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VERBO jurídico ® Gabriela Phalempin O Novo Regime do Despedimento por Inadaptação e a Terceira Alteração ao Código do Trabalho de 2009 operada pela Lei 23/2012, de 25 de Junho

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VERBO jurídico ®

Gabriela Phalempin

O Novo Regime do Despedimento por Inadaptação e a Terceira Alteração ao Código do Trabalho de 2009 operada pela Lei 23/2012, de 25 de Junho

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Índice

I – Introdução 5

II – Considerações gerais sobre a figura do despedimento por inadaptação 6

III – O caminho legislativo percorrido 10

IV – Os Acórdãos n.°s 107/88, de 31 de Maio e 64/91, de 4 de Abril do Tribunal

Constitucional e a Constituição da República Portuguesa 22

V – O Memorando de Entendimento sobre as Condicionalidades de Política Económica e o

Compromisso para o Crescimento, Competitividade e Emprego 37

VI – O regime da Lei 23/2012, de 25 de Junho 39

VII – As reacções ao actual regime 42

VIII – O Acórdão n.°602/2013, de 20 de Setembro do Tribunal Constitucional 48

IX – Conclusões 56

X – Bibliografia 59

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Lista de Abreviaturas e Siglas

Ac. – Acórdão

art. – Artigo

CC – Código Civil

CRP – Constituição da República Portuguesa

DL – Decreto-Lei

ed. – Edição

ibidem – No mesmo lugar / Na mesma obra

ob. - Obra

ob. cit. – Obra citada

p./pp. – Página/Páginas

ss. – Seguintes

TC – Tribunal Constitucional

Vol. - Volume

Os acórdãos de Tribunais portugueses que não tenham identificada a sua fonte podem

encontrar-se em www.dgsi.pt.

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I – Introdução

O presente tema, e consequente trabalho desenvolvido em torno do mesmo de

Agregação à Ordem dos Advogados serve, não só o objectivo de conclusão de formação de

estágio profissional, mas também o debate de algumas questões - como os conceitos de

caducidade e justa causa, o paralelismo com a figura do despedimento por extinção de posto

de trabalho e alguns princípios constitucionais - que, como veremos, não são, de todo,

recentes, e que foram (novamente) suscitadas pela Terceira Revisão ao Código do Trabalho de

2009 (de ora em diante, CT), operada pela entrada em vigor da Lei 23/2012, de 25 de Junho.

Antes, porém, de iniciarmos o conjunto de considerações e conclusões a respeito das

mesmas, recordemos que, nas palavras de Jorge Leite, a sociedade em que vivemos está

fundada no trabalho, sendo este “uma exigência natural, (…) uma componente essencial do

modo de vida de cada um de nós e (…) um elemento determinante de estruturação social”1.

Porém, como tantas outras ao longo da vida do ser humano, a relação jurídico-laboral

findará, mais cedo ou mais tarde, e o vínculo romper-se-á, como adiante explicaremos. Bem

sabemos que a extinção deste vínculo e a consequente perda do emprego poderá acarretar

efeitos devastadores, especialmente ao nível social. Segundo João Leal Amado, vivemos, hoje,

“num contexto de flexigurança”, querendo o autor com tal neologismo significar que a perda

de emprego se vai desdramatizando, perdendo o lugar de destaque em face da “ideia de

transição”2. É verdade que estamos a atravessar uma fase em que a transição entre empregos

é uma constante, uma realidade que arriscaríamos dizer indissociável da maioria da

população, visto que o “emprego para toda a vida” findou há muito e é, hoje, um fenómeno de

uma época que se nos afigura extremamente distante. E, se assim é, também não é menos

verdade que a Humanidade assim o quis e a tal obrigou, com todos os inconvenientes que tal

possa ter suscitado. O Mercado em constante mutação procura empreendedorismo e os

Estados veêm-se “coagidos” a reforçar políticas de gestão de recursos humanos, de reforço da

posição das empresas via inovação/evolução tecnológica e de resposta aos desafios que

surgem todos os dias por força do aumento feroz da concorrência.

Não podemos, pois, estranhar que a legislação tenha também sentido necessidade de

acompanhar este novo cenário e de se transmutar.

Eis o que nos propomos analisar e justificar.

1 Cfr. Leite, “Direito do trabalho”, Vol. I.

2 Cfr. LEAL AMADO, “Contrato de Trabalho”, p. 351 e ss.

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II – Considerações gerais sobre a figura do despedimento por inadaptação

O Despedimento Por Inadaptação, modalidade de despedimento por iniciativa do

empregador prevista actualmente nos artigos 373° a 380° e 385° do CT, tem vindo a ser

definida pela doutrina portuguesa como a possibilidade de o empregador fazer “cessar o

contrato de trabalho sempre que se determine a incapacidade do trabalhador para o exercício

das suas funções, tornando praticamente impossível a subsistência da relação de trabalho”3.

