinguir a

fronteira entre o pensar e o sentir (pelos sentidos) para chegar-se aos devidos

criteacuterios para anaacutelise das diferenccedilas entre o ente humano e os animais natildeo humanos

nesse sentido e indica que a maior dificuldade que enxergou nesse tipo de pesquisa

eacute o entendimento insuficiente do que seriam os sentidos internos e de seu papel nas

habilidades cognitivas desses animais Isto defende leva tanto a tentativas forccediladas

de explicar somente pelo instinto as habilidades como as citadas logo acima como agrave

atribuiccedilatildeo equivocada a esses animais da capacidade de inteligir

Isto que se acaba de dizer seraacute desenvolvido neste trabalho que natildeo tem a

pretensatildeo de ser mais do que mais uma etapa mais uma contribuiccedilatildeo para o

desenvolvimento de futuras pesquisas nessa linha

179

REALE ANTISERI 2005 p 215 180

GEORGE 2003

57

3 MEacuteTODOS E OBJETIVOS

Buscaremos na obra de Aristoacuteteles e na de Santo Tomaacutes de Aquino um

nuacutemero suficiente de informaccedilotildees que deveremos reunir aqui a fim de construirmos

a partir de seus pressupostos metafiacutesicos ndash que se fundamentam naquilo que eacute

evidente ou seja cuja apreensatildeo eacute sempre imediata sem necessidade de

demonstraccedilatildeo ndash sua doutrina psicoloacutegica mas tanto de um modo voltado para que

tentemos identificar limites ali propostos entre a inteligecircncia humana e a inteligecircncia

animal entre o sensiacutevel e o intelectivo como a fim de fornecermos elementos para

uma construccedilatildeo posterior integral dessa doutrina que se encontra espalhada pela

obra de ambos os autores uma vez que ao menos ateacute o presente natildeo encontramos

nenhum trabalho que apresente tal estudo

Recorreremos ainda a comentadores do aristotelismo-tomismo somente

quando e se houver necessidade de buscarmos direcionamento e eventuais

informaccedilotildees complementares que se mostrem relevantes para a concretizaccedilatildeo dos

objetivos estabelecidos

Buscaremos assim possiacuteveis respostas para questotildees como as que

levantamos mais acima e para um exame mais acurado percorreremos em seguida

uma seacuterie de trabalhos publicados nas uacuteltimas deacutecadas envolvendo pesquisas nas

disciplinas comparadas que atualmente se ocupam dos processos cognitivos como

a Etologia Cognitiva a Ecologia Comportamental e a Psicologia Comparada e

apontam para manifestaccedilotildees de inteligecircncia nos animais

Diz Mackintosh que

[] natildeo haacute uma coisa singular denominada inteligecircncia que certamente natildeo podemos classificar os animais pela sua posse da inteligecircncia Eacute muito mais profiacutecuo conceber a inteligecircncia como um arranjo diferenciado ou heterogecircneo de processos operaccedilotildees e habilidades

181

Nessa esteira Deacon182 apontou uma seacuterie de questotildees pertinentes sobre a

associaccedilatildeo entre o niacutevel das habilidades mentais e o tamanho cerebral como a falta

de consenso que haacute entre o tamanho absoluto e o tamanho relativo do ceacuterebro e a

possibilidade de haver fatores como variaacuteveis em razatildeo da multiplicidade de

operaccedilotildees do ceacuterebro e do fato de estas natildeo estarem distribuiacutedas de modo

181

MACKINTOSH 1997 p 34-35 182

DEACON 1997 p 146-148

58

uniforme do que questiona por exemplo como as diferenccedilas relacionadas ao

tamanho e agraves partes do ceacuterebro poderiam influenciar as operaccedilotildees deste Mas

corrobora que natildeo haacute duacutevida de que exista correlaccedilatildeo entre as capacidades de um

ceacuterebro e o seu tamanho

Nesse acircmbito da alometria Jerison propocircs o quociente de encefalizaccedilatildeo

(EQ)183 que eacute ldquoa razatildeo entre o tamanho real do ceacuterebro e o tamanho esperado do

ceacuterebro []rdquo que ldquoeacute um tipo de lsquomeacutediarsquo[] que leva em conta o tamanho do corpordquo184

Alguns trabalhos recentes tambeacutem corroboram a relaccedilatildeo entre inteligecircncia e volume

cerebral como o de Street e colaboradores185 que confirma a relaccedilatildeo entre o

volume cerebral e a chamada inteligecircncia social em primatas e o de Gignac e

colaboradores186 que reforccedila a relaccedilatildeo entre inteligecircncia e volume cerebral no

acircmbito intraespeciacutefico em estudos envolvendo humanos

Daremos aqui maior enfoque ndash sem desprezar as criacuteticas a esta perspectiva

mas porque precisamos de um referencial para o desenvolvimento do que

reiteramos eacute somente a etapa de um processo ndash portanto a algumas das

habilidades dos corviacutedeos e em especial dos membros da classe Mammalia que

destacamos anteriormente com maior relaccedilatildeo entre volume cerebral e tamanho

corporal e cuja estrutura neural mais parece aproximar-se da humana pertencentes

agraves ordens Proboscidea que apresentam o maior volume cerebral dentre os animais

terrestres Cetacea que apresenta o maior volume cerebral dentre todos os animais

e o maior quociente de encefalizaccedilatildeo depois do homem da qual abordaremos a

famiacutelia Delphinidae Primates com destaque para os grandes macacos por sua

proximidade com os humanos por exemplo dentro daquilo que hoje se conhece por

escala filogeneacutetica mas sem deixar de levar outros grupos em conta como os

membros da subfamiacutelia Cebinae por seu elevado quociente de inteligecircncia187 e

Carnivora ndash aqui especialmente a subespeacutecie Canis lupus familiaris da famiacutelia

Canidae por sua convivecircncia milenar com os humanos Tentaremos ainda esboccedilar

uma listagem dessas habilidades com o fim de facilitar os nossos propoacutesitos

Com o objetivo de verificarmos a compatibilidade do aristotelismo-tomismo

visando a corroborar a proposta de que esta corrente poderia contribuir com o

183

ldquoEncephalization quotientrdquo 184

ldquo[] the ratio of actual brain size to expected brain size [] is a kind of lsquoaveragersquo[] that takes body size into accountrdquo JERISON 1973 p 61

185 STREET et al 2017

186 GIGNAC et al 2017

187 ROTH DICKE 2005

59

avanccedilo das investigaccedilotildees que tocam agrave inteligecircncia dos animais o que eacute nosso

objetivo central e inclusive a outros campos afins levantaremos algumas relaccedilotildees

entre as habilidades descritas nesses estudos e a descriccedilatildeo aristoteacutelico-tomista das

potecircncias estimativa cogitativa e intelectiva a fim de testarmos se a visatildeo

aristoteacutelico-tomista estaria em consonacircncia com as hipoacuteteses mais consistentes com

os resultados das pesquisas realizadas sobretudo nas uacuteltimas deacutecadas buscando

interpretaccedilotildees possiacuteveis do resultado agrave luz daquela doutrina seguindo o modelo de

anaacutelise com algumas pequenas diferenccedilas estruturais apresentado no trabalho

supracitado da professora doutora Marie George e tambeacutem no de Koacutevac e

Mather188 que realizaram um breve estudo da cogniccedilatildeo sob a perspectiva do

aristotelismo-tomismo analisando simultaneamente a chamada inteligecircncia dos

cefaloacutepodes

Por fim percorreremos o histoacuterico apresentado anteriormente a fim de

forneceremos mais algumas sugestotildees para futuras investigaccedilotildees que poderatildeo

aclarar se as divergecircncias conceituais em torno dos principais termos que

apresentamos ateacute aqui como ldquointeligecircnciardquo encontram-se por exemplo no fato de

os pesquisadores empregarem um mesmo termo para denominar objetos distintos

ou se apontam para aspectos distintos isolados ou em conjunto de um mesmo

objeto ou se haacute outras explicaccedilotildees para as divergecircncias apontadas acima

188

KOacuteVAC MATHER 2008

60

4 RESULTADOS E DISCUSSAtildeO

41 UMA CONSTRUCcedilAtildeO PARA A PSICOLOGIA ARISTOTEacuteLICO-TOMISTA

411 A subalternaccedilatildeo das ciecircncias

Aristoacuteteles identifica trecircs ramos da filosofia teoreacutetica a fiacutesica a matemaacutetica e

a metafiacutesica ou filosofia primeira Estas ciecircncias que versam sobre os universais

(em oposiccedilatildeo aos singulares) subalternam-se segundo seu modo de abstraccedilatildeo Diz

ele no livro VI da Metafiacutesica

[] a fiacutesica refere-se agraves realidades separadas mas natildeo imoacuteveis algumas das ciecircncias matemaacuteticas referem-se a realidades imoacuteveis poreacutem natildeo separadas mas imanentes agrave mateacuteria ao contraacuterio a filosofia primeira refere-se agraves realidades separadas e imoacuteveis

189

Essas realidades separadas segundo Reale referem-se agravequilo que existe

ldquopor sirdquo ou que eacute capaz ldquode subsistir por sua proacutepria conta sem precisar inerir em

outrordquo190

Assim enquanto os sujeitos das ciecircncias fiacutesicas e matemaacuteticas satildeo algum

gecircnero particular de ente a metafiacutesica lida com o ente em comum bem como um

ente qualquer particular enquanto ente

Tomaacutes de Aquino define ldquoenterdquo como toda e qualquer coisa na medida em

que eacute una191 e fala de duas maneiras pelas quais se pode compreendecirc-lo

[] a primeira divide-se em dez gecircneros192

a segunda significa a verdade das proposiccedilotildees A diferenccedila destes dois sentidos estaacute em que no segundo pode chamar-se ente tudo aquilo de que uma proposiccedilatildeo afirmativa pode ser formada mesmo que tal natildeo ponha nada na realidade Assim eacute que as privaccedilotildees e as negaccedilotildees podem-se chamar entes De fato dizemos que a afirmaccedilatildeo se opotildee agrave negaccedilatildeo e que a cegueira estaacute no olho No primeiro sentido poreacutem soacute pode-se chamar ente o que potildee alguma coisa na realidade Assim eacute que a cegueira e outras privaccedilotildees ou negaccedilotildees deste tipo natildeo satildeo entes [] a essecircncia eacute tirada de ente no primeiro sentido

193

189

ARISTOacuteTELES 2005 1026a p 271-273 190

REALE 2005 p 307 191

TOMAacuteS DE AQUINO 2012 Q XI p 239 192

As categorias tema que se veraacute adiante 193

TOMAacuteS DE AQUINO 2003b p 53

61

Explica ainda o Aquinate194 que enquanto os entes naturais tecircm suas

espeacutecies na mateacuteria sensiacutevel os entes matemaacuteticos que exemplificam essa

segunda maneira as tecircm na mateacuteria inteligiacutevel As qualidades sensiacuteveis tecircm seu

fundamento na quantidade que inere na substacircncia e quando na mente elas satildeo

removidas o que resta eacute a quantidade contiacutenua A diferenccedila entatildeo que haacute entre a

quididade ou essecircncia de um ente natural e a de um ente matemaacutetico estaacute na

distinccedilatildeo entre respectivamente a mateacuteria que eacute submetida a uma conformaccedilatildeo de

qualidades sensiacuteveis atualizada por uma forma natural e a mateacuteria atualizada por

certa forma que se coloca sobre certa quantidade ndash a saber os entes matemaacuteticos

ndash exemplificados pelas figuras geomeacutetricas bidimensionais

A metafiacutesica eacute assim e por sua vez a ciecircncia universal que estuda o ente e

natildeo soacute o ente mas tambeacutem o ser (cuja definiccedilatildeo se veraacute adiante) enquanto ente e

ser bem como os atributos que lhes satildeo inerentes enquanto ente e ser

respectivamente Eacute ela que por tratar dos princiacutepios e das causas dos entes

forneceraacute axiomas para as ciecircncias matemaacuteticas que natildeo podem ser explicados

pelas proacuteprias ciecircncias matemaacuteticas que podem no maacuteximo os pressupor e o

mesmo se daacute com as ciecircncias fiacutesicas que possuem axiomas que soacute podem ser

fornecidos pelas ciecircncias matemaacuteticas ou pela metafiacutesica

194

TOMAacuteS DE AQUINO 2000 L III l 8 707-708

62

5 CONCEITOS FUNDAMENTAIS DO ARISTOTELISMO-TOMISMO

51 ATO E POTEcircNCIA

Comeccedila assim Tomaacutes de Aquino seu estudo sobre os princiacutepios da natureza

ldquoHaacute coisas que podem existir e natildeo existem e haacute coisas que jaacute existem Chama-se

ser em potecircncia ao que pode existir e natildeo existe e ser em ato ao que jaacute existerdquo195

Segundo a relaccedilatildeo entre potecircncia e ato todo ente que venha a existir ou seja que

venha a atualizar-se estaacute previamente em potecircncia Esta eacute limitada pela natureza da

coisa uma vez que como diz adiante o Aquinate ldquonenhuma coisa pode receber

uma potecircncia para agir que natildeo compita a ela mas antes a outra coisa a natildeo ser

que sua proacutepria natureza seja modificadardquo196 E assim tudo o que estaacute em potecircncia

deve estar na relaccedilatildeo correspondente a quando estaacute em ato197

No momento em que a coisa em si vem agrave existecircncia possui certo nuacutemero de

outras potecircncias que poderatildeo ou natildeo tornar-se ato Dentre estas se encontram as

que estatildeo entre a potecircncia e o ato ou seja em haacutebito e que satildeo assim definidas

pelo mesmo Tomaacutes de Aquino ldquosatildeo perfeiccedilotildees pelas quais as potecircncias se

encontram de certa maneira com respeito agraves coisas em virtude das quais elas

existem isto eacute com respeito aos seus objetosrdquo198

Portanto se toda potecircncia eacute determinada pelo ato ao qual ela estaacute ordenada

nenhum ente pode por si ir aleacutem nem das potecircncias que lhe satildeo inerentes nem

das que lhe satildeo acrescidas pela relaccedilatildeo com o meio circundante E se por seus atos

se distinguem as potecircncias ou seja se eacute o ato que define a potecircncia se eacute mediante

aquele que se conhece esta ndash e portanto eacute segundo a diversidade dos atos que se

diversificam as potecircncias ndash os atos por sua vez se distinguem por seus objetos

mediante estes tomando a espeacutecie destes que satildeo deste modo anteriores

agravequele199

O agente que concorrentemente opera para que uma potecircncia venha a ato

tem natureza extriacutenseca eacute a sua causa eficiente E diz ainda Santo Tomaacutes que

ldquoquanto mais uma potecircncia dista do ato tanto maior eacute o poder de que carece para

195

TOMAacuteS DE AQUINO 2003a p 19 196

Id 2012 Q XXI p 421 197

Id 2009 p 85 198

Id 2012 Q XIII p 279 199

Ibid Q XVI p 343 Id 2000 I L 6 111

63

ser conduzida ao atordquo200 A potecircncia assim eacute anterior ao ato ao qual ela se ordena

mas em outro sentido ela soacute pode-se tornar ato mediante a accedilatildeo de um agente em

ato (essa causa eficiente) e nesse acircmbito eacute correto dizer que o ato e a operaccedilatildeo

satildeo anteriores a ela Toda operaccedilatildeo que traraacute o ato de uma potecircncia pode ser um

princiacutepio de accedilatildeo a potecircncia ativa ou um princiacutepio de paixatildeo a potecircncia passiva

Naquela o objeto relacionado ao ato agrave operaccedilatildeo eacute efeito fim nesta o objeto eacute

causa princiacutepio201

52 ESSEcircNCIA E ACIDENTE

Prossegue Santo Tomaacutes em sua introduccedilatildeo ao estudo dos princiacutepios da

natureza

Por outro lado haacute duas espeacutecies de ser o ser essencial ou substancial202

de uma coisa por exemplo ser um homem e isto eacute o ser considerado em si mesmo e o ser acidental como eacute o caso de o homem ser branco e isto eacute o ser considerado sob relaccedilatildeo particular

203

E em sua explicaccedilatildeo sobre os dois modos de compreensatildeo a respeito do

ente diz

E porque aquilo pelo qual uma coisa eacute constituiacuteda no proacuteprio gecircnero ou espeacutecie eacute o que eacute significado pela definiccedilatildeo indicando o que eacute a coisa daiacute concluiacuterem os filoacutesofos que o nome da essecircncia eacute mudado para quididade Isto eacute tambeacutem o que o Filoacutesofo frequentemente chama o que era ser qualquer coisa isto eacute aquilo por que alguma coisa tem de ser uma coisa qualquer Chama-se-lhe tambeacutem forma na medida em que pela forma eacute significada a certeza de cada coisa Tambeacutem isto se chama por outro nome natureza no sentido de que se chama natureza a tudo o que pode de algum modo ser apreendido pela inteligecircncia pois uma coisa soacute eacute inteligiacutevel mediante a sua definiccedilatildeo e essecircncia a palavra natureza assim entendida parece significar a essecircncia da coisa segundo a qual eacute ordenada agrave sua operaccedilatildeo proacutepria pois nenhuma coisa perde a operaccedilatildeo proacutepria enquanto a palavra quididade proveacutem do facto de ser significada pela defini-ccedilatildeo Chama-se-lhe poreacutem essecircncia enquanto eacute por ela e eacute nela que o

ente possui o ser204

Para o aristotelismo-tomismo assim todo ente tangiacutevel caracteriza-se por sua

essecircncia e seus acidentes Por essecircncia entende-se o que haacute de mais fundamental

200

TOMAacuteS DE AQUINO 2006 p 119 201

Id 2000 L II l 6 304-305 202

A diferenccedila entre essecircncia e substacircncia que Aristoacuteteles afirma ser um gecircnero do ente e atribui agrave mateacuteria agrave forma e ao composto eacute simplesmente de perspectiva como se veraacute em seguida ARISTOacuteTELES 2010 II 1 p 61

203 TOMAacuteS DE AQUINO 2003a p 19

204 Id 2003b p 54-55

64

mais elementar e particular aquilo que determina que tal ente eacute o que eacute e natildeo outra

coisa e que estaacute de maneira proacutepria e verdadeiramente na substacircncia e por

acidente tem-se os elementos que podem ser modificados sem que haja corrupccedilatildeo

da essecircncia que nele estaacute de maneira relativa e de certo modo205

Adotando-se a perspectiva de que a essecircncia seja o substrato de tudo aquilo

que acidentalmente participe do ente recebe ela o conceito de ldquosubstacircnciardquo

Aristoacuteteles classifica-a como ldquosubstacircncia primeirardquo e ldquosubstacircncia segundardquo A

primeira diz respeito agrave mateacuteria que eacute tudo o que estaacute em potecircncia para ser

substancial (ldquomateacuteria de que eacute feitardquo ou mateacuteria propriamente dita) ou para ser

acidental (ldquomateacuteria em que se atualizardquo ou o que o Aquinate chama ldquosujeitordquo)206 e

por ser ldquoum sujeito primeiro que natildeo existe em outrordquo natildeo sendo ldquoparticipaacutevel por

muitosrdquo207 determina a individualidade de cada ente sensiacutevel que natildeo decorre de

nenhuma outra categoria sendo limitada por parte de seu proacuteprio ser e pela

segunda208 a forma que sendo uma finalizaccedilatildeo209 faz existir em ato todos os

seres substanciais e acidentais210 Esta procede da potecircncia da mateacuteria por

educcedilatildeo211 Eacute um princiacutepio que se refere agrave espeacutecie e ao gecircnero os uacutenicos predicados

que expressam a substacircncia primeira tratando-se portanto no acircmbito sensiacutevel de

multiplicidade de universalidade Assim aponta Angioni a substacircncia primeira tem

como particularidade o fato de que ela ldquonatildeo pode ser dita de um subjacenterdquo ao

passo que a segunda tem como particularidade o fato de que ldquopode ser dita de um

subjacenterdquo e assim a substacircncia caracteriza-se como tal por natildeo estar em um

subjacente212

A espeacutecie implica tudo o que existe no indiviacuteduo de maneira indistinta e

assim o gecircnero implica em seu significado tudo o que existe na espeacutecie Esta eacute

ideterminada em relaccedilatildeo ao indiviacuteduo e eacute afirmada dele como o gecircnero o eacute da

espeacutecie (da mesma forma que esta adquire a predicaccedilatildeo da diferenccedila213) e

indeterminado em relaccedilatildeo a ela e do indiviacuteduo mas tomado a partir da mateacuteria (mas

205

TOMAacuteS DE AQUINO 2003b p 55 206

Id 2003a p 19-20 Id 1949 Q 1 R 1 p 16 207

Id 2009 p 145 208

Id 2006 p 91 209

Id 2000 L II l 1 215 210

Id 2003a p 21 211

Id 2009 p 83-85 212

ANGIONI 1998 p 74 ARISTOacuteTELES 1965 2a p 31 213

TOMAacuteS DE AQUINO 2006 p 83

65

natildeo a mateacuteria prima)214 Ou seja assim como a forma eacute limitada ao indiviacuteduo em

razatildeo da mateacuteria o gecircnero estaacute limitado a uma espeacutecie por uma forma com mais

determinaccedilatildeo que eacute da qual o gecircnero obteacutem a diferenccedila que o contrairaacute na espeacutecie

da qual se predica215 Assim o define Aristoacuteteles ldquogecircnero significa o constitutivo

primeiro das definiccedilotildees contido na essecircnciardquo e diz que desse mesmo gecircnero ldquoas

qualidades satildeo diferenccedilasrdquo216

Como a forma a espeacutecie e o gecircnero a diferenccedila significa o todo como uma

denominaccedilatildeo oriunda da forma determinada (e assim diferentemente do gecircnero a

mateacuteria determinada natildeo eacute considerada em seu primeiro conceito)217

Portanto a espeacutecie eacute substrato do gecircnero uma vez que este eacute afirmado a

partir daquela sem que se decirc o oposto o que faz com que ela seja ldquomais

substacircnciardquo do que ele218 Ademais se a forma eacute uma universalidade os diversos

sujeitos que participam de uma mesma forma o fazem de trecircs modos por igualdade

por excesso ou por falha219

Os princiacutepios material e formal resultam no composto essencial (ou

substancial) ou tambeacutem sujeito chamado ldquosinolordquo220 que existe por si sem provir

de nada que se lhe acrescente221 Assim por substacircncia pode-se entender a

mateacuteria a forma ou o composto222 Sobre o composto ou sinolo explica o Aquinate

que o ente que ele eacute natildeo eacute nem forma nem mateacuteria ou seja constitui-se uma

terceira coisa de duas coisas ontologicamente anteriores223 que por serem

princiacutepios natildeo satildeo entes natildeo tecircm ser absoluto uma sem a outra e portanto natildeo se

fazem entes por outros iguais a eles respectivamente A forma por exemplo eacute ldquoo

teacutermino da geraccedilatildeordquo e natildeo eacute algo por outra forma224 Ela eacute ativa atualiza o ente

(move-o da potecircncia ao ato) como pertencente agrave espeacutecie por ela determinada e eacute

princiacutepio de operaccedilatildeo A mateacuteria (que em sua condiccedilatildeo mais fundamental eacute pura

potecircncia ndash e chama-se neste caso materia prima) eacute passiva recebe a forma e

entatildeo a individua sendo paciente de suas operaccedilotildees Mas soacute eacute princiacutepio de

214

TOMAacuteS DE AQUINO 2003b p 66 Id 1949 Q 1 R 9 p 20 e 25 215

Id 1949 Q 1 R 2 p 17 Ibid Q 3 Obj 3 p 44 216

ARISTOacuteTELES 2005 V 1024b p 259 217

TOMAacuteS DE AQUINO 2006 p 63-64 Id 1949 Q 1 R 24 p 25 218

ARISTOacuteTELES 1965 p 34-35 37-38 219

TOMAacuteS DE AQUINO 2006 p 131 220

REALE ANTISERI 2003 p 199 221

TOMAacuteS DE AQUINO 2003a p 20 222

ARISTOacuteTELES 2010 II 2 p 67 223

TOMAacuteS DE AQUINO 2003b p 64 224

Id 2006 p 97

66

individuaccedilatildeo a mateacuteria designada (ou materia signata quantitae) que se pode

considerar sobre certas dimensotildees e natildeo a mateacuteria sem mais natildeo designada que

eacute em potecircncia relativa agrave determinada espeacutecie considerando-se esta mesma espeacutecie

e natildeo a um indiviacuteduo dela

Eacute pois da mateacuteria designada por dimensotildees que se faz a ldquodesignaccedilatildeo do

indiviacuteduo em relaccedilatildeo agrave espeacutecierdquo e eacute pela ldquodiferenccedila constitutiva tirada pela forma da

coisardquo que se faz a ldquodesignaccedilatildeo da espeacutecie em relaccedilatildeo ao gecircnerordquo225 Portanto ldquoo

que existe na espeacutecie existe tambeacutem no gecircnero como natildeo determinadordquo226 e assim

ldquoo gecircnero significa indeterminadamente tudo o que existe na espeacutecierdquo227

A relaccedilatildeo entre a mateacuteria e a forma a ligaccedilatildeo de ambas que caracteriza o

sinolo explica Angioni natildeo eacute extrinsecamente determinada mas a partir de dentro

imanentemente pois diz ldquoeacute da proacutepria natureza da forma pocircr a necessidade de

uma mateacuteria propriamente determinadardquo228 A forma eacute princiacutepio de algo mais que

existe no composto o ser do qual a mateacuteria participa diz o Aquinate ldquopor receber a

formardquo ndash ou seja a forma daacute simpliciter229 o ser agrave mateacuteria ndash e por isso tudo o que eacute

ente eacute uno E explica

Assim o ser eacute consequente agrave proacutepria forma Natildeo obstante a forma natildeo eacute o proacuteprio ser E embora a mateacuteria natildeo alcance o ser senatildeo pela forma a forma no entanto enquanto eacute forma natildeo carece da mateacuteria para seu ser visto que o ser se segue agrave proacutepria forma apenas necessita da mateacuteria Portanto a proacutepria essecircncia da forma estaacute para o ser assim como a potecircncia estaacute para seu ato proacuteprio o proacuteprio ser eacute aquilo pelo qual algo eacute assim como a corrida eacute aquilo pelo qual algueacutem corre Portanto visto que a alma eacute certa forma subsistente por si concebe-se em sua composiccedilatildeo ato e potecircncia ndash isto eacute o ser (esse) e o que eacute (quod est) ndash sem que haja composiccedilatildeo de mateacuteria e forma

230

O ser assim eacute aquilo pelo qual algo eacute (sujeito que possui um ser

completo)231 eacute ato do todo substancial232 que atraveacutes da forma sobreveacutem agrave coisa e

de modo nenhum se separa da forma enquanto natildeo eacute nem esta nem a mateacuteria233 e

assim todas as substacircncias teratildeo seu ser limitado e confinado234 O ser eacute contraiacutedo

225

TOMAacuteS DE AQUINO 2003b p 60 226

Ibid p 61 227

Ibid p 63 228

ANGIONI 1997 p 241 229

Isto eacute ldquoem sentido absolutordquo 230

TOMAacuteS DE AQUINO 2012 Q VI p 135 231

Id 2003 p 20 232

Id 1990b L II c LIV p 256 233

Id 2006 p 89 234

Id 1949 Q 1 Obj 15 p 6

67

pelo ente que o recebe do ente ontologicamente anterior que o confere

caracterizando dois componentes presentes em todo e qualquer ente composto ldquoa

natureza da coisa que participa do serrdquo e o ldquomesmo ser que eacute participadordquo235 pelos

quais se conclui que todo composto ou sinolo apresentaraacute essencialmente dois

atos e duas potecircncias a saber o ato do ser em relaccedilatildeo agrave forma que eacute atualizada

natildeo por causa movente mas por causa influente e o ato da forma em relaccedilatildeo agrave

mateacuteria esta atualizada por causa movente e a potecircncia da mateacuteria em relaccedilatildeo agrave

forma e a da forma em relaccedilatildeo ao ser236

Portanto eacute pelo ser que se denomina ente certa substacircncia de modo que se

do composto de mateacuteria e forma pode-se dizer ldquoo que eacute (quod est)rdquo a coisa do

composto desta substacircncia mais o ser pode-se dizer ldquopelo qual eacute (quo est)rdquo a

coisa237

Nos entes inanimados exclusivamente corpoacutereos a forma eacute mais simples e

por isso se diz que tem menos ser Pode inclusive em certos casos ateacute ser

restaurada depois de desfeita238 Esta propriedade da forma enquanto princiacutepio

subsistente ou seja da forma substancial estaacute no cerne da gradaccedilatildeo entitativa da

qual se falaraacute adiante

Mas independentemente de a sua forma ter mais ou menos ser a substacircncia

natildeo eacute susceptiacutevel de mais e de menos intensidade e natildeo possui contraacuterios No

entanto ela eacute apta a receber contraacuterios como acidentes239

Haacute pois tambeacutem a forma acidental Esta eacute dependente da forma

substancial em virtude da qual ela age pois eacute meio pelo qual ela opera jaacute que natildeo

opera por si mesma (pois como diz Tomaacutes de Aquino ldquoaquilo que participa de algo

eacute segundo ele proacuteprio carente deste algordquo)240 A forma acidental confere agrave mateacuteria

235

Respectivamente ldquonatura rei quae participat esserdquo e ldquoipsum esse participatumrdquo 236

TOMAacuteS DE AQUINO 1949 Q 1 R p 15 e R 5 p 18 237

Id 1990b L II c LIV p 256 238

Eacute o caso por exemplo do misto ou de misturas de substacircncias quiacutemicas que podem ser desfeitas e em seguida reconstituiacutedas

239 ARISTOacuteTELES 1965 p 39-40

240 TOMAacuteS DE AQUINO 2006 p 87

68

secundum quid 241 o ldquoserrdquo dos acidentes242 tais como as cores e a consistecircncia e

complementa deste modo o sujeito o ente243

Assim os atributos que recebem o ser da forma acidental predicam do sujeito

per se ou predicam de outros atributos per accidens244 ou tambeacutem per se neste

caso ldquoquando as diversas formas possuem ordenaccedilatildeo entre si como quando

dizemos por exemplo que lsquoo que possui superfiacutecie eacute coloridorsquordquo Aqui o predicado

natildeo entra na definiccedilatildeo do sujeito mas daacute-se o contraacuterio como exemplifica o

Aquinate ldquoa superfiacutecie entra na definiccedilatildeo da cor assim como o nuacutemero entra na

definiccedilatildeo de parrdquo245 E nesse acircmbito as formas inerentes ou seja que satildeo inerentes

a determinado composto podem ser especiais como por exemplo o branco que

satildeo as que se alteram mediante a alteraccedilatildeo do sujeito ou gerais como a cor que

nesse caso permanece natildeo em seu ser na alteraccedilatildeo mas em seu conteuacutedo ou seja

continua havendo cor mas natildeo mais a branca246

A forma acidental portanto caracteriza os corpos artificiais que se podem

dizer substacircncia por sua mateacuteria jaacute que eacute natural uma vez que provecircm de corpos

naturais que satildeo mais substacircncia que os artificiais dos quais satildeo princiacutepios pois o

satildeo pela mateacuteria e pela forma247

Os acidentes variam conforme a diversidade dos princiacutepios que lhes satildeo

causa248 Pode-se consideraacute-los como sendo de trecircs gecircneros os proacuteprios

ldquocausados a partir dos princiacutepios da espeacutecie como a capacidade de rir no homemrdquo

os que ldquosatildeo causados a partir dos princiacutepios do indiviacuteduo porque tecircm causa

permanente no sujeito (e satildeo estes os acidentes inseparaacuteveis como lsquomasculinorsquo e

lsquofemininorsquo e similares)rdquo e os que ldquotecircm causa natildeo permanente no sujeito (e satildeo estes

os acidentes separaacuteveis como lsquosentar-sersquo ou lsquocaminharrsquo)rdquo249 E podem ser ainda

considerados em duas espeacutecies a saber os necessaacuterios presentes em qualquer

241

Ou seja ldquosegundo algordquo 242

Em verdade natildeo se pode dizer em sentido absoluto que o acidente seja ser mas que seja de um ser como explica o Estagirita na Metafiacutesica (cf ARISTOacuteTELES 2005 XII 1069a 1 23-24) o que leva Santo Tomaacutes a dizer que estas formas em rigor natildeo existem ldquomas que qualquer coisa existe por elasrdquo TOMAacuteS DE AQUINO 2009 p 77

243 Id 2001 Q 77 a 6 p 709

244 ldquoPor sirdquo e ldquopor acidenterdquo respectivamente

245 TOMAacuteS DE AQUINO 2012 Q XI p 237

246 Id 1988 art VI p 71

247 Id 2000 L II l 1 218

248 E note-se portanto que nos acidentes o gecircnero natildeo eacute tomado pela mateacuteria e a

diferenccedila natildeo eacute tomada pela forma mas ldquodo proacuteprio modo de ser segundo o qual o ente assume diversas designaccedilotildees conforme eacute anterior e posterior relativamente aos dez gecircneros de categoriasrdquo Id 2003b p 94

249 Id 2012 Q XII p 257

69

indiviacuteduo da espeacutecie natildeo se separando assim da realidade e os natildeo necessaacuterios

que podem variar entre os indiviacuteduos da espeacutecie ou separar-se da realidade250

Alguns acidentes estatildeo mais relacionados agrave forma outros agrave mateacuteria uns atingem a

mateacuteria segundo a relaccedilatildeo com a forma geral outros com uma forma especiacutefica

Uns podem ser causados segundo um ato perfeito a partir dos dois princiacutepios

essenciais outros segundo a aptidatildeo por exemplo a algo exterior251

Diz ainda o Aquinate sobre os acidentes

Todo e qualquer acidente poreacutem tem em comum natildeo ser da essecircncia da coisa e assim natildeo cai em sua definiccedilatildeo por isso podemos conceber o que uma coisa eacute sem que concebamos algo de seus acidentes Mas a espeacutecie natildeo pode ser concebida sem os acidentes consequentes ao seu princiacutepio Ela pode sim ser concebida sem os acidentes do indiviacuteduo mesmo aqueles inseparaacuteveis jaacute sem os separaacuteveis podem ser concebidos tanto a espeacutecie quanto o indiviacuteduo Ora as espeacutecies da alma satildeo acidentes enquanto propriedades Assim embora sem eles se conceba o que eacute a alma natildeo eacute possiacutevel nem inteligiacutevel que a alma exista sem eles

252

Infere-se disto outro princiacutepio a privaccedilatildeo253 ou o natildeo ser em ato o terceiro

dos trecircs princiacutepios da natureza e um dos trecircs requisitos para a geraccedilatildeo tambeacutem

junto com os princiacutepios anteriormente abordados (mateacuteria e forma) A forma provoca

a geraccedilatildeo que proveacutem da mateacuteria e da privaccedilatildeo Mateacuteria e privaccedilatildeo assim

distinguem-se somente no acircmbito da razatildeo mas natildeo no da realidade e deste modo

a privaccedilatildeo soacute pode ser considerada princiacutepio por acidente254 Portanto a mateacuteria

desprovida da forma e da privaccedilatildeo recebe o nome de ldquomateacuteria prima sem maisrdquo que

eacute pura potecircncia natildeo precedida de qualquer outra mateacuteria e por si mesma natildeo pode

ser conhecida sendo portanto una (uma vez que natildeo estaacute incluiacuteda em qualquer

estrutura que crie multiplicidade) Tomaacutes de Aquino menciona tambeacutem a ldquomateacuteria

prima relativamente a certo gecircnerordquo esta composta de mateacuteria e forma a qual

exemplifica com a aacutegua em relaccedilatildeo agraves ldquodiversas soluccedilotildees aquosasrdquo255

Como o ser natildeo se separa da forma a perda desta implica a corrupccedilatildeo dos

entes compostos256 No tocante aos acidentes dois modos haacute de corrpuccedilatildeo pela

corrupccedilatildeo de seu sujeito (como as potecircncias sensitivas das quais trataremos logo

250

TOMAacuteS DE AQUINO 2003a p 23 251

Id 2003b p 91-92 252

Id 2012 Q XII p 257 e 259 253

Diferente da negaccedilatildeo que independe do sujeito relacionado Id 2003a p 24 254

Ibid p 22-23 255

Ibid p 26-27 256

Id 2012 Q XIV p 291

70

adiante em relaccedilatildeo aos respectivos oacutergatildeos dos sentidos)257 ou por seu contraacuterio

(como o frio pelo quente)258

A corrupccedilatildeo ou movimento do ser para o natildeo ser259 bem como seu contraacuterio

a geraccedilatildeo ou movimento do natildeo ser para o ser podem ser simples ou seja estar

presentes no gecircnero da substacircncia ou acidentais ou seja que se passam em todos

os demais gecircneros260

A geraccedilatildeo tem por ponto de partida a mateacuteria e por porto de chegada a

forma261 No entanto nenhum dos princiacutepios tem por si o poder de gerar ou seja

nenhum ente tem por si o poder de passar da potecircncia ao ato sendo portanto

necessaacuterio como princiacutepio ativo um agente extriacutenseco como se disse

anteriormente a causa eficiente ou agente que daacute origem ao movimento sendo

assim tambeacutem chamada causa motora 262263

53 AS QUATRO CAUSAS E AS CATEGORIAS

Aristoacuteteles classifica as causas em quatro tipos ou espeacutecies que satildeo causas

por si e aos quais todos os demais tipos de causa que o satildeo por acidente por isso

mesmo se reduzem264 Diz ele ainda que as causas satildeo princiacutepios e Tomaacutes de

Aquino explica que isto se daacute em sujeito mas natildeo em significado onde diferem pois

princiacutepio ldquoimplica uma ordem ou uma sequecircnciardquo enquanto causa implica ldquoalguma

influecircncia no ser da coisa causadardquo265 Dos quatro tipos haacute dois que satildeo

considerados ab intrinseco ou intriacutensecos266 pois estatildeo relacionados agrave constituiccedilatildeo

essencial do ente sendo essas causas respectivamente a mateacuteria da qual as coisas

satildeo feitas e o modelo ou a forma substancial que a atualiza que diz o Estagirita eacute

257

TOMAacuteS DE AQUINO Q XIX p 395 258

Ibid Q XIX p 385 259

Id 1949 Q 2 R p 37 260

Id 2003a p 21-22 261

Ibid p 27 262

Quanto ao movimento o aristotelismo-tomismo qualifica-o como progressivo e distingue quatro espeacutecies o movimento segundo o lugar o movimento de crescimento e o de reduccedilatildeo e o movimento de alteraccedilatildeo A geraccedilatildeo e a corrupccedilatildeo assim natildeo satildeo consideradas propriamente como espeacutecies de movimento mas transformaccedilotildees instantacircneas (cf TOMAacuteS DE AQUINO 2000 L I l 6 75)

263 Id 2003a p 28

264 ARISTOacuteTELES 1995a L II 194b p 140-142 Id 2005 L V 1013a-1013b p 189-191

TOMAacuteS DE AQUINO 2003a p 31 265

ldquo[] implies an order or sequence []rdquo ldquo[] implies some influence on the being of the thing causedrdquo Id 1964b L V l 1 751

266 Id 2003a p 31

71

ldquoa definiccedilatildeo da essecircncia e seus gecircnerosrdquo267 jaacute descritas anteriormente e aqui

denominadas causa material e causa formal respectivamente

O terceiro tipo eacute a causa eficiente citada anteriormente pela qual a origem do

movimento se daacute de modo ab extrinseco ldquoo princiacutepio primeiro de onde proveacutem a

mudanccedila ou o repouso e o que faz mudar algo em relaccedilatildeo ao mudadordquo268 Eacute a

potecircncia motora como causa eficiente que determina a mateacuteria por si mesma que

em princiacutepio pode-se relacionar indiferentemente com qualquer forma a formas

especiais de modo que um agente natural distinto imprimiraacute uma uacutenica forma em

mateacuteria especiacutefica perfeccionada por uma forma mais universal e os acidentes

desta tornando a mateacuteria como diz o Aquinate ldquoproacutepria para a perfeiccedilatildeo

subsequenterdquo269

Quanto ao quarto eacute a causa final que com a anterior representa o segundo

tipo de causas extriacutensecas mas que ao contraacuterio dela eacute natildeo a origem mas o fim do

movimento aquilo para o qual ele tende naturalmente pois o que quer que aja o faz

tendendo a um fim que pode ser segundo Tomaacutes de Aquino de dois tipos o da

geraccedilatildeo ou o do gerado270 Explica ele entatildeo que o fim seria a ldquocausa das causasrdquo

jaacute que eacute causa da causalidade eficiente por ser a razatildeo pela qual esta age e eacute o

que faz com que a forma e a mateacuteria sejam respectivamente forma e mateacuteria e com

que estas interajam com aquela aperfeiccediloando esta mediante o fim271 Das quatro

causas somente a causa material eacute potecircncia enquanto que as demais satildeo ato

sendo que a formal pode ser uma soacute coisa com a final mas nunca com a eficiente

ainda que diferente da material seja da mesma espeacutecie272

Os quatro gecircneros de causa como se disse abarcam todas as espeacutecies de

causas como a causa proacutexima ou posterior referente ao que eacute mais particular e a

causa remota ou anterior referente ao que eacute mais universal ou como a causa por

si a de um objeto enquanto tal e a causa por acidente referente a algo que

acontece agrave anterior ou ainda a causa simples que eacute causa soacute por si ou soacute por

acidente ou eacute causa uacutenica ou a causa composta que pode ser a junccedilatildeo de duas

causas simples no primeiro caso ou quando haacute mais de um sujeito como causa ou

267

ldquo[] la definicioacuten de la esencia y sus geacuteneros []rdquo ARISTOacuteTELES 1995a L II 194b p 141

268 ldquo[] el principio primero de donde proviene el cambio O el reposo [] y lo que hace

cambiar algo respecto de lo cambiado []rdquo Ibid L II 194b p 142 269

ldquo[] propria ad subsequentem perfectionemrdquo Id 1949 Q 3 R 20 p 64-65 270

Id 2003a p 39 271

Ibid p 36 272

Ibid p 39-40

72

causa em ato que produz seu efeito em ato ou causa em potecircncia que natildeo produz

efeito mas pode vir a produzi-lo ou causa universal ou causa singular que se

distinguem em relaccedilatildeo agrave natureza do efeito etc273

O Estagirita tambeacutem reduz a seis essas causas segundo seu modo de ser

que diz podem ser entendidas no sentido de ato ou de potecircncia Seriam elas

causas ldquo(1) como particular ou (2) como gecircnero ou (3) como acidente ou (4) como

gecircnero do acidente ou (5) como combinadas umas e outras ou (6) como tomadas

cada uma por si []rdquo274

As causas particulares observa Tomaacutes de Aquino atuam pelo poder das

universais275

Ele explica tambeacutem que a perfeiccedilatildeo de um efeito eacute diretamente proporcional

ao grau de semelhanccedila com a sua causa276 que estaraacute sempre presente de alguma

forma nele que por sua vez jamais seraacute mais simples do que ela277 O efeito

tambeacutem estaraacute em sua causa diz o Aquinate ldquode modo mais elevado segundo o

poder da causardquo278

As quatro causas assim estatildeo presente em cada uma das chamadas

categorias

Quanto a essas categorias ou predicamentos o Estagirita as elenca em dez

a saber a substacircncia a quantidade a qualidade a relaccedilatildeo o lugar o tempo a

posiccedilatildeo a posse (habitum) a accedilatildeo e a afecccedilatildeo (paixatildeo)279

A substacircncia da qual se falou anteriormente eacute a uacutenica que apresenta caraacuteter

essencial enquanto as demais possuem caraacuteter acidental

A quantidade pode ser discreta ou seja quando natildeo haacute limite comum que

estabeleccedila contato entre as partes (como o nuacutemero e o discurso) ou contiacutenua (como

a superfiacutecie de um corpo soacutelido e o tempo)280

A relaccedilatildeo estabelece-se quando uma coisa a relativa com mais ou menos

intensidade depende de outra a correlativa ndash que lhe eacute de algum modo simultacircnea

e que lhe pode ser contraacuteria ou natildeo ndash ou quando se refere de algum modo a esta281

273

TOMAacuteS DE AQUINO 2003a p 41-43 274

ARISTOacuteTELES 2005 L V 1014a p 195 275

TOMAacuteS DE AQUINO 2006 p 101 276

Ibid p 133 277

Ibid p 125 278

Ibid p 145 279

ARISTOacuteTELES 1965 p 20 280

Ibid p 75 281

Ibid p 98-100 e 103

73

De todas as categorias ela eacute a uacutenica que natildeo coloca algo na natureza das coisas

senatildeo na esfera loacutegica ndash jaacute que as demais designam um algo enquanto ela designa

um ldquoem relaccedilatildeo a algordquo ndash o que pode ocorrer ldquoquando alguma coisa eacute posta em

relaccedilatildeo consigo mesmardquo (como a identidade) ldquoquando a proacutepria relaccedilatildeo eacute posta em

relaccedilatildeo com alguma coisardquo diretamente (como a paternidade) ldquoquando um dos

termos da relaccedilatildeo depende do outro e natildeo vice-versardquo (como a do conhecimento

com o objeto na dependecircncia do conhecimento em relaccedilatildeo aos objetos por

conhecer-se) quando ldquoo ser eacute comparado com o natildeo serrdquo (como quando um sujeito

diz que eacute antes dos que seratildeo depois dele)282

A qualidade eacute o acidente determinativo da substacircncia em si mesma

Aristoacuteteles define-a como aquilo ldquoem virtude do qual se diz que alguma coisa eacute talrdquo

A qualidade pode ter contraacuterios eacute susceptiacutevel tanto de mais e de menos como de

aumento e diminuiccedilatildeo e pode ser semelhante ou dissemelhante em relaccedilatildeo agrave outra

qualidade O Estagirita aponta alguns dos muitos gecircneros de qualidades Um eacute

aquele que eacute como haacutebito (as ciecircncias e as virtudes) e disposiccedilatildeo ndash que pode ser

ldquofacilmenterdquo movida e ldquorapidamenterdquo mudada (como o frio o calor o saudaacutevel o

enfermo etc) ndash sendo aquele mais estaacutevel e duraacutevel e sempre ao mesmo tempo

esta jaacute que possuir haacutebitos ldquoeacute tambeacutem encontrar-se numa certa disposiccedilatildeordquo283

Outro eacute aquele que satildeo determinaccedilotildees afirmadas por aptidotildees ou inaptidotildees

naturais (como os que tecircm aptidatildeo natural para realizar bem certo exerciacutecio ou para

suportar algo que lhe aconteccedila etc) Haacute tambeacutem o que estaacute relacionado agraves

afecccedilotildees e agraves qualidades afetivas como o frio a brancura a doccedilura etc que satildeo

qualidades que produzem modificaccedilatildeo nas sensaccedilotildees ou resultam de modificaccedilotildees

E o Estagirita cita mais um em seus escritos sobre as categorias que respeita agrave

figura e agrave forma acidental284

Em relaccedilatildeo agrave accedilatildeo e agrave afecccedilatildeo tambeacutem admitem contraacuterios e nelas tambeacutem

haacute susceptibilidade de mais e de menos285 Quanto agrave afecccedilatildeo ou paixatildeo pode ser

vista de dois modos como o simples ato de receber como o sentido recebe o

sensiacutevel ou quando algo da substacircncia do que padece ou paciente eacute eliminado

como ocorre com a madeira ao fogo286

282

TOMAacuteS DE AQUINO 1988 art V p 67-68 283

ARISTOacuteTELES 1965 p 124-126 284

Ibid p 126-127 e 129 285

Ibid p 141 286

TOMAacuteS DE AQUINO 2012 Q XXI p 423

74

Jaacute a posse ou haacutebito Aristoacuteteles define como ldquocerta atividade proacutepria do que

possui e do que eacute possuiacutedo como uma accedilatildeo ou um movimentordquo287 como algueacutem

que esteja calccedilado ou armado288 ou ldquo[] a disposiccedilatildeo em virtude da qual a coisa

disposta eacute disposta bem ou mal seja por si seja em relaccedilatildeo a outra []rdquo ou o que

participa dessa disposiccedilatildeo289

Por fim o tempo diz respeito exatamente a quando ou seja se ontem ou

hoje ou amanhatilde etc o local diz respeito a onde ou seja se nesta cidade se em

determinado recinto etc e a posiccedilatildeo diz respeito ao modo como o sujeito se situa

no tempo e no espaccedilo ou seja se de peacute ou sentado ou deitado etc290

54 A ALMA SUAS POTEcircNCIAS E A GRADACcedilAtildeO ENTITATIVA

Diz Tomaacutes de Aquino

Quanto mais perfeita uma forma eacute mais ela extrapassa a mateacuteria corpoacuterea Isto se torna claro desde a induccedilatildeo em que se consideram as vaacuterias ordens de formas A forma de um elemento natildeo tem mais operaccedilotildees que a que as realiza mediante as qualidades ativas e passivas que satildeo disposiccedilotildees da mateacuteria corpoacuterea A forma do corpo mineral tem uma operaccedilatildeo que supera as qualidades ativas e passivas [] a alma vegetal tem uma operaccedilatildeo com a qual as qualidades ativas e passivas orgacircnicas certamente contribuem mas para aleacutem da potecircncia de tais qualidades ela mesma alcanccedila um efeito proacuteprio como nutrir e fazer crescer ateacute um limite definido e realizar coisas semelhantes A alma sensitiva tem aleacutem disso uma operaccedilatildeo para a qual soacute chegam as qualidades ativas e passivas na medida em que satildeo necessaacuterias para a composiccedilatildeo do oacutegatildeo que se emprega no exerciacutecio desta operaccedilatildeo como ver ouvir apetecer etc

291

Nos entes viventes ou animados a forma substancial recebe a denominaccedilatildeo

de ldquoalmardquo (do latim anima) que pode ser conhecida por suas potecircncias natildeo sendo

287

ARISTOacuteTELES 2005 L V 1022b p 245 288

Id 1965 p 20 289

Id 2005 L V 1022b p 247 290

Id 1965 p 20 291

ldquo[] quod quanto aliqua forma est perfectior tanto magis supergreditur materiam corporalem quod patet inducenti in diversis formarum ordinibus Forma enim elementi non habet aliquam operationem nisi quae fit per qualitates activas et passivas quae sunt dispositiones materiae corporalis Forma autem corporis mineralis habet aliquam operationem excedentem qualitates activas et passivas [] Ulterius autem anima vegetabilis habet operationem cui quidem deserviunt qualitates activae et passivae organicae sed tamen supra posse huiusmodi qualitatum ipsa effectum proprium sortitur nutriendo et augendo usque ad determinatum terminum et alia huiusmodi complendo Anima autem sensitiva ulterius habet operationem ad quam nullo modo se extendunt qualitates activae et passivae nisi quatenus exiguntur ad compositionem organi per quod talis operatio exercetur ut videre audire apetere et huiusmodirdquo TOMAacuteS DE AQUINO 1949 Q 2 R p 35-36

75

estas nem partes suas essenciais ou integrais mas potenciais292 Partes diga-se

que satildeo separaacuteveis apenas conceptualmente e natildeo segundo o lugar (ldquosegundo a

substacircncia da alma ou localmenterdquo)293 Aristoacuteteles define a alma como o princiacutepio da

vida e como o ato primeiro de um corpo natural organizado294 que eacute ldquoenteleacutequiardquo

ou ato perfeiccedilatildeo295 e Santo Tomaacutes complementa ldquodotado de potecircncia para a

vidardquo296 e faacute-lo tambeacutem como ldquoa forma substancial de um corpo natural organizadordquo

ldquoem sentido universal [] uma substacircncia segundo a forma isto eacute a quididade de

cada corpordquo297

E a todo o corpo que dela eacute dotado ela vivifica estando presente e atuando

em todas as suas partes cada uma com potecircncias especiacuteficas inerentes ao

composto ou sinolo como ato seu por inteiro e tambeacutem de cada uma de suas

partes em ordem agrave integralidade do mesmo corpo as quais algumas satildeo

perfeccionadas com maior preferecircncia e perfeiccedilatildeo e outras com menos298 A alma

confere naturalmente o ser que dos viventes eacute o viver299 e a espeacutecie constituindo

no corpo sua diversidade de partes ndash mebros oacutergatildeos etc ndash em conformidade com

as distintas operaccedilotildees que tornam necessaacuteria a constituiccedilatildeo do corpo por partes a

elas correspondentes caracterizando um corpo organizado em que eacute em funccedilatildeo do

todo que essas mesmas partes existem Disto se infere que na constituiccedilatildeo dos

entes animados a propriedade teleoloacutegica eacute mais visiacutevel que na dos inanimados300

O aristotelismo-tomismo faz distinccedilatildeo entre movimento e operaccedilatildeo O

Aquinate define o primeiro como ldquoo ato de um ente imperfeitordquo e o segundo como ldquoo

ato de um ente perfeitordquo301 Explica tambeacutem que a alma move tanto a si mesma

como eacute movida por acidente ou seja quando eacute movida pelo corpo em que estaacute302 e

eacute movida ldquopelos sensiacuteveis na sensaccedilatildeo e pelos bens desejados na afecccedilatildeordquo303

292

TOMAacuteS DE AQUINO 2012 Q XIX p 389 293

Id 2009 p 53 294

ARISTOacuteTELES 2010 II 1 p 61-62 295

REALE ANTISERI 2003 p 212 296

ldquo[] doteacute em puissance de la vierdquo TOMAacuteS DE AQUINO 2000 II l 1 233 297

Id 2009 p 47 298

Id 1949 Q 4 SC II e IV p 71 Ibid Q 4 R 3 p 75 e R 8 p 76 299

Ibid Q 1 SC IV p 10 300

Id 2012 Q X p 221 e 225 Id 2000 II l 1 230 301

Respectivamente ldquolacte dun ecirctre imparfaitrdquo e ldquolacte dun ecirctre parfaitrdquo Id 2000 I l 6 111

302 Ibid I l 8 145

303 ldquo[] par les sensibles dans la sensation et par les biens deacutesirables dans lrsquoaffectionrdquo Ibid

I l 6 84

76

sendo ela a causa do movimento e do repouso nos animais304 Assim distingue-se

um ente vivo de um natildeo vivo pelo movimento uma vez que este precisa

necessariamente da accedilatildeo de um princiacutepio exterior para mover-se305

As almas nos viventes distinguem-se segundo o modo como suas operaccedilotildees

superam as respectivas naturezas corpoacutereas que eacute diretamente proporcional ao

domiacutenio que cada alma exerce sobre a mateacuteria corporal e inversamente

proporcional ao grau de imersatildeo nesta Tais operaccedilotildees se datildeo conforme as

potecircncias inerentes agrave alma ndash e diz o Aquinate que se considera vivente tudo o que

possui uma destas operaccedilotildees da alma306 ndash cujos gecircneros segundo o aristotelismo-

tomismo satildeo a vegetativa a sensitiva a intelectiva ou racional (que diferentemente

das duas anteriores que inerem no composto como propriedades naturais ndash e ainda

que tenham o composto como sujeito tecircm a alma como princiacutepio ndash inere

diretamente na alma)307 a apetitiva a locomotora ou motriz e a nutriz308 As trecircs

primeiras determinam as classes dos entes os graus das potecircncias na alma

enquanto que a apetitiva e a nutriz encontram-se nas trecircs classes definidas pelas

trecircs anteriores e a motriz natildeo eacute geralmente encontrada nos entes de classe

vegetativa309

Segundo a inclinaccedilatildeo natural proacutepria ou apetite natural procedente de cada

tipo de forma natural e da qual segue determinada operaccedilatildeo ou determinado

conjunto de operaccedilotildees o aristotelismo-tomismo enquadra cinco dos seis gecircneros

acima excluindo aqui a potecircncia nutriz310 e ainda segundo o grau dos viventes

exclui tambeacutem a apetitiva estabelecendo quatro como o nuacutemero de gecircneros para

esta classificaccedilatildeo311

As potecircncias da alma distinguem-se assim por seus diferentes objetos Isto

porque como explica o Aquinate

[] se os atos satildeo de potecircncias passivas seus objetos satildeo ativos e se os atos satildeo de potecircncias ativas seus objetos satildeo como fins Mas eacute segundo ambos que se considera a espeacutecie da operaccedilatildeo [] e tambeacutem ambos estatildeo

304

TOMAacuteS DE AQUINO 2000 I l 6 89 305

Ibid II l 1 219 306

Id 2009 p 51 307

Id 2012 Q XIX p 389 308

Id 2000 I l 14 201 309

Id 2001 Q 78 a 1 p 713 ARISTOacuteTELES 2010 II passim TOMAacuteS DE AQUINO 2000 II l 3 passim

310 TOMAacuteS DE AQUINO 2000 II l 5 279 286

311 Ibid II l 5 287

77

determinados a fins semelhantes pois o agente age de modo a induzir em outro sua proacutepria semelhanccedila

312

Deste modo conhecer e sentir satildeo operaccedilotildees da alma quanto aos sentidos e

pensar eacute operaccedilatildeo quanto agrave inteligecircncia

Estabelece-se portanto que todo e qualquer ente corpoacutereo enquadra-se em

alguma destas classes que seguem um esquema ascendente segundo o grau de

perfeiccedilatildeo natural a dos corpos sem vida (os elementos e em seguida os mistos) a

vegetativa (as plantas cujo corpo eacute animado com princiacutepio vital) a sensitiva

(potecircncia sensitiva acrescida agrave vegetativa o que caracteriza os animais

propriamente ditos) e a intelectiva (que eacute acrescida agraves anteriores o que caracteriza

o homem) de modo gradativo incluindo os agentes constitutivos de outros entes

(ceacutelulas partiacuteculas atocircmicas etc)

Explica Tomaacutes de Aquino que

[] em cada um dos gecircneros haacute diversas espeacutecies segundo os diversos graus de perfeiccedilatildeo natural No caso dos corpos simples a terra ocupa o grau iacutenfimo e o fogo o mais nobre No caso dos minerais a natureza avanccedila gradualmente atraveacutes de suas diversas espeacutecies ateacute culminar no ouro

Nos minerais que estatildeo mais proacuteximos dos elementos haacute menos harmonia o

que lhes confere maior durabilidade

Jaacute a vegetativa cujo objeto eacute o corpo eacute caracterizada por trecircs operaccedilotildees a

generativa a aumentativa e a nutritiva pelas quais recebe o ser se desenvolve e se

conserva respectivamente

Prossegue Santo Tomaacutes

Tambeacutem nas plantas ateacute culminar nas espeacutecies das aacutervores perfeitas e nos animais ateacute culminar no homem ndash embora alguns animais sejam muito proacuteximos das plantas como os imoacuteveis que soacute possuem tato De modo semelhante certas plantas satildeo muito proacuteximas dos entes inanimados

313

E da mesma forma certos animais exibem caracteriacutesticas muito proacuteximas agraves

de entes vegetais como o caso dos animais cujas partes sobrevivem apoacutes secccedilatildeo

algo que natildeo se daacute de modo algum nos animais ditos ldquosuperioresrdquo314

312

TOMAacuteS DE AQUINO 2012 Q XIV p 269 313

Ibid Q VII p 151 314

O Aquinate assim como Aristoacuteteles atribui isto ao fato de a alma desses animais natildeo ser diversificada em suas partes e acrescenta que cada ldquoparte reteacutem a disposiccedilatildeo mediante a qual o

78

O princiacutepio sensitivo nos vegetais eacute a proacutepria alma ao passo que nos animais

e nos humanos ele eacute parte da alma315 Algumas operaccedilotildees da alma se datildeo no todo

e estas se atualizam em qualquer uma das partes outras em locais especiacuteficos316

Quanto mais perfeita eacute a forma quanto maior sua virtude mais operaccedilotildees e em

maior diversidade natildeo soacute destas como tambeacutem de partes diferenciadas ela teraacute

do que se infere que enquanto as formas inferiores perfeccionam uniformemente a

alma natildeo o faz O homem assim eacute o ente com maior nuacutemero de operaccedilotildees e de

partes diferenciadas317

Eacute segundo a operaccedilatildeo e o movimento que o corpo se une agrave alma por suas

partes superiores318 O corpo eacute movido voluntariamente pela alma atraveacutes do apetite

e da apreensatildeo No homem ambos os movimentos se datildeo pela parte intelectiva e

pela parte sensitiva sendo que aquela move o corpo mediante o que pertence a

esta uma vez que o movimento eacute do singular319

Explica o Aquinate ldquoa alma daacute ao animal natildeo soacute o que eacute proacuteprio dele mas

tambeacutem o que pertence agraves formas inferioresrdquo e sendo assim do mesmo modo que

ldquoas formas inferiores satildeo princiacutepios de movimento natural nos corpos naturais assim

eacute a alma no corpo animalrdquo

Divide ele entatildeo as operaccedilotildees da alma em ldquoanimaisrdquo a saber as que

ldquoprocedem da alma segundo o que lhes eacute proacutepriordquo e ldquonaturaisrdquo que satildeo as que

ldquoprocedem da alma na medida em que ela produz o efeito das formas naturais

inferioresrdquo Assim em geral uma parte de cada animal eacute motora e outra parte eacute

movida e ldquoo corpo natural organizado estaacute para a alma como a mateacuteria estaacute para a

formardquo o que se daacute ldquoa partir da proacutepria almardquo320

Nos corpos naturais assim o que determina a quantidade o que confere os

limites de crescimento como o de tamanho e o de largura de cada indiviacuteduo de

corpo inteiro eacute perfectiacutevel pela almardquo e assim ldquopermanece nele a almardquo (TOMAacuteS DE AQUINO 2012 Q X p 225 e nota 247 p 451-452 cf Aristoacuteteles 2010 I 5 p 58) pois a mesma alma eacute uma em ato mas muacuteltipla em potecircncia (cf TOMAacuteS DE AQUINO 2000 II l 4 264) Isto se manteacutem em consonacircncia com o que se sabe hoje por exemplo a respeito da importacircncia da presenccedila do cutelo para o sustento da vida na parte seccionada de aneliacutedeos No caso das plantas diz Aristoacuteteles que algumas sobrevivem apoacutes a secccedilatildeo em razatildeo de a alma em cada indiviacuteduo ser uma em ato mas vaacuterias em potecircncia (cf ARISTOacuteTELES 2010 II 2 p 65-66)

315 TOMAacuteS DE AQUINO 2000 II l 4 262

316 Id 2009 p 51

317 Id 2000 I l 14 208 Id 1949 Q 4 R p 72-73

318 Se estiverem presentes as devidas disposiccedilotildees na mateacuteria

319 O intelecto apreende os universais e soacute pode assim mover mediante o particular que eacute

referente agrave natureza do sentido (cf TOMAacuteS DE AQUINO 2012 Q IX p 201) 320

TOMAacuteS DE AQUINO 2012 Q IX p 203

79

determinada espeacutecie para menos e para mais eacute menos a mateacuteria do que a forma

visto que a proporccedilatildeo e o fim de uma accedilatildeo no caso o crescimento satildeo impostos

pelo princiacutepio da operaccedilatildeo relacionada321

E no que concerne agraves operaccedilotildees o modo de agir na alma eacute fruto da accedilatildeo de

um ente vivo ou seja que move a si mesmo e por essa razatildeo a accedilatildeo da alma

supera a da natureza o que natildeo se daacute poreacutem necessariamente em relaccedilatildeo ao que

eacute agido Nos corpos animados e nos inanimados haacute o ser natural e o que para este eacute

requerido mas os inanimados necessitam para isto de um agente extriacutenseco

enquanto os animados requerem um agente intriacutenseco o que eacute exemplificado pelas

operaccedilotildees agraves quais estatildeo ordenadas as potecircncias supramencionadas da alma

vegetativa e incluam-se aqui tantos movimentos involuntaacuterios322 que satildeo pois

virtudes naturais

Seguindo uma ordem a primeira potecircncia da alma vegetativa eacute a virtude

nutritiva que se ordena agrave conservaccedilatildeo do ser e da espeacutecie pela transformaccedilatildeo e

pelo acreacutescimo de algo o alimento na substacircncia do crescimento e da geraccedilatildeo E eacute

a virtude aumentativa o crescimento a segunda na ordem pois dela o ente passa

em quantidade e virtude para uma perfeiccedilatildeo maior de quantidade devida de onde

entatildeo pode expressar a terceira potecircncia a gerativa que se ordena a que o

indiviacuteduo seja posto no serrdquo E se os entes inanimados recebem aleacutem da espeacutecie

sua quantidade devida sendo engendrados extrinsecamente os entes animados

satildeo comumente gerados de uma semente Assim a potecircncia gerativa manifesta-se

mediante a aumentativa e tanto a potecircncia gerativa quanto a aumentativa soacute se datildeo

em razatildeo da virtude nutritiva323

Prossegue Santo Tomaacutes

Existem ademais outras operaccedilotildees mais elevadas da alma que transcendem as operaccedilotildees dos corpos naturais tambeacutem quanto ao agido na medida em que eacute inato agrave alma que nela se encontre segundo o ser imaterial tudo o que existe pois a alma eacute em certa medida todas as coisas na medida em que eacute sensitiva e intelectiva Logo eacute necessaacuterio que existam diversos graus deste mencionado ser imaterial E um destes graus eacute aquele segundo o qual as coisas se encontram na alma sem sua mateacuteria proacutepria mas segundo sua singularidade e as condiccedilotildees individuais derivadas da mateacuteria E este eacute o niacutevel do sentido que eacute receptivo das espeacutecies individuais sem mateacuteria mas receptivo em um

321

TOMAacuteS DE AQUINO 2000 II l 8 332 322

Como os processos da digestatildeo e da respiraccedilatildeo os batimentos cardiacuteacos etc 323

TOMAacuteS DE AQUINO 2012 Q XIII p 271 e 283 Id 2000 II l 7 312 Ibid II l 9 340 344 e 347

80

oacutergatildeo corporal O outro grau de imaterialidade mais alto e mais perfeito eacute o do intelecto que recebe espeacutecies completamente abstraiacutedas da mateacuteria e das condiccedilotildees materiais e sem um oacutergatildeo corporal E assim como por sua forma natural a coisa possui uma inclinaccedilatildeo para algo e se move ou age para conseguir aquilo para o qual se inclina assim tambeacutem se deve a uma forma sensiacutevel ou inteligiacutevel a inclinaccedilatildeo para a coisa apreendida pelo sentido ou pelo intelecto inclinaccedilatildeo essa que pertence agrave potecircncia apetitiva Ademais eacute necessaacuterio que consequentemente exista um movimento pelo qual se alcance a coisa desejada e este pertence agrave potecircncia motriz

324

A potecircncia apetitiva segue-se agrave apreensatildeo realizada pelos sentidos e divide-

se em trecircs a potecircncia desiderativa ou vontade cuja operaccedilatildeo eacute o desejar que eacute o

apetite de natureza intelectual racional a potecircncia concupisciacutevel cuja operaccedilatildeo eacute o

desejar relacionado ao que eacute apeteciacutevel ou deleitaacutevel e conveniente aos sentidos e

a potecircncia irasciacutevel ou coacutelera relacionada a algo do que adveacutem o poder de

desfrutar agrave vontade o que eacute deleitaacutevel ao sentido como ocorre na conquista apoacutes

uma luta por algo325 Estas duas uacuteltimas pertencem agrave parte sensiacutevel e irracional e

assim o apetite irasciacutevel eacute como se fosse um defensor do concupisciacutevel As afecccedilotildees

daquele tem iniacutecio e fim nas afecccedilotildees deste326 e os atos de ambos satildeo realizados

com passividade327

Enquanto que ao apetite concupisciacutevel pertence o amor do bem ao apetite

irasciacutevel pertencem o oacutedio e o medo do mal e a esperanccedila do bem328

A virtude motriz por sua vez varia conforme a diversidade dos movimentos

ou as diferentes partes de um animal que possuem movimentos proacuteprios e

enquadra-se no princiacutepio de que ldquotudo o que se move eacute movido por outro se

dizemos que algo se move por si proacuteprio isto natildeo ocorre segundo ele mesmo mas

segundo suas diversas partes de modo que uma parte dele eacute motora e a outra

movidardquo329

Nas operaccedilotildees da alma explica o Aquinate330 o movimento encontra-se de

trecircs modos a saber ldquopropriamenterdquo que eacute o que se daacute no movimento de

crescimento como operaccedilatildeo da alma vegetativa e com o apetite sensiacutevel

relacionado ao movimento local e agrave alteraccedilatildeo como a dos humores ldquomenos

propriamenterdquo exemplificado na captaccedilatildeo dos sensiacuteveis como se daacute com a visatildeo

324

TOMAacuteS DE AQUINO 2012 Q XIII p 271 e 273 325

Ibid Q XIII p 277 326

Id 2000 I l 14 202 Ibid II l 5 288 Ibid III l 14 802 327

Id 1990b L II c LX p 274 328

Id 2000 III l 14 806 329

Id 2006 p 19 330

Id 2000 I l 10 157-160

81

em que um corpo eacute objeto da virtude visual mas dele soacute eacute captada a natureza dita

espiritual ou seja a luz que informa a cor e ldquomuito pouco propriamenterdquo como o eacute o

movimento na inteligecircncia que se daacute somente metaforicamente ou seja a operaccedilatildeo

ali eacute ato de um ente perfeito enquanto o movimento eacute sempre caracterizado por ser

ato de um ente imperfeito

A alma ou forma substancial racional ou intelectiva por fim faz com que por

meio dela sejamos simultaneamente homens animais viventes corpos substacircncias

e entes331 Eacute primeiramente segundo a razatildeo de forma universal e entatildeo segundo a

razatildeo de forma especial que a mateacuteria se perfecciona de modo que o intelecto

primeiro identifica o ente depois ser vivo em seguida o ser animal e entatildeo o ser

homem identificando tambeacutem seus acidentes proacuteprios que neste sentido se diz

que acompanham o gecircnero e a espeacutecie ao qual pertencem332

A potecircncia intelectiva que seraacute exposta apoacutes a explanaccedilatildeo sobre os sentidos

possui relaccedilotildees com a sensitiva e com a vegetativa que podem ser analisada sob

duas perspectivas o que Tomaacutes de Aquino explica com uma analogia

[] o intelecto difere das outras partes da alma pelo sujeito [] A faculdade vegetativa e a sensitiva estatildeo na faculdade intelectiva como o triacircngulo e o quadrilaacutetero no pentaacutegono Aleacutem do mais o quadrilaacutetero eacute uma figura absolutamente distinta do triacircngulo pela espeacutecie mas natildeo do triacircngulo que conteacutem em potecircncia como o nuacutemero quaternaacuterio tambeacutem natildeo se distingue do ternaacuterio que faz parte dele mas do ternaacuterio que existe separado E se acontecesse que diversas figuras fossem produzidas por diversos agentes o triacircngulo que existe separadamente do quadrilaacutetero teria uma causa produtora diferente da do quadrilaacutetero como tem tambeacutem uma outra espeacutecie mas o triacircngulo que estivesse contido no quadrilaacutetero teria a mesma causa produtora Assim tambeacutem por conseguinte a faculdade vegetativa que tem uma existecircncia agrave parte da sensitiva eacute uma outra espeacutecie de alma e tem uma outra causa produtora contudo eacute a mesma causa que produz a faculdade sensitiva e a faculdade vegetativa que estaacute contida na sensitiva

333

55 OS SENTIDOS

As potecircncias sensitivas tecircm pois como princiacutepio a alma de onde provecircm e

existem no composto tendo-o por sujeito Assim o que sente vecirc e ouve ou seja

aquilo pelo qual eacute manifesta a accedilatildeo dos sentidos eacute o composto em virtude da

331

TOMAacuteS DE AQUINO 1949 Q 3 R p 52 332

Ibid Q 3 R17 p 63-64 333

Id 2009 p 87-89

82

alma334 de modo que tanto as operaccedilotildees da alma sensitiva como as da vegetativa

satildeo movimentos natildeo da alma mas do composto335

E para o termo ldquosentidordquo Tomaacutes de Aquino atribui duas acepccedilotildees a saber

natildeo soacute a potecircncia sensitiva propriedade natural consequente agrave espeacutecie como

tambeacutem a proacutepria alma sensitiva336 A faculdade perceptiva existe somente em

potecircncia ou seja a alma sensiacutevel natildeo eacute os sensiacuteveis em ato337 mas em potecircncia

razatildeo pela qual o ato da percepccedilatildeo natildeo eacute contiacutenuo nos sentidos338

E partindo do princiacutepio de que diz o Aquinate ldquotudo o que eacute recebido

determina-se no recipiente segundo o modo do proacuteprio recipienterdquo339 tanto a

percepccedilatildeo da realidade sensiacutevel presente como a da ausente satildeo fundamentais

para que esses entes dotados com potecircncia sensitiva possam-se mover em busca

dos recursos externos que lhes satildeo vitais340 Assim eles natildeo soacute recebem como

tambeacutem conservam as espeacutecies dos objetos sensiacuteveis que alteram seus sentidos A

partir dessa conservaccedilatildeo eacute possiacutevel perceber as intenccedilotildees como a ameaccedila de um

predador a serventia de um objeto para determinado fim etc

Muszalski explica em relaccedilatildeo ao termo ldquointenccedilatildeordquo que

Apesar de que para Santo Tomaacutes pode-se usar o termo intentio em diversos sentidos fica claro que implica fundamentalmente uma relaccedilatildeo de uma coisa com outra utilizando-se sobretudo no acircmbito da apetecircncia Com efeito designa propriamente a tendecircncia a um fim e a faculdade que eacute diretiva para um fim eacute principalmente a vontade No entanto como as potecircncias cognoscitivas do vivente tendem ao conhecimento de uma coisa como se fosse seu fim pode-se aplicar o termo intentio analogamente agrave ordem do cognoscitivo de modo que natildeo soacute a vontade como tambeacutem a inteligecircncia e os sentidos possuem uma intencionalidade Mas com isto simplesmente se estaacute caracterizando o ato proacuteprio da faculdade de conhecimento

341

334

TOMAacuteS DE AQUINO 2012 Q XIX p 387-389 335

Id 2000 I l 10 161 336

Id 2012 Q XX p 389-391 337

No sentido de que o que eacute afetado adquire certa semelhanccedila em relaccedilatildeo ao agente da afecccedilatildeo Id 2000 II l 10 357 365 366

338 ARISTOacuteTELES 2010 II 5 p 75 TOMAacuteS DE AQUINO 2000 II l 10 354

339 TOMAacuteS DE AQUINO 2012 Q XX p 411

340 Que eacute acidental no homem e nos animais e natildeo substancial atributo este da alma

sensiacutevel (cf TOMAacuteS DE AQUINO 2012 Q XI p 243) 341

ldquoApesar de que para Santo Tomaacutes el teacutermino lsquointentiorsquo puede usarse en diversos sentidos resulta claro que implica fundamentalmente una relacioacuten de una cosa con otra utilizaacutendose sobre todo en el aacutembito de la apeticioacuten En efecto designa propiamente la tendencia a un fin y la facultad que es directiva hacia un fin es principalmente la voluntad Sin embargo como las potencias cognoscitivas del viviente tienden al conocimiento de una cosa como si fuera su fin el teacutermino intentio se puede aplicar anaacutelogamente al orden de lo cognoscitivo de modo que no soacutelo la voluntad sino tambieacuten la inteligencia y los sentidos poseen una intencionalidad Pero con esto simplemente se estaacute caracterizando el acto propio de la facultad de conocimientordquo MUSZALSKI 2014 p 87-88

83

E esta tem iniacutecio com a apreensatildeo dos sensiacuteveis O aristotelismo-tomismo

descreve os princiacutepios daqueles sentidos que realizam essa apreensatildeo e tambeacutem

de outros sentidos que por assim dizer processaratildeo o objeto captado por essa

apreensatildeo A estes chama ldquosentidos internosrdquo e agravequeles ldquosentidos externosrdquo

551 Sentidos externos

Diz Tomaacutes de Aquino que ldquoa alma eacute princiacutepio da sensaccedilatildeo natildeo como aquele

que sente mas como aquilo pelo qual o sentinte senterdquo342

A estimativa e a cogitativa das quais se trataraacute adiante mais a intelecccedilatildeo

tecircm como se disse iniacutecio com o exerciacutecio da funccedilatildeo dos sentidos externos Estes

se caracterizam por sua materialidade Exercem a captaccedilatildeo de formas sensiacuteveis

que satildeo invariavelmente acidentes jamais essecircncias ou seja sem a mateacuteria do

objeto que as imprime por meio de sua mateacuteria de receptores neurais nas

superfiacutecies deacutermicas em conformidade com a disposiccedilatildeo do respectivo oacutergatildeo

responsaacutevel No acircmbito aristoteacutelico-tomista isto se daacute natildeo como accedilatildeo de um

contraacuterio sobre seu correspondente resultando em transformaccedilatildeo ou alteraccedilatildeo mas

reduzindo o sentido da potecircncia ao ato por sua espeacutecie tratando-se de uma

operaccedilatildeo tal como se daacute com o conceber e o querer343 Por exemplo os olhos

captaratildeo a luz que estaraacute a refletir as cores e o formato (sensiacuteveis) de determinado

ente corpoacutereo mas natildeo a essecircncia deste mesmo ente em razatildeo da imaterialidade

de sua forma substancial344 Assim a forma do agente causa uma disposiccedilatildeo por

um lado similar a ele no sentido e por outro natildeo pelo fato de essa disposiccedilatildeo natildeo

ser material como o agente pois no sensiacutevel seu ser eacute natural e no sentido eacute

intencional ou espiritual345

Para Tomaacutes de Aquino o sentido ldquoeacute certa potecircncia passiva submetida por

natureza agrave alteraccedilatildeo proveniente dos objetos sensiacuteveis exterioresrdquo346 pelo que

como se disse entende ldquofaculdade sensitivardquo como aquilo que se sente natildeo em ato

mas em potecircncia347 Essa alteraccedilatildeo tem como requisitos tanto a ausecircncia no oacutergatildeo

342

TOMAacuteS DE AQUINO 2012 Q XIX p 393 343

Id 2000 III l 12 765-766 344

ARISTOacuteTELES 2010 II 12 p 96 TOMAacuteS DE AQUINO 2000 II l 24 551 345

TOMAacuteS DE AQUINO 2000 II l 24 552-553 346

ldquoEl sentido es una cierta potencia pasiva sometida por naturaleza a la alteracioacuten proveniente de los objetos sensibles exterioresrdquo Id 2001 Q 78 a 3 p 716

347 Id 2009 p 63

84

do sentido (salvo no que diz respeito ao tato que percebe os contraacuterios em seu

proacuteprio oacutergatildeo) dos contraacuterios que a ele compete perceber como o fato de o oacutergatildeo

estar em potecircncia para esses contraacuterios348 (e novamente com relaccedilatildeo ao tato eacute

preciso que para isto esteja reduzido a um ponto meacutedio o que faz com que tenha

no homem maior precisatildeo que nos outros animais em razatildeo de sua disposiccedilatildeo para

a alma racional349)350 e ela pode ocorrer de dois modos um fiacutesico e outro espiritual

Sentir portanto eacute uma alteraccedilatildeo que se daacute por afetaccedilatildeo e por moccedilatildeo351

Ademais afirma o Aquinate que ldquoA alteraccedilatildeo fiacutesica daacute-se quando a forma do

que eacute causa da alteraccedilatildeo eacute recebida no objeto alterado segundo seu proacuteprio ser

natural Por exemplo o calor no aquecidordquo E quanto agrave alteraccedilatildeo espiritual ldquodaacute-se

quando a forma do que provoca a alteraccedilatildeo eacute recebida no objeto alterado segundo

seu ser espiritual Por exemplo a forma da cor na pupila a qual natildeo por isso

permanece coloridardquo

O oacutergatildeo recebe pois a espeacutecie natildeo segundo o ser que tem no sensiacutevel e

natildeo em forma fiacutesica mas em forma intencional352 Eis porque a visatildeo eacute o uacutenico

sentido em que ocorre exclusivamente este segundo modo

Nos demais sentidos ocorrem ambos e a alteraccedilatildeo fiacutesica daacute-se por parte do

oacutergatildeo e por parte do objeto Na audiccedilatildeo ocorre por mudanccedila local jaacute que o som eacute

causado por uma percussatildeo e conseguinte vibraccedilatildeo do ar eacute sempre a atividade ldquode

alguma coisa contra alguma coisa e em alguma coisardquo353 Quanto ao olfato eacute

necessaacuteria certa alteraccedilatildeo no corpo para que ocorra a accedilatildeo de cheirar mas em

ambos os oacutergatildeos responsaacuteveis especificamente natildeo apresentam alteraccedilotildees fiacutesicas

salvo acidentalmente

Tomaacutes de Aquino estabelece aqui certa gradaccedilatildeo nos sentidos partindo do

pressuposto de que a visatildeo que eacute exclusivamente ldquoespiritualrdquo estaacute relacionada aos

corpos celestes por sua emissatildeo ou reflexatildeo de luz e que a audiccedilatildeo vem em

seguida sendo esses dois sentidos utilizados para o ensino O odor eacute captado da

substacircncia odorante os objetos da visatildeo e da audiccedilatildeo satildeo captados natildeo

348

ldquoContraacuteriosrdquo em relaccedilatildeo a atributos dos sensiacuteveis como o quente e o frio o aacutespero e o liso etc

349 ARISTOacuteTELES 2010 II 9 p 88

350 TOMAacuteS DE AQUINO 2012 Q VIII p 171

351 Id 2000 II l 10 350

352 Ibid II l 14 418

353 ARISTOacuteTELES 2010 II 8 p 83 TOMAacuteS DE AQUINO 2000 II l 16 441-442

85

diretamente mas por um intermediaacuterio (o ar e a aacutegua) e o paladar existe

intimamente com o tato relacionado aos elementos354

O tato e o paladar ocorrem nos respectivos oacutergatildeos mediante alteraccedilotildees

fiacutesicas locais sendo por isso ambos considerados os sentidos mais materiais355 O

primeiro eacute o mais universal e eis porque diz o Estagirita que eacute primeiramente por

sua causa que um ente eacute identificado como ldquoanimalrdquo356 Pelo fato de nele consistir

principialmente a natureza sensitiva em sua integralidade se for imobilizado

imobilizam-se todos os demais sentidos Os sentidos natildeo cessam somente ldquopelo

excesso dos seus sensiacuteveis proacutepriosrdquo diz o Aquinate mas tambeacutem ldquopelo excesso

dos sensiacuteveis proacuteprios do tatordquo357ndash porque sem ele natildeo pode haver nenhuma outra

sensaccedilatildeo ainda que possa-se dar sem nenhuma outra358 ndash jaacute que a intensidade

elevada da operaccedilatildeo de uma potecircncia tende a impedir a operaccedilatildeo de outra de

algum modo associada359

Assim o sentido pode sofrer corrupccedilatildeo por parte de um sensiacutevel muito

intenso pois o sentido eacute certa proporccedilatildeo que por outro lado obtecircm uma siacutentese

harmoniosa e agradaacutevel quando o sensiacutevel natildeo estaacute mais proacuteximo dos excessos e

ainda mais se se mistura como se observa na muacutesica360 Essa corrupccedilatildeo gera

afliccedilatildeo e pena como a dor em relaccedilatildeo ao tato podendo chegar ao ponto de destruir

a funcionalidade do oacutergatildeo do sentido E sendo o tato o sentido comum a todos os

animais e a base para os demais sentidos eacute o uacutenico em cujo excesso de um

tangiacutevel pode destruir o proacuteprio o animal361

Haveraacute por outro lado deleite como no abrandamento da dor por convir ao

sentido362 e em outras ocasiotildees como aquilo que pode ser proporcionado pelo

toque Da apreensatildeo dos sentidos principalmente o tato seguem o prazer e a dor

e entatildeo a felicidade e a tristeza apoacutes a apreensatildeo interior relacionados agrave

concupiscecircncia Eis o que relaciona o tato ao apetite e que caracteriza os entes

atualizados pela alma com potecircncia sensitiva363

354

TOMAacuteS DE AQUINO 2000 II l 14 417-418 355

ARISTOacuteTELES 2010 II 11 p 94 TOMAacuteS DE AQUINO 2001 Q 78 a 3 p 716 356

ARISTOacuteTELES 2010 II 2 p 65 TOMAacuteS DE AQUINO 2012 Q VIII p 171 357

TOMAacuteS DE AQUINO 2012 Q VIII p 171 358

ARISTOacuteTELES 2010 II 3 p 69 359

TOMAacuteS DE AQUINO 2012 Q XI p 239 360

ARISTOacuteTELES 2010 III 2 p 107 TOMAacuteS DE AQUINO 2000 III l 2 597 Ibidem 2000 III l 17 870

361 ARISTOacuteTELES 2010 III13 p 134

362 TOMAacuteS DE AQUINO 2012 Q XXI p 429-431

363 Id 2000 II l 5 289

86

Os sentidos externos captam seus sensiacuteveis proacuteprios (cor som etc) aos

quais cada sentido relacionado responderaacute conforme sua natureza e os sensiacuteveis

comuns que satildeo ldquoalgo intermediaacuterio entre as realidades sensiacuteveis percebidas

acidentalmente e os sensiacuteveis proacutepriosrdquo comum a todos os sentidos e se reduzem

agrave quantidade cujas espeacutecies satildeo a dimensatildeo e o nuacutemero (quantidade)364 Cada

oacutergatildeo sensorial diz o Estagirita ldquodiscrimina as diferenccedilas do sensiacutevel

correspondenterdquo e exemplifica com a discriminaccedilatildeo do branco e do preto pela visatildeo

e do doce e do amargo pelo paladar365

Com relaccedilatildeo aos sensiacuteveis comuns Aristoacuteteles aponta o movimento o

repouso o nuacutemero a unidade a figura e a grandeza366 sendo que os dois uacuteltimos

podem ser percebidos somente pelo tato e pela visatildeo367 A quantidade por sua vez

eacute ldquoo sujeito proacuteximo da qualidade modificante tal como a superfiacutecie em relaccedilatildeo agrave

corrdquo Por isso ldquoos sensiacuteveis comuns natildeo movem os sentidos de forma direta e

natural senatildeo em razatildeo da qualidade sensiacutevelrdquo mas satildeo ldquorealidades sensiacuteveisrdquo

percebidas diretamente ldquojaacute que estabelecem diversidade na alteraccedilatildeo do

sentidordquo368 Ou seja a percepccedilatildeo dos sensiacuteveis comuns pelos sentidos daacute-se com a

percepccedilatildeo dos sensiacuteveis proacuteprios369 mas aqueles satildeo percebidos porque causam

diferenccedila no sentido em razatildeo do movimento a partir do qual se percebe a

grandeza que permite perceber a figura e tambeacutem a quantidade pode ser percebida

quer pelo movimento pela negaccedilatildeo do contiacutenuo quer pelos sensiacuteveis proacuteprios pois

diz o Estagirita ldquocada sensaccedilatildeo percepciona uma uacutenica coisardquo370

Haacute ainda o sensiacutevel por acidente que eacute aquele que natildeo faz diferenccedila no que

toca agrave sua espeacutecie na imutaccedilatildeo do sentido e isto se daacute com um sensiacutevel proacuteprio de

determinado sentido captado por outro371 como quando se percebe o doce com a

visatildeo372

364

TOMAacuteS DE AQUINO 2012 Q VIII p 171 365

ARISTOacuteTELES 2010 III 2 p 107 366

Ibid II 6 p 79 Ibid III p 102 367

TOMAacuteS DE AQUINO 2000 II l 13 386 368

Id 2012 Q VIII p 171 369

Id 2000 II l 13 388 ARISTOacuteTELES 2010 III 1 p 103 370

ARISTOacuteTELES 2010 III 1 p 103 371

TOMAacuteS DE AQUINO 2000 II l 13 393-394 Ibid III l 1 577 ARISTOacuteTELES 2010 III 1 p 103

372 TOMAacuteS DE AQUINO 2000 III l 1 579-580

87

552 Sentidos internos

Diz Tomaacutes de Aquino

[] eacute necessaacuterio que o animal busque certas coisas e fuja de outras natildeo soacute por que lhe sejam convenientes ou prejudiciais ao sentido mas tambeacutem por certas outras conveniecircncias e utilidades ou prejuiacutezos Por exemplo a ovelha vendo o lobo aproximar-se foge natildeo porque a figura ou a cor do lobo lhe seja repulsiva mas porque o que estaacute vindo eacute um inimigo da sua proacutepria natureza O paacutessaro recolhe a palha natildeo para sentir prazer mas porque eacute uacutetil para a contruccedilatildeo de seu ninho Para fazer isso eacute necessaacuterio que o animal possa perceber essas intenccedilotildees que natildeo percebem os sentidos exteriores Ademais eacute preciso que nele exista um princiacutepio proacuteprio para tal percepccedilatildeo jaacute que a percepccedilatildeo do sensiacutevel proveacutem da alteraccedilatildeo do sentido coisa que natildeo ocorre com a percepccedilatildeo das intenccedilotildees

373

Os sensiacuteveis proacuteprios e os comuns satildeo captados pelos sentidos de duas

maneiras por duas potecircncias374 Primariamente pelos sentidos externos

correspondentes de modo exclusivo aos quais cabe julgar os objetos que lhes satildeo

proacuteprios como por exemplo em relaccedilatildeo agrave visatildeo discriminar fazer a distinccedilatildeo entre

as cores ou os objetos compartilhados e acidentais da mesma forma distinguindo

por exemplo o largo e o estreito como se viu

Em segundo lugar a discriminaccedilatildeo entre o doce e o branco natildeo pode ser feita

por um sentido proacuteprio por oacutergatildeos sensoriais distintos e em tempos diferentes375 e

entatildeo esta tarefa eacute desempenhada pelo primeiro dos sentidos internos ndash ou

potecircncias sensitivas interiores ndash aquele que eacute considerado ldquoraiz e princiacutepiordquo e que

tambeacutem eacute fim como um centro dos sentidos externos e das imutaccedilotildees destes376 ndash

dentre os quais o tato como base de todos os sentidos estaacute mais proacuteximo377 ndash ou

seja onde os resultados de todas elas seratildeo percebidos o sentido comum que

apresentaraacute juiacutezo de discernimento discriminaraacute os sensiacuteveis e faraacute a distinccedilatildeo

373

ldquo[] es necesario que el animal busque unas cosas y huya de otras no soacutelo porque le sean convenientes o perjudiciales al sentido sino tambieacuten por otras conveniencias utilidades o perjuicios Ejemplo La oveja al ver venir el lobo huye no porque la figura o el color del lobo sea repulsiva sino porque el que viene es un enemigo de su propia naturaleza El paacutejaro recoge pajas no para tener un placer sino porque son uacutetiles para la construccioacuten de su nido Para hacer eso es necesario que el animal pueda percibir esas intenciones que no percibe el sentido exterior Ademaacutes es preciso que en eacutel exista un principio propio para dicha percepcioacuten ya que la percepcioacuten de lo sensible proviene de la alteracioacuten del sentido cosa que no ocurre con la percepcioacuten de las intencionesrdquo TOMAacuteS DE AQUINO 2001 Q 78 a 4 p 719

374 O termo ldquopotecircnciardquo aqui tem o sentido de ldquoprinciacutepio motorrdquo

375 ARISTOacuteTELES 2010 III 2 p 107-108

376 TOMAacuteS DE AQUINO 2000 III l 3 609 Ibid l 12 773-774 Id 2001 Q 78 a 4 p 720

377 Ibid 2000 III l 3 602

88

entre eles percebendo as intenccedilotildees dos sentidos (como quando algueacutem vecirc que

vecirc)378

O sentido comum tambeacutem faz o juiacutezo e o discernimento finais dos contraacuterios

captados pelos sentidos proacuteprios379 Os sensiacuteveis seratildeo nele unificados em uma

imagem que seraacute retida e conservada e no caso do homem processada por outro

sentido interno a imaginaccedilatildeo ou fantasia que eacute um movimento produzido pela

atualizaccedilatildeo dos sentidos quando estes vecircm a ato pelo movimento dos sensiacuteveis e

que por isso eacute semelhante aos sentidos e aos sensiacuteveis jaacute que diz Tomaacutes de

Aquino380 o efeito produzido pelo agente que eacute a causa eficiente eacute semelhante a

este mesmo

A imaginaccedilatildeo propiciaraacute aos animais a apreensatildeo das coisas sensiacuteveis

tambeacutem quando elas natildeo estiverem fisicamente presentes o que se daacute pela

formaccedilatildeo na mente da ldquoimagemrdquo (ou ldquofantasmardquo) Aristoacuteteles distingue a imaginaccedilatildeo

que natildeo existe sem a percepccedilatildeo sensorial da suposiccedilatildeo que natildeo existe sem aquela

e cujos tipos que satildeo o do entender ele aponta ldquoa ciecircncia a opiniatildeo a sensatez

(que caracterizam o entender corretamente) e os contraacuterios destas (que

caracterizam o entender incorretamente)rdquo e do pensamento A imaginaccedilatildeo depende

da vontade ao passo que a formaccedilatildeo de opiniatildeo natildeo depende exclusivamente da

vontade podendo ser verdadeira ou falsa assim como a imaginaccedilatildeo sendo que

nesta pode-se produzir falsidade com muito mais frequecircncia e isto se daacute no caso da

imaginaccedilatildeo porque o efeito eacute mais fraco do que a causa e quanto mais ele se

distancia do agente que eacute causa eficiente (como quando a imaginaccedilatildeo ocorre na

ausecircncia dos sentidos) menos ele lhe eacute semelhante381 E porque a imaginaccedilatildeo eacute um

movimento da atualizaccedilatildeo dos sentidos o que entra na imaginaccedilatildeo eacute aquilo que

pode ser sentido mas jamais aquilo que eacute apenas inteligiacutevel382

A imagem eacute requisito necessaacuterio para o entendimento A alma pode perseguir

algo se apoacutes imaginaacute-lo afirma que eacute bom ou nega que seja mau e pode fugir de

algo se apoacutes imaginaacute-lo afirma que eacute mau ou nega que seja bom O ser do desejo

em ato e o ser da fuga em ato satildeo distintos satildeo atos diferentes mas seu princiacutepio

ou seja a faculdade do desejo a da fuga e a perceptiva natildeo satildeo diferentes entre si

378

TOMAacuteS DE AQUINO 2000 II l 13 390 Id 2001 C 78 a 4 p 720 379

Ibid III l 3 613 380

Ibid III l 6 656 e 659 Id 2001 Q 78 a 4 p 719 ARISTOacuteTELES 2010 III 3 p 113 381

ARISTOacuteTELES 2010 III 3 p 110-111 TOMAacuteS DE AQUINO 2000 III l5 638 Ibid l 6 664-665

382 TOMAacuteS DE AQUINO 2000 III l 6 657

89

em seu sujeito senatildeo somente na definiccedilatildeo A distinccedilatildeo e a apreensatildeo dos sentidos

pode gerar por aquelas accedilotildees que propiciam o bem dos sentidos o agradaacutevel que

conveacutem que causa prazer ou o mal que causa repulsa tristeza que natildeo conveacutem

estimulando a fuga respectivamente quando o sentido comum se relaciona como

uma espeacutecie de meio com os sentidos proacuteprios Eis o que move o apetite o desejo

dos quais partem certas accedilotildees383 Santo Tomaacutes divide entatildeo em trecircs graus o

percurso que faz o movimento sensiacutevel ldquoem primeiro lugar os sentidos apreendem

o sensiacutevel como conveniente ou nocivo em segundo lugar segue-se disto o prazer

ou a tristeza e em terceiro lugar por fim segue-se o desejo ou a fugardquo384

Mas a respeito disto o Aquinate aponta pelo modo como expressa

Aristoacuteteles para duas diferenccedilas entre o intelecto e os sentidos A primeira eacute que no

que toca ao intelecto que conhece e pode ser movido por um bem universal ou por

um mal universal da apreensatildeo do bem ou do mal o desejo ou a fuga pode seguir-

se imediatamente enquanto que os sentidos requerem necessariamente o terceiro

elemento ou seja o prazer ou a tristeza porque satildeo movidos por um bem

determinado ou por um mal determinado A segunda eacute que explica diz o Estagirita

simplesmente que o intelecto afirma ou nega enquanto os sentidos o fazem sempre

ldquode alguma maneirardquo385

Assim como as espeacutecies satildeo captadas pelo sentido proacuteprio e pelo sentido

comum e em seguida retidas pela imaginaccedilatildeo ou fantasia as intenccedilotildees que natildeo

satildeo apreendidas pelos sentidos tal como ldquoo nocivo e o uacutetilrdquo386 satildeo captadas pela

estimativa (ou no caso do homem cogitativa) e retidas pela memoacuteria os outros dois

sentidos internos

Explica Muszalski que

[] quando Santo Tomaacutes diz que a estimativa-cogitativa eacute apreensiva das intenccedilotildees particulares natildeo quer dizer tanto que tende a elas como a seu fim mas que a intenccedilatildeo particular equivale a uma forma presente na coisa e que esta faculdade pode apreender essa forma em concreto []

383

ARISTOacuteTELES 2010 III 7 p 120 TOMAacuteS DE AQUINO 2000 III l 12 768 384

ldquo[] en premier le sens saisit le sensible comme convenant ou nocif en second il srsquoensuit de cela plaisir ou tristesse en troisiegraveme par ailleurs il srsquoensuit deacutesir ou fuiterdquo TOMAacuteS DE AQUINO 2000 III l 12 p 768

385 ldquo[] de quelque manieacutererdquo ou seja do modo pelo qual os sentidos apreendem

particularmente determinado objeto Ibid III l 12 771-772 386

Id 2012 Q XIII p 273

90

E quanto agraves intenccedilotildees prossegue ldquotratam-se de aspectos de benefiacutecio e

prejuiacutezo que satildeo sensiacuteveis per accidens com relaccedilatildeo aos sentidos externos []rdquo387

Muszalski aponta ainda que enquanto as formas sensiacuteveis captadas pelos

sentidos externos satildeo beneacuteficas ou nocivas para o respectivo sentido sendo

determinantes para a subsistecircncia do indiviacuteduo as intenccedilotildees satildeo formas que tecircm

como conteuacutedo um valor natildeo para o proacuteprio sentido da estimativa-cogitativa mas

para o indiviacuteduo e inclusive para a espeacutecie sendo por isto determinante para ambos

Eacute nesse processo que eacute acidental de captaccedilatildeo e retenccedilatildeo das intenccedilotildees

das espeacutecies intencionais de conveniecircncia e prejuiacutezo ndash e que confere a noccedilatildeo de

determinado fim e o conhecimento da proporcionalidade entre este e certa atividade

desempenhada para alcanccedilaacute-lo ndash que residem duas diferenccedilas fundamentais entre

o homem e os demais animais no tocante aos sentidos internos Diz Santo Tomaacutes

que ldquoos animais percebem-nas somente por um instinto natural enquanto que o

homem as percebe por uma comparaccedilatildeordquo388 ou juicio collativo (juiacutezo discursivo)

ldquoinvestigando e discorrendordquo389

Assim por reunir ndash e comparar compor e dividir em um discurso ndash as

intenccedilotildees particulares individuais que os demais sentidos natildeo captam e sendo por

isto denominada pelos escolaacutesticos intentiones insensatae a faculdade estimativa eacute

no homem chamada cogitativa ou ldquorazatildeo particularrdquo ou ainda ldquoentendimento

passivordquo ou ldquointelecto passivordquo390 pelo que no homem o ser natural se move ao

apetite sensitivo391 A palavra cogitativa segundo Muszalski392 vem do verbo latino

cogitare que significa ldquopensamentordquo ldquoideiardquo ldquorepresentaccedilatildeordquo como junccedilatildeo entre a

preposiccedilatildeo cum (ldquocomrdquo) e o verbo agitare (ldquoagitarrdquo mover algo forte ou

repetidamente) e este complementa vem de agere (ldquolevarrdquo ldquoconduzirrdquo ldquoguiarrdquo)

concluindo que cogitare eacute um verbo que implica movimento e que pode-se traduzir

387

ldquo[] cuando Santo Tomaacutes dice que la estimativa-cogitativa es apreensiva de las intenciones particulares no quiere decir tanto que tende a ellas como a su fin sino que la intencioacuten particular equivale a una forma presente en la cosa y que esta facultad puede aprehender esa forma en concreto [] las intenciones [] se tratan de aspectos de beneficio y prejuicio que son sensibles per accidens respecto de los sentidos externosrdquo MUSZALSKI 2014 p 88-89

388 ldquo[] los animales las perciben soacutelo por un instinto natural mientras que el hombre las

percibe por una comparacioacutenrdquo TOMAacuteS DE AQUINO 2001 Q 78 a 4 p 719 389

Id 2012 Q XIII p 273 390

Ibid p 273 Id 1990b L II c LX p 273-274 Id 2001 Q 78 a 4 p 718-719 Na Suma Teoloacutegica Tomaacutes de Aquino (1993 Q 51 a 3 p 398) diz que Aristoacuteteles (2010 L 3 p 117) chama ldquoentendimento passivordquo e ldquorazatildeo particularrdquo a potecircncia cogitativa juntamente com a memoacuteria e a imaginaccedilatildeo

391 TOMAacuteS DE AQUINO 2001 Q 81 a 3 p 745

392 MUSZALSKI 2014

91

como lsquomover conjuntamentersquo ou lsquoconduzir junto com outrorsquo393 e entatildeo significa

ldquopensarrdquo como ldquoo movimento da razatildeo em sua busca discursivardquo394

Para a cogitativa e portanto isto natildeo se daria nos animais natildeo humanos a

imaginaccedilatildeo tambeacutem compotildee e divide as formas imaginadas o que Tomaacutes de

Aquino exemplifica com a capacidade de unir-se a imagem do ouro agrave de uma

montanha e entatildeo poder-se imaginar uma montanha de ouro395 Esse exerciacutecio

voluntaacuterio da imaginaccedilatildeo seria o que possibilita ao ente intelectivo a resoluccedilatildeo de

problemas por meio do pensamento

Jaacute a memoacuteria possibilita que o que foi apreendido seja novamente chamado agrave

consideraccedilatildeo atual O Estagirita jaacute reconhecia que ela estaacute presente em animais natildeo

humanos e ainda que ela opere nestes sem investigaccedilatildeo torna alguns mais aptos

ao aprendizado396 Somente no homem ela opera mediante investigaccedilatildeo e estudo o

que se daacute por ele tambeacutem possuir a faculdade da reminiscecircncia a memoacuteria

voluntaacuteria que lhe possibilita analisar silogisticamente as intenccedilotildees do passado

armazenadas397 Observa o Aquinate ainda que ldquoos atos das outras potecircncias

sensitivas se produzem segundo um movimento que vai das coisas para a alma

enquanto o da memoacuteria se efetua ao contraacuterio segundo um movimento que vai da

alma para as coisasrdquo398

E tal como a reminiscecircncia a cogitativa tambeacutem se deve agrave afinidade e agrave

razatildeo universal agrave repercussatildeo desta em ambas399 Assim se caracterizam o ato

daquela o comparar o compor e o dividir o ato da reminiscecircncia eacute fazer uso do

silogismo a fim de indagar400

Enquanto os sentidos em geral captam os acidentes a estimativa em especial

tem como objeto proacuteprio a quididade singular pela materialidade desta ainda que

natildeo a apreenda pela mateacuteria em si por soacute poder ser conhecida por sua analogia com

a forma401

393

ldquo[] cogitare es un verbo que implica movimiento y que puede traducirse como lsquomover conjuntamentersquo o lsquoconducir junto com otrorsquordquo MUSZALSKI 2014 p 80

394 ldquo[] el movimiento de la razoacuten en su buacutesqueda discursivardquo Ibid p 80

395 TOMAacuteS DE AQUINO 2001 Q 78 a 4 p 719-720

396 ARISTOacuteTELES 2005 L I 980a e 980b p 3

397 TOMAacuteS DE AQUINO 2001 Q 78 a4 p 719 Id 2012 Q XIII p 275

398 Id 2012 Q XIII p 275

399 Id 2001 Q 78 a4 p 720

400 Ibid Q 78 a 4 p 718

401 Id 1999 p 97-98

92

Retomando a cogitativa neste sentido Tomaacutes de Aquino diz que ldquocogitarrdquo (ou

ldquopensarrdquo) como ato da faculdade cogitativa eacute

[] propriamente o movimento da mente que delibera quando ainda natildeo chegou agrave perfeiccedilatildeo pela visatildeo plena da verdade Mas esse movimento da mente quando cogita pode versar antes sobre as intenccedilotildees universais caso em que pertence agrave parte intelectiva ou antes sobre representaccedilotildees particulares o que pertence agrave parte sensitiva Daiacute que em um segundo sentido pensar eacute ato da inteligecircncia que indaga e em outro terceiro sentido eacute ato da faculdade cognoscitiva

402

Assim explica Muszalski que quando se diz que a cogitativa eacute acidental isto

se daacute por ela secirc-lo em relaccedilatildeo agrave razatildeo ao tocar nesta enquanto estimativa por seu

modo de operar entre o sensitivo e o intelectivo e entatildeo diz ser apropriado

denominaacute-la ldquoobjeto formal quod acidentalrdquo403

56 INTELECTO

Com o produto final da operaccedilatildeo dos sentidos internos ou seja a imagem ou

fantasma tem iniacutecio o processo intelectivo no homem pelo qual este agora

reconhecendo as intenccedilotildees ou espeacutecies intencionais universais404 sabe ou seja

discrimina discerne (o que pertence ao juiacutezo) e concebe (apreende o que

discerniu)405 discorre e faz suposiccedilotildees ou seja forma concepccedilotildees e juiacutezos406

conhece o verdadeiro e o falso407 Se os sentidos e a imaginaccedilatildeo limitam-se agrave

apreensatildeo dos acidentes externos o intelecto diz o Aquinate ldquopenetra ateacute a

essecircncia das coisasrdquo e pode ser entendido de dois modos quando se apreende as

quididades ou quando se conhece os primeiros princiacutepios diretamente na coisa a

partir do conhecimento da quididade desta (razatildeo pela qual o intelecto eacute tido como o

402

ldquo[] propiamente el movimiento de la mente que delibera cuando todaviacutea no ha llegado a la perfeccioacuten por la visioacuten plena de la verdad Pero ese movimiento de la mente cuando piensa puede versar bien sobre las intenciones universales en cuyo caso pertenece a la parte intelectiva bien sobre representaciones particulares lo cual pertenece a la parte sensitiva De ahiacute que en un segundo sentido pensar es acto de la inteligencia que indaga y en otro tercer sentido es acto de la facultad cognoscitivardquo TOMAacuteS DE AQUINO 1990 Q 2 a 1 p 60

403 MUSZALSKI 2014 p 98

404 TOMAacuteS DE AQUINO 2001 Q 78 a 4 p 719

405 Id 2000 III l 7 672

406 ARISTOacuteTELES 2010 III 4 p 114 TOMAacuteS DE AQUINO 2000 III l 7 683

407 TOMAacuteS DE AQUINO 2000 III l 13 793

93

ldquohaacutebito dos princiacutepiosrdquo) ou ldquoenquanto abarca todas as operaccedilotildees tais como opinar e

raciocinarrdquo408

O homem eacute proporcionalmente dotado com o maior ceacuterebro em relaccedilatildeo agrave sua

quantidade e sendo o uacutenico animal ereto possui a cabeccedila no alto o que segundo o

aristotelismo-tomismo se daacute para maior liberdade de sua operaccedilatildeo principal a

intelecccedilatildeo para a qual o corpo humano se dispotildee409 uma vez que as coisas

inferiores existem em funccedilatildeo das superiores o que permite definir suficientemente

por determinado fim as coisas que existem para este mesmo fim410 E quanto mais

um ente possui a razatildeo de ldquoserrdquo mais elevado eacute o que fica evidente pela razatildeo

entre potecircncia e ato pois como explica Tomaacutes de Aquino411 diz-se propriamente

que ldquoeacuterdquo natildeo o que estaacute em potecircncia mas o que estaacute em ato

Observa Aristoacuteteles que os agentes que produzem o ato da percepccedilatildeo ou

seja os sensiacuteveis que satildeo particulares satildeo externos ao passo que satildeo internos os

universais que de algum modo estatildeo na alma mesma e entatildeo produzem a ciecircncia

Tomaacutes de Aquino acrescenta que ldquoos universais enquanto universais existem

somente na alma As naturezas proacuteprias em contrapartida que assumem a intenccedilatildeo

de universalidade existem nas coisasrdquo412

Em razatildeo disto o entendimento depende da vontade daquele que entende

enquanto a percepccedilatildeo natildeo depende necessariamente413 O Estagirita define

ldquoentendimentordquo como aquilo ldquocom que a alma discorre e faz suposiccedilotildeesrdquo414

Eacute por semelhanccedila que um objeto conhecido se faz presente naquilo que

conhece produzindo entatildeo o conhecimento de modo que assim como haacute

atualizaccedilatildeo dos sentidos pelos sensiacuteveis ndash que entatildeo imprimiratildeo neles certa

semelhanccedila de natureza corporal delimitada pelas dimensotildees caracteriacutesticas da

mateacuteria e que eacute um modo de conhecer ndash assim tambeacutem aquilo que a inteligecircncia

intelige a saber as espeacutecies inteligiacuteveis que procedem da abstraccedilatildeo formal da

mateacuteria produziratildeo nela certa semelhanccedila caracterizando outro modo de conhecer

de conceber onde haacute tal como nos sentidos distinccedilatildeo e apreensatildeo mas aqui agrave luz

408

TOMAacuteS DE AQUINO 1988 a XII p 92-93 409

Id 2012 Q VIII p 171 e 181 410

Id 2006 p 25 411

Ibid p 73 412

ldquo[] les universels en tant quuniversels nexistent que dans lacircme Les natures mecircmes par contre qui revecirctent lintention duniversaliteacute existent dans les chosesrdquo Id 2000 II l 12 380

413 ARISTOacuteTELES 2010 II 5 p 77

414 Ibid III 4 p 114

94

do intelecto com formaccedilatildeo de uma afirmaccedilatildeo ou de uma negaccedilatildeo o que nos

sentidos equivaleria ao surgimento do agradaacutevel ou da tristeza415

O intelecto ou inteligecircncia concebe o que eacute separaacutevel dos sensiacuteveis natildeo

separadamente ou seja a distinccedilatildeo eacute feita porque o separaacutevel pode ser entendido

em si mas natildeo existe sem o objeto do qual eacute racionalmente separado Eacute assim que

o intelecto abstrai os entes matemaacuteticos da mateacuteria sensiacutevel E de modo semelhante

a inteligecircncia abstrai o universal do particular ao conceber a natureza das espeacutecies

sem seus princiacutepios individuantes que compotildeem sua definiccedilatildeo416

Para o aristotelismo-tomismo o intelecto eacute parte da alma417 que

diferentemente dos sentidos ndash que natildeo conhecem a si mesmos nem agraves suas

operaccedilotildees (a visatildeo por exemplo natildeo vecirc que vecirc) ndash conhece a si mesmo e agrave sua

operaccedilatildeo (a intelecccedilatildeo)418 e intelige indefinidamente refletindo inclusive sobre si

mesmo (algo que natildeo se daacute com os sentidos)419 Ademais nada haacute em seu interior

que seja alguma natureza por ele conhecida420 sendo portanto de modo anaacutelogo

aos sentidos (mas enquanto a parte sensitiva recebe as formas nos oacutergatildeos e natildeo

em si mesma a intelectiva recebe em si mesma e natildeo nos oacutergatildeos421) e estaacute em

potecircncia para aquilo que conhece atualizando-se naquilo que pensa no instante em

que pensa422

O intelecto possui uma natureza pela qual estaacute em potecircncia para toda a

natureza sensiacutevel universalmente423 Ele natildeo se corrompe com o excesso de

inteligiacuteveis tambeacutem ao contraacuterio dos sentidos que satildeo corrompidos pelo excesso de

sensiacuteveis como jaacute se disse se entende algo em grau maior natildeo passa a entender

pior o que houver de inferior mas ao contraacuterio entende ainda melhor e conhece

melhor as coisas inferiores agrave medida que conhece as mais elevadas Possui

portanto um grau de impassibilidade muito superior ao dos sentidos424

415

TOMAacuteS DE AQUINO 2000 III l 12 767 416

Ibid III l 12 781 e 784 417

ARISTOacuteTELES 2010 III 4 p 113 418

TOMAacuteS DE AQUINO 2009 p 151 Id 2000 l 24 556 Id 1990b L II c LXVI p 285 419

Id 2009 p 151 Id 2000 l 24 556 420

Pois de outro modo obstruiria o conhecimento das outras naturezas assim como na visatildeo natildeo poderia haver uma cor sem que impedisse a captaccedilatildeo das demais ndash o que parte do entendimento de que o que se encontra no interior haveraacute de impedir ou de obstruir o que se encontra fora (cf ARISTOacuteTELES 2010 III 4 p 114)

421 TOMAacuteS DE AQUINO 2009 p 67

422 Ibid p 63 e 65

423 Id 2000 III l 7 681

424 ARISTOacuteTELES 2010 III 4 p 114-115 TOMAacuteS DE AQUINO 2000 III l 7 687 Tomaacutes

de Aquino 1990b L II c LXVI p 285

95

Segundo o Estagirita o intelecto eacute o lugar das espeacutecies425 o lugar das formas

em potecircncia426 uma taacutebua na qual nada haacute que esteja escrito em ato ainda que de

certa maneira seja os inteligiacuteveis em potecircncia427 A alma intelectual eacute de certa

maneira todas as coisas e isto se daacute porque nela atualizam as formas inteligiacuteveis de

todas as coisas428 as formas comuns e universais diz o Aquinate pelas quais o

entendimento que apreende a forma inteligiacutevel sem a contraccedilatildeo que a forma

substancial sofre ao ser recebida pela mateacuteria prima de modo que aquela esteja no

entendimento ldquosegundo a razatildeo de sua comunidaderdquo429

O intelecto integra duas partes Uma delas eacute o intelecto possiacutevel cuja

doutrina aristoteacutelica o Aquinate define assim ldquoeacute alguma coisa da alma que eacute ato de

um corpo isto poreacutem sem que esse intelecto da alma possua qualquer oacutergatildeo

corporal tal como sucede com as restantes faculdades da almardquo430 E partindo da

definiccedilatildeo de inteligecircncia de Aristoacuteteles de que eacute aquilo com que a alma forma

concepccedilotildees e juiacutezos conclui que o intelecto possiacutevel eacute em um sentido formal o que

cada homem pensa431

Eacute portanto certa forccedila ou potecircncia da alma humana que estando em

potecircncia para todos os inteligiacuteveis432 (e inclusive intelige-se a si mesmo ldquopor uma

forma sua pela qual ele se faz em atordquo433) recebe da outra parte do intelecto (jaacute que

natildeo pode produzir algo o que estaacute em potecircncia para este algo) o intelecto agente a

impressatildeo da imagem que eacute representativa de todas as coisas concretas tal como

os sentidos recebem a impressatildeo das espeacutecies sensiacuteveis dos acidentes (aqui

poreacutem sem a necessidade de um agente tal como se daacute no intelecto)

Enquanto a imaginaccedilatildeo eacute movida pelos sentidos jaacute que uma potecircncia eacute

movida por outra as formas inteligiacuteveis por serem universais natildeo podem ser

425

ARISTOacuteTELES 2010 III 4 p 114 426

Ibid III 4 p 114 427

Ibid III 4 p 116 TOMAacuteS DE AQUINO 2009 p 133 428

TOMAacuteS DE AQUINO 2000 III l 13 789-790 Aristoacuteteles faz uma comparaccedilatildeo com a matildeo que assumiria no homem o papel dos instrumentos observados nos animais para ataque ndash o que eacute exemplificado pela caccedila ndash defesa e abrigo (cf ARISTOacuteTELES 2010 III 8 p 123 TOMAacuteS DE AQUINO 2000 III l 13 790)

429 Id 1949 Q 1 R p 14

430 Id 2009 p 69

431 Id 2000 III l 7 690

432 Potecircncia esta que natildeo eacute essecircncia da alma uma vez que seu ato natildeo eacute essencial

433 TOMAacuteS DE AQUINO 2012 Q X p 343

96

causadas pelas formas da imaginaccedilatildeo que satildeo individuais434 Assim o intelecto

possiacutevel recebe apenas espeacutecies universais

Os fantasmas servem para a alma intelectiva ou discursiva como as

sensaccedilotildees os objetos sensiacuteveis servem para os sentidos435 E tal como os sentidos

satildeo movidos por seus objetos proacuteprios as espeacutecies sensiacuteveis o intelecto possiacutevel

que estaacute diz Tomaacutes de Aquino ldquoem potecircncia para todas as coisas que satildeo

inteligiacuteveis pelo homem seraacute movido pelas espeacutecies inteligiacuteveis seus objetos

proacutepriosrdquo ele ldquodeve ser receptivo dessas mesmas coisasrdquo (e consequentemente

como se disse delas desprovido) de ldquotodas as formas e naturezas sensiacuteveisrdquo e

entatildeo natildeo tem oacutergatildeo corpoacutereo pois ldquoSe tivesse algum oacutergatildeo corpoacutereordquo

complementa ldquoestaria determinado a alguma natureza sensiacutevel assim como a

potecircncia visiva determina-se agrave natureza do olhordquo436

A outra parte integrada eacute o entendimento que assim como a luz faz de

cores em potecircncia cores em ato faz tambeacutem todas as coisas ou seja todos os

inteligiacuteveis apoacutes o entendimento anterior o intelecto possiacutevel tornar-se todas as

coisas437 eacute o intelecto agente um princiacutepio ativo particular que faz com que o ente

humano seja um ente inteligente em ato Eacute nas palavras de Echavarriacutea (2009) ldquoa

lsquoluz natural da mente e eacute o princiacutepio ativo de toda a vida do espiacuterito primeiramente

do entenderrdquo438 que por abstraccedilatildeo da mateacuteria e das condiccedilotildees materiais (os

princiacutepios de individuaccedilatildeo) produziraacute as espeacutecies inteligiacuteveis que natildeo preexistem

na natureza das coisas extraindo-as da imagem ou fantasma439

Assim se o intelecto possiacutevel eacute nas palavras do Aquinate ldquoaquele que eacute

passiacutevel de tornar-se qualquer coisardquo o intelecto agente eacute aquele ldquoque pode fazer

tudordquo440 Diz ele tambeacutem que

[] eacute necessaacuterio que em todo agente haja um princiacutepio formal pelo qual ele opere formalmente porque eacute impossiacutevel que um agente opere formalmente

434

TOMAacuteS DE AQUINO 2012 Q IV p 103 435

ARISTOacuteTELES 2010 III 11 p 130 TOMAacuteS DE AQUINO apud PEREIRA JUNIOR 2006 p 63

436 TOMAacuteS DE AQUINO 2012 Q II ps 59 e 61

437 ARISTOacuteTELES 2010 III 5 p 117

438 ldquo[hellip] es la luz natural de la mente y es el principio activo de toda la vida del espiacuteritu

primeramente del entenderrdquo ECHAVARRIacuteA 2009 p 131 439

A accedilatildeo do intelecto agente imaterial difere da accedilatildeo dos agentes naturais aquele abstrai da mateacuteria enquanto estes imprimem formas na mateacuteria

440 TOMAacuteS DE AQUINO 1988 Art II p 49

97

mediante algo que eacute separado dele segundo o ser [] o intelecto agente estaacute para os fantasmas iluminados assim como a arte para a sua obra

441

O intelecto agente possui quatro propriedades sendo somente a quarta a que

o diferencia do intelecto possiacutevel que eacute superado por aquele nas outras trecircs eacute

separaacutevel eacute impassiacutevel eacute sem mistura ou seja natildeo eacute composto de natureza

corpoacuterea nem estaacute associado a um oacutergatildeo corpoacutereo estaacute em ato por essecircncia

enquanto o intelecto possiacutevel estaacute em potecircncia por essecircncia442

Ao inerirem neste as espeacutecies inteligiacuteveis satildeo individuadas mas os

universais mediante estas poderatildeo vir a ser conhecidos por serem concebidos

apoacutes os princiacutepios individuantes serem abstraiacutedos443 Elas natildeo satildeo o que eacute inteligido

pelo intelecto mas aquilo mediante o que ele intelige salvo reflexivamente ou seja

ldquoenquanto intelige que intelige a si proacuteprio e ao que mais possa inteligirrdquo444 de modo

que a Fiacutesica e a Metafiacutesica versaratildeo sobre elas Tomaacutes de Aquino explica o modo

como o intelecto intelige a si mesmo ldquomediante a espeacutecie inteligiacutevel dos demais

inteligiacuteveis pois por meio do objeto conhece sua operaccedilatildeo e mediante esta vem a

conhecer a si mesmordquo445

Em relaccedilatildeo ao que pertence por si agrave espeacutecie enquanto universal a natureza

desta natildeo pode multiplicar-se por estarem fora de sua razatildeo os princiacutepios

individuantes Assim diz o Aquinate ldquopoderaacute o intelecto captar a espeacutecie para aleacutem

de todas as condiccedilotildees individuantes e assim captar-se-aacute algo uno E pelo mesmo

motivo o intelecto capta a natureza do gecircnerordquo446

Poreacutem se por um lado o intelecto capta o universal eacute indiretamente que ele

conhece o singular

[] mediante certa reflexatildeo na medida em que pelo fato de que apreende seu inteligiacutevel volta-se agrave consideraccedilatildeo de seu proacuteprio ato agrave da espeacutecie inteligiacutevel que eacute princiacutepio de sua operaccedilatildeo e agrave da origem desta mesma espeacutecie Deste modo alcanccedila a consideraccedilatildeo dos fantasmas e dos singulares que lhes correspondem Mas esta reflexatildeo soacute se pode dar mediante o concurso das virtudes cogitativas e imaginativas

441

TOMAacuteS DE AQUINO 2012 Q V p 117 442

Id 2000 III l 10 732-733 443

Id 2012 Q II p 67 444

Ibid Q II p 69 445

Ibid Q III p 89 446

Ibid Q IV p 101

98

Eacute portanto a potecircncia sensitiva que conhece os singulares apoacutes os oacutergatildeos

sensitivos receberem as espeacutecies individuais ou seja o homem conhece os

universais pelo intelecto e os singulares pelos sentidos e entatildeo pelo intelecto por

um ato reflexivo de retorno aos fantasmas jaacute que eacute deles que o intelecto abstrai as

espeacutecies inteligiacuteveis447 O Aquinate fundamenta

[] tudo que pode a virtude inferior pode-o tambeacutem a superior mas natildeo do mesmo modo senatildeo por outro mais elevado Por isso aquelas mesmas coisas que o sentido percebe materialmente e singularmente conhece-as o intelecto imaterialmente e universalmente

448

No entanto

[] natildeo eacute necessaacuterio que aquilo que o intelecto intelige tenha ser separadamente nas coisas da natureza Do mesmo modo tampouco eacute preciso propor a subsistecircncia dos universais fora dos singulares nem a dos matemaacuteticos fora das coisas sensiacuteveis uma vez que os universais satildeo as essecircncias dos proacuteprios particulares e os matemaacuteticos satildeo as delimitaccedilotildees dos corpos sensiacuteveis

449

O intelecto ou razatildeo universal assim move e dirige a cogitativa ou razatildeo

particular para que realize sua comparaccedilatildeo entre as intenccedilotildees particulares

viabilizando as conclusotildees particulares a partir de proposiccedilotildees universais do

raciociacutenio silogiacutestico450 Ele natildeo pode jamais conceber uma forma sem que conceba

a mateacuteria da qual depende a concepccedilatildeo dessa forma ainda que possa conceber

uma forma sem seus princiacutepios individuantes jaacute que seu objeto apropriado eacute a

quididade das coisas sensiacuteveis ainda que de um modo diferente daquele em que

elas estatildeo nas coisas sensiacuteveis mas sem que se produza falsidade na

inteligecircncia451 Enquanto as espeacutecies inteligiacuteveis satildeo aquilo pelo qual o intelecto

conhece a semelhanccedila da coisa na alma a quididade eacute aquilo que eacute conhecido452

Assim como satildeo uma soacute coisa o sensiacutevel em ato e o sentido em ato tambeacutem eacute uma

soacute coisa o intelecto em ato e o que eacute conhecido em ato453

447

TOMAacuteS DE AQUINO 2006 p 165 Id 2000 II l 5 284 Ibid II l 12 377 Ibid III l 7 675-676 Ibid III l 8 712-713

448 Id 2012 Q XX p 417

449 Id 2006 p 19

450 Id 2001 Q 81 a 3 p 745

451 Id 2000 III l 8 717

452 Ibid III l 8 718-719

453 Ibid III l 9 724

99

O intelecto em ato possui trecircs propriedades a de que a ciecircncia em ato eacute a

mesma coisa que a coisa conhecida a de que a ciecircncia em potecircncia eacute anterior agrave

ciecircncia em ato no tempo (quando no acircmbito singular a potecircncia eacute anterior ao ato) em

um mesmo sujeito mas natildeo anterior universalmente em relaccedilatildeo natildeo soacute agrave natureza

(quando o ato eacute anterior agrave potecircncia) como tambeacutem ao tempo e a de que estar em

ato implica aqui necessariamente conceber e entatildeo ele difere dos intelectos

possiacutevel e agente que podem conceber ou natildeo conceber454

E explica o Aquinate que como ldquoo sentido e o sensiacutevel em potecircncia satildeo

diferentes mas o sentido e o sensiacutevel em ato satildeo uma e a mesma coisardquo tambeacutem

assim ldquoo intelecto ou a ciecircncia em ato satildeo o mesmo que a coisa conhecida em

atordquo ao que pode-se agregar o que diz Aristoacuteteles ldquoNo caso das coisas imateriais

o que entende e o que eacute entendido satildeo o mesmo pois a ciecircncia teoreacutetica e o objeto

cientificamente cognosciacutevel satildeo o mesmordquo455 Tomaacutes de Aquino prossegue

[] o intelecto possiacutevel estaacute em potecircncia com respeito aos inteligiacuteveis segundo o ser que estes tecircm nos fantasmas E eacute segundo o mesmo ser que os inteligiacuteveis tecircm nos fantasmas que o intelecto agente estaacute em ato com respeito a eles mas um por uma razatildeo e outro por outra razatildeo

456

Mesmo quando natildeo haacute intelecccedilatildeo em ato as espeacutecies inteligiacuteveis que o ente

adquire em vida poderatildeo residir no intelecto possiacutevel Isto se daacute pelo intelecto in

habito que se manifesta quando as espeacutecies inteligiacuteveis encontram-se entre a

potecircncia e o ato no intelecto o que permite que o homem intelija em ato sempre que

desejar457 Assim o intelecto in habito eacute efeito do intelecto agente e se encontra

necessariamente no intelecto possiacutevel458 O primeiro ato do intelecto possiacutevel eacute

pois o haacutebito da ciecircncia (haacutebito permanente diga-se) que estaacute em parte no

intelecto e em parte nas virtudes sensitivas459 e de posse deste apoacutes aprender ou

encontrar o intelecto pode passar para o segundo ato que eacute o da operaccedilatildeo ao

mesmo tempo em que se manteacutem em potecircncia para a consideraccedilatildeo em ato de algo

podendo entatildeo conceber qualquer coisa inclusive a si mesmo460 pois o objeto da

454

TOMAacuteS DE AQUINO 2000 III l 10 740 455

ARISTOacuteTELES 2010 4 III p 116 456

TOMAacuteS DE AQUINO 2012 Q V p 119-121 457

Ibid Q XV p 323 458

Id 1990b L II c LX p 276 459

Id 2001 Q 89 a 5 p 806 460

Id 2009 p 133 Id 2000 III l 8 700 703-704

100

ciecircncia especulativa que pode ser conhecido e a ciecircncia especulativa em si tambeacutem

satildeo a mesma coisa461

Explica o Aquinate462 que a intelecccedilatildeo seraacute sempre ou praacutetica ou

especulativa e de um ou outro modo teraacute sempre iniacutecio e fim A inteligecircncia praacutetica

ou entendimento praacutetico ou entendimento operativo eacute relacionada agrave accedilatildeo que

considera algo falso ou verdadeiro em relaccedilatildeo a um operaacutevel particular ldquojaacute que a

accedilatildeo se executa nas situaccedilotildees particularesrdquo463 Quanto agrave inteligecircncia especulativa

ou entendimento especulativo considera somente o objeto da especulaccedilatildeo natildeo do

que eacute factiacutevel segundo um ato singular mas somente universalmente e portanto

natildeo move porque natildeo faz fugir ou buscar natildeo move o apetite mas eacute movida de

certo modo pelas coisas porque recebe delas que constituem assim sua medida

Ambas as inteligecircncias satildeo uma mesma potecircncia diferindo portanto quanto ao fim

Diz entatildeo Tomaacutes de Aquino

[] as coisas da natureza satildeo ao mesmo tempo comensurantes e comensuradas Ao contraacuterio a nossa inteligecircncia eacute comensurada eacute tambeacutem comensurante natildeo poreacutem em relaccedilatildeo agraves coisas criadas mas em relaccedilatildeo aos produtos do engenho humano

464

O que move o ente eacute portanto aquilo que desperta a faculdade apetitiva que

leva o ente a retornar ao objeto que serviu de motor inicial para o processo cognitivo

naquele com relaccedilatildeo a este465 Sobre este movimento Aristoacuteteles aponta que satildeo

inuacutemeras as partes da alma que participam dele a parte que raciocina a impulsiva

a apetitiva (que tambeacutem podem ser classificadas como racionais ou irracionais) a

nutritiva a perceptiva (que natildeo eacute facilmente classificaacutevel como racional ou

irracional) a imaginativa a desiderativa sendo que a parte apetitiva e a parte

impulsiva diferem entre si menos do que as demais o fazem entre si466

Segue-se portanto que

Existem entatildeo trecircs coisas uma o que move a segunda aquilo com que move e ainda uma terceira o que eacute movido Por seu turno o que move eacute duplo existe assim o que natildeo se move e o que move e eacute movido O que natildeo se move eacute o bem realizaacutevel atraveacutes da accedilatildeo jaacute o que move e eacute movido eacute a faculdade desiderativa E que o que eacute movido eacute movido em virtude de

461

TOMAacuteS DE AQUINO 2000 III l 9 724 462

Ibid I l8 119 Ibid III l 12 779-780 Ibid III l 14 813 Id 2001 Q 79 a 11 p 737 463

ldquo[] lrsquoaction srsquoexeacutecute dans les situations particuliegraveresrdquo Id 2000 III l 12 780 464

Id 1988 Art II p 48 465

Ibid Art II p 47 466

ARISTOacuteTELES 2010 III 9 p124-125 Ibid III 10 p 128

101

desejar e o desejo em actividade eacute um tipo de movimento O que eacute movido por sua vez eacute o animal

467

Em uacuteltima anaacutelise o que move e sem mover-se quando entendido e quando

imaginado eacute o objeto do desejo pela faculdade desiderativa pelo desejo mesmo

cujo objeto diz o Filoacutesofo eacute ldquoo princiacutepio do entendimento praacutetico enquanto o termo

final do raciociacutenio eacute entatildeo o princiacutepio da accedilatildeordquo e assim pela inteligecircncia praacutetica

pelo pensamento discursivo praacutetico que move porque tem como princiacutepio o objeto

do desejo e pela imaginaccedilatildeo que eacute racional ou perceptiva e sem a qual a

faculdade desiderativa natildeo pode existir que soacute move com o desejo inclusive nos

animais sem raciociacutenio E a faculdade desiderativa move nas ocasiotildees em que haacute

somente apetite e nas em que o apetite e o raciociacutenio mesmo quando um contraria

o outro como quando pelo entendimento sabemos que devemos negar um apetite

que visa a um prazer imediato em razatildeo de consequecircncias posteriores468

Quanto agrave faculdade de deliberar a razatildeo deliberativa que eacute princiacutepio motor

somente no homem um desejo pode sobrepor-se a ela e movecirc-la assim como um

desejo tambeacutem pode sobrepor-se a outro desejo e movecirc-lo ou ser movido tambeacutem

pela sobreposiccedilatildeo daquela Jaacute a faculdade cientiacutefica (a razatildeo especulativa) natildeo se

move pois natildeo leva a fugir ou a desejar Assim diz o Estagirita relacionados ao

universal existem uma suposiccedilatildeo e um enunciado e relacionado ao particular existe

uma suposiccedilatildeo Ele exemplifica ldquoA primeira diz que certo tipo de homem tem de

praticar um acto de certa natureza o segundo diz que este eacute um acto daquela

natureza e que eu sou um homem daquele tipordquo e em seguida conclui ldquoEacute esta

uacuteltima opiniatildeo a que move e natildeo a respeitante ao universal Ou talvez ambas

movam mas a primeira permanecendo preferencialmente em repouso e a

segunda natildeordquo469

O animal racional examina primeiramente as coisas por fazer a fim de medir

qual seraacute preferencial ou quais o seratildeo e entatildeo opta pela que lhe proporcionaraacute

mais bens ou pelas que lhes proporcionaratildeo isto pelo que manifestaraacute desejo Por

essa escolha do melhor haacute pois como aponta Tomaacutes de Aquino trecircs objetos

atuantes trecircs fantasmas que seratildeo convertidos em um soacute dois elementos em que

467

ARISTOacuteTELES 2010 III 10 p 128 468

Ibid III 10 p 127-129 469

Ibid III 11 p 129-131

102

um seraacute preferiacutevel ao outro e uma medida que seraacute aquilo que torna um deles

preferiacutevel que eacute a opiniatildeo470

O fim da intelecccedilatildeo especulativa seraacute sempre as obras da razatildeo que satildeo a

definiccedilatildeo referente agrave intelecccedilatildeo simples e a demonstraccedilatildeo471 que compotildeem as trecircs

operaccedilotildees que se desdobram do intelecto in habito

a) A primeira consiste na apreensatildeo na simples captaccedilatildeo dos aspectos

inteligiacuteveis nas coisas eacute a intelecccedilatildeo propriamente dita na qual ocorre a

conceituaccedilatildeo e a definiccedilatildeo que tem o ldquogecircnero generaliacutessimordquo como

princiacutepio e a ldquoespeacutecie especialiacutessimardquo472 como termo473

b) A segunda eacute o juiacutezo que possibilita melhor conhecimento da realidade

onde ocorrem composiccedilatildeo e divisatildeo dos aspectos inteligiacuteveis

c) A terceira eacute o raciociacutenio propriamente dito que eacute desdobramento da

anterior

O iniacutecio das operaccedilotildees tem como base a apreensatildeo simples (aprehensio

simplex) do intelecto e caracteriza-se pela concepccedilatildeo das essecircncias indivisiacuteveis ou

outras incomplexas nas quais natildeo haacute distinccedilatildeo entre verdadeiro e falso que estatildeo

separadas entre si e entatildeo satildeo compostas para formar conceitos e a partir destes

mais conceitos Eacute a primeira inteligecircncia Diz Tomaacutes de Aquino que

[] a primeira coisa que a inteligecircncia concebe como a mais conhecida e agrave qual se reduz tudo eacute o ente [] todos os outros conceitos da inteligecircncia se obtecircm por adjunccedilatildeo ao ente Ora ao ente natildeo se pode acrescentar algo agrave maneira de uma natureza estranha assim como por exemplo a diferenccedila especiacutefica se acrescenta ao gecircnero ou o acidente ao sujeito uma vez que toda natureza eacute essencialmente um ente

474

E explica que o que se pode acrescentar ao ente eacute somente o que expressa

um modo seu determinado seja ldquoquando o modo expresso constitui certo modo

especial do enterdquo por suas peculiaridades seja ldquoquando o modo expresso compete a

cada ser de maneira geralrdquo enquanto ldquoconveacutem a todo ente considerado em si

mesmordquo (o que ldquosignifica que o modo exprime no ente algo de maneira afirmativa ou

470

TOMAacuteS DE AQUINO 2000 III l 16 840 471

Ibid I l 8 119 472

Respectivamente ldquogenre geacuteneacuteralissimerdquo e ldquoespeacutece speacutecialissimerdquo 473

TOMAacuteS DE AQUINO 2000 I l 8 121 474

Id 1988 Art I p 41

103

negativardquo respectivamente coisa ndash ou seja a quididade ou a entidade do ente ndash e

indivisatildeo que eacute o ldquounordquo) ou ldquoenquanto conveacutem a todo ente em relaccedilatildeo a outrordquo ou

ldquoconforme a divisatildeo ou distinccedilatildeo de uma coisa da outra (o ente eacute algo que se

distingue de outro ente)rdquo ou ldquosegundo a concordacircncia de um ente com outrordquo (como

se daacute com a proacutepria alma como se viu que eacute dita de certo modo ser tudo)475

Com relaccedilatildeo ao julgamento ou juiacutezo pode-se fazer aqui certa comparaccedilatildeo

com o sentido comum pois assim como este como uma faculdade eacute o termo de

vaacuterios objetos sendo algo uacutenico que pode julgar todos os sensiacuteveis o intelecto

tambeacutem eacute o termo das imagens e algo uacutenico que pode julgar todas elas476

Quando forma a quidade das coisas que existem fora do espiacuterito o intelecto

possui apenas a imagem destas mas quando elabora juiacutezos sobre elas estes satildeo

algo que natildeo estatildeo no objeto mas pertencem somente ao intelecto que assim

desempenharaacute as atividades sintetizante e analisante e entatildeo a formulaccedilatildeo de

definiccedilotildees477

Estas diz o Estagirita podem ser um princiacutepio ou uma conclusatildeo de uma

demonstraccedilatildeo ou uma demonstraccedilatildeo que difere pela ordem pela posiccedilatildeo dos

termos do princiacutepio e da conclusatildeo mas sem que caracterize um raciociacutenio478 Na

definiccedilatildeo o ente toma o nome primeiramente a partir da substacircncia de maneira

absoluta e de maneira relativa e de certo modo dos acidentes479

A composiccedilatildeo que se desenrola de conceitos de pensamentos que resultaraacute

em uma unidade ou seja que os teraacute como uma coisa soacute pode incluir conceitos

atuais e conceitos passados e futuros e nela pode ocorrer falsificaccedilatildeo Tomaacutes de

Aquino explica que se se pode afirmar esses conceitos tambeacutem eacute possiacutevel negaacute-los

e portanto o que resulta e que pode relacionar-se ao presente ao passado e ao

futuro pode tambeacutem obter-se por divisatildeo como verdadeiro ou falso Assim a

composiccedilatildeo das proposiccedilotildees apoacutes a constituiccedilatildeo dos inteligiacuteveis natildeo pode ser obra

da natureza mas da razatildeo e da inteligecircncia Essa composiccedilatildeo e essa divisatildeo

ocorrem nos divisiacuteveis em que haacute verdadeiro e falso e natildeo nos indivisiacuteveis480 uma

vez que natildeo existe ali o falso

475

TOMAacuteS DE AQUINO 1988 Art I p 42 476

Id 2000 III l 12 775 477

Id 1988 Art III p 50-51 478

ARISTOacuteTELES 1995b I 8 75b p 333-334 TOMAacuteS DE AQUINO 2000 II l 1 212 479

TOMAacuteS DE AQUINO 2003 p 55 480

Aristoacuteteles e Tomaacutes de Aquino explicam os indivisiacuteveis apresentando alguns modos como o que eacute quanto agrave continuidade quantitativamente sendo entatildeo indivisiacutevel em ato ainda que natildeo o

104

Com base nesse processo haacute duas formas de conhecer-se algo a partir de

outro algo e segundo o Aquinate somente o segundo eacute que cria o discurso O

primeiro daacute-se

[] conhecendo-se uma coisa conhecida a partir de outra coisa conhecida de maneira que seja distinto o conhecimento de ambas como quando o homem conhece as conclusotildees a partir dos princiacutepios considerando a ambos separadamente

Jaacute o segundo daacute-se ldquoconhecendo-se uma coisa conhecida a partir da espeacutecie

pela qual eacute conhecida como quando vemos uma pedra pela proacutepria espeacutecie da

pedra que estaacute em nosso olhordquo

E a enunciaccedilatildeo explica o mesmo Tomaacutes de Aquino ldquoeacute a expressatildeo do

conhecimento da inteligecircnciardquo481 e tem por objeto e que eacute o objeto das ciecircncias as

coisas em si Ou seja o intelecto possiacutevel natildeo pensa as espeacutecies mas por elas as

coisas482 Diz tambeacutem o Aquinate que a ciecircncia eacute anterior ao pensamento que estaacute

para ele como a potecircncia estaacute para o ato483 Os fantasmas natildeo se formam somente

pela recepccedilatildeo direta dos sentidos mas tambeacutem indireta ou seja sempre que se

especula em ato ocasiatildeo em que mantecircm sua semelhanccedila com as coisas sensiacuteveis

previamente conhecidas na medida em que estas participam do ente e por isso ateacute

o raciociacutenio pode comprometer-se se houver lesatildeo no oacutergatildeo da fantasia484

seja em potecircncia como o satildeo os contiacutenuos temporal e espacial Neste caso o ato que entende e o objeto entendido satildeo divisiacuteveis por acidente

Um outro tipo eacute caracterizado pelo fato de que algo pode ser indivisiacutevel tambeacutem quanto agrave espeacutecie e pode tambeacutem referir-se a uma espeacutecie uacutenica composta por partes natildeo contiacutenuas que o intelecto concebe tambeacutem acidentalmente pois nessas mesmas partes algo haacute de indivisiacutevel que eacute a espeacutecie de cada uma delas conhecidas pelo intelecto conhecendo assim em um tempo indivisiacutevel o que natildeo se daria se conhecesse somente as partes enquanto divididas O indivisiacutevel do contiacutenuo eacute o mesmo em qualquer parte mas aquele em espeacutecie natildeo eacute o mesmo em tudo o que tem espeacutecie pois haacute o que eacute composto por partes homogecircneas e haacute o que o eacute por partes heterogecircneas

Outro modo de indivisiacutevel eacute aquele que o eacute absolutamente ou seja indivisiacutevel em potecircncia e ato que se mostra agrave inteligecircncia como privaccedilatildeo do contiacutenuo e do divisiacutevel como o ponto o momento e a unidade Em outras palavras o entendimento daacute-se por privaccedilatildeo o objeto eacute conhecido tambeacutem pelo seu contraacuterio tanto em uma afirmaccedilatildeo como em uma negaccedilatildeo Como o que vem dos sentidos eacute o que eacute primeiro apreendido pelo intelecto o que ultrapassa o que natildeo eacute sentido eacute conhecido por negaccedilatildeo E de um modo semelhante se passa com aquilo que eacute conhecido por seu contraacuterio ou oposto e este se relaciona com aquele sempre como privaccedilatildeo ou ao menos como imperfeiccedilatildeo isto desde que o intelecto esteja em potecircncia para conhecer ambas as espeacutecies que satildeo entre si contraacuterias (cf ARISTOacuteTELES 2010 III 6 p 117-119 TOMAacuteS DE AQUINO 2000 III l 11 746-756)

Tomaacutes de Aquino diz ainda que os fantasmas seriam indivisiacuteveis somente em potecircncia mas natildeo em ato por sua semelhanccedila com os objetos particulares mas natildeo menciona se estaria apontando para um quarto modo (cf TOMAacuteS DE AQUINO 2000 III l 13 794)

481 TOMAacuteS DE AQUINO 1988 Art X p 88

482 Id 2009 p 151

483 Id 2000 II l 1 228

484 Ibid III l 13 791-792 Id 1988 Art I p 44

105

Explica o Pe Calderoacuten que o raciociacutenio como a terceira operaccedilatildeo do

intelecto pressupotildee a segunda operaccedilatildeo o juiacutezo ndash que tambeacutem pressupotildee a

primeira a simples apreensatildeo ndash sem confundir-se com ela e tomando-a como

elemento de sua estrutura mental assim como o juiacutezo pressupotildee a primeira a

simples apreensatildeo

Assim ele define o raciociacutenio

[] a operaccedilatildeo do intelecto pela qual se explica ou se desenvolve um juiacutezo manifestando o porquecirc ou a causa eacute uma nova espeacutecie de operaccedilatildeo do espiacuterito mais complexa que o juiacutezo composta por uma sequecircncia especial ou uma conexatildeo especial de juiacutezos eacute como um movimento de juiacutezos que termina em um juiacutezo de condiccedilatildeo especial ao qual se chama Conclusatildeo O juiacutezo comum significa uma simples atribuiccedilatildeo do predicado ao sujeito O sujeito eacute de tal predicado Em contrapartida no juiacutezo que eacute conclusatildeo de um raciociacutenio a atribuiccedilatildeo do predicado ao sujeito eacute uma atribuiccedilatildeo iluminada pela causa O sujeito eacute-por-tal-causa de tal predicado Por isso devemos distinguir a operaccedilatildeo do espiacuterito pela qual se compotildee ou divide desta outra pela qual se explica ou conclui

485

Tomaacutes de Aquino explica que a razatildeo e o entendimento no homem satildeo uma

mesma potecircncia mas distingue seus atos ldquo[] entender consiste na simples

apreensatildeo da verdade inteligiacutevel Em contrapartida raciocinar eacute passar de um

conceito a outro para conhecer a verdade inteligiacutevelrdquo486

E o mesmo Pe Calderoacuten fornece-nos o que nos resta para completar o que

aqui tiacutenhamos de expor sobre o intelecto e mais especificamente sobre esta terceira

operaccedilatildeo cuja obra imaterial segundo o aristotelismo-tomismo diz eacute a

argumentaccedilatildeo (argumentatio) caracterizada por uma ldquotriangulaccedilatildeordquo mental ldquoentre o

Sujeito a Propriedade e a Causardquo487

O juiacutezo incorpora os conceitos de simples apreensatildeo ao modo da mateacuteria sob uma nova forma Mas o raciociacutenio eacute como um movimento por isso natildeo dizemos que os juiacutezos que o compotildeem sejam ao modo de mateacuteria mas antes ao modo de extremos os que explicam a causa satildeo o lsquoantecedentersquo e a conclusatildeo eacute o lsquoconsequentersquo[] O raciociacutenio pode cumprir uma dupla

485

ldquo[] la operacioacuten del intelecto por la que se explica o desplega un juicio manifestando el porqueacute o la causa [] es una nueva especie de operacioacuten del espiacuteritu maacutes compleja que el juicio compuesta por una especial secuencia o conexioacuten de juiacutecios [] es como un movimiento de juicios que termina en un juicio de condicioacuten especial al que se lo llama Conclusioacuten [] El juicio comuacuten significa una simple atribuicioacuten del predicado al sujeto El sujeto es de tal predicado En cambio en el juicio que es conclusioacuten de un razonamiento la atribuicioacuten del predicado al sujeto es una atribucioacuten ilumiada por la causa El sujeto es-por-tal-causa de tal predicado Por eso debemos distinguir la operacioacuten del espiacuteritu por la que se compone o divide de esta otra por la que se explica o concluyerdquo CALDEROacuteN 2011 p 74-75

486 ldquo[] entender consiste en la simple aprehensioacuten de la verdad inteligible En cambio

raciocinar es pasar de un concepto a otro para conocer la verdad inteligiblerdquo TOMAacuteS DE AQUINO 2001 Q 79 a 8 p 732

487 ldquo[] el Sujeto la Propiedad y la Causa []rdquo CALDEROacuteN 2011 p 75

106

funccedilatildeo Demonstrar uma verdade conhecida [] Descobrir uma verdade conhecida []

488

Destrinccedilada a doutrina aristoteacutelico-tomista sobre os processos cognitivos no

acircmbito fiacutesico e metafiacutesico sob a oacuteptica dessa corrente havemos de destacar agora

os resultados de alguns dos principais estudos que apontam caracteriacutesticas nos

animais natildeo humanos em que se verifica a presenccedila de consciecircncia e de

inteligecircncia segundo as definiccedilotildees utilizadas nas uacuteltimas deacutecadas para que sejam

posteriormente discutidas a partir de um esquema de distinccedilatildeo entre as potecircncias

estimativa cogitativa e intelectiva

488

ldquoEl jucio incorpora los conceptos de simple aprehensioacuten a manera de materia bajo una nueva forma Pero el razonamiento es como un movimiento por eso no decimos que los jucios que lo componen sean a modo de materia sino maacutes bien a modo de exemos los que explican la causa son el lsquoantecedentersquo y la conclusioacuten es el lsquoconsecuentersquordquo CALDEROacuteN 2011 p 75

107

6 INVESTIGACcedilAtildeO SOBRE A ATRIBUICcedilAtildeO DE INTELIGEcircNCIA AOS ANIMAIS

A palavra ldquointeligecircnciardquo eacute atribuiacuteda hoje em dia a uma gama de entes

inclusive em casos curiosos como o de Physarum polycephalum do reino Protista

um protozoaacuterio que segundo Nakagaki e colaboradores489 expande seu plasmoacutedio

em redes tubulares seguindo padrotildees que otimizam o forrageamento Van Loon490

afirma que as plantas apresentam como que de algum modo correspondendo ao

sistema nervoso animal uma rede de ceacutelulas que satildeo as mais complexas dentre os

viventes da qual emergiriam propriedades que diz serem inteligentes e que

implicam algum tipo de memoacuteria e de aprendizagem relacionadas ao modo tambeacutem

otimizado de lidar com situaccedilotildees de estresse revividas seja de natureza climaacutetica

predatoacuteria etc

No entanto somente os entes do reino Animalia apresentam uma estrutura

neural que lhes permite realizar operaccedilotildees cognitivas mais avanccediladas Assim nesta

etapa mencionaremos e descreveremos algumas pesquisas desenvolvidas com

alguns desses entes (ver tabelas 2-7) a fim de que possamos reunir um material que

nos forneccedila subsiacutedio para o cumprimento dos objetivos deste trabalho

Pesquisas como as de Dyer491 as de Menzel e colaboradores492 e as de

Collett e colaboradores493 demonstram que himenoacutepteros podem memorizar uma

miriacuteade de marcos de referecircncia espacial que satildeo calculados de diferentes modos e

servem de orientaccedilatildeo para o retorno agrave colmeia depois de percorridas longas

distacircncias em busca de alimento e tambeacutem posteriormente ao local visitado O

percurso pode ser feito ateacute por atalhos o que parece implicar a tomada de decisatildeo

(ldquodecision-makingrdquo) e inclusive por trilha de feromocircnios Collett e Graham494

demonstram que os indiviacuteduos mais novos podem aprender rotas seguindo outros

coespeciacuteficos

Em uma revisatildeo Brown495 aponta nos peixes essas caracteriacutesticas e relata

tambeacutem que eles apresentam relaccedilotildees de cooperaccedilatildeo entre si (por exemplo na

489

NAKAGAKI et al 2004 490

VAN LOON 2016 491

DYER 1994 492

MENZEL et al 2005 493

COLLETT et al 2013 494

COLLETT GRAHAM 2015 495

BROWN 2015

108

vigilacircncia contra predadores) reconciliam-se usam ferramentas (como pedras para

quebrar conchas de mariscos) etc

Os cefaloacutepodes tambeacutem apresentam caracteriacutesticas cognitivas marcantes

Mather e Dickel496 descrevem em uma revisatildeo a complexa estrutura neural desses

animais e apontam habilidades como a de discriminar ameaccedilas e avaliar e

categorizar os riscos que representam a de modificar e combinar reaccedilotildees para lidar

com predadores a de resolver testes cognitivos passando objetos por furos a

mudanccedila sofisticada de cor na epiderme para camuflagem e como meio de atraccedilatildeo

da fecircmea a transferecircncia de objetos para servirem de abrigo etc que mostram que

tecircm flexibilidade para diversificar accedilotildees que visem a determinado fim o que sugere

que possuam imaginaccedilatildeo capacidade desenvolvida de tomada de decisatildeo e algum

senso de causalidade e prospecccedilatildeo

Fiorito e colaboradores497 realizaram um conhecido experimento em que um

polvo (Octopus vulgaris) abria a tampa de um frasco para capturar uma presa dentro

deste o que aprendeu por tentativa e erro ou por associaccedilotildees de estiacutemulo e

resposta Em outro teste Fiorito e Scotto498 ensinaram alguns espeacutecimes a

escolherem bolas vermelhas como recompensa e a rejeitarem bolas azuis para

natildeo sofrerem puniccedilatildeo enquanto outros espeacutecimes observavam Quando aqueles

aprenderam a escolher a bola vermelha em todas as tentativas esses observadores

foram em seguida tambeacutem testados e escolheram majoritariamente as bolas

vermelhas Os pesquisadores concluiacuteram que os resultados sugerem que esses

indiviacuteduos aprenderam por observaccedilatildeo

Mather e Byrne e colaboradores499 apontam para a lateralizaccedilatildeo assimeacutetrica

nesses animais (movimentam os olhos independentemente um do outro tendo por

preferecircncia a visatildeo monocular) muito rara em invertebrados e comum nos

mamiacuteferos e nas aves

Quanto a estas apresentam desempenho muito proacuteximo ao dos mamiacuteferos

natildeo humanos Os pombos assim como os ratos foram utilizados largamente em

testes cognitivos como nas famosas pesquisas de Skinner Estudos mais recentes

496

MATHER DICKEL 2017 497

FIORITO VON PLANTA SCOTTO 1990 498

FIORITO SCOTTO 1992 499

MATHER 2008 BYRNE et al 2002

109

como os de Bouchard e colaboradores500 exemplificam as habilidades de Columba

livia como o comportamento inovador e a aprendizagem social501

O uso de instrumentos tambeacutem eacute observado em muitas aves como o

tentilhatildeo pica-pau (Camarhynchus pallidus) que utiliza gravetos ou espinhos de

cactos com grande frequecircncia para retirar larvas de troncos por pequenos

orifiacutecios502 Tebbich e Bshary503 testaram espeacutecimes que conseguiram retirar larvas

de tubos com gravetos mesmo quando foi necessaacuterio antes remover outro objeto em

forma de ldquoHrdquo que dificultava a tarefa

Roelofs504 descreve tambeacutem em uma revisatildeo uma gama de outros usos de

instrumentos como o de pedras por certas aves de rapina como o abutre-do-egito

(Neophron percnopterus) com o fim de quebrar ovos e abater presas o de presas

como esponjas para levar aacutegua para a prole observado em melro-preto cervejeiro

(Euphagus cyanocephalus) ou fazendo-o com musgos como a cegonha (Ciconia

ciconia) o de pedaccedilos de patildees insetos gravetos etc lanccedilados na aacutegua para atrair

peixes como presas como o fazem os socoacutes-mirins (Butorides sp) o que tambeacutem jaacute

foi observado em outras espeacutecies como o martim-pescador (Ceryle rudis) o

milhafre-preto (Milvus migrans) e a gaivota-de-asa-escura (Larus fuscus)

Jaacute se viram corviacutedeos realizando todas essas atividades mencionadas com

instrumentos alguns dos quais eles mesmos produzem especialmente a partir do

gecircnero botacircnico Pandanus sp505 e outras mais como a utilizaccedilatildeo de objetos como

armas que lanccedilam ou deixam cair no oponente com o fim de afastaacute-lo seja para

alimentarem-se seja para livrarem-se de ameaccedila ao ninho ou para defenderem-se

a si mesmos etc

E natildeo por nada esta famiacutelia de passeriformes eacute a que mais tem ganho

destaque dentre as aves em testes cognitivos Isto pode exemplificar-se tambeacutem por

estudos como o de Lefebvre e colaboradores506 que mostra reforccedilando a hipoacutetese

500

BOUCHARD et al 2007 501

Aqui especificamente utilizou-se uma caixa de acriacutelico com sementes em seu interior que os animais poderiam acessar bicando empurrando puxando ou levantando tampas e gavetas Para correlacionar agrave aprendizagem social realizou-se outro teste com uma caixa contendo alimento ocultado por um objeto como uma rolha ou um tubo que deveria ser girado e removido para que caiacutesse o alimento impedindo o acesso a um espeacutecime qualquer natildeo treinado que teria entatildeo de observar outro jaacute treinado realizar a tarefa para aprender como acessar o alimento

502 EIBL‐EIBESFELDT 1961

503 TEBBICH BSHARY 2004

504 ROELOFS 2010

505 HUNT GRAY 2003

506 LEFEBVRE et al 2004

110

que leva em conta o quociente de encefalizaccedilatildeo que com seu maior volume

cerebral em relaccedilatildeo ao tamanho corporal seus membros possuem melhores

desempenhos em muitos aspectos como no quesito inovaccedilatildeo (novas formas de

conseguir alimento de fugir etc) A relaccedilatildeo entre o tamanho do seu ceacuterebro e o do

corpo seria proporcional a essa mesma relaccedilatildeo nos chimpanzeacutes507 e ainda que haja

diferenccedilas significativas em suas estruturas cerebrais apresentam grandes

semelhanccedilas cognitivas no acircmbito comportamental508 Estudos como o de

Wimpenny e colaboradores509 aqui com corvos-da-nova-caledocircnia (Corvus

moneduloides) mostram o ecircxito desses animais em experimentos que envolvem o

uso sequencial de instrumentos Aos animais testados oferecia-se um instrumento

mais curto que era como uma vareta com um suporte na ponta com o qual teriam

de alcanccedilar em aparatos de parede incolor com abertura pequena outro objeto

semelhante poreacutem mais comprido para com este ou obterem a recompensa ou

caso natildeo conseguissem pegarem outro ainda mais longo para entatildeo alcanccedilaacute-la Em

uma das etapas diante da impossibilidade de retirar a recompensa com o objeto

inicialmente disponiacutevel e tendo falhando em retirar o objeto mais longo um animal

voltou ao aviaacuterio de onde retornou trazendo um galho que utilizou para retirar

agora com sucesso o objeto mais longo com o qual obteve por fim o alimento

Um desses experimentos este com resoluccedilatildeo de problemas em oito passos

realizado pelo doutor Alex Taylor da Universidade de Auckland na Nova Zelacircndia

ganhou fama internacional por ter sido transmitido pela BBC de Londres510 Nele um

corvo-da-nova-caledocircnia retira inicialmente uma vareta suspensa em uma corda

puxando-a para o galho sobre o qual estaacute e onde ela estaacute pendurada Em seguida

se dirige para uma fila de trecircs gaiolas lado a lado cada uma contendo uma pedra

As trecircs pedras satildeo retiradas pelo corvo com a utilizaccedilatildeo da vareta e entatildeo levadas

ateacute uma caixa de acriacutelico com abertura superior Apoacutes o animal atirar ali a terceira

pedra a base da caixa cede liberando uma vareta maior com a qual o corvo

finalmente puxa a recompensa pela abertura estreita de outra caixa de acriacutelico na

qual se encontra

507

EMERY CLAYTON 2004 508

EMERY 2006 509

WIMPENNY 2009 510

BRITISH BROADCASTING CORPORATION 2014

111

Nos experimentos de Jelbert e colaboradores511 corvos-da-nova-caledocircnia

teriam de soltar objetos dentro de tubos a fim de que o niacutevel da aacutegua dentro destes

subisse e trouxesse a recompensa flutuante Os pesquisadores realizaram os testes

em seis condiccedilotildees a primeira com dois tubos sendo um com aacutegua e outro com

terra a segunda com dois tipos de objetos sendo um que afundava e fazia o niacutevel

da aacutegua subir e outro que simplesmente boiava na terceira havia dentre os objetos

alguns ocos que fariam subir muito pouco o niacutevel da aacutegua na quarta um tubo mais

estreito e outro mais largo com o niacutevel da aacutegua na mesma altura em ambos a

quinta com o tubo mais estreito com a altura do niacutevel da aacutegua bem mais baixa e o

sexto com trecircs tubos sendo que dois interconectados por baixo em forma de ldquoUrdquo e

um isolado Nesses dois o do meio no qual estava a recompensa era mais estreito

de modo que os objetos natildeo poderiam ser soltos dentro dele Salvo no quarto e no

sexto experimento os animais escolheram predominantemente aquilo que lhes

proporcionaria a recompensa ou que lhes proporcionaria a recompensa mais

rapidamente No caso do quarto teste os autores sugerem hipoacuteteses como a de que

os animais teriam dificuldade em ver no volume dos tubos um fator de causalidade

ou a de que teriam mais dificuldades de ver a funcionalidade no substrato (a aacutegua)

enquanto a veriam no instrumento (os objetos) sem descartarem a hipoacutetese de os

animais conseguirem ter mais sucesso em prazo mais longo Em relaccedilatildeo ao sexto

experimento somente quatro indiviacuteduos o realizaram o que os pesquisadores

consideraram ser uma amostragem insuficiente para chegarem a conclusotildees sobre

a espeacutecie mas levando em consideraccedilatildeo que o deslocamento da aacutegua seria uma

caracteriacutestica insuficiente para que inferissem que haveria uma conexatildeo que lhes

estivesse oculta

Tambeacutem Jelbert e colaboradores512 forneceram a primeira evidecircncia de que

os corvos-da-nova-caledocircnia podem manufaturar objetos a partir de um modelo

mental Diante de um aparato em que se tinha de inserir cartotildees de papel de

tamanho especiacutefico para que se recebesse a recompensa havia outras folhas de

papel disponiacuteveis Estas foram recortadas com o bico por alguns dos espeacutecimes

testados que haviam sido previamente treinados para lidar com o aparato mas natildeo

para o recorte

511

JELBERT et al 2014 512

JELBERT et al 2018

112

Em outro estudo a fim de testar se os corviacutedeos poderiam estabelecer

relaccedilotildees analoacutegicas Smirnova e colaboradores513 submeteram duas gralhas-

cinzentas (Corvus cornix) a treinamento com IMTS (ldquoidentity matching-to-samplerdquo) a

partir de placas contendo pares de figuras de ciacuterculo triacircngulo quadrado e cruz em

azul vermelho amarelo ou verde dispostas diagonalmente a fim de verificar

posteriormente se realizariam os testes de RMTS (ldquorelational matching-to-

samplerdquo)514 a partir de placas contendo cada uma um par de ciacuterculos quadrados ou

triacircngulos pretos dispostos lado a lado com tamanhos iguais ou diferentes Os

pesquisadores natildeo treinaram os animais para tamanho mas somente para nuacutemero

de figuras tipo de siacutembolo e cor do siacutembolo Eles apresentaram para as aves uma

bandeja com trecircs placas cada uma contendo duas figuras A do meio situava-se

diretamente sobre a bandeja ao passo que as outras duas repousavam cada uma

sobre um copo sendo que somente aquela que teria alguma correspondecircncia com a

do meio fosse de forma (igual ou diferente) de cor ou no caso do teste RMTS de

tamanho conteria a recompensa As placas eram oferecidas com diferentes

combinaccedilotildees e as aves assim teriam de identificar o tipo de correspondecircncia

apresentada ali antes de efetivar sua escolha Diante do ecircxito das gralhas os

pesquisadores sugeriram que elas teriam reconhecido relaccedilotildees de relaccedilotildees e que

entatildeo haveria raciociacutenio analoacutegico com abstraccedilatildeo nesses animais

Haacute muitas outras pesquisas demonstrando habilidades dos corviacutedeos em

razatildeo de seu sucesso em tantos testes cognitivos como as de Bugnyar e

colaboradores que sugeriram a partir de alguns experimentos como um em que os

espeacutecimes de Corvus corax em um recinto com uma pequena abertura para outro ao

lado que era aberta e fechada onde estaria outro indiviacuteduo guardavam o alimento

mais rapidamente quando pensavam estar sendo vigiados (e mesmo quando a

abertura estava fechada e os pesquisadores colocavam uma gravaccedilatildeo de som de

um coespeciacutefico) sejam caracterizados como apresentando ldquoteoria da menterdquo515 a

de Prior Schwarz e Guumlntuumlrkuumln516 que demonstrou que uma pega-rabilonga (Pica

pica) reconheceu-se em um espelho e a de Swift517 que estudou corviacutedeos

513

SMIRNOVA et al 2015 514

Respectivamente ldquocorrespondecircncia para amostra de identidaderdquo e ldquocorrespondecircncia para amostra relacionalrdquo

515 BUGNYAR et al 2016

516 PRIOR SCHWARZ GUumlNTUumlRKUumlN 2008

517 SWIFT 2015

113

visitando funerais de coespeciacuteficos para investigarem a causa de sua morte e

descobrir se representa ou natildeo perigo para o bando

Ainda dentre as aves os psitaciacutedeos tambeacutem exibem comportamentos

marcantes Roelofs518 aponta o uso de objetos para percussatildeo como exibiccedilatildeo de

gravetos para coccedilarem-se dentre muitas outras habilidades O caso do papagaio-

cinzento (Psittacus erithacus) Alex foi provavelmente o mais notaacutevel Peperberg519

afirma que ele aprendeu a identificar nomes de objetos materiais520 cores e formas

inclusive as categorias em que um item poderia classificar-se dentro desses

atributos aprendeu a diferenccedila entre similaridade e diferenccedila repetia frases

funcionais quando queria obter algo ou ir a algum lugar etc Alex foi ensinado a usar

a palavra ldquonone [nenhum(a)]rdquo quando natildeo houvesse categoria presente e que em

certa ocasiatildeo ele espontaneamente passou a aplicar o termo diante da ausecircncia de

um exemplar qualquer de uma dessas categorias A primeira vez que o fez foi em

relaccedilatildeo a um nuacutemero o trecircs relacionado a algo ausente Sua resposta foi citar o

cinco que tambeacutem se relacionava a uma ausecircncia e persistir ateacute ser indagado e

dizer o ldquononerdquo Peperberg daacute ecircnfase a isto por entender que Alex teria iniciado um

toacutepico Ele natildeo soacute aprendeu mais de cem palavras como aprendeu a criar novas

palavras combinando as que jaacute conhecia como quando disse ldquobanerryrdquo aglutinando

ldquobananardquo com ldquocherry [cereja]rdquo para denominar uma maccedilatilde ou seja compreendeu

que a partir de padrotildees sonoros independentes pode-se criar denominaccedilotildees

concluiu a pesquisadora521

A fim de testar a chamada competecircncia numeacuterica de Alex522 uma bandeja

com trecircs tipos diferentes de alimento (nozes jujubas e doces em forma de coraccedilatildeo)

era-lhe mostrada com estes dispostos sob dois copos de modo que cada tipo ou

natildeo estaria presente ou estaria em certa quantidade em ateacute seis unidades Essas

mesmas quantidades eram sempre que possiacutevel representadas em disposiccedilotildees

distintas distribuiacutedas entre os dois copos Em seguida depois de dois a trecircs

segundos de exibiccedilatildeo alternada cada copo era reposicionado sobre os doces Para

cada rodada o experimentador perguntava a Alex que jaacute natildeo via os alimentos

quantos de determinado tipo estavam na bandeja Esse tipo de teste foi repetido

518

ROELOFS 2010 519

PEPERBERG 2006 520

Aquilo de que algo eacute feito 521

PEPERBERG 2007 522

Id 2006

114

posteriormente com algarismos de numerais araacutebicos sem que Alex que

demonstrou algum ecircxito tivesse sido treinado para essa transposiccedilatildeo a partir de

quantidade de itens e tambeacutem com trecircs amostras de recompensa para soma por

bandeja523 Com itens Alex realizou somas que iam de 1 a 6 e com algarismos

realizou somas que iam de 1 a 5

A competecircncia numeacuterica foi testada em outros animais como os pombos (C

livia) como no estudo de Xia Siemann e Delius524 em que os animais trabalharam

ateacute o nuacutemero seis associando numerosidade de siacutembolos em chaves agrave quantidade

de bicadas nestas (indicada por esses siacutembolos) e no de Scarf e colaboradores525

com pares crescentes de algarismos bicados em uma tela em que se trabalhou ateacute

o nuacutemero nove do que concluiacuteram os autores que a competecircncia numeacuterica dos

pombos equivaleria agrave dos grandes primatas da qual se falaraacute mais adiante

Retornando aos psitaciacutedeos Heaney Gray e Taylor526 testaram papagaios-

da-nova-zelacircndia (Nestor notabilis) para tarefa que soacute se poderia concluir-se se

fosse realizada em colaboraccedilatildeo simultacircnea Consistia em uma bandeja em formato

de ldquoUrdquo contendo uma recompensa de cada lado encaixada entre dois suportes

podendo somente ser movida se duas aves a puxassem ao mesmo tempo ateacute a

gaiola onde se encontravam uma das cordas presas em cada uma das duas

extremidades da bandeja O teste foi realizado com a soltura das aves no local do

experimento simultaneamente e depois com um pequeno intervalo de tempo de

diferenccedila entre uma e outra Segundo os pesquisadores o desempenho dessas

aves foi semelhante ao de chimpanzeacutes e elefantes

Eacute destes uacuteltimos que trataremos agora passando a explorar a classe

Mammalia

61 ELEPHANTIDAE

Classificam-se os indiviacuteduos desta famiacutelia conhecidos atualmente em trecircs

espeacutecies a saber uma de elefante asiaacutetico Elephas maximus e duas de elefantes

africanos sendo uma das savanas Loxodonta africana e outra das florestas

Loxodonta cyclotis

523

PEPERBERG 2012 524

XIA SIEMANN DELIUS 2000 525

SCARF et al 2011 526

HEANEY GRAY TAYLOR 2017

115

O ceacuterebro desses espeacutecimes que pesa cerca de seis quilos527 possui

elevado quociente de relaccedilatildeo entre ceacuterebro e peso corporal com neocoacutertex bastante

desenvolvido e grande densidade neuronal528

Por tratar-se do maior ceacuterebro dentre os animais terrestres citamos

brevemente algumas caracteriacutesticas Shoshani e colaboradores529 apontam

telenceacutefalo com sulcos e giros bem desenvolvidos mostrando um grau de

complexidade intermediaacuterio em relaccedilatildeo aos ceacuterebros dos primatas e dos cetaacuteceos

Dentre as principais diferenccedilas entre o ceacuterebro humano e o do elefante estatildeo o

tamanho e as proporccedilotildees dos lobos a configuraccedilatildeo do sistema ventricular as

diferenccedilas na complexidade e no padratildeo giral tamanho do nervo olfatoacuterio e da

glacircndula pituitaacuteria maior nos elefantes e da pineal maior nos humanos Os

elefantes tecircm um lobo frontal proporcionalmente menor que o dos humanos e lobos

parietal e occipital menos definidos que o destes e iacutensula opercularizada

incompleta No cerebelo observa-se maior tamanho e complexidade giral Segundo

Jacobs e colaboradores530 o ceacuterebro do elefante eacute cerca de trecircs vezes maior que o

dos humanos e sua pesquisa aponta que em comparaccedilatildeo com os neurocircnios

piramidais supragranulares destes os neurocircnios piramidais superficiais daqueles

satildeo maiores menos densos e com padrotildees de ramificaccedilatildeo menos complexos e

exibem semelhante meacutedia de comprimento dendriacutetico basilar com segmentos

dendriacuteticos mais longos e ramificaccedilotildees menos complexas

Os elefantes apresentam um comportamento social natildeo aleatoacuterio e estaacutevel531

com relaccedilotildees duradouras entre indiviacuteduos que se autorreconhecem apresentam

empatia com capacidade de aprendizado e de transmissatildeo de informaccedilotildees e de

habilidades praacuteticas que interagem em geral a partir de comportamentos

convencionais incluindo comportamentos estrateacutegicos532 Sua comunicaccedilatildeo parece

dar-se a ateacute dois quilocircmetros e meio mas a resposta eacute obtida mais comumente em

distacircncias entre um quilocircmetro e um quilocircmetro e meio segundo a pesquisa

envolvendo aparelhagem de aacuteudio com reproduccedilatildeo de infrassons de Mccomb e

colaboradores533 Vivem em bandos de trecircs a cem indiviacuteduos os machos por vezes

527

RENSH 1956 528

LOCKE 2013 529

SHOSHANI et al 2006 530

JACOBS et al 2011 531

WITTEMYER DOUGLAS-HAMILTON GETZ 2005 532

LOCKE 2013 533

MCCOMB et al 2003

116

constituem grupos pequenos de dois a quatro indiviacuteduos ao passo que os grandes

grupos satildeo integrados basicamente por fecircmeas e filhotes liderados por matriarcas

que os conduzem aos locais em que haacute aacutegua e alimento Na criaccedilatildeo dos filhotes em

que satildeo amamentados ateacute aproximadamente o quinto ano de vida suas irmatildes e tias

atuam colaborativamente Ao crescerem as fecircmeas permanecem durante toda a

vida em seu grupo enquanto os machos os abandonam por volta dos doze a quinze

anos de idade em busca de parceiras para o acasalamento534

O trabalho de Wittemyer Douglas-Hamilton e Getz 535 foi o primeiro a apontar

estatisticamente quatro camadas de hierarquia social que expressam diferentes

respostas agraves variaccedilotildees temporais e sazonais nesses grupos com meacutetodos

quantitativos mais rigorosos mas indica outros anteriores sendo ateacute entatildeo mais

recente o de Moss e Poole536 que descreveram ateacute seis camadas que vatildeo desde a

interaccedilatildeo entre matildee e filhote ateacute o niacutevel populacional

Descreveremos algumas de suas habilidades cognitivas comeccedilando por

aquelas observadas em estudos em campo e em seguida abordaremos as que

foram verificadas em experimentos realizados em cativeiro com indiviacuteduos

domesticados Faremos o mesmo posteriormente quando tratarmos de primatas e

de golfinhos mas natildeo com os catildees jaacute que o que nos leva a dar-lhes enfoque eacute a

sua relaccedilatildeo com os humanos

611 Observaccedilotildees de Campo

No que concerne agraves observaccedilotildees de campo Bates e colaboradores537

distinguiram as seguintes interaccedilotildees comportamentais

- coalisatildeo ou seja uniatildeo com um ou mais indiviacuteduos para opor-se a outro ou

a outros tanto com fins de ameaccedila como de defesa de ameaccedila

- proteccedilatildeo seja de indiviacuteduos mais jovens contra predadores contra

indiviacuteduos maiores da proacutepria espeacutecie seja interrompendo brigas entre jovens etc

- conforto por indiviacuteduos adultos de filhotes em situaccedilatildeo de estresse

- cuidado por outros indiviacuteduos adultos com filhote na ausecircncia da matildee (o

que foi verificado somente em alguns casos)

534

IRIE HASEGAWA 2009 535

WITTEMYER DOUGLAS-HAMILTON GETZ 2005 536

MOSS POLE 1983 537

BATES et al 2008

117

- resgate como a conduccedilatildeo de um filhote perdido de volta ao grupo e agrave matildee

- auxiacutelio por exemplo relacionado agrave mobilidade como em caso de

atolamento ou na remoccedilatildeo de objetos estranhos em casos em que a viacutetima se

mostra de algum modo enfraquecida (como se verifica em casos de remoccedilatildeo com a

tromba de um dardo tranquilizante que tenha atingido outro membro do grupo ou

em casos em que a matildee remove resiacuteduos descartados por humanos presos na boca

de um filhote)

Essas interaccedilotildees indicam segundo os pesquisadores a existecircncia de

determinadas percepccedilotildees de natureza empaacutetica como

- a de que os outros geram comportamento espontaneamente ou seja satildeo

agentes animados (por exemplo o reconhecimento da imobilidade de outro indiviacuteduo

como uma anomalia)

- a de que pode haver direcionamento a partir de certos comportamentos para

objetivos especiacuteficos (por exemplo um macho persegue uma fecircmea em periacuteodo

feacutertil para o acasalamento)

- a de que haacute emoccedilotildees diferentes nos outros (por exemplo o apaziguamento

de jovens de humor alterado)

- a de que haacute competecircncias fiacutesicas como vulnerabilidades e habilidades

diferentes nos outros (por exemplo a percepccedilatildeo de que um filhote natildeo consegue

ultrapassar uma cerca)

- a de que haacute percepccedilatildeo particular nos outros (por exemplo o reconhecimento

de que o outro espeacutecime natildeo estaacute percebendo um determinado perigo em

determinada situaccedilatildeo)

- a de que haacute intenccedilotildees e necessidades diferentes nos outros (por exemplo a

percepccedilatildeo de um espeacutecime que tenta livrar-se do atoleiro)

- e a de que haacute crenccedilas e entendimentos diferentes nos outros (por exemplo

quando um espeacutecime prevecirc que o filhote de outro poderaacute ingerir algum alimento

venenoso e entatildeo interfere para salvar-lhe)

Plotnik e de Waal538 reforccedilaram ainda os estudos sobre o consolo apoacutes um

episoacutedio de sofrimento constatando que aleacutem do contato fiacutesico natildeo solicitado como

a tromba de uma fecircmea adulta na boca de um filhote aflito os elefantes tambeacutem

usam vocalizaccedilatildeo para o conforto reforccedilando a hipoacutetese da empatia do interesse

538

PLOTNIK DE WAAL 2014

118

no estado emocional de outro membro da espeacutecie em quem os animais identificam o

papel de viacutetima que passa por um momento de anguacutestia Essas respostas

emocionais podem provocar contaacutegio emocional fazendo com que muitos outros

indiviacuteduos exibam o mesmo estado emocional do primeiro e pode ateacute ser de

natureza universal ou seja causar a mesma reaccedilatildeo emocional em todos os demais

indiviacuteduos presentes do grupo Essa interaccedilatildeo de conforto de indiviacuteduos aflitos

reforccedila a comunicaccedilatildeo desses animais por meios sonoros e taacuteteis

Os estudos de populaccedilotildees realizados por McComb e colaboradores de 2007

a 2009539 forneceram evidecircncias de que diante de desafios enfrentados pelo grupo

de Loxodonta africana como a presenccedila de predadores satildeo as matriarcas mais

velhas que tomam as melhores decisotildees para o grupo Os pesquisadores

perceberam que os elefantes distinguem niacuteveis de ameaccedila inclusive dentro de uma

mesma classe de predadores como grupos eacutetnicos humanos a partir de sinais

olfativos e visuais

Esses resultados satildeo corroborados com o estudo de Soltis e colaboradores540

de indiviacuteduos da espeacutecie Loxodonta africana sob ameaccedila de abelhas e sob ameaccedila

de humanos no qual se observou que os elefantes estabelecem distinccedilotildees entre os

dois tipos de ameaccedila e manifestam comportamentos especiacuteficos para cada um dos

dois casos Esses comportamentos incluem a emissatildeo de sons de alerta aos demais

membros do grupo diante do que os pesquisadores concluiacuteram que os animais

emitem sons segundo niacuteveis de urgecircncia conforme a natureza das ameaccedilas

McComb e colaboradores541 presenciaram elefantes reconhecendo cracircnios de

membros de sua espeacutecie em meio aos de outras espeacutecies A atenccedilatildeo dos animais

foi atraiacuteda tambeacutem pelos marfins que eles investigaram com a tromba e uma das

patas

Jaacute Douglas-Hamilton e colaboradores542 registraram os sete dias que se

seguiram agrave morte de uma matriarca observando o interesse no cadaacutever tanto por

parte de membros de outros grupos como por parte dos membros do grupo dela

cujas visitas em frequecircncia duraccedilatildeo e nuacutemero de indiviacuteduos foram gradualmente

diminuindo durante o periacuteodo de observaccedilatildeo dos pesquisadores

539

MCCOMB et al 2011 540

SOLTIS et al 2014 541

MCCOMB BAKER MOSS 2006 542

DOUGLAS-HAMILTON et al 2006

119

612 Estudos experimentais

Smet e colaboradores543 verificaram em elefantes africanos a habilidade de

seguir gestos de indicaccedilatildeo humanos alguns inclusive sutis Eles testaram onze

espeacutecimes criados em cativeiro que falharam somente nos testes que envolviam

exclusivamente o olhar do experimentador para certa direccedilatildeo para encontrar

alimentos previamente escondidos E mesmo quando natildeo havia nenhum gesto os

animais guiaram-se pela posiccedilatildeo do corpo humano que era no entanto

desconsiderada quando havia algum gesto Acreditam os autores da pesquisa que

nenhum desses indiviacuteduos havia sido treinado anteriormente e que natildeo teria havido

oportunidades extensivas para tal aprendizado

Esses animais no entanto apresentam uma consideraacutevel capacidade de

retenccedilatildeo de memoacuteria espaccedilo-temporal tal como demonstrado por experimentos

como os de discriminaccedilatildeo entre luz e escuridatildeo realizados por Markowitz e

colaboradores544 com a utilizaccedilatildeo de um aparato de madeira compensada de pouco

mais de dois metros de altura com um painel em que espeacutecimes de Elephas

maximus acionavam um interruptor Esses animais jaacute tinham passado pelo mesmo

experimento oito anos antes e logo se recordaram do que teriam de fazer para obter

a recompensa

Irie-Sujimoto545 sugeriu que os elefantes possuem um conhecimento

conceitual sobre a relaccedilatildeo entre meio e fim com base em experimento de Piaget

que apontou a presenccedila dessa habilidade em crianccedilas de onze meses de idade

Essa habilidade indica a possibilidade de definiccedilatildeo de objetivos e um

comportamento direcionado para a tentativa de alcanccedilaacute-los Nesse estudo se

forneceu duas taacutebuas a dois elefantes asiaacuteticos sob quatro condiccedilotildees diferentes Na

primeira uma delas serviu como suporte para que o alimento fosse trazido ao seu

alcance enquanto a outra estava vazia e na segunda havia uma com alimento e

outra com o alimento colocado fora dela ao lado na terceira alteraram-se as cores e

as dimensotildees das taacutebuas repetindo a primeira condiccedilatildeo e na quarta as duas taacutebuas

continham alimento sendo que uma delas era partida e colocou-se o alimento na

parte que natildeo podia ser puxada Um dos animais realizou com relativo sucesso

todos os experimentos Diante das duas primeiras condiccedilotildees ambos aprenderam

543

SMET et al 2013 544

MARKOWITZ et al 1975 545

IRIE-SUJIMOTO 2008

120

que se puxassem a bandeja certa obteriam o alimento na terceira condiccedilatildeo um

animal ficou desmotivado e no outro se verificou a transferecircncia do aprendizado

para as novas condiccedilotildees por fazer distinccedilatildeo entre as caracteriacutesticas relevantes e as

irrelevantes para o problema e mediante a quarta condiccedilatildeo verificou-se que o

animal compreendeu raacutepida e corretamente a relaccedilatildeo espacial entre o alimento e a

bandeja

Com o fim de estudar a capacidade de cooperaccedilatildeo Plotnik e colaboradores546

realizaram um teste semelhante ao descrito anteriormente com psitaciacutedeos no qual

dois elefantes teriam de puxar cada um uma de duas cordas amarradas a uma

taacutebua contendo alimento Somente se os dois puxassem juntos e ao mesmo tempo

obteriam a recompensa O experimento foi realizado com sucesso com o

desempenho melhorando apoacutes o primeiro dia e sugeriu haver reconhecimento da

necessidade de um parceiro para o teste onde inclusive um aguardava a chegada

do outro para realizaccedilatildeo da tarefa quando a chegada deste era intencionalmente

retardada pelos experimentadores

Em outro estudo Foerder e colaboradores547 observaram um elefante asiaacutetico

macho utilizar um cubo para erguer-se nas patas dianteiras e alcanccedilar um ramo de

bambu com frutos preso em uma corda suspensa Quando a localizaccedilatildeo do alimento

foi modificada o animal espontaneamente empurrou o cubo ateacute o local ergueu-se

sobre ele e alcanccedilou o alimento Apoacutes a retirada do cubo do local pelos

pesquisadores o espeacutecime primeiramente tentou substituiacute-lo por uma bola e em

seguida empilhou objetos como taacutebuas para tentar sem sucesso nesta etapa

alcanccedilar seu objetivo Os testes demonstrarama capacidade nestes espeacutecimes de

resolver problemas com uso de instrumentos de modo suacutebito e perspicaz segundo

os pesquisadores natildeo precedido de tentativa e erro

Ainda em meados do uacuteltimo seacuteculo Rensch548 realizou estudos com pares de

padrotildees de figuras em cartas em que estas eram memorizadas por um elefante

indiano jovem e depois reapresentadas aleatoriamente e retiradas por este com a

tromba recebendo entatildeo a recompensa mediante o acerto O animal obteve

resultados exitosos e um ano depois ele demonstrou ter retido quase toda a

546

PLOTNIK et al 2011 547

FOERDER et al 2011 548

RENSCH 1956

121

informaccedilatildeo um tempo consideraacutevel em comparaccedilatildeo com a capacidade de

memorizaccedilatildeo de animais de porte menor

Rensh549 seguiu realizando experimentos com padrotildees de imagens e

observou elefantes indianos com idade entre vinte e sessenta anos reagindo a vinte

e um a vinte e quatro comandos verbais diferentes memorizando o sentido de vinte

pares de estiacutemulo ndash Lewis550 poreacutem afirmou que um elefante bem treinado chega a

reconhecer cerca de cem comandos entre palavras e frases Na tentativa de

identificar alguma capacidade de abstraccedilatildeo as cartas foram separadas de sua dupla

de padratildeo correspondente e o pesquisador verificou que uma fecircmea reconheceu a

caracteriacutestica essencial do padratildeo em questatildeo Ela parece ter desenvolvido a ideia

de cruz a de cruzamento de duas barras pretas e em um experimento onde isto

ficou mais claro o par de imagens original apresentava o padratildeo de listras uma

carta com listras com dois centiacutemetros de largura e outra com listras com quatro

centiacutemetros de largura A primeira carta foi apontada como positiva Quando as

larguras foram alteradas para um centiacutemetro e meio e dois centiacutemetros a elefanta

escolheu a primeira com listras mais estreitas mostrando que ela percebeu que a

escolha correta era a de um padratildeo de listras mais estreitas As cartas originais

foram reapresentadas e ela mais uma vez escolheu corretamente

Para a compreensatildeo de nuacutemeros o pesquisador usou um par de cartas em

que uma continha trecircs pontos (ciacuterculos pretos) e a outra quatro Positivou-se a carta

de trecircs pontos e entatildeo foram apresentadas configuraccedilotildees diferentes de trecircs pontos

em linha horizontal em linha vertical como triacircngulo equilaacutetero e outros formatos

em seguida fez-se o mesmo com quatro pontos O ecircxito relacionado a esse

vocabulaacuterio de comandos foi verificado um ano depois sem que neste periacuteodo o

animal tivesse tido contato com as cartas

Um colaborador de Rensch tambeacutem desenvolveu tarefa similar com sons em

que aos tons positivos o animal respondia batendo com a tromba na tampa de uma

caixa de distribuiccedilatildeo de um aparelho que o recompensava com alimento Ele

reconheceu doze tons em seis pares de sons Em seguida repetiram o experimento

com melodias e a elefanta reconheceu todas as que lhe foram apresentadas

mesmo depois de terem alterados o ritmo o tempo a intensidade a frequecircncia e os

instrumentos dos mais variados timbres

549

RENSCH 1957 550

LEWIS 1971 apud HART 1994

122

Experimentos semelhantes com pares de estiacutemulos foram realizados por

colaboradores de Rensh com cavalo (Equus ferus caballus) zebra (sem especificar

se se tratava de Equus grevyi de E quagga ou de E zebra) e asno (Equus asinus)

Enquanto os dois uacuteltimos natildeo conseguiram ter o mesmo ecircxito do elefante o cavalo

obteve sucesso no reconhecimento de todos os pares apresentados o que reforccedilou

a posiccedilatildeo de Rensch a respeito da relaccedilatildeo entre capacidade de aprendizagem e

tamanho do ceacuterebro

Os elefantes satildeo tambeacutem capazes de comparar quantidades Irie-Sujimoto e

colaboradores551 forneceram cestas com alimento tanto simultaneamente como

sucessivamente e observaram a preferecircncia de elefantes asiaacuteticos pelas cestas

mais cheias sem que fossem anteriormente submetidos a treinamento Este

resultado foi corroborado por Perdue e colaboradores552 que apontaram algumas

questotildees metodoloacutegicas que poderiam ter comprometido o resultado anterior como

o nuacutemero baixo de testes e repetiram o experimento tambeacutem exitosamente com

maior rigor

Plotnik e colaboradores553 verificaram que espeacutecimes de E maximus podem

reconhecer-se a si mesmos no espelho Os pesquisadores imprimiram uma marca

visiacutevel no lado direito e outra natildeo visiacutevel mas que podia ser percebida por odor ou

tato do lado esquerdo da testa de trecircs animais alternadamente e um deles tocou

repetidas vezes a marca visiacutevel em sua testa diante do espelho de dois metros

empregado no experimento frequentemente inspecionado pelos animais

Em um teste que segundo Dale e Plotnik554 se deve somar ao anterior de

autorreconhecimento foi analisado o comportamento de elefantes asiaacuteticos sobre

um tapete ao qual estava amarrada uma corda contendo um bastatildeo na outra

extremidade que deveria ser entregue ao treinador Os animais reconheceram que

seus corpos sobre o tapete eram um obstaacuteculo para a tarefa e se retiraram do

tapete sugerindo aos autores que os membros da espeacutecie possuem consciecircncia

corporal (body awareness)

551

IRIE-SUJIMOTO et al 2009 552

PERDUE et al 2012 553

PLOTNIK et al 2006 554

DALE PLOTNIK 2017

123

62 CARNIVORA ndash CANIS LUPUS FAMILIARIS

O catildeo desperta aqui interesse especial em razatildeo de seu longo e peculiar

conviacutevio com os humanos tendo sido possivelmente o primeiro animal a ser

domesticado555 processo que pode ter ocorrido em algum periacuteodo entre vinte mil e

quarenta mil anos atraacutes556

As atuais pesquisas parecem apontar para uma tripla origem do processo de

domesticaccedilatildeo no final do pleistoceno superior557 na Europa558 no sul do leste

asiaacutetico559 e na Aacutesia Central560

Pesquisas como a de Belyaev561 esta envolvendo mais de quarenta geraccedilotildees

de uma variaccedilatildeo de Vulpes vulpes (raposa vermelha) de coloraccedilatildeo prateada jaacute

demonstraram que o processo de domesticaccedilatildeo resulta no surgimento de alteraccedilotildees

bastante significativas nas geraccedilotildees seguintes O pesquisador e sua equipe

verificaram a ocorrecircncia de alteraccedilotildees reprodutivas decorrente da seleccedilatildeo que

realizaram como a ativaccedilatildeo fora de eacutepoca da funccedilatildeo reprodutiva em fecircmeas

alteraccedilotildees fisioloacutegicas como o prolongamento do periacuteodo de reproduccedilatildeo alteraccedilotildees

morfoloacutegicas como o surgimento de manchas marrons em torno das orelhas e do

pescoccedilo como o surgimento de orelhas caiacutedas tal como a de filhotes de catildees de

cauda enrolada e mudanccedilas na cor da pelagem principalmente despigmentaccedilatildeo

em algumas regiotildees estas uacuteltimas tambeacutem caracteriacutestica de algumas raccedilas de catildees

e alteraccedilotildees comportamentais como o iniacutecio tardio da expressatildeo do medo diante de

novidades (em razatildeo de mudanccedilas no niacutevel plasmaacutetico de corticosteroides que

atuam na adaptaccedilatildeo dos animais ao estresse) relacionado agrave seleccedilatildeo de indiviacuteduos

que exibiram maior mansidatildeo aleacutem de proximidade com humanos que inclui a

busca por contato e resposta a apelidos ndash com elevaccedilatildeo dos niacuteveis de serotonina e

alteraccedilotildees no sistema hipotalacircmico-hipofisaacuterio-adrenal e nos niacuteveis de hormocircnios

esteroides sexuais562 Hare563 menciona uma reduccedilatildeo de ossos e dentes da cauda

555

LARSON et al 2012 556

BOTIGUEacute et al 2017 557

LAURENT 2016 558

THALMANN et al 2013 559

WANG et al 2015 SAVOLAINEN 2002 560

SHANNON 2015 561

BELYAEV 1979 562

TRUT 1999 563

HARE 2004

124

em algumas espeacutecies reduccedilatildeo de cerca de vinte por cento no tamanho do ceacuterebro e

reduccedilatildeo do medo como resposta a novidades

Hare e Tomasello564 desenvolveram estudos e apontam outros que sugerem

o desenvolvimento de uma especializaccedilatildeo cognitiva nos catildees durante o processo de

domesticaccedilatildeo e tambeacutem resultante deste Corrobora isto o estudo de Kaminski e

colaboradores565 que esconderam dois conjuntos de cinco objetos para a cadela

Betsy e dois conjuntos de seis objetos para o catildeo Rico ambos da raccedila border collie

sendo um conjunto em cada um de dois recintos e entatildeo pediram para os animais

recuperarem-nos a fim de adquirirem a recompensa Mediante o sucesso da tarefa

concluiacuteram que os catildees integram a memoacuteria relacionada agrave identidade (ldquoo que eacuterdquo)

com a relacionada agrave localizaccedilatildeo (ldquoonde estaacuterdquo)

Uma consequecircncia da especializaccedilatildeo cognitiva pelo processo de

domesticaccedilatildeo eacute fornecida por Hare566 que comenta casos de catildees que se natildeo

mantiverem contato visual frequente com humanos manifestam sintomas de

ansiedade e depressatildeo Isto em animais que vivem em contexto de domesticaccedilatildeo

uma vez que existem catildees que natildeo satildeo domesticados nem satildeo sociaacuteveis em

relaccedilatildeo aos humanos567

Os catildees tecircm pois aleacutem da relaccedilatildeo com os membros de sua espeacutecie ndash e

nesse sentido verificou-se em experimento que eles usam o comportamento de

outro indiviacuteduo para prever o momento em que uma tarefa deve ser cumprida por

exemplo para obtenccedilatildeo de alimento568 ndash um relacionamento uacutenico com os entes

humanos em todo o reino animal com habilidades especiais na compreensatildeo dos

comportamentos humanos relacionados agrave comunicaccedilatildeo Ele desenvolveu seu

processo de aprendizado de modo a agir muitas vezes interpretando os sinais do

homem como linguagem oral e corporal expressotildees faciais estados emocionais

haacutebitos Reconhecem intenccedilotildees mudanccedilas de humor tom de voz569

Esses animais mostram-se assim mais aptos agrave resoluccedilatildeo de certos

problemas envolvendo a comunicaccedilatildeo com humanos do que outros animais como

os lobos e ateacute mesmo os primatas Tambeacutem a sua capacidade de improviso supera

564

HARE TOMASELLO 2006 565

KAMINSKI et al 2008 566

HARE 2004 567

UDELL et al 2014 Os pesquisadores elencam aleacutem desta modalidade ndash ou seja natildeo domesticados e natildeo sociaacuteveis ndash outras trecircs a saber catildees domesticados e sociaacuteveis (mansos) domesticados e natildeo sociaacuteveis e natildeo domesticados e sociaacuteveis

568 OSTOJIĆ CLAYTON 2014

569 KULKEKOVA 2006 HARE TOMASELLO 2005

125

a dos demais em tais testes Coren570 relata um caso parecido com o que aqui se

citou anteriormente narrado por Darwin Um golden retrivier chamado Buck havia

sido treinado para pegar objetos indicados por seu dono Um dia apoacutes a caccedila este

ia esquecendo um boneacute de basebol e um chapeacuteu de cauboacutei e entatildeo pediu para

Buck pegaacute-los O catildeo tentou com a boca pegar um e depois o outro sem sucesso

Parou entatildeo por alguns instantes e em seguida pegou o boneacute e o largou dentro do

chapeacuteu ajustando-o com uma das patas dianteiras agitando em seguida a cauda e

finalmente levando ambos para o dono

Retomando a capacidade de comunicaccedilatildeo esta foi verificada em pesquisas

como a de Hare e Tomasello571 que testaram a resposta a sinais humanos em catildees

e em primatas e concluiacuteram que aqueles conseguem identificar melhor do que estes

o comportamento humano relacionado agrave comunicaccedilatildeo e de maneiras bem mais

proacuteximas a de crianccedilas humanas Algo que o exemplifica eacute o fato de os catildees

responderem melhor do que os chimpanzeacutes agrave abertura dos olhos humanos (por

exemplo evitam comida proibida se um humano estiver olhando)

Nesse sentido Call e colaboradores572 constataram que os catildees reagem ateacute

mesmo de acordo com o estado de atenccedilatildeo dos humanos Num experimento em

que o alimento era colocado no meio da sala juntamente com o comando para que

natildeo comesse em cada etapa o experimentador se colocou de uma destas maneiras

sentado e vigiando sentado e de olhos fechados sentado e distraiacutedo com um objeto

em matildeos sentado de costas ausente da sala Os animais responderam conforme

cada situaccedilatildeo sentando-se e permanecendo assim por mais tempo e investigando

menos a comida aproximando-se dela de um modo mais indireto quando o

experimentador estava vigiando o alimento do que quando natildeo estava

Hare573 e colaboradores estudaram quatro espeacutecimes de catildees para o

reconhecimento de tipos de pista Os animais foram submetidos a testes a fim de

que encontrassem comida em um de dois recipientes estando o outro vazio As

pistas eram o apontar do dedo um marcador de madeira preto e branco no topo do

recipiente com a comida mais o olhar e o agitar de um dos recipientes sem barulho

por conter o alimento e entatildeo o do outro sem barulho O teste apontou o

570

COREN 2006 p 92-93 571

HARE TOMASELLO 2006 572

CALL et al 2003 573

HARE et al 2010

126

entendimento dos animais inclusive jovens de seis semanas de que as pistas

possuiacuteam caraacuteter comunicativo

Em outro experimento desenvolvido por Grassmann Kaminski e Tomasello574

envolvendo objetos familiares e outros ateacute entatildeo desconhecidos que deveriam ser

pegos segundo o comando de voz mais ou menos intenso bem como o gesto de

apontar os mesmos catildees supramencionados Betsy e Rico demonstraram assumir

a correferecircncia entre os dois tipos de comandos Ao buscarem um objeto ateacute entatildeo

desconhecido um dos catildees alcanccedilou o alvo por exclusatildeo Em uma das etapas

tinham de decidir em situaccedilatildeo conflituosa na qual o experimentador apontava para

um dos objetos e falava o nome de outro Os animais visitavam rapidamente o

objeto apontado mas pegavam o objeto nomeado demonstrando que o

apontamento tem relevacircncia para o processo de encontrar o que se pretende

A fim de investigarem a noccedilatildeo de causalidade Muumlller e colaboradores575

realizaram testes nos quais os cachorros deviam puxar um entre dois suportes para

serem recompensados de modo parecido com os realizados com elefantes que

mencionamos acima Dentre as condiccedilotildees apresentadas em uma havia um suporte

com comida em cima e outro com comida ao lado fora dele Em outra um suporte

tinha a comida mais afastada de si e outro a tinha tambeacutem fora mas encostada

nele Em uma nova condiccedilatildeo o alimento foi colocado em uma cavidade no extremo

de um dos suportes (fora da superfiacutecie de modo que natildeo poderia ser puxado) e na

outra o alimento estava sobre o suporte proacuteximo da sua extremidade e na uacuteltima

condiccedilatildeo havia um intervalo entre a parte de um dos suportes que seria puxada e a

outra destacada onde estava o alimento e no outro suporte o alimento situava-se

antes do intervalo de modo que poderia ser puxado Na terceira condiccedilatildeo os

animais comeccedilaram mal com exceccedilatildeo de trecircs indiviacuteduos mas melhoraram o

desempenho gradualmente e nesta uacuteltima os animais obtiveram pouco ecircxito Nas

duas primeiras condiccedilotildees os animais foram bem sucedidos no iniacutecio e na primeira

a maioria dos animais obteve ecircxito em oito a dez tentativas mas alguns

conseguiram ateacute mesmo na terceira tentativa no entanto com algum tempo o

rendimento passou a cair

Os pesquisadores observando que quando alguma pista anterior natildeo estava

mais disponiacutevel alguns dos catildees encontravam rapidamente novas pistas

574

GRASSMANN KAMINSKI TOMASELLO 2012 575

MUumlLLER et al 2014

127

concluiacuteram que esses animais utilizam sugestotildees perceptivas para a resoluccedilatildeo

desses problemas mas sem que a compreensatildeo deles decirc sinal de alcanccedilar a

relaccedilatildeo causal com os fundamentos fiacutesicos dessa tarefa

Em outro conjunto de experimentos Johnston e colaboradores576 observaram

que espeacutecimes de C lupus familiares e Canis dingo filtram gradualmente as accedilotildees

irrelevantes e natildeo demonstram padrotildees relevantes de sobreimitaccedilatildeo577 Uma das

tarefas realizadas nesse conjunto de experimentos consistiu inicialmente em fazer

com que os catildees observassem para que imitassem em seguida o experimentador

aproximar-se de uma caixa incolor mover uma alavanca em uma das laterais sem

funcionalidade de um lado para o outro entatildeo abrir a tampa na parte superior pegar

a comida mostraacute-la e inseri-la novamente repetindo o ato posteriormente com uma

caixa opaca Os animais foram gradualmente deixando de sondar a alavanca e

passaram a ir diretamente para a tampa da caixa

Alguns testes simples como o de Petrazzini e Wynne578 em que forneceram

aos catildees a opccedilatildeo por um de dois pratos que podiam variar entre nuacutemero e massa de

alimento mostraram que eles podem discriminar quantidades Outros como o de

West e Young579 que analisaram o comportamento de espeacutecimes diante de soma

simples de um mais um em que se forneciam resultados corretos e errados

sugerem que seriam capazes de contar

Haacute algumas habilidades em que os catildees ganham maior destaque Assim

como as crianccedilas eles aprendem naturalmente componentes da linguagem humana

de qualquer regiatildeo sem precisar de treinamento mas simplesmente ouvindo

palavras e frases e observando o comportamento humano na expressatildeo linguiacutestica

Eles tambeacutem aprendem um maior nuacutemero de palavras na infacircncia e reconhecem

variaccedilotildees de significados no volume e na entonaccedilatildeo do som emitido por

humanos580 mostrando preferecircncia em testes na entonaccedilatildeo que expressa

positividade em relaccedilatildeo agraves que expressam neutralidade ou negatividade em

comandos dados simultaneamente581

576

JOHNSTON et al 2017 577

Em inglecircs ldquooverimitationrdquo Significa a imitaccedilatildeo de accedilotildees relevantes somada agrave de accedilotildees irrelevantes para a execuccedilatildeo de determinada tarefa

578 PETRAZZINI WYNNE 2016

579 WEST YOUNG 2002

580 MIRBAZEL ARJMANDI 2018

581 COLBERT-WHITE et al 2018

128

O catildeo Rico comeccedilou a associar palavras a objetos com dez meses de idade

Segundo Kaminski e colaboradores582 ele passou a conhecer mais de duzentos

objetos pelo nome e os pesquisadores demonstraram que ele fazia novas

associaccedilotildees tambeacutem por exclusatildeo em tarefas em que um objeto desconhecido era

posto entre objetos conhecidos e ao catildeo era dada a ordem para pegaacute-lo Rico foi

superado pela cadela Chaser que com oito semanas de vida comeccedilou a treinar

fazendo-o diariamente por quatro a cinco horas Depois de trecircs anos de treinamento

ela jaacute conseguia reconhecer pelo nome (simples ou duplo) nada menos que 1022

objetos583

Pilley584 testou-a para reconhecimento semacircntico e sintaacutexico de frases com

trecircs elementos que envolviam um verbo e um objeto associado a uma preposiccedilatildeo

ou585 um objeto direto Para isto realizou-se trecircs experimentos No primeiro deles

foram utilizados muacuteltiplos objetos que eram familiares a Chaser ou seja cujo nome

ela conhecia O comando consistia simplesmente em pegar um dos objetos e levar

ateacute outro objeto determinado por vezes invertendo tambeacutem o papel dos dois

envolvidos em certa etapa Os outros dois experimentos seguiram o mesmo meacutetodo

sendo que no segundo os objetos eram considerados novos ou seja ainda natildeo

haviam sido testados no treinamento para estes testes e no terceiro os objetos

foram dispostos em dois recintos diferentes da casa onde ocorreram os testes de

modo que Chaser natildeo os via no momento em que recebia o comando Pilley

concluiu que ela entendeu o significado das sentenccedilas demonstrando compreensatildeo

sintaacutexica e semacircntica

Feuerbacher e Rosales-Ruiz586 realizaram mais recentemente experimentos

com um pastor alematildeo que foi treinado para distinguir entre categorias de objetos

uns considerados como ldquobrinquedosrdquo e outros como ldquonatildeo brinquedosrdquo587 Disto

sugeriram que os catildees poderiam formar conceitos

582

KAMINSKI et al 2004 583

PILLEY REID 2011 584

PILLEY 2013 585

Em inglecircs ldquoprepositional objectrdquo que natildeo implica necessariamente um objeto indireto 586

FEUERBACHER ROSALES-RUIZ 2017 587

Respectivamente ldquotoysrdquo e ldquonon-toysrdquo

129

63 CETACEAE ndash DELPHINIDAE

Em muitas espeacutecies da ordem Cetacea descobriu-se a presenccedila de neurocircnios

Von Economo que parecem estar ligados agrave consciecircncia (awareness) social e agraves

intuiccedilotildees raacutepidas em mudanccedilas de contexto como a que se tem sobre algueacutem com

que se acaba de deparar das quais seguem os julgamentos mais detalhados588

Aleacutem dos cetaacuteceos essas ceacutelulas foram verificadas apenas em grandes macacos

elefantes e humanos589

A ordem apresenta os indiviacuteduos com o maior quociente de encefalizaccedilatildeo

entre os animais natildeo humanos e dentre eles estatildeo os viventes de maior ceacuterebro

nenhum deles superando o dos cachalotes (Physeter macrocephalus) cujo peso

meacutedio eacute de 78 kg590 mas podendo chegar a cerca de 9 kg591 Esses animais

poreacutem natildeo figuram entre os representantes com maior quociente de encefalizaccedilatildeo

sendo superados por exemplo pelos membros das famiacutelias Phocoenidae e

Delphinidae agrave qual pertencem os golfinhos a quem daremos aqui destaque em

razatildeo da extensa gama de estudos realizados ndash em contraste com o nuacutemero

escasso de estudos relacionados agraves demais famiacutelias ndash envolvendo o gecircnero

Tursiops sp e em especial a espeacutecie Tursiops truncatus ou golfinho-nariz-de-

garrafa ou ainda golfinho-roaz

Jacobs Morgane e McFarland592 publicaram estudos anatocircmicos detalhados

do ceacuterebro desta espeacutecie descrevendo caracteriacutesticas como o neocoacutertex mais

expandido em detrimento de um arquicoacutertex mais reduzido como nos primatas e

com o prosenceacutefalo mais encurtado no eixo rostro-caudal em relaccedilatildeo aos dos

mamiacuteferos terrestres e flexuras mesencefaacutelica mais pronunciada o que nestes

verifica-se somente no estado embrionaacuterio Os pesquisadores chamam a atenccedilatildeo

para a orientaccedilatildeo do eixo orbito-occipital dos hemisfeacuterios tendo como referecircncia o

eixo do corpo que devido ao prosenceacutefalo aparecem como se tivessem sofrido certo

giro no eixo transversal o que causa confusatildeo no emprego de termos como

ldquoanteriorrdquo ldquooccipitalrdquo e ldquoventralrdquo para a descriccedilatildeo geral das aacutereas quando se tem por

referecircncia o ceacuterebro dos mamiacuteferos terrestres Eles exemplificam citando formaccedilotildees

588

ALLMAN et al 2005 589

BUTTI et al 2009 HAKEEM et al 2009 590

WHITEHEAD 2009 591

ROTH DICKE 2005 592

Cf JACOBS MCFARLAND MORGANE 1979 para rinenceacutefalo MORGANE et al 1980 para telenceacutefalo

130

ventrais e dorsais no ceacuterebro do golfinho com sua grande fenda entre os

hemisfeacuterios que seriam consideradas respectivamente ldquofrontaisrdquo e ldquoanterioresrdquo e

ldquoposteriores ou ldquooccipitaisrdquo em mamiacuteferos terrestres

O gecircnero Tursiops sp em particular apresenta algumas modalidades de

interaccedilotildees com os humanos sendo talvez a mais popular a sua utilizaccedilatildeo em

exibiccedilotildees em estaacutedios aquaacuteticos No entanto elas natildeo se reduzem ao conviacutevio em

cativeiro

631 Observaccedilotildees de campo

Os golfinhos tecircm colaborado com humanos na pesca segundo Busnel593

desde tempos imemoriais O pesquisador acompanhou pescadores na Mauritacircnia

dando batidas com pedaccedilos de pau na aacutegua ao que se seguiu a aproximaccedilatildeo de

um grande cardume de peixe perseguido por golfinhos que encheram assim as

redes dos pescadores Neil594 fornece alguns relatos de pesca colaborativa

semelhantes com ecircnfase naqueles recolhidos na Austraacutelia em que os humanos

usam desde batidas de lanccedilas na aacutegua a assobios no intuito de atrair a atenccedilatildeo dos

golfinhos para que tragam peixes

No Brasil estudos como os de Simotildees-Lopes595 e os de Zappes596 descrevem

esse tipo de interaccedilatildeo mas apontam para uma incerteza em relaccedilatildeo a se esses

animais teriam realmente alguma intenccedilatildeo de colaborar com os humanos

mencionando inclusive a existecircncia de botos que seriam bons ou prejudiciais para a

pescaria

Bearzi e colaboradores597 realizaram uma revisatildeo relacionada agraves interaccedilotildees

comportamentais de cetaacuteceos com coespeciacuteficos mortos verificando que esses

animais podem demorar a reconhecer o estado de morte e apoacutes isto dar-se podem

exibir manifestaccedilotildees de estresse e apego ao cadaacutever demorando a demonstrar

desinteresse por este tendo sido observados casos de matildees que carregam por

longo periacuteodo a carcaccedila de um filhote sem vida Essas e outras caracteriacutesticas

593

BUSNEL 1973 594

NEIL 2002 595

SIMOtildeES-LOPES 1991 596

ZAPPES 2011 ZAPPES et al 2011 597

BEARZI et al 2018

131

representam as muitas similaridades comportamentais com os primatas nesse tipo

de contexto598

Os golfinhos tambeacutem fazem uso de instrumentos Eacute o que demonstram

estudos como os de Kruumltzen e colaboradores e o de Kops e colaboradores599 que

fornecem um exemplo envolvendo certos grupos de Tursiops sp que utilizam

poriacuteferos como proteccedilatildeo contra ferimentos por corais inclusive em nichos ainda natildeo

explorados durante o forrageamento que se torna portanto mais frequente Os

pesquisadores identificaram ali evidecircncias de que este comportamento seria

transmitido culturalmente inclusive da matildee para a prole

632 Estudos experimentais

Louis Herman600 revisou experimentos relacionados a atividades cognitivas de

T truncatus a fim de apontar a existecircncia de inteligecircncia e consciecircncia nestes

animais

Ele verificou que no que toca agrave percepccedilatildeo dos gestos humanos601 os

golfinhos apresentaram grande habilidade em seguir o apontar do dedo e chegam

ateacute a seguir espontaneamente indicaccedilatildeo humana pelo gesto de estender um braccedilo

no corpo para indicar o outro lado sem compreensatildeo preacutevia direta disto algo que

levou o pesquisador602 a afirmar que os animais teriam compreendido o

apontamento como referecircncia para um objeto e que tambeacutem teriam aprendido a

seguir espontaneamente sem treinamento ateacute o olhar humano estagnado ou

dinacircmico

No acircmbito das interaccedilotildees sociais Herman identifica para estudo a atenccedilatildeo

conjunta a sincronia comportamental e a imitaccedilatildeo Os treinadores da equipe de

Herman ensinaram ao golfinho um comando que denominaram ldquotandemrdquo a partir do

qual os animais realizam os demais comandos em sincronia Entatildeo relacionaram

este comando ao de criaccedilatildeo e Herman observou os golfinhos realizarem

movimentos por conta proacutepria mas em sincronia perfeita algo que descreveu

afirmando desconhecer os mecanismos pelos quais isto se faz possiacutevel

598

ANDERSON 2011 599

KRUumlTZEN et al 2014 KOPS et al 2014 600

HERMAN 2006 Id 2012 601

HERMAN et al 1999 602

HERMAN 2006

132

No que diz respeito agrave habilidade de imitaccedilatildeo diz o pesquisador ao tratar da

imitaccedilatildeo de sons emitidos por computador que os golfinhos fazem uma distinccedilatildeo de

oitavas rara no mundo animal e aponta testes em que os animais apoacutes receberem

o comando imitaram outros coespeciacuteficos e humanos inclusive atraveacutes de imagens

de um televisor Ao imitar humanos poreacutem os animais improvisavam ou seja

levantavam a cauda quando o treinador levantava a perna acenavam com a

barbatana quando o treinador acenava com o braccedilo ficavam eretos com a cauda

imersa e locomoviam-se imitando sincronicamente o andar do treinador etc603

O pesquisador ressalta aqui a verificaccedilatildeo de senso de imagem corporal

representacional em relaccedilatildeo a si mesmo e ao outro e ainda de consciecircncia de si do

proacuteprio corpo e do corpo alheio de indiviacuteduos da mesma espeacutecie e de espeacutecie

distinta o que implica dizer que os golfinhos possuem esquemas e processos

mentais que distinguem codificam e representam as proacuteprias accedilotildees em relaccedilatildeo agraves

dos outros e que podem acessar ldquoo estado ou conteuacutedo de suas percepccedilotildees

memoacuterias ou conhecimentordquo604

Herman605 relata tambeacutem os testes que ele e sua equipe realizaram com os

golfinhos fecircmeos Akeakamai ou Ake e Phoenix esta treinada com algo como uma

linguagem acuacutestica gerada por computador e aquela com o uso de comandos de

trecircs a cinco palavras a partir de gestos simboacutelicos em que o treinador indicava

agentes objetos modificadores deste (localizaccedilatildeo) e accedilotildees inclusive de modo

recombinado O pesquisador aqui destaca o desempenho de Ake que diante do

objeto que sofreria determinada accedilatildeo da natureza da accedilatildeo do objeto de destino e

discriminando este objeto de outro similar que se encontrava do outro lado do

animal seguiu os comandos com sucesso inclusive diante da inversatildeo de papeacuteis

entre os objetos realizada com ela pela primeira vez Em testes similares observou

tambeacutem a eficaacutecia diante de outros comandos como um que sinalizava ao golfinho

para que repetisse o que fizera anteriormente606 e comportamentos curiosos como

a repeticcedilatildeo espontacircnea de movimentos previamente realizados enquanto o animal

aguardava um tempo maior entre um comando e outro607

603

HERMAN 2002 604

ldquo[] the state or content of its perceptions memories or knowledgerdquo Id 2012 p 540 605

HERMAN et al 1984 HERMAN 1986 606

MERCADO III et al 1998 MERCADO III et al 1999 607

COWAN 2003

133

Segundo Herman e colaboradores608 esses estudos pelos quais se

constatou que os animais compreenderam sentenccedilas lexicalmente novas

estruturalmente novas semanticamente reversiacuteveis e que expressam relaccedilotildees entre

objetos em que a posiccedilatildeo do modificador era alterada para mudar o significado da

sentenccedila e conjuntas ndash e nos quais se constatou que os golfinhos conhecem

generalizaccedilotildees como ldquopessoardquo e relacionadas a objetos com modificaccedilotildees

acidentais significativas como tamanho e cor ndash teriam sido aqueles que forneceram

pela primeira vez resultados convincentes de que certos animais podem processar

caracteriacutesticas de sentenccedilas de natureza semacircntica e sintaacutetica

Herman609 aponta o sucesso do animal tambeacutem em testes com comandos

que propositadamente natildeo faziam sentido com sequecircncias semacircntica ou

sintaticamente anocircmalas Agraves semanticamente anocircmalas Ake natildeo respondeu e agraves

sintaticamente anocircmalas Ake buscava na sequecircncia um subconjunto de itens que

fizessem sentido e entatildeo agia Exemplo disto foi a sequecircncia de comando ldquoAlto-

falante aacutegua tubo sobrerdquo610 que Ake interpretou como se tivesse de colocar o tubo

sobre o alto-falante fixado na parede da piscina e assim procedeu

Ake tambeacutem rearranjava objetos para cumprir certas tarefas como quando

levou uma prancha da beira da piscina para o centro a fim de seguir o comando para

pular a prancha e quando lhe foi dado um comando para recolher objetos sem

especificaccedilatildeo decidiu por si mesma trazer todos ao mesmo tempo o que fez

buscando primeiro o mais distante e entatildeo dispondo os demais no corpo de um

modo que foi possiacutevel fazecirc-lo o que mostrou segundo o pesquisador senso de

planejamento

Em outro estudo Herman e Forestell611 ensinaram Ake a pressionar um de

dois objetos aparentemente remos colocados verticalmente com a paacute para cima a

certa distacircncia um do outro na parede da piscina sendo um significando ldquosimrdquo e

outro significando ldquonatildeordquo para que ela tocasse um ou outro a fim de responder se

determinado objeto estaria ou natildeo na piscina o que fez com ecircxito Herman e

colaboradores612 associaram esta tarefa agravequela que envolve comando simples com

dois objetos e uma accedilatildeo Dava-se o comando como pocircr o frisbee no aro e na

608

HERMAN et al 1984 HERMAN 1986 609

HERMAN et al 1993a 610

ldquoSpeaker water pipe onrdquo 611

HERMAN FORESTELL 1985 612

HERMAN et al 1993b

134

ausecircncia de uma ou outra ferramenta o animal o indicaria no remo ldquonatildeordquo Diante

desses mesmos comandos na ausecircncia de ambos os objetos o frisbee e o aro ou

somente do frisbee Ake acionou o remo ldquonatildeordquo mas na ausecircncia somente do aro

ela espontaneamente levou o frisbee ateacute o remo como que querendo indicar que

natildeo havia o objeto de destino

Herman613 relata tambeacutem que haacute sinais que natildeo fazem parte do vocabulaacuterio

para que o golfinho realize certas accedilotildees sejam isoladas em sequecircncia ou para que

realizasse mais de uma simultaneamente como nadar em espiral abrir a boca fazer

ondas com a cauda mergulhar de costas soprar para fazer bolhas mergulhar em

espiral esguichar aacutegua e dar piruetas Apoacutes realizarem duas ou trecircs accedilotildees

simultaneamente os golfinhos passaram a espontaneamente repeti-las combinadas

e inclusive a manifestar outras combinaccedilotildees natildeo previamente solicitadas

Nos estudos publicados por Braslau-Schneck614 o golfinho Elele recebeu

dentre vaacuterios outros comandos de preenchimento615 um comando para criar um

comportamento ou mais de um caracterizando inclusive a tomada de decisatildeo O

animal realizou gestos que ainda natildeo tinham sido vistos o que fez Herman616

concluir que os golfinhos possuem o senso de agecircncia e de propriedade ou seja

reconhece a si mesmo como proprietaacuterio do corpo e agente das accedilotildees que pratica

e inclusive617 que o animal aprendeu em niacutevel conceitual a palavra que

corresponde a criar um movimento novo

Baseando-se nos resultados de estudos como este e como o de Reiss618 no

qual dois espeacutecimes de T truncatus mostraram por testes com marcas no corpo

reconhecerem-se a si mesmos no espelho Herman afirma que esses animais tecircm

autoconsciecircncia

Em outro deles619 o golfinho fecircmeo Phoenix recebeu o comando de tocar um

objeto com a barbatana peitoral ou com a boca ou com a cauda saltar sobre ele

ou nadar abaixo dele e em seguida recebeu o comando para repetir o gesto ou para

escolher fazer qualquer uma das outras quatro das cinco alternativas Quando foi

solicitado a escolher como primeiro comando o animal ficou por um momento

613

HERMAN 2006 614

BRASLAU-SCHNECK 1994 apud HERMAN 2006 615

Comandos que satildeo acrescentados acessoriamente agravequele(s) de maior relevacircncia para determinado experimento

616 HERMAN 2012

617 Id 2006

618 REISS 2001

619 CUTTING 1997 apud HERMAN 2006 HERMAN 2002

135

olhando para o experimentador e entatildeo compreendeu que podia optar por uma das

cinco e entatildeo saltou sobre o objeto

Em testes realizados com a fecircmea Elele para verificar se ela poderia

compreender siacutembolos como sendo referentes a partes de seu proacuteprio corpo

somando um total de nove como algo que as representa Herman e

colaboradores620 intentaram observar no animal o estabelecimento de correlaccedilatildeo

entre referecircncias gestuais simboacutelicas transmitidas pelos treinadores e as suas

diferentes partes do corpo no uso destas na realizaccedilatildeo de diferentes accedilotildees e em

interaccedilatildeo com objetos Elele usou a mesma parte do corpo para realizar accedilotildees

diferentes ndash como tocar lanccedilar ou indicar ndash ou partes diferentes para realizar uma

mesma accedilatildeo inclusive relacionando-se distintamente com objetos distintos ndash que se

encontravam flutuando na piscina colados na parede ou suspensos acima da

superfiacutecie ndash em combinaccedilotildees que muitas vezes natildeo faziam parte de seu repertoacuterio

Diante da demonstraccedilatildeo de que o animal sabia que parte do corpo usar e onde e

como fazecirc-lo bem como das capacidades versaacuteteis de motricidade621 o

pesquisador concluiu que o golfinho apresenta uma imagem corporal

representacional bem definida622 ldquouma imagem corporal bem articulada que pode

ser acessada conscientemente para obter respostas efetivas do corpo para ateacute

mesmo instruccedilotildees altamente abstratas ou eventos motores observadosrdquo623

64 PRIMATES

Frequentemente se observa nos grandes macacos por sua desenvolvida

capacidade cognitiva interaccedilotildees sociais extremamente complexas Witting e

Boesch624 por exemplo estudaram as interaccedilotildees de conflito em chimpanzeacutes (Pan

troglodytes) e constataram que eles levam em conta no processo de tomada de

decisatildeo para avaliar se um determinado conflito seraacute ou natildeo proveitoso o valor do

recurso disputado o risco de lesatildeo e o valor e a possibilidade de reparaccedilatildeo da

relaccedilatildeo

620

HERMAN et al 2001 621

HERMAN 2002 622

Id 2012 623

ldquo[] a well-articulated body image that can be consciously accessed for effective body-part responses to even highly abstract instructions or observed motor eventsrdquo HERMAN 2006 p 458

624 WITTING BOESCH 2003

136

Um exemplo talvez ainda mais marcante eacute a transmissatildeo cultural que o

pesquisador Shunzo Kawamura relatava em um trabalho cientiacutefico possivelmente

pela primeira vez em 1953 apoacutes seus estudos na ilha de Kawai no Japatildeo com

macacos japoneses (Macaca fuscata) em que observou a fecircmea Imo lavando uma

batata-doce antes de comecirc-la e este comportamento sendo entatildeo adotado

gradualmente pelos demais membros do grupo625

A transmissatildeo cultural varia de acordo com cada modelo social e pode-se dar

por ensinamento direto Withen e colaboradores626 incluindo Goodal verificaram

entre os chimpanzeacutes um nuacutemero de variaccedilotildees culturais que ateacute entatildeo natildeo havia sido

observado em nenhum outro animal natildeo humano e que cada grupo apresenta certo

conjunto de variaccedilotildees que torna uacutenico o seu perfil ainda que os elementos dessas

variaccedilotildees sejam normalmente encontrados em outros grupos mas podendo-se

observar tambeacutem elementos que lhe sejam exclusivos

Boesch identifica dois mecanismos que servem como preacute-requisito para

identificaccedilatildeo de cultura o ldquoprocesso de aprendizagem social que garante a

fidelidade da transferecircncia de informaccedilatildeo entre indiviacuteduosrdquo e as ldquonormas sociais que

garantam a fidelidade da informaccedilatildeo uma vez que ela tenha sido adquirida por um

indiviacuteduordquo627

Boesch e Tomasello628 tambeacutem em trabalho com chimpanzeacutes explicam que

individualmente as transmissotildees culturais satildeo mais raacutepidas e haacute pouca ou

moderada convenccedilatildeo e imposiccedilatildeo Jaacute nos grupos familiares e em associaccedilotildees as

transmissotildees variam conforme o nuacutemero de indiviacuteduos na populaccedilatildeo haacute pouca e

lenta convenccedilatildeo e um indiviacuteduo impotildee pouco ou moderadamente Em relaccedilatildeo agrave

maioria um indiviacuteduo toma as principais decisotildees e a transmissatildeo cultural daacute-se

mais lentamente e define convenccedilotildees e impotildee-se e quando se toma por foco o

prestiacutegio de um indiviacuteduo haacute transmissatildeo lenta poucas convenccedilotildees e ele impotildee

decisotildees lentas ou raacutepidas

Boesch629 fornece particularidades que caracterizam transmissatildeo cultural

como o aprendizado de um membro do grupo por outro membro que natildeo eacute

625

HIRATA et al 2008 626

WITHEN et al 1999 627

Respectivamente ldquosocial learning process that guarantee the fidelity of the information transfer between individualsrdquo e ldquosocial norms that guarantee the fidelity of the information once it has been acquired by an individualrdquo BOESCH 1996 p 265

628 BESCH TOMASELLO 1998

629 BOESCH 2003

137

transmitido geneticamente mas socialmente e natildeo implica necessariamente

adaptaccedilatildeo a determinadas condiccedilotildees ecoloacutegicas tratando-se portanto de uma

praacutetica coletiva que pode inclusive mudar rapidamente Acrescenta ainda a

referecircncia no campo antropoloacutegico que considera a cultura um sistema simboacutelico

com base em compartilhamento de significados

Ilustram esse compartilhamento os vinte tipos de instrumentos usados pelos

chimpanzeacutes do Taiuml National Park na Costa do Marfim dentre os quais se

encontravam gravetos e folhas identificados pelo pesquisador630 que constatou

ainda usos inovadores sem nenhuma mudanccedila aparente no contexto ambiental

(como o aparecimento de uma fonte de alimento antes desconhecida) enquadrando

entatildeo suas observaccedilotildees no que tomou por conceito de cultura

641 Observaccedilotildees de campo

Em outro estudo realizado no Taiuml National Park na Costa do Marfim Luncz e

colaboradores631 verificaram que ao usarem pedras ou tacos de madeira como

martelo para quebrar cascas de frutos de Coula edulis chimpanzeacutes de trecircs grupos

de um mesmo bloco florestal apresentaram cada um identidade cultural por meio de

variaccedilotildees na frequecircncia (ocorridas tambeacutem dentro de cada grupo na escala

temporal) do uso das pedras que predominava em alguns grupos e no dos tacos de

madeira que predominava em outros e os quais inclusive variavam de tamanho de

grupo para grupo Em trabalho posterior Luncz e Boesch632 observaram que as

fecircmeas que migraram para outros grupos que foi quase a totalidade das

observadas adotavam o comportamento do grupo novo o qual os pesquisadores

viram perdurar por cerca de vinte e cinco anos reforccedilando a existecircncia de um

processo de transmissatildeo cultural Os dois pesquisadores633 identificaram ainda

outros traccedilos culturais distintos entre os grupos no forrageamento na comunicaccedilatildeo

em interaccedilotildees sociais dos membros de cada um no comportamento de caccedila etc

somando um total de vinte e sete variantes

Boesch e Boesch tambeacutem identificaram o uso de instrumentos que os

chimpanzeacutes modelavam utilizando as matildeos para quebrar mateacuteria prima remover

630

BOESCH 1995 631

LUNCZ et al 2012 632

LUNCZ BOESCH 2014 633

Id 2015

138

partes suas puxaacute-la ou bater contra ela e os dentes para cortaacute-la Esses materiais

eram em geral mudas folhas gravetos usados como palitos extraiacutedos de pequenos

ramos frondosos ramos galhos usados como tacos e pedras Os animais usavam

nomalmente folhas mudas gravetos e pedaccedilos de galhos para inserccedilatildeo e retirada

de alimento em local de difiacutecil acesso para os dedos (casas de formigas corpo de

pequenos macacos predados etc) mudas folhas gravetos e ramos para sondar o

interior de cascas de aacutervore colmeias de abelha feridas cadaacuteveres usavam

gravetos e folhas como esponjas para assepsia e em exibiccedilotildees os animais

lanccedilavam e arrastavam pedras ramos e galhos e batiam com eles e com pedras e

tacos quebravam frutos duros por vezes usando gravetos para recolher partes

internas que natildeo conseguiam recolher com os dedos634

Outro uso de instrumentos observado por Boesch635 foi o de galhos como

tacos para bater ou tentar perfurar um leopardo que entrou em seu territoacuterio e a

quem entatildeo passaram a perseguir

Van Schaik636 verificou em orangotangos das ilhas de Borneacuteu e Sumatra o

uso de gravetos por orangotangos (Pongo pygmaeus) que podem ser inseridos

presos entre os dentes em pequenos furos em troncos de aacutervores para coletar mel

ou manualmente para tirar pedaccedilos de casas de cupins Outro uso de instrumento

observado por Schaik eacute a casca de ramo de aacutervore que aqueles animais retiram

prendem na boca e inserem em frutos em caacutepsula de aacutervores do gecircnero Neesia que

tecircm alto valor nutritivo para desprender e as sementes e a polpa que satildeo protegidas

por espinhos e entatildeo lanccedilaacute-las do fruto diretamente na boca

No tocante agrave comunicaccedilatildeo Boesch637 analisou um tipo simboacutelico observado

apenas nos chimpanzeacutes de Taiuml usado como norma social por curtos periacuteodos de

tempo a saber percursotildees em aacutervores pelo macho alfa e percebeu que elas

indicavam natildeo soacute a mudanccedila de direccedilatildeo no deslocamento do grupo apontada pela

direccedilatildeo e pelo sentido em que o animal se movia entre as duas aacutervores que

golpeava com os peacutes com as matildeos ou com ambos mas tambeacutem os periacuteodos de

descanso ou ambos combinados

634

BOESCH C BOESCH H 1990 635

BOESCH 1991 636

VAN SCHAIK 2006 637

BOESCH 1996

139

Hedwig e colaboradores incluindo Boesch638 registraram inclusive variaccedilotildees

sintaacuteticas nos chamados vocalizados de duas espeacutecies de gorilas Gorilla beringei

beringei e Gorilla gorilla gorilla em cinco tipos de unidades acuacutesticas combinadas de

cento e cinquenta e nove maneiras diferentes

642 Estudos experimentais

Premack e Woodruff639 realizaram experimentos como tentativas iniciais de

buscar evidecircncias sobre a teoria da mente em animais natildeo humanos Os

pesquisadores gravaram fitas de viacutedeo em que um ator humano dentro de uma jaula

tentava resolver sem sucesso testes tais como os realizados por Koumlhler Em um

deles prendiam-se algumas bananas no teto da jaula Em outro elas estavam fora

da jaula e do alcance do ator No seguinte estavam ao alcance mas impedidos por

uma caixa E em mais um teste repetiu-se o anterior mas com blocos pesados de

cimento dentro da caixa As imagens foram entatildeo mostradas nem sempre na

iacutentegra para um chimpanzeacute fecircmeo de nome Sarah habituado a assistir a cenas de

viacutedeo O animal recebeu entatildeo em cada sessatildeo cartas com imagens dentre as

quais somente uma representava a soluccedilatildeo correta para cada problema (como

empilhar caixas no primeiro cenaacuterio e usar uma vara no segundo) que foi

predominantemente escolhida por ele

Premack e Woodruff entatildeo descartaram que Sarah tenha estabelecido uma

simples correlaccedilatildeo de elementos fiacutesicos em razatildeo de diferenccedilas entre a disposiccedilatildeo

dos objetos nos viacutedeos e nas fotos e tambeacutem descartaram ainda que natildeo de todo

e como causa suficiente e exclusiva tambeacutem o associacionismo em que diante da

falta de um elemento na sequecircncia (como uma accedilatildeo ou um objeto) ela o reconhece

o que levaria por exemplo a recorrer a generalizaccedilotildees decorrentes de experiecircncias

cotidianas anteriores nas quais se teria de incorrer para explicar como Sarah

relacionou fotos aos viacutedeos incompletos que havia visto anteriormente Afirmaram

assim serem mais fortes as hipoacuteteses entre as quais afirmam natildeo haver grandes

diferenccedilas da empatia em que o animal teria-se colocado na posiccedilatildeo do ator

humano e da teoria da mente em que teria imputado a ele esses estados de

espiacuterito ou seja intenccedilatildeo ou propoacutesito e conhecimento ou crenccedila E dizem que a

638

HEDWIG et al 2014 639

PREMACK WOODRUFF 1978

140

empatia natildeo se sustentaria se as escolhas do animal fossem afetadas pela

identidade do ator

Na sessatildeo seguinte Sarah viu outras quatro cenas relacionadas a coisas que

estava acostumada a presenciar no cotidiano mas que para as quais natildeo havia sido

treinada uma em que o ator tentava sem sucesso sair da jaula outra em que

tentava sem sucesso ligar um aquecedor chegando a chutaacute-lo levemente

estremecendo e cruzando os braccedilos para demonstrar estar com frio outra em que

tentava fazer funcionar um fonoacutegrafo desplugado da tomada e uma uacuteltima em que o

ator natildeo conseguia lavar o chatildeo porque a mangueira que usava natildeo estava

devidamente conectada agrave torneira Na primeira sessatildeo a macaca Sarah recebeu

quatro fotos cada uma representando uma das situaccedilotildees e outras quatro uma com

uma chave outra com uma mangueira outra com um cabo eleacutetrico ligado na tomada

corretamente e uma uacuteltima com um cone de papel aceso Ela associou

corretamente essas fotos como objetos agraves fotos das situaccedilotildees Os pesquisadores

aqui ressaltam que natildeo haacute correspondecircncia fiacutesica entre algueacutem querendo sair de

uma jaula e uma chave nem entre um cone de papel em chamas e algueacutem

tremendo e olhando para um aquecedor

A etapa seguinte foi ainda mais complexa apresentou-se a Sarah trecircs

versotildees de cada objeto ou seja uma chave intacta outra torcida outra quebrada

uma mangueira conectada outra natildeo conectada outra conectada e ao mesmo

tempo cortada o mesmo em relaccedilatildeo ao cabo eleacutetrico e o papel apagado aceso ou

jaacute queimado Ela novamente obteve ecircxito associando o item correto agrave situaccedilatildeo

correta

Em uma nova etapa as cenas do primeiro experimento foram repetidas desta

vez com dois atores um treinador de quem Sarah gostava e outro por quem natildeo

demonstrava afeto Ambos em imagens em que obtinham sucesso nas tarefas e

tambeacutem em imagens em que natildeo obtinham sucesso utilizando uma vara de

comprimento mais curto passando pela caixa caindo sobre ela deitado com os

blocos de cimento espalhados Sarah selecionou as oito alternativas ldquoboasrdquo quando

o ator era aquele com quem simpatizava e apenas duas quando o ator era o outro

Os pesquisadores acrescentaram em seguida uma terceira situaccedilatildeo nem ldquoboardquo nem

ldquomaacuterdquo mas somente irrelevante O resultado das escolhas das fotografias manteve-

se reduzindo ainda para um o nuacutemero de alternativas ldquoboasrdquo para o outro ator

141

Hampton640 testou macacos-rhesus para metamemoacuteria641 os animais

optariam por escolher participar de um teste de memoacuteria ou natildeo Se decidissem

participar seriam recompensados com amendoim se acertassem e natildeo receberiam

nada se falhassem Se recusassem o teste ganhariam uma guloseima da qual

gostavam menos que de amendoim Os macacos que tinham desempenho mais

baixo preferiram desistir do teste e os que o tinham melhor desempenho insistiram

nele Hampton concluiu que os animais estariam assim reconhecendo quando se

lembram

Tambeacutem Rosati e Santos642 testaram trinta macacos-rhesus sem treinamento

preacutevio com o fim de tentar verificar a presenccedila da chamada metacogniccedilatildeo Em um

de dois tubos dispostos em forma de ldquoVrdquo o experimentador colocou uma isca um

alimento sem que os animais soubessem em qual Como controle aleacutem de verificar

o comportamento em caso de verem onde a isca teria sido colocada tambeacutem nesta

condiccedilatildeo se realizou o teste com um uacutenico tubo a fim de verificar se haveria

sondagem Os animais que natildeo sabiam da localizaccedilatildeo da isca no experimento com

os dois tubos dirigiram-se mais frequentemente para o ponto de convergecircncia a fim

de descobrirem a localizaccedilatildeo do alimento levando as pesquisadoras que ressaltam

que neste estudo observou-se pela primeira vez em animais natildeo humanos uma

resposta de busca de informaccedilatildeo em uma situaccedilatildeo para eles ineacutedita a concluirem

que eles podem buscar informaccedilotildees espontaneamente sobre algo que reconhecem

desconhecer o que as fez sugerir que esses macacos podem apresentar processos

metacognitivos semelhantes aos dos humanos

Em uma gama de testes cognitivos como para verificar a noccedilatildeo de

causalidade os primatas demonstraram grande eficaacutecia Um exemplo satildeo os

experimentos reproduzidos por Girndt e colaboradores643 e Martin-Ordas Call e

Colmenares644 com chimpanzeacutes (P troglodytes) orangotangos (P pygmaeus)

bonobos (Pan paniscus) e gorilas (Gorilla gorilla gorilla) em que com um

instrumento (no primeiro caso optando entre uma vareta ou um ancinho) tinham de

empurrar ou puxar o alimento (recompensa) sobre uma plataforma em forma de ldquoUrdquo

fixada externamente agrave grade com uma armadilha ou seja uma abertura pela qual a

640

HAMPTON 2001 641

SHATTLEWORTH 2010 p 244 642

ROSATI SANTOS 2016 643

GIRNDT et al 2008 644

MARTIN-ORDAS CALL COLMENARES 2008

142

recompensa se caiacutesse seria perdida (no primeiro estudo com variaccedilotildees como a

posiccedilatildeo e o nuacutemero das ferramentas disponiacuteveis) Em uma segunda etapa somente

no segundo estudo mencionado eles tinham de realizar tarefa similar dentro de dois

tubos fixados horizontalmente na grade tambeacutem contendo cada um uma armadilha

mas em um lado em um tubo e em outro lado no outro tubo Neste teste os animais

tinham de representar mentalmente o lado em que inseririam a ferramenta e entatildeo

tiveram menor ecircxito

Em experimento com macacos-rhesus (Macaca mulatta) Phillips e Santos645

associaram pequenas peccedilas de plaacutestico a uma metade de coco ou a uma maccedilatilde

parecendo pedaccedilos destes Um dos frutos foi colocado em uma caixa cheia de

folhas onde somente a peccedila de plaacutestico era retirada mostrada ao animal e colocada

novamente A peccedila anteriormente foi associada a um fruto ou outro e em cada

experimento podia ser colocada na caixa com o fruto com o qual fora associada ou

com o outro Os animais que tinham a peccedila associada ao fruto que natildeo estava na

caixa procuraram na caixa por mais tempo do que os que a tinham associado ao

fruto que estava dentro da caixa jaacute que procuravam pelo outro fruto Os

pesquisadores concluiacuteram assim que esses animais segundo o termo que utilizam

ldquoindividuamrdquo objetos segundo seus tipos e segundo suas propriedades

Tornou-se bastante conhecido o experimento de Brosnan e De Waal646 que

mostra como macacos-prego (Sapajus apella) lidam com a desigualdade Nesses

testes dois animais separados por uma grade eram submetidos por vez Cada um

dava uma pequena pedra como ficha ao experimentador Um deles recebia em troca

um pedaccedilo de pepino e o outro recebia uma uva alimento de que gostam mais O

que recebia o pedaccedilo de pepino tinha maior tendecircncia a rejeitar o alimento nesse

caso realizando movimentos de insatisfaccedilatildeo que mostravam seu desejo pela uva

Esses movimentos foram por vezes intensificados quando o outro passou a receber

a uva sem dar a pedra ou seja sem fazer qualquer esforccedilo Nos testes de controle

em que havia apenas um macaco natildeo houve repulsa pelo pepino Os pesquisadores

verificaram que os animais se baseiam na interaccedilatildeo com o outro coespeciacutefico e

sugerem que poderiam estar sob o efeito de expectativa frustrada e sendo movidos

por certas emoccedilotildees sociais

645

PHILLIPS SANTOS 2006 646

BROSNAN DE WAAL 2003

143

Lakshminarayanan e Santos647 realizaram experimentos com macacos-prego

tambeacutem treinados para trocar fichas por alimento entre um experimentador humano

que dava um pedaccedilo de maccedilatilde por um preccedilo e outro que dava um pedaccedilo e meio

pelo mesmo preccedilo os macacos escolheram este No experimento seguinte um

experimentador ofereceu um pedaccedilo de maccedilatilde e outro ofereceu dois pedaccedilos e meio

de maccedilatilde sendo que depois de negociar o segundo poderia retirar um pedaccedilo e o

primeiro poderia adicionar um pedaccedilo Os macacos passaram a evitar aquele e a

negociar somente com este mostrando aversatildeo agrave perda e que natildeo computam

somente o valor geral esperado

Os pesquisadores desenvolveram em seguida um experimento de risco em

duas etapas Na primeira os dois experimentadores ofereciam trecircs pedaccedilos de

maccedilatilde mas um natildeo retirava nada ou retirava dois de uma vez e o outro sempre

retirava um soacute sendo aquele entatildeo o escolhido pelos animais para negociar Jaacute na

segunda os dois experimentadores ofereciam um pedaccedilo de maccedilatilde mas um em

seguida acrescentava somente um enquanto o outro podia acrescentar outros dois

ou entatildeo nenhum e o primeiro foi o escolhido Os macacos apresentaram inclinaccedilatildeo

ao risco em um ambiente de perda e o rejeitaram em um ambiente de ganho

Em uma etapa seguinte os pesquisadores repetiram os experimentos usando

barra de cereal e pedaccedilos de frutas no lugar das fichas e os animais preferiram ficar

com o alimento que jaacute possuiacuteam Lakshminarayanan e Santos concluiacuteram que os

animais portam-se de modo similar aos humanos na tomada de decisatildeo

considerando as mudanccedilas de preferecircncias baseadas em escolhas

Em relaccedilatildeo agrave competecircncia numeacuterica Boysen e Berntson648 demonstraram

que a chimpanzeacute Sheba podia contar e somar nuacutemeros com resultados que iam de 1

a 4 empregando os meacutetodos descritos anteriormente para o papagaio Alex (aqui

com o animal deslocando-se para observar o conteuacutedo das bandejas) e tambeacutem

sem que tenha havido ensaio para transposiccedilatildeo das quantidades de itens para

algarismos de numerais araacutebicos

Kawai e Matsuzawa649 analisaram os estudos de Tomonaga e

colaboradores650 e os de Tomonaga e Matsuzawa651 que empregaram nuacutemeros em

647

LAKSHMINARAYANAN SANTOS 2012 648

BOYSEN BERNTSON 1989 649

KAWAI MATSUZAWA 2000b 650

TOMONAGA et al 1993 651

TOMONAGA MATSUZAWA 2000

144

uma tela de viacutedeo inclusive com itens curingas substituindo nuacutemeros para testar o

tempo de resposta relacionado a uma ordenaccedilatildeo numeacuterica crescente por uma

fecircmea de Pan troglodytes chamada Ai Ao tocar determinado nuacutemero diretamente na

tela se ela o fizesse ao correto somente ele desaparecia e se tocasse algum outro

todos desapareceriam reiniciando uma nova combinaccedilatildeo em uma nova sessatildeo No

final do teste feito corretamente Ai recebia recompensa e cada erro era seguido

somente de uma campainha Depois de um primeiro momento de exerciacutecio livre os

pesquisadores treinaram-na com reforccedilo sequencial com trinta e seis sequecircncias de

dois algarismos araacutebicos de 0 a 9 e ao aprendecirc-las o animal realizou com ecircxito a

transferecircncia de cardinal para ordinal selecionando as sequecircncias respectivas

corretas e recebendo a recompensa

No estudo seguinte ao treinarem Ai com oitenta e quatro combinaccedilotildees de

trecircs diacutegitos com acreacutescimo de um ou dois curingas na sequecircncia os pesquisadores

observaram que a identificaccedilatildeo de nuacutemeros mais proacuteximos agraves sequecircncias iniciais foi

mais demorada e a de nuacutemeros maiores na sequecircncia levou um tempo mais curto

o que sugeriu que a chimpanzeacute teria considerado toda a sequecircncia numeacuterica antes

de dar a primeira resposta No entanto quando os nuacutemeros maiores foram

primeiramente selecionados se deu o contraacuterio Isto e tambeacutem a reduccedilatildeo de tempo

de resposta para o menor nuacutemero diante do aumento do intervalo entre o nuacutemero

menor e o segundo menor foram interpretados como ldquoefeito da distacircncia

simboacutelicardquo652 que eacute verificado quando ocorre um desempenho superior mediante a

maior distacircncia ordinal entre as sequecircncias de caracteres (por exemplo quando se

verifica melhor desempenho entre 6-9 do que entre 2-3) Os testes assim revelaram

efeitos de posiccedilatildeo serial e de distacircncia simboacutelica observados no julgamento

comparativo humano

Tomonaga e Matsuzawa fazem referecircncia a testes semelhantes realizados

anteriormente com macacos-prego (Sapajus apella)653 e pombos (Columba livia)654

com seacuteries de cinco algarismos e itens curingas substitutos nos quais os pombos

treinados escolheram os nuacutemeros aleatoriamente ao passo que os macacos-prego

demonstraram ter algum conhecimento do posicionamento numeacuterico ordinal

652

ldquoSymbolic-distance effectrdquo 653

DrsquoAMATO COLOMBO 1989 654

TERRACE 1995

145

Outro trabalho analisado por Kawai e Matsuzawa o de Biro e Matsuzawa655

foi realizado tambeacutem com a seacuterie de trecircs nuacutemeros no mesmo intervalo mas quando

o animal apontava diretamente para o nuacutemero menor em seguida os outros dois

trocavam de posiccedilatildeo Nos testes realizados corretamente por Ai a duraccedilatildeo entre a

escolha do primeiro e do segundo nuacutemero era maior que essa mesma duraccedilatildeo nos

testes que ela realizou incorretamente quando mesmo assim Ai apontava o local jaacute

apagado do terceiro nuacutemero apoacutes a mudanccedila no conteuacutedo do visor com taxa maior

de erro quando os nuacutemeros eram mais proacuteximos Os pesquisadores concluiacuteram

deste estudo que o animal teria inspecionado ainda no iniacutecio da tentativa os trecircs

nuacutemeros e em seguida decidido a ordem em que os selecionaria e inclusive

planejado a sequecircncia motora que julgou ser mais apropriada para chegar agrave

resposta certa ou seja que o animal apresentou como estrateacutegia planejamento

monitoramento e ajustes flexiacuteveis quando houve mudanccedila de condiccedilotildees algo similar

ao que seria esperado de um humano

Kawai e Matsuzawa656 apontam que as conclusotildees obtidas nesses estudos

estatildeo em consonacircncia com outro que haviam publicado pouco antes657 no qual

investigaram a memoacuteria do animal para sequecircncias de cinco numerais no intervalo

de zero a nove e verificaram que Ai podia contar ateacute nove itens e ordenar em

sequecircncia neste intervalo Os nuacutemeros eram exibidos por um tempo cada vez mais

curto e logo convertidos em quadrados nos quais o animal tocaria obedecendo agrave

ordem haacute pouco observada Posteriormente essa tarefa passou a ser executada

com algarismos de 1 a 9 e Inoue e Matsuzawa658 realizaram um estudo comparativo

entre chimpanzeacutes e humanos nos quais aqueles apresentaram melhor desempenho

que estes

Em experimentos como o de Livingstone e colaboradores659 este com

macacos-rhesus (Macaca mulatta) verificou-se que alguns primatas aprendem a

associar algarismos araacutebicos e conjuntos de pontos (de tamanhos variados)

numericamente correspondentes agrave quantidade de alimento que recebem como

recompensa Os espeacutecimes treinados pelos autores tocavam os numerais ou os

conjuntos presentes em pares em uma tela de um aparelho de viacutedeo e escolheram

655

BIRO MATSUZAWA 1999 656

KAWAI MATSUZAWA 2000b 657

Id 2000a 658

INOUE MATSUZAWA 2007 659

LIVINGSTONE et al 2010

146

predominantemente as quantidades maiores que lhes proporcionariam um nuacutemero

maior de recompensas no caso pequenas doses de suco com uma quantidade

pequena de erro nos pares de nuacutemeros maiores e nos pares de conjuntos de

pontos de tamanhos parecidos

Com o fim de testar o chamado raciociacutenio analoacutegico em chimpanzeacutes num

outro experimento realizado com Sarah por Premack e Woodruff este tambeacutem

incluindo Gillan660 em uma primeira etapa foram apresentados ao animal cartotildees

com figuras geomeacutetricas coladas a saber triacircngulo lua crescente ou um quadrado

com um recorte triangular (como uma bandeirinha de festa junina) coloridas de azul

amarelo verde ou laranja variando entre trecircs tamanhos diferentes e podendo estar

marcadas com um ponto preto central ou natildeo Disto se montou setenta e duas

combinaccedilotildees diferentes Do lado esquerdo no cartatildeo as figuras A acima e Arsquo

abaixo seriam o modelo Do lado direito encontrava-se a figura B acima e um

espaccedilo vazio abaixo E mais abaixo a figura Brsquo que se relacionava com B

analogicamente (conforme cor formato ou outra das caracteriacutesticas) a Arsquo em

relaccedilatildeo a A e ao lado dela a figura C que seria a resposta errada ao problema

Sarah deveria indicar Brsquo utilizando um retacircngulo amarelo escrito ldquoSAMErdquo661

Em uma nova etapa o animal realizou a mesma tarefa indicando se a

combinaccedilatildeo era a mesma (B e Brsquo com ldquoSAMErdquo) ou se era diferente (B e C com

ldquoDIFFERENTrdquo)

No experimento seguinte Sarah deparou com cartotildees contendo objetos

caseiros que lhe eram familiares Por exemplo com um em que havia um cadeado

acima (A) e uma chave abaixo (Arsquo) do lado esquerdo e uma lata acima (B) do lado

direito com espaccedilo abaixo sendo aqui oferecidas a figura de um pincel (C) e a de

um abridor de latas (Brsquo) e com outro em que havia um papel (A) acima e um laacutepis

(Arsquo) abaixo do lado esquerdo e uma lata (B) em cima do lado direito com espaccedilo

abaixo sendo aqui oferecidas as mesmas figuras de abridor de latas (C) e pincel

(Brsquo)

Os pesquisadores concluiacuteram que Sarah resolveu os problemas por raciociacutenio

analoacutegico e pelo uso de classes conceituais o que teria sido corroborado na etapa

seguinte em que se empregou uma figura CB que tinha relaccedilatildeo com B mas

660

GILLAN et al 1981 661

ldquoMesmordquo

147

diferente daquela entre Arsquo e A (sendo entatildeo a resposta errada) e outra CA que se

relacionava com Arsquo na qual Sarah novamente obteve ecircxito

Em relaccedilatildeo agrave comunicaccedilatildeo no experimento de Zimmermann e

colaboradores662 realizado com chimpanzeacutes e bonobos criados em ambientes

humanos e outros criados em ambientes natildeo humanos a fim de verificar se os

animais levam em consideraccedilatildeo a perspectiva de um ajudante humano ao

apontarem onde se encontra um objeto escondido bonobos e orangotangos

apontaram consistentemente para o local onde havia comida escondida bem como

para um objeto escondido com o qual um voluntaacuterio humano pegaria a comida aqui

no caso um garfo (que o animal por si soacute natildeo usaria) Segundo os pesquisadores o

estudo sugere que os animais compreenderam a natureza referencial seletiva do

ato de apontar para alvos distintos Os orangotangos apontaram mais para o garfo

quando este era escondido na ausecircncia do agente humano do que nas vezes em

que era escondido na presenccedila deste Isto mais o fato de os animais apontarem

para o humano depois que este ia procurar o objeto em seu lugar habitual e natildeo

encontrava levaram o pesquisador a sugerir que esses macacos imitam ldquoa

propriedade de relevacircncia da comunicaccedilatildeo humanardquo663

Nos anos de 1930 alguns pesquisadores como Winthrop Kellogg e Luella

Kellogg664 tentaram ensinar chimpanzeacutes a falar mas verificou-se que seu aparelho

vocal natildeo possibilitava mais do que algumas palavras Alguns anos depois outros

estudiosos passaram a tentar-lhes ensinar a linguagem manual dos sinais

especificamente a American Sign Language (ASL) como Allen Gardner e Beatrice

Gardner665 que o fizeram com o chimpanzeacute fecircmeo Washoe Os pesquisadores

obtiveram como exemplo de resultados a distinccedilatildeo por parte do animal entre ldquoflorrdquo e

ldquocheirordquo666 e o uso de um mesmo sinal para flores dentro de casa para as que

estavam ao ar livre e ateacute para as que estavam em fotografias aleacutem do uso de sinais

de ecircnfase como ldquopor favor (please)rdquo ldquomais raacutepido (hurry)rdquo e ldquoquero mais (more)rdquo667

662

ZIMMERMANN et al 2009 663

ldquo[] the relevance property of human communicationrdquo 664

KELLOG W N KELLOG L A 1967 p 282-287 665

GARDNER R A GARDNER B T 1969 666

Respectivamente ldquoflowerrdquo e ldquosmellrdquo 667

Respectivamente ldquopleaserdquo ldquohurryrdquo e ldquomorerdquo

148

Segundo Miles668 o orangotango Chantek chegou a conhecer cerca de cento

e quarenta sinais manuais e diz George669 pareceu esboccedilar o iniacutecio de uma

conversa ao expressar a frase ldquoJeannie Chantek chaserdquo670

Dentre as outras accedilotildees de Chantek destacamos seu reconhecimento no

espelho que passou a utilizar para limpar-se e a sua capacidade de enganar a

treinadora tanto roubando alimento de seu bolso enquanto puxava a matildeo dela na

direccedilatildeo oposta como fingindo engolir a borracha de apagar que roubara mantendo-

a no canto da boca apoiando novamente o estojo e logo em seguida pedindo

comida por meio dos sinais Aqui Miles aponta evidecircncias de que o animal teria

demonstrado intencionalidade premeditado e assumido a perspectiva do outro

como proposto pela teoria da mente que implicam formaccedilatildeo de imagem mental

relacionada aos resultados desses atos Outro sinal disto foi a melhora do sinal

apresentado apoacutes o pedido do treinador sugerindo que o animal entendeu que o

sinal teria uma forma ideal refletida em sua imagem mental Chantek passou a

sinalizar tambeacutem com o peacute e com objetos como lacircminas de tesouras Miles afirma

que ele natildeo tinha os sinais somente como uma habilidade motora associada a algo

o que evidenciaria que o modo de processar os sinais teria natureza abstrata e

representacional O animal ainda chamava a atenccedilatildeo de um humano antes de

comeccedilar a sinalizar chegava a oferecer as matildeos para que fossem moldadas a fim

de que passasse a conhecer um sinal novo e passou a inventar seus proacuteprios

sinais mostrando ter entendido a natureza representacional dos sinais Assim

conclui ter-se-ia um exemplo de um animal que formou representaccedilotildees do mundo

real

Tomasello671 publicou uma revisatildeo sobre os avanccedilos de experimentos com

grandes macacos treinados para a comunicaccedilatildeo humana como o chimpanzeacute

Washoe a gorila Koko (apelido de Hanabiko) e o orangotango Chantek mas com

ecircnfase nos trabalhos desenvolvidos com o bonobo Kanzi que reuniu um repertoacuterio

de mais de trecircs mil palavras672 e afirma que a conclusatildeo geral eacute a de que estes

possuem a maior parte das habilidades cognitivas que servem como requisito para

algo que seria como a linguagem humana como o uso de siacutembolos linguiacutesticos

668

MILES 1990 669

GEORGE 2003 670

Traduccedilatildeo sugerida ldquoChantek persegue Jannierdquo MILES 1990 p 521 671

TOMASELLO 2017 672

RAFFAELE 2006

149

semelhante ao humano dos quais compreendem e produzem combinaccedilotildees de

maneira criativa

A gorila Koko que veio a tornar-se bastante famosa conheceu um repertoacuterio

bastante vasto da linguagem manual dos sinais da ASL em que utilizava mais de mil

palavras e reconhecia mais de duas mil673 Em certa etapa seu desenvolvimento

acompanhou sob muitos aspectos o de crianccedilas humanas mas sob outros ficava

aqueacutem destas No entanto aos quatro anos e meio jaacute pontuava acima de crianccedilas

de seis anos em alguns testes ditos de ldquoprogressatildeo loacutegicardquo como em uma

sequecircncia de quatro figuras de cartas com um triacircngulo e um ciacuterculo em que estes

alternavam com relaccedilatildeo agrave posiccedilatildeo superior e inferior (a primeira tinha o ciacuterculo

acima) e cada ciacuterculo a partir do segundo era maior que o anterior enquanto os

triacircngulos possuiacuteam o mesmo tamanho A quinta carta seguinte teria de ser um

grande ciacuterculo sobre o mesmo triacircngulo e Koko rapidamente a indicou entre outras

trecircs com triacircngulos e ciacuterculos em outras condiccedilotildees674

Se por um lado do teste da marca diante de um espelho realizado Allen e

Schwartz675 com um espeacutecime de gorila (G gorilla gorilla) chamado Otto apesar de

este ter obtido ecircxito os autores consideraram como inconclusiva a identificaccedilatildeo de

autorreconhecimento por outro Koko claramente se reconhecia no espelho e

inclusive indicava partes de seu rosto676 Segundo Patterson ela utilizava elementos

da linguagem aberta e produtivamente677 Koko se referia a eventos passados (como

quando se referiu a um fato ocorrido no dia anterior) e reconhecia o futuro proacuteximo

(como quando ia-se preparar depois de informada de que logo iria sair)678 dizia

quando gostava de algo ou de algueacutem quando oferecia algo como uma bebida para

algueacutem679 e dizia pares de palavras que rimavam entre si quando solicitada a fazecirc-

lo ou quando lhe pediam uma rima para uma palavra especiacutefica ela o fornecia680

Dava tambeacutem outras demonstraccedilotildees de humor como quando espontaneamente

chamava o nariz de ldquofake mouthrdquo681 brincava com as palavras em muitos casos

como o fazem crianccedilas como por exemplo aglutinando elementos moldando seu

673

THE GORILLA FOUNDATION 2018 674

PATTERSON LINDEN 1981 p 100 675

ALLEN SCHWARTZ 2007 676

PATTERSON LINDEN 1981 p 108 677

Ibid p 157 678

Ibid p 150-151 679

Ibid p 91 680

Ibid p 111 681

ldquoFalsa bocardquo PATTERSON LINDEN 1981 p 112

150

proacuteprio vocabulaacuterio e expressava em palavras certas emoccedilotildees como seus medos

inclusive xingando quem a contrariasse tendo espontaneamente passado a usar

palavras especiacuteficas para isto como ldquobirdrdquo682 e ateacute mentia para acusar algueacutem de

um erro que ela mesma cometida ou para disfarccedilar algo de errado que estivesse

fazendo ao ser pega em flagrante683 Quando natildeo sabia o nome de algum objeto ela

mesma atribuiacutea a este um como quando passou a chamar maacutescara ldquonose fakerdquo684

Isso tambeacutem indicaria segundo Patterson capacidade de estabelecer analogias e

metaacuteforas Assim Koko foi submetida a certo teste em que teria de reconhecer por

exemplo se uma cor era alegre ou triste ou se era suave ou pesada e passou com

desempenho superior ao de algumas crianccedilas com a idade de sete anos tambeacutem

testadas685

Pika e colaboradores incluindo o proacuteprio Tomasello686 mencionam o uso de

meacutetodos utilizados pelos grandes siacutemios para captar atenccedilatildeo para chamar a

atenccedilatildeo de outros para algo Este como exemplifica Tomasello687 pode ser o

proacuteprio sujeito uma parte do corpo deste ou algum objeto externo o que deveraacute

induzir o outro indiviacuteduo a fazer o que o sujeito que chamou sua atenccedilatildeo intenciona

E Tomasello acrescenta que ateacute onde se sabe somente os grandes primatas

chamam a atenccedilatildeo dos outros deste modo em seu processo de comunicaccedilatildeo

natural Ele observa que Kanzi consegue entender e produzir dispositivos

comunicativos a partir do modo como funciona psicologicamente a comunicaccedilatildeo

referencial o que significa que ao dirigir a atenccedilatildeo do outro eles estatildeo conseguindo

atingir um objetivo especiacutefico

Savage-Rumbaugh688 quem com colaboradores teria segundo afirma

realizado o primeiro experimento em que chimpanzeacutes estabeleceram comunicaccedilatildeo

entre si por meio do uso de siacutembolos689 relata que Kanzi se destaca pelo fato de

que observava desde pequeno os testes com lexigramas realizados com sua matildee

Matata e conseguiu aprender mais lexigramas do que ela desenvolvendo-se por si

mesmo em vez de por treinamento direto reforccedilado externamente tendo por

recompensa a conquista da comunicaccedilatildeo e o que esta lhe propiciava Os lexigramas

682

ldquoAverdquo PATTERSON LINDEN 1981 p 119-121 e 142 683

Ibid p 135 684

ldquoNariz falsordquo Ibid p 117 685

Ibid p 117 686

PIKA et al 2005 687

TOMASELLO 2017 688

SAVAGE-RUMBAUGH 1986 689

SAVAGE-RUMBAUGH et al 1978

151

satildeo iacutecones de computador que correspondem a palavras e aparecem em uma tela

para os animais em teste a fim de que a toquem no ponto exato em que veem o

iacutecone da palavra que pretendem expressar Se tocam nos iacutecones corretos em

relaccedilatildeo agrave determinada questatildeo recebem a recompensa Tomasello compara o

vocabulaacuterio de Kanzi ao de crianccedilas pequenas e tal compreensatildeo tambeacutem eacute

observada em papagaios catildees e outros animais mas nestes adquirida e produzida

somente mediante treinamento direto Compunham o vocabulaacuterio nomes proacuteprios

nomes de objetos localizaccedilotildees accedilotildees propriedades e adveacuterbios com certas

funccedilotildees como ldquosimrdquo e ldquonatildeordquo O pesquisador aponta a construccedilatildeo de sentenccedilas por

parte do animal com o emprego de accedilotildees que natildeo satildeo deduziacuteveis dos objetos

envolvidos como ldquoponha o dinheiro sobre os cogumelosrdquo690 e outras em que

poderia facilmente haver reversatildeo dos papeacuteis dos objetos envolvidos como ldquoponha

um pouco de leite na aacuteguardquo691

Remetendo-se a outro estudo seu692 Tomasello menciona ainda que Kanzi

tem uma categoria gramatical que o possibilita compreender coisas jaacute conhecidas de

novas maneiras e entende que a ordem das palavras pode ser usada como

dispositivo simboacutelico de diferenciaccedilatildeo e daacute como exemplos a resposta correta do

animal a comandos em que se troca somente o sujeito como ldquoponha o chapeacuteu em

sua bolardquo e ldquoponha a bola no chapeacuteurdquo693 e o entendimento por parte de Kanzi de

que aquele que pratica a accedilatildeo como ldquomorderrdquo ou ldquoperseguirrdquo694 vem antes do que

sofre a accedilatildeo decerto levando em conta aqui a voz ativa Conclui entatildeo que ele

entende certos eventos e certas accedilotildees bem como as palavras usadas para designaacute-

los que deles participam agentes cuja ordem em que aparecem na construccedilatildeo da

frase representa um papel especiacutefico tal como ocorre com uma crianccedila de dois

anos Diz o pesquisador

Ele sabe que o sujeito que estaacute mordendo ou perseguindo eacute mencionado antes de lsquomorderrsquo ou lsquoperseguirrsquo e o que estaacute sendo mordido ou perseguido eacute apenas mencionado depois Ele sabe essas coisas presumidamente porque viu uma ordem pareada com uma versatildeo do evento chave (por exemplo X perseguindo Y) e outra ordem pareada com outra versatildeo do mesmo evento (por exemplo Y perseguindo X)

695

690

ldquoPut the Money on the mushroomsrdquo 691

ldquoPut some milk on the waterrdquo 692

TOMASELLO 1994 693

Respectivamente ldquoput the hat on your ballrdquo e ldquoput the ball on the hatrdquo 694

Respectivamente ldquobiterdquo e ldquochaserdquo 695

TOMASELLO 2017 p 100

152

Tomasello assim distingue dois niacuteveis em relaccedilatildeo agrave competecircncia gramatical

O primeiro eacute a produccedilatildeo inovadora de combinaccedilotildees de siacutembolos criando novos

significados o que exemplifica com o chimpanzeacute Washoe referindo-se a um pato

como ldquowater birdrdquo696 O segundo satildeo essas combinaccedilotildees que um sujeito pode

produzir com siacutembolos especiacuteficos que servem como marcadores gramaticais Para

exemplificar o pesquisador aponta a ausecircncia de indicaccedilotildees simboacutelicas de como

esses dois signos ldquowaterrdquo e ldquobirdrdquo se relacionam entre si e assim cabe ao receptor

ou ouvinte estabelecer a relaccedilatildeo Uma dessas relaccedilotildees eacute a ordem exemplificada

mais acima em que se usa em uma frase primeiro um substantivo como sujeito e

depois (do verbo) outro como objeto direto Segundo o pesquisador Kanzi utiliza

alguns padrotildees de ordem consistentes utilizando lexigramas que correspondem a

uma accedilatildeo (primeiro elemento) geralmente antes do objeto da accedilatildeo (segundo

elemento) Mas ele por fim observa que uma coisa eacute haver consistecircncia no padratildeo

de ordenamento e outra eacute usar a ordem como dispositivo gramatical para produccedilatildeo

de um significado consistente que caracterize uma segunda ordem Isto mesmo

quando Kanzi combina de modo criativo os lexigramas com gestos que normalmente

vecircm em seguida como o de apontar para quem estaacute realizando alguma accedilatildeo ou

para o local para o qual a accedilatildeo seraacute dirigida

696

ldquoAve de aacuteguardquo

153

7 A INTELIGEcircNCIA NOS ANIMAIS SEGUNDO O ARISTOTELISMO-TOMISMO

Tendo selecionado assim algumas das principais habilidades cognitivas

comprovadas e inclusive outras sugeridas de animais natildeo humanos a partir de

trabalhos com pesquisas experimentais e de campo e de posse da informaccedilatildeo

estruturada necessaacuteria no acircmbito da psicologia aristoteacutelico-tomista buscaremos

enquadrar essas habilidades dentro dos limites entre o conhecimento adquirido

pelos sentidos nos animais natildeo humanos e aquele adquirido pelos sentidos no

homem bem como pelo intelecto a fim de darmos iniacutecio agrave verificaccedilatildeo da

compatibilidade entre a proposta aristoteacutelico-tomista e o que se sabe atualmente

sobre a chamada inteligecircncia nesses entes

O proacuteximo passo assim eacute retomarmos a obra de Aristoacuteteles e Tomaacutes de

Aquino para estabelecermos esses limites a partir da construccedilatildeo anterior e do que

os autores afirmam diretamente sobre o tema

Aristoacuteteles afirma que a alma de uma crianccedila pequena praticamente em nada

difere da de alguns animais com o ceacuterebro mais desenvolvido697 ou seja que estes

podem expressar caracteriacutesticas no acircmbito da potecircncia estimativa observadas

naquelas algo que reflete diretamente na questatildeo das habilidades cognitivas

Ele ilustra o que diz afirmando que nos animais encontram-se estados

psicoloacutegicos semelhantes aos dos humanos e elenca alguns como ldquodocilidade ou

ferocidade doccedilura ou aspereza coragem ou covardia temor ou ousadia paixatildeo e

maliacutecia e no plano intelectual certa sagacidaderdquo698 dentre outros traccedilos de caraacuteter

como a indolecircncia a irascibilidade a prudecircncia e a timidez a obstinaccedilatildeo e a

estupidez a vileza e a perfiacutedia a nobreza e a braveza a astuacutecia a afetuosidade a

inveja e a presunccedilatildeo a cautela e o brio

Afirma entatildeo que ainda que os demais animais tenham memoacuteria e faculdade

de aprendizagem o homem eacute o uacutenico que apresenta capacidade de reflexatildeo pois

soacute ele eacute capaz de recordar voluntariamente699

Quanto ao ato voluntaacuterio diz ele que o tecircm as crianccedilas e os animais natildeo

humanos que agem voluntariamente natildeo pela vontade livre ou por algo de origem

externa mas espontaneamente no sentido de que satildeo voluntaacuterias as accedilotildees

697

ARISTOacuteTELES 1992 L VIII 588a-588b p 412 698

ldquo[] docilidad o ferocidad dulzura o aspereza coraje o cobardiacutea temor u osadiacutea apasionamiento o malicia y en el plano intelectual una cierta sagacidade []rdquo Ibid L VIII 588a p 411

699 Ibid L I 488b p 48

154

praticadas impulsivamente que caracterizam um movimento proacuteprio em razatildeo do

apetite em conformidade com as afecccedilotildees da vontade sensitiva como o desejo

sensual e a raiva700 Mas nem nos animais natildeo humanos nem nas crianccedilas existe

escolha ainda que possa existir uma opiniatildeo sobre o que se haacute ou natildeo de fazer

uma opccedilatildeo sobre o que mais conveacutem a determinado fim701 jaacute que lhes falta o juiacutezo

o fundamento do ato e a deliberaccedilatildeo cuja parte da alma relacionada considera as

causas como aponta o Estagirita o ldquoem vista do quecircrdquo e o ldquopor quecircrdquo que entatildeo

conclui que ldquotudo o que foi escolhido deliberadamente eacute voluntaacuterio mas nem tudo o

que eacute voluntaacuterio eacute escolha deliberadardquo702

Assim enquanto o homem tem o conhecimento perfeito do fim em que satildeo

apreendidas a coisa constitutiva do fim aleacutem da ideia de fim e a da proporccedilatildeo entre

o fim e o ato que a este se ordena os demais animais tecircm pela estimativa o

conhecimento imperfeito do fim restrito agrave apreensatildeo deste e mesmo quando um

objeto por buscar-se natildeo estaacute presente em razatildeo da imaginaccedilatildeo e da memoacuteria

Assim se a essecircncia perfeita da vontade depende do conhecimento perfeito do fim

haacute tambeacutem a vontade em sentido imperfeito que depende do conhecimento

imperfeito do fim e neste caso haacute um movimento para o fim sem deliberaccedilatildeo703

Aristoacuteteles tambeacutem parece atribuir de algum modo inteligecircncia ou prudecircncia

(aqui como frocircnese ou phroacutenesis)704 natildeo soacute aos humanos no sentido de ldquoexaminar

bem o que se refere a si mesmordquo705 que tecircm a inteligecircncia universal por meio da

razatildeo mas a alguns dentre os demais animais que segundo ele ldquoparecem ter

faculdade de provisatildeo para sua proacutepria vidardquo706 no acircmbito de determinados atos

particulares707708

700

ARISTOacuteTELES 1998a L III 1111a-1111b p 184-185 TOMAacuteS DE AQUINO 1964 l 4 427

701 TOMAacuteS DE AQUINO 2003a p 30

702 ldquo[] todo lo que ha sido escogido deliberadamente es voluntario pero no todo lo voluntario

es eleccioacuten deliberadardquo ARISTOacuteTELES 1998b L II 1226b p 460 703

TOMAacuteS DE AQUINO 1993 Q 6 a 2 p 105 704

ldquoΦρόνησιςrdquo Alguns tradutores usam ldquointeligecircnciardquo mas partindo do que se disse anteriormente a respeito do intelecto o termo ldquoprudecircnciardquo parece ser dos dois o mais adequado Natildeo se trataria pois de inteligecircncia propriamente dita sob a oacuteptica aristoteacutelico-tomista

705 ldquo[] examinar bien lo que se refiere a siacute mismordquo ARISTOacuteTELES 1998a L VI 1141a p

278 706

ldquo[] parecen tener la facultad de previsioacuten para su propria vidardquo ARISTOacuteTELES 1998a L VI 1141a p 278

707 Reale (2005 p 7) explica que phroacutenesis aqui tem sentido mais geral e que quando

Aristoacuteteles emprega o termo aos humanos eacute no sentido de ldquosabedoria praacuteticardquo que eacute exclusiva destes

708 ARISTOacuteTELES 1998a L VI 1141a p 278 TOMAacuteS DE AQUINO 2001 Q 96 a 1 p

851 Id 1964a l 6 1187

155

Explica Tomaacutes de Aquino que essa inteligecircncia ou prudecircncia pode ser

encontrada em alguns animais com memoacuteria mas que diferente do homem no qual

ela se daacute quando este racionalmente delibera quanto ao que deve fazer nesses

animais se daacute por um juiacutezo instintivo das coisas por fazer-se de modo que diz ele

ldquonos outros animais a prudecircncia eacute uma estimativa natural sobre a busca daquilo que

eacute adequado e da fuga daquilo que eacute prejudicial como uma ovelha segue sua matildee e

foge do lobordquo709

Em seguida ele distingue nos escritos de Aristoacuteteles trecircs niacuteveis de

conhecimento nos animais natildeo humanos um representado pelos animais que natildeo

tecircm nem memoacuteria nem audiccedilatildeo e portanto natildeo satildeo capazes de ser ensinados nem

tecircm prudecircncia outro por aqueles que tecircm memoacuteria mas natildeo ouvem e entatildeo natildeo

tecircm capacidade para serem ensinados mas podem ter prudecircncia e o terceiro pelos

animais que tecircm memoacuteria e audiccedilatildeo e entatildeo tecircm prudecircncia e podem ser

ensinados710

O sentido de ldquoouvirrdquo nos animais natildeo humanos aqui explica Reale711 estaacute

expresso por Aristoacuteteles

Haacute os que participam por sua vez da capacidade tanto de aprender712

como de ensinar capacidade transmitida seja por seus proacuteprios semelhantes seja pelos homens Estes satildeo todos animais dotados do dom da audiccedilatildeo isto eacute natildeo soacute os que percebem as diferenccedilas dos sons mas tambeacutem os que distinguem a diversidade de significados

713

O Estagirita fornece o exemplo de pequenas aves que se natildeo forem criadas

com os pais podem apresentar cantos diferentes ao que se observa comumente na

espeacutecie Menciona entatildeo o caso de um rouxinol que ensinou os filhotes a cantar

corroborando a afirmaccedilatildeo de que a comunicaccedilatildeo que se daacute como uma participaccedilatildeo

na linguagem nos animais eacute transmitida por um processo educativo714

709

ldquo[] in other animals prudence is a natural estimate about the pursuit of what is fitting and the avoidance of what is harmful as a lamb follows its mother and runs away from a wolfrdquo TOMAacuteS DE AQUINO 1964b L I l 1 11

710 ARISTOacuteTELES 2005 L I 1 980a-980b p 3 TOMAacuteS DE AQUINO 1964b L I l 1 13

711 REALE 2005 p 7

712 Explica Reale (2005 p 7) que aqui se diz ldquoaprenderrdquo no sentido de ser disciplinado ser

adestrado 713

ldquoLos hay que participan a la vez de la capacidad tanto de aprender como de ensentildear capacidad transmitida ya por sus propios semejantes ya por los hombres Eacutestos son todos los animales dotados del don de la audicioacuten es decir no soacutelo los que perciben las diferencias de los sonidos sino tambieacuten los que distinguen la diversidad de significacionesrdquo ARISTOacuteTELES 1992 L IX 608a p 479

714 Ibid L IV 536b p 228-229

156

Os animais natildeo humanos bem como as crianccedilas tecircm representaccedilatildeo e

memoacuteria do particular Essa representaccedilatildeo corresponde agrave imagem apreendida que

eles retecircm e assim eacute pela imaginaccedilatildeo que eles buscam algo ou fogem de algo715 O

aristotelismo-tomismo entatildeo considera que a vida dos animais aos quais chama

imperfeitos eacute regida administrada pela imaginaccedilatildeo e a dos animais aos quais

chama perfeitos o eacute pela memoacuteria e Tomaacutes de Aquino explica que eacute a necessidade

de agir e natildeo o desejo de conhecer que caracteriza o modo como o conhecimento

pertence aos animais716

Reale717 aponta as cinco formas de conhecimento descritas por Aristoacuteteles no

iniacutecio da Metafiacutesica nomeadamente a sensaccedilatildeo a memoacuteria o experimento a arte

e a ciecircncia sendo as uacuteltimas duas somente consideradas como sapiecircncia ou

sabedoria jaacute que ambas se relacionam ao universal conhecem os porquecircs e as

causas dos fatos ao passo que o experimento e a sensaccedilatildeo o fazem ao particular

restringindo-se aos dados dos fatos nesse sentido

Em relaccedilatildeo ao experimento (experimentum) diz Tomaacutes de Aquino

Ora nos homens o que se segue sobre a memoacuteria eacute o experimento do qual alguns animais ainda que muito pouco participam Pois um experimento se forma pelas associaccedilotildees de muitas [intenccedilotildees] singulares recebidas na memoacuteria Esse tipo de correlaccedilatildeo eacute proacuteprio do homem e pertence agrave potecircncia cogitativa (tambeacutem chamada razatildeo particular) a qual compara as intenccedilotildees individuais assim como a razatildeo universal o faz com as intenccedilotildees universais Ora como os animais costumam buscar ou evitar algo a partir de muitas sensaccedilotildees e recordaccedilotildees por isso eacute que parecem participar algo do experimento ainda que pouco No entanto acima do experimento que pertence agrave razatildeo particular os homens tecircm como sua potecircncia principal uma razatildeo universal por meio da qual eles vivem

718

Alguns estudiosos do aristotelismo-tomismo como Manzanedo e Maritain

sugeriram haver aqui algo de cogitativa nestes animais ditos superiores aponta

Echavarriacutea que explica

715

ARISTOacuteTELES 1998a L VII 1147b p 299 TOMAacuteS DE AQUINO 1990b L II c LXVII p 285

716 ARISTOacuteTELES 2005 L I 1 980b p 3 TOMAacuteS DE AQUINO 1964b L I l 1 14

717 REALE 2005 p 5

718 ldquoNow [] in men the next thing above memory is experience which some animals have

only to a small degree For an experience arises from the association of many singular [intentions] received in memory And this kind of association is proper to man and pertains to the cogitative power (also called particular reason) which associates particular intentions just as universal reason associates universal ones Now since animals are accustomed to pursue or avoid certain things as a result of many sensations and memory for this reason they seem to share something of experience even though it be slight But above experience which belongs to particular reason men have as their chief power a universal reason by means of which they liverdquo TOMAacuteS DE AQUINO 1964b L I l 1 15

157

[] a assinalaccedilatildeo parece interessante e digna de ser analisada mas um

pouco apressada e sem fazer as distinccedilotildees adequadas Se haacute cogitativa animal se daacute soacute em alguns animais superiores Por outro lado Santo Tomaacutes considera a cogitativa como uma potecircncia proacutepria do homem e na maior parte das passagens de suas obras que tratam sobre o tema atribui soacute a estimativa aos animais brutos No entanto parece admitir que em alguns deles se decirc uma lsquoparticipaccedilatildeorsquo ainda que pequena desta faculdade

719

Sustentamos aqui esta segunda opccedilatildeo ou seja que esses animais teriam

apenas uma ldquoparticipaccedilatildeordquo da cogitativa relacionada agrave comparaccedilatildeo de intenccedilotildees

assim como muitos destes participam da comunicaccedilatildeo mas natildeo tecircm linguagem que

eacute proacutepria do homem uma vez que natildeo haacute qualquer vestiacutegio do refluxo intelectivo

que caracteriza a cogitativa Explica Muszalski que

Os animais irracionais superiores tecircm a potecircncia memorativa que eacute um tesouro no qual se acumulam as estimaccedilotildees realizadas em relaccedilatildeo agrave conveniecircncia ou prejuiacutezo dos singulares No entanto a repetida operaccedilatildeo de apreender a intentio no homem supotildee uma comparaccedilatildeo ndash denominada aqui ldquoraciociacuteniordquo ndash que natildeo ocorre com o bruto Como unicamente a cogitativa eacute capaz de realizar esse discurso soacute o homem eacute capaz de acumular na memoacuteria uma experiecircncia relacionada aos sensiacuteveis singulares

720

Cabe aqui recordar de modo bastante resumido o que se disse sobre os

sentidos na construccedilatildeo realizada na etapa anterior Enquanto o intelecto considera

as espeacutecies universais a quididade formal e assim as coisas incorpoacutereas como a

sabedoria e as relaccedilotildees das coisas os sentidos externos e internos consideram os

acidentes proacuteprios e comuns das coisas corpoacutereas pelas espeacutecies sensiacuteveis e

dentre os sentidos somente a estimativa e a cogitativa consideram daquelas a

quididade particular721 Deste modo diferentemente do homem que realiza de modo

inteligiacutevel coisas diversas e opostas os demais animais satildeo movidos pela natureza

pelo apetite e pelos sentidos

Por isso as accedilotildees pelas quais fazem as coisas movidos natildeo pela arte mas

pela mesma natureza satildeo ldquodeterminadas uniformes e da mesma espeacutecierdquo o que

Tomaacutes de Aquino exemplifica com a semelhanccedila entre os ninhos das andorinhas e

719

ECHAVARRIacuteA 2009 p 135-136 720

ldquoLos animales irracionales superiores tienen la potencia memorativa que es un tesoro en el cual se acumulan las estimaciones realizadas acerca de la conveniencia o perjuicio de los singulares Sin embargo la repetida operacioacuten de aprehender la intentio en el hombre supone una comparacioacuten mdash denominada aquiacute lsquorazonamientorsquo mdash que no ocurre en el bruto Como uacutenicamente la cogitativa es capaz de llevar a cabo este discurso soacutelo el hombre es capaz de acumular en la memoria una experiencia acerca de los sensibles singularesrdquo MUSZALSKI 2014 p 94

721 TOMAacuteS DE AQUINO 1999 p 97-98 Id 1990b L II c LXVI p 285

158

aquela entre o modo como as aranhas tecem as teias722 Mas como se vecirc pela

complexidade dessas construccedilotildees como a teia de Caerostris darwini os ninhos dos

gecircneros Ptilonorhynchus sp e Furnarius sp e inclusive as obras mais complexas

como a do gecircnero de mamiacutefero Castor sp que por vezes incluem espantosa

simetria como os complexos ciacuterculos construiacutedos por peixes do gecircnero Torquigener

sp trata-se de algo que envolve muito mais do que um simples automatismo como

a afirmaccedilatildeo poderia supor e entatildeo diz Muszalski que ldquoo conhecimento dos brutosrdquo

natildeo termina ldquona produccedilatildeo da imagemrdquo pois

[] o animal natildeo soacute possui as formas sensiacuteveis do conhecido pelos

sentidos ndash formas que produz e conserva a fantasia ndash como tambeacutem possui as formas ou intenccedilotildees de certos aspectos das coisas que conhece que natildeo satildeo captadas pelos sentidos externos

