ofensiva socialista n°10 - maio/junho 2012

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Preço: R$ 1,50 • Solidário: R$ 3,00 Jornal da LSR N° 10 maio/junho 2012 Seção brasileira do Comitê por uma Internacional dos Trabalhadores (CIT) Tendência do PSOL site: www.lsr-cit.org • e-mail: [email protected] • telefone: (11) 3104-1152 Acidentes e doenças no trabalho matam mais que guerras página 3 Entre cachoeiros e mensaleiros página 5 Argentina: nacionalização da YPF provoca a ira do imperialismo página 6-7 Unifesp: para avançar na luta, olhar além do que se vê página 8 Pela legalização integral do aborto – a luta continua! página 9 Os desafios da CSP-Conlutas em seu 1° Congresso Nacional página 12 O “voo de galinha” do cresci- mento econômico brasileiro aterrissou em medíocres 2,7% no ano passado, diante de uma média mundial de 3,2%. O pa- ís ficou com um dos piores re- sultados entre os países sul- -americanos e, obviamente, é o “lanterninha” dos BRICs. O principal culpado pelo resulta- do medíocre foi o setor industrial que ficou estagnado em 2011 (míseros 0,1% de crescimento). Com isso, a participação da indústria de transfor- mação no PIB retrocedeu em 2011 a um patamar de 14,6%, o mesmo ní- vel de meados dos anos 50, início do governo JK. O modesto crescimento brasilei- ro dos últimos anos esteve marcado pela direta dependência em relação ao mercado asiático e da China em particular. Em uma década (2001 a 2011) o volume de comércio do Bra- sil com a China cresceu de US$ 3,2 bilhões para US$ 77,1 bilhões (24 vezes mais). Além do fato de que a atual de- saceleração da economia chinesa ameaça diretamente o já moderado crescimento brasileiro, vemos co- mo a dependência em relação à Chi- na também é um fator de retrocesso para a economia nacional. A desin- dustrialização e a desnacionalização da indústria são consequências des- se processo. Relação colonial no comércio com a China Do total das vendas brasileiras à China, 85% foi composto por pro- dutos básicos (US$ 37,6 bilhões dos US$ 44,3 bilhões exportados) que praticamente se resumem a miné- rio de ferro, soja, petróleo e celulo- se. Os itens manufaturados exporta- dos à China limitaram-se a míseros 4,5% do total exportado. Do lado da China, a relação é inversa. O Brasil vende produtos primários e compra manufaturados. A dinâmica de desindustrializa- ção da economia brasileira também está ligada ao que a própria Dilma Rousseff chamou de “tsunami mo- netário”. Os trilhões de euros libe- rados pelo Banco Central Europeu para salvar os bancos privados aca- bam virando investimentos especu- lativos em países como o Brasil. Is- so provoca a valorização do real, en- carecendo os produtos nacionais, re- duzindo a competitividade da indús- tria instalada no país e estimulando as importações. O governo Dilma pretendeu de- monstrar que daria uma resposta fir- me, e para isso, convocou a unida- de entre capital e trabalho. Nisso foi prontamente apoiada pelas centrais sindicais governistas e pelegas que não demoraram a sair às ruas jun- to com a FIESP e outras entidades patronais. As medidas apresentadas como parte do “Acordo Nacional em de- fesa da produção e do Emprego” em nenhum momento atingem o cerne do problema. Não se toca no capital financeiro especulativo e se joga nas costas dos trabalhadores a responsa- bilidade pela recuperação da compe- titividade da indústria. Desonerar a indústria significa re- passar dinheiro público para a in- dústria instalada no país que é, em grande parte, de origem estrangei- ra e conivente com o grande capi- tal financeiro. Estima-se que em 2012 a deso- neração da folha de pagamento e as isenções fiscais gerarão uma perda de quase R$ 35 bilhões na arreca- dação. Tudo isso num momento em que o governo anunciou cortes da ordem de R$ 55 bilhões, atingindo gastos sociais e investimentos, para garantir o superávit primário, ou se- ja, pagar os especuladores/credores da dívida pública. Por ano, cerca de 20% do PIB vai direto para o bolso de um punhado de banqueiros e es- peculadores através da rolagem da dívida pública. Subsídios para bancos e empresas – arrocho para trabalhadores Além disso, a lógica da política do governo Dilma aponta para mais medidas no sentido de flexibilização dos contratos de trabalho, para bara- tear o custo da mão de obra – leia- -se: aumentar a exploração dos tra- balhadores. A única saída efetiva para o retro- cesso da indústria nacional é o en- frentamento com o grande capital e seu governo. Não a colaboração com ele. É preciso enfrentar o ca- pital financeiro através da suspen- são do pagamento da dívida pública aos grandes capitalistas, o controle do câmbio e a estatização do siste- ma financeiro com controle dos tra- balhadores. A partir daí se poderia construir uma política industrial, social e am- bientalmente sustentável, baseada num forte setor público através da reestatização das empresas privati- zadas e da estatização das grandes multinacionais com controle dos tra- balhadores. Um governo dos trabalhadores que aplicasse esse programa teria que buscar a integração com os povos latino-americanos na perspectiva de uma coordenação e planificação das economias da região. COMBATER A DESINDUSTRIALIZAçãO Só ENFRENTANDO O GRANDE CAPITAL O modesto crescimento brasileiro dos últimos anos esteve marcado pela dependência das exportações de produtos básicos para China

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Jornal da Liberdade, Socialismo e Revolução, corrente do PSOL e seção brasileira do Comitê por uma Internacional dos Trabalhadores

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Page 1: Ofensiva Socialista n°10 - maio/junho 2012

Preço: R$ 1,50 • Solidário: R$ 3,00 Jornal da LSR

N° 10 maio/junho 2012

Seção brasileira do Comitê por uma Internacional dos Trabalhadores (CIT)

Tendência do PSOL

site: www.lsr-cit.org • e-mail: [email protected] • telefone: (11) 3104-1152

Acidentes e doenças no trabalho matam mais que guerras

página 3

Entre cachoeiros e mensaleiros

página 5

Argentina: nacionalização da YPF provoca a ira do imperialismo

página 6-7

Unifesp: para avançar na luta, olhar além do que se vê

página 8

Pela legalização integral do aborto – a luta continua!

página 9

Os desafios da CSP-Conlutas em seu 1° Congresso Nacional

página 12

O “voo de galinha” do cresci-mento econômico brasileiro aterrissou em medíocres 2,7% no ano passado, diante de uma média mundial de 3,2%. O pa-ís ficou com um dos piores re-sultados entre os países sul--americanos e, obviamente, é o “lanterninha” dos BRICs.

O principal culpado pelo resulta-do medíocre foi o setor industrial que ficou estagnado em 2011 (míseros 0,1% de crescimento). Com isso, a participação da indústria de transfor-mação no PIB retrocedeu em 2011 a um patamar de 14,6%, o mesmo ní-vel de meados dos anos 50, início do governo JK.

O modesto crescimento brasilei-ro dos últimos anos esteve marcado pela direta dependência em relação ao mercado asiático e da China em particular. Em uma década (2001 a 2011) o volume de comércio do Bra-sil com a China cresceu de US$ 3,2 bilhões para US$ 77,1 bilhões (24 vezes mais).

Além do fato de que a atual de-saceleração da economia chinesa ameaça diretamente o já moderado crescimento brasileiro, vemos co-mo a dependência em relação à Chi-na também é um fator de retrocesso para a economia nacional. A desin-dustrialização e a desnacionalização da indústria são consequências des-se processo.

Relação colonial no comércio com a China

Do total das vendas brasileiras à China, 85% foi composto por pro-dutos básicos (US$ 37,6 bilhões dos US$ 44,3 bilhões exportados) que praticamente se resumem a miné-rio de ferro, soja, petróleo e celulo-se. Os itens manufaturados exporta-dos à China limitaram-se a míseros 4,5% do total exportado. Do lado da China, a relação é inversa. O Brasil vende produtos primários e compra manufaturados.

A dinâmica de desindustrializa-ção da economia brasileira também está ligada ao que a própria Dilma Rousseff chamou de “tsunami mo-netário”. Os trilhões de euros libe-rados pelo Banco Central Europeu para salvar os bancos privados aca-bam virando investimentos especu-lativos em países como o Brasil. Is-so provoca a valorização do real, en-carecendo os produtos nacionais, re-duzindo a competitividade da indús-tria instalada no país e estimulando as importações.

O governo Dilma pretendeu de-monstrar que daria uma resposta fir-me, e para isso, convocou a unida-de entre capital e trabalho. Nisso foi

prontamente apoiada pelas centrais sindicais governistas e pelegas que não demoraram a sair às ruas jun-to com a FIESP e outras entidades patronais.

As medidas apresentadas como parte do “Acordo Nacional em de-fesa da produção e do Emprego” em nenhum momento atingem o cerne do problema. Não se toca no capital financeiro especulativo e se joga nas costas dos trabalhadores a responsa-bilidade pela recuperação da compe-titividade da indústria.

Desonerar a indústria significa re-passar dinheiro público para a in-dústria instalada no país que é, em grande parte, de origem estrangei-

ra e conivente com o grande capi-tal financeiro.

Estima-se que em 2012 a deso-neração da folha de pagamento e as isenções fiscais gerarão uma perda de quase R$ 35 bilhões na arreca-dação. Tudo isso num momento em que o governo anunciou cortes da ordem de R$ 55 bilhões, atingindo gastos sociais e investimentos, para garantir o superávit primário, ou se-ja, pagar os especuladores/credores da dívida pública. Por ano, cerca de 20% do PIB vai direto para o bolso de um punhado de banqueiros e es-peculadores através da rolagem da dívida pública.

Subsídios para bancos e empresas – arrocho

para trabalhadores

Além disso, a lógica da política do governo Dilma aponta para mais medidas no sentido de flexibilização dos contratos de trabalho, para bara-tear o custo da mão de obra – leia--se: aumentar a exploração dos tra-balhadores.

A única saída efetiva para o retro-cesso da indústria nacional é o en-frentamento com o grande capital e seu governo. Não a colaboração com ele. É preciso enfrentar o ca-pital financeiro através da suspen-são do pagamento da dívida pública aos grandes capitalistas, o controle do câmbio e a estatização do siste-ma financeiro com controle dos tra-balhadores.

A partir daí se poderia construir uma política industrial, social e am-bientalmente sustentável, baseada num forte setor público através da reestatização das empresas privati-zadas e da estatização das grandes multinacionais com controle dos tra-balhadores.

Um governo dos trabalhadores que aplicasse esse programa teria que buscar a integração com os povos latino-americanos na perspectiva de uma coordenação e planificação das economias da região.

COmbater a deSiNduStrializaçãO Só eNfreNtaNdO O graNde CaPital

O modesto crescimento brasileiro dos últimos anos esteve marcado pela dependência das exportações de produtos básicos para China

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2 • nacional/lutas Ofensiva Socialista n°10 maio/junho - 2012

é uma publicação da Liberdade, Socialismo e Revolução

Telefone: (11) 3104-1152E-mail: [email protected]ítio: www.lsr-cit.orgCorreio: CP 02009 - CEP 01031970 - SP Assinatura: 10 edições: R$ 20 reais (Envie cheque nominal p/Marcus William Ronny Kollbrunner à caixa postal)

Colaboraram nessa edição: Aldo Barreto, André Ferrari, Dimitri Silveira, Fausta Camilo Fernan-des, Fernando Lacerda, Flávia Ribeiro, Isabel Keppler, Luciano da Silva Barboza, Marcio Silva, Mauricio de Oliveira Filho, Miguel Leme, Tony Saunois, Zelito F. Silva.

Canteiros de lutaObras do PAC em pé de guerraO Brasil vive mais uma onda de lutas, algumas delas radi-calizadas, nas grandes obras de infraestrutura do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), menina dos olhos do go-verno Dilma e do “lulismo”. So-mente em 2012 já foram cerca de 150 mil trabalhadores que fizeram greve nos canteiros do PAC por todo o país.

André Ferrari

O início desse processo foi em 2011 com as explosões de greves nas obras das usinas de Jirau e San-to Antonio, em Rondônia, seguidas de greves e mobilizações em várias outras obras envolvendo trabalhado-res da construção civil de vários es-tados brasileiros.

Depois de respaldar a demissão e perseguição de milhares de traba-lhadores, a resposta do governo foi a criação da “Mesa Nacional Perma-nente para o Aperfeiçoamento das Relações de Trabalho na Indústria da Construção”. O objetivo era dar al-gumas concessões formais para pa-cificar os canteiros de obras. Mas,

mesmo com a instauração da Me-sa por decreto presidencial o que se viu foram mais lutas e mobilizações.

Os trabalhadores de Jirau e San-to Antonio paralisaram as obras no mês de março reivindicando melho-res condições de trabalho e melhores salários. Em seguida vieram os tra-balhadores das obras da usina de Be-lo Monte (que será a terceira maior hidrelétrica do mundo) localizada no estado do Pará, que entraram em greve no início de abril.

Nova greve em Belo Monte

No dia 23 de abril, a grande maio-ria dos sete mil trabalhadores da obra de Belo Monte estava novamente em greve reivindicando o aumento da cesta-básica, a redução dos interva-los de folga para a visita dos traba-lhadores às suas cidades de origem, equiparação salarial, etc.

Em Belo Monte, os patrões repre-sentados pelo Consórcio Construtor de Belo Monte (CCBM), sequer aca-tam resoluções tomadas pela Mesa nacional da indústria da construção. Membros da Comissão de Base dos

trabalhadores foram demitidos pela empresa. Cerca de 60 trabalhadores foram demitidos por envolvimento com a greve e houve forte repres-são policial.

