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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO FACULDADE DE LETRAS PROGRAMA DE LETRAS NEOLATINAS ÁREA DE CONCENTRAÇÃO: ESTUDOS LINGÜÍSTICOS OPÇÃO: LÍNGUA ESPANHOLA ESTRATÉGIAS DE RAPPORT EM CONVERSAS COTIDIANAS ENTRE AMIGOS E FAMILIARES NO ESPANHOL DE BUENOS AIRES: uma perspectiva interacional Eliane Mattos de Souza Rio de Janeiro 2008

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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO

FACULDADE DE LETRAS

PROGRAMA DE LETRAS NEOLATINAS

ÁREA DE CONCENTRAÇÃO: ESTUDOS LINGÜÍSTICOS

OPÇÃO: LÍNGUA ESPANHOLA

ESTRATÉGIAS DE RAPPORT EM CONVERSAS COTIDIANAS ENTRE AMIGOS E FAMILIARES NO ESPANHOL DE BUENOS AIRES: uma

perspectiva interacional

Eliane Mattos de Souza

Rio de Janeiro 2008

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ESTRATÉGIAS DE RAPPORT EM CONVERSAS COTIDIANAS ENTRE AMIGOS E FAMILIARES NO ESPANHOL DE BUENOS

AIRES: uma perspectiva interacional

Eliane Mattos de Souza

Tese de Doutorado submetida ao Programa de Pós-Graduação em Letras Neolatinas da Universidade Federal do Rio de Janeiro, como parte dos requisitos necessários para a obtenção do Título de Doutor em Letras Neolatinas (Estudos Lingüísticos Neolatinos).

Orientador: Prof. Dr. Pierre François Georges Guisan Co-orientadora: Profª Drª Sonia Bittencourt Silveira

Rio de Janeiro Abril de 2008

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ESTRATÉGIAS DE RAPPORT EM CONVERSAS COTIDIANAS ENTRE AMIGOS E FAMILIARES NO ESPANHOL DE BUENOS AIRES: uma perspectiva interacional

Eliane Mattos de Souza Orientador: Prof. Dr. Pierre François Georges Guisan

Tese de Doutorado submetida ao Programa de Pós-Graduação em Letras Neolatinas da Universidade Federal do Rio de Janeiro – UFRJ, como parte dos requisitos necessários para a obtenção do título de Doutor em Letras Neolatinas (Estudos Lingüísticos Neolatinos).

Aprovada por: ________________________________________________ Presidente: Prof. Dr. Pierre François Georges Guisan, UFRJ ________________________________________________ Profª Drª Sonia Bittencourt Silveira (co-orientadora), UFJF ________________________________________________ Profª Drª Maria do Carmo Leite de Oliveira, PUC-RJ ________________________________________________ Profª Drª Claudia Nivia Roncarati de Souza, UFF ________________________________________________ Prof. Dr. José Carlos Gonçalves, UFF ________________________________________________ Profª Drª Maria Aurora Consuelo Alfaro Lagorio, UFRJ ________________________________________________ Profª Drª Annita Gullo, UFRJ (Suplente) ________________________________________________ Profª Drª Amitza Torres Vieira, UFJF (Suplente)

Rio de Janeiro Abril de 2008

4

À Cláudia Roncarati, que demonstrou ser

amiga no sentido pleno da palavra, me apoiando e

me incentivando nas horas em que pensei em

desistir, e sem a qual este humilde trabalho não

teria chegado a termo, por ser uma pessoa tão

especial.

À Camila, razão de viver, uma incentivadora

também, que cedeu tempo de convivência comigo

para a realização deste trabalho, demonstrando

desapego e amor.

5

AGRADECIMENTOS

Aos meus orientadores, pelo conhecimento que me foi passado e pela paciência

e perseverança que demonstraram para comigo.

Aos membros da banca do Exame de Qualificação, pelas valiosas sugestões.

Aos membros da banca da defesa, que muito gentilmente cederam seu tempo

para a leitura deste trabalho, meus sinceros agradecimentos (e, em especial, àqueles que

abriram mão de compromissos para estar hoje aqui).

A CAPES, cujo apoio financeiro foi fundamental para a realização deste

trabalho.

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RESUMO

O presente trabalho tem por objeto de análise o fenômeno denominado rapport,

focalizando as relações existentes entre esse conceito e os conceitos de polidez positiva

e envolvimento. Seu objetivo central é identificar e analisar o uso de estratégias de

rapport no gênero “conversa“ entre amigos e familiares, em um corpus oral da língua

espanhola, adotando para tal uma perspectiva interacional das trocas conversacionais

seqüencialmente situadas. A pesquisa possui uma abordagem de estudo de caso, de

natureza interpretativista e qualitativa, na qual foram utilizadas amostras de língua oral

da cidade de Buenos Aires, levantadas com base em gravações coletadas em uma

pesquisa coordenada pela Profª Drª Ana Maria Barrenechea, da Universidade de Buenos

Aires. O estudo do fenômeno do rapport em relações simétricas é complexo e abrange

outros conceitos a eles associados, como face, polidez positiva, envolvimento,

confiança, small talk e language play. Os resultados demonstram que certos atos, tais

como: não compartilhar as opiniões de seu interlocutor, manifestar falta de modéstia ou

parecer demasiadamente crítico são riscos decorrentes de manifestar a opinião própria

sobre alguém ou alguma coisa, e podem ser vistos como ameaçadores das relações

sociais. Entretanto, quando o nível de confiança existente entre os participantes é alto,

essas ameaças encontram-se neutralizadas. Conclui-se, também, que como

conseqüência dessas ameaças os participantes de nosso corpus orientam-se no sentido

da manutenção do rapport (harmonia) da relação, buscando o acordo interpessoal, a

participação cooperativa e o clima socio-emocional afiliativo quando expressam

opiniões.

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ABSTRACT

The present work is concerned with the phenomenon analysis called rapport, focusing

the relationship between this concept and the one of positive politeness and

involvement. The main focus is to identify and to analyze the use of strategies of

rapport in the activity type“conversation between friends and family”, in an oral corpus

of Spanish language, using an interactional approach focuses on speech-in-interaction

sequentially built by the participants. The research includes a case study, of qualitative

and interpretative nature, in which were used samples of the oral language of the city of

Buenos Aires. These samples were taken from conversations recorded in a research

program coordinated by the Profª Drª Ana Maria Barrenechea, from the University of

Buenos Aires. The study of the phenomenon of rapport in symmetric relationships is

complex and encompasses other concepts related to them as face, positive politeness,

involvement, trust, small talk and language play. The research results show that

disagreements or excessive criticism are risks arising from the act of presenting the own

opinion about someone or something and can be seen as threatening the social relations.

However, when the level of trust between the participants is high, such threats are

neutralized. Hence, it can be concluded that, as consequence of these potential threats,

the participants of the interactions analysed tend toward the maintenance of the rapport

(harmony) of the relation, seeking the interpersonal consent, the cooperative

participation , trying to preserve an affiliative emotional stance when they express their

opinions.

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SUMÁRIO

1. INTRODUÇÃO

2. NOÇÕES TEÓRICAS PERTINENTES: FACE, POLIDEZ, RAPPORT E

ENVOLVIMENTO – ENTRELAÇAMENTOS E ESPECIFICIDADES

2.1 A noção de face

2.1.1 Face e trabalho de face: Goffman

2.1.2 Face e trabalho de face: Brown e Levinson

2.2 A noção de polidez

2.2.1 Teoria da Polidez: Brown & Levinson

2.2.2 Modelo de Comunicação: Lim e Bowers

2.2.3 Sistemas de Polidez: Scollon e Scollon

2.2.4 Tipos de Polidez: Kerbrat-Orecchioni

2.3 A noção de rapport, de envolvimento e conceitos associados

2.3.1 Gerenciamento de rapport: Spencer-Oatey

2.3.2 Conceitos de rapport, de small talk e de language play

2.3.3 Conceitos de envolvimento, de script cultural e de confiança

2.4 Propostas de análise aplicadas a corpora em língua espanhola

2.4.1 Bravo (Universidade de Estocolmo)

2.4.2 Briz (Universidade de Valência)

2.4.3 Hernández-Flores (Escola Superior de Comércio de Copenhage)

2.4.4 Albelda (Universidade de Valência)

2.4.5 Boretti (Universidade Nacional de Rosário)

2.5 Síntese e discussão

2.5.1 Críticas à teoria da polidez de Brown e Levinson

2.5.2 Rapport como estratégia de envolvimento: um modelo teórico para análise

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3. METODOLOGIA

3.1 Critérios de constituição do corpus

3.2 Características da pesquisa: um estudo de caso

3.3 Proposta de modelo de análise do corpus

4. CONVERSA COTIDIANA ENTRE AMIGOS E FAMILIARES NA CIDADE

DE BUENOS AIRES: suas especificidades

4.1 Situando conversa entre amigos e familiares

4.2 Situando polidez positiva e rapport no contexto de nosso corpus

4.3 Situando o comportamento e o modo lingüístico do argentino

5. CONVERSA ENTRE AMIGOS E FAMILIARES: estratégias de envolvimento e

de rapport

5.1 Análise macro

5.1.1 Manutenção de rapport

5.1.2 Maximização de rapport

5.2 Uso das micro-estratégias de rapport

5.2.1 Micro estratégias destinadas à manutenção de rapport: gerenciamento / mitigação

de conflito

5.2.2 Micro estratégias destinadas à maximização de rapport: maximização / aumento

de acordo / compartilhamento

6. CONSIDERAÇÕES FINAIS

7. CONCLUSÃO

REFERÊNCIAS

ANEXOS

10

1. INTRODUÇÃO

Este trabalho, que se filia à linha de pesquisa “Processos Interculturais

Lingüísticos e Identitários”, tem como objeto de estudo o fenômeno denominado

rapport, focalizando as relações existentes entre esse conceito e os conceitos de polidez

positiva e envolvimento.

Nosso objetivo central é identificar e analisar o uso de estratégias de rapport no

gênero “conversa“ entre amigos e familiares, em um corpus oral da língua espanhola de

Buenos Aires, adotando para tal uma perspectiva interacional das trocas conversacionais

seqüencialmente situadas.

O conceito de rapport inclui uma ampla gama de estratégias (algumas das quais

têm sido apresentadas como de polidez positiva), que têm como objetivos a

aproximação e o envolvimento entre os participantes de um encontro social. Um dos

elementos constitutivos do envolvimento é, segundo Scollon e Scollon (1995),

demonstrar que o falante deseja sustentar uma visão de mundo partilhada com o

ouvinte. Já para Aston (1988, apud PLACENCIA, 2004), o rapport é uma forma de

estabelecimento e manutenção de relações amigáveis, sendo, por isso, um termo amplo

que abrange várias atividades: comunicação fática, cumprimentos, language play,

perguntas do tipo “como vai você?”, despedidas amigáveis, entre outras listadas como

estratégias de polidez positiva.

Na avaliação de Sacks (1992), a organização seqüencial da conversa envolve,

entre outras coisas, a sucessão de falantes, que se dá de forma sistemática e ordenada

através de um sistema de tomada de turnos. O sistema de tomada de turnos, nas

conversas, é organizado com base em relações simétricas entre os participantes, que,

teoricamente, têm os mesmos direitos de assumir os turnos de fala e de selecionar ou

recusar os tópicos. Assim, olhar para o modo pelo qual cada conversa se organiza

ilumina a forma pela qual as interações sociais são concebidas em uma dada

comunidade de fala. As regras que organizam os comportamentos, verbais e não-

verbais, emergem da orientação que os próprios participantes demonstram estar

assumindo (cf. DURANTI, 1996). Segundo Goffman (2002), um dos princípios

organizadores das trocas conversacionais é a preocupação com os desejos de face do

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self1 e do outro, condição necessária para a manutenção das interações sociais. As

“regras do grupo” e a “definição da situação“ são decisivas para a forma como a face e

as imagens do self são construídas e negociadas no curso da interação.

O estudo do fenômeno do rapport em relações simétricas é complexo e abrange

outros conceitos a eles associados, como face, polidez positiva, envolvimento,

confiança, small talk e language play2. A presente pesquisa vem suprir uma carência, no

sentido de as estratégias de rapport em relações simétricas terem sido ainda pouco

estudadas.

Apoiamos a discussão do conceito de rapport na concepção de face em Goffman

(1972), na Teoria da Polidez de Brown e Levinson (1978), na noção de atos lisonjeiros

para face (face flattering acts) de Kerbrat-Orecchioni (2000) e nas definições de

envolvimento em Tannen (1989) e Scollon e Scollon (1995).

Examinamos, ainda, na vertente espanhola, as categorias de autonomia e

afiliação propostas por Bravo (1999), as premissas ligadas a essas categorias, e os

resultados encontrados por Boretti (2003) em seus trabalhos com o espanhol de Rosário,

assim como com as estratégias de intensificação propostas por Albelda (2003), que

estende a proposta de Kerbrat-Orecchioni (op. cit.).

Considerando-se o entrelaçamento dos conceitos acima referidos – rapport,

polidez positiva e envolvimento – em nossa pesquisa, temos como objetivos discutir

e/ou responder às seguintes questões de natureza teórica e empírica:

(i) quais as relações de semelhança e diferença entre esses conceitos?

(ii) qual o papel do uso de estratégias de rapport na construção / negociação de relações

de amizade no corpus em análise?

1 A noção de self diz respeito à identidade pessoal do “eu” (self): é um conjunto de qualidades sem as quais o indivíduo não pode imaginar-se a si mesmo (noção psicológica); em termos de identidade social, o self é um conjunto relativamente estável de percepções sobre quem somos em relação a nós mesmos, aos outros e aos sistemas sociais. O self está organizado em torno de um conceito de si mesmo, isto é, das idéias e sentimentos que temos com relação a nós mesmos (porém sempre com respeito à relação que temos ou tivemos com os demais). 2 As noções de small talk (cf. KNAPP, 1978), comunicação fática, e de language play (cf. SHERZER, 1992), manipulação dos elementos de linguagem, serão detalhadas na seção 2.3.1.

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(iii) quais os principais recursos lingüísticos e discursivos usados no espanhol de

Buenos Aires para sinalizar rapport?

Algumas justificativas de ordem teórica e prática para o presente estudo

poderiam ser assim relacionadas:

• teóricas: contribuir para um melhor entendimento sobre as teorias de polidez e

rapport e, conseqüentemente, para o estudo da linguagem enquanto lugar de construção

/ negociação das relações interpessoais;

• práticas: o uso da linguagem em situações concretas e um melhor entendimento

dos recursos lingüísticos e discursivos que garantem uma comunicação não só eficaz do

ponto de vista da informação, mas bem sucedida em termos da manutenção e construção

das relações interpessoais, através de escolhas adequadas ao contexto de uso da

linguagem.

O presente trabalho segue a organização descrita a seguir.

No capítulo 1, especificamos o objeto de estudo e os objetivos pretendidos.

No capítulo 2, apresentamos os pressupostos teóricos pertinentes ao estudo do

rapport – noções de face, polidez, envolvimento, small talk e language play –,

discutimos os modelos aplicados a corpora em língua espanhola, examinamos os

modelos que criticam e/ou expandem a teoria de Brown e Levinson e, por último,

especificamos o modelo teórico adotado em nossa análise.

No capítulo 3, detalhamos os parâmetros metodológicos adequados a uma

perspectiva interacional de abordagem qualitativa de estudo de caso e definimos os

critérios de constituição do corpus “El habla culta de la cuidad de Buenos Aires –

materiales para su estúdio” (BARRENECHEA, 1987).

No capítulo 4, cotejamos as noções de polidez positiva e de rapport, com base

no corpus adotado, a partir das especificidades da conversa entre amigos e familiares no

contexto do comportamento e do modo lingüístico do argentino.

No capítulo 5, apresentamos a análise propriamente dita das estratégias de

rapport na conversa cotidiana entre amigos e familiares do espanhol de Buenos Aires.

O capítulo 6 é dedicado à discussão dos resultados e à síntese das conclusões

relevantes.

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2. NOÇÕES TEÓRICAS PERTINENTES: FACE, POLIDEZ, RAPPORT E ENVOLVIMENTO – ENTRELAÇAMENTOS E ESPECIFICIDADES

Neste capítulo, apresentamos, os pressupostos teóricos que nortearam nossa

análise à luz da perspectiva interacional. Nosso objetivo é buscar, nos entrelaçamentos

entre as noções de face, polidez positiva, rapport e envolvimento, direcionamentos

teórico-metodológicos que nos permitam examinar como os participantes constroem e

negociam seus alinhamentos no enquadre de uma conversa entre amigos e familiares

cujas relações interpessoais são potencialmente de natureza simétrica.

Inicialmente, cumpre esclarecer que, segundo Scollon e Scollon (1995),

conversas entre amigos e familiares regulam-se por um Sistema de Solidariedade, em

que há um alto grau de envolvimento, não havendo sentimentos de diferença de poder e

nem de distância entre os participantes da interação. As características deste sistema

podem ser assim configuradas: relação simétrica (-poder): os participantes se vêem

como estando na mesma posição social; relação estreita (-distância): os participantes

fazem uso de estratégias de envolvimento. Para eles, toda comunicação implica

envolvimento, expresso tanto através da assunção do ponto de vista do outro, quanto

através de um outro meio qualquer que demonstre que o falante deseja sustentar uma

visão de mundo partilhada.

2.1 A noção de face 2.1.1 Face e trabalho de face: Goffman

O ponto de partida para a maioria dos estudos atuais, no ocidente, sobre face e

trabalhos de face tem sido o trabalho pioneiro de Goffman, sociólogo de origem

canadense, acerca da natureza e forma de organização da interação social, em que face é

descrita como algo que pode ser perdido, mantido ou aumentado. Segundo Goffman

(1980 [1967]: 76-77), face é “o valor social positivo que uma pessoa realmente

reivindica para si, a partir da linha que os outros pressupõem que ela tenha adotado,

durante um contato particular”. Linha, por sua vez, corresponde ao padrão de atos

verbais e não-verbais que uma pessoa adota durante uma interação, expressando, assim,

a avaliação que faz da situação em que se encontra engajada, dos demais participantes e,

especialmente, de si mesma.

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Segundo Goffman (op.cit.), o conceito de face pode ser entendido como imagem

social. Para ele, face é “[...] o valor social positivo que uma pessoa efetivamente

reclama para si [...] em termos de atributos aprovados socialmente”. Este autor propõe o

conceito de face como imagem social porque, segundo ele, as pessoas estão

emocionalmente comprometidas com uma imagem de si mesmas que é aprovada pela

sociedade e que dá lugar a uma série de regras para o trato interpessoal e cujo

desconhecimento pode provocar conflitos na conversa. Ele também incorpora a noção

de território, ou melhor, “os territórios do eu”: territórios corporal, material, espacial,

temporal, cognitivo, etc.

Um outro pressuposto envolvido nas discussões sobre face é o de que, no curso

das interações sociais, as pessoas defendem suas faces e/ou os valores associados às

mesmas, como também as faces dos outros, através de trabalhos de face que são:

“as ações realizadas por uma pessoa para tornar o que quer que esteja

fazendo consistente com a face que está sendo reivindicada, num dado momento.

(Goffman, 1972, p.5).

Face é também definida como “uma imagem do self, delineada em termos de

atributos sociais aprovados (1980, p.76)”. Assim sendo, o termo face, para Goffman,

envolve tanto o significado denotado − semblante, aparência, aspecto externo – como o

sentido conotado de dignidade, auto-respeito, prestígio (i.e. valores afetivos e

sociocognitivos). Podemos verificar que o autor explora esse duplo sentido em sua

terminologia: ‘salvar a face’ (e.g. salvar as aparências); ‘perder a face’ (e.g. perder o

prestígio, desacreditar-se).

O conceito de face focaliza os seguintes aspectos:

(1) “valor social positivo que uma pessoa efetivamente reclama para si mesma através

daquilo que os outros presumem ser a linha por ela tomada durante um contato

específico” (op.cit., p.76-77)”;

(2) “uma imagem do self delineada em termos de atributos sociais aprovados” (op.cit.,

p.77);

(3) “algo que se localiza no fluxo de eventos que se desenrolam no encontro, e se torna

manifesto apenas quando estes eventos são lidos e interpretados em função das

avaliações que nele se expressam” (op.cit., p.78)

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Goffman (op.cit.) introduziu várias expressões relacionadas ao termo face, entre

as quais citamos as seguintes:

face social: “embora a face social de uma pessoa possa ser o que ela possui de mais pessoal, o centro de sua segurança e prazer, trata-se apenas de um empréstimo que lhe foi feito pela sociedade: poderá ser-lhe retirada caso não se comporte de modo a merecê-la” (p.80-81). manter a face: manter a face hoje implica ter adotado uma determinada linha coerente com a anterior (ex.: se a pessoa aceitou ser humilhada, os outros não terão consideração com seus sentimentos, no presente). estar na face errada: “uma pessoa está na face errada quando surge uma informação acerca de seu valor social que não pode ser integrada, mesmo com esforço, à face que está sendo sustentada” (p.79). estar na face errada / fora da face: produz sentimentos (justificados ou não) de vergonha, inferioridade, embaraço. A pessoa teme perder sua reputação e isso constitui uma ameaça à face e aos sentimentos ligados à mesma. A expressão “perder a face” significa estar fora da face, estar na face errada, estar envergonhado (perder o prestígio; desacreditar-se). estar em face / estar na face certa: produz confiança e segurança ou quando não está, mas os outros não deixam isto transparecer. salvar a face: refere-se ao processo pelo qual a pessoa sustenta para os outros a impressão de não ter perdido a face (salvar as aparências) trabalhos de face / elaboração da face: pretende designar “as ações através das quais uma pessoa é capaz de tornar qualquer coisa que esteja fazendo consistente com a face” (p.82)

Os tipos básicos de elaboração de face (trabalhos de face), segundo Goffman (op.cit.), são:

Processo de evitação: O modo mais seguro de se evitar ameaças à própria face é

evitar contatos nos quais exista a probabilidade de ocorrência de tais ameaças. Uma vez

que se tenha arriscado um encontro, como medida defensiva a pessoa pode manter-se

afastada de tópicos e atividades que poderiam levar à expressão de informações

inconsistentes com a linha seguida. Por outro lado, como manobra protetora, a pessoa

pode mostrar-se respeitosa e polida; empregar discrição; deixar de expor fatos que

poderiam, implícita ou explicitamente, contradizer e embaraçar as reivindicações

positivas feitas por outros; fazer ligeiras modificações nas exigências feitas aos outros e

na apreciação dos outros, etc.

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Processo corretivo: Os participantes tendem a dar à ameaça ocorrida o status de

incidente, para ratificá-la como uma ameaça que merece atenção oficial direta, e tentar

corrigir seus efeitos. A extensão e a intensidade do esforço corretivo são habilmente

adaptadas à persistência e intensidade da ameaça.

Um encontro pode tornar-se não uma cena de consideração mútua das faces, mas

uma arena na qual se desenrola um concurso ou uma competição. Objetivo: marcar o

maior número possível de pontos contra o adversário e fazer o maior número de pontos

para si mesmo (e.g. introduzir fatos lisonjeiros sobre si mesmo e fatos desfavoráveis

sobre os outros, dar alfinetadas, fazer afrontas, etc.) Em suma, estamos diante de

intercâmbios agressivos: o vencedor demonstra que, como interagente, consegue lidar

consigo mesmo melhor que seus adversários. É o que Goffman chamou de “fazer

pontos”, isto é, é o uso agressivo da elaboração facial.

Para Goffman, é fundamental a escolha da elaboração de face apropriada.

Quando ocorre um incidente, a pessoa cuja face é ameaçada pode tentar restabelecer a

ordem ritual através de um tipo de estratégia, enquanto os outros participantes podem

estar desejando ou esperando o emprego de uma prática de tipo diferente. Portanto,

quando alguém comete uma gafe, todos podem ficar embaraçados, não por uma

inabilidade em lidar com tais dificuldades, mas porque, por um momento, ninguém sabe

se o ofensor vai deixar passar o incidente, dar-lhe um reconhecimento jocoso ou

empregar alguma outra prática salvadora da face.

Sempre que há uma ameaça à face, uma elaboração deve ser feita. Como cada

participante em uma situação de interação está preocupado em salvar a própria face e a

face dos outros, embora por razões diferentes, produzir-se-á naturalmente uma

cooperação tácita, de tal forma que os participantes, em conjunto, possam atingir seus

objetivos comuns, apesar de diferentemente motivados.

Quando uma pessoa é responsável pela introdução de uma ameaça à face de

outrem, ela aparentemente tem o direito, dentro de certos limites, de esquivar-se da

dificuldade através da auto-degradação. Portanto, em termos do código ritual, a pessoa

parece ter uma permissão especial para aceitar maus-tratos de si própria, porém não

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pode aceitá-los caso venham de outrem. Além disso, dentro de certos limites, a pessoa

tem o direito de perdoar afrontas de outros participantes à sua imagem sagrada. Pode,

indulgentemente, deixar passar ofensas sem importância à sua face, e, quando se trata de

danos maiores, é ela a pessoa que está em posição de aceitar desculpas em nome de seu

self sagrado. É o que Goffman denominou de “os papéis rituais do self”. Em suma, os

direitos e deveres de um interagente são planejados para impedi-lo de abusar de seu

papel como objeto de valor sagrado.

Em qualquer sociedade, sempre que surge a possibilidade física de uma interação

falada, um sistema de práticas, convenções e regras de procedimento, que funciona

como um meio de guiar e organizar o fluxo de mensagens, parece entrar em jogo. Uma

compreensão acerca de quando e onde será permissível iniciar a conversa, entre quem, e

através de que tópicos, prevalecerá. Estas regras de fala pertencem, não à

interação falada enquanto processo contínuo, mas a uma ocasião de fala ou episódio de

interação como uma unidade naturalmente de marcada.

As convenções relacionadas à estrutura das ocasiões de fala representam uma

solução efetiva para o problema da organização de um fluxo de mensagens faladas. Ao

se tentar descobrir como tais convenções são mantidas com tal vigor como guias para a

ação, encontram-se indícios que sugerem uma relação funcional entre a estrutura do self

e a estrutura da interação falada.

Essa interação entre o self e a interação falada se revela mais claramente quando

se examina o intercâmbio ritual. Num encontro em que há conversa, a interação tende a

desenvolver-se em jorros, um intercâmbio de cada vez, e o fluxo de informação e

negócios é parcelado em termos dessas unidades rituais relativamente fechadas.

Quando uma pessoa começa um encontro mediado ou imediato, já existe algum

tipo de relação social entre ela e os outros interessados, assim como uma expectativa de

sua parte quanto à relação que manterá com estes após o término do encontro. Esta é

uma das formas pelas quais contatos sociais se inserem na sociedade mais ampla.

O fato de que cada um dos membros garanta seu apoio a uma dada face para os

outros membros em uma dada situação parece ser uma obrigação característica de

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muitas relações sociais. Portanto, para impedir o rompimento de tais relações, é

necessário que cada membro evite destruir a face dos outros. Uma relação social, então,

pode ser vista como um modo pelo qual a pessoa é forçada a confiar sua auto-imagem e

sua face ao tato e à boa conduta de outros.

Deve-se observar o fato de que qualquer sociedade, enquanto sociedade, deve

mobilizar seus membros como participantes auto-reguladores em encontros sociais. O

ritual é uma forma através da qual se pode mobilizar o indivíduo para este propósito.

2.1.2 Face e trabalho de face: Brown e Levinson

Com relação ao conceito de face, esta também é definida pelos autores (1978)

como a imagem social ou pública do self que todos querem reivindicar para si mesmos,

e que é constituída de dois aspectos relacionados.

Esses aspectos consistiriam de dois desejos básicos, que seriam:

(1) o desejo de não sofrer imposições, de ter liberdade de ação (não ser cerceado ou

impedido em suas ações), de reivindicar territorialidade, de preservação pessoal ou

privacidade, denominado de face negativa;

(2) o desejo de que a imagem do self seja aprovada e apreciada pelos interlocutores,

que os demais compartilhem e aprovem pelo menos algumas manifestações de sua

personalidade (forma de pensar, de agir, etc.), denominado de face positiva.

Os autores partem do pressuposto de que os atos de fala são ameaças potenciais

aos desejos de face e definem estratégias de polidez como aquelas utilizadas para

mitigar o grau de ameaça potencial existente nos atos de fala. Portanto, segundo esses

autores, todo ato de fala seria potencialmente ameaçador à face (face threatening acts,

FTAs) ou imagem social do falante e/ou do ouvinte.

A partir desse pressuposto, Brown e Levinson propõem um modelo de

estratégias de polidez (politeness strategies), que têm como objetivo atenuar o efeito

social negativo de atos que supõem a possibilidade de uma ameaça às faces de falantes e

ouvintes. Essas estratégias de polidez constituem trabalhos de face (face work), que são

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comportamentos realizados com o propósito atenuar ou evitar os efeitos dos atos de

ameaça à face.

Exemplos de ameaça à face negativa do interlocutor seriam pedidos ou ordens,

pois eles limitariam o direito da pessoa de decidir sobre suas próprias ações. O

adequado, para evitar-se o conflito, seria escolher um modo indireto ou atenuado de

formular o pedido (ou a ordem), que levasse em consideração a vontade do interpelado.

Ex.: (1) Me passe esse livro. (2) Me passe esse livro, por favor?

(3) Você poderia me passar esse livro, por favor?

(4) Será que você poderia me passar esse livro, por favor? Nos exemplos acima, o (1) ameaça a face negativa do interlocutor; já os

exemplos (2 - 4) possuem diferentes graus de atenuação para minimizar esse efeito de

ameaça.

Outros aspectos que devem ser levados em conta são os prosódicos, como a

entonação. Um mesmo enunciado, como (1), pode, conforme a entonação dada pelo

falante, ameaçar ou não a face do interlocutor.

Também as variáveis sociológicas (por exemplo, a distância social existente

entre os falantes) são fundamentais. O enunciado (1) pode não soar ameaçador à face, se

os falantes possuírem um alto grau de envolvimento e/ou intimidade.

No caso de ataques à face positiva, seria apropriado minimizar uma expressão de

desacordo ou de desaprovação para não frustrar os desejos de aprovação do interlocutor.

Ex.: (5) Na minha opinião, isso não procede. (6) Se não me engano, não foi isso que ele falou. (7) Eu acho que não é bem assim. (8) Dizem que foi isso o que aconteceu. (9) Parece que eles brigaram. Vamos analisar os exemplos acima segundo a terminologia adotada por Rosa

(1992). Os exemplos (5-6) lançam mão de marcadores de rejeição (disclaimers),

pequenos prefácios que costumam preceder possíveis atos ameaçadores da face, como

críticas, proibições, ordens (se não me engano, não me leve a mal, a meu ver, na minha

opinião, etc.). Esses marcadores preservam a face do enunciador, restringindo a gama

de respostas que possam gerar algum tipo de conflito entre os participantes de uma

interação. Também preservam a face do interlocutor, afastando, de antemão,

interpretações danosas à interação.

20

O exemplo (7) faz uso de um marcador de evasão (hedge), que introduz um

grau de incerteza ou imprecisão. Há evasivos de dois tipos: (1) indicadores de atividade

cognitiva = atenuação da impositividade (assim, quer dizer, sei lá, não sei, etc) e (2)

indicadores de incerteza = diminuição do comprometimento para com o que foi

enunciado (acho que, não sei, etc).

Os exemplos (8 – 9) lançam mão de marcadores de distanciamento, que

sinalizam lingüisticamente o afastamento do enunciador da situação de comunicação,

deslocando a responsabilidade, através de marcas lingüísticas de impessoalidade (

parece que, parece, é possível que, etc) e indeterminação do sujeito do enunciado (diz

que, dizem que, diz-se, segundo fulano, etc.).

Os procedimentos de atenuação contribuem para preservar a face na interação e

podem ser de natureza não-verbal (um sorriso), de natureza prosódica (entonação,

altura) ou de natureza verbal (palavras ou expressões atenuadoras).

Uma advertência, contudo, deve ser feita. Dizer que os elementos atenuadores

são procedimentos de preservação da face pode levar a uma confusão entre as noções de

polidez e de atenuação, que não são fenômenos equivalentes. Fraser (1980) considera

que o abrandamento ou atenuação implica polidez, mas não o inverso. O fenômeno da

polidez é mais amplo do que a atenuação e pode prescindir de procedimentos

atenuadores (por exemplo, um cumprimento é um ato de polidez, porém não é um

procedimento atenuador), além de ser possível a realização da polidez mediante

procedimentos de intensificação, como veremos mais adiante.

21

2. 2 A noção de polidez 2.2.1 Teoria da Polidez de Brown e Levinson A Teoria da Polidez de Brown e Levinson (1978) é uma extensão do conceito

de face e de elaboração da face de Goffman. Essa teoria propõe a existência de dois

princípios que governariam o uso da linguagem, a cooperação e a polidez. A

cooperação é definida como eficiência comunicativa e a polidez, como a expressão das

relações sociais.

A Teoria da Polidez adota como ponto de partida um “modelo de pessoa” (um

falante adulto de uma língua natural, fluente) dotado de duas propriedades:

racionalidade (modo de raciocínio) e face. O princípio da racionalidade consiste na

habilidade desse indivíduo modelar de escolher estratégias lingüísticas para atingir

determinados fins comunicativos. As escolhas feitas por um modelo de pessoa

(doravante, MP), para lidar com o desejo de ser eficiente comunicativamente e com os

desejos de face do self e do outro fornecem um modelo de descrição do estilo de

interação verbal.

Os pressupostos que fundamentam essa teoria podem ser assim resumidos: 1) Todos os MPs (falantes e ouvintes) têm face positiva e face negativa e todos os

MPs são agentes racionais, isto é, escolhem meios que irão satisfazer seus fins. 2) Dado que face consiste em um conjunto de desejos satisfeitos apenas por ações

(incluindo expressões de desejos) dos outros, é geralmente de interesse mútuo dos dois MPs manter a face um do outro, a não ser que o falante faça com que, via coerção, ameaça, etc., o ouvinte mantenha a sua face sem ter que recompensá-lo.

3) Alguns atos são intrinsecamente ameaçadores à face (AAFs: atos de ameaça a face).

4) A não ser que o falante queira fazer um AAF com máxima eficiência, (‘na bucha’, diretamente, bold on record), é desejável que o falante preserve a face do ouvinte (ou a sua própria) em algum grau, assim o falante desejará minimizar a ameaça à face do ato de fala.

5) Quanto mais um ato for ameaçador à face do falante e/ou do ouvinte, mais o falante deverá escolher uma estratégia destinada a minimizar o risco de ameaça às faces envolvidas.

Brown e Levinson (op. cit.) propõem a seguinte classificação para os atos de

ameaça à face, levando em consideração o tipo de face (positiva ou negativa) e o alvo

da ameaça (falante e/ou ouvinte):

22

A) Atos que ameaçam a face negativa (FN) do ouvinte: 1) atos que predizem alguma ação futura do ouvinte, gerando algum tipo de pressão

sobre o mesmo (ordem, pedido, sugestão, ameaça, advertência); 2) atos que prevêem alguma ação futura do falante, criando algum tipo de pressão

sobre o ouvinte (oferecimento, promessas); 3) atos que indicam o desejo do falante em relação ao ouvinte (cumprimentos,

elogios). B) Atos que ameaçam a face positiva (FP) do ouvinte (o falante não se importa com os desejos do ouvinte): 1) mostram que o falante tem uma avaliação negativa de alguns aspectos da FP do

ouvinte: expressar desacordo, críticas, ridicularização, insulto, questionamentos, etc.;

2) mostram que o falante não valoriza, nem teme o que o ouvinte teme: ser irreverente; falar de tabus ou coisas impróprias ao contexto; contar coisas desagradáveis sobre o ouvinte e agradáveis de si mesmo; demonstrar não-cooperação; interromper a fala do outro; não prestar atenção e marcar diferença de status através de termos de endereçamento.

C) Atos que ameaçam a face do falante e do ouvinte: 1) atos que ameaçam a face negativa do falante e do ouvinte: expressar

agradecimentos; aceitar agradecimentos / pedidos de desculpas, obrigando a minimizar transgressão do ouvinte; desculpar após um ato criticado pelo ouvinte; aceitar oferecimentos (o falante fica em débito); responder a um faux

pas (gafe) do ouvinte; promessas e oferecimentos (o falante promete, mas não quer / pode cumprir).

