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REVISTA LUMEN ET VIRTUS ISSN 2177-2789 VOL. VII Nº 15 MARÇO/2016 Julia Cristina Granetto-Moreira 88 OBJETOS DIGITAIS DE ENSINO- APRENDIZAGEM DO PROJETO E- SIPRIS: UM OLHAR PARA A LINGUAGEM IMAGÉTICA Julia Cristina Granetto-Moreira 1 http://lattes.cnpq.br/1612397536637333 RESUMO – Com o avanço das Tecnologias de Comunicação Digital (TCD), novos materiais didáticos e modalidades de ensino se apresentam, ganhando destaque os objetos digitais de ensino aprendizagem (ODEA) e a EaD (Educação a distância). Neste sentido, o presente artigo tem como objetivo apresentar os ODEA discutindo sobre os aspectos necessários para sua construção, enfatizando a linguagem imagética. Os ODEA discutidos neste artigo são elaborados para o Projeto Piloto e-Sipris. Para um melhor entendimento, primeiramente apresentaremos o projeto e-Sipris, da Universidade Estadual do Oeste do Paraná (UNIOESTE), que oferta curso profissionalizante de nível técnico na modalidade de ensino a distância para o sistema prisional das Penitenciárias PIC (Penitenciária Industrial de Cascavel) e PEC (Penitenciária Estadual de Cascavel), tal projeto atende ao caráter educacional, sociocultural e humanizante. Na sequência, trazemos para a discussão os objetos digitais de ensino aprendizagem, materiais que estão ganhando espaço nos contextos educacionais, conceituando e apresentando os aspectos necessários para sua produção. Na última seção do artigo, ganha destaque um dos aspectos levantados, a linguagem imagética, e sua importância na elaboração dos ODEA. PALAVRAS-CHAVE – Objetos digitais de ensino-aprendizagem; linguagem imagética; e-Sipris. ABSTRACT – From the advances in Digital Communication Technologies (DCT), new didactic materials and teaching methods are presented, highlighting the Digital Objects of Teaching-Learning (ODEA) and DL (Distance Learning). In that sense, this 1 Julia Cristina Granetto Moreira é doutoranda pelo programa de Pós Graduação em Letras, área de concentração Linguagem e Sociedade da Universidade Estadual do Oeste do Paraná (UNIOESTE).

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ISSN 2177-2789

VOL. VII Nº 15 MARÇO/2016

Julia Cristina Granetto-Moreira

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OBJETOS DIGITAIS DE ENSINO-APRENDIZAGEM DO PROJETO E-SIPRIS: UM OLHAR PARA A LINGUAGEM IMAGÉTICA

Julia Cristina Granetto-Moreira1

http://lattes.cnpq.br/1612397536637333

RESUMO – Com o avanço das Tecnologias de Comunicação Digital (TCD), novos

materiais didáticos e modalidades de ensino se apresentam, ganhando destaque os objetos

digitais de ensino aprendizagem (ODEA) e a EaD (Educação a distância). Neste sentido,

o presente artigo tem como objetivo apresentar os ODEA discutindo sobre os aspectos

necessários para sua construção, enfatizando a linguagem imagética. Os ODEA

discutidos neste artigo são elaborados para o Projeto Piloto e-Sipris. Para um melhor

entendimento, primeiramente apresentaremos o projeto e-Sipris, da Universidade

Estadual do Oeste do Paraná (UNIOESTE), que oferta curso profissionalizante de nível

técnico na modalidade de ensino a distância para o sistema prisional das Penitenciárias

PIC (Penitenciária Industrial de Cascavel) e PEC (Penitenciária Estadual de Cascavel), tal

projeto atende ao caráter educacional, sociocultural e humanizante. Na sequência,

trazemos para a discussão os objetos digitais de ensino aprendizagem, materiais que estão

ganhando espaço nos contextos educacionais, conceituando e apresentando os aspectos

necessários para sua produção. Na última seção do artigo, ganha destaque um dos

aspectos levantados, a linguagem imagética, e sua importância na elaboração dos ODEA.

