ofensiva socialista n°14 - maio/junho 2013

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Preço: R$ 1,50 • Solidário: R$ 3,00 Jornal da LSR N° 14 maio/junho 2013 Seção brasileira do Comitê por uma Internacional dos Trabalhadores (CIT) Tendência do PSOL site: www.lsr-cit.org • e-mail: [email protected] • telefone: (11) 3104-1152 Marcha do dia 24 de abril: o primeiro passo foi dado pág 03 Jornada Nacional de Lutas da Resistência Urbana pág 03 Educação em greve! pág 05 O IV Congresso do PSOL e as eleições de 2014 pág 06-7 Guerra entre Estados pelos Royalties – e o povo com isso? pág 07 Feliciano e o fundamentalismo religioso pág 09 Thatcher: uma obstinada combatente da classe capitalista pág 11 Inflação e estagnação não se combate com elevação de juros, privatização, cortes e repressão Em defesa do salário, emprego, serviços públicos e do direito de greve Nos anos 80 era bastante comum ir ao supermercado e se surpreen- der com a alta dos preços de um dia para outro. As famílias estoca- vam o que conseguiam com medo da escassez. Hoje, em 2013, não é mais possível esconder a retoma- da da inflação no país. A situação não é a mesma, mas o preço do to- mate chegou a superar o preço da carne e de outros alimentos, atin- gindo um patamar de alta de 122%. Ainda estamos longe de um cená- rio dos anos 80, no entanto o cená- rio mundial, e a politica governista, não nos anima em relação às saí- das e a possibilidade da retomada de crescimento. Jane Barros Não é mais possível esconder o sol com a peneira. Em março a taxa de inflação chegou a 6,59% superando o teto da me- ta de 6,5%. O Copom (Comitê de políti- ca monetária) do Banco Central aumen- tou a taxa Selic para 7,5%. O aumento de juros, segundo eles, tenderia a diminuir a demanda, o que levaria a redução dos preços. O objetivo do BC é manter a in- flação na faixa de 4,5%, com dois pontos de tolerância (para mais ou menos). Car- los Eduardo de Freitas, ex-diretor do Ban- co Central (BC), defende a tese de que vivemos hoje um momento de estagna- ção econômica com inflação: estagflação. Não vivemos hoje uma situação de au- mento do desemprego, ainda assim cres- ce a precarização e flexibilização dos di- continua na página 2 NÃO À AGENDA NEOLIBERAL DE DILMA

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Jornal da Liberdade, Socialismo e Revolução, corrente do PSOL e seção brasileira do Comitê por uma Internacional dos Trabalhadores

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Page 1: Ofensiva Socialista n°14 - maio/junho 2013

Preço: R$ 1,50 • Solidário: R$ 3,00 Jornal da LSR

N° 14 maio/junho 2013

Seção brasileira do Comitê por uma Internacional dos Trabalhadores (CIT)

Tendência do PSOL

site: www.lsr-cit.org • e-mail: [email protected] • telefone: (11) 3104-1152

Marcha do dia 24 de abril: o primeiro passo foi dado

pág 03

Jornada Nacional de Lutas da Resistência Urbana

pág 03

Educação em greve!

pág 05

O IV Congresso do PSOL e as eleições de 2014

pág 06-7

Guerra entre Estados pelos Royalties – e o povo com isso?

pág 07

Feliciano e o fundamentalismo religioso

pág 09

Thatcher: uma obstinada combatente da classe capitalista

pág 11

Inflação e estagnação não se combate comelevação de juros, privatização, cortes e repressão

Em defesa do salário, emprego,serviços públicos e do direito de greve

Nos anos 80 era bastante comum ir ao supermercado e se surpreen-der com a alta dos preços de um dia para outro. As famílias estoca-vam o que conseguiam com medo da escassez. Hoje, em 2013, não é mais possível esconder a retoma-da da inflação no país. A situação não é a mesma, mas o preço do to-mate chegou a superar o preço da carne e de outros alimentos, atin-gindo um patamar de alta de 122%. Ainda estamos longe de um cená-rio dos anos 80, no entanto o cená-rio mundial, e a politica governista, não nos anima em relação às saí-das e a possibilidade da retomada de crescimento.

Jane BarrosNão é mais possível esconder o sol com

a peneira. Em março a taxa de inflação chegou a 6,59% superando o teto da me-ta de 6,5%. O Copom (Comitê de políti-ca monetária) do Banco Central aumen-tou a taxa Selic para 7,5%. O aumento de juros, segundo eles, tenderia a diminuir a demanda, o que levaria a redução dos preços. O objetivo do BC é manter a in-flação na faixa de 4,5%, com dois pontos de tolerância (para mais ou menos). Car-los Eduardo de Freitas, ex-diretor do Ban-co Central (BC), defende a tese de que vivemos hoje um momento de estagna-ção econômica com inflação: estagflação.

Não vivemos hoje uma situação de au-mento do desemprego, ainda assim cres-ce a precarização e flexibilização dos di-

continua na página 2

Não à ageNdaNeoliberal

de dilma

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2 • nacional Ofensiva Socialista n°14 maio/junho - 2013

banco de horas para domésticas é golpe contra todos os trabalhadoresA flexibilização da jornada das trabalhadoras e trabalhadores domésticos é um golpe contra todos os trabalhadores e traba-lhadoras no país.

Joaquim Aristeu Benedito da Silva

Membro da Executiva Estadual da CSP-Conlutas em São Paulo

O famigerado banco de horas, tão detestado pelos trabalhadores de vá-rias categorias, tende a se tornar lei. Estão organizando um golpe, utili-

zando a lei das domésticas como bo-de expiatório para aprovar tal medi-da. Este banco de horas aparece pa-ra atenuar a vida das patroas, que se veem no inferno só porque agora as domésticas terão os mesmos direi-tos dos demais trabalhadores.

Após muitos anos de espera as domésticas conseguiram uma con-quista importante. Terão parte de seus direitos reconhecidos e sua jornada de trabalho regulamenta-da, pondo um fim a uma situação onde boa parte das domésticas ti-nha que pousar no trabalho, fican-

do a disposição dos patrões duran-te toda noite e nos finais de sema-na. Agora isso está sujeito a paga-mento de horas extras.

Querem individualizar o contrato de trabalho

A “patroada”, em especial aquelas que têm muito dinheiro e várias empre-gadas, começou a chiar e a presiden-te do sindicato das domésticas “muito preocupada” com o emprego das suas representadas foi à imprensa propondo o banco de horas como saída.

A burguesia e seus representan-tes, que não são bobos, mais que de-pressa através de um dos mais “le-gítimos” representantes da burgue-sia industrial, o presidente da FIESP Paulo Skaf e senador Romero Jucá do PMDB, elaboraram um projeto propondo que o banco de horas vi-re lei. Com esse projeto, as domésti-cas não receberão horas extras e seus contratos de trabalho seriam indivi-duais. Ou seja, não será necessária uma assembleia para aceitar o ban-co de horas, é só assinar um termo com a patroa.

Se isto já é uma tremenda sa-canagem com as domésticas, por trás desta proposta há a intenção de através deste projeto das domésti-cas também individualizar o contra-to de trabalho. Dessa forma, não se-ria mais necessário mudar o acordo coletivo através de uma assembleia para mudar a jornada. Se isso pas-sar para as domésticas, vai ser usa-do contra outras categorias. Por is-so, este projeto de banco de horas das domésticas não é um ataque só contra esta categoria, mais contra todos os trabalhadores.

reitos (marca forte do neoliberalismo). É possível identificar uma forte tendência à diminuição do poder da indústria, se-ja pelo processo de desindustrialização e investimento no modelo agroexportador, de commodities, ou mesmo pela falta de investimento neste setor produtivo. Este por sua vez encontra um cenário de bai-xíssimo crescimento, fortemente eviden-ciado pelo “pibinho” de 2012.

A grande verdade é que a política do Banco Central e do governo Dilma cabe muito bem no discurso neoliberal, que aposta numa solução interessante só pa-ra a burguesia: aumento de juros, contro-le da demanda, arrocho salarial, corte de verbas públicas para os serviços e áreas sociais. Esta seria uma forma de contro-lar a demanda e os gastos do Estado com os trabalhadores para manter o superávit primário o mais alto possível e garantir o pagamento da divida pública.

As saídas ineficazes do Governo DilmaA grande questão é que as políticas de

incentivo ao crédito e redução de im-postos se mostraram incapazes de fazer a economia crescer. O endividamento das familiais hoje cresceu, assim como a inadimplência, boa parte delas já pos-suem quase 30% da sua renda comprome-tida, não conseguindo mais se endividar.

Além do mais, o cenário de crise mun-dial não se mostra nada otimista, refor-çando a fragilidade desta saída, pois ata-ca de modo mais direto o setor produti-vo, que para se reorganizar e reestruturar vai garantir mais precarização, mais flexi-bilização das leis trabalhistas e até mes-mo demissões.

Além de não conseguir impulsionar o crescimento, o governo também foi inca-paz de conter o surto inflacionário. A al-ta da inflação é mais uma ferida exposta do Governo Dilma, as saídas são frágeis e claramente ineficazes.

Quando os preços sobem, o rendimen-

to das pessoas perde o seu poder de com-pra. O aumento do salário mínimo, pre-visto para R$ 714 reais no ano que vem, não acompanhará o ritmo da inflação real para os trabalhadores, que usam a maior parte da sua renda para comprar alimen-tos (que tiveram uma alta de preços maior que a inflação oficial), isso sem falar que nenhum trabalhador consegue sustentar sua família, pagar contas e aluguel com este salário.

Pesquisa do jornal O Estado de São Paulo, afirma que a inflação tira quase 8 kg da cesta básica do trabalhador. Como sempre, somos nós que pagamos o pato de uma política econômica focada nos in-teresses do grande capital.

Para a presidente Dilma, a preocupa-ção é não aumentar os juros exagerada-mente, pois isso poderia impactar nega-tivamente na sua reeleição, sobretudo se o próximo PIB for tão medíocre quando o de 2012. Mesmo com toda esta preo-cupação a perspectiva é de que os juros ainda aumentem mais.

Para nós trabalhadores fica evidente que o aumento de juros é a pior politica para o conjunto da classe. Exigimos que

os preços dos alimentos sejam congela-dos e controlados pelo Estado e popula-ção, de modo que não se reduza o con-sumo. Nossa preocupação não é enxugar os gastos do Estado, mas transferir o di-nheiro utilizado para o pagamento da di-vida pública para o custeamento de poli-ticas públicas e serviços como tarifa ze-ro de transporte, mais emprego, garantia dos direitos trabalhistas, dentre outros. Isso faria a economia crescer!

Os trabalhadores já começam a resistir

Não é a toa que já vemos em várias ci-dades movimentações contra o aumento da passagem, os baixos salários e a falta de investimento no setor público.

A grande manifestação em Porto Ale-gre contra o aumento da passagem, a gre-ve da educação em São Paulo, a Marcha a Brasília dia 24 de Abril, são exemplos de resistência dos trabalhadores frente a esta política econômica.

As altas da inflação e dos juros são ape-nas a expressão de uma política econômi-ca que tenta a todo custo manter um cres-cimento econômico sobre pés de barro e fazendo os trabalhadores pagarem por is-so. A fragilidade desta política é viven-ciada por nós trabalhadores no nosso dia a dia. A inexistência de serviço público, a não garantia de direitos básicos, a pre-carização e total flexibilização dos direi-tos trabalhistas (ACE) são a concretude desta política, defendida como modelo para América Latina.

A única saída para esta situação é uma transformação radical nas bases estrutu-rais, no modo de produção da sociedade. Não existem milagres para isso, e tam-pouco milagrosos, a saída esta em nos-sas mãos, na capacidade organizativa dos trabalhadores (as) e dos (as) socialistas em dar respostas a esta situação. Só a lu-ta e a nossa organização poderão de fato mostrar a real solução a este problema.

é uma publicação da Liberdade, Socialismo e Revolução

Telefone: (11) 3104-1152E-mail: [email protected]ítio: www.lsr-cit.orgCorreio: CP 02009 - CEP 01031970 - SP Assinatura: 10 edições: R$ 20 reais (Envie cheque nominal p/Marcus William Ronny Kollbrunner à caixa postal)

Colaboraram nessa edição: Alistair Tice, André Ferrari, Cristina Fernandes, Dimitri Silveira, Edemilson Antonio Perez Clementino, Guilherme Camilo, Jane Barros, Jean Henrique, Joaquim Aristeu Benedito da Silva, Johan Rivas, José Afonso Silva, Leonardo Sinedino, Liv Shange, Luciano Barboza, Marcus Kollbrunner, Mariana Cristina, Mauricio de Oliveira Filho, Miguel Leme Ferreira, Reginaldo Costa, Robério Paulino e William Prieto

Defendemos: ● O controle e congelamentos dos preços, principalmente dos itens da cesta básica.

● Uma verdadeira reforma agrária que estimule a agricultura familiar produtora de alimentos para baixar os preços desses produtos.

● Reestatização das empresas públicas de infraestrutura que foram privatizadas e investimento nos serviços públicos para rebaixar o preço das tarifas, estendendo a tarifa zero para transportes e outros setores.

● Combater a especulação e a política neoliberal que transforma serviços essenciais e direitos sociais em mercadoria, como moradia, alimentos, educação, saúde, etc.

● Lutar por aumento dos salários, para compensar o aumento de custo de vida e aumentar o poder de compra do trabalhador

● Intervenção e estatização de empresas que demitem, rebaixam salários, que não cumprirem sua função social e acordos previamente realizados, como no caso da GM de São José dos Campos.

A alta da inflação: uma ferida exposta da política econômica

continuação da página 1

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movimento • 3 Ofensiva Socialista n°14 maio/junho - 2013

marcha do dia 24 de abril: o primeiro passo foi dadoÉ necessário dar continuidade ao processo de unificação das lutasA Marcha do dia 24 de abril foi uma vitória para a classe traba-lhadora brasileira. Aproximada-mente 20 mil trabalhadores da cidade e do campo, de diversos estados do país, estiveram em Brasília contra a política eco-nômica e os ataques aos direi-tos dos trabalhadores por parte do Governo Dilma.

Miguel Leme FerreiraDiretor da Apeoesp e

da Executiva Nacional da CSP-Conlutas

Em virtude do impacto da crise econômica internacional no Brasil, o governo Dilma pretende reduzir o chamado “Custo Brasil” através da implementação do Acordo Coletivo Especial (ACE) e de uma nova con-tra-reforma da previdência.

O ACE prevê que o acordado pre-valeça sobre o legislado. Com isso, muito direitos importantes dos traba-lhadores podem ser flexibilizados ou mesmos retirados.