723

A impressatildeo que muitas vezes se tem de demonstraccedilotildees de inteligecircncia que

se assemelha agrave humana por parte de alguns animais normalmente se explica pelo

fato de um ou outro sentido externo em um ou outro animal superar o homem o que

ocorre inclusive ao sentido interno da memoacuteria que em alguns animais e sob certos

aspectos tambeacutem pode superar a do homem Ilustram isto o desempenho dos

chimpanzeacutes nos estudos de Inoue e Matsuzawa724 bem como o paacutessaro de Clark

que armazena para o inverno mais de trinta mil sementes escondendo-as em

lugares diferentes725

Gastoacuten Colleacute citado por Reale726 explica que a natureza do que se entende

como participaccedilatildeo no experimento em alguns animais possui ldquoforma puramente

sensiacutevelrdquo727 e deve ser ldquouma coleccedilatildeo de imagens ou uma fusatildeo de muitas

associaccedilotildees de imagens de lembranccedilas sensiacuteveis numa uacutenica representaccedilatildeo

sensiacutevelrdquo728 Colleacute comenta em seguida que essas representaccedilotildees propiciam a accedilatildeo

ao animal acompanhada de uma determinaccedilatildeo e que isto se daacute em um nuacutemero

muito reduzido de animais remetendo-se ao Estagirita para reiterar que a grande

maioria deles vive de memoacuterias isoladas de natureza sensiacutevel E um pouco adiante

722

TOMAacuteS DE AQUINO 1990b L II c LXVI p 284-285 ibid LXXXII p 327 723

MUSZALSKI 2014 724

INOUE MATSUZAWA 2007 725

MACKINTOSH 1997 726

REALE 2005 p 8 727

ldquo[] forme purement sensible []rdquo COLLEacute 1912 p 10 728

ldquo[] une collection dimages ou une fusion de plusieurs associations dimages de plusieurs souvenirs sensibles en une seule repreacutesentation sensiblerdquo Ibid p 11

159

jaacute explicando sobre o experimento no homem afirma ser ldquoo estado de consciecircncia

resultante de um conjunto de memoacuterias abstratas mais particularesrdquo729

Chega-se assim ao corolaacuterio do entendimento aristoteacutelico-tomista sobre a

inteligecircncia nos animais chamados superiores (ver tabela 1) daacute-se por apreensatildeo

de intenccedilotildees e quididades somada agraves comparaccedilotildees de imagens formadas pela

potecircncia imaginativa realizadas pela estimativa a partir de sensiacuteveis particulares

captados pelos sentidos proacuteprios e pelo sentido comum e retidas pela memoacuteria

sem poreacutem o recurso agrave memoacuteria e agrave imaginaccedilatildeo voluntaacuterias bem como sem o

refluxo do intelecto o que caracteriza a potecircncia cogitativa que eacute exclusiva do ente

humano

729

ldquo[] lrsquoeacutetat de conscience reacutesultant drsquoun ensemble de souvenirs abstraits mais particuliersrdquo COLLEacute 1912 p 11 Tambeacutem citado por REALE 2005 p 8

160

8 ANAacuteLISE DAS HABILIDADES COGNITIVAS SEGUNDO O MODELO

ARISTOTEacuteLICO-TOMISTA

Buscaremos agora analisar cada uma das informaccedilotildees levantadas na

literatura especializada especialmente na das uacuteltimas deacutecadas no intuito de

verificar de que modo as habilidades apresentadas pelos animais mencionadas aqui

se encaixariam no modelo aristoteacutelico-tomista se for o caso testando se haveria

algo que ultrapasse os limites estabelecidos por este para a estimativa alcanccedilando

o que seria proacuteprio da cogitativa e do intelecto

Adotaremos como dito um processo de investigaccedilatildeo seguindo uma linha

mais proacutexima daquelas realizadas por George730 e por Kovaacutecs e Mather731 a partir

da qual haveremos de sugerir ou natildeo a validade de determinada doutrina com base

nos fatos verificados buscando realizar tal empresa do modo mais objetivo que

pudermos Tentaremos restringir o maacuteximo possiacutevel o papel da subjetividade

mesmo reconhecendo as dificuldades em fazecirc-lo satisfatoriamente como pelo fato

de que estamos lidando com determinada perspectiva ndash que natildeo encontraraacute espaccedilo

aqui para ser merecidamente justificada ndash e reconhecendo que o que produzimos

deveraacute ser objeto de correccedilotildees futuras ressaltando por fim que as correlaccedilotildees que

estabelecemos aqui entre os resultados dos estudos e o aristotelismo-tomismo

haveratildeo de ter caraacuteter nada mais que sugestivo

Dito isto passemos a analisar os casos destacados aqui buscando

enquadraacute-los em categorias (ver tabelas 2-7) a comeccedilar pela que envolve

interaccedilotildees relacionadas ao comportamento

81 INTERACcedilOtildeES COMPORTAMENTAIS

811 Interaccedilotildees em geral

Haacute grande complexidade nas interaccedilotildees comportamentais entre elefantes

que sugerem haver caracteriacutesticas empaacuteticas descritas em estudos de campo como

o de Bates732 como coalisatildeo prestaccedilatildeo de auxiacutelio e inclusive resgate e remoccedilatildeo de

730

GEORGE 2003 731

KOacuteVACS MATHER 2008 732

BATES et al 2008

161

objetos proteccedilatildeo e conforto dedicados aos mais jovens esta descrita tambeacutem no

trabalho de Plotnik e de Waal733 em que o adulto usa a tromba e mesmo a

vocalizaccedilatildeo para consolar um pequeno espeacutecime Tem-se aiacute igualmente

despertando a necessidade de comunicar-se a identificaccedilatildeo do outro como

semelhante o reconhecimento das diferenccedilas entre ambos e das emoccedilotildees das

necessidades e das crenccedilas particulares que parecem ilustrar as funccedilotildees da

estimativa de identificar quididades particulares ou seja o outro como indiviacuteduo

bem como as intenccedilotildees particulares em relaccedilatildeo ao que o outro pretende ou do que

precisa inclusive comparando-as (com imagens na memoacuteria) como na verificaccedilatildeo

do estado emocional

Tambeacutem os estudos de McComb e colaboradores734 e os de Soltis e

colaboradores735 expressariam essas funccedilotildees da estimativa tanto no

reconhecimento de um indiviacuteduo associado agrave determinada funccedilatildeo por ser realizada

pelo indiviacuteduo que estaacute mais apto a exercecirc-la no caso a matriarca como a mais

capaz de tomar decisotildees frente a uma ameaccedila como no reconhecimento da

natureza do ente que eacute tido como ameaccedila aleacutem do niacutevel de ameaccedila estimado

intraespeciacutefico e mesmo interespeciacutefico no caso os diferentes grupos eacutetnicos

humanos que tambeacutem caracterizam a apreensatildeo das quididades e intenccedilotildees

particulares seguida de comparaccedilatildeo de ambas com aquelas que procedem da

imaginaccedilatildeo e estatildeo guardadas na memoacuteria

812 Comportamento diante da morte de coespeciacutefico

Seguindo nos estudos de campo os de McComb e colaboradores736

apontaram a distinccedilatildeo por elefantes de cracircnios de membro da espeacutecie inclusive os

marfins o que implica reconhecimento do outro ou de parte do outro coespeciacutefico

como semelhante Destacamos aqui a apreensatildeo da quididade particular pela

estimativa que viabiliza o reconhecimento da parte e o do cadaacutever como um todo o

que possibilita com a memoacuteria o acompanhamento por suscessivas visitas que

pode durar meses a partir do interesse pelo cadaacutever de membros do grupo descrito

733

PLOTNIK DE WAAL 2014 734

MCCOMB et al 2011 735

SOLTIS et al 2014 736

MCCOMB BAKER MOSS 2006

162

por Douglas-Hamilton e colaboradores737 mesmo tendo em vista o fato de que

conforme a natureza dos agentes envolvidos na decomposiccedilatildeo em questatildeo de

poucos dias o cracircnio jaacute pode estar exposto738

Quanto ao interesse em si pelo cadaacutever trata-se de um fenocircmeno ainda

pouco estudado como reconhecem por exemplo Bearzi e colaboradores739 que

publicaram uma revisatildeo sobre o tema em cetaacuteceos Pode-se propor que dentre as

possibilidades esteja tambeacutem aquilo mesmo que se daacute com os corviacutedeos segundo

Swift740 que sondam o cadaacutever em busca de sinais de perigo para o bando como

que isto tambeacutem poderia-se dar em relaccedilatildeo agrave ineacutercia e mesmo agrave transformaccedilatildeo do

indiviacuteduo sem vida assim como o reconhecimento de que ele jaacute natildeo tem

funcionalidade (de lideranccedila de maternidade etc) desencadeando certas reaccedilotildees

emocionais relacionadas Sugerimos que de um modo ou de outro esteja ali

expressa em destaque provavelmente associada agrave memoacuteria relacionada ao

indiviacuteduo enquanto ainda estava vivo a apreensatildeo pela estimativa de uma ou mais

intenccedilotildees aqui explicando tambeacutem a reaccedilatildeo dos corviacutedeos

813 Respostas a sinais humanos

Nos testes de respostas a sinais humanos catildees golfinhos grandes macacos

e elefantes obtiveram ecircxito salvo estes uacuteltimos em relaccedilatildeo a guiarem-se pelo olhar

humano como observaram Smet e colaboradores741 possivelmente por limitaccedilotildees

de sua visatildeo

Aqui os catildees e os golfinhos apresentam melhor desempenho aqueles

provavelmente por sua proximidade com os humanos e estes por aquilo que sugere

Herman e colaboradores742 sobre uma possiacutevel relaccedilatildeo entre a ecolocalizaccedilatildeo ou

seja a habilidade acuacutestica de apontamento por emissotildees sonares e o gesto

humano de apontar

Esta habilidade parece enquadrar-se na visatildeo aristoteacutelico-tomista

principalmente como resultado da apreensatildeo pela estimativa das intenccedilotildees

737

DOUGLAS-HAMILTON et al 2006 738

DOUGLAS-HAMILTON HILL 1981 739

BEARZI et al 2018 740

SWIFT 2015 741

SMET et al 2013 742

HERMAN et al 1999

163

particulares que pode desenvolver-se individualmente pela aprendizagem por

tentativa e erro ou dar-se por instinto

O mesmo pode-se dizer sobre as respostas aos estados de atenccedilatildeo

humanos como aquelas observadas nos catildees dos testes de Call e colaboradores743

e tambeacutem salvo no que toca ao instinto em relaccedilatildeo ao gesto em si sobre o caso

inverso descrito por Zimmermann e colaboradores744 em que os bonobos e

orangotangos aprenderam a apontar e a natureza referencial disto para que

humanos encontrassem objetos e alimentos escondidos

Jaacute o experimento de Grassmann Kaminski e Tomasello 745 em que os

animais combinaram dois tipos de comando resolvendo conflitos seja alcanccedilando o

alvo por exclusatildeo assim como no experimento de Kaminski e colaboradores746 seja

tendo de decidir entre o apontar com o dedo e o comando vocal simultacircneo para

objetos distintos ilustram pensamos a funccedilatildeo da estimativa de comparar intenccedilotildees

particulares

Sugerimos que o mesmo se aplique ao estudo de Hare e colaboradores747 O

entendimento dos catildees aqui do caraacuteter comunicativo das pistas fornecidas seria

fruto dessa mesma comparaccedilatildeo de intenccedilotildees

82 TEORIA DA MENTE E COMPORTAMENTO DIANTE DE TELAS DE VIacuteDEO

Diferentemente de outros animais os golfinhos como verificado por Herman

e colaboradores748 datildeo muita atenccedilatildeo agraves imagens em tela de viacutedeo e respondem a

comandos por ela Quando as imagens do treinador que dava comandos a Ake foi

gradualmente restrita somente aos membros que davam os sinais e entatildeo

esvanecida e substituiacuteda por manchas moacuteveis que o animal continuou a

reconhecer ainda que em menor grau isto sob a perspectiva aristoteacutelico-tomista

pode ser visto como a comparaccedilatildeo de intenccedilotildees (nos gestos) associada agrave

comparaccedilatildeo de imagens ndash aquelas em gradaccedilatildeo ndash pela estimativa

743

CALL et al 2003 744

ZIMMERMANN et al 2009 745

GRASSMANN KAMINSKI TOMASELLO 2012 746

KAMINSKI et al 2004 747

HARE et al 2010 748

HERMAN et al 1990 HERMAN 2006

164

Os experimentos com a macaca Sarah realizados por Premack e Wooldruff749

mostraram que os chimpanzeacutes podem reconhecer a realidade representada em uma

tela de viacutedeo tal como os golfinhos de Herman e em uma fotografia No acircmbito

aristoteacutelico-tomista entende-se ter havido comparaccedilotildees ou associaccedilotildees particulares

da estimativa entre o objeto real e sua imagem no viacutedeo ou no papel Quanto ao

desempenho nos testes no primeiro caso se observa provavelmente a

aprendizagem direta preacutevia com possiacutevel recurso agrave tentativa e erro ou participaccedilatildeo

no experimento e o recurso da estimativa agrave memoacuteria de intenccedilotildees nos casos em

que o viacutedeo natildeo foi exibido por completo O segundo caso poderia apontar para o

reconhecimento de cada uma das situaccedilotildees associadas ao estado emocional

expressado pelo ator mas tambeacutem para uma simples correlaccedilatildeo entre os objetos e

o modo como ele funciona Em ambas as possibilidades e a mais provaacutevel nesta

etapa que seria a associaccedilatildeo entre elas ou a segunda como uacutenica possibilidade na

etapa seguinte com as trecircs versotildees de cada objeto destacam-se as comparaccedilotildees

de intenccedilotildees particulares pela estimativa

Por fim a uacuteltima etapa tambeacutem caracteriza isto que se diz sobre as intenccedilotildees

na realizaccedilatildeo da tarefa em si de modo relacionado agrave reaccedilatildeo emocional do animal a

cada um dos dois indiviacuteduos jaacute que estaacute diante de um que lhe concede certo bem

pelo qual teraacute preferecircncia e lhe despertaraacute mais interesse pela tarefa e de outro que

natildeo o faz havendo entatildeo desinteresse o que tambeacutem por si refletiria a comparaccedilatildeo

de intenccedilotildees que se segue agrave captaccedilatildeo do particular por parte da estimativa E se

esta capta e compara intenccedilotildees permite assim que o animal reconhecendo o

estado mental de um outro indiviacuteduo possa tomar decisatildeo e agir ainda que natildeo

delibere com base nesta mesma percepccedilatildeo o que nos leva a sugerir que as

descriccedilotildees sobre a chamada teoria da mente estejam em consonacircncia com o

aristotelismo-tomismo

As tentativas de Chantek750 e Koko751 de enganar os treinadores indicando

premeditaccedilatildeo e reconhecimento da perspectiva do outro e que caracterizam a

inovaccedilatildeo no que toca ao desenvolvimento de estrateacutegias visando agrave obtenccedilatildeo do que

lhe apetecem evitando perda ou puniccedilatildeo (mas ainda sem que haja sinal de

abstraccedilatildeo para que se possa atribuir ao intelecto praacutetico) mostram no acircmbito do

749

PREMACK WOOLDRUFF 1978 750

MILES 1990 751

PATTERSON LINDEN 1981 p 135

165

aristotelismo-tomismo uma estimativa bastante desenvolvida Reforccedilam tambeacutem a

teoria da mente

83 METACOGNICcedilAtildeO

A teoria da mente parece estar associada ao que hoje se conhece por

metacogniccedilatildeo que por sua vez tem iacutentima relaccedilatildeo com a chamada metamemoacuteria

Shattleworth diz que por esta ldquoAs pessoas tendem a saber o quatildeo bem elas se

lembram das coisasrdquo e que esta apresenta duas funccedilotildees ldquomonitorar a forccedila de

memoacuteria e controlar a busca de informaccedilatildeordquo752 Em relaccedilatildeo agravequela explica que

ldquoinclui saber o quatildeo bem algueacutem eacute capaz de fazer discriminaccedilotildees de natureza

perceptivardquo753

A metacogniccedilatildeo pode ou natildeo implicar autorreflexatildeo Eacute associada

frequentemente agrave consciecircncia e sua presenccedila em animais natildeo humanos eacute sugerida

por trabalhos como o de Rosati e Santos754 com macacos-rhesus mencionado aqui

Kornell755 indica que os indiacutecios de que haveria metacogniccedilatildeo nos animais com

autorreflexatildeo satildeo escassos jaacute que as reaccedilotildees observadas poderiam estar

associadas ao objeto e que provavelmente seria uma exclusividade humana o que

em princiacutepio estaria em consonacircncia com o pensamento aristoteacutelico-tomista Sob

esta perspectiva os macacos do experimento de Rosati e Santos uma vez

informados sobre a presenccedila do alimento em um ou outro cano sem que se precise

dizer que sabiam que natildeo sabiam mas simplesmente por estarem movidos por um

apetite teriam percebido pela estimativa no que toca agraves inteccedilotildees que a forma mais

econocircmica de visualizaccedilatildeo para a busca seria pelo ponto de convergecircncia e entatildeo o

utilizaram No mesmo sentido uma sugestatildeo para explicar a metamemoacuteria apontada

nos experimentos de Hampton756 que descarta a hipoacutetese de a decisatildeo de recusa

do teste ter base na dificuldade em si da execuccedilatildeo deste seria uma percepccedilatildeo da

eficaacutecia do movimento para satisfaccedilatildeo do apetite com base na comparaccedilatildeo entre os

752

ldquo[] tend to know how well they remember thingsrdquo e ldquo[] monitoring memory strength and controlling information-seekingrdquo SHATTLEWORTH 2010 p 243

753 ldquoincludes knowing how well one is able to make perceptual discriminationsrdquo

SHATTLEWORTH 2010 p 244 754

ROSATI SANTOS 2016 755

KORNELL 2014 756

HAMPTON 2001

166

resultados obtidos por uma e por outra via ou seja aqui tambeacutem pela comparaccedilatildeo

de intenccedilotildees por parte da estimativa

84 NOCcedilAtildeO DE MEIO E FIM E USO DE INSTRUMENTOS

O reconhecimento da quididade particular associado ao de intenccedilotildees podem-

se aplicar aos testes aqui mencionados de colaboraccedilatildeo realizados com elefantes757

e com papagaios-da-nova-zelacircndia758 onde dois animais por tentativa e erro

aprenderam a puxar simultaneamente cada um uma corda amarrada em um suporte

para obterem o alimento sobre este o que se realizou por tentativa e erro

culminando com o reconhecimento da necessidade do parceiro e caracterizando a

participaccedilatildeo no experimento segundo o aristotelismo-tomismo

Tambeacutem exemplificariam a participaccedilatildeo no experimento com base em

tentativa e erro envolvendo a identificaccedilatildeo de intenccedilotildees e a comparaccedilatildeo de

imagens os testes individuais com suportes com ou sem alimento em que os

animais identificaram qual deles deveriam puxar para obter a recompensa como os

realizados com elefantes759 e os realizados com catildees760 cujo estudo apontou que

passavam a buscar pistas novas quando perdiam as anteriores segundo o

aristotelismo-tomismo movidos pelo apetite O mesmo pode-se dizer dos testes

dessa natureza com o tubo e com a plataforma em forma de ldquoUrdquo ambos com

arapucas para a recompensa761 realizados com as quatro principais espeacutecies de

grandes macacos

Jaacute Foerder e colaboradores762 afirmam que os resultados observados em sua

pesquisa com o elefante asiaacutetico que subiu em objetos para tentar alcanccedilar alimento

no alto natildeo se teriam dado por um processo preacutevio de tentativa e erro e que o uso

de objeto como apoio para alcanccedilar alimento no alto e mesmo a tentativa de

empilhar objetos para isto teria sido uma reaccedilatildeo suacutebita Mas os atos de empurrar o

objeto de substitui-lo de empilhar outros objetos ainda que neste uacuteltimo caso tenha

sido uma tentativa frustrada ndash caracterizando por si o processo de aprendizagem por

tentativa e erro ndash poderiam ter-se dado pelo fato de o animal ter visto algum

757

PLOTNIK et al 2011 758

HEANEY et al 2017 759

IRIE-SUJIMOTO 2008 760

MUumlLLER et al 2014 761

GIRNDT et al 2008 MARTIN-ORDAS CALL COLMENARES 2008 762

FOERDER et al 2011

167

humano outro animal ou mesmo um coespeciacutefico haacute mais tempo (dado o grande

alcance da memoacuteria destes animais) realizar tarefas similares o que poderia ter

escapado ao alcance do conhecimento dos pesquisadores

Mas assumindo estritamente o que dizem para o aristotelismo-tomismo os

animais sabem instintivamente que se se erguerem ou subirem em algo se for o

caso podem alcanccedilar uma presa ou um objeto que esteja mais alto e isto tambeacutem

pela estimativa especialmente quando o modo de subida natildeo eacute tatildeo evidente com

base na memoacuteria de imagens referentes a situaccedilotildees anteriores pela comparaccedilatildeo de

intenccedilotildees

O mesmo se diga dos macacos estudados por Koumlhler763 que empilharam as

caixas de madeira com sucesso para alcanccedilarem as bananas

A apreensatildeo de intenccedilotildees por parte da estimativa associada agrave tentativa e

erro ou seja agrave participaccedilatildeo no experimento estaacute ilustrada no uso de pedras e tacos

como martelo para quebrar cascas duras por primatas764 de bastotildees por

chimpanzeacutes ndash como nos testes de Koumlhler ndash e de objetos alongados por corviacutedeos ndash

ainda que tenha envolvido certo adestramento ndash765 e de peccedilas vegetais por grandes

primatas para inserccedilatildeo em locais cuja abertura eacute menor que a largura dos dedos766

aqui descrito tambeacutem em tentilhotildees pica-paus767 e inclusive no uso de objetos por

chimpanzeacutes768 e corviacutedeos769 para defesa contra predadores e em ataques de

babuiacutenos contra inimigos rolando rochas do alto de um morro tal como narrado por

Darwin770 bem como no uso de esponjas para proteccedilatildeo durante o forrageamento

em arrecifes por golfinhos771 Para o aristotelismo-tomismo existe a possibilidade

para cada um desses casos de haver tanto uma origem acidental como uma origem

intencional

Jaacute os testes que levaram Phillips e Santos772 a afirmarem que os macacos-

rhesus (Macaca mulatta) individuam objetos (no caso os frutos utilizados no estudo)

763

KOumlHLER 1927 p 135 ss 764

LUNCZ et al 2012 LUNCZ BOESCH 2014 765

JELBERT et al 2014 BRITISH BROADCASTING CORPORATION 2014 WIMPENNY 2009

766 BOESH C BOESH H 1990 VAN SCHAIK 2006

767 EIBL‐EIBESFELDT 1961 TEBBICH BSHARY 2004

768 BOESH 1991

769 ROELOFS 2010

770 DARWIN sd a) p 34-35

771 KRUumlTZEN et al 2014 KOPS et al 2014

772 PHILLIPS SANTOS 2006

168

segundo seu tipo e sua propriedade caracterizariam o reconhecimento de

quididades particulares pela estimativa e a comparaccedilatildeo de suas imagens

841 Planejamento

O golfinho fecircmeo Ake como relata Herman773 mostrou senso de

planejamento a partir dos comandos recebidos como quando levou a prancha da

beira para o meio da piscina para pulaacute-la e ao recolher os objetos dispondo-os pelo

corpo de modo que viabilizasse sua tarefa por entender o que fazer a partir de um

comando de recolhimento sem especificaccedilatildeo de um objeto determinado Eacute provaacutevel

que o animal tenha chegado a um e outro comportamento previamente por meio de

tentativa e erro ou por aprendizagem direta ou indireta (inclusive a imitaccedilatildeo)

Tambeacutem aqui natildeo se pode descartar a possibilidade da detecccedilatildeo por parte do

animal de movimentos sutis dos treinadores ou o efeito Clever Hans do qual se

falaraacute mais adiante

E ainda que se parta do princiacutepio de que natildeo houve nada disto sob a oacuteptica

aristoteacutelico-tomista estaacute-se no acircmbito das associaccedilotildees entre as intenccedilotildees

memorizadas e as imagens e apreensatildeo das intenccedilotildees referentes agravequele contexto

entatildeo adaptadas agrave situaccedilatildeo pela estimativa e relacionadas agrave voluntariedade

associada a esta observada nos animais natildeo humanos e nas crianccedilas o que estaacute

mais bem expresso nas combinaccedilotildees espontacircneas dos comportamentos que

seguem sinais que natildeo compotildeem o vocabulaacuterio demonstradas pelos golfinhos e

relatadas por Herman774 ou quando o golfinho Elele segue com sucesso o comando

para realizar um movimento novo conforme publicado por Braslau-Schneck775

gesto construiacutedo a partir do repertoacuterio conhecido e que reflete a plasticidade das

associaccedilotildees realizadas pela estimativa

85 IMITACcedilAtildeO E SINCRONIA

Tambeacutem ilustra a participaccedilatildeo no experimento e a comparaccedilatildeo de intenccedilotildees

segundo o aristotelismo-tomismo a busca dos catildees pela otimizaccedilatildeo da realizaccedilatildeo

773

HERMAN 2006 774

Ibid 775

BRASLAU-SCHNECK 1994 apud HERMAN 2006

169

de tarefas evitando assim a sobreimitaccedilatildeo tal como demonstrado pelo estudo de

Johnston e colaboradores776

Jaacute as habilidades de imitaccedilatildeo dos golfinhos com associaccedilotildees realizadas entre

suas partes corporais e as humanas correspondentes777 podem ser compreendidas

pela comparaccedilatildeo de imagens de natureza quiditativa e de intenccedilotildees

E pode-se sugerir a simples apreensatildeo de intenccedilotildees em relaccedilatildeo agrave habilidade

de sincronia e inclusive a de sincronia mediante o comando de criaccedilatildeo que

implicaria a voluntariedade sem deliberaccedilatildeo mesmo que ainda natildeo se conheccedila a

explicaccedilatildeo fisioloacutegica para o fenocircmeno778

86 CORRELACcedilAtildeO DE FIGURAS OU SONS

Assim explicam o raciociacutenio analoacutegico Gillan Premack e Woodruff

O raciociacutenio analoacutegico envolve o reconhecimento de que a relaccedilatildeo entre um par de estiacutemulos eacute a mesma que a relaccedilatildeo entre outro par de estiacutemulos Portanto o raciociacutenio analoacutegico requer uma relaccedilatildeo de segunda ordem ou uma relaccedilatildeo entre relaccedilotildees

779

Esses testes realizados com sucesso em outros primatas aleacutem dos

chimpanzeacutes como G gorilla gorilla e orangotangos da espeacutecie Pongo abelii780 e

babuiacutenos (Papio papio)781 com tela ldquotouch-screenrdquo e macacos-pregos (Cebus

apela)782 com cubos e copos ndash e inclusive como se viu em corviacutedeos com

pequenas placas ndash783 tambeacutem podem ser vistos agrave luz da estimativa como

identificaccedilatildeo e comparaccedilatildeo de imagens no acircmbito quiditativo essencial e acidental

No caso da segunda etapa do teste com Sarah784 o reconhecimento

comparativo entre o objeto conhecido memorizado e sua respectiva figura e o

conseguinte estabelecimento da relaccedilatildeo com a respectiva funccedilatildeo caracterizam

776

JOHNSTON et al 2017 777

HERMAN 2002 778

Id 2006 779

ldquoAnalogical reasoning involves recognizing that the relation between one pair of stimuli is the same as the relation between another pair of stimuli Therefore analogical reasoning requires a second-order relation or a relation among relationsrdquo GILLAN et al 1981 p 11

780 VONK 2003

781 FAGOT MAUGARD 2013

782 KENNEDY FRAGASZY 2008

783 SMIRNOVA et al 2015

784 GILLAN et al 1981

170

tambeacutem a identificaccedilatildeo e a comparaccedilatildeo de imagens no acircmbito quiditativo como

tambeacutem a associaccedilatildeo pela estimativa com as respectivas intenccedilotildees memorizadas

Tambeacutem o reconhecimento e a comparaccedilatildeo de imagens pela estimativa

levando agrave identificaccedilatildeo das correlaccedilotildees entre acidentes de figuras em uma

sequecircncia como tambeacutem identificou George785 a fim de que se identifique com

precisatildeo o componente seguinte jaacute explicaria sob a oacuteptica aristoteacutelico-tomista o

ecircxito de Koko786 em testes ditos de progressatildeo loacutegica

A capacidade dos elefantes de reconhecerem pares de padrotildees de figuras

apontada nos estudos de Rensch787 parece-nos mais um exemplo do papel da

estimativa integrada agrave memoacuteria e agrave imaginaccedilatildeo sendo julgado de iniacutecio pelo proacuteprio

sentido da visatildeo e entatildeo pelo sentido comum Essa pesquisa se soma agravequelas que

mostram a impressionante capacidade da memoacuteria dos elefantes como tambeacutem a

de Markowitz e colaboradores788 que aponta o papel da estimativa de comparaccedilatildeo

de intenccedilotildees pela associaccedilatildeo entre a accedilatildeo por realizar-se corretamente (acionar o

interruptor que apagaraacute ou acenderaacute a luz) e a recompensa obtida

Os experimentos seguintes de Rensch789 com a elefanta envolvendo padrotildees

de figuras e sons e o de seus colaboradores com cavalos levaram o pesquisador a

sugerir que esses animais conseguiriam realizar abstraccedilatildeo em algum grau pelo fato

de as figuras e os sons escolhidos com base em cada modelo a eles referente

apresentarem configuraccedilotildees diferentes deste fazendo-o crer que o animal estaria de

posse da ideia de cada um (a ideia de cruz de trecircs etc) Mas pode-se dizer sob a

oacuteptica aristoteacutelico-tomista que seguem no acircmbito dos particulares e tambeacutem dos

acidentes havendo natildeo abstraccedilatildeo mas se natildeo o que diremos em seguida em

relaccedilatildeo ao papagaio Alex e ao chimpanzeacute fecircmeo Sheba uma comparaccedilatildeo

quiditativa da estimativa entre figura com mais e figura com menos espaccedilo ocupado

pela representaccedilatildeo dos pontos e o mesmo em relaccedilatildeo agraves distacircncias entre as listras

e por figura escura com cruzamento de duas linhas a partir de um modelo de

imagem de cada um novamente por grau de semelhanccedila E pode-se dizer o mesmo

com relaccedilatildeo agraves melodias que independente das demais caracteriacutesticas que se

785

GEORGE 2003 786

PATTERSON LINDEN 1981 p 100 787

RENSCH 1956 RENSCH 1957 788

MARKOWITZ et al 1975 789

RENSCH 1957

171

apliquem a elas mantecircm seu caraacuteter distintivo particular identificaacutevel pelo sentido

da audiccedilatildeo

Tambeacutem o reconhecimento dos objetos com modificaccedilotildees acidentais

distinguidos pelos golfinhos de Herman790 e associado por este a generalizaccedilotildees

daacute-se segundo o aristotelismo-tomismo por comparaccedilatildeo das imagens por parte da

estimativa e entatildeo por grau de semelhanccedila

87 COMPETEcircNCIA PARA APREENSAtildeO DE QUANTIDADES

Sugerimos que se possa atribuir a mesma explicaccedilatildeo para experimentos

como os de Irie-Sujimoto791 e colaboradores os de Perdue e colaboradores792 e os

de Petrazzini e Wyne793 em que os elefantes e os catildees neste uacuteltimo preferiram

respectivamente cestas e pratos de alimento mais cheios apontando certa noccedilatildeo

de quantidade Os animais estimam que ali teratildeo mais condiccedilotildees de saciar o apetite

inclusive provavelmente comparando imagens anteriores memorizadas de

circunstacircncias em que deparou com menos ou mais alimentos e dos resultados em

relaccedilatildeo agrave saciedade

De anaacutelise mais precisa nesse sentido satildeo os testes da chamada

competecircncia numeacuterica como os realizados com Alex794 e com Sheba795 que teriam

efetuado pequenas somas com matrizes de objetos cujos resultados chegariam ateacute

os nuacutemeros 6 (e contagem ateacute 8) e 4 respectivamente e com algarismos araacutebicos

cujos resultados da parte de Alex iam de 1 a 5 Ambos foram treinados previamente

para a apreensatildeo de cada uma das quantidades que no acircmbito do aristotelismo-

tomismo diferem do nuacutemero propriamente dito enquanto resultante da abstraccedilatildeo

Esta apreensatildeo como se descreveu anteriormente tem sua primeira etapa no juiacutezo

dos sentidos e entatildeo a partir da imaginaccedilatildeo e da memoacuteria a estimativa pode

estabelecer desde suas quididades a ordenaccedilatildeo e realizar daiacute por comparaccedilatildeo natildeo

soacute a soma e a subtraccedilatildeo dessas quantidades como a transferecircncia por associaccedilatildeo

destas para as imagens dos algarismos com o que realizaraacute essas mesmas

operaccedilotildees a partir das quididades particulares destes

790

HERMAN et al 1984 HERMAN 1986 791

IRIE-SUJIMOTO et al 2009 792

PERDUE et al 2012 793

PETRAZZINI WYNNE 2016 794

PEPERBERG 2006 795

BOYSEN BERNTSON 1989

172

Isto se encontra em consonacircncia com o que diz Aristoacuteteles em relaccedilatildeo agrave

similaridade entre a alma desses animais e das crianccedilas E de fato Wynn796

demonstrou que crianccedilas de cerca de cinco meses jaacute apresenta a chamada

competecircncia numeacuterica para as adiccedilotildees e subtraccedilotildees mais simples

Com relaccedilatildeo aos estudos de Matsuzawa e equipe797 o aprendizado de

sequecircncias numeacutericas inclusive com curingas aleacutem do ecircxito diante da mudanccedila de

configuraccedilatildeo do experimento (numerais trocando de lugar apoacutes o acerto anterior)

tambeacutem se enquadra no que se acaba de dizer sobre a ordenaccedilatildeo cabendo

tambeacutem agrave estimativa o entendimento da relaccedilatildeo entre o algarismo e os curingas por

associaccedilatildeo

Seguem tambeacutem a mesma explicaccedilatildeo as associaccedilotildees entre algarismos

conjuntos de pontos e quantidade de alimento estabelecidas pelos macacos-rhesus

nos testes realizados por Livingstone e colaboradores798 mesmo que tenham

afirmado que natildeo obtiveram evidecircncia de que os animais teriam contado os pontos

E aos testes relacionados agrave economia envolvendo tomada de decisatildeo

realizados com macacos-prego por Lakshminarayanan e Santos799 empregamos

uma uacuteltima vez essa mesma explicaccedilatildeo aqui somada agrave voluntariedade associada agrave

estimativa e sua comparaccedilatildeo de intenccedilotildees o que teriam levado os animais a

preferirem um experimentador a outro

88 APTIDOtildeES RELACIONADAS Agrave COMUNICACcedilAtildeO

Em um dos estudos de Kaminski e colaboradores800 os catildees identificando os

nomes nos comandos com os respectivos objetos que deviam pegar em outras

dependecircncias do recinto demonstraram integrar memoacuterias relacionadas agrave

localizaccedilatildeo agravequelas relacionadas agrave identidade caracterizando nisto o papel da

estimativa de comparar e compor quididades particulares a partir de imagens

memorizadas

796

WYNN 1992 797

KAWAI MATSUZAWA 2000 Id 2000b TOMONAGA et al 1993 BIRO MATSUZAWA 1999

798 LIVINGSTONE et al 2010

799 LAKSHMINARAYANAN SANTOS 2012

800 KAMINSKI et al 2007

173

As associaccedilotildees apresentadas de palavras a objetos ou accedilotildees com destaque

para espeacutecimes como Rico801 e Chaser802 e no que toca aos grandes macacos por

Kanzi803 e por Koko804 se dariam pela composiccedilatildeo de quididades ou de quididades

e intenccedilotildees respectivamente com recurso evidentemente agrave memoacuteria

Os estudos de Herman e colaboradores com golfinhos mostraram

compreensatildeo de sentenccedilas reversiacuteveis e lexicalmente ou estruturalmente novas

para os animais inclusive sugerindo generalizaccedilotildees805 aleacutem do reconhecimento de

sequecircncias anocircmalas aos quais os animais responderam com omissatildeo ou com

improviso806 demonstrando a competecircncia semacircntica e sintaacutetica Mas para o

aristotelismo-tomismo haveria aqui ainda a participaccedilatildeo na linguagem e natildeo esta

propriamente dita que eacute fruto das operaccedilotildees do intelecto807 Por sua estimativa

desenvolvida esses animais chegariam ao entendimento de generalizaccedilotildees como

ldquopessoardquo808 porque identificam um humano como semelhante a outro por possuiacuterem

a imagem do humano comparando as imagens de humanos captadas e retidas por

seus sentidos ateacute entatildeo e natildeo por captaccedilatildeo da espeacutecie inteligiacutevel humanidade que

poderia-lhes conferir a habilidade de conceituar algo que natildeo se identificou Essa

mesma estimativa lhes permite por comparaccedilatildeo de intenccedilotildees perceber pelo que se

disse logo acima a relaccedilatildeo de cada palavra com seu respectivo objeto ou accedilatildeo e

entatildeo se haacute algo em seu contexto proacuteximo agravequilo que se refere agrave determinada

sequecircncia anocircmala para que execute ou natildeo o comando

Jaacute a identificaccedilatildeo da parte de Ake de que um remo significaria positivamente

a presenccedila de um objeto e o outro negativamente ou seja a ausecircncia809

caracterizaria a comparaccedilatildeo no acircmbito quiditativo de imagens e a captaccedilatildeo da

intenccedilatildeo relacionada a cada remo Quando nesta tarefa associada agrave outra de

comando com dois objetos e uma accedilatildeo810 Ake leva o frisbee ao remo ldquonatildeordquo verifica-

se isto que se diz aqui e o que se diz no paraacutegrafo anterior associados agrave

voluntariedade relacionada agrave estimativa

801

KAMINSKI et al 2004 802

PILLEY 2013 803

RAFFAELE 2006 804

THE GORILLA FOUNDATION 2018 805

HERMAN et al 1984 HERMAN 1986 Id 2006 806

HERMAN et al 1993a 807

TOMAacuteS DE AQUINO 2001 Q 58 a 4 p 549 808

HERMAN et al 1984 809

HERMAN FORESTELL 1985 810

HERMAN et al 1993b

174

A comunicaccedilatildeo entre grandes macacos observada no habitat natural como

os comandos por meio de golpes nas aacutervores relatados por Boesch811 e as tantas

variaccedilotildees acuacutesticas de gorilas verificadas por Hedwig e colaboradores812 tambeacutem

exemplificam a capacidade de participaccedilatildeo na linguagem bastante desenvolvida nos

grandes primatas mas com potenciais combinaccedilotildees que lhes confere destaque

dentre os outros animais que os faz nesse sentido assemelharem-se bastante agraves

crianccedilas humanas tal como visto nos estudos em que se ensinou a comunicaccedilatildeo

por gestos manuais ou por lexigramas como o desenvolvido por Patterson e

Linden813 com Koko e como Tomasello814 analisou em sua revisatildeo

respectivamente Dentre as habilidades do bonobo Kanzi afirma o pesquisador que

a de identificar a funccedilatildeo de uma palavra segundo sua posiccedilatildeo na frase equivaleria

ao animal estar expressando sentenccedilas como uma crianccedila de dois anos de idade

Mas a quase totalidade dessas sentenccedilas eacute constituiacuteda de pedidos com uma palavra

de accedilatildeo e uma ou mais de pessoas ou objetos Tomasello815 diz que o animal sabe

que o que eacute colocado vem em primeiro na frase e aquilo em que colocar vem em

seguida (como no caso da ldquobolardquo e do ldquochapeacuteurdquo) e explica

[] suas categorias gramaticais satildeo do tipo ldquoaquele que atingerdquo e ldquocoisa atingida comrdquo ldquoaquele que colocardquo e ldquocoisa colocadardquo natildeo categorias generalizadas tais como ldquoagenterdquo e ldquopacienterdquo ou ldquosujeitordquo e ldquoobjeto diretordquo Isso eacute basicamente o niacutevel de competecircncia gramatical de crianccedilas novas de dois anos que tambeacutem funciona com ldquoilhas verbaisrdquo

816 e outras construccedilotildees

baseadas em itens deste tipo817

811

BOESCH 1996 812

HEDWIG et al 2014 813

PATERSON LINDEN 1981 814

TOMASELLO 2017 815

Id 1994 2017 816

Segundo a Hipoacutetese da Ilha Verbal (Verb Island Hypothesis) do proacuteprio Tomasello ldquoa linguagem inicial das crianccedilas eacute organizada e estruturada completamente em torno de verbos individuais e outros termos predicativos ou seja a competecircncia sintaacutetica da crianccedila de dois anos eacute composta completamente de construccedilotildees de verbos especiacuteficos com aberturas nominais encaixadas Aleacutem da categorizaccedilatildeo dos nominais os aprendizes da linguagem nascente natildeo possuem outras abstraccedilotildees linguiacutesticas ou formas de organizaccedilatildeo sintaacuteticardquo (Original ldquo[] childrens early language is organized and structured totally around individual verbs and other predicative terms that is the 2-year-old childs syntactic competence is comprised totally of verb-specific constructions with open nominal slots Other than the categorization of nominals nascent language learners possess no other linguistic abstractions or forms of syntactic organizationrdquo) Id 2000 p 213-214

817 ldquo[] his grammatical categories are of the type lsquohitterrsquo and lsquothing hit withrsquo lsquoputterrsquo and lsquothing

putrsquo not generalized categories such as lsquoagentrsquo and lsquopatientrsquo or lsquosubjectrsquo and lsquodirect objectrsquo This is basically the level of grammatical competence of young two-year-old children who also work with lsquoverb islandsrsquo and other item-based constructions of this typerdquo Id 2017 p 101

175

A primeira categoria refere-se a termos singulares e a segunda a termos

universais o que possibilitaria a conceituaccedilatildeo a primeira operaccedilatildeo do intelecto e

caracterizaria definitivamente a abstraccedilatildeo intelectiva em animais natildeo humanos

segundo a descriccedilatildeo aristoteacutelico-tomista Natildeo foi poreacutem o caso Algo que poderia

parecer chegar um pouco mais perto disto seria a atribuiccedilatildeo de ldquowater birdrdquo ao pato

que fez Washoe ou as de ldquofake mouthrdquo818 dada a nariz e de ldquonose fakerdquo819 dada a

maacutescara por Koko e inclusive o modo como segundo Patterson e Linden xingava

ldquobirdrdquo820 Mas ainda assim o que se teria segundo o aristotelismo-tomismo seriam

correlaccedilotildees de quididades particulares (entre as palavras conhecidas os gestos ou

os lexigramas e os objetos em si) por grau de semelhanccedila pela estimativa com

voluntariedade que esses animais teriam aprendido a estabelecer em seus

respectivos processos de treinamento

Savage-Rumbaugh e colaboradores821 em trabalho em que elencam

seiscentos e sessenta comandos alguns com alguma variaccedilatildeo dados a Kanzi e agrave

menina Alia de dois anos filha de uma das assistentes referem-se a apontamentos

de Quine822 segundo os quais se teria de determinar qual ou quais das incontaacuteveis

propriedades de um objeto se levaria em consideraccedilatildeo ao denotaacute-lo Apontam entatildeo

a descontextualizaccedilatildeo pela qual um macaco poderia compreender por exemplo a

atribuiccedilatildeo da palavra maccedilatilde agrave fruta em si sem que esta esteja a representar-lhe uma

finalidade praacutetica sem que lhe valha como recompensa Como dizem

Eacute faacutecil treinar um macaco para dizer lsquomaccedilatildersquo afim de que pegue uma maccedilatilde mas eacute difiacutecil ensinaacute-lo a usar lsquomaccedilatildersquo para descrever uma comida que a ele natildeo eacute permitido comer uma comida que ele vecirc algueacutem mais comer uma comida que ele natildeo goste uma comida que eacute encontrada em um lugar em particular etc

823

Explicam que isto seria mais comum em crianccedilas humanas mas em macacos

soacute se pode verificar quando haacute descontextualizaccedilatildeo dos siacutembolos em relaccedilatildeo aos

818

PATTERSON LINDEN 1981 p 112 819

Ibid p 117 820

Ibid p 119-121 e 142 821

SAVAGE-RUMBAUGH et al 1993 822

QUINE 1960 passim 823

ldquoIt is easy to train an ape to say aple in order to get an aple but difficult to teach it to use aple to describe a food that it is not allowed to eat a food that it sees someone else eating a food that it does not like a food that is found in a particular location etcrdquo SAVAGE-RUMBAUGH et al 1993 p 15

176

eventos que estariam associados agrave sua aprendizagem E se o fazem entatildeo lhes

seria possiacutevel atribuir novos nomes a novos objetos e assim criar novos sinais

Mas mesmo aqui natildeo haacute razatildeo para negar que se siga no acircmbito das

associaccedilotildees de quididades e intenccedilotildees de natureza particular sob a perspectiva

aristoteacutelico-tomista no exerciacutecio da participaccedilatildeo no chamado experimento com

voluntariedade natildeo deliberativa

89 AUTORRECONHECIMENTO

Os estudos mostram que alguns animais a saber golfinhos824 corviacutedeos825

elefantes826 e grandes macacos como os gorilas827 e os orangotangos828

comprovadamente reconhecem sua proacutepria imagem diante de um espelho o que

poderia apontar para um tipo mais avanccedilado de ldquoawarenessrdquo Cammaerts Trico e

Cammaerts829 no entanto em um surpreendente estudo que sugere

autorreconhecimento em espelhos em formigas tambeacutem testadas com o

reconhecimento da marca realizado com trecircs espeacutecies de um mesmo gecircnero a

saber Myrmica sabuleti M rubra and M ruginodis afirmam que o

autorreconhecimento natildeo implicaria necessariamente algum tipo de consciecircncia

Alguns pesquisadores vieram tambeacutem a propor por meio de outros testes que

alguns animais possuem reconhecimento e quiccedilaacute consciecircncia do proacuteprio corpo

como Dale e Plotnik830 que verificaram que os elefantes asiaacuteticos teriam percebido

que o proacuteprio peso impedia a realizaccedilatildeo da tarefa e Herman que estudou a

execuccedilatildeo de tarefas por golfinhos que envolviam partes corporais associadas agraves

suas proacuteprias accedilotildees831 Diante da execuccedilatildeo do comando para que um destes

animais escolhesse a tarefa o pesquisador descreve que

Phoenix teve de manter uma representaccedilatildeo mental do comportamento que ela executou da uacuteltima vez atualizar isto com cada comportamento que se sucedeu processar semanticamente a repeticcedilatildeo ou algum outro gesto e

824

REISS 2001 825

PRIOR GUumlNTUumlRKUumlN 2008 826

PLOTNIK et al 2006 827

PATTERSON LINDEN 1981 p 108 828

MILES 1990 829

CAMMAERTS TRICO CAMMAERTS 2015 830

DALE PLOTNIK 2017 831

HERMAN 2006

177

entatildeo selecionar por ela mesma o mesmo comportamento para repetir ou escolher um comportamento dentre os outros quatro []

832

Aqui se observa sob a perspectiva aristoteacutelico-tomista a memoacuteria de

intenccedilotildees seguida de comparaccedilotildees destas por parte da estimativa e o exerciacutecio da

voluntariedade a ela associada

E o mesmo se diga das combinaccedilotildees entre accedilotildees e partes do corpo incluindo

as que implicam inovaccedilatildeo realizadas por Elele a partir de comandos833

relacionando ao que se disse mais acima sobre a associaccedilatildeo destes com objetos e

accedilotildees caracterizando associaccedilotildees particulares e ilustrando aqui tambeacutem a

plasticidade da estimativa

Quando os elefantes asiaacuteticos reconheceram o impedimento provocado pelo

proacuteprio peso isto segundo o aristotelismo-tomismo se explicaria pela comparaccedilatildeo

da estimativa entre a proacutepria quididade e a do tapete sobre o qual se encontravam e

a intencionalidade relacionada agrave permanecircncia neste

Sabe-se que os entes humanos comeccedilam a reconhecer-se no espelho antes

dos dois anos de idade834 Reconhecer-se implica apreender a proacutepria quididade

seja no acircmbito particular ou a partir de um universal e o mesmo pode-se dizer do

reconhecimento de cada parte corporal O autorreconhecimento pode assim estar

associado agrave estimativa do mesmo modo que se daacute com o reconhecimento do outro

832

ldquoPhoenix had to maintain a mental representation of the behaviour she last performed update that with each succeeding behaviour semantically process the repeat or any gesture and then either self-select the same behaviour for repeat or choose a behaviour from the remaining four if given anyrdquo HERMAN 2006 p 457

833 HERMAN et al 2001

834 AMSTERDAM 1972

178

9 CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS E CONCLUSAtildeO

Natildeo encontramos assim nenhuma habilidade que nos remeteria

necessariamente agrave presenccedila de cogitativa e de intelecccedilatildeo entre os animais natildeo

humanos na bibliografia consultada resultado que corrobora a validade das

interpretaccedilotildees a partir da doutrina aristoteacutelico-tomista relacionadas agrave psicologia

comparada agrave etologia e outras disciplinas congecircneres Pudemos enquadrar todas

as habilidades que percorremos como envolvendo apreensatildeo combinaccedilatildeo ou

comparaccedilatildeo de quididades ou intenccedilotildees de natureza singular particular Todos os

comportamentos analisados envolveram o sentido comum a memoacuteria a imaginaccedilatildeo

e a estimativa e nenhum deles nos deu sinal do uso da reminiscecircncia e do uso

voluntaacuterio de imagens que caracterizariam a cogitativa e serviriam de base para a

abstraccedilatildeo Mesmo os comportamentos considerados espontacircneos e ateacute os

inovadores poderiam ser explicados sob a oacuteptica aristoteacutelico-tomista como sendo

movidos pela memoacuteria ou pela imaginaccedilatildeo e natildeo motores de natureza voluntaacuteria

destas por associaccedilotildees resultantes tambeacutem das operaccedilotildees da estimativa

Nota-se o tom de entusiasmo por parte de alguns pesquisadores diante de

certos comportamentos observados como aqueles que caracterizaram uma accedilatildeo

realizada segundo eles pela primeira vez Neste sentido poreacutem Premack e

Woodruff835 ao darem iniacutecio agraves investigaccedilotildees sobre a teoria da mente afirmaram

que era muito difiacutecil evitar que um chimpanzeacute se envolvesse informalmente na

soluccedilatildeo de problemas no cotidiano o que dificultava a anaacutelise do quanto um

determinado comportamento teria de fato o caraacuteter inovador E isto decerto se aplica

aos demais casos relacionados aqui prioritariamente investigados por exemplo

reforccedilando o que afirmamos a respeito do golfinho fecircmeo Ake que poderia ter

perfeitamente aprendido a recolher os objetos a partir do mais distante por ter

observado entes humanos agindo anteriormente deste modo e tambeacutem do elefante

e dos chimpanzeacutes que utilizaram objetos para alcanccedilar alimento suspenso no alto e

inclusive tentaram empilhar caixas ou taacutebuas (estas da parte de um elefante sem

sucesso) e que podem perfeitamente ter visto entes humanos fazendo algo

semelhante em outras circunstacircncias Mas natildeo haacute como negar a presenccedila desta

capacidade quando se trata por exemplo do uso em ambiente selvagem de

835

PREMACK WOODRUFF 1978

179

instrumentos incluindo os meios de confecccedilatildeo e das diferenccedilas que costumam

haver neste acircmbito entre populaccedilotildees de uma mesma espeacutecie

Outro comportamento que foi objeto de muitos dos trabalhos consultados eacute a

transmissatildeo cultural que jaacute havia sido exemplificada sem referecircncia ao termo por

Aristoacuteteles quando se referiu ao ensinamento do canto por parte das aves e que

ilustra o alcance do processo de aprendizagem no acircmbito da estimativa e que

parece encontrar seu aacutepice no que toca aos animais natildeo humanos nos grandes

macacos

Estas duas caracteriacutesticas a teoria da mente e a transmissatildeo cultural

exemplificam um conjunto de variaacuteveis que podem atuar em determinado

comportamento e que deve ser considerado a fim de que a inteligecircncia observada

nos animais natildeo seja superestimada sobretudo quando se pretende comparaacute-la agrave

humana o que se daacute como indica Marie George836 pela distinccedilatildeo indevida entre o

intelecto e o sentido algo que pode levar a testes de inteligecircncia defeituosos e eacute

exemplificado pelo fato de que alguns sentidos mais acurados do que os dos

humanos em certos animais chegam a impressionar muitos pesquisadores a ponto

de fazecirc-los chamar inteligecircncia as habilidades a eles relacionadas Superestimar

assim a chamada inteligecircncia dos animais seria tatildeo equivocado como subestimaacute-la

como fizeram aqueles que tentaram explicar essas habilidades por uma visatildeo

estritamente mecanicista

Exemplificam essa superestima tanto o caso dos animais pintores que

reproduzem natildeo rabiscos como Kanzi mas figuras concretas como flores tal como

o fazem os elefantes asiaacuteticos no qual posteriormente descobriu-se que seus

mahouts837 eacute que lhes sussurravam comandos que orientavam as pinceladas como

explicou Morris838 e o famoso caso do cavalo Clever Hans que impressionou a

muitos por ter dado a entender que saberia realizar as quatro operaccedilotildees

matemaacuteticas representando o resultado com batidas com sua pata no chatildeo mas no

qual ele e seu treinador Wilhelm von Osten foram minuciosamente analisados pelo

bioacutelogo especialista em psicologia comparada Oskar Pfungst839 que por fim verificou

que o animal apenas respondia a sinais corporais de von Osten que indicavam

quando deveria parar de bater com a pata no chatildeo O efeito Clever Hans como essa

836

GEORGE 2003 837

Como chamam os treinadores na iacutendia 838

MORRIS 2009 839

PFUNGST 1911

180

interaccedilatildeo passou a chamar-se mostra a influecircncia dos humanos no desempenho

dos animais em seus testes podendo comprometer seriamente a interpretaccedilatildeo dos

resultados o que de certo modo conflita com a necessidade da presenccedila humana

para o sucesso na realizaccedilatildeo de uma miriacuteade de testes que envolvem as interaccedilotildees

sociais o que exclui a possibilidade de isolamento dos animais e provoca assim uma

seacuterie de dificuldades

Posteriormente estudos como os de Proops e colaboradores com cavalos

demonstraram que os animais natildeo soacute interagem com expressotildees corporais

incluindo as faciais e sugerem que podem memorizaacute-las por longos periacuteodos com

influecircncia significativa no desempenho de tarefas futuras840 Assim muitos dos

resultados apontados aqui de observaccedilotildees realizadas na presenccedila de treinadores

poderiam estar de algum modo relacionados a este efeito

Outro problema que George aponta eacute o uso ambiacuteguo de termos como a

proacutepria palavra ldquointeligecircnciardquo que segundo defende de acordo com o aristotelismo-

tomismo enquanto nos entes humanos se refere ao processo de intelecccedilatildeo de

abstraccedilatildeo como jaacute se disse nos animais implica somente uma inteligecircncia praacutetica

dos sentidos como corrobora o presente estudo com o que parece concordar

Damaacutesio quando ao tratar das reaccedilotildees especiacuteficas desencadeadas pelas emoccedilotildees

diz que ao deparar com o agente indutor os animais imediatamente fogem ficam

inertes atacam o inimigo ou adotam condutas que lhes geram algum tipo de prazer

ao passo que no homem haacute a possibilidade de que essas condutas sejam

temperadas pelo uso da razatildeo841

George exemplifica o que diz com a preferecircncia por parte de um gato por um

alimento uacutemido ao seco e pode ilustrar-se tambeacutem com os problemas que um ente

humano pode resolver sem precisar da intelecccedilatildeo como amarrar um sapato ou

andar de bicicleta que natildeo exigem o conhecimento teoacuterico que caracterizaria a

intelecccedilatildeo e ao que se chega por aprendizagem direta ou indireta ou por tentativa e

erro e que natildeo podem ser descritos por uma visatildeo inflexiacutevel do instinto Ela sugere

entatildeo como soluccedilatildeo para o melhor entendimento da questatildeo a saiacuteda do que entende

como uma dicotomia entre instinto e inteligecircncia

840

PROOPS et al 2018 O experimento aqui consistiu em mostrar imagens de rostos de pessoas sorrindo ou com raiva a cavalos associando-as a algum estado emocional e algumas horas depois fazendo com que os animais interagissem com as mesmas pessoas das fotografias agora com expressatildeo neutra a quem os cavalos demonstraram reaccedilotildees que se relacionavam com as expressotildees nas imagens fotograacuteficas

841 DAMAacuteSIO 2000 p 70

181

Explica Echavarriacutea por sua vez que quando Tomaacutes de Aquino fala de

instinto refere-se a um impulso natural com alguma voluntariedade ordenado agraves

necessidades do indiviacuteduo ou da espeacutecie842 Tem-se com isto um leque de

possibilidades que caracteriza por exemplo as menccedilotildees feitas aqui agrave plasticidade

da estimativa incluindo a participaccedilatildeo no ldquoexperimentordquo as habilidades que tal

participaccedilatildeo comporta sem sair do acircmbito da estimativa tal como as que foram

descritas neste estudo

No exemplo de George o gato por um lado natildeo eacute forccedilado a comer a comida

uacutemida e por outro natildeo deliberou sobre o caso Ele sente a diferenccedila entre ambas e

se dirige agrave que lhe eacute mais apeteciacutevel ilustrando a voluntariedade associada agrave

estimativa agrave qual o aristotelismo-tomismo se refere

Tambeacutem nos testes de comunicaccedilatildeo a pesquisadora aponta ainda falhas na

exposiccedilatildeo dos dados como a omissatildeo nos artigos por alguns pesquisadores do

uso de palavras que caracterizam redundacircncias e combinaccedilotildees sem sentido pelos

animais estudados Ela entatildeo observa que os grandes macacos que dominaram os

lexigramas e a comunicaccedilatildeo por sinais talvez pudessem expressar a relaccedilatildeo entre

causa e efeito jaacute que estabelecem essa relaccedilatildeo em casos concretos mas nenhum

deles foi capaz de adotar uma posiccedilatildeo em relaccedilatildeo a um problema e justificar essa

posiccedilatildeo o que caracterizaria o exerciacutecio do raciociacutenio e o que tornaria possiacutevel

ensinar-lhes uma ciecircncia ou mesmo princiacutepios dessa ciecircncia enquanto tais

Ela identificou no orangotango Chantek uma suposta tentativa de iniacutecio de

conversa com a frase anteriormente mencionada ldquoJeannie Chantek chaserdquo843 sobre

a qual natildeo soacute observa natildeo ir aleacutem disto inclusive porque sua meacutedia de comprimento

de enunciados era baixa como fornece como explicaccedilatildeo a hipoacutetese de que se trate

da busca por satisfaccedilatildeo no acircmbito emocional pelo contato social com a treinadora

O que diz George ateacute aqui parece adequar-se tambeacutem ao comportamento de

Koko que segundo seus treinadores expressava sentimentos com demonstraccedilotildees

de humor apelidava e inclusive podia mentir para eximir-se da culpa de determinado

ato

Nenhum deles prossegue a estudiosa tambeacutem foi capaz de exibir uma

conversa que caracterizasse algo mais do que um instrumento para alcanccedilar um

objetivo especiacutefico de expressar uma narrativa de solicitar uma informaccedilatildeo para

842

ECHAVARRIacuteA 2009 p 122-123 843

MILES 1990 p 521

182

compreender algo melhor de expressar uma opiniatildeo ou um desejo para aleacutem do

caraacuteter instrumental de usar palavras para coisas que natildeo sejam percebidas

sensivelmente

Enquanto Aristoacuteteles identifica a linguagem assim como a loacutegica como

exclusiva dos entes humanos como dependente do exerciacutecio da intelecccedilatildeo844

Miles845 identifica trecircs elementos que entende caracterizarem a representaccedilatildeo

linguiacutestica a saber 1- um elemento do mundo real designado por um sinal 2- que

intencionalmente transmite seu significado 3- sobre o qual haacute um entendimento

cultural compartilhado Para o aristotelismo-tomismo estes elementos estariam

presentes tanto na linguagem como poderiam estar presentes na participaccedilatildeo na

linguagem

Em seguida Miles fornece algumas evidecircncias de que palavras ou sinais

estejam sendo utilizados de modo referencial como a indicaccedilatildeo de um objeto ou

evento presente ou ausente no ambiente que tenham domiacutenios semacircnticos ou de

significado e que podem natildeo depender por completo do contexto Menciona entatildeo

os vaacuterios estaacutegios da comunicaccedilatildeo referencial para afirmar que Chantek apresenta

cada um desses estaacutegios tal como observado em crianccedilas O orangotango

inicialmente repetia accedilotildees socialmente orientadas (como fazer algo para chamar a

atenccedilatildeo) em seguida passou a sentir necessidade de exibir objetos e entatildeo a dar

objetos Posteriormente Chantek usou de sua capacidade de voluntariedade e do

sinal ldquoPointrdquo846 para apontar para locais relacionados ao modo com que queria ser

agradado e responder perguntas neste sentido e entatildeo passou a combinar este

sinal com o sinal ldquoGordquo847 encaminhando os treinadores para onde queria Os

resultados mostraram que Chantek possuiacutea o niacutevel de desempenho cognitivo de

uma crianccedila de cerca de dois anos de idade com algumas caracteriacutesticas

compartilhadas com crianccedilas de quatro e ateacute de sete anos de idade o que estaacute em

perfeita consonacircncia com a declaraccedilatildeo aristoteacutelica supracitada a respeito desta

relaccedilatildeo e com o que se descreveu anteriormante em relaccedilatildeo a isso sob a

perspectiva do uso da estimativa

Mesmo o reconhecimento da natureza representativa dos sinais que passou

a fazer com os peacutes e com objetos e inclusive a criar pode ser explicado aqui pela

844

DE MOURA NEVES 1981 845

MILES 1990 846

ldquoApontarrdquo 847

ldquoIrrdquo

183

combinaccedilatildeo de intenccedilotildees e imagens particulares dentre as quais aquelas

memorizadas teriam sido acessadas natildeo por deliberaccedilatildeo mas movidas pela

necessidade do animal naquele instante

A comunicaccedilatildeo tambeacutem poderia mostrar sinais de enquadramento na teoria

da mente da empatia da adoccedilatildeo da perspectiva alheia E natildeo soacute no acircmbito

intelectivo como no estimativo pela comparaccedilatildeo de particulares e reconhecimento

do outro e de si mesmo Segundo poreacutem a hipoacutetese da intuiccedilatildeo antropomoacuterfica

poder-se-ia estar superestimando ou subestimando este comportamento por ser-

nos de algum modo inacessiacutevel E se assim fosse parece-nos que natildeo se poderia

comprovar por exemplo a teoria da mente nos animais Ades destaca o seguinte

trecho de Romanes que aqui citamos com algumas palavras a mais e que este

apresenta em sua obra antes de criticar a teoria do automatismo animal que

atribuem a Descartes e tambeacutem parece natildeo concordar com tal atribuiccedilatildeo

[] a partir do que conheccedilo subjetivamente das operaccedilotildees de minha proacutepria mente individual e das atividades agraves quais elas impelem o meu organismo passo por analogia a inferir desde as atividades observaacuteveis de outros organismos quais satildeo as operaccedilotildees mentais que lhes satildeo subjacentes O senso comum no entanto sente universalmente que a analogia eacute aqui um guia mais seguro para a verdade do que a demanda ceacutetica pela evidecircncia impossiacutevel de modo que se a existecircncia objetiva de outros organismos e suas atividades satildeo asseguradas o senso comum concluiraacute sempre e sem questionar o que as atividades de outros organismos quando anaacutelogas agravequelas de nosso proacuteprio organismo que sabemos serem acompanhadas por certos estados mentais satildeo neles acompanhadas por estados mentais anaacutelogos

848

Ades entatildeo menciona o emprego de um mesmo termo que caracteriza um

comportamento humano para definir um nos animais natildeo humanos que de algum

modo corresponde a ele mas analogamente

No entanto para o aristotelismo-tomismo como se viu haacute fenocircmenos

mentais nos animais que podem ser associados aos humanos apenas como

participaccedilatildeo sem caracterizar propriamente uma das potecircncias de propriedades

848

ldquoStarting from what I know subjectively of the operations of my own individual mind and the activities wich in my own organism they prompt I proceed by analogy to infer from the observable activities of other organisms what are the mental operations that underlie them [] Common sens however universally feels that analogy is here a safer guide to thruth than the sceptical demand for impossible evidence so that if the objective existence of other organisms and their activities is granted [] common sense will always and without question conclude that the activities of organisms other than our own when analogous to those activities of our own wich we know to be accompanied by certain mental states are them accompanied by analogous mental satatesrdquo ROMANES 1888 p 1-2 6

184

exclusivamente humanas de modo que se por um lado a corrente reconhece a

superioridade de alguns animais no que toca a certos sentidos externos e internos

por outro sustenta que o homem conhece a verdade ou seja a realidade pela

adequaccedilatildeo do intelecto ao objeto

Assim sugerimos que o conhecimento do homem em relaccedilatildeo agrave chamada

inteligecircncia dos animais natildeo humanos natildeo estaria impedido e ele poderia chegar a

constataccedilotildees que entenderia como verdadeiras confirmando segundo o exemplo

supracitado e se for o caso a teoria da mente e reconhecendo a natureza desses

entes tal como eacute em si mesma (ainda que jamais se pudesse conhececirc-los de modo

integral) sem a tendecircncia a por assim dizer antropomorfizaacute-los comparando-a agrave

nossa ao situaacute-los em uma categoria especiacutefica da gradaccedilatildeo entitativa sem jamais

deixar de levar em conta a subjetividade no que toca agraves diferenccedilas marcantes de

percepccedilatildeo por meio dos sentidos agraves quais temos tido acesso gradual em razatildeo dos

avanccedilos tecnoloacutegicos que nos possibilitam investigar pontos nos espectros dos

sensiacuteveis que nossos sentidos por si soacutes natildeo alcanccedilam

Para chegar a isto Marie George849 como se viu aponta para a necessidade

de estabelecer-se a fronteira entre o pensar e o sentir e essa tarefa deve ser

realizada natildeo soacute com investigaccedilotildees com animais natildeo humanos como as que

apresentamos neste estudo mas tambeacutem com crianccedilas humanas em idade proacutexima

agravequela em que comeccedilam a mostrar sinais das operaccedilotildees do intelecto agrave luz do

aristotelismo-tomismo Esta fronteira contudo estabelece certos limites que seriam

intransponiacuteveis

Fizemos algumas perguntas anteriormente neste trabalho a partir deste tema

e tentaremos respondecirc-las com base nesta corrente no acircmbito das consideraccedilotildees

que se sucederatildeo

Darwin850 como se viu exemplifica aqueles que natildeo reconhecem essa

intransponibilidade ao apontar nos animais natildeo humanos caracteriacutesticas de

sociabilidade (como o auxiacutelio o alerta de perigo etc) de sentimento do belo a

comunicaccedilatildeo por algo anaacutelogo agrave linguagem a resoluccedilatildeo de problemas etc O

sentimento e a admiraccedilatildeo do belo que ele sugere com os casos em que uma ave

macha exibe sua plumagem para atrair uma fecircmea segundo o aristotelismo-

tomismo se trataria natildeo propriamente de um reconhecimento do belo enquanto

849

GEORGE 2013 850

DARWIN sd a) p 30-31 e 34-35

185

belo mas de uma atraccedilatildeo movida instintivamente pela comparaccedilatildeo de imagens pela

estimativa segundo a configuraccedilatildeo a coloraccedilatildeo etc Jaacute no caso do que diz ser

anaacutelogo agrave linguagem trata-se sob este vieacutes como se disse mais acima da

participaccedilatildeo e em relaccedilatildeo aos demais exemplos observam-se potecircncias

encontradas no homem mas aqui limitadas ao acircmbito da estimativa em

conformidade com os resultados fornecidos anteriormente Inclui-se aqui tambeacutem o

auxiacutelio de alimentaccedilatildeo prestado por algumas aves a companheiros cegos que

Darwin relata Ainda que como diz seja um fato incomum concorre para a

preservaccedilatildeo da espeacutecie e serve como indiacutecio da teoria da mente naqueles animais

Em todo caso temos sempre exemplos envolvendo os sentidos internos e a

natureza nos priva de fatos que validariam a ideia da gradaccedilatildeo contiacutenua

Demais disso se a ideia do princiacutepio formal e portanto imaterial procede

entatildeo estamos diante de um problema ainda mais profundo para sustentar a ideia da

possibilidade de haver um meio termo de haver tal gradaccedilatildeo no acircmbito ontoloacutegico

interespeciacutefico851 entre a natildeo captaccedilatildeo e a captaccedilatildeo de espeacutecies inteligiacuteveis Se haacute

captaccedilatildeo de espeacutecies imateriais isto somente se daacute por alguma potecircncia imaterial

Mas eacute possiacutevel conciliar essa descriccedilatildeo com outras que apontam o sistema

nervoso como a origem da inteligecircncia como o faz Gallegos852 ndash que sugere que

esteja distribuiacuteda pelas estruturas orgacircnicas relacionadas ndash ou com a explicaccedilatildeo

anteriormente citada das duas maneiras de atuaccedilatildeo do sistema nervoso nos

processos cognitivos descritas por Maturana e Varela853 por apontar a possibilidade

de a origem da expressatildeo material da inteligecircncia estar no ceacuterebro em seu todo

poreacutem como efeito como repercussatildeo de uma operaccedilatildeo que nasce no acircmbito

imaterial ou espiritual realizada exclusivamente pela alma esta a partir de

informaccedilotildees recebidas materialmente pelos sentidos

Mas aqui nos referimos exclusivamente agrave capacidade de abstraccedilatildeo

associada intimamente agrave vontade pelas quais no homem a inteligecircncia prevaleceraacute

sobre o instinto e natildeo ao produto exclusivo dos sentidos internos que seria entatildeo

plenamente material ou seja fruto da operaccedilatildeo da alma pela mateacuteria e natildeo por si

851

Porque intraespecificamente um ente humano que ainda natildeo atingiu a chamada ldquoidade da razatildeordquo segundo o aristotelismo-tomismo jaacute deteacutem a potecircncia intelectiva embora esta ainda natildeo se manifeste pelas limitaccedilotildees do organismo inclusive dos sentidos internos em desenvolvimento

852 GALLEGO 2013

853 MATURANA VARELA 1995 p 201-202

186

mesma tal como o eacute a chamada inteligecircncia animal em sua integralidade que

assim como diz Gallegos submete-se ao instinto

Estatildeo nesse campo material dos sentidos internos as citaccedilotildees anteriores de

Griffin854 e Shettleworth855 sobre os atributos dos processos cognitivos como as

representaccedilotildees cujas combinaccedilotildees que resultam em tomadas de decisatildeo

Outras pesquisas como a de Bechara e colaboradores856 que incluem

Antonio Damaacutesio apontam para comportamentos em humanos dentre os quais

estatildeo incluiacutedos casos de tomada de decisatildeo que se antecipam ao raciociacutenio Isto

nos parece ter certa consonacircncia com a proposta aristoteacutelico-tomista e sugerimos

que poderia ser corroborado a partir de estudos que busquem localizar os sentidos

internos no sistema nervoso a partir do que se sabe atualmente nos campos da

neurofisiologia e da neuroanatomia

Reiteramos o que diz George sobre a necessidade de estabelecerem-se os

limites entre os sentidos e a intelecccedilatildeo e que os avanccedilos de investigaccedilotildees nessa

linha podem ser de grande valia para o leque de possibilidades de estudos sobre a

inteligecircncia animal segundo a abordagem atual mais especiacutefica apontada por

Feuerbacher857 no acircmbito da etologia cognitiva e de outras ciecircncias afins

Sugerimos tambeacutem que o aristotelismo-tomismo poderia contribuir com o

esclarecimento dos principais pontos de muitas discussotildees como a polecircmica do

emprego do condicionamento operante skinneriano na educaccedilatildeo humana e os

efeitos negativos descritos por Iserbyt como o adoecimento de alunos ou

surgimento de tiques nervosos neles em razatildeo do estresse858 dentre outros de

longo prazo denunciados ao longo de sua obra ou como aquela que envolveu

Pavlov e Koumlhler e Yerkes Estes dois chegaram a sugerir a presenccedila de alguma

racionalidade de alguma reflexatildeo em chimpanzeacutes com base no que observaram em

seus experimentos alguns expostos aqui mas essas alegaccedilotildees se analisadas agrave luz

do aristotelismo-tomismo estiveram sempre no acircmbito da estimativa O conceito de

inteligecircncia que Koumlhler associou aos seus chimpanzeacutes859 por exemplo ilustrado

pela escolha de um meio diferente para a resoluccedilatildeo de determinada situaccedilatildeo eacute mais

um exemplo que se enquadra na noccedilatildeo aristoteacutelica supramencionada de

854

GRIFFIN 1994 p viii 855

SHETTLEWORTH 2010 p 4 856

BECHARA et al 1997 857

FEUERBACHER 2011 858

ISERBYT 2000 p A-158 859

KOumlHLER 1927 p 3-4

187

semelhanccedila entre a estimativa de certos animais e a de crianccedilas humanas mais

novas

Pode-se sugerir que essa estimativa vaacute aleacutem dos reflexos inatos e

condicionados pavlovianos nas crianccedilas e nos animais como deixam claros alguns

experimentos como aqueles que abordam a comunicaccedilatildeo realizados com Kanzi

Koko dentre outros em que os animais passam a fazer coisas que jamais fariam na

natureza mas sempre dentro dos limites de suas potencialidades Pavlov

reconheceu a elasticidade dessa capacidade de aprendizado de tentativa e erro que

atribuiacutea agraves associaccedilotildees que tecircm como fim a recompensa E diga-se o mesmo de

Thorndike que tambeacutem entendia a chamada inteligecircncia dos animais restrita agraves

operaccedilotildees dos sentidos dos impulsos dos sentimentos apontando neles a

ausecircncia de vontade e de ideias livres860 As delimitaccedilotildees de ambos parece-nos

enquadrarem-se no esquema aristoteacutelico-tomista assim como o que entendem das

associaccedilotildees tambeacutem apontadas por Lloyd que ainda destaca as inferecircncias sem

abstraccedilatildeo nos animais861 que caracterizam as operaccedilotildees da estimativa

E da mesma forma sem levar-se em conta a discrepacircncia na questatildeo de

haver ou natildeo possibilidade de um intermeacutedio entre a ausecircncia e a presenccedila de

capacidade de abstraccedilatildeo as observaccedilotildees de Darwin tambeacutem estatildeo muito proacuteximas

da doutrina aristoteacutelico-tomista como por exemplo em seu relato sobre as

expressotildees emocionais e o reconhecimento de memoacuteria e imaginaccedilatildeo e tambeacutem

quando diz que os animais seriam em algo aptos para o raciociacutenio (no original em

inglecircs ldquoreasoningrdquo) mas sem que tenham capacidade para abstrair descriccedilatildeo na

qual nos parece enquadrar-se a potecircncia estimativa Ademais ao referir-se ao

deliberar (no original em inglecircs ldquodeliberaterdquo)862 no exerciacutecio desse raciociacutenio tudo

indica estar-se referindo natildeo agrave deliberaccedilatildeo como vontade livre que tem como

requisito a intelecccedilatildeo mas justamente agrave voluntariedade que se observa nos animais

e nas crianccedilas

Hume tambeacutem atribuiu certo raciociacutenio com inferecircncias aos animais e

reconhecendo que somente o homem estabelece relaccedilotildees de ideias Mostrou

tambeacutem muita proximidade com o aristotelismo-tomismo ao chamar esse raciociacutenio

ldquoexperimentalrdquo e descrevecirc-lo por exemplo como o motivo pelo qual o animal espera

860

THORNDIKE 1898 p 84 e 108 861

LLOYD 1891 p 348 e 362 862

DARWIN 1882 p 75

188

que algo que se deu em determinada circunstacircncia volte a ocorrer caso esta se

repita863 o que mostra consonacircncia com a descriccedilatildeo da estimativa

Tambeacutem em consonacircncia com esta estaacute a observaccedilatildeo cartesiana da

ausecircncia nos animais de linguagem e raciociacutenio se este estaacute aqui entendido como

de natureza abstrativa A carecircncia de mais informaccedilotildees abriu espaccedilo para a

polecircmica envolvendo o automatismo Embora natildeo se possa mensurar ateacute onde

Descartes quis chegar ao mencionar a superioridade dos animais em relaccedilatildeo a

qualquer aparato de fabricaccedilatildeo humana parece haver seacuterias dificuldades em

apontar com maior precisatildeo se ele conceberia ou natildeo por exemplo consciecircncia

neles

Tomaacutes de Aquino aponta alguns sentidos dados agrave palavra ldquoconsciecircnciardquo

como significando a sindeacuterese mas explica que originalmente falando consciecircncia

significa ldquoa relaccedilatildeo de um conhecimento com uma coisardquo que equivaleria a um

ldquoconsaberrdquo e se efetua atraveacutes de um ato

A consciecircncia como a aplicaccedilatildeo de um conhecimento a alguma coisa que se

pratica pode dar-se de trecircs formas a) pelo reconhecimento de ter ou natildeo feito algo

a partir do que se diz que ela daacute testemunho b) pelo juiacutezo de que se deve ou natildeo

fazer algo a partir do que se diz que ela instiga ou liga e c) pelo juiacutezo de que algo

foi bem feito ou mal feito a partir do que se diz que ela excusa acusa ou

remorde864

Assim a consciecircncia segundo o aristotelismo-tomismo pode ser um ato do

intelecto ou da cogitativa ou um ato da estimativa E quando se trata destes uacuteltimos

eacute resultante de processos cerebrais afirmaccedilatildeo que fundamentaria as hipoacuteteses por

exemplo de Searle e Griffin No entanto a perspectiva de que a consciecircncia se

restringiria a processos orgacircnicos encontra algumas barreiras Tallis por exemplo

diz que se o ceacuterebro fosse uma maacutequina teria de estar ldquoacoplado a uma consciecircncia

que lhe fosse exterior para poder transformar os eventos que ocorrem nele em

lsquoatividadersquo computacionalrdquo pois ldquomaacutequinas natildeo calculam por si mesmasrdquo Esses

863

HUME 2001 p 128-132 864

ldquo[] la relacioacuten de un conocimiento con una cosardquo TOMAacuteS DE AQUINO 2001 art 13 q 79 p 739

189

eventos assim por si soacute natildeo poderiam ldquo[] constituir consciecircncia ou processos

mentaisrdquo865

A consciecircncia enquanto ato do intelecto viabiliza segundo o aristotelismo-

tomismo o ato consciente de que se estaacute consciente jaacute natildeo resultante desses

processos cerebrais ou ao menos natildeo apenas destes Encontramos aqui a divisatildeo

fornecida por Ades ou seja neste uacuteltimo caso teriacuteamos o emprego do termo

ldquoconsciousnessrdquo e no anterior o do termo ldquoawarenessrdquo e aqui se enquadra a

consciecircncia de si mesmo e a do proacuteprio corpo observadas em elefantes grandes

macacos e corvos e acrescidas daquela do proacuteprio comportamento que sob o vieacutes

aristoteacutelico-tomista seria das proacuteprias intenccedilotildees que Herman866 observou nos

golfinhos Deste modo os quatro domiacutenios indicados pelo pesquisador encontram-

se segundo o aristotelismo-tomismo no acircmbito estimativo

Jaacute na divisatildeo de Damaacutesio a chamada ldquoconsciecircncia centralrdquo o conhecimento

de que se estaacute no aqui e no agora parece poder enquadrar-se tambeacutem somente no

acircmbito estimativo ao passo que a chamada ldquoconsciecircncia ampliadardquo (de que se tem

uma identidade do passado e do futuro etc) seria um ato conjunto do intelecto com

a cogitativa Mas aqui o reconhecimento de si mesmo poderia tambeacutem estar

associado agrave estimativa como se observou e como uma participaccedilatildeo no sentido

aristoteacutelico-tomista na cogitativa

Tambeacutem quando Damaacutesio define a consciecircncia como um padratildeo privado que

reuacutene o objeto e o self867 se aproxima da definiccedilatildeo aristoteacutelico-tomista de aplicaccedilatildeo

do conhecimento (de um sujeito) a algo

Damaacutesio apresenta como fato a relaccedilatildeo entre ldquoalguns aspectos dos

processos da consciecircnciardquo e ldquoregiotildees e sistemas cerebrais especiacuteficosrdquo Poderia

estar reconhecendo aqui que nem todos esses aspectos enquadram-se nisto tal

como Chalmers que sugere que ela se estenda para aleacutem de bases orgacircnicas Isto

como se viu estaria mais em consonacircncia com a visatildeo aristoteacutelico-tomista em

relaccedilatildeo aos animais natildeo humanos mas se se pode excluir de algum modo os

processos orgacircnicos como causa tornar-se ia tambeacutem consonante em relaccedilatildeo aos

entes humanos e mais visivelmente com a capacidade de intelecccedilatildeo

865

Respectivamente ldquo[] coupled to a consciousness external to it to transform the events that take place in it into computational activityrdquo ldquo[] machines do not of themselves calculate []rdquo e ldquo[] constitute consciousness or mental processesrdquo TALLIS 2010 p 80

866 HERMAN 2006

867 DAMAacuteSIO 1999 p 30 e 33

190

Jaacute Lalande poderia considerar a definiccedilatildeo aristoteacutelico-tomista abusiva tal

como o faz com a de Schopenhauer e Kant mas natildeo nos parece que sua definiccedilatildeo

em si esteja distante da que ele mesmo propotildee e inclusive do modo como a

classifica Das cinco definiccedilotildees para a palavra ldquointuiccedilatildeordquo que ele fornece parece-nos

encaixarem aqui aquelas em que haacute referecircncia a um conhecimento evidente direto

e imediato868 Vemos assim consonacircncia entre a intuiccedilatildeo do espiacuterito que menciona

e a ciecircncia em ato do sujeito agrave qual se refere o aristotelismo-tomismo bem como

entre os estados e atos deste espiacuterito e o algo respectivamente mas neste segundo

caso de modo natildeo exaustivo E tambeacutem nos parece a consciecircncia espontacircnea

estaria proacutexima da ldquoawarenessrdquo ao passo que a consciecircncia reflexiva

corresponderia agrave ldquoconsciousnessrdquo da qual como aponta Locke869 depende o

perdurante reconhecimento do ldquoeurdquo o testemunho interno que esse ldquoeurdquo pode dar a

si mesmo como aponta Balibar870 e sem o que natildeo poderia haver o exerciacutecio da

intelecccedilatildeo uma vez que o sujeito que intelige somente apreende porque se manteacutem

enquanto o mesmo sujeito e de algum modo se reconhece enquanto tal e

reconhece que reconhece

Paralelamente a consciecircncia enquanto ldquoawarenessrdquo viabiliza a capacidade de

aprender e de adaptar-se ao ambiente que satildeo as duas caracteriacutesticas que Silva

encontra em praticamente todas as definiccedilotildees de inteligecircncia Ambas podem

enquadrar-se como objeto da estimativa ou como objeto da intelecccedilatildeo e daiacute

sugerimos que venha esse seu caraacuteter por assim dizer universal

Tambeacutem se pode enquadrar em ambas o entendimento de Claparegravede Stern

Buumlhler e Koumlhler citados por Piaget de que a inteligecircncia seria uma adaptaccedilatildeo

mental raacutepida a uma nova circunstacircncia Da parte dos animais natildeo humanos um

bom exemplo para ilustraacute-lo eacute o comportamento de obediecircncia dos espeacutecimes de

golfinhos a um comando de criaccedilatildeo

Jaacute o mesmo natildeo se daacute com algumas das caracteriacutesticas elencadas nas

palavras da Task Force on Intelligence da APA871 quando cita a necessidade de uma

busca para definiccedilatildeo de inteligecircncia As capacidades de adaptaccedilatildeo ao ambiente e

de aprendizado a partir da experiecircncia satildeo se tomadas por si soacute notoriamente

estimativas enquanto que a compreensatildeo de ideias complexas e o raciociacutenio satildeo

868

LALANDE 1932 p 396-400 869

LOCKE 2015 p 181 870

BALIBAR 2004 p 175 871

NEISSER 1996 P 77

191

deste modo classificaacuteveis conforme o sentido em que estes atributos satildeo

empregados mas a reflexatildeo eacute proacutepria do intelecto

Aqui jaacute comeccedilamos a esboccedilar como essa base do aristotelismo-tomismo

poderia contribuir para organizar essas caracteriacutesticas fornecendo sugerimos um

suporte para um modo eficaz de encontrar uma definiccedilatildeo para a inteligecircncia que

satisfaccedila agraves tantas correntes de pensamento

Dentre as caracteriacutesticas elencadas pelo Mainstream Science on

Intelligence872 as habilidades de planejar resolver problemas aprender

rapidamente e aprender com a experiecircncia satildeo se analisadas por si soacute verificaacuteveis

na estimativa Do mesmo modo assim como no caso anterior as habilidades de

raciocinar e compreender ideias complexas depende do sentido empregado e a de

pensar abstratamente eacute exclusiva do intelecto Fala-se tambeacutem na capacidade mais

ampla e profunda de compreender captar o sentido das coisas e calcular o que

fazer Este uacuteltimo por si poderia ser objeto da estimativa mas as duas qualificaccedilotildees

que o precedem situam-no na natureza cogitativa ou intelectiva humana

A definiccedilatildeo de Wechsler873 refere-se agrave inteligecircncia humana pois fala de um

pensamento racional para o trato com o ambiente o que exige reflexatildeo e parece

caracterizar o intelecto praacutetico segundo o aristotelismo-tomismo Jaacute a de Stern874 se

tomada apenas em si mesma poderia ser aplicaacutevel tanto aos animais que

destacamos aqui quanto aos humanos conforme o sentido que se pretenda dar

quando se refere ao indiviacuteduo ajustar o pensamento a novas exigecircncias

conscientemente Se ele o faz por exemplo consciente de que pensa no que faz

estaacute no acircmbito intelectivo e se o faz consciente do que estaacute fazendo pode estar no

da estimativa

A identificaccedilatildeo desta e dos sentidos internos e de sua expressatildeo no sistema

nervoso como jaacute propomos poderia servir de base inclusive de natureza

epistemoloacutegica para as abordagens bioloacutegicas segundo a classificaccedilatildeo de

Sternberg

Em se tratando da psicologia cognitiva parece-nos que a utilizaccedilatildeo dos

modelos mentais de Johnson-Laird estariam a ilustrar o refluxo do intelecto em suas

trecircs operaccedilotildees na imaginaccedilatildeo (as representaccedilotildees mentais as possibilidades etc)

872

GOTTFRESON 1997 p 13 873

WECHSLER 1944 p 3 874

STERN 1914 p 3

192

na memoacuteria e na reminiscecircncia (o recurso voluntaacuterio ou natildeo agravequelas) e na cogitativa

(apreendendo comparando e combinando as imagens e as intenccedilotildees relacionadas)

No que toca agraves demais abordagens cognitivas as habilidades ndash como as da

teoria triaacuterquica do proacuteprio Sternberg por exemplo as contextuais que dizem

respeito agraves interaccedilotildees com o ambiente em si como a de adaptaccedilatildeo ndash seriam

elencadas indicando-se se estariam relacionadas aos sentidos internos e a quais

ou ao intelecto e aqui ou ao intelecto praacutetico ou ao especulativo e assim tambeacutem

com as chamadas inteligecircncias muacuteltiplas de Gardner e a chamada inteligecircncia

emocional de Goleman e Salovey e Mayer Estas sob a oacuteptica aristoteacutelico-tomista

sugerimos natildeo caracterizariam inteligecircncia no sentido proacuteprio mas modalidades de

efeitos da expressatildeo desta e mesmo da cogitativa conforme o caso

Por fim esta mesma aplicaccedilatildeo poder-se-ia fazer em relaccedilatildeo agraves teorias na

abordagem psicomeacutetrica identificando-se a que cada um dos fatores propostos

estaria associado ou seja e mais uma vez se aos sentidos internos e a quais ou

ao intelecto praacutetico ou ao especulativo O raciociacutenio indutivo de Thurstone por

exemplo caracterizaria em princiacutepio o intelecto especulativo enquanto que os trecircs

tipos de inteligecircncia de Thorndike (social mecacircnica e abstrata) estariam em

princiacutepio associados ao intelecto especulativo e ao praacutetico jaacute que tratam de

aprendizado e administraccedilatildeo de relaccedilotildees

As divergecircncias na definiccedilatildeo de inteligecircncia satildeo demasiado intensas

considerando-se sobretudo o caraacuteter quantitativo No entanto como se observou

estatildeo sempre presentes nesses estudos as distinccedilotildees do aristotelismo-tomismo que

discrimina os sentidos internos dos animais e dos humanos e a intelecccedilatildeo

pertencente a estes e parece-nos que elas poderiam fornecer as devidas bases

para uma jornada de natureza consensual facilitando processos de delimitaccedilatildeo

algo que exigiria pesquisas futuras Pensamos que estas estariam ao mesmo tempo

prestando um contributo para o desenvolvimento do que abordamos aqui sobre a

inteligecircncia no homem e nos demais animais

Em relaccedilatildeo a estes como dissemos natildeo encontramos no presente trabalho

sinais de memoacuteria voluntaacuteria e imaginaccedilatildeo voluntaacuteria nem algo que caracterizasse a

apreensatildeo de universais Se as duas primeiras tivessem sido apontadas teriacuteamos

verificado a presenccedila de cogitativa e se a terceira o tivesse sido teriacuteamos deparado

com intelecccedilatildeo Se por um lado muitos animais apresentam sentidos externos e

inclusive alguns sentidos internos como a memoacuteria mais acurados do que os do

193

homem por outro nos eacute notoacuteria e soou-nos como sendo um consenso a

superioridade da faculdade intelectiva humana caracterizada pelo exerciacutecio da

razatildeo que possibilita profundas elucubraccedilotildees como as de Bachelard que citamos no

iniacutecio deste estudo que possibilita a formulaccedilatildeo de conceitos e de juiacutezos complexos

a construccedilatildeo de silogismos construccedilotildees especulativas complexas etc a partir da

abstraccedilatildeo tal como visto tambeacutem em outras citaccedilotildees aqui presentes como as de

Hume quando aponta as limitaccedilotildees da inteligecircncia nos animais natildeo humanos a de

Descartes quando diz que estes natildeo raciocinam e os compara a maacutequinas a de

Darwin ao dizer que os animais natildeo fazem reflexotildees e abstraccedilotildees no que tambeacutem

concordam Lloyd Thorndike e os demais

Os trabalhos que analisamos assim como estes autores em geral por

estarem ancorados na experiecircncia atribuem memoacuteria e imaginaccedilatildeo aos animais e

descrevem de algum modo a estimativa ao atribuir-lhes certa voluntariedade

capacidade de tomada de decisatildeo de estabelecimento de associaccedilotildees da

plasticidade de origem natural ou artificial mencionada por Lloyd que levam a certos

tipos de inferecircncias

Como se viu os behavioristas como Pavlov e Skinner seguem a ideia de

Darwin de que natildeo haveria barreiras naturais intransponiacuteveis entre a condiccedilatildeo

intelectiva humana e tudo aquilo que participa da inteligecircncia dos demais animais O

aristotelismo-tomismo apresenta um vieacutes mais principial partindo de premissas

ontoloacutegicas ou metafiacutesicas e aponta em outro sentido

As observaccedilotildees que fizemos aqui aleacutem de reforccedilarem a hipoacutetese central de

que sua aplicaccedilatildeo no entendimento da chamada inteligecircncia animal poderaacute ajudar a

estabelecer limites e pontos de partida para a compreensatildeo da inteligecircncia inclusive

a humana de natureza ainda mais complexa levaram-nos a emitir outras sugestotildees

para futuros estudos e eacute possiacutevel que tenham aberto uma ou mais frentes de

pesquisa de natureza interdisciplinar e inclusive etoloacutegica psicoloacutegica e quiccedilaacute

relacionadas a outras aacutereas

Por um lado natildeo encontramos um trabalho que reuacutena todas as informaccedilotildees

para a construccedilatildeo da doutrina psicoloacutegica aristoteacutelico-tomista que se encontra

dispersa na obra de Aristoacuteteles e Tomaacutes de Aquino razatildeo pela qual tentamos expocirc-

la de modo que possa vir a ser futuramente complementada

Por outro tentamos organizar as habilidades dos animais observadas nos

estudos bem como os testes empregados para avaliaacute-las sugerindo o

194

desenvolvimento de uma sistematizaccedilatildeo algo que ateacute o momento soacute vimos

esboccedilado no sumaacuterio e consequentemente na organizaccedilatildeo de algumas obras875

E como desenvolvimento direto da proposta central deste trabalho

apontamos para a sequecircncia na verificaccedilatildeo da viabilidade de associaccedilatildeo entre o

aristotelismo-tomismo e os estudos no campo da inteligecircncia humana e dos animais

natildeo humanos visando a futuras construccedilotildees nessas duas vertentes o que incluiria

estudos envolvendo a comparaccedilatildeo entre a inteligecircncia das crianccedilas e a dos animais

com base na psicologia de Aristoacuteteles e Tomaacutes de Aquino a tentativa insistimos de

identificaccedilatildeo no sistema nervoso sob as perspectivas humana e comparada dos

elementos cognitivos que compotildeem essa doutrina dos dois filoacutesofos etc Esse

processo inclusive desde jaacute sugerimos poderaacute contribuir para a formulaccedilatildeo de

novas hipoacuteteses que poderatildeo trazer esclarecimentos para problemas tatildeo atuais de

natureza fisioloacutegica conceitual etc como os que envolvem os processos de

tomada de decisatildeo bem como aquilo que se entende por consciecircncia a partir da

formulaccedilatildeo de abordagens de natureza epistemoloacutegica cuja aplicaccedilatildeo poderaacute

inclusive ser testada como meio para resoluccedilatildeo de questotildees estruturais internas e

externas das disciplinas relacionadas dada as bases da doutrina que se estruturam

sobre princiacutepios evidentes

Isto que se acaba de dizer pode ser mais bem visualizado no esquema da

paacutegina seguinte

875

Cf por exemplo SHETLLEWORTH 2010

195

Figura 1 - Esquema de sugestotildees para pesquisas futuras

Classificaccedilatildeo dos tipos de habilidade

Sequecircncia da coleta integral de dados

para composiccedilatildeo da doutrina psicoloacutegica aristoteacutelico-tomista

Estudos comparados da

inteligecircncia

Aristotelismo-tomismo

Sequecircncia da

investigaccedilatildeo sobre

compatibilidade entre

psicologia aristoteacutelico-

tomista e demais

estudos sob a oacuteptica

humana e comparada

TESE

Localizaccedilatildeo anatocircmica e

fisioloacutegica dos sentidos

internos no sistema nervoso

Aplicaccedilatildeo da psicologia

aristoteacutelico-tomista a esses

estudos

Estudos comparativos evolvendo a

estimativa dos animais e a das

crianccedilas humanas

Classificaccedilatildeo dos tipos de teste

Busca por soluccedilatildeo de questotildees conceituais de organizaccedilatildeo interna e externa das disciplinas envolvidas etc e de problemas de natureza

conceitual fisioloacutegica psicoloacutegica etc como os que envolvem a consciecircncia a tomada de decisatildeo etc

Estudos comparativos evolvendo a

estimativa dos animais e a

cogitativa e a intelecccedilatildeo

196

Esperamos assim ter conseguido contribuir com mais uma etapa para

corroborar a validade da psicologia de Aristoacuteteles e Tomaacutes de Aquino sob uma

perspectiva comparada e delinear satisfatoriamente algumas bases para a

realizaccedilatildeo de futuros estudos de natureza interdisciplinar que tenham como

estrutura a fusatildeo entre esse acircmbito principial da doutrina dos dois filoacutesofos e as

hipoacuteteses formuladas dentro das linhas de pesquisa aqui apresentadas o que nos

parece estar no acircmago da proposta da subalternaccedilatildeo das ciecircncias a qual assim

cremos jamais deveria ter sido negligenciada

197

REFEREcircNCIAS

ADES C O morcego outros bichos e a questatildeo da consciecircncia animal Psicologia USP Satildeo Paulo v 8 n 2 1997 ALLEN M SCHWARTZ B L Mirror self-recognition in a gorilla (Gorilla gorilla gorilla) 2007 29 f Dissertaccedilatildeo (Mestrado em Psicologia) ndash Florida International University Miami 2007 AMSTERDAM B Mirror self‐image reactions before age two Developmental Psychobiology v 5 n 4 p 297-305 1972 ANDERSON A Semantic and social-pragmatic aspects of meaning in task-oriented dialogue 1983 619 f Tese (Doutorado em Filosofia) ndash University of Glasgow Glasgow 1983 ANDERSON J R A primatological perspective on death American Journal of Primatology v 73 n 5 p 410-414 2011 ANGIONI L Sobre a relaccedilatildeo entre mateacuteria e forma na constituiccedilatildeo da essecircncia sensiacutevel em Aristoacuteteles Cadernos de Histoacuteria e Filosofia da Ciecircncia seacuterie 3 Campinas v 7 n 2 p 209-251 1997 ANGIONI L ldquoNatildeo ser dito de um subjacenterdquo ldquoum istordquo e ldquoseparadordquo o conceito de essecircncia como subjacente e forma (Z-3) Cadernos de Histoacuteria e Filosofia da Ciecircncia seacuterie 3 Campinas v 8 n esp p 69-126 1998 ALLMAN J M WATSON K K TETREAULT N A HAKEEM A Y Intuition and autism a possible role for Von Economo neurons Trends in Cognitive Sciences v 9 n 8 p 367-373 2005 ARISTOacuteTELES Das Categorias (Oacuterganon) Traduccedilatildeo notas e comentaacuterios de Maacuterio Ferreira dos Santos 2 ed Satildeo Paulo Editora Matese 1965 171 p ARISTOacuteTELES Investigacioacuten sobre los Animales Madrid Editorial Gredos 1992 612 p ARISTOacuteTELES Fiacutesica Madrid Editorial Gredos 1995a 506 p ARISTOacuteTELES Analiacuteticos segundos In Tratados de Loacutegica (Oacuterganon) II Madrid Editorial Gredos 1995b 460 p ARISTOacuteTELES Eacutetica Nicomaacutequea In ______ Eacutetica nicomaacutequea eacutetica eudemia Madrid Editorial Gredos 1998a 561 p ARISTOacuteTELES Eacutetica Eudemia In ______ Eacutetica nicomaacutequea eacutetica eudemia Madrid Editorial Gredos 1998b 561 p

198

ARISTOacuteTELES Metafiacutesica In REALE G (org) Metafiacutesica texto grego com traduccedilatildeo ao lado 2 ed Satildeo Paulo Ed Loyola 2005 v II 696 (xiv) p ARISTOacuteTELES Sobre a Alma Lisboa Centro de Filosofia da Universidade de Lisboa 2010 143 p (Coleccedilatildeo Obras Completas de Aristoacuteteles Biblioteca de Autores Claacutessicos Imprensa Nacional-Casa da Moeda) BACHELARD G A Chama de uma Vela Rio de Janeiro Ed Bertrand Brasil 1989 112 p BALIBAR E Consciousness conscience awareness In CASSIN B Dictionary of untranslatables a philosophical lexicon Princeton Princeton University Press 2004 1299 p BATES L A et al Do elephants show empathy Journal of Consciousness Studies v 15 n 10-11 p 204-225 2008 BEARZI G et al Whale and dolphin behavioural responses to dead conspecifics Zoology v 128 p 1-15 jun 2018 BECHARA A DAMASIO H TRANEL D DAMASIO A R Deciding advantageously before knowing the advantageous strategy Science v 275 n 5304 p 1293-1295 1997 BELYAEV D K Destabilizing selection as a factor in domestication Journal of Heredity v 70 n 5 p 301-308 1979 BIRO D MATSUZAWA T Numerical ordering in a chimpanzee (Pan troglodytes) Planning executing and monitoring Journal of Comparative Psychology v 113 n 2 p 178 1999 BOESCH C The effects of leopard predation on grouping patterns in forest chimpanzees Behaviour v 117 n 3 p 220-241 1991 BOESCH C Innovation in wild chimpanzees (Pan troglodytes) International Journal of Primatology v 16 n 1 p 1-16 1995 BOESCH C The emergence of cultures among wild chimpanzees In RUNCIMAN W G J SMITH M DUNBAR R I M (ed) Proceedings-British Academy New York Oxford University Press 1996 p 251-268 BOESCH C Is culture a golden barrier between human and chimpanzee Evolutionary Anthropology Issues News and Reviews v 12 n 2 p 82-91 2003 BOESCH C BOESCH H Tool use and tool making in wild chimpanzees Folia Primatologica v 54 n 1-2 p 86-99 1990 BOESCH C TOMASELLO M Chimpanzee and human cultures Current Anthropology v 39 n 5 p 591-614 1998

199

BOTIGUEacute L R et al Ancient European dog genomes reveal continuity since the early Neolithic Nature Communications v 8 p 16082 2017 BOUCHARD J GOODYER W LEFEBVRE L Social learning and innovation are positively correlated in pigeons (Columba livia) Animal Cognition v 10 n 2 p 259-266 2007 BOYSEN S T BERNTSON G G Numerical competence in a chimpanzee (Pan troglodytes) Journal of Comparative Psychology v 103 n 1 p 23 1989 BRITISH BROADCASTING CORPORATION Are crows the ultimate problem solvers [S l s n] 2014 1 video (4 min) Publicado pela BBC Health Disponiacutevel em wwwbbccoukprogrammesp01r0md3 httpswwwyoutubecomwatchv =cbSu2PXOTOc Acesso em 13 out 2018 BROSNAN S F DE WAAL F B Monkeys reject unequal pay Nature v 425 n 6955 p 297 2003 BROWN C Fish intelligence sentience and ethics Animal Cognition v 18 n 1 p 1-17 2015 BUGNYAR T REBER S A BUCKNER C Ravens attribute visual access to unseen competitors Nature Communications v 7 p 10506 2016 BURGHARDT G M BEKOFF M Animal consciousness In BAYNE T CLEEREMANS A WILKEN P (ed) The Oxford companion to consciousness Oxford UK Oxford University Press 2009 p 39-42 BUSNEL R G Symbiotic relationship between man and dolphins Transactions of the New York Academy of Sciences v 35 n 2 Series II p 112-131 1973 BUTTI C et al Total number and volume of Von Economo neurons in the cerebral cortex of cetaceans Journal of Comparative Neurology v 515 n 2 p 243-259 2009 BYRNE R A KUBA M GRIEBEL U Lateral asymmetry of eye use in Octopus vulgaris Animal Behaviour v 64 n 3 p 461-468 2002 BYRNE R W BATES L MOSS C J Elephant cognition in primate perspective Comparative Cognition amp Behavior Reviews v 4 p 65-79 2009 CALDEROacuteN A Umbrales de la filosofia cuatro introducciones tomistas Mendoza Ediccedilatildeo do autor 2011 519 p CALL J BRAumlUER J KAMINSKI J TOMASELLO M Domestic dogs (Canis familiaris) are sensitive to the attentional state Journal of Comparative Psychology v 117 n 3 p 257-263 2003

200

CAMMAERTS TRICOT M C CAMMAERTS R Are ants (Hymenoptera Formicidae) capable of self recognition Journal of Science v 5 n 7 p 521-532 2015 CAMPAN R Histoire de LEacutethologie repeacuteres chronologiques In ENCYCLOPAEDIA Universalis Toulouse [s n] [2018] Disponiacutevel em httpswwwuniversalisfr encyclopediehistoire-de-l-ethologie-reperes-chronologiques Acesso em 15 jan 2019 CARVALHO NETO M B MAYER P C M Skinner e a assimetria entre reforccedilamento e puniccedilatildeo Acta Comportamentalia Guadalajara v 19 n 4 2011 CHALMERS D J La mente consciente em busca de una teoriacutea fundamental Barcelona Gedisa Editorial 1999 CHERNISS C Intelligence Emotional In SPIELBERGER C (ed) Encyclopedia Of aplied psychology Amsterdan [s n] 2004 p 321-328 COLBERT-WHITE E N et al Can dogs use vocal intonation as a social referencing cue in an object choice task Animal Cognition v 21 n 2 p 253-265 2018 COLLEacute G La Meacutetaphysique ndash Livre Ier ndash Traduction et Commentaire Collection Traductions et Eacutetudes Institut Supeacuterieur de Philosophie de lrsquoUniversiteacute de Louvain 1912 171 (38) (vi) p COLLETT M CHITTKA L COLLETT T S Spatial memory in insect navigation Current Biology v 23 n 17 R789-R800 2013 COLLETT T S GRAHAM P Insect navigation do honeybees learn to follow highways Current Biology v 25 n 6 R240-R242 2015 CONSCIEcircNCIA In Dicionaacuterio Online Caldas Aulete Rio de Janeiro Lexikon Editora Digital 2008 Disponiacutevel em wwwauletecombr Acesso em 10 ago 2017 CONSCIEcircNCIA In Dicionaacuterio Priberam da Liacutengua Portuguesa Lisboa Priberam Informaacutetica 1998 Disponiacutevel em httpswwwpriberamptdlpo Acesso em 10 ago 2017 COREN S The Intelligence of Dogs a guide to the thoughts emotions and inner lives of our canine companions New York Free Press 2006 301 (xiii) p COTTINGHAM J ldquoA brute to the brutesrdquo Descartes treatment of animals Philosophy v 53 n 206 p 551-559 1978 COWAN R B Short-term memory for behavior in the bottlenosed dolphin (Tursiops truncatus) 2003 Dissertaccedilatildeo (Mestrado) ndash University of Hawaii Honolulu 2003 DALE R PLOTNIK J M Elephants know when their bodies are obstacles to success in a novel transfer task Scientific Reports 7 2017

201

DAMAacuteSIO A Sentir lo que sucede cuerpo y emocioacuten en la faacutebrica de la consciencia Santiago Editorial Andres Bello 2000 414 p DAMAacuteSIO A O misteacuterio da consciecircncia Satildeo Paulo Companhia das Letras 1999 DAMATO M R COLOMBO M Serial learning with wild card items by monkeys (Cebus apella) Implications for knowledge of ordinal position Journal of Comparative Psychology v 103 n 3 p 252 1989 DARWIN C R The descent of man and selection in relation to sex 2 ed London John Murray Albemarle Street 1882 693 (xvi) p DARWIN C R El Origen del Hombre la seleccioacuten natural y la sexual F Sempere Y Cordf Editores Valencia s d a) (aprox 1909) 195 p (a paginaccedilatildeo natildeo eacute original) Disponiacutevel em httpsmedicinaufmeduimages77cElorigendelhombre_POR _CHARLES_DARWINpdf Acesso em 13 set 2018 DARWIN C R La Expresioacuten de las Emociones en el Hombre y em los Animales F Sempere Y Cordf Editores Valencia sd b) v 1 255 p Disponiacutevel em httpfondos digitalesusesmediabooks3247la-expresion-de-las-emociones-en-el-hombre-y-en-los-animalespdf Acesso em set 2018 DEACON T W The symbolic species the co-evolution of language and the brain New York W W Norton amp Company 1997 527 p DE LIBERA A Intellectus In CASSIN B Dictionary of untranslatables a philosophical lexicon Princeton Princeton University Press 2004 1299 p DE MOURA NEVES M H A teoria linguiacutestica em Aristoacuteteles Alfa Marilia v 25 p 57-67 1981 DEWSBURY D A John B Watsonrsquos early work and comparative psychology Revista Mexicana de Anaacutelisis de la Conducta v 39 n 2 2013 DOUGLAS-HAMILTON I HILLMAN A K K Elephant carcasses and skeletons as indicators of population trends In GRIMSDELL JJR WESTLEY S Low level aerial survey techniques Nairobi ILCA 1981 p 113-129 (Monograph 4) DOUGLAS-HAMILTON I BHALLA S WITTEMYER G VOLLRATH F Behavioural reactions of elephants towards a dying and deceased matriarch Aplied Animal Behaviour Science v 100 n 1-2 p 87-102 2006 DWECK C S LEGGETT E L A social-cognitive aproach to motivation and personality Psychological Review v 95 n 2 p 256-273 1988 DYER F C Spatial cognition and navigation in insects In REAL L Behavioral mechanisms in evolutionary ecology Chicago University of Chicago Press 1994 p 66-98 471 p

202

ECHAVARRIacuteA M La Praacutexis de la Psicologia y sus niveles epistemoloacutegicos seguacuten Santo Tomaacutes de Aquino Argentina Editorial UCALP 2009

EIBL‐EIBESFELDT I Uumlber den Werkzeuggebrauch des Spechtfinken Camarhynchus pallidus (Sclater und Salvin) Ergebnisse der Galapagos‐Expedition des internationalen Institutes fuumlr submarine Forschung Vaduz (Liechtenstein) Zeitschrift fuumlr Tierpsychologie v 18 n 3 p 343-346 1961 EMERY N J Cognitive ornithology the evolution of avian intelligence Philosophical Transactions of the Royal Society of London B Biological Sciences v 361 n 1465 p 23-43 2006 EMERY N J CLAYTON N S The mentality of crows convergent evolution of intelligence in corvids and apes Science v 306 n 5703 p 1903-1907 2004 FAGOT J MAUGARD A Analogical reasoning in baboons (Papio papio) flexible reencoding of the source relation depending on the target relation Learning amp Behavior v 41 n 3 p 229-237 2013 FEUERBACHER E N A history of dogs as subjects in north american experimental psychological research Cognition and Behavior Review University of Florida and Kyung Hee University v 6 p 46-71 2011 FEUERBACHER E N ROSALES-RUIZ J Can dogs learn concepts the same way we do Concept formation in a German Shepherd International Journey of Comparative Psychology 30 p 1-25 2017 FIORITO G VON PLANTA C SCOTTO P Problem solving ability of Octopus vulgaris Lamarck (Mollusca Cephalopoda) Behavioral and Neural Biology v 53 n 2 p 217-230 1990 FIORITO G SCOTTO P Observational learning in Octopus vulgaris Science v 256 n 5056 p 545-547 1992 FOERDER P et al Insightful problem solving in an Asian elephant PloS one v 6 n 8 p e23251 2011 GALLEGOS W L A Teoriacutea de la inteligencia una aproximacioacuten neuropsicoloacutegica desde el punto de vista de Lev Vigotsky Cuadernos de Neuropsicologiacutea v 7 n 1 p 22-37 2013 GALLUP JR G G Chimpanzees self-recognition Science New Series v 167 n 3914 p 86-87 1970 GALLUP JR G G Self-recognition in primates American Psychologist 32 p 329-338 1977 GARDNER R A GARDNER B T Teaching sign language to a chimpanzee Science v 165 n 3894 p 664-672 1969

203

GEORGE M I Thomas Aquinas Meets Nim Chimpsky On the debate about human nature and the nature of other animals The Aquinas Review v 10 p 1-50 2003 GIGNAC G E BATES T C Brain volume and intelligence The moderating role of intelligence measurement quality Intelligence v 64 p 18-29 2017 GILLAN D J PREMACK D WOODRUFF G Reasoning in the chimpanzee I Analogical reasoning Journal of Experimental Psychology Animal Behavior Processes v 7 n 1 p 1 1981 GIRNDT A MEIER T CALL J Task constraints mask great apes ability to solve the trap-table task Journal of Experimental Psychology Animal Behavior Processes v 34 n 1 p 54 2008 GOTTFREDSON L Mainstream Science on Intelligence an editorial with 52 signatories history and bibliography Intelligence Norwood v 24 n 1 spec p 13-23 1997 GRASSMANN S KAMINSKI J TOMASELLO M How two word-trained dogs integrate pointing and naming Animal Cognition v 15 n 4 p 657-665 2012 GRENE M Aristotle and modern biology Journal of the History of Ideas v 33 n 3 p 395-424 1972 GRIFFIN D R Animal minds Chicago University of Chicago Press 1994 310 (x) p HAKEEM A Y et al Von Economo neurons in the elephant brain The Anatomical Record Advances in Integrative Anatomy and Evolutionary Biology v 292 n 2 p 242-248 2009 HAMPTON R R Rhesus monkeys know when they remember Proceedings of the National Academy of Sciences v 98 n 9 p 5359-5362 2001 HARE B et al The domestication hypothesis for dogs skills with human communication a response to Udell et al(2008) and Wynne et al(2008) Animal Behaviour 79 p e1-e6 2010 HARE B TOMASELLO M Human-like social skills in dogs Trends in Cognitive Sciences v 9 n 9 p 439-444 2005 HARE B Domestic dogs use humans as tools In BEKOFF M (ed) Encyclopedia of animal behaviour Connecticut Greenwood Press 2004 v 1 p 277-285 HARE B BROWN M WILLIAMSON C TOMASELLO M The domestication of social cognition in dogs Science v 298 n 5598 p 1634-1636 2002 HART B L HART L A PINTER-WOLLMAN N Large brains and cognition Where do elephants fit in Neuroscience and Biobehavioral Reviews v 32 n 1 p 86-98 2008

204

HART L A The Asian elephants-driver partnership the drivers perspective Aplied Animal Behaviour Science v 40 n 3 p 297-312 1994 HEANEY M GRAY R D TAYLOR A H Keas perform similarly to chimpanzees and elephants when solving collaborative tasks PloS one v 12 n 2 p e0169799 2017 HEDWIG D et al Acoustic structure and variation in mountain and western gorilla close calls a syntactic aproach Behaviour v 151 n 8 p 1091-1120 2014 HERMAN L M RICHARDS D G WOLZ J P Comprehension of sentences by bottlenosed dolphins Cognition v 16 n 2 p 129-219 1984 HERMAN L M FORESTELL P H Reporting presence or absence of named objects by a language-trained dolphin Neuroscience amp Biobehavioral Reviews v 9 n 4 p 667-681 1985 HERMAN L M Cognition and language competencies of bottlenosed dolphins In SCHUSTERMAN R J THOMAS J WOOD F G (ed) Dolphin cognition and behavior a comparative aproach Hillsdale NJ Lawrence Erlbaum Associates 1986 p 221-251 HERMAN L M MORREL-SAMUELS P PACK A A Bottlenosed dolphin and human recognition of veridical and degraded video displays of an artificial gestural language Journal of Experimental Psychology General v 119 n 2 p 215-230 1990 HERMAN L M KUCZAJ S III HOLDER M D Responses to anomalous gestural sequences by a language-trained dolphin Evidence for processing of semantic relations and syntactic information Journal of Experimental Psychology General v 122 n 2 p 184-194 1993a HERMAN L M PACK A A MORREL-SAMUELS P Representational and conceptual skills of dolphins In ROITBLAT H R HERMAN L M NACHTIGALL P (ed) Language and communication comparative perspectives Hillside NJ Lawrence Erlbaum 1993b p 273-298 HERMAN L M et al Dolphins (Tursiops truncatus) comprehend the referential character of the human pointing gesture Journal of Comparative Psychology v 113 n 4 p 1-18 1999 HERMAN L et al The bottlenosed dolphinrsquos (Tursiops truncatus) understanding of gestures as symbolic representations of its body parts Animal Learning and Behavior v 29 n 3 p 250-264 2001 HERMAN L M Vocal social and self-imitation by bottlenosed dolphins In NEHANIV C DAUTENHAHN K (ed) Imitation in animals and artifacts Cambridge MA MIT Press 2002 p 63-108

205

HERMAN L M Intelligence and rational behaviour in the bottlenosed dolphin In HURLEY S NUDDS M (ed) Rational Animals Oxford Oxford University Press 2006 p 439-467 HERMAN L M Body and self in dolphins Consciousness and Cognition v 21 n 1 p 526-545 2012 HIRATA S WATANABE K MASAO K ldquoSweet-potato washingrdquo revisited In Primate origins of human cognition and behavior Tokyo Springer 2008 p 487-508 HOFFMAN T Conscience and Synderesis In DAVIES B STUMP E (ed) The Oxford Handbook of Aquinas Oxford Oxford University Press 2012 p 255-264 HUME D Investigaccedilatildeo acerca do entendimento humano [S l] Ed Acroacutepolis 2001 [1748] Versatildeo para e-book de eBooksBrasil 2006 252 p HUNT G R GRAY R D Diversification and cumulative evolution in New Caledonian crow tool manufacture Proceedings of the Royal Society of London B Biological Sciences v 270 n 1517 p 867-874 2003 INFORMACcedilAtildeO In Dicionaacuterio online Caldas Aulete Rio de Janeiro Lexikon Editora Digital 2008 Disponiacutevel em wwwauletecombr Acesso em 10 ago 2017 INFORMACcedilAtildeO In Dicionaacuterio Priberam da Liacutengua Portuguesa Lisboa Priberam Informaacutetica 1998 Disponiacutevel em httpswwwpriberamptdlpo Acesso em 10 ago 2017 INFORMAR In Dicionaacuterio Online Caldas Aulete Lexikon editora digital Rio de Janeiro 2008 Disponiacutevel em wwwauletecombr Acesso em 10 ago 2017 INFORMAR In Dicionaacuterio Priberam da Liacutengua Portuguesa Lisboa Priberam Informaacutetica 1998 Disponiacutevel em httpswwwpriberamptdlpo Acesso em 10 ago 2017 INOUE S MATSUZAWA T Working memory of numerals in chimpanzees Current Biology v 17 n 23 p R1004-R1005 2007 INTELIGEcircNCIA In Dicionaacuterio Online Caldas Aulete Rio de Janeiro Lexikon Editora Digital 2008 Disponiacutevel em wwwauletecombr Acesso em 10 ago 2017 INTELIGEcircNCIA In Dicionaacuterio Priberam da Liacutengua Portuguesa Lisboa Priberam Informaacutetica 1998 Disponiacutevel em httpswwwpriberamptdlpo Acesso em 10 ago 2017 IRIE-SUGIMOTO N et al Evidence of meansndashend behavior in Asian elephants (Elephas maximus) Animal Cognition v 11 n 2 p 359-365 2008 IRIE-SUGIMOTO N KOBAYASHI T SATO T HASEGAWA T Relative quantity judgment by Asian elephants (Elephas maximus) Animal Cognition v 12 n 1 p 193-199 2009

206

IRIE N HASEGAWA T Elephant psychology what we know and what we would like to know Japanese Psychological Research v 51 n 3 p 177-181 2009 ISERBYT C T The Deliberate Dumbing Down of America 2 ed Ohio Conscience Press 2000 709 (xxvii) p JACOBS B et al Neuronal morphology in the African elephant (Loxodonta africana) neocortex Brain Structure and Function v 215 n 3-4 p 273-298 2011 JACOBS M S MCFARLAND W L MORGANE P J The anatomy of the brain of the bottlenose dolphin (Tursiops truncatus) Rhinic lobe (rhinencephalon) the archicortex Brain Research Bulletin v 4 p 1-108 1979 JELBERT S A et al Using the Aesops fable paradigm to investigate causal understanding of water displacement by New Caledonian crows PloS one v 9 n 3 p e92895 2014 JELBERT S A HOSKING R J TAYLOR A H GRAY R D Mental template matching is a potential cultural transmission mechanism for New Caledonian crow tool manufacturing traditions Scientific Reports v 8 n 1 p 8956 2018 JERISON H Evolution of the Brain and Intelligence New York Academic Press 1973 482 (xiv) p JOHNSON‐LAIRD P N Mental models in cognitive science Cognitive Science v 4 n 1 p 71-115 1980 JOHNSON-LAIRD Philip N Mental models and cognitive change Journal of Cognitive Psychology v 25 n 2 p 131-138 2013 JOHNSTON A M HOLDEN P C SANTOS L R Exploring the evolutionary

origins of overimitation a comparison across domesticated and non‐domesticated canids Developmental Science v 20 n 4 p e12460 2017 JOumlRGENSEN S Empathy altruism and the African elephant Monografia apresentada no Veterinaumlrprogrammet [Programa de Veterinaacuteria] do Institutionen foumlr biomedicin och veterinaumlr folkhaumllsovetenskap [Departamento de Biomedicina e Ciecircncias da Sauacutede Veterinaacuteria] da Sveriges lantbruksuniversitet 2015 KAMINSKI J CALL J FISCHER J Word Learning in a domestic dog evidence for fast maping Science v 304 p 1682-1683 2004 KAMINSKI J FISCHER J CALL J Prospective object search in dogs mixed evidence for knowledge of what and where Animal Cognition v 11 n 2 p 367-371 2008 KAWAI N MATSUZAWA T Numerical memory span in a chimpanze Nature v 403 p 6765 2000a

207

KAWAI N MATSUZAWA T A conventional aproach to chimpanzee cognition Response to MD Hauser (2000) Trends in cognitive sciences v 4 n 4 p 128-129 2000b KELLOGG W N KELLOGG L A The ape and the child a study of environmental influence upon early behavior Facsimile da ediccedilatildeo de McGraw-Hill Book Company Inc (1933) Hafner Publishing Company Inc New York 1967 341 (xv) p KENNEDY E H FRAGASZY D M Analogical reasoning in a capuchin monkey (Cebus apella) Journal of Comparative Psychology v 122 n 2 p 167 2008 KENNY A Aquinas on Mind Topics in Medieval Philosophy Routledge Londres 1994 182 (viii) p KOumlHLER W The mentality of apes 2 ed reimp 1931 New York Kegan Paul Trench Trubner amp Co 1927 336 (viii) p KOPS A M et al Characterizing the socially transmitted foraging tactic ldquospongingrdquo by bottlenose dolphins (Tursiops sp) in the western gulf of Shark Bay Western Australia Marine Mammal Science v 30 n 3 p 847-863 2014 KORNELL N Where is the ldquometardquo in animal metacognition Journal of Comparative Psychology v 128 n 2 p 143 2014 KOVAacuteCS Aacute MATHER J A Cephalopod cognition scholastic psychology Res Cogitans v 1 n 5 p 23-38 2008 KRUumlTZEN M et al Cultural transmission of tool use by Indo-Pacific bottlenose dolphins (Tursiops sp) provides access to a novel foraging niche Proceedings of the Royal Society of London B Biological Sciences v 281 n 1784 p 20140374 2014 KUKEKOVA A V et al The genetics of domesticated behavior in canids What can dogs and silver foxes tell us about each other Cold Spring Harbor Monograph Series v 44 p 515 2006 LAKATOS G DOacuteKA A MIKLOacuteSI Aacute The role of visual cues in the comprehension of the human pointing signals in dogs International Journal of Comparative Psychology v 20 n 4 p 341-350 2007 LAKSHMINARAYANAN V SANTOS L R The Evolution of Our Preferences Insights from Non-human Primates In DOLAN R SHAROT T Neuroscience of Preference and Choice [S l] Academic Press 2011 p 75-91 LALANDE A Vocabulaire technique et critique de la philosophie - Vol I A-M 4 ed [S l] Societeacute Franccedilaise de Philosophie 1932 499 (xviii) p LALANDE A Vocabulaire technique et critique de la philosophie - Vol II N-Z 4 ed [S l] QuadrigePUF Societeacute Franccedilaise de Philosophie 1997 665 p LE COADIC Y F A Ciecircncia da Informaccedilatildeo Brasiacutelia Briquet de Lemos 1996

208

LEFEBVRE L READER S M SOL D Brains innovations and evolution in birds and primates Brain Behavior and Evolution v 63 n 4 p 233-246 2004 LEWIS C S Studies in words 2 ed Cambridge Cambridge University Press 1967 343 p LIVINGSTONE M S SRIHASAM K MOROCZ I A The benefit of symbols monkeys show linear human-like accuracy when using symbols to represent scalar value Animal Cognition v 13 n 5 p 711-719 2010 LIT L SCHWEITZER J B OBERBAUER A M Handler beliefs affect scent detection dog outcomes Animal Cognition v 14 n 3 p 387-394 2011 LLOYD C M Animal life and intelligence London Stanford University Library 1891 512 (xvi) p LOCKE J Ensaio sobre o entendimento humano livro II 27 da identidade e da diversidade Skeacutepsis v 8 n 12 p 169-188 2015 LOCKE P Explorations in Ethnoelephantology Social Historical and Ecological Intersections between Asian Elephants and Humans Environment and Society Advances in Research v 4 n 1 p 79-97 2013 LUNCZ L V MUNDRY R BOESCH C Evidence for cultural differences between neighboring chimpanzee communities Current Biology v 22 n 10 p 922-926 2012 LUNCZ L V BOESCH C Tradition over trend Neighboring chimpanzee communities maintain differences in cultural behavior despite frequent immigration of adult females American Journal of Primatology v 76 n 7 p 649-657 2014 LUNCZ L V BOESCH LUNCZ C LYDIA V The extent of cultural variation between adjacent chimpanzee (Pan troglodytes verus) communities A microecological aproach American Journal of Physical Anthropology v 156 n 1 p 67-75 2015 MACINTYRE A Dependent rational animals why human beings need the virtues Chicago Open Court 2002 MACKINTOSH N Inteligecircncia em evoluccedilatildeo In KHALFA J (org) ROUANET L P (trad) A natureza da inteligecircncia uma visatildeo interdisciplinar [Satildeo Paulo] Ed UNESP 1997 p 33-54 MARTIN-ORDAS G CALL J COLMENARES F Tubes tables and traps great apes solve two functionally equivalent trap tasks but show no evidence of transfer across tasks Animal Cognition v 11 n 3 p 423-430 2008 MARKOWITZ H SCHMIDT M NADAL L SQUIER L Do elephants ever forget Journal of Aplied Behavior Analysis v 8 n 3 p 333-335 1975

209

MATHER J A Cephalopod consciousness behavioural evidence Consciousness and Cognition v 17 n 1 p 37-48 2008 MATHER J A DICKEL L Cephalopod complex cognition Current Opinion in Behavioral Sciences v 16 p 131-137 2017 MATURANA H VARELA F A aacutervore do conhecimento As bases bioloacutegicas do entendimento humano Campinas Editorial Psy 1995 281 p MAYR E The growth of biological thought diversity evolution and inheritance 11 ed London The Belknap Press 2000 974 (xvi) p MCCOMB K et al Leadership in elephants the adaptive value of age Proceedings of the Royal Society of London B Biological Sciences p rspb20110168 2011 MCCOMB K et al Long-distance communication of acoustic cues to social identity in African elephants Animal Behaviour v 65 n 2 p 317-329 2003 MCCOMB K BAKER L MOSS C African elephants show high levels of interest in the skulls and ivory of their own species Biology Letters v 2 n 1 p 26-28 2006 MENZEL R et al Honey bees navigate according to a map-like spatial memory Proceedings of the National Academy of Sciences v 102 n 8 p 3040-3045 2005 MERCADO III E et al Memory for recent actions in the bottlenosed dolphin (Tursiops truncatus) Repetition of arbitrary behaviors using an abstract rule Animal Learning amp Behavior v 26 n 2 p 210-218 1998 MERCADO III E UYEYAMA R K PACK A A HERMAN L M Memory for action events in the bottlenosed dolphin Animal Cognition v 2 n 1 p 17-25 1999 MILES H The cognitive foundations for reference in a signing orangutan In PARKER S T GIBSON K R (ed) ldquoLanguagerdquo and intelligence in monkeys and apes comparative developmental perspectives [Cambridge] Cambridge University Press 1990 p 511-539 MIRBAZEL S K ARJMANDI M Dogsrsquo Nature for Learning Human Languages Journal of Aplied Linguistics and Language Research v 5 n 3 p 247-255 2018 MORGANE P J JACOBS M S MCFARLAND W L The anatomy of the brain of the bottlenose dolphin (Tursiops truncatus) Surface configurations of the telencephalon of the bottlenose dolphin with comparative anatomical observations in four other cetacean species Brain Research Bulletin v 5 n 3 p 1-107 1980 MORRIS D Can jumbo elephants really paint Intrigued by stories naturalist Desmond Morris set out to find the truth Daily Mail Science amp Tech Kensington 22 feb 2009 Disponiacutevel em httpswwwdailymailcouksciencetecharticle-1151283Can-jumbo-elephants-really-paint--Intrigued-stories-naturalist-Desmond-Morris-set-truthhtmlixzz4uUGLEQ2X Acesso em 15 jul 2018

210

MUumlLLER C A et al Dogs learn to solve the suport problem based on perceptual cues Animal Cognition v 17 n 5 p 1071-1080 2014 MUSZALSKI H El objeto formal de la vis cogitativa en Santo Tomaacutes de Aquino Sapientia v 70 fasc 235 2014 NAKAGAKI T KOBAYASHI R NISHIURA Y UEDA T Obtaining multiple separate food sources behavioural intelligence in the Physarum plasmodium Proceedings of the Royal Society of London B Biological Sciences v 271 n 1554 p 2305-2310 2004 NEIL D T Cooperative fishing interactions between Aboriginal Australians and dolphins in eastern Australia Anthrozooumls v 15 n 1 p 3-18 2002 NEISSER U et al Intelligence Knows and Unknows American Psychologist v 51 n 2 p 77-101 1996 NISSANI M Do asian elephants (Elephas maximus) aply causal reasoning to tool-use tasks Journal of Experimental Psychology Animal Behavior Processes v 32 n 1 p 91-96 2006 OSTOJIĆ L CLAYTON N S Behavioural coordination of dogs in a cooperative problem-solving task with a conspecific and a human partner Animal Cognition v 17 n 2 p 445-459 2014 PAL H R PAL A TOURANI P Theories of intelligence Everymanrsquos Science v 39 n 3 p 181-192 2004 PATTERSON F LINDEN E The education of Koko New York The Gorilla Foundation 1981 162 p Disponiacutevel em httpwwwkokoorgsitesdefaultfiles rootpdfsteok_bookpdf Acesso em 20 mar 2017 PAVLOV I P Conditioned reflexes an investigation of physiological activity of the cerebral cortex [S l] Oxford University Press 1927 430 (xv) p PAVLOV I P Textos Escolhidos In MORENO R UFLAKER H A ANDREOLI E O M (trad) Pavlov ndash Skinner 2 ed Satildeo Paulo Abril Cultural 1984 402 (x) p (Coleccedilatildeo Os Pensadores) PENSAMENTO In Dicionaacuterio Online Caldas Aulete Rio de Janeiro Lexikon Editora Digital 2008 Disponiacutevel em wwwauletecombr Acesso em 10 ago 2017 PENSAMENTO In Dicionaacuterio Priberam da Liacutengua Portuguesa Lisboa Priberam Informaacutetica 1998 Disponiacutevel em httpswwwpriberamptdlpo Acesso em 10 ago 2017 PENSAR In Dicionaacuterio Online Caldas Aulete Rio de Janeiro Lexikon Editora Digital 2008 Disponiacutevel em wwwauletecombr Acesso em 10 ago 2017

211

PENSAR In Dicionaacuterio Priberam da Liacutengua Portuguesa Lisboa Priberam Informaacutetica 1998 Disponiacutevel em httpswwwpriberamptdlpo Acesso em 10 ago 2017 PEPERBERG I M Further evidence for addition and numerical competence by a Grey parrot (Psittacus erithacus) Animal Cognition v 15 n 4 p 711-717 2012 PEPERBERG I M Grey parrot numerical competence a review Animal Cognition v 9 n 4 p 377-391 2006 PEPERBERG I M Grey parrots do not always ldquoparrotrdquo the roles of imitation and phonological awareness in the creation of new labels from existing vocalizations Language Sciences v 29 n 1 p 1-13 2007 PERDUE B M TALBOT C F STONE A M BERAN M J Putting the elephant back in the herd elephant relative quantity judgments match those of other species Animal Cognition v 15 n 5 p 955-961 2012 PEREIRA JUacuteNIOR G O ocmentaacuterio de Tomaacutes de Aquino ao livro I do De Anima de Aristoacuteteles ndash Capiacutetulos 1-4 Dissertaccedilatildeo (Mestrado) ndash Instituto de Filosofia e Ciecircncias Humanas Universidade Estadual de Campinas Campinas 2006 PETRAZZINI M E M WYNNE C D What counts for dogs (Canis lupus familiaris) in a quantity discrimination task Behavioural processes v 122 p 90-97 2016 PFUNGST O Clever Hans (The Hors of Mr Von Osten) A contribution to experimental animal and human psychology New York Henry Holt and Company 1911 279 (viii) p PHILLIPS W SANTOS L R Evidence for kind representations in the absence of language Experiments with rhesus monkeys (Macaca mulatta) Cognition v 102 n 3 p 455-463 2007 PIAGET J Psicologia de la Inteligencia Buenos Aires Editorial Psique 1972 231 p PIANIGIANI O Vocabolario etimologico dela lingua italiana ndash vol I A-L Roma Societagrave Editrice Dante Alighieri 1907 789 p PIKA S LIEBAL K CALL J TOMASELLO M Gestural communication of apes Gesture v 5 n 1 p 41-56 2005 PILLEY J W REID A K Border collie comprehends object names as verbal referents Behavioural Processes v 86 n 2 p 184-195 2011 PILLEY J W Border collie comprehends sentences containing a prepositional object verb and direct object Learning and Motivation v 44 n 4 p 229-240 2013 PLOTNIK J M LAIR R SUPHACHOKSAHAKUN W DE WAAL F B Elephants know when they need a helping trunk in a cooperative task Proceedings of the National Academy of Sciences v 108 n 12 p 5116-5121 2011

212

PLOTNIK J M DE WAAL F B Asian elephants (Elephas maximus) reassure others in distress PeerJ v 2 p e278 2014 PLOTNIK J M DE WAAL F B M REISS D Self-recognition in a Asian elephant Proceedings of the National Academy of Sciences v 103 n 45 p 17053-17057 2006 POPER K R A loacutegica da pesquisa cientiacutefica 9 ed [S l] Ed Cultrix 2001 567 p PREMACK D WOODRUFF G Does the chimpanzee have a theory of mind Behavioral and Brain Sciences v 1 n 4 p 515-526 1978 PRIOR H SCHWARZ A GUumlNTUumlRKUumlN O Mirror-induced behavior in the magpie (Pica pica) evidence of self-recognition PLoS Biology v 6 n 8 p e202 2008 PROOPS L GROUNDS K SMITH A V MCCOMB K Current biology v 28 n 9 p 1428-1432 e4 2018 QUINE W V O Word and object [Massachusetts] The Massachusetts Institute of Technology 1960 296 (xvi) p RAFFAELE P Speaking bonobo Smithsonian Magazine v 37 p 74 2006 REALE G Metafiacutesica (Aristoacuteteles) sumaacuterio e comentaacuterios 2 ed Satildeo Paulo Ed Loyola 2005 v 3 754 (xiv) p REALE G ANTISERI D Histoacuteria da filosofia ndash Vol 1 Filosofia antiga e pagatilde 3 ed Satildeo Paulo Ed Paulus 2003 385 (xix) p REALE G ANTISERI D Histoacuteria da filosofia ndash Vol 2 Patriacutestica e escolaacutestica 2 ed Satildeo Paulo Ed Paulus 2005 335 (xvi) p REISS D MARINO L Mirror self-recognition in the bottlenose dolphIn A case of cognitive convergence Proceedings of the National Academy of Sciences v 98 n 10 p 5937-5942 2001 RENSCH B Increase of learning capability with increase of brain-size The American Naturalist v 90 n 851 p 81-95 1956 RENSCH B The intelligence of elephants Scientific American v 196 n 2 p 44-49 1957 ROELOFS Y C Tool use in birds an overview of reported cases ontogeny and underlying cognitive abilities 2010 Tese (Doutorado em Biologia Comportamental) ndash Biological Centre da University of Groningen Groningen 2010 ROMANES G Animal intelligence London Kegan Paul Tranch 1882 520 (xiv) p ROSATI A G SANTOS L R Spontaneous metacognition in rhesus monkeys Psychological Science v 27 n 9 p 1181-1191 2016

213

ROTH G DICKE U Evolution of the brain and intelligence Trends in Cognitive Sciences v 9 n 5 p 250-257 2005 SALOVEY P MAYER J D Emotional intelligence Imagination Cognition and Personality v 9 n 3 p 185-211 1990 SANTOS L R et al Means-means-end tool choice in cotton-top tamarins (Saguinus oedipus) finding the limits on primatesrsquo knowledge of tools Animal Cognition v 8 n 4 p 236-246 2005 SAVAGE-RUMBAUGH S et al Spontaneous symbol acquisition and communicative use by pygmy chimpanzees (Pan paniscus) Journal of Experimental Psychology General v 115 n 3 p 211 1986 SAVAGE-RUMBAUGH E S RUMBAUGH D M BOYSEN S Symbolic communication between two chimpanzees (Pan troglodytes) Science v 201 n 4356 p 641-644 1978 SAVAGE-RUMBAUGH E S et al Language comprehension in ape and child Monographs of the Society for Research in Child Development p i-252 1993 SAVOLAINEN P et al Genetic evidence for an East Asian origin of domestic dogs Science v 298 n 5598 p 1610-1613 2002 SCARF D HAYNE H COLOMBO M Pigeons on par with primates in numerical competence Science v 334 n 6063 p 1664-1664 2011 SCHAIE K W Primary mental abilities In CRAIGHEAD W E NEMEROFF C B (eds) The concise corsini encyclopedia of psychology and behavioral science 3 ed Hoboken NJ Wiley 2004 1112 (viii) p SEARLE J El Redescubrimiento de la Mente Barcelona Ed Criacutetica 1996 269 p SHETTLEWORTH J S Cognition evolution and behavior 2 ed New York Oxford University Press 2010 700 (XIII) p SHOSHANI J KUPSKY W J MARCHANT G H Elephant brain part i gross morphology functions comparative anatomy and evolution Brain Research Bulletin v 70 n 2 p 124-157 2006 SILVA J A Inteligecircncia humana abordagens bioloacutegicas e cognitivas Satildeo Paulo Lovise 2003 247 (xvi) p SIMOtildeES-LOPES P C Interaction of coastal populations of Tursiops truncatus (Cetacea Delphinidae) with the mullet artisanal fisheries in Southern Brazil Biotemas v 4 n 2 p 83-94 1991

214

SKINNER B F Two types of conditioned reflex a reply to Konorski and Miller Journal of General Psychology v 16 p 272-279 1937 Disponiacutevel em httpwwwdominiopublicogovbrdownloadtextops000164pdf Acesso em 20 ago 2018 SKINNER B F The behavior of organisms an experimental analysis New York The Century Psychology Series Apleton-Century Crofts Inc 1938 457 (ix) p SKINNER B F Contingences of reinforcement a theoretical analysis New York The Century Psychology Series Apleton-Century-Crofts Inc 1969 311 p Disponiacutevel em wwwbfskinnerorgwp-contentuploads201407CoRpdf Acesso em 11 ago 2018 SMIRNOVA A ZORINA Z OBOZOVA T WASSERMAN E Crows spontaneously exhibit analogical reasoning Current Biology v 25 n 2 p 256-260 2015 SOLTIS J et al A African elephant alarm calls distinguish between threats from humans and bees PLoS One v 9 n 2 p e89403 2014 STERN W The psychological methods of testing intelligence Baltimore Educational Psychology Monographs Warwick amp York 1914 n 13 160 (x) p STERNBERG R Intelligence in Humans In Encyclopedia Of Aplied Psychology USA p 321-328 2004 743 (xii) p STREET S E NAVARRETE A F READER S M LALAND K N Coevolution of cultural intelligence extended life history sociality and brain size in primates Proceedings of the National Academy of Sciences v 114 n 30 p 7908-7914 2017 SWIFT K N Wild American crows use funerals to learn about danger Tese (Doutorado) ndash The School of Environmental and Forest Sciences Washington University 2015 Disponiacutevel em httpsdigitallibwashingtoneduresearchworks handle177333178 Acesso em 13 set 2018 SZETEI V MIKLOacuteSI Aacute TOPAacuteL J CSAacuteNYI V When dogs seem to lose their nose an investigation on the use of visual and olfactory cues in communicative context between dog and owner Aplied Animal Behaviour Science v 83 n 2 p 141-152 2003 TALLIS R On the Edge of Certainty - Philosophical explorations 10 reimp New York St Martins Press 2010 236 (xvii) p TEBBICH S BSHARY R Cognitive abilities related to tool use in the woodpecker finch Cactospiza pallida Animal Behaviour v 67 n 4 p 689-697 2004 TELES M Mente Humana e Animal as perspectivas de Susanne Langer e Antoacutenio Damaacutesio Philosophica Lisboa v 25 p 147-168 2005

215

TERRACE H S CHEN S NEWMAN A B Serial learning with a wild card by pigeons (Columba livia) Effect of list length Journal of Comparative Psychology v 109 n 2 p 162 1995 THALMANN O et al Complete mitochondrial genomes of ancient canids suggest a European origin of domestic dogs Science v 342 n 6160 p 871-874 2013 THE GORILLA FOUNDATION Disponiacutevel em httpswwwkokoorgkoko-0 Acesso em 10 out 2018 THORNDIKE E L Animal intelligence An experimental study of the associative processes in animals The Psychological Review Monograph Suplements v 2 n 4 p i 1898 THORNDIKE E L Animal intelligence Toronto York University 2007 139 p (Classics in the History of Psychology) Disponiacutevel em httpwwwdominio publicogovbrdownloadtextops000178pdf Acesso em 10 ago 2018 THORNDIKE E L Intelligence and its uses Harpers Magazine 140 p 227-235 1920 TOMAacuteS DE AQUINO Disputed questions on spiritual creatures ndash de spiritualibus creaturis Milwaukee Marquette University Press 1949 187 p TOMAacuteS DE AQUINO Commentary on the Nicomachean ethics Chicago Regnery 1964a 2 v (Library of Living Catholic Thought) Disponiacutevel em httpdhsprioryorg thomasEthicshtm Acesso em 10 mar 2018 TOMAacuteS DE AQUINO Commentary on the metaphysics Chicago Regnery 1964b 2 v (Library of Living Catholic Thought) Disponiacutevel em httpdhsprioryorgthomas Metaphysicshtm Acesso em 25 abr 2017 TOMAacuteS DE AQUINO Questotildees discutidas sobre a verdade In BARAUacuteNA J et al (trad) Santo Tomaacutes de Aquino ndash Dante Satildeo Paulo Nova Cultural 1988 306 p (Coleccedilatildeo Os Pensadores) TOMAacuteS DE AQUINO Suma de Teologia ndash I ndash Introduccioacuten general y parte I 4 ed Madri [s n] 2001 993 (xxxviii) p (Biblioteca de Autores Cristianos) TOMAacuteS DE AQUINO Suma de Teologia ndash III ndash Parte II-II Madri [s n] 1990a 613 (xxvi) p (Biblioteca de Autores Cristianos) TOMAacuteS DE AQUINO Suma de Teologia ndash II ndash Parte I-II 2 ed Madri [s n] 1993 975 (xxxii) p (Biblioteca de Autores Cristianos) TOMAacuteS DE AQUINO Suma Contra os Gentios ndash Volume I Porto Alegre Livraria Sulina 1990b 376 (ix) p

216

TOMAacuteS DE AQUINO Sobre el Principio de Individuacioacuten Cuadernos de Anuario Filosofico Serie Universitaacuteria Universidade de Navarra Pamplona Espanha 1999 105 p TOMAacuteS DE AQUINO Commentaire au traiteacute de lrsquoacircme In THOMAS DrsquoAQUIN Commentaire au traiteacute de lrsquoacircme ndash Aristote Traiteacute de lrsquoacircme Les œuvres complegravetes de saint Thomas dAquin Projet Docteur Angeacutelique Institut Docteur Angeacutelique Eacutedition numeacuterique 2000 Disponiacutevel em httpdocteurangeliquefreefr Acesso em 18 maio 2017 TOMAacuteS DE AQUINO De Principiis Naturae In OS PRINCIacutePIOS da Realidade Natural Porto PT Elementos Sudoeste 2003a TOMAacuteS DE AQUINO De Ente et Essentia In OS PRINCIacutePIOS da Realidade Natural Porto PT Elementos Sudoeste 2003b TOMAacuteS DE AQUINO Sobre os Anjos (De Substantiis Separatis) Rio de Janeiro Ed Seacutetimo Selo 2006 229 (xxiv) p TOMAacuteS DE AQUINO A Unidade do Intelecto contra os averroiacutestas Lisboa Ediccedilotildees 70 2009 205 p TOMAacuteS DE AQUINO Questotildees Disputadas sobre a Alma Satildeo Paulo Eacute Realizaccedilotildees 2012 464 p TOMASELLO M Can an ape understand a sentence A review of language comprehension in ape and child by ES Savage-Rumbaugh et al Language amp Communication v 14 n 4 p 377-390 1994 TOMASELLO M Do young children have adult syntactic competence Cognition v 74 n 3 p 209-253 2000 TOMASELLO M What did we learn from the ape language studies In HARE B YAMAMOTO S Bonobos unique in mind brain and behavior [s n] Oxford University Press 2017 p 95-104 384 p TOMONAGA M MATSUZAWA T ITAKURA S Teaching ordinals to a cardinal-trained chimpanzee Primate Research v 9 n 2 p 67-77 1993 TOMONAGA M MATSUZAWA T Sequential responding to Arabic numerals with wild cards by the chimpanzee (Pan troglodytes) Animal Cognition v 3 n 1 p 1-11 2000 TOURINHO E Z Notas sobre o Behaviorismo de ontem e de hoje Psicologia Reflexatildeo e Criacutetica v 24 n 1 p 186-194 2011 TRUT L N Early canid domestication the farm-fox experiment foxes bred for tamability in a 40-year experiment exhibit remarkable transformations that suggest an interplay between behavioral genetics and development American Scientist v 87 n 2 p 160-169 1999

217

UDELL M A LORD K FEUERBACHER E N WYNNE C D A dogrsquos-eye view of canine cognition In HOROWITZ A Domestic dog cognition and behavior Berlin Springer Science amp Business Media 2014 p 221-240 VAN LOON L C The intelligent behavior of plants Trends in Plant Science v 21 n 4 p 286-294 2016 VAN SCHAIK C Why are some animals so smart Scientific American v 294 n 4 p 64-71 2006 VAN SCHAIK C P PRADHAN G R A model for tool-use traditions in primates implications for the coevolution of culture and cognition Journal of Human Evolution v 44 n 6 p 645-664 2003 VONK J Gorilla (Gorilla gorilla gorilla) and orangutan (Pongo abelii) understanding of first-and second-order relations Animal Cognition v 6 n 2 p 77-86 2003 WANG G-D et al Out of southern East Asia the natural history of domestic dogs across the world Cell Research v 26 n 1 p 21 2016 WECHSLER D Measurement of Adult Intelligence 3 ed Baltimore The Williams amp Wilkins Company 1944 258 (viii) p WEST R E YOUNG R J Do domestic dogs show any evidence of being able to count Animal Cognition v 5 n 3 p 183-186 2002 WHITEHEAD H Sperm whale Physeter macrocephalus In PERRIN W F WUumlRSIG B THEWISSEN J G M (ed) Encyclopedia of Marine Mammals 2 ed [S l] Academic Press 2009 p 1091-1097 WIMPENNY J H et al Cognitive processes associated with sequential tool use in New Caledonian crows PLoS One v 4 n 8 p e6471 2009 WITHEN A et al Cultures in chimpanzees Nature v 399 n 6737 p 682 1999 WITTEMYER G DOUGLAS-HAMILTON I GETZ W M The socioecology of elephants analysis of the processes creating multitiered social structures Animal Behaviour v 69 n 6 p 1357-1371 2005 WITTIG R M BOESCH C ldquoDecision-makingrdquo in conflicts of wild chimpanzees (Pan troglodytes) an extension of the Relational Model Behavioral Ecology and Sociobiology v 54 n 5 p 491-504 2003 WYNN K Addition and subtraction by human infants Nature v 358 n 6389 p 749 1992 XIA L SIEMANN M DELIUS J D Matching of numerical symbols with number of responses by pigeons Animal Cognition v 3 n 1 p 35-43 2000

218

YERKES R M YERKES A W The great apes a study of anthropoid life New Haven Yale University Press 1929 652 (xx) p ZAPPES C A ANDRIOLO A SIMOtildeES-LOPES P C DI BENEDITTO A P M Human-dolphin (Tursiops truncatus Montagu 1821) cooperative fishery and itrsquos influence on cast net fishing activities in Barra de ImbeacuteTramandaiacute Southern Brazil Ocean amp Coastal Management v 54 n 5 p 427-432 2011 ZAPPES C A O golfinho nariz-de-garrafa Tursiops truncatus (Montagu 1821) e a pesca artesanal no Atlacircntico Sul comparaccedilatildeo do conhecimento de pescadores tradicionais 2011 Tese (Doutorado) ndash Universidade Estadual do Norte Fluminense ndash UENF Campos dos Goytacazes 2011 ZIMMERMANN F ZEMKE F CALL J GOacuteMEZ J C Orangutans (Pongo pygmaeus) and bonobos (Pan paniscus) point to inform a human about the location of a tool Animal Cognition v 12 n 2 p 347-358 2009

219

TABELAS

Tabela 1 - Caracteriacutesticas das potecircncias da alma que compotildeem o aparato cognitivo

Potecircncias Animais natildeo humanos Ente humano

Sentidos Externos Sentido Comum Imaginaccedilatildeo Memoacuteria Estimativa Intelecto

Sentem percebem e discriminam seus sensiacuteveis proacuteprios e os comuns que lhes competem Une e julga todos os sensiacuteveis e intenccedilotildees dos sentidos externos Reteacutem e conserva formas sensiacuteveis Conserva e compara as imagens e as espeacutecies intencionais Apreende compotildee e divide e compara imagens e espeacutecies intencionais particulares tem como objeto proacuteprio as quididades particulares Percebe as intenccedilotildees por um instinto natural

Sentem percebem e discriminam seus sensiacuteveis proacuteprios e os comuns que lhes competem Une e julga todos os sensiacuteveis e intenccedilotildees dos sentidos externos Reteacutem e conserva formas sensiacuteveis e compotildee e divide imagens sob refluxo do intelecto Conserva e compara as imagens e as espeacutecies intencionais Reminiscecircncia acessa de modo voluntaacuterio sob refluxo do intelecto as imagens e as espeacutecies conservadas Cogitativa Apreende compotildee e divide e compara imagens e espeacutecies intencionais particulares tem como objeto proacuteprio as quididades particulares Reuacutene as intenccedilotildees particulares percebe as intenccedilotildees por uma comparaccedilatildeo sob refluxo do intelecto Apreende espeacutecies intencionais universais define conhece o verdadeiro e o falso discrimina sabe (discerne e concebe) entende discorre e faz suposiccedilotildees ou seja forma conceituaccedilotildees concepccedilotildees e juiacutezos compondo e dividindo conceitos para formar outros conceitos enuncia silogiza discursa

220

Tabela 2 - Testes e observaccedilotildees relacionados a invertebrados peixes e aves

Habilidades Testes Comportamentos espontacircneos

- Interaccedilotildees comportamentais Interaccedilotildees em geral - Noccedilatildeo de meio e fim e uso de instrumentos - Competecircncia para apreensatildeo de quantidades - Aptidotildees relacionadas agrave comunicaccedilatildeo - Autorreconhecimento

- Polvo teste de associar balatildeo de determinada cor agrave recompensa e outro de outra cor agrave puniccedilatildeo (aprendendo por observaccedilatildeo) - Polvo teste para abrir tampa de frasco para obter recompensa - Tentilhatildeo pica-pau teste de retirada de recompensa de tubos com gravetos inclusive com obstaacuteculo em forma de ldquoHrdquo - Papagaios-da-nova-zelacircndia teste de cooperaccedilatildeo em que dois espeacutecimes precisam puxar cada um uma corda ao mesmo tempo para obterem a recompensa - Papagaio-cinzento teste de contagem e de realizaccedilatildeo de pequenas somas com quantidades especiacuteficas de alimento ou com algarismos exibidos em bandejas -Pombos testes de associaccedilatildeo de siacutembolos com numerosidade contando ateacute nove - Papagaio-cinzento testes em que se verifica vocabulaacuterio pode conhecer com treinamento mais de cem palavras - Formigas teste de reconhecimento diante do espelho

- Peixes fazem vigilacircncia contra predadores pelo bando - Aves algumas ajudam um coespeciacutefico que esteja com deficiecircncia visual - Peixes usam pedras para quebrar conchas - Aves algumas usam pedras para quebrar ovos - lanccedilam alimentos para atrairem peixes e pescarem - usam presas e musgos como esponjas para levar aacutegua para a prole - usam gravetos ou espinhos de cacto para retirar larvas de pequenos orifiacutecios - Abelhas seguem coespeciacuteficos e aprendem rotas - Aves aprendem canto com os pais

221

Tabela 3 - Testes e observaccedilotildees relacionados a Corvidae

Habilidades Testes Comportamentos espontacircneos

- Interaccedilotildees comportamentais Comportamento diante da morte de coespeciacutefico - Teoria da mente e comportamento diante de telas de viacutedeo - Noccedilatildeo de meio e fim e uso de instrumentos - Correlaccedilatildeo de figuras ou sons - Autorreconhecimento

- Teste com recintos interligados por pequeno buraco em que animal em um acelerava estocagem de alimento quando o buraco estava aberto ou quando ouvia gravaccedilatildeo de som de coespeciacutefico com o buraco fechado - Teste com pedras e tubos com aacutegua e recompensa flutuando - Teste com varetas para alcanccedilar a recompensa ou outras varetas para alcanccedilar recompensa - Teste de oito passos com varetas e pedras - Teste de recorte de cartatildeo para inserir em maacutequina - Teste de raciociacutenio analoacutegico com placas e figuras geomeacutetricas - Teste de reconhecimento diante do espelho

- Aproximam-se de mortos para investigar causa da morte de coespeciacutefico - Lanccedilam objetos contra inimigos - Lanccedilam iscas para pesca - Por natildeo ter ecircxito em teste com o objeto alongado para alcanccedilar recompensa animal retornou ao aviaacuterio para pegar graveto e concluir tarefa - Produzem a partir de pequenos ramos instrumentos

222

Tabela 4 - Testes e observaccedilotildees relacionados a Elephantidae

Habilidades Testes Comportamentos espontacircneos

- Interaccedilotildees comportamentais Interaccedilotildees em geral Comportamento diante da morte de coespeciacutefico Respostas a sinais humanos - Teoria da mente e comportamento diante de telas de viacutedeo - Noccedilatildeo de meio e fim e uso de instrumentos - Correlaccedilatildeo de figuras ou sons

- Testes de reconhecimento de gestos humanos e da postura corporal humana que apontam para localizaccedilatildeo de alimento - Teste de acionar interruptor para ganhar recompensa - Teste da escolha de suportes um com alimento e outro sem com variaccedilotildees -Teste de cooperaccedilatildeo em que dois espeacutecimes tecircm de puxar cada um uma corda ao mesmo tempo para obterem a recompensa - Teste em que se utiliza objetos como apoio para alcanccedilar recompensa suspensa -Teste com cartas com padrotildees de imagens e com muacutesica com padrotildees de melodias

- Coalisatildeo proteccedilatildeo dos mais jovens conforto cuidado de filhotes na ausecircncia da matildee resgate auxiacutelio em caso de atolamento remoccedilatildeo de objetos estranhos - Distinccedilatildeo de tipos e niacuteveis de ameaccedila com comportamentos especiacuteficos para cada um - Distinguem e investigam restos mortais de coespeciacuteficos - Visitam por sucessivas vezes um cadaacutever de membro do grupo - Percepccedilatildeo de que o outro se comporta espontaneamente tecircm emoccedilotildees percepccedilotildees crenccedilas e entendimentos que podem ser diferentes - Animal trocou de objeto para tentar alcanccedilar alimento suspenso - Uso de conjuntos de ramos para espantar insetos

223

- Competecircncia para apreensatildeo de quantidades - Aptidotildees relacionadas agrave comunicaccedilatildeo - Autorreconhecimento

- Teste de comparaccedilatildeo de quantidades de alimento em cestas apresentadas simultaneamente e sucessivamente - Comparaccedilatildeo de cartas com quantidades de pontos - Com treinamento podem reconhecer pelo menos cerca de cem comandos verbais - Teste de reconhecimento diante do espelho - Teste com tapete para perceber que peso do proacuteprio corpo impede a realizaccedilatildeo de tarefa

224

Tabela 5 - Testes e observaccedilotildees relacionados a Carnivora ndash Canis lupus familiaris

Habilidades Testes Comportamento espontacircneo

Interaccedilotildees comportamentais - Respostas a sinais humanos - Noccedilatildeo de meio e fim e uso de instrumentos Planejamento - Imitaccedilatildeo e sincronia - Competecircncia para apreensatildeo de quantidades - Aptidotildees relacionadas agrave comunicaccedilatildeo

- Testes em geral para encontrar alimentos pelos quais respondem ao gesto de apontar agrave expressatildeo corporal a expressotildees faciais e ao estado de atenccedilatildeo a estados emocionais ao tom de voz humanos aleacutem de objetos utilizados para marcaccedilatildeo - Teste da escolha de suportes um com alimento e outro sem com variaccedilotildees - Teste para detectar padratildeo de sobreimitaccedilatildeo com caixa com tampa que pode ser aberta diretamente e alavanca desnecessaacuteria - Teste para verificar se distinguem pratos com maiores quantidades de alimento - Teste para verificar se sabem contar - Testes para pegar objetos apoacutes comando mostra que integram a memoacuteria relacionada agrave identidade com a relacionada agrave localizaccedilatildeo e assumem a correferecircncia do comando de voz com o gesto de apontar dos humanos - Mediante treinamento podem reconhecer mais de mil objetos pelo nome - Reconhecem categorias de objetos

Planejam como tratam presas ou objetos para transportaacute-los

225

Tabela 6 - Testes e observaccedilotildees relacionados a Cetaceae - Delphinidae

Habilidades Testes Comportamentos espontacircneos

- Interaccedilotildees comportamentais Interaccedilotildees gerais Comportamento diante da morte de coespeciacutefico Respostas a sinais humanos - Teoria da mente e comportamento diante de telas de viacutedeo - Noccedilatildeo de meio e fim e uso de instrumentos Planejamento - Imitaccedilatildeo e sincronia

- Testes para verificar se seguem o apontar de dedo a extensatildeo do braccedilo e o olhar humanos - Testes para respostas a sinais humanos por tela de viacutedeo - Testes para respostas a sinais humanos por tela de viacutedeo - Testes com comando ldquotendemrdquo para realizarem movimentos em sincronia - Testes de imitaccedilatildeo de sons emitidos por computador de coespeciacuteficos e de humanos

- Pesca colaborativa - Transmissatildeo cultural - Realizaccedilatildeo espontacircnea de novas combinaccedilotildees de accedilotildees associadas a sinais dos treinadores - possiacutevel demora relacionada ao reconhecimento do estado de morte manifestaccedilatildeo de estresse demora relacionada ao desapego do cadaacutever - Uso de poriacuteferas no focinho para proteccedilatildeo contra corais em forrageamento - Em obediecircncia a comando espeacutecime recolheu objetos na piscina mas de modo espontacircneo os dispocircs pelo corpo desde o que se encontrava mais distante - transporte espontacircneo de objeto para centro da piscina para executar com este comando

226

- Aptidotildees relacionadas agrave comunicaccedilatildeo - Autorreconhecimento

- Testes com comandos verbais para realizar tarefas com objetos em locais especiacuteficos incluindo combinaccedilotildees natildeo previamente treinadas e comando de repeticcedilatildeo aleacutem de uso de generalizaccedilotildees e de sequecircncias semacircntica ou sintaticamente anocircmalas - Teste com dois remos um significando ldquosimrdquo e outro significando ldquonatildeordquo - Teste com comando para criaccedilatildeo de novo movimento - Teste com comandos para lidar com objetos seguidos do comando ateacute entatildeo desconhecido para escolher a proacutexima accedilatildeo - Teste com associaccedilatildeo de siacutembolos (gestos) com partes do corpo mais realizaccedilatildeo de accedilotildees e uso de objetos - Teste de reconhecimento diante do espelho - Teste de reconhecimento de partes corporais com comandos para tocaacute-las em objetos ou realizar outras accedilotildees com este - Teste de imitaccedilatildeo de humanos - Teste com comando para criaccedilatildeo de novo movimento para senso de agecircncia e propriedade - Teste com associaccedilatildeo de siacutembolos (gestos) com partes do corpo mais realizaccedilatildeo de accedilotildees e uso de objetos

Aplicam-se a mais de um propoacutesito

227

Tabela 7 - Testes e observaccedilotildees relacionados a Primates

Habilidades Testes Observaccedilotildees de campo e comportamentos espontacircneos

- Interaccedilotildees comportamentais Interaccedilotildees gerais Comportamento diante da morte de coespeciacutefico

- Teoria da mente e comportamento diante de telas de viacutedeo - Metacogniccedilatildeo - Noccedilatildeo de meio e fim e uso de instrumentos

- Teste para verificar como animais lidam com desigualdade dando melhor recompensa a um que a outro por mesma tarefa - Teste com pessoas (em uma etapa uma por quem o animal tem apreccedilo e outra por quem natildeo tem) em viacutedeos e fotografias simulando depararem com problemas para resoluccedilatildeo destes pelo animal por fotografias - Teste de memoacuteria para metamemoacuteria em que macacos decidem se querem participar de teste para tentar recompensa de que gostam mais ou natildeo participar e ganhar recompensa de que gostam menos - Teste com tubos em ldquoVrdquo em que o experimentador insere alimento em um dos dois tubos sem o animal ver na abertura oposta ao acircngulo formado - Teste para obter alimento puxando-o ou empurrando-o com vareta ou ancinho em uma de duas vias de um aparato com bandeja ou em tubo com armadilha para

- Avaliam se determinado conflito eacute proveitoso e tomam decisatildeo - Transmissatildeo cultural comportamental como no uso de instrumentos - Chamam atenccedilatildeo de outro ente para comunicar-se - Macacos treinados podem enganar os pesquisadores - Possiacuteveis demora relacionada ao reconhecimento do estado de morte manifestaccedilatildeo de estresse demora relacionada ao desapego do cadaacutever - Uso de pedras tacos folhas gravetos etc como instrumentos para coleta de alimentos assepsia defesa etc

228

Planejamento - Correlaccedilatildeo de figuras ou sons - Competecircncia para apreensatildeo de quantidades

perda do alimento - Teste com peccedila plaacutestica associada a pedaccedilo de maccedilatilde ou de coco escondidos a fim de observar se animais individuam objetos - Teste com varas para alcanccedilar alimento diretamente ou encaixando uma vara em outra com ou sem obstaacuteculos - Teste com caixotes para os animais empilharem e alcanccedilarem alimento suspenso - Teste com trecircs nuacutemeros em tela em que apoacutes o toque no primeiro os outros dois mudam de posiccedilatildeo - Teste de sequecircncia loacutegica com imagens - Teste de raciociacutenio analoacutegico com figuras em cartotildees com objetos ou com imagens em telas de viacutedeo - Teste com sequecircncia numeacuterica em viacutedeo e contagem ateacute nove incluindo teste de memoacuteria com substituiccedilatildeo dos nuacutemeros por quadrados - Teste com quantidades especiacuteficas de alimento ou com algarismos exibidos em bandejas ou dispostos no recinto para verificar capacidade de realizar somas mais simples - Teste para associaccedilatildeo de algarismos ou figuras com pontos em tela de viacutedeo a quantidades respectivas de recompensa - Teste em que os animais trocam fichas por alimentos sendo que um experimentador lhes entrega mais e o outro menos podendo um acrescentar e outro retirar parte do alimento ou ambos acrescentarem alimento um mais e outro menos

229

- Aptidotildees relacionadas agrave comunicaccedilatildeo - Autorreconhecimento

- Testes em que se verifica vocabulaacuterio com treinamento podem reconhecer mais de trecircs mil palavras que podem expressar com sentenccedilas por lexigramas ou linguagem de sinais - Teste em que primatas apontam para indicar a humano onde estaacute alimento ou objeto para pegar alimento - Teste de reconhecimento diante do espelho

- Comunicaccedilatildeo por vocalizaccedilotildees ou por golpes em troncos - Animais treinados podem combinar e inventar sinais manuais para comunicaccedilatildeo dar nomes xingar - Indicaccedilatildeo de partes da face no espelho

Page 2: RAFAEL SAMPAIO OCTAVIANO DE SOUZA - HCTE/UFRJ · a todos os que já intercederam perante o Criador por esta pobre alma. AGRADECIMENTOS Ao Criador, por tudo, e a todos aqueles que

RAFAEL SAMPAIO OCTAVIANO DE SOUZA

APONTAMENTOS SOBRE A INTELIGEcircNCIA ANIMAL

Agrave LUZ DA PSICOLOGIA ARISTOTEacuteLICO-TOMISTA

Tese de Doutorado apresentada ao Programa

de Poacutes-Graduaccedilatildeo em Histoacuteria das Ciecircncias e

das Teacutecnicas e Epistemologia Universidade

Federal do Rio de Janeiro como requisito

parcial para a obtenccedilatildeo do tiacutetulo de Doutor em

Histoacuteria das Ciecircncias e das Teacutecnicas e

Epistemologia

Orientadora Profordf Drordf Maira Monteiro Froacutees

Rio de Janeiro

2018

S729 Souza Rafael Sampaio Octaviano de Apontamentos sobre a inteligecircncia animal agrave luz da psicologia Aristoteacutelico- Tomista Rafael Sampaio Octaviano de Souza ndash Rio de Janeiro 2018 229 f il 30 cm Orientadora Maira Monteiro Froacutees Tese (Doutorado) - Universidade Federal do Rio de Janeiro Centro de Ciecircncias Matemaacuteticas e da Natureza Programa de Poacutes-Graduaccedilatildeo em Histoacuteria das Ciecircncias e das Teacutecnicas e Epistemologia 2018 Referecircncias f 197-218 1 Aristotelismo-tomismo 2 Inteligecircncia 3 Animais natildeo humanos 4 Potecircncia estimativa 5 Testes de inteligecircncia I Froacutees Maira Monteiro II Universidade Federal do Rio de Janeiro Centro de Ciecircncias Matemaacuteticas e da Natureza III Tiacutetulo

CDD 1894

Dedico este trabalho

aos meus amados filhos e esposa

aos meus amados pais e irmatildeos

aos meus demais parentes e amigos queridos

aos mestres que me orientaram e ensinaram

a todos os que jaacute intercederam perante o

Criador por esta pobre alma

AGRADECIMENTOS

Ao Criador por tudo e a todos aqueles que intercederam e haveratildeo de

interceder de algum modo diante dlsquoEle por esta pobre alma

agrave minha esposa por seu amor por nossos filhos ndash e a eles ndash por tudo mais

aos meus pais por seu amor pela educaccedilatildeo pela vida e por esta tambeacutem

aos meus demais antepassados

agrave minha tatildeo querida orientadora fundamental neste percurso por tanta

confianccedila pelas orientaccedilotildees imprescindiacuteveis e luminosas

e por essas tambeacutem aos meus tatildeo queridos orientadores das etapas

anteriores

ao meu querido compadre e mestre tomista por tantas luzes

agrave minha tatildeo querida cunhada comadre que tatildeo carinhosamente se ocupou dos

ajustes finais

aos professores formais ou informais mestres e mestras que tive e tenho e

de quem palavras ou accedilotildees satildeo tijolos que estaratildeo cimentados neste ente

pela eternidade

ao HCTE pela oportunidade pelo enriquecimento e porque sem ele este

trabalho muito provavelmente natildeo existiria

aos professores das Bancas pelas dicas valiosas pela experiecircncia e agrave

CAPES pelos recursos

a todos os demais que de algum modo contribuiacuteram para a consumaccedilatildeo

desta jornada

ldquo eacute mau aquele amante popular que ama o corpo mais que a alma pois natildeo eacute ele constante por amar um objeto que tambeacutem natildeo eacute constante Com efeito ao mesmo tempo que cessa o viccedilo do corpo que era o que ele amava bdquoalccedila ele o seu vocirco‟ sem respeito a muitas palavras e promessas feitas Ao contraacuterio o amante do caraacuteter que eacute bom eacute constante por toda a vida porque se fundiu com o que eacute constanterdquo

Soacutecrates ndash O Banquete

RESUMO

SOUZA Rafael Sampaio Octaviano de Apontamentos sobre a inteligecircncia animal agrave luz da psicologia aristoteacutelico-tomista 2018 Tese (Doutorado em Histoacuteria das Ciecircncias e das Teacutecnicas e Epistemologia) ndash Programa de Poacutes-Graduaccedilatildeo Histoacuteria das Ciecircncias e das Teacutecnicas e Epistemologia Universidade Federal do Rio de Janeiro 2018

Para a psicologia aristoteacutelico-tomista apenas o ser humano eacute dotado de intelecto enquanto os outros animais estatildeo restritos agrave potecircncia estimativa e aos demais sentidos internos e externos No entanto muitas pesquisas comparativas sobre processos neurais e comportamentais apresentaram resultados que retratam a ampla gama de definiccedilotildees atualmente propostas para o termo rdquointeligecircnciardquo levando pesquisadores a sugerirem que muitos desses animais natildeo humanos seriam capazes de realizar inferecircncias raciociacutenios e ateacute abstraccedilotildees Algumas de suas contribuiccedilotildees mais representativas foram aqui revisadas e avaliadas de acordo com sua coerecircncia em relaccedilatildeo ao aristotelismo-tomismo Natildeo se verificou nenhuma incompatibilidade significativa na presente anaacutelise Sugerimos que consideraccedilotildees sobre os princiacutepios aristoteacutelicos-tomistas em pesquisas sobre inteligecircncia animal e outros campos afins podem contribuir para os debates sob a perspectiva interdisciplinar que vatildeo desde o acircmbito epistemoloacutegico ao desenvolvimento de vaacuterias disciplinas que envolvem o sujeito humano e outros entes que se propotildee que sejam inteligentes

Palavras-chave Aristotelismo-tomismo Inteligecircncia Animais natildeo humanos Potecircncia estimativa Testes de inteligecircncia

ABSTRACT

SOUZA Rafael Sampaio Octaviano de Apontamentos sobre a inteligecircncia animal agrave luz da psicologia aristoteacutelico-tomista 2018 Tese (Doutorado em Histoacuteria das Ciecircncias e das Teacutecnicas e Epistemologia) ndash Programa de Poacutes-Graduaccedilatildeo Histoacuteria das Ciecircncias e das Teacutecnicas e Epistemologia Universidade Federal do Rio de Janeiro 2018

For the Aristotelian-Thomist psychology only the human being is endowed with intellect while the other animals are restricted to an estimative power and the other internal and external senses However many comparative researches on neural and behavioral processes has presented results portraying the wide range of definitions currently proposed for the term intelligence leading researchers to suggest that many of these nonhuman animals would be able to make inferences reasoning and even abstractions Some of their most representative contributions have been here in reviewed and evaluated according to their coherence with regard to aristotelianism-thomism No significant incompatibility was verified in the present analysis We suggest that considerations of the aristotelian-thomism principles in research on animal intelligence and other related fields can contribute to the debates pertaining interdisciplinary perspective ranging from the epistemological scope to the development of various disciplines involving the human subject and other beings that are proposed be intelligent

Keywords Aristotelianism-Thomism Intelligence Non-human animals Estimative power Intelligence tests

LISTA DE TABELAS Tabela 1 - Caracteriacutesticas das potecircncias da alma que compotildeem o aparato

cognitivo

219

Tabela 2 - Testes e observaccedilotildees relacionados a invertebrados peixes e

aves

220

Tabela 3 - Testes e observaccedilotildees relacionados a Corvidae 221

Tabela 4 - Testes e observaccedilotildees relacionados a Elephantidae 222

Tabela 5 - Testes e observaccedilotildees relacionados a Carnivora ndash Canis lupus

familiaris

224

Tabela 6 - Testes e observaccedilotildees relacionados a Cetaceae ndash Delphinidae 225

Tabela 7 - Testes e observaccedilotildees relacionados a Primates 227

LISTA DE FIGURAS

Figura 1 - Esquema de sugestotildees para pesquisas futuras 195

SUMAacuteRIO

1 INTRODUCcedilAtildeO 12

2 JUSTIFICATIVA 53

3 MEacuteTODOS E OBJETIVOS 57

4 RESULTADOS E DISCUSSAtildeO 60

41 UMA CONSTRUCcedilAtildeO PARA A PSICOLOGIA ARISTOTEacuteLICO-TOMISTA 60

411 A subalternaccedilatildeo das ciecircncias 60

5 CONCEITOS FUNDAMENTAIS DO ARISTOTELISMO-TOMISMO 62

51 ATO E POTEcircNCIA 62

52 ESSEcircNCIA E ACIDENTE 63

53 AS QUATRO CAUSAS E AS CATEGORIAS 70

54 A ALMA SUAS POTEcircNCIAS E A GRADACcedilAtildeO ENTITATIVA 74

55 OS SENTIDOS 81

551 Sentidos externos 83

552 Sentidos internos 87

56 INTELECTO 92

6 INVESTIGACcedilAtildeO SOBRE A ATRIBUICcedilAtildeO DE INTELIGEcircNCIA AOS ANIMAIS 107

61 ELEPHANTIDAE 114

611 Observaccedilotildees de Campo 116

612 Estudos experimentais 119

62 CARNIVORA ndash CANIS LUPUS FAMILIARIS 123

63 CETACEAE ndash DELPHINIDAE 129

631 Observaccedilotildees de campo 130

632 Estudos experimentais 131

64 PRIMATES 135

641 Observaccedilotildees de campo 137

642 Estudos experimentais 139

7 A INTELIGEcircNCIA NOS ANIMAIS SEGUNDO O ARISTOTELISMO-TOMISMO 153

8 ANAacuteLISE DAS HABILIDADES COGNITIVAS SEGUNDO O MODELO

ARISTOTEacuteLICO-TOMISTA 160

81 INTERACcedilOtildeES COMPORTAMENTAIS 160

811 Interaccedilotildees em geral 160

812 Comportamento diante da morte de coespeciacutefico 161

813 Respostas a sinais humanos 162

82 TEORIA DA MENTE E COMPORTAMENTO DIANTE DE TELAS DE VIacuteDEO 163

83 METACOGNICcedilAtildeO 165

84 NOCcedilAtildeO DE MEIO E FIM E USO DE INSTRUMENTOS 166

841 Planejamento 168

85 IMITACcedilAtildeO E SINCRONIA 168

86 CORRELACcedilAtildeO DE FIGURAS OU SONS 169

87 COMPETEcircNCIA PARA APREENSAtildeO DE QUANTIDADES 171

88 APTIDOtildeES RELACIONADAS Agrave COMUNICACcedilAtildeO 172

89 AUTORRECONHECIMENTO 176

9 CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS E CONCLUSAtildeO 178

REFEREcircNCIAS 197

TABELAS 219

12

1 INTRODUCcedilAtildeO

Como definir a inteligecircncia Seria possiacutevel delimitaacute-la conceitualmente (e

neste caso atribuir-lhe eficazmente mais de um conceito) Poderia ela ser atribuiacuteda

a algum outro ente aleacutem do homem Muitos pensadores buscaram responder a

questotildees como estas desde pelo menos o advento da filosofia Por muito tempo se

propocircs predominantemente que o exerciacutecio do intelecto seria no que toca aos entes

sensiacuteveis um atributo exclusivo da alma humana apta agrave aquisiccedilatildeo de conhecimento

teoacuterico agrave apreensatildeo da realidade agrave da verdade Isto se deu pelo menos ateacute o final

do periacuteodo escolaacutestico em que vigorava um realismo moderado quando entatildeo os

alicerces dessa ideia passaram a ser gradualmente abandonados em razatildeo da

forccedila que ganhava o nominalismo e substituiacutedos por diversificadas correntes que se

desenvolveram e se puseram a reestruturaacute-la objetando inclusive contra a proacutepria

existecircncia do que se entendia por alma

Dentre as que se destacam estatildeo as idealistas que levantam duacutevidas sobre o

acesso mesmo do homem agrave realidade a verdades e as naturalistas estas realistas

ou mesmo de fundo idealista que restringem as explicaccedilotildees sobre a intelecccedilatildeo

exclusivamente a processos orgacircnicos Mas todos os principais filoacutesofos e cientistas

que representam tais visotildees alguns dos quais seratildeo citados no decorrer deste

trabalho natildeo discrepam de seus predecessores em relaccedilatildeo ao fato de que natildeo haacute

como especular satisfatoriamente sobre a inteligecircncia sem levar em conta a anaacutelise

da natureza da consciecircncia e a presenccedila de elementos como o pensamento e a

informaccedilatildeo esta uacuteltima incluindo sua transmissatildeo por parte do objeto e sua

captaccedilatildeo e processamento pelo sujeito que intelige E haacute igualmente consenso em

relaccedilatildeo ao fato de que o pensamento e a informaccedilatildeo bem como a consciecircncia e a

inteligecircncia mesma possuem objetos ou seja aquilo que eacute pensado aquilo a que se

refere a informaccedilatildeo aquilo de que se estaacute consciente e aquilo que eacute inteligido e

possuem sujeitos ou seja aquele que pensa aquele que deteacutem a informaccedilatildeo

aquele que estaacute consciente aquele que intelige

As divergecircncias entre as escolas supracitadas comeccedilam na interpretaccedilatildeo

sobre o que haacute de mais elementar na natureza desses sujeitos e objetos isto eacute

como jaacute apontado se satildeo ou natildeo reais ou se um o eacute e o outro natildeo o que pode

remeter imediatamente a questotildees sobre a natureza da informaccedilatildeo Em seguida

considerando a realidade do sujeito este recebe informaccedilotildees verdadeiras do mundo

13

agrave sua volta ou recebe informaccedilotildees falsas dele ou recebe informaccedilotildees parcialmente

verdadeiras e parcialmente falsas ou recebe informaccedilotildees sobre as quais natildeo tem

condiccedilotildees de emitir juiacutezo em relaccedilatildeo agrave sua veracidade ou falsidade Mesmo diante

das dificuldades que haacute em demonstrar no acircmbito cientiacutefico que os fenocircmenos

mentais envolvidos na cogniccedilatildeo apresentam caracteriacutesticas em comum com o seu

objeto a natureza dessas informaccedilotildees define assim a natureza do que ele pensa

Deste modo pensa em coisas reais e natildeo reais (ou pensa somente em coisas reais

se considera que todas sejam reais como pensamento) ou em coisas somente natildeo

reais ou em coisas que natildeo sabe serem ou natildeo reais E ao pensar potildee-se

consciente do que eacute real integral ou parcialmente ou do que natildeo o eacute

Considerando-se pois a realidade do sujeito e do objeto em um acircmbito

tangiacutevel independentemente das imensas dificuldades que haacute em demonstrar

cientificamente se os fenocircmenos mentais envolvidos na cogniccedilatildeo apresentam

caracteriacutesticas em comum com o objeto externo com o qual se relacionam1 a

informaccedilatildeo tem os sentidos daquele como porta de entrada e de algum modo torna-

se pensamento Como tal certa potecircncia sua eacute ampliada ao infinito como ilustram

bem estas palavras de Hume

Agrave primeira vista nada pode parecer mais ilimitado do que o pensamento humano que natildeo apenas escapa a toda autoridade e a todo poder do homem mas tambeacutem nem sempre eacute reprimido dentro dos limites da natureza e da realidade Formar monstros e juntar formas e aparecircncias incongruentes natildeo causam agrave imaginaccedilatildeo mais embaraccedilo do que conceber os objetos mais naturais e mais familiares Apesar de o corpo confinar-se num soacute planeta sobre o qual se arrasta com sofrimento e dificuldade o pensamento pode transportar-nos num instante agraves regiotildees mais distantes do Universo ou mesmo aleacutem do Universo para o caos indeterminado onde se supotildee que a Natureza se encontra em total confusatildeo Pode-se conceber o que ainda natildeo foi visto ou ouvido porque natildeo haacute nada que esteja fora do poder do pensamento exceto o que implica absoluta contradiccedilatildeo

2

Se a posse da informaccedilatildeo e o pensamento satildeo requisitos para que se esteja

consciente de algo tambeacutem o eacute o ato de conhecer Deve-se conhecer a informaccedilatildeo

para que possa ser pensada e entatildeo dela se esteja consciente E uma vez que algo

foi conhecido pode ter havido intelecccedilatildeo e obteve-se o entendimento

A inteligecircncia pois seraacute fundamental para que o pensamento possa

exercitar-se ilimitadamente e o faraacute em um jogo quase incessante com os sentidos

1 TALLIS 2010 p 118

2 HUME 2001 p 21-22

14

especialmente com a memoacuteria Bachelard conseguiu expressar isto com excelecircncia

em suas elucubraccedilotildees que assumiram como limiar a chama de uma vela

A chama eacute um mundo para o homem soacute []3 A chama ela sozinha pode

concretizar o ser de todas as suas imagens o ser de todos os seus fantasmas []

4 Existe um parentesco entre a lamparina que vela e a alma

que sonha Tanto para uma quanto para a outra o tempo eacute lento Tanto no devaneio quanto na luz fraca encontra-se a mesma paciecircncia Entatildeo o tempo se aprofunda as imagens e as lembranccedilas se reuacutenem O sonhador inflamado une o que vecirc ao que viu conhece a fusatildeo da imaginaccedilatildeo com a memoacuteria Abre-se entatildeo a todas as aventuras da fantasia aceita a ajuda dos grandes sonhadores e entra no mundo dos poetas Por conseguinte a fantasia da chama tatildeo unitaacuteria a princiacutepio torna-se de abundante multiplicidade []

5 Com as imagens literaacuterias da chama o surrealismo tem

alguma garantia de ter uma raiz de realidade As imagens mais fantaacutesticas da chama se convergem Transformam-se por meio de notaacutevel privileacutegio em imagens verdadeiras []

6 A chama nos leva a ver em primeira matildeo

temos mil lembranccedilas sonhamos tudo atraveacutes da personalidade de uma memoacuteria muito antiga e no entanto sonhamos como todo mundo lembramo-nos como todo mundo se lembra ndash entatildeo seguindo uma das leis mais constantes da fantasia diante da chama o sonhador vive em um passado que natildeo eacute mais unicamente seu no passado dos primeiros fogos do mundo

7

Assim o processo de intelecccedilatildeo implicaria a absorccedilatildeo transformaccedilatildeo

combinaccedilatildeo alimentaccedilatildeo e a possibilidade de emissatildeo de informaccedilotildees

Tallis aponta a importacircncia da interpretaccedilatildeo reconhecendo-a como ldquoatividade

fundamental da consciecircncia humanardquo8 e diz que haacute vaacuterios sentidos alguns

demasiado especializados atribuiacutedos ao termo ldquoinformaccedilatildeordquo mas explica que se

ldquoser informado eacute aprender algo que natildeo se conhecia antesrdquo entatildeo a palavra poderia

ser compreendida como ldquoalgo que resolve uma incerteza sobre como as coisas satildeo

ou sobre como seratildeordquo9

Dentre os significados fornecidos pelo Dicionaacuterio Aulete para a palavra

ldquoinformaccedilatildeordquo encontram-se

Accedilatildeo ou resultado de informar(-se) [] Conjunto de dados sobre algo ou algueacutem [] Relato de acontecimentos ou fatos transmitido ou recebido

3 BACHELARD 1989 p 12

4 Ibid p 13

5 Ibid p 19

6 Ibid p 13

7 Ibid p 11

8 ldquofundamental activity of human consciousnessrdquo TALLLIS 2010 p 104

9 ldquo[] to be informed is to learn something one did not know before []rdquo e ldquo[] something that

resolves an uncertainty about how things are or how they are going to berdquo TALLIS 2010 p 90

15

Explicaccedilatildeo dada para uma determinada finalidade [] Fil Na teoria hilemoacuterfica accedilatildeo pela qual a forma daacute ser ou informa a mateacuteria

10

E dentre os significados fornecidos pelo Dicionaacuterio Priberam figuram ldquoAto ou

efeito de informar [] Notiacutecia (dada ou recebida) [] Indagaccedilatildeo [] Esclarecimento

dado sobre os meacuteritos ou estado de outrem (Tambeacutem usado no plural)rdquo11

O Aulete fornece as seguintes definiccedilotildees para ldquoinformarrdquo ldquoDeixar algueacutem

ciente de (fatos notiacutecias acontecimentos) COMUNICAR [] Tomar ciecircncia de

INTEIRAR(-SE) Dar conhecimento de ser instrutivo para [] Levar orientaccedilatildeo a

[] Ministrar ensinamentos a [] Servir de base ou fundamentordquo12

E assim define o termo o Priberam ldquoDar informaccedilotildees a ou a respeito de []

Avisar [] Dar parecer sobre [] Dar forma a [] Tomar corpo engrossar

desenvolver-se [] Tomar informaccedilotildees [] Procurar notiacutecias [] Tomar forma []13

Le Coadic assim define informaccedilatildeo

A informaccedilatildeo eacute um conhecimento inscrito (gravado) sob a forma escrita (impressa ou numeacuterica) oral ou audiovisual A informaccedilatildeo comporta um elemento de sentido Eacute um significado transmitido a um ser consciente por meio de uma mensagem inscrita em um suporte espacial-temporal impresso sinal eleacutetrico onda sonora etc Essa inscriccedilatildeo eacute feita graccedilas a um sistema de signos (a linguagem) signo este que eacute um elemento da linguagem que associa um significante a um significado signo alfabeacutetico palavra sinal de pontuaccedilatildeo

14

A partir da citaccedilatildeo acima Le Coadic define em nota de rodapeacute o termo

ldquoconhecimentordquo

Um conhecimento (um saber) eacute o resultado do ato de conhecer ato pelo qual o espiacuterito apreende um objeto Conhecer eacute ser capaz de formar a ideia de alguma coisa eacute ter presente no espiacuterito Isso pode ir da simples identificaccedilatildeo (conhecimento comum) agrave compreensatildeo exata e completa dos objetos (conhecimento cientiacutefico) O saber designa um conjunto articulado e organizado de conhecimentos a partir do qual uma ciecircncia ndash um sistema de relaccedilotildees formais e experimentais ndash poderaacute originar-se

A palavra ldquopensamentordquo eacute assim definida pelo Aulete

Accedilatildeo ou resultado de pensar [] Capacidade ou atividade de formular eou evocar ideias juiacutezos conceitos etc REFLEXAtildeO [] Cada produto dessa atividade mental IDEIA [] Linha conceitual caracteriacutestica de um intelectual

10

INFORMACcedilAtildeO 2017 11

Ibid 12

Ibid 13

Ibid 14

LE COADIC 1996 p 5

16

de um grupo ou de uma eacutepoca [] Mente cabeccedila maneira de pensar Expressatildeo resumida de uma ideia em forma de frase

15

Estatildeo entre as definiccedilotildees de ldquopensamentordquo no Dicionaacuterio Priberam ldquoAto

faculdade de pensar [] Ideia reflexatildeo consideraccedilatildeo [] Intenccedilatildeo [] Conceito

opiniatildeo [] Esboccedilo da primeira ideia ou invenccedilatildeo de um artista [] A ideia capital de

um escrito e cada uma das mais notaacuteveis nele contidasrdquo16

Lalande comenta que

Essa palavra em cada um de seus sentidos pode-se aplicar seja ao conjunto de fatos considerados (pensamento) seja a cada um destes separadamente (um pensamento) [] Em um sentido mais amplo envolve todos os fenocircmenos do espiacuterito [] Mais ordinariamente se diz de todos os fenocircmenos cognitivos (por oposiccedilatildeo aos sentimentos e agraves vontades) [] Em sentido mais proacuteprio diz-se do entendimento e da razatildeo na medida em que permitem compreender que constitui a mateacuteria do conhecimento na medida em que percebem um grau de siacutentese mais elevado que a percepccedilatildeo a memoacuteria ou a imaginaccedilatildeo

17

Retomando o Aulete dentre as definiccedilotildees apresentadas para o verbo

ldquopensarrdquo constam

Elaborar ideias ou raciociacutenios MEDITAR REFLETIR [] Ter como intenccedilatildeo COGITAR TENCIONAR [] Procurar lembrar-se recordar-se [] Preocupar-se com [] Julgar supor [] Formar imagem mental de IMAGINAR PREVER [] Ter o mesmo ponto de vista opiniatildeo [] Tratar convenientemente ou cuidar Pensamento opiniatildeo juiacutezo

18

E entre as definiccedilotildees de ldquopensarrdquo no Priberam ldquoFormar ideias [] Refletir []

Raciocinar [] Ser de parecer [] Tencionar [] Ter no pensamento Imaginar

julgar [] Planear [] Dar penso alimento a [] Pensamento opiniatildeo juiacutezordquo19

Assim o pensamento pelo menos em acircmbito conceitual ou seja conforme

as definiccedilotildees adotadas e os entes aos quais satildeo aplicados como se veraacute mais

adiante pode estar ou natildeo associado agrave inteligecircncia Para esta o Dicionaacuterio Aulete

Digital fornece dentre os significados possiacuteveis os seguintes

15

PENSAMENTO 2017 16

Ibid 17

ldquoCe mot dans chacun de ses sens peut sapliqueur soit agrave lensemble des faits consideacutereacutes (la penseacutee) soit agrave chacun deux pris agrave part (une penseacutee) [] Au sens le plus large il envelope tous les pheacutenomegravenes de lesprit [] Plus ordinairement se dit de tous les pheacutenomegravenes cognitifs (par oposition aux sentiments et aux volitions) [] Au sens le plus propre se dit de lentendement et de la raison en tant quils permettent de comprendre ce qui constitue la matiegravere de la connaissance en tant quils reacutealisent un degreacute de syntegravese plus eacuteleveacute que la perception la meacutemoire ou limaginationrdquo LALANDE 1997 p 752

18 PENSAR 2017

19 Ibid

17

Faculdade de entender de compreender INTELECTO [] Penetraccedilatildeo de espiacuterito percepccedilatildeo clara e faacutecil DISCERNIMENTO JUIacuteZO [] Interpretaccedilatildeo do sentido de um texto um livro uma frase etc [] Conformidade de sentimentos e de intenccedilotildees [] Destreza habilidade para escolher os meacutetodos e obter um bom resultado [] Psi Capacidade de resolver situaccedilotildees novas e problemaacuteticas em circunstacircncias em que o instinto o conhecimento e o haacutebito natildeo podem ajudar

20

Dentre aqueles fornecidos pelo Dicionaacuterio Priberam da Liacutengua Portuguesa

para a palavra constam ldquoConjunto de todas as faculdades intelectuais (memoacuteria

imaginaccedilatildeo juiacutezo raciociacutenio abstraccedilatildeo e concepccedilatildeo) [] Qualidade de inteligente

[] Compreensatildeo faacutecil [] Habilidaderdquo21

E Lalande fornece dentre outras definiccedilotildees

Conjunto de todas as funccedilotildees que tecircm por objeto o conhecimento no sentido mais amplo da palavra (sensaccedilatildeo associaccedilatildeo memoacuteria imaginaccedilatildeo entendimento razatildeo consciecircncia) [] (Em oposiccedilatildeo agrave intuiccedilatildeo e agrave sensaccedilatildeo) sinocircnimo de compreensatildeo conhecimento conceitual e racional [] (Em oposiccedilatildeo ao instinto) atividade voluntaacuteria adaptaccedilatildeo refletida dos meios aos fins

22

Segundo De Libera a palavra ldquointeligirrdquo proveacutem do latim ldquointelligererdquo que por

sua vez eacute composta por dois eacutetimos um deles eacute ldquolegererdquo que pode significar

ldquoreunirrdquo ldquorecolherrdquo um dos significados da palavra grega ldquolegocircrdquo (λέγω) o outro eacute

ldquointerrdquo que significa ldquoentrerdquo23

De Libera observa tambeacutem que

Significar entender compreender estes significados natildeo representam um problema para o tradutor jaacute que a linguagem vernaacutecula os separou muitas vezes em termos que evoluiacuteram de diferentes maneiras com exclusatildeo de outros usos A palavra intellectus abrange aleacutem das esferas do significado e da compreensatildeo quase todas as noccedilotildees relativas ao pensamento sua atividade e agraves suas condiccedilotildees de possibilidade Eacute aiacute onde estatildeo as dificuldades Como um termo fundamental da psicologia antiga e medieval a palavra intellectus e a seacuterie de termos que derivam dela ou se relacionam com ela (intelligere intellectualis intelligibilis) levantam problemas particulares mas natildeo insoluacuteveis para o tradutor

24

20

INTELIGEcircNCIA 2017 21

Ibid 22

ldquoEnsemble de toutes les fonctions qui ont pour objet la connaissance au sens le plus large du mot (sensation association meacutemoire imagination entendement raison conscience) [] (Oposeacute agrave intuition et agrave sensation) synonyme dentendement connaissance conceptuelle et rationnelle [] (Oposeacute agrave instinct) activiteacute volontaire adaptation reacutefleacutechie de moyens agrave des finsrdquo LALANDE 1932 p 388-389

23 DE LIBERA 2004 p 493

24 ldquoTo mean to understand to comprehend these different meanings do not pose a problem

for the translator since vernacular language has often separated them out into terms that have evolved in different ways to the exclusion of other uses The word intellectus covers in addition to the spheres

18

Apoacutes apontar como problema mais grave o fato de que a palavra

ldquoentendimentordquo (ldquounderstandingrdquo ldquoentendementrdquo e ldquoVerstandrdquo em inglecircs francecircs e

alematildeo respectivamente) passou a ser aceita para traduzir ldquointellectusrdquo mas sem ter

precedente no peripatetismo e no escolasticismo e que assim ldquoA transformaccedilatildeo de

lsquointellectusrsquo em lsquoentendimentorsquo (lsquounderstandingrsquo lsquoentendementrsquo) marca uma ruptura

na histoacuteria das teorias da almardquo25 ele entatildeo assinala que ldquointellectusrdquo tornou-se

sinocircnimo do ldquonousrdquo aristoteacutelico ideia distinta de ldquoratiordquo somente depois das

traduccedilotildees latinas do De Anima De Libera afirma ainda haver pelo menos dez

significados de ldquointellectusrdquo encontrados no vocabulaacuterio escolaacutestico indicando que

haacute entre eles certa interconexatildeo e entatildeo os elenca

[] (1) o nous peripateacutetico entendido no sentido de ldquosubstacircnciardquo (2) o mesmo no sentido de ldquofaculdaderdquo [] ou ldquofaculdade de conhecimentordquo[] (3) a faculdade de conhecimento natildeo sensiacutevel ou suprassensiacutevel mas natildeo distinta de ldquoratiordquo (isto eacute sem levar em conta a distinccedilatildeo entre conhecimento intuitivo e conhecimento discursivo) (4) uma atividade cognitiva um ato de conhecimento intelecccedilatildeo ou inteligecircncia (sinocircnimo intellegentia) (5) a faculdade de conhecimento intuitiva natildeo sensiacutevel que penetra na essecircncia iacutentima das coisas (de acordo com a etimologia medieval que reuacutene intelligere e legere intus []) (6) o ldquohabitus dos princiacutepiosrdquo distinto de prudentia sapientia e scientia mas tambeacutem de ratio e synteresis [] o grego nous tocircn archocircn [νοῦς τῶν ἀρχῶν] e o latino habitus principiorum[] (7) inspeccedilatildeo intelectual [] sinocircnimo de intellegentia e que tem por antocircnimo ratio (8) concepccedilatildeo compreensatildeo interpretaccedilatildeo entendimento ou significado [] (9) uma representaccedilatildeo natildeo sensiacutevel [] ou uma noccedilatildeo sinocircnimo de ratio no sentido de uma foacutermula de definiccedilatildeo [] (10) significaccedilatildeo ou significado [] sinocircnimo de ratio (no sentido da foacutermula de definiccedilatildeo foacutermula-logos sensus significatio virtus vis [ldquoforccedila expressiva ou impactordquo] de uma palavra)

26

of meaning and of understanding almost all of the notions relating to thought its activity and its conditions of possibility This is where the difficulties lie As a fundamental term of ancient and medieval psychology intellectus and the series of terms that are derived from or related to it (intelligere intelectualis intelligibilis) pose particular if not insoluble problems for the translatorrdquo DE LIBERA 2004 p 492

25 ldquoThe transformation of intellectus into lsquounderstandingrsquo (entendement) marks a break in the

history of theories of the soulrdquo DE LIBERA 2004 p 493 26

ldquo(1) the Peripatetic nous understood in the sense of lsquosubstancersquo (2) the same in the sense of lsquofacultyrsquo[] or lsquofaculty of knowledgersquo[] (3) the nonsensible or suprasensible faculty of knowledge but not distinct from ratio (that is without taking into account the distinction between intuitive knowledge and discursive knowledge) (4) a cognitive activity an act of knowledge intellection or intelligence (synonym intellegentia) (5) the nonsensible intuitive faculty of knowledge which penetrates the intimate essence of things (according to the medieval etymology bringing together intelligere and legere intus [] (6) the lsquohabitus of principlesrsquo as distinct from prudentia sapientia and scientia but also from ratio and synteresis [] the Greek nous tocircn archocircn [νοῦς τῶν ἀϱχῶν] and the Latin habitus principiorum [] (7) intellectual inspection [] synonymous with intellegentia and the antonym of which is ratio (8) conception comprehension interpretation understanding or meaning [] (9) a nonsensible representation [] or a notion synonymous with ratio in the sense of a definitional formula [] (10) significance or meaning [] synonymous with ratio (in the sense of the definitional formula logos-formula sensus significatio virtus vis [ldquoexpressive force or impactrdquo] of a word)rdquo DE LIBERA 2004 p 493

19

Observa em seguida que o significado original da tradiccedilatildeo greco-latina uso

este que tambeacutem tem Guilherme de Moerbeke no seacuteculo XIII principal autor das

traduccedilotildees de Aristoacuteteles do grego para o latim naquele periacuteodo largamente

utilizadas por Santo Tomaacutes de Aquino como exemplo de emprego neste periacuteodo da

palavra intellectus eacute epinoia [ἐπίνοια] traduzida entatildeo comumente por opinio e que

eacute entendida pelo sentido geral ou comum de ldquointeligecircnciardquo como tambeacutem por

ldquopensamentordquo ldquoimaginaccedilatildeordquo ldquoreflexatildeordquo ldquoalgo que vem agrave menterdquo As palavras dianoia

[διανοία] que se refere ao pensamento discursivo agrave faculdade discursiva traduzida

entatildeo por rationalitas e ratio e to dianoegravetikon [τὸ διανοητιϰόν] que significa ldquorazatildeo

discursivardquo contrastam com os sentidos de ldquopensamentordquo em geral ou de

pensamento ldquointuitivordquo e de ldquorazatildeo intuitivardquo respectivamente de Intellectus como

noacuteecircsis [νόησις] Tambeacutem a palavra intelligentia era usada como intellegentia no

periacuteodo medieval em que aparece mais a forma legocirc que tem por significado ldquolerrdquo27

Esse significado tambeacutem estaacute na construccedilatildeo etimoloacutegica alternativa que era muitas

vezes empregada no mesmo periacuteodo intra ou intus mais legere28 como menciona

acima De Libera e pela qual Tomaacutes de Aquino demonstrava certo apreccedilo

significando ldquoler dentrordquo para explicar que a inteligecircncia ou intelecto conheceria o

iacutentimo das coisas29

No cenaacuterio cientiacutefico contemporacircneo as teorias sobre a inteligecircncia

foram enquadradas em dois tipos as teorias impliacutecitas e as teorias expliacutecitas

As teorias impliacutecitas30 satildeo definiccedilotildees e explicaccedilotildees para a inteligecircncia que os

pesquisadores colhem de pessoas que natildeo satildeo estudiosas do assunto

especialistas ou seja satildeo extraiacutedas do senso comum que variam conforme a faixa

etaacuteria e a cultura Delas emergem fatores como a capacidade de resolver

problemas aptidatildeo verbal competecircncia social compreensatildeo de si e do proacuteximo

respeito dentre outras habilidades cognitivas

Jaacute as teorias expliacutecitas satildeo as definiccedilotildees e conceitos formulados e publicados

pelos proacuteprios pesquisadores a maioria enquadrada em trecircs grandes abordagens

a) a das teorias psicomeacutetricas com raiacutezes fincadas nos trabalhos de Galton

que se fundamentam em anaacutelises da estrutura da inteligecircncia dos possiacuteveis

27

DE LIBERA 2004 p 494 28

Ibid p 493 29

TOMAacuteS DE AQUINO 1988 p 92 30

DWECK LEGGETT 1988

20

elementos que a compotildeem e que seratildeo objeto dos famosos testes de mediccedilatildeo de

inteligecircncia como os de Binet e Simon Cattel Stern Wechsler etc

b) a das teorias cognitivas que se originaram da proposta de Lee J

Cronbach de 1957 feita agrave American Psychological Association de unir as duas

disciplinas da psicologia cientiacutefica a experimental e a diferencial e sobre a qual se

desenvolvem estudos concernentes agraves diferenccedilas individuais que segundo

Sternberg partem do pressuposto de que ldquoa inteligecircncia eacute composta por um

conjunto de representaccedilotildees mentais (por exemplo proposiccedilotildees e imagens) de

informaccedilatildeo e de um conjunto de processos mentais que podem operar sobre as

representaccedilotildeesrdquo31

c) e a das teorias bioloacutegicas que abordam comportamentos inteligentes

baseados nas funccedilotildees neurofisioloacutegicas que os produzem

Sternberg parece propor ainda uma subdivisatildeo da cognitiva como mais uma

grande abordagem a cognitiva conceitual Tais teorias segundo afirma se

relacionam ldquocom o modo com que os processos cognitivos operam em vaacuterios

contextos ambientaisrdquo32 e tecircm como exemplos a sua proacutepria Teoria Triaacuterquica e a

famosa Teoria das Inteligecircncias Muacuteltiplas de Gardner

Algumas das principais teorias da inteligecircncia na abordagem psicomeacutetrica

estatildeo listadas em Pal e colaboradores33 dentre as quais destacamos

a) a dos dois fatores de Spearman o fator G uma habilidade mais geral inata

e o que mais fornece explicaccedilatildeo para a inteligecircncia ndash que da visatildeo desta de

Spearman Piaget34 cita os trecircs momentos essenciais a saber a apreensatildeo da

experiecircncia a educaccedilatildeo das relaccedilotildees e a educaccedilatildeo dos correlatos para entatildeo

acrescentar que eacute necessaacuterio que haja intermediaccedilatildeo de uma assimilaccedilatildeo

construtiva para a apreensatildeo da experiecircncia ndash e o fator S que representa

aquisiccedilotildees a partir do ambiente variando segundo as atividades de um mesmo

indiviacuteduo

b) a teoria dos multifatores de Thorndike ndash proponente dos trecircs tipos de

inteligecircncia (1) social (2) mecacircnica e (3) abstrata que estatildeo relacionadas agrave

31

ldquo[] intelligence is composed of a set of mental representations (eg propositions images) of information and a set of mental processes that can operate on the representationsrdquo STERNBERG 2004 p 323

32 ldquo[] cognitive processes operate in various environmental contextsrdquo STERNBERG 2004

p 323 33

PAL et al 2004 34

PIAGET 1972 p 127

21

capacidade de aprender a compreender e a administrar respectivamente (1)

homens mulheres crianccedilas as relaccedilotildees em geral (2) objetos e recursos naturais

(3) ideias e siacutembolos ndash35 que lista quatro fatores ou conjuntos de habilidades

requeridas para a atividade mental a saber a aptidatildeo para lidar com o niacutevel de

dificuldade de uma tarefa a capacidade de lidar com determinado nuacutemero de tarefas

em determinado grau de dificuldade o nuacutemero de situaccedilotildees em cada niacutevel agraves quais

o indiviacuteduo eacute capaz de responder e a velocidade com que ele responde

c) a teoria de Thurstone dos grupos independentes entre si ndash constituiacutedo por

sete fatores principais ou ldquohabilidades mentais primaacuteriasrdquo36 a saber compreensatildeo

verbal (W) orientaccedilatildeo espacial (S) raciociacutenio indutivo (R) aptidatildeo numeacuterica (N)

fluecircncia verbal (V) memoacuteria associativa (M) e velocidade perceptiva (P) ndash37 que

possuem como nuacutecleo um fator primaacuterio compartilhado por operaccedilotildees mentais deles

especiacuteficas e que daacute a elas unidade psicoloacutegica e funcional e as diferencia das de

outros grupos

d) o modelo de estrutura tridimensional do intelecto de Guilford no qual ele

classifica o trabalho intelectual de acordo com o conteuacutedo que pode ser visual

auditivo simboacutelico semacircntico ou comportamental com a operaccedilatildeo mental

envolvida que pode ser a cogniccedilatildeo a retenccedilatildeo de memoacuteria o registro de memoacuteria

a produccedilatildeo divergente e a produccedilatildeo e avaliaccedilatildeo convergente e com o produto

resultante da operaccedilatildeo classificado em unidades classes relaccedilotildees sistemas

transformaccedilotildees e implicaccedilotildees

e) a teoria hieraacuterquica de Vernon que estabelece quatro niacuteveis hieraacuterquicos

para os elementos da inteligecircncia numa tentativa de conciliar a teoria de Spearman

cujos fatores G e S encontram-se no primeiro e quarto niacuteveis respectivamente e a

de Thurstone cujos elementos estatildeo no terceiro niacutevel (o segundo refere-se a fatores

como as habilidades verbo-numeacuterico-educacionais e as fiacutesico-praacutetico-mecacircnico-

espaciais)

f) e a teoria fluida e a teoria cristalizada de Cattel que tratam a inteligecircncia

respectivamente como uma capacidadede pensar abstratamente e resolver

problemas adquirida pela potencialidade geneacutetica e como um conhecimento que

resulta de uma aprendizagem anterior inclusive resultante da experiecircncia

35

THORNDIKE 1920 36

ldquoPrimary mental abilitiesrdquo 37

SCHAIE 2004

22

Da abordagem psicomeacutetrica emergem assim duas subdivisotildees a partir de

Spearman a fatorial na qual se destacam o proacuteprio autor e Thurstone cujas

divergecircncias implicam basicamente a posiccedilatildeo e a importacircncia que cada um atribui

aos elementos isolados que compotildeem a inteligecircncia e a multidimensional que

tentaraacute conciliar as duas visotildees Esta tambeacutem apresenta duas subdivisotildees a dos

modelos natildeo hieraacuterquicos que tem como representantes Thorndike e Guilford e a

dos modelos hieraacuterquicos como os de Vernon e Cattel38

Pal e colaboradores39 listam ainda algumas das abordagens cognitivas como

a) a bastante conhecida teoria de Gardner das muacuteltiplas inteligecircncias a

inteligecircncia linguiacutestica a loacutegico-matemaacutetica a espacial a musical a cinesteacutesico-

corporal a interpessoal a intrapessoal a naturalista e a existencialista

b) a teoria triaacuterquica de Sternberg que distingue trecircs habilidades intelectivas

a analiacutetica ou componencial a praacutetica ou contextual e a criativa ou experiencial

c) e a teoria da inteligecircncia emocional popularizada por Daniel Goleman em

sua obra ldquoInteligecircncia Emocionalrdquo lanccedilada em 1995 e que recebeu muitos modelos

como o de Salovey e Mayer40 sendo assim definida por Cherniss41 ldquoInteligecircncia

emocional refere-se a um conjunto de habilidades que envolvem o modo com que

pessoas percebem expressam entendem e controlam suas proacuteprias emoccedilotildees bem

como as emoccedilotildees dos outrosrdquo42

E destoutro modo definem Salovey e Mayer ldquo[] o subconjunto de

inteligecircncia social que envolve a capacidade de monitorar os sentimentos e as

emoccedilotildees proacuteprios e do outro para discriminar entre elas e usar essa informaccedilatildeo

para orientar os pensamentos e as accedilotildees de algueacutemrdquo43

Da psicologia cognitiva destaca-se tambeacutem a teoria dos modelos mentais

(ldquoMental Models Theoryrdquo) Segundo Johnson-Laird seu principal proponente cada

modelo mental seria fruto da resposta a trecircs perguntas pelas quais se busca saber

38

SILVA 2003 39

PAL et al 2004 40

SALOVEY MAYER 1990 41

CHERNISS 2004 42

ldquoEmotional intelligence refers to a set of abilities that involve the way in which people perceive express understand and manage their own emotions as well as the emotions of othersrdquo CHERNISS 2004 p 315

43 ldquo[] the subset of social intelligence that involves the ability to monitor onersquos own and

otherrsquos feelings and emotions to discriminate among them and to use this information to guide onersquos thinking and actionsrdquo SALOVEY MAYER 1990 p 189

23

(1) a forma das representaccedilotildees mentais e as questotildees sobre se as imagens diferem dos conjuntos de proposiccedilatildeo (2) os processos mentais subjacentes ao raciociacutenio comum e a questatildeo de quais regras de inferecircncia eles incorporam e (3) a representaccedilatildeo do significado de palavras e a questatildeo de saber se elas dependem de um dicionaacuterio decomposicional

44 ou de um

conjunto de postulados de significado45

A teoria baseia-se assim em trecircs princiacutepios

Primeiro cada modelo mental representa o que eacute comum a um conjunto distinto de possibilidades [] Segundo os modelos mentais satildeo icocircnicos ou seja sua estrutura na medida do possiacutevel corresponde agrave estrutura do que eles representam [] Terceiro os modelos mentais que se baseiam em descriccedilotildees representam o que eacute verdadeiro agrave custa do que eacute falso

46

Parte entatildeo do pressuposto principal de que o ldquoos indiviacuteduos raciocinam

tentando visualizar as possibilidades compatiacuteveis com o que sabem ou acreditamrdquo47

Essas possibilidades caracterizam os modelos mentais que vatildeo sendo conectados

e reconectados entre si realizando inferecircncias no processo de intelecccedilatildeo

Por fim no tocante agrave abordagem bioloacutegica Silva descreve brevemente as

principais teorias que buscam variaacuteveis bioloacutegicas que subjazem agrave inteligecircncia

a) a de Hebb que distingue trecircs tipos de inteligecircncia o tipo A ou seja um

potencial inato o tipo B que diz respeito ao funcionamento do ceacuterebro e o tipo C

que se refere agravequela que pode ser mensurada pelos testes de inteligecircncia

b) a de Halstead que propocircs quatro fatores ou habilidades determinados

biologicamente o integrativo de campo o de abstraccedilatildeo o de potecircncia e o direcional

todos relacionados ao funcionamento do coacutertex dos lobos frontais

44

Parte de um ldquoprinciacutepio de composicionalidade (principle of compositionality)rdquo de Frege de que ldquoo significado de um constituinte sintaticamente complexo tal como uma sentenccedila eacute uma funccedilatildeo composicional dos significados de suas partesrdquo Assim esse tipo de dicionaacuterio decompotildee as palavras em elementos semacircnticos com o fim de que se caracterize ldquoas relaccedilotildees de significado entre as palavrasrdquo Respectivamente ldquo[] the meaning of a complex constituent such as a sentence is a compositional function of the meanings of its partsrdquo e ldquo[] meaning relations between wordsrdquo ANTHONY 1983 p 26

45 ldquo[] (1) the form of mental representations and the questions of whether images differ from

sets of proposition (2) the mental processes that underlie ordinary reasoning and the question of what rules of inference they embody and (3) the representation of meaning of words and the question of whether they depend on a decompositional dictionary or a set of meaning postulatesrdquo JOHNSON-LAIRD 1980 p 73

46 ldquoFirst each mental model represents what is common to a distinct set of possibilities []

Second mental models are iconic that is their structure as far as possible corresponds to the structure of what they represent [] Third mental models based on descriptions represent what is true at the expense of what is falserdquo Id 2013 p 132

47 ldquoThe principal assumption of the theory is that individuals reason by trying to envisage the

possibilities compatible with what they know or believerdquo Ibid p 131

24

c) e a de Luria que sugeriu haver trecircs grandes unidades no ceacuterebro

relacionadas agrave inteligecircncia uma de ativaccedilatildeo no tronco cerebral e nas estruturas do

ceacuterebro meacutedio uma sensorial de entrada nos lobos temporais e uma de

organizaccedilatildeo e planejamento no coacutertex frontal48

Aleacutem das tentativas supracitadas William Stern autor do famoso teste de

Quociente de Inteligecircncia forneceu uma definiccedilatildeo para o termo ldquointeligecircnciardquo que

segundo sugere ldquodiferencia claramente inteligecircncia de outras capacidades

mentaisrdquo49 ldquoInteligecircncia eacute uma capacidade geral de um indiviacuteduo conscientemente

ajustar seu pensamento a novas exigecircncias eacute adaptabilidade mental geral a novos

problemas e condiccedilotildees de vidardquo50

Wechsler por sua vez na deacutecada de quarenta assim a conceituou

Inteligecircncia eacute a capacidade agregada ou global do indiviacuteduo agir intencionalmente para pensar racionalmente e lidar efetivamente com seu ambiente Ela eacute global porque caracteriza o comportamento individual como um todo e eacute um agregado porque eacute composta de elementos ou habilidades que embora natildeo sejam completamente independentes satildeo qualitativamente diferenciaacuteveis

51

E mais recentemente o Mainstream Science on Intelligence redigido por um

grupo de pesquisadores acadecircmicos e publicado primeiramente no Wall Street

Journal em 13 de dezembro de 1994 definiu-a assim

Inteligecircncia eacute uma capacidade mental bastante geral que entre outras coisas envolve a habilidade de raciocinar planejar resolver problemas pensar abstratamente compreender ideias complexas aprender rapidamente e aprender com a experiecircncia Natildeo eacute meramente a aprendizagem literaacuteria uma habilidade estritamente acadecircmica ou o talento para um bom desempenho em testes Ao contraacuterio o termo reflete uma capacidade mais ampla e mais profunda de compreender o mundo agrave nossa volta ndash ldquocompreenderrdquo ldquocaptar o sentidordquo das coisas ou ldquocalcularrdquo o que fazer Inteligecircncia assim definida pode ser medida e os testes de inteligecircncia medem-na bem Eles natildeo medem criatividade caraacuteter personalidade ou outras diferenccedilas importantes entre indiviacuteduos nem se propotildeem a isto

52

48

SILVA 2003 p 67-68 49

ldquo[] differentiates intelligence clearly from other mental capacitiesrdquo STERN 1914 p 3 50

ldquoIntelligence is a general capacity of an individual consciously to adjust his thinking to new requirements it is general mental adaptability to new problems and conditions of liferdquo STERN 1914 p 3

51 ldquoIntelligence is the aggregate or global capacity of the individual to act purposefully to think

rationally and to deal effectively with his environment It is global because it characterizes the individuals behavior as a whole it is an aggregate because it is composed of elements or abilities which though not entirely independent are qualitatively differentiablerdquo WECHSLER 1944 p 3

52 Intelligence is a very general mental capability that among other things involves the ability

to reason plan solve problems think abstractly comprehend complex ideas learn quickly and learn

25

Silva poreacutem diz ldquonatildeo estaacute totalmente claro o que os testes de inteligecircncia

realmente medem [] eles natildeo produzem uma entidade uacutenicardquo53

Antes de expor o rol de teorias Pal e colaboradores mostram que o problema

eacute ainda mais grave

Haacute diferentes teorias sobre a inteligecircncia e nenhuma delas concorda com as demais Cada abordagem de pensamento vem agrave tona com sua proacutepria perspectiva e seus proacuteprios pressupostos frequentemente contradizendo pelo menos uma teoria anterior

54

E vatildeo aleacutem

Ateacute que uma clara definiccedilatildeo de inteligecircncia possa ser dada as teorias continuaratildeo natildeo sendo capazes de explicaacute-la A probabilidade de tal definiccedilatildeo surgir poreacutem eacute virtualmente zero pois sempre haveraacute alternativas por dar-se e assim as teorias da inteligecircncia estatildeo limitadas a serem contraproducentes

55

A Task Force on Intelligence da American Psychological Association (APA)

em artigo que serviu como reaccedilatildeo a outra polecircmica envolvendo a publicaccedilatildeo de The

Bell Curve ndash Intelligence and Class Structure in American Life em 1994 parece

reforccedilar a afirmaccedilatildeo anterior

Os indiviacuteduos diferem-se uns dos outros na habilidade de compreender ideias complexas de adaptar-se efetivamente ao ambiente aprender a partir da experiecircncia encontrar vaacuterias formas de raciocinar superar obstaacuteculos mediante a reflexatildeo Embora essas diferenccedilas individuais possam ser substanciais elas nunca satildeo completamente consistentes as caracteriacutesticas intelectuais de uma pessoa variaratildeo em diferentes ocasiotildees em diferentes domiacutenios e julgaratildeo com diferentes criteacuterios Os conceitos de lsquointeligecircnciarsquo satildeo tentativas de esclarecer e organizar esse complexo conjunto de fenocircmenos

56

from experience It is not merely book learning a narrow academic skill or test-taking smarts Rather it reflects a broader and deeper capability for comprehending our surroundings - catching on making sense of things or figuring out what to do

Intelligence so defined can be measured and intelligence tests measure it well [] They do not measure creativity character personality or other important differences among individuals nor are they intended to GOTTFRESON 1997 p 13

53 SILVA 2003 p 49

54 ldquoThere are different theories about intelligence none of which agree with each other Every

aproach to thinking comes up with itrsquos own different perspective and assumptions often contradicting at least one earlier theoryrdquo PAL et al 2004 p 181

55 ldquoUntil a clear-cut definition of intelligence can be given theories will continue not to be able

to explain it The likelihood of such a definition occurring is virtually zero as there will always be alternatives given and so theories of intelligence are bound to be self-defeatingrdquo PAL et al 2004 p 185

56 Individuals differ from one another in their ability to understand complex ideas to adapt

effectively to the environment to learn from experience to engage in various forms of reasoning to

26

Piaget tambeacutem aponta para as dificuldades de conceituaccedilatildeo no que chama

linha inferior cuja demarcaccedilatildeo afirma natildeo superar a arbitrariedade e entatildeo

descreve algumas definiccedilotildees de inteligecircncia

Para alguns como Claparegravede e Stern a inteligecircncia eacute uma adaptaccedilatildeo mental agraves circunstacircncias novas Claparegravede opotildee assim a inteligecircncia ao instinto e ao haacutebito que satildeo adaptaccedilotildees hereditaacuterias e adquiridas agraves circunstacircncias que se repetem mas o faz a partir do tateamento empiacuterico mais elementar (fonte dos tateamentos interiorizados que caracterizam ulteriormente a busca da hipoacutetese) Para Buumlhler que divide tambeacutem as estruturas em trecircs tipos (instinto adestramento e inteligecircncia) essa definiccedilatildeo eacute demasiado ampla a inteligecircncia soacute aparece com os atos de compreensatildeo suacutebita (Aha-Erlebnis) enquanto que o tateamento pertence ao adestramento Koumlhler reserva igualmente o termo ldquointeligecircnciardquo para os atos de reestruturaccedilatildeo brusca excluindo o tateamento Eacute inegaacutevel que este aparece desde a formaccedilatildeo dos costumes mais simples os quais satildeo em si mesmos no momento de sua constituiccedilatildeo adaptaccedilotildees agraves circunstacircncias novas Por outro lado a proposiccedilatildeo a hipoacutetese e o controle cuja reuniatildeo caracteriza tambeacutem a inteligecircncia segundo Claparegravede encontram-se jaacute em germe nas necessidades nos ensaios e nos erros e na sanccedilatildeo empiacuterica proacuteprios das adaptaccedilotildees sensoacuterio-motoras menos evoluiacutedas

57

Mas em seguida indica ser possiacutevel fornecer conceituaccedilotildees fundamentando-

se na direccedilatildeo em que estaacute orientado seu desenvolvimento58 e complementa ldquo[]

sem insistir sobre as questotildees de fronteiras que se convertem em questatildeo de

etapas ou de formas sucessivas de equiliacutebriordquo59

Silva fornece uma orientaccedilatildeo que parece reduzir um pouco mais a

inquietaccedilatildeo que pode ser gerada por essa ao menos aparente impossibilidade de

overcome obstacles by taking thought Although these individual differences can be substantial they are never entirely consistent A given persons intellectual performance will vary on different occasions in different domains as judged by different criteria Concepts of intelligence are attempts to clarify and organize this complex set of phenomena NEISSER 1996 p 77

57 ldquoPara algunos como Claparegravede y Stern la inteligecircncia es una adaptacioacuten mental a las

circunstancias nuevas Claparegravede opone asiacute la inteligecircncia al instinto y al haacutebito que son adaptaciones hereditarias o adquiridas a las circunstancias que se repiten pero la hace partir del tanto empiacuterico maacutes elemental (fuente de los tanteos interiorizados que caracterizan ulteriormente la buacutesqueda de la hipoacutetesis)

Para Buumlhler que divide tambieacuten las estructuras en tres tipos (instinto adiestramiento e inteligencia) esa definicioacuten es demasiado amplia la inteligencia soacutelo aparece con los actos de comprensioacuten suacutebita (Aha-Erlebnis) en tanto que el tanteo pertenece al adiestramiento Koehler reserva igualmente el teacutermino de inteligencia a los actos de reestructuracioacuten brusca excluyendo el tanteo Es innegable que eacuteste aparece desde la formacioacuten de las costumbres maacutes simples las cuales son en siacute mismas en el momento de su constitucioacuten adaptaciones a las circunstancias nuevas Por otra parte la proposicioacuten la hipoacutetesis y el control cuya reunioacuten caracteriza tambieacuten la inteligencia seguacuten Claparegravede se encuentran ya en la sancioacuten empiacuterica proacuteprios de las adaptaciones senso-motrices menos evolucionadasrdquo PIAGET 1972 p 21-22

58 Ibid p 21-22

59 ldquo[] sin insistir sobre las cuestiones de fronteras que convierten en cuestioacuten de etapas o

de formas sucesivas de equilibriordquo Ibid p 22

27

buscar-se um conceito satisfatoacuterio para ldquointeligecircnciardquo ao indicar que haacute duas

caracteriacutesticas que estatildeo presentes em praticamente todas as definiccedilotildees da palavra

ldquoa habilidade para aprenderrdquo e ldquoa habilidade para adaptar-se ao ambienterdquo60

E mediante essa habilidade para aprender uma vez que seja detentor de

certo conhecimento sujeito do pensamento o ente animado pode-se tornar

consciente do objeto da informaccedilatildeo Mas eis aqui outro objetivo intimamente

relacionado ao da inteligecircncia que tambeacutem sempre se mostrou aacuterduo para os

pesquisadores no decorrer da histoacuteria o de estabelecer consensos sobre a

conceituaccedilatildeo do que se conhece por ldquoconsciecircnciardquo

Dentre os significados apresentados pelo Dicionaacuterio Aulete Online para a

palavra consciecircncia encontram-se

Atributo que permite a uma pessoa a percepccedilatildeo com certo grau de objetividade do que se passa em torno de si (o mundo exterior) e dentro de si proacuteprio (o mundo interior ou subjetivo) [] Pext O conhecimento a percepccedilatildeo desse atributo [] Capacidade de julgar o que eacute correto e o que natildeo eacute de acordo com valores morais e de conhecimento [] Conhecimento noccedilatildeo percepccedilatildeo (de situaccedilotildees fatos conceitos especiacuteficos) [] Percepccedilatildeo e conhecimento da proacutepria atividade (psiacutequica ou fiacutesica) Sensibilidade ou preacute-disposiccedilatildeo para perceber situaccedilotildees problemas processos etc ligados a temas de interesse social ideoloacutegico poliacutetico etc Sua consciecircncia ecoloacutegica o fazia revoltar-se com o desmatamento criminoso [] Fil Psic Com base em conceito do filoacutesofo alematildeo Nietzsche e adotado na psicanaacutelise a faculdade de autopercepccedilatildeo objetiva limitada pela accedilatildeo das pulsotildees e emoccedilotildees do ser humano [] Med Estado em que o sistema nervoso estaacute capacitado aos processos de percepccedilatildeo reflexatildeo accedilatildeo compatiacutevel comportamento coerente etc Corresponde comumente ao estado de quem domina suas capacidades de perceber (ver ouvir) pensar e agir [] Psi Niacutevel de atividade mental no qual se tem percepccedilatildeo dos processos internos e externos (em oposiccedilatildeo ao niacutevel da inconsciecircncia ou da subconsciecircncia)

61

E dos significados apresentados pelo Dicionaacuterio Priberam encontram-se

ldquoFaculdade da razatildeo de julgar os proacuteprios atos ou o que eacute certo ou errado do ponto

de vista moral [] Cuidado atenccedilatildeo esmero [] [Medicina] Estado do sistema

nervoso central que permite pensar observar e interagir com o mundo exteriorrdquo62

Segundo Pianigiani o termo ldquoconsciecircnciardquo que vem do latim conscientia eacute

composto de cum uma partiacutecula de intensidade mais scire que significa ldquosaberrdquo63

Lewis trata assim a etimologia da palavra

60

SILVA 2003 p 48 61

CONSCIEcircNCIA 2017 62

Ibid 63

PIANIGIANI 1907 p 357

28

A palavra grega oida e a latina cio significam ldquoeu seirdquo O verbo grego pode ser composto com o prefixo sun ou xun (sunoida) o latino com cum que em composiccedilatildeo torna-se con- dando-nos conscio Sun e cum isolados significam a preposiccedilatildeo ldquocomrdquo E agraves vezes eles mantecircm esse significado quando se tornam prefixos de modo que sunoida e conscio podem significar ldquoConheccedilo conjuntamente compartilho (com algueacutem) o conhecimento dissordquo Mas agraves vezes eles teriam uma forccedila vagamente intensa de modo que os verbos compostos significariam simplesmente ldquoeu conheccedilo bemrdquo e talvez finalmente um pouco mais do que ldquoeu seirdquo Cada verbo tem uma sucessatildeo de palavras relacionadas Com sunoida vai o substantivo suneidesis e (o seu sinocircnimo) o particiacutepio neutro para suneidos e o particiacutepio masculino suneidocircs Com conscio o nome conscientia e o adjetivo conscius [] o duplo valor dos prefixos pode afetar todos estes de modo que suneidesis e conscientia possam ser o estado (ou o ato) de compartilhar o conhecimento ou simplesmente o conhecimento consciecircncia

64 apreensatildeo ndash e mesmo algo como mente ou pensamentordquo

65

Balibar observa que o emprego do termo grego suneidecircsis se deu por uma

retroversatildeo a partir dos romanos e no periacuteodo heleniacutestico eacute que se desenvolveu

como ldquoa maneira com que o indiviacuteduo lsquo[sozinho] consigo mesmorsquo avalia a dignidade

de sua conduta e o valor de sua pessoa nesta vida ou em antecipaccedilatildeo agrave morterdquo 66

Jaacute na Europa conscientia desenvolveu-se historicamente em duas direccedilotildees nas

quais se pode interpretar a partiacutecula cum ldquopor um lado a direccedilatildeo que conota

apropriaccedilatildeo e alcance (conhecer bem estar bem informado sobre) por outro lado a

que conota um compartilhamento privado ou secreto67

E prossegue

Daiacute em diante houve a ideia de um conhecimento reservado a poucas pessoas que cada uma confiava a si mesma Esse significado levou agrave representaccedilatildeo fundamental de um testemunho interno dado a si mesmo e finalmente agrave ideia de um julgamento que eacute feito dentro de noacutes no que diz respeito aos nossos atos e pensamentos Esta eacute a fonte de uma autoridade que se pode opor agrave de qualquer instituiccedilatildeo de imediato o mestre interior e uma garantia de autonomia Esta uniatildeo de contraacuterios a

64

ldquoAwarenessrdquo 65

ldquoGreek oida and Latins cio mean lsquoI knowrsquo The Greek verb can be compounded with the prefix sun or xun (sunoida) the Latin with cum which in composition becomes con- giving us conscio Sun and cum in isolation mean lsquowithrsquo And sometimes they retain this meaning when they become prefixes so that sunoida and cocircnscio can mean lsquoI know together with I share (with someone) the knowledge thatrsquo But sometimes they had a vaguely intensive force so that the compound verbs would mean merely lsquoI know wellrsquo and perhaps finally little more that lsquoI knowrsquo Each verb has a train of related words With sunoida goes the noun suneidesis and (its synonym) the neuter participle to suneidos and the masculine participle suneidocircs with cocircnscio the noun conscientia and the adjective conscious [] the double value of the prefixes may affect all these so that suneidesis and conscientia could be either the state (or act) of sharing knowledge or else simply knowledge awareness aprehension ndash even something like mind or thoughtrdquo LEWIS 1967 p 181

66 ldquo[] the way in which the individual lsquo[alone] with himselfrsquo evaluates the worthiness of his

conduct and the value of his person in this life or in anticipation of deathrdquo BALIBAR 2004 p 175 67

ldquo[] on the one hand the direction that connotes apropriation and achievement (know well be well informed about) on the other hand the one that connotes a private or secret lsquosharingrsquordquo Ibid

29

que a tradiccedilatildeo agostiniana iria dar um peso ontoloacutegico persistiu ateacute o nosso tempo

68

Balibar aponta a identificaccedilatildeo por parte dos Padres da Igreja do termo

ldquoconscientiardquo na alma que confronta seu Criador sendo entatildeo juiacuteza e julgada e seu

desenvolvimento no periacuteodo escolaacutestico com o surgimento do termo synderesis

originado de uma construccedilatildeo sobre anaacutelises equivocadas da palavra suntecircrecircsis

[συντήρησις] encontrada em Satildeo Jerocircnimo que teria dado agrave conscientia um uso

duplo como faculdade tanto ativa como passiva respectivamente como ldquoum traccedilo

da criaccedilatildeo divinardquo e como algo ldquoque opera sob condiccedilotildees de pecado depois da

Quedardquo69 E este mesmo termo syntheresis mais conscientia e conclusio teriam

formado um esquema que influenciaria importantes filoacutesofos posteriores mesmo

apoacutes o primeiro ter caiacutedo em desuso a partir do periacuteodo da Reforma prevalecendo

os sentidos de testemunho interior da moralidade e de sinal da graccedila divina Balibar

indica isto como o iniacutecio da formaccedilatildeo em trecircs episoacutedios da expressatildeo

ldquoautoconsciecircnciardquo70 que afirma ser a ldquoexpressatildeo privilegiada da ideia filosoacutefica da

lsquosubjetividadersquo no Ocidenterdquo71 na qual testemunha-se o que chama ldquoinvenccedilatildeo

europeia da consciecircnciardquo Atribui o primeiro episoacutedio aos debates em torno do termo

ldquoliberdade de consciecircnciardquo no periacuteodo da Reforma o segundo ldquoa uma identificaccedilatildeo

do lsquoeursquo com a atividade da mente reflexiva agrave qual Locke deu o nome de

lsquoconsciousnessrsquordquo72 e o terceiro ao seacuteculo XVIII em que teria havido reinterpretaccedilatildeo

dos princiacutepios do conhecimento e da moralidade73

Nesse segundo episoacutedio o termo ldquoconsciousnessrdquo cristaliza o sentido de

percepccedilatildeo de si da proacutepria mente e do que se passa nela74 Balibar ressalta que no

capiacutetulo 27 do livro II de ldquoEnsaio Sobre o Entendimento Humanordquo de Locke estaacute o

68

ldquoFrom that point on there was the idea of a knowledge reserved for a few people each of whom lsquoconfided in himselfrsquo This meaning led to the fundamental representation of an internal testimony given to oneself [] and finally to the idea of a judgment that is made within us with regard to our acts and thoughts This is the source of an authority that can be oposed to that of any institution at once the interior master and a guarantee of autonomy This union of contraries to which the Augustinian tradition was to give an ontological weight has persisted down to our own timerdquo BALIBAR 2004 p 175

69 Respectivamente ldquo[] a trace of divine creationrdquo e ldquo[] operating under conditions of sin

after the Fallrdquo Ibid p 175 70

ldquoSelf-consciousnessrdquo 71

Respectivamente ldquo[] the privileged expression of the philosophical idea of subjectivity in the Westrdquo e ldquoEuropean invention of consciousnessrdquo Ibid p 175

72 ldquo[] an identification of the lsquoselfrsquo with the mindrsquos reflective activity to which Locke gave the

name lsquoconsciousnessrsquordquo Ibid p 175 73

Ibid p 175 74

Ibid p 180

30

uacutenico emprego do termo ldquoself-consciousnessrdquo pelo filoacutesofo75 realizado no seguinte

contexto

[] sou o mesmo eu mesmo [same my self] agora enquanto escrevo (consista eu [I] completamente na mesma substacircncia material ou imaterial ou natildeo) que eu [I] fui ontem Com efeito quanto a esse ponto de ser o mesmo eu [self] natildeo importa se esse eu presente [present self] eacute constituiacutedo pela mesma ou por diferentes substacircncias desde que eu esteja tatildeo preocupado e seja tatildeo justamente responsaacutevel por qualquer accedilatildeo feita haacute mil anos associada a mim agora por essa autoconsciecircncia [self-consciousness] quanto eu sou pelo que fiz no uacuteltimo momento O eu [self] depende da consciecircncia Eu [self] eacute a coisa consciente pensante (seja ela feita de qualquer substacircncia se espiritual ou material simples ou composta isso natildeo importa) que eacute sensciente ou consciente de prazer e dor capaz de ser feliz ou miseraacutevel e assim que estaacute preocupada com si mesma [it self] tanto quanto sua consciecircncia se estende

76

Esse pensamento indica Balibar77 que relaciona intimamente a consciecircncia e

a autoconsciecircncia agrave memoacuteria e agrave responsabilidade que daacute azo a problematizaccedilotildees

envolvendo o eu (self) e a consciecircncia (consciousness) demarca o ponto de partida

dos conflitos que seratildeo gerados na filosofia moderna e que culminam na distinccedilatildeo

na liacutengua inglesa entre os termos ldquoawarenessrdquo e ldquoconsciousnessrdquo que grosso modo

implicam respectivamente o ter consciecircncia de algo e o ter consciecircncia de que se

tem consciecircncia de algo (que eacute inerente ao ente humano)

Lalande78 opotildee-se agrave ideia de certeza e realidade no acircmbito da definiccedilatildeo de

consciecircncia e sugere que seja abusivo o entendimento desta encontrado por

exemplo em Kant e em Schopenhauer como todo conhecimento imediato da

realidade Ele fornece a seguinte definiccedilatildeo que diz ser somente aproximada

ldquoIntuiccedilatildeo (mais ou menos completa mais ou menos clara) que tem o espiacuterito de seus

estados e de seus atosrdquo79 bem como uma das classificaccedilotildees possiacuteveis do termo

que compreende a consciecircncia espontacircnea que se refere agrave consciecircncia como

pensamento que antecede a distinccedilatildeo entre o saber e o conhecer e na qual natildeo se

diferencia o ato consciente do ato de que se eacute consciente e consciecircncia reflexiva

que ldquosupotildee uma oposiccedilatildeo entre aquele que conhece e aquilo que eacute conhecido e

uma anaacutelise do objeto desse conhecimentordquo80

75

BALIBAR 2004 p 181 76

LOCKE 2015 p 181 77

BALIBAR 2004 p 181 78

LALANDE 1932 79

ldquoIntuition (plus ou moins complegravete plus ou moins claire) qursquoa lrsquoesprit de ses eacutetats et de ses actesrdquo Ibid p 127

80 Ibid p 127-128

31

Como resultado do desenvolvimento das anaacutelises envolvendo o termo alguns

autores reduziram a consciecircncia a simples processos orgacircnicos outros defenderam

que ela seja de algum modo independente do ceacuterebro outros afirmaram que ela tem

base orgacircnica mas se desenvolve para algo mais

Eis as palavras de Chalmers defensor desta uacuteltima hipoacutetese

A experiecircncia consciente eacute ao mesmo tempo a mais familiar do mundo e a mais misteriosa De nenhuma outra coisa temos um conhecimento mais direto que da consciecircncia mas natildeo eacute claro absolutamente como reconciliaacute-la com todo o resto do que sabemos [] Conhecemos a consciecircncia de uma forma muito mais iacutentima do que o resto do mundo mas compreendemos a este uacuteltimo muito melhor do que compreendemos a consciecircncia

81

Ainda assim haacute um bom nuacutemero de tentativas de conceituaccedilotildees e definiccedilotildees

como esta de Damaacutesio

A consciecircncia como usualmente a concebemos de seus niacuteveis elementares aos mais complexos eacute o padratildeo mental unificado que reuacutene o objeto e o self [] A consciecircncia eacute um fenocircmeno inteiramente privado de primeira pessoa que ocorre como parte do processo privado de primeira pessoa que denominamos mente

82

O pesquisador baseia-se em quatro fatos por ele constatados para estruturar

sua teoria

a) o de que ldquoalguns aspectos dos processos da consciecircncia podem ser

relacionados agrave operaccedilatildeo de regiotildees e sistemas cerebrais especiacuteficos abrindo

caminho para a descoberta da arquitetura neural que sustenta a consciecircnciardquo

b) o de que ldquoa consciecircncia e o estado de vigiacutelia assim como a consciecircncia e a

atenccedilatildeo baacutesica podem ser distinguidosrdquo

c) o de que ldquoa consciecircncia e a emoccedilatildeo natildeo satildeo separaacuteveisrdquo

d) o de que ldquoa consciecircncia natildeo eacute um monoacutelito pelo menos natildeo nos seres

humanos ela pode ser separada em tipos complexo e simples e os dados

neuroloacutegicos deixam clara a separaccedilatildeordquo83

81

ldquoLa experiencia consciente es al mismo tiempo lo maacutes familiar del mundo y lo maacutes misterioso De ninguna otra cosa tenemos un conocimiento maacutes directo que de la conciencia pero al mismo tiempo es un tema que para la ciencia ha sido muy difiacutecil para estudiar y conceptualizar varias disciplinas han intentando estudiar este fenoacutemeno una de ella es la filosofiacutea la cual se ha propuesto encontrar una teoriacutea y una explicacioacuten satisfactoria de la conciencia CHALMERS 1999 p 25

82 DAMAacuteSIO 1999 p 30 e 33

83 Ibid p 39-40

32

Ao tipo simples ele denomina ldquoconsciecircncia centralrdquo e ao tipo complexo ele

denomina ldquoconsciecircncia ampliadardquo O primeiro tipo confere ao organismo apenas o

senso de localizaccedilatildeo imediata no tempo e no espaccedilo ou seja no aqui e no agora o

segundo daacute ao organismo uma identidade e uma pessoa dando-lhe a ciecircncia do

passado e do futuro e depende da memoacuteria funcional e da operacional do

raciociacutenio e da linguagem

No acircmbito da etologia cognitiva84 e a fim de verificar o alcance da

consciecircncia e inclusive da inteligecircncia em animais natildeo humanos Herman85

considerou quatro domiacutenios para classificar os dados que obteve com sua equipe no

The Dolphin Institute sobre o desempenho cognitivo e a resposta racional em

espeacutecimes de golfinhos-nariz-de-garrafa (Tursiops truncatus) e inclusive para

classificar as descobertas e ldquoilustrar a flexibilidade comportamental do golfinho que

se estende ateacute mesmo para comportamentos incomuns inovadoresrdquo86 Satildeo eles

a) o declarativo (semacircntico ou representacional)

b) o processual

c) o social

d) o do self

A cada um corresponde uma pergunta cuja resposta afirmativa foi

obtida das observaccedilotildees feitas pelo pesquisador e sua equipe indicando que tais

espeacutecimes apresentam algo que possa ser entendido como sinal de inteligecircncia e

inclusive de consciecircncia segundo as definiccedilotildees atuais Satildeo elas respectivamente

a) ldquoSeraacute que o golfinho mostra conhecimento ou entendimento sobre as

coisasrdquo

b) ldquoSeraacute que o golfinho exibe competecircncia para significados operaccedilotildees ou

meacutetodosrdquo

c) ldquoSeraacute que o golfinho revela consciecircncia social e responsividade nas

interaccedilotildees ou nas relaccedilotildees sociaisrdquo

d) ldquoSeraacute que o golfinho apresenta conhecimento ou consciecircncia (awareness)

de si mesmordquo87

84

GRIFFIN 1994 85

HERMAN 2006 86

ldquoto illustrate the behavioural flexibility of the dolphin that extends even to unusual innovative behavioursrdquo Ibid p 442

87 Respectivamente does the dolphin display knowledge or understanding about things

does the dolphin exhibit competency in means operations or methods does the dolphin reveal

33

Herman ali entende a consciecircncia de si ou autoconsciecircncia como um

conceito multidimensional razatildeo pela qual escolheu duas outras facetas dela para

estudar que implicam a indagaccedilatildeo de se os animais tecircm consciecircncia de seus

proacuteprios comportamentos e tambeacutem de suas proacuteprias partes corporais o que ateacute

entatildeo lhe parecia natildeo ter sido feito em razatildeo de ainda segundo ele as pesquisas

anteriores terem-se limitado a experimentos com espelhos para verificaccedilatildeo do

autorreconhecimento com resultados positivos Mantendo a ideia de Burghardt e

Bekoff88 de que a consciecircncia apresenta vaacuterios niacuteveis alguns anos depois Herman89

reuniu novamente informaccedilotildees de estudos anteriores que apontam para a presenccedila

em golfinhos de autoconsciecircncia e consciecircncia corporal do ego corporal

experienciado subjetiva e objetivamente corroborando o trabalho anterior

Seguindo a mesma esteira de Damaacutesio Ades descreve um pouco mais a

distinccedilatildeo supramencionada dos dois tipos de consciecircncia um o ldquoawarenessrdquo que

ldquose constitui no contato imediato entre o indiviacuteduo e seu contexto interno ou externo

Eacute um dar-se conta de que algo existerdquo e outro o ldquoconsciousnessrdquo ou a consciecircncia

capaz de reflexatildeo exclusivo dos humanos que

[] envolve um desdobramento eacute um dar-se-conta do dar-se-conta o indiviacuteduo eacute capaz de designar e de descrever o seu conhecimento das coisas Pode-se supor que tome como objeto o proacuteprio fato de estar consciente Estabelece implicitamente uma distinccedilatildeo entre o objeto percebido e sua percepccedilatildeo do objeto diferencia-se a si mesmo (como fonte do conhecer) daquilo que eacute conhecido Trata-se de uma consciecircncia capaz de ser comunicada em niacutevel simboacutelico isto eacute que pode ser dita

90

Com isto Ades sugere que os animais ou ao menos alguns deles tambeacutem

possuem algum tipo de consciecircncia Baseia-se ele em propostas como a de Griffin

(1994) considerado o fundador da Etologia Cognitiva

Uma razatildeo para suspeitar de que os animais natildeo humanos apresentam pensamentos conscientes eacute que a estrutura baacutesica e o funcionamento dos neurocircnios e sinapses satildeo muito similares ateacute onde sabemos nos animais com sistema nervoso central organizado Natildeo haacute evidecircncias convincentes de que caracteriacutesticas especiacuteficas da neuroanatomia macroscoacutepica sejam essenciais para o pensamento consciente no entanto eacute melhor manter uma mente aberta para a possibilidade de haver consciecircncia em todos os

social awareness and apropriate responsiveness in social interactions or relations does the dolphin exhibit knowledge or awareness of itself HERMAN 2006 p 442

88 BURGHARDT BEKOFF 2009

89 HERMAN 2012

90 ADES 1997

34

animais que exibem comportamento versaacutetil ou se comunicam de forma a sugerir que eles possam estar expressando pensamentos ou sentimentos

91

Fundamenta-se pois o autor na hipoacutetese de que ldquoo comportamento e a

consciecircncia no homem e em outros animais resultam integralmente de eventos que

ocorrem em seus sistemas nervosos centraisrdquo92 seguindo a mesma linha do filoacutesofo

John Searle que afirma ldquo[] a consciecircncia assim como a intencionalidade satildeo

processos bioloacutegicos causados por processos neurais de niacutevel mais baixo que

ocorrem no ceacuterebro e nenhuma das duas coisas eacute redutiacutevel a algo distintordquo93

Muitos estudos como se veraacute no desenvolvimento deste trabalho parecem

corroborar a hipoacutetese acima defendida por Griffin e Ades mas mais ainda em

vaacuterias correntes de pesquisa mais recentes tecircm-se atribuiacutedo o termo inteligecircncia em

algum grau a diversas espeacutecies de animais por estas apresentarem muitas das

habilidades elencadas pelos estudiosos das ciecircncias cognitivas

Jaacute o fazia Aristoacuteteles considerado o pai da metodologia cientiacutefica do meacutetodo

comparativo precursor da proacutepria biologia94 em um sentido especiacutefico que seraacute o

objeto principal deste trabalho provavelmente tenham-no feito antes de Aristoacuteteles

jaacute que os estudos dos seres viventes se datildeo desde tempos imemoriais e o fizeram

durante os seacuteculos que se seguiram como se nota por exemplo nos estudos de

Tomaacutes de Aquino de seu mestre Alberto Magno de alguns dos filoacutesofos aacuterabes

medievais e de outros grandes naturalistas e em filoacutesofos ainda posteriores como

Descartes que por sua vez se apresenta nesse percurso com uma marcante e

controversa ressalva digna de nota

Teria afirmado o filoacutesofo que os animais natildeo humanos seriam como

maacutequinas autocircmatos por seus processos orgacircnicos mas incomparavelmente

superiores a qualquer aparato construiacutedo pelo homem e apontando que natildeo

apresentam linguagem nem raciocinam o que fez parecer a muitos ter negado aos

animais natildeo somente isto mas inclusive a presenccedila de consciecircncia e ateacute mesmo de

sentimentos e sensaccedilotildees Alguns autores poreacutem como Cottingham95 respondem a

91

GRIFFIN 1994 p 4 92

Ibid p 4-5 93

ldquoTanto la conciencia como la intencionalidad son procesos bioloacutegicos causados por procesos neuronales de nivel maacutes bajo que tienen lugar en el cerebro y ninguna de las dos cosas es reductible a algo distintordquo SEARLE 1992 p 2

94 MAYR 2000 p 25 87-88 Diz Mayr ldquoIn almost any portion of the history of biology one has

to start with Aristotle []rdquo 95

COTTINGHAM 1978

35

isto alegando que natildeo haacute motivos suficientes para inferir que a ausecircncia de

racionalidade implicaria um mecanicismo tatildeo exacerbado que chegasse a esse

ponto

Hume96 poreacutem ao tratar do tema em sua Investigaccedilatildeo Acerca da Natureza

Humana atribui certo tipo de raciociacutenio aos animais que diz tratar-se de um

raciociacutenio experimental instintivo de poder mecacircnico sem relaccedilotildees de ideias e que

o homem tambeacutem possui ainda que natildeo se limite a ele Hume desenvolve sua tese

partindo da analogia e da inferecircncia no sentido de que se algueacutem como diz

observa a circulaccedilatildeo em um animal como a ratilde ou o peixe presumiraacute que o mesmo

processo ocorre em outros animais Diz entatildeo que tal como os homens os animais

[] apreendem muitas coisas da experiecircncia e inferem que os mesmos eventos resultaratildeo sempre das mesmas causas Mediante este princiacutepio familiarizam-se com as propriedades a partir de seu nascimento acumulam conhecimentos sobre a natureza do fogo da aacutegua da terra das pedras das altitudes das profundidades etc e daquilo que resulta de sua accedilatildeo Aqui se distingue claramente a ignoracircncia e a inexperiecircncia do jovem frente agrave astuacutecia e agrave sagacidade dos velhos que tecircm aprendido por uma longa observaccedilatildeo a evitar o que os fere e a perseguir o que lhes proporciona bem-estar e prazer

97

Ressalta em seguida que o adestramento deixa isto ainda mais evidente

explicando que

[] o animal infere um fato que ultrapassa aquilo que impressiona imediatamente seus sentidos [] esta experiecircncia estaacute completamente fundada na experiecircncia passada visto que a criatura espera do objeto presente os mesmos resultados que em sua observaccedilatildeo sempre tem visto derivar de objetos semelhantes

98

Explica em seguida que essa inferecircncia natildeo se funde em nenhum processo

racional mas que se daacute por induccedilatildeo do costume que apoacutes a impressatildeo de

determinado objeto nos sentidos faz com que a imaginaccedilatildeo conceba aquilo que lhe

estaacute associado ou seja concebendo um em razatildeo do surgimento do outro Hume

chama ldquocrenccedilardquo ao modo como isto se daacute e denomina ldquoinstintordquo uma capacidade

nos animais de aperfeiccediloar e superar em muito com a praacutetica e a experiecircncia certas

aptidotildees ordinaacuterias

96

HUME 2001 p 128-132 97

Ibid p 129 98

Ibid p 130

36

Na esteira de filoacutesofos como Hume e ainda que sob a influecircncia cartesiana o

termo inteligecircncia veio a ser mais significativamente atribuiacutedo a animais natildeo

humanos a partir do seacuteculo XIX como se observa na obra de Darwin ldquoThe Descent

of Man and Selection in Relation to Sexrdquo escrito em 1871 e quando o tema passou

a ser tratado inclusive em laboratoacuterio de modo mais especializado Esta obra de

Darwin precedeu outra que passou a ser considerada precursora da moderna

etologia lanccedilada no ano seguinte ldquoThe Expression of Emotions in Man and

Animalsrdquo em que o naturalista trata inicialmente das reaccedilotildees instintivas dos animais

natildeo humanos relacionadas agraves emoccedilotildees dos movimentos voluntaacuterios e involuntaacuterios

dos atos consequentes do reflexo sejam os inatos sejam aqueles adquiridos por

costume ou por associaccedilotildees que reaparecem mediante as mesmas causas que o

originaram99 e em seguida e antes de abordar o tema em relaccedilatildeo aos humanos

com o que concluiraacute seu estudo descreve as reaccedilotildees emocionais nos animais

tendo documentado expressotildees como o prazer a alegria o afeto a coacutelera a dor

etc que pareceram ser mais evidentes nos macacos

Em ldquoThe Descent of Manrdquo Darwin defende que haacute inteligecircncia nos animais100

e narra uma seacuterie de casos em que afirma haver neles memoacuteria como o de um catildeo

que teve e que natildeo via haacute cinco anos e ao reencontraacute-lo o animal o seguiu como

fazia em outros tempos diz ele pelo encontro ter ldquo[] instantaneamente despertado

em seu espiacuterito uma seacuterie de antigas associaccedilotildees []rdquo ou das formigas que diz

reconhecerem membros do mesmo grupo apoacutes separaccedilatildeo de quatro meses101

afirma haver neles tambeacutem imaginaccedilatildeo o que exemplifica com o fato de outros

autores que diz serem suficientemente confiaacuteveis terem constatado catildees gatos

cavalos e aves sonhando e certa aptidatildeo para o raciociacutenio102 Por raciociacutenio aqui

entende ldquofazer pausas deliberar e resolverrdquo103 E pouco adiante critica aqueles que

levantam barreiras inalcanccedilaacuteveis entre os animais e os homens o que objetaria agrave

sua teoria evolucionista e cita dentre outras caracteriacutesticas atribuiacutedas nessa visatildeo

aos animais como a consciecircncia proacutepria a ausecircncia de linguagem da faculdade de

abstraccedilatildeo e de ideias gerais reconhecendo que essas duas uacuteltimas encontram

plena exclusividade nos homens pois ldquoningueacutem supotildee que um animal inferior reflita

99

Sobre os reflexos adquiridos por costume cf DARWIN sd b) p 50 e quanto ao que mais se diz DARWIN sd b) passim

100 DARWIN sd a) p 22

101 Ibid p 28-29

102 Ibid p 29

103 ldquo[] hacer pausas deliberar y resolverrdquo Ibid p 29

37

sobre a vida e a morte nem outros assuntos parecidosrdquo104 jaacute que as aptidotildees

mentais em noacutes alcanccedilaram um niacutevel superior que diz implicar o uso plenamente

desenvolvido da linguagem105 Acrescenta tambeacutem agraves duas o senso moral

consciecircncia moral106 embora sugira que na fidelidade aos companheiros em

especial na do catildeo em relaccedilatildeo ao dono ndash o que exemplifica com o fato de aquele

natildeo roubar alimento na presenccedila deste ndash haja algo que se pareccedila muito com a

moralidade Por outro lado reconhece que esses animais aos quais chama

inferiores possuem personalidade e defende que haja algum tipo de consciecircncia107

Darwin apresenta entatildeo uma seacuterie de exemplos a partir dos quais infere haver o que

chama ldquoracionalidaderdquo nos animais alguns dos quais descreveremos brevemente

mais adiante

O termo inteligecircncia passou a ser especialmente atribuiacutedo aos animais natildeo

humanos com o surgimento de linhas de pesquisa como a etologia que tecircm como

proposta uma compreensatildeo que se sobrepotildee a um mecanicismo que apontam nos

trabalhos e nas teses de pesquisadores behavioristas renomados como na do

reflexo condicionado de Pavlov na do condicionamento operante de Skinner e na do

associacionismo e na lei do efeito de Thorndike que no final do seacuteculo XIX publicava

suas pesquisas sobre a chamada inteligecircncia animal apoacutes uma bateria de testes108

Em seu trabalho apresentado em 1898 que se tornou um marco para os

estudos do comportamento animal e inclusive para o desenvolvimento da psicologia

behaviorista Thorndike elogia o trabalho de Morgan Lloyd publicado havia pouco

menos de uma deacutecada Este diria o seguinte das associaccedilotildees que fundamentaratildeo

natildeo soacute o trabalho de 1898 mas tambeacutem a visatildeo behaviorista e que jaacute haviam sido

percebidas por Aristoacuteteles em especial das criadas artificialmente

No treinamento de animais (e de crianccedilas mais jovens) foram estabelecidas associaccedilotildees artificiais agradaacuteveis ou dolorosas em conexatildeo com certas accedilotildees Introduziram-se aversotildees e apetecircncias anormais na constituiccedilatildeo mental Este processo em muito depende da plasticidade da constituiccedilatildeo Na ausecircncia de tal plasticidade eacute impossiacutevel estabelecer novas associaccedilotildees

109

104

ldquoNadie supone que un animal inferior reflexione sobre la vida y la muerte ni otros asuntos parecidos []rdquo DARWIN sd a) p 43

105 Ibid p 32 e 43

106 Ibid p 48-49

107 Ibid p 43-44 e 49

108 TOURINHO 2009

109 ldquoIn the training of animals (and young children) artificial associations pleasurable or

painful have to be established in connection with certain actions Abnormal apetences and aversions

38

Com base em diversos estudos de outros pesquisadores com elefantes

raposas catildees e outros animais reconhecendo por exemplo que os catildees

comunicam certos desejos seus aos humanos que elefantes podem quebrar partes

vegetais para utilizaacute-las como instrumento para remover sanguessugas do corpo ou

espantar moscas110 etc Lloyd apontou trecircs tipos de inferecircncia sendo as duas

primeiras perceptivas e a terceira conceitual a ldquoinferecircncia inconsciente em

construccedilatildeo imediatardquo a ldquoinferecircncia inteligente que lida com construccedilotildees e

reconstruccedilotildees e a ldquoinferecircncia racional que implica anaacutelise e isolamentordquo111 e nesse

sentido chamava inteligentes certos animais negando nestes a presenccedila de ideias

abstratas112

Voltando a Thorndike este chegou a admitir consciecircncia nos animais mas

restringindo-a agraves impressotildees dos sentidos aos impulsos aos sentimentos e aos

atos corporais de um indiviacuteduo113 negando expressamente a possibilidade de estar

relacionada a ideias ou a impulsos livres114 O pesquisador realizou experimentos

com catildees galinhas mas especialmente com gatos que eram colocados em uma

caixa que tinha um dispositivo com fio e alavanca o qual era tocado acidentalmente

pelo animal que entatildeo via a caixa ser aberta possibilitando o acesso ao alimento a

recompensa fora dela Na seccedilatildeo seguinte o animal mostrava ter aprendido como

abrir a caixa mas natildeo repetia intencionalmente e de forma imediata o feito diante

de mudanccedilas no dispositivo

O pesquisador distinguiu as reaccedilotildees nos animais que satildeo realizadas sem

experiecircncia preacutevia das que satildeo construiacutedas com a experiecircncia que satildeo o objeto de

seu estudo e que se datildeo por processos associativos diante da ausecircncia do

pensamento abstrato que conceitua e infere que caracteriza o ente humano115

Depois de apontar limitaccedilotildees dos estudos anteriores aos seus sobre a

chamada inteligecircncia animal cujos meacutetodos segundo ele se baseavam na questatildeo

ldquoo que eles fazemrdquo parte da pergunta que acrescenta agrave anterior e agrave ldquocomo eles

have to be introduced into the mental constitution In this process much depends on the plasticity of the constitution In the absence of such plasticity it is impossible to establish new associationsrdquo LLOYD 1891 p 343

110 Ibid p 345 e 370

111 Respectivamente unconscious inference on immediate construction intelligente

inference dealing with constructs and reconstructs e rational inference implying analysis and isolation Ibid p 362

112 Id 1898 p 348

113 THORNDIKE 1898 p 84

114 Ibid p 108

115 Ibid p 1

39

fazem issordquo como proposta para novo meacutetodo ldquolsquoo que eles sentem enquanto

agemrdquo116 e conclui sobre as associaccedilotildees formadas que observou em laboratoacuterio

que ldquosatildeo absolutas e o que quer que delas se possa deduzir eacute certordquo117 e ainda que

embora elas

sejam tais que natildeo poderiam ter sido anteriormente experimentadas ou fornecidas por hereditariedade ainda natildeo satildeo tatildeo distantes do curso ordinaacuterio da vida do animal Elas significam simplesmente a conexatildeo de um determinado ato com uma determinada situaccedilatildeo resultante do prazer e esse tipo geral de associaccedilatildeo eacute encontrado normalmente atraveacutes da vida do animal

118

Com base nisto a definiccedilatildeo da lei do efeito viria a ser apresentada na

republicaccedilatildeo da obra em 1911

Das vaacuterias respostas agrave mesma situaccedilatildeo aquelas que satildeo acompanhadas ou seguidas de perto pela satisfaccedilatildeo do animal seratildeo mantidas iguais as outras coisas mais firmemente conectadas com a situaccedilatildeo de modo que quando [a situaccedilatildeo] repetir-se seraacute mais provaacutevel que voltem a ocorrer aquelas que satildeo acompanhadas ou seguidas de perto pelo desconforto do animal teratildeo mantidas iguais as outras coisas suas conexotildees com aquela situaccedilatildeo enfraquecidas de modo que quando [a situaccedilatildeo] repetir-se seraacute menos provaacutevel que voltem a ocorrer Quanto maior a satisfaccedilatildeo ou o desconforto maior o fortalecimento ou enfraquecimento do viacutenculo

119

Thorndike denomina instinto ldquoqualquer reaccedilatildeo que um animal tem sem

experiecircncia em relaccedilatildeo a uma situaccedilatildeordquo120 E por ldquoimpulsordquo ele entende

[] a consciecircncia que acompanha uma inervaccedilatildeo muscular uma parte daquele sentimento do ato que vem de ver a si mesmo mover do sentimento do corpo do sujeito em uma posiccedilatildeo diferente etc Eacute o sentimento direto do fazer enquanto distinto da ideia do ato realizado obtida atraveacutes do olho etc [] por impulso eu nunca me refiro ao motivo do ato No discurso popular pode-se dizer que aquela fome eacute o impulso que faz o

116

Respectivamente ldquowhat they dordquo ldquohow they do itrdquo ldquolsquowhat they feelrsquo while they actrdquo THORNDIKE 1898 p 5

117 ldquoThey are absolute and whatever can be deduced from them is surerdquo Ibid p 7

118 ldquo[] altough the associations formed are such as could not have been previously

experienced or provided for by heredity they are still not too remote from the animalrsquos ordinary course of life They mean simply the connection of a certain act with a certain situation and resultant pleasure and this general type of association is found troughout the animalrsquos life normallyrdquo Ibid p 7-8

119 Traduzido por Tourinho 2011 ldquoThe Law of Effect is that Of several responses made to the

same situation those which are accompanied or closely followed by satisfaction to the animal will other things being equal be more firmly connected with the situation so that when it recurs they will be more likely to recur those which are accompanied or closely followed by discomfort to the animal will other things being equal have their connections with that situation weakened so that when it recurs they will be less likely to occur The greater the satisfaction or discomfort the greater the strengthening or weakening of the bondrdquo Id 1911 p 118

120 ldquo[] any reaction which an animal makes to a situation without experiencerdquo Id 1898 p 14

40

gato arranhar Isso nunca seraacute usado aqui A palavra lsquomotivorsquo sempre denotaraacute esse tipo de consciecircncia

121

Pavlov por sua vez defendeu a visatildeo de que instinto nada mais eacute do que

reflexo respostas do organismo a estiacutemulos sejam eles externos ou internos e a

justifica com comparaccedilotildees entre a complexidade de comportamentos ditos

instintivos como por exemplo a construccedilatildeo de um ninho por uma ave com a

complexidade exigida por efeitos que resultam de determinados estiacutemulos

nervosos122

E define assim reflexo baseando-se na visatildeo de Descartes

Um estiacutemulo externo ou interno recai sobre um ou outro receptor nervoso e daacute origem a um impulso nervoso esse impulso nervoso eacute transmitido ao longo das fibras nervosas para o sistema nervoso central e aqui por causa das conexotildees nervosas existentes daacute origem a um novo impulso que passa ao longo das fibras nervosas que saem para o oacutergatildeo ativo onde excita uma atividade especial das estruturas celulares Assim um estiacutemulo parece estar conectado de necessidade a uma resposta definida como a causa com o efeito Parece oacutebvio que toda a atividade do organismo deve obedecer a leis definidas

123

Acrescenta a esse tipo de reflexo inato que principalmente se relaciona a

atividades de tecidos e oacutergatildeos particularmente outro que ocorre no sistema

nervoso relacionado ao comportamento instintivo dos animais que afirma tratar-se

das ldquoreaccedilotildees inevitaacuteveis a estiacutemulos perfeitamente definidosrdquo124 e entatildeo explica o

que chamou reflexo condicionado

Com uma compreensatildeo completa de todos os fatores envolvidos os novos reflexos de sinalizaccedilatildeo estatildeo sob o controle absoluto do experimentador eles procedem de acordo com leis tatildeo riacutegidas como as de qualquer outro processo psicoloacutegico e devem ser considerados como sendo em todos os

121

ldquo[] means the consciousness accompanying a muscular inervation a part from that feeling of the act wich comes from seeing oneself move from feeling onersquos body in a different position etc It is the direct feeling of the doing as distinguished from the idea of the act done gained through eye etc by impulse I never mean the motive to the act In popular speech you may say that hunger is the impulse wich makes the cat claw That will never be the use here The word motive will always denote that sort of consciousnessrdquo THORNDIKE 1898 p 14-15

122 PAVLOV 1927 p 9-11

123 ldquoAn external or internal stimulus falls on some one or other nervous receptor and gives rise

to a nervous impulse this nervous impulse is transmitted along nerve fibres to the central nervous system and here on account of existing nervous connections it gives rise to a fresh impulse which passes along outgoing nerve fibres to the active organ where it excites a special activity of the cellular structures Thus a stimulus apears to be connected of necessity with a definite response as cause with effect It seems obvious that the whole activity of the organism should conform to definite lawsrdquo Ibid p 7

124 ldquo[] the inevitable reactions to perfectly definite stimulirdquo Ibid p 9

41

sentidos uma parte da atividade fisioloacutegica dos seres viventes Eu denominei esse novo grupo de reflexos ldquoreflexos condicionadosrdquo para distingui-los dos reflexos inatos ou natildeo condicionados O termo ldquocondicionadordquo tem sido em geral cada vez mais empregado e eu penso que seu uso eacute plenamente justificado jaacute que comparado com os reflexos inatos esses novos reflexos realmente dependem de muitas condiccedilotildees tanto em sua formaccedilatildeo como na manutenccedilatildeo de sua atividade fisioloacutegica

125

Pavlov analisou os efeitos reflexos em animais especialmente em catildees a

partir de estiacutemulos positivos ou negativos que por exemplo despertavam a

salivaccedilatildeo tanto no estado de normalidade como no estado hipnoacutetico126 ou a partir

de situaccedilotildees em que o animal estava impedido de mover-se127 Realizou tambeacutem

experimentos com chimpanzeacutes observando que os animais criavam associaccedilotildees

inicialmente por tentativa e erro que eram reforccediladas com a obtenccedilatildeo da

recompensa (alimento) e demonstravam gradualmente aprimoramento resultante

de anaacutelise e do aprendizado obtendo pleno sucesso na realizaccedilatildeo da tarefa128

Neste contexto teceu criacuteticas a certas conclusotildees de Koumlhler e Yerkes em que

sugeriam ao contraacuterio de Pavlov e em oposiccedilatildeo agraves conclusotildees de Thorndike haver

certa racionalidade nos chimpanzeacutes testados a partir de publicaccedilotildees de seus

trabalhos que marcaram certo pioneirismo na busca por inteligecircncia nos grandes

macacos Koumlhler e Yerkes seguiram com as pesquisas com grandes macacos a

esteira de John B Watson fundador do behaviorismo e um dos poucos

pesquisadores tal como Margaret Washburn que tratavam da psicologia comparada

no despontar do seacuteculo XX129

Koumlhler deu iniacutecio a uma seacuterie de testes especialmente com chimpanzeacutes a

partir de indagaccedilotildees como esta

Esses seres mostram muitas caracteriacutesticas humanas em seu comportamento ldquocotidianordquo o que faz levantar a questatildeo de se eles natildeo se comportam com inteligecircncia e insight sob condiccedilotildees que requerem tal

125

ldquoWith a complete understanding of all the factors involved the new signalizing reflexes are under the absolute control of the experimenter they proceed according to as rigid laws as do any other physiological processes and must be regarded as being in every sense a part of the physiological activity of living beings I have termed this new group of reflexes conditioned reflexes to distinguish them from the inborn or unconditioned reflexes The term conditioned is becoming more and more generally employed and I think its use is fully justified in that compared with the inborn reflexes these new reflexes actually do depend on very many conditions both in their formation and in the maintenance of their physiological activityrdquo PAVLOV 1927 p 25

126 Id 1984 p 77-82

127 Ibid p 11-12

128 Ibid p 128-129

129 DEWSBURY 2013

42

comportamento Essa questatildeo expressa o primeiro pode-se dizer novo interesse na capacidade intelectual dos animais

130

Nelas emprega o termo ldquointeligecircnciardquo ldquono sentido em que a palavra eacute aplicada

ao homemrdquo131 ainda que natildeo se trate de algo bem definido mas que

superficialmente se reconheccedila como tal diferenciando-se de outros tipos de

comportamentos em especial nos proacuteprios animais Koumlhler explica entatildeo que o

emprego do termo se daacute em estudos como aqueles que realizou quando diante de

circunstacircncias que impedem o curso comum para atingir um determinado fim como

a realizaccedilatildeo de uma tarefa o ente toma um caminho diferente para resolver a

situaccedilatildeo diferentemente de quando o ente toma o caminho direto inquestionaacutevel

que ldquoclaramente surge naturalmente fora de sua organizaccedilatildeordquo132

Os experimentos que realizou partiram de testes mais simples que exigiam

somente movimentos do proacuteprio animal como para encontrar uma abertura em um

recinto que pudesse contornar e chegar ao alimento tornando-se gradualmente

mais complexos ao que passariam a reconhecer obstaacuteculos como uma caixa que

impedia o animal de alcanccedilar alimento fora da jaula e mesmo precisar da utilizaccedilatildeo

de outro objeto ou seja de um instrumento para alcanccedilar a recompensa do outro

lado da grade da jaula fosse por exemplo de cordas que precisava movimentar

para trazer a comida para perto ou de varas para alcanccedilar diretamente o alimento

e em testes posteriores trazer outra vara maior que ao contraacuterio da primeira

utilizada alcanccedilaria o objeto ou ainda de uma vara que teria de ser encaixada em

outra com uma abertura para alcanccedilar a recompensa mais distante etc Outros

experimentos envolveram caixas que deveriam ser empilhadas para que o animal

alcanccedilasse o alimento previamente suspendido no teto do local pelo

experimentador e mesmo com o auxiacutelio de uma vara

Yerkes por sua vez publicou muitas obras a principal com sua esposa um

grande tratado sobre os grandes antropoides no qual eles agregaram aos

resultados de seus estudos precedentes os de muitos outros pesquisadores

envolvidos com o tema desde os seacuteculos anteriores mas com bastantes referecircncias

130

ldquoThese beings show so many human traits in their lsquoeverydayrsquo behaviour that the question naturally arises whether they do not behave with intelligence and insight under conditions wich require such behaviour This question expresses the first one may say naive interest in the intelectual capacity of animalsrdquo KOumlHLER 1927 p 1

131 ldquo[] in the sense in wich the word is aplied to humanrdquo Ibid p 1

132 ldquo[] which clearly arises naturally out of their organizationrdquo Ibid p 3-4

43

ao trabalho de Koumlhler Ao destacar a inteligecircncia especialmente em orangotangos e

chimpanzeacutes relata casos curiosos como o de um orangotango do seacuteculo XVIII que

aprendeu a rodar a chave e a abrir a porta depois de ver o pesquisador fazecirc-lo133 E

aleacutem disso forneceu inclusive algumas sugestotildees para futuros estudos como para

a comprovaccedilatildeo do autorreconhecimento de macacos em espelhos algo que diz jaacute

vinha sendo bastante relatado134

Em paralelo e nos anos seguintes Skinner desenvolveria principalmente os

estudos de Thorndike e Pavlov realizando pesquisas especialmente com ratos e

pombos envolvendo reforccedilo positivo e negativo ou recompensa e puniccedilatildeo135 Ele

define inicialmente comportamento como ldquoparte da atividade total de um

organismo eacute o que um organismo estaacute fazendo ndash mais precisamente que eacute

observado por outro organismordquo ao que acrescenta ldquoeacute aquela parte do

funcionamento de um organismo que estaacute empenhada em agir ou estabelecer

relaccedilotildees com o mundo exteriorrdquo chegando entatildeo ao corolaacuterio

Por comportamento entatildeo refiro-me simplesmente ao movimento de um organismo ou de suas partes em um quadro de referecircncia fornecido pelo proacuteprio organismo ou por vaacuterios campos de forccedila ou objetos externos Eacute conveniente falar disso como a accedilatildeo do organismo sobre o mundo exterior e frequentemente eacute desejaacutevel lidar com um efeito em vez de com o proacuteprio movimento como no caso da produccedilatildeo de sons

136

Seus experimentos com animais consistiram basicamente em modelar neles

gradualmente novos comportamentos por meio de condicionamento que ele

entende como

[] um tipo de mudanccedila na forccedila do reflexo onde a operaccedilatildeo realizada sobre o organismo para induzir a mudanccedila eacute a apresentaccedilatildeo de um estiacutemulo de reforccedilo em certa relaccedilatildeo temporal com o comportamento Diferentes tipos de reflexos condicionados surgem porque um estiacutemulo de reforccedilo pode ser apresentado em diferentes tipos de relaccedilotildees temporais

137

133

YERKES R M YERKES A W 1929 p 176 134

Ibid p 171 135

CARVALHO NETO MAYER 2011 136

Respectivamente ldquo[] part of the total activity of an organismo [] is what an organism is doing ndash or more accurately what it is observed by another organism to be doingrdquo ldquois that part of the functioning of an organism which is engaged in acting upon or having commerce with the outside worldrdquo e ldquoBy behavior then I mean simply the movement of an organism or of its parts in a frame of reference provided by the organism itself or by various external objects or fields of force It is convenient to speak of this as the action of the organism upon the outside world and it is often desirable to deal with an effect rather than with the movement itself as in the case of the production of soundsrdquo SKINNER 1938 p 6

137 ldquoLet conditioning be defined as a kind of change in reflex strength where the operation

performed upon the organism to induce the change is the presentation of a reinforcing stimulus in a

44

Este condicionamento conhecido como ldquocondicionamento operanterdquo daacute-se a

partir de estiacutemulos que provocavam a repeticcedilatildeo de determinado comportamento

Essa repeticcedilatildeo gera o reforccedilo ou ldquoreforccedilamentordquo que entatildeo resulta na modificaccedilatildeo

comportamental Grande parte de seus experimentos eram realizados tambeacutem em

uma espeacutecie de caixa que passou a ser conhecida como ldquocaixa de Skinnerrdquo

Consistiam por exemplo em fazer um rato aprender a a partir de um estiacutemulo

como uma luz piscando ou um sinal sonoro pressionar com determinada

intensidade uma barra com apenas uma das patas dianteiras para que entatildeo se

abrisse um recipiente de onde poderia retirar o alimento como recompensa Para

isto cada movimento realizado aleatoriamente pelo animal na direccedilatildeo deste

propoacutesito era recompensado ateacute que ele o aprendesse gerando o que Skinner dizia

ser uma cadeia de reflexos um movimento determinado era realizado repetido

reforccedilado e entatildeo se passava para o movimento seguinte138

A partir de seus estudos ele definiu outros termos fundamentais como

ldquorespondenterdquo ou seja o comportamento de resposta a um estiacutemulo provocado e

ldquooperanterdquo sobre o qual inicialmente ele se restringe a dizer que eacute aquele que natildeo eacute

respondente139 mas posteriormente acrescenta que ldquoum operante eacute definido por

suas consequecircnciasrdquo140 e o define como ldquoUma classe da qual uma resposta eacute uma

instacircncia ou membro []rdquo e entatildeo explica como um conjunto de contingecircncias eacute

aquilo que o caracteriza

[] satildeo sempre instacircncias que satildeo contadas na determinaccedilatildeo da frequecircncia e a partir dessa frequecircncia a probabilidade de uma resposta ser inferida A probabilidade eacute frequentemente tomada no entanto como a medida da forccedila de um operante A forccedila da resposta natildeo tem significado salvo como uma propriedade de uma instacircncia como sua forccedila ou velocidade Eacute sempre uma resposta sobre a qual um determinado reforccedilo eacute contingente mas o eacute sob propriedades que definem a adesatildeo a um operante

141

certain temporal relation to behavior [] Different types of conditioned reflexes arise because a reinforcing stimulus may be presented in different kinds of temporal relationsrdquo SKINNER 1937 p 1

138 Id 1938 p 48-55

139 Ibid p 19

140 SKINNER 1969 p 128

141 ldquoAn operant is a class of which a response is an instance or member [] it is always

instances which are counted in determining frequency and from that frequency the probability of a response inferred The probability is frequently taken however as the measure of the strength of an operant Strength of response has no meaning except as a property of an instance such as its force or speed It is always a response upon which a given reinforcement is contingent but it is contingent upon properties which define membership in an operant Thus a set of contingencies defines an operantrdquo Ibid p 132

45

Os estudos de Skinner com animais passaram a ser empregados

posteriormente em humanos no acircmbito da educaccedilatildeo escolar por meacutetodos como o

da Instruccedilatildeo Direta (Direct Instruction) e o da Aprendizagem para o Domiacutenio

(Mastery Learning) o que veio a gerar uma seacuterie de controveacutersias e protestos nos

Estados Unidos142

Segundo Tourinho poreacutem eacute Skinner quem rompe com o mecanicismo

naquela corrente de pesquisa

[] eacute apenas com Skinner que o selecionismo como modo causal encontra uma elaboraccedilatildeo refinada na ciecircncia do comportamento uma elaboraccedilatildeo que articula as relaccedilotildees entre filogecircnese ontogecircnese e cultura como niacuteveis de seleccedilatildeo do comportamento e que operam ora em uma mesma direccedilatildeo ora em direccedilotildees conflitantes sobrepondo-se uns aos outros Foi a elaboraccedilatildeo skinneriana que definitivamente afastou o mecanicismo assinalando a bidirecionalidade variabilidade e dependecircncia muacutetua das relaccedilotildees entre respostas e estiacutemulos e o caraacuteter probabiliacutestico da determinaccedilatildeo das primeiras uma perspectiva ainda natildeo inteiramente explorada na proacutepria ciecircncia do comportamento

143

E paralelamente aos estudos de Skinner avanccedilavam as pesquisas sobre o

comportamento animal na chamada ldquorevoluccedilatildeo cognitivardquo dos anos 60 e 70144

quando inclusive iniciavam os estudos de pesquisadores como Jane Goodal ndash que

forneceu valiosas contribuiccedilotildees para a primatologia estudando em campo os

chimpanzeacutes de Gombe na Tanzacircnia ndash passava assim a ser reconhecida como

disciplina cientiacutefica a linha de pesquisa conhecida por etologia termo proposto pelo

zooacutelogo Isidoire Geoffroy Saint-Hilaire em 1854145 formalmente inaugurada com os

trabalhos de Konrad Lorenz Nikolaas Tinbergen e Karl von Frisch Nesse acircmbito a

inteligecircncia animal ganha um novo enfoque com as pesquisas de Donald Griffin que

dentro da etologia desenvolveu a etologia cognitiva na busca em meio agrave entatildeo

presente visatildeo em que se analisava melhor fatores como expectativas desejos e

crenccedilas por parte dos animais por sinais de consciecircncia nestes146 Mas somente na

uacuteltima deacutecada do seacuteculo XX eacute que a busca pela consciecircncia passou a tornar-se uma

aacuterea mais ativa de pesquisa147

142

ISERBYT 2000 143

TOURINHO 2011 144

SHETTLEWORTH 2010 p 6 145

CAMPAN 2019 146

GRIFFIN 1994 p viii 147

SHETTLEWORTH 2010 p 6

46

Feuerbacher148 faz referecircncia agraves pesquisas sobre os processos cognitivos e

comportamentais dos catildees que resume e ilustra as mudanccedilas de perspectiva

ocorridas no seacuteculo passado e que vieram culminar no atual enfoque adotado pelos

estudiosos que buscam compreender a chamada inteligecircncia animal Explica a

pesquisadora complementando o que se diz logo acima que soacute mais recentemente

em fins da deacutecada de noventa essas pesquisas passaram a enfocar as

caracteriacutesticas que aos catildees satildeo uacutenicas Antes o faziam em torno de processos que

natildeo lhes eram uacutenicos e de caracteriacutesticas natildeo necessariamente uacutenicas que podem

ser usadas para o estudo de fenocircmenos mais gerais ndash que a pesquisadora

exemplifica com o estudo da diversidade de raccedilas no acircmbito morfoloacutegico e

comportamental com o fim de examinar se alguns dos efeitos sobre o

comportamento provecircm de fatores atuantes na morfologia de modo concomitante ndash

razatildeo porque ela sugere natildeo haver conexotildees diretas nessa nova abordagem com os

trabalhos cientiacuteficos publicados anteriormente que representam uma tradiccedilatildeo cujo

fim se deu nos anos oitenta Acrescenta que isto explica o porquecirc de os trabalhos

anteriores a essa nova abordagem serem por vezes tatildeo pouco citados embora natildeo

desprezados pelo fato de trazerem contribuiccedilotildees importantes

Nesse acircmbito aleacutem da ordem Carnivora da qual os catildees fazem parte outras

ordens da classe Mammalia tecircm recebido algum destaque nas uacuteltimas deacutecadas tais

como Proboscidea Cetacea e Primates149 e inclusive certas aves em especial os

passeriformes da famiacutelia corvidae150 Esses animais apresentam alta complexidade

em seus atos e processos cognitivos observados em suas interaccedilotildees com os

demais membros dos grupos em que vivem com outros grupos da mesma espeacutecie

com presas e predadores e outros animais com os quais estabelecem associaccedilotildees

etc aleacutem dos observados em suas interaccedilotildees com os entes humanos

Por cogniccedilatildeo assim entende Shettleworth151

Cogniccedilatildeo se refere aos mecanismos pelos quais os animais adquirem processam armazenam e agem em relaccedilatildeo agrave informaccedilatildeo do ambiente Isso inclui percepccedilatildeo aprendizagem memoacuteria e tomada de decisatildeo O estudo de cogniccedilatildeo comparada eacute portanto relacionado com o modo como os

148

FEUERBACHER 2011 149

LOCKE 2013 GRIFFIN 1994 p 106 209 211-232 239 258 MCINTYRE 2002 p 31 COREN 2006 passim

150 EMERY 2006

151 SHETTLEWORTH 2010

47

animais processam informaccedilatildeo a comeccedilar por como a informaccedilatildeo eacute adquirida pelos sentidos

152

Ao que se pode agregar o que diz Dyer

Uma abordagem cognitiva do comportamento garante um papel causal importante para mecanismos internos em que dados sensoriais satildeo organizados para formar representaccedilotildees mais ou menos detalhadas de eventos e relaccedilotildees no mundo exterior

153

Maturana e Varela explicam que

[] o sistema nervoso participa dos fenocircmenos cognitivos de duas maneiras complementares relacionadas com seu modo particular de operaccedilatildeo como uma rede neural com clausura operacional e como parte de um sistema metacelular A primeira e mais oacutebvia se daacute pela ampliaccedilatildeo do domiacutenio de estados possiacuteveis do organismo resultado da enorme diversidade de configuraccedilotildees sensoacuterio-motoras que o sistema nervoso permite e que eacute a chave de sua participaccedilatildeo no funcionamento do organismo A segunda ocorre quando se abrem para o organismo novas dimensotildees de acoplamento estrutural tornando-lhe possiacutevel associar uma grande diversidade de estados internos agrave diversidade de interaccedilotildees de que participa A presenccedila ou ausecircncia do sistema nervoso eacute o que determina a descontinuidade existente entre organismos com uma cogniccedilatildeo relativamente limitada e aqueles capazes de uma diversidade em princiacutepio ilimitada como o homem

154

E uma vez que o aacutepice do processo cognitivo eacute a expressatildeo da inteligecircncia

Gallegos155 a descreve com base principalmente em alguns trabalhos de Vigostky

Pavlov e Luria em criacutetica agrave hipoacutetese supramencionada de Gardner como ldquo[] uma

construccedilatildeo unitaacuteria mas natildeo uniacutevoca indissoluvelmente ligada ao pensamento que

manteacutem relaccedilotildees sistecircmicas com diversas formas de atividade psiacutequicardquo156

Ele distingue-a de outras funccedilotildees da psique dentre as quais cita percepccedilatildeo

memoacuteria pensamento e linguagem afirmando que a inteligecircncia eacute uma construccedilatildeo

teoacuterica e que por isso ela parece ser uma propriedade do pensamento ndash o qual no

homem eacute capaz de estabelecer relaccedilotildees por meio de operaccedilotildees caracterizadas por

