psicomotricidade em serviço do processo de aquisição de linguagem e letramento

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PSICOMOTRICIDADE EM SERVIÇO DO PROCESSO DE AQUISIÇÃO DE LINGUAGEM E LETRAMENTO Leila Sanches Brandão 1 Ana Cristina Cury Teodoro de Oliveira 2 RESUMO: O presente artigo em visa realizar considerações sobre a importância da psicomotricidade em serviço do processo de aquisição de linguagem e letramento na educação infantil baseado em entrevistas de campo com profissionais que atuam na área. A presente pesquisa busca esclarecer se o desenvolvimento motor e o equilíbrio são, de fato, características fundamentais para que a criança desenvolva sua mentalidade intelectual. PALAVRAS-CHAVE: psicomotricidade; educação infantil; aquisição; linguagem; letramento. 1. INTRODUÇÃO Estudos cognitivos apontam que corpo e mente são entes interligados, pois nosso primeiro contato com o mundo se dá através dos nossos sentidos corporais, e em conseqüência disso algumas extensões de sentido são estabelecidas. Segundo o especialista em lingüística cognitiva Mário Eduardo Martelotta (2008), Segundo esse ponto de vista, nossa estrutura corporal é extremamente importante, já que a percepção que temos do mundo é limitada por nossas características físicas. A mente, portanto, não é separada do corpo. Ao contrário, o pensamento é corporificado no sentido de que a sua estrutura e a sua organização estão diretamente associadas à estrutura de nosso corpo, bem como às nossas restrições de percepção e de movimento de espaço. Isso significa dizer que o espaço em que habitamos transpassa em nossas falas, porque o processo de cognição mescla nosso mundo. Dessa maneira, torna-se imprescindível enfatizar a importância do corpo e das restrições que ele impõe ao modo como experienciamos o mundo, pois é a partir disso que será desenvolvido o processo de 1 Graduanda em Pedagogia. 2 Possui graduação em Pintura pela Escola de Música e Belas Artes do Paraná (1996), graduação em Educação Artística Desenho pela Universidade Federal do Paraná (2005) e mestrado em Educação pela Pontifícia Universidade Católica do Paraná (2006). Tem experiência na área de artes, com ênfase em artes visuais, atuando principalmente nos seguintes temas: educação a distância, formação de professores, ensino de arte, projetos educacionais e educação continuada. Produz trabalhos de artes visuais como pinturas, gravuras, desenhos e esculturas. É professora na Faculdade Educacional da Lapa - FAEL.

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O presente artigo em visa realizar considerações sobre a importância da psicomotricidade em serviço do processo de aquisição de linguagem e letramento na educação infantil baseado em entrevistas de campo com profissionais que atuam na área. A presente pesquisa busca esclarecer se o desenvolvimento motor e o equilíbrio são, de fato, características fundamentais para que a criança desenvolva sua mentalidade intelectual.

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Page 1: Psicomotricidade Em Serviço Do Processo de Aquisição de Linguagem e Letramento

PSICOMOTRICIDADE EM SERVIÇO DO PROCESSO DE AQUISIÇÃO DE

LINGUAGEM E LETRAMENTO

Leila Sanches Brandão1

Ana Cristina Cury Teodoro de Oliveira2

RESUMO: O presente artigo em visa realizar considerações sobre a importância da

psicomotricidade em serviço do processo de aquisição de linguagem e letramento na

educação infantil baseado em entrevistas de campo com profissionais que atuam na

área. A presente pesquisa busca esclarecer se o desenvolvimento motor e o equilíbrio

são, de fato, características fundamentais para que a criança desenvolva sua mentalidade

intelectual.

PALAVRAS-CHAVE: psicomotricidade; educação infantil; aquisição; linguagem;

letramento.

1. INTRODUÇÃO

Estudos cognitivos apontam que corpo e mente são entes interligados, pois nosso

primeiro contato com o mundo se dá através dos nossos sentidos corporais, e em

conseqüência disso algumas extensões de sentido são estabelecidas. Segundo o

especialista em lingüística cognitiva Mário Eduardo Martelotta (2008),

Segundo esse ponto de vista, nossa estrutura corporal é

extremamente importante, já que a percepção que temos do

mundo é limitada por nossas características físicas. A mente,

portanto, não é separada do corpo. Ao contrário, o pensamento é

corporificado no sentido de que a sua estrutura e a sua

organização estão diretamente associadas à estrutura de nosso

corpo, bem como às nossas restrições de percepção e de

movimento de espaço.

