prÁticas cotidianas em uma sala de inglÊs: um estudo

124
UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO INSTITUTO DE LINGUAGENS PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ESTUDOS DE LINGUAGEM MARIA DE FÁTIMA COMINI DA SILVA PRÁTICAS COTIDIANAS EM UMA SALA DE INGLÊS: UM ESTUDO ETNOGRÁFICO Cuiabá 2014

Upload: others

Post on 01-Nov-2021

7 views

Category:

Documents


0 download

TRANSCRIPT

Page 1: PRÁTICAS COTIDIANAS EM UMA SALA DE INGLÊS: UM ESTUDO

UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO

INSTITUTO DE LINGUAGENS PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ESTUDOS DE

LINGUAGEM

MARIA DE FÁTIMA COMINI DA SILVA

PRÁTICAS COTIDIANAS EM UMA SALA DE INGLÊS: UM ESTUDO ETNOGRÁFICO

Cuiabá 2014

Page 2: PRÁTICAS COTIDIANAS EM UMA SALA DE INGLÊS: UM ESTUDO

ii

MARIA DE FÁTIMA COMINI DA SILVA

PRÁTICAS COTIDIANAS EM UMA SALA DE INGLÊS: UM ESTUDO ETNOGRÁFICO

Dissertação apresentada ao Programa de Mestrado em Estudos de Linguagem da Universidade Federal de Mato Grosso – UFMT, como requisito parcial para obtenção do título de Mestre em Estudos de Linguagem. Área de Concentração: Estudos Linguísticos Linha de Pesquisa: Paradigma de Ensino de Línguas Orientadora: Dra. Ana Antônia de Assis-Peterson

Cuiabá 2014

Page 3: PRÁTICAS COTIDIANAS EM UMA SALA DE INGLÊS: UM ESTUDO
Page 4: PRÁTICAS COTIDIANAS EM UMA SALA DE INGLÊS: UM ESTUDO

iii

Page 5: PRÁTICAS COTIDIANAS EM UMA SALA DE INGLÊS: UM ESTUDO

iv

DEDICATÓRIA

A todos os meus alunos que foram fonte inspiradora

para esta investigação.

Page 6: PRÁTICAS COTIDIANAS EM UMA SALA DE INGLÊS: UM ESTUDO

v

AGRADECIMENTOS

A realização deste trabalho não seria possível sem a participação de pessoas especiais no meu percurso acadêmico, profissional e pessoal. Pessoas que me apoiaram e construíram comigo momentos únicos e inesquecíveis. De modo especial, agradeço:

À minha orientadora, Ana Antônia de Assis-Peterson, por mil e uma razões, incluindo as conversas inquietantes e transformadoras.

Aos meus alunos participantes desta pesquisa, que muito colaboraram

com este trabalho e com o meu aprendizado. Aos professores doutores Diógenes Cândido de Lima e Sérgio Flores

Pedroso, pelas valiosas contribuições que fizeram ao meu trabalho.

À professora Maria Rosa Petroni, pela leitura e avaliação deste trabalho. A todos os professores que contribuíram com suas experiências e

saberes para a construção contínua do meu conhecimento. Ao colega e amigo Arivan Salustiano Silva que sempre me dispensou

seu conhecimento e tempo. E à Danie Marcelo de Jesus, também colega e amigo, incentivador do meu olhar para a escola pública.

Aos diretores, coordenadores e professores das escolas em que trabalho, pelo suporte dado às minhas ausências durante o desenvolvimento desta pesquisa.

À minha irmã Rita Comini e ao meu cunhado Pitolé Sant’Ana pelo

incentivo e pelos maravilhosos almoços, proporcionando mais tempo para meus estudos.

Aos meus amigos que entenderam a minha ausência e distância. Aos meus pais, pelo modo de viver e de perceber o mundo. Ao meu filho Caio, sempre presente em meu coração. Ao meu companheiro Evandro, por me entender e por desejar o meu

sucesso. A Deus, por poder viver todos esses momentos.

Page 7: PRÁTICAS COTIDIANAS EM UMA SALA DE INGLÊS: UM ESTUDO

vi

Nada É Impossível De Mudar

Desconfiai do mais trivial,

na aparência singelo.

E examinai, sobretudo, o que parece

habitual.

Suplicamos expressamente:

não aceiteis o que é de hábito

como coisa natural,

pois em tempo de desordem sangrenta,

de confusão organizada,

de arbitrariedade consciente,

de humanidade desumanizada,

nada deve parecer natural,

nada deve parecer impossível de

mudar.

— Bertold Brecht

Page 8: PRÁTICAS COTIDIANAS EM UMA SALA DE INGLÊS: UM ESTUDO

vii

RESUMO

COMINI DA SILVA, Maria de Fátima. Práticas cotidianas em uma sala de inglês: um estudo etnográfico. Dissertação de Mestrado em Estudos de Linguagem. Orientadora: Ana Antônia de Assis-Peterson. Cuiabá, MT: Universidade Federal de Mato Grosso, 2014. Não é de hoje que professores e pesquisadores têm apontado desvantagens e deficiências a assombrar o ensino de inglês na escola de ensino regular, geralmente, contrastando-o com as vantagens e eficiências da renomada escola de idioma. Contudo, se a própria escola pública esquecer o cenário idealizado da escola de idioma e pensar o ensino de um outro lugar, outros modos de pensar poderiam abrir novas possibilidades. O objetivo principal deste estudo etnográfico está embasado em dois conceitos – fundos de conhecimento (GONZÁLEZ; MOLL; AMANTI, 2009) e princípio freireano da escuta (FREIRE,1996,1997) –, que destacam a valorização da cultura do aluno, ambos, portanto, são conceitos poderosos para se afastar da teoria do déficit, que só aponta deficiências estruturais e humanas. Para tal, o estudo busca conhecer de modo contextual a prática rotineira da sala de aula de uma professora de inglês, que também assume o papel de pesquisadora, a fim de avaliar se o trabalho desenvolvido com seus alunos está afinado com a pedagogia culturalmente sensível e inclusiva. Os atores da pesquisa são alunos do 2º ano do Ensino Médio Integrado de uma escola pública central de Cuiabá, oriundos de nove comunidades diferentes e a professora-pesquisadora. Por meio de observação participante e entrevistas semi-estruturadas, busca entender o que os atores – professora e alunos – fazem no espaço da sala de aulas e como eles atribuem sentido a esses eventos. São três as perguntas que orientam a pesquisa: O que os atores (professora e alunos) fazem em sala de aula? Como os atores (professora e alunos) atribuem sentidos aos eventos que acontecem em sala de aula? As práticas culturais da turma acolhem a escuta dos alunos? Por um lado, os resultados do estudo mostraram que os recursos dos alunos podem ser mais explorados a fim de ampliar o empoderamento do estudante sobre seu próprio aprendizado. Por outro, mostraram que a oralidade e o uso de inglês foram enfatizados na sala de aula e, além disso, a aceitação de tópicos dos alunos pela professora são aspectos que fazem parte da prática da turma e podem ser interpretados como índices de acolhimento à escuta dos alunos.

Palavras-chave: prática de sala de aula, ensino-aprendizagem de inglês, escola pública.

Page 9: PRÁTICAS COTIDIANAS EM UMA SALA DE INGLÊS: UM ESTUDO

viii

ABSTRACT

COMINI DA SILVA, Maria de Fátima. Daily Practices in a classroom of English: an ethnographic study. Dissertação de Mestrado em Estudos de Linguagem. Orientadora: Ana Antônia de Assis-Peterson. Cuiabá, MT: Universidade Federal de Mato Grosso, 2014. Not only now have teachers and researchers pointed out the disadvantages and deficiencies that haunt the teaching of English in a general education school as opposed with the advantages and efficiencies of the renowned language schools. All in all if the public school itself forgets the idealized setting of the language school and thinks of teaching in another place, other ways of thinking can open new possibilities. The principal objective of this ethnographic study is grounded in two concepts – funds of knowledge (GONZÁLEZ; MOLL; AMANTI, 2009) and Freirean principle of listening (FREIRE,1996,1997) that emphasize the acceptance of students’ culture. Both, therefore, are powerful concepts that dispel the theory of deficits that only points out structural and human deficiencies. For this, the study attempts to know in a contextual way the routine practice of the classroom of an English teacher that also assumes the role of researcher, in order to assess if the work developed with the students is in tune with culturally sensitive and inclusive pedagogy. The actors of this research are second year students of a secondary public school in Cuiaba coming from nine different communities and a researcher-teacher. Using participant observation and semi-structured interviews, this study attempts to understand what the actors – teachers and students – do in the space of the classroom and how they attribute meaning to these events. There are three questions that orient the research: What do the actors do in the classroom? How do the actors attribute meaning to the events that happen in the classroom? Do the cultural practices of the class encourage listening of the students? On one hand, the results of the study showed that the students’ resources could be more explored in order to empower the student with his own learning. On the other hand, orality and the use of English were emphasized in the classroom and, moreover, the acceptance of students’ topics by the teacher are aspects that make part of the practice of the class and can be interpreted as indication of the receptiveness of listening to the students.

Keywords: classroom practice, teaching-learning of English, public school.

Page 10: PRÁTICAS COTIDIANAS EM UMA SALA DE INGLÊS: UM ESTUDO

ix

TABELA DE SÍMBOLOS USADOS NA TRANSCRIÇÃO

Situação Convenção

Qualquer pausa ...

Incompreensão de palavras ou segmentos

( )

Superposição, simultaneidade de vozes

[

[

Supressão [...]

Page 11: PRÁTICAS COTIDIANAS EM UMA SALA DE INGLÊS: UM ESTUDO

x

SUMÁRIO INTRODUÇÃO 11 Caracterizando a pesquisa 13 O contexto e a problemática da pesquisa 14 Objetivos e perguntas de pesquisa 20 A natureza e a significância do estudo 21 Organização da dissertação 23

1 O BACKGROUND DA PESQUISA 24 1.1 Um caminho histórico: as reminiscências A mundialização da língua inglesa: o global-local 32 1.2 A reforma educacional nos documentos oficiais: OCEM e OCEB/MT 33 1.3 O conceito de fundos de conhecimento 37 1.4 A educação freireana 40 2 A METODOLOGIA DE PESQUISA 44 2.1 A perspectiva etnográfica 44

2.2 A localização e contextualização da pesquisa 47 A escola 47 Os atores da pesquisa 50 2.3 O percurso da pesquisa 55 2.4 Instrumentos, procedimentos metodológicos e analíticos 58 3 A TURMA DO 2º ANO: PRÁTICAS E SENTIDOS 61 3.1 Das práticas de sala de aula 61 Cena 1 - O ritual de entrada 62 Cena 2 - A chamada, a retrospectiva e a tarefa 64 Cena 3 – Questões e discussões relacionadas ao tema: conteúdo 69 3.2 Dos sentidos 81 3.2.1 Dos alunos 82 Tema 1 - “Bom, elas melhoraram” (Greg, entrevista em 06/11/2013) 82 Tema 2 - “Eu aprendo muita coisa com eles” ( Guto, entrevista em 06/11/2013) 85 3.2.2 Da professora 88 Relato 1 – Como vejo as minhas aulas? 88 Relato 2 – Como me vejo como professora? 90 Relato 3 - Como vejo meus alunos? 94 3.3 Dos fundos de conhecimento 97 CONCLUSÃO 104 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 107 ANEXOS 114

Page 12: PRÁTICAS COTIDIANAS EM UMA SALA DE INGLÊS: UM ESTUDO

11

INTRODUÇÃO

O diálogo entre professoras e/ou professores e alunos ou alunas não os torna iguais, mas marca a posição democrática entre eles ou elas... O diálogo tem significação precisamente porque os sujeitos dialógicos não apenas conservam sua identidade, mas a defendem e assim crescem um com o outro. O diálogo, por isso mesmo, não nivela, não reduz um ao outro. Nem é favor que um faz ao outro... Implica, ao contrário, um respeito fundamental dos sujeitos nele engajados...

— Paulo Freire (1994, p.117)

Paulo Freire, em sua Sétima Carta – De falar ao educando a falar a ele e

com ele; de ouvir o educando a ser ouvido por ele – (FREIRE, 1997, p.58 - 62),

considera a educação como um ato político, no qual os momentos vividos

devem ser harmoniosos e equilibrados entre o falar ao educando e falar com

ele. Para o autor, na escola de que o Brasil tanto precisa, o professor sabe que,

sem excluir os conteúdos, o diálogo sobre a vida é válido, tanto quanto o ato de

ensinar, como também formador de um clima aberto e livre no micro contexto

escolar. Nesse ambiente, onde o professor fala ao educando e fala com ele,

ouve o educando e é ouvido por ele, é que se passa o processo de formação

de cidadãos.

Também sob o ponto de vista de González, Moll e Amanti (2009, p. ix), o

“aprender não acontece apenas ‘entre os ouvidos’, mas é eminentemente um

processo social”1; a educação é vista sob a ótica do falar e do ouvir. Para os

autores, “a aprendizagem dos alunos está constrita em enquadres contextuais,

históricos, políticos e ideológicos mais abrangentes que afetam a sua vida”2.

Esses autores afirmam que são as práticas culturais de uma comunidade que a

tornam competente, devido ao conhecimento construído nas e pelas próprias

experiências vividas.

1 No original: Learning does not take place just “between the ears”, but is eminently a social process. (GONZÁLEZ, MOLL, AMANTI, 2009, p. ix). 2 No original: Students’ learning is bound within larger contextual, historical, political and

ideological frameworks that affect students’ lives (GONZÁLEZ, MOLL, AMANTI, 2009, p. ix).

Page 13: PRÁTICAS COTIDIANAS EM UMA SALA DE INGLÊS: UM ESTUDO

12

Práticas culturais são entendidas como as práticas das pessoas

justificadas através do que elas pensam e fazem. Os autores usam o conceito

fundos de conhecimento para se referirem a práticas culturais e propõem que

professores podem documentá-las, visitando lares ou comunidades de

estudantes para conhecer os fundos de conhecimento ali produzidos e

aproveitar esses recursos culturais e intelectuais nas suas aulas, como modo

de aproximar a escola do mundo do estudante.

De acordo com a perspectiva antropológica (ou cultural), entende-se a

sala de aula como um microcontexto de encontros transculturais marcados por

diferenças socioculturais (ERICKSON, 2001; RYMES, 2009). Conforme Rymes

(2009, p.12), “nesses encontros transculturais, a fim de que possamos

aprender um com o outro, devemos deixar de lado nossos pressupostos

etnocêntricos sobre o que é “normal” e abraçar uma perspectiva diferente da

nossa”3. Segundo Erickson (2001, p.12), sabe-se que a escola é o local que

pode propiciar essa oportunidade e que salas de aula, apesar da aparente

similaridade, “constituem ambientes de aprendizagem qualitativamente

diferentes”.

Todos esses autores alinham-se com a proposta de uma pedagogia

culturalmente sensível4 e inclusiva5, que especificamente reconhece a

presença da diversidade cultural dos estudantes e a necessidade que eles têm

de descobrir conexões entre eles e entre o conteúdo e as tarefas que os

professores pedem para que eles desempenhem. Quer dizer, o ensino deve

fazer sentido para os estudantes.

3 No original: Within such cross-cultural encounters, in order to learn from one another, we have to step outside our own assumptions about what is “normal” and enter into a perspective different from our own (RYMES, 2009, p.12). 4 Pedagogia culturalmente sensível é uma abordagem centrada no aluno e ao ensino em que forças culturais únicas dos alunos são identificadas e alimentadas para promover o desempenho do aluno e uma sensação de bem-estar sobre o lugar cultural dele no mundo (LYNCH, M. 2011, p. 1). 5 Pedagogia inclusiva enfatiza o trabalho que possa desenvolver plenamente competências e habilidades dos alunos a fim de que vivam uma vida responsável, produtiva e criativa no mundo (ANDERSON, J. R. 2014, p. 3).

Page 14: PRÁTICAS COTIDIANAS EM UMA SALA DE INGLÊS: UM ESTUDO

13

Caracterizando a pesquisa

Este estudo se insere na área da Linguística Aplicada, relacionada ao

ensino e aprendizagem de língua estrangeira (inglês). Nele são examinadas,

por meio de pesquisa qualitativa etnográfica, as ações/interações/trocas entre

uma professora de inglês e seus alunos no espaço da sala de aula, para

apreender conhecimentos não só dos eventos e práticas que nela acontecem,

mas também para conhecer que sentidos essas pessoas atribuem aos eventos

em que estão engajados. A turma investigada é do 2o ano do Ensino Médio, na

qual a autora desta dissertação é a professora investida de um segundo papel,

o de pesquisadora. Desse modo, o foco principal da pesquisa recai sobre o

estudo de um grupo, cujos dados são observados, registrados e analisados em

contexto natural e cotidiano, pois dados destituídos de contexto não fazem

sentido em pesquisa etnográfica.

Atualmente, como evidenciado nos documentos oficiais, Parâmetros

Curriculares Nacionais do Ensino Médio – PCNEM – (BRASIL, 2000),

Orientações Curriculares para o Ensino Médio – OCEM (BRASIL, 2008) – e

Orientações Curriculares: Concepções para a Educação Básica de Mato

Grosso - OCEB (MATO GROSSO, 2010), a língua estrangeira é considerada

como uma área de conhecimento tão importante quanto outra qualquer,

conforme os objetivos estabelecidos para o seu ensino na escola.

A respeito da importância da língua estrangeira, assinala Jorge (2009,

p.162), essa língua estrangeira constitui-se “como espaço privilegiado em

relação aos contextos culturais, políticos e sociais na contemporaneidade”. A

autora defende o ensino da língua pelo seu caráter educativo, alegando que,

sob este aspecto,

o aluno pode ter de se tornar mais consciente da diversidade que constitui o mundo e as múltiplas possibilidades de ser diferente, seja pela cultura, seja pelas identidades individuais, podem fazer com que o indivíduo se torne mais consciente de si próprio, em relação a seu contexto local e ao contexto global (JORGE, 2009, p.163).

Apesar de a autora citar o ensino da língua de forma generalizada, esta

pesquisa procura investigar um contexto específico. É um estudo qualitativo e

Page 15: PRÁTICAS COTIDIANAS EM UMA SALA DE INGLÊS: UM ESTUDO

14

interpretativo em que o processo é de fundamental importância, mas seus

resultados podem vir a auxiliar outros professores a encontrar pontos de

contato por meio de métodos comparativo e/ou contrastivo com o contexto em

que trabalham.

O contexto e a problemática da pesquisa

A educação tem sido constante motivo de preocupação para a

sociedade, seja ela brasileira ou não. Como um dos exemplos internacionais

mais difundidos, tem-se o Programme for International Student Assessment

(PISA) - Programa Internacional de Avaliação de Estudantes - uma iniciativa

internacional de avaliação comparada, aplicada, em 65 países, a estudantes na

faixa dos 15 anos, idade em que se pressupõe o término da escolaridade

básica obrigatória na maioria dos países. O objetivo é mensurar os

conhecimentos relativos a Leitura, Matemática e Ciências. Desenvolvido e

coordenado pela Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico

(OCDE), e coordenado, no Brasil, pelo Instituto Nacional de Estudos e

Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep), o Pisa tem como objetivo

produzir indicadores que contribuam para a discussão da qualidade da

educação nos países participantes, de modo a subsidiar políticas de melhoria

do ensino básico.

O tema também não é indiferente à Organização das Nações Unidas

para a Educação, a Ciência e a Cultura (UNESCO), especialmente, criada em

16 de novembro de 1945, com o objetivo de garantir a paz por meio da

cooperação intelectual entre as nações, acompanhando o desenvolvimento

mundial e auxiliando os Estados-Membros – 193 países – na busca de

soluções para os problemas que desafiam as sociedades, incluindo problemas

educacionais. Assim sendo, a 10ª edição do Relatório de Monitoramento Global

de Educação Para Todos 2012: “Juventude e habilidades: colocando a

educação em ação” (Youth and skills: Putting education to work), publicado em

16 de outubro de 2012, mostra grande preocupação com a realidade

educacional contemporânea, ainda bastante desigual (incluindo a falta de

qualidade e a exclusão), em diversas partes do mundo, conforme se observa

na Figura 1, abaixo.

Page 16: PRÁTICAS COTIDIANAS EM UMA SALA DE INGLÊS: UM ESTUDO

15

Figura 1 - Educação para todos no Brasil (REPRESENTAÇÃO DA UNESCO NO BRASIL, 2012), publicado em 16/10/12.

O debate educacional tem recebido contribuição, além dos órgãos

governamentais ou não-governamentais, não somente dos acadêmicos, das

publicações populares da mídia impressa e digital, bem como por meio de

diversos filmes, entre eles “Conrack” de (EUA, 1974); “The Wall”, de Alan

Parker (Inglaterra, 1982); “Nenhum a menos”, de Zhangyimou (China, 1999);

“Ser e Ter”, de Nicholas Philibert (França, 2002); “Vem dançar”, de

Lizfriedlander (EUA, 2006); “Pro dia nascer feliz”, de João Jardim ( Brasil,

2006); “Escritores da Liberdade”, de Richard LaGravenese (EUA, 2007); “Entre

Page 17: PRÁTICAS COTIDIANAS EM UMA SALA DE INGLÊS: UM ESTUDO

16

os muros da escola”, de Laurent Cantet (França, 2009) e “Waiting for

Superman”, de Davis Guggenheim (EUA, 2010).

As discussões atravessam fronteiras e, no Brasil, a situação não é

diferente. Embora o processo de inclusão de alunos na rede de ensino tenha

tido um grande progresso – em 2003, 65% dos jovens de 15 anos estavam na

escola e, em 2012, a taxa passou para 78% – o resultado do PISA 2012

(Programa Internacional de Avaliação de Alunos) classificou o Brasil, dentre

sessenta e cinco países, na 55ª posição em Leitura, 58ª em Matemática e 59ª

em Ciências, ficando atrás de países como Montenegro e Uruguai, Costa Rica

e Albânia, Jordânia e Argentina.

Além disso, segundo o Relatório de Monitoramento Global de Educação

Para Todos 2012, coordenado e exibido pela UNESCO, mesmo apresentando

outros avanços, como o acesso ao ensino fundamental de 94,45% da

população de 7 a 14 anos, a proporção de jovens, na idade própria, no ensino

médio é maior que o dobro daquela de 1995. Além da redução das taxas de

analfabetismo entre jovens e adultos e o aumento no acesso ao ensino

superior, o Brasil se apresenta entre os cinquenta e três (53) países que ainda

não atingiram, e nem estão perto de atingir, os objetivos de Educação para

Todos até 2015. Como país do E96 (grupo dos nove países mais populosos no

mundo que se comprometeram a encarar a educação como fator de

importância-chave para o desenvolvimento), a erradicação da pobreza absoluta

é um dos problemas a ser enfrentado para que se possa atingir a educação

básica de qualidades para todos.

Nesse cenário, parece haver consenso de que a educação pública

brasileira é deficitária e excludente (FREIRE,1982, p. 94; FORGIARINI, SILVA,

2007, p.2; COX, ASSIS-PETERSON, 2008, p.31; ROJO, 2009, p.15; ARAÚJO;

CARVALHO, 2012, p.2-3) e que precisa mudar os seus parâmetros curriculares

e pedagógicos para atender as exigências atuais – um mundo alicerçado na

informatização, conforme demonstram textos e/ou estudos realizados por

Menezes de Souza (2011), Lopes (2011), Paiva (2011), Duboc e Ferraz (2011),

Maciel (2011), Schlatter e Garcez (2012), Monte Mór (2012), dentre outros.

6 Segundo o documento Marco Estratégico para a UNESCO no Brasil, os países que fazem

parte do grupo E-9 são: Brasil, Bangladesh, China, Egito, Índia, Indonésia, México, Nigéria e Paquistão ( UNESCO, 2006, p.9)

Page 18: PRÁTICAS COTIDIANAS EM UMA SALA DE INGLÊS: UM ESTUDO

17

No cerne dessas discussões sobre a educação pública está o ensino de

língua inglesa, uma vez que ele é, atualmente, o que predomina nas escolas

brasileiras. Tal predomínio explica-se pelo fato de essa língua ser considerada,

na maioria das vezes, como possibilidade de inserção das pessoas no espaço

global. E com o processo intensificado da globalização, tem sido um dos bens

simbólicos mais valorizados no Brasil e em grande parte do mundo, tendo em

vista o papel de língua franca que desempenha como meio de comunicação.

Saber usar a língua inglesa é uma cobrança constante e, segundo Leffa (2011,

p.17), “tanto o fracasso quanto o sucesso na aprendizagem de uma língua

estrangeira é imediatamente percebido”. Ou o sujeito sabe e fala, ou

permanece mudo porque não sabe falar. Não há o que contestar, diz o autor.

Discursos cristalizados sobre a questão da culpabilidade para o fracasso

escolar, que cai ora no aluno, ora no professor, são materializados na

sociedade. É aluno culpado na visão do professor, professor culpado na visão

da academia e da mídia. O aluno é passivo, desinteressado e até destituído de

recursos intelectuais e culturais. O professor é “o bode expiatório”, mal

preparado, desmotivado, estagnado e desatualizado (ASSIS-PETERSON,

COX, 2008, p. 47- 48; LEFFA, 2011, p.21; GIMENEZ, 2011, p. 49;

RAJAGOPALAN, 2011, p. 58; BARCELOS, 2011, p.149).

Ainda na tentativa de justificar o fracasso, outros argumentos são

enumerados em autores que tratam do tema, como Cox e Assis-Peterson

(2008), Lima ( 2008, 2009, 2010) e Schlatter e Garcez (2012). Os professores

se queixam das péssimas condições dos estabelecimentos de ensino, da

escassez de material e recursos didáticos, da falta de oportunidade para se dar

continuidade à sua formação, do número grande de alunos por turma, do ínfimo

número de horas aulas semanais, da correria de uma turma para outra, dos

modelos impostos por exames padronizados, da falta de apoio pedagógico,

dentre outros.

Os alunos, desapontados com o baixo nível de língua que adquirem,

também reclamam do processo. Relacionam o seu aprendizado com um futuro

distante, pressupondo um alto grau de conhecimento de língua, e esquecem,

na maioria das vezes, que o inglês atravessa fronteiras e está, conforme nos

mostra o presente, no cotidiano (DIAS, ASSIS-PETERSON, 2006, p.124;

MICOLLI, 2011, p. 179, COX, ASSIS-PETERSON, 2013, p.154-155). Vê-se,

Page 19: PRÁTICAS COTIDIANAS EM UMA SALA DE INGLÊS: UM ESTUDO

18

então, que há evidências suficientes para se buscarem alternativas que

possam mudar o contexto atual.

Partindo dos princípios da Lei de Diretrizes Básicas (LDB), os

Parâmetros Curriculares Nacionais do Ensino Médio – PCNEM - (BRASIL,

2000), trazem, na nova Lei, o Ensino Médio como parte da educação escolar

que “[...] deverá vincular-se ao mundo do trabalho e à prática social” (Art.1º § 2º

da Lei nº 9.394/96). Ou seja, busca dar significado ao conhecimento escolar,

mediante a contextualização, a interdisciplinaridade, o incentivo ao raciocínio e

à capacidade de aprender, com funções equivalentes para todos os alunos.

Da mesma forma, têm-se as Orientações Curriculares para o Ensino

Médio – OCEM – (BRASIL, 2006), que retomam as reflexões a partir dos

PCNEM. Esse documento também reafirma as propostas anteriores mediante

apresentação dos seus objetivos, que propõem reflexão, discussão e

sugestões relacionadas à função educacional e as práticas de ensino de

Línguas Estrangeiras, tomando a noção de cidadania como central, e as

questões da exclusão e inclusão aliadas à era globalizante.

Em Mato Grosso, assim como em outros estados brasileiros, estudiosos

atendem ao chamado das secretarias estaduais de educação para elaborar

referenciais ou orientações curriculares de cunho regional. Nasce o documento

estadual denominado Orientações Curriculares para a Educação Básica do

Estado de Mato Grosso (Mato Grosso, 2010), com o objetivo de apontar:

[...] as estratégias e os recursos necessários destinados à apropriação por parte dos alunos dos conhecimentos nele veiculados, de modo a não permitir a exclusão por falta de conhecimento. Concebe-se a educação como elemento propiciador de conhecimento sobre a realidade, pelo debruçar-se sobre ela, a fim de extrair contextos significativos para a formação humana (MATO GROSSO, 2010, p.9).

Como se pode observar, os documentos apresentados comungam de

uma mesma ideia e focam em um ensino-aprendizagem voltado para a relação

do conhecimento com as práticas socioculturais. Essa visão contempla uma

sala de aula em constante diálogo com a sociedade. Aqui, a língua inglesa

assume sua característica de língua franca e a visão de ensino também precisa

se transformar: “[...] de correto para apropriado, de normas exclusivas do

Page 20: PRÁTICAS COTIDIANAS EM UMA SALA DE INGLÊS: UM ESTUDO

19

falante nativo para inclusão global e de maneiras igualitárias de falar que

satisfaçam as necessidades locais” (KADRI, 2010, p.66).

Documentos não garantem a qualidade do ensino e, segundo Oliveira e

Paiva (2011, p.38), “o papel da escola, seja ela pública ou particular, é limitado

no processo de aquisição, e as atividades que oferece são sempre insuficientes

para se aprender qualquer língua estrangeira.” Para a autora (2011, p. 39),

apesar de a escola não ter todas as condições para propiciar o aprendizado de

uma língua, e este não poder ficar restrito à escola, o professor pode estimular

o aprendiz a ir além.

Dutra e Oliveira (2008, p.110-111) discutem possibilidades de mudanças

a partir de três aspectos: disposição para mudar, trabalho colaborativo e

capacidade crítica para apropriar-se da teoria e transformá-la em

autoconhecimento para melhor atuação docente.

Já para Araújo de Oliveira (2011, p. 90-91), para se alcançar a qualidade

necessária no ensino de línguas, as mudanças estão relacionadas a três fontes

de ações: (1) realidade não utópica dos documentos oficiais; (2) expansão da

compreensão das questões da linguagem e a influência da linguística na

sociedade brasileira; (3) reconhecimento popular do papel da língua

estrangeira na formação do educando e do cidadão brasileiro. Para o autor

(2011, p.92), a dissonância entre papéis e práticas só será eliminada com a

intervenção de um trabalho governamental e coletivo: governamental, porque,

de acordo com a nossa Constituição, os governos federal, estadual e municipal

são responsáveis pela educação do povo brasileiro; coletivo, porque é

impossível para um único indivíduo assumir todo o trabalho.

Entendo que a mudança de paradigma de transmissão de conteúdo para

a construção e produção de conhecimento é uma tarefa árdua, mas que pode

ser o caminho para transformações. Acredito que o inglês em escolas públicas

pode funcionar e a investigação da minha própria sala de aula de língua

inglesa, proposta deste estudo, é, sem dúvida, o primeiro passo para que eu

possa conhecer e melhor entender a minha prática pedagógica e o sentido que

o meu aluno dá aos eventos da sala de aula de inglês. Afinal, mesmo com as

dificuldades do panorama atual, quero mudar e ver as coisas acontecerem.

Não quero apenas falar sobre elas.