2) atos que ameaçam a face positiva do falante: pedir desculpas; aceitar elogios;

auto-humilhar-se; confundir-se; acovardar-se; agir como um idiota; confessar-se e admitir culpa.

As estratégias de polidez positiva, que estão direcionadas aos desejos de face

positiva do ouvinte, têm como função “azeitar” as relações sociais. Brown e Levinson

dividem as estratégias de polidez positiva em três grandes mecanismos, que se

desmembram dando origem a um conjunto de quinze estratégias:

1º) Reivindicar base comum: Estratégia 1: tomar conhecimento, atender ao ouvinte (seus desejos, interesses, necessidades, bens); Estratégia 2: exagerar (interesse, aprovação, solidariedade com o ouvinte); Estratégia 3: intensificar interesse pelo ouvinte; Estratégia 4: utilizar marcadores de identidade do grupo, por exemplo, apelidos, formas de tratamento;

23

Estratégia 5: procurar acordo; Estratégia 6: evitar desacordo; Estratégia 7: pressupor, levantar, garantir base comum, por exemplo, falar “abobrinhas”, boatos ou assuntos que interessam ao falante e ao ouvinte antes de chegar ao “ponto”; Estratégia 8: fazer piadas para reparar um FTA. 2º) Informar que falante e ouvinte são cooperativos: Estratégia 9: garantir ou pressupor o conhecimento e interesses do falante pelos desejos do ouvinte e não potencialmente pressionar o ouvinte a cooperar com o falante ; Estratégia 10: oferecer, prometer (o que quer que o ouvinte deseje, o falante deseja por ele e o ajudará a obtê-lo); Estratégia 11: ser otimista, isto é, o falante assume que o ouvinte deseja os desejos do falante (interesse partilhado); Estratégia 12: incluir tanto o falante quanto o ouvinte na atividade, por exemplo, o uso de “nós” inclusivo; Estratégia 13: dar ou pedir razões, explicações, incluindo o uso de sugestões indiretas; Estratégia 14: supor ou garantir reciprocidade (direitos ou obrigações recíprocas). 3º) Atender aos desejos do outro: Estratégia 15: dar presentes para o ouvinte (bens, solidariedade, compreensão, cooperação, etc.), com a função de demonstrar que o ouvinte é: amado, admirado, compreendido, escutado, etc.

Brown e Levinson também propõem um total de dez estratégias de polidez

negativa, cuja função seria amenizar a imposição particular de um Ato de Ameaça à

Face (AAF). São elas: ser convencionalmente indireto; perguntar em vez de afirmar, ser

evasivo; ser pessimista; minimizar a imposição; fazer deferência; desculpar-se;

impessoalizar falante e ouvinte; apresentar um AAF como regra geral; usar estratégias

de nominalização; incorrer em débito com o ouvinte ou fazê-lo, não criando um débito

para o ouvinte.

Nas seções a seguir, apresentamos alguns outros modelos que têm como ponto

de partida a Teoria da Polidez de Brown e Levinson, porém a ela fazem críticas ou

propõem reformulações.

2.2.2 Modelo de Comunicação de Lim e Bowers Lim e Bowers criticam o fato de Brown e Levinson (op.cit) darem atenção

excessiva aos atos que ameaçam a face negativa (para eles face da autonomia),

negligenciando os trabalhos de face direcionados aos desejos de face positiva.

24

Diferentemente de Brown & Levinson (op.cit), esses autores defendem que as

estratégias de polidez positiva são dirigidas a dois desejos humanos distintos: o de ser

incluído e aceito pelos outros (polidez positiva para de Brown & Levinson) e o desejo

de ter suas habilidades respeitadas. O desejo de inclusão corresponderia, segundo eles,

à face da camaradagem, segundo a qual os participantes querem ser considerados

membros de um grupo, envolvendo os desejos de aceitação e pertencimento. Ao

reivindicarem a face da camaradagem, os participantes reivindicam valores associados à

amizade e cooperação. O segundo, o desejo de aprovação, corresponderia, à face da

competência e à necessidade de todo ser humano de ter suas habilidades reconhecidas e

suas ações respeitadas.

Propõem com isso um novo modelo de trabalhos de face, com três tipos de

desejos de face: o de inclusão, o de aprovação e o de estar livre de imposições ou

controle por parte de terceiros. A cada um desses desejos de face, corresponde um tipo

diferente de trabalho de face: estratégias de solidariedade, ligadas à face da

camaradagem; estratégias de aprovação, ligadas à face da competência e estratégias de

tato, associadas à face da autonomia.

Os autores apresentam, ainda, três fatores sociais como determinantes na escolha

dos trabalhos de face: a intimidade relacional, a diferença de poder e o direito de

realizar determinado ato.

A intimidade relacional entre os participantes da interação é o fator que mais

influencia a escolha dos trabalhos de face adotados. Quanto mais próxima for a relação

entre os interlocutores, mais eles sentir-se-ão obrigados a cooperar mutuamente, e

tornar-se-ão mais dispostos à tolerância de imposições e críticas. Sendo assim, o esforço

para minimizar uma ameaça à face do outro diminui à medida que a intimidade

aumenta. Porém, quando ocorrerem casos de ameaças à face que superem os limites

tolerados, essa dinâmica mudará e os interlocutores reagirão tão ou mais negativamente,

caso a relação entre eles não seja de proximidade.

O segundo fator social apontado pelos autores é a diferença de poder. Ele

influencia as escolhas dos trabalhos de face em uma medida menor do que a intimidade

relacional (devido à ideologia do igualitarismo que rege a maioria das sociedades), mas

também é uma influência forte nessas escolhas. À medida que o poder de um

25

interlocutor sobre o outro aumenta, ocorre, na mesma proporção, uma diminuição nos

índices de solidariedade, aprovação e tato, mas somente entre pessoas com baixo grau

de intimidade.

O terceiro e último fator social é o direito de realizar um ato. A legitimidade da

ação influencia os trabalhos de face, uma vez que os interlocutores, à medida que seu

direito de imposição e/ou desaprovação diminuem, tendem a utilizar níveis mais

elevados de tato e/ou aprovação.

2.2.3 Sistemas de polidez de Scollon e Scollon Scollon e Scollon (1995) definem e classificam três Sistemas de Polidez ou de

Face: Sistema de Deferência, Sistema de Solidariedade e Sistema Hierárquico. Tais

sistemas fazem uso de Estratégias de Polidez, que podem ser de dois tipos: de

envolvimento e de independência.

Na interação, além dos aspectos implicados na participação dos interlocutores

(em termos de quem são eles e de que papéis assumem), há um importante aspecto de

identidade tido como um elemento essencial à “participação”, ou seja, a identidade

interpessoal dos indivíduos envolvidos na interação. Este componente, segundo Scollon

e Scollon (op. cit.), tem sido referido como “face”. Face, portanto, segundo eles, é um

conceito paradoxal por implicar dois lados que estão em oposição: (a) a necessidade

humana de manter / expressar algum grau de independência em relação ao outro

participante e (b) a necessidade humana de estar envolvido com os outros participantes

e mostrar-lhes este envolvimento.

Segundo Scollon e Scollon, as estratégias utilizadas para mostrar independência

enfatizam a individualidade dos participantes, seu direito a não serem completamente

dominados seja por valores sociais, seja por valores do grupo, sendo expresso o desejo

de que a pessoa quer agir com algum grau de autonomia / liberdade de movimentos ou

de escolha. Para esses autores toda comunicação implica envolvimento e eles afirmam

que envolvimento pode ser manifestado ao assumir-se o ponto de vista do outro, ou

através de qualquer meio de demonstrar que o falante deseja sustentar uma visão de

mundo partilhada.

26

Por outro lado, os participantes devem partilhar alguns aspectos dos sistemas

simbólicos para que possam se intercomunicar. A necessidade de enfatizar

independência, porém, põe em risco o envolvimento e vice-versa, o que gera um

conflito. Destacam-se dez estratégias de envolvimento, que são aquelas utilizadas pelos

participantes de nosso corpus. São elas:

1) notar o ouvinte, atendê-lo:

“Gostei de sua jaqueta”; “Você está se sentindo melhor agora?” 2) exagerar interesse, aprovação ou simpatia pelo outro:

“Por favor, seja cuidadoso com os degraus, eles são muito escorregadios” 3) reivindicar pertencer ao mesmo grupo do ouvinte: “Todos nós aqui da PUC”. 4) reivindicar ponto de vista comum, opiniões, atitudes, conhecimento, empatia: “Eu sei como você se sente. Tive um resfriado destes a semana passada”

5) ser otimista: “Acho que vamos acabar este trabalho bem rápido.”

6) indicar que o falante conhece e leva em consideração os desejos do outro: “Tenho certeza que todos vocês querem saber quando esta reunião vai acabar.”

7) assumir ou afirmar reciprocidade: “Eu sei que você quer se dar bem nas vendas, tanto quanto eu quero que isto

ocorra.”

8) usar o primeiro nome ou apelido: “Bill, você pode fazer aquela reportagem para mim, amanhã?”

9) ser volúvel: (por exemplo, falar abobrinhas) 10) usar a linguagem ou o dialeto do ouvinte:

“Tudo bem, guria?”

Esses autores, tal como Brown e Levinson, afirmam que há três fatores que

determinam a escolha das estratégias e que colocam esse sistema em jogo: poder,

distância e grau de imposição (teor de risco).

O poder refere-se à diferença vertical entre os participantes numa estrutura

hierárquica. Por exemplo, a relação entre patrão e empregado é categorizada como

[+Poder]. A relação [-Poder] ocorre quando há pouca ou nenhuma diferença hierárquica

entre os participantes, trata-se de um sistema igualitário, como é o caso de nosso corpus.

Na distância, a relação pode ser entre desconhecidos [+Distância] ou entre

conhecidos, amigos [-Distância], este último sendo o caso de nossos dados. Assim, uma

conversa entre pessoas que possuem cargos equivalentes, mas são desconhecidas entre

27

si, seria categorizada como [+ Distância] e [-Poder] e uma conversa entre amigos como

de [-Distância] e [-Poder].

O terceiro fator a influenciar a escolha de estratégias de face é, segundo eles, o

grau de imposição. Mesmo se dois participantes têm relações fixas, as estratégias de

face usadas irão variar, dependendo da importância por eles atribuída ao tópico em

discussão (grau de ameaça inerente ao conteúdo proposicional do ato de fala). Esse fator

é muito relevante, e pode ser comprovado em nosso corpus, nos excertos (1) e (2) da

parte 1A (manutenção de rapport) de nossa análise.

Scollon e Scollon concluem que diferença hierárquica está associada a poder e

que grau de conhecimento está associado à distância (contato). Fatores como poder e

distância podem decorrer das mais diversas razões. Variam de sociedade para sociedade

e também no curso da história. Os autores ressaltam ainda que esses fatores estão

diretamente associados ao tipo de sistema de polidez que está operando na interação em

um dado momento: a deferência, a solidariedade ou a hierarquia.

Para que possa ser aplicado o Sistema de Deferência [-P; +D], as duas pessoas

que têm o mesmo status (-P), mas são desconhecidas (+D), devem usar um sistema de

deferência mútua, isto é, serão distantes e independentes. Pode-se encontrar este sistema

onde quer que a relação seja igualitária, mas em que os participantes queiram manter

distância (com deferência) entre eles. Esse sistema possui as seguintes características:

(1) ser simétrico (-P): os participantes usam estratégias de independência ao falar com o

outro; (2) ser distante (+D): cada participante usa estratégias de independência ao falar

com o outro.

No Sistema Hierárquico, os participantes reconhecem e respeitam as diferenças

sociais que coloca um deles numa posição superordenada (superior) e o outro, numa

posição subordinada. A principal característica deste sistema é o reconhecimento da

diferença de status ou [+P]: (1) relações assimétricas: os participantes se vêem como

estando em posições sociais desiguais; (2) relações assimétricas: os participantes usam

de estratégias de face diferentes: o superior usa estratégias de envolvimento e o

subordinado estratégias de independência.

28

Finalmente, no Sistema de Solidariedade (-P, -D), que é o sistema utilizado pelos

participantes de nosso corpus, há um alto grau de envolvimento, não havendo

sentimentos de diferença de poder entre os participantes da interação, nem de distância.

Esse sistema possui as seguintes características: (1). relação simétrica (-P): os

participantes se vêem como estando na mesma posição social; (2). relação estreita (-D):

ambos os participantes usam estratégias de envolvimento.

Podemos encontrar o Sistema de Solidariedade em todas as situações em que as

relações forem igualitárias e os participantes sintam ou expressem proximidade uns com

os outros. Amizades entre colegas de trabalho, parentes ou amigos que são muito

próximos, íntimos, geralmente são sistemas de solidariedade.

2.2.4 Tipos de polidez de Kerbrat-Orecchioni

Segundo Kerbrat-Orecchioni (1996), a teoria de Brown e Levinson é relevante

em seu fundamento básico: polidez é real e fundamentalmente uma questão de faces, de

desejo de face e de trabalho de face. Isso não significa necessariamente que todas as

coisas em uma interação correspondam a questões de face.

O maior impedimento para o correto funcionamento do modelo de Brown e

Levinson é, de acordo com essa autora, a extrema falta de clareza que permeia as

noções de negativo e positivo. Para ela, esses predicados se aplicam a dois objetos

diferentes: face e polidez.

No que concerne à noção de face, a face negativa corresponde aproximadamente

à noção de “território” de Goffman; e face positiva corresponde, grosso modo, ao que a

linguagem comumente chama ‘face’, que alguém pode perder ou salvar, estando

associada a orgulho, sentido de honra, narcisismo.

Por que, então renomear respectivamente ‘território’ e ‘face’ em ‘face negativa’

e ‘face positiva’, expressões que implicam que poderia existir uma relação de oposição

entre essas duas entidades, quando existe, de fato, dois constituintes complementares de

qualquer indivíduo social? De acordo com Kerbrat-Orecchioni, para correlacioná-los

29

com duas formas de polidez, a positiva e a negativa, e é neste ponto, segundo ela, que

surgem os problemas.

No que concerne à polidez, a negativa é primeiramente orientada para a

satisfação dos desejos de face negativa, porém Brown e Levinson acrescentam que essa

forma de polidez é principalmente baseada na evitação. O mesmo argumento pode ser

aplicado no que concerne à face positiva, a qual é o cenário dos desejos de preservação

e gratificação. Brown e Levinson incorporam, nesse momento, face positiva e polidez

positiva, quando a autora acredita que deveria ser:

(1) polidez negativa (ou mitigadora) orientada à face negativa (por exemplo, abrandar uma ordem); (2) polidez positiva (ou valorizante) orientada à face negativa (por exemplo, um presente); (3) polidez negativa (ou mitigadora) orientada à face positiva (por exemplo, abrandar uma crítica ou um desacordo); (4) polidez positiva (ou valorizante) orientada à face positiva (por exemplo, um elogio, uma expressão de acordo, etc.).

As principais proposições de ajustes ao modelo de Brown e Levinson feitas por

essa autora consistem, exatamente, em dissociar face negativa e face positiva de polidez

negativa e polidez positiva.

Kerbrat-Orecchioni também critica o fato de Brown e Levinson não haverem

ponderado que alguns atos poderiam ser lisonjeiros para as faces, como votos,

agradecimentos e elogios. É por isso que ela propõe introduzir um termo extra dentro

desse modelo teórico para referir-se a esses atos que são, de certo modo, uma cópia

positiva dos FTAs, aos quais ela chamou de FFAs (Face Flattering Acts), isto é, Atos

Lisonjeiros de Face.

30

2.3 A noção de rapport, de envolvimento e conceitos associados

2.3.1 Gerenciamento de rapport: Spencer-Oatey

Segundo Spencer-Oatey (2000), existem três características importantes que

incidem sobre o gerenciamento das relações sociais:

1) o uso que as pessoas fazem da linguagem pode influenciar as relações interpessoais; 2) as pessoas tentam controlar suas relações com as outras pessoas; 3) culturas diferentes podem ter convenções diferentes para o que é um comportamento apropriado e em qual contexto.

Segundo essa autora (op.cit.), as pessoas frequentemente pensam em

comunicação como ‘transmissão de informação’. Comunicação, porém, também

envolve ‘gerenciamento de relações sociais’. A autora define esse gerenciamento das

relações interpessoais como o uso da linguagem para promover, manter ou ameaçar

relações sociais harmoniosas e sugere o termo “rapport management” (gerenciamento

de rapport) para se referir a esta área.

Brown e Yule (1983) identificam duas funções principais da linguagem: a

função transacional (ou transferência de informação) e a função interacional (ou

manutenção de relações sociais). Previsões do tempo e conferências acadêmicas são

exemplos típicos de linguagem transacional, enquanto agradecimentos e small talk são

exemplos de linguagem interacional.

Spencer-Oatey (op.cit.) acredita que face é um fenômeno universal – todas as

pessoas possuem as mesmas preocupações fundamentais com a face – e que polidez é,

na verdade, um julgamento contextual: ‘nenhuma sentença é inerentemente polida ou

impolida’. O escopo da teoria da polidez tradicional é a manutenção e/ou promoção de

relações interpessoais harmoniosas.

Ela, por outro lado, emprega o termo ‘gerenciamento de rapport’ ao invés de

‘gerenciamento de face’ porque, segundo ela, o termo ‘face’ parece focar preocupações

com o self, enquanto gerenciamento de rapport sugere mais um equilíbrio entre o self e

o outro. A preocupação com o gerenciamento de rapport também é mais extensa: ele

examina o modo pelo qual a linguagem é usada para construir, manter e/ou ameaçar as

31

relações sociais e inclui o gerenciamento dos direitos sociais assim como de face. Pode-

se deduzir, portanto, que rapport pode envolver tanto relações de harmonia quanto de

conflito.

Spencer-Oatey (op.cit) propõe que gerenciamento de rapport (o gerenciamento

da harmonia – desarmonia entre as pessoas) envolve dois componentes principais: o

gerenciamento de face e o gerenciamento dos direitos sociais. O primeiro, como o

próprio nome indica, envolve o gerenciamento das necessidades da face segundo a

definição de Goffman (1972, p.5) já citada anteriormente.

O gerenciamento dos direitos sociais, por outro lado, envolve o gerenciamento

de expectativas sociais, que Spencer-Oatey define como “denominações fundamentais /

básicas / essenciais, pessoais e sociais, que os indivíduos efetivamente reivindicam para

si próprios em suas interações com os outros” (2000, p.14).

Essa autora (op.cit.) sugere que face possui dois aspectos inter-relacionados:

atributos / habilidades e papéis / identidades sociais.

(i) Face da competência: nós possuímos o desejo básico de que as pessoas nos avaliem positivamente em termos de nossas qualidades pessoais, isto é, nossas habilidades, competência, aparência, etc. Face da competência se relaciona com os valores que nós efetivamente reivindicamos para nós mesmos, em termos de qualidades pessoais, e, por isso, está intimamente relacionada com nosso senso de auto-estima pessoal. (cf. face da competência de Lim & Bowers) (ii) Face da identidade: nós possuímos o desejo básico de que as pessoas conheçam e apoiem nossas identidades ou papéis sociais, isto é, como líderes de grupo, amigos íntimos, etc. Face da identidade se relaciona com os valores que nós efetivamente reivindicamos para nós mesmos em termos de papéis sociais ou de grupo, e está intimamente relacionada com nosso senso de valor na esfera pública.

Similarmente, Spencer-Oatey (op.cit.) também sugere que direitos sociais

possuem dois aspectos inter-relacionados:

(iii) Direitos à justiça / imparcialidade: nós possuímos a crença básica em que temos o direito de reivindicar considerações pessoais dos outros, de maneira que sejamos tratados de maneira justa e honesta: que não sejamos indevidamente iludidos / ludibriados; que não sejamos instruídos de maneira injusta ou desonesta; e que não sejamos explorados ou que tirem proveito de nós. Parece haver dois componentes para essas reivindicações por justiça: a noção de custo-benefício (o grau em que somos explorados ou sofremos desvantagens, e a crença de que custos e benefícios deveriam ser mantidos rigidamente equilibrados através do princípio da reciprocidade), e a

32

questão relativa à autonomia-imposição (o grau em que as pessoas nos controlam ou nos impõem e/ou ordenam algo). (iv) Direitos à associação: nós possuímos a crença básica de que temos o direito de reivindicar uma associação com os outros que é restringida / sustentada pelo tipo de relação que temos com elas. Esses direitos de associação concernem em parte à associação-dissociação interacional (o tipo e o grau de nosso envolvimento com os outros). Eles também concernem à associação-dissociação afetiva (o grau pelo qual compartilhamos ansiedades, sentimentos e interesses).

Gerenciamento de face

(valores pessoais / sociais) Gerenciamento de direitos sociais (reivindicações pessoais / sociais)

Perspectiva pessoal / Independente

Face da competência / (cf. face positiva de Brown e Levinson)

Direitos de justiça / imparcialidade (cf. face negativa de Brown e Levinson)

Perspectiva social / interdependente

Face da identidade

Direitos de associação

Quadro 1: Componentes do gerenciamento de rapport: (fonte: SPENCER-OATEY, 2000, p.15). Segundo essa autora (op.cit.), existem dois conjuntos de fatores que influenciam

o uso de estratégias, que são: (i) orientações de rapport; e (ii) variáveis contextuais.

O primeiro deles diz respeito à orientação de rapport (sistematizada abaixo) e o

segundo conjunto de fatores que tem uma influência crucial na escolha do

gerenciamento das estratégias são as variáveis contextuais. Nesse segundo conjunto de

fatores, essa autora lista quatro variáveis: as relações dos participantes; o conteúdo das

mensagens; direitos e obrigações; e atividade comunicativa.

Ela sugere quatro tipos de orientações de rapport:

(1) orientação no sentido de AUMENTO / MAXIMIZAÇÃO de rapport: desejo de aumentar ou fortalecer relações harmoniosas entre os interlocutores. Motivos: iniciar uma relação romântica; ganhar um lucrativo contrato de negócios; etc. (2) orientação no sentido de MANUTENÇÃO de rapport: desejo de manter ou proteger a qualidade das relações em curso e o nível de rapport entre os interlocutores. Nesta orientação, existem dois tipos de diretrizes, dependendo da situação, para lograr o efeito desejado:

33

(i) escolher apropriadamente termos de tratamento, de saudação, honoríficos3, etc.; (ii) lidar apropriadamente com atos de ameaça à face. Alguns excertos desse tipo de ato: ordens, críticas, reclamações, desacordos e ameaças. (3) orientação no sentido de NEGLIGÊNCIA de rapport: falta interesse na qualidade das relações. Motivos: situações em que o foco maior está na informação / conteúdo ou nas tarefas e menos na qualidade das relações; estar mais preocupado em manter sua própria face do que na manutenção do rapport da relação; não se importar com a relação por algum motivo qualquer; etc. (4) orientação no sentido de QUESTIONAMENTO de rapport: desejo de questionar ou impedir relações harmoniosas entre os interlocutores; desejo por mudança negativa, prejudicando o rapport entre os interlocutores. Motivos: marcar independência, devolver ofensa, etc. Causar deliberadamente a perda de face das pessoas é uma maneira de consegui-lo.

Segundo a autora, essas orientações não podem ser diretamente observadas,

devendo, portanto, ser inferidas. Apesar da dificuldade, devem ser incluídas em

qualquer pesquisa sobre rapport (p.31) uma vez que, através delas, podemos investigar

qual é o ethos4 que subjaz a uma dada atividade de fala, isto é, em função da orientação

de rapport preponderante.

O segundo conjunto de fatores citado pela autora é composto por quatro

variáveis: as relações entre os participantes; o conteúdo das mensagens; direitos e

obrigações; e atividade comunicativa.

A primeira variável (participantes e suas relações) está subdividida em: poder,

distância, inter-relação entre poder e distância e número de participantes. Não nos

deteremos na análise que essa autora faz dos três primeiros itens, por não considerarmos

relevante para nossa pesquisa. Uma vez que nosso corpus é composto por participantes

que possuem relações de amizade, definidas por Scollon e Scollon como de [-Distância]

e [-Poder], utilizaremos os parâmetros do Sistema de Solidariedade desses autores, já

exposto anteriormente (item 2.2.3).

3 Cf. RONCARATI, C. Dêixis social – a designação socialmente referenciada: “Você sabe com quem está falando?” In: Votre, S. ; Roncarati, C. Anthony Julius Naro e a lingüística no Brasil – uma homenagem acadêmica. Rio de Janeiro: 7Letras/FAPERJ, 2008, p. 115-147. 4 Ethos: noção da retórica de Aristóteles = imagem que um orador transmitia implicitamente de si mesmo, através de sua maneira de falar, entonação, gestos, porte geral. Segundo Maingueneau, todo discurso oral supõe um ethos, uma representação do corpo de seu responsável, que se responsabiliza por ele. É um conjunto de traços psicológicos (jovial, sincero, simpático, ...) e uma corporalidade (um conjunto de traços físicos e indumentários). Cf. MAINGUENEAU, Dominique. Termos-chave da análise do discurso. Belo Horizonte: Editora UFMG, 2000, p. 59-60.

34

Com relação ao item “número de participantes”, Spencer-Oatey afirma que o que

as pessoas dizem e como elas dizem é freqüentemente influenciado pelo número de

pessoas presentes, e se todas elas estão escutando o que está sendo dito.

Essa autora afirma que a variável conteúdo das mensagens possui uma

influência fundamental na escolha das estratégias de manejo de rapport, uma vez que as

mensagens podem variar em seus prováveis graus de ameaça à face, e podem possuir

“custos” associados a elas. Esses custos não são necessariamente financeiros; eles

podem ser custos de tempo, de esforço, de imposição, de inconveniência, de risco, etc.

A terceira variável é composta pelos papéis sociais / interacionais que podem

influenciar o uso das estratégias de manejo de rapport, no sentido em que eles afetam a

avaliação das pessoas sobre direitos e obrigações. As pessoas cumprem diferentes

papéis sociais e interacionais, tais como: professor / aluno; patrão / empregado; amigo /

amigo; vendedor / cliente; etc., e em cada um desses papéis é necessário cumprir com

uma gama de direitos e obrigações.

A quarta e última variável que, de acordo com Spencer-Oatey, pode influenciar o

uso das estratégias de manejo de rapport é o tipo de atividade comunicativa que está

acontecendo: por exemplo, uma conferência, uma entrevista de emprego, um

julgamento, etc. Atividades comunicativas geralmente são organizadas com base em

gêneros comunicativos, que podem exibir padrões característicos em cada um dos cinco

domínios de manejo de rapport e suas regras e ideais especificados culturalmente

influenciam como os participantes compõem e interpretam a fala.

2.3.2 Conceitos de rapport, de small talk (comunicação fática) e de language play (jogos de palavras) Desde que Malinowski (1972, p. 151 [1923],) cunhou o termo ‘comunicação

fática’ para se referir a “[...] um tipo de discurso no qual laços de união (isto é, relações

interpessoais) são criados meramente pela troca de palavras”, comunicação fática ou

small talk tem sido reconhecida pelos lingüistas como preenchedora de importantes

funções sociais.

35

Firth (1964 [1937], APUD Placencia, 2004) enfatiza a importância da

comunicação fática, apontando a quantidade de tempo que as pessoas dispensam a este

tipo de comunicação em suas vidas diariamente. Knapp (1978, p.112) também enfatiza

a função da comunicação fática quando considera que “[...] small talk é um modo de

manutenção do senso de comunidade e de companheirismo com outros seres humanos,

nos ajudando a fortalecer nossos laços de humanidade”.

Aston (1988) refere-se à comunicação fática como uma conversa interacional

empregada na negociação do rapport positivo (orientado para relações harmoniosas), o

qual ele define como o estabelecimento e a manutenção de relações amigáveis. Assim,

ele emprega essa noção para referir-se não somente a formas convencionalizadas, mas

principalmente a usos individualizados e criativos da linguagem. Esse autor está entre

os primeiros que identificaram uma série de recursos lingüísticos que as pessoas

empregam na negociação das relações amigáveis, além do uso das formas

convencionais.

A noção de Aston (rapport-building) que dá título ao trabalho de Placencia

(2004) é como um termo ‘guarda-chuva’ para uma gama de atividades, incluindo trocas

de language play, atividades criativas não associadas com comunicação fática como ela

tem sido tradicionalmente concebida (perguntas sobre saúde, conversas sobre o tempo,

etc.), cumprimentos, perguntas do tipo “como vai você?”, despedidas amigáveis, entre

outras utilizadas nas estratégias de polidez positiva.

Atividades de language play são descritas por Aston como aquelas que refletem

a orientação dos participantes na manuteção de rapport ou de relações amigáveis.

Alguns exemplos de language play seriam jogos de palavras e jogos lingüísticos com

nomes (nomes próprios, apelidos, etc.). Já para Sherzer (1992, APUD Placencia, 2004),

language play corresponderia à manipulação dos elementos da linguagem, que envolve

modelagem de formas lingüísticas, criação de realidades alternativas e o uso social de

ambos.

Atividades de language play tais como: comportamentos inoportunos, piadas,

jogos lingüísticos com nomes e outros tipos de jogos de palavras são, para Placencia

(2004), atividades que, do mesmo modo que small talk ou comunicação fática, parecem

36

estar orientadas para metas que envolvem relacionamento, embora elas também possam

servir a outras metas (cf. COOK, 2000). Confira-se (excerto Anexo 3, trecho 5):

01 Carlos -A mí la naturaleza... el espectáculo...

02 Mercedes -Bueno, es la... es donde te encontrás con la creación, ¿no es cierto?

03 Carlos -Sí, sí, sí.

04 Mercedes -La obra de la... del Creador, la creación y su criatura, ¿no es así?

05 Carlos -Sí. Ahora, no la vi a la criatura ni a... vi otras criaturas de mini ...

06 Mercedes -¿Y la criatura no somos nosotros?

07 08

Carlos -Vi a otras criaturas de minifalda tan... [risas] No, no eran tan distintas que ella, ¿eh?

09 10 11

Mercedes -Yo fijáte que--- soy bastante--- religiosa, ¿no es cierto?, y te puedo garantizar que--- a veces encuentro más a Dios en la naturaleza que en el templo--- que es más artificial.

12 Carlos -Claro, claro.

No exemplo acima, por existir confiança, a brincadeira feita por Carlos com a

palavra criatura (ele jogou com os termos “te encontras con la creación” e “la creación

y su criatura” ditos por Mercedes nas linhas 2 e 4) foi interpretada por Mercedes dentro

de um enquadre de brincadeira e não gerou nenhum tipo de situação conflituosa.

Placencia (op. cit.), em seu estudo sobre rapport no contexto de compra e venda

em pequenas lojas/armazéns de bairro em Quito, inclui dentre as atividades de

construção de rapport as seguintes: troca de cumprimentos; perguntas do tipo ‘como vai

você’; tópicos conversacionais tais como saúde, problemas domésticos, feriados, escola

e trabalho; language play; despedidas do tipo ‘desejos de bem-estar ou felicidade’ ou

expressões que ela denomina leave-taking (por exemplo, hasta luego).

Já para Holmes (2000), a comunicação fática, embora sirva para estabelecer um

contato inicial entre duas pessoas, também serve a outras funções, tanto afetivas quanto

referenciais, o que reforça sua afirmação de que “[...] a fala é inerentemente

multifuncional” (op. cit. p. 33). Para ela, o uso da comunicação fática engloba uma série

de funções, dentre as quais as que valem a pena destacar seriam: (1) a de atender aos

desejos de face positiva; e (2) a orientação dos papéis dos participantes na relação.

Segundo essa autora (op.cit.), prestar atenção aos desejos de face dos outros é

um componente crucial no estabelecimento de uma relação de amizade. O

37

significado afetivo de um enunciado envolve a atitude do falante em relação ao ouvinte

no contexto da enunciação. Modificar a força ilocucionária pode servir para expressar

uma variedade de atitudes para com o ouvinte, variando de atitudes muito positivas a

atitudes muito negativas. Uma forma de analisar esta questão é examinar a extensão em

que ela aumenta ou diminui a solidariedade ou a distância social entre os interlocutores.

2.3.3 Conceitos de envolvimento conversacional, de script cultural e de confiança

Na visão de Tannen (1989), a conversação casual é construída através de

estratégias que são persuasivas, espontâneas e funcionais. Ela refere-se a essas

estratégias como estratégias de envolvimento, uma vez que refletem e criam

envolvimento interpessoal. Segundo ela, envolvimento, além de ser marcado pela

prosódia, também ocorre simultaneamente com seqüências e estratégias de

envolvimento, dentre elas: sincronia rítmica; repetição; indiretividade, além de outras

diretamente envolvidas na construção do sentido, tais como: figuras de linguagem;

discurso construído (reportado ou relatado); e narrativa.

A respeito da narrativa, Tannen (op.cit.) afirma que contar uma estória na

conversa pode, por si só, ser uma estratégia de envolvimento. Ela afirma também que

quando há um alto grau de envolvimento, as pessoas tendem a contar suas próprias

experiências pessoais e os sentimentos relativos a esses eventos.

Para Gumperz (1982), envolvimento conversacional é a habilidade de inferir,

de uma maneira global, sobre o que trata a interação e sobre o que um participante

espera ser, localmente, o significado de cada enunciado. Em resumo, envolvimento

conversacional constitui o resultado bem sucedido de uma inferência conversacional.

Esse autor (op.cit.) destaca que falantes e ouvintes, uma vez envolvidos na conversação,

mostram, pela sinalização do envolvimento (tanto por palavras quanto por gestos e

sinais não-verbais), que inferiram aquilo a que a fala em interação se refere. Tannen

(op.cit.) afirma ser esta a base de todo entendimento lingüístico, uma vez que

entendimento pressupõe envolvimento conversacional.

Selting (1994), por sua vez, destaca que o envolvimento é uma noção

interpretativa que faz referência ao campo das emoções e atitudes. O estilo marcado

38

pelas estratégias de envolvimento é denominado por ela de estilo enfático. Essa autora

também afirma que “[...] sinais de ênfase ou surpresa são manifestações emotivas

importantes e comuns nas quais o envolvimento ‘mais-que normal’ é expresso

lingüisticamente por pistas [pistas essas que equivalem às estratégias apontadas por

Tannen e mencionadas anteriormente] que sugerem o apropriado enquadre

interpretativo” (op. cit., p. 376).

Relembre-se que, de acordo com Scollon e Scollon (1995), mostra-se

envolvimento assumindo o ponto de vista do outro, ou através de qualquer meio de

demonstrar que o falante deseja sustentar uma visão de mundo partilhada. Para eles,

toda comunicação implica envolvimento.

Apesar dessas diferenças existentes em termos de focalização, os conceitos de

envolvimento têm em comum: (i) a definição de um mesmo foco de atenção, isto é,

interação centrada cognitiva e visualmente, nos termos de GOFFMAN (1992); e (ii)

partilhamento de pontos de vista, conhecimento, emoções, sentimentos.

Outro conceito relevante para este trabalho é o conceito de script cultural, que é

definido como um padrão de interação social característico de um grupo cultural

particular (TRIANDIS ET ALLI, 1983). Para esses autores, simpatia é o script cultural

dos hispânicos e latino-americanos. Segundo eles, “ser simpático” possui as seguintes

características:

• mostrar certos níveis de conformidade (adaptação); • ter a capacidade de partilhar os sentimentos dos outros; • comportar-se com dignidade e respeito para com os outros; • buscar harmonia nas relações inter-pessoais.

Estas características implicam uma evitação de conflitos interpessoais e uma

tendência por comportamentos positivos que devem ser enfatizados em situações

positivas e comportamentos negativos que devem ser desencorajados em situações

negativas. Esse conceito pode ser pensado à luz dos “valores sociais positivos” que um

dado grupo associa à imagem positiva do self ou as faces reivindicadas pelo grupo, nos

termos de Goffman (1992).

39

A noção de rapport pode ser pensada ainda à luz das noções de confiança e de

intimidade relacional. Placencia (2004) se refere à noção de confiança que Thurén

(1988, p. 222) define como “proximidade ou senso profundo de familiaridade” e como

um “estilo de comunicação” que, estudiosos como Hernández Flores (2001), enfatizam

em estudos de polidez na Espanha.