Isso significa dizer que o espaço em que habitamos transpassa em nossas falas, porque o

processo de cognição mescla nosso mundo. Dessa maneira, torna-se imprescindível

enfatizar a importância do corpo e das restrições que ele impõe ao modo como

experienciamos o mundo, pois é a partir disso que será desenvolvido o processo de

1 Graduanda em Pedagogia. 2 Possui graduação em Pintura pela Escola de Música e Belas Artes do Paraná (1996), graduação em Educação Artística Desenho pela Universidade Federal do Paraná (2005) e mestrado em Educação pela Pontifícia Universidade Católica do Paraná (2006). Tem experiência na área de artes, com ênfase em artes visuais, atuando principalmente nos seguintes temas: educação a distância, formação de professores, ensino de arte, projetos educacionais e educação continuada. Produz trabalhos de artes visuais como pinturas, gravuras, desenhos e esculturas. É professora na Faculdade Educacional da Lapa - FAEL.

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significação e expressão do mundo. Para comprovação dessa afirmação é pertinente

citar, novamente, Martelotta "Os cognitivistas tomam os sentidos como sendo entidades

conceptuais que o falante faz de cenas ou fatos da vida cotidiana. [...]", portanto,

segundo os cognitivistas corpo e mente estão intrinsecamente conectados.

Nesta perspectiva, esse pensamento pode ser unificado à educação infantil através da

psicomotricidade para contribuir no desenvolvimento do sujeito no contexto de

aprendizagem, como o psicólogo especialista em educação infantil Henri Wallon afirma,

"o corpo é uma totalidade e uma estrutura interna essencial para o desenvolvimento

mental, afetivo e motor da criança." Logo, a psicomotricidade não atenderia somente a

dimensão motora da construção do corpo, mas também a emotiva e cognitiva, uma vez

que favorece e estimula o processo do conhecimento através da internalização de

construções sociais que se desenvolvem a partir dessa integração. Um corpo que é

atendido nessas três dimensões tende a evoluir e desenvolver suas potencialidades e

habilidades.

Para enfatizar as contribuições que a psicomotricidade fornece para a educação,

podemos citar Fonseca (1995), "A psicomotricidade é um meio inesgotável de

afinamento perceptivo-motor que põe em jogo a complexidade dos processos mentais,

fundamentais para a polivalência preventiva e terapêutica das dificuldades de

aprendizagem.", ou seja, sua utilização possibilita a detecção das dificuldades escolares

nas crianças proporcionando que se tome consciência das relações existentes entre o

gesto e a afetividade. A psicomotricidade nada mais é que um mecanismo - uma saída -

para o educador intervir na aquisição do conhecimento para melhorar seu desempenho

no contexto de educação infantil.

Logo, torna-se de fundamental importância considerar esses pressupostos e realizar

alguns questionamentos: Será que se o professor atrelasse a psicomotricidade à

educação infantil iria obter melhores resultados na educação infantil? Os professores

estão estimulando seus alunos da maneira adequada? Eles valorizam a importância da

psicomotricidade na aprendizagem? Afinal, como afirma Barreto (2000), “O

desenvolvimento psicomotor é de suma importância na prevenção de problemas da

aprendizagem e na reeducação do tônus, da postura, da direcional idade, da lateralidade

e do ritmo”.

Por isso, o presente trabalho decidiu entrevistar alguns profissionais que trabalham

diretamente com educação infantil ou possuem alguma ligação direta a temática

trabalhada com o objetivo de esclarecer sua aplicabilidade. Uma vez que estudos e

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pesquisas sobre o tema estão cada vez mais frequentes e alusivos e dificilmente visam o

campo do desenvolvimento contribuindo para relação evolutiva da psicomotricidade

com a inteligência, afeto e emoção, e a aquisição de linguagem.