Em relação à previdência, o go-verno Dilma só aceita acabar com o fator previdenciário, se for apro-vado o chamado fator 85 para mu-lheres e o 95 para os homens. Em

ambos, o fator resulta da soma da idade com o tempo de contribuição. Com essa medida, o governo Dilma obrigará o trabalhador a se aposen-tar mais tarde.

Na Marcha, além desses pontos, os manifestantes protestaram contra a tentativa do governo em restringir o direito de greve dos servidores pú-

blicos, a intensificação da criminali-zação do movimentos sociais. Exigi-ram também reforma agrária e mais investimentos em saúde e educação.

Essa manifestação mostrou que é possível unificar as lutas.

No ano passado foram realizadas diversas lutas, com destaque para a greve dos servidores públicos fede-

rais. Entretanto, o grande problema foi que todas elas ocorreram de for-ma fragmentada.

Está claro que para derrotar os ata-ques dos patrões e do governo Dil-ma será necessário dar continuida-de a esse processo de unificação das lutas que resultou na Marcha do dia 24 de abril.

Construir a unidade nas lutas

Esta unidade construída nesta ação em Brasília tem que ser reproduzida nos Atos de 1° de maio, na Jornada de Luta do Movimento Popular em junho e nas campanhas salariais do segundo semestre, e de forma ime-diata na solidariedade às greves que estão em curso, como é o caso dos professores estaduais de São Paulo.

Além disso, é necessária a reali-zação de um Dia Nacional de Luta que unifique e permita dar um cará-ter geral a todas essas lutas e reivin-dicações. Esse Dia Nacional de Lu-ta seria realizada nos estados através da paralisação da produção e circu-lação de mercadorias, panfletagens em ponto de ônibus e escolas, atos unificados nas capitais etc.

Além disso, entendemos que se

faz necessário, a construção de um grande Encontro Aberto da Classe Trabalhadora da Cidade e do Cam-po. Este Encontro reuniria os milha-res de militantes combativos da es-querda socialista que estão dispersos nas diversas entidades sindicais e de movimentos sociais, bem como dos partidos políticos no campo dos tra-balhadores, como é o caso do PSOL, PSTU, PCB etc.

Este Encontro Aberto da Classe Trabalhadora da Cidade e do Cam-po, além de intensificar o proces-so de unificação das lutas, permiti-ria a retomada do processo reorga-nização sindical e popular no país e a construção de uma alternativa po-lítica para 2014 contra falsa polari-zação já existente entre PT e PSDB.

Bloco construiu e participou da marcha

do dia 24 de abril

As entidades que fazem parte Blo-co de Resistência Socialista (BRS), do qual os militantes da LSR fazem parte, construíram e estiveram pre-sentes na Marcha do dia 24 de abril.

Além dos militantes do Bloco, participaram também estudantes do Coletivo Nacional Construção.

Jornada Nacional de Lutas da Resistência Urbana

Um dia de luta contra as atrocidades em nome do dos megaeventosA última coordenação nacional da Resistência Urbana – Fren-te Nacional de Movimentos, formada por diversas organiza-ções populares do país, apon-tou o dia 14 de junho como da-ta para a realização da Jornada Nacional de Lutas. Esta jorna-da terá como foco a luta contra os despejos e remoções promo-vidos pelos governos em virtu-de dos megaeventos, Copa do Mundo de 2014 e Olimpíadas de 2016 no Rio de Janeiro.

José Afonso da Silva

A data escolhida para a jornada coincide com início da Copa das Confederações, marcada para o dia 15 de junho.

Em todo país os movimentos que fazem parte da Resistência Urbana estarão organizando ocupações de terra, travamento de rodovias, ma-nifestações na porta dos governos, panfletagens e etc, para denunciar e criticar os altos gastos do Estado pa-ra a construção de estádios de fute-bol em detrimento dos serviços pú-blicos. Também denunciará a forma desumana e cruel como comunida-des vêm sendo removidas e despeja-das para a construção das obras dos megaeventos.

A mais recente arbitrariedade co-metida pelo governo de Sérgio Ca-bral foi a destruição do Museu do Ín-dio, que fica ao lado do estádio do Maracanã e de acordo com o proje-to de reforma do Maracanã, a área

deverá ser transformada em um es-tacionamento.

O Museu do Índio, com área de 1.600 m², existe desde 1910 e foi desativado pela ditadura em 1978. Mas estava ocupado por índios des-de 2006 que batizaram o espaço de Aldeia Maracanã. No dia 23 de mar-ço, foram violentamente despejados pela Tropa de Choque do Rio de Ja-neiro a mando dos governos Dilma e Sérgio Cabral.

Dinheiro público para o setor privado

Segundo a presidente Dilma Rous-seff, o país gastará 33 bilhões de re-ais com as obras da Copa do Mun-do, incluindo gastos com infraestru-tura, modernização, ampliação e for-mação de pessoas. Desse total, 68% sairão dos cofres públicos.

Ao mesmo tempo, Dilma inten-sifica o processo de privatização de portos e aeroportos. Ou seja, empre-sas privadas “compram”, recebem dinheiro público para as reformas e ampliações e de brinde ganham o direito de explorar esses serviços por 30 anos.

A contrapartida, a exemplo do que ocorreu no último país sede da co-pa, a África do Sul, ficará apenas no papel, pois muitas obras sequer fi-carão prontas para os eventos. Sem falar que os atrasos nas obras impli-cam em mais aumento dos gastos das mesmas.

O mercado imobiliário, as emprei-teiras, as grandes marcas e os gran-

des especuladores são os grandes beneficiados e por conseguintes os grandes beneficiados dos megaeven-tos de 2014 e 2016. Esses estão re-cebendo bilhões em investimentos públicos e em aquisições de empre-sas públicas.

A copa do mundo já tem seus perdedores

Enquanto a grande maioria dos trabalhadores e a população mais pobre vivem em péssimas condições de vida, morando precariamente, se apertam num transporte público ca-ro e sucateado, morrem nas filas dos hospitais, estudam em escolas deca-dentes, etc., soa como piada saber que bilhões e bilhões são derrama-dos em obras para um evento que é controlado por uma das organizações mais corruptas do planeta.

É o negócio da China. A FIFA lu-crará bilhões em patrocínio, propa-ganda e direitos de imagem, mas quem põe a mão na carteira é o po-vo brasileiro. Depois das comemo-rações e das festas, as seleções vão embora, mas as dívidas ficam para a população e para as futuras ge-rações.

A FIFA ainda impõe o estado de exceção, que inclui proibição de gre-ves e manifestações, vendas restri-ta à marcas que patrocinam a co-pa do mundo, além de passar por cima da cultura nacional, como no caso das baianas que estão proibi-das de vender seus produtos dentro dos estádios.

Por essa e por outras que os me-gaeventos já se mostram como sen-do um grande engodo e justificam a Jornada Nacional de Lutas.

A Resistência Urbana estará orga-

nizando plenárias nos estados com o objetivo de atrair e convencer ou-tros movimentos populares da cida-de e do campo a se incorporarem nas ações da Jornada.

Movimentos que fazem parte da Resistência Urbana e estão construindo

a Jornada até o momento ● Circulo Palmarino ● MFST (Movimento

das Famílias Sem Teto)

● MLP (Movimento de Luta Popular)

● MPM (Movimento Popular Por Moradia)

● MSTB (Movimento dos Sem Teto da Bahia)

● MTST (Movimento dos Trabalhadores sem Teto)

● MUST (Movimento Urbano dos Sem Teto)

● Resistência Camponesa e Urbana do Piauí

● Terra Livre - Movimento popular do campo e da cidade

Próximo passo: por um dia nacional de luta!

Page 4: Ofensiva Socialista n°14 - maio/junho 2013

4 • juventude Ofensiva Socialista n°14 maio/junho - 2013

Congresso da UNe e novas possibilidades de articulação da luta dos estudantesEntre 29 de maio e 01 de junho vai acontecer o 54º Congresso da UNE (CONUNE). O Congres-so acontecerá em Goiânia (GO) e reunirá milhares de estudan-tes de todo o país.

Guilherme Camiloestudante de Psicologia da USP

A União Nacional dos Estudan-tes (UNE) é uma entidade que hoje não tem mais a mesma importância no cenário nacional como em outras épocas. Foi, no passado, protagonis-ta de importantes lutas nacionais, não apenas em defesa da educação pública para todos, mas também le-vantando bandeiras importantes pa-ra toda a sociedade, no processo de abertura democrática como “diretas já” e “fora Collor”.

Submisso ao governo

A relação do governo federal com a direção atual da UNE (formada principalmente pelo PCdoB e seto-res do PT) pode explicar o sumiço da entidade das grandes mobiliza-ções. Hoje ela é completamente sub-missa ao governo, apoiando as polí-ticas que têm privatizado e sucatea-do o ensino em todo o país. Sempre que faz alguma crítica, o caminho que aponta como solução é aprofun-dar cada vez mais as reformas que prejudicam a qualidade e autonomia da educação pública.

A autonomia na organização de qualquer movimento é fundamental para que se possa lutar pelos direitos sem ter o rabo preso com ninguém. Mas a relação tão estreita entre en-tidade e governo, incluindo troca de favores financeiros, faz com que a UNE fique completamente depen-dente, não cumprindo mais seu pa-pel de organizar os estudantes de for-ma autônoma. Se quiserem se mobi-lizar para lutar, os estudantes preci-sarão combater a direção dessa enti-dade e se reorganizar nacionalmente.

A reorganização do movimento estudantil

Apesar de ter uma direção que se coloca contra as lutas que conquis-tariam melhorias ao ensino e à so-ciedade, a UNE ainda é referência

para muitos estudantes e coletivos de esquerda que se mobilizam. A existência de uma Oposição de Es-querda (OE) dentro dessa entida-de mostra que lá existe espaço pa-ra que estes estudantes debatam en-tre si e construam novas possibili-dades de luta.

A OE é formada por vários cole-tivos e ativistas do movimento, e se organiza para enfrentar a atual situ-ação da UNE. É ainda muito frag-mentada e isso a fragiliza no dia a dia do movimento estudantil. Mas essa fragmentação tem chance de se reverter, e a OE, mais unificada, po-de se tornar uma ferramenta impor-tante para o ME.

Porém, esse espaço, apesar de ser hoje o mais amplo setor que organiza lutas no movimento, não representa toda a esquerda. Há outros ativistas e coletivos importantes na UNE que não veem a OE como alternativa, e ainda outros que não estão mais na

UNE. Entre estes, alguns constro-em novos espaços de organização por fora da entidade e outros conti-nuam se mobilizando sem uma refe-rência nacional.

Para que a Oposição de Esquerda cumpra o papel histórico de reorga-nizar a esquerda no movimento es-tudantil ela deve, portanto, ser uma ferramenta que ajude a unificar todos esses setores. Se ficar fechada em si mesma, vai deixar de corresponder à importância que hoje tem entre os estudantes mobilizados.

Construir a Oposição de Esquerda

Por isso, é importante que os es-tudantes vão ao Congresso da UNE, participem dos espaços e debates da Oposição de Esquerda e lutem por uma unificação cada vez mais am-pla no ME. A construção de um fó-rum nacional de mobilização dos es-

tudantes - um espaço de debates e de construção de lutas que aglutine aqueles que estão na OE e aqueles que estão ou não em outras tentati-vas de articulação nacional - é fun-damental para o processo de reorga-nização aqui colocado.

Em 2012, durante a greve das uni-versidades federais, o ME construiu um instrumento que mostrou que é possível unificar toda a esquerda em uma luta conjunta. O Comando Na-cional de Greve dos Estudantes, ape-sar de em alguns locais ter encontra-do problemas de representatividade, foi um instrumento fundamental para a luta, e mostra como um fórum de todos aqueles que lutam não é algo impossível de se construir, e muito menos algo sem importância, como alguns hoje acreditam.

Venha para o CONUNE e para a OE, participar da construção de no-vas alternativas de mobilização dos estudantes

Novas formações no ME: como avançar?Com a crise que existe hoje na direção do movimento es-tudantil, com a UNE completa-mente vinculada ao governo, alguns grupos e estudantes romperam com a entidade e tentaram construir novos ins-trumentos nacionais. O mais recente, e que existe até ho-je, se chama Assembleia Na-cional dos Estudantes Livre (ANEL).

Guilherme Camiloestudante de Psicologia da USP

Colocam corretamente críticas à direção da UNE, mas, em vez de se juntarem a todos os setores que combatem essa direção, se coloca-

ram à parte, construindo um instru-mento controlado por apenas um coletivo.

A nova entidade, com muita difi-culdade de dialogar com quaisquer outros setores da esquerda, acaba por cumprir um papel contrário ao qual se propõe: fragmenta o mo-vimento e impede a construção de um espaço de organização conjun-ta de todos aqueles que fazem lutas. Um exemplo dessa falta de diálogo é a data em que terão seu congres-so. Será na mesma data que o Con-gresso da UNE, onde, opondo-se à direção da entidade, muitos ati-vistas e grupos de esquerda estarão debatendo como se organizar para construir lutas.

É necessário construir algo novo,

que consiga enfrentar as políticas de precarização da educação impostas pelo governo. Mas algo novo só po-

de surgir de uma mobilização real dos estudantes, e da unificação de toda a esquerda, e não de iniciati-vas isoladas de um ou outro grupo.

Para que a ANEL de fato possa cumprir algum papel positivo no processo de reorganização do movi-mento estudantil, é preciso que dei-xe de lado a autoproclamação como único caminho possível. É preciso que se implique na unificação com os demais setores e estudantes que se mobilizam, e que estejam em es-paços de debate e construção con-juntos de toda a esquerda.

Vamos todos construir um fórum amplo que unifique Oposição de Es-querda da UNE, ANEL e setores de esquerda que não estejam em ne-nhuma dessas entidades!

Um dia de virada não esconde a desigualdade no acesso à culturaA Virada Cultural de São Pau-lo é um evento que acontece desde 2005 na cidade. Trata--se de uma programação cul-tural de 24 horas com gastos milionários. Esse ano a pre-feitura estima os gastos com o evento em oito milhões.

Cristina Fernandes

Por um lado a população tem acesso a grandes shows e espetá-culos. Por outro, vemos como a cultura em São Paulo é centrali-zada, e que passada as ‘24h’ vol-tamos à dura realidade da falta de investimentos em políticas cultu-rais para além do centro da cidade.

Até mesmo os Racionais MC´s que se apresentarão esse ano, que sempre representaram a resistên-cia na periferia, estarão em um dos grandes palcos do centro de São Paulo.

E onde fica a periferia em tudo isso? E os pontos culturais e o in-vestimento em políticas públicas que tenham uma continuidade, e que realmente façam a diferença na realidade da população?