Segundo Thurén (op.cit.), a confiança pode surgir como o resultado de contato

regular sem necessariamente existir uma relação de amizade entre os participantes (caso

do corpus trabalhado por Placencia em seu estudo citado aqui). Este, porém, não é o

caso de nossos dados, onde se comprova, através de pistas contextuais e de

conhecimento de mundo compartilhado, a existência de amizade entre os participantes.

Ainda segundo Thurén, é a presença da confiança que torna certos tipos de language

play e outros comportamentos lingüísticos e extralingüísticos parecerem aceitáveis e

mesmo desejáveis.

Já para Bravo (2003), a confiança interpessoal não requer que se compartilhem

os desejos do interlocutor, nem que se aprovem suas características de personalidade,

senão que se o aceite assim tal qual ele é, embora se o critique “abertamente” e se

discorde daquilo que ele pensa (também “abertamente”): é mais importante conhecer

uma pessoa do que aprová-la. Essa definição de Bravo é uma critica a definição de face

positiva de Brown e Levinson.

A definição apresentada por Lim e Bowers (1991) de intimidade relacional é

correlata à definição de confiança (cf. p.18). Sendo assim, segundo esses autores, o

esforço para minimizar uma ameaça à face do outro diminui à medida que a intimidade

aumenta.

Hernández-Flores (2003), por sua vez, focaliza as relações afiliativas da imagem

social. Ela toma como premissa que uma possível característica de afiliação na

comunidade cultural espanhola é o valor da confiança descrito por Bravo (2003), o qual

aparece nas seguintes expressões:

1) falar com confiança: alude a um estilo comunicativo que supõe falar

abertamente, sem reservas, com franqueza; 2) ter confiança em alguém: tipo de relação afetiva que alude à proximidade;

40

3) fazer algo porque se tem confiança: atuar livremente de acordo com sua própria personalidade, sem medo de ofender ao outro, e sabendo que esta conduta será recebida com naturalidade;

4) ser alguém de confiança: ser muito próximo de alguém, conhecer-lhe bem,

como alguém da família. Embora se depreenda dos resultados da pesquisa dessa autora que, se existe

confiança na relação, se é mais flexível com a expressão de polidez formal (como pedir

“por favor”, dizer “obrigado”), o uso da polidez continua tendo importância neste tipo

de relação: não ser polido seria um caso de abuso de confiança.

É interessante observar que o conceito de confiança descrito por Hernández-

Flores (2003) e o conceito de intimidade relacional de Lim e Bowers (1991) podem

ser entendidos como similares ou mesmo idênticos.

Para Hernández-Flores, confiança alude a um tipo de contrato social entre

pessoas que supostamente se conhecem bem, o que permite falar ou atuar abertamente e

sem medo de ofender. Lim e Bowers definem intimidade relacional nos seguintes

termos: quanto mais próxima for a relação entre os interlocutores, mais eles sentir-se-ão

obrigados a cooperar mutuamente, e tornar-se-ão mais dispostos à tolerância de

imposições e críticas. Sendo assim, o esforço para minimizar uma ameaça à face do

outro diminui à medida que a intimidade aumenta.

Para Hernández-Flores, confiança implica limites e adequacão: ter confiança é

algo positivo, porém sempre que ocorra no meio adequado ou com a pessoa adequada

(meio ou pessoa próximos a si) e na medida certa, pois o contrário é valorado

negativamente, daí a expressão “tomarse demasiadas confianzas”.

Do mesmo modo, a definição de Lim e Bowers para intimidade relacional

também implica limites. Segundo eles, quando ocorrerem casos de ameaça à face que

superem os limites tolerados, essa dinâmica mudará e os interlocutores reagirão tão ou

mais negativamente caso a relação entre eles não fosse de proximidade.

41

2.4 Propostas de análise aplicadas a corpora em língua espanhola 2.4.1 Bravo (Universidade de Estocolmo) Bravo (2003) critica o modelo de Brown e Levinson, pelo menos a partir do

enfoque sociocultural por ela utilizado. Segundo ela, o problema reside em que os

aspectos negativos e positivos da imagem social estão demarcados e/ou delimitados

socioculturalmente e somente são adequados para serem aplicados a algumas

comunidades de fala inglesa.

Segundo Bravo (op.cit.), em um número muito interessante de trabalhos que não

se encaixam totalmente nas expectativas criadas pelas categorias universais, as

diferenças se justificam em conteúdos socioculturalmente específicos da imagem social.

Por esse motivo, ela explica que considera imagem social central para uma teoria da

polidez, uma vez que essa noção, ao ser definida como psicosociológica tem, segundo

ela, a virtude de conectar os conceitos de identidade pessoal e social.

De acordo com o pressuposto de que a imagem social de uma comunidade é

específica dessa comunidade, Bravo (op.cit.) adotou as categorias de autonomia e

afiliação. Segundo essa teoria, a imagem da pessoa compreende duas perspectivas:

1) como alguém diferente do grupo: a autonomia;

2) como alguém integrado ao grupo: a afiliação.

Essa autora postula um conjunto de premissas ligadas à autonomia e à afiliação,

subjacentes à imagem do grupo e assumidas pelo indivíduo, envolvendo aspectos de

uma imagem social que acusa tendências mais ou menos estendidas na Espanha (cf.

BRAVO, 2002):

I) Premissas ligadas à autonomia: ver-se / ser visto

� Um indivíduo que se autoestima reconhece o próprio valor e modo de agir e se mostra capaz de exibir ou ratificar suas boas qualidades e originalidade. Esta autoestima se relaciona com a necessidade de autoafirmação do indivíduo e faz parte do ser social; está ligada ao sentimento de orgulho que pode ser manifestado expressiva e claramente; em geral, origina modos de ação diretos e frontais, o que permite que o indivíduo se confirme socialmente. A autoestima é merecedora do interesse, admiração e apreço, dentro do grupo.

42

� Um membro competente da sociedade não se queixa em demasia, não é muito crítico, não é indiferente, nem improvisa. � Um indivíduo não aceita facilmente que se questione seu valor. II) Premissas ligadas à afiliação: ver-se / ser visto � Um indivíduo é capaz de demonstrar afeto, tolerância, sinceridade e desinteresse, através de comportamentos próprios da intimidade familiar e da amizade. � Um indivíduo outorga e busca, com vistas à reciprocidade, a confiança do outro, com base no conhecimento mútuo ou nos acordos implícitos; não obstante, a confiança se ganha. � Um indivíduo para o qual importa o apreço interpessoal, o qual, por sua vez, conduz ao consenso e à manutenção da coesão do grupo.

Na conversa, a imagem social se manifesta na atuação do self frente ao alter5 e,

nesta medida, está unida a como se concebe uma relação interpessoal em uma

determinada circunstância. Os traços mais permanentes da imagem social fazem parte

da identidade social, porém não são a mesma coisa. O conceito de imagem social abarca

um sentimento de pertencimento, porém reduz seu alcance à atuação social dos

interlocutores. Por isso, a autora diz que há um compromisso de imagem no sentido em

que o falante está apresentando uma imagem de si mesmo a seu interlocutor ou

auditório, num determinado cenário de fala. Esta apresentação é única, temporal,

interacional e está circunstancialmente demarcada e/ou delimitada.

2.4.2 Briz (Universidade de Valência) Briz (1988 e 2003) faz um estudo da polidez de acordo com as unidades da

conversa e a partir de uma distinção básica entre polidez codificada e polidez

interpretada. A primeira está, segundo ele, regulada antes da interação, submetida,

portanto, à convenção, e a segunda, avaliada no transcurso da interação, contexto a

contexto, de acordo com os inícios e, sobretudo, com as reações dos participantes na

mesma.

Esse autor já assinalava (op.cit.) que as intervenções polidas estão parcialmente

convencionalizadas em cada língua, isto é, uma cultura subjetiva de maneira freqüente o

uso de certos mecanismos lingüísticos para mitigar, diminuir a força ilocucionária, que

ficam desse modo codificados para a expressão da polidez em uma dada língua.

5 A noção de alter [do latim alter, ‘outro’] refere-se ao conceito de cada indivíduo segundo o qual os outros seres são distintos dele próprio; opõe-se a ego (Novo Dicionário Aurélio, 1986).

43

A avaliação da polidez verbal somente é possível no processo mesmo da

interação; entendida como efeito, somente pode ser avaliada contextualmente. Briz,

então, propõe uma tentativa de explicar o dinamismo da atividade polida através de

“filtros de avaliação hierarquizados”. Cada um desses filtros pode ser especificado

segundo vários fatores: (1) +/- solidariedade entre os interlocutores; (2) +/- fim

interpessoal da interação; (3) +/- pertinência de ideomas6; (4) +/- problematicidade

temática; (5) +/- aceitação lingüística e social.

As interações de maior solidariedade são aquelas nas quais existem relações de

proximidade e de simetria entre os interlocutores. São excertos de relações de

proximidade: presença de vivências comuns, maior saber compartilhado, maior contato

e maior grau de compromisso afetivo entre os interlocutores. Com relação a interações

simétricas, são aquelas nas quais existe maior igualdade funcional e maior nivelação de

papéis (sobretudo os derivados das características socioculturais, como idade, gênero,

profissão, etc).

As interações com fim predominantemente interpessoal são aquelas que

primordialmente buscam e favorecem a manutenção das relações sociais, a relação entre

as pessoas, o contato entre elas. Do ponto de vista funcional são, portanto, simétricas, o

que indica sua estreita relação com as interações de maior solidariedade. Conversas

cotidianas entre amigos ou vizinhos, como é o caso de nossos dados, podem ser

excertos de conversas mais interpessoais, como também de interações de maior

solidariedade.

Já interações com fim predominantemente transacional são aquelas nas quais

existe um objeto de negociação concreto, uma finalidade precisa. Nestas tudo aparece

mais regulado, inclusive os turnos, ao mesmo tempo em que se realiza a distância social

e, do ponto de vista funcional, são assimétricas.

6 Segundo Briz, os ideomas, característicos de cada cultura ou grupo social, inclusive de cada indivíduo, são conteúdos culturais, além de fatores de codificação da atividade da polidez, que permitiriam explicar as diferentes interpretações do polido e dos mecanismos lingüísticos empregados em cada caso na construção de dita atividade. Cf. BRIZ, A. Cortesía verbal codificada y cortesía verbal interpretada en la conversación. In: Bravo, D. e Briz, A. Pragmática sociocultural: estudios sobre el discurso de cortesía en español. Barcelona: Editorial Ariel, 2004.

44

O terceiro fator diz respeito ao contexto cultural e a maior ou menor pertinência

de ideomas corteses segundo culturas. Segundo Briz, talvez seja possível estabelecer um

“mapa” do ideário da polidez, da imagem polida, em cada cultura e grupo social. Esta

classificação, portanto, finita poderia marcar as diferenças interculturais e intraculturais

da chamada polidez codificada ou convencional, assim como explicar as avaliações

prévias do polido e do impolido em uma língua ou entre várias línguas, ou de acordo

com as exigências de um grupo social determinado.

Os conteúdos culturais de privacidade e confiança da cultura anglo-saxã e

espanhola, respectivamente, além de fatores de codificação da atividade de polidez,

seriam filtros que permitiriam explicar as diferentes interpretações do polido e dos

mecanismos lingüísticos empregados em cada caso na construção de dita atividade.

Estes ideomas polidos, característicos de cada cultura ou grupo social, inclusive

de cada indivíduo, tornam prioritária a proteção de certas imagens próprias ou alheias e,

por isso, predeterminam ou favorecem a conveniência de atenuar (ou de valorizar) em

maior ou menor medida certas ações ou a presença de atenuantes para certos temas que

se consideram mais conflitivos e que possam provocar um choque ou conflito social.

O quarto fator diz respeito aos temas da interação e seu grau de

problematicidade. Em geral, uma conversação polêmica favorece a presença de

atenuantes polidos, principalmente se as imagens ficam comprometidas.

O quinto (e último) fator diz respeito a maior ou menor aceitação ou acordo, isto

é, à aceitação lingüística e social. Segundo Briz, o fim último de toda interação é, em

geral, lograr o acordo, a aceitação do outro. Assim, quando as metas do eu se enfrentam

ou não coincidem com as metas dos interlocutores, quando se deseja obter um benefício

e se sabem ou intuem dificuldades para consegui-lo, o falante recorre a mecanismos

atenuadores de polidez como meio para tentar lograr dito acordo / aceitação.

Segundo Briz (1988), os falantes de uma comunidade de fala assumem, em

virtude dos traços anteriores, uma série de princípios de conduta social e lingüística em

relação com a polidez, que velam pela imagem própria e alheia e que servem, além

45

disso, como filtros de avaliação prévia do comportamento polido, de sua maior ou

menor conveniência; determinam, portanto, um pensamento de conduta social.

É evidente que as sociedades, comunidades de fala e culturas diferem. Assim,

nas denominadas “culturas de distanciamento”, os princípios ativos sofrem, com menos

freqüência, estados de hibernação, frente ao que sucede nas “culturas de aproximação”

(termos introduzidos por Haverkate, em seu trabalho de 1994).

Na conversa coloquial espanhola, uma das chamadas culturas de aproximação

(assim como a argentina, caso de nosso corpus) uma situação prévia de imediatez

comunicativa (+ solidariedade), de + interpessoalidade e de + cotidianidade temática

favorece a desativação (ou posta em repouso) das convenções sociais e também

lingüísticas (existe um menor controle do produzido e das formas utilizadas)

relacionadas com a polidez.

Como se tem assinalado, a hierarquia dos filtros dados, com relação ao seu grau

de influência na atividade polida, não está estabelecida previamente, determina-se

contexto a contexto e pode mudar no transcurso da fala em interação.

Em resumo, pode-se dizer da polidez que se trata de um processo dinâmico que

se define e se redefine na interação segundo os indícios e, sobretudo, as reações do

outro ou outros. Somente deste modo se pode dar conta disso que Briz vem chamando a

polidez interpretada, um conceito que ajuda a entender, por sua vez, tal dinamismo.

2.4.3 Hernández-Flores (Escola Superior de Comércio de Copenhague)

Hernández-Flores (2003) critica o modelo de Brown e Levinson, pois, segundo

ela, as características outorgadas para as imagens negativa e positiva não são válidas

para descrever a imagem social que aparece em todas as comunidades, isto é, essas

características não são universais. E alinha-se a Bravo ao acreditar que a imagem social

de uma comunidade é específica dessa comunidade (cf.Bravo, 2003), e ao adotar as

categorias de autonomia (foco nas diferenças inter-grupos) e afiliação (foco nas

semelhanças) desenvolvidas por esta.

46

Dentre as características da imagem de autonomia espanhola, inclui-se o desejo

de mostrar-se original e consciente das boas qualidades próprias; dentro da imagem

afiliativa, existe o ideal de confiança, isto é, saber a que se ater com respeito ao outro e

o que se pode falar sem temor a ofensas ou sem temer ofender o outro.

Hernández-Flores compartilha a suposição de Bravo de que a confiança é uma

característica da imagem afiliativa espanhola, característica que não se pode incluir na

categoria de imagem positiva de Brown e Levinson, pois aquela supõe o desejo de

buscar ou reafirmar a proximidade social entre as pessoas, e não o desejo de ser

aprovado socialmente. Por outro lado, ter confiança em uma relação se chocaria de

forma flagrante com o outro desejo de imagem suposto por Brown e Levinson, o da face

negativa, pois, como já visto, ter confiança permite falar e atuar abertamente de cara ao

outro e sem temor de ofender, atuação que, segundo a perspectiva do desejo de face

negativa, invadiria o espaço privado do outro.

Os resultados dos testes de hábitos sociais aplicados por essa autora serviram

para que ela levantasse várias questões. A palavra polidez associa comportamentos

formais apreendidos a comportamentos de deferência. No meio familiar, porém, o

comportamento deferente é pouco mencionado (o que, em nossa opinião, não é

nenhuma surpresa, uma vez que deferência pressupõe diferença hierárquica) sendo

excertos de polidez, neste caso, os atos que permitem mostrar o afeto (ajudar, dar

atenção, mostrar carinho e escutar problemas ou opiniões) e os que ajudam a cumprir

requisitos para ter uma boa convivência (pedir por favor, considerar e respeitar gostos e

vontades).

Assim sendo, o exemplo mais mencionado de polidez em família é ajudar o

outro, um comportamento que alude a um valor apreciado na comunidade espanhola e

que está dirigido para a imagem afiliativa de seus membros, comportamento que não é

esperável que tenha a mesma consideração em outras comunidades como a anglosaxã,

por causa do alto valor que estas outorgam ao desejo de não intromissão (a chamada

face negativa).

47

2.4.4 Albelda (Universidade de Valência)

Albelda (2003) trabalha com polidez valorizante, seguindo as definições

propostas por Kerbrat-Orecchioni. Ela assim define os conceitos de intensificação,

polidez e imagem:

� Intensificação: nível argumentativo da linguagem (mensagem); nível social da linguagem (relação falante-ouvinte).

�Atividades de polidez: polidez positiva = valorizante; polidez negativa = mitigadora. � Atividades de imagem: face positiva e face negativa. Ambos os tipos de polidez podem referir-se aos dois tipos de imagem. A autora

segue Kerbrat-Orecchioni, para quem as relações entre faces e tipos de polidez

constituem quatro tipos básicos de polidez (cf. seção 2.2.4). A polidez mitigadora (de

caráter negativo) é preventiva e reparadora, enquanto que a polidez valorizante é de

caráter producionista: produz atos polidos, efetua FFAs (face flattering acts).

Existem, segundo essa autora, dois modos de reforçar a face (= atos de polidez

valorizante) dos interlocutores: diretamente, realizando FFAs para a face positiva do

interlocutor, satisfazendo seus desejos de aprovação; e indiretamente, manifestando

acordo com o feito ou dito pelo outro. Dentre as estratégias que apóiam e/ou reforçam

indiretamente a imagem do outro, ela destaca as seguintes:

• argumentos que reforçam a cooperação com o dito e/ou mostram o acordo, tais como: intervenção colaborativa em que se apóia o que o outro está contando; palavras que expressam acordo (claro, eso es, etc.), as quais são seguidas (ou não) por um argumento que as apóia; dar razão ao interlocutor; exclamações (que podem vir acompanhadas de palavras que expressam acordo) que, além disso, podem introduzir um argumento que reforça o dito; repetição do mesmo argumento anterior. • comentários valorativo-emotivos que mostram o desejo de equiparar seus sentimentos com os do falante; • a simples retroalimentação da conversa através de marcadores do discurso e outras partículas; • outras formas de manifestar o acordo e a cooperação são as intervenções nas quais o interlocutor tenta antecipar o que o outro vai dizer, ajudá-lo a produzir a fala (fala colaborativa) ou explicar algo que disse o interlocutor, manifestando implicitamente o

48

acordo com o dito por ele; acabar um enunciado do interlocutor, ajudar a formulá-lo ou repeti-lo. Essas são estratégias que manifestam a implicação do falante no tema e seu interesse por ele.

Vale a pena observar que as quatro estratégias propostas por Albelda, que têm

como objetivo apoiar e/ou reforçar indiretamente a imagem do outro são, na verdade,

similares às estratégias de polidez de envolvimento de Scollon e Scollon (1995) que,

por sua vez, são equivalentes às estratégias de polidez positiva de Brown e Levinson

(1978).

Analisando a função que desempenham tais atos de polidez valorizante, a

autora chega à seguinte conclusão: fim social, isto é, fortalecer a face do outro supõe,

por sua parte, fortalecer as relações sociais, estreitar esses laços. Ela salienta, porém,

que temos de observar que nos encontramos diante de situações sociais de

familiaridade, parâmetro social básico dos usos lingüísticos do espanhol coloquial.

2.4.5 Boretti (Universidade Nacional de Rosário) Com relação às conclusões de Boretti sobre o comportamento do argentino e o

modo lingüístico por ele utilizado na relação interpessoal, não pretendemos refutá-las,

uma vez que trabalhamos com outro método de análise, o qualitativo, enquanto ela

utilizou o método de análise quantitativo. Retomaremos esse tópico no capítulo 6,

destinado as conclusões e considerações finais.

Boretti (2003) levanta hipóteses com relação ao comportamento e ao modo

lingüístico (usado na relação interpessoal) dos argentinos, que refletem a competência

cultural do grupo e explicitam configurações identitárias, confrontadas com os “modos

de falar” de um grupo de falantes argentinos, representativo de uma “subcultura”, dentro

da cultura nacional: homens e mulheres de classe média urbana, em relação de amizade

e proximidade, a maioria deles profissionais.

Essa autora adota como método de trabalho para o estudo da polidez, as

propostas de Bravo (1999). Ela assinala que uma das razões da adoção dessa perspectiva

pragmática centrada nos contextos socioculturais foi o fato de ela permitir associar

interesses puramente lingüísticos, neste caso referidos à manifestação do discurso

polido na língua falada, com aspectos da imagem do argentino.

49

Segundo Boretti (2003), Leech (1983) afirma que a polidez surge na interação

onde são observados fenômenos lingüísticos de indiretividade. Porém, distintas

pesquisas mostraram que as formas diretas, em algumas culturas, não são impolidas,

isto é, polidez e indiretividade não se exigem mutuamente. Boretti também não

concorda com a hipótese de que existem atos inerentemente polidos (como os

oferecimentos) ou impolidos (as ordens), tal como afirma Leech (op.cit.) e também

Brown e Levinson (1978).

O objetivo da análise lingüística de Boretti era verificar se atividades

consideradas ameaçadoras de face por Brown e Levinson também o eram no contexto

de seu corpus. Entretanto, ela comprovou que formas tradicionalmente codificadas

como descorteses no contexto de seu corpus não o eram, porque esses usos, ligados à

diretividade e à frontalidade do comportamento lingüístico, se devem à combinatória

de conteúdos específicos da categoria de autonomia, tais como a autoafirmação e a

autoestima, com outros da categoria de afiliação, como a disponibilidade, a confiança e

a sinceridade. Assim, autonomia e afiliação não resultam equiparáveis com a face

negativa e, às vezes, tampouco com a positiva, descritas por Brown e Levinson.

É importante esclarecer que o teste de hábitos sociais, conduzido por Boretti em

1999 (que tomou como base o questionário de Hernández-Flores), consistia em um

questionário aplicado a 90 informantes e constava de três partes que visavam a recolher

opiniões com relação ao tema da polidez e exemplos de comportamentos lingüísticos

diante de situações concretas. As outras perguntas do teste eram:

1) Que é para você a polidez? 2) Você pode dar exemplos reais aonde você vê a polidez? 3) Por que você usa a polidez? Para que ela serve, na sua opinião?

Boretti acrescentou uma quarta parte, que lhe permitiu investigar,

especificamente, aspectos relativos à imagem do argentino. Essa autora pretendia

investigar o que entendiam os informantes por tratamento polido, e recolher dados mais

particularizados sobre a imagem do argentino (visto por ele mesmo) e seu modo de

comunicar-se. As perguntas foram propositadamente formuladas para evitar

50

generalizações nas respostas. Essa sessão do teste visava a investigar questões relativas

a:

-O comportamento do argentino, em geral, como poderia ser caracterizado?

a) individualista, e por quê?

b) orientado para a comunidade, e por quê?

-Em sua opinião, os argentinos, em geral, são frontais e diretos ou indiretos e

ambíguos em seu modo de comunicar-se com os demais?

Dentre as respostas e generalizações advindas dos resultados do teste de hábitos

sociais dos argentinos, podemos destacar as seguintes:

• O comportamento do argentino foi caracterizado como individualista, quer no sentido de desinteresse pelos demais – “salve-se quem puder” – (com exceção no trato com familiares e amigos), quer no sentido de atribuir “importância a si mesmo”. • O modo lingüístico usado na relação interpessoal foi categorizado como frontal e direto, às vezes em demasia.

Por outro lado, a autora assinala que, uma vez que a polidez pode ser entendida

como modo de comportamento (ao pedir um favor, por exemplo), a relação com

amigos, familiares e com companheiros de trabalho foi fortemente marcada por um alto

grau de confiança, o que neutralizaria a ameaça considerada intrínseca a certas

atividades comunicativas. Tal resultado também influenciou o nível de diretividade e

frontalidade.

51

2.5 Síntese e discussão 2.5.1 Críticas à Teoria da Polidez de Brown e Levinson

Nesta seção, apresentamos uma síntese daquilo que tanto os modelos vistos em

2.2 quanto às propostas aplicadas à língua espanhola, em 2.4, criticam e/ou reformulam

na Teoria da Polidez de Brown e Levinson (1978).

1) Conceito de face Segundo Goffman (1980), o conceito de face pode ser entendido como imagem

social. Para ele, face é “[...] o valor social positivo que uma pessoa efetivamente

reclama para si [...] em termos de atributos aprovados socialmente”. Brown e Levinson,

igualmente, definem face como a imagem social ou pública do self que todos querem

reivindicar para si mesmos.

Para Scollon e Scollon (1995), na interação há um importante aspecto de

identidade tido como um elemento essencial à “participação”, ou seja, a identidade

interpessoal dos indivíduos envolvidos na interação. Este componente tem sido referido

como “face”. Face, portanto, segundo eles, é um conceito paradoxal por implicar dois

lados que estão em oposição: (a) a necessidade humana de manter / expressar algum

grau de independência em relação ao outro participante e (b) a necessidade humana de

estar envolvido com os outros participantes e mostrar-lhes este envolvimento.

Para Kerbrat-Orecchioni (1996), no que concerne à noção de face, face

negativa corresponde aproximadamente à noção de “território” de Goffman; e face

positiva corresponde, grosso modo, ao que a linguagem comumente chama ‘face’, que

alguém pode perder ou salvar, estando associada a orgulho, sentido de honra,

narcisismo e todos esses tipos de coisa. Para essa autora, portanto, face positiva

equivale à noção de Brown e Levinson que, por sua vez, é equivalente ao conceito de

face em Goffman.

Bravo (2003) explica que considera a noção de imagem social central para uma

teoria da polidez uma vez que, segundo ela, a imagem social é uma noção

52

psicosociológica, e essa descrição tem a virtude de conectar os conceitos de identidade

pessoal e social.

2) Noções de face / imagem negativa e positiva e relação entre face e polidez Lim e Bowers (1991) consideram que Brown e Levinson levam em conta

principalmente os atos que ameaçam a face negativa do outro (por exemplo: perguntas e

ordens). Eles, porém, mantiveram o conceito de face negativa, chamando-a de face da

autonomia. Esses autores também argumentam que Brown e Levinson negligenciam os

trabalhos de face direcionados à face positiva do outro, e combinam, em um mesmo

conceito, dois desejos humanos distintos: o desejo de inclusão e o desejo de aprovação.

O desejo de inclusão corresponderia, segundo eles, à face da camaradagem, na

qual os participantes querem ser considerados membros de um grupo. É o desejo de ser

aceito, de pertencimento. Os participantes adotam os valores de amizade e cooperação

na face da camaradagem. O segundo, o desejo de aprovação, corresponderia à face da

competência. É a necessidade de todo ser humano de ter suas habilidades reconhecidas

e suas ações respeitadas. A cada um desses desejos de face, Lim e Bowers fizeram

corresponder um tipo diferente de trabalho de face: solidariedade, ligada à face da

camaradagem; aprovação, ligada à face da competência e tato, ligado à face da

autonomia.

Scollon e Scollon (1995) definem e classificam três Sistemas de Polidez ou de

Face: Sistema de Deferência, Sistema de Solidariedade e Sistema Hierárquico. Tais

sistemas fazem uso de estratégias de polidez, que podem ser de dois tipos: de

envolvimento e de independência. Esses autores consideram, como Brown e Levinson,

que há três fatores que determinam a escolha dessas estratégias, que são: poder,

distância e grau de imposição (teor de risco).

Em língua espanhola, os estudos têm forte apoio em Bravo. As pesquisadoras

Boretti e Hernández-Flores abraçam como método de trabalho para o estudo da polidez

as propostas de Bravo, adotando as categorias de autonomia e afiliação. Boretti

considera que os estudos de Bravo proporcionaram um panorama estimulante para que

ela iniciasse o estudo do discurso da polidez em seu país, a Argentina, e refletisse sobre

53

possíveis motivações de ordem sociocultural que, ao afetar a relação interpessoal,

afetariam também o modo de falar dos argentinos.

Tanto para Bravo, quanto para Boretti e Hernández-Flores, as noções por elas

adotadas de autonomia e afiliação não resultam equiparáveis com a face negativa e, às

vezes, tampouco com a positiva, descritas por Brown e Levinson. Essas categorias de

autonomia e afiliação devem ser preenchidas dentro do âmbito de cada cultura em

particular.

Na visão de Kerbrat-Orecchioni (2001), o maior impedimento para o correto

funcionamento do modelo de Brown e Levinson é a extrema falta de clareza que

permeia as noções de negativo e positivo. Para ela, esses predicados se aplicam a dois

objetos diferentes: face e polidez e, por isso, ela propõe dissociar face negativa e face

positiva de polidez negativa e polidez positiva.

(1) polidez negativa (ou mitigadora) orientada à face negativa (por exemplo, abrandar uma ordem); (2) polidez positiva (ou valorizante) orientada à face negativa (por exemplo, um presente); (3) polidez negativa (ou mitigadora) orientada à face positiva (por exemplo, abrandar uma crítica ou um desacordo); (4) polidez positiva (ou valorizante) orientada à face positiva (por exemplo, um elogio, uma expressão de acordo, etc.). Kerbrat-Orecchioni (op.cit.) afirma que os atos que os participantes são

induzidos a produzir no curso da conversação podem possuir efeitos negativos (FTAs)

ou positivos (FFAs) sobre suas faces (um mesmo ato pode, naturalmente, aparecer sob

diversas categorias). As distinções entre FTA e FFA habilitam, além disso, a esclarecer

as noções de polidez negativa versus polidez positiva, confusas na teoria de Brown e

Levinson:

a) polidez negativa é abstencionista e compensatória por natureza: ela consiste em evitar a ocorrência de FTAs, ou de alguma maneira abrandá-los, quando os mesmos são postos em prática (princípio: “Poupar um ao outro”); b) polidez positiva tem, ao contrário, um caráter de traço producionista: ela consiste em realizar algum ato de elogio orientado ao outro ou à face do outro (princípio: “Elogiar um ao outro”).

Finalmente, ainda segundo essa autora, vale a pena ressaltar que a redefinição

dos termos negativo e positivo poderia aplicar-se também à impolidez (não definida por

Brown e Levinson): ‘impolidez negativa’ consiste em não produzir um FFA esperado

54

(cumprimentos, desculpas, agradecimentos, etc.) e ‘impolidez positiva’ consiste em

produzir um FTA não abrandado que poderia mesmo ser endurecido por algum tipo de

“maximizador”.

Albelda (2003) trabalha com polidez valorizante, seguindo as definições

propostas por Kerbrat-Orecchioni. Os conceitos de polidez e imagem abrangem

atividades de polidez (polidez positiva = valorizante; polidez negativa = mitigadora) e

atividades de imagem (face positiva e face negativa). A polidez mitigadora (de caráter

negativo) é preventiva e reparadora, enquanto que a polidez valorizante é de caráter

producionista, produz atos polidos, efetua FFAs (face flattering acts).

Essa autora concorda com Kerbrat-Orecchioni, para quem ambos os tipos de

polidez podem referir-se aos dois tipos de imagem. Como resultado, as relações entre

faces e tipos de polidez passam a constituir quatro tipos básicos de polidez (já descritos

acima).

Spencer-Oatey (2000) acredita que face é um fenômeno universal – todas as

pessoas possuem as mesmas preocupações fundamentais com a face – e que polidez é,

na verdade, um julgamento contextual: ‘nenhuma sentença é inerentemente polida ou

impolida’. O escopo da teoria da polidez tradicional é a manutenção e/ou promoção de

relações interpessoais harmoniosas.

3) Questão da universalidade X diferenças culturais Para Kerbrat-Orecchioni (1996) a polidez é universal porque, em todas as

sociedades humanas, se constata a existência de comportamentos que permitem manter

um mínimo de harmonia entre aqueles que interagem, apesar dos riscos de conflitos

inerentes a toda interação. Porém, ao mesmo tempo, a polidez não é universal na

medida em que suas formas e condições de aplicação variam sensivelmente de uma

sociedade para outra. Essa autora propõe introduzir um certo número de arranjos no

modelo proposto por Brown e Levinson, a fim de melhorar sua capacidade descritiva,

essencialmente a introdução da noção de Ato Lisonjeiro de Face (em inglês, Face

Flattering Act) em oposição à de Ato Ameaçador de Face (em inglês, Face Threatening

Act).

55

Bravo (2003) critica o modelo de Brown e Levinson, pelo menos a partir do

enfoque sociocultural. Segundo ela, o problema reside em que os aspectos negativo e

positivo da imagem social estão demarcados e/ou delimitados socioculturalmente e são

adequados para serem aplicados somente a algumas comunidades de fala inglesa.

As noções de face negativa e positiva, para essa autora, não podem ser

consideradas universais. Segundo ela, nem todas as culturas, como a japonesa, estão

preocupadas em ter liberdade de ação e em preservar seu território pessoal; tampouco,

todas as culturas, como a espanhola, possuem o desejo de obter aprovação e de que os

outros compartilhem seus desejos, opiniões e características pessoais. Em muitos

trabalhos, que não se encaixam totalmente nas expectativas criadas pelas categorias

universais propostas por Brown e Levison, as diferenças se justificam em conteúdos

socioculturalmente específicos da imagem social.

Pelos mesmos motivos, Hernández-Flores (2003) critica o modelo de Brown e

Levinson uma vez que, segundo ela, as características outorgadas por eles para as

imagens negativa e positiva não são válidas para descrever a imagem social que aparece

em todas as comunidades, isto é, essas características não são universais. De acordo

com o pressuposto de que a imagem social de uma comunidade é específica dessa

comunidade, essa autora prefere seguir a linha de Bravo, adotando as categorias de

autonomia e afiliação que devem ser preenchidas dentro do âmbito de cada cultura em

particular.

Boretti (2003), assim como Hernández-Flores, abraça como método de trabalho

para o estudo da polidez as propostas de Bravo (1999), adotando as categorias de

autonomia e afiliação que devem ser preenchidas dentro do âmbito de cada cultura em

particular.

2.5.2 Rapport como estratégia de envolvimento: um modelo teórico para análise

Na seção anterior, apontamos algumas inadequações da Teoria de Polidez de

Brown e Levinson. Nesta seção, vamos apresentar o quadro teórico em que sustentamos

a nossa matriz analítica, destacando os pontos de convergência com os autores

resenhados.

56

Mas, antes, é necessário enfatizarmos que, em nosso entender, a Teoria da

Polidez de Brown e Levinson é a teoria-mãe ou seminal da polidez. Se assim não o

fosse, todos os outros modelos não teriam nela se inspirado, com algumas críticas e/ou

reformulações, é verdade, mas sempre dela partindo. De acordo com Kerbrat-

Orecchioni (1996), atualmente e dentro do campo da pragmática interacional e do

domínio mais particular dos fenômenos da polidez, não parece existir competidor sério

com a teoria de Brown e Levinson.

Entretanto, por não dar conta de todas as questões relacionadas à polidez

positiva de forma cabal (que, para Brown e Levison, é sempre um ato de reparação),

escolhemos trabalhar também com o modelo de Kerbrat-Orecchioni, que optou por

introduzir um termo extra dentro desse modelo teórico para referir-se a atos que são, de

certo modo, uma cópia positiva dos FTAs (atos de ameça à face, face threating acts),

atos ao qual chamou de FFAs (atos lisonjeiros de face, face flattering acts).

Spencer-Oatey propõe o termo “gerenciamento de rapport” (rapport

management) em lugar de “gerenciamento de face” (face management) porque, segundo

ela, o termo face parece enfocar somente o self, enquanto que gerenciamento de rapport

sugere, por outro lado, um equilíbrio entre o self e o outro.

O enfoque do gerenciamento de rapport também é mais amplo: ele examina o

modo como a linguagem é usada para construir, manter e/ou ameaçar relações sociais e

inclui tanto o gerenciamento dos direitos sociais como os de face.