2. PSICOMOTRICIDADE: SUBSÍDIOS TEÓRICOS

Sabe-se que psicomotricidade enquanto ciência preocupa-se em estudar o movimento

humano, considerando o sujeito em sua totalidade e, como já dito anteriormente, pode

ser utilizada como um meio que auxilia o professor para um melhor desempenho de

seus alunos. Será Wallon (2005) que se debruçará sobre os estudos aprofundados de

psicomotricidade, ressaltando sua importância e relacionando o movimento ao afeto e

a emoção. Fonseca (2008, p. 22), outro especialista na área, reitera "para Wallon, a

evolução da criança processa-se em uma dialética de desenvolvimento na qual entram

em jogo inúmeros fatores: metabólicos, morfológicos, psicotônicos, psicoemocionais,

psicomotores e psicossociais."

No entanto, apesar de todos os estudos realizados na área e especialistas se debruçarem

sobre a causa, fica evidenciado a falta do desenvolvimento dos esquemas psicomotores

por parte dos educadores gerando uma problemática: crianças com dificuldade de

aprendizagem. Cabe ressaltar que o professor em si não é o culpado, pelo menos

acredita-se, uma vez que o educador recebe ordens e precisa seguir uma política própria

da escola, caso contrário é afastado de sua função ou demitido.

O estudo e trabalho da educação psicomotora prevêem a formação indispensável do

desenvolvimento motor, afetivo e psicológico da criança fornecendo a oportunidade

para que essas se conscientizem sobre seu corpo, por meio de jogos, de atividades

lúdicas e será com estudiosos como Le Boulch, Fonseca, Wallon, entre outros, que

buscaremos propor soluções aos questionamentos realizados na pesquisa.

Nesta perspectiva, é através da recreação que a criança desenvolve suas aptidões

perceptivas como meio de ajustamento do comportamento psicomotor. Para que a

criança desenvolva o controle mental de sua expressão motora, a recreação deve ser

realizada como atividades mentais de sua expressão motora, a recreação deve realizar

atividades considerando seus níveis de maturação biológica, assim como Piaget já

tratava na década de 60 e 70.

Ainda que muitos não concordem a brincadeira é a melhor maneira de se comunicar, um

meio para perguntar e explicar o mundo, é por meio desse instrumento que a criança se

relaciona com outras crianças e com o mundo. Brincando e interagindo as crianças

Page 4: Psicomotricidade Em Serviço Do Processo de Aquisição de Linguagem e Letramento

aprendem muito sobre si mesmo e tudo aquilo que as cerca, é oportunidade de procurar

a melhor forma de se integrar a esse mundo que encontram ao nascer.

De acordo com Le Boulch (1987), o desenvolvimento de uma criança é resultado da

interação de seu corpo com os objetos de seu meio, com as pessoas com quem convive e

com o mundo onde estabelece ligações afetivas e emocionais. O corpo, portanto, é a

extensão do seu ser e ver. É através dele que ela estabelece contato com o ambiente, que

entra no mundo, que compreende o outro. Todo ser humano tem seu mundo construído a

partir de suas próprias experiências corporais, sendo assim, a criança terá maior

habilidade para se diferenciar e para sentir essas diferenças, pois é através dele que ela

estabelecerá contato com o meio, interagindo em nível psicológico, psicomotor,

cognitivo e social.

Como já citado anteriormente por Barreto (2000), "o desenvolvimento psicomotor é de

completa importância na prevenção de problemas de aprendizagens e na reeducação do

tônus, da postura, da lateralidade e do ritmo." A educação infantil deve evidenciar a

relação através do movimento de seu próprio corpo, levando em consideração sua idade,

a cultura corporal e seus interesses. A educação psicomotora para ser trabalhada

necessita que sejam utilizadas as funções motoras, perceptivas, afetivo e sócio motoras,

pois somente assim a criança explora o ambiente, passa por experiências concretas,

indispensáveis ao seu desenvolvimento intelectual, e é capaz de tomar consciência de si

mesma e do mundo que a cerca.