Page 21: PRÁTICAS COTIDIANAS EM UMA SALA DE INGLÊS: UM ESTUDO

20

Objetivos e perguntas de pesquisa

Esta pesquisa analisa uma turma de inglês do 2o ano do Ensino Médio,

sob a regência desta autora, que também se coloca no papel de pesquisadora

iniciante, a fim de conhecer as práticas culturais do microcontexto da sua

própria sala de aula e os sentidos que os estudantes e a professora dão aos

eventos em que estão envolvidos. O pesquisador etnógrafo entende a sala de

aula como cultura, quer dizer, cada sala de aula é uma comunidade com

modos específicos de conversar, agir, saber, fazer e ser. Esses modos,

práticas ou padrões rotineiros de um grupo específico, só se tornam visíveis, se

forem observados, registrados, gravados, analisados e interpretados

sistematicamente durante um período.

Esta pesquisa tem como principal objetivo conhecer as práticas rotineiras

da minha sala de aula, com o propósito de examinar se o trabalho que faço

com meus alunos está afinado com a pedagogia culturalmente sensível e

inclusiva. Para tal, busco entender, por meio da observação participante e

entrevistas, o que os atores – professora e alunos – fazem no espaço da sala

de aula. Em segundo lugar, busco entender como os atores atribuem sentido

ao que é feito em sala. Por último, busco descobrir se as práticas culturais da

minha sala de aula estão alinhadas com uma pedagogia que esteja centrada

no aluno a fim de promover o seu desempenho acadêmico e social. Três

perguntas orientam a pesquisa:

1. O que os atores (professora e alunos) fazem em sala de aula?

2. Como os atores (professora e alunos) atribuem sentidos aos eventos

que acontecem em sala de aula?

3. As práticas culturais da turma acolhem a escuta dos alunos?

Esta pesquisa se insere no paradigma de investigação qualitativa de

caráter interpretativo e etnográfico na área da Linguística Aplicada. À pesquisa

qualitativa, como é o caso desta, interessa mais o processo do que o produto,

por isso o foco é a atuação humana, para entender a natureza construída da

vida em salas de aulas. Os instrumentos principais utilizados foram:

observação participante por meio de gravações de áudio de aulas e entrevista

Page 22: PRÁTICAS COTIDIANAS EM UMA SALA DE INGLÊS: UM ESTUDO

21

semiestruturada, além da utilização de um questionário para traçar o perfil dos

alunos.

A natureza e a significância do estudo

Este estudo, qualitativo e interpretativo, é parte integrante de dois

projetos de Assis-Peterson: “Redes de conhecimento – conectando lares e

salas de aula em torno do ensino de línguas (um estudo sobre crenças,

discursos, práticas e ideologias de língua estrangeira)” (2008), e “Universidade,

escola e comunidade: teorizando e redesenhando práticas pedagógicas para

novos letramentos no ensino crítico de línguas estrangeiras” (2010)7. Ambos

os projetos comungam com a ideia que uma educação autêntica parte do

princípio de que alunos têm conhecimento e podem aprender.

O primeiro projeto tem como principal objetivo construir conexão entre

lares e escolas, estabelecendo redes de conhecimento nas quais interagem

professores, supervisores, pais e seus filhos, de forma a proporcionar uma

visão mais abrangente sobre como os professores podem ajudar os alunos a

desenvolver habilidades de letramento em língua inglesa. O segundo propõe

uma investigação para compreender a relação entre ensino de línguas

estrangeiras na escola pública e a relação desta com a educação, a concepção

de língua e linguagem presente no ensino de línguas estrangeiras, o

desenvolvimento de cidadania, promoção de inclusão por meio de línguas

estrangeiras e uma intervenção por meio de um programa de educação

continuada.

Mediante o contexto exposto, este estudo vai ao encontro das propostas

almejadas por cada projeto apresentado, pois, inserido no paradigma de

investigação qualitativa, busca observar, registrar e analisar os eventos da sala

de aula da turma do 2º ano. Além disso, apoia-se na compreensão de que a

7 Os dois projetos são coordenados por Ana Antônia de Assis-Peterson e vinculados à linha de

pesquisa “Paradigmas de Ensino de Línguas”, do Programa de Mestrado em Estudos de

Linguagem/UFMT. O segundo projeto é parte integrante do Projeto Nacional “Formação de professores nas teorias dos novos letramentos e multiletramentos: o ensino crítico de línguas estrangeiras na escola”, sob coordenação de Walkyria Monte Mór e Lynn Mario Trindade Menezes de Souza, vinculado à Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas, Departamento de Letras Modernas /USP, sendo a UFMT um dos núcleos parceiros.

Page 23: PRÁTICAS COTIDIANAS EM UMA SALA DE INGLÊS: UM ESTUDO

22

escuta do aluno pode ser realizada com base no conhecimento que ele já

possui e que adentra os muros da escola.

Pela complexidade do tema, esse fazer investigativo foi desafiador. Observar,

descrever, gravar, preparar, executar a aula e participar dela parecia ser, às

vezes, enlouquecedor. Ser a professora e pesquisadora, ao mesmo tempo,

trouxe momentos de incertezas e alvoroços. O planejado nem sempre

acontecia, mas tudo servia como impulso para continuar a estudar aquele

microcontexto escolar – a minha própria sala de aula.

De acordo como o Projeto “Sala Ambiente” (PPP, 2010) da Escola Azul,

investigada neste estudo, cada professor “tem” uma sala de aula. Assim, os

alunos – e não os professores – é que trocam de ambiente a cada aula. Esse

espaço é especializado para o atendimento de determinada disciplina e cabe

ao professor a responsabilidade de organizá-lo do jeito que lhe convém.

Com uma hora de aula de inglês semanal, a turma do 2º ano, composta

de onze alunos, foi alvo deste estudo durante um semestre. Nesse período,

munida com instrumentos próprios da etnografia, observei, registrei e analisei

dados. Entretanto, de acordo com Blommaert (2006, p. 3), “o cotidiano nunca

será ajustado ao plano de investigação e o único caminho a seguir é o de

adaptar o plano e maneiras de fazer as coisas com as regras da vida

cotidiana”. Assim aconteceu com este estudo, em que adaptações foram feitas

conforme as necessidades do cotidiano escolar.

Com este pano de fundo, espera-se que esta pesquisa possa,

efetivamente, contribuir com outros professores, a fim de que possam refletir

sobre suas ações pedagógicas e que sejam encorajados a investigar a sua

própria sala de aula.

Do ponto de vista teórico, a importância deste estudo se assenta nos

pressupostos de que o ensino de língua inglesa torna-se melhor quando os

professores aprendem sobre e aprendem com o cotidiano vivido pelos seus

alunos. Acredita-se que o diálogo da escola com a comunidade, de professores

com seus alunos, de professores com professores dentro da escola podem

gerar outras modos de pensar o ensino e a escola e isso poderia abrir novas

zonas de possibilidades em favor de uma educação linguística de valorização

de professores e alunos, alçados ao papel de protagonistas de seu dizer e

fazer.

Page 24: PRÁTICAS COTIDIANAS EM UMA SALA DE INGLÊS: UM ESTUDO

23

Organização da dissertação

Esta dissertação está estruturada em três capítulos, além desta

Introdução e da Conclusão. Nesta INTRODUÇÃO, apresento a caracterização

do trabalho, o contexto e a problemática, os objetivos e as perguntas de

pesquisa, a natureza e a significância do estudo. Aqui também descrevo a

organização da dissertação, a seguir.

No Capítulo 1 – O BACKGROUND DA PESQUISA – apresento os

principais aportes teóricos que orientam o estudo. Primeiramente, relato o

panorama da reforma educacional e do ensino de inglês no contexto brasileiro

e nos documentos oficiais. Em seguida, discorro sobre o conceito de fundos de

conhecimento de González, Moll e Amanti (2009) e discuto a importância do

princípio da escuta do aluno na perspectiva freireana.

No Capítulo 2 – A METODOLOGIA DA PESQUISA – trato do

desenvolvimento da pesquisa ancorado num enfoque qualitativo etnográfico.

Retomo as perguntas de pesquisa e, em seguida, apresento o cenário, os

participantes e instrumentos de pesquisa, destacando as circunstâncias em

que ela se desenvolveu. Por último, explicito os procedimentos de análise de

dados.

No Capítulo 3 – A TURMA DO 2O ANO: PRÁTICAS E SENTIDOS –

analiso e interpreto os temas orientadores da pesquisa, com base nas três

perguntas propostas para este estudo. Em primeiro lugar, descrevo os fazeres

da sala de aula. A seguir, apresento e analiso os dados que indicam os

sentidos atribuídos pelos atores aos encontros transculturais do microcontexto

escolar. Por fim, alicerçada no entendimento informado por dados, procuro

identificar se as práticas culturais da turma acolhem a escuta dos alunos.

Finalmente, na CONCLUSÃO, apresento uma síntese das principais

descobertas do estudo, suas limitações, e destaco o que aprendi com a

pesquisa.

A seguir, exponho os aportes teóricos que norteiam este trabalho

Page 25: PRÁTICAS COTIDIANAS EM UMA SALA DE INGLÊS: UM ESTUDO

24

CAPÍTULO 1

O BACKGROUND DA PESQUISA

Ninguém educa ninguém, ninguém educa a si mesmo, os homens se educam entre si, mediatizados pelo mundo.

— Paulo Freire (1987, p.39)

O objetivo deste capítulo é apresentar o background da pesquisa.

Primeiramente, com base em alguns estudiosos e documentos oficiais, trago

um breve relato da reforma educacional e do ensino de inglês no contexto

brasileiro. Em seguida, descrevo duas perspectivas teóricas – fundos de

conhecimento e educação freireana, que orientam o estudo. Por último, teço

algumas considerações sobre o papel do professor como pesquisador.

1.1 Um caminho histórico: as reminiscências

Segundo Pedroso (Comunicação pessoal, em sala de aula, 16/08/2010),

tudo o que rodeia a educação institucionalizada é fruto de nossa própria

história de sociedade, em suas mais variadas ramificações: econômicas,

sociais e políticas. Ou seja, o modo ou maneira de ensinar se modifica sempre

pela necessidade de cada época, pela situação de cada momento (PEDROSO,

comunicação pessoal em sala de aula, 20/09/2010). Sendo assim, a educação

brasileira e, consequentemente, o ensino de língua, estão marcados por

paradigmas e abordagens que sempre buscaram e ainda buscam atender os

anseios da sociedade da época em que está inserida.

Para Santos e Oliveira (2009, p.25), desde o começo do século XIX, o

ensino de língua inglesa está presente no currículo escolar brasileiro. Conforme

as autoras, devido às relações comerciais de Portugal com a Inglaterra,

aprender inglês passou a ser uma necessidade relacionada ao momento

Page 26: PRÁTICAS COTIDIANAS EM UMA SALA DE INGLÊS: UM ESTUDO

25

histórico da época, e a função do ensino era “capacitar os estudantes a se

comunicarem oralmente e por escrito.” Contudo, o único método da época era

o de gramática-tradução e, portanto, as aulas de inglês tinham como base a

tradução de textos e exercícios de leitura.

De acordo com Leffa (1998/1999, p.19), citado em Cox e Assis (2008, p.

20), “as décadas de 40 a 50 formam os anos dourados do ensino de línguas

estrangeiras no Brasil”. Nessa época, além do francês, inglês e espanhol, as

línguas clássicas, como o latim e grego, também faziam parte dos currículos

nacionais.

Dos tempos antigos até os atuais, muitas foram as mudanças e dentre

alguns autores que narram a história do ensino de inglês no contexto brasileiro,

ou parte dela, estão Cox e Assis (2008, p. 19-51). Contudo, até o final da

década de 60, o ensino de inglês, com ligeiras variações, reduzia-se ao registro

escrito padrão, com exercícios gramaticais e atividades voltadas para a versão

da língua estrangeira para a língua materna e vice-versa.

Para Cox e Assis (2008, p. 21), foi a partir de 1961 que a língua

estrangeira sofreu drásticas mudanças dentro do contexto brasileiro. Conforme

as autoras (p. 21-22), a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional – LDB

(BRASIL, 1961), publicada em 20 de dezembro de 1961, extinguiu a

obrigatoriedade da presença das línguas estrangeiras no currículo nacional,

deixando-as como disciplinas optativas. Assim sendo, a escolha da disciplina,

dentro das escolas brasileiras, ficou a critério dos interesses locais.

Segundo Mulik (2012, p. 20), outra reforma educacional surgiu com a

promulgação da LDB 5692 (BRASIL, 1971) e o ensino foi reduzido de 12 para

11 anos, sendo o 1º grau com oito anos de duração e o 2º, com três anos.

Cox e Assis (2008, p. 22-23), avaliam que o momento histórico

necessitava de mão de obra qualificada para trabalhar nas indústrias nacionais

e multinacionais, e a formação tecnicista e profissionalizante derrubou a base

humanista do período anterior. Apesar de a lei não determinar as disciplinas

obrigatórias nos currículos brasileiros, o foco era a formação de indivíduos para

o mercado de trabalho, e os EUA, nesse período, colocavam o Brasil e outros

países em posição de dependência. Com a habilitação profissional em

destaque, a legislação desobriga a inclusão de Língua Estrangeira (LE) nos

currículos de 1º e 2º graus. Sob a influência das ideias militares de

Page 27: PRÁTICAS COTIDIANAS EM UMA SALA DE INGLÊS: UM ESTUDO

26

nacionalismo, patriotismo e exaltação da identidade brasileira, a escola não

deveria ser impregnada pela cultura estrangeira e, dessa forma, o ensino de LE

passa a ser um instrumento das classes favorecidas.

De acordo com Mulik (2012, p. 20), vinte e cinco anos após a instituição

da LDB 5692 de agosto de 1971, foi promulgada a LDB 9.934 (BRASIL, 1996).

Com ela, a nomenclatura 1º e 2º graus passou a ser, respectivamente, Ensino

Fundamental e Médio.

Leffa (1999, p.14-15) esclarece que, embora uma base nacional comum

continue presente no currículo, o artigo 26 da LDB 9.934 (BRASIL, 1996)

determina que ela deva ser complementada: "em cada sistema de ensino e

estabelecimento escolar, por uma parte diversificada, exigida pelas

características regionais e locais da sociedade, da cultura, da economia e da

clientela”.

O autor confirma também a obrigatoriedade de pelo menos uma língua

estrangeira moderna, a partir da quinta série, dentro das possibilidades da

instituição (BRASIL, 1996, Art. 26, §5). De acordo com Leffa, (1999, p.14-15), a

lei dispõe para o ensino médio a obrigatoriedade de uma língua estrangeira

escolhida pela comunidade escolar e uma segunda, em caráter optativo, dentro

da disponibilidade da instituição (BRASIL, 1996, Art. 36, Inciso III).

Para Leffa (1999, p.15), a ideia de um único método certo é

abandonada, uma vez que o ensino passa a ser ministrado com base no

princípio do "pluralismo de ideias e de concepções pedagógicas" (BRASIL,

1996, Art.3º, Inciso III), dentro de uma grande flexibilidade curricular:

organização em séries anuais, períodos semestrais, ciclos, alternância regular de períodos de estudos, grupos não-seriados, com base na idade, na competência e em outros critérios, ou por forma diversa de organização, sempre que o interesse do processo de aprendizagem assim o recomendar (BRASIL, 1996, Art. 23).

Ainda conforme Leffa (1999, p.16), os Parâmetros Curriculares

Nacionais – PCN - (BRASIL, 1998), para o terceiro e quarto ciclos do Ensino

Fundamental, publicados em 1998, complementaram a LDB anterior. Com

base no princípio da transversalidade, o documento sugere uma abordagem

sociointeracional, com ênfase na leitura, e incorpora questões como

Page 28: PRÁTICAS COTIDIANAS EM UMA SALA DE INGLÊS: UM ESTUDO

27

Pluralidade Cultural, Orientação Sexual, Meio Ambiente, Ética, Trabalho e

Consumo.

Já nos PCNEM - (BRASIL, 2000), segundo Souza e Santos (2011, p. 2),

a sugestão é de que o ensino de línguas estrangeiras deva se concentrar no

desenvolvimento integral da competência comunicativa, visto que “(...) o

estudante precisa possuir um bom domínio da competência gramatical,

sociolinguística, da competência discursiva e da competência estratégica”.

(BRASIL, 2000, p.30). Tem-se a impressão, segundo a autora (2011, p. 2), de

que os dois documentos tratam do ensino de línguas estrangeiras para dois

países diferentes.

Entre documentos, práticas e momentos históricos, a língua espanhola

começa a ser percebida no país com a criação, pelo Tratado de Assunção, em

1991, do bloco econômico Mercosul (Mercado Comum do Sul). Entretanto, de

acordo com Mulik (2012, p. 20), foi em agosto de 2005, com a Lei nº 11.161

(BRASIL, 2005), que o ensino de língua espanhola garantiu sua presença nas

séries de educação básica, com prazo de implementação de cinco anos a partir

da criação da lei.

Todavia, Cox e Assis (2008, p. 23) afirmam que, “sob o signo do ensino

profissionalizante, o inglês tornou-se a língua estrangeira hegemônica no

currículo da escola pública brasileira” e que ela era, e ainda é, para muitas

pessoas, no Brasil, sinônimo de língua estrangeira.

Em 2006, um novo documento, as Orientações Curriculares para o

Ensino Médio – OCEM (BRASIL, 2006), é publicado e encaminhado aos

professores, a fim de apresentar um conjunto de reflexões que alimente a sua

prática docente.

A própria Secretaria de Educação Básica, por intermédio do

Departamento de Política do Ensino Médio, assume o novo documento como

uma “retomada da discussão dos Parâmetros Curriculares Nacionais do Ensino

Médio” (BRASIL, 2006, vol. 1, p. 9). Para os consultores da seção de Línguas

Estrangeiras, Menezes de Souza e Monte Mór, as OCEM tendem a expandir as

orientações anteriores e responder a investigações recentes (BRASIL, 2006,

vol. 1, p.87).

Em 2010, o Estado de Mato Grosso lança as Orientações Curriculares

para a Educação Básica – OCEB – (MATO GROSSO, 2010), a fim de levar a

Page 29: PRÁTICAS COTIDIANAS EM UMA SALA DE INGLÊS: UM ESTUDO

28

todos a concepção de educação que norteia as políticas educacionais

pretendidas e, a partir daí, o estado incorpora de forma definitiva a organização

estrutural através dos ciclos de formação humana para o ensino fundamental

até o 9º ano (MATO GROSSO, 2010, p.9).

O ensino médio mantém a estrutura seriada, sem deixar de levar em

conta a formação humana, e o ensino de língua inglesa, de acordo com os

documentos, deve se

aproximar a prática pedagógica das propostas dos PCN (BRASIL, 2000) e das OCN para o Ensino Médio (BRASIL, 2006), que obrigam hoje à adequação de remissões teóricas e a modificações organizacionais da escola e do currículo em função da concretização das propostas oficiais (MATO GROSSO, 2010, p.86).

Pedroso (Comunicação pessoal, em sala de aula, 26/11/2012) afirmou

que “ninguém é inaugural, todos respondem ao momento histórico em que

existem, por mais importantes que sejam.” Diante desse fato, o ensino de

línguas estrangeiras teve e, possivelmente, virá a ter, na sua história de vida,

uma vasta gama de documentos que busca responder ao momento histórico

em que a educação se encontra.

Fazem parte também dessa história diversas abordagens e/ou métodos

de ensino. Leffa (1988), no artigo Metodologia do ensino de línguas, traz uma

revisão histórica desses principais métodos/abordagens, a fim de “fazer com

que o professor comece onde os outros pararam, sem necessidade de

reinventar a roda ou repetir os erros do passado.” O autor (1988, p.211-236)

inicia com o relato da Abordagem da Gramática e da Tradução e termina com a

Abordagem Comunicativa, abordagem esta que tem sido de grande impacto

para o ensino de língua. Antes, a ênfase era mais na forma e com a nova

abordagem, o foco é a semântica, o uso da língua.

Passada a exaltação do ciclo da Abordagem Comunicativa, que,

segundo Assis-Peterson e Cox (2008, p. 26), talvez não tenha sido

implementada, efetivamente, nas escolas brasileiras, uma vez que ela não se

adéqua às condições do ensino público do Brasil, surgiram outras novidades.

A nova mudança veio, ainda na década de 90, através dos documentos oficiais

— Parâmetros Curriculares Nacionais do Ensino Fundamental, Parâmetros

Page 30: PRÁTICAS COTIDIANAS EM UMA SALA DE INGLÊS: UM ESTUDO

29

Curriculares do Ensino Médio e Orientações Curriculares para o Ensino Médio

— que buscavam se ajustar às condições do ensino público e atender ao

momento histórico-social da época. Com base na Pedagogia Crítica, o foco é o

sucesso do aluno dentro da necessidade de atuação, isto é, a ênfase do ensino

deve ser voltada para a aprendizagem geral do aluno, a fim de que ele esteja

apto a opinar e participar ativamente na comunidade.

Essa visão muda o paradigma educacional. Rompe-se com a razão

cartesiana e, na era pós-moderna, segundo Pedroso (Comunicação pessoal,

em sala de aula, 26/04/2012), a verdade deixa de ser absoluta e tudo passa a

ser relativizado.

Neste continuum, surgem as Orientações Curriculares. A tecnologia

permeia o mundo, o momento histórico social já é outro e a educação exige

novas mudanças. Com isso, nascem os novos letramentos. Aqui, letramento

desbanca o conceito de alfabetização que, segundo Rojo (2009, p.10), é visto

como conhecimento do alfabeto que leva o aluno ao processo mecânico da

escrita/leitura, e alfabetismo, como conjunto de capacidades e competências

envolvidas nos atos de leitura/escrita respectivamente (ROJO, 2009, p.74).

Embora o segundo conceito — alfabetismo — envolva a história de práticas

sociais do aprendiz, ambos os processos têm um foco individual (ROJO, 2009,

p.98)

Segundo Menezes de Souza e Monte-Mór (2006, p.106), letramento é

usado para “se referir aos usos heterogêneos da linguagem nas quais formas

de ‘leitura’ interagem com formas de ‘escrita’ em práticas socioculturais

contextualizadas”. Isso implica, necessariamente, o reconhecimento de

múltiplos letramentos, como o visual, digital, tecnológico e outros que deram

origem ao conceito de multiletramento, de Cope, Kalantzis (2000), “para dar

conta da extrema complexidade desses novos e complexos usos da linguagem

por novas comunidades de prática” (MENEZES DE SOUZA, MONTE-MÓR,

2006, p.106).

Sendo assim, no letramento crítico, texto e língua tomam novas

direções. Segundo Mattos e Valério (2010, p.138), a língua é vista como um

instrumento de poder e de transformação social e o texto é compreendido

“como um produto de forças ideológicas e sociopolíticas”, um “local de luta,

Page 31: PRÁTICAS COTIDIANAS EM UMA SALA DE INGLÊS: UM ESTUDO

30

negociação e mudança”, conforme Norton (2007, p.6) citado em Mattos e

Valério (2010, p.138).

Nessa perspectiva, o letramento poderá desenvolver a consciência

crítica do aprendiz, o qual, segundo Freire,

Quanto mais for levado a refletir sobre sua situacionalidade, sobre seu enraizamento espaço-temporal, mais “emergerá” dela conscientemente “carregado” de compromisso com sua realidade, da qual, porque é sujeito, não deve ser simples espectador, mas deve intervir cada vez mais (FREIRE, 1979, p.35).

Nesse sentido, Mattos e Valério (2010, p.141) confirmam a ideia

freireana quando afirmam que o letramento crítico “promove o empoderamento

do aprendiz, que é levado a apropriar-se de seu próprio processo educacional”.

Segundo as autoras, as atividades de sala de aula de língua inglesa,

trabalhadas sob a concepção de letramento crítico, poderão tanto conduzir o

aluno a pensar criticamente a respeito da cultura que o cerca, do seu cotidiano

e da sua postura como cidadão (MATTOS e VALÉRIO 2010, p.141 ), como

também poderão proporcionar ao professor a oportunidade de pensar sobre

sua experiência, “sobre seu modo de estar no mundo associado à sua ação

sobre o mundo” (FREIRE, 1979,p.8) e, talvez, se quiseram, fazer mudanças.

Afinal, a história prossegue, a elitização da educação nacional diminuiu,

mas não cessou e o ensino de língua estrangeira, no Brasil, segundo Kezen

(2005, p.1) sempre foi discriminatório. A desigualdade social, a exclusão

durante longos períodos dificultaram e, em muitos casos, até impedem a

democratização do ensino do inglês. Diante disso e das novas necessidades

da sociedade — saber inglês é um requisito para o exercício de uma cidadania

plena, não apenas para os alunos em fase escolar, mas para a maioria da

população — presenciamos críticas acirradas à não proficiência no idioma

pelos alunos e professores brasileiros e à incapacidade de as escolas públicas

e, por conseguinte, dos professores, proporcionarem um bom ensino da

língua.

Em parte, concordo com a mídia que denuncia a falta de proficiência

linguística dos estudantes e professores, tão exigida na sociedade atual.

Entretanto, questiono as críticas que, na maioria das vezes, responsabilizam

apenas as escolas públicas e seus professores pela má qualidade do ensino.

Page 32: PRÁTICAS COTIDIANAS EM UMA SALA DE INGLÊS: UM ESTUDO

31

Oliveira e Paiva (2011, p. 34) testemunha que ao longo de sua carreira, pôde

perceber que “ensino ruim ou de qualidade não é privilégio da educação

pública e que muitas escolas particulares também ficam devendo ao aluno um

ensino de qualidade” (OLIVEIRA e PAIVA, 2011, p. 34).

Outro fator importante é que não se veem muitas investigações voltadas

para os resultados das escolas particulares, referentes ao ensino de língua

estrangeira, e isso, possivelmente, interfere diretamente nas pesquisas

apresentadas para a sociedade brasileira. Portanto, adiro à Oliveira e Paiva

(2011, p. 34), ao considerar que a situação da qualidade perpassa pelo ensino

de uma forma geral, independentemente de ser público ou privado.

Ademais, algumas obras (OLIVEIRA E PAIVA, 2011, p. 34; OLIVEIRA,

2011, p.73; SCHMITZ, 2011 p. 111; LIMA, 2011 p. 162; MICOLLI, 2011 p.175,

SILVÉRIO DE LIMA, 2012), ainda de forma singular, mostram-nos muitas

escolas e professores que têm, dentro dos seus limites, procurado reverter o

panorama com iniciativas que se afinam com as propostas das orientações

oficiais em vigor e fazem do ensino da língua inglesa uma oportunidade para o

aluno interagir e participar no mundo social (humano, tecnológico, cientifico,

acadêmico) e conhecer culturas e tradições de diversos povos, uma vez que, a

cada dia que passa, a tecnologia permite-nos diminuir mais e mais as fronteiras

físicas entre os países.

Estamos em um novo momento, em que, segundo Freire (1997, p. 63),

“aprender e buscar se juntam, necessariamente a ensinar e conhecer”. Nessa

perspectiva, o conhecimento não é fixo, mas um processo dinâmico, produzido

coletivamente, buscando dar sentido ao mundo. A globalização contemporânea

traz consigo a aproximação e justaposição de culturas e povos diferentes

(MENEZES DE SOUZA, 2011, p. 128) e “a língua inglesa tem sido comumente

associada à língua oficial da globalização, que tanto pode incluir como excluir

os cidadãos”, de acordo com Maciel (2011, p. 255).

E é nesse momento histórico social que se situa esta pesquisa e que a

professora pesquisadora iniciante busca, na sua própria sala de aula, desvelar

os seus fazeres pedagógicos.

Page 33: PRÁTICAS COTIDIANAS EM UMA SALA DE INGLÊS: UM ESTUDO

32

A mundialização da língua inglesa: o global-local

As mudanças sociais das últimas décadas acontecem por conta do

movimento da globalização e não há mais como separar o global do local, a

sociedade da escola, a família do aluno. Para Steger (2003), citado em

Longaray (2009) entende-se, globalização como

um conjunto de processos sociais que produzem, multiplicam e intensificam a interdependência e as trocas sociais ao redor de todo o mundo ao mesmo tempo em que promovem o conhecimento de vínculos cada vez mais profundos entre o local e o não-local (LONGARAY,2009, p. 61),

Nesse cenário, de acordo com Barros (2008), citado por Siqueira (2012,

p.37), “é evidente a necessidade de uma educação para a diversidade,

entendida menos como uma atitude de respeito passivo e mais como uma

forma de estar no mundo.” E nessa circunstância, o ensino de línguas,

maternas ou estrangeiras, é um dos campos do saber/conhecimento que pode

promover a consciência crítica da diversidade humana e suas manifestações,

uma vez que domínio de línguas e interação com outras culturas e outros

povos são de fundamental importância para a educação que tem como meta a

cidadania.

Conforme Cox e Assis-Peterson (2008, p. 37), o mundo global fala inglês

e esse fato não depende de nele acreditarmos ou não. Pode até não agradar a

este ou àquele, mas é algo incontestável. E sendo o inglês a língua que a

globalização elegeu para a comunicação, estudos como os de Moita Lopes

(2008), Peterson, Cox (2007) e House (2003) têm trazido à tona discussões

sobre o ensino e a mundialização dessa língua, que ganha características

locais, e “consegue deixar de ser vista como língua internacional, para ser

mundial, hibridizada, a qual mescla o global com o local” (FERREIRA, KALVA,

2011, p 719).

Segundo essas autoras (2011, p. 710), outros autores, como

Canagarajah (1999; 2006; 2007), Crystal (1997), Block (2006), Seidlhofer

(2004), Gimenez (2008) também discutem a questão. Alicerçados na

Page 34: PRÁTICAS COTIDIANAS EM UMA SALA DE INGLÊS: UM ESTUDO

33

concepção de inglês como língua franca, veem a língua inglesa permeada pelo

global e o local.

Nessa perspectiva, Ferreira e Kalva (2011, p. 720) concordam com

Canagarajah, (2007) quando este diz que “não se pode pensar em inglês

como homogêneo, mas sim plural, no qual os vários participantes criam suas

próprias variedades de inglês”.

Segundo Ortiz (2006), citado em Assis-Peterson e Cox (2008, p.37),

qualquer indivíduo, independentemente de sua origem, tem a oportunidade e o

direito de manipular e deturpar o inglês que fala, uma vez que a existência de

um padrão linguístico é apenas uma ilusão.

Também para Rajagopalan (2009), a língua que ele chama de “World

English” não tem falantes nativos e ela “pertence a todos aqueles que dela

fazem algum uso no seu dia a dia, por mais limitado ou restrito que ele seja”

(RAJAGOPALAN, 2009, p. 41-42).

A despeito dessa circunstância, em que a língua inglesa é cada vez mais

utilizada e em que se valoriza a pluralidade de variedades de inglês, o ensino

deste não pode fechar os olhos para os aspectos tanto globais quanto locais

que perpassam as salas de aulas. Professores e aprendizes não devem ser

protótipos de falantes nativos e as escolas precisam repensar seus objetivos,

além de seus próprios muros.

1.2 A reforma educacional nos documentos oficiais: OCEM e OCEB/MT

Com a complexidade do “mundo de hoje”, sustentado pela globalização,

Menezes de Souza (2011, p.279) discute, em seu artigo intitulado O professor

de inglês e os letramentos no século XXI: métodos ou ética?, a necessidade

de se atuar de forma diferente diante da sala de aula, de agir e interagir com os

alunos e com os materiais de uma maneira diferente. Para o autor, esse

conceito que tínhamos de métodos, de livros didáticos, muda em consequência

da dinâmica da nossa realidade contemporaneamente.