PALAVRAS-CHAVE – Objetos digitais de ensino-aprendizagem; linguagem imagética;

e-Sipris.

ABSTRACT – From the advances in Digital Communication Technologies (DCT),

new didactic materials and teaching methods are presented, highlighting the Digital

Objects of Teaching-Learning (ODEA) and DL (Distance Learning). In that sense, this

1

Julia Cristina Granetto Moreira é doutoranda pelo programa de Pós Graduação em Letras, área de

concentração Linguagem e Sociedade da Universidade Estadual do Oeste do Paraná (UNIOESTE).

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paper aims to show the ODEA arguing about the elements necessary for its

construction, emphasizing the Imagetic Language. The ODEA discussed in this paper

are designed for the Pilot Project e-Sipris. For better understanding, primarily we will

present the project e-Sipris, the State University of Western Paraná (UNIOESTE),

which supply technical level course at distance modality of teaching for the prison

system of PIC (Industrial Penitentiary of Cascavel) and PEC (State Penitentiary of

Cascavel), this project meets educational, sociocultural and humanizing character.

Further, we bring for discussion Digital Objects of Teaching-Learning (ODEA)

materials which are gaining ground in educational contexts, conceptualizing and

featuring the elements necessary for its production. In the last section of the article,

stands out one of the aspects considered: the Imagetic Language, and its importance in

the development of ODEA.

KEYWORDS – Digital Objects of Teaching-Learning; imagetic language; e-Sipris.

Introdução

A incorporação das tecnologias de comunicação digital (TCD)2

, tem sido o

fenômeno econômico de mais alto impacto social e cultural contemporâneo, pois gera

grandes mudanças na produção de bens e serviços, como também na cultura local. No

contexto escolar, se faz necessária uma mediação adequada em meio aos processos

cognitivos da aprendizagem que são advindos da TCD.

Com o avanço e a presença da TCD, a modalidade de educação a distância

(EaD) ganha outros sentidos, outras possibilidades de ser construída. Com respeito a

EaD, Dal Molin e Motter indicam que tal modalidade é:

a forma mais potente e ágil para democratizar o conhecimento, e por

isso muito combatida, principalmente por quem não conhece o seu

funcionamento e a sua capacidade rizomática de ser. Já nascendo livre

de amarras, fora dos encaixes cartesianos e do modelo arbórico de

trabalhar com o conhecimento, a EaD é o rizoma segundo o que

preconizam Gilles Deleuze e Guattari (DAL MOLIN, MOTTER,

2013, p. 02).

2

O termo TCD Tecnologia de Comunicação Digital foi por nós adotado tendo como base a tese de

autoria da Professora Dra. Araci Hack Catapan: O Novo Modo do Ser, do Saber e do Aprender

(Construindo uma Taxionomia para a Mediação Pedagógica em Tecnologia de Comunicação Digital) o

termo “concerne às novas formas de informação e comunicação com base na linguagem digital”

(CATAPAN, 2001, p. 16).

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Na Universidade Estadual do Oeste do Paraná (UNIOESTE), a EaD é uma

modalidade de ensino recente, que tem como objetivo criar novas oportunidades e

outras possibilidades para quem deseja estudar, caracteriza-se por ser rizomática,

democrática, inclusiva, ausente de fronteiras, sejam elas geográficas, culturais ou de

acesso.

É nesta perspectiva que se configura o projeto e-Sipris/Unioeste, o qual

oportuniza aos setenciados-estudantes das Penitenciárias Industrial e Estadual de

Cascavel – PR, o retorno aos estudos por meio de um Curso profissionalizante,

garantindo a integração social e a aquisição de conhecimentos que permite a eles

assegurar um futuro mais digno, com capacitação profissional quando estiver em

liberdade.