Temos que lembrar que mesmo para participar da virada cultural temos os nossos limites. Gastos com transporte, alimentação. Se-gundo o site observatoriodoturis-mo.com.br o gasto em média na virada por pessoa é de R$ 50,32. Levando em conta a cidade desi-gual em que vivemos, a falta de acesso e qualidade ao transporte ‘público’ não podemos nos iludir com essa grande festa.

A cultura não pode ser um negó-cio, uma promoção política, onde se mostra em 24h o que não exis-te no resto do ano.

Não podemos deixar que leis de incentivos a cultura como a Lei Rouanet seja mais um negócio pa-ra os empresários, permitindo que empresas escolham quem irá pa-trocinar e em troca fazem propa-ganda da sua marca, retirando na prática, dinheiro público dos co-fres do Estado, já que a mesma se vê isenta do pagamento dos im-postos. Como no caso do musical Rei Leão, que é patrocinado pela Bradesco Seguros, com um custo aproximado de 50 milhões, tem ingressos a preços caríssimos que chegam a 280 reais.

● Queremos investimentos e democratização real do acesso a espaços culturais plurais que realmente representem os trabalhador@s e juventude.

● Não a criminalização da cultura na periferia!

● Não ao fechamento dos espaços de cultura nas comunidades, como foi o Sarau do Binho e a mais recente proibição dos bailes funks na periferia!

● Pela luta e resistência daqueles que acreditam na cultura e organização popular!

Reorganizar o movimento estudantil pela base.

Page 5: Ofensiva Socialista n°14 - maio/junho 2013

sindical • 5 Ofensiva Socialista n°14 maio/junho - 2013

Novo momento para a luta da educação em NatalA greve nacional da educação veio em boa hora, pelo menos em Natal. Não é difícil enxer-gar que grande parte da cate-goria está desmobilizada, des-motivada, e demonstra cansa-ço. Muito disso se dá em ra-zão do revés humilhante da úl-tima greve, em 2011 que du-rou mais de cem dias, e não obteve nenhuma conquista.

Leonardo Sinedinoprofessor dos anos iniciais

da rede estadual do Rio Grande do Norte

Também é resultado da descon-fiança oriunda do aparelhamento petista do sindicato e suas práticas pelegas de não enfrentamento, além da ausência do sindicato no coti-diano dos trabalhadores. Contribui também o fato de que as últimas vi-tórias da categoria não terem sido conquistadas nas ruas, mas sim pe-los advogados do sindicato.

No entanto, há indícios de um no-vo período que se abre.

Os novos professores concursa-dos – que foram recebidos na rede estadual com atrasos de salário – iniciaram uma mobilização em re-de, que cresceu com a adesão de es-tudantes secundaristas.

Só isso já é uma vitória: ter a concepção de que movimentos pe-la educação se fortalecem com a

união da comunidade escolar. Pro-fessores não estão sós na escola, portanto é fundamental que todos os agentes envolvidos nas práticas de ensino e aprendizagem estejam mo-bilizados e envolvidos com a luta. Em todo o país estudantes se mos-tram dispostos a encabeçar diversas lutas, portanto é importante que pro-fessores tenham a iniciativa de bus-car essa unidade em prol das lutas da educação.

Novas perspectivas para a Oposição

Após práticas antidialógicas da direção do SINTE, que atropelou as deliberações dos estudantes e dos novos professores, houve um estrei-tamento das relações com a Opo-sição, que se mostrou aberta para construir as ações da greve e do 1º de Maio, de forma democrática.

Abre-se uma nova perspectiva de Oposição, mesclando experiência dos quadros mais antigos, com a disposição de uma parte dos novos professores e estudantes secundaris-tas. Entretanto, é importante que se tenha em mente que a greve não de-ve ser um fim, um ato isolado, um dia tirado para ir às ruas, mas sim um meio para mobilizar pessoas e construir um movimento sólido e politizado, em prol de conquistas efetivas para uma educação públi-ca de qualidade.

Haddad aprofunda a privatização e o sucateamento da educação

Prefeito Pinóquio não cumpre promessaHaddad já demonstrou que é mais um daqueles políticos mentirosos que enganam a po-pulação. Em sua campanha eleitoral o então candidato pe-tista afirmou que cumpriria o acordo feito em 2012 entre os profissionais da educação e o ex-prefeito Kassab. O atual pre-feito, entretanto, não cumpriu sua promessa e utilizou como justificativa a velha ladainha de que não há verbas. Ora, o muni-cípio de São Paulo gasta cerca de R$ 4 bilhões todos os anos para pagar juros de sua dívida com a União.

Dimitri SilveiraProfessor da rede

municipal de São Paulo e Conselheiro do Sinpeem

Trata-se de uma dívida impagá-vel. De acordo com o ex-secretá-rio de finanças, Mauro Ricardo, em 2030, fim do prazo estipulado para o pagamento da dívida, São Paulo terá pagado R$ 170 bilhões e, ainda as-sim, ficará com um saldo devedor de R$ 215 bilhões. Este montante po-deria ser destinado à educação, saú-de, assistência social etc., mas ao in-vés disso o prefeito Pinóquio prefere seguir pagando juros de uma dívida

draconiana que não para de crescer.A cidade de São Paulo amarga

uma triste estatística. Mais de 100 mil crianças estão fora dos Centros de Educação Infantil em função da falta de vagas. Para “solucionar” es-te problema Haddad está ampliando a terceirização da educação infantil por meio de creches conveniadas e parce-ria com empresas. Essa é uma polí-tica já adotada pelo ex-prefeito Kas-sab que tem provocado efeitos devas-tadores sobre os trabalhadores da edu-cação, conforme apontou o Ministé-rio Público do Trabalho. Segundo a denúncia do órgão, foram constata-dos atrasos no salário, não pagamen-to de horas extras e desvio de função dos educadores que, em alguns casos, chegavam a ser responsáveis também pela faxina das salas de aula.

“Mais Educação”?

Outro exemplo de descaso com en-sino público municipal é a implan-tação do programa “Mais Educa-ção”. Muito semelhante à campanha “Amigos da Escola” da rede Globo, o “Mais Educação” de Dilma e Ha-ddad pretende levar voluntários pa-ra dentro das unidades escolares, o que fatalmente implicará em desor-ganização das escolas, desvalorização dos profissionais em educação e que-

da da qualidade de ensino. Educação é coisa séria, exige profissionais for-mados, experientes, motivados e não pode ser tratada com voluntarismo.

Unificar as lutas

Para barrar a destruição dos ser-viços públicos é necessário unificar a luta do funcionalismo estadual e municipal. A educação estadual de São Paulo já está em greve e os tra-balhadores da saúde entram em gre-ve a partir de 1º de maio. A educação do município precisa somar-se a es-tas lutas juntamente com as demais categorias do funcionalismo munici-pal para construir um poderoso mo-vimento capaz de derrotar os ataques de Alckmin/Haddad e obter vitórias.

Democratizar o SinpeemO maior entrave para organizar a

luta da educação municipal é a atual direção majoritária do Sinpeem. Por isso é necessário construir um movi-mento de Oposição com o objetivo de democratizar radicalmente o sin-dicato e trazê-lo de volta às mãos da categoria. O Movimento por Demo-cracia e Independência no Sinpeem está tomando esta iniciativa e ofe-rece a todos os lutadores uma al-ternativa coerente e combativa pa-ra fortalecer o movimento sindical da educação.

Professores da rede estadual de São Paulo em greve!No dia 19 de abril de 2013, em assembleia na avenida Paulis-ta, mais de dez mil professores da rede estadual de São Paulo decidiram entrar em greve por tempo indeterminado.

Edemilson Antonio Perez Clementino

Professor da E. E. Laurita Ortega Mari e Conselheiro

Estadual da APEOESP pela Oposição Alternativa

Os principais pontos da pauta de reivindicação são os seguintes: re-ajuste de 36,74%, cumprimento de 1/3 para atividades extraclasse, fim da precarização dos professores ca-tegoria “O” e contra a privatização do Hospital do Servidor Público Es-tadual.

A greve é necessária, sobretudo na medida em que o governo não nego-cia e não atende nossas reivindica-ções. O estado mais rico da Federa-ção, governado pelo PSDB nos últi-mos 20 anos, acabou com a base da educação pública. Alckmin e Herman continuam sucateando as escolas.

O que não faltam são motivos para a greve!

O que motiva a paralisação não é que os professores não gostem de trabalhar, como disse o senhor go-

vernador, mas sim o plano de des-mantelamento e destruição da escola pública implementado pelos gover-nos tucanos, que culminou nesse úl-timo período numa série de ataques.

São inúmeras as medias que agra-vam a situação de destruição e suca-teamento da educação pública em São Paulo. A retirada de direitos já garantidos pela categoria; aumento do assédio moral por parte das dire-ções extremamente autoritárias; pés-

simas condições de trabalho; falta de uma política salarial de valorização do magistério, recusa de reposição da inflação do período; jornadas diá-rias estafantes; aumento significativo da violência dentro e nos arredores das escolas; divisão dos professores em várias categorias (a mais preca-rizada é a categoria “O”); a implan-tação da Escola de Período Integral via decreto; terceirização da limpe-za, inspetores e merenda escolar.

Barrar a privatização do Hospital do

Servidor Público

Além de tudo isso, o governo quer privatizar o Hospital do Servidor Pú-blico Estadual; obriga o maior en-dividamento da categoria; aumen-ta gradualmente a intimidação e re-pressão à categoria; forja os mais va-riados e diversos projetos da pasta da educação criados sem discussão e implementados a toque de caixa, sendo estes, inúmeras vezes, total-mente fora da nossa realidade.

Infelizmente, todos esses fatores estão contribuindo de forma mui-to negativa para o adoecimento da categoria e aumentando a falta de professores nas escolas. Só para ter uma ideia, a falta de investimento e incentivo é tão grande, que hoje vi-venciamos o fechamento de cursos de licenciatura e o abandono do ma-

gistério por outras áreas mais valo-rizadas. Como vimos motivos não nos faltam para entrarmos em greve.

Queremos denunciar mais uma vez o que esses governantes estão fazendo conosco e com os filhos dos trabalhadores. Chega de maquiagem e vamos tratar a educação de forma séria, respeitosa e digna. Pela im-plantação imediata de um Plano de Educação que contemple uma carrei-ra digna ao professor e um estudo de qualidade para as crianças.

Repercussão da greve na sociedade

Apesar da campanha contrária da imprensa e da repressão das dire-ções, a greve começou com mui-ta força.

Temos recebido o apoio de pais e alunos, pois eles conhecem as péssi-mas condições de trabalho que temos enfrentado para realizar o processo de ensino e aprendizagem.

Entretanto, para garantirmos a vi-tória da greve, é necessário intensi-ficarmos os comandos de greve nas escolas e fortalecermos o apoio da comunidade escolar.

É fundamental também, buscar-mos a unidade com os demais seto-res do funcionalismo estadual, em particular com os trabalhadores da saúde e realizarmos uma campanha de mídia com matérias pagas na TV,

rádio e nos jornais de grande circu-lação, para respondermos às menti-ras do governo Alckmin e da gran-de imprensa.

Quanto ao nosso sindicato, a APEOESP, o maior sindicato da América Latina, é necessário fazer o enfrentamento consequente com esse governo e desmascará-lo fren-te à opinião pública de forma reta e direta. É necessário ir às ruas, radi-calizar a luta e denunciar nos meios de comunicação todos os desman-dos dos tucanos na área da educação!

Lutamos por: ● Reajuste de 36,74% já! ● Cumprimento de 1/3 para atividades extraclasse!

● Fim da precarização dos professores categoria “O”!

● Contra a privatização do Hospital do Servidor Público Estadual!

● Chega de manobras, queremos investimentos de 10% do PIB para a Educação, já!

A desvalorização do docente e da educação!

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6 • especial: PSOL Ofensiva Socialista n°14 maio/junho - 2013

O Partido Socialismo e Liberda-de (PSOL) vive um momento de de-bates e definições em uma conjun-tura extremamente grave da luta de classes no mundo e também refleti-da no Brasil.

Em meio à gravidade da crise capi-talista internacional e o acirramento da resistência de massas na Europa e outras regiões, as incertezas quan-to à situação nacional aumentaram a ansiedade das forças políticas da bur-guesia diante do que pode acontecer nas eleições de 2014.

Os dois anos de Dilma no gover-no estão marcados por uma economia

que patina apesar de todos os privi-légios, isenções de impostos e rega-lias dadas com dinheiro público aos grandes empresários.

A desindustrialização é uma ame-aça séria. O emprego não cresce co-mo se alardeava antes. Os baixos sa-lários e a precarização predominam. O aumento nos preços dos alimen-tos e outros bens da cesta básica do trabalhador agravam a situação. Não há crédito que compense eternamen-te essa situação. Os serviços públicos se deterioram e ficam mais inacessí-veis. O aumento das tarifas públicas, em particular do transporte, pode pro-

vocar situações explosivas.Nesse contexto, não há dúvidas so-

bre a opção feita por Dilma e os go-vernadores e prefeitos: jogar sobre as costas dos trabalhadores os custos do ajuste que veem como necessário pa-ra manter a estabilidade de seu siste-ma de lucros e exploração.

Somente no mês de janeiro, a União, estados e municípios reser-varam mais de R$ 30 bilhões para o pagamento da dívida pública. Esse foi o maior superávit primário men-sal já registrado no país. Em um úni-co mês se gastou com banqueiros e especuladores mais do que se desti-nará durante todo o ano de 2013 pa-ra o programa Bolsa Família (R$ 22 bilhões).

Diante dos sinais de crise, a repos-ta do governo Dilma é mais neolibe-ralismo: retirada de direitos dos tra-balhadores e privatizações. Aeropor-tos, portos e ferrovias estão sendo en-tregues ao setor privado seguindo o “modo petista de privatizar”. A pro-posta de Acordo Coletivo Especial (ACE), que permite e estimula a re-tirada de direitos trabalhistas, é mais uma política para desonerar os gran-des empresários à custa de quem vi-ve do trabalho.

Mas, Dilma também teve que se defrontar com muita luta e resistên-cia. As greves dos operários da cons-trução civil e das obras do PAC em 2011 e 2012 mostraram a força da classe trabalhadora. Vimos também a maior greve em muitos anos dos trabalhadores do serviço público fe-deral, em particular das universida-des federais, além das campanhas salariais do setor privado e das lutas da juventude contra os aumentos das tarifas de transporte e em defesa da educação pública.

Esse poderoso movimento poderia ter sido potencializado se não tives-se sido marcado pela fragmentação e ausência de uma coordenação nacio-nal capaz de unificar as lutas em tor-no a um projeto alternativo dos tra-balhadores.