O governo Dilma, por sua vez, não faz nada para que essa situação se re-verta, demostrando sua conivência com os patrões apesar da retórica de conciliação. Para piorar, promove a repressão e criminalização dos mo-vimentos legítimos dos trabalhado-res. O Sindicato dos Trabalhadores na Indústria da Construção Pesada do Pará, por sua vez, mostrou-se co-nivente com a perseguição de mem-bros da Comissão de Base.

Além das greves nas hidrelétricas do PAC, uma poderosa greve atin-giu as obras do Comperj, um com-plexo petroquímico da Petrobrás em construção em Itaboraí (RJ). São cer-ca de 15 mil trabalhadores que para-lisaram a obra mesmo contra a von-tade da direção do sindicato ligado à CUT e exigem reajuste salarial e aumento do vale-alimentação, além de melhores condições de trabalho.

Greves também têm sido deflagra-das nas obras de reforma dos está-dios para a Copa do Mundo de 2014.

Oito dos doze estádios em reforma já foram palco de paralisações e gre-ves desde o ano passado.

O papel da CSP-Conlutas e do sindicalismo classista

Construir uma base organizada pa-ra o movimento sindical combati-vo, classista e democrático entre os trabalhadores das obras do PAC é uma prioridade para o conjunto da esquerda.

A CSP-Conlutas tem que utilizar a Mesa nacional da indústria da cons-trução para denunciar os aconteci-mentos de Belo Monte e das obras

do PAC de forma geral. Tem que des-mascarar a farsa representada pela ideia de pacto social promovida pe-lo governo, os patrões e as centrais governistas e pelegas.

As lutas dos trabalhadores nos es-tádios em reforma para a Copa do Mundo devem estar ligas à luta do movimento popular contra as remo-ções em massa e demais ataques re-lacionados aos megaeventos.

O conjunto do movimento sindi-cal e popular independente de gover-nos e patrões deve buscar a unidade de ação para fortalecer esses movi-mentos e apontar uma alternativa de organização para os trabalhadores.

ambev recua e reconhece direitos de dirigente sindical demitido por “justa causa”Empresa, porém, não garantiu reintegração e a vitória do movimento foi parcialNo dia 12 de março, a multina-cional cervejeira AmBev de Ja-careí (SP) demitiu por “justa causa” o companheiro Joaquim Aristeu, conhecido como “Bo-ca”, dirigente da CSP-Conlutas no estado de São Paulo e mili-tante da LSR e do PSOL.

André Ferrari

A razão alegada pela empresa foi o fato de Joaquim ter denunciado publicamente a responsabilidade da empresa no acidente dentro da fábri-ca que acabou provocando a morte de um trabalhador terceirizado, um jovem de 25 anos de idade que tinha sua esposa grávida.

Joaquim exerceu um direito básico de livre expressão e também cumpriu seu dever como dirigente sindical e membro da CIPA (Comissão Interna de Prevenção de Acidentes). Ao invés de investir na segurança dos traba-lhadores, os patrões preferiram calar quem denunciou as irregularidades.

Joaquim trabalhou na AmBev de Jacareí durante 23 anos e é um incan-sável militante pela causa dos traba-lhadores há mais de 30 anos. Já foi presidente do Sindicato dos trabalha-dores nas indústrias de Alimentação de São José dos Campos e região e foi recentemente eleito pelos traba-lhadores para exercer um novo man-dato como vice-presidente da CIPA da AmBev-Jacareí.

A AmBev é a subsidiária brasilei-ra da megacorporação multinacional

AB InBev, a maior empresa cerve-jeira do mundo, presente em 32 pa-íses com cerca de 80 mil trabalha-dores. A presença de Joaquim den-tro da empresa sempre foi uma pe-dra no sapato dos patrões.

Tratou-se, portanto, de forma cla-ra e categórica, de uma perseguição contra a organização sindical dos trabalhadores da AmBev como par-te da ofensiva patronal contra aque-les que ousam lutar em várias par-tes do mundo em meio à crise capi-talista internacional.

Campanha nacional e internacional

Uma campanha nacional e interna-cional de protesto e solidariedade foi deflagrada. Uma imagem de um co-po de cerveja sujo de sangue denun-ciando a AmBev e suas marcas (Skol, Brahma, Antarctica, etc) foi difundi-da por todo o mundo pela internet.

Centenas de mensagens de enti-dades e organizações de trabalhado-res, parlamentares e personalidades da esquerda de países como a Gré-cia, Nigéria, Bélgica, EUA, Ingla-terra, Irlanda e Rússia chegaram à empresa. Do Brasil vieram mensa-gens do deputado federal Ivan Valen-te (PSOL-SP) e da deputada estadu-al Janira Rocha (PSOL-RJ), além do ex-candidato a presidente pelo PSOL Plínio de Arruda Sampaio.

Um Ato representativo com vá-rios sindicatos e entidades foi rea-lizado diante da fábrica e pelo me-

nos duas Assembleias aconteceram em todos os turnos para debater os rumos da campanha. A possibilida-de de greve não foi descartada, ain-da mais diante da postura da empre-sa nas negociações sobre o progra-ma de participação nos lucros e re-sultados específico da AmBev. Nas negociações os patrões queriam pu-nir os trabalhadores pela greve rea-lizada no ano passado.

Porém, a direção do sindicato dos trabalhadores nas indústrias de Ali-mentação de São José dos Campos e região não se mostrou à altura da gravidade da situação. Uma campa-nha pela reintegração do companhei-ro Joaquim deveria ser assumida pe-lo sindicato e o conjunto do movi-mento, incluindo a sustentação fi-nanceira do companheiro e sua famí-lia nesse período. É bom lembrar que Joaquim foi demitido por “justa cau-sa”, sem receber um tostão sequer.

A postura do sindicato, porém, foi de lavar as mãos nessa situação. A maioria da diretoria (vinculada à orga-nização “Unidos pra Lutar”) recusou--se a garantir a sustentação financei-ra e fez corpo mole na luta. Uma mi-noria da diretoria (ligada à CSP-Con-lutas) assumiu uma posição coerente.

Mesmo assim, a empresa se sentiu pressionada pela campanha e abriu uma negociação que resultaria, na prática, na retirada da “justa causa” e na garantia de todos os direitos tra-balhistas do companheiro. Além de todas os direitos, a empresa aceitou reconhecer por escrito e indenizar a

estabilidade de Joaquim não só co-mo cipeiro, mas também como diri-gente da CSP-Conlutas.

Apesar disso, a opção de Joaquim e dos apoiadores da campanha contra a demissão era de não fechar qual-quer acordo que não contemplasse a reintegração. Apesar de já estar com tempo para se aposentar, a reintegra-ção de Joaquim seria uma vitória pa-ra o conjunto do movimento sindical e isso era a prioridade. Mas, para is-so, seria necessário que se garantisse o mínimo de sustentação financeira mínima do companheiro enquanto a campanha acontecesse.

Porém, além da recusa do sindi-cato, o movimento mais amplo não ofereceu condições mínimas de sus-tentação do companheiro. Mesmo a CSP-Conlutas não garantiu e sugeriu o acordo como um mal menor, ga-rantindo uma vitória parcial.

Apoio unanime nas assembleias

Esse acabou sendo o caminho se-guido, apesar da disposição de luta até o fim por parte do companheiro Joaquim e os apoiadores da campa-nha. Assembleias foram realizadas em todos os turnos da empresa para discutir a situação com os trabalha-dores. Houve apoio unanime à assi-natura do acordo, além de uma vo-tação para que o sindicato assumis-se seu papel no caso.

Não deixa de ser um balanço ne-gativo do conjunto do movimento

sindical sua incapacidade de garan-tir condições para que seus dirigen-tes sindicais perseguidos possam se manter enquanto persistem na luta. Apesar disso, o companheiro Joa-quim sai da campanha com amplo apoio dos trabalhadores e condições renovadas para continuar militando pela causa dos trabalhadores, não apenas da AmBev ou da categoria da Alimentação, mas de todo o Vale do Paraíba e do país.

A saúde e segurança no trabalho e o direito de organização por local de trabalho são bandeiras vitais pa-ra o movimento sindical. O papel do companheiro Joaquim no próxi-mo período será o de levar adiante essa luta com mais garra e disposi-ção que nunca.

Gostaríamos de expressar uma enorme gratidão em relação a todos e todas que colaboraram com a cam-panha e reafirmar, junto com o com-panheiro Joaquim, nossa disposição de continuar a luta pelos direitos dos trabalhadores rumo a uma socieda-de socialista.

Repressão policial à greve de Belo Monte

Joaquim “Boca” se mantém firme na luta

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saúde do trabalhador • 3 Ofensiva Socialista n°10 maio/junho - 2012

28 de abril, para não esquecer:

acidentes e doenças no trabalho matam mais que guerrasOs acidentes e mortes ocorri-dos nos locais de trabalho tal-vez sejam uma das faces que mais explicitam as consequ-ências da exploração da força de trabalho de homens e mu-lheres na sociedade capitalis-ta. Os dados são alarmantes: o trabalho mata quatro traba-lhadores por minuto no mundo, muito mais que o vírus HIV ou as guerras. Morrem mais traba-lhadores por falta de segurança no local de trabalho que por ál-cool e drogas juntos!

Isabel Kepplerpsicóloga, Baixada Santista

Segundo a Organização Interna-cional do Trabalho (OIT), são 6 mil trabalhadores mortos a cada dia, por acidentes e doenças relacionadas ao trabalho. Dos casos não fatais, são 270 milhões acidentes de trabalho e 160 milhões de casos novos de doen-ças (dados extraídos no site da Fun-dacentro), e esses são apenas dados estimados, dada a quantidade de tra-balho informal.

A legislação que, teoricamente, foi feita pra proteger o trabalhador, na verdade é utilizada pelas empresas para culpabilizar o trabalhador por não ter seguido determinada norma. Enquanto essa norma não é seguida e não ocorre nenhum acidente, e com isso, a produtividade é maior, a em-presa ignora o fato do trabalhador não a seguir, ou até mesmo o esti-mula a não segui-la. Agora, quando ocorre o acidente, a empresa apro-veita pra colocar a culpa no traba-lhador!

Quando vemos os patrões, a mídia e o governo – via políticos e até mes-mo nas políticas públicas –, falando de prevenção via capacitação dos trabalhadores e informando sobre a segurança no trabalho, o que está se fazendo é dizer, implicitamente, que é o trabalhador o culpado por esses inúmeros acidentes e mortes. Quan-tos falam que é preciso aumentar o número de trabalhadores, reduzir a

jornada de trabalho, pelo fim da du-pla função, dar condições apropria-das como equipamento de seguran-ça? Quantos denunciam as irrespon-sabilidades, o trabalho subumano, às vezes em regime de escravidão, na qual muitos trabalhadores estão submetidos?

Podemos chamar de “acidente” quando morre um trabalhador por conta do quadro reduzido de fun-cionários, ou quando este trabalha em regime de “dobradinha” (duplo turno), às vezes controlando máqui-nas pesadas? Acidente não é aciden-te quando poderia ter sido evitado! A morte no local de trabalho, diante das condições que temos hoje, não é fatalidade, é assassinato! É preci-so ter coragem e intolerância frente a esses casos. Os patrões, a mídia e o governo querem culpabilizar e res-ponsabilizar quem, na verdade, é ví-tima! Temos que dar um basta nisso! São eles os verdadeiros culpados!

Progresso para quem?

Belo Monte, a menina dos olhos do governo Dilma, propagandeado como um grande progresso para o Brasil, está sendo construída em con-dições precárias de trabalho. A cons-trução civil é um dos setores em que a segurança no trabalho é mais alar-mante! São trabalhadores, muitas ve-zes de outros Estados, vivendo em alojamentos precários, trabalhando horas além da conta em condições precárias.

Os megaeventos têm sido aponta-dos como promissores para o desen-volvimento do país, enquanto apre-sentam denúncias das condições nos canteiros de obras. Isso tudo sem fa-lar no que acontecerá durante a Co-pa e as Olimpíadas, com uma série de trabalhos temporários precariza-dos! De que desenvolvimento e pro-gresso estão falando?

Não é preciso muito esforço pa-ra perceber essa contradição entre o “desenvolvimento” clamado pe-los poderosos e a situação de gran-de parte da sociedade. O trabalhador

no chão de fábrica pôde ver, nos úl-timos anos, o que mudou no seu lo-cal de trabalho: dos novos equipa-mentos e tecnologias desenvolvidos, quantos foram voltados para barate-ar e acelerar o processo de produção e o quanto foi voltado para melho-rar suas condições de trabalho? Ain-da que haja uma mudança ou outra com relação à segurança no traba-lho, esta é feita pensando no lucro, visto que sai caro muitos acidentes de trabalho.

Estima-se que o Brasil perde, por ano, o equivalente a 4% do PIB por conta disso. Henry Ford, fundador da Ford Motor Company e quem im-plementou um novo modelo de pro-dução conhecido posteriormente co-mo fordismo, já disse há muito tem-po atrás: “o corpo médico é a seção de minha fábrica que me dá mais lu-cro”. Dizia isto na medida em que contratava médicos para localizar os trabalhadores que poderiam vir a dar prejuízo para serem prontamen-te descartados, entre outras medidas que são relativas a segurança do tra-balho, que objetivavam assegurar o patrão, e não os trabalhadores!

Quem cuida da saúde do trabalhador?

Os trabalhadores precisam saber que, embora o culpado e responsável sejam os donos dos meios de produ-ção e todo esse sistema que está es-truturado na exploração do homem, o único capaz de cuidar de fato da saúde do trabalhador é o próprio tra-balhador! São os trabalhadores que devem se organizar coletivamente para lutar por melhores condições de trabalho!

Somente através da organização dos trabalhadores e da luta por me-lhores condições de trabalho, sem a delegação desta responsabilidade pa-ra a empresa ou “técnicos” da área de saúde e segurança do trabalho, é pos-sível evitar que o trabalho continue matando tantos trabalhadores. Estes

necessitam vender sua força subme-tendo-se a uma série de riscos para a sua saúde e sua própria vida, pois o trabalho é o único meio de tirar o sustento próprio e de sua família.