Assim, acrescenta o autor (2011):

A nossa lógica tradicional educacional – tradicional não do século passado e sim daquilo que ainda vigora na maioria das

Page 35: PRÁTICAS COTIDIANAS EM UMA SALA DE INGLÊS: UM ESTUDO

34

salas de aula ainda hoje – percebe o conceito de material didático, conhecido até aqui como “método”, sob uma lógica de que tudo seria “self-contained”, ou melhor, teria seu significado contido nele mesmo, a nossa prática já significaria “por si só”: esta é a lógica que temos, é algo completo, organizado, predeterminado, previsível e garantido (MENEZES DE SOUZA, 2011, p. 280).

Em alusão a Paulo Freire, Menezes de Souza retoma a metáfora da

educação bancária — na qual o professor age como quem deposita

conhecimento num aluno apenas receptivo — dizendo que no ensino não é

possível fazer depósitos e imaginar que, em algum momento, a conta vai

aumentar ou gerar lucro.

Na tentativa de fazer mudanças e de potencializar a aprendizagem no

país, o governo brasileiro tem, há décadas, criado diversos documentos oficiais

para nortear os rumos da educação brasileira. Independentemente do nome,

todos os documentos têm como diretriz a garantia de uma educação de

qualidade a todos e as OCEM – Orientações Curriculares Nacionais para o

Ensino Médio – (BRASIL, 2006) e as OCEB/MT – Orientações Curriculares

para a Educação Básica do Estado de Mato Grosso – (MATO GROSSO, 2010)

não são diferentes, como mostra o excerto abaixo:

A qualidade da escola é condição essencial de inclusão e democratização das oportunidades no Brasil, e o desafio de oferecer uma educação básica de qualidade para a inserção do aluno, o desenvolvimento do país e a consolidação da cidadania é tarefa de todos. [...] Dessa forma, colocou-se acima das diferenças o interesse maior pela educação pública de

qualidade (BRASIL, 2006, p.5).

Centrados nessa perspectiva, os documentos também priorizam uma

educação que enfatiza a formação do ser humano8, buscando com esta

sugestão retomar a proposta do Art. 35 no inciso III da LDB 9394/96 (BRASIL,

1996), que trata da questão do aprimoramento do educando como pessoa

humana. Como se vê, o excerto abaixo não elimina este tema:

8 Ser humano entendido como "um ser pensante, inteligente, dotado de razão e reflexão, e que pode considerar-se a si mesmo como um eu, ou seja, como o mesmo ser pensante, em diferentes tempos e lugares" (LOCKE, 1986, p. 318 apud FERREIRA, 2005).

Page 36: PRÁTICAS COTIDIANAS EM UMA SALA DE INGLÊS: UM ESTUDO

35

A partir da concepção de uma educação fundamentada na e para a formação humana9, no âmbito das relações socioculturais, estas Orientações Curriculares buscam a ressignificação dos tempos e espaços de aprendizagem e desenvolvimento dos educadores e educandos envolvidos no

espaço educativo (MATO GROSSO, 2010, p.1).

Configura-se, também, como discussão e proposta dos documentos, a

questão da cidadania. Formar para a cidadania, ou seja, formar indivíduos com

consciência social para compreenderem a sua posição no contexto sócio-

histórico em que estão inseridos é o objetivo principal da Educação Básica. E

contribuir com tal objetivo é uma das funções da Língua Estrangeira, conforme

atesta o fragmento a seguir:

Nas propostas atuais, essa visão da cidadania como algo homogêneo se modificou. Admite-se que o conceito é muito amplo e heterogêneo, mas entende-se que ‘ser cidadão’ envolve a compreensão sobre que posição/lugar uma pessoa (o aluno, o cidadão) ocupa na sociedade. Ou seja, de que lugar ele fala na sociedade? Por que essa é a sua posição? Como veio parar ali? Ele quer estar nela? Quer mudá-la? Quer sair dela? Essa posição o inclui ou o exclui de quê? Nessa perspectiva, no que compete ao ensino de idiomas, a disciplina Línguas Estrangeiras pode incluir o desenvolvimento da

cidadania (BRASIL, 2006, p.91).

Ainda com a mesma inquietação, as OCEM (BRASIL, 2006) reforçam a

questão da cidadania, com base nos princípios de Van Ek, Trim (1984) sobre a

contribuição da aprendizagem de língua estrangeira:

... o valor educacional da aprendizagem de uma língua estrangeira vai muito além de meramente capacitar o aprendiz a usar uma determinada língua estrangeira para fins comunicativos (BRASIL, 2006, p.92).

Igualmente às orientações nacionais, as OCEB/MT (MATO GROSSO,

2010) trazem na essência de seu texto o tema da cidadania como inclusão

social do ser humano,enfatizando esse objetivo:

9 Grifo da autora. Formação humana entendida como sinônimo de educação (SAVIANI, 2011 apud BORGES, 2012).

Page 37: PRÁTICAS COTIDIANAS EM UMA SALA DE INGLÊS: UM ESTUDO

36

...compreendida a Educação Básica, a sua concretização implica em intensivo trabalho coletivo dos profissionais da educação que atuam em todos os níveis, na implementação de políticas públicas que objetivem a formação humana na perspectiva da inclusão social (MATO GROSSO, 2010, p.22).

Aqui também, nas orientações de Mato Grosso, o processo educativo

deve assumir, em sua dimensão de totalidade, uma concepção histórica de

homem em sua integralidade. É preciso compreendê-lo como síntese do

desenvolvimento social e individual, e o processo educativo precisa oferecer

um aprendizado diversificado e contínuo, permitindo ao homem usar seus

conhecimentos científicos, tecnológicos, sócio-históricos e culturais para

compreender e intervir no mundo que o cerca.

À língua estrangeira é dada, como nos documentos nacionais, a função

de trazer para a sala de aula as reflexões sobre o estar no mundo e ela é vista,

pelas orientações mato-grossenses, como uma

condição essencial para possibilitar aos alunos a construção de sua cidadania e, portanto, sua inclusão no mundo social. Hoje, a língua estrangeira faz parte do processo de multiletramento (letramento da língua materna, digital e numérico, entre outros) (MATO GROSSO, 2010, p.88).

Não se pode esquecer, entretanto, como se lê nas OCEM (BRASIL,

2006, p.90), que os objetivos da escola regular são distintos dos cursos de

idiomas, pois “trata-se de instituições com finalidades diferenciadas”. O ensino

de línguas, na escola, tem que se preocupar com a formação de pessoas,

formação de cidadãos, de fazer com que o aluno pense naquilo que está

aprendendo. O objetivo da escola tem que ser benéfico para a escola e para a

própria formação de pessoas. Por isso, continua a autora, é preciso reforçar

que os objetivos do ensino de línguas nas escolas de Educação Básica têm um

caráter educativo e que essas instituições não podem tentar realizar o seu

ensino refletido naquilo que os cursos de idiomas fazem. Cada qual com seu

objetivo.

A necessidade de repensar a prática cotidiana é vital, pois o mundo se

relaciona de forma diferente e, consequentemente, a forma de aprender e

Page 38: PRÁTICAS COTIDIANAS EM UMA SALA DE INGLÊS: UM ESTUDO

37

ensinar também deve ser diferente. Diante de uma visão sociointeracionista, a

língua deve ser vista como resultado de uma prática social, totalmente

dinâmica e completamente dependente do contexto histórico. E a

aprendizagem de uma língua estrangeira ganha outro caráter. Assim sendo,

segundo as OCEB/MT:

Hoje, a aprendizagem de uma língua estrangeira não é mais ilustração ou um elemento adicional na educação, mas é parte da vida cotidiana e um instrumento importante para colaborar no processo de inclusão daqueles excluídos do mundo do trabalho, da informação, do conhecimento e da tecnologia (MATO GROSSO, 2010, p.84).

1.3 O conceito de fundos de conhecimento

Uma vida escolar bem sucedida não depende apenas dos avanços da

legislação, mas depende, em grande parte, do espaço escolar onde trabalham

professores e alunos e como eles compartilham e negociam seus

conhecimentos, pois ensinar e aprender são processos interativos que

requerem a participação de ambos. Sob essa ótica, as relações professor-

aluno-família-escola se modificam. A escola passa a se aproximar da

comunidade, e professores, de seus alunos, para que juntos possam

vislumbrar um novo olhar para a educação.

Entretanto, aproximar-se da comunidade escolar — alunos e família —

tem sido uma missão desafiadora para a maioria dos professores, uma vez que

não têm tempo e/ou não sabem como se deve fazer essa aproximação. A

situação gera, então, um total desinteresse entre os atores que deveriam estar

envolvidos no processo e o ensino fica, geralmente, à mercê de uma prática

pedagógica descontextualizada da realidade do aluno e do anseio do

professor.

Nessa perspectiva, dois aportes teóricos fundamentam esta pesquisa:

fundos de conhecimento e a educação freireana, pois ambas as concepções

apontam possibilidades de mudança para uma educação mais comprometida

com a diversidade das práticas culturais que adentram a sala de aula.

Page 39: PRÁTICAS COTIDIANAS EM UMA SALA DE INGLÊS: UM ESTUDO

38

Segundo Moll, Amanti, Neff e González (2009), o conceito de fundos de

conhecimento refere-se a corpos historicamente acumulados e culturalmente

desenvolvidos de conhecimentos e competências essenciais para uso

doméstico ou no funcionamento individual e bem-estar10. Ou seja, os fundos de

conhecimento são os recursos culturais das comunidades locais produzidos

pelas próprias famílias que os utilizam nas suas práticas sociais cotidianas.

Para González, Moll e Amanti (2009, p.1), “as práticas culturais são

formadas e transformadas com as circunstâncias sócio-históricas”. Por essa

razão, os autores entendem que a instrução deve ser ligada à vida dos

estudantes, e os aspectos de uma pedagogia eficaz devem ser ligados à

história local e ao contexto da comunidade.

Amanti (2009, p. 131) defende que “todas as culturas são heterogêneas

e as práticas dentro de um grupo variariam de acordo com fatores como

gênero, religião, classe e localização geográfica”. E para sedimentar a questão,

a autora retoma as palavras de Renato Rosaldo (1989, p.26)

A partir das piruetas do balé clássico até o mais bruto dos fatos brutos, toda conduta humana é culturalmente mediada. Cultura engloba o cotidiano e o esotérico,o mundano e o espiritual,o ridículo e o sublime. Nem alta nem baixa, a cultura é onipresente11 (GONZÁLEZ, MOLL, AMANTI, 2009, p. 132).

Na vida dos alunos, há muito conhecimento que a escola não sabe e,

portanto, não utiliza para ensinar habilidades acadêmicas. Uma vez que esses

conhecimentos são descobertos e mobilizados para a aprendizagem, eles

podem tornar-se um recurso social e intelectual de uma escola, assinalam

González, Moll e Amanti (2009, p. 13).

O conceito de fundos de conhecimento está alicerçado num trabalho

realizado por Vélez-Ibánez e Greenberg (2009) no Arizona. Segundo os

autores (2009, p. 53), esse conceito refere-se às estratégias de adaptação

10No original: We use the term funds of knowledge to refer to these historically accumulated and culturally developed bodies of knowledge and skills essential for household or individual functioning and well-being (MOLL, AMANTI, NEFF, GONZÁLEZ , 2009, p. 72); 11No original: From the pirouettes of classical ballet to the most brute of brute facts, all human

conduct is culturally mediated. Culture encompasses the everyday and the esoteric, the mundane and the elevated, the ridiculous and the sublime. Neither high nor low, culture is all pervasive (GONZÁLEZ, MOLL, AMANTI, 2009, p.132).

Page 40: PRÁTICAS COTIDIANAS EM UMA SALA DE INGLÊS: UM ESTUDO

39

constituídas por meio da combinação de habilidades rurais, experiências,

conhecimento técnico do habitat e de sobrevivência da grande parte da

população do Arizona-Sonora Mexicano. Mas foi em San Diego, trabalhando

na Universidade da Califórnia, que Moll desenvolveu dois estudos que,

segundo ele, “foram os precursores imediatos do projeto sobre os fundos de

conhecimento” (MOLL, 2009, p. 4). Apoiados nos métodos etnográficos para

pesquisa e na psicologia histórico-cultural de Vygotsky (1978), que enfatiza

como as práticas culturais e os recursos medeiam o desenvolvimento do

pensamento, Moll, Díaz e outros professores pesquisaram a dinâmica de sala

de aula e a vida no lar de algumas crianças mexicanas e suas respectivas

famílias.

No primeiro estudo, através de observações em sala de aula e de fitas

de vídeo, foi feita uma análise da organização social do ensino bilíngue

(crianças mexicanas em escolas americanas). A pesquisa mostrou que,

especialmente no que se referia à competência da leitura, não se aproveitavam

as habilidades das crianças em língua espanhola para dar instruções em língua

inglesa.

Com a ajuda do professor, os pesquisadores mudaram as estratégias de

ensino. Saíram da decodificação e concentração para o desenvolvimento da

compreensão de leitura do aluno. Organizaram lições de leitura, com suporte

em ambas as línguas, criando uma nova perspectiva para a compreensão do

que se lia. Segundo relato de Moll, em González, Moll e Amanti (2009, p. 4), os

alunos relegados a um baixo nível de leitura em inglês passaram a realizar um

trabalho muito mais avançado, uma vez que estavam providos com um suporte

estratégico do espanhol que favorecia o dar sentido ao texto.

O segundo estudo, realizado em escolas de ensino primário, contou

também com a atuação de diversos professores e focou no ensino da escrita

em inglês para aprendizes daquela língua. Além disso, teve como característica

as observações em lares e entrevistas com famílias para documentar a

natureza e amplitude do letramento familiar.

Um grupo de estudo formado pelos pesquisadores e professores

encontrava-se regularmente para discutir a utilização em sala de aula dos

conhecimentos apreendidos das famílias visitadas e refletir sobre esse recurso.

A inclusão de tópicos de relevância nas aulas e o diário reflexivo sobre as

Page 41: PRÁTICAS COTIDIANAS EM UMA SALA DE INGLÊS: UM ESTUDO

40

tentativas de mudanças a serem discutidas no grupo de estudo eram de

especial importância.

Na proposta de mudanças no ensino, atribuía-se maior ênfase ao

processo de escrita e em criar oportunidades para os alunos falarem sobre o

que eles escreveram; assim, gerava mais escrita pelos alunos e muito mais

oportunidades para ensinar.

Esses dois estudos formaram as bases do primeiro projeto sobre fundos

de conhecimento, em 1988, e impulsionaram a criação do Projeto de

Letramento Comunitário, para fundamentar as observações dos lares de

Tucson, com base nos resultados de Vélez-Ibanez e Greenberg sobre fundos

de conhecimento.

A experiência com a abordagem dos fundos de conhecimento mostrou

que o professor vê os alunos de forma diferente, entende melhor alguma

situação de sala de aula porque conhece as experiências de vida dos alunos.

Torna-se mais sensível e aprende a ouvir com mais atenção cada aluno. A

família, por sua vez, torna-se mais participativa da vida escolar dos seus filhos,

e os alunos, mais interessados. Nessa perspectiva, acredito que a abordagem

dos fundos de conhecimento pode, sim, colaborar com a transformação dos

professores e dos alunos em agentes coaprendizes e co-construtores do

conhecimento.

1.4 A educação freireana

Conhecido internacionalmente como um educador popular, Paulo Freire

se preocupou com a educação em geral e suas teorias estão ligadas a

propósitos sociais e políticos. Segundo sua filosofia, a educação é uma prática

política e sua pedagogia tem como objetivo maior desvelar as relações

opressivas vividas pelos homens, transformando-os para que eles transformem

o mundo.

Freire sempre defendeu, em todos os seus tabalhos (1982,1987, 1994,

1997 e outros), uma educação voltada para a conscientização (FERRARI,

2009, p.110). Atento às necessidades de seu tempo — instituir a democracia e

promover o desenvolvimento econômico do país — a educação era um motor

Page 42: PRÁTICAS COTIDIANAS EM UMA SALA DE INGLÊS: UM ESTUDO

41

propício para as transformações necessárias. Condenava a maioria das

escolas burguesas, que qualificou de “educação bancária”, e não aceitava a

ideia de que o aluno precisa apenas de que lhe sejam facilitadas as condições

para autoaprendizado. Freire ( 1987) afirma:

Se o educador é o que sabe, se os educandos são os que nada sabem, cabe àquele dar, entregar, levar, transmitir o seu saber aos segundos. Saber que deixa de ser de “experiência feito” para ser experiência narrada ou transmitida (FREIRE, 1987, p. 60).

Nessa visão, a educação não pode ser depósito de informação do

professor para o aluno. Precisa “superar a contradição entre o educador e o

educando para realizar-se como prática da liberdade” (FREIRE, 1987, p.68).

Para o autor, ninguém ensina nada a ninguém, mas as pessoas também

não aprendem sozinhas: “Os homens se educam entre si mediados pelo

mundo” (FERRARI, 2009, p.110 -111).

A concepção de educação está embutida numa concepção de mundo e

a valorização da cultura do aluno é a chave para o processo de sua

conscientização. Um dos seus princípios é de que o “aluno, alfabetizado ou

não, chega à escola levando uma cultura que não é melhor nem pior do que a

do professor”. E é através da relação de respeito à linguagem, cultura e história

de vida dos alunos que Freire propunha que a educação fosse feita. Dessa

forma, seria possível conscientizar o aluno para que este pudesse desenvolver

a criticidade e ter condições de entender sua situação social menos privilegiada

e agir em favor da própria libertação.

Para isso, o educador dizia ser preciso que o professor possibilitasse a

criação e a produção de conhecimento, e que o saber só existe “na invenção,

na reinvenção, na busca inquieta, impaciente, permanente, que os homens

fazem no mundo, com o mundo e com os outros” (FREIRE, 1987, p. 58).

Três momentos básicos permeiam a teoria do educador Paulo Freire. O

primeiro é aquele em que “o educador se inteira daquilo que o aluno conhece

não apenas para poder avançar no ensino de conteúdos, mas principalmente

para deixar que a cultura do aluno entre na sala de aula” (FERRARI, 2009, p.

111). Aqui, as práticas culturais do aluno vêm para sala de aula, auxiliam no

conteúdo e os dois – professor e aluno – aprendem juntos, um com o outro.

Page 43: PRÁTICAS COTIDIANAS EM UMA SALA DE INGLÊS: UM ESTUDO

42

Nada é verdade absoluta e as relações afetivas e/ou democráticas garantem a

todos a possibilidade de expressão. A base é o diálogo libertador e não o

monólogo opressivo do educador sobre o educando. Desta maneira:

o educador já não é o que apenas educa, mas o que, enquanto educa, é educado, em diálogo com o educando que, ao ser educado, também, educa. Ambos, assim, se tornam sujeitos do processo em que crescem juntos e em que os ‘argumentos de autoridade’ já não valem (FREIRE, 1987, p. 68).

A exploração das questões relacionadas ao tema em discussão surge no

segundo momento. É aqui que se dá a “construção do caminho do senso

comum para uma visão crítica da realidade” (FERRARI, 2009, P.111),

possibilitando, assim, a criação e a produção do conhecimento. Para que isso

ocorra, sempre é necessária a existência de sujeitos — aquele que ensina e

que aprende e aquele que no papel de aprendiz, também ensina — e objeto a

ser ensinado e aprendido, ou seja, o conteúdo.

Segundo Freire (1994),

o ato de ensinar e de aprender, dimensões do processo maior — o de conhecer — fazem parte da natureza da prática educativa. Não há educação sem ensino, sistemático ou não, de certo conteúdo. E ensinar é um verbo transitivo-relativo. Quem ensina, ensina alguma coisa — conteúdo — a alguém — aluno (FREIRE, 1994, p.110).

Entretanto, continua o autor (1994), o problema fundamental, de

natureza e política e ideológica, é

saber quem escolhe os conteúdos, a favor de quem e de que estará o seu ensino, contra quem,a favor de que, contra que. Qual é o papel que cabe aos educandos na organização programática dos conteúdos; qual o papel, em níveis diferentes, daqueles e daquelas que, nas bases, cozinheiras, zeladores, vigias, se acham envolvidos na prática educativa da escola; qual o papel das famílias, das organizações sociais, da comunidade local? (FREIRE, 1994, p.110).

Finalmente, volta-se do abstrato para o concreto, na chamada etapa de

problematização. O conteúdo encontra-se “dissecado”, o que deve sugerir

Page 44: PRÁTICAS COTIDIANAS EM UMA SALA DE INGLÊS: UM ESTUDO

43

ações para superar os impasses e essa etapa é que, segundo Freire, atende

ao objetivo final do ensino: a conscientização.

Assim sendo, como educadoras e educadores somos políticos, fazemos

política ao fazer educação. E se queremos uma escola democrática, isto é,

uma escola como sendo um espaço de interação e socialização, que prepara o

indivíduo para a vida adulta, não podemos fechar os nossos ouvidos para os

alunos e nem fechar os olhos para suas realidades contextuais, uma vez que a

dinamicidade, flexibilidade e heterogeneidade das culturas permeiam as

nossas salas de aulas, fazendo com que as práticas culturais locais

intercambiem com as práticas culturais globais. Não podemos esquecer que,

segundo Freire, tudo está em permanente transformação e interação. Afinal, já

dizia o educador: “o mundo não é, o mundo está sendo”.

No capítulo seguinte, apresento e discuto a metodologia empregada na

realização da pesquisa.

Page 45: PRÁTICAS COTIDIANAS EM UMA SALA DE INGLÊS: UM ESTUDO

44

CAPÍTULO 2

A METODOLOGIA DE PESQUISA

A ciência não passa do bom senso exercitado e organizado.

— Aldous Huxley (2013)

Neste capítulo, inicialmente, exponho a ótica da pesquisa. Em seguida,

discorro sobre os instrumentos e procedimentos metodológicos, bem como

descrevo os procedimentos analíticos aos quais recorri. Por último,

contextualizo o percurso da pesquisa, descrevo o cenário (cidade, bairros e

escola) e o perfil dos participantes.

2.1 A perspectiva etnográfica

Conforme André (2001), à ampliação do número de pesquisas da área de

educação nos últimos 30 anos, somaram-se igualmente a ampliação e

diversificação de temas. Os estudos que focavam o produto passaram a focar o

processo; as questões genéricas deram lugar às localizadas e as investigações

passaram a ser desenvolvidas em contextos específicos. A autora também

esclarece que a pesquisa etnográfica na área educacional ganhou força a partir

do final da década de 1970 e, a partir de então, o incentivo aos estudos

etnográficos tem sido intenso, pois eles proporcionam contato direto do

pesquisador com a situação investigada, possibilitando um contato face a face

com a realidade escolar, o que permite a interpretação das ações cotidianas

dos participantes.

Na pesquisa etnográfica, como sendo um processo participativo, o pesquisador

não somente observa, indaga, compara e faz inferências, mas também ouve e

reflete sobre o que os participantes têm para dizer. E nessa perspectiva, o

aprendizado deixa de ser uno e torna-se bilateral e o pesquisador tenta

Page 46: PRÁTICAS COTIDIANAS EM UMA SALA DE INGLÊS: UM ESTUDO

45

conhecer um novo modelo de entendimento de uma situação específica, não

prevista, para compará-la a outras que se aproximam de tal realidade.

São muitas as definições sobre etnografia ou o que não é etnografia.

Aqui destaco alguns aspectos que me auxiliam a entender a sala de aula como

cultura, pois, como diz Fetterman (1998, p. 11), etnografia é “a arte e ciência de

descrever um grupo ou cultura”. Se olharmos pela perspectiva da etnografia,

então, podemos entender a sala de aula como culturas que estão sendo

construídas numa base diária. O tipo de cultura que está sendo formada na

sala de aula determina o tipo de aprendizagem que ocorre. Quer dizer,

lembrando Erickson (2001, p. 12), que estudantes e professores criam padrões

rotineiros ao longo do tempo no modo de como eles agem, interagem,

compreendem e acreditam. Esses padrões rotineiros não são visíveis para os

atores neles engajados. A etnografia pode ser usada para tornar esses padrões

visíveis e permitir conhecer o que estudantes e professores estão fazendo e

aprendendo em sala de aulas.

Rees e Mello (2011, p. 35), discutindo a etnografia no espaço da sala de aula

de línguas, entendem que

a etnografia seja uma alternativa para o estudo do processo de ensino-aprendizagem porque ela permite tratar de questões teóricas e práticas sobre o que está acontecendo no momento em que a L2/LE está sendo ensinada e aprendida, além de poder compreender vários aspectos do contexto institucional da escola, entre eles as pressões sociais que os professores e alunos sofrem, as políticas de ensino e uso da(s) língua(s), os fatores sociais que afetam o planejamento educacional, os discursos concorrentes. Em outras palavras, a pesquisa etnográfica chama a atenção para a importância dos fatores socioculturais no processo de ensino-aprendizagem de L2/LE, além de proporcionar meios para a integração da teoria e prática (REES & MELLO, 2011, p. 35 - 36).

Aliada às possibilidades acima, há também a perspectiva de Spradley

(1980, p.7 - 8), ao entender que a etnografia se apoia na visão ética e êmica. A

primeira (visão ética) é descritiva e observa as estruturas comportamentais do

grupo cultural em foco. Na segunda (visão êmica), a verdade de um fenômeno

cultural deve ser interpretada de acordo com a visão de quem vive a cultura

investigada e isto é específico da etnografia.

Page 47: PRÁTICAS COTIDIANAS EM UMA SALA DE INGLÊS: UM ESTUDO

46

Eventos são diferentes em cada sala de aula porque professores e

estudantes são diferentes, estabelecendo e criando seus direitos e obrigações,

papeis e relações, normas e expectativas (GREEN, DIXON, 1993). O

pesquisador etnógrafo examina a sala de aula da perspectiva de ambos –

professor e alunos – e entende como as relações sociais são complicadas e

como são diferentes de uma sala para outra.

Os principais métodos usados na etnografia são observação participante

associada com as anotações de campo, entrevistas e documentos.

Etnógrafos se engajam em observação participante com o propósito de

ganhar insights acerca das práticas culturais. Os insights se desenvolvem ao

longo do tempo através de repetidas análises dos muitos aspectos observados

e anotados em relação aos detalhes de vida nos contextos da pesquisa.

Enquanto a observação participante oferece informação acerca das ações dos

atores, entrevistas propiciam aprender como pessoas refletem sobre ações,

circunstâncias, identidades, eventos e outros. As entrevistas são importantes

para ganhar insights em relação a perspectivas dos atores.

Os documentos são artefatos que não são produzidos para fins de

pesquisa. Eles são produzidos pelas pessoas que estão no campo de pesquisa

(por exemplo, no contexto escolar, podem ser cadernos de alunos, anotações

de professor), ou por pessoas que estão, de alguma forma, relacionadas com

as pessoas do contexto que estão sendo investigadas (o PPC, por exemplo),

ou ainda podem ser documentos produzidos sobre as pessoas que estão no

contexto da pesquisa. Todos esses documentos ajudam o pesquisador a

entender questões relacionadas ao seu contexto de pesquisa e como esses

documentos afetam os atores (WOLCOTT, 1994; HAMMERSLEY, 1995;

ERICKSON, 2001).

Entendo, portanto, que a etnografia é uma abordagem sistemática,

teoricamente orientada para o estudo da vida diária de um grupo social,

constituindo-se em “um modo de ver e observar vida em grupos sociais

específicos e um meio de documentar, analisar e representar essa vida”

(DIXON, FRANK, GREEN, 1999, p. 4). Ademais, entendo que não basta

registrar dados, descrevê-los ou falar sobre eles; também é necessário dialogar

com eles em consonância com as falas dos entrevistados, as anotações por

meio de observação participante e análise de documentos. Assim, a relação

Page 48: PRÁTICAS COTIDIANAS EM UMA SALA DE INGLÊS: UM ESTUDO

47

entre pesquisador e pesquisado se fundamenta sempre pelo discurso, pois,

fora dessa construção dialógica, a pesquisa perde o sentido.

A opção por inserir este trabalho nos princípios metodológicos da pesquisa

etnográfica se deveu ao fato de acreditar que a etnografia possibilita, no seu

contato face a face, uma relação de troca entre pesquisados e pesquisador.

Com uma observação participante detalhada, busquei observar ações

humanas que ocorrem em uma sala de aula real (a minha própria sala de aula,

em contexto natural) e, ao mesmo tempo, perguntar às pessoas nelas

engajadas como interpretam o que fazem. O objetivo central foi compreender

se as práticas realizadas em sala incluem o universo dos alunos. Com o intuito

de lembrar ao leitor, retomo aqui as três questões que guiam esta pesquisa:

O que os atores (professora e alunos) fazem em sala de aula?

Como os atores (professora e alunos) atribuem sentidos aos eventos

que acontecem em sala de aula?

As práticas culturais da turma acolhem a escuta dos alunos?

Para responder a essas questões, apresento na sequência o cenário da

pesquisa e seus atores.

2.2 A localização e contextualização da pesquisa

Para atender à essência desta pesquisa interpretativa etnográfica, que é

conhecer e tornar conhecidos os tipos de conhecimento advindos das práticas

culturais da comunidade investigada – uma sala de aula – nesta seção

descrevo o cenário e os participantes da pesquisa.

A escola

A Escola Azul faz parte da rede oficial de ensino, mantida pelo governo do

Estado de Mato Grosso, através da Secretaria de Estado de Educação

(SEDUC). Está localizada na cidade de Cuiabá, Mato Grosso. Situada à

margem esquerda do rio de mesmo nome, formando uma conurbação com o

município de Várzea Grande, Cuiabá possui uma população de 551.350

habitantes, segundo o resultado do Censo do IBGE de 2010. A região

Page 49: PRÁTICAS COTIDIANAS EM UMA SALA DE INGLÊS: UM ESTUDO

48

metropolitana engloba ainda outros municípios, como Santo Antônio do

Leverger e Nossa Senhora do Livramento, Acorizal e Chapada dos Guimarães,

formando um aglomerado urbano próximo de atingir um milhão de habitantes.

O município é cercado por três grandes ecossistemas: a Amazônia, o Cerrado

e o Pantanal; está próximo da Chapada dos Guimarães e ainda é considerada

a porta de entrada da Floresta Amazônica.

A Escola Azul, cenário desta pesquisa, localiza-se no Bairro Bandeirante,

situado na região leste da cidade, área nobre do município incluindo o Parque

Antonio Pires de Campos, “o morro da luz”. Segundo relato de moradores do

local, o bairro teve sua origem em um loteamento residencial em 1956. Desde

a sua fundação, conta com uma concentração significativa de população árabe,

tendo inclusive a mesquita da cidade localizada no bairro.

Antes era um bairro residencial, mas sofreu grandes alterações em

consequência da sua localização próxima à área central da cidade. Atualmente,

o bairro alterna a área residencial com atividades comerciais, como lojas,

bares, restaurantes, escritórios, hotéis e órgãos públicos, escolas públicas e

privadas, entidades de classes, hospitais, entre outras. Conta com uma boa

infraestrutura. Contudo, na questão da segurança, deixa a desejar e há

ocorrência de roubos e assaltos.

Por ser complexa a administração de uma escola, quatro órgãos

colegiados dão apoio direto à direção da escola, sendo eles: Conselho

Deliberativo da Comunidade Escolar, Conselho de Classe, Conselho Fiscal e

Grêmio Estudantil.

Com instalações antigas, mas bem estruturada, a escola é constituída

por dois andares e possui 33 salas distribuídas para aulas, diretoria, secretaria,

recursos humanos, coordenação, almoxarifado. Possui também biblioteca,

anfiteatro, laboratórios de informática e de ciências da natureza e da

matemática, quadras de esporte, cantina terceirizada, cozinha e refeitório.