A Lei de Execução Penal Brasileira (LEP) é explícita quanto à obrigatoriedade dos

presídios, penitenciárias, casas de detenção oportunizar aos seus detentos condições de

reeducação, reinserção e ressocialização. Da Assistência Educacional, a lei segue:

Art. 17. A assistência educacional compreenderá a instrução escolar e a

formação profissional do preso e do internado. Art. 18. O ensino de 1º

grau será obrigatório, integrando-se no sistema escolar da Unidade

Federativa. Art. 19. O ensino profissional será ministrado em nível de

iniciação ou de aperfeiçoamento técnico. (LEI. 7210, 1984).

Elionaldo Fernandes Julião (1993) ao investigar o papel da educação como

programa de reinserção social na política de execução penal, parte da reflexão, no que

concerne à reinserção social, que a educação pode vir assumir o papel de destaque, pois,

além dos benefícios da instrução escolar, o privado de liberdade pode vir a participar de

um processo de mudança capaz de melhorar sua visão de mundo, contribuindo para a

formação do senso crítico, principalmente resultando no entendimento do valor da

liberdade e melhorando o comportamento na vida carcerária.

Desta forma, o projeto e-Sipris juntamente com a Universidade cumprem um

importante papel social, apresentando-se como uma grande oportunidade para aqueles

que estão privados de liberdade retomarem seus estudos por meio da modalidade a

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distância. Sendo que, a educação e a profissionalização dos estudantes-setenciados são

condições imprescindíveis para sua reinserção no mundo do trabalho e no convívio

social.

A educação mediada pela tecnologia de comunicação digital pode oportunizar

mudanças nos paradigmas educacionais, tornando o ensino pluridimensional. A EaD,

como a modalidade capaz de lidar com diversas tecnologias, favorece a aprendizagem,

com vídeos, áudios, imagens, links, hiperlinks dentre outros recursos. Ademais, esta

modalidade busca, também, uma educação concebida na participação, criatividade,

expressividade, interatividade, em que favoreça a formação integral do indivíduo.

Levamos em consideração que estes estudantes-setenciados não têm contato, ou

quando têm é muito restrito, com outros materiais e linguagem visual como televisão,

internet, jornais impressos, fotografias etc, sendo que, com o curso técnico, estes passam

a ter acesso aos objetos digitais de ensino-aprendizagem (ODEA) produzidos pela equipe

e-Sipris, assim, justifica-se a importância deste olhar voltado a linguagem imagética

dentro destes ODEA neste contexto de aprendizagem.

Projeto e-Sipris

O objetivo do projeto e-Sipris, como brevemente apresentado na introdução

deste artigo, é a oferta de cursos de formação técnica aos setenciados-estudantes das

penitenciárias de Cascavel – PR, PIC e PEC, com o intuito que após o cumprimento de

suas penas, estes estejam capacitados para exercer uma profissão, bem como (re) integrar-

se na sociedade como cidadãos que agem dentro dos princípios sociais e são respeitados

pelas ações profissionais. Logo, garantindo à inclusão destes que não tiveram acesso à

educação.

O ingresso do setenciado-estudante das Unidades Prisionais como discente do

curso dependerá de: a) ser previamente selecionado pela Unidade Prisional onde se

encontra; b) ter concluído o ensino médio, para ingressar na modalidade de curso

subsequente; c) estar cursando regularmente o ensino médio, para ingressar na

modalidade de curso concomitante e e) apresentação da documentação escolar, que

confirme sua condição de participação no curso.

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O curso Técnico em Informática em nível médio será ofertado nas formas

subsequente e concomitante, na modalidade a distância e tem como intuito: a) capacitar

o cidadão para a reintegração social e para o mercado de trabalho; b) proporcionar

dinamismo na busca de informações; c) otimizar a capacidade de comunicação em um

ambiente virtual; d) inserir na metodologia a realização de trabalhos e atividades para a

formação de uma consciência crítica e socioeducativa inovadora; e) apresentar situações

que possibilitem o desenvolvimento da capacidade de iniciativa e para a tomada de

decisões e f) possibilitar a ampliação do convívio social do sentenciado, quando em gozo

de liberdade e, ainda mesmo, em ambiente de privação de sua liberdade.