A CIPA, nesse sentido, é um espa-ço fundamental a ser ocupado pelos trabalhadores, fazendo com que ela cumpra um papel de fiscalizar, trans-formando em um espaço de forma-ção de trabalhadores para trabalha-dores, um espaço de denúncia da política de reestruturação produtiva das empresas.

No entanto, o caso recente ocor-rido na AmBev nos faz ver que não basta organizar-se no local de tra-balho, mostrando que essa luta co-tidiana por melhores condições de trabalho deve estar organizada a al-go mais amplo.

Joaquim Boca, cipeiro demitido por justa causa por cumprir de for-ma íntegra o seu papel e denunciar a morte de um trabalhador por irre-gularidade no seu local de trabalho, depois de muita luta conseguiu que tivesse os seus direitos minimamen-te garantidos por estar vinculado a uma luta mais ampliada dos traba-lhadores, para além de sua catego-ria. O Comitê por uma Internacional dos Trabalhadores (CIT), denunciou internacionalmente o fato ocorrido, e a CSP-Conlutas também cumpriu um papel importante nas reuniões com a empresa para fechar o acordo.

28 de abril: uma data de luta para lembrar

as vítimas de morte e acidente de trabalho

Nesses marcos, o dia 28 de abril é celebrado pela mídia e pelas em-presas como “dia da saúde e segu-rança no trabalho”, organizando pro-gramas para “educar” o trabalhador em como executar sua função de for-ma mais “segura”. Tradicionalmen-te os trabalhadores organizados em sindicatos ou nos movimentos po-pulares de saúde reconhecem a da-

ta como “dia em memória das víti-mas de acidentes e doenças do tra-balho”, e marcam a data com atos e debates denunciando a situação alar-mante em que vivemos.

A CSP-Conlutas, fundada em 2010, organizou em 2011 atos, de-bates e panfletos para o dia 28 de abril. Em 2012 utilizará a data para denunciar a GM, Belo Monte, obras do PAC e a omissão do governo Dil-ma frente a todo esse cenário.

Construir a unidade da classe trabalhadora

Do dia 27 a 30 de abril acontece o I Congresso da Central Sindical e Popular - Conlutas. Neste curto pe-ríodo de existência, mostrou-se im-portante impulsionando uma forte resistência ao governo Dilma e a re-tomada do processo de recomposi-ção e reorganização da luta da classe trabalhadora. Apresenta-se como um espaço em potencial de ser ocupado pelos os sindicatos já filiados, mas também as oposições sindicais e mi-norias sindicais de entidades ligadas a outras Centrais que cada vez mais são desmascaradas revelando o seu rabo preso com patrões e governos.

Esta Central tem se destacado tam-bém jogando um papel importante com a criação do setorial nacional de Saúde do Trabalhador, ramifican-do para setoriais regionais e Estadu-ais. Essa instância, tem reunido ci-peiros e realizando um trabalho que a CUT e demais centrais abando-naram no último período. Nós, da LSR, em conjunto com demais se-tores do Bloco de Resistência Socia-lista, defendemos em nossa tese que a Central invista na organização das CIPAS, continue a formação de fó-runs regionais de saúde do trabalha-dor, construa um coletivo de advo-gados e profissionais voluntários es-pecializados em saúde e segurança dos trabalhadores, entre outras ini-ciativas para enfrentar os ataques à saúde do trabalhador.

Seis mil trabalhadores mortos todos os dias em razão das más condições de trabalho

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4 • sindical Ofensiva Socialista n°10 maio/junho - 2012

Greve dos profissionais de educação de São Paulo

greve histórica conquista vitórias mas é traída pelo presidente do sindicatoOs profissionais da educação municipal de São Paulo prota-gonizaram uma das maiores lu-tas como há muito não se via. Não resta dúvida de que foi uma mobilização histórica.

Dimitri SilveiraProfessor de geografia na rede

municipal de São Paulo

Aprovada no dia 28 de março e iniciada no dia 2 de abril, a greve da rede municipal de ensino foi motiva-da pela enrolação da prefeitura em cumprir acordos feitos com a cate-goria desde o ano passado, pela de-fasagem salarial, por um ataque que tornou mais difícil a evolução fun-cional entre os professores e também pela ameaça de perda de férias co-letivas e recesso escolar das profes-soras que lecionam na educação in-fantil da cidade.

Apesar da tentativa do presidente do sindicato sabotar a luta, fazendo todas as manobras possíveis para que a greve não acontecesse, a categoria demonstrou vontade de lutar e impôs uma derrota ao presidente pelego.

Nove dias de greve

Com duração de nove dias, a gre-ve teve seu ápice no dia 4 de abril, quando cerca de dez mil pessoas se reuniram em assembleia na Praça do Patriarca no centro da cidade e de-pois seguiram em passeata até a câ-mara municipal de São Paulo.

No dia 10 de abril realizou-se uma

assembleia na qual surgiram propos-tas a favor e contra a continuidade da greve. Desrespeitando a decisão da maioria da assembleia que votou pela continuidade da greve, Cláu-dio Fonseca, presidente do Sindi-cato dos Profissionais em Educação no Ensino Municipal de São Paulo

(Sinpeem), que também é vereador do PPS, partido de sustentação do governo Kassab, decretou o fim da greve. Indignados com a arbitrarie-dade do presidente traidor, centenas de pessoas cercaram o carro de som e passaram a hostilizar Cláudio Fon-seca e os demais diretores majoritá-

rios do sindicato, que só consegui-ram sair do local com escolta poli-cial, sob risco de serem linchados.

A greve acabou, mas a luta de-ve continuar. A primeira conquis-ta imediata foi a aposentadoria es-pecial para gestores e docentes re-adaptados. Porém, embora exista a

promessa da prefeitura em encami-nhar projetos de lei que tratam do au-mento de duas referências na tabe-la de vencimentos do plano de car-reira e a concessão de abono com-plementar para os profissionais co-missionados do quadro de apoio, is-so ainda não passa de uma simples promessa. Por isso é necessário man-ter a categoria mobilizada para que os projetos de lei sejam encaminha-dos e aprovados rapidamente na câ-mara municipal. Os profissionais de educação poderiam ter conquistado mais vitórias, como a garantia de re-cesso escolar nos CEIs e a revoga-ção da portaria que atacou a evolu-ção funcional dos professores, mas a traição do presidente do sindicato impediu que a luta seguisse adiante.

Oposição não pode vacilar e deve se manter unificada

Algumas figuras públicas da opo-sição não tiveram uma leitura cor-reta do potencial que a greve ain-da possuía e infelizmente defende-ram o fim da greve juntamente com a direção majoritária num momento onde ainda era possível avançar. Is-so gerou confusão e questionamen-tos entre aqueles que enxergam na oposição uma alternativa coerente para representar a categoria. Ape-sar deste erro, é necessário manter a unidade da oposição no Sinpeem para que as lutas sejam levadas até o fim de forma coerente, sem vaci-lar e com democracia.

Capital põe as mãos na previdência do servidorNem todos acreditam que a crise do capitalismo chegará ao Brasil, mas o governo bra-sileiro tem certeza disso e se prepara antecipando as “me-didas de austeridade”, discur-so que procura justificar enor-mes agressões aos direitos dos trabalhadores.

Aldo BarretoOposição ASSIBGE-SN

Fausta Camilo FernandesDireção SINTRAJUD-SP

A bola da vez são os trabalhado-res do setor público federal, mas é bom lembrar que os cortes nos di-reitos dos federais chegam rapida-mente aos outros níveis do gover-no (municipal, estadual) e à inicia-tiva privada, portanto o ataque a um trabalhador é ataque a toda à classe!

No dia 28 de março de 2012 foi aprovado no senado federal, sobre pressão da presidência, o PL1992/2007, que prevê a criação da Fundação de Previdência Com-plementar do Servidor Público Fe-deral (Funpresp) e institui a previ-dência complementar para os futu-ros servidores.

Alegando a necessidade de “as-segurar o funcionamento inicial” a União deve depositar nos fundos privados valores que somam R$

100.000.000,00 (cem milhões de reais) de dinheiro público, afetando as reservas que deveriam garantir a aposentadoria dos servidores atuais.

A expectativa é que este será o maior fundo de pensão da América Latina e servirá a sede insaciável do mercado financeiro e bancos, sem-pre em busca de maior apropriação do capital, daí a prontidão do gover-no federal em atender o interesse de seus grandes aliados.

Consequências para todos trabalhadores

Por outro lado, as consequências são drásticas para os servidores pú-blicos e para os trabalhadores em geral. Representam mais precari-zação dos serviços públicos e de-terioração das condições de traba-lho e dos salários dos servidores.

A lógica é a seguinte: Os novos servidores contribuirão no limite de 11% do valor teto do INSS para o Regime Próprio da Previdência, sendo que o valor que ultrapassar este teto será destinado ao fundo complementar. Com a previsão de aposentadoria de 500 mil servido-res civis e militares para os próxi-mos 5 anos, o tal “rombo” da pre-vidência (tão propagandeado pe-la imprensa e governo) aumenta-rá significativamente, justificando medidas como aumento da idade

mínima para aposentadoria, arro-cho salarial para os servidores da ativa e novas formas de reduzir os

proventos de aposentados e pen-sionistas, penalizando os trabalha-dores do setor público e compro-

metendo os serviços prestados pe-lo Estado em geral, inclusive os de necessidades básicas como saúde e educação.

A crise do capital internacional, usada como argumento para este corte, tem sua raiz justamente na falência de conglomerados finan-ceiros, muitos deles administrado-res dos tais fundos de previdência, portanto gera grande insegurança a entrega da previdência dos servido-res aos especuladores de capitais.

Construir uma ampla mobilização dos trabalhadores

Infelizmente, a mobilização dos Servidores Federais não foi capaz de impedir este ataque. Revertê-lo depende de uma correlação de for-ças diferente da atual. Precisamos, num primeiro momento, denunciar em todas as categorias dos servido-res federais este ataque.

Dialogar com os demais servi-dores de outras esferas, pois serão os próximos a terem sua previdên-cia apropriada pela gestão do capi-tal e contribuir para uma mobiliza-ção mais ampla da classe trabalha-dora como um todo, pois somente uma força ampla será capaz de en-frentar tamanhos interesses econô-micos e políticos alimentados com suor e sofrimento de uma nação.

Contrarreforma da previdência de Dilma é retrocesso para o funcionalismo

Havia disposição de luta, mas Claudio Fonseca e a direção do Sinpeem traíram o movimento

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nacional • 5 Ofensiva Socialista n°10 maio/junho - 2012

Corrupção em Goiás e no Brasil:

entre cachoeiros e mensaleirosNo final de 2010, a direita tra-dicional conformada pelo PS-DB e o DEM parecia ter conso-lidado sua hegemonia em Goi-ás. Nas eleições presidenciais, a candidatura de Serra tinha derrotado a de Dilma. Nas elei-ções estaduais Marconi Perillo (PSDB) venceu o candidato da aliança PMDB/PT e conquistou a maioria da assembleia legis-lativa. Enquanto isso, o DEM parecia ter encontrado uma so-brevida com a vitória de De-móstenes Torres, que planejava ser o próximo candidato a pre-sidente da oposição conserva-dora ao governo Dilma.

Fernando Lacerda Zelito F. Silva

Porta voz de uma política de se-gurança conservadora que crimina-liza a pobreza e figura pública da di-reita tradicional, Demóstenes Torres, após a divulgação da operação Mon-te Carlo da Polícia Federal, não pas-sa, agora, de um cadáver político re-jeitado até mesmo pelo partido que antes via na sua imagem a salvação.

O esquema de corrupção de Carlos Cachoeira influenciou as mais diver-sas instâncias públicas e privadas no Brasil: desde o semanário mais im-portante da burguesia – a revista Ve-ja – até a empresa que mais recebia verbas do PAC – a empresa Delta – passando ainda por policiais, depu-tados e governadores dos mais diver-sos partidos. Esta influência é ainda mais intensa no estado de origem de Cachoeira. Em Goiás, a presença do bicheiro se faz presente na prefeitura e no governo estadual, no Ministé-rio Público e na Polícia Militar. Ve-lhos (PSDB e DEM) e novos (PT) agentes da burguesia deixaram cla-ro que Marx e Engels estavam cor-retos quando afirmaram que o Esta-do “não é senão um comitê para gerir os negócios comuns de toda a clas-se burguesa”.

O bicheiro, o paladino da ética e o governador

Demóstenes parecia ser o grande nome da ética na política. A revis-ta Veja publicava matérias que eram criadas e plantadas por Cachoeira; no senado, Demóstenes era porta-voz das denúncias da revista e esta, por sua vez, apresentava o senador como uma figura expressiva da luta contra a corrupção. Enquanto isso, Cachoei-ra eliminava rivais econômicos e po-dia aumentar seus lucros. Com as in-vestigações da Operação Monte Car-lo, ficou claro que Demóstenes, lon-ge de ser um paladino da ética, era, na verdade, o representante público de uma quadrilha altamente organi-zada que ocupa os mais diversos es-calões do estado burguês.