Os serviços de multimídia didáticos são encontrados na escola com

facilidade. Há muitos televisores, DVDs, computadores, Data shows, máquinas

fotográficas digitais, filmadora, multiprojetor, calculadora, fotocopiadora,

retroprojetor e videocassete. Possui três lousas digitais e a Internet é

distribuída gratuitamente para toda a escola, através da rede WIFI.

Page 50: PRÁTICAS COTIDIANAS EM UMA SALA DE INGLÊS: UM ESTUDO

49

No ano letivo de 2013, nos períodos vespertino e matutino, 26 turmas foram

formadas com a Educação Básica nos níveis Médio, Médio Integrado e na

modalidade Médio Inovador – com implantação gradativa – somando um total

de 1.150 alunos, oriundos de 48 bairros distintos e da cidade vizinha Várzea

Grande.

Cinco projetos foram propostos para serem desenvolvidos no ano de 2013:

Sala do Educador, Olimpíadas, Robótica, Interdisciplinar Temático e Jornal

impresso, sendo o último proposto por mim, especificamente para área de

linguagem. Além disso, a escola conta com o projeto Sala Ambiente desde o

ano de 2005, projeto este que possibilita ao professor ter uma sala fixa para

sua disciplina, com materiais diversos e necessários para sua prática

pedagógica diária. Esse projeto melhorou a conservação dos bens públicos,

como carteiras, mesas e até paredes, e facilita a atuação do professor que não

precisa se deslocar a cada aula, de sala em sala, carregando sacolas de

materiais.

Os estudantes são oriundos de diversos bairros, em sua maioria, distantes dos

arredores da escola. Eles utilizam transporte público para ir à escola. Há casos

em que alguns estudantes gastam até uma hora e trinta minutos para se

locomoverem de suas casas à escola. Todos os bairros possuem escolas

estaduais capazes de atender às necessidades dos alunos, porém seus

familiares acreditam que a Escola Azul proporciona um estudo de melhor

qualidade e preferem ter seus filhos estudando nela.

A Sala Ambiente de Língua Inglesa possui ar condicionado e está aparelhada

com TV, DVD, vídeo cassete, aparelho de som, 03 grandes quadros

pendurados na parede, com vocabulário temático em inglês e suas respectivas

imagens, mural de recados em inglês e português, mural de aniversariantes,

armários embutidos com diversos materiais pedagógicos, como livros,

dicionários, jogos e muitos objetos escolares. Entre os três armários, há um

espaço sem portas, com três prateleiras que funcionam como uma estante.

Aberto, esse espaço dispõe de revistas e jornais, em inglês e português, para

os alunos acessarem livremente. Todo este material é recolhido pela

professora e doado por amigos e colegas da mesma.

As trinta cadeiras e mesas não são enfileiradas verticalmente como se vê nas

escolas. A organização se dá de acordo com as atividades propostas. Assim,

Page 51: PRÁTICAS COTIDIANAS EM UMA SALA DE INGLÊS: UM ESTUDO

50

ora estão em círculo ou em semicírculo, ora estão em duplas, em trios ou em

quartetos, ora estão juntas horizontalmente em duas filas. Entendo que essa

variação de organização dos assentos permite minimizar a relação assimétrica

de poder entre a professora e os estudantes.

Os atores da pesquisa

Os atores do estudo são onze alunos do atual segundo ano do Ensino

Médio Integrado à Educação Profissional (EMIEP)12e a professora de inglês,

que neste caso, também é a pesquisadora. Primeiramente, traço o perfil dos

alunos e, em seguida, o da professora-pesquisadora.

Por ter sido professora do EMIEP em 2012, enquanto era 1º ano, e perceber a

possível continuidade com a mesma turma em 2013 e 2014, escolhi este grupo

para minha pesquisa. Nas escolas públicas, não há garantia de continuidade

dos alunos em uma mesma turma durante os três anos de curso do ensino

médio, e nem mesmo a garantia do professor continuar com a mesma turma

ou na mesma escola.

Em 2012, a turma era composta de dezoito (18) alunos. Desses, cinco

saíram da escola e outros cinco foram reprovados. No término dos registros de

dados em 2013, a turma era composta por onze alunos13 e todos aceitaram

participar da pesquisa, conforme registro feito através do Termo de

Consentimento Informado (anexo 1). Apesar de poucos alunos em sala, o perfil

do grupo era bem diversificado, se levarmos em conta suas diferentes

procedências e experiências. As diferenças econômicas não são visíveis por

meio de vestuário, pois todos usam uniformes, cuidam da aparência física e

têm celulares. Nessa turma, todos os alunos são muito educados, dois são

extremamente tímidos, e há quatro que falam muito e são muito alegres. A falta

de respeito e a indisciplina não fazem parte deste contexto. Vê-se que o grupo

contraria todo o estereótipo do que seja uma turma de escola pública: sala

cheia, alunos de classe média baixa e indisciplinados.

12EMIEP refere-se a uma modalidade de ensino que faz a articulação entre a Educação Profissional Técnica de nível médio e o Ensino Médio de forma integrada, no mesmo estabelecimento de ensino, contando com matrícula única para cada aluno, conforme o artigo

3º do decreto 5.154/2004. No estado de Mato Grosso, iniciou-se em 2007, e na escola aqui

pesquisada, em 2010. 13 Nomes fictícios

Page 52: PRÁTICAS COTIDIANAS EM UMA SALA DE INGLÊS: UM ESTUDO

51

O quadro e os textos abaixo mostram, de forma simples e breve, o perfil de

cada aluno. Esses dados foram gerados através de um questionário

(Questionário Diagnóstico, Anexo 2), aplicado em novembro de 2012, quando

esse grupo ainda cursava o primeiro ano do ensino médio. O restante que

compõe a pesquisa é relativo a 2013, quando a turma cursava o 2º ano.

Quadro 1: Perfil da turma

Alunos Sexo Idade Naturalidade Bairro em que reside

Beto 16 Cuiabá Planalto

Greg 16 Cuiabá Jardim Leblon

Guto 15 Cuiabá Jardim Leblon

Inghy 15 Cuiabá Parque Cuiabá

Lady

15 Porto Alegre do Norte Dom Aquino

Vickie

17 Cuiabá Coophamil

Susuu

17 Cuiabá Jardim Comodoro

Tici

16 Várzea Grande Novo Millênio

Tatá

16 Cuiabá Altos da Serra

Vany

16 Cuiabá Grande Terceiro

Bibi

17 Cuiabá Santa Rosa II

Os alunos Greg, Vickie, Sussu e Bibi foram reprovados em 2012 e estavam

cursando em 2013, novamente, a mesma série. É importante ressaltar que

nove alunos moram no mesmo bairro desde que nasceram. Apenas as alunas

Lady e Tici tiveram mudanças recentes em suas vidas.Por meio das respostas

ao Questionário Diagnóstico (Anexo 2), fiz um breve histórico de aluno por

aluno, compondo o perfil que apresento a seguir.

Beto demonstra não ter ligação com os pais e vive com a avó, tios e

primos. O tio tem ensino fundamental completo, a tia possui ensino médio

completo e ambos são vendedores. O aluno diz ter escolhido a escola aqui

pesquisada pelo fato de a mesma ter sido indicada por outro professor e por ter

ar condicionado. Sente dificuldade em aprender a língua inglesa, mas a vê

Page 53: PRÁTICAS COTIDIANAS EM UMA SALA DE INGLÊS: UM ESTUDO

52

como oportunidade de trabalho. Não tem contato com a mesma fora da escola

e nem com outra língua, apesar de ter acesso à Internet. Estudou em uma

escola particular enquanto era criança e depois em escolas estaduais.

Greg mora com os pais e um irmão. O pai tem ensino fundamental

completo e é encarregado de uma loja de materiais de construção. A mãe tem

o ensino médio e trabalha em gerência de uma multinacional (espécie de

secretária particular). O irmão está no segundo ano do segundo grau. O aluno

sempre estudou em escolas públicas, está na escola pesquisada por opção

dos pais e entende que língua inglesa é importante por ser mundial e mais

utilizada no mundo. Diz que “temos que aprender novas culturas”. Não tem

contato com a língua inglesa e nem com outras línguas, apesar de ter acesso à

Internet.

Guto reside com os avós e tem três irmãos. Os avós têm ensino

fundamental incompleto. Dois irmãos estudam e o outro trabalha. A casa

parece de gente simples, com uma boa estrutura externa. O aluno só estudou

em escolas públicas e a escola atual foi indicada por um amigo. Acha a língua

inglesa importante e relaciona-a com atividades turísticas da cidade. Não tem

contato com a língua inglesa, apesar de ter acesso á internet.

Inghi mora com os pais e tem quatro irmãos. O pai é vistoriador de

seguradoras e a mãe trabalha no setor de compras de uma empresa particular.

O primeiro tem ensino médio completo e a segunda está cursando o nível

superior. Três irmãos já completaram os estudos e o mais novo está no 9º ano.

Sua casa é bem estruturada externamente e tem excelente localização dentro

do bairro. Passou por quatro escolas particulares e atualmente é a segunda

escola pública que frequenta. Acredita que esta escola, “por ser do centro da

cidade, tem melhores estruturas e conteúdos de ensino”. Entende que é bom

aprender a língua inglesa porque ela é a língua comercial do mundo. Ele utiliza

o inglês fora da sala de aula para dizer coisas engraçadas e para impressionar

outras pessoas. Também tem o hábito de usar a língua porque participa de um

jogo através da internet no qual há jogadores turcos, ingleses, espanhóis,

franceses que se comunicam em língua inglesa pelo TeamSpeak.

Page 54: PRÁTICAS COTIDIANAS EM UMA SALA DE INGLÊS: UM ESTUDO

53

Lady desconhece o pai e vive com a mãe e uma irmã. A mãe tem nível

superior completo e é esteticista. A irmã mais nova esta no 9º ano. Laura só

estudou em escola pública e está na escola pesquisada porque quando se

mudou para Cuiabá a escola estava próxima à casa dela. Atualmente, ela

também gasta mais ou menos uma hora para fazer o deslocamento

casa/escola. Vê necessidade do aprendizado da língua inglesa como meio de

trabalho em empresas fora do Brasil. Além da escola, o contato com a língua

inglesa se dá através da música que ela escuta. Tem acesso à internet, mas o

uso é restrito à língua portuguesa, mesmo no uso de redes sociais.

Vickie mora com uma irmã que está fazendo faculdade. Seu pai é

taxista e nada fala sobre sua mãe e sobre outro irmão que tem. Só estudou em

escolas públicas e por falta de vagas na escola Tiradentes, estuda na escola

aqui pesquisada. Diz que ama a língua inglesa e acha-a importante por ser a

língua universal. Seu contato com inglês fora da sala de aula se dá através das

redes sociais e das músicas que ela gosta de ouvir e cantar.

Sussu vive com a mãe e mais 03 irmãos menores. Sua mãe tem o

ensino médio completo e é doméstica. Veio para a escola Azul por indicação

sobre a qualidade do ensino. Acredita que o inglês seja um ponto importante na

vida profissional e que ser bilíngue é um ponto extra no currículo. Usa a

Internet para várias atividades, mas todas em língua portuguesa, mantendo,

assim, o contanto com o inglês apenas em sala de aula.

Tici mora com a mãe, pois os pais estão separados, e tem uma irmã. O

pai é autônomo (faz coleta de ossos em açougues e aqueles são

transformados em ração) e a mãe é professora. A mãe optou por esta escola

em função da qualidade do ensino divulgada por terceiros. Tici também diz que

o inglês é importante em função do mercado de trabalho.

Tatá reside com os avós, que são aposentados. Diz que o pai é vigilante

e não sabe sobre a profissão mãe. Ambos, pai e mãe, têm ensino médio

incompleto. Têm três irmãos mais novos. Estudou em uma escola particular,

Page 55: PRÁTICAS COTIDIANAS EM UMA SALA DE INGLÊS: UM ESTUDO

54

enquanto criança e depois em escolas públicas. A escola atual foi escolhida

pela mãe, que recebeu boas referências. Por considerar a universalidade da

língua inglesa, diz que somos obrigados a aprendê-la. Usa o inglês fora da

escola para cantar, em casa, algumas músicas e arriscar algumas palavras

com alguns colegas.

Vany mora com pai, mãe e dois irmãos mais novos. Seus pais têm grau

superior e são supervisores de lojas. Estudou em escolas particulares, como

Sesi e Coração de Jesus. Afirma que mudou para escola Azul em função das

cotas (pretende fazer medicina) e sabe que a mesma teve o melhor

desempenho entre as escolas centrais públicas de Cuiabá. Relaciona a

importância da língua inglesa ao trabalho fora do país e a clientes estrangeiros

residentes aqui.

Bibi mora com a mãe e dois irmãos. A mãe está fazendo curso superior

e o pai, servidor público, já possui o nível superior. Escolheu a escola pelo tipo

de curso que oferece – EMIEP. Vê o inglês como uma necessidade atual e o

utiliza ao cantar, escrever e, de vez em quando, em conversa. Tem contato com

o espanhol, pois possui parentes no Paraguai e sempre conversam.

Professora-Pesquisadora: Nascida nas Minas Gerais e cuiabana de

coração, formei-me em Letras - Português/Inglês - pela Universidade Federal

de Mato Grosso, em 1993. Já lecionei para todas as faixas etárias, do ensino

básico ao superior. Passei por escolas particulares, cursos de idiomas e

faculdades e só entrei para a escola pública em 2002. Nessa época já tinha

feito meu primeiro – de três – curso de especialização e pensei que estava

muito bem formada. Grande engano! Quanta ilusão! Minha formação estava só

começando. Toda a minha experiência anterior com sala de aula não podia ser

aplicada naquela escola, que carecia de equipamentos tecnológicos e de

material didático para o professor e os quarenta alunos da turma.

Atualmente, sinto que meu trabalho é reconhecido por alguns colegas e

parece-me que conquistei certo respeito para a disciplina de inglês, que

leciono, através das minhas ações pedagógicas. Hoje, sou a única professora

efetiva da escola pesquisada e, por todos esses anos, muitas colegas já

Page 56: PRÁTICAS COTIDIANAS EM UMA SALA DE INGLÊS: UM ESTUDO

55

trabalharam comigo. Por todos esses anos também, busco aperfeiçoamento,

do jeito que posso, através de cursos, encontros, seminários, associação dos

professores de inglês, leituras, grupos de estudo, conversas com colegas de

outras escolas, sendo ouvinte de algumas disciplinas de mestrado, recebendo

estagiárias em minha sala e sendo também colaboradora em pesquisas de

diversos colegas.

2.3 O percurso da pesquisa

Qualquer ação de pesquisa deve ser extremamente bem planejada e com a

etnografia isso não é diferente. O pesquisador etnógrafo, antes de iniciar a

pesquisa, busca fazer leituras da bibliografia relativa à prática etnográfica,

entender como a sua estada em campo, vivência e conversas entabuladas com

os atores do contexto da pesquisa devem prescindir de julgamentos

descontextualizados e tornar-se ser um bom observador, prestando atenção

aos detalhes.

Antes de iniciar esta pesquisa, fui professora colaboradora em uma

investigação de mestrado de um colega, hoje mestre em Estudos de

Linguagem pela Universidade Federal de Mato Grosso. Fui, então, apresentada

pela primeira vez ao fazer etnográfico, lendo textos sobre o assunto e

acompanhando o colega no seu trabalho de campo.

Encantada com a pesquisa do meu colega, imaginei que poderia realizar a

minha pesquisa do mestrado na linha etnográfica e convidei a única professora

de inglês na minha escola para que fosse colaboradora na minha pesquisa.

Infelizmente, ela não aceitou o convite. Decidi que poderia olhar para a minha

própria sala de aula para observar sistematicamente como era o meu próprio

fazer. Antevia, inicialmente, que teria dificuldades e desafios, pois, como

poderia, ao mesmo tempo, ser professora e pesquisadora? Como poderia

observar minha própria prática e registrar dados, ao mesmo tempo em que

estaria dando aulas? Conforme Blommaert (2006, p. 27), ao observar a si

mesmo, o pesquisador poderá ter mais dificuldade para lidar com o fenômeno

etnográfico, porque, mesmo tendo uma longa e rica experiência como professor

e estando familiarizado com o mundo da vida e da organização de um

Page 57: PRÁTICAS COTIDIANAS EM UMA SALA DE INGLÊS: UM ESTUDO

56

ambiente educacional, quando esse professor se transforma em um

pesquisador, ele para de ser professor. Além disso, o autor esclarece que, ao

fazer o trabalho de campo, o pesquisador entra na escola para pesquisar e não

para ensinar. E muito do que é verdade para o professor precisa ser posto em

questionamento pelo pesquisador.

Ao longo do ano de 2012, debrucei-me sobre as disciplinas exigidas e sobre as

diversas leituras indicadas pela orientadora, e outras que selecionava a partir

do que lia. Foi um ano de muitas descobertas que, por algumas vezes,

vislumbrava a minha própria pesquisa. Alguns encontros individuais com a

orientadora foram delineando o meu percurso e o que era pré-projeto passou a

ser projeto.

No segundo semestre, apliquei meu primeiro questionário aos alunos, em

busca de dados pessoais e informações gerais sobre seus familiares. Ao

apresentar o projeto para a turma, recebi de todos os alunos uma resposta

positiva e senti, mais uma vez, que o meu estímulo só aumentava. Os alunos,

por sua vez, sentiram-se extremamente importantes, por serem escolhidos

entre tantas outras turmas.

Em abril de 2013, depois de certa organização na escola e de posse dos dados

gerados através do questionário aplicado no ano anterior e de algumas

anotações no diário de campo, intensifiquei os registros e diversifiquei os

métodos. Iniciei as gravações das aulas, as visitas (registradas através de

gravação, algumas fotos e anotações) aos bairros dos quais meus alunos eram

oriundos e a participação em grupo de estudos com outros colegas do

mestrado, para compartilhar as ações realizadas nesse período. Nessa época,

convidei o Professor Arivan S. da Silva, meu colega de profissão e amigo, com

quem frequentemente converso sobre questões de ensino de línguas, para ser

colaborador na incursão aos bairros onde meus alunos moravam para

conhecer onde viviam. As conversas informais com o professor colaborador,

durante e após as divertidas visitas aos bairros em que os alunos moravam,

foram de suma importância para o trabalho. Sua formação e sua visão sempre

me faziam rever as minhas ações, ora de professora, ora de pesquisadora.

Atenta ao que a orientadora e o professor colaborador falavam sobre a

disciplina exigida pela pesquisa, fazia as transcrições das gravações e

organizava as anotações de campo após cada tarefa executada. Assim, a

Page 58: PRÁTICAS COTIDIANAS EM UMA SALA DE INGLÊS: UM ESTUDO

57

coleta do meu “lixo” (BLOMMAERT, 2006, p.52) foi se acumulando

organizadamente e, na segunda semana de julho, eu podia contar com o

questionário respondido pelos alunos em 2012, transcrições de oito aulas,

coleta de atividades dos alunos, anotações nos diários sobre aulas dos dois

bimestres do corrente ano, anotações e transcrições sobre os dez bairros

visitados e diversas fotografias, sendo vinte e duas dos bairros, 08 da sala de

aula e 04 do livro Upgrade, volume 2.

Percebi que não havia feito entrevistas, conforme o planejado. A volta do

recesso do mês de julho foi tomada por dois problemas políticos: a) decisão da

SEDUC em fechar as turmas do EMIEP, por terem número de alunos

insuficientes ( 35) nas salas de aulas, e b) a greve iniciada no dia 12 de agosto

e terminada em 18 de outubro. Ambos interferiram na minha programação. E

naquele momento a única coisa a ser feita era “brigar” para manter as turmas

na escola.

Nesse sentido, é preciso salientar aqui a postura dos alunos do EMIEP

quanto à decisão arbitrária da Secretaria de Educação, ao decidir pelo

fechamento das turmas em função do número reduzido de alunos. Aliados a

estudantes de outra escola pública que oferece o mesmo tipo de ensino, os

alunos apresentaram, em uma reunião com membros da assessoria

pedagógica e advogados da SEDUC, professores e pais, argumentos e

documentos pautados em fatos e leis que levaram a secretaria a retroceder

na decisão. Sem sombra de dúvida, essa ação marcou, mais do que nunca, a

ideia freireana de leitura do mundo: “ler a realidade (conhecê-la) para em

seguida poder reescrever essa realidade (transformá-la)” (FREIRE, 2009,

p.111-112).

Com a greve em movimento, nada mais podia ser feito, a não ser, esperar.

Pensei então, em alinhar os dados e, se necessário fosse, quando as aulas

voltassem, faria as entrevistas para checar ou acrescentar algumas

informações. Na realidade, dentro da minha inexperiência de pesquisadora, eu

estava muito satisfeita com tudo que eu tinha em mãos.

Dediquei-me, então, a escrever e logo percebi que as entrevistas seriam

de suma importância para minhas análises. Fiz o que pude e quando a greve

terminou, em 21 de outubro, retomei minhas atividades. Infelizmente, perdi

nesse período, duas alunas da turma pesquisada. Uma desistiu. Os problemas

Page 59: PRÁTICAS COTIDIANAS EM UMA SALA DE INGLÊS: UM ESTUDO

58

particulares sobrepuseram-se à vontade e à necessidade de estudar. Já a

outra passou no processo seletivo do IFMT (Instituto Federal de Mato Grosso)

e decidiu ingressar no curso enquanto a escola estadual estava em greve.

Em pouco tempo, voltamos à normalidade e eu gravei mais 04 aulas e fiz

entrevista com os alunos, entre os dias 04 a 22 de novembro. Em dezembro,

mais uma aluna desistiu. Desta vez, a aluna concluiu o segundo grau com base

no art. 38 da Lei nº 9.394/96, segundo o qual o exame ENEM pode ser

utilizado para fins de certificação14 de conclusão do ensino médio, para alunos

maiores de 18 anos que não concluíram esse nível de escolaridade na idade

adequada.

Na contramão dos diversos discursos sobre o excesso de estudantes em

salas de aulas, terminamos o ano letivo de 2013, em fevereiro de 2014, com

oito alunos. Que calmaria!

2.4 Instrumentos, procedimentos metodológicos e analíticos

Hammersley (1990) destaca cinco características da etnografia:

O comportamento das pessoas é estudado em contextos diários, cotidianos.

Dados são registrados por uma variedade de fontes, mas a observação e as

conversas informais são as principais.

A abordagem para o registro dos dados é “não-estruturada, aberta” (não

envolve um plano detalhado de antemão).

O foco da pesquisa é num único local ou num grupo pequeno.

A análise dos dados envolve interpretação dos sentidos e funções de ações

humanas e é relatada por meio de descrições e explicações verbais.

Levando em consideração a necessidade de conhecer as práticas

culturais da minha sala de aula em contexto natural e por meio de perspectivas

daqueles que participam do contexto investigado, são dois os instrumentos

14

A certificação é realizada pelas Secretarias Estaduais de Educação e pelos Institutos Federais de

Educação que aderiram a essa modalidade, nos termos da Portaria MEC nº 10, de 20 de maio de 2012 e da Portaria INEP nº 144, de 24 de maio de 2012.

Page 60: PRÁTICAS COTIDIANAS EM UMA SALA DE INGLÊS: UM ESTUDO

59

primários da pesquisa: observação participante e entrevistas semiestruturadas.

Além das anotações de campo, outros recursos foram utilizados para gerar

dados: questionário para compor o perfil do aluno e gravações em áudio,

especialmente porque, sendo professora e pesquisadora ao mesmo tempo,

ouvir o vídeo com todas as vozes de alunos e professora poderia me

proporcionar dados que tivessem escapado das anotações de campo. Assim,

me pareceu que a chamada subjetividade inerente a esses tipos de dados

adquire uma natureza intersubjetiva ao se levarem em conta várias

subjetividades ou várias maneiras de olhar para o mesmo objeto de

investigação.

Para Blommaert (2006), as notas de campo são uma variante de um

gênero muito antigo: o diário. Apesar de a Antropologia questionar os seus

valores devido às possíveis contradições em resultados finais da etnografia,

livros ou artigos, atribuí grande importância às minhas notas de campo. Na

condição de professora e pesquisadora, mesmo com algumas notações

confusas, muitas delas serviram-me para lembrar detalhadamente de eventos

importantes da sala de aula, dos corredores da escola, das visitas às

comunidades dos alunos.

Em relação à utilização de entrevista, Longaray (2009), baseando-se na

definição de Fontana e Frey (2000), entende também que ela é “uma das mais

comuns e poderosas formas com a qual tentamos entender uns aos outros”.

Ainda segundo esses autores, independentemente de a entrevista ser

estruturada, semiestruturada ou não-estruturada, entrevistas “são interações

ativas entre duas ou mais pessoas conduzindo os mesmos à resultados

negociados e contextualizados”.

O questionário também representa uma forma de indagar as pessoas

sobre uma situação e é muito usado para fazer levantamento de dado.

Segundo Flick (2013), uma característica é a extensiva padronização e tem por

objetivo receber respostas comparáveis de todos os participantes. Para o autor,

a diferença entre questionário e entrevista está no grau da padronização do

procedimento. O primeiro surge com uma lista pré-definida de perguntas e

resposta, enquanto a segunda é mais aberta. Neste trabalho, utilizei o

questionário para compor o perfil dos alunos.

Page 61: PRÁTICAS COTIDIANAS EM UMA SALA DE INGLÊS: UM ESTUDO

60

Em relação às gravações, Blommaert (2006) as vê como evidências e

exemplos que podem, eventualmente, fundamentar a análise de dados. Elas

são as fontes de informações cruciais para dar o tom acadêmico nos relatos

dos acontecimentos. Para o autor, as gravações têm uma função importante

durante todo o trabalho, pois elas oferecem um arquivo da própria investigação.

A coleção de gravações, nesse sentido, documenta o progresso do

pesquisador através do processo de aprendizado que é o ato de fazer

etnografia.

Os procedimentos analíticos buscaram seguir a orientação etnográfica,

tais quais ler contínua e sistematicamente os dados, obtidos por diferentes

fontes, durante o desenrolar de toda a pesquisa, para se familiarizar com a

informação e buscar “categorias ou temas de sentido”, trazendo uma ordem à

massa de dados coletados. Por esse procedimento, o etnógrafo pode se

assegurar de ter descoberto algo essencial ao entendimento do espaço

estudado.

Neste capítulo, foram apresentados conceitos e informações relevantes

à pesquisa empreendida por essa pesquisadora e relatada nesta dissertação.

Baseada na pesquisa qualitativa e interpretativa, de cunho etnográfico, este

estudo se desenvolveu para examinar as ações/interações/trocas entre os

atores (professora e alunos) da sala de aula, a fim de apreender

conhecimentos não só dos eventos e práticas que nela acontecem, mas

também para interpretar que sentidos essas pessoas atribuem aos eventos em

que estão engajados.

O próximo capítulo é dedicado à análise e à discussão das práticas e

sentidos em movimento.

Page 62: PRÁTICAS COTIDIANAS EM UMA SALA DE INGLÊS: UM ESTUDO

61

CAPÍTULO 3

A TURMA DO 2º ANO: PRÁTICAS E SENTIDOS

Todos nós sabemos alguma coisa. Todos nós ignoramos alguma coisa. Por isso, aprendemos sempre.

— Paulo Freire ( 1989, p. 31)

Neste capítulo, apresento a análise e interpretação de dados delineados

a partir das três perguntas da Introdução. Ao organizar o capítulo, faço-o por

meio de três seções: 3.1 - Das práticas, 3.2 - Dos sentidos e 3.3 - Dos

fundos de conhecimento. Na primeira seção, apresento as ações que se

realizam na sala de aula. Em seguida, analiso os sentidos que os alunos e a

professora atribuem aos eventos que compõem cada aula observada. Por

último, procuro responder se as práticas culturais da turma acolhem a escuta

dos alunos, base para uma educação eficaz.

3.1 Das práticas de sala de aula

No ano de 2013, pela primeira vez na minha vida de docente de escola

pública, alguma coisa começou diferente. Normalmente, o planejamento anual

exigido pela escola é feito por cada professor da disciplina que lhe é atribuída.

Nesse ano, influenciada pelas leituras de González, Moll e Amanti

(2009), decidi convidar a professora de espanhol para planejarmos nossas

aulas em conjunto. Seria a oportunidade para nos conhecermos melhor,

trocarmos ideias e planejarmos unidades temáticas semelhantes para usarmos

nas nossas aulas. Assim foi feito. Nós duas éramos as únicas professoras de

língua estrangeira na escola e, unidas, selecionamos conteúdos dos livros

adotados pela escola que tratassem do mesmo assunto e englobassem o tema

Page 63: PRÁTICAS COTIDIANAS EM UMA SALA DE INGLÊS: UM ESTUDO

62

geral do projeto temático “O jovem e sua inserção no mundo do trabalho”15, a

ser desenvolvido por todos os professores da escola Azul.

A professora de espanhol e eu optamos pelos tópicos que tratavam da

identificação pessoal, das referências mundiais a serem admiradas e

respeitadas, da relação corporal com a qualidade do que se come e da relação

do jovem com os trabalhos sociais. Todos os tópicos eram comuns aos livros16

de inglês (Upgrade, volume 2) e de espanhol (Sínteses, volume 2). Cada

tópico foi trabalhado em um bimestre, sendo que nem todas as unidades do

livro foram utilizadas e nem seguidas linearmente.

Abaixo descrevo as práticas observadas na turma de inglês do segundo

ano EMIEP sob minha responsabilidade. A fim de ordenar os dados qualitativos

registrados, optei por organizá-los por meios das ações em que a professora e

os alunos se engajavam. Essas ações constituem as práticas locais dessa

turma, representadas por meio de cenas e episódios. As cenas incluem o

cenário, o tópico e o propósito. Os episódios são microunidades interligadas

que constituem uma cena.

Cena 1 - O ritual de entrada

O Projeto Sala Ambiente da Escola Azul tem uma sala para cada

disciplina, levando os alunos, a cada aula, a mudarem de sala. Esse projeto

facilitou a vida do professor e dos alunos porque todo material a ser utilizado na

aula está disponível no mesmo ambiente e contribuiu para a preservação dos

bens públicos, uma vez que a sala torna-se mais personificada. Com carga

horária de cinco aulas por dia, recebo, de hora em hora, uma turma diferente

na sala de inglês.

A seguir, apresento três episódios que caracterizam o ritual de entrada

dos alunos na sala de aula e expõem a forma com a qual eu os acolho.

15 Dentre outras propostas da escola Azul, está o Projeto Temático anual que visa iniciar os alunos à pesquisa científica. 16 Os livros fazem parte das obras oferecidas às escolas públicas brasileiras, selecionadas pelo Programa Nacional do Livro Didático — PNDL de 2012/2013/2014 —, adquiridas e distribuídas pelo Ministério de Educação por intermédio do Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação.

Page 64: PRÁTICAS COTIDIANAS EM UMA SALA DE INGLÊS: UM ESTUDO

63

Data: 02/04/2013 Local: Porta da sala de aula Cena 1: O ritual de entrada

Episódio 1- “ Fine também” (Vany, 02/04/2013) Nesse dia, como sempre faço com todas as minhas turmas, recebi os alunos na porta da sala, cumprimentando-os em inglês.

Professora: Good morning. Vany: Good morning teacher. How are you? Professor: Fine, and you? Vany e Vickie: Fine, também. Professora: too. Vany: ah é ... too.

Data: 14 de maio Local: Porta da sala de aula Cena 1: O ritual de entrada

Episódio 2 – “ Hi teacher, que é isto?” ( Vickie,14/05/2013) Enquanto os alunos entravam na sala, eu os cumprimentava e entregava, em mãos, a prova unificada bimestral (prova que abarca todas as disciplinas) a pedido da coordenadora.