Rapport é um conceito que inclui uma gama de estratégias que têm como

objetivos a aproximação e o envolvimento. Algumas dessas estratégias fazem parte da

polidez positiva, porém rapport é um conceito mais amplo, pois ele pode envolver tanto

relações de harmonia quanto de conflito.

Como vimos, para Brown e Levinson, todos os atos supostamente ameaçam a

face (positiva ou negativa) do ouvinte. Por esse motivo, ao trabalharmos com as

estratégias de polidez positiva, que estão incluídas no escopo das estratégias de rapport,

temos que discordar de algumas abordagens que eles propõem, como o fizeram os

autores incluídos em 2.5.

57

Com relação aos atos que ameaçam a face negativa do ouvinte, Brown e Levison

elencam, entre outros, os cumprimentos e os elogios, pois indicam o desejo do falante

em relação ao ouvinte. Há, em nosso entender, uma outra leitura possível dessa

abordagem, pois os cumprimentos e os elogios são atos de polidez positiva que visam a

dar face ao outro e não a ameaçá-la.

Relembremos que, para Brown e Levison, os atos que ameaçam a face positiva

do ouvinte demonstram que o falante não se importa com os desejos do ouvinte. Dentre

estes, teríamos:

1) atos que mostram que o falante tem uma avaliação negativa de alguns aspectos da face positiva do ouvinte: expressar desacordo, críticas, ridicularização, insulto, questionamentos;

2) atos que mostram que o falante não valoriza, nem teme o que o ouvinte

teme: ser irreverente, falar de tabus ou coisas impróprias ao contexto, contar coisas desagradáveis sobre o ouvinte e agradáveis de si mesmo, demonstrar não-cooperação, interromper a fala do outro, não prestar atenção, marcar diferença de status através de termos de identificação.

Na nossa avaliação existem, nessa abordagem, atos que realmente podem

ameaçar a face positiva do ouvinte. Porém, para nós, alguns deles, a depender do

contexto em tela, podem não exercer tal função. Senão vejamos:

• expressar desacordo, críticas e/ou questionamentos: não necessariamente

expressam que o falante possui uma avaliação negativa da face positiva do ouvinte, pois, de acordo com Bravo (2003), a confiança interpessoal não requer que se compartilhem os desejos do interlocutor, nem que se aprovem suas características de personalidade, senão que se o aceite assim tal qual ele é, embora se o critique “abertamente” e se discorde daquilo que ele pensa (também “abertamente”): é mais importante conhecer uma pessoa do que aprová-la.

• interromper a fala do outro: há interrupções de natureza colaborativa na fala,

que não ameaçam e, sim, dão ou preservam a face do interlocutor; • ser irreverente: há situações que, em função do grau de intimidade entre os

participantes, podem ser aceitáveis ou sinalizar que o falante está agindo em tom de brincadeira;

• falar de assuntos tabu7: há casos em que, também em função do grau de

intimidade, existe a possibilidade de se abordar temas tidos como tabu naquela mesma cultura. 7 Para mais informações sobre este assunto, remetemos à dissertação Mecanismos de atenuação e

silenciamento no português xinguano. SOUZA, E. UFF, 2000.

58

Também concordamos com a posição de Kerbrat-Orecchioni que considera que

a polidez positiva tem um estatuto tão importante quanto àquele que a polidez negativa

exibe (ser polido numa interação significa produzir FFAs tanto quanto suavizar as

expressões dos FTAs): a polidez negativa é basicamente impolidez restritiva, porém

a polidez positiva é a verdadeira polidez (um elogio é ainda mais polido do que uma

crítica abrandada, a expressão de concordância é ainda mais polida do que um

desacordo mitigado, etc.).

Inspiramos nosso modelo também no de Albelda (2003), que inclui a noção de

polidez valorizante, prevendo dois modos de se reforçar a face dos interlocutores (= atos

de polidez valorizante): a direta, que realiza FFAs para a face positiva do interlocutor,

satisfazendo seus desejos de aprovação, e a indireta, que se manifesta através do acordo

com o feito ou dito pelo outro.

Partimos, também, da definição de Sistema de Solidariedade de Scollon e

Scollon (1995), para quem, em um sistema desse tipo, como uma conversa entre amigos

(caso do nosso corpus), há um alto grau de envolvimento, não havendo sentimentos de

diferença de poder entre os participantes da interação, nem de distância, já que os

participantes ocupam a mesma posição social. Por tratar-se de uma relação estreita (-D),

além de uma relação simétrica (-P), os participantes usam estratégias de envolvimento.

Conforme já apontamos, há várias definições para envolvimento. Em nosso

trabalho, vamos utilizar a definição mais lata de Scollon e Scollon (1995), que associa

envolvimento à assunção do ponto de vista do outro, ou a outros modos de sustentação

de uma visão de mundo partilhada.

Sob uma perspectiva mais restrita, adotamos tanto a definição de envolvimento

de Selting (1994), que o vê como uma noção interpretativa que se refere ao campo das

emoções e atitudes, codificadas através de pistas apropriadas aos enquadres

interpretativos em jogo na interação verbal, quanto aquela de significado afetivo de

Holmes (1984), que envolve a atitude do falante em relação ao ouvinte no contexto da

enunciação. Nesse sentido, entendemos que prestar atenção aos desejos de face dos

outros é um componente crucial no estabelecimento de uma relação de amizade.

59

Nossa escolha em adotar definições de envolvimento que dizem respeito ao

campo das emoções e do afeto se justifica ao levarmos em conta a natureza de nosso

corpus, composto por participantes que possuem, em um maior ou menor grau, relações

de amizade.

Concordamos com Briz (2004), que assevera que a proximidade e a

familiaridade fazem com que predominem certas manifestações da polidez, tais como

elogios, lisonjas e respostas colaborativas que reforçam o acordo daquilo que o outro

está dizendo, em resumo, a polidez valorizante. Pressupomos que, nesse tipo de

interações solidárias e interpessoais, os mitigadores são menos recorrentes, uma vez

que, na expressão dos atos dentro da interação, nada nem ninguém, em princípio, se

sente ameaçado pelo outro.

As estratégias de rapport que buscamos encontrar em nosso corpus são aquelas

enumeradas por Aston (1988): comunicação fática, cumprimentos, language play,

perguntas do tipo “como vai você?”, despedidas amigáveis, além daquelas utilizadas nas

estratégias de polidez positiva, e, nestas últimas, nos baseamos nas estratégias de

polidez de envolvimento de Scollon e Scollon (que são, com pequenas diferenças, as

mesmas descritas por Brown e Levinson).

60

3. METODOLOGIA 3.1 Critérios de constituição do corpus Nossa análise dos dados será de natureza essencialmente qualitativa e

interpretativa. Os resultados obtidos serão quantificados, se isto for possível e se fizer

necessário, para que padrões recorrentes possam ser estabelecidos.

O referencial metodológico adotado neste trabalho compreende uma análise,

através de uma perspectiva interacional e de uma abordagem qualitativa de estudo de

caso, de amostras de língua oral da cidade de Buenos Aires, levantadas com base em

gravações em fita cassete, a partir da quais vamos examinar a ocorrência de estratégias

de rapport.

Os dados foram coletados em uma pesquisa coordenada, na cidade de Buenos

Aires, pela Profª Drª Ana Maria Barrenechea, da Universidade de Buenos Aires,

publicada pelo Instituto de Filologia e Literaturas Hispânicas da Faculdade de Filosofia

e Letras dessa mesma universidade no ano de 1987, com o título “El habla culta de la

ciudad de Buenos Aires – materiales para su estúdio”. Trata-se de uma publicação em

dois volumes que oferece uma seleção de diálogos livres e entrevistas, gravados dentro

de “El proyeto de estudio coordinado de la norma lingüística culta de las principales

ciudades de Iberoamérica y de la Península Ibérica”.

Este projeto nasceu por iniciativa do Dr. Juan M. Lope Blanch. O sentido da

expressão “norma lingüística culta” que aparece no título deve-se ao fato de o critério

do projeto centrar-se na fala das pessoas com educação superior (ou de um nível

semelhante). O motivo dessa escolha deu-se em razão da urgência de aplicação de seus

resultados nesse nível de ensino. O projeto descreve o espanhol falado nas grandes

cidades (especialmente nas capitais), com o intuito de determinar as características que

costumam gozar de maior prestígio em cada país, em um idioma tão extendido

geográfica e politicamente.

Deve entender-se, portanto, que a palavra norma que aparece no título do projeto

não foi utilizada, nesse projeto, com sentido prescritivo ou impositivo, e, sim, com

sentido de língua standard, generalizado na terminologia lingüística.

61

Desse projeto, constam diálogos livres e entrevistas. Dentre eles, selecionamos

apenas diálogos livres, escolhendo três nos quais os participantes possuem laços de

amizade ou de familiaridade.

3.2 Características da pesquisa: um estudo de caso Como já citado no início em 3.1, a presente pesquisa adota um enfoque

interacional de base interpretativista, e, nela, se utiliza o método de análise qualitativo,

dentro da abordagem de estudo de caso.

A expressão “pesquisa qualitativa” compreende um conjunto de diferentes

técnicas interpretativas que visam a descrever e a decodificar os componentes de um

sistema complexo de significados.

Há, pelo menos, três diferentes possibilidades oferecidas pela abordagem

qualitativa: a pesquisa documental, o estudo de caso e a etnografia. Segundo Godoy

(1995, p. 25), o objeto do estudo de caso é a análise profunda de uma unidade de estudo,

que visa ao exame detalhado de um ambiente, de um sujeito ou de uma situação em

particular. Optamos por trabalhar com a abordagem estudo de caso, pois nosso objetivo

é uma análise aprofundada de cada situação que emerge em cada um dos três diálogos

analisados.

Para Garcez (1996, p. 45-46), [...] a Sociolingüística Interacional está interessada na interpretação dos

significados sociais e lingüísticos na conduta da interação humana. Focaliza a análise da produção e da interpretação de enunciados que ocorrem naturalmente em contexto social situado. Com diferentes origens na Antropologia, Lingüística e Sociologia, este ramo da sociolingüística investiga linguagem, cultura e sociedade, derivando seus insights básicos do trabalho de Goffman sobre o papel da linguagem na ordem interacional e do trabalho de Gumperz sobre o papel da cultura na contextualização da linguagem. Partilha também muitas de suas metas e pressupostos com a Análise da Conversação etnometodológica, com tradição na Sociologia.

Na análise do discurso, a abordagem interacionista enfatiza a necessidade de se

privilegiar o discurso dialogado oral, tal como ele se realiza nas diversas situações da

62

vida cotidiana. É, de fato, onde ocorre o mais forte grau de interatividade. Portanto, a

comunicação “face a face” é, sob esse ponto de vista, a mais representativa dos

mecanismos próprios da interação.

Essa abordagem colocou em evidência a importância do papel que exercem na

elaboração do discurso certos fenômenos completamente negligenciados até então pela

descrição gramatical, tais como: marcadores conversacionais, repetições, reformulações,

truncamentos, retificações, hesitações e outros procedimentos de “reparação”. Os

discursos são, nessa perspectiva, concebidos como construções coletivas, sendo que

todos os seus componentes podem prestar-se à negociação.

Concordamos com a perspectiva de Goffman (2002), segundo a qual a posição do

interlocutor é a de quem procura entender o significado do discurso a partir do contexto

interacional, indagando sempre onde se situa o contexto de fala, “onde está a realidade

de uma dada interação?”, “o que está acontecendo?”, “por que isso agora?”

Nesse viés analítico, segundo Garcez (2002, p. 8),

[...] tanto o falante quanto o ouvinte têm papéis ativos na elaboração da mensagem e na definição de ‘o que está se passando aqui e agora’. Não há, portanto, significado que não seja situado. A noção de contexto ganha relevância, passando a ser entendida como criação conjunta de todos os participantes presentes ao encontro e emergente a cada novo instante interacional.

Garcez (op. cit, p. 8:) afirma, ainda, que os participantes levam em consideração

não somente os dados contextuais relativamente mais estáveis – quem fala para quem,

referência (sobre o quê), espaço (em que lugar) e tempo (em que momento) _ levam em

conta, sobretudo, o modo pelo qual cada um dos presentes sustenta e sinaliza o contexto

interacional em andamento.

A Análise da Conversa demonstrou, repetidamente, que as conversas são

realizações cooperativas, em que se podem observar os membros trabalhando firme para

coordenar suas ações com as de seus interlocutores. Ao isolar pequenas seqüências de

fala, ela revela novas maneiras de se estudar o que as palavras fazem na interação.

Adotamos, em nossa análise, a perspectiva de Duranti (1997), que considera que,

em muitos casos, não podemos dizer a priori quais aspectos do contexto serão

63

relevantes. Os analistas da conversa têm argumentado que a única maneira

empiricamente adequada de se evocar o contexto é atentar para o que é posto em

relevância pelos próprios participantes, através de suas ações lingüísticas, sendo que a

idéia é que a busca pelo contexto começa, de fato, com a fala ou com outra conduta que

esteja sendo analisada.

Por fim, cumpre enfatizar que nossa escolha pela perspectiva interacional deveu-

se, principalmente, ao fato de trabalharmos com o discurso dialogado oral, ou seja, com

a comunicação face a face, tipo de discurso mais representativo dos mecanismos

próprios da interação. Essa abordagem também põe em evidência a importância de

certos fenômenos que examinaremos (repetições, reformulações, hesitações, etc.). Nela,

a noção de contexto é de extrema importância, uma vez que não há significado que não

esteja situado. O contexto, nessa perspectiva, pode ser entendido como uma criação

conjunta de todos os participantes, que sinalizam e sustentam o contexto interacional em

curso.

3.3 Proposta de modelo de análise do corpus A seguir, descreveremos a proposta de modelo de análise para os dados que

norteou nosso trabalho. A análise foi dividida em duas partes. Na primeira parte fizemos

uma análise macro que mostra, em um primeiro momento e de forma geral, como se dá,

seqüencialmente, o gerenciamento de conflitos e como as partes se orientam e se

mostram interessadas na manutenção do rapport. Em um segundo momento,

procedemos a uma análise que mostra como os participantes se alinham com o intuito

de aumentar / maximizar rapport. Na segunda parte da análise ilustramos o uso de

micro estratégias destinadas à manutenção de rapport e aquelas destinadas à

maximização de rapport.

Nossa pesquisa norteou-se na proposta de análise de rapport que tem como base

a orientação dos participantes. Verificamos, na primeira parte da análise, como ocorrem

em nossos dados as negociações e o gerenciamento de conflitos. As partes orientam-se

e mostram-se interessadas na manutenção do rapport (harmonia) da relação, através de

estratégias que visam à atenuação / minimização de atos tidos como ameaçadores de

64

face, como também alinham-se no sentido de construção de aumento / maximização de

rapport.

Finalmente, no capítulo “conclusão”, que é destinado à discussão dos resultados,

realizamos uma associação entre as orientações dos participantes (análise macro) e a

escolha e o uso de micro estratégias lingüístico-discursivas.

Partimos dos parâmetros teóricos de Spencer-Oatey (2000, p.29-30) que, como

já citado anteriormente, define quatro tipos de orientações de rapport:

1) estratégias destinadas à manutenção de rapport; 2) estratégias destinadas ao aumento / maximização de rapport; 3) estratégias destinadas ao negligenciamento de rapport; 4) estratégias destinadas ao questionamento de rapport. Porém, diferentemente dessa autora, segmentamos nossa análise em duas

orientações principais (estratégias 1 e 2) e duas secundárias (estratégias 3 e 4), que

aparecem subjacentes às outras.

1) Estratégias destinadas à MANUTENÇÃO de rapport: desejo de manter ou

proteger a qualidade das relações em curso e o nível de rapport entre os interlocutores.

Nesta orientação, existem dois tipos de diretrizes, dependendo da situação, para lograr o

efeito desejado:

(i) escolher apropriadamente termos de tratamento, de saudação, honoríficos,

etc.; (ii) lidar apropriadamente com atos de ameaça à face. Alguns exemplos desse

tipo de ato: ordens, críticas, reclamações, desacordos e ameaças.

O foco se dá através da negociação / evitação de conflito / desacordo. Nos dados

isso ocorre nos tópicos problemáticos e/ou delicados (conflito gerado por enquadres

distintos) e mal-entendidos. Analisaremos como o conflito é introduzido, gerenciado

seqüencialmente no curso da interação (atenuado / minimizado ou não, ignorado pelo

outro, etc.), resolvido ou não, abandonado / evitado.

2) Estratégias destinadas ao AUMENTO / MAXIMIZAÇÃO de rapport:

desejo de aumentar ou fortalecer relações harmoniosas entre os interlocutores. O foco

ocorre através de estratégias de maximização de solidariedade / consenso / cooperação.

65

A principal função das estratégias é sinalizar que os participantes compartilham

conhecimento de mundo, lembranças, pontos de vista, avaliações, etc.

3) Estratégias destinadas ao NEGLIGENCIAMENTO de rapport: falta

interesse na qualidade das relações, e pode ocorrer em situações em que o foco maior

está na informação / conteúdo ou nas tarefas e menos na qualidade das relações. As

razões para se negligenciar rapport podem ser: estar mais preocupado em manter a

própria face do que na manutenção do rapport da relação; não se importar com a

relação por algum motivo qualquer; etc.

4) Estratégias destinadas ao QUESTIONAMENTO de rapport: desejo de

questionar ou impedir relações harmoniosas entre os interlocutores; desejo por mudança

negativa, prejudicando o rapport entre os interlocutores. Podem ter diversos motivos,

tais como: marcar independência, devolver uma ofensa recebida (causar

deliberadamente a perda de face das pessoas é uma maneira de consegui-lo), etc.

Na primeira parte da análise, focalizamos os aspectos interacionais de ordem

macro, que definem o que está acontecendo ao longo da interação (ex.: é o

gerenciamento de um conflito?; é a tentativa de manter de relações amistosas?). Na

segunda parte, nos detivemos no exame das micro-estratégias, com o objetivo de olhar

para os detalhes da interação. Segmentamos as micro-estratégias encontradas em dois

tipos, as destinadas à manutenção de rapport e as orientadas à maximização de rapport.

2A) Micro estratégias destinadas à MANUTENÇÃO de rapport: gerenciamento / mitigação de conflito

As principais estratégias destinadas à manutenção de rapport encontradas foram:

reivindicação de acordo e/ou evitação de conflito; concordância com ressalva / pseudo-

acordo; formas de reparo e de auto-correção; perguntas ou pedidos de esclarecimento

(pedir explicações); oferecimento de razões ou explicações (tipo escusa / justificativa);

negociação e/ou recusa de pressuposições / inferências.

66

2B) Micro estratégias destinadas à MAXIMIZAÇÃO de rapport: maximização / aumento de acordo / compartilhamento

As principais estratégias destinadas à maximização de rapport encontradas

foram: co-construção de tópico, de elocução, de avaliações (construção colaborativa);

concordância de idéias ou consenso de opiniões; hetero-repetição colaborativa; uso de

language play; endereçamento afetivo (formas de tratamento, uso de apelidos); uso de

diminutivos (linguagem afetiva); adjetivação avaliativa; uso de marcadores discursivos

de acordo / consenso; uso de elogios; estratégia de modéstia.

67

4. CONVERSA COTIDIANA ENTRE AMIGOS E FAMILIARES NA CIDADE DE BUENOS AIRES: suas especificidades

4.1 Situando conversa entre amigos e familiares

Nesta seção, definimos, em termos gerais, as características prototípicas da

conversa, com base em Albelda (2004) e, na seqüência, apontamos as especificidades

do espanhol coloquial tal como Briz (1996) as define.

Uma conversa, segundo Briz (1998), se define como um conjunto sucessivo e

alternante de turnos de fala ocupados por diferentes falantes. A não predeterminação de

tal alternância é sua característica distintiva frente a outros discursos dialogais (por

exemplo, um debate, uma diálogo livre, manifestações nas quais dita alternância de

turno está predeterminada), o que não significa que a tomada ou cessão de turno não

fiquem submetidas, em último extremo, a certos princípios ou convenções

socioculturais. Portanto, desde esse ponto de vista social, a conversa se ordena e

progride através de unidades chamadas de turnos e da alternância de turnos.

Segundo Albelda (2004, p. 110-113), o espanhol coloquial que reflete um tipo de

registro de fala é usado, prototipicamente, em conversas mantidas em situações

comunicativas informais. Um registro é uma modalidade de uso determinada pelo

contexto comunicativo. Existem registros formais e informais e, entre eles, não há uma

linha divisória e, sim, um continuum de traços que permite identificar registros

intermediários.

Com relação ao registro informal ou coloquial, ainda segundo Albelda, os traços

que o definem se encaixam perfeitamente na modalidade discursiva da conversa, de

maneira que, habitualmente, a conversa adota o registro coloquial sendo, por esse

motivo, o modo discursivo prototípico do coloquial.

A conversa é uma modalidade discursiva que se caracteriza,

preponderantemente, por interlocuções em presença (face a face), imediatas, com

tomadas de turno não predeterminadas, dinâmicas e cooperativas. A essas

características, Albelda acrescenta aquelas próprias do registro coloquial. Para ela, a

caracterização global da conversa coloquial, em linhas gerais, pode ser assim definida:

68

1) Características ou traços situacionais:

• relação de igualdade (social e funcional) entre os interlocutores; • relação vivencial de proximidade entre os interlocutores; • marco de interação familiar, cotidiano; • temática não especializada.

2) Características ou traços discursivos:

• finalidade interpessoal; • tom informal; • ausência de planejamento prévio; • tomada de turno não predeterminada; • dinamismo, presença de tensão dialógica.

Segundo Briz (1996, p. 29-30), o espanhol coloquial possui as seguintes

características:

(i) É um registro, nível de fala, um uso determinado pela situação, pelas circunstâncias da comunicação.

(ii) Não é domínio de uma classe social, mas, sim, tal e qual como é entendido aqui, caracteriza as realizações de todos os falantes de uma língua. É certo que é o único registro que dominam os falantes de nível sociocultural baixo, meio-baixo, porém em absoluto é exclusivo deles.

(iii) Não é uniforme, nem homogêneo, já que varia segundo as características dialetais e sócio-dialetais dos usuários.

(iv) Reflete um sistema de expressão que, mais que simplificação do registro formal ou do uso escrito, parece ser a continuação e desenvolvimento do modo pragmático da comunicação humana.

(v) Além de ser oral, pode refletir-se ou manifestar-se no texto escrito. (vi) Aparece em vários tipos de discurso, se bem que é na conversa, como uso mais

autêntico da linguagem, onde também mais autenticamente se manifesta esta modalidade lingüística tornando-se, portanto, o lugar mais adequado para iniciar seu estudo.

4.2 Situando polidez positiva e rapport no contexto de nosso corpus

Neste item, apresentamos uma breve revisão das noções relevantes de polidez

positiva e de rapport em que sustentamos nossa matriz analítica e elencamos os

recursos lingüístico-discursivos que, em princípio, poderiam ocorrer em nosso corpus.

Como já dito anteriormente, a polidez positiva pode ser definida como

estratégias utilizadas na fala em interação, que visam azeitar as relações sociais através

69

do reforço da imagem do outro. Ela é producionista, isto é, produz atos polidos, efetua

FFAs (atos lijonseiros da face, face flattering acts).

Nossas expectativas quanto às respostas fornecidas pela análise podem ser assim

detalhadas:

● Em situações sociais de familiaridade, parâmetro social básico dos usos lingüísticos do espanhol coloquial, os atos de polidez positiva objetivam o fim social, no sentido de que visam a fortalecer a imagem do outro, que supõe, por sua parte, o fortalecimento das relações sociais.

● O tipo de situação em jogo determina a natureza da polidez, que pode ser entendida de dois modos: como norma social de comportamento e como estratégia conversacional.

� Em contextos informais de situações de familiaridade, tal como se configura no nosso corpus, a polidez atua como estratégia conversacional e, para isso, contribuem os atos de reforço da imagem social positiva do self e do outro.

� Há dois de modos de se reforçar a face (= atos de polidez valorizante) dos interlocutores: diretamente, através de FFAs que reforçam a imagem positiva do interlocutor, satisfazendo seus desejos de aprovação e, indiretamente, através de acordo com o feito ou dito pelo outro.

� As contribuições comunicativas de cada participante se redefinem no intercâmbio com seu interlocutor ao longo da conversa, uma vez que a polidez é, em última instância, uma função da avaliação do ouvinte.

� A noção de construção de rapport (rapport-building) é um termo guarda-chuva, que abriga uma gama de estratégias, que possibilitam aproximação e envolvimento, e podem incluir trocas de language play, isto é, atividades criativas não associadas com a comunicação fática como esta tem sido tradicionalmente concebida, mas que envolvem modelagem de formas lingüísticas, criação de realidades alternativas e uso social para gerar intimidade ou conflito. Atividades de language play (comportamentos provocadores ou brincalhões, piadas, jogos lingüísticos com nomes e outros tipos de jogos de palavras) são atividades que, do mesmo modo que small

talk ou comunicação fática, parecem estar orientadas para metas que envolvem relacionamento, embora também possam servir a outras metas.

� A comunicação fática é um tipo de conversa interacional utilizada na negociação do rapport positivo, que faculta o estabelecimento e a manutenção de relações amigáveis, através de formas convencionalizadas ou de usos individualizados e criativos da linguagem.

Dentre os principais recursos lingüístico-discursivos usados no espanhol de

Buenos Aires para construir rapport, esperamos encontrar em nossos dados:

• uso exagerado da adjetivação (que expressa maior afetividade); • uso de formas de tratamento, em especial de vocativos (diminutivos, apelidos, etc., demonstrando carinho e relações afetivas); • construções conjuntas e colaborativas da fala; • reivindicação de acordo através da busca de consenso; • estratégias de language play;

70

• elogios; • estratégia de modéstia; • perguntas ou solicitação de esclarecimento (demonstrando interesse); • explicações (ou razões) dadas ao interlocutor; • repetição do enunciado (em parte ou na totalidade) do interlocutor; • diminutivos, expresssando afetividade; • interrupção colaborativa; • emprego dos verbos performativos, como creer e parecer relativizando a opinião do falante, além de fórmulas estereotipadas e expressões modalizadoras, como para mí, a

lo mejor, no sé, yo que sé, oye, hombre, mujer, ¿no?, ¿entiendes?, ¿¡qué quieres que te diga? empregadas com função minimizadora.

4.3 Situando o comportamento e o modo lingüístico do argentino Nesta seção, ilustramos alguns aspectos de polidez relativos ao comportamento e

à codificação lingüística do argentino, em confronto com outros padrões culturais

diferentes.

Partimos do princípio de que a polidez não é exercida em todos os lugares da

mesma maneira, nem nas mesmas circunstâncias. Logo, trata-se de se determinar se ela

se reduz ou não em todos os lugares a um conjunto de estratégias de deferência /

valorização da imagem e de respeito ao território do outro. Como fenômeno variável, a

hipótese de uma teoria universal do uso polido da linguagem é posta em xeque ao se

tentar aplicá-la em diferentes tipos de sociedade e de cultura.

Nessa perspectiva, a proposta de Haverkate (1994) de diferenciar culturas de

aproximação e culturas de distanciamento é um ponto de partida importante para se

entender o uso distinto de estratégias polidas. Assim, por exemplo, o fato de não se

utilizar gentilezas ou de sempre se agradecer é algo explicável e natural em uma cultura

de distanciamento, assim como o é o fato de as gentilezas serem freqüentes e de se

considerar inadequado estar sempre agradecendo em uma cultura que tenda à

aproximação.

A polidez não se modaliza nem se entende igual nas distintas línguas e culturas,

de maneira que, tampouco, é estranho que, para um espanhol, o agradecimento ao estilo

holandês seja excessivo, exagerado, ou vice-versa, que um holandês não entenda uma

forma tão freqüente da polidez espanhola, como as gentilezas.

Briz (2004) entende que tal distinção proposta por Haverkate (op.cit.) entre

culturas de aproximação e culturas de distanciamento, assim como a proposta de Bravo

71

(cf. 1999, p. 169; 2002, p. 144-115), segundo a qual um dos conteúdos fundamentais da

imagem de autonomia espanhola é a expressão de auto-afirmação, são fundamentais

para se para entender o uso distinto de estratégias polidas em diferentes culturas.

Ainda na visão de Briz, os conteúdos culturais de privacidade da cultura anglo-

saxã e de confiança da cultura espanhola, além de codificarem a polidez, constituem

filtros que permitem explicar diferentes interpretações do polido e dos mecanismos

lingüísticos empregados. Esses “ideomas” polidos, característicos de cada cultura ou

grupo social, inclusive de cada indivíduo, tornam prioritária a proteção de certas

imagens próprias ou alheias e, por isso, predeterminam ou favorecem a conveniência de

se atenuar (ou de se valorizar), em maior ou menor medida, certos temas ou tópicos

considerados mais socialmente conflitivos. Uma conversação polêmica geralmente

favorece a presença de atenuantes polidos, principalmente se as imagens ficam

comprometidas.

Já segundo Markus e Kitayama (1991), pessoas de diferentes culturas têm

construções marcadamente diferentes do self e do outro, variando também a forma

como se dão as relações de interdependência entre eles. Para eles, as culturas se

diferenciam em coletivistas e individualistas, categorização esta que equivale às

chamadas culturas de aproximação e de distanciamento propostas por Haverkate (op.

cit.).

Para esses autores, as ditas culturas coletivistas insistem na relação fundamental

entre os indivíduos, sendo enfatizada a forma como as pessoas se adequam e mantêm

uma relação harmoniosa entre si. Já as culturas individualistas valorizam a forma como

o indivíduo descobre / expressa seus atributos internos singulares e se identificam com a

perspectiva ocidental do self. As culturas da América do Norte e da Europa Ocidental

são exemplos dessa cultura individualista.

Uma outra forma de se denominar essas diferentes concepções de self seria a de

tratá-las como construções interdependentes (culturas coletivistas) e independentes

(culturas individualistas) de self.

As diferenças entre construção independente e interdependente de self são

ilustradas no quadro a seguir, através de um quadro contrastivo:

72

CARACTERÍSTICA COMPARADA

CONSTRUÇÃO INDEPENDENTE DO SELF

CONSTRUÇÃO INTERDEPENDENTE DO

SELF

Definição de self separada do contexto social conectada ao contexto social Estrutura limitada, unitária, estável flexível, variável Características importantes internas, privadas (e.g.

habilidades, pensamentos e sentimentos)

externas, públicas (e.g. status, papéis e relações)

Tarefas • ser único; • expressar o self; • perceber os atributos internos; • estimular / promover as

próprias metas; • ser direto: “dizer o que está na

mente”

• pertencer, adequar-se; • ocupar seu próprio espaço; • engajar-se em ações

apropriadas; • estimular / promover as metas

dos outros; • ser indireto: “ler a mente do

outro” Papel dos outros • avaliação do self: os outros

são importantes para a comparação social, para a avaliação espelhada

• definição do self: as relações com os outros em contextos específicos definem o self.

Base para a auto-estima • habilidade em expressar o self, validar atributos internos

• habilidade de ajustar, restringir o self, de manter harmonia com o contexto social

Quadro 2: Construção independente e interdependent de self (fonte: MARKUS; KITAYAMA, 1991, p. 229)

Tal quadro constitui um sumário, breve e simplificado, de algumas das

diferenças hipotéticas entre construções independentes e interdependentes de self,

constituindo parte de um repertório do esquema de self usado para avaliar, organizar e

regular a experiência humana nas diferentes culturas. Markus e Katayama (1991)

ressaltam, contudo, que o conceito de self deriva-se não só de um esquema ‘cultural’ de

self, que é o foco de seu estudo, mas de uma completa configuração de esquemas de self

que sofrem a interferência de outras variáveis, tais como gênero, raça, religião, classe

social, além de fatores decorrentes da história de desenvolvimento pessoal e social de

cada indivíduo. Paralelamente às diferentes construções de self e, conseqüentemente,

aos diferentes valores sócio-cognitivos, afetivos e culturais a ele associados, podemos

identificar diferentes estratégias de trabalhos de face dirigidas ao self e/ou dirigidas ao

outro. Essas diferenças, como já apontamos, estão retratadas nas orientações das teorias

e modelos sobre face e trabalhos de face aqui resenhados.

73

De uma sociedade para outra, os comportamentos de polidez variam

consideravelmente, tanto quantitativa como qualitativamente, como apontam Markus e

Katayama (op. cit.):

� Em termos quantitativos, os procedimentos de polidez podem ser mais ou menos numerosos e freqüentes conforme as sociedades. O uso do agradecimento é menos freqüente em espanhol do que em francês. � Em termos qualitativos, o agradecimento, em árabe, pode tomar a aparência de uma fórmula de bendição, e, em japonês, a de uma fórmula de desculpa; na França, suaviza-se um pedido principalmente pela formulação indireta através do modalizador poder ou querer; porém, em outros lugares, o pedido pode ser suavizado por outro tipo de marcador. Uma mesma fórmula ou um mesmo procedimento de polidez pode receber valores diferentes, inclusive opostos, de uma sociedade para outra. Essas diferenças de ordem cultural, quantitativas e qualitativas, porém, não põem

em xeque os fundamentos do modelo de Brown e Levinson, que se estima sujeito a

restrições, tanto acerca do que deve ser considerado como um FTA ou um FFA em uma

situação dada, nas culturas e nas diferentes situações de fala inter- e intraculturais,

quanto acerca do que deve ser considerado polido em uma dada situação e não polido

em outras (em numerosas sociedades, é muito mal visto agradecer a um familiar).

É preciso, por isso, considerar como impolido a ausência de agradecimento? Não

o é mais do que para nós, que projetamos sobre usos estrangeiros (e, portanto,

estranhos) nossas próprias normas.

Concebido para pôr em evidência certos princípios universais do uso da

linguagem, a saber, os que permitem uma gestão harmoniosa da relação interpessoal, o

modelo de Brown e Levinson permite, mediante um certo número de

acondicionamentos, vislumbrar certas diferenças no funcionamento da polidez de uma

cultura a outra.

Kerbrat-Orecchioni (1996) assinala, a este propósito, que, se no texto de Brown e

Levinson existe etnocentrismo, este se localiza essencialmente na importância, sem

dúvida excessiva, conferida aos procedimentos de não imposição (polidez negativa)

que, com efeito, desempenham um papel crucial no funcionamento da polidez ao modo

ocidental: enquanto que, na China, certos pedidos podem ser percebidos como FFAs (na

medida em que honram seu destinatário, brindando-o com a ocasião de desempenhar o

74

papel de benfeitor), por outro lado, na França, parece que todo pedido conserva algo de

seu caráter “impositivo” e que não pode, por isso, ser considerado como polido, senão

com a condição de ser suavizado.

Em princípio, segundo essa autora (op.cit.), não parece irracional admiti-lo, se

forem comparados o número e a freqüência das formas e das fórmulas de polidez

vigentes nas sociedades consideradas. Contudo, a polidez não se deixa quantificar tão

facilmente, seja pelo aspecto das diferenças culturais aqui ilustradas, seja porque uma

sociedade não é nunca homogênea: os comportamentos de seus membros variam

segundo o subgrupo ao qual pertencem (problema de variação “interna”) e, também

segundo, as situações comunicativas. Por exemplo, na Rússia os comportamentos

mudam sensivelmente conforme o intercâmbio se efetue na esfera pública ou em um

espaço privado. Na China, a extrema aspereza dos encontros comerciais ou de serviço

contrasta com a afabilidade da qual dão prova em outros tipos de situações. Em outras

sociedades, todavia, é a oposição relação dentro do grupo (relation in-group) versus

relação fora do grupo (relation out-group) a que acarreta diferenças radicais de

comportamento, por exemplo, no Japão e na Coréia.

Essas diferenças nas lógicas culturais subjacentes aos comportamentos de

polidez podem, segundo Kerbrat-Orecchioni (op.cit.), acarretar más interpretações nos

intercâmbios interculturais e convidam a uma maior prudência no que concerne à

questão de saber se certas sociedades são mais polidas do que outras. A respeito disso,

quando se trabalha a partir de uma perspectiva comparativa, a primeira questão que

convém destacar, anterior a de como se exerce a polidez, é esta outra: para quem e em

que situação se exerce o dever da polidez?