No estado goiano, Marconi Pe-rillo assumiu o governo de Goiás se apresentando como um tecnocrata que resolveria todos os problemas administrativos e financeiros do es-tado. Na realidade, sua retórica era apenas uma justificativa para apli-car o tradicional programa tucano: atacar os trabalhadores, retirar di-reitos de servidores públicos e apli-car a clássica “privataria tucana”. Hoje, está claro que além de priva-tizador, Marconi tem possíveis re-lações com Don Cachoeira. A cola-boração de Marconi com Cachoei-

ra não é nova. O atual governador é o responsável por sancionar uma lei de 2000 que não só permitia a ex-ploração de jogos de azar em Goi-ás, mas também possibilitava o go-verno contratar empresas para ex-plorar jogos de azar. Uma das em-presas favorecidas pela lei foi a Ger-plan – empresa usada por Cachoeira em suas atividades ilegais. A bonda-de de Marconi foi recompensada por Cachoeira que, em 2010, doou, por meio de empresas de fachada, mais de R$400.000 para a campanha elei-toral de Marconi. Um sócio de Ca-choeira, o empresário Rossine Aires Guimarães, também realizou a gene-rosa doação de R$800 mil feita para o PSDB em 2010.

O grau de envolvimento do gover-no do PSDB com os negócios de Ca-choeira é tão grande que, além de membros do alto comando da polí-cia da capital, três de seus auxiliares diretos foram afastados: sua Chefe de Gabinete, o Presidente do DETRAN e o Procurador Geral de Goiás. A ex--chefe de gabinete, Eliane Gonçalves (que pediu exoneração após a publi-cação das denúncias), foi intercepta-da em escutas telefônicas da Polícia Federal repassando informações das operações de combate ao jogo com a finalidade de proteger os negócios de Cachoeira. Da mesma forma, a Polí-cia Federal provou que mais de 30 co-ronéis foram promovidos após paga-rem propinas de até R$100 mil reais. Enquanto tudo isso vem a tona, o po-bre governador diz não saber de nada.

A corrupção também está presente no PT

As denúncias envolvendo o gover-nador Marconi Perillo e o senador Demóstenes Torres atualmente estão sendo usadas para encobrir os diver-sos esquemas de corrupção presentes na prefeitura de Goiânia, dirigida por Paulo Garcia do PT. Desde 2010, o PSOL de Goiânia vem denunciando os mais diversos esquemas de corrup-ção: desde a venda de terrenos públi-cos, a preço de banana, para empresas privadas até o caso do Parque Muti-rama. Denúncias realizadas pelo ve-reador Elias Vaz, do PSOL, resulta-ram na investigação do MPF sobre a obra e apuraram o desvio de mais de R$ 2 milhões envolvendo membros da Agência Municipal de Obras e a empresa Warre Engenharia. Diante de uma crise inaugurada pelas de-núncias, o chefe de gabinete da pre-feitura, organizou uma reunião com vereadores da oposição para negociar uma saída pra a crise. “Curiosamen-te”, o chefe de gabinete da prefeitura do PT levou para a reunião o bichei-ro Carlos Cachoeira. Após o PSOL ter veiculado essa denúncia, o chefe de gabinete foi exonerado e o prefei-to, tal como fez Marconi, afirma que jamais teve conhecimento das ações de seu chefe de gabinete.

Além desses casos, está claro que o PT tem íntimas relações com os ne-gócios de Carlos Cachoeira. Se es-tá provado que Demóstenes atuava no senado para favorecer negócios de Cachoeira, o fato é que uma das empresas que funcionava como parte dos negócios do bicheiro é a empre-sa que mais recebeu verbas do prin-cipal programa de governo do PT: o PAC. A Delta Construções recebeu mais de R$850 milhões do gover-no e hoje é investigada por contri-buir na lavagem de dinheiro de Ca-

choeira e por pagar propinas para políticos para favorecer suas obras. Além de Goiás, governadores de To-cantins, Distrito Federal e Rio de Ja-neiro são suspeitos por envolvimen-to com os negócios da Delta Cons-truções e de Cachoeira..

Os acertos e os erros do PSOL

O PSOL foi e vem sendo um veí-culo importante da luta contra a cor-rupção. Desde a criação do parti-do, as suas principais figuras públi-cas estão envolvidas em ações de investigação e denúncia da corrup-ção. Assim, o partido foi o primeiro a protocolar o pedido de investiga-ção das ações criminosas de Demós-tenes Torres e no DF vem sendo um sujeito ativo na defesa de abertura das investigações sobre as ações do governo de Agnelo Queiroz.

No entanto, pensar a luta contra a corrupção de forma isolada pode levar a erros. Inicialmente, quando as primeiras denúncias contra De-móstenes Torres surgiram, o sena-dor do PSOL, Randolfe Rodrigues, demorou para se posicionar clara-mente diante da necessidade de se investigar e caçar o mandato de De-móstenes. Infelizmente, o senador do PSOL, ainda insiste em fazer decla-rações apontando para o papel “ad-mirável” (SIC) de Demóstenes na lu-ta contra a corrupção. É preciso lem-brar que além de corrupto, Demós-tenes é representante do que há de pior na direita brasileira: o ex-PFL, herdeiro direto da ditadura militar e partido que jamais vacilou em de-fender políticas neoliberais e os in-teresses do latifúndio.

Da mesma forma, em Goiânia, o PSOL foi um instrumento funda-mental na luta contra a corrupção. As denúncias de Elias Vaz, verea-dor do PSOL em Goiânia, serviram para mostrar como a prefeitura do PT usa o dinheiro dos trabalhado-res para enriquecer empresários pri-vados. Com a crise inaugurada pe-las denúncias de Elias Vaz, o PT ar-ticulou uma reunião com setores da oposição – vereadores do PSDB e o PSOL – para buscar uma saída nego-ciada para crise. Nesta reunião, o PT levou o bicheiro para dar a sua con-tribuição. Apesar desta reunião mos-trar, claramente, o grau de envolvi-mento do PT com o bicheiro Carlos Cachoeira é preciso perguntar: Que

razão o PSOL teria para participar de uma reunião organizada pelo PT em conjunto com vereadores do PSDB?

Infelizmente, mais grave ainda é o vazamento da ligação que Cacho-eira fez à Elias Vaz para solicitar que este converse com o ex-jorna-lista televisivo Kajuru. Apesar de a ligação não indicar qualquer ati-vidade ilícita por parte do vereador do PSOL, a intimidade com que este atende o telefone (chamando Cacho-eira de “companheiro”) é, no míni-mo, problemática. Que tipo de luta-dor socialista chama de companhei-ro um corrupto que contribui para a exploração do povo trabalhador? Isto se dá em um contexto, no qual, até o momento (25 de abril), a dire-ção do PSOL-GO não tomou qual-quer posição política contra Marco-ni Perillo, Demóstenes e cia. O par-tido não publicou nem mesmo qual-quer material defendendo a instala-ção de uma CPI sobre as relações de Marconi com Cachoeira.

Com os fatos recentes, a militân-cia do PSOL precisa de uma postura firme e clara da direção do partido. É preciso que a direção nacional do PSOL discuta profundamente em su-as instâncias – incluindo a comissão de ética – as implicações para o par-tido das relações de Elias Vaz com o bicheiro Carlos Cachoeira.

A indignação da juventude e a necessidade da

luta contra a corrupção ser anticapitalista

Enquanto o PSOL goiano vacila nas ações contra o governo de Mar-coni Perillo, a indignação contra a corrupção em Goiás se expressou em duas grandes manifestações que reu-niram mais de três mil pessoas que saíram às ruas para defender “Fora Marconi”. Há um claro clima de in-dignação contra a corrupção que se expressou na organização espontâ-nea das manifestações. Porém, se é possível notar a enorme indigna-ção especialmente entre setores de juventude, é preciso canalizar esse sentimento para uma organização da luta. Enquanto a luta não for organi-zada, militantes do PT e do PCdoB transformarão as manifestações em espaços que servirão para esconder o envolvimento de seus partidos em diversos casos de corrupção.

Da mesma forma, é preciso abrir um debate sobre qual é a saída pa-

ra a corrupção. A corrupção envol-vendo PT, PSDB, DEM e diversos outros partidos mostra que o Estado é apenas uma instância privilegiada para a burguesia garantir seus lu-cros. O problema central não são as ações ilegais de Cachoeira ou a fal-ta de ética de Marconi e Demóste-nes, mas sim o fato de que o estado é um espaço em que quadrilhas for-madas por empresários e políticos se organizam para ampliar seus lu-cros – retirados do sangue da classe trabalhadora.

A lógica de financiamento de campanhas políticas por empresá-rios e grandes grupos econômicos faz com que os políticos eleitos es-tejam na obrigação de devolver aos seus “benfeitores” o financiamento de sua campanha. Isto se dá pelos mais diversos tipos de favores: pri-vatizações, convênios, contratos, li-citações e outras formas de parceria público-privada que nada mais são do que novas formas de se garantir lucros para as grandes empresas uti-lizando o dinheiro das classes explo-radas. Não se trata de um problema ético, mas sim de lutas de classes. O Estado é o instrumento privilegiado para a burguesia defender seus inte-resses econômicos e sociais. É em-blemático o fato de que uma das po-lícias mais violentas do país – a po-lícia de Goiás, responsável pela for-mação de esquadrões da morte e de práticas de repressão violenta às ma-nifestações da classe trabalhadora e da juventude – tem a maior parte de seus dirigentes envolvidos nos es-quemas de “Don Cachoeira”. Se-ja pela polícia, seja pelas políticas “públicas”, o Estado sempre estará a serviço da burguesia.

A luta contra a corrupção deve ser uma luta contra o capital

A corrupção é parte necessária desse sistema gerador de desigual-dades. Por isso, as manifestações pe-lo “Fora Marconi” devem ser orga-nizadas para fortalecer a construção de uma alternativa à atual democra-cia burguesa e ao sistema capitalis-ta. Por isso, a LSR não defende ape-nas a investigação e a prisão de to-dos os corruptos, mas defende tam-bém a construção de uma saída anti-capitalista para a corrupção. Em Goi-ânia, diferentemente do setor majori-tário do PSOL goiano, a LSR – junto com as forças do bloco de esquerda do partido na cidade (CSOL, CST e independentes) – vem atuando ati-vamente das manifestações contra Marconi e defende:

✓ Realização de investigações sobre a corrupção por comitês formados por movimentos sociais e sindicatos;

✓ Prisão e confisco das fortunas de todos os corruptos! Fim dos fóruns privilegiados para os corruptos!

✓ Fora Demóstenes! Fora Marconi! Pela realização de novas eleições para o senado e para o governo!

✓ Pela quebra de sigilo de todos os sócios de Cachoeira!

✓ Pela criação de comitês de mobilização contra a corrupção!

Carlos Cachoeira – muito ainda a ser desmascarado

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6 • especial: Argentina Ofensiva Socialista n°10 maio/junho - 2012

O anúncio da presidenta pero-nista da Argentina, Cristina Fer-nández Kirchner, de que 51% das ações da YPF serão toma-das pelo Estado argentino foi recebida com apoio em massa na Argentina e visto como um golpe desferido contra a multi-nacional Repsol.

Tony Saunois, CIT

O Ministro da Indústria espanhol, José Manuel Soria, denunciou co-mo sendo este um ato de “hostilida-de contra a Espanha, que terá conse-quências”. O primeiro ministro Ra-joy trovejou: “foi um ato arbitrário e hostil”, que rompe o “clima de ami-zade” entre os dois países. O jornal britânico Financial Times, fez eco a esses sentimentos: no seu editorial, intitulado “Um ato de pirataria eco-nômica desprezível”, ameaçou a Ar-gentina de uma possível “suspensão do G20” e alertou Cristina Kirchner: “Não se deve permitir que ela se es-queça de que as ações têm consequ-ências” (FT 18/4/12).

O presidente neoliberal do Chile, Piñera, e Calderón, do México, tam-bém se juntaram ao coro de críticas da ação de Cristina Kirchner con-tra a empresa imperialista. Mesmo o presidente da Bolívia, Evo Morales, em uma reação um tanto quanto co-varde, argumentou que se tratava de uma questão bilateral entre dois es-tados e que seu governo, em contra-partida, mantém boas relações com a Repsol. No entanto, o governo bo-liviano sofreu ataques similares vin-dos do Brasil, quando tomou medi-das semelhantes contra a Petrobras, a multinacional brasileira!

Consequências para além da Argentina

“O canto da sereia do populismo seduz mais uma vez ...” foi a man-chete do artigo de Moisés Naim, no Financial Times de 19 de abril de 2012. Na realidade, a nacionalização das ações da YPF é um elemento ex-

tremamente significativo, mesmo pa-ra além da Argentina. Isto é o que es-tá por trás dos ataques violentos con-tra a intervenção estatal de Cristina Kirchner. A classe dominante inter-nacional teme que essa nacionaliza-ção abra precedentes para outros go-vernos diante do aprofundamento da crise econômica mundial. Nesse sen-tido, significa uma nova etapa.

Embora tenha havido hostilidade acentuada e oposição contra medidas semelhantes tomadas por Hugo Chá-vez na Venezuela, no passado, quan-do seu governo contrariou interesses de empresas como Total, BP e Che-vron, tais medidas não tiveram tan-ta repercussão internacional como a reação à recente intervenção de Cris-tina Kirchner.

A situação internacional é agora muito mais crítica para o capitalis-mo mundial do que era quando Chá-vez interveio contra aquelas empre-sas. A perspectiva de outros governos sendo obrigados a intervir ainda mais e nacionalizar outros setores da eco-nomia, seja como resultado de pres-são popular, seja para defender inte-resses governamentais, agora assus-ta a classe dominante.

Uma nova política da classe dominante?

A tomada de 51% das ações da YPF pelo governo de Cristina Kir-chner poderá anunciar uma nova situ-ação em que os governos serão obri-gados a promover intervenções esta-tais para tentar minimizar os efeitos de uma recessão prolongada ou de uma grave crise econômica.

A classe dominante teme que a classe trabalhadora assuma o tema da nacionalização e a coloque na sua pauta de reivindicações. Logo, os de-senvolvimentos na Argentina são ex-tremamente significativos em nível internacional.