Professora: Hello. Vickie: Hi, teacher, que é isto? Professora: Prova unificada. Tici: E a minha? Professora: I don’t know.

Data: 01/11/2013 Local: Sala de aula Cena1: O ritual de entrada Episódio 3 - “Hi are you?” ( Tici, 01/11/2013) Depois de cumprimentar todos os alunos na porta da sala, eu entro e, de pé, converso com eles, cumprimentando a todos novamente. Porém, apenas duas alunas interagem comigo.

Professora: Okay. People, good morning. Let’s start the class. Vany: Good morning Tici: Yes Professora: How are you? Vany: I’m fine. Tici: Huum... hi are you? (dito exatamente como está) Professora: Fine Vany: I’m so so. Professora: So, so. Why are you so so? Vany: Não sei. Professora: Ah! You don’t know. You are sad?

Page 65: PRÁTICAS COTIDIANAS EM UMA SALA DE INGLÊS: UM ESTUDO

64

Vany: Maybe. Prof: Maybe Tici: Huuuum talvez.

Nos três episódios acima, pode-se perceber que tento acolher os alunos

de uma maneira mais aconchegante, esperando-os à porta e cumprimentando-

os. Por eu ser muito alegre e estar sempre sorrindo, procuro trazer este tom

festivo ao ritual de entrada e mantê-lo durante toda a aula. Faço da minha sala,

parte da minha casa.

O ficar na porta talvez mostre que eu queira valorizar cada aluno ou,

talvez, porque queira marcar, ao falar inglês, que a aula começa ali, na entrada

daquela sala. Este ritual está tão impregnado nas minhas ações que o faço

naturalmente, mesmo que seja realizado com outras atividades que causam

estranhamento ao aluno, como é o caso do Episódio 2 (quando entreguei,

automaticamente, uma prova que os alunos haviam feito para outro professor e

que a coordenadora havia me pedido para lhes entregar).

O ritual de entrada é uma situação comunicativa genuína, buscando usar

o inglês em contexto e permitindo a mistura de português e inglês. Mesmo no

Episódio 1 quando Vany diz “Fine também”, espontaneamente, acrescentei

“Too,” talvez mais como suporte do que como correção professoral.

Cena 2 – A chamada, a retrospectiva e a tarefa

Após o ritual de entrada, observei que realizo uma sequencia de ações

rotineiras, que acontecem rapidamente, constituindo uma cena que marca,

claramente, o início da minha aula. Por ser apenas uma aula semanal, eu

sempre faço a chamada, a retrospectiva das ações da aula anterior e, em

seguida, recolho, comento/corrijo a tarefa dada ou dou uma tarefa para a aula

seguinte. Os episódios a seguir exibem esses momentos.

Data: 14/05/2013 Local: Sala de aula Cena 2: A chamada, a retrospectiva e a tarefa Episódio 4 – Da chamada

Enquanto eu fazia chamada, nome por nome, os alunos discutiam sobre as questões da prova que haviam recebido na entrada da sala. Entre um

Page 66: PRÁTICAS COTIDIANAS EM UMA SALA DE INGLÊS: UM ESTUDO

65

nome e outro, surgia alguma pergunta, ora para mim, ora para um colega.

Professora: Okay let’s go. Beto. Fernanda, não existe. Greg, Guto, Inghi. Inghi: Eu Professora: Lady, Vickie, Sussu,Tici Tici: Presente Professora: Tatá, Vany e Bibi.

Data: 25/06/2013 Local: Sala de aula Cena 2: A chamada, a retrospectiva e a tarefa Episódio 5 – Da chamada Sentada na cadeira da “minha mesa”, eu fiz a chamada, aluno por aluno.

Professora: today is 25. Beto is here? Beto: Present. Professora: Greg Gregl: I am here. Professora: Guto Guto: Present. Professora: Inghi, Lady. Beto: Present Vickie:Lady. Lady veio Beto: Já falei Professora: Lady , Yes. Just Inghi is absent. Yeah? Okay?

O fato de eu trabalhar em mais de uma escola, e ter entre vinte e

quarenta turmas, levou-me a fazer da chamada como um recurso para

memorizar o nome dos alunos. Ao fazer a chamada, dizendo nome por nome e

olhando para o rosto do aluno, eu consigo guardar o nome da maioria.

Lembro-me de que em outra turma em que a aluna pediu para fazer a

chamada para mim, eu respondi assim: “deixa eu fazer para aprender o nome

de vocês. É muito aluno pra eu memorizar.”

Observei também nos dados gravados que se, inicio a chamada falando

em inglês, os alunos são estimulados a falar inglês e a maioria assim o faz,

conforme se vê no Episódio 5 acima. Aqui também se vê a mistura de inglês e

português, sem que isso interfira na minha ação de fazer a chamada.

Mesmo depois de conhecer o nome de cada aluno, não deixo de fazer a

chamada. Ela é uma prática constante nas minhas aulas e às vezes é usada,

com as turmas de crianças, como revisão de vocabulário. Assim, ao chamar o

Page 67: PRÁTICAS COTIDIANAS EM UMA SALA DE INGLÊS: UM ESTUDO

66

nome do aluno, ele deve responder com um número, com o nome de uma cor,

de um objeto, entre outras possibilidades.

Data: 14/05/2013 Local: Sala de aula Cena 2: A chamada, a retrospectiva e a tarefa Episódio 6 – Da retrospectiva Comecei a aula fazendo uma retrospectiva da aula anterior, em que apresentei as estratégias de leituras e, depois disso, dei um exercício (anexo 3) para os alunos fazerem em duplas.

Professora: Okay. Vamos começar então. Aula passada eu falei com vocês o seguinte que... a gente tava trabalhando estratégias de leitura. [...] Bem a gente tava falando sobre estratégias de leitura, certo? Beto: certo Professora: Falamos de estrangeirismo, lembram? De cognatos, de deduções, okay? Então gente, agora eu vou pedir para vocês trabalharem em duplas. Podem escolher a vontade.

Data: 18/06/2013 Local: Sala de aula Cena 2: A chamada, a retrospectiva e a tarefa Episódio 7 – Da retrospectiva O início dessa aula foi bem confuso. Havia três semanas que os alunos estavam sem aula de inglês devido a uma greve de ônibus, a uma prova de Olimpíadas de Matemática17 e as comemorações do aniversário da

Escola Azul, que aconteceram exatamente nos dias de aulas de inglês. Os alunos estavam super agitados e perdidos. Falavam todos ao mesmo tempo. Sentei-me na cadeira e fiquei observando o alvoroço. Depois de muito barulho e gritos de alguns alunos chamando atenção dos próprios colegas, eu comecei a falar. Consultando meu caderno de planejamento das aulas, eu relatei tudo que havia acontecido desde o nosso último encontro em sala.

[ ...] Professora: Can you listen me please? [falei calmamente, sem levantar a voz] Beto: Cala a boca! Escuta a professora. Greg: Sit down! [disse gritando] Professora: Just a moment, gente. Pera aí.

17 A Olimpíada Brasileira de Matemática (OBM) é uma competição aberta a todos os estudantes dos Ensinos Fundamental (a partir do 6ª ano), Médio e Universitário das escolas públicas e privadas de todo o Brasil.

Page 68: PRÁTICAS COTIDIANAS EM UMA SALA DE INGLÊS: UM ESTUDO

67

Greg: Eu faltei quantas aulas aí professora? Eu tô perdido. Inghi: Acho que foi ela (professora) que faltou . […] Vany: Shut up! [ caindo na gargalhada] Professora: Oh my God! Okay, I’ll speak in Portuguese because I want everybody understand me, okay? [...] Professora: Por conta de todos esses dias, a última vez que estive com vocês foi exatamente quando eu passei aquele vídeo sobre pessoas importantes e que a gente meio que distribuiu as atividades que vocês deveriam apresentar na próxima aula. Essa próxima aula teve alguns problemas aí. Então nós tivemos uma aula que teve problema com transporte de ônibus, né? Depois nós tivemos uma aula com Olimpíadas e o aniversário da escola. Greg: A senhora faltou! Professora: e tudo isso atrapalhou. Com vocês eu não faltei, deixa eu ver aqui. [olhando para o meu caderno de anotações] Inghi: Acho que ela não faltou não. Professora: Eu não faltei não. Foi assim. Dia 21 de maio eu dei para vocês um vídeo [...]. No dia 28 de maio, foi a greve de ônibus que alguns alunos [...] Beto estava passando mal, Vany foi embora mais cedo e aí [...] Vany: Nossa professa, a senhora tem uma memória boa, né? Professora: é, eu tenho uma memória excellent. [sorrindo] Depois, no dia quatro do seis houve as Olimpíada de Matemática. [...]

Ao comentar rapidamente as ações que realizamos nas aulas anteriores,

observo que o objetivo da retrospectiva é para me situar no contexto específico

daquela turma. É o tempo que tenho para lembrar sobre o quê, o quem, o

quando, o porquê, o para quê e o como da turma em que estou naquele

momento. Além disso, percebo que esse recurso é bom, também, para os

alunos. Os faltosos, os distraídos, os tímidos, os inseguros têm, assim como

eu, o tempo para se posicionarem no contexto da aula.

Notei que no episódio da retrospectiva há momentos em que, também,

ocorrem situações comunicativas, pois o inglês aparece de forma natural

através de expressões — chunks — totalmente contextualizadas, como é o

caso do Episódio 7, em que os alunos dizem “Sit down” e “Shut up”.

Data: 14/05/2013 Local: Sala de aula Cena 2: A chamada, a retrospectiva e a tarefa

Episódio 8 – Da tarefa

Page 69: PRÁTICAS COTIDIANAS EM UMA SALA DE INGLÊS: UM ESTUDO

68

Depois de termos trabalhado o texto — Casino Aalborg — e praticado algumas estratégias de leitura, apresentei para a turma a tarefa (Anexo 4 - Atividades) para a aula seguinte.

[...] Professora: Bom, quero explicar isso aqui para vocês fazerem ... Pronto aí, meninas? Aqui tem algumas atividades, tarefas, que eu selecionei, preparei para que a gente possa fazer para dar uma lembrada de forma geral em tudo que a gente viu aqui hoje. E aí, na semana que vem, começar com os livros de vocês. Tici: De novo? Professora: Vocês já levaram o livro e alguns já guardaram aqui. [...] Este primeiro exercício, a gente tem muito recurso tipográfico e eu fiz aqui algumas perguntas para vocês responderem. Podem responder aqui atrás. [...] O segundo exercício, eu quero explicar a vocês exatamente o número três, os números aqui com relação a esses textos, as perguntas estão aqui. Mas esse número três é só para vocês, eu coloquei uma palavra Do jeito que eu fiz aqui (apontei para o quadro) para vocês dizerem o que significa cada um desses símbolos, o que eles estão querendo dizer. Então vocês vão pegar esses exercícios com a professora ... Tá entendido? Para próxima aula, viu?

Data: 21/05/2013 Local: Sala de aula Cena 2: A chamada, a retrospectiva e a tarefa

Episódio 9 – Da tarefa

Durante o ritual da entrada, as alunas Vany e Lady pediram ajuda sobre uma questão da tarefa dada na aula anterior (anexo 4 - Atividades) e que elas não conseguiram fazer. Feitas a chamada e a retrospectiva, atendi ao seu pedido: expliquei e, junto com os alunos, fizemos o exercício número dois, que não souberam resolver.

Professora: I will explain... Tici: eu não consegui fazer a tarefa. Professora: Just a moment. Ehhh… Vany? Vany: Yes. Professora: Vany and Lady asked me about one question. Page two, the question number two. Okay? Beto: Dois. Professora: Yes. Dentre as imagens qual delas permite-nos saber o autor da mesma? Por quê? Da mesma, é aquilo que a gente falou antes, a imagem. [...] Tici: Mas como eu vou saber o autor da foto?

Page 70: PRÁTICAS COTIDIANAS EM UMA SALA DE INGLÊS: UM ESTUDO

69

Professora: Eu vou ensinar como. Vocês têm que aprender a ler. Prestar atenção. Na primeira veio embaixo, “photo by” . Na segunda veio “photo from Newsweek.com”. A terceira vem “photo from xxxxx.com”. Lady: Não entendi ainda. Professora: Calma, você nem se assentou. Você só quer a resposta, não está nem prestando atenção. Observem que abaixo de todas as fotos, há alguma coisa escrita. Todas têm xxxx.com. Vany: Ah! Então é a do Lula. Porque antes do site tem o nome de alguém. [...]

As tarefas de casa fazem parte de minha prática docente por duas

razões. Primeiramente porque eu vivi demais essa prática como aluna

(lembro-me da professora Eladyr Silva. Quanta tarefa, meu Deus!) e,

consequentemente, trouxe-a para o meu fazer de professora. Em segundo

lugar porque considero a prática da tarefa como expansão do estudo, como um

aprendizado a mais. Recordo-me do período em que fazia o primário e o

ginásio e que, todos os dias, minha mãe dizia: “não tem tarefa? Então vai ler

esse livro. Depois eu quero ouvir a estória”. Assim, toda aula eu passo

exercícios para serem feitos em casa.

Percebi, através das gravações e dos episódios apresentados, que, ao

explicar ou corrigir os exercícios, uso, além do tom instrucional, a língua

materna. Curiosamente, notei também que em todos os dados gravados das

doze aulas, este foi o único momento que chamei atenção de um aluno,

momento em que eu disse “Calma, você nem se assentou. Você só quer a

resposta, não está nem prestando atenção” (Episódio 9). Esse episódio marca,

quem sabe, a importância exagerada que dou à prática da tarefa.

Cena 3 – Questões e discussões relacionadas ao tema: conteúdo

Observei que a minha aula segue, normalmente, com o momento em

que os alunos e eu vamos trabalhar o conteúdo programado para o dia. É a

hora em que atividades orais, auditivas e escritas se entrelaçam, nem sempre

nessa mesma ordem e nem sempre todas acontecendo em uma única aula,

para que o conhecimento seja construído.

Page 71: PRÁTICAS COTIDIANAS EM UMA SALA DE INGLÊS: UM ESTUDO

70

Sempre tive a maior dificuldade para fazer exercício de compreensão

auditiva e sempre ouvi dos meus professores que deveria praticar aquilo que

menos sei. Essa prática estudantil e a experiência de trabalho em cursos de

idiomas fazem com que eu leve bastantes atividades de audição para a sala de

aula ( músicas, vídeos, ditados). Percebo que os alunos gostam também, pois

compreender o que o outro fala é um desejo de consumo deles, uma vez que

querem entender tudo que se diz na letra desta ou daquela música. Este é um

dos momentos em que a sala se mantém em silêncio total, ouvindo “cd”,

“tapes” e “clips”.

A cena 3 é composta por treze episódios, sendo que quatro referem-se

ao Vamos ouvir, dois referem-se ao Vamos falar, quatro relacionam-se ao

“Vamos escrever” e três trazem à baila o “Vamos ler”. Os episódios abaixo

mostram ações de diferentes aulas em que as atividades auditivas foram

realizadas.

Data: 02/04/2014 Local: sala de aula Cena 3: Questões e discussões relacionadas ao tema: conteúdo

Episódio 10 – Vamos ouvir Falando em português, eu coloquei para os alunos a proposta da aula deste dia — exercícios auditivos e preparação de um diálogo para ser apresentado na aula seguinte. Recolhi as tarefas solicitadas na aula anterior e fui até ao quadro para mostrar o que os alunos deveriam copiar para realizarem as atividades auditivas (“listening”) da aula. No primeiro exercício (Anexo 5), os alunos ouviram algumas situações em que os personagens se despediam. O objetivo era marcar a sequência em que os vocábulos apareceram. E no segundo (Anexo 5), eles deveriam completar dez perguntas com vocabulário diverso, já estudado anteriormente. Normalmente, quando a atividade auditiva é feita por meio de “cd” ou “tape”, costumo repetir até três vezes os excertos a serem ouvidos para que a maioria possa entender.

Professor: Okay, ouviram a ordem aí? Beto: Hum hum Professor: Então há uma confusão aí, né? Um fala uma coisa, o outro fala outra. É bye, não, não bye, é good night, não, é see you. Vany: Acho que eles ( ) Professor: Parece que eles estão cansados, né?

Page 72: PRÁTICAS COTIDIANAS EM UMA SALA DE INGLÊS: UM ESTUDO

71

Episódio 11 – Corrigindo Novamente o “cd” é colocado. Os alunos ouvem e no final a resposta é dada automaticamente pela aluna Vany.

Professor: Okay? Vany: Ficou dois, um, seis, cinco, quatro, três. Professor: Como que ficou aí? Beto e Greg: Dois, um, seis, cinco, quatro, três. Professsor: Difícil? Todos: Não. Professor: Moleza, não é? Então agora vocês vão escutar mais um, hein?

O Episódio 10 retrata um exercício simples e que os alunos fizeram sem

nenhuma dificuldade, conforme confirmação no Episódio 11. Por ser muito fácil,

não foi preciso repetir a gravação e logo após o término, a aluna Vany falou a

sequência correta para todos da sala. Ainda assim, eu procurei confirmar, em

português, se realmente todos acertaram. Nesse momento, a língua inglesa foi

usada apenas para reproduzir alguns vocábulos do próprio exercício.

Episódio 12 – Vamos ouvir mais um Enquanto o segundo exercício (Anexo 5) era localizado no cd, os alunos copiavam do quadro e conversavam.

Professor: Number four, okay? I put some questions, you listen and complete them, okay? Okay oh! Vocês vão ouvir agora uma situação de uma pessoa conversando numa recepção e por isso ela pede tantas informações. Ela não vai pedir ( ) faz a pergunta, ele responde. Então vocês vão tentar completar. À medida que ela vai fazendo as perguntas vocês vão completar... Greg: Ali é postcode? Professora: Yes. Não é para responder. É só para completar as perguntas com o que ela está falando, okay? Let’s start? Beto: Let’s start Vany: Yes. Professora: Okay. Listen! Beto: ( ) Cadê? Vany: Ahhh! Professora: You ( ) don’t pay attention! [sem levantar a voz] Beto: Não, não entendi. [o cd é colocado mais uma vez]

Page 73: PRÁTICAS COTIDIANAS EM UMA SALA DE INGLÊS: UM ESTUDO

72

Data: 02/04/2014 Local: sala de aula Cena 3: Questões e discussões relacionadas ao tema: conteúdo

Episódio 13 – corrigindo Mesmo sendo dez perguntas, os alunos fizeram o exercício com facilidade e depois de ouvir duas vezes o mesmo excerto, eu comecei a correção. Assim, evitaria conversa paralela e as poucas dúvidas seriam esclarecidas imediatamente. Ao fazer a correção, as questões foram ouvidas novamente, uma por uma, eu repeti cada uma delas e ainda escrevi no quadro branco.

Professora: Number one Vários alunos: First Professora: Okay, first name. Okay first name? [Enquanto repito, escrevo no quadro a palavra fist] Beto: Ah, faltou o R. Professora: Second. Diversos alunos ao mesmo tempo: What´s? [confirmando a resposta] [Coloco a gravação da segunda questão] Professora: Okay. What’s your surname? Do you know what is surname? Vickie: É o ... segundo nome Professora: Segundo nome? Greg: Não Beto: Primeiro nome Greg: Último nome Vany: Sobrenome Professora: Okay, é o sobrenome. Number three.

Percebi que apenas o aluno Beto ficou sem fazer o exercício da primeira

vez, daí, a reclamação: “Não, não entendi”. Mas outra oportunidade foi dada

através de uma segunda audição do cd e ele fez todas as questões. Enquanto

se ouve o cd, o silêncio é geral. Ao fazer a correção, porém, todos querem

mostrar que acertaram e há momentos em que diversos alunos falam, alguns

mais alto do que outros, ao mesmo tempo. Às vezes, a correção pode até

parecer, para quem está do lado de fora da sala, como um sinal de desordem,

falta de domínio da turma.

Inglês e português se misturam e, mais uma vez, essa mistura não

interfere na prática da sala de aula. Pelo contrário, a meu ver, ela disponibiliza

oportunidade para todos participarem e, de certa forma, reforça o aprendizado,

como se vê no episódio acima em que eu pergunto em inglês se os alunos

sabem o que é surname (Do you know what is surname?) e eles respondem

Page 74: PRÁTICAS COTIDIANAS EM UMA SALA DE INGLÊS: UM ESTUDO

73

em português, levando-me a usar, também, o português para confirmar a

resposta deles.

Data: 09/04/2013 Local: Sala de aula Cena 3: Questões e discussões relacionadas ao tema: conteúdo

Episódio 14 – Vamos falar A aula do dia 09 de maio teve como ênfase os diálogos orais que os alunos apresentaram uns para os outros, com uso de expressões básicas e palavras interrogativas (WH) enfatizadas em aula anterior. Como tarefa, os alunos produziram, em duplas, seus diálogos para que fossem apresentados, oralmente, sem leitura. Essa atividade fazia parte do tema central do planejamento anual “WHO AM I” cujo objetivo final do bimestre era a produção de uma pequena autobiografia. Cada aluno escolheu o seu parceiro de trabalho de acordo com a afinidade entre eles. A seguir mostro duas das apresentações feitas em sala de aula referentes aos diálogos.

Diálogo 1

Inghi: Hello, Greg: Hello. My name’s Gabriel. And yours? Inghi: My name’s Inghi. Who are you from? (disse Who e não where) Greg: I am from Cuiabá. Inghi: What do you do? Greg: I’m student. Inghi: Good bye. Greg: See you. Ahhhh! Minino!!!! [Dá gargalhadas pelo sucesso obtido]

Diálogo 2 Vany: Hello Lady: Hello Vany: How are you? Lady: I am so so. And you? Vany: I am fine. Ehhh. She is beautiful Lady: Thank you Vany: What’s your phone number? Lady: Ahhh. Pode falar em português? Professora. Yeah. Lady: 99..... Vany: See you.. Lady: … Vany: Thank you see you Lady: Thank you see you Vany: Thank you Lady: Bye

Page 75: PRÁTICAS COTIDIANAS EM UMA SALA DE INGLÊS: UM ESTUDO

74

Os diálogos acima, apesar de serem decorados, mostram que os alunos

usam inglês básico de interação como em um outro momento do início da aula

do dia 16 de maio em que o aluno Beto falou “teacher, deixa eu ir lá no

banheiro?” e eu respondi “Can you speak in English?” e imediatamente o aluno

perguntou “May I go to the bathroom?”

Estes exemplos demonstram também que os alunos sentem-se à

vontade mesmo não podendo ler e que os enganos não os inibem, conforme

mostra o episódio da aluna Lady ao fato de não lembrar os números. Percebi

que a minha flexibilidade e aceitação dos erros como ato de aprendizagem só

contribuem para a desenvoltura do aluno. Assim, equívocos como o cometido

pelo aluno Inghi ao dizer “Who are you from?” são vistos como atos comuns a

qualquer aprendiz.

Data: 25/06/2013 Local: Sala de aula Cena 3: Questões e discussões relacionadas ao tema: conteúdo

Episódio 15 – Vamos falar Este outro momento de fala em sala de aula tinha como função a apresentação, em Power point, de uma biografia de uma pessoa importante na vida de cada um deles. As línguas, portuguesa e inglesa, se misturaram, de acordo com a habilidade de cada aluno e os personagens também foram mudados, de acordo com a vontade deles, uma vez que apresentaram biografias de pessoas famosas no mundo.

Vany: Michael Jordan. He was the best basketball player in the world. He is from New York. He is 40 years old.[ …] Mahatma Ghandi He was the idealizador do princípio de não agressão, de forma não violenta de protesto como meio de evolução. He was indian. Quotation: “You must be the change you wish to see in the world.” A tradução: Você deve ser a mudança que você deseja ver no mundo.”

O Episódio 15 é mais um exemplo da prática do Vamos falar na minha

sala de aula. Aqui eu percebi que o uso de inglês e português é uma constante

nas minhas aulas. Notei que os alunos usam as estruturas básicas da língua

Page 76: PRÁTICAS COTIDIANAS EM UMA SALA DE INGLÊS: UM ESTUDO

75

alvo que já sabem (“He is 40 years old”) e procuram expandir os seus

conhecimentos quando necessário (“You must be the change you wish to see

in the world”).

Esse mesmo episódio serviu para mostrar-me como tenho sido mais

flexível com os alunos. Em momento algum eu me exaltei ou contestei sobre o

que eles apresentaram em Power point. O combinado era que apresentariam

biografias de pessoas importantes para eles, como alguém da família, por

exemplo. E eles falaram de pessoas importantes no mundo. O que contou foi o

que falaram e não sobre quem falaram.

Data: 16/04/2013

Local: Sala de aula Cena 3: Questões e discussões relacionadas ao tema: conteúdo

Normalmente eu deixo os exercícios escritos para serem feitas em casa

a fim de aproveitar o tempo em sala de aula com atividades orais, auditivas e

de leituras, pois a produção escrita é mais demorada. Eu recolho, visto as

atividades na minha casa e procuro fazer um levantamento dos problemas

mais comuns a todos para serem corrigidos coletivamente em sala. Isto diminui

o serviço manual, apesar de não cobrir as necessidades de todos os alunos.

Sendo assim, o episódio abaixo mostra o resultado dessa prática. Os

alunos escreveram em casa suas pequenas biografias, e na aula fizeram a

refacção, tentando corrigir os seus erros. Nesse momento da escrita em sala,

os alunos sempre têm como suporte os dicionários impressos (da escola), a

internet dos seus respectivos celulares e eu, a professora, que circulo pela sala

enquanto eles escrevem.

Episódio 16 – Vamos escrever Esta aula foi preparada para os alunos reverem as pequenas autobiografias, escritas em casa, como tarefa da aula anterior e entregues dois dias antes da aula desse dia, 16 de abril. As figuras abaixo ilustram produções feitas pelos alunos, sendo que a figura 3 remete-se ao mesmo texto da figura 2, porém com as correções feitas pela própria aluna. Na figura 3, o aluno sinaliza os seus erros abaixo do texto.

Page 77: PRÁTICAS COTIDIANAS EM UMA SALA DE INGLÊS: UM ESTUDO

76

Figura 2

Figura 1

Figura 3

Durante o processo de produção escrita, a turma ficou bem tranquila,

pois os alunos trabalharam individualmente. Nesse momento, raramente

pediram ou receberam ajuda dos colegas. A maioria tentou resolver todos os

problemas através do celular. E só quando não conseguia é que se dirigira a

mim.

Page 78: PRÁTICAS COTIDIANAS EM UMA SALA DE INGLÊS: UM ESTUDO

77

Data:29/11/2013

Local: Sala de aula Cena 3: Questões e discussões relacionadas ao tema: conteúdo

Dentre os episódios da minha prática relacionados ao escrever, há

momentos em que a escrita não é livre, ou melhor, não é voltada para a

comunicação. Exercícios são dados para apreensão ou reforço de itens

gramaticais que, normalmente aparecem nos livros didáticos. A seleção dos

exercícios é feita conforme o que se planejou em cada bimestre e para

concretizarmos a proposta de criar um slogan e fazer pôsteres relacionados ao

tema Beeing a Volunteer, alguns exercícios das gramaticais ajudariam. Além

disso, atividades escritas que envolvam palavras cruzadas, caça – palavras,

confecção de cartazes e de murais temáticos, jogos e outros são bem vindas à

essa turma. Uso os Episódios 17, 18 e 19 para apresentarem alguns dos

momentos da escrita.

Episódio 17 – Vamos escrever Na aula do dia 29 de novembro, os alunos foram convidados a fazer diversos exercícios escritos do livro utilizado em sala: Upgrade . Na página 46, o número 2; na página 48, o número 1; os dois exercícios da página 52 e o terceiro da página 53. Em duplas, sozinhos, com livros, dicionários, celulares e conversas, os alunos dispuseram-se a trabalhar. Cada um começou por onde quis. Com isso, eu tinha a Vickie fazendo a página 46; a Vany e Tatá, juntas, fazendo a página 52 e assim por diante. Todos estavam trabalhando, mas cada um naquilo que queria e no seu ritmo. Para mim, o que importava era o resultado: tudo feito por todos. Dessa forma estariam preparados para fazerem o pôster solicitado através do exercício da página 55 do livro. Abaixo, apresento partes deste momento.

Vickie: Professora ( ... ) Professora: E aí? [não entendi e fui à cadeira dela]

Vickie: Não achei obligated. Só tem obligation, obligate. Professora: É porque é o seguinte. É ... é o seguinte [ em tom mais alto , para todos ouvirem].Observem ... [ ...] Vickie: Então eu tenho que olhar obligate. Professora: Exatamente. Como é o passado disso? [aponto para o dicionário] Vickie: Obligated [ fala baixinho] Professora: Entendeu. Lembra que a gente já tinha falado sobre isso? [...]

Page 79: PRÁTICAS COTIDIANAS EM UMA SALA DE INGLÊS: UM ESTUDO

78

Episódio 18 – Vamos escrever

Vany: Ah!!! A internet não funciona [Eu fui até a entrada da sala e abri a porta] Professora: Melhorou? Vany: Não sei porque mas agora foi. [...] Tatá: Oh, e agora?[olhando o exercício número dois da página cinquenta e dois e em tom de espanto] Google tradutor [ diz sorrindo] [Alguém fez uma pergunta] Vany: Página? Cinquenta e dois? Alguém: Quarenta e seis. Vany: Pago Alguém: Pagar? [...]

Episódio 19 – Vamos escrever

Tatá: Minha internet tá leeenta [fala baixinho] [ ...] Vany: Professora, vem cá rapidão. [chama duas vezes] [Respondo a outro aluno, outra coisa e vou até ela] Vany: professora, olha só. [ Mostrando a oração do livro] Essa primeira she humhum [representando o espaço] interview. Professora: That’s why she got the job Vany: Então aqui ela foi numa entrevista. Então aí eu coloco a good impression. Mas como eu colocaria? Assim normal? A good, sem mudar nada? Professora: Não. Você coloca ...

Nos três episódios acima, notei que os alunos se envolvem com os

exercícios escritos porque eles têm uma determinada liberdade para fazê-los.

Não há momentos de interação comunicativa com o uso do inglês. O inglês,

aqui, aparece apenas como a forma que o exercício exige. Também observei

que nesse tipo de exercício escrito, a procura pela minha presença é grande.

Os alunos me chamam constantemente para ajudá-los a resolver as diversas

situações, embora haja entre eles mesmos, uma busca por ajuda. Mesmo

fazendo exercícios diferentes, eles perguntam uns aos outros sobre esta ou

aquela dúvida.

Data:14 /05/2013

Local: Sala de aula Cena 3: Questões e discussões relacionadas ao tema: conteúdo

Page 80: PRÁTICAS COTIDIANAS EM UMA SALA DE INGLÊS: UM ESTUDO

79

Episódio 20 – Vamos ler Após a retrospectiva da aula anterior (estratégias de leitura) eu dei um texto (Anexo 3 – Casino Alborg) para que os alunos pudessem ler e responder quatro questões. O texto estava escrito em dinamarquês e o objetivo era que eles percebessem que usamos várias estratégias ao fazer leituras. Em duplas, escolhidas entre eles pela afinidade, fizeram as respostas nos respectivos cadernos, pois a cópia (material fotocopiado gratuitamente é raro) foi devolvida para ser usada com outras turmas. Expliquei o exercício e marquei um tempo para que eles não ficassem a aula inteira por conta de apenas uma atividade.