Existem, no entanto, certas particularidades de que alguns autores vão dando conta,

às quais nem todos se apresentam tão “sensíveis”, em virtude de este ramo do Direito e, em

particular, o tema de que ora cuidamos, estar repleto dos denominados “conceitos

indeterminados”. A propósito destes últimos, como ensina António Francisco De Sousa, tal

expressão “pretende referir aqueles conceitos que se caracterizam por um elevado grau de

indeterminação”, ou cujo “grau de indeterminação não é sempre o mesmo: ele varia e pode

variar muito”. Assim, alguns conceitos poderão reunir o consenso generalizado com relativa

facilidade mas, relativamente a outros, esse mesmo consenso será mais difícil de obter, senão

mesmo impossível, “já que a sua interpretação ocorre sempre, ou quase sempre, associada a

uma perspectiva necessariamente pessoal, moldada de acordo com os padrões morais, sociais,

culturais, políticos e religiosos do indivíduo”.

Ora, o legislador português, na sua profícua técnica legislativa, “recorre cada vez mais

a conceitos de interpretação difícil e aplicação ainda mais complexa”4, sendo que é esta uma

das causas em que se alicerça o presente trabalho.

Quanto ao que à origem da figura diz respeito, entende João Soares Ribeiro que a

mesma surgiu “porque os empresários se queixavam de que não havia nenhum mecanismo

legal que lhes permitisse «gerir» os recursos humanos tendo em conta a evolução técnica e

tecnológica, o que facilmente lhes fazia perder competitividade face às empresas congéneres

estrangeiras pelo que, em última análise, a falta dum tal instrumento legal que poderia

sacrificar alguns trabalhadores que não conseguiriam acompanhar o progresso, se iria traduzir,

3 Cfr. ROMANO MARTINEZ, “Direito do Trabalho”, p. 1075 e ss.. Sobre esta figura, podem ver-se LEAL

AMADO, ob.cit., VIEIRA GOMES, “Direito do Trabalho – Volume I – Relações Individuais de Trabalho”, p. 997 e ss., MOTTA VEIGA, “Lições de Direito do Trabalho”, p. 555 e ss., LOBO XAVIER, com a colaboração de FURTADO MARTINS, NUNES DE CARVALHO, VASCONCELOS, e GUERRA DE ALMEIDA, p. 781 e ss., PALMA RAMALHO, “Direito do Trabalho, Parte II – Situações Laborais Individuais”, p. 913 e ss., MONTEIRO FERNANDES, “Direito do Trabalho”, p. 514 e ss.. 4 Cfr. FRANCISCO DE SOUSA, “Conceitos Indeterminados” no Direito Administrativo”, pp. 17 e ss.,

especialmente pp. 23 e 24.

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a prazo, numa perda irremediável de todos os postos de trabalho daquelas empresas

condenadas à obsolescência e à extinção”5.

Ora, ressalvando algum exagero de tão douto autor, não podemos deixar de

compreender as opções que justificaram a instituição da figura de que ora curamos no nosso

ordenamento jurídico, bem como as alterações de que foi alvo em 2012.

Por outro lado, é inequívoca a confusão gerada pela proximidade da figura da

inadaptação e a da Caducidade. António Menezes Cordeiro parece defender que, em certas

situações da vida laboral de uma empresa, perante a introdução de uma modificação

tecnológica a que um trabalhador não logra adaptar-se, mesmo após o fornecimento da

formação adequada, e para o qual não haja nenhum outro posto a atribuir, “a impossibilidade

parece patente. E a assim ser, o novo fundamento mais não seria do que uma forma de

caducidade do contrato.”6. Verificámos, portanto, que o autor atribui à caducidade um sentido

demasiado amplo. Não assim, Pedro Romano Martinez, defendendo que, “em caso de

caducidade, o contrato cessa pela ocorrência de um facto jurídico stricto sensu, por exemplo,

na hipótese de extinção do objecto ou pela verificação de qualquer facto ou evento

superveniente a que se atribua efeito extintivo da relação contratual”7. Para que não surjam

posteriores querelas jurídico-linguísticas, fornece como exemplos de verificação deste «efeito

extintivo», “as prestações que devam ser realizadas num determinado prazo”, o esgotamento

“do objecto do contrato” ou mesmo “a morte do trabalhador”. Não afasta, ainda, a hipótese

de se verificar uma impossibilidade superveniente de prestar ou de receber o trabalho,

porque, afinal, estamos perante um vínculo sinalagmático e, “via de regra, a caducidade

também funciona automaticamente, não necessitando de ser invocada por qualquer das

partes”, o que nos leva a concluir pela não sustentabilidade da tese adiantada por Menezes

Cordeiro que, aliás, no nosso entender, apenas vem “(con)fundir” duas realidades distintas.