Segundo Piaget (1975), é dos 7 aos 12 anos que ocorre a estruturação do esquema

corporal. A criança já adquiriu noções do todo e das partes do corpo, o início desta fase

é marcada pela imagem do corpo estática, mas por volta dos 10 ou 12 anos a criança

passa a ter uma imagem mental do corpo em movimento, e é denominada de estágio das

operações concretas. Este período marca uma modificação decisiva e importante no

desenvolvimento, mental, intelectual, afetivo, relações sociais e ainda outros aspectos

indicados como básicos na psicomotricidade que é a lateralidade, estruturação espacial,

orientação temporal e a percepção através dos cinco sentidos. Logo se trabalhado isso

com o rigor necessário no futuro, a criança pode não apresentar problemas de ordem

cognitiva, motora e afetiva.

Já na estruturação espacial, a criança percebe a posição do seu corpo no espaço. Em

seguida, a posição dos objetos em relação a si mesma. E por fim, aprende a perceber as

relações das posições dos objetos entre si, ou seja, passa a se ver no meio em que vive,

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realiza relações entre os objetos e elementos, faz observações, compara, combina,

percebendo as diferenças e semelhanças.

Dando continuidade, é preciso citar sobre a orientação temporal, que é outro elemento

básico a ser trabalhado na psicomotricidade. Nada mais é do que a capacidade que a

criança tem de situar-se a partir de uma sucessão de acontecimentos, duração de tempo

e períodos. Como essas noções são demasiadamente abstratas, elas são adquiridas em

longo prazo e para que ocorra a aquisição da noção de sucessão são necessárias as

experiências sensório-motoras.

Portanto, estimular, analisar e avaliar as aprendizagens significativas das crianças

envolvidas no projeto através da estimulação psicomotora em seu desenvolvimento

motor, cognitivo, afetivo e psíquico, esse é o objetivo central da educação pelo

movimento que contribui para o desenvolvimento psicomotor da criança, da qual

depende, ao mesmo tempo, a evolução de sua personalidade e o sucesso escolar (LE

BOULCH, 1984, p. 24).

2.1 PROBLEMA E PESQUISA.

Diante de todas as teorias apresentadas será que os professores estão, verdadeiramente,

atualizados para aplicarem a psicomotricidade na educação infantil? Será que

compreendem sua importância e utilização em sala de aula? Estariam esses professores

comprometidos com seus alunos a ponto de aplicar a psicomotricidade na prática? Ou

estariam aplicando e ela não surte efeito? Por que, então, tantas críticas? Esse terreno

parece ser muito mais nebuloso do que parece.

Para responder a essas e outras questões foram realizadas duas entrevistas de campo

com uma pedagoga que atua no conselho tutelar de Duque de Caxias e com uma

professora de educação infantil formada em Letras - português/latim.

Seguem as entrevistas:

Entrevista I

Entrevistada: Marcia Cristina Conceição de Albuquerque3.

1. Como você vê a importância da educação psicomotora no desenvolvimento global da

criança na escola?

Marcia: Acredito que atividades psicomotoras auxiliam no desenvolvimento global das

crianças na educação infantil, pois são atividades simples, de origem lúdica que

3 Formada pela Unigranrio em pedagogia plena Unigranrio. Atua no conselho tutelar de Duque de Caxias como conselheira e leciona como professora de ensino fundamental no colégio particular Educacional Sanches Rosa.

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abrangem várias áreas e ao serem trabalhadas de forma correta, por um profissional

especializado, colabora para a formação do aluno como um todo. (física, mental, e

afetivas).

2. Como você classifica a importância do desenvolvimento psicomotor na Educação

infantil?

Marcia: Acho interessante a integração entre as atividades psicomotoras, com um

conteúdo das demais disciplinas, fazendo das atividades psicomotoras fonte de criação

para realização de integração multidisciplinar.

3. No que diz respeito sobre o papel do professor da educação infantil, você julga

importante o uso de músicas e jogos? Em sua opinião, o que isso irá somar na educação

infantil?

Marcia: Com a utilização de músicas e jogos o professor poderá desenvolver diversas

áreas como ritmo, equilíbrio, relação interpessoal, regras e outros. Essas atividades são

importantes no processo de aprendizagem e em seu cotidiano.

4. Os pais tratam a psicomotricidade na educação infantil como um mero passatempo,

na condição de professor qual seria sua visão diante disso?

Marcia: É importante a conscientização dos responsáveis quanto às atividades de

psicomotricidade para que através das informações passadas pelos profissionais da área

haja a conscientização e se desfaça o conceito de “brincadeira de criança.”