Greg: Professora que língua que é essa aqui? Professora: Just a moment. Inghi: Acho que isso aqui é inglês, só que abreviado. É Francês? Greg: Japonês Inghi: ou é turco Vani: Ele nem sabe o que é turco Inghi: Eu tenho amigo turco. Eu jogo com ele no CS Tici: Professora, o cassino veio da onde? Beto: É russo gurizada Greg: É alemão Inghi: Eu acho que não é alemão não. Alemão é diferente. Tici: Qual é a idade? [...]

Data:14 /05/2013

Local: Sala de aula Cena 3: Questões e discussões relacionadas ao tema: conteúdo

Episódio 21 – Corrigindo

Rapidamente os alunos terminaram o exercício e a correção foi imediata.

Professora: Nesse exercício que vocês fizeram aí, qual dessas estratégias vocês usaram Tatá e Sussu que terminaram por último. Hein? Qual foi a estratégia usada para responder essas quatro perguntas? Greg: chutômetro Tatá: é Professora: Vocês só chutaram? Sussu: Não. Eu deduzi. Professora: Como você fez isso? Sussu: A lógica. Professora: Que lógica que você usou? Tici: Professora ... [...].. Professora: Diga Tici Tici: eu usei os recursos tipográficos Professora: Recursos tipográficos. Lady usou ...

Page 81: PRÁTICAS COTIDIANAS EM UMA SALA DE INGLÊS: UM ESTUDO

80

[...] Beto: aqui oh professora. Por causa da vírgula aqui no dinheiro, por causo do pontinho separando o vinte dos zeros. Professora: e qual é foi a estratégia que vocês estão falando? Vany, Lady, Beto, Inghi: recursos tipográficos [...]

O episódio 20 mostra a constante interação entre os alunos enquanto

estão fazendo os exercícios. E tudo é dito para todos ouvirem. Esta prática

pode ser considerada como bagunça e/ou indisciplina, porém eu convivo bem

com ela e não me atrapalha em nada. Da mesma forma, acontece durante a

correção, a participação de todos os alunos é extremamente ativa. Entretanto,

o inglês não aparece nem como situação comunicativa e nem como forma,

uma vez que o texto está em outro idioma. As interações são descontraídas e

observo sempre, muita alegria e sintonia entre os alunos desta sala de aula.

Data:22 /02/2013

Local: Sala de aula Cena 3: Questões e discussões relacionadas ao tema: conteúdo

Episódio 22 – Vamos ler Nesta aula, bem no início do semestre, eu preparei uma atividade para os alunos lerem, conhecerem e discutirem um texto (anexo 6 — How many kisses) sobre aspectos culturais de outros países.

Por não ter horário definido, essa atividade foi preparada para trabalhar com todas as séries. Considerando essa indefinição das primeiras aulas eu procuro conversar e responder perguntas curiosas, intrigantes e, às vezes, cabulosas dos alunos. Para isso levo assuntos relacionados à cultura, de forma geral. Normalmente, as perguntas estão relacionadas ao comportamento das pessoas, às gírias, palavrões e à forma educacional. Textos como esse provocam grandes discussões, boas risadas e alguns estranhamentos. (Vinheta de observação, 22/02/2013)

Os episódios da cena 3 mostram as diversas práticas presentes na

minha sala de aula, embora não tenha registrados os momentos em que

utilizei filmes, vídeos e músicas. Percebi a ausência desses dados ao longo

das transcrições das aulas, mas, para mim, era inviável manusear

equipamentos diferentes em um mesmo momento. Assim, quando os filmes,

Page 82: PRÁTICAS COTIDIANAS EM UMA SALA DE INGLÊS: UM ESTUDO

81

vídeos e músicas foram utilizados, eu me preocupei apenas em ligar ou

desligar os aparelhos; aumentar ou diminuir o som quando necessário; pausar

ou continuar a apresentação para introduzir os comentários; repetir ou não

trechos das apresentações, quando solicitados. Enfim, eu fiz o que eu

precisava fazer para a aula acontecer.

Observei, mesmo sem registrar essas práticas, que eu procuro inserir

em sala, de forma simples, as diferentes habilidades pertinentes ao

aprendizado de uma língua. Com as atividades de compreensão auditiva, fala,

escrita e leitura tento oferecer possibilidades que sejam favoráveis a todos.

Mediante as práticas registradas, parece que o que está sendo feito em

sala de aula afina com alguns autores como Rajagopalan (2009), Pedroso

(2010), Menezes de Souza (2011), e outros, pois os alunos e a professora

procuram fazer algum uso do inglês, ainda que de forma restrita, e interagem

com os materiais de maneira diferenciada. Não há linearidade, não há

garantias e nada está pronto. Talvez, muito do que faço seja uma necessidade

minha de me afastar da rotina. Sem ela, equilibro o meu eu e

consequentemente, o meu fazer.

3.2 Dos sentidos

Nesta seção, procuro interpretar os dados que mostram os sentidos

atribuídos pelos atores da pesquisa (professora e alunos) aos eventos

cotidianos que estão relacionados ao aprender e ensinar inglês. Busquei me

aproximar dos alunos com o intuito de entender melhor suas visões acerca

desses sentidos por meio de entrevistas semi estruturadas. Desse modo,

propus algumas questões (Como você vê as aulas de inglês?; Como você vê o

meu papel e de seus colegas nas aulas de inglês?; O que você pensa sobre

mim enquanto professora? Você aprende inglês com o seu colega?, Como?;

Aula de inglês para você é...) e, no decorrer da entrevista, introduzi outras

perguntas quando precisava instigar mais informações sobre o tema em

questão.

Trago a seguir, através dos dois temas: “ Bom, elas melhoraram” e “Eu

aprendo muita coisa com eles”, recortes das entrevistas feitas com os alunos

Page 83: PRÁTICAS COTIDIANAS EM UMA SALA DE INGLÊS: UM ESTUDO

82

que me permitiram inferir como eles interpretaram suas experiências em sala

de aula.

3.2.1 DOS ALUNOS

Tema 1 — “ Bom, elas melhoraram” (Greg, entrevista em 06/11/2013)

Conforme o dizer dos alunos, houve mudanças nas minhas práticas e

essas mudanças foram para melhor. Tal asserção se baseia em uma

comparação entre as aulas do ano de 2013 com as aulas do ano anterior,

2012. A comparação referia-se ao inglês instrumental específico para a

informática (trabalhado com o Emiep em 2012) e com as atividades feitas no

ano de 2013, como músicas, filmes, vídeos e textos com temas diversificados.

De acordo com os Fragmentos 1 e 2 abaixo me parece que os alunos vêem as

aulas de inglês mais próxima do seu cotidiano, daí a justificativa da melhora.

Fragmento 1

Bom, elas melhoraram. Antes era voltado para o EMIEP, mais informática, né? E hoje em dia está mais voltada para o inglês mesmo assim, no dia a dia, né? A gente trabalha com imagens, né? E trabalha o texto e eu acho que melhorou bastante (Greg, entrevista, 06/11/2013). Fragmento 2

Elas (as aulas) fazem eu enxergar que o inglês não é só estudar na sala de aula. Existem outros meios de aprender o inglês. Um filme que assiste sem legenda, prestar atenção nas músicas que a gente ouve, nas palavras que a gente vê em shoppings, em qualquer mercado, ... Eu gostei de inglês por causa disso porque eu comecei a ver de outra forma (Vany, entrevista em 13/11/2013).

Apesar do discurso da aluna Vany no Fragmento 2 parecer uma

repetição do discurso da professora, todas as práticas mencionadas por ela

fizeram parte do ano letivo embora elas não tenham sido mostradas e

analisadas na seção anterior (Das práticas) quando notei que não havia

Page 84: PRÁTICAS COTIDIANAS EM UMA SALA DE INGLÊS: UM ESTUDO

83

registrado dados nos momentos em que fazia atividades que dependiam de

equipamentos que eu mesma precisava manejar.

Outro aspecto comentado sobre as aulas de inglês refere-se aos

diversos assuntos que levava para a sala de aula. A aluna Sussu reforça a

diversificação de temas levada para as aulas, que extrapola o livro didático, e,

no primeiro momento — Fragmento 3 — vê esse fato como algo “interessante”.

Ela diz que a aula de inglês vai além do linguístico trazendo questões políticas.

Fragmento 3

O que eu vejo das suas aulas eu acho assim, que além de você trazer o conhecimento da língua, você traz um conhecimento fora, de um todo, entendeu? Isso é interessante porque você pode ver que você não fala só de inglês, dá aula só de inglês, da aula só de língua. Você dá aula só de … Você fala de política, fala daquilo. E eu acho que suas aulas assim ... são bem interessantes, eu acho que não tenho o que falar assim (Sussu, entrevista, 08/11/2013).

Curiosamente, essa mesma aluna ao ser perguntada sobre o meu papel

como professora, mostrou-me que ela sente falta de mais rigidez quanto à

matéria, sente falta de um compromisso maior com o conteúdo do ensino

médio da escola — Fragmento 4. Notei que o fato de não trabalhar linearmente

e “fugir” do que é proposto pelo planejamento anual do conteúdo é para a aluna

algo que marca as minhas aulas. Ela disse: a senhora “não pega firme”,

“poderia pegar mais duro na matéria”.

Fragmento 4

Assim, pegar no .../ às vezes a senhora não pega firma muito numa matéria. Por exemplo: a senhora traz coisas .... como é que eu vou explicar ... Por exemplo: a gente no 1º ano , a gente estuda o verbo To Be. Beleza. Aí às vezes a gente tem matéria que são totalmente diferentes que a senhora traz, assim outras matérias de fora, que a senhora também queira, às vezes, fugindo um pouco ... que eu acho ... do ensino médio do ensino da escola. [...] Da matéria em si. Acho que a senhora poderia pegar mais duro na matéria mesmo, tipo, empenhar mais, entendeu? do livro (Sussu, entrevista, 08/11/2013).

Page 85: PRÁTICAS COTIDIANAS EM UMA SALA DE INGLÊS: UM ESTUDO

84

Nos fragmentos abaixo, dois alunos mencionaram que comecei a “dar

um jeito novo”, fazer uma “prática nova” (Beto, Fragmento 5), trazendo uma

“coisa nova”, sempre “inovando” nas aulas (Vickie, Fragmento 6). Talvez por

ser uma pesquisadora iniciante, não os incentivei a ilustrar com exemplos, o

que significava “novo” para eles. Talvez a “coisa nova” e a “prática nova”

estejam relacionadas à diversidade de atividades a que expus os alunos

durante o ano. Também, posso inferir que o novo está representado no dizer

de outros alunos, como os de Greg, Vany e Sussu (Fragmentos 1, 2 e 3).

Fragmento 5

Então, no início eu não entendia nada. Ficava meio nervoso para vir pra aula. Ano passado que eu falo. Depois a senhora começou a mudar, começou dar um jeito novo e aí já dá pra entender melhor. Uma prática nova, o ensino, a senhora melhorou bem. [...] Melhorou muito. Era ... não era ruim. [...] Não é só teoria, teoria, é mais prática, mais fala. Melhorou bastante ( Beto, entrevista, 04/11/2013). Fragmento 6

Acho que é bom também. Porque tem muito professor que dá aula e a aula fica cansativa, aquela coisa repetitiva. E a senhora não, a senhora sempre traz uma coisa nova, sempre está inovando as suas aulas e dá para aprender bastante o que a senhora ensina (Vickie, entrevista, 11/11/2013).

A respeito dos sentidos atribuídos à minha sala de inglês, os

Fragmentos 7 e 8 mostram que os alunos têm consciência das suas

participações no processo de aprender a língua e confirmam ter um ambiente

alegre, organizado e liberdade para expressão dentro desse ambiente: “gosto

de brincar”, “todo mundo participa”, “não tem confusão” (Inghi, Fragmento 7),

“participam bastante”, “tem mais liberdade para expressar” (Vickie, Fragmento

8). O aluno Inghi ainda destacou que a sala é “bem unida” e que “não há

confusão”.

Alguns dos atributos explícitos em suas falas são perceptíveis nos

episódios apresentados sobre as práticas. Lá, alguns dados mostram que os

alunos faziam exercícios e conversavam ao mesmo tempo; usavam celulares

para pesquisas e, todos sabemos, para dar uma espiada num torpedo que

Page 86: PRÁTICAS COTIDIANAS EM UMA SALA DE INGLÊS: UM ESTUDO

85

acabara de chegar; gritavam com colegas para pedir silêncio e depois

sorriam. Abaixo, os fragmentos ratificam esses sentidos.

Fragmento 7

São meus amigos e eu até gosto de brincar falando inglês com eles. Eu acho que eles também estão interagindo sim. A nossa sala é bem unida, todo mundo participa e não tem confusão (Inghi, entrevista,13/11/2013).

Fragmento 8

Eu acho que eles são interessados. [...] Eles participam bastante. Eu acho que sim porque até aqui a gente tem mais liberdade para expressar porque inglês é uma coisa assim de expressão, né? Então, é um jeito de você se expressar. Eu acho que eles expressam mais (Vickie, entrevista, 11/11/2013).

Tema 2 – “Eu aprendo muita coisa com eles” (Guto, entrevista em 06/11/2013)

A maioria dos alunos vê o colega como colaborador uns dos outros no

processo de aprender inglês. No Fragmento 09, Guto se coloca como um

aprendiz que tem dificuldade “eu tenho um pouco de dificuldade”, mas que

aprende com os colegas “eu consigo aprender muitas coisas” e que estes o

respeitam, não chamando-o de burro “me tratam também com muito respeito.

Não me chamam de ... de... burro”. No Fragmento 10, Greg percebe que não

sabe tudo “têm coisas que eu não sei” e que o saber do colega “o colega pode

saber” pode ajudá-lo “ele pode me ajudar”. Ou que ele pode saber algo “até

mesmo eu posso saber” que o colega não sabe “mas ele não sabe” e aí é a

hora de ele ajudar o colega “aí eu vou tentar explicar”. Notei que há, no dizer

de Greg, a ideia do intercâmbio, da troca de saberes. Essa imagem também

ocorre no falar da aluna Bibi, no final do Fragmento 11, ao confirmar

enfaticamente “ tem, tem” a minha hipótese. A aluna também diz que os

colegas ajudam-na “Eles me ajudam também” naquilo que ela não entende

“eu não tô entendendo uma coisa eu vou perguntar, eles já me explicam”.

Page 87: PRÁTICAS COTIDIANAS EM UMA SALA DE INGLÊS: UM ESTUDO

86

Fragmento 09

Eles... eu aprendo muita coisa com eles. E ... às vezes eu

tenho um pouco de dificuldade, né? Na hora de aprender as palavras que são um pouco difíceis. Mas é ... quando eles conversam assim eu consigo aprender muitas coisas. Eu faço perguntas que a senhora não ouve porque eu falo baixo e eles é .. me tratam também com muito respeito. Não me chamam de ... de... burro (Guto, entrevista em 06/11/2013).

Fragmento 10

Eu acho assim que têm coisas que eu não sei que o colega pode saber e isso ele pode me ajudar ou até mesmo eu posso saber alguma coisa mas ele não sabe, aí eu vou tentar explicar, fazer com que ele entenda. Acho que facilita pra ele. Tem um colega que conhece a matéria ou sabe alguma palavra e isso facilita bastante pra gente aprender (Greg, entrevista em 06/11/2013). Fragmento 11

Bibi: Eles me ajudam também. É ... em relação as vezes que

eu perco aula, eles me explicam. Coisas que eu não sei, que eu não entendi. […] Então, às vezes eles o que ... eu não tô entendendo uma coisa eu vou perguntar, eles já me explicam. A Vany, o Inghy, eles também tem uma certa facilidade em aprender , aí eles conseguem passar pra gente. Professora: Então você aprende com eles também. Bibi: Aprendo

Professora: Você acha que tem essa troca [tem] na sala de aula entre vocês. Bibi: tem, tem (Bibi, entrevista em 22/11/2013).

Em conformidade com as percepções apresentadas nos fragmentos

09,10 e 11, notei que a aluna Vany, no Fragmento abaixo, 12, vê a colaboração

dada aos colegas como um ato corriqueiro “automaticamente já vira e fala o

certo”. Ao falar dessa prática, enfatiza a expressão (“tem que”) trazendo à sua

resposta uma ideia de que ajudar é quase que uma obrigação.

Page 88: PRÁTICAS COTIDIANAS EM UMA SALA DE INGLÊS: UM ESTUDO

87

Fragmento 12

Consegue, bastante. É tipo assim ... eu sei o básico do básico. Aí quando um dos colegas fala alguma coisa errada, você automaticamente já vira e fala o certo. [...] tem que ajudar os outros ... [...] é uma cooperação (Vany, entrevista 13/11/2013).

Apenas duas alunas (Tatá, Fragmento 13 e Sussu, Fragmento 14)

dentre os onze não encontram nos colegas a confiança necessária para que

haja uma troca de conhecimentos. A primeira, Tatá, apesar de ser uma aluna

extrovertida, apresenta maiores dificuldades “fica me confundindo” com o

aprendizado, e por isso, demonstra uma necessidade maior da presença da

professora, daí “prefiro falar com a professora realmente”. Já a aluna do

fragmento 14, a Sussu, é extremamente tímida, arredia e sempre se assenta

mais longe do grupo. Ao ver o colega com um conhecimento diferente do dela,

acha-o esnobe “Ah eu sei”, e sente-se esnobada por ele “você não sabe.”

Fragmento 13

Não. Não muito porque tipo ... alguns sabem e alguns ficam em dúvida em falar o que realmente é. Então fica me confundindo e eu prefiro falar com a professora realmente (Tatá, entrevista, 11/11/2013).

Fragmento 14

Bom, acho que não ocorre muito isso na sala não. Acho que nem o inglês, o inglês ... pessoa que é considerada né?, sábio, que entende do inglês,ela ... meio que ... né? “Ah eu sei”, por

exemplo, Greg que sabe muito ás vezes ele ... meio assim ... aí quando a gente pergunta e ele “ah que não sei o quê”, “você não sabe”, tipo, não ocorre essa ajuda, pelo menos da minha parte não ocorre essa ajuda. Às vezes eu tenho dificuldade, mas porque não corro atrás para aprender (Sussu, entrevista, 08/11/2013).

A atribuição de sentidos interpretada por mim nos fragmentos

apresentados parecem ser coerentes com a necessidade contemporânea a

que Freire em 1997 já preconizava: busca e aprendizado se juntam ao ensino e

Page 89: PRÁTICAS COTIDIANAS EM UMA SALA DE INGLÊS: UM ESTUDO

88

conhecimento. E com isso, o processo do conhecimento mostra-se dinâmico e

coletivo.

3.3.2 DA PROFESSORA

Para falar dos sentidos que atribuo à minha própria prática, procurei me

orientar por meio de três perguntas: Como vejo as minhas aulas de inglês da

turma do 2o EMIEP?; Como vejo o meu papel como professora? e Como vejo o

papel dos alunos?

Encontrar respostas para as duas primeiras perguntas não foi fácil. Como é

difícil falar sobre nós mesmos! Busquei mais inspiração nos dados sobre o que

os alunos disseram (entrevistas semi-estruturadas) do que nas minhas próprias

anotações de campo ou ações de sala. Ao ler e reler os dados, fui delineando

tudo que pudesse desvendar os sentidos atribuídos por mim ao meu fazer

pedagógico. Através dos três relatos abaixo, apresento alguns momentos que

marcam minhas ações, bem sucedidas ou não, em favor de uma educação

mais eficaz.

Relato 1 – Como vejo as minhas aulas?

Não há ninguém melhor para avaliar nossas aulas do que os nossos

próprios alunos. Para mim, as aulas da turma do 2º EMIEP são exatamente do

jeito que a aluna Bibi diz: “É legal as aulas porque a gente tem um diálogo,

né?” (Bibi,entrevista, 22/11/2013). Gosto das minhas aulas de inglês porque

também as vejo como momentos legais em que, segundo Assis-Peterson

(1998/1999, p. 48), nós (eu e os alunos) construímos nossas ações e

interpretações no mundo por meio da interlocução e da intersubjetividade, pois

somos e agimos como pessoas concretas (e não idealizadas), vivas,

dinâmicas e mutáveis.

A anotação abaixo, feita após a aula do dia 09 de abril, vai ao encontro

da autora mencionada acima e mostra que, do meu jeito, eu tento prestar

atenção ao aluno.

Page 90: PRÁTICAS COTIDIANAS EM UMA SALA DE INGLÊS: UM ESTUDO

89

Eu dou okay nos nomes dos alunos que fizeram apresentação de seus diálogos ... Enquanto isso, Guto começa cantarolar. Eu comento Guto, you are so happy! I think you are in love. Guto sorriu e eu continuei: I think. I think you are in Love. You are happy all the classes. Smile all the time. Aí todos os colegas sorriram inclusive o Guto (Anotações de campo, 09/04/2013).

Um outro aspecto observado por mim sobre minhas aulas é a grande

preocupação que tenho em prepará-las:

“As aulas são preparadas para uma programação bimestral, mas eu, apesar de muitos anos de prática, não sei entrar em sala sem ter preparado a aula do dia. É claro que há dias que nada do que foi pensado e programado, acontece. Mas na cara limpa, eu não arrisco. Talvez seja porque esta preparação me

dê certa segurança” (Anotações de campo, 30/01/2013).

e apesar de me taxar como organizada, descobri que nem sempre, ou melhor,

na maioria das vezes, não faço fechamento das aulas.

“Às vezes, termino a aula passando tarefas e enquanto os alunos saem, eu falo repetidamente não esqueçam as tarefas, bom fim de semana; outras vezes, o sino bate e os alunos ainda estão fazendo atividades e com isso a aula se encerra.” (Anotações de campo, 08/12/2013). “Logo após, iniciamos as apresentações programadas na aula do dia 21 de maio. [...] Não houve tempo suficiente para todos apresentarem e combinamos para terminar no dia 02/07/2013, após a prova unificada” ( Anotações de campo, 25/06/2013)

Talvez seja esse o motivo pelo qual me apeguei tanto ao ritual da

retrospectiva. Entretanto, a falta de um encerramento formal no fim da aula não

foi percebida e/ou comentada por nenhum aluno. Pode ser que isso não os

incomode e nem seja relevante para essa turma. Mas eu fiquei surpresa e

chocada com tal revelação. Confesso que me aborreci. Essa é uma situação

que me fez refletir, monitorar os meus outros contextos e tentar mudar o meu

comportamento. Antes mesmo de terminar esta pesquisa, a partir do ano letivo

de 2014, eu tento me controlar e mudar a minha postura nos outros contextos.

Claro que nem sempre funciona, mas já acontece com maior frequência.

Page 91: PRÁTICAS COTIDIANAS EM UMA SALA DE INGLÊS: UM ESTUDO

90

Relato 2 – Como me vejo como professora?

Acima de tudo, sou professora porque amo o que eu faço e meu

comprometimento com a profissão se alinha com a ideia de que tanto a história

do aprendiz de língua quanto a do professor é concebida como sendo uma

história complexa e de múltiplos desejos. Através da noção de ‘investimento’

de Norton (1997) ensinar ou aprender uma outra língua é um “investimento na

construção da identidade social do aluno e do professor, identidade que se

transforma através do tempo e do espaço num movimento ininterrupto de

(re)negociação entre interlocutores” (NORTON,1997, apud ASSIS-PETERSON,

1998/1999, p. 43-50).

Por meio das palavras de alunos nas entrevistas, quando lhes perguntei

como me viam como professora, me taxaram de perspicaz, objetiva, detalhista,

culta e mãezona. Concordo com a observação da aluna Vany que me descreve

como “perspicaz”, “objetiva” e “detalhista”. Ao tentar definir perspicaz, a aluna,

acrescenta outros adjetivos (objetiva e detalhista) para em seguida explicar o

meu modo de ser: “toma posição sobre aquilo”, “vê coisas que a gente não vê”,

“a senhora presta atenção”.

“a senhora é ... perspicaz . Perspicaz porque você é muito ah ... ah ... a senhora é muito objetiva, detalhista com o que a gente faz. Você é ... como que eu posso falar? ... as vezes ... qualquer coisinha pequena. Você já toma posição sobre aquilo. Você faz a gente ver ... tipo assim ... detalhista. .. como que posso falar? Você vê coisas que a gente não vê. Pequenas coisinhas que passam despercebidas até para outros professores... uma pequena palavra, um erro ... a senhora presta atenção. Acho a senhora bem objetiva no que você quer” (Entrevista, 13/11/2013).

A fala de Vany me lembrou de uma outra expressão que os alunos

costumam usar quando falam comigo’: “Professora, a senhora que sabe de

tudo...” e, em seguida, lançam uma pergunta. Essas observações estão em

consonância com o meu grau de exigência comigo mesmo e com os alunos no

sentido de cumprir com as obrigações escolares e pelo fato de eu ser clara e

objetiva porque vou direto ao ponto que quero, sem meandros ou rodeios.

Page 92: PRÁTICAS COTIDIANAS EM UMA SALA DE INGLÊS: UM ESTUDO

91

A postura assertiva, apontada por Vany (“Você já toma posição sobre

aquilo”), é também destacada pelo diretor da escola. Conhecedor há muito

tempo do meu trabalho e acostumado a jogar água nas minhas fogueiras, ele

não poupou palavras para responder o que pensava a respeito de mim, quando

lhe perguntei porque sempre me chama de cizânia (“O que foi, cizânia?”, “O

que tá pegando, cizânia”? ,”Oh cizânia, vem cá!”). No seu comentário abaixo,

me vejo no papel de educadora que, do meu jeito e sem meandros, faço

política ao fazer educação.

A professora Fátima Comini é profissional de fino trato e, por isto, não consegue deixar de se posicionar frente a qualquer tema, especialmente quando a questão é polêmica (e ela adora polemizar!). Inteligente e sensível, mas de personalidade forte, suas posições sempre causam um certo desconforto e mal estar porque, via de regra, rompem as zonas de conforto e a comodidade de alguns. Deste modo, quando ela pede a fala, em geral, "causa cizânia entre os presentes", exigindo imediata intervenção para que o assunto não se torne motivo de desarmonia, confusão, divisões entre os profissionais presentes nas reuniões. De minha parte, acredito que profissionais como ela sejam indispensáveis no debate de qualquer temática relacionada a Educação, mas dá trabalho, a "Xiquinha" (Diretor, comentário enviado por e-mail, 18/01/2014).

A aluna Sussu, ao responder a mesma pergunta feita à aluna Vany,

disse: “Eu acho que você é uma boa professora, acho que é uma professora

muito culta ...” (Sussu, entrevista, 08/11/2013). Essa fala talvez esteja

relacionada com o hábito que tenho de levar as novidades culturais que

ocorrem na cidade como concertos, shows, exposições, peças teatrais,

revistas, além de comentar livros que leio, filmes que assisto. Também, por

conta do meu comprometimento profissional e do meu prazer, os alunos

percebem que participo de cursos de formação, congressos, seminários – que

exigem horas além sala de aula e, todas às vezes, com recursos financeiros

próprios – para enriquecimento e fortalecimento da minha formação e do meu

saber. Ao comentar com colegas professores e nas salas de aulas sobre as

novidades deste ou daquele assunto, passo uma visão de ser “antenada”

Page 93: PRÁTICAS COTIDIANAS EM UMA SALA DE INGLÊS: UM ESTUDO

92

(termo dado por alguns alunos e colegas de profissão) e de “culta”, para a

aluna Sussu.

Reconheço também que faço o papel da professora “mãezona”, como

disse o aluno Guto:

“É ... além de professora. É ... a senhora faz papel de mãe. [...] tipo ... alertar, falar para o aluno é ... tipo é ... melhorar naquilo que tipo ... ainda não deu [...] e a senhora me ajuda com conselhos e acho que deve continuar assim, dando conselhos” (Guto, entrevista, 06/11/2013).

Talvez, essa fala possa ser associada à prática do “ritual de entrada”

(Episódio 1), quando o meu estar à porta da sala para esperar os alunos

sinaliza a ideia de um contato familiar e, por isso, é constante e feito com a

preocupação de receber o aluno como indivíduo.

Do mesmo modo, a conversa com a aluna Sussu, que se seguiu após o

término da entrevista e que apresento a seguir, revela, pelo tom, uma atenção

além da relação professora-aluna. Nesse dia, indaguei sobre sua ausência em

muitas aulas. No momento, a preocupação não era somente com a aprendiz,

mas também com a pessoa. Reforço a presença de um sentimento que

extrapola o lado profissional. A aluna responde que passa por problemas e eu

me ofereço para ajudá-la, se precisar. Nesse caso, a emoção e a cognição se

entrelaçam e o processo de aprendizagem se apóia numa visão holística e

humanista defendida por Arnold e Brown (1999), citado por Aragão (2007, p.

47). Os autores sustentam essa ideia com base nos recentes estudos

neurobiológicos que têm demonstrado que as emoções fazem parte da razão e

que não há processos mentais sem processos emocionais, uma vez que estes

são parceiros no funcionamento do sistema nervoso.

Professora: E porque você faltou nas minhas aulas? Isso já é coisa pessoal, não é para pesquisa. Sussu: Não é só nas suas aulas. Ah... eu ... eu ando muito desanimada. Professora: Porque você está desanimada assim? Sussu: Ah .. estou muito desanimada. Professora: Está acontecendo algum problema? Está passando por alguma fase ...? Sussu: Mais ou menos . Mas sei lá. Eu acho que estou meio assim .... Por falta do trabalho .... / Professora: Bom, se você precisar, eu estou aqui, tá? Como amiga. O que eu puder fazer ..., okay? (Sussu, conversa informal, 08/11/2013)

Page 94: PRÁTICAS COTIDIANAS EM UMA SALA DE INGLÊS: UM ESTUDO

93

Ressalto também uma “eterna” preocupação em querer melhorar o que

faço. Em diversas vezes, enquanto entrevistava os alunos, mencionei que

precisava conhecer a “verdadeira visão” deles para que, de posse dos dados

para pesquisa, eu pudesse entendê-los e melhorar a minha prática. No

registro desses diversos momentos, em busca de “verdades” para aprimorar o

meu fazer pedagógico, percebi que realmente eu estava realizando um dos

meus desejos de professora de querer conhecer e entender o meu trabalho, e

dentre outros aspectos, combater o discurso da sociedade sobre a inércia dos

professores das escolas públicas brasileiras.

Seja sincero porque isto é uma pesquisa e eu preciso da verdade para melhorar. Até porque estou cheia de defeitos” (Fátima, entrevista com o aluno Beto, 04/11/2013). Esquece a amizade, as brincadeiras, veja a professora. E eu quero que você seja bem sincero porque é uma pesquisa. Não dá para falar: Ah! A senhora é ótima. Não! O que é realmente. Porque estou fazendo uma pesquisa para descobrir onde estou errando, então preciso da cooperação de vocês pra isso (Fátima, entrevista com o aluno Greg, 06/11/2013).

Você acha que eu cumpro o meu papel como professora? Porque eu falho, um monte de vezes [...] onde eu falho? Eu não sou a perfeição. Posso ser boa numa coisa, sou ruim numa outra, sou péssima naquela. Onde que eu falho? (Fátima, entrevista com aluna Sussu, 08/11/2013).

Essa insistência com a “verdade”, presente em todas as entrevistas e o

fato de mencionar várias vezes que “sou cheia de defeitos” é em virtude de

querer mostrar ao aluno que professores não têm “toda a verdade”, “todos os

conhecimentos” que lhes são cobrados. Interpreto nessa fala uma atitude

parcial e relativa das coisas.