Ofensiv dos patrões

A ofensiva dos patrões da GM de São José dos Campos eliminando postos de trabalho e impondo retira-da de direitos, como o banco de ho-ras e rebaixamento salarial, é uma demonstração dos ataques que virão pela frente se não conseguirmos uni-ficar e fortalecer nossa luta.

A oposição de direita ao governo Dilma, encabeçada por Aécio Neves do PSDB, mostra-se cada vez mais incapaz de aparecer como alternati-va. O máximo que podem propor é mais austeridade e ataques para co-locar ordem na casa. Sobre essa ba-se não ganharão mais apoio.

Mesmo assim, diante das incerte-zas, Dilma coloca as barbas de mo-lho. Assumiu sua candidatura à ree-leição desde já. Não quer ouvir falar em um retorno de Lula e tenta conter o crescimento de alternativas, mes-mo aquelas que surgem dentro do seu próprio campo político, como é o caso do PSB de Eduardo Campos.

Marina Silva tenta correr por fora.

Está fundando um partido que tenta-rá aparecer como a grande novidade do cenário político. Um partido com-posto e apoiado por grandes empresá-rios e banqueiros, que não se diz de esquerda ou de direita, oposição ou situação, mas que usa a bandeira da defesa do meio ambiente como uma maquiagem progressista.

Nesse cenário, a esquerda socialis-ta brasileira tem diante de si o enor-me desafio de apontar um caminho de unidade das lutas e da resistência ao mesmo tempo em que constrói as bases para a construção de uma al-ternativa eleitoral de oposição de es-querda, classista e socialista, nas elei-ções de 2014.

A responsabilidade do PSOL

As responsabilidades do PSOL nesse contexto são enormes e o par-tido precisa se colocar a altura do mo-mento histórico. Para isso, a corren-te Liberdade, Socialismo e Revolu-ção (LSR) luta para que o IV Con-gresso Nacional do PSOL, marcado para os dias 29, 30/11 e 01/12/2013, represente um ponto de inflexão na política do partido.

Lutamos para impor uma derro-ta clara à política que, nas eleições municipais de 2012, defendeu e esti-mulou coligações com os partidos do governo Dilma e Lula (PT, PCdoB, PSB, etc), além de partidos menos expressivos (embora não menos ne-fastos) da direita brasileira, como o PSC do homofóbico e racista depu-tado Marco Feliciano, que queremos derrubar da presidência da Comis-são de Direitos Humanos da Câma-ra Federal.

Combatemos a política que levou o PSOL de Belém (PA) nas eleições municipais do ano passado a vergo-nhosamente abrir espaço no progra-ma de TV do PSOL para que Lula, Dilma e Mercadante defendessem o governo federal. Trata-se de uma po-lítica que ameaça transformar nos-so partido em uma ala esquerda do campo lulista, renunciando ao proje-to fundacional do PSOL como oposi-ção de esquerda aos governos do PT.

É preciso também derrotar a deri-vação mais degenerada dessa políti-ca de pragmatismo eleitoral e opor-tunismo político expressa na postura que levou o PSOL de Macapá (AP) a aliar-se informalmente até mesmo com políticos da direita tradicional, incluindo PTB, PSDB e DEM, nas eleições do ano passado.

Internamente ao partido, entende-mos como uma prioridade a luta pa-ra derrotar no Congresso do PSOL o atual campo majoritário compos-to pelo setor que sustentou a políti-ca de Belém (representado pelo atu-al presidente do partido) em unida-de com o setor que banca o oportu-nismo extremo adotado em Macapá (representado pela figura do senador Randolfe Rodrigues).

A terceira vertente desse setor ma-joritário, composta por Martiniano Cavalcante, Elias Vaz e Jeferson Moura entre outros, se caracteriza-va por dar prioridade a uma alian-

ça com o eco-capitalismo de Mari-na Silva. Esse setor, junto com He-loísa Helena, já está em processo de saída do PSOL rumo ao novo parti-do “marinista”.

Para derrotar essa política é preci-so derrotar a maioria da direção que a sustenta e que se expressa na figu-ra do senador Randolfe Rodrigues.

O papel do Bloco de Esquerda no PSOL

A construção de um Bloco amplo e plural de forças políticas que se opõe à política desse setor majoritá-rio (composto por, além da LSR, cor-rentes como APS, MES, CST, TLS, Enlace, CSOL, CRS, Reage Socialis-ta, entre outras) representa um pas-so adiante para o PSOL e a LSR es-tá diretamente envolvida no seu for-talecimento.

Em nossa opinião, esse bloco de forças deve construir uma base polí-tica consequente para se contrapor à maioria baseada nos seguintes eixos:

● Enraizamento do PSOL nas lutas dos trabalhadores e na organiza-ção da resistência unitária contra os ataques do governo Dilma e dos patrões;

● Defesa da independência de clas-se na política do PSOL nos mo-vimentos sociais e no processo eleitoral;

● Defesa de candidatura própria do PSOL nos marcos de uma Fren-te de Esquerda e dos Trabalhado-res em 2014 que inclua o PSTU

O IV Congresso do PSOL e as eleições de 2014 – a posição da LSR

Não ao retrocesso – fortalecer o PSol como oposição de esquerda ao lulismo e à velha direita!

O texto que publicamos a se-guir é uma Declaração do Comitê Nacional da corrente Liberdade, Socialismo e Revolução (LSR) de 17 de março sobre as políti-cas do PSOL para as eleições de 2014. Ele foi escrito como par-te do debate no interior do Blo-co de Esquerda que é constitu-ído por várias correntes que lu-tam contra as políticas de desca-racterização do PSOL adotadas pelo setor majoritário do partido.

Entre outros pontos, a Declara-ção debate a visão de que a candi-datura de Chico Alencar, que não é membro do Bloco e não subs-creve suas principais avaliações, possa representar uma alternativa comum a todo o partido, incluin-do a esquerda, diante do risco de que Randolfe Rodrigues, o prin-cipal representante das políticas inaceitáveis de alianças com a di-reita adotadas em Macapá, man-tenha-se como postulante a ser o candidato do partido.

A LSR defende que o Bloco de Esquerda apresente um nome

alinhado com suas políticas co-mo pré-candidato à presidência pelo PSOL e reafirme uma clara plataforma política de esquerda, socialista e baseada na democra-cia interna do PSOL.

Após a elaboração do texto, o debate no interior do Bloco avan-çou principalmente no sentido do compromisso na busca de uma posição unitária de todas as cor-rentes da esquerda do partido. Is-so se refletiu inclusive no diálogo realizado pelo Bloco com o pró-prio companheiro Chico Alencar e outras iniciativas comuns do Bloco, como a preparação de sua intervenção na reunião do Diretó-rio Nacional de 27 e 28 de abril.

A LSR continua defendendo as posições expressas nessa Decla-ração e a submete à avaliação dos militantes e amigos do PSOL. Ao mesmo tempo nos colocamos cla-ramente como parte desse com-promisso de busca de uma políti-ca unitário do Bloco de Esquerda.

André Ferrari, Diretório Nacional do PSOL

Resgatar o PSOL das origens no quarto congresso!

Por um PSOL enraizido nas lutas dos trabalhadores.

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especial: PSOL/nacional • 7 Ofensiva Socialista n°14 maio/junho - 2013

O IV Congresso do PSOL e as eleições de 2014 – a posição da LSR

Não ao retrocesso – fortalecer o PSol como oposição de esquerda ao lulismo e à velha direita!

e PCB, além de movimentos so-ciais e políticos que se colocam no campo dos trabalhadores;

● Não ao financiamento de campa-nha por parte de empresas e em-presários;

● Perfil, programa e política de clara oposição de esquerda ao lulismo, à direita tradicional e nova direi-ta representada por Marina Silva;

● Defesa de um programa anticapi-talista e socialista para a luta di-reta dos trabalhadores e a disputa eleitoral de 2014. Por um progra-ma que vincule as lutas imedia-tas dos trabalhadores e de todos os explorados e oprimidos com bandeiras como a suspensão do pagamento da dívida pública aos grandes capitalistas, a reestatiza-ção das empresas privatizadas e a estatização do sistema financeiro sob controle dos trabalhadores.

● Defesa de uma democracia inter-na radical no PSOL, com o for-talecimento dos núcleos de base, dos setoriais e o controle da dire-ção e dos mandatos pela base mi-litante do partido;

● Não à filiação indiscriminada e despolitizada visando exclusi-vamente à luta interna. Por uma campanha ampla de filiação e construção do PSOL entre os tra-balhadores e a juventude cons-cientes. Construção e fortaleci-mento de critérios militantes pa-ra que os filiados ao partido par-ticipem do processo do Congres-so do partido.

Como parte do processo da luta em defesa dessa plataforma, o blo-co de oposição à atual maioria de-ver apresentar um nome próprio co-mo pré-candidato (a) à presidência da república.

Não vemos como hoje seria pos-sível encontrarmos uma candidatura de consenso no conjunto do partido diante de tamanhas divergências de projeto, programa e estratégia.

A possibilidade da pré-candidatu-ra do companheiro Chico Alencar, le-vantada como possibilidade por dife-rentes setores do partido, não resolve em si as divergências internas. Ainda que o nome do companheiro Chico possa representar um enorme avan-ço diante da possibilidade de que o representante da política de Macapá, Randolfe Rodrigues, seja apresenta-do como o candidato do PSOL, não podemos aceitar que essa candidatu-ra sirva como mecanismo para aba-far o debate interno.

Infelizmente a pré-candidatura do companheiro Chico Alencar, se de fa-to apresentada, não seria um candi-datura baseada nas posições políticas que o bloco de oposição levanta e de-fende e o bloco não pode e não deve abrir mão de travar essa luta.

Uma solução unitária pode e deve ser conquistada a partir de um amplo debate e uma luta política desde que isso se dê sobre bases justas e demo-cráticas. Suprimir o debate em nome de um suposto consenso pré-estabe-lecido, nesse momento pelo menos, significa empurrar as diferenças para debaixo do tapete e agravá-las ainda mais no futuro.

Portanto, entendemos que a apre-sentação de uma pré-candidatura do bloco de oposição é uma tarefa cen-tral na luta por um programa e polí-ticas alternativas à da direção majo-ritária do partido.

Até o momento, o nome da compa-nheira Luciana Genro é o único que se apresentou no interior do bloco de oposição. Tivemos no passado e ain-da mantemos diferenças políticas e metodológicas bastante conhecidas com sua corrente política, especial-mente em torno do que foi a política de aliança com o PV em Porto Alegre em 2008 e o financiamento de cam-panha com participação de empresas privadas, além de questionamentos sobre a prática política cotidiana no PSOL que apontam para diferenças relacionadas à concepção de partido.

Apesar disso, a LSR entende que a existência da pré-candidatura de Lu-ciana Genro joga um papel progres-sivo nesse momento, principalmen-te porque se dispõe a representar não somente as posições de sua tendência em particular, mas a elaboração co-letiva de um conjunto de forças po-líticas da esquerda do partido. Valo-rizamos o fato de que a pré-candida-tura de Luciana Genro se coloca co-mo um instrumento do bloco de opo-sição em defesa do PSOL contra as ameaças que pairam sobre o partido.

Manter o debate democrático em busca de um nome unitário

da esquerda

Diante da possibilidade do surgi-mento de outras possíveis pré-candi-daturas no interior do bloco, podere-mos debater democraticamente e bus-car um nome unitário que represente uma plataforma política e uma estra-tégia comum entre as forças que ho-je se colocam na esquerda do parti-do. Mas, alertamos que não podemos permanecer imobilizados aguardan-do a evolução da situação. O bloco de oposição tem enormes responsa-bilidades nesse momento.

Fazemos um chamado a que as for-ças políticas do bloco de oposição invistam no debate de uma platafor-ma política e na escolha de uma pré--candidatura que represente essa pla-taforma. Da nossa parte contribuire-mos para esse debate e lutaremos pa-ra que cheguemos a uma decisão uni-tária que nos permita derrotar o setor majoritário do partido e suas políti-cas que ameaçam a própria sobrevi-vência do PSOL como partido socia-lista independente.

Reiteramos aqui também a neces-sidade de que, para além da luta con-tra o projeto do setor majoritário, a esquerda socialista consequente do PSOL construa as bases para uma unidade mais estratégica com vis-tas ao processo de reorganização e reconstrução da esquerda socialista no Brasil e no mundo.

Comitê Nacional da corrente Liberdade, Socialismo e Revolução (LSR)17 de março de 2013

Guerra entre Estados pelos Royalties – e o povo com isso?A aprovação na Câmara da emenda sobre a distribuição para todos os Estados dos royalties do petróleo fará a re-ceita dos estados produtores (Rio de Janeiro, São Paulo e Es-pírito Santo) diminuir drastica-mente, pois a disputa entre os estados pelos royalties do pe-tróleo envolve hoje R$ 31,5 bi-lhões.

Luciano BarbozaHistoriador e Mestre em

Planejamento Urbano

O governador do RJ Sérgio Ca-bral FiO governador do Rio de Ja-neiro Sérgio Cabral Filho (PMDB) é uma figura muito importante na base de apoio ao governo Dilma, e junta-mente com os prefeitos da região pe-trolífera do RJ (Macaé, Campos, Rio das Ostras, etc) reclamou contra tal medida com o governo petista, ame-açando romper a aliança com o PT no RJ. Isso levou aos vetos de Lula à Lei dos Royalties e depois de Dil-ma (impedindo a partilha de contra-tos de campos já em fase de explo-ração). No dia 06 de março de 2013 esses vetos foram derrubados pelo Congresso Nacional, passando a lei a valer tanto para campos novos quan-to para as áreas já licitadas.

A bancada parlamentar do RJ se retirou desta votação, indignada com a truculência do presidente do Se-nado Renan Calheiros (PMDB-AL) na condução dos trabalhos. Gover-nadores, deputados e senadores dos Estados produtores foram ao Supre-mo Tribunal Federal e entraram com uma Ação Direta de Inconstituciona-lidade (Adin). A decisão da ministra Cármen Lúcia suspendeu a nova fór-mula de partilha dos royalties do pe-tróleo aprovada pelo Congresso Na-cional. Porém, o Senado recorreu ao STF contra a decisão da ministra.

Enquanto a guerra judicial pros-segue, Sabino (PSC) prefeito de Rio das Ostras eleito recentemente, já faz terrorismo com a população afirman-do que se os royalties acabarem a ci-dade vai parar seu funcionamento por falta de verbas, e os funcionários públicos perderam todas as gratifica-ções. Sérgio Cabral faz o mesmo di-zendo que a Copa do Mundo de 2014 e as Olimpíadas de 2016 serão com-prometidas por falta de investimen-tos do governo do estado.

Por outro lado, com a visão opos-ta a dos estados produtores de pe-tróleo, todos os outros estados co-memoram a renda extra que virá do petróleo e prometem maior desen-volvimento econômico e social de seus municípios.