152

ldquoCognition refers to the mechanisms by which animals acquire process store and act on information from the environment These include perception learning memory and decision-making The study of comparative cognition is therefore concerned with how animals process information starting with how information is acquired by the sensesrdquo SHETTLEWORTH 2010 p 4

153 ldquoA cognitive aproach to behavior grants an important causal role to internal mechanisms

whereby sensory data are organized to form more or less detailed representations of events and relationships in the outside worldrdquo DYER 1994 p 66

154 MATURANA VARELA 1995 p 201-202

155 GALLEGOS 2013

156 ldquo[] la inteligencia es un constructo unitario pero no uniacutevoco indisolublemente ligado al

pensamiento que mantiene relaciones sisteacutemicas con diversas formas de actividad psiacutequicardquo Ibid

48

discriminar generalizar e categorizar ndash e natildeo algo que exista por si razatildeo pela qual

se pode dizer que os animais natildeo humanos pensam e a eles pode-se atribuir

inteligecircncia Mas a inteligecircncia diz possui certa funccedilatildeo que caracteriza como

adaptativa

[] jaacute que permite modificar nossa conduta em funccedilatildeo da valoraccedilatildeo dos resultados obtidos Esta valoraccedilatildeo pode ser um simples mecanismo de associaccedilatildeo entre estiacutemulos e respostas assim como um complexo processo de anaacutelise e siacutentese

157

No homem esse processo que nele e nos animais encontra seu substrato

material nos processos neurais de anaacutelise e siacutentese descritos por Pavlov e que se

estrutura de um modo particular em cada indiviacuteduo eacute muito mais desenvolvido

dando-se em contextos soacutecio-culturais e por meio da linguagem a qual sob a

perspectiva vigotskyana faraacute a mediaccedilatildeo da internalizaccedilatildeo de toda funccedilatildeo

psicoloacutegica que tem origem externa e prossegue confere agrave mente humana a

capacidade de abstraccedilatildeo de compreender natildeo somente os sinais de natureza

sensorial mas como diz sinais de sinais por anaacutelise e siacutentese de sinais

Deste modo afirma a inteligecircncia predomina sobre o instinto no homem ao

passo que no animal o instinto predomina sobre a inteligecircncia

Gallegos conclui levantando a hipoacutetese de que a inteligecircncia seria um produto

do ceacuterebro em seu todo em que

[] os loacutebulos preacute-frontais como terceira unidade funcional podem exercer uma funccedilatildeo organizadora codificadora e sinalizadora da informaccedilatildeo enquanto que os loacutebulos occipital temporal e parietal como segunda unidade funcional realizam funccedilotildees de integraccedilatildeo

158

E diz tambeacutem Griffin

[] processos cognitivos possuem dentre outros atributos representaccedilotildees incluindo memoacuterias expectativas e antecipaccedilotildees Realizam-se combinaccedilotildees internas dessas representaccedilotildees para que resultem em decisotildees e classificaccedilotildees de objetos em relaccedilatildeo a desejos e crenccedilas Ou seja os animais querem algumas coisas temem outras esperam que determinadas accedilotildees levem a certos resultados

159

157

ldquo[] ya que permite modificar nuestra conducta en funcioacuten de la valoracioacuten de los resultados obtenidos Esta valoracioacuten puede ser un simple mecanismo de asociacioacuten entre estiacutemulos y respuestas asiacute como un complejo proceso de anaacutelisis y siacutentesisrdquo GALLEGO 2013

158 ldquo[] los loacutebulos prefrontales como tercera unidad funcional pueden ejercer una funcioacuten

organizadora codificadora y signalizadora de la informacioacuten en tanto que los loacutebulos occipital temporal y parietal como segunda unidad funcional realizan funciones de integracioacutenrdquo Ibid

159 GRIFFIN 1994 p viii

49

E para isso muitos animais natildeo humanos possuem aptidotildees para

comunicaccedilatildeo relativamente complexas se comparadas com as humanas como o

reconhecimento de siacutembolos o uso de ferramentas a vocalizaccedilatildeo a tomada de

decisatildeo e a capacidade de improviso etc160 que naturalmente potencializam seu

desempenho na luta diaacuteria pela sobrevivecircncia aleacutem das que aparecem mediante o

conviacutevio com os entes humanos

Ilustram isto bem os relatos de Darwin de histoacuterias que ouviu ou que ele

mesmo presenciou Conta o naturalista que os macacos americanos de Rengger

receberam ovos e inicialmente quebraram-nos com pouco jeito perdendo grande

parte do conteuacutedo mas pouco depois passaram a quebraacute-los cuidadosamente sobre

uma superfiacutecie dura retirando os pedaccedilos de cascas com os dedos Em outro

episoacutedio a esses mesmos animais foram dados um objeto cortante e em outra

ocasiatildeo torrotildees de accediluacutecar em envelopes de papel nos quais foram posteriormente

inseridas vespas Os animais depois de feridos passaram a pegar o objeto com

cuidado e a aproximar os envelopes dos ouvidos antes de abrirem161 Rengger

ensinou um de seus animais a abrir um tipo de noz com uma pedra tal como fazem

os chimpanzeacutes na natureza e o macaco passou a fazer o mesmo com outras frutas

de casca dura Outro destes macacos a quem ele ensinou a abrir o fruto com um

bastatildeo passou a usar este objeto para mover objetos pesados

Darwin relata tambeacutem que ele mesmo viu um orangotango colocar um pedaccedilo

de pau em uma abertura segurar a outra extremidade e fazer do objeto uma

alavanca Conta em seguida o interessante relato de Brehm segundo o qual um

grupo de macacos gelada (Theropithecus gelada) na Abissiacutenia em conflito com

outro de babuiacutenos (Papio hamadryas) desprendia das montanhas grandes pedras

que rolavam abaixo para atingirem os adversaacuterios que fugiam ainda que depois

retornassem para travar batalha corporal Tambeacutem Brehm relata que participou de

um ataque com armas de fogo a um grupo de babuiacutenos em que estes fizeram rolar

tantas pedras da montanha que aos caccediladores natildeo restou alternativa senatildeo bater

em retirada162

Haacute tambeacutem relatos com catildees de caccedila que segundo ouviu jamais haviam

matado a caccedila ateacute entatildeo No primeiro o catildeo de caccedila de Colquhoun foi buscar dois

160

ADES 1997 TELES 2005 HERMAN 2006 MCINTYRE 2002 passim GRIFFIN 1994 passim

161 DARWIN sd a) p 30-31

162 Ibid p 34-35

50

patos atingidos nas asas mas sem conseguir trazecirc-los ao mesmo tempo matou um

e trouxe o outro vivo No seguinte contou-lhe o coronel Hutchinsson que em caso

semelhante uma perdiz foi morta e outra caiu ferida Esta ao tentar fugir foi

capturada pelo catildeo que ao deparar com a morta parou e depois de tentar trazer

ambas naquele estado sem sucesso ateacute que matou a que estava viva e entatildeo

cumpriu a tarefa163

Para aleacutem destes relatos Darwin afirma que a linguagem articulada somada

(jaacute que por exemplo o papagaio tambeacutem a tem) agrave aplicaccedilatildeo de sons

correspondentes a ideias definidas seria uma habilidade exclusiva do homem ainda

que este se expresse de modo semelhante a outros animais por voz e gesticulaccedilotildees

em expressotildees mais simples de sentimentos como dor medo e surpresa Mas a

estes atribui tambeacutem algo anaacutelogo agrave linguagem e menciona como exemplos seis

tipos de sons vocais diferentes que caracterizam comunicaccedilatildeo emocional por Cebus

azarae do Paraguai que despertam nos demais cada um reaccedilotildees equivalentes ao

som emitido e cinco tons distintos no latido de catildees que satildeo facilmente

reconheciacuteveis por criadores o da caccedila o da coacutelera o de desespero por estar preso

em algum recinto o de gozo por sair para passear e o grito de suacuteplica quando pede

para que abram a porta Destaca poreacutem as aves que aleacutem de expressarem suas

emoccedilotildees pelo canto ensinam aos descendentes os cantos de chamados entre si

que o exercitam de modo rudimentarmente parecido com o que fazem os humanos

e aponta casos de aves que na ausecircncia dos progenitores aprenderam cantos de

chamado distintos daqueles observados em sua espeacutecie164

Diz o naturalista ainda haver sentimento do belo nos animais como nas aves

que exibem suas plumagens coloridas agraves fecircmeas concluindo que tal beleza eacute

admirada por estas165 e ressalta a sociabilidade verificada em muitos deles como

na tristeza diante da separaccedilatildeo (como de filhotes de seus pais de catildees de seus

donos) caracterizada pela expressatildeo de suas emoccedilotildees como nos alertas que

alguns datildeo aos coespeciacuteficos em situaccedilotildees de perigo (como golpes com as patas no

solo que se observam em coelhos e carneiros aleacutem da vocalizaccedilatildeo destes)

inclusive com o posicionamento de uma sentinela algo verificado entre certas aves

em focas e macacos como no auxiacutelio exemplificado pela remoccedilatildeo de ectoparasitas

163

DARWIN sd a) p 31 164

Ibid p 36-37 165

Ibid p 44

51

de companheiros como fazem os macacos os cavalos etc na caccedila em grupo

realizada por predadores como o lobo e na proteccedilatildeo de outros membros do grupo

Aqui Darwin traz mais um relato envolvendo babuiacutenos da Abissiacutenia em mais

um episoacutedio que lhe contou Brehm no qual os macacos que natildeo estavam na

montanha foram atacados pelos catildees de caccedila quando entatildeo machos mais velhos

desceram para socorrer os companheiros Havia restado somente um filhote que ao

ver-se cercado pelos catildees foi socorrido e carregado por apenas um dos maiores

machos do grupo Os catildees surpreendidos pelo gesto deste natildeo se moveram166

Vale mencionarmos ainda por fim os casos narrados de um pelicano de dois

ou trecircs corvos e de um galo todos cegos em situaccedilotildees distintas que eram

alimentados por seus respectivos companheiros de bando Darwin sustenta que

casos assim satildeo suficientemente raros de modo que natildeo se poderia atribuir o gesto

somente a algum instinto167

Diante desses quadros diz o pesquisador que o fato de os animais natildeo terem

faculdade de abstrair nem possuiacuterem ideias gerais natildeo configura uma barreira

intransponiacutevel entre eles e os homens168

Ades169 poreacutem aponta para as dificuldades de se compreender a inteligecircncia

e a consciecircncia nos animais em razatildeo das distinccedilotildees entre a nossa natureza e a

deles uma vez que natildeo escapamos de todo da tendecircncia de analisaacute-los ancorados

em nossas proacuteprias medidas Eis o que ele chama ldquointuiccedilatildeo antropomoacuterficardquo

Esta configuraria portanto um obstaacuteculo para a identificaccedilatildeo da chamada

teoria da mente em sua aplicaccedilatildeo no acircmbito interespeciacutefico A atribuiccedilatildeo desta aos

animais natildeo humanos foi sugerida por Premack e Woodruff que a definem assim

Ao afirmarmos que um indiviacuteduo tem uma teoria da mente estamos dizendo que o indiviacuteduo imputa estados mentais a ele mesmo e a outros (a coespeciacuteficos bem como a indiviacuteduos de outras espeacutecies) Um sistema de inferecircncias deste tipo eacute propriamente visto como uma teoria em primeiro lugar porque tais estados natildeo satildeo diretamente observaacuteveis e em segundo lugar porque o sistema pode ser usado para fazer prediccedilotildees especificamente sobre o comportamento de outros organismos

170

166

DARWIN sd a) p 52 167

Ibid p 53 168

Ibid p 32 169

ADES 1997 170

ldquoIn saying that an individual has a theory of mind we mean that the individual imputes mental states to himself and to others (either to conspecifics or to other species as well) A system of inferences of this kind is properly viewed as a theory first because such states are not directly observable and second because the system can be used to make predictions specifically about the behavior of other organismsrdquo PREMACK WOODRUFF 1978 p 515

52

Desenvolveram-se muitas pesquisas a partir desse pressuposto algumas das

quais seratildeo abordadas no corpo deste estudo

53

2 JUSTIFICATIVA

Despontam diante de tudo o que se viu ateacute aqui algumas indagaccedilotildees como

onde realmente estariam os limites entre a inteligecircncia humana e a dos demais

animais em todos esses apontamentos e segundo as mais diversas definiccedilotildees

Haveria de fato uma continuidade gradativa como defende Darwin ou haacute uma

lacuna natildeo preenchiacutevel entre a mente que abstrai e a que natildeo abstrai De que modo

esses limites se relacionam com os dois tipos baacutesicos de consciecircncia

supramencionados Seriam esses tipos tambeacutem continuamente gradativos

Uma vez que estamos lidando com problemas relacionados agrave natureza de

entes distintos isto de algum modo nos remete agrave linha de investigaccedilatildeo relacionada

ao ser ou seja agrave ontologia ou metafiacutesica que pensadores do seacuteculo passado

como Poper assumiram ter elementos vaacutelidos para o conhecimento humano no

caso testaacuteveis (ou falseaacuteveis) e em relaccedilatildeo agrave qual de um modo diferente do que

aqui se pretende fazer este mesmo pensador reconheceu a necessidade de

recorrer como algo complementar agrave ciecircncia moderna apontando para a necessidade

de haver limites bem estabelecidos entre uma e outra171

Grene por sua vez sugere que o aristotelismo poderia contribuir para a

resoluccedilatildeo de problemas filosoacuteficos na biologia como na localizaccedilatildeo de um problema

filosoacutefico de uma estrutura na natureza de um fenocircmeno no entendimento dos

fundamentos desta ciecircncia com base no conceito de eidos (que no aristotelismo-

tomismo traduz-se por ldquoformardquo mas Grene aponta para outros conceitos como

ldquoprinciacutepio organizadorrdquo ldquopadratildeo de accedilatildeo fixardquo ldquocoacutedigordquo etc) Este forneceria por

exemplo a demonstraccedilatildeo de que a proacutepria biologia natildeo poderia ser reduzida agrave fiacutesica

ou agrave quiacutemica tendo em vista que a compreensatildeo de um sistema organizado deve-se

dar considerando-se as partes enquanto organizadas no sistema e natildeo enquanto

partes isoladas172

Como se disse anteriormente Aristoacuteteles eacute considerado o pai da metodologia

cientiacutefica e deu os primeiros passos para as ciecircncias bioloacutegicas atuais mas mais

ainda apresentou aquela que provavelmente foi a primeira doutrina psicoloacutegica

aleacutem de ter sido tambeacutem provavelmente o primeiro a apresentar uma metafiacutesica

sistematizada estabelecendo com seu esquema de subalternaccedilatildeo das ciecircncias os

171

POPER 2001 p 37-40 172

GRENE 1972

54

limites na divisatildeo das disciplinas segundo os modos de abstraccedilatildeo E com diz

Anthony Kenny173 se a fiacutesica a quiacutemica e a biologia de Aristoacuteteles encontram

espaccedilo hoje somente na histoacuteria das ideias a eacutetica a epistemologia a metafiacutesica e

a filosofia da mente aristoteacutelicas continuam integrando os estudos filosoacuteficos ndash e

Kenny sugere que continuaratildeo a fazecirc-lo de modo perene

Aristoacuteteles nasceu em Estagira por volta de 384 e 383 aC e aos vinte anos

viajou para Atenas onde ingressou na Academia de Platatildeo onde permaneceu por

cerca de vinte anos Apoacutes a morte de Platatildeo foi para Assos na Aacutesia Menor onde

fundou com outros platocircnicos uma Escola e permaneceu por trecircs anos deslocando-

se em seguida para Mitilene Dali foi chamado por Filipe da Macedocircnia para educar

Alexandre e alguns anos depois retornou para Atenas onde comprou as edificaccedilotildees

para fundar sua Escola tambeacutem chamada Liceu ou Periacutepato de onde sairia a maior

parte de sua produccedilatildeo Morreu em 322 aC no exiacutelio em Caacutelcis apoacutes ser envolvido

como reacuteu na morte de Alexandre174

Dentre os seus principais comentadores destaca-se Santo Tomaacutes de Aquino

considerado o maior dos filoacutesofos teoacutelogos medievais cujos escritos segundo

Broadie

[] estatildeo sendo cada vez mais estudados por membros da vasta comunidade filosoacutefica e suas ideias vecircm sendo trabalhadas nos debates filosoacuteficos atuais nos campos da loacutegica loacutegica filosoacutefica da metafiacutesica da epistemologia da filosofia da mente da filosofia moral e da filosofia da religiatildeo

175

O pesquisador menciona ainda que os escritos tomistas vecircm sendo aplicados

cada vez mais fora do ambiente eclesiaacutestico inclusive na filosofia do direito o que se

daacute por exemplo em razatildeo de seu notaacutevel conhecimento em relaccedilatildeo agraves leis naturais

exposto na Summa Theologiae de modo diz completo e detalhado176

Kenny177 tambeacutem menciona esse interesse crescente em sua obra entre

cristatildeos e natildeo cristatildeos impressionados com seu gecircnio filosoacutefico inclusive por ter

sido muito pouco explorada nos seacuteculos anteriores ao que atribui dois motivos O

primeiro eacute a sua dimensatildeo Ele fornece dados correspondentes a nada menos que

173

KENNY 1994 p 5 174

REALE ANTISERI 2003 p 187-189 175

[] are increasingly studied by members of the wider philosophical community and his insights put to work in present-day philosophical debates in the fields of philosophical logic metaphysics epistemology philosophy of mind moral philosophy and the philosophy of religion BROADIE 1995 p 43

176 BROADIE 1995 p 47

177 KENNY 1994 p 10-12

55

uma produccedilatildeo de 8686577 palavras em menos de cinquenta anos considerando-

se somente os escritos comprovadamente autecircnticos (se se inclui os escritos de

autoria duvidosa a obra chega a cerca de onze milhotildees de palavras) e estima que

em seu ano mais produtivo Tomaacutes de Aquino tenha produzido cerca de trecircs milhotildees

de palavras o que faz com que sejam plausiacuteveis os testemunhos de que sua

produccedilatildeo se dava por ditado simultaneamente dentro de um periacuteodo a diferentes

secretaacuterios

O outro motivo que Kenny afirma para a pouca atenccedilatildeo que a produccedilatildeo

tomista recebeu nos seacuteculos que seguiram seu surgimento foi a falsa ideia de que

sua integridade filosoacutefica estaria comprometida pela fidelidade de Santo Tomaacutes agrave

ortodoxia de sua religiatildeo Mas Kenny o defende justamente ao apontar que como

profundo conhecedor da filosofia aristoteacutelica tomou o devido cuidado para fazer as

devidas distinccedilotildees entre aquilo em que acreditava enquanto teoacutelogo o que era

objeto de suas investigaccedilotildees teoloacutegicas e aquilo em que acreditava enquanto

filoacutesofo o que era objeto de suas investigaccedilotildees filosoacuteficas

Tomaacutes de Aquino nasceu em Roccasecca sul do Laacutecio no ano de 1221 Foi

educado em Montecassino e em Naacutepoles onde entrou para a ordem dominicana

contrariando seus familiares Em Colocircnia teve como mestre Alberto Magno o

precursor do aristotelismo no ocidente medieval e que tambeacutem realizou

investigaccedilotildees sobre os animais Foi entatildeo convidado para lecionar na Universidade

de Paris onde obteve o tiacutetulo de magister em teologia e uma caacutetedra Passou pelas

principais universidades do continente falecendo em Liatildeo em 1274 aos 53 anos de

idade178

O pensamento de Aristoacuteteles e Tomaacutes de Aquino expresso em algumas

disciplinas como a metafiacutesica e a fiacutesica partem de princiacutepios semelhantes de

fundamentaccedilatildeo empiacuterica desde aqueles considerados evidentes ou seja que

prescindem de demonstraccedilatildeo e desenvolvem-se de modo muito similar segundo a

epistemologia aristoteacutelica o que justifica o emprego do termo ldquoaristotelismo-

tomismordquo Esses princiacutepios expressam relaccedilotildees cujos conceitos satildeo fundamentais

para a compreensatildeo desta doutrina a qual se enquadra no chamado ldquorealismo

moderadordquo que segundo Reale e Antiseri ldquorecorre ao poder de abstraccedilatildeo do

178

REALE ANTISERI 2005 p 211-212

56

intelecto para explicar os universaisrdquo179 cuja apreensatildeo eacute o elemento central que

distingue os homens dos demais animais

Segundo as investigaccedilotildees filosoacuteficas sob a oacuteptica aristoteacutelico-tomista grosso

modo esses demais animais seriam dotados de uma potecircncia estimativa que serve

como meio de orientaccedilatildeo para o alcance dos fins aos quais estaacute ordenada a sua

natureza sensitiva Mas ainda que eles possam distinguir entre os entes e percebam

caracteriacutesticas que lhes satildeo proacuteprias natildeo chegariam a ser tal como os humanos

em que essa potecircncia estimativa eacute mais desenvolvida e por isso chamada

cogitativa dotados de intelecto Seu ato cognitivo estaria restrito agraves potecircncias dos

sentidos internos

A pesquisadora doutora e professora da St Johnrsquos University Marie I George

aponta que nesse campo o aristotelismo-tomismo tem recebido pouca ou nenhuma

atenccedilatildeo180 Ela analisou alguns casos como a identificaccedilatildeo de formato cor e

material de um objeto pelo papagaio Alex o processo para um macaco chegar ao

uso de um graveto como instrumento para retirada de alimento em um orifiacutecio menor

que seu dedo e o ensino de comunicaccedilatildeo por lexigramas e linguagem de sinais

fornecendo explicaccedilotildees como diz mais econocircmicas pelas quais aponta as

associaccedilotildees dos sentidos e natildeo algo que implicaria intelecccedilatildeo tal como o entende o

aristotelismo-tomismo A pesquisadora aponta entatildeo a necessidade de distinguir a

fronteira entre o pensar e o sentir (pelos sentidos) para chegar-se aos devidos

criteacuterios para anaacutelise das diferenccedilas entre o ente humano e os animais natildeo humanos

nesse sentido e indica que a maior dificuldade que enxergou nesse tipo de pesquisa

eacute o entendimento insuficiente do que seriam os sentidos internos e de seu papel nas

habilidades cognitivas desses animais Isto defende leva tanto a tentativas forccediladas

de explicar somente pelo instinto as habilidades como as citadas logo acima como agrave

atribuiccedilatildeo equivocada a esses animais da capacidade de inteligir

Isto que se acaba de dizer seraacute desenvolvido neste trabalho que natildeo tem a

pretensatildeo de ser mais do que mais uma etapa mais uma contribuiccedilatildeo para o

desenvolvimento de futuras pesquisas nessa linha

179

REALE ANTISERI 2005 p 215 180

GEORGE 2003

57

3 MEacuteTODOS E OBJETIVOS

Buscaremos na obra de Aristoacuteteles e na de Santo Tomaacutes de Aquino um

nuacutemero suficiente de informaccedilotildees que deveremos reunir aqui a fim de construirmos

a partir de seus pressupostos metafiacutesicos ndash que se fundamentam naquilo que eacute

evidente ou seja cuja apreensatildeo eacute sempre imediata sem necessidade de

demonstraccedilatildeo ndash sua doutrina psicoloacutegica mas tanto de um modo voltado para que

tentemos identificar limites ali propostos entre a inteligecircncia humana e a inteligecircncia

animal entre o sensiacutevel e o intelectivo como a fim de fornecermos elementos para

uma construccedilatildeo posterior integral dessa doutrina que se encontra espalhada pela

obra de ambos os autores uma vez que ao menos ateacute o presente natildeo encontramos

nenhum trabalho que apresente tal estudo

Recorreremos ainda a comentadores do aristotelismo-tomismo somente

quando e se houver necessidade de buscarmos direcionamento e eventuais

informaccedilotildees complementares que se mostrem relevantes para a concretizaccedilatildeo dos

objetivos estabelecidos

Buscaremos assim possiacuteveis respostas para questotildees como as que

levantamos mais acima e para um exame mais acurado percorreremos em seguida

uma seacuterie de trabalhos publicados nas uacuteltimas deacutecadas envolvendo pesquisas nas

disciplinas comparadas que atualmente se ocupam dos processos cognitivos como

a Etologia Cognitiva a Ecologia Comportamental e a Psicologia Comparada e

apontam para manifestaccedilotildees de inteligecircncia nos animais

Diz Mackintosh que

[] natildeo haacute uma coisa singular denominada inteligecircncia que certamente natildeo podemos classificar os animais pela sua posse da inteligecircncia Eacute muito mais profiacutecuo conceber a inteligecircncia como um arranjo diferenciado ou heterogecircneo de processos operaccedilotildees e habilidades

181

Nessa esteira Deacon182 apontou uma seacuterie de questotildees pertinentes sobre a

associaccedilatildeo entre o niacutevel das habilidades mentais e o tamanho cerebral como a falta

de consenso que haacute entre o tamanho absoluto e o tamanho relativo do ceacuterebro e a

possibilidade de haver fatores como variaacuteveis em razatildeo da multiplicidade de

operaccedilotildees do ceacuterebro e do fato de estas natildeo estarem distribuiacutedas de modo

181

MACKINTOSH 1997 p 34-35 182

DEACON 1997 p 146-148

58

uniforme do que questiona por exemplo como as diferenccedilas relacionadas ao

tamanho e agraves partes do ceacuterebro poderiam influenciar as operaccedilotildees deste Mas

corrobora que natildeo haacute duacutevida de que exista correlaccedilatildeo entre as capacidades de um

ceacuterebro e o seu tamanho

Nesse acircmbito da alometria Jerison propocircs o quociente de encefalizaccedilatildeo

(EQ)183 que eacute ldquoa razatildeo entre o tamanho real do ceacuterebro e o tamanho esperado do

ceacuterebro []rdquo que ldquoeacute um tipo de lsquomeacutediarsquo[] que leva em conta o tamanho do corpordquo184

Alguns trabalhos recentes tambeacutem corroboram a relaccedilatildeo entre inteligecircncia e volume

cerebral como o de Street e colaboradores185 que confirma a relaccedilatildeo entre o

volume cerebral e a chamada inteligecircncia social em primatas e o de Gignac e

colaboradores186 que reforccedila a relaccedilatildeo entre inteligecircncia e volume cerebral no

acircmbito intraespeciacutefico em estudos envolvendo humanos

Daremos aqui maior enfoque ndash sem desprezar as criacuteticas a esta perspectiva

mas porque precisamos de um referencial para o desenvolvimento do que

reiteramos eacute somente a etapa de um processo ndash portanto a algumas das

habilidades dos corviacutedeos e em especial dos membros da classe Mammalia que

destacamos anteriormente com maior relaccedilatildeo entre volume cerebral e tamanho

corporal e cuja estrutura neural mais parece aproximar-se da humana pertencentes

agraves ordens Proboscidea que apresentam o maior volume cerebral dentre os animais

terrestres Cetacea que apresenta o maior volume cerebral dentre todos os animais

e o maior quociente de encefalizaccedilatildeo depois do homem da qual abordaremos a

famiacutelia Delphinidae Primates com destaque para os grandes macacos por sua

proximidade com os humanos por exemplo dentro daquilo que hoje se conhece por

escala filogeneacutetica mas sem deixar de levar outros grupos em conta como os

membros da subfamiacutelia Cebinae por seu elevado quociente de inteligecircncia187 e

Carnivora ndash aqui especialmente a subespeacutecie Canis lupus familiaris da famiacutelia

Canidae por sua convivecircncia milenar com os humanos Tentaremos ainda esboccedilar

uma listagem dessas habilidades com o fim de facilitar os nossos propoacutesitos

Com o objetivo de verificarmos a compatibilidade do aristotelismo-tomismo

visando a corroborar a proposta de que esta corrente poderia contribuir com o

183

ldquoEncephalization quotientrdquo 184

ldquo[] the ratio of actual brain size to expected brain size [] is a kind of lsquoaveragersquo[] that takes body size into accountrdquo JERISON 1973 p 61

185 STREET et al 2017

186 GIGNAC et al 2017

187 ROTH DICKE 2005

59

avanccedilo das investigaccedilotildees que tocam agrave inteligecircncia dos animais o que eacute nosso

objetivo central e inclusive a outros campos afins levantaremos algumas relaccedilotildees

entre as habilidades descritas nesses estudos e a descriccedilatildeo aristoteacutelico-tomista das

potecircncias estimativa cogitativa e intelectiva a fim de testarmos se a visatildeo

aristoteacutelico-tomista estaria em consonacircncia com as hipoacuteteses mais consistentes com

os resultados das pesquisas realizadas sobretudo nas uacuteltimas deacutecadas buscando

interpretaccedilotildees possiacuteveis do resultado agrave luz daquela doutrina seguindo o modelo de

anaacutelise com algumas pequenas diferenccedilas estruturais apresentado no trabalho

supracitado da professora doutora Marie George e tambeacutem no de Koacutevac e

Mather188 que realizaram um breve estudo da cogniccedilatildeo sob a perspectiva do

aristotelismo-tomismo analisando simultaneamente a chamada inteligecircncia dos

cefaloacutepodes

Por fim percorreremos o histoacuterico apresentado anteriormente a fim de

forneceremos mais algumas sugestotildees para futuras investigaccedilotildees que poderatildeo

aclarar se as divergecircncias conceituais em torno dos principais termos que

apresentamos ateacute aqui como ldquointeligecircnciardquo encontram-se por exemplo no fato de

os pesquisadores empregarem um mesmo termo para denominar objetos distintos

ou se apontam para aspectos distintos isolados ou em conjunto de um mesmo

objeto ou se haacute outras explicaccedilotildees para as divergecircncias apontadas acima

188

KOacuteVAC MATHER 2008

60

4 RESULTADOS E DISCUSSAtildeO

41 UMA CONSTRUCcedilAtildeO PARA A PSICOLOGIA ARISTOTEacuteLICO-TOMISTA

411 A subalternaccedilatildeo das ciecircncias

Aristoacuteteles identifica trecircs ramos da filosofia teoreacutetica a fiacutesica a matemaacutetica e

a metafiacutesica ou filosofia primeira Estas ciecircncias que versam sobre os universais

(em oposiccedilatildeo aos singulares) subalternam-se segundo seu modo de abstraccedilatildeo Diz

ele no livro VI da Metafiacutesica

[] a fiacutesica refere-se agraves realidades separadas mas natildeo imoacuteveis algumas das ciecircncias matemaacuteticas referem-se a realidades imoacuteveis poreacutem natildeo separadas mas imanentes agrave mateacuteria ao contraacuterio a filosofia primeira refere-se agraves realidades separadas e imoacuteveis

189

Essas realidades separadas segundo Reale referem-se agravequilo que existe

ldquopor sirdquo ou que eacute capaz ldquode subsistir por sua proacutepria conta sem precisar inerir em

outrordquo190

Assim enquanto os sujeitos das ciecircncias fiacutesicas e matemaacuteticas satildeo algum

gecircnero particular de ente a metafiacutesica lida com o ente em comum bem como um

ente qualquer particular enquanto ente

Tomaacutes de Aquino define ldquoenterdquo como toda e qualquer coisa na medida em

que eacute una191 e fala de duas maneiras pelas quais se pode compreendecirc-lo

[] a primeira divide-se em dez gecircneros192

a segunda significa a verdade das proposiccedilotildees A diferenccedila destes dois sentidos estaacute em que no segundo pode chamar-se ente tudo aquilo de que uma proposiccedilatildeo afirmativa pode ser formada mesmo que tal natildeo ponha nada na realidade Assim eacute que as privaccedilotildees e as negaccedilotildees podem-se chamar entes De fato dizemos que a afirmaccedilatildeo se opotildee agrave negaccedilatildeo e que a cegueira estaacute no olho No primeiro sentido poreacutem soacute pode-se chamar ente o que potildee alguma coisa na realidade Assim eacute que a cegueira e outras privaccedilotildees ou negaccedilotildees deste tipo natildeo satildeo entes [] a essecircncia eacute tirada de ente no primeiro sentido

193

189

ARISTOacuteTELES 2005 1026a p 271-273 190

REALE 2005 p 307 191

TOMAacuteS DE AQUINO 2012 Q XI p 239 192

As categorias tema que se veraacute adiante 193

TOMAacuteS DE AQUINO 2003b p 53

61

Explica ainda o Aquinate194 que enquanto os entes naturais tecircm suas

espeacutecies na mateacuteria sensiacutevel os entes matemaacuteticos que exemplificam essa

segunda maneira as tecircm na mateacuteria inteligiacutevel As qualidades sensiacuteveis tecircm seu

fundamento na quantidade que inere na substacircncia e quando na mente elas satildeo

removidas o que resta eacute a quantidade contiacutenua A diferenccedila entatildeo que haacute entre a

quididade ou essecircncia de um ente natural e a de um ente matemaacutetico estaacute na

distinccedilatildeo entre respectivamente a mateacuteria que eacute submetida a uma conformaccedilatildeo de

qualidades sensiacuteveis atualizada por uma forma natural e a mateacuteria atualizada por

certa forma que se coloca sobre certa quantidade ndash a saber os entes matemaacuteticos

ndash exemplificados pelas figuras geomeacutetricas bidimensionais

A metafiacutesica eacute assim e por sua vez a ciecircncia universal que estuda o ente e

natildeo soacute o ente mas tambeacutem o ser (cuja definiccedilatildeo se veraacute adiante) enquanto ente e

ser bem como os atributos que lhes satildeo inerentes enquanto ente e ser

respectivamente Eacute ela que por tratar dos princiacutepios e das causas dos entes

forneceraacute axiomas para as ciecircncias matemaacuteticas que natildeo podem ser explicados

pelas proacuteprias ciecircncias matemaacuteticas que podem no maacuteximo os pressupor e o

mesmo se daacute com as ciecircncias fiacutesicas que possuem axiomas que soacute podem ser

fornecidos pelas ciecircncias matemaacuteticas ou pela metafiacutesica

194

TOMAacuteS DE AQUINO 2000 L III l 8 707-708

62

5 CONCEITOS FUNDAMENTAIS DO ARISTOTELISMO-TOMISMO

51 ATO E POTEcircNCIA

Comeccedila assim Tomaacutes de Aquino seu estudo sobre os princiacutepios da natureza

ldquoHaacute coisas que podem existir e natildeo existem e haacute coisas que jaacute existem Chama-se

ser em potecircncia ao que pode existir e natildeo existe e ser em ato ao que jaacute existerdquo195

Segundo a relaccedilatildeo entre potecircncia e ato todo ente que venha a existir ou seja que

venha a atualizar-se estaacute previamente em potecircncia Esta eacute limitada pela natureza da

coisa uma vez que como diz adiante o Aquinate ldquonenhuma coisa pode receber

uma potecircncia para agir que natildeo compita a ela mas antes a outra coisa a natildeo ser

que sua proacutepria natureza seja modificadardquo196 E assim tudo o que estaacute em potecircncia

deve estar na relaccedilatildeo correspondente a quando estaacute em ato197

No momento em que a coisa em si vem agrave existecircncia possui certo nuacutemero de

outras potecircncias que poderatildeo ou natildeo tornar-se ato Dentre estas se encontram as

que estatildeo entre a potecircncia e o ato ou seja em haacutebito e que satildeo assim definidas

pelo mesmo Tomaacutes de Aquino ldquosatildeo perfeiccedilotildees pelas quais as potecircncias se

encontram de certa maneira com respeito agraves coisas em virtude das quais elas

existem isto eacute com respeito aos seus objetosrdquo198

Portanto se toda potecircncia eacute determinada pelo ato ao qual ela estaacute ordenada

nenhum ente pode por si ir aleacutem nem das potecircncias que lhe satildeo inerentes nem

das que lhe satildeo acrescidas pela relaccedilatildeo com o meio circundante E se por seus atos

se distinguem as potecircncias ou seja se eacute o ato que define a potecircncia se eacute mediante

aquele que se conhece esta ndash e portanto eacute segundo a diversidade dos atos que se

diversificam as potecircncias ndash os atos por sua vez se distinguem por seus objetos

mediante estes tomando a espeacutecie destes que satildeo deste modo anteriores

agravequele199

O agente que concorrentemente opera para que uma potecircncia venha a ato

tem natureza extriacutenseca eacute a sua causa eficiente E diz ainda Santo Tomaacutes que

ldquoquanto mais uma potecircncia dista do ato tanto maior eacute o poder de que carece para

195

TOMAacuteS DE AQUINO 2003a p 19 196

Id 2012 Q XXI p 421 197

Id 2009 p 85 198

Id 2012 Q XIII p 279 199

Ibid Q XVI p 343 Id 2000 I L 6 111

63

ser conduzida ao atordquo200 A potecircncia assim eacute anterior ao ato ao qual ela se ordena

mas em outro sentido ela soacute pode-se tornar ato mediante a accedilatildeo de um agente em

ato (essa causa eficiente) e nesse acircmbito eacute correto dizer que o ato e a operaccedilatildeo

satildeo anteriores a ela Toda operaccedilatildeo que traraacute o ato de uma potecircncia pode ser um

princiacutepio de accedilatildeo a potecircncia ativa ou um princiacutepio de paixatildeo a potecircncia passiva

Naquela o objeto relacionado ao ato agrave operaccedilatildeo eacute efeito fim nesta o objeto eacute

causa princiacutepio201

52 ESSEcircNCIA E ACIDENTE

Prossegue Santo Tomaacutes em sua introduccedilatildeo ao estudo dos princiacutepios da

natureza

Por outro lado haacute duas espeacutecies de ser o ser essencial ou substancial202

de uma coisa por exemplo ser um homem e isto eacute o ser considerado em si mesmo e o ser acidental como eacute o caso de o homem ser branco e isto eacute o ser considerado sob relaccedilatildeo particular

203

E em sua explicaccedilatildeo sobre os dois modos de compreensatildeo a respeito do

ente diz

E porque aquilo pelo qual uma coisa eacute constituiacuteda no proacuteprio gecircnero ou espeacutecie eacute o que eacute significado pela definiccedilatildeo indicando o que eacute a coisa daiacute concluiacuterem os filoacutesofos que o nome da essecircncia eacute mudado para quididade Isto eacute tambeacutem o que o Filoacutesofo frequentemente chama o que era ser qualquer coisa isto eacute aquilo por que alguma coisa tem de ser uma coisa qualquer Chama-se-lhe tambeacutem forma na medida em que pela forma eacute significada a certeza de cada coisa Tambeacutem isto se chama por outro nome natureza no sentido de que se chama natureza a tudo o que pode de algum modo ser apreendido pela inteligecircncia pois uma coisa soacute eacute inteligiacutevel mediante a sua definiccedilatildeo e essecircncia a palavra natureza assim entendida parece significar a essecircncia da coisa segundo a qual eacute ordenada agrave sua operaccedilatildeo proacutepria pois nenhuma coisa perde a operaccedilatildeo proacutepria enquanto a palavra quididade proveacutem do facto de ser significada pela defini-ccedilatildeo Chama-se-lhe poreacutem essecircncia enquanto eacute por ela e eacute nela que o

ente possui o ser204

Para o aristotelismo-tomismo assim todo ente tangiacutevel caracteriza-se por sua

essecircncia e seus acidentes Por essecircncia entende-se o que haacute de mais fundamental

200

TOMAacuteS DE AQUINO 2006 p 119 201

Id 2000 L II l 6 304-305 202

A diferenccedila entre essecircncia e substacircncia que Aristoacuteteles afirma ser um gecircnero do ente e atribui agrave mateacuteria agrave forma e ao composto eacute simplesmente de perspectiva como se veraacute em seguida ARISTOacuteTELES 2010 II 1 p 61

203 TOMAacuteS DE AQUINO 2003a p 19

204 Id 2003b p 54-55

64

mais elementar e particular aquilo que determina que tal ente eacute o que eacute e natildeo outra

coisa e que estaacute de maneira proacutepria e verdadeiramente na substacircncia e por

acidente tem-se os elementos que podem ser modificados sem que haja corrupccedilatildeo

da essecircncia que nele estaacute de maneira relativa e de certo modo205

Adotando-se a perspectiva de que a essecircncia seja o substrato de tudo aquilo

que acidentalmente participe do ente recebe ela o conceito de ldquosubstacircnciardquo

Aristoacuteteles classifica-a como ldquosubstacircncia primeirardquo e ldquosubstacircncia segundardquo A

primeira diz respeito agrave mateacuteria que eacute tudo o que estaacute em potecircncia para ser

substancial (ldquomateacuteria de que eacute feitardquo ou mateacuteria propriamente dita) ou para ser

acidental (ldquomateacuteria em que se atualizardquo ou o que o Aquinate chama ldquosujeitordquo)206 e

por ser ldquoum sujeito primeiro que natildeo existe em outrordquo natildeo sendo ldquoparticipaacutevel por

muitosrdquo207 determina a individualidade de cada ente sensiacutevel que natildeo decorre de

nenhuma outra categoria sendo limitada por parte de seu proacuteprio ser e pela

segunda208 a forma que sendo uma finalizaccedilatildeo209 faz existir em ato todos os

seres substanciais e acidentais210 Esta procede da potecircncia da mateacuteria por

educcedilatildeo211 Eacute um princiacutepio que se refere agrave espeacutecie e ao gecircnero os uacutenicos predicados

que expressam a substacircncia primeira tratando-se portanto no acircmbito sensiacutevel de

multiplicidade de universalidade Assim aponta Angioni a substacircncia primeira tem

como particularidade o fato de que ela ldquonatildeo pode ser dita de um subjacenterdquo ao

passo que a segunda tem como particularidade o fato de que ldquopode ser dita de um

subjacenterdquo e assim a substacircncia caracteriza-se como tal por natildeo estar em um

subjacente212

A espeacutecie implica tudo o que existe no indiviacuteduo de maneira indistinta e

assim o gecircnero implica em seu significado tudo o que existe na espeacutecie Esta eacute

ideterminada em relaccedilatildeo ao indiviacuteduo e eacute afirmada dele como o gecircnero o eacute da

espeacutecie (da mesma forma que esta adquire a predicaccedilatildeo da diferenccedila213) e

indeterminado em relaccedilatildeo a ela e do indiviacuteduo mas tomado a partir da mateacuteria (mas

205

TOMAacuteS DE AQUINO 2003b p 55 206

Id 2003a p 19-20 Id 1949 Q 1 R 1 p 16 207

Id 2009 p 145 208

Id 2006 p 91 209

Id 2000 L II l 1 215 210

Id 2003a p 21 211

Id 2009 p 83-85 212

ANGIONI 1998 p 74 ARISTOacuteTELES 1965 2a p 31 213

TOMAacuteS DE AQUINO 2006 p 83

65

natildeo a mateacuteria prima)214 Ou seja assim como a forma eacute limitada ao indiviacuteduo em

razatildeo da mateacuteria o gecircnero estaacute limitado a uma espeacutecie por uma forma com mais

determinaccedilatildeo que eacute da qual o gecircnero obteacutem a diferenccedila que o contrairaacute na espeacutecie

da qual se predica215 Assim o define Aristoacuteteles ldquogecircnero significa o constitutivo

primeiro das definiccedilotildees contido na essecircnciardquo e diz que desse mesmo gecircnero ldquoas

qualidades satildeo diferenccedilasrdquo216

Como a forma a espeacutecie e o gecircnero a diferenccedila significa o todo como uma

denominaccedilatildeo oriunda da forma determinada (e assim diferentemente do gecircnero a

mateacuteria determinada natildeo eacute considerada em seu primeiro conceito)217

Portanto a espeacutecie eacute substrato do gecircnero uma vez que este eacute afirmado a

partir daquela sem que se decirc o oposto o que faz com que ela seja ldquomais

substacircnciardquo do que ele218 Ademais se a forma eacute uma universalidade os diversos

sujeitos que participam de uma mesma forma o fazem de trecircs modos por igualdade

por excesso ou por falha219

Os princiacutepios material e formal resultam no composto essencial (ou

substancial) ou tambeacutem sujeito chamado ldquosinolordquo220 que existe por si sem provir

de nada que se lhe acrescente221 Assim por substacircncia pode-se entender a

mateacuteria a forma ou o composto222 Sobre o composto ou sinolo explica o Aquinate

que o ente que ele eacute natildeo eacute nem forma nem mateacuteria ou seja constitui-se uma

terceira coisa de duas coisas ontologicamente anteriores223 que por serem

princiacutepios natildeo satildeo entes natildeo tecircm ser absoluto uma sem a outra e portanto natildeo se

fazem entes por outros iguais a eles respectivamente A forma por exemplo eacute ldquoo

teacutermino da geraccedilatildeordquo e natildeo eacute algo por outra forma224 Ela eacute ativa atualiza o ente

(move-o da potecircncia ao ato) como pertencente agrave espeacutecie por ela determinada e eacute

princiacutepio de operaccedilatildeo A mateacuteria (que em sua condiccedilatildeo mais fundamental eacute pura

potecircncia ndash e chama-se neste caso materia prima) eacute passiva recebe a forma e

entatildeo a individua sendo paciente de suas operaccedilotildees Mas soacute eacute princiacutepio de

214

TOMAacuteS DE AQUINO 2003b p 66 Id 1949 Q 1 R 9 p 20 e 25 215

Id 1949 Q 1 R 2 p 17 Ibid Q 3 Obj 3 p 44 216

ARISTOacuteTELES 2005 V 1024b p 259 217

TOMAacuteS DE AQUINO 2006 p 63-64 Id 1949 Q 1 R 24 p 25 218

ARISTOacuteTELES 1965 p 34-35 37-38 219

TOMAacuteS DE AQUINO 2006 p 131 220

REALE ANTISERI 2003 p 199 221

TOMAacuteS DE AQUINO 2003a p 20 222

ARISTOacuteTELES 2010 II 2 p 67 223

TOMAacuteS DE AQUINO 2003b p 64 224

Id 2006 p 97

66

individuaccedilatildeo a mateacuteria designada (ou materia signata quantitae) que se pode

considerar sobre certas dimensotildees e natildeo a mateacuteria sem mais natildeo designada que

eacute em potecircncia relativa agrave determinada espeacutecie considerando-se esta mesma espeacutecie

e natildeo a um indiviacuteduo dela

Eacute pois da mateacuteria designada por dimensotildees que se faz a ldquodesignaccedilatildeo do

indiviacuteduo em relaccedilatildeo agrave espeacutecierdquo e eacute pela ldquodiferenccedila constitutiva tirada pela forma da

coisardquo que se faz a ldquodesignaccedilatildeo da espeacutecie em relaccedilatildeo ao gecircnerordquo225 Portanto ldquoo

que existe na espeacutecie existe tambeacutem no gecircnero como natildeo determinadordquo226 e assim

ldquoo gecircnero significa indeterminadamente tudo o que existe na espeacutecierdquo227

A relaccedilatildeo entre a mateacuteria e a forma a ligaccedilatildeo de ambas que caracteriza o

sinolo explica Angioni natildeo eacute extrinsecamente determinada mas a partir de dentro

imanentemente pois diz ldquoeacute da proacutepria natureza da forma pocircr a necessidade de

uma mateacuteria propriamente determinadardquo228 A forma eacute princiacutepio de algo mais que

existe no composto o ser do qual a mateacuteria participa diz o Aquinate ldquopor receber a

formardquo ndash ou seja a forma daacute simpliciter229 o ser agrave mateacuteria ndash e por isso tudo o que eacute

ente eacute uno E explica

Assim o ser eacute consequente agrave proacutepria forma Natildeo obstante a forma natildeo eacute o proacuteprio ser E embora a mateacuteria natildeo alcance o ser senatildeo pela forma a forma no entanto enquanto eacute forma natildeo carece da mateacuteria para seu ser visto que o ser se segue agrave proacutepria forma apenas necessita da mateacuteria Portanto a proacutepria essecircncia da forma estaacute para o ser assim como a potecircncia estaacute para seu ato proacuteprio o proacuteprio ser eacute aquilo pelo qual algo eacute assim como a corrida eacute aquilo pelo qual algueacutem corre Portanto visto que a alma eacute certa forma subsistente por si concebe-se em sua composiccedilatildeo ato e potecircncia ndash isto eacute o ser (esse) e o que eacute (quod est) ndash sem que haja composiccedilatildeo de mateacuteria e forma

230

O ser assim eacute aquilo pelo qual algo eacute (sujeito que possui um ser

completo)231 eacute ato do todo substancial232 que atraveacutes da forma sobreveacutem agrave coisa e

de modo nenhum se separa da forma enquanto natildeo eacute nem esta nem a mateacuteria233 e

assim todas as substacircncias teratildeo seu ser limitado e confinado234 O ser eacute contraiacutedo

225

TOMAacuteS DE AQUINO 2003b p 60 226

Ibid p 61 227

Ibid p 63 228

ANGIONI 1997 p 241 229

Isto eacute ldquoem sentido absolutordquo 230

TOMAacuteS DE AQUINO 2012 Q VI p 135 231

Id 2003 p 20 232

Id 1990b L II c LIV p 256 233

Id 2006 p 89 234

Id 1949 Q 1 Obj 15 p 6

67

pelo ente que o recebe do ente ontologicamente anterior que o confere

caracterizando dois componentes presentes em todo e qualquer ente composto ldquoa

natureza da coisa que participa do serrdquo e o ldquomesmo ser que eacute participadordquo235 pelos

quais se conclui que todo composto ou sinolo apresentaraacute essencialmente dois

atos e duas potecircncias a saber o ato do ser em relaccedilatildeo agrave forma que eacute atualizada

natildeo por causa movente mas por causa influente e o ato da forma em relaccedilatildeo agrave

mateacuteria esta atualizada por causa movente e a potecircncia da mateacuteria em relaccedilatildeo agrave

forma e a da forma em relaccedilatildeo ao ser236

Portanto eacute pelo ser que se denomina ente certa substacircncia de modo que se

do composto de mateacuteria e forma pode-se dizer ldquoo que eacute (quod est)rdquo a coisa do

composto desta substacircncia mais o ser pode-se dizer ldquopelo qual eacute (quo est)rdquo a

coisa237

Nos entes inanimados exclusivamente corpoacutereos a forma eacute mais simples e

por isso se diz que tem menos ser Pode inclusive em certos casos ateacute ser

restaurada depois de desfeita238 Esta propriedade da forma enquanto princiacutepio

subsistente ou seja da forma substancial estaacute no cerne da gradaccedilatildeo entitativa da

qual se falaraacute adiante

Mas independentemente de a sua forma ter mais ou menos ser a substacircncia

natildeo eacute susceptiacutevel de mais e de menos intensidade e natildeo possui contraacuterios No

entanto ela eacute apta a receber contraacuterios como acidentes239

Haacute pois tambeacutem a forma acidental Esta eacute dependente da forma

substancial em virtude da qual ela age pois eacute meio pelo qual ela opera jaacute que natildeo

opera por si mesma (pois como diz Tomaacutes de Aquino ldquoaquilo que participa de algo

eacute segundo ele proacuteprio carente deste algordquo)240 A forma acidental confere agrave mateacuteria

235

Respectivamente ldquonatura rei quae participat esserdquo e ldquoipsum esse participatumrdquo 236

TOMAacuteS DE AQUINO 1949 Q 1 R p 15 e R 5 p 18 237

Id 1990b L II c LIV p 256 238

Eacute o caso por exemplo do misto ou de misturas de substacircncias quiacutemicas que podem ser desfeitas e em seguida reconstituiacutedas

239 ARISTOacuteTELES 1965 p 39-40

240 TOMAacuteS DE AQUINO 2006 p 87

68

secundum quid 241 o ldquoserrdquo dos acidentes242 tais como as cores e a consistecircncia e

complementa deste modo o sujeito o ente243

Assim os atributos que recebem o ser da forma acidental predicam do sujeito

per se ou predicam de outros atributos per accidens244 ou tambeacutem per se neste

caso ldquoquando as diversas formas possuem ordenaccedilatildeo entre si como quando

dizemos por exemplo que lsquoo que possui superfiacutecie eacute coloridorsquordquo Aqui o predicado

natildeo entra na definiccedilatildeo do sujeito mas daacute-se o contraacuterio como exemplifica o

Aquinate ldquoa superfiacutecie entra na definiccedilatildeo da cor assim como o nuacutemero entra na

definiccedilatildeo de parrdquo245 E nesse acircmbito as formas inerentes ou seja que satildeo inerentes

a determinado composto podem ser especiais como por exemplo o branco que

satildeo as que se alteram mediante a alteraccedilatildeo do sujeito ou gerais como a cor que

nesse caso permanece natildeo em seu ser na alteraccedilatildeo mas em seu conteuacutedo ou seja

continua havendo cor mas natildeo mais a branca246

A forma acidental portanto caracteriza os corpos artificiais que se podem

dizer substacircncia por sua mateacuteria jaacute que eacute natural uma vez que provecircm de corpos

naturais que satildeo mais substacircncia que os artificiais dos quais satildeo princiacutepios pois o

satildeo pela mateacuteria e pela forma247

Os acidentes variam conforme a diversidade dos princiacutepios que lhes satildeo

causa248 Pode-se consideraacute-los como sendo de trecircs gecircneros os proacuteprios

ldquocausados a partir dos princiacutepios da espeacutecie como a capacidade de rir no homemrdquo

os que ldquosatildeo causados a partir dos princiacutepios do indiviacuteduo porque tecircm causa

permanente no sujeito (e satildeo estes os acidentes inseparaacuteveis como lsquomasculinorsquo e

lsquofemininorsquo e similares)rdquo e os que ldquotecircm causa natildeo permanente no sujeito (e satildeo estes

os acidentes separaacuteveis como lsquosentar-sersquo ou lsquocaminharrsquo)rdquo249 E podem ser ainda

considerados em duas espeacutecies a saber os necessaacuterios presentes em qualquer

241

Ou seja ldquosegundo algordquo 242

Em verdade natildeo se pode dizer em sentido absoluto que o acidente seja ser mas que seja de um ser como explica o Estagirita na Metafiacutesica (cf ARISTOacuteTELES 2005 XII 1069a 1 23-24) o que leva Santo Tomaacutes a dizer que estas formas em rigor natildeo existem ldquomas que qualquer coisa existe por elasrdquo TOMAacuteS DE AQUINO 2009 p 77

243 Id 2001 Q 77 a 6 p 709

244 ldquoPor sirdquo e ldquopor acidenterdquo respectivamente

245 TOMAacuteS DE AQUINO 2012 Q XI p 237

246 Id 1988 art VI p 71

247 Id 2000 L II l 1 218

248 E note-se portanto que nos acidentes o gecircnero natildeo eacute tomado pela mateacuteria e a

diferenccedila natildeo eacute tomada pela forma mas ldquodo proacuteprio modo de ser segundo o qual o ente assume diversas designaccedilotildees conforme eacute anterior e posterior relativamente aos dez gecircneros de categoriasrdquo Id 2003b p 94

249 Id 2012 Q XII p 257

69

indiviacuteduo da espeacutecie natildeo se separando assim da realidade e os natildeo necessaacuterios

que podem variar entre os indiviacuteduos da espeacutecie ou separar-se da realidade250

Alguns acidentes estatildeo mais relacionados agrave forma outros agrave mateacuteria uns atingem a

mateacuteria segundo a relaccedilatildeo com a forma geral outros com uma forma especiacutefica

Uns podem ser causados segundo um ato perfeito a partir dos dois princiacutepios

essenciais outros segundo a aptidatildeo por exemplo a algo exterior251

Diz ainda o Aquinate sobre os acidentes

Todo e qualquer acidente poreacutem tem em comum natildeo ser da essecircncia da coisa e assim natildeo cai em sua definiccedilatildeo por isso podemos conceber o que uma coisa eacute sem que concebamos algo de seus acidentes Mas a espeacutecie natildeo pode ser concebida sem os acidentes consequentes ao seu princiacutepio Ela pode sim ser concebida sem os acidentes do indiviacuteduo mesmo aqueles inseparaacuteveis jaacute sem os separaacuteveis podem ser concebidos tanto a espeacutecie quanto o indiviacuteduo Ora as espeacutecies da alma satildeo acidentes enquanto propriedades Assim embora sem eles se conceba o que eacute a alma natildeo eacute possiacutevel nem inteligiacutevel que a alma exista sem eles

252

Infere-se disto outro princiacutepio a privaccedilatildeo253 ou o natildeo ser em ato o terceiro

dos trecircs princiacutepios da natureza e um dos trecircs requisitos para a geraccedilatildeo tambeacutem

junto com os princiacutepios anteriormente abordados (mateacuteria e forma) A forma provoca

a geraccedilatildeo que proveacutem da mateacuteria e da privaccedilatildeo Mateacuteria e privaccedilatildeo assim

distinguem-se somente no acircmbito da razatildeo mas natildeo no da realidade e deste modo

a privaccedilatildeo soacute pode ser considerada princiacutepio por acidente254 Portanto a mateacuteria

desprovida da forma e da privaccedilatildeo recebe o nome de ldquomateacuteria prima sem maisrdquo que

eacute pura potecircncia natildeo precedida de qualquer outra mateacuteria e por si mesma natildeo pode

ser conhecida sendo portanto una (uma vez que natildeo estaacute incluiacuteda em qualquer

estrutura que crie multiplicidade) Tomaacutes de Aquino menciona tambeacutem a ldquomateacuteria

prima relativamente a certo gecircnerordquo esta composta de mateacuteria e forma a qual

exemplifica com a aacutegua em relaccedilatildeo agraves ldquodiversas soluccedilotildees aquosasrdquo255

Como o ser natildeo se separa da forma a perda desta implica a corrupccedilatildeo dos

entes compostos256 No tocante aos acidentes dois modos haacute de corrpuccedilatildeo pela

corrupccedilatildeo de seu sujeito (como as potecircncias sensitivas das quais trataremos logo

250

TOMAacuteS DE AQUINO 2003a p 23 251

Id 2003b p 91-92 252

Id 2012 Q XII p 257 e 259 253

Diferente da negaccedilatildeo que independe do sujeito relacionado Id 2003a p 24 254

Ibid p 22-23 255

Ibid p 26-27 256

Id 2012 Q XIV p 291

70

adiante em relaccedilatildeo aos respectivos oacutergatildeos dos sentidos)257 ou por seu contraacuterio

(como o frio pelo quente)258

A corrupccedilatildeo ou movimento do ser para o natildeo ser259 bem como seu contraacuterio

a geraccedilatildeo ou movimento do natildeo ser para o ser podem ser simples ou seja estar

presentes no gecircnero da substacircncia ou acidentais ou seja que se passam em todos

os demais gecircneros260

A geraccedilatildeo tem por ponto de partida a mateacuteria e por porto de chegada a

forma261 No entanto nenhum dos princiacutepios tem por si o poder de gerar ou seja

nenhum ente tem por si o poder de passar da potecircncia ao ato sendo portanto

necessaacuterio como princiacutepio ativo um agente extriacutenseco como se disse

anteriormente a causa eficiente ou agente que daacute origem ao movimento sendo

assim tambeacutem chamada causa motora 262263

53 AS QUATRO CAUSAS E AS CATEGORIAS

Aristoacuteteles classifica as causas em quatro tipos ou espeacutecies que satildeo causas

por si e aos quais todos os demais tipos de causa que o satildeo por acidente por isso

mesmo se reduzem264 Diz ele ainda que as causas satildeo princiacutepios e Tomaacutes de

Aquino explica que isto se daacute em sujeito mas natildeo em significado onde diferem pois

princiacutepio ldquoimplica uma ordem ou uma sequecircnciardquo enquanto causa implica ldquoalguma

influecircncia no ser da coisa causadardquo265 Dos quatro tipos haacute dois que satildeo

considerados ab intrinseco ou intriacutensecos266 pois estatildeo relacionados agrave constituiccedilatildeo

essencial do ente sendo essas causas respectivamente a mateacuteria da qual as coisas

satildeo feitas e o modelo ou a forma substancial que a atualiza que diz o Estagirita eacute

257

TOMAacuteS DE AQUINO Q XIX p 395 258

Ibid Q XIX p 385 259

Id 1949 Q 2 R p 37 260

Id 2003a p 21-22 261

Ibid p 27 262

Quanto ao movimento o aristotelismo-tomismo qualifica-o como progressivo e distingue quatro espeacutecies o movimento segundo o lugar o movimento de crescimento e o de reduccedilatildeo e o movimento de alteraccedilatildeo A geraccedilatildeo e a corrupccedilatildeo assim natildeo satildeo consideradas propriamente como espeacutecies de movimento mas transformaccedilotildees instantacircneas (cf TOMAacuteS DE AQUINO 2000 L I l 6 75)

263 Id 2003a p 28

264 ARISTOacuteTELES 1995a L II 194b p 140-142 Id 2005 L V 1013a-1013b p 189-191

TOMAacuteS DE AQUINO 2003a p 31 265

ldquo[] implies an order or sequence []rdquo ldquo[] implies some influence on the being of the thing causedrdquo Id 1964b L V l 1 751

266 Id 2003a p 31

71

ldquoa definiccedilatildeo da essecircncia e seus gecircnerosrdquo267 jaacute descritas anteriormente e aqui

denominadas causa material e causa formal respectivamente

O terceiro tipo eacute a causa eficiente citada anteriormente pela qual a origem do

movimento se daacute de modo ab extrinseco ldquoo princiacutepio primeiro de onde proveacutem a

mudanccedila ou o repouso e o que faz mudar algo em relaccedilatildeo ao mudadordquo268 Eacute a

potecircncia motora como causa eficiente que determina a mateacuteria por si mesma que

em princiacutepio pode-se relacionar indiferentemente com qualquer forma a formas

especiais de modo que um agente natural distinto imprimiraacute uma uacutenica forma em

mateacuteria especiacutefica perfeccionada por uma forma mais universal e os acidentes

desta tornando a mateacuteria como diz o Aquinate ldquoproacutepria para a perfeiccedilatildeo

subsequenterdquo269

Quanto ao quarto eacute a causa final que com a anterior representa o segundo

tipo de causas extriacutensecas mas que ao contraacuterio dela eacute natildeo a origem mas o fim do

movimento aquilo para o qual ele tende naturalmente pois o que quer que aja o faz

tendendo a um fim que pode ser segundo Tomaacutes de Aquino de dois tipos o da

geraccedilatildeo ou o do gerado270 Explica ele entatildeo que o fim seria a ldquocausa das causasrdquo

jaacute que eacute causa da causalidade eficiente por ser a razatildeo pela qual esta age e eacute o

que faz com que a forma e a mateacuteria sejam respectivamente forma e mateacuteria e com

que estas interajam com aquela aperfeiccediloando esta mediante o fim271 Das quatro

causas somente a causa material eacute potecircncia enquanto que as demais satildeo ato

sendo que a formal pode ser uma soacute coisa com a final mas nunca com a eficiente

ainda que diferente da material seja da mesma espeacutecie272

Os quatro gecircneros de causa como se disse abarcam todas as espeacutecies de

causas como a causa proacutexima ou posterior referente ao que eacute mais particular e a

causa remota ou anterior referente ao que eacute mais universal ou como a causa por

si a de um objeto enquanto tal e a causa por acidente referente a algo que

acontece agrave anterior ou ainda a causa simples que eacute causa soacute por si ou soacute por

acidente ou eacute causa uacutenica ou a causa composta que pode ser a junccedilatildeo de duas

causas simples no primeiro caso ou quando haacute mais de um sujeito como causa ou

267

ldquo[] la definicioacuten de la esencia y sus geacuteneros []rdquo ARISTOacuteTELES 1995a L II 194b p 141

268 ldquo[] el principio primero de donde proviene el cambio O el reposo [] y lo que hace

cambiar algo respecto de lo cambiado []rdquo Ibid L II 194b p 142 269

ldquo[] propria ad subsequentem perfectionemrdquo Id 1949 Q 3 R 20 p 64-65 270

Id 2003a p 39 271

Ibid p 36 272

Ibid p 39-40

72

causa em ato que produz seu efeito em ato ou causa em potecircncia que natildeo produz

efeito mas pode vir a produzi-lo ou causa universal ou causa singular que se

distinguem em relaccedilatildeo agrave natureza do efeito etc273

O Estagirita tambeacutem reduz a seis essas causas segundo seu modo de ser

que diz podem ser entendidas no sentido de ato ou de potecircncia Seriam elas

causas ldquo(1) como particular ou (2) como gecircnero ou (3) como acidente ou (4) como

gecircnero do acidente ou (5) como combinadas umas e outras ou (6) como tomadas

cada uma por si []rdquo274

As causas particulares observa Tomaacutes de Aquino atuam pelo poder das

universais275

Ele explica tambeacutem que a perfeiccedilatildeo de um efeito eacute diretamente proporcional

ao grau de semelhanccedila com a sua causa276 que estaraacute sempre presente de alguma

forma nele que por sua vez jamais seraacute mais simples do que ela277 O efeito

tambeacutem estaraacute em sua causa diz o Aquinate ldquode modo mais elevado segundo o

poder da causardquo278

As quatro causas assim estatildeo presente em cada uma das chamadas

categorias

Quanto a essas categorias ou predicamentos o Estagirita as elenca em dez

a saber a substacircncia a quantidade a qualidade a relaccedilatildeo o lugar o tempo a

posiccedilatildeo a posse (habitum) a accedilatildeo e a afecccedilatildeo (paixatildeo)279

A substacircncia da qual se falou anteriormente eacute a uacutenica que apresenta caraacuteter

essencial enquanto as demais possuem caraacuteter acidental

A quantidade pode ser discreta ou seja quando natildeo haacute limite comum que

estabeleccedila contato entre as partes (como o nuacutemero e o discurso) ou contiacutenua (como

a superfiacutecie de um corpo soacutelido e o tempo)280

A relaccedilatildeo estabelece-se quando uma coisa a relativa com mais ou menos

intensidade depende de outra a correlativa ndash que lhe eacute de algum modo simultacircnea

e que lhe pode ser contraacuteria ou natildeo ndash ou quando se refere de algum modo a esta281

273

TOMAacuteS DE AQUINO 2003a p 41-43 274

ARISTOacuteTELES 2005 L V 1014a p 195 275

TOMAacuteS DE AQUINO 2006 p 101 276

Ibid p 133 277

Ibid p 125 278

Ibid p 145 279

ARISTOacuteTELES 1965 p 20 280

Ibid p 75 281

Ibid p 98-100 e 103

73

De todas as categorias ela eacute a uacutenica que natildeo coloca algo na natureza das coisas

senatildeo na esfera loacutegica ndash jaacute que as demais designam um algo enquanto ela designa

um ldquoem relaccedilatildeo a algordquo ndash o que pode ocorrer ldquoquando alguma coisa eacute posta em

relaccedilatildeo consigo mesmardquo (como a identidade) ldquoquando a proacutepria relaccedilatildeo eacute posta em

relaccedilatildeo com alguma coisardquo diretamente (como a paternidade) ldquoquando um dos

termos da relaccedilatildeo depende do outro e natildeo vice-versardquo (como a do conhecimento

com o objeto na dependecircncia do conhecimento em relaccedilatildeo aos objetos por

conhecer-se) quando ldquoo ser eacute comparado com o natildeo serrdquo (como quando um sujeito

diz que eacute antes dos que seratildeo depois dele)282

A qualidade eacute o acidente determinativo da substacircncia em si mesma

Aristoacuteteles define-a como aquilo ldquoem virtude do qual se diz que alguma coisa eacute talrdquo

A qualidade pode ter contraacuterios eacute susceptiacutevel tanto de mais e de menos como de

aumento e diminuiccedilatildeo e pode ser semelhante ou dissemelhante em relaccedilatildeo agrave outra

qualidade O Estagirita aponta alguns dos muitos gecircneros de qualidades Um eacute

aquele que eacute como haacutebito (as ciecircncias e as virtudes) e disposiccedilatildeo ndash que pode ser

ldquofacilmenterdquo movida e ldquorapidamenterdquo mudada (como o frio o calor o saudaacutevel o

enfermo etc) ndash sendo aquele mais estaacutevel e duraacutevel e sempre ao mesmo tempo

esta jaacute que possuir haacutebitos ldquoeacute tambeacutem encontrar-se numa certa disposiccedilatildeordquo283

Outro eacute aquele que satildeo determinaccedilotildees afirmadas por aptidotildees ou inaptidotildees

naturais (como os que tecircm aptidatildeo natural para realizar bem certo exerciacutecio ou para

suportar algo que lhe aconteccedila etc) Haacute tambeacutem o que estaacute relacionado agraves

afecccedilotildees e agraves qualidades afetivas como o frio a brancura a doccedilura etc que satildeo

qualidades que produzem modificaccedilatildeo nas sensaccedilotildees ou resultam de modificaccedilotildees

E o Estagirita cita mais um em seus escritos sobre as categorias que respeita agrave

figura e agrave forma acidental284

Em relaccedilatildeo agrave accedilatildeo e agrave afecccedilatildeo tambeacutem admitem contraacuterios e nelas tambeacutem

haacute susceptibilidade de mais e de menos285 Quanto agrave afecccedilatildeo ou paixatildeo pode ser

vista de dois modos como o simples ato de receber como o sentido recebe o

sensiacutevel ou quando algo da substacircncia do que padece ou paciente eacute eliminado

como ocorre com a madeira ao fogo286

282

TOMAacuteS DE AQUINO 1988 art V p 67-68 283

ARISTOacuteTELES 1965 p 124-126 284

Ibid p 126-127 e 129 285

Ibid p 141 286

TOMAacuteS DE AQUINO 2012 Q XXI p 423

74

Jaacute a posse ou haacutebito Aristoacuteteles define como ldquocerta atividade proacutepria do que

possui e do que eacute possuiacutedo como uma accedilatildeo ou um movimentordquo287 como algueacutem

que esteja calccedilado ou armado288 ou ldquo[] a disposiccedilatildeo em virtude da qual a coisa

disposta eacute disposta bem ou mal seja por si seja em relaccedilatildeo a outra []rdquo ou o que

participa dessa disposiccedilatildeo289

Por fim o tempo diz respeito exatamente a quando ou seja se ontem ou

hoje ou amanhatilde etc o local diz respeito a onde ou seja se nesta cidade se em

determinado recinto etc e a posiccedilatildeo diz respeito ao modo como o sujeito se situa

no tempo e no espaccedilo ou seja se de peacute ou sentado ou deitado etc290

54 A ALMA SUAS POTEcircNCIAS E A GRADACcedilAtildeO ENTITATIVA

Diz Tomaacutes de Aquino

Quanto mais perfeita uma forma eacute mais ela extrapassa a mateacuteria corpoacuterea Isto se torna claro desde a induccedilatildeo em que se consideram as vaacuterias ordens de formas A forma de um elemento natildeo tem mais operaccedilotildees que a que as realiza mediante as qualidades ativas e passivas que satildeo disposiccedilotildees da mateacuteria corpoacuterea A forma do corpo mineral tem uma operaccedilatildeo que supera as qualidades ativas e passivas [] a alma vegetal tem uma operaccedilatildeo com a qual as qualidades ativas e passivas orgacircnicas certamente contribuem mas para aleacutem da potecircncia de tais qualidades ela mesma alcanccedila um efeito proacuteprio como nutrir e fazer crescer ateacute um limite definido e realizar coisas semelhantes A alma sensitiva tem aleacutem disso uma operaccedilatildeo para a qual soacute chegam as qualidades ativas e passivas na medida em que satildeo necessaacuterias para a composiccedilatildeo do oacutegatildeo que se emprega no exerciacutecio desta operaccedilatildeo como ver ouvir apetecer etc

291

Nos entes viventes ou animados a forma substancial recebe a denominaccedilatildeo

de ldquoalmardquo (do latim anima) que pode ser conhecida por suas potecircncias natildeo sendo

287

ARISTOacuteTELES 2005 L V 1022b p 245 288

Id 1965 p 20 289

Id 2005 L V 1022b p 247 290

Id 1965 p 20 291

ldquo[] quod quanto aliqua forma est perfectior tanto magis supergreditur materiam corporalem quod patet inducenti in diversis formarum ordinibus Forma enim elementi non habet aliquam operationem nisi quae fit per qualitates activas et passivas quae sunt dispositiones materiae corporalis Forma autem corporis mineralis habet aliquam operationem excedentem qualitates activas et passivas [] Ulterius autem anima vegetabilis habet operationem cui quidem deserviunt qualitates activae et passivae organicae sed tamen supra posse huiusmodi qualitatum ipsa effectum proprium sortitur nutriendo et augendo usque ad determinatum terminum et alia huiusmodi complendo Anima autem sensitiva ulterius habet operationem ad quam nullo modo se extendunt qualitates activae et passivae nisi quatenus exiguntur ad compositionem organi per quod talis operatio exercetur ut videre audire apetere et huiusmodirdquo TOMAacuteS DE AQUINO 1949 Q 2 R p 35-36

75

estas nem partes suas essenciais ou integrais mas potenciais292 Partes diga-se

que satildeo separaacuteveis apenas conceptualmente e natildeo segundo o lugar (ldquosegundo a

substacircncia da alma ou localmenterdquo)293 Aristoacuteteles define a alma como o princiacutepio da

vida e como o ato primeiro de um corpo natural organizado294 que eacute ldquoenteleacutequiardquo

ou ato perfeiccedilatildeo295 e Santo Tomaacutes complementa ldquodotado de potecircncia para a

vidardquo296 e faacute-lo tambeacutem como ldquoa forma substancial de um corpo natural organizadordquo

ldquoem sentido universal [] uma substacircncia segundo a forma isto eacute a quididade de

cada corpordquo297

E a todo o corpo que dela eacute dotado ela vivifica estando presente e atuando

em todas as suas partes cada uma com potecircncias especiacuteficas inerentes ao

composto ou sinolo como ato seu por inteiro e tambeacutem de cada uma de suas

partes em ordem agrave integralidade do mesmo corpo as quais algumas satildeo

perfeccionadas com maior preferecircncia e perfeiccedilatildeo e outras com menos298 A alma

confere naturalmente o ser que dos viventes eacute o viver299 e a espeacutecie constituindo

no corpo sua diversidade de partes ndash mebros oacutergatildeos etc ndash em conformidade com

as distintas operaccedilotildees que tornam necessaacuteria a constituiccedilatildeo do corpo por partes a

elas correspondentes caracterizando um corpo organizado em que eacute em funccedilatildeo do

todo que essas mesmas partes existem Disto se infere que na constituiccedilatildeo dos

entes animados a propriedade teleoloacutegica eacute mais visiacutevel que na dos inanimados300

O aristotelismo-tomismo faz distinccedilatildeo entre movimento e operaccedilatildeo O

Aquinate define o primeiro como ldquoo ato de um ente imperfeitordquo e o segundo como ldquoo

ato de um ente perfeitordquo301 Explica tambeacutem que a alma move tanto a si mesma

como eacute movida por acidente ou seja quando eacute movida pelo corpo em que estaacute302 e

eacute movida ldquopelos sensiacuteveis na sensaccedilatildeo e pelos bens desejados na afecccedilatildeordquo303

292

TOMAacuteS DE AQUINO 2012 Q XIX p 389 293

Id 2009 p 53 294

ARISTOacuteTELES 2010 II 1 p 61-62 295

REALE ANTISERI 2003 p 212 296

ldquo[] doteacute em puissance de la vierdquo TOMAacuteS DE AQUINO 2000 II l 1 233 297

Id 2009 p 47 298

Id 1949 Q 4 SC II e IV p 71 Ibid Q 4 R 3 p 75 e R 8 p 76 299

Ibid Q 1 SC IV p 10 300

Id 2012 Q X p 221 e 225 Id 2000 II l 1 230 301

Respectivamente ldquolacte dun ecirctre imparfaitrdquo e ldquolacte dun ecirctre parfaitrdquo Id 2000 I l 6 111

302 Ibid I l 8 145

303 ldquo[] par les sensibles dans la sensation et par les biens deacutesirables dans lrsquoaffectionrdquo Ibid

I l 6 84

76

sendo ela a causa do movimento e do repouso nos animais304 Assim distingue-se

um ente vivo de um natildeo vivo pelo movimento uma vez que este precisa

necessariamente da accedilatildeo de um princiacutepio exterior para mover-se305

As almas nos viventes distinguem-se segundo o modo como suas operaccedilotildees

superam as respectivas naturezas corpoacutereas que eacute diretamente proporcional ao

domiacutenio que cada alma exerce sobre a mateacuteria corporal e inversamente

proporcional ao grau de imersatildeo nesta Tais operaccedilotildees se datildeo conforme as

potecircncias inerentes agrave alma ndash e diz o Aquinate que se considera vivente tudo o que

possui uma destas operaccedilotildees da alma306 ndash cujos gecircneros segundo o aristotelismo-

tomismo satildeo a vegetativa a sensitiva a intelectiva ou racional (que diferentemente

das duas anteriores que inerem no composto como propriedades naturais ndash e ainda

que tenham o composto como sujeito tecircm a alma como princiacutepio ndash inere

diretamente na alma)307 a apetitiva a locomotora ou motriz e a nutriz308 As trecircs

primeiras determinam as classes dos entes os graus das potecircncias na alma

enquanto que a apetitiva e a nutriz encontram-se nas trecircs classes definidas pelas

trecircs anteriores e a motriz natildeo eacute geralmente encontrada nos entes de classe

vegetativa309

Segundo a inclinaccedilatildeo natural proacutepria ou apetite natural procedente de cada

tipo de forma natural e da qual segue determinada operaccedilatildeo ou determinado

conjunto de operaccedilotildees o aristotelismo-tomismo enquadra cinco dos seis gecircneros

acima excluindo aqui a potecircncia nutriz310 e ainda segundo o grau dos viventes

exclui tambeacutem a apetitiva estabelecendo quatro como o nuacutemero de gecircneros para

esta classificaccedilatildeo311

As potecircncias da alma distinguem-se assim por seus diferentes objetos Isto

porque como explica o Aquinate

[] se os atos satildeo de potecircncias passivas seus objetos satildeo ativos e se os atos satildeo de potecircncias ativas seus objetos satildeo como fins Mas eacute segundo ambos que se considera a espeacutecie da operaccedilatildeo [] e tambeacutem ambos estatildeo

304

TOMAacuteS DE AQUINO 2000 I l 6 89 305

Ibid II l 1 219 306

Id 2009 p 51 307

Id 2012 Q XIX p 389 308

Id 2000 I l 14 201 309

Id 2001 Q 78 a 1 p 713 ARISTOacuteTELES 2010 II passim TOMAacuteS DE AQUINO 2000 II l 3 passim

310 TOMAacuteS DE AQUINO 2000 II l 5 279 286

311 Ibid II l 5 287

77

determinados a fins semelhantes pois o agente age de modo a induzir em outro sua proacutepria semelhanccedila

312

Deste modo conhecer e sentir satildeo operaccedilotildees da alma quanto aos sentidos e

pensar eacute operaccedilatildeo quanto agrave inteligecircncia

Estabelece-se portanto que todo e qualquer ente corpoacutereo enquadra-se em

alguma destas classes que seguem um esquema ascendente segundo o grau de

perfeiccedilatildeo natural a dos corpos sem vida (os elementos e em seguida os mistos) a

vegetativa (as plantas cujo corpo eacute animado com princiacutepio vital) a sensitiva

(potecircncia sensitiva acrescida agrave vegetativa o que caracteriza os animais

propriamente ditos) e a intelectiva (que eacute acrescida agraves anteriores o que caracteriza

o homem) de modo gradativo incluindo os agentes constitutivos de outros entes

(ceacutelulas partiacuteculas atocircmicas etc)

Explica Tomaacutes de Aquino que

[] em cada um dos gecircneros haacute diversas espeacutecies segundo os diversos graus de perfeiccedilatildeo natural No caso dos corpos simples a terra ocupa o grau iacutenfimo e o fogo o mais nobre No caso dos minerais a natureza avanccedila gradualmente atraveacutes de suas diversas espeacutecies ateacute culminar no ouro

Nos minerais que estatildeo mais proacuteximos dos elementos haacute menos harmonia o

que lhes confere maior durabilidade

Jaacute a vegetativa cujo objeto eacute o corpo eacute caracterizada por trecircs operaccedilotildees a

generativa a aumentativa e a nutritiva pelas quais recebe o ser se desenvolve e se

conserva respectivamente

Prossegue Santo Tomaacutes

Tambeacutem nas plantas ateacute culminar nas espeacutecies das aacutervores perfeitas e nos animais ateacute culminar no homem ndash embora alguns animais sejam muito proacuteximos das plantas como os imoacuteveis que soacute possuem tato De modo semelhante certas plantas satildeo muito proacuteximas dos entes inanimados

313

E da mesma forma certos animais exibem caracteriacutesticas muito proacuteximas agraves

de entes vegetais como o caso dos animais cujas partes sobrevivem apoacutes secccedilatildeo

algo que natildeo se daacute de modo algum nos animais ditos ldquosuperioresrdquo314

312

TOMAacuteS DE AQUINO 2012 Q XIV p 269 313

Ibid Q VII p 151 314

O Aquinate assim como Aristoacuteteles atribui isto ao fato de a alma desses animais natildeo ser diversificada em suas partes e acrescenta que cada ldquoparte reteacutem a disposiccedilatildeo mediante a qual o

78

O princiacutepio sensitivo nos vegetais eacute a proacutepria alma ao passo que nos animais

e nos humanos ele eacute parte da alma315 Algumas operaccedilotildees da alma se datildeo no todo

e estas se atualizam em qualquer uma das partes outras em locais especiacuteficos316

Quanto mais perfeita eacute a forma quanto maior sua virtude mais operaccedilotildees e em

maior diversidade natildeo soacute destas como tambeacutem de partes diferenciadas ela teraacute

do que se infere que enquanto as formas inferiores perfeccionam uniformemente a

alma natildeo o faz O homem assim eacute o ente com maior nuacutemero de operaccedilotildees e de

partes diferenciadas317

Eacute segundo a operaccedilatildeo e o movimento que o corpo se une agrave alma por suas

partes superiores318 O corpo eacute movido voluntariamente pela alma atraveacutes do apetite

e da apreensatildeo No homem ambos os movimentos se datildeo pela parte intelectiva e

pela parte sensitiva sendo que aquela move o corpo mediante o que pertence a

esta uma vez que o movimento eacute do singular319

Explica o Aquinate ldquoa alma daacute ao animal natildeo soacute o que eacute proacuteprio dele mas

tambeacutem o que pertence agraves formas inferioresrdquo e sendo assim do mesmo modo que

ldquoas formas inferiores satildeo princiacutepios de movimento natural nos corpos naturais assim

eacute a alma no corpo animalrdquo

Divide ele entatildeo as operaccedilotildees da alma em ldquoanimaisrdquo a saber as que

ldquoprocedem da alma segundo o que lhes eacute proacutepriordquo e ldquonaturaisrdquo que satildeo as que

ldquoprocedem da alma na medida em que ela produz o efeito das formas naturais

inferioresrdquo Assim em geral uma parte de cada animal eacute motora e outra parte eacute

movida e ldquoo corpo natural organizado estaacute para a alma como a mateacuteria estaacute para a

formardquo o que se daacute ldquoa partir da proacutepria almardquo320

Nos corpos naturais assim o que determina a quantidade o que confere os

limites de crescimento como o de tamanho e o de largura de cada indiviacuteduo de

corpo inteiro eacute perfectiacutevel pela almardquo e assim ldquopermanece nele a almardquo (TOMAacuteS DE AQUINO 2012 Q X p 225 e nota 247 p 451-452 cf Aristoacuteteles 2010 I 5 p 58) pois a mesma alma eacute uma em ato mas muacuteltipla em potecircncia (cf TOMAacuteS DE AQUINO 2000 II l 4 264) Isto se manteacutem em consonacircncia com o que se sabe hoje por exemplo a respeito da importacircncia da presenccedila do cutelo para o sustento da vida na parte seccionada de aneliacutedeos No caso das plantas diz Aristoacuteteles que algumas sobrevivem apoacutes a secccedilatildeo em razatildeo de a alma em cada indiviacuteduo ser uma em ato mas vaacuterias em potecircncia (cf ARISTOacuteTELES 2010 II 2 p 65-66)

315 TOMAacuteS DE AQUINO 2000 II l 4 262

316 Id 2009 p 51

317 Id 2000 I l 14 208 Id 1949 Q 4 R p 72-73

318 Se estiverem presentes as devidas disposiccedilotildees na mateacuteria

319 O intelecto apreende os universais e soacute pode assim mover mediante o particular que eacute

referente agrave natureza do sentido (cf TOMAacuteS DE AQUINO 2012 Q IX p 201) 320

TOMAacuteS DE AQUINO 2012 Q IX p 203

79

determinada espeacutecie para menos e para mais eacute menos a mateacuteria do que a forma

visto que a proporccedilatildeo e o fim de uma accedilatildeo no caso o crescimento satildeo impostos

pelo princiacutepio da operaccedilatildeo relacionada321

E no que concerne agraves operaccedilotildees o modo de agir na alma eacute fruto da accedilatildeo de

um ente vivo ou seja que move a si mesmo e por essa razatildeo a accedilatildeo da alma

supera a da natureza o que natildeo se daacute poreacutem necessariamente em relaccedilatildeo ao que

eacute agido Nos corpos animados e nos inanimados haacute o ser natural e o que para este eacute

requerido mas os inanimados necessitam para isto de um agente extriacutenseco

enquanto os animados requerem um agente intriacutenseco o que eacute exemplificado pelas

operaccedilotildees agraves quais estatildeo ordenadas as potecircncias supramencionadas da alma

vegetativa e incluam-se aqui tantos movimentos involuntaacuterios322 que satildeo pois

virtudes naturais

Seguindo uma ordem a primeira potecircncia da alma vegetativa eacute a virtude

nutritiva que se ordena agrave conservaccedilatildeo do ser e da espeacutecie pela transformaccedilatildeo e

pelo acreacutescimo de algo o alimento na substacircncia do crescimento e da geraccedilatildeo E eacute

a virtude aumentativa o crescimento a segunda na ordem pois dela o ente passa

em quantidade e virtude para uma perfeiccedilatildeo maior de quantidade devida de onde

entatildeo pode expressar a terceira potecircncia a gerativa que se ordena a que o

indiviacuteduo seja posto no serrdquo E se os entes inanimados recebem aleacutem da espeacutecie

sua quantidade devida sendo engendrados extrinsecamente os entes animados

satildeo comumente gerados de uma semente Assim a potecircncia gerativa manifesta-se

mediante a aumentativa e tanto a potecircncia gerativa quanto a aumentativa soacute se datildeo

em razatildeo da virtude nutritiva323

Prossegue Santo Tomaacutes

Existem ademais outras operaccedilotildees mais elevadas da alma que transcendem as operaccedilotildees dos corpos naturais tambeacutem quanto ao agido na medida em que eacute inato agrave alma que nela se encontre segundo o ser imaterial tudo o que existe pois a alma eacute em certa medida todas as coisas na medida em que eacute sensitiva e intelectiva Logo eacute necessaacuterio que existam diversos graus deste mencionado ser imaterial E um destes graus eacute aquele segundo o qual as coisas se encontram na alma sem sua mateacuteria proacutepria mas segundo sua singularidade e as condiccedilotildees individuais derivadas da mateacuteria E este eacute o niacutevel do sentido que eacute receptivo das espeacutecies individuais sem mateacuteria mas receptivo em um

321

TOMAacuteS DE AQUINO 2000 II l 8 332 322

Como os processos da digestatildeo e da respiraccedilatildeo os batimentos cardiacuteacos etc 323

TOMAacuteS DE AQUINO 2012 Q XIII p 271 e 283 Id 2000 II l 7 312 Ibid II l 9 340 344 e 347

80

oacutergatildeo corporal O outro grau de imaterialidade mais alto e mais perfeito eacute o do intelecto que recebe espeacutecies completamente abstraiacutedas da mateacuteria e das condiccedilotildees materiais e sem um oacutergatildeo corporal E assim como por sua forma natural a coisa possui uma inclinaccedilatildeo para algo e se move ou age para conseguir aquilo para o qual se inclina assim tambeacutem se deve a uma forma sensiacutevel ou inteligiacutevel a inclinaccedilatildeo para a coisa apreendida pelo sentido ou pelo intelecto inclinaccedilatildeo essa que pertence agrave potecircncia apetitiva Ademais eacute necessaacuterio que consequentemente exista um movimento pelo qual se alcance a coisa desejada e este pertence agrave potecircncia motriz

324

A potecircncia apetitiva segue-se agrave apreensatildeo realizada pelos sentidos e divide-

se em trecircs a potecircncia desiderativa ou vontade cuja operaccedilatildeo eacute o desejar que eacute o

apetite de natureza intelectual racional a potecircncia concupisciacutevel cuja operaccedilatildeo eacute o

desejar relacionado ao que eacute apeteciacutevel ou deleitaacutevel e conveniente aos sentidos e

a potecircncia irasciacutevel ou coacutelera relacionada a algo do que adveacutem o poder de

desfrutar agrave vontade o que eacute deleitaacutevel ao sentido como ocorre na conquista apoacutes

uma luta por algo325 Estas duas uacuteltimas pertencem agrave parte sensiacutevel e irracional e

assim o apetite irasciacutevel eacute como se fosse um defensor do concupisciacutevel As afecccedilotildees

daquele tem iniacutecio e fim nas afecccedilotildees deste326 e os atos de ambos satildeo realizados

com passividade327

Enquanto que ao apetite concupisciacutevel pertence o amor do bem ao apetite

irasciacutevel pertencem o oacutedio e o medo do mal e a esperanccedila do bem328

A virtude motriz por sua vez varia conforme a diversidade dos movimentos

ou as diferentes partes de um animal que possuem movimentos proacuteprios e

enquadra-se no princiacutepio de que ldquotudo o que se move eacute movido por outro se

dizemos que algo se move por si proacuteprio isto natildeo ocorre segundo ele mesmo mas

segundo suas diversas partes de modo que uma parte dele eacute motora e a outra

movidardquo329

Nas operaccedilotildees da alma explica o Aquinate330 o movimento encontra-se de

trecircs modos a saber ldquopropriamenterdquo que eacute o que se daacute no movimento de

crescimento como operaccedilatildeo da alma vegetativa e com o apetite sensiacutevel

relacionado ao movimento local e agrave alteraccedilatildeo como a dos humores ldquomenos

propriamenterdquo exemplificado na captaccedilatildeo dos sensiacuteveis como se daacute com a visatildeo

324

TOMAacuteS DE AQUINO 2012 Q XIII p 271 e 273 325

Ibid Q XIII p 277 326

Id 2000 I l 14 202 Ibid II l 5 288 Ibid III l 14 802 327

Id 1990b L II c LX p 274 328

Id 2000 III l 14 806 329

Id 2006 p 19 330

Id 2000 I l 10 157-160

81

em que um corpo eacute objeto da virtude visual mas dele soacute eacute captada a natureza dita

espiritual ou seja a luz que informa a cor e ldquomuito pouco propriamenterdquo como o eacute o

movimento na inteligecircncia que se daacute somente metaforicamente ou seja a operaccedilatildeo

ali eacute ato de um ente perfeito enquanto o movimento eacute sempre caracterizado por ser

ato de um ente imperfeito

A alma ou forma substancial racional ou intelectiva por fim faz com que por

meio dela sejamos simultaneamente homens animais viventes corpos substacircncias

e entes331 Eacute primeiramente segundo a razatildeo de forma universal e entatildeo segundo a

razatildeo de forma especial que a mateacuteria se perfecciona de modo que o intelecto

primeiro identifica o ente depois ser vivo em seguida o ser animal e entatildeo o ser

homem identificando tambeacutem seus acidentes proacuteprios que neste sentido se diz

que acompanham o gecircnero e a espeacutecie ao qual pertencem332

A potecircncia intelectiva que seraacute exposta apoacutes a explanaccedilatildeo sobre os sentidos

possui relaccedilotildees com a sensitiva e com a vegetativa que podem ser analisada sob

duas perspectivas o que Tomaacutes de Aquino explica com uma analogia

[] o intelecto difere das outras partes da alma pelo sujeito [] A faculdade vegetativa e a sensitiva estatildeo na faculdade intelectiva como o triacircngulo e o quadrilaacutetero no pentaacutegono Aleacutem do mais o quadrilaacutetero eacute uma figura absolutamente distinta do triacircngulo pela espeacutecie mas natildeo do triacircngulo que conteacutem em potecircncia como o nuacutemero quaternaacuterio tambeacutem natildeo se distingue do ternaacuterio que faz parte dele mas do ternaacuterio que existe separado E se acontecesse que diversas figuras fossem produzidas por diversos agentes o triacircngulo que existe separadamente do quadrilaacutetero teria uma causa produtora diferente da do quadrilaacutetero como tem tambeacutem uma outra espeacutecie mas o triacircngulo que estivesse contido no quadrilaacutetero teria a mesma causa produtora Assim tambeacutem por conseguinte a faculdade vegetativa que tem uma existecircncia agrave parte da sensitiva eacute uma outra espeacutecie de alma e tem uma outra causa produtora contudo eacute a mesma causa que produz a faculdade sensitiva e a faculdade vegetativa que estaacute contida na sensitiva

333

55 OS SENTIDOS

As potecircncias sensitivas tecircm pois como princiacutepio a alma de onde provecircm e

existem no composto tendo-o por sujeito Assim o que sente vecirc e ouve ou seja

aquilo pelo qual eacute manifesta a accedilatildeo dos sentidos eacute o composto em virtude da

331

TOMAacuteS DE AQUINO 1949 Q 3 R p 52 332

Ibid Q 3 R17 p 63-64 333

Id 2009 p 87-89

82

alma334 de modo que tanto as operaccedilotildees da alma sensitiva como as da vegetativa

satildeo movimentos natildeo da alma mas do composto335

E para o termo ldquosentidordquo Tomaacutes de Aquino atribui duas acepccedilotildees a saber

natildeo soacute a potecircncia sensitiva propriedade natural consequente agrave espeacutecie como

tambeacutem a proacutepria alma sensitiva336 A faculdade perceptiva existe somente em

potecircncia ou seja a alma sensiacutevel natildeo eacute os sensiacuteveis em ato337 mas em potecircncia

razatildeo pela qual o ato da percepccedilatildeo natildeo eacute contiacutenuo nos sentidos338

E partindo do princiacutepio de que diz o Aquinate ldquotudo o que eacute recebido

determina-se no recipiente segundo o modo do proacuteprio recipienterdquo339 tanto a

percepccedilatildeo da realidade sensiacutevel presente como a da ausente satildeo fundamentais

para que esses entes dotados com potecircncia sensitiva possam-se mover em busca

dos recursos externos que lhes satildeo vitais340 Assim eles natildeo soacute recebem como

tambeacutem conservam as espeacutecies dos objetos sensiacuteveis que alteram seus sentidos A

partir dessa conservaccedilatildeo eacute possiacutevel perceber as intenccedilotildees como a ameaccedila de um

predador a serventia de um objeto para determinado fim etc

Muszalski explica em relaccedilatildeo ao termo ldquointenccedilatildeordquo que

Apesar de que para Santo Tomaacutes pode-se usar o termo intentio em diversos sentidos fica claro que implica fundamentalmente uma relaccedilatildeo de uma coisa com outra utilizando-se sobretudo no acircmbito da apetecircncia Com efeito designa propriamente a tendecircncia a um fim e a faculdade que eacute diretiva para um fim eacute principalmente a vontade No entanto como as potecircncias cognoscitivas do vivente tendem ao conhecimento de uma coisa como se fosse seu fim pode-se aplicar o termo intentio analogamente agrave ordem do cognoscitivo de modo que natildeo soacute a vontade como tambeacutem a inteligecircncia e os sentidos possuem uma intencionalidade Mas com isto simplesmente se estaacute caracterizando o ato proacuteprio da faculdade de conhecimento

341

334

TOMAacuteS DE AQUINO 2012 Q XIX p 387-389 335

Id 2000 I l 10 161 336

Id 2012 Q XX p 389-391 337

No sentido de que o que eacute afetado adquire certa semelhanccedila em relaccedilatildeo ao agente da afecccedilatildeo Id 2000 II l 10 357 365 366

338 ARISTOacuteTELES 2010 II 5 p 75 TOMAacuteS DE AQUINO 2000 II l 10 354

339 TOMAacuteS DE AQUINO 2012 Q XX p 411

340 Que eacute acidental no homem e nos animais e natildeo substancial atributo este da alma

sensiacutevel (cf TOMAacuteS DE AQUINO 2012 Q XI p 243) 341

ldquoApesar de que para Santo Tomaacutes el teacutermino lsquointentiorsquo puede usarse en diversos sentidos resulta claro que implica fundamentalmente una relacioacuten de una cosa con otra utilizaacutendose sobre todo en el aacutembito de la apeticioacuten En efecto designa propiamente la tendencia a un fin y la facultad que es directiva hacia un fin es principalmente la voluntad Sin embargo como las potencias cognoscitivas del viviente tienden al conocimiento de una cosa como si fuera su fin el teacutermino intentio se puede aplicar anaacutelogamente al orden de lo cognoscitivo de modo que no soacutelo la voluntad sino tambieacuten la inteligencia y los sentidos poseen una intencionalidad Pero con esto simplemente se estaacute caracterizando el acto propio de la facultad de conocimientordquo MUSZALSKI 2014 p 87-88

83

E esta tem iniacutecio com a apreensatildeo dos sensiacuteveis O aristotelismo-tomismo

descreve os princiacutepios daqueles sentidos que realizam essa apreensatildeo e tambeacutem

de outros sentidos que por assim dizer processaratildeo o objeto captado por essa

apreensatildeo A estes chama ldquosentidos internosrdquo e agravequeles ldquosentidos externosrdquo

551 Sentidos externos

Diz Tomaacutes de Aquino que ldquoa alma eacute princiacutepio da sensaccedilatildeo natildeo como aquele

que sente mas como aquilo pelo qual o sentinte senterdquo342

A estimativa e a cogitativa das quais se trataraacute adiante mais a intelecccedilatildeo

tecircm como se disse iniacutecio com o exerciacutecio da funccedilatildeo dos sentidos externos Estes

se caracterizam por sua materialidade Exercem a captaccedilatildeo de formas sensiacuteveis

que satildeo invariavelmente acidentes jamais essecircncias ou seja sem a mateacuteria do

objeto que as imprime por meio de sua mateacuteria de receptores neurais nas

superfiacutecies deacutermicas em conformidade com a disposiccedilatildeo do respectivo oacutergatildeo

responsaacutevel No acircmbito aristoteacutelico-tomista isto se daacute natildeo como accedilatildeo de um

contraacuterio sobre seu correspondente resultando em transformaccedilatildeo ou alteraccedilatildeo mas

reduzindo o sentido da potecircncia ao ato por sua espeacutecie tratando-se de uma

operaccedilatildeo tal como se daacute com o conceber e o querer343 Por exemplo os olhos

captaratildeo a luz que estaraacute a refletir as cores e o formato (sensiacuteveis) de determinado

ente corpoacutereo mas natildeo a essecircncia deste mesmo ente em razatildeo da imaterialidade

de sua forma substancial344 Assim a forma do agente causa uma disposiccedilatildeo por

um lado similar a ele no sentido e por outro natildeo pelo fato de essa disposiccedilatildeo natildeo

ser material como o agente pois no sensiacutevel seu ser eacute natural e no sentido eacute

intencional ou espiritual345

Para Tomaacutes de Aquino o sentido ldquoeacute certa potecircncia passiva submetida por

natureza agrave alteraccedilatildeo proveniente dos objetos sensiacuteveis exterioresrdquo346 pelo que

como se disse entende ldquofaculdade sensitivardquo como aquilo que se sente natildeo em ato

mas em potecircncia347 Essa alteraccedilatildeo tem como requisitos tanto a ausecircncia no oacutergatildeo

342

TOMAacuteS DE AQUINO 2012 Q XIX p 393 343

Id 2000 III l 12 765-766 344

ARISTOacuteTELES 2010 II 12 p 96 TOMAacuteS DE AQUINO 2000 II l 24 551 345

TOMAacuteS DE AQUINO 2000 II l 24 552-553 346

ldquoEl sentido es una cierta potencia pasiva sometida por naturaleza a la alteracioacuten proveniente de los objetos sensibles exterioresrdquo Id 2001 Q 78 a 3 p 716

347 Id 2009 p 63

84

do sentido (salvo no que diz respeito ao tato que percebe os contraacuterios em seu

proacuteprio oacutergatildeo) dos contraacuterios que a ele compete perceber como o fato de o oacutergatildeo

estar em potecircncia para esses contraacuterios348 (e novamente com relaccedilatildeo ao tato eacute

preciso que para isto esteja reduzido a um ponto meacutedio o que faz com que tenha

no homem maior precisatildeo que nos outros animais em razatildeo de sua disposiccedilatildeo para

a alma racional349)350 e ela pode ocorrer de dois modos um fiacutesico e outro espiritual

Sentir portanto eacute uma alteraccedilatildeo que se daacute por afetaccedilatildeo e por moccedilatildeo351

Ademais afirma o Aquinate que ldquoA alteraccedilatildeo fiacutesica daacute-se quando a forma do

que eacute causa da alteraccedilatildeo eacute recebida no objeto alterado segundo seu proacuteprio ser

natural Por exemplo o calor no aquecidordquo E quanto agrave alteraccedilatildeo espiritual ldquodaacute-se

quando a forma do que provoca a alteraccedilatildeo eacute recebida no objeto alterado segundo

seu ser espiritual Por exemplo a forma da cor na pupila a qual natildeo por isso

permanece coloridardquo

O oacutergatildeo recebe pois a espeacutecie natildeo segundo o ser que tem no sensiacutevel e

natildeo em forma fiacutesica mas em forma intencional352 Eis porque a visatildeo eacute o uacutenico

sentido em que ocorre exclusivamente este segundo modo

Nos demais sentidos ocorrem ambos e a alteraccedilatildeo fiacutesica daacute-se por parte do

oacutergatildeo e por parte do objeto Na audiccedilatildeo ocorre por mudanccedila local jaacute que o som eacute

causado por uma percussatildeo e conseguinte vibraccedilatildeo do ar eacute sempre a atividade ldquode

alguma coisa contra alguma coisa e em alguma coisardquo353 Quanto ao olfato eacute

necessaacuteria certa alteraccedilatildeo no corpo para que ocorra a accedilatildeo de cheirar mas em

ambos os oacutergatildeos responsaacuteveis especificamente natildeo apresentam alteraccedilotildees fiacutesicas

salvo acidentalmente

Tomaacutes de Aquino estabelece aqui certa gradaccedilatildeo nos sentidos partindo do

pressuposto de que a visatildeo que eacute exclusivamente ldquoespiritualrdquo estaacute relacionada aos

corpos celestes por sua emissatildeo ou reflexatildeo de luz e que a audiccedilatildeo vem em

seguida sendo esses dois sentidos utilizados para o ensino O odor eacute captado da

substacircncia odorante os objetos da visatildeo e da audiccedilatildeo satildeo captados natildeo

348

ldquoContraacuteriosrdquo em relaccedilatildeo a atributos dos sensiacuteveis como o quente e o frio o aacutespero e o liso etc

349 ARISTOacuteTELES 2010 II 9 p 88

350 TOMAacuteS DE AQUINO 2012 Q VIII p 171

351 Id 2000 II l 10 350

352 Ibid II l 14 418

353 ARISTOacuteTELES 2010 II 8 p 83 TOMAacuteS DE AQUINO 2000 II l 16 441-442

85

diretamente mas por um intermediaacuterio (o ar e a aacutegua) e o paladar existe

intimamente com o tato relacionado aos elementos354

O tato e o paladar ocorrem nos respectivos oacutergatildeos mediante alteraccedilotildees

fiacutesicas locais sendo por isso ambos considerados os sentidos mais materiais355 O

primeiro eacute o mais universal e eis porque diz o Estagirita que eacute primeiramente por

sua causa que um ente eacute identificado como ldquoanimalrdquo356 Pelo fato de nele consistir

principialmente a natureza sensitiva em sua integralidade se for imobilizado

imobilizam-se todos os demais sentidos Os sentidos natildeo cessam somente ldquopelo

excesso dos seus sensiacuteveis proacutepriosrdquo diz o Aquinate mas tambeacutem ldquopelo excesso

dos sensiacuteveis proacuteprios do tatordquo357ndash porque sem ele natildeo pode haver nenhuma outra

sensaccedilatildeo ainda que possa-se dar sem nenhuma outra358 ndash jaacute que a intensidade

elevada da operaccedilatildeo de uma potecircncia tende a impedir a operaccedilatildeo de outra de

algum modo associada359

Assim o sentido pode sofrer corrupccedilatildeo por parte de um sensiacutevel muito

intenso pois o sentido eacute certa proporccedilatildeo que por outro lado obtecircm uma siacutentese

harmoniosa e agradaacutevel quando o sensiacutevel natildeo estaacute mais proacuteximo dos excessos e

ainda mais se se mistura como se observa na muacutesica360 Essa corrupccedilatildeo gera

afliccedilatildeo e pena como a dor em relaccedilatildeo ao tato podendo chegar ao ponto de destruir

a funcionalidade do oacutergatildeo do sentido E sendo o tato o sentido comum a todos os

animais e a base para os demais sentidos eacute o uacutenico em cujo excesso de um

tangiacutevel pode destruir o proacuteprio o animal361

Haveraacute por outro lado deleite como no abrandamento da dor por convir ao

sentido362 e em outras ocasiotildees como aquilo que pode ser proporcionado pelo

toque Da apreensatildeo dos sentidos principalmente o tato seguem o prazer e a dor

e entatildeo a felicidade e a tristeza apoacutes a apreensatildeo interior relacionados agrave

concupiscecircncia Eis o que relaciona o tato ao apetite e que caracteriza os entes

atualizados pela alma com potecircncia sensitiva363

354

TOMAacuteS DE AQUINO 2000 II l 14 417-418 355

ARISTOacuteTELES 2010 II 11 p 94 TOMAacuteS DE AQUINO 2001 Q 78 a 3 p 716 356

ARISTOacuteTELES 2010 II 2 p 65 TOMAacuteS DE AQUINO 2012 Q VIII p 171 357

TOMAacuteS DE AQUINO 2012 Q VIII p 171 358

ARISTOacuteTELES 2010 II 3 p 69 359

TOMAacuteS DE AQUINO 2012 Q XI p 239 360

ARISTOacuteTELES 2010 III 2 p 107 TOMAacuteS DE AQUINO 2000 III l 2 597 Ibidem 2000 III l 17 870

361 ARISTOacuteTELES 2010 III13 p 134

362 TOMAacuteS DE AQUINO 2012 Q XXI p 429-431

363 Id 2000 II l 5 289

86

Os sentidos externos captam seus sensiacuteveis proacuteprios (cor som etc) aos

quais cada sentido relacionado responderaacute conforme sua natureza e os sensiacuteveis

comuns que satildeo ldquoalgo intermediaacuterio entre as realidades sensiacuteveis percebidas

acidentalmente e os sensiacuteveis proacutepriosrdquo comum a todos os sentidos e se reduzem

agrave quantidade cujas espeacutecies satildeo a dimensatildeo e o nuacutemero (quantidade)364 Cada

oacutergatildeo sensorial diz o Estagirita ldquodiscrimina as diferenccedilas do sensiacutevel

correspondenterdquo e exemplifica com a discriminaccedilatildeo do branco e do preto pela visatildeo

e do doce e do amargo pelo paladar365

Com relaccedilatildeo aos sensiacuteveis comuns Aristoacuteteles aponta o movimento o

repouso o nuacutemero a unidade a figura e a grandeza366 sendo que os dois uacuteltimos

podem ser percebidos somente pelo tato e pela visatildeo367 A quantidade por sua vez

eacute ldquoo sujeito proacuteximo da qualidade modificante tal como a superfiacutecie em relaccedilatildeo agrave

corrdquo Por isso ldquoos sensiacuteveis comuns natildeo movem os sentidos de forma direta e

natural senatildeo em razatildeo da qualidade sensiacutevelrdquo mas satildeo ldquorealidades sensiacuteveisrdquo

percebidas diretamente ldquojaacute que estabelecem diversidade na alteraccedilatildeo do

sentidordquo368 Ou seja a percepccedilatildeo dos sensiacuteveis comuns pelos sentidos daacute-se com a

percepccedilatildeo dos sensiacuteveis proacuteprios369 mas aqueles satildeo percebidos porque causam

diferenccedila no sentido em razatildeo do movimento a partir do qual se percebe a

grandeza que permite perceber a figura e tambeacutem a quantidade pode ser percebida

quer pelo movimento pela negaccedilatildeo do contiacutenuo quer pelos sensiacuteveis proacuteprios pois

diz o Estagirita ldquocada sensaccedilatildeo percepciona uma uacutenica coisardquo370

Haacute ainda o sensiacutevel por acidente que eacute aquele que natildeo faz diferenccedila no que

toca agrave sua espeacutecie na imutaccedilatildeo do sentido e isto se daacute com um sensiacutevel proacuteprio de

determinado sentido captado por outro371 como quando se percebe o doce com a

visatildeo372

364

TOMAacuteS DE AQUINO 2012 Q VIII p 171 365

ARISTOacuteTELES 2010 III 2 p 107 366

Ibid II 6 p 79 Ibid III p 102 367

TOMAacuteS DE AQUINO 2000 II l 13 386 368

Id 2012 Q VIII p 171 369

Id 2000 II l 13 388 ARISTOacuteTELES 2010 III 1 p 103 370

ARISTOacuteTELES 2010 III 1 p 103 371

TOMAacuteS DE AQUINO 2000 II l 13 393-394 Ibid III l 1 577 ARISTOacuteTELES 2010 III 1 p 103

372 TOMAacuteS DE AQUINO 2000 III l 1 579-580

87

552 Sentidos internos

Diz Tomaacutes de Aquino

[] eacute necessaacuterio que o animal busque certas coisas e fuja de outras natildeo soacute por que lhe sejam convenientes ou prejudiciais ao sentido mas tambeacutem por certas outras conveniecircncias e utilidades ou prejuiacutezos Por exemplo a ovelha vendo o lobo aproximar-se foge natildeo porque a figura ou a cor do lobo lhe seja repulsiva mas porque o que estaacute vindo eacute um inimigo da sua proacutepria natureza O paacutessaro recolhe a palha natildeo para sentir prazer mas porque eacute uacutetil para a contruccedilatildeo de seu ninho Para fazer isso eacute necessaacuterio que o animal possa perceber essas intenccedilotildees que natildeo percebem os sentidos exteriores Ademais eacute preciso que nele exista um princiacutepio proacuteprio para tal percepccedilatildeo jaacute que a percepccedilatildeo do sensiacutevel proveacutem da alteraccedilatildeo do sentido coisa que natildeo ocorre com a percepccedilatildeo das intenccedilotildees

373

Os sensiacuteveis proacuteprios e os comuns satildeo captados pelos sentidos de duas

maneiras por duas potecircncias374 Primariamente pelos sentidos externos

correspondentes de modo exclusivo aos quais cabe julgar os objetos que lhes satildeo

proacuteprios como por exemplo em relaccedilatildeo agrave visatildeo discriminar fazer a distinccedilatildeo entre

as cores ou os objetos compartilhados e acidentais da mesma forma distinguindo

por exemplo o largo e o estreito como se viu

Em segundo lugar a discriminaccedilatildeo entre o doce e o branco natildeo pode ser feita

por um sentido proacuteprio por oacutergatildeos sensoriais distintos e em tempos diferentes375 e

entatildeo esta tarefa eacute desempenhada pelo primeiro dos sentidos internos ndash ou

potecircncias sensitivas interiores ndash aquele que eacute considerado ldquoraiz e princiacutepiordquo e que

tambeacutem eacute fim como um centro dos sentidos externos e das imutaccedilotildees destes376 ndash

dentre os quais o tato como base de todos os sentidos estaacute mais proacuteximo377 ndash ou

seja onde os resultados de todas elas seratildeo percebidos o sentido comum que

apresentaraacute juiacutezo de discernimento discriminaraacute os sensiacuteveis e faraacute a distinccedilatildeo

373

ldquo[] es necesario que el animal busque unas cosas y huya de otras no soacutelo porque le sean convenientes o perjudiciales al sentido sino tambieacuten por otras conveniencias utilidades o perjuicios Ejemplo La oveja al ver venir el lobo huye no porque la figura o el color del lobo sea repulsiva sino porque el que viene es un enemigo de su propia naturaleza El paacutejaro recoge pajas no para tener un placer sino porque son uacutetiles para la construccioacuten de su nido Para hacer eso es necesario que el animal pueda percibir esas intenciones que no percibe el sentido exterior Ademaacutes es preciso que en eacutel exista un principio propio para dicha percepcioacuten ya que la percepcioacuten de lo sensible proviene de la alteracioacuten del sentido cosa que no ocurre con la percepcioacuten de las intencionesrdquo TOMAacuteS DE AQUINO 2001 Q 78 a 4 p 719

374 O termo ldquopotecircnciardquo aqui tem o sentido de ldquoprinciacutepio motorrdquo

375 ARISTOacuteTELES 2010 III 2 p 107-108

376 TOMAacuteS DE AQUINO 2000 III l 3 609 Ibid l 12 773-774 Id 2001 Q 78 a 4 p 720

377 Ibid 2000 III l 3 602

88

entre eles percebendo as intenccedilotildees dos sentidos (como quando algueacutem vecirc que

vecirc)378

O sentido comum tambeacutem faz o juiacutezo e o discernimento finais dos contraacuterios

captados pelos sentidos proacuteprios379 Os sensiacuteveis seratildeo nele unificados em uma

imagem que seraacute retida e conservada e no caso do homem processada por outro

sentido interno a imaginaccedilatildeo ou fantasia que eacute um movimento produzido pela

atualizaccedilatildeo dos sentidos quando estes vecircm a ato pelo movimento dos sensiacuteveis e

que por isso eacute semelhante aos sentidos e aos sensiacuteveis jaacute que diz Tomaacutes de

Aquino380 o efeito produzido pelo agente que eacute a causa eficiente eacute semelhante a

este mesmo

A imaginaccedilatildeo propiciaraacute aos animais a apreensatildeo das coisas sensiacuteveis

tambeacutem quando elas natildeo estiverem fisicamente presentes o que se daacute pela

formaccedilatildeo na mente da ldquoimagemrdquo (ou ldquofantasmardquo) Aristoacuteteles distingue a imaginaccedilatildeo

que natildeo existe sem a percepccedilatildeo sensorial da suposiccedilatildeo que natildeo existe sem aquela

e cujos tipos que satildeo o do entender ele aponta ldquoa ciecircncia a opiniatildeo a sensatez

(que caracterizam o entender corretamente) e os contraacuterios destas (que

caracterizam o entender incorretamente)rdquo e do pensamento A imaginaccedilatildeo depende

da vontade ao passo que a formaccedilatildeo de opiniatildeo natildeo depende exclusivamente da

vontade podendo ser verdadeira ou falsa assim como a imaginaccedilatildeo sendo que

nesta pode-se produzir falsidade com muito mais frequecircncia e isto se daacute no caso da

imaginaccedilatildeo porque o efeito eacute mais fraco do que a causa e quanto mais ele se

distancia do agente que eacute causa eficiente (como quando a imaginaccedilatildeo ocorre na

ausecircncia dos sentidos) menos ele lhe eacute semelhante381 E porque a imaginaccedilatildeo eacute um

movimento da atualizaccedilatildeo dos sentidos o que entra na imaginaccedilatildeo eacute aquilo que

pode ser sentido mas jamais aquilo que eacute apenas inteligiacutevel382

A imagem eacute requisito necessaacuterio para o entendimento A alma pode perseguir

algo se apoacutes imaginaacute-lo afirma que eacute bom ou nega que seja mau e pode fugir de

algo se apoacutes imaginaacute-lo afirma que eacute mau ou nega que seja bom O ser do desejo

em ato e o ser da fuga em ato satildeo distintos satildeo atos diferentes mas seu princiacutepio

ou seja a faculdade do desejo a da fuga e a perceptiva natildeo satildeo diferentes entre si

378

TOMAacuteS DE AQUINO 2000 II l 13 390 Id 2001 C 78 a 4 p 720 379

Ibid III l 3 613 380

Ibid III l 6 656 e 659 Id 2001 Q 78 a 4 p 719 ARISTOacuteTELES 2010 III 3 p 113 381

ARISTOacuteTELES 2010 III 3 p 110-111 TOMAacuteS DE AQUINO 2000 III l5 638 Ibid l 6 664-665

382 TOMAacuteS DE AQUINO 2000 III l 6 657

89

em seu sujeito senatildeo somente na definiccedilatildeo A distinccedilatildeo e a apreensatildeo dos sentidos

pode gerar por aquelas accedilotildees que propiciam o bem dos sentidos o agradaacutevel que

conveacutem que causa prazer ou o mal que causa repulsa tristeza que natildeo conveacutem

estimulando a fuga respectivamente quando o sentido comum se relaciona como

uma espeacutecie de meio com os sentidos proacuteprios Eis o que move o apetite o desejo

dos quais partem certas accedilotildees383 Santo Tomaacutes divide entatildeo em trecircs graus o

percurso que faz o movimento sensiacutevel ldquoem primeiro lugar os sentidos apreendem

o sensiacutevel como conveniente ou nocivo em segundo lugar segue-se disto o prazer

ou a tristeza e em terceiro lugar por fim segue-se o desejo ou a fugardquo384

Mas a respeito disto o Aquinate aponta pelo modo como expressa

Aristoacuteteles para duas diferenccedilas entre o intelecto e os sentidos A primeira eacute que no

que toca ao intelecto que conhece e pode ser movido por um bem universal ou por

um mal universal da apreensatildeo do bem ou do mal o desejo ou a fuga pode seguir-

se imediatamente enquanto que os sentidos requerem necessariamente o terceiro

elemento ou seja o prazer ou a tristeza porque satildeo movidos por um bem

determinado ou por um mal determinado A segunda eacute que explica diz o Estagirita

simplesmente que o intelecto afirma ou nega enquanto os sentidos o fazem sempre

ldquode alguma maneirardquo385

Assim como as espeacutecies satildeo captadas pelo sentido proacuteprio e pelo sentido

comum e em seguida retidas pela imaginaccedilatildeo ou fantasia as intenccedilotildees que natildeo

satildeo apreendidas pelos sentidos tal como ldquoo nocivo e o uacutetilrdquo386 satildeo captadas pela

estimativa (ou no caso do homem cogitativa) e retidas pela memoacuteria os outros dois

sentidos internos

Explica Muszalski que

[] quando Santo Tomaacutes diz que a estimativa-cogitativa eacute apreensiva das intenccedilotildees particulares natildeo quer dizer tanto que tende a elas como a seu fim mas que a intenccedilatildeo particular equivale a uma forma presente na coisa e que esta faculdade pode apreender essa forma em concreto []

383

ARISTOacuteTELES 2010 III 7 p 120 TOMAacuteS DE AQUINO 2000 III l 12 768 384

ldquo[] en premier le sens saisit le sensible comme convenant ou nocif en second il srsquoensuit de cela plaisir ou tristesse en troisiegraveme par ailleurs il srsquoensuit deacutesir ou fuiterdquo TOMAacuteS DE AQUINO 2000 III l 12 p 768

385 ldquo[] de quelque manieacutererdquo ou seja do modo pelo qual os sentidos apreendem

particularmente determinado objeto Ibid III l 12 771-772 386

Id 2012 Q XIII p 273

90

E quanto agraves intenccedilotildees prossegue ldquotratam-se de aspectos de benefiacutecio e

prejuiacutezo que satildeo sensiacuteveis per accidens com relaccedilatildeo aos sentidos externos []rdquo387

Muszalski aponta ainda que enquanto as formas sensiacuteveis captadas pelos

sentidos externos satildeo beneacuteficas ou nocivas para o respectivo sentido sendo

determinantes para a subsistecircncia do indiviacuteduo as intenccedilotildees satildeo formas que tecircm

como conteuacutedo um valor natildeo para o proacuteprio sentido da estimativa-cogitativa mas

para o indiviacuteduo e inclusive para a espeacutecie sendo por isto determinante para ambos

Eacute nesse processo que eacute acidental de captaccedilatildeo e retenccedilatildeo das intenccedilotildees

das espeacutecies intencionais de conveniecircncia e prejuiacutezo ndash e que confere a noccedilatildeo de

determinado fim e o conhecimento da proporcionalidade entre este e certa atividade

desempenhada para alcanccedilaacute-lo ndash que residem duas diferenccedilas fundamentais entre

o homem e os demais animais no tocante aos sentidos internos Diz Santo Tomaacutes

que ldquoos animais percebem-nas somente por um instinto natural enquanto que o

homem as percebe por uma comparaccedilatildeordquo388 ou juicio collativo (juiacutezo discursivo)

ldquoinvestigando e discorrendordquo389

Assim por reunir ndash e comparar compor e dividir em um discurso ndash as

intenccedilotildees particulares individuais que os demais sentidos natildeo captam e sendo por

isto denominada pelos escolaacutesticos intentiones insensatae a faculdade estimativa eacute

no homem chamada cogitativa ou ldquorazatildeo particularrdquo ou ainda ldquoentendimento

passivordquo ou ldquointelecto passivordquo390 pelo que no homem o ser natural se move ao

apetite sensitivo391 A palavra cogitativa segundo Muszalski392 vem do verbo latino

cogitare que significa ldquopensamentordquo ldquoideiardquo ldquorepresentaccedilatildeordquo como junccedilatildeo entre a

preposiccedilatildeo cum (ldquocomrdquo) e o verbo agitare (ldquoagitarrdquo mover algo forte ou

repetidamente) e este complementa vem de agere (ldquolevarrdquo ldquoconduzirrdquo ldquoguiarrdquo)

concluindo que cogitare eacute um verbo que implica movimento e que pode-se traduzir

387

ldquo[] cuando Santo Tomaacutes dice que la estimativa-cogitativa es apreensiva de las intenciones particulares no quiere decir tanto que tende a ellas como a su fin sino que la intencioacuten particular equivale a una forma presente en la cosa y que esta facultad puede aprehender esa forma en concreto [] las intenciones [] se tratan de aspectos de beneficio y prejuicio que son sensibles per accidens respecto de los sentidos externosrdquo MUSZALSKI 2014 p 88-89

388 ldquo[] los animales las perciben soacutelo por un instinto natural mientras que el hombre las

percibe por una comparacioacutenrdquo TOMAacuteS DE AQUINO 2001 Q 78 a 4 p 719 389

Id 2012 Q XIII p 273 390

Ibid p 273 Id 1990b L II c LX p 273-274 Id 2001 Q 78 a 4 p 718-719 Na Suma Teoloacutegica Tomaacutes de Aquino (1993 Q 51 a 3 p 398) diz que Aristoacuteteles (2010 L 3 p 117) chama ldquoentendimento passivordquo e ldquorazatildeo particularrdquo a potecircncia cogitativa juntamente com a memoacuteria e a imaginaccedilatildeo

391 TOMAacuteS DE AQUINO 2001 Q 81 a 3 p 745

392 MUSZALSKI 2014

91

como lsquomover conjuntamentersquo ou lsquoconduzir junto com outrorsquo393 e entatildeo significa

ldquopensarrdquo como ldquoo movimento da razatildeo em sua busca discursivardquo394

Para a cogitativa e portanto isto natildeo se daria nos animais natildeo humanos a

imaginaccedilatildeo tambeacutem compotildee e divide as formas imaginadas o que Tomaacutes de

Aquino exemplifica com a capacidade de unir-se a imagem do ouro agrave de uma

montanha e entatildeo poder-se imaginar uma montanha de ouro395 Esse exerciacutecio

voluntaacuterio da imaginaccedilatildeo seria o que possibilita ao ente intelectivo a resoluccedilatildeo de

problemas por meio do pensamento

Jaacute a memoacuteria possibilita que o que foi apreendido seja novamente chamado agrave

consideraccedilatildeo atual O Estagirita jaacute reconhecia que ela estaacute presente em animais natildeo

humanos e ainda que ela opere nestes sem investigaccedilatildeo torna alguns mais aptos

ao aprendizado396 Somente no homem ela opera mediante investigaccedilatildeo e estudo o

que se daacute por ele tambeacutem possuir a faculdade da reminiscecircncia a memoacuteria

voluntaacuteria que lhe possibilita analisar silogisticamente as intenccedilotildees do passado

armazenadas397 Observa o Aquinate ainda que ldquoos atos das outras potecircncias

sensitivas se produzem segundo um movimento que vai das coisas para a alma

enquanto o da memoacuteria se efetua ao contraacuterio segundo um movimento que vai da

alma para as coisasrdquo398

E tal como a reminiscecircncia a cogitativa tambeacutem se deve agrave afinidade e agrave

razatildeo universal agrave repercussatildeo desta em ambas399 Assim se caracterizam o ato

daquela o comparar o compor e o dividir o ato da reminiscecircncia eacute fazer uso do

silogismo a fim de indagar400

Enquanto os sentidos em geral captam os acidentes a estimativa em especial

tem como objeto proacuteprio a quididade singular pela materialidade desta ainda que

natildeo a apreenda pela mateacuteria em si por soacute poder ser conhecida por sua analogia com

a forma401

393

ldquo[] cogitare es un verbo que implica movimiento y que puede traducirse como lsquomover conjuntamentersquo o lsquoconducir junto com otrorsquordquo MUSZALSKI 2014 p 80

394 ldquo[] el movimiento de la razoacuten en su buacutesqueda discursivardquo Ibid p 80

395 TOMAacuteS DE AQUINO 2001 Q 78 a 4 p 719-720

396 ARISTOacuteTELES 2005 L I 980a e 980b p 3

397 TOMAacuteS DE AQUINO 2001 Q 78 a4 p 719 Id 2012 Q XIII p 275

398 Id 2012 Q XIII p 275

399 Id 2001 Q 78 a4 p 720

400 Ibid Q 78 a 4 p 718

401 Id 1999 p 97-98

92

Retomando a cogitativa neste sentido Tomaacutes de Aquino diz que ldquocogitarrdquo (ou

ldquopensarrdquo) como ato da faculdade cogitativa eacute

[] propriamente o movimento da mente que delibera quando ainda natildeo chegou agrave perfeiccedilatildeo pela visatildeo plena da verdade Mas esse movimento da mente quando cogita pode versar antes sobre as intenccedilotildees universais caso em que pertence agrave parte intelectiva ou antes sobre representaccedilotildees particulares o que pertence agrave parte sensitiva Daiacute que em um segundo sentido pensar eacute ato da inteligecircncia que indaga e em outro terceiro sentido eacute ato da faculdade cognoscitiva

402

Assim explica Muszalski que quando se diz que a cogitativa eacute acidental isto

se daacute por ela secirc-lo em relaccedilatildeo agrave razatildeo ao tocar nesta enquanto estimativa por seu

modo de operar entre o sensitivo e o intelectivo e entatildeo diz ser apropriado

denominaacute-la ldquoobjeto formal quod acidentalrdquo403

56 INTELECTO

Com o produto final da operaccedilatildeo dos sentidos internos ou seja a imagem ou

fantasma tem iniacutecio o processo intelectivo no homem pelo qual este agora

reconhecendo as intenccedilotildees ou espeacutecies intencionais universais404 sabe ou seja

discrimina discerne (o que pertence ao juiacutezo) e concebe (apreende o que

discerniu)405 discorre e faz suposiccedilotildees ou seja forma concepccedilotildees e juiacutezos406

conhece o verdadeiro e o falso407 Se os sentidos e a imaginaccedilatildeo limitam-se agrave

apreensatildeo dos acidentes externos o intelecto diz o Aquinate ldquopenetra ateacute a

essecircncia das coisasrdquo e pode ser entendido de dois modos quando se apreende as

quididades ou quando se conhece os primeiros princiacutepios diretamente na coisa a

partir do conhecimento da quididade desta (razatildeo pela qual o intelecto eacute tido como o

402

ldquo[] propiamente el movimiento de la mente que delibera cuando todaviacutea no ha llegado a la perfeccioacuten por la visioacuten plena de la verdad Pero ese movimiento de la mente cuando piensa puede versar bien sobre las intenciones universales en cuyo caso pertenece a la parte intelectiva bien sobre representaciones particulares lo cual pertenece a la parte sensitiva De ahiacute que en un segundo sentido pensar es acto de la inteligencia que indaga y en otro tercer sentido es acto de la facultad cognoscitivardquo TOMAacuteS DE AQUINO 1990 Q 2 a 1 p 60

403 MUSZALSKI 2014 p 98

404 TOMAacuteS DE AQUINO 2001 Q 78 a 4 p 719

405 Id 2000 III l 7 672

406 ARISTOacuteTELES 2010 III 4 p 114 TOMAacuteS DE AQUINO 2000 III l 7 683

407 TOMAacuteS DE AQUINO 2000 III l 13 793

93

ldquohaacutebito dos princiacutepiosrdquo) ou ldquoenquanto abarca todas as operaccedilotildees tais como opinar e

raciocinarrdquo408

O homem eacute proporcionalmente dotado com o maior ceacuterebro em relaccedilatildeo agrave sua

quantidade e sendo o uacutenico animal ereto possui a cabeccedila no alto o que segundo o

aristotelismo-tomismo se daacute para maior liberdade de sua operaccedilatildeo principal a

intelecccedilatildeo para a qual o corpo humano se dispotildee409 uma vez que as coisas

inferiores existem em funccedilatildeo das superiores o que permite definir suficientemente

por determinado fim as coisas que existem para este mesmo fim410 E quanto mais

um ente possui a razatildeo de ldquoserrdquo mais elevado eacute o que fica evidente pela razatildeo

entre potecircncia e ato pois como explica Tomaacutes de Aquino411 diz-se propriamente

que ldquoeacuterdquo natildeo o que estaacute em potecircncia mas o que estaacute em ato

Observa Aristoacuteteles que os agentes que produzem o ato da percepccedilatildeo ou

seja os sensiacuteveis que satildeo particulares satildeo externos ao passo que satildeo internos os

universais que de algum modo estatildeo na alma mesma e entatildeo produzem a ciecircncia

Tomaacutes de Aquino acrescenta que ldquoos universais enquanto universais existem

somente na alma As naturezas proacuteprias em contrapartida que assumem a intenccedilatildeo

de universalidade existem nas coisasrdquo412

Em razatildeo disto o entendimento depende da vontade daquele que entende

enquanto a percepccedilatildeo natildeo depende necessariamente413 O Estagirita define

ldquoentendimentordquo como aquilo ldquocom que a alma discorre e faz suposiccedilotildeesrdquo414

Eacute por semelhanccedila que um objeto conhecido se faz presente naquilo que

conhece produzindo entatildeo o conhecimento de modo que assim como haacute

atualizaccedilatildeo dos sentidos pelos sensiacuteveis ndash que entatildeo imprimiratildeo neles certa

semelhanccedila de natureza corporal delimitada pelas dimensotildees caracteriacutesticas da

mateacuteria e que eacute um modo de conhecer ndash assim tambeacutem aquilo que a inteligecircncia

intelige a saber as espeacutecies inteligiacuteveis que procedem da abstraccedilatildeo formal da

mateacuteria produziratildeo nela certa semelhanccedila caracterizando outro modo de conhecer

de conceber onde haacute tal como nos sentidos distinccedilatildeo e apreensatildeo mas aqui agrave luz

408

TOMAacuteS DE AQUINO 1988 a XII p 92-93 409

Id 2012 Q VIII p 171 e 181 410

Id 2006 p 25 411

Ibid p 73 412

ldquo[] les universels en tant quuniversels nexistent que dans lacircme Les natures mecircmes par contre qui revecirctent lintention duniversaliteacute existent dans les chosesrdquo Id 2000 II l 12 380

413 ARISTOacuteTELES 2010 II 5 p 77

414 Ibid III 4 p 114

94

do intelecto com formaccedilatildeo de uma afirmaccedilatildeo ou de uma negaccedilatildeo o que nos

sentidos equivaleria ao surgimento do agradaacutevel ou da tristeza415

O intelecto ou inteligecircncia concebe o que eacute separaacutevel dos sensiacuteveis natildeo

separadamente ou seja a distinccedilatildeo eacute feita porque o separaacutevel pode ser entendido

em si mas natildeo existe sem o objeto do qual eacute racionalmente separado Eacute assim que

o intelecto abstrai os entes matemaacuteticos da mateacuteria sensiacutevel E de modo semelhante

a inteligecircncia abstrai o universal do particular ao conceber a natureza das espeacutecies

sem seus princiacutepios individuantes que compotildeem sua definiccedilatildeo416

Para o aristotelismo-tomismo o intelecto eacute parte da alma417 que

diferentemente dos sentidos ndash que natildeo conhecem a si mesmos nem agraves suas

operaccedilotildees (a visatildeo por exemplo natildeo vecirc que vecirc) ndash conhece a si mesmo e agrave sua

operaccedilatildeo (a intelecccedilatildeo)418 e intelige indefinidamente refletindo inclusive sobre si

mesmo (algo que natildeo se daacute com os sentidos)419 Ademais nada haacute em seu interior

que seja alguma natureza por ele conhecida420 sendo portanto de modo anaacutelogo

aos sentidos (mas enquanto a parte sensitiva recebe as formas nos oacutergatildeos e natildeo

em si mesma a intelectiva recebe em si mesma e natildeo nos oacutergatildeos421) e estaacute em

potecircncia para aquilo que conhece atualizando-se naquilo que pensa no instante em

que pensa422

O intelecto possui uma natureza pela qual estaacute em potecircncia para toda a

natureza sensiacutevel universalmente423 Ele natildeo se corrompe com o excesso de

inteligiacuteveis tambeacutem ao contraacuterio dos sentidos que satildeo corrompidos pelo excesso de

sensiacuteveis como jaacute se disse se entende algo em grau maior natildeo passa a entender

pior o que houver de inferior mas ao contraacuterio entende ainda melhor e conhece

melhor as coisas inferiores agrave medida que conhece as mais elevadas Possui

portanto um grau de impassibilidade muito superior ao dos sentidos424

415

TOMAacuteS DE AQUINO 2000 III l 12 767 416

Ibid III l 12 781 e 784 417

ARISTOacuteTELES 2010 III 4 p 113 418

TOMAacuteS DE AQUINO 2009 p 151 Id 2000 l 24 556 Id 1990b L II c LXVI p 285 419

Id 2009 p 151 Id 2000 l 24 556 420

Pois de outro modo obstruiria o conhecimento das outras naturezas assim como na visatildeo natildeo poderia haver uma cor sem que impedisse a captaccedilatildeo das demais ndash o que parte do entendimento de que o que se encontra no interior haveraacute de impedir ou de obstruir o que se encontra fora (cf ARISTOacuteTELES 2010 III 4 p 114)

421 TOMAacuteS DE AQUINO 2009 p 67

422 Ibid p 63 e 65

423 Id 2000 III l 7 681

424 ARISTOacuteTELES 2010 III 4 p 114-115 TOMAacuteS DE AQUINO 2000 III l 7 687 Tomaacutes

de Aquino 1990b L II c LXVI p 285

95

Segundo o Estagirita o intelecto eacute o lugar das espeacutecies425 o lugar das formas

em potecircncia426 uma taacutebua na qual nada haacute que esteja escrito em ato ainda que de

certa maneira seja os inteligiacuteveis em potecircncia427 A alma intelectual eacute de certa

maneira todas as coisas e isto se daacute porque nela atualizam as formas inteligiacuteveis de

todas as coisas428 as formas comuns e universais diz o Aquinate pelas quais o

entendimento que apreende a forma inteligiacutevel sem a contraccedilatildeo que a forma

substancial sofre ao ser recebida pela mateacuteria prima de modo que aquela esteja no

entendimento ldquosegundo a razatildeo de sua comunidaderdquo429

O intelecto integra duas partes Uma delas eacute o intelecto possiacutevel cuja

doutrina aristoteacutelica o Aquinate define assim ldquoeacute alguma coisa da alma que eacute ato de

um corpo isto poreacutem sem que esse intelecto da alma possua qualquer oacutergatildeo

corporal tal como sucede com as restantes faculdades da almardquo430 E partindo da

definiccedilatildeo de inteligecircncia de Aristoacuteteles de que eacute aquilo com que a alma forma

concepccedilotildees e juiacutezos conclui que o intelecto possiacutevel eacute em um sentido formal o que

cada homem pensa431

Eacute portanto certa forccedila ou potecircncia da alma humana que estando em

potecircncia para todos os inteligiacuteveis432 (e inclusive intelige-se a si mesmo ldquopor uma

forma sua pela qual ele se faz em atordquo433) recebe da outra parte do intelecto (jaacute que

natildeo pode produzir algo o que estaacute em potecircncia para este algo) o intelecto agente a

impressatildeo da imagem que eacute representativa de todas as coisas concretas tal como

os sentidos recebem a impressatildeo das espeacutecies sensiacuteveis dos acidentes (aqui

poreacutem sem a necessidade de um agente tal como se daacute no intelecto)

Enquanto a imaginaccedilatildeo eacute movida pelos sentidos jaacute que uma potecircncia eacute

movida por outra as formas inteligiacuteveis por serem universais natildeo podem ser

425

ARISTOacuteTELES 2010 III 4 p 114 426

Ibid III 4 p 114 427

Ibid III 4 p 116 TOMAacuteS DE AQUINO 2009 p 133 428

TOMAacuteS DE AQUINO 2000 III l 13 789-790 Aristoacuteteles faz uma comparaccedilatildeo com a matildeo que assumiria no homem o papel dos instrumentos observados nos animais para ataque ndash o que eacute exemplificado pela caccedila ndash defesa e abrigo (cf ARISTOacuteTELES 2010 III 8 p 123 TOMAacuteS DE AQUINO 2000 III l 13 790)

429 Id 1949 Q 1 R p 14

430 Id 2009 p 69

431 Id 2000 III l 7 690

432 Potecircncia esta que natildeo eacute essecircncia da alma uma vez que seu ato natildeo eacute essencial

433 TOMAacuteS DE AQUINO 2012 Q X p 343

96

causadas pelas formas da imaginaccedilatildeo que satildeo individuais434 Assim o intelecto

possiacutevel recebe apenas espeacutecies universais

Os fantasmas servem para a alma intelectiva ou discursiva como as

sensaccedilotildees os objetos sensiacuteveis servem para os sentidos435 E tal como os sentidos

satildeo movidos por seus objetos proacuteprios as espeacutecies sensiacuteveis o intelecto possiacutevel

que estaacute diz Tomaacutes de Aquino ldquoem potecircncia para todas as coisas que satildeo

inteligiacuteveis pelo homem seraacute movido pelas espeacutecies inteligiacuteveis seus objetos

proacutepriosrdquo ele ldquodeve ser receptivo dessas mesmas coisasrdquo (e consequentemente

como se disse delas desprovido) de ldquotodas as formas e naturezas sensiacuteveisrdquo e

entatildeo natildeo tem oacutergatildeo corpoacutereo pois ldquoSe tivesse algum oacutergatildeo corpoacutereordquo

complementa ldquoestaria determinado a alguma natureza sensiacutevel assim como a

potecircncia visiva determina-se agrave natureza do olhordquo436

A outra parte integrada eacute o entendimento que assim como a luz faz de

cores em potecircncia cores em ato faz tambeacutem todas as coisas ou seja todos os

inteligiacuteveis apoacutes o entendimento anterior o intelecto possiacutevel tornar-se todas as

coisas437 eacute o intelecto agente um princiacutepio ativo particular que faz com que o ente

humano seja um ente inteligente em ato Eacute nas palavras de Echavarriacutea (2009) ldquoa

lsquoluz natural da mente e eacute o princiacutepio ativo de toda a vida do espiacuterito primeiramente

do entenderrdquo438 que por abstraccedilatildeo da mateacuteria e das condiccedilotildees materiais (os

princiacutepios de individuaccedilatildeo) produziraacute as espeacutecies inteligiacuteveis que natildeo preexistem

na natureza das coisas extraindo-as da imagem ou fantasma439

Assim se o intelecto possiacutevel eacute nas palavras do Aquinate ldquoaquele que eacute

passiacutevel de tornar-se qualquer coisardquo o intelecto agente eacute aquele ldquoque pode fazer

tudordquo440 Diz ele tambeacutem que

[] eacute necessaacuterio que em todo agente haja um princiacutepio formal pelo qual ele opere formalmente porque eacute impossiacutevel que um agente opere formalmente

434

TOMAacuteS DE AQUINO 2012 Q IV p 103 435

ARISTOacuteTELES 2010 III 11 p 130 TOMAacuteS DE AQUINO apud PEREIRA JUNIOR 2006 p 63

436 TOMAacuteS DE AQUINO 2012 Q II ps 59 e 61

437 ARISTOacuteTELES 2010 III 5 p 117

438 ldquo[hellip] es la luz natural de la mente y es el principio activo de toda la vida del espiacuteritu

primeramente del entenderrdquo ECHAVARRIacuteA 2009 p 131 439

A accedilatildeo do intelecto agente imaterial difere da accedilatildeo dos agentes naturais aquele abstrai da mateacuteria enquanto estes imprimem formas na mateacuteria

440 TOMAacuteS DE AQUINO 1988 Art II p 49

97

mediante algo que eacute separado dele segundo o ser [] o intelecto agente estaacute para os fantasmas iluminados assim como a arte para a sua obra

441

O intelecto agente possui quatro propriedades sendo somente a quarta a que

o diferencia do intelecto possiacutevel que eacute superado por aquele nas outras trecircs eacute

separaacutevel eacute impassiacutevel eacute sem mistura ou seja natildeo eacute composto de natureza

corpoacuterea nem estaacute associado a um oacutergatildeo corpoacutereo estaacute em ato por essecircncia

enquanto o intelecto possiacutevel estaacute em potecircncia por essecircncia442

Ao inerirem neste as espeacutecies inteligiacuteveis satildeo individuadas mas os

universais mediante estas poderatildeo vir a ser conhecidos por serem concebidos

apoacutes os princiacutepios individuantes serem abstraiacutedos443 Elas natildeo satildeo o que eacute inteligido

pelo intelecto mas aquilo mediante o que ele intelige salvo reflexivamente ou seja

ldquoenquanto intelige que intelige a si proacuteprio e ao que mais possa inteligirrdquo444 de modo

que a Fiacutesica e a Metafiacutesica versaratildeo sobre elas Tomaacutes de Aquino explica o modo

como o intelecto intelige a si mesmo ldquomediante a espeacutecie inteligiacutevel dos demais

inteligiacuteveis pois por meio do objeto conhece sua operaccedilatildeo e mediante esta vem a

conhecer a si mesmordquo445

Em relaccedilatildeo ao que pertence por si agrave espeacutecie enquanto universal a natureza

desta natildeo pode multiplicar-se por estarem fora de sua razatildeo os princiacutepios

individuantes Assim diz o Aquinate ldquopoderaacute o intelecto captar a espeacutecie para aleacutem

de todas as condiccedilotildees individuantes e assim captar-se-aacute algo uno E pelo mesmo

motivo o intelecto capta a natureza do gecircnerordquo446

Poreacutem se por um lado o intelecto capta o universal eacute indiretamente que ele

conhece o singular

[] mediante certa reflexatildeo na medida em que pelo fato de que apreende seu inteligiacutevel volta-se agrave consideraccedilatildeo de seu proacuteprio ato agrave da espeacutecie inteligiacutevel que eacute princiacutepio de sua operaccedilatildeo e agrave da origem desta mesma espeacutecie Deste modo alcanccedila a consideraccedilatildeo dos fantasmas e dos singulares que lhes correspondem Mas esta reflexatildeo soacute se pode dar mediante o concurso das virtudes cogitativas e imaginativas

441

TOMAacuteS DE AQUINO 2012 Q V p 117 442

Id 2000 III l 10 732-733 443

Id 2012 Q II p 67 444

Ibid Q II p 69 445

Ibid Q III p 89 446

Ibid Q IV p 101

98

Eacute portanto a potecircncia sensitiva que conhece os singulares apoacutes os oacutergatildeos

sensitivos receberem as espeacutecies individuais ou seja o homem conhece os

universais pelo intelecto e os singulares pelos sentidos e entatildeo pelo intelecto por

um ato reflexivo de retorno aos fantasmas jaacute que eacute deles que o intelecto abstrai as

espeacutecies inteligiacuteveis447 O Aquinate fundamenta

[] tudo que pode a virtude inferior pode-o tambeacutem a superior mas natildeo do mesmo modo senatildeo por outro mais elevado Por isso aquelas mesmas coisas que o sentido percebe materialmente e singularmente conhece-as o intelecto imaterialmente e universalmente

448

No entanto

[] natildeo eacute necessaacuterio que aquilo que o intelecto intelige tenha ser separadamente nas coisas da natureza Do mesmo modo tampouco eacute preciso propor a subsistecircncia dos universais fora dos singulares nem a dos matemaacuteticos fora das coisas sensiacuteveis uma vez que os universais satildeo as essecircncias dos proacuteprios particulares e os matemaacuteticos satildeo as delimitaccedilotildees dos corpos sensiacuteveis

449

O intelecto ou razatildeo universal assim move e dirige a cogitativa ou razatildeo

particular para que realize sua comparaccedilatildeo entre as intenccedilotildees particulares

viabilizando as conclusotildees particulares a partir de proposiccedilotildees universais do

raciociacutenio silogiacutestico450 Ele natildeo pode jamais conceber uma forma sem que conceba

a mateacuteria da qual depende a concepccedilatildeo dessa forma ainda que possa conceber

uma forma sem seus princiacutepios individuantes jaacute que seu objeto apropriado eacute a

quididade das coisas sensiacuteveis ainda que de um modo diferente daquele em que

elas estatildeo nas coisas sensiacuteveis mas sem que se produza falsidade na

inteligecircncia451 Enquanto as espeacutecies inteligiacuteveis satildeo aquilo pelo qual o intelecto

conhece a semelhanccedila da coisa na alma a quididade eacute aquilo que eacute conhecido452

Assim como satildeo uma soacute coisa o sensiacutevel em ato e o sentido em ato tambeacutem eacute uma

soacute coisa o intelecto em ato e o que eacute conhecido em ato453

447

TOMAacuteS DE AQUINO 2006 p 165 Id 2000 II l 5 284 Ibid II l 12 377 Ibid III l 7 675-676 Ibid III l 8 712-713

448 Id 2012 Q XX p 417

449 Id 2006 p 19

450 Id 2001 Q 81 a 3 p 745

451 Id 2000 III l 8 717

452 Ibid III l 8 718-719

453 Ibid III l 9 724

99

O intelecto em ato possui trecircs propriedades a de que a ciecircncia em ato eacute a

mesma coisa que a coisa conhecida a de que a ciecircncia em potecircncia eacute anterior agrave

ciecircncia em ato no tempo (quando no acircmbito singular a potecircncia eacute anterior ao ato) em

um mesmo sujeito mas natildeo anterior universalmente em relaccedilatildeo natildeo soacute agrave natureza

(quando o ato eacute anterior agrave potecircncia) como tambeacutem ao tempo e a de que estar em

ato implica aqui necessariamente conceber e entatildeo ele difere dos intelectos

possiacutevel e agente que podem conceber ou natildeo conceber454

E explica o Aquinate que como ldquoo sentido e o sensiacutevel em potecircncia satildeo

diferentes mas o sentido e o sensiacutevel em ato satildeo uma e a mesma coisardquo tambeacutem

assim ldquoo intelecto ou a ciecircncia em ato satildeo o mesmo que a coisa conhecida em

atordquo ao que pode-se agregar o que diz Aristoacuteteles ldquoNo caso das coisas imateriais

o que entende e o que eacute entendido satildeo o mesmo pois a ciecircncia teoreacutetica e o objeto

cientificamente cognosciacutevel satildeo o mesmordquo455 Tomaacutes de Aquino prossegue

[] o intelecto possiacutevel estaacute em potecircncia com respeito aos inteligiacuteveis segundo o ser que estes tecircm nos fantasmas E eacute segundo o mesmo ser que os inteligiacuteveis tecircm nos fantasmas que o intelecto agente estaacute em ato com respeito a eles mas um por uma razatildeo e outro por outra razatildeo

456

Mesmo quando natildeo haacute intelecccedilatildeo em ato as espeacutecies inteligiacuteveis que o ente

adquire em vida poderatildeo residir no intelecto possiacutevel Isto se daacute pelo intelecto in

habito que se manifesta quando as espeacutecies inteligiacuteveis encontram-se entre a

potecircncia e o ato no intelecto o que permite que o homem intelija em ato sempre que

desejar457 Assim o intelecto in habito eacute efeito do intelecto agente e se encontra

necessariamente no intelecto possiacutevel458 O primeiro ato do intelecto possiacutevel eacute

pois o haacutebito da ciecircncia (haacutebito permanente diga-se) que estaacute em parte no

intelecto e em parte nas virtudes sensitivas459 e de posse deste apoacutes aprender ou

encontrar o intelecto pode passar para o segundo ato que eacute o da operaccedilatildeo ao

mesmo tempo em que se manteacutem em potecircncia para a consideraccedilatildeo em ato de algo

podendo entatildeo conceber qualquer coisa inclusive a si mesmo460 pois o objeto da

454

TOMAacuteS DE AQUINO 2000 III l 10 740 455

ARISTOacuteTELES 2010 4 III p 116 456

TOMAacuteS DE AQUINO 2012 Q V p 119-121 457

Ibid Q XV p 323 458

Id 1990b L II c LX p 276 459

Id 2001 Q 89 a 5 p 806 460

Id 2009 p 133 Id 2000 III l 8 700 703-704

100

ciecircncia especulativa que pode ser conhecido e a ciecircncia especulativa em si tambeacutem

satildeo a mesma coisa461

Explica o Aquinate462 que a intelecccedilatildeo seraacute sempre ou praacutetica ou

especulativa e de um ou outro modo teraacute sempre iniacutecio e fim A inteligecircncia praacutetica

ou entendimento praacutetico ou entendimento operativo eacute relacionada agrave accedilatildeo que

considera algo falso ou verdadeiro em relaccedilatildeo a um operaacutevel particular ldquojaacute que a

accedilatildeo se executa nas situaccedilotildees particularesrdquo463 Quanto agrave inteligecircncia especulativa

ou entendimento especulativo considera somente o objeto da especulaccedilatildeo natildeo do

que eacute factiacutevel segundo um ato singular mas somente universalmente e portanto

natildeo move porque natildeo faz fugir ou buscar natildeo move o apetite mas eacute movida de

certo modo pelas coisas porque recebe delas que constituem assim sua medida

Ambas as inteligecircncias satildeo uma mesma potecircncia diferindo portanto quanto ao fim

Diz entatildeo Tomaacutes de Aquino

[] as coisas da natureza satildeo ao mesmo tempo comensurantes e comensuradas Ao contraacuterio a nossa inteligecircncia eacute comensurada eacute tambeacutem comensurante natildeo poreacutem em relaccedilatildeo agraves coisas criadas mas em relaccedilatildeo aos produtos do engenho humano

464

O que move o ente eacute portanto aquilo que desperta a faculdade apetitiva que

leva o ente a retornar ao objeto que serviu de motor inicial para o processo cognitivo

naquele com relaccedilatildeo a este465 Sobre este movimento Aristoacuteteles aponta que satildeo

inuacutemeras as partes da alma que participam dele a parte que raciocina a impulsiva

a apetitiva (que tambeacutem podem ser classificadas como racionais ou irracionais) a

nutritiva a perceptiva (que natildeo eacute facilmente classificaacutevel como racional ou

irracional) a imaginativa a desiderativa sendo que a parte apetitiva e a parte

impulsiva diferem entre si menos do que as demais o fazem entre si466

Segue-se portanto que

Existem entatildeo trecircs coisas uma o que move a segunda aquilo com que move e ainda uma terceira o que eacute movido Por seu turno o que move eacute duplo existe assim o que natildeo se move e o que move e eacute movido O que natildeo se move eacute o bem realizaacutevel atraveacutes da accedilatildeo jaacute o que move e eacute movido eacute a faculdade desiderativa E que o que eacute movido eacute movido em virtude de

461

TOMAacuteS DE AQUINO 2000 III l 9 724 462

Ibid I l8 119 Ibid III l 12 779-780 Ibid III l 14 813 Id 2001 Q 79 a 11 p 737 463

ldquo[] lrsquoaction srsquoexeacutecute dans les situations particuliegraveresrdquo Id 2000 III l 12 780 464

Id 1988 Art II p 48 465

Ibid Art II p 47 466

ARISTOacuteTELES 2010 III 9 p124-125 Ibid III 10 p 128

101

desejar e o desejo em actividade eacute um tipo de movimento O que eacute movido por sua vez eacute o animal

467

Em uacuteltima anaacutelise o que move e sem mover-se quando entendido e quando

imaginado eacute o objeto do desejo pela faculdade desiderativa pelo desejo mesmo

cujo objeto diz o Filoacutesofo eacute ldquoo princiacutepio do entendimento praacutetico enquanto o termo

final do raciociacutenio eacute entatildeo o princiacutepio da accedilatildeordquo e assim pela inteligecircncia praacutetica

pelo pensamento discursivo praacutetico que move porque tem como princiacutepio o objeto

do desejo e pela imaginaccedilatildeo que eacute racional ou perceptiva e sem a qual a

faculdade desiderativa natildeo pode existir que soacute move com o desejo inclusive nos

animais sem raciociacutenio E a faculdade desiderativa move nas ocasiotildees em que haacute

somente apetite e nas em que o apetite e o raciociacutenio mesmo quando um contraria

o outro como quando pelo entendimento sabemos que devemos negar um apetite

que visa a um prazer imediato em razatildeo de consequecircncias posteriores468

Quanto agrave faculdade de deliberar a razatildeo deliberativa que eacute princiacutepio motor

somente no homem um desejo pode sobrepor-se a ela e movecirc-la assim como um

desejo tambeacutem pode sobrepor-se a outro desejo e movecirc-lo ou ser movido tambeacutem

pela sobreposiccedilatildeo daquela Jaacute a faculdade cientiacutefica (a razatildeo especulativa) natildeo se

move pois natildeo leva a fugir ou a desejar Assim diz o Estagirita relacionados ao

universal existem uma suposiccedilatildeo e um enunciado e relacionado ao particular existe

uma suposiccedilatildeo Ele exemplifica ldquoA primeira diz que certo tipo de homem tem de

praticar um acto de certa natureza o segundo diz que este eacute um acto daquela

natureza e que eu sou um homem daquele tipordquo e em seguida conclui ldquoEacute esta

uacuteltima opiniatildeo a que move e natildeo a respeitante ao universal Ou talvez ambas

movam mas a primeira permanecendo preferencialmente em repouso e a

segunda natildeordquo469

O animal racional examina primeiramente as coisas por fazer a fim de medir

qual seraacute preferencial ou quais o seratildeo e entatildeo opta pela que lhe proporcionaraacute

mais bens ou pelas que lhes proporcionaratildeo isto pelo que manifestaraacute desejo Por

essa escolha do melhor haacute pois como aponta Tomaacutes de Aquino trecircs objetos

atuantes trecircs fantasmas que seratildeo convertidos em um soacute dois elementos em que

467

ARISTOacuteTELES 2010 III 10 p 128 468

Ibid III 10 p 127-129 469

Ibid III 11 p 129-131

102

um seraacute preferiacutevel ao outro e uma medida que seraacute aquilo que torna um deles

preferiacutevel que eacute a opiniatildeo470

O fim da intelecccedilatildeo especulativa seraacute sempre as obras da razatildeo que satildeo a

definiccedilatildeo referente agrave intelecccedilatildeo simples e a demonstraccedilatildeo471 que compotildeem as trecircs

operaccedilotildees que se desdobram do intelecto in habito

a) A primeira consiste na apreensatildeo na simples captaccedilatildeo dos aspectos

inteligiacuteveis nas coisas eacute a intelecccedilatildeo propriamente dita na qual ocorre a

conceituaccedilatildeo e a definiccedilatildeo que tem o ldquogecircnero generaliacutessimordquo como

princiacutepio e a ldquoespeacutecie especialiacutessimardquo472 como termo473

b) A segunda eacute o juiacutezo que possibilita melhor conhecimento da realidade

onde ocorrem composiccedilatildeo e divisatildeo dos aspectos inteligiacuteveis

c) A terceira eacute o raciociacutenio propriamente dito que eacute desdobramento da

anterior

O iniacutecio das operaccedilotildees tem como base a apreensatildeo simples (aprehensio

simplex) do intelecto e caracteriza-se pela concepccedilatildeo das essecircncias indivisiacuteveis ou

outras incomplexas nas quais natildeo haacute distinccedilatildeo entre verdadeiro e falso que estatildeo

separadas entre si e entatildeo satildeo compostas para formar conceitos e a partir destes

mais conceitos Eacute a primeira inteligecircncia Diz Tomaacutes de Aquino que

[] a primeira coisa que a inteligecircncia concebe como a mais conhecida e agrave qual se reduz tudo eacute o ente [] todos os outros conceitos da inteligecircncia se obtecircm por adjunccedilatildeo ao ente Ora ao ente natildeo se pode acrescentar algo agrave maneira de uma natureza estranha assim como por exemplo a diferenccedila especiacutefica se acrescenta ao gecircnero ou o acidente ao sujeito uma vez que toda natureza eacute essencialmente um ente

474

E explica que o que se pode acrescentar ao ente eacute somente o que expressa

um modo seu determinado seja ldquoquando o modo expresso constitui certo modo

especial do enterdquo por suas peculiaridades seja ldquoquando o modo expresso compete a

cada ser de maneira geralrdquo enquanto ldquoconveacutem a todo ente considerado em si

mesmordquo (o que ldquosignifica que o modo exprime no ente algo de maneira afirmativa ou

470

TOMAacuteS DE AQUINO 2000 III l 16 840 471

Ibid I l 8 119 472

Respectivamente ldquogenre geacuteneacuteralissimerdquo e ldquoespeacutece speacutecialissimerdquo 473

TOMAacuteS DE AQUINO 2000 I l 8 121 474

Id 1988 Art I p 41

103

negativardquo respectivamente coisa ndash ou seja a quididade ou a entidade do ente ndash e

indivisatildeo que eacute o ldquounordquo) ou ldquoenquanto conveacutem a todo ente em relaccedilatildeo a outrordquo ou

ldquoconforme a divisatildeo ou distinccedilatildeo de uma coisa da outra (o ente eacute algo que se

distingue de outro ente)rdquo ou ldquosegundo a concordacircncia de um ente com outrordquo (como

se daacute com a proacutepria alma como se viu que eacute dita de certo modo ser tudo)475

Com relaccedilatildeo ao julgamento ou juiacutezo pode-se fazer aqui certa comparaccedilatildeo

com o sentido comum pois assim como este como uma faculdade eacute o termo de

vaacuterios objetos sendo algo uacutenico que pode julgar todos os sensiacuteveis o intelecto

tambeacutem eacute o termo das imagens e algo uacutenico que pode julgar todas elas476

Quando forma a quidade das coisas que existem fora do espiacuterito o intelecto

possui apenas a imagem destas mas quando elabora juiacutezos sobre elas estes satildeo

algo que natildeo estatildeo no objeto mas pertencem somente ao intelecto que assim

desempenharaacute as atividades sintetizante e analisante e entatildeo a formulaccedilatildeo de

definiccedilotildees477

Estas diz o Estagirita podem ser um princiacutepio ou uma conclusatildeo de uma

demonstraccedilatildeo ou uma demonstraccedilatildeo que difere pela ordem pela posiccedilatildeo dos

termos do princiacutepio e da conclusatildeo mas sem que caracterize um raciociacutenio478 Na

definiccedilatildeo o ente toma o nome primeiramente a partir da substacircncia de maneira

absoluta e de maneira relativa e de certo modo dos acidentes479

A composiccedilatildeo que se desenrola de conceitos de pensamentos que resultaraacute

em uma unidade ou seja que os teraacute como uma coisa soacute pode incluir conceitos

atuais e conceitos passados e futuros e nela pode ocorrer falsificaccedilatildeo Tomaacutes de

Aquino explica que se se pode afirmar esses conceitos tambeacutem eacute possiacutevel negaacute-los

e portanto o que resulta e que pode relacionar-se ao presente ao passado e ao

futuro pode tambeacutem obter-se por divisatildeo como verdadeiro ou falso Assim a

composiccedilatildeo das proposiccedilotildees apoacutes a constituiccedilatildeo dos inteligiacuteveis natildeo pode ser obra

da natureza mas da razatildeo e da inteligecircncia Essa composiccedilatildeo e essa divisatildeo

ocorrem nos divisiacuteveis em que haacute verdadeiro e falso e natildeo nos indivisiacuteveis480 uma

vez que natildeo existe ali o falso

475

TOMAacuteS DE AQUINO 1988 Art I p 42 476

Id 2000 III l 12 775 477

Id 1988 Art III p 50-51 478

ARISTOacuteTELES 1995b I 8 75b p 333-334 TOMAacuteS DE AQUINO 2000 II l 1 212 479

TOMAacuteS DE AQUINO 2003 p 55 480

Aristoacuteteles e Tomaacutes de Aquino explicam os indivisiacuteveis apresentando alguns modos como o que eacute quanto agrave continuidade quantitativamente sendo entatildeo indivisiacutevel em ato ainda que natildeo o

104

Com base nesse processo haacute duas formas de conhecer-se algo a partir de

outro algo e segundo o Aquinate somente o segundo eacute que cria o discurso O

primeiro daacute-se

[] conhecendo-se uma coisa conhecida a partir de outra coisa conhecida de maneira que seja distinto o conhecimento de ambas como quando o homem conhece as conclusotildees a partir dos princiacutepios considerando a ambos separadamente

Jaacute o segundo daacute-se ldquoconhecendo-se uma coisa conhecida a partir da espeacutecie

pela qual eacute conhecida como quando vemos uma pedra pela proacutepria espeacutecie da

pedra que estaacute em nosso olhordquo

E a enunciaccedilatildeo explica o mesmo Tomaacutes de Aquino ldquoeacute a expressatildeo do

conhecimento da inteligecircnciardquo481 e tem por objeto e que eacute o objeto das ciecircncias as

coisas em si Ou seja o intelecto possiacutevel natildeo pensa as espeacutecies mas por elas as

coisas482 Diz tambeacutem o Aquinate que a ciecircncia eacute anterior ao pensamento que estaacute

para ele como a potecircncia estaacute para o ato483 Os fantasmas natildeo se formam somente

pela recepccedilatildeo direta dos sentidos mas tambeacutem indireta ou seja sempre que se

especula em ato ocasiatildeo em que mantecircm sua semelhanccedila com as coisas sensiacuteveis

previamente conhecidas na medida em que estas participam do ente e por isso ateacute

o raciociacutenio pode comprometer-se se houver lesatildeo no oacutergatildeo da fantasia484

seja em potecircncia como o satildeo os contiacutenuos temporal e espacial Neste caso o ato que entende e o objeto entendido satildeo divisiacuteveis por acidente

Um outro tipo eacute caracterizado pelo fato de que algo pode ser indivisiacutevel tambeacutem quanto agrave espeacutecie e pode tambeacutem referir-se a uma espeacutecie uacutenica composta por partes natildeo contiacutenuas que o intelecto concebe tambeacutem acidentalmente pois nessas mesmas partes algo haacute de indivisiacutevel que eacute a espeacutecie de cada uma delas conhecidas pelo intelecto conhecendo assim em um tempo indivisiacutevel o que natildeo se daria se conhecesse somente as partes enquanto divididas O indivisiacutevel do contiacutenuo eacute o mesmo em qualquer parte mas aquele em espeacutecie natildeo eacute o mesmo em tudo o que tem espeacutecie pois haacute o que eacute composto por partes homogecircneas e haacute o que o eacute por partes heterogecircneas

Outro modo de indivisiacutevel eacute aquele que o eacute absolutamente ou seja indivisiacutevel em potecircncia e ato que se mostra agrave inteligecircncia como privaccedilatildeo do contiacutenuo e do divisiacutevel como o ponto o momento e a unidade Em outras palavras o entendimento daacute-se por privaccedilatildeo o objeto eacute conhecido tambeacutem pelo seu contraacuterio tanto em uma afirmaccedilatildeo como em uma negaccedilatildeo Como o que vem dos sentidos eacute o que eacute primeiro apreendido pelo intelecto o que ultrapassa o que natildeo eacute sentido eacute conhecido por negaccedilatildeo E de um modo semelhante se passa com aquilo que eacute conhecido por seu contraacuterio ou oposto e este se relaciona com aquele sempre como privaccedilatildeo ou ao menos como imperfeiccedilatildeo isto desde que o intelecto esteja em potecircncia para conhecer ambas as espeacutecies que satildeo entre si contraacuterias (cf ARISTOacuteTELES 2010 III 6 p 117-119 TOMAacuteS DE AQUINO 2000 III l 11 746-756)

Tomaacutes de Aquino diz ainda que os fantasmas seriam indivisiacuteveis somente em potecircncia mas natildeo em ato por sua semelhanccedila com os objetos particulares mas natildeo menciona se estaria apontando para um quarto modo (cf TOMAacuteS DE AQUINO 2000 III l 13 794)

481 TOMAacuteS DE AQUINO 1988 Art X p 88

482 Id 2009 p 151

483 Id 2000 II l 1 228

484 Ibid III l 13 791-792 Id 1988 Art I p 44

105

Explica o Pe Calderoacuten que o raciociacutenio como a terceira operaccedilatildeo do

intelecto pressupotildee a segunda operaccedilatildeo o juiacutezo ndash que tambeacutem pressupotildee a

primeira a simples apreensatildeo ndash sem confundir-se com ela e tomando-a como

elemento de sua estrutura mental assim como o juiacutezo pressupotildee a primeira a

simples apreensatildeo

Assim ele define o raciociacutenio

[] a operaccedilatildeo do intelecto pela qual se explica ou se desenvolve um juiacutezo manifestando o porquecirc ou a causa eacute uma nova espeacutecie de operaccedilatildeo do espiacuterito mais complexa que o juiacutezo composta por uma sequecircncia especial ou uma conexatildeo especial de juiacutezos eacute como um movimento de juiacutezos que termina em um juiacutezo de condiccedilatildeo especial ao qual se chama Conclusatildeo O juiacutezo comum significa uma simples atribuiccedilatildeo do predicado ao sujeito O sujeito eacute de tal predicado Em contrapartida no juiacutezo que eacute conclusatildeo de um raciociacutenio a atribuiccedilatildeo do predicado ao sujeito eacute uma atribuiccedilatildeo iluminada pela causa O sujeito eacute-por-tal-causa de tal predicado Por isso devemos distinguir a operaccedilatildeo do espiacuterito pela qual se compotildee ou divide desta outra pela qual se explica ou conclui

485

Tomaacutes de Aquino explica que a razatildeo e o entendimento no homem satildeo uma

mesma potecircncia mas distingue seus atos ldquo[] entender consiste na simples

apreensatildeo da verdade inteligiacutevel Em contrapartida raciocinar eacute passar de um

conceito a outro para conhecer a verdade inteligiacutevelrdquo486

E o mesmo Pe Calderoacuten fornece-nos o que nos resta para completar o que

aqui tiacutenhamos de expor sobre o intelecto e mais especificamente sobre esta terceira

operaccedilatildeo cuja obra imaterial segundo o aristotelismo-tomismo diz eacute a

argumentaccedilatildeo (argumentatio) caracterizada por uma ldquotriangulaccedilatildeordquo mental ldquoentre o

Sujeito a Propriedade e a Causardquo487

O juiacutezo incorpora os conceitos de simples apreensatildeo ao modo da mateacuteria sob uma nova forma Mas o raciociacutenio eacute como um movimento por isso natildeo dizemos que os juiacutezos que o compotildeem sejam ao modo de mateacuteria mas antes ao modo de extremos os que explicam a causa satildeo o lsquoantecedentersquo e a conclusatildeo eacute o lsquoconsequentersquo[] O raciociacutenio pode cumprir uma dupla

485

ldquo[] la operacioacuten del intelecto por la que se explica o desplega un juicio manifestando el porqueacute o la causa [] es una nueva especie de operacioacuten del espiacuteritu maacutes compleja que el juicio compuesta por una especial secuencia o conexioacuten de juiacutecios [] es como un movimiento de juicios que termina en un juicio de condicioacuten especial al que se lo llama Conclusioacuten [] El juicio comuacuten significa una simple atribuicioacuten del predicado al sujeto El sujeto es de tal predicado En cambio en el juicio que es conclusioacuten de un razonamiento la atribuicioacuten del predicado al sujeto es una atribucioacuten ilumiada por la causa El sujeto es-por-tal-causa de tal predicado Por eso debemos distinguir la operacioacuten del espiacuteritu por la que se compone o divide de esta otra por la que se explica o concluyerdquo CALDEROacuteN 2011 p 74-75

486 ldquo[] entender consiste en la simple aprehensioacuten de la verdad inteligible En cambio

raciocinar es pasar de un concepto a otro para conocer la verdad inteligiblerdquo TOMAacuteS DE AQUINO 2001 Q 79 a 8 p 732

487 ldquo[] el Sujeto la Propiedad y la Causa []rdquo CALDEROacuteN 2011 p 75

106

funccedilatildeo Demonstrar uma verdade conhecida [] Descobrir uma verdade conhecida []

488

Destrinccedilada a doutrina aristoteacutelico-tomista sobre os processos cognitivos no

acircmbito fiacutesico e metafiacutesico sob a oacuteptica dessa corrente havemos de destacar agora

os resultados de alguns dos principais estudos que apontam caracteriacutesticas nos

animais natildeo humanos em que se verifica a presenccedila de consciecircncia e de

inteligecircncia segundo as definiccedilotildees utilizadas nas uacuteltimas deacutecadas para que sejam

posteriormente discutidas a partir de um esquema de distinccedilatildeo entre as potecircncias

estimativa cogitativa e intelectiva

488

ldquoEl jucio incorpora los conceptos de simple aprehensioacuten a manera de materia bajo una nueva forma Pero el razonamiento es como un movimiento por eso no decimos que los jucios que lo componen sean a modo de materia sino maacutes bien a modo de exemos los que explican la causa son el lsquoantecedentersquo y la conclusioacuten es el lsquoconsecuentersquordquo CALDEROacuteN 2011 p 75

107

6 INVESTIGACcedilAtildeO SOBRE A ATRIBUICcedilAtildeO DE INTELIGEcircNCIA AOS ANIMAIS

A palavra ldquointeligecircnciardquo eacute atribuiacuteda hoje em dia a uma gama de entes

inclusive em casos curiosos como o de Physarum polycephalum do reino Protista

um protozoaacuterio que segundo Nakagaki e colaboradores489 expande seu plasmoacutedio

em redes tubulares seguindo padrotildees que otimizam o forrageamento Van Loon490

afirma que as plantas apresentam como que de algum modo correspondendo ao

sistema nervoso animal uma rede de ceacutelulas que satildeo as mais complexas dentre os

viventes da qual emergiriam propriedades que diz serem inteligentes e que

implicam algum tipo de memoacuteria e de aprendizagem relacionadas ao modo tambeacutem

otimizado de lidar com situaccedilotildees de estresse revividas seja de natureza climaacutetica

predatoacuteria etc

No entanto somente os entes do reino Animalia apresentam uma estrutura

neural que lhes permite realizar operaccedilotildees cognitivas mais avanccediladas Assim nesta

etapa mencionaremos e descreveremos algumas pesquisas desenvolvidas com

alguns desses entes (ver tabelas 2-7) a fim de que possamos reunir um material que

nos forneccedila subsiacutedio para o cumprimento dos objetivos deste trabalho

Pesquisas como as de Dyer491 as de Menzel e colaboradores492 e as de

Collett e colaboradores493 demonstram que himenoacutepteros podem memorizar uma

miriacuteade de marcos de referecircncia espacial que satildeo calculados de diferentes modos e

servem de orientaccedilatildeo para o retorno agrave colmeia depois de percorridas longas

distacircncias em busca de alimento e tambeacutem posteriormente ao local visitado O

percurso pode ser feito ateacute por atalhos o que parece implicar a tomada de decisatildeo

(ldquodecision-makingrdquo) e inclusive por trilha de feromocircnios Collett e Graham494

demonstram que os indiviacuteduos mais novos podem aprender rotas seguindo outros

coespeciacuteficos

Em uma revisatildeo Brown495 aponta nos peixes essas caracteriacutesticas e relata

tambeacutem que eles apresentam relaccedilotildees de cooperaccedilatildeo entre si (por exemplo na

489

NAKAGAKI et al 2004 490

VAN LOON 2016 491

DYER 1994 492

MENZEL et al 2005 493

COLLETT et al 2013 494

COLLETT GRAHAM 2015 495

BROWN 2015

108

vigilacircncia contra predadores) reconciliam-se usam ferramentas (como pedras para

quebrar conchas de mariscos) etc

Os cefaloacutepodes tambeacutem apresentam caracteriacutesticas cognitivas marcantes

Mather e Dickel496 descrevem em uma revisatildeo a complexa estrutura neural desses

animais e apontam habilidades como a de discriminar ameaccedilas e avaliar e

categorizar os riscos que representam a de modificar e combinar reaccedilotildees para lidar

com predadores a de resolver testes cognitivos passando objetos por furos a

mudanccedila sofisticada de cor na epiderme para camuflagem e como meio de atraccedilatildeo

da fecircmea a transferecircncia de objetos para servirem de abrigo etc que mostram que

tecircm flexibilidade para diversificar accedilotildees que visem a determinado fim o que sugere

que possuam imaginaccedilatildeo capacidade desenvolvida de tomada de decisatildeo e algum

senso de causalidade e prospecccedilatildeo

Fiorito e colaboradores497 realizaram um conhecido experimento em que um

polvo (Octopus vulgaris) abria a tampa de um frasco para capturar uma presa dentro

deste o que aprendeu por tentativa e erro ou por associaccedilotildees de estiacutemulo e

resposta Em outro teste Fiorito e Scotto498 ensinaram alguns espeacutecimes a

escolherem bolas vermelhas como recompensa e a rejeitarem bolas azuis para

natildeo sofrerem puniccedilatildeo enquanto outros espeacutecimes observavam Quando aqueles

aprenderam a escolher a bola vermelha em todas as tentativas esses observadores

foram em seguida tambeacutem testados e escolheram majoritariamente as bolas

vermelhas Os pesquisadores concluiacuteram que os resultados sugerem que esses

indiviacuteduos aprenderam por observaccedilatildeo

Mather e Byrne e colaboradores499 apontam para a lateralizaccedilatildeo assimeacutetrica

nesses animais (movimentam os olhos independentemente um do outro tendo por

preferecircncia a visatildeo monocular) muito rara em invertebrados e comum nos

mamiacuteferos e nas aves

Quanto a estas apresentam desempenho muito proacuteximo ao dos mamiacuteferos

natildeo humanos Os pombos assim como os ratos foram utilizados largamente em

testes cognitivos como nas famosas pesquisas de Skinner Estudos mais recentes

496

MATHER DICKEL 2017 497

FIORITO VON PLANTA SCOTTO 1990 498

FIORITO SCOTTO 1992 499

MATHER 2008 BYRNE et al 2002

109

como os de Bouchard e colaboradores500 exemplificam as habilidades de Columba

livia como o comportamento inovador e a aprendizagem social501

O uso de instrumentos tambeacutem eacute observado em muitas aves como o

tentilhatildeo pica-pau (Camarhynchus pallidus) que utiliza gravetos ou espinhos de

cactos com grande frequecircncia para retirar larvas de troncos por pequenos

orifiacutecios502 Tebbich e Bshary503 testaram espeacutecimes que conseguiram retirar larvas

de tubos com gravetos mesmo quando foi necessaacuterio antes remover outro objeto em

forma de ldquoHrdquo que dificultava a tarefa

Roelofs504 descreve tambeacutem em uma revisatildeo uma gama de outros usos de

instrumentos como o de pedras por certas aves de rapina como o abutre-do-egito

(Neophron percnopterus) com o fim de quebrar ovos e abater presas o de presas

como esponjas para levar aacutegua para a prole observado em melro-preto cervejeiro

(Euphagus cyanocephalus) ou fazendo-o com musgos como a cegonha (Ciconia

ciconia) o de pedaccedilos de patildees insetos gravetos etc lanccedilados na aacutegua para atrair

peixes como presas como o fazem os socoacutes-mirins (Butorides sp) o que tambeacutem jaacute

foi observado em outras espeacutecies como o martim-pescador (Ceryle rudis) o

milhafre-preto (Milvus migrans) e a gaivota-de-asa-escura (Larus fuscus)

Jaacute se viram corviacutedeos realizando todas essas atividades mencionadas com

instrumentos alguns dos quais eles mesmos produzem especialmente a partir do

gecircnero botacircnico Pandanus sp505 e outras mais como a utilizaccedilatildeo de objetos como

armas que lanccedilam ou deixam cair no oponente com o fim de afastaacute-lo seja para

alimentarem-se seja para livrarem-se de ameaccedila ao ninho ou para defenderem-se

a si mesmos etc

E natildeo por nada esta famiacutelia de passeriformes eacute a que mais tem ganho

destaque dentre as aves em testes cognitivos Isto pode exemplificar-se tambeacutem por

estudos como o de Lefebvre e colaboradores506 que mostra reforccedilando a hipoacutetese

500

BOUCHARD et al 2007 501

Aqui especificamente utilizou-se uma caixa de acriacutelico com sementes em seu interior que os animais poderiam acessar bicando empurrando puxando ou levantando tampas e gavetas Para correlacionar agrave aprendizagem social realizou-se outro teste com uma caixa contendo alimento ocultado por um objeto como uma rolha ou um tubo que deveria ser girado e removido para que caiacutesse o alimento impedindo o acesso a um espeacutecime qualquer natildeo treinado que teria entatildeo de observar outro jaacute treinado realizar a tarefa para aprender como acessar o alimento

502 EIBL‐EIBESFELDT 1961

503 TEBBICH BSHARY 2004

504 ROELOFS 2010

505 HUNT GRAY 2003

506 LEFEBVRE et al 2004

110

que leva em conta o quociente de encefalizaccedilatildeo que com seu maior volume

cerebral em relaccedilatildeo ao tamanho corporal seus membros possuem melhores

desempenhos em muitos aspectos como no quesito inovaccedilatildeo (novas formas de

conseguir alimento de fugir etc) A relaccedilatildeo entre o tamanho do seu ceacuterebro e o do

corpo seria proporcional a essa mesma relaccedilatildeo nos chimpanzeacutes507 e ainda que haja

diferenccedilas significativas em suas estruturas cerebrais apresentam grandes

semelhanccedilas cognitivas no acircmbito comportamental508 Estudos como o de

Wimpenny e colaboradores509 aqui com corvos-da-nova-caledocircnia (Corvus

moneduloides) mostram o ecircxito desses animais em experimentos que envolvem o

uso sequencial de instrumentos Aos animais testados oferecia-se um instrumento

mais curto que era como uma vareta com um suporte na ponta com o qual teriam

de alcanccedilar em aparatos de parede incolor com abertura pequena outro objeto

semelhante poreacutem mais comprido para com este ou obterem a recompensa ou

caso natildeo conseguissem pegarem outro ainda mais longo para entatildeo alcanccedilaacute-la Em

uma das etapas diante da impossibilidade de retirar a recompensa com o objeto

inicialmente disponiacutevel e tendo falhando em retirar o objeto mais longo um animal

voltou ao aviaacuterio de onde retornou trazendo um galho que utilizou para retirar

agora com sucesso o objeto mais longo com o qual obteve por fim o alimento

Um desses experimentos este com resoluccedilatildeo de problemas em oito passos

realizado pelo doutor Alex Taylor da Universidade de Auckland na Nova Zelacircndia

ganhou fama internacional por ter sido transmitido pela BBC de Londres510 Nele um

corvo-da-nova-caledocircnia retira inicialmente uma vareta suspensa em uma corda

puxando-a para o galho sobre o qual estaacute e onde ela estaacute pendurada Em seguida

se dirige para uma fila de trecircs gaiolas lado a lado cada uma contendo uma pedra

As trecircs pedras satildeo retiradas pelo corvo com a utilizaccedilatildeo da vareta e entatildeo levadas

ateacute uma caixa de acriacutelico com abertura superior Apoacutes o animal atirar ali a terceira

pedra a base da caixa cede liberando uma vareta maior com a qual o corvo

finalmente puxa a recompensa pela abertura estreita de outra caixa de acriacutelico na

qual se encontra

507

EMERY CLAYTON 2004 508

EMERY 2006 509

WIMPENNY 2009 510

BRITISH BROADCASTING CORPORATION 2014

111

Nos experimentos de Jelbert e colaboradores511 corvos-da-nova-caledocircnia

teriam de soltar objetos dentro de tubos a fim de que o niacutevel da aacutegua dentro destes

subisse e trouxesse a recompensa flutuante Os pesquisadores realizaram os testes

em seis condiccedilotildees a primeira com dois tubos sendo um com aacutegua e outro com

terra a segunda com dois tipos de objetos sendo um que afundava e fazia o niacutevel

da aacutegua subir e outro que simplesmente boiava na terceira havia dentre os objetos

alguns ocos que fariam subir muito pouco o niacutevel da aacutegua na quarta um tubo mais

estreito e outro mais largo com o niacutevel da aacutegua na mesma altura em ambos a

quinta com o tubo mais estreito com a altura do niacutevel da aacutegua bem mais baixa e o

sexto com trecircs tubos sendo que dois interconectados por baixo em forma de ldquoUrdquo e

um isolado Nesses dois o do meio no qual estava a recompensa era mais estreito

de modo que os objetos natildeo poderiam ser soltos dentro dele Salvo no quarto e no

sexto experimento os animais escolheram predominantemente aquilo que lhes

proporcionaria a recompensa ou que lhes proporcionaria a recompensa mais

rapidamente No caso do quarto teste os autores sugerem hipoacuteteses como a de que

os animais teriam dificuldade em ver no volume dos tubos um fator de causalidade

ou a de que teriam mais dificuldades de ver a funcionalidade no substrato (a aacutegua)

enquanto a veriam no instrumento (os objetos) sem descartarem a hipoacutetese de os

animais conseguirem ter mais sucesso em prazo mais longo Em relaccedilatildeo ao sexto

experimento somente quatro indiviacuteduos o realizaram o que os pesquisadores

consideraram ser uma amostragem insuficiente para chegarem a conclusotildees sobre

a espeacutecie mas levando em consideraccedilatildeo que o deslocamento da aacutegua seria uma

caracteriacutestica insuficiente para que inferissem que haveria uma conexatildeo que lhes

estivesse oculta

Tambeacutem Jelbert e colaboradores512 forneceram a primeira evidecircncia de que

os corvos-da-nova-caledocircnia podem manufaturar objetos a partir de um modelo

mental Diante de um aparato em que se tinha de inserir cartotildees de papel de

tamanho especiacutefico para que se recebesse a recompensa havia outras folhas de

papel disponiacuteveis Estas foram recortadas com o bico por alguns dos espeacutecimes

testados que haviam sido previamente treinados para lidar com o aparato mas natildeo

para o recorte

511

JELBERT et al 2014 512

JELBERT et al 2018

112

Em outro estudo a fim de testar se os corviacutedeos poderiam estabelecer

relaccedilotildees analoacutegicas Smirnova e colaboradores513 submeteram duas gralhas-

cinzentas (Corvus cornix) a treinamento com IMTS (ldquoidentity matching-to-samplerdquo) a

partir de placas contendo pares de figuras de ciacuterculo triacircngulo quadrado e cruz em

azul vermelho amarelo ou verde dispostas diagonalmente a fim de verificar

posteriormente se realizariam os testes de RMTS (ldquorelational matching-to-

samplerdquo)514 a partir de placas contendo cada uma um par de ciacuterculos quadrados ou

triacircngulos pretos dispostos lado a lado com tamanhos iguais ou diferentes Os

pesquisadores natildeo treinaram os animais para tamanho mas somente para nuacutemero

de figuras tipo de siacutembolo e cor do siacutembolo Eles apresentaram para as aves uma

bandeja com trecircs placas cada uma contendo duas figuras A do meio situava-se

diretamente sobre a bandeja ao passo que as outras duas repousavam cada uma

sobre um copo sendo que somente aquela que teria alguma correspondecircncia com a

do meio fosse de forma (igual ou diferente) de cor ou no caso do teste RMTS de

tamanho conteria a recompensa As placas eram oferecidas com diferentes

combinaccedilotildees e as aves assim teriam de identificar o tipo de correspondecircncia

apresentada ali antes de efetivar sua escolha Diante do ecircxito das gralhas os

pesquisadores sugeriram que elas teriam reconhecido relaccedilotildees de relaccedilotildees e que

entatildeo haveria raciociacutenio analoacutegico com abstraccedilatildeo nesses animais

Haacute muitas outras pesquisas demonstrando habilidades dos corviacutedeos em

razatildeo de seu sucesso em tantos testes cognitivos como as de Bugnyar e

colaboradores que sugeriram a partir de alguns experimentos como um em que os

espeacutecimes de Corvus corax em um recinto com uma pequena abertura para outro ao

lado que era aberta e fechada onde estaria outro indiviacuteduo guardavam o alimento

mais rapidamente quando pensavam estar sendo vigiados (e mesmo quando a

abertura estava fechada e os pesquisadores colocavam uma gravaccedilatildeo de som de

um coespeciacutefico) sejam caracterizados como apresentando ldquoteoria da menterdquo515 a

de Prior Schwarz e Guumlntuumlrkuumln516 que demonstrou que uma pega-rabilonga (Pica

pica) reconheceu-se em um espelho e a de Swift517 que estudou corviacutedeos

513

SMIRNOVA et al 2015 514

Respectivamente ldquocorrespondecircncia para amostra de identidaderdquo e ldquocorrespondecircncia para amostra relacionalrdquo

515 BUGNYAR et al 2016

516 PRIOR SCHWARZ GUumlNTUumlRKUumlN 2008

517 SWIFT 2015

113

visitando funerais de coespeciacuteficos para investigarem a causa de sua morte e

descobrir se representa ou natildeo perigo para o bando

Ainda dentre as aves os psitaciacutedeos tambeacutem exibem comportamentos

marcantes Roelofs518 aponta o uso de objetos para percussatildeo como exibiccedilatildeo de

gravetos para coccedilarem-se dentre muitas outras habilidades O caso do papagaio-

cinzento (Psittacus erithacus) Alex foi provavelmente o mais notaacutevel Peperberg519

afirma que ele aprendeu a identificar nomes de objetos materiais520 cores e formas

inclusive as categorias em que um item poderia classificar-se dentro desses

atributos aprendeu a diferenccedila entre similaridade e diferenccedila repetia frases

funcionais quando queria obter algo ou ir a algum lugar etc Alex foi ensinado a usar

a palavra ldquonone [nenhum(a)]rdquo quando natildeo houvesse categoria presente e que em

certa ocasiatildeo ele espontaneamente passou a aplicar o termo diante da ausecircncia de

um exemplar qualquer de uma dessas categorias A primeira vez que o fez foi em

relaccedilatildeo a um nuacutemero o trecircs relacionado a algo ausente Sua resposta foi citar o

cinco que tambeacutem se relacionava a uma ausecircncia e persistir ateacute ser indagado e

dizer o ldquononerdquo Peperberg daacute ecircnfase a isto por entender que Alex teria iniciado um

toacutepico Ele natildeo soacute aprendeu mais de cem palavras como aprendeu a criar novas

palavras combinando as que jaacute conhecia como quando disse ldquobanerryrdquo aglutinando

ldquobananardquo com ldquocherry [cereja]rdquo para denominar uma maccedilatilde ou seja compreendeu

que a partir de padrotildees sonoros independentes pode-se criar denominaccedilotildees

concluiu a pesquisadora521

A fim de testar a chamada competecircncia numeacuterica de Alex522 uma bandeja

com trecircs tipos diferentes de alimento (nozes jujubas e doces em forma de coraccedilatildeo)

era-lhe mostrada com estes dispostos sob dois copos de modo que cada tipo ou

natildeo estaria presente ou estaria em certa quantidade em ateacute seis unidades Essas

mesmas quantidades eram sempre que possiacutevel representadas em disposiccedilotildees

distintas distribuiacutedas entre os dois copos Em seguida depois de dois a trecircs

segundos de exibiccedilatildeo alternada cada copo era reposicionado sobre os doces Para

cada rodada o experimentador perguntava a Alex que jaacute natildeo via os alimentos

quantos de determinado tipo estavam na bandeja Esse tipo de teste foi repetido

518

ROELOFS 2010 519

PEPERBERG 2006 520

Aquilo de que algo eacute feito 521

PEPERBERG 2007 522

Id 2006

114

posteriormente com algarismos de numerais araacutebicos sem que Alex que

demonstrou algum ecircxito tivesse sido treinado para essa transposiccedilatildeo a partir de

quantidade de itens e tambeacutem com trecircs amostras de recompensa para soma por

bandeja523 Com itens Alex realizou somas que iam de 1 a 6 e com algarismos

realizou somas que iam de 1 a 5

A competecircncia numeacuterica foi testada em outros animais como os pombos (C

livia) como no estudo de Xia Siemann e Delius524 em que os animais trabalharam

ateacute o nuacutemero seis associando numerosidade de siacutembolos em chaves agrave quantidade

de bicadas nestas (indicada por esses siacutembolos) e no de Scarf e colaboradores525

com pares crescentes de algarismos bicados em uma tela em que se trabalhou ateacute

o nuacutemero nove do que concluiacuteram os autores que a competecircncia numeacuterica dos

pombos equivaleria agrave dos grandes primatas da qual se falaraacute mais adiante

Retornando aos psitaciacutedeos Heaney Gray e Taylor526 testaram papagaios-

da-nova-zelacircndia (Nestor notabilis) para tarefa que soacute se poderia concluir-se se

fosse realizada em colaboraccedilatildeo simultacircnea Consistia em uma bandeja em formato

de ldquoUrdquo contendo uma recompensa de cada lado encaixada entre dois suportes

podendo somente ser movida se duas aves a puxassem ao mesmo tempo ateacute a

gaiola onde se encontravam uma das cordas presas em cada uma das duas

extremidades da bandeja O teste foi realizado com a soltura das aves no local do

experimento simultaneamente e depois com um pequeno intervalo de tempo de

diferenccedila entre uma e outra Segundo os pesquisadores o desempenho dessas

aves foi semelhante ao de chimpanzeacutes e elefantes

Eacute destes uacuteltimos que trataremos agora passando a explorar a classe

Mammalia

61 ELEPHANTIDAE

Classificam-se os indiviacuteduos desta famiacutelia conhecidos atualmente em trecircs

espeacutecies a saber uma de elefante asiaacutetico Elephas maximus e duas de elefantes

africanos sendo uma das savanas Loxodonta africana e outra das florestas

Loxodonta cyclotis

523

PEPERBERG 2012 524

XIA SIEMANN DELIUS 2000 525

SCARF et al 2011 526

HEANEY GRAY TAYLOR 2017

115

O ceacuterebro desses espeacutecimes que pesa cerca de seis quilos527 possui

elevado quociente de relaccedilatildeo entre ceacuterebro e peso corporal com neocoacutertex bastante

desenvolvido e grande densidade neuronal528

Por tratar-se do maior ceacuterebro dentre os animais terrestres citamos

brevemente algumas caracteriacutesticas Shoshani e colaboradores529 apontam

telenceacutefalo com sulcos e giros bem desenvolvidos mostrando um grau de

complexidade intermediaacuterio em relaccedilatildeo aos ceacuterebros dos primatas e dos cetaacuteceos

Dentre as principais diferenccedilas entre o ceacuterebro humano e o do elefante estatildeo o

tamanho e as proporccedilotildees dos lobos a configuraccedilatildeo do sistema ventricular as

diferenccedilas na complexidade e no padratildeo giral tamanho do nervo olfatoacuterio e da

glacircndula pituitaacuteria maior nos elefantes e da pineal maior nos humanos Os

elefantes tecircm um lobo frontal proporcionalmente menor que o dos humanos e lobos

parietal e occipital menos definidos que o destes e iacutensula opercularizada

incompleta No cerebelo observa-se maior tamanho e complexidade giral Segundo

Jacobs e colaboradores530 o ceacuterebro do elefante eacute cerca de trecircs vezes maior que o

dos humanos e sua pesquisa aponta que em comparaccedilatildeo com os neurocircnios

piramidais supragranulares destes os neurocircnios piramidais superficiais daqueles

satildeo maiores menos densos e com padrotildees de ramificaccedilatildeo menos complexos e

exibem semelhante meacutedia de comprimento dendriacutetico basilar com segmentos

dendriacuteticos mais longos e ramificaccedilotildees menos complexas

Os elefantes apresentam um comportamento social natildeo aleatoacuterio e estaacutevel531

com relaccedilotildees duradouras entre indiviacuteduos que se autorreconhecem apresentam

empatia com capacidade de aprendizado e de transmissatildeo de informaccedilotildees e de

habilidades praacuteticas que interagem em geral a partir de comportamentos

convencionais incluindo comportamentos estrateacutegicos532 Sua comunicaccedilatildeo parece

dar-se a ateacute dois quilocircmetros e meio mas a resposta eacute obtida mais comumente em

distacircncias entre um quilocircmetro e um quilocircmetro e meio segundo a pesquisa

envolvendo aparelhagem de aacuteudio com reproduccedilatildeo de infrassons de Mccomb e

colaboradores533 Vivem em bandos de trecircs a cem indiviacuteduos os machos por vezes

527

RENSH 1956 528

LOCKE 2013 529

SHOSHANI et al 2006 530

JACOBS et al 2011 531

WITTEMYER DOUGLAS-HAMILTON GETZ 2005 532

LOCKE 2013 533

MCCOMB et al 2003

116

constituem grupos pequenos de dois a quatro indiviacuteduos ao passo que os grandes

grupos satildeo integrados basicamente por fecircmeas e filhotes liderados por matriarcas

que os conduzem aos locais em que haacute aacutegua e alimento Na criaccedilatildeo dos filhotes em

que satildeo amamentados ateacute aproximadamente o quinto ano de vida suas irmatildes e tias

atuam colaborativamente Ao crescerem as fecircmeas permanecem durante toda a

vida em seu grupo enquanto os machos os abandonam por volta dos doze a quinze

anos de idade em busca de parceiras para o acasalamento534

O trabalho de Wittemyer Douglas-Hamilton e Getz 535 foi o primeiro a apontar

estatisticamente quatro camadas de hierarquia social que expressam diferentes

respostas agraves variaccedilotildees temporais e sazonais nesses grupos com meacutetodos

quantitativos mais rigorosos mas indica outros anteriores sendo ateacute entatildeo mais

recente o de Moss e Poole536 que descreveram ateacute seis camadas que vatildeo desde a

interaccedilatildeo entre matildee e filhote ateacute o niacutevel populacional

Descreveremos algumas de suas habilidades cognitivas comeccedilando por

aquelas observadas em estudos em campo e em seguida abordaremos as que

foram verificadas em experimentos realizados em cativeiro com indiviacuteduos

domesticados Faremos o mesmo posteriormente quando tratarmos de primatas e

de golfinhos mas natildeo com os catildees jaacute que o que nos leva a dar-lhes enfoque eacute a

sua relaccedilatildeo com os humanos

611 Observaccedilotildees de Campo

No que concerne agraves observaccedilotildees de campo Bates e colaboradores537

distinguiram as seguintes interaccedilotildees comportamentais

- coalisatildeo ou seja uniatildeo com um ou mais indiviacuteduos para opor-se a outro ou

a outros tanto com fins de ameaccedila como de defesa de ameaccedila

- proteccedilatildeo seja de indiviacuteduos mais jovens contra predadores contra

indiviacuteduos maiores da proacutepria espeacutecie seja interrompendo brigas entre jovens etc

- conforto por indiviacuteduos adultos de filhotes em situaccedilatildeo de estresse

- cuidado por outros indiviacuteduos adultos com filhote na ausecircncia da matildee (o

que foi verificado somente em alguns casos)

534

IRIE HASEGAWA 2009 535

WITTEMYER DOUGLAS-HAMILTON GETZ 2005 536

MOSS POLE 1983 537

BATES et al 2008

117

- resgate como a conduccedilatildeo de um filhote perdido de volta ao grupo e agrave matildee

- auxiacutelio por exemplo relacionado agrave mobilidade como em caso de

atolamento ou na remoccedilatildeo de objetos estranhos em casos em que a viacutetima se

mostra de algum modo enfraquecida (como se verifica em casos de remoccedilatildeo com a

tromba de um dardo tranquilizante que tenha atingido outro membro do grupo ou

em casos em que a matildee remove resiacuteduos descartados por humanos presos na boca

de um filhote)

Essas interaccedilotildees indicam segundo os pesquisadores a existecircncia de

determinadas percepccedilotildees de natureza empaacutetica como

- a de que os outros geram comportamento espontaneamente ou seja satildeo

agentes animados (por exemplo o reconhecimento da imobilidade de outro indiviacuteduo

como uma anomalia)

- a de que pode haver direcionamento a partir de certos comportamentos para

objetivos especiacuteficos (por exemplo um macho persegue uma fecircmea em periacuteodo

feacutertil para o acasalamento)

- a de que haacute emoccedilotildees diferentes nos outros (por exemplo o apaziguamento

de jovens de humor alterado)

- a de que haacute competecircncias fiacutesicas como vulnerabilidades e habilidades

diferentes nos outros (por exemplo a percepccedilatildeo de que um filhote natildeo consegue

ultrapassar uma cerca)

- a de que haacute percepccedilatildeo particular nos outros (por exemplo o reconhecimento

de que o outro espeacutecime natildeo estaacute percebendo um determinado perigo em

determinada situaccedilatildeo)

- a de que haacute intenccedilotildees e necessidades diferentes nos outros (por exemplo a

percepccedilatildeo de um espeacutecime que tenta livrar-se do atoleiro)

- e a de que haacute crenccedilas e entendimentos diferentes nos outros (por exemplo

quando um espeacutecime prevecirc que o filhote de outro poderaacute ingerir algum alimento

venenoso e entatildeo interfere para salvar-lhe)

Plotnik e de Waal538 reforccedilaram ainda os estudos sobre o consolo apoacutes um

episoacutedio de sofrimento constatando que aleacutem do contato fiacutesico natildeo solicitado como

a tromba de uma fecircmea adulta na boca de um filhote aflito os elefantes tambeacutem

usam vocalizaccedilatildeo para o conforto reforccedilando a hipoacutetese da empatia do interesse

538

PLOTNIK DE WAAL 2014

118

no estado emocional de outro membro da espeacutecie em quem os animais identificam o

papel de viacutetima que passa por um momento de anguacutestia Essas respostas

emocionais podem provocar contaacutegio emocional fazendo com que muitos outros

indiviacuteduos exibam o mesmo estado emocional do primeiro e pode ateacute ser de

natureza universal ou seja causar a mesma reaccedilatildeo emocional em todos os demais

indiviacuteduos presentes do grupo Essa interaccedilatildeo de conforto de indiviacuteduos aflitos

reforccedila a comunicaccedilatildeo desses animais por meios sonoros e taacuteteis

Os estudos de populaccedilotildees realizados por McComb e colaboradores de 2007

a 2009539 forneceram evidecircncias de que diante de desafios enfrentados pelo grupo

de Loxodonta africana como a presenccedila de predadores satildeo as matriarcas mais

velhas que tomam as melhores decisotildees para o grupo Os pesquisadores

perceberam que os elefantes distinguem niacuteveis de ameaccedila inclusive dentro de uma

mesma classe de predadores como grupos eacutetnicos humanos a partir de sinais

olfativos e visuais

Esses resultados satildeo corroborados com o estudo de Soltis e colaboradores540

de indiviacuteduos da espeacutecie Loxodonta africana sob ameaccedila de abelhas e sob ameaccedila

de humanos no qual se observou que os elefantes estabelecem distinccedilotildees entre os

dois tipos de ameaccedila e manifestam comportamentos especiacuteficos para cada um dos

dois casos Esses comportamentos incluem a emissatildeo de sons de alerta aos demais

membros do grupo diante do que os pesquisadores concluiacuteram que os animais

emitem sons segundo niacuteveis de urgecircncia conforme a natureza das ameaccedilas

McComb e colaboradores541 presenciaram elefantes reconhecendo cracircnios de

membros de sua espeacutecie em meio aos de outras espeacutecies A atenccedilatildeo dos animais

foi atraiacuteda tambeacutem pelos marfins que eles investigaram com a tromba e uma das

patas

Jaacute Douglas-Hamilton e colaboradores542 registraram os sete dias que se

seguiram agrave morte de uma matriarca observando o interesse no cadaacutever tanto por

parte de membros de outros grupos como por parte dos membros do grupo dela

cujas visitas em frequecircncia duraccedilatildeo e nuacutemero de indiviacuteduos foram gradualmente

diminuindo durante o periacuteodo de observaccedilatildeo dos pesquisadores

539

MCCOMB et al 2011 540

SOLTIS et al 2014 541

MCCOMB BAKER MOSS 2006 542

DOUGLAS-HAMILTON et al 2006

119

612 Estudos experimentais

Smet e colaboradores543 verificaram em elefantes africanos a habilidade de

seguir gestos de indicaccedilatildeo humanos alguns inclusive sutis Eles testaram onze

espeacutecimes criados em cativeiro que falharam somente nos testes que envolviam

exclusivamente o olhar do experimentador para certa direccedilatildeo para encontrar

alimentos previamente escondidos E mesmo quando natildeo havia nenhum gesto os

animais guiaram-se pela posiccedilatildeo do corpo humano que era no entanto

desconsiderada quando havia algum gesto Acreditam os autores da pesquisa que

nenhum desses indiviacuteduos havia sido treinado anteriormente e que natildeo teria havido

oportunidades extensivas para tal aprendizado

Esses animais no entanto apresentam uma consideraacutevel capacidade de

retenccedilatildeo de memoacuteria espaccedilo-temporal tal como demonstrado por experimentos

como os de discriminaccedilatildeo entre luz e escuridatildeo realizados por Markowitz e

colaboradores544 com a utilizaccedilatildeo de um aparato de madeira compensada de pouco

mais de dois metros de altura com um painel em que espeacutecimes de Elephas

maximus acionavam um interruptor Esses animais jaacute tinham passado pelo mesmo

experimento oito anos antes e logo se recordaram do que teriam de fazer para obter

a recompensa

Irie-Sujimoto545 sugeriu que os elefantes possuem um conhecimento

conceitual sobre a relaccedilatildeo entre meio e fim com base em experimento de Piaget

que apontou a presenccedila dessa habilidade em crianccedilas de onze meses de idade

Essa habilidade indica a possibilidade de definiccedilatildeo de objetivos e um

comportamento direcionado para a tentativa de alcanccedilaacute-los Nesse estudo se

forneceu duas taacutebuas a dois elefantes asiaacuteticos sob quatro condiccedilotildees diferentes Na

primeira uma delas serviu como suporte para que o alimento fosse trazido ao seu

alcance enquanto a outra estava vazia e na segunda havia uma com alimento e

outra com o alimento colocado fora dela ao lado na terceira alteraram-se as cores e

as dimensotildees das taacutebuas repetindo a primeira condiccedilatildeo e na quarta as duas taacutebuas

continham alimento sendo que uma delas era partida e colocou-se o alimento na

parte que natildeo podia ser puxada Um dos animais realizou com relativo sucesso

todos os experimentos Diante das duas primeiras condiccedilotildees ambos aprenderam

543

SMET et al 2013 544

MARKOWITZ et al 1975 545

IRIE-SUJIMOTO 2008

120

que se puxassem a bandeja certa obteriam o alimento na terceira condiccedilatildeo um

animal ficou desmotivado e no outro se verificou a transferecircncia do aprendizado

para as novas condiccedilotildees por fazer distinccedilatildeo entre as caracteriacutesticas relevantes e as

irrelevantes para o problema e mediante a quarta condiccedilatildeo verificou-se que o

animal compreendeu raacutepida e corretamente a relaccedilatildeo espacial entre o alimento e a

bandeja

Com o fim de estudar a capacidade de cooperaccedilatildeo Plotnik e colaboradores546

realizaram um teste semelhante ao descrito anteriormente com psitaciacutedeos no qual

dois elefantes teriam de puxar cada um uma de duas cordas amarradas a uma

taacutebua contendo alimento Somente se os dois puxassem juntos e ao mesmo tempo

obteriam a recompensa O experimento foi realizado com sucesso com o

desempenho melhorando apoacutes o primeiro dia e sugeriu haver reconhecimento da

necessidade de um parceiro para o teste onde inclusive um aguardava a chegada

do outro para realizaccedilatildeo da tarefa quando a chegada deste era intencionalmente

retardada pelos experimentadores

Em outro estudo Foerder e colaboradores547 observaram um elefante asiaacutetico

macho utilizar um cubo para erguer-se nas patas dianteiras e alcanccedilar um ramo de

bambu com frutos preso em uma corda suspensa Quando a localizaccedilatildeo do alimento

foi modificada o animal espontaneamente empurrou o cubo ateacute o local ergueu-se

sobre ele e alcanccedilou o alimento Apoacutes a retirada do cubo do local pelos

pesquisadores o espeacutecime primeiramente tentou substituiacute-lo por uma bola e em

seguida empilhou objetos como taacutebuas para tentar sem sucesso nesta etapa

alcanccedilar seu objetivo Os testes demonstrarama capacidade nestes espeacutecimes de

resolver problemas com uso de instrumentos de modo suacutebito e perspicaz segundo

os pesquisadores natildeo precedido de tentativa e erro

Ainda em meados do uacuteltimo seacuteculo Rensch548 realizou estudos com pares de

padrotildees de figuras em cartas em que estas eram memorizadas por um elefante

indiano jovem e depois reapresentadas aleatoriamente e retiradas por este com a

tromba recebendo entatildeo a recompensa mediante o acerto O animal obteve

resultados exitosos e um ano depois ele demonstrou ter retido quase toda a

546

PLOTNIK et al 2011 547

FOERDER et al 2011 548

RENSCH 1956

121

informaccedilatildeo um tempo consideraacutevel em comparaccedilatildeo com a capacidade de

memorizaccedilatildeo de animais de porte menor

Rensh549 seguiu realizando experimentos com padrotildees de imagens e

observou elefantes indianos com idade entre vinte e sessenta anos reagindo a vinte

e um a vinte e quatro comandos verbais diferentes memorizando o sentido de vinte

pares de estiacutemulo ndash Lewis550 poreacutem afirmou que um elefante bem treinado chega a

reconhecer cerca de cem comandos entre palavras e frases Na tentativa de

identificar alguma capacidade de abstraccedilatildeo as cartas foram separadas de sua dupla

de padratildeo correspondente e o pesquisador verificou que uma fecircmea reconheceu a

caracteriacutestica essencial do padratildeo em questatildeo Ela parece ter desenvolvido a ideia

de cruz a de cruzamento de duas barras pretas e em um experimento onde isto

ficou mais claro o par de imagens original apresentava o padratildeo de listras uma

carta com listras com dois centiacutemetros de largura e outra com listras com quatro

centiacutemetros de largura A primeira carta foi apontada como positiva Quando as

larguras foram alteradas para um centiacutemetro e meio e dois centiacutemetros a elefanta

escolheu a primeira com listras mais estreitas mostrando que ela percebeu que a

escolha correta era a de um padratildeo de listras mais estreitas As cartas originais

foram reapresentadas e ela mais uma vez escolheu corretamente

Para a compreensatildeo de nuacutemeros o pesquisador usou um par de cartas em

que uma continha trecircs pontos (ciacuterculos pretos) e a outra quatro Positivou-se a carta

de trecircs pontos e entatildeo foram apresentadas configuraccedilotildees diferentes de trecircs pontos

em linha horizontal em linha vertical como triacircngulo equilaacutetero e outros formatos

em seguida fez-se o mesmo com quatro pontos O ecircxito relacionado a esse

vocabulaacuterio de comandos foi verificado um ano depois sem que neste periacuteodo o

animal tivesse tido contato com as cartas

Um colaborador de Rensch tambeacutem desenvolveu tarefa similar com sons em

que aos tons positivos o animal respondia batendo com a tromba na tampa de uma

caixa de distribuiccedilatildeo de um aparelho que o recompensava com alimento Ele

reconheceu doze tons em seis pares de sons Em seguida repetiram o experimento

com melodias e a elefanta reconheceu todas as que lhe foram apresentadas

mesmo depois de terem alterados o ritmo o tempo a intensidade a frequecircncia e os

instrumentos dos mais variados timbres

549

RENSCH 1957 550

LEWIS 1971 apud HART 1994

122

Experimentos semelhantes com pares de estiacutemulos foram realizados por

colaboradores de Rensh com cavalo (Equus ferus caballus) zebra (sem especificar

se se tratava de Equus grevyi de E quagga ou de E zebra) e asno (Equus asinus)

Enquanto os dois uacuteltimos natildeo conseguiram ter o mesmo ecircxito do elefante o cavalo

obteve sucesso no reconhecimento de todos os pares apresentados o que reforccedilou

a posiccedilatildeo de Rensch a respeito da relaccedilatildeo entre capacidade de aprendizagem e

tamanho do ceacuterebro

Os elefantes satildeo tambeacutem capazes de comparar quantidades Irie-Sujimoto e

colaboradores551 forneceram cestas com alimento tanto simultaneamente como

sucessivamente e observaram a preferecircncia de elefantes asiaacuteticos pelas cestas

mais cheias sem que fossem anteriormente submetidos a treinamento Este

resultado foi corroborado por Perdue e colaboradores552 que apontaram algumas

questotildees metodoloacutegicas que poderiam ter comprometido o resultado anterior como

o nuacutemero baixo de testes e repetiram o experimento tambeacutem exitosamente com

maior rigor

Plotnik e colaboradores553 verificaram que espeacutecimes de E maximus podem

reconhecer-se a si mesmos no espelho Os pesquisadores imprimiram uma marca

visiacutevel no lado direito e outra natildeo visiacutevel mas que podia ser percebida por odor ou

tato do lado esquerdo da testa de trecircs animais alternadamente e um deles tocou

repetidas vezes a marca visiacutevel em sua testa diante do espelho de dois metros

empregado no experimento frequentemente inspecionado pelos animais

Em um teste que segundo Dale e Plotnik554 se deve somar ao anterior de

autorreconhecimento foi analisado o comportamento de elefantes asiaacuteticos sobre

um tapete ao qual estava amarrada uma corda contendo um bastatildeo na outra

extremidade que deveria ser entregue ao treinador Os animais reconheceram que

seus corpos sobre o tapete eram um obstaacuteculo para a tarefa e se retiraram do

tapete sugerindo aos autores que os membros da espeacutecie possuem consciecircncia

corporal (body awareness)

551

IRIE-SUJIMOTO et al 2009 552

PERDUE et al 2012 553

PLOTNIK et al 2006 554

DALE PLOTNIK 2017

123

62 CARNIVORA ndash CANIS LUPUS FAMILIARIS

O catildeo desperta aqui interesse especial em razatildeo de seu longo e peculiar

conviacutevio com os humanos tendo sido possivelmente o primeiro animal a ser

domesticado555 processo que pode ter ocorrido em algum periacuteodo entre vinte mil e

quarenta mil anos atraacutes556

As atuais pesquisas parecem apontar para uma tripla origem do processo de

domesticaccedilatildeo no final do pleistoceno superior557 na Europa558 no sul do leste

asiaacutetico559 e na Aacutesia Central560

Pesquisas como a de Belyaev561 esta envolvendo mais de quarenta geraccedilotildees

de uma variaccedilatildeo de Vulpes vulpes (raposa vermelha) de coloraccedilatildeo prateada jaacute

demonstraram que o processo de domesticaccedilatildeo resulta no surgimento de alteraccedilotildees

bastante significativas nas geraccedilotildees seguintes O pesquisador e sua equipe

verificaram a ocorrecircncia de alteraccedilotildees reprodutivas decorrente da seleccedilatildeo que

realizaram como a ativaccedilatildeo fora de eacutepoca da funccedilatildeo reprodutiva em fecircmeas

alteraccedilotildees fisioloacutegicas como o prolongamento do periacuteodo de reproduccedilatildeo alteraccedilotildees

morfoloacutegicas como o surgimento de manchas marrons em torno das orelhas e do

pescoccedilo como o surgimento de orelhas caiacutedas tal como a de filhotes de catildees de

cauda enrolada e mudanccedilas na cor da pelagem principalmente despigmentaccedilatildeo

em algumas regiotildees estas uacuteltimas tambeacutem caracteriacutestica de algumas raccedilas de catildees

e alteraccedilotildees comportamentais como o iniacutecio tardio da expressatildeo do medo diante de

novidades (em razatildeo de mudanccedilas no niacutevel plasmaacutetico de corticosteroides que

atuam na adaptaccedilatildeo dos animais ao estresse) relacionado agrave seleccedilatildeo de indiviacuteduos

que exibiram maior mansidatildeo aleacutem de proximidade com humanos que inclui a

busca por contato e resposta a apelidos ndash com elevaccedilatildeo dos niacuteveis de serotonina e

alteraccedilotildees no sistema hipotalacircmico-hipofisaacuterio-adrenal e nos niacuteveis de hormocircnios

esteroides sexuais562 Hare563 menciona uma reduccedilatildeo de ossos e dentes da cauda

555

LARSON et al 2012 556

BOTIGUEacute et al 2017 557

LAURENT 2016 558

THALMANN et al 2013 559

WANG et al 2015 SAVOLAINEN 2002 560

SHANNON 2015 561

BELYAEV 1979 562

TRUT 1999 563

HARE 2004

124

em algumas espeacutecies reduccedilatildeo de cerca de vinte por cento no tamanho do ceacuterebro e

reduccedilatildeo do medo como resposta a novidades

Hare e Tomasello564 desenvolveram estudos e apontam outros que sugerem

o desenvolvimento de uma especializaccedilatildeo cognitiva nos catildees durante o processo de

domesticaccedilatildeo e tambeacutem resultante deste Corrobora isto o estudo de Kaminski e

colaboradores565 que esconderam dois conjuntos de cinco objetos para a cadela

Betsy e dois conjuntos de seis objetos para o catildeo Rico ambos da raccedila border collie

sendo um conjunto em cada um de dois recintos e entatildeo pediram para os animais

recuperarem-nos a fim de adquirirem a recompensa Mediante o sucesso da tarefa

concluiacuteram que os catildees integram a memoacuteria relacionada agrave identidade (ldquoo que eacuterdquo)

com a relacionada agrave localizaccedilatildeo (ldquoonde estaacuterdquo)

Uma consequecircncia da especializaccedilatildeo cognitiva pelo processo de

domesticaccedilatildeo eacute fornecida por Hare566 que comenta casos de catildees que se natildeo

mantiverem contato visual frequente com humanos manifestam sintomas de

ansiedade e depressatildeo Isto em animais que vivem em contexto de domesticaccedilatildeo

uma vez que existem catildees que natildeo satildeo domesticados nem satildeo sociaacuteveis em

relaccedilatildeo aos humanos567

Os catildees tecircm pois aleacutem da relaccedilatildeo com os membros de sua espeacutecie ndash e

nesse sentido verificou-se em experimento que eles usam o comportamento de

outro indiviacuteduo para prever o momento em que uma tarefa deve ser cumprida por

exemplo para obtenccedilatildeo de alimento568 ndash um relacionamento uacutenico com os entes

humanos em todo o reino animal com habilidades especiais na compreensatildeo dos

comportamentos humanos relacionados agrave comunicaccedilatildeo Ele desenvolveu seu

processo de aprendizado de modo a agir muitas vezes interpretando os sinais do

homem como linguagem oral e corporal expressotildees faciais estados emocionais

haacutebitos Reconhecem intenccedilotildees mudanccedilas de humor tom de voz569

Esses animais mostram-se assim mais aptos agrave resoluccedilatildeo de certos

problemas envolvendo a comunicaccedilatildeo com humanos do que outros animais como

os lobos e ateacute mesmo os primatas Tambeacutem a sua capacidade de improviso supera

564

HARE TOMASELLO 2006 565

KAMINSKI et al 2008 566

HARE 2004 567

UDELL et al 2014 Os pesquisadores elencam aleacutem desta modalidade ndash ou seja natildeo domesticados e natildeo sociaacuteveis ndash outras trecircs a saber catildees domesticados e sociaacuteveis (mansos) domesticados e natildeo sociaacuteveis e natildeo domesticados e sociaacuteveis

568 OSTOJIĆ CLAYTON 2014

569 KULKEKOVA 2006 HARE TOMASELLO 2005

125

a dos demais em tais testes Coren570 relata um caso parecido com o que aqui se

citou anteriormente narrado por Darwin Um golden retrivier chamado Buck havia

sido treinado para pegar objetos indicados por seu dono Um dia apoacutes a caccedila este

ia esquecendo um boneacute de basebol e um chapeacuteu de cauboacutei e entatildeo pediu para

Buck pegaacute-los O catildeo tentou com a boca pegar um e depois o outro sem sucesso

Parou entatildeo por alguns instantes e em seguida pegou o boneacute e o largou dentro do

chapeacuteu ajustando-o com uma das patas dianteiras agitando em seguida a cauda e

finalmente levando ambos para o dono

Retomando a capacidade de comunicaccedilatildeo esta foi verificada em pesquisas

como a de Hare e Tomasello571 que testaram a resposta a sinais humanos em catildees

e em primatas e concluiacuteram que aqueles conseguem identificar melhor do que estes

o comportamento humano relacionado agrave comunicaccedilatildeo e de maneiras bem mais

proacuteximas a de crianccedilas humanas Algo que o exemplifica eacute o fato de os catildees

responderem melhor do que os chimpanzeacutes agrave abertura dos olhos humanos (por

exemplo evitam comida proibida se um humano estiver olhando)

Nesse sentido Call e colaboradores572 constataram que os catildees reagem ateacute

mesmo de acordo com o estado de atenccedilatildeo dos humanos Num experimento em

que o alimento era colocado no meio da sala juntamente com o comando para que

natildeo comesse em cada etapa o experimentador se colocou de uma destas maneiras

sentado e vigiando sentado e de olhos fechados sentado e distraiacutedo com um objeto

em matildeos sentado de costas ausente da sala Os animais responderam conforme

cada situaccedilatildeo sentando-se e permanecendo assim por mais tempo e investigando

menos a comida aproximando-se dela de um modo mais indireto quando o

experimentador estava vigiando o alimento do que quando natildeo estava

Hare573 e colaboradores estudaram quatro espeacutecimes de catildees para o

reconhecimento de tipos de pista Os animais foram submetidos a testes a fim de

que encontrassem comida em um de dois recipientes estando o outro vazio As

pistas eram o apontar do dedo um marcador de madeira preto e branco no topo do

recipiente com a comida mais o olhar e o agitar de um dos recipientes sem barulho

por conter o alimento e entatildeo o do outro sem barulho O teste apontou o

570

COREN 2006 p 92-93 571

HARE TOMASELLO 2006 572

CALL et al 2003 573

HARE et al 2010

126

entendimento dos animais inclusive jovens de seis semanas de que as pistas

possuiacuteam caraacuteter comunicativo

Em outro experimento desenvolvido por Grassmann Kaminski e Tomasello574

envolvendo objetos familiares e outros ateacute entatildeo desconhecidos que deveriam ser

pegos segundo o comando de voz mais ou menos intenso bem como o gesto de

apontar os mesmos catildees supramencionados Betsy e Rico demonstraram assumir

a correferecircncia entre os dois tipos de comandos Ao buscarem um objeto ateacute entatildeo

desconhecido um dos catildees alcanccedilou o alvo por exclusatildeo Em uma das etapas

tinham de decidir em situaccedilatildeo conflituosa na qual o experimentador apontava para

um dos objetos e falava o nome de outro Os animais visitavam rapidamente o

objeto apontado mas pegavam o objeto nomeado demonstrando que o

apontamento tem relevacircncia para o processo de encontrar o que se pretende

A fim de investigarem a noccedilatildeo de causalidade Muumlller e colaboradores575

realizaram testes nos quais os cachorros deviam puxar um entre dois suportes para

serem recompensados de modo parecido com os realizados com elefantes que

mencionamos acima Dentre as condiccedilotildees apresentadas em uma havia um suporte

com comida em cima e outro com comida ao lado fora dele Em outra um suporte

tinha a comida mais afastada de si e outro a tinha tambeacutem fora mas encostada

nele Em uma nova condiccedilatildeo o alimento foi colocado em uma cavidade no extremo

de um dos suportes (fora da superfiacutecie de modo que natildeo poderia ser puxado) e na

outra o alimento estava sobre o suporte proacuteximo da sua extremidade e na uacuteltima

condiccedilatildeo havia um intervalo entre a parte de um dos suportes que seria puxada e a

outra destacada onde estava o alimento e no outro suporte o alimento situava-se

antes do intervalo de modo que poderia ser puxado Na terceira condiccedilatildeo os

animais comeccedilaram mal com exceccedilatildeo de trecircs indiviacuteduos mas melhoraram o

desempenho gradualmente e nesta uacuteltima os animais obtiveram pouco ecircxito Nas

duas primeiras condiccedilotildees os animais foram bem sucedidos no iniacutecio e na primeira

a maioria dos animais obteve ecircxito em oito a dez tentativas mas alguns

conseguiram ateacute mesmo na terceira tentativa no entanto com algum tempo o

rendimento passou a cair

Os pesquisadores observando que quando alguma pista anterior natildeo estava

mais disponiacutevel alguns dos catildees encontravam rapidamente novas pistas

574

GRASSMANN KAMINSKI TOMASELLO 2012 575

MUumlLLER et al 2014

127

concluiacuteram que esses animais utilizam sugestotildees perceptivas para a resoluccedilatildeo

desses problemas mas sem que a compreensatildeo deles decirc sinal de alcanccedilar a

relaccedilatildeo causal com os fundamentos fiacutesicos dessa tarefa

Em outro conjunto de experimentos Johnston e colaboradores576 observaram

que espeacutecimes de C lupus familiares e Canis dingo filtram gradualmente as accedilotildees

irrelevantes e natildeo demonstram padrotildees relevantes de sobreimitaccedilatildeo577 Uma das

tarefas realizadas nesse conjunto de experimentos consistiu inicialmente em fazer

com que os catildees observassem para que imitassem em seguida o experimentador

aproximar-se de uma caixa incolor mover uma alavanca em uma das laterais sem

funcionalidade de um lado para o outro entatildeo abrir a tampa na parte superior pegar

a comida mostraacute-la e inseri-la novamente repetindo o ato posteriormente com uma

caixa opaca Os animais foram gradualmente deixando de sondar a alavanca e

passaram a ir diretamente para a tampa da caixa

Alguns testes simples como o de Petrazzini e Wynne578 em que forneceram

aos catildees a opccedilatildeo por um de dois pratos que podiam variar entre nuacutemero e massa de

alimento mostraram que eles podem discriminar quantidades Outros como o de

West e Young579 que analisaram o comportamento de espeacutecimes diante de soma

simples de um mais um em que se forneciam resultados corretos e errados

sugerem que seriam capazes de contar

Haacute algumas habilidades em que os catildees ganham maior destaque Assim

como as crianccedilas eles aprendem naturalmente componentes da linguagem humana

de qualquer regiatildeo sem precisar de treinamento mas simplesmente ouvindo

palavras e frases e observando o comportamento humano na expressatildeo linguiacutestica

Eles tambeacutem aprendem um maior nuacutemero de palavras na infacircncia e reconhecem

variaccedilotildees de significados no volume e na entonaccedilatildeo do som emitido por

humanos580 mostrando preferecircncia em testes na entonaccedilatildeo que expressa

positividade em relaccedilatildeo agraves que expressam neutralidade ou negatividade em

comandos dados simultaneamente581

576

JOHNSTON et al 2017 577

Em inglecircs ldquooverimitationrdquo Significa a imitaccedilatildeo de accedilotildees relevantes somada agrave de accedilotildees irrelevantes para a execuccedilatildeo de determinada tarefa

578 PETRAZZINI WYNNE 2016

579 WEST YOUNG 2002

580 MIRBAZEL ARJMANDI 2018

581 COLBERT-WHITE et al 2018

128

O catildeo Rico comeccedilou a associar palavras a objetos com dez meses de idade

Segundo Kaminski e colaboradores582 ele passou a conhecer mais de duzentos

objetos pelo nome e os pesquisadores demonstraram que ele fazia novas

associaccedilotildees tambeacutem por exclusatildeo em tarefas em que um objeto desconhecido era

posto entre objetos conhecidos e ao catildeo era dada a ordem para pegaacute-lo Rico foi

superado pela cadela Chaser que com oito semanas de vida comeccedilou a treinar

fazendo-o diariamente por quatro a cinco horas Depois de trecircs anos de treinamento

ela jaacute conseguia reconhecer pelo nome (simples ou duplo) nada menos que 1022

objetos583

Pilley584 testou-a para reconhecimento semacircntico e sintaacutexico de frases com

trecircs elementos que envolviam um verbo e um objeto associado a uma preposiccedilatildeo

ou585 um objeto direto Para isto realizou-se trecircs experimentos No primeiro deles

foram utilizados muacuteltiplos objetos que eram familiares a Chaser ou seja cujo nome

ela conhecia O comando consistia simplesmente em pegar um dos objetos e levar

ateacute outro objeto determinado por vezes invertendo tambeacutem o papel dos dois

envolvidos em certa etapa Os outros dois experimentos seguiram o mesmo meacutetodo

sendo que no segundo os objetos eram considerados novos ou seja ainda natildeo

haviam sido testados no treinamento para estes testes e no terceiro os objetos

foram dispostos em dois recintos diferentes da casa onde ocorreram os testes de

modo que Chaser natildeo os via no momento em que recebia o comando Pilley

concluiu que ela entendeu o significado das sentenccedilas demonstrando compreensatildeo

sintaacutexica e semacircntica

Feuerbacher e Rosales-Ruiz586 realizaram mais recentemente experimentos

com um pastor alematildeo que foi treinado para distinguir entre categorias de objetos

uns considerados como ldquobrinquedosrdquo e outros como ldquonatildeo brinquedosrdquo587 Disto

sugeriram que os catildees poderiam formar conceitos

582

KAMINSKI et al 2004 583

PILLEY REID 2011 584

PILLEY 2013 585

Em inglecircs ldquoprepositional objectrdquo que natildeo implica necessariamente um objeto indireto 586

FEUERBACHER ROSALES-RUIZ 2017 587

Respectivamente ldquotoysrdquo e ldquonon-toysrdquo

129

63 CETACEAE ndash DELPHINIDAE

Em muitas espeacutecies da ordem Cetacea descobriu-se a presenccedila de neurocircnios

Von Economo que parecem estar ligados agrave consciecircncia (awareness) social e agraves

intuiccedilotildees raacutepidas em mudanccedilas de contexto como a que se tem sobre algueacutem com

que se acaba de deparar das quais seguem os julgamentos mais detalhados588

Aleacutem dos cetaacuteceos essas ceacutelulas foram verificadas apenas em grandes macacos

elefantes e humanos589

A ordem apresenta os indiviacuteduos com o maior quociente de encefalizaccedilatildeo

entre os animais natildeo humanos e dentre eles estatildeo os viventes de maior ceacuterebro

nenhum deles superando o dos cachalotes (Physeter macrocephalus) cujo peso

meacutedio eacute de 78 kg590 mas podendo chegar a cerca de 9 kg591 Esses animais

poreacutem natildeo figuram entre os representantes com maior quociente de encefalizaccedilatildeo

sendo superados por exemplo pelos membros das famiacutelias Phocoenidae e

Delphinidae agrave qual pertencem os golfinhos a quem daremos aqui destaque em

razatildeo da extensa gama de estudos realizados ndash em contraste com o nuacutemero

escasso de estudos relacionados agraves demais famiacutelias ndash envolvendo o gecircnero

Tursiops sp e em especial a espeacutecie Tursiops truncatus ou golfinho-nariz-de-

garrafa ou ainda golfinho-roaz

Jacobs Morgane e McFarland592 publicaram estudos anatocircmicos detalhados

do ceacuterebro desta espeacutecie descrevendo caracteriacutesticas como o neocoacutertex mais

expandido em detrimento de um arquicoacutertex mais reduzido como nos primatas e

com o prosenceacutefalo mais encurtado no eixo rostro-caudal em relaccedilatildeo aos dos

mamiacuteferos terrestres e flexuras mesencefaacutelica mais pronunciada o que nestes

verifica-se somente no estado embrionaacuterio Os pesquisadores chamam a atenccedilatildeo

para a orientaccedilatildeo do eixo orbito-occipital dos hemisfeacuterios tendo como referecircncia o

eixo do corpo que devido ao prosenceacutefalo aparecem como se tivessem sofrido certo

giro no eixo transversal o que causa confusatildeo no emprego de termos como

ldquoanteriorrdquo ldquooccipitalrdquo e ldquoventralrdquo para a descriccedilatildeo geral das aacutereas quando se tem por

referecircncia o ceacuterebro dos mamiacuteferos terrestres Eles exemplificam citando formaccedilotildees

588

ALLMAN et al 2005 589

BUTTI et al 2009 HAKEEM et al 2009 590

WHITEHEAD 2009 591

ROTH DICKE 2005 592

Cf JACOBS MCFARLAND MORGANE 1979 para rinenceacutefalo MORGANE et al 1980 para telenceacutefalo

130

ventrais e dorsais no ceacuterebro do golfinho com sua grande fenda entre os

hemisfeacuterios que seriam consideradas respectivamente ldquofrontaisrdquo e ldquoanterioresrdquo e

ldquoposteriores ou ldquooccipitaisrdquo em mamiacuteferos terrestres

O gecircnero Tursiops sp em particular apresenta algumas modalidades de

interaccedilotildees com os humanos sendo talvez a mais popular a sua utilizaccedilatildeo em

exibiccedilotildees em estaacutedios aquaacuteticos No entanto elas natildeo se reduzem ao conviacutevio em

cativeiro

631 Observaccedilotildees de campo

Os golfinhos tecircm colaborado com humanos na pesca segundo Busnel593

desde tempos imemoriais O pesquisador acompanhou pescadores na Mauritacircnia

dando batidas com pedaccedilos de pau na aacutegua ao que se seguiu a aproximaccedilatildeo de

um grande cardume de peixe perseguido por golfinhos que encheram assim as

redes dos pescadores Neil594 fornece alguns relatos de pesca colaborativa

semelhantes com ecircnfase naqueles recolhidos na Austraacutelia em que os humanos

usam desde batidas de lanccedilas na aacutegua a assobios no intuito de atrair a atenccedilatildeo dos

golfinhos para que tragam peixes

No Brasil estudos como os de Simotildees-Lopes595 e os de Zappes596 descrevem

esse tipo de interaccedilatildeo mas apontam para uma incerteza em relaccedilatildeo a se esses

animais teriam realmente alguma intenccedilatildeo de colaborar com os humanos

mencionando inclusive a existecircncia de botos que seriam bons ou prejudiciais para a

pescaria

Bearzi e colaboradores597 realizaram uma revisatildeo relacionada agraves interaccedilotildees

comportamentais de cetaacuteceos com coespeciacuteficos mortos verificando que esses

animais podem demorar a reconhecer o estado de morte e apoacutes isto dar-se podem

exibir manifestaccedilotildees de estresse e apego ao cadaacutever demorando a demonstrar

desinteresse por este tendo sido observados casos de matildees que carregam por

longo periacuteodo a carcaccedila de um filhote sem vida Essas e outras caracteriacutesticas

593

BUSNEL 1973 594

NEIL 2002 595

SIMOtildeES-LOPES 1991 596

ZAPPES 2011 ZAPPES et al 2011 597

BEARZI et al 2018

131

representam as muitas similaridades comportamentais com os primatas nesse tipo

de contexto598

Os golfinhos tambeacutem fazem uso de instrumentos Eacute o que demonstram

estudos como os de Kruumltzen e colaboradores e o de Kops e colaboradores599 que

fornecem um exemplo envolvendo certos grupos de Tursiops sp que utilizam

poriacuteferos como proteccedilatildeo contra ferimentos por corais inclusive em nichos ainda natildeo

explorados durante o forrageamento que se torna portanto mais frequente Os

pesquisadores identificaram ali evidecircncias de que este comportamento seria

transmitido culturalmente inclusive da matildee para a prole

632 Estudos experimentais

Louis Herman600 revisou experimentos relacionados a atividades cognitivas de

T truncatus a fim de apontar a existecircncia de inteligecircncia e consciecircncia nestes

animais

Ele verificou que no que toca agrave percepccedilatildeo dos gestos humanos601 os

golfinhos apresentaram grande habilidade em seguir o apontar do dedo e chegam

ateacute a seguir espontaneamente indicaccedilatildeo humana pelo gesto de estender um braccedilo

no corpo para indicar o outro lado sem compreensatildeo preacutevia direta disto algo que

levou o pesquisador602 a afirmar que os animais teriam compreendido o

apontamento como referecircncia para um objeto e que tambeacutem teriam aprendido a

seguir espontaneamente sem treinamento ateacute o olhar humano estagnado ou

dinacircmico

No acircmbito das interaccedilotildees sociais Herman identifica para estudo a atenccedilatildeo

conjunta a sincronia comportamental e a imitaccedilatildeo Os treinadores da equipe de

Herman ensinaram ao golfinho um comando que denominaram ldquotandemrdquo a partir do

qual os animais realizam os demais comandos em sincronia Entatildeo relacionaram

este comando ao de criaccedilatildeo e Herman observou os golfinhos realizarem

movimentos por conta proacutepria mas em sincronia perfeita algo que descreveu

afirmando desconhecer os mecanismos pelos quais isto se faz possiacutevel

598

ANDERSON 2011 599

KRUumlTZEN et al 2014 KOPS et al 2014 600

HERMAN 2006 Id 2012 601

HERMAN et al 1999 602

HERMAN 2006

132

No que diz respeito agrave habilidade de imitaccedilatildeo diz o pesquisador ao tratar da

imitaccedilatildeo de sons emitidos por computador que os golfinhos fazem uma distinccedilatildeo de

oitavas rara no mundo animal e aponta testes em que os animais apoacutes receberem

o comando imitaram outros coespeciacuteficos e humanos inclusive atraveacutes de imagens

de um televisor Ao imitar humanos poreacutem os animais improvisavam ou seja

levantavam a cauda quando o treinador levantava a perna acenavam com a

barbatana quando o treinador acenava com o braccedilo ficavam eretos com a cauda

imersa e locomoviam-se imitando sincronicamente o andar do treinador etc603

O pesquisador ressalta aqui a verificaccedilatildeo de senso de imagem corporal

representacional em relaccedilatildeo a si mesmo e ao outro e ainda de consciecircncia de si do

proacuteprio corpo e do corpo alheio de indiviacuteduos da mesma espeacutecie e de espeacutecie

distinta o que implica dizer que os golfinhos possuem esquemas e processos

mentais que distinguem codificam e representam as proacuteprias accedilotildees em relaccedilatildeo agraves

dos outros e que podem acessar ldquoo estado ou conteuacutedo de suas percepccedilotildees

memoacuterias ou conhecimentordquo604

Herman605 relata tambeacutem os testes que ele e sua equipe realizaram com os

golfinhos fecircmeos Akeakamai ou Ake e Phoenix esta treinada com algo como uma

linguagem acuacutestica gerada por computador e aquela com o uso de comandos de

trecircs a cinco palavras a partir de gestos simboacutelicos em que o treinador indicava

agentes objetos modificadores deste (localizaccedilatildeo) e accedilotildees inclusive de modo

recombinado O pesquisador aqui destaca o desempenho de Ake que diante do

objeto que sofreria determinada accedilatildeo da natureza da accedilatildeo do objeto de destino e

discriminando este objeto de outro similar que se encontrava do outro lado do

animal seguiu os comandos com sucesso inclusive diante da inversatildeo de papeacuteis

entre os objetos realizada com ela pela primeira vez Em testes similares observou

tambeacutem a eficaacutecia diante de outros comandos como um que sinalizava ao golfinho

para que repetisse o que fizera anteriormente606 e comportamentos curiosos como

a repeticcedilatildeo espontacircnea de movimentos previamente realizados enquanto o animal

aguardava um tempo maior entre um comando e outro607

603

HERMAN 2002 604

ldquo[] the state or content of its perceptions memories or knowledgerdquo Id 2012 p 540 605

HERMAN et al 1984 HERMAN 1986 606

MERCADO III et al 1998 MERCADO III et al 1999 607

COWAN 2003

133

Segundo Herman e colaboradores608 esses estudos pelos quais se

constatou que os animais compreenderam sentenccedilas lexicalmente novas

estruturalmente novas semanticamente reversiacuteveis e que expressam relaccedilotildees entre

objetos em que a posiccedilatildeo do modificador era alterada para mudar o significado da

sentenccedila e conjuntas ndash e nos quais se constatou que os golfinhos conhecem

generalizaccedilotildees como ldquopessoardquo e relacionadas a objetos com modificaccedilotildees

acidentais significativas como tamanho e cor ndash teriam sido aqueles que forneceram

pela primeira vez resultados convincentes de que certos animais podem processar

caracteriacutesticas de sentenccedilas de natureza semacircntica e sintaacutetica

Herman609 aponta o sucesso do animal tambeacutem em testes com comandos

que propositadamente natildeo faziam sentido com sequecircncias semacircntica ou

sintaticamente anocircmalas Agraves semanticamente anocircmalas Ake natildeo respondeu e agraves

sintaticamente anocircmalas Ake buscava na sequecircncia um subconjunto de itens que

fizessem sentido e entatildeo agia Exemplo disto foi a sequecircncia de comando ldquoAlto-

falante aacutegua tubo sobrerdquo610 que Ake interpretou como se tivesse de colocar o tubo

sobre o alto-falante fixado na parede da piscina e assim procedeu

Ake tambeacutem rearranjava objetos para cumprir certas tarefas como quando

levou uma prancha da beira da piscina para o centro a fim de seguir o comando para

pular a prancha e quando lhe foi dado um comando para recolher objetos sem

especificaccedilatildeo decidiu por si mesma trazer todos ao mesmo tempo o que fez

buscando primeiro o mais distante e entatildeo dispondo os demais no corpo de um

modo que foi possiacutevel fazecirc-lo o que mostrou segundo o pesquisador senso de

planejamento

Em outro estudo Herman e Forestell611 ensinaram Ake a pressionar um de

dois objetos aparentemente remos colocados verticalmente com a paacute para cima a

certa distacircncia um do outro na parede da piscina sendo um significando ldquosimrdquo e

outro significando ldquonatildeordquo para que ela tocasse um ou outro a fim de responder se

determinado objeto estaria ou natildeo na piscina o que fez com ecircxito Herman e

colaboradores612 associaram esta tarefa agravequela que envolve comando simples com

dois objetos e uma accedilatildeo Dava-se o comando como pocircr o frisbee no aro e na

608

HERMAN et al 1984 HERMAN 1986 609

HERMAN et al 1993a 610

ldquoSpeaker water pipe onrdquo 611

HERMAN FORESTELL 1985 612

HERMAN et al 1993b

134

ausecircncia de uma ou outra ferramenta o animal o indicaria no remo ldquonatildeordquo Diante

desses mesmos comandos na ausecircncia de ambos os objetos o frisbee e o aro ou

somente do frisbee Ake acionou o remo ldquonatildeordquo mas na ausecircncia somente do aro

ela espontaneamente levou o frisbee ateacute o remo como que querendo indicar que

natildeo havia o objeto de destino

Herman613 relata tambeacutem que haacute sinais que natildeo fazem parte do vocabulaacuterio

para que o golfinho realize certas accedilotildees sejam isoladas em sequecircncia ou para que

realizasse mais de uma simultaneamente como nadar em espiral abrir a boca fazer

ondas com a cauda mergulhar de costas soprar para fazer bolhas mergulhar em

espiral esguichar aacutegua e dar piruetas Apoacutes realizarem duas ou trecircs accedilotildees

simultaneamente os golfinhos passaram a espontaneamente repeti-las combinadas

e inclusive a manifestar outras combinaccedilotildees natildeo previamente solicitadas

Nos estudos publicados por Braslau-Schneck614 o golfinho Elele recebeu

dentre vaacuterios outros comandos de preenchimento615 um comando para criar um

comportamento ou mais de um caracterizando inclusive a tomada de decisatildeo O

animal realizou gestos que ainda natildeo tinham sido vistos o que fez Herman616

concluir que os golfinhos possuem o senso de agecircncia e de propriedade ou seja

reconhece a si mesmo como proprietaacuterio do corpo e agente das accedilotildees que pratica

e inclusive617 que o animal aprendeu em niacutevel conceitual a palavra que

corresponde a criar um movimento novo

Baseando-se nos resultados de estudos como este e como o de Reiss618 no

qual dois espeacutecimes de T truncatus mostraram por testes com marcas no corpo

reconhecerem-se a si mesmos no espelho Herman afirma que esses animais tecircm

autoconsciecircncia

Em outro deles619 o golfinho fecircmeo Phoenix recebeu o comando de tocar um

objeto com a barbatana peitoral ou com a boca ou com a cauda saltar sobre ele

ou nadar abaixo dele e em seguida recebeu o comando para repetir o gesto ou para

escolher fazer qualquer uma das outras quatro das cinco alternativas Quando foi

solicitado a escolher como primeiro comando o animal ficou por um momento

613

HERMAN 2006 614

BRASLAU-SCHNECK 1994 apud HERMAN 2006 615

Comandos que satildeo acrescentados acessoriamente agravequele(s) de maior relevacircncia para determinado experimento

616 HERMAN 2012

617 Id 2006

618 REISS 2001

619 CUTTING 1997 apud HERMAN 2006 HERMAN 2002

135

olhando para o experimentador e entatildeo compreendeu que podia optar por uma das

cinco e entatildeo saltou sobre o objeto

Em testes realizados com a fecircmea Elele para verificar se ela poderia

compreender siacutembolos como sendo referentes a partes de seu proacuteprio corpo

somando um total de nove como algo que as representa Herman e

colaboradores620 intentaram observar no animal o estabelecimento de correlaccedilatildeo

entre referecircncias gestuais simboacutelicas transmitidas pelos treinadores e as suas

diferentes partes do corpo no uso destas na realizaccedilatildeo de diferentes accedilotildees e em

interaccedilatildeo com objetos Elele usou a mesma parte do corpo para realizar accedilotildees

diferentes ndash como tocar lanccedilar ou indicar ndash ou partes diferentes para realizar uma

mesma accedilatildeo inclusive relacionando-se distintamente com objetos distintos ndash que se

encontravam flutuando na piscina colados na parede ou suspensos acima da

superfiacutecie ndash em combinaccedilotildees que muitas vezes natildeo faziam parte de seu repertoacuterio

Diante da demonstraccedilatildeo de que o animal sabia que parte do corpo usar e onde e

como fazecirc-lo bem como das capacidades versaacuteteis de motricidade621 o

pesquisador concluiu que o golfinho apresenta uma imagem corporal

representacional bem definida622 ldquouma imagem corporal bem articulada que pode

ser acessada conscientemente para obter respostas efetivas do corpo para ateacute

mesmo instruccedilotildees altamente abstratas ou eventos motores observadosrdquo623

64 PRIMATES

Frequentemente se observa nos grandes macacos por sua desenvolvida

capacidade cognitiva interaccedilotildees sociais extremamente complexas Witting e

Boesch624 por exemplo estudaram as interaccedilotildees de conflito em chimpanzeacutes (Pan

troglodytes) e constataram que eles levam em conta no processo de tomada de

decisatildeo para avaliar se um determinado conflito seraacute ou natildeo proveitoso o valor do

recurso disputado o risco de lesatildeo e o valor e a possibilidade de reparaccedilatildeo da

relaccedilatildeo

620

HERMAN et al 2001 621

HERMAN 2002 622

Id 2012 623

ldquo[] a well-articulated body image that can be consciously accessed for effective body-part responses to even highly abstract instructions or observed motor eventsrdquo HERMAN 2006 p 458

624 WITTING BOESCH 2003

136

Um exemplo talvez ainda mais marcante eacute a transmissatildeo cultural que o

pesquisador Shunzo Kawamura relatava em um trabalho cientiacutefico possivelmente

pela primeira vez em 1953 apoacutes seus estudos na ilha de Kawai no Japatildeo com

macacos japoneses (Macaca fuscata) em que observou a fecircmea Imo lavando uma

batata-doce antes de comecirc-la e este comportamento sendo entatildeo adotado

gradualmente pelos demais membros do grupo625

A transmissatildeo cultural varia de acordo com cada modelo social e pode-se dar

por ensinamento direto Withen e colaboradores626 incluindo Goodal verificaram

entre os chimpanzeacutes um nuacutemero de variaccedilotildees culturais que ateacute entatildeo natildeo havia sido

observado em nenhum outro animal natildeo humano e que cada grupo apresenta certo

conjunto de variaccedilotildees que torna uacutenico o seu perfil ainda que os elementos dessas

variaccedilotildees sejam normalmente encontrados em outros grupos mas podendo-se

observar tambeacutem elementos que lhe sejam exclusivos

Boesch identifica dois mecanismos que servem como preacute-requisito para

identificaccedilatildeo de cultura o ldquoprocesso de aprendizagem social que garante a

fidelidade da transferecircncia de informaccedilatildeo entre indiviacuteduosrdquo e as ldquonormas sociais que

garantam a fidelidade da informaccedilatildeo uma vez que ela tenha sido adquirida por um

indiviacuteduordquo627

Boesch e Tomasello628 tambeacutem em trabalho com chimpanzeacutes explicam que

individualmente as transmissotildees culturais satildeo mais raacutepidas e haacute pouca ou

moderada convenccedilatildeo e imposiccedilatildeo Jaacute nos grupos familiares e em associaccedilotildees as

transmissotildees variam conforme o nuacutemero de indiviacuteduos na populaccedilatildeo haacute pouca e

lenta convenccedilatildeo e um indiviacuteduo impotildee pouco ou moderadamente Em relaccedilatildeo agrave

maioria um indiviacuteduo toma as principais decisotildees e a transmissatildeo cultural daacute-se

mais lentamente e define convenccedilotildees e impotildee-se e quando se toma por foco o

prestiacutegio de um indiviacuteduo haacute transmissatildeo lenta poucas convenccedilotildees e ele impotildee

decisotildees lentas ou raacutepidas

Boesch629 fornece particularidades que caracterizam transmissatildeo cultural

como o aprendizado de um membro do grupo por outro membro que natildeo eacute

625

HIRATA et al 2008 626

WITHEN et al 1999 627

Respectivamente ldquosocial learning process that guarantee the fidelity of the information transfer between individualsrdquo e ldquosocial norms that guarantee the fidelity of the information once it has been acquired by an individualrdquo BOESCH 1996 p 265

628 BESCH TOMASELLO 1998

629 BOESCH 2003

137

transmitido geneticamente mas socialmente e natildeo implica necessariamente

adaptaccedilatildeo a determinadas condiccedilotildees ecoloacutegicas tratando-se portanto de uma

praacutetica coletiva que pode inclusive mudar rapidamente Acrescenta ainda a

referecircncia no campo antropoloacutegico que considera a cultura um sistema simboacutelico

com base em compartilhamento de significados

Ilustram esse compartilhamento os vinte tipos de instrumentos usados pelos

chimpanzeacutes do Taiuml National Park na Costa do Marfim dentre os quais se

encontravam gravetos e folhas identificados pelo pesquisador630 que constatou

ainda usos inovadores sem nenhuma mudanccedila aparente no contexto ambiental

(como o aparecimento de uma fonte de alimento antes desconhecida) enquadrando

entatildeo suas observaccedilotildees no que tomou por conceito de cultura

641 Observaccedilotildees de campo

Em outro estudo realizado no Taiuml National Park na Costa do Marfim Luncz e

colaboradores631 verificaram que ao usarem pedras ou tacos de madeira como

martelo para quebrar cascas de frutos de Coula edulis chimpanzeacutes de trecircs grupos

de um mesmo bloco florestal apresentaram cada um identidade cultural por meio de

variaccedilotildees na frequecircncia (ocorridas tambeacutem dentro de cada grupo na escala

temporal) do uso das pedras que predominava em alguns grupos e no dos tacos de

madeira que predominava em outros e os quais inclusive variavam de tamanho de

grupo para grupo Em trabalho posterior Luncz e Boesch632 observaram que as

fecircmeas que migraram para outros grupos que foi quase a totalidade das

observadas adotavam o comportamento do grupo novo o qual os pesquisadores

viram perdurar por cerca de vinte e cinco anos reforccedilando a existecircncia de um

processo de transmissatildeo cultural Os dois pesquisadores633 identificaram ainda

outros traccedilos culturais distintos entre os grupos no forrageamento na comunicaccedilatildeo

em interaccedilotildees sociais dos membros de cada um no comportamento de caccedila etc

somando um total de vinte e sete variantes

Boesch e Boesch tambeacutem identificaram o uso de instrumentos que os

chimpanzeacutes modelavam utilizando as matildeos para quebrar mateacuteria prima remover

630

BOESCH 1995 631

LUNCZ et al 2012 632

LUNCZ BOESCH 2014 633

Id 2015

138

partes suas puxaacute-la ou bater contra ela e os dentes para cortaacute-la Esses materiais

eram em geral mudas folhas gravetos usados como palitos extraiacutedos de pequenos

ramos frondosos ramos galhos usados como tacos e pedras Os animais usavam

nomalmente folhas mudas gravetos e pedaccedilos de galhos para inserccedilatildeo e retirada

de alimento em local de difiacutecil acesso para os dedos (casas de formigas corpo de

pequenos macacos predados etc) mudas folhas gravetos e ramos para sondar o

interior de cascas de aacutervore colmeias de abelha feridas cadaacuteveres usavam

gravetos e folhas como esponjas para assepsia e em exibiccedilotildees os animais

lanccedilavam e arrastavam pedras ramos e galhos e batiam com eles e com pedras e

tacos quebravam frutos duros por vezes usando gravetos para recolher partes

internas que natildeo conseguiam recolher com os dedos634

Outro uso de instrumentos observado por Boesch635 foi o de galhos como

tacos para bater ou tentar perfurar um leopardo que entrou em seu territoacuterio e a

quem entatildeo passaram a perseguir

Van Schaik636 verificou em orangotangos das ilhas de Borneacuteu e Sumatra o

uso de gravetos por orangotangos (Pongo pygmaeus) que podem ser inseridos

presos entre os dentes em pequenos furos em troncos de aacutervores para coletar mel

ou manualmente para tirar pedaccedilos de casas de cupins Outro uso de instrumento

observado por Schaik eacute a casca de ramo de aacutervore que aqueles animais retiram

prendem na boca e inserem em frutos em caacutepsula de aacutervores do gecircnero Neesia que

tecircm alto valor nutritivo para desprender e as sementes e a polpa que satildeo protegidas

por espinhos e entatildeo lanccedilaacute-las do fruto diretamente na boca

No tocante agrave comunicaccedilatildeo Boesch637 analisou um tipo simboacutelico observado

apenas nos chimpanzeacutes de Taiuml usado como norma social por curtos periacuteodos de

tempo a saber percursotildees em aacutervores pelo macho alfa e percebeu que elas

indicavam natildeo soacute a mudanccedila de direccedilatildeo no deslocamento do grupo apontada pela

direccedilatildeo e pelo sentido em que o animal se movia entre as duas aacutervores que

golpeava com os peacutes com as matildeos ou com ambos mas tambeacutem os periacuteodos de

descanso ou ambos combinados

634

BOESCH C BOESCH H 1990 635

BOESCH 1991 636

VAN SCHAIK 2006 637

BOESCH 1996

139

Hedwig e colaboradores incluindo Boesch638 registraram inclusive variaccedilotildees

sintaacuteticas nos chamados vocalizados de duas espeacutecies de gorilas Gorilla beringei

beringei e Gorilla gorilla gorilla em cinco tipos de unidades acuacutesticas combinadas de

cento e cinquenta e nove maneiras diferentes

642 Estudos experimentais

Premack e Woodruff639 realizaram experimentos como tentativas iniciais de

buscar evidecircncias sobre a teoria da mente em animais natildeo humanos Os

pesquisadores gravaram fitas de viacutedeo em que um ator humano dentro de uma jaula

tentava resolver sem sucesso testes tais como os realizados por Koumlhler Em um

deles prendiam-se algumas bananas no teto da jaula Em outro elas estavam fora

da jaula e do alcance do ator No seguinte estavam ao alcance mas impedidos por

uma caixa E em mais um teste repetiu-se o anterior mas com blocos pesados de

cimento dentro da caixa As imagens foram entatildeo mostradas nem sempre na

iacutentegra para um chimpanzeacute fecircmeo de nome Sarah habituado a assistir a cenas de

viacutedeo O animal recebeu entatildeo em cada sessatildeo cartas com imagens dentre as

quais somente uma representava a soluccedilatildeo correta para cada problema (como

empilhar caixas no primeiro cenaacuterio e usar uma vara no segundo) que foi

predominantemente escolhida por ele

Premack e Woodruff entatildeo descartaram que Sarah tenha estabelecido uma

simples correlaccedilatildeo de elementos fiacutesicos em razatildeo de diferenccedilas entre a disposiccedilatildeo

dos objetos nos viacutedeos e nas fotos e tambeacutem descartaram ainda que natildeo de todo

e como causa suficiente e exclusiva tambeacutem o associacionismo em que diante da

falta de um elemento na sequecircncia (como uma accedilatildeo ou um objeto) ela o reconhece

o que levaria por exemplo a recorrer a generalizaccedilotildees decorrentes de experiecircncias

cotidianas anteriores nas quais se teria de incorrer para explicar como Sarah

relacionou fotos aos viacutedeos incompletos que havia visto anteriormente Afirmaram

assim serem mais fortes as hipoacuteteses entre as quais afirmam natildeo haver grandes

diferenccedilas da empatia em que o animal teria-se colocado na posiccedilatildeo do ator

humano e da teoria da mente em que teria imputado a ele esses estados de

espiacuterito ou seja intenccedilatildeo ou propoacutesito e conhecimento ou crenccedila E dizem que a

638

HEDWIG et al 2014 639

PREMACK WOODRUFF 1978

140

empatia natildeo se sustentaria se as escolhas do animal fossem afetadas pela

identidade do ator

Na sessatildeo seguinte Sarah viu outras quatro cenas relacionadas a coisas que

estava acostumada a presenciar no cotidiano mas que para as quais natildeo havia sido

treinada uma em que o ator tentava sem sucesso sair da jaula outra em que

tentava sem sucesso ligar um aquecedor chegando a chutaacute-lo levemente

estremecendo e cruzando os braccedilos para demonstrar estar com frio outra em que

tentava fazer funcionar um fonoacutegrafo desplugado da tomada e uma uacuteltima em que o

ator natildeo conseguia lavar o chatildeo porque a mangueira que usava natildeo estava

devidamente conectada agrave torneira Na primeira sessatildeo a macaca Sarah recebeu

quatro fotos cada uma representando uma das situaccedilotildees e outras quatro uma com

uma chave outra com uma mangueira outra com um cabo eleacutetrico ligado na tomada

corretamente e uma uacuteltima com um cone de papel aceso Ela associou

corretamente essas fotos como objetos agraves fotos das situaccedilotildees Os pesquisadores

aqui ressaltam que natildeo haacute correspondecircncia fiacutesica entre algueacutem querendo sair de

uma jaula e uma chave nem entre um cone de papel em chamas e algueacutem

tremendo e olhando para um aquecedor

A etapa seguinte foi ainda mais complexa apresentou-se a Sarah trecircs

versotildees de cada objeto ou seja uma chave intacta outra torcida outra quebrada

uma mangueira conectada outra natildeo conectada outra conectada e ao mesmo

tempo cortada o mesmo em relaccedilatildeo ao cabo eleacutetrico e o papel apagado aceso ou

jaacute queimado Ela novamente obteve ecircxito associando o item correto agrave situaccedilatildeo

correta

Em uma nova etapa as cenas do primeiro experimento foram repetidas desta

vez com dois atores um treinador de quem Sarah gostava e outro por quem natildeo

demonstrava afeto Ambos em imagens em que obtinham sucesso nas tarefas e

tambeacutem em imagens em que natildeo obtinham sucesso utilizando uma vara de

comprimento mais curto passando pela caixa caindo sobre ela deitado com os

blocos de cimento espalhados Sarah selecionou as oito alternativas ldquoboasrdquo quando

o ator era aquele com quem simpatizava e apenas duas quando o ator era o outro

Os pesquisadores acrescentaram em seguida uma terceira situaccedilatildeo nem ldquoboardquo nem

ldquomaacuterdquo mas somente irrelevante O resultado das escolhas das fotografias manteve-

se reduzindo ainda para um o nuacutemero de alternativas ldquoboasrdquo para o outro ator

141

Hampton640 testou macacos-rhesus para metamemoacuteria641 os animais

optariam por escolher participar de um teste de memoacuteria ou natildeo Se decidissem

participar seriam recompensados com amendoim se acertassem e natildeo receberiam

nada se falhassem Se recusassem o teste ganhariam uma guloseima da qual

gostavam menos que de amendoim Os macacos que tinham desempenho mais

baixo preferiram desistir do teste e os que o tinham melhor desempenho insistiram

nele Hampton concluiu que os animais estariam assim reconhecendo quando se

lembram

Tambeacutem Rosati e Santos642 testaram trinta macacos-rhesus sem treinamento

preacutevio com o fim de tentar verificar a presenccedila da chamada metacogniccedilatildeo Em um

de dois tubos dispostos em forma de ldquoVrdquo o experimentador colocou uma isca um

alimento sem que os animais soubessem em qual Como controle aleacutem de verificar

o comportamento em caso de verem onde a isca teria sido colocada tambeacutem nesta

condiccedilatildeo se realizou o teste com um uacutenico tubo a fim de verificar se haveria

sondagem Os animais que natildeo sabiam da localizaccedilatildeo da isca no experimento com

os dois tubos dirigiram-se mais frequentemente para o ponto de convergecircncia a fim

de descobrirem a localizaccedilatildeo do alimento levando as pesquisadoras que ressaltam

que neste estudo observou-se pela primeira vez em animais natildeo humanos uma

resposta de busca de informaccedilatildeo em uma situaccedilatildeo para eles ineacutedita a concluirem

que eles podem buscar informaccedilotildees espontaneamente sobre algo que reconhecem

desconhecer o que as fez sugerir que esses macacos podem apresentar processos

metacognitivos semelhantes aos dos humanos

Em uma gama de testes cognitivos como para verificar a noccedilatildeo de

causalidade os primatas demonstraram grande eficaacutecia Um exemplo satildeo os

experimentos reproduzidos por Girndt e colaboradores643 e Martin-Ordas Call e

Colmenares644 com chimpanzeacutes (P troglodytes) orangotangos (P pygmaeus)

bonobos (Pan paniscus) e gorilas (Gorilla gorilla gorilla) em que com um

instrumento (no primeiro caso optando entre uma vareta ou um ancinho) tinham de

empurrar ou puxar o alimento (recompensa) sobre uma plataforma em forma de ldquoUrdquo

fixada externamente agrave grade com uma armadilha ou seja uma abertura pela qual a

640

HAMPTON 2001 641

SHATTLEWORTH 2010 p 244 642

ROSATI SANTOS 2016 643

GIRNDT et al 2008 644

MARTIN-ORDAS CALL COLMENARES 2008

142

recompensa se caiacutesse seria perdida (no primeiro estudo com variaccedilotildees como a

posiccedilatildeo e o nuacutemero das ferramentas disponiacuteveis) Em uma segunda etapa somente

no segundo estudo mencionado eles tinham de realizar tarefa similar dentro de dois

tubos fixados horizontalmente na grade tambeacutem contendo cada um uma armadilha

mas em um lado em um tubo e em outro lado no outro tubo Neste teste os animais

tinham de representar mentalmente o lado em que inseririam a ferramenta e entatildeo

tiveram menor ecircxito

Em experimento com macacos-rhesus (Macaca mulatta) Phillips e Santos645

associaram pequenas peccedilas de plaacutestico a uma metade de coco ou a uma maccedilatilde

parecendo pedaccedilos destes Um dos frutos foi colocado em uma caixa cheia de

folhas onde somente a peccedila de plaacutestico era retirada mostrada ao animal e colocada

novamente A peccedila anteriormente foi associada a um fruto ou outro e em cada

experimento podia ser colocada na caixa com o fruto com o qual fora associada ou

com o outro Os animais que tinham a peccedila associada ao fruto que natildeo estava na

caixa procuraram na caixa por mais tempo do que os que a tinham associado ao

fruto que estava dentro da caixa jaacute que procuravam pelo outro fruto Os

pesquisadores concluiacuteram assim que esses animais segundo o termo que utilizam

ldquoindividuamrdquo objetos segundo seus tipos e segundo suas propriedades

Tornou-se bastante conhecido o experimento de Brosnan e De Waal646 que

mostra como macacos-prego (Sapajus apella) lidam com a desigualdade Nesses

testes dois animais separados por uma grade eram submetidos por vez Cada um

dava uma pequena pedra como ficha ao experimentador Um deles recebia em troca

um pedaccedilo de pepino e o outro recebia uma uva alimento de que gostam mais O

que recebia o pedaccedilo de pepino tinha maior tendecircncia a rejeitar o alimento nesse

caso realizando movimentos de insatisfaccedilatildeo que mostravam seu desejo pela uva

Esses movimentos foram por vezes intensificados quando o outro passou a receber

a uva sem dar a pedra ou seja sem fazer qualquer esforccedilo Nos testes de controle

em que havia apenas um macaco natildeo houve repulsa pelo pepino Os pesquisadores

verificaram que os animais se baseiam na interaccedilatildeo com o outro coespeciacutefico e

sugerem que poderiam estar sob o efeito de expectativa frustrada e sendo movidos

por certas emoccedilotildees sociais

645

PHILLIPS SANTOS 2006 646

BROSNAN DE WAAL 2003

143

Lakshminarayanan e Santos647 realizaram experimentos com macacos-prego

tambeacutem treinados para trocar fichas por alimento entre um experimentador humano

que dava um pedaccedilo de maccedilatilde por um preccedilo e outro que dava um pedaccedilo e meio

pelo mesmo preccedilo os macacos escolheram este No experimento seguinte um

experimentador ofereceu um pedaccedilo de maccedilatilde e outro ofereceu dois pedaccedilos e meio

de maccedilatilde sendo que depois de negociar o segundo poderia retirar um pedaccedilo e o

primeiro poderia adicionar um pedaccedilo Os macacos passaram a evitar aquele e a

negociar somente com este mostrando aversatildeo agrave perda e que natildeo computam

somente o valor geral esperado

Os pesquisadores desenvolveram em seguida um experimento de risco em

duas etapas Na primeira os dois experimentadores ofereciam trecircs pedaccedilos de

maccedilatilde mas um natildeo retirava nada ou retirava dois de uma vez e o outro sempre

retirava um soacute sendo aquele entatildeo o escolhido pelos animais para negociar Jaacute na

segunda os dois experimentadores ofereciam um pedaccedilo de maccedilatilde mas um em

seguida acrescentava somente um enquanto o outro podia acrescentar outros dois

ou entatildeo nenhum e o primeiro foi o escolhido Os macacos apresentaram inclinaccedilatildeo

ao risco em um ambiente de perda e o rejeitaram em um ambiente de ganho

Em uma etapa seguinte os pesquisadores repetiram os experimentos usando

barra de cereal e pedaccedilos de frutas no lugar das fichas e os animais preferiram ficar

com o alimento que jaacute possuiacuteam Lakshminarayanan e Santos concluiacuteram que os

animais portam-se de modo similar aos humanos na tomada de decisatildeo

considerando as mudanccedilas de preferecircncias baseadas em escolhas

Em relaccedilatildeo agrave competecircncia numeacuterica Boysen e Berntson648 demonstraram

que a chimpanzeacute Sheba podia contar e somar nuacutemeros com resultados que iam de 1

a 4 empregando os meacutetodos descritos anteriormente para o papagaio Alex (aqui

com o animal deslocando-se para observar o conteuacutedo das bandejas) e tambeacutem

sem que tenha havido ensaio para transposiccedilatildeo das quantidades de itens para

algarismos de numerais araacutebicos

Kawai e Matsuzawa649 analisaram os estudos de Tomonaga e

colaboradores650 e os de Tomonaga e Matsuzawa651 que empregaram nuacutemeros em

647

LAKSHMINARAYANAN SANTOS 2012 648

BOYSEN BERNTSON 1989 649

KAWAI MATSUZAWA 2000b 650

TOMONAGA et al 1993 651

TOMONAGA MATSUZAWA 2000

144

uma tela de viacutedeo inclusive com itens curingas substituindo nuacutemeros para testar o

tempo de resposta relacionado a uma ordenaccedilatildeo numeacuterica crescente por uma

fecircmea de Pan troglodytes chamada Ai Ao tocar determinado nuacutemero diretamente na

tela se ela o fizesse ao correto somente ele desaparecia e se tocasse algum outro

todos desapareceriam reiniciando uma nova combinaccedilatildeo em uma nova sessatildeo No

final do teste feito corretamente Ai recebia recompensa e cada erro era seguido

somente de uma campainha Depois de um primeiro momento de exerciacutecio livre os

pesquisadores treinaram-na com reforccedilo sequencial com trinta e seis sequecircncias de

dois algarismos araacutebicos de 0 a 9 e ao aprendecirc-las o animal realizou com ecircxito a

transferecircncia de cardinal para ordinal selecionando as sequecircncias respectivas

corretas e recebendo a recompensa

No estudo seguinte ao treinarem Ai com oitenta e quatro combinaccedilotildees de

trecircs diacutegitos com acreacutescimo de um ou dois curingas na sequecircncia os pesquisadores

observaram que a identificaccedilatildeo de nuacutemeros mais proacuteximos agraves sequecircncias iniciais foi

mais demorada e a de nuacutemeros maiores na sequecircncia levou um tempo mais curto

o que sugeriu que a chimpanzeacute teria considerado toda a sequecircncia numeacuterica antes

de dar a primeira resposta No entanto quando os nuacutemeros maiores foram

primeiramente selecionados se deu o contraacuterio Isto e tambeacutem a reduccedilatildeo de tempo

de resposta para o menor nuacutemero diante do aumento do intervalo entre o nuacutemero

menor e o segundo menor foram interpretados como ldquoefeito da distacircncia

simboacutelicardquo652 que eacute verificado quando ocorre um desempenho superior mediante a

maior distacircncia ordinal entre as sequecircncias de caracteres (por exemplo quando se

verifica melhor desempenho entre 6-9 do que entre 2-3) Os testes assim revelaram

efeitos de posiccedilatildeo serial e de distacircncia simboacutelica observados no julgamento

comparativo humano

Tomonaga e Matsuzawa fazem referecircncia a testes semelhantes realizados

anteriormente com macacos-prego (Sapajus apella)653 e pombos (Columba livia)654

com seacuteries de cinco algarismos e itens curingas substitutos nos quais os pombos

treinados escolheram os nuacutemeros aleatoriamente ao passo que os macacos-prego

demonstraram ter algum conhecimento do posicionamento numeacuterico ordinal

652

ldquoSymbolic-distance effectrdquo 653

DrsquoAMATO COLOMBO 1989 654

TERRACE 1995

145

Outro trabalho analisado por Kawai e Matsuzawa o de Biro e Matsuzawa655

foi realizado tambeacutem com a seacuterie de trecircs nuacutemeros no mesmo intervalo mas quando

o animal apontava diretamente para o nuacutemero menor em seguida os outros dois

trocavam de posiccedilatildeo Nos testes realizados corretamente por Ai a duraccedilatildeo entre a

escolha do primeiro e do segundo nuacutemero era maior que essa mesma duraccedilatildeo nos

testes que ela realizou incorretamente quando mesmo assim Ai apontava o local jaacute

apagado do terceiro nuacutemero apoacutes a mudanccedila no conteuacutedo do visor com taxa maior

de erro quando os nuacutemeros eram mais proacuteximos Os pesquisadores concluiacuteram

deste estudo que o animal teria inspecionado ainda no iniacutecio da tentativa os trecircs

nuacutemeros e em seguida decidido a ordem em que os selecionaria e inclusive

planejado a sequecircncia motora que julgou ser mais apropriada para chegar agrave

resposta certa ou seja que o animal apresentou como estrateacutegia planejamento

monitoramento e ajustes flexiacuteveis quando houve mudanccedila de condiccedilotildees algo similar

ao que seria esperado de um humano

Kawai e Matsuzawa656 apontam que as conclusotildees obtidas nesses estudos

estatildeo em consonacircncia com outro que haviam publicado pouco antes657 no qual

investigaram a memoacuteria do animal para sequecircncias de cinco numerais no intervalo

de zero a nove e verificaram que Ai podia contar ateacute nove itens e ordenar em

sequecircncia neste intervalo Os nuacutemeros eram exibidos por um tempo cada vez mais

curto e logo convertidos em quadrados nos quais o animal tocaria obedecendo agrave

ordem haacute pouco observada Posteriormente essa tarefa passou a ser executada

com algarismos de 1 a 9 e Inoue e Matsuzawa658 realizaram um estudo comparativo

entre chimpanzeacutes e humanos nos quais aqueles apresentaram melhor desempenho

que estes

Em experimentos como o de Livingstone e colaboradores659 este com

macacos-rhesus (Macaca mulatta) verificou-se que alguns primatas aprendem a

associar algarismos araacutebicos e conjuntos de pontos (de tamanhos variados)

numericamente correspondentes agrave quantidade de alimento que recebem como

recompensa Os espeacutecimes treinados pelos autores tocavam os numerais ou os

conjuntos presentes em pares em uma tela de um aparelho de viacutedeo e escolheram

655

BIRO MATSUZAWA 1999 656

KAWAI MATSUZAWA 2000b 657

Id 2000a 658

INOUE MATSUZAWA 2007 659

LIVINGSTONE et al 2010

146

predominantemente as quantidades maiores que lhes proporcionariam um nuacutemero

maior de recompensas no caso pequenas doses de suco com uma quantidade

pequena de erro nos pares de nuacutemeros maiores e nos pares de conjuntos de

pontos de tamanhos parecidos

Com o fim de testar o chamado raciociacutenio analoacutegico em chimpanzeacutes num

outro experimento realizado com Sarah por Premack e Woodruff este tambeacutem

incluindo Gillan660 em uma primeira etapa foram apresentados ao animal cartotildees

com figuras geomeacutetricas coladas a saber triacircngulo lua crescente ou um quadrado

com um recorte triangular (como uma bandeirinha de festa junina) coloridas de azul

amarelo verde ou laranja variando entre trecircs tamanhos diferentes e podendo estar

marcadas com um ponto preto central ou natildeo Disto se montou setenta e duas

combinaccedilotildees diferentes Do lado esquerdo no cartatildeo as figuras A acima e Arsquo

abaixo seriam o modelo Do lado direito encontrava-se a figura B acima e um

espaccedilo vazio abaixo E mais abaixo a figura Brsquo que se relacionava com B

analogicamente (conforme cor formato ou outra das caracteriacutesticas) a Arsquo em

relaccedilatildeo a A e ao lado dela a figura C que seria a resposta errada ao problema

Sarah deveria indicar Brsquo utilizando um retacircngulo amarelo escrito ldquoSAMErdquo661

Em uma nova etapa o animal realizou a mesma tarefa indicando se a

combinaccedilatildeo era a mesma (B e Brsquo com ldquoSAMErdquo) ou se era diferente (B e C com

ldquoDIFFERENTrdquo)

No experimento seguinte Sarah deparou com cartotildees contendo objetos

caseiros que lhe eram familiares Por exemplo com um em que havia um cadeado

acima (A) e uma chave abaixo (Arsquo) do lado esquerdo e uma lata acima (B) do lado

direito com espaccedilo abaixo sendo aqui oferecidas a figura de um pincel (C) e a de

um abridor de latas (Brsquo) e com outro em que havia um papel (A) acima e um laacutepis

(Arsquo) abaixo do lado esquerdo e uma lata (B) em cima do lado direito com espaccedilo

abaixo sendo aqui oferecidas as mesmas figuras de abridor de latas (C) e pincel

(Brsquo)

Os pesquisadores concluiacuteram que Sarah resolveu os problemas por raciociacutenio

analoacutegico e pelo uso de classes conceituais o que teria sido corroborado na etapa

seguinte em que se empregou uma figura CB que tinha relaccedilatildeo com B mas

660

GILLAN et al 1981 661

ldquoMesmordquo

147

diferente daquela entre Arsquo e A (sendo entatildeo a resposta errada) e outra CA que se

relacionava com Arsquo na qual Sarah novamente obteve ecircxito

Em relaccedilatildeo agrave comunicaccedilatildeo no experimento de Zimmermann e

colaboradores662 realizado com chimpanzeacutes e bonobos criados em ambientes

humanos e outros criados em ambientes natildeo humanos a fim de verificar se os

animais levam em consideraccedilatildeo a perspectiva de um ajudante humano ao

apontarem onde se encontra um objeto escondido bonobos e orangotangos

apontaram consistentemente para o local onde havia comida escondida bem como

para um objeto escondido com o qual um voluntaacuterio humano pegaria a comida aqui

no caso um garfo (que o animal por si soacute natildeo usaria) Segundo os pesquisadores o

estudo sugere que os animais compreenderam a natureza referencial seletiva do

ato de apontar para alvos distintos Os orangotangos apontaram mais para o garfo

quando este era escondido na ausecircncia do agente humano do que nas vezes em

que era escondido na presenccedila deste Isto mais o fato de os animais apontarem

para o humano depois que este ia procurar o objeto em seu lugar habitual e natildeo

encontrava levaram o pesquisador a sugerir que esses macacos imitam ldquoa

propriedade de relevacircncia da comunicaccedilatildeo humanardquo663

Nos anos de 1930 alguns pesquisadores como Winthrop Kellogg e Luella

Kellogg664 tentaram ensinar chimpanzeacutes a falar mas verificou-se que seu aparelho

vocal natildeo possibilitava mais do que algumas palavras Alguns anos depois outros

estudiosos passaram a tentar-lhes ensinar a linguagem manual dos sinais

especificamente a American Sign Language (ASL) como Allen Gardner e Beatrice

Gardner665 que o fizeram com o chimpanzeacute fecircmeo Washoe Os pesquisadores

obtiveram como exemplo de resultados a distinccedilatildeo por parte do animal entre ldquoflorrdquo e

ldquocheirordquo666 e o uso de um mesmo sinal para flores dentro de casa para as que

estavam ao ar livre e ateacute para as que estavam em fotografias aleacutem do uso de sinais

de ecircnfase como ldquopor favor (please)rdquo ldquomais raacutepido (hurry)rdquo e ldquoquero mais (more)rdquo667

662

ZIMMERMANN et al 2009 663

ldquo[] the relevance property of human communicationrdquo 664

KELLOG W N KELLOG L A 1967 p 282-287 665

GARDNER R A GARDNER B T 1969 666

Respectivamente ldquoflowerrdquo e ldquosmellrdquo 667

Respectivamente ldquopleaserdquo ldquohurryrdquo e ldquomorerdquo

148

Segundo Miles668 o orangotango Chantek chegou a conhecer cerca de cento

e quarenta sinais manuais e diz George669 pareceu esboccedilar o iniacutecio de uma

conversa ao expressar a frase ldquoJeannie Chantek chaserdquo670

Dentre as outras accedilotildees de Chantek destacamos seu reconhecimento no

espelho que passou a utilizar para limpar-se e a sua capacidade de enganar a

treinadora tanto roubando alimento de seu bolso enquanto puxava a matildeo dela na

direccedilatildeo oposta como fingindo engolir a borracha de apagar que roubara mantendo-

a no canto da boca apoiando novamente o estojo e logo em seguida pedindo

comida por meio dos sinais Aqui Miles aponta evidecircncias de que o animal teria

demonstrado intencionalidade premeditado e assumido a perspectiva do outro

como proposto pela teoria da mente que implicam formaccedilatildeo de imagem mental

relacionada aos resultados desses atos Outro sinal disto foi a melhora do sinal

apresentado apoacutes o pedido do treinador sugerindo que o animal entendeu que o

sinal teria uma forma ideal refletida em sua imagem mental Chantek passou a

sinalizar tambeacutem com o peacute e com objetos como lacircminas de tesouras Miles afirma

que ele natildeo tinha os sinais somente como uma habilidade motora associada a algo

o que evidenciaria que o modo de processar os sinais teria natureza abstrata e

representacional O animal ainda chamava a atenccedilatildeo de um humano antes de

comeccedilar a sinalizar chegava a oferecer as matildeos para que fossem moldadas a fim

de que passasse a conhecer um sinal novo e passou a inventar seus proacuteprios

sinais mostrando ter entendido a natureza representacional dos sinais Assim

conclui ter-se-ia um exemplo de um animal que formou representaccedilotildees do mundo

real

Tomasello671 publicou uma revisatildeo sobre os avanccedilos de experimentos com

grandes macacos treinados para a comunicaccedilatildeo humana como o chimpanzeacute

Washoe a gorila Koko (apelido de Hanabiko) e o orangotango Chantek mas com

ecircnfase nos trabalhos desenvolvidos com o bonobo Kanzi que reuniu um repertoacuterio

de mais de trecircs mil palavras672 e afirma que a conclusatildeo geral eacute a de que estes

possuem a maior parte das habilidades cognitivas que servem como requisito para

algo que seria como a linguagem humana como o uso de siacutembolos linguiacutesticos

668

MILES 1990 669

GEORGE 2003 670

Traduccedilatildeo sugerida ldquoChantek persegue Jannierdquo MILES 1990 p 521 671

TOMASELLO 2017 672

RAFFAELE 2006

149

semelhante ao humano dos quais compreendem e produzem combinaccedilotildees de

maneira criativa

A gorila Koko que veio a tornar-se bastante famosa conheceu um repertoacuterio

bastante vasto da linguagem manual dos sinais da ASL em que utilizava mais de mil

palavras e reconhecia mais de duas mil673 Em certa etapa seu desenvolvimento

acompanhou sob muitos aspectos o de crianccedilas humanas mas sob outros ficava

aqueacutem destas No entanto aos quatro anos e meio jaacute pontuava acima de crianccedilas

de seis anos em alguns testes ditos de ldquoprogressatildeo loacutegicardquo como em uma

sequecircncia de quatro figuras de cartas com um triacircngulo e um ciacuterculo em que estes

alternavam com relaccedilatildeo agrave posiccedilatildeo superior e inferior (a primeira tinha o ciacuterculo

acima) e cada ciacuterculo a partir do segundo era maior que o anterior enquanto os

triacircngulos possuiacuteam o mesmo tamanho A quinta carta seguinte teria de ser um

grande ciacuterculo sobre o mesmo triacircngulo e Koko rapidamente a indicou entre outras

trecircs com triacircngulos e ciacuterculos em outras condiccedilotildees674

Se por um lado do teste da marca diante de um espelho realizado Allen e

Schwartz675 com um espeacutecime de gorila (G gorilla gorilla) chamado Otto apesar de

este ter obtido ecircxito os autores consideraram como inconclusiva a identificaccedilatildeo de

autorreconhecimento por outro Koko claramente se reconhecia no espelho e

inclusive indicava partes de seu rosto676 Segundo Patterson ela utilizava elementos

da linguagem aberta e produtivamente677 Koko se referia a eventos passados (como

quando se referiu a um fato ocorrido no dia anterior) e reconhecia o futuro proacuteximo

(como quando ia-se preparar depois de informada de que logo iria sair)678 dizia

quando gostava de algo ou de algueacutem quando oferecia algo como uma bebida para

algueacutem679 e dizia pares de palavras que rimavam entre si quando solicitada a fazecirc-

lo ou quando lhe pediam uma rima para uma palavra especiacutefica ela o fornecia680

Dava tambeacutem outras demonstraccedilotildees de humor como quando espontaneamente

chamava o nariz de ldquofake mouthrdquo681 brincava com as palavras em muitos casos

como o fazem crianccedilas como por exemplo aglutinando elementos moldando seu

673

THE GORILLA FOUNDATION 2018 674

PATTERSON LINDEN 1981 p 100 675

ALLEN SCHWARTZ 2007 676

PATTERSON LINDEN 1981 p 108 677

Ibid p 157 678

Ibid p 150-151 679

Ibid p 91 680

Ibid p 111 681

ldquoFalsa bocardquo PATTERSON LINDEN 1981 p 112

150

proacuteprio vocabulaacuterio e expressava em palavras certas emoccedilotildees como seus medos

inclusive xingando quem a contrariasse tendo espontaneamente passado a usar

palavras especiacuteficas para isto como ldquobirdrdquo682 e ateacute mentia para acusar algueacutem de

um erro que ela mesma cometida ou para disfarccedilar algo de errado que estivesse

fazendo ao ser pega em flagrante683 Quando natildeo sabia o nome de algum objeto ela

mesma atribuiacutea a este um como quando passou a chamar maacutescara ldquonose fakerdquo684

Isso tambeacutem indicaria segundo Patterson capacidade de estabelecer analogias e

metaacuteforas Assim Koko foi submetida a certo teste em que teria de reconhecer por

exemplo se uma cor era alegre ou triste ou se era suave ou pesada e passou com

desempenho superior ao de algumas crianccedilas com a idade de sete anos tambeacutem

testadas685

Pika e colaboradores incluindo o proacuteprio Tomasello686 mencionam o uso de

meacutetodos utilizados pelos grandes siacutemios para captar atenccedilatildeo para chamar a

atenccedilatildeo de outros para algo Este como exemplifica Tomasello687 pode ser o

proacuteprio sujeito uma parte do corpo deste ou algum objeto externo o que deveraacute

induzir o outro indiviacuteduo a fazer o que o sujeito que chamou sua atenccedilatildeo intenciona

E Tomasello acrescenta que ateacute onde se sabe somente os grandes primatas

chamam a atenccedilatildeo dos outros deste modo em seu processo de comunicaccedilatildeo

natural Ele observa que Kanzi consegue entender e produzir dispositivos

comunicativos a partir do modo como funciona psicologicamente a comunicaccedilatildeo

referencial o que significa que ao dirigir a atenccedilatildeo do outro eles estatildeo conseguindo

atingir um objetivo especiacutefico

Savage-Rumbaugh688 quem com colaboradores teria segundo afirma

realizado o primeiro experimento em que chimpanzeacutes estabeleceram comunicaccedilatildeo

entre si por meio do uso de siacutembolos689 relata que Kanzi se destaca pelo fato de

que observava desde pequeno os testes com lexigramas realizados com sua matildee

Matata e conseguiu aprender mais lexigramas do que ela desenvolvendo-se por si

mesmo em vez de por treinamento direto reforccedilado externamente tendo por

recompensa a conquista da comunicaccedilatildeo e o que esta lhe propiciava Os lexigramas