Por isso mesmo, ela conclui (op.cit.), o estudioso da polidez deve ser prudente, já

que uma reflexão sistemática sobre variações culturais pode contribuir para a luta contra

reflexos xenófobos que, muitas vezes, residem no desconhecimento da amplitude de

variações que afetam as normas comunicativas e, mais especificamente, as regras da

polidez lingüística.

Cada cultura (ou inclusive cada indivíduo) concede mais importância a

determinadas ações e temas, ou dá maior relevância a certas imagens. A maior ou menor

75

problematicidade temática se revela, de acordo com cada cultura, em um continuum

que vai desde temas corriqueiros ou banais, passando por temas polêmicos, até,

inclusive, os temas tidos como tabu. De acordo com Aston (1988, p. 304), o processo de

rapport pode envolver desde compartilhamento de atitudes até controvérsias sobre

temas potencialmente conflituosos.

O grau de aceitação que o falante supõe que vai obter previamente, assim como o

grau de solidariedade entre os interlocutores (sua distância ou aproximação social ou

funcional, sua distância ou proximidade vivencial), o fim predominante da interação

(interpessoal ou transacional) e o contexto cultural são fatos que favorecem certos usos

que, em nenhum caso, podem ser avaliados de modo polarizado, nem sequer como

graus de maior ou menor polidez.

A solidariedade se refere às relações de proximidade e simetria entre os

interlocutores. As interações de maior relação de proximidade são aquelas nas quais

existem ou se percebem entre os interlocutores maior presença de vivências comuns,

saber compartilhado, maior contato, maior grau de compromisso afetivo. São interações

simétricas aquelas nas quais existem ou se percebem entre os participantes da interação

maior igualdade funcional, maior identidade grupal, maior nivelação de papéis

(sobretudo os derivados das características socioculturais, como idade, gênero,

profissão, etc.).

Para concluir esta seção, remetemos às pesquisas já citadas de Boretti e

Hernández-Flores (cf. seções 2.3.3 e 2.3.5) que, diferentemente da nossa pesquisa,

utilizaram o método de análise quantitativo. Nossa pesquisa, como já enfatizamos, é de

enfoque interacional e de base interpretativista, na qual se utiliza o método de análise

qualitativo.

Segundo os resultados de Boretti (2003), a categoria de autonomia argentina

pressupõe as seguintes características: auto-estima, auto-afirmação; enquanto que a

categoria de afiliação argentina inclui as características a seguir: disponibilidade,

confiança, sinceridade, reciprocidade, generosidade, hospitalidade.

Já os resultados de Hernández-Flores (2003) apontaram uma característica de

afiliação na comunidade cultural espanhola: o valor da confiança descrito por Bravo

76

(2003) segundo o qual, dentre as características da imagem de autonomia espanhola,

estão o desejo de mostrar-se original e consciente das boas qualidades próprias, e,

dentro da imagem afiliativa, existe o ideal de “confiança”, isto é, saber a que se ater

com respeito ao outro e o que se pode falar sem temor a ofensas ou sem temer ofender o

outro.

Hernández-Flores colheu, em sua pesquisa, evidências de que falar com

confiança refere-se a um estilo comunicativo que supõe falar abertamente, sem reservas,

com franqueza; ter confiança em alguém, a um tipo de relação afetiva que alude à

proximidade; fazer algo porque se tem confiança, a um tipo de atuação em

conformidade com a própria personalidade, sem medo de ofender ao outro, sabendo que

esta conduta será recebida com naturalidade; ser alguém de confiança. Refere-se, por

fim, a ser muito próximo de alguém, conhecer-lhe bem, como alguém da família.

Freqüentemente pode ver-se escrito que as conversas coloquiais espanholas são

menos polidas que as formais, até mesmo que a conversa espanhola peninsular em geral

é menos polida que a de outras culturas.

De acordo com Briz (2003), nenhuma das considerações anteriores é correta. Por

um lado, o que realmente é constatável é que, nas coloquiais, prototipicamente

solidárias e interpessoais, os atenuadores, como procedimentos lingüísticos de

expressão da polidez mitigadora, são menos freqüentes, pois sua presença excessiva

contradiria o fim das mesmas, essa familiaridade e solidariedade prévia ou buscada

pelos interlocutores.

Segundo Bravo (2003), entre espanhóis, em situações de negociação, não se

manifesta o território pessoal, enquanto que no nível “gregário” se procura tratar o outro

de forma familiar e conseguir níveis de confiança no interpessoal. A confiança

interpessoal não requer que se compartilhem os desejos do interlocutor, nem que se

aprovem suas características de personalidade, senão que se aceite o interlocutor tal qual

ele é, embora se o critique abertamente e se discorde daquilo que ele pensa (também

abertamente): é mais importante conhecer uma pessoa do que aprová-la.

77

5. CONVERSA ENTRE AMIGOS E FAMILIARES: ESTRATÉGIAS DE ENVOLVIMENTO E DE RAPPORT O corpus com o qual trabalhamos é composto por três diálogos livres. Note-se

que, abaixo do número de cada amostra (diálogo), seguem uma descrição dos

participantes e, logo após, comentários sobre eles. As descrições foram extraídas do

corpus e foram redigidas pelos autores do projeto; já os comentários foram por mim

elaborados para dar conta dos objetivos deste trabalho.

Seguem, portanto, as descrições dos participantes e os comentários sobre as

relações existentes entre eles, relações essas que podem ser inferidas através de pistas

do discurso.

Diálogo livre número 1: participantes Marta e Tereza

Amostra XXIX

Corresponde à amostra nº 240, fita CXX-A. Diálogo livre. Duração: 47 minutos. Tema: campainhas e portas, ensino de alemão, amigas, idiomas. O participante A (nº 278 de nosso arquivo) é uma mulher de 67 anos, solteira, nascida em Buenos Aires, onde sempre residiu. Já viajou à Europa, ao Oriente e ao Uruguai. Profissão: professora de Filosofia. Fala alemão e francês. Seu pai, advogado e fazendeiro, e sua mãe, dona de casa, também são de Buenos Aires. O participante B (nº 279 de nosso arquivo) é uma mulher de 70 anos, solteira, nascida em Buenos Aires, onde sempre residiu. Já viajou à Europa, ao Oriente e à América. Profissão: professora de Filosofia. Fala inglês e francês. Seu pai, fazendeiro, e sua mãe, dona de casa, também são de Buenos Aires.

Comentários

A partir da análise deste diálogo, através de pistas contextuais, pode-se inferir

que as participantes Marta e Tereza são amigas de longa data. Algumas dessas pistas

seriam os assuntos tratados, o conhecimento de mundo compartilhado e as amigas em

comum. Pode-se concluir, também, que se trata de uma relação de amizade que passa

pelo afeto, como comprovam, entre outras estratégias, as formas carinhosas de

tratamento utilizadas (Bebita e hija). Confira-se:

01 02

Tereza -Ahora--- vas a tropezar con una dificultad que es mi pésima memoria. Yo no puedo memorizar.

03 04

Marta -¿Querés que te diga una cosa, Bebita? Yo creo que lo de la pésima memoria tuya es un. . . un leitmotiv que tenés.

05 Tereza -¿Un qué?

06 Marta -Leit-motiv: lo repetís pero no es verdad.

78

07 08

Tereza -Pero yo me pongo a estudiar un verbo, y lo estudio y me lo olvido a los pocos días.

09 10 11 12

Marta -Pero vos me has estudiado poesías de memoria: La "Lorelei", "Die Grenardirn", qué se yo, y te los has sabido perfectamente; y vos te acordás de las declinaciones.

13 Tereza -Pero los verbos los confundo.

14 Marta -¿El significado?

15 Tereza -No, confundo... confundo cuando la...

16 Marta -¿ La formación ?

17 Tereza -Las formaciones, sí.

18 Marta -¡Ah, no! que con la declinación...

19 Tereza -Los tiempos compuestos, el subjuntivo, todo eso.

20 21

Marta -Pero eso, hija, eso es muy humano porque son - - - endiablados los verbos.

22 Tereza -Ah, bueno. Entonces me consolás.

23 Marta -Pero hija, cuando yo me puse...

Diálogo livre número 2: participantes Carmen e Maura

Amostra XXVII

Corresponde à amostra nº 305, fita CLIX-A. Diálogo livre. Duração: 48 minutos. Tema: vários. O participante B (nº 117 de nosso arquivo) é uma mulher, solteira, de 37 anos, nascida em Buenos Aires, onde sempre residiu. Ocupação: professora de letras. Fala inglês e francês. Já viajou para Europa, Estados Unidos, Peru, México e Brasil. Seu pai, médico, é de Rosário, e sua mãe, dona de casa, é de Buenos Aires. O participante A, mulher, não se considera (*), embora reúna as condições exigidas, pois a porcentagem de mulheres da terceira idade já está coberta.

(*) não se considera: refere-se ao fato de o projeto do qual extraí meu corpus de trabalho não haver analisado a participante A (Carmen), pois, apesar de reunir as condições buscadas por eles, a porcentagem de mulheres da terceira idade já estava coberta.

Comentários

A partir da leitura deste diálogo, por sua vez, constata-se que as participantes

Carmen e Maura são mãe e filha, respectivamente. Por conseguinte, há uma relação que

vai além da amizade, pois é uma relação de familiaridade, que passa pelo afeto e pelas

emoções. Isso pode ser comprovado através das formas de tratamento por elas utilizadas

(mamita e nena), além de longos segmento de falas de narrativa pois, como afirma

Tannen (1984), quando existe um alto grau de envolvimento, as pessoas tendem a

79

contar suas próprias experiências pessoais e os sentimentos relativos a esses eventos.

Confira-se:

01 02

Carmen -¿ Y... ehm... ? ¿ Qué quier... qué querés que te cuente algo de cuando era chica?

03 Maura -Bueno.

04 Carmen -¿ Eh?

05 Maura -Contáme, mamita, contáme.

06 07 08 09 10 11 12

Carmen -[................] te voy a contar, nena, portáte bien que te voy a contar un cuentito de la mamá cuando era chiquita, ¿eh? Resulta que nosotros vivíamos en una casa muy antigua y éramos ocho hermanos, cuatro varones y cuatro mujeres. Y mamá no tenía ni tiempo de vigilarnos a todos. Y en las vacaciones --- mi hermano mayor, que después se recibió de médico esté...

Diálogo livre número 3: participantes Mercedes e Carlos

Amostra XXVI

Corresponde à amostra nº 303, fita CLVI-A. Diálogo livre. Duração: 49 minutos. Tema: o gravador, França, religião, viagens, anedotas sobre Sarmiento, Chile. O participante B (nº 115 de nosso arquivo) é uma mulher de 52 anos, casada, nascida em Buenos Aires, onde sempre residiu. Já viajou à Europa, à Austrália e à Ásia. Ocupação: obras sociais e o lar. Fala francês. Seu pai, fazendeiro, e sua mãe, dona de casa, são da província de Buenos Aires. Seu marido, fazendeiro, é da província de Buenos Aires. O participante A, homem, não se considera (*), pois não reúne as condições necessárias.

(*) não se considera: refere-se ao fato de o projeto do qual extraí meu corpus de trabalho não haver analisado o participante A (Carlos), pois não reunia as condições buscadas por eles.

Comentários

O segmento de fala inicial da conversa entre os interlocutores Carlos e Mercedes

é muito importante, pois nele encontramos evidências sobre a relação de amizade

existente entre os participantes, como se observa pelas falas de Mercedes nas linhas 21,

23 e 24. Confira-se:

21 22

Mercedes -Claro. Bueno, yo por lo que te conozco a través de tantos años...

23 Carlos -Te...

24 25

Mercedes -...sé que has tenido una veneración muy especial por el hombre del cuadro, como dijo Cristina, ¿no?

26 27

Carlos -Mirá--- yo más que por el hombre del cuadro--- la veneración mía--- es mi abuelo.

28 Mercedes -¿Cuál, Carlos L.?

29 Carlos -Carlos L., a quien no conocí.

30 Mercedes -Y, claro, es el decano; claro.

80

Essas falas são relevantes pois, além de afirmar que eles se conhecem há muitos

anos, Mercedes também mostra, com a frase “[...]sé que has tenido una veneración muy

especial por el hombre del cuadro, como dijo Cristina, ¿no?”, conhecimento de mundo

compartilhado. Ela afima saber alguma coisa importante da vida de seu interlocutor, e,

ainda, menciona uma pessoa, Cristina, de quem se pode inferir que seja uma amiga

comum.

Este capítulo está dividido em duas partes. Na primeira parte fizemos uma

análise macro que mostra, em um primeiro momento e de forma geral, como se dá,

seqüencialmente, o gerenciamento de conflitos e como as partes se orientam e se

mostram interessadas na manutenção do rapport. Em um segundo momento,

procedemos a uma análise que mostra como os participantes se alinham com o intuito

de aumentar / maximizar rapport. Na segunda parte deste capítulo ilustramos o uso de

micro estratégias destinadas à manutenção de rapport e aquelas destinadas à

maximização de rapport.

Finalmente, no capítulo “conclusão”, que é destinado à discussão dos resultados,

realizamos uma associação entre as orientações dos participantes (análise macro) e a

escolha e o uso de micro estratégias lingüístico-discursivas.

Relembramos que Spencer-Oatey define o gerenciamento das relações

interpessoais como o uso da linguagem para promover, manter ou ameaçar relações

sociais harmoniosas e sugere o termo “rapport management” (gerenciamento de

rapport) para se referir a esta área.

Lembramos que iremos efetuar nossa análise de acordo com os parâmetros

teóricos dessa autora, que sugere quatro tipos de orientações de rapport. Porém,

diferentemente dela, segmentamos nossa análise em duas orientações principais

(orientações 1 e 2) e duas secundárias (orientações 3 e 4), estas últimas aparecendo

subjacentes às outras, como movimentos que ocorrem de maneira esporádica e que não

impedem a manutenção do rapport da relação.

(1) orientação no sentido de MANUTENÇÃO de rapport

(2) orientação no sentido de AUMENTO / MAXIMIZAÇÃO de rapport

(3) orientação no sentido de NEGLIGÊNCIA de rapport

(4) orientação no sentido de QUESTIONAMENTO de rapport

81

5.1 Análise macro 1) Como os participantes se orientam com o intuito de manutenção do rapport da relação; 2) como os participantes se alinham no sentido de construção de um aumento / maximização de rapport. 5.1.1 Manutenção de rapport Veremos, a seguir, como ocorre, em nossos dados, as negociações e o

gerenciamento de conflitos. Utilizando-se do discurso argumentativo, as partes

orientam-se e mostram-se interessadas na manutenção do rapport (harmonia) da

relação, através de estratégias que visam à atenuação / minimização de atos tidos como

ameaçadores de face.

Entendemos o discurso argumentativo como aquele no qual, através de

argumentos, desenvolve-se uma negociação entre os participantes, negociação essa

destinada a resolver os conflitos advindos de opiniões divergentes.

Excerto 1 (diálogo 1):

Neste segmento do diálogo 1 ocorre (linhas 1-64), uma situação conflituosa

onde o rapport é gerenciado através da evitação de conflito ou de desacordo, das

perguntas e dos pedidos de esclarecimento e do oferecimento de razões ou explicações.

O segmento em questão segue com o tema do anterior, ensino de alemão por

parte de Marta. Nele ocorre (linhas 1-64), uma situação conflituosa que foi gerada por

um ressentimento de Teresa para com sua amiga Marta. Esse ressentimento deve-se ao

fato de Tereza descobrir que Marta está dando aulas de alemão para outra pessoa,

porém havia deixado de dar aulas para ela. Veremos como se dá o gerenciamento

dessa situação de conflito, isto é, como ele é posteriormente minimizado / atenuado

pelos interlocutores, como conseqüência do interesse das partes na manutenção do

rapport da relação.

01 02

Tereza -Yo creía--- que vos habías dejado la enseñanza del alemán.

82

03 04 05 06 07 08 09 10 11 12

Marta -Pero--- es que yo no puedo decir que enseñe alemán, me da vergüenza. Tanto, que esta chica me dice: "i Pero Marta, qué lecciones largas, pero qué barbaridad! Pero no me cobra más que... eh... lo que me ha cobrado el año pasado por una hora." "No, hija", le digo yo. Son lecciones muy poco académicas, en las que yo recurro al diccionario, y en las que yo consulto la gramática en presencia de ella. Pero yo creo que ella prefiere--- que haga así un trabajo de sinceridad--- y no que me presentara como una gran profesora no siéndolo.

13 14

Tereza -¿Y por qué te has olvidado de una de tus alumnas--- que has dejado completamente a un lado?

15 16

Marta -Porque es una vaga que se la pasa viajando. Y cuando viene acá--- se lo pasa paseando...

17 18 19

Tereza -Como definición me parece muy bonito, porque está escrito en tono de soneto, con ritmo de soneto, pero no responde a la verdad.

20 Marta -Yo creo que sí. Tengo… tengo otra amiga ...

21 22

Tereza -Yo, mirá, creo francamente que no te interesaba, porque si no...

23 Marta -No, es que...

24 25

Tereza -Vos no sabés el beneficio moral--- que a mí me hace una lección de alemán.

26 27

Marta -Pero es que todas vienen a mí por beneficio moral; porque esta chica me decía: "Me hace falta..."

28 Tereza -No, ella va por necesidad también.

29 30 31

Marta -No no, porque esos pi... ahora tiene este trabajo nuevo, pero el año pasado me decía: "Me hace falta el alemán y me hace falta M. R."--- El beneficio moral... moral...

32 33

Tereza –Yo creí que no te interesaba o que no tenías tiempo, que no querías hacerlo.

34 35 36 37 38 39

Marta -Este año he tenido un año terrible de luchas internas--- ya sabés a quién me refiero--- Y tengo pendiente--- otra clase de alemán, pero quién sabe si se llega a realizar, porque Georgina tenía idea de ir a Alemania, y entonces quería--- uno o dos meses antes de ir a Alemania --conversar conmigo un poco en alemán.

40 Tereza -¿Pero sabe un poco Georgina?

41 42 43

Marta -Sí, ella se recibió de maestra hace aiíos --en el Consejo de Mujeres, pero no lo ha cultivado y nunca lo ha sache... lo ha sabido como yo.

44 Tereza -Ah, bueno! Es más fácil.

45 46

Marta -Pero--- conmigo, conversando, lo hubiera refrescado eso que sabía.

47 Tereza -¿Y tenés tiempo para dar alguna clase de alemán?

48 49 50 51 52 53 54

Marta -Mirá, si viene la obligación--- yo hago el tiempo y en realidad me viene bien; pero vos sabés el problema que yo tengo en casa. Vos sabés que a mí--- la muchacha me tiene enloquecida con sus imprevistos, con sus --agachadas--- con miles de cosas que no sé cómo definir --- y que no es como tener una empleada cualquiera por lo que tiene la chiquita.

55 Tereza -Bueno.

56 Marta -Y que está en juego la felicidad de esa criatura.

57 58

Tereza -Yo comprendo; por ese motivo te he respetado y no te las he pedido, pero me hubiera hecho bien porque me

83

59

levanta- - - y además porque...

60 Marta -Te levanta de la cama.

61 Tereza -No puedo decirte...

62 Marta -Te levanta de la cama, ¿no?

63 64

Tereza -No, no me levanta de la cama: me levanta el ánimo, que

65 66

Marta -Bueno, pero si es así, decí, yo creía que--estabas--- llena de obligaciones sociales.

67 68 69

Tereza -Sí, tengo obligaciones; pero, como vos decís, el tiempo puede hacerse de alguna forma. Siempre un hueco hay.

70 71

Marta -Mhm. Bueno, yo también puedo hacer un hueco. Sobre todo a la mañana.

72 73

Tereza -¡Espléndido! Ahora, mi alemán es muy deficiente, eso es lo malo.

74 75 76

Marta -Yo no le veo. Yo encuentro --- que el ja... que... que entre vos y la otra chiquilina --- hay una diferencia abismal.

77 Tereza -¿En qué sentido?

78 79 80 81 82 83 84 85 86

Marta -Lo que vos sabés --- lo has estudiado--- académicamente, conscientemente --- y la pregunta tuya es precisa--- esta chica--- es inteligente, es rápida, pero es un poco haragana--- y no ha estudiado--- como vos. Cuando vos--- decís que un sustantivo, en ese caso corresponde en dativo o en acusativo, yo pienso: "Tiene razón porque lo debe de haber estudiado." ¿Entendés?

87 88

Tereza -Bueno, yo te propondría--- que hiciéramos las lecciones que pudiéramos.

89 90

Marta -Claro, como ha sido siempre- - - el día que te conviene.

91 92 93

Tereza -Como ha sido siempre; porque--- es un pequeño bagaje, es un bagaje muy corto, muy diminuto, muy insignificante.

94 Marta -Sí.

95 96

Tereza -Pero--- por lo menos permite- - - moverse—elementalmente.

97 Marta -Claro.

98 99 100

Tereza -Y como siempre pienso hacer un viaje en Alemania--- y me hace un bien moral también, podríamos tomar esos libros de historia.

101 Marta -Mirá, me parecería muy divertido.

102 Tereza -Son divertidísimos.

No segmento acima ocorre um mal-entendido entre as interlocutoras, que pode

ser classificado como um conflito de pressuposições ou inferências equivocadas

realizadas por cada uma das interlocutoras. Este segmento pode ser sub-dividido em

duas partes. Na primeira (linhas 1-64) há a pressuposição equivocada por parte de

Tereza, que pensa que a amiga não quer ou não pode mais dar aulas de alemão para ela.

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Note-se que, logo após o início do segmento de fala conflituoso, ocorrem duas

orientações distintas, uma por parte de Tereza, que se orienta no sentido de

questionamento de rapport, e outra por parte de Marta, que está orientada para a

manutenção do rapport da relação. Todas as ações de Tereza na parte inicial do

segmento acima (até a linha 39) estão ameaçando as relações sociais harmoniosas entre

ela e sua interlocutora Marta.

Esse segmento inicia-se com Tereza fazendo uma ameaça à face positiva de sua

amiga Marta, ao dizer que “Yo creía – que habías dejado la enseñanza del alemán.”

(linhas 1-2), o que Marta passará a responder com estratégias de proteção de face,

através de justificativas ou pseudo-estratégias de modéstia como, por exemplo, “Pero

– es que yo no puedo decir que enseñe alemán, me dá vergüenza.” (linhas 3-4) , que

minimizam, atenuam seu ato.

Tereza, porém, continua a ameaçar a face positiva de sua amiga, dizendo: “Y

por qué te has olvidado de una de tus alumnas – que has dejado completamente a un

lado?” (linhas 13-14), ao que Marta, recorrendo novamente a justificativas, afirma:

“Porque es una vaga que se la pasa viajando. Y cuando viene acá – se lo pasa

paseando…” (linhas 15-16).

Tereza lança mão da estratégia da indiretividade, através de duas artimanhas:

ocultamento do nome da pessoa que seria beneficiária das aulas de alemão (“una de tus

alumnas”, no caso, ela mesma) e utilização do formato de pergunta. O que na verdade

Tereza faz é uma cobrança atenuada (pela indiretividade), pois a amiga está dando aula

para outra pessoa e não está mais dando aula para ela.

É fundamental observar-se que o gerenciamento das relações interpessoais é feito

de formas distintas por Tereza e Marta. Com relação à Tereza, no sentido de

questionamento de rapport e por sua amiga Marta, cujas asserções são sempre

orientadas pela escolha de estratégias de atenuação / minimização, no sentido de

manutenção de rapport.

A continuação (linhas 17-19), Tereza responde sem utilizar-se de qualquer tipo

de atenuação e chega a valer-se de ironia (ou mesmo de deboche) para contestar o que

disse Marta em sua defesa: “Como definición me parece muy bonito, porque está

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escrito en tono de soneto, con ritmo de soneto, pero no responde a la verdad.”. Com

isso ela diz não acreditar no que sua amiga falou (“...o que você diz não é verdade”),

em mais uma ameaça à face de sua interlocutora. Marta recusa e diz, em sua defesa, que

está dizendo a verdade: “Yo creo que sí.” (linha 20).

Spencer-Oatey afirma que causar deliberadamente a perda de face das pessoas é

uma maneira de orientar-se no sentido de questionamento de rapport, e é a estratégia

que Tereza vem seguindo até o momento. Os motivos que levam uma pessoa a

questionar rapport são vários. No exemplo em questão (após a descoberta das aulas que

Marta ministra para outra pessoa e não mais para ela), o motivo que leva Tereza a

seguir a orientação de questionamento de rapport pode ser o questionamento da própria

amizade existente entre ela e Marta.

Segue-se um segmento (linhas 21-31) no qual Tereza continua ameaçando a face

positiva de sua interlocutora. Esta se orienta, uma vez mais, pela manutenção do

rapport (harmonia) da relação, como pode verificar através das estratégias de atenuação

utilizadas por esta última (estratégia de dar justificativas e/ou explicações):

21 22

Tereza -Yo, mirá, creo francamente que no te interesaba, porque si no...

23 Marta -No, es que...

24 25

Tereza -Vos no sabés el beneficio moral--- que a mí me hace una lección de alemán.

26 27

Marta -Pero es que todas vienen a mí por beneficio moral; porque esta chica me decía: "Me hace falta..."

28 Tereza -No, ella va por necesidad también.

29 30 31

Marta -No no, porque esos pi... ahora tiene este trabajo nuevo, pero el año pasado me decía: "Me hace falta el alemán y me hace falta M. R."--- El beneficio moral... moral...

Tereza (linhas 21-22) reafirma sua opinião (dada anteriormente na linha 1), e o

faz de uma forma não atenuada pois, apesar da utilização do verbo parentético8 creer,

que deveria funcionar como instrumento atenuador, esse recurso é perdido pelo efeito

do advérbio francamente, usado em seguida. Marta (linha 23) faz uma tentativa

interrompida de explicação e Tereza (linhas 24-25) passa a expor a sua amiga o motivo

pelo qual ela necessita tanto das aulas de alemão e, por isso, estar tão aborrecida (o que

8 Segundo Fraser (1980), verbos e advérbios parentéticos (do tipo acho, creio, provavelmente, etc.), reduzem o comprometimento resultante da enunciação, funcionando, assim, como instrumentos atenuadores da força ilocucionária dos enunciados.

86

se deduz do fato de ela não estar atenuando suas asserções) com o fato: as aulas são um

benefício moral para ela.

A descrição de Bravo (2003) para confiança – confiança interpessoal não requer

que se compartilhem os desejos do interlocutor, nem que se aprovem suas

características de personalidade, senão que se o aceite assim tal qual ele é, embora se o

critique “abertamente” e se discorde daquilo que ele pensa (também “abertamente”) – é

o que, em nosso entender, faz com que Marta aceite as várias críticas e questionamentos

a sua pessoa feitos por sua amiga Tereza e, ao longo de todo esse segmento de fala,

prossiga em sua orientação de manutenção de rapport.

Tereza afirma que Marta sabia de suas necessidades pessoais, isto é, do

benefício moral que as aulas de alemão dão a ela (linhas 24-25). Porém Marta recusa e

diz, para salvaguardar a sua face, que todas as alunas a procuram com esse argumento,

isto é: ”-Pero es que todas vienen a mí por beneficio moral; porque esta chica me

decía: "Me hace falta..." (linhas 26-27), ao que Tereza responde, não aceitando a

explicação de Marta: “-No, ella va por necesidad también.” (linha 28), em referência

ao emprego de vendedora que a aluna de Marta ocupa, e no qual ela necessita falar

alemão. Tereza opta novamente pela ação despreferida de discordância do interlocutor,

e novamente o faz sem atenuação.

Marta (linhas 29-31) pondera que a aluna “ahora tiene este trabajo nuevo”,

porém no ano anterior ela também pedia as aulas de alemão alegando o beneficio moral

que fariam a ela (ela utiliza a conjunção pero, que indica contraposição entre a idéia

inicial e a que a sucede). Marta, em mais uma tentativa de salvar a sua face, utiliza-se

da estratégia de oferecer razões ou explicações a sua interlocutora.

Note-se que o assunto, polêmico, foi gerado por um mal-entendido ocorrido

anteriormente entre as partes. Isso pode ser deduzido especialmente nas falas transcritas

abaixo (linhas 21-22 e 65-66):

21 22

Tereza -Yo, mirá, creo francamente que no te interesaba, porque si no...

65 66

Marta Bueno, pero si es así, decí, yo creía que--estabas--- llena de obligaciones sociales.

87

Pode-se observar que Tereza pensava que à Marta não interessava mais dar

aulas de alemão e Marta pensava que sua amiga estava muito ocupada, cheia de

obrigações sociais e não tinha mais tempo para estudar alemão.

Marta, dando continuidade a sua estratégia de evitação de conflito, dá

explicações à Tereza (linhas 34-39), informando sobre seus problemas e sobre a

existência de outra amiga sua que também deseja ter aulas de alemão, porém ela ainda

não atendeu a esse pedido:

34 35 36 37 38 39

Marta -Este año he tenido un año terrible de luchas internas--- ya sabés a quién me refiero--- Y tengo pendiente--- otra clase de alemán, pero quién sabe si se llega a realizar, porque Georgina tenía idea de ir a Alemania, y entonces quería--- uno o dos meses antes de ir a Alemania --conversar conmigo un poco en alemán.

A continuação, Tereza muda sua orientação e parece aceitar as explicações de

Marta, atenuando suas asserções e fazendo perguntas sobre Georgina (amiga de Marta),

o que mostra seu interesse na narrativa de Marta e na manutenção do rapport (linhas 40,

44 e 47). Em seguida, Marta dá novamente explicações à Tereza (linhas 48-54 e 56):

40 Tereza -¿Pero sabe un poco Georgina?

41 42 43

Marta -Sí, ella se recibió de maestra hace aiíos --en el Consejo de Mujeres, pero no lo ha cultivado y nunca lo ha sache... lo ha sabido como yo.

44 Tereza -Ah, bueno! Es más fácil.

45 46

Marta -Pero--- conmigo, conversando, lo hubiera refrescado eso que sabía.

47 Tereza -¿Y tenés tiempo para dar alguna clase de alemán?

48 49 50 51 52 53 54

Marta -Mirá, si viene la obligación--- yo hago el tiempo y en realidad me viene bien; pero vos sabés el problema que yo tengo en casa. Vos sabés que a mí--- la muchacha me tiene enloquecida con sus imprevistos, con sus --agachadas--- con miles de cosas que no sé cómo definir --- y que no es como tener una empleada cualquiera por lo que tiene la chiquita.

55 Tereza -Bueno.

56 Marta -Y que está en juego la felicidad de esa criatura.

Segue-se um segmento de construção colaborativa da fala (linhas 57-62), no

qual Tereza começa por dizer que entende os motivos de sua interlocutora, mas expõe

que as aulas fariam bem a sua pessoa, sendo interrompida duas vezes por Marta, que

88

tenta antecipar o que ela vai dizer, numa forma de manifestação de acordo e

cooperação.

57 58 59

Tereza -Yo comprendo; por ese motivo te he respetado y no te las he pedido, pero me hubiera hecho bien porque me levanta- - - y además porque...

60 Marta -Te levanta de la cama.

61 Tereza -No puedo decirte...

62 Marta -Te levanta de la cama, ¿no?

63 64

Tereza -No, no me levanta de la cama: me levanta el ánimo, que es más importante.

Por dois turnos seguidos (linhas 60 e 62) Marta oferece o complemento “Te

levanta de la cama”, sendo, na segunda vez, corrigida por Tereza, que responde

fazendo a correção: “-No, no me levanta de la cama: me levanta el ánimo, que es más

importante. . “ (linhas 63-64).

Esse segmento de construção colaborativa (linhas 57-64) não é bem sucedido,

uma vez que a pressuposição feita por Marta sobre o motivo de as aulas de alemão

fazerem bem a sua amiga Tereza não correspondiam à realidade. Ao dizer “pero me

hubiera hecho bien porque me levanta…” (linha 58), Tereza não queria dizer, como

pressupôs Marta, que as aulas a levantariam da cama, mas sim que “... me levanta el

ánimo, que es más importante.” (linha 63-64). Pode-se dizer que o ocorrido foi uma

pressuposição de conhecimento compartilhado que estava equivocada.

Tereza, porém, ao recusar o complemento dado por sua amiga (que ela

decodifica em seu sentido literal, isto é, levantar-se da cama para ir à aula) pode

também ter-se equivocado, uma vez que sua interlocutora poderia estar falando em

sentido metafórico.

Na segunda parte desse segmento (linhas 65-71) é a falante Marta quem se

equivoca (linhas 65-66), ao pensar que Tereza estava muito ocupada e não queria mais

ter aulas com ela.

65 66

Marta -Bueno, pero si es así, decí, yo creía que--estabas--- llena de obligaciones sociales.

67 68 69

Tereza -Sí, tengo obligaciones; pero, como vos decís, el tiempo puede hacerse de alguna forma. Siempre un hueco hay.

70 71

Marta -Mhm. Bueno, yo también puedo hacer un hueco. Sobre todo a la mañana.

89

Tereza, então, tenta desfazer o equívoco, fazendo o devido reparo, porém de

forma atenuada. Primeiramente ela afirma: “Sí, tengo obligaciones;” (linha 67), para,

em seguida, iniciar uma ressalva com a conjunção pero. Em seguida ela faz uma

afirmação (“el tiempo puede hacerse de alguna forma”), porém imputa essa afirmação a

sua interlocutora (“como vos decís”), como uma maneira de dizer que, embora tenha

muitos compromissos, ela concorda com sua amiga, isto é, que há uma maneira de

conciliar as duas coisas.

Tem início a superação do conflito: a partir da linha 65 tem início a resolução

do conflito, com Marta (linhas 70-71) orientando-se no sentido de chegar a um acordo

com sua interlocutora. Tereza ratifica o acordo proposto (linhas 72-73), inclusive

fazendo uso da estratégia de adjetivação (“Espléndido!”), porém avisa à Marta que elas

terão um problema, devido ao fato de o seu alemão ser deficiente (estratégia de

modéstia ou de auto-depreciação).

65 66

Marta -Bueno, pero si es así, decí, yo creía que--estabas--- llena de obligaciones sociales.

67 68 69

Tereza -Sí, tengo obligaciones; pero, como vos decís, el tiempo puede hacerse de alguna forma. Siempre un hueco hay.

70 71

Marta -Mhm. Bueno, yo también puedo hacer un hueco. Sobre todo a la mañana.

72 73

Tereza -¡Espléndido! Ahora, mi alemán es muy deficiente, eso es lo malo. (estratégia de modéstia ou de auto-depreciação)

Desse segmento em diante passam a predominar, por parte de Marta, as

estratégias destinadas à maximização de rapport, sobretudo os elogios seguidos de

argumentos (linhas 74-76 e 78-86). Nota-se também uma mudança na orientação de

rapport por parte de Tereza, que passa a orientar-se no sentido de manutenção de

rapport.

Marta recusa a afirmação de Tereza, dizendo que entre ela e sua outra aluna

existe uma diferença abismal, diferença essa que se deve ao fato de ela já haver

estudado alemão academicamente, de forma consciente. Essa estratégia utilizada por

Marta é uma estratégia de polidez positiva (ou modo de reforçar a imagem do outro)

direta, que satisfaz os desejos de aprovação do outro através do uso de elogios.

74 75 76

Marta -Yo no le veo. Yo encuentro --- que el ja... que... que entre vos y la otra chiquilina --- hay una diferencia abismal. (elogio)

90

77 Tereza ¿En qué sentido?

78 79 80 81 82 83 84 85 86

Marta -Lo que vos sabés --- lo has estudiado--- académicamente, conscientemente --- y la pregunta tuya es precisa--- esta chica--- es inteligente, es rápida, pero es un poco haragana--- y no ha estudiado--- como vos. Cuando vos--- decís que un sustantivo, en ese caso corresponde en dativo o en acusativo, yo pienso: “Tiene razón porque lo debe de haber estudiado." ¿Entendés? (elogio seguido de argumentos)

Nos turnos seguintes (linhas 87-94) é logrado o acordo, como se constata, por

exemplo, pela repetição de parte do enunciado do interlocutor (linha 91):

87 88

Tereza -Bueno, yo te propondría--- que hiciéramos las lecciones que pudiéramos.