O debate mais importante é outro

O debate mais importante e que não aparece na grande mídia é on-de tem sido investido o dinheiro dos royalties do petróleo e como deve ser investido.

Outro questionamento importan-te é: o dinheiro já recebido pelos es-tados produtores foi investido em

questões ambientais e sociais? Será que o município de Campos-RJ co-mo maior produtor de petróleo, se tornou uma cidade com menos de-sigualdade social depois que rece-beu os royalties?

Infelizmente sabemos que as res-postas são NÃO, e que muitas vezes esse dinheiro dos royalties desapare-ce através de uma intensa corrupção nas cidades produtoras de petróleo.

Controle social

O deputado estadual do PSOL Marcelo Freixo disse na Assembleia Legislativa do RJ: “Tem que acabar com a caixa-preta dos royalties de boa parte dos municípios do RJ, pro-ponho que a verba dos royalties se-ja carimbada e com controle social”.

Além de abrir a caixa preta, é ne-cessário amenizar os danos ambien-tais provocadas pela retirada do pe-tróleo e construir infraestrutura urba-na nas regiões produtoras de petró-leo para evitar o processo de cresci-mento de favelas que esta ocorren-do em larga escala no município de Macaé, por exemplo.

O debate sobre as matrizes energé-ticas foi esquecido e atropelado por uma abordagem corporativista/regio-nalista/localista dos produtores de petróleo. Essa abordagem não com-preende que o debate fundamental é outro: a necessidade de superação do combustível fóssil que é destru-tivo e poluidor colocando em seu lu-gar uma energia limpa e sustentável.

O investimento em regiões não produtoras de petróleo é essencial para evitar o êxodo rural e para di-minuir as desigualdades regionais, porém não basta só isso, e necessá-rio uma nova matriz energética não poluente, que utilize energias alter-nativas como a eólica e a solar. Além disso, a verba dos royalties tem que ser carimbada e com controle social.

Somente com um planejamento por parte do governo federal que combata as desigualdades regionais e com uma Petrobras 100% estatal sob o controle dos trabalhadores, po-deremos enfrentar os problemas re-gionais brasileiros que mantém há décadas uma grande concentração de capital na região sudeste em de-trimento das demais regiões.

Royalties anuais(bilhões de reais)

2001

3,9

2007

14,8

2012

31,5

Por um PSOL enraizido nas lutas dos trabalhadores.

Page 8: Ofensiva Socialista n°14 - maio/junho 2013

8 • nacional Ofensiva Socialista n°14 maio/junho - 2013

A luta pelo transporte é contra o capital e pelo direito à cidadeJá virou uma praxe de início de ano: aumento das tarifas do transporte público. Com o de-sejo voraz de aumentar seus lu-cros, empresas que tem a con-cessão do transporte coleti-vo em diversas cidades contam com a ajuda imensa das prefei-turas na hora de aumentar ta-rifas e atacar trabalhadoras e trabalhadores do serviço.

Mauricio de Oliveira FilhoMembro da Gestão do

DCE – Unifesp

Com isso, quem perde – como sem-pre – somos nós estudantes, trabalha-doras e trabalhadores que depende-mos do transporte público para nos locomover até o local de trabalho e/ou escola. Como muitos outros di-reitos que nos são tirados, tomam de nós também o direito à cidade, já que os custos com transporte dificultam o acesso a serviços, lazer, cultura etc.

Porém, no último período foram dados sinais evidentes de que não ha-verá facilidade para os governos e pa-ra os empresários. Em cidades como Taboão da Serra, Porto Alegre e Na-tal houve lutas importantes com vi-tórias significativas para a classe tra-balhadora.

Em Taboão da Serra, após o então Prefeito Evilásio Farias (PSB) au-mentar a tarifa dos ônibus munici-pais de R$ 3,00 para R$ 3,30, a po-pulação se manifestou incisivamente

exigindo a revogação do aumento da tarifa. Já sob um novo governo, estu-dantes e trabalhadores seguiram mo-bilizados e nos dias 8 e 9 de janeiro fizeram novos Atos e o novo prefei-to Fernando Fernandes se viu obriga-do a revogar o aumento da tarifa con-cedida à Viação Pirajussara/Fervima.

Vitória em Porto Alegre

Em Porto Alegre, desde janeiro, partidos como PSOL e PSTU além de outros coletivos não ligados a par-tidos e/ou anarquistas e militantes in-dependentes organizaram o Bloco de Luta pelo Transporte Público. As mo-bilizações, que no começo do ano reuniram centenas de pessoas, che-garam a reunir 10 mil pessoas em 1° de abril. Após uma liminar consegui-da pela bancada do PSOL na Câma-ra Municipal e da pressão popular, o aumento foi revogado.

Em Natal, em plena campanha eleitoral a prefeita Micarla de Sousa (PV) implementa o terceiro aumen-to nas tarifas de sua gestão. A popu-lação vai às ruas e, em seu programa de tevê, o candidato à prefeitura pe-lo PSOL e militante da LSR, Robé-rio Paulino, defende o direito à mobi-lização da população e repudia a re-pressão policial. A proposta de cria-ção de uma empresa pública de trans-porte era uma de suas principais pro-postas. Vendo-se obrigada a revogar o aumento, a prefeita cede à pressão, mas corta a integração dos ônibus. A

população novamente se mobilizou e conseguiu a volta da integração.

Neste ano, o vereador Sandro Pi-mentel (PSOL/Natal), propõe que a tarifa em Natal seja zero através de uma parceria com as empresas que fazem a gestão do serviço. Se por um lado a tarifa zero é um grande avanço, por outro há um limite quando se pro-põe a parceria com as empresas. Nós, da LSR, somos radicalmente contra a parceria com o capital. Os interes-ses sociais devem sempre estar aci-ma dos interesses do capital, pois o capital não deseja outra coisa senão o seu lucro a qualquer custo.

Em outras cidades como Rio de Janeiro e Niterói, apesar da intensa mobilização a gana pelo lucro falou mais alto e o aumento não foi revo-

gado. As pessoas que vivem e traba-lham nas duas cidades dependem das barcas para transitar entre uma cida-de e outra. Em 2012, após ser conce-dida isenção de 100% do ICMS para a empresa que administra o serviço, a Barcas S.A., o governo do estado concede aumento de 60% nas tarifas! Ou seja, além de ter seus custos di-minuídos, a empresa teve um grande aumento nas receitas com o aumen-to de R$ 2,80 para R$ 4,50.

Logo após a concessão deste au-mento, a CCR, empresa que já tinha a concessão da Ponte Rio-Niterói, adquire o controle acionário da Bar-cas S.A. Ora, mesmo para o senso de justiça do capital, isso é absurdo, pois é um monopólio. Mas, para além do monopólio, fica a sensação de que o

aumento já era planejado para bene-ficiar a nova empresa.

Apesar de toda a mobilização da população e da atuação do deputado estadual Marcelo Freixo, do PSOL, que entrou com uma ação na justiça pedindo a revogação da isenção do ICMS para a empresa, o valor da ta-rifa e a isenção foram mantidos.

4,80 é um roubo!

Neste ano, a tarifa foi novamente reajustada para R$ 4,80. Isso repre-senta um aumento de receita com ta-rifas de cerca de um milhão de reais por mês para a CCR-Barcas. Apesar da vitória da empresa no ano passa-do, fica evidente como a mobiliza-ção da população amedronta ainda o capital. A CCR-Barcas entrou com uma liminar que proibia manifes-tações contra a empresa sob a pena de multa de R$ 5 milhões. Isso mos-tra como a organização da popula-ção oferece risco ao capital. Mas es-sa liminar foi cassada e novamente haverá mobilizações contra este no-vo aumento.

Assim, lutar pelo transporte é lutar contra o capital. Enquanto os interes-ses do lucro estiverem acima dos in-teresses de trabalhadoras e trabalha-dores, nós deveremos nos organizar e lutar. Por isso defendemos um trans-porte coletivo 100% público sob con-trole dos trabalhadores e usuários do serviço e a redução das tarifas rumo à tarifa zero!

a redução da maioridade penal a serviço da criminalização da pobrezaA cada crime cometido por uma criança ou adolescente a grande mídia se utiliza do sen-sacionalismo para apontar co-mo grande solução para a vio-lência urbana a instauração da redução da maioridade penal. O recente assassinato do es-tudante Victor Hugo Deppman, de 19 anos, reascendeu forte-mente este debate, pois o as-sassino estava a três dias de completar 18 anos.

Reginaldo Costa

Apesar de compreender a mágoa da família e amigos, não é concebí-vel que se discuta a justiça do Bra-sil tendo como princípio a vingança e achismos sensacionalistas que só servem a discursos populistas, que escondem as verdadeiras motiva-ções da situação de crescimento da violência. Vamos aos fatos.

Segundo o relatório da Unicef “Porque dizer não à redução da ida-de penal” a grande maioria dos cri-mes cometidos por menores são cri-mes contra o patrimônio. O estudo revela que, de 2000 a 2001, 58,7% das acusações são referentes a rou-bos e furtos. Os homicídios chegam a 1,4% apenas. Ou seja, a grande maioria dos crimes não é cometida por menores.

O mais importante deveria ser o debate referente à solução da cau-sa dos problemas sociais ligados às crianças e adolescentes. De acordo com o presidente da OAB, Vinicius

Furtado, “toda teoria científica está a demonstrar que ela [a redução] não representa benefícios em termos de segurança para a população”.

Já o Instituto Não Violência afir-ma que “as pesquisas realizadas nas áreas social e educacional apontam que no Brasil a violência está pro-fundamente ligada a questões co-mo: desigualdade social (diferente de pobreza!), exclusão social, im-punidade (as leis existentes não são cumpridas, independentemente de serem “leves” ou “pesadas”), falhas na educação familiar e/ou escolar, principalmente no que diz respeito à chamada educação em valores ou comportamento ético, e, finalmen-te, certos processos culturais exa-cerbados em nossa sociedade como individualismo, consumismo e cul-tura do prazer.”

Fatores sociais por trás do crime

O que não é mostrado pela grande mídia é que os adolescentes infrato-res, em sua grande maioria, são de origem pobre, possuem problemas familiares, são expostos à violência e não têm acesso as políticas públi-cas. É importante ressaltar que isso por si só não é o suficiente para for-mar criminosos, pois a grande maio-ria da juventude pobre, apesar das di-ficuldades, se mantém fora do crime. Mas o que temos aqui é parte expres-siva dos problemas sociais que le-vam um jovem a cometer um crime.

Os centros de reabilitação de jo-

vens se encontram em situação de penúria. Um pedagogo que atuou durante onze anos na Fundação Ca-sa em São Paulo assim denunciou: “a Fundação Casa nasceu para dar errado. Eles saem de lá com mais ódio, achando que as pessoas são to-das ruins e que não há como mudar isso. São desrespeitados como seres humanos, são tratados como lixo. E isso faz com que eles pensem que não podem mudar.” Esse pedagogo recebe constantes ameaças em fun-ção das denúncias que fez. Seu rela-to só mostra que estas casas de rea-

bilitação, que deveriam ser uma for-ma de solução, acabaram tornando--se um mecanismo cruel de aprofun-damento da desumanização destas crianças, que só incentiva o crime.

Achar que as penitenciárias bra-sileiras iriam resolver os problemas também é outro equívoco. Temos atualmente uma população carce-rária de 527 mil presos e déficit de 181 mil vagas. A entrada de adoles-centes só tornaria ainda mais caó-ticas e desumanas estas penitenci-árias. O advogado Walter Cenevi-va é sumário: “colocar menores in-

fracionais na prisão será uma forma de aumentar o número de crimino-sos reincidentes, com prejuízo para a sociedade. A redução da maiorida-de penal é um erro”.

Exemplo dos EUA mostra o efeito nocivo

O exemplo dos EUA, que atual-mente prendem adolescentes junto com adultos em presídios, só refor-ça o erro de diminuir a maioridade penal. De acordo com a UNICEF os adolescentes que passaram a cum-prir penas em prisões comuns tive-ram grande piora de comportamen-to, agravando a violência, inclusive, se comparado aos jovens submeti-dos à Justiça Especial da Infância e Juventude. Não por acaso diversos estados estão voltando atrás em su-as decisões de redução da maiori-dade penal.

Outro elemento importante é que uma medida de redução da maiori-dade penal é inconstitucional, pois a maioridade penal faz parte das cláu-sulas pétreas da Constituição (1988), o que tornaria necessário uma As-sembleia Constituinte para modi-ficá-las.

O que de fato é necessário é ter-mos políticas públicas para a juven-tude pobre do país. Investirmos em educação, de maneira que esta se-ja a principal possibilidade de vida de uma criança. Além disso, a desi-gualdade social deve ser sanada, ten-do em vista programas que garantam emprego e renda para a juventude.

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opressões • 9 Ofensiva Socialista n°14 maio/junho - 2013

Fundamentalismo religioso a serviço do sistemaO fenômeno Feliciano mobilizou a sociedade no último período. O que esperar de uma comis-são de direitos humanos presi-dida por um machista, homofó-bico e racista? Mas, isso tam-bém evidenciou o papel que o fundamentalismo religioso pos-sui de mantenedor da opressão de grupos vistos como minori-tários, assim como revelou a força do povo unido contra to-da forma de opressão.

Mariana Cristina

A defesa incisiva de setores con-servadores das religiões cristãs à fa-mília, mantém a divisão sexual de papéis sociais. Esta divisão é basea-da no patriarcalismo, com o homem sendo o chefe do núcleo familiar e a mulher tendo que se submeter a ele. Da mesma forma, a luta destes se-tores contra o uso de preservativos ou mesmo contra a legalização do aborto compõe a ideia de que a mu-lher só deve fazer sexo para a pro-criação de sua família e não para o seu prazer, lhe retirando o direito so-bre o seu próprio corpo.

As opressões mantêm o status quo, pois dividem a classe trabalhadora

Não é à toa que os setores funda-mentalistas rechaçam o casamen-to homoafetivo. Apesar de muitos casais LGBTs reproduzirem a divi-são sexual de papel (um assume o lugar do homem e o outro da mu-lher), este desafia a “estabilidade” dos papéis da família nuclear. Pois, quando não se tem um indivíduo que possui uma relação de poder supe-rior, já que ambos possuem o mes-mo gênero, possibilita que novas re-lações menos opressoras se estabe-leçam. Enquanto houver capitalis-mo as opressões existirão, pois es-tas permitem a manutenção do sta-tus quo, através da divisão da clas-se trabalhadora com a submissão de uns em relação a outros.