682

ldquoAverdquo PATTERSON LINDEN 1981 p 119-121 e 142 683

Ibid p 135 684

ldquoNariz falsordquo Ibid p 117 685

Ibid p 117 686

PIKA et al 2005 687

TOMASELLO 2017 688

SAVAGE-RUMBAUGH 1986 689

SAVAGE-RUMBAUGH et al 1978

151

satildeo iacutecones de computador que correspondem a palavras e aparecem em uma tela

para os animais em teste a fim de que a toquem no ponto exato em que veem o

iacutecone da palavra que pretendem expressar Se tocam nos iacutecones corretos em

relaccedilatildeo agrave determinada questatildeo recebem a recompensa Tomasello compara o

vocabulaacuterio de Kanzi ao de crianccedilas pequenas e tal compreensatildeo tambeacutem eacute

observada em papagaios catildees e outros animais mas nestes adquirida e produzida

somente mediante treinamento direto Compunham o vocabulaacuterio nomes proacuteprios

nomes de objetos localizaccedilotildees accedilotildees propriedades e adveacuterbios com certas

funccedilotildees como ldquosimrdquo e ldquonatildeordquo O pesquisador aponta a construccedilatildeo de sentenccedilas por

parte do animal com o emprego de accedilotildees que natildeo satildeo deduziacuteveis dos objetos

envolvidos como ldquoponha o dinheiro sobre os cogumelosrdquo690 e outras em que

poderia facilmente haver reversatildeo dos papeacuteis dos objetos envolvidos como ldquoponha

um pouco de leite na aacuteguardquo691

Remetendo-se a outro estudo seu692 Tomasello menciona ainda que Kanzi

tem uma categoria gramatical que o possibilita compreender coisas jaacute conhecidas de

novas maneiras e entende que a ordem das palavras pode ser usada como

dispositivo simboacutelico de diferenciaccedilatildeo e daacute como exemplos a resposta correta do

animal a comandos em que se troca somente o sujeito como ldquoponha o chapeacuteu em

sua bolardquo e ldquoponha a bola no chapeacuteurdquo693 e o entendimento por parte de Kanzi de

que aquele que pratica a accedilatildeo como ldquomorderrdquo ou ldquoperseguirrdquo694 vem antes do que

sofre a accedilatildeo decerto levando em conta aqui a voz ativa Conclui entatildeo que ele

entende certos eventos e certas accedilotildees bem como as palavras usadas para designaacute-

los que deles participam agentes cuja ordem em que aparecem na construccedilatildeo da

frase representa um papel especiacutefico tal como ocorre com uma crianccedila de dois

anos Diz o pesquisador

Ele sabe que o sujeito que estaacute mordendo ou perseguindo eacute mencionado antes de lsquomorderrsquo ou lsquoperseguirrsquo e o que estaacute sendo mordido ou perseguido eacute apenas mencionado depois Ele sabe essas coisas presumidamente porque viu uma ordem pareada com uma versatildeo do evento chave (por exemplo X perseguindo Y) e outra ordem pareada com outra versatildeo do mesmo evento (por exemplo Y perseguindo X)

695

690

ldquoPut the Money on the mushroomsrdquo 691

ldquoPut some milk on the waterrdquo 692

TOMASELLO 1994 693

Respectivamente ldquoput the hat on your ballrdquo e ldquoput the ball on the hatrdquo 694

Respectivamente ldquobiterdquo e ldquochaserdquo 695

TOMASELLO 2017 p 100

152

Tomasello assim distingue dois niacuteveis em relaccedilatildeo agrave competecircncia gramatical

O primeiro eacute a produccedilatildeo inovadora de combinaccedilotildees de siacutembolos criando novos

significados o que exemplifica com o chimpanzeacute Washoe referindo-se a um pato

como ldquowater birdrdquo696 O segundo satildeo essas combinaccedilotildees que um sujeito pode

produzir com siacutembolos especiacuteficos que servem como marcadores gramaticais Para

exemplificar o pesquisador aponta a ausecircncia de indicaccedilotildees simboacutelicas de como

esses dois signos ldquowaterrdquo e ldquobirdrdquo se relacionam entre si e assim cabe ao receptor

ou ouvinte estabelecer a relaccedilatildeo Uma dessas relaccedilotildees eacute a ordem exemplificada

mais acima em que se usa em uma frase primeiro um substantivo como sujeito e

depois (do verbo) outro como objeto direto Segundo o pesquisador Kanzi utiliza

alguns padrotildees de ordem consistentes utilizando lexigramas que correspondem a

uma accedilatildeo (primeiro elemento) geralmente antes do objeto da accedilatildeo (segundo

elemento) Mas ele por fim observa que uma coisa eacute haver consistecircncia no padratildeo

de ordenamento e outra eacute usar a ordem como dispositivo gramatical para produccedilatildeo

de um significado consistente que caracterize uma segunda ordem Isto mesmo

quando Kanzi combina de modo criativo os lexigramas com gestos que normalmente

vecircm em seguida como o de apontar para quem estaacute realizando alguma accedilatildeo ou

para o local para o qual a accedilatildeo seraacute dirigida

696

ldquoAve de aacuteguardquo

153

7 A INTELIGEcircNCIA NOS ANIMAIS SEGUNDO O ARISTOTELISMO-TOMISMO

Tendo selecionado assim algumas das principais habilidades cognitivas

comprovadas e inclusive outras sugeridas de animais natildeo humanos a partir de

trabalhos com pesquisas experimentais e de campo e de posse da informaccedilatildeo

estruturada necessaacuteria no acircmbito da psicologia aristoteacutelico-tomista buscaremos

enquadrar essas habilidades dentro dos limites entre o conhecimento adquirido

pelos sentidos nos animais natildeo humanos e aquele adquirido pelos sentidos no

homem bem como pelo intelecto a fim de darmos iniacutecio agrave verificaccedilatildeo da

compatibilidade entre a proposta aristoteacutelico-tomista e o que se sabe atualmente

sobre a chamada inteligecircncia nesses entes

O proacuteximo passo assim eacute retomarmos a obra de Aristoacuteteles e Tomaacutes de

Aquino para estabelecermos esses limites a partir da construccedilatildeo anterior e do que

os autores afirmam diretamente sobre o tema

Aristoacuteteles afirma que a alma de uma crianccedila pequena praticamente em nada

difere da de alguns animais com o ceacuterebro mais desenvolvido697 ou seja que estes

podem expressar caracteriacutesticas no acircmbito da potecircncia estimativa observadas

naquelas algo que reflete diretamente na questatildeo das habilidades cognitivas

Ele ilustra o que diz afirmando que nos animais encontram-se estados

psicoloacutegicos semelhantes aos dos humanos e elenca alguns como ldquodocilidade ou

ferocidade doccedilura ou aspereza coragem ou covardia temor ou ousadia paixatildeo e

maliacutecia e no plano intelectual certa sagacidaderdquo698 dentre outros traccedilos de caraacuteter

como a indolecircncia a irascibilidade a prudecircncia e a timidez a obstinaccedilatildeo e a

estupidez a vileza e a perfiacutedia a nobreza e a braveza a astuacutecia a afetuosidade a

inveja e a presunccedilatildeo a cautela e o brio

Afirma entatildeo que ainda que os demais animais tenham memoacuteria e faculdade

de aprendizagem o homem eacute o uacutenico que apresenta capacidade de reflexatildeo pois

soacute ele eacute capaz de recordar voluntariamente699

Quanto ao ato voluntaacuterio diz ele que o tecircm as crianccedilas e os animais natildeo

humanos que agem voluntariamente natildeo pela vontade livre ou por algo de origem

externa mas espontaneamente no sentido de que satildeo voluntaacuterias as accedilotildees

697

ARISTOacuteTELES 1992 L VIII 588a-588b p 412 698

ldquo[] docilidad o ferocidad dulzura o aspereza coraje o cobardiacutea temor u osadiacutea apasionamiento o malicia y en el plano intelectual una cierta sagacidade []rdquo Ibid L VIII 588a p 411

699 Ibid L I 488b p 48

154

praticadas impulsivamente que caracterizam um movimento proacuteprio em razatildeo do

apetite em conformidade com as afecccedilotildees da vontade sensitiva como o desejo

sensual e a raiva700 Mas nem nos animais natildeo humanos nem nas crianccedilas existe

escolha ainda que possa existir uma opiniatildeo sobre o que se haacute ou natildeo de fazer

uma opccedilatildeo sobre o que mais conveacutem a determinado fim701 jaacute que lhes falta o juiacutezo

o fundamento do ato e a deliberaccedilatildeo cuja parte da alma relacionada considera as

causas como aponta o Estagirita o ldquoem vista do quecircrdquo e o ldquopor quecircrdquo que entatildeo

conclui que ldquotudo o que foi escolhido deliberadamente eacute voluntaacuterio mas nem tudo o

que eacute voluntaacuterio eacute escolha deliberadardquo702

Assim enquanto o homem tem o conhecimento perfeito do fim em que satildeo

apreendidas a coisa constitutiva do fim aleacutem da ideia de fim e a da proporccedilatildeo entre

o fim e o ato que a este se ordena os demais animais tecircm pela estimativa o

conhecimento imperfeito do fim restrito agrave apreensatildeo deste e mesmo quando um

objeto por buscar-se natildeo estaacute presente em razatildeo da imaginaccedilatildeo e da memoacuteria

Assim se a essecircncia perfeita da vontade depende do conhecimento perfeito do fim

haacute tambeacutem a vontade em sentido imperfeito que depende do conhecimento

imperfeito do fim e neste caso haacute um movimento para o fim sem deliberaccedilatildeo703

Aristoacuteteles tambeacutem parece atribuir de algum modo inteligecircncia ou prudecircncia

(aqui como frocircnese ou phroacutenesis)704 natildeo soacute aos humanos no sentido de ldquoexaminar

bem o que se refere a si mesmordquo705 que tecircm a inteligecircncia universal por meio da

razatildeo mas a alguns dentre os demais animais que segundo ele ldquoparecem ter

faculdade de provisatildeo para sua proacutepria vidardquo706 no acircmbito de determinados atos

particulares707708

700

ARISTOacuteTELES 1998a L III 1111a-1111b p 184-185 TOMAacuteS DE AQUINO 1964 l 4 427

701 TOMAacuteS DE AQUINO 2003a p 30

702 ldquo[] todo lo que ha sido escogido deliberadamente es voluntario pero no todo lo voluntario

es eleccioacuten deliberadardquo ARISTOacuteTELES 1998b L II 1226b p 460 703

TOMAacuteS DE AQUINO 1993 Q 6 a 2 p 105 704

ldquoΦρόνησιςrdquo Alguns tradutores usam ldquointeligecircnciardquo mas partindo do que se disse anteriormente a respeito do intelecto o termo ldquoprudecircnciardquo parece ser dos dois o mais adequado Natildeo se trataria pois de inteligecircncia propriamente dita sob a oacuteptica aristoteacutelico-tomista

705 ldquo[] examinar bien lo que se refiere a siacute mismordquo ARISTOacuteTELES 1998a L VI 1141a p

278 706

ldquo[] parecen tener la facultad de previsioacuten para su propria vidardquo ARISTOacuteTELES 1998a L VI 1141a p 278

707 Reale (2005 p 7) explica que phroacutenesis aqui tem sentido mais geral e que quando

Aristoacuteteles emprega o termo aos humanos eacute no sentido de ldquosabedoria praacuteticardquo que eacute exclusiva destes

708 ARISTOacuteTELES 1998a L VI 1141a p 278 TOMAacuteS DE AQUINO 2001 Q 96 a 1 p

851 Id 1964a l 6 1187

155

Explica Tomaacutes de Aquino que essa inteligecircncia ou prudecircncia pode ser

encontrada em alguns animais com memoacuteria mas que diferente do homem no qual

ela se daacute quando este racionalmente delibera quanto ao que deve fazer nesses

animais se daacute por um juiacutezo instintivo das coisas por fazer-se de modo que diz ele

ldquonos outros animais a prudecircncia eacute uma estimativa natural sobre a busca daquilo que

eacute adequado e da fuga daquilo que eacute prejudicial como uma ovelha segue sua matildee e

foge do lobordquo709

Em seguida ele distingue nos escritos de Aristoacuteteles trecircs niacuteveis de

conhecimento nos animais natildeo humanos um representado pelos animais que natildeo

tecircm nem memoacuteria nem audiccedilatildeo e portanto natildeo satildeo capazes de ser ensinados nem

tecircm prudecircncia outro por aqueles que tecircm memoacuteria mas natildeo ouvem e entatildeo natildeo

tecircm capacidade para serem ensinados mas podem ter prudecircncia e o terceiro pelos

animais que tecircm memoacuteria e audiccedilatildeo e entatildeo tecircm prudecircncia e podem ser

ensinados710

O sentido de ldquoouvirrdquo nos animais natildeo humanos aqui explica Reale711 estaacute

expresso por Aristoacuteteles

Haacute os que participam por sua vez da capacidade tanto de aprender712

como de ensinar capacidade transmitida seja por seus proacuteprios semelhantes seja pelos homens Estes satildeo todos animais dotados do dom da audiccedilatildeo isto eacute natildeo soacute os que percebem as diferenccedilas dos sons mas tambeacutem os que distinguem a diversidade de significados

713

O Estagirita fornece o exemplo de pequenas aves que se natildeo forem criadas

com os pais podem apresentar cantos diferentes ao que se observa comumente na

espeacutecie Menciona entatildeo o caso de um rouxinol que ensinou os filhotes a cantar

corroborando a afirmaccedilatildeo de que a comunicaccedilatildeo que se daacute como uma participaccedilatildeo

na linguagem nos animais eacute transmitida por um processo educativo714

709

ldquo[] in other animals prudence is a natural estimate about the pursuit of what is fitting and the avoidance of what is harmful as a lamb follows its mother and runs away from a wolfrdquo TOMAacuteS DE AQUINO 1964b L I l 1 11

710 ARISTOacuteTELES 2005 L I 1 980a-980b p 3 TOMAacuteS DE AQUINO 1964b L I l 1 13

711 REALE 2005 p 7

712 Explica Reale (2005 p 7) que aqui se diz ldquoaprenderrdquo no sentido de ser disciplinado ser

adestrado 713

ldquoLos hay que participan a la vez de la capacidad tanto de aprender como de ensentildear capacidad transmitida ya por sus propios semejantes ya por los hombres Eacutestos son todos los animales dotados del don de la audicioacuten es decir no soacutelo los que perciben las diferencias de los sonidos sino tambieacuten los que distinguen la diversidad de significacionesrdquo ARISTOacuteTELES 1992 L IX 608a p 479

714 Ibid L IV 536b p 228-229

156

Os animais natildeo humanos bem como as crianccedilas tecircm representaccedilatildeo e

memoacuteria do particular Essa representaccedilatildeo corresponde agrave imagem apreendida que

eles retecircm e assim eacute pela imaginaccedilatildeo que eles buscam algo ou fogem de algo715 O

aristotelismo-tomismo entatildeo considera que a vida dos animais aos quais chama

imperfeitos eacute regida administrada pela imaginaccedilatildeo e a dos animais aos quais

chama perfeitos o eacute pela memoacuteria e Tomaacutes de Aquino explica que eacute a necessidade

de agir e natildeo o desejo de conhecer que caracteriza o modo como o conhecimento

pertence aos animais716

Reale717 aponta as cinco formas de conhecimento descritas por Aristoacuteteles no

iniacutecio da Metafiacutesica nomeadamente a sensaccedilatildeo a memoacuteria o experimento a arte

e a ciecircncia sendo as uacuteltimas duas somente consideradas como sapiecircncia ou

sabedoria jaacute que ambas se relacionam ao universal conhecem os porquecircs e as

causas dos fatos ao passo que o experimento e a sensaccedilatildeo o fazem ao particular

restringindo-se aos dados dos fatos nesse sentido

Em relaccedilatildeo ao experimento (experimentum) diz Tomaacutes de Aquino

Ora nos homens o que se segue sobre a memoacuteria eacute o experimento do qual alguns animais ainda que muito pouco participam Pois um experimento se forma pelas associaccedilotildees de muitas [intenccedilotildees] singulares recebidas na memoacuteria Esse tipo de correlaccedilatildeo eacute proacuteprio do homem e pertence agrave potecircncia cogitativa (tambeacutem chamada razatildeo particular) a qual compara as intenccedilotildees individuais assim como a razatildeo universal o faz com as intenccedilotildees universais Ora como os animais costumam buscar ou evitar algo a partir de muitas sensaccedilotildees e recordaccedilotildees por isso eacute que parecem participar algo do experimento ainda que pouco No entanto acima do experimento que pertence agrave razatildeo particular os homens tecircm como sua potecircncia principal uma razatildeo universal por meio da qual eles vivem

718

Alguns estudiosos do aristotelismo-tomismo como Manzanedo e Maritain

sugeriram haver aqui algo de cogitativa nestes animais ditos superiores aponta

Echavarriacutea que explica

715

ARISTOacuteTELES 1998a L VII 1147b p 299 TOMAacuteS DE AQUINO 1990b L II c LXVII p 285

716 ARISTOacuteTELES 2005 L I 1 980b p 3 TOMAacuteS DE AQUINO 1964b L I l 1 14

717 REALE 2005 p 5

718 ldquoNow [] in men the next thing above memory is experience which some animals have

only to a small degree For an experience arises from the association of many singular [intentions] received in memory And this kind of association is proper to man and pertains to the cogitative power (also called particular reason) which associates particular intentions just as universal reason associates universal ones Now since animals are accustomed to pursue or avoid certain things as a result of many sensations and memory for this reason they seem to share something of experience even though it be slight But above experience which belongs to particular reason men have as their chief power a universal reason by means of which they liverdquo TOMAacuteS DE AQUINO 1964b L I l 1 15

157

[] a assinalaccedilatildeo parece interessante e digna de ser analisada mas um

pouco apressada e sem fazer as distinccedilotildees adequadas Se haacute cogitativa animal se daacute soacute em alguns animais superiores Por outro lado Santo Tomaacutes considera a cogitativa como uma potecircncia proacutepria do homem e na maior parte das passagens de suas obras que tratam sobre o tema atribui soacute a estimativa aos animais brutos No entanto parece admitir que em alguns deles se decirc uma lsquoparticipaccedilatildeorsquo ainda que pequena desta faculdade

719

Sustentamos aqui esta segunda opccedilatildeo ou seja que esses animais teriam

apenas uma ldquoparticipaccedilatildeordquo da cogitativa relacionada agrave comparaccedilatildeo de intenccedilotildees

assim como muitos destes participam da comunicaccedilatildeo mas natildeo tecircm linguagem que

eacute proacutepria do homem uma vez que natildeo haacute qualquer vestiacutegio do refluxo intelectivo

que caracteriza a cogitativa Explica Muszalski que

Os animais irracionais superiores tecircm a potecircncia memorativa que eacute um tesouro no qual se acumulam as estimaccedilotildees realizadas em relaccedilatildeo agrave conveniecircncia ou prejuiacutezo dos singulares No entanto a repetida operaccedilatildeo de apreender a intentio no homem supotildee uma comparaccedilatildeo ndash denominada aqui ldquoraciociacuteniordquo ndash que natildeo ocorre com o bruto Como unicamente a cogitativa eacute capaz de realizar esse discurso soacute o homem eacute capaz de acumular na memoacuteria uma experiecircncia relacionada aos sensiacuteveis singulares

720

Cabe aqui recordar de modo bastante resumido o que se disse sobre os

sentidos na construccedilatildeo realizada na etapa anterior Enquanto o intelecto considera

as espeacutecies universais a quididade formal e assim as coisas incorpoacutereas como a

sabedoria e as relaccedilotildees das coisas os sentidos externos e internos consideram os

acidentes proacuteprios e comuns das coisas corpoacutereas pelas espeacutecies sensiacuteveis e

dentre os sentidos somente a estimativa e a cogitativa consideram daquelas a

quididade particular721 Deste modo diferentemente do homem que realiza de modo

inteligiacutevel coisas diversas e opostas os demais animais satildeo movidos pela natureza

pelo apetite e pelos sentidos

Por isso as accedilotildees pelas quais fazem as coisas movidos natildeo pela arte mas

pela mesma natureza satildeo ldquodeterminadas uniformes e da mesma espeacutecierdquo o que

Tomaacutes de Aquino exemplifica com a semelhanccedila entre os ninhos das andorinhas e

719

ECHAVARRIacuteA 2009 p 135-136 720

ldquoLos animales irracionales superiores tienen la potencia memorativa que es un tesoro en el cual se acumulan las estimaciones realizadas acerca de la conveniencia o perjuicio de los singulares Sin embargo la repetida operacioacuten de aprehender la intentio en el hombre supone una comparacioacuten mdash denominada aquiacute lsquorazonamientorsquo mdash que no ocurre en el bruto Como uacutenicamente la cogitativa es capaz de llevar a cabo este discurso soacutelo el hombre es capaz de acumular en la memoria una experiencia acerca de los sensibles singularesrdquo MUSZALSKI 2014 p 94

721 TOMAacuteS DE AQUINO 1999 p 97-98 Id 1990b L II c LXVI p 285

158

aquela entre o modo como as aranhas tecem as teias722 Mas como se vecirc pela

complexidade dessas construccedilotildees como a teia de Caerostris darwini os ninhos dos

gecircneros Ptilonorhynchus sp e Furnarius sp e inclusive as obras mais complexas

como a do gecircnero de mamiacutefero Castor sp que por vezes incluem espantosa

simetria como os complexos ciacuterculos construiacutedos por peixes do gecircnero Torquigener

sp trata-se de algo que envolve muito mais do que um simples automatismo como

a afirmaccedilatildeo poderia supor e entatildeo diz Muszalski que ldquoo conhecimento dos brutosrdquo

natildeo termina ldquona produccedilatildeo da imagemrdquo pois

[] o animal natildeo soacute possui as formas sensiacuteveis do conhecido pelos

sentidos ndash formas que produz e conserva a fantasia ndash como tambeacutem possui as formas ou intenccedilotildees de certos aspectos das coisas que conhece que natildeo satildeo captadas pelos sentidos externos

723

A impressatildeo que muitas vezes se tem de demonstraccedilotildees de inteligecircncia que

se assemelha agrave humana por parte de alguns animais normalmente se explica pelo

fato de um ou outro sentido externo em um ou outro animal superar o homem o que

ocorre inclusive ao sentido interno da memoacuteria que em alguns animais e sob certos

aspectos tambeacutem pode superar a do homem Ilustram isto o desempenho dos

chimpanzeacutes nos estudos de Inoue e Matsuzawa724 bem como o paacutessaro de Clark

que armazena para o inverno mais de trinta mil sementes escondendo-as em

lugares diferentes725

Gastoacuten Colleacute citado por Reale726 explica que a natureza do que se entende

como participaccedilatildeo no experimento em alguns animais possui ldquoforma puramente

sensiacutevelrdquo727 e deve ser ldquouma coleccedilatildeo de imagens ou uma fusatildeo de muitas

associaccedilotildees de imagens de lembranccedilas sensiacuteveis numa uacutenica representaccedilatildeo

sensiacutevelrdquo728 Colleacute comenta em seguida que essas representaccedilotildees propiciam a accedilatildeo

ao animal acompanhada de uma determinaccedilatildeo e que isto se daacute em um nuacutemero

muito reduzido de animais remetendo-se ao Estagirita para reiterar que a grande

maioria deles vive de memoacuterias isoladas de natureza sensiacutevel E um pouco adiante

722

TOMAacuteS DE AQUINO 1990b L II c LXVI p 284-285 ibid LXXXII p 327 723

MUSZALSKI 2014 724

INOUE MATSUZAWA 2007 725

MACKINTOSH 1997 726

REALE 2005 p 8 727

ldquo[] forme purement sensible []rdquo COLLEacute 1912 p 10 728

ldquo[] une collection dimages ou une fusion de plusieurs associations dimages de plusieurs souvenirs sensibles en une seule repreacutesentation sensiblerdquo Ibid p 11

159

jaacute explicando sobre o experimento no homem afirma ser ldquoo estado de consciecircncia

resultante de um conjunto de memoacuterias abstratas mais particularesrdquo729

Chega-se assim ao corolaacuterio do entendimento aristoteacutelico-tomista sobre a

inteligecircncia nos animais chamados superiores (ver tabela 1) daacute-se por apreensatildeo

de intenccedilotildees e quididades somada agraves comparaccedilotildees de imagens formadas pela

potecircncia imaginativa realizadas pela estimativa a partir de sensiacuteveis particulares

captados pelos sentidos proacuteprios e pelo sentido comum e retidas pela memoacuteria

sem poreacutem o recurso agrave memoacuteria e agrave imaginaccedilatildeo voluntaacuterias bem como sem o

refluxo do intelecto o que caracteriza a potecircncia cogitativa que eacute exclusiva do ente

humano

729

ldquo[] lrsquoeacutetat de conscience reacutesultant drsquoun ensemble de souvenirs abstraits mais particuliersrdquo COLLEacute 1912 p 11 Tambeacutem citado por REALE 2005 p 8

160

8 ANAacuteLISE DAS HABILIDADES COGNITIVAS SEGUNDO O MODELO

ARISTOTEacuteLICO-TOMISTA

Buscaremos agora analisar cada uma das informaccedilotildees levantadas na

literatura especializada especialmente na das uacuteltimas deacutecadas no intuito de

verificar de que modo as habilidades apresentadas pelos animais mencionadas aqui

se encaixariam no modelo aristoteacutelico-tomista se for o caso testando se haveria

algo que ultrapasse os limites estabelecidos por este para a estimativa alcanccedilando

o que seria proacuteprio da cogitativa e do intelecto

Adotaremos como dito um processo de investigaccedilatildeo seguindo uma linha

mais proacutexima daquelas realizadas por George730 e por Kovaacutecs e Mather731 a partir

da qual haveremos de sugerir ou natildeo a validade de determinada doutrina com base

nos fatos verificados buscando realizar tal empresa do modo mais objetivo que

pudermos Tentaremos restringir o maacuteximo possiacutevel o papel da subjetividade

mesmo reconhecendo as dificuldades em fazecirc-lo satisfatoriamente como pelo fato

de que estamos lidando com determinada perspectiva ndash que natildeo encontraraacute espaccedilo

aqui para ser merecidamente justificada ndash e reconhecendo que o que produzimos

deveraacute ser objeto de correccedilotildees futuras ressaltando por fim que as correlaccedilotildees que

estabelecemos aqui entre os resultados dos estudos e o aristotelismo-tomismo

haveratildeo de ter caraacuteter nada mais que sugestivo

Dito isto passemos a analisar os casos destacados aqui buscando

enquadraacute-los em categorias (ver tabelas 2-7) a comeccedilar pela que envolve

interaccedilotildees relacionadas ao comportamento

81 INTERACcedilOtildeES COMPORTAMENTAIS

811 Interaccedilotildees em geral

Haacute grande complexidade nas interaccedilotildees comportamentais entre elefantes

que sugerem haver caracteriacutesticas empaacuteticas descritas em estudos de campo como

o de Bates732 como coalisatildeo prestaccedilatildeo de auxiacutelio e inclusive resgate e remoccedilatildeo de

730

GEORGE 2003 731

KOacuteVACS MATHER 2008 732

BATES et al 2008

161

objetos proteccedilatildeo e conforto dedicados aos mais jovens esta descrita tambeacutem no

trabalho de Plotnik e de Waal733 em que o adulto usa a tromba e mesmo a

vocalizaccedilatildeo para consolar um pequeno espeacutecime Tem-se aiacute igualmente

despertando a necessidade de comunicar-se a identificaccedilatildeo do outro como

semelhante o reconhecimento das diferenccedilas entre ambos e das emoccedilotildees das

necessidades e das crenccedilas particulares que parecem ilustrar as funccedilotildees da

estimativa de identificar quididades particulares ou seja o outro como indiviacuteduo

bem como as intenccedilotildees particulares em relaccedilatildeo ao que o outro pretende ou do que

precisa inclusive comparando-as (com imagens na memoacuteria) como na verificaccedilatildeo

do estado emocional

Tambeacutem os estudos de McComb e colaboradores734 e os de Soltis e

colaboradores735 expressariam essas funccedilotildees da estimativa tanto no

reconhecimento de um indiviacuteduo associado agrave determinada funccedilatildeo por ser realizada

pelo indiviacuteduo que estaacute mais apto a exercecirc-la no caso a matriarca como a mais

capaz de tomar decisotildees frente a uma ameaccedila como no reconhecimento da

natureza do ente que eacute tido como ameaccedila aleacutem do niacutevel de ameaccedila estimado

intraespeciacutefico e mesmo interespeciacutefico no caso os diferentes grupos eacutetnicos

humanos que tambeacutem caracterizam a apreensatildeo das quididades e intenccedilotildees

particulares seguida de comparaccedilatildeo de ambas com aquelas que procedem da

imaginaccedilatildeo e estatildeo guardadas na memoacuteria

812 Comportamento diante da morte de coespeciacutefico

Seguindo nos estudos de campo os de McComb e colaboradores736

apontaram a distinccedilatildeo por elefantes de cracircnios de membro da espeacutecie inclusive os

marfins o que implica reconhecimento do outro ou de parte do outro coespeciacutefico

como semelhante Destacamos aqui a apreensatildeo da quididade particular pela

estimativa que viabiliza o reconhecimento da parte e o do cadaacutever como um todo o

que possibilita com a memoacuteria o acompanhamento por suscessivas visitas que

pode durar meses a partir do interesse pelo cadaacutever de membros do grupo descrito

733

PLOTNIK DE WAAL 2014 734

MCCOMB et al 2011 735

SOLTIS et al 2014 736

MCCOMB BAKER MOSS 2006

162

por Douglas-Hamilton e colaboradores737 mesmo tendo em vista o fato de que

conforme a natureza dos agentes envolvidos na decomposiccedilatildeo em questatildeo de

poucos dias o cracircnio jaacute pode estar exposto738

Quanto ao interesse em si pelo cadaacutever trata-se de um fenocircmeno ainda

pouco estudado como reconhecem por exemplo Bearzi e colaboradores739 que

publicaram uma revisatildeo sobre o tema em cetaacuteceos Pode-se propor que dentre as

possibilidades esteja tambeacutem aquilo mesmo que se daacute com os corviacutedeos segundo

Swift740 que sondam o cadaacutever em busca de sinais de perigo para o bando como

que isto tambeacutem poderia-se dar em relaccedilatildeo agrave ineacutercia e mesmo agrave transformaccedilatildeo do

indiviacuteduo sem vida assim como o reconhecimento de que ele jaacute natildeo tem

funcionalidade (de lideranccedila de maternidade etc) desencadeando certas reaccedilotildees

emocionais relacionadas Sugerimos que de um modo ou de outro esteja ali

expressa em destaque provavelmente associada agrave memoacuteria relacionada ao

indiviacuteduo enquanto ainda estava vivo a apreensatildeo pela estimativa de uma ou mais

intenccedilotildees aqui explicando tambeacutem a reaccedilatildeo dos corviacutedeos

813 Respostas a sinais humanos

Nos testes de respostas a sinais humanos catildees golfinhos grandes macacos

e elefantes obtiveram ecircxito salvo estes uacuteltimos em relaccedilatildeo a guiarem-se pelo olhar

humano como observaram Smet e colaboradores741 possivelmente por limitaccedilotildees

de sua visatildeo

Aqui os catildees e os golfinhos apresentam melhor desempenho aqueles

provavelmente por sua proximidade com os humanos e estes por aquilo que sugere

Herman e colaboradores742 sobre uma possiacutevel relaccedilatildeo entre a ecolocalizaccedilatildeo ou

seja a habilidade acuacutestica de apontamento por emissotildees sonares e o gesto

humano de apontar

Esta habilidade parece enquadrar-se na visatildeo aristoteacutelico-tomista

principalmente como resultado da apreensatildeo pela estimativa das intenccedilotildees

737

DOUGLAS-HAMILTON et al 2006 738

DOUGLAS-HAMILTON HILL 1981 739

BEARZI et al 2018 740

SWIFT 2015 741

SMET et al 2013 742

HERMAN et al 1999

163

particulares que pode desenvolver-se individualmente pela aprendizagem por

tentativa e erro ou dar-se por instinto

O mesmo pode-se dizer sobre as respostas aos estados de atenccedilatildeo

humanos como aquelas observadas nos catildees dos testes de Call e colaboradores743

e tambeacutem salvo no que toca ao instinto em relaccedilatildeo ao gesto em si sobre o caso

inverso descrito por Zimmermann e colaboradores744 em que os bonobos e

orangotangos aprenderam a apontar e a natureza referencial disto para que

humanos encontrassem objetos e alimentos escondidos

Jaacute o experimento de Grassmann Kaminski e Tomasello 745 em que os

animais combinaram dois tipos de comando resolvendo conflitos seja alcanccedilando o

alvo por exclusatildeo assim como no experimento de Kaminski e colaboradores746 seja

tendo de decidir entre o apontar com o dedo e o comando vocal simultacircneo para

objetos distintos ilustram pensamos a funccedilatildeo da estimativa de comparar intenccedilotildees

particulares

Sugerimos que o mesmo se aplique ao estudo de Hare e colaboradores747 O

entendimento dos catildees aqui do caraacuteter comunicativo das pistas fornecidas seria

fruto dessa mesma comparaccedilatildeo de intenccedilotildees

82 TEORIA DA MENTE E COMPORTAMENTO DIANTE DE TELAS DE VIacuteDEO

Diferentemente de outros animais os golfinhos como verificado por Herman

e colaboradores748 datildeo muita atenccedilatildeo agraves imagens em tela de viacutedeo e respondem a

comandos por ela Quando as imagens do treinador que dava comandos a Ake foi

gradualmente restrita somente aos membros que davam os sinais e entatildeo

esvanecida e substituiacuteda por manchas moacuteveis que o animal continuou a

reconhecer ainda que em menor grau isto sob a perspectiva aristoteacutelico-tomista

pode ser visto como a comparaccedilatildeo de intenccedilotildees (nos gestos) associada agrave

comparaccedilatildeo de imagens ndash aquelas em gradaccedilatildeo ndash pela estimativa

743

CALL et al 2003 744

ZIMMERMANN et al 2009 745

GRASSMANN KAMINSKI TOMASELLO 2012 746

KAMINSKI et al 2004 747

HARE et al 2010 748

HERMAN et al 1990 HERMAN 2006

164

Os experimentos com a macaca Sarah realizados por Premack e Wooldruff749

mostraram que os chimpanzeacutes podem reconhecer a realidade representada em uma

tela de viacutedeo tal como os golfinhos de Herman e em uma fotografia No acircmbito

aristoteacutelico-tomista entende-se ter havido comparaccedilotildees ou associaccedilotildees particulares

da estimativa entre o objeto real e sua imagem no viacutedeo ou no papel Quanto ao

desempenho nos testes no primeiro caso se observa provavelmente a

aprendizagem direta preacutevia com possiacutevel recurso agrave tentativa e erro ou participaccedilatildeo

no experimento e o recurso da estimativa agrave memoacuteria de intenccedilotildees nos casos em

que o viacutedeo natildeo foi exibido por completo O segundo caso poderia apontar para o

reconhecimento de cada uma das situaccedilotildees associadas ao estado emocional

expressado pelo ator mas tambeacutem para uma simples correlaccedilatildeo entre os objetos e

o modo como ele funciona Em ambas as possibilidades e a mais provaacutevel nesta

etapa que seria a associaccedilatildeo entre elas ou a segunda como uacutenica possibilidade na

etapa seguinte com as trecircs versotildees de cada objeto destacam-se as comparaccedilotildees

de intenccedilotildees particulares pela estimativa

Por fim a uacuteltima etapa tambeacutem caracteriza isto que se diz sobre as intenccedilotildees

na realizaccedilatildeo da tarefa em si de modo relacionado agrave reaccedilatildeo emocional do animal a

cada um dos dois indiviacuteduos jaacute que estaacute diante de um que lhe concede certo bem

pelo qual teraacute preferecircncia e lhe despertaraacute mais interesse pela tarefa e de outro que

natildeo o faz havendo entatildeo desinteresse o que tambeacutem por si refletiria a comparaccedilatildeo

de intenccedilotildees que se segue agrave captaccedilatildeo do particular por parte da estimativa E se

esta capta e compara intenccedilotildees permite assim que o animal reconhecendo o

estado mental de um outro indiviacuteduo possa tomar decisatildeo e agir ainda que natildeo

delibere com base nesta mesma percepccedilatildeo o que nos leva a sugerir que as

descriccedilotildees sobre a chamada teoria da mente estejam em consonacircncia com o

aristotelismo-tomismo

As tentativas de Chantek750 e Koko751 de enganar os treinadores indicando

premeditaccedilatildeo e reconhecimento da perspectiva do outro e que caracterizam a

inovaccedilatildeo no que toca ao desenvolvimento de estrateacutegias visando agrave obtenccedilatildeo do que

lhe apetecem evitando perda ou puniccedilatildeo (mas ainda sem que haja sinal de

abstraccedilatildeo para que se possa atribuir ao intelecto praacutetico) mostram no acircmbito do

749

PREMACK WOOLDRUFF 1978 750

MILES 1990 751

PATTERSON LINDEN 1981 p 135

165

aristotelismo-tomismo uma estimativa bastante desenvolvida Reforccedilam tambeacutem a

teoria da mente

83 METACOGNICcedilAtildeO

A teoria da mente parece estar associada ao que hoje se conhece por

metacogniccedilatildeo que por sua vez tem iacutentima relaccedilatildeo com a chamada metamemoacuteria

Shattleworth diz que por esta ldquoAs pessoas tendem a saber o quatildeo bem elas se

lembram das coisasrdquo e que esta apresenta duas funccedilotildees ldquomonitorar a forccedila de

memoacuteria e controlar a busca de informaccedilatildeordquo752 Em relaccedilatildeo agravequela explica que

ldquoinclui saber o quatildeo bem algueacutem eacute capaz de fazer discriminaccedilotildees de natureza

perceptivardquo753

A metacogniccedilatildeo pode ou natildeo implicar autorreflexatildeo Eacute associada

frequentemente agrave consciecircncia e sua presenccedila em animais natildeo humanos eacute sugerida

por trabalhos como o de Rosati e Santos754 com macacos-rhesus mencionado aqui

Kornell755 indica que os indiacutecios de que haveria metacogniccedilatildeo nos animais com

autorreflexatildeo satildeo escassos jaacute que as reaccedilotildees observadas poderiam estar

associadas ao objeto e que provavelmente seria uma exclusividade humana o que

em princiacutepio estaria em consonacircncia com o pensamento aristoteacutelico-tomista Sob

esta perspectiva os macacos do experimento de Rosati e Santos uma vez

informados sobre a presenccedila do alimento em um ou outro cano sem que se precise

dizer que sabiam que natildeo sabiam mas simplesmente por estarem movidos por um

apetite teriam percebido pela estimativa no que toca agraves inteccedilotildees que a forma mais

econocircmica de visualizaccedilatildeo para a busca seria pelo ponto de convergecircncia e entatildeo o

utilizaram No mesmo sentido uma sugestatildeo para explicar a metamemoacuteria apontada

nos experimentos de Hampton756 que descarta a hipoacutetese de a decisatildeo de recusa

do teste ter base na dificuldade em si da execuccedilatildeo deste seria uma percepccedilatildeo da

eficaacutecia do movimento para satisfaccedilatildeo do apetite com base na comparaccedilatildeo entre os

752

ldquo[] tend to know how well they remember thingsrdquo e ldquo[] monitoring memory strength and controlling information-seekingrdquo SHATTLEWORTH 2010 p 243

753 ldquoincludes knowing how well one is able to make perceptual discriminationsrdquo

SHATTLEWORTH 2010 p 244 754

ROSATI SANTOS 2016 755

KORNELL 2014 756

HAMPTON 2001

166

resultados obtidos por uma e por outra via ou seja aqui tambeacutem pela comparaccedilatildeo

de intenccedilotildees por parte da estimativa

84 NOCcedilAtildeO DE MEIO E FIM E USO DE INSTRUMENTOS

O reconhecimento da quididade particular associado ao de intenccedilotildees podem-

se aplicar aos testes aqui mencionados de colaboraccedilatildeo realizados com elefantes757

e com papagaios-da-nova-zelacircndia758 onde dois animais por tentativa e erro

aprenderam a puxar simultaneamente cada um uma corda amarrada em um suporte

para obterem o alimento sobre este o que se realizou por tentativa e erro

culminando com o reconhecimento da necessidade do parceiro e caracterizando a

participaccedilatildeo no experimento segundo o aristotelismo-tomismo

Tambeacutem exemplificariam a participaccedilatildeo no experimento com base em

tentativa e erro envolvendo a identificaccedilatildeo de intenccedilotildees e a comparaccedilatildeo de

imagens os testes individuais com suportes com ou sem alimento em que os

animais identificaram qual deles deveriam puxar para obter a recompensa como os

realizados com elefantes759 e os realizados com catildees760 cujo estudo apontou que

passavam a buscar pistas novas quando perdiam as anteriores segundo o

aristotelismo-tomismo movidos pelo apetite O mesmo pode-se dizer dos testes

dessa natureza com o tubo e com a plataforma em forma de ldquoUrdquo ambos com

arapucas para a recompensa761 realizados com as quatro principais espeacutecies de

grandes macacos

Jaacute Foerder e colaboradores762 afirmam que os resultados observados em sua

pesquisa com o elefante asiaacutetico que subiu em objetos para tentar alcanccedilar alimento

no alto natildeo se teriam dado por um processo preacutevio de tentativa e erro e que o uso

de objeto como apoio para alcanccedilar alimento no alto e mesmo a tentativa de

empilhar objetos para isto teria sido uma reaccedilatildeo suacutebita Mas os atos de empurrar o

objeto de substitui-lo de empilhar outros objetos ainda que neste uacuteltimo caso tenha

sido uma tentativa frustrada ndash caracterizando por si o processo de aprendizagem por

tentativa e erro ndash poderiam ter-se dado pelo fato de o animal ter visto algum

757

PLOTNIK et al 2011 758

HEANEY et al 2017 759

IRIE-SUJIMOTO 2008 760

MUumlLLER et al 2014 761

GIRNDT et al 2008 MARTIN-ORDAS CALL COLMENARES 2008 762

FOERDER et al 2011

167

humano outro animal ou mesmo um coespeciacutefico haacute mais tempo (dado o grande

alcance da memoacuteria destes animais) realizar tarefas similares o que poderia ter

escapado ao alcance do conhecimento dos pesquisadores

Mas assumindo estritamente o que dizem para o aristotelismo-tomismo os

animais sabem instintivamente que se se erguerem ou subirem em algo se for o

caso podem alcanccedilar uma presa ou um objeto que esteja mais alto e isto tambeacutem

pela estimativa especialmente quando o modo de subida natildeo eacute tatildeo evidente com

base na memoacuteria de imagens referentes a situaccedilotildees anteriores pela comparaccedilatildeo de

intenccedilotildees

O mesmo se diga dos macacos estudados por Koumlhler763 que empilharam as

caixas de madeira com sucesso para alcanccedilarem as bananas

A apreensatildeo de intenccedilotildees por parte da estimativa associada agrave tentativa e

erro ou seja agrave participaccedilatildeo no experimento estaacute ilustrada no uso de pedras e tacos

como martelo para quebrar cascas duras por primatas764 de bastotildees por

chimpanzeacutes ndash como nos testes de Koumlhler ndash e de objetos alongados por corviacutedeos ndash

ainda que tenha envolvido certo adestramento ndash765 e de peccedilas vegetais por grandes

primatas para inserccedilatildeo em locais cuja abertura eacute menor que a largura dos dedos766

aqui descrito tambeacutem em tentilhotildees pica-paus767 e inclusive no uso de objetos por

chimpanzeacutes768 e corviacutedeos769 para defesa contra predadores e em ataques de

babuiacutenos contra inimigos rolando rochas do alto de um morro tal como narrado por

Darwin770 bem como no uso de esponjas para proteccedilatildeo durante o forrageamento

em arrecifes por golfinhos771 Para o aristotelismo-tomismo existe a possibilidade

para cada um desses casos de haver tanto uma origem acidental como uma origem

intencional

Jaacute os testes que levaram Phillips e Santos772 a afirmarem que os macacos-

rhesus (Macaca mulatta) individuam objetos (no caso os frutos utilizados no estudo)

763

KOumlHLER 1927 p 135 ss 764

LUNCZ et al 2012 LUNCZ BOESCH 2014 765

JELBERT et al 2014 BRITISH BROADCASTING CORPORATION 2014 WIMPENNY 2009

766 BOESH C BOESH H 1990 VAN SCHAIK 2006

767 EIBL‐EIBESFELDT 1961 TEBBICH BSHARY 2004

768 BOESH 1991

769 ROELOFS 2010

770 DARWIN sd a) p 34-35

771 KRUumlTZEN et al 2014 KOPS et al 2014

772 PHILLIPS SANTOS 2006

168

segundo seu tipo e sua propriedade caracterizariam o reconhecimento de

quididades particulares pela estimativa e a comparaccedilatildeo de suas imagens

841 Planejamento

O golfinho fecircmeo Ake como relata Herman773 mostrou senso de

planejamento a partir dos comandos recebidos como quando levou a prancha da

beira para o meio da piscina para pulaacute-la e ao recolher os objetos dispondo-os pelo

corpo de modo que viabilizasse sua tarefa por entender o que fazer a partir de um

comando de recolhimento sem especificaccedilatildeo de um objeto determinado Eacute provaacutevel

que o animal tenha chegado a um e outro comportamento previamente por meio de

tentativa e erro ou por aprendizagem direta ou indireta (inclusive a imitaccedilatildeo)

Tambeacutem aqui natildeo se pode descartar a possibilidade da detecccedilatildeo por parte do

animal de movimentos sutis dos treinadores ou o efeito Clever Hans do qual se

falaraacute mais adiante

E ainda que se parta do princiacutepio de que natildeo houve nada disto sob a oacuteptica

aristoteacutelico-tomista estaacute-se no acircmbito das associaccedilotildees entre as intenccedilotildees

memorizadas e as imagens e apreensatildeo das intenccedilotildees referentes agravequele contexto

entatildeo adaptadas agrave situaccedilatildeo pela estimativa e relacionadas agrave voluntariedade

associada a esta observada nos animais natildeo humanos e nas crianccedilas o que estaacute

mais bem expresso nas combinaccedilotildees espontacircneas dos comportamentos que

seguem sinais que natildeo compotildeem o vocabulaacuterio demonstradas pelos golfinhos e

relatadas por Herman774 ou quando o golfinho Elele segue com sucesso o comando

para realizar um movimento novo conforme publicado por Braslau-Schneck775

gesto construiacutedo a partir do repertoacuterio conhecido e que reflete a plasticidade das

associaccedilotildees realizadas pela estimativa

85 IMITACcedilAtildeO E SINCRONIA

Tambeacutem ilustra a participaccedilatildeo no experimento e a comparaccedilatildeo de intenccedilotildees

segundo o aristotelismo-tomismo a busca dos catildees pela otimizaccedilatildeo da realizaccedilatildeo

773

HERMAN 2006 774

Ibid 775

BRASLAU-SCHNECK 1994 apud HERMAN 2006

169

de tarefas evitando assim a sobreimitaccedilatildeo tal como demonstrado pelo estudo de

Johnston e colaboradores776

Jaacute as habilidades de imitaccedilatildeo dos golfinhos com associaccedilotildees realizadas entre

suas partes corporais e as humanas correspondentes777 podem ser compreendidas

pela comparaccedilatildeo de imagens de natureza quiditativa e de intenccedilotildees

E pode-se sugerir a simples apreensatildeo de intenccedilotildees em relaccedilatildeo agrave habilidade

de sincronia e inclusive a de sincronia mediante o comando de criaccedilatildeo que

implicaria a voluntariedade sem deliberaccedilatildeo mesmo que ainda natildeo se conheccedila a

explicaccedilatildeo fisioloacutegica para o fenocircmeno778

86 CORRELACcedilAtildeO DE FIGURAS OU SONS

Assim explicam o raciociacutenio analoacutegico Gillan Premack e Woodruff

O raciociacutenio analoacutegico envolve o reconhecimento de que a relaccedilatildeo entre um par de estiacutemulos eacute a mesma que a relaccedilatildeo entre outro par de estiacutemulos Portanto o raciociacutenio analoacutegico requer uma relaccedilatildeo de segunda ordem ou uma relaccedilatildeo entre relaccedilotildees

779

Esses testes realizados com sucesso em outros primatas aleacutem dos

chimpanzeacutes como G gorilla gorilla e orangotangos da espeacutecie Pongo abelii780 e

babuiacutenos (Papio papio)781 com tela ldquotouch-screenrdquo e macacos-pregos (Cebus

apela)782 com cubos e copos ndash e inclusive como se viu em corviacutedeos com

pequenas placas ndash783 tambeacutem podem ser vistos agrave luz da estimativa como

identificaccedilatildeo e comparaccedilatildeo de imagens no acircmbito quiditativo essencial e acidental

No caso da segunda etapa do teste com Sarah784 o reconhecimento

comparativo entre o objeto conhecido memorizado e sua respectiva figura e o

conseguinte estabelecimento da relaccedilatildeo com a respectiva funccedilatildeo caracterizam

776

JOHNSTON et al 2017 777

HERMAN 2002 778

Id 2006 779

ldquoAnalogical reasoning involves recognizing that the relation between one pair of stimuli is the same as the relation between another pair of stimuli Therefore analogical reasoning requires a second-order relation or a relation among relationsrdquo GILLAN et al 1981 p 11

780 VONK 2003

781 FAGOT MAUGARD 2013

782 KENNEDY FRAGASZY 2008

783 SMIRNOVA et al 2015

784 GILLAN et al 1981

170

tambeacutem a identificaccedilatildeo e a comparaccedilatildeo de imagens no acircmbito quiditativo como

tambeacutem a associaccedilatildeo pela estimativa com as respectivas intenccedilotildees memorizadas

Tambeacutem o reconhecimento e a comparaccedilatildeo de imagens pela estimativa

levando agrave identificaccedilatildeo das correlaccedilotildees entre acidentes de figuras em uma

sequecircncia como tambeacutem identificou George785 a fim de que se identifique com

precisatildeo o componente seguinte jaacute explicaria sob a oacuteptica aristoteacutelico-tomista o

ecircxito de Koko786 em testes ditos de progressatildeo loacutegica

A capacidade dos elefantes de reconhecerem pares de padrotildees de figuras

apontada nos estudos de Rensch787 parece-nos mais um exemplo do papel da

estimativa integrada agrave memoacuteria e agrave imaginaccedilatildeo sendo julgado de iniacutecio pelo proacuteprio

sentido da visatildeo e entatildeo pelo sentido comum Essa pesquisa se soma agravequelas que

mostram a impressionante capacidade da memoacuteria dos elefantes como tambeacutem a

de Markowitz e colaboradores788 que aponta o papel da estimativa de comparaccedilatildeo

de intenccedilotildees pela associaccedilatildeo entre a accedilatildeo por realizar-se corretamente (acionar o

interruptor que apagaraacute ou acenderaacute a luz) e a recompensa obtida

Os experimentos seguintes de Rensch789 com a elefanta envolvendo padrotildees

de figuras e sons e o de seus colaboradores com cavalos levaram o pesquisador a

sugerir que esses animais conseguiriam realizar abstraccedilatildeo em algum grau pelo fato

de as figuras e os sons escolhidos com base em cada modelo a eles referente

apresentarem configuraccedilotildees diferentes deste fazendo-o crer que o animal estaria de

posse da ideia de cada um (a ideia de cruz de trecircs etc) Mas pode-se dizer sob a

oacuteptica aristoteacutelico-tomista que seguem no acircmbito dos particulares e tambeacutem dos

acidentes havendo natildeo abstraccedilatildeo mas se natildeo o que diremos em seguida em

relaccedilatildeo ao papagaio Alex e ao chimpanzeacute fecircmeo Sheba uma comparaccedilatildeo

quiditativa da estimativa entre figura com mais e figura com menos espaccedilo ocupado

pela representaccedilatildeo dos pontos e o mesmo em relaccedilatildeo agraves distacircncias entre as listras

e por figura escura com cruzamento de duas linhas a partir de um modelo de

imagem de cada um novamente por grau de semelhanccedila E pode-se dizer o mesmo

com relaccedilatildeo agraves melodias que independente das demais caracteriacutesticas que se

785

GEORGE 2003 786

PATTERSON LINDEN 1981 p 100 787

RENSCH 1956 RENSCH 1957 788

MARKOWITZ et al 1975 789

RENSCH 1957

171

apliquem a elas mantecircm seu caraacuteter distintivo particular identificaacutevel pelo sentido

da audiccedilatildeo

Tambeacutem o reconhecimento dos objetos com modificaccedilotildees acidentais

distinguidos pelos golfinhos de Herman790 e associado por este a generalizaccedilotildees

daacute-se segundo o aristotelismo-tomismo por comparaccedilatildeo das imagens por parte da

estimativa e entatildeo por grau de semelhanccedila

87 COMPETEcircNCIA PARA APREENSAtildeO DE QUANTIDADES

Sugerimos que se possa atribuir a mesma explicaccedilatildeo para experimentos

como os de Irie-Sujimoto791 e colaboradores os de Perdue e colaboradores792 e os

de Petrazzini e Wyne793 em que os elefantes e os catildees neste uacuteltimo preferiram

respectivamente cestas e pratos de alimento mais cheios apontando certa noccedilatildeo

de quantidade Os animais estimam que ali teratildeo mais condiccedilotildees de saciar o apetite

inclusive provavelmente comparando imagens anteriores memorizadas de

circunstacircncias em que deparou com menos ou mais alimentos e dos resultados em

relaccedilatildeo agrave saciedade

De anaacutelise mais precisa nesse sentido satildeo os testes da chamada

competecircncia numeacuterica como os realizados com Alex794 e com Sheba795 que teriam

efetuado pequenas somas com matrizes de objetos cujos resultados chegariam ateacute

os nuacutemeros 6 (e contagem ateacute 8) e 4 respectivamente e com algarismos araacutebicos

cujos resultados da parte de Alex iam de 1 a 5 Ambos foram treinados previamente

para a apreensatildeo de cada uma das quantidades que no acircmbito do aristotelismo-

tomismo diferem do nuacutemero propriamente dito enquanto resultante da abstraccedilatildeo

Esta apreensatildeo como se descreveu anteriormente tem sua primeira etapa no juiacutezo

dos sentidos e entatildeo a partir da imaginaccedilatildeo e da memoacuteria a estimativa pode

estabelecer desde suas quididades a ordenaccedilatildeo e realizar daiacute por comparaccedilatildeo natildeo

soacute a soma e a subtraccedilatildeo dessas quantidades como a transferecircncia por associaccedilatildeo

destas para as imagens dos algarismos com o que realizaraacute essas mesmas

operaccedilotildees a partir das quididades particulares destes

790

HERMAN et al 1984 HERMAN 1986 791

IRIE-SUJIMOTO et al 2009 792

PERDUE et al 2012 793

PETRAZZINI WYNNE 2016 794

PEPERBERG 2006 795

BOYSEN BERNTSON 1989

172

Isto se encontra em consonacircncia com o que diz Aristoacuteteles em relaccedilatildeo agrave

similaridade entre a alma desses animais e das crianccedilas E de fato Wynn796

demonstrou que crianccedilas de cerca de cinco meses jaacute apresenta a chamada

competecircncia numeacuterica para as adiccedilotildees e subtraccedilotildees mais simples

Com relaccedilatildeo aos estudos de Matsuzawa e equipe797 o aprendizado de

sequecircncias numeacutericas inclusive com curingas aleacutem do ecircxito diante da mudanccedila de

configuraccedilatildeo do experimento (numerais trocando de lugar apoacutes o acerto anterior)

tambeacutem se enquadra no que se acaba de dizer sobre a ordenaccedilatildeo cabendo

tambeacutem agrave estimativa o entendimento da relaccedilatildeo entre o algarismo e os curingas por

associaccedilatildeo

Seguem tambeacutem a mesma explicaccedilatildeo as associaccedilotildees entre algarismos

conjuntos de pontos e quantidade de alimento estabelecidas pelos macacos-rhesus

nos testes realizados por Livingstone e colaboradores798 mesmo que tenham

afirmado que natildeo obtiveram evidecircncia de que os animais teriam contado os pontos

E aos testes relacionados agrave economia envolvendo tomada de decisatildeo

realizados com macacos-prego por Lakshminarayanan e Santos799 empregamos

uma uacuteltima vez essa mesma explicaccedilatildeo aqui somada agrave voluntariedade associada agrave

estimativa e sua comparaccedilatildeo de intenccedilotildees o que teriam levado os animais a

preferirem um experimentador a outro

88 APTIDOtildeES RELACIONADAS Agrave COMUNICACcedilAtildeO

Em um dos estudos de Kaminski e colaboradores800 os catildees identificando os

nomes nos comandos com os respectivos objetos que deviam pegar em outras

dependecircncias do recinto demonstraram integrar memoacuterias relacionadas agrave

localizaccedilatildeo agravequelas relacionadas agrave identidade caracterizando nisto o papel da

estimativa de comparar e compor quididades particulares a partir de imagens

memorizadas

796

WYNN 1992 797

KAWAI MATSUZAWA 2000 Id 2000b TOMONAGA et al 1993 BIRO MATSUZAWA 1999

798 LIVINGSTONE et al 2010

799 LAKSHMINARAYANAN SANTOS 2012

800 KAMINSKI et al 2007

173

As associaccedilotildees apresentadas de palavras a objetos ou accedilotildees com destaque

para espeacutecimes como Rico801 e Chaser802 e no que toca aos grandes macacos por

Kanzi803 e por Koko804 se dariam pela composiccedilatildeo de quididades ou de quididades

e intenccedilotildees respectivamente com recurso evidentemente agrave memoacuteria

Os estudos de Herman e colaboradores com golfinhos mostraram

compreensatildeo de sentenccedilas reversiacuteveis e lexicalmente ou estruturalmente novas

para os animais inclusive sugerindo generalizaccedilotildees805 aleacutem do reconhecimento de

sequecircncias anocircmalas aos quais os animais responderam com omissatildeo ou com

improviso806 demonstrando a competecircncia semacircntica e sintaacutetica Mas para o

aristotelismo-tomismo haveria aqui ainda a participaccedilatildeo na linguagem e natildeo esta

propriamente dita que eacute fruto das operaccedilotildees do intelecto807 Por sua estimativa

desenvolvida esses animais chegariam ao entendimento de generalizaccedilotildees como

ldquopessoardquo808 porque identificam um humano como semelhante a outro por possuiacuterem

a imagem do humano comparando as imagens de humanos captadas e retidas por

seus sentidos ateacute entatildeo e natildeo por captaccedilatildeo da espeacutecie inteligiacutevel humanidade que

poderia-lhes conferir a habilidade de conceituar algo que natildeo se identificou Essa

mesma estimativa lhes permite por comparaccedilatildeo de intenccedilotildees perceber pelo que se

disse logo acima a relaccedilatildeo de cada palavra com seu respectivo objeto ou accedilatildeo e

entatildeo se haacute algo em seu contexto proacuteximo agravequilo que se refere agrave determinada

sequecircncia anocircmala para que execute ou natildeo o comando

Jaacute a identificaccedilatildeo da parte de Ake de que um remo significaria positivamente

a presenccedila de um objeto e o outro negativamente ou seja a ausecircncia809

caracterizaria a comparaccedilatildeo no acircmbito quiditativo de imagens e a captaccedilatildeo da

intenccedilatildeo relacionada a cada remo Quando nesta tarefa associada agrave outra de

comando com dois objetos e uma accedilatildeo810 Ake leva o frisbee ao remo ldquonatildeordquo verifica-

se isto que se diz aqui e o que se diz no paraacutegrafo anterior associados agrave

voluntariedade relacionada agrave estimativa

801

KAMINSKI et al 2004 802

PILLEY 2013 803

RAFFAELE 2006 804

THE GORILLA FOUNDATION 2018 805

HERMAN et al 1984 HERMAN 1986 Id 2006 806

HERMAN et al 1993a 807

TOMAacuteS DE AQUINO 2001 Q 58 a 4 p 549 808

HERMAN et al 1984 809

HERMAN FORESTELL 1985 810

HERMAN et al 1993b

174

A comunicaccedilatildeo entre grandes macacos observada no habitat natural como

os comandos por meio de golpes nas aacutervores relatados por Boesch811 e as tantas

variaccedilotildees acuacutesticas de gorilas verificadas por Hedwig e colaboradores812 tambeacutem

exemplificam a capacidade de participaccedilatildeo na linguagem bastante desenvolvida nos

grandes primatas mas com potenciais combinaccedilotildees que lhes confere destaque

dentre os outros animais que os faz nesse sentido assemelharem-se bastante agraves

crianccedilas humanas tal como visto nos estudos em que se ensinou a comunicaccedilatildeo

por gestos manuais ou por lexigramas como o desenvolvido por Patterson e

Linden813 com Koko e como Tomasello814 analisou em sua revisatildeo

respectivamente Dentre as habilidades do bonobo Kanzi afirma o pesquisador que

a de identificar a funccedilatildeo de uma palavra segundo sua posiccedilatildeo na frase equivaleria

ao animal estar expressando sentenccedilas como uma crianccedila de dois anos de idade

Mas a quase totalidade dessas sentenccedilas eacute constituiacuteda de pedidos com uma palavra

de accedilatildeo e uma ou mais de pessoas ou objetos Tomasello815 diz que o animal sabe

que o que eacute colocado vem em primeiro na frase e aquilo em que colocar vem em

seguida (como no caso da ldquobolardquo e do ldquochapeacuteurdquo) e explica

[] suas categorias gramaticais satildeo do tipo ldquoaquele que atingerdquo e ldquocoisa atingida comrdquo ldquoaquele que colocardquo e ldquocoisa colocadardquo natildeo categorias generalizadas tais como ldquoagenterdquo e ldquopacienterdquo ou ldquosujeitordquo e ldquoobjeto diretordquo Isso eacute basicamente o niacutevel de competecircncia gramatical de crianccedilas novas de dois anos que tambeacutem funciona com ldquoilhas verbaisrdquo

816 e outras construccedilotildees

baseadas em itens deste tipo817

811

BOESCH 1996 812

HEDWIG et al 2014 813

PATERSON LINDEN 1981 814

TOMASELLO 2017 815

Id 1994 2017 816

Segundo a Hipoacutetese da Ilha Verbal (Verb Island Hypothesis) do proacuteprio Tomasello ldquoa linguagem inicial das crianccedilas eacute organizada e estruturada completamente em torno de verbos individuais e outros termos predicativos ou seja a competecircncia sintaacutetica da crianccedila de dois anos eacute composta completamente de construccedilotildees de verbos especiacuteficos com aberturas nominais encaixadas Aleacutem da categorizaccedilatildeo dos nominais os aprendizes da linguagem nascente natildeo possuem outras abstraccedilotildees linguiacutesticas ou formas de organizaccedilatildeo sintaacuteticardquo (Original ldquo[] childrens early language is organized and structured totally around individual verbs and other predicative terms that is the 2-year-old childs syntactic competence is comprised totally of verb-specific constructions with open nominal slots Other than the categorization of nominals nascent language learners possess no other linguistic abstractions or forms of syntactic organizationrdquo) Id 2000 p 213-214

817 ldquo[] his grammatical categories are of the type lsquohitterrsquo and lsquothing hit withrsquo lsquoputterrsquo and lsquothing

putrsquo not generalized categories such as lsquoagentrsquo and lsquopatientrsquo or lsquosubjectrsquo and lsquodirect objectrsquo This is basically the level of grammatical competence of young two-year-old children who also work with lsquoverb islandsrsquo and other item-based constructions of this typerdquo Id 2017 p 101

175

A primeira categoria refere-se a termos singulares e a segunda a termos

universais o que possibilitaria a conceituaccedilatildeo a primeira operaccedilatildeo do intelecto e

caracterizaria definitivamente a abstraccedilatildeo intelectiva em animais natildeo humanos

segundo a descriccedilatildeo aristoteacutelico-tomista Natildeo foi poreacutem o caso Algo que poderia

parecer chegar um pouco mais perto disto seria a atribuiccedilatildeo de ldquowater birdrdquo ao pato

que fez Washoe ou as de ldquofake mouthrdquo818 dada a nariz e de ldquonose fakerdquo819 dada a

maacutescara por Koko e inclusive o modo como segundo Patterson e Linden xingava

ldquobirdrdquo820 Mas ainda assim o que se teria segundo o aristotelismo-tomismo seriam

correlaccedilotildees de quididades particulares (entre as palavras conhecidas os gestos ou

os lexigramas e os objetos em si) por grau de semelhanccedila pela estimativa com

voluntariedade que esses animais teriam aprendido a estabelecer em seus

respectivos processos de treinamento

Savage-Rumbaugh e colaboradores821 em trabalho em que elencam

seiscentos e sessenta comandos alguns com alguma variaccedilatildeo dados a Kanzi e agrave

menina Alia de dois anos filha de uma das assistentes referem-se a apontamentos

de Quine822 segundo os quais se teria de determinar qual ou quais das incontaacuteveis

propriedades de um objeto se levaria em consideraccedilatildeo ao denotaacute-lo Apontam entatildeo

a descontextualizaccedilatildeo pela qual um macaco poderia compreender por exemplo a

atribuiccedilatildeo da palavra maccedilatilde agrave fruta em si sem que esta esteja a representar-lhe uma

finalidade praacutetica sem que lhe valha como recompensa Como dizem

Eacute faacutecil treinar um macaco para dizer lsquomaccedilatildersquo afim de que pegue uma maccedilatilde mas eacute difiacutecil ensinaacute-lo a usar lsquomaccedilatildersquo para descrever uma comida que a ele natildeo eacute permitido comer uma comida que ele vecirc algueacutem mais comer uma comida que ele natildeo goste uma comida que eacute encontrada em um lugar em particular etc

823

Explicam que isto seria mais comum em crianccedilas humanas mas em macacos

soacute se pode verificar quando haacute descontextualizaccedilatildeo dos siacutembolos em relaccedilatildeo aos

818

PATTERSON LINDEN 1981 p 112 819

Ibid p 117 820

Ibid p 119-121 e 142 821

SAVAGE-RUMBAUGH et al 1993 822

QUINE 1960 passim 823

ldquoIt is easy to train an ape to say aple in order to get an aple but difficult to teach it to use aple to describe a food that it is not allowed to eat a food that it sees someone else eating a food that it does not like a food that is found in a particular location etcrdquo SAVAGE-RUMBAUGH et al 1993 p 15

176

eventos que estariam associados agrave sua aprendizagem E se o fazem entatildeo lhes

seria possiacutevel atribuir novos nomes a novos objetos e assim criar novos sinais

Mas mesmo aqui natildeo haacute razatildeo para negar que se siga no acircmbito das

associaccedilotildees de quididades e intenccedilotildees de natureza particular sob a perspectiva

aristoteacutelico-tomista no exerciacutecio da participaccedilatildeo no chamado experimento com

voluntariedade natildeo deliberativa

89 AUTORRECONHECIMENTO

Os estudos mostram que alguns animais a saber golfinhos824 corviacutedeos825

elefantes826 e grandes macacos como os gorilas827 e os orangotangos828

comprovadamente reconhecem sua proacutepria imagem diante de um espelho o que

poderia apontar para um tipo mais avanccedilado de ldquoawarenessrdquo Cammaerts Trico e

Cammaerts829 no entanto em um surpreendente estudo que sugere

autorreconhecimento em espelhos em formigas tambeacutem testadas com o

reconhecimento da marca realizado com trecircs espeacutecies de um mesmo gecircnero a

saber Myrmica sabuleti M rubra and M ruginodis afirmam que o

autorreconhecimento natildeo implicaria necessariamente algum tipo de consciecircncia

Alguns pesquisadores vieram tambeacutem a propor por meio de outros testes que

alguns animais possuem reconhecimento e quiccedilaacute consciecircncia do proacuteprio corpo

como Dale e Plotnik830 que verificaram que os elefantes asiaacuteticos teriam percebido

que o proacuteprio peso impedia a realizaccedilatildeo da tarefa e Herman que estudou a

execuccedilatildeo de tarefas por golfinhos que envolviam partes corporais associadas agraves

suas proacuteprias accedilotildees831 Diante da execuccedilatildeo do comando para que um destes

animais escolhesse a tarefa o pesquisador descreve que

Phoenix teve de manter uma representaccedilatildeo mental do comportamento que ela executou da uacuteltima vez atualizar isto com cada comportamento que se sucedeu processar semanticamente a repeticcedilatildeo ou algum outro gesto e

824

REISS 2001 825

PRIOR GUumlNTUumlRKUumlN 2008 826

PLOTNIK et al 2006 827

PATTERSON LINDEN 1981 p 108 828

MILES 1990 829

CAMMAERTS TRICO CAMMAERTS 2015 830

DALE PLOTNIK 2017 831

HERMAN 2006

177

entatildeo selecionar por ela mesma o mesmo comportamento para repetir ou escolher um comportamento dentre os outros quatro []

832

Aqui se observa sob a perspectiva aristoteacutelico-tomista a memoacuteria de

intenccedilotildees seguida de comparaccedilotildees destas por parte da estimativa e o exerciacutecio da

voluntariedade a ela associada

E o mesmo se diga das combinaccedilotildees entre accedilotildees e partes do corpo incluindo

as que implicam inovaccedilatildeo realizadas por Elele a partir de comandos833

relacionando ao que se disse mais acima sobre a associaccedilatildeo destes com objetos e

accedilotildees caracterizando associaccedilotildees particulares e ilustrando aqui tambeacutem a

plasticidade da estimativa

Quando os elefantes asiaacuteticos reconheceram o impedimento provocado pelo

proacuteprio peso isto segundo o aristotelismo-tomismo se explicaria pela comparaccedilatildeo

da estimativa entre a proacutepria quididade e a do tapete sobre o qual se encontravam e

a intencionalidade relacionada agrave permanecircncia neste

Sabe-se que os entes humanos comeccedilam a reconhecer-se no espelho antes

dos dois anos de idade834 Reconhecer-se implica apreender a proacutepria quididade

seja no acircmbito particular ou a partir de um universal e o mesmo pode-se dizer do

reconhecimento de cada parte corporal O autorreconhecimento pode assim estar

associado agrave estimativa do mesmo modo que se daacute com o reconhecimento do outro

832

ldquoPhoenix had to maintain a mental representation of the behaviour she last performed update that with each succeeding behaviour semantically process the repeat or any gesture and then either self-select the same behaviour for repeat or choose a behaviour from the remaining four if given anyrdquo HERMAN 2006 p 457

833 HERMAN et al 2001

834 AMSTERDAM 1972

178

9 CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS E CONCLUSAtildeO

Natildeo encontramos assim nenhuma habilidade que nos remeteria

necessariamente agrave presenccedila de cogitativa e de intelecccedilatildeo entre os animais natildeo

humanos na bibliografia consultada resultado que corrobora a validade das

interpretaccedilotildees a partir da doutrina aristoteacutelico-tomista relacionadas agrave psicologia

comparada agrave etologia e outras disciplinas congecircneres Pudemos enquadrar todas

as habilidades que percorremos como envolvendo apreensatildeo combinaccedilatildeo ou

comparaccedilatildeo de quididades ou intenccedilotildees de natureza singular particular Todos os

comportamentos analisados envolveram o sentido comum a memoacuteria a imaginaccedilatildeo

e a estimativa e nenhum deles nos deu sinal do uso da reminiscecircncia e do uso

voluntaacuterio de imagens que caracterizariam a cogitativa e serviriam de base para a

abstraccedilatildeo Mesmo os comportamentos considerados espontacircneos e ateacute os

inovadores poderiam ser explicados sob a oacuteptica aristoteacutelico-tomista como sendo

movidos pela memoacuteria ou pela imaginaccedilatildeo e natildeo motores de natureza voluntaacuteria

destas por associaccedilotildees resultantes tambeacutem das operaccedilotildees da estimativa

Nota-se o tom de entusiasmo por parte de alguns pesquisadores diante de

certos comportamentos observados como aqueles que caracterizaram uma accedilatildeo

realizada segundo eles pela primeira vez Neste sentido poreacutem Premack e

Woodruff835 ao darem iniacutecio agraves investigaccedilotildees sobre a teoria da mente afirmaram

que era muito difiacutecil evitar que um chimpanzeacute se envolvesse informalmente na

soluccedilatildeo de problemas no cotidiano o que dificultava a anaacutelise do quanto um

determinado comportamento teria de fato o caraacuteter inovador E isto decerto se aplica

aos demais casos relacionados aqui prioritariamente investigados por exemplo

reforccedilando o que afirmamos a respeito do golfinho fecircmeo Ake que poderia ter

perfeitamente aprendido a recolher os objetos a partir do mais distante por ter

observado entes humanos agindo anteriormente deste modo e tambeacutem do elefante

e dos chimpanzeacutes que utilizaram objetos para alcanccedilar alimento suspenso no alto e

inclusive tentaram empilhar caixas ou taacutebuas (estas da parte de um elefante sem

sucesso) e que podem perfeitamente ter visto entes humanos fazendo algo

semelhante em outras circunstacircncias Mas natildeo haacute como negar a presenccedila desta

capacidade quando se trata por exemplo do uso em ambiente selvagem de

835

PREMACK WOODRUFF 1978

179

instrumentos incluindo os meios de confecccedilatildeo e das diferenccedilas que costumam

haver neste acircmbito entre populaccedilotildees de uma mesma espeacutecie

Outro comportamento que foi objeto de muitos dos trabalhos consultados eacute a

transmissatildeo cultural que jaacute havia sido exemplificada sem referecircncia ao termo por

Aristoacuteteles quando se referiu ao ensinamento do canto por parte das aves e que

ilustra o alcance do processo de aprendizagem no acircmbito da estimativa e que

parece encontrar seu aacutepice no que toca aos animais natildeo humanos nos grandes

macacos

Estas duas caracteriacutesticas a teoria da mente e a transmissatildeo cultural

exemplificam um conjunto de variaacuteveis que podem atuar em determinado

comportamento e que deve ser considerado a fim de que a inteligecircncia observada

nos animais natildeo seja superestimada sobretudo quando se pretende comparaacute-la agrave

humana o que se daacute como indica Marie George836 pela distinccedilatildeo indevida entre o

intelecto e o sentido algo que pode levar a testes de inteligecircncia defeituosos e eacute

exemplificado pelo fato de que alguns sentidos mais acurados do que os dos

humanos em certos animais chegam a impressionar muitos pesquisadores a ponto

de fazecirc-los chamar inteligecircncia as habilidades a eles relacionadas Superestimar

assim a chamada inteligecircncia dos animais seria tatildeo equivocado como subestimaacute-la

como fizeram aqueles que tentaram explicar essas habilidades por uma visatildeo

estritamente mecanicista

Exemplificam essa superestima tanto o caso dos animais pintores que

reproduzem natildeo rabiscos como Kanzi mas figuras concretas como flores tal como

o fazem os elefantes asiaacuteticos no qual posteriormente descobriu-se que seus

mahouts837 eacute que lhes sussurravam comandos que orientavam as pinceladas como

explicou Morris838 e o famoso caso do cavalo Clever Hans que impressionou a

muitos por ter dado a entender que saberia realizar as quatro operaccedilotildees

matemaacuteticas representando o resultado com batidas com sua pata no chatildeo mas no

qual ele e seu treinador Wilhelm von Osten foram minuciosamente analisados pelo

bioacutelogo especialista em psicologia comparada Oskar Pfungst839 que por fim verificou

que o animal apenas respondia a sinais corporais de von Osten que indicavam

quando deveria parar de bater com a pata no chatildeo O efeito Clever Hans como essa

836

GEORGE 2003 837

Como chamam os treinadores na iacutendia 838

MORRIS 2009 839

PFUNGST 1911

180

interaccedilatildeo passou a chamar-se mostra a influecircncia dos humanos no desempenho

dos animais em seus testes podendo comprometer seriamente a interpretaccedilatildeo dos

resultados o que de certo modo conflita com a necessidade da presenccedila humana

para o sucesso na realizaccedilatildeo de uma miriacuteade de testes que envolvem as interaccedilotildees

sociais o que exclui a possibilidade de isolamento dos animais e provoca assim uma

seacuterie de dificuldades

Posteriormente estudos como os de Proops e colaboradores com cavalos

demonstraram que os animais natildeo soacute interagem com expressotildees corporais

incluindo as faciais e sugerem que podem memorizaacute-las por longos periacuteodos com

influecircncia significativa no desempenho de tarefas futuras840 Assim muitos dos

resultados apontados aqui de observaccedilotildees realizadas na presenccedila de treinadores

poderiam estar de algum modo relacionados a este efeito

Outro problema que George aponta eacute o uso ambiacuteguo de termos como a

proacutepria palavra ldquointeligecircnciardquo que segundo defende de acordo com o aristotelismo-

tomismo enquanto nos entes humanos se refere ao processo de intelecccedilatildeo de

abstraccedilatildeo como jaacute se disse nos animais implica somente uma inteligecircncia praacutetica

dos sentidos como corrobora o presente estudo com o que parece concordar

Damaacutesio quando ao tratar das reaccedilotildees especiacuteficas desencadeadas pelas emoccedilotildees

diz que ao deparar com o agente indutor os animais imediatamente fogem ficam

inertes atacam o inimigo ou adotam condutas que lhes geram algum tipo de prazer

ao passo que no homem haacute a possibilidade de que essas condutas sejam

temperadas pelo uso da razatildeo841

George exemplifica o que diz com a preferecircncia por parte de um gato por um

alimento uacutemido ao seco e pode ilustrar-se tambeacutem com os problemas que um ente

humano pode resolver sem precisar da intelecccedilatildeo como amarrar um sapato ou

andar de bicicleta que natildeo exigem o conhecimento teoacuterico que caracterizaria a

intelecccedilatildeo e ao que se chega por aprendizagem direta ou indireta ou por tentativa e

erro e que natildeo podem ser descritos por uma visatildeo inflexiacutevel do instinto Ela sugere

entatildeo como soluccedilatildeo para o melhor entendimento da questatildeo a saiacuteda do que entende

como uma dicotomia entre instinto e inteligecircncia

840

PROOPS et al 2018 O experimento aqui consistiu em mostrar imagens de rostos de pessoas sorrindo ou com raiva a cavalos associando-as a algum estado emocional e algumas horas depois fazendo com que os animais interagissem com as mesmas pessoas das fotografias agora com expressatildeo neutra a quem os cavalos demonstraram reaccedilotildees que se relacionavam com as expressotildees nas imagens fotograacuteficas

841 DAMAacuteSIO 2000 p 70

181

Explica Echavarriacutea por sua vez que quando Tomaacutes de Aquino fala de

instinto refere-se a um impulso natural com alguma voluntariedade ordenado agraves

necessidades do indiviacuteduo ou da espeacutecie842 Tem-se com isto um leque de

possibilidades que caracteriza por exemplo as menccedilotildees feitas aqui agrave plasticidade

da estimativa incluindo a participaccedilatildeo no ldquoexperimentordquo as habilidades que tal

participaccedilatildeo comporta sem sair do acircmbito da estimativa tal como as que foram

descritas neste estudo

No exemplo de George o gato por um lado natildeo eacute forccedilado a comer a comida

uacutemida e por outro natildeo deliberou sobre o caso Ele sente a diferenccedila entre ambas e

se dirige agrave que lhe eacute mais apeteciacutevel ilustrando a voluntariedade associada agrave

estimativa agrave qual o aristotelismo-tomismo se refere

Tambeacutem nos testes de comunicaccedilatildeo a pesquisadora aponta ainda falhas na

exposiccedilatildeo dos dados como a omissatildeo nos artigos por alguns pesquisadores do

uso de palavras que caracterizam redundacircncias e combinaccedilotildees sem sentido pelos

animais estudados Ela entatildeo observa que os grandes macacos que dominaram os

lexigramas e a comunicaccedilatildeo por sinais talvez pudessem expressar a relaccedilatildeo entre

causa e efeito jaacute que estabelecem essa relaccedilatildeo em casos concretos mas nenhum

deles foi capaz de adotar uma posiccedilatildeo em relaccedilatildeo a um problema e justificar essa

posiccedilatildeo o que caracterizaria o exerciacutecio do raciociacutenio e o que tornaria possiacutevel

ensinar-lhes uma ciecircncia ou mesmo princiacutepios dessa ciecircncia enquanto tais

Ela identificou no orangotango Chantek uma suposta tentativa de iniacutecio de

conversa com a frase anteriormente mencionada ldquoJeannie Chantek chaserdquo843 sobre

a qual natildeo soacute observa natildeo ir aleacutem disto inclusive porque sua meacutedia de comprimento

de enunciados era baixa como fornece como explicaccedilatildeo a hipoacutetese de que se trate

da busca por satisfaccedilatildeo no acircmbito emocional pelo contato social com a treinadora

O que diz George ateacute aqui parece adequar-se tambeacutem ao comportamento de

Koko que segundo seus treinadores expressava sentimentos com demonstraccedilotildees

de humor apelidava e inclusive podia mentir para eximir-se da culpa de determinado

ato

Nenhum deles prossegue a estudiosa tambeacutem foi capaz de exibir uma

conversa que caracterizasse algo mais do que um instrumento para alcanccedilar um

objetivo especiacutefico de expressar uma narrativa de solicitar uma informaccedilatildeo para

842

ECHAVARRIacuteA 2009 p 122-123 843

MILES 1990 p 521

182

compreender algo melhor de expressar uma opiniatildeo ou um desejo para aleacutem do

caraacuteter instrumental de usar palavras para coisas que natildeo sejam percebidas

sensivelmente

Enquanto Aristoacuteteles identifica a linguagem assim como a loacutegica como

exclusiva dos entes humanos como dependente do exerciacutecio da intelecccedilatildeo844

Miles845 identifica trecircs elementos que entende caracterizarem a representaccedilatildeo

linguiacutestica a saber 1- um elemento do mundo real designado por um sinal 2- que

intencionalmente transmite seu significado 3- sobre o qual haacute um entendimento

cultural compartilhado Para o aristotelismo-tomismo estes elementos estariam

presentes tanto na linguagem como poderiam estar presentes na participaccedilatildeo na

linguagem

Em seguida Miles fornece algumas evidecircncias de que palavras ou sinais

estejam sendo utilizados de modo referencial como a indicaccedilatildeo de um objeto ou

evento presente ou ausente no ambiente que tenham domiacutenios semacircnticos ou de

significado e que podem natildeo depender por completo do contexto Menciona entatildeo

os vaacuterios estaacutegios da comunicaccedilatildeo referencial para afirmar que Chantek apresenta

cada um desses estaacutegios tal como observado em crianccedilas O orangotango

inicialmente repetia accedilotildees socialmente orientadas (como fazer algo para chamar a

atenccedilatildeo) em seguida passou a sentir necessidade de exibir objetos e entatildeo a dar

objetos Posteriormente Chantek usou de sua capacidade de voluntariedade e do

sinal ldquoPointrdquo846 para apontar para locais relacionados ao modo com que queria ser

agradado e responder perguntas neste sentido e entatildeo passou a combinar este

sinal com o sinal ldquoGordquo847 encaminhando os treinadores para onde queria Os

resultados mostraram que Chantek possuiacutea o niacutevel de desempenho cognitivo de

uma crianccedila de cerca de dois anos de idade com algumas caracteriacutesticas

compartilhadas com crianccedilas de quatro e ateacute de sete anos de idade o que estaacute em

perfeita consonacircncia com a declaraccedilatildeo aristoteacutelica supracitada a respeito desta

relaccedilatildeo e com o que se descreveu anteriormante em relaccedilatildeo a isso sob a

perspectiva do uso da estimativa

Mesmo o reconhecimento da natureza representativa dos sinais que passou

a fazer com os peacutes e com objetos e inclusive a criar pode ser explicado aqui pela

844

DE MOURA NEVES 1981 845

MILES 1990 846

ldquoApontarrdquo 847

ldquoIrrdquo

183

combinaccedilatildeo de intenccedilotildees e imagens particulares dentre as quais aquelas

memorizadas teriam sido acessadas natildeo por deliberaccedilatildeo mas movidas pela

necessidade do animal naquele instante

A comunicaccedilatildeo tambeacutem poderia mostrar sinais de enquadramento na teoria

da mente da empatia da adoccedilatildeo da perspectiva alheia E natildeo soacute no acircmbito

intelectivo como no estimativo pela comparaccedilatildeo de particulares e reconhecimento

do outro e de si mesmo Segundo poreacutem a hipoacutetese da intuiccedilatildeo antropomoacuterfica

poder-se-ia estar superestimando ou subestimando este comportamento por ser-

nos de algum modo inacessiacutevel E se assim fosse parece-nos que natildeo se poderia

comprovar por exemplo a teoria da mente nos animais Ades destaca o seguinte

trecho de Romanes que aqui citamos com algumas palavras a mais e que este

apresenta em sua obra antes de criticar a teoria do automatismo animal que

atribuem a Descartes e tambeacutem parece natildeo concordar com tal atribuiccedilatildeo

[] a partir do que conheccedilo subjetivamente das operaccedilotildees de minha proacutepria mente individual e das atividades agraves quais elas impelem o meu organismo passo por analogia a inferir desde as atividades observaacuteveis de outros organismos quais satildeo as operaccedilotildees mentais que lhes satildeo subjacentes O senso comum no entanto sente universalmente que a analogia eacute aqui um guia mais seguro para a verdade do que a demanda ceacutetica pela evidecircncia impossiacutevel de modo que se a existecircncia objetiva de outros organismos e suas atividades satildeo asseguradas o senso comum concluiraacute sempre e sem questionar o que as atividades de outros organismos quando anaacutelogas agravequelas de nosso proacuteprio organismo que sabemos serem acompanhadas por certos estados mentais satildeo neles acompanhadas por estados mentais anaacutelogos

848

Ades entatildeo menciona o emprego de um mesmo termo que caracteriza um

comportamento humano para definir um nos animais natildeo humanos que de algum

modo corresponde a ele mas analogamente

No entanto para o aristotelismo-tomismo como se viu haacute fenocircmenos

mentais nos animais que podem ser associados aos humanos apenas como

participaccedilatildeo sem caracterizar propriamente uma das potecircncias de propriedades

848

ldquoStarting from what I know subjectively of the operations of my own individual mind and the activities wich in my own organism they prompt I proceed by analogy to infer from the observable activities of other organisms what are the mental operations that underlie them [] Common sens however universally feels that analogy is here a safer guide to thruth than the sceptical demand for impossible evidence so that if the objective existence of other organisms and their activities is granted [] common sense will always and without question conclude that the activities of organisms other than our own when analogous to those activities of our own wich we know to be accompanied by certain mental states are them accompanied by analogous mental satatesrdquo ROMANES 1888 p 1-2 6

184

exclusivamente humanas de modo que se por um lado a corrente reconhece a

superioridade de alguns animais no que toca a certos sentidos externos e internos

por outro sustenta que o homem conhece a verdade ou seja a realidade pela

adequaccedilatildeo do intelecto ao objeto

Assim sugerimos que o conhecimento do homem em relaccedilatildeo agrave chamada

inteligecircncia dos animais natildeo humanos natildeo estaria impedido e ele poderia chegar a

constataccedilotildees que entenderia como verdadeiras confirmando segundo o exemplo

supracitado e se for o caso a teoria da mente e reconhecendo a natureza desses

entes tal como eacute em si mesma (ainda que jamais se pudesse conhececirc-los de modo

integral) sem a tendecircncia a por assim dizer antropomorfizaacute-los comparando-a agrave

nossa ao situaacute-los em uma categoria especiacutefica da gradaccedilatildeo entitativa sem jamais

deixar de levar em conta a subjetividade no que toca agraves diferenccedilas marcantes de

percepccedilatildeo por meio dos sentidos agraves quais temos tido acesso gradual em razatildeo dos

avanccedilos tecnoloacutegicos que nos possibilitam investigar pontos nos espectros dos

sensiacuteveis que nossos sentidos por si soacutes natildeo alcanccedilam

Para chegar a isto Marie George849 como se viu aponta para a necessidade

de estabelecer-se a fronteira entre o pensar e o sentir e essa tarefa deve ser

realizada natildeo soacute com investigaccedilotildees com animais natildeo humanos como as que

apresentamos neste estudo mas tambeacutem com crianccedilas humanas em idade proacutexima

agravequela em que comeccedilam a mostrar sinais das operaccedilotildees do intelecto agrave luz do

aristotelismo-tomismo Esta fronteira contudo estabelece certos limites que seriam

intransponiacuteveis

Fizemos algumas perguntas anteriormente neste trabalho a partir deste tema

e tentaremos respondecirc-las com base nesta corrente no acircmbito das consideraccedilotildees

que se sucederatildeo

Darwin850 como se viu exemplifica aqueles que natildeo reconhecem essa

intransponibilidade ao apontar nos animais natildeo humanos caracteriacutesticas de

sociabilidade (como o auxiacutelio o alerta de perigo etc) de sentimento do belo a

comunicaccedilatildeo por algo anaacutelogo agrave linguagem a resoluccedilatildeo de problemas etc O

sentimento e a admiraccedilatildeo do belo que ele sugere com os casos em que uma ave

macha exibe sua plumagem para atrair uma fecircmea segundo o aristotelismo-

tomismo se trataria natildeo propriamente de um reconhecimento do belo enquanto

849

GEORGE 2013 850

DARWIN sd a) p 30-31 e 34-35

185

belo mas de uma atraccedilatildeo movida instintivamente pela comparaccedilatildeo de imagens pela

estimativa segundo a configuraccedilatildeo a coloraccedilatildeo etc Jaacute no caso do que diz ser

anaacutelogo agrave linguagem trata-se sob este vieacutes como se disse mais acima da

participaccedilatildeo e em relaccedilatildeo aos demais exemplos observam-se potecircncias

encontradas no homem mas aqui limitadas ao acircmbito da estimativa em

conformidade com os resultados fornecidos anteriormente Inclui-se aqui tambeacutem o

auxiacutelio de alimentaccedilatildeo prestado por algumas aves a companheiros cegos que

Darwin relata Ainda que como diz seja um fato incomum concorre para a

preservaccedilatildeo da espeacutecie e serve como indiacutecio da teoria da mente naqueles animais

Em todo caso temos sempre exemplos envolvendo os sentidos internos e a

natureza nos priva de fatos que validariam a ideia da gradaccedilatildeo contiacutenua

Demais disso se a ideia do princiacutepio formal e portanto imaterial procede

entatildeo estamos diante de um problema ainda mais profundo para sustentar a ideia da

possibilidade de haver um meio termo de haver tal gradaccedilatildeo no acircmbito ontoloacutegico

interespeciacutefico851 entre a natildeo captaccedilatildeo e a captaccedilatildeo de espeacutecies inteligiacuteveis Se haacute

captaccedilatildeo de espeacutecies imateriais isto somente se daacute por alguma potecircncia imaterial

Mas eacute possiacutevel conciliar essa descriccedilatildeo com outras que apontam o sistema

nervoso como a origem da inteligecircncia como o faz Gallegos852 ndash que sugere que

esteja distribuiacuteda pelas estruturas orgacircnicas relacionadas ndash ou com a explicaccedilatildeo

anteriormente citada das duas maneiras de atuaccedilatildeo do sistema nervoso nos

processos cognitivos descritas por Maturana e Varela853 por apontar a possibilidade

de a origem da expressatildeo material da inteligecircncia estar no ceacuterebro em seu todo

poreacutem como efeito como repercussatildeo de uma operaccedilatildeo que nasce no acircmbito

imaterial ou espiritual realizada exclusivamente pela alma esta a partir de

informaccedilotildees recebidas materialmente pelos sentidos

Mas aqui nos referimos exclusivamente agrave capacidade de abstraccedilatildeo

associada intimamente agrave vontade pelas quais no homem a inteligecircncia prevaleceraacute

sobre o instinto e natildeo ao produto exclusivo dos sentidos internos que seria entatildeo

plenamente material ou seja fruto da operaccedilatildeo da alma pela mateacuteria e natildeo por si

851

Porque intraespecificamente um ente humano que ainda natildeo atingiu a chamada ldquoidade da razatildeordquo segundo o aristotelismo-tomismo jaacute deteacutem a potecircncia intelectiva embora esta ainda natildeo se manifeste pelas limitaccedilotildees do organismo inclusive dos sentidos internos em desenvolvimento

852 GALLEGO 2013

853 MATURANA VARELA 1995 p 201-202

186

mesma tal como o eacute a chamada inteligecircncia animal em sua integralidade que

assim como diz Gallegos submete-se ao instinto

Estatildeo nesse campo material dos sentidos internos as citaccedilotildees anteriores de

Griffin854 e Shettleworth855 sobre os atributos dos processos cognitivos como as

representaccedilotildees cujas combinaccedilotildees que resultam em tomadas de decisatildeo

Outras pesquisas como a de Bechara e colaboradores856 que incluem

Antonio Damaacutesio apontam para comportamentos em humanos dentre os quais

estatildeo incluiacutedos casos de tomada de decisatildeo que se antecipam ao raciociacutenio Isto

nos parece ter certa consonacircncia com a proposta aristoteacutelico-tomista e sugerimos

que poderia ser corroborado a partir de estudos que busquem localizar os sentidos

internos no sistema nervoso a partir do que se sabe atualmente nos campos da

neurofisiologia e da neuroanatomia

Reiteramos o que diz George sobre a necessidade de estabelecerem-se os

limites entre os sentidos e a intelecccedilatildeo e que os avanccedilos de investigaccedilotildees nessa

linha podem ser de grande valia para o leque de possibilidades de estudos sobre a

inteligecircncia animal segundo a abordagem atual mais especiacutefica apontada por

Feuerbacher857 no acircmbito da etologia cognitiva e de outras ciecircncias afins

Sugerimos tambeacutem que o aristotelismo-tomismo poderia contribuir com o

esclarecimento dos principais pontos de muitas discussotildees como a polecircmica do

emprego do condicionamento operante skinneriano na educaccedilatildeo humana e os

efeitos negativos descritos por Iserbyt como o adoecimento de alunos ou

surgimento de tiques nervosos neles em razatildeo do estresse858 dentre outros de

longo prazo denunciados ao longo de sua obra ou como aquela que envolveu

Pavlov e Koumlhler e Yerkes Estes dois chegaram a sugerir a presenccedila de alguma

racionalidade de alguma reflexatildeo em chimpanzeacutes com base no que observaram em

seus experimentos alguns expostos aqui mas essas alegaccedilotildees se analisadas agrave luz

do aristotelismo-tomismo estiveram sempre no acircmbito da estimativa O conceito de

inteligecircncia que Koumlhler associou aos seus chimpanzeacutes859 por exemplo ilustrado

pela escolha de um meio diferente para a resoluccedilatildeo de determinada situaccedilatildeo eacute mais

um exemplo que se enquadra na noccedilatildeo aristoteacutelica supramencionada de

854

GRIFFIN 1994 p viii 855

SHETTLEWORTH 2010 p 4 856

BECHARA et al 1997 857

FEUERBACHER 2011 858

ISERBYT 2000 p A-158 859

KOumlHLER 1927 p 3-4

187

semelhanccedila entre a estimativa de certos animais e a de crianccedilas humanas mais

novas

Pode-se sugerir que essa estimativa vaacute aleacutem dos reflexos inatos e

condicionados pavlovianos nas crianccedilas e nos animais como deixam claros alguns

experimentos como aqueles que abordam a comunicaccedilatildeo realizados com Kanzi

Koko dentre outros em que os animais passam a fazer coisas que jamais fariam na

natureza mas sempre dentro dos limites de suas potencialidades Pavlov

reconheceu a elasticidade dessa capacidade de aprendizado de tentativa e erro que

atribuiacutea agraves associaccedilotildees que tecircm como fim a recompensa E diga-se o mesmo de

Thorndike que tambeacutem entendia a chamada inteligecircncia dos animais restrita agraves

operaccedilotildees dos sentidos dos impulsos dos sentimentos apontando neles a

ausecircncia de vontade e de ideias livres860 As delimitaccedilotildees de ambos parece-nos

enquadrarem-se no esquema aristoteacutelico-tomista assim como o que entendem das

associaccedilotildees tambeacutem apontadas por Lloyd que ainda destaca as inferecircncias sem

abstraccedilatildeo nos animais861 que caracterizam as operaccedilotildees da estimativa

E da mesma forma sem levar-se em conta a discrepacircncia na questatildeo de

haver ou natildeo possibilidade de um intermeacutedio entre a ausecircncia e a presenccedila de

capacidade de abstraccedilatildeo as observaccedilotildees de Darwin tambeacutem estatildeo muito proacuteximas

da doutrina aristoteacutelico-tomista como por exemplo em seu relato sobre as

expressotildees emocionais e o reconhecimento de memoacuteria e imaginaccedilatildeo e tambeacutem

quando diz que os animais seriam em algo aptos para o raciociacutenio (no original em

inglecircs ldquoreasoningrdquo) mas sem que tenham capacidade para abstrair descriccedilatildeo na

qual nos parece enquadrar-se a potecircncia estimativa Ademais ao referir-se ao

deliberar (no original em inglecircs ldquodeliberaterdquo)862 no exerciacutecio desse raciociacutenio tudo

indica estar-se referindo natildeo agrave deliberaccedilatildeo como vontade livre que tem como

requisito a intelecccedilatildeo mas justamente agrave voluntariedade que se observa nos animais

e nas crianccedilas

Hume tambeacutem atribuiu certo raciociacutenio com inferecircncias aos animais e

reconhecendo que somente o homem estabelece relaccedilotildees de ideias Mostrou

tambeacutem muita proximidade com o aristotelismo-tomismo ao chamar esse raciociacutenio

ldquoexperimentalrdquo e descrevecirc-lo por exemplo como o motivo pelo qual o animal espera

860

THORNDIKE 1898 p 84 e 108 861

LLOYD 1891 p 348 e 362 862

DARWIN 1882 p 75

188

que algo que se deu em determinada circunstacircncia volte a ocorrer caso esta se

repita863 o que mostra consonacircncia com a descriccedilatildeo da estimativa

Tambeacutem em consonacircncia com esta estaacute a observaccedilatildeo cartesiana da

ausecircncia nos animais de linguagem e raciociacutenio se este estaacute aqui entendido como

de natureza abstrativa A carecircncia de mais informaccedilotildees abriu espaccedilo para a

polecircmica envolvendo o automatismo Embora natildeo se possa mensurar ateacute onde

Descartes quis chegar ao mencionar a superioridade dos animais em relaccedilatildeo a

qualquer aparato de fabricaccedilatildeo humana parece haver seacuterias dificuldades em

apontar com maior precisatildeo se ele conceberia ou natildeo por exemplo consciecircncia

neles

Tomaacutes de Aquino aponta alguns sentidos dados agrave palavra ldquoconsciecircnciardquo

como significando a sindeacuterese mas explica que originalmente falando consciecircncia

significa ldquoa relaccedilatildeo de um conhecimento com uma coisardquo que equivaleria a um

ldquoconsaberrdquo e se efetua atraveacutes de um ato

A consciecircncia como a aplicaccedilatildeo de um conhecimento a alguma coisa que se

pratica pode dar-se de trecircs formas a) pelo reconhecimento de ter ou natildeo feito algo

a partir do que se diz que ela daacute testemunho b) pelo juiacutezo de que se deve ou natildeo

fazer algo a partir do que se diz que ela instiga ou liga e c) pelo juiacutezo de que algo

foi bem feito ou mal feito a partir do que se diz que ela excusa acusa ou

remorde864

Assim a consciecircncia segundo o aristotelismo-tomismo pode ser um ato do

intelecto ou da cogitativa ou um ato da estimativa E quando se trata destes uacuteltimos

eacute resultante de processos cerebrais afirmaccedilatildeo que fundamentaria as hipoacuteteses por

exemplo de Searle e Griffin No entanto a perspectiva de que a consciecircncia se

restringiria a processos orgacircnicos encontra algumas barreiras Tallis por exemplo

diz que se o ceacuterebro fosse uma maacutequina teria de estar ldquoacoplado a uma consciecircncia

que lhe fosse exterior para poder transformar os eventos que ocorrem nele em

lsquoatividadersquo computacionalrdquo pois ldquomaacutequinas natildeo calculam por si mesmasrdquo Esses

863

HUME 2001 p 128-132 864

ldquo[] la relacioacuten de un conocimiento con una cosardquo TOMAacuteS DE AQUINO 2001 art 13 q 79 p 739

189

eventos assim por si soacute natildeo poderiam ldquo[] constituir consciecircncia ou processos

mentaisrdquo865

A consciecircncia enquanto ato do intelecto viabiliza segundo o aristotelismo-

tomismo o ato consciente de que se estaacute consciente jaacute natildeo resultante desses

processos cerebrais ou ao menos natildeo apenas destes Encontramos aqui a divisatildeo

fornecida por Ades ou seja neste uacuteltimo caso teriacuteamos o emprego do termo

ldquoconsciousnessrdquo e no anterior o do termo ldquoawarenessrdquo e aqui se enquadra a

consciecircncia de si mesmo e a do proacuteprio corpo observadas em elefantes grandes

macacos e corvos e acrescidas daquela do proacuteprio comportamento que sob o vieacutes

aristoteacutelico-tomista seria das proacuteprias intenccedilotildees que Herman866 observou nos

golfinhos Deste modo os quatro domiacutenios indicados pelo pesquisador encontram-

se segundo o aristotelismo-tomismo no acircmbito estimativo

Jaacute na divisatildeo de Damaacutesio a chamada ldquoconsciecircncia centralrdquo o conhecimento

de que se estaacute no aqui e no agora parece poder enquadrar-se tambeacutem somente no

acircmbito estimativo ao passo que a chamada ldquoconsciecircncia ampliadardquo (de que se tem

uma identidade do passado e do futuro etc) seria um ato conjunto do intelecto com

a cogitativa Mas aqui o reconhecimento de si mesmo poderia tambeacutem estar

associado agrave estimativa como se observou e como uma participaccedilatildeo no sentido

aristoteacutelico-tomista na cogitativa

Tambeacutem quando Damaacutesio define a consciecircncia como um padratildeo privado que

reuacutene o objeto e o self867 se aproxima da definiccedilatildeo aristoteacutelico-tomista de aplicaccedilatildeo

do conhecimento (de um sujeito) a algo

Damaacutesio apresenta como fato a relaccedilatildeo entre ldquoalguns aspectos dos

processos da consciecircnciardquo e ldquoregiotildees e sistemas cerebrais especiacuteficosrdquo Poderia

estar reconhecendo aqui que nem todos esses aspectos enquadram-se nisto tal

como Chalmers que sugere que ela se estenda para aleacutem de bases orgacircnicas Isto

como se viu estaria mais em consonacircncia com a visatildeo aristoteacutelico-tomista em

relaccedilatildeo aos animais natildeo humanos mas se se pode excluir de algum modo os

processos orgacircnicos como causa tornar-se ia tambeacutem consonante em relaccedilatildeo aos

entes humanos e mais visivelmente com a capacidade de intelecccedilatildeo

865

Respectivamente ldquo[] coupled to a consciousness external to it to transform the events that take place in it into computational activityrdquo ldquo[] machines do not of themselves calculate []rdquo e ldquo[] constitute consciousness or mental processesrdquo TALLIS 2010 p 80

866 HERMAN 2006

867 DAMAacuteSIO 1999 p 30 e 33

190

Jaacute Lalande poderia considerar a definiccedilatildeo aristoteacutelico-tomista abusiva tal

como o faz com a de Schopenhauer e Kant mas natildeo nos parece que sua definiccedilatildeo

em si esteja distante da que ele mesmo propotildee e inclusive do modo como a

classifica Das cinco definiccedilotildees para a palavra ldquointuiccedilatildeordquo que ele fornece parece-nos

encaixarem aqui aquelas em que haacute referecircncia a um conhecimento evidente direto

e imediato868 Vemos assim consonacircncia entre a intuiccedilatildeo do espiacuterito que menciona

e a ciecircncia em ato do sujeito agrave qual se refere o aristotelismo-tomismo bem como

entre os estados e atos deste espiacuterito e o algo respectivamente mas neste segundo

caso de modo natildeo exaustivo E tambeacutem nos parece a consciecircncia espontacircnea

estaria proacutexima da ldquoawarenessrdquo ao passo que a consciecircncia reflexiva

corresponderia agrave ldquoconsciousnessrdquo da qual como aponta Locke869 depende o

perdurante reconhecimento do ldquoeurdquo o testemunho interno que esse ldquoeurdquo pode dar a

si mesmo como aponta Balibar870 e sem o que natildeo poderia haver o exerciacutecio da

intelecccedilatildeo uma vez que o sujeito que intelige somente apreende porque se manteacutem

enquanto o mesmo sujeito e de algum modo se reconhece enquanto tal e

reconhece que reconhece

Paralelamente a consciecircncia enquanto ldquoawarenessrdquo viabiliza a capacidade de

aprender e de adaptar-se ao ambiente que satildeo as duas caracteriacutesticas que Silva

encontra em praticamente todas as definiccedilotildees de inteligecircncia Ambas podem

enquadrar-se como objeto da estimativa ou como objeto da intelecccedilatildeo e daiacute

sugerimos que venha esse seu caraacuteter por assim dizer universal

Tambeacutem se pode enquadrar em ambas o entendimento de Claparegravede Stern

Buumlhler e Koumlhler citados por Piaget de que a inteligecircncia seria uma adaptaccedilatildeo

mental raacutepida a uma nova circunstacircncia Da parte dos animais natildeo humanos um

bom exemplo para ilustraacute-lo eacute o comportamento de obediecircncia dos espeacutecimes de

golfinhos a um comando de criaccedilatildeo

Jaacute o mesmo natildeo se daacute com algumas das caracteriacutesticas elencadas nas

palavras da Task Force on Intelligence da APA871 quando cita a necessidade de uma

busca para definiccedilatildeo de inteligecircncia As capacidades de adaptaccedilatildeo ao ambiente e

de aprendizado a partir da experiecircncia satildeo se tomadas por si soacute notoriamente

estimativas enquanto que a compreensatildeo de ideias complexas e o raciociacutenio satildeo

868

LALANDE 1932 p 396-400 869

LOCKE 2015 p 181 870

BALIBAR 2004 p 175 871

NEISSER 1996 P 77

191

deste modo classificaacuteveis conforme o sentido em que estes atributos satildeo

empregados mas a reflexatildeo eacute proacutepria do intelecto

Aqui jaacute comeccedilamos a esboccedilar como essa base do aristotelismo-tomismo

poderia contribuir para organizar essas caracteriacutesticas fornecendo sugerimos um

suporte para um modo eficaz de encontrar uma definiccedilatildeo para a inteligecircncia que

satisfaccedila agraves tantas correntes de pensamento

Dentre as caracteriacutesticas elencadas pelo Mainstream Science on

Intelligence872 as habilidades de planejar resolver problemas aprender

rapidamente e aprender com a experiecircncia satildeo se analisadas por si soacute verificaacuteveis

na estimativa Do mesmo modo assim como no caso anterior as habilidades de

raciocinar e compreender ideias complexas depende do sentido empregado e a de

pensar abstratamente eacute exclusiva do intelecto Fala-se tambeacutem na capacidade mais

ampla e profunda de compreender captar o sentido das coisas e calcular o que

fazer Este uacuteltimo por si poderia ser objeto da estimativa mas as duas qualificaccedilotildees

que o precedem situam-no na natureza cogitativa ou intelectiva humana

A definiccedilatildeo de Wechsler873 refere-se agrave inteligecircncia humana pois fala de um

pensamento racional para o trato com o ambiente o que exige reflexatildeo e parece

caracterizar o intelecto praacutetico segundo o aristotelismo-tomismo Jaacute a de Stern874 se

tomada apenas em si mesma poderia ser aplicaacutevel tanto aos animais que

destacamos aqui quanto aos humanos conforme o sentido que se pretenda dar

quando se refere ao indiviacuteduo ajustar o pensamento a novas exigecircncias

conscientemente Se ele o faz por exemplo consciente de que pensa no que faz

estaacute no acircmbito intelectivo e se o faz consciente do que estaacute fazendo pode estar no

da estimativa

A identificaccedilatildeo desta e dos sentidos internos e de sua expressatildeo no sistema

nervoso como jaacute propomos poderia servir de base inclusive de natureza

epistemoloacutegica para as abordagens bioloacutegicas segundo a classificaccedilatildeo de

Sternberg

Em se tratando da psicologia cognitiva parece-nos que a utilizaccedilatildeo dos

modelos mentais de Johnson-Laird estariam a ilustrar o refluxo do intelecto em suas

trecircs operaccedilotildees na imaginaccedilatildeo (as representaccedilotildees mentais as possibilidades etc)

872

GOTTFRESON 1997 p 13 873

WECHSLER 1944 p 3 874

STERN 1914 p 3

192

na memoacuteria e na reminiscecircncia (o recurso voluntaacuterio ou natildeo agravequelas) e na cogitativa

(apreendendo comparando e combinando as imagens e as intenccedilotildees relacionadas)

No que toca agraves demais abordagens cognitivas as habilidades ndash como as da

teoria triaacuterquica do proacuteprio Sternberg por exemplo as contextuais que dizem

respeito agraves interaccedilotildees com o ambiente em si como a de adaptaccedilatildeo ndash seriam

elencadas indicando-se se estariam relacionadas aos sentidos internos e a quais

ou ao intelecto e aqui ou ao intelecto praacutetico ou ao especulativo e assim tambeacutem

com as chamadas inteligecircncias muacuteltiplas de Gardner e a chamada inteligecircncia

emocional de Goleman e Salovey e Mayer Estas sob a oacuteptica aristoteacutelico-tomista

sugerimos natildeo caracterizariam inteligecircncia no sentido proacuteprio mas modalidades de

efeitos da expressatildeo desta e mesmo da cogitativa conforme o caso

Por fim esta mesma aplicaccedilatildeo poder-se-ia fazer em relaccedilatildeo agraves teorias na

abordagem psicomeacutetrica identificando-se a que cada um dos fatores propostos

estaria associado ou seja e mais uma vez se aos sentidos internos e a quais ou

ao intelecto praacutetico ou ao especulativo O raciociacutenio indutivo de Thurstone por

exemplo caracterizaria em princiacutepio o intelecto especulativo enquanto que os trecircs

tipos de inteligecircncia de Thorndike (social mecacircnica e abstrata) estariam em

princiacutepio associados ao intelecto especulativo e ao praacutetico jaacute que tratam de

aprendizado e administraccedilatildeo de relaccedilotildees

As divergecircncias na definiccedilatildeo de inteligecircncia satildeo demasiado intensas

considerando-se sobretudo o caraacuteter quantitativo No entanto como se observou

estatildeo sempre presentes nesses estudos as distinccedilotildees do aristotelismo-tomismo que

discrimina os sentidos internos dos animais e dos humanos e a intelecccedilatildeo

pertencente a estes e parece-nos que elas poderiam fornecer as devidas bases

para uma jornada de natureza consensual facilitando processos de delimitaccedilatildeo

algo que exigiria pesquisas futuras Pensamos que estas estariam ao mesmo tempo

prestando um contributo para o desenvolvimento do que abordamos aqui sobre a

inteligecircncia no homem e nos demais animais

Em relaccedilatildeo a estes como dissemos natildeo encontramos no presente trabalho

sinais de memoacuteria voluntaacuteria e imaginaccedilatildeo voluntaacuteria nem algo que caracterizasse a

apreensatildeo de universais Se as duas primeiras tivessem sido apontadas teriacuteamos

verificado a presenccedila de cogitativa e se a terceira o tivesse sido teriacuteamos deparado

com intelecccedilatildeo Se por um lado muitos animais apresentam sentidos externos e

inclusive alguns sentidos internos como a memoacuteria mais acurados do que os do

193

homem por outro nos eacute notoacuteria e soou-nos como sendo um consenso a

superioridade da faculdade intelectiva humana caracterizada pelo exerciacutecio da

razatildeo que possibilita profundas elucubraccedilotildees como as de Bachelard que citamos no

iniacutecio deste estudo que possibilita a formulaccedilatildeo de conceitos e de juiacutezos complexos

a construccedilatildeo de silogismos construccedilotildees especulativas complexas etc a partir da

abstraccedilatildeo tal como visto tambeacutem em outras citaccedilotildees aqui presentes como as de

Hume quando aponta as limitaccedilotildees da inteligecircncia nos animais natildeo humanos a de

Descartes quando diz que estes natildeo raciocinam e os compara a maacutequinas a de

Darwin ao dizer que os animais natildeo fazem reflexotildees e abstraccedilotildees no que tambeacutem

concordam Lloyd Thorndike e os demais

Os trabalhos que analisamos assim como estes autores em geral por

estarem ancorados na experiecircncia atribuem memoacuteria e imaginaccedilatildeo aos animais e

descrevem de algum modo a estimativa ao atribuir-lhes certa voluntariedade

capacidade de tomada de decisatildeo de estabelecimento de associaccedilotildees da

plasticidade de origem natural ou artificial mencionada por Lloyd que levam a certos

tipos de inferecircncias

Como se viu os behavioristas como Pavlov e Skinner seguem a ideia de

Darwin de que natildeo haveria barreiras naturais intransponiacuteveis entre a condiccedilatildeo

intelectiva humana e tudo aquilo que participa da inteligecircncia dos demais animais O

aristotelismo-tomismo apresenta um vieacutes mais principial partindo de premissas

ontoloacutegicas ou metafiacutesicas e aponta em outro sentido

As observaccedilotildees que fizemos aqui aleacutem de reforccedilarem a hipoacutetese central de

que sua aplicaccedilatildeo no entendimento da chamada inteligecircncia animal poderaacute ajudar a

estabelecer limites e pontos de partida para a compreensatildeo da inteligecircncia inclusive

a humana de natureza ainda mais complexa levaram-nos a emitir outras sugestotildees

para futuros estudos e eacute possiacutevel que tenham aberto uma ou mais frentes de

pesquisa de natureza interdisciplinar e inclusive etoloacutegica psicoloacutegica e quiccedilaacute

relacionadas a outras aacutereas

Por um lado natildeo encontramos um trabalho que reuacutena todas as informaccedilotildees

para a construccedilatildeo da doutrina psicoloacutegica aristoteacutelico-tomista que se encontra

dispersa na obra de Aristoacuteteles e Tomaacutes de Aquino razatildeo pela qual tentamos expocirc-

la de modo que possa vir a ser futuramente complementada

Por outro tentamos organizar as habilidades dos animais observadas nos

estudos bem como os testes empregados para avaliaacute-las sugerindo o

194

desenvolvimento de uma sistematizaccedilatildeo algo que ateacute o momento soacute vimos

esboccedilado no sumaacuterio e consequentemente na organizaccedilatildeo de algumas obras875

E como desenvolvimento direto da proposta central deste trabalho

apontamos para a sequecircncia na verificaccedilatildeo da viabilidade de associaccedilatildeo entre o

aristotelismo-tomismo e os estudos no campo da inteligecircncia humana e dos animais

natildeo humanos visando a futuras construccedilotildees nessas duas vertentes o que incluiria

estudos envolvendo a comparaccedilatildeo entre a inteligecircncia das crianccedilas e a dos animais

com base na psicologia de Aristoacuteteles e Tomaacutes de Aquino a tentativa insistimos de

identificaccedilatildeo no sistema nervoso sob as perspectivas humana e comparada dos

elementos cognitivos que compotildeem essa doutrina dos dois filoacutesofos etc Esse

processo inclusive desde jaacute sugerimos poderaacute contribuir para a formulaccedilatildeo de

novas hipoacuteteses que poderatildeo trazer esclarecimentos para problemas tatildeo atuais de

natureza fisioloacutegica conceitual etc como os que envolvem os processos de

tomada de decisatildeo bem como aquilo que se entende por consciecircncia a partir da

formulaccedilatildeo de abordagens de natureza epistemoloacutegica cuja aplicaccedilatildeo poderaacute

inclusive ser testada como meio para resoluccedilatildeo de questotildees estruturais internas e

externas das disciplinas relacionadas dada as bases da doutrina que se estruturam

sobre princiacutepios evidentes

Isto que se acaba de dizer pode ser mais bem visualizado no esquema da

paacutegina seguinte

875

Cf por exemplo SHETLLEWORTH 2010

195

Figura 1 - Esquema de sugestotildees para pesquisas futuras

Classificaccedilatildeo dos tipos de habilidade

Sequecircncia da coleta integral de dados

para composiccedilatildeo da doutrina psicoloacutegica aristoteacutelico-tomista

Estudos comparados da

inteligecircncia

Aristotelismo-tomismo

Sequecircncia da

investigaccedilatildeo sobre

compatibilidade entre

psicologia aristoteacutelico-

tomista e demais

estudos sob a oacuteptica

humana e comparada

TESE

Localizaccedilatildeo anatocircmica e

fisioloacutegica dos sentidos

internos no sistema nervoso

Aplicaccedilatildeo da psicologia

aristoteacutelico-tomista a esses

estudos

Estudos comparativos evolvendo a

estimativa dos animais e a das

crianccedilas humanas

Classificaccedilatildeo dos tipos de teste

Busca por soluccedilatildeo de questotildees conceituais de organizaccedilatildeo interna e externa das disciplinas envolvidas etc e de problemas de natureza

conceitual fisioloacutegica psicoloacutegica etc como os que envolvem a consciecircncia a tomada de decisatildeo etc

Estudos comparativos evolvendo a

estimativa dos animais e a

cogitativa e a intelecccedilatildeo

196

Esperamos assim ter conseguido contribuir com mais uma etapa para

corroborar a validade da psicologia de Aristoacuteteles e Tomaacutes de Aquino sob uma

perspectiva comparada e delinear satisfatoriamente algumas bases para a

realizaccedilatildeo de futuros estudos de natureza interdisciplinar que tenham como

estrutura a fusatildeo entre esse acircmbito principial da doutrina dos dois filoacutesofos e as

hipoacuteteses formuladas dentro das linhas de pesquisa aqui apresentadas o que nos

parece estar no acircmago da proposta da subalternaccedilatildeo das ciecircncias a qual assim

cremos jamais deveria ter sido negligenciada

197

REFEREcircNCIAS

ADES C O morcego outros bichos e a questatildeo da consciecircncia animal Psicologia USP Satildeo Paulo v 8 n 2 1997 ALLEN M SCHWARTZ B L Mirror self-recognition in a gorilla (Gorilla gorilla gorilla) 2007 29 f Dissertaccedilatildeo (Mestrado em Psicologia) ndash Florida International University Miami 2007 AMSTERDAM B Mirror self‐image reactions before age two Developmental Psychobiology v 5 n 4 p 297-305 1972 ANDERSON A Semantic and social-pragmatic aspects of meaning in task-oriented dialogue 1983 619 f Tese (Doutorado em Filosofia) ndash University of Glasgow Glasgow 1983 ANDERSON J R A primatological perspective on death American Journal of Primatology v 73 n 5 p 410-414 2011 ANGIONI L Sobre a relaccedilatildeo entre mateacuteria e forma na constituiccedilatildeo da essecircncia sensiacutevel em Aristoacuteteles Cadernos de Histoacuteria e Filosofia da Ciecircncia seacuterie 3 Campinas v 7 n 2 p 209-251 1997 ANGIONI L ldquoNatildeo ser dito de um subjacenterdquo ldquoum istordquo e ldquoseparadordquo o conceito de essecircncia como subjacente e forma (Z-3) Cadernos de Histoacuteria e Filosofia da Ciecircncia seacuterie 3 Campinas v 8 n esp p 69-126 1998 ALLMAN J M WATSON K K TETREAULT N A HAKEEM A Y Intuition and autism a possible role for Von Economo neurons Trends in Cognitive Sciences v 9 n 8 p 367-373 2005 ARISTOacuteTELES Das Categorias (Oacuterganon) Traduccedilatildeo notas e comentaacuterios de Maacuterio Ferreira dos Santos 2 ed Satildeo Paulo Editora Matese 1965 171 p ARISTOacuteTELES Investigacioacuten sobre los Animales Madrid Editorial Gredos 1992 612 p ARISTOacuteTELES Fiacutesica Madrid Editorial Gredos 1995a 506 p ARISTOacuteTELES Analiacuteticos segundos In Tratados de Loacutegica (Oacuterganon) II Madrid Editorial Gredos 1995b 460 p ARISTOacuteTELES Eacutetica Nicomaacutequea In ______ Eacutetica nicomaacutequea eacutetica eudemia Madrid Editorial Gredos 1998a 561 p ARISTOacuteTELES Eacutetica Eudemia In ______ Eacutetica nicomaacutequea eacutetica eudemia Madrid Editorial Gredos 1998b 561 p

198

ARISTOacuteTELES Metafiacutesica In REALE G (org) Metafiacutesica texto grego com traduccedilatildeo ao lado 2 ed Satildeo Paulo Ed Loyola 2005 v II 696 (xiv) p ARISTOacuteTELES Sobre a Alma Lisboa Centro de Filosofia da Universidade de Lisboa 2010 143 p (Coleccedilatildeo Obras Completas de Aristoacuteteles Biblioteca de Autores Claacutessicos Imprensa Nacional-Casa da Moeda) BACHELARD G A Chama de uma Vela Rio de Janeiro Ed Bertrand Brasil 1989 112 p BALIBAR E Consciousness conscience awareness In CASSIN B Dictionary of untranslatables a philosophical lexicon Princeton Princeton University Press 2004 1299 p BATES L A et al Do elephants show empathy Journal of Consciousness Studies v 15 n 10-11 p 204-225 2008 BEARZI G et al Whale and dolphin behavioural responses to dead conspecifics Zoology v 128 p 1-15 jun 2018 BECHARA A DAMASIO H TRANEL D DAMASIO A R Deciding advantageously before knowing the advantageous strategy Science v 275 n 5304 p 1293-1295 1997 BELYAEV D K Destabilizing selection as a factor in domestication Journal of Heredity v 70 n 5 p 301-308 1979 BIRO D MATSUZAWA T Numerical ordering in a chimpanzee (Pan troglodytes) Planning executing and monitoring Journal of Comparative Psychology v 113 n 2 p 178 1999 BOESCH C The effects of leopard predation on grouping patterns in forest chimpanzees Behaviour v 117 n 3 p 220-241 1991 BOESCH C Innovation in wild chimpanzees (Pan troglodytes) International Journal of Primatology v 16 n 1 p 1-16 1995 BOESCH C The emergence of cultures among wild chimpanzees In RUNCIMAN W G J SMITH M DUNBAR R I M (ed) Proceedings-British Academy New York Oxford University Press 1996 p 251-268 BOESCH C Is culture a golden barrier between human and chimpanzee Evolutionary Anthropology Issues News and Reviews v 12 n 2 p 82-91 2003 BOESCH C BOESCH H Tool use and tool making in wild chimpanzees Folia Primatologica v 54 n 1-2 p 86-99 1990 BOESCH C TOMASELLO M Chimpanzee and human cultures Current Anthropology v 39 n 5 p 591-614 1998

199

BOTIGUEacute L R et al Ancient European dog genomes reveal continuity since the early Neolithic Nature Communications v 8 p 16082 2017 BOUCHARD J GOODYER W LEFEBVRE L Social learning and innovation are positively correlated in pigeons (Columba livia) Animal Cognition v 10 n 2 p 259-266 2007 BOYSEN S T BERNTSON G G Numerical competence in a chimpanzee (Pan troglodytes) Journal of Comparative Psychology v 103 n 1 p 23 1989 BRITISH BROADCASTING CORPORATION Are crows the ultimate problem solvers [S l s n] 2014 1 video (4 min) Publicado pela BBC Health Disponiacutevel em wwwbbccoukprogrammesp01r0md3 httpswwwyoutubecomwatchv =cbSu2PXOTOc Acesso em 13 out 2018 BROSNAN S F DE WAAL F B Monkeys reject unequal pay Nature v 425 n 6955 p 297 2003 BROWN C Fish intelligence sentience and ethics Animal Cognition v 18 n 1 p 1-17 2015 BUGNYAR T REBER S A BUCKNER C Ravens attribute visual access to unseen competitors Nature Communications v 7 p 10506 2016 BURGHARDT G M BEKOFF M Animal consciousness In BAYNE T CLEEREMANS A WILKEN P (ed) The Oxford companion to consciousness Oxford UK Oxford University Press 2009 p 39-42 BUSNEL R G Symbiotic relationship between man and dolphins Transactions of the New York Academy of Sciences v 35 n 2 Series II p 112-131 1973 BUTTI C et al Total number and volume of Von Economo neurons in the cerebral cortex of cetaceans Journal of Comparative Neurology v 515 n 2 p 243-259 2009 BYRNE R A KUBA M GRIEBEL U Lateral asymmetry of eye use in Octopus vulgaris Animal Behaviour v 64 n 3 p 461-468 2002 BYRNE R W BATES L MOSS C J Elephant cognition in primate perspective Comparative Cognition amp Behavior Reviews v 4 p 65-79 2009 CALDEROacuteN A Umbrales de la filosofia cuatro introducciones tomistas Mendoza Ediccedilatildeo do autor 2011 519 p CALL J BRAumlUER J KAMINSKI J TOMASELLO M Domestic dogs (Canis familiaris) are sensitive to the attentional state Journal of Comparative Psychology v 117 n 3 p 257-263 2003

200

CAMMAERTS TRICOT M C CAMMAERTS R Are ants (Hymenoptera Formicidae) capable of self recognition Journal of Science v 5 n 7 p 521-532 2015 CAMPAN R Histoire de LEacutethologie repeacuteres chronologiques In ENCYCLOPAEDIA Universalis Toulouse [s n] [2018] Disponiacutevel em httpswwwuniversalisfr encyclopediehistoire-de-l-ethologie-reperes-chronologiques Acesso em 15 jan 2019 CARVALHO NETO M B MAYER P C M Skinner e a assimetria entre reforccedilamento e puniccedilatildeo Acta Comportamentalia Guadalajara v 19 n 4 2011 CHALMERS D J La mente consciente em busca de una teoriacutea fundamental Barcelona Gedisa Editorial 1999 CHERNISS C Intelligence Emotional In SPIELBERGER C (ed) Encyclopedia Of aplied psychology Amsterdan [s n] 2004 p 321-328 COLBERT-WHITE E N et al Can dogs use vocal intonation as a social referencing cue in an object choice task Animal Cognition v 21 n 2 p 253-265 2018 COLLEacute G La Meacutetaphysique ndash Livre Ier ndash Traduction et Commentaire Collection Traductions et Eacutetudes Institut Supeacuterieur de Philosophie de lrsquoUniversiteacute de Louvain 1912 171 (38) (vi) p COLLETT M CHITTKA L COLLETT T S Spatial memory in insect navigation Current Biology v 23 n 17 R789-R800 2013 COLLETT T S GRAHAM P Insect navigation do honeybees learn to follow highways Current Biology v 25 n 6 R240-R242 2015 CONSCIEcircNCIA In Dicionaacuterio Online Caldas Aulete Rio de Janeiro Lexikon Editora Digital 2008 Disponiacutevel em wwwauletecombr Acesso em 10 ago 2017 CONSCIEcircNCIA In Dicionaacuterio Priberam da Liacutengua Portuguesa Lisboa Priberam Informaacutetica 1998 Disponiacutevel em httpswwwpriberamptdlpo Acesso em 10 ago 2017 COREN S The Intelligence of Dogs a guide to the thoughts emotions and inner lives of our canine companions New York Free Press 2006 301 (xiii) p COTTINGHAM J ldquoA brute to the brutesrdquo Descartes treatment of animals Philosophy v 53 n 206 p 551-559 1978 COWAN R B Short-term memory for behavior in the bottlenosed dolphin (Tursiops truncatus) 2003 Dissertaccedilatildeo (Mestrado) ndash University of Hawaii Honolulu 2003 DALE R PLOTNIK J M Elephants know when their bodies are obstacles to success in a novel transfer task Scientific Reports 7 2017

201

DAMAacuteSIO A Sentir lo que sucede cuerpo y emocioacuten en la faacutebrica de la consciencia Santiago Editorial Andres Bello 2000 414 p DAMAacuteSIO A O misteacuterio da consciecircncia Satildeo Paulo Companhia das Letras 1999 DAMATO M R COLOMBO M Serial learning with wild card items by monkeys (Cebus apella) Implications for knowledge of ordinal position Journal of Comparative Psychology v 103 n 3 p 252 1989 DARWIN C R The descent of man and selection in relation to sex 2 ed London John Murray Albemarle Street 1882 693 (xvi) p DARWIN C R El Origen del Hombre la seleccioacuten natural y la sexual F Sempere Y Cordf Editores Valencia s d a) (aprox 1909) 195 p (a paginaccedilatildeo natildeo eacute original) Disponiacutevel em httpsmedicinaufmeduimages77cElorigendelhombre_POR _CHARLES_DARWINpdf Acesso em 13 set 2018 DARWIN C R La Expresioacuten de las Emociones en el Hombre y em los Animales F Sempere Y Cordf Editores Valencia sd b) v 1 255 p Disponiacutevel em httpfondos digitalesusesmediabooks3247la-expresion-de-las-emociones-en-el-hombre-y-en-los-animalespdf Acesso em set 2018 DEACON T W The symbolic species the co-evolution of language and the brain New York W W Norton amp Company 1997 527 p DE LIBERA A Intellectus In CASSIN B Dictionary of untranslatables a philosophical lexicon Princeton Princeton University Press 2004 1299 p DE MOURA NEVES M H A teoria linguiacutestica em Aristoacuteteles Alfa Marilia v 25 p 57-67 1981 DEWSBURY D A John B Watsonrsquos early work and comparative psychology Revista Mexicana de Anaacutelisis de la Conducta v 39 n 2 2013 DOUGLAS-HAMILTON I HILLMAN A K K Elephant carcasses and skeletons as indicators of population trends In GRIMSDELL JJR WESTLEY S Low level aerial survey techniques Nairobi ILCA 1981 p 113-129 (Monograph 4) DOUGLAS-HAMILTON I BHALLA S WITTEMYER G VOLLRATH F Behavioural reactions of elephants towards a dying and deceased matriarch Aplied Animal Behaviour Science v 100 n 1-2 p 87-102 2006 DWECK C S LEGGETT E L A social-cognitive aproach to motivation and personality Psychological Review v 95 n 2 p 256-273 1988 DYER F C Spatial cognition and navigation in insects In REAL L Behavioral mechanisms in evolutionary ecology Chicago University of Chicago Press 1994 p 66-98 471 p

202

ECHAVARRIacuteA M La Praacutexis de la Psicologia y sus niveles epistemoloacutegicos seguacuten Santo Tomaacutes de Aquino Argentina Editorial UCALP 2009

EIBL‐EIBESFELDT I Uumlber den Werkzeuggebrauch des Spechtfinken Camarhynchus pallidus (Sclater und Salvin) Ergebnisse der Galapagos‐Expedition des internationalen Institutes fuumlr submarine Forschung Vaduz (Liechtenstein) Zeitschrift fuumlr Tierpsychologie v 18 n 3 p 343-346 1961 EMERY N J Cognitive ornithology the evolution of avian intelligence Philosophical Transactions of the Royal Society of London B Biological Sciences v 361 n 1465 p 23-43 2006 EMERY N J CLAYTON N S The mentality of crows convergent evolution of intelligence in corvids and apes Science v 306 n 5703 p 1903-1907 2004 FAGOT J MAUGARD A Analogical reasoning in baboons (Papio papio) flexible reencoding of the source relation depending on the target relation Learning amp Behavior v 41 n 3 p 229-237 2013 FEUERBACHER E N A history of dogs as subjects in north american experimental psychological research Cognition and Behavior Review University of Florida and Kyung Hee University v 6 p 46-71 2011 FEUERBACHER E N ROSALES-RUIZ J Can dogs learn concepts the same way we do Concept formation in a German Shepherd International Journey of Comparative Psychology 30 p 1-25 2017 FIORITO G VON PLANTA C SCOTTO P Problem solving ability of Octopus vulgaris Lamarck (Mollusca Cephalopoda) Behavioral and Neural Biology v 53 n 2 p 217-230 1990 FIORITO G SCOTTO P Observational learning in Octopus vulgaris Science v 256 n 5056 p 545-547 1992 FOERDER P et al Insightful problem solving in an Asian elephant PloS one v 6 n 8 p e23251 2011 GALLEGOS W L A Teoriacutea de la inteligencia una aproximacioacuten neuropsicoloacutegica desde el punto de vista de Lev Vigotsky Cuadernos de Neuropsicologiacutea v 7 n 1 p 22-37 2013 GALLUP JR G G Chimpanzees self-recognition Science New Series v 167 n 3914 p 86-87 1970 GALLUP JR G G Self-recognition in primates American Psychologist 32 p 329-338 1977 GARDNER R A GARDNER B T Teaching sign language to a chimpanzee Science v 165 n 3894 p 664-672 1969

203

GEORGE M I Thomas Aquinas Meets Nim Chimpsky On the debate about human nature and the nature of other animals The Aquinas Review v 10 p 1-50 2003 GIGNAC G E BATES T C Brain volume and intelligence The moderating role of intelligence measurement quality Intelligence v 64 p 18-29 2017 GILLAN D J PREMACK D WOODRUFF G Reasoning in the chimpanzee I Analogical reasoning Journal of Experimental Psychology Animal Behavior Processes v 7 n 1 p 1 1981 GIRNDT A MEIER T CALL J Task constraints mask great apes ability to solve the trap-table task Journal of Experimental Psychology Animal Behavior Processes v 34 n 1 p 54 2008 GOTTFREDSON L Mainstream Science on Intelligence an editorial with 52 signatories history and bibliography Intelligence Norwood v 24 n 1 spec p 13-23 1997 GRASSMANN S KAMINSKI J TOMASELLO M How two word-trained dogs integrate pointing and naming Animal Cognition v 15 n 4 p 657-665 2012 GRENE M Aristotle and modern biology Journal of the History of Ideas v 33 n 3 p 395-424 1972 GRIFFIN D R Animal minds Chicago University of Chicago Press 1994 310 (x) p HAKEEM A Y et al Von Economo neurons in the elephant brain The Anatomical Record Advances in Integrative Anatomy and Evolutionary Biology v 292 n 2 p 242-248 2009 HAMPTON R R Rhesus monkeys know when they remember Proceedings of the National Academy of Sciences v 98 n 9 p 5359-5362 2001 HARE B et al The domestication hypothesis for dogs skills with human communication a response to Udell et al(2008) and Wynne et al(2008) Animal Behaviour 79 p e1-e6 2010 HARE B TOMASELLO M Human-like social skills in dogs Trends in Cognitive Sciences v 9 n 9 p 439-444 2005 HARE B Domestic dogs use humans as tools In BEKOFF M (ed) Encyclopedia of animal behaviour Connecticut Greenwood Press 2004 v 1 p 277-285 HARE B BROWN M WILLIAMSON C TOMASELLO M The domestication of social cognition in dogs Science v 298 n 5598 p 1634-1636 2002 HART B L HART L A PINTER-WOLLMAN N Large brains and cognition Where do elephants fit in Neuroscience and Biobehavioral Reviews v 32 n 1 p 86-98 2008

204

HART L A The Asian elephants-driver partnership the drivers perspective Aplied Animal Behaviour Science v 40 n 3 p 297-312 1994 HEANEY M GRAY R D TAYLOR A H Keas perform similarly to chimpanzees and elephants when solving collaborative tasks PloS one v 12 n 2 p e0169799 2017 HEDWIG D et al Acoustic structure and variation in mountain and western gorilla close calls a syntactic aproach Behaviour v 151 n 8 p 1091-1120 2014 HERMAN L M RICHARDS D G WOLZ J P Comprehension of sentences by bottlenosed dolphins Cognition v 16 n 2 p 129-219 1984 HERMAN L M FORESTELL P H Reporting presence or absence of named objects by a language-trained dolphin Neuroscience amp Biobehavioral Reviews v 9 n 4 p 667-681 1985 HERMAN L M Cognition and language competencies of bottlenosed dolphins In SCHUSTERMAN R J THOMAS J WOOD F G (ed) Dolphin cognition and behavior a comparative aproach Hillsdale NJ Lawrence Erlbaum Associates 1986 p 221-251 HERMAN L M MORREL-SAMUELS P PACK A A Bottlenosed dolphin and human recognition of veridical and degraded video displays of an artificial gestural language Journal of Experimental Psychology General v 119 n 2 p 215-230 1990 HERMAN L M KUCZAJ S III HOLDER M D Responses to anomalous gestural sequences by a language-trained dolphin Evidence for processing of semantic relations and syntactic information Journal of Experimental Psychology General v 122 n 2 p 184-194 1993a HERMAN L M PACK A A MORREL-SAMUELS P Representational and conceptual skills of dolphins In ROITBLAT H R HERMAN L M NACHTIGALL P (ed) Language and communication comparative perspectives Hillside NJ Lawrence Erlbaum 1993b p 273-298 HERMAN L M et al Dolphins (Tursiops truncatus) comprehend the referential character of the human pointing gesture Journal of Comparative Psychology v 113 n 4 p 1-18 1999 HERMAN L et al The bottlenosed dolphinrsquos (Tursiops truncatus) understanding of gestures as symbolic representations of its body parts Animal Learning and Behavior v 29 n 3 p 250-264 2001 HERMAN L M Vocal social and self-imitation by bottlenosed dolphins In NEHANIV C DAUTENHAHN K (ed) Imitation in animals and artifacts Cambridge MA MIT Press 2002 p 63-108

205

HERMAN L M Intelligence and rational behaviour in the bottlenosed dolphin In HURLEY S NUDDS M (ed) Rational Animals Oxford Oxford University Press 2006 p 439-467 HERMAN L M Body and self in dolphins Consciousness and Cognition v 21 n 1 p 526-545 2012 HIRATA S WATANABE K MASAO K ldquoSweet-potato washingrdquo revisited In Primate origins of human cognition and behavior Tokyo Springer 2008 p 487-508 HOFFMAN T Conscience and Synderesis In DAVIES B STUMP E (ed) The Oxford Handbook of Aquinas Oxford Oxford University Press 2012 p 255-264 HUME D Investigaccedilatildeo acerca do entendimento humano [S l] Ed Acroacutepolis 2001 [1748] Versatildeo para e-book de eBooksBrasil 2006 252 p HUNT G R GRAY R D Diversification and cumulative evolution in New Caledonian crow tool manufacture Proceedings of the Royal Society of London B Biological Sciences v 270 n 1517 p 867-874 2003 INFORMACcedilAtildeO In Dicionaacuterio online Caldas Aulete Rio de Janeiro Lexikon Editora Digital 2008 Disponiacutevel em wwwauletecombr Acesso em 10 ago 2017 INFORMACcedilAtildeO In Dicionaacuterio Priberam da Liacutengua Portuguesa Lisboa Priberam Informaacutetica 1998 Disponiacutevel em httpswwwpriberamptdlpo Acesso em 10 ago 2017 INFORMAR In Dicionaacuterio Online Caldas Aulete Lexikon editora digital Rio de Janeiro 2008 Disponiacutevel em wwwauletecombr Acesso em 10 ago 2017 INFORMAR In Dicionaacuterio Priberam da Liacutengua Portuguesa Lisboa Priberam Informaacutetica 1998 Disponiacutevel em httpswwwpriberamptdlpo Acesso em 10 ago 2017 INOUE S MATSUZAWA T Working memory of numerals in chimpanzees Current Biology v 17 n 23 p R1004-R1005 2007 INTELIGEcircNCIA In Dicionaacuterio Online Caldas Aulete Rio de Janeiro Lexikon Editora Digital 2008 Disponiacutevel em wwwauletecombr Acesso em 10 ago 2017 INTELIGEcircNCIA In Dicionaacuterio Priberam da Liacutengua Portuguesa Lisboa Priberam Informaacutetica 1998 Disponiacutevel em httpswwwpriberamptdlpo Acesso em 10 ago 2017 IRIE-SUGIMOTO N et al Evidence of meansndashend behavior in Asian elephants (Elephas maximus) Animal Cognition v 11 n 2 p 359-365 2008 IRIE-SUGIMOTO N KOBAYASHI T SATO T HASEGAWA T Relative quantity judgment by Asian elephants (Elephas maximus) Animal Cognition v 12 n 1 p 193-199 2009

206

IRIE N HASEGAWA T Elephant psychology what we know and what we would like to know Japanese Psychological Research v 51 n 3 p 177-181 2009 ISERBYT C T The Deliberate Dumbing Down of America 2 ed Ohio Conscience Press 2000 709 (xxvii) p JACOBS B et al Neuronal morphology in the African elephant (Loxodonta africana) neocortex Brain Structure and Function v 215 n 3-4 p 273-298 2011 JACOBS M S MCFARLAND W L MORGANE P J The anatomy of the brain of the bottlenose dolphin (Tursiops truncatus) Rhinic lobe (rhinencephalon) the archicortex Brain Research Bulletin v 4 p 1-108 1979 JELBERT S A et al Using the Aesops fable paradigm to investigate causal understanding of water displacement by New Caledonian crows PloS one v 9 n 3 p e92895 2014 JELBERT S A HOSKING R J TAYLOR A H GRAY R D Mental template matching is a potential cultural transmission mechanism for New Caledonian crow tool manufacturing traditions Scientific Reports v 8 n 1 p 8956 2018 JERISON H Evolution of the Brain and Intelligence New York Academic Press 1973 482 (xiv) p JOHNSON‐LAIRD P N Mental models in cognitive science Cognitive Science v 4 n 1 p 71-115 1980 JOHNSON-LAIRD Philip N Mental models and cognitive change Journal of Cognitive Psychology v 25 n 2 p 131-138 2013 JOHNSTON A M HOLDEN P C SANTOS L R Exploring the evolutionary

origins of overimitation a comparison across domesticated and non‐domesticated canids Developmental Science v 20 n 4 p e12460 2017 JOumlRGENSEN S Empathy altruism and the African elephant Monografia apresentada no Veterinaumlrprogrammet [Programa de Veterinaacuteria] do Institutionen foumlr biomedicin och veterinaumlr folkhaumllsovetenskap [Departamento de Biomedicina e Ciecircncias da Sauacutede Veterinaacuteria] da Sveriges lantbruksuniversitet 2015 KAMINSKI J CALL J FISCHER J Word Learning in a domestic dog evidence for fast maping Science v 304 p 1682-1683 2004 KAMINSKI J FISCHER J CALL J Prospective object search in dogs mixed evidence for knowledge of what and where Animal Cognition v 11 n 2 p 367-371 2008 KAWAI N MATSUZAWA T Numerical memory span in a chimpanze Nature v 403 p 6765 2000a

207

KAWAI N MATSUZAWA T A conventional aproach to chimpanzee cognition Response to MD Hauser (2000) Trends in cognitive sciences v 4 n 4 p 128-129 2000b KELLOGG W N KELLOGG L A The ape and the child a study of environmental influence upon early behavior Facsimile da ediccedilatildeo de McGraw-Hill Book Company Inc (1933) Hafner Publishing Company Inc New York 1967 341 (xv) p KENNEDY E H FRAGASZY D M Analogical reasoning in a capuchin monkey (Cebus apella) Journal of Comparative Psychology v 122 n 2 p 167 2008 KENNY A Aquinas on Mind Topics in Medieval Philosophy Routledge Londres 1994 182 (viii) p KOumlHLER W The mentality of apes 2 ed reimp 1931 New York Kegan Paul Trench Trubner amp Co 1927 336 (viii) p KOPS A M et al Characterizing the socially transmitted foraging tactic ldquospongingrdquo by bottlenose dolphins (Tursiops sp) in the western gulf of Shark Bay Western Australia Marine Mammal Science v 30 n 3 p 847-863 2014 KORNELL N Where is the ldquometardquo in animal metacognition Journal of Comparative Psychology v 128 n 2 p 143 2014 KOVAacuteCS Aacute MATHER J A Cephalopod cognition scholastic psychology Res Cogitans v 1 n 5 p 23-38 2008 KRUumlTZEN M et al Cultural transmission of tool use by Indo-Pacific bottlenose dolphins (Tursiops sp) provides access to a novel foraging niche Proceedings of the Royal Society of London B Biological Sciences v 281 n 1784 p 20140374 2014 KUKEKOVA A V et al The genetics of domesticated behavior in canids What can dogs and silver foxes tell us about each other Cold Spring Harbor Monograph Series v 44 p 515 2006 LAKATOS G DOacuteKA A MIKLOacuteSI Aacute The role of visual cues in the comprehension of the human pointing signals in dogs International Journal of Comparative Psychology v 20 n 4 p 341-350 2007 LAKSHMINARAYANAN V SANTOS L R The Evolution of Our Preferences Insights from Non-human Primates In DOLAN R SHAROT T Neuroscience of Preference and Choice [S l] Academic Press 2011 p 75-91 LALANDE A Vocabulaire technique et critique de la philosophie - Vol I A-M 4 ed [S l] Societeacute Franccedilaise de Philosophie 1932 499 (xviii) p LALANDE A Vocabulaire technique et critique de la philosophie - Vol II N-Z 4 ed [S l] QuadrigePUF Societeacute Franccedilaise de Philosophie 1997 665 p LE COADIC Y F A Ciecircncia da Informaccedilatildeo Brasiacutelia Briquet de Lemos 1996

208

LEFEBVRE L READER S M SOL D Brains innovations and evolution in birds and primates Brain Behavior and Evolution v 63 n 4 p 233-246 2004 LEWIS C S Studies in words 2 ed Cambridge Cambridge University Press 1967 343 p LIVINGSTONE M S SRIHASAM K MOROCZ I A The benefit of symbols monkeys show linear human-like accuracy when using symbols to represent scalar value Animal Cognition v 13 n 5 p 711-719 2010 LIT L SCHWEITZER J B OBERBAUER A M Handler beliefs affect scent detection dog outcomes Animal Cognition v 14 n 3 p 387-394 2011 LLOYD C M Animal life and intelligence London Stanford University Library 1891 512 (xvi) p LOCKE J Ensaio sobre o entendimento humano livro II 27 da identidade e da diversidade Skeacutepsis v 8 n 12 p 169-188 2015 LOCKE P Explorations in Ethnoelephantology Social Historical and Ecological Intersections between Asian Elephants and Humans Environment and Society Advances in Research v 4 n 1 p 79-97 2013 LUNCZ L V MUNDRY R BOESCH C Evidence for cultural differences between neighboring chimpanzee communities Current Biology v 22 n 10 p 922-926 2012 LUNCZ L V BOESCH C Tradition over trend Neighboring chimpanzee communities maintain differences in cultural behavior despite frequent immigration of adult females American Journal of Primatology v 76 n 7 p 649-657 2014 LUNCZ L V BOESCH LUNCZ C LYDIA V The extent of cultural variation between adjacent chimpanzee (Pan troglodytes verus) communities A microecological aproach American Journal of Physical Anthropology v 156 n 1 p 67-75 2015 MACINTYRE A Dependent rational animals why human beings need the virtues Chicago Open Court 2002 MACKINTOSH N Inteligecircncia em evoluccedilatildeo In KHALFA J (org) ROUANET L P (trad) A natureza da inteligecircncia uma visatildeo interdisciplinar [Satildeo Paulo] Ed UNESP 1997 p 33-54 MARTIN-ORDAS G CALL J COLMENARES F Tubes tables and traps great apes solve two functionally equivalent trap tasks but show no evidence of transfer across tasks Animal Cognition v 11 n 3 p 423-430 2008 MARKOWITZ H SCHMIDT M NADAL L SQUIER L Do elephants ever forget Journal of Aplied Behavior Analysis v 8 n 3 p 333-335 1975

209

MATHER J A Cephalopod consciousness behavioural evidence Consciousness and Cognition v 17 n 1 p 37-48 2008 MATHER J A DICKEL L Cephalopod complex cognition Current Opinion in Behavioral Sciences v 16 p 131-137 2017 MATURANA H VARELA F A aacutervore do conhecimento As bases bioloacutegicas do entendimento humano Campinas Editorial Psy 1995 281 p MAYR E The growth of biological thought diversity evolution and inheritance 11 ed London The Belknap Press 2000 974 (xvi) p MCCOMB K et al Leadership in elephants the adaptive value of age Proceedings of the Royal Society of London B Biological Sciences p rspb20110168 2011 MCCOMB K et al Long-distance communication of acoustic cues to social identity in African elephants Animal Behaviour v 65 n 2 p 317-329 2003 MCCOMB K BAKER L MOSS C African elephants show high levels of interest in the skulls and ivory of their own species Biology Letters v 2 n 1 p 26-28 2006 MENZEL R et al Honey bees navigate according to a map-like spatial memory Proceedings of the National Academy of Sciences v 102 n 8 p 3040-3045 2005 MERCADO III E et al Memory for recent actions in the bottlenosed dolphin (Tursiops truncatus) Repetition of arbitrary behaviors using an abstract rule Animal Learning amp Behavior v 26 n 2 p 210-218 1998 MERCADO III E UYEYAMA R K PACK A A HERMAN L M Memory for action events in the bottlenosed dolphin Animal Cognition v 2 n 1 p 17-25 1999 MILES H The cognitive foundations for reference in a signing orangutan In PARKER S T GIBSON K R (ed) ldquoLanguagerdquo and intelligence in monkeys and apes comparative developmental perspectives [Cambridge] Cambridge University Press 1990 p 511-539 MIRBAZEL S K ARJMANDI M Dogsrsquo Nature for Learning Human Languages Journal of Aplied Linguistics and Language Research v 5 n 3 p 247-255 2018 MORGANE P J JACOBS M S MCFARLAND W L The anatomy of the brain of the bottlenose dolphin (Tursiops truncatus) Surface configurations of the telencephalon of the bottlenose dolphin with comparative anatomical observations in four other cetacean species Brain Research Bulletin v 5 n 3 p 1-107 1980 MORRIS D Can jumbo elephants really paint Intrigued by stories naturalist Desmond Morris set out to find the truth Daily Mail Science amp Tech Kensington 22 feb 2009 Disponiacutevel em httpswwwdailymailcouksciencetecharticle-1151283Can-jumbo-elephants-really-paint--Intrigued-stories-naturalist-Desmond-Morris-set-truthhtmlixzz4uUGLEQ2X Acesso em 15 jul 2018

210

MUumlLLER C A et al Dogs learn to solve the suport problem based on perceptual cues Animal Cognition v 17 n 5 p 1071-1080 2014 MUSZALSKI H El objeto formal de la vis cogitativa en Santo Tomaacutes de Aquino Sapientia v 70 fasc 235 2014 NAKAGAKI T KOBAYASHI R NISHIURA Y UEDA T Obtaining multiple separate food sources behavioural intelligence in the Physarum plasmodium Proceedings of the Royal Society of London B Biological Sciences v 271 n 1554 p 2305-2310 2004 NEIL D T Cooperative fishing interactions between Aboriginal Australians and dolphins in eastern Australia Anthrozooumls v 15 n 1 p 3-18 2002 NEISSER U et al Intelligence Knows and Unknows American Psychologist v 51 n 2 p 77-101 1996 NISSANI M Do asian elephants (Elephas maximus) aply causal reasoning to tool-use tasks Journal of Experimental Psychology Animal Behavior Processes v 32 n 1 p 91-96 2006 OSTOJIĆ L CLAYTON N S Behavioural coordination of dogs in a cooperative problem-solving task with a conspecific and a human partner Animal Cognition v 17 n 2 p 445-459 2014 PAL H R PAL A TOURANI P Theories of intelligence Everymanrsquos Science v 39 n 3 p 181-192 2004 PATTERSON F LINDEN E The education of Koko New York The Gorilla Foundation 1981 162 p Disponiacutevel em httpwwwkokoorgsitesdefaultfiles rootpdfsteok_bookpdf Acesso em 20 mar 2017 PAVLOV I P Conditioned reflexes an investigation of physiological activity of the cerebral cortex [S l] Oxford University Press 1927 430 (xv) p PAVLOV I P Textos Escolhidos In MORENO R UFLAKER H A ANDREOLI E O M (trad) Pavlov ndash Skinner 2 ed Satildeo Paulo Abril Cultural 1984 402 (x) p (Coleccedilatildeo Os Pensadores) PENSAMENTO In Dicionaacuterio Online Caldas Aulete Rio de Janeiro Lexikon Editora Digital 2008 Disponiacutevel em wwwauletecombr Acesso em 10 ago 2017 PENSAMENTO In Dicionaacuterio Priberam da Liacutengua Portuguesa Lisboa Priberam Informaacutetica 1998 Disponiacutevel em httpswwwpriberamptdlpo Acesso em 10 ago 2017 PENSAR In Dicionaacuterio Online Caldas Aulete Rio de Janeiro Lexikon Editora Digital 2008 Disponiacutevel em wwwauletecombr Acesso em 10 ago 2017

211

PENSAR In Dicionaacuterio Priberam da Liacutengua Portuguesa Lisboa Priberam Informaacutetica 1998 Disponiacutevel em httpswwwpriberamptdlpo Acesso em 10 ago 2017 PEPERBERG I M Further evidence for addition and numerical competence by a Grey parrot (Psittacus erithacus) Animal Cognition v 15 n 4 p 711-717 2012 PEPERBERG I M Grey parrot numerical competence a review Animal Cognition v 9 n 4 p 377-391 2006 PEPERBERG I M Grey parrots do not always ldquoparrotrdquo the roles of imitation and phonological awareness in the creation of new labels from existing vocalizations Language Sciences v 29 n 1 p 1-13 2007 PERDUE B M TALBOT C F STONE A M BERAN M J Putting the elephant back in the herd elephant relative quantity judgments match those of other species Animal Cognition v 15 n 5 p 955-961 2012 PEREIRA JUacuteNIOR G O ocmentaacuterio de Tomaacutes de Aquino ao livro I do De Anima de Aristoacuteteles ndash Capiacutetulos 1-4 Dissertaccedilatildeo (Mestrado) ndash Instituto de Filosofia e Ciecircncias Humanas Universidade Estadual de Campinas Campinas 2006 PETRAZZINI M E M WYNNE C D What counts for dogs (Canis lupus familiaris) in a quantity discrimination task Behavioural processes v 122 p 90-97 2016 PFUNGST O Clever Hans (The Hors of Mr Von Osten) A contribution to experimental animal and human psychology New York Henry Holt and Company 1911 279 (viii) p PHILLIPS W SANTOS L R Evidence for kind representations in the absence of language Experiments with rhesus monkeys (Macaca mulatta) Cognition v 102 n 3 p 455-463 2007 PIAGET J Psicologia de la Inteligencia Buenos Aires Editorial Psique 1972 231 p PIANIGIANI O Vocabolario etimologico dela lingua italiana ndash vol I A-L Roma Societagrave Editrice Dante Alighieri 1907 789 p PIKA S LIEBAL K CALL J TOMASELLO M Gestural communication of apes Gesture v 5 n 1 p 41-56 2005 PILLEY J W REID A K Border collie comprehends object names as verbal referents Behavioural Processes v 86 n 2 p 184-195 2011 PILLEY J W Border collie comprehends sentences containing a prepositional object verb and direct object Learning and Motivation v 44 n 4 p 229-240 2013 PLOTNIK J M LAIR R SUPHACHOKSAHAKUN W DE WAAL F B Elephants know when they need a helping trunk in a cooperative task Proceedings of the National Academy of Sciences v 108 n 12 p 5116-5121 2011

212

PLOTNIK J M DE WAAL F B Asian elephants (Elephas maximus) reassure others in distress PeerJ v 2 p e278 2014 PLOTNIK J M DE WAAL F B M REISS D Self-recognition in a Asian elephant Proceedings of the National Academy of Sciences v 103 n 45 p 17053-17057 2006 POPER K R A loacutegica da pesquisa cientiacutefica 9 ed [S l] Ed Cultrix 2001 567 p PREMACK D WOODRUFF G Does the chimpanzee have a theory of mind Behavioral and Brain Sciences v 1 n 4 p 515-526 1978 PRIOR H SCHWARZ A GUumlNTUumlRKUumlN O Mirror-induced behavior in the magpie (Pica pica) evidence of self-recognition PLoS Biology v 6 n 8 p e202 2008 PROOPS L GROUNDS K SMITH A V MCCOMB K Current biology v 28 n 9 p 1428-1432 e4 2018 QUINE W V O Word and object [Massachusetts] The Massachusetts Institute of Technology 1960 296 (xvi) p RAFFAELE P Speaking bonobo Smithsonian Magazine v 37 p 74 2006 REALE G Metafiacutesica (Aristoacuteteles) sumaacuterio e comentaacuterios 2 ed Satildeo Paulo Ed Loyola 2005 v 3 754 (xiv) p REALE G ANTISERI D Histoacuteria da filosofia ndash Vol 1 Filosofia antiga e pagatilde 3 ed Satildeo Paulo Ed Paulus 2003 385 (xix) p REALE G ANTISERI D Histoacuteria da filosofia ndash Vol 2 Patriacutestica e escolaacutestica 2 ed Satildeo Paulo Ed Paulus 2005 335 (xvi) p REISS D MARINO L Mirror self-recognition in the bottlenose dolphIn A case of cognitive convergence Proceedings of the National Academy of Sciences v 98 n 10 p 5937-5942 2001 RENSCH B Increase of learning capability with increase of brain-size The American Naturalist v 90 n 851 p 81-95 1956 RENSCH B The intelligence of elephants Scientific American v 196 n 2 p 44-49 1957 ROELOFS Y C Tool use in birds an overview of reported cases ontogeny and underlying cognitive abilities 2010 Tese (Doutorado em Biologia Comportamental) ndash Biological Centre da University of Groningen Groningen 2010 ROMANES G Animal intelligence London Kegan Paul Tranch 1882 520 (xiv) p ROSATI A G SANTOS L R Spontaneous metacognition in rhesus monkeys Psychological Science v 27 n 9 p 1181-1191 2016

213

ROTH G DICKE U Evolution of the brain and intelligence Trends in Cognitive Sciences v 9 n 5 p 250-257 2005 SALOVEY P MAYER J D Emotional intelligence Imagination Cognition and Personality v 9 n 3 p 185-211 1990 SANTOS L R et al Means-means-end tool choice in cotton-top tamarins (Saguinus oedipus) finding the limits on primatesrsquo knowledge of tools Animal Cognition v 8 n 4 p 236-246 2005 SAVAGE-RUMBAUGH S et al Spontaneous symbol acquisition and communicative use by pygmy chimpanzees (Pan paniscus) Journal of Experimental Psychology General v 115 n 3 p 211 1986 SAVAGE-RUMBAUGH E S RUMBAUGH D M BOYSEN S Symbolic communication between two chimpanzees (Pan troglodytes) Science v 201 n 4356 p 641-644 1978 SAVAGE-RUMBAUGH E S et al Language comprehension in ape and child Monographs of the Society for Research in Child Development p i-252 1993 SAVOLAINEN P et al Genetic evidence for an East Asian origin of domestic dogs Science v 298 n 5598 p 1610-1613 2002 SCARF D HAYNE H COLOMBO M Pigeons on par with primates in numerical competence Science v 334 n 6063 p 1664-1664 2011 SCHAIE K W Primary mental abilities In CRAIGHEAD W E NEMEROFF C B (eds) The concise corsini encyclopedia of psychology and behavioral science 3 ed Hoboken NJ Wiley 2004 1112 (viii) p SEARLE J El Redescubrimiento de la Mente Barcelona Ed Criacutetica 1996 269 p SHETTLEWORTH J S Cognition evolution and behavior 2 ed New York Oxford University Press 2010 700 (XIII) p SHOSHANI J KUPSKY W J MARCHANT G H Elephant brain part i gross morphology functions comparative anatomy and evolution Brain Research Bulletin v 70 n 2 p 124-157 2006 SILVA J A Inteligecircncia humana abordagens bioloacutegicas e cognitivas Satildeo Paulo Lovise 2003 247 (xvi) p SIMOtildeES-LOPES P C Interaction of coastal populations of Tursiops truncatus (Cetacea Delphinidae) with the mullet artisanal fisheries in Southern Brazil Biotemas v 4 n 2 p 83-94 1991

214

SKINNER B F Two types of conditioned reflex a reply to Konorski and Miller Journal of General Psychology v 16 p 272-279 1937 Disponiacutevel em httpwwwdominiopublicogovbrdownloadtextops000164pdf Acesso em 20 ago 2018 SKINNER B F The behavior of organisms an experimental analysis New York The Century Psychology Series Apleton-Century Crofts Inc 1938 457 (ix) p SKINNER B F Contingences of reinforcement a theoretical analysis New York The Century Psychology Series Apleton-Century-Crofts Inc 1969 311 p Disponiacutevel em wwwbfskinnerorgwp-contentuploads201407CoRpdf Acesso em 11 ago 2018 SMIRNOVA A ZORINA Z OBOZOVA T WASSERMAN E Crows spontaneously exhibit analogical reasoning Current Biology v 25 n 2 p 256-260 2015 SOLTIS J et al A African elephant alarm calls distinguish between threats from humans and bees PLoS One v 9 n 2 p e89403 2014 STERN W The psychological methods of testing intelligence Baltimore Educational Psychology Monographs Warwick amp York 1914 n 13 160 (x) p STERNBERG R Intelligence in Humans In Encyclopedia Of Aplied Psychology USA p 321-328 2004 743 (xii) p STREET S E NAVARRETE A F READER S M LALAND K N Coevolution of cultural intelligence extended life history sociality and brain size in primates Proceedings of the National Academy of Sciences v 114 n 30 p 7908-7914 2017 SWIFT K N Wild American crows use funerals to learn about danger Tese (Doutorado) ndash The School of Environmental and Forest Sciences Washington University 2015 Disponiacutevel em httpsdigitallibwashingtoneduresearchworks handle177333178 Acesso em 13 set 2018 SZETEI V MIKLOacuteSI Aacute TOPAacuteL J CSAacuteNYI V When dogs seem to lose their nose an investigation on the use of visual and olfactory cues in communicative context between dog and owner Aplied Animal Behaviour Science v 83 n 2 p 141-152 2003 TALLIS R On the Edge of Certainty - Philosophical explorations 10 reimp New York St Martins Press 2010 236 (xvii) p TEBBICH S BSHARY R Cognitive abilities related to tool use in the woodpecker finch Cactospiza pallida Animal Behaviour v 67 n 4 p 689-697 2004 TELES M Mente Humana e Animal as perspectivas de Susanne Langer e Antoacutenio Damaacutesio Philosophica Lisboa v 25 p 147-168 2005

215

TERRACE H S CHEN S NEWMAN A B Serial learning with a wild card by pigeons (Columba livia) Effect of list length Journal of Comparative Psychology v 109 n 2 p 162 1995 THALMANN O et al Complete mitochondrial genomes of ancient canids suggest a European origin of domestic dogs Science v 342 n 6160 p 871-874 2013 THE GORILLA FOUNDATION Disponiacutevel em httpswwwkokoorgkoko-0 Acesso em 10 out 2018 THORNDIKE E L Animal intelligence An experimental study of the associative processes in animals The Psychological Review Monograph Suplements v 2 n 4 p i 1898 THORNDIKE E L Animal intelligence Toronto York University 2007 139 p (Classics in the History of Psychology) Disponiacutevel em httpwwwdominio publicogovbrdownloadtextops000178pdf Acesso em 10 ago 2018 THORNDIKE E L Intelligence and its uses Harpers Magazine 140 p 227-235 1920 TOMAacuteS DE AQUINO Disputed questions on spiritual creatures ndash de spiritualibus creaturis Milwaukee Marquette University Press 1949 187 p TOMAacuteS DE AQUINO Commentary on the Nicomachean ethics Chicago Regnery 1964a 2 v (Library of Living Catholic Thought) Disponiacutevel em httpdhsprioryorg thomasEthicshtm Acesso em 10 mar 2018 TOMAacuteS DE AQUINO Commentary on the metaphysics Chicago Regnery 1964b 2 v (Library of Living Catholic Thought) Disponiacutevel em httpdhsprioryorgthomas Metaphysicshtm Acesso em 25 abr 2017 TOMAacuteS DE AQUINO Questotildees discutidas sobre a verdade In BARAUacuteNA J et al (trad) Santo Tomaacutes de Aquino ndash Dante Satildeo Paulo Nova Cultural 1988 306 p (Coleccedilatildeo Os Pensadores) TOMAacuteS DE AQUINO Suma de Teologia ndash I ndash Introduccioacuten general y parte I 4 ed Madri [s n] 2001 993 (xxxviii) p (Biblioteca de Autores Cristianos) TOMAacuteS DE AQUINO Suma de Teologia ndash III ndash Parte II-II Madri [s n] 1990a 613 (xxvi) p (Biblioteca de Autores Cristianos) TOMAacuteS DE AQUINO Suma de Teologia ndash II ndash Parte I-II 2 ed Madri [s n] 1993 975 (xxxii) p (Biblioteca de Autores Cristianos) TOMAacuteS DE AQUINO Suma Contra os Gentios ndash Volume I Porto Alegre Livraria Sulina 1990b 376 (ix) p

216

TOMAacuteS DE AQUINO Sobre el Principio de Individuacioacuten Cuadernos de Anuario Filosofico Serie Universitaacuteria Universidade de Navarra Pamplona Espanha 1999 105 p TOMAacuteS DE AQUINO Commentaire au traiteacute de lrsquoacircme In THOMAS DrsquoAQUIN Commentaire au traiteacute de lrsquoacircme ndash Aristote Traiteacute de lrsquoacircme Les œuvres complegravetes de saint Thomas dAquin Projet Docteur Angeacutelique Institut Docteur Angeacutelique Eacutedition numeacuterique 2000 Disponiacutevel em httpdocteurangeliquefreefr Acesso em 18 maio 2017 TOMAacuteS DE AQUINO De Principiis Naturae In OS PRINCIacutePIOS da Realidade Natural Porto PT Elementos Sudoeste 2003a TOMAacuteS DE AQUINO De Ente et Essentia In OS PRINCIacutePIOS da Realidade Natural Porto PT Elementos Sudoeste 2003b TOMAacuteS DE AQUINO Sobre os Anjos (De Substantiis Separatis) Rio de Janeiro Ed Seacutetimo Selo 2006 229 (xxiv) p TOMAacuteS DE AQUINO A Unidade do Intelecto contra os averroiacutestas Lisboa Ediccedilotildees 70 2009 205 p TOMAacuteS DE AQUINO Questotildees Disputadas sobre a Alma Satildeo Paulo Eacute Realizaccedilotildees 2012 464 p TOMASELLO M Can an ape understand a sentence A review of language comprehension in ape and child by ES Savage-Rumbaugh et al Language amp Communication v 14 n 4 p 377-390 1994 TOMASELLO M Do young children have adult syntactic competence Cognition v 74 n 3 p 209-253 2000 TOMASELLO M What did we learn from the ape language studies In HARE B YAMAMOTO S Bonobos unique in mind brain and behavior [s n] Oxford University Press 2017 p 95-104 384 p TOMONAGA M MATSUZAWA T ITAKURA S Teaching ordinals to a cardinal-trained chimpanzee Primate Research v 9 n 2 p 67-77 1993 TOMONAGA M MATSUZAWA T Sequential responding to Arabic numerals with wild cards by the chimpanzee (Pan troglodytes) Animal Cognition v 3 n 1 p 1-11 2000 TOURINHO E Z Notas sobre o Behaviorismo de ontem e de hoje Psicologia Reflexatildeo e Criacutetica v 24 n 1 p 186-194 2011 TRUT L N Early canid domestication the farm-fox experiment foxes bred for tamability in a 40-year experiment exhibit remarkable transformations that suggest an interplay between behavioral genetics and development American Scientist v 87 n 2 p 160-169 1999

217

UDELL M A LORD K FEUERBACHER E N WYNNE C D A dogrsquos-eye view of canine cognition In HOROWITZ A Domestic dog cognition and behavior Berlin Springer Science amp Business Media 2014 p 221-240 VAN LOON L C The intelligent behavior of plants Trends in Plant Science v 21 n 4 p 286-294 2016 VAN SCHAIK C Why are some animals so smart Scientific American v 294 n 4 p 64-71 2006 VAN SCHAIK C P PRADHAN G R A model for tool-use traditions in primates implications for the coevolution of culture and cognition Journal of Human Evolution v 44 n 6 p 645-664 2003 VONK J Gorilla (Gorilla gorilla gorilla) and orangutan (Pongo abelii) understanding of first-and second-order relations Animal Cognition v 6 n 2 p 77-86 2003 WANG G-D et al Out of southern East Asia the natural history of domestic dogs across the world Cell Research v 26 n 1 p 21 2016 WECHSLER D Measurement of Adult Intelligence 3 ed Baltimore The Williams amp Wilkins Company 1944 258 (viii) p WEST R E YOUNG R J Do domestic dogs show any evidence of being able to count Animal Cognition v 5 n 3 p 183-186 2002 WHITEHEAD H Sperm whale Physeter macrocephalus In PERRIN W F WUumlRSIG B THEWISSEN J G M (ed) Encyclopedia of Marine Mammals 2 ed [S l] Academic Press 2009 p 1091-1097 WIMPENNY J H et al Cognitive processes associated with sequential tool use in New Caledonian crows PLoS One v 4 n 8 p e6471 2009 WITHEN A et al Cultures in chimpanzees Nature v 399 n 6737 p 682 1999 WITTEMYER G DOUGLAS-HAMILTON I GETZ W M The socioecology of elephants analysis of the processes creating multitiered social structures Animal Behaviour v 69 n 6 p 1357-1371 2005 WITTIG R M BOESCH C ldquoDecision-makingrdquo in conflicts of wild chimpanzees (Pan troglodytes) an extension of the Relational Model Behavioral Ecology and Sociobiology v 54 n 5 p 491-504 2003 WYNN K Addition and subtraction by human infants Nature v 358 n 6389 p 749 1992 XIA L SIEMANN M DELIUS J D Matching of numerical symbols with number of responses by pigeons Animal Cognition v 3 n 1 p 35-43 2000

218

YERKES R M YERKES A W The great apes a study of anthropoid life New Haven Yale University Press 1929 652 (xx) p ZAPPES C A ANDRIOLO A SIMOtildeES-LOPES P C DI BENEDITTO A P M Human-dolphin (Tursiops truncatus Montagu 1821) cooperative fishery and itrsquos influence on cast net fishing activities in Barra de ImbeacuteTramandaiacute Southern Brazil Ocean amp Coastal Management v 54 n 5 p 427-432 2011 ZAPPES C A O golfinho nariz-de-garrafa Tursiops truncatus (Montagu 1821) e a pesca artesanal no Atlacircntico Sul comparaccedilatildeo do conhecimento de pescadores tradicionais 2011 Tese (Doutorado) ndash Universidade Estadual do Norte Fluminense ndash UENF Campos dos Goytacazes 2011 ZIMMERMANN F ZEMKE F CALL J GOacuteMEZ J C Orangutans (Pongo pygmaeus) and bonobos (Pan paniscus) point to inform a human about the location of a tool Animal Cognition v 12 n 2 p 347-358 2009

219

TABELAS

Tabela 1 - Caracteriacutesticas das potecircncias da alma que compotildeem o aparato cognitivo

Potecircncias Animais natildeo humanos Ente humano

Sentidos Externos Sentido Comum Imaginaccedilatildeo Memoacuteria Estimativa Intelecto

Sentem percebem e discriminam seus sensiacuteveis proacuteprios e os comuns que lhes competem Une e julga todos os sensiacuteveis e intenccedilotildees dos sentidos externos Reteacutem e conserva formas sensiacuteveis Conserva e compara as imagens e as espeacutecies intencionais Apreende compotildee e divide e compara imagens e espeacutecies intencionais particulares tem como objeto proacuteprio as quididades particulares Percebe as intenccedilotildees por um instinto natural

Sentem percebem e discriminam seus sensiacuteveis proacuteprios e os comuns que lhes competem Une e julga todos os sensiacuteveis e intenccedilotildees dos sentidos externos Reteacutem e conserva formas sensiacuteveis e compotildee e divide imagens sob refluxo do intelecto Conserva e compara as imagens e as espeacutecies intencionais Reminiscecircncia acessa de modo voluntaacuterio sob refluxo do intelecto as imagens e as espeacutecies conservadas Cogitativa Apreende compotildee e divide e compara imagens e espeacutecies intencionais particulares tem como objeto proacuteprio as quididades particulares Reuacutene as intenccedilotildees particulares percebe as intenccedilotildees por uma comparaccedilatildeo sob refluxo do intelecto Apreende espeacutecies intencionais universais define conhece o verdadeiro e o falso discrimina sabe (discerne e concebe) entende discorre e faz suposiccedilotildees ou seja forma conceituaccedilotildees concepccedilotildees e juiacutezos compondo e dividindo conceitos para formar outros conceitos enuncia silogiza discursa

220

Tabela 2 - Testes e observaccedilotildees relacionados a invertebrados peixes e aves

Habilidades Testes Comportamentos espontacircneos

- Interaccedilotildees comportamentais Interaccedilotildees em geral - Noccedilatildeo de meio e fim e uso de instrumentos - Competecircncia para apreensatildeo de quantidades - Aptidotildees relacionadas agrave comunicaccedilatildeo - Autorreconhecimento

- Polvo teste de associar balatildeo de determinada cor agrave recompensa e outro de outra cor agrave puniccedilatildeo (aprendendo por observaccedilatildeo) - Polvo teste para abrir tampa de frasco para obter recompensa - Tentilhatildeo pica-pau teste de retirada de recompensa de tubos com gravetos inclusive com obstaacuteculo em forma de ldquoHrdquo - Papagaios-da-nova-zelacircndia teste de cooperaccedilatildeo em que dois espeacutecimes precisam puxar cada um uma corda ao mesmo tempo para obterem a recompensa - Papagaio-cinzento teste de contagem e de realizaccedilatildeo de pequenas somas com quantidades especiacuteficas de alimento ou com algarismos exibidos em bandejas -Pombos testes de associaccedilatildeo de siacutembolos com numerosidade contando ateacute nove - Papagaio-cinzento testes em que se verifica vocabulaacuterio pode conhecer com treinamento mais de cem palavras - Formigas teste de reconhecimento diante do espelho

- Peixes fazem vigilacircncia contra predadores pelo bando - Aves algumas ajudam um coespeciacutefico que esteja com deficiecircncia visual - Peixes usam pedras para quebrar conchas - Aves algumas usam pedras para quebrar ovos - lanccedilam alimentos para atrairem peixes e pescarem - usam presas e musgos como esponjas para levar aacutegua para a prole - usam gravetos ou espinhos de cacto para retirar larvas de pequenos orifiacutecios - Abelhas seguem coespeciacuteficos e aprendem rotas - Aves aprendem canto com os pais

221

Tabela 3 - Testes e observaccedilotildees relacionados a Corvidae

Habilidades Testes Comportamentos espontacircneos

- Interaccedilotildees comportamentais Comportamento diante da morte de coespeciacutefico - Teoria da mente e comportamento diante de telas de viacutedeo - Noccedilatildeo de meio e fim e uso de instrumentos - Correlaccedilatildeo de figuras ou sons - Autorreconhecimento

- Teste com recintos interligados por pequeno buraco em que animal em um acelerava estocagem de alimento quando o buraco estava aberto ou quando ouvia gravaccedilatildeo de som de coespeciacutefico com o buraco fechado - Teste com pedras e tubos com aacutegua e recompensa flutuando - Teste com varetas para alcanccedilar a recompensa ou outras varetas para alcanccedilar recompensa - Teste de oito passos com varetas e pedras - Teste de recorte de cartatildeo para inserir em maacutequina - Teste de raciociacutenio analoacutegico com placas e figuras geomeacutetricas - Teste de reconhecimento diante do espelho

- Aproximam-se de mortos para investigar causa da morte de coespeciacutefico - Lanccedilam objetos contra inimigos - Lanccedilam iscas para pesca - Por natildeo ter ecircxito em teste com o objeto alongado para alcanccedilar recompensa animal retornou ao aviaacuterio para pegar graveto e concluir tarefa - Produzem a partir de pequenos ramos instrumentos

222

Tabela 4 - Testes e observaccedilotildees relacionados a Elephantidae

Habilidades Testes Comportamentos espontacircneos

- Interaccedilotildees comportamentais Interaccedilotildees em geral Comportamento diante da morte de coespeciacutefico Respostas a sinais humanos - Teoria da mente e comportamento diante de telas de viacutedeo - Noccedilatildeo de meio e fim e uso de instrumentos - Correlaccedilatildeo de figuras ou sons

- Testes de reconhecimento de gestos humanos e da postura corporal humana que apontam para localizaccedilatildeo de alimento - Teste de acionar interruptor para ganhar recompensa - Teste da escolha de suportes um com alimento e outro sem com variaccedilotildees -Teste de cooperaccedilatildeo em que dois espeacutecimes tecircm de puxar cada um uma corda ao mesmo tempo para obterem a recompensa - Teste em que se utiliza objetos como apoio para alcanccedilar recompensa suspensa -Teste com cartas com padrotildees de imagens e com muacutesica com padrotildees de melodias

- Coalisatildeo proteccedilatildeo dos mais jovens conforto cuidado de filhotes na ausecircncia da matildee resgate auxiacutelio em caso de atolamento remoccedilatildeo de objetos estranhos - Distinccedilatildeo de tipos e niacuteveis de ameaccedila com comportamentos especiacuteficos para cada um - Distinguem e investigam restos mortais de coespeciacuteficos - Visitam por sucessivas vezes um cadaacutever de membro do grupo - Percepccedilatildeo de que o outro se comporta espontaneamente tecircm emoccedilotildees percepccedilotildees crenccedilas e entendimentos que podem ser diferentes - Animal trocou de objeto para tentar alcanccedilar alimento suspenso - Uso de conjuntos de ramos para espantar insetos

223

- Competecircncia para apreensatildeo de quantidades - Aptidotildees relacionadas agrave comunicaccedilatildeo - Autorreconhecimento

- Teste de comparaccedilatildeo de quantidades de alimento em cestas apresentadas simultaneamente e sucessivamente - Comparaccedilatildeo de cartas com quantidades de pontos - Com treinamento podem reconhecer pelo menos cerca de cem comandos verbais - Teste de reconhecimento diante do espelho - Teste com tapete para perceber que peso do proacuteprio corpo impede a realizaccedilatildeo de tarefa

224

Tabela 5 - Testes e observaccedilotildees relacionados a Carnivora ndash Canis lupus familiaris

Habilidades Testes Comportamento espontacircneo

Interaccedilotildees comportamentais - Respostas a sinais humanos - Noccedilatildeo de meio e fim e uso de instrumentos Planejamento - Imitaccedilatildeo e sincronia - Competecircncia para apreensatildeo de quantidades - Aptidotildees relacionadas agrave comunicaccedilatildeo

- Testes em geral para encontrar alimentos pelos quais respondem ao gesto de apontar agrave expressatildeo corporal a expressotildees faciais e ao estado de atenccedilatildeo a estados emocionais ao tom de voz humanos aleacutem de objetos utilizados para marcaccedilatildeo - Teste da escolha de suportes um com alimento e outro sem com variaccedilotildees - Teste para detectar padratildeo de sobreimitaccedilatildeo com caixa com tampa que pode ser aberta diretamente e alavanca desnecessaacuteria - Teste para verificar se distinguem pratos com maiores quantidades de alimento - Teste para verificar se sabem contar - Testes para pegar objetos apoacutes comando mostra que integram a memoacuteria relacionada agrave identidade com a relacionada agrave localizaccedilatildeo e assumem a correferecircncia do comando de voz com o gesto de apontar dos humanos - Mediante treinamento podem reconhecer mais de mil objetos pelo nome - Reconhecem categorias de objetos

Planejam como tratam presas ou objetos para transportaacute-los

225

Tabela 6 - Testes e observaccedilotildees relacionados a Cetaceae - Delphinidae

Habilidades Testes Comportamentos espontacircneos

- Interaccedilotildees comportamentais Interaccedilotildees gerais Comportamento diante da morte de coespeciacutefico Respostas a sinais humanos - Teoria da mente e comportamento diante de telas de viacutedeo - Noccedilatildeo de meio e fim e uso de instrumentos Planejamento - Imitaccedilatildeo e sincronia

- Testes para verificar se seguem o apontar de dedo a extensatildeo do braccedilo e o olhar humanos - Testes para respostas a sinais humanos por tela de viacutedeo - Testes para respostas a sinais humanos por tela de viacutedeo - Testes com comando ldquotendemrdquo para realizarem movimentos em sincronia - Testes de imitaccedilatildeo de sons emitidos por computador de coespeciacuteficos e de humanos

- Pesca colaborativa - Transmissatildeo cultural - Realizaccedilatildeo espontacircnea de novas combinaccedilotildees de accedilotildees associadas a sinais dos treinadores - possiacutevel demora relacionada ao reconhecimento do estado de morte manifestaccedilatildeo de estresse demora relacionada ao desapego do cadaacutever - Uso de poriacuteferas no focinho para proteccedilatildeo contra corais em forrageamento - Em obediecircncia a comando espeacutecime recolheu objetos na piscina mas de modo espontacircneo os dispocircs pelo corpo desde o que se encontrava mais distante - transporte espontacircneo de objeto para centro da piscina para executar com este comando

226

- Aptidotildees relacionadas agrave comunicaccedilatildeo - Autorreconhecimento

- Testes com comandos verbais para realizar tarefas com objetos em locais especiacuteficos incluindo combinaccedilotildees natildeo previamente treinadas e comando de repeticcedilatildeo aleacutem de uso de generalizaccedilotildees e de sequecircncias semacircntica ou sintaticamente anocircmalas - Teste com dois remos um significando ldquosimrdquo e outro significando ldquonatildeordquo - Teste com comando para criaccedilatildeo de novo movimento - Teste com comandos para lidar com objetos seguidos do comando ateacute entatildeo desconhecido para escolher a proacutexima accedilatildeo - Teste com associaccedilatildeo de siacutembolos (gestos) com partes do corpo mais realizaccedilatildeo de accedilotildees e uso de objetos - Teste de reconhecimento diante do espelho - Teste de reconhecimento de partes corporais com comandos para tocaacute-las em objetos ou realizar outras accedilotildees com este - Teste de imitaccedilatildeo de humanos - Teste com comando para criaccedilatildeo de novo movimento para senso de agecircncia e propriedade - Teste com associaccedilatildeo de siacutembolos (gestos) com partes do corpo mais realizaccedilatildeo de accedilotildees e uso de objetos

Aplicam-se a mais de um propoacutesito

227

Tabela 7 - Testes e observaccedilotildees relacionados a Primates

Habilidades Testes Observaccedilotildees de campo e comportamentos espontacircneos

- Interaccedilotildees comportamentais Interaccedilotildees gerais Comportamento diante da morte de coespeciacutefico

- Teoria da mente e comportamento diante de telas de viacutedeo - Metacogniccedilatildeo - Noccedilatildeo de meio e fim e uso de instrumentos

- Teste para verificar como animais lidam com desigualdade dando melhor recompensa a um que a outro por mesma tarefa - Teste com pessoas (em uma etapa uma por quem o animal tem apreccedilo e outra por quem natildeo tem) em viacutedeos e fotografias simulando depararem com problemas para resoluccedilatildeo destes pelo animal por fotografias - Teste de memoacuteria para metamemoacuteria em que macacos decidem se querem participar de teste para tentar recompensa de que gostam mais ou natildeo participar e ganhar recompensa de que gostam menos - Teste com tubos em ldquoVrdquo em que o experimentador insere alimento em um dos dois tubos sem o animal ver na abertura oposta ao acircngulo formado - Teste para obter alimento puxando-o ou empurrando-o com vareta ou ancinho em uma de duas vias de um aparato com bandeja ou em tubo com armadilha para

- Avaliam se determinado conflito eacute proveitoso e tomam decisatildeo - Transmissatildeo cultural comportamental como no uso de instrumentos - Chamam atenccedilatildeo de outro ente para comunicar-se - Macacos treinados podem enganar os pesquisadores - Possiacuteveis demora relacionada ao reconhecimento do estado de morte manifestaccedilatildeo de estresse demora relacionada ao desapego do cadaacutever - Uso de pedras tacos folhas gravetos etc como instrumentos para coleta de alimentos assepsia defesa etc

228

Planejamento - Correlaccedilatildeo de figuras ou sons - Competecircncia para apreensatildeo de quantidades

perda do alimento - Teste com peccedila plaacutestica associada a pedaccedilo de maccedilatilde ou de coco escondidos a fim de observar se animais individuam objetos - Teste com varas para alcanccedilar alimento diretamente ou encaixando uma vara em outra com ou sem obstaacuteculos - Teste com caixotes para os animais empilharem e alcanccedilarem alimento suspenso - Teste com trecircs nuacutemeros em tela em que apoacutes o toque no primeiro os outros dois mudam de posiccedilatildeo - Teste de sequecircncia loacutegica com imagens - Teste de raciociacutenio analoacutegico com figuras em cartotildees com objetos ou com imagens em telas de viacutedeo - Teste com sequecircncia numeacuterica em viacutedeo e contagem ateacute nove incluindo teste de memoacuteria com substituiccedilatildeo dos nuacutemeros por quadrados - Teste com quantidades especiacuteficas de alimento ou com algarismos exibidos em bandejas ou dispostos no recinto para verificar capacidade de realizar somas mais simples - Teste para associaccedilatildeo de algarismos ou figuras com pontos em tela de viacutedeo a quantidades respectivas de recompensa - Teste em que os animais trocam fichas por alimentos sendo que um experimentador lhes entrega mais e o outro menos podendo um acrescentar e outro retirar parte do alimento ou ambos acrescentarem alimento um mais e outro menos

229

- Aptidotildees relacionadas agrave comunicaccedilatildeo - Autorreconhecimento

- Testes em que se verifica vocabulaacuterio com treinamento podem reconhecer mais de trecircs mil palavras que podem expressar com sentenccedilas por lexigramas ou linguagem de sinais - Teste em que primatas apontam para indicar a humano onde estaacute alimento ou objeto para pegar alimento - Teste de reconhecimento diante do espelho

- Comunicaccedilatildeo por vocalizaccedilotildees ou por golpes em troncos - Animais treinados podem combinar e inventar sinais manuais para comunicaccedilatildeo dar nomes xingar - Indicaccedilatildeo de partes da face no espelho

Page 3: RAFAEL SAMPAIO OCTAVIANO DE SOUZA - HCTE/UFRJ · a todos os que já intercederam perante o Criador por esta pobre alma. AGRADECIMENTOS Ao Criador, por tudo, e a todos aqueles que

S729 Souza Rafael Sampaio Octaviano de Apontamentos sobre a inteligecircncia animal agrave luz da psicologia Aristoteacutelico- Tomista Rafael Sampaio Octaviano de Souza ndash Rio de Janeiro 2018 229 f il 30 cm Orientadora Maira Monteiro Froacutees Tese (Doutorado) - Universidade Federal do Rio de Janeiro Centro de Ciecircncias Matemaacuteticas e da Natureza Programa de Poacutes-Graduaccedilatildeo em Histoacuteria das Ciecircncias e das Teacutecnicas e Epistemologia 2018 Referecircncias f 197-218 1 Aristotelismo-tomismo 2 Inteligecircncia 3 Animais natildeo humanos 4 Potecircncia estimativa 5 Testes de inteligecircncia I Froacutees Maira Monteiro II Universidade Federal do Rio de Janeiro Centro de Ciecircncias Matemaacuteticas e da Natureza III Tiacutetulo

CDD 1894

Dedico este trabalho

aos meus amados filhos e esposa

aos meus amados pais e irmatildeos

aos meus demais parentes e amigos queridos

aos mestres que me orientaram e ensinaram

a todos os que jaacute intercederam perante o

Criador por esta pobre alma

AGRADECIMENTOS

Ao Criador por tudo e a todos aqueles que intercederam e haveratildeo de

interceder de algum modo diante dlsquoEle por esta pobre alma

agrave minha esposa por seu amor por nossos filhos ndash e a eles ndash por tudo mais

aos meus pais por seu amor pela educaccedilatildeo pela vida e por esta tambeacutem

aos meus demais antepassados

agrave minha tatildeo querida orientadora fundamental neste percurso por tanta

confianccedila pelas orientaccedilotildees imprescindiacuteveis e luminosas

e por essas tambeacutem aos meus tatildeo queridos orientadores das etapas

anteriores

ao meu querido compadre e mestre tomista por tantas luzes

agrave minha tatildeo querida cunhada comadre que tatildeo carinhosamente se ocupou dos

ajustes finais

aos professores formais ou informais mestres e mestras que tive e tenho e

de quem palavras ou accedilotildees satildeo tijolos que estaratildeo cimentados neste ente

pela eternidade

ao HCTE pela oportunidade pelo enriquecimento e porque sem ele este

trabalho muito provavelmente natildeo existiria

aos professores das Bancas pelas dicas valiosas pela experiecircncia e agrave

CAPES pelos recursos

a todos os demais que de algum modo contribuiacuteram para a consumaccedilatildeo

desta jornada

ldquo eacute mau aquele amante popular que ama o corpo mais que a alma pois natildeo eacute ele constante por amar um objeto que tambeacutem natildeo eacute constante Com efeito ao mesmo tempo que cessa o viccedilo do corpo que era o que ele amava bdquoalccedila ele o seu vocirco‟ sem respeito a muitas palavras e promessas feitas Ao contraacuterio o amante do caraacuteter que eacute bom eacute constante por toda a vida porque se fundiu com o que eacute constanterdquo

Soacutecrates ndash O Banquete

RESUMO

SOUZA Rafael Sampaio Octaviano de Apontamentos sobre a inteligecircncia animal agrave luz da psicologia aristoteacutelico-tomista 2018 Tese (Doutorado em Histoacuteria das Ciecircncias e das Teacutecnicas e Epistemologia) ndash Programa de Poacutes-Graduaccedilatildeo Histoacuteria das Ciecircncias e das Teacutecnicas e Epistemologia Universidade Federal do Rio de Janeiro 2018

Para a psicologia aristoteacutelico-tomista apenas o ser humano eacute dotado de intelecto enquanto os outros animais estatildeo restritos agrave potecircncia estimativa e aos demais sentidos internos e externos No entanto muitas pesquisas comparativas sobre processos neurais e comportamentais apresentaram resultados que retratam a ampla gama de definiccedilotildees atualmente propostas para o termo rdquointeligecircnciardquo levando pesquisadores a sugerirem que muitos desses animais natildeo humanos seriam capazes de realizar inferecircncias raciociacutenios e ateacute abstraccedilotildees Algumas de suas contribuiccedilotildees mais representativas foram aqui revisadas e avaliadas de acordo com sua coerecircncia em relaccedilatildeo ao aristotelismo-tomismo Natildeo se verificou nenhuma incompatibilidade significativa na presente anaacutelise Sugerimos que consideraccedilotildees sobre os princiacutepios aristoteacutelicos-tomistas em pesquisas sobre inteligecircncia animal e outros campos afins podem contribuir para os debates sob a perspectiva interdisciplinar que vatildeo desde o acircmbito epistemoloacutegico ao desenvolvimento de vaacuterias disciplinas que envolvem o sujeito humano e outros entes que se propotildee que sejam inteligentes

Palavras-chave Aristotelismo-tomismo Inteligecircncia Animais natildeo humanos Potecircncia estimativa Testes de inteligecircncia

ABSTRACT

SOUZA Rafael Sampaio Octaviano de Apontamentos sobre a inteligecircncia animal agrave luz da psicologia aristoteacutelico-tomista 2018 Tese (Doutorado em Histoacuteria das Ciecircncias e das Teacutecnicas e Epistemologia) ndash Programa de Poacutes-Graduaccedilatildeo Histoacuteria das Ciecircncias e das Teacutecnicas e Epistemologia Universidade Federal do Rio de Janeiro 2018

For the Aristotelian-Thomist psychology only the human being is endowed with intellect while the other animals are restricted to an estimative power and the other internal and external senses However many comparative researches on neural and behavioral processes has presented results portraying the wide range of definitions currently proposed for the term intelligence leading researchers to suggest that many of these nonhuman animals would be able to make inferences reasoning and even abstractions Some of their most representative contributions have been here in reviewed and evaluated according to their coherence with regard to aristotelianism-thomism No significant incompatibility was verified in the present analysis We suggest that considerations of the aristotelian-thomism principles in research on animal intelligence and other related fields can contribute to the debates pertaining interdisciplinary perspective ranging from the epistemological scope to the development of various disciplines involving the human subject and other beings that are proposed be intelligent

Keywords Aristotelianism-Thomism Intelligence Non-human animals Estimative power Intelligence tests

LISTA DE TABELAS Tabela 1 - Caracteriacutesticas das potecircncias da alma que compotildeem o aparato

cognitivo

219

Tabela 2 - Testes e observaccedilotildees relacionados a invertebrados peixes e

aves

220

Tabela 3 - Testes e observaccedilotildees relacionados a Corvidae 221

Tabela 4 - Testes e observaccedilotildees relacionados a Elephantidae 222

Tabela 5 - Testes e observaccedilotildees relacionados a Carnivora ndash Canis lupus

familiaris

224

Tabela 6 - Testes e observaccedilotildees relacionados a Cetaceae ndash Delphinidae 225

Tabela 7 - Testes e observaccedilotildees relacionados a Primates 227

LISTA DE FIGURAS

Figura 1 - Esquema de sugestotildees para pesquisas futuras 195

SUMAacuteRIO

1 INTRODUCcedilAtildeO 12

2 JUSTIFICATIVA 53

3 MEacuteTODOS E OBJETIVOS 57

4 RESULTADOS E DISCUSSAtildeO 60

41 UMA CONSTRUCcedilAtildeO PARA A PSICOLOGIA ARISTOTEacuteLICO-TOMISTA 60

411 A subalternaccedilatildeo das ciecircncias 60

5 CONCEITOS FUNDAMENTAIS DO ARISTOTELISMO-TOMISMO 62

51 ATO E POTEcircNCIA 62

52 ESSEcircNCIA E ACIDENTE 63

53 AS QUATRO CAUSAS E AS CATEGORIAS 70

54 A ALMA SUAS POTEcircNCIAS E A GRADACcedilAtildeO ENTITATIVA 74

55 OS SENTIDOS 81

551 Sentidos externos 83

552 Sentidos internos 87

56 INTELECTO 92

6 INVESTIGACcedilAtildeO SOBRE A ATRIBUICcedilAtildeO DE INTELIGEcircNCIA AOS ANIMAIS 107

61 ELEPHANTIDAE 114

611 Observaccedilotildees de Campo 116

612 Estudos experimentais 119

62 CARNIVORA ndash CANIS LUPUS FAMILIARIS 123

63 CETACEAE ndash DELPHINIDAE 129

631 Observaccedilotildees de campo 130

632 Estudos experimentais 131

64 PRIMATES 135

641 Observaccedilotildees de campo 137

642 Estudos experimentais 139

7 A INTELIGEcircNCIA NOS ANIMAIS SEGUNDO O ARISTOTELISMO-TOMISMO 153

8 ANAacuteLISE DAS HABILIDADES COGNITIVAS SEGUNDO O MODELO

ARISTOTEacuteLICO-TOMISTA 160

81 INTERACcedilOtildeES COMPORTAMENTAIS 160

811 Interaccedilotildees em geral 160

812 Comportamento diante da morte de coespeciacutefico 161

813 Respostas a sinais humanos 162

82 TEORIA DA MENTE E COMPORTAMENTO DIANTE DE TELAS DE VIacuteDEO 163

83 METACOGNICcedilAtildeO 165

84 NOCcedilAtildeO DE MEIO E FIM E USO DE INSTRUMENTOS 166

841 Planejamento 168

85 IMITACcedilAtildeO E SINCRONIA 168

86 CORRELACcedilAtildeO DE FIGURAS OU SONS 169

87 COMPETEcircNCIA PARA APREENSAtildeO DE QUANTIDADES 171

88 APTIDOtildeES RELACIONADAS Agrave COMUNICACcedilAtildeO 172

89 AUTORRECONHECIMENTO 176

9 CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS E CONCLUSAtildeO 178

REFEREcircNCIAS 197

TABELAS 219

12

1 INTRODUCcedilAtildeO

Como definir a inteligecircncia Seria possiacutevel delimitaacute-la conceitualmente (e

neste caso atribuir-lhe eficazmente mais de um conceito) Poderia ela ser atribuiacuteda

a algum outro ente aleacutem do homem Muitos pensadores buscaram responder a

questotildees como estas desde pelo menos o advento da filosofia Por muito tempo se

propocircs predominantemente que o exerciacutecio do intelecto seria no que toca aos entes

sensiacuteveis um atributo exclusivo da alma humana apta agrave aquisiccedilatildeo de conhecimento

teoacuterico agrave apreensatildeo da realidade agrave da verdade Isto se deu pelo menos ateacute o final

do periacuteodo escolaacutestico em que vigorava um realismo moderado quando entatildeo os

alicerces dessa ideia passaram a ser gradualmente abandonados em razatildeo da

forccedila que ganhava o nominalismo e substituiacutedos por diversificadas correntes que se

desenvolveram e se puseram a reestruturaacute-la objetando inclusive contra a proacutepria

existecircncia do que se entendia por alma

Dentre as que se destacam estatildeo as idealistas que levantam duacutevidas sobre o

acesso mesmo do homem agrave realidade a verdades e as naturalistas estas realistas

ou mesmo de fundo idealista que restringem as explicaccedilotildees sobre a intelecccedilatildeo

exclusivamente a processos orgacircnicos Mas todos os principais filoacutesofos e cientistas

que representam tais visotildees alguns dos quais seratildeo citados no decorrer deste

trabalho natildeo discrepam de seus predecessores em relaccedilatildeo ao fato de que natildeo haacute

como especular satisfatoriamente sobre a inteligecircncia sem levar em conta a anaacutelise

da natureza da consciecircncia e a presenccedila de elementos como o pensamento e a

informaccedilatildeo esta uacuteltima incluindo sua transmissatildeo por parte do objeto e sua

captaccedilatildeo e processamento pelo sujeito que intelige E haacute igualmente consenso em

relaccedilatildeo ao fato de que o pensamento e a informaccedilatildeo bem como a consciecircncia e a

inteligecircncia mesma possuem objetos ou seja aquilo que eacute pensado aquilo a que se

refere a informaccedilatildeo aquilo de que se estaacute consciente e aquilo que eacute inteligido e

possuem sujeitos ou seja aquele que pensa aquele que deteacutem a informaccedilatildeo

aquele que estaacute consciente aquele que intelige

As divergecircncias entre as escolas supracitadas comeccedilam na interpretaccedilatildeo

sobre o que haacute de mais elementar na natureza desses sujeitos e objetos isto eacute

como jaacute apontado se satildeo ou natildeo reais ou se um o eacute e o outro natildeo o que pode

remeter imediatamente a questotildees sobre a natureza da informaccedilatildeo Em seguida

considerando a realidade do sujeito este recebe informaccedilotildees verdadeiras do mundo

13

agrave sua volta ou recebe informaccedilotildees falsas dele ou recebe informaccedilotildees parcialmente

verdadeiras e parcialmente falsas ou recebe informaccedilotildees sobre as quais natildeo tem

condiccedilotildees de emitir juiacutezo em relaccedilatildeo agrave sua veracidade ou falsidade Mesmo diante

das dificuldades que haacute em demonstrar no acircmbito cientiacutefico que os fenocircmenos

mentais envolvidos na cogniccedilatildeo apresentam caracteriacutesticas em comum com o seu

objeto a natureza dessas informaccedilotildees define assim a natureza do que ele pensa

Deste modo pensa em coisas reais e natildeo reais (ou pensa somente em coisas reais

se considera que todas sejam reais como pensamento) ou em coisas somente natildeo

reais ou em coisas que natildeo sabe serem ou natildeo reais E ao pensar potildee-se

consciente do que eacute real integral ou parcialmente ou do que natildeo o eacute

Considerando-se pois a realidade do sujeito e do objeto em um acircmbito

tangiacutevel independentemente das imensas dificuldades que haacute em demonstrar

cientificamente se os fenocircmenos mentais envolvidos na cogniccedilatildeo apresentam

caracteriacutesticas em comum com o objeto externo com o qual se relacionam1 a

informaccedilatildeo tem os sentidos daquele como porta de entrada e de algum modo torna-

se pensamento Como tal certa potecircncia sua eacute ampliada ao infinito como ilustram

bem estas palavras de Hume

Agrave primeira vista nada pode parecer mais ilimitado do que o pensamento humano que natildeo apenas escapa a toda autoridade e a todo poder do homem mas tambeacutem nem sempre eacute reprimido dentro dos limites da natureza e da realidade Formar monstros e juntar formas e aparecircncias incongruentes natildeo causam agrave imaginaccedilatildeo mais embaraccedilo do que conceber os objetos mais naturais e mais familiares Apesar de o corpo confinar-se num soacute planeta sobre o qual se arrasta com sofrimento e dificuldade o pensamento pode transportar-nos num instante agraves regiotildees mais distantes do Universo ou mesmo aleacutem do Universo para o caos indeterminado onde se supotildee que a Natureza se encontra em total confusatildeo Pode-se conceber o que ainda natildeo foi visto ou ouvido porque natildeo haacute nada que esteja fora do poder do pensamento exceto o que implica absoluta contradiccedilatildeo

2

Se a posse da informaccedilatildeo e o pensamento satildeo requisitos para que se esteja

consciente de algo tambeacutem o eacute o ato de conhecer Deve-se conhecer a informaccedilatildeo

para que possa ser pensada e entatildeo dela se esteja consciente E uma vez que algo

foi conhecido pode ter havido intelecccedilatildeo e obteve-se o entendimento

A inteligecircncia pois seraacute fundamental para que o pensamento possa

exercitar-se ilimitadamente e o faraacute em um jogo quase incessante com os sentidos

1 TALLIS 2010 p 118

2 HUME 2001 p 21-22

14

especialmente com a memoacuteria Bachelard conseguiu expressar isto com excelecircncia

em suas elucubraccedilotildees que assumiram como limiar a chama de uma vela

A chama eacute um mundo para o homem soacute []3 A chama ela sozinha pode

concretizar o ser de todas as suas imagens o ser de todos os seus fantasmas []

4 Existe um parentesco entre a lamparina que vela e a alma

que sonha Tanto para uma quanto para a outra o tempo eacute lento Tanto no devaneio quanto na luz fraca encontra-se a mesma paciecircncia Entatildeo o tempo se aprofunda as imagens e as lembranccedilas se reuacutenem O sonhador inflamado une o que vecirc ao que viu conhece a fusatildeo da imaginaccedilatildeo com a memoacuteria Abre-se entatildeo a todas as aventuras da fantasia aceita a ajuda dos grandes sonhadores e entra no mundo dos poetas Por conseguinte a fantasia da chama tatildeo unitaacuteria a princiacutepio torna-se de abundante multiplicidade []

5 Com as imagens literaacuterias da chama o surrealismo tem

alguma garantia de ter uma raiz de realidade As imagens mais fantaacutesticas da chama se convergem Transformam-se por meio de notaacutevel privileacutegio em imagens verdadeiras []

6 A chama nos leva a ver em primeira matildeo

temos mil lembranccedilas sonhamos tudo atraveacutes da personalidade de uma memoacuteria muito antiga e no entanto sonhamos como todo mundo lembramo-nos como todo mundo se lembra ndash entatildeo seguindo uma das leis mais constantes da fantasia diante da chama o sonhador vive em um passado que natildeo eacute mais unicamente seu no passado dos primeiros fogos do mundo

7

Assim o processo de intelecccedilatildeo implicaria a absorccedilatildeo transformaccedilatildeo

combinaccedilatildeo alimentaccedilatildeo e a possibilidade de emissatildeo de informaccedilotildees

Tallis aponta a importacircncia da interpretaccedilatildeo reconhecendo-a como ldquoatividade

fundamental da consciecircncia humanardquo8 e diz que haacute vaacuterios sentidos alguns

demasiado especializados atribuiacutedos ao termo ldquoinformaccedilatildeordquo mas explica que se

ldquoser informado eacute aprender algo que natildeo se conhecia antesrdquo entatildeo a palavra poderia

ser compreendida como ldquoalgo que resolve uma incerteza sobre como as coisas satildeo

ou sobre como seratildeordquo9

Dentre os significados fornecidos pelo Dicionaacuterio Aulete para a palavra

ldquoinformaccedilatildeordquo encontram-se

Accedilatildeo ou resultado de informar(-se) [] Conjunto de dados sobre algo ou algueacutem [] Relato de acontecimentos ou fatos transmitido ou recebido

3 BACHELARD 1989 p 12

4 Ibid p 13

5 Ibid p 19

6 Ibid p 13

7 Ibid p 11

8 ldquofundamental activity of human consciousnessrdquo TALLLIS 2010 p 104

9 ldquo[] to be informed is to learn something one did not know before []rdquo e ldquo[] something that

resolves an uncertainty about how things are or how they are going to berdquo TALLIS 2010 p 90

15

Explicaccedilatildeo dada para uma determinada finalidade [] Fil Na teoria hilemoacuterfica accedilatildeo pela qual a forma daacute ser ou informa a mateacuteria

10

E dentre os significados fornecidos pelo Dicionaacuterio Priberam figuram ldquoAto ou

efeito de informar [] Notiacutecia (dada ou recebida) [] Indagaccedilatildeo [] Esclarecimento

dado sobre os meacuteritos ou estado de outrem (Tambeacutem usado no plural)rdquo11

O Aulete fornece as seguintes definiccedilotildees para ldquoinformarrdquo ldquoDeixar algueacutem

ciente de (fatos notiacutecias acontecimentos) COMUNICAR [] Tomar ciecircncia de

INTEIRAR(-SE) Dar conhecimento de ser instrutivo para [] Levar orientaccedilatildeo a

[] Ministrar ensinamentos a [] Servir de base ou fundamentordquo12

E assim define o termo o Priberam ldquoDar informaccedilotildees a ou a respeito de []

Avisar [] Dar parecer sobre [] Dar forma a [] Tomar corpo engrossar

desenvolver-se [] Tomar informaccedilotildees [] Procurar notiacutecias [] Tomar forma []13

Le Coadic assim define informaccedilatildeo

A informaccedilatildeo eacute um conhecimento inscrito (gravado) sob a forma escrita (impressa ou numeacuterica) oral ou audiovisual A informaccedilatildeo comporta um elemento de sentido Eacute um significado transmitido a um ser consciente por meio de uma mensagem inscrita em um suporte espacial-temporal impresso sinal eleacutetrico onda sonora etc Essa inscriccedilatildeo eacute feita graccedilas a um sistema de signos (a linguagem) signo este que eacute um elemento da linguagem que associa um significante a um significado signo alfabeacutetico palavra sinal de pontuaccedilatildeo

14

A partir da citaccedilatildeo acima Le Coadic define em nota de rodapeacute o termo

ldquoconhecimentordquo

Um conhecimento (um saber) eacute o resultado do ato de conhecer ato pelo qual o espiacuterito apreende um objeto Conhecer eacute ser capaz de formar a ideia de alguma coisa eacute ter presente no espiacuterito Isso pode ir da simples identificaccedilatildeo (conhecimento comum) agrave compreensatildeo exata e completa dos objetos (conhecimento cientiacutefico) O saber designa um conjunto articulado e organizado de conhecimentos a partir do qual uma ciecircncia ndash um sistema de relaccedilotildees formais e experimentais ndash poderaacute originar-se

A palavra ldquopensamentordquo eacute assim definida pelo Aulete

Accedilatildeo ou resultado de pensar [] Capacidade ou atividade de formular eou evocar ideias juiacutezos conceitos etc REFLEXAtildeO [] Cada produto dessa atividade mental IDEIA [] Linha conceitual caracteriacutestica de um intelectual

10

INFORMACcedilAtildeO 2017 11

Ibid 12

Ibid 13

Ibid 14

LE COADIC 1996 p 5

16

de um grupo ou de uma eacutepoca [] Mente cabeccedila maneira de pensar Expressatildeo resumida de uma ideia em forma de frase

15

Estatildeo entre as definiccedilotildees de ldquopensamentordquo no Dicionaacuterio Priberam ldquoAto

faculdade de pensar [] Ideia reflexatildeo consideraccedilatildeo [] Intenccedilatildeo [] Conceito

opiniatildeo [] Esboccedilo da primeira ideia ou invenccedilatildeo de um artista [] A ideia capital de

um escrito e cada uma das mais notaacuteveis nele contidasrdquo16

Lalande comenta que

Essa palavra em cada um de seus sentidos pode-se aplicar seja ao conjunto de fatos considerados (pensamento) seja a cada um destes separadamente (um pensamento) [] Em um sentido mais amplo envolve todos os fenocircmenos do espiacuterito [] Mais ordinariamente se diz de todos os fenocircmenos cognitivos (por oposiccedilatildeo aos sentimentos e agraves vontades) [] Em sentido mais proacuteprio diz-se do entendimento e da razatildeo na medida em que permitem compreender que constitui a mateacuteria do conhecimento na medida em que percebem um grau de siacutentese mais elevado que a percepccedilatildeo a memoacuteria ou a imaginaccedilatildeo

17

Retomando o Aulete dentre as definiccedilotildees apresentadas para o verbo

ldquopensarrdquo constam

Elaborar ideias ou raciociacutenios MEDITAR REFLETIR [] Ter como intenccedilatildeo COGITAR TENCIONAR [] Procurar lembrar-se recordar-se [] Preocupar-se com [] Julgar supor [] Formar imagem mental de IMAGINAR PREVER [] Ter o mesmo ponto de vista opiniatildeo [] Tratar convenientemente ou cuidar Pensamento opiniatildeo juiacutezo

18

E entre as definiccedilotildees de ldquopensarrdquo no Priberam ldquoFormar ideias [] Refletir []

Raciocinar [] Ser de parecer [] Tencionar [] Ter no pensamento Imaginar

julgar [] Planear [] Dar penso alimento a [] Pensamento opiniatildeo juiacutezordquo19

Assim o pensamento pelo menos em acircmbito conceitual ou seja conforme

as definiccedilotildees adotadas e os entes aos quais satildeo aplicados como se veraacute mais

adiante pode estar ou natildeo associado agrave inteligecircncia Para esta o Dicionaacuterio Aulete

Digital fornece dentre os significados possiacuteveis os seguintes

15

PENSAMENTO 2017 16

Ibid 17

ldquoCe mot dans chacun de ses sens peut sapliqueur soit agrave lensemble des faits consideacutereacutes (la penseacutee) soit agrave chacun deux pris agrave part (une penseacutee) [] Au sens le plus large il envelope tous les pheacutenomegravenes de lesprit [] Plus ordinairement se dit de tous les pheacutenomegravenes cognitifs (par oposition aux sentiments et aux volitions) [] Au sens le plus propre se dit de lentendement et de la raison en tant quils permettent de comprendre ce qui constitue la matiegravere de la connaissance en tant quils reacutealisent un degreacute de syntegravese plus eacuteleveacute que la perception la meacutemoire ou limaginationrdquo LALANDE 1997 p 752

18 PENSAR 2017

19 Ibid

17

Faculdade de entender de compreender INTELECTO [] Penetraccedilatildeo de espiacuterito percepccedilatildeo clara e faacutecil DISCERNIMENTO JUIacuteZO [] Interpretaccedilatildeo do sentido de um texto um livro uma frase etc [] Conformidade de sentimentos e de intenccedilotildees [] Destreza habilidade para escolher os meacutetodos e obter um bom resultado [] Psi Capacidade de resolver situaccedilotildees novas e problemaacuteticas em circunstacircncias em que o instinto o conhecimento e o haacutebito natildeo podem ajudar

20

Dentre aqueles fornecidos pelo Dicionaacuterio Priberam da Liacutengua Portuguesa

para a palavra constam ldquoConjunto de todas as faculdades intelectuais (memoacuteria

imaginaccedilatildeo juiacutezo raciociacutenio abstraccedilatildeo e concepccedilatildeo) [] Qualidade de inteligente

[] Compreensatildeo faacutecil [] Habilidaderdquo21

E Lalande fornece dentre outras definiccedilotildees

Conjunto de todas as funccedilotildees que tecircm por objeto o conhecimento no sentido mais amplo da palavra (sensaccedilatildeo associaccedilatildeo memoacuteria imaginaccedilatildeo entendimento razatildeo consciecircncia) [] (Em oposiccedilatildeo agrave intuiccedilatildeo e agrave sensaccedilatildeo) sinocircnimo de compreensatildeo conhecimento conceitual e racional [] (Em oposiccedilatildeo ao instinto) atividade voluntaacuteria adaptaccedilatildeo refletida dos meios aos fins

22

Segundo De Libera a palavra ldquointeligirrdquo proveacutem do latim ldquointelligererdquo que por

sua vez eacute composta por dois eacutetimos um deles eacute ldquolegererdquo que pode significar

ldquoreunirrdquo ldquorecolherrdquo um dos significados da palavra grega ldquolegocircrdquo (λέγω) o outro eacute

ldquointerrdquo que significa ldquoentrerdquo23

De Libera observa tambeacutem que

Significar entender compreender estes significados natildeo representam um problema para o tradutor jaacute que a linguagem vernaacutecula os separou muitas vezes em termos que evoluiacuteram de diferentes maneiras com exclusatildeo de outros usos A palavra intellectus abrange aleacutem das esferas do significado e da compreensatildeo quase todas as noccedilotildees relativas ao pensamento sua atividade e agraves suas condiccedilotildees de possibilidade Eacute aiacute onde estatildeo as dificuldades Como um termo fundamental da psicologia antiga e medieval a palavra intellectus e a seacuterie de termos que derivam dela ou se relacionam com ela (intelligere intellectualis intelligibilis) levantam problemas particulares mas natildeo insoluacuteveis para o tradutor

24

20

INTELIGEcircNCIA 2017 21

Ibid 22

ldquoEnsemble de toutes les fonctions qui ont pour objet la connaissance au sens le plus large du mot (sensation association meacutemoire imagination entendement raison conscience) [] (Oposeacute agrave intuition et agrave sensation) synonyme dentendement connaissance conceptuelle et rationnelle [] (Oposeacute agrave instinct) activiteacute volontaire adaptation reacutefleacutechie de moyens agrave des finsrdquo LALANDE 1932 p 388-389

23 DE LIBERA 2004 p 493

24 ldquoTo mean to understand to comprehend these different meanings do not pose a problem

for the translator since vernacular language has often separated them out into terms that have evolved in different ways to the exclusion of other uses The word intellectus covers in addition to the spheres

18

Apoacutes apontar como problema mais grave o fato de que a palavra

ldquoentendimentordquo (ldquounderstandingrdquo ldquoentendementrdquo e ldquoVerstandrdquo em inglecircs francecircs e

alematildeo respectivamente) passou a ser aceita para traduzir ldquointellectusrdquo mas sem ter

precedente no peripatetismo e no escolasticismo e que assim ldquoA transformaccedilatildeo de

lsquointellectusrsquo em lsquoentendimentorsquo (lsquounderstandingrsquo lsquoentendementrsquo) marca uma ruptura

na histoacuteria das teorias da almardquo25 ele entatildeo assinala que ldquointellectusrdquo tornou-se

sinocircnimo do ldquonousrdquo aristoteacutelico ideia distinta de ldquoratiordquo somente depois das

traduccedilotildees latinas do De Anima De Libera afirma ainda haver pelo menos dez

significados de ldquointellectusrdquo encontrados no vocabulaacuterio escolaacutestico indicando que

haacute entre eles certa interconexatildeo e entatildeo os elenca

[] (1) o nous peripateacutetico entendido no sentido de ldquosubstacircnciardquo (2) o mesmo no sentido de ldquofaculdaderdquo [] ou ldquofaculdade de conhecimentordquo[] (3) a faculdade de conhecimento natildeo sensiacutevel ou suprassensiacutevel mas natildeo distinta de ldquoratiordquo (isto eacute sem levar em conta a distinccedilatildeo entre conhecimento intuitivo e conhecimento discursivo) (4) uma atividade cognitiva um ato de conhecimento intelecccedilatildeo ou inteligecircncia (sinocircnimo intellegentia) (5) a faculdade de conhecimento intuitiva natildeo sensiacutevel que penetra na essecircncia iacutentima das coisas (de acordo com a etimologia medieval que reuacutene intelligere e legere intus []) (6) o ldquohabitus dos princiacutepiosrdquo distinto de prudentia sapientia e scientia mas tambeacutem de ratio e synteresis [] o grego nous tocircn archocircn [νοῦς τῶν ἀρχῶν] e o latino habitus principiorum[] (7) inspeccedilatildeo intelectual [] sinocircnimo de intellegentia e que tem por antocircnimo ratio (8) concepccedilatildeo compreensatildeo interpretaccedilatildeo entendimento ou significado [] (9) uma representaccedilatildeo natildeo sensiacutevel [] ou uma noccedilatildeo sinocircnimo de ratio no sentido de uma foacutermula de definiccedilatildeo [] (10) significaccedilatildeo ou significado [] sinocircnimo de ratio (no sentido da foacutermula de definiccedilatildeo foacutermula-logos sensus significatio virtus vis [ldquoforccedila expressiva ou impactordquo] de uma palavra)

26

of meaning and of understanding almost all of the notions relating to thought its activity and its conditions of possibility This is where the difficulties lie As a fundamental term of ancient and medieval psychology intellectus and the series of terms that are derived from or related to it (intelligere intelectualis intelligibilis) pose particular if not insoluble problems for the translatorrdquo DE LIBERA 2004 p 492

25 ldquoThe transformation of intellectus into lsquounderstandingrsquo (entendement) marks a break in the

history of theories of the soulrdquo DE LIBERA 2004 p 493 26

ldquo(1) the Peripatetic nous understood in the sense of lsquosubstancersquo (2) the same in the sense of lsquofacultyrsquo[] or lsquofaculty of knowledgersquo[] (3) the nonsensible or suprasensible faculty of knowledge but not distinct from ratio (that is without taking into account the distinction between intuitive knowledge and discursive knowledge) (4) a cognitive activity an act of knowledge intellection or intelligence (synonym intellegentia) (5) the nonsensible intuitive faculty of knowledge which penetrates the intimate essence of things (according to the medieval etymology bringing together intelligere and legere intus [] (6) the lsquohabitus of principlesrsquo as distinct from prudentia sapientia and scientia but also from ratio and synteresis [] the Greek nous tocircn archocircn [νοῦς τῶν ἀϱχῶν] and the Latin habitus principiorum [] (7) intellectual inspection [] synonymous with intellegentia and the antonym of which is ratio (8) conception comprehension interpretation understanding or meaning [] (9) a nonsensible representation [] or a notion synonymous with ratio in the sense of a definitional formula [] (10) significance or meaning [] synonymous with ratio (in the sense of the definitional formula logos-formula sensus significatio virtus vis [ldquoexpressive force or impactrdquo] of a word)rdquo DE LIBERA 2004 p 493

19

Observa em seguida que o significado original da tradiccedilatildeo greco-latina uso

este que tambeacutem tem Guilherme de Moerbeke no seacuteculo XIII principal autor das

traduccedilotildees de Aristoacuteteles do grego para o latim naquele periacuteodo largamente

utilizadas por Santo Tomaacutes de Aquino como exemplo de emprego neste periacuteodo da

palavra intellectus eacute epinoia [ἐπίνοια] traduzida entatildeo comumente por opinio e que

eacute entendida pelo sentido geral ou comum de ldquointeligecircnciardquo como tambeacutem por

ldquopensamentordquo ldquoimaginaccedilatildeordquo ldquoreflexatildeordquo ldquoalgo que vem agrave menterdquo As palavras dianoia

[διανοία] que se refere ao pensamento discursivo agrave faculdade discursiva traduzida

entatildeo por rationalitas e ratio e to dianoegravetikon [τὸ διανοητιϰόν] que significa ldquorazatildeo

discursivardquo contrastam com os sentidos de ldquopensamentordquo em geral ou de

pensamento ldquointuitivordquo e de ldquorazatildeo intuitivardquo respectivamente de Intellectus como

noacuteecircsis [νόησις] Tambeacutem a palavra intelligentia era usada como intellegentia no

periacuteodo medieval em que aparece mais a forma legocirc que tem por significado ldquolerrdquo27

Esse significado tambeacutem estaacute na construccedilatildeo etimoloacutegica alternativa que era muitas

vezes empregada no mesmo periacuteodo intra ou intus mais legere28 como menciona

acima De Libera e pela qual Tomaacutes de Aquino demonstrava certo apreccedilo

significando ldquoler dentrordquo para explicar que a inteligecircncia ou intelecto conheceria o

iacutentimo das coisas29

No cenaacuterio cientiacutefico contemporacircneo as teorias sobre a inteligecircncia

foram enquadradas em dois tipos as teorias impliacutecitas e as teorias expliacutecitas

As teorias impliacutecitas30 satildeo definiccedilotildees e explicaccedilotildees para a inteligecircncia que os

pesquisadores colhem de pessoas que natildeo satildeo estudiosas do assunto

especialistas ou seja satildeo extraiacutedas do senso comum que variam conforme a faixa

etaacuteria e a cultura Delas emergem fatores como a capacidade de resolver

problemas aptidatildeo verbal competecircncia social compreensatildeo de si e do proacuteximo

respeito dentre outras habilidades cognitivas

Jaacute as teorias expliacutecitas satildeo as definiccedilotildees e conceitos formulados e publicados

pelos proacuteprios pesquisadores a maioria enquadrada em trecircs grandes abordagens

a) a das teorias psicomeacutetricas com raiacutezes fincadas nos trabalhos de Galton

que se fundamentam em anaacutelises da estrutura da inteligecircncia dos possiacuteveis

27

DE LIBERA 2004 p 494 28

Ibid p 493 29

TOMAacuteS DE AQUINO 1988 p 92 30

DWECK LEGGETT 1988

20

elementos que a compotildeem e que seratildeo objeto dos famosos testes de mediccedilatildeo de

inteligecircncia como os de Binet e Simon Cattel Stern Wechsler etc

b) a das teorias cognitivas que se originaram da proposta de Lee J

Cronbach de 1957 feita agrave American Psychological Association de unir as duas

disciplinas da psicologia cientiacutefica a experimental e a diferencial e sobre a qual se

desenvolvem estudos concernentes agraves diferenccedilas individuais que segundo

Sternberg partem do pressuposto de que ldquoa inteligecircncia eacute composta por um

conjunto de representaccedilotildees mentais (por exemplo proposiccedilotildees e imagens) de

informaccedilatildeo e de um conjunto de processos mentais que podem operar sobre as

representaccedilotildeesrdquo31

c) e a das teorias bioloacutegicas que abordam comportamentos inteligentes

baseados nas funccedilotildees neurofisioloacutegicas que os produzem

Sternberg parece propor ainda uma subdivisatildeo da cognitiva como mais uma

grande abordagem a cognitiva conceitual Tais teorias segundo afirma se

relacionam ldquocom o modo com que os processos cognitivos operam em vaacuterios

contextos ambientaisrdquo32 e tecircm como exemplos a sua proacutepria Teoria Triaacuterquica e a

famosa Teoria das Inteligecircncias Muacuteltiplas de Gardner

Algumas das principais teorias da inteligecircncia na abordagem psicomeacutetrica

estatildeo listadas em Pal e colaboradores33 dentre as quais destacamos

a) a dos dois fatores de Spearman o fator G uma habilidade mais geral inata

e o que mais fornece explicaccedilatildeo para a inteligecircncia ndash que da visatildeo desta de

Spearman Piaget34 cita os trecircs momentos essenciais a saber a apreensatildeo da

experiecircncia a educaccedilatildeo das relaccedilotildees e a educaccedilatildeo dos correlatos para entatildeo

acrescentar que eacute necessaacuterio que haja intermediaccedilatildeo de uma assimilaccedilatildeo

construtiva para a apreensatildeo da experiecircncia ndash e o fator S que representa

aquisiccedilotildees a partir do ambiente variando segundo as atividades de um mesmo

indiviacuteduo

b) a teoria dos multifatores de Thorndike ndash proponente dos trecircs tipos de

inteligecircncia (1) social (2) mecacircnica e (3) abstrata que estatildeo relacionadas agrave

31

ldquo[] intelligence is composed of a set of mental representations (eg propositions images) of information and a set of mental processes that can operate on the representationsrdquo STERNBERG 2004 p 323

32 ldquo[] cognitive processes operate in various environmental contextsrdquo STERNBERG 2004

p 323 33

PAL et al 2004 34

PIAGET 1972 p 127

21

capacidade de aprender a compreender e a administrar respectivamente (1)

homens mulheres crianccedilas as relaccedilotildees em geral (2) objetos e recursos naturais

(3) ideias e siacutembolos ndash35 que lista quatro fatores ou conjuntos de habilidades

requeridas para a atividade mental a saber a aptidatildeo para lidar com o niacutevel de

dificuldade de uma tarefa a capacidade de lidar com determinado nuacutemero de tarefas

em determinado grau de dificuldade o nuacutemero de situaccedilotildees em cada niacutevel agraves quais

o indiviacuteduo eacute capaz de responder e a velocidade com que ele responde

c) a teoria de Thurstone dos grupos independentes entre si ndash constituiacutedo por

sete fatores principais ou ldquohabilidades mentais primaacuteriasrdquo36 a saber compreensatildeo

verbal (W) orientaccedilatildeo espacial (S) raciociacutenio indutivo (R) aptidatildeo numeacuterica (N)

fluecircncia verbal (V) memoacuteria associativa (M) e velocidade perceptiva (P) ndash37 que

possuem como nuacutecleo um fator primaacuterio compartilhado por operaccedilotildees mentais deles

especiacuteficas e que daacute a elas unidade psicoloacutegica e funcional e as diferencia das de

outros grupos

d) o modelo de estrutura tridimensional do intelecto de Guilford no qual ele

classifica o trabalho intelectual de acordo com o conteuacutedo que pode ser visual

auditivo simboacutelico semacircntico ou comportamental com a operaccedilatildeo mental

envolvida que pode ser a cogniccedilatildeo a retenccedilatildeo de memoacuteria o registro de memoacuteria

a produccedilatildeo divergente e a produccedilatildeo e avaliaccedilatildeo convergente e com o produto

resultante da operaccedilatildeo classificado em unidades classes relaccedilotildees sistemas

transformaccedilotildees e implicaccedilotildees

e) a teoria hieraacuterquica de Vernon que estabelece quatro niacuteveis hieraacuterquicos

para os elementos da inteligecircncia numa tentativa de conciliar a teoria de Spearman

cujos fatores G e S encontram-se no primeiro e quarto niacuteveis respectivamente e a

de Thurstone cujos elementos estatildeo no terceiro niacutevel (o segundo refere-se a fatores

como as habilidades verbo-numeacuterico-educacionais e as fiacutesico-praacutetico-mecacircnico-

espaciais)

f) e a teoria fluida e a teoria cristalizada de Cattel que tratam a inteligecircncia

respectivamente como uma capacidadede pensar abstratamente e resolver

problemas adquirida pela potencialidade geneacutetica e como um conhecimento que

resulta de uma aprendizagem anterior inclusive resultante da experiecircncia

35

THORNDIKE 1920 36

ldquoPrimary mental abilitiesrdquo 37

SCHAIE 2004

22

Da abordagem psicomeacutetrica emergem assim duas subdivisotildees a partir de

Spearman a fatorial na qual se destacam o proacuteprio autor e Thurstone cujas

divergecircncias implicam basicamente a posiccedilatildeo e a importacircncia que cada um atribui

aos elementos isolados que compotildeem a inteligecircncia e a multidimensional que

tentaraacute conciliar as duas visotildees Esta tambeacutem apresenta duas subdivisotildees a dos

modelos natildeo hieraacuterquicos que tem como representantes Thorndike e Guilford e a

dos modelos hieraacuterquicos como os de Vernon e Cattel38

Pal e colaboradores39 listam ainda algumas das abordagens cognitivas como

a) a bastante conhecida teoria de Gardner das muacuteltiplas inteligecircncias a

inteligecircncia linguiacutestica a loacutegico-matemaacutetica a espacial a musical a cinesteacutesico-

corporal a interpessoal a intrapessoal a naturalista e a existencialista

b) a teoria triaacuterquica de Sternberg que distingue trecircs habilidades intelectivas

a analiacutetica ou componencial a praacutetica ou contextual e a criativa ou experiencial

c) e a teoria da inteligecircncia emocional popularizada por Daniel Goleman em

sua obra ldquoInteligecircncia Emocionalrdquo lanccedilada em 1995 e que recebeu muitos modelos

como o de Salovey e Mayer40 sendo assim definida por Cherniss41 ldquoInteligecircncia

emocional refere-se a um conjunto de habilidades que envolvem o modo com que

pessoas percebem expressam entendem e controlam suas proacuteprias emoccedilotildees bem

como as emoccedilotildees dos outrosrdquo42

E destoutro modo definem Salovey e Mayer ldquo[] o subconjunto de

inteligecircncia social que envolve a capacidade de monitorar os sentimentos e as

emoccedilotildees proacuteprios e do outro para discriminar entre elas e usar essa informaccedilatildeo

para orientar os pensamentos e as accedilotildees de algueacutemrdquo43

Da psicologia cognitiva destaca-se tambeacutem a teoria dos modelos mentais

(ldquoMental Models Theoryrdquo) Segundo Johnson-Laird seu principal proponente cada

modelo mental seria fruto da resposta a trecircs perguntas pelas quais se busca saber

38

SILVA 2003 39

PAL et al 2004 40

SALOVEY MAYER 1990 41

CHERNISS 2004 42

ldquoEmotional intelligence refers to a set of abilities that involve the way in which people perceive express understand and manage their own emotions as well as the emotions of othersrdquo CHERNISS 2004 p 315

43 ldquo[] the subset of social intelligence that involves the ability to monitor onersquos own and

otherrsquos feelings and emotions to discriminate among them and to use this information to guide onersquos thinking and actionsrdquo SALOVEY MAYER 1990 p 189

23

(1) a forma das representaccedilotildees mentais e as questotildees sobre se as imagens diferem dos conjuntos de proposiccedilatildeo (2) os processos mentais subjacentes ao raciociacutenio comum e a questatildeo de quais regras de inferecircncia eles incorporam e (3) a representaccedilatildeo do significado de palavras e a questatildeo de saber se elas dependem de um dicionaacuterio decomposicional

44 ou de um

conjunto de postulados de significado45

A teoria baseia-se assim em trecircs princiacutepios

Primeiro cada modelo mental representa o que eacute comum a um conjunto distinto de possibilidades [] Segundo os modelos mentais satildeo icocircnicos ou seja sua estrutura na medida do possiacutevel corresponde agrave estrutura do que eles representam [] Terceiro os modelos mentais que se baseiam em descriccedilotildees representam o que eacute verdadeiro agrave custa do que eacute falso

46

Parte entatildeo do pressuposto principal de que o ldquoos indiviacuteduos raciocinam

tentando visualizar as possibilidades compatiacuteveis com o que sabem ou acreditamrdquo47

Essas possibilidades caracterizam os modelos mentais que vatildeo sendo conectados

e reconectados entre si realizando inferecircncias no processo de intelecccedilatildeo

Por fim no tocante agrave abordagem bioloacutegica Silva descreve brevemente as

principais teorias que buscam variaacuteveis bioloacutegicas que subjazem agrave inteligecircncia

a) a de Hebb que distingue trecircs tipos de inteligecircncia o tipo A ou seja um

potencial inato o tipo B que diz respeito ao funcionamento do ceacuterebro e o tipo C

que se refere agravequela que pode ser mensurada pelos testes de inteligecircncia

b) a de Halstead que propocircs quatro fatores ou habilidades determinados

biologicamente o integrativo de campo o de abstraccedilatildeo o de potecircncia e o direcional

todos relacionados ao funcionamento do coacutertex dos lobos frontais

44

Parte de um ldquoprinciacutepio de composicionalidade (principle of compositionality)rdquo de Frege de que ldquoo significado de um constituinte sintaticamente complexo tal como uma sentenccedila eacute uma funccedilatildeo composicional dos significados de suas partesrdquo Assim esse tipo de dicionaacuterio decompotildee as palavras em elementos semacircnticos com o fim de que se caracterize ldquoas relaccedilotildees de significado entre as palavrasrdquo Respectivamente ldquo[] the meaning of a complex constituent such as a sentence is a compositional function of the meanings of its partsrdquo e ldquo[] meaning relations between wordsrdquo ANTHONY 1983 p 26

45 ldquo[] (1) the form of mental representations and the questions of whether images differ from

sets of proposition (2) the mental processes that underlie ordinary reasoning and the question of what rules of inference they embody and (3) the representation of meaning of words and the question of whether they depend on a decompositional dictionary or a set of meaning postulatesrdquo JOHNSON-LAIRD 1980 p 73

46 ldquoFirst each mental model represents what is common to a distinct set of possibilities []

Second mental models are iconic that is their structure as far as possible corresponds to the structure of what they represent [] Third mental models based on descriptions represent what is true at the expense of what is falserdquo Id 2013 p 132

47 ldquoThe principal assumption of the theory is that individuals reason by trying to envisage the

possibilities compatible with what they know or believerdquo Ibid p 131

24

c) e a de Luria que sugeriu haver trecircs grandes unidades no ceacuterebro

relacionadas agrave inteligecircncia uma de ativaccedilatildeo no tronco cerebral e nas estruturas do

ceacuterebro meacutedio uma sensorial de entrada nos lobos temporais e uma de

organizaccedilatildeo e planejamento no coacutertex frontal48

Aleacutem das tentativas supracitadas William Stern autor do famoso teste de

Quociente de Inteligecircncia forneceu uma definiccedilatildeo para o termo ldquointeligecircnciardquo que

segundo sugere ldquodiferencia claramente inteligecircncia de outras capacidades

mentaisrdquo49 ldquoInteligecircncia eacute uma capacidade geral de um indiviacuteduo conscientemente

ajustar seu pensamento a novas exigecircncias eacute adaptabilidade mental geral a novos

problemas e condiccedilotildees de vidardquo50

Wechsler por sua vez na deacutecada de quarenta assim a conceituou

Inteligecircncia eacute a capacidade agregada ou global do indiviacuteduo agir intencionalmente para pensar racionalmente e lidar efetivamente com seu ambiente Ela eacute global porque caracteriza o comportamento individual como um todo e eacute um agregado porque eacute composta de elementos ou habilidades que embora natildeo sejam completamente independentes satildeo qualitativamente diferenciaacuteveis

51

E mais recentemente o Mainstream Science on Intelligence redigido por um

grupo de pesquisadores acadecircmicos e publicado primeiramente no Wall Street

Journal em 13 de dezembro de 1994 definiu-a assim

Inteligecircncia eacute uma capacidade mental bastante geral que entre outras coisas envolve a habilidade de raciocinar planejar resolver problemas pensar abstratamente compreender ideias complexas aprender rapidamente e aprender com a experiecircncia Natildeo eacute meramente a aprendizagem literaacuteria uma habilidade estritamente acadecircmica ou o talento para um bom desempenho em testes Ao contraacuterio o termo reflete uma capacidade mais ampla e mais profunda de compreender o mundo agrave nossa volta ndash ldquocompreenderrdquo ldquocaptar o sentidordquo das coisas ou ldquocalcularrdquo o que fazer Inteligecircncia assim definida pode ser medida e os testes de inteligecircncia medem-na bem Eles natildeo medem criatividade caraacuteter personalidade ou outras diferenccedilas importantes entre indiviacuteduos nem se propotildeem a isto

52

48

SILVA 2003 p 67-68 49

ldquo[] differentiates intelligence clearly from other mental capacitiesrdquo STERN 1914 p 3 50

ldquoIntelligence is a general capacity of an individual consciously to adjust his thinking to new requirements it is general mental adaptability to new problems and conditions of liferdquo STERN 1914 p 3

51 ldquoIntelligence is the aggregate or global capacity of the individual to act purposefully to think

rationally and to deal effectively with his environment It is global because it characterizes the individuals behavior as a whole it is an aggregate because it is composed of elements or abilities which though not entirely independent are qualitatively differentiablerdquo WECHSLER 1944 p 3

52 Intelligence is a very general mental capability that among other things involves the ability

to reason plan solve problems think abstractly comprehend complex ideas learn quickly and learn

25

Silva poreacutem diz ldquonatildeo estaacute totalmente claro o que os testes de inteligecircncia

realmente medem [] eles natildeo produzem uma entidade uacutenicardquo53

Antes de expor o rol de teorias Pal e colaboradores mostram que o problema

eacute ainda mais grave

Haacute diferentes teorias sobre a inteligecircncia e nenhuma delas concorda com as demais Cada abordagem de pensamento vem agrave tona com sua proacutepria perspectiva e seus proacuteprios pressupostos frequentemente contradizendo pelo menos uma teoria anterior

54

E vatildeo aleacutem

Ateacute que uma clara definiccedilatildeo de inteligecircncia possa ser dada as teorias continuaratildeo natildeo sendo capazes de explicaacute-la A probabilidade de tal definiccedilatildeo surgir poreacutem eacute virtualmente zero pois sempre haveraacute alternativas por dar-se e assim as teorias da inteligecircncia estatildeo limitadas a serem contraproducentes

55

A Task Force on Intelligence da American Psychological Association (APA)

em artigo que serviu como reaccedilatildeo a outra polecircmica envolvendo a publicaccedilatildeo de The

Bell Curve ndash Intelligence and Class Structure in American Life em 1994 parece

reforccedilar a afirmaccedilatildeo anterior

Os indiviacuteduos diferem-se uns dos outros na habilidade de compreender ideias complexas de adaptar-se efetivamente ao ambiente aprender a partir da experiecircncia encontrar vaacuterias formas de raciocinar superar obstaacuteculos mediante a reflexatildeo Embora essas diferenccedilas individuais possam ser substanciais elas nunca satildeo completamente consistentes as caracteriacutesticas intelectuais de uma pessoa variaratildeo em diferentes ocasiotildees em diferentes domiacutenios e julgaratildeo com diferentes criteacuterios Os conceitos de lsquointeligecircnciarsquo satildeo tentativas de esclarecer e organizar esse complexo conjunto de fenocircmenos

56

from experience It is not merely book learning a narrow academic skill or test-taking smarts Rather it reflects a broader and deeper capability for comprehending our surroundings - catching on making sense of things or figuring out what to do

Intelligence so defined can be measured and intelligence tests measure it well [] They do not measure creativity character personality or other important differences among individuals nor are they intended to GOTTFRESON 1997 p 13

53 SILVA 2003 p 49

54 ldquoThere are different theories about intelligence none of which agree with each other Every

aproach to thinking comes up with itrsquos own different perspective and assumptions often contradicting at least one earlier theoryrdquo PAL et al 2004 p 181

55 ldquoUntil a clear-cut definition of intelligence can be given theories will continue not to be able

to explain it The likelihood of such a definition occurring is virtually zero as there will always be alternatives given and so theories of intelligence are bound to be self-defeatingrdquo PAL et al 2004 p 185

56 Individuals differ from one another in their ability to understand complex ideas to adapt

effectively to the environment to learn from experience to engage in various forms of reasoning to

26

Piaget tambeacutem aponta para as dificuldades de conceituaccedilatildeo no que chama

linha inferior cuja demarcaccedilatildeo afirma natildeo superar a arbitrariedade e entatildeo

descreve algumas definiccedilotildees de inteligecircncia

Para alguns como Claparegravede e Stern a inteligecircncia eacute uma adaptaccedilatildeo mental agraves circunstacircncias novas Claparegravede opotildee assim a inteligecircncia ao instinto e ao haacutebito que satildeo adaptaccedilotildees hereditaacuterias e adquiridas agraves circunstacircncias que se repetem mas o faz a partir do tateamento empiacuterico mais elementar (fonte dos tateamentos interiorizados que caracterizam ulteriormente a busca da hipoacutetese) Para Buumlhler que divide tambeacutem as estruturas em trecircs tipos (instinto adestramento e inteligecircncia) essa definiccedilatildeo eacute demasiado ampla a inteligecircncia soacute aparece com os atos de compreensatildeo suacutebita (Aha-Erlebnis) enquanto que o tateamento pertence ao adestramento Koumlhler reserva igualmente o termo ldquointeligecircnciardquo para os atos de reestruturaccedilatildeo brusca excluindo o tateamento Eacute inegaacutevel que este aparece desde a formaccedilatildeo dos costumes mais simples os quais satildeo em si mesmos no momento de sua constituiccedilatildeo adaptaccedilotildees agraves circunstacircncias novas Por outro lado a proposiccedilatildeo a hipoacutetese e o controle cuja reuniatildeo caracteriza tambeacutem a inteligecircncia segundo Claparegravede encontram-se jaacute em germe nas necessidades nos ensaios e nos erros e na sanccedilatildeo empiacuterica proacuteprios das adaptaccedilotildees sensoacuterio-motoras menos evoluiacutedas

57

Mas em seguida indica ser possiacutevel fornecer conceituaccedilotildees fundamentando-

se na direccedilatildeo em que estaacute orientado seu desenvolvimento58 e complementa ldquo[]

sem insistir sobre as questotildees de fronteiras que se convertem em questatildeo de

etapas ou de formas sucessivas de equiliacutebriordquo59

Silva fornece uma orientaccedilatildeo que parece reduzir um pouco mais a

inquietaccedilatildeo que pode ser gerada por essa ao menos aparente impossibilidade de

overcome obstacles by taking thought Although these individual differences can be substantial they are never entirely consistent A given persons intellectual performance will vary on different occasions in different domains as judged by different criteria Concepts of intelligence are attempts to clarify and organize this complex set of phenomena NEISSER 1996 p 77

57 ldquoPara algunos como Claparegravede y Stern la inteligecircncia es una adaptacioacuten mental a las

circunstancias nuevas Claparegravede opone asiacute la inteligecircncia al instinto y al haacutebito que son adaptaciones hereditarias o adquiridas a las circunstancias que se repiten pero la hace partir del tanto empiacuterico maacutes elemental (fuente de los tanteos interiorizados que caracterizan ulteriormente la buacutesqueda de la hipoacutetesis)

Para Buumlhler que divide tambieacuten las estructuras en tres tipos (instinto adiestramiento e inteligencia) esa definicioacuten es demasiado amplia la inteligencia soacutelo aparece con los actos de comprensioacuten suacutebita (Aha-Erlebnis) en tanto que el tanteo pertenece al adiestramiento Koehler reserva igualmente el teacutermino de inteligencia a los actos de reestructuracioacuten brusca excluyendo el tanteo Es innegable que eacuteste aparece desde la formacioacuten de las costumbres maacutes simples las cuales son en siacute mismas en el momento de su constitucioacuten adaptaciones a las circunstancias nuevas Por otra parte la proposicioacuten la hipoacutetesis y el control cuya reunioacuten caracteriza tambieacuten la inteligencia seguacuten Claparegravede se encuentran ya en la sancioacuten empiacuterica proacuteprios de las adaptaciones senso-motrices menos evolucionadasrdquo PIAGET 1972 p 21-22

58 Ibid p 21-22

59 ldquo[] sin insistir sobre las cuestiones de fronteras que convierten en cuestioacuten de etapas o

de formas sucesivas de equilibriordquo Ibid p 22

27

buscar-se um conceito satisfatoacuterio para ldquointeligecircnciardquo ao indicar que haacute duas

caracteriacutesticas que estatildeo presentes em praticamente todas as definiccedilotildees da palavra

ldquoa habilidade para aprenderrdquo e ldquoa habilidade para adaptar-se ao ambienterdquo60

E mediante essa habilidade para aprender uma vez que seja detentor de

certo conhecimento sujeito do pensamento o ente animado pode-se tornar

consciente do objeto da informaccedilatildeo Mas eis aqui outro objetivo intimamente

relacionado ao da inteligecircncia que tambeacutem sempre se mostrou aacuterduo para os

pesquisadores no decorrer da histoacuteria o de estabelecer consensos sobre a

conceituaccedilatildeo do que se conhece por ldquoconsciecircnciardquo

Dentre os significados apresentados pelo Dicionaacuterio Aulete Online para a

palavra consciecircncia encontram-se

Atributo que permite a uma pessoa a percepccedilatildeo com certo grau de objetividade do que se passa em torno de si (o mundo exterior) e dentro de si proacuteprio (o mundo interior ou subjetivo) [] Pext O conhecimento a percepccedilatildeo desse atributo [] Capacidade de julgar o que eacute correto e o que natildeo eacute de acordo com valores morais e de conhecimento [] Conhecimento noccedilatildeo percepccedilatildeo (de situaccedilotildees fatos conceitos especiacuteficos) [] Percepccedilatildeo e conhecimento da proacutepria atividade (psiacutequica ou fiacutesica) Sensibilidade ou preacute-disposiccedilatildeo para perceber situaccedilotildees problemas processos etc ligados a temas de interesse social ideoloacutegico poliacutetico etc Sua consciecircncia ecoloacutegica o fazia revoltar-se com o desmatamento criminoso [] Fil Psic Com base em conceito do filoacutesofo alematildeo Nietzsche e adotado na psicanaacutelise a faculdade de autopercepccedilatildeo objetiva limitada pela accedilatildeo das pulsotildees e emoccedilotildees do ser humano [] Med Estado em que o sistema nervoso estaacute capacitado aos processos de percepccedilatildeo reflexatildeo accedilatildeo compatiacutevel comportamento coerente etc Corresponde comumente ao estado de quem domina suas capacidades de perceber (ver ouvir) pensar e agir [] Psi Niacutevel de atividade mental no qual se tem percepccedilatildeo dos processos internos e externos (em oposiccedilatildeo ao niacutevel da inconsciecircncia ou da subconsciecircncia)

61

E dos significados apresentados pelo Dicionaacuterio Priberam encontram-se

ldquoFaculdade da razatildeo de julgar os proacuteprios atos ou o que eacute certo ou errado do ponto

de vista moral [] Cuidado atenccedilatildeo esmero [] [Medicina] Estado do sistema

nervoso central que permite pensar observar e interagir com o mundo exteriorrdquo62

Segundo Pianigiani o termo ldquoconsciecircnciardquo que vem do latim conscientia eacute

composto de cum uma partiacutecula de intensidade mais scire que significa ldquosaberrdquo63

Lewis trata assim a etimologia da palavra

60

SILVA 2003 p 48 61

CONSCIEcircNCIA 2017 62

Ibid 63

PIANIGIANI 1907 p 357

28

A palavra grega oida e a latina cio significam ldquoeu seirdquo O verbo grego pode ser composto com o prefixo sun ou xun (sunoida) o latino com cum que em composiccedilatildeo torna-se con- dando-nos conscio Sun e cum isolados significam a preposiccedilatildeo ldquocomrdquo E agraves vezes eles mantecircm esse significado quando se tornam prefixos de modo que sunoida e conscio podem significar ldquoConheccedilo conjuntamente compartilho (com algueacutem) o conhecimento dissordquo Mas agraves vezes eles teriam uma forccedila vagamente intensa de modo que os verbos compostos significariam simplesmente ldquoeu conheccedilo bemrdquo e talvez finalmente um pouco mais do que ldquoeu seirdquo Cada verbo tem uma sucessatildeo de palavras relacionadas Com sunoida vai o substantivo suneidesis e (o seu sinocircnimo) o particiacutepio neutro para suneidos e o particiacutepio masculino suneidocircs Com conscio o nome conscientia e o adjetivo conscius [] o duplo valor dos prefixos pode afetar todos estes de modo que suneidesis e conscientia possam ser o estado (ou o ato) de compartilhar o conhecimento ou simplesmente o conhecimento consciecircncia

64 apreensatildeo ndash e mesmo algo como mente ou pensamentordquo

65

Balibar observa que o emprego do termo grego suneidecircsis se deu por uma

retroversatildeo a partir dos romanos e no periacuteodo heleniacutestico eacute que se desenvolveu

como ldquoa maneira com que o indiviacuteduo lsquo[sozinho] consigo mesmorsquo avalia a dignidade

de sua conduta e o valor de sua pessoa nesta vida ou em antecipaccedilatildeo agrave morterdquo 66

Jaacute na Europa conscientia desenvolveu-se historicamente em duas direccedilotildees nas

quais se pode interpretar a partiacutecula cum ldquopor um lado a direccedilatildeo que conota

apropriaccedilatildeo e alcance (conhecer bem estar bem informado sobre) por outro lado a

que conota um compartilhamento privado ou secreto67

E prossegue

Daiacute em diante houve a ideia de um conhecimento reservado a poucas pessoas que cada uma confiava a si mesma Esse significado levou agrave representaccedilatildeo fundamental de um testemunho interno dado a si mesmo e finalmente agrave ideia de um julgamento que eacute feito dentro de noacutes no que diz respeito aos nossos atos e pensamentos Esta eacute a fonte de uma autoridade que se pode opor agrave de qualquer instituiccedilatildeo de imediato o mestre interior e uma garantia de autonomia Esta uniatildeo de contraacuterios a

64

ldquoAwarenessrdquo 65

ldquoGreek oida and Latins cio mean lsquoI knowrsquo The Greek verb can be compounded with the prefix sun or xun (sunoida) the Latin with cum which in composition becomes con- giving us conscio Sun and cum in isolation mean lsquowithrsquo And sometimes they retain this meaning when they become prefixes so that sunoida and cocircnscio can mean lsquoI know together with I share (with someone) the knowledge thatrsquo But sometimes they had a vaguely intensive force so that the compound verbs would mean merely lsquoI know wellrsquo and perhaps finally little more that lsquoI knowrsquo Each verb has a train of related words With sunoida goes the noun suneidesis and (its synonym) the neuter participle to suneidos and the masculine participle suneidocircs with cocircnscio the noun conscientia and the adjective conscious [] the double value of the prefixes may affect all these so that suneidesis and conscientia could be either the state (or act) of sharing knowledge or else simply knowledge awareness aprehension ndash even something like mind or thoughtrdquo LEWIS 1967 p 181

66 ldquo[] the way in which the individual lsquo[alone] with himselfrsquo evaluates the worthiness of his

conduct and the value of his person in this life or in anticipation of deathrdquo BALIBAR 2004 p 175 67

ldquo[] on the one hand the direction that connotes apropriation and achievement (know well be well informed about) on the other hand the one that connotes a private or secret lsquosharingrsquordquo Ibid

29

que a tradiccedilatildeo agostiniana iria dar um peso ontoloacutegico persistiu ateacute o nosso tempo

68

Balibar aponta a identificaccedilatildeo por parte dos Padres da Igreja do termo

ldquoconscientiardquo na alma que confronta seu Criador sendo entatildeo juiacuteza e julgada e seu

desenvolvimento no periacuteodo escolaacutestico com o surgimento do termo synderesis

originado de uma construccedilatildeo sobre anaacutelises equivocadas da palavra suntecircrecircsis

[συντήρησις] encontrada em Satildeo Jerocircnimo que teria dado agrave conscientia um uso

duplo como faculdade tanto ativa como passiva respectivamente como ldquoum traccedilo

da criaccedilatildeo divinardquo e como algo ldquoque opera sob condiccedilotildees de pecado depois da

Quedardquo69 E este mesmo termo syntheresis mais conscientia e conclusio teriam

formado um esquema que influenciaria importantes filoacutesofos posteriores mesmo

apoacutes o primeiro ter caiacutedo em desuso a partir do periacuteodo da Reforma prevalecendo

os sentidos de testemunho interior da moralidade e de sinal da graccedila divina Balibar

indica isto como o iniacutecio da formaccedilatildeo em trecircs episoacutedios da expressatildeo

ldquoautoconsciecircnciardquo70 que afirma ser a ldquoexpressatildeo privilegiada da ideia filosoacutefica da

lsquosubjetividadersquo no Ocidenterdquo71 na qual testemunha-se o que chama ldquoinvenccedilatildeo

europeia da consciecircnciardquo Atribui o primeiro episoacutedio aos debates em torno do termo

ldquoliberdade de consciecircnciardquo no periacuteodo da Reforma o segundo ldquoa uma identificaccedilatildeo

do lsquoeursquo com a atividade da mente reflexiva agrave qual Locke deu o nome de

lsquoconsciousnessrsquordquo72 e o terceiro ao seacuteculo XVIII em que teria havido reinterpretaccedilatildeo

dos princiacutepios do conhecimento e da moralidade73

Nesse segundo episoacutedio o termo ldquoconsciousnessrdquo cristaliza o sentido de

percepccedilatildeo de si da proacutepria mente e do que se passa nela74 Balibar ressalta que no

capiacutetulo 27 do livro II de ldquoEnsaio Sobre o Entendimento Humanordquo de Locke estaacute o

68

ldquoFrom that point on there was the idea of a knowledge reserved for a few people each of whom lsquoconfided in himselfrsquo This meaning led to the fundamental representation of an internal testimony given to oneself [] and finally to the idea of a judgment that is made within us with regard to our acts and thoughts This is the source of an authority that can be oposed to that of any institution at once the interior master and a guarantee of autonomy This union of contraries to which the Augustinian tradition was to give an ontological weight has persisted down to our own timerdquo BALIBAR 2004 p 175

69 Respectivamente ldquo[] a trace of divine creationrdquo e ldquo[] operating under conditions of sin

after the Fallrdquo Ibid p 175 70

ldquoSelf-consciousnessrdquo 71

Respectivamente ldquo[] the privileged expression of the philosophical idea of subjectivity in the Westrdquo e ldquoEuropean invention of consciousnessrdquo Ibid p 175

72 ldquo[] an identification of the lsquoselfrsquo with the mindrsquos reflective activity to which Locke gave the

name lsquoconsciousnessrsquordquo Ibid p 175 73

Ibid p 175 74

Ibid p 180

30

uacutenico emprego do termo ldquoself-consciousnessrdquo pelo filoacutesofo75 realizado no seguinte

contexto

[] sou o mesmo eu mesmo [same my self] agora enquanto escrevo (consista eu [I] completamente na mesma substacircncia material ou imaterial ou natildeo) que eu [I] fui ontem Com efeito quanto a esse ponto de ser o mesmo eu [self] natildeo importa se esse eu presente [present self] eacute constituiacutedo pela mesma ou por diferentes substacircncias desde que eu esteja tatildeo preocupado e seja tatildeo justamente responsaacutevel por qualquer accedilatildeo feita haacute mil anos associada a mim agora por essa autoconsciecircncia [self-consciousness] quanto eu sou pelo que fiz no uacuteltimo momento O eu [self] depende da consciecircncia Eu [self] eacute a coisa consciente pensante (seja ela feita de qualquer substacircncia se espiritual ou material simples ou composta isso natildeo importa) que eacute sensciente ou consciente de prazer e dor capaz de ser feliz ou miseraacutevel e assim que estaacute preocupada com si mesma [it self] tanto quanto sua consciecircncia se estende

76

Esse pensamento indica Balibar77 que relaciona intimamente a consciecircncia e

a autoconsciecircncia agrave memoacuteria e agrave responsabilidade que daacute azo a problematizaccedilotildees

envolvendo o eu (self) e a consciecircncia (consciousness) demarca o ponto de partida

dos conflitos que seratildeo gerados na filosofia moderna e que culminam na distinccedilatildeo

na liacutengua inglesa entre os termos ldquoawarenessrdquo e ldquoconsciousnessrdquo que grosso modo

implicam respectivamente o ter consciecircncia de algo e o ter consciecircncia de que se

tem consciecircncia de algo (que eacute inerente ao ente humano)

Lalande78 opotildee-se agrave ideia de certeza e realidade no acircmbito da definiccedilatildeo de

consciecircncia e sugere que seja abusivo o entendimento desta encontrado por

exemplo em Kant e em Schopenhauer como todo conhecimento imediato da

realidade Ele fornece a seguinte definiccedilatildeo que diz ser somente aproximada

ldquoIntuiccedilatildeo (mais ou menos completa mais ou menos clara) que tem o espiacuterito de seus

estados e de seus atosrdquo79 bem como uma das classificaccedilotildees possiacuteveis do termo

que compreende a consciecircncia espontacircnea que se refere agrave consciecircncia como

pensamento que antecede a distinccedilatildeo entre o saber e o conhecer e na qual natildeo se

diferencia o ato consciente do ato de que se eacute consciente e consciecircncia reflexiva

que ldquosupotildee uma oposiccedilatildeo entre aquele que conhece e aquilo que eacute conhecido e

uma anaacutelise do objeto desse conhecimentordquo80

75

BALIBAR 2004 p 181 76

LOCKE 2015 p 181 77

BALIBAR 2004 p 181 78

LALANDE 1932 79

ldquoIntuition (plus ou moins complegravete plus ou moins claire) qursquoa lrsquoesprit de ses eacutetats et de ses actesrdquo Ibid p 127

80 Ibid p 127-128

31

Como resultado do desenvolvimento das anaacutelises envolvendo o termo alguns

autores reduziram a consciecircncia a simples processos orgacircnicos outros defenderam

que ela seja de algum modo independente do ceacuterebro outros afirmaram que ela tem

base orgacircnica mas se desenvolve para algo mais

Eis as palavras de Chalmers defensor desta uacuteltima hipoacutetese

A experiecircncia consciente eacute ao mesmo tempo a mais familiar do mundo e a mais misteriosa De nenhuma outra coisa temos um conhecimento mais direto que da consciecircncia mas natildeo eacute claro absolutamente como reconciliaacute-la com todo o resto do que sabemos [] Conhecemos a consciecircncia de uma forma muito mais iacutentima do que o resto do mundo mas compreendemos a este uacuteltimo muito melhor do que compreendemos a consciecircncia

81

Ainda assim haacute um bom nuacutemero de tentativas de conceituaccedilotildees e definiccedilotildees

como esta de Damaacutesio

A consciecircncia como usualmente a concebemos de seus niacuteveis elementares aos mais complexos eacute o padratildeo mental unificado que reuacutene o objeto e o self [] A consciecircncia eacute um fenocircmeno inteiramente privado de primeira pessoa que ocorre como parte do processo privado de primeira pessoa que denominamos mente

82

O pesquisador baseia-se em quatro fatos por ele constatados para estruturar

sua teoria

a) o de que ldquoalguns aspectos dos processos da consciecircncia podem ser

relacionados agrave operaccedilatildeo de regiotildees e sistemas cerebrais especiacuteficos abrindo

caminho para a descoberta da arquitetura neural que sustenta a consciecircnciardquo

b) o de que ldquoa consciecircncia e o estado de vigiacutelia assim como a consciecircncia e a

atenccedilatildeo baacutesica podem ser distinguidosrdquo

c) o de que ldquoa consciecircncia e a emoccedilatildeo natildeo satildeo separaacuteveisrdquo

d) o de que ldquoa consciecircncia natildeo eacute um monoacutelito pelo menos natildeo nos seres

humanos ela pode ser separada em tipos complexo e simples e os dados

neuroloacutegicos deixam clara a separaccedilatildeordquo83

81

ldquoLa experiencia consciente es al mismo tiempo lo maacutes familiar del mundo y lo maacutes misterioso De ninguna otra cosa tenemos un conocimiento maacutes directo que de la conciencia pero al mismo tiempo es un tema que para la ciencia ha sido muy difiacutecil para estudiar y conceptualizar varias disciplinas han intentando estudiar este fenoacutemeno una de ella es la filosofiacutea la cual se ha propuesto encontrar una teoriacutea y una explicacioacuten satisfactoria de la conciencia CHALMERS 1999 p 25

82 DAMAacuteSIO 1999 p 30 e 33

83 Ibid p 39-40

32

Ao tipo simples ele denomina ldquoconsciecircncia centralrdquo e ao tipo complexo ele

denomina ldquoconsciecircncia ampliadardquo O primeiro tipo confere ao organismo apenas o

senso de localizaccedilatildeo imediata no tempo e no espaccedilo ou seja no aqui e no agora o

segundo daacute ao organismo uma identidade e uma pessoa dando-lhe a ciecircncia do

passado e do futuro e depende da memoacuteria funcional e da operacional do

raciociacutenio e da linguagem

No acircmbito da etologia cognitiva84 e a fim de verificar o alcance da

consciecircncia e inclusive da inteligecircncia em animais natildeo humanos Herman85

considerou quatro domiacutenios para classificar os dados que obteve com sua equipe no

The Dolphin Institute sobre o desempenho cognitivo e a resposta racional em

espeacutecimes de golfinhos-nariz-de-garrafa (Tursiops truncatus) e inclusive para

classificar as descobertas e ldquoilustrar a flexibilidade comportamental do golfinho que

se estende ateacute mesmo para comportamentos incomuns inovadoresrdquo86 Satildeo eles

a) o declarativo (semacircntico ou representacional)

b) o processual

c) o social

d) o do self

A cada um corresponde uma pergunta cuja resposta afirmativa foi

obtida das observaccedilotildees feitas pelo pesquisador e sua equipe indicando que tais

espeacutecimes apresentam algo que possa ser entendido como sinal de inteligecircncia e

inclusive de consciecircncia segundo as definiccedilotildees atuais Satildeo elas respectivamente

a) ldquoSeraacute que o golfinho mostra conhecimento ou entendimento sobre as

coisasrdquo

b) ldquoSeraacute que o golfinho exibe competecircncia para significados operaccedilotildees ou

meacutetodosrdquo

c) ldquoSeraacute que o golfinho revela consciecircncia social e responsividade nas

interaccedilotildees ou nas relaccedilotildees sociaisrdquo

d) ldquoSeraacute que o golfinho apresenta conhecimento ou consciecircncia (awareness)

de si mesmordquo87

84

GRIFFIN 1994 85

HERMAN 2006 86

ldquoto illustrate the behavioural flexibility of the dolphin that extends even to unusual innovative behavioursrdquo Ibid p 442

87 Respectivamente does the dolphin display knowledge or understanding about things

does the dolphin exhibit competency in means operations or methods does the dolphin reveal

33

Herman ali entende a consciecircncia de si ou autoconsciecircncia como um

conceito multidimensional razatildeo pela qual escolheu duas outras facetas dela para

estudar que implicam a indagaccedilatildeo de se os animais tecircm consciecircncia de seus

proacuteprios comportamentos e tambeacutem de suas proacuteprias partes corporais o que ateacute

entatildeo lhe parecia natildeo ter sido feito em razatildeo de ainda segundo ele as pesquisas

anteriores terem-se limitado a experimentos com espelhos para verificaccedilatildeo do

autorreconhecimento com resultados positivos Mantendo a ideia de Burghardt e

Bekoff88 de que a consciecircncia apresenta vaacuterios niacuteveis alguns anos depois Herman89

reuniu novamente informaccedilotildees de estudos anteriores que apontam para a presenccedila

em golfinhos de autoconsciecircncia e consciecircncia corporal do ego corporal

experienciado subjetiva e objetivamente corroborando o trabalho anterior

Seguindo a mesma esteira de Damaacutesio Ades descreve um pouco mais a

distinccedilatildeo supramencionada dos dois tipos de consciecircncia um o ldquoawarenessrdquo que

ldquose constitui no contato imediato entre o indiviacuteduo e seu contexto interno ou externo

Eacute um dar-se conta de que algo existerdquo e outro o ldquoconsciousnessrdquo ou a consciecircncia

capaz de reflexatildeo exclusivo dos humanos que

[] envolve um desdobramento eacute um dar-se-conta do dar-se-conta o indiviacuteduo eacute capaz de designar e de descrever o seu conhecimento das coisas Pode-se supor que tome como objeto o proacuteprio fato de estar consciente Estabelece implicitamente uma distinccedilatildeo entre o objeto percebido e sua percepccedilatildeo do objeto diferencia-se a si mesmo (como fonte do conhecer) daquilo que eacute conhecido Trata-se de uma consciecircncia capaz de ser comunicada em niacutevel simboacutelico isto eacute que pode ser dita

90

Com isto Ades sugere que os animais ou ao menos alguns deles tambeacutem

possuem algum tipo de consciecircncia Baseia-se ele em propostas como a de Griffin

(1994) considerado o fundador da Etologia Cognitiva

Uma razatildeo para suspeitar de que os animais natildeo humanos apresentam pensamentos conscientes eacute que a estrutura baacutesica e o funcionamento dos neurocircnios e sinapses satildeo muito similares ateacute onde sabemos nos animais com sistema nervoso central organizado Natildeo haacute evidecircncias convincentes de que caracteriacutesticas especiacuteficas da neuroanatomia macroscoacutepica sejam essenciais para o pensamento consciente no entanto eacute melhor manter uma mente aberta para a possibilidade de haver consciecircncia em todos os

social awareness and apropriate responsiveness in social interactions or relations does the dolphin exhibit knowledge or awareness of itself HERMAN 2006 p 442

88 BURGHARDT BEKOFF 2009

89 HERMAN 2012

90 ADES 1997

34

animais que exibem comportamento versaacutetil ou se comunicam de forma a sugerir que eles possam estar expressando pensamentos ou sentimentos

91

Fundamenta-se pois o autor na hipoacutetese de que ldquoo comportamento e a

consciecircncia no homem e em outros animais resultam integralmente de eventos que

ocorrem em seus sistemas nervosos centraisrdquo92 seguindo a mesma linha do filoacutesofo

John Searle que afirma ldquo[] a consciecircncia assim como a intencionalidade satildeo

processos bioloacutegicos causados por processos neurais de niacutevel mais baixo que

ocorrem no ceacuterebro e nenhuma das duas coisas eacute redutiacutevel a algo distintordquo93

Muitos estudos como se veraacute no desenvolvimento deste trabalho parecem

corroborar a hipoacutetese acima defendida por Griffin e Ades mas mais ainda em

vaacuterias correntes de pesquisa mais recentes tecircm-se atribuiacutedo o termo inteligecircncia em

algum grau a diversas espeacutecies de animais por estas apresentarem muitas das

habilidades elencadas pelos estudiosos das ciecircncias cognitivas

Jaacute o fazia Aristoacuteteles considerado o pai da metodologia cientiacutefica do meacutetodo

comparativo precursor da proacutepria biologia94 em um sentido especiacutefico que seraacute o

objeto principal deste trabalho provavelmente tenham-no feito antes de Aristoacuteteles

jaacute que os estudos dos seres viventes se datildeo desde tempos imemoriais e o fizeram

durante os seacuteculos que se seguiram como se nota por exemplo nos estudos de

Tomaacutes de Aquino de seu mestre Alberto Magno de alguns dos filoacutesofos aacuterabes

medievais e de outros grandes naturalistas e em filoacutesofos ainda posteriores como

Descartes que por sua vez se apresenta nesse percurso com uma marcante e

controversa ressalva digna de nota

Teria afirmado o filoacutesofo que os animais natildeo humanos seriam como

maacutequinas autocircmatos por seus processos orgacircnicos mas incomparavelmente

superiores a qualquer aparato construiacutedo pelo homem e apontando que natildeo

apresentam linguagem nem raciocinam o que fez parecer a muitos ter negado aos

animais natildeo somente isto mas inclusive a presenccedila de consciecircncia e ateacute mesmo de

sentimentos e sensaccedilotildees Alguns autores poreacutem como Cottingham95 respondem a

91

GRIFFIN 1994 p 4 92

Ibid p 4-5 93

ldquoTanto la conciencia como la intencionalidad son procesos bioloacutegicos causados por procesos neuronales de nivel maacutes bajo que tienen lugar en el cerebro y ninguna de las dos cosas es reductible a algo distintordquo SEARLE 1992 p 2

94 MAYR 2000 p 25 87-88 Diz Mayr ldquoIn almost any portion of the history of biology one has

to start with Aristotle []rdquo 95

COTTINGHAM 1978

35

isto alegando que natildeo haacute motivos suficientes para inferir que a ausecircncia de

racionalidade implicaria um mecanicismo tatildeo exacerbado que chegasse a esse

ponto

Hume96 poreacutem ao tratar do tema em sua Investigaccedilatildeo Acerca da Natureza

Humana atribui certo tipo de raciociacutenio aos animais que diz tratar-se de um

raciociacutenio experimental instintivo de poder mecacircnico sem relaccedilotildees de ideias e que

o homem tambeacutem possui ainda que natildeo se limite a ele Hume desenvolve sua tese

partindo da analogia e da inferecircncia no sentido de que se algueacutem como diz

observa a circulaccedilatildeo em um animal como a ratilde ou o peixe presumiraacute que o mesmo

processo ocorre em outros animais Diz entatildeo que tal como os homens os animais

[] apreendem muitas coisas da experiecircncia e inferem que os mesmos eventos resultaratildeo sempre das mesmas causas Mediante este princiacutepio familiarizam-se com as propriedades a partir de seu nascimento acumulam conhecimentos sobre a natureza do fogo da aacutegua da terra das pedras das altitudes das profundidades etc e daquilo que resulta de sua accedilatildeo Aqui se distingue claramente a ignoracircncia e a inexperiecircncia do jovem frente agrave astuacutecia e agrave sagacidade dos velhos que tecircm aprendido por uma longa observaccedilatildeo a evitar o que os fere e a perseguir o que lhes proporciona bem-estar e prazer

97

Ressalta em seguida que o adestramento deixa isto ainda mais evidente

explicando que

[] o animal infere um fato que ultrapassa aquilo que impressiona imediatamente seus sentidos [] esta experiecircncia estaacute completamente fundada na experiecircncia passada visto que a criatura espera do objeto presente os mesmos resultados que em sua observaccedilatildeo sempre tem visto derivar de objetos semelhantes

98

Explica em seguida que essa inferecircncia natildeo se funde em nenhum processo

racional mas que se daacute por induccedilatildeo do costume que apoacutes a impressatildeo de

determinado objeto nos sentidos faz com que a imaginaccedilatildeo conceba aquilo que lhe

estaacute associado ou seja concebendo um em razatildeo do surgimento do outro Hume

chama ldquocrenccedilardquo ao modo como isto se daacute e denomina ldquoinstintordquo uma capacidade

nos animais de aperfeiccediloar e superar em muito com a praacutetica e a experiecircncia certas

aptidotildees ordinaacuterias

96

HUME 2001 p 128-132 97

Ibid p 129 98

Ibid p 130

36

Na esteira de filoacutesofos como Hume e ainda que sob a influecircncia cartesiana o

termo inteligecircncia veio a ser mais significativamente atribuiacutedo a animais natildeo

humanos a partir do seacuteculo XIX como se observa na obra de Darwin ldquoThe Descent

of Man and Selection in Relation to Sexrdquo escrito em 1871 e quando o tema passou

a ser tratado inclusive em laboratoacuterio de modo mais especializado Esta obra de

Darwin precedeu outra que passou a ser considerada precursora da moderna

etologia lanccedilada no ano seguinte ldquoThe Expression of Emotions in Man and

Animalsrdquo em que o naturalista trata inicialmente das reaccedilotildees instintivas dos animais

natildeo humanos relacionadas agraves emoccedilotildees dos movimentos voluntaacuterios e involuntaacuterios

dos atos consequentes do reflexo sejam os inatos sejam aqueles adquiridos por

costume ou por associaccedilotildees que reaparecem mediante as mesmas causas que o

originaram99 e em seguida e antes de abordar o tema em relaccedilatildeo aos humanos

com o que concluiraacute seu estudo descreve as reaccedilotildees emocionais nos animais

tendo documentado expressotildees como o prazer a alegria o afeto a coacutelera a dor

etc que pareceram ser mais evidentes nos macacos

Em ldquoThe Descent of Manrdquo Darwin defende que haacute inteligecircncia nos animais100

e narra uma seacuterie de casos em que afirma haver neles memoacuteria como o de um catildeo

que teve e que natildeo via haacute cinco anos e ao reencontraacute-lo o animal o seguiu como

fazia em outros tempos diz ele pelo encontro ter ldquo[] instantaneamente despertado

em seu espiacuterito uma seacuterie de antigas associaccedilotildees []rdquo ou das formigas que diz

reconhecerem membros do mesmo grupo apoacutes separaccedilatildeo de quatro meses101

afirma haver neles tambeacutem imaginaccedilatildeo o que exemplifica com o fato de outros

autores que diz serem suficientemente confiaacuteveis terem constatado catildees gatos

cavalos e aves sonhando e certa aptidatildeo para o raciociacutenio102 Por raciociacutenio aqui

entende ldquofazer pausas deliberar e resolverrdquo103 E pouco adiante critica aqueles que

levantam barreiras inalcanccedilaacuteveis entre os animais e os homens o que objetaria agrave

sua teoria evolucionista e cita dentre outras caracteriacutesticas atribuiacutedas nessa visatildeo

aos animais como a consciecircncia proacutepria a ausecircncia de linguagem da faculdade de

abstraccedilatildeo e de ideias gerais reconhecendo que essas duas uacuteltimas encontram

plena exclusividade nos homens pois ldquoningueacutem supotildee que um animal inferior reflita

99

Sobre os reflexos adquiridos por costume cf DARWIN sd b) p 50 e quanto ao que mais se diz DARWIN sd b) passim

100 DARWIN sd a) p 22

101 Ibid p 28-29

102 Ibid p 29

103 ldquo[] hacer pausas deliberar y resolverrdquo Ibid p 29

37

sobre a vida e a morte nem outros assuntos parecidosrdquo104 jaacute que as aptidotildees

mentais em noacutes alcanccedilaram um niacutevel superior que diz implicar o uso plenamente

desenvolvido da linguagem105 Acrescenta tambeacutem agraves duas o senso moral

consciecircncia moral106 embora sugira que na fidelidade aos companheiros em

especial na do catildeo em relaccedilatildeo ao dono ndash o que exemplifica com o fato de aquele

natildeo roubar alimento na presenccedila deste ndash haja algo que se pareccedila muito com a

moralidade Por outro lado reconhece que esses animais aos quais chama

inferiores possuem personalidade e defende que haja algum tipo de consciecircncia107

Darwin apresenta entatildeo uma seacuterie de exemplos a partir dos quais infere haver o que

chama ldquoracionalidaderdquo nos animais alguns dos quais descreveremos brevemente

mais adiante

O termo inteligecircncia passou a ser especialmente atribuiacutedo aos animais natildeo

humanos com o surgimento de linhas de pesquisa como a etologia que tecircm como

proposta uma compreensatildeo que se sobrepotildee a um mecanicismo que apontam nos

trabalhos e nas teses de pesquisadores behavioristas renomados como na do

reflexo condicionado de Pavlov na do condicionamento operante de Skinner e na do

associacionismo e na lei do efeito de Thorndike que no final do seacuteculo XIX publicava

suas pesquisas sobre a chamada inteligecircncia animal apoacutes uma bateria de testes108

Em seu trabalho apresentado em 1898 que se tornou um marco para os

estudos do comportamento animal e inclusive para o desenvolvimento da psicologia

behaviorista Thorndike elogia o trabalho de Morgan Lloyd publicado havia pouco

menos de uma deacutecada Este diria o seguinte das associaccedilotildees que fundamentaratildeo

natildeo soacute o trabalho de 1898 mas tambeacutem a visatildeo behaviorista e que jaacute haviam sido

percebidas por Aristoacuteteles em especial das criadas artificialmente

No treinamento de animais (e de crianccedilas mais jovens) foram estabelecidas associaccedilotildees artificiais agradaacuteveis ou dolorosas em conexatildeo com certas accedilotildees Introduziram-se aversotildees e apetecircncias anormais na constituiccedilatildeo mental Este processo em muito depende da plasticidade da constituiccedilatildeo Na ausecircncia de tal plasticidade eacute impossiacutevel estabelecer novas associaccedilotildees

109

104

ldquoNadie supone que un animal inferior reflexione sobre la vida y la muerte ni otros asuntos parecidos []rdquo DARWIN sd a) p 43

105 Ibid p 32 e 43

106 Ibid p 48-49

107 Ibid p 43-44 e 49

108 TOURINHO 2009

109 ldquoIn the training of animals (and young children) artificial associations pleasurable or

painful have to be established in connection with certain actions Abnormal apetences and aversions

38

Com base em diversos estudos de outros pesquisadores com elefantes

raposas catildees e outros animais reconhecendo por exemplo que os catildees

comunicam certos desejos seus aos humanos que elefantes podem quebrar partes

vegetais para utilizaacute-las como instrumento para remover sanguessugas do corpo ou

espantar moscas110 etc Lloyd apontou trecircs tipos de inferecircncia sendo as duas

primeiras perceptivas e a terceira conceitual a ldquoinferecircncia inconsciente em

construccedilatildeo imediatardquo a ldquoinferecircncia inteligente que lida com construccedilotildees e

reconstruccedilotildees e a ldquoinferecircncia racional que implica anaacutelise e isolamentordquo111 e nesse

sentido chamava inteligentes certos animais negando nestes a presenccedila de ideias

abstratas112

Voltando a Thorndike este chegou a admitir consciecircncia nos animais mas

restringindo-a agraves impressotildees dos sentidos aos impulsos aos sentimentos e aos

atos corporais de um indiviacuteduo113 negando expressamente a possibilidade de estar

relacionada a ideias ou a impulsos livres114 O pesquisador realizou experimentos

com catildees galinhas mas especialmente com gatos que eram colocados em uma

caixa que tinha um dispositivo com fio e alavanca o qual era tocado acidentalmente

pelo animal que entatildeo via a caixa ser aberta possibilitando o acesso ao alimento a

recompensa fora dela Na seccedilatildeo seguinte o animal mostrava ter aprendido como

abrir a caixa mas natildeo repetia intencionalmente e de forma imediata o feito diante

de mudanccedilas no dispositivo

O pesquisador distinguiu as reaccedilotildees nos animais que satildeo realizadas sem

experiecircncia preacutevia das que satildeo construiacutedas com a experiecircncia que satildeo o objeto de

seu estudo e que se datildeo por processos associativos diante da ausecircncia do

pensamento abstrato que conceitua e infere que caracteriza o ente humano115

Depois de apontar limitaccedilotildees dos estudos anteriores aos seus sobre a

chamada inteligecircncia animal cujos meacutetodos segundo ele se baseavam na questatildeo

ldquoo que eles fazemrdquo parte da pergunta que acrescenta agrave anterior e agrave ldquocomo eles

have to be introduced into the mental constitution In this process much depends on the plasticity of the constitution In the absence of such plasticity it is impossible to establish new associationsrdquo LLOYD 1891 p 343

110 Ibid p 345 e 370

111 Respectivamente unconscious inference on immediate construction intelligente

inference dealing with constructs and reconstructs e rational inference implying analysis and isolation Ibid p 362

112 Id 1898 p 348

113 THORNDIKE 1898 p 84

114 Ibid p 108

115 Ibid p 1

39

fazem issordquo como proposta para novo meacutetodo ldquolsquoo que eles sentem enquanto

agemrdquo116 e conclui sobre as associaccedilotildees formadas que observou em laboratoacuterio

que ldquosatildeo absolutas e o que quer que delas se possa deduzir eacute certordquo117 e ainda que

embora elas

sejam tais que natildeo poderiam ter sido anteriormente experimentadas ou fornecidas por hereditariedade ainda natildeo satildeo tatildeo distantes do curso ordinaacuterio da vida do animal Elas significam simplesmente a conexatildeo de um determinado ato com uma determinada situaccedilatildeo resultante do prazer e esse tipo geral de associaccedilatildeo eacute encontrado normalmente atraveacutes da vida do animal

118

Com base nisto a definiccedilatildeo da lei do efeito viria a ser apresentada na

republicaccedilatildeo da obra em 1911

Das vaacuterias respostas agrave mesma situaccedilatildeo aquelas que satildeo acompanhadas ou seguidas de perto pela satisfaccedilatildeo do animal seratildeo mantidas iguais as outras coisas mais firmemente conectadas com a situaccedilatildeo de modo que quando [a situaccedilatildeo] repetir-se seraacute mais provaacutevel que voltem a ocorrer aquelas que satildeo acompanhadas ou seguidas de perto pelo desconforto do animal teratildeo mantidas iguais as outras coisas suas conexotildees com aquela situaccedilatildeo enfraquecidas de modo que quando [a situaccedilatildeo] repetir-se seraacute menos provaacutevel que voltem a ocorrer Quanto maior a satisfaccedilatildeo ou o desconforto maior o fortalecimento ou enfraquecimento do viacutenculo

119

Thorndike denomina instinto ldquoqualquer reaccedilatildeo que um animal tem sem

experiecircncia em relaccedilatildeo a uma situaccedilatildeordquo120 E por ldquoimpulsordquo ele entende

[] a consciecircncia que acompanha uma inervaccedilatildeo muscular uma parte daquele sentimento do ato que vem de ver a si mesmo mover do sentimento do corpo do sujeito em uma posiccedilatildeo diferente etc Eacute o sentimento direto do fazer enquanto distinto da ideia do ato realizado obtida atraveacutes do olho etc [] por impulso eu nunca me refiro ao motivo do ato No discurso popular pode-se dizer que aquela fome eacute o impulso que faz o

116

Respectivamente ldquowhat they dordquo ldquohow they do itrdquo ldquolsquowhat they feelrsquo while they actrdquo THORNDIKE 1898 p 5

117 ldquoThey are absolute and whatever can be deduced from them is surerdquo Ibid p 7

118 ldquo[] altough the associations formed are such as could not have been previously

experienced or provided for by heredity they are still not too remote from the animalrsquos ordinary course of life They mean simply the connection of a certain act with a certain situation and resultant pleasure and this general type of association is found troughout the animalrsquos life normallyrdquo Ibid p 7-8

119 Traduzido por Tourinho 2011 ldquoThe Law of Effect is that Of several responses made to the

same situation those which are accompanied or closely followed by satisfaction to the animal will other things being equal be more firmly connected with the situation so that when it recurs they will be more likely to recur those which are accompanied or closely followed by discomfort to the animal will other things being equal have their connections with that situation weakened so that when it recurs they will be less likely to occur The greater the satisfaction or discomfort the greater the strengthening or weakening of the bondrdquo Id 1911 p 118

120 ldquo[] any reaction which an animal makes to a situation without experiencerdquo Id 1898 p 14

40

gato arranhar Isso nunca seraacute usado aqui A palavra lsquomotivorsquo sempre denotaraacute esse tipo de consciecircncia

121

Pavlov por sua vez defendeu a visatildeo de que instinto nada mais eacute do que

reflexo respostas do organismo a estiacutemulos sejam eles externos ou internos e a

justifica com comparaccedilotildees entre a complexidade de comportamentos ditos

instintivos como por exemplo a construccedilatildeo de um ninho por uma ave com a

complexidade exigida por efeitos que resultam de determinados estiacutemulos

nervosos122

E define assim reflexo baseando-se na visatildeo de Descartes

Um estiacutemulo externo ou interno recai sobre um ou outro receptor nervoso e daacute origem a um impulso nervoso esse impulso nervoso eacute transmitido ao longo das fibras nervosas para o sistema nervoso central e aqui por causa das conexotildees nervosas existentes daacute origem a um novo impulso que passa ao longo das fibras nervosas que saem para o oacutergatildeo ativo onde excita uma atividade especial das estruturas celulares Assim um estiacutemulo parece estar conectado de necessidade a uma resposta definida como a causa com o efeito Parece oacutebvio que toda a atividade do organismo deve obedecer a leis definidas