89 90

Marta -Claro, como ha sido siempre- - - el día que te conviene.

91 92 93

Tereza -Como ha sido siempre; porque--- es un pequeño bagaje, es un bagaje muy corto, muy diminuto, muy insignificante.

94 Marta -Sí.

Esse acordo também se manifesta nos turnos seguintes (linhas 91-102), nos

quais Marta concorda com Tereza, numa estratégia que reforça a cooperação. Ao

reforçar o dito por sua interlocutora, Marta reforça também a imagem desta.

91 92 93

Tereza -Como ha sido siempre; porque--- es un pequeño bagaje, es un bagaje muy corto, muy diminuto, muy insignificante.

94 Marta -Sí.

95 96

Tereza -Pero--- por lo menos permite- - - moverse--elementalmente.

97 Marta -Claro.

98 99 100

Tereza -Y como siempre pienso hacer un viaje en Alemania--- y me hace un bien moral también, podríamos tomar esos libros de historia.

101 Marta -Mirá, me parecería muy divertido.

102 Tereza -Son divertidísimos.

Excerto 2 (diálogo 3):

Neste segmento do diálogo 3 ocorre uma situação conflituosa (linhas 1-44) que

foi gerada, sobretudo, em virtude do tópico da conversa: religiosidade. Mostraremos

como se dá, seqüencialmente, o gerenciamento do conflito.

91

Há interesse na manutenção do rapport (harmonia da relação) como no exemplo

anterior, no qual a falante Marta se orienta nesse sentido. Neste, porém, a orientação dos

participantes mudará no curso da interação (como veremos mais adiante). Aqui, porém,

não é logrado o acordo, e um conflito maior é evitado através do abandono do tópico

religiosidade (cf. linhas 41-43).

01 Carlos -A mí la naturaleza... el espectáculo...

02 03

Mercedes -Bueno, es la... es donde te encontrás con la creación, ¿no es cierto?

04 Carlos -Sí, sí, sí.

05 06

Mercedes -La obra de la... del Creador, la creación y su criatura, ¿no es así?

07 08

Carlos -Sí. Ahora, no la vi a la criatura ni a... vi otras criaturas de mini ...

09 Mercedes -¿Y la criatura no somos nosotros?

10 11

Carlos -Vi a otras criaturas de minifalda tan... [risas] No, no eran tan distintas que ella, ¿eh?

12 13 14 15

Mercedes -Yo fijáte que--- soy bastante--- religiosa, ¿no es cierto?, y te puedo garantizar que--- a veces encuentro más a Dios en la naturaleza que en el templo--- que es más artificial.

16 Carlos -Claro, claro.

17 18

Mercedes -No sé, ¿no te pasa a vos--- conmoverte frente a la obra del--- Creador?

19 20

Carlos -Sí. Bueno, mirá--- sí --- sí, pero en cuanto a las creencias mías--- son--- muy distintas a las tuyas.

21 Mercedes -¿Por qué?

22 Carlos -No, porque vos sos una ... sos... sos una...

23 24

Mercedes -No no, yo tengo una educación del colegio religioso, ¿viste?, que te... te... te...

25 Carlos -Claro. En cambio yo no. De manera que...

26 Mercedes -Pero no sos ateo.

27 Carlos -No, ateo no soy, no.

28 Mercedes -Pero podés creer que sos.

29 30 31

Carlos -Eh... no soy no; no soy ateo y la prueba es que... esté... recibí la bendición del Santo Padre por segunda vez.

32 33 34 35

Mercedes -Claro. Bueno, el otro día el padre L. explicaba, ¿no? que la religiosidad--- es una creación del hombre, lo que te viene de Dios es la fe--- que es diferente, ¿no es cierto?

36 37

Carlos -Claro. ¿Y vendrá de Dios? Porque si viniera de Dios todos tendrían fe.

38 Mercedes -Sí, claro; pero a veces hay quien es más sordo.

39 40

Carlos -Ah, entonces yo debo ser... debo... Claro, sí sí; sí, yo soy sordo.

41 Mercedes -Me parece que nos estamos metiendo en un tema teológico

92

42 43

que conviene salir, ¿eh?, para uno más frívolo, ¿qué te parece? [risas] ¿No has estado en el cine últimamente?

44 Carlos -No.

Esse segmento versa sobre o polêmico tema religiosidade e, a princípio (linhas

1-16), os interlocutores parecem desfrutar uma perfeita concordância de idéias.

01 Carlos -A mí la naturaleza... el espectáculo...

02 03

Mercedes -Bueno, es la... es donde te encontrás con la creación, ¿no es cierto?

04 Carlos -Sí, sí, sí.

05 06

Mercedes -La obra de la... del Creador, la creación y su criatura, ¿no es así?

07 08

Carlos -Sí. Ahora, no la vi a la criatura ni a... vi otras criaturas de mini ...

09 Mercedes -¿Y la criatura no somos nosotros?

10 11

Carlos -Vi a otras criaturas de minifalda tan... [risas] No, no eran tan distintas que ella, ¿eh?

12 13 14 15

Mercedes -Yo fijáte que--- soy bastante--- religiosa, ¿no es cierto?, y te puedo garantizar que--- a veces encuentro más a Dios en la naturaleza que en el templo--- que es más artificial.

16 Carlos -Claro, claro.

As observações de Carlos destacadas abaixo podem ser descritas como

estratégias de language play, pois ele faz (linhas 7-8 e 10-11) trocadilhos com os termos

“te encontrás con la creación” e “la creación y su criatura”, ditos

por Mercedes nas linhas 2 e 5:

07 08

Carlos -Sí. Ahora, no la vi a la criatura ni a... vi otras criaturas de mini ...

10 11

Carlos -Vi a otras criaturas de minifalda tan... [risas] No, no eran tan distintas que ella, ¿eh?

Atividades de language play são descritas por Aston como aquelas que refletem

a orientação dos participantes na manuteção de rapport ou de relações amigáveis e,

neste segmento, parecem sinalizar que, ou Carlos não leva o tópico religiosidade tão a

sério quanto Mercedes, ou pensa ser ele pesado e tenta suavizá-lo. É a presença da

confiança, entretanto, que torna certos tipos de language play e outros comportamentos

lingüísticos e extralingüísticos parecerem aceitáveis (e mesmo desejáveis). No exemplo

em questão, se não existisse confiança, a brincadeira feita por Carlos com a palavra

criatura poderia ser erroneamente interpretada por Mercedes e gerar uma situação

conflituosa.

93

O fragmento seguinte (linhas 17-31), porém, tem um caráter extremamente

polêmico e nele ocorrem vários desacordos e mal-entendidos. Mercedes interpreta de

maneira equivocada as pistas de contextualização dadas por Carlos (no caso uma

escolha lexical e sintática). Quando ele diz: “...sí, pero en cuanto a las creencias mías---

son--- muy distintas a las tuyas.” (linhas 19-20), Carlos queria dizer que ele não é tão religioso

quanto Mercedes. Esta, porém, interpreta exatamente o contrário, isto é, que ele pensa que ela

não é uma pessoa religiosa. As falhas de comunicação desse tipo levam a julgamentos

errôneos sobre a intenção do falante.

17 18

Mercedes -No sé, ¿no te pasa a vos--- conmoverte frente a la obra del--- Creador?

19 20

Carlos -Sí. Bueno, mirá--- sí --- sí, pero en cuanto a las creencias mías--- son--- muy distintas a las tuyas.

21 Mercedes -¿Por qué?

22 Carlos -No, porque vos sos una ... sos... sos una...

23 24

Mercedes -No no, yo tengo una educación del colegio religioso, ¿viste?, que te... te... te...

25 Carlos -Claro. En cambio yo no. De manera que...

26 Mercedes -Pero no sos ateo.

27 Carlos -No, ateo no soy, no.

28 Mercedes -Pero podés creer que sos.

29 30 31

Carlos -Eh... no soy no; no soy ateo y la prueba es que... esté... recibí la bendición del Santo Padre por segunda vez.

Carlos afirma (linhas 19-20) que suas crenças são muito diferentes das de sua

amiga Mercedes. Esta pergunta o porquê e Carlos (linha 22) tenta explicar-se, não

conseguindo, porém, finalizar seu argumento. Após várias hesitações de Carlos,

Mercedes responde (linhas 23-24) com uma asserção direta (“No no, yo tengo una

educación del colegio religioso, ¿viste?”), negando aquilo que ela acreditou que Carlos

diria, ou seja, ela pensava que Carlos duvidava de sua religiosidade, e isso, para ela, era

uma ofensa, uma ameaça a sua face, um FTA (face threating act).

Note-se que essa era uma pressuposição equivocada por parte de Mercedes, pois

Carlos responde (linha 25): “Claro. En cambio yo no.”. Em seguida, Mercedes indaga

de Carlos se ele é ateu e ele responde categórico (linha 27): “No, ateo no soy, no.”. Ela,

porém, opta por divergir de seu interlocutor, afirmando (linha 28): “Pero podés creer

que sos.”, desferindo uma ameaça (FTA) à face positiva de Carlos, o que faz com que

94

este responda de forma direta, categória e enfática, lançando mão, inclusive, além da

negação enfática, do artifício de acrescentar argumentos que reforcem sua posição

(linhas 29-31): “Eh... no soy no; no soy ateo y la prueba es que... esté... recibí la

bendición del Santo Padre por segunda vez.” Há uma pista de contextualização

realizada por Carlos para dar autenticidade a seus argumentos, quando ele afirma: “...y

la prueba es que...”.

Observe-se, por todo o segmento acima (linhas 1-31), a orientação de Carlos no

sentido de manutenção do rapport da relação. Mercedes, por sua vez, faz uma afirmação

(linha 28) que está mais orientada no sentido de questionamento de rapport, uma vez

que ela afirma sobre seu interlocutor algo que ele mesmo havia acabado de negar.

26 Mercedes -Pero no sos ateo.

27 Carlos -No, ateo no soy, no.

28 Mercedes -Pero podés creer que sos.

No fragmento final deste segmento (linhas 32-44) surge uma nova polêmica.

Após Mercedes tentar explicar a diferença entre religiosidade e fé (linhas 32-35), Carlos

faz indagações que questionam a validade dos argumentos de Mercedes (linhas 36-37),

introduzindo a dúvida. Mercedes contra-argumenta (linha 38) e Carlos, então, sustenta a

polêmica ao afirmar (linhas 39-40): “Ah, entonces yo debo ser... debo... Claro, si, si; si,

yo soy sordo.”, para justificar sua suposta falta de fé.

32 33 34 35

Mercedes -Claro. Bueno, el otro día el padre L. explicaba, ¿no? que la religiosidad--- es una creación del hombre, lo que te viene de Dios es la fe--- que es diferente, ¿no es cierto?

36 37

Carlos -Claro. ¿Y vendrá de Dios? Porque si viniera de Dios todos tendrían fe.

38 Mercedes -Sí, claro; pero a veces hay quien es más sordo.

39 40

Carlos -Ah, entonces yo debo ser... debo... Claro, sí sí; sí, yo soy sordo.

41 42 43

Mercedes -Me parece que nos estamos metiendo en un tema teológico que conviene salir, ¿eh?, para uno más frívolo, ¿qué te parece? [risas] ¿No has estado en el cine últimamente?

44 Carlos -No.

Mercedes, então, propõe a troca do tema da conversa (linhas 41-43), ao perceber

que o assunto, extremamente polêmico, está gerando um conflito, conflito esse que eles

não estão conseguindo gerenciar de forma satisfatória (não ocorre atenuação /

95

minimização das asserções). Em conseqüência, e com o intuito de manutenção do

rapport da relação, Carlos aceita a proposta de Mercedes, e eles abandonam o tópico e

trocam o tema da conversa.

41 42 43

Mercedes -Me parece que nos estamos metiendo en un tema teológico que conviene salir, ¿eh?, para uno más frívolo, ¿qué te parece? [risas] ¿No has estado en el cine últimamente?

44 Carlos -No.

5.1.2 Maximização de rapport Excerto 3 (diálogo 2): A maximização de rapport, neste segmento de fala, ocorre através do uso de

apelidos carinhosos como forma de tratamento, das repetições de parte do enunciado

do outro que geram um diálogo construído, do uso de diminutivos e de um segmento de

fala de narrativa.

A “base comum” (common ground) existente entre as interlocutoras faz com que

se produza envolvimento entre elas, resultado da visão de confiança tal qual a define

Thurén (1988, p.222), isto é, proximidade ou senso profundo de familiaridade.

01 02

Carmen -¿ Y... ehm... ? ¿ Qué quier... qué querés que te cuente algo de cuando era chica?

03 Maura -Bueno.

04 Carmen -¿ Eh?

05 Maura -Contáme, mamita, contáme.

06 07 08 09 10 11 12

Carmen -[................] te voy a contar, nena, portáte bien que te voy a contar un cuentito de la mamá cuando era chiquita, ¿eh? Resulta que nosotros vivíamos en una casa muy antigua y éramos ocho hermanos, cuatro varones y cuatro mujeres. Y mamá no tenía ni tiempo de vigilarnos a todos. Y en las vacaciones --- mi hermano mayor, que después se recibió de médico esté...

13 Maura -Vos lo conociste a Ulises.

14 15 16 17 18 19 20 21 22 23

Carmen -¿A Ulises lo conocías, sí? Bueno--- desde chico, siempre que se quería disfrazar, siempre agarraba una valijita chica que nosotros ... sacaba una cartera así, de esas valijitas redondas que usaban los médicos antiguamente, habrás visto algún dibujo vos, y él se ponía una galera de papá y decía: "Soy el doctor." Desde chico me acuerdo haberío visto siempre que quería ser médico él. Bueno, él tenía una paciencia bárbara. A la mañana temprano, cuando estábamos de vacaciones, en fin, que estaban ellos, porque yo en esa casa tenía cuatro

96

24 años, tres, así que no [ ...... 1

25 Maura -¿En Moreno era?

26 27 28 29

Carmen -En Moreno, sí. Frente a Bolívar, ahí donde está el Nacional ahora. Resulta que íbamos a la terraza- - la azotea, nos íbamos todos. Él llevaba una pava y tomábamos mate.

30 Maura -Ah.

31 32 33 34 35 36 37 38 39 40 41 42 43 44 45 46 47

Carmen -Nos servía el mate. Mirá, yo a los tres años tomando mate. Esté... y en la casa que en esa época todas las casas eran un piso alto nomás, por ahí, y más o menos vos podías pasar de una terraza a la de al lado--- porque, no tenían más que unas paredes bajitas que las separaban. Una altura de cincuenta centímetros había, así que se pasaba p@ encima, por ahí, y había... esté... en la misma cuadra, pero a la vuelta de '¡a casa nuestra, había un almacén por mayor--- muy grande, de los de R., que ahora no ... no sé si existen ellos porque creo que se han muerto todos, pero entonces era una firma muy importante. Y tenían en el local, yo me acuerdo haber pasado por ahí y haber visto, tenían- - - los locales grandes todo... todo el... las mercaderías, las latas, todas las cosas colocadas, y en los techos hacían como una especie de... como una pirámide de ladrillos para arriba, como un hueco, yo no sé para qué sería eso. Era como un hueco.

48 Maura -¿ Qué hab ... qué había adentro?

49 50 51 52 53 54

Carmen -No sé, eran en la........................................los techos eran así, formando esa especie de hueco que [1 una pirámide, formaba como una pirámide para arriba. Esas pirámides sob... sobresalían en la terraza, ¿sabés?, y eran todo de esos ladrillos colorados--- de esos mosaicos colorados.

55 56

Maura - [ 1 sería [ 1 el humo de la cocina. Una especie de [

57 58 59

Carmen -No no, si era en el salón grande, donde estaban todas las mercaderías, donde vendían, que era almacén por mayor.

60 Maura -Entonces no sé qué sería.

61 62 63

Carmen -No sé para qué sería. Y sería... era un galpón grande. Lo habrían hecho de esa forma. No sé si tendría a lo mejor alguna rejilla, tender... posiblemente...

64 Maura -Para ventilación puede ser. Para ventilación.

65 66 67 68 69 70 71 72 73

Carmen -Para ventilación pud... eh... podría ser, ¿no?, que tuviera alguna rejilla. Yo no me acuerdo de eso, de la rejilla. Lo que me acuerdo que la... la terraza--- era toda medio ondulada--- porque era una terraza vieja, gastada. Y cuando llovía se formaban charcos ahí abajo de esas pirámides--- se formaban charcos de agua. ¿,Vos sabés 1 ... 1 la gracia nuestra? Resbalar de ahí arriba de la punta ................. 1 de las chicas se largaban, y Ema...

74 Maura -Como si fuera un tobogán.

75 76 77

Carmen -Sí--- como si fuera un tobogán. Ema se ponía la bombacha a la miseria, toda mojada. Todas un día al aire [ 1 Ulises nos llevaba allá arriba--- a la terraza

97

78 79

y nos contaba cuentos, nos leía cuentos. Sí, nos leía siempre cuentos. Yo me acuerdo de haber ido allá...

80 Maura -Siempre tuvo espíritu de solterón.

81 82 83 84

Carmen -Sí, era muy, muy bueno, pobre. Tenía mucha paciencia. Y... y me acuerdo una vez que... esté... se pusieron ... se puso, ¿quién fue?, Ulises se puso las botas de un ... de un...

85 Maura -Ah, sí. Bah, yo no me acuerdo, pero vos contaste.

86 87 88 89 90 91 92 93 94 95 96 97 98 99 100 101 102

Carmen -Yo te conté, sí. Ulises, yo no sé cuántos años tendría. La misma casa cuatro, i cinco, diez... diez, once aflos tendría él, doce, no sé cuántos años. Se puso las botas de un cocinero que--- trabajaba en el almacén de la casa [ ] Había abajo un almacén. Entonces trabajaba este hombre allí, se puso esas botas del cocinero, después... se había puesto con los zapatos de él puestos. Claro, entrar... las calzó, cuando se las quería sacar no se podía. Y estábamos allá en la terraza, todos tirábamos de la cintura, unos de otros, para quererle sacar las botas. Y todos llorando porque no le podíamos sacar las botas. No se le podían sacar las botas. Al final qué sé yo quién vino a ayudar y le sacó la bota con el zapato y todo, y salieron. Pero ya creíamos que iba a estar con las botas para toda la vida.

Esse segmento começa com uma indagação (linhas 1-2) de Carmen a Maura

sobre se esta última deseja que aquela lhe conte um episódio ocorrido em sua infância

(de Carmen). É através do uso dos pronomes de tratamento em forma de apelidos

carinhosos (mamita, nena e mamá) que se percebe que as interlocutoras são mãe

(Carmen) e filha (Maura). O uso desses pronomes (linhas 5, 6 e 7), que denotam

intimidade e afetividade, além do uso dos diminutivos cuentito e chiquita (linhas 7 e 8),

geram um aumento / maximização de rapport. Confira-se:

01 02

Carmen -¿ Y... ehm... ? ¿ Qué quier... qué querés que te cuente algo de cuando era chica?

03 Maura -Bueno.

04 Carmen -¿ Eh?

05 Maura -Contáme, mamita, contáme.

06 07 08 09 10 11 12

Carmen -[................] te voy a contar, nena, portáte bien que te voy a contar un cuentito de la mamá cuando era chiquita, ¿eh? Resulta que nosotros vivíamos en una casa muy antigua y éramos ocho hermanos, cuatro varones y cuatro mujeres. Y mamá no tenía ni tiempo de vigilarnos a todos. Y en las vacaciones --- mi hermano mayor, que después se recibió de médico esté...

98

Tannen (1989) afirma que o envolvimento, além de ser marcado pela prosódia,

também ocorre simultaneamente com seqüências e estratégias de envolvimento, e cita,

entre outras, a repetição, o diálogo construído e a narrativa. A respeito da narrativa, essa

autora afirma que contar uma estória na conversa pode, por si só, ser uma estratégia de

envolvimento. Ela afirma também que, quando há um alto grau de envolvimento, as

pessoas tendem a contar suas próprias experiências pessoais e os sentimentos relativos a

esses eventos, que é justamente o que ocorre aqui.

A narrativa realizada por Carmen do episódio ocorrido em sua infância (linhas 6-

102), está permeada por perguntas feitas por Maura, que denotam interesse pelo

assunto. Confira-se:

25 Maura -¿En Moreno era?

26 27 28 29

Carmen -En Moreno, sí. Frente a Bolívar, ahí donde está el Nacional ahora. Resulta que íbamos a la terraza- - la azotea, nos íbamos todos. Él llevaba una pava y tomábamos mate.

48 Maura -¿ Qué hab ... qué había adentro?

49 50 51 52 53 54

Carmen -No sé, eran en la ....................................... los techos eran así, formando esa especie de hueco que [1 una pirámide, formaba como una pirámide para arriba. Esas pirámides sob... sobresalían en la terraza, ¿sabés?, y eran todo de esos ladrillos colorados--- de esos mosaicos colorados.

Ao longo da narrativa ocorre, também, um grande número de repetições, que

geram um diálogo co-construído. Essas repetições dão suporte e concordância às

afirmações do outro, aumentando o rapport existente e evidenciando que as

interlocutoras alinham-se como amigas, além de compartilharem lembranças e

conhecimento de mundo.

57 58 59

Carmen -No no, si era en el salón grande, donde estaban todas las mercaderías, donde vendían, que era almacén por mayor.

60 Maura -Entonces no sé qué sería.

61 62 63

Carmen -No sé para qué sería. Y sería... era un galpón grande. Lo habrían hecho de esa forma. No sé si tendría a lo mejor alguna rejilla, tender... posiblemente...

64 Maura -Para ventilación puede ser. Para ventilación.

65 66 67 68

Carmen -Para ventilación pud... eh... podría ser, ¿no?, que tuviera alguna rejilla. Yo no me acuerdo de eso, de la rejilla. Lo que me acuerdo que la... la terraza--- era toda medio ondulada--- porque era una terraza vieja,

99

69 70 71 72 73

gastada. Y cuando llovía se formaban charcos ahí abajo de esas pirámides--- se formaban charcos de agua. ¿,Vos sabés 1 ... 1 la gracia nuestra? Resbalar de ahí arriba de la punta ................. 1 de las chicas se largaban, y Ema...

74 Maura -Como si fuera un tobogán.

75 76 77 78 79

Carmen -Sí--- como si fuera un tobogán. Ema se ponía la bombacha a la miseria, toda mojada. Todas un día al aire [ 1 Ulises nos llevaba allá arriba--- a la terraza y nos contaba cuentos, nos leía cuentos. Sí, nos leía siempre cuentos. Yo me acuerdo de haber ido allá...

Vale salientar que, apesar de, no segmento de fala acima, a narradora do

episódio ser Carmen, é sempre Maura quem introduz os enunciados que serão aceitos e

repetidos por Carmen, o que evidencia o alto grau de envolvimento existente entre elas

e a colaboração e o interesse de Maura na narrativa. Maura, ao sugerir proposições para

as quais sua interlocutora não conseguia achar as palavras adequadas (linha 64) ou

resumir o dito por ela (linha 74), está colaborando para a elaboração de um diálogo

construído.

Repetições, diálogo construído e narrativa, três maneiras de gerar envolvimento

segundo Tannen (e, consequentemente, de maximizar rapport), ocorrem

simultaneamente neste segmento do diálogo 2, evidenciando o alto grau de

envolvimento existente entre as interlocutoras.

Excerto 4 (diálogo 2):

No segmento de fala a seguir o aumento / maximização de rapport ocorre

através, principalmente, do consenso de opiniões e das repetições que geram diálogo

construído. Mais uma vez, a “base comum” (common ground) existente entre as

interlocutoras resultou em envolvimento, fruto da visão de confiança tal qual a define

Thurén (1988, p.222)..

01 02 03 04

Carmen -Y Be... y Bety, ¿sabés lo que me pone en la carta? Dice que a Inés para una fiesta del colegio, que tenía que bailar un vals con trajes ... ¿qué di'o--- trajes antiguos?

05 06 07

Maura no sé, porque le pusieron el traje de torero para m bailar--- un vals. Ahora, lo habrá bailado con todo el vals, seguramente.

08 09 10

Carmen Eran chicas [ 1 con cualquier traje sería. Bueno, la cuestión que le pu ¿no le [ 1 trajes como antiguos o trajes raros? [ 1 algo así.

100

11 Maura -Sí, con trajes antiguos, trajes raros, sí.

12 13 14

Carmen -Sí. Entonces le puso... le hizo... eh... le puso el traje que ella usó cuando era chica--- que iba a baile espaiíol.

15 Maura -Pero lo habrá modificado un poco, a lo mejor.

16 17 18 19 20

Carmen -No sé, no creo, estaba muy bien. Dice que le quedaba espléndido. Y Cecilia tenía que bailar el cuándo, y entonces le puso un vestido que le había hecho ella a Inés hace dos años para otra fiesta del colegio--- y después un peinetón que era mío, dice [...............]

21 Maura -Sí, acá el peinetón grande [ ] de abuelita.

22 Carmen -Yo tenía dos peinet... no, mío, de disfraz.

23 24

Maura -[ ] uno de disfraz. Vos tenés una foto disfrazada con el peinetón, sí.

25 26 27

Carmen -Sí, que yo vivía disfrazada de chica. Me gustaba muchísimo vestirme así--- cantar en... canciones españolas y bailar la jota. Me gustaba muchísimo.

28 Maura -Es una artista.

29 30

Carmen -No, no soy una artista. Tengo vocación de artista, pero no soy artista.

31 Maura -Mhm.

32 33

Carmen -No, en serio que me gustaba muchísimo. Me gustaba mucho cantar y bailar.

34 35 36

Maura -Yo sí, yo también bailaba ciiando... cuando era chica me... pre... pretendieron enseñarme a bailar baile... baile español y clásico.

37 Carmen -Bailes clásicos eran.

38 39

Maura -Pero iba [ ] a danzas clásicas. Claro--- yo era gorda y Bety era muy flaca y parecían ... ¿cómo decían los

40 41 42

Carmen -No sé. No [....................] ¿ Pero y después cuando venía acá el profesor a hacerle hacer gimnasia rítmica a casa?

43 Maura -Aquél perfumado, sí.

44 45

Carmen -¡Qué risa! Mirá que nos hemos divertido, ¿eh? La hemos pasado muy bien tanta ge... tanta gente.

A conversa começa com Carmen relatando (linhas 1-4) o recebimento de uma

carta enviada por uma pessoa chamada Bety, e esse fato evidencia o conhecimento de

mundo compartilhado pelas falantes, pois não se torna necessário explicar para Maura

quem é Bety.

A continuação (linhas 19-27), ao comentar sobre as roupas antigas usadas por

Carmen quando era criança, as falantes repetem parte do enunciado uma da outra (como

“de disfraz”) e Carmen, após Maura dizer “Vos tenés una foto disfrazada con el

peinetón, sí.”, assevera que é verdade que ela adorava se fantasiar – “Sí, que yo vivia

disfrazada de chica.” – numa seqüência de falas colaborativas que denotam o

conhecimento de mundo compartilhado por elas.

101

16 17 18 19 20

Carmen -No sé, no creo, estaba muy bien. Dice que le quedaba espléndido. Y Cecilia tenía que bailar el cuándo, y entonces le puso un vestido que le había hecho ella a Inés hace dos años para otra fiesta del colegio--- y después un peinetón que era mío, dice [...............]

21 Maura -Sí, acá el peinetón grande [ ] de abuelita.

22 Carmen -Yo tenía dos peinet... no, mío, de disfraz.

23 24

Maura -[ ] uno de disfraz. Vos tenés una foto disfrazada con el peinetón, sí.

25 26 27

Carmen -Sí, que yo vivía disfrazada de chica. Me gustaba muchísimo vestirme así--- cantar en... canciones españolas y bailar la jota. Me gustaba muchísimo.

28 Maura -Es una artista. (elogio)

29 30

Carmen -No, no soy una artista. Tengo vocación de artista, pero no soy artista. (estratégia de modéstia)

31 Maura -Mhm.

Note-se, em seguida, o par adjacente composto por elogio / recusa de elogio

(linhas 28-30). Maura faz um elogio à Carmen (“es una artista)”, que o recusa,

lançando mão da estratégia de modéstia.

Mais adiante (linhas 40-45), ocorre uma simbiose de idéias, o que denota a

perfeita sintonia existente entre as falantes, que compartilham avaliações e pontos de

vista comuns:

40 41 42

Carmen -No sé. No [....................] ¿ Pero y después cuando venía acá el profesor a hacerle hacer gimnasia rítmica a casa?

43 Maura -Aquél perfumado, sí.

44 45

Carmen -¡Qué risa! Mirá que nos hemos divertido, ¿eh? La hemos pasado muy bien tanta ge... tanta gente.

Excerto 5 (diálogo 3):

O aumento / maximização de rapport no excerto a seguir foi realizado,

preponderantemente, através da utilização de elogios.

01 Mercedes -Ah, ¿Pero vos vivías cuando él murió?

02 Carlos -Sí, mi abuelo murió en el año cinco.

03

Mercedes -¿Y vos de cuántos años es...?, si no es indiscreto.

04 Carlos -Yo soy del cuatro. [risas]

05 06

Mercedes -Estas cosas no se preguntan aunque sean hombres, ¿no es cierto ?

07 Carlos -De... de los... esté...

102

08 Outra voz

-Es joven.

09 Carlos -¿Eh?

10 Mercedes -Joven.

11 12

Carlos -Bueno, yo creo que--- la juventud se lleva en el espíritu, ¿no?

13 Mercedes -Claro, sí.

14 15

Carlos -Es una frase ya hecha, pero es la verdad. Yo... yo tengo compañeros míos de curso...

16 17 18

Mercedes -Bueno, yo hasta que me di cuenta que tenía el corazón enfermo de tanto amar, no sabía que era una persona grande.

19 20

Carlos -Pero vos sos una... vos sos una chica--- una chica agrandada en cuanto a... a algo...

21 22 23 24

Mercedes -Pero es que... no, pero es verdad, ¿eh?, es verdad. Yo nunca me imaginé que tenía--- la edad que tengo--- no la sentía hasta que t... t... tuvieron que hacerme--- los análisis que me hacés.

25 Carlos -Pero... bueno, pero--- ni la representás.

26 Mercedes -Sí, la represento. Siendo una abuela...

27 Carlos -No la representas. Bueno, lo de abuela...

28 Mercedes -¿Eh?

29 30

Carlos -Eso no tiene importancia. Lo de abuela no tiene importancia para los años.

31 Mercedes -¿Te parece? ¡Ay, sí! ¿Sabés qué?, las arrugas.

32 Carlos -¡Oh, las arrugas!

33 Mercedes -Las arrugas porque--- después el cuerpo no.

34

Carlos -¿,Qué arrugas? ¿las arrugas de qué? ¿de la piel? No.

Neste segmento ocorre um pseudo-conflito (linhas 16-34), isto é, o que parece

ser uma discordância na realidade não o é, pois Mercedes, na verdade, compartilha a

opinião de Carlos. O tema em questão é se Mercedes aparenta a idade que tem, e se ela

se sente como uma pessoa idosa.

Como se comprova através das falas de Mercedes no trecho abaixo, ela não se

sente uma pessoa idosa (cf. linhas 16-18 e 21-24): “[...] no sabía que era una persona

grande”; “Yo nunca me imaginé que tenía--- la edad que tengo--- no la sentía...“.

Também se verifica que Mercedes concorda com a opinião de Carlos sobre ela não

aparentar a idade que tem uma vez que, após o elogio feito por este (linhas 19-20), ela

responde (linha 21): “Pero es que... no, pero es verdad, ¿eh?, es verdad.”

103

16 17 18

Mercedes -Bueno, yo hasta que me di cuenta que tenía el corazón enfermo de tanto amar, no sabía que era una persona grande.

19 20

Carlos -Pero vos sos una... vos sos una chica--- una chica agrandada en cuanto a... a algo...

21 22 23 24

Mercedes -Pero es que... no, pero es verdad, ¿eh?, es verdad. Yo nunca me imaginé que tenía--- la edad que tengo--- no la sentía hasta que t... t... tuvieron que hacerme--- los análisis que me hacés.

25 Carlos -Pero... bueno, pero--- ni la representás.

O tópico “idade: juventude / velhice” é gerenciado através do uso de elogios,

por parte de Carlos, direcionados a sua amiga Mercedes (linhas 19-20, 25, 27, 29-30,

34). Esta, por sua vez, começa por aceitar os elogios (linha 21) para, em seguida,

recusá-los (linhas 26, 31, 33), lançando mão, inclusive, da estratégia de modéstia (linha

26): “Sí, la represento. Siendo una abuela...”. Isto se dá através de uma série de pares

adjacentes que proporcionam enquadres de interpretação compostos, na primeira parte,

por elogios e, na segunda, por aceitação ou recusa.

16 17 18

Mercedes -Bueno, yo hasta que me di cuenta que tenía el corazón enfermo de tanto amar, no sabía que era una persona grande.

19 20

Carlos -Pero vos sos una... vos sos una chica--- una chica agrandada en cuanto a... a algo... (elogio)

21 22 23 24

Mercedes -Pero es que... no, pero es verdad, ¿eh?, es verdad. (aceitação do elogio) Yo nunca me imaginé que tenía--- la edad que tengo--- no la sentía hasta que t... t... tuvieron que hacerme--- los análisis que me hacés.

25 Carlos -Pero... bueno, pero--- ni la representás. (elogio)

26 Mercedes -Sí, la represento. Siendo una abuela... (recusa elogio)

27 Carlos -No la representas. Bueno, lo de abuela... (elogio)

28 Mercedes -¿Eh?

29 30

Carlos -Eso no tiene importancia. Lo de abuela no tiene importancia para los años. (elogio)

31

Mercedes -¿Te parece? ¡Ay, sí! ¿Sabés qué?, las arrugas. (pedido de confirmação do elogio)

32 Carlos -¡Oh, las arrugas!

33 Mercedes -Las arrugas porque--- después el cuerpo no.

34 Carlos -¿,Qué arrugas? ¿las arrugas de qué? ¿de la piel? No. (elogio)

A Análise da Conversa mostrou que há linhas de ação preferidas, isto é, aquilo

que é considerado normal ou esperado em qualquer dada situação. Porém, quando a

organização de preferência precisa dar conta, por exemplo, dos elogios, surge a questão:

elogios: aceitação ou recusa?

104

Segundo Duranti (1996), os elogios são uma categoria à parte, pois, ao mesmo

tempo em que expressam aprovação, eles criam um problema para o ouvinte para o qual

o elogio é endereçado. O problema seria um conflito entre os dois princípios gerais da

interação, que são: a preferência pela concordância e a despreferência pelo auto-elogio.

O segmento acima (linhas 16-34) começa com Carlos elogiando sua amiga

Mercedes (linhas 19-20), que aceita o elogio (linha 21). Mercedes, ao aceitá-lo, escolhe

a ação preferida de concordância com o interlocutor, ao mesmo tempo em que pratica a

atividade despreferida do auto-elogio.

Carlos prossegue com os elogios a Mercedes (linha 25), ao dizer que ela não

aparenta a idade que tem. Mercedes, por sua vez, recusa o elogio (linha 26). Então

Carlos reafirma sua opinião: “No la representas.” (linhas 27). Mercedes, agora,

pratica ação inversa àquela por ela praticada anteriormente, isto é, ela rejeita os elogios

de Carlos e, assim, escolhe a ação despreferida de discordância com o interlocutor, ao

mesmo tempo em que se alinha com a estratégia de recusa aos elogios.

Carlos (linhas 29-30) prossegue com os argumentos que sustentam sua opinião

anteriormente exposta, isto é, de que Mercedes não é uma representante das pessoas de

sua idade. Mercedes (linha 31), então, rejeita essa afirmação com o contra-argumento:

“Sabés que? las arrugas.”, ao que Carlos responde com a divertida sentença (linha 32):

“Oh, las arrugas!” (“Oh, as rugas!”). Mercedes (linha 33) prossegue sua contra-

argumentação, que é novamente rebatida por Carlos (linha 34).