A bancada dos evangélicos rea-cionários hoje é a segunda maior do Congresso, só perdendo para os ru-

ralistas. Existe uma ofensiva ideoló-gica e política deste setor que des-constrói o estado laico. Defendemos a livre expressão de todas as religi-ões, mas para isso o Estado não pode ser determinado por uma única reli-gião, mas deve ser neutro e autôno-mo em relação a qualquer uma delas.

Crescimento do fundamentalismo religioso

Infelizmente não é isso que tem ocorrido hoje. Tem sido destinado dinheiro público para a Marcha para Jesus e eventos “gospel”. A Jornada Mundial da Juventude católica está pleiteando que o Estado pague par-te dos 130 milhões de reais que se-rão gastos com este evento.

São diversas as escolas públicas pelo Brasil afora que rezam antes do início das aulas. Em Tocantins são 74% das escolas, em Goiás são 67%, 66% no Espírito Santo, 64,8% em Minas Gerais, etc. Aquelas crian-ças que possuem outras religiões e por isso não rezam, muitas vezes são rechaçadas e oprimidas por profes-sores e outros colegas.

As instituições religiosas também estão administrando diretamente serviços públicos como o Hospital Santa Marcelina, referência na Zo-na Leste de São Paulo. E muitas das comunidades terapêuticas do Rio de Janeiro que atendem aos usuários de drogas. Com isso, valores e doutri-nas religiosas passam a ser base dos tratamentos, o que coloca em risco

direitos conquistados e a qualidade do atendimento. Por exemplo, o di-reito ao aborto nos casos previstos em lei (casos de estupro e risco de vida para a mãe) é negado nestas ins-tituições devido às restrições impos-tas pela religião. No caso das comu-nidades terapêuticas o tratamento fi-ca enviesado pela “cura cristã” em vez de estar embasado nas diretrizes da reforma antimanicomial.

Dilma usa reivindicações como moeda de troca

A política do governo Dilma de agradar a “gregos e troianos” tem grande responsabilidade no cresci-mento dos fundamentalistas. Em no-me da governabilidade, Dilma uni-ficou na base do governo partidos cristãos e aqueles que fazem oposi-ção ao fundamentalismo religioso. Da mesma forma o PT cooptou par-te do movimento feminista e LGBT que se institucionalizaram em secre-tarias de governo e aparelhos par-tidários. Desta forma restringiu-se a oposição e a luta contra o funda-mentalismo religioso e as opressões.

Dilma aprofundou a política já im-plementada por Lula de abrir mão de bandeiras históricas dos movimentos sociais contra as opressões nas bar-ganhas para manter unida a base go-vernista. Isso ficou claro quando du-rante a campanha eleitoral de 2010 Dilma declarou ser contra a legaliza-ção do aborto apesar de ser esta uma bandeira histórica de seu partido. Tu-do isso para conseguir o apoio do Crivella (PRB-RJ), bispo da Igreja Universal do Reino de Deus e de An-thony Garotinho (PR-RJ), da Igre-ja Presbiteriana. Na mesma época, assinou uma carta de compromisso com os cristãos dizendo que não to-caria em “assuntos polêmicos” para a igreja. Em 2011 o PT retirou o kit educacional anti-homofobia para ob-ter o apoio da bancada evangélica.

A indicação do Marco Feliciano do PSC (Partido Social Cristão) para presidir a Comissão de Direitos Hu-manos e Minorias (CDHM) da Câ-

mara dos deputados foi uma afronta à sociedade. Mas, é importante lem-brar que sua indicação é resultado de um acordo entre os partidos gover-nistas encabeçados pelo PT. Além disso, não podemos nos esquecer das indicações de deputados fede-rais condenados pelo mensalão, João Paulo Cunha (PT-SP) e José Genoíno (PT-SP), para a Comissão de Cons-tituição e Justiça.

Luta pelo Fora Feliciano mobiliza em todo o país

Das 18 cadeiras da CDHM da Câ-mara, 11 são da bancada evangéli-ca, número abusivo e desproporcio-nal. O deputado federal pelo PSOL--RJ, Jean Willys, tem travado uma luta contra o fundamentalismo reli-gioso e as opressões. Ele impulsio-nou um movimento, junto aos depu-tados, de oposição a Feliciano, pa-ra que se retirassem desta comissão. O resultado foi a saída de cinco de-putados da CDHM. No entanto, os trabalhos desta comissão não serão paralisados, pois bastam 10 deputa-dos para que esta funcione.

Apesar do absurdo, um pastor ho-mofóbico, racista e sexista na comis-são de direitos humanos, a mobili-zação gerada pela indignação de jo-vens, mulheres, negros, comunida-de LGBTT e da população em ge-ral possibilitou o fortalecimento de uma identidade coletiva e ilustrou o enorme potencial que a luta do po-vo unido possui. Ocorreram cente-nas de atos pelo país todo que diziam em um único e forte coro “Felicia-no não nos representa”. A última ex-plosão de luta foi a marcha à Brasí-lia, ocorrida no dia 24 de abril, que contou com a participação de qua-se 30 mil pessoas e tinha como uma das reivindicações principais o Fo-ra Feliciano.

Muitas outras lutas virão. E não descansaremos até derrotamos Fe-liciano e todos os representantes da intolerância e opressão.

A luta do povo unido nos repre-senta!

Vamos botar a cara ou apenas ficar no discurso?Vivemos um momento compli-cado: temos hoje como presi-dente e vice da Comissão de Direitos Humanos e Minorias da Câmara dos Deputados os parlamentares Marco Felicia-no (PSC-SP) e Antônia Lúcia (PSC-AC).

Jean Henriquecoordenador do Núcleo Sítio

Cercado do PSOL-Curitiba e militante da LSR

Precisamos dialogar com a maio-ria, mas, afinal, quem é essa maio-ria? Será que a maioria prefere acre-ditar nas organizações dos trabalha-dores, que defendem a todo momen-to não só a causa LGBT mas tam-bém estão à frente das lutas por di-reitos dos negros, mulheres e opri-midos em geral, ou a maioria tem uma enorme tendência em acreditar em pastores, que usam da fé alheia e da religião, para além do interesse dos fiéis? Quando digo “para além do interesse dos fiéis” é calculando o

interesse particular – ou você acredi-ta que Marco Feliciano candidatou--se e foi eleito deputado federal ape-nas por pura devoção a sua fé parti-cular? Bom, não preciso responder essa pergunta; a matéria da revista Carta Capital deixa mais fácil de en-tender o seu interesse em ser depu-tado federal.

Uma luta conjunta

Mas, Marcos e Malafaias a parte, a quem combatemos, com quem que-remos dialogar são as tantas organi-zações e militantes que, sim, corre-tamente, defendem as causas e lutas citadas acima, mas não dão o pas-so importante de ampliar a luta. Es-se simples texto, passível de muitos erros de português, tem como objeti-vo convocar todas as pessoas que se identificam com a luta não só LGBT, mas também com a causa das e dos trabalhadores em geral.

Será que não vivemos um momen-to onde as lutas têm que necessa-riamente se unificarem, sem frag-

mentação? Num período como es-te de crise, desse sistema sujo que é o capitalismo, ele se aproveita das opressões contra os homossexuais, mulheres e negros e também bran-cos pobres, para cada vez mais nos dividir, lucrar e criar a cada dia que passa mais “Marcos e Malafaias” para, dessa forma, possam manter a classe trabalhadora imobilizada!

Nossa organização política preten-de contribuir para que mais pesso-as tenham elementos para olharem os acontecimentos de outra manei-ra, que vá além das muitas igrejas

espalhadas por todo o mundo. Des-de já, deixamos claro que não temos nenhum problema com a fé e a cren-ça de quem quer que seja; temos em nossa organização militantes de vá-rias religiões. Não propomos que as organizações e militantes aceitem o que está escrito aqui sem um diálo-go, sobre como fazer essas discus-sões chegarem até um bairro como o Sítio Cercado. Queremos o máxi-mo de participação de todas as pes-soas, pretendemos ser uma opção de construção de novas ideias e práticas junto à classe trabalhadora.

Romper com o sistema

Portanto, fica o chamado à todas as pessoas a botar a cara, tirar as dis-cussões dos nossos círculos fecha-dos que, no caso, são representados por nossas organizações políticas, sindicatos e universidade. Enquan-to os discursos contra a homofobia, o machismo e o racismo não forem acessíveis aos que realmente sofrem diariamente às mazelas desse siste-

ma podre, vão continuar crescen-do nas periferias os aproveitadores.

O chamado está feito, tanto pa-ra a vanguarda quanto para os tra-balhadores e trabalhadoras que nos apoiam diariamente, seja em uma conversa, seja adquirindo nosso jor-nal (Ofensiva Socialista). Estamos dispostos a planejar e fazer ativida-des do gênero; o que nos falta, en-quanto vanguarda é deixar de ser-mos os donos da verdade e da revo-lução e começar a lutar juntos.

Afinal, o que serve para aqueles que nos dominam (a burguesia) é acreditar que ser homossexual é pe-cado, que o negro tem sempre a ten-dência de fazer e ser o mal, que ser mulher significa fraqueza. E, o que nos une? É nossa situação real e con-creta de classe, de classe trabalhado-ra, que não tem tempo pra nada, de-vido a exploração que sofre diaria-mente, que não fica com nada do que produz; isso que nos une: somos a maioria trabalhadoras e trabalhado-res, filhos deles e delas, gay, homem ou mulher, somos os trabalhadores!

Atos em todo o pais: contra Feliciano e as opressões!

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10 • internacional Ofensiva Socialista n°14 maio/junho - 2013

África do Sul: novo partido dando os primeiros passos para unir as lutasApós o lançamento do Parti-do Socialista e dos Trabalha-dores (WASP) o trabalho es-tá focado em duas tarefas: o registro formal do partido e fincar raízes em toda a Áfri-ca do Sul.

Liv ShangeDSM (CIT África do Sul)

O foco principal está agora em uma mobilização por empregos, sa-lários e condições de trabalho de-centes para as centenas de milha-res de trabalhadores que são explo-rados como “voluntários” no setor público, bem como as demandas dos mineiros por um salário digno e contra o fechamento de minas. O Movimento Socialista Democrático (DSM - CIT na África do Sul) e ati-vistas mineiros estão construindo o WASP através dessas mobilizações.

O WASP já tem estruturas ini-ciais em todas as nove províncias do país, com acesso a várias ca-madas importantes dos trabalha-dores, como por exemplo, entre os trabalhadores dos municípios e de transporte.

No 1° de Maio, o WASP reali-zará um comício em Carletonvil-le, uma cidade mineradora ao sul de Johanesburgo, com o objetivo de vincular todas as campanhas existentes em defesa da naciona-lização do setor de mineração com controle democrático dos trabalha-dores e as comunidades.

O governo do CNA está usando o desemprego em massa para im-plementar programas onde pessoas são contratadas para fazer serviços do setor público, como manutenção de rua, educação de adultos, cuida-dos básicos de saúde por salários bai-xos, equivalentes a 110 reais em al-guns casos. O WASP está agora tra-balhando para organizar esses traba-lhadores na província de Gauteng.

Em Wedela, perto de uma mina de ouro o município dirigido pelo CNA vem nos últimos meses cor-tando a energia elétrica de cente-nas de pessoas que não conseguem pagar as tarifas. Isso causou gran-des protestos. A jovem direção por trás do movimento “Operação Li-gue a Luz” que dirige os protestos participa na construção do WASP.

Patrões lucram bilhões

Enquanto os trabalhadores e os desempregados são obrigados a pro-curar lenha nas matas e coletar água dos córregos contaminados pela ex-ploração das minas, os monopólios mineradores estão lucrando bilhões de dólares. Ainda assim, ameaçam demitir milhares de mineiros. A em-presa Anglo Platinum, a maior pro-dutora de platina do mundo ameaça demitir 14 mil mineiros em Rusten-burg. Isso pode se espalhar também para as minas de ouro, onde os pre-ços também estão caindo.

O CNA deixou clara sua posi-ção pró-capitalista no Congresso do partido realizado em dezembro ao rejeitar as demandas pela na-cionalização das minas. Enquan-to isso, a central sindical COSA-TU, em aliança com o CNA, está vivendo grandes tensões internas. A necessidade de construir o WA-SP e as comissões independentes de trabalhadores não poderia ser mais urgente.

eleições presidenciais venezuelanas: ameaça da contrarrevolução cresceNicolas Maduro ganhou as elei-ções presidenciais da Venezue-la, derrotando o candidato da direita Capriles, por meros 200 mil votos de diferença. Madu-ro, nomeado por Chávez como seu sucessor, esperava vencer com uma vantagem maior. Es-sa vitória apertada coloca cla-ramente a ameaça de uma vitó-ria das forças contrarrevolucio-nários de direita.

William Prieto e Johan RivasSocialismo Revolucionário

(CIT Venezuela)

Desde a eleição, ao mesmo tem-po que exigia uma recontagem (com apoio de John Kerry, representando o imperialismo dos EUA), a direita evitou lançar um confronto direto. Eles agora parecem voltados a mi-nar o novo e fraco governo, possi-velmente com novas eleições o mais rápido possível, com o objetivo de derrubá-lo.

Após o anúncio da morte de Chá-vez no dia 5 de março deste ano, mi-lhões de pessoas inundaram as ru-as demonstrando seu luto e apoio à Revolução Bolivariana. Este mo-mento, combinado com os resulta-dos das eleições dos governadores em dezembro, onde o chavismo ga-nhou 20 de 23 dos cargos, indicaram que eles estavam bem colocados pa-ra vencer qualquer desafio na eleição presidencial.

Quando as eleições presidenciais foram convocadas para 14 de abril, tudo indicava uma vitória clara pa-ra Maduro, apesar do crescente des-contentamento entre as massas de-corrente da situação econômica e da ineficiência e burocratização das es-truturas do Estado.

“Votar em Maduro não será suficiente!”

O Socialismo Revolucionário (SR - Venezuela) produziu um do-cumento para estas eleições com ba-se em nossa posição anterior sobre as eleições presidenciais de outubro de 2012, onde nós dissemos: “Vo-tar em Maduro não será suficiente!” SR defendeu um programa de rei-vindicações democráticas e socia-listas revolucionárias para aprofun-dar a revolução, derrotar o capitalis-mo e corrigir o curso atual, pois es-te não é um caminho para comple-tar a revolução socialista.

A posição do SR estava em mar-cante contraste com outras organi-zações de esquerda. Várias apresen-taram uma posição sectária de voto “nulo”, sem considerar as consequ-ências de uma vitória da direita, a ex-trema polarização no país ou a cons-ciência atual das massas. O outro ex-tremo foi um chamado oportunista a um voto para Maduro, sem qualquer crítica do processo ou programa que ele estava defendendo.