A modalidade de ensino a distância pode atingir inclusive aqueles detentos que

não poderiam participar de aulas presenciais por diversos motivos. Uma particularidade

é que os sentenciados-estudantes poderão dar continuidade ao curso após sua liberdade,

além da possibilidade de enquanto pagam suas penas usam este tempo de forma

construtiva, para sua formação, preparando-se assim para a liberdade de modo mais

consciente de seu papel social e profissional.

O projeto está se dedicando a produção de ODEA autênticos, já que estes

devem ser cuidadosamente elaborados, não apenas levando em conta questões

pedagógicas referentes aos conteúdos, como também questões éticas, pois, nem tudo,

pela questão da segurança, pode ser apresentado a este público. É com relação a esta

etapa do Curso: Produção de ODEA, que este artigo se dedica.

Objetos digitais de ensino-aprendizagem

Com a TCD, modificações importantes são propiciadas na forma pela qual os

materiais educacionais didáticos são planejados, construídos, disponibilizados e entregues

àqueles que desejam aprender. Com o avanço da tecnologia, e com o crescimento de seu

uso para fins educativos, incluindo a modalidade de ensino a distância, surge um novo

modo de pensar em materiais e recursos didáticos, chamados de objetos digitais de

ensino-aprendizagem, possibilitando novos caminhos para a práxis pedagógica.

Neste trabalho, consideramos como ODEA todo e qualquer material disponível

na Web que tenha objetivo pedagógico, contendo desde simples elementos, como um

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texto ou um vídeo, ou ainda, podendo ser mais completo e complexo como um

hipertexto, uma página da internet, um filme, um curso ou até mesmo uma animação

com áudio e recursos mais avançados e mistos. É importante mencionar que os ODEA

podem ser utilizados tanto na modalidade de ensino presencial como a distância.

Entre as diversas possibilidades de potencializar o acesso ao conhecimento, na

modalidade a distância, destaca-se o papel que ocupam os objetos digitais de ensino-

aprendizagem que não apenas proporcionam uma maior interatividade na forma de

transmissão de conteúdo, como também potencializam e possibilitam um novo modo de

ensinar e aprender, por seu caráter transdisciplinar, transversal e hipertextual.

(GRANETTO, 2014).

Os ODEA se posicionam como recursos importantes na modalidade de ensino

referida, sendo assim, é necessária uma produção de objetos digitais de ensino-

aprendizagem que contenham uma abordagem pedagógica, teórica e metodológica que

atenda as especificidades dos contextos idiossincráticos3

, neste caso, a educação no

sistema prisional.

Necessita-se assim, desenvolver ODEA que possam atender a esse novo ambiente

pedagógico da EaD, garantindo a qualidade de um ensino que se construa não apenas

pelo manuseio do aparato tecnológico, mas para além dele, pelo incentivo ao

desenvolvimento de competências técnicas, conceituais e humanas, apresentando

dinamismo ao processo, aprimorando as competências dos estudantes, saindo da

linearidade, buscando a transversalidade e a transdisciplinaridade, vencendo os modelos

que se preocupam apenas em transmitir o conhecimento produzidos pela humanidade,

ainda presentes na modalidade de ensino da EaD.

Os ODEA surgem com esse objetivo, de serem instrumentos que facilitem a

disponibilidade e acessibilidade da informação no ciberespaço. Desta forma, um

conteúdo educacional digital deveria, para ensejar a aprendizagem, utilizar um modo

dual de apresentação do conteúdo, isto é, um estímulo verbal (que pode ser a palavra

falada ou escrita) e um estímulo não-verbal (uma imagem, um vídeo, uma animação ou

3

Entendemos como idiossincrático algo próprio que age sobre ambientes incomuns, no caso, educação no

sistema prisional.

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um som de fundo sem letra). Sendo este último um aspecto que julgamos como essencial

na elaboração dos ODEA.

Dentre os aspectos que julgamos essenciais para a produção de ODEA estão: a

transdisciplinaridade, transversalidade, hipertextualidade e a linguagem imagética.