Excerto 6 (diálogo 3): Esse segmento evidencia a paixão que os interlocutores compartilham por

viagens, sendo um exemplo típico de diálogo co-construído, através de repetições de

parte da fala do interlocutor e de pressuposições que se confirmam, evidenciando o alto

grau de envolvimento existente.

Essas estratégias citadas, destinadas à maximização de rapport, evidenciam que

os participantes possuem pontos de vista e avaliações comuns e que compartilham

lembranças e conhecimento de mundo.

105

01 02

Carlos -Bueno, hoy es... hoy en la mesa estábamos hablando de algo muy agradable.

03 Mercedes -¿Del viaje?

04 Carlos -De los viajes--- sí.

05 Mercedes -¡Ah, qué interesante! Yo dejo cualquier cosa por viajar.

06 Carlos -Porque los viajes son--- apasionantes, ¿no?

07 08

Mercedes -Ah, sí. Yo prefiero un... ése es un--- lujo que no sé si es lujo.

09 Carlos -No, yo tampoco.

10 11 12 13

Mercedes -Pero a cualquier cosa, a las pieles--- a... incluso a tener más comodidades en la casa. Más de las que tengo no lo... no... no... no... no las preciso. En fin--- uno siempre por el gusto estético, ¿no es cierto?

14 Carlos -Sí, aspira a más, ¿mm?

15 Mercedes -Sí, siempre uno aspira a tener una cosa

16 Carlos -Bueno, dentro ... dentro de las comodidades que...

17 Mercedes -Ah, sí, es auténtico.

18 Carlos -Pero el viajar a mí también... a mí--- me encanta.

19 20

Mercedes -Yo creo que es acercarse a la historia de los pueblos, ¿no es cierto?, y de los hombres, ¿no?

21 Carlos -Ah, sí; ah, sí. Sí, retroceder así...

22 Mercedes -Ahora, me canso mucho yo, porque yo--- us... tilizo...

23 Carlos -Cansás tu imaginación.

24 Mercedes -Sí. No sé si cansando la imaginación--- pero...

25 26

Carlos -Agotás la imaginación, ¿eh?, porque vos sí que retrocedés--- y querés... querés--- en el...

27 28

Mercedes -En el tiempo. Bueno, yo trato de--- reconstruir la época--- en que fueron...

29 Carlos -Te ubicás... te ubicás en aquel tiempo.

30 31 32

Mercedes -Exacto Me parece que es lo más interesante porque--- hoy sería ridículo, por ejemplo, concebir un---Versailles, ¿no?

33 34

Carlos -Ajá. Y sobre todo como está Versailles desmantelado, ¿no?

35 Mercedes -Sí, no. Bueno, Versa... claro.

36 37

Carlos -A mí me... a mí Versailles me decepcionó. Te voy a decir por qué.

38 Mercedes -Porque no viste muebles, ¿verdad? Nada.

39 40

Carlos -Nada, nada. Salones. El salón de los espejos, salón grande y después y después...

41 Mercedes -Claro.[.......] magnífico, ¿no?

42 Carlos -Ah, sí. Magnífico.

43 Mercedes -Grandioso.

44 45

Carlos -Eh... las habitaciones vacías. En cambio Fontainebleau me gustó.

46 Mercedes -Bueno, porque tiene más de la época de Napoleón, ¿no?

106

47 Carlos -Sí, sí. No no. Y además esté...

48 Mercedes -El mobiliario.

49 Carlos -Sí, el mobiliario.

50 Mercedes -¿Conocés Malmaison?

51 Carlos -No, no no, no.

52 53 54 55 56

Mercedes -Y ya esté... está bastante ma... acom... Bueno, vos sabés que en Versailles como fue donde ejecutaron, la [sic] sacaron presos a los reyes... eh... fue el último momento de ellos, tiraron todo por las ventanas, quemaron. Fue el incendio del populacho, ¿no? Es por eso.

57 58 59

Carlos -Ajá. Y qué raro que... eh... los demás, Fontainebleau... yo al que no he ido es al Petit Trianon y al gran... al gran...

60 Mercedes -No, no tiene gran cosa. No no.

61 Carlos -¿,No hay nada?

62 63 64 65

Mercedes -Sí, bueno, en--- el Grand Trianon creo que reside el gobierno de Francia, ¿no? Yo no lo pude--- Visitar porque había ese día que fui--- una [sic] gran almuerzo de De Gaulle.

66 Carlos -¿Y está cerquita de las... de...

67 Mercedes -De París.

68 Carlos -...de Versailles? Creo, ¿no? Sí sí, creo que...

69 70

Mercedes -Sí, de... sí, camino de Versailles, ¿no? La Malmaison sí--- que era la casa de ella, ¿no?

71 Carlos -Sí, si. Yo ésa tampoco la vi, pero ...

72 Mercedes -Esté... es bonita. Es una casa chica. Bonita es.

73 Carlos -¿Y está también--- bien amueblada así?

74 75 76

Mercedes -Sí, sí, sí. Sí, está sí. Está... está bien amueblada. Está... está más vivida. Se salvó del incendio, ¿no es cierto?

77 Carlos -Ajá.

No segmento abaixo, Mercedes (linha 38) arrisca uma pressuposição de qual

seria o motivo da afirmação de Carlos (linhas 36-37):“A mí me... a mí Versailles me

decepcionó. Te voy a decir por qué.”, pressuposição essa que se confirma (linhas 39-

40). Logo em seguida, Mercedes novamente (linhas 46-48) arrisca outra pressuposição,

tentando encontrar uma resposta para a asserção de Carlos (linhas 44-45): “En cambio

Fontainebleau me gustó.”, que, mais uma vez, se confirma (linhas 47-49).

30 31 32

Mercedes -Exacto Me parece que es lo más interesante porque--- hoy sería ridículo, por ejemplo, concebir un---Versailles, ¿no?

33 34

Carlos -Ajá. Y sobre todo como está Versailles desmantelado, ¿no?

107

35 Mercedes -Sí, no. Bueno, Versa... claro.

36 37

Carlos -A mí me... a mí Versailles me decepcionó. Te voy a decir por qué.

38 Mercedes -Porque no viste muebles, ¿verdad? Nada.

39 40

Carlos -Nada, nada. Salones. El salón de los espejos, salón grande y después y después...

41 Mercedes -Claro.[.......] magnífico, ¿no?

42 Carlos -Ah, sí. Magnífico.

43 Mercedes -Grandioso.

44 45

Carlos -Eh... las habitaciones vacías. En cambio Fontainebleau me gustó.

46 Mercedes -Bueno, porque tiene más de la época de Napoleón, ¿no?

47 Carlos -Sí, sí. No no. Y además esté...

48 Mercedes -El mobiliario.

49 Carlos -Sí, el mobiliario.

Esse é mais um exemplo de diálogo co-construído, no qual ocorrem vários

turnos de consenso entre os interlocutores, com pressuposições que se confirmam

(linhas 39-40, 47-49), repetição de parte do enunciado do interlocutor (linhas 41-42, 48-

49 e 73-74) e uso de adjetivação avaliativa (linhas 41-43).

Nos segmentos transcritos abaixo ocorrem repetições de parte do enunciado do

interlocutor (linhas 48-49 e 73-74), evidenciando que os falantes possuem avaliações e

pontos de vista comuns, compartilhados. Essas repetições têm função de concordância,

de acordo.

44 45

Carlos -Eh... las habitaciones vacías. En cambio Fontainebleau me gustó.

46 Mercedes -Bueno, porque tiene más de la época de Napoleón, ¿no?

47 Carlos -Sí, sí. No no. Y además esté...

48 Mercedes -El mobiliario.

49 Carlos -Sí, el mobiliario.

72 Mercedes -Esté... es bonita. Es una casa chica. Bonita es.

73 Carlos -¿Y está también--- bien amueblada así?

74 75 76

Mercedes -Sí, sí, sí. Sí, está sí. Está... está bien amueblada. Está... está más vivida. Se salvó del incendio, ¿no es cierto?

77 Carlos -Ajá.

108

5.2 Uso das micro-estratégias de rapport

Nesta segunda parte procedemos à amostragem das micro-estratégias

encontradas em nossos dados que estão dirigidas à manutenção de rapport, além

daquelas destinadas à maximização de rapport.

5.2.1 Micro estratégias destinadas à MANUTENÇÃO de rapport: gerenciamento / mitigação de conflito Excerto 1 (diálogo 2):

O tópico do exemplo a seguir versa sobre comentários sobre vizinhos (a

coloquialmente denominada fofoca9). Nele, as interlocutoras possuem opiniões

discordantes, que não chegam a gerar conflito entre elas pois ocorre um gerenciamento

adequado do rapport, com a produção de opiniões atenuadas.

As micro estratégias utilizadas, que serão analisadas segundo o uso e a

contribuição na orientação do gerenciamento de rapport, foram:

(a) marcadores conversacionais de rejeição (ou disclaimers) e de distanciamento;

(b) formas de auto-correção.

01 Carmen -¿Eh?

02 Maura -¿ Qué le pasó?

03 04

Carmen -Y nada. Le ... le dan muchísimo trabajo los chicos para estudiar. El otro día te encontraste con ella abajo, ¿no?

05 06 07 08 09

Maura -No ... eh ... eh ... la otra noche la encontré. Había ido a comprar el diario el chico, ella estaba esperando en la puerta porque dice que el chico no se duerme si no lee el diario antes, y ella no se lo deja leer si no estudia. ¿En qué colegio está el ... ?

10 Carmen -Está acá en el Carlos Pellegrini. Aquí en Charcas en ...

11 12

Maura -Ah, Carlos Pellegrini el chico. Pero es un monstruo ese chico.

13 Carmen - [...........

14 Maura -Tiene cara... no tiene cara de r... una cara rara.

15 16

Carmen - No, a mí no me parece feo. No es feo ese chico. El más chico es más feo.

17 Maura -¿ El más chico? Tiene una cabeza de melón así grande.

9 Fofoca (popular): mexerico, intriga, bisbilhotice (Novo Dicionário Aurélio, 1986).

109

18 19

Carmen -Ah, bueno, puede ser que la cabeza sea grande, pero la cara no es feo.

20 Maura -Ah...

21 Carmen -En cambio el mayor tiene una nariz de .... 1 - - 1

22 23

Maura -¿El mayor... el mayor se lla... el mayor... el mayor se llama Adrián?

24 Carmen -No, Adrián deben ser los chicos del primer piso.

Neste trecho (linhas 1-24) as interlocutoras conversam sobre crianças que vivem

na vizinhança, começando pelo tópico colégio e estudos. Há um segmento em que elas

criticam a aparência de uma criança (linhas 11-21), no qual Maura começa por dizer que

a criança “...es un monstruo” (linhas 11-12), para, em sua fala seguinte (linha 14),

fazer uma auto-correção, atenuando e dizendo que a criança possui um rosto pouco

comum, diferente, singular: “...una cara rara”.

10 Carmen -Está acá en el Carlos Pellegrini. Aquí en Charcas en ...

11 12

Maura -Ah, Carlos Pellegrini el chico. Pero es un monstruo ese chico.

13 Carmen - [...........

14 Maura -Tiene cara... no tiene cara de r... una cara rara.

15 16

Carmen - No, a mí no me parece feo. No es feo ese chico. El más chico es más feo.

17 Maura -¿ El más chico? Tiene una cabeza de melón así grande.

18 19

Carmen -Ah, bueno, puede ser que la cabeza sea grande, pero la cara no es feo.

20 Maura -Ah...

21 Carmen -En cambio el mayor tiene una nariz de .... 1 - - 1

O trecho acima gera uma discordância entre elas, com Carmen dizendo (linha

15) que, na opinião dela, a criança não é feia. A outra criança menor (eles devem ser

irmãos) sim que, na opinião dela, é feia. Carmen utiliza a estrutura “a mí no me parece

feo”10.

A resposta de Maura é “¿El más chico?”(o menor?), e prossegue com uma

afirmação (linha 17) que gera um segmento de fala dúbio na conversação. Ela diz:

“Tiene una cabeza de melón así grande.”, e não se sabe se ela está se referindo à criança

menor ou à maior. Carmen não concorda com a opinião de Maura (linhas 18-19): “Ah,

bueno, puede ser que la cabeza sea grande, pero la cara no es feo.”, e por essa

10 Segundo Consuelo Alfaro Lagorio, essa é uma seqüência formulaica, fazendo o verbo parecer parte do grupo de dativos ‘canônicos’ que em espanhol são recorrentes e produtivos. Esse verbo possui uma regência obrigatória me com a variação a mi (opinião manifesta durante defesa desta tese).

110

afirmação deduz-se que Maura se referia à criança maior, pois Carmen concorda em

parte com Maura, mas diz novamente que a criança não é feia. Na opinião dela, a

menor é mais feia que a maior.

As falas discordantes que ocorrem nesse segmento de fala não chegam a gerar

um conflito entre as interlocutoras, uma vez que há um gerenciamento adequado do

rapport, com as falantes produzindo opiniões atenuadas, migitadas. A discordância com

relação à aparência das crianças, portanto, não chega a comprometer o bom andamento

da conversa, que prossegue normalmente, voltando ao tópico colégio e estudos.

Excerto 2 (diálogo 1): As micro estratégias utilizadas no trecho abaixo foram:

(a) fazer perguntas ou pedidos de esclarecimento (pedir explicações) (em negrito)

(b) oferecer razões / dar explicações (tipo escusa / justificativa) (em negrito e itálico)

(c) estratégia de modéstia e/ou auto-depreciação (em negrito e itálico)

01 02

Tereza -Yo creía--- que vos habías dejado la enseñanza del alemán.

03 04 05 06 07 08 09 10 11 12

Marta -Pero--- es que yo no puedo decir que enseñe alemán, me da vergüenza. Tanto, que esta chica me dice: "i Pero Marta, qué lecciones largas, pero qué barbaridad! Pero no me cobra más que... eh... lo que me ha cobrado el año pasado por una hora." "No, hija", le digo yo. Son lecciones muy poco académicas, en las que yo recurro al diccionario, y en las que yo consulto la gramática en presencia de ella. Pero yo creo que ella prefiere--- que haga así un trabajo de sinceridad--- y no que me presentara como una gran profesora no siéndolo.

13 14

Tereza -¿Y por qué te has olvidado de una de tus alumnas--- que has dejado completamente a un lado?

15 16

Marta -Porque es una vaga que se la pasa viajando. Y cuando viene acá--- se lo pasa paseando...

17 18 19

Tereza -Como definición me parece muy bonito, porque está escrito en tono de soneto, con ritmo de soneto, pero no responde a la verdad.

20 Marta -Yo creo que sí. Tengo… tengo otra amiga ...

21 22

Tereza -Yo, mirá, creo francamente que no te interesaba, porque si no...

23 Marta -No, es que...

24 25

Tereza -Vos no sabés el beneficio moral--- que a mí me hace una lección de alemán.

26 27

Marta -Pero es que todas vienen a mí por beneficio moral; porque esta chica me decía: "Me hace falta..."

28 Tereza -No, ella va por necesidad también.

111

29 30 31

Marta -No no, porque esos pi... ahora tiene este trabajo nuevo, pero el año pasado me decía: "Me hace falta el alemán y me hace falta M. R."--- El beneficio moral... moral...

Tereza (linhas 1-2) faz, através de indiretividade, um questionamento a sua amiga

Marta, que responde (linhas 3-12) com estratégias de dar explicações e/ou razões (tipo

escusa / justificativa), que têm como finalidade a manuteção do rapport da relação.

Note-se que ela o faz ao longo de 10 linhas, o que demonstra sua grande preocupação

com a opinião / avaliação de sua amiga Tereza.

Marta também recorre (linhas 3-4 e 11-12), ao longo de suas justificativas, à

estratégia de modéstia (ou de auto-depreciação), ao dizer que ela não pode ser

considerada professora de alemão. Ela também (linhas 4-5) lança mão de argumentos

(através da fala de sua aluna) que corroborem o que ela deseja comprovar, isto é, que ela

não é realmente professora de alemão.

Confira-se (em negrito e negrito com itálico):

03 04 05 06 07 08 09 10 11 12

Marta -Pero--- es que yo no puedo decir que enseñe alemán, me da vergüenza. Tanto, que esta chica me dice: "i Pero Marta, qué lecciones largas, pero qué barbaridad! Pero no me cobra más que... eh... lo que me ha cobrado el año pasado por una hora." "No, hija", le digo yo. Son lecciones muy poco académicas, en las que yo recurro al diccionario, y en las que yo consulto la gramática en presencia de ella. Pero yo creo que ella prefiere--- que haga así un trabajo de sinceridad--- y no que me presentara como una gran profesora no siéndolo.

Novamente Tereza (linhas 13-14) pede explicações à Marta, questionando as que

esta havia dado anteriormente (isto é, porque Marta pode dar aulas para outra pessoa e

não para ela). Marta, mais uma vez (linhas 15-16), recorre às micro estratégias de

oferecer razões / explicações que, mais uma vez, não são aceitas por Tereza. Esta

(linhas 17-19) recorre à ironia para mostrar que não acredita nas razões dadas por

Marta. Confira-se:

13 14

Tereza -¿Y por qué te has olvidado de una de tus alumnas--- que has dejado completamente a un lado?

15 16

Marta -Porque es una vaga que se la pasa viajando. Y cuando viene acá--- se lo pasa paseando...

17 18 19

Tereza -Como definición me parece muy bonito, porque está escrito en tono de soneto, con ritmo de soneto, pero no responde a la verdad.

20 Marta -Yo creo que sí. Tengo… tengo otra amiga ...

112

21 22

Tereza -Yo, mirá, creo francamente que no te interesaba, porque si no...

23 Marta -No, es que...

Marta (linhas 20 e 23) faz novas tentativas de explicação, interrompidas e rebatidas

por Tereza, que (linhas 21-22) reafirma sua posição dada anteriormente (linhas 1-2), isto

é, de que Marta não mais desejava dar aulas de alemão. A seguir, Tereza (linhas 24-25)

agrega argumentos que justificam o fato de ela estar tão aborrecida: as aulas de alemão

são, para ela, um benefício moral. Marta, porém, argumenta (linhas 26-27) que todas

dizem a mesma coisa, ao que Tereza (linha 28) rebate, dizendo que para a aluna de

Marta as aulas são uma necessidade de trabalho. Marta (linhas 29-31) se utiliza

novamente da micro estratégia de dar justificativas, dizendo: “... ahora tiene este

trabajo nuevo, pero el año pasado me decía...”.

24 25

Tereza -Vos no sabés el beneficio moral--- que a mí me hace una lección de alemán.

26 27

Marta -Pero es que todas vienen a mí por beneficio moral; porque esta chica me decía: "Me hace falta..."

28 Tereza -No, ella va por necesidad también.

29 30 31

Marta -No no, porque esos pi... ahora tiene este trabajo nuevo, pero el año pasado me decía: "Me hace falta el alemán y me hace falta M. R."--- El beneficio moral... moral...

A continuação, as interlocutoras chegam a um acordo com relação a Marta

voltar a dar aulas para Tereza, comprovando que todo o esforço de Marta no sentido de

valer-se de estratégias para manter o rapport da relação foi recompensado.

Excerto 3 (diálogo 1): No segmento abaixo Marta recorre à micro estratégia de pseudo-acordo

(concordar para em seguida discordar). Esta estratégia tem a finalidade de evitar a

discordância direta ao interlocutor, favorecendo, assim, a manutenção do rapport da

relação.

01 02 03 04 05 06 07 08 09

Marta -Mirá, vos le fuistes--- a enseñar el mecanismo de la puerta--- En materia de puertas lo más original, para mi modo de ver, es la que ha puesto--- Erwin Rubens en su casa. Vos tocás la campanilla--- y empieza un sonido musical- - - de varillas metálicas que se chocan entre sí; y así vos apretés el botón con fastidio, con apuro, con rabia, eso no sale de su ritmo--- y tenés--- que aguantarte que vengan a abrirte cuando les da la gana. No es lo mismo--- que cuando vos apretás el botón y con rabia le das y le das y le das.

113

10 Tereza -Sí.

11 12

Marta -Y yo le digo: "Mire, acá tiene uno que dejar todo malhumor. . . porque no hay caso; te contesta una musiquita.

13 Tereza -Porque es un sonido continuo, melódico, como una música.

14 15 16 17

Marta -Sí sí; no es --- continuo porque es s ... ensegmento de falacan unas cuatro o e... los cuatro o cinco caireles--y después--- se acaba; y vos volvés a tocar--- y vuelve otra vez a producirse lo mismo.

18 Tereza -Entonces hay que probar la paciencia--- del visitante.

A construção colaborativa feita por Tereza (linha 13) gera um pseudo-acordo

(linha 14) por parte de Marta, que recusa a afirmação de Tereza “…es un sonido

continuo,…”, dizendo: “Sí, sí; no es …continuo porque es …”. Marta discorda de

Tereza, porém, antes de fazer o reparo necessário (no es… continuo porque es…),

utiliza as partículas Sí, sí;. Deste modo ela primeiro concorda para depois discordar.

Com isso, ela evita a discordância direta a sua interlocutora.

Os motivos que levaram Marta a utilizar-se da estratégia de pseudo-acordo

foram: (i) o fato de sua interlocutora haver produzido uma fala colaborativa a sua

narrativa; e (ii) estar orientada no sentido de manutenção do rapport da relação.

Excerto 4 (diálogo 1): No segmento abaixo Marta lança mão da micro estratégia de concordância com

ressalva, para não quebrar a seqüência de falas colaborativas de Tereza e evitar que a

discordância direta gerasse algum tipo de desentendimento.

16 Tereza -Es una manera muy interesante de objetivar la gramática.

17 Marta -Claro.

18 Tereza -De hacerla objetiva...

19 20

Marta -Y de que los chicos aprendan; porque por regla general--- los chiquitos...

21 Tereza -. . y de participar en ella.

22 Marta -Claro, parece...

23 Tereza -Porque de otra manera es el libro y el niiío.

24 Marta -Sí.

25 26 27

Tereza -Y nada más que las pequeñas letras que él tiene que ir descifrando el significado; de la otra manera se crea un poco.

28 29 30

Marta -María Victoria también ha inventado juegos--- en que el chico tiene que hablar y el otro tiene que contestar, y así se acostumbran al... al diálogo.

31 Tereza -Al fin se ha llegado a mejorar la ense... la ped... la

114

32 metodología de la gramática.

33 34

Marta -Pero--- en este renglón y ese grupo de personas, porque yo creo que eso no está muy generalizado.

35 Tereza -No, creo que no.

Marta (linhas 33-34) utiliza-se da partícula pero e do marcador de atenuação

“yo creo que” para marcar que a opinião de Tereza (linhas 31-32) procede, porém não

de maneira generalizada: “Pero… en este renglón y ese grupo de personas, porque yo

creo que eso no está muy generalizado.”

Essas estratégias atenuadoras devem-se ao fato de Marta estar discordando de

sua interlocutora (atividade despreferida). Logo em seguida (linha 35) Tereza concorda

com o reparo feito: “No, creo que no.” A estratégia utilizada por Marta foi a da

concordância com ressalva, pois discordar abertamente e de forma direta do interlocutor

pode gerar conflito entre as partes, e costuma ser evitado quando o falante está

orientado para a manutenção do rapport da relação.

Excerto 5 (diálogo 3):

As micro estratégias utilizadas no segmento a seguir são:

(a) pressuposições (que se confirmam);

(b) adjetivação avaliativa.

30 31 32

Mercedes -Exacto Me parece que es lo más interesante porque--- hoy sería ridículo, por ejemplo, concebir un---Versailles, ¿no?

33 34

Carlos -Ajá. Y sobre todo como está Versailles desmantelado, ¿no?

35 Mercedes -Sí, no. Bueno, Versa... claro.

36 37

Carlos -A mí me... a mí Versailles me decepcionó. Te voy a decir por qué.

38 Mercedes -Porque no viste muebles, ¿verdad? Nada.

39 40

Carlos -Nada, nada. Salones. El salón de los espejos, salón grande y después y después...

41 Mercedes -Claro.[.......] magnífico, ¿no?

42 Carlos -Ah, sí. Magnífico.

43 Mercedes -Grandioso.

44 45

Carlos -Eh... las habitaciones vacías. En cambio Fontainebleau me gustó.

46 Mercedes -Bueno, porque tiene más de la época de Napoleón, ¿no?

47 Carlos -Sí, sí. No no. Y además esté...

115

48 Mercedes -El mobiliario.

49 Carlos -Sí, el mobiliario.

Mercedes (linha 38) faz uma pressuposição com relação à afirmação de Carlos

(linhas 36-37): “A mí me... a mí Versailles me decepcionó. Te voy a decir

por qué.”, que se confirma (linha 39). Em seguida, há o uso de adjetivação avaliativa

(linhas 41-43). A continuação, Mercedes (linha 46) arrisca novamente uma

pressuposição com relação à afirmação de Carlos (linhas 44-45): “En cambio

Fontainebleau me gustó.”, pressuposição essa que se confirma (linhas 47-49).

Excerto 6 (diálogo 1):

As micro estratégias utilizadas no segmento a seguir são:

(a) pressuposições equivocadas (não se confirmam);

(b) demonstração de solidariedade.

57 58 59

Tereza -Yo comprendo; por ese motivo te he respetado y no te las he pedido, pero me hubiera hecho bien porque me levanta- - - y además porque...

60 Marta -Te levanta de la cama.

61 Tereza -No puedo decirte...

62 Marta -Te levanta de la cama, ¿no?

63 64

Tereza -No, no me levanta de la cama: me levanta el ánimo, que es más importante.

65 66

Marta -Bueno, pero si es así, decí, yo creía que—estabas--- llena de obligaciones sociales.

No início do trecho acima, Tereza (linhas 57-58) demonstra solidariedade para

com sua amiga Marta, ao afirmar: “Yo comprendo; por ese motivo te he respetado y no te

las he pedido,...”.

Em seguida, por dois turnos seguidos (linhas 60 e 62) Marta oferece o

complemento “Te levanta de la cama”, sendo, na segunda vez, corrigida por Tereza,

que responde fazendo a correção: “-No, no me levanta de la cama: me levanta el ánimo, que

es más importante.” (linhas 63-64).

Esse segmento de construção colaborativa (linhas 57-64) não é bem sucedido,

uma vez que a pressuposição feita por Marta sobre o motivo de as aulas de alemão

116

fazerem bem a sua amiga Tereza não correspondiam à realidade. Ao dizer “pero me

hubiera hecho bien porque me levanta…” (linha 58), Tereza não queria dizer, como

pressupôs Marta, que as aulas a levantariam da cama, mas sim que “... me levanta el

ánimo, que es más importante.” (linha 63-64). Pode-se dizer que o ocorrido foi uma

pressuposição de conhecimento compartilhado que estava equivocada.

Tereza, porém, ao recusar o complemento dado por sua amiga (que ela

decodifica em seu sentido literal, isto é, levantar-se da cama para ir à aula) pode

também ter-se equivocado, uma vez que sua interlocutora poderia estar falando em

sentido metafórico. Vale salientar que a correção de Tereza à pressuposição feita por

Marta não prejudica o rapport da relação, como se evidencia no turno seguinte (linhas

65-66), no qual Marta compreende os motivos de sua amiga e tenta chegar a um acordo

com ela.

5.2.2 Micro estratégias destinadas à MAXIMIZAÇÃO de rapport: maximização / aumento de acordo / compartilhamento

Segundo Brown e Levinson, os elogios são uma ameaça à face negativa, uma

vez que expressam desejo pelo objeto elogiado. Porém, segundo Kerbrat-Orecchioni,

sem negar que esse ato algumas vezes possui esse traço, um elogio é, em primeiro

lugar, um comportamento lisonjeiro para com a outra pessoa, antes de tudo uma anti-

ameaça, um FFA. Os elogios são estratégias de polidez positiva (ou modo de reforçar a

imagem do outro) diretas, que satisfazem os desejos de aprovação do outro, fazendo

parte, portanto, das estratégias de rapport.

Excerto 7 (diálogo 1):

As micro estratégias encontradas no segmento a seguir foram:

(a) elogios;

(b) estratégia de modéstia,

(c) formas de tratamento que demonstram carinho e relações afetivas;

(d) repetição colaborativa do enunciado do interlocutor;

(e) demonstração de solidariedade;

(f) procura de acordo.

117

01 02

Tereza -Ahora--- vas a tropezar con una dificultad que es mi pésima memoria. Yo no puedo memorizar.

03 04

Marta -¿Querés que te diga una cosa, Bebita? Yo creo que lo de la pésima memoria tuya es un. . . un leitmotiv que tenés.

05 Tereza -¿Un qué?

06 Marta -Leit-motiv: lo repetís pero no es verdad.

07 08

Tereza -Pero yo me pongo a estudiar un verbo, y lo estudio y me lo olvido a los pocos días.

09 10 11 12

Marta -Pero vos me has estudiado poesías de memoria: La "Lorelei", "Die Grenardirn", qué se yo, y te los has sabido perfectamente; y vos te acordás de las declinaciones.

13 Tereza -Pero los verbos los confundo.

14 Marta -¿El significado?

15 Tereza -No, confundo... confundo cuando la...

16 Marta -¿ La formación ?

17 Tereza -Las formaciones, sí.

18 Marta -¡Ah, no! que con la declinación...

19 Tereza -Los tiempos compuestos, el subjuntivo, todo eso.

20 21

Marta -Pero eso, hija, eso es muy humano porque son - - - endiablados los verbos.

22 Tereza -Ah, bueno. Entonces me consolás.

23 Marta -Pero hija, cuando yo me puse...

24 Tereza -Entonces empezamos el jueves.

25 26 27 28 29 30 31 32 33 34

Marta -Mirá, cuando yo me puse a estudiar italíano--- que me pareció que me iba a ser muy fácil, porque yo oigo hablar italiano a un conferencista o en el teatro y lo entiendo, cuando se trató de estudiarlo me encontré con que el--- punto verbos era poco menos que inaccesible para mí. No hay verbos regulares casi; casi ... cada verbo tiene una conjugación propia; y después hay un montón de palabritas chiquitas como en griego--- que en la traducción se pierden--- y que sin embargo, en italiano, le tienen que dar un matiz especial al ... al ... a la frase.

35 36

Tereza -Bueno, vamos a hacer así. Vamos entonces a empezar el lunes.

37 Marta -No, el jueves.

38 Tereza -El jueves.

39 Marta -El jueves.

40 Tereza -El jueves.

41 42

Marta -Bueno, muy bien. A mí me divierte también y también me obliga, me disciplina; me disciplina en muchos sentidos.

43 44

Tereza -Yo tengo mucho libro de lectura porque he comprado mucho texto, porque he leído bastante.

45 46

Marta -Tenés una enormidad: si cuando yo vi--todos los libros que tenías y que te los habías leído.

47 Tereza -Y que la mayor parte son leídos.

48 49

Marta -Por eso te digo, y comprendidos, que eso es muy importante.

118

50 Tereza -Sí. 51 52 53 54 55

Marta -Entonces yo no sé qué es mucho ... qué mucho es lo que te puedo enseñar; únicamente que aquí sin... eh... ¿te acordás que una vez--- fuimos a la Sociedad Hebraica--- a ver una exposición de códices--- y que vos fuistes hablando conmigo alemán durante varias cuadras?

56 Tereza -Sí, sí. 57 58

Marta -Y yo estaba pas... sorprendida. Nunca hubiera esperado que supieras tanto.

59 60 61

Tereza -Bueno, me alentás mucho. Vamos a hacer así. Vamos a hacer un rato de conversación, vos me corregirás las partes gramaticales.

62 Marta -Las que sepa.

63 64

Tereza -Y las que yo no sepa buscaremos en el libro, juntas, para disipar dudas.

65 66

Marta -Y leeremos y traduciremos el librito. Yo empezaré--- por repasarte... por repasarte una lección que yo sepa.

67 Tereza -Claro.

Esse segmento de fala segue com o assunto do anterior, que são as aulas de

alemão que Marta dará para Tereza. Tereza inicia fazendo uma auto-crítica (linhas 1-2)

a sua memória (estratégia de modéstia ou de auto-depreciação), crítica essa que é

rebatida por Marta nos turnos seguintes (linhas 3-4; 6; e 9-12), através do uso de

elogios.

Note-se o uso do dativo de interesse - Pero vos me has estudiado poesías de

memoria -, fenômeno amplamente estudado por Lavandera, que é um elemento de

reforço para os argumentos que estão sendo utilizados. Esse me, de natureza

pragmática, marca o grau máximo de envolvimento.

09 10 11 12

Marta -Pero vos me has estudiado poesías de memoria: La "Lorelei", "Die Grenardirn", qué se yo, y te los has sabido perfectamente; y vos te acordás de las declinaciones.

Marta também se utiliza (linha 3) de uma forma de endereçamento carinhosa

– um apelido no diminutivo, Bebita – como uma estratégia de reforço ao elogio feito, o

que demonstra relação de intimidade. Esse uso está inserido nas chamadas atividades

de language play (dentre as quais se incluem o uso de variações do primeiro nome,

como apelidos ou diminutivos).

01 02

Tereza -Ahora--- vas a tropezar con una dificultad que es mi pésima memoria. Yo no puedo memorizar.

03 04

Marta -¿Querés que te diga una cosa, Bebita? Yo creo que lo de la pésima memoria tuya es un. . . un leitmotiv que tenés.

119

05 Tereza -¿Un qué?

06 Marta -Leit-motiv: lo repetís pero no es verdad.

07 08

Tereza -Pero yo me pongo a estudiar un verbo, y lo estudio y me lo olvido a los pocos días.

Tereza, por sua vez, não aceita os elogios e recusa-os reiteradamente (linhas 7-

8 e 13). Marta, então, sustenta sua opinião e segue elogiando a boa memória da amiga

(como se constata nos turnos seguintes, linhas 9-12 e 20-21), porém agora ela

acrescenta argumentos que os defendem e justificam.

Note-se, também, (linhas 20 e 23) o vocativo carinhoso hija11, uso que denota

extrema cumplicidade, novamente uma estratégia inserida nas atividades de language

play. Finalmente (linha 22), Tereza se rende: “Ah, bueno. Entonces me consolás.”

Note-se uma mudança de enquadre interpretativo nesta fala de Tereza. Esta, após vários

elogios feitos por Marta, realinha o seu discurso, passando a aceitar os elogios feitos

pela amiga:

09 10 11 12

Marta -Pero vos me has estudiado poesías de memoria: La "Lorelei", "Die Grenardirn", qué se yo, y te los has sabido perfectamente; y vos te acordás de las declinaciones.

13 Tereza -Pero los verbos los confundo.

14 Marta -¿El significado?

15 Tereza -No, confundo... confundo cuando la...

16 Marta -¿ La formación ?

17 Tereza -Las formaciones, sí.

18 Marta -¡Ah, no! que con la declinación...

19 Tereza -Los tiempos compuestos, el subjuntivo, todo eso.

20 21

Marta -Pero eso, hija, eso es muy humano porque son - - - endiablados los verbos.

22 Tereza -Ah, bueno. Entonces me consolás.

23 Marta -Pero hija, cuando yo me puse...

Nos turnos seguintes (linhas 23 e 25-34), Marta tentará mostrar solidariedade

e compreensão para com Tereza, ao compartilhar com ela suas próprias dificuldades

quando de sua aprendizagem da língua italiana.

11 Segundo Consuelo Alfaro Lagorio, o que é relevante nessa forma é que se trata de uma marca não só de intimidade, mas de gênero, pois requer o traço [+feminino] tanto do enunciador como do co-enunciador (opinião manifesta durante defesa desta tese).

120

23 Marta -Pero hija, cuando yo me puse...

24 Tereza -Entonces empezamos el jueves.

25 26 27 28 29 30 31 32 33 34

Marta -Mirá, cuando yo me puse a estudiar italíano--- que me pareció que me iba a ser muy fácil, porque yo oigo hablar italiano a un conferencista o en el teatro y lo entiendo, cuando se trató de estudiarlo me encontré con que el--- punto verbos era poco menos que inaccesible para mí. No hay verbos regulares casi; casi ... cada verbo tiene una conjugación propia; y después hay un montón de palabritas chiquitas como en griego--- que en la traducción se pierden--- y que sin embargo, en italiano, le tienen que dar un matiz especial al ... al ... a la frase.