Outro elemento importante são os interesses geopolíticos na América Latina e nas Américas. O notável de-clínio da influência de Hugo Chávez está deixando um espaço que Cris-

tina Kirchner está tentando preen-cher. O imperialismo dos EUA tem sido, portanto, mais cauteloso em sua reação, não querendo empurrar Cristina Kirchner ainda mais para o “campo populista”. O jornal argen-tino El País cita um oficial dos EUA após a recente Cúpula das Améri-cas, na Colômbia: “Nós temos dife-renças ocasionais com a Argentina, mas nós não queremos que isso (na-cionalização da YPF) comprometa a nossa ampla cooperação nos domí-nios da economia e da segurança”. (El País 16/4/12)

A parcial renacionalização da YPF deriva diretamente das consequências desastrosas da privatização em mas-sa realizada na Argentina na década de 1990, sob o então presidente pe-ronista Carlos Menem. Tradicional-mente, o peronismo, um movimen-to populista nacionalista, havia ado-tado uma política de intervencionis-mo estatal abrangente. As privatiza-ções em massa foram reflexo da ade-são do governo argentino às políticas neoliberais internacionalizadas du-rante aquele período.

Esse giro à direita foi apelidado de “menemismo”.

A YPF foi privatizada em 1992. Tal como aconteceu com as outras priva-tizações, foi um desastre para as mas-sas, mas abriu enormes oportunida-des para os capitalistas argentinos e para as multinacionais como a Rep-sol, que retornaram à América Latina como novos “conquistadores”, com-prando vastas áreas da Argentina e da economia latino-americana.

Essas privatizações foram catastró-ficas para a economia argentina. Co-mo Cristina Kirchner apontou, a fal-ta de investimento e de desenvolvi-mento no setor de energia e de gaso-lina já resultou no fato de que a Ar-gentina tem que importar gás e pe-

tróleo pela primeira vez em mais de 17 anos - isso apesar da descoberta de um grande campo de gás de xis-to argiloso, conhecido como “Vaca Muerta”!

“Esta política esvaziada, de não produzir nem explorar, praticamente nos tornou um país inviável, e isso se deve à lógica de mercado, não à falta de recursos”, declarou Cristina Kir-chner ao tomar uma participação ma-joritária na YPF. (El País 17/04/12)

No período recente, as Aerolíneas Argentinas, empresas de eletricida-de e algumas outras também foram parcialmente renacionalizadas, por razões semelhantes.

Esta mudança de política do gover-no Kirchner vem na esteira de uma rápida desaceleração da economia, do aumento da inflação, da introdu-ção de cortes e também do aumento do desemprego. Efetivamente, o que ela está dizendo é que se o setor pri-vatizado não garantir serviços essen-ciais, então o Estado vai intervir e vai fazê-lo. No entanto, apesar da onda de hostilidade por parte dos represen-tantes do capitalismo e do imperialis-mo, Cristina Kirchner não naciona-lizou a YPF num sentido socialista.

Lições do México 1938

Em março de 1938, o governo me-xicano radical populista, liderado por Lázaro Cárdenas, nacionalizou em-presas anglo-americano-holandesas de petróleo. Trotsky argumentou que este passo devia ser apoiado e que os sindicatos e a classe trabalhado-ra deviam lutar pelo controle e pela gestão democrática dos trabalhado-res na nova indústria estatal do pe-tróleo, mesmo que tal indústria não tivesse sido nacionalizada numa ba-se socialista. Essa experiência serve à Argentina de hoje.

Da mesma forma, quando os go-vernos trabalhistas da Grã Bretanha do pós-guerra implementaram a na-cionalização do carvão, das ferro-vias e, posteriormente, de outros se-tores da economia, os marxistas exi-giram o controle e a gestão demo-cráticos pelos trabalhadores. Con-cretamente, propuseram que os con-selhos de administração dessas em-presas deveriam ser compostos de maneira paritária: em um terço pelos sindicatos da indústria, em um terço pela central sindical TUC – que re-presentava a classe trabalhadora num sentido mais amplo – e um terço pe-lo governo.

A nacionalização parcial de Cris-tina Kirchner tem sido suficiente pa-ra provocar a ira da classe dominan-te. Ela não expressa uma mudança na política só deste governo, e sim da própria “era Kirchner”, que não tem sido amiga dos trabalhadores e dos pobres argentinos. Seu anteces-sor (e marido, já falecido), Néstor Kirchner, apoiou entusiasticamente a privatização da YPF, em 1992. Ele vendeu para a Repsol a parcela de 5% da YPF que pertencia à província de Santa Cruz, da qual foi governador.

Quando a Repsol aumentou sua participação na YPF para 99%, Nés-tor Kirchner apoiou uma política de “Argentinalização” e insistiu que uma porcentagem deveria ser con-trolada por interesses argentinos. Co-mo resultado disso, o grupo argentino Peterson, de propriedade da família Eskenazi, recebeu 25% das ações da YPF - participação esta que não foi atingida pela recente nacionalização parcial de Cristina.

No governo, o casal Kirchner acu-mulou uma fortuna. Quando Nés-tor Kirchner foi eleito presidente em 2003, a fortuna do casal foi estimada em 2,35 milhões de dólares. Uma vez

argentina: nacionalização da YPf provoca a ira do imperialismo

Cristina Kirchner anuncia nacionalização diante da imagem de Evita Perón

Nacionalização da YPF ficou no meio do caminho, mas indica gravidade da crise

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especial: Argentina • 7 Ofensiva Socialista n°10 maio/junho - 2012

Precisamos de uma YPF 100% estatal sob controle dos trabalhadoresO governo de Cristina Kirchner decidiu que o Estado vai com-prar 51% das ações da Repsol. Em seu projeto, que chamou de “Para a soberania de hidro-carbonetos”, o governo fala em expropriação e nacionaliza-ção da empresa YPF. Fala tam-bém de soberania da nação pa-ra garantir o abastecimento necessário.

La Chispa (CIT Argentina)

Com Menem todas as empresas estatais foram privatizadas. Telefo-nes, eletricidade, água, Aerolíneas Argentinas, a YPF, ferrovias, etc. Uma lei dessa época transferiu pa-ra as províncias os recursos do sub-solo (petróleo, gás, minerais, etc.). O país foi esquartejado.

Grandes empresas multinacionais se apropriaram do espólio a preços baixos, com um único objetivo: ob-ter lucros o mais rápido possível e enviá-los a suas matrizes, enquan-to durasse a festa. Os investimentos necessários, os interesses da popu-lação e o desenvolvimento do pa-ís nunca foram levados em conta.

Nosso país, que era autossuficien-te em petróleo e gás, nos últimos anos tornou-se importador. Nos últi-mos anos, a falta de combustível ele-vou os preços da gasolina e do boti-jão de gás, o que os tornou inaces-síveis para a população mais pobre.

Há muitas perguntas sem respos-ta: Por que a YPF é mantida como uma SA e não totalmente nacionali-zada? Por que a Eskenazi, Repsol e outros acionistas mantém uma parte importante das ações? Por que o go-verno demorou tanto para desapro-priar? Quanto a gasolina, o diesel e o gás vão custar agora? Outras empre-sas multinacionais, incluindo a Pe-trobras (Brasil), Total (França), Te-cpetrol (Grupo Techint), Pan Ame-rican, Bridas, etc., continuarão sa-

queando o nosso petróleo e gás co-mo antes? Como lidar com as re-presálias econômicas da União Eu-ropeia e da Espanha?

Os petroleiros enfrentam o saque há anos

Enquanto o governo nacional (Nestor e Cristina), bem como to-dos os governadores das províncias de petróleo, têm sido cúmplices das empresas petrolíferas, os petrolei-ros da Patagônia tem liderado a lu-ta contra as companhias de petróleo. As greves dos petroleiros que ocor-reram no sul, que começou com a to-mada dos depósitos petrolíferos da Termap em 2005, pavimentou o ca-minho para disputar o rendimento da Repsol e outras empresas.

A resposta do governo foi mui-tas vezes a repressão, perseguição, julgamento e prisão, como aconte-ceu recentemente com o sindicalis-ta Víctor Oñate e vários outros. No ano passado, a própria presidente advertiu os petroleiros de que não permitiria mais bloqueios e ocupa-ções dos campos de petróleo.

Poucos dias depois de anunciar a expropriação, o governo rapidamen-te começou as negociações com os futuros parceiros: Petrobras, a em-presa estatal de petróleo chinês, Bri-tish Petroleum, etc.

Como custear as mudanças necessárias

Há dinheiro para implementar verdadeiras transformações. O go-verno paga bilhões de subsídios aos empresários e aos credores da dívi-da externa. Em vez de discursos in-flamados sobre as Malvinas devem começar por taxar pesadamente to-das as empresas estrangeiras que fa-zem festa no nosso país.

O governo não disse uma palavra sobre como enfrentar represálias in-ternacionais da Espanha, da União Europeia ou dos EUA. Acreditamos que o governo deve dizer claramente que “o governo soberano expropria-rá sem indenização empresas desses países para ressarcir os danos cau-sados pela retaliação econômica”.

Os petroleiros, lutando todos es-ses anos contra as companhias pe-trolíferas, abriram o caminho para recuperar a nossa soberania. Os de-mais trabalhadores e setores popu-lares devem seguir o mesmo cami-nho, o único que pode garantir re-almente a nossa soberania.

Sabemos que a nossa soberania efetiva será fruto de uma luta dura, não só contra o governo e todos os seus cúmplices, que aplaudiram o saque até ontem, mas contra o im-perialismo, tanto ianque quanto eu-ropeu, que durante décadas levaram a sua “cruzada” para controlar o pe-tróleo do mundo.

De Menem a Kirchner, o caminho percorrido levou à pilhagem, à es-cassez e à entrega de todos os nossos recursos naturais. Cabe a nós agora preparar-nos para conquistar nossa segunda independência.

As verdadeiras medidas para recuperar a soberania dos hidrocarbonetos no país

✓ Nacionalização e estatização de todos os hidrocarbonetos, através de expropriação sem indenização de 100% de todas as empresas que operam no setor. ✓ Anulação das leis de 1994 que transferiram às províncias a gestão sobre os recursos naturais assim como de todas as leis, decretos e acordos firmados até hoje com as empresas privadas. ✓ Criação de uma única empresa estatal, nacional e monopolista do petróleo em todo o país. ✓ Estabelecer o controle dos trabalhadores em cada um dos setores e empresas de todos os recursos naturais. ✓ Cancelamento das exportações de petróleo, derivados, gás e todos os tipos de energia até o atendimento das necessidades de consumo interno. ✓ Defesa da democracia sindical para os trabalhadores petroleiros e das demais empresas do setor energético. Reconhecimento da democracia operária nas ações de luta dos trabalhadores por seus direitos e reivindicações. ✓ Gestão sustentável dos recursos naturais privilegiando as necessidades do povo trabalhador, na perspectiva do desenvolvimento da uma matriz energética baseada em energia renovável. ✓ Anulação total da taxação sobre os rendimentos dos trabalhadores. ✓ Aplicação da jornada de trabalho de 8 horas para os petroleiros, sem redução de salários.

no cargo, a riqueza dos Kirchner dis-parou em impressionantes 900% em sete anos. À época da morte de Nés-tor, em 2010, a riqueza deles era ava-liada em 18 milhões de dólares, com 27 casas, apartamentos, lojas e hotéis em seu nome. Enquanto em 2003 a família não tinha interesses comer-ciais na cidade patagônica de El Ca-lafate, em 2010, os Kirchner contro-lavam de 60 a 70% da atividade eco-nômica da cidade!

As medidas tomadas por Cristina Kirchner, muito populares na Argen-tina, são uma intervenção do Estado capitalista para tentar resolver a cri-se energética. Elas foram tomadas em parte para tentar resolver o déficit de energia, devido a falhas da Repsol em desenvolver a indústria. São também uma tentativa do governo de conquis-tar apoio popular agora, de manei-ra a preparar terreno para prováveis novos ataques à classe trabalhadora argentina, num possível contexto de crise econômica.

Para se ter uma ideia dessa táti-ca, Cristina tentou invocar a memó-ria da radical populista nacionalista peronista Evita Peron - anunciando as medidas estatais em frente a uma imagem de uma Evita sorrindo e na presença das Madres de La Plaza de Mayo – o movimento das mães de milhares de desaparecidos durante a ditadura militar.

Esta intervenção demonstra como a classe dominante pode ser obriga-da a mudar sua política e apoiar a in-tervenção do Estado, quando seus in-teresses são ameaçados. Ao fazê-lo, Cristina Kirchner desferiu um gol-pe pequeno contra os interesses do imperialismo espanhol e a sua mul-tinacional Repsol. Ao fazê-lo, ela anunciou a eventualidade de novos e maiores golpes contra outros impe-rialistas e recolocou a questão da na-

cionalização de volta na agenda po-lítica. Isso tem aterrorizado a classe dominante internacionalmente.

Os trabalhadores devem levantar a bandeira de nacionalização

A demanda das nacionalizações agora precisa ser assumida por or-ganizações dos trabalhadores em es-cala internacional. É um passo posi-tivo que a Izquierda Unida na Espa-nha se tenha oposto ao governo espa-nhol e defendido o direito do gover-no argentino de nacionalizar a YPF.

No entanto, como dissemos, a com-pra de 51% das ações da YPF não sig-nifica uma “nacionalização socialis-ta”. Isso ficou claro quando Cristina Kirchner declarou: “O modelo não é estatização, isto é claro, mas a re-cuperação da soberania e do contro-le do funcionamento da economia”. (El País 17/04/12)

O CIT se opõe aos protestos dos políticos imperialistas e capitalistas. Apoiamos todas as medidas reais to-madas contra o imperialismo. Exigi-mos que ações reais sejam tomadas contra o domínio imperialista da eco-nomia e contra os capitalistas nacio-nais que exploram o povo da Argen-tina. Defendemos, portanto, uma na-cionalização socialista e democrática de todo o setor energético. Somos pela nacionalização da Repsol, de todas as multinacionais e de toda a YPF, com compensações a serem pagas somente se for comprovada alguma necessida-de (eventuais pequenos investidores).