5. Estudiosos evidenciam que é justamente na educação infantil que podemos perceber

o desenvolvimento da criança, diante dessa evidência qual seria a sua posição diante

disso?

Marcia: Durante atividades psicomotoras podemos sim perceber com clareza se o aluno

está em pleno desenvolvimento ou se há alguma dificuldade. Sendo percebido isso, é

preciso investigação e/ou encaminhamento para outro profissional especializado.

6. Você acredita que uso efetivo da psicomotricidade em serviço do processo de

aquisição de linguagem e letramento na educação infantil pode gerar resultados mais

contundentes que os atuais?

Marcia: Com certeza, o uso efetivo da psicomotricidade a serviço do processo de

linguagem e letramento acelera a aprendizagem e auxilia nas atividades dessa fase.

7. Pensando como educador o que poderia ser trabalhado na psicomotricidade em

serviço do processo de aquisição de linguagem e letramento com crianças da educação

infantil?

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Marcia: O uso de atividades com o objetivo do desenvolvimento motor e cognitivo

como: amarelinha de letrinhas, alinhavo, dramatização como pequenas falas e outros,

auxiliam as crianças em seu processo de aprendizagem.

8. O que fazer quando nos deparamos com alunos desatentos, desmotivados,

indisciplinados ou incapazes de desempenhar atividades mais complexas? Diante desse

problema o que você como educador poderá trabalhar com esses alunos?

Marcia: Caso as tentativas do professor e/ou equipe técnica atuarem sem êxito é preciso

uma parceria com a família para que seja diagnosticado os motivos de tal

comportamento, recorrendo a outros profissionais, se necessário for. Dentre as medidas

cabíveis o diálogo, a proposta de atividades motivadoras e a criatividade são destaques

nesse caso.

Entrevista II

Entrevistada: Camila Antonia da Silva Santos4

Questionário

1. Como você vê a importância da educação psicomotora no desenvolvimento global da

criança na escola?

Camila: As crianças, desde muito cedo, conhecem seu corpo e a partir dele descobrem

diferentes sensações. A psicomotricidade auxilia no desenvolvimento da descoberta não

só do próprio corpo como o alheio.

Na educação infantil, percebo que as atividades que envolvem corpo em movimento são

as prediletas e mais desafiadoras. Elas ensinam regras, esquema corporal, ampliam o

vocabulário entre outros benefícios.

2. Como você classifica a importância do desenvolvimento psicomotor na Educação

infantil?

Camila: A importância é indiscutível e as atividades voltadas para essa temática são

presença vital na educação infantil. Presente no Referencial Curricular da Educação

Infantil é um direito da criança o movimentar-se, pois através de um simples

movimento, expressam emoções e pensamento.

O movimento deve ser visto como uma forma da criança, principalmente aquela que

está com a linguagem em construção, expressar seus desejos, angústias e também ser

participar da construção do seu conhecimento.

4 Graduada em Letras - Português/ Latim pela UERJ, com ênfase em Línguas Clássicas. Atua como professora na Creche Municipal Emília Joana Fonseca Marques (RJ/ 7ª CRE).

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3. No que diz respeito sobre o papel do professor da educação infantil, você julga

importante o uso de músicas e jogos? Na sua opinião o que isso irá somar na educação

infantil?

Camila: Em 3 (três) anos de educação infantil, passando por diferentes turmas desde

berçário até maternal II, há um unanimidade do momento mais esperado serem as

músicas. Seja na rodinha, antes das atividades, ouvida, dançada; o fato é que as crianças

amam as músicas, principalmente as que envolvem mais gestos e expressões faciais. Ela

está presente em todas as turmas e em diferentes momentos. Então é inegável sua

importância para o desenvolvimento infantil e o prazer que ela proporciona no

ambiente.

Os jogos são desafiadores. Crianças pequenas aprendem pela repetição, então os jogos

são apresentados e gradativamente as crianças vão absorvendo. Em um primeiro

momento, eles têm certa resistência a regras e querem fazer o que querem, mas devagar

vão aprendendo as regras, esperar a vez etc. Até pela fase do egocentrismo os jogos

auxiliam a perceber o outro e respeitá-lo, sendo uma ferramenta que enriquece o

aprendizado.