Ainda a respeito da minha visão sobre o meu papel de professora, por

meio de algumas anotações de campo referentes à prática de sala de aula,

percebo que meus alunos têm liberdade para se posicionar e ser também o

sujeito de seu aprendizado. Pelos exemplos abaixo, também posso acrescentar

que acolho os seus tópicos mesmo que sejam em tom de brincadeira.

Page 95: PRÁTICAS COTIDIANAS EM UMA SALA DE INGLÊS: UM ESTUDO

94

No dia 19 de março de 2013 eu estava revendo com o grupo as perguntas básicas – WH questions – e ao fazer a pergunta para a turma Who are you?, o aluno Greg logo respondeu: Soy un estudiante exemplar. Todos caíram na gargalhada (Anotações de campo, 19/03/2013).

Na entrada da sala, a aluna Vany disse: Eu não consegui fazer a atividade que a senhora passou. Eu não, ninguém. Ela é muito difícil. Difícil não, complicada. Tendo ouvido a reclamação, assim que fiz a chamada, direcionei a aula para explicar a atividade (Anotações de campo, 26/03/2013). Estava passando um exercício escrito no quadro, quando o aluno Beto perguntou-me: Professora, como é veado [com a pronúncia de vi] em inglês? O animal. Eu escrevi a palavra deer no quadro e a aluna Bibi disse imediatamente que ela já havia ouvido, num seriado de televisão, a palavra homo para a outra situação (Anotações de campo, 26/03/2013).

Relato 3 - Como vejo meus alunos?

Minha reflexão sobre o papel do aluno leva-me a percebê-lo como um

aprendiz que faz hipóteses e comete erros para poder acertar. Gravação de

áudio das aulas e anotações de campo mostram que abro espaço para que o

aluno se exponha em busca do seu aprendizado. Assim, nos textos abaixo são

mostrados três situações de sala de aula que confirmam, na prática, a visão

que tenho dos meus alunos. No primeiro, quando repito a palavra sixty, instigo

o aluno Beto a buscar, a testar sua suposição e, quando ele acerta, tanto eu

como o colega Inghi demonstramos a nossa satisfação. No segundo e terceiro

exemplos, encorajo não só a aluna Tatá, mas toda a turma a reconheceer que

os erros fazem parte do aprendizado.

Exemplo 1

Professora: Page Sixty Beto: Seis? Professora.: Sixty. Beto: Sessenta? Professora.: Yes, of course Inghy: Parabéns! (Gravação de áudio, 18/06/2013).

Page 96: PRÁTICAS COTIDIANAS EM UMA SALA DE INGLÊS: UM ESTUDO

95

Exemplo 2

Hoje, Tatá conversou comigo, bem baixinho, sobre os erros que ela e a colega cometeram na apresentação dos diálogos. Aí eu incentivei todos os alunos, reforçando a necessidade de errar para se acertar. Dei como exemplo a natação, dizendo que nada adianta ver alguém nadando para que possamos aprender a nadar. É preciso praticar para aprender (Anotação de campo, 09/04/2013). Exemplo 3 Tatá: Professora e se eu errar? Professora: No, no problem. Gente, errar é necessário pra aprender. Se a gente não errar, a gente não aprende (Gravação de áudio, 09/04/2013).

Percebi também que, assim como a maioria dos alunos da turma do 2º

EMIEP veem os colegas como colaborador, eu também os aceito e os incentivo

nessa função de co-autores, de sujeitos autônomos. Observei que, em

diversas aulas, os alunos tomam o turno da professora (fazendo traduções do

que eu falava) e, em nenhuma das práticas da sala, sua ajuda é descartada por

mim, como no exemplo abaixo.

Professora: Oh my God! Ok, I’ll speak in Portuguese because I want everybody understand me, ok? [Inghy começa a tradução do que eu disse e para no meio da frase. Então eu repito tudo em inglês e ele diz tudo em português]. Professora: Yes, very good. Your translation is excellent, Inghy. [Todos da sala bateram palmas e eu expliquei em português tudo o que foi feito na última aula até o presente] (Gravação de áudio, 18/06/2013).

Além disso, houve momentos, como o apresentado no Episódio 15

(seção 3.1 Das práticas), em que os alunos espontaneamente escolheram

como queriam fazer a atividade de biografia proposta por mim. Havia pedido

que apresentassem uma biografia de alguém importante na sua vida, contudo,

eles preferiram falar de personagens mundiais, que nem todos da sala

conheciam, em razão de não quererem se expor [Vickie: Ah professora! Vou

falar da minha vida?; Greg: Eu não tenho ninguém importante não, professora!

(Anotações de campo, 21/05/2013). As escolhas foram feitas, entre eles, de

acordo com o interesse pessoal de cada um. Assim a aluna Vany, sendo

Page 97: PRÁTICAS COTIDIANAS EM UMA SALA DE INGLÊS: UM ESTUDO

96

religiosa, interessou-se pela vida de Mahatma Ghandi e do jogador de

basquete Michael Jordan, pois é o esporte que ela mais gosta.

Vejo nas relações da sala de aula uma cumplicidade que se estende nos

corredores da escola, ou vice versa, dos corredores para as salas de aula. Não

sei bem onde começa uma e termina a outra. Só sei dizer que essas relações

se complementam e possibilitam momentos inesquecíveis no processo de

ensinar e aprender. Nas anotações de campo, registrei um fato que me fez

sorrir muito e refletir bastante. Numa conversa de corredor, em que os

celulares foram mostrados uns para os outros, deparei-me com a situação de

ter o aparelho mais antigo do grupo, daquele que “quebra até tijolo”, segundo

uma das alunas. Como se não fosse o suficiente, o aparelho também não tinha

internet. Claro que as risadas foram muitas. O mais curioso foi perceber o

sentido que os alunos dão ao aparelho, uma vez que aluna Vickie me

questionou “o que é telefonar”. Abaixo relato o fato tal e qual aconteceu:

Ao chegar na escola, encontrei com a turma que estava esperando decisão sobre ir ou não para a feira de informática no Centro de Eventos Pantanal. Cumprimentei a todos em inglês e Vickie perguntou se seria amanhã (25/10/13) a nossa aula. Disse que sim, mas não sabia o horário. Beto disse: Deixe olhar no meu I-phone. Ao tirá-lo do bolso, exclamei: Nossa! Que chick! Tatá falou: Viu professora, como ele está esnobando? Então eu falei: Nossa gente, se vocês virem o meu, não acreditarão. Tatá mostrou o dela e disse: olha o meu. Vickie então mostrou o dela (que claro, é mais moderno que o meu). Então, mostrei o meu celular antigo (daqueles que só servem para telefonar). Lidiane, uma aluna minha de outra turma falou: Nossa, é do meu tempo! Pelo menos tem internet? Eu respondi: Nada, só serve para telefonar. Vany: Telefonar, teacher? O que é isso? Vickie: Esse celular é de 2001. Eu: Isso mesmo e nunca estragou. Vickie: É Nokia e Nokia quebra até tijolo. Lidiane: Professora, este celular é até à prova d’água. Nesse momento chegou o agente de pátio e terminou com a conversa, colocando todos para dentro da sala de aula (Anotações de campo, 24/10/2013).

Page 98: PRÁTICAS COTIDIANAS EM UMA SALA DE INGLÊS: UM ESTUDO

97

Momentos como esse, onde impera a descontração, muitas vezes são

tão ricos e tão cheios de sutilezas que podem estreitar as relações entre

professor e aluno e, além disso, propiciar reflexões importantes que podem ser

aproveitadas para as salas de aulas. Na situação acima, o cômico ficou por

conta da comparação do telefone ao tijolo e a reflexão pautou-se nos

constantes discursos, acadêmicos ou não, de que o mundo se relaciona de

forma diferente e por isso há uma necessidade de contínua atualização, de agir

e de interagir de forma diferente diante da sala de aula contemporânea.

3.3 Dos fundos de conhecimento

De acordo com Oughton (2010), o conceito de fundos de conhecimento,

desde sua concepção original, desenvolvido por Vélez-Ibáñez e Greenberg

(1990) e difundido por Moll, Amanti e González (1992), poderoso em

desmontar discursos de deficit, tem sido usado e reinterpretado por diferentes

pesquisadores e professores, contudo, sem ser avaliado, questionado ou

desconstruído criticamente. Como não pretendo desconstruir o conceito nem

discutir aspectos localizando-o em arcabouços teóricos como faz a autora,

recomendo a leitura do artigo. Apesar disso, considero relevante mencionar

que Oughton (2010), ao tecer a história do conceito, destaca como sua

interpretação tem sofrido mudanças de modo a torná-lo relevante para outros

contextos como a aprendizagem de adultos. Esse aspecto da reinterpretação

do conceito faz sentido para o meu trabalho, uma vez que me distanciei da

concepção original do conceito.

Como exposto no Capítulo 1 – O background da pesquisa, González,

Moll e Amanti (2009) referem-se ao conceito de fundos de conhecimento que

representa uma visão positiva dos lares detentores de amplos recursos

estratégicos, cognitivos e culturais com enorme potencial de utilidade para a

instrução em sala de aula. Esses recursos culturais e intelectuais sobre origem,

uso e distribuição de conhecimento e habilidades, estratégias de sobrevivência

desenvolvidos nos lares e comunidades constituem os fundos de

conhecimento.

O fato de este estudo ter sido realizado com jovens de ensino médio e

não com crianças como na pesquisa de González et al. (2009), levou-me a

Page 99: PRÁTICAS COTIDIANAS EM UMA SALA DE INGLÊS: UM ESTUDO

98

reinterpretar o conceito de fundos de conhecimento. Antes descrito, por esses

autores, como um princípio para identificar e descrever recursos culturais e

cognitivos produzidos nas práticas de lares e comunidades para utilizá-los no

ensino para crianças, por mim foi utilizado para focalizar fundos de

conhecimento produzidos por indivíduos. Quer dizer, ao invés de realizar visitas

aos lares de alunos para conhecer práticas advindas dos lares, voltei meu olhar

para práticas, experiências vividas ao longo da vida pessoal, escolar e de

trabalho do indivíduo (no caso meus alunos). Isto é, me afastei da ideia de

localizar os fundos de conhecimento de comunidades locais embasadas em

atividades produzidas na vida familiar, para localizar os fundos de

conhecimento de alunos sob a premissa que alunos não são uma tabula rasa;

eles são competentes e constroem conhecimento por meio de práticas e

experiências de vida.

Dessa forma, ainda imbuída da possibilidade de realizar as visitas aos

lares, decidi conhecer primeiramente os bairros que os alunos moravam. Por

meio da aplicação de um questionário (Anexo 2) inicial para coletar algumas

informações sobre os alunos, descobri, para minha surpresa, que eles

moravam em bairros distintos e distantes da escola. Junto com o professor

Arivan Salustiano da Silva, conhecemos dez bairros. Diferentemente de

González, Mol e Amanti (2009), esta pesquisa não contou com grupo de estudo

específico, pois a investigação foi na minha própria sala de aula. Mas, Arivan

tem sido ao longo dos anos, além de grande amigo, meu parceiro profissional.

E nós dois, mesmo trabalhando em escolas diferentes, estamos sempre juntos.

Pessoalmente ou por telefone, trocamos nossas ideias, preparamos aulas e

avaliações, sugerimos leituras um ao outro. Enfim, construímos e

desconstruímos muitos dos nossos conhecimentos em dupla e nessa pesquisa

ele não poderia ser apenas um espectador.

Inevitável também foi a cumplicidade da professora Ana Antônia ao ouvir

os muitos “casos” das minhas salas de aula. E no papel de orientadora,

fundamentalmente importante foi sua interferência na indicação das

bibliografias e sua disposição para, a quatro mãos, construirmos esta seção.

As visitas aos bairros foram feitas durante os meses de abril a julho,

sempre aos sábados ou domingos à tarde. Distribuídos entre as zonas leste,

oeste e sul da cidade, observei que seis dos dez bairros visitados situam-se

Page 100: PRÁTICAS COTIDIANAS EM UMA SALA DE INGLÊS: UM ESTUDO

99

muito longe da escola Azul. Apesar da distância, das diversas localizações e

das múltiplas diferenças entre um lugar e outro, constatei, também,

semelhanças entre os bairros. Alguns com ruas asfaltadas (outros, no entanto,

com ruas esburacadas e sem asfalto), e todos com escolas públicas, igrejas

e/ou templos de diversas religiões, comércio local, inclusive muitos deles com

nomes em língua inglesa, lans houses, campos de futebol e feiras ambulantes,

montadas aos sábados nas ruas principais do bairro. O que me chamou

atenção em todos os bairros foi a escassez de espaço para lazer e

entretenimento para as crianças e jovens. Vi muita gente sentada à porta de

suas casas, conversando e tomando cerveja, enquanto as crianças brincavam

na rua. Outro fato presente e interessante são as antenas de televisão por

assinatura em quase todos os imóveis.

Todos os moradores com os quais conversei foram extremamente

atenciosos e gentis. Para ilustrar, reporto-me a uma situação em que meu carro

apresentou um problema. Isso me levou a conhecer diversas pessoas. Entre

essas um transeunte de bicicleta parou e decidiu comprar combustível em um

posto, longe do local em que estava parada; um senhor, que não conseguiu

abrir a tampa do tanque de gasolina, apresentou-me ao proprietário de um

mercado que, por sua vez, acionou o seu mecânico de confiança. Ao cair da

noite, quando o mecânico chegou e detectou o defeito, avisou que só poderia

consertá-lo no dia seguinte. O proprietário do mercado e o mecânico se

dirigiram a um morador e pediram se poderiam deixar o carro na garagem até o

dia seguinte. Em seguida, o mecânico nos (Arivan e eu) levou para minha casa.

No dia seguinte, quando fui buscar o carro, a esposa do mecânico me recebeu

com um belíssimo almoço. Quando relatei a uma aluna que fui visitar o seu

bairro e que meu carro teve problema, a primeira coisa que ela disse foi:

Nossa! Ele não foi roubado!

A visita aos bairros foi tão impactante que mudou o meu modo de olhar

para os alunos ao descobrir “o lugar onde eles moravam”. Percorrer os bairros,

mesmo que brevemente, fez diferença. Descobri que o eventual atraso dos

alunos ao chegar à escola se deve à distância dos bairros da escola, com

inevitáveis problemas de trânsito e de transporte público, requerendo que os

alunos saiam de suas casas entre 5h e 6h. Nunca havia pensando nesse

detalhe. Mesmo com os problemas de saneamento e outros que requerem

Page 101: PRÁTICAS COTIDIANAS EM UMA SALA DE INGLÊS: UM ESTUDO

100

atenção governamental, vê-se que os bairros estão conectados com o mundo

global. A tecnologia e o inglês estão além escola na presença de lan houses,

TV com assinatura, uso do celular etc.

Segundo Dias e Assis-Peterson (2006, p. 115), os resultados da

pesquisa de Dias (2006) mostraram que existe uma “visão institucional’’

(escola) em que diretores, professores e coordenadores de escola concebem

os bairros dos alunos como um mundinho isolado dos valores do mundo

tecnológico globalizado, que “parece estar na idade da pedra, em que o

pessoal cozinha em fogão à lenha, falta água e é comum ver mulheres com

lata na cabeça” (DIAS, p. 61). Como bem enfatizam Dias e Assis-Peterson

(2006), essa visão abriga um discurso preconceituoso que contempla a

realidade social por uma ótica negativa de exclusão, ancorada na desfiliação

existente entre escola e comunidade, reforçando o preconceito de déficit

linguístico e cultural das classes economicamente desfavorecidas.

Zeichner (2000), especialista na formação de professores, também

enfatiza que é preciso uma conexão estreita da universidade com a escola e

com a comunidade. Sem isso, cria-se um fosso entre as atividades acadêmicas

e o contexto em que se deve trabalhar, mantendo assim, um sistema desigual

de escolarização sem perspectivas de mudanças bem sucedidas.

O autor vê na distância entre escola e comunidade a falta de experiência

intercultural direta, uma vez que o professor não interage com a cultura do

aluno que está em sala de aula. Para ele, muitos professores não observam e

nem aprendem com a comunidade dos seus alunos e com isso deixam de

incorporar, de modo positivo, os recursos que os aprendizes trazem para a

escola.

O fato de o professor não conhecer o entorno de sua própria escola

certamente, é um dos fatores que levou González, Moll e Amanti (2009) a

conceber o conceito de fundos de conhecimento embasado no modo de fazer

pesquisa envolvendo a escola e professor com a comunidade. Os autores

também entendem que o processo educativo pode ser muito maior quando os

professores aprendem sobre as situações do quotidiano de vidas de seus

alunos. Ligação entre comunidade, escola e universidade.

Freire também, desde o início de seu trabalho em Recife, entre os anos

de 1950 e 1960, inquietava-se com a participação da família na e com a escola.

Page 102: PRÁTICAS COTIDIANAS EM UMA SALA DE INGLÊS: UM ESTUDO

101

Gadotti, Freire, Ciseski, Torres, Gutiérrez, Gerhardt, Romão, Padilha (1996, p.

96) destacam escritos do ano de 1957 em que Freire defende a constituição de

Círculos de Pais e Professores como uma forma de fortalecer a participação da

família e da comunidade no espaço escolar. Para Freire, a união da família-

comunidade–escola pode provocar mudanças de “hábitos antigos para hábitos

novos, isto é, hábitos de passividade em hábitos de participação”.

Pelo exposto, busco então responder se as práticas culturais da turma

acolhem a escuta do aluno, isto é, se o meu trabalho com os alunos está

afinado com a pedagogia culturalmente sensível. De certa forma, desejo usar

o que apreendi da minha prática, neste estudo, como “palco de criação de

reflexões teóricas”, isto é, ao invés de levar a teoria para a vida prática,

entendo, que teoria e prática não são coisas diferentes e que a teoria é

concebida dentro da prática (RAJAGOPALAN, 2011, p.1).

Nesse sentido, vejo que a minha prática, explora pouco os recursos

culturais e intelectuais – fundos de conhecimento – dos meus alunos. Não os

ignoro, mas ainda não os incorporo adequadamente ao meu fazer pedagógico.

Em relação ao ensino de língua, posso e devo avançar mais. Os alunos

precisam ser mais expostos a situações em que o uso de inglês seja

fundamentalmente necessário para eles. Para isso, o programa anual ainda

deve ser menor, isto é, ser mais selecionado para atender a quantidade real de

aulas e ser mais contínuo e progressivo. Ou seja, é preciso ir além dos

conteúdos básicos e oferecer aos alunos condições para que acreditem no

aprendizado, tornem-se donos dos seus saberes e aptos para se lançarem

com mais comprometimento e motivação em sua própria aprendizagem.

Em termos da seleção de atividades diárias (das aulas) percebi que não

devem ser estendidas por muitas aulas. É muito importante, dentro do contexto

da escola pública, isto é, cinquenta minutos de aulas semanal, que as

estratégias a serem utilizadas sejam planejadas dentro de um tempo menor, a

fim de que o aluno possa usar a língua e não deixar que ele perca o

entusiasmo do resultado (objetivo) a ser alcançado ao longo de inúmeras

aulas. É sempre bom lembrar que estamos num mundo dinâmico e tudo é

muito rápido.

O ensino da língua e a questão cultural é um outro ponto a ser refletido.

Apesar de trabalhar com temas do livro Upgrade 2 como We are what we eat,

Page 103: PRÁTICAS COTIDIANAS EM UMA SALA DE INGLÊS: UM ESTUDO

102

Being a volunteer, Great leaders of the world e Voices of Africa, que

possibilitam uma maior conscientização crítica e cultural do aprendiz, percebi

que explorei pouco a questão e que o tema ficou encaixado no conceito de

cultura com c minúsculo”, conforme cita Lima (2009, p. 182). Não foi ignorado,

mas ficou na periferia.

Ao refletir em como a minha prática favorece a escuta do aluno, inicio

com o questionário para diagnosticar o perfil dos alunos, com algumas

perguntas etnográficas que contribuíram para que eu pudesse fazer o

planejamento anual com base em temas mais pertinentes à turma pesquisada

e com a ida ao bairros que parece uma coisa banal e trivial, e por isso

mesmo, tão importante ao ponto de vista da etnografia, uma vez que me

permitiu conhecer um pouco das práticas culturais das comunidades nas quais

os alunos estão inseridos.

Considero que os padrões rotineiros construídos na minha sala de aula,

até então invisíveis, direcionam para aulas com uso da língua alvo, no caso o

inglês, e priorizam a oralidade. Diversos momentos apresentados na Seção 3.1

— Das práticas de sala de aula — mostram interações contextualizadas de

comunicação feitas em inglês. E muito do que se fala e/ou falou em inglês, vem

de um conhecimento que ultrapassa o que foi ensinado na escola. Um desses

momentos está marcado pela hipótese que o aluno Beto criou sobre a palavra

range ao tentar associá-la à série norte americana revenge e a associação da

palavra powerful com a palavra power range feita por Greg, na aula do dia

14/05/2013. Ambos os casos confirmam que o aluno faz uso dos seus recursos

cognitivos e culturais apreendidos fora da escola.

Apresentação de diálogos, de pesquisas, de pôsteres, leituras de

autobiografias e discussões sobre letras de música e vídeos realizadas ao

longo do ano, apesar de nem tudo ter sido inserido nesta pesquisa, mostram

que falamos e lemos mais do que escrevemos. Nessa perspectiva, observo

que estou em consonância com Pedroso (2010) sobre a sugestão de priorizar a

oralidade, sem esquecer-se da escrita, como um requisito da sociedade

contemporânea. Entretanto, não sou ingênua para dizer que os alunos já estão

inseridos no grupo que fala inglês. O que tenho feito é apenas o começo.

Pautada numa relação de diálogo, isto é, numa concepção freireana de

educação, em que o respeito à linguagem, cultura e história de vida dos alunos

Page 104: PRÁTICAS COTIDIANAS EM UMA SALA DE INGLÊS: UM ESTUDO

103

são fatores essenciais dentro da sala de aula, avalio as tomadas de turno e a

aceitação de tópicos como algo que acolhe a escuta dos alunos. Os episódios

9 e 15 da seção 3.1 — Das práticas de sala de aula — demonstram que a

interação, a relação face-a-face entre os alunos e eu tem sido construída com

base num “complexo e inacabado” processo de mão dupla.

De volta ao objetivo principal dessa pesquisa, o de conhecer as práticas

da minha sala de aula e examinar se o meu trabalho está afinado com a

pedagogia culturalmente sensível e inclusiva, reconheço que já dei alguns

passos importantes para que o meu aluno possa se apoderar do seu saber e

se inserir, de acordo com Schlatter e Garcez, (2009), como falante de inglês,

nas práticas sociais das quais quer participar. Sei que não estou pronta, estou

como Freire disse, em movimento, estou me fazendo. Afinal, ninguém nasce

feito, é experimentando-nos no mundo que nós nos fazemos.

Page 105: PRÁTICAS COTIDIANAS EM UMA SALA DE INGLÊS: UM ESTUDO

104

CONCLUSÃO

... o indispensável pensar certo não é presente dos deuses nem se acha nos guias de professores que iluminados intelectuais escrevem desde o centro do poder, mas, pelo contrário, o pensar certo que supera o ingênuo tem que ser produzido pelo próprio aprendiz em comunhão com o professor formador.

Paulo Freire (1996, p. 43)

Longe de apresentar soluções para o ensino de língua estrangeira nas

escolas públicas brasileiras, esta pesquisa almeja ser um diagnóstico inicial

que possibilite novos olhares, ou olhares mais atentos para a prática docente

no ensino de língua inglesa. Certa de que uma sala de aula nunca é igual a

outra, os resultados desta pesquisa podem, conforme Lima (2014, p. 3) em seu

parecer sobre este trabalho, ser generalizados para outros contextos, pois

segundo o autor, “o processo é de fundamental importância, mas o produto

pode servir de exemplo para incentivar professores da área e servir de exemplo

para eles”.

Inserida na área da Linguística Aplicada, a opção pela investigação

qualitativa de caráter interpretativo e etnográfico deveu-se a um interesse da

pesquisadora pela ação das pessoas dentro do microcontexto da sala de aula.

Uma vez que a rotina da sala de aula cria padrões do grupo que nela convive,

e a etnografia, retomando Fetterman (1998, p.11), “é a arte e ciência de

descrever um grupo ou cultura”, torna-se possível dizer que a escolha por esta

abordagem foi muito apropriada.

Mergulhada na minha própria sala de aula, tentei analisar o trabalho que

faço com meus alunos da turma do 2º EMIEP, a fim de conhecer as práticas

rotineiras do meu fazer pedagógico e os sentidos que nós – os alunos e eu –

damos aos eventos em que estamos envolvidos. Com a visão de que a sala de

aula é um microcontexto de encontros transculturais, marcados por diferenças

socioculturais, esta pesquisa foi construída com base em três questões: 1) O

que os atores (professora e alunos) fazem em sala de aula? 2) Como os atores

Page 106: PRÁTICAS COTIDIANAS EM UMA SALA DE INGLÊS: UM ESTUDO

105

(professora e alunos) atribuem sentidos aos eventos que acontecem em sala

de aula? 3) As práticas culturais da turma acolhem a escuta dos alunos?

Sob o conceito de fundos de conhecimento e do princípio de escuta do

aluno na educação freireana, discuti a importância que há em conhecer o aluno

e utilizar o que se sabe sobre ele, isto é, prestar atenção a ele e ouvir a sua voz

para que se possa promover o ensino-aprendizagem.

Pela interpretação das ações realizadas em sala de aula, Capítulo 3, foi

mostrado que, dentro da realidade que permeia a escola pública Azul, os

atores – professora e alunos – do 2º EMIEP se empenham para que haja

condições favoráveis ao ato de aprender e ensinar a língua inglesa. Refiro-me à

realidade da escola porque todos nós sabemos que o trabalho do professor

sofre influência do contexto em que ele atua. E a estrutura da escola

investigada, ao oferecer uma sala de aula específica para a disciplina e

disponibilizar diversos equipamentos, além de dois laboratórios de informática,

contribui, sem sombra de dúvida, para uma maior motivação dos envolvidos no

processo da educação.

Aliado às diferentes atividades levadas para sala de aula, à estrutura da

escola e à interação entre professora e alunos, o empenho em querer

desenvolver a oralidade em sala de aula é, segundo Pedroso (Comunicação

pessoal, na qualificação deste trabalho, em 10/06/2014), um fator inusitado.

Para esse pesquisador, é comum aos professores de língua estrangeira

sonegar a oralidade da língua alvo em favor da escrita. Em seu artigo A

realidade do currículo no ensino fundamental: as línguas estrangeiras, a

priorização da oralidade é tida, entre outros fatores, como uma das sugestões

para que se atenda aos anseios da sociedade contemporânea quanto ao

ensino significativo de língua estrangeira (PEDROSO, 2010, p.187).

Para mim, o que ficou evidente é que a luta para a melhoria no processo

de ensino e aprendizagem não pode ser somente individual, mas a vontade

pessoal, embora não sendo suficiente, é necessária à frente de qualquer ação.

Ao rever a análise dos dados referentes aos sentidos atribuídos pelos

atores desta pesquisa aos eventos cotidianos da sala de aula,

surpreendentemente, percebi que a emoção perpassa muitos dos momentos

do meu agir e acredito que esse fator leva os alunos a visualizarem as aulas

como algo “legal” e um espaço de mais liberdade, os colegas, como parceiros

Page 107: PRÁTICAS COTIDIANAS EM UMA SALA DE INGLÊS: UM ESTUDO

106

no ensino, membros de uma “turma unida”, e a mim (a professora), como

“mãe”. A personalidade forte, dita pelo diretor da escola, ratifica a presença da

emoção e, sem dúvida, a forma como se dão as relações da professora com os

alunos, deles com ela e deles entre si demonstra a cultura da boa vizinhança

que subjaz a minha sala de aula. Se esse é o melhor caminho, não se sabe.

Mas este é o que, neste momento, encontramos.

Entendo que esta pesquisa, como qualquer outra, apresenta limitações.

Afinal ser professora e ser pesquisadora é algo que requer experiência, tempo

e ousadia. Coragem não me falta, mas empreender os dois papéis ao mesmo

tempo é algo complicado, principalmente, quando a pesquisa é feita pela

primeira vez, como é o meu caso. Nem sempre sabia se preparava aula ou se

fazia transcrição de aula; se corrigia atividades dos alunos ou se organizava as

minhas anotações de campo. A falta de habilidade em lidar com o que é óbvio,

de enxergar o que é necessário e de perceber o que é pertinente para uma

pesquisa, certamente, é um aspecto que restringiu o olhar da pesquisadora

iniciante. Entretanto, mesmo com todos os atropelos de “marinheira de primeira

viagem”, aprendi muito com este estudo e percebi que é possível fazer

pesquisas no nosso dia-a-dia da sala de aula.

Avalio que esta pesquisa possa promover trocas de conhecimentos,

assim como possa servir de base para expansão e aperfeiçoamento dos

assuntos aqui tratados. Ler publicações sobre os trabalhos que são feitos em

sala de aulas e artigos que nos façam refletir sobre as práticas cotidianas de

outros colegas, apresentar os nossos fazeres de sala de aula em congressos e

dividir opiniões com colegas das áreas, como eu tenho feito com Arivan, são,

sem sombra de dúvida, atitudes que só nos fazem crescer e, portanto,

propostas que aqui ficam como sugestões.

Também espero que esta pesquisa possa transmitir a outros professores

a "síndrome do professor etnógrafo", para que eles passem a se preocupar

com o que seus alunos são motivados, como eles aprendem e com o que eles

já sabem. Além disso, e acima de tudo, desejo que ela possa servir de exemplo

para todos os que acreditam, assim como eu, nas emocionantes palavras de

Brecht: “nada deve parecer impossível de mudar”.

Page 108: PRÁTICAS COTIDIANAS EM UMA SALA DE INGLÊS: UM ESTUDO

107

BIBLIOGRAFIA

ANDERSON, J. R. et al. Transformative Dialogues. Teaching & Learning Journal. Bridgewater State University, v. 7, Issue 1, March, 2014. ANDRÉ, M. Pesquisa em educação: buscando rigor e qualidade. Cadernos de Pesquisa, São Paulo, n.113, p. 51- 64, Jul, 2001.

ARAÚJO, G. J. F.; CARVALHO, C. M. O ensino público e as políticas de acesso ao ensino superior brasileiro no governo Lula. Revista Espaço Acadêmico, n. 132, maio de 2012. Disponível em: <http://eduem.uem.br/ojs/index.php/EspacoAcademico/article/view/13943/911>. Acesso em: 11 Ago. 2013.

ARAGÃO, R. C. São as histórias que nos dizem mais: Emoção, reflexão e ação na sala de aula. 2007. 287f. Tese (Doutorado em Estudos Lingüísticos). Faculdade de Letras. Universidade Federal de Minas Gerais, Belo Horizonte, 2007.

ASSIS-PETERSON, A. A. Alguns apontamentos em torno da formação de professores de Língua Estrangeira. Contexturas – Ensino Crítico de Língua Inglesa, nº 4. São José do Rio Preto: APLIESP, 1998/1999, p. 43 -50 ASSIS-PETERSON, A. A. Redes de Conhecimento: Conectando lares e salas de aula em torno do ensino de línguas (um estudo sobre crenças, discursos, práticas e ideologias de línguas estrangeiras). Projeto de Pesquisa, Universidade Federal de Mato Grosso, Cuiabá, MT, 2008.

ASSIS-PETERSON, A. A.; COX. M. I. P. Standard English & World English: entre o siso e o riso. Calidoscópio, v. 11, n. 2, p. 153-166, mai/ago, 2013.