O setor de energia nacionalizado deve então ser gerido democratica-mente pelo povo trabalhador da Ar-gentina, como parte de um plano de-mocrático de toda a economia base-ada na nacionalização das principais empresas e do setor financeiro.

argentina: nacionalização da YPf provoca a ira do imperialismo

Nacionalização da YPF ficou no meio do caminho, mas indica gravidade da crise

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8 • estudantil Ofensiva Socialista n°10 maio/junho - 2012

unifesp: para avançar na luta, olhar além do que se vêA Universidade Federal de São Paulo (UNIFESP) foi uma das primeiras Universidades no pro-cesso acelerado de expansão – marco no cenário da educa-ção brasileira no último perío-do – das Universidades Fede-rais, inaugurando o Campus da Baixada Santista em 2006. Um ano depois, em 2007, esse pro-cesso de expansão foi consoli-dado via Programa de Reestru-turação e Expansão das Univer-sidades Federais (REUNI), que veio acompanhado de lutas em diversas federais de todo o Pa-ís, e também na UNIFESP. As-sim, junto com esse novo mo-mento de expansão dos cur-sos de graduação, observamos também um novo momento de mobilização.

Mauricio de Oliveira FilhoEstudante de Serviço Social

na Unifesp – Baixada Santista – C.A. Unificado

De 2007 até hoje, todos os campi passaram por atos, mobilizações, de-bates, greves, consolidação de Cen-tros Acadêmicos, Fórum dos Es-tudantes etc. Houve mobilizações como o movimento Fora Ulysses (2008) - pela saída do Reitor que roubou com o cartão corporativo, que agregou estudantes de todos os campi - e outras mobilizações refer-ente à autonomia e democracia na Universidade, mas desde 2007 até hoje, uma pauta que segue sempre unânime em todos os campi, geran-do diferentes tipo de mobilização, é a pauta por melhor infraestrutu-ra e por uma política efetiva de per-manência estudantil.

No presente e futuro, não há alter-nativa diferente senão a luta, pois a precarização da Universidade está nas entrelinhas dos planos do Gov-erno e Reitoria e, assim, fica eviden-te que a proposta da Universidade é, sim, continuar agravando a situa-ção de sucateamento: o mais recen-te Plano de Desenvolvimento Insti-tucional (PDI), lançado em 2010 e

que vale até 2015, prevê um aumen-to da oferta de vagas de 6.631 para 14.858, contudo o número de auxí-lios permanência previstos para ca-da ano não se altera: 2095 por ano. Quanto à precarização do ensino e/ou ao ensino voltado para o desen-volvimento econômico das grandes empresas, até 2015 está prevista a criação de 15 cursos de curta dura-ção (2 e/ou 3 anos). Há a previsão de criação de moradias estudantis já em 2012. Mas, pelo menos para a Baixada Santista, já há informa-ções da própria direção de que isso não ocorrerá.

Lógica privatista

Há claras evidências de uma lógica privatista crescente: os cursos pagos, o intensivo processo de terceirização de serviços básicos da Universidade e a Fundação de Apoio a Pesquisa (FAP) uma fundação privada que es-tabelece uma relação cada vez mais predadora com a UNIFESP, são ape-

nas alguns exemplos. Além disso, neste ano foi realizada a “Conferên-cia do Futuro”, uma Conferência pa-ra definir o “planejamento estratégi-co” da Unifesp realizada às pressas, sem participação ampla da univers-idade, sem pré conferências etc. En-tre a convocação e a sua realização tivemos menos de um mês. Ela se deu num hotel fazenda, e foi “facil-itada”, por uma empresa de consulto-ria privada - “Sol Maior”. A empresa não possui site na internet e o pro-cesso de licitação é desconhecido.

É preciso olhar para além do que se vê!

Nesses anos, foram muitas as con-quistas, ataques, acertos e erros na luta de trabalhadores e estudantes da UNIFESP. O processo histórico foi levando os estudantes a assum-irem posicionamentos, o que foi tor-nando cada vez mais plural as opin-iões sobre o que fazer, quais estraté-gias assumir, reflexo de um proces-

so de amadurecimento político tanto individual como do coletivo de es-tudantes no movimento. Com todos esses problemas que a UNIFESP vi-vencia, o movimento estudantil seg-ue uma tendência em dar respostas imediatas a questões urgentes, sem se aprofundar na compreensão do que se trata, afinal, o diagnóstico da Universidade. Isso faz com que os debates fiquem restritos a “o que fazer” (greve ou não?; quando fazer ato?), sem que o conjunto dos estu-dantes compreendam de fato o “por quê fazer”.

Para além de favorecer uma tendência a obter apenas vitórias pontuais e parciais, provoca tam-bém um processo de divisão dos estudantes. Essa segregação visível em alguns momentos beneficia ape-nas a Direção e Reitoria, visto que gera desarticulação entre aqueles que outrora mostraram ser capaz-es de responder aos ataques e ob-ter vitórias.

Superar esta segregação, fruto

de concepções políticas e estraté-gias distintas entre os estudantes da UNIFESP é importante, mas tam-bém faz-se necessário superar uma segregação que está colocada por questões físicas e geográficas, que é a relação entre os estudantes de todos os Campi da UNIFESP. Des-de 2007, todos os campi de alguma forma estão lutando por uma melhor infraestrutura e uma política conse-quente e eficaz de permanência estu-dantil. É preciso envolver e articular, compreendendo que a UNIFESP é uma só. Ou seja, embora esses prob-lemas hoje se expressem de forma distinta localmente, fazem parte de um projeto comum da direção da UNIFESP e do Governo Federal.

Aprofundar a discussão e análise dos motivos da precarização da Uni-versidade, com debates entre todos os estudantes e sistematização dos problemas vivenciados nos campi é um caminho importante para que o movimento tome para si maior con-sistência de suas pautas, e consiga avançar na luta por uma educação de qualidade.

Expandir as mobilizações

Hoje, Guarulhos está em greve no-vamente por questões referentes à estrutura e permanência estudantil. Há um grande esforço para expandir a mobilização para os demais cam-pi e, embora de forma incipiente, há sinais de algum resultado. Há mobi-lização da Baixada Santista frente a mudança para o Campus defini-tivo em condições precárias. Os de-mais campi encontram-se em algu-ma medida mobilizados. Um ato no dia 20/04 em frente à reitoria reuniu quatro dos seis campi da UNIFESP, ainda com perspectiva de se massi-ficar a luta.

Para conquis tar melhores condições e por uma educação de qualidade, é fundamental que a lu-ta se espalhe e alcance outros cam-pi e universidades. Essa articulação não pode ser vista como um “trabal-ho a mais”, mas como única forma de conseguir avançar a luta.

uNifeSP-guarulhos em greve!O ano de 2012 começou fer-vendo na Unifesp - Campus Guarulhos. Estudantes come-çaram aulas e não tinham pers-pectiva de saber, aonde estu-dariam ou não. Dizia-se que sa-las seriam liberadas no CEU (Centro Educacional Unifica-do) ao lado do terreno da UNI-FESP, ou ainda que prédios se-riam alugados e os estudantes de determinados cursos seriam separados.

Soluções precárias, reflexo da fal-ta de planejamento universitário. Ou pelo contrário, pela política muito bem planejada da expansão univer-sitária do REUNI.

Os ônibus que garantiam trans-porte dos estudantes ao campus es-tavam superlotados, retirando mais uma “regalia” da UNIFESP da chamada assistência estudantil. O bandejão, da mesma forma, super-

lotava, o calor estava além do su-portável no pequeno puxadinho con-quistado na última greve.

E sim, a última greve. Relembram os veteranos os dizeres da reitoria e da diretoria acadêmica do campus, onde fundos e mundos foram pro-metidos, comprometimento de que a licitação para construção do pré-dio seria imediata, prioritária. Hoje, nada de fato mudou: as concessões de transporte, do RU que serviu de conquistas parciais para alguns estu-dantes não suportavam nem mesmo as necessidades daqueles discentes, e menos ainda com a chegada dos calouros de 2011 e 2012.

Por isso, greve!

Greve por insatisfação, com todo um processo de debate e construção em andamento. Era início do semes-tre para os calouros que aderiram a greve, mas que estavam conhecendo

a universidade ainda. E como con-heceram! A luta está se estendendo aos outros campi, diversos esforços para uma articulação intercampi es-tão sendo levantados, pelo comando de greve e por um grupo articulado de CA’s, mas a discussão é ainda rasa.

De tudo faz a burocracia universi-tária para criminalizar e deslegitimar o movimento dos estudantes, des-de abaixo assinados virtuais envia-dos aos e-mails institucionais e pes-soais pelo fim da greve até moções de repúdio super dramáticas demon-strando o horror e repúdio dos pro-fessores a ações do movimento pa-ra chamar a atenção da diretoria acadêmica e da reitoria para um at-endimento concreto das reivindica-ções dos estudantes. E estas, ao mes-mo tempo que dizem entender e le-gitimar as reivindicações do movi-mento, não abrem uma negociação, demonstrando o “respeito” as man-ifestações estudantis. Assembleia dos estudantes da UNIFESP de Guarulhos

Expandir e unificar as mobilizações na UNIFESP

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opressões• 9 Ofensiva Socialista n°10 maio/junho - 2012

Descriminalização do aborto em caso de anencefalia

Pela legalização integral do aborto – a luta continua!Esse ano a luta das mulheres teve uma vitória no dia 12 de abril! Mas essa é apenas uma vitória parcial. Depois de dois dias de discussão o Supremo Tribunal Federal (STF) aprovou por 8 votos a 2 a descrimina-lização do aborto em caso de anencefalia.

Flávia Ribeiropsicóloga e militante do

Movimento Mulheres em Luta

No Brasil, a descriminalização do aborto em dois casos específicos esta prevista na Constituição Federal: es-tupro ou risco de morte da mãe. No entanto, mesmo nestes casos, não há garantia de acesso a uma inter-rupção, mesmo a mulher compro-vando o seu estado de desgraça ou morte eminente. Nos casos de anen-cefalia, muitos profissionais se re-cusavam a realizar o procedimen-to, mesmo com a autorização judi-cial, a anencefalia era analisada ca-so a caso com ações demoradas na justiça, resultando várias vezes nu-ma gestação completa onde a deci-são favorável para a interrupção te-rapêutica era julgada após o nasci-mento do feto, onde ai literalmente falando, “Inês já é morta”.

Processo durou 8 anos

Vale lembrar que a Confederação Nacional de Trabalhadores da Saú-de ingressou com uma ADPF 54 – Ação de Descumprimento de Di-reito Fundamental – em 2004 e só agora, passados 8 anos que o Su-premo debruçou-se sobre o tema, depois de dois dias de intensos de-bates. É interessante observar que os votos contrários afrontam dire-tamente os preceitos fundamentais

da Constituição Federal que garan-tem a não interferência da religião no Estado, que garantem o direito a vida e a dignidade da pessoa huma-na, da saúde, da privacidade da mu-lher. Esta afronta reflete uma posi-ção conservadora que se iniciou na campanha de Dilma, onde a bandei-ra pela legalização e descriminaliza-ção do aborto foi usada como moe-da de troca para garantir sua eleição e uma falsa governabilidade.

Tais fatos nos colocam de volta ao tema da discussão onde fazemos várias perguntas, afinal, acreditamos que a mulher que queira ter filhos tem TODO esse direito e o Estado deve garantir-lhe condições para tê--lo, com um acompanhamento no serviço público de saúde e na assis-tência social! Mas fica a pergunta: e a que não quer!? E a vida dessa mu-lher? Ela não pode ter nenhuma rela-ção sexual? E se tem, não pode deci-dir pelo seu corpo? E a que engravi-da e descobre que terá um filho anen-céfalo? Tudo bem ela ter uma gra-videz de risco e poder morrer junto com seu filho? Tudo bem ela gestar 9 meses um filho que não vai viver mais de uma hora por malformação, tendo praticamente uma “gravidez funeral”? E a vida dessa mulher!? E a saúde dessa mulher!? Saúde físi-ca e mental... na verdade DESSAS mulheres, pois milhares de mulheres morrem em consequência de abortos clandestinos e complicações do par-to todos os anos, para além dos casos de anencefalia! Por isso somos a fa-vor da legalização do aborto!

Por quem lutamos

Lutamos hoje pelo direito das mu-lheres, que estão inseridas numa cul-tura que valoriza amplamente o pro-cesso de gestação em suas vidas, co-

mo se elas nascessem apenas pra is-so, como se a gravidez fosse uma missão, um dever.

Lutamos pelas mulheres que não querem ter mais filhos, devendo se submeter a uma moral que não per-mite que elas digam não a seus par-ceiros na hora do sexo, e ao mesmo tempo lhes proíbem o uso do mais básico dos contraceptivos que é a camisinha. Lutamos pelas mulhe-res que enfrentam um Estado mui-tas vezes omisso e até mesmo opres-sor, que vira as costas para seus di-reitos de uma saúde plena para sub-meter-se à valores religiosos. Luta-mos pelo direito das mulheres pe-los seus corpos e pelo direito à de-cisão sobre se querem ou não con-tinuar com uma gestação, sendo ela de risco ou não.

Lutamos também, pela saúde das mulheres que querem ter seus filhos, mas, infelizmente, o feto é anencé-falo. Lutamos pela preservação da saúde mental e física dessas mulhe-res. Quando dizemos saúde física, nos referimos ao fato dessa gravi-dez trazer sérios malefícios à mulher, como por exemplo, hipertensão ar-terial, excesso de líquido amniótico com consequente hiperdistenção do útero, o que pode levar a grandes he-morragias. Quanto à saúde mental, nos referimos à tortura que é pra uma mulher não poder cuidar do seu filho quando ele nascer, não poder acari-ciá-lo, dar banho, amamentar, vê-lo correr, brincar e amá-lo como dese-ja. Pois, nada deve ser tão deprimen-te e mortífero pra uma mulher que

quer ser mãe, sentir seu filho cres-cendo dentro dela e não poder segu-rá-lo no colo, vê-lo viver, por conta desta malformação.