4. Os pais tratam a psicomotricidade na educação infantil como um mero passatempo,

na condição de professor qual seria sua visão diante disso?

Trabalho em uma área carente em que a maior parte dos pais tem uma baixa

escolaridade e encaram a creche como um depósito de crianças, um mero local onde

deixam seus filhos para brincar e ser cuidado. Percebo que o cuidar é importante para

eles, sendo o educar, muitas vezes, algo que passa despercebido.

Nas atividades no pátio, muitos pais passam e ao ver os filhos brincando não conseguem

ver uma atividade pedagógica. É como se só as atividades nas folhinhas fossem

importantes.

5. Estudiosos evidenciam que é justamente na educação infantil que podemos perceber

o desenvolvimento da criança, diante dessa evidência qual seria a sua posição diante

disso?

Camila: A educação infantil é essencial para a criança. Quanto mais cedo ela entra, mais

percebo seu desenvolvimento. Por exemplo, a criança que passa pela creche antes de

entrar na pré-escola, tem uma adaptação mais fácil, um desenvolvimento e

independência maior.

Page 9: Psicomotricidade Em Serviço Do Processo de Aquisição de Linguagem e Letramento

6. Você acredita que uso efetivo da psicomotricidade em serviço do processo de

aquisição de linguagem e letramento na educação infantil pode gerar resultados mais

contundentes que os atuais?

Camila: Sem dúvidas. A criança para ter um aprendizado significativo é necessário que

ela participe da construção do seu conhecimento. Ela não pode ser um sujeito passivo!

Criança gosta de movimento, tem energia e canalizar isso na aprendizagem é prazeroso.

A criança precisa gostar de aprender e para isso tem que aprender por meio de algo que

goste, que prenda sua atenção.

Muitos profissionais querem uma turma mais calma, passiva e acabam não pensando no

bem-estar da criança, e sim, no próprio. É preciso mesclar atividades calmas e agitadas.

Diversificar sempre, pois quanto menor a idade, menor o poder de concentração. A

criança precisa explorar o corpo, o espaço e tudo que ali está exposto. É explorando que

ela aprende!

7. Pensando como educador o que poderia ser trabalhado na psicomotricidade em

serviço do processo de aquisição de linguagem e letramento com crianças da educação

infantil?

Camila: A psicomotricidade é um poderoso instrumento para o aprendizado. Por

exemplo: ao trabalhar a letra "A" com meus alunos e após apresentar a letra, desenhei-a

no chão para que os alunos caminhassem sobre ela. Assim eles “sentiram” a letra. Achei

essa forma muito mais eficiente e prazerosa.

As atividades com música ampliam o vocabulário da criança, e particularmente, são as

que eu mais uso para desenvolver a oralidade dos meus alunos.

8. O que fazer quando nos deparamos com alunos desatentos, desmotivados,

indisciplinados ou incapazes de desempenhar atividades mais complexas? Diante desse

problema o que você como educador poderá trabalhar com esses alunos?

Camila: É preciso primeiro saber o porquê do problema. O aluno está com problemas

familiares? Não está gostando da atividade? Meus alunos são o meu termômetro. Se

eles estão muito dispersos, percebo que a atividade não está agradando e logo mudo.

Muitos alunos entram indisciplinados por estar acostumado com o ambiente familiar,

então ele precisa de um tempo para adaptar-se. É preciso dar atenção a todos e estar

sempre atenta. Onde trabalho tem um livro chamado “Diário de Bordo”, nele os

professores registram o planejamento e tem um quadro em que colocamos como cada

criança se comportou diariamente. Semanalmente, fazemos o levantamento da turma

como um todo e se há uma criança que necessita mais da nossa atenção e de que forma

Page 10: Psicomotricidade Em Serviço Do Processo de Aquisição de Linguagem e Letramento

podemos reverter esse quadro. A proposta dada pela direção auxiliou muito a perceber

individualmente cada criança.

2.2 RESULTADOS DA PESQUISA

Foi verificado que os termos utilizados pelas professoras demonstram que a educação

psicomotora é um diferencial e é considerada por elas de grande relevância. Ambas

reconhecem a necessidade da empregabilidade de práticas psicomotoras na educação

infantil. Inclusive uma das entrevistadas alega utilizar com suas crianças da maneira

mais lúdica possível:

A psicomotricidade é um poderoso instrumento para o

aprendizado. Por exemplo: ao trabalhar a letra "A" com meus

alunos e após apresentar a letra, desenhei-a no chão para que os

alunos caminhassem sobre ela. Assim eles “sentiram” a letra.