Consideramos que construir ODEA sob um aspecto transdisciplinar exige uma

contextualização maior, procurando demonstrar que, por mais distante que possa

parecer, tudo está relacionado, a visão transdisciplinar de ciência que inclui a alteridade,

ou seja, construo meu conhecimento considerando a visão do outro, e incluo também o

alternativo, no sentido de algo independente das tendências dominantes (GRANETTO,

2014).

A transversalidade é mais um aspecto para a construção de ODEA que deve ser

tratada de modo integrado, pois se refere a questões sociais a serem abordadas em sua

complexidade, tão importantes para a educação prisional, principalmente pelas questões

morais e éticas. Além do mais, a transversalidade permite a motivação para a

aprendizagem, possibilitando a entrada de ações cotidianas no ambiente escolar,

valorizando-o em sua amplitude, implicando assim em uma nova atitude diante dos

saberes, de forma não fragmentada, não hierarquizada.

Já na hipertextualidade, como menciona Lévy (2004), todo o conhecimento até

então disponível no ciberespaço está ao alcance, se potencializa, uma vez que está

trafegando a uma impressionante velocidade. Um aspecto que articula os conteúdos

estabelecendo links com outros textos, imagens e outros recursos.

O último aspecto que julgamos necessário se refere à linguagem imagética,

consideramos que para o ODEA ser construído de modo transversal, transdisciplinar e

hipertextual a linguagem escrita não é suficiente, pede-se algo a mais, por isso a

importância de outras linguagens, como a imagética, tão importante em tempos de

TCD. É com relação a este último aspecto que dedicamos a próxima seção.

Linguagem imagética como aspecto para a construção de ODEA

Na EaD, ainda prevalece uma cultura pautada em livros didáticos impressos

como principal e, em algumas ocasiões, como único material didático a ser utilizado,

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privilegiando a escrita em detrimento de outras linguagens. Não nos posicionamos

contra os materiais didáticos impressos, nem tampouco à linguagem escrita, pelo

contrário, eles se apresentam como importantes recursos para tal modalidade, no

entanto, o que nos inquieta é quando estes são os únicos materiais utilizados frente a

uma gama de opções que são proporcionadas pela TCD. Conforme nos aponta Dal

Molin:

A tecnologia de comunicação digital (TCD) permitiu ampliar o leque

de linguagens, assim, a escrita deixa de ser a única linguagem para dar

lugar a uma orquestra semiótica que harmoniza imagem, som,

movimento e simulação, possibilitando originar ambientes

infocomunicacionais alternativos que estão a serviço da virtualização

(DAL MOLIN, 2003, p. 143).

Antes do advento da tecnologia, em especial da internet, a linguagem imagética

disseminada era restrita à elite. Com o desenvolvimento da TCD e dos aparelhos

fotográficos digitais, produzir imagens tornou-se uma prática comum. Hoje, temos

acesso a diversos bancos de imagens, alguns ofertados gratuitamente e outros pagos, isso

demonstra o quanto as pessoas, com a possibilidade de acesso à produção de imagens, se

tornam cada vez mais produtores do seu próprio conhecimento.

Na educação a distância, o investimento no aprimoramento e nas inovações são

constantes, ganhando destaque a produção de ODEA, sua função nesta modalidade não é

agir como mero suporte na transmissão tradicional do saber, estes materiais digitais vão

além, possibilitando que todos se coloquem como atores e autores desta modalidade e,

neste cenário, a linguagem visual se coloca como um auxiliar poderoso ao ensino.

Santaella e Noth (2008) abordam que o cotidiano das pessoas está permeado pelos

mais diversos tipos de imagens, objetos materiais, signos que representam nosso meio

ambiente visual. Concordamos com os autores, mas como pensar no cotidiano das

pessoas que vivem enclausuradas, como é o caso dos setenciados-estudantes, que

visualizam sempre os mesmos objetos, imagens, signos?

Esta inquietação faz com que tenhamos outro olhar com a produção dos ODEA

para o projeto e-Sipris, preocupando-nos em demonstrar muito além da estética das

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imagens dentro dos objetos digitais de ensino aprendizagem, não valorizando apenas a

imagem pela imagem, sem nenhum sentido. Além do mais, ao produzir ODEA, a

hibridização de linguagens passa a ser considerada indispensável, juntando sons,

linguagem escrita e linguagem imagética em uma mesma composição, com a finalidade

de uma melhor compreensão do processo de aprendizagem.