Finalmente (linhas 35-42), as amigas chegam a um acordo quanto ao dia da

semana em que ocorrerão as aulas (estratégia de procurar acordo). Primeiro, porém

(linhas 35-36), ocorre um equívoco por parte de Tereza, que é corrigido por Marta

(linha 37):

35 36

Tereza -Bueno, vamos a hacer así. Vamos entonces a empezar el lunes.

37 Marta -No, el jueves.

Em seguida, a repetição da expressão “El jueves” (linhas 38-40) torna-se

necessária como uma estratégia cuja finalidade é de reforço, com o intuito de desfazer-

se totalmente o equívoco ocorrido anteriormente.

35 36

Tereza -Bueno, vamos a hacer así. Vamos entonces a empezar el lunes.

37 Marta -No, el jueves.

38 Tereza -El jueves.

39 Marta -El jueves.

40 Tereza -El jueves.

41 42

Marta -Bueno, muy bien. A mí me divierte también y también me obliga, me disciplina; me disciplina en muchos sentidos.

Mais uma vez Marta faz (linhas 57-58) um FFA em forma de elogio à Tereza,

com relação a seu conhecimento de alemão, e Tereza (linha 59) o aceita:

57 58

Marta -Y yo estaba pas... sorprendida. Nunca hubiera esperado que supieras tanto.

59 60 61

Tereza -Bueno, me alentás mucho. Vamos a hacer así. Vamos a hacer un rato de conversación, vos me corregirás las partes gramaticales.

121

Excerto 8 (diálogo 2): Os principais recursos usados para construir / maximizar rapport são:

(a) construções conjuntas e colaborativas;

(b) repetições do enunciado do interlocutor (geram envolvimento);

(c) concordância com ressalva;

(d) auto-correção.

O tópico do segmento a seguir versa sobre comentários relacionados a parentes ou

amigos em comum. A visão de confiança (na visão de Thurén) é resultado da “base

comum” (common ground) existente entre as interlocutoras.

01 02 03 04 05 06 07 08

Carmen -Y es un trabajo cuando los chicos dan... mejor dicho, es una desesperación cuando los chicos dan trabajo para estudiar. Mirá--- Bety me escribe... era una risa la carta de Bety. Dice que... que Inés es de lo más burra para matemáticas--- no le gustan las matemáticas, no le gusta, y la vez pasada le estuvieron preguntando una cosa y no sabía. Y el padre le preguntó cuál era el... ¿cómo es?, el...

09 Maura -El múltiplo del...

10 Carmen -El múltiplo del gramo... de gramo, y dijo gramore.

11 Maura -Claro, porque le pareció que era algo más grande.

12 13 14 15 16

Carmen -¿Te das cuenta? Entonces le han tenido que tomar una maestra que va todas las tardes una hora. Y dice que va, y sí que está aprendiendo mucho. Bueno, a lo mejor, pobrecita, ella se distrae mucho en el colegio, conversa muchísimo.

17 Maura -Es ... es muy charlatana.

18 19 20

Carmen -Es muy charlatana y--- no presta atención. De manera que si no presta atención, las cosas que no le gustan [ 1 se aburre.

21 22 23 24

Maura -Además, cuando se aburre, ella dice directamente que está aburrida en la clase. La otra vez ... eh... ¿qué fue lo que le dijo a la maestra? Se habían portado muy mal, entonces la maestra...

25 Carmen -Que tenían que prometerle.

26 27 28 29 30 31 32

Maura - [ 1 le tenían que prometer que se iban a portar bien, que iban a ser buenos. Y dijo: "¿Me prometen?" Y entonces [ 1 se para y dice: "Seiíorita, yo no prometo nada." "¿Por qué?" "Y, porque si yo le prometo ahora que me voy a portar bien, sería una mentira porque se lo digo ahora, pero yo me voy a portar mal enseguida", le contestó. Así que... además quiere ser hippy cuando sea grande.

33 34

Carmen -Pero le gusta escribir muchísimo. Dice que hace unas composiciones espléndidas. ¿Te acordás que I?

35 Maura -Sí, con muchas faltas de ortografía, pero escribe bien.

36 37

Carmen -Sí, escri... redacta muy, muy bien. Así que por ahí va a salir escritora.

122

38 39 40

Maura -Y, puede ser. Pero leer no ... leer sí, también le gusta porque en Monte Hermoso estaba leyendo Coi,azón. Leía todas las noches un capítulo o dos.

41 42 43 44

Carmen -¿ Qué... qué... qué podíamos decir? ¿ Qué le contamos a Susana? Hay que contarle algunas cosas de esas que... esas cosas que han pasada,, que hace tanto que no la veo a Susana y que no le puedo contar yo.

45 Maura -No sé '

Nesse segmento, ao dar continuidade ao tópico crianças e estudos, Carmen

menciona uma carta que ela recebeu de Bety (amiga em comum ou parente), que

menciona uma criança com dificuldades no colégio. Esse segmento de fala evidencia

que as falantes possuem conhecimento de mundo compartilhado.

Ocorre um segmento de fala de construção conjunta e colaborativa, na qual

Maura (linha 6) ajuda Carmen a encontrar o termo adequado (sugere palavra), após a

hesitação desta (linha 5):

01 02 03 04 05 06 07 08

Carmen -Y es un trabajo cuando los chicos dan... mejor dicho, es una desesperación cuando los chicos dan trabajo para estudiar. Mirá--- Bety me escribe... era una risa la carta de Bety. Dice que... que Inés es de lo más burra para matemáticas--- no le gustan las matemáticas, no le gusta, y la vez pasada le estuvieron preguntando una cosa y no sabía. Y el padre le preguntó cuál era el... ¿cómo es?, el...

09 Maura -El múltiplo del...

10 Carmen -El múltiplo del gramo... de gramo, y dijo gramore.

11 Maura -Claro, porque le pareció que era algo más grande.

12 13 14 15 16

Carmen -¿Te das cuenta? Entonces le han tenido que tomar una maestra que va todas las tardes una hora. Y dice que va, y sí que está aprendiendo mucho. Bueno, a lo mejor, pobrecita, ella se distrae mucho en el colegio, conversa muchísimo.

Ato contínuo (linhas 7 a 11), ocorre uma perfeita sintonia entre as falas de

Carmen e Maura, uma complementando a outra. À asserção de Carmen (linha 7),

Maura responde com um “Claro,” para, em seguida, justificar a fala de sua

interlocutora. Ocorre, portanto, uma concordância seguida de justificação. Carmen

(linha 9), ao perceber que sua interlocutora concordou com sua colocação (além de

justificá-la), diz “Te das cuenta?” (algo como, em portugués, “Você percebe?”).

No segmento de fala a seguir (linhas 9 a 23) ocorre novamente uma perfeita

simbiose de idéias entre as falantes:

123

12 13 14 15 16

Carmen -¿Te das cuenta? Entonces le han tenido que tomar una maestra que va todas las tardes una hora. Y dice que va, y sí que está aprendiendo mucho. Bueno, a lo mejor, pobrecita, ella se distrae mucho en el colegio, conversa muchísimo.

17 Maura -Es ... es muy charlatana.

18 19 20

Carmen -Es muy charlatana y--- no presta atención. De manera que si no presta atención, las cosas que no le gustan [ 1 se aburre.

21 22 23 24

Maura -Además, cuando se aburre, ella dice directamente que está aburrida en la clase. La otra vez ... eh... ¿qué fue lo que le dijo a la maestra? Se habían portado muy mal, entonces la maestra...

25 Carmen -Que tenían que prometerle.

26 27 28 29 30 31 32

Maura - [ 1 le tenían que prometer que se iban a portar bien, que iban a ser buenos. Y dijo: "¿Me prometen?" Y entonces [ 1 se para y dice: "Seiíorita, yo no prometo nada." "¿Por qué?" "Y, porque si yo le prometo ahora que me voy a portar bien, sería una mentira porque se lo digo ahora, pero yo me voy a portar mal enseguida", le contestó. Así que... además quiere ser hippy cuando sea grande.

Essa simbiose de idéias começa com a concordância, por parte de Maura, ao dito

por Carmen (linhas 10-11):“Bueno, a lo mejor, pobrecita, ella se distrae mucho en el

colegio, conversa muchísimo”, e essa concordância ocorre através de um resumo: “Es...

es muy charlatana.”, ao que Carmen responde com a repetição colaborativa da fala de

Maura e um complemento (“Es muy charlatana y… no presta atención”), complemento

esse que gera uma consequência (segmento marcado em negrito):

18 19 20

Carmen -Es muy charlatana y--- no presta atención. De manera que si no presta atención, las cosas que no le gustan [ 1 se aburre.

Esse enunciado gera uma resposta de Maura (linha 15) que, além de ser uma

concordância ao dito por Carmen, é uma complementação (segmento marcado em

negrito):

21 22 23 24

Maura -Además, cuando se aburre, ella dice directamente que está aburrida en la clase. La otra vez ... eh... ¿qué fue lo que le dijo a la maestra? Se habían portado muy mal, entonces la maestra...

Maura também tenta lembrar-se de um segmento de fala da carta (linhas 15-17),

e produz algumas hesitações e uma pergunta, gerando uma co-construção por parte de

Carmen que a auxilia com a frase que lhe faltava (linha 18). Em seguida Maura (linha

19) repete o que lhe foi sugerido por Carmen, complementando seu raciocínio.

124

21 22 23 24

Maura -Además, cuando se aburre, ella dice directamente que está aburrida en la clase. La otra vez ... eh... ¿qué fue lo que le dijo a la maestra? Se habían portado muy mal, entonces la maestra...

25 Carmen -Que tenían que prometerle.

26 27 28 29 30 31 32

Maura - [ 1 le tenían que prometer que se iban a portar bien, que iban a ser buenos. Y dijo: "¿Me prometen?" Y entonces [ 1 se para y dice: "Seiíorita, yo no prometo nada." "¿Por qué?" "Y, porque si yo le prometo ahora que me voy a portar bien, sería una mentira porque se lo digo ahora, pero yo me voy a portar mal enseguida", le contestó. Así que... además quiere ser hippy cuando sea grande.

No segmento abaixo (linhas 33-45) também ocorrem vários episódios de

concordância e de fala colaborativa.

33 34

Carmen -Pero le gusta escribir muchísimo. Dice que hace unas composiciones espléndidas. ¿Te acordás que I?

35 Maura -Sí, con muchas faltas de ortografía, pero escribe bien.

36 37

Carmen -Sí, escri... redacta muy, muy bien. Así que por ahí va a salir escritora.

38 39 40

Maura -Y, puede ser. Pero leer no ... leer sí, también le gusta porque en Monte Hermoso estaba leyendo Coi,azón. Leía todas las noches un capítulo o dos.

41 42 43 44

Carmen -¿ Qué... qué... qué podíamos decir? ¿ Qué le contamos a Susana? Hay que contarle algunas cosas de esas que... esas cosas que han pasada,, que hace tanto que no la veo a Susana y que no le puedo contar yo.

45 Maura -No sé '

Maura responde (linha 35) a uma pergunta feita por Carmen (linhas 33-34) com

uma concordância com ressalva (concorda para em seguida discordar). A sentença de

Maura poderia ser reordenada dessa forma:

• concordância: “Sí, escribe bien, ...”

• ressalva: “... pero con muchas faltas de ortografía.”

33 34

Carmen -Pero le gusta escribir muchísimo. Dice que hace unas composiciones espléndidas. ¿Te acordás que I?

35 Maura -Sí, con muchas faltas de ortografía, pero escribe bien.

Carmen concorda (linhas 36-37) com Maura. Após uma hesitação, porém,

reformula sua frase, através da troca da palabra “escribe” pela palavra “redacta”. Em

seguida, Maura concorda com a afirmação de sua interlocutora (linhas 36-37) – “Así que

por ahí va a salir escritora.” – afirmando: “Y, puede ser.”

125

Ato contínuo, Maura faz uma auto-correção (linha 38), quando começa por

dizer que a menina não gosta de ler (“Pero leer no…”), e corrige para: “leer sí, también

le gusta...”.

36 37

Carmen -Sí, escri... redacta muy, muy bien. Así que por ahí va a salir escritora.

38 39 40

Maura -Y, puede ser. Pero leer no ... leer sí, también le gusta porque en Monte Hermoso estaba leyendo Coi,azón. Leía todas las noches un capítulo o dos.

Excerto 9 (diálogo 2): O uso dos pronomes de tratamento em forma de apelidos carinhosos mamita,

nena e mamá (linhas 5, 6 e 7), que denotam intimidade e afetividade, além do uso dos

diminutivos cuentito e chiquita (linhas 7 e 8), geram um aumento / maximização de

rapport.

01 02

Carmen -¿ Y... ehm... ? ¿ Qué quier... qué querés que te cuente algo de cuando era chica?

03 Maura -Bueno.

04 Carmen -¿ Eh?

05 Maura -Contáme, mamita, contáme.

06 07 08 09 10 11 12

Carmen -[................] te voy a contar, nena, portáte bien que te voy a contar un cuentito de la mamá cuando era chiquita, ¿eh? Resulta que nosotros vivíamos en una casa muy antigua y éramos ocho hermanos, cuatro varones y cuatro mujeres. Y mamá no tenía ni tiempo de vigilarnos a todos. Y en las vacaciones --- mi hermano mayor, que después se recibió de médico esté...

Excerto 10 (diálogo 3):

Esse segmento versa sobre o polêmico tema da religiosidade. As observações de

Carlos destacadas abaixo podem ser descritas como estratégias de language play, pois

ele faz um trocadilho com os termos “te encontrás con la creación” e “la creación y su

criatura” ditos por Mercedes nas linhas 2 e 5.

01 Carlos -A mí la naturaleza... el espectáculo...

02 03

Mercedes -Bueno, es la... es donde te encontrás con la creación, ¿no es cierto?

04 Carlos -Sí, sí, sí.

05 Mercedes -La obra de la... del Creador, la creación y su criatura,

126

06 ¿no es así?

07 08

Carlos -Sí. Ahora, no la vi a la criatura ni a... vi otras criaturas de mini ...

09 Mercedes -¿Y la criatura no somos nosotros?

10 11

Carlos -Vi a otras criaturas de minifalda tan... [risas] No, no eran tan distintas que ella, ¿eh?

12 13 14 15

Mercedes -Yo fijáte que--- soy bastante--- religiosa, ¿no es cierto?, y te puedo garantizar que--- a veces encuentro más a Dios en la naturaleza que en el templo--- que es más artificial.

16 Carlos -Claro, claro.

127

6. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Considerando-se o entrelaçamento dos conceitos rapport, polidez positiva e

envolvimento em nossa pesquisa, propusemos, na introdução, as seguintes questões de

natureza teórica e empírica, que tentamos responder a seguir:

(i) quais as relações de semelhança e diferença entre esses conceitos?

(ii) qual o papel do uso de estratégias de rapport na construção / negociação de relações

de amizade no corpus em análise?

(iii) quais os principais recursos lingüísticos e discursivos usados no espanhol de

Buenos Aires para sinalizar rapport?

Com relação à primeira pergunta, referendamos a visão de Tannen (1989), na

qual a conversa casual é construída através de estratégias que são persuasivas,

espontâneas e funcionais. Essa autora refere-se a essas estratégias como estratégias de

envolvimento, uma vez que refletem e criam envolvimento interpessoal.

Conforme já apontamos, há várias definições para envolvimento.

• Scollon e Scollon (1995) associam envolvimento à assunção do ponto de vista

do outro, ou a outros modos de sustentação de uma visão de mundo partilhada.

• Segundo Selting (1994), envolvimento é uma noção interpretativa que se

refere ao campo das emoções e atitudes, codificadas através de pistas apropriadas aos

enquadres interpretativos em jogo na interação verbal.

• Segundo Holmes (1984), significado afetivo envolve a atitude do falante em

relação ao ouvinte no contexto da enunciação. Nesse sentido, entendemos que prestar

atenção aos desejos de face dos outros é um componente crucial no estabelecimento de

uma relação de amizade.

Todos esses conceitos se aplicam a nossos dados, uma vez que os participantes

de nosso corpus, em uma medida maior ou menor, possuem uma visão de mundo

partilhada, assumem o ponto de vista do outro, prestam atenção aos desejos de face do

outro, compartilham emoções, sentimentos, lembranças e atitudes.

128

Para Spencer-Oatey polidez é, na verdade, um julgamento contextual: ‘nenhuma

sentença é inerentemente polida ou impolida’. O escopo da teoria da polidez tradicional

é a manutenção e/ou promoção de relações interpessoais harmoniosas. Já polidez

positiva, segundo Brown e Levinson, possui estratégias que estão direcionadas aos

desejos de face positiva do ouvinte (que nos remete à definição de significado afetivo

segundo Holmes), e têm como função “azeitar” as relações sociais.

Rapport é um conceito que inclui uma gama de estratégias que têm como

objetivos aproximação e envolvimento. Algumas dessas estratégias fazem parte da

polidez positiva, porém rapport é um conceito mais amplo, uma vez que ele pode

envolver tanto relações de harmonia quanto de conflito. Porém, não pode haver rapport

sem envolvimento; envolvimento é condição essencial para a existência de rapport.

Spencer-Oatey propõe o termo “gerenciamento de rapport” (rapport

management) em lugar de “gerenciamento de face” (face management) porque, segundo

ela, o termo face parece enfocar somente o self, enquanto que gerenciamento de rapport

sugere, por outro lado, um equilíbrio entre o self e o outro. O enfoque do

gerenciamento de rapport também é mais amplo: ele examina o modo pelo qual a

linguagem é usada para construir, manter e/ou ameaçar as relações sociais e inclui tanto

o gerenciamento dos direitos sociais como os de face.

Podemos incluir entre as atividades de construção de rapport as seguintes

estratégias: troca de cumprimentos; perguntas do tipo ‘como vai você’; tópicos

conversacionais tais como: saúde, problemas domésticos, feriados, escola e trabalho;

language play; despedidas do tipo ‘desejos de bem-estar ou felicidade’; atividades

criativas distintas das tradicionalmente reconhecidas como comunicação fática

(perguntas sobre saúde, conversas sobre o tempo, etc.); despedidas amigáveis, entre

outras utilizadas nas estratégias de polidez positiva. Podemos concluir que o escopo das

atividades / estratégias de rapport é maior do que o da polidez positiva.

Dentre as estratégias de polidez positiva, podemos destacar: tomar

conhecimento, atender ao ouvinte (seus desejos, interesses, necessidades, bens);

exagerar (interesse, aprovação, solidariedade com o ouvinte); intensificar interesse pelo

ouvinte; utilizar marcadores de identidade do grupo, por exemplo, apelidos, formas de

129

tratamento; procurar acordo; evitar desacordo; pressupor, levantar, garantir base

comum, por exemplo, falar “abobrinhas”, boatos ou assuntos que interessam ao falante

e ao ouvinte antes de chegar ao “ponto”; fazer piadas para reparar um FTA; garantir ou

pressupor o conhecimento e interesses do falante pelos desejos do ouvinte e não

potencialmente pressionar o ouvinte a cooperar com o falante; oferecer, prometer (o que

quer que o ouvinte deseje, o falante deseja por ele e o ajudará a obtê-lo); ser otimista,

isto é, o falante assume que o ouvinte deseja os desejos do falante (interesse partilhado);

incluir tanto o falante quanto o ouvinte na atividade, por exemplo, o uso de “nós”

inclusivo; dar ou pedir razões, explicações, incluindo o uso de sugestões indiretas; supor

ou garantir reciprocidade (direitos ou obrigações recíprocas); etc.

Com relação à segunda pergunta – qual o papel do uso de estratégias de

rapport na construção / negociação de relações de amizade no corpus em análise –

verificamos que:

• A escolha das estratégias de polidez, em nossos dados, reflete e constitui,

predominantemente, as relações de amizade que as pessoas possuem e desejam manter.

Verificamos que isso ocorre tanto com a polidez positiva (cujas estratégias aumentam o

desejo de aprovação do outro, aumentando o rapport da relação) quanto com a negativa,

que tenta atenuar / minimizar atos entendidos como de ameaça à face do outro (cujas

estratégias buscam a superação de um possível conflito e / ou a manutenção do rapport /

harmonia da relação).

• Concluimos que o desejo de face e o alinhamento dos participantes como

amigos são fatores preponderantes na definição da intensidade do uso de rapport. Os

participantes utilizam rapport com meio de reafirmar o alinhamento escolhido e

satisfazer os desejos de face do self e do outro, orientando-se para os papéis sociais dos

mesmos na relação. Em nossos dados isso significa relações de afeto, amizade,

camaradagem e familiaridade.

• Rapport emerge da construção real de uma situação, emerge de um

conhecimento construído e não artificial. A conversa entre amigos é um exemplo típico

de interação interpessoal, que tem como objetivo buscar e favorecer a manutenção das

130

relações sociais. E isso ocorre através do gerenciamento do rapport (entendido aqui

como harmonia) da relação.

• A noção de rapport pode ser pensada ainda à luz das noções de confiança e de

intimidade relacional. Thurén (1988) define a confiança como proximidade ou senso

profundo de familiaridade. É a presença da confiança que torna certos tipos de language

play e outros comportamentos lingüísticos e extralingüísticos tornarem-se aceitáveis e

mesmo desejáveis uma vez que, se não houvesse a confiança, esses comportamentos

poderiam ser tomados como ofensa, gerando um conflito e uma possível diminuição do

rapport (harmonia) da relação.

• Em nossos dados, os exemplos mais recorrentes no sentido de aumento /

maximização de rapport, que visam ao fim social (isto é, fortalecer a face do outro,

fortalecer as relações sociais, estreitar esses laços), foram (totalizando 61 exemplos):

• co-construção / construção colaborativa: 27 exemplos;

• hetero-repetição: 12 exemplos;

• concordância de idéias / consenso de opiniões: 11 exemplos;

• uso de elogios: 11 exemplos.

• Em contrapartida, os exemplos mais recorrentes direcionados à manutenção do

rapport da relação foram (totalizando 26 exemplos):

• reivindicação de acordo / evitação de conflito: 11 exemplos;

• dar razões ou explicações: 8 exemplos;

• fazer perguntas ou pedidos de esclarecimento: 7 exemplos.

Esse fato nos remete à seguinte conclusão: quando nos encontramos diante de

situações sociais de familiaridade, parâmetro social básico dos usos lingüísticos do

espanhol coloquial, o gerenciamento do rapport (harmonia) da relação visa,

fundamentalmente, dar face ao outro, aumentar o desejo de aprovação do outro. Por

outro lado, as estratégias destinadas à manutenção do rapport (harmonia) da relação

também marcaram presença, uma vez que alinhar-se como amigo pressupõe evitar o

conflito, reivindicar o acordo, pedir explicações ou esclarecimentos, dar razões ou

explicações quando solicitado.

131

De acordo com o conceito de script cultural (Triands et alli, 1983), descrito em

2.3.3., simpatia é o script cultural dos hispânicos e latino-americanos. Segundo eles,

“ser simpático” possui as seguintes características:

• mostrar certos níveis de conformidade (adaptação);

• ter a capacidade de partilhar os sentimentos dos outros;

• comportar-se com dignidade e respeito para com os outros;

• buscar harmonia nas relações inter-pessoais.

Dentre as características acima, todas, com exceção da primeira, marcaram

presença em nossos dados. A terceira e a quarta puderam ser encontradas ao longo de

quase todo o corpus (com raras exceções) e tivemos alguns exemplos da segunda, que

transcrevemos a seguir:

Excerto 1: (diálogo 1, segmento 4, anexos p.4)

38 Marta -Y que está en juego la felicidad de esa criatura.

39 40 41

Tereza -Yo comprendo; por ese motivo te he respetado y no te las he pedido, pero me hubiera hecho bien porque me levanta- - - y además porque...

Tereza demonstra, no exemplo acima, a capacidade de partilhar os sentimentos

de Marta (segmento de fala em negrito).

Excerto 2: (diálogo 1, segmento de fala 8, anexos p.8)

06 07

Marta -Porque la Nena va a grabar también y Mecha L.- - - también, ¿la que vos le decías la mujer fuerte?

08 Tereza -Justamente.

09 10

Marta -Ahí está--- Te diré que--- es una mentalidad extraordinaria la de esa mujer, ¿eh?

11 Tereza -Yo la envidio. (“Eu a invejo.”)

12 13

Marta -Ochenta y dos años--- y se va pasito a Daso, sola, de noche, de su casa a lo de la Nena...

Quanto à primeira característica, esta não apareceu de forma significativa em

nossos dados, uma vez que os falantes, por diversas vezes, discordaram abertamente das

opiniões de seus interlocutores, fato que chegou a gerar situações conflituosas que

foram posteriormente minimizadas (entrando em cena, então, a quarta característica

acima).

132

Com relação à terceira pergunta – quais os principais recursos lingüísticos e

discursivos usados no espanhol de Buenos Aires para sinalizar rapport – listamos, no

início de nossa pesquisa, aqueles que acreditávamos seriam os mais usados no espanhol

de Buenos Aires para construir rapport. Após a análise, comprovamos que quase todos

eles se encontram presentes no corpus, porém as estratégias mais recorrentes estão

descritas no quadro abaixo.

ESTRATÉGIAS Diálogo 1

12 páginas Diálogo 2 (4 páginas)

Diálogo 3 (8 páginas)

TOTAL

Uso de elogios, acompanhado (ou não) da estratégia de modéstia

5 exemplos 1 exemplo 5 exemplos 11

hetero-repetição 5 exemplos 5 exemplos 2 exemplos 12

language play 4 exemplos 2 exemplos - 6

Co-construção / construção colaborativa (em conjunto ou não com a concordância de idéias e/ou opiniões)

15 exemplos

6 exemplos 6 exemplos 27

Reivindicação de acordo e/ou evitação de conflito

9 exemplos 2 exemplos - 11

Concordância de idéias e/ou consenso de opiniões

8 exemplos - 3 exemplos 11

Formas de reparo e auto-correção 4 exemplos - - 4

Fornecer razões e/ou explicações 8 exemplos - - 8

Fazer perguntas ou pedidos de esclarecimento

7 exemplos - - 7

Total 65 16 16 97

Quadro 3: Quadro quantificativo das estratégias de rapport O fato de, no diálogo 1, as estratégias encontradas serem quantitativamente

muito mais significativas em relação aos outros dois diálogos deveu-se, em nossa

opinião, a:

(i) este diálogo possuir o triplo de páginas do diálogo 2, e um terço a mais de páginas do

que o diálogo 3;

(ii) neste diálogo haver um extenso trecho que versa sobre um tema conflituoso e, por

esse motivo, as interlocutores (especialmente Marta) necessitarem lançar mão de

estratégias de manutenção de rapport com uma freqüência muito maior;

(iii) o fato de, após as interlocutoras haverem chegado a um acordo, ocorrer uma

mudança na orientação (especialmente de Tereza), e então as estratégias de aumento /

maximização de rapport passaram a marcar forte presença, acreditamos que numa

tentativa de “compensar” o tempo dispendido com a negociação do conflito.

133

Com relação à associação entre as orientações dos participantes (análise macro)

e a escolha e o uso feitos por eles de micro estratégias lingüístico-discursivas, chegamos

à seguinte conclusão:

• quando a orientação dos participantes era no sentido de manutenção de

rapport, as estratégias mais empregadas foram: evitação de conflito ou de desacordo,

perguntas e pedidos de esclarecimento, oferecimento de razões ou explicações, uso de

marcadores conversacionais de rejeição (ou disclaimers) e de distanciamento, pseudo-

acordo, concordância com ressalva;

• quando a orientação dos participantes era no sentido de aumento /

maximização de rapport, as estratégias mais utilizadas foram: uso de co-construções e

construções colaborativas; uso de formas de tratamento (por exemplo, apelidos) que

demonstram carinho e relações afetivas, hetero-repetições (que geram diálogo

construído), uso de diminutivos (linguagem afetiva), narrativa, consenso de opiniões,

uso de elogios, pressuposições que se confirmam, estratégia de modéstia.

Concluímos que o alinhamento de amizade dos participantes foi o que definiu a

intensidade do uso do rapport, assim como quais estratégias foram mais utilizadas. As

estratégias de co-construção ou construção colaborativa da fala e de hetero-repetição

foram as mais recorrentes (27 e 12 exemplos, respectivamente), uma vez que elas

sinalizam acordo, rapport (harmonia) e reafirmam o alinhamento escolhido (de

amizade). Quando uma pessoa procura alinhar-se como amigo, ela repete a fala do outro

(como forma de sinalização de sintonia), lança mão de construções colaborativas da fala

(diálogos co-construídos) e de concordância de idéias ou consenso de opiniões, além de

fazer uso de estratégias de rapport que visem dar face ao outro, como, por exemplo,

elogios (11 exemplos encontrados).

As estratégias destinadas à manutenção do rapport (harmonia) da relação

também ocorreram de forma relevante, uma vez que alinhar-se como amigo pressupõe,

como já dito anteriormente, que se evite o conflito, que se reivindique o acordo, que se

peça explicações ou esclarecimentos, que se dê razões ou explicações quando solicitado.

134

Outras estratégias encontradas foram formas de reparo, auto-correção e

estratégias de language play, estas últimas ocorrendo preponderantemente quando

existe a noção de confiança descrita anteriormente. Quando a noção de confiança está

presente, brincadeiras do tipo language play são aceitas e mesmo esperadas, e reparos

podem ser feitos sem que sejam codificados como descorteses.

Reiteramos que a intimidade relacional entre os participantes da interação é o

fator que mais influencia a escolha dos trabalhos de face adotados: quanto mais próxima

for a relação entre os interlocutores, mais eles sentir-se-ão obrigados a cooperar

mutuamente, e tornar-se-ão mais dispostos à tolerância de imposições e críticas.

Boretti (2003) comprovou que formas tradicionalmente codificadas como

descorteses no contexto de seu corpus não o eram, porque esses usos, ligados à

direcionalidade e frontalidade do comportamento lingüístico, se devem, segundo ela, à

combinatória de conteúdos específicos da categoria de autonomia, tais como a

autoafirmação e a autoestima, com outros da categoria de afiliação, como a

disponibilidade, a confiança e a sinceridade.

As características que se inserem na categoria afiliativa, tais como:

disponibilidade, confiança, sinceridade, reciprocidade e generosidade, aparecem

subjacentes às estratégias mais recorrentes encontradas em nosso corpus, que foram: o

uso de elogios (expressa afeto, estima) e a estratégia de modéstia; as co-construções ou

construções colaborativas (falar pelo outro mostra afiliação, envolvimento,

conhecimento compartilhado); fazer perguntas ou pedir esclarecimentos (mostra

interesse pelo assunto); estratégia da hetero-repetição (demonstra envolvimento);

estratégias de “language play” (que caracterizam afetividade, envolvimento,

familiaridade), etc.

Com relação à categoria de autonomia argentina, tal como descrita por Boretti

(2003), esta não marcou presença relevante em nossos dados:

“Um indivíduo que se autoestima reconhece o próprio valor e modo de agir e se mostra

capaz de exibir ou ratificar suas boas qualidades e originalidade. Esta autoestima se relaciona

com a necessidade de autoafirmação do indivíduo e faz parte do ser social; está ligada ao sentimento de orgulho que pode ser manifestado expressiva e claramente; em geral, origina

modos de ação diretos e frontais, o que permite que o indivíduo se confirme socialmente. A

autoestima é merecedora do interesse, admiração e apreço, dentro do grupo.”.

135

A estratégia de modéstia vai de encontro ao que Boretti enfatizou como sendo

características da categoria de autonomia argentina – “Um indivíduo que se autoestima

reconhece o próprio valor e modo de agir e se mostra capaz de exibir ou ratificar suas

boas qualidades e originalidade.” – pois o interlocutor, para adequar-se a essas

características, deveria aceitar os elogios recebidos, o que não ocorre na grande maioria

das vezes.

Os resultados de nossa análise são compatíveis com a posição de Kerbrat-

Orecchioni quando ela considera que polidez positiva legitimamente toma uma posição

tão, ou mais, importante quanto àquela que a polidez negativa toma (ser polido numa

interação significa produzir FFAs tanto quanto suavizar as expressões dos FTAs), isto é,

polidez negativa é basicamente impolidez restritiva, porém polidez positiva é a

verdadeira polidez.

136

7. CONCLUSÃO

A atenuação é o recurso estratégico dentro da atividade argumentativa e

conversacional que busca a aceitação do ouvinte, quer seja do dito e do dizer ou do

próprio falante. Entendemos o discurso argumentativo como aquele no qual, através de

argumentos, desenvolve-se uma negociação entre os participantes, negociação essa

destinada a resolver os conflitos advindos de opiniões divergentes.

Concluímos que a maior ou menor presença de atenuantes em uma conversação

é proporcional não somente ao grau de desacordo que exista na mesma, mas também ao

grau de intimidade relacional existente entre os participantes e à presença ou não da

noção de confiança.

Em resumo, vários fatos afetam o fenômeno da polidez, como o fato de que uma

interação apresente mais ou menos solidariedade entre os interlocutores ou que tenha

um fim predominantemente interpessoal ou transacional. A proximidade, a

familiaridade, etc., fazem com que predominem certas manifestações da polidez como

os elogios, as lisonjas, as respostas colaborativas, que reforçam o acordo daquilo que o

outro está dizendo, isto é, a polidez valorizante.

Neste tipo de interações solidárias e interpessoais, como é o caso de nossos

dados, em conseqüência, os mitigadores são menos freqüentes, uma vez que na

expressão dos atos dentro da interação nada nem ninguém se sente ameaçado pelo outro

e sua presença excessiva contradiria o fim das mesmas, essa familiaridade e

solidariedade prévia ou buscada pelos interlocutores.

Contudo, a menor presença de atenuantes não tem como correlato um menor

grau de polidez, pois há as contribuições polidas (como as gentilezas, os afagos, os

carinhos), a já citada polidez valorizante, que nada têm que ver com a atenuação

lingüística, mas, sim com a intensificação.

Como se observa, quando o nível de confiança existente entre os participantes de

um encontro social é alto, eles podem ameaçar a face do outro, discordar do que o outro

pensa, criticar o outro “abertamente”, abordar temas controversos ou tidos como tabu,

137

uma vez que as ameaças consideradas intrínsecas a essas e outras atividades

comunicativas se encontram neutralizadas. Em uma linguagem coloquial, pode-se dizer

que não há necessidade de tantas “papas na língua” para falar certas coisas com pessoas

muito íntimas a nós, como seriam necessárias para falar a mesma coisa com pessoas

com as quais não possuímos intimidade ou que nos sejam estranhas. Reiteramos, porém,

que quando ocorrem casos de ameaça à face que superem os limites tolerados, essa

dinâmica muda e os interlocutores reagem tão ou mais negativamente caso a relação

entre eles não fosse de proximidade.

Pode-se dizer da polidez, então, que se trata de um processo dinâmico que se

define e se redefine na interação, segundo os alinhamentos e, sobretudo, as reações do

outro. Somente deste modo se pode dar conta do que Briz vem chamando de polidez

interpretada, conceito que ajuda a entender, por sua vez, tal dinamismo.

Os resultados nos mostram que ameaças como as de não compartilhar as

opiniões de seu interlocutor, manifestar falta de modéstia (ao aceitar-se elogios ou auto-

elogiar-se, por exemplo) ou parecer demasiadamente crítico são riscos decorrentes de

manifestar a opinião própria sobre alguém ou alguma coisa. Entretanto, quando o nível

de confiança existente entre os participantes é alto, essas ameaças encontram-se

neutralizadas (como mencionado anteriormente), como ocorre em nossos dados.

Como entendemos que o teor de ameaça de um ato é cultural, assim como a

polidez é contextual, só podemos entender / visualizar a construção do rapport a partir

de uma situação contextualmente e culturalmente situada.

Como conseqüência, os participantes de nosso corpus orientam-se no sentido da

manutenção do rapport (harmonia) da relação, buscando o acordo interpessoal, a

participação cooperativa e o clima socio-emocional afiliativo quando expressam

opiniões.

Esperamos que o presente trabalho tenha contribuído para elucidar os

mecanismos de utilização do rapport e do envolvimento em relações que envolvam

amizade e afeto e que suscite novas pesquisas na área.

138

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