Ao contrário de muitos desses gru-pos, nós distribuímos panfletos com nossa posição na entrada das esta-ções de metrô em Caracas nos dias que antecederam a eleição e duran-te a manifestação final da campanha eleitoral de Maduro. Recebemos al-gumas críticas fortes, mas também

muito interesse dos membros de ba-ses do partido PSUV de Chávez.

Estes membros do partido disse-ram que acreditavam que a morte de Chávez abriria um espaço para dis-cutir os rumos da revolução. Mas, na realidade, a direção do PSUV deixou claro que para os líderes do partido agora não era o momento para le-vantar críticas, apenas para apoiar a candidatura de Maduro.

Muitos líderes do chavismo eram, e ainda são, ameaçados de expulsão por fazer críticas, que eram muito mais fracas do que as defendidas pe-los membros do SR. Tais métodos de fechar a porta à crítica interna e deba-te, um método bem conhecido do sta-linismo, teve um efeito muito negati-vo, especialmente dentro de um par-tido que reivindica operar sob a ban-deira do socialismo revolucionário.

Sinal de alerta

Maduro venceu a eleição por uma margem mínima. Foi um sinal de alerta, mesmo para os membros mais acríticos do PSUV, levantando ques-tões dentro das fileiras do partido e trazendo à tona as críticas existentes. Em apenas sete meses desde as últi-mas eleições presidenciais, Maduro perdeu quase 700 mil votos dos mais de oito milhões obtidos por Chávez.

Mesmo Diosdado Cabello, o atu-al presidente da Assembleia Nacio-nal e líder do PSUV, questionou pu-blicamente como era possível que um trabalhador vote em seu opres-sor (Capriles) e disse que agora era a hora de “autorreflexão”.

A resposta à pergunta de Cabello é que não há uma alternativa revo-lucionária real que está sendo apre-sentada para a classe trabalhadora, os pobres e explorados, bem como se-tores da classe média. Assim, mui-

tos, infelizmente, veem a direita hi-pócrita, populista e oportunista co-mo a solução para resolver esses pro-blemas. Estes problemas básicos do dia-a-dia e a ausência de discussão sobre eles tornaram difícil para al-guns defender o governo.

A relutância dos chamados “líde-res revolucionários” em discutir es-ses problemas afastou muitos do go-verno. O trabalhador que ouve que os cortes frequentes de eletricidade são em parte culpa deles mesmos por abuso no uso da eletricidade, e o tra-balhador que efetivamente paga pe-la atual crise econômica através da desvalorização da moeda e tem que lidar com a escassez de alimentos, infelizmente, foi atraído por um pe-rigoso populista de direita que ago-ra pinta-se como uma força demo-crática e justa que quer “unidade”.

A escassez de alimentos, aliás, é o resultado da camada burguesa para-sitária que ainda existe na Venezue-la hoje. Esta também é a responsabi-lidade de um governo que continua a apoiá-los com o dinheiro para im-portar produtos, mas que não colo-ca a mesma indústria nas mãos dos trabalhadores.

E agora?

Hoje temos uma direita que recu-perou sua confiança e também al-cançou uma importante base social. Eleitoralmente, é quase do mesmo tamanho do chavismo. Isto tem se dado, em parte, devido à capacida-de da direita de capitalizar demago-gicamente, sobre os erros e fraque-zas do governo e preencher parcial-mente o vácuo devido à ausência de uma oposição da esquerda socialista crítica, que não tem sido capaz de se desenvolver dentro do processo re-volucionário.

O governo de Maduro agora es-tá com a iniciativa. Ele pode se mo-ver para a reconciliação com a direi-ta ou radicalizar e aprofundar o pro-cesso e avançar em direção ao socia-lismo. Se eles aceitarem a última op-ção, a qual nós defendemos e luta-mos, eles seriam obrigados a reco-nhecer a grande base social que ho-je vê a direita como a sua alternati-va para a mudança e aplicar um no-vo curso para ganhar o seu apoio mais uma vez.

Após 14 anos de luta há um des-gaste geral do movimento, um gran-de descontentamento e erros acumu-lados. Isso vai exigir uma luta enor-me para superar esses obstáculos e fortalecer um movimento para de-senvolver a revolução socialista so-bre uma base democrática.

Este é um dos muitos desafios que o governo Maduro enfrenta. Não po-demos cair na armadilha de pensar que todos os sete milhões de pessoas que votaram em Capriles são capita-listas ou oligarcas. Como Fidel Cas-tro disse a Chávez durante uma reu-nião anos atrás “... não acredite que os cinco milhões que são a oposição na Venezuela hoje são burgueses”.

Socialismo Revolucionário alerta para a ameaça crescente de uma vitó-ria das forças contrarrevolucionárias de direita. A classe trabalhadora, os pobres e todos aqueles que querem levar a revolução adiante precisam urgentemente tirar lições do cresci-mento da direita nesta eleição. É ne-cessário levar a revolução adiante e romper com o capitalismo.

A classe trabalhadora e a juventude devem

mobilizar urgentemente para derrotar a ameaça

da contrarrevolução

A classe trabalhadora e a juventu-de devem mobilizar urgentemente para derrotar a ameaça da contrarre-volução. As massas devem construir suas próprias organizações e forças independentes. Ocupar os locais de trabalho e criar comissões democrá-ticas de controle e autodefesa contra os ataques de direita.

Lutar pela nacionalização dos meios de produção que permane-cem em sua maioria nas mãos da classe capitalista parasitária, sob o controle incondicional dos trabalha-dores e das comunidades, e não sob o atual controle burocrático.

Pela organização democrática dos trabalhadores e das comunidades em comissões para organizar uma eco-nomia planificada que irá satisfazer as nossas necessidades e não os da classe dominante. Essa economia não vai ser a mesma economia ca-pitalista que existe atualmente sob uma cortina de fumaça que hoje se referem na Venezuela como “socia-lismo”.

Essas medidas não só irão parar o avanço da direita e conquistar nos-sos irmãos e irmãs que foram se-duzidos pela direita. Elas também irão conquistar a solidariedade in-ternacional dos que lutam por uma mudança genuína e vão estimula--los a essas mudanças. Tais passos são agora urgentes para impedir o triunfo da direita.

Maduro numa encruzilhada: pra que lado ira?

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internacional • 11 Ofensiva Socialista n°14 maio/junho - 2013

Thatcher: uma obstinada combatente da classe capitalistaMilhões esperavam por esse dia, 8 de abril de 2013. Mar-garet Thatcher nunca será per-doada pela devastação que as políticas de seu governo Tory (partido conservador) trou-xeram aos trabalhadores nos anos 1980 – e que é sentida ainda hoje.

Alistair TicePartido Socialista (CIT

Inglaterra e País de Gales)

“Eu sugeriria como memorial para a Sra. Thatcher que, ao invés da lá-pide ou estátua convencionais, uma pista de dança fosse construída so-bre seu túmulo”. Isso foi sugerido por um leitor ao jornal Observer de Durham, uma antiga área mineira, no 30° aniversário da chegada de-la ao poder.

Na tentativa de evitar a raiva e oposição que um enterro de Estado para Thatcher provocaria, ainda as-sim o governo realizou um enterro com todas as características, menos o nome, de um funeral de Estado. Não tendo poupado veneno para ata-car milhões de desempregados, tra-balhadores sub-remunerados e ido-sos, o governo descobriu que possuía um lado delicado e se absteve de di-zer quanto esse “funeral cerimonial” custaria aos cofres públicos. Sem dú-vida, foram milhões.

Apesar disso, muitos ex-mineiros e suas famílias, sindicalistas e socia-listas estão celebrando sua morte. O jornal The Guardian relatou sobre a reação em Orgreave, uma cidade fa-mosa por causa do grande ataque aos mineiros grevistas orquestrado por Thatcher nos anos 1980. Um vete-rano “disse que ele estava pensando em criar uma camiseta com a frase ‘Thatcher está no inferno – ela está lá há apenas algumas horas e já fe-chou as fornalhas’.”

Mitos

“Diga-me com quem andas e te direis quem és” é um clichê manja-do, mas o caso de Thatcher é signi-ficativo. Thatcher contava entre seus amigos o assassino ditador chileno Augusto Pinochet e o ex-presiden-te dos EUA Ronald Reagan, seu co--arquiteto do neoliberalismo brutal.

Mas, ao mesmo tempo, os políti-cos, barões da imprensa e editores vomitam louvores e bajulação para a primeira ministra que eles dizem ter “tornado a Grã-Bretanha grande no-

vamente”. Ela não foi nada do tipo.A indústria cinematográfica ten-

tou vender a Dama de Ferro como um ícone feminista. Thatcher foi a primeira mulher primeira-ministra, mas suas políticas reacionárias cau-saram um retrocesso em relação a conquistas anteriores para a igual-dade das mulheres.

O comprometimento dela com os “valores vitorianos” e a crença de que “não existe essa coisa que vo-cês chamam de sociedade”, foram justificativas ideológicas para cor-tes nos gastos com serviços públi-cos e para empurrar a responsabi-lidade sobre essas tarefas para a fa-mília, que na maioria dos casos sig-nificava as mulheres.

Ela era contra “subsidiar” mães pa-ra que saíssem para trabalhar dizen-do que isso as desencorajaria de ficar em casa para cuidar dos filhos. Mais da metade das trabalhadoras da Grã--Bretanha tiveram negados benefí-cios como licença maternidade e re-dução das horas de trabalho. As cre-ches públicas foram reduzidas ao ní-vel mais baixo da Europa Ocidental.

Economia

Peter Taaffe, secretário-geral do Partido Socialista, já havia obser-vado que: “Friedrich Engels, funda-dor das ideias do socialismo científi-co ao lado de Karl Marx, comentou que cada época cria as personalida-des exigidas pelas circunstâncias ob-jetivas. Mas se elas não existem em uma forma completa, são ‘inventa-das’. Thatcher, sem quaisquer dos escrúpulos ou hesitações dos gran-des aristocratas conservadores, foi a face brutal do capitalismo britânico, exigida pela situação. Ela polarizou não apenas a sociedade, mas o pró-prio partido Tory.”

Vinte anos antes, durante o cres-cimento econômico do pós-guerra e do consenso da “economia mis-ta”, ela não teria se tornado uma lí-der do partido Tory, ou, se tivesse, não como uma thatcherista. Mas a estagnação econômica e industrial dos anos 1970 fez com que a clas-se dominante abandonasse o acordo do pós-guerra de políticas levemen-te redistribuicionistas e keynesianas a favor do ataque às condições de vi-da e direitos da classe trabalhadora, a fim de restaurar a lucratividade de um capitalismo britânico enfermo.

Thatcher, uma convertida à ideolo-gia monetarista e de livre mercado de Hayek e Milton Friedman, substituiu o derrotado Ted Heath, primeiro mi-nistro e Tory “moderado” em 1975, e ganhou a eleição geral em 1979.

Contudo, foi a direção do Partido Trabalhista que preparou o cami-nho para o thatcherismo ao come-çar a implantar políticas neoliberais nos anos 1970. Thatcher ganhou três eleições gerais e ficou no poder por onze anos, dando a aparência de ser popular e inabalável. Não era nada disso. Segundo pesquisas de opinião, ela foi, na verdade, o segundo pri-meiro-ministro mais impopular no pós-guerra enquanto esteve no cargo.

Mas a direção Trabalhista falhou em tirar vantagem disso. De um lado, falhou em resolver os problemas da classe trabalhadora e por outro lado dirigiu suas energias contra a esquer-da, especialmente a tendência Mili-tant (antecessora do Partido Socia-lista). Nisso se revela a sua degene-

ração de um partido pró-classe tra-balhadora na base para o que ele é hoje, indistinguível de outros parti-dos capitalistas.

Depois da onda de motins de 1981 sua taxa de aprovação pessoal era de apenas 23%. Depois de derrotar a greve dos mineiros em abril de 1985 os Tories estavam 5% atrás do Tra-balhismo nas pesquisas e em abril de 1990, quando o “poll tax” foi in-troduzido na Inglaterra e Gales, eles estavam 24% atrás!

Popularidade?

Em outras palavras, no auge das lutas de classes que polarizaram a sociedade, Thatcher era vista clara-mente como lutando por sua classe contra a maioria da sociedade, a clas-se trabalhadora. Muito de sua supos-ta força era na verdade reflexo da fra-queza dos líderes sindicais e do Par-tido Trabalhista.

Enquanto sua vitória eleitoral de 1983 se devia ao chamado fator Falklands (a vitória contra a Argen-tina na guerra das Malvinas), a rup-tura da ala direita do Trabalhismo que formou o Partido Socialdemo-crata (SDP) e o início da caça as bru-xas contra os apoiadores da tendên-cia Militant, dividiu o Partido Traba-lhista, que foi visto como inelegível.

Thatcher poderia ter sido derrota-da pela greve dos mineiros de 1984-85, como o governo Heath em 1974, se os outros sindicatos não tivessem vacilado e os líderes da TUC (Cen-tral sindical britânica) tivessem cha-mado uma greve geral em apoio aos mineiros. Mesmo assim, o líder tra-balhista Neil Kinnock perdeu a lide-rança nas pesquisas atacando o pre-sidente do sindicato dos mineiros, Arthur Scargill, e também a Câma-ra Municipal de Liverpool, liderada pela tendência Militant, nas prévias para a eleição de 1987.

A Câmara Municipal de Liverpo-ol, ao mobilizar um apoio de mas-sas para suas políticas de construção de casas e criação de empregos, for-çou o governo Tory a conceder um fi-nanciamento extra de 60 milhões de libras no verão de 1984. Mas Tha-

tcher conseguiu utilizar as hesitações da direção Trabalhista para prepa-rar de forma mais completa a derro-ta, primeiro sobre os mineiros e de-pois dos municípios liderados pela esquerda Trabalhista.

Poll Tax

Depois de ganhar a eleição geral de 1987, Thatcher cometeu o erro de atacar toda a classe trabalhadora de uma vez só, ao introduzir o poll tax, um imposto punitivo e regressi-vo sobre todos os adultos (indepen-dente da renda ou fortuna) pelo uso dos serviços públicos. Ela declarou esse “imposto municipal” como a principal conquista de sua política. Começando na Escócia em 1989, on-de o imposto seria introduzido pri-meiro, a tendência Militant ajudou a iniciar uma campanha de não-pa-gamento em massa, organizada pe-la base através de “uniões anti-poll tax”, que se espalharam pelo resto da Grã-Bretanha em 1990.

Em seu auge, 18 milhões de pes-soas se recusavam a pagar o poll tax, na maior campanha de desobediên-cia civil de todos os tempos. Pouco depois dos chamados quebra-que-bras do poll tax na Trafalgar Squa-re em Londres (causados pelo ata-que da polícia à manifestação de 200 mil pessoas), os Tories estavam 24% atrás nas pesquisas de opinião. Ape-sar dos tribunais, oficiais de justiça e prisões, o não pagamento aumen-tou, tornando o imposto impossível de ser recolhido.