Vale salientar que a decisão do STF não obriga nenhuma mulher a interrupção terapêutica, sendo es-ta uma gravidez anencefálica. Ela apenas assegura que, pelo menos, nos casos permitidos por lei, de es-tupro, risco de morte pra mãe e ago-ra anencefalia, haja o DIREITO DE ESCOLHA!

A vitória é ainda parcial

Apoiamos a decisão majoritária do STF neste caso, mas não pode-mos deixar de analisar que é uma vitoria parcial, pois a mesma justi-ça burguesa que votou favorável a

anencefalia, também absolveu re-centemente um pedófilo com o ar-gumento de que as três meninas de 12 anos já eram prostitutas na oca-sião dos fatos. Como se com prosti-tutas pode-se fazer o que quiser in-dependente da idade. Caso estas me-ninas engravidassem, lhes seria ne-gado o direito ao aborto, já que não se caracterizou um estupro.

Ainda há muito que lutar e con-quistar para que tenhamos uma so-ciedade igualitária e as mulheres re-almente consigam ter mais direitos que um feto. Mas o fundamental pa-ra todas estas lutas é lhe garantir o direito a vida com dignidade, como afirma o lema da campanha nacional das mulheres do PSOL: não há vida digna para as mulheres com violên-cia e sem direitos.

A anencefalia é uma malformação fetal grave que resulta na ausência total do cérebro, calota craniana e couro cabeludo impossibilitando que o feto sobreviva depois de nascer. A anencefalia, ou a tal malformação, pode ser descoberta já nos primeiros três meses de gestação, sendo esse um diagnóstico extremamente preciso através de exames simples como o ultrassom. A maioria desses fetos acaba morrendo dentro do útero em poucos meses de gestação.

Pelo direito ao aborto legal – a luta continua!

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10 • PSOL e as eleições municipais Ofensiva Socialista n°10 maio/junho - 2012

A pré-candidatura de Renan Palmeira para a prefeitura de João Pessoa ganhou grande re-percussão na sociedade parai-bana e está mexendo nas es-truturas do PSOL municipal. Ele pode ser o primeiro candi-dato a cargos executivos assu-midamente gay – da direção do Movimento Espírito Lilás (MEL) – e é um militante combativo em vários movimentos sociais da Paraíba.

Marcio SilvaLSR João Pessoa

O PSOL em João Pessoa vivia até este ano um momento de estagnação. Após grandes disputas destrutivas e pouco politizadas em torno do pe-núltimo Congresso do PSOL, o par-tido funcionou de forma burocráti-ca e apenas às vésperas de eleições. Ele aparecia para o grande públi-co como mais um partido entre tan-tos, sem um programa claro, e mui-tos candidatos a vereador e deputa-dos com nenhuma identificação com uma ideologia de esquerda.

Através de importantes lutas na cidade, como contra o aumento das passagens, contra a entrega da saú-de para a iniciativa privada, as lu-tas pela moradia, entre outras, al-guns militantes do PSOL sentiram que podiam mudar o quadro do par-tido baseado nas demandas do movi-mento dos trabalhadores, estrutura-do socialmente na luta cotidiana do povo. Construímos o núcleo Educa-

ção e Luta Social com companheiros de várias correntes e independentes. Foi este núcleo que lançou a propos-ta da candidatura de Renan.

Renan é muito jovem, apenas 25 anos, mas experimentado em diver-sos combates da luta de classes. Apa-receu bastante na mídia local, porque é uma das principais figuras na luta pelos direitos da comunidade LGBT e foi peça chave do núcleo.

Em uma plenária em 25 de março o partido escolheu Renan como pré--candidato. Desde então a impren-sa local e nacional se interessou na curiosa notícia (e para os homofóbi-cos enrustidos, a engraçada notícia) e o PSOL teve uma exposição rara para um partido de esquerda.

Na conservadora sociedade parai-bana, apenas a notícia de um candi-dato gay a prefeito gera rejeição em massa. Por isso, o PSOL terá um

grande enfrentamento ideológico nesta campanha. Por outro lado, o comitê da pré-candidatura tem cla-ro que a campanha não pode cair na armadilha de se restringir a questão LGBT. Ela deve dialogar com todos os setores dos trabalhadores pesso-enses. Por isso, ela já nasceu com o apoio de vários movimentos e luta-dores de sindicatos e entidades, in-clusive de lutadores da Assembleia Popular e da intelectualidade de es-querda das universidades públicas.

Internamente, a pré-candidatura tem superado as expectativas, atrain-do antigos filiados e militantes, unin-do novamente o partido, reconstruin-do-o de forma efetiva e a longo pra-zo. Fazia tempo que o clima de ami-zade, união e vontade de construção unitária não aparecia desta forma.

Politizar para se diferenciar

Nesta campanha, para o PSOL se diferenciar dos outros partidos e dia-logar com os trabalhadores que so-frem no dia a dia, ele deve assumir o mesmo papel que tem nas lutas nas épocas longe das eleições: levantar as reivindicações dos movimentos, de-nunciar os governos pelo seu papel de representantes dos ricos e apre-sentar um programa de ruptura com os projetos de “gestão” que os parti-dos burgueses propõem. O marketing eleitoral tem a capacidade de atingir as massas com mais facilidade na so-ciedade capitalista, mas funciona para quem trabalha com campanhas com

rios de dinheiro, quem quer enga-nar para continuar gerindo o capital, quem tem compromissos com os mi-lionários doadores. Para o PSOL, ele só serve para nos igualar com os po-líticos profissionais que o povo xinga diariamente nas conversas de esqui-na , em casa e nos locais de trabalho.

Nós devemos assumir o discurso de explicar às massas o porque os serviços públicos não funcionam, o porque do transporte público mas-sacrante, o porque que o povo mo-ra em péssimas condições – o que, é claro, não acontece por “incompe-tência na gestão”.

Quando o PSOL reduz o programa com a desculpa de dialogar com “se-tores mais amplos” e assume um dis-

curso de gestão da prefeitura, nós es-tamos competindo de forma desigual com os profissionais das eleições e, o pior, perdemos grande chance de levar um discurso de ruptura de es-querda para setores amplos dos tra-balhadores.

Em João Pessoa, a expectativa é construir um programa com os mo-vimentos e apoiadores vindos das lutas sociais. Haverá vários seminá-rios de discussão programática para a formação do discurso da campa-nha de Renan. Será a grande chan-ce de construirmos um programa que aglutine os lutadores e chame para nosso voto e, principalmente, para a nossa luta, amplos setores dos tra-balhadores.

Ocupação Terra Livre em João PessoaOcupamos porque não temos casa!

Nós, 100 famílias do Movimen-to Popular Terra Livre que ocupa-mos desde sábado (21/4) um ter-reno público no Roger, somos ci-dadãos de João Pessoa e moráva-mos de aluguel, em casas de paren-tes ou em áreas de risco.

Não temos condições econômi-cas de pagar o aluguel cobrado na cidade, muito menos de comprar um imóvel. O mercado imobiliá-rio sufoca o povo pobre.

Os planos habitacionais dos go-vernos são insuficientes, deixando

milhares de famílias em uma fila interminável. Alguns de nós espe-raram a vida toda por uma provi-dência da Prefeitura. O Minha Ca-sa Minha Vida ajuda as construto-ras, mas não a população carente que mais precisa.

A ocupação é uma saída concre-ta para nosso problema.

Queremos construir as nos-sas casas pacificamente e con-tamos com o poder público pa-ra nos dar condições de garantir nosso direito.

Ofensiva Socialista falou com José Afonso da Silva, militante da Liberdade, Socialismo e Re-volução e pré-candidato a vere-ador pelo PSOL em Taboão da Serra (SP).

LSR: Explique como se deram os escândalos de corrupção em Taboão da Serra

Afonso: Em maio de 2011 todos

fomos surpreendidos com a prisão de três vereadores de Taboão da Ser-ra, transmitida ao vivo pela mídia em plena sessão da Câmara Muni-cipal. Foram acusados de formação de quadrilha para desviar dinheiro do IPTU, sendo que, de acordo com as investigações da seccional de Ta-boão da Serra, desviaram mais de um milhão dos cofres públicos somen-te em 2011.

Mas, esse escândalo foi apenas a ponta do iceberg. A investigação que começou com a descoberta de uma quadrilha para saquear o dinheiro do IPTU, avançou para aluguel de car-ros pela Câmara, cancelamento das multas de trânsito, fraude da outor-ga onerosa, desvio de 220 mil reais da folha de pagamento do funciona-lismo e do ISS, escândalos na secre-taria de cultura, saúde, etc.

São mais de 20 inquéritos que le-varam quatro vereadores para a pri-são, três secretários e vários funcio-nários da prefeitura. De acordo com a polícia civil do município o rombo

nos cofres públicos pode ultrapassar os 30 milhões de reais.

LSR: E qual o envolvimento do

prefeito nesses escândalos? Afonso: Num primeiro momento,

o Prefeito Evilásio Farias posou de herói, como aquele que teve a cora-gem de denunciar a quadrilha insta-lada na prefeitura. No entanto, à me-dida que avançavam as investigações ficou claro que, no mínimo Evilásio, foi omisso, pois é inadmissível que nos últimos anos vereadores, secre-tários e funcionários de confiança roubassem os cofres da prefeitura e o prefeito de nada soubesse. Portan-to, ou ele foi omisso, negligente ou incompetente. Ele mesmo declarou à imprensa regional em Convenção do PSB no município, em novembro de 2011, que o desvio do dinheiro público ultrapassou os oito milhões.

LSR: Você assinou a representa-

ção pedindo o impeachment do pre-feito – por que os vereadores não afastaram o prefeito?

Afonso: Após os escândalos de

corrupção foi formado o Comitê de Luta Contra a Corrupção em Taboão da Serra, que contou com a participa-ção da APEOESP, do MTST, da Co-missão Independente de Professoras ADIs, da Ação Popular, do PSOL e do PSTU.

Eu como um dos coordenadores

do Comitê, fui indicado para proto-colar junto a Câmara Municipal a re-presentação por infração político ad-ministrativa contra o prefeito Evilá-sio Farias. Infelizmente, o PT, atra-vés do vereador Wagner Ecstein, sal-vou a pele do prefeito engavetando a representação.

Para nós não foi surpresa, até porque a Câmara Municipal votou a criação da zona azul, aumento do IPTU, CIP, retirada de direitos do funcionalismo, etc. Tudo isso por unanimidade. A Câmara Municipal se tornou uma sucursal do prefeito, aprovando os projetos sem sequer ler e prevaricando ao não cumprir seu papel de fiscalizador do executivo.

LSR: Você hoje é pré-candidato a vereador pelo PSOL em Taboão da Serra. Quais foram as razões para essa decisão?

Afonso: Bom, na verdade essa de-

cisão foi coletiva e não minha. Com-panheiros ligados aos movimentos populares da cidade levantaram es-sa possibilidade ainda em 2011, uma vez que na Câmara Municipal não havia representantes desses movi-mentos. Após as grandes mobiliza-ções contra a corrupção que aconte-ceram no município em 2011, onde joguei um papel de coordenação da-quela luta, a proposta se fortaleceu.

Companheiros do MTST, professo-res e professoras da Apeoesp, setores do funcionalismo municipal, militan-tes do PSOL e munícipes que acom-panharam as ações do Comitê de Lu-ta Contra a Corrupção começaram a colocar a necessidade da candidatura.

LSR: Sua candidatura estaria a

serviço desses setores? Afonso: Sim! Penso que campa-

nha eleitoral é um espaço importan-te para apresentar a um público mais amplo as bandeiras dos trabalhado-res, da juventude, do funcionalismo e dos movimentos sociais da cidade.

Mas também é importante utili-zar o processo eleitoral para expli-car ao conjunto da população mais pobre que os problemas existentes nas áreas da saúde, educação, sane-

amento básico, transporte e falta de moradia, se devem às políticas neo-liberais aplicadas pelos governos fe-deral e estadual que também são le-vadas a cabo no município. Políti-cas essas que priorizam o enriqueci-mento das empreiteiras, imobiliárias e grandes empresas, em detrimento dos serviços públicos e da popula-ção mais pobre. Esses interesses as-sociados a grandes esquemas de cor-rupção agravam ainda mais esse qua-dro dramático.

Uma campanha baseada na mobi-lização popular é capaz de esclarecer à maioria da população que os candi-datos dos partidos de direita, sejam eles da situação ou da oposição, são farinha do mesmo saco e que uma vez eleitos defenderão os interesses dos poderosos e, é claro, os seus pró-prios interesses.

LSR: O PSOL apresentará candi-

dato a prefeito? Afonso: O PSOL lançará o com-

panheiro Stan Szermeta como resul-tado deste processo concreto de uni-dade lutas. Mas o processo de esco-lha do companheiro Stan se dá de forma mais ampla, onde os compa-nheiros do PSTU jogam um papel fundamental na formação da Fren-te de Esquerda em Taboão da Serra.

A Frente de Esquerda é a única ca-paz de apresentar uma alternativa ao governo corrupto de PSB, ao tucana-to e à falsa alternativa do PT.