BLOMMAERT, J. Ethnographic fieldwork: a beginner’s guide. 2006. Disponível em: <https://www.jyu.fi/hum/laitokset/kielet/tutkimus/hankkeet/ paattyneet-hankkeet/fidipro/en/courses/fieldwork-text>. Acesso em: 26 abr. 2012.

BRASIL. Parâmetros Curriculares Nacionais para o Ensino Médio. Brasília: Ministério de Educação, Secretaria de Educação Básica, 2000. Disponível em: <portal.mec.gov.br/seb/arquivos/pdf/blegais.pdf>. Acesso em: 13 maio 2012.

BRASIL. Linguagens, códigos e suas tecnologias/Secretaria de Educação Básica. Brasília: Ministério da Educação, Secretaria de Educação Básica, 2006. 239 p. (Orientações curriculares para o ensino médio; volume 1) Disponível em: <portal.mec.gov.br/seb/arquivos/pdf/book_volume_01_internet.pdf>. Acesso em: 19 maio 2012.

Page 109: PRÁTICAS COTIDIANAS EM UMA SALA DE INGLÊS: UM ESTUDO

108

BRASIL. Senado Federal. Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional nº 9394/96. Brasília, 1996.

COX, M. I. P.; ASSIS-PETERSON, A. A. (Org.). Cenas de sala de aula. Campinas, SP: Mercado de Letras, 2001. (Coleção Ideias sobre Linguagem). COX, M. I. P.; ASSIS-PETERSON, A. A. O drama do ensino de inglês na escola pública brasileira. In: ASSIS-PETERSON, A. A. (Org.). Línguas estrangeiras: para além do método. São Carlos: Pedro & João Editores/ Cuiabá: EdUFMT, 2008, p.19-54.

DALACORTE, Maria C. F. A participação dos aprendizes na interação em sala de aula. In: MELLO, Heloisa A. B.; DALACORTE, Maria C. F. (Org.). A sala de aula de língua estrangeira. Goiânia: Ed. da UFG, 2000, p. 39-62.

DE FEO, Graziela Lionetti; STANGHERLIM, Roberta. Paulo freire e o tema “escola, família e comunidade” nas pesquisas em educação: levantamento de dissertações e teses do período de 2000. Disponível em <http://www.uninove.br/marketing/ix_coloquio/PDF/roberta_stangherlim.pdf>. Acesso: 15 jun. 2014. DIAS, M. H.; ASSIS-PETERSON. O inglês na escola pública: vozes de pais e alunos. Polifonia, Cuiabá, volume 12, n. 2, p. 107-128, 2006. DIXON, C. N.; Frank, C. R.; Green, J. L. Classroom as cultures: Toward understanding the constructed nature of life in classrooms. Primary Voices K-6, v. 7, n. 3, p. 4-8, 1999.

DUBOC, Ana Paula; FERRAZ, Daniel Mello. Letramentos Críticos e Formação de Professores de Inglês: Currículos e Perspectivas em Expansão. In: JORDÃO, C. M. (Org.). Letramentos e Multiletramentos no Ensino de Línguas e Literaturas. Dossiê Especial, revista X, vol.1, p. 19 – 32, 2011.

ECODESENVOLVIMENTO. Educação do Brasil foi a 3ª que mais avançou no mundo, diz pesquisa. São Paulo, 2012. Disponível em: <http://noticias.terra.com.br/educacao/educação-do-brasil-foi-a-3-que-mais-avancou-no-mundo-diz-pesquisa,5d5b42ba7d2da310VgnCLD200000bbcce b0aRCRD.html>. Acesso em: 09 ago. 2013.

ERICKSON, F. Prefácio. In: COX, M. I. P.; ASSIS-PETERSON, A. A. (Org.). Cenas da sala de aula. Campinas, SP: Mercado de Letras, 2001, p. 9-17.

FIGUEIREDO, Ricardo Carvalho. Diálogo entre saberes: a formação extra-curricular do professor de teatro. Disponível em: <http://www.portalabrace.org/vcongresso/textos/pedagogia/Ricardo%20Carvalho%20de%20Figueiredo%20%20DIALOGO%20ENTRE%20SABERES%20a%20formacao%20extra-curricular%20do%20professor%20de%20teatro.pdf>. Acesso em: 02 dez. 2013.

Page 110: PRÁTICAS COTIDIANAS EM UMA SALA DE INGLÊS: UM ESTUDO

109

FERRARI, M. Paulo Freire, o mentor da educação para a consciência. Nova

Escola, São Paulo, Editora Abril, julho, 2009, p. 110-112.

FERREIRA., A. de J.; KALVA, J. M. Ensino de inglês como língua franca e a identidade nacional: refletindo sobre a formação de professores. Revista Travessias, v. 5, n.1, p. 709-727, 2011. Disponível em: <http://www.academia.edu/830139/Ensino_de_ingles_como_lingua_franca_e_a_identidade_nacional_refletindo_sobre_a_formacao_de_professores>. Acesso em: 10 out. 2013. FETTERMAN, D. Ethnography step by step. 2nd edition. Newbury Park, CA: Sage, 1998.

FLICK, Uwe. Introdução à pesquisa qualitativa. Tradução de J. E. COSTA. 3 ed. Porto Alegre: Artmed, 2009. FLICK, Uwe. Introdução à metodologia de pesquisa: um guia para iniciantes. Tradução de M. LOPES. Revisão técnica de D. da SILVA. Porto Alegre: Penso, 2013. FORGIARINI, Solange A. B.; SILVA, João Carlos. Escola pública: fracasso escolar numa perspectiva histórica. Disponível em: <http://www.diadiaeducacao.pr.gov.br/portals/pde/arquivos/369-2.pdf>. Acesso em: 10 ago. 2013. FREIRE, Paulo, Sobre Educação (diálogos). Vol. 1 Rio de Janeiro: Paz e Terra,1982. ______. Paulo. Educação e Mudança. 13. ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1987. ______. Pedagogia da autonomia. 17 ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1987. ______. Pedagogia da autonomia: saberes necessários à pratica educativa. São Paulo: Paz e Terra. 1996. ______. Professora sim, tia não: cartas a quem ousa ensinar. São Paulo: Editora Olho d´Água. 1997. GABARDO, Tânia Lazier. Reflexões sobre as orientações dos textos oficiais para o ensino de línguas estrangeiras nas instituições de ensino de educação básica. In: 1º SIMPÓSIO DE REFLEXÕES SOBRE AS METODOLOGIAS E PRÁTICAS DE ENSINO DE LÍNGUAS ESTRANGEIRAS MODERNAS, 10, 2009 Curitiba-PR. Anais ... Curitiba: Eletras, vol. 19, n.19, dez., 2009. Disponível em <http://www.utp.edu.br/revista-eletronica-do-curso-de-letras/>. Acesso em : 10 ago. 2013.

Page 111: PRÁTICAS COTIDIANAS EM UMA SALA DE INGLÊS: UM ESTUDO

110

GADOTTI, M. (Org.). PAULO FREIRE: uma biobibliografia. São Paulo: Cortez editora. 1996. Disponível em: <http://seminariopaulofreire.pbworks.com/f/unid2_ativ4paulofreire_umabiobibliografia.pdf>. Acesso em 14 jun. 2014. GONZÁLEZ, N.; ANDRADE, R.; CIVIL, M.; MOLL, L. Funds of Distributed Knowledge. In: GONZÁLES, N.; MOLL, L. C.; AMANTI, C. (Eds.) Funds of Knowledge: theorizing practices in households, communities, and classrooms. New York: Routledge Taylor & Francis Group, 2009.

GREEN, J.L.; DIXON, C. Talking Knowledge into being: Discursive and social practices in classrooms. Linguistics and Education, 1993, 5 (3/4), p. 231-239.

HAMMEL, A. C.; BORGES, L. F. P. A Formação Humana e a Opção pelos Ciclos de Formação. In: IX ANPED SUL Seminário de Pesquisa em Educação da Região Sul, 2012, Oeste do Paraná. Disponível em <http://www.ucs.br/etc/ conferencias/index.php/anpedsul/9anpedsul/paper/viewFile/1661/525>. Acesso em: 12 jun. 2014. HAMMERSLEY, M. Ethnography: Principles in Practice. First edition, Nova York: Routledge: reprinted in 1990. HAMMERSLEY, M. Ethnography: Principles in Practice. Second edition. Nova York: Routledge: 1995.

INEP. Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira. Educação Básica ENEM: Certificação. Disponível em http://portal.inep.gov.br/ /web/enem/certificacao. Acesso em: 15 jul. 2013.

JORGE, Miriam. Preconceito contra o ensino de língua estrangeira na rede pública. In: LIMA, D. C. (Org.). Ensino Aprendizagem de língua inglesa: conversas com especialistas. São Paulo: Parábola Editorial, 2009, p.161-168. KADRI, Michele Salles El. Inglês como língua franca: um olhar sobre programas disciplinares de um curso de formação inicial de professores de inglês. Entretextos, Londrina, v.10, n.2, p.64-91, jul./dez., 2010. KEZEN, S. O ensino de língua estrangeira no Brasil, 2003. Disponível em:

<http://www.fdc.br/lingua_estrangeira.htm>. Acesso em: 05 ago. 2013. LEFFA, Vilson J. Metodologia do ensino de línguas. In: BOHN, H. I.; VANDRESEN, P. Tópicos em lingüística aplicada: O ensino de línguas estrangeiras. Florianópolis: Ed. da UFSC, 1988, p. 211-236. Disponível em: <http://www.leffa.pro.br/textos/trabalhos/Metodologia_ensino_linguas.pdf>. Acesso em: 05 set. 2013. LIMA, C. N. Língua inglesa: uma análise de sua aplicação na prática pedagógica. Acta Científica, 2009. Disponível em: <http://www.unasp-

Page 112: PRÁTICAS COTIDIANAS EM UMA SALA DE INGLÊS: UM ESTUDO

111

ec.com/revistas/index.php/actacientifica/article/view/310>. Acesso em: 26 out. 2013. LIMA, D. C. Quando o ideal supera as adversidades: um exemplo a (não) ser seguido. ______. (Org.). Inglês em escolas públicas não funciona? Uma questão, múltiplos olhares. São Paulo: Parábola Editorial, 2011. p.159-170. LIMA, F. S. Adolescentes, turma problema? Experiências em uma intervenção na escola pública. Pesquisas em Discurso Pedagógico, v. 2, 2012. Disponível em: http://www.maxwell.lambda.ele.pucrio.br/208/20885.PDFXXvmi=6IOCKB7G9Dn7INleCnKsQDgPdS8PwrzDbnfV0nC920gKODZq2JTSnbIB5RrCk1fvpvrpT5AV6RGUuFlwpgpNs9px2RbmTrTjXmKRrlOzduuJbQgC8HpCRQaTImhDOcXMzIF24tBi062cXjO72fJU6UPPi7s7jqUTaAWf5xz5FBiEV7MZnwTusJkLQOSbgN6ro3HtCgAiSSXP1KOoiITLrfwj5pvleCOEGv9iNJBHDzwEkm4D5ZoxeWRknoGC1uhH Acesso em 02 set 2013. LONGARY, E. A. Globalização, anti-imperialismo e o ensino de inglês na era pós-moderna. 2009. 247f. Tese (Doutorado em Estudos da Linguagem) – Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, 2009.

LYNCH, M. What Is Culturally Responsive Pedagogy? Disponível em: http://www.huffingtonpost.com/matthew-lynch-edd/culturally-responsive pedagogy_b_1147364.html. Aceso em: 12 jun. 2014.

MACIEL, R. F. Globalização, reformas educacionais e ensino de línguas: colaboração de pesquisa Brasil/Canadá. Disponível em: <http://www.revistas.unilasalle.edu.br/index.php/interfaces/article/view/559>. Acesso em: 15. nov. 2013. MACIEL, R. F.; ARAUJO, V. A. (Org.). Formação de Professores de Línguas: ampliando perspectivas. Jundiaí, Paco Editorial: 2011 MARTINEZ, Pierre. Didáticas de Línguas Estrangeiras. Tradução de M. MARCIONILO. São Paulo: Parábola Editorial, 2009. (Estratégias de Ensino, 15). MATTOS, A. M. A.; VALÉRIO, K. M. Letramento crítico e ensino comunicativo: lacunas e interseções. RBLA. Belo Horizonte, v. 10, n. 1, p. 135-158, 2010. MATO GROSSO/SEDUC. Superintendência de Educação Básica. Orientações Curriculares para a Educação Básica do Estado de Mato Grosso: Área de Linguagens. Cuiabá, 2010. 126 p. MELLO, Heloisa A. B. O que está por trás da ação do professor na sala de aula. In: MELLO, Heloisa A. B.; DALACORTE, Maria C. F. (Org.). A sala de aula de língua estrangeira. Goiânia: EFG, 2000. p. 11-37. MENEZES DE SOUZA, L. M. T. O Professor de inglês e os letramentos no século XXI: métodos ou ética? In: JORDÃO, C. M.; MARTINEZ, J. Z.; HALU,

Page 113: PRÁTICAS COTIDIANAS EM UMA SALA DE INGLÊS: UM ESTUDO

112

R. C. Formação Desformatada. Práticas com professores de língua inglesa. Campinas, SP: Pontes Editores, 2011. p. 279-303. (Coleção Novas Perspectivas em Linguística Aplicada, v. 15).

MICCOLI, Laura. O ensino na escola pública pode funcionar, desde que ... In: LIMA, D. C. (Org.). Inglês em escolas públicas não funciona? Uma questão, múltiplos olhares. São Paulo: Parábola Editorial, 2011. p.171-184. MONIZ, E. Nada É Impossível De Mudar. In: Antologia Poética de Bertolt Brecht - Uma Breve Biografia (1898-1956). Disponível em: <http: www.culturabrasil.org/brechtantologia.htm>. Acesso em: 19 jun. 2014. MONTE MOR, Walkyria. Orientações Curriculares para o Ensino Médio. OCEM. Língua Estrangeira. Entrevista. Parte I. Disponível em: <http://vimeo.com/25259253>. Acesso em: 20 jul 2013. ______. Orientações Curriculares para o Ensino Médio. OCEM. Língua Estrangeira. Entrevista. Parte II. Disponível em: <http://vimeo.com/25262616>. Acesso em: 20 jul 2013. MULIK, K. B. O ensino de língua estrangeira no contexto brasileiro: um passeio pela história. Crátilo: Revista de Estudos Linguísticos e Literários,

UNIPAM, 5(1), p. 14‐22, 2012.

NÓVOA, A. Matrizes Curriculares. Entrevista em 13 set. 2001. Disponível em <http://www.tvbrasil.org.br/saltoparaofuturo/entrevista.asp?cod_Entrevista=59>. Acesso em: 22 set. 2013. OLIVEIRA, Adelaide P. de. Era uma vez, um aluno que queria aprender inglês e tornar-se um professor. In: LIMA, D. C. (Org.). Inglês em escolas públicas não funciona? Uma questão, múltiplos olhares. São Paulo: Parábola Editorial, 2011. p. 67-78. OLIVEIRA e PAIVA, Vera Lucia. M. Ilusão, aquisição ou participação. In: LIMA, D.C. (Org.). Inglês em escolas públicas não funciona? Uma questão, múltiplos olhares. São Paulo: Parábola Editorial, 2011. p. 33-46.

OLIVEIRA. Roberval A. A Matrix da LE no Brasil: a legislação e a política do Fingimento. In: LIMA, D. C. (Org.). Inglês em escolas públicas não funciona? Uma questão, múltiplos olhares. São Paulo: Parábola Editorial, 2011. p. 79 - 92. OUGHTON, H. Funds of knowledge - a conceptual critique. Studies in the Education of Adults; Spring 2010, Vol. 42 Issue 1, p 63. Disponível em: <http://connection.ebscohost.com/c/articles/52250257/funds-knowledge-conceptual-critique>. Acesso em: 13 mai.2014. PAIVA,Thais Paiva; OLIVEIRA Tory. Nação monoglota. Revista Carta Capital. Disponivel em <http://www.cartacapital.com.br/educacao/nacao-monoglota>. Acesso em: 10 ago. 2013.

Page 114: PRÁTICAS COTIDIANAS EM UMA SALA DE INGLÊS: UM ESTUDO

113

PEDROSO, S. F. A realidade do currículo no ensino fundamental: as línguas estrangeiras. In: BARROS, S. M.; ASSIS-PETERSON, A. A. Formação crítica de professores de línguas: desejos e possibilidades. São Carlos: Pedro & João Editores, 2010, p. 185 -191. REES D. K.; MELLO, H. A. B. A investigação etnográfica na sala de aula de segunda língua/língua estrangeira. Cadernos do IL, Porto Alegre, n.º 42, p. 30-50, jun. 2011. REPRESENTAÇÃO DA UNESCO NO BRASIL. Educação para todos no Brasil. Disponível em: <http://www.unesco.org/new/pt/brasilia/education/education-for-all/>. Acesso em: 30 out. 2012. ROJO, Roxane. Letramentos Múltiplos. Escola e inclusão social. São Paulo: Parábola Editorial, 2009.

SANTOS, J. A.; OLIVEIRA, L. A. Ensino de Língua Estrangeira para jovens e adultos na escola pública. In: LIMA, D. C. (Org.). Ensino e Aprendizagem de Língua Inglesa: Conversas com Especialistas São Paulo: Parábola Editorial, 2009. p. 21-30. SCHLATTER, Margarete; GARCEZ, P. de M. Línguas adicionais na escola: aprendizagens colaborativas em inglês. Erechim: Edelbra,2012. SCHMITZ, John Robert. Diálogo com um professor de língua inglesa sobre a carreira docente e a escola pública. In: LIMA, D. C. (Org.). Inglês em escolas públicas não funciona? Uma questão, múltiplos olhares. São Paulo: Parábola Editorial, 2011. p.111-.119. SILVA, Maria A. C. M. B. A dimensão da aula de língua estrangeira. In: Contexturas. Ensino Crítico de Língua Inglesa, n. 7, 2003/2004. Publicação da APLIESP: Associação dos professores de língua inglesa do estado de São Paulo. PUC-SP, p.83-91. SIQUEIRA, Sávio. Diversidade, Ensino e Linguagem: que desafios e compromissos aguardam o profissional de letras contemporâneo? Revista Línguas & Letras, v. 13, n. 24, 1º sem, 2012, p. 35- 66. (Dossiê: Inclusão social e políticas sociais para minorias: o papel das pesquisas na área de Letras e Linguística). SPRADLEY, J. P. Participant Observation. New York: Holt, Rinehart and Winston, 1980. WOLCOTT, H. Transforming qualitative data: Description, analysis and interpretation. Thousand Oaks, CA: Sage, 1994. ZEICHNER, Kenneth. Formação de professores: contato direto com a realidade da escola. Entrevista. Transcrição e tradução de Carlos Alberto Gohn. Presença Pedagógica 6 n.34, jul./ago. 2000.

Page 115: PRÁTICAS COTIDIANAS EM UMA SALA DE INGLÊS: UM ESTUDO

114

ANEXOS

Page 116: PRÁTICAS COTIDIANAS EM UMA SALA DE INGLÊS: UM ESTUDO

115

ANEXO 1

TERMO DE CONSENTIMENTO INFORMADO Eu,

___________________________________________________________, RG _____________________, participante da turma 2º EMIEP da Escola Estadual Professor Nilo Póvoas, declaro, por meio deste termo, que concordo em participar da pesquisa científica intitulada FUNDOS DE CONHECIMENTO PARA UMA PROPOSTA DE ENSINO DE INGLÊS: O PROFESSOR ETNÓGRAFO, desenvolvida pela mestranda Maria de Fátima Comini da Silva, aluna do Programa de Pós-Graduação em Estudos de Linguagem, sob orientação da Professora Doutora Ana Antonia de Assis-Peterson, professora da Universidade Federal de Mato Grosso.

Declaro que fui informado/a que o objetivo da pesquisa é conhecer as práticas culturais dos alunos para intervir crítica e adequadamente nos planejamentos locais da professora-pesquisadora.

Declaro que fui igualmente informado/a de que minhas contribuições em salas e/ ou fora delas e textos escritos serão utilizados como dados para esta pesquisa e que serão divulgados apenas em contextos acadêmicos ( artigos científicos, palestras, seminários, trabalho de conclusão de cursos etc.). Todas as informações serão mantidas em caráter confidencial pelo uso de pseudônimos. Além disso, os dados não serão disponibilizados para outros propósitos que não se encaixem nos termos da pesquisa.

Declaro também que ao participar desta pesquisa não terei nenhum tipo de despesa , bem como nada será pago pela participação.

Fui ainda informado/a que tenho a liberdade de retirar meu consentimento a qualquer momento e deixar de participar do estudo sem penalizações.

Estou ciente de que, em caso de dúvida, poderei contatar a pesquisadora pelo telefone 9281-0991 e pelo endereço eletrônico [email protected] , e /ou a orientadora da pesquisa pelo endereço [email protected] para os esclarecimentos necessários e desejados.

Cuiabá, 04 de Outubro de 2012.

_____________________ _____________________ Aluno participante Responsável pelo aluno participante

_____________________ ___________________________ Professora pesquisadora Professora orientadora

Page 117: PRÁTICAS COTIDIANAS EM UMA SALA DE INGLÊS: UM ESTUDO

116

ANEXO 2 QUESTIONÁRIO DIAGNÓSTICO

Pesquisa: UFMT – Programa de Mestrado em Estudos de Linguagem

QUESTIONÁRIO

Caro estudante, Este questionário tem por objetivo obter algumas informações importantes a seu respeito. Agradeço antecipadamente sua colaboração. Os dados serão utilizados em minha Dissertação de Mestrado. Grata. - Dados pessoais Sexo ( ) F ( ) M Idade: ______ anos. - Cidade onde nasceu (Naturalidade): _____________________________________ Estado onde nasceu (UF)__________________País onde nasceu______________ - Cidade onde mora/vive ______________________ Há quanto tempo? ________ - Em que bairro ou região você mora na sua cidade? _____________________________________________________________ Se você nasceu em cidade diferente do local onde vive hoje, responda: - onde você morava antes?________________________________ - Quando se mudou para a cidade em que mora atualmente?_________________ - Por que você e sua família vieram morar nesta cidade?_____________________ ___________________________________________________________________ - Até você chegar à essa Escola (ensino médio), qual(is) escola(s) você frequentou? ____________________( )particular ( )municipal ( ) estadual ( ) federal ( ) ____________________( )particular ( )municipal ( ) estadual ( ) federal ( ) ____________________( )particular ( )municipal ( ) estadual ( ) federal ( ) ____________________( )particular ( )municipal ( ) estadual ( ) federal ( ) ____________________( )outras - A(s) escola(s) ficava(m) na zona rural ( ) ou na cidade/zona urbana ( )? - Quais cidades ? ______________________________________________ - A(s) escola(s) ficava(m) em bairro central ( ) ou na periferia ( )? - Você trabalha? Onde? O que faz nesse serviço? _______________________________________________________________________ FAMÍLIA: - Com quem você mora? - Em que seus pais trabalham? Pai _______________________________________________________________ Mãe_______________________________________________________________ Responsável________________________________________________________ - Quantos irmãos você têm?___________________________________________ - Eles estudam qual(is) séries?_________________________________________ -Seus pais ou responsáveis estudaram até que série/ano? ( ) não estudaram ( ) fundamental ( ) incompleto ( ) completo ( ) ensino médio ( ) incompleto ( ) completo ( ) 3º grau/superior ( ) incompleto ( ) completo

- Você e sua família gostam de festas/comemorações? ___________________________________________________________ - Como e quando sua família gosta de reunir?

Page 118: PRÁTICAS COTIDIANAS EM UMA SALA DE INGLÊS: UM ESTUDO

117

Pesquisa: UFMT – Programa de Mestrado em Estudos de Linguagem

ESCOLA ATUAL - Por que você escolheu essa escola para estudar? -Você gosta da língua inglesa? - Você acredita que a língua inglesa é importante para sua vida pessoal e profissional? De que forma/maneira? - O que você pensa sobre as aulas de língua inglesa da escola? - Você participa das aulas de língua inglesa? ( )Sim, porque_____________________________________________ ( )Não, porque_____________________________________________ - De que maneira você participa das aulas de língua inglesa? - Você utiliza a língua inglesa fora da sala de aula? Em que situação? - Você tem contato com outra língua estrangeira que não seja o inglês na sua vida? Em que situações? - Você utiliza a internet para fazer o quê? - Além da internet, quais são os meios de comunicação que você mais utiliza no seu dia a dia? - Você gostaria de ter mais conhecimentos sobre qual assunto?

Page 119: PRÁTICAS COTIDIANAS EM UMA SALA DE INGLÊS: UM ESTUDO

118

ANEXO 03

TEXTO 1:

CASINO AALBORG

Ved Straden, 14-16 Tlf. 98 10 15 50. Glæd dig til spændende og morsomme timer i

selskab med festligemennesker i en international atmosfære. Åben alle ugens dage

fra kl. 20.00 – 04.00. Entré DKK 50,00. Der er legitimationspligt i henhold til

dansk lov. Ingen adgang for unge under 18 år.

Leia o texto e responda:

1. Qual é o horário de atendimento do lugar?

2. Quanto custa o ingresso?

3. Qual é o telefone do estabelecimento?

4. Qual a idade mínima para frequentar o cassino?

Page 120: PRÁTICAS COTIDIANAS EM UMA SALA DE INGLÊS: UM ESTUDO

119

ANEXO 4

ATIVIDADES 1) Leia o texto abaixo:

2) Qual é o titulo do texto? Responda em português.

Page 121: PRÁTICAS COTIDIANAS EM UMA SALA DE INGLÊS: UM ESTUDO

120

3) How much memory does the Sapphire 300 MP3 Player have? 4) Dê um exemplo de palavras cognatas e um de anglicismo, se houver. 5) Que marcas tipográficas foram utilizadas nestes textos? 6) “The fastest and strongest available! Qual o sentido dos dois

sufixos?

ANEXO 4 Continuação do anterior 2) Observe os textos abaixo e responda ao que se pede.

Photo by Khue Bui – newsweek.com

Once a leftist firebrand, Brazil's president Luiz Inácio Lula da Silva turned to free-market liberalism and helped make his country Latin America's biggest economic success. Earlier this month he became the first Latin leader to visit President Barack Obama at the White House, and in April he'll head to London for the G20 summit on the global financial crisis. HE met with Newsweek's Fareed Zakaria in New York.

Fonte: Zakaria (2009, extraído da Internet).

Photo from kenkutaragi.com

On the eve of the Play-Station 3 launch, Ken Kutaragi, the head of Sony Computer Entertainment and the creator of all three generations of the hit game console, took time off to give a rare interview to Newsweek's Steven Levy, via phone from Tokyo.

Fonte: Levy (2006, extraído da Internet).

Photo from nytimes.com

In 2000, Dr. Eric Kandel, a Columbia professor and Howard Hughes Medical Institute senior investigator, earned a Nobel Prize for his work on learning and memory. But Kandel's early passion was psychoanalysis, and HE is a leading proponent of merging the long-divided fields of neuroscience and psychology. HIS book on the

topic, "In Search of Memory," hits bookstores this month. Kandel, 76, talked with Newsweek's Claudia Kalb.

Fonte: Kalb (2006, extraído da Internet).

1- Quais são os recursos tipográficos utilizados em cada texto 2- Dentre as imagens, qual delas permite-nos saber o autor da mesma? Por quê? 3- No texto 01 e 03 estão destacadas as palavras HE e HIS. O que elas significam e a que

estão relacionadas? 4- Observe os 3 textos e liste as palavras repetidas em cada um deles. 5- Utilizando Scanning, complete o quadro abaixo com informações retiradas dos textos:

Name Occupation Interviewed by

Professor

Luiz Inácio Lula da Silva

Steven Levy

3) Observe o excerto, abaixo, retirado de um dicionário bilíngüe:

book [buk] n. livro; (notebook) caderno; // vt. Reservar; ~ case n. estante para livros; ~seller n. livreiro; ~ store n. livraria

Page 122: PRÁTICAS COTIDIANAS EM UMA SALA DE INGLÊS: UM ESTUDO

121

Agora responda. Com base no seu conhecimento e no que vimos em sala, o que significa cada símbolo abaixo? [buk] – __________________________________

n // vt. – _________________________________

~ case - __________________________________

Page 123: PRÁTICAS COTIDIANAS EM UMA SALA DE INGLÊS: UM ESTUDO

122

ANEXO 05

EXERCÍCIOS AUDITIVOS

1) Listen and number the words. ( New English File 1, p. 5, track 1.8)

Goodbye. ( ) Bye. ( ) Goodnight ( ) See you ( ) See you on Saturday ( ) See you tomorrow ( )

2) Listen. Complete the receptionist’s questions. ( New English File 1, p. 8,

track 1.20) a) What’s your ___________ name? b) ___________ your surname? c) ___________ do you spell it? d) Where _________________? e) _____________ a ___________? f) ______________________ you? g) __________________ your address? h) ___________________ your postcode? i) ___________________ e-mail address? j) What’s your ____________________?

Tapescript do exercício 1: Tom: Ok, bye. Anna: Yes, goodbye. Tom: See you tomorrow. Anna: Not tomorrow, Saturday. Tom: Oh, yeah. See you on Saturday. Anna: See you. Tom: Goodnight.

Page 124: PRÁTICAS COTIDIANAS EM UMA SALA DE INGLÊS: UM ESTUDO

123

ANEXO 06

TEXTO 2:

How many Kisses?

You must remember this: you were going in for a double European-style greeting kiss with a friend who was expecting only a single cheek peck. It's an awkward question that constantly creates trouble for travelers: how many times should you pucker up? Here's a handy guide: One: A single buss is acceptable in the U.S., but it's mostly a big-city phenomenom. Women will give a brief hug, while men shake hands. In the Middle East, one kiss on the lips is a normal greeting, but not between men and women. Two: Double up in Spain, Austria, Sweden, Hungary and, more recently, in Britain. Three or more: Triple kisses will work in Egypt, Russia, Switzerland and the Netherlands. Business in Belgium? Three kisses are a sign of respect for those at least 10 years older than you. Pack your lip balm in France; many people still insist on four kisses. Keep your lips to yourself: Germans rarely greet with a kiss. In Chile, opt for an abrazo (a handshake / hug hybrid). Skip the kiss and bow or shake hands instead when visiting Japan, China and Korea. (Source: Time, March 15, 2004, p.63)

Vocabulary:

go in for (phrasal verb) - be interested in, participate in greeting - salutation peck - quick light kiss awkward - embarrasing, incovenient pucker up (phrasal verb)- get your lips ready to kiss handy - accessible, available buss (slang) - a friend kiss

http://www.solinguainglesa.com.br/conteudo/situacoes/sit_diarias1.php

Responda, com base no texto dado e em português, as questões abaixo. 1) Qual é o assunto/tema do texto? 2) Qual é a relação da imagem com o assunto do texto? 3) Com base nas novas tecnologias, que emoticon você usaria para ser

relacionado ao texto? 4) Quais são os países mencionados no terceiro parágrafo do texto? 5) Qual é a cultura da Suíça em relação ao tema do texto? 6) De acordo como texto, qual é a diferença entre a cultura da Espanha e a do

Japão? 7) Há no texto, alguma cultura semelhante à do Brasil? Qual? 8) O que significa a palavra abrazo para os chilenos? 9) De acordo com o comportamento de cada país, qual deles você achou mais

estranho? Por quê?

10)Há no Brasil uma palavra para representar a gíria buss?Qual?