Achei essa forma muito mais eficiente e prazerosa.

As atividades com música ampliam o vocabulário da criança, e

particularmente, são as que eu mais uso para desenvolver a

oralidade dos meus alunos.

(Segunda entrevistada)

No entanto, a primeira entrevistada pareceu desconhecer a temática ou ser mais

superficial que a segunda em vários trechos, demonstrando que há barreiras a serem

ultrapassadas para a verdadeira utilização da psicomotricidade na educação infantil:

2. Como você classifica a importância do desenvolvimento

psicomotor na Educação infantil?

Marcia: Acho interessante a integração entre as atividades

psicomotoras, com um conteúdo das demais disciplinas, fazendo

das atividades psicomotoras fonte de criação para realização de

integração multidisciplinar.

Diante desse contexto, Alves (2011, p. 24) destaca que:

A escola reconhece a necessidade do emprego das condutas

psicomotoras na Educação Infantil para a função de preparar a

criança para aprendizagens futuras. [...] O educador não pode

continuar investindo apenas em seu intelecto e em seu corpo

como instrumento de aprendizagem. A psicomotricidade tem

ação educativa e preventiva.

Page 11: Psicomotricidade Em Serviço Do Processo de Aquisição de Linguagem e Letramento

Nesta perspectiva é por meio da fala das professoras que podemos afirmar que de certa

maneira ambas se apropriam de modelos pedagógicos ora sem analisá-los e ora

utilizando-os com propriedade. A primeira entrevistada muitas vezes deixa de utilizar

alternativas psicomotoras que poderiam contribuir para uma prática pedagógica mais

efetiva e repete ações que impossibilitam um desenvolvimento integral do aluno. A

segunda entrevistada pode ser considerada um diferencial entre muitos educadores, pois

ela apresenta uma conduta mais ativa, atualizada e que valoriza a criança e não o que é

mais "fácil". Isso demonstra um maior domínio da integralização psicomotricidade mais

aquisição de linguagem, principalmente por meio da música, excelente instrumento na

construção da língua materna.

Portanto, ficou claro que a prática psicomotora não pode ser diretiva, uma vez que ela

precisa levar a criança a explorar o mundo exterior por meio de experiências concretas.

Um profissional da educação infantil mais atento e preparado faz com que muitas

dificuldades sejam amenizadas ou superadas.

3. CONSIDERAÇÕES FINAIS

O educador que possui um maior preparo e conhecimento sobre a importância de se

trabalhar o desenvolvimento psicomotor consegue atuar preventivamente. Isso significa

dizer que essa prática diminuiria de forma expressiva intervenções que apenas suavizam

e não solucionam as questões relacionadas a dificuldades de aprendizagem.

Nesse contexto o desenvolvimento da educação psicomotora se torna extremamente

importante na educação infantil, pois o professor ficaria responsável por promover um

trabalho psicomotor com as crianças de maneira que atenderia suas necessidades a fim

de produzir um desenvolvimento completo dos aprendizes.

Contudo, aos professores sem preparo ou que desconhecem o uso da psicomotricidade

aliada ao processo de aquisição de linguagem poderiam ser realizados debates e

reflexões acerca da psicomotricidade no currículo da educação infantil, pois esta seria

uma intervenção direta e mais atuante. Nesta perspectiva, o professor passaria de

observador a facilitador, permitindo à criança situações e estímulos cada vez mais

variados, com experiências concretas e vividas com o corpo inteiro para trazer a

psicomotricidade sob um olhar pedagógico e preventivo.

Portanto, a educação psicomotora por meio de uma intervenção pedagógica lúdica tem

como papel fundamental promover o desenvolvimento de todas as potencialidades da

criança, objetivando sua capacidade intelectual em todas as áreas do conhecimento,

Page 12: Psicomotricidade Em Serviço Do Processo de Aquisição de Linguagem e Letramento

não só da linguagem, mas também no seu espaço de interação: o mundo como um

todo.

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