123

Acrescenta a esse tipo de reflexo inato que principalmente se relaciona a

atividades de tecidos e oacutergatildeos particularmente outro que ocorre no sistema

nervoso relacionado ao comportamento instintivo dos animais que afirma tratar-se

das ldquoreaccedilotildees inevitaacuteveis a estiacutemulos perfeitamente definidosrdquo124 e entatildeo explica o

que chamou reflexo condicionado

Com uma compreensatildeo completa de todos os fatores envolvidos os novos reflexos de sinalizaccedilatildeo estatildeo sob o controle absoluto do experimentador eles procedem de acordo com leis tatildeo riacutegidas como as de qualquer outro processo psicoloacutegico e devem ser considerados como sendo em todos os

121

ldquo[] means the consciousness accompanying a muscular inervation a part from that feeling of the act wich comes from seeing oneself move from feeling onersquos body in a different position etc It is the direct feeling of the doing as distinguished from the idea of the act done gained through eye etc by impulse I never mean the motive to the act In popular speech you may say that hunger is the impulse wich makes the cat claw That will never be the use here The word motive will always denote that sort of consciousnessrdquo THORNDIKE 1898 p 14-15

122 PAVLOV 1927 p 9-11

123 ldquoAn external or internal stimulus falls on some one or other nervous receptor and gives rise

to a nervous impulse this nervous impulse is transmitted along nerve fibres to the central nervous system and here on account of existing nervous connections it gives rise to a fresh impulse which passes along outgoing nerve fibres to the active organ where it excites a special activity of the cellular structures Thus a stimulus apears to be connected of necessity with a definite response as cause with effect It seems obvious that the whole activity of the organism should conform to definite lawsrdquo Ibid p 7

124 ldquo[] the inevitable reactions to perfectly definite stimulirdquo Ibid p 9

41

sentidos uma parte da atividade fisioloacutegica dos seres viventes Eu denominei esse novo grupo de reflexos ldquoreflexos condicionadosrdquo para distingui-los dos reflexos inatos ou natildeo condicionados O termo ldquocondicionadordquo tem sido em geral cada vez mais empregado e eu penso que seu uso eacute plenamente justificado jaacute que comparado com os reflexos inatos esses novos reflexos realmente dependem de muitas condiccedilotildees tanto em sua formaccedilatildeo como na manutenccedilatildeo de sua atividade fisioloacutegica

125

Pavlov analisou os efeitos reflexos em animais especialmente em catildees a

partir de estiacutemulos positivos ou negativos que por exemplo despertavam a

salivaccedilatildeo tanto no estado de normalidade como no estado hipnoacutetico126 ou a partir

de situaccedilotildees em que o animal estava impedido de mover-se127 Realizou tambeacutem

experimentos com chimpanzeacutes observando que os animais criavam associaccedilotildees

inicialmente por tentativa e erro que eram reforccediladas com a obtenccedilatildeo da

recompensa (alimento) e demonstravam gradualmente aprimoramento resultante

de anaacutelise e do aprendizado obtendo pleno sucesso na realizaccedilatildeo da tarefa128

Neste contexto teceu criacuteticas a certas conclusotildees de Koumlhler e Yerkes em que

sugeriam ao contraacuterio de Pavlov e em oposiccedilatildeo agraves conclusotildees de Thorndike haver

certa racionalidade nos chimpanzeacutes testados a partir de publicaccedilotildees de seus

trabalhos que marcaram certo pioneirismo na busca por inteligecircncia nos grandes

macacos Koumlhler e Yerkes seguiram com as pesquisas com grandes macacos a

esteira de John B Watson fundador do behaviorismo e um dos poucos

pesquisadores tal como Margaret Washburn que tratavam da psicologia comparada

no despontar do seacuteculo XX129

Koumlhler deu iniacutecio a uma seacuterie de testes especialmente com chimpanzeacutes a

partir de indagaccedilotildees como esta

Esses seres mostram muitas caracteriacutesticas humanas em seu comportamento ldquocotidianordquo o que faz levantar a questatildeo de se eles natildeo se comportam com inteligecircncia e insight sob condiccedilotildees que requerem tal

125

ldquoWith a complete understanding of all the factors involved the new signalizing reflexes are under the absolute control of the experimenter they proceed according to as rigid laws as do any other physiological processes and must be regarded as being in every sense a part of the physiological activity of living beings I have termed this new group of reflexes conditioned reflexes to distinguish them from the inborn or unconditioned reflexes The term conditioned is becoming more and more generally employed and I think its use is fully justified in that compared with the inborn reflexes these new reflexes actually do depend on very many conditions both in their formation and in the maintenance of their physiological activityrdquo PAVLOV 1927 p 25

126 Id 1984 p 77-82

127 Ibid p 11-12

128 Ibid p 128-129

129 DEWSBURY 2013

42

comportamento Essa questatildeo expressa o primeiro pode-se dizer novo interesse na capacidade intelectual dos animais

130

Nelas emprega o termo ldquointeligecircnciardquo ldquono sentido em que a palavra eacute aplicada

ao homemrdquo131 ainda que natildeo se trate de algo bem definido mas que

superficialmente se reconheccedila como tal diferenciando-se de outros tipos de

comportamentos em especial nos proacuteprios animais Koumlhler explica entatildeo que o

emprego do termo se daacute em estudos como aqueles que realizou quando diante de

circunstacircncias que impedem o curso comum para atingir um determinado fim como

a realizaccedilatildeo de uma tarefa o ente toma um caminho diferente para resolver a

situaccedilatildeo diferentemente de quando o ente toma o caminho direto inquestionaacutevel

que ldquoclaramente surge naturalmente fora de sua organizaccedilatildeordquo132

Os experimentos que realizou partiram de testes mais simples que exigiam

somente movimentos do proacuteprio animal como para encontrar uma abertura em um

recinto que pudesse contornar e chegar ao alimento tornando-se gradualmente

mais complexos ao que passariam a reconhecer obstaacuteculos como uma caixa que

impedia o animal de alcanccedilar alimento fora da jaula e mesmo precisar da utilizaccedilatildeo

de outro objeto ou seja de um instrumento para alcanccedilar a recompensa do outro

lado da grade da jaula fosse por exemplo de cordas que precisava movimentar

para trazer a comida para perto ou de varas para alcanccedilar diretamente o alimento

e em testes posteriores trazer outra vara maior que ao contraacuterio da primeira

utilizada alcanccedilaria o objeto ou ainda de uma vara que teria de ser encaixada em

outra com uma abertura para alcanccedilar a recompensa mais distante etc Outros

experimentos envolveram caixas que deveriam ser empilhadas para que o animal

alcanccedilasse o alimento previamente suspendido no teto do local pelo

experimentador e mesmo com o auxiacutelio de uma vara

Yerkes por sua vez publicou muitas obras a principal com sua esposa um

grande tratado sobre os grandes antropoides no qual eles agregaram aos

resultados de seus estudos precedentes os de muitos outros pesquisadores

envolvidos com o tema desde os seacuteculos anteriores mas com bastantes referecircncias

130

ldquoThese beings show so many human traits in their lsquoeverydayrsquo behaviour that the question naturally arises whether they do not behave with intelligence and insight under conditions wich require such behaviour This question expresses the first one may say naive interest in the intelectual capacity of animalsrdquo KOumlHLER 1927 p 1

131 ldquo[] in the sense in wich the word is aplied to humanrdquo Ibid p 1

132 ldquo[] which clearly arises naturally out of their organizationrdquo Ibid p 3-4

43

ao trabalho de Koumlhler Ao destacar a inteligecircncia especialmente em orangotangos e

chimpanzeacutes relata casos curiosos como o de um orangotango do seacuteculo XVIII que

aprendeu a rodar a chave e a abrir a porta depois de ver o pesquisador fazecirc-lo133 E

aleacutem disso forneceu inclusive algumas sugestotildees para futuros estudos como para

a comprovaccedilatildeo do autorreconhecimento de macacos em espelhos algo que diz jaacute

vinha sendo bastante relatado134

Em paralelo e nos anos seguintes Skinner desenvolveria principalmente os

estudos de Thorndike e Pavlov realizando pesquisas especialmente com ratos e

pombos envolvendo reforccedilo positivo e negativo ou recompensa e puniccedilatildeo135 Ele

define inicialmente comportamento como ldquoparte da atividade total de um

organismo eacute o que um organismo estaacute fazendo ndash mais precisamente que eacute

observado por outro organismordquo ao que acrescenta ldquoeacute aquela parte do

funcionamento de um organismo que estaacute empenhada em agir ou estabelecer

relaccedilotildees com o mundo exteriorrdquo chegando entatildeo ao corolaacuterio

Por comportamento entatildeo refiro-me simplesmente ao movimento de um organismo ou de suas partes em um quadro de referecircncia fornecido pelo proacuteprio organismo ou por vaacuterios campos de forccedila ou objetos externos Eacute conveniente falar disso como a accedilatildeo do organismo sobre o mundo exterior e frequentemente eacute desejaacutevel lidar com um efeito em vez de com o proacuteprio movimento como no caso da produccedilatildeo de sons

136

Seus experimentos com animais consistiram basicamente em modelar neles

gradualmente novos comportamentos por meio de condicionamento que ele

entende como

[] um tipo de mudanccedila na forccedila do reflexo onde a operaccedilatildeo realizada sobre o organismo para induzir a mudanccedila eacute a apresentaccedilatildeo de um estiacutemulo de reforccedilo em certa relaccedilatildeo temporal com o comportamento Diferentes tipos de reflexos condicionados surgem porque um estiacutemulo de reforccedilo pode ser apresentado em diferentes tipos de relaccedilotildees temporais

137

133

YERKES R M YERKES A W 1929 p 176 134

Ibid p 171 135

CARVALHO NETO MAYER 2011 136

Respectivamente ldquo[] part of the total activity of an organismo [] is what an organism is doing ndash or more accurately what it is observed by another organism to be doingrdquo ldquois that part of the functioning of an organism which is engaged in acting upon or having commerce with the outside worldrdquo e ldquoBy behavior then I mean simply the movement of an organism or of its parts in a frame of reference provided by the organism itself or by various external objects or fields of force It is convenient to speak of this as the action of the organism upon the outside world and it is often desirable to deal with an effect rather than with the movement itself as in the case of the production of soundsrdquo SKINNER 1938 p 6

137 ldquoLet conditioning be defined as a kind of change in reflex strength where the operation

performed upon the organism to induce the change is the presentation of a reinforcing stimulus in a

44

Este condicionamento conhecido como ldquocondicionamento operanterdquo daacute-se a

partir de estiacutemulos que provocavam a repeticcedilatildeo de determinado comportamento

Essa repeticcedilatildeo gera o reforccedilo ou ldquoreforccedilamentordquo que entatildeo resulta na modificaccedilatildeo

comportamental Grande parte de seus experimentos eram realizados tambeacutem em

uma espeacutecie de caixa que passou a ser conhecida como ldquocaixa de Skinnerrdquo

Consistiam por exemplo em fazer um rato aprender a a partir de um estiacutemulo

como uma luz piscando ou um sinal sonoro pressionar com determinada

intensidade uma barra com apenas uma das patas dianteiras para que entatildeo se

abrisse um recipiente de onde poderia retirar o alimento como recompensa Para

isto cada movimento realizado aleatoriamente pelo animal na direccedilatildeo deste

propoacutesito era recompensado ateacute que ele o aprendesse gerando o que Skinner dizia

ser uma cadeia de reflexos um movimento determinado era realizado repetido

reforccedilado e entatildeo se passava para o movimento seguinte138

A partir de seus estudos ele definiu outros termos fundamentais como

ldquorespondenterdquo ou seja o comportamento de resposta a um estiacutemulo provocado e

ldquooperanterdquo sobre o qual inicialmente ele se restringe a dizer que eacute aquele que natildeo eacute

respondente139 mas posteriormente acrescenta que ldquoum operante eacute definido por

suas consequecircnciasrdquo140 e o define como ldquoUma classe da qual uma resposta eacute uma

instacircncia ou membro []rdquo e entatildeo explica como um conjunto de contingecircncias eacute

aquilo que o caracteriza

[] satildeo sempre instacircncias que satildeo contadas na determinaccedilatildeo da frequecircncia e a partir dessa frequecircncia a probabilidade de uma resposta ser inferida A probabilidade eacute frequentemente tomada no entanto como a medida da forccedila de um operante A forccedila da resposta natildeo tem significado salvo como uma propriedade de uma instacircncia como sua forccedila ou velocidade Eacute sempre uma resposta sobre a qual um determinado reforccedilo eacute contingente mas o eacute sob propriedades que definem a adesatildeo a um operante

141

certain temporal relation to behavior [] Different types of conditioned reflexes arise because a reinforcing stimulus may be presented in different kinds of temporal relationsrdquo SKINNER 1937 p 1

138 Id 1938 p 48-55

139 Ibid p 19

140 SKINNER 1969 p 128

141 ldquoAn operant is a class of which a response is an instance or member [] it is always

instances which are counted in determining frequency and from that frequency the probability of a response inferred The probability is frequently taken however as the measure of the strength of an operant Strength of response has no meaning except as a property of an instance such as its force or speed It is always a response upon which a given reinforcement is contingent but it is contingent upon properties which define membership in an operant Thus a set of contingencies defines an operantrdquo Ibid p 132

45

Os estudos de Skinner com animais passaram a ser empregados

posteriormente em humanos no acircmbito da educaccedilatildeo escolar por meacutetodos como o

da Instruccedilatildeo Direta (Direct Instruction) e o da Aprendizagem para o Domiacutenio

(Mastery Learning) o que veio a gerar uma seacuterie de controveacutersias e protestos nos

Estados Unidos142

Segundo Tourinho poreacutem eacute Skinner quem rompe com o mecanicismo

naquela corrente de pesquisa

[] eacute apenas com Skinner que o selecionismo como modo causal encontra uma elaboraccedilatildeo refinada na ciecircncia do comportamento uma elaboraccedilatildeo que articula as relaccedilotildees entre filogecircnese ontogecircnese e cultura como niacuteveis de seleccedilatildeo do comportamento e que operam ora em uma mesma direccedilatildeo ora em direccedilotildees conflitantes sobrepondo-se uns aos outros Foi a elaboraccedilatildeo skinneriana que definitivamente afastou o mecanicismo assinalando a bidirecionalidade variabilidade e dependecircncia muacutetua das relaccedilotildees entre respostas e estiacutemulos e o caraacuteter probabiliacutestico da determinaccedilatildeo das primeiras uma perspectiva ainda natildeo inteiramente explorada na proacutepria ciecircncia do comportamento

143

E paralelamente aos estudos de Skinner avanccedilavam as pesquisas sobre o

comportamento animal na chamada ldquorevoluccedilatildeo cognitivardquo dos anos 60 e 70144

quando inclusive iniciavam os estudos de pesquisadores como Jane Goodal ndash que

forneceu valiosas contribuiccedilotildees para a primatologia estudando em campo os

chimpanzeacutes de Gombe na Tanzacircnia ndash passava assim a ser reconhecida como

disciplina cientiacutefica a linha de pesquisa conhecida por etologia termo proposto pelo

zooacutelogo Isidoire Geoffroy Saint-Hilaire em 1854145 formalmente inaugurada com os

trabalhos de Konrad Lorenz Nikolaas Tinbergen e Karl von Frisch Nesse acircmbito a

inteligecircncia animal ganha um novo enfoque com as pesquisas de Donald Griffin que

dentro da etologia desenvolveu a etologia cognitiva na busca em meio agrave entatildeo

presente visatildeo em que se analisava melhor fatores como expectativas desejos e

crenccedilas por parte dos animais por sinais de consciecircncia nestes146 Mas somente na

uacuteltima deacutecada do seacuteculo XX eacute que a busca pela consciecircncia passou a tornar-se uma

aacuterea mais ativa de pesquisa147

142

ISERBYT 2000 143

TOURINHO 2011 144

SHETTLEWORTH 2010 p 6 145

CAMPAN 2019 146

GRIFFIN 1994 p viii 147

SHETTLEWORTH 2010 p 6

46

Feuerbacher148 faz referecircncia agraves pesquisas sobre os processos cognitivos e

comportamentais dos catildees que resume e ilustra as mudanccedilas de perspectiva

ocorridas no seacuteculo passado e que vieram culminar no atual enfoque adotado pelos

estudiosos que buscam compreender a chamada inteligecircncia animal Explica a

pesquisadora complementando o que se diz logo acima que soacute mais recentemente

em fins da deacutecada de noventa essas pesquisas passaram a enfocar as

caracteriacutesticas que aos catildees satildeo uacutenicas Antes o faziam em torno de processos que

natildeo lhes eram uacutenicos e de caracteriacutesticas natildeo necessariamente uacutenicas que podem

ser usadas para o estudo de fenocircmenos mais gerais ndash que a pesquisadora

exemplifica com o estudo da diversidade de raccedilas no acircmbito morfoloacutegico e

comportamental com o fim de examinar se alguns dos efeitos sobre o

comportamento provecircm de fatores atuantes na morfologia de modo concomitante ndash

razatildeo porque ela sugere natildeo haver conexotildees diretas nessa nova abordagem com os

trabalhos cientiacuteficos publicados anteriormente que representam uma tradiccedilatildeo cujo

fim se deu nos anos oitenta Acrescenta que isto explica o porquecirc de os trabalhos

anteriores a essa nova abordagem serem por vezes tatildeo pouco citados embora natildeo

desprezados pelo fato de trazerem contribuiccedilotildees importantes

Nesse acircmbito aleacutem da ordem Carnivora da qual os catildees fazem parte outras

ordens da classe Mammalia tecircm recebido algum destaque nas uacuteltimas deacutecadas tais

como Proboscidea Cetacea e Primates149 e inclusive certas aves em especial os

passeriformes da famiacutelia corvidae150 Esses animais apresentam alta complexidade

em seus atos e processos cognitivos observados em suas interaccedilotildees com os

demais membros dos grupos em que vivem com outros grupos da mesma espeacutecie

com presas e predadores e outros animais com os quais estabelecem associaccedilotildees

etc aleacutem dos observados em suas interaccedilotildees com os entes humanos

Por cogniccedilatildeo assim entende Shettleworth151

Cogniccedilatildeo se refere aos mecanismos pelos quais os animais adquirem processam armazenam e agem em relaccedilatildeo agrave informaccedilatildeo do ambiente Isso inclui percepccedilatildeo aprendizagem memoacuteria e tomada de decisatildeo O estudo de cogniccedilatildeo comparada eacute portanto relacionado com o modo como os

148

FEUERBACHER 2011 149

LOCKE 2013 GRIFFIN 1994 p 106 209 211-232 239 258 MCINTYRE 2002 p 31 COREN 2006 passim

150 EMERY 2006

151 SHETTLEWORTH 2010

47

animais processam informaccedilatildeo a comeccedilar por como a informaccedilatildeo eacute adquirida pelos sentidos

152

Ao que se pode agregar o que diz Dyer

Uma abordagem cognitiva do comportamento garante um papel causal importante para mecanismos internos em que dados sensoriais satildeo organizados para formar representaccedilotildees mais ou menos detalhadas de eventos e relaccedilotildees no mundo exterior

153

Maturana e Varela explicam que

[] o sistema nervoso participa dos fenocircmenos cognitivos de duas maneiras complementares relacionadas com seu modo particular de operaccedilatildeo como uma rede neural com clausura operacional e como parte de um sistema metacelular A primeira e mais oacutebvia se daacute pela ampliaccedilatildeo do domiacutenio de estados possiacuteveis do organismo resultado da enorme diversidade de configuraccedilotildees sensoacuterio-motoras que o sistema nervoso permite e que eacute a chave de sua participaccedilatildeo no funcionamento do organismo A segunda ocorre quando se abrem para o organismo novas dimensotildees de acoplamento estrutural tornando-lhe possiacutevel associar uma grande diversidade de estados internos agrave diversidade de interaccedilotildees de que participa A presenccedila ou ausecircncia do sistema nervoso eacute o que determina a descontinuidade existente entre organismos com uma cogniccedilatildeo relativamente limitada e aqueles capazes de uma diversidade em princiacutepio ilimitada como o homem

154

E uma vez que o aacutepice do processo cognitivo eacute a expressatildeo da inteligecircncia

Gallegos155 a descreve com base principalmente em alguns trabalhos de Vigostky

Pavlov e Luria em criacutetica agrave hipoacutetese supramencionada de Gardner como ldquo[] uma

construccedilatildeo unitaacuteria mas natildeo uniacutevoca indissoluvelmente ligada ao pensamento que

manteacutem relaccedilotildees sistecircmicas com diversas formas de atividade psiacutequicardquo156

Ele distingue-a de outras funccedilotildees da psique dentre as quais cita percepccedilatildeo

memoacuteria pensamento e linguagem afirmando que a inteligecircncia eacute uma construccedilatildeo

teoacuterica e que por isso ela parece ser uma propriedade do pensamento ndash o qual no

homem eacute capaz de estabelecer relaccedilotildees por meio de operaccedilotildees caracterizadas por

152

ldquoCognition refers to the mechanisms by which animals acquire process store and act on information from the environment These include perception learning memory and decision-making The study of comparative cognition is therefore concerned with how animals process information starting with how information is acquired by the sensesrdquo SHETTLEWORTH 2010 p 4

153 ldquoA cognitive aproach to behavior grants an important causal role to internal mechanisms

whereby sensory data are organized to form more or less detailed representations of events and relationships in the outside worldrdquo DYER 1994 p 66

154 MATURANA VARELA 1995 p 201-202

155 GALLEGOS 2013

156 ldquo[] la inteligencia es un constructo unitario pero no uniacutevoco indisolublemente ligado al

pensamiento que mantiene relaciones sisteacutemicas con diversas formas de actividad psiacutequicardquo Ibid

48

discriminar generalizar e categorizar ndash e natildeo algo que exista por si razatildeo pela qual

se pode dizer que os animais natildeo humanos pensam e a eles pode-se atribuir

inteligecircncia Mas a inteligecircncia diz possui certa funccedilatildeo que caracteriza como

adaptativa

[] jaacute que permite modificar nossa conduta em funccedilatildeo da valoraccedilatildeo dos resultados obtidos Esta valoraccedilatildeo pode ser um simples mecanismo de associaccedilatildeo entre estiacutemulos e respostas assim como um complexo processo de anaacutelise e siacutentese

157

No homem esse processo que nele e nos animais encontra seu substrato

material nos processos neurais de anaacutelise e siacutentese descritos por Pavlov e que se

estrutura de um modo particular em cada indiviacuteduo eacute muito mais desenvolvido

dando-se em contextos soacutecio-culturais e por meio da linguagem a qual sob a

perspectiva vigotskyana faraacute a mediaccedilatildeo da internalizaccedilatildeo de toda funccedilatildeo

psicoloacutegica que tem origem externa e prossegue confere agrave mente humana a

capacidade de abstraccedilatildeo de compreender natildeo somente os sinais de natureza

sensorial mas como diz sinais de sinais por anaacutelise e siacutentese de sinais

Deste modo afirma a inteligecircncia predomina sobre o instinto no homem ao

passo que no animal o instinto predomina sobre a inteligecircncia

Gallegos conclui levantando a hipoacutetese de que a inteligecircncia seria um produto

do ceacuterebro em seu todo em que

[] os loacutebulos preacute-frontais como terceira unidade funcional podem exercer uma funccedilatildeo organizadora codificadora e sinalizadora da informaccedilatildeo enquanto que os loacutebulos occipital temporal e parietal como segunda unidade funcional realizam funccedilotildees de integraccedilatildeo

158

E diz tambeacutem Griffin

[] processos cognitivos possuem dentre outros atributos representaccedilotildees incluindo memoacuterias expectativas e antecipaccedilotildees Realizam-se combinaccedilotildees internas dessas representaccedilotildees para que resultem em decisotildees e classificaccedilotildees de objetos em relaccedilatildeo a desejos e crenccedilas Ou seja os animais querem algumas coisas temem outras esperam que determinadas accedilotildees levem a certos resultados

159

157

ldquo[] ya que permite modificar nuestra conducta en funcioacuten de la valoracioacuten de los resultados obtenidos Esta valoracioacuten puede ser un simple mecanismo de asociacioacuten entre estiacutemulos y respuestas asiacute como un complejo proceso de anaacutelisis y siacutentesisrdquo GALLEGO 2013

158 ldquo[] los loacutebulos prefrontales como tercera unidad funcional pueden ejercer una funcioacuten

organizadora codificadora y signalizadora de la informacioacuten en tanto que los loacutebulos occipital temporal y parietal como segunda unidad funcional realizan funciones de integracioacutenrdquo Ibid

159 GRIFFIN 1994 p viii

49

E para isso muitos animais natildeo humanos possuem aptidotildees para

comunicaccedilatildeo relativamente complexas se comparadas com as humanas como o

reconhecimento de siacutembolos o uso de ferramentas a vocalizaccedilatildeo a tomada de

decisatildeo e a capacidade de improviso etc160 que naturalmente potencializam seu

desempenho na luta diaacuteria pela sobrevivecircncia aleacutem das que aparecem mediante o

conviacutevio com os entes humanos

Ilustram isto bem os relatos de Darwin de histoacuterias que ouviu ou que ele

mesmo presenciou Conta o naturalista que os macacos americanos de Rengger

receberam ovos e inicialmente quebraram-nos com pouco jeito perdendo grande

parte do conteuacutedo mas pouco depois passaram a quebraacute-los cuidadosamente sobre

uma superfiacutecie dura retirando os pedaccedilos de cascas com os dedos Em outro

episoacutedio a esses mesmos animais foram dados um objeto cortante e em outra

ocasiatildeo torrotildees de accediluacutecar em envelopes de papel nos quais foram posteriormente

inseridas vespas Os animais depois de feridos passaram a pegar o objeto com

cuidado e a aproximar os envelopes dos ouvidos antes de abrirem161 Rengger

ensinou um de seus animais a abrir um tipo de noz com uma pedra tal como fazem

os chimpanzeacutes na natureza e o macaco passou a fazer o mesmo com outras frutas

de casca dura Outro destes macacos a quem ele ensinou a abrir o fruto com um

bastatildeo passou a usar este objeto para mover objetos pesados

Darwin relata tambeacutem que ele mesmo viu um orangotango colocar um pedaccedilo

de pau em uma abertura segurar a outra extremidade e fazer do objeto uma

alavanca Conta em seguida o interessante relato de Brehm segundo o qual um

grupo de macacos gelada (Theropithecus gelada) na Abissiacutenia em conflito com

outro de babuiacutenos (Papio hamadryas) desprendia das montanhas grandes pedras

que rolavam abaixo para atingirem os adversaacuterios que fugiam ainda que depois

retornassem para travar batalha corporal Tambeacutem Brehm relata que participou de

um ataque com armas de fogo a um grupo de babuiacutenos em que estes fizeram rolar

tantas pedras da montanha que aos caccediladores natildeo restou alternativa senatildeo bater

em retirada162

Haacute tambeacutem relatos com catildees de caccedila que segundo ouviu jamais haviam

matado a caccedila ateacute entatildeo No primeiro o catildeo de caccedila de Colquhoun foi buscar dois

160

ADES 1997 TELES 2005 HERMAN 2006 MCINTYRE 2002 passim GRIFFIN 1994 passim

161 DARWIN sd a) p 30-31

162 Ibid p 34-35

50

patos atingidos nas asas mas sem conseguir trazecirc-los ao mesmo tempo matou um

e trouxe o outro vivo No seguinte contou-lhe o coronel Hutchinsson que em caso

semelhante uma perdiz foi morta e outra caiu ferida Esta ao tentar fugir foi

capturada pelo catildeo que ao deparar com a morta parou e depois de tentar trazer

ambas naquele estado sem sucesso ateacute que matou a que estava viva e entatildeo

cumpriu a tarefa163

Para aleacutem destes relatos Darwin afirma que a linguagem articulada somada

(jaacute que por exemplo o papagaio tambeacutem a tem) agrave aplicaccedilatildeo de sons

correspondentes a ideias definidas seria uma habilidade exclusiva do homem ainda

que este se expresse de modo semelhante a outros animais por voz e gesticulaccedilotildees

em expressotildees mais simples de sentimentos como dor medo e surpresa Mas a

estes atribui tambeacutem algo anaacutelogo agrave linguagem e menciona como exemplos seis

tipos de sons vocais diferentes que caracterizam comunicaccedilatildeo emocional por Cebus

azarae do Paraguai que despertam nos demais cada um reaccedilotildees equivalentes ao

som emitido e cinco tons distintos no latido de catildees que satildeo facilmente

reconheciacuteveis por criadores o da caccedila o da coacutelera o de desespero por estar preso

em algum recinto o de gozo por sair para passear e o grito de suacuteplica quando pede

para que abram a porta Destaca poreacutem as aves que aleacutem de expressarem suas

emoccedilotildees pelo canto ensinam aos descendentes os cantos de chamados entre si

que o exercitam de modo rudimentarmente parecido com o que fazem os humanos

e aponta casos de aves que na ausecircncia dos progenitores aprenderam cantos de

chamado distintos daqueles observados em sua espeacutecie164

Diz o naturalista ainda haver sentimento do belo nos animais como nas aves

que exibem suas plumagens coloridas agraves fecircmeas concluindo que tal beleza eacute

admirada por estas165 e ressalta a sociabilidade verificada em muitos deles como

na tristeza diante da separaccedilatildeo (como de filhotes de seus pais de catildees de seus

donos) caracterizada pela expressatildeo de suas emoccedilotildees como nos alertas que

alguns datildeo aos coespeciacuteficos em situaccedilotildees de perigo (como golpes com as patas no

solo que se observam em coelhos e carneiros aleacutem da vocalizaccedilatildeo destes)

inclusive com o posicionamento de uma sentinela algo verificado entre certas aves

em focas e macacos como no auxiacutelio exemplificado pela remoccedilatildeo de ectoparasitas

163

DARWIN sd a) p 31 164

Ibid p 36-37 165

Ibid p 44

51

de companheiros como fazem os macacos os cavalos etc na caccedila em grupo

realizada por predadores como o lobo e na proteccedilatildeo de outros membros do grupo

Aqui Darwin traz mais um relato envolvendo babuiacutenos da Abissiacutenia em mais

um episoacutedio que lhe contou Brehm no qual os macacos que natildeo estavam na

montanha foram atacados pelos catildees de caccedila quando entatildeo machos mais velhos

desceram para socorrer os companheiros Havia restado somente um filhote que ao

ver-se cercado pelos catildees foi socorrido e carregado por apenas um dos maiores

machos do grupo Os catildees surpreendidos pelo gesto deste natildeo se moveram166

Vale mencionarmos ainda por fim os casos narrados de um pelicano de dois

ou trecircs corvos e de um galo todos cegos em situaccedilotildees distintas que eram

alimentados por seus respectivos companheiros de bando Darwin sustenta que

casos assim satildeo suficientemente raros de modo que natildeo se poderia atribuir o gesto

somente a algum instinto167

Diante desses quadros diz o pesquisador que o fato de os animais natildeo terem

faculdade de abstrair nem possuiacuterem ideias gerais natildeo configura uma barreira

intransponiacutevel entre eles e os homens168

Ades169 poreacutem aponta para as dificuldades de se compreender a inteligecircncia

e a consciecircncia nos animais em razatildeo das distinccedilotildees entre a nossa natureza e a

deles uma vez que natildeo escapamos de todo da tendecircncia de analisaacute-los ancorados

em nossas proacuteprias medidas Eis o que ele chama ldquointuiccedilatildeo antropomoacuterficardquo

Esta configuraria portanto um obstaacuteculo para a identificaccedilatildeo da chamada

teoria da mente em sua aplicaccedilatildeo no acircmbito interespeciacutefico A atribuiccedilatildeo desta aos

animais natildeo humanos foi sugerida por Premack e Woodruff que a definem assim

Ao afirmarmos que um indiviacuteduo tem uma teoria da mente estamos dizendo que o indiviacuteduo imputa estados mentais a ele mesmo e a outros (a coespeciacuteficos bem como a indiviacuteduos de outras espeacutecies) Um sistema de inferecircncias deste tipo eacute propriamente visto como uma teoria em primeiro lugar porque tais estados natildeo satildeo diretamente observaacuteveis e em segundo lugar porque o sistema pode ser usado para fazer prediccedilotildees especificamente sobre o comportamento de outros organismos

170

166

DARWIN sd a) p 52 167

Ibid p 53 168

Ibid p 32 169

ADES 1997 170

ldquoIn saying that an individual has a theory of mind we mean that the individual imputes mental states to himself and to others (either to conspecifics or to other species as well) A system of inferences of this kind is properly viewed as a theory first because such states are not directly observable and second because the system can be used to make predictions specifically about the behavior of other organismsrdquo PREMACK WOODRUFF 1978 p 515

52

Desenvolveram-se muitas pesquisas a partir desse pressuposto algumas das

quais seratildeo abordadas no corpo deste estudo

53

2 JUSTIFICATIVA

Despontam diante de tudo o que se viu ateacute aqui algumas indagaccedilotildees como

onde realmente estariam os limites entre a inteligecircncia humana e a dos demais

animais em todos esses apontamentos e segundo as mais diversas definiccedilotildees

Haveria de fato uma continuidade gradativa como defende Darwin ou haacute uma

lacuna natildeo preenchiacutevel entre a mente que abstrai e a que natildeo abstrai De que modo

esses limites se relacionam com os dois tipos baacutesicos de consciecircncia

supramencionados Seriam esses tipos tambeacutem continuamente gradativos

Uma vez que estamos lidando com problemas relacionados agrave natureza de

entes distintos isto de algum modo nos remete agrave linha de investigaccedilatildeo relacionada

ao ser ou seja agrave ontologia ou metafiacutesica que pensadores do seacuteculo passado

como Poper assumiram ter elementos vaacutelidos para o conhecimento humano no

caso testaacuteveis (ou falseaacuteveis) e em relaccedilatildeo agrave qual de um modo diferente do que

aqui se pretende fazer este mesmo pensador reconheceu a necessidade de

recorrer como algo complementar agrave ciecircncia moderna apontando para a necessidade

de haver limites bem estabelecidos entre uma e outra171

Grene por sua vez sugere que o aristotelismo poderia contribuir para a

resoluccedilatildeo de problemas filosoacuteficos na biologia como na localizaccedilatildeo de um problema

filosoacutefico de uma estrutura na natureza de um fenocircmeno no entendimento dos

fundamentos desta ciecircncia com base no conceito de eidos (que no aristotelismo-

tomismo traduz-se por ldquoformardquo mas Grene aponta para outros conceitos como

ldquoprinciacutepio organizadorrdquo ldquopadratildeo de accedilatildeo fixardquo ldquocoacutedigordquo etc) Este forneceria por

exemplo a demonstraccedilatildeo de que a proacutepria biologia natildeo poderia ser reduzida agrave fiacutesica

ou agrave quiacutemica tendo em vista que a compreensatildeo de um sistema organizado deve-se

dar considerando-se as partes enquanto organizadas no sistema e natildeo enquanto

partes isoladas172

Como se disse anteriormente Aristoacuteteles eacute considerado o pai da metodologia

cientiacutefica e deu os primeiros passos para as ciecircncias bioloacutegicas atuais mas mais

ainda apresentou aquela que provavelmente foi a primeira doutrina psicoloacutegica

aleacutem de ter sido tambeacutem provavelmente o primeiro a apresentar uma metafiacutesica

sistematizada estabelecendo com seu esquema de subalternaccedilatildeo das ciecircncias os

171

POPER 2001 p 37-40 172

GRENE 1972

54

limites na divisatildeo das disciplinas segundo os modos de abstraccedilatildeo E com diz

Anthony Kenny173 se a fiacutesica a quiacutemica e a biologia de Aristoacuteteles encontram

espaccedilo hoje somente na histoacuteria das ideias a eacutetica a epistemologia a metafiacutesica e

a filosofia da mente aristoteacutelicas continuam integrando os estudos filosoacuteficos ndash e

Kenny sugere que continuaratildeo a fazecirc-lo de modo perene

Aristoacuteteles nasceu em Estagira por volta de 384 e 383 aC e aos vinte anos

viajou para Atenas onde ingressou na Academia de Platatildeo onde permaneceu por

cerca de vinte anos Apoacutes a morte de Platatildeo foi para Assos na Aacutesia Menor onde

fundou com outros platocircnicos uma Escola e permaneceu por trecircs anos deslocando-

se em seguida para Mitilene Dali foi chamado por Filipe da Macedocircnia para educar

Alexandre e alguns anos depois retornou para Atenas onde comprou as edificaccedilotildees

para fundar sua Escola tambeacutem chamada Liceu ou Periacutepato de onde sairia a maior

parte de sua produccedilatildeo Morreu em 322 aC no exiacutelio em Caacutelcis apoacutes ser envolvido

como reacuteu na morte de Alexandre174

Dentre os seus principais comentadores destaca-se Santo Tomaacutes de Aquino

considerado o maior dos filoacutesofos teoacutelogos medievais cujos escritos segundo

Broadie

[] estatildeo sendo cada vez mais estudados por membros da vasta comunidade filosoacutefica e suas ideias vecircm sendo trabalhadas nos debates filosoacuteficos atuais nos campos da loacutegica loacutegica filosoacutefica da metafiacutesica da epistemologia da filosofia da mente da filosofia moral e da filosofia da religiatildeo

175

O pesquisador menciona ainda que os escritos tomistas vecircm sendo aplicados

cada vez mais fora do ambiente eclesiaacutestico inclusive na filosofia do direito o que se

daacute por exemplo em razatildeo de seu notaacutevel conhecimento em relaccedilatildeo agraves leis naturais

exposto na Summa Theologiae de modo diz completo e detalhado176

Kenny177 tambeacutem menciona esse interesse crescente em sua obra entre

cristatildeos e natildeo cristatildeos impressionados com seu gecircnio filosoacutefico inclusive por ter

sido muito pouco explorada nos seacuteculos anteriores ao que atribui dois motivos O

primeiro eacute a sua dimensatildeo Ele fornece dados correspondentes a nada menos que

173

KENNY 1994 p 5 174

REALE ANTISERI 2003 p 187-189 175

[] are increasingly studied by members of the wider philosophical community and his insights put to work in present-day philosophical debates in the fields of philosophical logic metaphysics epistemology philosophy of mind moral philosophy and the philosophy of religion BROADIE 1995 p 43

176 BROADIE 1995 p 47

177 KENNY 1994 p 10-12

55

uma produccedilatildeo de 8686577 palavras em menos de cinquenta anos considerando-

se somente os escritos comprovadamente autecircnticos (se se inclui os escritos de

autoria duvidosa a obra chega a cerca de onze milhotildees de palavras) e estima que

em seu ano mais produtivo Tomaacutes de Aquino tenha produzido cerca de trecircs milhotildees

de palavras o que faz com que sejam plausiacuteveis os testemunhos de que sua

produccedilatildeo se dava por ditado simultaneamente dentro de um periacuteodo a diferentes

secretaacuterios

O outro motivo que Kenny afirma para a pouca atenccedilatildeo que a produccedilatildeo

tomista recebeu nos seacuteculos que seguiram seu surgimento foi a falsa ideia de que

sua integridade filosoacutefica estaria comprometida pela fidelidade de Santo Tomaacutes agrave

ortodoxia de sua religiatildeo Mas Kenny o defende justamente ao apontar que como

profundo conhecedor da filosofia aristoteacutelica tomou o devido cuidado para fazer as

devidas distinccedilotildees entre aquilo em que acreditava enquanto teoacutelogo o que era

objeto de suas investigaccedilotildees teoloacutegicas e aquilo em que acreditava enquanto

filoacutesofo o que era objeto de suas investigaccedilotildees filosoacuteficas

Tomaacutes de Aquino nasceu em Roccasecca sul do Laacutecio no ano de 1221 Foi

educado em Montecassino e em Naacutepoles onde entrou para a ordem dominicana

contrariando seus familiares Em Colocircnia teve como mestre Alberto Magno o

precursor do aristotelismo no ocidente medieval e que tambeacutem realizou

investigaccedilotildees sobre os animais Foi entatildeo convidado para lecionar na Universidade

de Paris onde obteve o tiacutetulo de magister em teologia e uma caacutetedra Passou pelas

principais universidades do continente falecendo em Liatildeo em 1274 aos 53 anos de

idade178

O pensamento de Aristoacuteteles e Tomaacutes de Aquino expresso em algumas

disciplinas como a metafiacutesica e a fiacutesica partem de princiacutepios semelhantes de

fundamentaccedilatildeo empiacuterica desde aqueles considerados evidentes ou seja que

prescindem de demonstraccedilatildeo e desenvolvem-se de modo muito similar segundo a

epistemologia aristoteacutelica o que justifica o emprego do termo ldquoaristotelismo-

tomismordquo Esses princiacutepios expressam relaccedilotildees cujos conceitos satildeo fundamentais

para a compreensatildeo desta doutrina a qual se enquadra no chamado ldquorealismo

moderadordquo que segundo Reale e Antiseri ldquorecorre ao poder de abstraccedilatildeo do

178

REALE ANTISERI 2005 p 211-212

56

intelecto para explicar os universaisrdquo179 cuja apreensatildeo eacute o elemento central que

distingue os homens dos demais animais

Segundo as investigaccedilotildees filosoacuteficas sob a oacuteptica aristoteacutelico-tomista grosso

modo esses demais animais seriam dotados de uma potecircncia estimativa que serve

como meio de orientaccedilatildeo para o alcance dos fins aos quais estaacute ordenada a sua

natureza sensitiva Mas ainda que eles possam distinguir entre os entes e percebam

caracteriacutesticas que lhes satildeo proacuteprias natildeo chegariam a ser tal como os humanos

em que essa potecircncia estimativa eacute mais desenvolvida e por isso chamada

cogitativa dotados de intelecto Seu ato cognitivo estaria restrito agraves potecircncias dos

sentidos internos

A pesquisadora doutora e professora da St Johnrsquos University Marie I George

aponta que nesse campo o aristotelismo-tomismo tem recebido pouca ou nenhuma

atenccedilatildeo180 Ela analisou alguns casos como a identificaccedilatildeo de formato cor e

material de um objeto pelo papagaio Alex o processo para um macaco chegar ao

uso de um graveto como instrumento para retirada de alimento em um orifiacutecio menor

que seu dedo e o ensino de comunicaccedilatildeo por lexigramas e linguagem de sinais

fornecendo explicaccedilotildees como diz mais econocircmicas pelas quais aponta as

associaccedilotildees dos sentidos e natildeo algo que implicaria intelecccedilatildeo tal como o entende o

aristotelismo-tomismo A pesquisadora aponta entatildeo a necessidade de distinguir a

fronteira entre o pensar e o sentir (pelos sentidos) para chegar-se aos devidos

criteacuterios para anaacutelise das diferenccedilas entre o ente humano e os animais natildeo humanos

nesse sentido e indica que a maior dificuldade que enxergou nesse tipo de pesquisa

eacute o entendimento insuficiente do que seriam os sentidos internos e de seu papel nas

habilidades cognitivas desses animais Isto defende leva tanto a tentativas forccediladas

de explicar somente pelo instinto as habilidades como as citadas logo acima como agrave

atribuiccedilatildeo equivocada a esses animais da capacidade de inteligir

Isto que se acaba de dizer seraacute desenvolvido neste trabalho que natildeo tem a

pretensatildeo de ser mais do que mais uma etapa mais uma contribuiccedilatildeo para o

desenvolvimento de futuras pesquisas nessa linha

179

REALE ANTISERI 2005 p 215 180

GEORGE 2003

57

3 MEacuteTODOS E OBJETIVOS

Buscaremos na obra de Aristoacuteteles e na de Santo Tomaacutes de Aquino um

nuacutemero suficiente de informaccedilotildees que deveremos reunir aqui a fim de construirmos

a partir de seus pressupostos metafiacutesicos ndash que se fundamentam naquilo que eacute

evidente ou seja cuja apreensatildeo eacute sempre imediata sem necessidade de

demonstraccedilatildeo ndash sua doutrina psicoloacutegica mas tanto de um modo voltado para que

tentemos identificar limites ali propostos entre a inteligecircncia humana e a inteligecircncia

animal entre o sensiacutevel e o intelectivo como a fim de fornecermos elementos para

uma construccedilatildeo posterior integral dessa doutrina que se encontra espalhada pela

obra de ambos os autores uma vez que ao menos ateacute o presente natildeo encontramos

nenhum trabalho que apresente tal estudo

Recorreremos ainda a comentadores do aristotelismo-tomismo somente

quando e se houver necessidade de buscarmos direcionamento e eventuais

informaccedilotildees complementares que se mostrem relevantes para a concretizaccedilatildeo dos

objetivos estabelecidos

Buscaremos assim possiacuteveis respostas para questotildees como as que

levantamos mais acima e para um exame mais acurado percorreremos em seguida

uma seacuterie de trabalhos publicados nas uacuteltimas deacutecadas envolvendo pesquisas nas

disciplinas comparadas que atualmente se ocupam dos processos cognitivos como

a Etologia Cognitiva a Ecologia Comportamental e a Psicologia Comparada e

apontam para manifestaccedilotildees de inteligecircncia nos animais

Diz Mackintosh que

[] natildeo haacute uma coisa singular denominada inteligecircncia que certamente natildeo podemos classificar os animais pela sua posse da inteligecircncia Eacute muito mais profiacutecuo conceber a inteligecircncia como um arranjo diferenciado ou heterogecircneo de processos operaccedilotildees e habilidades

181

Nessa esteira Deacon182 apontou uma seacuterie de questotildees pertinentes sobre a

associaccedilatildeo entre o niacutevel das habilidades mentais e o tamanho cerebral como a falta

de consenso que haacute entre o tamanho absoluto e o tamanho relativo do ceacuterebro e a

possibilidade de haver fatores como variaacuteveis em razatildeo da multiplicidade de

operaccedilotildees do ceacuterebro e do fato de estas natildeo estarem distribuiacutedas de modo

181

MACKINTOSH 1997 p 34-35 182

DEACON 1997 p 146-148

58

uniforme do que questiona por exemplo como as diferenccedilas relacionadas ao

tamanho e agraves partes do ceacuterebro poderiam influenciar as operaccedilotildees deste Mas

corrobora que natildeo haacute duacutevida de que exista correlaccedilatildeo entre as capacidades de um

ceacuterebro e o seu tamanho

Nesse acircmbito da alometria Jerison propocircs o quociente de encefalizaccedilatildeo

(EQ)183 que eacute ldquoa razatildeo entre o tamanho real do ceacuterebro e o tamanho esperado do

ceacuterebro []rdquo que ldquoeacute um tipo de lsquomeacutediarsquo[] que leva em conta o tamanho do corpordquo184

Alguns trabalhos recentes tambeacutem corroboram a relaccedilatildeo entre inteligecircncia e volume

cerebral como o de Street e colaboradores185 que confirma a relaccedilatildeo entre o

volume cerebral e a chamada inteligecircncia social em primatas e o de Gignac e

colaboradores186 que reforccedila a relaccedilatildeo entre inteligecircncia e volume cerebral no

acircmbito intraespeciacutefico em estudos envolvendo humanos

Daremos aqui maior enfoque ndash sem desprezar as criacuteticas a esta perspectiva

mas porque precisamos de um referencial para o desenvolvimento do que

reiteramos eacute somente a etapa de um processo ndash portanto a algumas das

habilidades dos corviacutedeos e em especial dos membros da classe Mammalia que

destacamos anteriormente com maior relaccedilatildeo entre volume cerebral e tamanho

corporal e cuja estrutura neural mais parece aproximar-se da humana pertencentes

agraves ordens Proboscidea que apresentam o maior volume cerebral dentre os animais

terrestres Cetacea que apresenta o maior volume cerebral dentre todos os animais

e o maior quociente de encefalizaccedilatildeo depois do homem da qual abordaremos a

famiacutelia Delphinidae Primates com destaque para os grandes macacos por sua

proximidade com os humanos por exemplo dentro daquilo que hoje se conhece por

escala filogeneacutetica mas sem deixar de levar outros grupos em conta como os

membros da subfamiacutelia Cebinae por seu elevado quociente de inteligecircncia187 e

Carnivora ndash aqui especialmente a subespeacutecie Canis lupus familiaris da famiacutelia

Canidae por sua convivecircncia milenar com os humanos Tentaremos ainda esboccedilar

uma listagem dessas habilidades com o fim de facilitar os nossos propoacutesitos

Com o objetivo de verificarmos a compatibilidade do aristotelismo-tomismo

visando a corroborar a proposta de que esta corrente poderia contribuir com o

183

ldquoEncephalization quotientrdquo 184

ldquo[] the ratio of actual brain size to expected brain size [] is a kind of lsquoaveragersquo[] that takes body size into accountrdquo JERISON 1973 p 61

185 STREET et al 2017

186 GIGNAC et al 2017

187 ROTH DICKE 2005

59

avanccedilo das investigaccedilotildees que tocam agrave inteligecircncia dos animais o que eacute nosso

objetivo central e inclusive a outros campos afins levantaremos algumas relaccedilotildees

entre as habilidades descritas nesses estudos e a descriccedilatildeo aristoteacutelico-tomista das

potecircncias estimativa cogitativa e intelectiva a fim de testarmos se a visatildeo

aristoteacutelico-tomista estaria em consonacircncia com as hipoacuteteses mais consistentes com

os resultados das pesquisas realizadas sobretudo nas uacuteltimas deacutecadas buscando

interpretaccedilotildees possiacuteveis do resultado agrave luz daquela doutrina seguindo o modelo de

anaacutelise com algumas pequenas diferenccedilas estruturais apresentado no trabalho

supracitado da professora doutora Marie George e tambeacutem no de Koacutevac e

Mather188 que realizaram um breve estudo da cogniccedilatildeo sob a perspectiva do

aristotelismo-tomismo analisando simultaneamente a chamada inteligecircncia dos

cefaloacutepodes

Por fim percorreremos o histoacuterico apresentado anteriormente a fim de

forneceremos mais algumas sugestotildees para futuras investigaccedilotildees que poderatildeo

aclarar se as divergecircncias conceituais em torno dos principais termos que

apresentamos ateacute aqui como ldquointeligecircnciardquo encontram-se por exemplo no fato de

os pesquisadores empregarem um mesmo termo para denominar objetos distintos

ou se apontam para aspectos distintos isolados ou em conjunto de um mesmo

objeto ou se haacute outras explicaccedilotildees para as divergecircncias apontadas acima

188

KOacuteVAC MATHER 2008

60

4 RESULTADOS E DISCUSSAtildeO

41 UMA CONSTRUCcedilAtildeO PARA A PSICOLOGIA ARISTOTEacuteLICO-TOMISTA

411 A subalternaccedilatildeo das ciecircncias

Aristoacuteteles identifica trecircs ramos da filosofia teoreacutetica a fiacutesica a matemaacutetica e

a metafiacutesica ou filosofia primeira Estas ciecircncias que versam sobre os universais

(em oposiccedilatildeo aos singulares) subalternam-se segundo seu modo de abstraccedilatildeo Diz

ele no livro VI da Metafiacutesica

[] a fiacutesica refere-se agraves realidades separadas mas natildeo imoacuteveis algumas das ciecircncias matemaacuteticas referem-se a realidades imoacuteveis poreacutem natildeo separadas mas imanentes agrave mateacuteria ao contraacuterio a filosofia primeira refere-se agraves realidades separadas e imoacuteveis

189

Essas realidades separadas segundo Reale referem-se agravequilo que existe

ldquopor sirdquo ou que eacute capaz ldquode subsistir por sua proacutepria conta sem precisar inerir em

outrordquo190

Assim enquanto os sujeitos das ciecircncias fiacutesicas e matemaacuteticas satildeo algum

gecircnero particular de ente a metafiacutesica lida com o ente em comum bem como um

ente qualquer particular enquanto ente

Tomaacutes de Aquino define ldquoenterdquo como toda e qualquer coisa na medida em

que eacute una191 e fala de duas maneiras pelas quais se pode compreendecirc-lo

[] a primeira divide-se em dez gecircneros192

a segunda significa a verdade das proposiccedilotildees A diferenccedila destes dois sentidos estaacute em que no segundo pode chamar-se ente tudo aquilo de que uma proposiccedilatildeo afirmativa pode ser formada mesmo que tal natildeo ponha nada na realidade Assim eacute que as privaccedilotildees e as negaccedilotildees podem-se chamar entes De fato dizemos que a afirmaccedilatildeo se opotildee agrave negaccedilatildeo e que a cegueira estaacute no olho No primeiro sentido poreacutem soacute pode-se chamar ente o que potildee alguma coisa na realidade Assim eacute que a cegueira e outras privaccedilotildees ou negaccedilotildees deste tipo natildeo satildeo entes [] a essecircncia eacute tirada de ente no primeiro sentido

193

189

ARISTOacuteTELES 2005 1026a p 271-273 190

REALE 2005 p 307 191

TOMAacuteS DE AQUINO 2012 Q XI p 239 192

As categorias tema que se veraacute adiante 193

TOMAacuteS DE AQUINO 2003b p 53

61

Explica ainda o Aquinate194 que enquanto os entes naturais tecircm suas

espeacutecies na mateacuteria sensiacutevel os entes matemaacuteticos que exemplificam essa

segunda maneira as tecircm na mateacuteria inteligiacutevel As qualidades sensiacuteveis tecircm seu

fundamento na quantidade que inere na substacircncia e quando na mente elas satildeo

removidas o que resta eacute a quantidade contiacutenua A diferenccedila entatildeo que haacute entre a

quididade ou essecircncia de um ente natural e a de um ente matemaacutetico estaacute na

distinccedilatildeo entre respectivamente a mateacuteria que eacute submetida a uma conformaccedilatildeo de

qualidades sensiacuteveis atualizada por uma forma natural e a mateacuteria atualizada por

certa forma que se coloca sobre certa quantidade ndash a saber os entes matemaacuteticos

ndash exemplificados pelas figuras geomeacutetricas bidimensionais

A metafiacutesica eacute assim e por sua vez a ciecircncia universal que estuda o ente e

natildeo soacute o ente mas tambeacutem o ser (cuja definiccedilatildeo se veraacute adiante) enquanto ente e

ser bem como os atributos que lhes satildeo inerentes enquanto ente e ser

respectivamente Eacute ela que por tratar dos princiacutepios e das causas dos entes

forneceraacute axiomas para as ciecircncias matemaacuteticas que natildeo podem ser explicados

pelas proacuteprias ciecircncias matemaacuteticas que podem no maacuteximo os pressupor e o

mesmo se daacute com as ciecircncias fiacutesicas que possuem axiomas que soacute podem ser

fornecidos pelas ciecircncias matemaacuteticas ou pela metafiacutesica

194

TOMAacuteS DE AQUINO 2000 L III l 8 707-708

62

5 CONCEITOS FUNDAMENTAIS DO ARISTOTELISMO-TOMISMO

51 ATO E POTEcircNCIA

Comeccedila assim Tomaacutes de Aquino seu estudo sobre os princiacutepios da natureza

ldquoHaacute coisas que podem existir e natildeo existem e haacute coisas que jaacute existem Chama-se

ser em potecircncia ao que pode existir e natildeo existe e ser em ato ao que jaacute existerdquo195

Segundo a relaccedilatildeo entre potecircncia e ato todo ente que venha a existir ou seja que

venha a atualizar-se estaacute previamente em potecircncia Esta eacute limitada pela natureza da

coisa uma vez que como diz adiante o Aquinate ldquonenhuma coisa pode receber

uma potecircncia para agir que natildeo compita a ela mas antes a outra coisa a natildeo ser

que sua proacutepria natureza seja modificadardquo196 E assim tudo o que estaacute em potecircncia

deve estar na relaccedilatildeo correspondente a quando estaacute em ato197

No momento em que a coisa em si vem agrave existecircncia possui certo nuacutemero de

outras potecircncias que poderatildeo ou natildeo tornar-se ato Dentre estas se encontram as

que estatildeo entre a potecircncia e o ato ou seja em haacutebito e que satildeo assim definidas

pelo mesmo Tomaacutes de Aquino ldquosatildeo perfeiccedilotildees pelas quais as potecircncias se

encontram de certa maneira com respeito agraves coisas em virtude das quais elas

existem isto eacute com respeito aos seus objetosrdquo198

Portanto se toda potecircncia eacute determinada pelo ato ao qual ela estaacute ordenada

nenhum ente pode por si ir aleacutem nem das potecircncias que lhe satildeo inerentes nem

das que lhe satildeo acrescidas pela relaccedilatildeo com o meio circundante E se por seus atos

se distinguem as potecircncias ou seja se eacute o ato que define a potecircncia se eacute mediante

aquele que se conhece esta ndash e portanto eacute segundo a diversidade dos atos que se

diversificam as potecircncias ndash os atos por sua vez se distinguem por seus objetos

mediante estes tomando a espeacutecie destes que satildeo deste modo anteriores

agravequele199

O agente que concorrentemente opera para que uma potecircncia venha a ato

tem natureza extriacutenseca eacute a sua causa eficiente E diz ainda Santo Tomaacutes que

ldquoquanto mais uma potecircncia dista do ato tanto maior eacute o poder de que carece para

195

TOMAacuteS DE AQUINO 2003a p 19 196

Id 2012 Q XXI p 421 197

Id 2009 p 85 198

Id 2012 Q XIII p 279 199

Ibid Q XVI p 343 Id 2000 I L 6 111

63

ser conduzida ao atordquo200 A potecircncia assim eacute anterior ao ato ao qual ela se ordena

mas em outro sentido ela soacute pode-se tornar ato mediante a accedilatildeo de um agente em

ato (essa causa eficiente) e nesse acircmbito eacute correto dizer que o ato e a operaccedilatildeo

satildeo anteriores a ela Toda operaccedilatildeo que traraacute o ato de uma potecircncia pode ser um

princiacutepio de accedilatildeo a potecircncia ativa ou um princiacutepio de paixatildeo a potecircncia passiva

Naquela o objeto relacionado ao ato agrave operaccedilatildeo eacute efeito fim nesta o objeto eacute

causa princiacutepio201

52 ESSEcircNCIA E ACIDENTE

Prossegue Santo Tomaacutes em sua introduccedilatildeo ao estudo dos princiacutepios da

natureza

Por outro lado haacute duas espeacutecies de ser o ser essencial ou substancial202

de uma coisa por exemplo ser um homem e isto eacute o ser considerado em si mesmo e o ser acidental como eacute o caso de o homem ser branco e isto eacute o ser considerado sob relaccedilatildeo particular

203

E em sua explicaccedilatildeo sobre os dois modos de compreensatildeo a respeito do

ente diz

E porque aquilo pelo qual uma coisa eacute constituiacuteda no proacuteprio gecircnero ou espeacutecie eacute o que eacute significado pela definiccedilatildeo indicando o que eacute a coisa daiacute concluiacuterem os filoacutesofos que o nome da essecircncia eacute mudado para quididade Isto eacute tambeacutem o que o Filoacutesofo frequentemente chama o que era ser qualquer coisa isto eacute aquilo por que alguma coisa tem de ser uma coisa qualquer Chama-se-lhe tambeacutem forma na medida em que pela forma eacute significada a certeza de cada coisa Tambeacutem isto se chama por outro nome natureza no sentido de que se chama natureza a tudo o que pode de algum modo ser apreendido pela inteligecircncia pois uma coisa soacute eacute inteligiacutevel mediante a sua definiccedilatildeo e essecircncia a palavra natureza assim entendida parece significar a essecircncia da coisa segundo a qual eacute ordenada agrave sua operaccedilatildeo proacutepria pois nenhuma coisa perde a operaccedilatildeo proacutepria enquanto a palavra quididade proveacutem do facto de ser significada pela defini-ccedilatildeo Chama-se-lhe poreacutem essecircncia enquanto eacute por ela e eacute nela que o

ente possui o ser204

Para o aristotelismo-tomismo assim todo ente tangiacutevel caracteriza-se por sua

essecircncia e seus acidentes Por essecircncia entende-se o que haacute de mais fundamental

200

TOMAacuteS DE AQUINO 2006 p 119 201

Id 2000 L II l 6 304-305 202

A diferenccedila entre essecircncia e substacircncia que Aristoacuteteles afirma ser um gecircnero do ente e atribui agrave mateacuteria agrave forma e ao composto eacute simplesmente de perspectiva como se veraacute em seguida ARISTOacuteTELES 2010 II 1 p 61

203 TOMAacuteS DE AQUINO 2003a p 19

204 Id 2003b p 54-55

64

mais elementar e particular aquilo que determina que tal ente eacute o que eacute e natildeo outra

coisa e que estaacute de maneira proacutepria e verdadeiramente na substacircncia e por

acidente tem-se os elementos que podem ser modificados sem que haja corrupccedilatildeo

da essecircncia que nele estaacute de maneira relativa e de certo modo205

Adotando-se a perspectiva de que a essecircncia seja o substrato de tudo aquilo

que acidentalmente participe do ente recebe ela o conceito de ldquosubstacircnciardquo

Aristoacuteteles classifica-a como ldquosubstacircncia primeirardquo e ldquosubstacircncia segundardquo A

primeira diz respeito agrave mateacuteria que eacute tudo o que estaacute em potecircncia para ser

substancial (ldquomateacuteria de que eacute feitardquo ou mateacuteria propriamente dita) ou para ser

acidental (ldquomateacuteria em que se atualizardquo ou o que o Aquinate chama ldquosujeitordquo)206 e

por ser ldquoum sujeito primeiro que natildeo existe em outrordquo natildeo sendo ldquoparticipaacutevel por

muitosrdquo207 determina a individualidade de cada ente sensiacutevel que natildeo decorre de

nenhuma outra categoria sendo limitada por parte de seu proacuteprio ser e pela

segunda208 a forma que sendo uma finalizaccedilatildeo209 faz existir em ato todos os

seres substanciais e acidentais210 Esta procede da potecircncia da mateacuteria por

educcedilatildeo211 Eacute um princiacutepio que se refere agrave espeacutecie e ao gecircnero os uacutenicos predicados

que expressam a substacircncia primeira tratando-se portanto no acircmbito sensiacutevel de

multiplicidade de universalidade Assim aponta Angioni a substacircncia primeira tem

como particularidade o fato de que ela ldquonatildeo pode ser dita de um subjacenterdquo ao

passo que a segunda tem como particularidade o fato de que ldquopode ser dita de um

subjacenterdquo e assim a substacircncia caracteriza-se como tal por natildeo estar em um

subjacente212

A espeacutecie implica tudo o que existe no indiviacuteduo de maneira indistinta e

assim o gecircnero implica em seu significado tudo o que existe na espeacutecie Esta eacute

ideterminada em relaccedilatildeo ao indiviacuteduo e eacute afirmada dele como o gecircnero o eacute da

espeacutecie (da mesma forma que esta adquire a predicaccedilatildeo da diferenccedila213) e

indeterminado em relaccedilatildeo a ela e do indiviacuteduo mas tomado a partir da mateacuteria (mas

205

TOMAacuteS DE AQUINO 2003b p 55 206

Id 2003a p 19-20 Id 1949 Q 1 R 1 p 16 207

Id 2009 p 145 208

Id 2006 p 91 209

Id 2000 L II l 1 215 210

Id 2003a p 21 211

Id 2009 p 83-85 212

ANGIONI 1998 p 74 ARISTOacuteTELES 1965 2a p 31 213

TOMAacuteS DE AQUINO 2006 p 83

65

natildeo a mateacuteria prima)214 Ou seja assim como a forma eacute limitada ao indiviacuteduo em

razatildeo da mateacuteria o gecircnero estaacute limitado a uma espeacutecie por uma forma com mais

determinaccedilatildeo que eacute da qual o gecircnero obteacutem a diferenccedila que o contrairaacute na espeacutecie

da qual se predica215 Assim o define Aristoacuteteles ldquogecircnero significa o constitutivo

primeiro das definiccedilotildees contido na essecircnciardquo e diz que desse mesmo gecircnero ldquoas

qualidades satildeo diferenccedilasrdquo216

Como a forma a espeacutecie e o gecircnero a diferenccedila significa o todo como uma

denominaccedilatildeo oriunda da forma determinada (e assim diferentemente do gecircnero a

mateacuteria determinada natildeo eacute considerada em seu primeiro conceito)217

Portanto a espeacutecie eacute substrato do gecircnero uma vez que este eacute afirmado a

partir daquela sem que se decirc o oposto o que faz com que ela seja ldquomais

substacircnciardquo do que ele218 Ademais se a forma eacute uma universalidade os diversos

sujeitos que participam de uma mesma forma o fazem de trecircs modos por igualdade

por excesso ou por falha219

Os princiacutepios material e formal resultam no composto essencial (ou

substancial) ou tambeacutem sujeito chamado ldquosinolordquo220 que existe por si sem provir

de nada que se lhe acrescente221 Assim por substacircncia pode-se entender a

mateacuteria a forma ou o composto222 Sobre o composto ou sinolo explica o Aquinate

que o ente que ele eacute natildeo eacute nem forma nem mateacuteria ou seja constitui-se uma

terceira coisa de duas coisas ontologicamente anteriores223 que por serem

princiacutepios natildeo satildeo entes natildeo tecircm ser absoluto uma sem a outra e portanto natildeo se

fazem entes por outros iguais a eles respectivamente A forma por exemplo eacute ldquoo

teacutermino da geraccedilatildeordquo e natildeo eacute algo por outra forma224 Ela eacute ativa atualiza o ente

(move-o da potecircncia ao ato) como pertencente agrave espeacutecie por ela determinada e eacute

princiacutepio de operaccedilatildeo A mateacuteria (que em sua condiccedilatildeo mais fundamental eacute pura

potecircncia ndash e chama-se neste caso materia prima) eacute passiva recebe a forma e

entatildeo a individua sendo paciente de suas operaccedilotildees Mas soacute eacute princiacutepio de

214

TOMAacuteS DE AQUINO 2003b p 66 Id 1949 Q 1 R 9 p 20 e 25 215

Id 1949 Q 1 R 2 p 17 Ibid Q 3 Obj 3 p 44 216

ARISTOacuteTELES 2005 V 1024b p 259 217

TOMAacuteS DE AQUINO 2006 p 63-64 Id 1949 Q 1 R 24 p 25 218

ARISTOacuteTELES 1965 p 34-35 37-38 219

TOMAacuteS DE AQUINO 2006 p 131 220

REALE ANTISERI 2003 p 199 221

TOMAacuteS DE AQUINO 2003a p 20 222

ARISTOacuteTELES 2010 II 2 p 67 223

TOMAacuteS DE AQUINO 2003b p 64 224

Id 2006 p 97

66

individuaccedilatildeo a mateacuteria designada (ou materia signata quantitae) que se pode

considerar sobre certas dimensotildees e natildeo a mateacuteria sem mais natildeo designada que

eacute em potecircncia relativa agrave determinada espeacutecie considerando-se esta mesma espeacutecie

e natildeo a um indiviacuteduo dela

Eacute pois da mateacuteria designada por dimensotildees que se faz a ldquodesignaccedilatildeo do

indiviacuteduo em relaccedilatildeo agrave espeacutecierdquo e eacute pela ldquodiferenccedila constitutiva tirada pela forma da

coisardquo que se faz a ldquodesignaccedilatildeo da espeacutecie em relaccedilatildeo ao gecircnerordquo225 Portanto ldquoo

que existe na espeacutecie existe tambeacutem no gecircnero como natildeo determinadordquo226 e assim

ldquoo gecircnero significa indeterminadamente tudo o que existe na espeacutecierdquo227

A relaccedilatildeo entre a mateacuteria e a forma a ligaccedilatildeo de ambas que caracteriza o

sinolo explica Angioni natildeo eacute extrinsecamente determinada mas a partir de dentro

imanentemente pois diz ldquoeacute da proacutepria natureza da forma pocircr a necessidade de

uma mateacuteria propriamente determinadardquo228 A forma eacute princiacutepio de algo mais que

existe no composto o ser do qual a mateacuteria participa diz o Aquinate ldquopor receber a

formardquo ndash ou seja a forma daacute simpliciter229 o ser agrave mateacuteria ndash e por isso tudo o que eacute

ente eacute uno E explica

Assim o ser eacute consequente agrave proacutepria forma Natildeo obstante a forma natildeo eacute o proacuteprio ser E embora a mateacuteria natildeo alcance o ser senatildeo pela forma a forma no entanto enquanto eacute forma natildeo carece da mateacuteria para seu ser visto que o ser se segue agrave proacutepria forma apenas necessita da mateacuteria Portanto a proacutepria essecircncia da forma estaacute para o ser assim como a potecircncia estaacute para seu ato proacuteprio o proacuteprio ser eacute aquilo pelo qual algo eacute assim como a corrida eacute aquilo pelo qual algueacutem corre Portanto visto que a alma eacute certa forma subsistente por si concebe-se em sua composiccedilatildeo ato e potecircncia ndash isto eacute o ser (esse) e o que eacute (quod est) ndash sem que haja composiccedilatildeo de mateacuteria e forma

230

O ser assim eacute aquilo pelo qual algo eacute (sujeito que possui um ser

completo)231 eacute ato do todo substancial232 que atraveacutes da forma sobreveacutem agrave coisa e

de modo nenhum se separa da forma enquanto natildeo eacute nem esta nem a mateacuteria233 e

assim todas as substacircncias teratildeo seu ser limitado e confinado234 O ser eacute contraiacutedo

225

TOMAacuteS DE AQUINO 2003b p 60 226

Ibid p 61 227

Ibid p 63 228

ANGIONI 1997 p 241 229

Isto eacute ldquoem sentido absolutordquo 230

TOMAacuteS DE AQUINO 2012 Q VI p 135 231

Id 2003 p 20 232

Id 1990b L II c LIV p 256 233

Id 2006 p 89 234

Id 1949 Q 1 Obj 15 p 6

67

pelo ente que o recebe do ente ontologicamente anterior que o confere

caracterizando dois componentes presentes em todo e qualquer ente composto ldquoa

natureza da coisa que participa do serrdquo e o ldquomesmo ser que eacute participadordquo235 pelos

quais se conclui que todo composto ou sinolo apresentaraacute essencialmente dois

atos e duas potecircncias a saber o ato do ser em relaccedilatildeo agrave forma que eacute atualizada

natildeo por causa movente mas por causa influente e o ato da forma em relaccedilatildeo agrave

mateacuteria esta atualizada por causa movente e a potecircncia da mateacuteria em relaccedilatildeo agrave

forma e a da forma em relaccedilatildeo ao ser236

Portanto eacute pelo ser que se denomina ente certa substacircncia de modo que se

do composto de mateacuteria e forma pode-se dizer ldquoo que eacute (quod est)rdquo a coisa do

composto desta substacircncia mais o ser pode-se dizer ldquopelo qual eacute (quo est)rdquo a

coisa237

Nos entes inanimados exclusivamente corpoacutereos a forma eacute mais simples e

por isso se diz que tem menos ser Pode inclusive em certos casos ateacute ser

restaurada depois de desfeita238 Esta propriedade da forma enquanto princiacutepio

subsistente ou seja da forma substancial estaacute no cerne da gradaccedilatildeo entitativa da

qual se falaraacute adiante

Mas independentemente de a sua forma ter mais ou menos ser a substacircncia

natildeo eacute susceptiacutevel de mais e de menos intensidade e natildeo possui contraacuterios No

entanto ela eacute apta a receber contraacuterios como acidentes239

Haacute pois tambeacutem a forma acidental Esta eacute dependente da forma

substancial em virtude da qual ela age pois eacute meio pelo qual ela opera jaacute que natildeo

opera por si mesma (pois como diz Tomaacutes de Aquino ldquoaquilo que participa de algo

eacute segundo ele proacuteprio carente deste algordquo)240 A forma acidental confere agrave mateacuteria

235

Respectivamente ldquonatura rei quae participat esserdquo e ldquoipsum esse participatumrdquo 236

TOMAacuteS DE AQUINO 1949 Q 1 R p 15 e R 5 p 18 237

Id 1990b L II c LIV p 256 238

Eacute o caso por exemplo do misto ou de misturas de substacircncias quiacutemicas que podem ser desfeitas e em seguida reconstituiacutedas

239 ARISTOacuteTELES 1965 p 39-40

240 TOMAacuteS DE AQUINO 2006 p 87

68

secundum quid 241 o ldquoserrdquo dos acidentes242 tais como as cores e a consistecircncia e

complementa deste modo o sujeito o ente243

Assim os atributos que recebem o ser da forma acidental predicam do sujeito

per se ou predicam de outros atributos per accidens244 ou tambeacutem per se neste

caso ldquoquando as diversas formas possuem ordenaccedilatildeo entre si como quando

dizemos por exemplo que lsquoo que possui superfiacutecie eacute coloridorsquordquo Aqui o predicado

natildeo entra na definiccedilatildeo do sujeito mas daacute-se o contraacuterio como exemplifica o

Aquinate ldquoa superfiacutecie entra na definiccedilatildeo da cor assim como o nuacutemero entra na

definiccedilatildeo de parrdquo245 E nesse acircmbito as formas inerentes ou seja que satildeo inerentes

a determinado composto podem ser especiais como por exemplo o branco que

satildeo as que se alteram mediante a alteraccedilatildeo do sujeito ou gerais como a cor que

nesse caso permanece natildeo em seu ser na alteraccedilatildeo mas em seu conteuacutedo ou seja

continua havendo cor mas natildeo mais a branca246

A forma acidental portanto caracteriza os corpos artificiais que se podem

dizer substacircncia por sua mateacuteria jaacute que eacute natural uma vez que provecircm de corpos

naturais que satildeo mais substacircncia que os artificiais dos quais satildeo princiacutepios pois o

satildeo pela mateacuteria e pela forma247

Os acidentes variam conforme a diversidade dos princiacutepios que lhes satildeo

causa248 Pode-se consideraacute-los como sendo de trecircs gecircneros os proacuteprios

ldquocausados a partir dos princiacutepios da espeacutecie como a capacidade de rir no homemrdquo

os que ldquosatildeo causados a partir dos princiacutepios do indiviacuteduo porque tecircm causa

permanente no sujeito (e satildeo estes os acidentes inseparaacuteveis como lsquomasculinorsquo e

lsquofemininorsquo e similares)rdquo e os que ldquotecircm causa natildeo permanente no sujeito (e satildeo estes

os acidentes separaacuteveis como lsquosentar-sersquo ou lsquocaminharrsquo)rdquo249 E podem ser ainda

considerados em duas espeacutecies a saber os necessaacuterios presentes em qualquer

241

Ou seja ldquosegundo algordquo 242

Em verdade natildeo se pode dizer em sentido absoluto que o acidente seja ser mas que seja de um ser como explica o Estagirita na Metafiacutesica (cf ARISTOacuteTELES 2005 XII 1069a 1 23-24) o que leva Santo Tomaacutes a dizer que estas formas em rigor natildeo existem ldquomas que qualquer coisa existe por elasrdquo TOMAacuteS DE AQUINO 2009 p 77

243 Id 2001 Q 77 a 6 p 709

244 ldquoPor sirdquo e ldquopor acidenterdquo respectivamente

245 TOMAacuteS DE AQUINO 2012 Q XI p 237

246 Id 1988 art VI p 71

247 Id 2000 L II l 1 218

248 E note-se portanto que nos acidentes o gecircnero natildeo eacute tomado pela mateacuteria e a

diferenccedila natildeo eacute tomada pela forma mas ldquodo proacuteprio modo de ser segundo o qual o ente assume diversas designaccedilotildees conforme eacute anterior e posterior relativamente aos dez gecircneros de categoriasrdquo Id 2003b p 94

249 Id 2012 Q XII p 257

69

indiviacuteduo da espeacutecie natildeo se separando assim da realidade e os natildeo necessaacuterios

que podem variar entre os indiviacuteduos da espeacutecie ou separar-se da realidade250

Alguns acidentes estatildeo mais relacionados agrave forma outros agrave mateacuteria uns atingem a

mateacuteria segundo a relaccedilatildeo com a forma geral outros com uma forma especiacutefica

Uns podem ser causados segundo um ato perfeito a partir dos dois princiacutepios

essenciais outros segundo a aptidatildeo por exemplo a algo exterior251

Diz ainda o Aquinate sobre os acidentes

Todo e qualquer acidente poreacutem tem em comum natildeo ser da essecircncia da coisa e assim natildeo cai em sua definiccedilatildeo por isso podemos conceber o que uma coisa eacute sem que concebamos algo de seus acidentes Mas a espeacutecie natildeo pode ser concebida sem os acidentes consequentes ao seu princiacutepio Ela pode sim ser concebida sem os acidentes do indiviacuteduo mesmo aqueles inseparaacuteveis jaacute sem os separaacuteveis podem ser concebidos tanto a espeacutecie quanto o indiviacuteduo Ora as espeacutecies da alma satildeo acidentes enquanto propriedades Assim embora sem eles se conceba o que eacute a alma natildeo eacute possiacutevel nem inteligiacutevel que a alma exista sem eles

252

Infere-se disto outro princiacutepio a privaccedilatildeo253 ou o natildeo ser em ato o terceiro

dos trecircs princiacutepios da natureza e um dos trecircs requisitos para a geraccedilatildeo tambeacutem

junto com os princiacutepios anteriormente abordados (mateacuteria e forma) A forma provoca

a geraccedilatildeo que proveacutem da mateacuteria e da privaccedilatildeo Mateacuteria e privaccedilatildeo assim

distinguem-se somente no acircmbito da razatildeo mas natildeo no da realidade e deste modo

a privaccedilatildeo soacute pode ser considerada princiacutepio por acidente254 Portanto a mateacuteria

desprovida da forma e da privaccedilatildeo recebe o nome de ldquomateacuteria prima sem maisrdquo que

eacute pura potecircncia natildeo precedida de qualquer outra mateacuteria e por si mesma natildeo pode

ser conhecida sendo portanto una (uma vez que natildeo estaacute incluiacuteda em qualquer

estrutura que crie multiplicidade) Tomaacutes de Aquino menciona tambeacutem a ldquomateacuteria

prima relativamente a certo gecircnerordquo esta composta de mateacuteria e forma a qual

exemplifica com a aacutegua em relaccedilatildeo agraves ldquodiversas soluccedilotildees aquosasrdquo255

Como o ser natildeo se separa da forma a perda desta implica a corrupccedilatildeo dos

entes compostos256 No tocante aos acidentes dois modos haacute de corrpuccedilatildeo pela

corrupccedilatildeo de seu sujeito (como as potecircncias sensitivas das quais trataremos logo

250

TOMAacuteS DE AQUINO 2003a p 23 251

Id 2003b p 91-92 252

Id 2012 Q XII p 257 e 259 253

Diferente da negaccedilatildeo que independe do sujeito relacionado Id 2003a p 24 254

Ibid p 22-23 255

Ibid p 26-27 256

Id 2012 Q XIV p 291

70

adiante em relaccedilatildeo aos respectivos oacutergatildeos dos sentidos)257 ou por seu contraacuterio

(como o frio pelo quente)258

A corrupccedilatildeo ou movimento do ser para o natildeo ser259 bem como seu contraacuterio

a geraccedilatildeo ou movimento do natildeo ser para o ser podem ser simples ou seja estar

presentes no gecircnero da substacircncia ou acidentais ou seja que se passam em todos

os demais gecircneros260

A geraccedilatildeo tem por ponto de partida a mateacuteria e por porto de chegada a

forma261 No entanto nenhum dos princiacutepios tem por si o poder de gerar ou seja

nenhum ente tem por si o poder de passar da potecircncia ao ato sendo portanto

necessaacuterio como princiacutepio ativo um agente extriacutenseco como se disse

anteriormente a causa eficiente ou agente que daacute origem ao movimento sendo

assim tambeacutem chamada causa motora 262263

53 AS QUATRO CAUSAS E AS CATEGORIAS

Aristoacuteteles classifica as causas em quatro tipos ou espeacutecies que satildeo causas

por si e aos quais todos os demais tipos de causa que o satildeo por acidente por isso

mesmo se reduzem264 Diz ele ainda que as causas satildeo princiacutepios e Tomaacutes de

Aquino explica que isto se daacute em sujeito mas natildeo em significado onde diferem pois

princiacutepio ldquoimplica uma ordem ou uma sequecircnciardquo enquanto causa implica ldquoalguma

influecircncia no ser da coisa causadardquo265 Dos quatro tipos haacute dois que satildeo

considerados ab intrinseco ou intriacutensecos266 pois estatildeo relacionados agrave constituiccedilatildeo

essencial do ente sendo essas causas respectivamente a mateacuteria da qual as coisas

satildeo feitas e o modelo ou a forma substancial que a atualiza que diz o Estagirita eacute

257

TOMAacuteS DE AQUINO Q XIX p 395 258

Ibid Q XIX p 385 259

Id 1949 Q 2 R p 37 260

Id 2003a p 21-22 261

Ibid p 27 262

Quanto ao movimento o aristotelismo-tomismo qualifica-o como progressivo e distingue quatro espeacutecies o movimento segundo o lugar o movimento de crescimento e o de reduccedilatildeo e o movimento de alteraccedilatildeo A geraccedilatildeo e a corrupccedilatildeo assim natildeo satildeo consideradas propriamente como espeacutecies de movimento mas transformaccedilotildees instantacircneas (cf TOMAacuteS DE AQUINO 2000 L I l 6 75)

263 Id 2003a p 28

264 ARISTOacuteTELES 1995a L II 194b p 140-142 Id 2005 L V 1013a-1013b p 189-191

TOMAacuteS DE AQUINO 2003a p 31 265

ldquo[] implies an order or sequence []rdquo ldquo[] implies some influence on the being of the thing causedrdquo Id 1964b L V l 1 751

266 Id 2003a p 31

71

ldquoa definiccedilatildeo da essecircncia e seus gecircnerosrdquo267 jaacute descritas anteriormente e aqui

denominadas causa material e causa formal respectivamente

O terceiro tipo eacute a causa eficiente citada anteriormente pela qual a origem do

movimento se daacute de modo ab extrinseco ldquoo princiacutepio primeiro de onde proveacutem a

mudanccedila ou o repouso e o que faz mudar algo em relaccedilatildeo ao mudadordquo268 Eacute a

potecircncia motora como causa eficiente que determina a mateacuteria por si mesma que

em princiacutepio pode-se relacionar indiferentemente com qualquer forma a formas

especiais de modo que um agente natural distinto imprimiraacute uma uacutenica forma em

mateacuteria especiacutefica perfeccionada por uma forma mais universal e os acidentes

desta tornando a mateacuteria como diz o Aquinate ldquoproacutepria para a perfeiccedilatildeo

subsequenterdquo269

Quanto ao quarto eacute a causa final que com a anterior representa o segundo

tipo de causas extriacutensecas mas que ao contraacuterio dela eacute natildeo a origem mas o fim do

movimento aquilo para o qual ele tende naturalmente pois o que quer que aja o faz

tendendo a um fim que pode ser segundo Tomaacutes de Aquino de dois tipos o da

geraccedilatildeo ou o do gerado270 Explica ele entatildeo que o fim seria a ldquocausa das causasrdquo

jaacute que eacute causa da causalidade eficiente por ser a razatildeo pela qual esta age e eacute o

que faz com que a forma e a mateacuteria sejam respectivamente forma e mateacuteria e com

que estas interajam com aquela aperfeiccediloando esta mediante o fim271 Das quatro

causas somente a causa material eacute potecircncia enquanto que as demais satildeo ato

sendo que a formal pode ser uma soacute coisa com a final mas nunca com a eficiente

ainda que diferente da material seja da mesma espeacutecie272

Os quatro gecircneros de causa como se disse abarcam todas as espeacutecies de

causas como a causa proacutexima ou posterior referente ao que eacute mais particular e a

causa remota ou anterior referente ao que eacute mais universal ou como a causa por

si a de um objeto enquanto tal e a causa por acidente referente a algo que

acontece agrave anterior ou ainda a causa simples que eacute causa soacute por si ou soacute por

acidente ou eacute causa uacutenica ou a causa composta que pode ser a junccedilatildeo de duas

causas simples no primeiro caso ou quando haacute mais de um sujeito como causa ou

267

ldquo[] la definicioacuten de la esencia y sus geacuteneros []rdquo ARISTOacuteTELES 1995a L II 194b p 141

268 ldquo[] el principio primero de donde proviene el cambio O el reposo [] y lo que hace

cambiar algo respecto de lo cambiado []rdquo Ibid L II 194b p 142 269

ldquo[] propria ad subsequentem perfectionemrdquo Id 1949 Q 3 R 20 p 64-65 270

Id 2003a p 39 271

Ibid p 36 272

Ibid p 39-40

72

causa em ato que produz seu efeito em ato ou causa em potecircncia que natildeo produz

efeito mas pode vir a produzi-lo ou causa universal ou causa singular que se

distinguem em relaccedilatildeo agrave natureza do efeito etc273

O Estagirita tambeacutem reduz a seis essas causas segundo seu modo de ser

que diz podem ser entendidas no sentido de ato ou de potecircncia Seriam elas

causas ldquo(1) como particular ou (2) como gecircnero ou (3) como acidente ou (4) como

gecircnero do acidente ou (5) como combinadas umas e outras ou (6) como tomadas

cada uma por si []rdquo274

As causas particulares observa Tomaacutes de Aquino atuam pelo poder das

universais275

Ele explica tambeacutem que a perfeiccedilatildeo de um efeito eacute diretamente proporcional

ao grau de semelhanccedila com a sua causa276 que estaraacute sempre presente de alguma

forma nele que por sua vez jamais seraacute mais simples do que ela277 O efeito

tambeacutem estaraacute em sua causa diz o Aquinate ldquode modo mais elevado segundo o

poder da causardquo278

As quatro causas assim estatildeo presente em cada uma das chamadas

categorias

Quanto a essas categorias ou predicamentos o Estagirita as elenca em dez

a saber a substacircncia a quantidade a qualidade a relaccedilatildeo o lugar o tempo a

posiccedilatildeo a posse (habitum) a accedilatildeo e a afecccedilatildeo (paixatildeo)279

A substacircncia da qual se falou anteriormente eacute a uacutenica que apresenta caraacuteter

essencial enquanto as demais possuem caraacuteter acidental

A quantidade pode ser discreta ou seja quando natildeo haacute limite comum que

estabeleccedila contato entre as partes (como o nuacutemero e o discurso) ou contiacutenua (como

a superfiacutecie de um corpo soacutelido e o tempo)280

A relaccedilatildeo estabelece-se quando uma coisa a relativa com mais ou menos

intensidade depende de outra a correlativa ndash que lhe eacute de algum modo simultacircnea

e que lhe pode ser contraacuteria ou natildeo ndash ou quando se refere de algum modo a esta281

273

TOMAacuteS DE AQUINO 2003a p 41-43 274

ARISTOacuteTELES 2005 L V 1014a p 195 275

TOMAacuteS DE AQUINO 2006 p 101 276

Ibid p 133 277

Ibid p 125 278

Ibid p 145 279

ARISTOacuteTELES 1965 p 20 280

Ibid p 75 281

Ibid p 98-100 e 103

73

De todas as categorias ela eacute a uacutenica que natildeo coloca algo na natureza das coisas

senatildeo na esfera loacutegica ndash jaacute que as demais designam um algo enquanto ela designa

um ldquoem relaccedilatildeo a algordquo ndash o que pode ocorrer ldquoquando alguma coisa eacute posta em

relaccedilatildeo consigo mesmardquo (como a identidade) ldquoquando a proacutepria relaccedilatildeo eacute posta em

relaccedilatildeo com alguma coisardquo diretamente (como a paternidade) ldquoquando um dos

termos da relaccedilatildeo depende do outro e natildeo vice-versardquo (como a do conhecimento

com o objeto na dependecircncia do conhecimento em relaccedilatildeo aos objetos por

conhecer-se) quando ldquoo ser eacute comparado com o natildeo serrdquo (como quando um sujeito

diz que eacute antes dos que seratildeo depois dele)282

A qualidade eacute o acidente determinativo da substacircncia em si mesma

Aristoacuteteles define-a como aquilo ldquoem virtude do qual se diz que alguma coisa eacute talrdquo

A qualidade pode ter contraacuterios eacute susceptiacutevel tanto de mais e de menos como de

aumento e diminuiccedilatildeo e pode ser semelhante ou dissemelhante em relaccedilatildeo agrave outra

qualidade O Estagirita aponta alguns dos muitos gecircneros de qualidades Um eacute

aquele que eacute como haacutebito (as ciecircncias e as virtudes) e disposiccedilatildeo ndash que pode ser

ldquofacilmenterdquo movida e ldquorapidamenterdquo mudada (como o frio o calor o saudaacutevel o

enfermo etc) ndash sendo aquele mais estaacutevel e duraacutevel e sempre ao mesmo tempo

esta jaacute que possuir haacutebitos ldquoeacute tambeacutem encontrar-se numa certa disposiccedilatildeordquo283

Outro eacute aquele que satildeo determinaccedilotildees afirmadas por aptidotildees ou inaptidotildees

naturais (como os que tecircm aptidatildeo natural para realizar bem certo exerciacutecio ou para

suportar algo que lhe aconteccedila etc) Haacute tambeacutem o que estaacute relacionado agraves

afecccedilotildees e agraves qualidades afetivas como o frio a brancura a doccedilura etc que satildeo

qualidades que produzem modificaccedilatildeo nas sensaccedilotildees ou resultam de modificaccedilotildees

E o Estagirita cita mais um em seus escritos sobre as categorias que respeita agrave

figura e agrave forma acidental284

Em relaccedilatildeo agrave accedilatildeo e agrave afecccedilatildeo tambeacutem admitem contraacuterios e nelas tambeacutem

haacute susceptibilidade de mais e de menos285 Quanto agrave afecccedilatildeo ou paixatildeo pode ser

vista de dois modos como o simples ato de receber como o sentido recebe o

sensiacutevel ou quando algo da substacircncia do que padece ou paciente eacute eliminado

como ocorre com a madeira ao fogo286

282

TOMAacuteS DE AQUINO 1988 art V p 67-68 283

ARISTOacuteTELES 1965 p 124-126 284

Ibid p 126-127 e 129 285

Ibid p 141 286

TOMAacuteS DE AQUINO 2012 Q XXI p 423

74

Jaacute a posse ou haacutebito Aristoacuteteles define como ldquocerta atividade proacutepria do que

possui e do que eacute possuiacutedo como uma accedilatildeo ou um movimentordquo287 como algueacutem

que esteja calccedilado ou armado288 ou ldquo[] a disposiccedilatildeo em virtude da qual a coisa

disposta eacute disposta bem ou mal seja por si seja em relaccedilatildeo a outra []rdquo ou o que

participa dessa disposiccedilatildeo289

Por fim o tempo diz respeito exatamente a quando ou seja se ontem ou

hoje ou amanhatilde etc o local diz respeito a onde ou seja se nesta cidade se em

determinado recinto etc e a posiccedilatildeo diz respeito ao modo como o sujeito se situa

no tempo e no espaccedilo ou seja se de peacute ou sentado ou deitado etc290

54 A ALMA SUAS POTEcircNCIAS E A GRADACcedilAtildeO ENTITATIVA

Diz Tomaacutes de Aquino

Quanto mais perfeita uma forma eacute mais ela extrapassa a mateacuteria corpoacuterea Isto se torna claro desde a induccedilatildeo em que se consideram as vaacuterias ordens de formas A forma de um elemento natildeo tem mais operaccedilotildees que a que as realiza mediante as qualidades ativas e passivas que satildeo disposiccedilotildees da mateacuteria corpoacuterea A forma do corpo mineral tem uma operaccedilatildeo que supera as qualidades ativas e passivas [] a alma vegetal tem uma operaccedilatildeo com a qual as qualidades ativas e passivas orgacircnicas certamente contribuem mas para aleacutem da potecircncia de tais qualidades ela mesma alcanccedila um efeito proacuteprio como nutrir e fazer crescer ateacute um limite definido e realizar coisas semelhantes A alma sensitiva tem aleacutem disso uma operaccedilatildeo para a qual soacute chegam as qualidades ativas e passivas na medida em que satildeo necessaacuterias para a composiccedilatildeo do oacutegatildeo que se emprega no exerciacutecio desta operaccedilatildeo como ver ouvir apetecer etc

291

Nos entes viventes ou animados a forma substancial recebe a denominaccedilatildeo

de ldquoalmardquo (do latim anima) que pode ser conhecida por suas potecircncias natildeo sendo

287

ARISTOacuteTELES 2005 L V 1022b p 245 288

Id 1965 p 20 289

Id 2005 L V 1022b p 247 290

Id 1965 p 20 291

ldquo[] quod quanto aliqua forma est perfectior tanto magis supergreditur materiam corporalem quod patet inducenti in diversis formarum ordinibus Forma enim elementi non habet aliquam operationem nisi quae fit per qualitates activas et passivas quae sunt dispositiones materiae corporalis Forma autem corporis mineralis habet aliquam operationem excedentem qualitates activas et passivas [] Ulterius autem anima vegetabilis habet operationem cui quidem deserviunt qualitates activae et passivae organicae sed tamen supra posse huiusmodi qualitatum ipsa effectum proprium sortitur nutriendo et augendo usque ad determinatum terminum et alia huiusmodi complendo Anima autem sensitiva ulterius habet operationem ad quam nullo modo se extendunt qualitates activae et passivae nisi quatenus exiguntur ad compositionem organi per quod talis operatio exercetur ut videre audire apetere et huiusmodirdquo TOMAacuteS DE AQUINO 1949 Q 2 R p 35-36

75

estas nem partes suas essenciais ou integrais mas potenciais292 Partes diga-se

que satildeo separaacuteveis apenas conceptualmente e natildeo segundo o lugar (ldquosegundo a

substacircncia da alma ou localmenterdquo)293 Aristoacuteteles define a alma como o princiacutepio da

vida e como o ato primeiro de um corpo natural organizado294 que eacute ldquoenteleacutequiardquo

ou ato perfeiccedilatildeo295 e Santo Tomaacutes complementa ldquodotado de potecircncia para a

vidardquo296 e faacute-lo tambeacutem como ldquoa forma substancial de um corpo natural organizadordquo

ldquoem sentido universal [] uma substacircncia segundo a forma isto eacute a quididade de

cada corpordquo297

E a todo o corpo que dela eacute dotado ela vivifica estando presente e atuando

em todas as suas partes cada uma com potecircncias especiacuteficas inerentes ao

composto ou sinolo como ato seu por inteiro e tambeacutem de cada uma de suas

partes em ordem agrave integralidade do mesmo corpo as quais algumas satildeo

perfeccionadas com maior preferecircncia e perfeiccedilatildeo e outras com menos298 A alma

confere naturalmente o ser que dos viventes eacute o viver299 e a espeacutecie constituindo

no corpo sua diversidade de partes ndash mebros oacutergatildeos etc ndash em conformidade com

as distintas operaccedilotildees que tornam necessaacuteria a constituiccedilatildeo do corpo por partes a

elas correspondentes caracterizando um corpo organizado em que eacute em funccedilatildeo do

todo que essas mesmas partes existem Disto se infere que na constituiccedilatildeo dos

entes animados a propriedade teleoloacutegica eacute mais visiacutevel que na dos inanimados300

O aristotelismo-tomismo faz distinccedilatildeo entre movimento e operaccedilatildeo O

Aquinate define o primeiro como ldquoo ato de um ente imperfeitordquo e o segundo como ldquoo

ato de um ente perfeitordquo301 Explica tambeacutem que a alma move tanto a si mesma

como eacute movida por acidente ou seja quando eacute movida pelo corpo em que estaacute302 e

eacute movida ldquopelos sensiacuteveis na sensaccedilatildeo e pelos bens desejados na afecccedilatildeordquo303

292

TOMAacuteS DE AQUINO 2012 Q XIX p 389 293

Id 2009 p 53 294

ARISTOacuteTELES 2010 II 1 p 61-62 295

REALE ANTISERI 2003 p 212 296

ldquo[] doteacute em puissance de la vierdquo TOMAacuteS DE AQUINO 2000 II l 1 233 297

Id 2009 p 47 298

Id 1949 Q 4 SC II e IV p 71 Ibid Q 4 R 3 p 75 e R 8 p 76 299

Ibid Q 1 SC IV p 10 300

Id 2012 Q X p 221 e 225 Id 2000 II l 1 230 301

Respectivamente ldquolacte dun ecirctre imparfaitrdquo e ldquolacte dun ecirctre parfaitrdquo Id 2000 I l 6 111

302 Ibid I l 8 145

303 ldquo[] par les sensibles dans la sensation et par les biens deacutesirables dans lrsquoaffectionrdquo Ibid

I l 6 84

76

sendo ela a causa do movimento e do repouso nos animais304 Assim distingue-se

um ente vivo de um natildeo vivo pelo movimento uma vez que este precisa

necessariamente da accedilatildeo de um princiacutepio exterior para mover-se305

As almas nos viventes distinguem-se segundo o modo como suas operaccedilotildees

superam as respectivas naturezas corpoacutereas que eacute diretamente proporcional ao

domiacutenio que cada alma exerce sobre a mateacuteria corporal e inversamente

proporcional ao grau de imersatildeo nesta Tais operaccedilotildees se datildeo conforme as

potecircncias inerentes agrave alma ndash e diz o Aquinate que se considera vivente tudo o que

possui uma destas operaccedilotildees da alma306 ndash cujos gecircneros segundo o aristotelismo-

tomismo satildeo a vegetativa a sensitiva a intelectiva ou racional (que diferentemente

das duas anteriores que inerem no composto como propriedades naturais ndash e ainda

que tenham o composto como sujeito tecircm a alma como princiacutepio ndash inere

diretamente na alma)307 a apetitiva a locomotora ou motriz e a nutriz308 As trecircs

primeiras determinam as classes dos entes os graus das potecircncias na alma

enquanto que a apetitiva e a nutriz encontram-se nas trecircs classes definidas pelas

trecircs anteriores e a motriz natildeo eacute geralmente encontrada nos entes de classe

vegetativa309

Segundo a inclinaccedilatildeo natural proacutepria ou apetite natural procedente de cada

tipo de forma natural e da qual segue determinada operaccedilatildeo ou determinado

conjunto de operaccedilotildees o aristotelismo-tomismo enquadra cinco dos seis gecircneros

acima excluindo aqui a potecircncia nutriz310 e ainda segundo o grau dos viventes

exclui tambeacutem a apetitiva estabelecendo quatro como o nuacutemero de gecircneros para

esta classificaccedilatildeo311

As potecircncias da alma distinguem-se assim por seus diferentes objetos Isto

porque como explica o Aquinate

[] se os atos satildeo de potecircncias passivas seus objetos satildeo ativos e se os atos satildeo de potecircncias ativas seus objetos satildeo como fins Mas eacute segundo ambos que se considera a espeacutecie da operaccedilatildeo [] e tambeacutem ambos estatildeo

304

TOMAacuteS DE AQUINO 2000 I l 6 89 305

Ibid II l 1 219 306

Id 2009 p 51 307

Id 2012 Q XIX p 389 308

Id 2000 I l 14 201 309

Id 2001 Q 78 a 1 p 713 ARISTOacuteTELES 2010 II passim TOMAacuteS DE AQUINO 2000 II l 3 passim

310 TOMAacuteS DE AQUINO 2000 II l 5 279 286

311 Ibid II l 5 287

77

determinados a fins semelhantes pois o agente age de modo a induzir em outro sua proacutepria semelhanccedila

312

Deste modo conhecer e sentir satildeo operaccedilotildees da alma quanto aos sentidos e

pensar eacute operaccedilatildeo quanto agrave inteligecircncia

Estabelece-se portanto que todo e qualquer ente corpoacutereo enquadra-se em

alguma destas classes que seguem um esquema ascendente segundo o grau de

perfeiccedilatildeo natural a dos corpos sem vida (os elementos e em seguida os mistos) a

vegetativa (as plantas cujo corpo eacute animado com princiacutepio vital) a sensitiva

(potecircncia sensitiva acrescida agrave vegetativa o que caracteriza os animais

propriamente ditos) e a intelectiva (que eacute acrescida agraves anteriores o que caracteriza

o homem) de modo gradativo incluindo os agentes constitutivos de outros entes

(ceacutelulas partiacuteculas atocircmicas etc)

Explica Tomaacutes de Aquino que

[] em cada um dos gecircneros haacute diversas espeacutecies segundo os diversos graus de perfeiccedilatildeo natural No caso dos corpos simples a terra ocupa o grau iacutenfimo e o fogo o mais nobre No caso dos minerais a natureza avanccedila gradualmente atraveacutes de suas diversas espeacutecies ateacute culminar no ouro

Nos minerais que estatildeo mais proacuteximos dos elementos haacute menos harmonia o

que lhes confere maior durabilidade

Jaacute a vegetativa cujo objeto eacute o corpo eacute caracterizada por trecircs operaccedilotildees a

generativa a aumentativa e a nutritiva pelas quais recebe o ser se desenvolve e se

conserva respectivamente

Prossegue Santo Tomaacutes

Tambeacutem nas plantas ateacute culminar nas espeacutecies das aacutervores perfeitas e nos animais ateacute culminar no homem ndash embora alguns animais sejam muito proacuteximos das plantas como os imoacuteveis que soacute possuem tato De modo semelhante certas plantas satildeo muito proacuteximas dos entes inanimados

313

E da mesma forma certos animais exibem caracteriacutesticas muito proacuteximas agraves

de entes vegetais como o caso dos animais cujas partes sobrevivem apoacutes secccedilatildeo

algo que natildeo se daacute de modo algum nos animais ditos ldquosuperioresrdquo314

312

TOMAacuteS DE AQUINO 2012 Q XIV p 269 313

Ibid Q VII p 151 314

O Aquinate assim como Aristoacuteteles atribui isto ao fato de a alma desses animais natildeo ser diversificada em suas partes e acrescenta que cada ldquoparte reteacutem a disposiccedilatildeo mediante a qual o

78

O princiacutepio sensitivo nos vegetais eacute a proacutepria alma ao passo que nos animais

e nos humanos ele eacute parte da alma315 Algumas operaccedilotildees da alma se datildeo no todo

e estas se atualizam em qualquer uma das partes outras em locais especiacuteficos316

Quanto mais perfeita eacute a forma quanto maior sua virtude mais operaccedilotildees e em

maior diversidade natildeo soacute destas como tambeacutem de partes diferenciadas ela teraacute

do que se infere que enquanto as formas inferiores perfeccionam uniformemente a

alma natildeo o faz O homem assim eacute o ente com maior nuacutemero de operaccedilotildees e de

partes diferenciadas317

Eacute segundo a operaccedilatildeo e o movimento que o corpo se une agrave alma por suas

partes superiores318 O corpo eacute movido voluntariamente pela alma atraveacutes do apetite

e da apreensatildeo No homem ambos os movimentos se datildeo pela parte intelectiva e

pela parte sensitiva sendo que aquela move o corpo mediante o que pertence a

esta uma vez que o movimento eacute do singular319

Explica o Aquinate ldquoa alma daacute ao animal natildeo soacute o que eacute proacuteprio dele mas

tambeacutem o que pertence agraves formas inferioresrdquo e sendo assim do mesmo modo que

ldquoas formas inferiores satildeo princiacutepios de movimento natural nos corpos naturais assim

eacute a alma no corpo animalrdquo

Divide ele entatildeo as operaccedilotildees da alma em ldquoanimaisrdquo a saber as que

ldquoprocedem da alma segundo o que lhes eacute proacutepriordquo e ldquonaturaisrdquo que satildeo as que

ldquoprocedem da alma na medida em que ela produz o efeito das formas naturais

inferioresrdquo Assim em geral uma parte de cada animal eacute motora e outra parte eacute

movida e ldquoo corpo natural organizado estaacute para a alma como a mateacuteria estaacute para a

formardquo o que se daacute ldquoa partir da proacutepria almardquo320

Nos corpos naturais assim o que determina a quantidade o que confere os

limites de crescimento como o de tamanho e o de largura de cada indiviacuteduo de

corpo inteiro eacute perfectiacutevel pela almardquo e assim ldquopermanece nele a almardquo (TOMAacuteS DE AQUINO 2012 Q X p 225 e nota 247 p 451-452 cf Aristoacuteteles 2010 I 5 p 58) pois a mesma alma eacute uma em ato mas muacuteltipla em potecircncia (cf TOMAacuteS DE AQUINO 2000 II l 4 264) Isto se manteacutem em consonacircncia com o que se sabe hoje por exemplo a respeito da importacircncia da presenccedila do cutelo para o sustento da vida na parte seccionada de aneliacutedeos No caso das plantas diz Aristoacuteteles que algumas sobrevivem apoacutes a secccedilatildeo em razatildeo de a alma em cada indiviacuteduo ser uma em ato mas vaacuterias em potecircncia (cf ARISTOacuteTELES 2010 II 2 p 65-66)

315 TOMAacuteS DE AQUINO 2000 II l 4 262

316 Id 2009 p 51

317 Id 2000 I l 14 208 Id 1949 Q 4 R p 72-73

318 Se estiverem presentes as devidas disposiccedilotildees na mateacuteria

319 O intelecto apreende os universais e soacute pode assim mover mediante o particular que eacute

referente agrave natureza do sentido (cf TOMAacuteS DE AQUINO 2012 Q IX p 201) 320

TOMAacuteS DE AQUINO 2012 Q IX p 203

79

determinada espeacutecie para menos e para mais eacute menos a mateacuteria do que a forma

visto que a proporccedilatildeo e o fim de uma accedilatildeo no caso o crescimento satildeo impostos

pelo princiacutepio da operaccedilatildeo relacionada321

E no que concerne agraves operaccedilotildees o modo de agir na alma eacute fruto da accedilatildeo de

um ente vivo ou seja que move a si mesmo e por essa razatildeo a accedilatildeo da alma

supera a da natureza o que natildeo se daacute poreacutem necessariamente em relaccedilatildeo ao que

eacute agido Nos corpos animados e nos inanimados haacute o ser natural e o que para este eacute

requerido mas os inanimados necessitam para isto de um agente extriacutenseco

enquanto os animados requerem um agente intriacutenseco o que eacute exemplificado pelas

operaccedilotildees agraves quais estatildeo ordenadas as potecircncias supramencionadas da alma

vegetativa e incluam-se aqui tantos movimentos involuntaacuterios322 que satildeo pois

virtudes naturais

Seguindo uma ordem a primeira potecircncia da alma vegetativa eacute a virtude

nutritiva que se ordena agrave conservaccedilatildeo do ser e da espeacutecie pela transformaccedilatildeo e

pelo acreacutescimo de algo o alimento na substacircncia do crescimento e da geraccedilatildeo E eacute

a virtude aumentativa o crescimento a segunda na ordem pois dela o ente passa

em quantidade e virtude para uma perfeiccedilatildeo maior de quantidade devida de onde

entatildeo pode expressar a terceira potecircncia a gerativa que se ordena a que o

indiviacuteduo seja posto no serrdquo E se os entes inanimados recebem aleacutem da espeacutecie

sua quantidade devida sendo engendrados extrinsecamente os entes animados

satildeo comumente gerados de uma semente Assim a potecircncia gerativa manifesta-se

mediante a aumentativa e tanto a potecircncia gerativa quanto a aumentativa soacute se datildeo

em razatildeo da virtude nutritiva323

Prossegue Santo Tomaacutes

Existem ademais outras operaccedilotildees mais elevadas da alma que transcendem as operaccedilotildees dos corpos naturais tambeacutem quanto ao agido na medida em que eacute inato agrave alma que nela se encontre segundo o ser imaterial tudo o que existe pois a alma eacute em certa medida todas as coisas na medida em que eacute sensitiva e intelectiva Logo eacute necessaacuterio que existam diversos graus deste mencionado ser imaterial E um destes graus eacute aquele segundo o qual as coisas se encontram na alma sem sua mateacuteria proacutepria mas segundo sua singularidade e as condiccedilotildees individuais derivadas da mateacuteria E este eacute o niacutevel do sentido que eacute receptivo das espeacutecies individuais sem mateacuteria mas receptivo em um

321

TOMAacuteS DE AQUINO 2000 II l 8 332 322

Como os processos da digestatildeo e da respiraccedilatildeo os batimentos cardiacuteacos etc 323

TOMAacuteS DE AQUINO 2012 Q XIII p 271 e 283 Id 2000 II l 7 312 Ibid II l 9 340 344 e 347

80

oacutergatildeo corporal O outro grau de imaterialidade mais alto e mais perfeito eacute o do intelecto que recebe espeacutecies completamente abstraiacutedas da mateacuteria e das condiccedilotildees materiais e sem um oacutergatildeo corporal E assim como por sua forma natural a coisa possui uma inclinaccedilatildeo para algo e se move ou age para conseguir aquilo para o qual se inclina assim tambeacutem se deve a uma forma sensiacutevel ou inteligiacutevel a inclinaccedilatildeo para a coisa apreendida pelo sentido ou pelo intelecto inclinaccedilatildeo essa que pertence agrave potecircncia apetitiva Ademais eacute necessaacuterio que consequentemente exista um movimento pelo qual se alcance a coisa desejada e este pertence agrave potecircncia motriz

324

A potecircncia apetitiva segue-se agrave apreensatildeo realizada pelos sentidos e divide-

se em trecircs a potecircncia desiderativa ou vontade cuja operaccedilatildeo eacute o desejar que eacute o

apetite de natureza intelectual racional a potecircncia concupisciacutevel cuja operaccedilatildeo eacute o

desejar relacionado ao que eacute apeteciacutevel ou deleitaacutevel e conveniente aos sentidos e

a potecircncia irasciacutevel ou coacutelera relacionada a algo do que adveacutem o poder de

desfrutar agrave vontade o que eacute deleitaacutevel ao sentido como ocorre na conquista apoacutes

uma luta por algo325 Estas duas uacuteltimas pertencem agrave parte sensiacutevel e irracional e

assim o apetite irasciacutevel eacute como se fosse um defensor do concupisciacutevel As afecccedilotildees

daquele tem iniacutecio e fim nas afecccedilotildees deste326 e os atos de ambos satildeo realizados

com passividade327

Enquanto que ao apetite concupisciacutevel pertence o amor do bem ao apetite

irasciacutevel pertencem o oacutedio e o medo do mal e a esperanccedila do bem328

A virtude motriz por sua vez varia conforme a diversidade dos movimentos

ou as diferentes partes de um animal que possuem movimentos proacuteprios e

enquadra-se no princiacutepio de que ldquotudo o que se move eacute movido por outro se

dizemos que algo se move por si proacuteprio isto natildeo ocorre segundo ele mesmo mas

segundo suas diversas partes de modo que uma parte dele eacute motora e a outra

movidardquo329

Nas operaccedilotildees da alma explica o Aquinate330 o movimento encontra-se de

trecircs modos a saber ldquopropriamenterdquo que eacute o que se daacute no movimento de

crescimento como operaccedilatildeo da alma vegetativa e com o apetite sensiacutevel

relacionado ao movimento local e agrave alteraccedilatildeo como a dos humores ldquomenos

propriamenterdquo exemplificado na captaccedilatildeo dos sensiacuteveis como se daacute com a visatildeo

324

TOMAacuteS DE AQUINO 2012 Q XIII p 271 e 273 325

Ibid Q XIII p 277 326

Id 2000 I l 14 202 Ibid II l 5 288 Ibid III l 14 802 327

Id 1990b L II c LX p 274 328

Id 2000 III l 14 806 329

Id 2006 p 19 330

Id 2000 I l 10 157-160

81

em que um corpo eacute objeto da virtude visual mas dele soacute eacute captada a natureza dita

espiritual ou seja a luz que informa a cor e ldquomuito pouco propriamenterdquo como o eacute o

movimento na inteligecircncia que se daacute somente metaforicamente ou seja a operaccedilatildeo

ali eacute ato de um ente perfeito enquanto o movimento eacute sempre caracterizado por ser

ato de um ente imperfeito

A alma ou forma substancial racional ou intelectiva por fim faz com que por

meio dela sejamos simultaneamente homens animais viventes corpos substacircncias

e entes331 Eacute primeiramente segundo a razatildeo de forma universal e entatildeo segundo a

razatildeo de forma especial que a mateacuteria se perfecciona de modo que o intelecto

primeiro identifica o ente depois ser vivo em seguida o ser animal e entatildeo o ser

homem identificando tambeacutem seus acidentes proacuteprios que neste sentido se diz

que acompanham o gecircnero e a espeacutecie ao qual pertencem332

A potecircncia intelectiva que seraacute exposta apoacutes a explanaccedilatildeo sobre os sentidos

possui relaccedilotildees com a sensitiva e com a vegetativa que podem ser analisada sob

duas perspectivas o que Tomaacutes de Aquino explica com uma analogia

[] o intelecto difere das outras partes da alma pelo sujeito [] A faculdade vegetativa e a sensitiva estatildeo na faculdade intelectiva como o triacircngulo e o quadrilaacutetero no pentaacutegono Aleacutem do mais o quadrilaacutetero eacute uma figura absolutamente distinta do triacircngulo pela espeacutecie mas natildeo do triacircngulo que conteacutem em potecircncia como o nuacutemero quaternaacuterio tambeacutem natildeo se distingue do ternaacuterio que faz parte dele mas do ternaacuterio que existe separado E se acontecesse que diversas figuras fossem produzidas por diversos agentes o triacircngulo que existe separadamente do quadrilaacutetero teria uma causa produtora diferente da do quadrilaacutetero como tem tambeacutem uma outra espeacutecie mas o triacircngulo que estivesse contido no quadrilaacutetero teria a mesma causa produtora Assim tambeacutem por conseguinte a faculdade vegetativa que tem uma existecircncia agrave parte da sensitiva eacute uma outra espeacutecie de alma e tem uma outra causa produtora contudo eacute a mesma causa que produz a faculdade sensitiva e a faculdade vegetativa que estaacute contida na sensitiva

333

55 OS SENTIDOS

As potecircncias sensitivas tecircm pois como princiacutepio a alma de onde provecircm e

existem no composto tendo-o por sujeito Assim o que sente vecirc e ouve ou seja

aquilo pelo qual eacute manifesta a accedilatildeo dos sentidos eacute o composto em virtude da

331

TOMAacuteS DE AQUINO 1949 Q 3 R p 52 332

Ibid Q 3 R17 p 63-64 333

Id 2009 p 87-89

82

alma334 de modo que tanto as operaccedilotildees da alma sensitiva como as da vegetativa

satildeo movimentos natildeo da alma mas do composto335

E para o termo ldquosentidordquo Tomaacutes de Aquino atribui duas acepccedilotildees a saber

natildeo soacute a potecircncia sensitiva propriedade natural consequente agrave espeacutecie como

tambeacutem a proacutepria alma sensitiva336 A faculdade perceptiva existe somente em

potecircncia ou seja a alma sensiacutevel natildeo eacute os sensiacuteveis em ato337 mas em potecircncia

razatildeo pela qual o ato da percepccedilatildeo natildeo eacute contiacutenuo nos sentidos338

E partindo do princiacutepio de que diz o Aquinate ldquotudo o que eacute recebido

determina-se no recipiente segundo o modo do proacuteprio recipienterdquo339 tanto a

percepccedilatildeo da realidade sensiacutevel presente como a da ausente satildeo fundamentais

para que esses entes dotados com potecircncia sensitiva possam-se mover em busca

dos recursos externos que lhes satildeo vitais340 Assim eles natildeo soacute recebem como

tambeacutem conservam as espeacutecies dos objetos sensiacuteveis que alteram seus sentidos A

partir dessa conservaccedilatildeo eacute possiacutevel perceber as intenccedilotildees como a ameaccedila de um

predador a serventia de um objeto para determinado fim etc

Muszalski explica em relaccedilatildeo ao termo ldquointenccedilatildeordquo que

Apesar de que para Santo Tomaacutes pode-se usar o termo intentio em diversos sentidos fica claro que implica fundamentalmente uma relaccedilatildeo de uma coisa com outra utilizando-se sobretudo no acircmbito da apetecircncia Com efeito designa propriamente a tendecircncia a um fim e a faculdade que eacute diretiva para um fim eacute principalmente a vontade No entanto como as potecircncias cognoscitivas do vivente tendem ao conhecimento de uma coisa como se fosse seu fim pode-se aplicar o termo intentio analogamente agrave ordem do cognoscitivo de modo que natildeo soacute a vontade como tambeacutem a inteligecircncia e os sentidos possuem uma intencionalidade Mas com isto simplesmente se estaacute caracterizando o ato proacuteprio da faculdade de conhecimento

341

334

TOMAacuteS DE AQUINO 2012 Q XIX p 387-389 335

Id 2000 I l 10 161 336

Id 2012 Q XX p 389-391 337

No sentido de que o que eacute afetado adquire certa semelhanccedila em relaccedilatildeo ao agente da afecccedilatildeo Id 2000 II l 10 357 365 366

338 ARISTOacuteTELES 2010 II 5 p 75 TOMAacuteS DE AQUINO 2000 II l 10 354

339 TOMAacuteS DE AQUINO 2012 Q XX p 411

340 Que eacute acidental no homem e nos animais e natildeo substancial atributo este da alma

sensiacutevel (cf TOMAacuteS DE AQUINO 2012 Q XI p 243) 341

ldquoApesar de que para Santo Tomaacutes el teacutermino lsquointentiorsquo puede usarse en diversos sentidos resulta claro que implica fundamentalmente una relacioacuten de una cosa con otra utilizaacutendose sobre todo en el aacutembito de la apeticioacuten En efecto designa propiamente la tendencia a un fin y la facultad que es directiva hacia un fin es principalmente la voluntad Sin embargo como las potencias cognoscitivas del viviente tienden al conocimiento de una cosa como si fuera su fin el teacutermino intentio se puede aplicar anaacutelogamente al orden de lo cognoscitivo de modo que no soacutelo la voluntad sino tambieacuten la inteligencia y los sentidos poseen una intencionalidad Pero con esto simplemente se estaacute caracterizando el acto propio de la facultad de conocimientordquo MUSZALSKI 2014 p 87-88

83

E esta tem iniacutecio com a apreensatildeo dos sensiacuteveis O aristotelismo-tomismo

descreve os princiacutepios daqueles sentidos que realizam essa apreensatildeo e tambeacutem

de outros sentidos que por assim dizer processaratildeo o objeto captado por essa

apreensatildeo A estes chama ldquosentidos internosrdquo e agravequeles ldquosentidos externosrdquo

551 Sentidos externos

Diz Tomaacutes de Aquino que ldquoa alma eacute princiacutepio da sensaccedilatildeo natildeo como aquele

que sente mas como aquilo pelo qual o sentinte senterdquo342

A estimativa e a cogitativa das quais se trataraacute adiante mais a intelecccedilatildeo

tecircm como se disse iniacutecio com o exerciacutecio da funccedilatildeo dos sentidos externos Estes

se caracterizam por sua materialidade Exercem a captaccedilatildeo de formas sensiacuteveis

que satildeo invariavelmente acidentes jamais essecircncias ou seja sem a mateacuteria do

objeto que as imprime por meio de sua mateacuteria de receptores neurais nas

superfiacutecies deacutermicas em conformidade com a disposiccedilatildeo do respectivo oacutergatildeo

responsaacutevel No acircmbito aristoteacutelico-tomista isto se daacute natildeo como accedilatildeo de um

contraacuterio sobre seu correspondente resultando em transformaccedilatildeo ou alteraccedilatildeo mas

reduzindo o sentido da potecircncia ao ato por sua espeacutecie tratando-se de uma

operaccedilatildeo tal como se daacute com o conceber e o querer343 Por exemplo os olhos

captaratildeo a luz que estaraacute a refletir as cores e o formato (sensiacuteveis) de determinado

ente corpoacutereo mas natildeo a essecircncia deste mesmo ente em razatildeo da imaterialidade

de sua forma substancial344 Assim a forma do agente causa uma disposiccedilatildeo por

um lado similar a ele no sentido e por outro natildeo pelo fato de essa disposiccedilatildeo natildeo

ser material como o agente pois no sensiacutevel seu ser eacute natural e no sentido eacute

intencional ou espiritual345

Para Tomaacutes de Aquino o sentido ldquoeacute certa potecircncia passiva submetida por

natureza agrave alteraccedilatildeo proveniente dos objetos sensiacuteveis exterioresrdquo346 pelo que

como se disse entende ldquofaculdade sensitivardquo como aquilo que se sente natildeo em ato

mas em potecircncia347 Essa alteraccedilatildeo tem como requisitos tanto a ausecircncia no oacutergatildeo

342

TOMAacuteS DE AQUINO 2012 Q XIX p 393 343

Id 2000 III l 12 765-766 344

ARISTOacuteTELES 2010 II 12 p 96 TOMAacuteS DE AQUINO 2000 II l 24 551 345

TOMAacuteS DE AQUINO 2000 II l 24 552-553 346

ldquoEl sentido es una cierta potencia pasiva sometida por naturaleza a la alteracioacuten proveniente de los objetos sensibles exterioresrdquo Id 2001 Q 78 a 3 p 716

347 Id 2009 p 63

84

do sentido (salvo no que diz respeito ao tato que percebe os contraacuterios em seu

proacuteprio oacutergatildeo) dos contraacuterios que a ele compete perceber como o fato de o oacutergatildeo

estar em potecircncia para esses contraacuterios348 (e novamente com relaccedilatildeo ao tato eacute

preciso que para isto esteja reduzido a um ponto meacutedio o que faz com que tenha

no homem maior precisatildeo que nos outros animais em razatildeo de sua disposiccedilatildeo para

a alma racional349)350 e ela pode ocorrer de dois modos um fiacutesico e outro espiritual

Sentir portanto eacute uma alteraccedilatildeo que se daacute por afetaccedilatildeo e por moccedilatildeo351

Ademais afirma o Aquinate que ldquoA alteraccedilatildeo fiacutesica daacute-se quando a forma do

que eacute causa da alteraccedilatildeo eacute recebida no objeto alterado segundo seu proacuteprio ser

natural Por exemplo o calor no aquecidordquo E quanto agrave alteraccedilatildeo espiritual ldquodaacute-se

quando a forma do que provoca a alteraccedilatildeo eacute recebida no objeto alterado segundo

seu ser espiritual Por exemplo a forma da cor na pupila a qual natildeo por isso

permanece coloridardquo

O oacutergatildeo recebe pois a espeacutecie natildeo segundo o ser que tem no sensiacutevel e

natildeo em forma fiacutesica mas em forma intencional352 Eis porque a visatildeo eacute o uacutenico

sentido em que ocorre exclusivamente este segundo modo

Nos demais sentidos ocorrem ambos e a alteraccedilatildeo fiacutesica daacute-se por parte do

oacutergatildeo e por parte do objeto Na audiccedilatildeo ocorre por mudanccedila local jaacute que o som eacute

causado por uma percussatildeo e conseguinte vibraccedilatildeo do ar eacute sempre a atividade ldquode

alguma coisa contra alguma coisa e em alguma coisardquo353 Quanto ao olfato eacute

necessaacuteria certa alteraccedilatildeo no corpo para que ocorra a accedilatildeo de cheirar mas em

ambos os oacutergatildeos responsaacuteveis especificamente natildeo apresentam alteraccedilotildees fiacutesicas

salvo acidentalmente

Tomaacutes de Aquino estabelece aqui certa gradaccedilatildeo nos sentidos partindo do

pressuposto de que a visatildeo que eacute exclusivamente ldquoespiritualrdquo estaacute relacionada aos

corpos celestes por sua emissatildeo ou reflexatildeo de luz e que a audiccedilatildeo vem em

seguida sendo esses dois sentidos utilizados para o ensino O odor eacute captado da

substacircncia odorante os objetos da visatildeo e da audiccedilatildeo satildeo captados natildeo

348

ldquoContraacuteriosrdquo em relaccedilatildeo a atributos dos sensiacuteveis como o quente e o frio o aacutespero e o liso etc

349 ARISTOacuteTELES 2010 II 9 p 88

350 TOMAacuteS DE AQUINO 2012 Q VIII p 171

351 Id 2000 II l 10 350

352 Ibid II l 14 418

353 ARISTOacuteTELES 2010 II 8 p 83 TOMAacuteS DE AQUINO 2000 II l 16 441-442

85

diretamente mas por um intermediaacuterio (o ar e a aacutegua) e o paladar existe

intimamente com o tato relacionado aos elementos354

O tato e o paladar ocorrem nos respectivos oacutergatildeos mediante alteraccedilotildees

fiacutesicas locais sendo por isso ambos considerados os sentidos mais materiais355 O

primeiro eacute o mais universal e eis porque diz o Estagirita que eacute primeiramente por

sua causa que um ente eacute identificado como ldquoanimalrdquo356 Pelo fato de nele consistir

principialmente a natureza sensitiva em sua integralidade se for imobilizado

imobilizam-se todos os demais sentidos Os sentidos natildeo cessam somente ldquopelo

excesso dos seus sensiacuteveis proacutepriosrdquo diz o Aquinate mas tambeacutem ldquopelo excesso

dos sensiacuteveis proacuteprios do tatordquo357ndash porque sem ele natildeo pode haver nenhuma outra

sensaccedilatildeo ainda que possa-se dar sem nenhuma outra358 ndash jaacute que a intensidade

elevada da operaccedilatildeo de uma potecircncia tende a impedir a operaccedilatildeo de outra de

algum modo associada359

Assim o sentido pode sofrer corrupccedilatildeo por parte de um sensiacutevel muito

intenso pois o sentido eacute certa proporccedilatildeo que por outro lado obtecircm uma siacutentese

harmoniosa e agradaacutevel quando o sensiacutevel natildeo estaacute mais proacuteximo dos excessos e

ainda mais se se mistura como se observa na muacutesica360 Essa corrupccedilatildeo gera

afliccedilatildeo e pena como a dor em relaccedilatildeo ao tato podendo chegar ao ponto de destruir

a funcionalidade do oacutergatildeo do sentido E sendo o tato o sentido comum a todos os

animais e a base para os demais sentidos eacute o uacutenico em cujo excesso de um

tangiacutevel pode destruir o proacuteprio o animal361

Haveraacute por outro lado deleite como no abrandamento da dor por convir ao

sentido362 e em outras ocasiotildees como aquilo que pode ser proporcionado pelo

toque Da apreensatildeo dos sentidos principalmente o tato seguem o prazer e a dor

e entatildeo a felicidade e a tristeza apoacutes a apreensatildeo interior relacionados agrave

concupiscecircncia Eis o que relaciona o tato ao apetite e que caracteriza os entes

atualizados pela alma com potecircncia sensitiva363

354

TOMAacuteS DE AQUINO 2000 II l 14 417-418 355

ARISTOacuteTELES 2010 II 11 p 94 TOMAacuteS DE AQUINO 2001 Q 78 a 3 p 716 356

ARISTOacuteTELES 2010 II 2 p 65 TOMAacuteS DE AQUINO 2012 Q VIII p 171 357

TOMAacuteS DE AQUINO 2012 Q VIII p 171 358

ARISTOacuteTELES 2010 II 3 p 69 359

TOMAacuteS DE AQUINO 2012 Q XI p 239 360

ARISTOacuteTELES 2010 III 2 p 107 TOMAacuteS DE AQUINO 2000 III l 2 597 Ibidem 2000 III l 17 870

361 ARISTOacuteTELES 2010 III13 p 134

362 TOMAacuteS DE AQUINO 2012 Q XXI p 429-431

363 Id 2000 II l 5 289

86

Os sentidos externos captam seus sensiacuteveis proacuteprios (cor som etc) aos

quais cada sentido relacionado responderaacute conforme sua natureza e os sensiacuteveis

comuns que satildeo ldquoalgo intermediaacuterio entre as realidades sensiacuteveis percebidas

acidentalmente e os sensiacuteveis proacutepriosrdquo comum a todos os sentidos e se reduzem

agrave quantidade cujas espeacutecies satildeo a dimensatildeo e o nuacutemero (quantidade)364 Cada

oacutergatildeo sensorial diz o Estagirita ldquodiscrimina as diferenccedilas do sensiacutevel

correspondenterdquo e exemplifica com a discriminaccedilatildeo do branco e do preto pela visatildeo

e do doce e do amargo pelo paladar365

Com relaccedilatildeo aos sensiacuteveis comuns Aristoacuteteles aponta o movimento o

repouso o nuacutemero a unidade a figura e a grandeza366 sendo que os dois uacuteltimos

podem ser percebidos somente pelo tato e pela visatildeo367 A quantidade por sua vez

eacute ldquoo sujeito proacuteximo da qualidade modificante tal como a superfiacutecie em relaccedilatildeo agrave

corrdquo Por isso ldquoos sensiacuteveis comuns natildeo movem os sentidos de forma direta e

natural senatildeo em razatildeo da qualidade sensiacutevelrdquo mas satildeo ldquorealidades sensiacuteveisrdquo

percebidas diretamente ldquojaacute que estabelecem diversidade na alteraccedilatildeo do

sentidordquo368 Ou seja a percepccedilatildeo dos sensiacuteveis comuns pelos sentidos daacute-se com a

percepccedilatildeo dos sensiacuteveis proacuteprios369 mas aqueles satildeo percebidos porque causam

diferenccedila no sentido em razatildeo do movimento a partir do qual se percebe a

grandeza que permite perceber a figura e tambeacutem a quantidade pode ser percebida

quer pelo movimento pela negaccedilatildeo do contiacutenuo quer pelos sensiacuteveis proacuteprios pois

diz o Estagirita ldquocada sensaccedilatildeo percepciona uma uacutenica coisardquo370

Haacute ainda o sensiacutevel por acidente que eacute aquele que natildeo faz diferenccedila no que

toca agrave sua espeacutecie na imutaccedilatildeo do sentido e isto se daacute com um sensiacutevel proacuteprio de

determinado sentido captado por outro371 como quando se percebe o doce com a

visatildeo372

364

TOMAacuteS DE AQUINO 2012 Q VIII p 171 365

ARISTOacuteTELES 2010 III 2 p 107 366

Ibid II 6 p 79 Ibid III p 102 367

TOMAacuteS DE AQUINO 2000 II l 13 386 368

Id 2012 Q VIII p 171 369

Id 2000 II l 13 388 ARISTOacuteTELES 2010 III 1 p 103 370

ARISTOacuteTELES 2010 III 1 p 103 371

TOMAacuteS DE AQUINO 2000 II l 13 393-394 Ibid III l 1 577 ARISTOacuteTELES 2010 III 1 p 103

372 TOMAacuteS DE AQUINO 2000 III l 1 579-580

87

552 Sentidos internos

Diz Tomaacutes de Aquino

[] eacute necessaacuterio que o animal busque certas coisas e fuja de outras natildeo soacute por que lhe sejam convenientes ou prejudiciais ao sentido mas tambeacutem por certas outras conveniecircncias e utilidades ou prejuiacutezos Por exemplo a ovelha vendo o lobo aproximar-se foge natildeo porque a figura ou a cor do lobo lhe seja repulsiva mas porque o que estaacute vindo eacute um inimigo da sua proacutepria natureza O paacutessaro recolhe a palha natildeo para sentir prazer mas porque eacute uacutetil para a contruccedilatildeo de seu ninho Para fazer isso eacute necessaacuterio que o animal possa perceber essas intenccedilotildees que natildeo percebem os sentidos exteriores Ademais eacute preciso que nele exista um princiacutepio proacuteprio para tal percepccedilatildeo jaacute que a percepccedilatildeo do sensiacutevel proveacutem da alteraccedilatildeo do sentido coisa que natildeo ocorre com a percepccedilatildeo das intenccedilotildees

373

Os sensiacuteveis proacuteprios e os comuns satildeo captados pelos sentidos de duas

maneiras por duas potecircncias374 Primariamente pelos sentidos externos

correspondentes de modo exclusivo aos quais cabe julgar os objetos que lhes satildeo

proacuteprios como por exemplo em relaccedilatildeo agrave visatildeo discriminar fazer a distinccedilatildeo entre

as cores ou os objetos compartilhados e acidentais da mesma forma distinguindo

por exemplo o largo e o estreito como se viu

Em segundo lugar a discriminaccedilatildeo entre o doce e o branco natildeo pode ser feita

por um sentido proacuteprio por oacutergatildeos sensoriais distintos e em tempos diferentes375 e

entatildeo esta tarefa eacute desempenhada pelo primeiro dos sentidos internos ndash ou

potecircncias sensitivas interiores ndash aquele que eacute considerado ldquoraiz e princiacutepiordquo e que

tambeacutem eacute fim como um centro dos sentidos externos e das imutaccedilotildees destes376 ndash

dentre os quais o tato como base de todos os sentidos estaacute mais proacuteximo377 ndash ou

seja onde os resultados de todas elas seratildeo percebidos o sentido comum que

apresentaraacute juiacutezo de discernimento discriminaraacute os sensiacuteveis e faraacute a distinccedilatildeo

373

ldquo[] es necesario que el animal busque unas cosas y huya de otras no soacutelo porque le sean convenientes o perjudiciales al sentido sino tambieacuten por otras conveniencias utilidades o perjuicios Ejemplo La oveja al ver venir el lobo huye no porque la figura o el color del lobo sea repulsiva sino porque el que viene es un enemigo de su propia naturaleza El paacutejaro recoge pajas no para tener un placer sino porque son uacutetiles para la construccioacuten de su nido Para hacer eso es necesario que el animal pueda percibir esas intenciones que no percibe el sentido exterior Ademaacutes es preciso que en eacutel exista un principio propio para dicha percepcioacuten ya que la percepcioacuten de lo sensible proviene de la alteracioacuten del sentido cosa que no ocurre con la percepcioacuten de las intencionesrdquo TOMAacuteS DE AQUINO 2001 Q 78 a 4 p 719

374 O termo ldquopotecircnciardquo aqui tem o sentido de ldquoprinciacutepio motorrdquo

375 ARISTOacuteTELES 2010 III 2 p 107-108

376 TOMAacuteS DE AQUINO 2000 III l 3 609 Ibid l 12 773-774 Id 2001 Q 78 a 4 p 720

377 Ibid 2000 III l 3 602

88

entre eles percebendo as intenccedilotildees dos sentidos (como quando algueacutem vecirc que

vecirc)378

O sentido comum tambeacutem faz o juiacutezo e o discernimento finais dos contraacuterios

captados pelos sentidos proacuteprios379 Os sensiacuteveis seratildeo nele unificados em uma

imagem que seraacute retida e conservada e no caso do homem processada por outro

sentido interno a imaginaccedilatildeo ou fantasia que eacute um movimento produzido pela

atualizaccedilatildeo dos sentidos quando estes vecircm a ato pelo movimento dos sensiacuteveis e

que por isso eacute semelhante aos sentidos e aos sensiacuteveis jaacute que diz Tomaacutes de

Aquino380 o efeito produzido pelo agente que eacute a causa eficiente eacute semelhante a

este mesmo

A imaginaccedilatildeo propiciaraacute aos animais a apreensatildeo das coisas sensiacuteveis

tambeacutem quando elas natildeo estiverem fisicamente presentes o que se daacute pela

formaccedilatildeo na mente da ldquoimagemrdquo (ou ldquofantasmardquo) Aristoacuteteles distingue a imaginaccedilatildeo

que natildeo existe sem a percepccedilatildeo sensorial da suposiccedilatildeo que natildeo existe sem aquela

e cujos tipos que satildeo o do entender ele aponta ldquoa ciecircncia a opiniatildeo a sensatez

(que caracterizam o entender corretamente) e os contraacuterios destas (que

caracterizam o entender incorretamente)rdquo e do pensamento A imaginaccedilatildeo depende

da vontade ao passo que a formaccedilatildeo de opiniatildeo natildeo depende exclusivamente da

vontade podendo ser verdadeira ou falsa assim como a imaginaccedilatildeo sendo que

nesta pode-se produzir falsidade com muito mais frequecircncia e isto se daacute no caso da

imaginaccedilatildeo porque o efeito eacute mais fraco do que a causa e quanto mais ele se

distancia do agente que eacute causa eficiente (como quando a imaginaccedilatildeo ocorre na

ausecircncia dos sentidos) menos ele lhe eacute semelhante381 E porque a imaginaccedilatildeo eacute um

movimento da atualizaccedilatildeo dos sentidos o que entra na imaginaccedilatildeo eacute aquilo que

pode ser sentido mas jamais aquilo que eacute apenas inteligiacutevel382

A imagem eacute requisito necessaacuterio para o entendimento A alma pode perseguir

algo se apoacutes imaginaacute-lo afirma que eacute bom ou nega que seja mau e pode fugir de

algo se apoacutes imaginaacute-lo afirma que eacute mau ou nega que seja bom O ser do desejo

em ato e o ser da fuga em ato satildeo distintos satildeo atos diferentes mas seu princiacutepio

ou seja a faculdade do desejo a da fuga e a perceptiva natildeo satildeo diferentes entre si

378

TOMAacuteS DE AQUINO 2000 II l 13 390 Id 2001 C 78 a 4 p 720 379

Ibid III l 3 613 380

Ibid III l 6 656 e 659 Id 2001 Q 78 a 4 p 719 ARISTOacuteTELES 2010 III 3 p 113 381

ARISTOacuteTELES 2010 III 3 p 110-111 TOMAacuteS DE AQUINO 2000 III l5 638 Ibid l 6 664-665

382 TOMAacuteS DE AQUINO 2000 III l 6 657

89

em seu sujeito senatildeo somente na definiccedilatildeo A distinccedilatildeo e a apreensatildeo dos sentidos

pode gerar por aquelas accedilotildees que propiciam o bem dos sentidos o agradaacutevel que

conveacutem que causa prazer ou o mal que causa repulsa tristeza que natildeo conveacutem

estimulando a fuga respectivamente quando o sentido comum se relaciona como

uma espeacutecie de meio com os sentidos proacuteprios Eis o que move o apetite o desejo

dos quais partem certas accedilotildees383 Santo Tomaacutes divide entatildeo em trecircs graus o

percurso que faz o movimento sensiacutevel ldquoem primeiro lugar os sentidos apreendem

o sensiacutevel como conveniente ou nocivo em segundo lugar segue-se disto o prazer

ou a tristeza e em terceiro lugar por fim segue-se o desejo ou a fugardquo384

Mas a respeito disto o Aquinate aponta pelo modo como expressa

Aristoacuteteles para duas diferenccedilas entre o intelecto e os sentidos A primeira eacute que no

que toca ao intelecto que conhece e pode ser movido por um bem universal ou por

um mal universal da apreensatildeo do bem ou do mal o desejo ou a fuga pode seguir-

se imediatamente enquanto que os sentidos requerem necessariamente o terceiro

elemento ou seja o prazer ou a tristeza porque satildeo movidos por um bem

determinado ou por um mal determinado A segunda eacute que explica diz o Estagirita

simplesmente que o intelecto afirma ou nega enquanto os sentidos o fazem sempre

ldquode alguma maneirardquo385

Assim como as espeacutecies satildeo captadas pelo sentido proacuteprio e pelo sentido

comum e em seguida retidas pela imaginaccedilatildeo ou fantasia as intenccedilotildees que natildeo

satildeo apreendidas pelos sentidos tal como ldquoo nocivo e o uacutetilrdquo386 satildeo captadas pela

estimativa (ou no caso do homem cogitativa) e retidas pela memoacuteria os outros dois

sentidos internos

Explica Muszalski que

[] quando Santo Tomaacutes diz que a estimativa-cogitativa eacute apreensiva das intenccedilotildees particulares natildeo quer dizer tanto que tende a elas como a seu fim mas que a intenccedilatildeo particular equivale a uma forma presente na coisa e que esta faculdade pode apreender essa forma em concreto []

383

ARISTOacuteTELES 2010 III 7 p 120 TOMAacuteS DE AQUINO 2000 III l 12 768 384

ldquo[] en premier le sens saisit le sensible comme convenant ou nocif en second il srsquoensuit de cela plaisir ou tristesse en troisiegraveme par ailleurs il srsquoensuit deacutesir ou fuiterdquo TOMAacuteS DE AQUINO 2000 III l 12 p 768

385 ldquo[] de quelque manieacutererdquo ou seja do modo pelo qual os sentidos apreendem

particularmente determinado objeto Ibid III l 12 771-772 386

Id 2012 Q XIII p 273

90

E quanto agraves intenccedilotildees prossegue ldquotratam-se de aspectos de benefiacutecio e

prejuiacutezo que satildeo sensiacuteveis per accidens com relaccedilatildeo aos sentidos externos []rdquo387

Muszalski aponta ainda que enquanto as formas sensiacuteveis captadas pelos

sentidos externos satildeo beneacuteficas ou nocivas para o respectivo sentido sendo

determinantes para a subsistecircncia do indiviacuteduo as intenccedilotildees satildeo formas que tecircm

como conteuacutedo um valor natildeo para o proacuteprio sentido da estimativa-cogitativa mas

para o indiviacuteduo e inclusive para a espeacutecie sendo por isto determinante para ambos

Eacute nesse processo que eacute acidental de captaccedilatildeo e retenccedilatildeo das intenccedilotildees

das espeacutecies intencionais de conveniecircncia e prejuiacutezo ndash e que confere a noccedilatildeo de

determinado fim e o conhecimento da proporcionalidade entre este e certa atividade

desempenhada para alcanccedilaacute-lo ndash que residem duas diferenccedilas fundamentais entre

o homem e os demais animais no tocante aos sentidos internos Diz Santo Tomaacutes

que ldquoos animais percebem-nas somente por um instinto natural enquanto que o

homem as percebe por uma comparaccedilatildeordquo388 ou juicio collativo (juiacutezo discursivo)

ldquoinvestigando e discorrendordquo389

Assim por reunir ndash e comparar compor e dividir em um discurso ndash as

intenccedilotildees particulares individuais que os demais sentidos natildeo captam e sendo por

isto denominada pelos escolaacutesticos intentiones insensatae a faculdade estimativa eacute

no homem chamada cogitativa ou ldquorazatildeo particularrdquo ou ainda ldquoentendimento

passivordquo ou ldquointelecto passivordquo390 pelo que no homem o ser natural se move ao

apetite sensitivo391 A palavra cogitativa segundo Muszalski392 vem do verbo latino

cogitare que significa ldquopensamentordquo ldquoideiardquo ldquorepresentaccedilatildeordquo como junccedilatildeo entre a

preposiccedilatildeo cum (ldquocomrdquo) e o verbo agitare (ldquoagitarrdquo mover algo forte ou

repetidamente) e este complementa vem de agere (ldquolevarrdquo ldquoconduzirrdquo ldquoguiarrdquo)

concluindo que cogitare eacute um verbo que implica movimento e que pode-se traduzir

387

ldquo[] cuando Santo Tomaacutes dice que la estimativa-cogitativa es apreensiva de las intenciones particulares no quiere decir tanto que tende a ellas como a su fin sino que la intencioacuten particular equivale a una forma presente en la cosa y que esta facultad puede aprehender esa forma en concreto [] las intenciones [] se tratan de aspectos de beneficio y prejuicio que son sensibles per accidens respecto de los sentidos externosrdquo MUSZALSKI 2014 p 88-89

388 ldquo[] los animales las perciben soacutelo por un instinto natural mientras que el hombre las

percibe por una comparacioacutenrdquo TOMAacuteS DE AQUINO 2001 Q 78 a 4 p 719 389

Id 2012 Q XIII p 273 390

Ibid p 273 Id 1990b L II c LX p 273-274 Id 2001 Q 78 a 4 p 718-719 Na Suma Teoloacutegica Tomaacutes de Aquino (1993 Q 51 a 3 p 398) diz que Aristoacuteteles (2010 L 3 p 117) chama ldquoentendimento passivordquo e ldquorazatildeo particularrdquo a potecircncia cogitativa juntamente com a memoacuteria e a imaginaccedilatildeo

391 TOMAacuteS DE AQUINO 2001 Q 81 a 3 p 745

392 MUSZALSKI 2014

91

como lsquomover conjuntamentersquo ou lsquoconduzir junto com outrorsquo393 e entatildeo significa

ldquopensarrdquo como ldquoo movimento da razatildeo em sua busca discursivardquo394

Para a cogitativa e portanto isto natildeo se daria nos animais natildeo humanos a

imaginaccedilatildeo tambeacutem compotildee e divide as formas imaginadas o que Tomaacutes de

Aquino exemplifica com a capacidade de unir-se a imagem do ouro agrave de uma

montanha e entatildeo poder-se imaginar uma montanha de ouro395 Esse exerciacutecio

voluntaacuterio da imaginaccedilatildeo seria o que possibilita ao ente intelectivo a resoluccedilatildeo de

problemas por meio do pensamento

Jaacute a memoacuteria possibilita que o que foi apreendido seja novamente chamado agrave

consideraccedilatildeo atual O Estagirita jaacute reconhecia que ela estaacute presente em animais natildeo

humanos e ainda que ela opere nestes sem investigaccedilatildeo torna alguns mais aptos

ao aprendizado396 Somente no homem ela opera mediante investigaccedilatildeo e estudo o

que se daacute por ele tambeacutem possuir a faculdade da reminiscecircncia a memoacuteria

voluntaacuteria que lhe possibilita analisar silogisticamente as intenccedilotildees do passado

armazenadas397 Observa o Aquinate ainda que ldquoos atos das outras potecircncias

sensitivas se produzem segundo um movimento que vai das coisas para a alma

enquanto o da memoacuteria se efetua ao contraacuterio segundo um movimento que vai da

alma para as coisasrdquo398

E tal como a reminiscecircncia a cogitativa tambeacutem se deve agrave afinidade e agrave

razatildeo universal agrave repercussatildeo desta em ambas399 Assim se caracterizam o ato

daquela o comparar o compor e o dividir o ato da reminiscecircncia eacute fazer uso do

silogismo a fim de indagar400

Enquanto os sentidos em geral captam os acidentes a estimativa em especial

tem como objeto proacuteprio a quididade singular pela materialidade desta ainda que

natildeo a apreenda pela mateacuteria em si por soacute poder ser conhecida por sua analogia com

a forma401

393

ldquo[] cogitare es un verbo que implica movimiento y que puede traducirse como lsquomover conjuntamentersquo o lsquoconducir junto com otrorsquordquo MUSZALSKI 2014 p 80

394 ldquo[] el movimiento de la razoacuten en su buacutesqueda discursivardquo Ibid p 80

395 TOMAacuteS DE AQUINO 2001 Q 78 a 4 p 719-720

396 ARISTOacuteTELES 2005 L I 980a e 980b p 3

397 TOMAacuteS DE AQUINO 2001 Q 78 a4 p 719 Id 2012 Q XIII p 275

398 Id 2012 Q XIII p 275

399 Id 2001 Q 78 a4 p 720

400 Ibid Q 78 a 4 p 718

401 Id 1999 p 97-98

92

Retomando a cogitativa neste sentido Tomaacutes de Aquino diz que ldquocogitarrdquo (ou

ldquopensarrdquo) como ato da faculdade cogitativa eacute

[] propriamente o movimento da mente que delibera quando ainda natildeo chegou agrave perfeiccedilatildeo pela visatildeo plena da verdade Mas esse movimento da mente quando cogita pode versar antes sobre as intenccedilotildees universais caso em que pertence agrave parte intelectiva ou antes sobre representaccedilotildees particulares o que pertence agrave parte sensitiva Daiacute que em um segundo sentido pensar eacute ato da inteligecircncia que indaga e em outro terceiro sentido eacute ato da faculdade cognoscitiva

402

Assim explica Muszalski que quando se diz que a cogitativa eacute acidental isto

se daacute por ela secirc-lo em relaccedilatildeo agrave razatildeo ao tocar nesta enquanto estimativa por seu

modo de operar entre o sensitivo e o intelectivo e entatildeo diz ser apropriado

denominaacute-la ldquoobjeto formal quod acidentalrdquo403

56 INTELECTO

Com o produto final da operaccedilatildeo dos sentidos internos ou seja a imagem ou

fantasma tem iniacutecio o processo intelectivo no homem pelo qual este agora

reconhecendo as intenccedilotildees ou espeacutecies intencionais universais404 sabe ou seja

discrimina discerne (o que pertence ao juiacutezo) e concebe (apreende o que

discerniu)405 discorre e faz suposiccedilotildees ou seja forma concepccedilotildees e juiacutezos406

conhece o verdadeiro e o falso407 Se os sentidos e a imaginaccedilatildeo limitam-se agrave

apreensatildeo dos acidentes externos o intelecto diz o Aquinate ldquopenetra ateacute a

essecircncia das coisasrdquo e pode ser entendido de dois modos quando se apreende as

quididades ou quando se conhece os primeiros princiacutepios diretamente na coisa a

partir do conhecimento da quididade desta (razatildeo pela qual o intelecto eacute tido como o

402

ldquo[] propiamente el movimiento de la mente que delibera cuando todaviacutea no ha llegado a la perfeccioacuten por la visioacuten plena de la verdad Pero ese movimiento de la mente cuando piensa puede versar bien sobre las intenciones universales en cuyo caso pertenece a la parte intelectiva bien sobre representaciones particulares lo cual pertenece a la parte sensitiva De ahiacute que en un segundo sentido pensar es acto de la inteligencia que indaga y en otro tercer sentido es acto de la facultad cognoscitivardquo TOMAacuteS DE AQUINO 1990 Q 2 a 1 p 60

403 MUSZALSKI 2014 p 98

404 TOMAacuteS DE AQUINO 2001 Q 78 a 4 p 719

405 Id 2000 III l 7 672

406 ARISTOacuteTELES 2010 III 4 p 114 TOMAacuteS DE AQUINO 2000 III l 7 683

407 TOMAacuteS DE AQUINO 2000 III l 13 793

93

ldquohaacutebito dos princiacutepiosrdquo) ou ldquoenquanto abarca todas as operaccedilotildees tais como opinar e

raciocinarrdquo408

O homem eacute proporcionalmente dotado com o maior ceacuterebro em relaccedilatildeo agrave sua

quantidade e sendo o uacutenico animal ereto possui a cabeccedila no alto o que segundo o

aristotelismo-tomismo se daacute para maior liberdade de sua operaccedilatildeo principal a

intelecccedilatildeo para a qual o corpo humano se dispotildee409 uma vez que as coisas

inferiores existem em funccedilatildeo das superiores o que permite definir suficientemente

por determinado fim as coisas que existem para este mesmo fim410 E quanto mais

um ente possui a razatildeo de ldquoserrdquo mais elevado eacute o que fica evidente pela razatildeo

entre potecircncia e ato pois como explica Tomaacutes de Aquino411 diz-se propriamente

que ldquoeacuterdquo natildeo o que estaacute em potecircncia mas o que estaacute em ato

Observa Aristoacuteteles que os agentes que produzem o ato da percepccedilatildeo ou

seja os sensiacuteveis que satildeo particulares satildeo externos ao passo que satildeo internos os

universais que de algum modo estatildeo na alma mesma e entatildeo produzem a ciecircncia

Tomaacutes de Aquino acrescenta que ldquoos universais enquanto universais existem

somente na alma As naturezas proacuteprias em contrapartida que assumem a intenccedilatildeo

de universalidade existem nas coisasrdquo412

Em razatildeo disto o entendimento depende da vontade daquele que entende

enquanto a percepccedilatildeo natildeo depende necessariamente413 O Estagirita define

ldquoentendimentordquo como aquilo ldquocom que a alma discorre e faz suposiccedilotildeesrdquo414

Eacute por semelhanccedila que um objeto conhecido se faz presente naquilo que

conhece produzindo entatildeo o conhecimento de modo que assim como haacute

atualizaccedilatildeo dos sentidos pelos sensiacuteveis ndash que entatildeo imprimiratildeo neles certa

semelhanccedila de natureza corporal delimitada pelas dimensotildees caracteriacutesticas da

mateacuteria e que eacute um modo de conhecer ndash assim tambeacutem aquilo que a inteligecircncia

intelige a saber as espeacutecies inteligiacuteveis que procedem da abstraccedilatildeo formal da

mateacuteria produziratildeo nela certa semelhanccedila caracterizando outro modo de conhecer

de conceber onde haacute tal como nos sentidos distinccedilatildeo e apreensatildeo mas aqui agrave luz

408

TOMAacuteS DE AQUINO 1988 a XII p 92-93 409

Id 2012 Q VIII p 171 e 181 410

Id 2006 p 25 411

Ibid p 73 412

ldquo[] les universels en tant quuniversels nexistent que dans lacircme Les natures mecircmes par contre qui revecirctent lintention duniversaliteacute existent dans les chosesrdquo Id 2000 II l 12 380

413 ARISTOacuteTELES 2010 II 5 p 77

414 Ibid III 4 p 114

94

do intelecto com formaccedilatildeo de uma afirmaccedilatildeo ou de uma negaccedilatildeo o que nos

sentidos equivaleria ao surgimento do agradaacutevel ou da tristeza415

O intelecto ou inteligecircncia concebe o que eacute separaacutevel dos sensiacuteveis natildeo

separadamente ou seja a distinccedilatildeo eacute feita porque o separaacutevel pode ser entendido

em si mas natildeo existe sem o objeto do qual eacute racionalmente separado Eacute assim que

o intelecto abstrai os entes matemaacuteticos da mateacuteria sensiacutevel E de modo semelhante

a inteligecircncia abstrai o universal do particular ao conceber a natureza das espeacutecies

sem seus princiacutepios individuantes que compotildeem sua definiccedilatildeo416

Para o aristotelismo-tomismo o intelecto eacute parte da alma417 que

diferentemente dos sentidos ndash que natildeo conhecem a si mesmos nem agraves suas

operaccedilotildees (a visatildeo por exemplo natildeo vecirc que vecirc) ndash conhece a si mesmo e agrave sua

operaccedilatildeo (a intelecccedilatildeo)418 e intelige indefinidamente refletindo inclusive sobre si

mesmo (algo que natildeo se daacute com os sentidos)419 Ademais nada haacute em seu interior

que seja alguma natureza por ele conhecida420 sendo portanto de modo anaacutelogo

aos sentidos (mas enquanto a parte sensitiva recebe as formas nos oacutergatildeos e natildeo

em si mesma a intelectiva recebe em si mesma e natildeo nos oacutergatildeos421) e estaacute em

potecircncia para aquilo que conhece atualizando-se naquilo que pensa no instante em

que pensa422

O intelecto possui uma natureza pela qual estaacute em potecircncia para toda a

natureza sensiacutevel universalmente423 Ele natildeo se corrompe com o excesso de

inteligiacuteveis tambeacutem ao contraacuterio dos sentidos que satildeo corrompidos pelo excesso de

sensiacuteveis como jaacute se disse se entende algo em grau maior natildeo passa a entender

pior o que houver de inferior mas ao contraacuterio entende ainda melhor e conhece

melhor as coisas inferiores agrave medida que conhece as mais elevadas Possui

portanto um grau de impassibilidade muito superior ao dos sentidos424

415

TOMAacuteS DE AQUINO 2000 III l 12 767 416

Ibid III l 12 781 e 784 417

ARISTOacuteTELES 2010 III 4 p 113 418

TOMAacuteS DE AQUINO 2009 p 151 Id 2000 l 24 556 Id 1990b L II c LXVI p 285 419

Id 2009 p 151 Id 2000 l 24 556 420

Pois de outro modo obstruiria o conhecimento das outras naturezas assim como na visatildeo natildeo poderia haver uma cor sem que impedisse a captaccedilatildeo das demais ndash o que parte do entendimento de que o que se encontra no interior haveraacute de impedir ou de obstruir o que se encontra fora (cf ARISTOacuteTELES 2010 III 4 p 114)

421 TOMAacuteS DE AQUINO 2009 p 67

422 Ibid p 63 e 65

423 Id 2000 III l 7 681

424 ARISTOacuteTELES 2010 III 4 p 114-115 TOMAacuteS DE AQUINO 2000 III l 7 687 Tomaacutes

de Aquino 1990b L II c LXVI p 285

95

Segundo o Estagirita o intelecto eacute o lugar das espeacutecies425 o lugar das formas

em potecircncia426 uma taacutebua na qual nada haacute que esteja escrito em ato ainda que de

certa maneira seja os inteligiacuteveis em potecircncia427 A alma intelectual eacute de certa

maneira todas as coisas e isto se daacute porque nela atualizam as formas inteligiacuteveis de

todas as coisas428 as formas comuns e universais diz o Aquinate pelas quais o

entendimento que apreende a forma inteligiacutevel sem a contraccedilatildeo que a forma

substancial sofre ao ser recebida pela mateacuteria prima de modo que aquela esteja no

entendimento ldquosegundo a razatildeo de sua comunidaderdquo429

O intelecto integra duas partes Uma delas eacute o intelecto possiacutevel cuja

doutrina aristoteacutelica o Aquinate define assim ldquoeacute alguma coisa da alma que eacute ato de

um corpo isto poreacutem sem que esse intelecto da alma possua qualquer oacutergatildeo

corporal tal como sucede com as restantes faculdades da almardquo430 E partindo da

definiccedilatildeo de inteligecircncia de Aristoacuteteles de que eacute aquilo com que a alma forma

concepccedilotildees e juiacutezos conclui que o intelecto possiacutevel eacute em um sentido formal o que

cada homem pensa431

Eacute portanto certa forccedila ou potecircncia da alma humana que estando em

potecircncia para todos os inteligiacuteveis432 (e inclusive intelige-se a si mesmo ldquopor uma

forma sua pela qual ele se faz em atordquo433) recebe da outra parte do intelecto (jaacute que

natildeo pode produzir algo o que estaacute em potecircncia para este algo) o intelecto agente a

impressatildeo da imagem que eacute representativa de todas as coisas concretas tal como

os sentidos recebem a impressatildeo das espeacutecies sensiacuteveis dos acidentes (aqui

poreacutem sem a necessidade de um agente tal como se daacute no intelecto)

Enquanto a imaginaccedilatildeo eacute movida pelos sentidos jaacute que uma potecircncia eacute

movida por outra as formas inteligiacuteveis por serem universais natildeo podem ser

425

ARISTOacuteTELES 2010 III 4 p 114 426

Ibid III 4 p 114 427

Ibid III 4 p 116 TOMAacuteS DE AQUINO 2009 p 133 428

TOMAacuteS DE AQUINO 2000 III l 13 789-790 Aristoacuteteles faz uma comparaccedilatildeo com a matildeo que assumiria no homem o papel dos instrumentos observados nos animais para ataque ndash o que eacute exemplificado pela caccedila ndash defesa e abrigo (cf ARISTOacuteTELES 2010 III 8 p 123 TOMAacuteS DE AQUINO 2000 III l 13 790)

429 Id 1949 Q 1 R p 14

430 Id 2009 p 69

431 Id 2000 III l 7 690

432 Potecircncia esta que natildeo eacute essecircncia da alma uma vez que seu ato natildeo eacute essencial

433 TOMAacuteS DE AQUINO 2012 Q X p 343

96

causadas pelas formas da imaginaccedilatildeo que satildeo individuais434 Assim o intelecto

possiacutevel recebe apenas espeacutecies universais

Os fantasmas servem para a alma intelectiva ou discursiva como as

sensaccedilotildees os objetos sensiacuteveis servem para os sentidos435 E tal como os sentidos

satildeo movidos por seus objetos proacuteprios as espeacutecies sensiacuteveis o intelecto possiacutevel

que estaacute diz Tomaacutes de Aquino ldquoem potecircncia para todas as coisas que satildeo

inteligiacuteveis pelo homem seraacute movido pelas espeacutecies inteligiacuteveis seus objetos

proacutepriosrdquo ele ldquodeve ser receptivo dessas mesmas coisasrdquo (e consequentemente

como se disse delas desprovido) de ldquotodas as formas e naturezas sensiacuteveisrdquo e

entatildeo natildeo tem oacutergatildeo corpoacutereo pois ldquoSe tivesse algum oacutergatildeo corpoacutereordquo

complementa ldquoestaria determinado a alguma natureza sensiacutevel assim como a

potecircncia visiva determina-se agrave natureza do olhordquo436

A outra parte integrada eacute o entendimento que assim como a luz faz de

cores em potecircncia cores em ato faz tambeacutem todas as coisas ou seja todos os

inteligiacuteveis apoacutes o entendimento anterior o intelecto possiacutevel tornar-se todas as

coisas437 eacute o intelecto agente um princiacutepio ativo particular que faz com que o ente

humano seja um ente inteligente em ato Eacute nas palavras de Echavarriacutea (2009) ldquoa

lsquoluz natural da mente e eacute o princiacutepio ativo de toda a vida do espiacuterito primeiramente

do entenderrdquo438 que por abstraccedilatildeo da mateacuteria e das condiccedilotildees materiais (os

princiacutepios de individuaccedilatildeo) produziraacute as espeacutecies inteligiacuteveis que natildeo preexistem

na natureza das coisas extraindo-as da imagem ou fantasma439

Assim se o intelecto possiacutevel eacute nas palavras do Aquinate ldquoaquele que eacute

passiacutevel de tornar-se qualquer coisardquo o intelecto agente eacute aquele ldquoque pode fazer

tudordquo440 Diz ele tambeacutem que

[] eacute necessaacuterio que em todo agente haja um princiacutepio formal pelo qual ele opere formalmente porque eacute impossiacutevel que um agente opere formalmente

434

TOMAacuteS DE AQUINO 2012 Q IV p 103 435

ARISTOacuteTELES 2010 III 11 p 130 TOMAacuteS DE AQUINO apud PEREIRA JUNIOR 2006 p 63

436 TOMAacuteS DE AQUINO 2012 Q II ps 59 e 61

437 ARISTOacuteTELES 2010 III 5 p 117

438 ldquo[hellip] es la luz natural de la mente y es el principio activo de toda la vida del espiacuteritu

primeramente del entenderrdquo ECHAVARRIacuteA 2009 p 131 439

A accedilatildeo do intelecto agente imaterial difere da accedilatildeo dos agentes naturais aquele abstrai da mateacuteria enquanto estes imprimem formas na mateacuteria

440 TOMAacuteS DE AQUINO 1988 Art II p 49

97

mediante algo que eacute separado dele segundo o ser [] o intelecto agente estaacute para os fantasmas iluminados assim como a arte para a sua obra

441

O intelecto agente possui quatro propriedades sendo somente a quarta a que

o diferencia do intelecto possiacutevel que eacute superado por aquele nas outras trecircs eacute

separaacutevel eacute impassiacutevel eacute sem mistura ou seja natildeo eacute composto de natureza

corpoacuterea nem estaacute associado a um oacutergatildeo corpoacutereo estaacute em ato por essecircncia

enquanto o intelecto possiacutevel estaacute em potecircncia por essecircncia442

Ao inerirem neste as espeacutecies inteligiacuteveis satildeo individuadas mas os

universais mediante estas poderatildeo vir a ser conhecidos por serem concebidos

apoacutes os princiacutepios individuantes serem abstraiacutedos443 Elas natildeo satildeo o que eacute inteligido

pelo intelecto mas aquilo mediante o que ele intelige salvo reflexivamente ou seja

ldquoenquanto intelige que intelige a si proacuteprio e ao que mais possa inteligirrdquo444 de modo

que a Fiacutesica e a Metafiacutesica versaratildeo sobre elas Tomaacutes de Aquino explica o modo

como o intelecto intelige a si mesmo ldquomediante a espeacutecie inteligiacutevel dos demais

inteligiacuteveis pois por meio do objeto conhece sua operaccedilatildeo e mediante esta vem a

conhecer a si mesmordquo445

Em relaccedilatildeo ao que pertence por si agrave espeacutecie enquanto universal a natureza

desta natildeo pode multiplicar-se por estarem fora de sua razatildeo os princiacutepios

individuantes Assim diz o Aquinate ldquopoderaacute o intelecto captar a espeacutecie para aleacutem

de todas as condiccedilotildees individuantes e assim captar-se-aacute algo uno E pelo mesmo

motivo o intelecto capta a natureza do gecircnerordquo446

Poreacutem se por um lado o intelecto capta o universal eacute indiretamente que ele

conhece o singular

[] mediante certa reflexatildeo na medida em que pelo fato de que apreende seu inteligiacutevel volta-se agrave consideraccedilatildeo de seu proacuteprio ato agrave da espeacutecie inteligiacutevel que eacute princiacutepio de sua operaccedilatildeo e agrave da origem desta mesma espeacutecie Deste modo alcanccedila a consideraccedilatildeo dos fantasmas e dos singulares que lhes correspondem Mas esta reflexatildeo soacute se pode dar mediante o concurso das virtudes cogitativas e imaginativas

441

TOMAacuteS DE AQUINO 2012 Q V p 117 442

Id 2000 III l 10 732-733 443

Id 2012 Q II p 67 444

Ibid Q II p 69 445

Ibid Q III p 89 446

Ibid Q IV p 101

98

Eacute portanto a potecircncia sensitiva que conhece os singulares apoacutes os oacutergatildeos

sensitivos receberem as espeacutecies individuais ou seja o homem conhece os

universais pelo intelecto e os singulares pelos sentidos e entatildeo pelo intelecto por

um ato reflexivo de retorno aos fantasmas jaacute que eacute deles que o intelecto abstrai as

espeacutecies inteligiacuteveis447 O Aquinate fundamenta

[] tudo que pode a virtude inferior pode-o tambeacutem a superior mas natildeo do mesmo modo senatildeo por outro mais elevado Por isso aquelas mesmas coisas que o sentido percebe materialmente e singularmente conhece-as o intelecto imaterialmente e universalmente

448

No entanto

[] natildeo eacute necessaacuterio que aquilo que o intelecto intelige tenha ser separadamente nas coisas da natureza Do mesmo modo tampouco eacute preciso propor a subsistecircncia dos universais fora dos singulares nem a dos matemaacuteticos fora das coisas sensiacuteveis uma vez que os universais satildeo as essecircncias dos proacuteprios particulares e os matemaacuteticos satildeo as delimitaccedilotildees dos corpos sensiacuteveis

449

O intelecto ou razatildeo universal assim move e dirige a cogitativa ou razatildeo

particular para que realize sua comparaccedilatildeo entre as intenccedilotildees particulares

viabilizando as conclusotildees particulares a partir de proposiccedilotildees universais do

raciociacutenio silogiacutestico450 Ele natildeo pode jamais conceber uma forma sem que conceba

a mateacuteria da qual depende a concepccedilatildeo dessa forma ainda que possa conceber

uma forma sem seus princiacutepios individuantes jaacute que seu objeto apropriado eacute a

quididade das coisas sensiacuteveis ainda que de um modo diferente daquele em que

elas estatildeo nas coisas sensiacuteveis mas sem que se produza falsidade na

inteligecircncia451 Enquanto as espeacutecies inteligiacuteveis satildeo aquilo pelo qual o intelecto

conhece a semelhanccedila da coisa na alma a quididade eacute aquilo que eacute conhecido452

Assim como satildeo uma soacute coisa o sensiacutevel em ato e o sentido em ato tambeacutem eacute uma

soacute coisa o intelecto em ato e o que eacute conhecido em ato453

447

TOMAacuteS DE AQUINO 2006 p 165 Id 2000 II l 5 284 Ibid II l 12 377 Ibid III l 7 675-676 Ibid III l 8 712-713

448 Id 2012 Q XX p 417

449 Id 2006 p 19

450 Id 2001 Q 81 a 3 p 745

451 Id 2000 III l 8 717

452 Ibid III l 8 718-719

453 Ibid III l 9 724

99

O intelecto em ato possui trecircs propriedades a de que a ciecircncia em ato eacute a

mesma coisa que a coisa conhecida a de que a ciecircncia em potecircncia eacute anterior agrave

ciecircncia em ato no tempo (quando no acircmbito singular a potecircncia eacute anterior ao ato) em

um mesmo sujeito mas natildeo anterior universalmente em relaccedilatildeo natildeo soacute agrave natureza

(quando o ato eacute anterior agrave potecircncia) como tambeacutem ao tempo e a de que estar em

ato implica aqui necessariamente conceber e entatildeo ele difere dos intelectos

possiacutevel e agente que podem conceber ou natildeo conceber454

E explica o Aquinate que como ldquoo sentido e o sensiacutevel em potecircncia satildeo

diferentes mas o sentido e o sensiacutevel em ato satildeo uma e a mesma coisardquo tambeacutem

assim ldquoo intelecto ou a ciecircncia em ato satildeo o mesmo que a coisa conhecida em

atordquo ao que pode-se agregar o que diz Aristoacuteteles ldquoNo caso das coisas imateriais

o que entende e o que eacute entendido satildeo o mesmo pois a ciecircncia teoreacutetica e o objeto

cientificamente cognosciacutevel satildeo o mesmordquo455 Tomaacutes de Aquino prossegue

[] o intelecto possiacutevel estaacute em potecircncia com respeito aos inteligiacuteveis segundo o ser que estes tecircm nos fantasmas E eacute segundo o mesmo ser que os inteligiacuteveis tecircm nos fantasmas que o intelecto agente estaacute em ato com respeito a eles mas um por uma razatildeo e outro por outra razatildeo

456

Mesmo quando natildeo haacute intelecccedilatildeo em ato as espeacutecies inteligiacuteveis que o ente

adquire em vida poderatildeo residir no intelecto possiacutevel Isto se daacute pelo intelecto in

habito que se manifesta quando as espeacutecies inteligiacuteveis encontram-se entre a

potecircncia e o ato no intelecto o que permite que o homem intelija em ato sempre que

desejar457 Assim o intelecto in habito eacute efeito do intelecto agente e se encontra

necessariamente no intelecto possiacutevel458 O primeiro ato do intelecto possiacutevel eacute

pois o haacutebito da ciecircncia (haacutebito permanente diga-se) que estaacute em parte no

intelecto e em parte nas virtudes sensitivas459 e de posse deste apoacutes aprender ou

encontrar o intelecto pode passar para o segundo ato que eacute o da operaccedilatildeo ao

mesmo tempo em que se manteacutem em potecircncia para a consideraccedilatildeo em ato de algo

podendo entatildeo conceber qualquer coisa inclusive a si mesmo460 pois o objeto da

454

TOMAacuteS DE AQUINO 2000 III l 10 740 455

ARISTOacuteTELES 2010 4 III p 116 456

TOMAacuteS DE AQUINO 2012 Q V p 119-121 457

Ibid Q XV p 323 458

Id 1990b L II c LX p 276 459

Id 2001 Q 89 a 5 p 806 460

Id 2009 p 133 Id 2000 III l 8 700 703-704

100

ciecircncia especulativa que pode ser conhecido e a ciecircncia especulativa em si tambeacutem

satildeo a mesma coisa461

Explica o Aquinate462 que a intelecccedilatildeo seraacute sempre ou praacutetica ou

especulativa e de um ou outro modo teraacute sempre iniacutecio e fim A inteligecircncia praacutetica

ou entendimento praacutetico ou entendimento operativo eacute relacionada agrave accedilatildeo que

considera algo falso ou verdadeiro em relaccedilatildeo a um operaacutevel particular ldquojaacute que a

accedilatildeo se executa nas situaccedilotildees particularesrdquo463 Quanto agrave inteligecircncia especulativa

ou entendimento especulativo considera somente o objeto da especulaccedilatildeo natildeo do

que eacute factiacutevel segundo um ato singular mas somente universalmente e portanto

natildeo move porque natildeo faz fugir ou buscar natildeo move o apetite mas eacute movida de

certo modo pelas coisas porque recebe delas que constituem assim sua medida

Ambas as inteligecircncias satildeo uma mesma potecircncia diferindo portanto quanto ao fim

Diz entatildeo Tomaacutes de Aquino

[] as coisas da natureza satildeo ao mesmo tempo comensurantes e comensuradas Ao contraacuterio a nossa inteligecircncia eacute comensurada eacute tambeacutem comensurante natildeo poreacutem em relaccedilatildeo agraves coisas criadas mas em relaccedilatildeo aos produtos do engenho humano

464

O que move o ente eacute portanto aquilo que desperta a faculdade apetitiva que

leva o ente a retornar ao objeto que serviu de motor inicial para o processo cognitivo

naquele com relaccedilatildeo a este465 Sobre este movimento Aristoacuteteles aponta que satildeo

inuacutemeras as partes da alma que participam dele a parte que raciocina a impulsiva

a apetitiva (que tambeacutem podem ser classificadas como racionais ou irracionais) a

nutritiva a perceptiva (que natildeo eacute facilmente classificaacutevel como racional ou

irracional) a imaginativa a desiderativa sendo que a parte apetitiva e a parte

impulsiva diferem entre si menos do que as demais o fazem entre si466

Segue-se portanto que

Existem entatildeo trecircs coisas uma o que move a segunda aquilo com que move e ainda uma terceira o que eacute movido Por seu turno o que move eacute duplo existe assim o que natildeo se move e o que move e eacute movido O que natildeo se move eacute o bem realizaacutevel atraveacutes da accedilatildeo jaacute o que move e eacute movido eacute a faculdade desiderativa E que o que eacute movido eacute movido em virtude de

461

TOMAacuteS DE AQUINO 2000 III l 9 724 462

Ibid I l8 119 Ibid III l 12 779-780 Ibid III l 14 813 Id 2001 Q 79 a 11 p 737 463

ldquo[] lrsquoaction srsquoexeacutecute dans les situations particuliegraveresrdquo Id 2000 III l 12 780 464

Id 1988 Art II p 48 465

Ibid Art II p 47 466

ARISTOacuteTELES 2010 III 9 p124-125 Ibid III 10 p 128

101

desejar e o desejo em actividade eacute um tipo de movimento O que eacute movido por sua vez eacute o animal

467

Em uacuteltima anaacutelise o que move e sem mover-se quando entendido e quando

imaginado eacute o objeto do desejo pela faculdade desiderativa pelo desejo mesmo

cujo objeto diz o Filoacutesofo eacute ldquoo princiacutepio do entendimento praacutetico enquanto o termo

final do raciociacutenio eacute entatildeo o princiacutepio da accedilatildeordquo e assim pela inteligecircncia praacutetica

pelo pensamento discursivo praacutetico que move porque tem como princiacutepio o objeto

do desejo e pela imaginaccedilatildeo que eacute racional ou perceptiva e sem a qual a

faculdade desiderativa natildeo pode existir que soacute move com o desejo inclusive nos

animais sem raciociacutenio E a faculdade desiderativa move nas ocasiotildees em que haacute

somente apetite e nas em que o apetite e o raciociacutenio mesmo quando um contraria

o outro como quando pelo entendimento sabemos que devemos negar um apetite

que visa a um prazer imediato em razatildeo de consequecircncias posteriores468

Quanto agrave faculdade de deliberar a razatildeo deliberativa que eacute princiacutepio motor

somente no homem um desejo pode sobrepor-se a ela e movecirc-la assim como um

desejo tambeacutem pode sobrepor-se a outro desejo e movecirc-lo ou ser movido tambeacutem

pela sobreposiccedilatildeo daquela Jaacute a faculdade cientiacutefica (a razatildeo especulativa) natildeo se

move pois natildeo leva a fugir ou a desejar Assim diz o Estagirita relacionados ao

universal existem uma suposiccedilatildeo e um enunciado e relacionado ao particular existe

uma suposiccedilatildeo Ele exemplifica ldquoA primeira diz que certo tipo de homem tem de

praticar um acto de certa natureza o segundo diz que este eacute um acto daquela

natureza e que eu sou um homem daquele tipordquo e em seguida conclui ldquoEacute esta

uacuteltima opiniatildeo a que move e natildeo a respeitante ao universal Ou talvez ambas

movam mas a primeira permanecendo preferencialmente em repouso e a

segunda natildeordquo469

O animal racional examina primeiramente as coisas por fazer a fim de medir

qual seraacute preferencial ou quais o seratildeo e entatildeo opta pela que lhe proporcionaraacute

mais bens ou pelas que lhes proporcionaratildeo isto pelo que manifestaraacute desejo Por

essa escolha do melhor haacute pois como aponta Tomaacutes de Aquino trecircs objetos

atuantes trecircs fantasmas que seratildeo convertidos em um soacute dois elementos em que

467

ARISTOacuteTELES 2010 III 10 p 128 468

Ibid III 10 p 127-129 469

Ibid III 11 p 129-131

102

um seraacute preferiacutevel ao outro e uma medida que seraacute aquilo que torna um deles

preferiacutevel que eacute a opiniatildeo470

O fim da intelecccedilatildeo especulativa seraacute sempre as obras da razatildeo que satildeo a

definiccedilatildeo referente agrave intelecccedilatildeo simples e a demonstraccedilatildeo471 que compotildeem as trecircs

operaccedilotildees que se desdobram do intelecto in habito

a) A primeira consiste na apreensatildeo na simples captaccedilatildeo dos aspectos

inteligiacuteveis nas coisas eacute a intelecccedilatildeo propriamente dita na qual ocorre a

conceituaccedilatildeo e a definiccedilatildeo que tem o ldquogecircnero generaliacutessimordquo como

princiacutepio e a ldquoespeacutecie especialiacutessimardquo472 como termo473

b) A segunda eacute o juiacutezo que possibilita melhor conhecimento da realidade

onde ocorrem composiccedilatildeo e divisatildeo dos aspectos inteligiacuteveis

c) A terceira eacute o raciociacutenio propriamente dito que eacute desdobramento da

anterior

O iniacutecio das operaccedilotildees tem como base a apreensatildeo simples (aprehensio

simplex) do intelecto e caracteriza-se pela concepccedilatildeo das essecircncias indivisiacuteveis ou

outras incomplexas nas quais natildeo haacute distinccedilatildeo entre verdadeiro e falso que estatildeo

separadas entre si e entatildeo satildeo compostas para formar conceitos e a partir destes

mais conceitos Eacute a primeira inteligecircncia Diz Tomaacutes de Aquino que

[] a primeira coisa que a inteligecircncia concebe como a mais conhecida e agrave qual se reduz tudo eacute o ente [] todos os outros conceitos da inteligecircncia se obtecircm por adjunccedilatildeo ao ente Ora ao ente natildeo se pode acrescentar algo agrave maneira de uma natureza estranha assim como por exemplo a diferenccedila especiacutefica se acrescenta ao gecircnero ou o acidente ao sujeito uma vez que toda natureza eacute essencialmente um ente

474

E explica que o que se pode acrescentar ao ente eacute somente o que expressa

um modo seu determinado seja ldquoquando o modo expresso constitui certo modo

especial do enterdquo por suas peculiaridades seja ldquoquando o modo expresso compete a

cada ser de maneira geralrdquo enquanto ldquoconveacutem a todo ente considerado em si

mesmordquo (o que ldquosignifica que o modo exprime no ente algo de maneira afirmativa ou

470

TOMAacuteS DE AQUINO 2000 III l 16 840 471

Ibid I l 8 119 472

Respectivamente ldquogenre geacuteneacuteralissimerdquo e ldquoespeacutece speacutecialissimerdquo 473

TOMAacuteS DE AQUINO 2000 I l 8 121 474

Id 1988 Art I p 41

103

negativardquo respectivamente coisa ndash ou seja a quididade ou a entidade do ente ndash e

indivisatildeo que eacute o ldquounordquo) ou ldquoenquanto conveacutem a todo ente em relaccedilatildeo a outrordquo ou

ldquoconforme a divisatildeo ou distinccedilatildeo de uma coisa da outra (o ente eacute algo que se

distingue de outro ente)rdquo ou ldquosegundo a concordacircncia de um ente com outrordquo (como

se daacute com a proacutepria alma como se viu que eacute dita de certo modo ser tudo)475

Com relaccedilatildeo ao julgamento ou juiacutezo pode-se fazer aqui certa comparaccedilatildeo

com o sentido comum pois assim como este como uma faculdade eacute o termo de

vaacuterios objetos sendo algo uacutenico que pode julgar todos os sensiacuteveis o intelecto

tambeacutem eacute o termo das imagens e algo uacutenico que pode julgar todas elas476

Quando forma a quidade das coisas que existem fora do espiacuterito o intelecto

possui apenas a imagem destas mas quando elabora juiacutezos sobre elas estes satildeo

algo que natildeo estatildeo no objeto mas pertencem somente ao intelecto que assim

desempenharaacute as atividades sintetizante e analisante e entatildeo a formulaccedilatildeo de

definiccedilotildees477

Estas diz o Estagirita podem ser um princiacutepio ou uma conclusatildeo de uma

demonstraccedilatildeo ou uma demonstraccedilatildeo que difere pela ordem pela posiccedilatildeo dos

termos do princiacutepio e da conclusatildeo mas sem que caracterize um raciociacutenio478 Na

definiccedilatildeo o ente toma o nome primeiramente a partir da substacircncia de maneira

absoluta e de maneira relativa e de certo modo dos acidentes479

A composiccedilatildeo que se desenrola de conceitos de pensamentos que resultaraacute

em uma unidade ou seja que os teraacute como uma coisa soacute pode incluir conceitos

atuais e conceitos passados e futuros e nela pode ocorrer falsificaccedilatildeo Tomaacutes de

Aquino explica que se se pode afirmar esses conceitos tambeacutem eacute possiacutevel negaacute-los

e portanto o que resulta e que pode relacionar-se ao presente ao passado e ao

futuro pode tambeacutem obter-se por divisatildeo como verdadeiro ou falso Assim a

composiccedilatildeo das proposiccedilotildees apoacutes a constituiccedilatildeo dos inteligiacuteveis natildeo pode ser obra

da natureza mas da razatildeo e da inteligecircncia Essa composiccedilatildeo e essa divisatildeo

ocorrem nos divisiacuteveis em que haacute verdadeiro e falso e natildeo nos indivisiacuteveis480 uma

vez que natildeo existe ali o falso

475

TOMAacuteS DE AQUINO 1988 Art I p 42 476

Id 2000 III l 12 775 477

Id 1988 Art III p 50-51 478

ARISTOacuteTELES 1995b I 8 75b p 333-334 TOMAacuteS DE AQUINO 2000 II l 1 212 479

TOMAacuteS DE AQUINO 2003 p 55 480

Aristoacuteteles e Tomaacutes de Aquino explicam os indivisiacuteveis apresentando alguns modos como o que eacute quanto agrave continuidade quantitativamente sendo entatildeo indivisiacutevel em ato ainda que natildeo o

104

Com base nesse processo haacute duas formas de conhecer-se algo a partir de

outro algo e segundo o Aquinate somente o segundo eacute que cria o discurso O

primeiro daacute-se

[] conhecendo-se uma coisa conhecida a partir de outra coisa conhecida de maneira que seja distinto o conhecimento de ambas como quando o homem conhece as conclusotildees a partir dos princiacutepios considerando a ambos separadamente

Jaacute o segundo daacute-se ldquoconhecendo-se uma coisa conhecida a partir da espeacutecie

pela qual eacute conhecida como quando vemos uma pedra pela proacutepria espeacutecie da

pedra que estaacute em nosso olhordquo

E a enunciaccedilatildeo explica o mesmo Tomaacutes de Aquino ldquoeacute a expressatildeo do

conhecimento da inteligecircnciardquo481 e tem por objeto e que eacute o objeto das ciecircncias as

coisas em si Ou seja o intelecto possiacutevel natildeo pensa as espeacutecies mas por elas as

coisas482 Diz tambeacutem o Aquinate que a ciecircncia eacute anterior ao pensamento que estaacute

para ele como a potecircncia estaacute para o ato483 Os fantasmas natildeo se formam somente

pela recepccedilatildeo direta dos sentidos mas tambeacutem indireta ou seja sempre que se

especula em ato ocasiatildeo em que mantecircm sua semelhanccedila com as coisas sensiacuteveis

previamente conhecidas na medida em que estas participam do ente e por isso ateacute

o raciociacutenio pode comprometer-se se houver lesatildeo no oacutergatildeo da fantasia484

seja em potecircncia como o satildeo os contiacutenuos temporal e espacial Neste caso o ato que entende e o objeto entendido satildeo divisiacuteveis por acidente

Um outro tipo eacute caracterizado pelo fato de que algo pode ser indivisiacutevel tambeacutem quanto agrave espeacutecie e pode tambeacutem referir-se a uma espeacutecie uacutenica composta por partes natildeo contiacutenuas que o intelecto concebe tambeacutem acidentalmente pois nessas mesmas partes algo haacute de indivisiacutevel que eacute a espeacutecie de cada uma delas conhecidas pelo intelecto conhecendo assim em um tempo indivisiacutevel o que natildeo se daria se conhecesse somente as partes enquanto divididas O indivisiacutevel do contiacutenuo eacute o mesmo em qualquer parte mas aquele em espeacutecie natildeo eacute o mesmo em tudo o que tem espeacutecie pois haacute o que eacute composto por partes homogecircneas e haacute o que o eacute por partes heterogecircneas

Outro modo de indivisiacutevel eacute aquele que o eacute absolutamente ou seja indivisiacutevel em potecircncia e ato que se mostra agrave inteligecircncia como privaccedilatildeo do contiacutenuo e do divisiacutevel como o ponto o momento e a unidade Em outras palavras o entendimento daacute-se por privaccedilatildeo o objeto eacute conhecido tambeacutem pelo seu contraacuterio tanto em uma afirmaccedilatildeo como em uma negaccedilatildeo Como o que vem dos sentidos eacute o que eacute primeiro apreendido pelo intelecto o que ultrapassa o que natildeo eacute sentido eacute conhecido por negaccedilatildeo E de um modo semelhante se passa com aquilo que eacute conhecido por seu contraacuterio ou oposto e este se relaciona com aquele sempre como privaccedilatildeo ou ao menos como imperfeiccedilatildeo isto desde que o intelecto esteja em potecircncia para conhecer ambas as espeacutecies que satildeo entre si contraacuterias (cf ARISTOacuteTELES 2010 III 6 p 117-119 TOMAacuteS DE AQUINO 2000 III l 11 746-756)

Tomaacutes de Aquino diz ainda que os fantasmas seriam indivisiacuteveis somente em potecircncia mas natildeo em ato por sua semelhanccedila com os objetos particulares mas natildeo menciona se estaria apontando para um quarto modo (cf TOMAacuteS DE AQUINO 2000 III l 13 794)

481 TOMAacuteS DE AQUINO 1988 Art X p 88

482 Id 2009 p 151

483 Id 2000 II l 1 228

484 Ibid III l 13 791-792 Id 1988 Art I p 44

105

Explica o Pe Calderoacuten que o raciociacutenio como a terceira operaccedilatildeo do

intelecto pressupotildee a segunda operaccedilatildeo o juiacutezo ndash que tambeacutem pressupotildee a

primeira a simples apreensatildeo ndash sem confundir-se com ela e tomando-a como

elemento de sua estrutura mental assim como o juiacutezo pressupotildee a primeira a

simples apreensatildeo

Assim ele define o raciociacutenio

[] a operaccedilatildeo do intelecto pela qual se explica ou se desenvolve um juiacutezo manifestando o porquecirc ou a causa eacute uma nova espeacutecie de operaccedilatildeo do espiacuterito mais complexa que o juiacutezo composta por uma sequecircncia especial ou uma conexatildeo especial de juiacutezos eacute como um movimento de juiacutezos que termina em um juiacutezo de condiccedilatildeo especial ao qual se chama Conclusatildeo O juiacutezo comum significa uma simples atribuiccedilatildeo do predicado ao sujeito O sujeito eacute de tal predicado Em contrapartida no juiacutezo que eacute conclusatildeo de um raciociacutenio a atribuiccedilatildeo do predicado ao sujeito eacute uma atribuiccedilatildeo iluminada pela causa O sujeito eacute-por-tal-causa de tal predicado Por isso devemos distinguir a operaccedilatildeo do espiacuterito pela qual se compotildee ou divide desta outra pela qual se explica ou conclui

485

Tomaacutes de Aquino explica que a razatildeo e o entendimento no homem satildeo uma

mesma potecircncia mas distingue seus atos ldquo[] entender consiste na simples

apreensatildeo da verdade inteligiacutevel Em contrapartida raciocinar eacute passar de um

conceito a outro para conhecer a verdade inteligiacutevelrdquo486

E o mesmo Pe Calderoacuten fornece-nos o que nos resta para completar o que

aqui tiacutenhamos de expor sobre o intelecto e mais especificamente sobre esta terceira

operaccedilatildeo cuja obra imaterial segundo o aristotelismo-tomismo diz eacute a

argumentaccedilatildeo (argumentatio) caracterizada por uma ldquotriangulaccedilatildeordquo mental ldquoentre o

Sujeito a Propriedade e a Causardquo487

O juiacutezo incorpora os conceitos de simples apreensatildeo ao modo da mateacuteria sob uma nova forma Mas o raciociacutenio eacute como um movimento por isso natildeo dizemos que os juiacutezos que o compotildeem sejam ao modo de mateacuteria mas antes ao modo de extremos os que explicam a causa satildeo o lsquoantecedentersquo e a conclusatildeo eacute o lsquoconsequentersquo[] O raciociacutenio pode cumprir uma dupla

485

ldquo[] la operacioacuten del intelecto por la que se explica o desplega un juicio manifestando el porqueacute o la causa [] es una nueva especie de operacioacuten del espiacuteritu maacutes compleja que el juicio compuesta por una especial secuencia o conexioacuten de juiacutecios [] es como un movimiento de juicios que termina en un juicio de condicioacuten especial al que se lo llama Conclusioacuten [] El juicio comuacuten significa una simple atribuicioacuten del predicado al sujeto El sujeto es de tal predicado En cambio en el juicio que es conclusioacuten de un razonamiento la atribuicioacuten del predicado al sujeto es una atribucioacuten ilumiada por la causa El sujeto es-por-tal-causa de tal predicado Por eso debemos distinguir la operacioacuten del espiacuteritu por la que se compone o divide de esta otra por la que se explica o concluyerdquo CALDEROacuteN 2011 p 74-75

486 ldquo[] entender consiste en la simple aprehensioacuten de la verdad inteligible En cambio

raciocinar es pasar de un concepto a otro para conocer la verdad inteligiblerdquo TOMAacuteS DE AQUINO 2001 Q 79 a 8 p 732

487 ldquo[] el Sujeto la Propiedad y la Causa []rdquo CALDEROacuteN 2011 p 75

106

funccedilatildeo Demonstrar uma verdade conhecida [] Descobrir uma verdade conhecida []

488

Destrinccedilada a doutrina aristoteacutelico-tomista sobre os processos cognitivos no

acircmbito fiacutesico e metafiacutesico sob a oacuteptica dessa corrente havemos de destacar agora

os resultados de alguns dos principais estudos que apontam caracteriacutesticas nos

animais natildeo humanos em que se verifica a presenccedila de consciecircncia e de

inteligecircncia segundo as definiccedilotildees utilizadas nas uacuteltimas deacutecadas para que sejam

posteriormente discutidas a partir de um esquema de distinccedilatildeo entre as potecircncias

estimativa cogitativa e intelectiva

488

ldquoEl jucio incorpora los conceptos de simple aprehensioacuten a manera de materia bajo una nueva forma Pero el razonamiento es como un movimiento por eso no decimos que los jucios que lo componen sean a modo de materia sino maacutes bien a modo de exemos los que explican la causa son el lsquoantecedentersquo y la conclusioacuten es el lsquoconsecuentersquordquo CALDEROacuteN 2011 p 75

107

6 INVESTIGACcedilAtildeO SOBRE A ATRIBUICcedilAtildeO DE INTELIGEcircNCIA AOS ANIMAIS

A palavra ldquointeligecircnciardquo eacute atribuiacuteda hoje em dia a uma gama de entes

inclusive em casos curiosos como o de Physarum polycephalum do reino Protista

um protozoaacuterio que segundo Nakagaki e colaboradores489 expande seu plasmoacutedio

em redes tubulares seguindo padrotildees que otimizam o forrageamento Van Loon490

afirma que as plantas apresentam como que de algum modo correspondendo ao

sistema nervoso animal uma rede de ceacutelulas que satildeo as mais complexas dentre os

viventes da qual emergiriam propriedades que diz serem inteligentes e que

implicam algum tipo de memoacuteria e de aprendizagem relacionadas ao modo tambeacutem

otimizado de lidar com situaccedilotildees de estresse revividas seja de natureza climaacutetica

predatoacuteria etc

No entanto somente os entes do reino Animalia apresentam uma estrutura

neural que lhes permite realizar operaccedilotildees cognitivas mais avanccediladas Assim nesta

etapa mencionaremos e descreveremos algumas pesquisas desenvolvidas com

alguns desses entes (ver tabelas 2-7) a fim de que possamos reunir um material que

nos forneccedila subsiacutedio para o cumprimento dos objetivos deste trabalho

Pesquisas como as de Dyer491 as de Menzel e colaboradores492 e as de

Collett e colaboradores493 demonstram que himenoacutepteros podem memorizar uma

miriacuteade de marcos de referecircncia espacial que satildeo calculados de diferentes modos e

servem de orientaccedilatildeo para o retorno agrave colmeia depois de percorridas longas

distacircncias em busca de alimento e tambeacutem posteriormente ao local visitado O

percurso pode ser feito ateacute por atalhos o que parece implicar a tomada de decisatildeo

(ldquodecision-makingrdquo) e inclusive por trilha de feromocircnios Collett e Graham494

demonstram que os indiviacuteduos mais novos podem aprender rotas seguindo outros

coespeciacuteficos

Em uma revisatildeo Brown495 aponta nos peixes essas caracteriacutesticas e relata

tambeacutem que eles apresentam relaccedilotildees de cooperaccedilatildeo entre si (por exemplo na

489

NAKAGAKI et al 2004 490

VAN LOON 2016 491

DYER 1994 492

MENZEL et al 2005 493

COLLETT et al 2013 494

COLLETT GRAHAM 2015 495

BROWN 2015

108

vigilacircncia contra predadores) reconciliam-se usam ferramentas (como pedras para

quebrar conchas de mariscos) etc

Os cefaloacutepodes tambeacutem apresentam caracteriacutesticas cognitivas marcantes

Mather e Dickel496 descrevem em uma revisatildeo a complexa estrutura neural desses

animais e apontam habilidades como a de discriminar ameaccedilas e avaliar e

categorizar os riscos que representam a de modificar e combinar reaccedilotildees para lidar

com predadores a de resolver testes cognitivos passando objetos por furos a

mudanccedila sofisticada de cor na epiderme para camuflagem e como meio de atraccedilatildeo

da fecircmea a transferecircncia de objetos para servirem de abrigo etc que mostram que

tecircm flexibilidade para diversificar accedilotildees que visem a determinado fim o que sugere

que possuam imaginaccedilatildeo capacidade desenvolvida de tomada de decisatildeo e algum

senso de causalidade e prospecccedilatildeo

Fiorito e colaboradores497 realizaram um conhecido experimento em que um

polvo (Octopus vulgaris) abria a tampa de um frasco para capturar uma presa dentro

deste o que aprendeu por tentativa e erro ou por associaccedilotildees de estiacutemulo e

resposta Em outro teste Fiorito e Scotto498 ensinaram alguns espeacutecimes a

escolherem bolas vermelhas como recompensa e a rejeitarem bolas azuis para

natildeo sofrerem puniccedilatildeo enquanto outros espeacutecimes observavam Quando aqueles

aprenderam a escolher a bola vermelha em todas as tentativas esses observadores

foram em seguida tambeacutem testados e escolheram majoritariamente as bolas

vermelhas Os pesquisadores concluiacuteram que os resultados sugerem que esses

indiviacuteduos aprenderam por observaccedilatildeo

Mather e Byrne e colaboradores499 apontam para a lateralizaccedilatildeo assimeacutetrica

nesses animais (movimentam os olhos independentemente um do outro tendo por

preferecircncia a visatildeo monocular) muito rara em invertebrados e comum nos

mamiacuteferos e nas aves

Quanto a estas apresentam desempenho muito proacuteximo ao dos mamiacuteferos

natildeo humanos Os pombos assim como os ratos foram utilizados largamente em

testes cognitivos como nas famosas pesquisas de Skinner Estudos mais recentes

496

MATHER DICKEL 2017 497

FIORITO VON PLANTA SCOTTO 1990 498

FIORITO SCOTTO 1992 499

MATHER 2008 BYRNE et al 2002

109

como os de Bouchard e colaboradores500 exemplificam as habilidades de Columba

livia como o comportamento inovador e a aprendizagem social501

O uso de instrumentos tambeacutem eacute observado em muitas aves como o

tentilhatildeo pica-pau (Camarhynchus pallidus) que utiliza gravetos ou espinhos de

cactos com grande frequecircncia para retirar larvas de troncos por pequenos

orifiacutecios502 Tebbich e Bshary503 testaram espeacutecimes que conseguiram retirar larvas

de tubos com gravetos mesmo quando foi necessaacuterio antes remover outro objeto em

forma de ldquoHrdquo que dificultava a tarefa

Roelofs504 descreve tambeacutem em uma revisatildeo uma gama de outros usos de

instrumentos como o de pedras por certas aves de rapina como o abutre-do-egito

(Neophron percnopterus) com o fim de quebrar ovos e abater presas o de presas

como esponjas para levar aacutegua para a prole observado em melro-preto cervejeiro

(Euphagus cyanocephalus) ou fazendo-o com musgos como a cegonha (Ciconia

ciconia) o de pedaccedilos de patildees insetos gravetos etc lanccedilados na aacutegua para atrair

peixes como presas como o fazem os socoacutes-mirins (Butorides sp) o que tambeacutem jaacute

foi observado em outras espeacutecies como o martim-pescador (Ceryle rudis) o

milhafre-preto (Milvus migrans) e a gaivota-de-asa-escura (Larus fuscus)

Jaacute se viram corviacutedeos realizando todas essas atividades mencionadas com

instrumentos alguns dos quais eles mesmos produzem especialmente a partir do

gecircnero botacircnico Pandanus sp505 e outras mais como a utilizaccedilatildeo de objetos como

armas que lanccedilam ou deixam cair no oponente com o fim de afastaacute-lo seja para

alimentarem-se seja para livrarem-se de ameaccedila ao ninho ou para defenderem-se

a si mesmos etc

E natildeo por nada esta famiacutelia de passeriformes eacute a que mais tem ganho

destaque dentre as aves em testes cognitivos Isto pode exemplificar-se tambeacutem por

estudos como o de Lefebvre e colaboradores506 que mostra reforccedilando a hipoacutetese

500

BOUCHARD et al 2007 501

Aqui especificamente utilizou-se uma caixa de acriacutelico com sementes em seu interior que os animais poderiam acessar bicando empurrando puxando ou levantando tampas e gavetas Para correlacionar agrave aprendizagem social realizou-se outro teste com uma caixa contendo alimento ocultado por um objeto como uma rolha ou um tubo que deveria ser girado e removido para que caiacutesse o alimento impedindo o acesso a um espeacutecime qualquer natildeo treinado que teria entatildeo de observar outro jaacute treinado realizar a tarefa para aprender como acessar o alimento

502 EIBL‐EIBESFELDT 1961

503 TEBBICH BSHARY 2004

504 ROELOFS 2010

505 HUNT GRAY 2003

506 LEFEBVRE et al 2004

110

que leva em conta o quociente de encefalizaccedilatildeo que com seu maior volume

cerebral em relaccedilatildeo ao tamanho corporal seus membros possuem melhores

desempenhos em muitos aspectos como no quesito inovaccedilatildeo (novas formas de

conseguir alimento de fugir etc) A relaccedilatildeo entre o tamanho do seu ceacuterebro e o do

corpo seria proporcional a essa mesma relaccedilatildeo nos chimpanzeacutes507 e ainda que haja

diferenccedilas significativas em suas estruturas cerebrais apresentam grandes

semelhanccedilas cognitivas no acircmbito comportamental508 Estudos como o de

Wimpenny e colaboradores509 aqui com corvos-da-nova-caledocircnia (Corvus

moneduloides) mostram o ecircxito desses animais em experimentos que envolvem o

uso sequencial de instrumentos Aos animais testados oferecia-se um instrumento

mais curto que era como uma vareta com um suporte na ponta com o qual teriam

de alcanccedilar em aparatos de parede incolor com abertura pequena outro objeto

semelhante poreacutem mais comprido para com este ou obterem a recompensa ou

caso natildeo conseguissem pegarem outro ainda mais longo para entatildeo alcanccedilaacute-la Em

uma das etapas diante da impossibilidade de retirar a recompensa com o objeto

inicialmente disponiacutevel e tendo falhando em retirar o objeto mais longo um animal

voltou ao aviaacuterio de onde retornou trazendo um galho que utilizou para retirar

agora com sucesso o objeto mais longo com o qual obteve por fim o alimento

Um desses experimentos este com resoluccedilatildeo de problemas em oito passos

realizado pelo doutor Alex Taylor da Universidade de Auckland na Nova Zelacircndia

ganhou fama internacional por ter sido transmitido pela BBC de Londres510 Nele um

corvo-da-nova-caledocircnia retira inicialmente uma vareta suspensa em uma corda

puxando-a para o galho sobre o qual estaacute e onde ela estaacute pendurada Em seguida

se dirige para uma fila de trecircs gaiolas lado a lado cada uma contendo uma pedra

As trecircs pedras satildeo retiradas pelo corvo com a utilizaccedilatildeo da vareta e entatildeo levadas

ateacute uma caixa de acriacutelico com abertura superior Apoacutes o animal atirar ali a terceira

pedra a base da caixa cede liberando uma vareta maior com a qual o corvo

finalmente puxa a recompensa pela abertura estreita de outra caixa de acriacutelico na

qual se encontra

507

EMERY CLAYTON 2004 508

EMERY 2006 509

WIMPENNY 2009 510

BRITISH BROADCASTING CORPORATION 2014

111

Nos experimentos de Jelbert e colaboradores511 corvos-da-nova-caledocircnia

teriam de soltar objetos dentro de tubos a fim de que o niacutevel da aacutegua dentro destes

subisse e trouxesse a recompensa flutuante Os pesquisadores realizaram os testes

em seis condiccedilotildees a primeira com dois tubos sendo um com aacutegua e outro com

terra a segunda com dois tipos de objetos sendo um que afundava e fazia o niacutevel

da aacutegua subir e outro que simplesmente boiava na terceira havia dentre os objetos

alguns ocos que fariam subir muito pouco o niacutevel da aacutegua na quarta um tubo mais

estreito e outro mais largo com o niacutevel da aacutegua na mesma altura em ambos a

quinta com o tubo mais estreito com a altura do niacutevel da aacutegua bem mais baixa e o

sexto com trecircs tubos sendo que dois interconectados por baixo em forma de ldquoUrdquo e

um isolado Nesses dois o do meio no qual estava a recompensa era mais estreito

de modo que os objetos natildeo poderiam ser soltos dentro dele Salvo no quarto e no

sexto experimento os animais escolheram predominantemente aquilo que lhes

proporcionaria a recompensa ou que lhes proporcionaria a recompensa mais

rapidamente No caso do quarto teste os autores sugerem hipoacuteteses como a de que

os animais teriam dificuldade em ver no volume dos tubos um fator de causalidade

ou a de que teriam mais dificuldades de ver a funcionalidade no substrato (a aacutegua)

enquanto a veriam no instrumento (os objetos) sem descartarem a hipoacutetese de os

animais conseguirem ter mais sucesso em prazo mais longo Em relaccedilatildeo ao sexto

experimento somente quatro indiviacuteduos o realizaram o que os pesquisadores

consideraram ser uma amostragem insuficiente para chegarem a conclusotildees sobre

a espeacutecie mas levando em consideraccedilatildeo que o deslocamento da aacutegua seria uma

caracteriacutestica insuficiente para que inferissem que haveria uma conexatildeo que lhes

estivesse oculta

Tambeacutem Jelbert e colaboradores512 forneceram a primeira evidecircncia de que

os corvos-da-nova-caledocircnia podem manufaturar objetos a partir de um modelo

mental Diante de um aparato em que se tinha de inserir cartotildees de papel de

tamanho especiacutefico para que se recebesse a recompensa havia outras folhas de

papel disponiacuteveis Estas foram recortadas com o bico por alguns dos espeacutecimes

testados que haviam sido previamente treinados para lidar com o aparato mas natildeo

para o recorte

511

JELBERT et al 2014 512

JELBERT et al 2018

112

Em outro estudo a fim de testar se os corviacutedeos poderiam estabelecer

relaccedilotildees analoacutegicas Smirnova e colaboradores513 submeteram duas gralhas-

cinzentas (Corvus cornix) a treinamento com IMTS (ldquoidentity matching-to-samplerdquo) a

partir de placas contendo pares de figuras de ciacuterculo triacircngulo quadrado e cruz em

azul vermelho amarelo ou verde dispostas diagonalmente a fim de verificar

posteriormente se realizariam os testes de RMTS (ldquorelational matching-to-

samplerdquo)514 a partir de placas contendo cada uma um par de ciacuterculos quadrados ou

triacircngulos pretos dispostos lado a lado com tamanhos iguais ou diferentes Os

pesquisadores natildeo treinaram os animais para tamanho mas somente para nuacutemero

de figuras tipo de siacutembolo e cor do siacutembolo Eles apresentaram para as aves uma

bandeja com trecircs placas cada uma contendo duas figuras A do meio situava-se

diretamente sobre a bandeja ao passo que as outras duas repousavam cada uma

sobre um copo sendo que somente aquela que teria alguma correspondecircncia com a

do meio fosse de forma (igual ou diferente) de cor ou no caso do teste RMTS de

tamanho conteria a recompensa As placas eram oferecidas com diferentes

combinaccedilotildees e as aves assim teriam de identificar o tipo de correspondecircncia

apresentada ali antes de efetivar sua escolha Diante do ecircxito das gralhas os

pesquisadores sugeriram que elas teriam reconhecido relaccedilotildees de relaccedilotildees e que

entatildeo haveria raciociacutenio analoacutegico com abstraccedilatildeo nesses animais

Haacute muitas outras pesquisas demonstrando habilidades dos corviacutedeos em

razatildeo de seu sucesso em tantos testes cognitivos como as de Bugnyar e

colaboradores que sugeriram a partir de alguns experimentos como um em que os

espeacutecimes de Corvus corax em um recinto com uma pequena abertura para outro ao

lado que era aberta e fechada onde estaria outro indiviacuteduo guardavam o alimento

mais rapidamente quando pensavam estar sendo vigiados (e mesmo quando a

abertura estava fechada e os pesquisadores colocavam uma gravaccedilatildeo de som de

um coespeciacutefico) sejam caracterizados como apresentando ldquoteoria da menterdquo515 a

de Prior Schwarz e Guumlntuumlrkuumln516 que demonstrou que uma pega-rabilonga (Pica

pica) reconheceu-se em um espelho e a de Swift517 que estudou corviacutedeos

513

SMIRNOVA et al 2015 514

Respectivamente ldquocorrespondecircncia para amostra de identidaderdquo e ldquocorrespondecircncia para amostra relacionalrdquo

515 BUGNYAR et al 2016

516 PRIOR SCHWARZ GUumlNTUumlRKUumlN 2008

517 SWIFT 2015

113

visitando funerais de coespeciacuteficos para investigarem a causa de sua morte e

descobrir se representa ou natildeo perigo para o bando

Ainda dentre as aves os psitaciacutedeos tambeacutem exibem comportamentos

marcantes Roelofs518 aponta o uso de objetos para percussatildeo como exibiccedilatildeo de

gravetos para coccedilarem-se dentre muitas outras habilidades O caso do papagaio-

cinzento (Psittacus erithacus) Alex foi provavelmente o mais notaacutevel Peperberg519

afirma que ele aprendeu a identificar nomes de objetos materiais520 cores e formas

inclusive as categorias em que um item poderia classificar-se dentro desses

atributos aprendeu a diferenccedila entre similaridade e diferenccedila repetia frases

funcionais quando queria obter algo ou ir a algum lugar etc Alex foi ensinado a usar

a palavra ldquonone [nenhum(a)]rdquo quando natildeo houvesse categoria presente e que em

certa ocasiatildeo ele espontaneamente passou a aplicar o termo diante da ausecircncia de

um exemplar qualquer de uma dessas categorias A primeira vez que o fez foi em

relaccedilatildeo a um nuacutemero o trecircs relacionado a algo ausente Sua resposta foi citar o

cinco que tambeacutem se relacionava a uma ausecircncia e persistir ateacute ser indagado e

dizer o ldquononerdquo Peperberg daacute ecircnfase a isto por entender que Alex teria iniciado um

toacutepico Ele natildeo soacute aprendeu mais de cem palavras como aprendeu a criar novas

palavras combinando as que jaacute conhecia como quando disse ldquobanerryrdquo aglutinando

ldquobananardquo com ldquocherry [cereja]rdquo para denominar uma maccedilatilde ou seja compreendeu

que a partir de padrotildees sonoros independentes pode-se criar denominaccedilotildees

concluiu a pesquisadora521

A fim de testar a chamada competecircncia numeacuterica de Alex522 uma bandeja

com trecircs tipos diferentes de alimento (nozes jujubas e doces em forma de coraccedilatildeo)

era-lhe mostrada com estes dispostos sob dois copos de modo que cada tipo ou

natildeo estaria presente ou estaria em certa quantidade em ateacute seis unidades Essas

mesmas quantidades eram sempre que possiacutevel representadas em disposiccedilotildees

distintas distribuiacutedas entre os dois copos Em seguida depois de dois a trecircs

segundos de exibiccedilatildeo alternada cada copo era reposicionado sobre os doces Para

cada rodada o experimentador perguntava a Alex que jaacute natildeo via os alimentos

quantos de determinado tipo estavam na bandeja Esse tipo de teste foi repetido

518

ROELOFS 2010 519

PEPERBERG 2006 520

Aquilo de que algo eacute feito 521

PEPERBERG 2007 522

Id 2006

114

posteriormente com algarismos de numerais araacutebicos sem que Alex que

demonstrou algum ecircxito tivesse sido treinado para essa transposiccedilatildeo a partir de

quantidade de itens e tambeacutem com trecircs amostras de recompensa para soma por

bandeja523 Com itens Alex realizou somas que iam de 1 a 6 e com algarismos

realizou somas que iam de 1 a 5

A competecircncia numeacuterica foi testada em outros animais como os pombos (C

livia) como no estudo de Xia Siemann e Delius524 em que os animais trabalharam

ateacute o nuacutemero seis associando numerosidade de siacutembolos em chaves agrave quantidade

de bicadas nestas (indicada por esses siacutembolos) e no de Scarf e colaboradores525

com pares crescentes de algarismos bicados em uma tela em que se trabalhou ateacute

o nuacutemero nove do que concluiacuteram os autores que a competecircncia numeacuterica dos

pombos equivaleria agrave dos grandes primatas da qual se falaraacute mais adiante

Retornando aos psitaciacutedeos Heaney Gray e Taylor526 testaram papagaios-

da-nova-zelacircndia (Nestor notabilis) para tarefa que soacute se poderia concluir-se se

fosse realizada em colaboraccedilatildeo simultacircnea Consistia em uma bandeja em formato

de ldquoUrdquo contendo uma recompensa de cada lado encaixada entre dois suportes

podendo somente ser movida se duas aves a puxassem ao mesmo tempo ateacute a

gaiola onde se encontravam uma das cordas presas em cada uma das duas

extremidades da bandeja O teste foi realizado com a soltura das aves no local do

experimento simultaneamente e depois com um pequeno intervalo de tempo de

diferenccedila entre uma e outra Segundo os pesquisadores o desempenho dessas

aves foi semelhante ao de chimpanzeacutes e elefantes

Eacute destes uacuteltimos que trataremos agora passando a explorar a classe

Mammalia

61 ELEPHANTIDAE

Classificam-se os indiviacuteduos desta famiacutelia conhecidos atualmente em trecircs

espeacutecies a saber uma de elefante asiaacutetico Elephas maximus e duas de elefantes

africanos sendo uma das savanas Loxodonta africana e outra das florestas

Loxodonta cyclotis

523

PEPERBERG 2012 524

XIA SIEMANN DELIUS 2000 525

SCARF et al 2011 526

HEANEY GRAY TAYLOR 2017

115

O ceacuterebro desses espeacutecimes que pesa cerca de seis quilos527 possui

elevado quociente de relaccedilatildeo entre ceacuterebro e peso corporal com neocoacutertex bastante

desenvolvido e grande densidade neuronal528

Por tratar-se do maior ceacuterebro dentre os animais terrestres citamos

brevemente algumas caracteriacutesticas Shoshani e colaboradores529 apontam

telenceacutefalo com sulcos e giros bem desenvolvidos mostrando um grau de

complexidade intermediaacuterio em relaccedilatildeo aos ceacuterebros dos primatas e dos cetaacuteceos

Dentre as principais diferenccedilas entre o ceacuterebro humano e o do elefante estatildeo o

tamanho e as proporccedilotildees dos lobos a configuraccedilatildeo do sistema ventricular as

diferenccedilas na complexidade e no padratildeo giral tamanho do nervo olfatoacuterio e da

glacircndula pituitaacuteria maior nos elefantes e da pineal maior nos humanos Os

elefantes tecircm um lobo frontal proporcionalmente menor que o dos humanos e lobos

parietal e occipital menos definidos que o destes e iacutensula opercularizada

incompleta No cerebelo observa-se maior tamanho e complexidade giral Segundo

Jacobs e colaboradores530 o ceacuterebro do elefante eacute cerca de trecircs vezes maior que o

dos humanos e sua pesquisa aponta que em comparaccedilatildeo com os neurocircnios

piramidais supragranulares destes os neurocircnios piramidais superficiais daqueles

satildeo maiores menos densos e com padrotildees de ramificaccedilatildeo menos complexos e

exibem semelhante meacutedia de comprimento dendriacutetico basilar com segmentos

dendriacuteticos mais longos e ramificaccedilotildees menos complexas

Os elefantes apresentam um comportamento social natildeo aleatoacuterio e estaacutevel531

com relaccedilotildees duradouras entre indiviacuteduos que se autorreconhecem apresentam

empatia com capacidade de aprendizado e de transmissatildeo de informaccedilotildees e de

habilidades praacuteticas que interagem em geral a partir de comportamentos

convencionais incluindo comportamentos estrateacutegicos532 Sua comunicaccedilatildeo parece

dar-se a ateacute dois quilocircmetros e meio mas a resposta eacute obtida mais comumente em

distacircncias entre um quilocircmetro e um quilocircmetro e meio segundo a pesquisa

envolvendo aparelhagem de aacuteudio com reproduccedilatildeo de infrassons de Mccomb e

colaboradores533 Vivem em bandos de trecircs a cem indiviacuteduos os machos por vezes

527

RENSH 1956 528

LOCKE 2013 529

SHOSHANI et al 2006 530

JACOBS et al 2011 531

WITTEMYER DOUGLAS-HAMILTON GETZ 2005 532

LOCKE 2013 533

MCCOMB et al 2003

116

constituem grupos pequenos de dois a quatro indiviacuteduos ao passo que os grandes

grupos satildeo integrados basicamente por fecircmeas e filhotes liderados por matriarcas

que os conduzem aos locais em que haacute aacutegua e alimento Na criaccedilatildeo dos filhotes em

que satildeo amamentados ateacute aproximadamente o quinto ano de vida suas irmatildes e tias

atuam colaborativamente Ao crescerem as fecircmeas permanecem durante toda a

vida em seu grupo enquanto os machos os abandonam por volta dos doze a quinze

anos de idade em busca de parceiras para o acasalamento534

O trabalho de Wittemyer Douglas-Hamilton e Getz 535 foi o primeiro a apontar

estatisticamente quatro camadas de hierarquia social que expressam diferentes

respostas agraves variaccedilotildees temporais e sazonais nesses grupos com meacutetodos

quantitativos mais rigorosos mas indica outros anteriores sendo ateacute entatildeo mais

recente o de Moss e Poole536 que descreveram ateacute seis camadas que vatildeo desde a

interaccedilatildeo entre matildee e filhote ateacute o niacutevel populacional

Descreveremos algumas de suas habilidades cognitivas comeccedilando por

aquelas observadas em estudos em campo e em seguida abordaremos as que

foram verificadas em experimentos realizados em cativeiro com indiviacuteduos

domesticados Faremos o mesmo posteriormente quando tratarmos de primatas e

de golfinhos mas natildeo com os catildees jaacute que o que nos leva a dar-lhes enfoque eacute a

sua relaccedilatildeo com os humanos

611 Observaccedilotildees de Campo

No que concerne agraves observaccedilotildees de campo Bates e colaboradores537

distinguiram as seguintes interaccedilotildees comportamentais

- coalisatildeo ou seja uniatildeo com um ou mais indiviacuteduos para opor-se a outro ou

a outros tanto com fins de ameaccedila como de defesa de ameaccedila

- proteccedilatildeo seja de indiviacuteduos mais jovens contra predadores contra

indiviacuteduos maiores da proacutepria espeacutecie seja interrompendo brigas entre jovens etc

- conforto por indiviacuteduos adultos de filhotes em situaccedilatildeo de estresse

- cuidado por outros indiviacuteduos adultos com filhote na ausecircncia da matildee (o

que foi verificado somente em alguns casos)

534

IRIE HASEGAWA 2009 535

WITTEMYER DOUGLAS-HAMILTON GETZ 2005 536

MOSS POLE 1983 537

BATES et al 2008

117

- resgate como a conduccedilatildeo de um filhote perdido de volta ao grupo e agrave matildee

- auxiacutelio por exemplo relacionado agrave mobilidade como em caso de

atolamento ou na remoccedilatildeo de objetos estranhos em casos em que a viacutetima se

mostra de algum modo enfraquecida (como se verifica em casos de remoccedilatildeo com a

tromba de um dardo tranquilizante que tenha atingido outro membro do grupo ou

em casos em que a matildee remove resiacuteduos descartados por humanos presos na boca

de um filhote)

Essas interaccedilotildees indicam segundo os pesquisadores a existecircncia de

determinadas percepccedilotildees de natureza empaacutetica como

- a de que os outros geram comportamento espontaneamente ou seja satildeo

agentes animados (por exemplo o reconhecimento da imobilidade de outro indiviacuteduo

como uma anomalia)

- a de que pode haver direcionamento a partir de certos comportamentos para

objetivos especiacuteficos (por exemplo um macho persegue uma fecircmea em periacuteodo

feacutertil para o acasalamento)

- a de que haacute emoccedilotildees diferentes nos outros (por exemplo o apaziguamento

de jovens de humor alterado)

- a de que haacute competecircncias fiacutesicas como vulnerabilidades e habilidades

diferentes nos outros (por exemplo a percepccedilatildeo de que um filhote natildeo consegue

ultrapassar uma cerca)

- a de que haacute percepccedilatildeo particular nos outros (por exemplo o reconhecimento

de que o outro espeacutecime natildeo estaacute percebendo um determinado perigo em

determinada situaccedilatildeo)

- a de que haacute intenccedilotildees e necessidades diferentes nos outros (por exemplo a

percepccedilatildeo de um espeacutecime que tenta livrar-se do atoleiro)

- e a de que haacute crenccedilas e entendimentos diferentes nos outros (por exemplo

quando um espeacutecime prevecirc que o filhote de outro poderaacute ingerir algum alimento

venenoso e entatildeo interfere para salvar-lhe)

Plotnik e de Waal538 reforccedilaram ainda os estudos sobre o consolo apoacutes um

episoacutedio de sofrimento constatando que aleacutem do contato fiacutesico natildeo solicitado como

a tromba de uma fecircmea adulta na boca de um filhote aflito os elefantes tambeacutem

usam vocalizaccedilatildeo para o conforto reforccedilando a hipoacutetese da empatia do interesse

538

PLOTNIK DE WAAL 2014

118

no estado emocional de outro membro da espeacutecie em quem os animais identificam o

papel de viacutetima que passa por um momento de anguacutestia Essas respostas

emocionais podem provocar contaacutegio emocional fazendo com que muitos outros

indiviacuteduos exibam o mesmo estado emocional do primeiro e pode ateacute ser de

natureza universal ou seja causar a mesma reaccedilatildeo emocional em todos os demais

indiviacuteduos presentes do grupo Essa interaccedilatildeo de conforto de indiviacuteduos aflitos

reforccedila a comunicaccedilatildeo desses animais por meios sonoros e taacuteteis

Os estudos de populaccedilotildees realizados por McComb e colaboradores de 2007

a 2009539 forneceram evidecircncias de que diante de desafios enfrentados pelo grupo

de Loxodonta africana como a presenccedila de predadores satildeo as matriarcas mais

velhas que tomam as melhores decisotildees para o grupo Os pesquisadores

perceberam que os elefantes distinguem niacuteveis de ameaccedila inclusive dentro de uma

mesma classe de predadores como grupos eacutetnicos humanos a partir de sinais

olfativos e visuais

Esses resultados satildeo corroborados com o estudo de Soltis e colaboradores540

de indiviacuteduos da espeacutecie Loxodonta africana sob ameaccedila de abelhas e sob ameaccedila

de humanos no qual se observou que os elefantes estabelecem distinccedilotildees entre os

dois tipos de ameaccedila e manifestam comportamentos especiacuteficos para cada um dos

dois casos Esses comportamentos incluem a emissatildeo de sons de alerta aos demais

membros do grupo diante do que os pesquisadores concluiacuteram que os animais

emitem sons segundo niacuteveis de urgecircncia conforme a natureza das ameaccedilas

McComb e colaboradores541 presenciaram elefantes reconhecendo cracircnios de

membros de sua espeacutecie em meio aos de outras espeacutecies A atenccedilatildeo dos animais

foi atraiacuteda tambeacutem pelos marfins que eles investigaram com a tromba e uma das

patas

Jaacute Douglas-Hamilton e colaboradores542 registraram os sete dias que se

seguiram agrave morte de uma matriarca observando o interesse no cadaacutever tanto por

parte de membros de outros grupos como por parte dos membros do grupo dela

cujas visitas em frequecircncia duraccedilatildeo e nuacutemero de indiviacuteduos foram gradualmente

diminuindo durante o periacuteodo de observaccedilatildeo dos pesquisadores

539

MCCOMB et al 2011 540

SOLTIS et al 2014 541

MCCOMB BAKER MOSS 2006 542

DOUGLAS-HAMILTON et al 2006

119

612 Estudos experimentais

Smet e colaboradores543 verificaram em elefantes africanos a habilidade de

seguir gestos de indicaccedilatildeo humanos alguns inclusive sutis Eles testaram onze

espeacutecimes criados em cativeiro que falharam somente nos testes que envolviam

exclusivamente o olhar do experimentador para certa direccedilatildeo para encontrar

alimentos previamente escondidos E mesmo quando natildeo havia nenhum gesto os

animais guiaram-se pela posiccedilatildeo do corpo humano que era no entanto

desconsiderada quando havia algum gesto Acreditam os autores da pesquisa que

nenhum desses indiviacuteduos havia sido treinado anteriormente e que natildeo teria havido

oportunidades extensivas para tal aprendizado

Esses animais no entanto apresentam uma consideraacutevel capacidade de

retenccedilatildeo de memoacuteria espaccedilo-temporal tal como demonstrado por experimentos

como os de discriminaccedilatildeo entre luz e escuridatildeo realizados por Markowitz e

colaboradores544 com a utilizaccedilatildeo de um aparato de madeira compensada de pouco

mais de dois metros de altura com um painel em que espeacutecimes de Elephas

maximus acionavam um interruptor Esses animais jaacute tinham passado pelo mesmo

experimento oito anos antes e logo se recordaram do que teriam de fazer para obter

a recompensa

Irie-Sujimoto545 sugeriu que os elefantes possuem um conhecimento

conceitual sobre a relaccedilatildeo entre meio e fim com base em experimento de Piaget

que apontou a presenccedila dessa habilidade em crianccedilas de onze meses de idade

Essa habilidade indica a possibilidade de definiccedilatildeo de objetivos e um

comportamento direcionado para a tentativa de alcanccedilaacute-los Nesse estudo se

forneceu duas taacutebuas a dois elefantes asiaacuteticos sob quatro condiccedilotildees diferentes Na

primeira uma delas serviu como suporte para que o alimento fosse trazido ao seu

alcance enquanto a outra estava vazia e na segunda havia uma com alimento e

outra com o alimento colocado fora dela ao lado na terceira alteraram-se as cores e

as dimensotildees das taacutebuas repetindo a primeira condiccedilatildeo e na quarta as duas taacutebuas

continham alimento sendo que uma delas era partida e colocou-se o alimento na

parte que natildeo podia ser puxada Um dos animais realizou com relativo sucesso

todos os experimentos Diante das duas primeiras condiccedilotildees ambos aprenderam

543

SMET et al 2013 544

MARKOWITZ et al 1975 545

IRIE-SUJIMOTO 2008

120

que se puxassem a bandeja certa obteriam o alimento na terceira condiccedilatildeo um

animal ficou desmotivado e no outro se verificou a transferecircncia do aprendizado

para as novas condiccedilotildees por fazer distinccedilatildeo entre as caracteriacutesticas relevantes e as

irrelevantes para o problema e mediante a quarta condiccedilatildeo verificou-se que o

animal compreendeu raacutepida e corretamente a relaccedilatildeo espacial entre o alimento e a

bandeja

Com o fim de estudar a capacidade de cooperaccedilatildeo Plotnik e colaboradores546

realizaram um teste semelhante ao descrito anteriormente com psitaciacutedeos no qual

dois elefantes teriam de puxar cada um uma de duas cordas amarradas a uma

taacutebua contendo alimento Somente se os dois puxassem juntos e ao mesmo tempo

obteriam a recompensa O experimento foi realizado com sucesso com o

desempenho melhorando apoacutes o primeiro dia e sugeriu haver reconhecimento da

necessidade de um parceiro para o teste onde inclusive um aguardava a chegada

do outro para realizaccedilatildeo da tarefa quando a chegada deste era intencionalmente

retardada pelos experimentadores

Em outro estudo Foerder e colaboradores547 observaram um elefante asiaacutetico

macho utilizar um cubo para erguer-se nas patas dianteiras e alcanccedilar um ramo de

bambu com frutos preso em uma corda suspensa Quando a localizaccedilatildeo do alimento

foi modificada o animal espontaneamente empurrou o cubo ateacute o local ergueu-se

sobre ele e alcanccedilou o alimento Apoacutes a retirada do cubo do local pelos

pesquisadores o espeacutecime primeiramente tentou substituiacute-lo por uma bola e em

seguida empilhou objetos como taacutebuas para tentar sem sucesso nesta etapa

alcanccedilar seu objetivo Os testes demonstrarama capacidade nestes espeacutecimes de

resolver problemas com uso de instrumentos de modo suacutebito e perspicaz segundo

os pesquisadores natildeo precedido de tentativa e erro

Ainda em meados do uacuteltimo seacuteculo Rensch548 realizou estudos com pares de

padrotildees de figuras em cartas em que estas eram memorizadas por um elefante

indiano jovem e depois reapresentadas aleatoriamente e retiradas por este com a

tromba recebendo entatildeo a recompensa mediante o acerto O animal obteve

resultados exitosos e um ano depois ele demonstrou ter retido quase toda a

546

PLOTNIK et al 2011 547

FOERDER et al 2011 548

RENSCH 1956

121

informaccedilatildeo um tempo consideraacutevel em comparaccedilatildeo com a capacidade de

memorizaccedilatildeo de animais de porte menor

Rensh549 seguiu realizando experimentos com padrotildees de imagens e

observou elefantes indianos com idade entre vinte e sessenta anos reagindo a vinte

e um a vinte e quatro comandos verbais diferentes memorizando o sentido de vinte

pares de estiacutemulo ndash Lewis550 poreacutem afirmou que um elefante bem treinado chega a

reconhecer cerca de cem comandos entre palavras e frases Na tentativa de

identificar alguma capacidade de abstraccedilatildeo as cartas foram separadas de sua dupla

de padratildeo correspondente e o pesquisador verificou que uma fecircmea reconheceu a

caracteriacutestica essencial do padratildeo em questatildeo Ela parece ter desenvolvido a ideia

de cruz a de cruzamento de duas barras pretas e em um experimento onde isto

ficou mais claro o par de imagens original apresentava o padratildeo de listras uma

carta com listras com dois centiacutemetros de largura e outra com listras com quatro

centiacutemetros de largura A primeira carta foi apontada como positiva Quando as

larguras foram alteradas para um centiacutemetro e meio e dois centiacutemetros a elefanta

escolheu a primeira com listras mais estreitas mostrando que ela percebeu que a

escolha correta era a de um padratildeo de listras mais estreitas As cartas originais

foram reapresentadas e ela mais uma vez escolheu corretamente

Para a compreensatildeo de nuacutemeros o pesquisador usou um par de cartas em

que uma continha trecircs pontos (ciacuterculos pretos) e a outra quatro Positivou-se a carta

de trecircs pontos e entatildeo foram apresentadas configuraccedilotildees diferentes de trecircs pontos

em linha horizontal em linha vertical como triacircngulo equilaacutetero e outros formatos

em seguida fez-se o mesmo com quatro pontos O ecircxito relacionado a esse

vocabulaacuterio de comandos foi verificado um ano depois sem que neste periacuteodo o

animal tivesse tido contato com as cartas

Um colaborador de Rensch tambeacutem desenvolveu tarefa similar com sons em

que aos tons positivos o animal respondia batendo com a tromba na tampa de uma

caixa de distribuiccedilatildeo de um aparelho que o recompensava com alimento Ele

reconheceu doze tons em seis pares de sons Em seguida repetiram o experimento

com melodias e a elefanta reconheceu todas as que lhe foram apresentadas

mesmo depois de terem alterados o ritmo o tempo a intensidade a frequecircncia e os

instrumentos dos mais variados timbres

549

RENSCH 1957 550

LEWIS 1971 apud HART 1994

122

Experimentos semelhantes com pares de estiacutemulos foram realizados por

colaboradores de Rensh com cavalo (Equus ferus caballus) zebra (sem especificar

se se tratava de Equus grevyi de E quagga ou de E zebra) e asno (Equus asinus)

Enquanto os dois uacuteltimos natildeo conseguiram ter o mesmo ecircxito do elefante o cavalo

obteve sucesso no reconhecimento de todos os pares apresentados o que reforccedilou

a posiccedilatildeo de Rensch a respeito da relaccedilatildeo entre capacidade de aprendizagem e

tamanho do ceacuterebro

Os elefantes satildeo tambeacutem capazes de comparar quantidades Irie-Sujimoto e

colaboradores551 forneceram cestas com alimento tanto simultaneamente como

sucessivamente e observaram a preferecircncia de elefantes asiaacuteticos pelas cestas

mais cheias sem que fossem anteriormente submetidos a treinamento Este

resultado foi corroborado por Perdue e colaboradores552 que apontaram algumas

questotildees metodoloacutegicas que poderiam ter comprometido o resultado anterior como

o nuacutemero baixo de testes e repetiram o experimento tambeacutem exitosamente com

maior rigor

Plotnik e colaboradores553 verificaram que espeacutecimes de E maximus podem

reconhecer-se a si mesmos no espelho Os pesquisadores imprimiram uma marca

visiacutevel no lado direito e outra natildeo visiacutevel mas que podia ser percebida por odor ou

tato do lado esquerdo da testa de trecircs animais alternadamente e um deles tocou

repetidas vezes a marca visiacutevel em sua testa diante do espelho de dois metros

empregado no experimento frequentemente inspecionado pelos animais

Em um teste que segundo Dale e Plotnik554 se deve somar ao anterior de

autorreconhecimento foi analisado o comportamento de elefantes asiaacuteticos sobre

um tapete ao qual estava amarrada uma corda contendo um bastatildeo na outra

extremidade que deveria ser entregue ao treinador Os animais reconheceram que

seus corpos sobre o tapete eram um obstaacuteculo para a tarefa e se retiraram do

tapete sugerindo aos autores que os membros da espeacutecie possuem consciecircncia

corporal (body awareness)

551

IRIE-SUJIMOTO et al 2009 552

PERDUE et al 2012 553

PLOTNIK et al 2006 554

DALE PLOTNIK 2017

123

62 CARNIVORA ndash CANIS LUPUS FAMILIARIS

O catildeo desperta aqui interesse especial em razatildeo de seu longo e peculiar

conviacutevio com os humanos tendo sido possivelmente o primeiro animal a ser

domesticado555 processo que pode ter ocorrido em algum periacuteodo entre vinte mil e

quarenta mil anos atraacutes556

As atuais pesquisas parecem apontar para uma tripla origem do processo de

domesticaccedilatildeo no final do pleistoceno superior557 na Europa558 no sul do leste

asiaacutetico559 e na Aacutesia Central560

Pesquisas como a de Belyaev561 esta envolvendo mais de quarenta geraccedilotildees

de uma variaccedilatildeo de Vulpes vulpes (raposa vermelha) de coloraccedilatildeo prateada jaacute

demonstraram que o processo de domesticaccedilatildeo resulta no surgimento de alteraccedilotildees

bastante significativas nas geraccedilotildees seguintes O pesquisador e sua equipe

verificaram a ocorrecircncia de alteraccedilotildees reprodutivas decorrente da seleccedilatildeo que

realizaram como a ativaccedilatildeo fora de eacutepoca da funccedilatildeo reprodutiva em fecircmeas

alteraccedilotildees fisioloacutegicas como o prolongamento do periacuteodo de reproduccedilatildeo alteraccedilotildees

morfoloacutegicas como o surgimento de manchas marrons em torno das orelhas e do

pescoccedilo como o surgimento de orelhas caiacutedas tal como a de filhotes de catildees de

cauda enrolada e mudanccedilas na cor da pelagem principalmente despigmentaccedilatildeo

em algumas regiotildees estas uacuteltimas tambeacutem caracteriacutestica de algumas raccedilas de catildees

e alteraccedilotildees comportamentais como o iniacutecio tardio da expressatildeo do medo diante de

novidades (em razatildeo de mudanccedilas no niacutevel plasmaacutetico de corticosteroides que

atuam na adaptaccedilatildeo dos animais ao estresse) relacionado agrave seleccedilatildeo de indiviacuteduos

que exibiram maior mansidatildeo aleacutem de proximidade com humanos que inclui a

busca por contato e resposta a apelidos ndash com elevaccedilatildeo dos niacuteveis de serotonina e

alteraccedilotildees no sistema hipotalacircmico-hipofisaacuterio-adrenal e nos niacuteveis de hormocircnios

esteroides sexuais562 Hare563 menciona uma reduccedilatildeo de ossos e dentes da cauda

555

LARSON et al 2012 556

BOTIGUEacute et al 2017 557

LAURENT 2016 558

THALMANN et al 2013 559

WANG et al 2015 SAVOLAINEN 2002 560

SHANNON 2015 561

BELYAEV 1979 562

TRUT 1999 563

HARE 2004

124

em algumas espeacutecies reduccedilatildeo de cerca de vinte por cento no tamanho do ceacuterebro e

reduccedilatildeo do medo como resposta a novidades

Hare e Tomasello564 desenvolveram estudos e apontam outros que sugerem

o desenvolvimento de uma especializaccedilatildeo cognitiva nos catildees durante o processo de

domesticaccedilatildeo e tambeacutem resultante deste Corrobora isto o estudo de Kaminski e

colaboradores565 que esconderam dois conjuntos de cinco objetos para a cadela

Betsy e dois conjuntos de seis objetos para o catildeo Rico ambos da raccedila border collie

sendo um conjunto em cada um de dois recintos e entatildeo pediram para os animais

recuperarem-nos a fim de adquirirem a recompensa Mediante o sucesso da tarefa

concluiacuteram que os catildees integram a memoacuteria relacionada agrave identidade (ldquoo que eacuterdquo)

com a relacionada agrave localizaccedilatildeo (ldquoonde estaacuterdquo)

Uma consequecircncia da especializaccedilatildeo cognitiva pelo processo de

domesticaccedilatildeo eacute fornecida por Hare566 que comenta casos de catildees que se natildeo

mantiverem contato visual frequente com humanos manifestam sintomas de

ansiedade e depressatildeo Isto em animais que vivem em contexto de domesticaccedilatildeo

uma vez que existem catildees que natildeo satildeo domesticados nem satildeo sociaacuteveis em

relaccedilatildeo aos humanos567

Os catildees tecircm pois aleacutem da relaccedilatildeo com os membros de sua espeacutecie ndash e

nesse sentido verificou-se em experimento que eles usam o comportamento de

outro indiviacuteduo para prever o momento em que uma tarefa deve ser cumprida por

exemplo para obtenccedilatildeo de alimento568 ndash um relacionamento uacutenico com os entes

humanos em todo o reino animal com habilidades especiais na compreensatildeo dos

comportamentos humanos relacionados agrave comunicaccedilatildeo Ele desenvolveu seu

processo de aprendizado de modo a agir muitas vezes interpretando os sinais do

homem como linguagem oral e corporal expressotildees faciais estados emocionais

haacutebitos Reconhecem intenccedilotildees mudanccedilas de humor tom de voz569

Esses animais mostram-se assim mais aptos agrave resoluccedilatildeo de certos

problemas envolvendo a comunicaccedilatildeo com humanos do que outros animais como

os lobos e ateacute mesmo os primatas Tambeacutem a sua capacidade de improviso supera

564

HARE TOMASELLO 2006 565

KAMINSKI et al 2008 566

HARE 2004 567

UDELL et al 2014 Os pesquisadores elencam aleacutem desta modalidade ndash ou seja natildeo domesticados e natildeo sociaacuteveis ndash outras trecircs a saber catildees domesticados e sociaacuteveis (mansos) domesticados e natildeo sociaacuteveis e natildeo domesticados e sociaacuteveis

568 OSTOJIĆ CLAYTON 2014

569 KULKEKOVA 2006 HARE TOMASELLO 2005

125

a dos demais em tais testes Coren570 relata um caso parecido com o que aqui se

citou anteriormente narrado por Darwin Um golden retrivier chamado Buck havia

sido treinado para pegar objetos indicados por seu dono Um dia apoacutes a caccedila este

ia esquecendo um boneacute de basebol e um chapeacuteu de cauboacutei e entatildeo pediu para

Buck pegaacute-los O catildeo tentou com a boca pegar um e depois o outro sem sucesso

Parou entatildeo por alguns instantes e em seguida pegou o boneacute e o largou dentro do

chapeacuteu ajustando-o com uma das patas dianteiras agitando em seguida a cauda e

finalmente levando ambos para o dono

Retomando a capacidade de comunicaccedilatildeo esta foi verificada em pesquisas

como a de Hare e Tomasello571 que testaram a resposta a sinais humanos em catildees

e em primatas e concluiacuteram que aqueles conseguem identificar melhor do que estes

o comportamento humano relacionado agrave comunicaccedilatildeo e de maneiras bem mais

proacuteximas a de crianccedilas humanas Algo que o exemplifica eacute o fato de os catildees

responderem melhor do que os chimpanzeacutes agrave abertura dos olhos humanos (por

exemplo evitam comida proibida se um humano estiver olhando)

Nesse sentido Call e colaboradores572 constataram que os catildees reagem ateacute

mesmo de acordo com o estado de atenccedilatildeo dos humanos Num experimento em

que o alimento era colocado no meio da sala juntamente com o comando para que

natildeo comesse em cada etapa o experimentador se colocou de uma destas maneiras

sentado e vigiando sentado e de olhos fechados sentado e distraiacutedo com um objeto

em matildeos sentado de costas ausente da sala Os animais responderam conforme

cada situaccedilatildeo sentando-se e permanecendo assim por mais tempo e investigando

menos a comida aproximando-se dela de um modo mais indireto quando o

experimentador estava vigiando o alimento do que quando natildeo estava

Hare573 e colaboradores estudaram quatro espeacutecimes de catildees para o

reconhecimento de tipos de pista Os animais foram submetidos a testes a fim de

que encontrassem comida em um de dois recipientes estando o outro vazio As

pistas eram o apontar do dedo um marcador de madeira preto e branco no topo do

recipiente com a comida mais o olhar e o agitar de um dos recipientes sem barulho

por conter o alimento e entatildeo o do outro sem barulho O teste apontou o

570

COREN 2006 p 92-93 571

HARE TOMASELLO 2006 572

CALL et al 2003 573

HARE et al 2010

126

entendimento dos animais inclusive jovens de seis semanas de que as pistas

possuiacuteam caraacuteter comunicativo

Em outro experimento desenvolvido por Grassmann Kaminski e Tomasello574

envolvendo objetos familiares e outros ateacute entatildeo desconhecidos que deveriam ser

pegos segundo o comando de voz mais ou menos intenso bem como o gesto de

apontar os mesmos catildees supramencionados Betsy e Rico demonstraram assumir

a correferecircncia entre os dois tipos de comandos Ao buscarem um objeto ateacute entatildeo

desconhecido um dos catildees alcanccedilou o alvo por exclusatildeo Em uma das etapas

tinham de decidir em situaccedilatildeo conflituosa na qual o experimentador apontava para

um dos objetos e falava o nome de outro Os animais visitavam rapidamente o

objeto apontado mas pegavam o objeto nomeado demonstrando que o

apontamento tem relevacircncia para o processo de encontrar o que se pretende

A fim de investigarem a noccedilatildeo de causalidade Muumlller e colaboradores575

realizaram testes nos quais os cachorros deviam puxar um entre dois suportes para

serem recompensados de modo parecido com os realizados com elefantes que

mencionamos acima Dentre as condiccedilotildees apresentadas em uma havia um suporte

com comida em cima e outro com comida ao lado fora dele Em outra um suporte

tinha a comida mais afastada de si e outro a tinha tambeacutem fora mas encostada

nele Em uma nova condiccedilatildeo o alimento foi colocado em uma cavidade no extremo

de um dos suportes (fora da superfiacutecie de modo que natildeo poderia ser puxado) e na

outra o alimento estava sobre o suporte proacuteximo da sua extremidade e na uacuteltima

condiccedilatildeo havia um intervalo entre a parte de um dos suportes que seria puxada e a

outra destacada onde estava o alimento e no outro suporte o alimento situava-se

antes do intervalo de modo que poderia ser puxado Na terceira condiccedilatildeo os

animais comeccedilaram mal com exceccedilatildeo de trecircs indiviacuteduos mas melhoraram o

desempenho gradualmente e nesta uacuteltima os animais obtiveram pouco ecircxito Nas

duas primeiras condiccedilotildees os animais foram bem sucedidos no iniacutecio e na primeira

a maioria dos animais obteve ecircxito em oito a dez tentativas mas alguns

conseguiram ateacute mesmo na terceira tentativa no entanto com algum tempo o

rendimento passou a cair

Os pesquisadores observando que quando alguma pista anterior natildeo estava

mais disponiacutevel alguns dos catildees encontravam rapidamente novas pistas

574

GRASSMANN KAMINSKI TOMASELLO 2012 575

MUumlLLER et al 2014

127

concluiacuteram que esses animais utilizam sugestotildees perceptivas para a resoluccedilatildeo

desses problemas mas sem que a compreensatildeo deles decirc sinal de alcanccedilar a

relaccedilatildeo causal com os fundamentos fiacutesicos dessa tarefa

Em outro conjunto de experimentos Johnston e colaboradores576 observaram

que espeacutecimes de C lupus familiares e Canis dingo filtram gradualmente as accedilotildees

irrelevantes e natildeo demonstram padrotildees relevantes de sobreimitaccedilatildeo577 Uma das

tarefas realizadas nesse conjunto de experimentos consistiu inicialmente em fazer

com que os catildees observassem para que imitassem em seguida o experimentador

aproximar-se de uma caixa incolor mover uma alavanca em uma das laterais sem

funcionalidade de um lado para o outro entatildeo abrir a tampa na parte superior pegar

a comida mostraacute-la e inseri-la novamente repetindo o ato posteriormente com uma

caixa opaca Os animais foram gradualmente deixando de sondar a alavanca e

passaram a ir diretamente para a tampa da caixa

Alguns testes simples como o de Petrazzini e Wynne578 em que forneceram

aos catildees a opccedilatildeo por um de dois pratos que podiam variar entre nuacutemero e massa de

alimento mostraram que eles podem discriminar quantidades Outros como o de

West e Young579 que analisaram o comportamento de espeacutecimes diante de soma

simples de um mais um em que se forneciam resultados corretos e errados

sugerem que seriam capazes de contar

Haacute algumas habilidades em que os catildees ganham maior destaque Assim

como as crianccedilas eles aprendem naturalmente componentes da linguagem humana

de qualquer regiatildeo sem precisar de treinamento mas simplesmente ouvindo

palavras e frases e observando o comportamento humano na expressatildeo linguiacutestica

Eles tambeacutem aprendem um maior nuacutemero de palavras na infacircncia e reconhecem

variaccedilotildees de significados no volume e na entonaccedilatildeo do som emitido por

humanos580 mostrando preferecircncia em testes na entonaccedilatildeo que expressa

positividade em relaccedilatildeo agraves que expressam neutralidade ou negatividade em

comandos dados simultaneamente581

576

JOHNSTON et al 2017 577

Em inglecircs ldquooverimitationrdquo Significa a imitaccedilatildeo de accedilotildees relevantes somada agrave de accedilotildees irrelevantes para a execuccedilatildeo de determinada tarefa

578 PETRAZZINI WYNNE 2016

579 WEST YOUNG 2002

580 MIRBAZEL ARJMANDI 2018

581 COLBERT-WHITE et al 2018

128

O catildeo Rico comeccedilou a associar palavras a objetos com dez meses de idade

Segundo Kaminski e colaboradores582 ele passou a conhecer mais de duzentos

objetos pelo nome e os pesquisadores demonstraram que ele fazia novas

associaccedilotildees tambeacutem por exclusatildeo em tarefas em que um objeto desconhecido era

posto entre objetos conhecidos e ao catildeo era dada a ordem para pegaacute-lo Rico foi

superado pela cadela Chaser que com oito semanas de vida comeccedilou a treinar

fazendo-o diariamente por quatro a cinco horas Depois de trecircs anos de treinamento

ela jaacute conseguia reconhecer pelo nome (simples ou duplo) nada menos que 1022

objetos583

Pilley584 testou-a para reconhecimento semacircntico e sintaacutexico de frases com

trecircs elementos que envolviam um verbo e um objeto associado a uma preposiccedilatildeo

ou585 um objeto direto Para isto realizou-se trecircs experimentos No primeiro deles

foram utilizados muacuteltiplos objetos que eram familiares a Chaser ou seja cujo nome

ela conhecia O comando consistia simplesmente em pegar um dos objetos e levar

ateacute outro objeto determinado por vezes invertendo tambeacutem o papel dos dois

envolvidos em certa etapa Os outros dois experimentos seguiram o mesmo meacutetodo

sendo que no segundo os objetos eram considerados novos ou seja ainda natildeo

haviam sido testados no treinamento para estes testes e no terceiro os objetos

foram dispostos em dois recintos diferentes da casa onde ocorreram os testes de

modo que Chaser natildeo os via no momento em que recebia o comando Pilley

concluiu que ela entendeu o significado das sentenccedilas demonstrando compreensatildeo

sintaacutexica e semacircntica

Feuerbacher e Rosales-Ruiz586 realizaram mais recentemente experimentos

com um pastor alematildeo que foi treinado para distinguir entre categorias de objetos

uns considerados como ldquobrinquedosrdquo e outros como ldquonatildeo brinquedosrdquo587 Disto

sugeriram que os catildees poderiam formar conceitos

582

KAMINSKI et al 2004 583

PILLEY REID 2011 584

PILLEY 2013 585

Em inglecircs ldquoprepositional objectrdquo que natildeo implica necessariamente um objeto indireto 586

FEUERBACHER ROSALES-RUIZ 2017 587

Respectivamente ldquotoysrdquo e ldquonon-toysrdquo

129

63 CETACEAE ndash DELPHINIDAE

Em muitas espeacutecies da ordem Cetacea descobriu-se a presenccedila de neurocircnios

Von Economo que parecem estar ligados agrave consciecircncia (awareness) social e agraves

intuiccedilotildees raacutepidas em mudanccedilas de contexto como a que se tem sobre algueacutem com

que se acaba de deparar das quais seguem os julgamentos mais detalhados588

Aleacutem dos cetaacuteceos essas ceacutelulas foram verificadas apenas em grandes macacos

elefantes e humanos589

A ordem apresenta os indiviacuteduos com o maior quociente de encefalizaccedilatildeo

entre os animais natildeo humanos e dentre eles estatildeo os viventes de maior ceacuterebro

nenhum deles superando o dos cachalotes (Physeter macrocephalus) cujo peso

meacutedio eacute de 78 kg590 mas podendo chegar a cerca de 9 kg591 Esses animais

poreacutem natildeo figuram entre os representantes com maior quociente de encefalizaccedilatildeo

sendo superados por exemplo pelos membros das famiacutelias Phocoenidae e

Delphinidae agrave qual pertencem os golfinhos a quem daremos aqui destaque em

razatildeo da extensa gama de estudos realizados ndash em contraste com o nuacutemero

escasso de estudos relacionados agraves demais famiacutelias ndash envolvendo o gecircnero

Tursiops sp e em especial a espeacutecie Tursiops truncatus ou golfinho-nariz-de-

garrafa ou ainda golfinho-roaz

Jacobs Morgane e McFarland592 publicaram estudos anatocircmicos detalhados

do ceacuterebro desta espeacutecie descrevendo caracteriacutesticas como o neocoacutertex mais

expandido em detrimento de um arquicoacutertex mais reduzido como nos primatas e

com o prosenceacutefalo mais encurtado no eixo rostro-caudal em relaccedilatildeo aos dos

mamiacuteferos terrestres e flexuras mesencefaacutelica mais pronunciada o que nestes

verifica-se somente no estado embrionaacuterio Os pesquisadores chamam a atenccedilatildeo

para a orientaccedilatildeo do eixo orbito-occipital dos hemisfeacuterios tendo como referecircncia o

eixo do corpo que devido ao prosenceacutefalo aparecem como se tivessem sofrido certo

giro no eixo transversal o que causa confusatildeo no emprego de termos como

ldquoanteriorrdquo ldquooccipitalrdquo e ldquoventralrdquo para a descriccedilatildeo geral das aacutereas quando se tem por

referecircncia o ceacuterebro dos mamiacuteferos terrestres Eles exemplificam citando formaccedilotildees

588

ALLMAN et al 2005 589

BUTTI et al 2009 HAKEEM et al 2009 590

WHITEHEAD 2009 591

ROTH DICKE 2005 592

Cf JACOBS MCFARLAND MORGANE 1979 para rinenceacutefalo MORGANE et al 1980 para telenceacutefalo

130

ventrais e dorsais no ceacuterebro do golfinho com sua grande fenda entre os

hemisfeacuterios que seriam consideradas respectivamente ldquofrontaisrdquo e ldquoanterioresrdquo e

ldquoposteriores ou ldquooccipitaisrdquo em mamiacuteferos terrestres

O gecircnero Tursiops sp em particular apresenta algumas modalidades de

interaccedilotildees com os humanos sendo talvez a mais popular a sua utilizaccedilatildeo em

exibiccedilotildees em estaacutedios aquaacuteticos No entanto elas natildeo se reduzem ao conviacutevio em

cativeiro

631 Observaccedilotildees de campo

Os golfinhos tecircm colaborado com humanos na pesca segundo Busnel593

desde tempos imemoriais O pesquisador acompanhou pescadores na Mauritacircnia

dando batidas com pedaccedilos de pau na aacutegua ao que se seguiu a aproximaccedilatildeo de

um grande cardume de peixe perseguido por golfinhos que encheram assim as

redes dos pescadores Neil594 fornece alguns relatos de pesca colaborativa

semelhantes com ecircnfase naqueles recolhidos na Austraacutelia em que os humanos

usam desde batidas de lanccedilas na aacutegua a assobios no intuito de atrair a atenccedilatildeo dos

golfinhos para que tragam peixes

No Brasil estudos como os de Simotildees-Lopes595 e os de Zappes596 descrevem

esse tipo de interaccedilatildeo mas apontam para uma incerteza em relaccedilatildeo a se esses

animais teriam realmente alguma intenccedilatildeo de colaborar com os humanos

mencionando inclusive a existecircncia de botos que seriam bons ou prejudiciais para a

pescaria

Bearzi e colaboradores597 realizaram uma revisatildeo relacionada agraves interaccedilotildees

comportamentais de cetaacuteceos com coespeciacuteficos mortos verificando que esses

animais podem demorar a reconhecer o estado de morte e apoacutes isto dar-se podem

exibir manifestaccedilotildees de estresse e apego ao cadaacutever demorando a demonstrar

desinteresse por este tendo sido observados casos de matildees que carregam por

longo periacuteodo a carcaccedila de um filhote sem vida Essas e outras caracteriacutesticas

593

BUSNEL 1973 594

NEIL 2002 595

SIMOtildeES-LOPES 1991 596

ZAPPES 2011 ZAPPES et al 2011 597

BEARZI et al 2018

131

representam as muitas similaridades comportamentais com os primatas nesse tipo

de contexto598

Os golfinhos tambeacutem fazem uso de instrumentos Eacute o que demonstram

estudos como os de Kruumltzen e colaboradores e o de Kops e colaboradores599 que

fornecem um exemplo envolvendo certos grupos de Tursiops sp que utilizam

poriacuteferos como proteccedilatildeo contra ferimentos por corais inclusive em nichos ainda natildeo

explorados durante o forrageamento que se torna portanto mais frequente Os

pesquisadores identificaram ali evidecircncias de que este comportamento seria

transmitido culturalmente inclusive da matildee para a prole

632 Estudos experimentais

Louis Herman600 revisou experimentos relacionados a atividades cognitivas de

T truncatus a fim de apontar a existecircncia de inteligecircncia e consciecircncia nestes

animais

Ele verificou que no que toca agrave percepccedilatildeo dos gestos humanos601 os

golfinhos apresentaram grande habilidade em seguir o apontar do dedo e chegam

ateacute a seguir espontaneamente indicaccedilatildeo humana pelo gesto de estender um braccedilo

no corpo para indicar o outro lado sem compreensatildeo preacutevia direta disto algo que

levou o pesquisador602 a afirmar que os animais teriam compreendido o

apontamento como referecircncia para um objeto e que tambeacutem teriam aprendido a

seguir espontaneamente sem treinamento ateacute o olhar humano estagnado ou

dinacircmico

No acircmbito das interaccedilotildees sociais Herman identifica para estudo a atenccedilatildeo

conjunta a sincronia comportamental e a imitaccedilatildeo Os treinadores da equipe de

Herman ensinaram ao golfinho um comando que denominaram ldquotandemrdquo a partir do

qual os animais realizam os demais comandos em sincronia Entatildeo relacionaram

este comando ao de criaccedilatildeo e Herman observou os golfinhos realizarem

movimentos por conta proacutepria mas em sincronia perfeita algo que descreveu

afirmando desconhecer os mecanismos pelos quais isto se faz possiacutevel

598

ANDERSON 2011 599

KRUumlTZEN et al 2014 KOPS et al 2014 600

HERMAN 2006 Id 2012 601

HERMAN et al 1999 602

HERMAN 2006

132

No que diz respeito agrave habilidade de imitaccedilatildeo diz o pesquisador ao tratar da

imitaccedilatildeo de sons emitidos por computador que os golfinhos fazem uma distinccedilatildeo de

oitavas rara no mundo animal e aponta testes em que os animais apoacutes receberem

o comando imitaram outros coespeciacuteficos e humanos inclusive atraveacutes de imagens

de um televisor Ao imitar humanos poreacutem os animais improvisavam ou seja

levantavam a cauda quando o treinador levantava a perna acenavam com a

barbatana quando o treinador acenava com o braccedilo ficavam eretos com a cauda

imersa e locomoviam-se imitando sincronicamente o andar do treinador etc603

O pesquisador ressalta aqui a verificaccedilatildeo de senso de imagem corporal

representacional em relaccedilatildeo a si mesmo e ao outro e ainda de consciecircncia de si do

proacuteprio corpo e do corpo alheio de indiviacuteduos da mesma espeacutecie e de espeacutecie

distinta o que implica dizer que os golfinhos possuem esquemas e processos

mentais que distinguem codificam e representam as proacuteprias accedilotildees em relaccedilatildeo agraves

dos outros e que podem acessar ldquoo estado ou conteuacutedo de suas percepccedilotildees

memoacuterias ou conhecimentordquo604

Herman605 relata tambeacutem os testes que ele e sua equipe realizaram com os

golfinhos fecircmeos Akeakamai ou Ake e Phoenix esta treinada com algo como uma

linguagem acuacutestica gerada por computador e aquela com o uso de comandos de

trecircs a cinco palavras a partir de gestos simboacutelicos em que o treinador indicava

agentes objetos modificadores deste (localizaccedilatildeo) e accedilotildees inclusive de modo

recombinado O pesquisador aqui destaca o desempenho de Ake que diante do

objeto que sofreria determinada accedilatildeo da natureza da accedilatildeo do objeto de destino e

discriminando este objeto de outro similar que se encontrava do outro lado do

animal seguiu os comandos com sucesso inclusive diante da inversatildeo de papeacuteis

entre os objetos realizada com ela pela primeira vez Em testes similares observou

tambeacutem a eficaacutecia diante de outros comandos como um que sinalizava ao golfinho

para que repetisse o que fizera anteriormente606 e comportamentos curiosos como

a repeticcedilatildeo espontacircnea de movimentos previamente realizados enquanto o animal

aguardava um tempo maior entre um comando e outro607

603

HERMAN 2002 604

ldquo[] the state or content of its perceptions memories or knowledgerdquo Id 2012 p 540 605

HERMAN et al 1984 HERMAN 1986 606

MERCADO III et al 1998 MERCADO III et al 1999 607

COWAN 2003

133

Segundo Herman e colaboradores608 esses estudos pelos quais se

constatou que os animais compreenderam sentenccedilas lexicalmente novas

estruturalmente novas semanticamente reversiacuteveis e que expressam relaccedilotildees entre

objetos em que a posiccedilatildeo do modificador era alterada para mudar o significado da

sentenccedila e conjuntas ndash e nos quais se constatou que os golfinhos conhecem

generalizaccedilotildees como ldquopessoardquo e relacionadas a objetos com modificaccedilotildees

acidentais significativas como tamanho e cor ndash teriam sido aqueles que forneceram

pela primeira vez resultados convincentes de que certos animais podem processar

caracteriacutesticas de sentenccedilas de natureza semacircntica e sintaacutetica

Herman609 aponta o sucesso do animal tambeacutem em testes com comandos

que propositadamente natildeo faziam sentido com sequecircncias semacircntica ou

sintaticamente anocircmalas Agraves semanticamente anocircmalas Ake natildeo respondeu e agraves

sintaticamente anocircmalas Ake buscava na sequecircncia um subconjunto de itens que

fizessem sentido e entatildeo agia Exemplo disto foi a sequecircncia de comando ldquoAlto-

falante aacutegua tubo sobrerdquo610 que Ake interpretou como se tivesse de colocar o tubo

sobre o alto-falante fixado na parede da piscina e assim procedeu

Ake tambeacutem rearranjava objetos para cumprir certas tarefas como quando

levou uma prancha da beira da piscina para o centro a fim de seguir o comando para

pular a prancha e quando lhe foi dado um comando para recolher objetos sem

especificaccedilatildeo decidiu por si mesma trazer todos ao mesmo tempo o que fez

buscando primeiro o mais distante e entatildeo dispondo os demais no corpo de um

modo que foi possiacutevel fazecirc-lo o que mostrou segundo o pesquisador senso de

planejamento

Em outro estudo Herman e Forestell611 ensinaram Ake a pressionar um de

dois objetos aparentemente remos colocados verticalmente com a paacute para cima a

certa distacircncia um do outro na parede da piscina sendo um significando ldquosimrdquo e

outro significando ldquonatildeordquo para que ela tocasse um ou outro a fim de responder se

determinado objeto estaria ou natildeo na piscina o que fez com ecircxito Herman e

colaboradores612 associaram esta tarefa agravequela que envolve comando simples com

dois objetos e uma accedilatildeo Dava-se o comando como pocircr o frisbee no aro e na

608

HERMAN et al 1984 HERMAN 1986 609

HERMAN et al 1993a 610

ldquoSpeaker water pipe onrdquo 611

HERMAN FORESTELL 1985 612

HERMAN et al 1993b

134

ausecircncia de uma ou outra ferramenta o animal o indicaria no remo ldquonatildeordquo Diante

desses mesmos comandos na ausecircncia de ambos os objetos o frisbee e o aro ou

somente do frisbee Ake acionou o remo ldquonatildeordquo mas na ausecircncia somente do aro

ela espontaneamente levou o frisbee ateacute o remo como que querendo indicar que

natildeo havia o objeto de destino

Herman613 relata tambeacutem que haacute sinais que natildeo fazem parte do vocabulaacuterio

para que o golfinho realize certas accedilotildees sejam isoladas em sequecircncia ou para que

realizasse mais de uma simultaneamente como nadar em espiral abrir a boca fazer

ondas com a cauda mergulhar de costas soprar para fazer bolhas mergulhar em

espiral esguichar aacutegua e dar piruetas Apoacutes realizarem duas ou trecircs accedilotildees

simultaneamente os golfinhos passaram a espontaneamente repeti-las combinadas

e inclusive a manifestar outras combinaccedilotildees natildeo previamente solicitadas

Nos estudos publicados por Braslau-Schneck614 o golfinho Elele recebeu

dentre vaacuterios outros comandos de preenchimento615 um comando para criar um

comportamento ou mais de um caracterizando inclusive a tomada de decisatildeo O

animal realizou gestos que ainda natildeo tinham sido vistos o que fez Herman616

concluir que os golfinhos possuem o senso de agecircncia e de propriedade ou seja

reconhece a si mesmo como proprietaacuterio do corpo e agente das accedilotildees que pratica

e inclusive617 que o animal aprendeu em niacutevel conceitual a palavra que

corresponde a criar um movimento novo

Baseando-se nos resultados de estudos como este e como o de Reiss618 no

qual dois espeacutecimes de T truncatus mostraram por testes com marcas no corpo

reconhecerem-se a si mesmos no espelho Herman afirma que esses animais tecircm

autoconsciecircncia

Em outro deles619 o golfinho fecircmeo Phoenix recebeu o comando de tocar um

objeto com a barbatana peitoral ou com a boca ou com a cauda saltar sobre ele

ou nadar abaixo dele e em seguida recebeu o comando para repetir o gesto ou para

escolher fazer qualquer uma das outras quatro das cinco alternativas Quando foi

solicitado a escolher como primeiro comando o animal ficou por um momento

613

HERMAN 2006 614

BRASLAU-SCHNECK 1994 apud HERMAN 2006 615

Comandos que satildeo acrescentados acessoriamente agravequele(s) de maior relevacircncia para determinado experimento

616 HERMAN 2012

617 Id 2006

618 REISS 2001

619 CUTTING 1997 apud HERMAN 2006 HERMAN 2002

135

olhando para o experimentador e entatildeo compreendeu que podia optar por uma das

cinco e entatildeo saltou sobre o objeto

Em testes realizados com a fecircmea Elele para verificar se ela poderia

compreender siacutembolos como sendo referentes a partes de seu proacuteprio corpo

somando um total de nove como algo que as representa Herman e

colaboradores620 intentaram observar no animal o estabelecimento de correlaccedilatildeo

entre referecircncias gestuais simboacutelicas transmitidas pelos treinadores e as suas

diferentes partes do corpo no uso destas na realizaccedilatildeo de diferentes accedilotildees e em

interaccedilatildeo com objetos Elele usou a mesma parte do corpo para realizar accedilotildees

diferentes ndash como tocar lanccedilar ou indicar ndash ou partes diferentes para realizar uma

mesma accedilatildeo inclusive relacionando-se distintamente com objetos distintos ndash que se

encontravam flutuando na piscina colados na parede ou suspensos acima da

superfiacutecie ndash em combinaccedilotildees que muitas vezes natildeo faziam parte de seu repertoacuterio

Diante da demonstraccedilatildeo de que o animal sabia que parte do corpo usar e onde e

como fazecirc-lo bem como das capacidades versaacuteteis de motricidade621 o

pesquisador concluiu que o golfinho apresenta uma imagem corporal

representacional bem definida622 ldquouma imagem corporal bem articulada que pode

ser acessada conscientemente para obter respostas efetivas do corpo para ateacute

mesmo instruccedilotildees altamente abstratas ou eventos motores observadosrdquo623

64 PRIMATES

Frequentemente se observa nos grandes macacos por sua desenvolvida

capacidade cognitiva interaccedilotildees sociais extremamente complexas Witting e

Boesch624 por exemplo estudaram as interaccedilotildees de conflito em chimpanzeacutes (Pan

troglodytes) e constataram que eles levam em conta no processo de tomada de

decisatildeo para avaliar se um determinado conflito seraacute ou natildeo proveitoso o valor do

recurso disputado o risco de lesatildeo e o valor e a possibilidade de reparaccedilatildeo da

relaccedilatildeo

620

HERMAN et al 2001 621

HERMAN 2002 622

Id 2012 623

ldquo[] a well-articulated body image that can be consciously accessed for effective body-part responses to even highly abstract instructions or observed motor eventsrdquo HERMAN 2006 p 458

624 WITTING BOESCH 2003

136

Um exemplo talvez ainda mais marcante eacute a transmissatildeo cultural que o

pesquisador Shunzo Kawamura relatava em um trabalho cientiacutefico possivelmente

pela primeira vez em 1953 apoacutes seus estudos na ilha de Kawai no Japatildeo com

macacos japoneses (Macaca fuscata) em que observou a fecircmea Imo lavando uma

batata-doce antes de comecirc-la e este comportamento sendo entatildeo adotado

gradualmente pelos demais membros do grupo625

A transmissatildeo cultural varia de acordo com cada modelo social e pode-se dar

por ensinamento direto Withen e colaboradores626 incluindo Goodal verificaram

entre os chimpanzeacutes um nuacutemero de variaccedilotildees culturais que ateacute entatildeo natildeo havia sido

observado em nenhum outro animal natildeo humano e que cada grupo apresenta certo

conjunto de variaccedilotildees que torna uacutenico o seu perfil ainda que os elementos dessas

variaccedilotildees sejam normalmente encontrados em outros grupos mas podendo-se

observar tambeacutem elementos que lhe sejam exclusivos

Boesch identifica dois mecanismos que servem como preacute-requisito para

identificaccedilatildeo de cultura o ldquoprocesso de aprendizagem social que garante a

fidelidade da transferecircncia de informaccedilatildeo entre indiviacuteduosrdquo e as ldquonormas sociais que

garantam a fidelidade da informaccedilatildeo uma vez que ela tenha sido adquirida por um

indiviacuteduordquo627

Boesch e Tomasello628 tambeacutem em trabalho com chimpanzeacutes explicam que

individualmente as transmissotildees culturais satildeo mais raacutepidas e haacute pouca ou

moderada convenccedilatildeo e imposiccedilatildeo Jaacute nos grupos familiares e em associaccedilotildees as

transmissotildees variam conforme o nuacutemero de indiviacuteduos na populaccedilatildeo haacute pouca e

lenta convenccedilatildeo e um indiviacuteduo impotildee pouco ou moderadamente Em relaccedilatildeo agrave

maioria um indiviacuteduo toma as principais decisotildees e a transmissatildeo cultural daacute-se

mais lentamente e define convenccedilotildees e impotildee-se e quando se toma por foco o

prestiacutegio de um indiviacuteduo haacute transmissatildeo lenta poucas convenccedilotildees e ele impotildee

decisotildees lentas ou raacutepidas

Boesch629 fornece particularidades que caracterizam transmissatildeo cultural

como o aprendizado de um membro do grupo por outro membro que natildeo eacute

625

HIRATA et al 2008 626

WITHEN et al 1999 627

Respectivamente ldquosocial learning process that guarantee the fidelity of the information transfer between individualsrdquo e ldquosocial norms that guarantee the fidelity of the information once it has been acquired by an individualrdquo BOESCH 1996 p 265

628 BESCH TOMASELLO 1998

629 BOESCH 2003

137

transmitido geneticamente mas socialmente e natildeo implica necessariamente

adaptaccedilatildeo a determinadas condiccedilotildees ecoloacutegicas tratando-se portanto de uma

praacutetica coletiva que pode inclusive mudar rapidamente Acrescenta ainda a

referecircncia no campo antropoloacutegico que considera a cultura um sistema simboacutelico

com base em compartilhamento de significados

Ilustram esse compartilhamento os vinte tipos de instrumentos usados pelos

chimpanzeacutes do Taiuml National Park na Costa do Marfim dentre os quais se

encontravam gravetos e folhas identificados pelo pesquisador630 que constatou

ainda usos inovadores sem nenhuma mudanccedila aparente no contexto ambiental

(como o aparecimento de uma fonte de alimento antes desconhecida) enquadrando

entatildeo suas observaccedilotildees no que tomou por conceito de cultura

641 Observaccedilotildees de campo

Em outro estudo realizado no Taiuml National Park na Costa do Marfim Luncz e

colaboradores631 verificaram que ao usarem pedras ou tacos de madeira como

martelo para quebrar cascas de frutos de Coula edulis chimpanzeacutes de trecircs grupos

de um mesmo bloco florestal apresentaram cada um identidade cultural por meio de

variaccedilotildees na frequecircncia (ocorridas tambeacutem dentro de cada grupo na escala

temporal) do uso das pedras que predominava em alguns grupos e no dos tacos de

madeira que predominava em outros e os quais inclusive variavam de tamanho de

grupo para grupo Em trabalho posterior Luncz e Boesch632 observaram que as

fecircmeas que migraram para outros grupos que foi quase a totalidade das

observadas adotavam o comportamento do grupo novo o qual os pesquisadores

viram perdurar por cerca de vinte e cinco anos reforccedilando a existecircncia de um

processo de transmissatildeo cultural Os dois pesquisadores633 identificaram ainda

outros traccedilos culturais distintos entre os grupos no forrageamento na comunicaccedilatildeo

em interaccedilotildees sociais dos membros de cada um no comportamento de caccedila etc

somando um total de vinte e sete variantes

Boesch e Boesch tambeacutem identificaram o uso de instrumentos que os

chimpanzeacutes modelavam utilizando as matildeos para quebrar mateacuteria prima remover

630

BOESCH 1995 631

LUNCZ et al 2012 632

LUNCZ BOESCH 2014 633

Id 2015

138

partes suas puxaacute-la ou bater contra ela e os dentes para cortaacute-la Esses materiais

eram em geral mudas folhas gravetos usados como palitos extraiacutedos de pequenos

ramos frondosos ramos galhos usados como tacos e pedras Os animais usavam

nomalmente folhas mudas gravetos e pedaccedilos de galhos para inserccedilatildeo e retirada

de alimento em local de difiacutecil acesso para os dedos (casas de formigas corpo de

pequenos macacos predados etc) mudas folhas gravetos e ramos para sondar o

interior de cascas de aacutervore colmeias de abelha feridas cadaacuteveres usavam

gravetos e folhas como esponjas para assepsia e em exibiccedilotildees os animais

lanccedilavam e arrastavam pedras ramos e galhos e batiam com eles e com pedras e

tacos quebravam frutos duros por vezes usando gravetos para recolher partes

internas que natildeo conseguiam recolher com os dedos634

Outro uso de instrumentos observado por Boesch635 foi o de galhos como

tacos para bater ou tentar perfurar um leopardo que entrou em seu territoacuterio e a

quem entatildeo passaram a perseguir

Van Schaik636 verificou em orangotangos das ilhas de Borneacuteu e Sumatra o

uso de gravetos por orangotangos (Pongo pygmaeus) que podem ser inseridos

presos entre os dentes em pequenos furos em troncos de aacutervores para coletar mel

ou manualmente para tirar pedaccedilos de casas de cupins Outro uso de instrumento

observado por Schaik eacute a casca de ramo de aacutervore que aqueles animais retiram

prendem na boca e inserem em frutos em caacutepsula de aacutervores do gecircnero Neesia que

tecircm alto valor nutritivo para desprender e as sementes e a polpa que satildeo protegidas

por espinhos e entatildeo lanccedilaacute-las do fruto diretamente na boca

No tocante agrave comunicaccedilatildeo Boesch637 analisou um tipo simboacutelico observado

apenas nos chimpanzeacutes de Taiuml usado como norma social por curtos periacuteodos de

tempo a saber percursotildees em aacutervores pelo macho alfa e percebeu que elas

indicavam natildeo soacute a mudanccedila de direccedilatildeo no deslocamento do grupo apontada pela

direccedilatildeo e pelo sentido em que o animal se movia entre as duas aacutervores que

golpeava com os peacutes com as matildeos ou com ambos mas tambeacutem os periacuteodos de

descanso ou ambos combinados

634

BOESCH C BOESCH H 1990 635

BOESCH 1991 636

VAN SCHAIK 2006 637

BOESCH 1996

139

Hedwig e colaboradores incluindo Boesch638 registraram inclusive variaccedilotildees

sintaacuteticas nos chamados vocalizados de duas espeacutecies de gorilas Gorilla beringei

beringei e Gorilla gorilla gorilla em cinco tipos de unidades acuacutesticas combinadas de

cento e cinquenta e nove maneiras diferentes

642 Estudos experimentais

Premack e Woodruff639 realizaram experimentos como tentativas iniciais de

buscar evidecircncias sobre a teoria da mente em animais natildeo humanos Os

pesquisadores gravaram fitas de viacutedeo em que um ator humano dentro de uma jaula

tentava resolver sem sucesso testes tais como os realizados por Koumlhler Em um

deles prendiam-se algumas bananas no teto da jaula Em outro elas estavam fora

da jaula e do alcance do ator No seguinte estavam ao alcance mas impedidos por

uma caixa E em mais um teste repetiu-se o anterior mas com blocos pesados de

cimento dentro da caixa As imagens foram entatildeo mostradas nem sempre na

iacutentegra para um chimpanzeacute fecircmeo de nome Sarah habituado a assistir a cenas de

viacutedeo O animal recebeu entatildeo em cada sessatildeo cartas com imagens dentre as

quais somente uma representava a soluccedilatildeo correta para cada problema (como

empilhar caixas no primeiro cenaacuterio e usar uma vara no segundo) que foi

predominantemente escolhida por ele

Premack e Woodruff entatildeo descartaram que Sarah tenha estabelecido uma

simples correlaccedilatildeo de elementos fiacutesicos em razatildeo de diferenccedilas entre a disposiccedilatildeo

dos objetos nos viacutedeos e nas fotos e tambeacutem descartaram ainda que natildeo de todo

e como causa suficiente e exclusiva tambeacutem o associacionismo em que diante da

falta de um elemento na sequecircncia (como uma accedilatildeo ou um objeto) ela o reconhece

o que levaria por exemplo a recorrer a generalizaccedilotildees decorrentes de experiecircncias

cotidianas anteriores nas quais se teria de incorrer para explicar como Sarah

relacionou fotos aos viacutedeos incompletos que havia visto anteriormente Afirmaram

assim serem mais fortes as hipoacuteteses entre as quais afirmam natildeo haver grandes

diferenccedilas da empatia em que o animal teria-se colocado na posiccedilatildeo do ator

humano e da teoria da mente em que teria imputado a ele esses estados de

espiacuterito ou seja intenccedilatildeo ou propoacutesito e conhecimento ou crenccedila E dizem que a

638

HEDWIG et al 2014 639

PREMACK WOODRUFF 1978

140

empatia natildeo se sustentaria se as escolhas do animal fossem afetadas pela

identidade do ator

Na sessatildeo seguinte Sarah viu outras quatro cenas relacionadas a coisas que

estava acostumada a presenciar no cotidiano mas que para as quais natildeo havia sido

treinada uma em que o ator tentava sem sucesso sair da jaula outra em que

tentava sem sucesso ligar um aquecedor chegando a chutaacute-lo levemente

estremecendo e cruzando os braccedilos para demonstrar estar com frio outra em que

tentava fazer funcionar um fonoacutegrafo desplugado da tomada e uma uacuteltima em que o

ator natildeo conseguia lavar o chatildeo porque a mangueira que usava natildeo estava

devidamente conectada agrave torneira Na primeira sessatildeo a macaca Sarah recebeu

quatro fotos cada uma representando uma das situaccedilotildees e outras quatro uma com

uma chave outra com uma mangueira outra com um cabo eleacutetrico ligado na tomada

corretamente e uma uacuteltima com um cone de papel aceso Ela associou

corretamente essas fotos como objetos agraves fotos das situaccedilotildees Os pesquisadores

aqui ressaltam que natildeo haacute correspondecircncia fiacutesica entre algueacutem querendo sair de

uma jaula e uma chave nem entre um cone de papel em chamas e algueacutem

tremendo e olhando para um aquecedor

A etapa seguinte foi ainda mais complexa apresentou-se a Sarah trecircs

versotildees de cada objeto ou seja uma chave intacta outra torcida outra quebrada

uma mangueira conectada outra natildeo conectada outra conectada e ao mesmo

tempo cortada o mesmo em relaccedilatildeo ao cabo eleacutetrico e o papel apagado aceso ou

jaacute queimado Ela novamente obteve ecircxito associando o item correto agrave situaccedilatildeo

correta

Em uma nova etapa as cenas do primeiro experimento foram repetidas desta

vez com dois atores um treinador de quem Sarah gostava e outro por quem natildeo

demonstrava afeto Ambos em imagens em que obtinham sucesso nas tarefas e

tambeacutem em imagens em que natildeo obtinham sucesso utilizando uma vara de

comprimento mais curto passando pela caixa caindo sobre ela deitado com os

blocos de cimento espalhados Sarah selecionou as oito alternativas ldquoboasrdquo quando

o ator era aquele com quem simpatizava e apenas duas quando o ator era o outro

Os pesquisadores acrescentaram em seguida uma terceira situaccedilatildeo nem ldquoboardquo nem

ldquomaacuterdquo mas somente irrelevante O resultado das escolhas das fotografias manteve-

se reduzindo ainda para um o nuacutemero de alternativas ldquoboasrdquo para o outro ator

141

Hampton640 testou macacos-rhesus para metamemoacuteria641 os animais

optariam por escolher participar de um teste de memoacuteria ou natildeo Se decidissem

participar seriam recompensados com amendoim se acertassem e natildeo receberiam

nada se falhassem Se recusassem o teste ganhariam uma guloseima da qual

gostavam menos que de amendoim Os macacos que tinham desempenho mais

baixo preferiram desistir do teste e os que o tinham melhor desempenho insistiram

nele Hampton concluiu que os animais estariam assim reconhecendo quando se

lembram

Tambeacutem Rosati e Santos642 testaram trinta macacos-rhesus sem treinamento

preacutevio com o fim de tentar verificar a presenccedila da chamada metacogniccedilatildeo Em um

de dois tubos dispostos em forma de ldquoVrdquo o experimentador colocou uma isca um

alimento sem que os animais soubessem em qual Como controle aleacutem de verificar

o comportamento em caso de verem onde a isca teria sido colocada tambeacutem nesta

condiccedilatildeo se realizou o teste com um uacutenico tubo a fim de verificar se haveria

sondagem Os animais que natildeo sabiam da localizaccedilatildeo da isca no experimento com

os dois tubos dirigiram-se mais frequentemente para o ponto de convergecircncia a fim

de descobrirem a localizaccedilatildeo do alimento levando as pesquisadoras que ressaltam

que neste estudo observou-se pela primeira vez em animais natildeo humanos uma

resposta de busca de informaccedilatildeo em uma situaccedilatildeo para eles ineacutedita a concluirem

que eles podem buscar informaccedilotildees espontaneamente sobre algo que reconhecem

desconhecer o que as fez sugerir que esses macacos podem apresentar processos

metacognitivos semelhantes aos dos humanos

Em uma gama de testes cognitivos como para verificar a noccedilatildeo de

causalidade os primatas demonstraram grande eficaacutecia Um exemplo satildeo os

experimentos reproduzidos por Girndt e colaboradores643 e Martin-Ordas Call e

Colmenares644 com chimpanzeacutes (P troglodytes) orangotangos (P pygmaeus)

bonobos (Pan paniscus) e gorilas (Gorilla gorilla gorilla) em que com um

instrumento (no primeiro caso optando entre uma vareta ou um ancinho) tinham de

empurrar ou puxar o alimento (recompensa) sobre uma plataforma em forma de ldquoUrdquo

fixada externamente agrave grade com uma armadilha ou seja uma abertura pela qual a

640

HAMPTON 2001 641

SHATTLEWORTH 2010 p 244 642

ROSATI SANTOS 2016 643

GIRNDT et al 2008 644

MARTIN-ORDAS CALL COLMENARES 2008

142

recompensa se caiacutesse seria perdida (no primeiro estudo com variaccedilotildees como a

posiccedilatildeo e o nuacutemero das ferramentas disponiacuteveis) Em uma segunda etapa somente

no segundo estudo mencionado eles tinham de realizar tarefa similar dentro de dois

tubos fixados horizontalmente na grade tambeacutem contendo cada um uma armadilha

mas em um lado em um tubo e em outro lado no outro tubo Neste teste os animais

tinham de representar mentalmente o lado em que inseririam a ferramenta e entatildeo

tiveram menor ecircxito

Em experimento com macacos-rhesus (Macaca mulatta) Phillips e Santos645

associaram pequenas peccedilas de plaacutestico a uma metade de coco ou a uma maccedilatilde

parecendo pedaccedilos destes Um dos frutos foi colocado em uma caixa cheia de

folhas onde somente a peccedila de plaacutestico era retirada mostrada ao animal e colocada

novamente A peccedila anteriormente foi associada a um fruto ou outro e em cada

experimento podia ser colocada na caixa com o fruto com o qual fora associada ou

com o outro Os animais que tinham a peccedila associada ao fruto que natildeo estava na

caixa procuraram na caixa por mais tempo do que os que a tinham associado ao

fruto que estava dentro da caixa jaacute que procuravam pelo outro fruto Os

pesquisadores concluiacuteram assim que esses animais segundo o termo que utilizam

ldquoindividuamrdquo objetos segundo seus tipos e segundo suas propriedades

Tornou-se bastante conhecido o experimento de Brosnan e De Waal646 que

mostra como macacos-prego (Sapajus apella) lidam com a desigualdade Nesses

testes dois animais separados por uma grade eram submetidos por vez Cada um

dava uma pequena pedra como ficha ao experimentador Um deles recebia em troca

um pedaccedilo de pepino e o outro recebia uma uva alimento de que gostam mais O

que recebia o pedaccedilo de pepino tinha maior tendecircncia a rejeitar o alimento nesse

caso realizando movimentos de insatisfaccedilatildeo que mostravam seu desejo pela uva