Entre os variados materiais e metodologias disponíveis hoje para o

desenvolvimento desse processo, desponta a Tecnologia de

Comunicação Digital que potencializa e disponibiliza uma imensidade

de imagens que podem ser trabalhadas em integração com texto escrito,

som e movimento (DAL MOLIN, 2003, p. 63).

Como apontado na seção anterior, ao elaborar um objeto digital de ensino

aprendizagem (ODEA) são muitas as questões a serem analisadas: o conteúdo a ser

abordado, a forma de apresentá-lo, que ferramentas utilizar, quais são os pressupostos

pedagógicos que irão embasá-lo, dentre outras. No que diz respeito à forma de

apresentação do conteúdo, exige-se uma presença não apenas da linguagem escrita, como

também da linguagem imagética.

O uso da linguagem imagética na arquitetura dos ODEA mostra-se fundamental,

com a intenção de não apenas passar informações do texto escrito, como também

suscitar o pensamento reflexivo, em que os estudantes identifiquem e compreendam a

linguagem interior presente nas imagens, e não associá-las de forma mecânica com o

simples uso ilustrativo de um conteúdo escrito. A linguagem imagética tem um

compromisso social, não apenas com a retratação da realidade, mas com a ressignificação

dessa realidade pela contextualização engajada através de sua narrativa visual do mundo.

Elas devem expressar valores estéticos e explorar os sentidos às diversas interpretações

pessoais dos estudantes. Uma imagem não serve apenas para ser vista, e sim

contextualizada, pois como demonstra Meira:

uma imagem é, também, um corpo de ideias, uma posição política sobre

o contexto, um recorte ético sobre valores, um mapa de sentidos sobre

algo que se aprendeu [...] os alunos captam imagens que estão ao seu

redor o tempo todo, uma vez que a imagem não encontra mais

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barreiras para se propagar e pode-se falar de uma estética do cotidiano

(MEIRA, 1999, p. 124).

Cabe assim ao estudante a tarefa de interpretar a imagem de acordo com as suas

vivências, seus conhecimentos e sentimentos acerca do mundo ao redor. Desta forma, faz

todo sentido trabalhar com a linguagem imagética relacionada aos aspectos transversais e

transdisciplinares, pois como afirma Gomes “a linguagem imagética é aberta, imprecisa e

plural” (GOMES, 2012, p.24). O autor ainda comenta que as imagens são formas de

representação que necessitam de atenção e sensibilidade para serem lidas, produzidas e,

consequentemente, produzir novas representações.

Neste contexto, Fernando Hernández (2009) propõe uma compreensão crítica da

linguagem visual. Isto significa que devemos levar em conta que as imagens são discursos

que constroem e reconstroem relatos do mundo social. Para compreendermos melhor

esses discursos é preciso desenvolver estratégias que permitam posicionamentos críticos

diante deles. Não podemos esquecer, todavia, que a construção do conhecimento ou da

sua interpretação é determinada pelas características da cultura em que o indivíduo vive.

Neste trabalho, consideramos como linguagem imagética os filmes, imagens,

criadas ou não com recursos tecnológicos, como é o caso dos gifs e também a fotografia.

Sendo que esta última ganha destaque pela sua forma de representar. Embora estática e

fragmentada, a representação promovida pela fotografia vai além do ponto e da fixidez.