Militante LGBT candidato a prefeito do PSOL em João Pessoa

Militante da LSR candidato a vereador em Taboão da Serra

uma candidatura para levantar as bandeiras dos trabalhadores

Renan Palmeira

José Afonso da Silva

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internacional • 11 Ofensiva Socialista n°10 maio/junho - 2012

Joe Higgins: um mandato dos trabalhadores no parlamentoEsta entrevista o deputado do Partido Socialista da Irlanda, Joe Higgins, foi realizada em Nieuwpoort na Bélgica, em ja-neiro desse ano, durante a reu-nião do Comitê Executivo Inter-nacional do Comitê por uma In-ternacional dos Trabalhadores (CIT). A entrevista foi feita por Luciano da Silva Barboza.

L: Como um candidato trotskista, apresentando o programa do CIT, conseguiu relacionar as lutas fei-tas pela classe trabalhadora irlan-desa com o processo eleitoral, con-seguindo chegar à vitória no parla-mento europeu e, mais recentemen-te, no Parlamento irlandês pela se-gunda vez?

JH: O Partido Socialista da Irlan-da é um pequeno partido, mas nos posicionamos claramente nos assun-tos que atingem a classe trabalhado-ra na sua vida cotidiana. Atualmente existe uma grande ofensiva de aus-teridade por parte dos governos ca-pitalistas como o irlandês, que quer recuperar terreno com medidas neo-liberais, retirando os direitos que os trabalhadores ganharam lutando du-rante o auge econômico europeu (Es-tado de bem estar social 1960-1980).

Lutamos contra os cortes sociais promovidos pelos neoliberais que pioraram o nível de vida dos traba-lhadores, principalmente em setores como saúde, educação e habitação. Participamos de campanhas concre-tas contra essas medidas neoliberais de austeridade fiscal e estamos dire-tamente ligados à luta da classe tra-balhadora irlandesa. Explicamos na nossa campanha eleitoral que pa-ra melhorar a vida da classe traba-lhadora temos lutar contra o siste-ma capitalista.

Durante a campanha eleitoral, nos colocamos como os principais oposi-tores dos interesses dos banqueiros. Colocamos também que somos con-tra a propriedade privada e a favor da propriedade pública sob o controle dos trabalhadores. A campanha ex-pôs ainda abertamente a perspecti-va internacionalista, pois acredita-mos ser necessário fazer a luta em toda a Europa, pois os bancos envol-

vidos na crise econômica são mul-tinacionais.

Explicamos na campanha que o sistema capitalista é um sistema de crises econômicas que só pode so-breviver nesses momentos retiran-do os direitos da classe trabalhado-ra, e por isso apresentamos o socia-lismo como solução para o fim des-sa exploração.

Conseguimos unir as lutas pelas necessidades básicas diárias com a luta contra o sistema capitalista. As pessoas votaram no Partido Socia-lista não porque eram todas a favor do socialismo, mas porque fomos os mais ativos militantes nas lutas con-tra as medidas neoliberais, a popu-lação irlandesa reconheceu através do voto que estamos, como parte do CIT lutando contra o neoliberalismo há décadas na Irlanda.

L: Explique um pouco da sua his-tória antes de ser eleito.

JH: Em 1997 eu fui eleito depu-

tado federal pelo Partido Socialis-ta para o parlamento irlandês, mas em 2007 eu não consegui me reele-ger. Em 2009 eu fui o candidato pe-lo Partido Socialista irlandês a de-putado no parlamento europeu e fui eleito. Em fevereiro de 2011, nova-mente nas eleições do parlamento ir-landês, eu fui eleito deputado irlan-dês novamente.

Assumi o mandato de deputado na Irlanda e por isso fui obrigado a en-tregar o mandato de deputado euro-peu para o camarada Paul Murphy que segue fazendo campanhas con-tra as medidas neoliberais, ajudando na luta da classe trabalhadora e le-vando suas posições para o interior do parlamento europeu.

L: Na atuação cotidiana no par-lamento europeu você ficou isolado politicamente ou conseguiu se unir a deputados de esquerda?

JH: Participei de uma frente com 34 deputados europeus entre can-

didatos verdes e candidatos de es-querda, mas essa era a menor frente do parlamento europeu. Dessa fren-te participaram os membros eleitos pelo Bloco de Esquerda de Portugal, assim como os membros dos Par-tidos Comunistas de Portugal e da Grécia, além de membro do partido Die Linke (A Esquerda) da Alema-nha e do Syriza da Grécia.

Fizemos na medida do possível campanhas junto com esses deputa-dos. A principal delas foi em 2010 contra as medidas de austeridade ne-oliberais. Em 2011 o deputado eu-ropeu Paul que me substituiu, fez uma bela campanha de solidarieda-de à crítica situação dos palestinos na Faixa de Gaza, criticando a vio-lência feita pelo Estado de Israel.

L: Por favor, faça um panorama da situação econômica da Irlanda em 2011 e das principais lutas da classe trabalhadora irlandesa.

JH: A situação econômica é uma catástrofe, pois existe uma grande crise econômica que não vai aca-bar tão cedo, esta é a pior crise do capitalismo desde 1929, e o pior é que os governos capitalistas insis-tem que os trabalhadores devem pa-gar as contas desta crise feita pelos donos de bancos.

Os bancos especularam muito na Irlanda, perderam dezenas de bilhões de euros especulando, e agora esses mesmos especuladores querem que o governo irlandês assuma esses bi-lhões de euros de dívida, que deve-rá ser paga pela classe trabalhado-ra através do plano de austeridade e dos cortes sociais.

Os capitalistas querem lançar a classe trabalhadora na miséria, a ta-xa de desemprego atingiu 14,5% na Irlanda em 2011. Apesar dessa situ-ação, não podemos afirmar que hou-ve grandes mobilizações sociais na Irlanda em 2011, mas é possível um processo de mobilização de massas da classe trabalhadora em 2012, por-que será aprovada uma nova taxa na Irlanda (todas as casas vão pagar

inicialmente uma taxa de cem eu-ros, não importando se os morado-res são pobres ou ricos, com o tem-po a taxa crescerá mais ainda) que vai piorar a situação da classe traba-lhadora e nós do Partido Socialista vamos fazer uma grande campanha que pode gerar as primeiras lutas de massas contra essas medidas neoli-berais. Essa será a principal meta de lutas em 2012.

L: Como você percebe a possibi-lidade do ressurgimento de lutas in-ternacionais em um cenário de crise global do sistema capitalista?

JH: Nós marxistas temos que sempre adotar uma política interna-cionalista, e infelizmente atualmen-te não existe um partido de massas da classe trabalhadora internacio-nal que possa lançar uma campa-nha mundial poderosa de solidarie-dade aos trabalhadores e de comba-te às medidas neoliberais.

Nós do CIT somos uma parte pe-quena, mas importante desta luta in-ternacional e faremos isso dentro das nossas forças em cerca de 40 países em todos os continentes onde esta-mos organizados. Precisamos dar respostas internacionalistas aos pro-blemas do sistema financeiro inter-nacional e nossa resposta é a divul-gação do socialismo com liberdade como solução para a crise do capital.

O Comitê por uma internacional dos Trabalhadores é uma

organização socialista com presença em mais de 40 países,

em todos os continentes. A LSR é a seção brasileira do CIT.

Visite os sites do CIT:www.socialistworld.net

www.mundosocialista.netJoe Higgins, atualmente no Parlamento irlandês, na luta contra um novo imposto domiciliar, igual para ricos e pobres. À sua esquerda a outra deputada do Partido Socialista irlandês, Clare Daly

Joe Higgins no Parlamento Europeu denunciando a política “anticrise” às custas dos trabalhadores: “Pelo fim da ditadura dos mercados”,“Resgate do FMI e União Europeia: privatizações, cortes e desemprego”

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Preço: R$ 1,50 • Solidário: R$ 3,00

N° 10 maio/junho 2012

Acesso o nosso site:

www.lsr-cit.orge-mail: [email protected]

telefone: (11) 3104-1152

Os desafios da CSP-Conlutas em seu 1° Congresso NacionalO I Congresso Nacional da CSP-Conlutas será realizado de 27 a 30 de abril em Suma-ré, São Paulo. Este Congresso ocorrerá numa conjuntura de agravamento da crise econômi-ca mundial.

Miguel LemeDiretor da Apeoesp e

da Executiva Nacional da CSP-Conlutas

O centro da crise econômica mun-dial, neste momento, tem sido a dí-vida pública europeia. A receita da burguesia europeia tem sido a mes-ma: demissões de funcionários pú-blicos, redução nos salários e no va-lor das aposentadorias e cortes de re-cursos para os setores sociais como saúde e educação.

Um das consequências imediatas da crise econômica para os trabalha-dores europeus tem sido o aumento do desemprego. Desde 2008, houve um aumento de 46,8% no número de desempregados.

Outra consequência tem sido o crescimento no índice dos suicídios. Na Grécia, o índice entre homens au-mentou mais de 24% entre 2007 e 2009. Na Irlanda, no mesmo período, houve um aumento de mais de 16% nos suicídios de homens. Na Itália, os suicídios motivados por dificulda-des financeiras, subiram de 123 em 2005 para 187 em 2010. Segundo es-pecialistas da burguesia, a tendência é que estes índices aumentem à me-dida que os governos implementem medidas de mais austeridade.

Os trabalhadores resistem

Entretanto, esses ataques não têm ocorrido sem uma forte resistência por parte dos trabalhadores. Só na Grécia, nos últimos dois anos, fo-ram realizadas mais de 15 greves gerais. Apesar de todas essas lutas, o fato concreto é que os trabalhado-res gregos não têm conseguido der-rotar todos esses ataques. Isso ocor-re devido ao papel não consequente por parte das centrais sindicais e pe-la ausência de uma alternativa políti-ca com influência junto a massa dos trabalhadores que coloque de forma concreta a necessidade de tomada do poder numa perspectiva socialista.

No Brasil, o governo Dilma tem tomado medidas de ataques para minimizar o impacto da crise eco-

nômica mundial no país. As princi-pais foram as seguintes: corte de R$ 50 bilhões em 2011 e de R$ 55 bi-lhões no orçamento de 2012, con-gelamento do salário do funciona-lismo federal por 10 anos, privati-zação dos aeroportos, criação de um fundo complementar de previ-dência para o funcionalismo fede-ral e a perspectiva de uma nova re-forma da previdência.

Apesar de todos esses ataques, 2011 foi um ano foi de muitas lu-tas por parte da classe trabalhadora brasileira. As principais foram as se-guintes: rebeliões nas obras do PAC, protestos de bombeiros no Rio de Janeiro, greves de vários setores do funcionalismo federal, bancários, correios e de milhares de trabalha-

dores em educação em quase todos os estados.

Em 2012 também começou com muitas lutas, como as greves das po-lícias na Bahia e no Rio de Janeiro, manifestações em Brasília do fun-cionalismo federal, greve nacional de três dias convocada pela CNTE e uma forte greve da saúde estadual no Rio Grande do Norte; e mais re-centemente, greves dos operários da construção civil em obras do PAC; e em particular dos trabalhadores da hidrelétrica de Belo Monte, em gre-ve desde o dia 23 de abril.

Apesar de todas essas fortes lutas, o fato concreto é que elas têm ocor-rido de forma fragmentada. Apesar do papel no sentido de unificá-las, a nossa Central é ainda muito pequena

para poder influenciar o conjunto dos trabalhadores da cidade e do campo.

A ruptura do Conclat foi uma der-rota para o conjunto da classe traba-lhadora brasileira, pois poderíamos estar num outro patamar de enfren-tamento a esses ataques, caso tivés-semos saído deste espaço com uma central sindical e popular unitária.

Para nós do Bloco de Resistência Socialista, do qual a LSR faz parte, um dos desafios fundamentais que está colocado para o I Congresso da CSP-Conlutas será o de aprovar um plano de ação que vise contribuir para a unificação de todas essas lu-tas e continuar investindo no proces-so de reorganização da nossa classe, com setores que estiveram presen-tes ou não no Conclat para que te-

nhamos uma central sindical e po-pular unitária.

Mas para que a CSP-Conlutas con-tinue sendo este polo progressivo no processo de reorganização, é neces-sário sinalizações importantes para que novos setores venham participar da nossa Central. Uma delas seria a mudança do nome da nossa Central de CSP-Conlutas para Central Sin-dical e Popular. Outra medida sen-sata também seria o setor majoritá-rio da CSP-Conlutas recuar de sua proposta de reduzir a Executiva dos atuais 27 membros para 17. Se nós queremos que novos setores e enti-dades do movimento sindical e po-pular se incorporem à Central, essa proposta vai no sentido contrário.

Investir no processo de reorganização

Além de investir no processo de reorganização, é necessário que o I Congresso da CSP-Conlutas tenha posição sobre as eleições munici-pais deste ano. É fundamental que seja aprovada uma resolução afir-mando que a CSP-Conlutas intervi-rá no processo eleitoral levantando as demandas dos trabalhadores em torno dos problemas locais concre-tos, como moradia, saúde pública, educação e a situação dos servidores.

A partir disso, a CSP-Conlutas deve apoiar iniciativas nos municípios que impulsionem a construção de Frentes de Esquerda e dos trabalhadores, en-volvendo ativistas e movimentos so-ciais combativos e independentes do governo e dos patrões. Os materiais da Central devem ter claramente uma postura de oposição de esquerda à po-lítica neoliberal do governo Dilma e à herança lulista, além aos governos estaduais e municipais, e defender o nosso programa geral anticapitalista e socialista fazendo o vínculo com os problemas locais.

Outro desafio importante está re-lacionado ao debate sobre saúde e se-gurança do trabalhador. A CSP-Con-lutas deve aprovar em seu I Congres-so Nacional uma resolução que am-plie e fortaleça o trabalho da Cen-tral neste setor.

Para finalizar, é necessário criar as condições para que haja uma integra-ção plena do movimento popular à Central. Essa integração passa por garantir as condições políticas e es-truturais para a participação das de-legações do movimento popular em todas as instâncias da Central.

O Congresso da CSP-Conlutas deve servir para fortalecer a unidade na luta contra governos e patrões