Esses movimentos foram por vezes intensificados quando o outro passou a receber

a uva sem dar a pedra ou seja sem fazer qualquer esforccedilo Nos testes de controle

em que havia apenas um macaco natildeo houve repulsa pelo pepino Os pesquisadores

verificaram que os animais se baseiam na interaccedilatildeo com o outro coespeciacutefico e

sugerem que poderiam estar sob o efeito de expectativa frustrada e sendo movidos

por certas emoccedilotildees sociais

645

PHILLIPS SANTOS 2006 646

BROSNAN DE WAAL 2003

143

Lakshminarayanan e Santos647 realizaram experimentos com macacos-prego

tambeacutem treinados para trocar fichas por alimento entre um experimentador humano

que dava um pedaccedilo de maccedilatilde por um preccedilo e outro que dava um pedaccedilo e meio

pelo mesmo preccedilo os macacos escolheram este No experimento seguinte um

experimentador ofereceu um pedaccedilo de maccedilatilde e outro ofereceu dois pedaccedilos e meio

de maccedilatilde sendo que depois de negociar o segundo poderia retirar um pedaccedilo e o

primeiro poderia adicionar um pedaccedilo Os macacos passaram a evitar aquele e a

negociar somente com este mostrando aversatildeo agrave perda e que natildeo computam

somente o valor geral esperado

Os pesquisadores desenvolveram em seguida um experimento de risco em

duas etapas Na primeira os dois experimentadores ofereciam trecircs pedaccedilos de

maccedilatilde mas um natildeo retirava nada ou retirava dois de uma vez e o outro sempre

retirava um soacute sendo aquele entatildeo o escolhido pelos animais para negociar Jaacute na

segunda os dois experimentadores ofereciam um pedaccedilo de maccedilatilde mas um em

seguida acrescentava somente um enquanto o outro podia acrescentar outros dois

ou entatildeo nenhum e o primeiro foi o escolhido Os macacos apresentaram inclinaccedilatildeo

ao risco em um ambiente de perda e o rejeitaram em um ambiente de ganho

Em uma etapa seguinte os pesquisadores repetiram os experimentos usando

barra de cereal e pedaccedilos de frutas no lugar das fichas e os animais preferiram ficar

com o alimento que jaacute possuiacuteam Lakshminarayanan e Santos concluiacuteram que os

animais portam-se de modo similar aos humanos na tomada de decisatildeo

considerando as mudanccedilas de preferecircncias baseadas em escolhas

Em relaccedilatildeo agrave competecircncia numeacuterica Boysen e Berntson648 demonstraram

que a chimpanzeacute Sheba podia contar e somar nuacutemeros com resultados que iam de 1

a 4 empregando os meacutetodos descritos anteriormente para o papagaio Alex (aqui

com o animal deslocando-se para observar o conteuacutedo das bandejas) e tambeacutem

sem que tenha havido ensaio para transposiccedilatildeo das quantidades de itens para

algarismos de numerais araacutebicos

Kawai e Matsuzawa649 analisaram os estudos de Tomonaga e

colaboradores650 e os de Tomonaga e Matsuzawa651 que empregaram nuacutemeros em

647

LAKSHMINARAYANAN SANTOS 2012 648

BOYSEN BERNTSON 1989 649

KAWAI MATSUZAWA 2000b 650

TOMONAGA et al 1993 651

TOMONAGA MATSUZAWA 2000

144

uma tela de viacutedeo inclusive com itens curingas substituindo nuacutemeros para testar o

tempo de resposta relacionado a uma ordenaccedilatildeo numeacuterica crescente por uma

fecircmea de Pan troglodytes chamada Ai Ao tocar determinado nuacutemero diretamente na

tela se ela o fizesse ao correto somente ele desaparecia e se tocasse algum outro

todos desapareceriam reiniciando uma nova combinaccedilatildeo em uma nova sessatildeo No

final do teste feito corretamente Ai recebia recompensa e cada erro era seguido

somente de uma campainha Depois de um primeiro momento de exerciacutecio livre os

pesquisadores treinaram-na com reforccedilo sequencial com trinta e seis sequecircncias de

dois algarismos araacutebicos de 0 a 9 e ao aprendecirc-las o animal realizou com ecircxito a

transferecircncia de cardinal para ordinal selecionando as sequecircncias respectivas

corretas e recebendo a recompensa

No estudo seguinte ao treinarem Ai com oitenta e quatro combinaccedilotildees de

trecircs diacutegitos com acreacutescimo de um ou dois curingas na sequecircncia os pesquisadores

observaram que a identificaccedilatildeo de nuacutemeros mais proacuteximos agraves sequecircncias iniciais foi

mais demorada e a de nuacutemeros maiores na sequecircncia levou um tempo mais curto

o que sugeriu que a chimpanzeacute teria considerado toda a sequecircncia numeacuterica antes

de dar a primeira resposta No entanto quando os nuacutemeros maiores foram

primeiramente selecionados se deu o contraacuterio Isto e tambeacutem a reduccedilatildeo de tempo

de resposta para o menor nuacutemero diante do aumento do intervalo entre o nuacutemero

menor e o segundo menor foram interpretados como ldquoefeito da distacircncia

simboacutelicardquo652 que eacute verificado quando ocorre um desempenho superior mediante a

maior distacircncia ordinal entre as sequecircncias de caracteres (por exemplo quando se

verifica melhor desempenho entre 6-9 do que entre 2-3) Os testes assim revelaram

efeitos de posiccedilatildeo serial e de distacircncia simboacutelica observados no julgamento

comparativo humano

Tomonaga e Matsuzawa fazem referecircncia a testes semelhantes realizados

anteriormente com macacos-prego (Sapajus apella)653 e pombos (Columba livia)654

com seacuteries de cinco algarismos e itens curingas substitutos nos quais os pombos

treinados escolheram os nuacutemeros aleatoriamente ao passo que os macacos-prego

demonstraram ter algum conhecimento do posicionamento numeacuterico ordinal

652

ldquoSymbolic-distance effectrdquo 653

DrsquoAMATO COLOMBO 1989 654

TERRACE 1995

145

Outro trabalho analisado por Kawai e Matsuzawa o de Biro e Matsuzawa655

foi realizado tambeacutem com a seacuterie de trecircs nuacutemeros no mesmo intervalo mas quando

o animal apontava diretamente para o nuacutemero menor em seguida os outros dois

trocavam de posiccedilatildeo Nos testes realizados corretamente por Ai a duraccedilatildeo entre a

escolha do primeiro e do segundo nuacutemero era maior que essa mesma duraccedilatildeo nos

testes que ela realizou incorretamente quando mesmo assim Ai apontava o local jaacute

apagado do terceiro nuacutemero apoacutes a mudanccedila no conteuacutedo do visor com taxa maior

de erro quando os nuacutemeros eram mais proacuteximos Os pesquisadores concluiacuteram

deste estudo que o animal teria inspecionado ainda no iniacutecio da tentativa os trecircs

nuacutemeros e em seguida decidido a ordem em que os selecionaria e inclusive

planejado a sequecircncia motora que julgou ser mais apropriada para chegar agrave

resposta certa ou seja que o animal apresentou como estrateacutegia planejamento

monitoramento e ajustes flexiacuteveis quando houve mudanccedila de condiccedilotildees algo similar

ao que seria esperado de um humano

Kawai e Matsuzawa656 apontam que as conclusotildees obtidas nesses estudos

estatildeo em consonacircncia com outro que haviam publicado pouco antes657 no qual

investigaram a memoacuteria do animal para sequecircncias de cinco numerais no intervalo

de zero a nove e verificaram que Ai podia contar ateacute nove itens e ordenar em

sequecircncia neste intervalo Os nuacutemeros eram exibidos por um tempo cada vez mais

curto e logo convertidos em quadrados nos quais o animal tocaria obedecendo agrave

ordem haacute pouco observada Posteriormente essa tarefa passou a ser executada

com algarismos de 1 a 9 e Inoue e Matsuzawa658 realizaram um estudo comparativo

entre chimpanzeacutes e humanos nos quais aqueles apresentaram melhor desempenho

que estes

Em experimentos como o de Livingstone e colaboradores659 este com

macacos-rhesus (Macaca mulatta) verificou-se que alguns primatas aprendem a

associar algarismos araacutebicos e conjuntos de pontos (de tamanhos variados)

numericamente correspondentes agrave quantidade de alimento que recebem como

recompensa Os espeacutecimes treinados pelos autores tocavam os numerais ou os

conjuntos presentes em pares em uma tela de um aparelho de viacutedeo e escolheram

655

BIRO MATSUZAWA 1999 656

KAWAI MATSUZAWA 2000b 657

Id 2000a 658

INOUE MATSUZAWA 2007 659

LIVINGSTONE et al 2010

146

predominantemente as quantidades maiores que lhes proporcionariam um nuacutemero

maior de recompensas no caso pequenas doses de suco com uma quantidade

pequena de erro nos pares de nuacutemeros maiores e nos pares de conjuntos de

pontos de tamanhos parecidos

Com o fim de testar o chamado raciociacutenio analoacutegico em chimpanzeacutes num

outro experimento realizado com Sarah por Premack e Woodruff este tambeacutem

incluindo Gillan660 em uma primeira etapa foram apresentados ao animal cartotildees

com figuras geomeacutetricas coladas a saber triacircngulo lua crescente ou um quadrado

com um recorte triangular (como uma bandeirinha de festa junina) coloridas de azul

amarelo verde ou laranja variando entre trecircs tamanhos diferentes e podendo estar

marcadas com um ponto preto central ou natildeo Disto se montou setenta e duas

combinaccedilotildees diferentes Do lado esquerdo no cartatildeo as figuras A acima e Arsquo

abaixo seriam o modelo Do lado direito encontrava-se a figura B acima e um

espaccedilo vazio abaixo E mais abaixo a figura Brsquo que se relacionava com B

analogicamente (conforme cor formato ou outra das caracteriacutesticas) a Arsquo em

relaccedilatildeo a A e ao lado dela a figura C que seria a resposta errada ao problema

Sarah deveria indicar Brsquo utilizando um retacircngulo amarelo escrito ldquoSAMErdquo661

Em uma nova etapa o animal realizou a mesma tarefa indicando se a

combinaccedilatildeo era a mesma (B e Brsquo com ldquoSAMErdquo) ou se era diferente (B e C com

ldquoDIFFERENTrdquo)

No experimento seguinte Sarah deparou com cartotildees contendo objetos

caseiros que lhe eram familiares Por exemplo com um em que havia um cadeado

acima (A) e uma chave abaixo (Arsquo) do lado esquerdo e uma lata acima (B) do lado

direito com espaccedilo abaixo sendo aqui oferecidas a figura de um pincel (C) e a de

um abridor de latas (Brsquo) e com outro em que havia um papel (A) acima e um laacutepis

(Arsquo) abaixo do lado esquerdo e uma lata (B) em cima do lado direito com espaccedilo

abaixo sendo aqui oferecidas as mesmas figuras de abridor de latas (C) e pincel

(Brsquo)

Os pesquisadores concluiacuteram que Sarah resolveu os problemas por raciociacutenio

analoacutegico e pelo uso de classes conceituais o que teria sido corroborado na etapa

seguinte em que se empregou uma figura CB que tinha relaccedilatildeo com B mas

660

GILLAN et al 1981 661

ldquoMesmordquo

147

diferente daquela entre Arsquo e A (sendo entatildeo a resposta errada) e outra CA que se

relacionava com Arsquo na qual Sarah novamente obteve ecircxito

Em relaccedilatildeo agrave comunicaccedilatildeo no experimento de Zimmermann e

colaboradores662 realizado com chimpanzeacutes e bonobos criados em ambientes

humanos e outros criados em ambientes natildeo humanos a fim de verificar se os

animais levam em consideraccedilatildeo a perspectiva de um ajudante humano ao

apontarem onde se encontra um objeto escondido bonobos e orangotangos

apontaram consistentemente para o local onde havia comida escondida bem como

para um objeto escondido com o qual um voluntaacuterio humano pegaria a comida aqui

no caso um garfo (que o animal por si soacute natildeo usaria) Segundo os pesquisadores o

estudo sugere que os animais compreenderam a natureza referencial seletiva do

ato de apontar para alvos distintos Os orangotangos apontaram mais para o garfo

quando este era escondido na ausecircncia do agente humano do que nas vezes em

que era escondido na presenccedila deste Isto mais o fato de os animais apontarem

para o humano depois que este ia procurar o objeto em seu lugar habitual e natildeo

encontrava levaram o pesquisador a sugerir que esses macacos imitam ldquoa

propriedade de relevacircncia da comunicaccedilatildeo humanardquo663

Nos anos de 1930 alguns pesquisadores como Winthrop Kellogg e Luella

Kellogg664 tentaram ensinar chimpanzeacutes a falar mas verificou-se que seu aparelho

vocal natildeo possibilitava mais do que algumas palavras Alguns anos depois outros

estudiosos passaram a tentar-lhes ensinar a linguagem manual dos sinais

especificamente a American Sign Language (ASL) como Allen Gardner e Beatrice

Gardner665 que o fizeram com o chimpanzeacute fecircmeo Washoe Os pesquisadores

obtiveram como exemplo de resultados a distinccedilatildeo por parte do animal entre ldquoflorrdquo e

ldquocheirordquo666 e o uso de um mesmo sinal para flores dentro de casa para as que

estavam ao ar livre e ateacute para as que estavam em fotografias aleacutem do uso de sinais

de ecircnfase como ldquopor favor (please)rdquo ldquomais raacutepido (hurry)rdquo e ldquoquero mais (more)rdquo667

662

ZIMMERMANN et al 2009 663

ldquo[] the relevance property of human communicationrdquo 664

KELLOG W N KELLOG L A 1967 p 282-287 665

GARDNER R A GARDNER B T 1969 666

Respectivamente ldquoflowerrdquo e ldquosmellrdquo 667

Respectivamente ldquopleaserdquo ldquohurryrdquo e ldquomorerdquo

148

Segundo Miles668 o orangotango Chantek chegou a conhecer cerca de cento

e quarenta sinais manuais e diz George669 pareceu esboccedilar o iniacutecio de uma

conversa ao expressar a frase ldquoJeannie Chantek chaserdquo670

Dentre as outras accedilotildees de Chantek destacamos seu reconhecimento no

espelho que passou a utilizar para limpar-se e a sua capacidade de enganar a

treinadora tanto roubando alimento de seu bolso enquanto puxava a matildeo dela na

direccedilatildeo oposta como fingindo engolir a borracha de apagar que roubara mantendo-

a no canto da boca apoiando novamente o estojo e logo em seguida pedindo

comida por meio dos sinais Aqui Miles aponta evidecircncias de que o animal teria

demonstrado intencionalidade premeditado e assumido a perspectiva do outro

como proposto pela teoria da mente que implicam formaccedilatildeo de imagem mental

relacionada aos resultados desses atos Outro sinal disto foi a melhora do sinal

apresentado apoacutes o pedido do treinador sugerindo que o animal entendeu que o

sinal teria uma forma ideal refletida em sua imagem mental Chantek passou a

sinalizar tambeacutem com o peacute e com objetos como lacircminas de tesouras Miles afirma

que ele natildeo tinha os sinais somente como uma habilidade motora associada a algo

o que evidenciaria que o modo de processar os sinais teria natureza abstrata e

representacional O animal ainda chamava a atenccedilatildeo de um humano antes de

comeccedilar a sinalizar chegava a oferecer as matildeos para que fossem moldadas a fim

de que passasse a conhecer um sinal novo e passou a inventar seus proacuteprios

sinais mostrando ter entendido a natureza representacional dos sinais Assim

conclui ter-se-ia um exemplo de um animal que formou representaccedilotildees do mundo

real

Tomasello671 publicou uma revisatildeo sobre os avanccedilos de experimentos com

grandes macacos treinados para a comunicaccedilatildeo humana como o chimpanzeacute

Washoe a gorila Koko (apelido de Hanabiko) e o orangotango Chantek mas com

ecircnfase nos trabalhos desenvolvidos com o bonobo Kanzi que reuniu um repertoacuterio

de mais de trecircs mil palavras672 e afirma que a conclusatildeo geral eacute a de que estes

possuem a maior parte das habilidades cognitivas que servem como requisito para

algo que seria como a linguagem humana como o uso de siacutembolos linguiacutesticos

668

MILES 1990 669

GEORGE 2003 670

Traduccedilatildeo sugerida ldquoChantek persegue Jannierdquo MILES 1990 p 521 671

TOMASELLO 2017 672

RAFFAELE 2006

149

semelhante ao humano dos quais compreendem e produzem combinaccedilotildees de

maneira criativa

A gorila Koko que veio a tornar-se bastante famosa conheceu um repertoacuterio

bastante vasto da linguagem manual dos sinais da ASL em que utilizava mais de mil

palavras e reconhecia mais de duas mil673 Em certa etapa seu desenvolvimento

acompanhou sob muitos aspectos o de crianccedilas humanas mas sob outros ficava

aqueacutem destas No entanto aos quatro anos e meio jaacute pontuava acima de crianccedilas

de seis anos em alguns testes ditos de ldquoprogressatildeo loacutegicardquo como em uma

sequecircncia de quatro figuras de cartas com um triacircngulo e um ciacuterculo em que estes

alternavam com relaccedilatildeo agrave posiccedilatildeo superior e inferior (a primeira tinha o ciacuterculo

acima) e cada ciacuterculo a partir do segundo era maior que o anterior enquanto os

triacircngulos possuiacuteam o mesmo tamanho A quinta carta seguinte teria de ser um

grande ciacuterculo sobre o mesmo triacircngulo e Koko rapidamente a indicou entre outras

trecircs com triacircngulos e ciacuterculos em outras condiccedilotildees674

Se por um lado do teste da marca diante de um espelho realizado Allen e

Schwartz675 com um espeacutecime de gorila (G gorilla gorilla) chamado Otto apesar de

este ter obtido ecircxito os autores consideraram como inconclusiva a identificaccedilatildeo de

autorreconhecimento por outro Koko claramente se reconhecia no espelho e

inclusive indicava partes de seu rosto676 Segundo Patterson ela utilizava elementos

da linguagem aberta e produtivamente677 Koko se referia a eventos passados (como

quando se referiu a um fato ocorrido no dia anterior) e reconhecia o futuro proacuteximo

(como quando ia-se preparar depois de informada de que logo iria sair)678 dizia

quando gostava de algo ou de algueacutem quando oferecia algo como uma bebida para

algueacutem679 e dizia pares de palavras que rimavam entre si quando solicitada a fazecirc-

lo ou quando lhe pediam uma rima para uma palavra especiacutefica ela o fornecia680

Dava tambeacutem outras demonstraccedilotildees de humor como quando espontaneamente

chamava o nariz de ldquofake mouthrdquo681 brincava com as palavras em muitos casos

como o fazem crianccedilas como por exemplo aglutinando elementos moldando seu

673

THE GORILLA FOUNDATION 2018 674

PATTERSON LINDEN 1981 p 100 675

ALLEN SCHWARTZ 2007 676

PATTERSON LINDEN 1981 p 108 677

Ibid p 157 678

Ibid p 150-151 679

Ibid p 91 680

Ibid p 111 681

ldquoFalsa bocardquo PATTERSON LINDEN 1981 p 112

150

proacuteprio vocabulaacuterio e expressava em palavras certas emoccedilotildees como seus medos

inclusive xingando quem a contrariasse tendo espontaneamente passado a usar

palavras especiacuteficas para isto como ldquobirdrdquo682 e ateacute mentia para acusar algueacutem de

um erro que ela mesma cometida ou para disfarccedilar algo de errado que estivesse

fazendo ao ser pega em flagrante683 Quando natildeo sabia o nome de algum objeto ela

mesma atribuiacutea a este um como quando passou a chamar maacutescara ldquonose fakerdquo684

Isso tambeacutem indicaria segundo Patterson capacidade de estabelecer analogias e

metaacuteforas Assim Koko foi submetida a certo teste em que teria de reconhecer por

exemplo se uma cor era alegre ou triste ou se era suave ou pesada e passou com

desempenho superior ao de algumas crianccedilas com a idade de sete anos tambeacutem

testadas685

Pika e colaboradores incluindo o proacuteprio Tomasello686 mencionam o uso de

meacutetodos utilizados pelos grandes siacutemios para captar atenccedilatildeo para chamar a

atenccedilatildeo de outros para algo Este como exemplifica Tomasello687 pode ser o

proacuteprio sujeito uma parte do corpo deste ou algum objeto externo o que deveraacute

induzir o outro indiviacuteduo a fazer o que o sujeito que chamou sua atenccedilatildeo intenciona

E Tomasello acrescenta que ateacute onde se sabe somente os grandes primatas

chamam a atenccedilatildeo dos outros deste modo em seu processo de comunicaccedilatildeo

natural Ele observa que Kanzi consegue entender e produzir dispositivos

comunicativos a partir do modo como funciona psicologicamente a comunicaccedilatildeo

referencial o que significa que ao dirigir a atenccedilatildeo do outro eles estatildeo conseguindo

atingir um objetivo especiacutefico

Savage-Rumbaugh688 quem com colaboradores teria segundo afirma

realizado o primeiro experimento em que chimpanzeacutes estabeleceram comunicaccedilatildeo

entre si por meio do uso de siacutembolos689 relata que Kanzi se destaca pelo fato de

que observava desde pequeno os testes com lexigramas realizados com sua matildee

Matata e conseguiu aprender mais lexigramas do que ela desenvolvendo-se por si

mesmo em vez de por treinamento direto reforccedilado externamente tendo por

recompensa a conquista da comunicaccedilatildeo e o que esta lhe propiciava Os lexigramas

682

ldquoAverdquo PATTERSON LINDEN 1981 p 119-121 e 142 683

Ibid p 135 684

ldquoNariz falsordquo Ibid p 117 685

Ibid p 117 686

PIKA et al 2005 687

TOMASELLO 2017 688

SAVAGE-RUMBAUGH 1986 689

SAVAGE-RUMBAUGH et al 1978

151

satildeo iacutecones de computador que correspondem a palavras e aparecem em uma tela

para os animais em teste a fim de que a toquem no ponto exato em que veem o

iacutecone da palavra que pretendem expressar Se tocam nos iacutecones corretos em

relaccedilatildeo agrave determinada questatildeo recebem a recompensa Tomasello compara o

vocabulaacuterio de Kanzi ao de crianccedilas pequenas e tal compreensatildeo tambeacutem eacute

observada em papagaios catildees e outros animais mas nestes adquirida e produzida

somente mediante treinamento direto Compunham o vocabulaacuterio nomes proacuteprios

nomes de objetos localizaccedilotildees accedilotildees propriedades e adveacuterbios com certas

funccedilotildees como ldquosimrdquo e ldquonatildeordquo O pesquisador aponta a construccedilatildeo de sentenccedilas por

parte do animal com o emprego de accedilotildees que natildeo satildeo deduziacuteveis dos objetos

envolvidos como ldquoponha o dinheiro sobre os cogumelosrdquo690 e outras em que

poderia facilmente haver reversatildeo dos papeacuteis dos objetos envolvidos como ldquoponha

um pouco de leite na aacuteguardquo691

Remetendo-se a outro estudo seu692 Tomasello menciona ainda que Kanzi

tem uma categoria gramatical que o possibilita compreender coisas jaacute conhecidas de

novas maneiras e entende que a ordem das palavras pode ser usada como

dispositivo simboacutelico de diferenciaccedilatildeo e daacute como exemplos a resposta correta do

animal a comandos em que se troca somente o sujeito como ldquoponha o chapeacuteu em

sua bolardquo e ldquoponha a bola no chapeacuteurdquo693 e o entendimento por parte de Kanzi de

que aquele que pratica a accedilatildeo como ldquomorderrdquo ou ldquoperseguirrdquo694 vem antes do que

sofre a accedilatildeo decerto levando em conta aqui a voz ativa Conclui entatildeo que ele

entende certos eventos e certas accedilotildees bem como as palavras usadas para designaacute-

los que deles participam agentes cuja ordem em que aparecem na construccedilatildeo da

frase representa um papel especiacutefico tal como ocorre com uma crianccedila de dois

anos Diz o pesquisador

Ele sabe que o sujeito que estaacute mordendo ou perseguindo eacute mencionado antes de lsquomorderrsquo ou lsquoperseguirrsquo e o que estaacute sendo mordido ou perseguido eacute apenas mencionado depois Ele sabe essas coisas presumidamente porque viu uma ordem pareada com uma versatildeo do evento chave (por exemplo X perseguindo Y) e outra ordem pareada com outra versatildeo do mesmo evento (por exemplo Y perseguindo X)

695

690

ldquoPut the Money on the mushroomsrdquo 691

ldquoPut some milk on the waterrdquo 692

TOMASELLO 1994 693

Respectivamente ldquoput the hat on your ballrdquo e ldquoput the ball on the hatrdquo 694

Respectivamente ldquobiterdquo e ldquochaserdquo 695

TOMASELLO 2017 p 100

152

Tomasello assim distingue dois niacuteveis em relaccedilatildeo agrave competecircncia gramatical

O primeiro eacute a produccedilatildeo inovadora de combinaccedilotildees de siacutembolos criando novos

significados o que exemplifica com o chimpanzeacute Washoe referindo-se a um pato

como ldquowater birdrdquo696 O segundo satildeo essas combinaccedilotildees que um sujeito pode

produzir com siacutembolos especiacuteficos que servem como marcadores gramaticais Para

exemplificar o pesquisador aponta a ausecircncia de indicaccedilotildees simboacutelicas de como

esses dois signos ldquowaterrdquo e ldquobirdrdquo se relacionam entre si e assim cabe ao receptor

ou ouvinte estabelecer a relaccedilatildeo Uma dessas relaccedilotildees eacute a ordem exemplificada

mais acima em que se usa em uma frase primeiro um substantivo como sujeito e

depois (do verbo) outro como objeto direto Segundo o pesquisador Kanzi utiliza

alguns padrotildees de ordem consistentes utilizando lexigramas que correspondem a

uma accedilatildeo (primeiro elemento) geralmente antes do objeto da accedilatildeo (segundo

elemento) Mas ele por fim observa que uma coisa eacute haver consistecircncia no padratildeo

de ordenamento e outra eacute usar a ordem como dispositivo gramatical para produccedilatildeo

de um significado consistente que caracterize uma segunda ordem Isto mesmo

quando Kanzi combina de modo criativo os lexigramas com gestos que normalmente

vecircm em seguida como o de apontar para quem estaacute realizando alguma accedilatildeo ou

para o local para o qual a accedilatildeo seraacute dirigida

696

ldquoAve de aacuteguardquo

153

7 A INTELIGEcircNCIA NOS ANIMAIS SEGUNDO O ARISTOTELISMO-TOMISMO

Tendo selecionado assim algumas das principais habilidades cognitivas

comprovadas e inclusive outras sugeridas de animais natildeo humanos a partir de

trabalhos com pesquisas experimentais e de campo e de posse da informaccedilatildeo

estruturada necessaacuteria no acircmbito da psicologia aristoteacutelico-tomista buscaremos

enquadrar essas habilidades dentro dos limites entre o conhecimento adquirido

pelos sentidos nos animais natildeo humanos e aquele adquirido pelos sentidos no

homem bem como pelo intelecto a fim de darmos iniacutecio agrave verificaccedilatildeo da

compatibilidade entre a proposta aristoteacutelico-tomista e o que se sabe atualmente

sobre a chamada inteligecircncia nesses entes

O proacuteximo passo assim eacute retomarmos a obra de Aristoacuteteles e Tomaacutes de

Aquino para estabelecermos esses limites a partir da construccedilatildeo anterior e do que

os autores afirmam diretamente sobre o tema

Aristoacuteteles afirma que a alma de uma crianccedila pequena praticamente em nada

difere da de alguns animais com o ceacuterebro mais desenvolvido697 ou seja que estes

podem expressar caracteriacutesticas no acircmbito da potecircncia estimativa observadas

naquelas algo que reflete diretamente na questatildeo das habilidades cognitivas

Ele ilustra o que diz afirmando que nos animais encontram-se estados

psicoloacutegicos semelhantes aos dos humanos e elenca alguns como ldquodocilidade ou

ferocidade doccedilura ou aspereza coragem ou covardia temor ou ousadia paixatildeo e

maliacutecia e no plano intelectual certa sagacidaderdquo698 dentre outros traccedilos de caraacuteter

como a indolecircncia a irascibilidade a prudecircncia e a timidez a obstinaccedilatildeo e a

estupidez a vileza e a perfiacutedia a nobreza e a braveza a astuacutecia a afetuosidade a

inveja e a presunccedilatildeo a cautela e o brio

Afirma entatildeo que ainda que os demais animais tenham memoacuteria e faculdade

de aprendizagem o homem eacute o uacutenico que apresenta capacidade de reflexatildeo pois

soacute ele eacute capaz de recordar voluntariamente699

Quanto ao ato voluntaacuterio diz ele que o tecircm as crianccedilas e os animais natildeo

humanos que agem voluntariamente natildeo pela vontade livre ou por algo de origem

externa mas espontaneamente no sentido de que satildeo voluntaacuterias as accedilotildees

697

ARISTOacuteTELES 1992 L VIII 588a-588b p 412 698

ldquo[] docilidad o ferocidad dulzura o aspereza coraje o cobardiacutea temor u osadiacutea apasionamiento o malicia y en el plano intelectual una cierta sagacidade []rdquo Ibid L VIII 588a p 411

699 Ibid L I 488b p 48

154

praticadas impulsivamente que caracterizam um movimento proacuteprio em razatildeo do

apetite em conformidade com as afecccedilotildees da vontade sensitiva como o desejo

sensual e a raiva700 Mas nem nos animais natildeo humanos nem nas crianccedilas existe

escolha ainda que possa existir uma opiniatildeo sobre o que se haacute ou natildeo de fazer

uma opccedilatildeo sobre o que mais conveacutem a determinado fim701 jaacute que lhes falta o juiacutezo

o fundamento do ato e a deliberaccedilatildeo cuja parte da alma relacionada considera as

causas como aponta o Estagirita o ldquoem vista do quecircrdquo e o ldquopor quecircrdquo que entatildeo

conclui que ldquotudo o que foi escolhido deliberadamente eacute voluntaacuterio mas nem tudo o

que eacute voluntaacuterio eacute escolha deliberadardquo702

Assim enquanto o homem tem o conhecimento perfeito do fim em que satildeo

apreendidas a coisa constitutiva do fim aleacutem da ideia de fim e a da proporccedilatildeo entre

o fim e o ato que a este se ordena os demais animais tecircm pela estimativa o

conhecimento imperfeito do fim restrito agrave apreensatildeo deste e mesmo quando um

objeto por buscar-se natildeo estaacute presente em razatildeo da imaginaccedilatildeo e da memoacuteria

Assim se a essecircncia perfeita da vontade depende do conhecimento perfeito do fim

haacute tambeacutem a vontade em sentido imperfeito que depende do conhecimento

imperfeito do fim e neste caso haacute um movimento para o fim sem deliberaccedilatildeo703

Aristoacuteteles tambeacutem parece atribuir de algum modo inteligecircncia ou prudecircncia

(aqui como frocircnese ou phroacutenesis)704 natildeo soacute aos humanos no sentido de ldquoexaminar

bem o que se refere a si mesmordquo705 que tecircm a inteligecircncia universal por meio da

razatildeo mas a alguns dentre os demais animais que segundo ele ldquoparecem ter

faculdade de provisatildeo para sua proacutepria vidardquo706 no acircmbito de determinados atos

particulares707708

700

ARISTOacuteTELES 1998a L III 1111a-1111b p 184-185 TOMAacuteS DE AQUINO 1964 l 4 427

701 TOMAacuteS DE AQUINO 2003a p 30

702 ldquo[] todo lo que ha sido escogido deliberadamente es voluntario pero no todo lo voluntario

es eleccioacuten deliberadardquo ARISTOacuteTELES 1998b L II 1226b p 460 703

TOMAacuteS DE AQUINO 1993 Q 6 a 2 p 105 704

ldquoΦρόνησιςrdquo Alguns tradutores usam ldquointeligecircnciardquo mas partindo do que se disse anteriormente a respeito do intelecto o termo ldquoprudecircnciardquo parece ser dos dois o mais adequado Natildeo se trataria pois de inteligecircncia propriamente dita sob a oacuteptica aristoteacutelico-tomista

705 ldquo[] examinar bien lo que se refiere a siacute mismordquo ARISTOacuteTELES 1998a L VI 1141a p

278 706

ldquo[] parecen tener la facultad de previsioacuten para su propria vidardquo ARISTOacuteTELES 1998a L VI 1141a p 278

707 Reale (2005 p 7) explica que phroacutenesis aqui tem sentido mais geral e que quando

Aristoacuteteles emprega o termo aos humanos eacute no sentido de ldquosabedoria praacuteticardquo que eacute exclusiva destes

708 ARISTOacuteTELES 1998a L VI 1141a p 278 TOMAacuteS DE AQUINO 2001 Q 96 a 1 p

851 Id 1964a l 6 1187

155

Explica Tomaacutes de Aquino que essa inteligecircncia ou prudecircncia pode ser

encontrada em alguns animais com memoacuteria mas que diferente do homem no qual

ela se daacute quando este racionalmente delibera quanto ao que deve fazer nesses

animais se daacute por um juiacutezo instintivo das coisas por fazer-se de modo que diz ele

ldquonos outros animais a prudecircncia eacute uma estimativa natural sobre a busca daquilo que

eacute adequado e da fuga daquilo que eacute prejudicial como uma ovelha segue sua matildee e

foge do lobordquo709

Em seguida ele distingue nos escritos de Aristoacuteteles trecircs niacuteveis de

conhecimento nos animais natildeo humanos um representado pelos animais que natildeo

tecircm nem memoacuteria nem audiccedilatildeo e portanto natildeo satildeo capazes de ser ensinados nem

tecircm prudecircncia outro por aqueles que tecircm memoacuteria mas natildeo ouvem e entatildeo natildeo

tecircm capacidade para serem ensinados mas podem ter prudecircncia e o terceiro pelos

animais que tecircm memoacuteria e audiccedilatildeo e entatildeo tecircm prudecircncia e podem ser

ensinados710

O sentido de ldquoouvirrdquo nos animais natildeo humanos aqui explica Reale711 estaacute

expresso por Aristoacuteteles

Haacute os que participam por sua vez da capacidade tanto de aprender712

como de ensinar capacidade transmitida seja por seus proacuteprios semelhantes seja pelos homens Estes satildeo todos animais dotados do dom da audiccedilatildeo isto eacute natildeo soacute os que percebem as diferenccedilas dos sons mas tambeacutem os que distinguem a diversidade de significados

713

O Estagirita fornece o exemplo de pequenas aves que se natildeo forem criadas

com os pais podem apresentar cantos diferentes ao que se observa comumente na

espeacutecie Menciona entatildeo o caso de um rouxinol que ensinou os filhotes a cantar

corroborando a afirmaccedilatildeo de que a comunicaccedilatildeo que se daacute como uma participaccedilatildeo

na linguagem nos animais eacute transmitida por um processo educativo714

709

ldquo[] in other animals prudence is a natural estimate about the pursuit of what is fitting and the avoidance of what is harmful as a lamb follows its mother and runs away from a wolfrdquo TOMAacuteS DE AQUINO 1964b L I l 1 11

710 ARISTOacuteTELES 2005 L I 1 980a-980b p 3 TOMAacuteS DE AQUINO 1964b L I l 1 13

711 REALE 2005 p 7

712 Explica Reale (2005 p 7) que aqui se diz ldquoaprenderrdquo no sentido de ser disciplinado ser

adestrado 713

ldquoLos hay que participan a la vez de la capacidad tanto de aprender como de ensentildear capacidad transmitida ya por sus propios semejantes ya por los hombres Eacutestos son todos los animales dotados del don de la audicioacuten es decir no soacutelo los que perciben las diferencias de los sonidos sino tambieacuten los que distinguen la diversidad de significacionesrdquo ARISTOacuteTELES 1992 L IX 608a p 479

714 Ibid L IV 536b p 228-229

156

Os animais natildeo humanos bem como as crianccedilas tecircm representaccedilatildeo e

memoacuteria do particular Essa representaccedilatildeo corresponde agrave imagem apreendida que

eles retecircm e assim eacute pela imaginaccedilatildeo que eles buscam algo ou fogem de algo715 O

aristotelismo-tomismo entatildeo considera que a vida dos animais aos quais chama

imperfeitos eacute regida administrada pela imaginaccedilatildeo e a dos animais aos quais

chama perfeitos o eacute pela memoacuteria e Tomaacutes de Aquino explica que eacute a necessidade

de agir e natildeo o desejo de conhecer que caracteriza o modo como o conhecimento

pertence aos animais716

Reale717 aponta as cinco formas de conhecimento descritas por Aristoacuteteles no

iniacutecio da Metafiacutesica nomeadamente a sensaccedilatildeo a memoacuteria o experimento a arte

e a ciecircncia sendo as uacuteltimas duas somente consideradas como sapiecircncia ou

sabedoria jaacute que ambas se relacionam ao universal conhecem os porquecircs e as

causas dos fatos ao passo que o experimento e a sensaccedilatildeo o fazem ao particular

restringindo-se aos dados dos fatos nesse sentido

Em relaccedilatildeo ao experimento (experimentum) diz Tomaacutes de Aquino

Ora nos homens o que se segue sobre a memoacuteria eacute o experimento do qual alguns animais ainda que muito pouco participam Pois um experimento se forma pelas associaccedilotildees de muitas [intenccedilotildees] singulares recebidas na memoacuteria Esse tipo de correlaccedilatildeo eacute proacuteprio do homem e pertence agrave potecircncia cogitativa (tambeacutem chamada razatildeo particular) a qual compara as intenccedilotildees individuais assim como a razatildeo universal o faz com as intenccedilotildees universais Ora como os animais costumam buscar ou evitar algo a partir de muitas sensaccedilotildees e recordaccedilotildees por isso eacute que parecem participar algo do experimento ainda que pouco No entanto acima do experimento que pertence agrave razatildeo particular os homens tecircm como sua potecircncia principal uma razatildeo universal por meio da qual eles vivem

718

Alguns estudiosos do aristotelismo-tomismo como Manzanedo e Maritain

sugeriram haver aqui algo de cogitativa nestes animais ditos superiores aponta

Echavarriacutea que explica

715

ARISTOacuteTELES 1998a L VII 1147b p 299 TOMAacuteS DE AQUINO 1990b L II c LXVII p 285

716 ARISTOacuteTELES 2005 L I 1 980b p 3 TOMAacuteS DE AQUINO 1964b L I l 1 14

717 REALE 2005 p 5

718 ldquoNow [] in men the next thing above memory is experience which some animals have

only to a small degree For an experience arises from the association of many singular [intentions] received in memory And this kind of association is proper to man and pertains to the cogitative power (also called particular reason) which associates particular intentions just as universal reason associates universal ones Now since animals are accustomed to pursue or avoid certain things as a result of many sensations and memory for this reason they seem to share something of experience even though it be slight But above experience which belongs to particular reason men have as their chief power a universal reason by means of which they liverdquo TOMAacuteS DE AQUINO 1964b L I l 1 15

157

[] a assinalaccedilatildeo parece interessante e digna de ser analisada mas um

pouco apressada e sem fazer as distinccedilotildees adequadas Se haacute cogitativa animal se daacute soacute em alguns animais superiores Por outro lado Santo Tomaacutes considera a cogitativa como uma potecircncia proacutepria do homem e na maior parte das passagens de suas obras que tratam sobre o tema atribui soacute a estimativa aos animais brutos No entanto parece admitir que em alguns deles se decirc uma lsquoparticipaccedilatildeorsquo ainda que pequena desta faculdade

719

Sustentamos aqui esta segunda opccedilatildeo ou seja que esses animais teriam

apenas uma ldquoparticipaccedilatildeordquo da cogitativa relacionada agrave comparaccedilatildeo de intenccedilotildees

assim como muitos destes participam da comunicaccedilatildeo mas natildeo tecircm linguagem que

eacute proacutepria do homem uma vez que natildeo haacute qualquer vestiacutegio do refluxo intelectivo

que caracteriza a cogitativa Explica Muszalski que

Os animais irracionais superiores tecircm a potecircncia memorativa que eacute um tesouro no qual se acumulam as estimaccedilotildees realizadas em relaccedilatildeo agrave conveniecircncia ou prejuiacutezo dos singulares No entanto a repetida operaccedilatildeo de apreender a intentio no homem supotildee uma comparaccedilatildeo ndash denominada aqui ldquoraciociacuteniordquo ndash que natildeo ocorre com o bruto Como unicamente a cogitativa eacute capaz de realizar esse discurso soacute o homem eacute capaz de acumular na memoacuteria uma experiecircncia relacionada aos sensiacuteveis singulares

720

Cabe aqui recordar de modo bastante resumido o que se disse sobre os

sentidos na construccedilatildeo realizada na etapa anterior Enquanto o intelecto considera

as espeacutecies universais a quididade formal e assim as coisas incorpoacutereas como a

sabedoria e as relaccedilotildees das coisas os sentidos externos e internos consideram os

acidentes proacuteprios e comuns das coisas corpoacutereas pelas espeacutecies sensiacuteveis e

dentre os sentidos somente a estimativa e a cogitativa consideram daquelas a

quididade particular721 Deste modo diferentemente do homem que realiza de modo

inteligiacutevel coisas diversas e opostas os demais animais satildeo movidos pela natureza

pelo apetite e pelos sentidos

Por isso as accedilotildees pelas quais fazem as coisas movidos natildeo pela arte mas

pela mesma natureza satildeo ldquodeterminadas uniformes e da mesma espeacutecierdquo o que

Tomaacutes de Aquino exemplifica com a semelhanccedila entre os ninhos das andorinhas e

719

ECHAVARRIacuteA 2009 p 135-136 720

ldquoLos animales irracionales superiores tienen la potencia memorativa que es un tesoro en el cual se acumulan las estimaciones realizadas acerca de la conveniencia o perjuicio de los singulares Sin embargo la repetida operacioacuten de aprehender la intentio en el hombre supone una comparacioacuten mdash denominada aquiacute lsquorazonamientorsquo mdash que no ocurre en el bruto Como uacutenicamente la cogitativa es capaz de llevar a cabo este discurso soacutelo el hombre es capaz de acumular en la memoria una experiencia acerca de los sensibles singularesrdquo MUSZALSKI 2014 p 94

721 TOMAacuteS DE AQUINO 1999 p 97-98 Id 1990b L II c LXVI p 285

158

aquela entre o modo como as aranhas tecem as teias722 Mas como se vecirc pela

complexidade dessas construccedilotildees como a teia de Caerostris darwini os ninhos dos

gecircneros Ptilonorhynchus sp e Furnarius sp e inclusive as obras mais complexas

como a do gecircnero de mamiacutefero Castor sp que por vezes incluem espantosa

simetria como os complexos ciacuterculos construiacutedos por peixes do gecircnero Torquigener

sp trata-se de algo que envolve muito mais do que um simples automatismo como

a afirmaccedilatildeo poderia supor e entatildeo diz Muszalski que ldquoo conhecimento dos brutosrdquo

natildeo termina ldquona produccedilatildeo da imagemrdquo pois

[] o animal natildeo soacute possui as formas sensiacuteveis do conhecido pelos

sentidos ndash formas que produz e conserva a fantasia ndash como tambeacutem possui as formas ou intenccedilotildees de certos aspectos das coisas que conhece que natildeo satildeo captadas pelos sentidos externos

723

A impressatildeo que muitas vezes se tem de demonstraccedilotildees de inteligecircncia que

se assemelha agrave humana por parte de alguns animais normalmente se explica pelo

fato de um ou outro sentido externo em um ou outro animal superar o homem o que

ocorre inclusive ao sentido interno da memoacuteria que em alguns animais e sob certos

aspectos tambeacutem pode superar a do homem Ilustram isto o desempenho dos

chimpanzeacutes nos estudos de Inoue e Matsuzawa724 bem como o paacutessaro de Clark

que armazena para o inverno mais de trinta mil sementes escondendo-as em

lugares diferentes725

Gastoacuten Colleacute citado por Reale726 explica que a natureza do que se entende

como participaccedilatildeo no experimento em alguns animais possui ldquoforma puramente

sensiacutevelrdquo727 e deve ser ldquouma coleccedilatildeo de imagens ou uma fusatildeo de muitas

associaccedilotildees de imagens de lembranccedilas sensiacuteveis numa uacutenica representaccedilatildeo

sensiacutevelrdquo728 Colleacute comenta em seguida que essas representaccedilotildees propiciam a accedilatildeo

ao animal acompanhada de uma determinaccedilatildeo e que isto se daacute em um nuacutemero

muito reduzido de animais remetendo-se ao Estagirita para reiterar que a grande

maioria deles vive de memoacuterias isoladas de natureza sensiacutevel E um pouco adiante

722

TOMAacuteS DE AQUINO 1990b L II c LXVI p 284-285 ibid LXXXII p 327 723

MUSZALSKI 2014 724

INOUE MATSUZAWA 2007 725

MACKINTOSH 1997 726

REALE 2005 p 8 727

ldquo[] forme purement sensible []rdquo COLLEacute 1912 p 10 728

ldquo[] une collection dimages ou une fusion de plusieurs associations dimages de plusieurs souvenirs sensibles en une seule repreacutesentation sensiblerdquo Ibid p 11

159

jaacute explicando sobre o experimento no homem afirma ser ldquoo estado de consciecircncia

resultante de um conjunto de memoacuterias abstratas mais particularesrdquo729

Chega-se assim ao corolaacuterio do entendimento aristoteacutelico-tomista sobre a

inteligecircncia nos animais chamados superiores (ver tabela 1) daacute-se por apreensatildeo

de intenccedilotildees e quididades somada agraves comparaccedilotildees de imagens formadas pela

potecircncia imaginativa realizadas pela estimativa a partir de sensiacuteveis particulares

captados pelos sentidos proacuteprios e pelo sentido comum e retidas pela memoacuteria

sem poreacutem o recurso agrave memoacuteria e agrave imaginaccedilatildeo voluntaacuterias bem como sem o

refluxo do intelecto o que caracteriza a potecircncia cogitativa que eacute exclusiva do ente

humano

729

ldquo[] lrsquoeacutetat de conscience reacutesultant drsquoun ensemble de souvenirs abstraits mais particuliersrdquo COLLEacute 1912 p 11 Tambeacutem citado por REALE 2005 p 8

160

8 ANAacuteLISE DAS HABILIDADES COGNITIVAS SEGUNDO O MODELO

ARISTOTEacuteLICO-TOMISTA

Buscaremos agora analisar cada uma das informaccedilotildees levantadas na

literatura especializada especialmente na das uacuteltimas deacutecadas no intuito de

verificar de que modo as habilidades apresentadas pelos animais mencionadas aqui

se encaixariam no modelo aristoteacutelico-tomista se for o caso testando se haveria

algo que ultrapasse os limites estabelecidos por este para a estimativa alcanccedilando

o que seria proacuteprio da cogitativa e do intelecto

Adotaremos como dito um processo de investigaccedilatildeo seguindo uma linha

mais proacutexima daquelas realizadas por George730 e por Kovaacutecs e Mather731 a partir

da qual haveremos de sugerir ou natildeo a validade de determinada doutrina com base

nos fatos verificados buscando realizar tal empresa do modo mais objetivo que

pudermos Tentaremos restringir o maacuteximo possiacutevel o papel da subjetividade

mesmo reconhecendo as dificuldades em fazecirc-lo satisfatoriamente como pelo fato

de que estamos lidando com determinada perspectiva ndash que natildeo encontraraacute espaccedilo

aqui para ser merecidamente justificada ndash e reconhecendo que o que produzimos

deveraacute ser objeto de correccedilotildees futuras ressaltando por fim que as correlaccedilotildees que

estabelecemos aqui entre os resultados dos estudos e o aristotelismo-tomismo

haveratildeo de ter caraacuteter nada mais que sugestivo

Dito isto passemos a analisar os casos destacados aqui buscando

enquadraacute-los em categorias (ver tabelas 2-7) a comeccedilar pela que envolve

interaccedilotildees relacionadas ao comportamento

81 INTERACcedilOtildeES COMPORTAMENTAIS

811 Interaccedilotildees em geral

Haacute grande complexidade nas interaccedilotildees comportamentais entre elefantes

que sugerem haver caracteriacutesticas empaacuteticas descritas em estudos de campo como

o de Bates732 como coalisatildeo prestaccedilatildeo de auxiacutelio e inclusive resgate e remoccedilatildeo de

730

GEORGE 2003 731

KOacuteVACS MATHER 2008 732

BATES et al 2008

161

objetos proteccedilatildeo e conforto dedicados aos mais jovens esta descrita tambeacutem no

trabalho de Plotnik e de Waal733 em que o adulto usa a tromba e mesmo a

vocalizaccedilatildeo para consolar um pequeno espeacutecime Tem-se aiacute igualmente

despertando a necessidade de comunicar-se a identificaccedilatildeo do outro como

semelhante o reconhecimento das diferenccedilas entre ambos e das emoccedilotildees das

necessidades e das crenccedilas particulares que parecem ilustrar as funccedilotildees da

estimativa de identificar quididades particulares ou seja o outro como indiviacuteduo

bem como as intenccedilotildees particulares em relaccedilatildeo ao que o outro pretende ou do que

precisa inclusive comparando-as (com imagens na memoacuteria) como na verificaccedilatildeo

do estado emocional

Tambeacutem os estudos de McComb e colaboradores734 e os de Soltis e

colaboradores735 expressariam essas funccedilotildees da estimativa tanto no

reconhecimento de um indiviacuteduo associado agrave determinada funccedilatildeo por ser realizada

pelo indiviacuteduo que estaacute mais apto a exercecirc-la no caso a matriarca como a mais

capaz de tomar decisotildees frente a uma ameaccedila como no reconhecimento da

natureza do ente que eacute tido como ameaccedila aleacutem do niacutevel de ameaccedila estimado

intraespeciacutefico e mesmo interespeciacutefico no caso os diferentes grupos eacutetnicos

humanos que tambeacutem caracterizam a apreensatildeo das quididades e intenccedilotildees

particulares seguida de comparaccedilatildeo de ambas com aquelas que procedem da

imaginaccedilatildeo e estatildeo guardadas na memoacuteria

812 Comportamento diante da morte de coespeciacutefico

Seguindo nos estudos de campo os de McComb e colaboradores736

apontaram a distinccedilatildeo por elefantes de cracircnios de membro da espeacutecie inclusive os

marfins o que implica reconhecimento do outro ou de parte do outro coespeciacutefico

como semelhante Destacamos aqui a apreensatildeo da quididade particular pela

estimativa que viabiliza o reconhecimento da parte e o do cadaacutever como um todo o

que possibilita com a memoacuteria o acompanhamento por suscessivas visitas que

pode durar meses a partir do interesse pelo cadaacutever de membros do grupo descrito

733

PLOTNIK DE WAAL 2014 734

MCCOMB et al 2011 735

SOLTIS et al 2014 736

MCCOMB BAKER MOSS 2006

162

por Douglas-Hamilton e colaboradores737 mesmo tendo em vista o fato de que

conforme a natureza dos agentes envolvidos na decomposiccedilatildeo em questatildeo de

poucos dias o cracircnio jaacute pode estar exposto738

Quanto ao interesse em si pelo cadaacutever trata-se de um fenocircmeno ainda

pouco estudado como reconhecem por exemplo Bearzi e colaboradores739 que

publicaram uma revisatildeo sobre o tema em cetaacuteceos Pode-se propor que dentre as

possibilidades esteja tambeacutem aquilo mesmo que se daacute com os corviacutedeos segundo

Swift740 que sondam o cadaacutever em busca de sinais de perigo para o bando como

que isto tambeacutem poderia-se dar em relaccedilatildeo agrave ineacutercia e mesmo agrave transformaccedilatildeo do

indiviacuteduo sem vida assim como o reconhecimento de que ele jaacute natildeo tem

funcionalidade (de lideranccedila de maternidade etc) desencadeando certas reaccedilotildees

emocionais relacionadas Sugerimos que de um modo ou de outro esteja ali

expressa em destaque provavelmente associada agrave memoacuteria relacionada ao

indiviacuteduo enquanto ainda estava vivo a apreensatildeo pela estimativa de uma ou mais

intenccedilotildees aqui explicando tambeacutem a reaccedilatildeo dos corviacutedeos

813 Respostas a sinais humanos

Nos testes de respostas a sinais humanos catildees golfinhos grandes macacos

e elefantes obtiveram ecircxito salvo estes uacuteltimos em relaccedilatildeo a guiarem-se pelo olhar

humano como observaram Smet e colaboradores741 possivelmente por limitaccedilotildees

de sua visatildeo

Aqui os catildees e os golfinhos apresentam melhor desempenho aqueles

provavelmente por sua proximidade com os humanos e estes por aquilo que sugere

Herman e colaboradores742 sobre uma possiacutevel relaccedilatildeo entre a ecolocalizaccedilatildeo ou

seja a habilidade acuacutestica de apontamento por emissotildees sonares e o gesto

humano de apontar

Esta habilidade parece enquadrar-se na visatildeo aristoteacutelico-tomista

principalmente como resultado da apreensatildeo pela estimativa das intenccedilotildees

737

DOUGLAS-HAMILTON et al 2006 738

DOUGLAS-HAMILTON HILL 1981 739

BEARZI et al 2018 740

SWIFT 2015 741

SMET et al 2013 742

HERMAN et al 1999

163

particulares que pode desenvolver-se individualmente pela aprendizagem por

tentativa e erro ou dar-se por instinto

O mesmo pode-se dizer sobre as respostas aos estados de atenccedilatildeo

humanos como aquelas observadas nos catildees dos testes de Call e colaboradores743

e tambeacutem salvo no que toca ao instinto em relaccedilatildeo ao gesto em si sobre o caso

inverso descrito por Zimmermann e colaboradores744 em que os bonobos e

orangotangos aprenderam a apontar e a natureza referencial disto para que

humanos encontrassem objetos e alimentos escondidos

Jaacute o experimento de Grassmann Kaminski e Tomasello 745 em que os

animais combinaram dois tipos de comando resolvendo conflitos seja alcanccedilando o

alvo por exclusatildeo assim como no experimento de Kaminski e colaboradores746 seja

tendo de decidir entre o apontar com o dedo e o comando vocal simultacircneo para

objetos distintos ilustram pensamos a funccedilatildeo da estimativa de comparar intenccedilotildees

particulares

Sugerimos que o mesmo se aplique ao estudo de Hare e colaboradores747 O

entendimento dos catildees aqui do caraacuteter comunicativo das pistas fornecidas seria

fruto dessa mesma comparaccedilatildeo de intenccedilotildees

82 TEORIA DA MENTE E COMPORTAMENTO DIANTE DE TELAS DE VIacuteDEO

Diferentemente de outros animais os golfinhos como verificado por Herman

e colaboradores748 datildeo muita atenccedilatildeo agraves imagens em tela de viacutedeo e respondem a

comandos por ela Quando as imagens do treinador que dava comandos a Ake foi

gradualmente restrita somente aos membros que davam os sinais e entatildeo

esvanecida e substituiacuteda por manchas moacuteveis que o animal continuou a

reconhecer ainda que em menor grau isto sob a perspectiva aristoteacutelico-tomista

pode ser visto como a comparaccedilatildeo de intenccedilotildees (nos gestos) associada agrave

comparaccedilatildeo de imagens ndash aquelas em gradaccedilatildeo ndash pela estimativa

743

CALL et al 2003 744

ZIMMERMANN et al 2009 745

GRASSMANN KAMINSKI TOMASELLO 2012 746

KAMINSKI et al 2004 747

HARE et al 2010 748

HERMAN et al 1990 HERMAN 2006

164

Os experimentos com a macaca Sarah realizados por Premack e Wooldruff749

mostraram que os chimpanzeacutes podem reconhecer a realidade representada em uma

tela de viacutedeo tal como os golfinhos de Herman e em uma fotografia No acircmbito

aristoteacutelico-tomista entende-se ter havido comparaccedilotildees ou associaccedilotildees particulares

da estimativa entre o objeto real e sua imagem no viacutedeo ou no papel Quanto ao

desempenho nos testes no primeiro caso se observa provavelmente a

aprendizagem direta preacutevia com possiacutevel recurso agrave tentativa e erro ou participaccedilatildeo

no experimento e o recurso da estimativa agrave memoacuteria de intenccedilotildees nos casos em

que o viacutedeo natildeo foi exibido por completo O segundo caso poderia apontar para o

reconhecimento de cada uma das situaccedilotildees associadas ao estado emocional

expressado pelo ator mas tambeacutem para uma simples correlaccedilatildeo entre os objetos e

o modo como ele funciona Em ambas as possibilidades e a mais provaacutevel nesta

etapa que seria a associaccedilatildeo entre elas ou a segunda como uacutenica possibilidade na

etapa seguinte com as trecircs versotildees de cada objeto destacam-se as comparaccedilotildees

de intenccedilotildees particulares pela estimativa

Por fim a uacuteltima etapa tambeacutem caracteriza isto que se diz sobre as intenccedilotildees

na realizaccedilatildeo da tarefa em si de modo relacionado agrave reaccedilatildeo emocional do animal a

cada um dos dois indiviacuteduos jaacute que estaacute diante de um que lhe concede certo bem

pelo qual teraacute preferecircncia e lhe despertaraacute mais interesse pela tarefa e de outro que

natildeo o faz havendo entatildeo desinteresse o que tambeacutem por si refletiria a comparaccedilatildeo

de intenccedilotildees que se segue agrave captaccedilatildeo do particular por parte da estimativa E se

esta capta e compara intenccedilotildees permite assim que o animal reconhecendo o

estado mental de um outro indiviacuteduo possa tomar decisatildeo e agir ainda que natildeo

delibere com base nesta mesma percepccedilatildeo o que nos leva a sugerir que as

descriccedilotildees sobre a chamada teoria da mente estejam em consonacircncia com o

aristotelismo-tomismo

As tentativas de Chantek750 e Koko751 de enganar os treinadores indicando

premeditaccedilatildeo e reconhecimento da perspectiva do outro e que caracterizam a

inovaccedilatildeo no que toca ao desenvolvimento de estrateacutegias visando agrave obtenccedilatildeo do que

lhe apetecem evitando perda ou puniccedilatildeo (mas ainda sem que haja sinal de

abstraccedilatildeo para que se possa atribuir ao intelecto praacutetico) mostram no acircmbito do

749

PREMACK WOOLDRUFF 1978 750

MILES 1990 751

PATTERSON LINDEN 1981 p 135

165

aristotelismo-tomismo uma estimativa bastante desenvolvida Reforccedilam tambeacutem a

teoria da mente

83 METACOGNICcedilAtildeO

A teoria da mente parece estar associada ao que hoje se conhece por

metacogniccedilatildeo que por sua vez tem iacutentima relaccedilatildeo com a chamada metamemoacuteria

Shattleworth diz que por esta ldquoAs pessoas tendem a saber o quatildeo bem elas se

lembram das coisasrdquo e que esta apresenta duas funccedilotildees ldquomonitorar a forccedila de

memoacuteria e controlar a busca de informaccedilatildeordquo752 Em relaccedilatildeo agravequela explica que

ldquoinclui saber o quatildeo bem algueacutem eacute capaz de fazer discriminaccedilotildees de natureza

perceptivardquo753

A metacogniccedilatildeo pode ou natildeo implicar autorreflexatildeo Eacute associada

frequentemente agrave consciecircncia e sua presenccedila em animais natildeo humanos eacute sugerida

por trabalhos como o de Rosati e Santos754 com macacos-rhesus mencionado aqui

Kornell755 indica que os indiacutecios de que haveria metacogniccedilatildeo nos animais com

autorreflexatildeo satildeo escassos jaacute que as reaccedilotildees observadas poderiam estar

associadas ao objeto e que provavelmente seria uma exclusividade humana o que

em princiacutepio estaria em consonacircncia com o pensamento aristoteacutelico-tomista Sob

esta perspectiva os macacos do experimento de Rosati e Santos uma vez

informados sobre a presenccedila do alimento em um ou outro cano sem que se precise

dizer que sabiam que natildeo sabiam mas simplesmente por estarem movidos por um

apetite teriam percebido pela estimativa no que toca agraves inteccedilotildees que a forma mais

econocircmica de visualizaccedilatildeo para a busca seria pelo ponto de convergecircncia e entatildeo o

utilizaram No mesmo sentido uma sugestatildeo para explicar a metamemoacuteria apontada

nos experimentos de Hampton756 que descarta a hipoacutetese de a decisatildeo de recusa

do teste ter base na dificuldade em si da execuccedilatildeo deste seria uma percepccedilatildeo da

eficaacutecia do movimento para satisfaccedilatildeo do apetite com base na comparaccedilatildeo entre os

752

ldquo[] tend to know how well they remember thingsrdquo e ldquo[] monitoring memory strength and controlling information-seekingrdquo SHATTLEWORTH 2010 p 243

753 ldquoincludes knowing how well one is able to make perceptual discriminationsrdquo

SHATTLEWORTH 2010 p 244 754

ROSATI SANTOS 2016 755

KORNELL 2014 756

HAMPTON 2001

166

resultados obtidos por uma e por outra via ou seja aqui tambeacutem pela comparaccedilatildeo

de intenccedilotildees por parte da estimativa

84 NOCcedilAtildeO DE MEIO E FIM E USO DE INSTRUMENTOS

O reconhecimento da quididade particular associado ao de intenccedilotildees podem-

se aplicar aos testes aqui mencionados de colaboraccedilatildeo realizados com elefantes757

e com papagaios-da-nova-zelacircndia758 onde dois animais por tentativa e erro

aprenderam a puxar simultaneamente cada um uma corda amarrada em um suporte

para obterem o alimento sobre este o que se realizou por tentativa e erro

culminando com o reconhecimento da necessidade do parceiro e caracterizando a

participaccedilatildeo no experimento segundo o aristotelismo-tomismo

Tambeacutem exemplificariam a participaccedilatildeo no experimento com base em

tentativa e erro envolvendo a identificaccedilatildeo de intenccedilotildees e a comparaccedilatildeo de

imagens os testes individuais com suportes com ou sem alimento em que os

animais identificaram qual deles deveriam puxar para obter a recompensa como os

realizados com elefantes759 e os realizados com catildees760 cujo estudo apontou que

passavam a buscar pistas novas quando perdiam as anteriores segundo o

aristotelismo-tomismo movidos pelo apetite O mesmo pode-se dizer dos testes

dessa natureza com o tubo e com a plataforma em forma de ldquoUrdquo ambos com

arapucas para a recompensa761 realizados com as quatro principais espeacutecies de

grandes macacos

Jaacute Foerder e colaboradores762 afirmam que os resultados observados em sua

pesquisa com o elefante asiaacutetico que subiu em objetos para tentar alcanccedilar alimento

no alto natildeo se teriam dado por um processo preacutevio de tentativa e erro e que o uso

de objeto como apoio para alcanccedilar alimento no alto e mesmo a tentativa de

empilhar objetos para isto teria sido uma reaccedilatildeo suacutebita Mas os atos de empurrar o

objeto de substitui-lo de empilhar outros objetos ainda que neste uacuteltimo caso tenha

sido uma tentativa frustrada ndash caracterizando por si o processo de aprendizagem por

tentativa e erro ndash poderiam ter-se dado pelo fato de o animal ter visto algum

757

PLOTNIK et al 2011 758

HEANEY et al 2017 759

IRIE-SUJIMOTO 2008 760

MUumlLLER et al 2014 761

GIRNDT et al 2008 MARTIN-ORDAS CALL COLMENARES 2008 762

FOERDER et al 2011

167

humano outro animal ou mesmo um coespeciacutefico haacute mais tempo (dado o grande

alcance da memoacuteria destes animais) realizar tarefas similares o que poderia ter

escapado ao alcance do conhecimento dos pesquisadores

Mas assumindo estritamente o que dizem para o aristotelismo-tomismo os

animais sabem instintivamente que se se erguerem ou subirem em algo se for o

caso podem alcanccedilar uma presa ou um objeto que esteja mais alto e isto tambeacutem

pela estimativa especialmente quando o modo de subida natildeo eacute tatildeo evidente com

base na memoacuteria de imagens referentes a situaccedilotildees anteriores pela comparaccedilatildeo de

intenccedilotildees

O mesmo se diga dos macacos estudados por Koumlhler763 que empilharam as

caixas de madeira com sucesso para alcanccedilarem as bananas

A apreensatildeo de intenccedilotildees por parte da estimativa associada agrave tentativa e

erro ou seja agrave participaccedilatildeo no experimento estaacute ilustrada no uso de pedras e tacos

como martelo para quebrar cascas duras por primatas764 de bastotildees por

chimpanzeacutes ndash como nos testes de Koumlhler ndash e de objetos alongados por corviacutedeos ndash

ainda que tenha envolvido certo adestramento ndash765 e de peccedilas vegetais por grandes

primatas para inserccedilatildeo em locais cuja abertura eacute menor que a largura dos dedos766

aqui descrito tambeacutem em tentilhotildees pica-paus767 e inclusive no uso de objetos por

chimpanzeacutes768 e corviacutedeos769 para defesa contra predadores e em ataques de

babuiacutenos contra inimigos rolando rochas do alto de um morro tal como narrado por

Darwin770 bem como no uso de esponjas para proteccedilatildeo durante o forrageamento

em arrecifes por golfinhos771 Para o aristotelismo-tomismo existe a possibilidade

para cada um desses casos de haver tanto uma origem acidental como uma origem

intencional

Jaacute os testes que levaram Phillips e Santos772 a afirmarem que os macacos-

rhesus (Macaca mulatta) individuam objetos (no caso os frutos utilizados no estudo)

763

KOumlHLER 1927 p 135 ss 764

LUNCZ et al 2012 LUNCZ BOESCH 2014 765

JELBERT et al 2014 BRITISH BROADCASTING CORPORATION 2014 WIMPENNY 2009

766 BOESH C BOESH H 1990 VAN SCHAIK 2006

767 EIBL‐EIBESFELDT 1961 TEBBICH BSHARY 2004

768 BOESH 1991

769 ROELOFS 2010

770 DARWIN sd a) p 34-35

771 KRUumlTZEN et al 2014 KOPS et al 2014

772 PHILLIPS SANTOS 2006

168

segundo seu tipo e sua propriedade caracterizariam o reconhecimento de

quididades particulares pela estimativa e a comparaccedilatildeo de suas imagens

841 Planejamento

O golfinho fecircmeo Ake como relata Herman773 mostrou senso de

planejamento a partir dos comandos recebidos como quando levou a prancha da

beira para o meio da piscina para pulaacute-la e ao recolher os objetos dispondo-os pelo

corpo de modo que viabilizasse sua tarefa por entender o que fazer a partir de um

comando de recolhimento sem especificaccedilatildeo de um objeto determinado Eacute provaacutevel

que o animal tenha chegado a um e outro comportamento previamente por meio de

tentativa e erro ou por aprendizagem direta ou indireta (inclusive a imitaccedilatildeo)

Tambeacutem aqui natildeo se pode descartar a possibilidade da detecccedilatildeo por parte do

animal de movimentos sutis dos treinadores ou o efeito Clever Hans do qual se

falaraacute mais adiante

E ainda que se parta do princiacutepio de que natildeo houve nada disto sob a oacuteptica

aristoteacutelico-tomista estaacute-se no acircmbito das associaccedilotildees entre as intenccedilotildees

memorizadas e as imagens e apreensatildeo das intenccedilotildees referentes agravequele contexto

entatildeo adaptadas agrave situaccedilatildeo pela estimativa e relacionadas agrave voluntariedade

associada a esta observada nos animais natildeo humanos e nas crianccedilas o que estaacute

mais bem expresso nas combinaccedilotildees espontacircneas dos comportamentos que

seguem sinais que natildeo compotildeem o vocabulaacuterio demonstradas pelos golfinhos e

relatadas por Herman774 ou quando o golfinho Elele segue com sucesso o comando

para realizar um movimento novo conforme publicado por Braslau-Schneck775

gesto construiacutedo a partir do repertoacuterio conhecido e que reflete a plasticidade das

associaccedilotildees realizadas pela estimativa

85 IMITACcedilAtildeO E SINCRONIA

Tambeacutem ilustra a participaccedilatildeo no experimento e a comparaccedilatildeo de intenccedilotildees

segundo o aristotelismo-tomismo a busca dos catildees pela otimizaccedilatildeo da realizaccedilatildeo

773

HERMAN 2006 774

Ibid 775

BRASLAU-SCHNECK 1994 apud HERMAN 2006

169

de tarefas evitando assim a sobreimitaccedilatildeo tal como demonstrado pelo estudo de

Johnston e colaboradores776

Jaacute as habilidades de imitaccedilatildeo dos golfinhos com associaccedilotildees realizadas entre

suas partes corporais e as humanas correspondentes777 podem ser compreendidas

pela comparaccedilatildeo de imagens de natureza quiditativa e de intenccedilotildees

E pode-se sugerir a simples apreensatildeo de intenccedilotildees em relaccedilatildeo agrave habilidade

de sincronia e inclusive a de sincronia mediante o comando de criaccedilatildeo que

implicaria a voluntariedade sem deliberaccedilatildeo mesmo que ainda natildeo se conheccedila a

explicaccedilatildeo fisioloacutegica para o fenocircmeno778

86 CORRELACcedilAtildeO DE FIGURAS OU SONS

Assim explicam o raciociacutenio analoacutegico Gillan Premack e Woodruff

O raciociacutenio analoacutegico envolve o reconhecimento de que a relaccedilatildeo entre um par de estiacutemulos eacute a mesma que a relaccedilatildeo entre outro par de estiacutemulos Portanto o raciociacutenio analoacutegico requer uma relaccedilatildeo de segunda ordem ou uma relaccedilatildeo entre relaccedilotildees

779

Esses testes realizados com sucesso em outros primatas aleacutem dos

chimpanzeacutes como G gorilla gorilla e orangotangos da espeacutecie Pongo abelii780 e

babuiacutenos (Papio papio)781 com tela ldquotouch-screenrdquo e macacos-pregos (Cebus

apela)782 com cubos e copos ndash e inclusive como se viu em corviacutedeos com

pequenas placas ndash783 tambeacutem podem ser vistos agrave luz da estimativa como

identificaccedilatildeo e comparaccedilatildeo de imagens no acircmbito quiditativo essencial e acidental

No caso da segunda etapa do teste com Sarah784 o reconhecimento

comparativo entre o objeto conhecido memorizado e sua respectiva figura e o

conseguinte estabelecimento da relaccedilatildeo com a respectiva funccedilatildeo caracterizam

776

JOHNSTON et al 2017 777

HERMAN 2002 778

Id 2006 779

ldquoAnalogical reasoning involves recognizing that the relation between one pair of stimuli is the same as the relation between another pair of stimuli Therefore analogical reasoning requires a second-order relation or a relation among relationsrdquo GILLAN et al 1981 p 11

780 VONK 2003

781 FAGOT MAUGARD 2013

782 KENNEDY FRAGASZY 2008

783 SMIRNOVA et al 2015

784 GILLAN et al 1981

170

tambeacutem a identificaccedilatildeo e a comparaccedilatildeo de imagens no acircmbito quiditativo como

tambeacutem a associaccedilatildeo pela estimativa com as respectivas intenccedilotildees memorizadas

Tambeacutem o reconhecimento e a comparaccedilatildeo de imagens pela estimativa

levando agrave identificaccedilatildeo das correlaccedilotildees entre acidentes de figuras em uma

sequecircncia como tambeacutem identificou George785 a fim de que se identifique com

precisatildeo o componente seguinte jaacute explicaria sob a oacuteptica aristoteacutelico-tomista o

ecircxito de Koko786 em testes ditos de progressatildeo loacutegica

A capacidade dos elefantes de reconhecerem pares de padrotildees de figuras

apontada nos estudos de Rensch787 parece-nos mais um exemplo do papel da

estimativa integrada agrave memoacuteria e agrave imaginaccedilatildeo sendo julgado de iniacutecio pelo proacuteprio

sentido da visatildeo e entatildeo pelo sentido comum Essa pesquisa se soma agravequelas que

mostram a impressionante capacidade da memoacuteria dos elefantes como tambeacutem a

de Markowitz e colaboradores788 que aponta o papel da estimativa de comparaccedilatildeo

de intenccedilotildees pela associaccedilatildeo entre a accedilatildeo por realizar-se corretamente (acionar o

interruptor que apagaraacute ou acenderaacute a luz) e a recompensa obtida

Os experimentos seguintes de Rensch789 com a elefanta envolvendo padrotildees

de figuras e sons e o de seus colaboradores com cavalos levaram o pesquisador a

sugerir que esses animais conseguiriam realizar abstraccedilatildeo em algum grau pelo fato

de as figuras e os sons escolhidos com base em cada modelo a eles referente

apresentarem configuraccedilotildees diferentes deste fazendo-o crer que o animal estaria de

posse da ideia de cada um (a ideia de cruz de trecircs etc) Mas pode-se dizer sob a

oacuteptica aristoteacutelico-tomista que seguem no acircmbito dos particulares e tambeacutem dos

acidentes havendo natildeo abstraccedilatildeo mas se natildeo o que diremos em seguida em

relaccedilatildeo ao papagaio Alex e ao chimpanzeacute fecircmeo Sheba uma comparaccedilatildeo

quiditativa da estimativa entre figura com mais e figura com menos espaccedilo ocupado

pela representaccedilatildeo dos pontos e o mesmo em relaccedilatildeo agraves distacircncias entre as listras

e por figura escura com cruzamento de duas linhas a partir de um modelo de

imagem de cada um novamente por grau de semelhanccedila E pode-se dizer o mesmo

com relaccedilatildeo agraves melodias que independente das demais caracteriacutesticas que se

785

GEORGE 2003 786

PATTERSON LINDEN 1981 p 100 787

RENSCH 1956 RENSCH 1957 788

MARKOWITZ et al 1975 789

RENSCH 1957

171

apliquem a elas mantecircm seu caraacuteter distintivo particular identificaacutevel pelo sentido

da audiccedilatildeo

Tambeacutem o reconhecimento dos objetos com modificaccedilotildees acidentais

distinguidos pelos golfinhos de Herman790 e associado por este a generalizaccedilotildees

daacute-se segundo o aristotelismo-tomismo por comparaccedilatildeo das imagens por parte da

estimativa e entatildeo por grau de semelhanccedila

87 COMPETEcircNCIA PARA APREENSAtildeO DE QUANTIDADES

Sugerimos que se possa atribuir a mesma explicaccedilatildeo para experimentos

como os de Irie-Sujimoto791 e colaboradores os de Perdue e colaboradores792 e os

de Petrazzini e Wyne793 em que os elefantes e os catildees neste uacuteltimo preferiram

respectivamente cestas e pratos de alimento mais cheios apontando certa noccedilatildeo

de quantidade Os animais estimam que ali teratildeo mais condiccedilotildees de saciar o apetite

inclusive provavelmente comparando imagens anteriores memorizadas de

circunstacircncias em que deparou com menos ou mais alimentos e dos resultados em

relaccedilatildeo agrave saciedade

De anaacutelise mais precisa nesse sentido satildeo os testes da chamada

competecircncia numeacuterica como os realizados com Alex794 e com Sheba795 que teriam

efetuado pequenas somas com matrizes de objetos cujos resultados chegariam ateacute

os nuacutemeros 6 (e contagem ateacute 8) e 4 respectivamente e com algarismos araacutebicos

cujos resultados da parte de Alex iam de 1 a 5 Ambos foram treinados previamente

para a apreensatildeo de cada uma das quantidades que no acircmbito do aristotelismo-

tomismo diferem do nuacutemero propriamente dito enquanto resultante da abstraccedilatildeo

Esta apreensatildeo como se descreveu anteriormente tem sua primeira etapa no juiacutezo

dos sentidos e entatildeo a partir da imaginaccedilatildeo e da memoacuteria a estimativa pode

estabelecer desde suas quididades a ordenaccedilatildeo e realizar daiacute por comparaccedilatildeo natildeo

soacute a soma e a subtraccedilatildeo dessas quantidades como a transferecircncia por associaccedilatildeo

destas para as imagens dos algarismos com o que realizaraacute essas mesmas

operaccedilotildees a partir das quididades particulares destes

790

HERMAN et al 1984 HERMAN 1986 791

IRIE-SUJIMOTO et al 2009 792

PERDUE et al 2012 793

PETRAZZINI WYNNE 2016 794

PEPERBERG 2006 795

BOYSEN BERNTSON 1989

172

Isto se encontra em consonacircncia com o que diz Aristoacuteteles em relaccedilatildeo agrave

similaridade entre a alma desses animais e das crianccedilas E de fato Wynn796

demonstrou que crianccedilas de cerca de cinco meses jaacute apresenta a chamada

competecircncia numeacuterica para as adiccedilotildees e subtraccedilotildees mais simples

Com relaccedilatildeo aos estudos de Matsuzawa e equipe797 o aprendizado de

sequecircncias numeacutericas inclusive com curingas aleacutem do ecircxito diante da mudanccedila de

configuraccedilatildeo do experimento (numerais trocando de lugar apoacutes o acerto anterior)

tambeacutem se enquadra no que se acaba de dizer sobre a ordenaccedilatildeo cabendo

tambeacutem agrave estimativa o entendimento da relaccedilatildeo entre o algarismo e os curingas por

associaccedilatildeo

Seguem tambeacutem a mesma explicaccedilatildeo as associaccedilotildees entre algarismos

conjuntos de pontos e quantidade de alimento estabelecidas pelos macacos-rhesus

nos testes realizados por Livingstone e colaboradores798 mesmo que tenham

afirmado que natildeo obtiveram evidecircncia de que os animais teriam contado os pontos

E aos testes relacionados agrave economia envolvendo tomada de decisatildeo

realizados com macacos-prego por Lakshminarayanan e Santos799 empregamos

uma uacuteltima vez essa mesma explicaccedilatildeo aqui somada agrave voluntariedade associada agrave

estimativa e sua comparaccedilatildeo de intenccedilotildees o que teriam levado os animais a

preferirem um experimentador a outro

88 APTIDOtildeES RELACIONADAS Agrave COMUNICACcedilAtildeO

Em um dos estudos de Kaminski e colaboradores800 os catildees identificando os

nomes nos comandos com os respectivos objetos que deviam pegar em outras

dependecircncias do recinto demonstraram integrar memoacuterias relacionadas agrave

localizaccedilatildeo agravequelas relacionadas agrave identidade caracterizando nisto o papel da

estimativa de comparar e compor quididades particulares a partir de imagens

memorizadas

796

WYNN 1992 797

KAWAI MATSUZAWA 2000 Id 2000b TOMONAGA et al 1993 BIRO MATSUZAWA 1999

798 LIVINGSTONE et al 2010

799 LAKSHMINARAYANAN SANTOS 2012

800 KAMINSKI et al 2007

173

As associaccedilotildees apresentadas de palavras a objetos ou accedilotildees com destaque

para espeacutecimes como Rico801 e Chaser802 e no que toca aos grandes macacos por

Kanzi803 e por Koko804 se dariam pela composiccedilatildeo de quididades ou de quididades

e intenccedilotildees respectivamente com recurso evidentemente agrave memoacuteria

Os estudos de Herman e colaboradores com golfinhos mostraram

compreensatildeo de sentenccedilas reversiacuteveis e lexicalmente ou estruturalmente novas

para os animais inclusive sugerindo generalizaccedilotildees805 aleacutem do reconhecimento de

sequecircncias anocircmalas aos quais os animais responderam com omissatildeo ou com

improviso806 demonstrando a competecircncia semacircntica e sintaacutetica Mas para o

aristotelismo-tomismo haveria aqui ainda a participaccedilatildeo na linguagem e natildeo esta

propriamente dita que eacute fruto das operaccedilotildees do intelecto807 Por sua estimativa

desenvolvida esses animais chegariam ao entendimento de generalizaccedilotildees como

ldquopessoardquo808 porque identificam um humano como semelhante a outro por possuiacuterem

a imagem do humano comparando as imagens de humanos captadas e retidas por

seus sentidos ateacute entatildeo e natildeo por captaccedilatildeo da espeacutecie inteligiacutevel humanidade que

poderia-lhes conferir a habilidade de conceituar algo que natildeo se identificou Essa

mesma estimativa lhes permite por comparaccedilatildeo de intenccedilotildees perceber pelo que se

disse logo acima a relaccedilatildeo de cada palavra com seu respectivo objeto ou accedilatildeo e

entatildeo se haacute algo em seu contexto proacuteximo agravequilo que se refere agrave determinada

sequecircncia anocircmala para que execute ou natildeo o comando

Jaacute a identificaccedilatildeo da parte de Ake de que um remo significaria positivamente

a presenccedila de um objeto e o outro negativamente ou seja a ausecircncia809

caracterizaria a comparaccedilatildeo no acircmbito quiditativo de imagens e a captaccedilatildeo da

intenccedilatildeo relacionada a cada remo Quando nesta tarefa associada agrave outra de

comando com dois objetos e uma accedilatildeo810 Ake leva o frisbee ao remo ldquonatildeordquo verifica-

se isto que se diz aqui e o que se diz no paraacutegrafo anterior associados agrave

voluntariedade relacionada agrave estimativa

801

KAMINSKI et al 2004 802

PILLEY 2013 803

RAFFAELE 2006 804

THE GORILLA FOUNDATION 2018 805

HERMAN et al 1984 HERMAN 1986 Id 2006 806

HERMAN et al 1993a 807

TOMAacuteS DE AQUINO 2001 Q 58 a 4 p 549 808

HERMAN et al 1984 809

HERMAN FORESTELL 1985 810

HERMAN et al 1993b

174

A comunicaccedilatildeo entre grandes macacos observada no habitat natural como

os comandos por meio de golpes nas aacutervores relatados por Boesch811 e as tantas

variaccedilotildees acuacutesticas de gorilas verificadas por Hedwig e colaboradores812 tambeacutem

exemplificam a capacidade de participaccedilatildeo na linguagem bastante desenvolvida nos

grandes primatas mas com potenciais combinaccedilotildees que lhes confere destaque

dentre os outros animais que os faz nesse sentido assemelharem-se bastante agraves

crianccedilas humanas tal como visto nos estudos em que se ensinou a comunicaccedilatildeo

por gestos manuais ou por lexigramas como o desenvolvido por Patterson e

Linden813 com Koko e como Tomasello814 analisou em sua revisatildeo

respectivamente Dentre as habilidades do bonobo Kanzi afirma o pesquisador que

a de identificar a funccedilatildeo de uma palavra segundo sua posiccedilatildeo na frase equivaleria

ao animal estar expressando sentenccedilas como uma crianccedila de dois anos de idade

Mas a quase totalidade dessas sentenccedilas eacute constituiacuteda de pedidos com uma palavra

de accedilatildeo e uma ou mais de pessoas ou objetos Tomasello815 diz que o animal sabe

que o que eacute colocado vem em primeiro na frase e aquilo em que colocar vem em

seguida (como no caso da ldquobolardquo e do ldquochapeacuteurdquo) e explica

[] suas categorias gramaticais satildeo do tipo ldquoaquele que atingerdquo e ldquocoisa atingida comrdquo ldquoaquele que colocardquo e ldquocoisa colocadardquo natildeo categorias generalizadas tais como ldquoagenterdquo e ldquopacienterdquo ou ldquosujeitordquo e ldquoobjeto diretordquo Isso eacute basicamente o niacutevel de competecircncia gramatical de crianccedilas novas de dois anos que tambeacutem funciona com ldquoilhas verbaisrdquo

816 e outras construccedilotildees

baseadas em itens deste tipo817

811

BOESCH 1996 812

HEDWIG et al 2014 813

PATERSON LINDEN 1981 814

TOMASELLO 2017 815

Id 1994 2017 816

Segundo a Hipoacutetese da Ilha Verbal (Verb Island Hypothesis) do proacuteprio Tomasello ldquoa linguagem inicial das crianccedilas eacute organizada e estruturada completamente em torno de verbos individuais e outros termos predicativos ou seja a competecircncia sintaacutetica da crianccedila de dois anos eacute composta completamente de construccedilotildees de verbos especiacuteficos com aberturas nominais encaixadas Aleacutem da categorizaccedilatildeo dos nominais os aprendizes da linguagem nascente natildeo possuem outras abstraccedilotildees linguiacutesticas ou formas de organizaccedilatildeo sintaacuteticardquo (Original ldquo[] childrens early language is organized and structured totally around individual verbs and other predicative terms that is the 2-year-old childs syntactic competence is comprised totally of verb-specific constructions with open nominal slots Other than the categorization of nominals nascent language learners possess no other linguistic abstractions or forms of syntactic organizationrdquo) Id 2000 p 213-214

817 ldquo[] his grammatical categories are of the type lsquohitterrsquo and lsquothing hit withrsquo lsquoputterrsquo and lsquothing

putrsquo not generalized categories such as lsquoagentrsquo and lsquopatientrsquo or lsquosubjectrsquo and lsquodirect objectrsquo This is basically the level of grammatical competence of young two-year-old children who also work with lsquoverb islandsrsquo and other item-based constructions of this typerdquo Id 2017 p 101

175

A primeira categoria refere-se a termos singulares e a segunda a termos

universais o que possibilitaria a conceituaccedilatildeo a primeira operaccedilatildeo do intelecto e

caracterizaria definitivamente a abstraccedilatildeo intelectiva em animais natildeo humanos

segundo a descriccedilatildeo aristoteacutelico-tomista Natildeo foi poreacutem o caso Algo que poderia

parecer chegar um pouco mais perto disto seria a atribuiccedilatildeo de ldquowater birdrdquo ao pato

que fez Washoe ou as de ldquofake mouthrdquo818 dada a nariz e de ldquonose fakerdquo819 dada a

maacutescara por Koko e inclusive o modo como segundo Patterson e Linden xingava

ldquobirdrdquo820 Mas ainda assim o que se teria segundo o aristotelismo-tomismo seriam

correlaccedilotildees de quididades particulares (entre as palavras conhecidas os gestos ou

os lexigramas e os objetos em si) por grau de semelhanccedila pela estimativa com

voluntariedade que esses animais teriam aprendido a estabelecer em seus

respectivos processos de treinamento

Savage-Rumbaugh e colaboradores821 em trabalho em que elencam

seiscentos e sessenta comandos alguns com alguma variaccedilatildeo dados a Kanzi e agrave

menina Alia de dois anos filha de uma das assistentes referem-se a apontamentos

de Quine822 segundo os quais se teria de determinar qual ou quais das incontaacuteveis

propriedades de um objeto se levaria em consideraccedilatildeo ao denotaacute-lo Apontam entatildeo

a descontextualizaccedilatildeo pela qual um macaco poderia compreender por exemplo a

atribuiccedilatildeo da palavra maccedilatilde agrave fruta em si sem que esta esteja a representar-lhe uma

finalidade praacutetica sem que lhe valha como recompensa Como dizem

Eacute faacutecil treinar um macaco para dizer lsquomaccedilatildersquo afim de que pegue uma maccedilatilde mas eacute difiacutecil ensinaacute-lo a usar lsquomaccedilatildersquo para descrever uma comida que a ele natildeo eacute permitido comer uma comida que ele vecirc algueacutem mais comer uma comida que ele natildeo goste uma comida que eacute encontrada em um lugar em particular etc

823

Explicam que isto seria mais comum em crianccedilas humanas mas em macacos

soacute se pode verificar quando haacute descontextualizaccedilatildeo dos siacutembolos em relaccedilatildeo aos

818

PATTERSON LINDEN 1981 p 112 819

Ibid p 117 820

Ibid p 119-121 e 142 821

SAVAGE-RUMBAUGH et al 1993 822

QUINE 1960 passim 823

ldquoIt is easy to train an ape to say aple in order to get an aple but difficult to teach it to use aple to describe a food that it is not allowed to eat a food that it sees someone else eating a food that it does not like a food that is found in a particular location etcrdquo SAVAGE-RUMBAUGH et al 1993 p 15

176

eventos que estariam associados agrave sua aprendizagem E se o fazem entatildeo lhes

seria possiacutevel atribuir novos nomes a novos objetos e assim criar novos sinais

Mas mesmo aqui natildeo haacute razatildeo para negar que se siga no acircmbito das

associaccedilotildees de quididades e intenccedilotildees de natureza particular sob a perspectiva

aristoteacutelico-tomista no exerciacutecio da participaccedilatildeo no chamado experimento com

voluntariedade natildeo deliberativa

89 AUTORRECONHECIMENTO

Os estudos mostram que alguns animais a saber golfinhos824 corviacutedeos825

elefantes826 e grandes macacos como os gorilas827 e os orangotangos828

comprovadamente reconhecem sua proacutepria imagem diante de um espelho o que

poderia apontar para um tipo mais avanccedilado de ldquoawarenessrdquo Cammaerts Trico e

Cammaerts829 no entanto em um surpreendente estudo que sugere

autorreconhecimento em espelhos em formigas tambeacutem testadas com o

reconhecimento da marca realizado com trecircs espeacutecies de um mesmo gecircnero a

saber Myrmica sabuleti M rubra and M ruginodis afirmam que o

autorreconhecimento natildeo implicaria necessariamente algum tipo de consciecircncia

Alguns pesquisadores vieram tambeacutem a propor por meio de outros testes que

alguns animais possuem reconhecimento e quiccedilaacute consciecircncia do proacuteprio corpo

como Dale e Plotnik830 que verificaram que os elefantes asiaacuteticos teriam percebido

que o proacuteprio peso impedia a realizaccedilatildeo da tarefa e Herman que estudou a

execuccedilatildeo de tarefas por golfinhos que envolviam partes corporais associadas agraves

suas proacuteprias accedilotildees831 Diante da execuccedilatildeo do comando para que um destes

animais escolhesse a tarefa o pesquisador descreve que

Phoenix teve de manter uma representaccedilatildeo mental do comportamento que ela executou da uacuteltima vez atualizar isto com cada comportamento que se sucedeu processar semanticamente a repeticcedilatildeo ou algum outro gesto e

824

REISS 2001 825

PRIOR GUumlNTUumlRKUumlN 2008 826

PLOTNIK et al 2006 827

PATTERSON LINDEN 1981 p 108 828

MILES 1990 829

CAMMAERTS TRICO CAMMAERTS 2015 830

DALE PLOTNIK 2017 831

HERMAN 2006

177

entatildeo selecionar por ela mesma o mesmo comportamento para repetir ou escolher um comportamento dentre os outros quatro []

832

Aqui se observa sob a perspectiva aristoteacutelico-tomista a memoacuteria de

intenccedilotildees seguida de comparaccedilotildees destas por parte da estimativa e o exerciacutecio da

voluntariedade a ela associada

E o mesmo se diga das combinaccedilotildees entre accedilotildees e partes do corpo incluindo

as que implicam inovaccedilatildeo realizadas por Elele a partir de comandos833

relacionando ao que se disse mais acima sobre a associaccedilatildeo destes com objetos e

accedilotildees caracterizando associaccedilotildees particulares e ilustrando aqui tambeacutem a

plasticidade da estimativa

Quando os elefantes asiaacuteticos reconheceram o impedimento provocado pelo

proacuteprio peso isto segundo o aristotelismo-tomismo se explicaria pela comparaccedilatildeo

da estimativa entre a proacutepria quididade e a do tapete sobre o qual se encontravam e

a intencionalidade relacionada agrave permanecircncia neste

Sabe-se que os entes humanos comeccedilam a reconhecer-se no espelho antes

dos dois anos de idade834 Reconhecer-se implica apreender a proacutepria quididade

seja no acircmbito particular ou a partir de um universal e o mesmo pode-se dizer do

reconhecimento de cada parte corporal O autorreconhecimento pode assim estar

associado agrave estimativa do mesmo modo que se daacute com o reconhecimento do outro

832

ldquoPhoenix had to maintain a mental representation of the behaviour she last performed update that with each succeeding behaviour semantically process the repeat or any gesture and then either self-select the same behaviour for repeat or choose a behaviour from the remaining four if given anyrdquo HERMAN 2006 p 457

833 HERMAN et al 2001

834 AMSTERDAM 1972

178

9 CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS E CONCLUSAtildeO

Natildeo encontramos assim nenhuma habilidade que nos remeteria

necessariamente agrave presenccedila de cogitativa e de intelecccedilatildeo entre os animais natildeo

humanos na bibliografia consultada resultado que corrobora a validade das

interpretaccedilotildees a partir da doutrina aristoteacutelico-tomista relacionadas agrave psicologia

comparada agrave etologia e outras disciplinas congecircneres Pudemos enquadrar todas

as habilidades que percorremos como envolvendo apreensatildeo combinaccedilatildeo ou

comparaccedilatildeo de quididades ou intenccedilotildees de natureza singular particular Todos os

comportamentos analisados envolveram o sentido comum a memoacuteria a imaginaccedilatildeo

e a estimativa e nenhum deles nos deu sinal do uso da reminiscecircncia e do uso

voluntaacuterio de imagens que caracterizariam a cogitativa e serviriam de base para a

abstraccedilatildeo Mesmo os comportamentos considerados espontacircneos e ateacute os

inovadores poderiam ser explicados sob a oacuteptica aristoteacutelico-tomista como sendo

movidos pela memoacuteria ou pela imaginaccedilatildeo e natildeo motores de natureza voluntaacuteria

destas por associaccedilotildees resultantes tambeacutem das operaccedilotildees da estimativa

Nota-se o tom de entusiasmo por parte de alguns pesquisadores diante de

certos comportamentos observados como aqueles que caracterizaram uma accedilatildeo

realizada segundo eles pela primeira vez Neste sentido poreacutem Premack e

Woodruff835 ao darem iniacutecio agraves investigaccedilotildees sobre a teoria da mente afirmaram

que era muito difiacutecil evitar que um chimpanzeacute se envolvesse informalmente na

soluccedilatildeo de problemas no cotidiano o que dificultava a anaacutelise do quanto um

determinado comportamento teria de fato o caraacuteter inovador E isto decerto se aplica

aos demais casos relacionados aqui prioritariamente investigados por exemplo

reforccedilando o que afirmamos a respeito do golfinho fecircmeo Ake que poderia ter

perfeitamente aprendido a recolher os objetos a partir do mais distante por ter

observado entes humanos agindo anteriormente deste modo e tambeacutem do elefante

e dos chimpanzeacutes que utilizaram objetos para alcanccedilar alimento suspenso no alto e

inclusive tentaram empilhar caixas ou taacutebuas (estas da parte de um elefante sem

sucesso) e que podem perfeitamente ter visto entes humanos fazendo algo

semelhante em outras circunstacircncias Mas natildeo haacute como negar a presenccedila desta

capacidade quando se trata por exemplo do uso em ambiente selvagem de

835

PREMACK WOODRUFF 1978

179

instrumentos incluindo os meios de confecccedilatildeo e das diferenccedilas que costumam

haver neste acircmbito entre populaccedilotildees de uma mesma espeacutecie

Outro comportamento que foi objeto de muitos dos trabalhos consultados eacute a

transmissatildeo cultural que jaacute havia sido exemplificada sem referecircncia ao termo por

Aristoacuteteles quando se referiu ao ensinamento do canto por parte das aves e que

ilustra o alcance do processo de aprendizagem no acircmbito da estimativa e que

parece encontrar seu aacutepice no que toca aos animais natildeo humanos nos grandes

macacos

Estas duas caracteriacutesticas a teoria da mente e a transmissatildeo cultural

exemplificam um conjunto de variaacuteveis que podem atuar em determinado

comportamento e que deve ser considerado a fim de que a inteligecircncia observada

nos animais natildeo seja superestimada sobretudo quando se pretende comparaacute-la agrave

humana o que se daacute como indica Marie George836 pela distinccedilatildeo indevida entre o

intelecto e o sentido algo que pode levar a testes de inteligecircncia defeituosos e eacute

exemplificado pelo fato de que alguns sentidos mais acurados do que os dos

humanos em certos animais chegam a impressionar muitos pesquisadores a ponto

de fazecirc-los chamar inteligecircncia as habilidades a eles relacionadas Superestimar

assim a chamada inteligecircncia dos animais seria tatildeo equivocado como subestimaacute-la

como fizeram aqueles que tentaram explicar essas habilidades por uma visatildeo

estritamente mecanicista

Exemplificam essa superestima tanto o caso dos animais pintores que

reproduzem natildeo rabiscos como Kanzi mas figuras concretas como flores tal como

o fazem os elefantes asiaacuteticos no qual posteriormente descobriu-se que seus

mahouts837 eacute que lhes sussurravam comandos que orientavam as pinceladas como

explicou Morris838 e o famoso caso do cavalo Clever Hans que impressionou a

muitos por ter dado a entender que saberia realizar as quatro operaccedilotildees

matemaacuteticas representando o resultado com batidas com sua pata no chatildeo mas no

qual ele e seu treinador Wilhelm von Osten foram minuciosamente analisados pelo

bioacutelogo especialista em psicologia comparada Oskar Pfungst839 que por fim verificou

que o animal apenas respondia a sinais corporais de von Osten que indicavam

quando deveria parar de bater com a pata no chatildeo O efeito Clever Hans como essa

836

GEORGE 2003 837

Como chamam os treinadores na iacutendia 838

MORRIS 2009 839

PFUNGST 1911

180

interaccedilatildeo passou a chamar-se mostra a influecircncia dos humanos no desempenho

dos animais em seus testes podendo comprometer seriamente a interpretaccedilatildeo dos

resultados o que de certo modo conflita com a necessidade da presenccedila humana

para o sucesso na realizaccedilatildeo de uma miriacuteade de testes que envolvem as interaccedilotildees

sociais o que exclui a possibilidade de isolamento dos animais e provoca assim uma

seacuterie de dificuldades

Posteriormente estudos como os de Proops e colaboradores com cavalos

demonstraram que os animais natildeo soacute interagem com expressotildees corporais

incluindo as faciais e sugerem que podem memorizaacute-las por longos periacuteodos com

influecircncia significativa no desempenho de tarefas futuras840 Assim muitos dos

resultados apontados aqui de observaccedilotildees realizadas na presenccedila de treinadores

poderiam estar de algum modo relacionados a este efeito

Outro problema que George aponta eacute o uso ambiacuteguo de termos como a

proacutepria palavra ldquointeligecircnciardquo que segundo defende de acordo com o aristotelismo-

tomismo enquanto nos entes humanos se refere ao processo de intelecccedilatildeo de

abstraccedilatildeo como jaacute se disse nos animais implica somente uma inteligecircncia praacutetica

dos sentidos como corrobora o presente estudo com o que parece concordar

Damaacutesio quando ao tratar das reaccedilotildees especiacuteficas desencadeadas pelas emoccedilotildees

diz que ao deparar com o agente indutor os animais imediatamente fogem ficam

inertes atacam o inimigo ou adotam condutas que lhes geram algum tipo de prazer

ao passo que no homem haacute a possibilidade de que essas condutas sejam

temperadas pelo uso da razatildeo841

George exemplifica o que diz com a preferecircncia por parte de um gato por um

alimento uacutemido ao seco e pode ilustrar-se tambeacutem com os problemas que um ente

humano pode resolver sem precisar da intelecccedilatildeo como amarrar um sapato ou

andar de bicicleta que natildeo exigem o conhecimento teoacuterico que caracterizaria a

intelecccedilatildeo e ao que se chega por aprendizagem direta ou indireta ou por tentativa e

erro e que natildeo podem ser descritos por uma visatildeo inflexiacutevel do instinto Ela sugere

entatildeo como soluccedilatildeo para o melhor entendimento da questatildeo a saiacuteda do que entende

como uma dicotomia entre instinto e inteligecircncia

840

PROOPS et al 2018 O experimento aqui consistiu em mostrar imagens de rostos de pessoas sorrindo ou com raiva a cavalos associando-as a algum estado emocional e algumas horas depois fazendo com que os animais interagissem com as mesmas pessoas das fotografias agora com expressatildeo neutra a quem os cavalos demonstraram reaccedilotildees que se relacionavam com as expressotildees nas imagens fotograacuteficas

841 DAMAacuteSIO 2000 p 70

181

Explica Echavarriacutea por sua vez que quando Tomaacutes de Aquino fala de

instinto refere-se a um impulso natural com alguma voluntariedade ordenado agraves

necessidades do indiviacuteduo ou da espeacutecie842 Tem-se com isto um leque de

possibilidades que caracteriza por exemplo as menccedilotildees feitas aqui agrave plasticidade

da estimativa incluindo a participaccedilatildeo no ldquoexperimentordquo as habilidades que tal

participaccedilatildeo comporta sem sair do acircmbito da estimativa tal como as que foram

descritas neste estudo

No exemplo de George o gato por um lado natildeo eacute forccedilado a comer a comida

uacutemida e por outro natildeo deliberou sobre o caso Ele sente a diferenccedila entre ambas e

se dirige agrave que lhe eacute mais apeteciacutevel ilustrando a voluntariedade associada agrave

estimativa agrave qual o aristotelismo-tomismo se refere

Tambeacutem nos testes de comunicaccedilatildeo a pesquisadora aponta ainda falhas na

exposiccedilatildeo dos dados como a omissatildeo nos artigos por alguns pesquisadores do

uso de palavras que caracterizam redundacircncias e combinaccedilotildees sem sentido pelos

animais estudados Ela entatildeo observa que os grandes macacos que dominaram os

lexigramas e a comunicaccedilatildeo por sinais talvez pudessem expressar a relaccedilatildeo entre

causa e efeito jaacute que estabelecem essa relaccedilatildeo em casos concretos mas nenhum

deles foi capaz de adotar uma posiccedilatildeo em relaccedilatildeo a um problema e justificar essa

posiccedilatildeo o que caracterizaria o exerciacutecio do raciociacutenio e o que tornaria possiacutevel

ensinar-lhes uma ciecircncia ou mesmo princiacutepios dessa ciecircncia enquanto tais

Ela identificou no orangotango Chantek uma suposta tentativa de iniacutecio de

conversa com a frase anteriormente mencionada ldquoJeannie Chantek chaserdquo843 sobre

a qual natildeo soacute observa natildeo ir aleacutem disto inclusive porque sua meacutedia de comprimento

de enunciados era baixa como fornece como explicaccedilatildeo a hipoacutetese de que se trate

da busca por satisfaccedilatildeo no acircmbito emocional pelo contato social com a treinadora

O que diz George ateacute aqui parece adequar-se tambeacutem ao comportamento de

Koko que segundo seus treinadores expressava sentimentos com demonstraccedilotildees

de humor apelidava e inclusive podia mentir para eximir-se da culpa de determinado

ato

Nenhum deles prossegue a estudiosa tambeacutem foi capaz de exibir uma

conversa que caracterizasse algo mais do que um instrumento para alcanccedilar um

objetivo especiacutefico de expressar uma narrativa de solicitar uma informaccedilatildeo para

842

ECHAVARRIacuteA 2009 p 122-123 843

MILES 1990 p 521

182

compreender algo melhor de expressar uma opiniatildeo ou um desejo para aleacutem do

caraacuteter instrumental de usar palavras para coisas que natildeo sejam percebidas

sensivelmente

Enquanto Aristoacuteteles identifica a linguagem assim como a loacutegica como

exclusiva dos entes humanos como dependente do exerciacutecio da intelecccedilatildeo844

Miles845 identifica trecircs elementos que entende caracterizarem a representaccedilatildeo

linguiacutestica a saber 1- um elemento do mundo real designado por um sinal 2- que

intencionalmente transmite seu significado 3- sobre o qual haacute um entendimento

cultural compartilhado Para o aristotelismo-tomismo estes elementos estariam

presentes tanto na linguagem como poderiam estar presentes na participaccedilatildeo na

linguagem

Em seguida Miles fornece algumas evidecircncias de que palavras ou sinais

estejam sendo utilizados de modo referencial como a indicaccedilatildeo de um objeto ou

evento presente ou ausente no ambiente que tenham domiacutenios semacircnticos ou de

significado e que podem natildeo depender por completo do contexto Menciona entatildeo

os vaacuterios estaacutegios da comunicaccedilatildeo referencial para afirmar que Chantek apresenta

cada um desses estaacutegios tal como observado em crianccedilas O orangotango

inicialmente repetia accedilotildees socialmente orientadas (como fazer algo para chamar a

atenccedilatildeo) em seguida passou a sentir necessidade de exibir objetos e entatildeo a dar

objetos Posteriormente Chantek usou de sua capacidade de voluntariedade e do

sinal ldquoPointrdquo846 para apontar para locais relacionados ao modo com que queria ser

agradado e responder perguntas neste sentido e entatildeo passou a combinar este

sinal com o sinal ldquoGordquo847 encaminhando os treinadores para onde queria Os

resultados mostraram que Chantek possuiacutea o niacutevel de desempenho cognitivo de

uma crianccedila de cerca de dois anos de idade com algumas caracteriacutesticas

compartilhadas com crianccedilas de quatro e ateacute de sete anos de idade o que estaacute em

perfeita consonacircncia com a declaraccedilatildeo aristoteacutelica supracitada a respeito desta

relaccedilatildeo e com o que se descreveu anteriormante em relaccedilatildeo a isso sob a

perspectiva do uso da estimativa

Mesmo o reconhecimento da natureza representativa dos sinais que passou

a fazer com os peacutes e com objetos e inclusive a criar pode ser explicado aqui pela

844

DE MOURA NEVES 1981 845

MILES 1990 846

ldquoApontarrdquo 847

ldquoIrrdquo

183

combinaccedilatildeo de intenccedilotildees e imagens particulares dentre as quais aquelas

memorizadas teriam sido acessadas natildeo por deliberaccedilatildeo mas movidas pela

necessidade do animal naquele instante

A comunicaccedilatildeo tambeacutem poderia mostrar sinais de enquadramento na teoria

da mente da empatia da adoccedilatildeo da perspectiva alheia E natildeo soacute no acircmbito

intelectivo como no estimativo pela comparaccedilatildeo de particulares e reconhecimento

do outro e de si mesmo Segundo poreacutem a hipoacutetese da intuiccedilatildeo antropomoacuterfica

poder-se-ia estar superestimando ou subestimando este comportamento por ser-

nos de algum modo inacessiacutevel E se assim fosse parece-nos que natildeo se poderia

comprovar por exemplo a teoria da mente nos animais Ades destaca o seguinte

trecho de Romanes que aqui citamos com algumas palavras a mais e que este

apresenta em sua obra antes de criticar a teoria do automatismo animal que

atribuem a Descartes e tambeacutem parece natildeo concordar com tal atribuiccedilatildeo

[] a partir do que conheccedilo subjetivamente das operaccedilotildees de minha proacutepria mente individual e das atividades agraves quais elas impelem o meu organismo passo por analogia a inferir desde as atividades observaacuteveis de outros organismos quais satildeo as operaccedilotildees mentais que lhes satildeo subjacentes O senso comum no entanto sente universalmente que a analogia eacute aqui um guia mais seguro para a verdade do que a demanda ceacutetica pela evidecircncia impossiacutevel de modo que se a existecircncia objetiva de outros organismos e suas atividades satildeo asseguradas o senso comum concluiraacute sempre e sem questionar o que as atividades de outros organismos quando anaacutelogas agravequelas de nosso proacuteprio organismo que sabemos serem acompanhadas por certos estados mentais satildeo neles acompanhadas por estados mentais anaacutelogos

848

Ades entatildeo menciona o emprego de um mesmo termo que caracteriza um

comportamento humano para definir um nos animais natildeo humanos que de algum

modo corresponde a ele mas analogamente

No entanto para o aristotelismo-tomismo como se viu haacute fenocircmenos

mentais nos animais que podem ser associados aos humanos apenas como

participaccedilatildeo sem caracterizar propriamente uma das potecircncias de propriedades

848

ldquoStarting from what I know subjectively of the operations of my own individual mind and the activities wich in my own organism they prompt I proceed by analogy to infer from the observable activities of other organisms what are the mental operations that underlie them [] Common sens however universally feels that analogy is here a safer guide to thruth than the sceptical demand for impossible evidence so that if the objective existence of other organisms and their activities is granted [] common sense will always and without question conclude that the activities of organisms other than our own when analogous to those activities of our own wich we know to be accompanied by certain mental states are them accompanied by analogous mental satatesrdquo ROMANES 1888 p 1-2 6

184

exclusivamente humanas de modo que se por um lado a corrente reconhece a

superioridade de alguns animais no que toca a certos sentidos externos e internos

por outro sustenta que o homem conhece a verdade ou seja a realidade pela

adequaccedilatildeo do intelecto ao objeto

Assim sugerimos que o conhecimento do homem em relaccedilatildeo agrave chamada

inteligecircncia dos animais natildeo humanos natildeo estaria impedido e ele poderia chegar a

constataccedilotildees que entenderia como verdadeiras confirmando segundo o exemplo

supracitado e se for o caso a teoria da mente e reconhecendo a natureza desses

entes tal como eacute em si mesma (ainda que jamais se pudesse conhececirc-los de modo

integral) sem a tendecircncia a por assim dizer antropomorfizaacute-los comparando-a agrave

nossa ao situaacute-los em uma categoria especiacutefica da gradaccedilatildeo entitativa sem jamais

deixar de levar em conta a subjetividade no que toca agraves diferenccedilas marcantes de

percepccedilatildeo por meio dos sentidos agraves quais temos tido acesso gradual em razatildeo dos

avanccedilos tecnoloacutegicos que nos possibilitam investigar pontos nos espectros dos

sensiacuteveis que nossos sentidos por si soacutes natildeo alcanccedilam

Para chegar a isto Marie George849 como se viu aponta para a necessidade

de estabelecer-se a fronteira entre o pensar e o sentir e essa tarefa deve ser

realizada natildeo soacute com investigaccedilotildees com animais natildeo humanos como as que

apresentamos neste estudo mas tambeacutem com crianccedilas humanas em idade proacutexima

agravequela em que comeccedilam a mostrar sinais das operaccedilotildees do intelecto agrave luz do

aristotelismo-tomismo Esta fronteira contudo estabelece certos limites que seriam

intransponiacuteveis

Fizemos algumas perguntas anteriormente neste trabalho a partir deste tema

e tentaremos respondecirc-las com base nesta corrente no acircmbito das consideraccedilotildees

que se sucederatildeo

Darwin850 como se viu exemplifica aqueles que natildeo reconhecem essa

intransponibilidade ao apontar nos animais natildeo humanos caracteriacutesticas de

sociabilidade (como o auxiacutelio o alerta de perigo etc) de sentimento do belo a

comunicaccedilatildeo por algo anaacutelogo agrave linguagem a resoluccedilatildeo de problemas etc O

sentimento e a admiraccedilatildeo do belo que ele sugere com os casos em que uma ave

macha exibe sua plumagem para atrair uma fecircmea segundo o aristotelismo-

tomismo se trataria natildeo propriamente de um reconhecimento do belo enquanto

849

GEORGE 2013 850

DARWIN sd a) p 30-31 e 34-35

185

belo mas de uma atraccedilatildeo movida instintivamente pela comparaccedilatildeo de imagens pela

estimativa segundo a configuraccedilatildeo a coloraccedilatildeo etc Jaacute no caso do que diz ser

anaacutelogo agrave linguagem trata-se sob este vieacutes como se disse mais acima da

participaccedilatildeo e em relaccedilatildeo aos demais exemplos observam-se potecircncias

encontradas no homem mas aqui limitadas ao acircmbito da estimativa em

conformidade com os resultados fornecidos anteriormente Inclui-se aqui tambeacutem o

auxiacutelio de alimentaccedilatildeo prestado por algumas aves a companheiros cegos que

Darwin relata Ainda que como diz seja um fato incomum concorre para a

preservaccedilatildeo da espeacutecie e serve como indiacutecio da teoria da mente naqueles animais

Em todo caso temos sempre exemplos envolvendo os sentidos internos e a

natureza nos priva de fatos que validariam a ideia da gradaccedilatildeo contiacutenua

Demais disso se a ideia do princiacutepio formal e portanto imaterial procede

entatildeo estamos diante de um problema ainda mais profundo para sustentar a ideia da

possibilidade de haver um meio termo de haver tal gradaccedilatildeo no acircmbito ontoloacutegico

interespeciacutefico851 entre a natildeo captaccedilatildeo e a captaccedilatildeo de espeacutecies inteligiacuteveis Se haacute

captaccedilatildeo de espeacutecies imateriais isto somente se daacute por alguma potecircncia imaterial

Mas eacute possiacutevel conciliar essa descriccedilatildeo com outras que apontam o sistema

nervoso como a origem da inteligecircncia como o faz Gallegos852 ndash que sugere que

esteja distribuiacuteda pelas estruturas orgacircnicas relacionadas ndash ou com a explicaccedilatildeo

anteriormente citada das duas maneiras de atuaccedilatildeo do sistema nervoso nos

processos cognitivos descritas por Maturana e Varela853 por apontar a possibilidade

de a origem da expressatildeo material da inteligecircncia estar no ceacuterebro em seu todo

poreacutem como efeito como repercussatildeo de uma operaccedilatildeo que nasce no acircmbito

imaterial ou espiritual realizada exclusivamente pela alma esta a partir de

informaccedilotildees recebidas materialmente pelos sentidos

Mas aqui nos referimos exclusivamente agrave capacidade de abstraccedilatildeo

associada intimamente agrave vontade pelas quais no homem a inteligecircncia prevaleceraacute

sobre o instinto e natildeo ao produto exclusivo dos sentidos internos que seria entatildeo

plenamente material ou seja fruto da operaccedilatildeo da alma pela mateacuteria e natildeo por si

851

Porque intraespecificamente um ente humano que ainda natildeo atingiu a chamada ldquoidade da razatildeordquo segundo o aristotelismo-tomismo jaacute deteacutem a potecircncia intelectiva embora esta ainda natildeo se manifeste pelas limitaccedilotildees do organismo inclusive dos sentidos internos em desenvolvimento

852 GALLEGO 2013

853 MATURANA VARELA 1995 p 201-202

186

mesma tal como o eacute a chamada inteligecircncia animal em sua integralidade que

assim como diz Gallegos submete-se ao instinto

Estatildeo nesse campo material dos sentidos internos as citaccedilotildees anteriores de

Griffin854 e Shettleworth855 sobre os atributos dos processos cognitivos como as

representaccedilotildees cujas combinaccedilotildees que resultam em tomadas de decisatildeo

Outras pesquisas como a de Bechara e colaboradores856 que incluem

Antonio Damaacutesio apontam para comportamentos em humanos dentre os quais

estatildeo incluiacutedos casos de tomada de decisatildeo que se antecipam ao raciociacutenio Isto

nos parece ter certa consonacircncia com a proposta aristoteacutelico-tomista e sugerimos

que poderia ser corroborado a partir de estudos que busquem localizar os sentidos

internos no sistema nervoso a partir do que se sabe atualmente nos campos da

neurofisiologia e da neuroanatomia

Reiteramos o que diz George sobre a necessidade de estabelecerem-se os

limites entre os sentidos e a intelecccedilatildeo e que os avanccedilos de investigaccedilotildees nessa

linha podem ser de grande valia para o leque de possibilidades de estudos sobre a

inteligecircncia animal segundo a abordagem atual mais especiacutefica apontada por

Feuerbacher857 no acircmbito da etologia cognitiva e de outras ciecircncias afins

Sugerimos tambeacutem que o aristotelismo-tomismo poderia contribuir com o

esclarecimento dos principais pontos de muitas discussotildees como a polecircmica do

emprego do condicionamento operante skinneriano na educaccedilatildeo humana e os

efeitos negativos descritos por Iserbyt como o adoecimento de alunos ou

surgimento de tiques nervosos neles em razatildeo do estresse858 dentre outros de

longo prazo denunciados ao longo de sua obra ou como aquela que envolveu

Pavlov e Koumlhler e Yerkes Estes dois chegaram a sugerir a presenccedila de alguma

racionalidade de alguma reflexatildeo em chimpanzeacutes com base no que observaram em

seus experimentos alguns expostos aqui mas essas alegaccedilotildees se analisadas agrave luz

do aristotelismo-tomismo estiveram sempre no acircmbito da estimativa O conceito de

inteligecircncia que Koumlhler associou aos seus chimpanzeacutes859 por exemplo ilustrado

pela escolha de um meio diferente para a resoluccedilatildeo de determinada situaccedilatildeo eacute mais

um exemplo que se enquadra na noccedilatildeo aristoteacutelica supramencionada de

854

GRIFFIN 1994 p viii 855

SHETTLEWORTH 2010 p 4 856

BECHARA et al 1997 857

FEUERBACHER 2011 858

ISERBYT 2000 p A-158 859

KOumlHLER 1927 p 3-4

187

semelhanccedila entre a estimativa de certos animais e a de crianccedilas humanas mais

novas

Pode-se sugerir que essa estimativa vaacute aleacutem dos reflexos inatos e

condicionados pavlovianos nas crianccedilas e nos animais como deixam claros alguns

experimentos como aqueles que abordam a comunicaccedilatildeo realizados com Kanzi

Koko dentre outros em que os animais passam a fazer coisas que jamais fariam na

natureza mas sempre dentro dos limites de suas potencialidades Pavlov

reconheceu a elasticidade dessa capacidade de aprendizado de tentativa e erro que

atribuiacutea agraves associaccedilotildees que tecircm como fim a recompensa E diga-se o mesmo de

Thorndike que tambeacutem entendia a chamada inteligecircncia dos animais restrita agraves

operaccedilotildees dos sentidos dos impulsos dos sentimentos apontando neles a

ausecircncia de vontade e de ideias livres860 As delimitaccedilotildees de ambos parece-nos

enquadrarem-se no esquema aristoteacutelico-tomista assim como o que entendem das

associaccedilotildees tambeacutem apontadas por Lloyd que ainda destaca as inferecircncias sem

abstraccedilatildeo nos animais861 que caracterizam as operaccedilotildees da estimativa

E da mesma forma sem levar-se em conta a discrepacircncia na questatildeo de

haver ou natildeo possibilidade de um intermeacutedio entre a ausecircncia e a presenccedila de

capacidade de abstraccedilatildeo as observaccedilotildees de Darwin tambeacutem estatildeo muito proacuteximas

da doutrina aristoteacutelico-tomista como por exemplo em seu relato sobre as

expressotildees emocionais e o reconhecimento de memoacuteria e imaginaccedilatildeo e tambeacutem

quando diz que os animais seriam em algo aptos para o raciociacutenio (no original em

inglecircs ldquoreasoningrdquo) mas sem que tenham capacidade para abstrair descriccedilatildeo na

qual nos parece enquadrar-se a potecircncia estimativa Ademais ao referir-se ao

deliberar (no original em inglecircs ldquodeliberaterdquo)862 no exerciacutecio desse raciociacutenio tudo

indica estar-se referindo natildeo agrave deliberaccedilatildeo como vontade livre que tem como

requisito a intelecccedilatildeo mas justamente agrave voluntariedade que se observa nos animais

e nas crianccedilas

Hume tambeacutem atribuiu certo raciociacutenio com inferecircncias aos animais e

reconhecendo que somente o homem estabelece relaccedilotildees de ideias Mostrou

tambeacutem muita proximidade com o aristotelismo-tomismo ao chamar esse raciociacutenio

ldquoexperimentalrdquo e descrevecirc-lo por exemplo como o motivo pelo qual o animal espera

860

THORNDIKE 1898 p 84 e 108 861

LLOYD 1891 p 348 e 362 862

DARWIN 1882 p 75

188

que algo que se deu em determinada circunstacircncia volte a ocorrer caso esta se

repita863 o que mostra consonacircncia com a descriccedilatildeo da estimativa

Tambeacutem em consonacircncia com esta estaacute a observaccedilatildeo cartesiana da

ausecircncia nos animais de linguagem e raciociacutenio se este estaacute aqui entendido como

de natureza abstrativa A carecircncia de mais informaccedilotildees abriu espaccedilo para a

polecircmica envolvendo o automatismo Embora natildeo se possa mensurar ateacute onde

Descartes quis chegar ao mencionar a superioridade dos animais em relaccedilatildeo a

qualquer aparato de fabricaccedilatildeo humana parece haver seacuterias dificuldades em

apontar com maior precisatildeo se ele conceberia ou natildeo por exemplo consciecircncia

neles

Tomaacutes de Aquino aponta alguns sentidos dados agrave palavra ldquoconsciecircnciardquo

como significando a sindeacuterese mas explica que originalmente falando consciecircncia

significa ldquoa relaccedilatildeo de um conhecimento com uma coisardquo que equivaleria a um

ldquoconsaberrdquo e se efetua atraveacutes de um ato

A consciecircncia como a aplicaccedilatildeo de um conhecimento a alguma coisa que se

pratica pode dar-se de trecircs formas a) pelo reconhecimento de ter ou natildeo feito algo

a partir do que se diz que ela daacute testemunho b) pelo juiacutezo de que se deve ou natildeo

fazer algo a partir do que se diz que ela instiga ou liga e c) pelo juiacutezo de que algo

foi bem feito ou mal feito a partir do que se diz que ela excusa acusa ou

remorde864

Assim a consciecircncia segundo o aristotelismo-tomismo pode ser um ato do

intelecto ou da cogitativa ou um ato da estimativa E quando se trata destes uacuteltimos

eacute resultante de processos cerebrais afirmaccedilatildeo que fundamentaria as hipoacuteteses por

exemplo de Searle e Griffin No entanto a perspectiva de que a consciecircncia se

restringiria a processos orgacircnicos encontra algumas barreiras Tallis por exemplo

diz que se o ceacuterebro fosse uma maacutequina teria de estar ldquoacoplado a uma consciecircncia

que lhe fosse exterior para poder transformar os eventos que ocorrem nele em

lsquoatividadersquo computacionalrdquo pois ldquomaacutequinas natildeo calculam por si mesmasrdquo Esses

863

HUME 2001 p 128-132 864

ldquo[] la relacioacuten de un conocimiento con una cosardquo TOMAacuteS DE AQUINO 2001 art 13 q 79 p 739

189

eventos assim por si soacute natildeo poderiam ldquo[] constituir consciecircncia ou processos

mentaisrdquo865

A consciecircncia enquanto ato do intelecto viabiliza segundo o aristotelismo-

tomismo o ato consciente de que se estaacute consciente jaacute natildeo resultante desses

processos cerebrais ou ao menos natildeo apenas destes Encontramos aqui a divisatildeo

fornecida por Ades ou seja neste uacuteltimo caso teriacuteamos o emprego do termo

ldquoconsciousnessrdquo e no anterior o do termo ldquoawarenessrdquo e aqui se enquadra a

consciecircncia de si mesmo e a do proacuteprio corpo observadas em elefantes grandes

macacos e corvos e acrescidas daquela do proacuteprio comportamento que sob o vieacutes

aristoteacutelico-tomista seria das proacuteprias intenccedilotildees que Herman866 observou nos

golfinhos Deste modo os quatro domiacutenios indicados pelo pesquisador encontram-

se segundo o aristotelismo-tomismo no acircmbito estimativo

Jaacute na divisatildeo de Damaacutesio a chamada ldquoconsciecircncia centralrdquo o conhecimento

de que se estaacute no aqui e no agora parece poder enquadrar-se tambeacutem somente no

acircmbito estimativo ao passo que a chamada ldquoconsciecircncia ampliadardquo (de que se tem

uma identidade do passado e do futuro etc) seria um ato conjunto do intelecto com

a cogitativa Mas aqui o reconhecimento de si mesmo poderia tambeacutem estar

associado agrave estimativa como se observou e como uma participaccedilatildeo no sentido

aristoteacutelico-tomista na cogitativa

Tambeacutem quando Damaacutesio define a consciecircncia como um padratildeo privado que

reuacutene o objeto e o self867 se aproxima da definiccedilatildeo aristoteacutelico-tomista de aplicaccedilatildeo

do conhecimento (de um sujeito) a algo

Damaacutesio apresenta como fato a relaccedilatildeo entre ldquoalguns aspectos dos

processos da consciecircnciardquo e ldquoregiotildees e sistemas cerebrais especiacuteficosrdquo Poderia

estar reconhecendo aqui que nem todos esses aspectos enquadram-se nisto tal

como Chalmers que sugere que ela se estenda para aleacutem de bases orgacircnicas Isto

como se viu estaria mais em consonacircncia com a visatildeo aristoteacutelico-tomista em

relaccedilatildeo aos animais natildeo humanos mas se se pode excluir de algum modo os

processos orgacircnicos como causa tornar-se ia tambeacutem consonante em relaccedilatildeo aos

entes humanos e mais visivelmente com a capacidade de intelecccedilatildeo

865

Respectivamente ldquo[] coupled to a consciousness external to it to transform the events that take place in it into computational activityrdquo ldquo[] machines do not of themselves calculate []rdquo e ldquo[] constitute consciousness or mental processesrdquo TALLIS 2010 p 80

866 HERMAN 2006

867 DAMAacuteSIO 1999 p 30 e 33

190

Jaacute Lalande poderia considerar a definiccedilatildeo aristoteacutelico-tomista abusiva tal

como o faz com a de Schopenhauer e Kant mas natildeo nos parece que sua definiccedilatildeo

em si esteja distante da que ele mesmo propotildee e inclusive do modo como a

classifica Das cinco definiccedilotildees para a palavra ldquointuiccedilatildeordquo que ele fornece parece-nos

encaixarem aqui aquelas em que haacute referecircncia a um conhecimento evidente direto

e imediato868 Vemos assim consonacircncia entre a intuiccedilatildeo do espiacuterito que menciona

e a ciecircncia em ato do sujeito agrave qual se refere o aristotelismo-tomismo bem como

entre os estados e atos deste espiacuterito e o algo respectivamente mas neste segundo

caso de modo natildeo exaustivo E tambeacutem nos parece a consciecircncia espontacircnea

estaria proacutexima da ldquoawarenessrdquo ao passo que a consciecircncia reflexiva

corresponderia agrave ldquoconsciousnessrdquo da qual como aponta Locke869 depende o

perdurante reconhecimento do ldquoeurdquo o testemunho interno que esse ldquoeurdquo pode dar a

si mesmo como aponta Balibar870 e sem o que natildeo poderia haver o exerciacutecio da

intelecccedilatildeo uma vez que o sujeito que intelige somente apreende porque se manteacutem

enquanto o mesmo sujeito e de algum modo se reconhece enquanto tal e

reconhece que reconhece

Paralelamente a consciecircncia enquanto ldquoawarenessrdquo viabiliza a capacidade de

aprender e de adaptar-se ao ambiente que satildeo as duas caracteriacutesticas que Silva

encontra em praticamente todas as definiccedilotildees de inteligecircncia Ambas podem

enquadrar-se como objeto da estimativa ou como objeto da intelecccedilatildeo e daiacute

sugerimos que venha esse seu caraacuteter por assim dizer universal

Tambeacutem se pode enquadrar em ambas o entendimento de Claparegravede Stern

Buumlhler e Koumlhler citados por Piaget de que a inteligecircncia seria uma adaptaccedilatildeo

mental raacutepida a uma nova circunstacircncia Da parte dos animais natildeo humanos um

bom exemplo para ilustraacute-lo eacute o comportamento de obediecircncia dos espeacutecimes de

golfinhos a um comando de criaccedilatildeo

Jaacute o mesmo natildeo se daacute com algumas das caracteriacutesticas elencadas nas

palavras da Task Force on Intelligence da APA871 quando cita a necessidade de uma

busca para definiccedilatildeo de inteligecircncia As capacidades de adaptaccedilatildeo ao ambiente e

de aprendizado a partir da experiecircncia satildeo se tomadas por si soacute notoriamente

estimativas enquanto que a compreensatildeo de ideias complexas e o raciociacutenio satildeo

868

LALANDE 1932 p 396-400 869

LOCKE 2015 p 181 870

BALIBAR 2004 p 175 871

NEISSER 1996 P 77

191

deste modo classificaacuteveis conforme o sentido em que estes atributos satildeo

empregados mas a reflexatildeo eacute proacutepria do intelecto

Aqui jaacute comeccedilamos a esboccedilar como essa base do aristotelismo-tomismo

poderia contribuir para organizar essas caracteriacutesticas fornecendo sugerimos um

suporte para um modo eficaz de encontrar uma definiccedilatildeo para a inteligecircncia que

satisfaccedila agraves tantas correntes de pensamento

Dentre as caracteriacutesticas elencadas pelo Mainstream Science on

Intelligence872 as habilidades de planejar resolver problemas aprender

rapidamente e aprender com a experiecircncia satildeo se analisadas por si soacute verificaacuteveis

na estimativa Do mesmo modo assim como no caso anterior as habilidades de

raciocinar e compreender ideias complexas depende do sentido empregado e a de

pensar abstratamente eacute exclusiva do intelecto Fala-se tambeacutem na capacidade mais

ampla e profunda de compreender captar o sentido das coisas e calcular o que

fazer Este uacuteltimo por si poderia ser objeto da estimativa mas as duas qualificaccedilotildees

que o precedem situam-no na natureza cogitativa ou intelectiva humana

A definiccedilatildeo de Wechsler873 refere-se agrave inteligecircncia humana pois fala de um

pensamento racional para o trato com o ambiente o que exige reflexatildeo e parece

caracterizar o intelecto praacutetico segundo o aristotelismo-tomismo Jaacute a de Stern874 se

tomada apenas em si mesma poderia ser aplicaacutevel tanto aos animais que

destacamos aqui quanto aos humanos conforme o sentido que se pretenda dar

quando se refere ao indiviacuteduo ajustar o pensamento a novas exigecircncias

conscientemente Se ele o faz por exemplo consciente de que pensa no que faz

estaacute no acircmbito intelectivo e se o faz consciente do que estaacute fazendo pode estar no

da estimativa

A identificaccedilatildeo desta e dos sentidos internos e de sua expressatildeo no sistema

nervoso como jaacute propomos poderia servir de base inclusive de natureza

epistemoloacutegica para as abordagens bioloacutegicas segundo a classificaccedilatildeo de

Sternberg

Em se tratando da psicologia cognitiva parece-nos que a utilizaccedilatildeo dos

modelos mentais de Johnson-Laird estariam a ilustrar o refluxo do intelecto em suas

trecircs operaccedilotildees na imaginaccedilatildeo (as representaccedilotildees mentais as possibilidades etc)

872

GOTTFRESON 1997 p 13 873

WECHSLER 1944 p 3 874

STERN 1914 p 3

192

na memoacuteria e na reminiscecircncia (o recurso voluntaacuterio ou natildeo agravequelas) e na cogitativa

(apreendendo comparando e combinando as imagens e as intenccedilotildees relacionadas)

No que toca agraves demais abordagens cognitivas as habilidades ndash como as da

teoria triaacuterquica do proacuteprio Sternberg por exemplo as contextuais que dizem

respeito agraves interaccedilotildees com o ambiente em si como a de adaptaccedilatildeo ndash seriam

elencadas indicando-se se estariam relacionadas aos sentidos internos e a quais

ou ao intelecto e aqui ou ao intelecto praacutetico ou ao especulativo e assim tambeacutem

com as chamadas inteligecircncias muacuteltiplas de Gardner e a chamada inteligecircncia

emocional de Goleman e Salovey e Mayer Estas sob a oacuteptica aristoteacutelico-tomista

sugerimos natildeo caracterizariam inteligecircncia no sentido proacuteprio mas modalidades de

efeitos da expressatildeo desta e mesmo da cogitativa conforme o caso

Por fim esta mesma aplicaccedilatildeo poder-se-ia fazer em relaccedilatildeo agraves teorias na

abordagem psicomeacutetrica identificando-se a que cada um dos fatores propostos

estaria associado ou seja e mais uma vez se aos sentidos internos e a quais ou

ao intelecto praacutetico ou ao especulativo O raciociacutenio indutivo de Thurstone por

exemplo caracterizaria em princiacutepio o intelecto especulativo enquanto que os trecircs

tipos de inteligecircncia de Thorndike (social mecacircnica e abstrata) estariam em

princiacutepio associados ao intelecto especulativo e ao praacutetico jaacute que tratam de

aprendizado e administraccedilatildeo de relaccedilotildees

As divergecircncias na definiccedilatildeo de inteligecircncia satildeo demasiado intensas

considerando-se sobretudo o caraacuteter quantitativo No entanto como se observou

estatildeo sempre presentes nesses estudos as distinccedilotildees do aristotelismo-tomismo que

discrimina os sentidos internos dos animais e dos humanos e a intelecccedilatildeo

pertencente a estes e parece-nos que elas poderiam fornecer as devidas bases

para uma jornada de natureza consensual facilitando processos de delimitaccedilatildeo

algo que exigiria pesquisas futuras Pensamos que estas estariam ao mesmo tempo

prestando um contributo para o desenvolvimento do que abordamos aqui sobre a

inteligecircncia no homem e nos demais animais

Em relaccedilatildeo a estes como dissemos natildeo encontramos no presente trabalho

sinais de memoacuteria voluntaacuteria e imaginaccedilatildeo voluntaacuteria nem algo que caracterizasse a

apreensatildeo de universais Se as duas primeiras tivessem sido apontadas teriacuteamos

verificado a presenccedila de cogitativa e se a terceira o tivesse sido teriacuteamos deparado

com intelecccedilatildeo Se por um lado muitos animais apresentam sentidos externos e

inclusive alguns sentidos internos como a memoacuteria mais acurados do que os do

193

homem por outro nos eacute notoacuteria e soou-nos como sendo um consenso a

superioridade da faculdade intelectiva humana caracterizada pelo exerciacutecio da

razatildeo que possibilita profundas elucubraccedilotildees como as de Bachelard que citamos no

iniacutecio deste estudo que possibilita a formulaccedilatildeo de conceitos e de juiacutezos complexos

a construccedilatildeo de silogismos construccedilotildees especulativas complexas etc a partir da

abstraccedilatildeo tal como visto tambeacutem em outras citaccedilotildees aqui presentes como as de

Hume quando aponta as limitaccedilotildees da inteligecircncia nos animais natildeo humanos a de

Descartes quando diz que estes natildeo raciocinam e os compara a maacutequinas a de

Darwin ao dizer que os animais natildeo fazem reflexotildees e abstraccedilotildees no que tambeacutem

concordam Lloyd Thorndike e os demais

Os trabalhos que analisamos assim como estes autores em geral por

estarem ancorados na experiecircncia atribuem memoacuteria e imaginaccedilatildeo aos animais e

descrevem de algum modo a estimativa ao atribuir-lhes certa voluntariedade

capacidade de tomada de decisatildeo de estabelecimento de associaccedilotildees da

plasticidade de origem natural ou artificial mencionada por Lloyd que levam a certos

tipos de inferecircncias

Como se viu os behavioristas como Pavlov e Skinner seguem a ideia de

Darwin de que natildeo haveria barreiras naturais intransponiacuteveis entre a condiccedilatildeo

intelectiva humana e tudo aquilo que participa da inteligecircncia dos demais animais O

aristotelismo-tomismo apresenta um vieacutes mais principial partindo de premissas

ontoloacutegicas ou metafiacutesicas e aponta em outro sentido

As observaccedilotildees que fizemos aqui aleacutem de reforccedilarem a hipoacutetese central de

que sua aplicaccedilatildeo no entendimento da chamada inteligecircncia animal poderaacute ajudar a

estabelecer limites e pontos de partida para a compreensatildeo da inteligecircncia inclusive

a humana de natureza ainda mais complexa levaram-nos a emitir outras sugestotildees

para futuros estudos e eacute possiacutevel que tenham aberto uma ou mais frentes de

pesquisa de natureza interdisciplinar e inclusive etoloacutegica psicoloacutegica e quiccedilaacute

relacionadas a outras aacutereas

Por um lado natildeo encontramos um trabalho que reuacutena todas as informaccedilotildees

para a construccedilatildeo da doutrina psicoloacutegica aristoteacutelico-tomista que se encontra

dispersa na obra de Aristoacuteteles e Tomaacutes de Aquino razatildeo pela qual tentamos expocirc-

la de modo que possa vir a ser futuramente complementada

Por outro tentamos organizar as habilidades dos animais observadas nos

estudos bem como os testes empregados para avaliaacute-las sugerindo o

194

desenvolvimento de uma sistematizaccedilatildeo algo que ateacute o momento soacute vimos

esboccedilado no sumaacuterio e consequentemente na organizaccedilatildeo de algumas obras875

E como desenvolvimento direto da proposta central deste trabalho

apontamos para a sequecircncia na verificaccedilatildeo da viabilidade de associaccedilatildeo entre o

aristotelismo-tomismo e os estudos no campo da inteligecircncia humana e dos animais

natildeo humanos visando a futuras construccedilotildees nessas duas vertentes o que incluiria

estudos envolvendo a comparaccedilatildeo entre a inteligecircncia das crianccedilas e a dos animais

com base na psicologia de Aristoacuteteles e Tomaacutes de Aquino a tentativa insistimos de

identificaccedilatildeo no sistema nervoso sob as perspectivas humana e comparada dos

elementos cognitivos que compotildeem essa doutrina dos dois filoacutesofos etc Esse

processo inclusive desde jaacute sugerimos poderaacute contribuir para a formulaccedilatildeo de

novas hipoacuteteses que poderatildeo trazer esclarecimentos para problemas tatildeo atuais de

natureza fisioloacutegica conceitual etc como os que envolvem os processos de

tomada de decisatildeo bem como aquilo que se entende por consciecircncia a partir da

formulaccedilatildeo de abordagens de natureza epistemoloacutegica cuja aplicaccedilatildeo poderaacute

inclusive ser testada como meio para resoluccedilatildeo de questotildees estruturais internas e

externas das disciplinas relacionadas dada as bases da doutrina que se estruturam

sobre princiacutepios evidentes

Isto que se acaba de dizer pode ser mais bem visualizado no esquema da

paacutegina seguinte

875

Cf por exemplo SHETLLEWORTH 2010

195

Figura 1 - Esquema de sugestotildees para pesquisas futuras

Classificaccedilatildeo dos tipos de habilidade

Sequecircncia da coleta integral de dados

para composiccedilatildeo da doutrina psicoloacutegica aristoteacutelico-tomista

Estudos comparados da

inteligecircncia

Aristotelismo-tomismo

Sequecircncia da

investigaccedilatildeo sobre

compatibilidade entre

psicologia aristoteacutelico-

tomista e demais

estudos sob a oacuteptica

humana e comparada

TESE

Localizaccedilatildeo anatocircmica e

fisioloacutegica dos sentidos

internos no sistema nervoso

Aplicaccedilatildeo da psicologia

aristoteacutelico-tomista a esses

estudos

Estudos comparativos evolvendo a

estimativa dos animais e a das

crianccedilas humanas

Classificaccedilatildeo dos tipos de teste

Busca por soluccedilatildeo de questotildees conceituais de organizaccedilatildeo interna e externa das disciplinas envolvidas etc e de problemas de natureza

conceitual fisioloacutegica psicoloacutegica etc como os que envolvem a consciecircncia a tomada de decisatildeo etc

Estudos comparativos evolvendo a

estimativa dos animais e a

cogitativa e a intelecccedilatildeo

196

Esperamos assim ter conseguido contribuir com mais uma etapa para

corroborar a validade da psicologia de Aristoacuteteles e Tomaacutes de Aquino sob uma

perspectiva comparada e delinear satisfatoriamente algumas bases para a

realizaccedilatildeo de futuros estudos de natureza interdisciplinar que tenham como

estrutura a fusatildeo entre esse acircmbito principial da doutrina dos dois filoacutesofos e as

hipoacuteteses formuladas dentro das linhas de pesquisa aqui apresentadas o que nos

parece estar no acircmago da proposta da subalternaccedilatildeo das ciecircncias a qual assim

cremos jamais deveria ter sido negligenciada

197

REFEREcircNCIAS

ADES C O morcego outros bichos e a questatildeo da consciecircncia animal Psicologia USP Satildeo Paulo v 8 n 2 1997 ALLEN M SCHWARTZ B L Mirror self-recognition in a gorilla (Gorilla gorilla gorilla) 2007 29 f Dissertaccedilatildeo (Mestrado em Psicologia) ndash Florida International University Miami 2007 AMSTERDAM B Mirror self‐image reactions before age two Developmental Psychobiology v 5 n 4 p 297-305 1972 ANDERSON A Semantic and social-pragmatic aspects of meaning in task-oriented dialogue 1983 619 f Tese (Doutorado em Filosofia) ndash University of Glasgow Glasgow 1983 ANDERSON J R A primatological perspective on death American Journal of Primatology v 73 n 5 p 410-414 2011 ANGIONI L Sobre a relaccedilatildeo entre mateacuteria e forma na constituiccedilatildeo da essecircncia sensiacutevel em Aristoacuteteles Cadernos de Histoacuteria e Filosofia da Ciecircncia seacuterie 3 Campinas v 7 n 2 p 209-251 1997 ANGIONI L ldquoNatildeo ser dito de um subjacenterdquo ldquoum istordquo e ldquoseparadordquo o conceito de essecircncia como subjacente e forma (Z-3) Cadernos de Histoacuteria e Filosofia da Ciecircncia seacuterie 3 Campinas v 8 n esp p 69-126 1998 ALLMAN J M WATSON K K TETREAULT N A HAKEEM A Y Intuition and autism a possible role for Von Economo neurons Trends in Cognitive Sciences v 9 n 8 p 367-373 2005 ARISTOacuteTELES Das Categorias (Oacuterganon) Traduccedilatildeo notas e comentaacuterios de Maacuterio Ferreira dos Santos 2 ed Satildeo Paulo Editora Matese 1965 171 p ARISTOacuteTELES Investigacioacuten sobre los Animales Madrid Editorial Gredos 1992 612 p ARISTOacuteTELES Fiacutesica Madrid Editorial Gredos 1995a 506 p ARISTOacuteTELES Analiacuteticos segundos In Tratados de Loacutegica (Oacuterganon) II Madrid Editorial Gredos 1995b 460 p ARISTOacuteTELES Eacutetica Nicomaacutequea In ______ Eacutetica nicomaacutequea eacutetica eudemia Madrid Editorial Gredos 1998a 561 p ARISTOacuteTELES Eacutetica Eudemia In ______ Eacutetica nicomaacutequea eacutetica eudemia Madrid Editorial Gredos 1998b 561 p

198

ARISTOacuteTELES Metafiacutesica In REALE G (org) Metafiacutesica texto grego com traduccedilatildeo ao lado 2 ed Satildeo Paulo Ed Loyola 2005 v II 696 (xiv) p ARISTOacuteTELES Sobre a Alma Lisboa Centro de Filosofia da Universidade de Lisboa 2010 143 p (Coleccedilatildeo Obras Completas de Aristoacuteteles Biblioteca de Autores Claacutessicos Imprensa Nacional-Casa da Moeda) BACHELARD G A Chama de uma Vela Rio de Janeiro Ed Bertrand Brasil 1989 112 p BALIBAR E Consciousness conscience awareness In CASSIN B Dictionary of untranslatables a philosophical lexicon Princeton Princeton University Press 2004 1299 p BATES L A et al Do elephants show empathy Journal of Consciousness Studies v 15 n 10-11 p 204-225 2008 BEARZI G et al Whale and dolphin behavioural responses to dead conspecifics Zoology v 128 p 1-15 jun 2018 BECHARA A DAMASIO H TRANEL D DAMASIO A R Deciding advantageously before knowing the advantageous strategy Science v 275 n 5304 p 1293-1295 1997 BELYAEV D K Destabilizing selection as a factor in domestication Journal of Heredity v 70 n 5 p 301-308 1979 BIRO D MATSUZAWA T Numerical ordering in a chimpanzee (Pan troglodytes) Planning executing and monitoring Journal of Comparative Psychology v 113 n 2 p 178 1999 BOESCH C The effects of leopard predation on grouping patterns in forest chimpanzees Behaviour v 117 n 3 p 220-241 1991 BOESCH C Innovation in wild chimpanzees (Pan troglodytes) International Journal of Primatology v 16 n 1 p 1-16 1995 BOESCH C The emergence of cultures among wild chimpanzees In RUNCIMAN W G J SMITH M DUNBAR R I M (ed) Proceedings-British Academy New York Oxford University Press 1996 p 251-268 BOESCH C Is culture a golden barrier between human and chimpanzee Evolutionary Anthropology Issues News and Reviews v 12 n 2 p 82-91 2003 BOESCH C BOESCH H Tool use and tool making in wild chimpanzees Folia Primatologica v 54 n 1-2 p 86-99 1990 BOESCH C TOMASELLO M Chimpanzee and human cultures Current Anthropology v 39 n 5 p 591-614 1998

199

BOTIGUEacute L R et al Ancient European dog genomes reveal continuity since the early Neolithic Nature Communications v 8 p 16082 2017 BOUCHARD J GOODYER W LEFEBVRE L Social learning and innovation are positively correlated in pigeons (Columba livia) Animal Cognition v 10 n 2 p 259-266 2007 BOYSEN S T BERNTSON G G Numerical competence in a chimpanzee (Pan troglodytes) Journal of Comparative Psychology v 103 n 1 p 23 1989 BRITISH BROADCASTING CORPORATION Are crows the ultimate problem solvers [S l s n] 2014 1 video (4 min) Publicado pela BBC Health Disponiacutevel em wwwbbccoukprogrammesp01r0md3 httpswwwyoutubecomwatchv =cbSu2PXOTOc Acesso em 13 out 2018 BROSNAN S F DE WAAL F B Monkeys reject unequal pay Nature v 425 n 6955 p 297 2003 BROWN C Fish intelligence sentience and ethics Animal Cognition v 18 n 1 p 1-17 2015 BUGNYAR T REBER S A BUCKNER C Ravens attribute visual access to unseen competitors Nature Communications v 7 p 10506 2016 BURGHARDT G M BEKOFF M Animal consciousness In BAYNE T CLEEREMANS A WILKEN P (ed) The Oxford companion to consciousness Oxford UK Oxford University Press 2009 p 39-42 BUSNEL R G Symbiotic relationship between man and dolphins Transactions of the New York Academy of Sciences v 35 n 2 Series II p 112-131 1973 BUTTI C et al Total number and volume of Von Economo neurons in the cerebral cortex of cetaceans Journal of Comparative Neurology v 515 n 2 p 243-259 2009 BYRNE R A KUBA M GRIEBEL U Lateral asymmetry of eye use in Octopus vulgaris Animal Behaviour v 64 n 3 p 461-468 2002 BYRNE R W BATES L MOSS C J Elephant cognition in primate perspective Comparative Cognition amp Behavior Reviews v 4 p 65-79 2009 CALDEROacuteN A Umbrales de la filosofia cuatro introducciones tomistas Mendoza Ediccedilatildeo do autor 2011 519 p CALL J BRAumlUER J KAMINSKI J TOMASELLO M Domestic dogs (Canis familiaris) are sensitive to the attentional state Journal of Comparative Psychology v 117 n 3 p 257-263 2003

200

CAMMAERTS TRICOT M C CAMMAERTS R Are ants (Hymenoptera Formicidae) capable of self recognition Journal of Science v 5 n 7 p 521-532 2015 CAMPAN R Histoire de LEacutethologie repeacuteres chronologiques In ENCYCLOPAEDIA Universalis Toulouse [s n] [2018] Disponiacutevel em httpswwwuniversalisfr encyclopediehistoire-de-l-ethologie-reperes-chronologiques Acesso em 15 jan 2019 CARVALHO NETO M B MAYER P C M Skinner e a assimetria entre reforccedilamento e puniccedilatildeo Acta Comportamentalia Guadalajara v 19 n 4 2011 CHALMERS D J La mente consciente em busca de una teoriacutea fundamental Barcelona Gedisa Editorial 1999 CHERNISS C Intelligence Emotional In SPIELBERGER C (ed) Encyclopedia Of aplied psychology Amsterdan [s n] 2004 p 321-328 COLBERT-WHITE E N et al Can dogs use vocal intonation as a social referencing cue in an object choice task Animal Cognition v 21 n 2 p 253-265 2018 COLLEacute G La Meacutetaphysique ndash Livre Ier ndash Traduction et Commentaire Collection Traductions et Eacutetudes Institut Supeacuterieur de Philosophie de lrsquoUniversiteacute de Louvain 1912 171 (38) (vi) p COLLETT M CHITTKA L COLLETT T S Spatial memory in insect navigation Current Biology v 23 n 17 R789-R800 2013 COLLETT T S GRAHAM P Insect navigation do honeybees learn to follow highways Current Biology v 25 n 6 R240-R242 2015 CONSCIEcircNCIA In Dicionaacuterio Online Caldas Aulete Rio de Janeiro Lexikon Editora Digital 2008 Disponiacutevel em wwwauletecombr Acesso em 10 ago 2017 CONSCIEcircNCIA In Dicionaacuterio Priberam da Liacutengua Portuguesa Lisboa Priberam Informaacutetica 1998 Disponiacutevel em httpswwwpriberamptdlpo Acesso em 10 ago 2017 COREN S The Intelligence of Dogs a guide to the thoughts emotions and inner lives of our canine companions New York Free Press 2006 301 (xiii) p COTTINGHAM J ldquoA brute to the brutesrdquo Descartes treatment of animals Philosophy v 53 n 206 p 551-559 1978 COWAN R B Short-term memory for behavior in the bottlenosed dolphin (Tursiops truncatus) 2003 Dissertaccedilatildeo (Mestrado) ndash University of Hawaii Honolulu 2003 DALE R PLOTNIK J M Elephants know when their bodies are obstacles to success in a novel transfer task Scientific Reports 7 2017

201

DAMAacuteSIO A Sentir lo que sucede cuerpo y emocioacuten en la faacutebrica de la consciencia Santiago Editorial Andres Bello 2000 414 p DAMAacuteSIO A O misteacuterio da consciecircncia Satildeo Paulo Companhia das Letras 1999 DAMATO M R COLOMBO M Serial learning with wild card items by monkeys (Cebus apella) Implications for knowledge of ordinal position Journal of Comparative Psychology v 103 n 3 p 252 1989 DARWIN C R The descent of man and selection in relation to sex 2 ed London John Murray Albemarle Street 1882 693 (xvi) p DARWIN C R El Origen del Hombre la seleccioacuten natural y la sexual F Sempere Y Cordf Editores Valencia s d a) (aprox 1909) 195 p (a paginaccedilatildeo natildeo eacute original) Disponiacutevel em httpsmedicinaufmeduimages77cElorigendelhombre_POR _CHARLES_DARWINpdf Acesso em 13 set 2018 DARWIN C R La Expresioacuten de las Emociones en el Hombre y em los Animales F Sempere Y Cordf Editores Valencia sd b) v 1 255 p Disponiacutevel em httpfondos digitalesusesmediabooks3247la-expresion-de-las-emociones-en-el-hombre-y-en-los-animalespdf Acesso em set 2018 DEACON T W The symbolic species the co-evolution of language and the brain New York W W Norton amp Company 1997 527 p DE LIBERA A Intellectus In CASSIN B Dictionary of untranslatables a philosophical lexicon Princeton Princeton University Press 2004 1299 p DE MOURA NEVES M H A teoria linguiacutestica em Aristoacuteteles Alfa Marilia v 25 p 57-67 1981 DEWSBURY D A John B Watsonrsquos early work and comparative psychology Revista Mexicana de Anaacutelisis de la Conducta v 39 n 2 2013 DOUGLAS-HAMILTON I HILLMAN A K K Elephant carcasses and skeletons as indicators of population trends In GRIMSDELL JJR WESTLEY S Low level aerial survey techniques Nairobi ILCA 1981 p 113-129 (Monograph 4) DOUGLAS-HAMILTON I BHALLA S WITTEMYER G VOLLRATH F Behavioural reactions of elephants towards a dying and deceased matriarch Aplied Animal Behaviour Science v 100 n 1-2 p 87-102 2006 DWECK C S LEGGETT E L A social-cognitive aproach to motivation and personality Psychological Review v 95 n 2 p 256-273 1988 DYER F C Spatial cognition and navigation in insects In REAL L Behavioral mechanisms in evolutionary ecology Chicago University of Chicago Press 1994 p 66-98 471 p

202

ECHAVARRIacuteA M La Praacutexis de la Psicologia y sus niveles epistemoloacutegicos seguacuten Santo Tomaacutes de Aquino Argentina Editorial UCALP 2009

EIBL‐EIBESFELDT I Uumlber den Werkzeuggebrauch des Spechtfinken Camarhynchus pallidus (Sclater und Salvin) Ergebnisse der Galapagos‐Expedition des internationalen Institutes fuumlr submarine Forschung Vaduz (Liechtenstein) Zeitschrift fuumlr Tierpsychologie v 18 n 3 p 343-346 1961 EMERY N J Cognitive ornithology the evolution of avian intelligence Philosophical Transactions of the Royal Society of London B Biological Sciences v 361 n 1465 p 23-43 2006 EMERY N J CLAYTON N S The mentality of crows convergent evolution of intelligence in corvids and apes Science v 306 n 5703 p 1903-1907 2004 FAGOT J MAUGARD A Analogical reasoning in baboons (Papio papio) flexible reencoding of the source relation depending on the target relation Learning amp Behavior v 41 n 3 p 229-237 2013 FEUERBACHER E N A history of dogs as subjects in north american experimental psychological research Cognition and Behavior Review University of Florida and Kyung Hee University v 6 p 46-71 2011 FEUERBACHER E N ROSALES-RUIZ J Can dogs learn concepts the same way we do Concept formation in a German Shepherd International Journey of Comparative Psychology 30 p 1-25 2017 FIORITO G VON PLANTA C SCOTTO P Problem solving ability of Octopus vulgaris Lamarck (Mollusca Cephalopoda) Behavioral and Neural Biology v 53 n 2 p 217-230 1990 FIORITO G SCOTTO P Observational learning in Octopus vulgaris Science v 256 n 5056 p 545-547 1992 FOERDER P et al Insightful problem solving in an Asian elephant PloS one v 6 n 8 p e23251 2011 GALLEGOS W L A Teoriacutea de la inteligencia una aproximacioacuten neuropsicoloacutegica desde el punto de vista de Lev Vigotsky Cuadernos de Neuropsicologiacutea v 7 n 1 p 22-37 2013 GALLUP JR G G Chimpanzees self-recognition Science New Series v 167 n 3914 p 86-87 1970 GALLUP JR G G Self-recognition in primates American Psychologist 32 p 329-338 1977 GARDNER R A GARDNER B T Teaching sign language to a chimpanzee Science v 165 n 3894 p 664-672 1969

203

GEORGE M I Thomas Aquinas Meets Nim Chimpsky On the debate about human nature and the nature of other animals The Aquinas Review v 10 p 1-50 2003 GIGNAC G E BATES T C Brain volume and intelligence The moderating role of intelligence measurement quality Intelligence v 64 p 18-29 2017 GILLAN D J PREMACK D WOODRUFF G Reasoning in the chimpanzee I Analogical reasoning Journal of Experimental Psychology Animal Behavior Processes v 7 n 1 p 1 1981 GIRNDT A MEIER T CALL J Task constraints mask great apes ability to solve the trap-table task Journal of Experimental Psychology Animal Behavior Processes v 34 n 1 p 54 2008 GOTTFREDSON L Mainstream Science on Intelligence an editorial with 52 signatories history and bibliography Intelligence Norwood v 24 n 1 spec p 13-23 1997 GRASSMANN S KAMINSKI J TOMASELLO M How two word-trained dogs integrate pointing and naming Animal Cognition v 15 n 4 p 657-665 2012 GRENE M Aristotle and modern biology Journal of the History of Ideas v 33 n 3 p 395-424 1972 GRIFFIN D R Animal minds Chicago University of Chicago Press 1994 310 (x) p HAKEEM A Y et al Von Economo neurons in the elephant brain The Anatomical Record Advances in Integrative Anatomy and Evolutionary Biology v 292 n 2 p 242-248 2009 HAMPTON R R Rhesus monkeys know when they remember Proceedings of the National Academy of Sciences v 98 n 9 p 5359-5362 2001 HARE B et al The domestication hypothesis for dogs skills with human communication a response to Udell et al(2008) and Wynne et al(2008) Animal Behaviour 79 p e1-e6 2010 HARE B TOMASELLO M Human-like social skills in dogs Trends in Cognitive Sciences v 9 n 9 p 439-444 2005 HARE B Domestic dogs use humans as tools In BEKOFF M (ed) Encyclopedia of animal behaviour Connecticut Greenwood Press 2004 v 1 p 277-285 HARE B BROWN M WILLIAMSON C TOMASELLO M The domestication of social cognition in dogs Science v 298 n 5598 p 1634-1636 2002 HART B L HART L A PINTER-WOLLMAN N Large brains and cognition Where do elephants fit in Neuroscience and Biobehavioral Reviews v 32 n 1 p 86-98 2008

204

HART L A The Asian elephants-driver partnership the drivers perspective Aplied Animal Behaviour Science v 40 n 3 p 297-312 1994 HEANEY M GRAY R D TAYLOR A H Keas perform similarly to chimpanzees and elephants when solving collaborative tasks PloS one v 12 n 2 p e0169799 2017 HEDWIG D et al Acoustic structure and variation in mountain and western gorilla close calls a syntactic aproach Behaviour v 151 n 8 p 1091-1120 2014 HERMAN L M RICHARDS D G WOLZ J P Comprehension of sentences by bottlenosed dolphins Cognition v 16 n 2 p 129-219 1984 HERMAN L M FORESTELL P H Reporting presence or absence of named objects by a language-trained dolphin Neuroscience amp Biobehavioral Reviews v 9 n 4 p 667-681 1985 HERMAN L M Cognition and language competencies of bottlenosed dolphins In SCHUSTERMAN R J THOMAS J WOOD F G (ed) Dolphin cognition and behavior a comparative aproach Hillsdale NJ Lawrence Erlbaum Associates 1986 p 221-251 HERMAN L M MORREL-SAMUELS P PACK A A Bottlenosed dolphin and human recognition of veridical and degraded video displays of an artificial gestural language Journal of Experimental Psychology General v 119 n 2 p 215-230 1990 HERMAN L M KUCZAJ S III HOLDER M D Responses to anomalous gestural sequences by a language-trained dolphin Evidence for processing of semantic relations and syntactic information Journal of Experimental Psychology General v 122 n 2 p 184-194 1993a HERMAN L M PACK A A MORREL-SAMUELS P Representational and conceptual skills of dolphins In ROITBLAT H R HERMAN L M NACHTIGALL P (ed) Language and communication comparative perspectives Hillside NJ Lawrence Erlbaum 1993b p 273-298 HERMAN L M et al Dolphins (Tursiops truncatus) comprehend the referential character of the human pointing gesture Journal of Comparative Psychology v 113 n 4 p 1-18 1999 HERMAN L et al The bottlenosed dolphinrsquos (Tursiops truncatus) understanding of gestures as symbolic representations of its body parts Animal Learning and Behavior v 29 n 3 p 250-264 2001 HERMAN L M Vocal social and self-imitation by bottlenosed dolphins In NEHANIV C DAUTENHAHN K (ed) Imitation in animals and artifacts Cambridge MA MIT Press 2002 p 63-108

205

HERMAN L M Intelligence and rational behaviour in the bottlenosed dolphin In HURLEY S NUDDS M (ed) Rational Animals Oxford Oxford University Press 2006 p 439-467 HERMAN L M Body and self in dolphins Consciousness and Cognition v 21 n 1 p 526-545 2012 HIRATA S WATANABE K MASAO K ldquoSweet-potato washingrdquo revisited In Primate origins of human cognition and behavior Tokyo Springer 2008 p 487-508 HOFFMAN T Conscience and Synderesis In DAVIES B STUMP E (ed) The Oxford Handbook of Aquinas Oxford Oxford University Press 2012 p 255-264 HUME D Investigaccedilatildeo acerca do entendimento humano [S l] Ed Acroacutepolis 2001 [1748] Versatildeo para e-book de eBooksBrasil 2006 252 p HUNT G R GRAY R D Diversification and cumulative evolution in New Caledonian crow tool manufacture Proceedings of the Royal Society of London B Biological Sciences v 270 n 1517 p 867-874 2003 INFORMACcedilAtildeO In Dicionaacuterio online Caldas Aulete Rio de Janeiro Lexikon Editora Digital 2008 Disponiacutevel em wwwauletecombr Acesso em 10 ago 2017 INFORMACcedilAtildeO In Dicionaacuterio Priberam da Liacutengua Portuguesa Lisboa Priberam Informaacutetica 1998 Disponiacutevel em httpswwwpriberamptdlpo Acesso em 10 ago 2017 INFORMAR In Dicionaacuterio Online Caldas Aulete Lexikon editora digital Rio de Janeiro 2008 Disponiacutevel em wwwauletecombr Acesso em 10 ago 2017 INFORMAR In Dicionaacuterio Priberam da Liacutengua Portuguesa Lisboa Priberam Informaacutetica 1998 Disponiacutevel em httpswwwpriberamptdlpo Acesso em 10 ago 2017 INOUE S MATSUZAWA T Working memory of numerals in chimpanzees Current Biology v 17 n 23 p R1004-R1005 2007 INTELIGEcircNCIA In Dicionaacuterio Online Caldas Aulete Rio de Janeiro Lexikon Editora Digital 2008 Disponiacutevel em wwwauletecombr Acesso em 10 ago 2017 INTELIGEcircNCIA In Dicionaacuterio Priberam da Liacutengua Portuguesa Lisboa Priberam Informaacutetica 1998 Disponiacutevel em httpswwwpriberamptdlpo Acesso em 10 ago 2017 IRIE-SUGIMOTO N et al Evidence of meansndashend behavior in Asian elephants (Elephas maximus) Animal Cognition v 11 n 2 p 359-365 2008 IRIE-SUGIMOTO N KOBAYASHI T SATO T HASEGAWA T Relative quantity judgment by Asian elephants (Elephas maximus) Animal Cognition v 12 n 1 p 193-199 2009

206

IRIE N HASEGAWA T Elephant psychology what we know and what we would like to know Japanese Psychological Research v 51 n 3 p 177-181 2009 ISERBYT C T The Deliberate Dumbing Down of America 2 ed Ohio Conscience Press 2000 709 (xxvii) p JACOBS B et al Neuronal morphology in the African elephant (Loxodonta africana) neocortex Brain Structure and Function v 215 n 3-4 p 273-298 2011 JACOBS M S MCFARLAND W L MORGANE P J The anatomy of the brain of the bottlenose dolphin (Tursiops truncatus) Rhinic lobe (rhinencephalon) the archicortex Brain Research Bulletin v 4 p 1-108 1979 JELBERT S A et al Using the Aesops fable paradigm to investigate causal understanding of water displacement by New Caledonian crows PloS one v 9 n 3 p e92895 2014 JELBERT S A HOSKING R J TAYLOR A H GRAY R D Mental template matching is a potential cultural transmission mechanism for New Caledonian crow tool manufacturing traditions Scientific Reports v 8 n 1 p 8956 2018 JERISON H Evolution of the Brain and Intelligence New York Academic Press 1973 482 (xiv) p JOHNSON‐LAIRD P N Mental models in cognitive science Cognitive Science v 4 n 1 p 71-115 1980 JOHNSON-LAIRD Philip N Mental models and cognitive change Journal of Cognitive Psychology v 25 n 2 p 131-138 2013 JOHNSTON A M HOLDEN P C SANTOS L R Exploring the evolutionary

origins of overimitation a comparison across domesticated and non‐domesticated canids Developmental Science v 20 n 4 p e12460 2017 JOumlRGENSEN S Empathy altruism and the African elephant Monografia apresentada no Veterinaumlrprogrammet [Programa de Veterinaacuteria] do Institutionen foumlr biomedicin och veterinaumlr folkhaumllsovetenskap [Departamento de Biomedicina e Ciecircncias da Sauacutede Veterinaacuteria] da Sveriges lantbruksuniversitet 2015 KAMINSKI J CALL J FISCHER J Word Learning in a domestic dog evidence for fast maping Science v 304 p 1682-1683 2004 KAMINSKI J FISCHER J CALL J Prospective object search in dogs mixed evidence for knowledge of what and where Animal Cognition v 11 n 2 p 367-371 2008 KAWAI N MATSUZAWA T Numerical memory span in a chimpanze Nature v 403 p 6765 2000a

207

KAWAI N MATSUZAWA T A conventional aproach to chimpanzee cognition Response to MD Hauser (2000) Trends in cognitive sciences v 4 n 4 p 128-129 2000b KELLOGG W N KELLOGG L A The ape and the child a study of environmental influence upon early behavior Facsimile da ediccedilatildeo de McGraw-Hill Book Company Inc (1933) Hafner Publishing Company Inc New York 1967 341 (xv) p KENNEDY E H FRAGASZY D M Analogical reasoning in a capuchin monkey (Cebus apella) Journal of Comparative Psychology v 122 n 2 p 167 2008 KENNY A Aquinas on Mind Topics in Medieval Philosophy Routledge Londres 1994 182 (viii) p KOumlHLER W The mentality of apes 2 ed reimp 1931 New York Kegan Paul Trench Trubner amp Co 1927 336 (viii) p KOPS A M et al Characterizing the socially transmitted foraging tactic ldquospongingrdquo by bottlenose dolphins (Tursiops sp) in the western gulf of Shark Bay Western Australia Marine Mammal Science v 30 n 3 p 847-863 2014 KORNELL N Where is the ldquometardquo in animal metacognition Journal of Comparative Psychology v 128 n 2 p 143 2014 KOVAacuteCS Aacute MATHER J A Cephalopod cognition scholastic psychology Res Cogitans v 1 n 5 p 23-38 2008 KRUumlTZEN M et al Cultural transmission of tool use by Indo-Pacific bottlenose dolphins (Tursiops sp) provides access to a novel foraging niche Proceedings of the Royal Society of London B Biological Sciences v 281 n 1784 p 20140374 2014 KUKEKOVA A V et al The genetics of domesticated behavior in canids What can dogs and silver foxes tell us about each other Cold Spring Harbor Monograph Series v 44 p 515 2006 LAKATOS G DOacuteKA A MIKLOacuteSI Aacute The role of visual cues in the comprehension of the human pointing signals in dogs International Journal of Comparative Psychology v 20 n 4 p 341-350 2007 LAKSHMINARAYANAN V SANTOS L R The Evolution of Our Preferences Insights from Non-human Primates In DOLAN R SHAROT T Neuroscience of Preference and Choice [S l] Academic Press 2011 p 75-91 LALANDE A Vocabulaire technique et critique de la philosophie - Vol I A-M 4 ed [S l] Societeacute Franccedilaise de Philosophie 1932 499 (xviii) p LALANDE A Vocabulaire technique et critique de la philosophie - Vol II N-Z 4 ed [S l] QuadrigePUF Societeacute Franccedilaise de Philosophie 1997 665 p LE COADIC Y F A Ciecircncia da Informaccedilatildeo Brasiacutelia Briquet de Lemos 1996

208

LEFEBVRE L READER S M SOL D Brains innovations and evolution in birds and primates Brain Behavior and Evolution v 63 n 4 p 233-246 2004 LEWIS C S Studies in words 2 ed Cambridge Cambridge University Press 1967 343 p LIVINGSTONE M S SRIHASAM K MOROCZ I A The benefit of symbols monkeys show linear human-like accuracy when using symbols to represent scalar value Animal Cognition v 13 n 5 p 711-719 2010 LIT L SCHWEITZER J B OBERBAUER A M Handler beliefs affect scent detection dog outcomes Animal Cognition v 14 n 3 p 387-394 2011 LLOYD C M Animal life and intelligence London Stanford University Library 1891 512 (xvi) p LOCKE J Ensaio sobre o entendimento humano livro II 27 da identidade e da diversidade Skeacutepsis v 8 n 12 p 169-188 2015 LOCKE P Explorations in Ethnoelephantology Social Historical and Ecological Intersections between Asian Elephants and Humans Environment and Society Advances in Research v 4 n 1 p 79-97 2013 LUNCZ L V MUNDRY R BOESCH C Evidence for cultural differences between neighboring chimpanzee communities Current Biology v 22 n 10 p 922-926 2012 LUNCZ L V BOESCH C Tradition over trend Neighboring chimpanzee communities maintain differences in cultural behavior despite frequent immigration of adult females American Journal of Primatology v 76 n 7 p 649-657 2014 LUNCZ L V BOESCH LUNCZ C LYDIA V The extent of cultural variation between adjacent chimpanzee (Pan troglodytes verus) communities A microecological aproach American Journal of Physical Anthropology v 156 n 1 p 67-75 2015 MACINTYRE A Dependent rational animals why human beings need the virtues Chicago Open Court 2002 MACKINTOSH N Inteligecircncia em evoluccedilatildeo In KHALFA J (org) ROUANET L P (trad) A natureza da inteligecircncia uma visatildeo interdisciplinar [Satildeo Paulo] Ed UNESP 1997 p 33-54 MARTIN-ORDAS G CALL J COLMENARES F Tubes tables and traps great apes solve two functionally equivalent trap tasks but show no evidence of transfer across tasks Animal Cognition v 11 n 3 p 423-430 2008 MARKOWITZ H SCHMIDT M NADAL L SQUIER L Do elephants ever forget Journal of Aplied Behavior Analysis v 8 n 3 p 333-335 1975

209

MATHER J A Cephalopod consciousness behavioural evidence Consciousness and Cognition v 17 n 1 p 37-48 2008 MATHER J A DICKEL L Cephalopod complex cognition Current Opinion in Behavioral Sciences v 16 p 131-137 2017 MATURANA H VARELA F A aacutervore do conhecimento As bases bioloacutegicas do entendimento humano Campinas Editorial Psy 1995 281 p MAYR E The growth of biological thought diversity evolution and inheritance 11 ed London The Belknap Press 2000 974 (xvi) p MCCOMB K et al Leadership in elephants the adaptive value of age Proceedings of the Royal Society of London B Biological Sciences p rspb20110168 2011 MCCOMB K et al Long-distance communication of acoustic cues to social identity in African elephants Animal Behaviour v 65 n 2 p 317-329 2003 MCCOMB K BAKER L MOSS C African elephants show high levels of interest in the skulls and ivory of their own species Biology Letters v 2 n 1 p 26-28 2006 MENZEL R et al Honey bees navigate according to a map-like spatial memory Proceedings of the National Academy of Sciences v 102 n 8 p 3040-3045 2005 MERCADO III E et al Memory for recent actions in the bottlenosed dolphin (Tursiops truncatus) Repetition of arbitrary behaviors using an abstract rule Animal Learning amp Behavior v 26 n 2 p 210-218 1998 MERCADO III E UYEYAMA R K PACK A A HERMAN L M Memory for action events in the bottlenosed dolphin Animal Cognition v 2 n 1 p 17-25 1999 MILES H The cognitive foundations for reference in a signing orangutan In PARKER S T GIBSON K R (ed) ldquoLanguagerdquo and intelligence in monkeys and apes comparative developmental perspectives [Cambridge] Cambridge University Press 1990 p 511-539 MIRBAZEL S K ARJMANDI M Dogsrsquo Nature for Learning Human Languages Journal of Aplied Linguistics and Language Research v 5 n 3 p 247-255 2018 MORGANE P J JACOBS M S MCFARLAND W L The anatomy of the brain of the bottlenose dolphin (Tursiops truncatus) Surface configurations of the telencephalon of the bottlenose dolphin with comparative anatomical observations in four other cetacean species Brain Research Bulletin v 5 n 3 p 1-107 1980 MORRIS D Can jumbo elephants really paint Intrigued by stories naturalist Desmond Morris set out to find the truth Daily Mail Science amp Tech Kensington 22 feb 2009 Disponiacutevel em httpswwwdailymailcouksciencetecharticle-1151283Can-jumbo-elephants-really-paint--Intrigued-stories-naturalist-Desmond-Morris-set-truthhtmlixzz4uUGLEQ2X Acesso em 15 jul 2018

210

MUumlLLER C A et al Dogs learn to solve the suport problem based on perceptual cues Animal Cognition v 17 n 5 p 1071-1080 2014 MUSZALSKI H El objeto formal de la vis cogitativa en Santo Tomaacutes de Aquino Sapientia v 70 fasc 235 2014 NAKAGAKI T KOBAYASHI R NISHIURA Y UEDA T Obtaining multiple separate food sources behavioural intelligence in the Physarum plasmodium Proceedings of the Royal Society of London B Biological Sciences v 271 n 1554 p 2305-2310 2004 NEIL D T Cooperative fishing interactions between Aboriginal Australians and dolphins in eastern Australia Anthrozooumls v 15 n 1 p 3-18 2002 NEISSER U et al Intelligence Knows and Unknows American Psychologist v 51 n 2 p 77-101 1996 NISSANI M Do asian elephants (Elephas maximus) aply causal reasoning to tool-use tasks Journal of Experimental Psychology Animal Behavior Processes v 32 n 1 p 91-96 2006 OSTOJIĆ L CLAYTON N S Behavioural coordination of dogs in a cooperative problem-solving task with a conspecific and a human partner Animal Cognition v 17 n 2 p 445-459 2014 PAL H R PAL A TOURANI P Theories of intelligence Everymanrsquos Science v 39 n 3 p 181-192 2004 PATTERSON F LINDEN E The education of Koko New York The Gorilla Foundation 1981 162 p Disponiacutevel em httpwwwkokoorgsitesdefaultfiles rootpdfsteok_bookpdf Acesso em 20 mar 2017 PAVLOV I P Conditioned reflexes an investigation of physiological activity of the cerebral cortex [S l] Oxford University Press 1927 430 (xv) p PAVLOV I P Textos Escolhidos In MORENO R UFLAKER H A ANDREOLI E O M (trad) Pavlov ndash Skinner 2 ed Satildeo Paulo Abril Cultural 1984 402 (x) p (Coleccedilatildeo Os Pensadores) PENSAMENTO In Dicionaacuterio Online Caldas Aulete Rio de Janeiro Lexikon Editora Digital 2008 Disponiacutevel em wwwauletecombr Acesso em 10 ago 2017 PENSAMENTO In Dicionaacuterio Priberam da Liacutengua Portuguesa Lisboa Priberam Informaacutetica 1998 Disponiacutevel em httpswwwpriberamptdlpo Acesso em 10 ago 2017 PENSAR In Dicionaacuterio Online Caldas Aulete Rio de Janeiro Lexikon Editora Digital 2008 Disponiacutevel em wwwauletecombr Acesso em 10 ago 2017

211

PENSAR In Dicionaacuterio Priberam da Liacutengua Portuguesa Lisboa Priberam Informaacutetica 1998 Disponiacutevel em httpswwwpriberamptdlpo Acesso em 10 ago 2017 PEPERBERG I M Further evidence for addition and numerical competence by a Grey parrot (Psittacus erithacus) Animal Cognition v 15 n 4 p 711-717 2012 PEPERBERG I M Grey parrot numerical competence a review Animal Cognition v 9 n 4 p 377-391 2006 PEPERBERG I M Grey parrots do not always ldquoparrotrdquo the roles of imitation and phonological awareness in the creation of new labels from existing vocalizations Language Sciences v 29 n 1 p 1-13 2007 PERDUE B M TALBOT C F STONE A M BERAN M J Putting the elephant back in the herd elephant relative quantity judgments match those of other species Animal Cognition v 15 n 5 p 955-961 2012 PEREIRA JUacuteNIOR G O ocmentaacuterio de Tomaacutes de Aquino ao livro I do De Anima de Aristoacuteteles ndash Capiacutetulos 1-4 Dissertaccedilatildeo (Mestrado) ndash Instituto de Filosofia e Ciecircncias Humanas Universidade Estadual de Campinas Campinas 2006 PETRAZZINI M E M WYNNE C D What counts for dogs (Canis lupus familiaris) in a quantity discrimination task Behavioural processes v 122 p 90-97 2016 PFUNGST O Clever Hans (The Hors of Mr Von Osten) A contribution to experimental animal and human psychology New York Henry Holt and Company 1911 279 (viii) p PHILLIPS W SANTOS L R Evidence for kind representations in the absence of language Experiments with rhesus monkeys (Macaca mulatta) Cognition v 102 n 3 p 455-463 2007 PIAGET J Psicologia de la Inteligencia Buenos Aires Editorial Psique 1972 231 p PIANIGIANI O Vocabolario etimologico dela lingua italiana ndash vol I A-L Roma Societagrave Editrice Dante Alighieri 1907 789 p PIKA S LIEBAL K CALL J TOMASELLO M Gestural communication of apes Gesture v 5 n 1 p 41-56 2005 PILLEY J W REID A K Border collie comprehends object names as verbal referents Behavioural Processes v 86 n 2 p 184-195 2011 PILLEY J W Border collie comprehends sentences containing a prepositional object verb and direct object Learning and Motivation v 44 n 4 p 229-240 2013 PLOTNIK J M LAIR R SUPHACHOKSAHAKUN W DE WAAL F B Elephants know when they need a helping trunk in a cooperative task Proceedings of the National Academy of Sciences v 108 n 12 p 5116-5121 2011

212

PLOTNIK J M DE WAAL F B Asian elephants (Elephas maximus) reassure others in distress PeerJ v 2 p e278 2014 PLOTNIK J M DE WAAL F B M REISS D Self-recognition in a Asian elephant Proceedings of the National Academy of Sciences v 103 n 45 p 17053-17057 2006 POPER K R A loacutegica da pesquisa cientiacutefica 9 ed [S l] Ed Cultrix 2001 567 p PREMACK D WOODRUFF G Does the chimpanzee have a theory of mind Behavioral and Brain Sciences v 1 n 4 p 515-526 1978 PRIOR H SCHWARZ A GUumlNTUumlRKUumlN O Mirror-induced behavior in the magpie (Pica pica) evidence of self-recognition PLoS Biology v 6 n 8 p e202 2008 PROOPS L GROUNDS K SMITH A V MCCOMB K Current biology v 28 n 9 p 1428-1432 e4 2018 QUINE W V O Word and object [Massachusetts] The Massachusetts Institute of Technology 1960 296 (xvi) p RAFFAELE P Speaking bonobo Smithsonian Magazine v 37 p 74 2006 REALE G Metafiacutesica (Aristoacuteteles) sumaacuterio e comentaacuterios 2 ed Satildeo Paulo Ed Loyola 2005 v 3 754 (xiv) p REALE G ANTISERI D Histoacuteria da filosofia ndash Vol 1 Filosofia antiga e pagatilde 3 ed Satildeo Paulo Ed Paulus 2003 385 (xix) p REALE G ANTISERI D Histoacuteria da filosofia ndash Vol 2 Patriacutestica e escolaacutestica 2 ed Satildeo Paulo Ed Paulus 2005 335 (xvi) p REISS D MARINO L Mirror self-recognition in the bottlenose dolphIn A case of cognitive convergence Proceedings of the National Academy of Sciences v 98 n 10 p 5937-5942 2001 RENSCH B Increase of learning capability with increase of brain-size The American Naturalist v 90 n 851 p 81-95 1956 RENSCH B The intelligence of elephants Scientific American v 196 n 2 p 44-49 1957 ROELOFS Y C Tool use in birds an overview of reported cases ontogeny and underlying cognitive abilities 2010 Tese (Doutorado em Biologia Comportamental) ndash Biological Centre da University of Groningen Groningen 2010 ROMANES G Animal intelligence London Kegan Paul Tranch 1882 520 (xiv) p ROSATI A G SANTOS L R Spontaneous metacognition in rhesus monkeys Psychological Science v 27 n 9 p 1181-1191 2016

213

ROTH G DICKE U Evolution of the brain and intelligence Trends in Cognitive Sciences v 9 n 5 p 250-257 2005 SALOVEY P MAYER J D Emotional intelligence Imagination Cognition and Personality v 9 n 3 p 185-211 1990 SANTOS L R et al Means-means-end tool choice in cotton-top tamarins (Saguinus oedipus) finding the limits on primatesrsquo knowledge of tools Animal Cognition v 8 n 4 p 236-246 2005 SAVAGE-RUMBAUGH S et al Spontaneous symbol acquisition and communicative use by pygmy chimpanzees (Pan paniscus) Journal of Experimental Psychology General v 115 n 3 p 211 1986 SAVAGE-RUMBAUGH E S RUMBAUGH D M BOYSEN S Symbolic communication between two chimpanzees (Pan troglodytes) Science v 201 n 4356 p 641-644 1978 SAVAGE-RUMBAUGH E S et al Language comprehension in ape and child Monographs of the Society for Research in Child Development p i-252 1993 SAVOLAINEN P et al Genetic evidence for an East Asian origin of domestic dogs Science v 298 n 5598 p 1610-1613 2002 SCARF D HAYNE H COLOMBO M Pigeons on par with primates in numerical competence Science v 334 n 6063 p 1664-1664 2011 SCHAIE K W Primary mental abilities In CRAIGHEAD W E NEMEROFF C B (eds) The concise corsini encyclopedia of psychology and behavioral science 3 ed Hoboken NJ Wiley 2004 1112 (viii) p SEARLE J El Redescubrimiento de la Mente Barcelona Ed Criacutetica 1996 269 p SHETTLEWORTH J S Cognition evolution and behavior 2 ed New York Oxford University Press 2010 700 (XIII) p SHOSHANI J KUPSKY W J MARCHANT G H Elephant brain part i gross morphology functions comparative anatomy and evolution Brain Research Bulletin v 70 n 2 p 124-157 2006 SILVA J A Inteligecircncia humana abordagens bioloacutegicas e cognitivas Satildeo Paulo Lovise 2003 247 (xvi) p SIMOtildeES-LOPES P C Interaction of coastal populations of Tursiops truncatus (Cetacea Delphinidae) with the mullet artisanal fisheries in Southern Brazil Biotemas v 4 n 2 p 83-94 1991

214

SKINNER B F Two types of conditioned reflex a reply to Konorski and Miller Journal of General Psychology v 16 p 272-279 1937 Disponiacutevel em httpwwwdominiopublicogovbrdownloadtextops000164pdf Acesso em 20 ago 2018 SKINNER B F The behavior of organisms an experimental analysis New York The Century Psychology Series Apleton-Century Crofts Inc 1938 457 (ix) p SKINNER B F Contingences of reinforcement a theoretical analysis New York The Century Psychology Series Apleton-Century-Crofts Inc 1969 311 p Disponiacutevel em wwwbfskinnerorgwp-contentuploads201407CoRpdf Acesso em 11 ago 2018 SMIRNOVA A ZORINA Z OBOZOVA T WASSERMAN E Crows spontaneously exhibit analogical reasoning Current Biology v 25 n 2 p 256-260 2015 SOLTIS J et al A African elephant alarm calls distinguish between threats from humans and bees PLoS One v 9 n 2 p e89403 2014 STERN W The psychological methods of testing intelligence Baltimore Educational Psychology Monographs Warwick amp York 1914 n 13 160 (x) p STERNBERG R Intelligence in Humans In Encyclopedia Of Aplied Psychology USA p 321-328 2004 743 (xii) p STREET S E NAVARRETE A F READER S M LALAND K N Coevolution of cultural intelligence extended life history sociality and brain size in primates Proceedings of the National Academy of Sciences v 114 n 30 p 7908-7914 2017 SWIFT K N Wild American crows use funerals to learn about danger Tese (Doutorado) ndash The School of Environmental and Forest Sciences Washington University 2015 Disponiacutevel em httpsdigitallibwashingtoneduresearchworks handle177333178 Acesso em 13 set 2018 SZETEI V MIKLOacuteSI Aacute TOPAacuteL J CSAacuteNYI V When dogs seem to lose their nose an investigation on the use of visual and olfactory cues in communicative context between dog and owner Aplied Animal Behaviour Science v 83 n 2 p 141-152 2003 TALLIS R On the Edge of Certainty - Philosophical explorations 10 reimp New York St Martins Press 2010 236 (xvii) p TEBBICH S BSHARY R Cognitive abilities related to tool use in the woodpecker finch Cactospiza pallida Animal Behaviour v 67 n 4 p 689-697 2004 TELES M Mente Humana e Animal as perspectivas de Susanne Langer e Antoacutenio Damaacutesio Philosophica Lisboa v 25 p 147-168 2005

215

TERRACE H S CHEN S NEWMAN A B Serial learning with a wild card by pigeons (Columba livia) Effect of list length Journal of Comparative Psychology v 109 n 2 p 162 1995 THALMANN O et al Complete mitochondrial genomes of ancient canids suggest a European origin of domestic dogs Science v 342 n 6160 p 871-874 2013 THE GORILLA FOUNDATION Disponiacutevel em httpswwwkokoorgkoko-0 Acesso em 10 out 2018 THORNDIKE E L Animal intelligence An experimental study of the associative processes in animals The Psychological Review Monograph Suplements v 2 n 4 p i 1898 THORNDIKE E L Animal intelligence Toronto York University 2007 139 p (Classics in the History of Psychology) Disponiacutevel em httpwwwdominio publicogovbrdownloadtextops000178pdf Acesso em 10 ago 2018 THORNDIKE E L Intelligence and its uses Harpers Magazine 140 p 227-235 1920 TOMAacuteS DE AQUINO Disputed questions on spiritual creatures ndash de spiritualibus creaturis Milwaukee Marquette University Press 1949 187 p TOMAacuteS DE AQUINO Commentary on the Nicomachean ethics Chicago Regnery 1964a 2 v (Library of Living Catholic Thought) Disponiacutevel em httpdhsprioryorg thomasEthicshtm Acesso em 10 mar 2018 TOMAacuteS DE AQUINO Commentary on the metaphysics Chicago Regnery 1964b 2 v (Library of Living Catholic Thought) Disponiacutevel em httpdhsprioryorgthomas Metaphysicshtm Acesso em 25 abr 2017 TOMAacuteS DE AQUINO Questotildees discutidas sobre a verdade In BARAUacuteNA J et al (trad) Santo Tomaacutes de Aquino ndash Dante Satildeo Paulo Nova Cultural 1988 306 p (Coleccedilatildeo Os Pensadores) TOMAacuteS DE AQUINO Suma de Teologia ndash I ndash Introduccioacuten general y parte I 4 ed Madri [s n] 2001 993 (xxxviii) p (Biblioteca de Autores Cristianos) TOMAacuteS DE AQUINO Suma de Teologia ndash III ndash Parte II-II Madri [s n] 1990a 613 (xxvi) p (Biblioteca de Autores Cristianos) TOMAacuteS DE AQUINO Suma de Teologia ndash II ndash Parte I-II 2 ed Madri [s n] 1993 975 (xxxii) p (Biblioteca de Autores Cristianos) TOMAacuteS DE AQUINO Suma Contra os Gentios ndash Volume I Porto Alegre Livraria Sulina 1990b 376 (ix) p

216

TOMAacuteS DE AQUINO Sobre el Principio de Individuacioacuten Cuadernos de Anuario Filosofico Serie Universitaacuteria Universidade de Navarra Pamplona Espanha 1999 105 p TOMAacuteS DE AQUINO Commentaire au traiteacute de lrsquoacircme In THOMAS DrsquoAQUIN Commentaire au traiteacute de lrsquoacircme ndash Aristote Traiteacute de lrsquoacircme Les œuvres complegravetes de saint Thomas dAquin Projet Docteur Angeacutelique Institut Docteur Angeacutelique Eacutedition numeacuterique 2000 Disponiacutevel em httpdocteurangeliquefreefr Acesso em 18 maio 2017 TOMAacuteS DE AQUINO De Principiis Naturae In OS PRINCIacutePIOS da Realidade Natural Porto PT Elementos Sudoeste 2003a TOMAacuteS DE AQUINO De Ente et Essentia In OS PRINCIacutePIOS da Realidade Natural Porto PT Elementos Sudoeste 2003b TOMAacuteS DE AQUINO Sobre os Anjos (De Substantiis Separatis) Rio de Janeiro Ed Seacutetimo Selo 2006 229 (xxiv) p TOMAacuteS DE AQUINO A Unidade do Intelecto contra os averroiacutestas Lisboa Ediccedilotildees 70 2009 205 p TOMAacuteS DE AQUINO Questotildees Disputadas sobre a Alma Satildeo Paulo Eacute Realizaccedilotildees 2012 464 p TOMASELLO M Can an ape understand a sentence A review of language comprehension in ape and child by ES Savage-Rumbaugh et al Language amp Communication v 14 n 4 p 377-390 1994 TOMASELLO M Do young children have adult syntactic competence Cognition v 74 n 3 p 209-253 2000 TOMASELLO M What did we learn from the ape language studies In HARE B YAMAMOTO S Bonobos unique in mind brain and behavior [s n] Oxford University Press 2017 p 95-104 384 p TOMONAGA M MATSUZAWA T ITAKURA S Teaching ordinals to a cardinal-trained chimpanzee Primate Research v 9 n 2 p 67-77 1993 TOMONAGA M MATSUZAWA T Sequential responding to Arabic numerals with wild cards by the chimpanzee (Pan troglodytes) Animal Cognition v 3 n 1 p 1-11 2000 TOURINHO E Z Notas sobre o Behaviorismo de ontem e de hoje Psicologia Reflexatildeo e Criacutetica v 24 n 1 p 186-194 2011 TRUT L N Early canid domestication the farm-fox experiment foxes bred for tamability in a 40-year experiment exhibit remarkable transformations that suggest an interplay between behavioral genetics and development American Scientist v 87 n 2 p 160-169 1999

217

UDELL M A LORD K FEUERBACHER E N WYNNE C D A dogrsquos-eye view of canine cognition In HOROWITZ A Domestic dog cognition and behavior Berlin Springer Science amp Business Media 2014 p 221-240 VAN LOON L C The intelligent behavior of plants Trends in Plant Science v 21 n 4 p 286-294 2016 VAN SCHAIK C Why are some animals so smart Scientific American v 294 n 4 p 64-71 2006 VAN SCHAIK C P PRADHAN G R A model for tool-use traditions in primates implications for the coevolution of culture and cognition Journal of Human Evolution v 44 n 6 p 645-664 2003 VONK J Gorilla (Gorilla gorilla gorilla) and orangutan (Pongo abelii) understanding of first-and second-order relations Animal Cognition v 6 n 2 p 77-86 2003 WANG G-D et al Out of southern East Asia the natural history of domestic dogs across the world Cell Research v 26 n 1 p 21 2016 WECHSLER D Measurement of Adult Intelligence 3 ed Baltimore The Williams amp Wilkins Company 1944 258 (viii) p WEST R E YOUNG R J Do domestic dogs show any evidence of being able to count Animal Cognition v 5 n 3 p 183-186 2002 WHITEHEAD H Sperm whale Physeter macrocephalus In PERRIN W F WUumlRSIG B THEWISSEN J G M (ed) Encyclopedia of Marine Mammals 2 ed [S l] Academic Press 2009 p 1091-1097 WIMPENNY J H et al Cognitive processes associated with sequential tool use in New Caledonian crows PLoS One v 4 n 8 p e6471 2009 WITHEN A et al Cultures in chimpanzees Nature v 399 n 6737 p 682 1999 WITTEMYER G DOUGLAS-HAMILTON I GETZ W M The socioecology of elephants analysis of the processes creating multitiered social structures Animal Behaviour v 69 n 6 p 1357-1371 2005 WITTIG R M BOESCH C ldquoDecision-makingrdquo in conflicts of wild chimpanzees (Pan troglodytes) an extension of the Relational Model Behavioral Ecology and Sociobiology v 54 n 5 p 491-504 2003 WYNN K Addition and subtraction by human infants Nature v 358 n 6389 p 749 1992 XIA L SIEMANN M DELIUS J D Matching of numerical symbols with number of responses by pigeons Animal Cognition v 3 n 1 p 35-43 2000

218

YERKES R M YERKES A W The great apes a study of anthropoid life New Haven Yale University Press 1929 652 (xx) p ZAPPES C A ANDRIOLO A SIMOtildeES-LOPES P C DI BENEDITTO A P M Human-dolphin (Tursiops truncatus Montagu 1821) cooperative fishery and itrsquos influence on cast net fishing activities in Barra de ImbeacuteTramandaiacute Southern Brazil Ocean amp Coastal Management v 54 n 5 p 427-432 2011 ZAPPES C A O golfinho nariz-de-garrafa Tursiops truncatus (Montagu 1821) e a pesca artesanal no Atlacircntico Sul comparaccedilatildeo do conhecimento de pescadores tradicionais 2011 Tese (Doutorado) ndash Universidade Estadual do Norte Fluminense ndash UENF Campos dos Goytacazes 2011 ZIMMERMANN F ZEMKE F CALL J GOacuteMEZ J C Orangutans (Pongo pygmaeus) and bonobos (Pan paniscus) point to inform a human about the location of a tool Animal Cognition v 12 n 2 p 347-358 2009

219

TABELAS

Tabela 1 - Caracteriacutesticas das potecircncias da alma que compotildeem o aparato cognitivo

Potecircncias Animais natildeo humanos Ente humano

Sentidos Externos Sentido Comum Imaginaccedilatildeo Memoacuteria Estimativa Intelecto

Sentem percebem e discriminam seus sensiacuteveis proacuteprios e os comuns que lhes competem Une e julga todos os sensiacuteveis e intenccedilotildees dos sentidos externos Reteacutem e conserva formas sensiacuteveis Conserva e compara as imagens e as espeacutecies intencionais Apreende compotildee e divide e compara imagens e espeacutecies intencionais particulares tem como objeto proacuteprio as quididades particulares Percebe as intenccedilotildees por um instinto natural

Sentem percebem e discriminam seus sensiacuteveis proacuteprios e os comuns que lhes competem Une e julga todos os sensiacuteveis e intenccedilotildees dos sentidos externos Reteacutem e conserva formas sensiacuteveis e compotildee e divide imagens sob refluxo do intelecto Conserva e compara as imagens e as espeacutecies intencionais Reminiscecircncia acessa de modo voluntaacuterio sob refluxo do intelecto as imagens e as espeacutecies conservadas Cogitativa Apreende compotildee e divide e compara imagens e espeacutecies intencionais particulares tem como objeto proacuteprio as quididades particulares Reuacutene as intenccedilotildees particulares percebe as intenccedilotildees por uma comparaccedilatildeo sob refluxo do intelecto Apreende espeacutecies intencionais universais define conhece o verdadeiro e o falso discrimina sabe (discerne e concebe) entende discorre e faz suposiccedilotildees ou seja forma conceituaccedilotildees concepccedilotildees e juiacutezos compondo e dividindo conceitos para formar outros conceitos enuncia silogiza discursa

220

Tabela 2 - Testes e observaccedilotildees relacionados a invertebrados peixes e aves

Habilidades Testes Comportamentos espontacircneos

- Interaccedilotildees comportamentais Interaccedilotildees em geral - Noccedilatildeo de meio e fim e uso de instrumentos - Competecircncia para apreensatildeo de quantidades - Aptidotildees relacionadas agrave comunicaccedilatildeo - Autorreconhecimento

- Polvo teste de associar balatildeo de determinada cor agrave recompensa e outro de outra cor agrave puniccedilatildeo (aprendendo por observaccedilatildeo) - Polvo teste para abrir tampa de frasco para obter recompensa - Tentilhatildeo pica-pau teste de retirada de recompensa de tubos com gravetos inclusive com obstaacuteculo em forma de ldquoHrdquo - Papagaios-da-nova-zelacircndia teste de cooperaccedilatildeo em que dois espeacutecimes precisam puxar cada um uma corda ao mesmo tempo para obterem a recompensa - Papagaio-cinzento teste de contagem e de realizaccedilatildeo de pequenas somas com quantidades especiacuteficas de alimento ou com algarismos exibidos em bandejas -Pombos testes de associaccedilatildeo de siacutembolos com numerosidade contando ateacute nove - Papagaio-cinzento testes em que se verifica vocabulaacuterio pode conhecer com treinamento mais de cem palavras - Formigas teste de reconhecimento diante do espelho

- Peixes fazem vigilacircncia contra predadores pelo bando - Aves algumas ajudam um coespeciacutefico que esteja com deficiecircncia visual - Peixes usam pedras para quebrar conchas - Aves algumas usam pedras para quebrar ovos - lanccedilam alimentos para atrairem peixes e pescarem - usam presas e musgos como esponjas para levar aacutegua para a prole - usam gravetos ou espinhos de cacto para retirar larvas de pequenos orifiacutecios - Abelhas seguem coespeciacuteficos e aprendem rotas - Aves aprendem canto com os pais

221

Tabela 3 - Testes e observaccedilotildees relacionados a Corvidae

Habilidades Testes Comportamentos espontacircneos

- Interaccedilotildees comportamentais Comportamento diante da morte de coespeciacutefico - Teoria da mente e comportamento diante de telas de viacutedeo - Noccedilatildeo de meio e fim e uso de instrumentos - Correlaccedilatildeo de figuras ou sons - Autorreconhecimento

- Teste com recintos interligados por pequeno buraco em que animal em um acelerava estocagem de alimento quando o buraco estava aberto ou quando ouvia gravaccedilatildeo de som de coespeciacutefico com o buraco fechado - Teste com pedras e tubos com aacutegua e recompensa flutuando - Teste com varetas para alcanccedilar a recompensa ou outras varetas para alcanccedilar recompensa - Teste de oito passos com varetas e pedras - Teste de recorte de cartatildeo para inserir em maacutequina - Teste de raciociacutenio analoacutegico com placas e figuras geomeacutetricas - Teste de reconhecimento diante do espelho

- Aproximam-se de mortos para investigar causa da morte de coespeciacutefico - Lanccedilam objetos contra inimigos - Lanccedilam iscas para pesca - Por natildeo ter ecircxito em teste com o objeto alongado para alcanccedilar recompensa animal retornou ao aviaacuterio para pegar graveto e concluir tarefa - Produzem a partir de pequenos ramos instrumentos

222

Tabela 4 - Testes e observaccedilotildees relacionados a Elephantidae

Habilidades Testes Comportamentos espontacircneos

- Interaccedilotildees comportamentais Interaccedilotildees em geral Comportamento diante da morte de coespeciacutefico Respostas a sinais humanos - Teoria da mente e comportamento diante de telas de viacutedeo - Noccedilatildeo de meio e fim e uso de instrumentos - Correlaccedilatildeo de figuras ou sons

- Testes de reconhecimento de gestos humanos e da postura corporal humana que apontam para localizaccedilatildeo de alimento - Teste de acionar interruptor para ganhar recompensa - Teste da escolha de suportes um com alimento e outro sem com variaccedilotildees -Teste de cooperaccedilatildeo em que dois espeacutecimes tecircm de puxar cada um uma corda ao mesmo tempo para obterem a recompensa - Teste em que se utiliza objetos como apoio para alcanccedilar recompensa suspensa -Teste com cartas com padrotildees de imagens e com muacutesica com padrotildees de melodias

- Coalisatildeo proteccedilatildeo dos mais jovens conforto cuidado de filhotes na ausecircncia da matildee resgate auxiacutelio em caso de atolamento remoccedilatildeo de objetos estranhos - Distinccedilatildeo de tipos e niacuteveis de ameaccedila com comportamentos especiacuteficos para cada um - Distinguem e investigam restos mortais de coespeciacuteficos - Visitam por sucessivas vezes um cadaacutever de membro do grupo - Percepccedilatildeo de que o outro se comporta espontaneamente tecircm emoccedilotildees percepccedilotildees crenccedilas e entendimentos que podem ser diferentes - Animal trocou de objeto para tentar alcanccedilar alimento suspenso - Uso de conjuntos de ramos para espantar insetos

223

- Competecircncia para apreensatildeo de quantidades - Aptidotildees relacionadas agrave comunicaccedilatildeo - Autorreconhecimento

- Teste de comparaccedilatildeo de quantidades de alimento em cestas apresentadas simultaneamente e sucessivamente - Comparaccedilatildeo de cartas com quantidades de pontos - Com treinamento podem reconhecer pelo menos cerca de cem comandos verbais - Teste de reconhecimento diante do espelho - Teste com tapete para perceber que peso do proacuteprio corpo impede a realizaccedilatildeo de tarefa

224

Tabela 5 - Testes e observaccedilotildees relacionados a Carnivora ndash Canis lupus familiaris

Habilidades Testes Comportamento espontacircneo

Interaccedilotildees comportamentais - Respostas a sinais humanos - Noccedilatildeo de meio e fim e uso de instrumentos Planejamento - Imitaccedilatildeo e sincronia - Competecircncia para apreensatildeo de quantidades - Aptidotildees relacionadas agrave comunicaccedilatildeo

- Testes em geral para encontrar alimentos pelos quais respondem ao gesto de apontar agrave expressatildeo corporal a expressotildees faciais e ao estado de atenccedilatildeo a estados emocionais ao tom de voz humanos aleacutem de objetos utilizados para marcaccedilatildeo - Teste da escolha de suportes um com alimento e outro sem com variaccedilotildees - Teste para detectar padratildeo de sobreimitaccedilatildeo com caixa com tampa que pode ser aberta diretamente e alavanca desnecessaacuteria - Teste para verificar se distinguem pratos com maiores quantidades de alimento - Teste para verificar se sabem contar - Testes para pegar objetos apoacutes comando mostra que integram a memoacuteria relacionada agrave identidade com a relacionada agrave localizaccedilatildeo e assumem a correferecircncia do comando de voz com o gesto de apontar dos humanos - Mediante treinamento podem reconhecer mais de mil objetos pelo nome - Reconhecem categorias de objetos

Planejam como tratam presas ou objetos para transportaacute-los

225

Tabela 6 - Testes e observaccedilotildees relacionados a Cetaceae - Delphinidae

Habilidades Testes Comportamentos espontacircneos

- Interaccedilotildees comportamentais Interaccedilotildees gerais Comportamento diante da morte de coespeciacutefico Respostas a sinais humanos - Teoria da mente e comportamento diante de telas de viacutedeo - Noccedilatildeo de meio e fim e uso de instrumentos Planejamento - Imitaccedilatildeo e sincronia

- Testes para verificar se seguem o apontar de dedo a extensatildeo do braccedilo e o olhar humanos - Testes para respostas a sinais humanos por tela de viacutedeo - Testes para respostas a sinais humanos por tela de viacutedeo - Testes com comando ldquotendemrdquo para realizarem movimentos em sincronia - Testes de imitaccedilatildeo de sons emitidos por computador de coespeciacuteficos e de humanos

- Pesca colaborativa - Transmissatildeo cultural - Realizaccedilatildeo espontacircnea de novas combinaccedilotildees de accedilotildees associadas a sinais dos treinadores - possiacutevel demora relacionada ao reconhecimento do estado de morte manifestaccedilatildeo de estresse demora relacionada ao desapego do cadaacutever - Uso de poriacuteferas no focinho para proteccedilatildeo contra corais em forrageamento - Em obediecircncia a comando espeacutecime recolheu objetos na piscina mas de modo espontacircneo os dispocircs pelo corpo desde o que se encontrava mais distante - transporte espontacircneo de objeto para centro da piscina para executar com este comando

226

- Aptidotildees relacionadas agrave comunicaccedilatildeo - Autorreconhecimento

- Testes com comandos verbais para realizar tarefas com objetos em locais especiacuteficos incluindo combinaccedilotildees natildeo previamente treinadas e comando de repeticcedilatildeo aleacutem de uso de generalizaccedilotildees e de sequecircncias semacircntica ou sintaticamente anocircmalas - Teste com dois remos um significando ldquosimrdquo e outro significando ldquonatildeordquo - Teste com comando para criaccedilatildeo de novo movimento - Teste com comandos para lidar com objetos seguidos do comando ateacute entatildeo desconhecido para escolher a proacutexima accedilatildeo - Teste com associaccedilatildeo de siacutembolos (gestos) com partes do corpo mais realizaccedilatildeo de accedilotildees e uso de objetos - Teste de reconhecimento diante do espelho - Teste de reconhecimento de partes corporais com comandos para tocaacute-las em objetos ou realizar outras accedilotildees com este - Teste de imitaccedilatildeo de humanos - Teste com comando para criaccedilatildeo de novo movimento para senso de agecircncia e propriedade - Teste com associaccedilatildeo de siacutembolos (gestos) com partes do corpo mais realizaccedilatildeo de accedilotildees e uso de objetos

Aplicam-se a mais de um propoacutesito

227

Tabela 7 - Testes e observaccedilotildees relacionados a Primates

Habilidades Testes Observaccedilotildees de campo e comportamentos espontacircneos

- Interaccedilotildees comportamentais Interaccedilotildees gerais Comportamento diante da morte de coespeciacutefico

- Teoria da mente e comportamento diante de telas de viacutedeo - Metacogniccedilatildeo - Noccedilatildeo de meio e fim e uso de instrumentos

- Teste para verificar como animais lidam com desigualdade dando melhor recompensa a um que a outro por mesma tarefa - Teste com pessoas (em uma etapa uma por quem o animal tem apreccedilo e outra por quem natildeo tem) em viacutedeos e fotografias simulando depararem com problemas para resoluccedilatildeo destes pelo animal por fotografias - Teste de memoacuteria para metamemoacuteria em que macacos decidem se querem participar de teste para tentar recompensa de que gostam mais ou natildeo participar e ganhar recompensa de que gostam menos - Teste com tubos em ldquoVrdquo em que o experimentador insere alimento em um dos dois tubos sem o animal ver na abertura oposta ao acircngulo formado - Teste para obter alimento puxando-o ou empurrando-o com vareta ou ancinho em uma de duas vias de um aparato com bandeja ou em tubo com armadilha para

- Avaliam se determinado conflito eacute proveitoso e tomam decisatildeo - Transmissatildeo cultural comportamental como no uso de instrumentos - Chamam atenccedilatildeo de outro ente para comunicar-se - Macacos treinados podem enganar os pesquisadores - Possiacuteveis demora relacionada ao reconhecimento do estado de morte manifestaccedilatildeo de estresse demora relacionada ao desapego do cadaacutever - Uso de pedras tacos folhas gravetos etc como instrumentos para coleta de alimentos assepsia defesa etc

228

Planejamento - Correlaccedilatildeo de figuras ou sons - Competecircncia para apreensatildeo de quantidades

perda do alimento - Teste com peccedila plaacutestica associada a pedaccedilo de maccedilatilde ou de coco escondidos a fim de observar se animais individuam objetos - Teste com varas para alcanccedilar alimento diretamente ou encaixando uma vara em outra com ou sem obstaacuteculos - Teste com caixotes para os animais empilharem e alcanccedilarem alimento suspenso - Teste com trecircs nuacutemeros em tela em que apoacutes o toque no primeiro os outros dois mudam de posiccedilatildeo - Teste de sequecircncia loacutegica com imagens - Teste de raciociacutenio analoacutegico com figuras em cartotildees com objetos ou com imagens em telas de viacutedeo - Teste com sequecircncia numeacuterica em viacutedeo e contagem ateacute nove incluindo teste de memoacuteria com substituiccedilatildeo dos nuacutemeros por quadrados - Teste com quantidades especiacuteficas de alimento ou com algarismos exibidos em bandejas ou dispostos no recinto para verificar capacidade de realizar somas mais simples - Teste para associaccedilatildeo de algarismos ou figuras com pontos em tela de viacutedeo a quantidades respectivas de recompensa - Teste em que os animais trocam fichas por alimentos sendo que um experimentador lhes entrega mais e o outro menos podendo um acrescentar e outro retirar parte do alimento ou ambos acrescentarem alimento um mais e outro menos

229

- Aptidotildees relacionadas agrave comunicaccedilatildeo - Autorreconhecimento

- Testes em que se verifica vocabulaacuterio com treinamento podem reconhecer mais de trecircs mil palavras que podem expressar com sentenccedilas por lexigramas ou linguagem de sinais - Teste em que primatas apontam para indicar a humano onde estaacute alimento ou objeto para pegar alimento - Teste de reconhecimento diante do espelho

- Comunicaccedilatildeo por vocalizaccedilotildees ou por golpes em troncos - Animais treinados podem combinar e inventar sinais manuais para comunicaccedilatildeo dar nomes xingar - Indicaccedilatildeo de partes da face no espelho

Page 4: RAFAEL SAMPAIO OCTAVIANO DE SOUZA - HCTE/UFRJ · a todos os que já intercederam perante o Criador por esta pobre alma. AGRADECIMENTOS Ao Criador, por tudo, e a todos aqueles que

Dedico este trabalho

aos meus amados filhos e esposa

aos meus amados pais e irmatildeos

aos meus demais parentes e amigos queridos

aos mestres que me orientaram e ensinaram

a todos os que jaacute intercederam perante o

Criador por esta pobre alma

AGRADECIMENTOS

Ao Criador por tudo e a todos aqueles que intercederam e haveratildeo de

interceder de algum modo diante dlsquoEle por esta pobre alma

agrave minha esposa por seu amor por nossos filhos ndash e a eles ndash por tudo mais

aos meus pais por seu amor pela educaccedilatildeo pela vida e por esta tambeacutem

aos meus demais antepassados

agrave minha tatildeo querida orientadora fundamental neste percurso por tanta

confianccedila pelas orientaccedilotildees imprescindiacuteveis e luminosas

e por essas tambeacutem aos meus tatildeo queridos orientadores das etapas

anteriores

ao meu querido compadre e mestre tomista por tantas luzes

agrave minha tatildeo querida cunhada comadre que tatildeo carinhosamente se ocupou dos

ajustes finais

aos professores formais ou informais mestres e mestras que tive e tenho e

de quem palavras ou accedilotildees satildeo tijolos que estaratildeo cimentados neste ente

pela eternidade

ao HCTE pela oportunidade pelo enriquecimento e porque sem ele este

trabalho muito provavelmente natildeo existiria

aos professores das Bancas pelas dicas valiosas pela experiecircncia e agrave

CAPES pelos recursos

a todos os demais que de algum modo contribuiacuteram para a consumaccedilatildeo

desta jornada

ldquo eacute mau aquele amante popular que ama o corpo mais que a alma pois natildeo eacute ele constante por amar um objeto que tambeacutem natildeo eacute constante Com efeito ao mesmo tempo que cessa o viccedilo do corpo que era o que ele amava bdquoalccedila ele o seu vocirco‟ sem respeito a muitas palavras e promessas feitas Ao contraacuterio o amante do caraacuteter que eacute bom eacute constante por toda a vida porque se fundiu com o que eacute constanterdquo

Soacutecrates ndash O Banquete

RESUMO

SOUZA Rafael Sampaio Octaviano de Apontamentos sobre a inteligecircncia animal agrave luz da psicologia aristoteacutelico-tomista 2018 Tese (Doutorado em Histoacuteria das Ciecircncias e das Teacutecnicas e Epistemologia) ndash Programa de Poacutes-Graduaccedilatildeo Histoacuteria das Ciecircncias e das Teacutecnicas e Epistemologia Universidade Federal do Rio de Janeiro 2018

Para a psicologia aristoteacutelico-tomista apenas o ser humano eacute dotado de intelecto enquanto os outros animais estatildeo restritos agrave potecircncia estimativa e aos demais sentidos internos e externos No entanto muitas pesquisas comparativas sobre processos neurais e comportamentais apresentaram resultados que retratam a ampla gama de definiccedilotildees atualmente propostas para o termo rdquointeligecircnciardquo levando pesquisadores a sugerirem que muitos desses animais natildeo humanos seriam capazes de realizar inferecircncias raciociacutenios e ateacute abstraccedilotildees Algumas de suas contribuiccedilotildees mais representativas foram aqui revisadas e avaliadas de acordo com sua coerecircncia em relaccedilatildeo ao aristotelismo-tomismo Natildeo se verificou nenhuma incompatibilidade significativa na presente anaacutelise Sugerimos que consideraccedilotildees sobre os princiacutepios aristoteacutelicos-tomistas em pesquisas sobre inteligecircncia animal e outros campos afins podem contribuir para os debates sob a perspectiva interdisciplinar que vatildeo desde o acircmbito epistemoloacutegico ao desenvolvimento de vaacuterias disciplinas que envolvem o sujeito humano e outros entes que se propotildee que sejam inteligentes

Palavras-chave Aristotelismo-tomismo Inteligecircncia Animais natildeo humanos Potecircncia estimativa Testes de inteligecircncia

ABSTRACT

SOUZA Rafael Sampaio Octaviano de Apontamentos sobre a inteligecircncia animal agrave luz da psicologia aristoteacutelico-tomista 2018 Tese (Doutorado em Histoacuteria das Ciecircncias e das Teacutecnicas e Epistemologia) ndash Programa de Poacutes-Graduaccedilatildeo Histoacuteria das Ciecircncias e das Teacutecnicas e Epistemologia Universidade Federal do Rio de Janeiro 2018

For the Aristotelian-Thomist psychology only the human being is endowed with intellect while the other animals are restricted to an estimative power and the other internal and external senses However many comparative researches on neural and behavioral processes has presented results portraying the wide range of definitions currently proposed for the term intelligence leading researchers to suggest that many of these nonhuman animals would be able to make inferences reasoning and even abstractions Some of their most representative contributions have been here in reviewed and evaluated according to their coherence with regard to aristotelianism-thomism No significant incompatibility was verified in the present analysis We suggest that considerations of the aristotelian-thomism principles in research on animal intelligence and other related fields can contribute to the debates pertaining interdisciplinary perspective ranging from the epistemological scope to the development of various disciplines involving the human subject and other beings that are proposed be intelligent

Keywords Aristotelianism-Thomism Intelligence Non-human animals Estimative power Intelligence tests

LISTA DE TABELAS Tabela 1 - Caracteriacutesticas das potecircncias da alma que compotildeem o aparato

cognitivo

219

Tabela 2 - Testes e observaccedilotildees relacionados a invertebrados peixes e

aves

220

Tabela 3 - Testes e observaccedilotildees relacionados a Corvidae 221

Tabela 4 - Testes e observaccedilotildees relacionados a Elephantidae 222

Tabela 5 - Testes e observaccedilotildees relacionados a Carnivora ndash Canis lupus

familiaris

224

Tabela 6 - Testes e observaccedilotildees relacionados a Cetaceae ndash Delphinidae 225

Tabela 7 - Testes e observaccedilotildees relacionados a Primates 227

LISTA DE FIGURAS

Figura 1 - Esquema de sugestotildees para pesquisas futuras 195

SUMAacuteRIO

1 INTRODUCcedilAtildeO 12

2 JUSTIFICATIVA 53

3 MEacuteTODOS E OBJETIVOS 57

4 RESULTADOS E DISCUSSAtildeO 60

41 UMA CONSTRUCcedilAtildeO PARA A PSICOLOGIA ARISTOTEacuteLICO-TOMISTA 60

411 A subalternaccedilatildeo das ciecircncias 60

5 CONCEITOS FUNDAMENTAIS DO ARISTOTELISMO-TOMISMO 62

51 ATO E POTEcircNCIA 62

52 ESSEcircNCIA E ACIDENTE 63

53 AS QUATRO CAUSAS E AS CATEGORIAS 70

54 A ALMA SUAS POTEcircNCIAS E A GRADACcedilAtildeO ENTITATIVA 74

55 OS SENTIDOS 81

551 Sentidos externos 83

552 Sentidos internos 87

56 INTELECTO 92

6 INVESTIGACcedilAtildeO SOBRE A ATRIBUICcedilAtildeO DE INTELIGEcircNCIA AOS ANIMAIS 107

61 ELEPHANTIDAE 114

611 Observaccedilotildees de Campo 116

612 Estudos experimentais 119

62 CARNIVORA ndash CANIS LUPUS FAMILIARIS 123

63 CETACEAE ndash DELPHINIDAE 129

631 Observaccedilotildees de campo 130

632 Estudos experimentais 131

64 PRIMATES 135

641 Observaccedilotildees de campo 137

642 Estudos experimentais 139

7 A INTELIGEcircNCIA NOS ANIMAIS SEGUNDO O ARISTOTELISMO-TOMISMO 153

8 ANAacuteLISE DAS HABILIDADES COGNITIVAS SEGUNDO O MODELO

ARISTOTEacuteLICO-TOMISTA 160

81 INTERACcedilOtildeES COMPORTAMENTAIS 160

811 Interaccedilotildees em geral 160

812 Comportamento diante da morte de coespeciacutefico 161

813 Respostas a sinais humanos 162

82 TEORIA DA MENTE E COMPORTAMENTO DIANTE DE TELAS DE VIacuteDEO 163

83 METACOGNICcedilAtildeO 165

84 NOCcedilAtildeO DE MEIO E FIM E USO DE INSTRUMENTOS 166

841 Planejamento 168

85 IMITACcedilAtildeO E SINCRONIA 168

86 CORRELACcedilAtildeO DE FIGURAS OU SONS 169

87 COMPETEcircNCIA PARA APREENSAtildeO DE QUANTIDADES 171

88 APTIDOtildeES RELACIONADAS Agrave COMUNICACcedilAtildeO 172

89 AUTORRECONHECIMENTO 176

9 CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS E CONCLUSAtildeO 178

REFEREcircNCIAS 197

TABELAS 219

12

1 INTRODUCcedilAtildeO

Como definir a inteligecircncia Seria possiacutevel delimitaacute-la conceitualmente (e

neste caso atribuir-lhe eficazmente mais de um conceito) Poderia ela ser atribuiacuteda

a algum outro ente aleacutem do homem Muitos pensadores buscaram responder a

questotildees como estas desde pelo menos o advento da filosofia Por muito tempo se

propocircs predominantemente que o exerciacutecio do intelecto seria no que toca aos entes

sensiacuteveis um atributo exclusivo da alma humana apta agrave aquisiccedilatildeo de conhecimento

teoacuterico agrave apreensatildeo da realidade agrave da verdade Isto se deu pelo menos ateacute o final

do periacuteodo escolaacutestico em que vigorava um realismo moderado quando entatildeo os

alicerces dessa ideia passaram a ser gradualmente abandonados em razatildeo da

forccedila que ganhava o nominalismo e substituiacutedos por diversificadas correntes que se

desenvolveram e se puseram a reestruturaacute-la objetando inclusive contra a proacutepria

existecircncia do que se entendia por alma

Dentre as que se destacam estatildeo as idealistas que levantam duacutevidas sobre o

acesso mesmo do homem agrave realidade a verdades e as naturalistas estas realistas

ou mesmo de fundo idealista que restringem as explicaccedilotildees sobre a intelecccedilatildeo

exclusivamente a processos orgacircnicos Mas todos os principais filoacutesofos e cientistas

que representam tais visotildees alguns dos quais seratildeo citados no decorrer deste

trabalho natildeo discrepam de seus predecessores em relaccedilatildeo ao fato de que natildeo haacute

como especular satisfatoriamente sobre a inteligecircncia sem levar em conta a anaacutelise

da natureza da consciecircncia e a presenccedila de elementos como o pensamento e a

informaccedilatildeo esta uacuteltima incluindo sua transmissatildeo por parte do objeto e sua

captaccedilatildeo e processamento pelo sujeito que intelige E haacute igualmente consenso em

relaccedilatildeo ao fato de que o pensamento e a informaccedilatildeo bem como a consciecircncia e a

inteligecircncia mesma possuem objetos ou seja aquilo que eacute pensado aquilo a que se

refere a informaccedilatildeo aquilo de que se estaacute consciente e aquilo que eacute inteligido e

possuem sujeitos ou seja aquele que pensa aquele que deteacutem a informaccedilatildeo

aquele que estaacute consciente aquele que intelige

As divergecircncias entre as escolas supracitadas comeccedilam na interpretaccedilatildeo

sobre o que haacute de mais elementar na natureza desses sujeitos e objetos isto eacute

como jaacute apontado se satildeo ou natildeo reais ou se um o eacute e o outro natildeo o que pode

remeter imediatamente a questotildees sobre a natureza da informaccedilatildeo Em seguida

considerando a realidade do sujeito este recebe informaccedilotildees verdadeiras do mundo

13

agrave sua volta ou recebe informaccedilotildees falsas dele ou recebe informaccedilotildees parcialmente

verdadeiras e parcialmente falsas ou recebe informaccedilotildees sobre as quais natildeo tem

condiccedilotildees de emitir juiacutezo em relaccedilatildeo agrave sua veracidade ou falsidade Mesmo diante

das dificuldades que haacute em demonstrar no acircmbito cientiacutefico que os fenocircmenos

mentais envolvidos na cogniccedilatildeo apresentam caracteriacutesticas em comum com o seu

objeto a natureza dessas informaccedilotildees define assim a natureza do que ele pensa

Deste modo pensa em coisas reais e natildeo reais (ou pensa somente em coisas reais

se considera que todas sejam reais como pensamento) ou em coisas somente natildeo

reais ou em coisas que natildeo sabe serem ou natildeo reais E ao pensar potildee-se

consciente do que eacute real integral ou parcialmente ou do que natildeo o eacute

Considerando-se pois a realidade do sujeito e do objeto em um acircmbito

tangiacutevel independentemente das imensas dificuldades que haacute em demonstrar

cientificamente se os fenocircmenos mentais envolvidos na cogniccedilatildeo apresentam

caracteriacutesticas em comum com o objeto externo com o qual se relacionam1 a

informaccedilatildeo tem os sentidos daquele como porta de entrada e de algum modo torna-

se pensamento Como tal certa potecircncia sua eacute ampliada ao infinito como ilustram

bem estas palavras de Hume

Agrave primeira vista nada pode parecer mais ilimitado do que o pensamento humano que natildeo apenas escapa a toda autoridade e a todo poder do homem mas tambeacutem nem sempre eacute reprimido dentro dos limites da natureza e da realidade Formar monstros e juntar formas e aparecircncias incongruentes natildeo causam agrave imaginaccedilatildeo mais embaraccedilo do que conceber os objetos mais naturais e mais familiares Apesar de o corpo confinar-se num soacute planeta sobre o qual se arrasta com sofrimento e dificuldade o pensamento pode transportar-nos num instante agraves regiotildees mais distantes do Universo ou mesmo aleacutem do Universo para o caos indeterminado onde se supotildee que a Natureza se encontra em total confusatildeo Pode-se conceber o que ainda natildeo foi visto ou ouvido porque natildeo haacute nada que esteja fora do poder do pensamento exceto o que implica absoluta contradiccedilatildeo

2

Se a posse da informaccedilatildeo e o pensamento satildeo requisitos para que se esteja

consciente de algo tambeacutem o eacute o ato de conhecer Deve-se conhecer a informaccedilatildeo

para que possa ser pensada e entatildeo dela se esteja consciente E uma vez que algo

foi conhecido pode ter havido intelecccedilatildeo e obteve-se o entendimento

A inteligecircncia pois seraacute fundamental para que o pensamento possa

exercitar-se ilimitadamente e o faraacute em um jogo quase incessante com os sentidos

1 TALLIS 2010 p 118

2 HUME 2001 p 21-22

14

especialmente com a memoacuteria Bachelard conseguiu expressar isto com excelecircncia

em suas elucubraccedilotildees que assumiram como limiar a chama de uma vela

A chama eacute um mundo para o homem soacute []3 A chama ela sozinha pode

concretizar o ser de todas as suas imagens o ser de todos os seus fantasmas []

4 Existe um parentesco entre a lamparina que vela e a alma

que sonha Tanto para uma quanto para a outra o tempo eacute lento Tanto no devaneio quanto na luz fraca encontra-se a mesma paciecircncia Entatildeo o tempo se aprofunda as imagens e as lembranccedilas se reuacutenem O sonhador inflamado une o que vecirc ao que viu conhece a fusatildeo da imaginaccedilatildeo com a memoacuteria Abre-se entatildeo a todas as aventuras da fantasia aceita a ajuda dos grandes sonhadores e entra no mundo dos poetas Por conseguinte a fantasia da chama tatildeo unitaacuteria a princiacutepio torna-se de abundante multiplicidade []

5 Com as imagens literaacuterias da chama o surrealismo tem

alguma garantia de ter uma raiz de realidade As imagens mais fantaacutesticas da chama se convergem Transformam-se por meio de notaacutevel privileacutegio em imagens verdadeiras []

6 A chama nos leva a ver em primeira matildeo

temos mil lembranccedilas sonhamos tudo atraveacutes da personalidade de uma memoacuteria muito antiga e no entanto sonhamos como todo mundo lembramo-nos como todo mundo se lembra ndash entatildeo seguindo uma das leis mais constantes da fantasia diante da chama o sonhador vive em um passado que natildeo eacute mais unicamente seu no passado dos primeiros fogos do mundo

7

Assim o processo de intelecccedilatildeo implicaria a absorccedilatildeo transformaccedilatildeo

combinaccedilatildeo alimentaccedilatildeo e a possibilidade de emissatildeo de informaccedilotildees

Tallis aponta a importacircncia da interpretaccedilatildeo reconhecendo-a como ldquoatividade

fundamental da consciecircncia humanardquo8 e diz que haacute vaacuterios sentidos alguns

demasiado especializados atribuiacutedos ao termo ldquoinformaccedilatildeordquo mas explica que se

ldquoser informado eacute aprender algo que natildeo se conhecia antesrdquo entatildeo a palavra poderia

ser compreendida como ldquoalgo que resolve uma incerteza sobre como as coisas satildeo

ou sobre como seratildeordquo9

Dentre os significados fornecidos pelo Dicionaacuterio Aulete para a palavra

ldquoinformaccedilatildeordquo encontram-se

Accedilatildeo ou resultado de informar(-se) [] Conjunto de dados sobre algo ou algueacutem [] Relato de acontecimentos ou fatos transmitido ou recebido

3 BACHELARD 1989 p 12

4 Ibid p 13

5 Ibid p 19

6 Ibid p 13

7 Ibid p 11

8 ldquofundamental activity of human consciousnessrdquo TALLLIS 2010 p 104

9 ldquo[] to be informed is to learn something one did not know before []rdquo e ldquo[] something that

resolves an uncertainty about how things are or how they are going to berdquo TALLIS 2010 p 90

15

Explicaccedilatildeo dada para uma determinada finalidade [] Fil Na teoria hilemoacuterfica accedilatildeo pela qual a forma daacute ser ou informa a mateacuteria

10

E dentre os significados fornecidos pelo Dicionaacuterio Priberam figuram ldquoAto ou

efeito de informar [] Notiacutecia (dada ou recebida) [] Indagaccedilatildeo [] Esclarecimento

dado sobre os meacuteritos ou estado de outrem (Tambeacutem usado no plural)rdquo11

O Aulete fornece as seguintes definiccedilotildees para ldquoinformarrdquo ldquoDeixar algueacutem

ciente de (fatos notiacutecias acontecimentos) COMUNICAR [] Tomar ciecircncia de

INTEIRAR(-SE) Dar conhecimento de ser instrutivo para [] Levar orientaccedilatildeo a

[] Ministrar ensinamentos a [] Servir de base ou fundamentordquo12

E assim define o termo o Priberam ldquoDar informaccedilotildees a ou a respeito de []

Avisar [] Dar parecer sobre [] Dar forma a [] Tomar corpo engrossar

desenvolver-se [] Tomar informaccedilotildees [] Procurar notiacutecias [] Tomar forma []13

Le Coadic assim define informaccedilatildeo

A informaccedilatildeo eacute um conhecimento inscrito (gravado) sob a forma escrita (impressa ou numeacuterica) oral ou audiovisual A informaccedilatildeo comporta um elemento de sentido Eacute um significado transmitido a um ser consciente por meio de uma mensagem inscrita em um suporte espacial-temporal impresso sinal eleacutetrico onda sonora etc Essa inscriccedilatildeo eacute feita graccedilas a um sistema de signos (a linguagem) signo este que eacute um elemento da linguagem que associa um significante a um significado signo alfabeacutetico palavra sinal de pontuaccedilatildeo

14

A partir da citaccedilatildeo acima Le Coadic define em nota de rodapeacute o termo

ldquoconhecimentordquo

Um conhecimento (um saber) eacute o resultado do ato de conhecer ato pelo qual o espiacuterito apreende um objeto Conhecer eacute ser capaz de formar a ideia de alguma coisa eacute ter presente no espiacuterito Isso pode ir da simples identificaccedilatildeo (conhecimento comum) agrave compreensatildeo exata e completa dos objetos (conhecimento cientiacutefico) O saber designa um conjunto articulado e organizado de conhecimentos a partir do qual uma ciecircncia ndash um sistema de relaccedilotildees formais e experimentais ndash poderaacute originar-se

A palavra ldquopensamentordquo eacute assim definida pelo Aulete

Accedilatildeo ou resultado de pensar [] Capacidade ou atividade de formular eou evocar ideias juiacutezos conceitos etc REFLEXAtildeO [] Cada produto dessa atividade mental IDEIA [] Linha conceitual caracteriacutestica de um intelectual

10

INFORMACcedilAtildeO 2017 11

Ibid 12

Ibid 13

Ibid 14

LE COADIC 1996 p 5

16

de um grupo ou de uma eacutepoca [] Mente cabeccedila maneira de pensar Expressatildeo resumida de uma ideia em forma de frase

15

Estatildeo entre as definiccedilotildees de ldquopensamentordquo no Dicionaacuterio Priberam ldquoAto

faculdade de pensar [] Ideia reflexatildeo consideraccedilatildeo [] Intenccedilatildeo [] Conceito

opiniatildeo [] Esboccedilo da primeira ideia ou invenccedilatildeo de um artista [] A ideia capital de

um escrito e cada uma das mais notaacuteveis nele contidasrdquo16

Lalande comenta que

Essa palavra em cada um de seus sentidos pode-se aplicar seja ao conjunto de fatos considerados (pensamento) seja a cada um destes separadamente (um pensamento) [] Em um sentido mais amplo envolve todos os fenocircmenos do espiacuterito [] Mais ordinariamente se diz de todos os fenocircmenos cognitivos (por oposiccedilatildeo aos sentimentos e agraves vontades) [] Em sentido mais proacuteprio diz-se do entendimento e da razatildeo na medida em que permitem compreender que constitui a mateacuteria do conhecimento na medida em que percebem um grau de siacutentese mais elevado que a percepccedilatildeo a memoacuteria ou a imaginaccedilatildeo

17

Retomando o Aulete dentre as definiccedilotildees apresentadas para o verbo

ldquopensarrdquo constam

Elaborar ideias ou raciociacutenios MEDITAR REFLETIR [] Ter como intenccedilatildeo COGITAR TENCIONAR [] Procurar lembrar-se recordar-se [] Preocupar-se com [] Julgar supor [] Formar imagem mental de IMAGINAR PREVER [] Ter o mesmo ponto de vista opiniatildeo [] Tratar convenientemente ou cuidar Pensamento opiniatildeo juiacutezo

18

E entre as definiccedilotildees de ldquopensarrdquo no Priberam ldquoFormar ideias [] Refletir []

Raciocinar [] Ser de parecer [] Tencionar [] Ter no pensamento Imaginar

julgar [] Planear [] Dar penso alimento a [] Pensamento opiniatildeo juiacutezordquo19

Assim o pensamento pelo menos em acircmbito conceitual ou seja conforme

as definiccedilotildees adotadas e os entes aos quais satildeo aplicados como se veraacute mais

adiante pode estar ou natildeo associado agrave inteligecircncia Para esta o Dicionaacuterio Aulete

Digital fornece dentre os significados possiacuteveis os seguintes

15

PENSAMENTO 2017 16

Ibid 17

ldquoCe mot dans chacun de ses sens peut sapliqueur soit agrave lensemble des faits consideacutereacutes (la penseacutee) soit agrave chacun deux pris agrave part (une penseacutee) [] Au sens le plus large il envelope tous les pheacutenomegravenes de lesprit [] Plus ordinairement se dit de tous les pheacutenomegravenes cognitifs (par oposition aux sentiments et aux volitions) [] Au sens le plus propre se dit de lentendement et de la raison en tant quils permettent de comprendre ce qui constitue la matiegravere de la connaissance en tant quils reacutealisent un degreacute de syntegravese plus eacuteleveacute que la perception la meacutemoire ou limaginationrdquo LALANDE 1997 p 752

18 PENSAR 2017

19 Ibid

17

Faculdade de entender de compreender INTELECTO [] Penetraccedilatildeo de espiacuterito percepccedilatildeo clara e faacutecil DISCERNIMENTO JUIacuteZO [] Interpretaccedilatildeo do sentido de um texto um livro uma frase etc [] Conformidade de sentimentos e de intenccedilotildees [] Destreza habilidade para escolher os meacutetodos e obter um bom resultado [] Psi Capacidade de resolver situaccedilotildees novas e problemaacuteticas em circunstacircncias em que o instinto o conhecimento e o haacutebito natildeo podem ajudar

20

Dentre aqueles fornecidos pelo Dicionaacuterio Priberam da Liacutengua Portuguesa

para a palavra constam ldquoConjunto de todas as faculdades intelectuais (memoacuteria

imaginaccedilatildeo juiacutezo raciociacutenio abstraccedilatildeo e concepccedilatildeo) [] Qualidade de inteligente

[] Compreensatildeo faacutecil [] Habilidaderdquo21

E Lalande fornece dentre outras definiccedilotildees

Conjunto de todas as funccedilotildees que tecircm por objeto o conhecimento no sentido mais amplo da palavra (sensaccedilatildeo associaccedilatildeo memoacuteria imaginaccedilatildeo entendimento razatildeo consciecircncia) [] (Em oposiccedilatildeo agrave intuiccedilatildeo e agrave sensaccedilatildeo) sinocircnimo de compreensatildeo conhecimento conceitual e racional [] (Em oposiccedilatildeo ao instinto) atividade voluntaacuteria adaptaccedilatildeo refletida dos meios aos fins

22

Segundo De Libera a palavra ldquointeligirrdquo proveacutem do latim ldquointelligererdquo que por

sua vez eacute composta por dois eacutetimos um deles eacute ldquolegererdquo que pode significar

ldquoreunirrdquo ldquorecolherrdquo um dos significados da palavra grega ldquolegocircrdquo (λέγω) o outro eacute

ldquointerrdquo que significa ldquoentrerdquo23

De Libera observa tambeacutem que

Significar entender compreender estes significados natildeo representam um problema para o tradutor jaacute que a linguagem vernaacutecula os separou muitas vezes em termos que evoluiacuteram de diferentes maneiras com exclusatildeo de outros usos A palavra intellectus abrange aleacutem das esferas do significado e da compreensatildeo quase todas as noccedilotildees relativas ao pensamento sua atividade e agraves suas condiccedilotildees de possibilidade Eacute aiacute onde estatildeo as dificuldades Como um termo fundamental da psicologia antiga e medieval a palavra intellectus e a seacuterie de termos que derivam dela ou se relacionam com ela (intelligere intellectualis intelligibilis) levantam problemas particulares mas natildeo insoluacuteveis para o tradutor

24

20

INTELIGEcircNCIA 2017 21

Ibid 22

ldquoEnsemble de toutes les fonctions qui ont pour objet la connaissance au sens le plus large du mot (sensation association meacutemoire imagination entendement raison conscience) [] (Oposeacute agrave intuition et agrave sensation) synonyme dentendement connaissance conceptuelle et rationnelle [] (Oposeacute agrave instinct) activiteacute volontaire adaptation reacutefleacutechie de moyens agrave des finsrdquo LALANDE 1932 p 388-389

23 DE LIBERA 2004 p 493

24 ldquoTo mean to understand to comprehend these different meanings do not pose a problem

for the translator since vernacular language has often separated them out into terms that have evolved in different ways to the exclusion of other uses The word intellectus covers in addition to the spheres

18

Apoacutes apontar como problema mais grave o fato de que a palavra

ldquoentendimentordquo (ldquounderstandingrdquo ldquoentendementrdquo e ldquoVerstandrdquo em inglecircs francecircs e

alematildeo respectivamente) passou a ser aceita para traduzir ldquointellectusrdquo mas sem ter

precedente no peripatetismo e no escolasticismo e que assim ldquoA transformaccedilatildeo de

lsquointellectusrsquo em lsquoentendimentorsquo (lsquounderstandingrsquo lsquoentendementrsquo) marca uma ruptura

na histoacuteria das teorias da almardquo25 ele entatildeo assinala que ldquointellectusrdquo tornou-se

sinocircnimo do ldquonousrdquo aristoteacutelico ideia distinta de ldquoratiordquo somente depois das

traduccedilotildees latinas do De Anima De Libera afirma ainda haver pelo menos dez

significados de ldquointellectusrdquo encontrados no vocabulaacuterio escolaacutestico indicando que

haacute entre eles certa interconexatildeo e entatildeo os elenca

[] (1) o nous peripateacutetico entendido no sentido de ldquosubstacircnciardquo (2) o mesmo no sentido de ldquofaculdaderdquo [] ou ldquofaculdade de conhecimentordquo[] (3) a faculdade de conhecimento natildeo sensiacutevel ou suprassensiacutevel mas natildeo distinta de ldquoratiordquo (isto eacute sem levar em conta a distinccedilatildeo entre conhecimento intuitivo e conhecimento discursivo) (4) uma atividade cognitiva um ato de conhecimento intelecccedilatildeo ou inteligecircncia (sinocircnimo intellegentia) (5) a faculdade de conhecimento intuitiva natildeo sensiacutevel que penetra na essecircncia iacutentima das coisas (de acordo com a etimologia medieval que reuacutene intelligere e legere intus []) (6) o ldquohabitus dos princiacutepiosrdquo distinto de prudentia sapientia e scientia mas tambeacutem de ratio e synteresis [] o grego nous tocircn archocircn [νοῦς τῶν ἀρχῶν] e o latino habitus principiorum[] (7) inspeccedilatildeo intelectual [] sinocircnimo de intellegentia e que tem por antocircnimo ratio (8) concepccedilatildeo compreensatildeo interpretaccedilatildeo entendimento ou significado [] (9) uma representaccedilatildeo natildeo sensiacutevel [] ou uma noccedilatildeo sinocircnimo de ratio no sentido de uma foacutermula de definiccedilatildeo [] (10) significaccedilatildeo ou significado [] sinocircnimo de ratio (no sentido da foacutermula de definiccedilatildeo foacutermula-logos sensus significatio virtus vis [ldquoforccedila expressiva ou impactordquo] de uma palavra)

26

of meaning and of understanding almost all of the notions relating to thought its activity and its conditions of possibility This is where the difficulties lie As a fundamental term of ancient and medieval psychology intellectus and the series of terms that are derived from or related to it (intelligere intelectualis intelligibilis) pose particular if not insoluble problems for the translatorrdquo DE LIBERA 2004 p 492

25 ldquoThe transformation of intellectus into lsquounderstandingrsquo (entendement) marks a break in the

history of theories of the soulrdquo DE LIBERA 2004 p 493 26

ldquo(1) the Peripatetic nous understood in the sense of lsquosubstancersquo (2) the same in the sense of lsquofacultyrsquo[] or lsquofaculty of knowledgersquo[] (3) the nonsensible or suprasensible faculty of knowledge but not distinct from ratio (that is without taking into account the distinction between intuitive knowledge and discursive knowledge) (4) a cognitive activity an act of knowledge intellection or intelligence (synonym intellegentia) (5) the nonsensible intuitive faculty of knowledge which penetrates the intimate essence of things (according to the medieval etymology bringing together intelligere and legere intus [] (6) the lsquohabitus of principlesrsquo as distinct from prudentia sapientia and scientia but also from ratio and synteresis [] the Greek nous tocircn archocircn [νοῦς τῶν ἀϱχῶν] and the Latin habitus principiorum [] (7) intellectual inspection [] synonymous with intellegentia and the antonym of which is ratio (8) conception comprehension interpretation understanding or meaning [] (9) a nonsensible representation [] or a notion synonymous with ratio in the sense of a definitional formula [] (10) significance or meaning [] synonymous with ratio (in the sense of the definitional formula logos-formula sensus significatio virtus vis [ldquoexpressive force or impactrdquo] of a word)rdquo DE LIBERA 2004 p 493

19

Observa em seguida que o significado original da tradiccedilatildeo greco-latina uso

este que tambeacutem tem Guilherme de Moerbeke no seacuteculo XIII principal autor das

traduccedilotildees de Aristoacuteteles do grego para o latim naquele periacuteodo largamente

utilizadas por Santo Tomaacutes de Aquino como exemplo de emprego neste periacuteodo da

palavra intellectus eacute epinoia [ἐπίνοια] traduzida entatildeo comumente por opinio e que

eacute entendida pelo sentido geral ou comum de ldquointeligecircnciardquo como tambeacutem por

ldquopensamentordquo ldquoimaginaccedilatildeordquo ldquoreflexatildeordquo ldquoalgo que vem agrave menterdquo As palavras dianoia

[διανοία] que se refere ao pensamento discursivo agrave faculdade discursiva traduzida

entatildeo por rationalitas e ratio e to dianoegravetikon [τὸ διανοητιϰόν] que significa ldquorazatildeo

discursivardquo contrastam com os sentidos de ldquopensamentordquo em geral ou de

pensamento ldquointuitivordquo e de ldquorazatildeo intuitivardquo respectivamente de Intellectus como

noacuteecircsis [νόησις] Tambeacutem a palavra intelligentia era usada como intellegentia no

periacuteodo medieval em que aparece mais a forma legocirc que tem por significado ldquolerrdquo27

Esse significado tambeacutem estaacute na construccedilatildeo etimoloacutegica alternativa que era muitas

vezes empregada no mesmo periacuteodo intra ou intus mais legere28 como menciona

acima De Libera e pela qual Tomaacutes de Aquino demonstrava certo apreccedilo

significando ldquoler dentrordquo para explicar que a inteligecircncia ou intelecto conheceria o

iacutentimo das coisas29

No cenaacuterio cientiacutefico contemporacircneo as teorias sobre a inteligecircncia

foram enquadradas em dois tipos as teorias impliacutecitas e as teorias expliacutecitas

As teorias impliacutecitas30 satildeo definiccedilotildees e explicaccedilotildees para a inteligecircncia que os

pesquisadores colhem de pessoas que natildeo satildeo estudiosas do assunto

especialistas ou seja satildeo extraiacutedas do senso comum que variam conforme a faixa

etaacuteria e a cultura Delas emergem fatores como a capacidade de resolver

problemas aptidatildeo verbal competecircncia social compreensatildeo de si e do proacuteximo

respeito dentre outras habilidades cognitivas

Jaacute as teorias expliacutecitas satildeo as definiccedilotildees e conceitos formulados e publicados

pelos proacuteprios pesquisadores a maioria enquadrada em trecircs grandes abordagens

a) a das teorias psicomeacutetricas com raiacutezes fincadas nos trabalhos de Galton

que se fundamentam em anaacutelises da estrutura da inteligecircncia dos possiacuteveis

27

DE LIBERA 2004 p 494 28

Ibid p 493 29

TOMAacuteS DE AQUINO 1988 p 92 30

DWECK LEGGETT 1988

20

elementos que a compotildeem e que seratildeo objeto dos famosos testes de mediccedilatildeo de

inteligecircncia como os de Binet e Simon Cattel Stern Wechsler etc

b) a das teorias cognitivas que se originaram da proposta de Lee J

Cronbach de 1957 feita agrave American Psychological Association de unir as duas

disciplinas da psicologia cientiacutefica a experimental e a diferencial e sobre a qual se

desenvolvem estudos concernentes agraves diferenccedilas individuais que segundo

Sternberg partem do pressuposto de que ldquoa inteligecircncia eacute composta por um

conjunto de representaccedilotildees mentais (por exemplo proposiccedilotildees e imagens) de

informaccedilatildeo e de um conjunto de processos mentais que podem operar sobre as

representaccedilotildeesrdquo31

c) e a das teorias bioloacutegicas que abordam comportamentos inteligentes

baseados nas funccedilotildees neurofisioloacutegicas que os produzem

Sternberg parece propor ainda uma subdivisatildeo da cognitiva como mais uma

grande abordagem a cognitiva conceitual Tais teorias segundo afirma se

relacionam ldquocom o modo com que os processos cognitivos operam em vaacuterios

contextos ambientaisrdquo32 e tecircm como exemplos a sua proacutepria Teoria Triaacuterquica e a

famosa Teoria das Inteligecircncias Muacuteltiplas de Gardner

Algumas das principais teorias da inteligecircncia na abordagem psicomeacutetrica

estatildeo listadas em Pal e colaboradores33 dentre as quais destacamos

a) a dos dois fatores de Spearman o fator G uma habilidade mais geral inata

e o que mais fornece explicaccedilatildeo para a inteligecircncia ndash que da visatildeo desta de

Spearman Piaget34 cita os trecircs momentos essenciais a saber a apreensatildeo da

experiecircncia a educaccedilatildeo das relaccedilotildees e a educaccedilatildeo dos correlatos para entatildeo

acrescentar que eacute necessaacuterio que haja intermediaccedilatildeo de uma assimilaccedilatildeo

construtiva para a apreensatildeo da experiecircncia ndash e o fator S que representa

aquisiccedilotildees a partir do ambiente variando segundo as atividades de um mesmo

indiviacuteduo

b) a teoria dos multifatores de Thorndike ndash proponente dos trecircs tipos de

inteligecircncia (1) social (2) mecacircnica e (3) abstrata que estatildeo relacionadas agrave

31

ldquo[] intelligence is composed of a set of mental representations (eg propositions images) of information and a set of mental processes that can operate on the representationsrdquo STERNBERG 2004 p 323

32 ldquo[] cognitive processes operate in various environmental contextsrdquo STERNBERG 2004

p 323 33

PAL et al 2004 34

PIAGET 1972 p 127

21

capacidade de aprender a compreender e a administrar respectivamente (1)

homens mulheres crianccedilas as relaccedilotildees em geral (2) objetos e recursos naturais

(3) ideias e siacutembolos ndash35 que lista quatro fatores ou conjuntos de habilidades

requeridas para a atividade mental a saber a aptidatildeo para lidar com o niacutevel de

dificuldade de uma tarefa a capacidade de lidar com determinado nuacutemero de tarefas

em determinado grau de dificuldade o nuacutemero de situaccedilotildees em cada niacutevel agraves quais

o indiviacuteduo eacute capaz de responder e a velocidade com que ele responde

c) a teoria de Thurstone dos grupos independentes entre si ndash constituiacutedo por

sete fatores principais ou ldquohabilidades mentais primaacuteriasrdquo36 a saber compreensatildeo

verbal (W) orientaccedilatildeo espacial (S) raciociacutenio indutivo (R) aptidatildeo numeacuterica (N)

fluecircncia verbal (V) memoacuteria associativa (M) e velocidade perceptiva (P) ndash37 que

possuem como nuacutecleo um fator primaacuterio compartilhado por operaccedilotildees mentais deles

especiacuteficas e que daacute a elas unidade psicoloacutegica e funcional e as diferencia das de

outros grupos

d) o modelo de estrutura tridimensional do intelecto de Guilford no qual ele

classifica o trabalho intelectual de acordo com o conteuacutedo que pode ser visual

auditivo simboacutelico semacircntico ou comportamental com a operaccedilatildeo mental

envolvida que pode ser a cogniccedilatildeo a retenccedilatildeo de memoacuteria o registro de memoacuteria

a produccedilatildeo divergente e a produccedilatildeo e avaliaccedilatildeo convergente e com o produto

resultante da operaccedilatildeo classificado em unidades classes relaccedilotildees sistemas

transformaccedilotildees e implicaccedilotildees

e) a teoria hieraacuterquica de Vernon que estabelece quatro niacuteveis hieraacuterquicos

para os elementos da inteligecircncia numa tentativa de conciliar a teoria de Spearman

cujos fatores G e S encontram-se no primeiro e quarto niacuteveis respectivamente e a

de Thurstone cujos elementos estatildeo no terceiro niacutevel (o segundo refere-se a fatores

como as habilidades verbo-numeacuterico-educacionais e as fiacutesico-praacutetico-mecacircnico-

espaciais)

f) e a teoria fluida e a teoria cristalizada de Cattel que tratam a inteligecircncia

respectivamente como uma capacidadede pensar abstratamente e resolver

problemas adquirida pela potencialidade geneacutetica e como um conhecimento que

resulta de uma aprendizagem anterior inclusive resultante da experiecircncia

35

THORNDIKE 1920 36

ldquoPrimary mental abilitiesrdquo 37

SCHAIE 2004

22

Da abordagem psicomeacutetrica emergem assim duas subdivisotildees a partir de

Spearman a fatorial na qual se destacam o proacuteprio autor e Thurstone cujas

divergecircncias implicam basicamente a posiccedilatildeo e a importacircncia que cada um atribui

aos elementos isolados que compotildeem a inteligecircncia e a multidimensional que

tentaraacute conciliar as duas visotildees Esta tambeacutem apresenta duas subdivisotildees a dos

modelos natildeo hieraacuterquicos que tem como representantes Thorndike e Guilford e a

dos modelos hieraacuterquicos como os de Vernon e Cattel38

Pal e colaboradores39 listam ainda algumas das abordagens cognitivas como

a) a bastante conhecida teoria de Gardner das muacuteltiplas inteligecircncias a

inteligecircncia linguiacutestica a loacutegico-matemaacutetica a espacial a musical a cinesteacutesico-

corporal a interpessoal a intrapessoal a naturalista e a existencialista

b) a teoria triaacuterquica de Sternberg que distingue trecircs habilidades intelectivas

a analiacutetica ou componencial a praacutetica ou contextual e a criativa ou experiencial

c) e a teoria da inteligecircncia emocional popularizada por Daniel Goleman em

sua obra ldquoInteligecircncia Emocionalrdquo lanccedilada em 1995 e que recebeu muitos modelos

como o de Salovey e Mayer40 sendo assim definida por Cherniss41 ldquoInteligecircncia

emocional refere-se a um conjunto de habilidades que envolvem o modo com que

pessoas percebem expressam entendem e controlam suas proacuteprias emoccedilotildees bem

como as emoccedilotildees dos outrosrdquo42

E destoutro modo definem Salovey e Mayer ldquo[] o subconjunto de

inteligecircncia social que envolve a capacidade de monitorar os sentimentos e as

emoccedilotildees proacuteprios e do outro para discriminar entre elas e usar essa informaccedilatildeo

para orientar os pensamentos e as accedilotildees de algueacutemrdquo43

Da psicologia cognitiva destaca-se tambeacutem a teoria dos modelos mentais

(ldquoMental Models Theoryrdquo) Segundo Johnson-Laird seu principal proponente cada

modelo mental seria fruto da resposta a trecircs perguntas pelas quais se busca saber

38

SILVA 2003 39

PAL et al 2004 40

SALOVEY MAYER 1990 41

CHERNISS 2004 42

ldquoEmotional intelligence refers to a set of abilities that involve the way in which people perceive express understand and manage their own emotions as well as the emotions of othersrdquo CHERNISS 2004 p 315

43 ldquo[] the subset of social intelligence that involves the ability to monitor onersquos own and

otherrsquos feelings and emotions to discriminate among them and to use this information to guide onersquos thinking and actionsrdquo SALOVEY MAYER 1990 p 189

23

(1) a forma das representaccedilotildees mentais e as questotildees sobre se as imagens diferem dos conjuntos de proposiccedilatildeo (2) os processos mentais subjacentes ao raciociacutenio comum e a questatildeo de quais regras de inferecircncia eles incorporam e (3) a representaccedilatildeo do significado de palavras e a questatildeo de saber se elas dependem de um dicionaacuterio decomposicional

44 ou de um

conjunto de postulados de significado45

A teoria baseia-se assim em trecircs princiacutepios

Primeiro cada modelo mental representa o que eacute comum a um conjunto distinto de possibilidades [] Segundo os modelos mentais satildeo icocircnicos ou seja sua estrutura na medida do possiacutevel corresponde agrave estrutura do que eles representam [] Terceiro os modelos mentais que se baseiam em descriccedilotildees representam o que eacute verdadeiro agrave custa do que eacute falso

46

Parte entatildeo do pressuposto principal de que o ldquoos indiviacuteduos raciocinam

tentando visualizar as possibilidades compatiacuteveis com o que sabem ou acreditamrdquo47

Essas possibilidades caracterizam os modelos mentais que vatildeo sendo conectados

e reconectados entre si realizando inferecircncias no processo de intelecccedilatildeo

Por fim no tocante agrave abordagem bioloacutegica Silva descreve brevemente as

principais teorias que buscam variaacuteveis bioloacutegicas que subjazem agrave inteligecircncia

a) a de Hebb que distingue trecircs tipos de inteligecircncia o tipo A ou seja um

potencial inato o tipo B que diz respeito ao funcionamento do ceacuterebro e o tipo C

que se refere agravequela que pode ser mensurada pelos testes de inteligecircncia

b) a de Halstead que propocircs quatro fatores ou habilidades determinados

biologicamente o integrativo de campo o de abstraccedilatildeo o de potecircncia e o direcional

todos relacionados ao funcionamento do coacutertex dos lobos frontais

44

Parte de um ldquoprinciacutepio de composicionalidade (principle of compositionality)rdquo de Frege de que ldquoo significado de um constituinte sintaticamente complexo tal como uma sentenccedila eacute uma funccedilatildeo composicional dos significados de suas partesrdquo Assim esse tipo de dicionaacuterio decompotildee as palavras em elementos semacircnticos com o fim de que se caracterize ldquoas relaccedilotildees de significado entre as palavrasrdquo Respectivamente ldquo[] the meaning of a complex constituent such as a sentence is a compositional function of the meanings of its partsrdquo e ldquo[] meaning relations between wordsrdquo ANTHONY 1983 p 26

45 ldquo[] (1) the form of mental representations and the questions of whether images differ from

sets of proposition (2) the mental processes that underlie ordinary reasoning and the question of what rules of inference they embody and (3) the representation of meaning of words and the question of whether they depend on a decompositional dictionary or a set of meaning postulatesrdquo JOHNSON-LAIRD 1980 p 73

46 ldquoFirst each mental model represents what is common to a distinct set of possibilities []

Second mental models are iconic that is their structure as far as possible corresponds to the structure of what they represent [] Third mental models based on descriptions represent what is true at the expense of what is falserdquo Id 2013 p 132

47 ldquoThe principal assumption of the theory is that individuals reason by trying to envisage the

possibilities compatible with what they know or believerdquo Ibid p 131

24

c) e a de Luria que sugeriu haver trecircs grandes unidades no ceacuterebro

relacionadas agrave inteligecircncia uma de ativaccedilatildeo no tronco cerebral e nas estruturas do

ceacuterebro meacutedio uma sensorial de entrada nos lobos temporais e uma de

organizaccedilatildeo e planejamento no coacutertex frontal48

Aleacutem das tentativas supracitadas William Stern autor do famoso teste de

Quociente de Inteligecircncia forneceu uma definiccedilatildeo para o termo ldquointeligecircnciardquo que

segundo sugere ldquodiferencia claramente inteligecircncia de outras capacidades

mentaisrdquo49 ldquoInteligecircncia eacute uma capacidade geral de um indiviacuteduo conscientemente

ajustar seu pensamento a novas exigecircncias eacute adaptabilidade mental geral a novos

problemas e condiccedilotildees de vidardquo50

Wechsler por sua vez na deacutecada de quarenta assim a conceituou

Inteligecircncia eacute a capacidade agregada ou global do indiviacuteduo agir intencionalmente para pensar racionalmente e lidar efetivamente com seu ambiente Ela eacute global porque caracteriza o comportamento individual como um todo e eacute um agregado porque eacute composta de elementos ou habilidades que embora natildeo sejam completamente independentes satildeo qualitativamente diferenciaacuteveis

51

E mais recentemente o Mainstream Science on Intelligence redigido por um

grupo de pesquisadores acadecircmicos e publicado primeiramente no Wall Street

Journal em 13 de dezembro de 1994 definiu-a assim

Inteligecircncia eacute uma capacidade mental bastante geral que entre outras coisas envolve a habilidade de raciocinar planejar resolver problemas pensar abstratamente compreender ideias complexas aprender rapidamente e aprender com a experiecircncia Natildeo eacute meramente a aprendizagem literaacuteria uma habilidade estritamente acadecircmica ou o talento para um bom desempenho em testes Ao contraacuterio o termo reflete uma capacidade mais ampla e mais profunda de compreender o mundo agrave nossa volta ndash ldquocompreenderrdquo ldquocaptar o sentidordquo das coisas ou ldquocalcularrdquo o que fazer Inteligecircncia assim definida pode ser medida e os testes de inteligecircncia medem-na bem Eles natildeo medem criatividade caraacuteter personalidade ou outras diferenccedilas importantes entre indiviacuteduos nem se propotildeem a isto

52

48

SILVA 2003 p 67-68 49

ldquo[] differentiates intelligence clearly from other mental capacitiesrdquo STERN 1914 p 3 50

ldquoIntelligence is a general capacity of an individual consciously to adjust his thinking to new requirements it is general mental adaptability to new problems and conditions of liferdquo STERN 1914 p 3

51 ldquoIntelligence is the aggregate or global capacity of the individual to act purposefully to think

rationally and to deal effectively with his environment It is global because it characterizes the individuals behavior as a whole it is an aggregate because it is composed of elements or abilities which though not entirely independent are qualitatively differentiablerdquo WECHSLER 1944 p 3

52 Intelligence is a very general mental capability that among other things involves the ability

to reason plan solve problems think abstractly comprehend complex ideas learn quickly and learn

25

Silva poreacutem diz ldquonatildeo estaacute totalmente claro o que os testes de inteligecircncia

realmente medem [] eles natildeo produzem uma entidade uacutenicardquo53

Antes de expor o rol de teorias Pal e colaboradores mostram que o problema

eacute ainda mais grave

Haacute diferentes teorias sobre a inteligecircncia e nenhuma delas concorda com as demais Cada abordagem de pensamento vem agrave tona com sua proacutepria perspectiva e seus proacuteprios pressupostos frequentemente contradizendo pelo menos uma teoria anterior

54

E vatildeo aleacutem

Ateacute que uma clara definiccedilatildeo de inteligecircncia possa ser dada as teorias continuaratildeo natildeo sendo capazes de explicaacute-la A probabilidade de tal definiccedilatildeo surgir poreacutem eacute virtualmente zero pois sempre haveraacute alternativas por dar-se e assim as teorias da inteligecircncia estatildeo limitadas a serem contraproducentes

55

A Task Force on Intelligence da American Psychological Association (APA)

em artigo que serviu como reaccedilatildeo a outra polecircmica envolvendo a publicaccedilatildeo de The

Bell Curve ndash Intelligence and Class Structure in American Life em 1994 parece

reforccedilar a afirmaccedilatildeo anterior

Os indiviacuteduos diferem-se uns dos outros na habilidade de compreender ideias complexas de adaptar-se efetivamente ao ambiente aprender a partir da experiecircncia encontrar vaacuterias formas de raciocinar superar obstaacuteculos mediante a reflexatildeo Embora essas diferenccedilas individuais possam ser substanciais elas nunca satildeo completamente consistentes as caracteriacutesticas intelectuais de uma pessoa variaratildeo em diferentes ocasiotildees em diferentes domiacutenios e julgaratildeo com diferentes criteacuterios Os conceitos de lsquointeligecircnciarsquo satildeo tentativas de esclarecer e organizar esse complexo conjunto de fenocircmenos

56

from experience It is not merely book learning a narrow academic skill or test-taking smarts Rather it reflects a broader and deeper capability for comprehending our surroundings - catching on making sense of things or figuring out what to do

Intelligence so defined can be measured and intelligence tests measure it well [] They do not measure creativity character personality or other important differences among individuals nor are they intended to GOTTFRESON 1997 p 13

53 SILVA 2003 p 49

54 ldquoThere are different theories about intelligence none of which agree with each other Every

aproach to thinking comes up with itrsquos own different perspective and assumptions often contradicting at least one earlier theoryrdquo PAL et al 2004 p 181

55 ldquoUntil a clear-cut definition of intelligence can be given theories will continue not to be able

to explain it The likelihood of such a definition occurring is virtually zero as there will always be alternatives given and so theories of intelligence are bound to be self-defeatingrdquo PAL et al 2004 p 185

56 Individuals differ from one another in their ability to understand complex ideas to adapt

effectively to the environment to learn from experience to engage in various forms of reasoning to

26

Piaget tambeacutem aponta para as dificuldades de conceituaccedilatildeo no que chama

linha inferior cuja demarcaccedilatildeo afirma natildeo superar a arbitrariedade e entatildeo

descreve algumas definiccedilotildees de inteligecircncia

Para alguns como Claparegravede e Stern a inteligecircncia eacute uma adaptaccedilatildeo mental agraves circunstacircncias novas Claparegravede opotildee assim a inteligecircncia ao instinto e ao haacutebito que satildeo adaptaccedilotildees hereditaacuterias e adquiridas agraves circunstacircncias que se repetem mas o faz a partir do tateamento empiacuterico mais elementar (fonte dos tateamentos interiorizados que caracterizam ulteriormente a busca da hipoacutetese) Para Buumlhler que divide tambeacutem as estruturas em trecircs tipos (instinto adestramento e inteligecircncia) essa definiccedilatildeo eacute demasiado ampla a inteligecircncia soacute aparece com os atos de compreensatildeo suacutebita (Aha-Erlebnis) enquanto que o tateamento pertence ao adestramento Koumlhler reserva igualmente o termo ldquointeligecircnciardquo para os atos de reestruturaccedilatildeo brusca excluindo o tateamento Eacute inegaacutevel que este aparece desde a formaccedilatildeo dos costumes mais simples os quais satildeo em si mesmos no momento de sua constituiccedilatildeo adaptaccedilotildees agraves circunstacircncias novas Por outro lado a proposiccedilatildeo a hipoacutetese e o controle cuja reuniatildeo caracteriza tambeacutem a inteligecircncia segundo Claparegravede encontram-se jaacute em germe nas necessidades nos ensaios e nos erros e na sanccedilatildeo empiacuterica proacuteprios das adaptaccedilotildees sensoacuterio-motoras menos evoluiacutedas

57

Mas em seguida indica ser possiacutevel fornecer conceituaccedilotildees fundamentando-

se na direccedilatildeo em que estaacute orientado seu desenvolvimento58 e complementa ldquo[]

sem insistir sobre as questotildees de fronteiras que se convertem em questatildeo de

etapas ou de formas sucessivas de equiliacutebriordquo59

Silva fornece uma orientaccedilatildeo que parece reduzir um pouco mais a

inquietaccedilatildeo que pode ser gerada por essa ao menos aparente impossibilidade de

overcome obstacles by taking thought Although these individual differences can be substantial they are never entirely consistent A given persons intellectual performance will vary on different occasions in different domains as judged by different criteria Concepts of intelligence are attempts to clarify and organize this complex set of phenomena NEISSER 1996 p 77

57 ldquoPara algunos como Claparegravede y Stern la inteligecircncia es una adaptacioacuten mental a las

circunstancias nuevas Claparegravede opone asiacute la inteligecircncia al instinto y al haacutebito que son adaptaciones hereditarias o adquiridas a las circunstancias que se repiten pero la hace partir del tanto empiacuterico maacutes elemental (fuente de los tanteos interiorizados que caracterizan ulteriormente la buacutesqueda de la hipoacutetesis)

Para Buumlhler que divide tambieacuten las estructuras en tres tipos (instinto adiestramiento e inteligencia) esa definicioacuten es demasiado amplia la inteligencia soacutelo aparece con los actos de comprensioacuten suacutebita (Aha-Erlebnis) en tanto que el tanteo pertenece al adiestramiento Koehler reserva igualmente el teacutermino de inteligencia a los actos de reestructuracioacuten brusca excluyendo el tanteo Es innegable que eacuteste aparece desde la formacioacuten de las costumbres maacutes simples las cuales son en siacute mismas en el momento de su constitucioacuten adaptaciones a las circunstancias nuevas Por otra parte la proposicioacuten la hipoacutetesis y el control cuya reunioacuten caracteriza tambieacuten la inteligencia seguacuten Claparegravede se encuentran ya en la sancioacuten empiacuterica proacuteprios de las adaptaciones senso-motrices menos evolucionadasrdquo PIAGET 1972 p 21-22

58 Ibid p 21-22

59 ldquo[] sin insistir sobre las cuestiones de fronteras que convierten en cuestioacuten de etapas o

de formas sucesivas de equilibriordquo Ibid p 22

27

buscar-se um conceito satisfatoacuterio para ldquointeligecircnciardquo ao indicar que haacute duas

caracteriacutesticas que estatildeo presentes em praticamente todas as definiccedilotildees da palavra

ldquoa habilidade para aprenderrdquo e ldquoa habilidade para adaptar-se ao ambienterdquo60

E mediante essa habilidade para aprender uma vez que seja detentor de

certo conhecimento sujeito do pensamento o ente animado pode-se tornar

consciente do objeto da informaccedilatildeo Mas eis aqui outro objetivo intimamente

relacionado ao da inteligecircncia que tambeacutem sempre se mostrou aacuterduo para os

pesquisadores no decorrer da histoacuteria o de estabelecer consensos sobre a

conceituaccedilatildeo do que se conhece por ldquoconsciecircnciardquo

Dentre os significados apresentados pelo Dicionaacuterio Aulete Online para a

palavra consciecircncia encontram-se

Atributo que permite a uma pessoa a percepccedilatildeo com certo grau de objetividade do que se passa em torno de si (o mundo exterior) e dentro de si proacuteprio (o mundo interior ou subjetivo) [] Pext O conhecimento a percepccedilatildeo desse atributo [] Capacidade de julgar o que eacute correto e o que natildeo eacute de acordo com valores morais e de conhecimento [] Conhecimento noccedilatildeo percepccedilatildeo (de situaccedilotildees fatos conceitos especiacuteficos) [] Percepccedilatildeo e conhecimento da proacutepria atividade (psiacutequica ou fiacutesica) Sensibilidade ou preacute-disposiccedilatildeo para perceber situaccedilotildees problemas processos etc ligados a temas de interesse social ideoloacutegico poliacutetico etc Sua consciecircncia ecoloacutegica o fazia revoltar-se com o desmatamento criminoso [] Fil Psic Com base em conceito do filoacutesofo alematildeo Nietzsche e adotado na psicanaacutelise a faculdade de autopercepccedilatildeo objetiva limitada pela accedilatildeo das pulsotildees e emoccedilotildees do ser humano [] Med Estado em que o sistema nervoso estaacute capacitado aos processos de percepccedilatildeo reflexatildeo accedilatildeo compatiacutevel comportamento coerente etc Corresponde comumente ao estado de quem domina suas capacidades de perceber (ver ouvir) pensar e agir [] Psi Niacutevel de atividade mental no qual se tem percepccedilatildeo dos processos internos e externos (em oposiccedilatildeo ao niacutevel da inconsciecircncia ou da subconsciecircncia)

61

E dos significados apresentados pelo Dicionaacuterio Priberam encontram-se

ldquoFaculdade da razatildeo de julgar os proacuteprios atos ou o que eacute certo ou errado do ponto

de vista moral [] Cuidado atenccedilatildeo esmero [] [Medicina] Estado do sistema

nervoso central que permite pensar observar e interagir com o mundo exteriorrdquo62

Segundo Pianigiani o termo ldquoconsciecircnciardquo que vem do latim conscientia eacute

composto de cum uma partiacutecula de intensidade mais scire que significa ldquosaberrdquo63

Lewis trata assim a etimologia da palavra

60

SILVA 2003 p 48 61

CONSCIEcircNCIA 2017 62

Ibid 63

PIANIGIANI 1907 p 357

28

A palavra grega oida e a latina cio significam ldquoeu seirdquo O verbo grego pode ser composto com o prefixo sun ou xun (sunoida) o latino com cum que em composiccedilatildeo torna-se con- dando-nos conscio Sun e cum isolados significam a preposiccedilatildeo ldquocomrdquo E agraves vezes eles mantecircm esse significado quando se tornam prefixos de modo que sunoida e conscio podem significar ldquoConheccedilo conjuntamente compartilho (com algueacutem) o conhecimento dissordquo Mas agraves vezes eles teriam uma forccedila vagamente intensa de modo que os verbos compostos significariam simplesmente ldquoeu conheccedilo bemrdquo e talvez finalmente um pouco mais do que ldquoeu seirdquo Cada verbo tem uma sucessatildeo de palavras relacionadas Com sunoida vai o substantivo suneidesis e (o seu sinocircnimo) o particiacutepio neutro para suneidos e o particiacutepio masculino suneidocircs Com conscio o nome conscientia e o adjetivo conscius [] o duplo valor dos prefixos pode afetar todos estes de modo que suneidesis e conscientia possam ser o estado (ou o ato) de compartilhar o conhecimento ou simplesmente o conhecimento consciecircncia

64 apreensatildeo ndash e mesmo algo como mente ou pensamentordquo

65

Balibar observa que o emprego do termo grego suneidecircsis se deu por uma

retroversatildeo a partir dos romanos e no periacuteodo heleniacutestico eacute que se desenvolveu

como ldquoa maneira com que o indiviacuteduo lsquo[sozinho] consigo mesmorsquo avalia a dignidade

de sua conduta e o valor de sua pessoa nesta vida ou em antecipaccedilatildeo agrave morterdquo 66

Jaacute na Europa conscientia desenvolveu-se historicamente em duas direccedilotildees nas

quais se pode interpretar a partiacutecula cum ldquopor um lado a direccedilatildeo que conota

apropriaccedilatildeo e alcance (conhecer bem estar bem informado sobre) por outro lado a

que conota um compartilhamento privado ou secreto67

E prossegue

Daiacute em diante houve a ideia de um conhecimento reservado a poucas pessoas que cada uma confiava a si mesma Esse significado levou agrave representaccedilatildeo fundamental de um testemunho interno dado a si mesmo e finalmente agrave ideia de um julgamento que eacute feito dentro de noacutes no que diz respeito aos nossos atos e pensamentos Esta eacute a fonte de uma autoridade que se pode opor agrave de qualquer instituiccedilatildeo de imediato o mestre interior e uma garantia de autonomia Esta uniatildeo de contraacuterios a

64

ldquoAwarenessrdquo 65

ldquoGreek oida and Latins cio mean lsquoI knowrsquo The Greek verb can be compounded with the prefix sun or xun (sunoida) the Latin with cum which in composition becomes con- giving us conscio Sun and cum in isolation mean lsquowithrsquo And sometimes they retain this meaning when they become prefixes so that sunoida and cocircnscio can mean lsquoI know together with I share (with someone) the knowledge thatrsquo But sometimes they had a vaguely intensive force so that the compound verbs would mean merely lsquoI know wellrsquo and perhaps finally little more that lsquoI knowrsquo Each verb has a train of related words With sunoida goes the noun suneidesis and (its synonym) the neuter participle to suneidos and the masculine participle suneidocircs with cocircnscio the noun conscientia and the adjective conscious [] the double value of the prefixes may affect all these so that suneidesis and conscientia could be either the state (or act) of sharing knowledge or else simply knowledge awareness aprehension ndash even something like mind or thoughtrdquo LEWIS 1967 p 181

66 ldquo[] the way in which the individual lsquo[alone] with himselfrsquo evaluates the worthiness of his

conduct and the value of his person in this life or in anticipation of deathrdquo BALIBAR 2004 p 175 67

ldquo[] on the one hand the direction that connotes apropriation and achievement (know well be well informed about) on the other hand the one that connotes a private or secret lsquosharingrsquordquo Ibid

29

que a tradiccedilatildeo agostiniana iria dar um peso ontoloacutegico persistiu ateacute o nosso tempo

68

Balibar aponta a identificaccedilatildeo por parte dos Padres da Igreja do termo

ldquoconscientiardquo na alma que confronta seu Criador sendo entatildeo juiacuteza e julgada e seu

desenvolvimento no periacuteodo escolaacutestico com o surgimento do termo synderesis

originado de uma construccedilatildeo sobre anaacutelises equivocadas da palavra suntecircrecircsis

[συντήρησις] encontrada em Satildeo Jerocircnimo que teria dado agrave conscientia um uso

duplo como faculdade tanto ativa como passiva respectivamente como ldquoum traccedilo

da criaccedilatildeo divinardquo e como algo ldquoque opera sob condiccedilotildees de pecado depois da

Quedardquo69 E este mesmo termo syntheresis mais conscientia e conclusio teriam

formado um esquema que influenciaria importantes filoacutesofos posteriores mesmo

apoacutes o primeiro ter caiacutedo em desuso a partir do periacuteodo da Reforma prevalecendo

os sentidos de testemunho interior da moralidade e de sinal da graccedila divina Balibar

indica isto como o iniacutecio da formaccedilatildeo em trecircs episoacutedios da expressatildeo

ldquoautoconsciecircnciardquo70 que afirma ser a ldquoexpressatildeo privilegiada da ideia filosoacutefica da

lsquosubjetividadersquo no Ocidenterdquo71 na qual testemunha-se o que chama ldquoinvenccedilatildeo

europeia da consciecircnciardquo Atribui o primeiro episoacutedio aos debates em torno do termo

ldquoliberdade de consciecircnciardquo no periacuteodo da Reforma o segundo ldquoa uma identificaccedilatildeo

do lsquoeursquo com a atividade da mente reflexiva agrave qual Locke deu o nome de

lsquoconsciousnessrsquordquo72 e o terceiro ao seacuteculo XVIII em que teria havido reinterpretaccedilatildeo

dos princiacutepios do conhecimento e da moralidade73

Nesse segundo episoacutedio o termo ldquoconsciousnessrdquo cristaliza o sentido de

percepccedilatildeo de si da proacutepria mente e do que se passa nela74 Balibar ressalta que no

capiacutetulo 27 do livro II de ldquoEnsaio Sobre o Entendimento Humanordquo de Locke estaacute o

68

ldquoFrom that point on there was the idea of a knowledge reserved for a few people each of whom lsquoconfided in himselfrsquo This meaning led to the fundamental representation of an internal testimony given to oneself [] and finally to the idea of a judgment that is made within us with regard to our acts and thoughts This is the source of an authority that can be oposed to that of any institution at once the interior master and a guarantee of autonomy This union of contraries to which the Augustinian tradition was to give an ontological weight has persisted down to our own timerdquo BALIBAR 2004 p 175

69 Respectivamente ldquo[] a trace of divine creationrdquo e ldquo[] operating under conditions of sin

after the Fallrdquo Ibid p 175 70

ldquoSelf-consciousnessrdquo 71

Respectivamente ldquo[] the privileged expression of the philosophical idea of subjectivity in the Westrdquo e ldquoEuropean invention of consciousnessrdquo Ibid p 175

72 ldquo[] an identification of the lsquoselfrsquo with the mindrsquos reflective activity to which Locke gave the

name lsquoconsciousnessrsquordquo Ibid p 175 73

Ibid p 175 74

Ibid p 180

30

uacutenico emprego do termo ldquoself-consciousnessrdquo pelo filoacutesofo75 realizado no seguinte

contexto

[] sou o mesmo eu mesmo [same my self] agora enquanto escrevo (consista eu [I] completamente na mesma substacircncia material ou imaterial ou natildeo) que eu [I] fui ontem Com efeito quanto a esse ponto de ser o mesmo eu [self] natildeo importa se esse eu presente [present self] eacute constituiacutedo pela mesma ou por diferentes substacircncias desde que eu esteja tatildeo preocupado e seja tatildeo justamente responsaacutevel por qualquer accedilatildeo feita haacute mil anos associada a mim agora por essa autoconsciecircncia [self-consciousness] quanto eu sou pelo que fiz no uacuteltimo momento O eu [self] depende da consciecircncia Eu [self] eacute a coisa consciente pensante (seja ela feita de qualquer substacircncia se espiritual ou material simples ou composta isso natildeo importa) que eacute sensciente ou consciente de prazer e dor capaz de ser feliz ou miseraacutevel e assim que estaacute preocupada com si mesma [it self] tanto quanto sua consciecircncia se estende

76

Esse pensamento indica Balibar77 que relaciona intimamente a consciecircncia e

a autoconsciecircncia agrave memoacuteria e agrave responsabilidade que daacute azo a problematizaccedilotildees

envolvendo o eu (self) e a consciecircncia (consciousness) demarca o ponto de partida

dos conflitos que seratildeo gerados na filosofia moderna e que culminam na distinccedilatildeo

na liacutengua inglesa entre os termos ldquoawarenessrdquo e ldquoconsciousnessrdquo que grosso modo

implicam respectivamente o ter consciecircncia de algo e o ter consciecircncia de que se

tem consciecircncia de algo (que eacute inerente ao ente humano)

Lalande78 opotildee-se agrave ideia de certeza e realidade no acircmbito da definiccedilatildeo de

consciecircncia e sugere que seja abusivo o entendimento desta encontrado por

exemplo em Kant e em Schopenhauer como todo conhecimento imediato da

realidade Ele fornece a seguinte definiccedilatildeo que diz ser somente aproximada

ldquoIntuiccedilatildeo (mais ou menos completa mais ou menos clara) que tem o espiacuterito de seus

estados e de seus atosrdquo79 bem como uma das classificaccedilotildees possiacuteveis do termo

que compreende a consciecircncia espontacircnea que se refere agrave consciecircncia como

pensamento que antecede a distinccedilatildeo entre o saber e o conhecer e na qual natildeo se

diferencia o ato consciente do ato de que se eacute consciente e consciecircncia reflexiva

que ldquosupotildee uma oposiccedilatildeo entre aquele que conhece e aquilo que eacute conhecido e

uma anaacutelise do objeto desse conhecimentordquo80

75

BALIBAR 2004 p 181 76

LOCKE 2015 p 181 77

BALIBAR 2004 p 181 78

LALANDE 1932 79

ldquoIntuition (plus ou moins complegravete plus ou moins claire) qursquoa lrsquoesprit de ses eacutetats et de ses actesrdquo Ibid p 127

80 Ibid p 127-128

31

Como resultado do desenvolvimento das anaacutelises envolvendo o termo alguns

autores reduziram a consciecircncia a simples processos orgacircnicos outros defenderam

que ela seja de algum modo independente do ceacuterebro outros afirmaram que ela tem

base orgacircnica mas se desenvolve para algo mais

Eis as palavras de Chalmers defensor desta uacuteltima hipoacutetese

A experiecircncia consciente eacute ao mesmo tempo a mais familiar do mundo e a mais misteriosa De nenhuma outra coisa temos um conhecimento mais direto que da consciecircncia mas natildeo eacute claro absolutamente como reconciliaacute-la com todo o resto do que sabemos [] Conhecemos a consciecircncia de uma forma muito mais iacutentima do que o resto do mundo mas compreendemos a este uacuteltimo muito melhor do que compreendemos a consciecircncia

81

Ainda assim haacute um bom nuacutemero de tentativas de conceituaccedilotildees e definiccedilotildees

como esta de Damaacutesio

A consciecircncia como usualmente a concebemos de seus niacuteveis elementares aos mais complexos eacute o padratildeo mental unificado que reuacutene o objeto e o self [] A consciecircncia eacute um fenocircmeno inteiramente privado de primeira pessoa que ocorre como parte do processo privado de primeira pessoa que denominamos mente

82

O pesquisador baseia-se em quatro fatos por ele constatados para estruturar

sua teoria

a) o de que ldquoalguns aspectos dos processos da consciecircncia podem ser

relacionados agrave operaccedilatildeo de regiotildees e sistemas cerebrais especiacuteficos abrindo

caminho para a descoberta da arquitetura neural que sustenta a consciecircnciardquo

b) o de que ldquoa consciecircncia e o estado de vigiacutelia assim como a consciecircncia e a

atenccedilatildeo baacutesica podem ser distinguidosrdquo

c) o de que ldquoa consciecircncia e a emoccedilatildeo natildeo satildeo separaacuteveisrdquo

d) o de que ldquoa consciecircncia natildeo eacute um monoacutelito pelo menos natildeo nos seres

humanos ela pode ser separada em tipos complexo e simples e os dados

neuroloacutegicos deixam clara a separaccedilatildeordquo83

81

ldquoLa experiencia consciente es al mismo tiempo lo maacutes familiar del mundo y lo maacutes misterioso De ninguna otra cosa tenemos un conocimiento maacutes directo que de la conciencia pero al mismo tiempo es un tema que para la ciencia ha sido muy difiacutecil para estudiar y conceptualizar varias disciplinas han intentando estudiar este fenoacutemeno una de ella es la filosofiacutea la cual se ha propuesto encontrar una teoriacutea y una explicacioacuten satisfactoria de la conciencia CHALMERS 1999 p 25

82 DAMAacuteSIO 1999 p 30 e 33

83 Ibid p 39-40

32

Ao tipo simples ele denomina ldquoconsciecircncia centralrdquo e ao tipo complexo ele

denomina ldquoconsciecircncia ampliadardquo O primeiro tipo confere ao organismo apenas o

senso de localizaccedilatildeo imediata no tempo e no espaccedilo ou seja no aqui e no agora o

segundo daacute ao organismo uma identidade e uma pessoa dando-lhe a ciecircncia do

passado e do futuro e depende da memoacuteria funcional e da operacional do

raciociacutenio e da linguagem

No acircmbito da etologia cognitiva84 e a fim de verificar o alcance da

consciecircncia e inclusive da inteligecircncia em animais natildeo humanos Herman85

considerou quatro domiacutenios para classificar os dados que obteve com sua equipe no

The Dolphin Institute sobre o desempenho cognitivo e a resposta racional em

espeacutecimes de golfinhos-nariz-de-garrafa (Tursiops truncatus) e inclusive para

classificar as descobertas e ldquoilustrar a flexibilidade comportamental do golfinho que

se estende ateacute mesmo para comportamentos incomuns inovadoresrdquo86 Satildeo eles

a) o declarativo (semacircntico ou representacional)

b) o processual

c) o social

d) o do self

A cada um corresponde uma pergunta cuja resposta afirmativa foi

obtida das observaccedilotildees feitas pelo pesquisador e sua equipe indicando que tais

espeacutecimes apresentam algo que possa ser entendido como sinal de inteligecircncia e

inclusive de consciecircncia segundo as definiccedilotildees atuais Satildeo elas respectivamente

a) ldquoSeraacute que o golfinho mostra conhecimento ou entendimento sobre as

coisasrdquo

b) ldquoSeraacute que o golfinho exibe competecircncia para significados operaccedilotildees ou

meacutetodosrdquo

c) ldquoSeraacute que o golfinho revela consciecircncia social e responsividade nas

interaccedilotildees ou nas relaccedilotildees sociaisrdquo

d) ldquoSeraacute que o golfinho apresenta conhecimento ou consciecircncia (awareness)

de si mesmordquo87

84

GRIFFIN 1994 85

HERMAN 2006 86

ldquoto illustrate the behavioural flexibility of the dolphin that extends even to unusual innovative behavioursrdquo Ibid p 442

87 Respectivamente does the dolphin display knowledge or understanding about things

does the dolphin exhibit competency in means operations or methods does the dolphin reveal

33

Herman ali entende a consciecircncia de si ou autoconsciecircncia como um

conceito multidimensional razatildeo pela qual escolheu duas outras facetas dela para

estudar que implicam a indagaccedilatildeo de se os animais tecircm consciecircncia de seus

proacuteprios comportamentos e tambeacutem de suas proacuteprias partes corporais o que ateacute

entatildeo lhe parecia natildeo ter sido feito em razatildeo de ainda segundo ele as pesquisas

anteriores terem-se limitado a experimentos com espelhos para verificaccedilatildeo do

autorreconhecimento com resultados positivos Mantendo a ideia de Burghardt e

Bekoff88 de que a consciecircncia apresenta vaacuterios niacuteveis alguns anos depois Herman89

reuniu novamente informaccedilotildees de estudos anteriores que apontam para a presenccedila

em golfinhos de autoconsciecircncia e consciecircncia corporal do ego corporal

experienciado subjetiva e objetivamente corroborando o trabalho anterior

Seguindo a mesma esteira de Damaacutesio Ades descreve um pouco mais a

distinccedilatildeo supramencionada dos dois tipos de consciecircncia um o ldquoawarenessrdquo que

ldquose constitui no contato imediato entre o indiviacuteduo e seu contexto interno ou externo