Por se tratar de um fragmento da realidade, enquadrado em uma representação, os

elementos que compõem a imagem (tema e conteúdo) são atravessados pela dimensão

técnica e criam inúmeras conexões com o externo, com o presente-ausente da fotografia

que é o conteúdo representado em associação com o contexto sócio histórico e cultural

da época e a situação imaginada pelo observador, mais do que qualquer outro meio “a

fotografia possui a aptitude de expressar os desejos e as necessidades das camadas sociais

dominantes, e de interpretar a sua maneira os acontecimentos da vida social”

(FREUND, 1989, p. 8)4

. Borges contribui apontando que:

4

Más que cualquier otro medio, “la fotografía posee la aptitud de expresar los deseos y las necesidades de

las capas sociales dominantes, y de interpretar a su manera los acontecimientos de la vida social”

(FREUND, 1989, p. 8) [Tradução da autora]

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a imagem fotográfica perpetua instantâneos e acontecimentos de um

dado tempo e momento, com a grande diferença que, ao contrário da

escrita, não é necessário ser iniciado-alfabetizado para construir e dar

sentido a uma imagem. Seu caráter polissêmico permite diversas

leituras. (BORGES, 2010, p. 197).

Esta característica das imagens como matéria inspiradora de sentidos abertos e

interconectados faz da fotografia uma linguagem, por excelência, adequada às práticas

educativas abertas, multirreferencializadas e transversais. “pensar na fotografia é pensar

em uma linguagem dotada de força que por meio de suas narrativas visuais é capaz de

instaurar novos modos de ver, comunicar e pensar”. (BORGES, 2003, p. 09).

Sabemos que a imagem presente nos ODEA é uma ferramenta mediadora do

conhecimento, possibilitando a aprendizagem significativa com a percepção e apreensão

de sentidos reais e concretos. A fotografia, por seu turno, é a retratação visual dos

discursos, muitas vezes os mais silenciados e os que mais produzem sentido, o que se

torna importante para ambientes de aprendizagem idiossincráticos, como é o caso do

sistema prisional.

No caminho a que nos propomos compreender, produção de ODEA ao sistema

prisional, constatamos que a linguagem imagética se apresenta como matéria inspiradora

de práticas educativas abertas, multirreferencializadas e promotoras de aprendizagens

autênticas, alcançando o tão esperado protagonismo daquele que está aprendendo.

Considerações finais

As tecnologias de comunicação digital trouxeram, e ainda trazem, novas formas

de agir e de pensar, impõem novos comportamentos, atitudes que lenta ou rapidamente

são incorporadas. Assim se caracteriza a EaD, como também a produção de ODEA,

diante desta nova narrativa, impulsionando novos olhares.

O uso da linguagem imagética, seja ela qual for, é um elemento que contribui

para a formação do estudante, visando estabelecer um diálogo entre a narrativa da

imagem, os conhecimentos adquiridos ao longo da escolaridade básica e demais

conhecimentos adquiridos pela vivência de cada pessoa. E quando é dado um

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direcionamento transversal e transdisciplinar a linguagem imagética vai além,

interagindo com o mundo que a cerca.

A utilização de uma arquitetura de ODEA elaborada sob os aspectos da

transdisciplinaridade, transversalidade, hipertextualidade e linguagem imagética abre

novas possibilidades de ensinar e de aprender condizentes com a nova era do saber,

movida pelas tecnologias de comunicação digital.

Acreditamos que, através do uso da linguagem imagética na produção, não apenas

dos ODEA, como também no cotidiano das escolas, e até mesmo da educação mediada,

faz com que nossos estudantes sejam construtores do seu próprio conhecimento, de

forma autêntica, em que as práticas educativas escolares possam promover relações

comunicativas mais críticas, ocupadas com a contextualização social, política e com a

construção democrática da aprendizagem autônoma e significativa. Pois como nos coloca

Saramago:

Vivemos todos numa espécie de parque audiovisual onde os sons se

multiplicam e onde as imagens se multiplicam e aonde nós vamos, cada

vez mais, sentindo-nos perdidos. Perdidos, em primeiro lugar, de nós

próprios. E, em segundo lugar, perdidos em relação com o mundo.

Acabamos por circular aí sem saber muito bem nem o que somos, nem

para quê servimos, nem que sentido tem a existência.

(Janela da Alma - SARAMAGO, 2001).

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

BORGES, Paulo Humberto Porto. Representação fotográfica e povos indígenas. In:

discursos fotográficos, Londrina, v.6, n.8, p.195-212, jan./jun. 2010.

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