Foi essa oposição e impopulari-dade de massas que convenceram o partido Tory a sacrificar sua heroí-na, e com ela o poll tax, que foi ime-diatamente descartado por seu subs-tituto, John Major.

O que isso mostra é que todas as qualidades atribuídas a Thatcher co-mo uma líder forte, resoluta, deter-minada e obstinada, simbolizada em seu famoso discurso “Recuem se quiserem. A dama não recua”, tor-nou-se seu oposto quando suas po-líticas divisionistas minaram com-pletamente o apoio social ao gover-no Tory.

Não derramaremos lágrimas por sua morte. Ela será lembrada para sempre por destruir a indústria e cau-sar um permanente desemprego em massa. Suas políticas monetaristas de altas taxas de juros e cortes nos servi-ços públicos transformou a recessão de 1979-81 em depressão. A produ-ção industrial caiu 30% até 1983. In-dústrias como a do aço, carvão e en-genharia foram dizimadas, e comuni-dades inteiras junto com elas. A antiga “fábrica do mundo” começou a im-portar mais do que exportar pela pri-meira vez desde a revolução indus-trial. O desemprego subiu em um mi-lhão em apenas um ano, atingindo 3,3 milhões em 1986, com uma “geração perdida” de jovens atirada na sarjeta.

Thatcher, representando o capi-tal financeiro, acreditava que a des-regulamentação levaria os negócios a prosperarem e a riqueza “chega-ria a todos”. Junto com as vendas das moradias públicas e privatiza-ções em massa da infraestrutura pú-blica, houve a aparência de crescen-te prosperidade refletida na cultura “yuppie” e de “crédito fácil”, mas is-so era superficial e apenas beneficia-va uma pequena minoria.

Legado

No final dos anos 1980, 12,2 mi-lhões de pessoas, mais de um quin-to da população, vivia na pobreza, e o abismo entre os 20% mais ricos e os 20% mais pobres se ampliou em 60%. Esse aumento da desigualdade iria se ampliar ainda mais sob o go-verno do Novo Trabalhismo de Blair, que continuou as políticas thatcheris-tas de repressão aos sindicatos, priva-tização dos recursos públicos e desre-gulamentação do sistema financeiro. Em 2001, Peter Mandelson, do Par-tido Trabalhista, de forma revelado-ra, disse: “Agora somos todos tha-tcheristas”, antes de confessar, com entusiasmo, que estava “totalmente tranquilo com o fato das pessoas es-tarem ficando obscenamente ricas”.

A própria Thatcher disse que o No-vo Trabalhismo (convertido às políti-cas capitalistas neoliberais) era o seu maior legado, e o líder Trabalhista Ed Miliband louvou algumas das princi-pais políticas de Thatcher, dizendo: “Muito do que foi feito nos anos 1980 estava certo. Foi certo deixar as pes-soas comprarem suas casas. Foi cer-to cortar os impostos na ordem de 60, 70, 80%. E foi certo mudar as regras da sindicalização, das votações antes das greves. Essas mudanças estavam corretas, e erramos em nos opor a elas na época”. Essa completa capitulação ao mercado agora levou o Trabalhis-mo a aceitar os cortes da coalizão de Conservadores e Liberal-Democratas no governo hoje e não fazer nada, tor-nando a necessidade de um novo par-tido de massas dos trabalhadores ain-da mais urgente.

Não deixa de ser adequado que Thatcher tenha morrido na época em que o capitalismo de livre mercado, em meio a sua pior crise econômica em 80 anos, tenha falhado de forma tão espetacular. Ela procurou “fazer recuar as fronteiras do socialismo”, mas agora essas mesmas ideias do socialismo voltarão a aparecer na medida em que um número crescen-te de trabalhadores e jovens buscam uma alternativa à austeridade, guer-ra e destruição ambiental, ou seja, o capitalismo global de hoje.

Militant na direção da luta vitoriosa dos trabalhadores contra o poll tax e a derrota de Thatcher!

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N° 14 maio/junho 2013

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Vários estados do Nordeste brasileiro viveram nos últimos 15 meses uma tragédia. Foi a pior seca dos últimos 50 anos, se forem levados em conta apenas os índices de incidên-cia de chuvas.

Robério PaulinoEconomista e professor do Depto.

de Políticas Públicas da UFRN. Ex-candidato a prefeito de Natal

pelo PSOL e militante da LSR

No Rio Grande do Norte, março de 2013 foi o mês de março com me-nos chuva em cem anos, com ape-nas 26,5 mm de média mensal. Na Bahia, em Alagoas, Sergipe, Per-nambuco, Paraíba e Rio Grande do Norte, mais de 1900 cidades decla-raram estado de emergência. Dez mi-lhões de pessoas foram afetadas, es-pecialmente a população e os sitian-tes mais pobres. O fenômeno destrói grande parte da economia rural da re-gião, trazendo imensos prejuízos pa-ra as principais fontes de renda co-mo a pecuária e as lavouras de mi-lho, feijão, mandioca e até a agroin-dústria da cana de açúcar, no litoral. A produção de leite pode ter caído a 20% da média anual. Muitas áre-as sofrem agudos processos de de-sertificação.

A seca aprofunda a desigualdade entre as regiões do país, atrasando a economia e elevando a pobreza no Nordeste. Ao fim da seca, a região poderá ter perdido até 40% de seu rebanho bovino, cerca de 29,5 mi-lhões de cabeças em 2011, segun-do o IBGE. Um prejuízo estrutural e duradouro, que levará décadas pa-ra ser recuperado. A visão de milha-res de carcaças de animais mortos à beira das estradas impressiona pro-fundamente a qualquer um. Com o maior grau de mobilidade de trans-portes entre o campo e a cidade ho-je existente e os programas de trans-ferência de renda, a população hu-mana consegue se salvar. Muitas fa-mílias abandonaram suas casas e ro-ças e foram para as cidades. O sofri-mento dos animais, entretanto, que não têm para onde correr para comer e beber no meio do ambiente seco e escaldante, é comovedor. No passa-do, as secas matavam gente e bichos. Hoje matam apenas os animais, mas trazem imenso sofrimento e prejuí-zos aos homens. O cenário da seca é de dor e aflição.

Remédios paliativos

Ao contrário das grandes secas do passado, que geravam imensos êxo-dos humanos em direção às cidades, os efeitos da seca atual são minimi-zados pela existência da aposenta-doria rural, uma conquista inserida na Constituição de 1988; pelos pro-gramas de transferência de renda, co-mo o Bolsa Família e a distribuição de cestas básicas. Mas os efeitos da atual estiagem só provam como estes programas são apenas remédios pa-liativos para um organismo doente, pois não atacam e mantêm os gran-des fatores estruturais que alimen-tam a pobreza no Nordeste e no pa-ís: a concentração da renda e da terra e a falta de investimentos realmente estruturais para enfrentar os proble-mas. Isso além de inibirem a mobili-

zação e a organização social das co-munidades fragilizadas, através das práticas clientelistas e assistencialis-tas dos corruptos grupos políticos lo-cais, associados ao governo federal.

As famílias sobrevivem com esses programas de transferência de ren-da, mas já não podem plantar, veem a mata sumir, os rios secarem, o ga-do morrer, o ambiente se degradar. O feijão e até a farinha de mandio-ca, comprados nos mercados, tive-ram que vir de fora, revelando a re-al insegurança alimentar na região. Torna-se evidente que estes progra-mas são incapazes de impedir que a economia rural sofra um verdadei-ro colapso durante essas longas es-tiagens. Em períodos difíceis como o atual, a população apenas sobrevi-ve, ou faz de conta que vive, olhan-do para o céu, esperando pela chu-va ou por um carro-pipa.

“Indústria da seca”

A estiagem também alimenta o que se convencionou chamar de “in-dústria da seca”. Nesses períodos, grupos econômicos e políticos lo-cais tiram proveito do flagelo da re-gião em benefício próprio. Ajudados pela mídia, que divulga situações de calamidade pública, a conservado-ra elite latifundiária local consegue substanciais ajudas do Estado, como anistia ou refinanciamento de dívi-das, renegociação de empréstimos e verbas de emergência, que dificil-mente beneficiam o pequeno produ-tor, ficando com os maiores proprie-tários. As verbas públicas são usadas muitas vezes para construção de açu-des e projetos de irrigação que be-neficiam apenas os próprios grupos dirigentes. Além disso, os pequenos

proprietários de terra e gado vendem grande parte de suas terras ou de seus rebanhos a preços subavaliados, para não o verem morrer, já que um car-ro-pipa de água chega a custar até R$ 180,00. A “indústria da seca” só eterniza os problemas e eleva a con-centração de renda.

A responsabilidade por essa situ-ação não é apenas da Natureza, mas sim dos governos e dos medíocres grupos capitalistas nacionais e lo-cais. A sensação da população é de quase abandono, descaso, inação por parte dos governos federal e esta-duais. Eles apenas mantém vivas e controladas as populações, com bol-sas, carros-pipa e cestas básicas, mas alocam recursos mínimos para me-didas realmente estruturais de con-vivência no semiárido brasileiro. O projeto de transposição das águas do Rio São Francisco, por exemplo, que supostamente poderia aliviar a situ-ação, anda a passo de tartaruga e os canais, antes mesmo de concluídos, já apresentam inúmeros problemas.

Prioridades perversas

Para que se tenha um parâmetro de comparação, apenas no primei-ro semestre de 2013, segundo da-dos divulgados pelo próprio gover-no federal, o BNDES entregou 37 bi-lhões de reais de dinheiro público pa-ra as grandes empresas no Brasil. Já a Dívida Pública Federal consumirá 47% do Orçamento Geral da União de 2013, algo como 600 bilhões de reais. Enquanto isso, Dilma Rousse-ff veio ao Nordeste nos últimos dias anunciar que gastou em 2012 algo como 500 milhões de reais em car-ros-pipa, como se isso fosse muita coisa, e que vai alocar para a seca na

região até 9 bilhões de reais. “Deus sabe lá quando”, dizem alguns.

Se a redução das chuvas no Nor-deste em certos períodos é um even-to climático até certo ponto natural, influenciado por fenômenos distan-tes, que alteram a pressão atmosféri-ca e a temperatura das águas no Pa-cífico Equatorial, como a “célula de Walker” ou o “El nino”, suas con-sequências não são nada naturais. A ideia de que a menor incidência de chuvas e a seca são os principais res-ponsáveis pela miséria e pelo atraso social na região precisa ser desmis-tificada. Esses fatores estão presen-tes em muitas outras regiões do pla-neta, onde chove menos que aqui e nem por isso as populações são tão pobres. Quase trinta por cento da po-pulação da Austrália vive muito bem em fazendas na sua porção desértica, onde chove menos que no Nordeste brasileiro, estocando e administran-do cientificamente a água da chu-va. Aquele país tem um dos maiores IDHs do mundo. Israel é outro exem-plo de como se pode usar a tecnolo-gia para plantar e colher frutas e le-gumes em regiões mais secas que o semiárido brasileiro.

Existem alternativas

Muitas seriam as alternativas pa-ra não só conviver no semiárido fa-zendo a pequena produção de sub-sistência, algo que deve ser supera-do, pois é uma visão quase feudal, mas produzindo grandes exceden-tes que possam dinamizar a econo-mia rural da região e acabar com a pobreza. A forma prioritária de es-tocagem da água em açudes e bar-reiros, sujos e contaminados por do-enças, e onde até 90% da água eva-

pora, está totalmente equivocada. A proposta do INPE (Instituto de Pes-quisas Espaciais), feita há décadas, é estocar a água dentro de cada pro-priedade, através de grandes placas coletoras e cisternas limpas, não só dos pequenos telhados das casinhas do interior nordestino, como hoje faz o governo federal, ainda assim de forma insuficiente. A precipita-ção média no Nordeste é superior ao deserto australiano e permitiria esto-car muita água para os anos mais se-cos. A Petrobras também tem tecno-logia para perfurar poços que che-guem ao grande aquífero que existe sob a região. A água do mar poderia ser dessalinizada e bombeada para o interior, como faz a Arábia Saudi-ta, o mesmo podendo ser feito com as águas dos rios que deságuam no litoral. Tudo isso permitiria a agri-cultura irrigada, livrando a região da pobreza secular e do assistencialis-mo. Como se vê, as medidas pode-riam ser muitas.

Os problemas do Nordeste e do Brasil são outros. Residem na con-centração da terra, da riqueza e da renda, na falta de uma verdadeira reforma agrária, que mesmo os paí-ses capitalistas mais avançados fize-ram e o Brasil nunca fez, na falta de investimentos realmente estruturais para acabar com a pobreza na região e no país. Tudo isso tem uma expli-cação de fundo: a mentalidade taca-nha, medíocre, conservadora, quase feudal de nossas oligarquias empre-sariais e rurais, que cumprem um pa-pel nefasto para a região e para o pa-ís. O verdadeiro problema do Nor-deste chama-se capitalismo, ainda mais em um país atrasado e perifé-rico no sistema mundial. Nossa ta-refa é mobilizar e esclarecer a popu-lação acerca deste estado de coisas.

Repensar a atuação sobre o planeta

Está claro também que é preciso repensar a própria ação humana so-bre o planeta e a terra, a urgência da questão ambiental, educar as popula-ções para um tipo de exploração me-nos danosa à Natureza. A seca tam-bém tem uma explicação no desmata-mento indiscriminado, no uso do car-vão vegetal que destrói a mata, no ti-po de agricultura horizontal, extensi-va e predatória que se praticou na re-gião desde a colonização, que exaure a terra e aquece a atmosfera do plane-ta. Uma das medidas que se impõem é um maciço reflorestamento com milhões de árvores em toda a região.

Quando fechávamos este texto, chovia densamente em grande par-te do Nordeste. Mesmo que isso não possa ainda ser tomado como fim da seca atual, o fato nos traz uma imen-sa alegria, pela amenização do sofri-mento de nossos irmãos e de milhões de animais e árvores no campo. Co-mo em todas as culturas humanas, chuva no Nordeste é vida. No litoral, nossa torcida é que as nuvens carre-gadas que passam no céu cheguem ao sertão. A cada dia, acompanha-mos os boletins diários de chuva no interior, como se acompanham os in-formes de uma guerra. Os prejuízos até aqui, no entanto, são profundos e estão na conta do capitalismo bra-sileiro, que o povo do Nordeste um dia vai cobrar com juros.

a tragédia da seca no Nordeste

Fenômeno natural ou consequência de um capitalismo atrasado e perverso?

Manifestantes denunciam a omissão dos governos diante da Seca.