Eacute um dar-se conta de que algo existerdquo e outro o ldquoconsciousnessrdquo ou a consciecircncia

capaz de reflexatildeo exclusivo dos humanos que

[] envolve um desdobramento eacute um dar-se-conta do dar-se-conta o indiviacuteduo eacute capaz de designar e de descrever o seu conhecimento das coisas Pode-se supor que tome como objeto o proacuteprio fato de estar consciente Estabelece implicitamente uma distinccedilatildeo entre o objeto percebido e sua percepccedilatildeo do objeto diferencia-se a si mesmo (como fonte do conhecer) daquilo que eacute conhecido Trata-se de uma consciecircncia capaz de ser comunicada em niacutevel simboacutelico isto eacute que pode ser dita

90

Com isto Ades sugere que os animais ou ao menos alguns deles tambeacutem

possuem algum tipo de consciecircncia Baseia-se ele em propostas como a de Griffin

(1994) considerado o fundador da Etologia Cognitiva

Uma razatildeo para suspeitar de que os animais natildeo humanos apresentam pensamentos conscientes eacute que a estrutura baacutesica e o funcionamento dos neurocircnios e sinapses satildeo muito similares ateacute onde sabemos nos animais com sistema nervoso central organizado Natildeo haacute evidecircncias convincentes de que caracteriacutesticas especiacuteficas da neuroanatomia macroscoacutepica sejam essenciais para o pensamento consciente no entanto eacute melhor manter uma mente aberta para a possibilidade de haver consciecircncia em todos os

social awareness and apropriate responsiveness in social interactions or relations does the dolphin exhibit knowledge or awareness of itself HERMAN 2006 p 442

88 BURGHARDT BEKOFF 2009

89 HERMAN 2012

90 ADES 1997

34

animais que exibem comportamento versaacutetil ou se comunicam de forma a sugerir que eles possam estar expressando pensamentos ou sentimentos

91

Fundamenta-se pois o autor na hipoacutetese de que ldquoo comportamento e a

consciecircncia no homem e em outros animais resultam integralmente de eventos que

ocorrem em seus sistemas nervosos centraisrdquo92 seguindo a mesma linha do filoacutesofo

John Searle que afirma ldquo[] a consciecircncia assim como a intencionalidade satildeo

processos bioloacutegicos causados por processos neurais de niacutevel mais baixo que

ocorrem no ceacuterebro e nenhuma das duas coisas eacute redutiacutevel a algo distintordquo93

Muitos estudos como se veraacute no desenvolvimento deste trabalho parecem

corroborar a hipoacutetese acima defendida por Griffin e Ades mas mais ainda em

vaacuterias correntes de pesquisa mais recentes tecircm-se atribuiacutedo o termo inteligecircncia em

algum grau a diversas espeacutecies de animais por estas apresentarem muitas das

habilidades elencadas pelos estudiosos das ciecircncias cognitivas

Jaacute o fazia Aristoacuteteles considerado o pai da metodologia cientiacutefica do meacutetodo

comparativo precursor da proacutepria biologia94 em um sentido especiacutefico que seraacute o

objeto principal deste trabalho provavelmente tenham-no feito antes de Aristoacuteteles

jaacute que os estudos dos seres viventes se datildeo desde tempos imemoriais e o fizeram

durante os seacuteculos que se seguiram como se nota por exemplo nos estudos de

Tomaacutes de Aquino de seu mestre Alberto Magno de alguns dos filoacutesofos aacuterabes

medievais e de outros grandes naturalistas e em filoacutesofos ainda posteriores como

Descartes que por sua vez se apresenta nesse percurso com uma marcante e

controversa ressalva digna de nota

Teria afirmado o filoacutesofo que os animais natildeo humanos seriam como

maacutequinas autocircmatos por seus processos orgacircnicos mas incomparavelmente

superiores a qualquer aparato construiacutedo pelo homem e apontando que natildeo

apresentam linguagem nem raciocinam o que fez parecer a muitos ter negado aos

animais natildeo somente isto mas inclusive a presenccedila de consciecircncia e ateacute mesmo de

sentimentos e sensaccedilotildees Alguns autores poreacutem como Cottingham95 respondem a

91

GRIFFIN 1994 p 4 92

Ibid p 4-5 93

ldquoTanto la conciencia como la intencionalidad son procesos bioloacutegicos causados por procesos neuronales de nivel maacutes bajo que tienen lugar en el cerebro y ninguna de las dos cosas es reductible a algo distintordquo SEARLE 1992 p 2

94 MAYR 2000 p 25 87-88 Diz Mayr ldquoIn almost any portion of the history of biology one has

to start with Aristotle []rdquo 95

COTTINGHAM 1978

35

isto alegando que natildeo haacute motivos suficientes para inferir que a ausecircncia de

racionalidade implicaria um mecanicismo tatildeo exacerbado que chegasse a esse

ponto

Hume96 poreacutem ao tratar do tema em sua Investigaccedilatildeo Acerca da Natureza

Humana atribui certo tipo de raciociacutenio aos animais que diz tratar-se de um

raciociacutenio experimental instintivo de poder mecacircnico sem relaccedilotildees de ideias e que

o homem tambeacutem possui ainda que natildeo se limite a ele Hume desenvolve sua tese

partindo da analogia e da inferecircncia no sentido de que se algueacutem como diz

observa a circulaccedilatildeo em um animal como a ratilde ou o peixe presumiraacute que o mesmo

processo ocorre em outros animais Diz entatildeo que tal como os homens os animais

[] apreendem muitas coisas da experiecircncia e inferem que os mesmos eventos resultaratildeo sempre das mesmas causas Mediante este princiacutepio familiarizam-se com as propriedades a partir de seu nascimento acumulam conhecimentos sobre a natureza do fogo da aacutegua da terra das pedras das altitudes das profundidades etc e daquilo que resulta de sua accedilatildeo Aqui se distingue claramente a ignoracircncia e a inexperiecircncia do jovem frente agrave astuacutecia e agrave sagacidade dos velhos que tecircm aprendido por uma longa observaccedilatildeo a evitar o que os fere e a perseguir o que lhes proporciona bem-estar e prazer

97

Ressalta em seguida que o adestramento deixa isto ainda mais evidente

explicando que

[] o animal infere um fato que ultrapassa aquilo que impressiona imediatamente seus sentidos [] esta experiecircncia estaacute completamente fundada na experiecircncia passada visto que a criatura espera do objeto presente os mesmos resultados que em sua observaccedilatildeo sempre tem visto derivar de objetos semelhantes

98

Explica em seguida que essa inferecircncia natildeo se funde em nenhum processo

racional mas que se daacute por induccedilatildeo do costume que apoacutes a impressatildeo de

determinado objeto nos sentidos faz com que a imaginaccedilatildeo conceba aquilo que lhe

estaacute associado ou seja concebendo um em razatildeo do surgimento do outro Hume

chama ldquocrenccedilardquo ao modo como isto se daacute e denomina ldquoinstintordquo uma capacidade

nos animais de aperfeiccediloar e superar em muito com a praacutetica e a experiecircncia certas

aptidotildees ordinaacuterias

96

HUME 2001 p 128-132 97

Ibid p 129 98

Ibid p 130

36

Na esteira de filoacutesofos como Hume e ainda que sob a influecircncia cartesiana o

termo inteligecircncia veio a ser mais significativamente atribuiacutedo a animais natildeo

humanos a partir do seacuteculo XIX como se observa na obra de Darwin ldquoThe Descent

of Man and Selection in Relation to Sexrdquo escrito em 1871 e quando o tema passou

a ser tratado inclusive em laboratoacuterio de modo mais especializado Esta obra de

Darwin precedeu outra que passou a ser considerada precursora da moderna

etologia lanccedilada no ano seguinte ldquoThe Expression of Emotions in Man and

Animalsrdquo em que o naturalista trata inicialmente das reaccedilotildees instintivas dos animais

natildeo humanos relacionadas agraves emoccedilotildees dos movimentos voluntaacuterios e involuntaacuterios

dos atos consequentes do reflexo sejam os inatos sejam aqueles adquiridos por

costume ou por associaccedilotildees que reaparecem mediante as mesmas causas que o

originaram99 e em seguida e antes de abordar o tema em relaccedilatildeo aos humanos

com o que concluiraacute seu estudo descreve as reaccedilotildees emocionais nos animais

tendo documentado expressotildees como o prazer a alegria o afeto a coacutelera a dor

etc que pareceram ser mais evidentes nos macacos

Em ldquoThe Descent of Manrdquo Darwin defende que haacute inteligecircncia nos animais100

e narra uma seacuterie de casos em que afirma haver neles memoacuteria como o de um catildeo

que teve e que natildeo via haacute cinco anos e ao reencontraacute-lo o animal o seguiu como

fazia em outros tempos diz ele pelo encontro ter ldquo[] instantaneamente despertado

em seu espiacuterito uma seacuterie de antigas associaccedilotildees []rdquo ou das formigas que diz

reconhecerem membros do mesmo grupo apoacutes separaccedilatildeo de quatro meses101

afirma haver neles tambeacutem imaginaccedilatildeo o que exemplifica com o fato de outros

autores que diz serem suficientemente confiaacuteveis terem constatado catildees gatos

cavalos e aves sonhando e certa aptidatildeo para o raciociacutenio102 Por raciociacutenio aqui

entende ldquofazer pausas deliberar e resolverrdquo103 E pouco adiante critica aqueles que

levantam barreiras inalcanccedilaacuteveis entre os animais e os homens o que objetaria agrave

sua teoria evolucionista e cita dentre outras caracteriacutesticas atribuiacutedas nessa visatildeo

aos animais como a consciecircncia proacutepria a ausecircncia de linguagem da faculdade de

abstraccedilatildeo e de ideias gerais reconhecendo que essas duas uacuteltimas encontram

plena exclusividade nos homens pois ldquoningueacutem supotildee que um animal inferior reflita

99

Sobre os reflexos adquiridos por costume cf DARWIN sd b) p 50 e quanto ao que mais se diz DARWIN sd b) passim

100 DARWIN sd a) p 22

101 Ibid p 28-29

102 Ibid p 29

103 ldquo[] hacer pausas deliberar y resolverrdquo Ibid p 29

37

sobre a vida e a morte nem outros assuntos parecidosrdquo104 jaacute que as aptidotildees

mentais em noacutes alcanccedilaram um niacutevel superior que diz implicar o uso plenamente

desenvolvido da linguagem105 Acrescenta tambeacutem agraves duas o senso moral

consciecircncia moral106 embora sugira que na fidelidade aos companheiros em

especial na do catildeo em relaccedilatildeo ao dono ndash o que exemplifica com o fato de aquele

natildeo roubar alimento na presenccedila deste ndash haja algo que se pareccedila muito com a

moralidade Por outro lado reconhece que esses animais aos quais chama

inferiores possuem personalidade e defende que haja algum tipo de consciecircncia107

Darwin apresenta entatildeo uma seacuterie de exemplos a partir dos quais infere haver o que

chama ldquoracionalidaderdquo nos animais alguns dos quais descreveremos brevemente

mais adiante

O termo inteligecircncia passou a ser especialmente atribuiacutedo aos animais natildeo

humanos com o surgimento de linhas de pesquisa como a etologia que tecircm como

proposta uma compreensatildeo que se sobrepotildee a um mecanicismo que apontam nos

trabalhos e nas teses de pesquisadores behavioristas renomados como na do

reflexo condicionado de Pavlov na do condicionamento operante de Skinner e na do

associacionismo e na lei do efeito de Thorndike que no final do seacuteculo XIX publicava

suas pesquisas sobre a chamada inteligecircncia animal apoacutes uma bateria de testes108

Em seu trabalho apresentado em 1898 que se tornou um marco para os

estudos do comportamento animal e inclusive para o desenvolvimento da psicologia

behaviorista Thorndike elogia o trabalho de Morgan Lloyd publicado havia pouco

menos de uma deacutecada Este diria o seguinte das associaccedilotildees que fundamentaratildeo

natildeo soacute o trabalho de 1898 mas tambeacutem a visatildeo behaviorista e que jaacute haviam sido

percebidas por Aristoacuteteles em especial das criadas artificialmente

No treinamento de animais (e de crianccedilas mais jovens) foram estabelecidas associaccedilotildees artificiais agradaacuteveis ou dolorosas em conexatildeo com certas accedilotildees Introduziram-se aversotildees e apetecircncias anormais na constituiccedilatildeo mental Este processo em muito depende da plasticidade da constituiccedilatildeo Na ausecircncia de tal plasticidade eacute impossiacutevel estabelecer novas associaccedilotildees

109

104

ldquoNadie supone que un animal inferior reflexione sobre la vida y la muerte ni otros asuntos parecidos []rdquo DARWIN sd a) p 43

105 Ibid p 32 e 43

106 Ibid p 48-49

107 Ibid p 43-44 e 49

108 TOURINHO 2009

109 ldquoIn the training of animals (and young children) artificial associations pleasurable or

painful have to be established in connection with certain actions Abnormal apetences and aversions

38

Com base em diversos estudos de outros pesquisadores com elefantes

raposas catildees e outros animais reconhecendo por exemplo que os catildees

comunicam certos desejos seus aos humanos que elefantes podem quebrar partes

vegetais para utilizaacute-las como instrumento para remover sanguessugas do corpo ou

espantar moscas110 etc Lloyd apontou trecircs tipos de inferecircncia sendo as duas

primeiras perceptivas e a terceira conceitual a ldquoinferecircncia inconsciente em

construccedilatildeo imediatardquo a ldquoinferecircncia inteligente que lida com construccedilotildees e

reconstruccedilotildees e a ldquoinferecircncia racional que implica anaacutelise e isolamentordquo111 e nesse

sentido chamava inteligentes certos animais negando nestes a presenccedila de ideias

abstratas112

Voltando a Thorndike este chegou a admitir consciecircncia nos animais mas

restringindo-a agraves impressotildees dos sentidos aos impulsos aos sentimentos e aos

atos corporais de um indiviacuteduo113 negando expressamente a possibilidade de estar

relacionada a ideias ou a impulsos livres114 O pesquisador realizou experimentos

com catildees galinhas mas especialmente com gatos que eram colocados em uma

caixa que tinha um dispositivo com fio e alavanca o qual era tocado acidentalmente

pelo animal que entatildeo via a caixa ser aberta possibilitando o acesso ao alimento a

recompensa fora dela Na seccedilatildeo seguinte o animal mostrava ter aprendido como

abrir a caixa mas natildeo repetia intencionalmente e de forma imediata o feito diante

de mudanccedilas no dispositivo

O pesquisador distinguiu as reaccedilotildees nos animais que satildeo realizadas sem

experiecircncia preacutevia das que satildeo construiacutedas com a experiecircncia que satildeo o objeto de

seu estudo e que se datildeo por processos associativos diante da ausecircncia do

pensamento abstrato que conceitua e infere que caracteriza o ente humano115

Depois de apontar limitaccedilotildees dos estudos anteriores aos seus sobre a

chamada inteligecircncia animal cujos meacutetodos segundo ele se baseavam na questatildeo

ldquoo que eles fazemrdquo parte da pergunta que acrescenta agrave anterior e agrave ldquocomo eles

have to be introduced into the mental constitution In this process much depends on the plasticity of the constitution In the absence of such plasticity it is impossible to establish new associationsrdquo LLOYD 1891 p 343

110 Ibid p 345 e 370

111 Respectivamente unconscious inference on immediate construction intelligente

inference dealing with constructs and reconstructs e rational inference implying analysis and isolation Ibid p 362

112 Id 1898 p 348

113 THORNDIKE 1898 p 84

114 Ibid p 108

115 Ibid p 1

39

fazem issordquo como proposta para novo meacutetodo ldquolsquoo que eles sentem enquanto

agemrdquo116 e conclui sobre as associaccedilotildees formadas que observou em laboratoacuterio

que ldquosatildeo absolutas e o que quer que delas se possa deduzir eacute certordquo117 e ainda que

embora elas

sejam tais que natildeo poderiam ter sido anteriormente experimentadas ou fornecidas por hereditariedade ainda natildeo satildeo tatildeo distantes do curso ordinaacuterio da vida do animal Elas significam simplesmente a conexatildeo de um determinado ato com uma determinada situaccedilatildeo resultante do prazer e esse tipo geral de associaccedilatildeo eacute encontrado normalmente atraveacutes da vida do animal

118

Com base nisto a definiccedilatildeo da lei do efeito viria a ser apresentada na

republicaccedilatildeo da obra em 1911

Das vaacuterias respostas agrave mesma situaccedilatildeo aquelas que satildeo acompanhadas ou seguidas de perto pela satisfaccedilatildeo do animal seratildeo mantidas iguais as outras coisas mais firmemente conectadas com a situaccedilatildeo de modo que quando [a situaccedilatildeo] repetir-se seraacute mais provaacutevel que voltem a ocorrer aquelas que satildeo acompanhadas ou seguidas de perto pelo desconforto do animal teratildeo mantidas iguais as outras coisas suas conexotildees com aquela situaccedilatildeo enfraquecidas de modo que quando [a situaccedilatildeo] repetir-se seraacute menos provaacutevel que voltem a ocorrer Quanto maior a satisfaccedilatildeo ou o desconforto maior o fortalecimento ou enfraquecimento do viacutenculo

119

Thorndike denomina instinto ldquoqualquer reaccedilatildeo que um animal tem sem

experiecircncia em relaccedilatildeo a uma situaccedilatildeordquo120 E por ldquoimpulsordquo ele entende

[] a consciecircncia que acompanha uma inervaccedilatildeo muscular uma parte daquele sentimento do ato que vem de ver a si mesmo mover do sentimento do corpo do sujeito em uma posiccedilatildeo diferente etc Eacute o sentimento direto do fazer enquanto distinto da ideia do ato realizado obtida atraveacutes do olho etc [] por impulso eu nunca me refiro ao motivo do ato No discurso popular pode-se dizer que aquela fome eacute o impulso que faz o

116

Respectivamente ldquowhat they dordquo ldquohow they do itrdquo ldquolsquowhat they feelrsquo while they actrdquo THORNDIKE 1898 p 5

117 ldquoThey are absolute and whatever can be deduced from them is surerdquo Ibid p 7

118 ldquo[] altough the associations formed are such as could not have been previously

experienced or provided for by heredity they are still not too remote from the animalrsquos ordinary course of life They mean simply the connection of a certain act with a certain situation and resultant pleasure and this general type of association is found troughout the animalrsquos life normallyrdquo Ibid p 7-8

119 Traduzido por Tourinho 2011 ldquoThe Law of Effect is that Of several responses made to the

same situation those which are accompanied or closely followed by satisfaction to the animal will other things being equal be more firmly connected with the situation so that when it recurs they will be more likely to recur those which are accompanied or closely followed by discomfort to the animal will other things being equal have their connections with that situation weakened so that when it recurs they will be less likely to occur The greater the satisfaction or discomfort the greater the strengthening or weakening of the bondrdquo Id 1911 p 118

120 ldquo[] any reaction which an animal makes to a situation without experiencerdquo Id 1898 p 14

40

gato arranhar Isso nunca seraacute usado aqui A palavra lsquomotivorsquo sempre denotaraacute esse tipo de consciecircncia

121

Pavlov por sua vez defendeu a visatildeo de que instinto nada mais eacute do que

reflexo respostas do organismo a estiacutemulos sejam eles externos ou internos e a

justifica com comparaccedilotildees entre a complexidade de comportamentos ditos

instintivos como por exemplo a construccedilatildeo de um ninho por uma ave com a

complexidade exigida por efeitos que resultam de determinados estiacutemulos

nervosos122

E define assim reflexo baseando-se na visatildeo de Descartes

Um estiacutemulo externo ou interno recai sobre um ou outro receptor nervoso e daacute origem a um impulso nervoso esse impulso nervoso eacute transmitido ao longo das fibras nervosas para o sistema nervoso central e aqui por causa das conexotildees nervosas existentes daacute origem a um novo impulso que passa ao longo das fibras nervosas que saem para o oacutergatildeo ativo onde excita uma atividade especial das estruturas celulares Assim um estiacutemulo parece estar conectado de necessidade a uma resposta definida como a causa com o efeito Parece oacutebvio que toda a atividade do organismo deve obedecer a leis definidas

123

Acrescenta a esse tipo de reflexo inato que principalmente se relaciona a

atividades de tecidos e oacutergatildeos particularmente outro que ocorre no sistema

nervoso relacionado ao comportamento instintivo dos animais que afirma tratar-se

das ldquoreaccedilotildees inevitaacuteveis a estiacutemulos perfeitamente definidosrdquo124 e entatildeo explica o

que chamou reflexo condicionado

Com uma compreensatildeo completa de todos os fatores envolvidos os novos reflexos de sinalizaccedilatildeo estatildeo sob o controle absoluto do experimentador eles procedem de acordo com leis tatildeo riacutegidas como as de qualquer outro processo psicoloacutegico e devem ser considerados como sendo em todos os

121

ldquo[] means the consciousness accompanying a muscular inervation a part from that feeling of the act wich comes from seeing oneself move from feeling onersquos body in a different position etc It is the direct feeling of the doing as distinguished from the idea of the act done gained through eye etc by impulse I never mean the motive to the act In popular speech you may say that hunger is the impulse wich makes the cat claw That will never be the use here The word motive will always denote that sort of consciousnessrdquo THORNDIKE 1898 p 14-15

122 PAVLOV 1927 p 9-11

123 ldquoAn external or internal stimulus falls on some one or other nervous receptor and gives rise

to a nervous impulse this nervous impulse is transmitted along nerve fibres to the central nervous system and here on account of existing nervous connections it gives rise to a fresh impulse which passes along outgoing nerve fibres to the active organ where it excites a special activity of the cellular structures Thus a stimulus apears to be connected of necessity with a definite response as cause with effect It seems obvious that the whole activity of the organism should conform to definite lawsrdquo Ibid p 7

124 ldquo[] the inevitable reactions to perfectly definite stimulirdquo Ibid p 9

41

sentidos uma parte da atividade fisioloacutegica dos seres viventes Eu denominei esse novo grupo de reflexos ldquoreflexos condicionadosrdquo para distingui-los dos reflexos inatos ou natildeo condicionados O termo ldquocondicionadordquo tem sido em geral cada vez mais empregado e eu penso que seu uso eacute plenamente justificado jaacute que comparado com os reflexos inatos esses novos reflexos realmente dependem de muitas condiccedilotildees tanto em sua formaccedilatildeo como na manutenccedilatildeo de sua atividade fisioloacutegica

125

Pavlov analisou os efeitos reflexos em animais especialmente em catildees a

partir de estiacutemulos positivos ou negativos que por exemplo despertavam a

salivaccedilatildeo tanto no estado de normalidade como no estado hipnoacutetico126 ou a partir

de situaccedilotildees em que o animal estava impedido de mover-se127 Realizou tambeacutem

experimentos com chimpanzeacutes observando que os animais criavam associaccedilotildees

inicialmente por tentativa e erro que eram reforccediladas com a obtenccedilatildeo da

recompensa (alimento) e demonstravam gradualmente aprimoramento resultante

de anaacutelise e do aprendizado obtendo pleno sucesso na realizaccedilatildeo da tarefa128

Neste contexto teceu criacuteticas a certas conclusotildees de Koumlhler e Yerkes em que

sugeriam ao contraacuterio de Pavlov e em oposiccedilatildeo agraves conclusotildees de Thorndike haver

certa racionalidade nos chimpanzeacutes testados a partir de publicaccedilotildees de seus

trabalhos que marcaram certo pioneirismo na busca por inteligecircncia nos grandes

macacos Koumlhler e Yerkes seguiram com as pesquisas com grandes macacos a

esteira de John B Watson fundador do behaviorismo e um dos poucos

pesquisadores tal como Margaret Washburn que tratavam da psicologia comparada

no despontar do seacuteculo XX129

Koumlhler deu iniacutecio a uma seacuterie de testes especialmente com chimpanzeacutes a

partir de indagaccedilotildees como esta

Esses seres mostram muitas caracteriacutesticas humanas em seu comportamento ldquocotidianordquo o que faz levantar a questatildeo de se eles natildeo se comportam com inteligecircncia e insight sob condiccedilotildees que requerem tal

125

ldquoWith a complete understanding of all the factors involved the new signalizing reflexes are under the absolute control of the experimenter they proceed according to as rigid laws as do any other physiological processes and must be regarded as being in every sense a part of the physiological activity of living beings I have termed this new group of reflexes conditioned reflexes to distinguish them from the inborn or unconditioned reflexes The term conditioned is becoming more and more generally employed and I think its use is fully justified in that compared with the inborn reflexes these new reflexes actually do depend on very many conditions both in their formation and in the maintenance of their physiological activityrdquo PAVLOV 1927 p 25

126 Id 1984 p 77-82

127 Ibid p 11-12

128 Ibid p 128-129

129 DEWSBURY 2013

42

comportamento Essa questatildeo expressa o primeiro pode-se dizer novo interesse na capacidade intelectual dos animais

130

Nelas emprega o termo ldquointeligecircnciardquo ldquono sentido em que a palavra eacute aplicada

ao homemrdquo131 ainda que natildeo se trate de algo bem definido mas que

superficialmente se reconheccedila como tal diferenciando-se de outros tipos de

comportamentos em especial nos proacuteprios animais Koumlhler explica entatildeo que o

emprego do termo se daacute em estudos como aqueles que realizou quando diante de

circunstacircncias que impedem o curso comum para atingir um determinado fim como

a realizaccedilatildeo de uma tarefa o ente toma um caminho diferente para resolver a

situaccedilatildeo diferentemente de quando o ente toma o caminho direto inquestionaacutevel

que ldquoclaramente surge naturalmente fora de sua organizaccedilatildeordquo132

Os experimentos que realizou partiram de testes mais simples que exigiam

somente movimentos do proacuteprio animal como para encontrar uma abertura em um

recinto que pudesse contornar e chegar ao alimento tornando-se gradualmente

mais complexos ao que passariam a reconhecer obstaacuteculos como uma caixa que

impedia o animal de alcanccedilar alimento fora da jaula e mesmo precisar da utilizaccedilatildeo

de outro objeto ou seja de um instrumento para alcanccedilar a recompensa do outro

lado da grade da jaula fosse por exemplo de cordas que precisava movimentar

para trazer a comida para perto ou de varas para alcanccedilar diretamente o alimento

e em testes posteriores trazer outra vara maior que ao contraacuterio da primeira

utilizada alcanccedilaria o objeto ou ainda de uma vara que teria de ser encaixada em

outra com uma abertura para alcanccedilar a recompensa mais distante etc Outros

experimentos envolveram caixas que deveriam ser empilhadas para que o animal

alcanccedilasse o alimento previamente suspendido no teto do local pelo

experimentador e mesmo com o auxiacutelio de uma vara

Yerkes por sua vez publicou muitas obras a principal com sua esposa um

grande tratado sobre os grandes antropoides no qual eles agregaram aos

resultados de seus estudos precedentes os de muitos outros pesquisadores

envolvidos com o tema desde os seacuteculos anteriores mas com bastantes referecircncias

130

ldquoThese beings show so many human traits in their lsquoeverydayrsquo behaviour that the question naturally arises whether they do not behave with intelligence and insight under conditions wich require such behaviour This question expresses the first one may say naive interest in the intelectual capacity of animalsrdquo KOumlHLER 1927 p 1

131 ldquo[] in the sense in wich the word is aplied to humanrdquo Ibid p 1

132 ldquo[] which clearly arises naturally out of their organizationrdquo Ibid p 3-4

43

ao trabalho de Koumlhler Ao destacar a inteligecircncia especialmente em orangotangos e

chimpanzeacutes relata casos curiosos como o de um orangotango do seacuteculo XVIII que

aprendeu a rodar a chave e a abrir a porta depois de ver o pesquisador fazecirc-lo133 E

aleacutem disso forneceu inclusive algumas sugestotildees para futuros estudos como para

a comprovaccedilatildeo do autorreconhecimento de macacos em espelhos algo que diz jaacute

vinha sendo bastante relatado134

Em paralelo e nos anos seguintes Skinner desenvolveria principalmente os

estudos de Thorndike e Pavlov realizando pesquisas especialmente com ratos e

pombos envolvendo reforccedilo positivo e negativo ou recompensa e puniccedilatildeo135 Ele

define inicialmente comportamento como ldquoparte da atividade total de um

organismo eacute o que um organismo estaacute fazendo ndash mais precisamente que eacute

observado por outro organismordquo ao que acrescenta ldquoeacute aquela parte do

funcionamento de um organismo que estaacute empenhada em agir ou estabelecer

relaccedilotildees com o mundo exteriorrdquo chegando entatildeo ao corolaacuterio

Por comportamento entatildeo refiro-me simplesmente ao movimento de um organismo ou de suas partes em um quadro de referecircncia fornecido pelo proacuteprio organismo ou por vaacuterios campos de forccedila ou objetos externos Eacute conveniente falar disso como a accedilatildeo do organismo sobre o mundo exterior e frequentemente eacute desejaacutevel lidar com um efeito em vez de com o proacuteprio movimento como no caso da produccedilatildeo de sons

136

Seus experimentos com animais consistiram basicamente em modelar neles

gradualmente novos comportamentos por meio de condicionamento que ele

entende como

[] um tipo de mudanccedila na forccedila do reflexo onde a operaccedilatildeo realizada sobre o organismo para induzir a mudanccedila eacute a apresentaccedilatildeo de um estiacutemulo de reforccedilo em certa relaccedilatildeo temporal com o comportamento Diferentes tipos de reflexos condicionados surgem porque um estiacutemulo de reforccedilo pode ser apresentado em diferentes tipos de relaccedilotildees temporais

137

133

YERKES R M YERKES A W 1929 p 176 134

Ibid p 171 135

CARVALHO NETO MAYER 2011 136

Respectivamente ldquo[] part of the total activity of an organismo [] is what an organism is doing ndash or more accurately what it is observed by another organism to be doingrdquo ldquois that part of the functioning of an organism which is engaged in acting upon or having commerce with the outside worldrdquo e ldquoBy behavior then I mean simply the movement of an organism or of its parts in a frame of reference provided by the organism itself or by various external objects or fields of force It is convenient to speak of this as the action of the organism upon the outside world and it is often desirable to deal with an effect rather than with the movement itself as in the case of the production of soundsrdquo SKINNER 1938 p 6

137 ldquoLet conditioning be defined as a kind of change in reflex strength where the operation

performed upon the organism to induce the change is the presentation of a reinforcing stimulus in a

44

Este condicionamento conhecido como ldquocondicionamento operanterdquo daacute-se a

partir de estiacutemulos que provocavam a repeticcedilatildeo de determinado comportamento

Essa repeticcedilatildeo gera o reforccedilo ou ldquoreforccedilamentordquo que entatildeo resulta na modificaccedilatildeo

comportamental Grande parte de seus experimentos eram realizados tambeacutem em

uma espeacutecie de caixa que passou a ser conhecida como ldquocaixa de Skinnerrdquo

Consistiam por exemplo em fazer um rato aprender a a partir de um estiacutemulo

como uma luz piscando ou um sinal sonoro pressionar com determinada

intensidade uma barra com apenas uma das patas dianteiras para que entatildeo se

abrisse um recipiente de onde poderia retirar o alimento como recompensa Para

isto cada movimento realizado aleatoriamente pelo animal na direccedilatildeo deste

propoacutesito era recompensado ateacute que ele o aprendesse gerando o que Skinner dizia

ser uma cadeia de reflexos um movimento determinado era realizado repetido

reforccedilado e entatildeo se passava para o movimento seguinte138

A partir de seus estudos ele definiu outros termos fundamentais como

ldquorespondenterdquo ou seja o comportamento de resposta a um estiacutemulo provocado e

ldquooperanterdquo sobre o qual inicialmente ele se restringe a dizer que eacute aquele que natildeo eacute

respondente139 mas posteriormente acrescenta que ldquoum operante eacute definido por

suas consequecircnciasrdquo140 e o define como ldquoUma classe da qual uma resposta eacute uma

instacircncia ou membro []rdquo e entatildeo explica como um conjunto de contingecircncias eacute

aquilo que o caracteriza

[] satildeo sempre instacircncias que satildeo contadas na determinaccedilatildeo da frequecircncia e a partir dessa frequecircncia a probabilidade de uma resposta ser inferida A probabilidade eacute frequentemente tomada no entanto como a medida da forccedila de um operante A forccedila da resposta natildeo tem significado salvo como uma propriedade de uma instacircncia como sua forccedila ou velocidade Eacute sempre uma resposta sobre a qual um determinado reforccedilo eacute contingente mas o eacute sob propriedades que definem a adesatildeo a um operante

141

certain temporal relation to behavior [] Different types of conditioned reflexes arise because a reinforcing stimulus may be presented in different kinds of temporal relationsrdquo SKINNER 1937 p 1

138 Id 1938 p 48-55

139 Ibid p 19

140 SKINNER 1969 p 128

141 ldquoAn operant is a class of which a response is an instance or member [] it is always

instances which are counted in determining frequency and from that frequency the probability of a response inferred The probability is frequently taken however as the measure of the strength of an operant Strength of response has no meaning except as a property of an instance such as its force or speed It is always a response upon which a given reinforcement is contingent but it is contingent upon properties which define membership in an operant Thus a set of contingencies defines an operantrdquo Ibid p 132

45

Os estudos de Skinner com animais passaram a ser empregados

posteriormente em humanos no acircmbito da educaccedilatildeo escolar por meacutetodos como o

da Instruccedilatildeo Direta (Direct Instruction) e o da Aprendizagem para o Domiacutenio

(Mastery Learning) o que veio a gerar uma seacuterie de controveacutersias e protestos nos

Estados Unidos142

Segundo Tourinho poreacutem eacute Skinner quem rompe com o mecanicismo

naquela corrente de pesquisa

[] eacute apenas com Skinner que o selecionismo como modo causal encontra uma elaboraccedilatildeo refinada na ciecircncia do comportamento uma elaboraccedilatildeo que articula as relaccedilotildees entre filogecircnese ontogecircnese e cultura como niacuteveis de seleccedilatildeo do comportamento e que operam ora em uma mesma direccedilatildeo ora em direccedilotildees conflitantes sobrepondo-se uns aos outros Foi a elaboraccedilatildeo skinneriana que definitivamente afastou o mecanicismo assinalando a bidirecionalidade variabilidade e dependecircncia muacutetua das relaccedilotildees entre respostas e estiacutemulos e o caraacuteter probabiliacutestico da determinaccedilatildeo das primeiras uma perspectiva ainda natildeo inteiramente explorada na proacutepria ciecircncia do comportamento

143

E paralelamente aos estudos de Skinner avanccedilavam as pesquisas sobre o

comportamento animal na chamada ldquorevoluccedilatildeo cognitivardquo dos anos 60 e 70144

quando inclusive iniciavam os estudos de pesquisadores como Jane Goodal ndash que

forneceu valiosas contribuiccedilotildees para a primatologia estudando em campo os

chimpanzeacutes de Gombe na Tanzacircnia ndash passava assim a ser reconhecida como

disciplina cientiacutefica a linha de pesquisa conhecida por etologia termo proposto pelo

zooacutelogo Isidoire Geoffroy Saint-Hilaire em 1854145 formalmente inaugurada com os

trabalhos de Konrad Lorenz Nikolaas Tinbergen e Karl von Frisch Nesse acircmbito a

inteligecircncia animal ganha um novo enfoque com as pesquisas de Donald Griffin que

dentro da etologia desenvolveu a etologia cognitiva na busca em meio agrave entatildeo

presente visatildeo em que se analisava melhor fatores como expectativas desejos e

crenccedilas por parte dos animais por sinais de consciecircncia nestes146 Mas somente na

uacuteltima deacutecada do seacuteculo XX eacute que a busca pela consciecircncia passou a tornar-se uma

aacuterea mais ativa de pesquisa147

142

ISERBYT 2000 143

TOURINHO 2011 144

SHETTLEWORTH 2010 p 6 145

CAMPAN 2019 146

GRIFFIN 1994 p viii 147

SHETTLEWORTH 2010 p 6

46

Feuerbacher148 faz referecircncia agraves pesquisas sobre os processos cognitivos e

comportamentais dos catildees que resume e ilustra as mudanccedilas de perspectiva

ocorridas no seacuteculo passado e que vieram culminar no atual enfoque adotado pelos

estudiosos que buscam compreender a chamada inteligecircncia animal Explica a

pesquisadora complementando o que se diz logo acima que soacute mais recentemente

em fins da deacutecada de noventa essas pesquisas passaram a enfocar as

caracteriacutesticas que aos catildees satildeo uacutenicas Antes o faziam em torno de processos que

natildeo lhes eram uacutenicos e de caracteriacutesticas natildeo necessariamente uacutenicas que podem

ser usadas para o estudo de fenocircmenos mais gerais ndash que a pesquisadora

exemplifica com o estudo da diversidade de raccedilas no acircmbito morfoloacutegico e

comportamental com o fim de examinar se alguns dos efeitos sobre o

comportamento provecircm de fatores atuantes na morfologia de modo concomitante ndash

razatildeo porque ela sugere natildeo haver conexotildees diretas nessa nova abordagem com os

trabalhos cientiacuteficos publicados anteriormente que representam uma tradiccedilatildeo cujo

fim se deu nos anos oitenta Acrescenta que isto explica o porquecirc de os trabalhos

anteriores a essa nova abordagem serem por vezes tatildeo pouco citados embora natildeo

desprezados pelo fato de trazerem contribuiccedilotildees importantes

Nesse acircmbito aleacutem da ordem Carnivora da qual os catildees fazem parte outras

ordens da classe Mammalia tecircm recebido algum destaque nas uacuteltimas deacutecadas tais

como Proboscidea Cetacea e Primates149 e inclusive certas aves em especial os

passeriformes da famiacutelia corvidae150 Esses animais apresentam alta complexidade

em seus atos e processos cognitivos observados em suas interaccedilotildees com os

demais membros dos grupos em que vivem com outros grupos da mesma espeacutecie

com presas e predadores e outros animais com os quais estabelecem associaccedilotildees

etc aleacutem dos observados em suas interaccedilotildees com os entes humanos

Por cogniccedilatildeo assim entende Shettleworth151

Cogniccedilatildeo se refere aos mecanismos pelos quais os animais adquirem processam armazenam e agem em relaccedilatildeo agrave informaccedilatildeo do ambiente Isso inclui percepccedilatildeo aprendizagem memoacuteria e tomada de decisatildeo O estudo de cogniccedilatildeo comparada eacute portanto relacionado com o modo como os

148

FEUERBACHER 2011 149

LOCKE 2013 GRIFFIN 1994 p 106 209 211-232 239 258 MCINTYRE 2002 p 31 COREN 2006 passim

150 EMERY 2006

151 SHETTLEWORTH 2010

47

animais processam informaccedilatildeo a comeccedilar por como a informaccedilatildeo eacute adquirida pelos sentidos

152

Ao que se pode agregar o que diz Dyer

Uma abordagem cognitiva do comportamento garante um papel causal importante para mecanismos internos em que dados sensoriais satildeo organizados para formar representaccedilotildees mais ou menos detalhadas de eventos e relaccedilotildees no mundo exterior

153

Maturana e Varela explicam que

[] o sistema nervoso participa dos fenocircmenos cognitivos de duas maneiras complementares relacionadas com seu modo particular de operaccedilatildeo como uma rede neural com clausura operacional e como parte de um sistema metacelular A primeira e mais oacutebvia se daacute pela ampliaccedilatildeo do domiacutenio de estados possiacuteveis do organismo resultado da enorme diversidade de configuraccedilotildees sensoacuterio-motoras que o sistema nervoso permite e que eacute a chave de sua participaccedilatildeo no funcionamento do organismo A segunda ocorre quando se abrem para o organismo novas dimensotildees de acoplamento estrutural tornando-lhe possiacutevel associar uma grande diversidade de estados internos agrave diversidade de interaccedilotildees de que participa A presenccedila ou ausecircncia do sistema nervoso eacute o que determina a descontinuidade existente entre organismos com uma cogniccedilatildeo relativamente limitada e aqueles capazes de uma diversidade em princiacutepio ilimitada como o homem

154

E uma vez que o aacutepice do processo cognitivo eacute a expressatildeo da inteligecircncia

Gallegos155 a descreve com base principalmente em alguns trabalhos de Vigostky

Pavlov e Luria em criacutetica agrave hipoacutetese supramencionada de Gardner como ldquo[] uma

construccedilatildeo unitaacuteria mas natildeo uniacutevoca indissoluvelmente ligada ao pensamento que

manteacutem relaccedilotildees sistecircmicas com diversas formas de atividade psiacutequicardquo156

Ele distingue-a de outras funccedilotildees da psique dentre as quais cita percepccedilatildeo

memoacuteria pensamento e linguagem afirmando que a inteligecircncia eacute uma construccedilatildeo

teoacuterica e que por isso ela parece ser uma propriedade do pensamento ndash o qual no

homem eacute capaz de estabelecer relaccedilotildees por meio de operaccedilotildees caracterizadas por

152

ldquoCognition refers to the mechanisms by which animals acquire process store and act on information from the environment These include perception learning memory and decision-making The study of comparative cognition is therefore concerned with how animals process information starting with how information is acquired by the sensesrdquo SHETTLEWORTH 2010 p 4

153 ldquoA cognitive aproach to behavior grants an important causal role to internal mechanisms

whereby sensory data are organized to form more or less detailed representations of events and relationships in the outside worldrdquo DYER 1994 p 66

154 MATURANA VARELA 1995 p 201-202

155 GALLEGOS 2013

156 ldquo[] la inteligencia es un constructo unitario pero no uniacutevoco indisolublemente ligado al

pensamiento que mantiene relaciones sisteacutemicas con diversas formas de actividad psiacutequicardquo Ibid

48

discriminar generalizar e categorizar ndash e natildeo algo que exista por si razatildeo pela qual

se pode dizer que os animais natildeo humanos pensam e a eles pode-se atribuir

inteligecircncia Mas a inteligecircncia diz possui certa funccedilatildeo que caracteriza como

adaptativa

[] jaacute que permite modificar nossa conduta em funccedilatildeo da valoraccedilatildeo dos resultados obtidos Esta valoraccedilatildeo pode ser um simples mecanismo de associaccedilatildeo entre estiacutemulos e respostas assim como um complexo processo de anaacutelise e siacutentese

157

No homem esse processo que nele e nos animais encontra seu substrato

material nos processos neurais de anaacutelise e siacutentese descritos por Pavlov e que se

estrutura de um modo particular em cada indiviacuteduo eacute muito mais desenvolvido

dando-se em contextos soacutecio-culturais e por meio da linguagem a qual sob a

perspectiva vigotskyana faraacute a mediaccedilatildeo da internalizaccedilatildeo de toda funccedilatildeo

psicoloacutegica que tem origem externa e prossegue confere agrave mente humana a

capacidade de abstraccedilatildeo de compreender natildeo somente os sinais de natureza

sensorial mas como diz sinais de sinais por anaacutelise e siacutentese de sinais

Deste modo afirma a inteligecircncia predomina sobre o instinto no homem ao

passo que no animal o instinto predomina sobre a inteligecircncia

Gallegos conclui levantando a hipoacutetese de que a inteligecircncia seria um produto

do ceacuterebro em seu todo em que

[] os loacutebulos preacute-frontais como terceira unidade funcional podem exercer uma funccedilatildeo organizadora codificadora e sinalizadora da informaccedilatildeo enquanto que os loacutebulos occipital temporal e parietal como segunda unidade funcional realizam funccedilotildees de integraccedilatildeo

158

E diz tambeacutem Griffin

[] processos cognitivos possuem dentre outros atributos representaccedilotildees incluindo memoacuterias expectativas e antecipaccedilotildees Realizam-se combinaccedilotildees internas dessas representaccedilotildees para que resultem em decisotildees e classificaccedilotildees de objetos em relaccedilatildeo a desejos e crenccedilas Ou seja os animais querem algumas coisas temem outras esperam que determinadas accedilotildees levem a certos resultados

159

157

ldquo[] ya que permite modificar nuestra conducta en funcioacuten de la valoracioacuten de los resultados obtenidos Esta valoracioacuten puede ser un simple mecanismo de asociacioacuten entre estiacutemulos y respuestas asiacute como un complejo proceso de anaacutelisis y siacutentesisrdquo GALLEGO 2013

158 ldquo[] los loacutebulos prefrontales como tercera unidad funcional pueden ejercer una funcioacuten

organizadora codificadora y signalizadora de la informacioacuten en tanto que los loacutebulos occipital temporal y parietal como segunda unidad funcional realizan funciones de integracioacutenrdquo Ibid

159 GRIFFIN 1994 p viii

49

E para isso muitos animais natildeo humanos possuem aptidotildees para

comunicaccedilatildeo relativamente complexas se comparadas com as humanas como o

reconhecimento de siacutembolos o uso de ferramentas a vocalizaccedilatildeo a tomada de

decisatildeo e a capacidade de improviso etc160 que naturalmente potencializam seu

desempenho na luta diaacuteria pela sobrevivecircncia aleacutem das que aparecem mediante o

conviacutevio com os entes humanos

Ilustram isto bem os relatos de Darwin de histoacuterias que ouviu ou que ele

mesmo presenciou Conta o naturalista que os macacos americanos de Rengger

receberam ovos e inicialmente quebraram-nos com pouco jeito perdendo grande

parte do conteuacutedo mas pouco depois passaram a quebraacute-los cuidadosamente sobre

uma superfiacutecie dura retirando os pedaccedilos de cascas com os dedos Em outro

episoacutedio a esses mesmos animais foram dados um objeto cortante e em outra

ocasiatildeo torrotildees de accediluacutecar em envelopes de papel nos quais foram posteriormente

inseridas vespas Os animais depois de feridos passaram a pegar o objeto com

cuidado e a aproximar os envelopes dos ouvidos antes de abrirem161 Rengger

ensinou um de seus animais a abrir um tipo de noz com uma pedra tal como fazem

os chimpanzeacutes na natureza e o macaco passou a fazer o mesmo com outras frutas

de casca dura Outro destes macacos a quem ele ensinou a abrir o fruto com um

bastatildeo passou a usar este objeto para mover objetos pesados

Darwin relata tambeacutem que ele mesmo viu um orangotango colocar um pedaccedilo

de pau em uma abertura segurar a outra extremidade e fazer do objeto uma

alavanca Conta em seguida o interessante relato de Brehm segundo o qual um

grupo de macacos gelada (Theropithecus gelada) na Abissiacutenia em conflito com

outro de babuiacutenos (Papio hamadryas) desprendia das montanhas grandes pedras

que rolavam abaixo para atingirem os adversaacuterios que fugiam ainda que depois

retornassem para travar batalha corporal Tambeacutem Brehm relata que participou de

um ataque com armas de fogo a um grupo de babuiacutenos em que estes fizeram rolar

tantas pedras da montanha que aos caccediladores natildeo restou alternativa senatildeo bater

em retirada162

Haacute tambeacutem relatos com catildees de caccedila que segundo ouviu jamais haviam

matado a caccedila ateacute entatildeo No primeiro o catildeo de caccedila de Colquhoun foi buscar dois

160

ADES 1997 TELES 2005 HERMAN 2006 MCINTYRE 2002 passim GRIFFIN 1994 passim

161 DARWIN sd a) p 30-31

162 Ibid p 34-35

50

patos atingidos nas asas mas sem conseguir trazecirc-los ao mesmo tempo matou um

e trouxe o outro vivo No seguinte contou-lhe o coronel Hutchinsson que em caso

semelhante uma perdiz foi morta e outra caiu ferida Esta ao tentar fugir foi

capturada pelo catildeo que ao deparar com a morta parou e depois de tentar trazer

ambas naquele estado sem sucesso ateacute que matou a que estava viva e entatildeo

cumpriu a tarefa163

Para aleacutem destes relatos Darwin afirma que a linguagem articulada somada

(jaacute que por exemplo o papagaio tambeacutem a tem) agrave aplicaccedilatildeo de sons

correspondentes a ideias definidas seria uma habilidade exclusiva do homem ainda

que este se expresse de modo semelhante a outros animais por voz e gesticulaccedilotildees

em expressotildees mais simples de sentimentos como dor medo e surpresa Mas a

estes atribui tambeacutem algo anaacutelogo agrave linguagem e menciona como exemplos seis

tipos de sons vocais diferentes que caracterizam comunicaccedilatildeo emocional por Cebus

azarae do Paraguai que despertam nos demais cada um reaccedilotildees equivalentes ao

som emitido e cinco tons distintos no latido de catildees que satildeo facilmente

reconheciacuteveis por criadores o da caccedila o da coacutelera o de desespero por estar preso

em algum recinto o de gozo por sair para passear e o grito de suacuteplica quando pede

para que abram a porta Destaca poreacutem as aves que aleacutem de expressarem suas

emoccedilotildees pelo canto ensinam aos descendentes os cantos de chamados entre si

que o exercitam de modo rudimentarmente parecido com o que fazem os humanos

e aponta casos de aves que na ausecircncia dos progenitores aprenderam cantos de

chamado distintos daqueles observados em sua espeacutecie164

Diz o naturalista ainda haver sentimento do belo nos animais como nas aves

que exibem suas plumagens coloridas agraves fecircmeas concluindo que tal beleza eacute

admirada por estas165 e ressalta a sociabilidade verificada em muitos deles como

na tristeza diante da separaccedilatildeo (como de filhotes de seus pais de catildees de seus

donos) caracterizada pela expressatildeo de suas emoccedilotildees como nos alertas que

alguns datildeo aos coespeciacuteficos em situaccedilotildees de perigo (como golpes com as patas no

solo que se observam em coelhos e carneiros aleacutem da vocalizaccedilatildeo destes)

inclusive com o posicionamento de uma sentinela algo verificado entre certas aves

em focas e macacos como no auxiacutelio exemplificado pela remoccedilatildeo de ectoparasitas

163

DARWIN sd a) p 31 164

Ibid p 36-37 165

Ibid p 44

51

de companheiros como fazem os macacos os cavalos etc na caccedila em grupo

realizada por predadores como o lobo e na proteccedilatildeo de outros membros do grupo

Aqui Darwin traz mais um relato envolvendo babuiacutenos da Abissiacutenia em mais

um episoacutedio que lhe contou Brehm no qual os macacos que natildeo estavam na

montanha foram atacados pelos catildees de caccedila quando entatildeo machos mais velhos

desceram para socorrer os companheiros Havia restado somente um filhote que ao

ver-se cercado pelos catildees foi socorrido e carregado por apenas um dos maiores

machos do grupo Os catildees surpreendidos pelo gesto deste natildeo se moveram166

Vale mencionarmos ainda por fim os casos narrados de um pelicano de dois

ou trecircs corvos e de um galo todos cegos em situaccedilotildees distintas que eram

alimentados por seus respectivos companheiros de bando Darwin sustenta que

casos assim satildeo suficientemente raros de modo que natildeo se poderia atribuir o gesto

somente a algum instinto167

Diante desses quadros diz o pesquisador que o fato de os animais natildeo terem

faculdade de abstrair nem possuiacuterem ideias gerais natildeo configura uma barreira

intransponiacutevel entre eles e os homens168

Ades169 poreacutem aponta para as dificuldades de se compreender a inteligecircncia

e a consciecircncia nos animais em razatildeo das distinccedilotildees entre a nossa natureza e a

deles uma vez que natildeo escapamos de todo da tendecircncia de analisaacute-los ancorados

em nossas proacuteprias medidas Eis o que ele chama ldquointuiccedilatildeo antropomoacuterficardquo

Esta configuraria portanto um obstaacuteculo para a identificaccedilatildeo da chamada

teoria da mente em sua aplicaccedilatildeo no acircmbito interespeciacutefico A atribuiccedilatildeo desta aos

animais natildeo humanos foi sugerida por Premack e Woodruff que a definem assim

Ao afirmarmos que um indiviacuteduo tem uma teoria da mente estamos dizendo que o indiviacuteduo imputa estados mentais a ele mesmo e a outros (a coespeciacuteficos bem como a indiviacuteduos de outras espeacutecies) Um sistema de inferecircncias deste tipo eacute propriamente visto como uma teoria em primeiro lugar porque tais estados natildeo satildeo diretamente observaacuteveis e em segundo lugar porque o sistema pode ser usado para fazer prediccedilotildees especificamente sobre o comportamento de outros organismos

170

166

DARWIN sd a) p 52 167

Ibid p 53 168

Ibid p 32 169

ADES 1997 170

ldquoIn saying that an individual has a theory of mind we mean that the individual imputes mental states to himself and to others (either to conspecifics or to other species as well) A system of inferences of this kind is properly viewed as a theory first because such states are not directly observable and second because the system can be used to make predictions specifically about the behavior of other organismsrdquo PREMACK WOODRUFF 1978 p 515

52

Desenvolveram-se muitas pesquisas a partir desse pressuposto algumas das

quais seratildeo abordadas no corpo deste estudo

53

2 JUSTIFICATIVA

Despontam diante de tudo o que se viu ateacute aqui algumas indagaccedilotildees como

onde realmente estariam os limites entre a inteligecircncia humana e a dos demais

animais em todos esses apontamentos e segundo as mais diversas definiccedilotildees

Haveria de fato uma continuidade gradativa como defende Darwin ou haacute uma

lacuna natildeo preenchiacutevel entre a mente que abstrai e a que natildeo abstrai De que modo

esses limites se relacionam com os dois tipos baacutesicos de consciecircncia

supramencionados Seriam esses tipos tambeacutem continuamente gradativos

Uma vez que estamos lidando com problemas relacionados agrave natureza de

entes distintos isto de algum modo nos remete agrave linha de investigaccedilatildeo relacionada

ao ser ou seja agrave ontologia ou metafiacutesica que pensadores do seacuteculo passado

como Poper assumiram ter elementos vaacutelidos para o conhecimento humano no

caso testaacuteveis (ou falseaacuteveis) e em relaccedilatildeo agrave qual de um modo diferente do que

aqui se pretende fazer este mesmo pensador reconheceu a necessidade de

recorrer como algo complementar agrave ciecircncia moderna apontando para a necessidade

de haver limites bem estabelecidos entre uma e outra171

Grene por sua vez sugere que o aristotelismo poderia contribuir para a

resoluccedilatildeo de problemas filosoacuteficos na biologia como na localizaccedilatildeo de um problema

filosoacutefico de uma estrutura na natureza de um fenocircmeno no entendimento dos

fundamentos desta ciecircncia com base no conceito de eidos (que no aristotelismo-

tomismo traduz-se por ldquoformardquo mas Grene aponta para outros conceitos como

ldquoprinciacutepio organizadorrdquo ldquopadratildeo de accedilatildeo fixardquo ldquocoacutedigordquo etc) Este forneceria por

exemplo a demonstraccedilatildeo de que a proacutepria biologia natildeo poderia ser reduzida agrave fiacutesica

ou agrave quiacutemica tendo em vista que a compreensatildeo de um sistema organizado deve-se

dar considerando-se as partes enquanto organizadas no sistema e natildeo enquanto

partes isoladas172

Como se disse anteriormente Aristoacuteteles eacute considerado o pai da metodologia

cientiacutefica e deu os primeiros passos para as ciecircncias bioloacutegicas atuais mas mais

ainda apresentou aquela que provavelmente foi a primeira doutrina psicoloacutegica

aleacutem de ter sido tambeacutem provavelmente o primeiro a apresentar uma metafiacutesica

sistematizada estabelecendo com seu esquema de subalternaccedilatildeo das ciecircncias os

171

POPER 2001 p 37-40 172

GRENE 1972

54

limites na divisatildeo das disciplinas segundo os modos de abstraccedilatildeo E com diz

Anthony Kenny173 se a fiacutesica a quiacutemica e a biologia de Aristoacuteteles encontram

espaccedilo hoje somente na histoacuteria das ideias a eacutetica a epistemologia a metafiacutesica e

a filosofia da mente aristoteacutelicas continuam integrando os estudos filosoacuteficos ndash e

Kenny sugere que continuaratildeo a fazecirc-lo de modo perene

Aristoacuteteles nasceu em Estagira por volta de 384 e 383 aC e aos vinte anos

viajou para Atenas onde ingressou na Academia de Platatildeo onde permaneceu por

cerca de vinte anos Apoacutes a morte de Platatildeo foi para Assos na Aacutesia Menor onde

fundou com outros platocircnicos uma Escola e permaneceu por trecircs anos deslocando-

se em seguida para Mitilene Dali foi chamado por Filipe da Macedocircnia para educar

Alexandre e alguns anos depois retornou para Atenas onde comprou as edificaccedilotildees

para fundar sua Escola tambeacutem chamada Liceu ou Periacutepato de onde sairia a maior

parte de sua produccedilatildeo Morreu em 322 aC no exiacutelio em Caacutelcis apoacutes ser envolvido

como reacuteu na morte de Alexandre174

Dentre os seus principais comentadores destaca-se Santo Tomaacutes de Aquino

considerado o maior dos filoacutesofos teoacutelogos medievais cujos escritos segundo

Broadie

[] estatildeo sendo cada vez mais estudados por membros da vasta comunidade filosoacutefica e suas ideias vecircm sendo trabalhadas nos debates filosoacuteficos atuais nos campos da loacutegica loacutegica filosoacutefica da metafiacutesica da epistemologia da filosofia da mente da filosofia moral e da filosofia da religiatildeo

175

O pesquisador menciona ainda que os escritos tomistas vecircm sendo aplicados

cada vez mais fora do ambiente eclesiaacutestico inclusive na filosofia do direito o que se

daacute por exemplo em razatildeo de seu notaacutevel conhecimento em relaccedilatildeo agraves leis naturais

exposto na Summa Theologiae de modo diz completo e detalhado176

Kenny177 tambeacutem menciona esse interesse crescente em sua obra entre

cristatildeos e natildeo cristatildeos impressionados com seu gecircnio filosoacutefico inclusive por ter

sido muito pouco explorada nos seacuteculos anteriores ao que atribui dois motivos O

primeiro eacute a sua dimensatildeo Ele fornece dados correspondentes a nada menos que

173

KENNY 1994 p 5 174

REALE ANTISERI 2003 p 187-189 175

[] are increasingly studied by members of the wider philosophical community and his insights put to work in present-day philosophical debates in the fields of philosophical logic metaphysics epistemology philosophy of mind moral philosophy and the philosophy of religion BROADIE 1995 p 43

176 BROADIE 1995 p 47

177 KENNY 1994 p 10-12

55

uma produccedilatildeo de 8686577 palavras em menos de cinquenta anos considerando-

se somente os escritos comprovadamente autecircnticos (se se inclui os escritos de

autoria duvidosa a obra chega a cerca de onze milhotildees de palavras) e estima que

em seu ano mais produtivo Tomaacutes de Aquino tenha produzido cerca de trecircs milhotildees

de palavras o que faz com que sejam plausiacuteveis os testemunhos de que sua

produccedilatildeo se dava por ditado simultaneamente dentro de um periacuteodo a diferentes

secretaacuterios

O outro motivo que Kenny afirma para a pouca atenccedilatildeo que a produccedilatildeo

tomista recebeu nos seacuteculos que seguiram seu surgimento foi a falsa ideia de que

sua integridade filosoacutefica estaria comprometida pela fidelidade de Santo Tomaacutes agrave

ortodoxia de sua religiatildeo Mas Kenny o defende justamente ao apontar que como

profundo conhecedor da filosofia aristoteacutelica tomou o devido cuidado para fazer as

devidas distinccedilotildees entre aquilo em que acreditava enquanto teoacutelogo o que era

objeto de suas investigaccedilotildees teoloacutegicas e aquilo em que acreditava enquanto

filoacutesofo o que era objeto de suas investigaccedilotildees filosoacuteficas

Tomaacutes de Aquino nasceu em Roccasecca sul do Laacutecio no ano de 1221 Foi

educado em Montecassino e em Naacutepoles onde entrou para a ordem dominicana

contrariando seus familiares Em Colocircnia teve como mestre Alberto Magno o

precursor do aristotelismo no ocidente medieval e que tambeacutem realizou

investigaccedilotildees sobre os animais Foi entatildeo convidado para lecionar na Universidade

de Paris onde obteve o tiacutetulo de magister em teologia e uma caacutetedra Passou pelas

principais universidades do continente falecendo em Liatildeo em 1274 aos 53 anos de

idade178

O pensamento de Aristoacuteteles e Tomaacutes de Aquino expresso em algumas

disciplinas como a metafiacutesica e a fiacutesica partem de princiacutepios semelhantes de

fundamentaccedilatildeo empiacuterica desde aqueles considerados evidentes ou seja que

prescindem de demonstraccedilatildeo e desenvolvem-se de modo muito similar segundo a

epistemologia aristoteacutelica o que justifica o emprego do termo ldquoaristotelismo-

tomismordquo Esses princiacutepios expressam relaccedilotildees cujos conceitos satildeo fundamentais

para a compreensatildeo desta doutrina a qual se enquadra no chamado ldquorealismo

moderadordquo que segundo Reale e Antiseri ldquorecorre ao poder de abstraccedilatildeo do

178

REALE ANTISERI 2005 p 211-212

56

intelecto para explicar os universaisrdquo179 cuja apreensatildeo eacute o elemento central que

distingue os homens dos demais animais

Segundo as investigaccedilotildees filosoacuteficas sob a oacuteptica aristoteacutelico-tomista grosso

modo esses demais animais seriam dotados de uma potecircncia estimativa que serve

como meio de orientaccedilatildeo para o alcance dos fins aos quais estaacute ordenada a sua

natureza sensitiva Mas ainda que eles possam distinguir entre os entes e percebam

caracteriacutesticas que lhes satildeo proacuteprias natildeo chegariam a ser tal como os humanos

em que essa potecircncia estimativa eacute mais desenvolvida e por isso chamada

cogitativa dotados de intelecto Seu ato cognitivo estaria restrito agraves potecircncias dos

sentidos internos

A pesquisadora doutora e professora da St Johnrsquos University Marie I George

aponta que nesse campo o aristotelismo-tomismo tem recebido pouca ou nenhuma

atenccedilatildeo180 Ela analisou alguns casos como a identificaccedilatildeo de formato cor e

material de um objeto pelo papagaio Alex o processo para um macaco chegar ao

uso de um graveto como instrumento para retirada de alimento em um orifiacutecio menor

que seu dedo e o ensino de comunicaccedilatildeo por lexigramas e linguagem de sinais

fornecendo explicaccedilotildees como diz mais econocircmicas pelas quais aponta as

associaccedilotildees dos sentidos e natildeo algo que implicaria intelecccedilatildeo tal como o entende o

aristotelismo-tomismo A pesquisadora aponta entatildeo a necessidade de distinguir a

fronteira entre o pensar e o sentir (pelos sentidos) para chegar-se aos devidos

criteacuterios para anaacutelise das diferenccedilas entre o ente humano e os animais natildeo humanos

nesse sentido e indica que a maior dificuldade que enxergou nesse tipo de pesquisa

eacute o entendimento insuficiente do que seriam os sentidos internos e de seu papel nas

habilidades cognitivas desses animais Isto defende leva tanto a tentativas forccediladas

de explicar somente pelo instinto as habilidades como as citadas logo acima como agrave

atribuiccedilatildeo equivocada a esses animais da capacidade de inteligir

Isto que se acaba de dizer seraacute desenvolvido neste trabalho que natildeo tem a

pretensatildeo de ser mais do que mais uma etapa mais uma contribuiccedilatildeo para o

desenvolvimento de futuras pesquisas nessa linha

179

REALE ANTISERI 2005 p 215 180

GEORGE 2003

57

3 MEacuteTODOS E OBJETIVOS

Buscaremos na obra de Aristoacuteteles e na de Santo Tomaacutes de Aquino um

nuacutemero suficiente de informaccedilotildees que deveremos reunir aqui a fim de construirmos

a partir de seus pressupostos metafiacutesicos ndash que se fundamentam naquilo que eacute

evidente ou seja cuja apreensatildeo eacute sempre imediata sem necessidade de

demonstraccedilatildeo ndash sua doutrina psicoloacutegica mas tanto de um modo voltado para que

tentemos identificar limites ali propostos entre a inteligecircncia humana e a inteligecircncia

animal entre o sensiacutevel e o intelectivo como a fim de fornecermos elementos para

uma construccedilatildeo posterior integral dessa doutrina que se encontra espalhada pela

obra de ambos os autores uma vez que ao menos ateacute o presente natildeo encontramos

nenhum trabalho que apresente tal estudo

Recorreremos ainda a comentadores do aristotelismo-tomismo somente

quando e se houver necessidade de buscarmos direcionamento e eventuais

informaccedilotildees complementares que se mostrem relevantes para a concretizaccedilatildeo dos

objetivos estabelecidos

Buscaremos assim possiacuteveis respostas para questotildees como as que

levantamos mais acima e para um exame mais acurado percorreremos em seguida

uma seacuterie de trabalhos publicados nas uacuteltimas deacutecadas envolvendo pesquisas nas

disciplinas comparadas que atualmente se ocupam dos processos cognitivos como

a Etologia Cognitiva a Ecologia Comportamental e a Psicologia Comparada e

apontam para manifestaccedilotildees de inteligecircncia nos animais

Diz Mackintosh que

[] natildeo haacute uma coisa singular denominada inteligecircncia que certamente natildeo podemos classificar os animais pela sua posse da inteligecircncia Eacute muito mais profiacutecuo conceber a inteligecircncia como um arranjo diferenciado ou heterogecircneo de processos operaccedilotildees e habilidades

181

Nessa esteira Deacon182 apontou uma seacuterie de questotildees pertinentes sobre a

associaccedilatildeo entre o niacutevel das habilidades mentais e o tamanho cerebral como a falta

de consenso que haacute entre o tamanho absoluto e o tamanho relativo do ceacuterebro e a

possibilidade de haver fatores como variaacuteveis em razatildeo da multiplicidade de

operaccedilotildees do ceacuterebro e do fato de estas natildeo estarem distribuiacutedas de modo

181

MACKINTOSH 1997 p 34-35 182

DEACON 1997 p 146-148

58

uniforme do que questiona por exemplo como as diferenccedilas relacionadas ao

tamanho e agraves partes do ceacuterebro poderiam influenciar as operaccedilotildees deste Mas

corrobora que natildeo haacute duacutevida de que exista correlaccedilatildeo entre as capacidades de um

ceacuterebro e o seu tamanho

Nesse acircmbito da alometria Jerison propocircs o quociente de encefalizaccedilatildeo

(EQ)183 que eacute ldquoa razatildeo entre o tamanho real do ceacuterebro e o tamanho esperado do

ceacuterebro []rdquo que ldquoeacute um tipo de lsquomeacutediarsquo[] que leva em conta o tamanho do corpordquo184

Alguns trabalhos recentes tambeacutem corroboram a relaccedilatildeo entre inteligecircncia e volume

cerebral como o de Street e colaboradores185 que confirma a relaccedilatildeo entre o

volume cerebral e a chamada inteligecircncia social em primatas e o de Gignac e

colaboradores186 que reforccedila a relaccedilatildeo entre inteligecircncia e volume cerebral no

acircmbito intraespeciacutefico em estudos envolvendo humanos

Daremos aqui maior enfoque ndash sem desprezar as criacuteticas a esta perspectiva

mas porque precisamos de um referencial para o desenvolvimento do que

reiteramos eacute somente a etapa de um processo ndash portanto a algumas das

habilidades dos corviacutedeos e em especial dos membros da classe Mammalia que

destacamos anteriormente com maior relaccedilatildeo entre volume cerebral e tamanho

corporal e cuja estrutura neural mais parece aproximar-se da humana pertencentes

agraves ordens Proboscidea que apresentam o maior volume cerebral dentre os animais

terrestres Cetacea que apresenta o maior volume cerebral dentre todos os animais

e o maior quociente de encefalizaccedilatildeo depois do homem da qual abordaremos a

famiacutelia Delphinidae Primates com destaque para os grandes macacos por sua

proximidade com os humanos por exemplo dentro daquilo que hoje se conhece por

escala filogeneacutetica mas sem deixar de levar outros grupos em conta como os

membros da subfamiacutelia Cebinae por seu elevado quociente de inteligecircncia187 e

Carnivora ndash aqui especialmente a subespeacutecie Canis lupus familiaris da famiacutelia

Canidae por sua convivecircncia milenar com os humanos Tentaremos ainda esboccedilar

uma listagem dessas habilidades com o fim de facilitar os nossos propoacutesitos

Com o objetivo de verificarmos a compatibilidade do aristotelismo-tomismo

visando a corroborar a proposta de que esta corrente poderia contribuir com o

183

ldquoEncephalization quotientrdquo 184

ldquo[] the ratio of actual brain size to expected brain size [] is a kind of lsquoaveragersquo[] that takes body size into accountrdquo JERISON 1973 p 61

185 STREET et al 2017

186 GIGNAC et al 2017

187 ROTH DICKE 2005

59

avanccedilo das investigaccedilotildees que tocam agrave inteligecircncia dos animais o que eacute nosso

objetivo central e inclusive a outros campos afins levantaremos algumas relaccedilotildees

entre as habilidades descritas nesses estudos e a descriccedilatildeo aristoteacutelico-tomista das

potecircncias estimativa cogitativa e intelectiva a fim de testarmos se a visatildeo

aristoteacutelico-tomista estaria em consonacircncia com as hipoacuteteses mais consistentes com

os resultados das pesquisas realizadas sobretudo nas uacuteltimas deacutecadas buscando

interpretaccedilotildees possiacuteveis do resultado agrave luz daquela doutrina seguindo o modelo de

anaacutelise com algumas pequenas diferenccedilas estruturais apresentado no trabalho

supracitado da professora doutora Marie George e tambeacutem no de Koacutevac e

Mather188 que realizaram um breve estudo da cogniccedilatildeo sob a perspectiva do

aristotelismo-tomismo analisando simultaneamente a chamada inteligecircncia dos

cefaloacutepodes

Por fim percorreremos o histoacuterico apresentado anteriormente a fim de

forneceremos mais algumas sugestotildees para futuras investigaccedilotildees que poderatildeo

aclarar se as divergecircncias conceituais em torno dos principais termos que

apresentamos ateacute aqui como ldquointeligecircnciardquo encontram-se por exemplo no fato de

os pesquisadores empregarem um mesmo termo para denominar objetos distintos

ou se apontam para aspectos distintos isolados ou em conjunto de um mesmo

objeto ou se haacute outras explicaccedilotildees para as divergecircncias apontadas acima

188

KOacuteVAC MATHER 2008

60

4 RESULTADOS E DISCUSSAtildeO

41 UMA CONSTRUCcedilAtildeO PARA A PSICOLOGIA ARISTOTEacuteLICO-TOMISTA

411 A subalternaccedilatildeo das ciecircncias

Aristoacuteteles identifica trecircs ramos da filosofia teoreacutetica a fiacutesica a matemaacutetica e

a metafiacutesica ou filosofia primeira Estas ciecircncias que versam sobre os universais

(em oposiccedilatildeo aos singulares) subalternam-se segundo seu modo de abstraccedilatildeo Diz

ele no livro VI da Metafiacutesica

[] a fiacutesica refere-se agraves realidades separadas mas natildeo imoacuteveis algumas das ciecircncias matemaacuteticas referem-se a realidades imoacuteveis poreacutem natildeo separadas mas imanentes agrave mateacuteria ao contraacuterio a filosofia primeira refere-se agraves realidades separadas e imoacuteveis

189

Essas realidades separadas segundo Reale referem-se agravequilo que existe

ldquopor sirdquo ou que eacute capaz ldquode subsistir por sua proacutepria conta sem precisar inerir em

outrordquo190

Assim enquanto os sujeitos das ciecircncias fiacutesicas e matemaacuteticas satildeo algum

gecircnero particular de ente a metafiacutesica lida com o ente em comum bem como um

ente qualquer particular enquanto ente

Tomaacutes de Aquino define ldquoenterdquo como toda e qualquer coisa na medida em

que eacute una191 e fala de duas maneiras pelas quais se pode compreendecirc-lo

[] a primeira divide-se em dez gecircneros192

a segunda significa a verdade das proposiccedilotildees A diferenccedila destes dois sentidos estaacute em que no segundo pode chamar-se ente tudo aquilo de que uma proposiccedilatildeo afirmativa pode ser formada mesmo que tal natildeo ponha nada na realidade Assim eacute que as privaccedilotildees e as negaccedilotildees podem-se chamar entes De fato dizemos que a afirmaccedilatildeo se opotildee agrave negaccedilatildeo e que a cegueira estaacute no olho No primeiro sentido poreacutem soacute pode-se chamar ente o que potildee alguma coisa na realidade Assim eacute que a cegueira e outras privaccedilotildees ou negaccedilotildees deste tipo natildeo satildeo entes [] a essecircncia eacute tirada de ente no primeiro sentido

193

189

ARISTOacuteTELES 2005 1026a p 271-273 190

REALE 2005 p 307 191

TOMAacuteS DE AQUINO 2012 Q XI p 239 192

As categorias tema que se veraacute adiante 193

TOMAacuteS DE AQUINO 2003b p 53

61

Explica ainda o Aquinate194 que enquanto os entes naturais tecircm suas

espeacutecies na mateacuteria sensiacutevel os entes matemaacuteticos que exemplificam essa

segunda maneira as tecircm na mateacuteria inteligiacutevel As qualidades sensiacuteveis tecircm seu

fundamento na quantidade que inere na substacircncia e quando na mente elas satildeo

removidas o que resta eacute a quantidade contiacutenua A diferenccedila entatildeo que haacute entre a

quididade ou essecircncia de um ente natural e a de um ente matemaacutetico estaacute na

distinccedilatildeo entre respectivamente a mateacuteria que eacute submetida a uma conformaccedilatildeo de

qualidades sensiacuteveis atualizada por uma forma natural e a mateacuteria atualizada por

certa forma que se coloca sobre certa quantidade ndash a saber os entes matemaacuteticos

ndash exemplificados pelas figuras geomeacutetricas bidimensionais

A metafiacutesica eacute assim e por sua vez a ciecircncia universal que estuda o ente e

natildeo soacute o ente mas tambeacutem o ser (cuja definiccedilatildeo se veraacute adiante) enquanto ente e

ser bem como os atributos que lhes satildeo inerentes enquanto ente e ser

respectivamente Eacute ela que por tratar dos princiacutepios e das causas dos entes

forneceraacute axiomas para as ciecircncias matemaacuteticas que natildeo podem ser explicados

pelas proacuteprias ciecircncias matemaacuteticas que podem no maacuteximo os pressupor e o

mesmo se daacute com as ciecircncias fiacutesicas que possuem axiomas que soacute podem ser

fornecidos pelas ciecircncias matemaacuteticas ou pela metafiacutesica

194

TOMAacuteS DE AQUINO 2000 L III l 8 707-708

62

5 CONCEITOS FUNDAMENTAIS DO ARISTOTELISMO-TOMISMO

51 ATO E POTEcircNCIA

Comeccedila assim Tomaacutes de Aquino seu estudo sobre os princiacutepios da natureza

ldquoHaacute coisas que podem existir e natildeo existem e haacute coisas que jaacute existem Chama-se

ser em potecircncia ao que pode existir e natildeo existe e ser em ato ao que jaacute existerdquo195

Segundo a relaccedilatildeo entre potecircncia e ato todo ente que venha a existir ou seja que

venha a atualizar-se estaacute previamente em potecircncia Esta eacute limitada pela natureza da

coisa uma vez que como diz adiante o Aquinate ldquonenhuma coisa pode receber

uma potecircncia para agir que natildeo compita a ela mas antes a outra coisa a natildeo ser

que sua proacutepria natureza seja modificadardquo196 E assim tudo o que estaacute em potecircncia

deve estar na relaccedilatildeo correspondente a quando estaacute em ato197

No momento em que a coisa em si vem agrave existecircncia possui certo nuacutemero de

outras potecircncias que poderatildeo ou natildeo tornar-se ato Dentre estas se encontram as

que estatildeo entre a potecircncia e o ato ou seja em haacutebito e que satildeo assim definidas

pelo mesmo Tomaacutes de Aquino ldquosatildeo perfeiccedilotildees pelas quais as potecircncias se

encontram de certa maneira com respeito agraves coisas em virtude das quais elas

existem isto eacute com respeito aos seus objetosrdquo198

Portanto se toda potecircncia eacute determinada pelo ato ao qual ela estaacute ordenada

nenhum ente pode por si ir aleacutem nem das potecircncias que lhe satildeo inerentes nem

das que lhe satildeo acrescidas pela relaccedilatildeo com o meio circundante E se por seus atos

se distinguem as potecircncias ou seja se eacute o ato que define a potecircncia se eacute mediante

aquele que se conhece esta ndash e portanto eacute segundo a diversidade dos atos que se

diversificam as potecircncias ndash os atos por sua vez se distinguem por seus objetos

mediante estes tomando a espeacutecie destes que satildeo deste modo anteriores

agravequele199

O agente que concorrentemente opera para que uma potecircncia venha a ato

tem natureza extriacutenseca eacute a sua causa eficiente E diz ainda Santo Tomaacutes que

ldquoquanto mais uma potecircncia dista do ato tanto maior eacute o poder de que carece para

195

TOMAacuteS DE AQUINO 2003a p 19 196

Id 2012 Q XXI p 421 197

Id 2009 p 85 198

Id 2012 Q XIII p 279 199

Ibid Q XVI p 343 Id 2000 I L 6 111

63

ser conduzida ao atordquo200 A potecircncia assim eacute anterior ao ato ao qual ela se ordena

mas em outro sentido ela soacute pode-se tornar ato mediante a accedilatildeo de um agente em

ato (essa causa eficiente) e nesse acircmbito eacute correto dizer que o ato e a operaccedilatildeo

satildeo anteriores a ela Toda operaccedilatildeo que traraacute o ato de uma potecircncia pode ser um

princiacutepio de accedilatildeo a potecircncia ativa ou um princiacutepio de paixatildeo a potecircncia passiva

Naquela o objeto relacionado ao ato agrave operaccedilatildeo eacute efeito fim nesta o objeto eacute

causa princiacutepio201

52 ESSEcircNCIA E ACIDENTE

Prossegue Santo Tomaacutes em sua introduccedilatildeo ao estudo dos princiacutepios da

natureza

Por outro lado haacute duas espeacutecies de ser o ser essencial ou substancial202

de uma coisa por exemplo ser um homem e isto eacute o ser considerado em si mesmo e o ser acidental como eacute o caso de o homem ser branco e isto eacute o ser considerado sob relaccedilatildeo particular

203

E em sua explicaccedilatildeo sobre os dois modos de compreensatildeo a respeito do

ente diz

E porque aquilo pelo qual uma coisa eacute constituiacuteda no proacuteprio gecircnero ou espeacutecie eacute o que eacute significado pela definiccedilatildeo indicando o que eacute a coisa daiacute concluiacuterem os filoacutesofos que o nome da essecircncia eacute mudado para quididade Isto eacute tambeacutem o que o Filoacutesofo frequentemente chama o que era ser qualquer coisa isto eacute aquilo por que alguma coisa tem de ser uma coisa qualquer Chama-se-lhe tambeacutem forma na medida em que pela forma eacute significada a certeza de cada coisa Tambeacutem isto se chama por outro nome natureza no sentido de que se chama natureza a tudo o que pode de algum modo ser apreendido pela inteligecircncia pois uma coisa soacute eacute inteligiacutevel mediante a sua definiccedilatildeo e essecircncia a palavra natureza assim entendida parece significar a essecircncia da coisa segundo a qual eacute ordenada agrave sua operaccedilatildeo proacutepria pois nenhuma coisa perde a operaccedilatildeo proacutepria enquanto a palavra quididade proveacutem do facto de ser significada pela defini-ccedilatildeo Chama-se-lhe poreacutem essecircncia enquanto eacute por ela e eacute nela que o

ente possui o ser204

Para o aristotelismo-tomismo assim todo ente tangiacutevel caracteriza-se por sua

essecircncia e seus acidentes Por essecircncia entende-se o que haacute de mais fundamental

200

TOMAacuteS DE AQUINO 2006 p 119 201

Id 2000 L II l 6 304-305 202

A diferenccedila entre essecircncia e substacircncia que Aristoacuteteles afirma ser um gecircnero do ente e atribui agrave mateacuteria agrave forma e ao composto eacute simplesmente de perspectiva como se veraacute em seguida ARISTOacuteTELES 2010 II 1 p 61

203 TOMAacuteS DE AQUINO 2003a p 19

204 Id 2003b p 54-55

64

mais elementar e particular aquilo que determina que tal ente eacute o que eacute e natildeo outra

coisa e que estaacute de maneira proacutepria e verdadeiramente na substacircncia e por

acidente tem-se os elementos que podem ser modificados sem que haja corrupccedilatildeo

da essecircncia que nele estaacute de maneira relativa e de certo modo205

Adotando-se a perspectiva de que a essecircncia seja o substrato de tudo aquilo

que acidentalmente participe do ente recebe ela o conceito de ldquosubstacircnciardquo

Aristoacuteteles classifica-a como ldquosubstacircncia primeirardquo e ldquosubstacircncia segundardquo A

primeira diz respeito agrave mateacuteria que eacute tudo o que estaacute em potecircncia para ser

substancial (ldquomateacuteria de que eacute feitardquo ou mateacuteria propriamente dita) ou para ser

acidental (ldquomateacuteria em que se atualizardquo ou o que o Aquinate chama ldquosujeitordquo)206 e

por ser ldquoum sujeito primeiro que natildeo existe em outrordquo natildeo sendo ldquoparticipaacutevel por

muitosrdquo207 determina a individualidade de cada ente sensiacutevel que natildeo decorre de

nenhuma outra categoria sendo limitada por parte de seu proacuteprio ser e pela

segunda208 a forma que sendo uma finalizaccedilatildeo209 faz existir em ato todos os

seres substanciais e acidentais210 Esta procede da potecircncia da mateacuteria por

educcedilatildeo211 Eacute um princiacutepio que se refere agrave espeacutecie e ao gecircnero os uacutenicos predicados

que expressam a substacircncia primeira tratando-se portanto no acircmbito sensiacutevel de

multiplicidade de universalidade Assim aponta Angioni a substacircncia primeira tem

como particularidade o fato de que ela ldquonatildeo pode ser dita de um subjacenterdquo ao

passo que a segunda tem como particularidade o fato de que ldquopode ser dita de um

subjacenterdquo e assim a substacircncia caracteriza-se como tal por natildeo estar em um

subjacente212

A espeacutecie implica tudo o que existe no indiviacuteduo de maneira indistinta e

assim o gecircnero implica em seu significado tudo o que existe na espeacutecie Esta eacute

ideterminada em relaccedilatildeo ao indiviacuteduo e eacute afirmada dele como o gecircnero o eacute da

espeacutecie (da mesma forma que esta adquire a predicaccedilatildeo da diferenccedila213) e

indeterminado em relaccedilatildeo a ela e do indiviacuteduo mas tomado a partir da mateacuteria (mas

205

TOMAacuteS DE AQUINO 2003b p 55 206

Id 2003a p 19-20 Id 1949 Q 1 R 1 p 16 207

Id 2009 p 145 208

Id 2006 p 91 209

Id 2000 L II l 1 215 210

Id 2003a p 21 211

Id 2009 p 83-85 212

ANGIONI 1998 p 74 ARISTOacuteTELES 1965 2a p 31 213

TOMAacuteS DE AQUINO 2006 p 83

65

natildeo a mateacuteria prima)214 Ou seja assim como a forma eacute limitada ao indiviacuteduo em

razatildeo da mateacuteria o gecircnero estaacute limitado a uma espeacutecie por uma forma com mais

determinaccedilatildeo que eacute da qual o gecircnero obteacutem a diferenccedila que o contrairaacute na espeacutecie

da qual se predica215 Assim o define Aristoacuteteles ldquogecircnero significa o constitutivo

primeiro das definiccedilotildees contido na essecircnciardquo e diz que desse mesmo gecircnero ldquoas

qualidades satildeo diferenccedilasrdquo216

Como a forma a espeacutecie e o gecircnero a diferenccedila significa o todo como uma

denominaccedilatildeo oriunda da forma determinada (e assim diferentemente do gecircnero a

mateacuteria determinada natildeo eacute considerada em seu primeiro conceito)217

Portanto a espeacutecie eacute substrato do gecircnero uma vez que este eacute afirmado a

partir daquela sem que se decirc o oposto o que faz com que ela seja ldquomais

substacircnciardquo do que ele218 Ademais se a forma eacute uma universalidade os diversos

sujeitos que participam de uma mesma forma o fazem de trecircs modos por igualdade

por excesso ou por falha219

Os princiacutepios material e formal resultam no composto essencial (ou

substancial) ou tambeacutem sujeito chamado ldquosinolordquo220 que existe por si sem provir

de nada que se lhe acrescente221 Assim por substacircncia pode-se entender a

mateacuteria a forma ou o composto222 Sobre o composto ou sinolo explica o Aquinate

que o ente que ele eacute natildeo eacute nem forma nem mateacuteria ou seja constitui-se uma

terceira coisa de duas coisas ontologicamente anteriores223 que por serem

princiacutepios natildeo satildeo entes natildeo tecircm ser absoluto uma sem a outra e portanto natildeo se

fazem entes por outros iguais a eles respectivamente A forma por exemplo eacute ldquoo

teacutermino da geraccedilatildeordquo e natildeo eacute algo por outra forma224 Ela eacute ativa atualiza o ente

(move-o da potecircncia ao ato) como pertencente agrave espeacutecie por ela determinada e eacute

princiacutepio de operaccedilatildeo A mateacuteria (que em sua condiccedilatildeo mais fundamental eacute pura

potecircncia ndash e chama-se neste caso materia prima) eacute passiva recebe a forma e

entatildeo a individua sendo paciente de suas operaccedilotildees Mas soacute eacute princiacutepio de

214

TOMAacuteS DE AQUINO 2003b p 66 Id 1949 Q 1 R 9 p 20 e 25 215

Id 1949 Q 1 R 2 p 17 Ibid Q 3 Obj 3 p 44 216

ARISTOacuteTELES 2005 V 1024b p 259 217

TOMAacuteS DE AQUINO 2006 p 63-64 Id 1949 Q 1 R 24 p 25 218

ARISTOacuteTELES 1965 p 34-35 37-38 219

TOMAacuteS DE AQUINO 2006 p 131 220

REALE ANTISERI 2003 p 199 221

TOMAacuteS DE AQUINO 2003a p 20 222

ARISTOacuteTELES 2010 II 2 p 67 223

TOMAacuteS DE AQUINO 2003b p 64 224

Id 2006 p 97

66

individuaccedilatildeo a mateacuteria designada (ou materia signata quantitae) que se pode

considerar sobre certas dimensotildees e natildeo a mateacuteria sem mais natildeo designada que

eacute em potecircncia relativa agrave determinada espeacutecie considerando-se esta mesma espeacutecie

e natildeo a um indiviacuteduo dela

Eacute pois da mateacuteria designada por dimensotildees que se faz a ldquodesignaccedilatildeo do

indiviacuteduo em relaccedilatildeo agrave espeacutecierdquo e eacute pela ldquodiferenccedila constitutiva tirada pela forma da

coisardquo que se faz a ldquodesignaccedilatildeo da espeacutecie em relaccedilatildeo ao gecircnerordquo225 Portanto ldquoo

que existe na espeacutecie existe tambeacutem no gecircnero como natildeo determinadordquo226 e assim

ldquoo gecircnero significa indeterminadamente tudo o que existe na espeacutecierdquo227

A relaccedilatildeo entre a mateacuteria e a forma a ligaccedilatildeo de ambas que caracteriza o

sinolo explica Angioni natildeo eacute extrinsecamente determinada mas a partir de dentro

imanentemente pois diz ldquoeacute da proacutepria natureza da forma pocircr a necessidade de

uma mateacuteria propriamente determinadardquo228 A forma eacute princiacutepio de algo mais que

existe no composto o ser do qual a mateacuteria participa diz o Aquinate ldquopor receber a

formardquo ndash ou seja a forma daacute simpliciter229 o ser agrave mateacuteria ndash e por isso tudo o que eacute

ente eacute uno E explica

Assim o ser eacute consequente agrave proacutepria forma Natildeo obstante a forma natildeo eacute o proacuteprio ser E embora a mateacuteria natildeo alcance o ser senatildeo pela forma a forma no entanto enquanto eacute forma natildeo carece da mateacuteria para seu ser visto que o ser se segue agrave proacutepria forma apenas necessita da mateacuteria Portanto a proacutepria essecircncia da forma estaacute para o ser assim como a potecircncia estaacute para seu ato proacuteprio o proacuteprio ser eacute aquilo pelo qual algo eacute assim como a corrida eacute aquilo pelo qual algueacutem corre Portanto visto que a alma eacute certa forma subsistente por si concebe-se em sua composiccedilatildeo ato e potecircncia ndash isto eacute o ser (esse) e o que eacute (quod est) ndash sem que haja composiccedilatildeo de mateacuteria e forma

230

O ser assim eacute aquilo pelo qual algo eacute (sujeito que possui um ser

completo)231 eacute ato do todo substancial232 que atraveacutes da forma sobreveacutem agrave coisa e

de modo nenhum se separa da forma enquanto natildeo eacute nem esta nem a mateacuteria233 e

assim todas as substacircncias teratildeo seu ser limitado e confinado234 O ser eacute contraiacutedo

225

TOMAacuteS DE AQUINO 2003b p 60 226

Ibid p 61 227

Ibid p 63 228

ANGIONI 1997 p 241 229

Isto eacute ldquoem sentido absolutordquo 230

TOMAacuteS DE AQUINO 2012 Q VI p 135 231

Id 2003 p 20 232

Id 1990b L II c LIV p 256 233

Id 2006 p 89 234

Id 1949 Q 1 Obj 15 p 6

67

pelo ente que o recebe do ente ontologicamente anterior que o confere

caracterizando dois componentes presentes em todo e qualquer ente composto ldquoa

natureza da coisa que participa do serrdquo e o ldquomesmo ser que eacute participadordquo235 pelos

quais se conclui que todo composto ou sinolo apresentaraacute essencialmente dois

atos e duas potecircncias a saber o ato do ser em relaccedilatildeo agrave forma que eacute atualizada

natildeo por causa movente mas por causa influente e o ato da forma em relaccedilatildeo agrave

mateacuteria esta atualizada por causa movente e a potecircncia da mateacuteria em relaccedilatildeo agrave

forma e a da forma em relaccedilatildeo ao ser236

Portanto eacute pelo ser que se denomina ente certa substacircncia de modo que se

do composto de mateacuteria e forma pode-se dizer ldquoo que eacute (quod est)rdquo a coisa do

composto desta substacircncia mais o ser pode-se dizer ldquopelo qual eacute (quo est)rdquo a

coisa237

Nos entes inanimados exclusivamente corpoacutereos a forma eacute mais simples e

por isso se diz que tem menos ser Pode inclusive em certos casos ateacute ser

restaurada depois de desfeita238 Esta propriedade da forma enquanto princiacutepio

subsistente ou seja da forma substancial estaacute no cerne da gradaccedilatildeo entitativa da

qual se falaraacute adiante

Mas independentemente de a sua forma ter mais ou menos ser a substacircncia

natildeo eacute susceptiacutevel de mais e de menos intensidade e natildeo possui contraacuterios No

entanto ela eacute apta a receber contraacuterios como acidentes239

Haacute pois tambeacutem a forma acidental Esta eacute dependente da forma

substancial em virtude da qual ela age pois eacute meio pelo qual ela opera jaacute que natildeo

opera por si mesma (pois como diz Tomaacutes de Aquino ldquoaquilo que participa de algo

eacute segundo ele proacuteprio carente deste algordquo)240 A forma acidental confere agrave mateacuteria

235

Respectivamente ldquonatura rei quae participat esserdquo e ldquoipsum esse participatumrdquo 236

TOMAacuteS DE AQUINO 1949 Q 1 R p 15 e R 5 p 18 237

Id 1990b L II c LIV p 256 238

Eacute o caso por exemplo do misto ou de misturas de substacircncias quiacutemicas que podem ser desfeitas e em seguida reconstituiacutedas

239 ARISTOacuteTELES 1965 p 39-40

240 TOMAacuteS DE AQUINO 2006 p 87

68

secundum quid 241 o ldquoserrdquo dos acidentes242 tais como as cores e a consistecircncia e

complementa deste modo o sujeito o ente243

Assim os atributos que recebem o ser da forma acidental predicam do sujeito

per se ou predicam de outros atributos per accidens244 ou tambeacutem per se neste

caso ldquoquando as diversas formas possuem ordenaccedilatildeo entre si como quando

dizemos por exemplo que lsquoo que possui superfiacutecie eacute coloridorsquordquo Aqui o predicado

natildeo entra na definiccedilatildeo do sujeito mas daacute-se o contraacuterio como exemplifica o

Aquinate ldquoa superfiacutecie entra na definiccedilatildeo da cor assim como o nuacutemero entra na

definiccedilatildeo de parrdquo245 E nesse acircmbito as formas inerentes ou seja que satildeo inerentes

a determinado composto podem ser especiais como por exemplo o branco que

satildeo as que se alteram mediante a alteraccedilatildeo do sujeito ou gerais como a cor que

nesse caso permanece natildeo em seu ser na alteraccedilatildeo mas em seu conteuacutedo ou seja

continua havendo cor mas natildeo mais a branca246

A forma acidental portanto caracteriza os corpos artificiais que se podem

dizer substacircncia por sua mateacuteria jaacute que eacute natural uma vez que provecircm de corpos

naturais que satildeo mais substacircncia que os artificiais dos quais satildeo princiacutepios pois o

satildeo pela mateacuteria e pela forma247

Os acidentes variam conforme a diversidade dos princiacutepios que lhes satildeo

causa248 Pode-se consideraacute-los como sendo de trecircs gecircneros os proacuteprios

ldquocausados a partir dos princiacutepios da espeacutecie como a capacidade de rir no homemrdquo

os que ldquosatildeo causados a partir dos princiacutepios do indiviacuteduo porque tecircm causa

permanente no sujeito (e satildeo estes os acidentes inseparaacuteveis como lsquomasculinorsquo e

lsquofemininorsquo e similares)rdquo e os que ldquotecircm causa natildeo permanente no sujeito (e satildeo estes

os acidentes separaacuteveis como lsquosentar-sersquo ou lsquocaminharrsquo)rdquo249 E podem ser ainda

considerados em duas espeacutecies a saber os necessaacuterios presentes em qualquer

241

Ou seja ldquosegundo algordquo 242

Em verdade natildeo se pode dizer em sentido absoluto que o acidente seja ser mas que seja de um ser como explica o Estagirita na Metafiacutesica (cf ARISTOacuteTELES 2005 XII 1069a 1 23-24) o que leva Santo Tomaacutes a dizer que estas formas em rigor natildeo existem ldquomas que qualquer coisa existe por elasrdquo TOMAacuteS DE AQUINO 2009 p 77

243 Id 2001 Q 77 a 6 p 709

244 ldquoPor sirdquo e ldquopor acidenterdquo respectivamente

245 TOMAacuteS DE AQUINO 2012 Q XI p 237

246 Id 1988 art VI p 71

247 Id 2000 L II l 1 218

248 E note-se portanto que nos acidentes o gecircnero natildeo eacute tomado pela mateacuteria e a

diferenccedila natildeo eacute tomada pela forma mas ldquodo proacuteprio modo de ser segundo o qual o ente assume diversas designaccedilotildees conforme eacute anterior e posterior relativamente aos dez gecircneros de categoriasrdquo Id 2003b p 94

249 Id 2012 Q XII p 257

69

indiviacuteduo da espeacutecie natildeo se separando assim da realidade e os natildeo necessaacuterios

que podem variar entre os indiviacuteduos da espeacutecie ou separar-se da realidade250

Alguns acidentes estatildeo mais relacionados agrave forma outros agrave mateacuteria uns atingem a

mateacuteria segundo a relaccedilatildeo com a forma geral outros com uma forma especiacutefica

Uns podem ser causados segundo um ato perfeito a partir dos dois princiacutepios

essenciais outros segundo a aptidatildeo por exemplo a algo exterior251

Diz ainda o Aquinate sobre os acidentes

Todo e qualquer acidente poreacutem tem em comum natildeo ser da essecircncia da coisa e assim natildeo cai em sua definiccedilatildeo por isso podemos conceber o que uma coisa eacute sem que concebamos algo de seus acidentes Mas a espeacutecie natildeo pode ser concebida sem os acidentes consequentes ao seu princiacutepio Ela pode sim ser concebida sem os acidentes do indiviacuteduo mesmo aqueles inseparaacuteveis jaacute sem os separaacuteveis podem ser concebidos tanto a espeacutecie quanto o indiviacuteduo Ora as espeacutecies da alma satildeo acidentes enquanto propriedades Assim embora sem eles se conceba o que eacute a alma natildeo eacute possiacutevel nem inteligiacutevel que a alma exista sem eles

252

Infere-se disto outro princiacutepio a privaccedilatildeo253 ou o natildeo ser em ato o terceiro

dos trecircs princiacutepios da natureza e um dos trecircs requisitos para a geraccedilatildeo tambeacutem

junto com os princiacutepios anteriormente abordados (mateacuteria e forma) A forma provoca

a geraccedilatildeo que proveacutem da mateacuteria e da privaccedilatildeo Mateacuteria e privaccedilatildeo assim

distinguem-se somente no acircmbito da razatildeo mas natildeo no da realidade e deste modo

a privaccedilatildeo soacute pode ser considerada princiacutepio por acidente254 Portanto a mateacuteria

desprovida da forma e da privaccedilatildeo recebe o nome de ldquomateacuteria prima sem maisrdquo que

eacute pura potecircncia natildeo precedida de qualquer outra mateacuteria e por si mesma natildeo pode

ser conhecida sendo portanto una (uma vez que natildeo estaacute incluiacuteda em qualquer

estrutura que crie multiplicidade) Tomaacutes de Aquino menciona tambeacutem a ldquomateacuteria

prima relativamente a certo gecircnerordquo esta composta de mateacuteria e forma a qual

exemplifica com a aacutegua em relaccedilatildeo agraves ldquodiversas soluccedilotildees aquosasrdquo255

Como o ser natildeo se separa da forma a perda desta implica a corrupccedilatildeo dos

entes compostos256 No tocante aos acidentes dois modos haacute de corrpuccedilatildeo pela

corrupccedilatildeo de seu sujeito (como as potecircncias sensitivas das quais trataremos logo

250

TOMAacuteS DE AQUINO 2003a p 23 251

Id 2003b p 91-92 252

Id 2012 Q XII p 257 e 259 253

Diferente da negaccedilatildeo que independe do sujeito relacionado Id 2003a p 24 254

Ibid p 22-23 255

Ibid p 26-27 256

Id 2012 Q XIV p 291

70

adiante em relaccedilatildeo aos respectivos oacutergatildeos dos sentidos)257 ou por seu contraacuterio

(como o frio pelo quente)258

A corrupccedilatildeo ou movimento do ser para o natildeo ser259 bem como seu contraacuterio

a geraccedilatildeo ou movimento do natildeo ser para o ser podem ser simples ou seja estar

presentes no gecircnero da substacircncia ou acidentais ou seja que se passam em todos

os demais gecircneros260

A geraccedilatildeo tem por ponto de partida a mateacuteria e por porto de chegada a

forma261 No entanto nenhum dos princiacutepios tem por si o poder de gerar ou seja

nenhum ente tem por si o poder de passar da potecircncia ao ato sendo portanto

necessaacuterio como princiacutepio ativo um agente extriacutenseco como se disse

anteriormente a causa eficiente ou agente que daacute origem ao movimento sendo

assim tambeacutem chamada causa motora 262263

53 AS QUATRO CAUSAS E AS CATEGORIAS

Aristoacuteteles classifica as causas em quatro tipos ou espeacutecies que satildeo causas

por si e aos quais todos os demais tipos de causa que o satildeo por acidente por isso

mesmo se reduzem264 Diz ele ainda que as causas satildeo princiacutepios e Tomaacutes de

Aquino explica que isto se daacute em sujeito mas natildeo em significado onde diferem pois

princiacutepio ldquoimplica uma ordem ou uma sequecircnciardquo enquanto causa implica ldquoalguma

influecircncia no ser da coisa causadardquo265 Dos quatro tipos haacute dois que satildeo

considerados ab intrinseco ou intriacutensecos266 pois estatildeo relacionados agrave constituiccedilatildeo

essencial do ente sendo essas causas respectivamente a mateacuteria da qual as coisas

satildeo feitas e o modelo ou a forma substancial que a atualiza que diz o Estagirita eacute

257

TOMAacuteS DE AQUINO Q XIX p 395 258

Ibid Q XIX p 385 259

Id 1949 Q 2 R p 37 260

Id 2003a p 21-22 261

Ibid p 27 262

Quanto ao movimento o aristotelismo-tomismo qualifica-o como progressivo e distingue quatro espeacutecies o movimento segundo o lugar o movimento de crescimento e o de reduccedilatildeo e o movimento de alteraccedilatildeo A geraccedilatildeo e a corrupccedilatildeo assim natildeo satildeo consideradas propriamente como espeacutecies de movimento mas transformaccedilotildees instantacircneas (cf TOMAacuteS DE AQUINO 2000 L I l 6 75)

263 Id 2003a p 28

264 ARISTOacuteTELES 1995a L II 194b p 140-142 Id 2005 L V 1013a-1013b p 189-191

TOMAacuteS DE AQUINO 2003a p 31 265

ldquo[] implies an order or sequence []rdquo ldquo[] implies some influence on the being of the thing causedrdquo Id 1964b L V l 1 751

266 Id 2003a p 31

71

ldquoa definiccedilatildeo da essecircncia e seus gecircnerosrdquo267 jaacute descritas anteriormente e aqui

denominadas causa material e causa formal respectivamente

O terceiro tipo eacute a causa eficiente citada anteriormente pela qual a origem do

movimento se daacute de modo ab extrinseco ldquoo princiacutepio primeiro de onde proveacutem a

mudanccedila ou o repouso e o que faz mudar algo em relaccedilatildeo ao mudadordquo268 Eacute a

potecircncia motora como causa eficiente que determina a mateacuteria por si mesma que

em princiacutepio pode-se relacionar indiferentemente com qualquer forma a formas

especiais de modo que um agente natural distinto imprimiraacute uma uacutenica forma em

mateacuteria especiacutefica perfeccionada por uma forma mais universal e os acidentes

desta tornando a mateacuteria como diz o Aquinate ldquoproacutepria para a perfeiccedilatildeo

subsequenterdquo269

Quanto ao quarto eacute a causa final que com a anterior representa o segundo

tipo de causas extriacutensecas mas que ao contraacuterio dela eacute natildeo a origem mas o fim do

movimento aquilo para o qual ele tende naturalmente pois o que quer que aja o faz

tendendo a um fim que pode ser segundo Tomaacutes de Aquino de dois tipos o da

geraccedilatildeo ou o do gerado270 Explica ele entatildeo que o fim seria a ldquocausa das causasrdquo

jaacute que eacute causa da causalidade eficiente por ser a razatildeo pela qual esta age e eacute o

que faz com que a forma e a mateacuteria sejam respectivamente forma e mateacuteria e com

que estas interajam com aquela aperfeiccediloando esta mediante o fim271 Das quatro

causas somente a causa material eacute potecircncia enquanto que as demais satildeo ato

sendo que a formal pode ser uma soacute coisa com a final mas nunca com a eficiente

ainda que diferente da material seja da mesma espeacutecie272

Os quatro gecircneros de causa como se disse abarcam todas as espeacutecies de

causas como a causa proacutexima ou posterior referente ao que eacute mais particular e a

causa remota ou anterior referente ao que eacute mais universal ou como a causa por

si a de um objeto enquanto tal e a causa por acidente referente a algo que

acontece agrave anterior ou ainda a causa simples que eacute causa soacute por si ou soacute por

acidente ou eacute causa uacutenica ou a causa composta que pode ser a junccedilatildeo de duas

causas simples no primeiro caso ou quando haacute mais de um sujeito como causa ou

267

ldquo[] la definicioacuten de la esencia y sus geacuteneros []rdquo ARISTOacuteTELES 1995a L II 194b p 141

268 ldquo[] el principio primero de donde proviene el cambio O el reposo [] y lo que hace

cambiar algo respecto de lo cambiado []rdquo Ibid L II 194b p 142 269

ldquo[] propria ad subsequentem perfectionemrdquo Id 1949 Q 3 R 20 p 64-65 270

Id 2003a p 39 271

Ibid p 36 272

Ibid p 39-40

72

causa em ato que produz seu efeito em ato ou causa em potecircncia que natildeo produz

efeito mas pode vir a produzi-lo ou causa universal ou causa singular que se

distinguem em relaccedilatildeo agrave natureza do efeito etc273

O Estagirita tambeacutem reduz a seis essas causas segundo seu modo de ser

que diz podem ser entendidas no sentido de ato ou de potecircncia Seriam elas

causas ldquo(1) como particular ou (2) como gecircnero ou (3) como acidente ou (4) como

gecircnero do acidente ou (5) como combinadas umas e outras ou (6) como tomadas

cada uma por si []rdquo274

As causas particulares observa Tomaacutes de Aquino atuam pelo poder das

universais275

Ele explica tambeacutem que a perfeiccedilatildeo de um efeito eacute diretamente proporcional

ao grau de semelhanccedila com a sua causa276 que estaraacute sempre presente de alguma

forma nele que por sua vez jamais seraacute mais simples do que ela277 O efeito

tambeacutem estaraacute em sua causa diz o Aquinate ldquode modo mais elevado segundo o

poder da causardquo278

As quatro causas assim estatildeo presente em cada uma das chamadas

categorias

Quanto a essas categorias ou predicamentos o Estagirita as elenca em dez

a saber a substacircncia a quantidade a qualidade a relaccedilatildeo o lugar o tempo a

posiccedilatildeo a posse (habitum) a accedilatildeo e a afecccedilatildeo (paixatildeo)279

A substacircncia da qual se falou anteriormente eacute a uacutenica que apresenta caraacuteter

essencial enquanto as demais possuem caraacuteter acidental

A quantidade pode ser discreta ou seja quando natildeo haacute limite comum que

estabeleccedila contato entre as partes (como o nuacutemero e o discurso) ou contiacutenua (como

a superfiacutecie de um corpo soacutelido e o tempo)280

A relaccedilatildeo estabelece-se quando uma coisa a relativa com mais ou menos

intensidade depende de outra a correlativa ndash que lhe eacute de algum modo simultacircnea

e que lhe pode ser contraacuteria ou natildeo ndash ou quando se refere de algum modo a esta281

273

TOMAacuteS DE AQUINO 2003a p 41-43 274

ARISTOacuteTELES 2005 L V 1014a p 195 275

TOMAacuteS DE AQUINO 2006 p 101 276

Ibid p 133 277

Ibid p 125 278

Ibid p 145 279

ARISTOacuteTELES 1965 p 20 280

Ibid p 75 281

Ibid p 98-100 e 103

73

De todas as categorias ela eacute a uacutenica que natildeo coloca algo na natureza das coisas

senatildeo na esfera loacutegica ndash jaacute que as demais designam um algo enquanto ela designa

um ldquoem relaccedilatildeo a algordquo ndash o que pode ocorrer ldquoquando alguma coisa eacute posta em

relaccedilatildeo consigo mesmardquo (como a identidade) ldquoquando a proacutepria relaccedilatildeo eacute posta em

relaccedilatildeo com alguma coisardquo diretamente (como a paternidade) ldquoquando um dos

termos da relaccedilatildeo depende do outro e natildeo vice-versardquo (como a do conhecimento

com o objeto na dependecircncia do conhecimento em relaccedilatildeo aos objetos por

conhecer-se) quando ldquoo ser eacute comparado com o natildeo serrdquo (como quando um sujeito

diz que eacute antes dos que seratildeo depois dele)282

A qualidade eacute o acidente determinativo da substacircncia em si mesma

Aristoacuteteles define-a como aquilo ldquoem virtude do qual se diz que alguma coisa eacute talrdquo

A qualidade pode ter contraacuterios eacute susceptiacutevel tanto de mais e de menos como de

aumento e diminuiccedilatildeo e pode ser semelhante ou dissemelhante em relaccedilatildeo agrave outra

qualidade O Estagirita aponta alguns dos muitos gecircneros de qualidades Um eacute

aquele que eacute como haacutebito (as ciecircncias e as virtudes) e disposiccedilatildeo ndash que pode ser

ldquofacilmenterdquo movida e ldquorapidamenterdquo mudada (como o frio o calor o saudaacutevel o

enfermo etc) ndash sendo aquele mais estaacutevel e duraacutevel e sempre ao mesmo tempo

esta jaacute que possuir haacutebitos ldquoeacute tambeacutem encontrar-se numa certa disposiccedilatildeordquo283

Outro eacute aquele que satildeo determinaccedilotildees afirmadas por aptidotildees ou inaptidotildees

naturais (como os que tecircm aptidatildeo natural para realizar bem certo exerciacutecio ou para

suportar algo que lhe aconteccedila etc) Haacute tambeacutem o que estaacute relacionado agraves

afecccedilotildees e agraves qualidades afetivas como o frio a brancura a doccedilura etc que satildeo

qualidades que produzem modificaccedilatildeo nas sensaccedilotildees ou resultam de modificaccedilotildees

E o Estagirita cita mais um em seus escritos sobre as categorias que respeita agrave

figura e agrave forma acidental284

Em relaccedilatildeo agrave accedilatildeo e agrave afecccedilatildeo tambeacutem admitem contraacuterios e nelas tambeacutem

haacute susceptibilidade de mais e de menos285 Quanto agrave afecccedilatildeo ou paixatildeo pode ser

vista de dois modos como o simples ato de receber como o sentido recebe o

sensiacutevel ou quando algo da substacircncia do que padece ou paciente eacute eliminado

como ocorre com a madeira ao fogo286

282

TOMAacuteS DE AQUINO 1988 art V p 67-68 283

ARISTOacuteTELES 1965 p 124-126 284

Ibid p 126-127 e 129 285

Ibid p 141 286

TOMAacuteS DE AQUINO 2012 Q XXI p 423

74

Jaacute a posse ou haacutebito Aristoacuteteles define como ldquocerta atividade proacutepria do que

possui e do que eacute possuiacutedo como uma accedilatildeo ou um movimentordquo287 como algueacutem

que esteja calccedilado ou armado288 ou ldquo[] a disposiccedilatildeo em virtude da qual a coisa

disposta eacute disposta bem ou mal seja por si seja em relaccedilatildeo a outra []rdquo ou o que

participa dessa disposiccedilatildeo289

Por fim o tempo diz respeito exatamente a quando ou seja se ontem ou

hoje ou amanhatilde etc o local diz respeito a onde ou seja se nesta cidade se em

determinado recinto etc e a posiccedilatildeo diz respeito ao modo como o sujeito se situa

no tempo e no espaccedilo ou seja se de peacute ou sentado ou deitado etc290

54 A ALMA SUAS POTEcircNCIAS E A GRADACcedilAtildeO ENTITATIVA

Diz Tomaacutes de Aquino

Quanto mais perfeita uma forma eacute mais ela extrapassa a mateacuteria corpoacuterea Isto se torna claro desde a induccedilatildeo em que se consideram as vaacuterias ordens de formas A forma de um elemento natildeo tem mais operaccedilotildees que a que as realiza mediante as qualidades ativas e passivas que satildeo disposiccedilotildees da mateacuteria corpoacuterea A forma do corpo mineral tem uma operaccedilatildeo que supera as qualidades ativas e passivas [] a alma vegetal tem uma operaccedilatildeo com a qual as qualidades ativas e passivas orgacircnicas certamente contribuem mas para aleacutem da potecircncia de tais qualidades ela mesma alcanccedila um efeito proacuteprio como nutrir e fazer crescer ateacute um limite definido e realizar coisas semelhantes A alma sensitiva tem aleacutem disso uma operaccedilatildeo para a qual soacute chegam as qualidades ativas e passivas na medida em que satildeo necessaacuterias para a composiccedilatildeo do oacutegatildeo que se emprega no exerciacutecio desta operaccedilatildeo como ver ouvir apetecer etc

291

Nos entes viventes ou animados a forma substancial recebe a denominaccedilatildeo

de ldquoalmardquo (do latim anima) que pode ser conhecida por suas potecircncias natildeo sendo

287

ARISTOacuteTELES 2005 L V 1022b p 245 288

Id 1965 p 20 289

Id 2005 L V 1022b p 247 290

Id 1965 p 20 291

ldquo[] quod quanto aliqua forma est perfectior tanto magis supergreditur materiam corporalem quod patet inducenti in diversis formarum ordinibus Forma enim elementi non habet aliquam operationem nisi quae fit per qualitates activas et passivas quae sunt dispositiones materiae corporalis Forma autem corporis mineralis habet aliquam operationem excedentem qualitates activas et passivas [] Ulterius autem anima vegetabilis habet operationem cui quidem deserviunt qualitates activae et passivae organicae sed tamen supra posse huiusmodi qualitatum ipsa effectum proprium sortitur nutriendo et augendo usque ad determinatum terminum et alia huiusmodi complendo Anima autem sensitiva ulterius habet operationem ad quam nullo modo se extendunt qualitates activae et passivae nisi quatenus exiguntur ad compositionem organi per quod talis operatio exercetur ut videre audire apetere et huiusmodirdquo TOMAacuteS DE AQUINO 1949 Q 2 R p 35-36

75

estas nem partes suas essenciais ou integrais mas potenciais292 Partes diga-se

que satildeo separaacuteveis apenas conceptualmente e natildeo segundo o lugar (ldquosegundo a

substacircncia da alma ou localmenterdquo)293 Aristoacuteteles define a alma como o princiacutepio da

vida e como o ato primeiro de um corpo natural organizado294 que eacute ldquoenteleacutequiardquo

ou ato perfeiccedilatildeo295 e Santo Tomaacutes complementa ldquodotado de potecircncia para a

vidardquo296 e faacute-lo tambeacutem como ldquoa forma substancial de um corpo natural organizadordquo

ldquoem sentido universal [] uma substacircncia segundo a forma isto eacute a quididade de

cada corpordquo297

E a todo o corpo que dela eacute dotado ela vivifica estando presente e atuando

em todas as suas partes cada uma com potecircncias especiacuteficas inerentes ao

composto ou sinolo como ato seu por inteiro e tambeacutem de cada uma de suas

partes em ordem agrave integralidade do mesmo corpo as quais algumas satildeo

perfeccionadas com maior preferecircncia e perfeiccedilatildeo e outras com menos298 A alma

confere naturalmente o ser que dos viventes eacute o viver299 e a espeacutecie constituindo

no corpo sua diversidade de partes ndash mebros oacutergatildeos etc ndash em conformidade com

as distintas operaccedilotildees que tornam necessaacuteria a constituiccedilatildeo do corpo por partes a

elas correspondentes caracterizando um corpo organizado em que eacute em funccedilatildeo do

todo que essas mesmas partes existem Disto se infere que na constituiccedilatildeo dos

entes animados a propriedade teleoloacutegica eacute mais visiacutevel que na dos inanimados300

O aristotelismo-tomismo faz distinccedilatildeo entre movimento e operaccedilatildeo O

Aquinate define o primeiro como ldquoo ato de um ente imperfeitordquo e o segundo como ldquoo

ato de um ente perfeitordquo301 Explica tambeacutem que a alma move tanto a si mesma

como eacute movida por acidente ou seja quando eacute movida pelo corpo em que estaacute302 e

eacute movida ldquopelos sensiacuteveis na sensaccedilatildeo e pelos bens desejados na afecccedilatildeordquo303

292

TOMAacuteS DE AQUINO 2012 Q XIX p 389 293

Id 2009 p 53 294

ARISTOacuteTELES 2010 II 1 p 61-62 295

REALE ANTISERI 2003 p 212 296

ldquo[] doteacute em puissance de la vierdquo TOMAacuteS DE AQUINO 2000 II l 1 233 297

Id 2009 p 47 298

Id 1949 Q 4 SC II e IV p 71 Ibid Q 4 R 3 p 75 e R 8 p 76 299

Ibid Q 1 SC IV p 10 300

Id 2012 Q X p 221 e 225 Id 2000 II l 1 230 301

Respectivamente ldquolacte dun ecirctre imparfaitrdquo e ldquolacte dun ecirctre parfaitrdquo Id 2000 I l 6 111

302 Ibid I l 8 145

303 ldquo[] par les sensibles dans la sensation et par les biens deacutesirables dans lrsquoaffectionrdquo Ibid

I l 6 84

76

sendo ela a causa do movimento e do repouso nos animais304 Assim distingue-se

um ente vivo de um natildeo vivo pelo movimento uma vez que este precisa

necessariamente da accedilatildeo de um princiacutepio exterior para mover-se305

As almas nos viventes distinguem-se segundo o modo como suas operaccedilotildees

superam as respectivas naturezas corpoacutereas que eacute diretamente proporcional ao

domiacutenio que cada alma exerce sobre a mateacuteria corporal e inversamente

proporcional ao grau de imersatildeo nesta Tais operaccedilotildees se datildeo conforme as

potecircncias inerentes agrave alma ndash e diz o Aquinate que se considera vivente tudo o que

possui uma destas operaccedilotildees da alma306 ndash cujos gecircneros segundo o aristotelismo-

tomismo satildeo a vegetativa a sensitiva a intelectiva ou racional (que diferentemente

das duas anteriores que inerem no composto como propriedades naturais ndash e ainda

que tenham o composto como sujeito tecircm a alma como princiacutepio ndash inere

diretamente na alma)307 a apetitiva a locomotora ou motriz e a nutriz308 As trecircs

primeiras determinam as classes dos entes os graus das potecircncias na alma

enquanto que a apetitiva e a nutriz encontram-se nas trecircs classes definidas pelas

trecircs anteriores e a motriz natildeo eacute geralmente encontrada nos entes de classe

vegetativa309

Segundo a inclinaccedilatildeo natural proacutepria ou apetite natural procedente de cada

tipo de forma natural e da qual segue determinada operaccedilatildeo ou determinado

conjunto de operaccedilotildees o aristotelismo-tomismo enquadra cinco dos seis gecircneros

acima excluindo aqui a potecircncia nutriz310 e ainda segundo o grau dos viventes

exclui tambeacutem a apetitiva estabelecendo quatro como o nuacutemero de gecircneros para

esta classificaccedilatildeo311

As potecircncias da alma distinguem-se assim por seus diferentes objetos Isto

porque como explica o Aquinate

[] se os atos satildeo de potecircncias passivas seus objetos satildeo ativos e se os atos satildeo de potecircncias ativas seus objetos satildeo como fins Mas eacute segundo ambos que se considera a espeacutecie da operaccedilatildeo [] e tambeacutem ambos estatildeo

304

TOMAacuteS DE AQUINO 2000 I l 6 89 305

Ibid II l 1 219 306

Id 2009 p 51 307

Id 2012 Q XIX p 389 308

Id 2000 I l 14 201 309

Id 2001 Q 78 a 1 p 713 ARISTOacuteTELES 2010 II passim TOMAacuteS DE AQUINO 2000 II l 3 passim

310 TOMAacuteS DE AQUINO 2000 II l 5 279 286

311 Ibid II l 5 287

77

determinados a fins semelhantes pois o agente age de modo a induzir em outro sua proacutepria semelhanccedila

312

Deste modo conhecer e sentir satildeo operaccedilotildees da alma quanto aos sentidos e

pensar eacute operaccedilatildeo quanto agrave inteligecircncia

Estabelece-se portanto que todo e qualquer ente corpoacutereo enquadra-se em

alguma destas classes que seguem um esquema ascendente segundo o grau de

perfeiccedilatildeo natural a dos corpos sem vida (os elementos e em seguida os mistos) a

vegetativa (as plantas cujo corpo eacute animado com princiacutepio vital) a sensitiva

(potecircncia sensitiva acrescida agrave vegetativa o que caracteriza os animais

propriamente ditos) e a intelectiva (que eacute acrescida agraves anteriores o que caracteriza

o homem) de modo gradativo incluindo os agentes constitutivos de outros entes

(ceacutelulas partiacuteculas atocircmicas etc)

Explica Tomaacutes de Aquino que

[] em cada um dos gecircneros haacute diversas espeacutecies segundo os diversos graus de perfeiccedilatildeo natural No caso dos corpos simples a terra ocupa o grau iacutenfimo e o fogo o mais nobre No caso dos minerais a natureza avanccedila gradualmente atraveacutes de suas diversas espeacutecies ateacute culminar no ouro

Nos minerais que estatildeo mais proacuteximos dos elementos haacute menos harmonia o

que lhes confere maior durabilidade

Jaacute a vegetativa cujo objeto eacute o corpo eacute caracterizada por trecircs operaccedilotildees a

generativa a aumentativa e a nutritiva pelas quais recebe o ser se desenvolve e se

conserva respectivamente

Prossegue Santo Tomaacutes

Tambeacutem nas plantas ateacute culminar nas espeacutecies das aacutervores perfeitas e nos animais ateacute culminar no homem ndash embora alguns animais sejam muito proacuteximos das plantas como os imoacuteveis que soacute possuem tato De modo semelhante certas plantas satildeo muito proacuteximas dos entes inanimados

313

E da mesma forma certos animais exibem caracteriacutesticas muito proacuteximas agraves

de entes vegetais como o caso dos animais cujas partes sobrevivem apoacutes secccedilatildeo

algo que natildeo se daacute de modo algum nos animais ditos ldquosuperioresrdquo314

312

TOMAacuteS DE AQUINO 2012 Q XIV p 269 313

Ibid Q VII p 151 314

O Aquinate assim como Aristoacuteteles atribui isto ao fato de a alma desses animais natildeo ser diversificada em suas partes e acrescenta que cada ldquoparte reteacutem a disposiccedilatildeo mediante a qual o

78

O princiacutepio sensitivo nos vegetais eacute a proacutepria alma ao passo que nos animais

e nos humanos ele eacute parte da alma315 Algumas operaccedilotildees da alma se datildeo no todo

e estas se atualizam em qualquer uma das partes outras em locais especiacuteficos316

Quanto mais perfeita eacute a forma quanto maior sua virtude mais operaccedilotildees e em

maior diversidade natildeo soacute destas como tambeacutem de partes diferenciadas ela teraacute

do que se infere que enquanto as formas inferiores perfeccionam uniformemente a

alma natildeo o faz O homem assim eacute o ente com maior nuacutemero de operaccedilotildees e de

partes diferenciadas317

Eacute segundo a operaccedilatildeo e o movimento que o corpo se une agrave alma por suas

partes superiores318 O corpo eacute movido voluntariamente pela alma atraveacutes do apetite

e da apreensatildeo No homem ambos os movimentos se datildeo pela parte intelectiva e

pela parte sensitiva sendo que aquela move o corpo mediante o que pertence a

esta uma vez que o movimento eacute do singular319

Explica o Aquinate ldquoa alma daacute ao animal natildeo soacute o que eacute proacuteprio dele mas

tambeacutem o que pertence agraves formas inferioresrdquo e sendo assim do mesmo modo que

ldquoas formas inferiores satildeo princiacutepios de movimento natural nos corpos naturais assim

eacute a alma no corpo animalrdquo

Divide ele entatildeo as operaccedilotildees da alma em ldquoanimaisrdquo a saber as que

ldquoprocedem da alma segundo o que lhes eacute proacutepriordquo e ldquonaturaisrdquo que satildeo as que

ldquoprocedem da alma na medida em que ela produz o efeito das formas naturais

inferioresrdquo Assim em geral uma parte de cada animal eacute motora e outra parte eacute

movida e ldquoo corpo natural organizado estaacute para a alma como a mateacuteria estaacute para a

formardquo o que se daacute ldquoa partir da proacutepria almardquo320

Nos corpos naturais assim o que determina a quantidade o que confere os

limites de crescimento como o de tamanho e o de largura de cada indiviacuteduo de

corpo inteiro eacute perfectiacutevel pela almardquo e assim ldquopermanece nele a almardquo (TOMAacuteS DE AQUINO 2012 Q X p 225 e nota 247 p 451-452 cf Aristoacuteteles 2010 I 5 p 58) pois a mesma alma eacute uma em ato mas muacuteltipla em potecircncia (cf TOMAacuteS DE AQUINO 2000 II l 4 264) Isto se manteacutem em consonacircncia com o que se sabe hoje por exemplo a respeito da importacircncia da presenccedila do cutelo para o sustento da vida na parte seccionada de aneliacutedeos No caso das plantas diz Aristoacuteteles que algumas sobrevivem apoacutes a secccedilatildeo em razatildeo de a alma em cada indiviacuteduo ser uma em ato mas vaacuterias em potecircncia (cf ARISTOacuteTELES 2010 II 2 p 65-66)

315 TOMAacuteS DE AQUINO 2000 II l 4 262

316 Id 2009 p 51

317 Id 2000 I l 14 208 Id 1949 Q 4 R p 72-73

318 Se estiverem presentes as devidas disposiccedilotildees na mateacuteria

319 O intelecto apreende os universais e soacute pode assim mover mediante o particular que eacute

referente agrave natureza do sentido (cf TOMAacuteS DE AQUINO 2012 Q IX p 201) 320

TOMAacuteS DE AQUINO 2012 Q IX p 203

79

determinada espeacutecie para menos e para mais eacute menos a mateacuteria do que a forma

visto que a proporccedilatildeo e o fim de uma accedilatildeo no caso o crescimento satildeo impostos

pelo princiacutepio da operaccedilatildeo relacionada321

E no que concerne agraves operaccedilotildees o modo de agir na alma eacute fruto da accedilatildeo de

um ente vivo ou seja que move a si mesmo e por essa razatildeo a accedilatildeo da alma

supera a da natureza o que natildeo se daacute poreacutem necessariamente em relaccedilatildeo ao que

eacute agido Nos corpos animados e nos inanimados haacute o ser natural e o que para este eacute

requerido mas os inanimados necessitam para isto de um agente extriacutenseco

enquanto os animados requerem um agente intriacutenseco o que eacute exemplificado pelas

operaccedilotildees agraves quais estatildeo ordenadas as potecircncias supramencionadas da alma

vegetativa e incluam-se aqui tantos movimentos involuntaacuterios322 que satildeo pois

virtudes naturais

Seguindo uma ordem a primeira potecircncia da alma vegetativa eacute a virtude

nutritiva que se ordena agrave conservaccedilatildeo do ser e da espeacutecie pela transformaccedilatildeo e

pelo acreacutescimo de algo o alimento na substacircncia do crescimento e da geraccedilatildeo E eacute

a virtude aumentativa o crescimento a segunda na ordem pois dela o ente passa

em quantidade e virtude para uma perfeiccedilatildeo maior de quantidade devida de onde

entatildeo pode expressar a terceira potecircncia a gerativa que se ordena a que o

indiviacuteduo seja posto no serrdquo E se os entes inanimados recebem aleacutem da espeacutecie

sua quantidade devida sendo engendrados extrinsecamente os entes animados

satildeo comumente gerados de uma semente Assim a potecircncia gerativa manifesta-se

mediante a aumentativa e tanto a potecircncia gerativa quanto a aumentativa soacute se datildeo

em razatildeo da virtude nutritiva323

Prossegue Santo Tomaacutes

Existem ademais outras operaccedilotildees mais elevadas da alma que transcendem as operaccedilotildees dos corpos naturais tambeacutem quanto ao agido na medida em que eacute inato agrave alma que nela se encontre segundo o ser imaterial tudo o que existe pois a alma eacute em certa medida todas as coisas na medida em que eacute sensitiva e intelectiva Logo eacute necessaacuterio que existam diversos graus deste mencionado ser imaterial E um destes graus eacute aquele segundo o qual as coisas se encontram na alma sem sua mateacuteria proacutepria mas segundo sua singularidade e as condiccedilotildees individuais derivadas da mateacuteria E este eacute o niacutevel do sentido que eacute receptivo das espeacutecies individuais sem mateacuteria mas receptivo em um

321

TOMAacuteS DE AQUINO 2000 II l 8 332 322

Como os processos da digestatildeo e da respiraccedilatildeo os batimentos cardiacuteacos etc 323

TOMAacuteS DE AQUINO 2012 Q XIII p 271 e 283 Id 2000 II l 7 312 Ibid II l 9 340 344 e 347

80

oacutergatildeo corporal O outro grau de imaterialidade mais alto e mais perfeito eacute o do intelecto que recebe espeacutecies completamente abstraiacutedas da mateacuteria e das condiccedilotildees materiais e sem um oacutergatildeo corporal E assim como por sua forma natural a coisa possui uma inclinaccedilatildeo para algo e se move ou age para conseguir aquilo para o qual se inclina assim tambeacutem se deve a uma forma sensiacutevel ou inteligiacutevel a inclinaccedilatildeo para a coisa apreendida pelo sentido ou pelo intelecto inclinaccedilatildeo essa que pertence agrave potecircncia apetitiva Ademais eacute necessaacuterio que consequentemente exista um movimento pelo qual se alcance a coisa desejada e este pertence agrave potecircncia motriz

324

A potecircncia apetitiva segue-se agrave apreensatildeo realizada pelos sentidos e divide-

se em trecircs a potecircncia desiderativa ou vontade cuja operaccedilatildeo eacute o desejar que eacute o

apetite de natureza intelectual racional a potecircncia concupisciacutevel cuja operaccedilatildeo eacute o

desejar relacionado ao que eacute apeteciacutevel ou deleitaacutevel e conveniente aos sentidos e

a potecircncia irasciacutevel ou coacutelera relacionada a algo do que adveacutem o poder de

desfrutar agrave vontade o que eacute deleitaacutevel ao sentido como ocorre na conquista apoacutes

uma luta por algo325 Estas duas uacuteltimas pertencem agrave parte sensiacutevel e irracional e

assim o apetite irasciacutevel eacute como se fosse um defensor do concupisciacutevel As afecccedilotildees

daquele tem iniacutecio e fim nas afecccedilotildees deste326 e os atos de ambos satildeo realizados

com passividade327

Enquanto que ao apetite concupisciacutevel pertence o amor do bem ao apetite

irasciacutevel pertencem o oacutedio e o medo do mal e a esperanccedila do bem328

A virtude motriz por sua vez varia conforme a diversidade dos movimentos

ou as diferentes partes de um animal que possuem movimentos proacuteprios e

enquadra-se no princiacutepio de que ldquotudo o que se move eacute movido por outro se

dizemos que algo se move por si proacuteprio isto natildeo ocorre segundo ele mesmo mas

segundo suas diversas partes de modo que uma parte dele eacute motora e a outra

movidardquo329

Nas operaccedilotildees da alma explica o Aquinate330 o movimento encontra-se de

trecircs modos a saber ldquopropriamenterdquo que eacute o que se daacute no movimento de

crescimento como operaccedilatildeo da alma vegetativa e com o apetite sensiacutevel

relacionado ao movimento local e agrave alteraccedilatildeo como a dos humores ldquomenos

propriamenterdquo exemplificado na captaccedilatildeo dos sensiacuteveis como se daacute com a visatildeo

324

TOMAacuteS DE AQUINO 2012 Q XIII p 271 e 273 325

Ibid Q XIII p 277 326

Id 2000 I l 14 202 Ibid II l 5 288 Ibid III l 14 802 327

Id 1990b L II c LX p 274 328

Id 2000 III l 14 806 329

Id 2006 p 19 330

Id 2000 I l 10 157-160

81

em que um corpo eacute objeto da virtude visual mas dele soacute eacute captada a natureza dita

espiritual ou seja a luz que informa a cor e ldquomuito pouco propriamenterdquo como o eacute o

movimento na inteligecircncia que se daacute somente metaforicamente ou seja a operaccedilatildeo

ali eacute ato de um ente perfeito enquanto o movimento eacute sempre caracterizado por ser

ato de um ente imperfeito

A alma ou forma substancial racional ou intelectiva por fim faz com que por

meio dela sejamos simultaneamente homens animais viventes corpos substacircncias

e entes331 Eacute primeiramente segundo a razatildeo de forma universal e entatildeo segundo a

razatildeo de forma especial que a mateacuteria se perfecciona de modo que o intelecto

primeiro identifica o ente depois ser vivo em seguida o ser animal e entatildeo o ser

homem identificando tambeacutem seus acidentes proacuteprios que neste sentido se diz

que acompanham o gecircnero e a espeacutecie ao qual pertencem332

A potecircncia intelectiva que seraacute exposta apoacutes a explanaccedilatildeo sobre os sentidos

possui relaccedilotildees com a sensitiva e com a vegetativa que podem ser analisada sob

duas perspectivas o que Tomaacutes de Aquino explica com uma analogia

[] o intelecto difere das outras partes da alma pelo sujeito [] A faculdade vegetativa e a sensitiva estatildeo na faculdade intelectiva como o triacircngulo e o quadrilaacutetero no pentaacutegono Aleacutem do mais o quadrilaacutetero eacute uma figura absolutamente distinta do triacircngulo pela espeacutecie mas natildeo do triacircngulo que conteacutem em potecircncia como o nuacutemero quaternaacuterio tambeacutem natildeo se distingue do ternaacuterio que faz parte dele mas do ternaacuterio que existe separado E se acontecesse que diversas figuras fossem produzidas por diversos agentes o triacircngulo que existe separadamente do quadrilaacutetero teria uma causa produtora diferente da do quadrilaacutetero como tem tambeacutem uma outra espeacutecie mas o triacircngulo que estivesse contido no quadrilaacutetero teria a mesma causa produtora Assim tambeacutem por conseguinte a faculdade vegetativa que tem uma existecircncia agrave parte da sensitiva eacute uma outra espeacutecie de alma e tem uma outra causa produtora contudo eacute a mesma causa que produz a faculdade sensitiva e a faculdade vegetativa que estaacute contida na sensitiva

333

55 OS SENTIDOS

As potecircncias sensitivas tecircm pois como princiacutepio a alma de onde provecircm e

existem no composto tendo-o por sujeito Assim o que sente vecirc e ouve ou seja

aquilo pelo qual eacute manifesta a accedilatildeo dos sentidos eacute o composto em virtude da

331

TOMAacuteS DE AQUINO 1949 Q 3 R p 52 332

Ibid Q 3 R17 p 63-64 333

Id 2009 p 87-89

82

alma334 de modo que tanto as operaccedilotildees da alma sensitiva como as da vegetativa

satildeo movimentos natildeo da alma mas do composto335

E para o termo ldquosentidordquo Tomaacutes de Aquino atribui duas acepccedilotildees a saber

natildeo soacute a potecircncia sensitiva propriedade natural consequente agrave espeacutecie como

tambeacutem a proacutepria alma sensitiva336 A faculdade perceptiva existe somente em

potecircncia ou seja a alma sensiacutevel natildeo eacute os sensiacuteveis em ato337 mas em potecircncia

razatildeo pela qual o ato da percepccedilatildeo natildeo eacute contiacutenuo nos sentidos338

E partindo do princiacutepio de que diz o Aquinate ldquotudo o que eacute recebido

determina-se no recipiente segundo o modo do proacuteprio recipienterdquo339 tanto a

percepccedilatildeo da realidade sensiacutevel presente como a da ausente satildeo fundamentais

para que esses entes dotados com potecircncia sensitiva possam-se mover em busca

dos recursos externos que lhes satildeo vitais340 Assim eles natildeo soacute recebem como

tambeacutem conservam as espeacutecies dos objetos sensiacuteveis que alteram seus sentidos A

partir dessa conservaccedilatildeo eacute possiacutevel perceber as intenccedilotildees como a ameaccedila de um

predador a serventia de um objeto para determinado fim etc

Muszalski explica em relaccedilatildeo ao termo ldquointenccedilatildeordquo que

Apesar de que para Santo Tomaacutes pode-se usar o termo intentio em diversos sentidos fica claro que implica fundamentalmente uma relaccedilatildeo de uma coisa com outra utilizando-se sobretudo no acircmbito da apetecircncia Com efeito designa propriamente a tendecircncia a um fim e a faculdade que eacute diretiva para um fim eacute principalmente a vontade No entanto como as potecircncias cognoscitivas do vivente tendem ao conhecimento de uma coisa como se fosse seu fim pode-se aplicar o termo intentio analogamente agrave ordem do cognoscitivo de modo que natildeo soacute a vontade como tambeacutem a inteligecircncia e os sentidos possuem uma intencionalidade Mas com isto simplesmente se estaacute caracterizando o ato proacuteprio da faculdade de conhecimento

341

334

TOMAacuteS DE AQUINO 2012 Q XIX p 387-389 335

Id 2000 I l 10 161 336

Id 2012 Q XX p 389-391 337

No sentido de que o que eacute afetado adquire certa semelhanccedila em relaccedilatildeo ao agente da afecccedilatildeo Id 2000 II l 10 357 365 366

338 ARISTOacuteTELES 2010 II 5 p 75 TOMAacuteS DE AQUINO 2000 II l 10 354

339 TOMAacuteS DE AQUINO 2012 Q XX p 411

340 Que eacute acidental no homem e nos animais e natildeo substancial atributo este da alma

sensiacutevel (cf TOMAacuteS DE AQUINO 2012 Q XI p 243) 341

ldquoApesar de que para Santo Tomaacutes el teacutermino lsquointentiorsquo puede usarse en diversos sentidos resulta claro que implica fundamentalmente una relacioacuten de una cosa con otra utilizaacutendose sobre todo en el aacutembito de la apeticioacuten En efecto designa propiamente la tendencia a un fin y la facultad que es directiva hacia un fin es principalmente la voluntad Sin embargo como las potencias cognoscitivas del viviente tienden al conocimiento de una cosa como si fuera su fin el teacutermino intentio se puede aplicar anaacutelogamente al orden de lo cognoscitivo de modo que no soacutelo la voluntad sino tambieacuten la inteligencia y los sentidos poseen una intencionalidad Pero con esto simplemente se estaacute caracterizando el acto propio de la facultad de conocimientordquo MUSZALSKI 2014 p 87-88

83

E esta tem iniacutecio com a apreensatildeo dos sensiacuteveis O aristotelismo-tomismo

descreve os princiacutepios daqueles sentidos que realizam essa apreensatildeo e tambeacutem

de outros sentidos que por assim dizer processaratildeo o objeto captado por essa

apreensatildeo A estes chama ldquosentidos internosrdquo e agravequeles ldquosentidos externosrdquo

551 Sentidos externos

Diz Tomaacutes de Aquino que ldquoa alma eacute princiacutepio da sensaccedilatildeo natildeo como aquele

que sente mas como aquilo pelo qual o sentinte senterdquo342

A estimativa e a cogitativa das quais se trataraacute adiante mais a intelecccedilatildeo

tecircm como se disse iniacutecio com o exerciacutecio da funccedilatildeo dos sentidos externos Estes

se caracterizam por sua materialidade Exercem a captaccedilatildeo de formas sensiacuteveis

que satildeo invariavelmente acidentes jamais essecircncias ou seja sem a mateacuteria do

objeto que as imprime por meio de sua mateacuteria de receptores neurais nas

superfiacutecies deacutermicas em conformidade com a disposiccedilatildeo do respectivo oacutergatildeo

responsaacutevel No acircmbito aristoteacutelico-tomista isto se daacute natildeo como accedilatildeo de um

contraacuterio sobre seu correspondente resultando em transformaccedilatildeo ou alteraccedilatildeo mas

reduzindo o sentido da potecircncia ao ato por sua espeacutecie tratando-se de uma

operaccedilatildeo tal como se daacute com o conceber e o querer343 Por exemplo os olhos

captaratildeo a luz que estaraacute a refletir as cores e o formato (sensiacuteveis) de determinado

ente corpoacutereo mas natildeo a essecircncia deste mesmo ente em razatildeo da imaterialidade

de sua forma substancial344 Assim a forma do agente causa uma disposiccedilatildeo por

um lado similar a ele no sentido e por outro natildeo pelo fato de essa disposiccedilatildeo natildeo

ser material como o agente pois no sensiacutevel seu ser eacute natural e no sentido eacute

intencional ou espiritual345

Para Tomaacutes de Aquino o sentido ldquoeacute certa potecircncia passiva submetida por

natureza agrave alteraccedilatildeo proveniente dos objetos sensiacuteveis exterioresrdquo346 pelo que

como se disse entende ldquofaculdade sensitivardquo como aquilo que se sente natildeo em ato

mas em potecircncia347 Essa alteraccedilatildeo tem como requisitos tanto a ausecircncia no oacutergatildeo

342

TOMAacuteS DE AQUINO 2012 Q XIX p 393 343

Id 2000 III l 12 765-766 344

ARISTOacuteTELES 2010 II 12 p 96 TOMAacuteS DE AQUINO 2000 II l 24 551 345

TOMAacuteS DE AQUINO 2000 II l 24 552-553 346

ldquoEl sentido es una cierta potencia pasiva sometida por naturaleza a la alteracioacuten proveniente de los objetos sensibles exterioresrdquo Id 2001 Q 78 a 3 p 716

347 Id 2009 p 63

84

do sentido (salvo no que diz respeito ao tato que percebe os contraacuterios em seu

proacuteprio oacutergatildeo) dos contraacuterios que a ele compete perceber como o fato de o oacutergatildeo

estar em potecircncia para esses contraacuterios348 (e novamente com relaccedilatildeo ao tato eacute

preciso que para isto esteja reduzido a um ponto meacutedio o que faz com que tenha

no homem maior precisatildeo que nos outros animais em razatildeo de sua disposiccedilatildeo para

a alma racional349)350 e ela pode ocorrer de dois modos um fiacutesico e outro espiritual

Sentir portanto eacute uma alteraccedilatildeo que se daacute por afetaccedilatildeo e por moccedilatildeo351

Ademais afirma o Aquinate que ldquoA alteraccedilatildeo fiacutesica daacute-se quando a forma do

que eacute causa da alteraccedilatildeo eacute recebida no objeto alterado segundo seu proacuteprio ser

natural Por exemplo o calor no aquecidordquo E quanto agrave alteraccedilatildeo espiritual ldquodaacute-se

quando a forma do que provoca a alteraccedilatildeo eacute recebida no objeto alterado segundo

seu ser espiritual Por exemplo a forma da cor na pupila a qual natildeo por isso

permanece coloridardquo

O oacutergatildeo recebe pois a espeacutecie natildeo segundo o ser que tem no sensiacutevel e

natildeo em forma fiacutesica mas em forma intencional352 Eis porque a visatildeo eacute o uacutenico

sentido em que ocorre exclusivamente este segundo modo

Nos demais sentidos ocorrem ambos e a alteraccedilatildeo fiacutesica daacute-se por parte do

oacutergatildeo e por parte do objeto Na audiccedilatildeo ocorre por mudanccedila local jaacute que o som eacute

causado por uma percussatildeo e conseguinte vibraccedilatildeo do ar eacute sempre a atividade ldquode

alguma coisa contra alguma coisa e em alguma coisardquo353 Quanto ao olfato eacute

necessaacuteria certa alteraccedilatildeo no corpo para que ocorra a accedilatildeo de cheirar mas em

ambos os oacutergatildeos responsaacuteveis especificamente natildeo apresentam alteraccedilotildees fiacutesicas

salvo acidentalmente

Tomaacutes de Aquino estabelece aqui certa gradaccedilatildeo nos sentidos partindo do

pressuposto de que a visatildeo que eacute exclusivamente ldquoespiritualrdquo estaacute relacionada aos

corpos celestes por sua emissatildeo ou reflexatildeo de luz e que a audiccedilatildeo vem em

seguida sendo esses dois sentidos utilizados para o ensino O odor eacute captado da

substacircncia odorante os objetos da visatildeo e da audiccedilatildeo satildeo captados natildeo

348

ldquoContraacuteriosrdquo em relaccedilatildeo a atributos dos sensiacuteveis como o quente e o frio o aacutespero e o liso etc

349 ARISTOacuteTELES 2010 II 9 p 88

350 TOMAacuteS DE AQUINO 2012 Q VIII p 171

351 Id 2000 II l 10 350

352 Ibid II l 14 418

353 ARISTOacuteTELES 2010 II 8 p 83 TOMAacuteS DE AQUINO 2000 II l 16 441-442

85

diretamente mas por um intermediaacuterio (o ar e a aacutegua) e o paladar existe

intimamente com o tato relacionado aos elementos354

O tato e o paladar ocorrem nos respectivos oacutergatildeos mediante alteraccedilotildees

fiacutesicas locais sendo por isso ambos considerados os sentidos mais materiais355 O

primeiro eacute o mais universal e eis porque diz o Estagirita que eacute primeiramente por

sua causa que um ente eacute identificado como ldquoanimalrdquo356 Pelo fato de nele consistir

principialmente a natureza sensitiva em sua integralidade se for imobilizado

imobilizam-se todos os demais sentidos Os sentidos natildeo cessam somente ldquopelo

excesso dos seus sensiacuteveis proacutepriosrdquo diz o Aquinate mas tambeacutem ldquopelo excesso

dos sensiacuteveis proacuteprios do tatordquo357ndash porque sem ele natildeo pode haver nenhuma outra

sensaccedilatildeo ainda que possa-se dar sem nenhuma outra358 ndash jaacute que a intensidade

elevada da operaccedilatildeo de uma potecircncia tende a impedir a operaccedilatildeo de outra de

algum modo associada359

Assim o sentido pode sofrer corrupccedilatildeo por parte de um sensiacutevel muito

intenso pois o sentido eacute certa proporccedilatildeo que por outro lado obtecircm uma siacutentese

harmoniosa e agradaacutevel quando o sensiacutevel natildeo estaacute mais proacuteximo dos excessos e

ainda mais se se mistura como se observa na muacutesica360 Essa corrupccedilatildeo gera

afliccedilatildeo e pena como a dor em relaccedilatildeo ao tato podendo chegar ao ponto de destruir

a funcionalidade do oacutergatildeo do sentido E sendo o tato o sentido comum a todos os

animais e a base para os demais sentidos eacute o uacutenico em cujo excesso de um

tangiacutevel pode destruir o proacuteprio o animal361

Haveraacute por outro lado deleite como no abrandamento da dor por convir ao

sentido362 e em outras ocasiotildees como aquilo que pode ser proporcionado pelo

toque Da apreensatildeo dos sentidos principalmente o tato seguem o prazer e a dor

e entatildeo a felicidade e a tristeza apoacutes a apreensatildeo interior relacionados agrave

concupiscecircncia Eis o que relaciona o tato ao apetite e que caracteriza os entes

atualizados pela alma com potecircncia sensitiva363

354

TOMAacuteS DE AQUINO 2000 II l 14 417-418 355

ARISTOacuteTELES 2010 II 11 p 94 TOMAacuteS DE AQUINO 2001 Q 78 a 3 p 716 356

ARISTOacuteTELES 2010 II 2 p 65 TOMAacuteS DE AQUINO 2012 Q VIII p 171 357

TOMAacuteS DE AQUINO 2012 Q VIII p 171 358

ARISTOacuteTELES 2010 II 3 p 69 359

TOMAacuteS DE AQUINO 2012 Q XI p 239 360

ARISTOacuteTELES 2010 III 2 p 107 TOMAacuteS DE AQUINO 2000 III l 2 597 Ibidem 2000 III l 17 870

361 ARISTOacuteTELES 2010 III13 p 134

362 TOMAacuteS DE AQUINO 2012 Q XXI p 429-431

363 Id 2000 II l 5 289

86

Os sentidos externos captam seus sensiacuteveis proacuteprios (cor som etc) aos

quais cada sentido relacionado responderaacute conforme sua natureza e os sensiacuteveis

comuns que satildeo ldquoalgo intermediaacuterio entre as realidades sensiacuteveis percebidas

acidentalmente e os sensiacuteveis proacutepriosrdquo comum a todos os sentidos e se reduzem

agrave quantidade cujas espeacutecies satildeo a dimensatildeo e o nuacutemero (quantidade)364 Cada

oacutergatildeo sensorial diz o Estagirita ldquodiscrimina as diferenccedilas do sensiacutevel

correspondenterdquo e exemplifica com a discriminaccedilatildeo do branco e do preto pela visatildeo

e do doce e do amargo pelo paladar365

Com relaccedilatildeo aos sensiacuteveis comuns Aristoacuteteles aponta o movimento o

repouso o nuacutemero a unidade a figura e a grandeza366 sendo que os dois uacuteltimos

podem ser percebidos somente pelo tato e pela visatildeo367 A quantidade por sua vez

eacute ldquoo sujeito proacuteximo da qualidade modificante tal como a superfiacutecie em relaccedilatildeo agrave

corrdquo Por isso ldquoos sensiacuteveis comuns natildeo movem os sentidos de forma direta e

natural senatildeo em razatildeo da qualidade sensiacutevelrdquo mas satildeo ldquorealidades sensiacuteveisrdquo

percebidas diretamente ldquojaacute que estabelecem diversidade na alteraccedilatildeo do

sentidordquo368 Ou seja a percepccedilatildeo dos sensiacuteveis comuns pelos sentidos daacute-se com a

percepccedilatildeo dos sensiacuteveis proacuteprios369 mas aqueles satildeo percebidos porque causam

diferenccedila no sentido em razatildeo do movimento a partir do qual se percebe a

grandeza que permite perceber a figura e tambeacutem a quantidade pode ser percebida

quer pelo movimento pela negaccedilatildeo do contiacutenuo quer pelos sensiacuteveis proacuteprios pois

diz o Estagirita ldquocada sensaccedilatildeo percepciona uma uacutenica coisardquo370

Haacute ainda o sensiacutevel por acidente que eacute aquele que natildeo faz diferenccedila no que

toca agrave sua espeacutecie na imutaccedilatildeo do sentido e isto se daacute com um sensiacutevel proacuteprio de

determinado sentido captado por outro371 como quando se percebe o doce com a

visatildeo372

364

TOMAacuteS DE AQUINO 2012 Q VIII p 171 365

ARISTOacuteTELES 2010 III 2 p 107 366

Ibid II 6 p 79 Ibid III p 102 367

TOMAacuteS DE AQUINO 2000 II l 13 386 368

Id 2012 Q VIII p 171 369

Id 2000 II l 13 388 ARISTOacuteTELES 2010 III 1 p 103 370

ARISTOacuteTELES 2010 III 1 p 103 371

TOMAacuteS DE AQUINO 2000 II l 13 393-394 Ibid III l 1 577 ARISTOacuteTELES 2010 III 1 p 103

372 TOMAacuteS DE AQUINO 2000 III l 1 579-580

87

552 Sentidos internos

Diz Tomaacutes de Aquino

[] eacute necessaacuterio que o animal busque certas coisas e fuja de outras natildeo soacute por que lhe sejam convenientes ou prejudiciais ao sentido mas tambeacutem por certas outras conveniecircncias e utilidades ou prejuiacutezos Por exemplo a ovelha vendo o lobo aproximar-se foge natildeo porque a figura ou a cor do lobo lhe seja repulsiva mas porque o que estaacute vindo eacute um inimigo da sua proacutepria natureza O paacutessaro recolhe a palha natildeo para sentir prazer mas porque eacute uacutetil para a contruccedilatildeo de seu ninho Para fazer isso eacute necessaacuterio que o animal possa perceber essas intenccedilotildees que natildeo percebem os sentidos exteriores Ademais eacute preciso que nele exista um princiacutepio proacuteprio para tal percepccedilatildeo jaacute que a percepccedilatildeo do sensiacutevel proveacutem da alteraccedilatildeo do sentido coisa que natildeo ocorre com a percepccedilatildeo das intenccedilotildees

373

Os sensiacuteveis proacuteprios e os comuns satildeo captados pelos sentidos de duas

maneiras por duas potecircncias374 Primariamente pelos sentidos externos

correspondentes de modo exclusivo aos quais cabe julgar os objetos que lhes satildeo

proacuteprios como por exemplo em relaccedilatildeo agrave visatildeo discriminar fazer a distinccedilatildeo entre

as cores ou os objetos compartilhados e acidentais da mesma forma distinguindo

por exemplo o largo e o estreito como se viu

Em segundo lugar a discriminaccedilatildeo entre o doce e o branco natildeo pode ser feita

por um sentido proacuteprio por oacutergatildeos sensoriais distintos e em tempos diferentes375 e

entatildeo esta tarefa eacute desempenhada pelo primeiro dos sentidos internos ndash ou

potecircncias sensitivas interiores ndash aquele que eacute considerado ldquoraiz e princiacutepiordquo e que

tambeacutem eacute fim como um centro dos sentidos externos e das imutaccedilotildees destes376 ndash

dentre os quais o tato como base de todos os sentidos estaacute mais proacuteximo377 ndash ou

seja onde os resultados de todas elas seratildeo percebidos o sentido comum que

apresentaraacute juiacutezo de discernimento discriminaraacute os sensiacuteveis e faraacute a distinccedilatildeo

373

ldquo[] es necesario que el animal busque unas cosas y huya de otras no soacutelo porque le sean convenientes o perjudiciales al sentido sino tambieacuten por otras conveniencias utilidades o perjuicios Ejemplo La oveja al ver venir el lobo huye no porque la figura o el color del lobo sea repulsiva sino porque el que viene es un enemigo de su propia naturaleza El paacutejaro recoge pajas no para tener un placer sino porque son uacutetiles para la construccioacuten de su nido Para hacer eso es necesario que el animal pueda percibir esas intenciones que no percibe el sentido exterior Ademaacutes es preciso que en eacutel exista un principio propio para dicha percepcioacuten ya que la percepcioacuten de lo sensible proviene de la alteracioacuten del sentido cosa que no ocurre con la percepcioacuten de las intencionesrdquo TOMAacuteS DE AQUINO 2001 Q 78 a 4 p 719

374 O termo ldquopotecircnciardquo aqui tem o sentido de ldquoprinciacutepio motorrdquo

375 ARISTOacuteTELES 2010 III 2 p 107-108

376 TOMAacuteS DE AQUINO 2000 III l 3 609 Ibid l 12 773-774 Id 2001 Q 78 a 4 p 720

377 Ibid 2000 III l 3 602

88

entre eles percebendo as intenccedilotildees dos sentidos (como quando algueacutem vecirc que

vecirc)378

O sentido comum tambeacutem faz o juiacutezo e o discernimento finais dos contraacuterios

captados pelos sentidos proacuteprios379 Os sensiacuteveis seratildeo nele unificados em uma

imagem que seraacute retida e conservada e no caso do homem processada por outro

sentido interno a imaginaccedilatildeo ou fantasia que eacute um movimento produzido pela

atualizaccedilatildeo dos sentidos quando estes vecircm a ato pelo movimento dos sensiacuteveis e

que por isso eacute semelhante aos sentidos e aos sensiacuteveis jaacute que diz Tomaacutes de

Aquino380 o efeito produzido pelo agente que eacute a causa eficiente eacute semelhante a

este mesmo

A imaginaccedilatildeo propiciaraacute aos animais a apreensatildeo das coisas sensiacuteveis

tambeacutem quando elas natildeo estiverem fisicamente presentes o que se daacute pela

formaccedilatildeo na mente da ldquoimagemrdquo (ou ldquofantasmardquo) Aristoacuteteles distingue a imaginaccedilatildeo

que natildeo existe sem a percepccedilatildeo sensorial da suposiccedilatildeo que natildeo existe sem aquela

e cujos tipos que satildeo o do entender ele aponta ldquoa ciecircncia a opiniatildeo a sensatez

(que caracterizam o entender corretamente) e os contraacuterios destas (que

caracterizam o entender incorretamente)rdquo e do pensamento A imaginaccedilatildeo depende

da vontade ao passo que a formaccedilatildeo de opiniatildeo natildeo depende exclusivamente da

vontade podendo ser verdadeira ou falsa assim como a imaginaccedilatildeo sendo que

nesta pode-se produzir falsidade com muito mais frequecircncia e isto se daacute no caso da

imaginaccedilatildeo porque o efeito eacute mais fraco do que a causa e quanto mais ele se

distancia do agente que eacute causa eficiente (como quando a imaginaccedilatildeo ocorre na

ausecircncia dos sentidos) menos ele lhe eacute semelhante381 E porque a imaginaccedilatildeo eacute um

movimento da atualizaccedilatildeo dos sentidos o que entra na imaginaccedilatildeo eacute aquilo que

pode ser sentido mas jamais aquilo que eacute apenas inteligiacutevel382

A imagem eacute requisito necessaacuterio para o entendimento A alma pode perseguir

algo se apoacutes imaginaacute-lo afirma que eacute bom ou nega que seja mau e pode fugir de

algo se apoacutes imaginaacute-lo afirma que eacute mau ou nega que seja bom O ser do desejo

em ato e o ser da fuga em ato satildeo distintos satildeo atos diferentes mas seu princiacutepio

ou seja a faculdade do desejo a da fuga e a perceptiva natildeo satildeo diferentes entre si

378

TOMAacuteS DE AQUINO 2000 II l 13 390 Id 2001 C 78 a 4 p 720 379

Ibid III l 3 613 380

Ibid III l 6 656 e 659 Id 2001 Q 78 a 4 p 719 ARISTOacuteTELES 2010 III 3 p 113 381

ARISTOacuteTELES 2010 III 3 p 110-111 TOMAacuteS DE AQUINO 2000 III l5 638 Ibid l 6 664-665

382 TOMAacuteS DE AQUINO 2000 III l 6 657

89

em seu sujeito senatildeo somente na definiccedilatildeo A distinccedilatildeo e a apreensatildeo dos sentidos

pode gerar por aquelas accedilotildees que propiciam o bem dos sentidos o agradaacutevel que

conveacutem que causa prazer ou o mal que causa repulsa tristeza que natildeo conveacutem

estimulando a fuga respectivamente quando o sentido comum se relaciona como

uma espeacutecie de meio com os sentidos proacuteprios Eis o que move o apetite o desejo

dos quais partem certas accedilotildees383 Santo Tomaacutes divide entatildeo em trecircs graus o

percurso que faz o movimento sensiacutevel ldquoem primeiro lugar os sentidos apreendem

o sensiacutevel como conveniente ou nocivo em segundo lugar segue-se disto o prazer

ou a tristeza e em terceiro lugar por fim segue-se o desejo ou a fugardquo384

Mas a respeito disto o Aquinate aponta pelo modo como expressa

Aristoacuteteles para duas diferenccedilas entre o intelecto e os sentidos A primeira eacute que no

que toca ao intelecto que conhece e pode ser movido por um bem universal ou por

um mal universal da apreensatildeo do bem ou do mal o desejo ou a fuga pode seguir-

se imediatamente enquanto que os sentidos requerem necessariamente o terceiro

elemento ou seja o prazer ou a tristeza porque satildeo movidos por um bem

determinado ou por um mal determinado A segunda eacute que explica diz o Estagirita

simplesmente que o intelecto afirma ou nega enquanto os sentidos o fazem sempre

ldquode alguma maneirardquo385

Assim como as espeacutecies satildeo captadas pelo sentido proacuteprio e pelo sentido

comum e em seguida retidas pela imaginaccedilatildeo ou fantasia as intenccedilotildees que natildeo

satildeo apreendidas pelos sentidos tal como ldquoo nocivo e o uacutetilrdquo386 satildeo captadas pela

estimativa (ou no caso do homem cogitativa) e retidas pela memoacuteria os outros dois

sentidos internos

Explica Muszalski que

[] quando Santo Tomaacutes diz que a estimativa-cogitativa eacute apreensiva das intenccedilotildees particulares natildeo quer dizer tanto que tende a elas como a seu fim mas que a intenccedilatildeo particular equivale a uma forma presente na coisa e que esta faculdade pode apreender essa forma em concreto []

383

ARISTOacuteTELES 2010 III 7 p 120 TOMAacuteS DE AQUINO 2000 III l 12 768 384

ldquo[] en premier le sens saisit le sensible comme convenant ou nocif en second il srsquoensuit de cela plaisir ou tristesse en troisiegraveme par ailleurs il srsquoensuit deacutesir ou fuiterdquo TOMAacuteS DE AQUINO 2000 III l 12 p 768

385 ldquo[] de quelque manieacutererdquo ou seja do modo pelo qual os sentidos apreendem

particularmente determinado objeto Ibid III l 12 771-772 386

Id 2012 Q XIII p 273

90

E quanto agraves intenccedilotildees prossegue ldquotratam-se de aspectos de benefiacutecio e

prejuiacutezo que satildeo sensiacuteveis per accidens com relaccedilatildeo aos sentidos externos []rdquo387

Muszalski aponta ainda que enquanto as formas sensiacuteveis captadas pelos

sentidos externos satildeo beneacuteficas ou nocivas para o respectivo sentido sendo

determinantes para a subsistecircncia do indiviacuteduo as intenccedilotildees satildeo formas que tecircm

como conteuacutedo um valor natildeo para o proacuteprio sentido da estimativa-cogitativa mas

para o indiviacuteduo e inclusive para a espeacutecie sendo por isto determinante para ambos

Eacute nesse processo que eacute acidental de captaccedilatildeo e retenccedilatildeo das intenccedilotildees

das espeacutecies intencionais de conveniecircncia e prejuiacutezo ndash e que confere a noccedilatildeo de

determinado fim e o conhecimento da proporcionalidade entre este e certa atividade

desempenhada para alcanccedilaacute-lo ndash que residem duas diferenccedilas fundamentais entre

o homem e os demais animais no tocante aos sentidos internos Diz Santo Tomaacutes

que ldquoos animais percebem-nas somente por um instinto natural enquanto que o

homem as percebe por uma comparaccedilatildeordquo388 ou juicio collativo (juiacutezo discursivo)

ldquoinvestigando e discorrendordquo389

Assim por reunir ndash e comparar compor e dividir em um discurso ndash as

intenccedilotildees particulares individuais que os demais sentidos natildeo captam e sendo por

isto denominada pelos escolaacutesticos intentiones insensatae a faculdade estimativa eacute

no homem chamada cogitativa ou ldquorazatildeo particularrdquo ou ainda ldquoentendimento

passivordquo ou ldquointelecto passivordquo390 pelo que no homem o ser natural se move ao

apetite sensitivo391 A palavra cogitativa segundo Muszalski392 vem do verbo latino

cogitare que significa ldquopensamentordquo ldquoideiardquo ldquorepresentaccedilatildeordquo como junccedilatildeo entre a

preposiccedilatildeo cum (ldquocomrdquo) e o verbo agitare (ldquoagitarrdquo mover algo forte ou

repetidamente) e este complementa vem de agere (ldquolevarrdquo ldquoconduzirrdquo ldquoguiarrdquo)

concluindo que cogitare eacute um verbo que implica movimento e que pode-se traduzir

387

ldquo[] cuando Santo Tomaacutes dice que la estimativa-cogitativa es apreensiva de las intenciones particulares no quiere decir tanto que tende a ellas como a su fin sino que la intencioacuten particular equivale a una forma presente en la cosa y que esta facultad puede aprehender esa forma en concreto [] las intenciones [] se tratan de aspectos de beneficio y prejuicio que son sensibles per accidens respecto de los sentidos externosrdquo MUSZALSKI 2014 p 88-89

388 ldquo[] los animales las perciben soacutelo por un instinto natural mientras que el hombre las

percibe por una comparacioacutenrdquo TOMAacuteS DE AQUINO 2001 Q 78 a 4 p 719 389

Id 2012 Q XIII p 273 390

Ibid p 273 Id 1990b L II c LX p 273-274 Id 2001 Q 78 a 4 p 718-719 Na Suma Teoloacutegica Tomaacutes de Aquino (1993 Q 51 a 3 p 398) diz que Aristoacuteteles (2010 L 3 p 117) chama ldquoentendimento passivordquo e ldquorazatildeo particularrdquo a potecircncia cogitativa juntamente com a memoacuteria e a imaginaccedilatildeo

391 TOMAacuteS DE AQUINO 2001 Q 81 a 3 p 745

392 MUSZALSKI 2014

91

como lsquomover conjuntamentersquo ou lsquoconduzir junto com outrorsquo393 e entatildeo significa

ldquopensarrdquo como ldquoo movimento da razatildeo em sua busca discursivardquo394

Para a cogitativa e portanto isto natildeo se daria nos animais natildeo humanos a

imaginaccedilatildeo tambeacutem compotildee e divide as formas imaginadas o que Tomaacutes de

Aquino exemplifica com a capacidade de unir-se a imagem do ouro agrave de uma

montanha e entatildeo poder-se imaginar uma montanha de ouro395 Esse exerciacutecio

voluntaacuterio da imaginaccedilatildeo seria o que possibilita ao ente intelectivo a resoluccedilatildeo de

problemas por meio do pensamento

Jaacute a memoacuteria possibilita que o que foi apreendido seja novamente chamado agrave

consideraccedilatildeo atual O Estagirita jaacute reconhecia que ela estaacute presente em animais natildeo

humanos e ainda que ela opere nestes sem investigaccedilatildeo torna alguns mais aptos

ao aprendizado396 Somente no homem ela opera mediante investigaccedilatildeo e estudo o

que se daacute por ele tambeacutem possuir a faculdade da reminiscecircncia a memoacuteria

voluntaacuteria que lhe possibilita analisar silogisticamente as intenccedilotildees do passado

armazenadas397 Observa o Aquinate ainda que ldquoos atos das outras potecircncias

sensitivas se produzem segundo um movimento que vai das coisas para a alma

enquanto o da memoacuteria se efetua ao contraacuterio segundo um movimento que vai da

alma para as coisasrdquo398

E tal como a reminiscecircncia a cogitativa tambeacutem se deve agrave afinidade e agrave

razatildeo universal agrave repercussatildeo desta em ambas399 Assim se caracterizam o ato

daquela o comparar o compor e o dividir o ato da reminiscecircncia eacute fazer uso do

silogismo a fim de indagar400

Enquanto os sentidos em geral captam os acidentes a estimativa em especial

tem como objeto proacuteprio a quididade singular pela materialidade desta ainda que

natildeo a apreenda pela mateacuteria em si por soacute poder ser conhecida por sua analogia com

a forma401

393

ldquo[] cogitare es un verbo que implica movimiento y que puede traducirse como lsquomover conjuntamentersquo o lsquoconducir junto com otrorsquordquo MUSZALSKI 2014 p 80

394 ldquo[] el movimiento de la razoacuten en su buacutesqueda discursivardquo Ibid p 80

395 TOMAacuteS DE AQUINO 2001 Q 78 a 4 p 719-720

396 ARISTOacuteTELES 2005 L I 980a e 980b p 3

397 TOMAacuteS DE AQUINO 2001 Q 78 a4 p 719 Id 2012 Q XIII p 275

398 Id 2012 Q XIII p 275

399 Id 2001 Q 78 a4 p 720

400 Ibid Q 78 a 4 p 718

401 Id 1999 p 97-98

92

Retomando a cogitativa neste sentido Tomaacutes de Aquino diz que ldquocogitarrdquo (ou

ldquopensarrdquo) como ato da faculdade cogitativa eacute

[] propriamente o movimento da mente que delibera quando ainda natildeo chegou agrave perfeiccedilatildeo pela visatildeo plena da verdade Mas esse movimento da mente quando cogita pode versar antes sobre as intenccedilotildees universais caso em que pertence agrave parte intelectiva ou antes sobre representaccedilotildees particulares o que pertence agrave parte sensitiva Daiacute que em um segundo sentido pensar eacute ato da inteligecircncia que indaga e em outro terceiro sentido eacute ato da faculdade cognoscitiva

402

Assim explica Muszalski que quando se diz que a cogitativa eacute acidental isto

se daacute por ela secirc-lo em relaccedilatildeo agrave razatildeo ao tocar nesta enquanto estimativa por seu

modo de operar entre o sensitivo e o intelectivo e entatildeo diz ser apropriado

denominaacute-la ldquoobjeto formal quod acidentalrdquo403

56 INTELECTO

Com o produto final da operaccedilatildeo dos sentidos internos ou seja a imagem ou

fantasma tem iniacutecio o processo intelectivo no homem pelo qual este agora

reconhecendo as intenccedilotildees ou espeacutecies intencionais universais404 sabe ou seja

discrimina discerne (o que pertence ao juiacutezo) e concebe (apreende o que

discerniu)405 discorre e faz suposiccedilotildees ou seja forma concepccedilotildees e juiacutezos406

conhece o verdadeiro e o falso407 Se os sentidos e a imaginaccedilatildeo limitam-se agrave

apreensatildeo dos acidentes externos o intelecto diz o Aquinate ldquopenetra ateacute a

essecircncia das coisasrdquo e pode ser entendido de dois modos quando se apreende as

quididades ou quando se conhece os primeiros princiacutepios diretamente na coisa a

partir do conhecimento da quididade desta (razatildeo pela qual o intelecto eacute tido como o

402

ldquo[] propiamente el movimiento de la mente que delibera cuando todaviacutea no ha llegado a la perfeccioacuten por la visioacuten plena de la verdad Pero ese movimiento de la mente cuando piensa puede versar bien sobre las intenciones universales en cuyo caso pertenece a la parte intelectiva bien sobre representaciones particulares lo cual pertenece a la parte sensitiva De ahiacute que en un segundo sentido pensar es acto de la inteligencia que indaga y en otro tercer sentido es acto de la facultad cognoscitivardquo TOMAacuteS DE AQUINO 1990 Q 2 a 1 p 60

403 MUSZALSKI 2014 p 98

404 TOMAacuteS DE AQUINO 2001 Q 78 a 4 p 719

405 Id 2000 III l 7 672

406 ARISTOacuteTELES 2010 III 4 p 114 TOMAacuteS DE AQUINO 2000 III l 7 683

407 TOMAacuteS DE AQUINO 2000 III l 13 793

93

ldquohaacutebito dos princiacutepiosrdquo) ou ldquoenquanto abarca todas as operaccedilotildees tais como opinar e

raciocinarrdquo408

O homem eacute proporcionalmente dotado com o maior ceacuterebro em relaccedilatildeo agrave sua

quantidade e sendo o uacutenico animal ereto possui a cabeccedila no alto o que segundo o

aristotelismo-tomismo se daacute para maior liberdade de sua operaccedilatildeo principal a

intelecccedilatildeo para a qual o corpo humano se dispotildee409 uma vez que as coisas

inferiores existem em funccedilatildeo das superiores o que permite definir suficientemente

por determinado fim as coisas que existem para este mesmo fim410 E quanto mais

um ente possui a razatildeo de ldquoserrdquo mais elevado eacute o que fica evidente pela razatildeo

entre potecircncia e ato pois como explica Tomaacutes de Aquino411 diz-se propriamente

que ldquoeacuterdquo natildeo o que estaacute em potecircncia mas o que estaacute em ato

Observa Aristoacuteteles que os agentes que produzem o ato da percepccedilatildeo ou

seja os sensiacuteveis que satildeo particulares satildeo externos ao passo que satildeo internos os

universais que de algum modo estatildeo na alma mesma e entatildeo produzem a ciecircncia

Tomaacutes de Aquino acrescenta que ldquoos universais enquanto universais existem

somente na alma As naturezas proacuteprias em contrapartida que assumem a intenccedilatildeo

de universalidade existem nas coisasrdquo412

Em razatildeo disto o entendimento depende da vontade daquele que entende

enquanto a percepccedilatildeo natildeo depende necessariamente413 O Estagirita define

ldquoentendimentordquo como aquilo ldquocom que a alma discorre e faz suposiccedilotildeesrdquo414

Eacute por semelhanccedila que um objeto conhecido se faz presente naquilo que

conhece produzindo entatildeo o conhecimento de modo que assim como haacute

atualizaccedilatildeo dos sentidos pelos sensiacuteveis ndash que entatildeo imprimiratildeo neles certa

semelhanccedila de natureza corporal delimitada pelas dimensotildees caracteriacutesticas da

mateacuteria e que eacute um modo de conhecer ndash assim tambeacutem aquilo que a inteligecircncia

intelige a saber as espeacutecies inteligiacuteveis que procedem da abstraccedilatildeo formal da

mateacuteria produziratildeo nela certa semelhanccedila caracterizando outro modo de conhecer

de conceber onde haacute tal como nos sentidos distinccedilatildeo e apreensatildeo mas aqui agrave luz

408

TOMAacuteS DE AQUINO 1988 a XII p 92-93 409

Id 2012 Q VIII p 171 e 181 410

Id 2006 p 25 411

Ibid p 73 412

ldquo[] les universels en tant quuniversels nexistent que dans lacircme Les natures mecircmes par contre qui revecirctent lintention duniversaliteacute existent dans les chosesrdquo Id 2000 II l 12 380

413 ARISTOacuteTELES 2010 II 5 p 77

414 Ibid III 4 p 114

94

do intelecto com formaccedilatildeo de uma afirmaccedilatildeo ou de uma negaccedilatildeo o que nos

sentidos equivaleria ao surgimento do agradaacutevel ou da tristeza415

O intelecto ou inteligecircncia concebe o que eacute separaacutevel dos sensiacuteveis natildeo

separadamente ou seja a distinccedilatildeo eacute feita porque o separaacutevel pode ser entendido

em si mas natildeo existe sem o objeto do qual eacute racionalmente separado Eacute assim que

o intelecto abstrai os entes matemaacuteticos da mateacuteria sensiacutevel E de modo semelhante

a inteligecircncia abstrai o universal do particular ao conceber a natureza das espeacutecies

sem seus princiacutepios individuantes que compotildeem sua definiccedilatildeo416

Para o aristotelismo-tomismo o intelecto eacute parte da alma417 que

diferentemente dos sentidos ndash que natildeo conhecem a si mesmos nem agraves suas

operaccedilotildees (a visatildeo por exemplo natildeo vecirc que vecirc) ndash conhece a si mesmo e agrave sua

operaccedilatildeo (a intelecccedilatildeo)418 e intelige indefinidamente refletindo inclusive sobre si

mesmo (algo que natildeo se daacute com os sentidos)419 Ademais nada haacute em seu interior

que seja alguma natureza por ele conhecida420 sendo portanto de modo anaacutelogo

aos sentidos (mas enquanto a parte sensitiva recebe as formas nos oacutergatildeos e natildeo

em si mesma a intelectiva recebe em si mesma e natildeo nos oacutergatildeos421) e estaacute em

potecircncia para aquilo que conhece atualizando-se naquilo que pensa no instante em

que pensa422

O intelecto possui uma natureza pela qual estaacute em potecircncia para toda a

natureza sensiacutevel universalmente423 Ele natildeo se corrompe com o excesso de

inteligiacuteveis tambeacutem ao contraacuterio dos sentidos que satildeo corrompidos pelo excesso de

sensiacuteveis como jaacute se disse se entende algo em grau maior natildeo passa a entender

pior o que houver de inferior mas ao contraacuterio entende ainda melhor e conhece

melhor as coisas inferiores agrave medida que conhece as mais elevadas Possui

portanto um grau de impassibilidade muito superior ao dos sentidos424

415

TOMAacuteS DE AQUINO 2000 III l 12 767 416

Ibid III l 12 781 e 784 417

ARISTOacuteTELES 2010 III 4 p 113 418

TOMAacuteS DE AQUINO 2009 p 151 Id 2000 l 24 556 Id 1990b L II c LXVI p 285 419

Id 2009 p 151 Id 2000 l 24 556 420

Pois de outro modo obstruiria o conhecimento das outras naturezas assim como na visatildeo natildeo poderia haver uma cor sem que impedisse a captaccedilatildeo das demais ndash o que parte do entendimento de que o que se encontra no interior haveraacute de impedir ou de obstruir o que se encontra fora (cf ARISTOacuteTELES 2010 III 4 p 114)

421 TOMAacuteS DE AQUINO 2009 p 67

422 Ibid p 63 e 65

423 Id 2000 III l 7 681

424 ARISTOacuteTELES 2010 III 4 p 114-115 TOMAacuteS DE AQUINO 2000 III l 7 687 Tomaacutes

de Aquino 1990b L II c LXVI p 285

95

Segundo o Estagirita o intelecto eacute o lugar das espeacutecies425 o lugar das formas

em potecircncia426 uma taacutebua na qual nada haacute que esteja escrito em ato ainda que de

certa maneira seja os inteligiacuteveis em potecircncia427 A alma intelectual eacute de certa

maneira todas as coisas e isto se daacute porque nela atualizam as formas inteligiacuteveis de

todas as coisas428 as formas comuns e universais diz o Aquinate pelas quais o

entendimento que apreende a forma inteligiacutevel sem a contraccedilatildeo que a forma

substancial sofre ao ser recebida pela mateacuteria prima de modo que aquela esteja no

entendimento ldquosegundo a razatildeo de sua comunidaderdquo429

O intelecto integra duas partes Uma delas eacute o intelecto possiacutevel cuja

doutrina aristoteacutelica o Aquinate define assim ldquoeacute alguma coisa da alma que eacute ato de

um corpo isto poreacutem sem que esse intelecto da alma possua qualquer oacutergatildeo

corporal tal como sucede com as restantes faculdades da almardquo430 E partindo da

definiccedilatildeo de inteligecircncia de Aristoacuteteles de que eacute aquilo com que a alma forma

concepccedilotildees e juiacutezos conclui que o intelecto possiacutevel eacute em um sentido formal o que

cada homem pensa431

Eacute portanto certa forccedila ou potecircncia da alma humana que estando em

potecircncia para todos os inteligiacuteveis432 (e inclusive intelige-se a si mesmo ldquopor uma

forma sua pela qual ele se faz em atordquo433) recebe da outra parte do intelecto (jaacute que

natildeo pode produzir algo o que estaacute em potecircncia para este algo) o intelecto agente a

impressatildeo da imagem que eacute representativa de todas as coisas concretas tal como

os sentidos recebem a impressatildeo das espeacutecies sensiacuteveis dos acidentes (aqui

poreacutem sem a necessidade de um agente tal como se daacute no intelecto)

Enquanto a imaginaccedilatildeo eacute movida pelos sentidos jaacute que uma potecircncia eacute

movida por outra as formas inteligiacuteveis por serem universais natildeo podem ser

425

ARISTOacuteTELES 2010 III 4 p 114 426

Ibid III 4 p 114 427

Ibid III 4 p 116 TOMAacuteS DE AQUINO 2009 p 133 428

TOMAacuteS DE AQUINO 2000 III l 13 789-790 Aristoacuteteles faz uma comparaccedilatildeo com a matildeo que assumiria no homem o papel dos instrumentos observados nos animais para ataque ndash o que eacute exemplificado pela caccedila ndash defesa e abrigo (cf ARISTOacuteTELES 2010 III 8 p 123 TOMAacuteS DE AQUINO 2000 III l 13 790)

429 Id 1949 Q 1 R p 14

430 Id 2009 p 69

431 Id 2000 III l 7 690

432 Potecircncia esta que natildeo eacute essecircncia da alma uma vez que seu ato natildeo eacute essencial

433 TOMAacuteS DE AQUINO 2012 Q X p 343

96

causadas pelas formas da imaginaccedilatildeo que satildeo individuais434 Assim o intelecto

possiacutevel recebe apenas espeacutecies universais

Os fantasmas servem para a alma intelectiva ou discursiva como as

sensaccedilotildees os objetos sensiacuteveis servem para os sentidos435 E tal como os sentidos

satildeo movidos por seus objetos proacuteprios as espeacutecies sensiacuteveis o intelecto possiacutevel

que estaacute diz Tomaacutes de Aquino ldquoem potecircncia para todas as coisas que satildeo

inteligiacuteveis pelo homem seraacute movido pelas espeacutecies inteligiacuteveis seus objetos

proacutepriosrdquo ele ldquodeve ser receptivo dessas mesmas coisasrdquo (e consequentemente

como se disse delas desprovido) de ldquotodas as formas e naturezas sensiacuteveisrdquo e

entatildeo natildeo tem oacutergatildeo corpoacutereo pois ldquoSe tivesse algum oacutergatildeo corpoacutereordquo

complementa ldquoestaria determinado a alguma natureza sensiacutevel assim como a

potecircncia visiva determina-se agrave natureza do olhordquo436

A outra parte integrada eacute o entendimento que assim como a luz faz de

cores em potecircncia cores em ato faz tambeacutem todas as coisas ou seja todos os

inteligiacuteveis apoacutes o entendimento anterior o intelecto possiacutevel tornar-se todas as

coisas437 eacute o intelecto agente um princiacutepio ativo particular que faz com que o ente

humano seja um ente inteligente em ato Eacute nas palavras de Echavarriacutea (2009) ldquoa

lsquoluz natural da mente e eacute o princiacutepio ativo de toda a vida do espiacuterito primeiramente

do entenderrdquo438 que por abstraccedilatildeo da mateacuteria e das condiccedilotildees materiais (os

princiacutepios de individuaccedilatildeo) produziraacute as espeacutecies inteligiacuteveis que natildeo preexistem

na natureza das coisas extraindo-as da imagem ou fantasma439

Assim se o intelecto possiacutevel eacute nas palavras do Aquinate ldquoaquele que eacute

passiacutevel de tornar-se qualquer coisardquo o intelecto agente eacute aquele ldquoque pode fazer

tudordquo440 Diz ele tambeacutem que

[] eacute necessaacuterio que em todo agente haja um princiacutepio formal pelo qual ele opere formalmente porque eacute impossiacutevel que um agente opere formalmente

434

TOMAacuteS DE AQUINO 2012 Q IV p 103 435

ARISTOacuteTELES 2010 III 11 p 130 TOMAacuteS DE AQUINO apud PEREIRA JUNIOR 2006 p 63

436 TOMAacuteS DE AQUINO 2012 Q II ps 59 e 61

437 ARISTOacuteTELES 2010 III 5 p 117

438 ldquo[hellip] es la luz natural de la mente y es el principio activo de toda la vida del espiacuteritu

primeramente del entenderrdquo ECHAVARRIacuteA 2009 p 131 439

A accedilatildeo do intelecto agente imaterial difere da accedilatildeo dos agentes naturais aquele abstrai da mateacuteria enquanto estes imprimem formas na mateacuteria

440 TOMAacuteS DE AQUINO 1988 Art II p 49

97

mediante algo que eacute separado dele segundo o ser [] o intelecto agente estaacute para os fantasmas iluminados assim como a arte para a sua obra

441

O intelecto agente possui quatro propriedades sendo somente a quarta a que

o diferencia do intelecto possiacutevel que eacute superado por aquele nas outras trecircs eacute

separaacutevel eacute impassiacutevel eacute sem mistura ou seja natildeo eacute composto de natureza

corpoacuterea nem estaacute associado a um oacutergatildeo corpoacutereo estaacute em ato por essecircncia

enquanto o intelecto possiacutevel estaacute em potecircncia por essecircncia442

Ao inerirem neste as espeacutecies inteligiacuteveis satildeo individuadas mas os

universais mediante estas poderatildeo vir a ser conhecidos por serem concebidos

apoacutes os princiacutepios individuantes serem abstraiacutedos443 Elas natildeo satildeo o que eacute inteligido

pelo intelecto mas aquilo mediante o que ele intelige salvo reflexivamente ou seja

ldquoenquanto intelige que intelige a si proacuteprio e ao que mais possa inteligirrdquo444 de modo

que a Fiacutesica e a Metafiacutesica versaratildeo sobre elas Tomaacutes de Aquino explica o modo

como o intelecto intelige a si mesmo ldquomediante a espeacutecie inteligiacutevel dos demais

inteligiacuteveis pois por meio do objeto conhece sua operaccedilatildeo e mediante esta vem a

conhecer a si mesmordquo445

Em relaccedilatildeo ao que pertence por si agrave espeacutecie enquanto universal a natureza

desta natildeo pode multiplicar-se por estarem fora de sua razatildeo os princiacutepios

individuantes Assim diz o Aquinate ldquopoderaacute o intelecto captar a espeacutecie para aleacutem

de todas as condiccedilotildees individuantes e assim captar-se-aacute algo uno E pelo mesmo

motivo o intelecto capta a natureza do gecircnerordquo446

Poreacutem se por um lado o intelecto capta o universal eacute indiretamente que ele

conhece o singular

[] mediante certa reflexatildeo na medida em que pelo fato de que apreende seu inteligiacutevel volta-se agrave consideraccedilatildeo de seu proacuteprio ato agrave da espeacutecie inteligiacutevel que eacute princiacutepio de sua operaccedilatildeo e agrave da origem desta mesma espeacutecie Deste modo alcanccedila a consideraccedilatildeo dos fantasmas e dos singulares que lhes correspondem Mas esta reflexatildeo soacute se pode dar mediante o concurso das virtudes cogitativas e imaginativas

441

TOMAacuteS DE AQUINO 2012 Q V p 117 442

Id 2000 III l 10 732-733 443

Id 2012 Q II p 67 444

Ibid Q II p 69 445

Ibid Q III p 89 446

Ibid Q IV p 101

98

Eacute portanto a potecircncia sensitiva que conhece os singulares apoacutes os oacutergatildeos

sensitivos receberem as espeacutecies individuais ou seja o homem conhece os

universais pelo intelecto e os singulares pelos sentidos e entatildeo pelo intelecto por

um ato reflexivo de retorno aos fantasmas jaacute que eacute deles que o intelecto abstrai as

espeacutecies inteligiacuteveis447 O Aquinate fundamenta

[] tudo que pode a virtude inferior pode-o tambeacutem a superior mas natildeo do mesmo modo senatildeo por outro mais elevado Por isso aquelas mesmas coisas que o sentido percebe materialmente e singularmente conhece-as o intelecto imaterialmente e universalmente

448

No entanto

[] natildeo eacute necessaacuterio que aquilo que o intelecto intelige tenha ser separadamente nas coisas da natureza Do mesmo modo tampouco eacute preciso propor a subsistecircncia dos universais fora dos singulares nem a dos matemaacuteticos fora das coisas sensiacuteveis uma vez que os universais satildeo as essecircncias dos proacuteprios particulares e os matemaacuteticos satildeo as delimitaccedilotildees dos corpos sensiacuteveis

449

O intelecto ou razatildeo universal assim move e dirige a cogitativa ou razatildeo

particular para que realize sua comparaccedilatildeo entre as intenccedilotildees particulares

viabilizando as conclusotildees particulares a partir de proposiccedilotildees universais do

raciociacutenio silogiacutestico450 Ele natildeo pode jamais conceber uma forma sem que conceba

a mateacuteria da qual depende a concepccedilatildeo dessa forma ainda que possa conceber

uma forma sem seus princiacutepios individuantes jaacute que seu objeto apropriado eacute a

quididade das coisas sensiacuteveis ainda que de um modo diferente daquele em que

elas estatildeo nas coisas sensiacuteveis mas sem que se produza falsidade na

inteligecircncia451 Enquanto as espeacutecies inteligiacuteveis satildeo aquilo pelo qual o intelecto

conhece a semelhanccedila da coisa na alma a quididade eacute aquilo que eacute conhecido452

Assim como satildeo uma soacute coisa o sensiacutevel em ato e o sentido em ato tambeacutem eacute uma

soacute coisa o intelecto em ato e o que eacute conhecido em ato453

447

TOMAacuteS DE AQUINO 2006 p 165 Id 2000 II l 5 284 Ibid II l 12 377 Ibid III l 7 675-676 Ibid III l 8 712-713

448 Id 2012 Q XX p 417

449 Id 2006 p 19

450 Id 2001 Q 81 a 3 p 745

451 Id 2000 III l 8 717

452 Ibid III l 8 718-719

453 Ibid III l 9 724

99

O intelecto em ato possui trecircs propriedades a de que a ciecircncia em ato eacute a

mesma coisa que a coisa conhecida a de que a ciecircncia em potecircncia eacute anterior agrave

ciecircncia em ato no tempo (quando no acircmbito singular a potecircncia eacute anterior ao ato) em

um mesmo sujeito mas natildeo anterior universalmente em relaccedilatildeo natildeo soacute agrave natureza

(quando o ato eacute anterior agrave potecircncia) como tambeacutem ao tempo e a de que estar em

ato implica aqui necessariamente conceber e entatildeo ele difere dos intelectos

possiacutevel e agente que podem conceber ou natildeo conceber454

E explica o Aquinate que como ldquoo sentido e o sensiacutevel em potecircncia satildeo

diferentes mas o sentido e o sensiacutevel em ato satildeo uma e a mesma coisardquo tambeacutem

assim ldquoo intelecto ou a ciecircncia em ato satildeo o mesmo que a coisa conhecida em

atordquo ao que pode-se agregar o que diz Aristoacuteteles ldquoNo caso das coisas imateriais

o que entende e o que eacute entendido satildeo o mesmo pois a ciecircncia teoreacutetica e o objeto

cientificamente cognosciacutevel satildeo o mesmordquo455 Tomaacutes de Aquino prossegue

[] o intelecto possiacutevel estaacute em potecircncia com respeito aos inteligiacuteveis segundo o ser que estes tecircm nos fantasmas E eacute segundo o mesmo ser que os inteligiacuteveis tecircm nos fantasmas que o intelecto agente estaacute em ato com respeito a eles mas um por uma razatildeo e outro por outra razatildeo

456

Mesmo quando natildeo haacute intelecccedilatildeo em ato as espeacutecies inteligiacuteveis que o ente

adquire em vida poderatildeo residir no intelecto possiacutevel Isto se daacute pelo intelecto in

habito que se manifesta quando as espeacutecies inteligiacuteveis encontram-se entre a

potecircncia e o ato no intelecto o que permite que o homem intelija em ato sempre que

desejar457 Assim o intelecto in habito eacute efeito do intelecto agente e se encontra

necessariamente no intelecto possiacutevel458 O primeiro ato do intelecto possiacutevel eacute

pois o haacutebito da ciecircncia (haacutebito permanente diga-se) que estaacute em parte no

intelecto e em parte nas virtudes sensitivas459 e de posse deste apoacutes aprender ou

encontrar o intelecto pode passar para o segundo ato que eacute o da operaccedilatildeo ao

mesmo tempo em que se manteacutem em potecircncia para a consideraccedilatildeo em ato de algo

podendo entatildeo conceber qualquer coisa inclusive a si mesmo460 pois o objeto da

454

TOMAacuteS DE AQUINO 2000 III l 10 740 455

ARISTOacuteTELES 2010 4 III p 116 456

TOMAacuteS DE AQUINO 2012 Q V p 119-121 457

Ibid Q XV p 323 458

Id 1990b L II c LX p 276 459

Id 2001 Q 89 a 5 p 806 460

Id 2009 p 133 Id 2000 III l 8 700 703-704

100

ciecircncia especulativa que pode ser conhecido e a ciecircncia especulativa em si tambeacutem

satildeo a mesma coisa461

Explica o Aquinate462 que a intelecccedilatildeo seraacute sempre ou praacutetica ou

especulativa e de um ou outro modo teraacute sempre iniacutecio e fim A inteligecircncia praacutetica

ou entendimento praacutetico ou entendimento operativo eacute relacionada agrave accedilatildeo que

considera algo falso ou verdadeiro em relaccedilatildeo a um operaacutevel particular ldquojaacute que a

accedilatildeo se executa nas situaccedilotildees particularesrdquo463 Quanto agrave inteligecircncia especulativa

ou entendimento especulativo considera somente o objeto da especulaccedilatildeo natildeo do

que eacute factiacutevel segundo um ato singular mas somente universalmente e portanto

natildeo move porque natildeo faz fugir ou buscar natildeo move o apetite mas eacute movida de

certo modo pelas coisas porque recebe delas que constituem assim sua medida

Ambas as inteligecircncias satildeo uma mesma potecircncia diferindo portanto quanto ao fim

Diz entatildeo Tomaacutes de Aquino

[] as coisas da natureza satildeo ao mesmo tempo comensurantes e comensuradas Ao contraacuterio a nossa inteligecircncia eacute comensurada eacute tambeacutem comensurante natildeo poreacutem em relaccedilatildeo agraves coisas criadas mas em relaccedilatildeo aos produtos do engenho humano

464

O que move o ente eacute portanto aquilo que desperta a faculdade apetitiva que

leva o ente a retornar ao objeto que serviu de motor inicial para o processo cognitivo

naquele com relaccedilatildeo a este465 Sobre este movimento Aristoacuteteles aponta que satildeo

inuacutemeras as partes da alma que participam dele a parte que raciocina a impulsiva

a apetitiva (que tambeacutem podem ser classificadas como racionais ou irracionais) a

nutritiva a perceptiva (que natildeo eacute facilmente classificaacutevel como racional ou

irracional) a imaginativa a desiderativa sendo que a parte apetitiva e a parte

impulsiva diferem entre si menos do que as demais o fazem entre si466

Segue-se portanto que

Existem entatildeo trecircs coisas uma o que move a segunda aquilo com que move e ainda uma terceira o que eacute movido Por seu turno o que move eacute duplo existe assim o que natildeo se move e o que move e eacute movido O que natildeo se move eacute o bem realizaacutevel atraveacutes da accedilatildeo jaacute o que move e eacute movido eacute a faculdade desiderativa E que o que eacute movido eacute movido em virtude de

461

TOMAacuteS DE AQUINO 2000 III l 9 724 462

Ibid I l8 119 Ibid III l 12 779-780 Ibid III l 14 813 Id 2001 Q 79 a 11 p 737 463

ldquo[] lrsquoaction srsquoexeacutecute dans les situations particuliegraveresrdquo Id 2000 III l 12 780 464

Id 1988 Art II p 48 465

Ibid Art II p 47 466

ARISTOacuteTELES 2010 III 9 p124-125 Ibid III 10 p 128

101

desejar e o desejo em actividade eacute um tipo de movimento O que eacute movido por sua vez eacute o animal

467

Em uacuteltima anaacutelise o que move e sem mover-se quando entendido e quando

imaginado eacute o objeto do desejo pela faculdade desiderativa pelo desejo mesmo

cujo objeto diz o Filoacutesofo eacute ldquoo princiacutepio do entendimento praacutetico enquanto o termo

final do raciociacutenio eacute entatildeo o princiacutepio da accedilatildeordquo e assim pela inteligecircncia praacutetica

pelo pensamento discursivo praacutetico que move porque tem como princiacutepio o objeto

do desejo e pela imaginaccedilatildeo que eacute racional ou perceptiva e sem a qual a

faculdade desiderativa natildeo pode existir que soacute move com o desejo inclusive nos

animais sem raciociacutenio E a faculdade desiderativa move nas ocasiotildees em que haacute

somente apetite e nas em que o apetite e o raciociacutenio mesmo quando um contraria

o outro como quando pelo entendimento sabemos que devemos negar um apetite

que visa a um prazer imediato em razatildeo de consequecircncias posteriores468

Quanto agrave faculdade de deliberar a razatildeo deliberativa que eacute princiacutepio motor

somente no homem um desejo pode sobrepor-se a ela e movecirc-la assim como um

desejo tambeacutem pode sobrepor-se a outro desejo e movecirc-lo ou ser movido tambeacutem

pela sobreposiccedilatildeo daquela Jaacute a faculdade cientiacutefica (a razatildeo especulativa) natildeo se

move pois natildeo leva a fugir ou a desejar Assim diz o Estagirita relacionados ao

universal existem uma suposiccedilatildeo e um enunciado e relacionado ao particular existe

uma suposiccedilatildeo Ele exemplifica ldquoA primeira diz que certo tipo de homem tem de

praticar um acto de certa natureza o segundo diz que este eacute um acto daquela

natureza e que eu sou um homem daquele tipordquo e em seguida conclui ldquoEacute esta

uacuteltima opiniatildeo a que move e natildeo a respeitante ao universal Ou talvez ambas

movam mas a primeira permanecendo preferencialmente em repouso e a

segunda natildeordquo469

O animal racional examina primeiramente as coisas por fazer a fim de medir

qual seraacute preferencial ou quais o seratildeo e entatildeo opta pela que lhe proporcionaraacute

mais bens ou pelas que lhes proporcionaratildeo isto pelo que manifestaraacute desejo Por

essa escolha do melhor haacute pois como aponta Tomaacutes de Aquino trecircs objetos

atuantes trecircs fantasmas que seratildeo convertidos em um soacute dois elementos em que

467

ARISTOacuteTELES 2010 III 10 p 128 468

Ibid III 10 p 127-129 469

Ibid III 11 p 129-131

102

um seraacute preferiacutevel ao outro e uma medida que seraacute aquilo que torna um deles

preferiacutevel que eacute a opiniatildeo470

O fim da intelecccedilatildeo especulativa seraacute sempre as obras da razatildeo que satildeo a

definiccedilatildeo referente agrave intelecccedilatildeo simples e a demonstraccedilatildeo471 que compotildeem as trecircs

operaccedilotildees que se desdobram do intelecto in habito

a) A primeira consiste na apreensatildeo na simples captaccedilatildeo dos aspectos

inteligiacuteveis nas coisas eacute a intelecccedilatildeo propriamente dita na qual ocorre a

conceituaccedilatildeo e a definiccedilatildeo que tem o ldquogecircnero generaliacutessimordquo como

princiacutepio e a ldquoespeacutecie especialiacutessimardquo472 como termo473

b) A segunda eacute o juiacutezo que possibilita melhor conhecimento da realidade

onde ocorrem composiccedilatildeo e divisatildeo dos aspectos inteligiacuteveis

c) A terceira eacute o raciociacutenio propriamente dito que eacute desdobramento da

anterior

O iniacutecio das operaccedilotildees tem como base a apreensatildeo simples (aprehensio

simplex) do intelecto e caracteriza-se pela concepccedilatildeo das essecircncias indivisiacuteveis ou

outras incomplexas nas quais natildeo haacute distinccedilatildeo entre verdadeiro e falso que estatildeo

separadas entre si e entatildeo satildeo compostas para formar conceitos e a partir destes

mais conceitos Eacute a primeira inteligecircncia Diz Tomaacutes de Aquino que

[] a primeira coisa que a inteligecircncia concebe como a mais conhecida e agrave qual se reduz tudo eacute o ente [] todos os outros conceitos da inteligecircncia se obtecircm por adjunccedilatildeo ao ente Ora ao ente natildeo se pode acrescentar algo agrave maneira de uma natureza estranha assim como por exemplo a diferenccedila especiacutefica se acrescenta ao gecircnero ou o acidente ao sujeito uma vez que toda natureza eacute essencialmente um ente

474

E explica que o que se pode acrescentar ao ente eacute somente o que expressa

um modo seu determinado seja ldquoquando o modo expresso constitui certo modo

especial do enterdquo por suas peculiaridades seja ldquoquando o modo expresso compete a

cada ser de maneira geralrdquo enquanto ldquoconveacutem a todo ente considerado em si

mesmordquo (o que ldquosignifica que o modo exprime no ente algo de maneira afirmativa ou

470

TOMAacuteS DE AQUINO 2000 III l 16 840 471

Ibid I l 8 119 472

Respectivamente ldquogenre geacuteneacuteralissimerdquo e ldquoespeacutece speacutecialissimerdquo 473

TOMAacuteS DE AQUINO 2000 I l 8 121 474

Id 1988 Art I p 41

103

negativardquo respectivamente coisa ndash ou seja a quididade ou a entidade do ente ndash e

indivisatildeo que eacute o ldquounordquo) ou ldquoenquanto conveacutem a todo ente em relaccedilatildeo a outrordquo ou

ldquoconforme a divisatildeo ou distinccedilatildeo de uma coisa da outra (o ente eacute algo que se

distingue de outro ente)rdquo ou ldquosegundo a concordacircncia de um ente com outrordquo (como

se daacute com a proacutepria alma como se viu que eacute dita de certo modo ser tudo)475

Com relaccedilatildeo ao julgamento ou juiacutezo pode-se fazer aqui certa comparaccedilatildeo

com o sentido comum pois assim como este como uma faculdade eacute o termo de

vaacuterios objetos sendo algo uacutenico que pode julgar todos os sensiacuteveis o intelecto

tambeacutem eacute o termo das imagens e algo uacutenico que pode julgar todas elas476

Quando forma a quidade das coisas que existem fora do espiacuterito o intelecto

possui apenas a imagem destas mas quando elabora juiacutezos sobre elas estes satildeo

algo que natildeo estatildeo no objeto mas pertencem somente ao intelecto que assim

desempenharaacute as atividades sintetizante e analisante e entatildeo a formulaccedilatildeo de

definiccedilotildees477

Estas diz o Estagirita podem ser um princiacutepio ou uma conclusatildeo de uma

demonstraccedilatildeo ou uma demonstraccedilatildeo que difere pela ordem pela posiccedilatildeo dos

termos do princiacutepio e da conclusatildeo mas sem que caracterize um raciociacutenio478 Na

definiccedilatildeo o ente toma o nome primeiramente a partir da substacircncia de maneira

absoluta e de maneira relativa e de certo modo dos acidentes479

A composiccedilatildeo que se desenrola de conceitos de pensamentos que resultaraacute

em uma unidade ou seja que os teraacute como uma coisa soacute pode incluir conceitos

atuais e conceitos passados e futuros e nela pode ocorrer falsificaccedilatildeo Tomaacutes de

Aquino explica que se se pode afirmar esses conceitos tambeacutem eacute possiacutevel negaacute-los

e portanto o que resulta e que pode relacionar-se ao presente ao passado e ao

futuro pode tambeacutem obter-se por divisatildeo como verdadeiro ou falso Assim a

composiccedilatildeo das proposiccedilotildees apoacutes a constituiccedilatildeo dos inteligiacuteveis natildeo pode ser obra

da natureza mas da razatildeo e da inteligecircncia Essa composiccedilatildeo e essa divisatildeo

ocorrem nos divisiacuteveis em que haacute verdadeiro e falso e natildeo nos indivisiacuteveis480 uma

vez que natildeo existe ali o falso

475

TOMAacuteS DE AQUINO 1988 Art I p 42 476

Id 2000 III l 12 775 477

Id 1988 Art III p 50-51 478

ARISTOacuteTELES 1995b I 8 75b p 333-334 TOMAacuteS DE AQUINO 2000 II l 1 212 479

TOMAacuteS DE AQUINO 2003 p 55 480

Aristoacuteteles e Tomaacutes de Aquino explicam os indivisiacuteveis apresentando alguns modos como o que eacute quanto agrave continuidade quantitativamente sendo entatildeo indivisiacutevel em ato ainda que natildeo o

104

Com base nesse processo haacute duas formas de conhecer-se algo a partir de

outro algo e segundo o Aquinate somente o segundo eacute que cria o discurso O

primeiro daacute-se

[] conhecendo-se uma coisa conhecida a partir de outra coisa conhecida de maneira que seja distinto o conhecimento de ambas como quando o homem conhece as conclusotildees a partir dos princiacutepios considerando a ambos separadamente

Jaacute o segundo daacute-se ldquoconhecendo-se uma coisa conhecida a partir da espeacutecie

pela qual eacute conhecida como quando vemos uma pedra pela proacutepria espeacutecie da

pedra que estaacute em nosso olhordquo

E a enunciaccedilatildeo explica o mesmo Tomaacutes de Aquino ldquoeacute a expressatildeo do

conhecimento da inteligecircnciardquo481 e tem por objeto e que eacute o objeto das ciecircncias as

coisas em si Ou seja o intelecto possiacutevel natildeo pensa as espeacutecies mas por elas as

coisas482 Diz tambeacutem o Aquinate que a ciecircncia eacute anterior ao pensamento que estaacute

para ele como a potecircncia estaacute para o ato483 Os fantasmas natildeo se formam somente

pela recepccedilatildeo direta dos sentidos mas tambeacutem indireta ou seja sempre que se

especula em ato ocasiatildeo em que mantecircm sua semelhanccedila com as coisas sensiacuteveis

previamente conhecidas na medida em que estas participam do ente e por isso ateacute

o raciociacutenio pode comprometer-se se houver lesatildeo no oacutergatildeo da fantasia484

seja em potecircncia como o satildeo os contiacutenuos temporal e espacial Neste caso o ato que entende e o objeto entendido satildeo divisiacuteveis por acidente

Um outro tipo eacute caracterizado pelo fato de que algo pode ser indivisiacutevel tambeacutem quanto agrave espeacutecie e pode tambeacutem referir-se a uma espeacutecie uacutenica composta por partes natildeo contiacutenuas que o intelecto concebe tambeacutem acidentalmente pois nessas mesmas partes algo haacute de indivisiacutevel que eacute a espeacutecie de cada uma delas conhecidas pelo intelecto conhecendo assim em um tempo indivisiacutevel o que natildeo se daria se conhecesse somente as partes enquanto divididas O indivisiacutevel do contiacutenuo eacute o mesmo em qualquer parte mas aquele em espeacutecie natildeo eacute o mesmo em tudo o que tem espeacutecie pois haacute o que eacute composto por partes homogecircneas e haacute o que o eacute por partes heterogecircneas

Outro modo de indivisiacutevel eacute aquele que o eacute absolutamente ou seja indivisiacutevel em potecircncia e ato que se mostra agrave inteligecircncia como privaccedilatildeo do contiacutenuo e do divisiacutevel como o ponto o momento e a unidade Em outras palavras o entendimento daacute-se por privaccedilatildeo o objeto eacute conhecido tambeacutem pelo seu contraacuterio tanto em uma afirmaccedilatildeo como em uma negaccedilatildeo Como o que vem dos sentidos eacute o que eacute primeiro apreendido pelo intelecto o que ultrapassa o que natildeo eacute sentido eacute conhecido por negaccedilatildeo E de um modo semelhante se passa com aquilo que eacute conhecido por seu contraacuterio ou oposto e este se relaciona com aquele sempre como privaccedilatildeo ou ao menos como imperfeiccedilatildeo isto desde que o intelecto esteja em potecircncia para conhecer ambas as espeacutecies que satildeo entre si contraacuterias (cf ARISTOacuteTELES 2010 III 6 p 117-119 TOMAacuteS DE AQUINO 2000 III l 11 746-756)

Tomaacutes de Aquino diz ainda que os fantasmas seriam indivisiacuteveis somente em potecircncia mas natildeo em ato por sua semelhanccedila com os objetos particulares mas natildeo menciona se estaria apontando para um quarto modo (cf TOMAacuteS DE AQUINO 2000 III l 13 794)

481 TOMAacuteS DE AQUINO 1988 Art X p 88

482 Id 2009 p 151

483 Id 2000 II l 1 228

484 Ibid III l 13 791-792 Id 1988 Art I p 44

105

Explica o Pe Calderoacuten que o raciociacutenio como a terceira operaccedilatildeo do

intelecto pressupotildee a segunda operaccedilatildeo o juiacutezo ndash que tambeacutem pressupotildee a

primeira a simples apreensatildeo ndash sem confundir-se com ela e tomando-a como

elemento de sua estrutura mental assim como o juiacutezo pressupotildee a primeira a

simples apreensatildeo

Assim ele define o raciociacutenio

[] a operaccedilatildeo do intelecto pela qual se explica ou se desenvolve um juiacutezo manifestando o porquecirc ou a causa eacute uma nova espeacutecie de operaccedilatildeo do espiacuterito mais complexa que o juiacutezo composta por uma sequecircncia especial ou uma conexatildeo especial de juiacutezos eacute como um movimento de juiacutezos que termina em um juiacutezo de condiccedilatildeo especial ao qual se chama Conclusatildeo O juiacutezo comum significa uma simples atribuiccedilatildeo do predicado ao sujeito O sujeito eacute de tal predicado Em contrapartida no juiacutezo que eacute conclusatildeo de um raciociacutenio a atribuiccedilatildeo do predicado ao sujeito eacute uma atribuiccedilatildeo iluminada pela causa O sujeito eacute-por-tal-causa de tal predicado Por isso devemos distinguir a operaccedilatildeo do espiacuterito pela qual se compotildee ou divide desta outra pela qual se explica ou conclui

485

Tomaacutes de Aquino explica que a razatildeo e o entendimento no homem satildeo uma

mesma potecircncia mas distingue seus atos ldquo[] entender consiste na simples

apreensatildeo da verdade inteligiacutevel Em contrapartida raciocinar eacute passar de um

conceito a outro para conhecer a verdade inteligiacutevelrdquo486

E o mesmo Pe Calderoacuten fornece-nos o que nos resta para completar o que

aqui tiacutenhamos de expor sobre o intelecto e mais especificamente sobre esta terceira

operaccedilatildeo cuja obra imaterial segundo o aristotelismo-tomismo diz eacute a

argumentaccedilatildeo (argumentatio) caracterizada por uma ldquotriangulaccedilatildeordquo mental ldquoentre o

Sujeito a Propriedade e a Causardquo487

O juiacutezo incorpora os conceitos de simples apreensatildeo ao modo da mateacuteria sob uma nova forma Mas o raciociacutenio eacute como um movimento por isso natildeo dizemos que os juiacutezos que o compotildeem sejam ao modo de mateacuteria mas antes ao modo de extremos os que explicam a causa satildeo o lsquoantecedentersquo e a conclusatildeo eacute o lsquoconsequentersquo[] O raciociacutenio pode cumprir uma dupla

485

ldquo[] la operacioacuten del intelecto por la que se explica o desplega un juicio manifestando el porqueacute o la causa [] es una nueva especie de operacioacuten del espiacuteritu maacutes compleja que el juicio compuesta por una especial secuencia o conexioacuten de juiacutecios [] es como un movimiento de juicios que termina en un juicio de condicioacuten especial al que se lo llama Conclusioacuten [] El juicio comuacuten significa una simple atribuicioacuten del predicado al sujeto El sujeto es de tal predicado En cambio en el juicio que es conclusioacuten de un razonamiento la atribuicioacuten del predicado al sujeto es una atribucioacuten ilumiada por la causa El sujeto es-por-tal-causa de tal predicado Por eso debemos distinguir la operacioacuten del espiacuteritu por la que se compone o divide de esta otra por la que se explica o concluyerdquo CALDEROacuteN 2011 p 74-75

486 ldquo[] entender consiste en la simple aprehensioacuten de la verdad inteligible En cambio

raciocinar es pasar de un concepto a otro para conocer la verdad inteligiblerdquo TOMAacuteS DE AQUINO 2001 Q 79 a 8 p 732

487 ldquo[] el Sujeto la Propiedad y la Causa []rdquo CALDEROacuteN 2011 p 75

106

funccedilatildeo Demonstrar uma verdade conhecida [] Descobrir uma verdade conhecida []

488

Destrinccedilada a doutrina aristoteacutelico-tomista sobre os processos cognitivos no

acircmbito fiacutesico e metafiacutesico sob a oacuteptica dessa corrente havemos de destacar agora

os resultados de alguns dos principais estudos que apontam caracteriacutesticas nos

animais natildeo humanos em que se verifica a presenccedila de consciecircncia e de

inteligecircncia segundo as definiccedilotildees utilizadas nas uacuteltimas deacutecadas para que sejam

posteriormente discutidas a partir de um esquema de distinccedilatildeo entre as potecircncias

estimativa cogitativa e intelectiva

488

ldquoEl jucio incorpora los conceptos de simple aprehensioacuten a manera de materia bajo una nueva forma Pero el razonamiento es como un movimiento por eso no decimos que los jucios que lo componen sean a modo de materia sino maacutes bien a modo de exemos los que explican la causa son el lsquoantecedentersquo y la conclusioacuten es el lsquoconsecuentersquordquo CALDEROacuteN 2011 p 75

107

6 INVESTIGACcedilAtildeO SOBRE A ATRIBUICcedilAtildeO DE INTELIGEcircNCIA AOS ANIMAIS

A palavra ldquointeligecircnciardquo eacute atribuiacuteda hoje em dia a uma gama de entes

inclusive em casos curiosos como o de Physarum polycephalum do reino Protista

um protozoaacuterio que segundo Nakagaki e colaboradores489 expande seu plasmoacutedio

em redes tubulares seguindo padrotildees que otimizam o forrageamento Van Loon490

afirma que as plantas apresentam como que de algum modo correspondendo ao

sistema nervoso animal uma rede de ceacutelulas que satildeo as mais complexas dentre os

viventes da qual emergiriam propriedades que diz serem inteligentes e que

implicam algum tipo de memoacuteria e de aprendizagem relacionadas ao modo tambeacutem

otimizado de lidar com situaccedilotildees de estresse revividas seja de natureza climaacutetica

predatoacuteria etc

No entanto somente os entes do reino Animalia apresentam uma estrutura

neural que lhes permite realizar operaccedilotildees cognitivas mais avanccediladas Assim nesta

etapa mencionaremos e descreveremos algumas pesquisas desenvolvidas com

alguns desses entes (ver tabelas 2-7) a fim de que possamos reunir um material que

nos forneccedila subsiacutedio para o cumprimento dos objetivos deste trabalho

Pesquisas como as de Dyer491 as de Menzel e colaboradores492 e as de

Collett e colaboradores493 demonstram que himenoacutepteros podem memorizar uma

miriacuteade de marcos de referecircncia espacial que satildeo calculados de diferentes modos e

servem de orientaccedilatildeo para o retorno agrave colmeia depois de percorridas longas

distacircncias em busca de alimento e tambeacutem posteriormente ao local visitado O

percurso pode ser feito ateacute por atalhos o que parece implicar a tomada de decisatildeo

(ldquodecision-makingrdquo) e inclusive por trilha de feromocircnios Collett e Graham494

demonstram que os indiviacuteduos mais novos podem aprender rotas seguindo outros

coespeciacuteficos

Em uma revisatildeo Brown495 aponta nos peixes essas caracteriacutesticas e relata

tambeacutem que eles apresentam relaccedilotildees de cooperaccedilatildeo entre si (por exemplo na

489

NAKAGAKI et al 2004 490

VAN LOON 2016 491

DYER 1994 492

MENZEL et al 2005 493

COLLETT et al 2013 494

COLLETT GRAHAM 2015 495

BROWN 2015

108

vigilacircncia contra predadores) reconciliam-se usam ferramentas (como pedras para

quebrar conchas de mariscos) etc

Os cefaloacutepodes tambeacutem apresentam caracteriacutesticas cognitivas marcantes

Mather e Dickel496 descrevem em uma revisatildeo a complexa estrutura neural desses

animais e apontam habilidades como a de discriminar ameaccedilas e avaliar e

categorizar os riscos que representam a de modificar e combinar reaccedilotildees para lidar

com predadores a de resolver testes cognitivos passando objetos por furos a

mudanccedila sofisticada de cor na epiderme para camuflagem e como meio de atraccedilatildeo

da fecircmea a transferecircncia de objetos para servirem de abrigo etc que mostram que

tecircm flexibilidade para diversificar accedilotildees que visem a determinado fim o que sugere

que possuam imaginaccedilatildeo capacidade desenvolvida de tomada de decisatildeo e algum

senso de causalidade e prospecccedilatildeo

Fiorito e colaboradores497 realizaram um conhecido experimento em que um

polvo (Octopus vulgaris) abria a tampa de um frasco para capturar uma presa dentro

deste o que aprendeu por tentativa e erro ou por associaccedilotildees de estiacutemulo e

resposta Em outro teste Fiorito e Scotto498 ensinaram alguns espeacutecimes a

escolherem bolas vermelhas como recompensa e a rejeitarem bolas azuis para

natildeo sofrerem puniccedilatildeo enquanto outros espeacutecimes observavam Quando aqueles

aprenderam a escolher a bola vermelha em todas as tentativas esses observadores

foram em seguida tambeacutem testados e escolheram majoritariamente as bolas

vermelhas Os pesquisadores concluiacuteram que os resultados sugerem que esses

indiviacuteduos aprenderam por observaccedilatildeo

Mather e Byrne e colaboradores499 apontam para a lateralizaccedilatildeo assimeacutetrica

nesses animais (movimentam os olhos independentemente um do outro tendo por

preferecircncia a visatildeo monocular) muito rara em invertebrados e comum nos

mamiacuteferos e nas aves

Quanto a estas apresentam desempenho muito proacuteximo ao dos mamiacuteferos

natildeo humanos Os pombos assim como os ratos foram utilizados largamente em

testes cognitivos como nas famosas pesquisas de Skinner Estudos mais recentes

496

MATHER DICKEL 2017 497

FIORITO VON PLANTA SCOTTO 1990 498

FIORITO SCOTTO 1992 499

MATHER 2008 BYRNE et al 2002

109

como os de Bouchard e colaboradores500 exemplificam as habilidades de Columba

livia como o comportamento inovador e a aprendizagem social501

O uso de instrumentos tambeacutem eacute observado em muitas aves como o

tentilhatildeo pica-pau (Camarhynchus pallidus) que utiliza gravetos ou espinhos de

cactos com grande frequecircncia para retirar larvas de troncos por pequenos

orifiacutecios502 Tebbich e Bshary503 testaram espeacutecimes que conseguiram retirar larvas

de tubos com gravetos mesmo quando foi necessaacuterio antes remover outro objeto em

forma de ldquoHrdquo que dificultava a tarefa

Roelofs504 descreve tambeacutem em uma revisatildeo uma gama de outros usos de

instrumentos como o de pedras por certas aves de rapina como o abutre-do-egito

(Neophron percnopterus) com o fim de quebrar ovos e abater presas o de presas

como esponjas para levar aacutegua para a prole observado em melro-preto cervejeiro

(Euphagus cyanocephalus) ou fazendo-o com musgos como a cegonha (Ciconia

ciconia) o de pedaccedilos de patildees insetos gravetos etc lanccedilados na aacutegua para atrair

peixes como presas como o fazem os socoacutes-mirins (Butorides sp) o que tambeacutem jaacute

foi observado em outras espeacutecies como o martim-pescador (Ceryle rudis) o

milhafre-preto (Milvus migrans) e a gaivota-de-asa-escura (Larus fuscus)

Jaacute se viram corviacutedeos realizando todas essas atividades mencionadas com

instrumentos alguns dos quais eles mesmos produzem especialmente a partir do

gecircnero botacircnico Pandanus sp505 e outras mais como a utilizaccedilatildeo de objetos como

armas que lanccedilam ou deixam cair no oponente com o fim de afastaacute-lo seja para

alimentarem-se seja para livrarem-se de ameaccedila ao ninho ou para defenderem-se

a si mesmos etc

E natildeo por nada esta famiacutelia de passeriformes eacute a que mais tem ganho

destaque dentre as aves em testes cognitivos Isto pode exemplificar-se tambeacutem por

estudos como o de Lefebvre e colaboradores506 que mostra reforccedilando a hipoacutetese

500

BOUCHARD et al 2007 501

Aqui especificamente utilizou-se uma caixa de acriacutelico com sementes em seu interior que os animais poderiam acessar bicando empurrando puxando ou levantando tampas e gavetas Para correlacionar agrave aprendizagem social realizou-se outro teste com uma caixa contendo alimento ocultado por um objeto como uma rolha ou um tubo que deveria ser girado e removido para que caiacutesse o alimento impedindo o acesso a um espeacutecime qualquer natildeo treinado que teria entatildeo de observar outro jaacute treinado realizar a tarefa para aprender como acessar o alimento

502 EIBL‐EIBESFELDT 1961

503 TEBBICH BSHARY 2004

504 ROELOFS 2010

505 HUNT GRAY 2003

506 LEFEBVRE et al 2004

110

que leva em conta o quociente de encefalizaccedilatildeo que com seu maior volume

cerebral em relaccedilatildeo ao tamanho corporal seus membros possuem melhores

desempenhos em muitos aspectos como no quesito inovaccedilatildeo (novas formas de

conseguir alimento de fugir etc) A relaccedilatildeo entre o tamanho do seu ceacuterebro e o do

corpo seria proporcional a essa mesma relaccedilatildeo nos chimpanzeacutes507 e ainda que haja

diferenccedilas significativas em suas estruturas cerebrais apresentam grandes

semelhanccedilas cognitivas no acircmbito comportamental508 Estudos como o de

Wimpenny e colaboradores509 aqui com corvos-da-nova-caledocircnia (Corvus

moneduloides) mostram o ecircxito desses animais em experimentos que envolvem o

uso sequencial de instrumentos Aos animais testados oferecia-se um instrumento

mais curto que era como uma vareta com um suporte na ponta com o qual teriam

de alcanccedilar em aparatos de parede incolor com abertura pequena outro objeto

semelhante poreacutem mais comprido para com este ou obterem a recompensa ou

caso natildeo conseguissem pegarem outro ainda mais longo para entatildeo alcanccedilaacute-la Em

uma das etapas diante da impossibilidade de retirar a recompensa com o objeto

inicialmente disponiacutevel e tendo falhando em retirar o objeto mais longo um animal

voltou ao aviaacuterio de onde retornou trazendo um galho que utilizou para retirar

agora com sucesso o objeto mais longo com o qual obteve por fim o alimento

Um desses experimentos este com resoluccedilatildeo de problemas em oito passos

realizado pelo doutor Alex Taylor da Universidade de Auckland na Nova Zelacircndia

ganhou fama internacional por ter sido transmitido pela BBC de Londres510 Nele um

corvo-da-nova-caledocircnia retira inicialmente uma vareta suspensa em uma corda

puxando-a para o galho sobre o qual estaacute e onde ela estaacute pendurada Em seguida

se dirige para uma fila de trecircs gaiolas lado a lado cada uma contendo uma pedra

As trecircs pedras satildeo retiradas pelo corvo com a utilizaccedilatildeo da vareta e entatildeo levadas

ateacute uma caixa de acriacutelico com abertura superior Apoacutes o animal atirar ali a terceira

pedra a base da caixa cede liberando uma vareta maior com a qual o corvo

finalmente puxa a recompensa pela abertura estreita de outra caixa de acriacutelico na

qual se encontra

507

EMERY CLAYTON 2004 508

EMERY 2006 509

WIMPENNY 2009 510

BRITISH BROADCASTING CORPORATION 2014

111

Nos experimentos de Jelbert e colaboradores511 corvos-da-nova-caledocircnia

teriam de soltar objetos dentro de tubos a fim de que o niacutevel da aacutegua dentro destes

subisse e trouxesse a recompensa flutuante Os pesquisadores realizaram os testes

em seis condiccedilotildees a primeira com dois tubos sendo um com aacutegua e outro com

terra a segunda com dois tipos de objetos sendo um que afundava e fazia o niacutevel

da aacutegua subir e outro que simplesmente boiava na terceira havia dentre os objetos

alguns ocos que fariam subir muito pouco o niacutevel da aacutegua na quarta um tubo mais

estreito e outro mais largo com o niacutevel da aacutegua na mesma altura em ambos a

quinta com o tubo mais estreito com a altura do niacutevel da aacutegua bem mais baixa e o

sexto com trecircs tubos sendo que dois interconectados por baixo em forma de ldquoUrdquo e

um isolado Nesses dois o do meio no qual estava a recompensa era mais estreito

de modo que os objetos natildeo poderiam ser soltos dentro dele Salvo no quarto e no

sexto experimento os animais escolheram predominantemente aquilo que lhes

proporcionaria a recompensa ou que lhes proporcionaria a recompensa mais

rapidamente No caso do quarto teste os autores sugerem hipoacuteteses como a de que

os animais teriam dificuldade em ver no volume dos tubos um fator de causalidade

ou a de que teriam mais dificuldades de ver a funcionalidade no substrato (a aacutegua)

enquanto a veriam no instrumento (os objetos) sem descartarem a hipoacutetese de os

animais conseguirem ter mais sucesso em prazo mais longo Em relaccedilatildeo ao sexto

experimento somente quatro indiviacuteduos o realizaram o que os pesquisadores

consideraram ser uma amostragem insuficiente para chegarem a conclusotildees sobre

a espeacutecie mas levando em consideraccedilatildeo que o deslocamento da aacutegua seria uma

caracteriacutestica insuficiente para que inferissem que haveria uma conexatildeo que lhes

estivesse oculta

Tambeacutem Jelbert e colaboradores512 forneceram a primeira evidecircncia de que

os corvos-da-nova-caledocircnia podem manufaturar objetos a partir de um modelo

mental Diante de um aparato em que se tinha de inserir cartotildees de papel de

tamanho especiacutefico para que se recebesse a recompensa havia outras folhas de

papel disponiacuteveis Estas foram recortadas com o bico por alguns dos espeacutecimes

testados que haviam sido previamente treinados para lidar com o aparato mas natildeo

para o recorte

511

JELBERT et al 2014 512

JELBERT et al 2018

112

Em outro estudo a fim de testar se os corviacutedeos poderiam estabelecer

relaccedilotildees analoacutegicas Smirnova e colaboradores513 submeteram duas gralhas-

cinzentas (Corvus cornix) a treinamento com IMTS (ldquoidentity matching-to-samplerdquo) a

partir de placas contendo pares de figuras de ciacuterculo triacircngulo quadrado e cruz em

azul vermelho amarelo ou verde dispostas diagonalmente a fim de verificar

posteriormente se realizariam os testes de RMTS (ldquorelational matching-to-

samplerdquo)514 a partir de placas contendo cada uma um par de ciacuterculos quadrados ou

triacircngulos pretos dispostos lado a lado com tamanhos iguais ou diferentes Os

pesquisadores natildeo treinaram os animais para tamanho mas somente para nuacutemero

de figuras tipo de siacutembolo e cor do siacutembolo Eles apresentaram para as aves uma

bandeja com trecircs placas cada uma contendo duas figuras A do meio situava-se

diretamente sobre a bandeja ao passo que as outras duas repousavam cada uma

sobre um copo sendo que somente aquela que teria alguma correspondecircncia com a

do meio fosse de forma (igual ou diferente) de cor ou no caso do teste RMTS de

tamanho conteria a recompensa As placas eram oferecidas com diferentes

combinaccedilotildees e as aves assim teriam de identificar o tipo de correspondecircncia

apresentada ali antes de efetivar sua escolha Diante do ecircxito das gralhas os

pesquisadores sugeriram que elas teriam reconhecido relaccedilotildees de relaccedilotildees e que

entatildeo haveria raciociacutenio analoacutegico com abstraccedilatildeo nesses animais

Haacute muitas outras pesquisas demonstrando habilidades dos corviacutedeos em

razatildeo de seu sucesso em tantos testes cognitivos como as de Bugnyar e

colaboradores que sugeriram a partir de alguns experimentos como um em que os

espeacutecimes de Corvus corax em um recinto com uma pequena abertura para outro ao

lado que era aberta e fechada onde estaria outro indiviacuteduo guardavam o alimento

mais rapidamente quando pensavam estar sendo vigiados (e mesmo quando a

abertura estava fechada e os pesquisadores colocavam uma gravaccedilatildeo de som de

um coespeciacutefico) sejam caracterizados como apresentando ldquoteoria da menterdquo515 a

de Prior Schwarz e Guumlntuumlrkuumln516 que demonstrou que uma pega-rabilonga (Pica

pica) reconheceu-se em um espelho e a de Swift517 que estudou corviacutedeos

513

SMIRNOVA et al 2015 514

Respectivamente ldquocorrespondecircncia para amostra de identidaderdquo e ldquocorrespondecircncia para amostra relacionalrdquo

515 BUGNYAR et al 2016

516 PRIOR SCHWARZ GUumlNTUumlRKUumlN 2008

517 SWIFT 2015

113

visitando funerais de coespeciacuteficos para investigarem a causa de sua morte e

descobrir se representa ou natildeo perigo para o bando

Ainda dentre as aves os psitaciacutedeos tambeacutem exibem comportamentos

marcantes Roelofs518 aponta o uso de objetos para percussatildeo como exibiccedilatildeo de

gravetos para coccedilarem-se dentre muitas outras habilidades O caso do papagaio-

cinzento (Psittacus erithacus) Alex foi provavelmente o mais notaacutevel Peperberg519

afirma que ele aprendeu a identificar nomes de objetos materiais520 cores e formas

inclusive as categorias em que um item poderia classificar-se dentro desses

atributos aprendeu a diferenccedila entre similaridade e diferenccedila repetia frases

funcionais quando queria obter algo ou ir a algum lugar etc Alex foi ensinado a usar

a palavra ldquonone [nenhum(a)]rdquo quando natildeo houvesse categoria presente e que em

certa ocasiatildeo ele espontaneamente passou a aplicar o termo diante da ausecircncia de

um exemplar qualquer de uma dessas categorias A primeira vez que o fez foi em

relaccedilatildeo a um nuacutemero o trecircs relacionado a algo ausente Sua resposta foi citar o

cinco que tambeacutem se relacionava a uma ausecircncia e persistir ateacute ser indagado e

dizer o ldquononerdquo Peperberg daacute ecircnfase a isto por entender que Alex teria iniciado um

toacutepico Ele natildeo soacute aprendeu mais de cem palavras como aprendeu a criar novas

palavras combinando as que jaacute conhecia como quando disse ldquobanerryrdquo aglutinando

ldquobananardquo com ldquocherry [cereja]rdquo para denominar uma maccedilatilde ou seja compreendeu

que a partir de padrotildees sonoros independentes pode-se criar denominaccedilotildees

concluiu a pesquisadora521

A fim de testar a chamada competecircncia numeacuterica de Alex522 uma bandeja

com trecircs tipos diferentes de alimento (nozes jujubas e doces em forma de coraccedilatildeo)

era-lhe mostrada com estes dispostos sob dois copos de modo que cada tipo ou

natildeo estaria presente ou estaria em certa quantidade em ateacute seis unidades Essas

mesmas quantidades eram sempre que possiacutevel representadas em disposiccedilotildees

distintas distribuiacutedas entre os dois copos Em seguida depois de dois a trecircs

segundos de exibiccedilatildeo alternada cada copo era reposicionado sobre os doces Para

cada rodada o experimentador perguntava a Alex que jaacute natildeo via os alimentos

quantos de determinado tipo estavam na bandeja Esse tipo de teste foi repetido

518

ROELOFS 2010 519

PEPERBERG 2006 520

Aquilo de que algo eacute feito 521

PEPERBERG 2007 522

Id 2006

114

posteriormente com algarismos de numerais araacutebicos sem que Alex que

demonstrou algum ecircxito tivesse sido treinado para essa transposiccedilatildeo a partir de

quantidade de itens e tambeacutem com trecircs amostras de recompensa para soma por

bandeja523 Com itens Alex realizou somas que iam de 1 a 6 e com algarismos

realizou somas que iam de 1 a 5

A competecircncia numeacuterica foi testada em outros animais como os pombos (C

livia) como no estudo de Xia Siemann e Delius524 em que os animais trabalharam

ateacute o nuacutemero seis associando numerosidade de siacutembolos em chaves agrave quantidade

de bicadas nestas (indicada por esses siacutembolos) e no de Scarf e colaboradores525

com pares crescentes de algarismos bicados em uma tela em que se trabalhou ateacute

o nuacutemero nove do que concluiacuteram os autores que a competecircncia numeacuterica dos

pombos equivaleria agrave dos grandes primatas da qual se falaraacute mais adiante

Retornando aos psitaciacutedeos Heaney Gray e Taylor526 testaram papagaios-

da-nova-zelacircndia (Nestor notabilis) para tarefa que soacute se poderia concluir-se se

fosse realizada em colaboraccedilatildeo simultacircnea Consistia em uma bandeja em formato

de ldquoUrdquo contendo uma recompensa de cada lado encaixada entre dois suportes

podendo somente ser movida se duas aves a puxassem ao mesmo tempo ateacute a

gaiola onde se encontravam uma das cordas presas em cada uma das duas

extremidades da bandeja O teste foi realizado com a soltura das aves no local do

experimento simultaneamente e depois com um pequeno intervalo de tempo de

diferenccedila entre uma e outra Segundo os pesquisadores o desempenho dessas

aves foi semelhante ao de chimpanzeacutes e elefantes

Eacute destes uacuteltimos que trataremos agora passando a explorar a classe

Mammalia

61 ELEPHANTIDAE

Classificam-se os indiviacuteduos desta famiacutelia conhecidos atualmente em trecircs

espeacutecies a saber uma de elefante asiaacutetico Elephas maximus e duas de elefantes

africanos sendo uma das savanas Loxodonta africana e outra das florestas

Loxodonta cyclotis

523

PEPERBERG 2012 524

XIA SIEMANN DELIUS 2000 525

SCARF et al 2011 526

HEANEY GRAY TAYLOR 2017

115

O ceacuterebro desses espeacutecimes que pesa cerca de seis quilos527 possui

elevado quociente de relaccedilatildeo entre ceacuterebro e peso corporal com neocoacutertex bastante

desenvolvido e grande densidade neuronal528

Por tratar-se do maior ceacuterebro dentre os animais terrestres citamos

brevemente algumas caracteriacutesticas Shoshani e colaboradores529 apontam

telenceacutefalo com sulcos e giros bem desenvolvidos mostrando um grau de

complexidade intermediaacuterio em relaccedilatildeo aos ceacuterebros dos primatas e dos cetaacuteceos

Dentre as principais diferenccedilas entre o ceacuterebro humano e o do elefante estatildeo o

tamanho e as proporccedilotildees dos lobos a configuraccedilatildeo do sistema ventricular as

diferenccedilas na complexidade e no padratildeo giral tamanho do nervo olfatoacuterio e da

glacircndula pituitaacuteria maior nos elefantes e da pineal maior nos humanos Os

elefantes tecircm um lobo frontal proporcionalmente menor que o dos humanos e lobos

parietal e occipital menos definidos que o destes e iacutensula opercularizada

incompleta No cerebelo observa-se maior tamanho e complexidade giral Segundo

Jacobs e colaboradores530 o ceacuterebro do elefante eacute cerca de trecircs vezes maior que o

dos humanos e sua pesquisa aponta que em comparaccedilatildeo com os neurocircnios

piramidais supragranulares destes os neurocircnios piramidais superficiais daqueles

satildeo maiores menos densos e com padrotildees de ramificaccedilatildeo menos complexos e

exibem semelhante meacutedia de comprimento dendriacutetico basilar com segmentos

dendriacuteticos mais longos e ramificaccedilotildees menos complexas

Os elefantes apresentam um comportamento social natildeo aleatoacuterio e estaacutevel531

com relaccedilotildees duradouras entre indiviacuteduos que se autorreconhecem apresentam

empatia com capacidade de aprendizado e de transmissatildeo de informaccedilotildees e de

habilidades praacuteticas que interagem em geral a partir de comportamentos

convencionais incluindo comportamentos estrateacutegicos532 Sua comunicaccedilatildeo parece

dar-se a ateacute dois quilocircmetros e meio mas a resposta eacute obtida mais comumente em

distacircncias entre um quilocircmetro e um quilocircmetro e meio segundo a pesquisa

envolvendo aparelhagem de aacuteudio com reproduccedilatildeo de infrassons de Mccomb e

colaboradores533 Vivem em bandos de trecircs a cem indiviacuteduos os machos por vezes

527

RENSH 1956 528

LOCKE 2013 529

SHOSHANI et al 2006 530

JACOBS et al 2011 531

WITTEMYER DOUGLAS-HAMILTON GETZ 2005 532

LOCKE 2013 533

MCCOMB et al 2003

116

constituem grupos pequenos de dois a quatro indiviacuteduos ao passo que os grandes

grupos satildeo integrados basicamente por fecircmeas e filhotes liderados por matriarcas

que os conduzem aos locais em que haacute aacutegua e alimento Na criaccedilatildeo dos filhotes em

que satildeo amamentados ateacute aproximadamente o quinto ano de vida suas irmatildes e tias

atuam colaborativamente Ao crescerem as fecircmeas permanecem durante toda a

vida em seu grupo enquanto os machos os abandonam por volta dos doze a quinze

anos de idade em busca de parceiras para o acasalamento534

O trabalho de Wittemyer Douglas-Hamilton e Getz 535 foi o primeiro a apontar

estatisticamente quatro camadas de hierarquia social que expressam diferentes

respostas agraves variaccedilotildees temporais e sazonais nesses grupos com meacutetodos

quantitativos mais rigorosos mas indica outros anteriores sendo ateacute entatildeo mais

recente o de Moss e Poole536 que descreveram ateacute seis camadas que vatildeo desde a

interaccedilatildeo entre matildee e filhote ateacute o niacutevel populacional

Descreveremos algumas de suas habilidades cognitivas comeccedilando por

aquelas observadas em estudos em campo e em seguida abordaremos as que

foram verificadas em experimentos realizados em cativeiro com indiviacuteduos

domesticados Faremos o mesmo posteriormente quando tratarmos de primatas e

de golfinhos mas natildeo com os catildees jaacute que o que nos leva a dar-lhes enfoque eacute a

sua relaccedilatildeo com os humanos

611 Observaccedilotildees de Campo

No que concerne agraves observaccedilotildees de campo Bates e colaboradores537

distinguiram as seguintes interaccedilotildees comportamentais

- coalisatildeo ou seja uniatildeo com um ou mais indiviacuteduos para opor-se a outro ou

a outros tanto com fins de ameaccedila como de defesa de ameaccedila

- proteccedilatildeo seja de indiviacuteduos mais jovens contra predadores contra

indiviacuteduos maiores da proacutepria espeacutecie seja interrompendo brigas entre jovens etc

- conforto por indiviacuteduos adultos de filhotes em situaccedilatildeo de estresse

- cuidado por outros indiviacuteduos adultos com filhote na ausecircncia da matildee (o

que foi verificado somente em alguns casos)

534

IRIE HASEGAWA 2009 535

WITTEMYER DOUGLAS-HAMILTON GETZ 2005 536

MOSS POLE 1983 537

BATES et al 2008

117

- resgate como a conduccedilatildeo de um filhote perdido de volta ao grupo e agrave matildee

- auxiacutelio por exemplo relacionado agrave mobilidade como em caso de

atolamento ou na remoccedilatildeo de objetos estranhos em casos em que a viacutetima se

mostra de algum modo enfraquecida (como se verifica em casos de remoccedilatildeo com a

tromba de um dardo tranquilizante que tenha atingido outro membro do grupo ou

em casos em que a matildee remove resiacuteduos descartados por humanos presos na boca

de um filhote)

Essas interaccedilotildees indicam segundo os pesquisadores a existecircncia de

determinadas percepccedilotildees de natureza empaacutetica como

- a de que os outros geram comportamento espontaneamente ou seja satildeo

agentes animados (por exemplo o reconhecimento da imobilidade de outro indiviacuteduo

como uma anomalia)

- a de que pode haver direcionamento a partir de certos comportamentos para

objetivos especiacuteficos (por exemplo um macho persegue uma fecircmea em periacuteodo

feacutertil para o acasalamento)

- a de que haacute emoccedilotildees diferentes nos outros (por exemplo o apaziguamento

de jovens de humor alterado)

- a de que haacute competecircncias fiacutesicas como vulnerabilidades e habilidades

diferentes nos outros (por exemplo a percepccedilatildeo de que um filhote natildeo consegue

ultrapassar uma cerca)

- a de que haacute percepccedilatildeo particular nos outros (por exemplo o reconhecimento

de que o outro espeacutecime natildeo estaacute percebendo um determinado perigo em

determinada situaccedilatildeo)

- a de que haacute intenccedilotildees e necessidades diferentes nos outros (por exemplo a

percepccedilatildeo de um espeacutecime que tenta livrar-se do atoleiro)

- e a de que haacute crenccedilas e entendimentos diferentes nos outros (por exemplo

quando um espeacutecime prevecirc que o filhote de outro poderaacute ingerir algum alimento

venenoso e entatildeo interfere para salvar-lhe)

Plotnik e de Waal538 reforccedilaram ainda os estudos sobre o consolo apoacutes um

episoacutedio de sofrimento constatando que aleacutem do contato fiacutesico natildeo solicitado como

a tromba de uma fecircmea adulta na boca de um filhote aflito os elefantes tambeacutem

usam vocalizaccedilatildeo para o conforto reforccedilando a hipoacutetese da empatia do interesse

538

PLOTNIK DE WAAL 2014

118

no estado emocional de outro membro da espeacutecie em quem os animais identificam o

papel de viacutetima que passa por um momento de anguacutestia Essas respostas

emocionais podem provocar contaacutegio emocional fazendo com que muitos outros

indiviacuteduos exibam o mesmo estado emocional do primeiro e pode ateacute ser de

natureza universal ou seja causar a mesma reaccedilatildeo emocional em todos os demais

indiviacuteduos presentes do grupo Essa interaccedilatildeo de conforto de indiviacuteduos aflitos

reforccedila a comunicaccedilatildeo desses animais por meios sonoros e taacuteteis

Os estudos de populaccedilotildees realizados por McComb e colaboradores de 2007

a 2009539 forneceram evidecircncias de que diante de desafios enfrentados pelo grupo

de Loxodonta africana como a presenccedila de predadores satildeo as matriarcas mais

velhas que tomam as melhores decisotildees para o grupo Os pesquisadores

perceberam que os elefantes distinguem niacuteveis de ameaccedila inclusive dentro de uma

mesma classe de predadores como grupos eacutetnicos humanos a partir de sinais

olfativos e visuais

Esses resultados satildeo corroborados com o estudo de Soltis e colaboradores540

de indiviacuteduos da espeacutecie Loxodonta africana sob ameaccedila de abelhas e sob ameaccedila

de humanos no qual se observou que os elefantes estabelecem distinccedilotildees entre os

dois tipos de ameaccedila e manifestam comportamentos especiacuteficos para cada um dos

dois casos Esses comportamentos incluem a emissatildeo de sons de alerta aos demais

membros do grupo diante do que os pesquisadores concluiacuteram que os animais

emitem sons segundo niacuteveis de urgecircncia conforme a natureza das ameaccedilas

McComb e colaboradores541 presenciaram elefantes reconhecendo cracircnios de

membros de sua espeacutecie em meio aos de outras espeacutecies A atenccedilatildeo dos animais

foi atraiacuteda tambeacutem pelos marfins que eles investigaram com a tromba e uma das

patas

Jaacute Douglas-Hamilton e colaboradores542 registraram os sete dias que se

seguiram agrave morte de uma matriarca observando o interesse no cadaacutever tanto por

parte de membros de outros grupos como por parte dos membros do grupo dela

cujas visitas em frequecircncia duraccedilatildeo e nuacutemero de indiviacuteduos foram gradualmente

diminuindo durante o periacuteodo de observaccedilatildeo dos pesquisadores

539

MCCOMB et al 2011 540

SOLTIS et al 2014 541

MCCOMB BAKER MOSS 2006 542

DOUGLAS-HAMILTON et al 2006

119

612 Estudos experimentais

Smet e colaboradores543 verificaram em elefantes africanos a habilidade de

seguir gestos de indicaccedilatildeo humanos alguns inclusive sutis Eles testaram onze

espeacutecimes criados em cativeiro que falharam somente nos testes que envolviam

exclusivamente o olhar do experimentador para certa direccedilatildeo para encontrar

alimentos previamente escondidos E mesmo quando natildeo havia nenhum gesto os

animais guiaram-se pela posiccedilatildeo do corpo humano que era no entanto

desconsiderada quando havia algum gesto Acreditam os autores da pesquisa que

nenhum desses indiviacuteduos havia sido treinado anteriormente e que natildeo teria havido

oportunidades extensivas para tal aprendizado

Esses animais no entanto apresentam uma consideraacutevel capacidade de

retenccedilatildeo de memoacuteria espaccedilo-temporal tal como demonstrado por experimentos

como os de discriminaccedilatildeo entre luz e escuridatildeo realizados por Markowitz e

colaboradores544 com a utilizaccedilatildeo de um aparato de madeira compensada de pouco

mais de dois metros de altura com um painel em que espeacutecimes de Elephas

maximus acionavam um interruptor Esses animais jaacute tinham passado pelo mesmo

experimento oito anos antes e logo se recordaram do que teriam de fazer para obter

a recompensa

Irie-Sujimoto545 sugeriu que os elefantes possuem um conhecimento

conceitual sobre a relaccedilatildeo entre meio e fim com base em experimento de Piaget

que apontou a presenccedila dessa habilidade em crianccedilas de onze meses de idade

Essa habilidade indica a possibilidade de definiccedilatildeo de objetivos e um

comportamento direcionado para a tentativa de alcanccedilaacute-los Nesse estudo se

forneceu duas taacutebuas a dois elefantes asiaacuteticos sob quatro condiccedilotildees diferentes Na

primeira uma delas serviu como suporte para que o alimento fosse trazido ao seu

alcance enquanto a outra estava vazia e na segunda havia uma com alimento e

outra com o alimento colocado fora dela ao lado na terceira alteraram-se as cores e

as dimensotildees das taacutebuas repetindo a primeira condiccedilatildeo e na quarta as duas taacutebuas

continham alimento sendo que uma delas era partida e colocou-se o alimento na

parte que natildeo podia ser puxada Um dos animais realizou com relativo sucesso

todos os experimentos Diante das duas primeiras condiccedilotildees ambos aprenderam

543

SMET et al 2013 544

MARKOWITZ et al 1975 545

IRIE-SUJIMOTO 2008

120

que se puxassem a bandeja certa obteriam o alimento na terceira condiccedilatildeo um

animal ficou desmotivado e no outro se verificou a transferecircncia do aprendizado

para as novas condiccedilotildees por fazer distinccedilatildeo entre as caracteriacutesticas relevantes e as

irrelevantes para o problema e mediante a quarta condiccedilatildeo verificou-se que o

animal compreendeu raacutepida e corretamente a relaccedilatildeo espacial entre o alimento e a

bandeja

Com o fim de estudar a capacidade de cooperaccedilatildeo Plotnik e colaboradores546

realizaram um teste semelhante ao descrito anteriormente com psitaciacutedeos no qual

dois elefantes teriam de puxar cada um uma de duas cordas amarradas a uma

taacutebua contendo alimento Somente se os dois puxassem juntos e ao mesmo tempo

obteriam a recompensa O experimento foi realizado com sucesso com o

desempenho melhorando apoacutes o primeiro dia e sugeriu haver reconhecimento da

necessidade de um parceiro para o teste onde inclusive um aguardava a chegada

do outro para realizaccedilatildeo da tarefa quando a chegada deste era intencionalmente

retardada pelos experimentadores

Em outro estudo Foerder e colaboradores547 observaram um elefante asiaacutetico

macho utilizar um cubo para erguer-se nas patas dianteiras e alcanccedilar um ramo de

bambu com frutos preso em uma corda suspensa Quando a localizaccedilatildeo do alimento

foi modificada o animal espontaneamente empurrou o cubo ateacute o local ergueu-se

sobre ele e alcanccedilou o alimento Apoacutes a retirada do cubo do local pelos

pesquisadores o espeacutecime primeiramente tentou substituiacute-lo por uma bola e em

seguida empilhou objetos como taacutebuas para tentar sem sucesso nesta etapa

alcanccedilar seu objetivo Os testes demonstrarama capacidade nestes espeacutecimes de

resolver problemas com uso de instrumentos de modo suacutebito e perspicaz segundo

os pesquisadores natildeo precedido de tentativa e erro

Ainda em meados do uacuteltimo seacuteculo Rensch548 realizou estudos com pares de

padrotildees de figuras em cartas em que estas eram memorizadas por um elefante

indiano jovem e depois reapresentadas aleatoriamente e retiradas por este com a

tromba recebendo entatildeo a recompensa mediante o acerto O animal obteve

resultados exitosos e um ano depois ele demonstrou ter retido quase toda a

546

PLOTNIK et al 2011 547

FOERDER et al 2011 548

RENSCH 1956

121

informaccedilatildeo um tempo consideraacutevel em comparaccedilatildeo com a capacidade de

memorizaccedilatildeo de animais de porte menor

Rensh549 seguiu realizando experimentos com padrotildees de imagens e

observou elefantes indianos com idade entre vinte e sessenta anos reagindo a vinte

e um a vinte e quatro comandos verbais diferentes memorizando o sentido de vinte

pares de estiacutemulo ndash Lewis550 poreacutem afirmou que um elefante bem treinado chega a

reconhecer cerca de cem comandos entre palavras e frases Na tentativa de

identificar alguma capacidade de abstraccedilatildeo as cartas foram separadas de sua dupla

de padratildeo correspondente e o pesquisador verificou que uma fecircmea reconheceu a

caracteriacutestica essencial do padratildeo em questatildeo Ela parece ter desenvolvido a ideia

de cruz a de cruzamento de duas barras pretas e em um experimento onde isto

ficou mais claro o par de imagens original apresentava o padratildeo de listras uma

carta com listras com dois centiacutemetros de largura e outra com listras com quatro

centiacutemetros de largura A primeira carta foi apontada como positiva Quando as

larguras foram alteradas para um centiacutemetro e meio e dois centiacutemetros a elefanta

escolheu a primeira com listras mais estreitas mostrando que ela percebeu que a

escolha correta era a de um padratildeo de listras mais estreitas As cartas originais

foram reapresentadas e ela mais uma vez escolheu corretamente

Para a compreensatildeo de nuacutemeros o pesquisador usou um par de cartas em

que uma continha trecircs pontos (ciacuterculos pretos) e a outra quatro Positivou-se a carta

de trecircs pontos e entatildeo foram apresentadas configuraccedilotildees diferentes de trecircs pontos

em linha horizontal em linha vertical como triacircngulo equilaacutetero e outros formatos

em seguida fez-se o mesmo com quatro pontos O ecircxito relacionado a esse

vocabulaacuterio de comandos foi verificado um ano depois sem que neste periacuteodo o

animal tivesse tido contato com as cartas

Um colaborador de Rensch tambeacutem desenvolveu tarefa similar com sons em

que aos tons positivos o animal respondia batendo com a tromba na tampa de uma

caixa de distribuiccedilatildeo de um aparelho que o recompensava com alimento Ele

reconheceu doze tons em seis pares de sons Em seguida repetiram o experimento

com melodias e a elefanta reconheceu todas as que lhe foram apresentadas

mesmo depois de terem alterados o ritmo o tempo a intensidade a frequecircncia e os

instrumentos dos mais variados timbres

549

RENSCH 1957 550

LEWIS 1971 apud HART 1994

122

Experimentos semelhantes com pares de estiacutemulos foram realizados por

colaboradores de Rensh com cavalo (Equus ferus caballus) zebra (sem especificar

se se tratava de Equus grevyi de E quagga ou de E zebra) e asno (Equus asinus)

Enquanto os dois uacuteltimos natildeo conseguiram ter o mesmo ecircxito do elefante o cavalo

obteve sucesso no reconhecimento de todos os pares apresentados o que reforccedilou

a posiccedilatildeo de Rensch a respeito da relaccedilatildeo entre capacidade de aprendizagem e

tamanho do ceacuterebro

Os elefantes satildeo tambeacutem capazes de comparar quantidades Irie-Sujimoto e

colaboradores551 forneceram cestas com alimento tanto simultaneamente como

sucessivamente e observaram a preferecircncia de elefantes asiaacuteticos pelas cestas

mais cheias sem que fossem anteriormente submetidos a treinamento Este

resultado foi corroborado por Perdue e colaboradores552 que apontaram algumas

questotildees metodoloacutegicas que poderiam ter comprometido o resultado anterior como

o nuacutemero baixo de testes e repetiram o experimento tambeacutem exitosamente com

maior rigor

Plotnik e colaboradores553 verificaram que espeacutecimes de E maximus podem

reconhecer-se a si mesmos no espelho Os pesquisadores imprimiram uma marca

visiacutevel no lado direito e outra natildeo visiacutevel mas que podia ser percebida por odor ou

tato do lado esquerdo da testa de trecircs animais alternadamente e um deles tocou

repetidas vezes a marca visiacutevel em sua testa diante do espelho de dois metros

empregado no experimento frequentemente inspecionado pelos animais

Em um teste que segundo Dale e Plotnik554 se deve somar ao anterior de

autorreconhecimento foi analisado o comportamento de elefantes asiaacuteticos sobre

um tapete ao qual estava amarrada uma corda contendo um bastatildeo na outra

extremidade que deveria ser entregue ao treinador Os animais reconheceram que

seus corpos sobre o tapete eram um obstaacuteculo para a tarefa e se retiraram do

tapete sugerindo aos autores que os membros da espeacutecie possuem consciecircncia

corporal (body awareness)

551

IRIE-SUJIMOTO et al 2009 552

PERDUE et al 2012 553

PLOTNIK et al 2006 554

DALE PLOTNIK 2017

123

62 CARNIVORA ndash CANIS LUPUS FAMILIARIS

O catildeo desperta aqui interesse especial em razatildeo de seu longo e peculiar

conviacutevio com os humanos tendo sido possivelmente o primeiro animal a ser

domesticado555 processo que pode ter ocorrido em algum periacuteodo entre vinte mil e

quarenta mil anos atraacutes556

As atuais pesquisas parecem apontar para uma tripla origem do processo de

domesticaccedilatildeo no final do pleistoceno superior557 na Europa558 no sul do leste

asiaacutetico559 e na Aacutesia Central560

Pesquisas como a de Belyaev561 esta envolvendo mais de quarenta geraccedilotildees

de uma variaccedilatildeo de Vulpes vulpes (raposa vermelha) de coloraccedilatildeo prateada jaacute

demonstraram que o processo de domesticaccedilatildeo resulta no surgimento de alteraccedilotildees

bastante significativas nas geraccedilotildees seguintes O pesquisador e sua equipe

verificaram a ocorrecircncia de alteraccedilotildees reprodutivas decorrente da seleccedilatildeo que

realizaram como a ativaccedilatildeo fora de eacutepoca da funccedilatildeo reprodutiva em fecircmeas

alteraccedilotildees fisioloacutegicas como o prolongamento do periacuteodo de reproduccedilatildeo alteraccedilotildees

morfoloacutegicas como o surgimento de manchas marrons em torno das orelhas e do

pescoccedilo como o surgimento de orelhas caiacutedas tal como a de filhotes de catildees de

cauda enrolada e mudanccedilas na cor da pelagem principalmente despigmentaccedilatildeo

em algumas regiotildees estas uacuteltimas tambeacutem caracteriacutestica de algumas raccedilas de catildees

e alteraccedilotildees comportamentais como o iniacutecio tardio da expressatildeo do medo diante de

novidades (em razatildeo de mudanccedilas no niacutevel plasmaacutetico de corticosteroides que

atuam na adaptaccedilatildeo dos animais ao estresse) relacionado agrave seleccedilatildeo de indiviacuteduos

que exibiram maior mansidatildeo aleacutem de proximidade com humanos que inclui a

busca por contato e resposta a apelidos ndash com elevaccedilatildeo dos niacuteveis de serotonina e

alteraccedilotildees no sistema hipotalacircmico-hipofisaacuterio-adrenal e nos niacuteveis de hormocircnios

esteroides sexuais562 Hare563 menciona uma reduccedilatildeo de ossos e dentes da cauda

555

LARSON et al 2012 556

BOTIGUEacute et al 2017 557

LAURENT 2016 558

THALMANN et al 2013 559

WANG et al 2015 SAVOLAINEN 2002 560

SHANNON 2015 561

BELYAEV 1979 562

TRUT 1999 563

HARE 2004

124

em algumas espeacutecies reduccedilatildeo de cerca de vinte por cento no tamanho do ceacuterebro e

reduccedilatildeo do medo como resposta a novidades

Hare e Tomasello564 desenvolveram estudos e apontam outros que sugerem

o desenvolvimento de uma especializaccedilatildeo cognitiva nos catildees durante o processo de

domesticaccedilatildeo e tambeacutem resultante deste Corrobora isto o estudo de Kaminski e

colaboradores565 que esconderam dois conjuntos de cinco objetos para a cadela

Betsy e dois conjuntos de seis objetos para o catildeo Rico ambos da raccedila border collie

sendo um conjunto em cada um de dois recintos e entatildeo pediram para os animais

recuperarem-nos a fim de adquirirem a recompensa Mediante o sucesso da tarefa

concluiacuteram que os catildees integram a memoacuteria relacionada agrave identidade (ldquoo que eacuterdquo)

com a relacionada agrave localizaccedilatildeo (ldquoonde estaacuterdquo)

Uma consequecircncia da especializaccedilatildeo cognitiva pelo processo de

domesticaccedilatildeo eacute fornecida por Hare566 que comenta casos de catildees que se natildeo

mantiverem contato visual frequente com humanos manifestam sintomas de

ansiedade e depressatildeo Isto em animais que vivem em contexto de domesticaccedilatildeo

uma vez que existem catildees que natildeo satildeo domesticados nem satildeo sociaacuteveis em

relaccedilatildeo aos humanos567

Os catildees tecircm pois aleacutem da relaccedilatildeo com os membros de sua espeacutecie ndash e

nesse sentido verificou-se em experimento que eles usam o comportamento de

outro indiviacuteduo para prever o momento em que uma tarefa deve ser cumprida por

exemplo para obtenccedilatildeo de alimento568 ndash um relacionamento uacutenico com os entes

humanos em todo o reino animal com habilidades especiais na compreensatildeo dos

comportamentos humanos relacionados agrave comunicaccedilatildeo Ele desenvolveu seu

processo de aprendizado de modo a agir muitas vezes interpretando os sinais do

homem como linguagem oral e corporal expressotildees faciais estados emocionais

haacutebitos Reconhecem intenccedilotildees mudanccedilas de humor tom de voz569

Esses animais mostram-se assim mais aptos agrave resoluccedilatildeo de certos

problemas envolvendo a comunicaccedilatildeo com humanos do que outros animais como

os lobos e ateacute mesmo os primatas Tambeacutem a sua capacidade de improviso supera

564

HARE TOMASELLO 2006 565

KAMINSKI et al 2008 566

HARE 2004 567

UDELL et al 2014 Os pesquisadores elencam aleacutem desta modalidade ndash ou seja natildeo domesticados e natildeo sociaacuteveis ndash outras trecircs a saber catildees domesticados e sociaacuteveis (mansos) domesticados e natildeo sociaacuteveis e natildeo domesticados e sociaacuteveis

568 OSTOJIĆ CLAYTON 2014

569 KULKEKOVA 2006 HARE TOMASELLO 2005

125

a dos demais em tais testes Coren570 relata um caso parecido com o que aqui se

citou anteriormente narrado por Darwin Um golden retrivier chamado Buck havia

sido treinado para pegar objetos indicados por seu dono Um dia apoacutes a caccedila este

ia esquecendo um boneacute de basebol e um chapeacuteu de cauboacutei e entatildeo pediu para

Buck pegaacute-los O catildeo tentou com a boca pegar um e depois o outro sem sucesso

Parou entatildeo por alguns instantes e em seguida pegou o boneacute e o largou dentro do

chapeacuteu ajustando-o com uma das patas dianteiras agitando em seguida a cauda e

finalmente levando ambos para o dono

Retomando a capacidade de comunicaccedilatildeo esta foi verificada em pesquisas

como a de Hare e Tomasello571 que testaram a resposta a sinais humanos em catildees

e em primatas e concluiacuteram que aqueles conseguem identificar melhor do que estes

o comportamento humano relacionado agrave comunicaccedilatildeo e de maneiras bem mais

proacuteximas a de crianccedilas humanas Algo que o exemplifica eacute o fato de os catildees

responderem melhor do que os chimpanzeacutes agrave abertura dos olhos humanos (por

exemplo evitam comida proibida se um humano estiver olhando)

Nesse sentido Call e colaboradores572 constataram que os catildees reagem ateacute

mesmo de acordo com o estado de atenccedilatildeo dos humanos Num experimento em

que o alimento era colocado no meio da sala juntamente com o comando para que

natildeo comesse em cada etapa o experimentador se colocou de uma destas maneiras

sentado e vigiando sentado e de olhos fechados sentado e distraiacutedo com um objeto

em matildeos sentado de costas ausente da sala Os animais responderam conforme

cada situaccedilatildeo sentando-se e permanecendo assim por mais tempo e investigando

menos a comida aproximando-se dela de um modo mais indireto quando o

experimentador estava vigiando o alimento do que quando natildeo estava

Hare573 e colaboradores estudaram quatro espeacutecimes de catildees para o

reconhecimento de tipos de pista Os animais foram submetidos a testes a fim de

que encontrassem comida em um de dois recipientes estando o outro vazio As

pistas eram o apontar do dedo um marcador de madeira preto e branco no topo do

recipiente com a comida mais o olhar e o agitar de um dos recipientes sem barulho

por conter o alimento e entatildeo o do outro sem barulho O teste apontou o

570

COREN 2006 p 92-93 571

HARE TOMASELLO 2006 572

CALL et al 2003 573

HARE et al 2010

126

entendimento dos animais inclusive jovens de seis semanas de que as pistas

possuiacuteam caraacuteter comunicativo

Em outro experimento desenvolvido por Grassmann Kaminski e Tomasello574

envolvendo objetos familiares e outros ateacute entatildeo desconhecidos que deveriam ser

pegos segundo o comando de voz mais ou menos intenso bem como o gesto de

apontar os mesmos catildees supramencionados Betsy e Rico demonstraram assumir

a correferecircncia entre os dois tipos de comandos Ao buscarem um objeto ateacute entatildeo

desconhecido um dos catildees alcanccedilou o alvo por exclusatildeo Em uma das etapas

tinham de decidir em situaccedilatildeo conflituosa na qual o experimentador apontava para

um dos objetos e falava o nome de outro Os animais visitavam rapidamente o

objeto apontado mas pegavam o objeto nomeado demonstrando que o

apontamento tem relevacircncia para o processo de encontrar o que se pretende

A fim de investigarem a noccedilatildeo de causalidade Muumlller e colaboradores575

realizaram testes nos quais os cachorros deviam puxar um entre dois suportes para

serem recompensados de modo parecido com os realizados com elefantes que

mencionamos acima Dentre as condiccedilotildees apresentadas em uma havia um suporte

com comida em cima e outro com comida ao lado fora dele Em outra um suporte

tinha a comida mais afastada de si e outro a tinha tambeacutem fora mas encostada

nele Em uma nova condiccedilatildeo o alimento foi colocado em uma cavidade no extremo

de um dos suportes (fora da superfiacutecie de modo que natildeo poderia ser puxado) e na

outra o alimento estava sobre o suporte proacuteximo da sua extremidade e na uacuteltima

condiccedilatildeo havia um intervalo entre a parte de um dos suportes que seria puxada e a

outra destacada onde estava o alimento e no outro suporte o alimento situava-se

antes do intervalo de modo que poderia ser puxado Na terceira condiccedilatildeo os

animais comeccedilaram mal com exceccedilatildeo de trecircs indiviacuteduos mas melhoraram o

desempenho gradualmente e nesta uacuteltima os animais obtiveram pouco ecircxito Nas

duas primeiras condiccedilotildees os animais foram bem sucedidos no iniacutecio e na primeira

a maioria dos animais obteve ecircxito em oito a dez tentativas mas alguns

conseguiram ateacute mesmo na terceira tentativa no entanto com algum tempo o

rendimento passou a cair

Os pesquisadores observando que quando alguma pista anterior natildeo estava

mais disponiacutevel alguns dos catildees encontravam rapidamente novas pistas

574

GRASSMANN KAMINSKI TOMASELLO 2012 575

MUumlLLER et al 2014

127

concluiacuteram que esses animais utilizam sugestotildees perceptivas para a resoluccedilatildeo

desses problemas mas sem que a compreensatildeo deles decirc sinal de alcanccedilar a

relaccedilatildeo causal com os fundamentos fiacutesicos dessa tarefa

Em outro conjunto de experimentos Johnston e colaboradores576 observaram

que espeacutecimes de C lupus familiares e Canis dingo filtram gradualmente as accedilotildees

irrelevantes e natildeo demonstram padrotildees relevantes de sobreimitaccedilatildeo577 Uma das

tarefas realizadas nesse conjunto de experimentos consistiu inicialmente em fazer

com que os catildees observassem para que imitassem em seguida o experimentador

aproximar-se de uma caixa incolor mover uma alavanca em uma das laterais sem

funcionalidade de um lado para o outro entatildeo abrir a tampa na parte superior pegar

a comida mostraacute-la e inseri-la novamente repetindo o ato posteriormente com uma

caixa opaca Os animais foram gradualmente deixando de sondar a alavanca e

passaram a ir diretamente para a tampa da caixa

Alguns testes simples como o de Petrazzini e Wynne578 em que forneceram

aos catildees a opccedilatildeo por um de dois pratos que podiam variar entre nuacutemero e massa de

alimento mostraram que eles podem discriminar quantidades Outros como o de

West e Young579 que analisaram o comportamento de espeacutecimes diante de soma

simples de um mais um em que se forneciam resultados corretos e errados

sugerem que seriam capazes de contar

Haacute algumas habilidades em que os catildees ganham maior destaque Assim

como as crianccedilas eles aprendem naturalmente componentes da linguagem humana

de qualquer regiatildeo sem precisar de treinamento mas simplesmente ouvindo

palavras e frases e observando o comportamento humano na expressatildeo linguiacutestica

Eles tambeacutem aprendem um maior nuacutemero de palavras na infacircncia e reconhecem

variaccedilotildees de significados no volume e na entonaccedilatildeo do som emitido por

humanos580 mostrando preferecircncia em testes na entonaccedilatildeo que expressa

positividade em relaccedilatildeo agraves que expressam neutralidade ou negatividade em

comandos dados simultaneamente581

576

JOHNSTON et al 2017 577

Em inglecircs ldquooverimitationrdquo Significa a imitaccedilatildeo de accedilotildees relevantes somada agrave de accedilotildees irrelevantes para a execuccedilatildeo de determinada tarefa

578 PETRAZZINI WYNNE 2016

579 WEST YOUNG 2002

580 MIRBAZEL ARJMANDI 2018

581 COLBERT-WHITE et al 2018

128

O catildeo Rico comeccedilou a associar palavras a objetos com dez meses de idade

Segundo Kaminski e colaboradores582 ele passou a conhecer mais de duzentos

objetos pelo nome e os pesquisadores demonstraram que ele fazia novas

associaccedilotildees tambeacutem por exclusatildeo em tarefas em que um objeto desconhecido era

posto entre objetos conhecidos e ao catildeo era dada a ordem para pegaacute-lo Rico foi

superado pela cadela Chaser que com oito semanas de vida comeccedilou a treinar

fazendo-o diariamente por quatro a cinco horas Depois de trecircs anos de treinamento

ela jaacute conseguia reconhecer pelo nome (simples ou duplo) nada menos que 1022

objetos583

Pilley584 testou-a para reconhecimento semacircntico e sintaacutexico de frases com

trecircs elementos que envolviam um verbo e um objeto associado a uma preposiccedilatildeo

ou585 um objeto direto Para isto realizou-se trecircs experimentos No primeiro deles

foram utilizados muacuteltiplos objetos que eram familiares a Chaser ou seja cujo nome

ela conhecia O comando consistia simplesmente em pegar um dos objetos e levar

ateacute outro objeto determinado por vezes invertendo tambeacutem o papel dos dois

envolvidos em certa etapa Os outros dois experimentos seguiram o mesmo meacutetodo

sendo que no segundo os objetos eram considerados novos ou seja ainda natildeo

haviam sido testados no treinamento para estes testes e no terceiro os objetos

foram dispostos em dois recintos diferentes da casa onde ocorreram os testes de

modo que Chaser natildeo os via no momento em que recebia o comando Pilley

concluiu que ela entendeu o significado das sentenccedilas demonstrando compreensatildeo

sintaacutexica e semacircntica

Feuerbacher e Rosales-Ruiz586 realizaram mais recentemente experimentos

com um pastor alematildeo que foi treinado para distinguir entre categorias de objetos

uns considerados como ldquobrinquedosrdquo e outros como ldquonatildeo brinquedosrdquo587 Disto

sugeriram que os catildees poderiam formar conceitos

582

KAMINSKI et al 2004 583

PILLEY REID 2011 584

PILLEY 2013 585

Em inglecircs ldquoprepositional objectrdquo que natildeo implica necessariamente um objeto indireto 586

FEUERBACHER ROSALES-RUIZ 2017 587

Respectivamente ldquotoysrdquo e ldquonon-toysrdquo

129

63 CETACEAE ndash DELPHINIDAE

Em muitas espeacutecies da ordem Cetacea descobriu-se a presenccedila de neurocircnios

Von Economo que parecem estar ligados agrave consciecircncia (awareness) social e agraves

intuiccedilotildees raacutepidas em mudanccedilas de contexto como a que se tem sobre algueacutem com

que se acaba de deparar das quais seguem os julgamentos mais detalhados588

Aleacutem dos cetaacuteceos essas ceacutelulas foram verificadas apenas em grandes macacos

elefantes e humanos589

A ordem apresenta os indiviacuteduos com o maior quociente de encefalizaccedilatildeo

entre os animais natildeo humanos e dentre eles estatildeo os viventes de maior ceacuterebro

nenhum deles superando o dos cachalotes (Physeter macrocephalus) cujo peso

meacutedio eacute de 78 kg590 mas podendo chegar a cerca de 9 kg591 Esses animais

poreacutem natildeo figuram entre os representantes com maior quociente de encefalizaccedilatildeo

sendo superados por exemplo pelos membros das famiacutelias Phocoenidae e

Delphinidae agrave qual pertencem os golfinhos a quem daremos aqui destaque em

razatildeo da extensa gama de estudos realizados ndash em contraste com o nuacutemero

escasso de estudos relacionados agraves demais famiacutelias ndash envolvendo o gecircnero

Tursiops sp e em especial a espeacutecie Tursiops truncatus ou golfinho-nariz-de-

garrafa ou ainda golfinho-roaz

Jacobs Morgane e McFarland592 publicaram estudos anatocircmicos detalhados

do ceacuterebro desta espeacutecie descrevendo caracteriacutesticas como o neocoacutertex mais

expandido em detrimento de um arquicoacutertex mais reduzido como nos primatas e

com o prosenceacutefalo mais encurtado no eixo rostro-caudal em relaccedilatildeo aos dos

mamiacuteferos terrestres e flexuras mesencefaacutelica mais pronunciada o que nestes

verifica-se somente no estado embrionaacuterio Os pesquisadores chamam a atenccedilatildeo

para a orientaccedilatildeo do eixo orbito-occipital dos hemisfeacuterios tendo como referecircncia o

eixo do corpo que devido ao prosenceacutefalo aparecem como se tivessem sofrido certo

giro no eixo transversal o que causa confusatildeo no emprego de termos como

ldquoanteriorrdquo ldquooccipitalrdquo e ldquoventralrdquo para a descriccedilatildeo geral das aacutereas quando se tem por

referecircncia o ceacuterebro dos mamiacuteferos terrestres Eles exemplificam citando formaccedilotildees

588

ALLMAN et al 2005 589

BUTTI et al 2009 HAKEEM et al 2009 590

WHITEHEAD 2009 591

ROTH DICKE 2005 592

Cf JACOBS MCFARLAND MORGANE 1979 para rinenceacutefalo MORGANE et al 1980 para telenceacutefalo

130

ventrais e dorsais no ceacuterebro do golfinho com sua grande fenda entre os

hemisfeacuterios que seriam consideradas respectivamente ldquofrontaisrdquo e ldquoanterioresrdquo e

ldquoposteriores ou ldquooccipitaisrdquo em mamiacuteferos terrestres

O gecircnero Tursiops sp em particular apresenta algumas modalidades de

interaccedilotildees com os humanos sendo talvez a mais popular a sua utilizaccedilatildeo em

exibiccedilotildees em estaacutedios aquaacuteticos No entanto elas natildeo se reduzem ao conviacutevio em

cativeiro

631 Observaccedilotildees de campo

Os golfinhos tecircm colaborado com humanos na pesca segundo Busnel593

desde tempos imemoriais O pesquisador acompanhou pescadores na Mauritacircnia

dando batidas com pedaccedilos de pau na aacutegua ao que se seguiu a aproximaccedilatildeo de

um grande cardume de peixe perseguido por golfinhos que encheram assim as

redes dos pescadores Neil594 fornece alguns relatos de pesca colaborativa

semelhantes com ecircnfase naqueles recolhidos na Austraacutelia em que os humanos

usam desde batidas de lanccedilas na aacutegua a assobios no intuito de atrair a atenccedilatildeo dos

golfinhos para que tragam peixes

No Brasil estudos como os de Simotildees-Lopes595 e os de Zappes596 descrevem

esse tipo de interaccedilatildeo mas apontam para uma incerteza em relaccedilatildeo a se esses

animais teriam realmente alguma intenccedilatildeo de colaborar com os humanos

mencionando inclusive a existecircncia de botos que seriam bons ou prejudiciais para a

pescaria

Bearzi e colaboradores597 realizaram uma revisatildeo relacionada agraves interaccedilotildees

comportamentais de cetaacuteceos com coespeciacuteficos mortos verificando que esses

animais podem demorar a reconhecer o estado de morte e apoacutes isto dar-se podem

exibir manifestaccedilotildees de estresse e apego ao cadaacutever demorando a demonstrar

desinteresse por este tendo sido observados casos de matildees que carregam por

longo periacuteodo a carcaccedila de um filhote sem vida Essas e outras caracteriacutesticas

593

BUSNEL 1973 594

NEIL 2002 595

SIMOtildeES-LOPES 1991 596

ZAPPES 2011 ZAPPES et al 2011 597

BEARZI et al 2018

131

representam as muitas similaridades comportamentais com os primatas nesse tipo

de contexto598

Os golfinhos tambeacutem fazem uso de instrumentos Eacute o que demonstram

estudos como os de Kruumltzen e colaboradores e o de Kops e colaboradores599 que

fornecem um exemplo envolvendo certos grupos de Tursiops sp que utilizam

poriacuteferos como proteccedilatildeo contra ferimentos por corais inclusive em nichos ainda natildeo

explorados durante o forrageamento que se torna portanto mais frequente Os

pesquisadores identificaram ali evidecircncias de que este comportamento seria

transmitido culturalmente inclusive da matildee para a prole

632 Estudos experimentais

Louis Herman600 revisou experimentos relacionados a atividades cognitivas de

T truncatus a fim de apontar a existecircncia de inteligecircncia e consciecircncia nestes

animais

Ele verificou que no que toca agrave percepccedilatildeo dos gestos humanos601 os

golfinhos apresentaram grande habilidade em seguir o apontar do dedo e chegam

ateacute a seguir espontaneamente indicaccedilatildeo humana pelo gesto de estender um braccedilo

no corpo para indicar o outro lado sem compreensatildeo preacutevia direta disto algo que

levou o pesquisador602 a afirmar que os animais teriam compreendido o

apontamento como referecircncia para um objeto e que tambeacutem teriam aprendido a

seguir espontaneamente sem treinamento ateacute o olhar humano estagnado ou

dinacircmico

No acircmbito das interaccedilotildees sociais Herman identifica para estudo a atenccedilatildeo

conjunta a sincronia comportamental e a imitaccedilatildeo Os treinadores da equipe de

Herman ensinaram ao golfinho um comando que denominaram ldquotandemrdquo a partir do

qual os animais realizam os demais comandos em sincronia Entatildeo relacionaram

este comando ao de criaccedilatildeo e Herman observou os golfinhos realizarem

movimentos por conta proacutepria mas em sincronia perfeita algo que descreveu

afirmando desconhecer os mecanismos pelos quais isto se faz possiacutevel

598

ANDERSON 2011 599

KRUumlTZEN et al 2014 KOPS et al 2014 600

HERMAN 2006 Id 2012 601

HERMAN et al 1999 602

HERMAN 2006

132

No que diz respeito agrave habilidade de imitaccedilatildeo diz o pesquisador ao tratar da

imitaccedilatildeo de sons emitidos por computador que os golfinhos fazem uma distinccedilatildeo de

oitavas rara no mundo animal e aponta testes em que os animais apoacutes receberem

o comando imitaram outros coespeciacuteficos e humanos inclusive atraveacutes de imagens

de um televisor Ao imitar humanos poreacutem os animais improvisavam ou seja

levantavam a cauda quando o treinador levantava a perna acenavam com a

barbatana quando o treinador acenava com o braccedilo ficavam eretos com a cauda

imersa e locomoviam-se imitando sincronicamente o andar do treinador etc603

O pesquisador ressalta aqui a verificaccedilatildeo de senso de imagem corporal

representacional em relaccedilatildeo a si mesmo e ao outro e ainda de consciecircncia de si do

proacuteprio corpo e do corpo alheio de indiviacuteduos da mesma espeacutecie e de espeacutecie

distinta o que implica dizer que os golfinhos possuem esquemas e processos

mentais que distinguem codificam e representam as proacuteprias accedilotildees em relaccedilatildeo agraves

dos outros e que podem acessar ldquoo estado ou conteuacutedo de suas percepccedilotildees

memoacuterias ou conhecimentordquo604

Herman605 relata tambeacutem os testes que ele e sua equipe realizaram com os

golfinhos fecircmeos Akeakamai ou Ake e Phoenix esta treinada com algo como uma

linguagem acuacutestica gerada por computador e aquela com o uso de comandos de

trecircs a cinco palavras a partir de gestos simboacutelicos em que o treinador indicava

agentes objetos modificadores deste (localizaccedilatildeo) e accedilotildees inclusive de modo

recombinado O pesquisador aqui destaca o desempenho de Ake que diante do

objeto que sofreria determinada accedilatildeo da natureza da accedilatildeo do objeto de destino e

discriminando este objeto de outro similar que se encontrava do outro lado do

animal seguiu os comandos com sucesso inclusive diante da inversatildeo de papeacuteis

entre os objetos realizada com ela pela primeira vez Em testes similares observou

tambeacutem a eficaacutecia diante de outros comandos como um que sinalizava ao golfinho

para que repetisse o que fizera anteriormente606 e comportamentos curiosos como

a repeticcedilatildeo espontacircnea de movimentos previamente realizados enquanto o animal

aguardava um tempo maior entre um comando e outro607

603

HERMAN 2002 604

ldquo[] the state or content of its perceptions memories or knowledgerdquo Id 2012 p 540 605

HERMAN et al 1984 HERMAN 1986 606

MERCADO III et al 1998 MERCADO III et al 1999 607

COWAN 2003

133

Segundo Herman e colaboradores608 esses estudos pelos quais se

constatou que os animais compreenderam sentenccedilas lexicalmente novas

estruturalmente novas semanticamente reversiacuteveis e que expressam relaccedilotildees entre

objetos em que a posiccedilatildeo do modificador era alterada para mudar o significado da

sentenccedila e conjuntas ndash e nos quais se constatou que os golfinhos conhecem

generalizaccedilotildees como ldquopessoardquo e relacionadas a objetos com modificaccedilotildees

acidentais significativas como tamanho e cor ndash teriam sido aqueles que forneceram

pela primeira vez resultados convincentes de que certos animais podem processar

caracteriacutesticas de sentenccedilas de natureza semacircntica e sintaacutetica

Herman609 aponta o sucesso do animal tambeacutem em testes com comandos

que propositadamente natildeo faziam sentido com sequecircncias semacircntica ou

sintaticamente anocircmalas Agraves semanticamente anocircmalas Ake natildeo respondeu e agraves

sintaticamente anocircmalas Ake buscava na sequecircncia um subconjunto de itens que

fizessem sentido e entatildeo agia Exemplo disto foi a sequecircncia de comando ldquoAlto-

falante aacutegua tubo sobrerdquo610 que Ake interpretou como se tivesse de colocar o tubo

sobre o alto-falante fixado na parede da piscina e assim procedeu

Ake tambeacutem rearranjava objetos para cumprir certas tarefas como quando

levou uma prancha da beira da piscina para o centro a fim de seguir o comando para

pular a prancha e quando lhe foi dado um comando para recolher objetos sem

especificaccedilatildeo decidiu por si mesma trazer todos ao mesmo tempo o que fez

buscando primeiro o mais distante e entatildeo dispondo os demais no corpo de um

modo que foi possiacutevel fazecirc-lo o que mostrou segundo o pesquisador senso de

planejamento

Em outro estudo Herman e Forestell611 ensinaram Ake a pressionar um de

dois objetos aparentemente remos colocados verticalmente com a paacute para cima a

certa distacircncia um do outro na parede da piscina sendo um significando ldquosimrdquo e

outro significando ldquonatildeordquo para que ela tocasse um ou outro a fim de responder se

determinado objeto estaria ou natildeo na piscina o que fez com ecircxito Herman e

colaboradores612 associaram esta tarefa agravequela que envolve comando simples com

dois objetos e uma accedilatildeo Dava-se o comando como pocircr o frisbee no aro e na

608

HERMAN et al 1984 HERMAN 1986 609

HERMAN et al 1993a 610

ldquoSpeaker water pipe onrdquo 611

HERMAN FORESTELL 1985 612

HERMAN et al 1993b

134

ausecircncia de uma ou outra ferramenta o animal o indicaria no remo ldquonatildeordquo Diante

desses mesmos comandos na ausecircncia de ambos os objetos o frisbee e o aro ou

somente do frisbee Ake acionou o remo ldquonatildeordquo mas na ausecircncia somente do aro

ela espontaneamente levou o frisbee ateacute o remo como que querendo indicar que

natildeo havia o objeto de destino

Herman613 relata tambeacutem que haacute sinais que natildeo fazem parte do vocabulaacuterio

para que o golfinho realize certas accedilotildees sejam isoladas em sequecircncia ou para que

realizasse mais de uma simultaneamente como nadar em espiral abrir a boca fazer

ondas com a cauda mergulhar de costas soprar para fazer bolhas mergulhar em

espiral esguichar aacutegua e dar piruetas Apoacutes realizarem duas ou trecircs accedilotildees

simultaneamente os golfinhos passaram a espontaneamente repeti-las combinadas

e inclusive a manifestar outras combinaccedilotildees natildeo previamente solicitadas

Nos estudos publicados por Braslau-Schneck614 o golfinho Elele recebeu

dentre vaacuterios outros comandos de preenchimento615 um comando para criar um

comportamento ou mais de um caracterizando inclusive a tomada de decisatildeo O

animal realizou gestos que ainda natildeo tinham sido vistos o que fez Herman616

concluir que os golfinhos possuem o senso de agecircncia e de propriedade ou seja

reconhece a si mesmo como proprietaacuterio do corpo e agente das accedilotildees que pratica

e inclusive617 que o animal aprendeu em niacutevel conceitual a palavra que

corresponde a criar um movimento novo

Baseando-se nos resultados de estudos como este e como o de Reiss618 no

qual dois espeacutecimes de T truncatus mostraram por testes com marcas no corpo

reconhecerem-se a si mesmos no espelho Herman afirma que esses animais tecircm

autoconsciecircncia

Em outro deles619 o golfinho fecircmeo Phoenix recebeu o comando de tocar um

objeto com a barbatana peitoral ou com a boca ou com a cauda saltar sobre ele

ou nadar abaixo dele e em seguida recebeu o comando para repetir o gesto ou para

escolher fazer qualquer uma das outras quatro das cinco alternativas Quando foi

solicitado a escolher como primeiro comando o animal ficou por um momento

613

HERMAN 2006 614

BRASLAU-SCHNECK 1994 apud HERMAN 2006 615

Comandos que satildeo acrescentados acessoriamente agravequele(s) de maior relevacircncia para determinado experimento

616 HERMAN 2012

617 Id 2006

618 REISS 2001

619 CUTTING 1997 apud HERMAN 2006 HERMAN 2002

135

olhando para o experimentador e entatildeo compreendeu que podia optar por uma das

cinco e entatildeo saltou sobre o objeto

Em testes realizados com a fecircmea Elele para verificar se ela poderia

compreender siacutembolos como sendo referentes a partes de seu proacuteprio corpo

somando um total de nove como algo que as representa Herman e

colaboradores620 intentaram observar no animal o estabelecimento de correlaccedilatildeo

entre referecircncias gestuais simboacutelicas transmitidas pelos treinadores e as suas

diferentes partes do corpo no uso destas na realizaccedilatildeo de diferentes accedilotildees e em

interaccedilatildeo com objetos Elele usou a mesma parte do corpo para realizar accedilotildees

diferentes ndash como tocar lanccedilar ou indicar ndash ou partes diferentes para realizar uma

mesma accedilatildeo inclusive relacionando-se distintamente com objetos distintos ndash que se

encontravam flutuando na piscina colados na parede ou suspensos acima da

superfiacutecie ndash em combinaccedilotildees que muitas vezes natildeo faziam parte de seu repertoacuterio

Diante da demonstraccedilatildeo de que o animal sabia que parte do corpo usar e onde e

como fazecirc-lo bem como das capacidades versaacuteteis de motricidade621 o

pesquisador concluiu que o golfinho apresenta uma imagem corporal

representacional bem definida622 ldquouma imagem corporal bem articulada que pode

ser acessada conscientemente para obter respostas efetivas do corpo para ateacute

mesmo instruccedilotildees altamente abstratas ou eventos motores observadosrdquo623

64 PRIMATES

Frequentemente se observa nos grandes macacos por sua desenvolvida

capacidade cognitiva interaccedilotildees sociais extremamente complexas Witting e

Boesch624 por exemplo estudaram as interaccedilotildees de conflito em chimpanzeacutes (Pan

troglodytes) e constataram que eles levam em conta no processo de tomada de

decisatildeo para avaliar se um determinado conflito seraacute ou natildeo proveitoso o valor do

recurso disputado o risco de lesatildeo e o valor e a possibilidade de reparaccedilatildeo da

relaccedilatildeo

620

HERMAN et al 2001 621

HERMAN 2002 622

Id 2012 623

ldquo[] a well-articulated body image that can be consciously accessed for effective body-part responses to even highly abstract instructions or observed motor eventsrdquo HERMAN 2006 p 458

624 WITTING BOESCH 2003

136

Um exemplo talvez ainda mais marcante eacute a transmissatildeo cultural que o

pesquisador Shunzo Kawamura relatava em um trabalho cientiacutefico possivelmente

pela primeira vez em 1953 apoacutes seus estudos na ilha de Kawai no Japatildeo com

macacos japoneses (Macaca fuscata) em que observou a fecircmea Imo lavando uma

batata-doce antes de comecirc-la e este comportamento sendo entatildeo adotado

gradualmente pelos demais membros do grupo625

A transmissatildeo cultural varia de acordo com cada modelo social e pode-se dar

por ensinamento direto Withen e colaboradores626 incluindo Goodal verificaram

entre os chimpanzeacutes um nuacutemero de variaccedilotildees culturais que ateacute entatildeo natildeo havia sido

observado em nenhum outro animal natildeo humano e que cada grupo apresenta certo

conjunto de variaccedilotildees que torna uacutenico o seu perfil ainda que os elementos dessas

variaccedilotildees sejam normalmente encontrados em outros grupos mas podendo-se

observar tambeacutem elementos que lhe sejam exclusivos

Boesch identifica dois mecanismos que servem como preacute-requisito para

identificaccedilatildeo de cultura o ldquoprocesso de aprendizagem social que garante a

fidelidade da transferecircncia de informaccedilatildeo entre indiviacuteduosrdquo e as ldquonormas sociais que

garantam a fidelidade da informaccedilatildeo uma vez que ela tenha sido adquirida por um

indiviacuteduordquo627

Boesch e Tomasello628 tambeacutem em trabalho com chimpanzeacutes explicam que

individualmente as transmissotildees culturais satildeo mais raacutepidas e haacute pouca ou

moderada convenccedilatildeo e imposiccedilatildeo Jaacute nos grupos familiares e em associaccedilotildees as

transmissotildees variam conforme o nuacutemero de indiviacuteduos na populaccedilatildeo haacute pouca e

lenta convenccedilatildeo e um indiviacuteduo impotildee pouco ou moderadamente Em relaccedilatildeo agrave

maioria um indiviacuteduo toma as principais decisotildees e a transmissatildeo cultural daacute-se

mais lentamente e define convenccedilotildees e impotildee-se e quando se toma por foco o

prestiacutegio de um indiviacuteduo haacute transmissatildeo lenta poucas convenccedilotildees e ele impotildee

decisotildees lentas ou raacutepidas

Boesch629 fornece particularidades que caracterizam transmissatildeo cultural

como o aprendizado de um membro do grupo por outro membro que natildeo eacute

625

HIRATA et al 2008 626

WITHEN et al 1999 627

Respectivamente ldquosocial learning process that guarantee the fidelity of the information transfer between individualsrdquo e ldquosocial norms that guarantee the fidelity of the information once it has been acquired by an individualrdquo BOESCH 1996 p 265

628 BESCH TOMASELLO 1998

629 BOESCH 2003

137

transmitido geneticamente mas socialmente e natildeo implica necessariamente

adaptaccedilatildeo a determinadas condiccedilotildees ecoloacutegicas tratando-se portanto de uma

praacutetica coletiva que pode inclusive mudar rapidamente Acrescenta ainda a

referecircncia no campo antropoloacutegico que considera a cultura um sistema simboacutelico

com base em compartilhamento de significados

Ilustram esse compartilhamento os vinte tipos de instrumentos usados pelos

chimpanzeacutes do Taiuml National Park na Costa do Marfim dentre os quais se

encontravam gravetos e folhas identificados pelo pesquisador630 que constatou

ainda usos inovadores sem nenhuma mudanccedila aparente no contexto ambiental

(como o aparecimento de uma fonte de alimento antes desconhecida) enquadrando

entatildeo suas observaccedilotildees no que tomou por conceito de cultura

641 Observaccedilotildees de campo

Em outro estudo realizado no Taiuml National Park na Costa do Marfim Luncz e

colaboradores631 verificaram que ao usarem pedras ou tacos de madeira como

martelo para quebrar cascas de frutos de Coula edulis chimpanzeacutes de trecircs grupos

de um mesmo bloco florestal apresentaram cada um identidade cultural por meio de

variaccedilotildees na frequecircncia (ocorridas tambeacutem dentro de cada grupo na escala

temporal) do uso das pedras que predominava em alguns grupos e no dos tacos de

madeira que predominava em outros e os quais inclusive variavam de tamanho de

grupo para grupo Em trabalho posterior Luncz e Boesch632 observaram que as

fecircmeas que migraram para outros grupos que foi quase a totalidade das

observadas adotavam o comportamento do grupo novo o qual os pesquisadores

viram perdurar por cerca de vinte e cinco anos reforccedilando a existecircncia de um

processo de transmissatildeo cultural Os dois pesquisadores633 identificaram ainda

outros traccedilos culturais distintos entre os grupos no forrageamento na comunicaccedilatildeo

em interaccedilotildees sociais dos membros de cada um no comportamento de caccedila etc

somando um total de vinte e sete variantes

Boesch e Boesch tambeacutem identificaram o uso de instrumentos que os

chimpanzeacutes modelavam utilizando as matildeos para quebrar mateacuteria prima remover

630

BOESCH 1995 631

LUNCZ et al 2012 632

LUNCZ BOESCH 2014 633

Id 2015

138

partes suas puxaacute-la ou bater contra ela e os dentes para cortaacute-la Esses materiais

eram em geral mudas folhas gravetos usados como palitos extraiacutedos de pequenos

ramos frondosos ramos galhos usados como tacos e pedras Os animais usavam

nomalmente folhas mudas gravetos e pedaccedilos de galhos para inserccedilatildeo e retirada

de alimento em local de difiacutecil acesso para os dedos (casas de formigas corpo de

pequenos macacos predados etc) mudas folhas gravetos e ramos para sondar o

interior de cascas de aacutervore colmeias de abelha feridas cadaacuteveres usavam

gravetos e folhas como esponjas para assepsia e em exibiccedilotildees os animais

lanccedilavam e arrastavam pedras ramos e galhos e batiam com eles e com pedras e

tacos quebravam frutos duros por vezes usando gravetos para recolher partes

internas que natildeo conseguiam recolher com os dedos634

Outro uso de instrumentos observado por Boesch635 foi o de galhos como

tacos para bater ou tentar perfurar um leopardo que entrou em seu territoacuterio e a

quem entatildeo passaram a perseguir

Van Schaik636 verificou em orangotangos das ilhas de Borneacuteu e Sumatra o

uso de gravetos por orangotangos (Pongo pygmaeus) que podem ser inseridos

presos entre os dentes em pequenos furos em troncos de aacutervores para coletar mel

ou manualmente para tirar pedaccedilos de casas de cupins Outro uso de instrumento

observado por Schaik eacute a casca de ramo de aacutervore que aqueles animais retiram

prendem na boca e inserem em frutos em caacutepsula de aacutervores do gecircnero Neesia que

tecircm alto valor nutritivo para desprender e as sementes e a polpa que satildeo protegidas

por espinhos e entatildeo lanccedilaacute-las do fruto diretamente na boca

No tocante agrave comunicaccedilatildeo Boesch637 analisou um tipo simboacutelico observado

apenas nos chimpanzeacutes de Taiuml usado como norma social por curtos periacuteodos de

tempo a saber percursotildees em aacutervores pelo macho alfa e percebeu que elas

indicavam natildeo soacute a mudanccedila de direccedilatildeo no deslocamento do grupo apontada pela

direccedilatildeo e pelo sentido em que o animal se movia entre as duas aacutervores que

golpeava com os peacutes com as matildeos ou com ambos mas tambeacutem os periacuteodos de

descanso ou ambos combinados

634

BOESCH C BOESCH H 1990 635

BOESCH 1991 636

VAN SCHAIK 2006 637

BOESCH 1996

139

Hedwig e colaboradores incluindo Boesch638 registraram inclusive variaccedilotildees

sintaacuteticas nos chamados vocalizados de duas espeacutecies de gorilas Gorilla beringei

beringei e Gorilla gorilla gorilla em cinco tipos de unidades acuacutesticas combinadas de

cento e cinquenta e nove maneiras diferentes

642 Estudos experimentais

Premack e Woodruff639 realizaram experimentos como tentativas iniciais de

buscar evidecircncias sobre a teoria da mente em animais natildeo humanos Os

pesquisadores gravaram fitas de viacutedeo em que um ator humano dentro de uma jaula

tentava resolver sem sucesso testes tais como os realizados por Koumlhler Em um

deles prendiam-se algumas bananas no teto da jaula Em outro elas estavam fora

da jaula e do alcance do ator No seguinte estavam ao alcance mas impedidos por

uma caixa E em mais um teste repetiu-se o anterior mas com blocos pesados de

cimento dentro da caixa As imagens foram entatildeo mostradas nem sempre na

iacutentegra para um chimpanzeacute fecircmeo de nome Sarah habituado a assistir a cenas de

viacutedeo O animal recebeu entatildeo em cada sessatildeo cartas com imagens dentre as

quais somente uma representava a soluccedilatildeo correta para cada problema (como

empilhar caixas no primeiro cenaacuterio e usar uma vara no segundo) que foi

predominantemente escolhida por ele

Premack e Woodruff entatildeo descartaram que Sarah tenha estabelecido uma

simples correlaccedilatildeo de elementos fiacutesicos em razatildeo de diferenccedilas entre a disposiccedilatildeo

dos objetos nos viacutedeos e nas fotos e tambeacutem descartaram ainda que natildeo de todo

e como causa suficiente e exclusiva tambeacutem o associacionismo em que diante da

falta de um elemento na sequecircncia (como uma accedilatildeo ou um objeto) ela o reconhece

o que levaria por exemplo a recorrer a generalizaccedilotildees decorrentes de experiecircncias

cotidianas anteriores nas quais se teria de incorrer para explicar como Sarah

relacionou fotos aos viacutedeos incompletos que havia visto anteriormente Afirmaram

assim serem mais fortes as hipoacuteteses entre as quais afirmam natildeo haver grandes

diferenccedilas da empatia em que o animal teria-se colocado na posiccedilatildeo do ator

humano e da teoria da mente em que teria imputado a ele esses estados de

espiacuterito ou seja intenccedilatildeo ou propoacutesito e conhecimento ou crenccedila E dizem que a

638

HEDWIG et al 2014 639

PREMACK WOODRUFF 1978

140

empatia natildeo se sustentaria se as escolhas do animal fossem afetadas pela

identidade do ator

Na sessatildeo seguinte Sarah viu outras quatro cenas relacionadas a coisas que

estava acostumada a presenciar no cotidiano mas que para as quais natildeo havia sido

treinada uma em que o ator tentava sem sucesso sair da jaula outra em que

tentava sem sucesso ligar um aquecedor chegando a chutaacute-lo levemente

estremecendo e cruzando os braccedilos para demonstrar estar com frio outra em que

tentava fazer funcionar um fonoacutegrafo desplugado da tomada e uma uacuteltima em que o

ator natildeo conseguia lavar o chatildeo porque a mangueira que usava natildeo estava

devidamente conectada agrave torneira Na primeira sessatildeo a macaca Sarah recebeu

quatro fotos cada uma representando uma das situaccedilotildees e outras quatro uma com

uma chave outra com uma mangueira outra com um cabo eleacutetrico ligado na tomada

corretamente e uma uacuteltima com um cone de papel aceso Ela associou

corretamente essas fotos como objetos agraves fotos das situaccedilotildees Os pesquisadores

aqui ressaltam que natildeo haacute correspondecircncia fiacutesica entre algueacutem querendo sair de

uma jaula e uma chave nem entre um cone de papel em chamas e algueacutem

tremendo e olhando para um aquecedor

A etapa seguinte foi ainda mais complexa apresentou-se a Sarah trecircs

versotildees de cada objeto ou seja uma chave intacta outra torcida outra quebrada

uma mangueira conectada outra natildeo conectada outra conectada e ao mesmo

tempo cortada o mesmo em relaccedilatildeo ao cabo eleacutetrico e o papel apagado aceso ou

jaacute queimado Ela novamente obteve ecircxito associando o item correto agrave situaccedilatildeo

correta

Em uma nova etapa as cenas do primeiro experimento foram repetidas desta

vez com dois atores um treinador de quem Sarah gostava e outro por quem natildeo

demonstrava afeto Ambos em imagens em que obtinham sucesso nas tarefas e

tambeacutem em imagens em que natildeo obtinham sucesso utilizando uma vara de

comprimento mais curto passando pela caixa caindo sobre ela deitado com os

blocos de cimento espalhados Sarah selecionou as oito alternativas ldquoboasrdquo quando

o ator era aquele com quem simpatizava e apenas duas quando o ator era o outro

Os pesquisadores acrescentaram em seguida uma terceira situaccedilatildeo nem ldquoboardquo nem

ldquomaacuterdquo mas somente irrelevante O resultado das escolhas das fotografias manteve-

se reduzindo ainda para um o nuacutemero de alternativas ldquoboasrdquo para o outro ator

141

Hampton640 testou macacos-rhesus para metamemoacuteria641 os animais

optariam por escolher participar de um teste de memoacuteria ou natildeo Se decidissem

participar seriam recompensados com amendoim se acertassem e natildeo receberiam

nada se falhassem Se recusassem o teste ganhariam uma guloseima da qual

gostavam menos que de amendoim Os macacos que tinham desempenho mais

baixo preferiram desistir do teste e os que o tinham melhor desempenho insistiram

nele Hampton concluiu que os animais estariam assim reconhecendo quando se

lembram

Tambeacutem Rosati e Santos642 testaram trinta macacos-rhesus sem treinamento

preacutevio com o fim de tentar verificar a presenccedila da chamada metacogniccedilatildeo Em um

de dois tubos dispostos em forma de ldquoVrdquo o experimentador colocou uma isca um

alimento sem que os animais soubessem em qual Como controle aleacutem de verificar

o comportamento em caso de verem onde a isca teria sido colocada tambeacutem nesta

condiccedilatildeo se realizou o teste com um uacutenico tubo a fim de verificar se haveria

sondagem Os animais que natildeo sabiam da localizaccedilatildeo da isca no experimento com

os dois tubos dirigiram-se mais frequentemente para o ponto de convergecircncia a fim

de descobrirem a localizaccedilatildeo do alimento levando as pesquisadoras que ressaltam

que neste estudo observou-se pela primeira vez em animais natildeo humanos uma

resposta de busca de informaccedilatildeo em uma situaccedilatildeo para eles ineacutedita a concluirem

que eles podem buscar informaccedilotildees espontaneamente sobre algo que reconhecem

desconhecer o que as fez sugerir que esses macacos podem apresentar processos

metacognitivos semelhantes aos dos humanos

Em uma gama de testes cognitivos como para verificar a noccedilatildeo de

causalidade os primatas demonstraram grande eficaacutecia Um exemplo satildeo os

experimentos reproduzidos por Girndt e colaboradores643 e Martin-Ordas Call e

Colmenares644 com chimpanzeacutes (P troglodytes) orangotangos (P pygmaeus)

bonobos (Pan paniscus) e gorilas (Gorilla gorilla gorilla) em que com um

instrumento (no primeiro caso optando entre uma vareta ou um ancinho) tinham de

empurrar ou puxar o alimento (recompensa) sobre uma plataforma em forma de ldquoUrdquo

fixada externamente agrave grade com uma armadilha ou seja uma abertura pela qual a

640

HAMPTON 2001 641

SHATTLEWORTH 2010 p 244 642

ROSATI SANTOS 2016 643

GIRNDT et al 2008 644

MARTIN-ORDAS CALL COLMENARES 2008

142

recompensa se caiacutesse seria perdida (no primeiro estudo com variaccedilotildees como a

posiccedilatildeo e o nuacutemero das ferramentas disponiacuteveis) Em uma segunda etapa somente

no segundo estudo mencionado eles tinham de realizar tarefa similar dentro de dois

tubos fixados horizontalmente na grade tambeacutem contendo cada um uma armadilha

mas em um lado em um tubo e em outro lado no outro tubo Neste teste os animais

tinham de representar mentalmente o lado em que inseririam a ferramenta e entatildeo

tiveram menor ecircxito

Em experimento com macacos-rhesus (Macaca mulatta) Phillips e Santos645

associaram pequenas peccedilas de plaacutestico a uma metade de coco ou a uma maccedilatilde

parecendo pedaccedilos destes Um dos frutos foi colocado em uma caixa cheia de

folhas onde somente a peccedila de plaacutestico era retirada mostrada ao animal e colocada

novamente A peccedila anteriormente foi associada a um fruto ou outro e em cada

experimento podia ser colocada na caixa com o fruto com o qual fora associada ou

com o outro Os animais que tinham a peccedila associada ao fruto que natildeo estava na

caixa procuraram na caixa por mais tempo do que os que a tinham associado ao

fruto que estava dentro da caixa jaacute que procuravam pelo outro fruto Os

pesquisadores concluiacuteram assim que esses animais segundo o termo que utilizam

ldquoindividuamrdquo objetos segundo seus tipos e segundo suas propriedades

Tornou-se bastante conhecido o experimento de Brosnan e De Waal646 que

mostra como macacos-prego (Sapajus apella) lidam com a desigualdade Nesses

testes dois animais separados por uma grade eram submetidos por vez Cada um

dava uma pequena pedra como ficha ao experimentador Um deles recebia em troca

um pedaccedilo de pepino e o outro recebia uma uva alimento de que gostam mais O

que recebia o pedaccedilo de pepino tinha maior tendecircncia a rejeitar o alimento nesse

caso realizando movimentos de insatisfaccedilatildeo que mostravam seu desejo pela uva

Esses movimentos foram por vezes intensificados quando o outro passou a receber

a uva sem dar a pedra ou seja sem fazer qualquer esforccedilo Nos testes de controle

em que havia apenas um macaco natildeo houve repulsa pelo pepino Os pesquisadores

verificaram que os animais se baseiam na interaccedilatildeo com o outro coespeciacutefico e

sugerem que poderiam estar sob o efeito de expectativa frustrada e sendo movidos

por certas emoccedilotildees sociais

645

PHILLIPS SANTOS 2006 646

BROSNAN DE WAAL 2003

143

Lakshminarayanan e Santos647 realizaram experimentos com macacos-prego

tambeacutem treinados para trocar fichas por alimento entre um experimentador humano

que dava um pedaccedilo de maccedilatilde por um preccedilo e outro que dava um pedaccedilo e meio

pelo mesmo preccedilo os macacos escolheram este No experimento seguinte um

experimentador ofereceu um pedaccedilo de maccedilatilde e outro ofereceu dois pedaccedilos e meio

de maccedilatilde sendo que depois de negociar o segundo poderia retirar um pedaccedilo e o

primeiro poderia adicionar um pedaccedilo Os macacos passaram a evitar aquele e a

negociar somente com este mostrando aversatildeo agrave perda e que natildeo computam

somente o valor geral esperado

Os pesquisadores desenvolveram em seguida um experimento de risco em

duas etapas Na primeira os dois experimentadores ofereciam trecircs pedaccedilos de

maccedilatilde mas um natildeo retirava nada ou retirava dois de uma vez e o outro sempre

retirava um soacute sendo aquele entatildeo o escolhido pelos animais para negociar Jaacute na

segunda os dois experimentadores ofereciam um pedaccedilo de maccedilatilde mas um em

seguida acrescentava somente um enquanto o outro podia acrescentar outros dois

ou entatildeo nenhum e o primeiro foi o escolhido Os macacos apresentaram inclinaccedilatildeo

ao risco em um ambiente de perda e o rejeitaram em um ambiente de ganho

Em uma etapa seguinte os pesquisadores repetiram os experimentos usando

barra de cereal e pedaccedilos de frutas no lugar das fichas e os animais preferiram ficar

com o alimento que jaacute possuiacuteam Lakshminarayanan e Santos concluiacuteram que os

animais portam-se de modo similar aos humanos na tomada de decisatildeo

considerando as mudanccedilas de preferecircncias baseadas em escolhas

Em relaccedilatildeo agrave competecircncia numeacuterica Boysen e Berntson648 demonstraram

que a chimpanzeacute Sheba podia contar e somar nuacutemeros com resultados que iam de 1

a 4 empregando os meacutetodos descritos anteriormente para o papagaio Alex (aqui

com o animal deslocando-se para observar o conteuacutedo das bandejas) e tambeacutem

sem que tenha havido ensaio para transposiccedilatildeo das quantidades de itens para

algarismos de numerais araacutebicos

Kawai e Matsuzawa649 analisaram os estudos de Tomonaga e

colaboradores650 e os de Tomonaga e Matsuzawa651 que empregaram nuacutemeros em

647

LAKSHMINARAYANAN SANTOS 2012 648

BOYSEN BERNTSON 1989 649

KAWAI MATSUZAWA 2000b 650

TOMONAGA et al 1993 651

TOMONAGA MATSUZAWA 2000

144

uma tela de viacutedeo inclusive com itens curingas substituindo nuacutemeros para testar o

tempo de resposta relacionado a uma ordenaccedilatildeo numeacuterica crescente por uma

fecircmea de Pan troglodytes chamada Ai Ao tocar determinado nuacutemero diretamente na

tela se ela o fizesse ao correto somente ele desaparecia e se tocasse algum outro

todos desapareceriam reiniciando uma nova combinaccedilatildeo em uma nova sessatildeo No

final do teste feito corretamente Ai recebia recompensa e cada erro era seguido

somente de uma campainha Depois de um primeiro momento de exerciacutecio livre os

pesquisadores treinaram-na com reforccedilo sequencial com trinta e seis sequecircncias de

dois algarismos araacutebicos de 0 a 9 e ao aprendecirc-las o animal realizou com ecircxito a

transferecircncia de cardinal para ordinal selecionando as sequecircncias respectivas

corretas e recebendo a recompensa

No estudo seguinte ao treinarem Ai com oitenta e quatro combinaccedilotildees de

trecircs diacutegitos com acreacutescimo de um ou dois curingas na sequecircncia os pesquisadores

observaram que a identificaccedilatildeo de nuacutemeros mais proacuteximos agraves sequecircncias iniciais foi

mais demorada e a de nuacutemeros maiores na sequecircncia levou um tempo mais curto

o que sugeriu que a chimpanzeacute teria considerado toda a sequecircncia numeacuterica antes

de dar a primeira resposta No entanto quando os nuacutemeros maiores foram

primeiramente selecionados se deu o contraacuterio Isto e tambeacutem a reduccedilatildeo de tempo

de resposta para o menor nuacutemero diante do aumento do intervalo entre o nuacutemero

menor e o segundo menor foram interpretados como ldquoefeito da distacircncia

simboacutelicardquo652 que eacute verificado quando ocorre um desempenho superior mediante a

maior distacircncia ordinal entre as sequecircncias de caracteres (por exemplo quando se

verifica melhor desempenho entre 6-9 do que entre 2-3) Os testes assim revelaram

efeitos de posiccedilatildeo serial e de distacircncia simboacutelica observados no julgamento

comparativo humano

Tomonaga e Matsuzawa fazem referecircncia a testes semelhantes realizados

anteriormente com macacos-prego (Sapajus apella)653 e pombos (Columba livia)654

com seacuteries de cinco algarismos e itens curingas substitutos nos quais os pombos

treinados escolheram os nuacutemeros aleatoriamente ao passo que os macacos-prego

demonstraram ter algum conhecimento do posicionamento numeacuterico ordinal

652

ldquoSymbolic-distance effectrdquo 653

DrsquoAMATO COLOMBO 1989 654

TERRACE 1995

145

Outro trabalho analisado por Kawai e Matsuzawa o de Biro e Matsuzawa655

foi realizado tambeacutem com a seacuterie de trecircs nuacutemeros no mesmo intervalo mas quando

o animal apontava diretamente para o nuacutemero menor em seguida os outros dois

trocavam de posiccedilatildeo Nos testes realizados corretamente por Ai a duraccedilatildeo entre a

escolha do primeiro e do segundo nuacutemero era maior que essa mesma duraccedilatildeo nos

testes que ela realizou incorretamente quando mesmo assim Ai apontava o local jaacute

apagado do terceiro nuacutemero apoacutes a mudanccedila no conteuacutedo do visor com taxa maior

de erro quando os nuacutemeros eram mais proacuteximos Os pesquisadores concluiacuteram

deste estudo que o animal teria inspecionado ainda no iniacutecio da tentativa os trecircs

nuacutemeros e em seguida decidido a ordem em que os selecionaria e inclusive

planejado a sequecircncia motora que julgou ser mais apropriada para chegar agrave

resposta certa ou seja que o animal apresentou como estrateacutegia planejamento

monitoramento e ajustes flexiacuteveis quando houve mudanccedila de condiccedilotildees algo similar

ao que seria esperado de um humano

Kawai e Matsuzawa656 apontam que as conclusotildees obtidas nesses estudos

estatildeo em consonacircncia com outro que haviam publicado pouco antes657 no qual

investigaram a memoacuteria do animal para sequecircncias de cinco numerais no intervalo

de zero a nove e verificaram que Ai podia contar ateacute nove itens e ordenar em

sequecircncia neste intervalo Os nuacutemeros eram exibidos por um tempo cada vez mais

curto e logo convertidos em quadrados nos quais o animal tocaria obedecendo agrave

ordem haacute pouco observada Posteriormente essa tarefa passou a ser executada

com algarismos de 1 a 9 e Inoue e Matsuzawa658 realizaram um estudo comparativo

entre chimpanzeacutes e humanos nos quais aqueles apresentaram melhor desempenho

que estes

Em experimentos como o de Livingstone e colaboradores659 este com

macacos-rhesus (Macaca mulatta) verificou-se que alguns primatas aprendem a

associar algarismos araacutebicos e conjuntos de pontos (de tamanhos variados)

numericamente correspondentes agrave quantidade de alimento que recebem como

recompensa Os espeacutecimes treinados pelos autores tocavam os numerais ou os

conjuntos presentes em pares em uma tela de um aparelho de viacutedeo e escolheram

655

BIRO MATSUZAWA 1999 656

KAWAI MATSUZAWA 2000b 657

Id 2000a 658

INOUE MATSUZAWA 2007 659

LIVINGSTONE et al 2010

146

predominantemente as quantidades maiores que lhes proporcionariam um nuacutemero

maior de recompensas no caso pequenas doses de suco com uma quantidade

pequena de erro nos pares de nuacutemeros maiores e nos pares de conjuntos de

pontos de tamanhos parecidos

Com o fim de testar o chamado raciociacutenio analoacutegico em chimpanzeacutes num

outro experimento realizado com Sarah por Premack e Woodruff este tambeacutem

incluindo Gillan660 em uma primeira etapa foram apresentados ao animal cartotildees

com figuras geomeacutetricas coladas a saber triacircngulo lua crescente ou um quadrado

com um recorte triangular (como uma bandeirinha de festa junina) coloridas de azul

amarelo verde ou laranja variando entre trecircs tamanhos diferentes e podendo estar

marcadas com um ponto preto central ou natildeo Disto se montou setenta e duas

combinaccedilotildees diferentes Do lado esquerdo no cartatildeo as figuras A acima e Arsquo

abaixo seriam o modelo Do lado direito encontrava-se a figura B acima e um

espaccedilo vazio abaixo E mais abaixo a figura Brsquo que se relacionava com B

analogicamente (conforme cor formato ou outra das caracteriacutesticas) a Arsquo em

relaccedilatildeo a A e ao lado dela a figura C que seria a resposta errada ao problema

Sarah deveria indicar Brsquo utilizando um retacircngulo amarelo escrito ldquoSAMErdquo661

Em uma nova etapa o animal realizou a mesma tarefa indicando se a

combinaccedilatildeo era a mesma (B e Brsquo com ldquoSAMErdquo) ou se era diferente (B e C com

ldquoDIFFERENTrdquo)

No experimento seguinte Sarah deparou com cartotildees contendo objetos

caseiros que lhe eram familiares Por exemplo com um em que havia um cadeado

acima (A) e uma chave abaixo (Arsquo) do lado esquerdo e uma lata acima (B) do lado

direito com espaccedilo abaixo sendo aqui oferecidas a figura de um pincel (C) e a de

um abridor de latas (Brsquo) e com outro em que havia um papel (A) acima e um laacutepis

(Arsquo) abaixo do lado esquerdo e uma lata (B) em cima do lado direito com espaccedilo

abaixo sendo aqui oferecidas as mesmas figuras de abridor de latas (C) e pincel

(Brsquo)

Os pesquisadores concluiacuteram que Sarah resolveu os problemas por raciociacutenio

analoacutegico e pelo uso de classes conceituais o que teria sido corroborado na etapa

seguinte em que se empregou uma figura CB que tinha relaccedilatildeo com B mas

660

GILLAN et al 1981 661

ldquoMesmordquo

147

diferente daquela entre Arsquo e A (sendo entatildeo a resposta errada) e outra CA que se

relacionava com Arsquo na qual Sarah novamente obteve ecircxito

Em relaccedilatildeo agrave comunicaccedilatildeo no experimento de Zimmermann e

colaboradores662 realizado com chimpanzeacutes e bonobos criados em ambientes

humanos e outros criados em ambientes natildeo humanos a fim de verificar se os

animais levam em consideraccedilatildeo a perspectiva de um ajudante humano ao

apontarem onde se encontra um objeto escondido bonobos e orangotangos

apontaram consistentemente para o local onde havia comida escondida bem como

para um objeto escondido com o qual um voluntaacuterio humano pegaria a comida aqui

no caso um garfo (que o animal por si soacute natildeo usaria) Segundo os pesquisadores o

estudo sugere que os animais compreenderam a natureza referencial seletiva do

ato de apontar para alvos distintos Os orangotangos apontaram mais para o garfo

quando este era escondido na ausecircncia do agente humano do que nas vezes em

que era escondido na presenccedila deste Isto mais o fato de os animais apontarem

para o humano depois que este ia procurar o objeto em seu lugar habitual e natildeo

encontrava levaram o pesquisador a sugerir que esses macacos imitam ldquoa

propriedade de relevacircncia da comunicaccedilatildeo humanardquo663

Nos anos de 1930 alguns pesquisadores como Winthrop Kellogg e Luella

Kellogg664 tentaram ensinar chimpanzeacutes a falar mas verificou-se que seu aparelho

vocal natildeo possibilitava mais do que algumas palavras Alguns anos depois outros

estudiosos passaram a tentar-lhes ensinar a linguagem manual dos sinais

especificamente a American Sign Language (ASL) como Allen Gardner e Beatrice

Gardner665 que o fizeram com o chimpanzeacute fecircmeo Washoe Os pesquisadores

obtiveram como exemplo de resultados a distinccedilatildeo por parte do animal entre ldquoflorrdquo e

ldquocheirordquo666 e o uso de um mesmo sinal para flores dentro de casa para as que

estavam ao ar livre e ateacute para as que estavam em fotografias aleacutem do uso de sinais

de ecircnfase como ldquopor favor (please)rdquo ldquomais raacutepido (hurry)rdquo e ldquoquero mais (more)rdquo667

662

ZIMMERMANN et al 2009 663

ldquo[] the relevance property of human communicationrdquo 664

KELLOG W N KELLOG L A 1967 p 282-287 665

GARDNER R A GARDNER B T 1969 666

Respectivamente ldquoflowerrdquo e ldquosmellrdquo 667

Respectivamente ldquopleaserdquo ldquohurryrdquo e ldquomorerdquo

148

Segundo Miles668 o orangotango Chantek chegou a conhecer cerca de cento

e quarenta sinais manuais e diz George669 pareceu esboccedilar o iniacutecio de uma

conversa ao expressar a frase ldquoJeannie Chantek chaserdquo670

Dentre as outras accedilotildees de Chantek destacamos seu reconhecimento no

espelho que passou a utilizar para limpar-se e a sua capacidade de enganar a

treinadora tanto roubando alimento de seu bolso enquanto puxava a matildeo dela na

direccedilatildeo oposta como fingindo engolir a borracha de apagar que roubara mantendo-

a no canto da boca apoiando novamente o estojo e logo em seguida pedindo

comida por meio dos sinais Aqui Miles aponta evidecircncias de que o animal teria

demonstrado intencionalidade premeditado e assumido a perspectiva do outro

como proposto pela teoria da mente que implicam formaccedilatildeo de imagem mental

relacionada aos resultados desses atos Outro sinal disto foi a melhora do sinal

apresentado apoacutes o pedido do treinador sugerindo que o animal entendeu que o

sinal teria uma forma ideal refletida em sua imagem mental Chantek passou a

sinalizar tambeacutem com o peacute e com objetos como lacircminas de tesouras Miles afirma

que ele natildeo tinha os sinais somente como uma habilidade motora associada a algo

o que evidenciaria que o modo de processar os sinais teria natureza abstrata e

representacional O animal ainda chamava a atenccedilatildeo de um humano antes de

comeccedilar a sinalizar chegava a oferecer as matildeos para que fossem moldadas a fim

de que passasse a conhecer um sinal novo e passou a inventar seus proacuteprios

sinais mostrando ter entendido a natureza representacional dos sinais Assim

conclui ter-se-ia um exemplo de um animal que formou representaccedilotildees do mundo

real

Tomasello671 publicou uma revisatildeo sobre os avanccedilos de experimentos com

grandes macacos treinados para a comunicaccedilatildeo humana como o chimpanzeacute

Washoe a gorila Koko (apelido de Hanabiko) e o orangotango Chantek mas com

ecircnfase nos trabalhos desenvolvidos com o bonobo Kanzi que reuniu um repertoacuterio

de mais de trecircs mil palavras672 e afirma que a conclusatildeo geral eacute a de que estes

possuem a maior parte das habilidades cognitivas que servem como requisito para

algo que seria como a linguagem humana como o uso de siacutembolos linguiacutesticos

668

MILES 1990 669

GEORGE 2003 670

Traduccedilatildeo sugerida ldquoChantek persegue Jannierdquo MILES 1990 p 521 671

TOMASELLO 2017 672

RAFFAELE 2006

149

semelhante ao humano dos quais compreendem e produzem combinaccedilotildees de

maneira criativa

A gorila Koko que veio a tornar-se bastante famosa conheceu um repertoacuterio

bastante vasto da linguagem manual dos sinais da ASL em que utilizava mais de mil

palavras e reconhecia mais de duas mil673 Em certa etapa seu desenvolvimento

acompanhou sob muitos aspectos o de crianccedilas humanas mas sob outros ficava

aqueacutem destas No entanto aos quatro anos e meio jaacute pontuava acima de crianccedilas

de seis anos em alguns testes ditos de ldquoprogressatildeo loacutegicardquo como em uma

sequecircncia de quatro figuras de cartas com um triacircngulo e um ciacuterculo em que estes

alternavam com relaccedilatildeo agrave posiccedilatildeo superior e inferior (a primeira tinha o ciacuterculo

acima) e cada ciacuterculo a partir do segundo era maior que o anterior enquanto os

triacircngulos possuiacuteam o mesmo tamanho A quinta carta seguinte teria de ser um

grande ciacuterculo sobre o mesmo triacircngulo e Koko rapidamente a indicou entre outras

trecircs com triacircngulos e ciacuterculos em outras condiccedilotildees674

Se por um lado do teste da marca diante de um espelho realizado Allen e

Schwartz675 com um espeacutecime de gorila (G gorilla gorilla) chamado Otto apesar de

este ter obtido ecircxito os autores consideraram como inconclusiva a identificaccedilatildeo de

autorreconhecimento por outro Koko claramente se reconhecia no espelho e

inclusive indicava partes de seu rosto676 Segundo Patterson ela utilizava elementos

da linguagem aberta e produtivamente677 Koko se referia a eventos passados (como

quando se referiu a um fato ocorrido no dia anterior) e reconhecia o futuro proacuteximo

(como quando ia-se preparar depois de informada de que logo iria sair)678 dizia

quando gostava de algo ou de algueacutem quando oferecia algo como uma bebida para

algueacutem679 e dizia pares de palavras que rimavam entre si quando solicitada a fazecirc-

lo ou quando lhe pediam uma rima para uma palavra especiacutefica ela o fornecia680

Dava tambeacutem outras demonstraccedilotildees de humor como quando espontaneamente

chamava o nariz de ldquofake mouthrdquo681 brincava com as palavras em muitos casos

como o fazem crianccedilas como por exemplo aglutinando elementos moldando seu

673

THE GORILLA FOUNDATION 2018 674

PATTERSON LINDEN 1981 p 100 675

ALLEN SCHWARTZ 2007 676

PATTERSON LINDEN 1981 p 108 677

Ibid p 157 678

Ibid p 150-151 679

Ibid p 91 680

Ibid p 111 681

ldquoFalsa bocardquo PATTERSON LINDEN 1981 p 112

150

proacuteprio vocabulaacuterio e expressava em palavras certas emoccedilotildees como seus medos

inclusive xingando quem a contrariasse tendo espontaneamente passado a usar

palavras especiacuteficas para isto como ldquobirdrdquo682 e ateacute mentia para acusar algueacutem de

um erro que ela mesma cometida ou para disfarccedilar algo de errado que estivesse

fazendo ao ser pega em flagrante683 Quando natildeo sabia o nome de algum objeto ela

mesma atribuiacutea a este um como quando passou a chamar maacutescara ldquonose fakerdquo684

Isso tambeacutem indicaria segundo Patterson capacidade de estabelecer analogias e

metaacuteforas Assim Koko foi submetida a certo teste em que teria de reconhecer por

exemplo se uma cor era alegre ou triste ou se era suave ou pesada e passou com

desempenho superior ao de algumas crianccedilas com a idade de sete anos tambeacutem

testadas685

Pika e colaboradores incluindo o proacuteprio Tomasello686 mencionam o uso de

meacutetodos utilizados pelos grandes siacutemios para captar atenccedilatildeo para chamar a

atenccedilatildeo de outros para algo Este como exemplifica Tomasello687 pode ser o

proacuteprio sujeito uma parte do corpo deste ou algum objeto externo o que deveraacute

induzir o outro indiviacuteduo a fazer o que o sujeito que chamou sua atenccedilatildeo intenciona

E Tomasello acrescenta que ateacute onde se sabe somente os grandes primatas

chamam a atenccedilatildeo dos outros deste modo em seu processo de comunicaccedilatildeo

natural Ele observa que Kanzi consegue entender e produzir dispositivos

comunicativos a partir do modo como funciona psicologicamente a comunicaccedilatildeo

referencial o que significa que ao dirigir a atenccedilatildeo do outro eles estatildeo conseguindo

atingir um objetivo especiacutefico

Savage-Rumbaugh688 quem com colaboradores teria segundo afirma

realizado o primeiro experimento em que chimpanzeacutes estabeleceram comunicaccedilatildeo

entre si por meio do uso de siacutembolos689 relata que Kanzi se destaca pelo fato de

que observava desde pequeno os testes com lexigramas realizados com sua matildee

Matata e conseguiu aprender mais lexigramas do que ela desenvolvendo-se por si

mesmo em vez de por treinamento direto reforccedilado externamente tendo por

recompensa a conquista da comunicaccedilatildeo e o que esta lhe propiciava Os lexigramas

682

ldquoAverdquo PATTERSON LINDEN 1981 p 119-121 e 142 683

Ibid p 135 684

ldquoNariz falsordquo Ibid p 117 685

Ibid p 117 686

PIKA et al 2005 687

TOMASELLO 2017 688

SAVAGE-RUMBAUGH 1986 689

SAVAGE-RUMBAUGH et al 1978

151

satildeo iacutecones de computador que correspondem a palavras e aparecem em uma tela

para os animais em teste a fim de que a toquem no ponto exato em que veem o

iacutecone da palavra que pretendem expressar Se tocam nos iacutecones corretos em

relaccedilatildeo agrave determinada questatildeo recebem a recompensa Tomasello compara o

vocabulaacuterio de Kanzi ao de crianccedilas pequenas e tal compreensatildeo tambeacutem eacute

observada em papagaios catildees e outros animais mas nestes adquirida e produzida

somente mediante treinamento direto Compunham o vocabulaacuterio nomes proacuteprios

nomes de objetos localizaccedilotildees accedilotildees propriedades e adveacuterbios com certas

funccedilotildees como ldquosimrdquo e ldquonatildeordquo O pesquisador aponta a construccedilatildeo de sentenccedilas por

parte do animal com o emprego de accedilotildees que natildeo satildeo deduziacuteveis dos objetos

envolvidos como ldquoponha o dinheiro sobre os cogumelosrdquo690 e outras em que

poderia facilmente haver reversatildeo dos papeacuteis dos objetos envolvidos como ldquoponha

um pouco de leite na aacuteguardquo691

Remetendo-se a outro estudo seu692 Tomasello menciona ainda que Kanzi

tem uma categoria gramatical que o possibilita compreender coisas jaacute conhecidas de

novas maneiras e entende que a ordem das palavras pode ser usada como

dispositivo simboacutelico de diferenciaccedilatildeo e daacute como exemplos a resposta correta do

animal a comandos em que se troca somente o sujeito como ldquoponha o chapeacuteu em

sua bolardquo e ldquoponha a bola no chapeacuteurdquo693 e o entendimento por parte de Kanzi de

que aquele que pratica a accedilatildeo como ldquomorderrdquo ou ldquoperseguirrdquo694 vem antes do que

sofre a accedilatildeo decerto levando em conta aqui a voz ativa Conclui entatildeo que ele

entende certos eventos e certas accedilotildees bem como as palavras usadas para designaacute-

los que deles participam agentes cuja ordem em que aparecem na construccedilatildeo da

frase representa um papel especiacutefico tal como ocorre com uma crianccedila de dois

anos Diz o pesquisador

Ele sabe que o sujeito que estaacute mordendo ou perseguindo eacute mencionado antes de lsquomorderrsquo ou lsquoperseguirrsquo e o que estaacute sendo mordido ou perseguido eacute apenas mencionado depois Ele sabe essas coisas presumidamente porque viu uma ordem pareada com uma versatildeo do evento chave (por exemplo X perseguindo Y) e outra ordem pareada com outra versatildeo do mesmo evento (por exemplo Y perseguindo X)

695

690

ldquoPut the Money on the mushroomsrdquo 691

ldquoPut some milk on the waterrdquo 692

TOMASELLO 1994 693

Respectivamente ldquoput the hat on your ballrdquo e ldquoput the ball on the hatrdquo 694

Respectivamente ldquobiterdquo e ldquochaserdquo 695

TOMASELLO 2017 p 100

152

Tomasello assim distingue dois niacuteveis em relaccedilatildeo agrave competecircncia gramatical

O primeiro eacute a produccedilatildeo inovadora de combinaccedilotildees de siacutembolos criando novos

significados o que exemplifica com o chimpanzeacute Washoe referindo-se a um pato

como ldquowater birdrdquo696 O segundo satildeo essas combinaccedilotildees que um sujeito pode

produzir com siacutembolos especiacuteficos que servem como marcadores gramaticais Para

exemplificar o pesquisador aponta a ausecircncia de indicaccedilotildees simboacutelicas de como

esses dois signos ldquowaterrdquo e ldquobirdrdquo se relacionam entre si e assim cabe ao receptor

ou ouvinte estabelecer a relaccedilatildeo Uma dessas relaccedilotildees eacute a ordem exemplificada

mais acima em que se usa em uma frase primeiro um substantivo como sujeito e

depois (do verbo) outro como objeto direto Segundo o pesquisador Kanzi utiliza

alguns padrotildees de ordem consistentes utilizando lexigramas que correspondem a

uma accedilatildeo (primeiro elemento) geralmente antes do objeto da accedilatildeo (segundo

elemento) Mas ele por fim observa que uma coisa eacute haver consistecircncia no padratildeo

de ordenamento e outra eacute usar a ordem como dispositivo gramatical para produccedilatildeo

de um significado consistente que caracterize uma segunda ordem Isto mesmo

quando Kanzi combina de modo criativo os lexigramas com gestos que normalmente

vecircm em seguida como o de apontar para quem estaacute realizando alguma accedilatildeo ou

para o local para o qual a accedilatildeo seraacute dirigida

696

ldquoAve de aacuteguardquo

153

7 A INTELIGEcircNCIA NOS ANIMAIS SEGUNDO O ARISTOTELISMO-TOMISMO

Tendo selecionado assim algumas das principais habilidades cognitivas

comprovadas e inclusive outras sugeridas de animais natildeo humanos a partir de

trabalhos com pesquisas experimentais e de campo e de posse da informaccedilatildeo

estruturada necessaacuteria no acircmbito da psicologia aristoteacutelico-tomista buscaremos

enquadrar essas habilidades dentro dos limites entre o conhecimento adquirido

pelos sentidos nos animais natildeo humanos e aquele adquirido pelos sentidos no

homem bem como pelo intelecto a fim de darmos iniacutecio agrave verificaccedilatildeo da

compatibilidade entre a proposta aristoteacutelico-tomista e o que se sabe atualmente

sobre a chamada inteligecircncia nesses entes

O proacuteximo passo assim eacute retomarmos a obra de Aristoacuteteles e Tomaacutes de

Aquino para estabelecermos esses limites a partir da construccedilatildeo anterior e do que

os autores afirmam diretamente sobre o tema

Aristoacuteteles afirma que a alma de uma crianccedila pequena praticamente em nada

difere da de alguns animais com o ceacuterebro mais desenvolvido697 ou seja que estes

podem expressar caracteriacutesticas no acircmbito da potecircncia estimativa observadas

naquelas algo que reflete diretamente na questatildeo das habilidades cognitivas

Ele ilustra o que diz afirmando que nos animais encontram-se estados

psicoloacutegicos semelhantes aos dos humanos e elenca alguns como ldquodocilidade ou

ferocidade doccedilura ou aspereza coragem ou covardia temor ou ousadia paixatildeo e

maliacutecia e no plano intelectual certa sagacidaderdquo698 dentre outros traccedilos de caraacuteter

como a indolecircncia a irascibilidade a prudecircncia e a timidez a obstinaccedilatildeo e a

estupidez a vileza e a perfiacutedia a nobreza e a braveza a astuacutecia a afetuosidade a

inveja e a presunccedilatildeo a cautela e o brio

Afirma entatildeo que ainda que os demais animais tenham memoacuteria e faculdade

de aprendizagem o homem eacute o uacutenico que apresenta capacidade de reflexatildeo pois

soacute ele eacute capaz de recordar voluntariamente699

Quanto ao ato voluntaacuterio diz ele que o tecircm as crianccedilas e os animais natildeo

humanos que agem voluntariamente natildeo pela vontade livre ou por algo de origem

externa mas espontaneamente no sentido de que satildeo voluntaacuterias as accedilotildees

697

ARISTOacuteTELES 1992 L VIII 588a-588b p 412 698

ldquo[] docilidad o ferocidad dulzura o aspereza coraje o cobardiacutea temor u osadiacutea apasionamiento o malicia y en el plano intelectual una cierta sagacidade []rdquo Ibid L VIII 588a p 411

699 Ibid L I 488b p 48

154

praticadas impulsivamente que caracterizam um movimento proacuteprio em razatildeo do

apetite em conformidade com as afecccedilotildees da vontade sensitiva como o desejo

sensual e a raiva700 Mas nem nos animais natildeo humanos nem nas crianccedilas existe

escolha ainda que possa existir uma opiniatildeo sobre o que se haacute ou natildeo de fazer

uma opccedilatildeo sobre o que mais conveacutem a determinado fim701 jaacute que lhes falta o juiacutezo

o fundamento do ato e a deliberaccedilatildeo cuja parte da alma relacionada considera as

causas como aponta o Estagirita o ldquoem vista do quecircrdquo e o ldquopor quecircrdquo que entatildeo

conclui que ldquotudo o que foi escolhido deliberadamente eacute voluntaacuterio mas nem tudo o

que eacute voluntaacuterio eacute escolha deliberadardquo702

Assim enquanto o homem tem o conhecimento perfeito do fim em que satildeo

apreendidas a coisa constitutiva do fim aleacutem da ideia de fim e a da proporccedilatildeo entre

o fim e o ato que a este se ordena os demais animais tecircm pela estimativa o

conhecimento imperfeito do fim restrito agrave apreensatildeo deste e mesmo quando um

objeto por buscar-se natildeo estaacute presente em razatildeo da imaginaccedilatildeo e da memoacuteria

Assim se a essecircncia perfeita da vontade depende do conhecimento perfeito do fim

haacute tambeacutem a vontade em sentido imperfeito que depende do conhecimento

imperfeito do fim e neste caso haacute um movimento para o fim sem deliberaccedilatildeo703

Aristoacuteteles tambeacutem parece atribuir de algum modo inteligecircncia ou prudecircncia

(aqui como frocircnese ou phroacutenesis)704 natildeo soacute aos humanos no sentido de ldquoexaminar

bem o que se refere a si mesmordquo705 que tecircm a inteligecircncia universal por meio da

razatildeo mas a alguns dentre os demais animais que segundo ele ldquoparecem ter

faculdade de provisatildeo para sua proacutepria vidardquo706 no acircmbito de determinados atos

particulares707708

700

ARISTOacuteTELES 1998a L III 1111a-1111b p 184-185 TOMAacuteS DE AQUINO 1964 l 4 427

701 TOMAacuteS DE AQUINO 2003a p 30

702 ldquo[] todo lo que ha sido escogido deliberadamente es voluntario pero no todo lo voluntario

es eleccioacuten deliberadardquo ARISTOacuteTELES 1998b L II 1226b p 460 703

TOMAacuteS DE AQUINO 1993 Q 6 a 2 p 105 704

ldquoΦρόνησιςrdquo Alguns tradutores usam ldquointeligecircnciardquo mas partindo do que se disse anteriormente a respeito do intelecto o termo ldquoprudecircnciardquo parece ser dos dois o mais adequado Natildeo se trataria pois de inteligecircncia propriamente dita sob a oacuteptica aristoteacutelico-tomista

705 ldquo[] examinar bien lo que se refiere a siacute mismordquo ARISTOacuteTELES 1998a L VI 1141a p

278 706

ldquo[] parecen tener la facultad de previsioacuten para su propria vidardquo ARISTOacuteTELES 1998a L VI 1141a p 278

707 Reale (2005 p 7) explica que phroacutenesis aqui tem sentido mais geral e que quando

Aristoacuteteles emprega o termo aos humanos eacute no sentido de ldquosabedoria praacuteticardquo que eacute exclusiva destes

708 ARISTOacuteTELES 1998a L VI 1141a p 278 TOMAacuteS DE AQUINO 2001 Q 96 a 1 p

851 Id 1964a l 6 1187

155

Explica Tomaacutes de Aquino que essa inteligecircncia ou prudecircncia pode ser

encontrada em alguns animais com memoacuteria mas que diferente do homem no qual

ela se daacute quando este racionalmente delibera quanto ao que deve fazer nesses

animais se daacute por um juiacutezo instintivo das coisas por fazer-se de modo que diz ele

ldquonos outros animais a prudecircncia eacute uma estimativa natural sobre a busca daquilo que

eacute adequado e da fuga daquilo que eacute prejudicial como uma ovelha segue sua matildee e

foge do lobordquo709

Em seguida ele distingue nos escritos de Aristoacuteteles trecircs niacuteveis de

conhecimento nos animais natildeo humanos um representado pelos animais que natildeo

tecircm nem memoacuteria nem audiccedilatildeo e portanto natildeo satildeo capazes de ser ensinados nem

tecircm prudecircncia outro por aqueles que tecircm memoacuteria mas natildeo ouvem e entatildeo natildeo

tecircm capacidade para serem ensinados mas podem ter prudecircncia e o terceiro pelos

animais que tecircm memoacuteria e audiccedilatildeo e entatildeo tecircm prudecircncia e podem ser

ensinados710

O sentido de ldquoouvirrdquo nos animais natildeo humanos aqui explica Reale711 estaacute

expresso por Aristoacuteteles

Haacute os que participam por sua vez da capacidade tanto de aprender712

como de ensinar capacidade transmitida seja por seus proacuteprios semelhantes seja pelos homens Estes satildeo todos animais dotados do dom da audiccedilatildeo isto eacute natildeo soacute os que percebem as diferenccedilas dos sons mas tambeacutem os que distinguem a diversidade de significados

713

O Estagirita fornece o exemplo de pequenas aves que se natildeo forem criadas

com os pais podem apresentar cantos diferentes ao que se observa comumente na

espeacutecie Menciona entatildeo o caso de um rouxinol que ensinou os filhotes a cantar

corroborando a afirmaccedilatildeo de que a comunicaccedilatildeo que se daacute como uma participaccedilatildeo

na linguagem nos animais eacute transmitida por um processo educativo714

709

ldquo[] in other animals prudence is a natural estimate about the pursuit of what is fitting and the avoidance of what is harmful as a lamb follows its mother and runs away from a wolfrdquo TOMAacuteS DE AQUINO 1964b L I l 1 11

710 ARISTOacuteTELES 2005 L I 1 980a-980b p 3 TOMAacuteS DE AQUINO 1964b L I l 1 13

711 REALE 2005 p 7

712 Explica Reale (2005 p 7) que aqui se diz ldquoaprenderrdquo no sentido de ser disciplinado ser

adestrado 713

ldquoLos hay que participan a la vez de la capacidad tanto de aprender como de ensentildear capacidad transmitida ya por sus propios semejantes ya por los hombres Eacutestos son todos los animales dotados del don de la audicioacuten es decir no soacutelo los que perciben las diferencias de los sonidos sino tambieacuten los que distinguen la diversidad de significacionesrdquo ARISTOacuteTELES 1992 L IX 608a p 479

714 Ibid L IV 536b p 228-229

156

Os animais natildeo humanos bem como as crianccedilas tecircm representaccedilatildeo e

memoacuteria do particular Essa representaccedilatildeo corresponde agrave imagem apreendida que

eles retecircm e assim eacute pela imaginaccedilatildeo que eles buscam algo ou fogem de algo715 O

aristotelismo-tomismo entatildeo considera que a vida dos animais aos quais chama

imperfeitos eacute regida administrada pela imaginaccedilatildeo e a dos animais aos quais

chama perfeitos o eacute pela memoacuteria e Tomaacutes de Aquino explica que eacute a necessidade

de agir e natildeo o desejo de conhecer que caracteriza o modo como o conhecimento

pertence aos animais716

Reale717 aponta as cinco formas de conhecimento descritas por Aristoacuteteles no

iniacutecio da Metafiacutesica nomeadamente a sensaccedilatildeo a memoacuteria o experimento a arte

e a ciecircncia sendo as uacuteltimas duas somente consideradas como sapiecircncia ou

sabedoria jaacute que ambas se relacionam ao universal conhecem os porquecircs e as

causas dos fatos ao passo que o experimento e a sensaccedilatildeo o fazem ao particular

restringindo-se aos dados dos fatos nesse sentido

Em relaccedilatildeo ao experimento (experimentum) diz Tomaacutes de Aquino

Ora nos homens o que se segue sobre a memoacuteria eacute o experimento do qual alguns animais ainda que muito pouco participam Pois um experimento se forma pelas associaccedilotildees de muitas [intenccedilotildees] singulares recebidas na memoacuteria Esse tipo de correlaccedilatildeo eacute proacuteprio do homem e pertence agrave potecircncia cogitativa (tambeacutem chamada razatildeo particular) a qual compara as intenccedilotildees individuais assim como a razatildeo universal o faz com as intenccedilotildees universais Ora como os animais costumam buscar ou evitar algo a partir de muitas sensaccedilotildees e recordaccedilotildees por isso eacute que parecem participar algo do experimento ainda que pouco No entanto acima do experimento que pertence agrave razatildeo particular os homens tecircm como sua potecircncia principal uma razatildeo universal por meio da qual eles vivem

718

Alguns estudiosos do aristotelismo-tomismo como Manzanedo e Maritain

sugeriram haver aqui algo de cogitativa nestes animais ditos superiores aponta

Echavarriacutea que explica

715

ARISTOacuteTELES 1998a L VII 1147b p 299 TOMAacuteS DE AQUINO 1990b L II c LXVII p 285

716 ARISTOacuteTELES 2005 L I 1 980b p 3 TOMAacuteS DE AQUINO 1964b L I l 1 14

717 REALE 2005 p 5

718 ldquoNow [] in men the next thing above memory is experience which some animals have

only to a small degree For an experience arises from the association of many singular [intentions] received in memory And this kind of association is proper to man and pertains to the cogitative power (also called particular reason) which associates particular intentions just as universal reason associates universal ones Now since animals are accustomed to pursue or avoid certain things as a result of many sensations and memory for this reason they seem to share something of experience even though it be slight But above experience which belongs to particular reason men have as their chief power a universal reason by means of which they liverdquo TOMAacuteS DE AQUINO 1964b L I l 1 15

157

[] a assinalaccedilatildeo parece interessante e digna de ser analisada mas um

pouco apressada e sem fazer as distinccedilotildees adequadas Se haacute cogitativa animal se daacute soacute em alguns animais superiores Por outro lado Santo Tomaacutes considera a cogitativa como uma potecircncia proacutepria do homem e na maior parte das passagens de suas obras que tratam sobre o tema atribui soacute a estimativa aos animais brutos No entanto parece admitir que em alguns deles se decirc uma lsquoparticipaccedilatildeorsquo ainda que pequena desta faculdade

719

Sustentamos aqui esta segunda opccedilatildeo ou seja que esses animais teriam

apenas uma ldquoparticipaccedilatildeordquo da cogitativa relacionada agrave comparaccedilatildeo de intenccedilotildees

assim como muitos destes participam da comunicaccedilatildeo mas natildeo tecircm linguagem que

eacute proacutepria do homem uma vez que natildeo haacute qualquer vestiacutegio do refluxo intelectivo

que caracteriza a cogitativa Explica Muszalski que

Os animais irracionais superiores tecircm a potecircncia memorativa que eacute um tesouro no qual se acumulam as estimaccedilotildees realizadas em relaccedilatildeo agrave conveniecircncia ou prejuiacutezo dos singulares No entanto a repetida operaccedilatildeo de apreender a intentio no homem supotildee uma comparaccedilatildeo ndash denominada aqui ldquoraciociacuteniordquo ndash que natildeo ocorre com o bruto Como unicamente a cogitativa eacute capaz de realizar esse discurso soacute o homem eacute capaz de acumular na memoacuteria uma experiecircncia relacionada aos sensiacuteveis singulares

720

Cabe aqui recordar de modo bastante resumido o que se disse sobre os

sentidos na construccedilatildeo realizada na etapa anterior Enquanto o intelecto considera

as espeacutecies universais a quididade formal e assim as coisas incorpoacutereas como a

sabedoria e as relaccedilotildees das coisas os sentidos externos e internos consideram os

acidentes proacuteprios e comuns das coisas corpoacutereas pelas espeacutecies sensiacuteveis e

dentre os sentidos somente a estimativa e a cogitativa consideram daquelas a

quididade particular721 Deste modo diferentemente do homem que realiza de modo

inteligiacutevel coisas diversas e opostas os demais animais satildeo movidos pela natureza

pelo apetite e pelos sentidos

Por isso as accedilotildees pelas quais fazem as coisas movidos natildeo pela arte mas

pela mesma natureza satildeo ldquodeterminadas uniformes e da mesma espeacutecierdquo o que

Tomaacutes de Aquino exemplifica com a semelhanccedila entre os ninhos das andorinhas e

719

ECHAVARRIacuteA 2009 p 135-136 720

ldquoLos animales irracionales superiores tienen la potencia memorativa que es un tesoro en el cual se acumulan las estimaciones realizadas acerca de la conveniencia o perjuicio de los singulares Sin embargo la repetida operacioacuten de aprehender la intentio en el hombre supone una comparacioacuten mdash denominada aquiacute lsquorazonamientorsquo mdash que no ocurre en el bruto Como uacutenicamente la cogitativa es capaz de llevar a cabo este discurso soacutelo el hombre es capaz de acumular en la memoria una experiencia acerca de los sensibles singularesrdquo MUSZALSKI 2014 p 94

721 TOMAacuteS DE AQUINO 1999 p 97-98 Id 1990b L II c LXVI p 285

158

aquela entre o modo como as aranhas tecem as teias722 Mas como se vecirc pela

complexidade dessas construccedilotildees como a teia de Caerostris darwini os ninhos dos

gecircneros Ptilonorhynchus sp e Furnarius sp e inclusive as obras mais complexas

como a do gecircnero de mamiacutefero Castor sp que por vezes incluem espantosa

simetria como os complexos ciacuterculos construiacutedos por peixes do gecircnero Torquigener

sp trata-se de algo que envolve muito mais do que um simples automatismo como

a afirmaccedilatildeo poderia supor e entatildeo diz Muszalski que ldquoo conhecimento dos brutosrdquo

natildeo termina ldquona produccedilatildeo da imagemrdquo pois

[] o animal natildeo soacute possui as formas sensiacuteveis do conhecido pelos

sentidos ndash formas que produz e conserva a fantasia ndash como tambeacutem possui as formas ou intenccedilotildees de certos aspectos das coisas que conhece que natildeo satildeo captadas pelos sentidos externos

723

A impressatildeo que muitas vezes se tem de demonstraccedilotildees de inteligecircncia que

se assemelha agrave humana por parte de alguns animais normalmente se explica pelo

fato de um ou outro sentido externo em um ou outro animal superar o homem o que

ocorre inclusive ao sentido interno da memoacuteria que em alguns animais e sob certos

aspectos tambeacutem pode superar a do homem Ilustram isto o desempenho dos

chimpanzeacutes nos estudos de Inoue e Matsuzawa724 bem como o paacutessaro de Clark

que armazena para o inverno mais de trinta mil sementes escondendo-as em

lugares diferentes725

Gastoacuten Colleacute citado por Reale726 explica que a natureza do que se entende

como participaccedilatildeo no experimento em alguns animais possui ldquoforma puramente

sensiacutevelrdquo727 e deve ser ldquouma coleccedilatildeo de imagens ou uma fusatildeo de muitas

associaccedilotildees de imagens de lembranccedilas sensiacuteveis numa uacutenica representaccedilatildeo

sensiacutevelrdquo728 Colleacute comenta em seguida que essas representaccedilotildees propiciam a accedilatildeo

ao animal acompanhada de uma determinaccedilatildeo e que isto se daacute em um nuacutemero

muito reduzido de animais remetendo-se ao Estagirita para reiterar que a grande

maioria deles vive de memoacuterias isoladas de natureza sensiacutevel E um pouco adiante

722

TOMAacuteS DE AQUINO 1990b L II c LXVI p 284-285 ibid LXXXII p 327 723

MUSZALSKI 2014 724

INOUE MATSUZAWA 2007 725

MACKINTOSH 1997 726

REALE 2005 p 8 727

ldquo[] forme purement sensible []rdquo COLLEacute 1912 p 10 728

ldquo[] une collection dimages ou une fusion de plusieurs associations dimages de plusieurs souvenirs sensibles en une seule repreacutesentation sensiblerdquo Ibid p 11

159

jaacute explicando sobre o experimento no homem afirma ser ldquoo estado de consciecircncia

resultante de um conjunto de memoacuterias abstratas mais particularesrdquo729

Chega-se assim ao corolaacuterio do entendimento aristoteacutelico-tomista sobre a

inteligecircncia nos animais chamados superiores (ver tabela 1) daacute-se por apreensatildeo

de intenccedilotildees e quididades somada agraves comparaccedilotildees de imagens formadas pela

potecircncia imaginativa realizadas pela estimativa a partir de sensiacuteveis particulares

captados pelos sentidos proacuteprios e pelo sentido comum e retidas pela memoacuteria

sem poreacutem o recurso agrave memoacuteria e agrave imaginaccedilatildeo voluntaacuterias bem como sem o

refluxo do intelecto o que caracteriza a potecircncia cogitativa que eacute exclusiva do ente

humano

729

ldquo[] lrsquoeacutetat de conscience reacutesultant drsquoun ensemble de souvenirs abstraits mais particuliersrdquo COLLEacute 1912 p 11 Tambeacutem citado por REALE 2005 p 8

160

8 ANAacuteLISE DAS HABILIDADES COGNITIVAS SEGUNDO O MODELO

ARISTOTEacuteLICO-TOMISTA

Buscaremos agora analisar cada uma das informaccedilotildees levantadas na

literatura especializada especialmente na das uacuteltimas deacutecadas no intuito de

verificar de que modo as habilidades apresentadas pelos animais mencionadas aqui

se encaixariam no modelo aristoteacutelico-tomista se for o caso testando se haveria

algo que ultrapasse os limites estabelecidos por este para a estimativa alcanccedilando

o que seria proacuteprio da cogitativa e do intelecto

Adotaremos como dito um processo de investigaccedilatildeo seguindo uma linha

mais proacutexima daquelas realizadas por George730 e por Kovaacutecs e Mather731 a partir

da qual haveremos de sugerir ou natildeo a validade de determinada doutrina com base

nos fatos verificados buscando realizar tal empresa do modo mais objetivo que

pudermos Tentaremos restringir o maacuteximo possiacutevel o papel da subjetividade

mesmo reconhecendo as dificuldades em fazecirc-lo satisfatoriamente como pelo fato

de que estamos lidando com determinada perspectiva ndash que natildeo encontraraacute espaccedilo

aqui para ser merecidamente justificada ndash e reconhecendo que o que produzimos

deveraacute ser objeto de correccedilotildees futuras ressaltando por fim que as correlaccedilotildees que

estabelecemos aqui entre os resultados dos estudos e o aristotelismo-tomismo

haveratildeo de ter caraacuteter nada mais que sugestivo

Dito isto passemos a analisar os casos destacados aqui buscando

enquadraacute-los em categorias (ver tabelas 2-7) a comeccedilar pela que envolve

interaccedilotildees relacionadas ao comportamento

81 INTERACcedilOtildeES COMPORTAMENTAIS

811 Interaccedilotildees em geral

Haacute grande complexidade nas interaccedilotildees comportamentais entre elefantes

que sugerem haver caracteriacutesticas empaacuteticas descritas em estudos de campo como

o de Bates732 como coalisatildeo prestaccedilatildeo de auxiacutelio e inclusive resgate e remoccedilatildeo de

730

GEORGE 2003 731

KOacuteVACS MATHER 2008 732

BATES et al 2008

161

objetos proteccedilatildeo e conforto dedicados aos mais jovens esta descrita tambeacutem no

trabalho de Plotnik e de Waal733 em que o adulto usa a tromba e mesmo a

vocalizaccedilatildeo para consolar um pequeno espeacutecime Tem-se aiacute igualmente

despertando a necessidade de comunicar-se a identificaccedilatildeo do outro como

semelhante o reconhecimento das diferenccedilas entre ambos e das emoccedilotildees das

necessidades e das crenccedilas particulares que parecem ilustrar as funccedilotildees da

estimativa de identificar quididades particulares ou seja o outro como indiviacuteduo

bem como as intenccedilotildees particulares em relaccedilatildeo ao que o outro pretende ou do que

precisa inclusive comparando-as (com imagens na memoacuteria) como na verificaccedilatildeo

do estado emocional

Tambeacutem os estudos de McComb e colaboradores734 e os de Soltis e

colaboradores735 expressariam essas funccedilotildees da estimativa tanto no

reconhecimento de um indiviacuteduo associado agrave determinada funccedilatildeo por ser realizada

pelo indiviacuteduo que estaacute mais apto a exercecirc-la no caso a matriarca como a mais

capaz de tomar decisotildees frente a uma ameaccedila como no reconhecimento da

natureza do ente que eacute tido como ameaccedila aleacutem do niacutevel de ameaccedila estimado

intraespeciacutefico e mesmo interespeciacutefico no caso os diferentes grupos eacutetnicos

humanos que tambeacutem caracterizam a apreensatildeo das quididades e intenccedilotildees

particulares seguida de comparaccedilatildeo de ambas com aquelas que procedem da

imaginaccedilatildeo e estatildeo guardadas na memoacuteria

812 Comportamento diante da morte de coespeciacutefico

Seguindo nos estudos de campo os de McComb e colaboradores736

apontaram a distinccedilatildeo por elefantes de cracircnios de membro da espeacutecie inclusive os

marfins o que implica reconhecimento do outro ou de parte do outro coespeciacutefico

como semelhante Destacamos aqui a apreensatildeo da quididade particular pela

estimativa que viabiliza o reconhecimento da parte e o do cadaacutever como um todo o

que possibilita com a memoacuteria o acompanhamento por suscessivas visitas que

pode durar meses a partir do interesse pelo cadaacutever de membros do grupo descrito

733

PLOTNIK DE WAAL 2014 734

MCCOMB et al 2011 735

SOLTIS et al 2014 736

MCCOMB BAKER MOSS 2006

162

por Douglas-Hamilton e colaboradores737 mesmo tendo em vista o fato de que

conforme a natureza dos agentes envolvidos na decomposiccedilatildeo em questatildeo de

poucos dias o cracircnio jaacute pode estar exposto738

Quanto ao interesse em si pelo cadaacutever trata-se de um fenocircmeno ainda

pouco estudado como reconhecem por exemplo Bearzi e colaboradores739 que

publicaram uma revisatildeo sobre o tema em cetaacuteceos Pode-se propor que dentre as

possibilidades esteja tambeacutem aquilo mesmo que se daacute com os corviacutedeos segundo

Swift740 que sondam o cadaacutever em busca de sinais de perigo para o bando como

que isto tambeacutem poderia-se dar em relaccedilatildeo agrave ineacutercia e mesmo agrave transformaccedilatildeo do

indiviacuteduo sem vida assim como o reconhecimento de que ele jaacute natildeo tem

funcionalidade (de lideranccedila de maternidade etc) desencadeando certas reaccedilotildees

emocionais relacionadas Sugerimos que de um modo ou de outro esteja ali

expressa em destaque provavelmente associada agrave memoacuteria relacionada ao

indiviacuteduo enquanto ainda estava vivo a apreensatildeo pela estimativa de uma ou mais

intenccedilotildees aqui explicando tambeacutem a reaccedilatildeo dos corviacutedeos

813 Respostas a sinais humanos

Nos testes de respostas a sinais humanos catildees golfinhos grandes macacos

e elefantes obtiveram ecircxito salvo estes uacuteltimos em relaccedilatildeo a guiarem-se pelo olhar

humano como observaram Smet e colaboradores741 possivelmente por limitaccedilotildees

de sua visatildeo

Aqui os catildees e os golfinhos apresentam melhor desempenho aqueles

provavelmente por sua proximidade com os humanos e estes por aquilo que sugere

Herman e colaboradores742 sobre uma possiacutevel relaccedilatildeo entre a ecolocalizaccedilatildeo ou

seja a habilidade acuacutestica de apontamento por emissotildees sonares e o gesto

humano de apontar

Esta habilidade parece enquadrar-se na visatildeo aristoteacutelico-tomista

principalmente como resultado da apreensatildeo pela estimativa das intenccedilotildees

737

DOUGLAS-HAMILTON et al 2006 738

DOUGLAS-HAMILTON HILL 1981 739

BEARZI et al 2018 740

SWIFT 2015 741

SMET et al 2013 742

HERMAN et al 1999

163

particulares que pode desenvolver-se individualmente pela aprendizagem por

tentativa e erro ou dar-se por instinto

O mesmo pode-se dizer sobre as respostas aos estados de atenccedilatildeo

humanos como aquelas observadas nos catildees dos testes de Call e colaboradores743

e tambeacutem salvo no que toca ao instinto em relaccedilatildeo ao gesto em si sobre o caso

inverso descrito por Zimmermann e colaboradores744 em que os bonobos e

orangotangos aprenderam a apontar e a natureza referencial disto para que

humanos encontrassem objetos e alimentos escondidos

Jaacute o experimento de Grassmann Kaminski e Tomasello 745 em que os

animais combinaram dois tipos de comando resolvendo conflitos seja alcanccedilando o

alvo por exclusatildeo assim como no experimento de Kaminski e colaboradores746 seja

tendo de decidir entre o apontar com o dedo e o comando vocal simultacircneo para

objetos distintos ilustram pensamos a funccedilatildeo da estimativa de comparar intenccedilotildees

particulares

Sugerimos que o mesmo se aplique ao estudo de Hare e colaboradores747 O

entendimento dos catildees aqui do caraacuteter comunicativo das pistas fornecidas seria

fruto dessa mesma comparaccedilatildeo de intenccedilotildees

82 TEORIA DA MENTE E COMPORTAMENTO DIANTE DE TELAS DE VIacuteDEO

Diferentemente de outros animais os golfinhos como verificado por Herman

e colaboradores748 datildeo muita atenccedilatildeo agraves imagens em tela de viacutedeo e respondem a

comandos por ela Quando as imagens do treinador que dava comandos a Ake foi

gradualmente restrita somente aos membros que davam os sinais e entatildeo

esvanecida e substituiacuteda por manchas moacuteveis que o animal continuou a

reconhecer ainda que em menor grau isto sob a perspectiva aristoteacutelico-tomista

pode ser visto como a comparaccedilatildeo de intenccedilotildees (nos gestos) associada agrave

comparaccedilatildeo de imagens ndash aquelas em gradaccedilatildeo ndash pela estimativa

743

CALL et al 2003 744

ZIMMERMANN et al 2009 745

GRASSMANN KAMINSKI TOMASELLO 2012 746

KAMINSKI et al 2004 747

HARE et al 2010 748

HERMAN et al 1990 HERMAN 2006

164

Os experimentos com a macaca Sarah realizados por Premack e Wooldruff749

mostraram que os chimpanzeacutes podem reconhecer a realidade representada em uma

tela de viacutedeo tal como os golfinhos de Herman e em uma fotografia No acircmbito

aristoteacutelico-tomista entende-se ter havido comparaccedilotildees ou associaccedilotildees particulares

da estimativa entre o objeto real e sua imagem no viacutedeo ou no papel Quanto ao

desempenho nos testes no primeiro caso se observa provavelmente a

aprendizagem direta preacutevia com possiacutevel recurso agrave tentativa e erro ou participaccedilatildeo

no experimento e o recurso da estimativa agrave memoacuteria de intenccedilotildees nos casos em

que o viacutedeo natildeo foi exibido por completo O segundo caso poderia apontar para o

reconhecimento de cada uma das situaccedilotildees associadas ao estado emocional

expressado pelo ator mas tambeacutem para uma simples correlaccedilatildeo entre os objetos e

o modo como ele funciona Em ambas as possibilidades e a mais provaacutevel nesta

etapa que seria a associaccedilatildeo entre elas ou a segunda como uacutenica possibilidade na

etapa seguinte com as trecircs versotildees de cada objeto destacam-se as comparaccedilotildees

de intenccedilotildees particulares pela estimativa

Por fim a uacuteltima etapa tambeacutem caracteriza isto que se diz sobre as intenccedilotildees

na realizaccedilatildeo da tarefa em si de modo relacionado agrave reaccedilatildeo emocional do animal a

cada um dos dois indiviacuteduos jaacute que estaacute diante de um que lhe concede certo bem

pelo qual teraacute preferecircncia e lhe despertaraacute mais interesse pela tarefa e de outro que

natildeo o faz havendo entatildeo desinteresse o que tambeacutem por si refletiria a comparaccedilatildeo

de intenccedilotildees que se segue agrave captaccedilatildeo do particular por parte da estimativa E se

esta capta e compara intenccedilotildees permite assim que o animal reconhecendo o

estado mental de um outro indiviacuteduo possa tomar decisatildeo e agir ainda que natildeo

delibere com base nesta mesma percepccedilatildeo o que nos leva a sugerir que as

descriccedilotildees sobre a chamada teoria da mente estejam em consonacircncia com o

aristotelismo-tomismo

As tentativas de Chantek750 e Koko751 de enganar os treinadores indicando

premeditaccedilatildeo e reconhecimento da perspectiva do outro e que caracterizam a

inovaccedilatildeo no que toca ao desenvolvimento de estrateacutegias visando agrave obtenccedilatildeo do que

lhe apetecem evitando perda ou puniccedilatildeo (mas ainda sem que haja sinal de

abstraccedilatildeo para que se possa atribuir ao intelecto praacutetico) mostram no acircmbito do

749

PREMACK WOOLDRUFF 1978 750

MILES 1990 751

PATTERSON LINDEN 1981 p 135

165

aristotelismo-tomismo uma estimativa bastante desenvolvida Reforccedilam tambeacutem a

teoria da mente

83 METACOGNICcedilAtildeO

A teoria da mente parece estar associada ao que hoje se conhece por

metacogniccedilatildeo que por sua vez tem iacutentima relaccedilatildeo com a chamada metamemoacuteria

Shattleworth diz que por esta ldquoAs pessoas tendem a saber o quatildeo bem elas se

lembram das coisasrdquo e que esta apresenta duas funccedilotildees ldquomonitorar a forccedila de

memoacuteria e controlar a busca de informaccedilatildeordquo752 Em relaccedilatildeo agravequela explica que

ldquoinclui saber o quatildeo bem algueacutem eacute capaz de fazer discriminaccedilotildees de natureza

perceptivardquo753

A metacogniccedilatildeo pode ou natildeo implicar autorreflexatildeo Eacute associada

frequentemente agrave consciecircncia e sua presenccedila em animais natildeo humanos eacute sugerida

por trabalhos como o de Rosati e Santos754 com macacos-rhesus mencionado aqui

Kornell755 indica que os indiacutecios de que haveria metacogniccedilatildeo nos animais com

autorreflexatildeo satildeo escassos jaacute que as reaccedilotildees observadas poderiam estar

associadas ao objeto e que provavelmente seria uma exclusividade humana o que

em princiacutepio estaria em consonacircncia com o pensamento aristoteacutelico-tomista Sob

esta perspectiva os macacos do experimento de Rosati e Santos uma vez

informados sobre a presenccedila do alimento em um ou outro cano sem que se precise

dizer que sabiam que natildeo sabiam mas simplesmente por estarem movidos por um

apetite teriam percebido pela estimativa no que toca agraves inteccedilotildees que a forma mais

econocircmica de visualizaccedilatildeo para a busca seria pelo ponto de convergecircncia e entatildeo o

utilizaram No mesmo sentido uma sugestatildeo para explicar a metamemoacuteria apontada

nos experimentos de Hampton756 que descarta a hipoacutetese de a decisatildeo de recusa

do teste ter base na dificuldade em si da execuccedilatildeo deste seria uma percepccedilatildeo da

eficaacutecia do movimento para satisfaccedilatildeo do apetite com base na comparaccedilatildeo entre os

752

ldquo[] tend to know how well they remember thingsrdquo e ldquo[] monitoring memory strength and controlling information-seekingrdquo SHATTLEWORTH 2010 p 243

753 ldquoincludes knowing how well one is able to make perceptual discriminationsrdquo

SHATTLEWORTH 2010 p 244 754

ROSATI SANTOS 2016 755

KORNELL 2014 756

HAMPTON 2001

166

resultados obtidos por uma e por outra via ou seja aqui tambeacutem pela comparaccedilatildeo

de intenccedilotildees por parte da estimativa

84 NOCcedilAtildeO DE MEIO E FIM E USO DE INSTRUMENTOS

O reconhecimento da quididade particular associado ao de intenccedilotildees podem-

se aplicar aos testes aqui mencionados de colaboraccedilatildeo realizados com elefantes757

e com papagaios-da-nova-zelacircndia758 onde dois animais por tentativa e erro

aprenderam a puxar simultaneamente cada um uma corda amarrada em um suporte

para obterem o alimento sobre este o que se realizou por tentativa e erro

culminando com o reconhecimento da necessidade do parceiro e caracterizando a

participaccedilatildeo no experimento segundo o aristotelismo-tomismo

Tambeacutem exemplificariam a participaccedilatildeo no experimento com base em

tentativa e erro envolvendo a identificaccedilatildeo de intenccedilotildees e a comparaccedilatildeo de

imagens os testes individuais com suportes com ou sem alimento em que os

animais identificaram qual deles deveriam puxar para obter a recompensa como os

realizados com elefantes759 e os realizados com catildees760 cujo estudo apontou que

passavam a buscar pistas novas quando perdiam as anteriores segundo o

aristotelismo-tomismo movidos pelo apetite O mesmo pode-se dizer dos testes

dessa natureza com o tubo e com a plataforma em forma de ldquoUrdquo ambos com

arapucas para a recompensa761 realizados com as quatro principais espeacutecies de

grandes macacos

Jaacute Foerder e colaboradores762 afirmam que os resultados observados em sua

pesquisa com o elefante asiaacutetico que subiu em objetos para tentar alcanccedilar alimento

no alto natildeo se teriam dado por um processo preacutevio de tentativa e erro e que o uso

de objeto como apoio para alcanccedilar alimento no alto e mesmo a tentativa de

empilhar objetos para isto teria sido uma reaccedilatildeo suacutebita Mas os atos de empurrar o

objeto de substitui-lo de empilhar outros objetos ainda que neste uacuteltimo caso tenha

sido uma tentativa frustrada ndash caracterizando por si o processo de aprendizagem por

tentativa e erro ndash poderiam ter-se dado pelo fato de o animal ter visto algum

757

PLOTNIK et al 2011 758

HEANEY et al 2017 759

IRIE-SUJIMOTO 2008 760

MUumlLLER et al 2014 761

GIRNDT et al 2008 MARTIN-ORDAS CALL COLMENARES 2008 762

FOERDER et al 2011

167

humano outro animal ou mesmo um coespeciacutefico haacute mais tempo (dado o grande

alcance da memoacuteria destes animais) realizar tarefas similares o que poderia ter

escapado ao alcance do conhecimento dos pesquisadores

Mas assumindo estritamente o que dizem para o aristotelismo-tomismo os

animais sabem instintivamente que se se erguerem ou subirem em algo se for o

caso podem alcanccedilar uma presa ou um objeto que esteja mais alto e isto tambeacutem

pela estimativa especialmente quando o modo de subida natildeo eacute tatildeo evidente com

base na memoacuteria de imagens referentes a situaccedilotildees anteriores pela comparaccedilatildeo de

intenccedilotildees

O mesmo se diga dos macacos estudados por Koumlhler763 que empilharam as

caixas de madeira com sucesso para alcanccedilarem as bananas

A apreensatildeo de intenccedilotildees por parte da estimativa associada agrave tentativa e

erro ou seja agrave participaccedilatildeo no experimento estaacute ilustrada no uso de pedras e tacos

como martelo para quebrar cascas duras por primatas764 de bastotildees por

chimpanzeacutes ndash como nos testes de Koumlhler ndash e de objetos alongados por corviacutedeos ndash

ainda que tenha envolvido certo adestramento ndash765 e de peccedilas vegetais por grandes

primatas para inserccedilatildeo em locais cuja abertura eacute menor que a largura dos dedos766

aqui descrito tambeacutem em tentilhotildees pica-paus767 e inclusive no uso de objetos por

chimpanzeacutes768 e corviacutedeos769 para defesa contra predadores e em ataques de

babuiacutenos contra inimigos rolando rochas do alto de um morro tal como narrado por

Darwin770 bem como no uso de esponjas para proteccedilatildeo durante o forrageamento

em arrecifes por golfinhos771 Para o aristotelismo-tomismo existe a possibilidade

para cada um desses casos de haver tanto uma origem acidental como uma origem

intencional

Jaacute os testes que levaram Phillips e Santos772 a afirmarem que os macacos-

rhesus (Macaca mulatta) individuam objetos (no caso os frutos utilizados no estudo)

763

KOumlHLER 1927 p 135 ss 764

LUNCZ et al 2012 LUNCZ BOESCH 2014 765

JELBERT et al 2014 BRITISH BROADCASTING CORPORATION 2014 WIMPENNY 2009

766 BOESH C BOESH H 1990 VAN SCHAIK 2006

767 EIBL‐EIBESFELDT 1961 TEBBICH BSHARY 2004

768 BOESH 1991

769 ROELOFS 2010

770 DARWIN sd a) p 34-35

771 KRUumlTZEN et al 2014 KOPS et al 2014

772 PHILLIPS SANTOS 2006

168

segundo seu tipo e sua propriedade caracterizariam o reconhecimento de

quididades particulares pela estimativa e a comparaccedilatildeo de suas imagens

841 Planejamento

O golfinho fecircmeo Ake como relata Herman773 mostrou senso de

planejamento a partir dos comandos recebidos como quando levou a prancha da

beira para o meio da piscina para pulaacute-la e ao recolher os objetos dispondo-os pelo

corpo de modo que viabilizasse sua tarefa por entender o que fazer a partir de um

comando de recolhimento sem especificaccedilatildeo de um objeto determinado Eacute provaacutevel

que o animal tenha chegado a um e outro comportamento previamente por meio de

tentativa e erro ou por aprendizagem direta ou indireta (inclusive a imitaccedilatildeo)

Tambeacutem aqui natildeo se pode descartar a possibilidade da detecccedilatildeo por parte do

animal de movimentos sutis dos treinadores ou o efeito Clever Hans do qual se

falaraacute mais adiante

E ainda que se parta do princiacutepio de que natildeo houve nada disto sob a oacuteptica

aristoteacutelico-tomista estaacute-se no acircmbito das associaccedilotildees entre as intenccedilotildees

memorizadas e as imagens e apreensatildeo das intenccedilotildees referentes agravequele contexto

entatildeo adaptadas agrave situaccedilatildeo pela estimativa e relacionadas agrave voluntariedade

associada a esta observada nos animais natildeo humanos e nas crianccedilas o que estaacute

mais bem expresso nas combinaccedilotildees espontacircneas dos comportamentos que

seguem sinais que natildeo compotildeem o vocabulaacuterio demonstradas pelos golfinhos e

relatadas por Herman774 ou quando o golfinho Elele segue com sucesso o comando

para realizar um movimento novo conforme publicado por Braslau-Schneck775

gesto construiacutedo a partir do repertoacuterio conhecido e que reflete a plasticidade das

associaccedilotildees realizadas pela estimativa

85 IMITACcedilAtildeO E SINCRONIA

Tambeacutem ilustra a participaccedilatildeo no experimento e a comparaccedilatildeo de intenccedilotildees

segundo o aristotelismo-tomismo a busca dos catildees pela otimizaccedilatildeo da realizaccedilatildeo

773

HERMAN 2006 774

Ibid 775

BRASLAU-SCHNECK 1994 apud HERMAN 2006

169

de tarefas evitando assim a sobreimitaccedilatildeo tal como demonstrado pelo estudo de

Johnston e colaboradores776

Jaacute as habilidades de imitaccedilatildeo dos golfinhos com associaccedilotildees realizadas entre

suas partes corporais e as humanas correspondentes777 podem ser compreendidas

pela comparaccedilatildeo de imagens de natureza quiditativa e de intenccedilotildees

E pode-se sugerir a simples apreensatildeo de intenccedilotildees em relaccedilatildeo agrave habilidade

de sincronia e inclusive a de sincronia mediante o comando de criaccedilatildeo que

implicaria a voluntariedade sem deliberaccedilatildeo mesmo que ainda natildeo se conheccedila a

explicaccedilatildeo fisioloacutegica para o fenocircmeno778

86 CORRELACcedilAtildeO DE FIGURAS OU SONS

Assim explicam o raciociacutenio analoacutegico Gillan Premack e Woodruff

O raciociacutenio analoacutegico envolve o reconhecimento de que a relaccedilatildeo entre um par de estiacutemulos eacute a mesma que a relaccedilatildeo entre outro par de estiacutemulos Portanto o raciociacutenio analoacutegico requer uma relaccedilatildeo de segunda ordem ou uma relaccedilatildeo entre relaccedilotildees

779

Esses testes realizados com sucesso em outros primatas aleacutem dos

chimpanzeacutes como G gorilla gorilla e orangotangos da espeacutecie Pongo abelii780 e

babuiacutenos (Papio papio)781 com tela ldquotouch-screenrdquo e macacos-pregos (Cebus

apela)782 com cubos e copos ndash e inclusive como se viu em corviacutedeos com

pequenas placas ndash783 tambeacutem podem ser vistos agrave luz da estimativa como

identificaccedilatildeo e comparaccedilatildeo de imagens no acircmbito quiditativo essencial e acidental

No caso da segunda etapa do teste com Sarah784 o reconhecimento

comparativo entre o objeto conhecido memorizado e sua respectiva figura e o

conseguinte estabelecimento da relaccedilatildeo com a respectiva funccedilatildeo caracterizam

776

JOHNSTON et al 2017 777

HERMAN 2002 778

Id 2006 779

ldquoAnalogical reasoning involves recognizing that the relation between one pair of stimuli is the same as the relation between another pair of stimuli Therefore analogical reasoning requires a second-order relation or a relation among relationsrdquo GILLAN et al 1981 p 11

780 VONK 2003

781 FAGOT MAUGARD 2013

782 KENNEDY FRAGASZY 2008

783 SMIRNOVA et al 2015

784 GILLAN et al 1981

170

tambeacutem a identificaccedilatildeo e a comparaccedilatildeo de imagens no acircmbito quiditativo como

tambeacutem a associaccedilatildeo pela estimativa com as respectivas intenccedilotildees memorizadas

Tambeacutem o reconhecimento e a comparaccedilatildeo de imagens pela estimativa

levando agrave identificaccedilatildeo das correlaccedilotildees entre acidentes de figuras em uma

sequecircncia como tambeacutem identificou George785 a fim de que se identifique com

precisatildeo o componente seguinte jaacute explicaria sob a oacuteptica aristoteacutelico-tomista o

ecircxito de Koko786 em testes ditos de progressatildeo loacutegica

A capacidade dos elefantes de reconhecerem pares de padrotildees de figuras

apontada nos estudos de Rensch787 parece-nos mais um exemplo do papel da

estimativa integrada agrave memoacuteria e agrave imaginaccedilatildeo sendo julgado de iniacutecio pelo proacuteprio

sentido da visatildeo e entatildeo pelo sentido comum Essa pesquisa se soma agravequelas que

mostram a impressionante capacidade da memoacuteria dos elefantes como tambeacutem a

de Markowitz e colaboradores788 que aponta o papel da estimativa de comparaccedilatildeo

de intenccedilotildees pela associaccedilatildeo entre a accedilatildeo por realizar-se corretamente (acionar o

interruptor que apagaraacute ou acenderaacute a luz) e a recompensa obtida

Os experimentos seguintes de Rensch789 com a elefanta envolvendo padrotildees

de figuras e sons e o de seus colaboradores com cavalos levaram o pesquisador a

sugerir que esses animais conseguiriam realizar abstraccedilatildeo em algum grau pelo fato

de as figuras e os sons escolhidos com base em cada modelo a eles referente

apresentarem configuraccedilotildees diferentes deste fazendo-o crer que o animal estaria de

posse da ideia de cada um (a ideia de cruz de trecircs etc) Mas pode-se dizer sob a

oacuteptica aristoteacutelico-tomista que seguem no acircmbito dos particulares e tambeacutem dos

acidentes havendo natildeo abstraccedilatildeo mas se natildeo o que diremos em seguida em

relaccedilatildeo ao papagaio Alex e ao chimpanzeacute fecircmeo Sheba uma comparaccedilatildeo

quiditativa da estimativa entre figura com mais e figura com menos espaccedilo ocupado

pela representaccedilatildeo dos pontos e o mesmo em relaccedilatildeo agraves distacircncias entre as listras

e por figura escura com cruzamento de duas linhas a partir de um modelo de

imagem de cada um novamente por grau de semelhanccedila E pode-se dizer o mesmo

com relaccedilatildeo agraves melodias que independente das demais caracteriacutesticas que se

785

GEORGE 2003 786

PATTERSON LINDEN 1981 p 100 787

RENSCH 1956 RENSCH 1957 788

MARKOWITZ et al 1975 789

RENSCH 1957

171

apliquem a elas mantecircm seu caraacuteter distintivo particular identificaacutevel pelo sentido

da audiccedilatildeo

Tambeacutem o reconhecimento dos objetos com modificaccedilotildees acidentais

distinguidos pelos golfinhos de Herman790 e associado por este a generalizaccedilotildees

daacute-se segundo o aristotelismo-tomismo por comparaccedilatildeo das imagens por parte da

estimativa e entatildeo por grau de semelhanccedila

87 COMPETEcircNCIA PARA APREENSAtildeO DE QUANTIDADES

Sugerimos que se possa atribuir a mesma explicaccedilatildeo para experimentos

como os de Irie-Sujimoto791 e colaboradores os de Perdue e colaboradores792 e os

de Petrazzini e Wyne793 em que os elefantes e os catildees neste uacuteltimo preferiram

respectivamente cestas e pratos de alimento mais cheios apontando certa noccedilatildeo

de quantidade Os animais estimam que ali teratildeo mais condiccedilotildees de saciar o apetite

inclusive provavelmente comparando imagens anteriores memorizadas de

circunstacircncias em que deparou com menos ou mais alimentos e dos resultados em

relaccedilatildeo agrave saciedade

De anaacutelise mais precisa nesse sentido satildeo os testes da chamada

competecircncia numeacuterica como os realizados com Alex794 e com Sheba795 que teriam

efetuado pequenas somas com matrizes de objetos cujos resultados chegariam ateacute

os nuacutemeros 6 (e contagem ateacute 8) e 4 respectivamente e com algarismos araacutebicos

cujos resultados da parte de Alex iam de 1 a 5 Ambos foram treinados previamente

para a apreensatildeo de cada uma das quantidades que no acircmbito do aristotelismo-

tomismo diferem do nuacutemero propriamente dito enquanto resultante da abstraccedilatildeo

Esta apreensatildeo como se descreveu anteriormente tem sua primeira etapa no juiacutezo

dos sentidos e entatildeo a partir da imaginaccedilatildeo e da memoacuteria a estimativa pode

estabelecer desde suas quididades a ordenaccedilatildeo e realizar daiacute por comparaccedilatildeo natildeo

soacute a soma e a subtraccedilatildeo dessas quantidades como a transferecircncia por associaccedilatildeo

destas para as imagens dos algarismos com o que realizaraacute essas mesmas

operaccedilotildees a partir das quididades particulares destes

790

HERMAN et al 1984 HERMAN 1986 791

IRIE-SUJIMOTO et al 2009 792

PERDUE et al 2012 793

PETRAZZINI WYNNE 2016 794

PEPERBERG 2006 795

BOYSEN BERNTSON 1989

172

Isto se encontra em consonacircncia com o que diz Aristoacuteteles em relaccedilatildeo agrave

similaridade entre a alma desses animais e das crianccedilas E de fato Wynn796

demonstrou que crianccedilas de cerca de cinco meses jaacute apresenta a chamada

competecircncia numeacuterica para as adiccedilotildees e subtraccedilotildees mais simples

Com relaccedilatildeo aos estudos de Matsuzawa e equipe797 o aprendizado de

sequecircncias numeacutericas inclusive com curingas aleacutem do ecircxito diante da mudanccedila de

configuraccedilatildeo do experimento (numerais trocando de lugar apoacutes o acerto anterior)

tambeacutem se enquadra no que se acaba de dizer sobre a ordenaccedilatildeo cabendo

tambeacutem agrave estimativa o entendimento da relaccedilatildeo entre o algarismo e os curingas por

associaccedilatildeo

Seguem tambeacutem a mesma explicaccedilatildeo as associaccedilotildees entre algarismos

conjuntos de pontos e quantidade de alimento estabelecidas pelos macacos-rhesus

nos testes realizados por Livingstone e colaboradores798 mesmo que tenham

afirmado que natildeo obtiveram evidecircncia de que os animais teriam contado os pontos

E aos testes relacionados agrave economia envolvendo tomada de decisatildeo

realizados com macacos-prego por Lakshminarayanan e Santos799 empregamos

uma uacuteltima vez essa mesma explicaccedilatildeo aqui somada agrave voluntariedade associada agrave

estimativa e sua comparaccedilatildeo de intenccedilotildees o que teriam levado os animais a

preferirem um experimentador a outro

88 APTIDOtildeES RELACIONADAS Agrave COMUNICACcedilAtildeO

Em um dos estudos de Kaminski e colaboradores800 os catildees identificando os

nomes nos comandos com os respectivos objetos que deviam pegar em outras

dependecircncias do recinto demonstraram integrar memoacuterias relacionadas agrave

localizaccedilatildeo agravequelas relacionadas agrave identidade caracterizando nisto o papel da

estimativa de comparar e compor quididades particulares a partir de imagens

memorizadas

796

WYNN 1992 797

KAWAI MATSUZAWA 2000 Id 2000b TOMONAGA et al 1993 BIRO MATSUZAWA 1999

798 LIVINGSTONE et al 2010

799 LAKSHMINARAYANAN SANTOS 2012

800 KAMINSKI et al 2007

173

As associaccedilotildees apresentadas de palavras a objetos ou accedilotildees com destaque

para espeacutecimes como Rico801 e Chaser802 e no que toca aos grandes macacos por

Kanzi803 e por Koko804 se dariam pela composiccedilatildeo de quididades ou de quididades

e intenccedilotildees respectivamente com recurso evidentemente agrave memoacuteria

Os estudos de Herman e colaboradores com golfinhos mostraram

compreensatildeo de sentenccedilas reversiacuteveis e lexicalmente ou estruturalmente novas

para os animais inclusive sugerindo generalizaccedilotildees805 aleacutem do reconhecimento de

sequecircncias anocircmalas aos quais os animais responderam com omissatildeo ou com

improviso806 demonstrando a competecircncia semacircntica e sintaacutetica Mas para o

aristotelismo-tomismo haveria aqui ainda a participaccedilatildeo na linguagem e natildeo esta

propriamente dita que eacute fruto das operaccedilotildees do intelecto807 Por sua estimativa

desenvolvida esses animais chegariam ao entendimento de generalizaccedilotildees como

ldquopessoardquo808 porque identificam um humano como semelhante a outro por possuiacuterem

a imagem do humano comparando as imagens de humanos captadas e retidas por

seus sentidos ateacute entatildeo e natildeo por captaccedilatildeo da espeacutecie inteligiacutevel humanidade que

poderia-lhes conferir a habilidade de conceituar algo que natildeo se identificou Essa

mesma estimativa lhes permite por comparaccedilatildeo de intenccedilotildees perceber pelo que se

disse logo acima a relaccedilatildeo de cada palavra com seu respectivo objeto ou accedilatildeo e

entatildeo se haacute algo em seu contexto proacuteximo agravequilo que se refere agrave determinada

sequecircncia anocircmala para que execute ou natildeo o comando

Jaacute a identificaccedilatildeo da parte de Ake de que um remo significaria positivamente

a presenccedila de um objeto e o outro negativamente ou seja a ausecircncia809

caracterizaria a comparaccedilatildeo no acircmbito quiditativo de imagens e a captaccedilatildeo da

intenccedilatildeo relacionada a cada remo Quando nesta tarefa associada agrave outra de

comando com dois objetos e uma accedilatildeo810 Ake leva o frisbee ao remo ldquonatildeordquo verifica-

se isto que se diz aqui e o que se diz no paraacutegrafo anterior associados agrave

voluntariedade relacionada agrave estimativa

801

KAMINSKI et al 2004 802

PILLEY 2013 803

RAFFAELE 2006 804

THE GORILLA FOUNDATION 2018 805

HERMAN et al 1984 HERMAN 1986 Id 2006 806

HERMAN et al 1993a 807

TOMAacuteS DE AQUINO 2001 Q 58 a 4 p 549 808

HERMAN et al 1984 809

HERMAN FORESTELL 1985 810

HERMAN et al 1993b

174

A comunicaccedilatildeo entre grandes macacos observada no habitat natural como

os comandos por meio de golpes nas aacutervores relatados por Boesch811 e as tantas

variaccedilotildees acuacutesticas de gorilas verificadas por Hedwig e colaboradores812 tambeacutem

exemplificam a capacidade de participaccedilatildeo na linguagem bastante desenvolvida nos

grandes primatas mas com potenciais combinaccedilotildees que lhes confere destaque

dentre os outros animais que os faz nesse sentido assemelharem-se bastante agraves

crianccedilas humanas tal como visto nos estudos em que se ensinou a comunicaccedilatildeo

por gestos manuais ou por lexigramas como o desenvolvido por Patterson e

Linden813 com Koko e como Tomasello814 analisou em sua revisatildeo

respectivamente Dentre as habilidades do bonobo Kanzi afirma o pesquisador que

a de identificar a funccedilatildeo de uma palavra segundo sua posiccedilatildeo na frase equivaleria

ao animal estar expressando sentenccedilas como uma crianccedila de dois anos de idade

Mas a quase totalidade dessas sentenccedilas eacute constituiacuteda de pedidos com uma palavra

de accedilatildeo e uma ou mais de pessoas ou objetos Tomasello815 diz que o animal sabe

que o que eacute colocado vem em primeiro na frase e aquilo em que colocar vem em

seguida (como no caso da ldquobolardquo e do ldquochapeacuteurdquo) e explica

[] suas categorias gramaticais satildeo do tipo ldquoaquele que atingerdquo e ldquocoisa atingida comrdquo ldquoaquele que colocardquo e ldquocoisa colocadardquo natildeo categorias generalizadas tais como ldquoagenterdquo e ldquopacienterdquo ou ldquosujeitordquo e ldquoobjeto diretordquo Isso eacute basicamente o niacutevel de competecircncia gramatical de crianccedilas novas de dois anos que tambeacutem funciona com ldquoilhas verbaisrdquo

816 e outras construccedilotildees

baseadas em itens deste tipo817

811

BOESCH 1996 812

HEDWIG et al 2014 813

PATERSON LINDEN 1981 814

TOMASELLO 2017 815

Id 1994 2017 816

Segundo a Hipoacutetese da Ilha Verbal (Verb Island Hypothesis) do proacuteprio Tomasello ldquoa linguagem inicial das crianccedilas eacute organizada e estruturada completamente em torno de verbos individuais e outros termos predicativos ou seja a competecircncia sintaacutetica da crianccedila de dois anos eacute composta completamente de construccedilotildees de verbos especiacuteficos com aberturas nominais encaixadas Aleacutem da categorizaccedilatildeo dos nominais os aprendizes da linguagem nascente natildeo possuem outras abstraccedilotildees linguiacutesticas ou formas de organizaccedilatildeo sintaacuteticardquo (Original ldquo[] childrens early language is organized and structured totally around individual verbs and other predicative terms that is the 2-year-old childs syntactic competence is comprised totally of verb-specific constructions with open nominal slots Other than the categorization of nominals nascent language learners possess no other linguistic abstractions or forms of syntactic organizationrdquo) Id 2000 p 213-214

817 ldquo[] his grammatical categories are of the type lsquohitterrsquo and lsquothing hit withrsquo lsquoputterrsquo and lsquothing

putrsquo not generalized categories such as lsquoagentrsquo and lsquopatientrsquo or lsquosubjectrsquo and lsquodirect objectrsquo This is basically the level of grammatical competence of young two-year-old children who also work with lsquoverb islandsrsquo and other item-based constructions of this typerdquo Id 2017 p 101

175

A primeira categoria refere-se a termos singulares e a segunda a termos

universais o que possibilitaria a conceituaccedilatildeo a primeira operaccedilatildeo do intelecto e

caracterizaria definitivamente a abstraccedilatildeo intelectiva em animais natildeo humanos

segundo a descriccedilatildeo aristoteacutelico-tomista Natildeo foi poreacutem o caso Algo que poderia

parecer chegar um pouco mais perto disto seria a atribuiccedilatildeo de ldquowater birdrdquo ao pato

que fez Washoe ou as de ldquofake mouthrdquo818 dada a nariz e de ldquonose fakerdquo819 dada a

maacutescara por Koko e inclusive o modo como segundo Patterson e Linden xingava

ldquobirdrdquo820 Mas ainda assim o que se teria segundo o aristotelismo-tomismo seriam

correlaccedilotildees de quididades particulares (entre as palavras conhecidas os gestos ou

os lexigramas e os objetos em si) por grau de semelhanccedila pela estimativa com

voluntariedade que esses animais teriam aprendido a estabelecer em seus

respectivos processos de treinamento

Savage-Rumbaugh e colaboradores821 em trabalho em que elencam

seiscentos e sessenta comandos alguns com alguma variaccedilatildeo dados a Kanzi e agrave

menina Alia de dois anos filha de uma das assistentes referem-se a apontamentos

de Quine822 segundo os quais se teria de determinar qual ou quais das incontaacuteveis

propriedades de um objeto se levaria em consideraccedilatildeo ao denotaacute-lo Apontam entatildeo

a descontextualizaccedilatildeo pela qual um macaco poderia compreender por exemplo a

atribuiccedilatildeo da palavra maccedilatilde agrave fruta em si sem que esta esteja a representar-lhe uma

finalidade praacutetica sem que lhe valha como recompensa Como dizem

Eacute faacutecil treinar um macaco para dizer lsquomaccedilatildersquo afim de que pegue uma maccedilatilde mas eacute difiacutecil ensinaacute-lo a usar lsquomaccedilatildersquo para descrever uma comida que a ele natildeo eacute permitido comer uma comida que ele vecirc algueacutem mais comer uma comida que ele natildeo goste uma comida que eacute encontrada em um lugar em particular etc

823

Explicam que isto seria mais comum em crianccedilas humanas mas em macacos

soacute se pode verificar quando haacute descontextualizaccedilatildeo dos siacutembolos em relaccedilatildeo aos

818

PATTERSON LINDEN 1981 p 112 819

Ibid p 117 820

Ibid p 119-121 e 142 821

SAVAGE-RUMBAUGH et al 1993 822

QUINE 1960 passim 823

ldquoIt is easy to train an ape to say aple in order to get an aple but difficult to teach it to use aple to describe a food that it is not allowed to eat a food that it sees someone else eating a food that it does not like a food that is found in a particular location etcrdquo SAVAGE-RUMBAUGH et al 1993 p 15

176

eventos que estariam associados agrave sua aprendizagem E se o fazem entatildeo lhes

seria possiacutevel atribuir novos nomes a novos objetos e assim criar novos sinais

Mas mesmo aqui natildeo haacute razatildeo para negar que se siga no acircmbito das

associaccedilotildees de quididades e intenccedilotildees de natureza particular sob a perspectiva

aristoteacutelico-tomista no exerciacutecio da participaccedilatildeo no chamado experimento com

voluntariedade natildeo deliberativa

89 AUTORRECONHECIMENTO

Os estudos mostram que alguns animais a saber golfinhos824 corviacutedeos825

elefantes826 e grandes macacos como os gorilas827 e os orangotangos828

comprovadamente reconhecem sua proacutepria imagem diante de um espelho o que

poderia apontar para um tipo mais avanccedilado de ldquoawarenessrdquo Cammaerts Trico e

Cammaerts829 no entanto em um surpreendente estudo que sugere

autorreconhecimento em espelhos em formigas tambeacutem testadas com o

reconhecimento da marca realizado com trecircs espeacutecies de um mesmo gecircnero a

saber Myrmica sabuleti M rubra and M ruginodis afirmam que o

autorreconhecimento natildeo implicaria necessariamente algum tipo de consciecircncia

Alguns pesquisadores vieram tambeacutem a propor por meio de outros testes que

alguns animais possuem reconhecimento e quiccedilaacute consciecircncia do proacuteprio corpo

como Dale e Plotnik830 que verificaram que os elefantes asiaacuteticos teriam percebido

que o proacuteprio peso impedia a realizaccedilatildeo da tarefa e Herman que estudou a

execuccedilatildeo de tarefas por golfinhos que envolviam partes corporais associadas agraves

suas proacuteprias accedilotildees831 Diante da execuccedilatildeo do comando para que um destes

animais escolhesse a tarefa o pesquisador descreve que

Phoenix teve de manter uma representaccedilatildeo mental do comportamento que ela executou da uacuteltima vez atualizar isto com cada comportamento que se sucedeu processar semanticamente a repeticcedilatildeo ou algum outro gesto e

824

REISS 2001 825

PRIOR GUumlNTUumlRKUumlN 2008 826

PLOTNIK et al 2006 827

PATTERSON LINDEN 1981 p 108 828

MILES 1990 829

CAMMAERTS TRICO CAMMAERTS 2015 830

DALE PLOTNIK 2017 831

HERMAN 2006

177

entatildeo selecionar por ela mesma o mesmo comportamento para repetir ou escolher um comportamento dentre os outros quatro []

832

Aqui se observa sob a perspectiva aristoteacutelico-tomista a memoacuteria de

intenccedilotildees seguida de comparaccedilotildees destas por parte da estimativa e o exerciacutecio da

voluntariedade a ela associada

E o mesmo se diga das combinaccedilotildees entre accedilotildees e partes do corpo incluindo

as que implicam inovaccedilatildeo realizadas por Elele a partir de comandos833

relacionando ao que se disse mais acima sobre a associaccedilatildeo destes com objetos e

accedilotildees caracterizando associaccedilotildees particulares e ilustrando aqui tambeacutem a

plasticidade da estimativa

Quando os elefantes asiaacuteticos reconheceram o impedimento provocado pelo

proacuteprio peso isto segundo o aristotelismo-tomismo se explicaria pela comparaccedilatildeo

da estimativa entre a proacutepria quididade e a do tapete sobre o qual se encontravam e

a intencionalidade relacionada agrave permanecircncia neste

Sabe-se que os entes humanos comeccedilam a reconhecer-se no espelho antes

dos dois anos de idade834 Reconhecer-se implica apreender a proacutepria quididade

seja no acircmbito particular ou a partir de um universal e o mesmo pode-se dizer do

reconhecimento de cada parte corporal O autorreconhecimento pode assim estar

associado agrave estimativa do mesmo modo que se daacute com o reconhecimento do outro

832

ldquoPhoenix had to maintain a mental representation of the behaviour she last performed update that with each succeeding behaviour semantically process the repeat or any gesture and then either self-select the same behaviour for repeat or choose a behaviour from the remaining four if given anyrdquo HERMAN 2006 p 457

833 HERMAN et al 2001

834 AMSTERDAM 1972

178

9 CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS E CONCLUSAtildeO

Natildeo encontramos assim nenhuma habilidade que nos remeteria

necessariamente agrave presenccedila de cogitativa e de intelecccedilatildeo entre os animais natildeo

humanos na bibliografia consultada resultado que corrobora a validade das

interpretaccedilotildees a partir da doutrina aristoteacutelico-tomista relacionadas agrave psicologia

comparada agrave etologia e outras disciplinas congecircneres Pudemos enquadrar todas

as habilidades que percorremos como envolvendo apreensatildeo combinaccedilatildeo ou

comparaccedilatildeo de quididades ou intenccedilotildees de natureza singular particular Todos os

comportamentos analisados envolveram o sentido comum a memoacuteria a imaginaccedilatildeo

e a estimativa e nenhum deles nos deu sinal do uso da reminiscecircncia e do uso

voluntaacuterio de imagens que caracterizariam a cogitativa e serviriam de base para a

abstraccedilatildeo Mesmo os comportamentos considerados espontacircneos e ateacute os

inovadores poderiam ser explicados sob a oacuteptica aristoteacutelico-tomista como sendo

movidos pela memoacuteria ou pela imaginaccedilatildeo e natildeo motores de natureza voluntaacuteria

destas por associaccedilotildees resultantes tambeacutem das operaccedilotildees da estimativa

Nota-se o tom de entusiasmo por parte de alguns pesquisadores diante de

certos comportamentos observados como aqueles que caracterizaram uma accedilatildeo

realizada segundo eles pela primeira vez Neste sentido poreacutem Premack e

Woodruff835 ao darem iniacutecio agraves investigaccedilotildees sobre a teoria da mente afirmaram

que era muito difiacutecil evitar que um chimpanzeacute se envolvesse informalmente na

soluccedilatildeo de problemas no cotidiano o que dificultava a anaacutelise do quanto um

determinado comportamento teria de fato o caraacuteter inovador E isto decerto se aplica

aos demais casos relacionados aqui prioritariamente investigados por exemplo

reforccedilando o que afirmamos a respeito do golfinho fecircmeo Ake que poderia ter

perfeitamente aprendido a recolher os objetos a partir do mais distante por ter

observado entes humanos agindo anteriormente deste modo e tambeacutem do elefante

e dos chimpanzeacutes que utilizaram objetos para alcanccedilar alimento suspenso no alto e

inclusive tentaram empilhar caixas ou taacutebuas (estas da parte de um elefante sem

sucesso) e que podem perfeitamente ter visto entes humanos fazendo algo

semelhante em outras circunstacircncias Mas natildeo haacute como negar a presenccedila desta

capacidade quando se trata por exemplo do uso em ambiente selvagem de

835

PREMACK WOODRUFF 1978

179

instrumentos incluindo os meios de confecccedilatildeo e das diferenccedilas que costumam

haver neste acircmbito entre populaccedilotildees de uma mesma espeacutecie

Outro comportamento que foi objeto de muitos dos trabalhos consultados eacute a

transmissatildeo cultural que jaacute havia sido exemplificada sem referecircncia ao termo por

Aristoacuteteles quando se referiu ao ensinamento do canto por parte das aves e que

ilustra o alcance do processo de aprendizagem no acircmbito da estimativa e que

parece encontrar seu aacutepice no que toca aos animais natildeo humanos nos grandes

macacos

Estas duas caracteriacutesticas a teoria da mente e a transmissatildeo cultural

exemplificam um conjunto de variaacuteveis que podem atuar em determinado

comportamento e que deve ser considerado a fim de que a inteligecircncia observada

nos animais natildeo seja superestimada sobretudo quando se pretende comparaacute-la agrave

humana o que se daacute como indica Marie George836 pela distinccedilatildeo indevida entre o

intelecto e o sentido algo que pode levar a testes de inteligecircncia defeituosos e eacute

exemplificado pelo fato de que alguns sentidos mais acurados do que os dos

humanos em certos animais chegam a impressionar muitos pesquisadores a ponto

de fazecirc-los chamar inteligecircncia as habilidades a eles relacionadas Superestimar

assim a chamada inteligecircncia dos animais seria tatildeo equivocado como subestimaacute-la

como fizeram aqueles que tentaram explicar essas habilidades por uma visatildeo

estritamente mecanicista

Exemplificam essa superestima tanto o caso dos animais pintores que

reproduzem natildeo rabiscos como Kanzi mas figuras concretas como flores tal como

o fazem os elefantes asiaacuteticos no qual posteriormente descobriu-se que seus

mahouts837 eacute que lhes sussurravam comandos que orientavam as pinceladas como

explicou Morris838 e o famoso caso do cavalo Clever Hans que impressionou a

muitos por ter dado a entender que saberia realizar as quatro operaccedilotildees

matemaacuteticas representando o resultado com batidas com sua pata no chatildeo mas no

qual ele e seu treinador Wilhelm von Osten foram minuciosamente analisados pelo

bioacutelogo especialista em psicologia comparada Oskar Pfungst839 que por fim verificou

que o animal apenas respondia a sinais corporais de von Osten que indicavam

quando deveria parar de bater com a pata no chatildeo O efeito Clever Hans como essa

836

GEORGE 2003 837

Como chamam os treinadores na iacutendia 838

MORRIS 2009 839

PFUNGST 1911

180

interaccedilatildeo passou a chamar-se mostra a influecircncia dos humanos no desempenho

dos animais em seus testes podendo comprometer seriamente a interpretaccedilatildeo dos

resultados o que de certo modo conflita com a necessidade da presenccedila humana

para o sucesso na realizaccedilatildeo de uma miriacuteade de testes que envolvem as interaccedilotildees

sociais o que exclui a possibilidade de isolamento dos animais e provoca assim uma

seacuterie de dificuldades

Posteriormente estudos como os de Proops e colaboradores com cavalos

demonstraram que os animais natildeo soacute interagem com expressotildees corporais

incluindo as faciais e sugerem que podem memorizaacute-las por longos periacuteodos com

influecircncia significativa no desempenho de tarefas futuras840 Assim muitos dos

resultados apontados aqui de observaccedilotildees realizadas na presenccedila de treinadores

poderiam estar de algum modo relacionados a este efeito

Outro problema que George aponta eacute o uso ambiacuteguo de termos como a

proacutepria palavra ldquointeligecircnciardquo que segundo defende de acordo com o aristotelismo-

tomismo enquanto nos entes humanos se refere ao processo de intelecccedilatildeo de

abstraccedilatildeo como jaacute se disse nos animais implica somente uma inteligecircncia praacutetica

dos sentidos como corrobora o presente estudo com o que parece concordar

Damaacutesio quando ao tratar das reaccedilotildees especiacuteficas desencadeadas pelas emoccedilotildees

diz que ao deparar com o agente indutor os animais imediatamente fogem ficam

inertes atacam o inimigo ou adotam condutas que lhes geram algum tipo de prazer

ao passo que no homem haacute a possibilidade de que essas condutas sejam

temperadas pelo uso da razatildeo841

George exemplifica o que diz com a preferecircncia por parte de um gato por um

alimento uacutemido ao seco e pode ilustrar-se tambeacutem com os problemas que um ente

humano pode resolver sem precisar da intelecccedilatildeo como amarrar um sapato ou

andar de bicicleta que natildeo exigem o conhecimento teoacuterico que caracterizaria a

intelecccedilatildeo e ao que se chega por aprendizagem direta ou indireta ou por tentativa e

erro e que natildeo podem ser descritos por uma visatildeo inflexiacutevel do instinto Ela sugere

entatildeo como soluccedilatildeo para o melhor entendimento da questatildeo a saiacuteda do que entende

como uma dicotomia entre instinto e inteligecircncia

840

PROOPS et al 2018 O experimento aqui consistiu em mostrar imagens de rostos de pessoas sorrindo ou com raiva a cavalos associando-as a algum estado emocional e algumas horas depois fazendo com que os animais interagissem com as mesmas pessoas das fotografias agora com expressatildeo neutra a quem os cavalos demonstraram reaccedilotildees que se relacionavam com as expressotildees nas imagens fotograacuteficas

841 DAMAacuteSIO 2000 p 70

181

Explica Echavarriacutea por sua vez que quando Tomaacutes de Aquino fala de

instinto refere-se a um impulso natural com alguma voluntariedade ordenado agraves

necessidades do indiviacuteduo ou da espeacutecie842 Tem-se com isto um leque de

possibilidades que caracteriza por exemplo as menccedilotildees feitas aqui agrave plasticidade

da estimativa incluindo a participaccedilatildeo no ldquoexperimentordquo as habilidades que tal

participaccedilatildeo comporta sem sair do acircmbito da estimativa tal como as que foram

descritas neste estudo

No exemplo de George o gato por um lado natildeo eacute forccedilado a comer a comida

uacutemida e por outro natildeo deliberou sobre o caso Ele sente a diferenccedila entre ambas e

se dirige agrave que lhe eacute mais apeteciacutevel ilustrando a voluntariedade associada agrave

estimativa agrave qual o aristotelismo-tomismo se refere

Tambeacutem nos testes de comunicaccedilatildeo a pesquisadora aponta ainda falhas na

exposiccedilatildeo dos dados como a omissatildeo nos artigos por alguns pesquisadores do

uso de palavras que caracterizam redundacircncias e combinaccedilotildees sem sentido pelos

animais estudados Ela entatildeo observa que os grandes macacos que dominaram os

lexigramas e a comunicaccedilatildeo por sinais talvez pudessem expressar a relaccedilatildeo entre

causa e efeito jaacute que estabelecem essa relaccedilatildeo em casos concretos mas nenhum

deles foi capaz de adotar uma posiccedilatildeo em relaccedilatildeo a um problema e justificar essa

posiccedilatildeo o que caracterizaria o exerciacutecio do raciociacutenio e o que tornaria possiacutevel

ensinar-lhes uma ciecircncia ou mesmo princiacutepios dessa ciecircncia enquanto tais

Ela identificou no orangotango Chantek uma suposta tentativa de iniacutecio de

conversa com a frase anteriormente mencionada ldquoJeannie Chantek chaserdquo843 sobre

a qual natildeo soacute observa natildeo ir aleacutem disto inclusive porque sua meacutedia de comprimento

de enunciados era baixa como fornece como explicaccedilatildeo a hipoacutetese de que se trate

da busca por satisfaccedilatildeo no acircmbito emocional pelo contato social com a treinadora

O que diz George ateacute aqui parece adequar-se tambeacutem ao comportamento de

Koko que segundo seus treinadores expressava sentimentos com demonstraccedilotildees

de humor apelidava e inclusive podia mentir para eximir-se da culpa de determinado

ato

Nenhum deles prossegue a estudiosa tambeacutem foi capaz de exibir uma

conversa que caracterizasse algo mais do que um instrumento para alcanccedilar um

objetivo especiacutefico de expressar uma narrativa de solicitar uma informaccedilatildeo para

842

ECHAVARRIacuteA 2009 p 122-123 843

MILES 1990 p 521

182

compreender algo melhor de expressar uma opiniatildeo ou um desejo para aleacutem do

caraacuteter instrumental de usar palavras para coisas que natildeo sejam percebidas

sensivelmente

Enquanto Aristoacuteteles identifica a linguagem assim como a loacutegica como

exclusiva dos entes humanos como dependente do exerciacutecio da intelecccedilatildeo844

Miles845 identifica trecircs elementos que entende caracterizarem a representaccedilatildeo

linguiacutestica a saber 1- um elemento do mundo real designado por um sinal 2- que

intencionalmente transmite seu significado 3- sobre o qual haacute um entendimento

cultural compartilhado Para o aristotelismo-tomismo estes elementos estariam

presentes tanto na linguagem como poderiam estar presentes na participaccedilatildeo na

linguagem

Em seguida Miles fornece algumas evidecircncias de que palavras ou sinais

estejam sendo utilizados de modo referencial como a indicaccedilatildeo de um objeto ou

evento presente ou ausente no ambiente que tenham domiacutenios semacircnticos ou de

significado e que podem natildeo depender por completo do contexto Menciona entatildeo

os vaacuterios estaacutegios da comunicaccedilatildeo referencial para afirmar que Chantek apresenta

cada um desses estaacutegios tal como observado em crianccedilas O orangotango

inicialmente repetia accedilotildees socialmente orientadas (como fazer algo para chamar a

atenccedilatildeo) em seguida passou a sentir necessidade de exibir objetos e entatildeo a dar

objetos Posteriormente Chantek usou de sua capacidade de voluntariedade e do

sinal ldquoPointrdquo846 para apontar para locais relacionados ao modo com que queria ser

agradado e responder perguntas neste sentido e entatildeo passou a combinar este

sinal com o sinal ldquoGordquo847 encaminhando os treinadores para onde queria Os

resultados mostraram que Chantek possuiacutea o niacutevel de desempenho cognitivo de

uma crianccedila de cerca de dois anos de idade com algumas caracteriacutesticas

compartilhadas com crianccedilas de quatro e ateacute de sete anos de idade o que estaacute em

perfeita consonacircncia com a declaraccedilatildeo aristoteacutelica supracitada a respeito desta

relaccedilatildeo e com o que se descreveu anteriormante em relaccedilatildeo a isso sob a

perspectiva do uso da estimativa

Mesmo o reconhecimento da natureza representativa dos sinais que passou

a fazer com os peacutes e com objetos e inclusive a criar pode ser explicado aqui pela

844

DE MOURA NEVES 1981 845

MILES 1990 846

ldquoApontarrdquo 847

ldquoIrrdquo

183

combinaccedilatildeo de intenccedilotildees e imagens particulares dentre as quais aquelas

memorizadas teriam sido acessadas natildeo por deliberaccedilatildeo mas movidas pela

necessidade do animal naquele instante

A comunicaccedilatildeo tambeacutem poderia mostrar sinais de enquadramento na teoria

da mente da empatia da adoccedilatildeo da perspectiva alheia E natildeo soacute no acircmbito

intelectivo como no estimativo pela comparaccedilatildeo de particulares e reconhecimento

do outro e de si mesmo Segundo poreacutem a hipoacutetese da intuiccedilatildeo antropomoacuterfica

poder-se-ia estar superestimando ou subestimando este comportamento por ser-

nos de algum modo inacessiacutevel E se assim fosse parece-nos que natildeo se poderia

comprovar por exemplo a teoria da mente nos animais Ades destaca o seguinte

trecho de Romanes que aqui citamos com algumas palavras a mais e que este

apresenta em sua obra antes de criticar a teoria do automatismo animal que

atribuem a Descartes e tambeacutem parece natildeo concordar com tal atribuiccedilatildeo

[] a partir do que conheccedilo subjetivamente das operaccedilotildees de minha proacutepria mente individual e das atividades agraves quais elas impelem o meu organismo passo por analogia a inferir desde as atividades observaacuteveis de outros organismos quais satildeo as operaccedilotildees mentais que lhes satildeo subjacentes O senso comum no entanto sente universalmente que a analogia eacute aqui um guia mais seguro para a verdade do que a demanda ceacutetica pela evidecircncia impossiacutevel de modo que se a existecircncia objetiva de outros organismos e suas atividades satildeo asseguradas o senso comum concluiraacute sempre e sem questionar o que as atividades de outros organismos quando anaacutelogas agravequelas de nosso proacuteprio organismo que sabemos serem acompanhadas por certos estados mentais satildeo neles acompanhadas por estados mentais anaacutelogos

848

Ades entatildeo menciona o emprego de um mesmo termo que caracteriza um

comportamento humano para definir um nos animais natildeo humanos que de algum

modo corresponde a ele mas analogamente

No entanto para o aristotelismo-tomismo como se viu haacute fenocircmenos

mentais nos animais que podem ser associados aos humanos apenas como

participaccedilatildeo sem caracterizar propriamente uma das potecircncias de propriedades

848

ldquoStarting from what I know subjectively of the operations of my own individual mind and the activities wich in my own organism they prompt I proceed by analogy to infer from the observable activities of other organisms what are the mental operations that underlie them [] Common sens however universally feels that analogy is here a safer guide to thruth than the sceptical demand for impossible evidence so that if the objective existence of other organisms and their activities is granted [] common sense will always and without question conclude that the activities of organisms other than our own when analogous to those activities of our own wich we know to be accompanied by certain mental states are them accompanied by analogous mental satatesrdquo ROMANES 1888 p 1-2 6

184

exclusivamente humanas de modo que se por um lado a corrente reconhece a

superioridade de alguns animais no que toca a certos sentidos externos e internos

por outro sustenta que o homem conhece a verdade ou seja a realidade pela

adequaccedilatildeo do intelecto ao objeto

Assim sugerimos que o conhecimento do homem em relaccedilatildeo agrave chamada

inteligecircncia dos animais natildeo humanos natildeo estaria impedido e ele poderia chegar a

constataccedilotildees que entenderia como verdadeiras confirmando segundo o exemplo

supracitado e se for o caso a teoria da mente e reconhecendo a natureza desses

entes tal como eacute em si mesma (ainda que jamais se pudesse conhececirc-los de modo

integral) sem a tendecircncia a por assim dizer antropomorfizaacute-los comparando-a agrave

nossa ao situaacute-los em uma categoria especiacutefica da gradaccedilatildeo entitativa sem jamais

deixar de levar em conta a subjetividade no que toca agraves diferenccedilas marcantes de

percepccedilatildeo por meio dos sentidos agraves quais temos tido acesso gradual em razatildeo dos

avanccedilos tecnoloacutegicos que nos possibilitam investigar pontos nos espectros dos

sensiacuteveis que nossos sentidos por si soacutes natildeo alcanccedilam

Para chegar a isto Marie George849 como se viu aponta para a necessidade

de estabelecer-se a fronteira entre o pensar e o sentir e essa tarefa deve ser

realizada natildeo soacute com investigaccedilotildees com animais natildeo humanos como as que

apresentamos neste estudo mas tambeacutem com crianccedilas humanas em idade proacutexima

agravequela em que comeccedilam a mostrar sinais das operaccedilotildees do intelecto agrave luz do

aristotelismo-tomismo Esta fronteira contudo estabelece certos limites que seriam

intransponiacuteveis

Fizemos algumas perguntas anteriormente neste trabalho a partir deste tema

e tentaremos respondecirc-las com base nesta corrente no acircmbito das consideraccedilotildees

que se sucederatildeo

Darwin850 como se viu exemplifica aqueles que natildeo reconhecem essa

intransponibilidade ao apontar nos animais natildeo humanos caracteriacutesticas de

sociabilidade (como o auxiacutelio o alerta de perigo etc) de sentimento do belo a

comunicaccedilatildeo por algo anaacutelogo agrave linguagem a resoluccedilatildeo de problemas etc O

sentimento e a admiraccedilatildeo do belo que ele sugere com os casos em que uma ave

macha exibe sua plumagem para atrair uma fecircmea segundo o aristotelismo-

tomismo se trataria natildeo propriamente de um reconhecimento do belo enquanto

849

GEORGE 2013 850

DARWIN sd a) p 30-31 e 34-35

185

belo mas de uma atraccedilatildeo movida instintivamente pela comparaccedilatildeo de imagens pela

estimativa segundo a configuraccedilatildeo a coloraccedilatildeo etc Jaacute no caso do que diz ser

anaacutelogo agrave linguagem trata-se sob este vieacutes como se disse mais acima da

participaccedilatildeo e em relaccedilatildeo aos demais exemplos observam-se potecircncias

encontradas no homem mas aqui limitadas ao acircmbito da estimativa em

conformidade com os resultados fornecidos anteriormente Inclui-se aqui tambeacutem o

auxiacutelio de alimentaccedilatildeo prestado por algumas aves a companheiros cegos que

Darwin relata Ainda que como diz seja um fato incomum concorre para a

preservaccedilatildeo da espeacutecie e serve como indiacutecio da teoria da mente naqueles animais

Em todo caso temos sempre exemplos envolvendo os sentidos internos e a

natureza nos priva de fatos que validariam a ideia da gradaccedilatildeo contiacutenua

Demais disso se a ideia do princiacutepio formal e portanto imaterial procede

entatildeo estamos diante de um problema ainda mais profundo para sustentar a ideia da

possibilidade de haver um meio termo de haver tal gradaccedilatildeo no acircmbito ontoloacutegico

interespeciacutefico851 entre a natildeo captaccedilatildeo e a captaccedilatildeo de espeacutecies inteligiacuteveis Se haacute

captaccedilatildeo de espeacutecies imateriais isto somente se daacute por alguma potecircncia imaterial

Mas eacute possiacutevel conciliar essa descriccedilatildeo com outras que apontam o sistema

nervoso como a origem da inteligecircncia como o faz Gallegos852 ndash que sugere que

esteja distribuiacuteda pelas estruturas orgacircnicas relacionadas ndash ou com a explicaccedilatildeo

anteriormente citada das duas maneiras de atuaccedilatildeo do sistema nervoso nos

processos cognitivos descritas por Maturana e Varela853 por apontar a possibilidade

de a origem da expressatildeo material da inteligecircncia estar no ceacuterebro em seu todo

poreacutem como efeito como repercussatildeo de uma operaccedilatildeo que nasce no acircmbito

imaterial ou espiritual realizada exclusivamente pela alma esta a partir de

informaccedilotildees recebidas materialmente pelos sentidos

Mas aqui nos referimos exclusivamente agrave capacidade de abstraccedilatildeo

associada intimamente agrave vontade pelas quais no homem a inteligecircncia prevaleceraacute

sobre o instinto e natildeo ao produto exclusivo dos sentidos internos que seria entatildeo

plenamente material ou seja fruto da operaccedilatildeo da alma pela mateacuteria e natildeo por si

851

Porque intraespecificamente um ente humano que ainda natildeo atingiu a chamada ldquoidade da razatildeordquo segundo o aristotelismo-tomismo jaacute deteacutem a potecircncia intelectiva embora esta ainda natildeo se manifeste pelas limitaccedilotildees do organismo inclusive dos sentidos internos em desenvolvimento

852 GALLEGO 2013

853 MATURANA VARELA 1995 p 201-202

186

mesma tal como o eacute a chamada inteligecircncia animal em sua integralidade que

assim como diz Gallegos submete-se ao instinto

Estatildeo nesse campo material dos sentidos internos as citaccedilotildees anteriores de

Griffin854 e Shettleworth855 sobre os atributos dos processos cognitivos como as

representaccedilotildees cujas combinaccedilotildees que resultam em tomadas de decisatildeo

Outras pesquisas como a de Bechara e colaboradores856 que incluem

Antonio Damaacutesio apontam para comportamentos em humanos dentre os quais

estatildeo incluiacutedos casos de tomada de decisatildeo que se antecipam ao raciociacutenio Isto

nos parece ter certa consonacircncia com a proposta aristoteacutelico-tomista e sugerimos

que poderia ser corroborado a partir de estudos que busquem localizar os sentidos

internos no sistema nervoso a partir do que se sabe atualmente nos campos da

neurofisiologia e da neuroanatomia

Reiteramos o que diz George sobre a necessidade de estabelecerem-se os

limites entre os sentidos e a intelecccedilatildeo e que os avanccedilos de investigaccedilotildees nessa

linha podem ser de grande valia para o leque de possibilidades de estudos sobre a

inteligecircncia animal segundo a abordagem atual mais especiacutefica apontada por

Feuerbacher857 no acircmbito da etologia cognitiva e de outras ciecircncias afins

Sugerimos tambeacutem que o aristotelismo-tomismo poderia contribuir com o

esclarecimento dos principais pontos de muitas discussotildees como a polecircmica do

emprego do condicionamento operante skinneriano na educaccedilatildeo humana e os

efeitos negativos descritos por Iserbyt como o adoecimento de alunos ou

surgimento de tiques nervosos neles em razatildeo do estresse858 dentre outros de

longo prazo denunciados ao longo de sua obra ou como aquela que envolveu

Pavlov e Koumlhler e Yerkes Estes dois chegaram a sugerir a presenccedila de alguma

racionalidade de alguma reflexatildeo em chimpanzeacutes com base no que observaram em

seus experimentos alguns expostos aqui mas essas alegaccedilotildees se analisadas agrave luz

do aristotelismo-tomismo estiveram sempre no acircmbito da estimativa O conceito de

inteligecircncia que Koumlhler associou aos seus chimpanzeacutes859 por exemplo ilustrado

pela escolha de um meio diferente para a resoluccedilatildeo de determinada situaccedilatildeo eacute mais

um exemplo que se enquadra na noccedilatildeo aristoteacutelica supramencionada de

854

GRIFFIN 1994 p viii 855

SHETTLEWORTH 2010 p 4 856

BECHARA et al 1997 857

FEUERBACHER 2011 858

ISERBYT 2000 p A-158 859

KOumlHLER 1927 p 3-4

187

semelhanccedila entre a estimativa de certos animais e a de crianccedilas humanas mais

novas

Pode-se sugerir que essa estimativa vaacute aleacutem dos reflexos inatos e

condicionados pavlovianos nas crianccedilas e nos animais como deixam claros alguns

experimentos como aqueles que abordam a comunicaccedilatildeo realizados com Kanzi

Koko dentre outros em que os animais passam a fazer coisas que jamais fariam na

natureza mas sempre dentro dos limites de suas potencialidades Pavlov

reconheceu a elasticidade dessa capacidade de aprendizado de tentativa e erro que

atribuiacutea agraves associaccedilotildees que tecircm como fim a recompensa E diga-se o mesmo de

Thorndike que tambeacutem entendia a chamada inteligecircncia dos animais restrita agraves

operaccedilotildees dos sentidos dos impulsos dos sentimentos apontando neles a

ausecircncia de vontade e de ideias livres860 As delimitaccedilotildees de ambos parece-nos

enquadrarem-se no esquema aristoteacutelico-tomista assim como o que entendem das

associaccedilotildees tambeacutem apontadas por Lloyd que ainda destaca as inferecircncias sem

abstraccedilatildeo nos animais861 que caracterizam as operaccedilotildees da estimativa

E da mesma forma sem levar-se em conta a discrepacircncia na questatildeo de

haver ou natildeo possibilidade de um intermeacutedio entre a ausecircncia e a presenccedila de

capacidade de abstraccedilatildeo as observaccedilotildees de Darwin tambeacutem estatildeo muito proacuteximas

da doutrina aristoteacutelico-tomista como por exemplo em seu relato sobre as

expressotildees emocionais e o reconhecimento de memoacuteria e imaginaccedilatildeo e tambeacutem

quando diz que os animais seriam em algo aptos para o raciociacutenio (no original em

inglecircs ldquoreasoningrdquo) mas sem que tenham capacidade para abstrair descriccedilatildeo na

qual nos parece enquadrar-se a potecircncia estimativa Ademais ao referir-se ao

deliberar (no original em inglecircs ldquodeliberaterdquo)862 no exerciacutecio desse raciociacutenio tudo

indica estar-se referindo natildeo agrave deliberaccedilatildeo como vontade livre que tem como

requisito a intelecccedilatildeo mas justamente agrave voluntariedade que se observa nos animais

e nas crianccedilas

Hume tambeacutem atribuiu certo raciociacutenio com inferecircncias aos animais e

reconhecendo que somente o homem estabelece relaccedilotildees de ideias Mostrou

tambeacutem muita proximidade com o aristotelismo-tomismo ao chamar esse raciociacutenio

ldquoexperimentalrdquo e descrevecirc-lo por exemplo como o motivo pelo qual o animal espera

860

THORNDIKE 1898 p 84 e 108 861

LLOYD 1891 p 348 e 362 862

DARWIN 1882 p 75

188

que algo que se deu em determinada circunstacircncia volte a ocorrer caso esta se

repita863 o que mostra consonacircncia com a descriccedilatildeo da estimativa

Tambeacutem em consonacircncia com esta estaacute a observaccedilatildeo cartesiana da

ausecircncia nos animais de linguagem e raciociacutenio se este estaacute aqui entendido como

de natureza abstrativa A carecircncia de mais informaccedilotildees abriu espaccedilo para a

polecircmica envolvendo o automatismo Embora natildeo se possa mensurar ateacute onde

Descartes quis chegar ao mencionar a superioridade dos animais em relaccedilatildeo a

qualquer aparato de fabricaccedilatildeo humana parece haver seacuterias dificuldades em

apontar com maior precisatildeo se ele conceberia ou natildeo por exemplo consciecircncia

neles

Tomaacutes de Aquino aponta alguns sentidos dados agrave palavra ldquoconsciecircnciardquo

como significando a sindeacuterese mas explica que originalmente falando consciecircncia

significa ldquoa relaccedilatildeo de um conhecimento com uma coisardquo que equivaleria a um

ldquoconsaberrdquo e se efetua atraveacutes de um ato

A consciecircncia como a aplicaccedilatildeo de um conhecimento a alguma coisa que se

pratica pode dar-se de trecircs formas a) pelo reconhecimento de ter ou natildeo feito algo

a partir do que se diz que ela daacute testemunho b) pelo juiacutezo de que se deve ou natildeo

fazer algo a partir do que se diz que ela instiga ou liga e c) pelo juiacutezo de que algo

foi bem feito ou mal feito a partir do que se diz que ela excusa acusa ou

remorde864

Assim a consciecircncia segundo o aristotelismo-tomismo pode ser um ato do

intelecto ou da cogitativa ou um ato da estimativa E quando se trata destes uacuteltimos

eacute resultante de processos cerebrais afirmaccedilatildeo que fundamentaria as hipoacuteteses por

exemplo de Searle e Griffin No entanto a perspectiva de que a consciecircncia se

restringiria a processos orgacircnicos encontra algumas barreiras Tallis por exemplo

diz que se o ceacuterebro fosse uma maacutequina teria de estar ldquoacoplado a uma consciecircncia

que lhe fosse exterior para poder transformar os eventos que ocorrem nele em

lsquoatividadersquo computacionalrdquo pois ldquomaacutequinas natildeo calculam por si mesmasrdquo Esses

863

HUME 2001 p 128-132 864

ldquo[] la relacioacuten de un conocimiento con una cosardquo TOMAacuteS DE AQUINO 2001 art 13 q 79 p 739

189

eventos assim por si soacute natildeo poderiam ldquo[] constituir consciecircncia ou processos

mentaisrdquo865

A consciecircncia enquanto ato do intelecto viabiliza segundo o aristotelismo-

tomismo o ato consciente de que se estaacute consciente jaacute natildeo resultante desses

processos cerebrais ou ao menos natildeo apenas destes Encontramos aqui a divisatildeo

fornecida por Ades ou seja neste uacuteltimo caso teriacuteamos o emprego do termo

ldquoconsciousnessrdquo e no anterior o do termo ldquoawarenessrdquo e aqui se enquadra a

consciecircncia de si mesmo e a do proacuteprio corpo observadas em elefantes grandes

macacos e corvos e acrescidas daquela do proacuteprio comportamento que sob o vieacutes

aristoteacutelico-tomista seria das proacuteprias intenccedilotildees que Herman866 observou nos

golfinhos Deste modo os quatro domiacutenios indicados pelo pesquisador encontram-

se segundo o aristotelismo-tomismo no acircmbito estimativo

Jaacute na divisatildeo de Damaacutesio a chamada ldquoconsciecircncia centralrdquo o conhecimento

de que se estaacute no aqui e no agora parece poder enquadrar-se tambeacutem somente no

acircmbito estimativo ao passo que a chamada ldquoconsciecircncia ampliadardquo (de que se tem

uma identidade do passado e do futuro etc) seria um ato conjunto do intelecto com

a cogitativa Mas aqui o reconhecimento de si mesmo poderia tambeacutem estar

associado agrave estimativa como se observou e como uma participaccedilatildeo no sentido

aristoteacutelico-tomista na cogitativa

Tambeacutem quando Damaacutesio define a consciecircncia como um padratildeo privado que

reuacutene o objeto e o self867 se aproxima da definiccedilatildeo aristoteacutelico-tomista de aplicaccedilatildeo

do conhecimento (de um sujeito) a algo

Damaacutesio apresenta como fato a relaccedilatildeo entre ldquoalguns aspectos dos

processos da consciecircnciardquo e ldquoregiotildees e sistemas cerebrais especiacuteficosrdquo Poderia

estar reconhecendo aqui que nem todos esses aspectos enquadram-se nisto tal

como Chalmers que sugere que ela se estenda para aleacutem de bases orgacircnicas Isto

como se viu estaria mais em consonacircncia com a visatildeo aristoteacutelico-tomista em

relaccedilatildeo aos animais natildeo humanos mas se se pode excluir de algum modo os

processos orgacircnicos como causa tornar-se ia tambeacutem consonante em relaccedilatildeo aos

entes humanos e mais visivelmente com a capacidade de intelecccedilatildeo

865

Respectivamente ldquo[] coupled to a consciousness external to it to transform the events that take place in it into computational activityrdquo ldquo[] machines do not of themselves calculate []rdquo e ldquo[] constitute consciousness or mental processesrdquo TALLIS 2010 p 80

866 HERMAN 2006

867 DAMAacuteSIO 1999 p 30 e 33

190

Jaacute Lalande poderia considerar a definiccedilatildeo aristoteacutelico-tomista abusiva tal

como o faz com a de Schopenhauer e Kant mas natildeo nos parece que sua definiccedilatildeo

em si esteja distante da que ele mesmo propotildee e inclusive do modo como a

classifica Das cinco definiccedilotildees para a palavra ldquointuiccedilatildeordquo que ele fornece parece-nos

encaixarem aqui aquelas em que haacute referecircncia a um conhecimento evidente direto

e imediato868 Vemos assim consonacircncia entre a intuiccedilatildeo do espiacuterito que menciona

e a ciecircncia em ato do sujeito agrave qual se refere o aristotelismo-tomismo bem como

entre os estados e atos deste espiacuterito e o algo respectivamente mas neste segundo

caso de modo natildeo exaustivo E tambeacutem nos parece a consciecircncia espontacircnea

estaria proacutexima da ldquoawarenessrdquo ao passo que a consciecircncia reflexiva

corresponderia agrave ldquoconsciousnessrdquo da qual como aponta Locke869 depende o

perdurante reconhecimento do ldquoeurdquo o testemunho interno que esse ldquoeurdquo pode dar a

si mesmo como aponta Balibar870 e sem o que natildeo poderia haver o exerciacutecio da

intelecccedilatildeo uma vez que o sujeito que intelige somente apreende porque se manteacutem

enquanto o mesmo sujeito e de algum modo se reconhece enquanto tal e

reconhece que reconhece

Paralelamente a consciecircncia enquanto ldquoawarenessrdquo viabiliza a capacidade de

aprender e de adaptar-se ao ambiente que satildeo as duas caracteriacutesticas que Silva

encontra em praticamente todas as definiccedilotildees de inteligecircncia Ambas podem

enquadrar-se como objeto da estimativa ou como objeto da intelecccedilatildeo e daiacute

sugerimos que venha esse seu caraacuteter por assim dizer universal

Tambeacutem se pode enquadrar em ambas o entendimento de Claparegravede Stern

Buumlhler e Koumlhler citados por Piaget de que a inteligecircncia seria uma adaptaccedilatildeo

mental raacutepida a uma nova circunstacircncia Da parte dos animais natildeo humanos um

bom exemplo para ilustraacute-lo eacute o comportamento de obediecircncia dos espeacutecimes de

golfinhos a um comando de criaccedilatildeo

Jaacute o mesmo natildeo se daacute com algumas das caracteriacutesticas elencadas nas

palavras da Task Force on Intelligence da APA871 quando cita a necessidade de uma

busca para definiccedilatildeo de inteligecircncia As capacidades de adaptaccedilatildeo ao ambiente e

de aprendizado a partir da experiecircncia satildeo se tomadas por si soacute notoriamente

estimativas enquanto que a compreensatildeo de ideias complexas e o raciociacutenio satildeo

868

LALANDE 1932 p 396-400 869

LOCKE 2015 p 181 870

BALIBAR 2004 p 175 871

NEISSER 1996 P 77

191

deste modo classificaacuteveis conforme o sentido em que estes atributos satildeo

empregados mas a reflexatildeo eacute proacutepria do intelecto

Aqui jaacute comeccedilamos a esboccedilar como essa base do aristotelismo-tomismo

poderia contribuir para organizar essas caracteriacutesticas fornecendo sugerimos um

suporte para um modo eficaz de encontrar uma definiccedilatildeo para a inteligecircncia que

satisfaccedila agraves tantas correntes de pensamento

Dentre as caracteriacutesticas elencadas pelo Mainstream Science on

Intelligence872 as habilidades de planejar resolver problemas aprender

rapidamente e aprender com a experiecircncia satildeo se analisadas por si soacute verificaacuteveis

na estimativa Do mesmo modo assim como no caso anterior as habilidades de

raciocinar e compreender ideias complexas depende do sentido empregado e a de

pensar abstratamente eacute exclusiva do intelecto Fala-se tambeacutem na capacidade mais

ampla e profunda de compreender captar o sentido das coisas e calcular o que

fazer Este uacuteltimo por si poderia ser objeto da estimativa mas as duas qualificaccedilotildees

que o precedem situam-no na natureza cogitativa ou intelectiva humana

A definiccedilatildeo de Wechsler873 refere-se agrave inteligecircncia humana pois fala de um

pensamento racional para o trato com o ambiente o que exige reflexatildeo e parece

caracterizar o intelecto praacutetico segundo o aristotelismo-tomismo Jaacute a de Stern874 se

tomada apenas em si mesma poderia ser aplicaacutevel tanto aos animais que

destacamos aqui quanto aos humanos conforme o sentido que se pretenda dar

quando se refere ao indiviacuteduo ajustar o pensamento a novas exigecircncias

conscientemente Se ele o faz por exemplo consciente de que pensa no que faz

estaacute no acircmbito intelectivo e se o faz consciente do que estaacute fazendo pode estar no

da estimativa

A identificaccedilatildeo desta e dos sentidos internos e de sua expressatildeo no sistema

nervoso como jaacute propomos poderia servir de base inclusive de natureza

epistemoloacutegica para as abordagens bioloacutegicas segundo a classificaccedilatildeo de

Sternberg

Em se tratando da psicologia cognitiva parece-nos que a utilizaccedilatildeo dos

modelos mentais de Johnson-Laird estariam a ilustrar o refluxo do intelecto em suas

trecircs operaccedilotildees na imaginaccedilatildeo (as representaccedilotildees mentais as possibilidades etc)

872

GOTTFRESON 1997 p 13 873

WECHSLER 1944 p 3 874

STERN 1914 p 3

192

na memoacuteria e na reminiscecircncia (o recurso voluntaacuterio ou natildeo agravequelas) e na cogitativa

(apreendendo comparando e combinando as imagens e as intenccedilotildees relacionadas)

No que toca agraves demais abordagens cognitivas as habilidades ndash como as da

teoria triaacuterquica do proacuteprio Sternberg por exemplo as contextuais que dizem

respeito agraves interaccedilotildees com o ambiente em si como a de adaptaccedilatildeo ndash seriam

elencadas indicando-se se estariam relacionadas aos sentidos internos e a quais

ou ao intelecto e aqui ou ao intelecto praacutetico ou ao especulativo e assim tambeacutem

com as chamadas inteligecircncias muacuteltiplas de Gardner e a chamada inteligecircncia

emocional de Goleman e Salovey e Mayer Estas sob a oacuteptica aristoteacutelico-tomista

sugerimos natildeo caracterizariam inteligecircncia no sentido proacuteprio mas modalidades de

efeitos da expressatildeo desta e mesmo da cogitativa conforme o caso

Por fim esta mesma aplicaccedilatildeo poder-se-ia fazer em relaccedilatildeo agraves teorias na

abordagem psicomeacutetrica identificando-se a que cada um dos fatores propostos

estaria associado ou seja e mais uma vez se aos sentidos internos e a quais ou

ao intelecto praacutetico ou ao especulativo O raciociacutenio indutivo de Thurstone por

exemplo caracterizaria em princiacutepio o intelecto especulativo enquanto que os trecircs

tipos de inteligecircncia de Thorndike (social mecacircnica e abstrata) estariam em

princiacutepio associados ao intelecto especulativo e ao praacutetico jaacute que tratam de

aprendizado e administraccedilatildeo de relaccedilotildees

As divergecircncias na definiccedilatildeo de inteligecircncia satildeo demasiado intensas

considerando-se sobretudo o caraacuteter quantitativo No entanto como se observou

estatildeo sempre presentes nesses estudos as distinccedilotildees do aristotelismo-tomismo que

discrimina os sentidos internos dos animais e dos humanos e a intelecccedilatildeo

pertencente a estes e parece-nos que elas poderiam fornecer as devidas bases

para uma jornada de natureza consensual facilitando processos de delimitaccedilatildeo

algo que exigiria pesquisas futuras Pensamos que estas estariam ao mesmo tempo

prestando um contributo para o desenvolvimento do que abordamos aqui sobre a

inteligecircncia no homem e nos demais animais

Em relaccedilatildeo a estes como dissemos natildeo encontramos no presente trabalho

sinais de memoacuteria voluntaacuteria e imaginaccedilatildeo voluntaacuteria nem algo que caracterizasse a

apreensatildeo de universais Se as duas primeiras tivessem sido apontadas teriacuteamos

verificado a presenccedila de cogitativa e se a terceira o tivesse sido teriacuteamos deparado

com intelecccedilatildeo Se por um lado muitos animais apresentam sentidos externos e

inclusive alguns sentidos internos como a memoacuteria mais acurados do que os do

193

homem por outro nos eacute notoacuteria e soou-nos como sendo um consenso a

superioridade da faculdade intelectiva humana caracterizada pelo exerciacutecio da

razatildeo que possibilita profundas elucubraccedilotildees como as de Bachelard que citamos no

iniacutecio deste estudo que possibilita a formulaccedilatildeo de conceitos e de juiacutezos complexos

a construccedilatildeo de silogismos construccedilotildees especulativas complexas etc a partir da

abstraccedilatildeo tal como visto tambeacutem em outras citaccedilotildees aqui presentes como as de

Hume quando aponta as limitaccedilotildees da inteligecircncia nos animais natildeo humanos a de

Descartes quando diz que estes natildeo raciocinam e os compara a maacutequinas a de

Darwin ao dizer que os animais natildeo fazem reflexotildees e abstraccedilotildees no que tambeacutem

concordam Lloyd Thorndike e os demais

Os trabalhos que analisamos assim como estes autores em geral por

estarem ancorados na experiecircncia atribuem memoacuteria e imaginaccedilatildeo aos animais e

descrevem de algum modo a estimativa ao atribuir-lhes certa voluntariedade

capacidade de tomada de decisatildeo de estabelecimento de associaccedilotildees da

plasticidade de origem natural ou artificial mencionada por Lloyd que levam a certos

tipos de inferecircncias

Como se viu os behavioristas como Pavlov e Skinner seguem a ideia de

Darwin de que natildeo haveria barreiras naturais intransponiacuteveis entre a condiccedilatildeo

intelectiva humana e tudo aquilo que participa da inteligecircncia dos demais animais O

aristotelismo-tomismo apresenta um vieacutes mais principial partindo de premissas

ontoloacutegicas ou metafiacutesicas e aponta em outro sentido

As observaccedilotildees que fizemos aqui aleacutem de reforccedilarem a hipoacutetese central de

que sua aplicaccedilatildeo no entendimento da chamada inteligecircncia animal poderaacute ajudar a

estabelecer limites e pontos de partida para a compreensatildeo da inteligecircncia inclusive

a humana de natureza ainda mais complexa levaram-nos a emitir outras sugestotildees

para futuros estudos e eacute possiacutevel que tenham aberto uma ou mais frentes de

pesquisa de natureza interdisciplinar e inclusive etoloacutegica psicoloacutegica e quiccedilaacute

relacionadas a outras aacutereas

Por um lado natildeo encontramos um trabalho que reuacutena todas as informaccedilotildees

para a construccedilatildeo da doutrina psicoloacutegica aristoteacutelico-tomista que se encontra

dispersa na obra de Aristoacuteteles e Tomaacutes de Aquino razatildeo pela qual tentamos expocirc-

la de modo que possa vir a ser futuramente complementada

Por outro tentamos organizar as habilidades dos animais observadas nos

estudos bem como os testes empregados para avaliaacute-las sugerindo o

194

desenvolvimento de uma sistematizaccedilatildeo algo que ateacute o momento soacute vimos

esboccedilado no sumaacuterio e consequentemente na organizaccedilatildeo de algumas obras875

E como desenvolvimento direto da proposta central deste trabalho

apontamos para a sequecircncia na verificaccedilatildeo da viabilidade de associaccedilatildeo entre o

aristotelismo-tomismo e os estudos no campo da inteligecircncia humana e dos animais

natildeo humanos visando a futuras construccedilotildees nessas duas vertentes o que incluiria

estudos envolvendo a comparaccedilatildeo entre a inteligecircncia das crianccedilas e a dos animais

com base na psicologia de Aristoacuteteles e Tomaacutes de Aquino a tentativa insistimos de

identificaccedilatildeo no sistema nervoso sob as perspectivas humana e comparada dos

elementos cognitivos que compotildeem essa doutrina dos dois filoacutesofos etc Esse

processo inclusive desde jaacute sugerimos poderaacute contribuir para a formulaccedilatildeo de

novas hipoacuteteses que poderatildeo trazer esclarecimentos para problemas tatildeo atuais de

natureza fisioloacutegica conceitual etc como os que envolvem os processos de

tomada de decisatildeo bem como aquilo que se entende por consciecircncia a partir da

formulaccedilatildeo de abordagens de natureza epistemoloacutegica cuja aplicaccedilatildeo poderaacute

inclusive ser testada como meio para resoluccedilatildeo de questotildees estruturais internas e

externas das disciplinas relacionadas dada as bases da doutrina que se estruturam

sobre princiacutepios evidentes

Isto que se acaba de dizer pode ser mais bem visualizado no esquema da

paacutegina seguinte

875

Cf por exemplo SHETLLEWORTH 2010

195

Figura 1 - Esquema de sugestotildees para pesquisas futuras

Classificaccedilatildeo dos tipos de habilidade

Sequecircncia da coleta integral de dados

para composiccedilatildeo da doutrina psicoloacutegica aristoteacutelico-tomista

Estudos comparados da

inteligecircncia

Aristotelismo-tomismo

Sequecircncia da

investigaccedilatildeo sobre

compatibilidade entre

psicologia aristoteacutelico-

tomista e demais

estudos sob a oacuteptica

humana e comparada

TESE

Localizaccedilatildeo anatocircmica e

fisioloacutegica dos sentidos

internos no sistema nervoso

Aplicaccedilatildeo da psicologia

aristoteacutelico-tomista a esses

estudos

Estudos comparativos evolvendo a

estimativa dos animais e a das

crianccedilas humanas

Classificaccedilatildeo dos tipos de teste

Busca por soluccedilatildeo de questotildees conceituais de organizaccedilatildeo interna e externa das disciplinas envolvidas etc e de problemas de natureza

conceitual fisioloacutegica psicoloacutegica etc como os que envolvem a consciecircncia a tomada de decisatildeo etc

Estudos comparativos evolvendo a

estimativa dos animais e a

cogitativa e a intelecccedilatildeo

196

Esperamos assim ter conseguido contribuir com mais uma etapa para

corroborar a validade da psicologia de Aristoacuteteles e Tomaacutes de Aquino sob uma

perspectiva comparada e delinear satisfatoriamente algumas bases para a

realizaccedilatildeo de futuros estudos de natureza interdisciplinar que tenham como

estrutura a fusatildeo entre esse acircmbito principial da doutrina dos dois filoacutesofos e as

hipoacuteteses formuladas dentro das linhas de pesquisa aqui apresentadas o que nos

parece estar no acircmago da proposta da subalternaccedilatildeo das ciecircncias a qual assim

cremos jamais deveria ter sido negligenciada

197

REFEREcircNCIAS

ADES C O morcego outros bichos e a questatildeo da consciecircncia animal Psicologia USP Satildeo Paulo v 8 n 2 1997 ALLEN M SCHWARTZ B L Mirror self-recognition in a gorilla (Gorilla gorilla gorilla) 2007 29 f Dissertaccedilatildeo (Mestrado em Psicologia) ndash Florida International University Miami 2007 AMSTERDAM B Mirror self‐image reactions before age two Developmental Psychobiology v 5 n 4 p 297-305 1972 ANDERSON A Semantic and social-pragmatic aspects of meaning in task-oriented dialogue 1983 619 f Tese (Doutorado em Filosofia) ndash University of Glasgow Glasgow 1983 ANDERSON J R A primatological perspective on death American Journal of Primatology v 73 n 5 p 410-414 2011 ANGIONI L Sobre a relaccedilatildeo entre mateacuteria e forma na constituiccedilatildeo da essecircncia sensiacutevel em Aristoacuteteles Cadernos de Histoacuteria e Filosofia da Ciecircncia seacuterie 3 Campinas v 7 n 2 p 209-251 1997 ANGIONI L ldquoNatildeo ser dito de um subjacenterdquo ldquoum istordquo e ldquoseparadordquo o conceito de essecircncia como subjacente e forma (Z-3) Cadernos de Histoacuteria e Filosofia da Ciecircncia seacuterie 3 Campinas v 8 n esp p 69-126 1998 ALLMAN J M WATSON K K TETREAULT N A HAKEEM A Y Intuition and autism a possible role for Von Economo neurons Trends in Cognitive Sciences v 9 n 8 p 367-373 2005 ARISTOacuteTELES Das Categorias (Oacuterganon) Traduccedilatildeo notas e comentaacuterios de Maacuterio Ferreira dos Santos 2 ed Satildeo Paulo Editora Matese 1965 171 p ARISTOacuteTELES Investigacioacuten sobre los Animales Madrid Editorial Gredos 1992 612 p ARISTOacuteTELES Fiacutesica Madrid Editorial Gredos 1995a 506 p ARISTOacuteTELES Analiacuteticos segundos In Tratados de Loacutegica (Oacuterganon) II Madrid Editorial Gredos 1995b 460 p ARISTOacuteTELES Eacutetica Nicomaacutequea In ______ Eacutetica nicomaacutequea eacutetica eudemia Madrid Editorial Gredos 1998a 561 p ARISTOacuteTELES Eacutetica Eudemia In ______ Eacutetica nicomaacutequea eacutetica eudemia Madrid Editorial Gredos 1998b 561 p

198

ARISTOacuteTELES Metafiacutesica In REALE G (org) Metafiacutesica texto grego com traduccedilatildeo ao lado 2 ed Satildeo Paulo Ed Loyola 2005 v II 696 (xiv) p ARISTOacuteTELES Sobre a Alma Lisboa Centro de Filosofia da Universidade de Lisboa 2010 143 p (Coleccedilatildeo Obras Completas de Aristoacuteteles Biblioteca de Autores Claacutessicos Imprensa Nacional-Casa da Moeda) BACHELARD G A Chama de uma Vela Rio de Janeiro Ed Bertrand Brasil 1989 112 p BALIBAR E Consciousness conscience awareness In CASSIN B Dictionary of untranslatables a philosophical lexicon Princeton Princeton University Press 2004 1299 p BATES L A et al Do elephants show empathy Journal of Consciousness Studies v 15 n 10-11 p 204-225 2008 BEARZI G et al Whale and dolphin behavioural responses to dead conspecifics Zoology v 128 p 1-15 jun 2018 BECHARA A DAMASIO H TRANEL D DAMASIO A R Deciding advantageously before knowing the advantageous strategy Science v 275 n 5304 p 1293-1295 1997 BELYAEV D K Destabilizing selection as a factor in domestication Journal of Heredity v 70 n 5 p 301-308 1979 BIRO D MATSUZAWA T Numerical ordering in a chimpanzee (Pan troglodytes) Planning executing and monitoring Journal of Comparative Psychology v 113 n 2 p 178 1999 BOESCH C The effects of leopard predation on grouping patterns in forest chimpanzees Behaviour v 117 n 3 p 220-241 1991 BOESCH C Innovation in wild chimpanzees (Pan troglodytes) International Journal of Primatology v 16 n 1 p 1-16 1995 BOESCH C The emergence of cultures among wild chimpanzees In RUNCIMAN W G J SMITH M DUNBAR R I M (ed) Proceedings-British Academy New York Oxford University Press 1996 p 251-268 BOESCH C Is culture a golden barrier between human and chimpanzee Evolutionary Anthropology Issues News and Reviews v 12 n 2 p 82-91 2003 BOESCH C BOESCH H Tool use and tool making in wild chimpanzees Folia Primatologica v 54 n 1-2 p 86-99 1990 BOESCH C TOMASELLO M Chimpanzee and human cultures Current Anthropology v 39 n 5 p 591-614 1998

199

BOTIGUEacute L R et al Ancient European dog genomes reveal continuity since the early Neolithic Nature Communications v 8 p 16082 2017 BOUCHARD J GOODYER W LEFEBVRE L Social learning and innovation are positively correlated in pigeons (Columba livia) Animal Cognition v 10 n 2 p 259-266 2007 BOYSEN S T BERNTSON G G Numerical competence in a chimpanzee (Pan troglodytes) Journal of Comparative Psychology v 103 n 1 p 23 1989 BRITISH BROADCASTING CORPORATION Are crows the ultimate problem solvers [S l s n] 2014 1 video (4 min) Publicado pela BBC Health Disponiacutevel em wwwbbccoukprogrammesp01r0md3 httpswwwyoutubecomwatchv =cbSu2PXOTOc Acesso em 13 out 2018 BROSNAN S F DE WAAL F B Monkeys reject unequal pay Nature v 425 n 6955 p 297 2003 BROWN C Fish intelligence sentience and ethics Animal Cognition v 18 n 1 p 1-17 2015 BUGNYAR T REBER S A BUCKNER C Ravens attribute visual access to unseen competitors Nature Communications v 7 p 10506 2016 BURGHARDT G M BEKOFF M Animal consciousness In BAYNE T CLEEREMANS A WILKEN P (ed) The Oxford companion to consciousness Oxford UK Oxford University Press 2009 p 39-42 BUSNEL R G Symbiotic relationship between man and dolphins Transactions of the New York Academy of Sciences v 35 n 2 Series II p 112-131 1973 BUTTI C et al Total number and volume of Von Economo neurons in the cerebral cortex of cetaceans Journal of Comparative Neurology v 515 n 2 p 243-259 2009 BYRNE R A KUBA M GRIEBEL U Lateral asymmetry of eye use in Octopus vulgaris Animal Behaviour v 64 n 3 p 461-468 2002 BYRNE R W BATES L MOSS C J Elephant cognition in primate perspective Comparative Cognition amp Behavior Reviews v 4 p 65-79 2009 CALDEROacuteN A Umbrales de la filosofia cuatro introducciones tomistas Mendoza Ediccedilatildeo do autor 2011 519 p CALL J BRAumlUER J KAMINSKI J TOMASELLO M Domestic dogs (Canis familiaris) are sensitive to the attentional state Journal of Comparative Psychology v 117 n 3 p 257-263 2003

200

CAMMAERTS TRICOT M C CAMMAERTS R Are ants (Hymenoptera Formicidae) capable of self recognition Journal of Science v 5 n 7 p 521-532 2015 CAMPAN R Histoire de LEacutethologie repeacuteres chronologiques In ENCYCLOPAEDIA Universalis Toulouse [s n] [2018] Disponiacutevel em httpswwwuniversalisfr encyclopediehistoire-de-l-ethologie-reperes-chronologiques Acesso em 15 jan 2019 CARVALHO NETO M B MAYER P C M Skinner e a assimetria entre reforccedilamento e puniccedilatildeo Acta Comportamentalia Guadalajara v 19 n 4 2011 CHALMERS D J La mente consciente em busca de una teoriacutea fundamental Barcelona Gedisa Editorial 1999 CHERNISS C Intelligence Emotional In SPIELBERGER C (ed) Encyclopedia Of aplied psychology Amsterdan [s n] 2004 p 321-328 COLBERT-WHITE E N et al Can dogs use vocal intonation as a social referencing cue in an object choice task Animal Cognition v 21 n 2 p 253-265 2018 COLLEacute G La Meacutetaphysique ndash Livre Ier ndash Traduction et Commentaire Collection Traductions et Eacutetudes Institut Supeacuterieur de Philosophie de lrsquoUniversiteacute de Louvain 1912 171 (38) (vi) p COLLETT M CHITTKA L COLLETT T S Spatial memory in insect navigation Current Biology v 23 n 17 R789-R800 2013 COLLETT T S GRAHAM P Insect navigation do honeybees learn to follow highways Current Biology v 25 n 6 R240-R242 2015 CONSCIEcircNCIA In Dicionaacuterio Online Caldas Aulete Rio de Janeiro Lexikon Editora Digital 2008 Disponiacutevel em wwwauletecombr Acesso em 10 ago 2017 CONSCIEcircNCIA In Dicionaacuterio Priberam da Liacutengua Portuguesa Lisboa Priberam Informaacutetica 1998 Disponiacutevel em httpswwwpriberamptdlpo Acesso em 10 ago 2017 COREN S The Intelligence of Dogs a guide to the thoughts emotions and inner lives of our canine companions New York Free Press 2006 301 (xiii) p COTTINGHAM J ldquoA brute to the brutesrdquo Descartes treatment of animals Philosophy v 53 n 206 p 551-559 1978 COWAN R B Short-term memory for behavior in the bottlenosed dolphin (Tursiops truncatus) 2003 Dissertaccedilatildeo (Mestrado) ndash University of Hawaii Honolulu 2003 DALE R PLOTNIK J M Elephants know when their bodies are obstacles to success in a novel transfer task Scientific Reports 7 2017

201

DAMAacuteSIO A Sentir lo que sucede cuerpo y emocioacuten en la faacutebrica de la consciencia Santiago Editorial Andres Bello 2000 414 p DAMAacuteSIO A O misteacuterio da consciecircncia Satildeo Paulo Companhia das Letras 1999 DAMATO M R COLOMBO M Serial learning with wild card items by monkeys (Cebus apella) Implications for knowledge of ordinal position Journal of Comparative Psychology v 103 n 3 p 252 1989 DARWIN C R The descent of man and selection in relation to sex 2 ed London John Murray Albemarle Street 1882 693 (xvi) p DARWIN C R El Origen del Hombre la seleccioacuten natural y la sexual F Sempere Y Cordf Editores Valencia s d a) (aprox 1909) 195 p (a paginaccedilatildeo natildeo eacute original) Disponiacutevel em httpsmedicinaufmeduimages77cElorigendelhombre_POR _CHARLES_DARWINpdf Acesso em 13 set 2018 DARWIN C R La Expresioacuten de las Emociones en el Hombre y em los Animales F Sempere Y Cordf Editores Valencia sd b) v 1 255 p Disponiacutevel em httpfondos digitalesusesmediabooks3247la-expresion-de-las-emociones-en-el-hombre-y-en-los-animalespdf Acesso em set 2018 DEACON T W The symbolic species the co-evolution of language and the brain New York W W Norton amp Company 1997 527 p DE LIBERA A Intellectus In CASSIN B Dictionary of untranslatables a philosophical lexicon Princeton Princeton University Press 2004 1299 p DE MOURA NEVES M H A teoria linguiacutestica em Aristoacuteteles Alfa Marilia v 25 p 57-67 1981 DEWSBURY D A John B Watsonrsquos early work and comparative psychology Revista Mexicana de Anaacutelisis de la Conducta v 39 n 2 2013 DOUGLAS-HAMILTON I HILLMAN A K K Elephant carcasses and skeletons as indicators of population trends In GRIMSDELL JJR WESTLEY S Low level aerial survey techniques Nairobi ILCA 1981 p 113-129 (Monograph 4) DOUGLAS-HAMILTON I BHALLA S WITTEMYER G VOLLRATH F Behavioural reactions of elephants towards a dying and deceased matriarch Aplied Animal Behaviour Science v 100 n 1-2 p 87-102 2006 DWECK C S LEGGETT E L A social-cognitive aproach to motivation and personality Psychological Review v 95 n 2 p 256-273 1988 DYER F C Spatial cognition and navigation in insects In REAL L Behavioral mechanisms in evolutionary ecology Chicago University of Chicago Press 1994 p 66-98 471 p

202

ECHAVARRIacuteA M La Praacutexis de la Psicologia y sus niveles epistemoloacutegicos seguacuten Santo Tomaacutes de Aquino Argentina Editorial UCALP 2009

EIBL‐EIBESFELDT I Uumlber den Werkzeuggebrauch des Spechtfinken Camarhynchus pallidus (Sclater und Salvin) Ergebnisse der Galapagos‐Expedition des internationalen Institutes fuumlr submarine Forschung Vaduz (Liechtenstein) Zeitschrift fuumlr Tierpsychologie v 18 n 3 p 343-346 1961 EMERY N J Cognitive ornithology the evolution of avian intelligence Philosophical Transactions of the Royal Society of London B Biological Sciences v 361 n 1465 p 23-43 2006 EMERY N J CLAYTON N S The mentality of crows convergent evolution of intelligence in corvids and apes Science v 306 n 5703 p 1903-1907 2004 FAGOT J MAUGARD A Analogical reasoning in baboons (Papio papio) flexible reencoding of the source relation depending on the target relation Learning amp Behavior v 41 n 3 p 229-237 2013 FEUERBACHER E N A history of dogs as subjects in north american experimental psychological research Cognition and Behavior Review University of Florida and Kyung Hee University v 6 p 46-71 2011 FEUERBACHER E N ROSALES-RUIZ J Can dogs learn concepts the same way we do Concept formation in a German Shepherd International Journey of Comparative Psychology 30 p 1-25 2017 FIORITO G VON PLANTA C SCOTTO P Problem solving ability of Octopus vulgaris Lamarck (Mollusca Cephalopoda) Behavioral and Neural Biology v 53 n 2 p 217-230 1990 FIORITO G SCOTTO P Observational learning in Octopus vulgaris Science v 256 n 5056 p 545-547 1992 FOERDER P et al Insightful problem solving in an Asian elephant PloS one v 6 n 8 p e23251 2011 GALLEGOS W L A Teoriacutea de la inteligencia una aproximacioacuten neuropsicoloacutegica desde el punto de vista de Lev Vigotsky Cuadernos de Neuropsicologiacutea v 7 n 1 p 22-37 2013 GALLUP JR G G Chimpanzees self-recognition Science New Series v 167 n 3914 p 86-87 1970 GALLUP JR G G Self-recognition in primates American Psychologist 32 p 329-338 1977 GARDNER R A GARDNER B T Teaching sign language to a chimpanzee Science v 165 n 3894 p 664-672 1969

203

GEORGE M I Thomas Aquinas Meets Nim Chimpsky On the debate about human nature and the nature of other animals The Aquinas Review v 10 p 1-50 2003 GIGNAC G E BATES T C Brain volume and intelligence The moderating role of intelligence measurement quality Intelligence v 64 p 18-29 2017 GILLAN D J PREMACK D WOODRUFF G Reasoning in the chimpanzee I Analogical reasoning Journal of Experimental Psychology Animal Behavior Processes v 7 n 1 p 1 1981 GIRNDT A MEIER T CALL J Task constraints mask great apes ability to solve the trap-table task Journal of Experimental Psychology Animal Behavior Processes v 34 n 1 p 54 2008 GOTTFREDSON L Mainstream Science on Intelligence an editorial with 52 signatories history and bibliography Intelligence Norwood v 24 n 1 spec p 13-23 1997 GRASSMANN S KAMINSKI J TOMASELLO M How two word-trained dogs integrate pointing and naming Animal Cognition v 15 n 4 p 657-665 2012 GRENE M Aristotle and modern biology Journal of the History of Ideas v 33 n 3 p 395-424 1972 GRIFFIN D R Animal minds Chicago University of Chicago Press 1994 310 (x) p HAKEEM A Y et al Von Economo neurons in the elephant brain The Anatomical Record Advances in Integrative Anatomy and Evolutionary Biology v 292 n 2 p 242-248 2009 HAMPTON R R Rhesus monkeys know when they remember Proceedings of the National Academy of Sciences v 98 n 9 p 5359-5362 2001 HARE B et al The domestication hypothesis for dogs skills with human communication a response to Udell et al(2008) and Wynne et al(2008) Animal Behaviour 79 p e1-e6 2010 HARE B TOMASELLO M Human-like social skills in dogs Trends in Cognitive Sciences v 9 n 9 p 439-444 2005 HARE B Domestic dogs use humans as tools In BEKOFF M (ed) Encyclopedia of animal behaviour Connecticut Greenwood Press 2004 v 1 p 277-285 HARE B BROWN M WILLIAMSON C TOMASELLO M The domestication of social cognition in dogs Science v 298 n 5598 p 1634-1636 2002 HART B L HART L A PINTER-WOLLMAN N Large brains and cognition Where do elephants fit in Neuroscience and Biobehavioral Reviews v 32 n 1 p 86-98 2008

204

HART L A The Asian elephants-driver partnership the drivers perspective Aplied Animal Behaviour Science v 40 n 3 p 297-312 1994 HEANEY M GRAY R D TAYLOR A H Keas perform similarly to chimpanzees and elephants when solving collaborative tasks PloS one v 12 n 2 p e0169799 2017 HEDWIG D et al Acoustic structure and variation in mountain and western gorilla close calls a syntactic aproach Behaviour v 151 n 8 p 1091-1120 2014 HERMAN L M RICHARDS D G WOLZ J P Comprehension of sentences by bottlenosed dolphins Cognition v 16 n 2 p 129-219 1984 HERMAN L M FORESTELL P H Reporting presence or absence of named objects by a language-trained dolphin Neuroscience amp Biobehavioral Reviews v 9 n 4 p 667-681 1985 HERMAN L M Cognition and language competencies of bottlenosed dolphins In SCHUSTERMAN R J THOMAS J WOOD F G (ed) Dolphin cognition and behavior a comparative aproach Hillsdale NJ Lawrence Erlbaum Associates 1986 p 221-251 HERMAN L M MORREL-SAMUELS P PACK A A Bottlenosed dolphin and human recognition of veridical and degraded video displays of an artificial gestural language Journal of Experimental Psychology General v 119 n 2 p 215-230 1990 HERMAN L M KUCZAJ S III HOLDER M D Responses to anomalous gestural sequences by a language-trained dolphin Evidence for processing of semantic relations and syntactic information Journal of Experimental Psychology General v 122 n 2 p 184-194 1993a HERMAN L M PACK A A MORREL-SAMUELS P Representational and conceptual skills of dolphins In ROITBLAT H R HERMAN L M NACHTIGALL P (ed) Language and communication comparative perspectives Hillside NJ Lawrence Erlbaum 1993b p 273-298 HERMAN L M et al Dolphins (Tursiops truncatus) comprehend the referential character of the human pointing gesture Journal of Comparative Psychology v 113 n 4 p 1-18 1999 HERMAN L et al The bottlenosed dolphinrsquos (Tursiops truncatus) understanding of gestures as symbolic representations of its body parts Animal Learning and Behavior v 29 n 3 p 250-264 2001 HERMAN L M Vocal social and self-imitation by bottlenosed dolphins In NEHANIV C DAUTENHAHN K (ed) Imitation in animals and artifacts Cambridge MA MIT Press 2002 p 63-108

205

HERMAN L M Intelligence and rational behaviour in the bottlenosed dolphin In HURLEY S NUDDS M (ed) Rational Animals Oxford Oxford University Press 2006 p 439-467 HERMAN L M Body and self in dolphins Consciousness and Cognition v 21 n 1 p 526-545 2012 HIRATA S WATANABE K MASAO K ldquoSweet-potato washingrdquo revisited In Primate origins of human cognition and behavior Tokyo Springer 2008 p 487-508 HOFFMAN T Conscience and Synderesis In DAVIES B STUMP E (ed) The Oxford Handbook of Aquinas Oxford Oxford University Press 2012 p 255-264 HUME D Investigaccedilatildeo acerca do entendimento humano [S l] Ed Acroacutepolis 2001 [1748] Versatildeo para e-book de eBooksBrasil 2006 252 p HUNT G R GRAY R D Diversification and cumulative evolution in New Caledonian crow tool manufacture Proceedings of the Royal Society of London B Biological Sciences v 270 n 1517 p 867-874 2003 INFORMACcedilAtildeO In Dicionaacuterio online Caldas Aulete Rio de Janeiro Lexikon Editora Digital 2008 Disponiacutevel em wwwauletecombr Acesso em 10 ago 2017 INFORMACcedilAtildeO In Dicionaacuterio Priberam da Liacutengua Portuguesa Lisboa Priberam Informaacutetica 1998 Disponiacutevel em httpswwwpriberamptdlpo Acesso em 10 ago 2017 INFORMAR In Dicionaacuterio Online Caldas Aulete Lexikon editora digital Rio de Janeiro 2008 Disponiacutevel em wwwauletecombr Acesso em 10 ago 2017 INFORMAR In Dicionaacuterio Priberam da Liacutengua Portuguesa Lisboa Priberam Informaacutetica 1998 Disponiacutevel em httpswwwpriberamptdlpo Acesso em 10 ago 2017 INOUE S MATSUZAWA T Working memory of numerals in chimpanzees Current Biology v 17 n 23 p R1004-R1005 2007 INTELIGEcircNCIA In Dicionaacuterio Online Caldas Aulete Rio de Janeiro Lexikon Editora Digital 2008 Disponiacutevel em wwwauletecombr Acesso em 10 ago 2017 INTELIGEcircNCIA In Dicionaacuterio Priberam da Liacutengua Portuguesa Lisboa Priberam Informaacutetica 1998 Disponiacutevel em httpswwwpriberamptdlpo Acesso em 10 ago 2017 IRIE-SUGIMOTO N et al Evidence of meansndashend behavior in Asian elephants (Elephas maximus) Animal Cognition v 11 n 2 p 359-365 2008 IRIE-SUGIMOTO N KOBAYASHI T SATO T HASEGAWA T Relative quantity judgment by Asian elephants (Elephas maximus) Animal Cognition v 12 n 1 p 193-199 2009

206

IRIE N HASEGAWA T Elephant psychology what we know and what we would like to know Japanese Psychological Research v 51 n 3 p 177-181 2009 ISERBYT C T The Deliberate Dumbing Down of America 2 ed Ohio Conscience Press 2000 709 (xxvii) p JACOBS B et al Neuronal morphology in the African elephant (Loxodonta africana) neocortex Brain Structure and Function v 215 n 3-4 p 273-298 2011 JACOBS M S MCFARLAND W L MORGANE P J The anatomy of the brain of the bottlenose dolphin (Tursiops truncatus) Rhinic lobe (rhinencephalon) the archicortex Brain Research Bulletin v 4 p 1-108 1979 JELBERT S A et al Using the Aesops fable paradigm to investigate causal understanding of water displacement by New Caledonian crows PloS one v 9 n 3 p e92895 2014 JELBERT S A HOSKING R J TAYLOR A H GRAY R D Mental template matching is a potential cultural transmission mechanism for New Caledonian crow tool manufacturing traditions Scientific Reports v 8 n 1 p 8956 2018 JERISON H Evolution of the Brain and Intelligence New York Academic Press 1973 482 (xiv) p JOHNSON‐LAIRD P N Mental models in cognitive science Cognitive Science v 4 n 1 p 71-115 1980 JOHNSON-LAIRD Philip N Mental models and cognitive change Journal of Cognitive Psychology v 25 n 2 p 131-138 2013 JOHNSTON A M HOLDEN P C SANTOS L R Exploring the evolutionary

origins of overimitation a comparison across domesticated and non‐domesticated canids Developmental Science v 20 n 4 p e12460 2017 JOumlRGENSEN S Empathy altruism and the African elephant Monografia apresentada no Veterinaumlrprogrammet [Programa de Veterinaacuteria] do Institutionen foumlr biomedicin och veterinaumlr folkhaumllsovetenskap [Departamento de Biomedicina e Ciecircncias da Sauacutede Veterinaacuteria] da Sveriges lantbruksuniversitet 2015 KAMINSKI J CALL J FISCHER J Word Learning in a domestic dog evidence for fast maping Science v 304 p 1682-1683 2004 KAMINSKI J FISCHER J CALL J Prospective object search in dogs mixed evidence for knowledge of what and where Animal Cognition v 11 n 2 p 367-371 2008 KAWAI N MATSUZAWA T Numerical memory span in a chimpanze Nature v 403 p 6765 2000a

207

KAWAI N MATSUZAWA T A conventional aproach to chimpanzee cognition Response to MD Hauser (2000) Trends in cognitive sciences v 4 n 4 p 128-129 2000b KELLOGG W N KELLOGG L A The ape and the child a study of environmental influence upon early behavior Facsimile da ediccedilatildeo de McGraw-Hill Book Company Inc (1933) Hafner Publishing Company Inc New York 1967 341 (xv) p KENNEDY E H FRAGASZY D M Analogical reasoning in a capuchin monkey (Cebus apella) Journal of Comparative Psychology v 122 n 2 p 167 2008 KENNY A Aquinas on Mind Topics in Medieval Philosophy Routledge Londres 1994 182 (viii) p KOumlHLER W The mentality of apes 2 ed reimp 1931 New York Kegan Paul Trench Trubner amp Co 1927 336 (viii) p KOPS A M et al Characterizing the socially transmitted foraging tactic ldquospongingrdquo by bottlenose dolphins (Tursiops sp) in the western gulf of Shark Bay Western Australia Marine Mammal Science v 30 n 3 p 847-863 2014 KORNELL N Where is the ldquometardquo in animal metacognition Journal of Comparative Psychology v 128 n 2 p 143 2014 KOVAacuteCS Aacute MATHER J A Cephalopod cognition scholastic psychology Res Cogitans v 1 n 5 p 23-38 2008 KRUumlTZEN M et al Cultural transmission of tool use by Indo-Pacific bottlenose dolphins (Tursiops sp) provides access to a novel foraging niche Proceedings of the Royal Society of London B Biological Sciences v 281 n 1784 p 20140374 2014 KUKEKOVA A V et al The genetics of domesticated behavior in canids What can dogs and silver foxes tell us about each other Cold Spring Harbor Monograph Series v 44 p 515 2006 LAKATOS G DOacuteKA A MIKLOacuteSI Aacute The role of visual cues in the comprehension of the human pointing signals in dogs International Journal of Comparative Psychology v 20 n 4 p 341-350 2007 LAKSHMINARAYANAN V SANTOS L R The Evolution of Our Preferences Insights from Non-human Primates In DOLAN R SHAROT T Neuroscience of Preference and Choice [S l] Academic Press 2011 p 75-91 LALANDE A Vocabulaire technique et critique de la philosophie - Vol I A-M 4 ed [S l] Societeacute Franccedilaise de Philosophie 1932 499 (xviii) p LALANDE A Vocabulaire technique et critique de la philosophie - Vol II N-Z 4 ed [S l] QuadrigePUF Societeacute Franccedilaise de Philosophie 1997 665 p LE COADIC Y F A Ciecircncia da Informaccedilatildeo Brasiacutelia Briquet de Lemos 1996

208

LEFEBVRE L READER S M SOL D Brains innovations and evolution in birds and primates Brain Behavior and Evolution v 63 n 4 p 233-246 2004 LEWIS C S Studies in words 2 ed Cambridge Cambridge University Press 1967 343 p LIVINGSTONE M S SRIHASAM K MOROCZ I A The benefit of symbols monkeys show linear human-like accuracy when using symbols to represent scalar value Animal Cognition v 13 n 5 p 711-719 2010 LIT L SCHWEITZER J B OBERBAUER A M Handler beliefs affect scent detection dog outcomes Animal Cognition v 14 n 3 p 387-394 2011 LLOYD C M Animal life and intelligence London Stanford University Library 1891 512 (xvi) p LOCKE J Ensaio sobre o entendimento humano livro II 27 da identidade e da diversidade Skeacutepsis v 8 n 12 p 169-188 2015 LOCKE P Explorations in Ethnoelephantology Social Historical and Ecological Intersections between Asian Elephants and Humans Environment and Society Advances in Research v 4 n 1 p 79-97 2013 LUNCZ L V MUNDRY R BOESCH C Evidence for cultural differences between neighboring chimpanzee communities Current Biology v 22 n 10 p 922-926 2012 LUNCZ L V BOESCH C Tradition over trend Neighboring chimpanzee communities maintain differences in cultural behavior despite frequent immigration of adult females American Journal of Primatology v 76 n 7 p 649-657 2014 LUNCZ L V BOESCH LUNCZ C LYDIA V The extent of cultural variation between adjacent chimpanzee (Pan troglodytes verus) communities A microecological aproach American Journal of Physical Anthropology v 156 n 1 p 67-75 2015 MACINTYRE A Dependent rational animals why human beings need the virtues Chicago Open Court 2002 MACKINTOSH N Inteligecircncia em evoluccedilatildeo In KHALFA J (org) ROUANET L P (trad) A natureza da inteligecircncia uma visatildeo interdisciplinar [Satildeo Paulo] Ed UNESP 1997 p 33-54 MARTIN-ORDAS G CALL J COLMENARES F Tubes tables and traps great apes solve two functionally equivalent trap tasks but show no evidence of transfer across tasks Animal Cognition v 11 n 3 p 423-430 2008 MARKOWITZ H SCHMIDT M NADAL L SQUIER L Do elephants ever forget Journal of Aplied Behavior Analysis v 8 n 3 p 333-335 1975

209

MATHER J A Cephalopod consciousness behavioural evidence Consciousness and Cognition v 17 n 1 p 37-48 2008 MATHER J A DICKEL L Cephalopod complex cognition Current Opinion in Behavioral Sciences v 16 p 131-137 2017 MATURANA H VARELA F A aacutervore do conhecimento As bases bioloacutegicas do entendimento humano Campinas Editorial Psy 1995 281 p MAYR E The growth of biological thought diversity evolution and inheritance 11 ed London The Belknap Press 2000 974 (xvi) p MCCOMB K et al Leadership in elephants the adaptive value of age Proceedings of the Royal Society of London B Biological Sciences p rspb20110168 2011 MCCOMB K et al Long-distance communication of acoustic cues to social identity in African elephants Animal Behaviour v 65 n 2 p 317-329 2003 MCCOMB K BAKER L MOSS C African elephants show high levels of interest in the skulls and ivory of their own species Biology Letters v 2 n 1 p 26-28 2006 MENZEL R et al Honey bees navigate according to a map-like spatial memory Proceedings of the National Academy of Sciences v 102 n 8 p 3040-3045 2005 MERCADO III E et al Memory for recent actions in the bottlenosed dolphin (Tursiops truncatus) Repetition of arbitrary behaviors using an abstract rule Animal Learning amp Behavior v 26 n 2 p 210-218 1998 MERCADO III E UYEYAMA R K PACK A A HERMAN L M Memory for action events in the bottlenosed dolphin Animal Cognition v 2 n 1 p 17-25 1999 MILES H The cognitive foundations for reference in a signing orangutan In PARKER S T GIBSON K R (ed) ldquoLanguagerdquo and intelligence in monkeys and apes comparative developmental perspectives [Cambridge] Cambridge University Press 1990 p 511-539 MIRBAZEL S K ARJMANDI M Dogsrsquo Nature for Learning Human Languages Journal of Aplied Linguistics and Language Research v 5 n 3 p 247-255 2018 MORGANE P J JACOBS M S MCFARLAND W L The anatomy of the brain of the bottlenose dolphin (Tursiops truncatus) Surface configurations of the telencephalon of the bottlenose dolphin with comparative anatomical observations in four other cetacean species Brain Research Bulletin v 5 n 3 p 1-107 1980 MORRIS D Can jumbo elephants really paint Intrigued by stories naturalist Desmond Morris set out to find the truth Daily Mail Science amp Tech Kensington 22 feb 2009 Disponiacutevel em httpswwwdailymailcouksciencetecharticle-1151283Can-jumbo-elephants-really-paint--Intrigued-stories-naturalist-Desmond-Morris-set-truthhtmlixzz4uUGLEQ2X Acesso em 15 jul 2018

210

MUumlLLER C A et al Dogs learn to solve the suport problem based on perceptual cues Animal Cognition v 17 n 5 p 1071-1080 2014 MUSZALSKI H El objeto formal de la vis cogitativa en Santo Tomaacutes de Aquino Sapientia v 70 fasc 235 2014 NAKAGAKI T KOBAYASHI R NISHIURA Y UEDA T Obtaining multiple separate food sources behavioural intelligence in the Physarum plasmodium Proceedings of the Royal Society of London B Biological Sciences v 271 n 1554 p 2305-2310 2004 NEIL D T Cooperative fishing interactions between Aboriginal Australians and dolphins in eastern Australia Anthrozooumls v 15 n 1 p 3-18 2002 NEISSER U et al Intelligence Knows and Unknows American Psychologist v 51 n 2 p 77-101 1996 NISSANI M Do asian elephants (Elephas maximus) aply causal reasoning to tool-use tasks Journal of Experimental Psychology Animal Behavior Processes v 32 n 1 p 91-96 2006 OSTOJIĆ L CLAYTON N S Behavioural coordination of dogs in a cooperative problem-solving task with a conspecific and a human partner Animal Cognition v 17 n 2 p 445-459 2014 PAL H R PAL A TOURANI P Theories of intelligence Everymanrsquos Science v 39 n 3 p 181-192 2004 PATTERSON F LINDEN E The education of Koko New York The Gorilla Foundation 1981 162 p Disponiacutevel em httpwwwkokoorgsitesdefaultfiles rootpdfsteok_bookpdf Acesso em 20 mar 2017 PAVLOV I P Conditioned reflexes an investigation of physiological activity of the cerebral cortex [S l] Oxford University Press 1927 430 (xv) p PAVLOV I P Textos Escolhidos In MORENO R UFLAKER H A ANDREOLI E O M (trad) Pavlov ndash Skinner 2 ed Satildeo Paulo Abril Cultural 1984 402 (x) p (Coleccedilatildeo Os Pensadores) PENSAMENTO In Dicionaacuterio Online Caldas Aulete Rio de Janeiro Lexikon Editora Digital 2008 Disponiacutevel em wwwauletecombr Acesso em 10 ago 2017 PENSAMENTO In Dicionaacuterio Priberam da Liacutengua Portuguesa Lisboa Priberam Informaacutetica 1998 Disponiacutevel em httpswwwpriberamptdlpo Acesso em 10 ago 2017 PENSAR In Dicionaacuterio Online Caldas Aulete Rio de Janeiro Lexikon Editora Digital 2008 Disponiacutevel em wwwauletecombr Acesso em 10 ago 2017

211

PENSAR In Dicionaacuterio Priberam da Liacutengua Portuguesa Lisboa Priberam Informaacutetica 1998 Disponiacutevel em httpswwwpriberamptdlpo Acesso em 10 ago 2017 PEPERBERG I M Further evidence for addition and numerical competence by a Grey parrot (Psittacus erithacus) Animal Cognition v 15 n 4 p 711-717 2012 PEPERBERG I M Grey parrot numerical competence a review Animal Cognition v 9 n 4 p 377-391 2006 PEPERBERG I M Grey parrots do not always ldquoparrotrdquo the roles of imitation and phonological awareness in the creation of new labels from existing vocalizations Language Sciences v 29 n 1 p 1-13 2007 PERDUE B M TALBOT C F STONE A M BERAN M J Putting the elephant back in the herd elephant relative quantity judgments match those of other species Animal Cognition v 15 n 5 p 955-961 2012 PEREIRA JUacuteNIOR G O ocmentaacuterio de Tomaacutes de Aquino ao livro I do De Anima de Aristoacuteteles ndash Capiacutetulos 1-4 Dissertaccedilatildeo (Mestrado) ndash Instituto de Filosofia e Ciecircncias Humanas Universidade Estadual de Campinas Campinas 2006 PETRAZZINI M E M WYNNE C D What counts for dogs (Canis lupus familiaris) in a quantity discrimination task Behavioural processes v 122 p 90-97 2016 PFUNGST O Clever Hans (The Hors of Mr Von Osten) A contribution to experimental animal and human psychology New York Henry Holt and Company 1911 279 (viii) p PHILLIPS W SANTOS L R Evidence for kind representations in the absence of language Experiments with rhesus monkeys (Macaca mulatta) Cognition v 102 n 3 p 455-463 2007 PIAGET J Psicologia de la Inteligencia Buenos Aires Editorial Psique 1972 231 p PIANIGIANI O Vocabolario etimologico dela lingua italiana ndash vol I A-L Roma Societagrave Editrice Dante Alighieri 1907 789 p PIKA S LIEBAL K CALL J TOMASELLO M Gestural communication of apes Gesture v 5 n 1 p 41-56 2005 PILLEY J W REID A K Border collie comprehends object names as verbal referents Behavioural Processes v 86 n 2 p 184-195 2011 PILLEY J W Border collie comprehends sentences containing a prepositional object verb and direct object Learning and Motivation v 44 n 4 p 229-240 2013 PLOTNIK J M LAIR R SUPHACHOKSAHAKUN W DE WAAL F B Elephants know when they need a helping trunk in a cooperative task Proceedings of the National Academy of Sciences v 108 n 12 p 5116-5121 2011

212

PLOTNIK J M DE WAAL F B Asian elephants (Elephas maximus) reassure others in distress PeerJ v 2 p e278 2014 PLOTNIK J M DE WAAL F B M REISS D Self-recognition in a Asian elephant Proceedings of the National Academy of Sciences v 103 n 45 p 17053-17057 2006 POPER K R A loacutegica da pesquisa cientiacutefica 9 ed [S l] Ed Cultrix 2001 567 p PREMACK D WOODRUFF G Does the chimpanzee have a theory of mind Behavioral and Brain Sciences v 1 n 4 p 515-526 1978 PRIOR H SCHWARZ A GUumlNTUumlRKUumlN O Mirror-induced behavior in the magpie (Pica pica) evidence of self-recognition PLoS Biology v 6 n 8 p e202 2008 PROOPS L GROUNDS K SMITH A V MCCOMB K Current biology v 28 n 9 p 1428-1432 e4 2018 QUINE W V O Word and object [Massachusetts] The Massachusetts Institute of Technology 1960 296 (xvi) p RAFFAELE P Speaking bonobo Smithsonian Magazine v 37 p 74 2006 REALE G Metafiacutesica (Aristoacuteteles) sumaacuterio e comentaacuterios 2 ed Satildeo Paulo Ed Loyola 2005 v 3 754 (xiv) p REALE G ANTISERI D Histoacuteria da filosofia ndash Vol 1 Filosofia antiga e pagatilde 3 ed Satildeo Paulo Ed Paulus 2003 385 (xix) p REALE G ANTISERI D Histoacuteria da filosofia ndash Vol 2 Patriacutestica e escolaacutestica 2 ed Satildeo Paulo Ed Paulus 2005 335 (xvi) p REISS D MARINO L Mirror self-recognition in the bottlenose dolphIn A case of cognitive convergence Proceedings of the National Academy of Sciences v 98 n 10 p 5937-5942 2001 RENSCH B Increase of learning capability with increase of brain-size The American Naturalist v 90 n 851 p 81-95 1956 RENSCH B The intelligence of elephants Scientific American v 196 n 2 p 44-49 1957 ROELOFS Y C Tool use in birds an overview of reported cases ontogeny and underlying cognitive abilities 2010 Tese (Doutorado em Biologia Comportamental) ndash Biological Centre da University of Groningen Groningen 2010 ROMANES G Animal intelligence London Kegan Paul Tranch 1882 520 (xiv) p ROSATI A G SANTOS L R Spontaneous metacognition in rhesus monkeys Psychological Science v 27 n 9 p 1181-1191 2016

213

ROTH G DICKE U Evolution of the brain and intelligence Trends in Cognitive Sciences v 9 n 5 p 250-257 2005 SALOVEY P MAYER J D Emotional intelligence Imagination Cognition and Personality v 9 n 3 p 185-211 1990 SANTOS L R et al Means-means-end tool choice in cotton-top tamarins (Saguinus oedipus) finding the limits on primatesrsquo knowledge of tools Animal Cognition v 8 n 4 p 236-246 2005 SAVAGE-RUMBAUGH S et al Spontaneous symbol acquisition and communicative use by pygmy chimpanzees (Pan paniscus) Journal of Experimental Psychology General v 115 n 3 p 211 1986 SAVAGE-RUMBAUGH E S RUMBAUGH D M BOYSEN S Symbolic communication between two chimpanzees (Pan troglodytes) Science v 201 n 4356 p 641-644 1978 SAVAGE-RUMBAUGH E S et al Language comprehension in ape and child Monographs of the Society for Research in Child Development p i-252 1993 SAVOLAINEN P et al Genetic evidence for an East Asian origin of domestic dogs Science v 298 n 5598 p 1610-1613 2002 SCARF D HAYNE H COLOMBO M Pigeons on par with primates in numerical competence Science v 334 n 6063 p 1664-1664 2011 SCHAIE K W Primary mental abilities In CRAIGHEAD W E NEMEROFF C B (eds) The concise corsini encyclopedia of psychology and behavioral science 3 ed Hoboken NJ Wiley 2004 1112 (viii) p SEARLE J El Redescubrimiento de la Mente Barcelona Ed Criacutetica 1996 269 p SHETTLEWORTH J S Cognition evolution and behavior 2 ed New York Oxford University Press 2010 700 (XIII) p SHOSHANI J KUPSKY W J MARCHANT G H Elephant brain part i gross morphology functions comparative anatomy and evolution Brain Research Bulletin v 70 n 2 p 124-157 2006 SILVA J A Inteligecircncia humana abordagens bioloacutegicas e cognitivas Satildeo Paulo Lovise 2003 247 (xvi) p SIMOtildeES-LOPES P C Interaction of coastal populations of Tursiops truncatus (Cetacea Delphinidae) with the mullet artisanal fisheries in Southern Brazil Biotemas v 4 n 2 p 83-94 1991

214

SKINNER B F Two types of conditioned reflex a reply to Konorski and Miller Journal of General Psychology v 16 p 272-279 1937 Disponiacutevel em httpwwwdominiopublicogovbrdownloadtextops000164pdf Acesso em 20 ago 2018 SKINNER B F The behavior of organisms an experimental analysis New York The Century Psychology Series Apleton-Century Crofts Inc 1938 457 (ix) p SKINNER B F Contingences of reinforcement a theoretical analysis New York The Century Psychology Series Apleton-Century-Crofts Inc 1969 311 p Disponiacutevel em wwwbfskinnerorgwp-contentuploads201407CoRpdf Acesso em 11 ago 2018 SMIRNOVA A ZORINA Z OBOZOVA T WASSERMAN E Crows spontaneously exhibit analogical reasoning Current Biology v 25 n 2 p 256-260 2015 SOLTIS J et al A African elephant alarm calls distinguish between threats from humans and bees PLoS One v 9 n 2 p e89403 2014 STERN W The psychological methods of testing intelligence Baltimore Educational Psychology Monographs Warwick amp York 1914 n 13 160 (x) p STERNBERG R Intelligence in Humans In Encyclopedia Of Aplied Psychology USA p 321-328 2004 743 (xii) p STREET S E NAVARRETE A F READER S M LALAND K N Coevolution of cultural intelligence extended life history sociality and brain size in primates Proceedings of the National Academy of Sciences v 114 n 30 p 7908-7914 2017 SWIFT K N Wild American crows use funerals to learn about danger Tese (Doutorado) ndash The School of Environmental and Forest Sciences Washington University 2015 Disponiacutevel em httpsdigitallibwashingtoneduresearchworks handle177333178 Acesso em 13 set 2018 SZETEI V MIKLOacuteSI Aacute TOPAacuteL J CSAacuteNYI V When dogs seem to lose their nose an investigation on the use of visual and olfactory cues in communicative context between dog and owner Aplied Animal Behaviour Science v 83 n 2 p 141-152 2003 TALLIS R On the Edge of Certainty - Philosophical explorations 10 reimp New York St Martins Press 2010 236 (xvii) p TEBBICH S BSHARY R Cognitive abilities related to tool use in the woodpecker finch Cactospiza pallida Animal Behaviour v 67 n 4 p 689-697 2004 TELES M Mente Humana e Animal as perspectivas de Susanne Langer e Antoacutenio Damaacutesio Philosophica Lisboa v 25 p 147-168 2005

215

TERRACE H S CHEN S NEWMAN A B Serial learning with a wild card by pigeons (Columba livia) Effect of list length Journal of Comparative Psychology v 109 n 2 p 162 1995 THALMANN O et al Complete mitochondrial genomes of ancient canids suggest a European origin of domestic dogs Science v 342 n 6160 p 871-874 2013 THE GORILLA FOUNDATION Disponiacutevel em httpswwwkokoorgkoko-0 Acesso em 10 out 2018 THORNDIKE E L Animal intelligence An experimental study of the associative processes in animals The Psychological Review Monograph Suplements v 2 n 4 p i 1898 THORNDIKE E L Animal intelligence Toronto York University 2007 139 p (Classics in the History of Psychology) Disponiacutevel em httpwwwdominio publicogovbrdownloadtextops000178pdf Acesso em 10 ago 2018 THORNDIKE E L Intelligence and its uses Harpers Magazine 140 p 227-235 1920 TOMAacuteS DE AQUINO Disputed questions on spiritual creatures ndash de spiritualibus creaturis Milwaukee Marquette University Press 1949 187 p TOMAacuteS DE AQUINO Commentary on the Nicomachean ethics Chicago Regnery 1964a 2 v (Library of Living Catholic Thought) Disponiacutevel em httpdhsprioryorg thomasEthicshtm Acesso em 10 mar 2018 TOMAacuteS DE AQUINO Commentary on the metaphysics Chicago Regnery 1964b 2 v (Library of Living Catholic Thought) Disponiacutevel em httpdhsprioryorgthomas Metaphysicshtm Acesso em 25 abr 2017 TOMAacuteS DE AQUINO Questotildees discutidas sobre a verdade In BARAUacuteNA J et al (trad) Santo Tomaacutes de Aquino ndash Dante Satildeo Paulo Nova Cultural 1988 306 p (Coleccedilatildeo Os Pensadores) TOMAacuteS DE AQUINO Suma de Teologia ndash I ndash Introduccioacuten general y parte I 4 ed Madri [s n] 2001 993 (xxxviii) p (Biblioteca de Autores Cristianos) TOMAacuteS DE AQUINO Suma de Teologia ndash III ndash Parte II-II Madri [s n] 1990a 613 (xxvi) p (Biblioteca de Autores Cristianos) TOMAacuteS DE AQUINO Suma de Teologia ndash II ndash Parte I-II 2 ed Madri [s n] 1993 975 (xxxii) p (Biblioteca de Autores Cristianos) TOMAacuteS DE AQUINO Suma Contra os Gentios ndash Volume I Porto Alegre Livraria Sulina 1990b 376 (ix) p

216

TOMAacuteS DE AQUINO Sobre el Principio de Individuacioacuten Cuadernos de Anuario Filosofico Serie Universitaacuteria Universidade de Navarra Pamplona Espanha 1999 105 p TOMAacuteS DE AQUINO Commentaire au traiteacute de lrsquoacircme In THOMAS DrsquoAQUIN Commentaire au traiteacute de lrsquoacircme ndash Aristote Traiteacute de lrsquoacircme Les œuvres complegravetes de saint Thomas dAquin Projet Docteur Angeacutelique Institut Docteur Angeacutelique Eacutedition numeacuterique 2000 Disponiacutevel em httpdocteurangeliquefreefr Acesso em 18 maio 2017 TOMAacuteS DE AQUINO De Principiis Naturae In OS PRINCIacutePIOS da Realidade Natural Porto PT Elementos Sudoeste 2003a TOMAacuteS DE AQUINO De Ente et Essentia In OS PRINCIacutePIOS da Realidade Natural Porto PT Elementos Sudoeste 2003b TOMAacuteS DE AQUINO Sobre os Anjos (De Substantiis Separatis) Rio de Janeiro Ed Seacutetimo Selo 2006 229 (xxiv) p TOMAacuteS DE AQUINO A Unidade do Intelecto contra os averroiacutestas Lisboa Ediccedilotildees 70 2009 205 p TOMAacuteS DE AQUINO Questotildees Disputadas sobre a Alma Satildeo Paulo Eacute Realizaccedilotildees 2012 464 p TOMASELLO M Can an ape understand a sentence A review of language comprehension in ape and child by ES Savage-Rumbaugh et al Language amp Communication v 14 n 4 p 377-390 1994 TOMASELLO M Do young children have adult syntactic competence Cognition v 74 n 3 p 209-253 2000 TOMASELLO M What did we learn from the ape language studies In HARE B YAMAMOTO S Bonobos unique in mind brain and behavior [s n] Oxford University Press 2017 p 95-104 384 p TOMONAGA M MATSUZAWA T ITAKURA S Teaching ordinals to a cardinal-trained chimpanzee Primate Research v 9 n 2 p 67-77 1993 TOMONAGA M MATSUZAWA T Sequential responding to Arabic numerals with wild cards by the chimpanzee (Pan troglodytes) Animal Cognition v 3 n 1 p 1-11 2000 TOURINHO E Z Notas sobre o Behaviorismo de ontem e de hoje Psicologia Reflexatildeo e Criacutetica v 24 n 1 p 186-194 2011 TRUT L N Early canid domestication the farm-fox experiment foxes bred for tamability in a 40-year experiment exhibit remarkable transformations that suggest an interplay between behavioral genetics and development American Scientist v 87 n 2 p 160-169 1999

217

UDELL M A LORD K FEUERBACHER E N WYNNE C D A dogrsquos-eye view of canine cognition In HOROWITZ A Domestic dog cognition and behavior Berlin Springer Science amp Business Media 2014 p 221-240 VAN LOON L C The intelligent behavior of plants Trends in Plant Science v 21 n 4 p 286-294 2016 VAN SCHAIK C Why are some animals so smart Scientific American v 294 n 4 p 64-71 2006 VAN SCHAIK C P PRADHAN G R A model for tool-use traditions in primates implications for the coevolution of culture and cognition Journal of Human Evolution v 44 n 6 p 645-664 2003 VONK J Gorilla (Gorilla gorilla gorilla) and orangutan (Pongo abelii) understanding of first-and second-order relations Animal Cognition v 6 n 2 p 77-86 2003 WANG G-D et al Out of southern East Asia the natural history of domestic dogs across the world Cell Research v 26 n 1 p 21 2016 WECHSLER D Measurement of Adult Intelligence 3 ed Baltimore The Williams amp Wilkins Company 1944 258 (viii) p WEST R E YOUNG R J Do domestic dogs show any evidence of being able to count Animal Cognition v 5 n 3 p 183-186 2002 WHITEHEAD H Sperm whale Physeter macrocephalus In PERRIN W F WUumlRSIG B THEWISSEN J G M (ed) Encyclopedia of Marine Mammals 2 ed [S l] Academic Press 2009 p 1091-1097 WIMPENNY J H et al Cognitive processes associated with sequential tool use in New Caledonian crows PLoS One v 4 n 8 p e6471 2009 WITHEN A et al Cultures in chimpanzees Nature v 399 n 6737 p 682 1999 WITTEMYER G DOUGLAS-HAMILTON I GETZ W M The socioecology of elephants analysis of the processes creating multitiered social structures Animal Behaviour v 69 n 6 p 1357-1371 2005 WITTIG R M BOESCH C ldquoDecision-makingrdquo in conflicts of wild chimpanzees (Pan troglodytes) an extension of the Relational Model Behavioral Ecology and Sociobiology v 54 n 5 p 491-504 2003 WYNN K Addition and subtraction by human infants Nature v 358 n 6389 p 749 1992 XIA L SIEMANN M DELIUS J D Matching of numerical symbols with number of responses by pigeons Animal Cognition v 3 n 1 p 35-43 2000

218

YERKES R M YERKES A W The great apes a study of anthropoid life New Haven Yale University Press 1929 652 (xx) p ZAPPES C A ANDRIOLO A SIMOtildeES-LOPES P C DI BENEDITTO A P M Human-dolphin (Tursiops truncatus Montagu 1821) cooperative fishery and itrsquos influence on cast net fishing activities in Barra de ImbeacuteTramandaiacute Southern Brazil Ocean amp Coastal Management v 54 n 5 p 427-432 2011 ZAPPES C A O golfinho nariz-de-garrafa Tursiops truncatus (Montagu 1821) e a pesca artesanal no Atlacircntico Sul comparaccedilatildeo do conhecimento de pescadores tradicionais 2011 Tese (Doutorado) ndash Universidade Estadual do Norte Fluminense ndash UENF Campos dos Goytacazes 2011 ZIMMERMANN F ZEMKE F CALL J GOacuteMEZ J C Orangutans (Pongo pygmaeus) and bonobos (Pan paniscus) point to inform a human about the location of a tool Animal Cognition v 12 n 2 p 347-358 2009

219

TABELAS

Tabela 1 - Caracteriacutesticas das potecircncias da alma que compotildeem o aparato cognitivo

Potecircncias Animais natildeo humanos Ente humano

Sentidos Externos Sentido Comum Imaginaccedilatildeo Memoacuteria Estimativa Intelecto

Sentem percebem e discriminam seus sensiacuteveis proacuteprios e os comuns que lhes competem Une e julga todos os sensiacuteveis e intenccedilotildees dos sentidos externos Reteacutem e conserva formas sensiacuteveis Conserva e compara as imagens e as espeacutecies intencionais Apreende compotildee e divide e compara imagens e espeacutecies intencionais particulares tem como objeto proacuteprio as quididades particulares Percebe as intenccedilotildees por um instinto natural

Sentem percebem e discriminam seus sensiacuteveis proacuteprios e os comuns que lhes competem Une e julga todos os sensiacuteveis e intenccedilotildees dos sentidos externos Reteacutem e conserva formas sensiacuteveis e compotildee e divide imagens sob refluxo do intelecto Conserva e compara as imagens e as espeacutecies intencionais Reminiscecircncia acessa de modo voluntaacuterio sob refluxo do intelecto as imagens e as espeacutecies conservadas Cogitativa Apreende compotildee e divide e compara imagens e espeacutecies intencionais particulares tem como objeto proacuteprio as quididades particulares Reuacutene as intenccedilotildees particulares percebe as intenccedilotildees por uma comparaccedilatildeo sob refluxo do intelecto Apreende espeacutecies intencionais universais define conhece o verdadeiro e o falso discrimina sabe (discerne e concebe) entende discorre e faz suposiccedilotildees ou seja forma conceituaccedilotildees concepccedilotildees e juiacutezos compondo e dividindo conceitos para formar outros conceitos enuncia silogiza discursa

220

Tabela 2 - Testes e observaccedilotildees relacionados a invertebrados peixes e aves

Habilidades Testes Comportamentos espontacircneos

- Interaccedilotildees comportamentais Interaccedilotildees em geral - Noccedilatildeo de meio e fim e uso de instrumentos - Competecircncia para apreensatildeo de quantidades - Aptidotildees relacionadas agrave comunicaccedilatildeo - Autorreconhecimento

- Polvo teste de associar balatildeo de determinada cor agrave recompensa e outro de outra cor agrave puniccedilatildeo (aprendendo por observaccedilatildeo) - Polvo teste para abrir tampa de frasco para obter recompensa - Tentilhatildeo pica-pau teste de retirada de recompensa de tubos com gravetos inclusive com obstaacuteculo em forma de ldquoHrdquo - Papagaios-da-nova-zelacircndia teste de cooperaccedilatildeo em que dois espeacutecimes precisam puxar cada um uma corda ao mesmo tempo para obterem a recompensa - Papagaio-cinzento teste de contagem e de realizaccedilatildeo de pequenas somas com quantidades especiacuteficas de alimento ou com algarismos exibidos em bandejas -Pombos testes de associaccedilatildeo de siacutembolos com numerosidade contando ateacute nove - Papagaio-cinzento testes em que se verifica vocabulaacuterio pode conhecer com treinamento mais de cem palavras - Formigas teste de reconhecimento diante do espelho

- Peixes fazem vigilacircncia contra predadores pelo bando - Aves algumas ajudam um coespeciacutefico que esteja com deficiecircncia visual - Peixes usam pedras para quebrar conchas - Aves algumas usam pedras para quebrar ovos - lanccedilam alimentos para atrairem peixes e pescarem - usam presas e musgos como esponjas para levar aacutegua para a prole - usam gravetos ou espinhos de cacto para retirar larvas de pequenos orifiacutecios - Abelhas seguem coespeciacuteficos e aprendem rotas - Aves aprendem canto com os pais

221

Tabela 3 - Testes e observaccedilotildees relacionados a Corvidae

Habilidades Testes Comportamentos espontacircneos

- Interaccedilotildees comportamentais Comportamento diante da morte de coespeciacutefico - Teoria da mente e comportamento diante de telas de viacutedeo - Noccedilatildeo de meio e fim e uso de instrumentos - Correlaccedilatildeo de figuras ou sons - Autorreconhecimento

- Teste com recintos interligados por pequeno buraco em que animal em um acelerava estocagem de alimento quando o buraco estava aberto ou quando ouvia gravaccedilatildeo de som de coespeciacutefico com o buraco fechado - Teste com pedras e tubos com aacutegua e recompensa flutuando - Teste com varetas para alcanccedilar a recompensa ou outras varetas para alcanccedilar recompensa - Teste de oito passos com varetas e pedras - Teste de recorte de cartatildeo para inserir em maacutequina - Teste de raciociacutenio analoacutegico com placas e figuras geomeacutetricas - Teste de reconhecimento diante do espelho

- Aproximam-se de mortos para investigar causa da morte de coespeciacutefico - Lanccedilam objetos contra inimigos - Lanccedilam iscas para pesca - Por natildeo ter ecircxito em teste com o objeto alongado para alcanccedilar recompensa animal retornou ao aviaacuterio para pegar graveto e concluir tarefa - Produzem a partir de pequenos ramos instrumentos

222

Tabela 4 - Testes e observaccedilotildees relacionados a Elephantidae

Habilidades Testes Comportamentos espontacircneos

- Interaccedilotildees comportamentais Interaccedilotildees em geral Comportamento diante da morte de coespeciacutefico Respostas a sinais humanos - Teoria da mente e comportamento diante de telas de viacutedeo - Noccedilatildeo de meio e fim e uso de instrumentos - Correlaccedilatildeo de figuras ou sons

- Testes de reconhecimento de gestos humanos e da postura corporal humana que apontam para localizaccedilatildeo de alimento - Teste de acionar interruptor para ganhar recompensa - Teste da escolha de suportes um com alimento e outro sem com variaccedilotildees -Teste de cooperaccedilatildeo em que dois espeacutecimes tecircm de puxar cada um uma corda ao mesmo tempo para obterem a recompensa - Teste em que se utiliza objetos como apoio para alcanccedilar recompensa suspensa -Teste com cartas com padrotildees de imagens e com muacutesica com padrotildees de melodias

- Coalisatildeo proteccedilatildeo dos mais jovens conforto cuidado de filhotes na ausecircncia da matildee resgate auxiacutelio em caso de atolamento remoccedilatildeo de objetos estranhos - Distinccedilatildeo de tipos e niacuteveis de ameaccedila com comportamentos especiacuteficos para cada um - Distinguem e investigam restos mortais de coespeciacuteficos - Visitam por sucessivas vezes um cadaacutever de membro do grupo - Percepccedilatildeo de que o outro se comporta espontaneamente tecircm emoccedilotildees percepccedilotildees crenccedilas e entendimentos que podem ser diferentes - Animal trocou de objeto para tentar alcanccedilar alimento suspenso - Uso de conjuntos de ramos para espantar insetos

223

- Competecircncia para apreensatildeo de quantidades - Aptidotildees relacionadas agrave comunicaccedilatildeo - Autorreconhecimento

- Teste de comparaccedilatildeo de quantidades de alimento em cestas apresentadas simultaneamente e sucessivamente - Comparaccedilatildeo de cartas com quantidades de pontos - Com treinamento podem reconhecer pelo menos cerca de cem comandos verbais - Teste de reconhecimento diante do espelho - Teste com tapete para perceber que peso do proacuteprio corpo impede a realizaccedilatildeo de tarefa

224

Tabela 5 - Testes e observaccedilotildees relacionados a Carnivora ndash Canis lupus familiaris

Habilidades Testes Comportamento espontacircneo

Interaccedilotildees comportamentais - Respostas a sinais humanos - Noccedilatildeo de meio e fim e uso de instrumentos Planejamento - Imitaccedilatildeo e sincronia - Competecircncia para apreensatildeo de quantidades - Aptidotildees relacionadas agrave comunicaccedilatildeo

- Testes em geral para encontrar alimentos pelos quais respondem ao gesto de apontar agrave expressatildeo corporal a expressotildees faciais e ao estado de atenccedilatildeo a estados emocionais ao tom de voz humanos aleacutem de objetos utilizados para marcaccedilatildeo - Teste da escolha de suportes um com alimento e outro sem com variaccedilotildees - Teste para detectar padratildeo de sobreimitaccedilatildeo com caixa com tampa que pode ser aberta diretamente e alavanca desnecessaacuteria - Teste para verificar se distinguem pratos com maiores quantidades de alimento - Teste para verificar se sabem contar - Testes para pegar objetos apoacutes comando mostra que integram a memoacuteria relacionada agrave identidade com a relacionada agrave localizaccedilatildeo e assumem a correferecircncia do comando de voz com o gesto de apontar dos humanos - Mediante treinamento podem reconhecer mais de mil objetos pelo nome - Reconhecem categorias de objetos

Planejam como tratam presas ou objetos para transportaacute-los

225

Tabela 6 - Testes e observaccedilotildees relacionados a Cetaceae - Delphinidae

Habilidades Testes Comportamentos espontacircneos

- Interaccedilotildees comportamentais Interaccedilotildees gerais Comportamento diante da morte de coespeciacutefico Respostas a sinais humanos - Teoria da mente e comportamento diante de telas de viacutedeo - Noccedilatildeo de meio e fim e uso de instrumentos Planejamento - Imitaccedilatildeo e sincronia

- Testes para verificar se seguem o apontar de dedo a extensatildeo do braccedilo e o olhar humanos - Testes para respostas a sinais humanos por tela de viacutedeo - Testes para respostas a sinais humanos por tela de viacutedeo - Testes com comando ldquotendemrdquo para realizarem movimentos em sincronia - Testes de imitaccedilatildeo de sons emitidos por computador de coespeciacuteficos e de humanos

- Pesca colaborativa - Transmissatildeo cultural - Realizaccedilatildeo espontacircnea de novas combinaccedilotildees de accedilotildees associadas a sinais dos treinadores - possiacutevel demora relacionada ao reconhecimento do estado de morte manifestaccedilatildeo de estresse demora relacionada ao desapego do cadaacutever - Uso de poriacuteferas no focinho para proteccedilatildeo contra corais em forrageamento - Em obediecircncia a comando espeacutecime recolheu objetos na piscina mas de modo espontacircneo os dispocircs pelo corpo desde o que se encontrava mais distante - transporte espontacircneo de objeto para centro da piscina para executar com este comando

226

- Aptidotildees relacionadas agrave comunicaccedilatildeo - Autorreconhecimento

- Testes com comandos verbais para realizar tarefas com objetos em locais especiacuteficos incluindo combinaccedilotildees natildeo previamente treinadas e comando de repeticcedilatildeo aleacutem de uso de generalizaccedilotildees e de sequecircncias semacircntica ou sintaticamente anocircmalas - Teste com dois remos um significando ldquosimrdquo e outro significando ldquonatildeordquo - Teste com comando para criaccedilatildeo de novo movimento - Teste com comandos para lidar com objetos seguidos do comando ateacute entatildeo desconhecido para escolher a proacutexima accedilatildeo - Teste com associaccedilatildeo de siacutembolos (gestos) com partes do corpo mais realizaccedilatildeo de accedilotildees e uso de objetos - Teste de reconhecimento diante do espelho - Teste de reconhecimento de partes corporais com comandos para tocaacute-las em objetos ou realizar outras accedilotildees com este - Teste de imitaccedilatildeo de humanos - Teste com comando para criaccedilatildeo de novo movimento para senso de agecircncia e propriedade - Teste com associaccedilatildeo de siacutembolos (gestos) com partes do corpo mais realizaccedilatildeo de accedilotildees e uso de objetos

Aplicam-se a mais de um propoacutesito

227

Tabela 7 - Testes e observaccedilotildees relacionados a Primates

Habilidades Testes Observaccedilotildees de campo e comportamentos espontacircneos

- Interaccedilotildees comportamentais Interaccedilotildees gerais Comportamento diante da morte de coespeciacutefico

- Teoria da mente e comportamento diante de telas de viacutedeo - Metacogniccedilatildeo - Noccedilatildeo de meio e fim e uso de instrumentos

- Teste para verificar como animais lidam com desigualdade dando melhor recompensa a um que a outro por mesma tarefa - Teste com pessoas (em uma etapa uma por quem o animal tem apreccedilo e outra por quem natildeo tem) em viacutedeos e fotografias simulando depararem com problemas para resoluccedilatildeo destes pelo animal por fotografias - Teste de memoacuteria para metamemoacuteria em que macacos decidem se querem participar de teste para tentar recompensa de que gostam mais ou natildeo participar e ganhar recompensa de que gostam menos - Teste com tubos em ldquoVrdquo em que o experimentador insere alimento em um dos dois tubos sem o animal ver na abertura oposta ao acircngulo formado - Teste para obter alimento puxando-o ou empurrando-o com vareta ou ancinho em uma de duas vias de um aparato com bandeja ou em tubo com armadilha para

- Avaliam se determinado conflito eacute proveitoso e tomam decisatildeo - Transmissatildeo cultural comportamental como no uso de instrumentos - Chamam atenccedilatildeo de outro ente para comunicar-se - Macacos treinados podem enganar os pesquisadores - Possiacuteveis demora relacionada ao reconhecimento do estado de morte manifestaccedilatildeo de estresse demora relacionada ao desapego do cadaacutever - Uso de pedras tacos folhas gravetos etc como instrumentos para coleta de alimentos assepsia defesa etc

228

Planejamento - Correlaccedilatildeo de figuras ou sons - Competecircncia para apreensatildeo de quantidades

perda do alimento - Teste com peccedila plaacutestica associada a pedaccedilo de maccedilatilde ou de coco escondidos a fim de observar se animais individuam objetos - Teste com varas para alcanccedilar alimento diretamente ou encaixando uma vara em outra com ou sem obstaacuteculos - Teste com caixotes para os animais empilharem e alcanccedilarem alimento suspenso - Teste com trecircs nuacutemeros em tela em que apoacutes o toque no primeiro os outros dois mudam de posiccedilatildeo - Teste de sequecircncia loacutegica com imagens - Teste de raciociacutenio analoacutegico com figuras em cartotildees com objetos ou com imagens em telas de viacutedeo - Teste com sequecircncia numeacuterica em viacutedeo e contagem ateacute nove incluindo teste de memoacuteria com substituiccedilatildeo dos nuacutemeros por quadrados - Teste com quantidades especiacuteficas de alimento ou com algarismos exibidos em bandejas ou dispostos no recinto para verificar capacidade de realizar somas mais simples - Teste para associaccedilatildeo de algarismos ou figuras com pontos em tela de viacutedeo a quantidades respectivas de recompensa - Teste em que os animais trocam fichas por alimentos sendo que um experimentador lhes entrega mais e o outro menos podendo um acrescentar e outro retirar parte do alimento ou ambos acrescentarem alimento um mais e outro menos

229

- Aptidotildees relacionadas agrave comunicaccedilatildeo - Autorreconhecimento

- Testes em que se verifica vocabulaacuterio com treinamento podem reconhecer mais de trecircs mil palavras que podem expressar com sentenccedilas por lexigramas ou linguagem de sinais - Teste em que primatas apontam para indicar a humano onde estaacute alimento ou objeto para pegar alimento - Teste de reconhecimento diante do espelho

- Comunicaccedilatildeo por vocalizaccedilotildees ou por golpes em troncos - Animais treinados podem combinar e inventar sinais manuais para comunicaccedilatildeo dar nomes xingar - Indicaccedilatildeo de partes da face no espelho

Page 5: RAFAEL SAMPAIO OCTAVIANO DE SOUZA - HCTE/UFRJ · a todos os que já intercederam perante o Criador por esta pobre alma. AGRADECIMENTOS Ao Criador, por tudo, e a todos aqueles que
Page 6: RAFAEL SAMPAIO OCTAVIANO DE SOUZA - HCTE/UFRJ · a todos os que já intercederam perante o Criador por esta pobre alma. AGRADECIMENTOS Ao Criador, por tudo, e a todos aqueles que
Page 7: RAFAEL SAMPAIO OCTAVIANO DE SOUZA - HCTE/UFRJ · a todos os que já intercederam perante o Criador por esta pobre alma. AGRADECIMENTOS Ao Criador, por tudo, e a todos aqueles que
Page 8: RAFAEL SAMPAIO OCTAVIANO DE SOUZA - HCTE/UFRJ · a todos os que já intercederam perante o Criador por esta pobre alma. AGRADECIMENTOS Ao Criador, por tudo, e a todos aqueles que
Page 9: RAFAEL SAMPAIO OCTAVIANO DE SOUZA - HCTE/UFRJ · a todos os que já intercederam perante o Criador por esta pobre alma. AGRADECIMENTOS Ao Criador, por tudo, e a todos aqueles que
Page 10: RAFAEL SAMPAIO OCTAVIANO DE SOUZA - HCTE/UFRJ · a todos os que já intercederam perante o Criador por esta pobre alma. AGRADECIMENTOS Ao Criador, por tudo, e a todos aqueles que
Page 11: RAFAEL SAMPAIO OCTAVIANO DE SOUZA - HCTE/UFRJ · a todos os que já intercederam perante o Criador por esta pobre alma. AGRADECIMENTOS Ao Criador, por tudo, e a todos aqueles que
Page 12: RAFAEL SAMPAIO OCTAVIANO DE SOUZA - HCTE/UFRJ · a todos os que já intercederam perante o Criador por esta pobre alma. AGRADECIMENTOS Ao Criador, por tudo, e a todos aqueles que
Page 13: RAFAEL SAMPAIO OCTAVIANO DE SOUZA - HCTE/UFRJ · a todos os que já intercederam perante o Criador por esta pobre alma. AGRADECIMENTOS Ao Criador, por tudo, e a todos aqueles que
Page 14: RAFAEL SAMPAIO OCTAVIANO DE SOUZA - HCTE/UFRJ · a todos os que já intercederam perante o Criador por esta pobre alma. AGRADECIMENTOS Ao Criador, por tudo, e a todos aqueles que
Page 15: RAFAEL SAMPAIO OCTAVIANO DE SOUZA - HCTE/UFRJ · a todos os que já intercederam perante o Criador por esta pobre alma. AGRADECIMENTOS Ao Criador, por tudo, e a todos aqueles que
Page 16: RAFAEL SAMPAIO OCTAVIANO DE SOUZA - HCTE/UFRJ · a todos os que já intercederam perante o Criador por esta pobre alma. AGRADECIMENTOS Ao Criador, por tudo, e a todos aqueles que
Page 17: RAFAEL SAMPAIO OCTAVIANO DE SOUZA - HCTE/UFRJ · a todos os que já intercederam perante o Criador por esta pobre alma. AGRADECIMENTOS Ao Criador, por tudo, e a todos aqueles que
Page 18: RAFAEL SAMPAIO OCTAVIANO DE SOUZA - HCTE/UFRJ · a todos os que já intercederam perante o Criador por esta pobre alma. AGRADECIMENTOS Ao Criador, por tudo, e a todos aqueles que
Page 19: RAFAEL SAMPAIO OCTAVIANO DE SOUZA - HCTE/UFRJ · a todos os que já intercederam perante o Criador por esta pobre alma. AGRADECIMENTOS Ao Criador, por tudo, e a todos aqueles que
Page 20: RAFAEL SAMPAIO OCTAVIANO DE SOUZA - HCTE/UFRJ · a todos os que já intercederam perante o Criador por esta pobre alma. AGRADECIMENTOS Ao Criador, por tudo, e a todos aqueles que
Page 21: RAFAEL SAMPAIO OCTAVIANO DE SOUZA - HCTE/UFRJ · a todos os que já intercederam perante o Criador por esta pobre alma. AGRADECIMENTOS Ao Criador, por tudo, e a todos aqueles que
Page 22: RAFAEL SAMPAIO OCTAVIANO DE SOUZA - HCTE/UFRJ · a todos os que já intercederam perante o Criador por esta pobre alma. AGRADECIMENTOS Ao Criador, por tudo, e a todos aqueles que
Page 23: RAFAEL SAMPAIO OCTAVIANO DE SOUZA - HCTE/UFRJ · a todos os que já intercederam perante o Criador por esta pobre alma. AGRADECIMENTOS Ao Criador, por tudo, e a todos aqueles que
Page 24: RAFAEL SAMPAIO OCTAVIANO DE SOUZA - HCTE/UFRJ · a todos os que já intercederam perante o Criador por esta pobre alma. AGRADECIMENTOS Ao Criador, por tudo, e a todos aqueles que
Page 25: RAFAEL SAMPAIO OCTAVIANO DE SOUZA - HCTE/UFRJ · a todos os que já intercederam perante o Criador por esta pobre alma. AGRADECIMENTOS Ao Criador, por tudo, e a todos aqueles que
Page 26: RAFAEL SAMPAIO OCTAVIANO DE SOUZA - HCTE/UFRJ · a todos os que já intercederam perante o Criador por esta pobre alma. AGRADECIMENTOS Ao Criador, por tudo, e a todos aqueles que
Page 27: RAFAEL SAMPAIO OCTAVIANO DE SOUZA - HCTE/UFRJ · a todos os que já intercederam perante o Criador por esta pobre alma. AGRADECIMENTOS Ao Criador, por tudo, e a todos aqueles que
Page 28: RAFAEL SAMPAIO OCTAVIANO DE SOUZA - HCTE/UFRJ · a todos os que já intercederam perante o Criador por esta pobre alma. AGRADECIMENTOS Ao Criador, por tudo, e a todos aqueles que
Page 29: RAFAEL SAMPAIO OCTAVIANO DE SOUZA - HCTE/UFRJ · a todos os que já intercederam perante o Criador por esta pobre alma. AGRADECIMENTOS Ao Criador, por tudo, e a todos aqueles que
Page 30: RAFAEL SAMPAIO OCTAVIANO DE SOUZA - HCTE/UFRJ · a todos os que já intercederam perante o Criador por esta pobre alma. AGRADECIMENTOS Ao Criador, por tudo, e a todos aqueles que
Page 31: RAFAEL SAMPAIO OCTAVIANO DE SOUZA - HCTE/UFRJ · a todos os que já intercederam perante o Criador por esta pobre alma. AGRADECIMENTOS Ao Criador, por tudo, e a todos aqueles que
Page 32: RAFAEL SAMPAIO OCTAVIANO DE SOUZA - HCTE/UFRJ · a todos os que já intercederam perante o Criador por esta pobre alma. AGRADECIMENTOS Ao Criador, por tudo, e a todos aqueles que
Page 33: RAFAEL SAMPAIO OCTAVIANO DE SOUZA - HCTE/UFRJ · a todos os que já intercederam perante o Criador por esta pobre alma. AGRADECIMENTOS Ao Criador, por tudo, e a todos aqueles que
Page 34: RAFAEL SAMPAIO OCTAVIANO DE SOUZA - HCTE/UFRJ · a todos os que já intercederam perante o Criador por esta pobre alma. AGRADECIMENTOS Ao Criador, por tudo, e a todos aqueles que
Page 35: RAFAEL SAMPAIO OCTAVIANO DE SOUZA - HCTE/UFRJ · a todos os que já intercederam perante o Criador por esta pobre alma. AGRADECIMENTOS Ao Criador, por tudo, e a todos aqueles que
Page 36: RAFAEL SAMPAIO OCTAVIANO DE SOUZA - HCTE/UFRJ · a todos os que já intercederam perante o Criador por esta pobre alma. AGRADECIMENTOS Ao Criador, por tudo, e a todos aqueles que
Page 37: RAFAEL SAMPAIO OCTAVIANO DE SOUZA - HCTE/UFRJ · a todos os que já intercederam perante o Criador por esta pobre alma. AGRADECIMENTOS Ao Criador, por tudo, e a todos aqueles que
Page 38: RAFAEL SAMPAIO OCTAVIANO DE SOUZA - HCTE/UFRJ · a todos os que já intercederam perante o Criador por esta pobre alma. AGRADECIMENTOS Ao Criador, por tudo, e a todos aqueles que
Page 39: RAFAEL SAMPAIO OCTAVIANO DE SOUZA - HCTE/UFRJ · a todos os que já intercederam perante o Criador por esta pobre alma. AGRADECIMENTOS Ao Criador, por tudo, e a todos aqueles que
Page 40: RAFAEL SAMPAIO OCTAVIANO DE SOUZA - HCTE/UFRJ · a todos os que já intercederam perante o Criador por esta pobre alma. AGRADECIMENTOS Ao Criador, por tudo, e a todos aqueles que
Page 41: RAFAEL SAMPAIO OCTAVIANO DE SOUZA - HCTE/UFRJ · a todos os que já intercederam perante o Criador por esta pobre alma. AGRADECIMENTOS Ao Criador, por tudo, e a todos aqueles que
Page 42: RAFAEL SAMPAIO OCTAVIANO DE SOUZA - HCTE/UFRJ · a todos os que já intercederam perante o Criador por esta pobre alma. AGRADECIMENTOS Ao Criador, por tudo, e a todos aqueles que
Page 43: RAFAEL SAMPAIO OCTAVIANO DE SOUZA - HCTE/UFRJ · a todos os que já intercederam perante o Criador por esta pobre alma. AGRADECIMENTOS Ao Criador, por tudo, e a todos aqueles que
Page 44: RAFAEL SAMPAIO OCTAVIANO DE SOUZA - HCTE/UFRJ · a todos os que já intercederam perante o Criador por esta pobre alma. AGRADECIMENTOS Ao Criador, por tudo, e a todos aqueles que
Page 45: RAFAEL SAMPAIO OCTAVIANO DE SOUZA - HCTE/UFRJ · a todos os que já intercederam perante o Criador por esta pobre alma. AGRADECIMENTOS Ao Criador, por tudo, e a todos aqueles que
Page 46: RAFAEL SAMPAIO OCTAVIANO DE SOUZA - HCTE/UFRJ · a todos os que já intercederam perante o Criador por esta pobre alma. AGRADECIMENTOS Ao Criador, por tudo, e a todos aqueles que
Page 47: RAFAEL SAMPAIO OCTAVIANO DE SOUZA - HCTE/UFRJ · a todos os que já intercederam perante o Criador por esta pobre alma. AGRADECIMENTOS Ao Criador, por tudo, e a todos aqueles que
Page 48: RAFAEL SAMPAIO OCTAVIANO DE SOUZA - HCTE/UFRJ · a todos os que já intercederam perante o Criador por esta pobre alma. AGRADECIMENTOS Ao Criador, por tudo, e a todos aqueles que
Page 49: RAFAEL SAMPAIO OCTAVIANO DE SOUZA - HCTE/UFRJ · a todos os que já intercederam perante o Criador por esta pobre alma. AGRADECIMENTOS Ao Criador, por tudo, e a todos aqueles que
Page 50: RAFAEL SAMPAIO OCTAVIANO DE SOUZA - HCTE/UFRJ · a todos os que já intercederam perante o Criador por esta pobre alma. AGRADECIMENTOS Ao Criador, por tudo, e a todos aqueles que
Page 51: RAFAEL SAMPAIO OCTAVIANO DE SOUZA - HCTE/UFRJ · a todos os que já intercederam perante o Criador por esta pobre alma. AGRADECIMENTOS Ao Criador, por tudo, e a todos aqueles que
Page 52: RAFAEL SAMPAIO OCTAVIANO DE SOUZA - HCTE/UFRJ · a todos os que já intercederam perante o Criador por esta pobre alma. AGRADECIMENTOS Ao Criador, por tudo, e a todos aqueles que
Page 53: RAFAEL SAMPAIO OCTAVIANO DE SOUZA - HCTE/UFRJ · a todos os que já intercederam perante o Criador por esta pobre alma. AGRADECIMENTOS Ao Criador, por tudo, e a todos aqueles que
Page 54: RAFAEL SAMPAIO OCTAVIANO DE SOUZA - HCTE/UFRJ · a todos os que já intercederam perante o Criador por esta pobre alma. AGRADECIMENTOS Ao Criador, por tudo, e a todos aqueles que
Page 55: RAFAEL SAMPAIO OCTAVIANO DE SOUZA - HCTE/UFRJ · a todos os que já intercederam perante o Criador por esta pobre alma. AGRADECIMENTOS Ao Criador, por tudo, e a todos aqueles que
Page 56: RAFAEL SAMPAIO OCTAVIANO DE SOUZA - HCTE/UFRJ · a todos os que já intercederam perante o Criador por esta pobre alma. AGRADECIMENTOS Ao Criador, por tudo, e a todos aqueles que
Page 57: RAFAEL SAMPAIO OCTAVIANO DE SOUZA - HCTE/UFRJ · a todos os que já intercederam perante o Criador por esta pobre alma. AGRADECIMENTOS Ao Criador, por tudo, e a todos aqueles que
Page 58: RAFAEL SAMPAIO OCTAVIANO DE SOUZA - HCTE/UFRJ · a todos os que já intercederam perante o Criador por esta pobre alma. AGRADECIMENTOS Ao Criador, por tudo, e a todos aqueles que
Page 59: RAFAEL SAMPAIO OCTAVIANO DE SOUZA - HCTE/UFRJ · a todos os que já intercederam perante o Criador por esta pobre alma. AGRADECIMENTOS Ao Criador, por tudo, e a todos aqueles que
Page 60: RAFAEL SAMPAIO OCTAVIANO DE SOUZA - HCTE/UFRJ · a todos os que já intercederam perante o Criador por esta pobre alma. AGRADECIMENTOS Ao Criador, por tudo, e a todos aqueles que
Page 61: RAFAEL SAMPAIO OCTAVIANO DE SOUZA - HCTE/UFRJ · a todos os que já intercederam perante o Criador por esta pobre alma. AGRADECIMENTOS Ao Criador, por tudo, e a todos aqueles que
Page 62: RAFAEL SAMPAIO OCTAVIANO DE SOUZA - HCTE/UFRJ · a todos os que já intercederam perante o Criador por esta pobre alma. AGRADECIMENTOS Ao Criador, por tudo, e a todos aqueles que
Page 63: RAFAEL SAMPAIO OCTAVIANO DE SOUZA - HCTE/UFRJ · a todos os que já intercederam perante o Criador por esta pobre alma. AGRADECIMENTOS Ao Criador, por tudo, e a todos aqueles que
Page 64: RAFAEL SAMPAIO OCTAVIANO DE SOUZA - HCTE/UFRJ · a todos os que já intercederam perante o Criador por esta pobre alma. AGRADECIMENTOS Ao Criador, por tudo, e a todos aqueles que
Page 65: RAFAEL SAMPAIO OCTAVIANO DE SOUZA - HCTE/UFRJ · a todos os que já intercederam perante o Criador por esta pobre alma. AGRADECIMENTOS Ao Criador, por tudo, e a todos aqueles que
Page 66: RAFAEL SAMPAIO OCTAVIANO DE SOUZA - HCTE/UFRJ · a todos os que já intercederam perante o Criador por esta pobre alma. AGRADECIMENTOS Ao Criador, por tudo, e a todos aqueles que
Page 67: RAFAEL SAMPAIO OCTAVIANO DE SOUZA - HCTE/UFRJ · a todos os que já intercederam perante o Criador por esta pobre alma. AGRADECIMENTOS Ao Criador, por tudo, e a todos aqueles que
Page 68: RAFAEL SAMPAIO OCTAVIANO DE SOUZA - HCTE/UFRJ · a todos os que já intercederam perante o Criador por esta pobre alma. AGRADECIMENTOS Ao Criador, por tudo, e a todos aqueles que
Page 69: RAFAEL SAMPAIO OCTAVIANO DE SOUZA - HCTE/UFRJ · a todos os que já intercederam perante o Criador por esta pobre alma. AGRADECIMENTOS Ao Criador, por tudo, e a todos aqueles que
Page 70: RAFAEL SAMPAIO OCTAVIANO DE SOUZA - HCTE/UFRJ · a todos os que já intercederam perante o Criador por esta pobre alma. AGRADECIMENTOS Ao Criador, por tudo, e a todos aqueles que
Page 71: RAFAEL SAMPAIO OCTAVIANO DE SOUZA - HCTE/UFRJ · a todos os que já intercederam perante o Criador por esta pobre alma. AGRADECIMENTOS Ao Criador, por tudo, e a todos aqueles que
Page 72: RAFAEL SAMPAIO OCTAVIANO DE SOUZA - HCTE/UFRJ · a todos os que já intercederam perante o Criador por esta pobre alma. AGRADECIMENTOS Ao Criador, por tudo, e a todos aqueles que
Page 73: RAFAEL SAMPAIO OCTAVIANO DE SOUZA - HCTE/UFRJ · a todos os que já intercederam perante o Criador por esta pobre alma. AGRADECIMENTOS Ao Criador, por tudo, e a todos aqueles que
Page 74: RAFAEL SAMPAIO OCTAVIANO DE SOUZA - HCTE/UFRJ · a todos os que já intercederam perante o Criador por esta pobre alma. AGRADECIMENTOS Ao Criador, por tudo, e a todos aqueles que
Page 75: RAFAEL SAMPAIO OCTAVIANO DE SOUZA - HCTE/UFRJ · a todos os que já intercederam perante o Criador por esta pobre alma. AGRADECIMENTOS Ao Criador, por tudo, e a todos aqueles que
Page 76: RAFAEL SAMPAIO OCTAVIANO DE SOUZA - HCTE/UFRJ · a todos os que já intercederam perante o Criador por esta pobre alma. AGRADECIMENTOS Ao Criador, por tudo, e a todos aqueles que
Page 77: RAFAEL SAMPAIO OCTAVIANO DE SOUZA - HCTE/UFRJ · a todos os que já intercederam perante o Criador por esta pobre alma. AGRADECIMENTOS Ao Criador, por tudo, e a todos aqueles que
Page 78: RAFAEL SAMPAIO OCTAVIANO DE SOUZA - HCTE/UFRJ · a todos os que já intercederam perante o Criador por esta pobre alma. AGRADECIMENTOS Ao Criador, por tudo, e a todos aqueles que
Page 79: RAFAEL SAMPAIO OCTAVIANO DE SOUZA - HCTE/UFRJ · a todos os que já intercederam perante o Criador por esta pobre alma. AGRADECIMENTOS Ao Criador, por tudo, e a todos aqueles que
Page 80: RAFAEL SAMPAIO OCTAVIANO DE SOUZA - HCTE/UFRJ · a todos os que já intercederam perante o Criador por esta pobre alma. AGRADECIMENTOS Ao Criador, por tudo, e a todos aqueles que
Page 81: RAFAEL SAMPAIO OCTAVIANO DE SOUZA - HCTE/UFRJ · a todos os que já intercederam perante o Criador por esta pobre alma. AGRADECIMENTOS Ao Criador, por tudo, e a todos aqueles que
Page 82: RAFAEL SAMPAIO OCTAVIANO DE SOUZA - HCTE/UFRJ · a todos os que já intercederam perante o Criador por esta pobre alma. AGRADECIMENTOS Ao Criador, por tudo, e a todos aqueles que
Page 83: RAFAEL SAMPAIO OCTAVIANO DE SOUZA - HCTE/UFRJ · a todos os que já intercederam perante o Criador por esta pobre alma. AGRADECIMENTOS Ao Criador, por tudo, e a todos aqueles que
Page 84: RAFAEL SAMPAIO OCTAVIANO DE SOUZA - HCTE/UFRJ · a todos os que já intercederam perante o Criador por esta pobre alma. AGRADECIMENTOS Ao Criador, por tudo, e a todos aqueles que
Page 85: RAFAEL SAMPAIO OCTAVIANO DE SOUZA - HCTE/UFRJ · a todos os que já intercederam perante o Criador por esta pobre alma. AGRADECIMENTOS Ao Criador, por tudo, e a todos aqueles que
Page 86: RAFAEL SAMPAIO OCTAVIANO DE SOUZA - HCTE/UFRJ · a todos os que já intercederam perante o Criador por esta pobre alma. AGRADECIMENTOS Ao Criador, por tudo, e a todos aqueles que
Page 87: RAFAEL SAMPAIO OCTAVIANO DE SOUZA - HCTE/UFRJ · a todos os que já intercederam perante o Criador por esta pobre alma. AGRADECIMENTOS Ao Criador, por tudo, e a todos aqueles que
Page 88: RAFAEL SAMPAIO OCTAVIANO DE SOUZA - HCTE/UFRJ · a todos os que já intercederam perante o Criador por esta pobre alma. AGRADECIMENTOS Ao Criador, por tudo, e a todos aqueles que
Page 89: RAFAEL SAMPAIO OCTAVIANO DE SOUZA - HCTE/UFRJ · a todos os que já intercederam perante o Criador por esta pobre alma. AGRADECIMENTOS Ao Criador, por tudo, e a todos aqueles que
Page 90: RAFAEL SAMPAIO OCTAVIANO DE SOUZA - HCTE/UFRJ · a todos os que já intercederam perante o Criador por esta pobre alma. AGRADECIMENTOS Ao Criador, por tudo, e a todos aqueles que
Page 91: RAFAEL SAMPAIO OCTAVIANO DE SOUZA - HCTE/UFRJ · a todos os que já intercederam perante o Criador por esta pobre alma. AGRADECIMENTOS Ao Criador, por tudo, e a todos aqueles que
Page 92: RAFAEL SAMPAIO OCTAVIANO DE SOUZA - HCTE/UFRJ · a todos os que já intercederam perante o Criador por esta pobre alma. AGRADECIMENTOS Ao Criador, por tudo, e a todos aqueles que
Page 93: RAFAEL SAMPAIO OCTAVIANO DE SOUZA - HCTE/UFRJ · a todos os que já intercederam perante o Criador por esta pobre alma. AGRADECIMENTOS Ao Criador, por tudo, e a todos aqueles que
Page 94: RAFAEL SAMPAIO OCTAVIANO DE SOUZA - HCTE/UFRJ · a todos os que já intercederam perante o Criador por esta pobre alma. AGRADECIMENTOS Ao Criador, por tudo, e a todos aqueles que
Page 95: RAFAEL SAMPAIO OCTAVIANO DE SOUZA - HCTE/UFRJ · a todos os que já intercederam perante o Criador por esta pobre alma. AGRADECIMENTOS Ao Criador, por tudo, e a todos aqueles que
Page 96: RAFAEL SAMPAIO OCTAVIANO DE SOUZA - HCTE/UFRJ · a todos os que já intercederam perante o Criador por esta pobre alma. AGRADECIMENTOS Ao Criador, por tudo, e a todos aqueles que
Page 97: RAFAEL SAMPAIO OCTAVIANO DE SOUZA - HCTE/UFRJ · a todos os que já intercederam perante o Criador por esta pobre alma. AGRADECIMENTOS Ao Criador, por tudo, e a todos aqueles que
Page 98: RAFAEL SAMPAIO OCTAVIANO DE SOUZA - HCTE/UFRJ · a todos os que já intercederam perante o Criador por esta pobre alma. AGRADECIMENTOS Ao Criador, por tudo, e a todos aqueles que
Page 99: RAFAEL SAMPAIO OCTAVIANO DE SOUZA - HCTE/UFRJ · a todos os que já intercederam perante o Criador por esta pobre alma. AGRADECIMENTOS Ao Criador, por tudo, e a todos aqueles que
Page 100: RAFAEL SAMPAIO OCTAVIANO DE SOUZA - HCTE/UFRJ · a todos os que já intercederam perante o Criador por esta pobre alma. AGRADECIMENTOS Ao Criador, por tudo, e a todos aqueles que
Page 101: RAFAEL SAMPAIO OCTAVIANO DE SOUZA - HCTE/UFRJ · a todos os que já intercederam perante o Criador por esta pobre alma. AGRADECIMENTOS Ao Criador, por tudo, e a todos aqueles que
Page 102: RAFAEL SAMPAIO OCTAVIANO DE SOUZA - HCTE/UFRJ · a todos os que já intercederam perante o Criador por esta pobre alma. AGRADECIMENTOS Ao Criador, por tudo, e a todos aqueles que
Page 103: RAFAEL SAMPAIO OCTAVIANO DE SOUZA - HCTE/UFRJ · a todos os que já intercederam perante o Criador por esta pobre alma. AGRADECIMENTOS Ao Criador, por tudo, e a todos aqueles que
Page 104: RAFAEL SAMPAIO OCTAVIANO DE SOUZA - HCTE/UFRJ · a todos os que já intercederam perante o Criador por esta pobre alma. AGRADECIMENTOS Ao Criador, por tudo, e a todos aqueles que
Page 105: RAFAEL SAMPAIO OCTAVIANO DE SOUZA - HCTE/UFRJ · a todos os que já intercederam perante o Criador por esta pobre alma. AGRADECIMENTOS Ao Criador, por tudo, e a todos aqueles que
Page 106: RAFAEL SAMPAIO OCTAVIANO DE SOUZA - HCTE/UFRJ · a todos os que já intercederam perante o Criador por esta pobre alma. AGRADECIMENTOS Ao Criador, por tudo, e a todos aqueles que
Page 107: RAFAEL SAMPAIO OCTAVIANO DE SOUZA - HCTE/UFRJ · a todos os que já intercederam perante o Criador por esta pobre alma. AGRADECIMENTOS Ao Criador, por tudo, e a todos aqueles que
Page 108: RAFAEL SAMPAIO OCTAVIANO DE SOUZA - HCTE/UFRJ · a todos os que já intercederam perante o Criador por esta pobre alma. AGRADECIMENTOS Ao Criador, por tudo, e a todos aqueles que
Page 109: RAFAEL SAMPAIO OCTAVIANO DE SOUZA - HCTE/UFRJ · a todos os que já intercederam perante o Criador por esta pobre alma. AGRADECIMENTOS Ao Criador, por tudo, e a todos aqueles que
Page 110: RAFAEL SAMPAIO OCTAVIANO DE SOUZA - HCTE/UFRJ · a todos os que já intercederam perante o Criador por esta pobre alma. AGRADECIMENTOS Ao Criador, por tudo, e a todos aqueles que
Page 111: RAFAEL SAMPAIO OCTAVIANO DE SOUZA - HCTE/UFRJ · a todos os que já intercederam perante o Criador por esta pobre alma. AGRADECIMENTOS Ao Criador, por tudo, e a todos aqueles que
Page 112: RAFAEL SAMPAIO OCTAVIANO DE SOUZA - HCTE/UFRJ · a todos os que já intercederam perante o Criador por esta pobre alma. AGRADECIMENTOS Ao Criador, por tudo, e a todos aqueles que
Page 113: RAFAEL SAMPAIO OCTAVIANO DE SOUZA - HCTE/UFRJ · a todos os que já intercederam perante o Criador por esta pobre alma. AGRADECIMENTOS Ao Criador, por tudo, e a todos aqueles que
Page 114: RAFAEL SAMPAIO OCTAVIANO DE SOUZA - HCTE/UFRJ · a todos os que já intercederam perante o Criador por esta pobre alma. AGRADECIMENTOS Ao Criador, por tudo, e a todos aqueles que
Page 115: RAFAEL SAMPAIO OCTAVIANO DE SOUZA - HCTE/UFRJ · a todos os que já intercederam perante o Criador por esta pobre alma. AGRADECIMENTOS Ao Criador, por tudo, e a todos aqueles que
Page 116: RAFAEL SAMPAIO OCTAVIANO DE SOUZA - HCTE/UFRJ · a todos os que já intercederam perante o Criador por esta pobre alma. AGRADECIMENTOS Ao Criador, por tudo, e a todos aqueles que
Page 117: RAFAEL SAMPAIO OCTAVIANO DE SOUZA - HCTE/UFRJ · a todos os que já intercederam perante o Criador por esta pobre alma. AGRADECIMENTOS Ao Criador, por tudo, e a todos aqueles que
Page 118: RAFAEL SAMPAIO OCTAVIANO DE SOUZA - HCTE/UFRJ · a todos os que já intercederam perante o Criador por esta pobre alma. AGRADECIMENTOS Ao Criador, por tudo, e a todos aqueles que
Page 119: RAFAEL SAMPAIO OCTAVIANO DE SOUZA - HCTE/UFRJ · a todos os que já intercederam perante o Criador por esta pobre alma. AGRADECIMENTOS Ao Criador, por tudo, e a todos aqueles que
Page 120: RAFAEL SAMPAIO OCTAVIANO DE SOUZA - HCTE/UFRJ · a todos os que já intercederam perante o Criador por esta pobre alma. AGRADECIMENTOS Ao Criador, por tudo, e a todos aqueles que
Page 121: RAFAEL SAMPAIO OCTAVIANO DE SOUZA - HCTE/UFRJ · a todos os que já intercederam perante o Criador por esta pobre alma. AGRADECIMENTOS Ao Criador, por tudo, e a todos aqueles que
Page 122: RAFAEL SAMPAIO OCTAVIANO DE SOUZA - HCTE/UFRJ · a todos os que já intercederam perante o Criador por esta pobre alma. AGRADECIMENTOS Ao Criador, por tudo, e a todos aqueles que
Page 123: RAFAEL SAMPAIO OCTAVIANO DE SOUZA - HCTE/UFRJ · a todos os que já intercederam perante o Criador por esta pobre alma. AGRADECIMENTOS Ao Criador, por tudo, e a todos aqueles que
Page 124: RAFAEL SAMPAIO OCTAVIANO DE SOUZA - HCTE/UFRJ · a todos os que já intercederam perante o Criador por esta pobre alma. AGRADECIMENTOS Ao Criador, por tudo, e a todos aqueles que
Page 125: RAFAEL SAMPAIO OCTAVIANO DE SOUZA - HCTE/UFRJ · a todos os que já intercederam perante o Criador por esta pobre alma. AGRADECIMENTOS Ao Criador, por tudo, e a todos aqueles que
Page 126: RAFAEL SAMPAIO OCTAVIANO DE SOUZA - HCTE/UFRJ · a todos os que já intercederam perante o Criador por esta pobre alma. AGRADECIMENTOS Ao Criador, por tudo, e a todos aqueles que
Page 127: RAFAEL SAMPAIO OCTAVIANO DE SOUZA - HCTE/UFRJ · a todos os que já intercederam perante o Criador por esta pobre alma. AGRADECIMENTOS Ao Criador, por tudo, e a todos aqueles que
Page 128: RAFAEL SAMPAIO OCTAVIANO DE SOUZA - HCTE/UFRJ · a todos os que já intercederam perante o Criador por esta pobre alma. AGRADECIMENTOS Ao Criador, por tudo, e a todos aqueles que
Page 129: RAFAEL SAMPAIO OCTAVIANO DE SOUZA - HCTE/UFRJ · a todos os que já intercederam perante o Criador por esta pobre alma. AGRADECIMENTOS Ao Criador, por tudo, e a todos aqueles que
Page 130: RAFAEL SAMPAIO OCTAVIANO DE SOUZA - HCTE/UFRJ · a todos os que já intercederam perante o Criador por esta pobre alma. AGRADECIMENTOS Ao Criador, por tudo, e a todos aqueles que
Page 131: RAFAEL SAMPAIO OCTAVIANO DE SOUZA - HCTE/UFRJ · a todos os que já intercederam perante o Criador por esta pobre alma. AGRADECIMENTOS Ao Criador, por tudo, e a todos aqueles que
Page 132: RAFAEL SAMPAIO OCTAVIANO DE SOUZA - HCTE/UFRJ · a todos os que já intercederam perante o Criador por esta pobre alma. AGRADECIMENTOS Ao Criador, por tudo, e a todos aqueles que
Page 133: RAFAEL SAMPAIO OCTAVIANO DE SOUZA - HCTE/UFRJ · a todos os que já intercederam perante o Criador por esta pobre alma. AGRADECIMENTOS Ao Criador, por tudo, e a todos aqueles que
Page 134: RAFAEL SAMPAIO OCTAVIANO DE SOUZA - HCTE/UFRJ · a todos os que já intercederam perante o Criador por esta pobre alma. AGRADECIMENTOS Ao Criador, por tudo, e a todos aqueles que
Page 135: RAFAEL SAMPAIO OCTAVIANO DE SOUZA - HCTE/UFRJ · a todos os que já intercederam perante o Criador por esta pobre alma. AGRADECIMENTOS Ao Criador, por tudo, e a todos aqueles que
Page 136: RAFAEL SAMPAIO OCTAVIANO DE SOUZA - HCTE/UFRJ · a todos os que já intercederam perante o Criador por esta pobre alma. AGRADECIMENTOS Ao Criador, por tudo, e a todos aqueles que
Page 137: RAFAEL SAMPAIO OCTAVIANO DE SOUZA - HCTE/UFRJ · a todos os que já intercederam perante o Criador por esta pobre alma. AGRADECIMENTOS Ao Criador, por tudo, e a todos aqueles que
Page 138: RAFAEL SAMPAIO OCTAVIANO DE SOUZA - HCTE/UFRJ · a todos os que já intercederam perante o Criador por esta pobre alma. AGRADECIMENTOS Ao Criador, por tudo, e a todos aqueles que
Page 139: RAFAEL SAMPAIO OCTAVIANO DE SOUZA - HCTE/UFRJ · a todos os que já intercederam perante o Criador por esta pobre alma. AGRADECIMENTOS Ao Criador, por tudo, e a todos aqueles que
Page 140: RAFAEL SAMPAIO OCTAVIANO DE SOUZA - HCTE/UFRJ · a todos os que já intercederam perante o Criador por esta pobre alma. AGRADECIMENTOS Ao Criador, por tudo, e a todos aqueles que
Page 141: RAFAEL SAMPAIO OCTAVIANO DE SOUZA - HCTE/UFRJ · a todos os que já intercederam perante o Criador por esta pobre alma. AGRADECIMENTOS Ao Criador, por tudo, e a todos aqueles que
Page 142: RAFAEL SAMPAIO OCTAVIANO DE SOUZA - HCTE/UFRJ · a todos os que já intercederam perante o Criador por esta pobre alma. AGRADECIMENTOS Ao Criador, por tudo, e a todos aqueles que
Page 143: RAFAEL SAMPAIO OCTAVIANO DE SOUZA - HCTE/UFRJ · a todos os que já intercederam perante o Criador por esta pobre alma. AGRADECIMENTOS Ao Criador, por tudo, e a todos aqueles que
Page 144: RAFAEL SAMPAIO OCTAVIANO DE SOUZA - HCTE/UFRJ · a todos os que já intercederam perante o Criador por esta pobre alma. AGRADECIMENTOS Ao Criador, por tudo, e a todos aqueles que
Page 145: RAFAEL SAMPAIO OCTAVIANO DE SOUZA - HCTE/UFRJ · a todos os que já intercederam perante o Criador por esta pobre alma. AGRADECIMENTOS Ao Criador, por tudo, e a todos aqueles que
Page 146: RAFAEL SAMPAIO OCTAVIANO DE SOUZA - HCTE/UFRJ · a todos os que já intercederam perante o Criador por esta pobre alma. AGRADECIMENTOS Ao Criador, por tudo, e a todos aqueles que
Page 147: RAFAEL SAMPAIO OCTAVIANO DE SOUZA - HCTE/UFRJ · a todos os que já intercederam perante o Criador por esta pobre alma. AGRADECIMENTOS Ao Criador, por tudo, e a todos aqueles que
Page 148: RAFAEL SAMPAIO OCTAVIANO DE SOUZA - HCTE/UFRJ · a todos os que já intercederam perante o Criador por esta pobre alma. AGRADECIMENTOS Ao Criador, por tudo, e a todos aqueles que
Page 149: RAFAEL SAMPAIO OCTAVIANO DE SOUZA - HCTE/UFRJ · a todos os que já intercederam perante o Criador por esta pobre alma. AGRADECIMENTOS Ao Criador, por tudo, e a todos aqueles que
Page 150: RAFAEL SAMPAIO OCTAVIANO DE SOUZA - HCTE/UFRJ · a todos os que já intercederam perante o Criador por esta pobre alma. AGRADECIMENTOS Ao Criador, por tudo, e a todos aqueles que
Page 151: RAFAEL SAMPAIO OCTAVIANO DE SOUZA - HCTE/UFRJ · a todos os que já intercederam perante o Criador por esta pobre alma. AGRADECIMENTOS Ao Criador, por tudo, e a todos aqueles que
Page 152: RAFAEL SAMPAIO OCTAVIANO DE SOUZA - HCTE/UFRJ · a todos os que já intercederam perante o Criador por esta pobre alma. AGRADECIMENTOS Ao Criador, por tudo, e a todos aqueles que
Page 153: RAFAEL SAMPAIO OCTAVIANO DE SOUZA - HCTE/UFRJ · a todos os que já intercederam perante o Criador por esta pobre alma. AGRADECIMENTOS Ao Criador, por tudo, e a todos aqueles que
Page 154: RAFAEL SAMPAIO OCTAVIANO DE SOUZA - HCTE/UFRJ · a todos os que já intercederam perante o Criador por esta pobre alma. AGRADECIMENTOS Ao Criador, por tudo, e a todos aqueles que
Page 155: RAFAEL SAMPAIO OCTAVIANO DE SOUZA - HCTE/UFRJ · a todos os que já intercederam perante o Criador por esta pobre alma. AGRADECIMENTOS Ao Criador, por tudo, e a todos aqueles que
Page 156: RAFAEL SAMPAIO OCTAVIANO DE SOUZA - HCTE/UFRJ · a todos os que já intercederam perante o Criador por esta pobre alma. AGRADECIMENTOS Ao Criador, por tudo, e a todos aqueles que
Page 157: RAFAEL SAMPAIO OCTAVIANO DE SOUZA - HCTE/UFRJ · a todos os que já intercederam perante o Criador por esta pobre alma. AGRADECIMENTOS Ao Criador, por tudo, e a todos aqueles que
Page 158: RAFAEL SAMPAIO OCTAVIANO DE SOUZA - HCTE/UFRJ · a todos os que já intercederam perante o Criador por esta pobre alma. AGRADECIMENTOS Ao Criador, por tudo, e a todos aqueles que
Page 159: RAFAEL SAMPAIO OCTAVIANO DE SOUZA - HCTE/UFRJ · a todos os que já intercederam perante o Criador por esta pobre alma. AGRADECIMENTOS Ao Criador, por tudo, e a todos aqueles que
Page 160: RAFAEL SAMPAIO OCTAVIANO DE SOUZA - HCTE/UFRJ · a todos os que já intercederam perante o Criador por esta pobre alma. AGRADECIMENTOS Ao Criador, por tudo, e a todos aqueles que
Page 161: RAFAEL SAMPAIO OCTAVIANO DE SOUZA - HCTE/UFRJ · a todos os que já intercederam perante o Criador por esta pobre alma. AGRADECIMENTOS Ao Criador, por tudo, e a todos aqueles que
Page 162: RAFAEL SAMPAIO OCTAVIANO DE SOUZA - HCTE/UFRJ · a todos os que já intercederam perante o Criador por esta pobre alma. AGRADECIMENTOS Ao Criador, por tudo, e a todos aqueles que
Page 163: RAFAEL SAMPAIO OCTAVIANO DE SOUZA - HCTE/UFRJ · a todos os que já intercederam perante o Criador por esta pobre alma. AGRADECIMENTOS Ao Criador, por tudo, e a todos aqueles que
Page 164: RAFAEL SAMPAIO OCTAVIANO DE SOUZA - HCTE/UFRJ · a todos os que já intercederam perante o Criador por esta pobre alma. AGRADECIMENTOS Ao Criador, por tudo, e a todos aqueles que
Page 165: RAFAEL SAMPAIO OCTAVIANO DE SOUZA - HCTE/UFRJ · a todos os que já intercederam perante o Criador por esta pobre alma. AGRADECIMENTOS Ao Criador, por tudo, e a todos aqueles que
Page 166: RAFAEL SAMPAIO OCTAVIANO DE SOUZA - HCTE/UFRJ · a todos os que já intercederam perante o Criador por esta pobre alma. AGRADECIMENTOS Ao Criador, por tudo, e a todos aqueles que
Page 167: RAFAEL SAMPAIO OCTAVIANO DE SOUZA - HCTE/UFRJ · a todos os que já intercederam perante o Criador por esta pobre alma. AGRADECIMENTOS Ao Criador, por tudo, e a todos aqueles que
Page 168: RAFAEL SAMPAIO OCTAVIANO DE SOUZA - HCTE/UFRJ · a todos os que já intercederam perante o Criador por esta pobre alma. AGRADECIMENTOS Ao Criador, por tudo, e a todos aqueles que
Page 169: RAFAEL SAMPAIO OCTAVIANO DE SOUZA - HCTE/UFRJ · a todos os que já intercederam perante o Criador por esta pobre alma. AGRADECIMENTOS Ao Criador, por tudo, e a todos aqueles que
Page 170: RAFAEL SAMPAIO OCTAVIANO DE SOUZA - HCTE/UFRJ · a todos os que já intercederam perante o Criador por esta pobre alma. AGRADECIMENTOS Ao Criador, por tudo, e a todos aqueles que
Page 171: RAFAEL SAMPAIO OCTAVIANO DE SOUZA - HCTE/UFRJ · a todos os que já intercederam perante o Criador por esta pobre alma. AGRADECIMENTOS Ao Criador, por tudo, e a todos aqueles que
Page 172: RAFAEL SAMPAIO OCTAVIANO DE SOUZA - HCTE/UFRJ · a todos os que já intercederam perante o Criador por esta pobre alma. AGRADECIMENTOS Ao Criador, por tudo, e a todos aqueles que
Page 173: RAFAEL SAMPAIO OCTAVIANO DE SOUZA - HCTE/UFRJ · a todos os que já intercederam perante o Criador por esta pobre alma. AGRADECIMENTOS Ao Criador, por tudo, e a todos aqueles que
Page 174: RAFAEL SAMPAIO OCTAVIANO DE SOUZA - HCTE/UFRJ · a todos os que já intercederam perante o Criador por esta pobre alma. AGRADECIMENTOS Ao Criador, por tudo, e a todos aqueles que
Page 175: RAFAEL SAMPAIO OCTAVIANO DE SOUZA - HCTE/UFRJ · a todos os que já intercederam perante o Criador por esta pobre alma. AGRADECIMENTOS Ao Criador, por tudo, e a todos aqueles que
Page 176: RAFAEL SAMPAIO OCTAVIANO DE SOUZA - HCTE/UFRJ · a todos os que já intercederam perante o Criador por esta pobre alma. AGRADECIMENTOS Ao Criador, por tudo, e a todos aqueles que
Page 177: RAFAEL SAMPAIO OCTAVIANO DE SOUZA - HCTE/UFRJ · a todos os que já intercederam perante o Criador por esta pobre alma. AGRADECIMENTOS Ao Criador, por tudo, e a todos aqueles que
Page 178: RAFAEL SAMPAIO OCTAVIANO DE SOUZA - HCTE/UFRJ · a todos os que já intercederam perante o Criador por esta pobre alma. AGRADECIMENTOS Ao Criador, por tudo, e a todos aqueles que
Page 179: RAFAEL SAMPAIO OCTAVIANO DE SOUZA - HCTE/UFRJ · a todos os que já intercederam perante o Criador por esta pobre alma. AGRADECIMENTOS Ao Criador, por tudo, e a todos aqueles que
Page 180: RAFAEL SAMPAIO OCTAVIANO DE SOUZA - HCTE/UFRJ · a todos os que já intercederam perante o Criador por esta pobre alma. AGRADECIMENTOS Ao Criador, por tudo, e a todos aqueles que
Page 181: RAFAEL SAMPAIO OCTAVIANO DE SOUZA - HCTE/UFRJ · a todos os que já intercederam perante o Criador por esta pobre alma. AGRADECIMENTOS Ao Criador, por tudo, e a todos aqueles que
Page 182: RAFAEL SAMPAIO OCTAVIANO DE SOUZA - HCTE/UFRJ · a todos os que já intercederam perante o Criador por esta pobre alma. AGRADECIMENTOS Ao Criador, por tudo, e a todos aqueles que
Page 183: RAFAEL SAMPAIO OCTAVIANO DE SOUZA - HCTE/UFRJ · a todos os que já intercederam perante o Criador por esta pobre alma. AGRADECIMENTOS Ao Criador, por tudo, e a todos aqueles que
Page 184: RAFAEL SAMPAIO OCTAVIANO DE SOUZA - HCTE/UFRJ · a todos os que já intercederam perante o Criador por esta pobre alma. AGRADECIMENTOS Ao Criador, por tudo, e a todos aqueles que
Page 185: RAFAEL SAMPAIO OCTAVIANO DE SOUZA - HCTE/UFRJ · a todos os que já intercederam perante o Criador por esta pobre alma. AGRADECIMENTOS Ao Criador, por tudo, e a todos aqueles que
Page 186: RAFAEL SAMPAIO OCTAVIANO DE SOUZA - HCTE/UFRJ · a todos os que já intercederam perante o Criador por esta pobre alma. AGRADECIMENTOS Ao Criador, por tudo, e a todos aqueles que
Page 187: RAFAEL SAMPAIO OCTAVIANO DE SOUZA - HCTE/UFRJ · a todos os que já intercederam perante o Criador por esta pobre alma. AGRADECIMENTOS Ao Criador, por tudo, e a todos aqueles que
Page 188: RAFAEL SAMPAIO OCTAVIANO DE SOUZA - HCTE/UFRJ · a todos os que já intercederam perante o Criador por esta pobre alma. AGRADECIMENTOS Ao Criador, por tudo, e a todos aqueles que
Page 189: RAFAEL SAMPAIO OCTAVIANO DE SOUZA - HCTE/UFRJ · a todos os que já intercederam perante o Criador por esta pobre alma. AGRADECIMENTOS Ao Criador, por tudo, e a todos aqueles que
Page 190: RAFAEL SAMPAIO OCTAVIANO DE SOUZA - HCTE/UFRJ · a todos os que já intercederam perante o Criador por esta pobre alma. AGRADECIMENTOS Ao Criador, por tudo, e a todos aqueles que
Page 191: RAFAEL SAMPAIO OCTAVIANO DE SOUZA - HCTE/UFRJ · a todos os que já intercederam perante o Criador por esta pobre alma. AGRADECIMENTOS Ao Criador, por tudo, e a todos aqueles que
Page 192: RAFAEL SAMPAIO OCTAVIANO DE SOUZA - HCTE/UFRJ · a todos os que já intercederam perante o Criador por esta pobre alma. AGRADECIMENTOS Ao Criador, por tudo, e a todos aqueles que
Page 193: RAFAEL SAMPAIO OCTAVIANO DE SOUZA - HCTE/UFRJ · a todos os que já intercederam perante o Criador por esta pobre alma. AGRADECIMENTOS Ao Criador, por tudo, e a todos aqueles que
Page 194: RAFAEL SAMPAIO OCTAVIANO DE SOUZA - HCTE/UFRJ · a todos os que já intercederam perante o Criador por esta pobre alma. AGRADECIMENTOS Ao Criador, por tudo, e a todos aqueles que
Page 195: RAFAEL SAMPAIO OCTAVIANO DE SOUZA - HCTE/UFRJ · a todos os que já intercederam perante o Criador por esta pobre alma. AGRADECIMENTOS Ao Criador, por tudo, e a todos aqueles que
Page 196: RAFAEL SAMPAIO OCTAVIANO DE SOUZA - HCTE/UFRJ · a todos os que já intercederam perante o Criador por esta pobre alma. AGRADECIMENTOS Ao Criador, por tudo, e a todos aqueles que
Page 197: RAFAEL SAMPAIO OCTAVIANO DE SOUZA - HCTE/UFRJ · a todos os que já intercederam perante o Criador por esta pobre alma. AGRADECIMENTOS Ao Criador, por tudo, e a todos aqueles que
Page 198: RAFAEL SAMPAIO OCTAVIANO DE SOUZA - HCTE/UFRJ · a todos os que já intercederam perante o Criador por esta pobre alma. AGRADECIMENTOS Ao Criador, por tudo, e a todos aqueles que
Page 199: RAFAEL SAMPAIO OCTAVIANO DE SOUZA - HCTE/UFRJ · a todos os que já intercederam perante o Criador por esta pobre alma. AGRADECIMENTOS Ao Criador, por tudo, e a todos aqueles que
Page 200: RAFAEL SAMPAIO OCTAVIANO DE SOUZA - HCTE/UFRJ · a todos os que já intercederam perante o Criador por esta pobre alma. AGRADECIMENTOS Ao Criador, por tudo, e a todos aqueles que
Page 201: RAFAEL SAMPAIO OCTAVIANO DE SOUZA - HCTE/UFRJ · a todos os que já intercederam perante o Criador por esta pobre alma. AGRADECIMENTOS Ao Criador, por tudo, e a todos aqueles que
Page 202: RAFAEL SAMPAIO OCTAVIANO DE SOUZA - HCTE/UFRJ · a todos os que já intercederam perante o Criador por esta pobre alma. AGRADECIMENTOS Ao Criador, por tudo, e a todos aqueles que
Page 203: RAFAEL SAMPAIO OCTAVIANO DE SOUZA - HCTE/UFRJ · a todos os que já intercederam perante o Criador por esta pobre alma. AGRADECIMENTOS Ao Criador, por tudo, e a todos aqueles que
Page 204: RAFAEL SAMPAIO OCTAVIANO DE SOUZA - HCTE/UFRJ · a todos os que já intercederam perante o Criador por esta pobre alma. AGRADECIMENTOS Ao Criador, por tudo, e a todos aqueles que
Page 205: RAFAEL SAMPAIO OCTAVIANO DE SOUZA - HCTE/UFRJ · a todos os que já intercederam perante o Criador por esta pobre alma. AGRADECIMENTOS Ao Criador, por tudo, e a todos aqueles que
Page 206: RAFAEL SAMPAIO OCTAVIANO DE SOUZA - HCTE/UFRJ · a todos os que já intercederam perante o Criador por esta pobre alma. AGRADECIMENTOS Ao Criador, por tudo, e a todos aqueles que
Page 207: RAFAEL SAMPAIO OCTAVIANO DE SOUZA - HCTE/UFRJ · a todos os que já intercederam perante o Criador por esta pobre alma. AGRADECIMENTOS Ao Criador, por tudo, e a todos aqueles que
Page 208: RAFAEL SAMPAIO OCTAVIANO DE SOUZA - HCTE/UFRJ · a todos os que já intercederam perante o Criador por esta pobre alma. AGRADECIMENTOS Ao Criador, por tudo, e a todos aqueles que
Page 209: RAFAEL SAMPAIO OCTAVIANO DE SOUZA - HCTE/UFRJ · a todos os que já intercederam perante o Criador por esta pobre alma. AGRADECIMENTOS Ao Criador, por tudo, e a todos aqueles que
Page 210: RAFAEL SAMPAIO OCTAVIANO DE SOUZA - HCTE/UFRJ · a todos os que já intercederam perante o Criador por esta pobre alma. AGRADECIMENTOS Ao Criador, por tudo, e a todos aqueles que
Page 211: RAFAEL SAMPAIO OCTAVIANO DE SOUZA - HCTE/UFRJ · a todos os que já intercederam perante o Criador por esta pobre alma. AGRADECIMENTOS Ao Criador, por tudo, e a todos aqueles que
Page 212: RAFAEL SAMPAIO OCTAVIANO DE SOUZA - HCTE/UFRJ · a todos os que já intercederam perante o Criador por esta pobre alma. AGRADECIMENTOS Ao Criador, por tudo, e a todos aqueles que
Page 213: RAFAEL SAMPAIO OCTAVIANO DE SOUZA - HCTE/UFRJ · a todos os que já intercederam perante o Criador por esta pobre alma. AGRADECIMENTOS Ao Criador, por tudo, e a todos aqueles que
Page 214: RAFAEL SAMPAIO OCTAVIANO DE SOUZA - HCTE/UFRJ · a todos os que já intercederam perante o Criador por esta pobre alma. AGRADECIMENTOS Ao Criador, por tudo, e a todos aqueles que
Page 215: RAFAEL SAMPAIO OCTAVIANO DE SOUZA - HCTE/UFRJ · a todos os que já intercederam perante o Criador por esta pobre alma. AGRADECIMENTOS Ao Criador, por tudo, e a todos aqueles que
Page 216: RAFAEL SAMPAIO OCTAVIANO DE SOUZA - HCTE/UFRJ · a todos os que já intercederam perante o Criador por esta pobre alma. AGRADECIMENTOS Ao Criador, por tudo, e a todos aqueles que
Page 217: RAFAEL SAMPAIO OCTAVIANO DE SOUZA - HCTE/UFRJ · a todos os que já intercederam perante o Criador por esta pobre alma. AGRADECIMENTOS Ao Criador, por tudo, e a todos aqueles que
Page 218: RAFAEL SAMPAIO OCTAVIANO DE SOUZA - HCTE/UFRJ · a todos os que já intercederam perante o Criador por esta pobre alma. AGRADECIMENTOS Ao Criador, por tudo, e a todos aqueles que
Page 219: RAFAEL SAMPAIO OCTAVIANO DE SOUZA - HCTE/UFRJ · a todos os que já intercederam perante o Criador por esta pobre alma. AGRADECIMENTOS Ao Criador, por tudo, e a todos aqueles que
Page 220: RAFAEL SAMPAIO OCTAVIANO DE SOUZA - HCTE/UFRJ · a todos os que já intercederam perante o Criador por esta pobre alma. AGRADECIMENTOS Ao Criador, por tudo, e a todos aqueles que
Page 221: RAFAEL SAMPAIO OCTAVIANO DE SOUZA - HCTE/UFRJ · a todos os que já intercederam perante o Criador por esta pobre alma. AGRADECIMENTOS Ao Criador, por tudo, e a todos aqueles que
Page 222: RAFAEL SAMPAIO OCTAVIANO DE SOUZA - HCTE/UFRJ · a todos os que já intercederam perante o Criador por esta pobre alma. AGRADECIMENTOS Ao Criador, por tudo, e a todos aqueles que
Page 223: RAFAEL SAMPAIO OCTAVIANO DE SOUZA - HCTE/UFRJ · a todos os que já intercederam perante o Criador por esta pobre alma. AGRADECIMENTOS Ao Criador, por tudo, e a todos aqueles que
Page 224: RAFAEL SAMPAIO OCTAVIANO DE SOUZA - HCTE/UFRJ · a todos os que já intercederam perante o Criador por esta pobre alma. AGRADECIMENTOS Ao Criador, por tudo, e a todos aqueles que
Page 225: RAFAEL SAMPAIO OCTAVIANO DE SOUZA - HCTE/UFRJ · a todos os que já intercederam perante o Criador por esta pobre alma. AGRADECIMENTOS Ao Criador, por tudo, e a todos aqueles que
Page 226: RAFAEL SAMPAIO OCTAVIANO DE SOUZA - HCTE/UFRJ · a todos os que já intercederam perante o Criador por esta pobre alma. AGRADECIMENTOS Ao Criador, por tudo, e a todos aqueles que
Page 227: RAFAEL SAMPAIO OCTAVIANO DE SOUZA - HCTE/UFRJ · a todos os que já intercederam perante o Criador por esta pobre alma. AGRADECIMENTOS Ao Criador, por tudo, e a todos aqueles que
Page 228: RAFAEL SAMPAIO OCTAVIANO DE SOUZA - HCTE/UFRJ · a todos os que já intercederam perante o Criador por esta pobre alma. AGRADECIMENTOS Ao Criador, por tudo, e a todos aqueles que
Page 229: RAFAEL SAMPAIO OCTAVIANO DE SOUZA - HCTE/UFRJ · a todos os que já intercederam perante o Criador por esta pobre alma. AGRADECIMENTOS Ao Criador, por tudo, e a todos aqueles que
Page 230: RAFAEL SAMPAIO OCTAVIANO DE SOUZA - HCTE/UFRJ · a todos os que já intercederam perante o Criador por esta pobre alma. AGRADECIMENTOS Ao Criador, por tudo, e a todos aqueles que