Merecedora de nota é, ainda, a distinção dos conceitos de “Inaptidão” e

“Inadaptação”, os quais surgem, muitas das vezes, indiferenciadamente em textos legais e

doutrinais mas que, na verdade, não o são. Assim, ao passo que a inadaptação é superveniente

e motivada pela falta de capacidade do trabalhador em se moldar a uma nova realidade, a

inaptidão pode ser originária. Neste último caso, o trabalhador, “desde o início da execução

5 Cfr. SOARES RIBEIRO, “Da cessação do contrato de trabalho por inadaptação do trabalhador”, p. 401. 6 Cfr. MENEZES CORDEIRO, “Da cessação do contrato de trabalho por inadaptação do trabalhador

perante a Constituição da República”, p. 398. 7 Cfr. ROMANO MARTINEZ, ob. cit., pp. 977 e ss.

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laboral não promove um desempenho adequado ou satisfatório face às exigências do

empregador. A inaptidão será superveniente quando, no decurso do contrato, o trabalhador

perdeu as aptidões que possuía, sem, no entanto, tal perda motivar a caducidade do contrato

(será um dos casos de admissibilidade da mudança de categoria do trabalhador)”8. Pensemos

num acidente, de foro não laboral (uma vez que, como estipula o art. 374°, nº 3 do CT, deste

regime estão excluídas as consequências de acidentes de trabalho e de doenças profissionais,

prevenindo, assim, uma utilização abusiva deste regime em relação a trabalhadores com

capacidade de trabalho reduzida não superveniente, com deficiência ou doença crónica), que

vem originar a perda de capacidades funcionais do indivíduo/trabalhador em determinado

grau, por exemplo.

Pesem embora as diferentes interpretações destas disposições e conceitos legais, e

suas consequências práticas na realidade jurídica, certo é que, nas palavras de Maria do

Rosário Palma Ramalho, “o grau de exigência da lei na configuração do despedimento por

inadaptação, na sua configuração tradicional, não só pelo número de requisitos que o rodeia,

como pelo carácter cumulativo destes requisitos, tornou a figura muito difícil de aplicar e,

portanto, de escassa utilidade prática, o que é confirmado pela falta de jurisprudência nesta

matéria”9. Seguindo ainda a linha de raciocínio da autora, o qual tivemos a oportunidade de

verificar, os Acórdãos que se referem a esta figura, fazem-no do modo indirecto, isto é, a

propósito da apreciação dos requisitos substanciais da figura do despedimento por extinção do

posto de trabalho, estabelecendo comparações, e/ou diferenciando os dois regimes.

Propomo-nos ir mais longe e tentar demonstrar - contrariamente ao que parece ser a

convicção da supra citada autora, e sublinhamos o vocábulo «parece» pois, com a devida

reverência nos merece, através da redacção da sua própria obra, esta não sustenta a sua

opinião com certeza (“Com as alterações introduzidas – que, em geral, se consideram positivas,

à excepção da supressão do despedimento modificativo, pode esta figura vir a ter uma maior

8 Cfr. QUINTAS, P. e QUINTAS, H., “Manual de Direito do Trabalho e de Processo do Trabalho”, pp.168 e

ss. 9 Cfr. PALMA RAMALHO, ob. cit., especialmente pp. 923 e 924. No mesmo sentido, cfr. VIEIRA GOMES,

ob. cit. e NETO, “Novo Código do Trabalho e Legislação Complementar Anotados”, p. 911, “4. Embora seja comummente reconhecida a necessidade de existir um mecanismo relevante para ultrapassar situações de impossibilidade de prossecução da relação de trabalho motivadas pela falta de capacidade profissional, o certo é que a prática tem demonstrado que o despedimento por inadaptação, tal como se encontra estruturado desde a publicação do DL n.° 400/91, de 16 – 10, não é o adequado, como o demonstra a ausência de jurisprudência sobre esta figura, e foi expressamente reconhecido no Livro Branco das Relações Laborais, 2007, p.113, no qual foram enunciadas diversas medidas tendentes a tornar efectiva a aplicação prática deste regime, sem que o legislador haja adoptado qualquer delas.”.

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aplicação”10) – que a actual configuração da figura do despedimento por inadaptação não fará

abalar as suas considerações relativamente à aludida “configuração tradicional”, uma vez que

os requisitos permanecem rígidos, cumulativos e, como tal, de muito difícil aplicação prática e

consequente chegada à barra dos tribunais.

10 Cfr. PALMA RAMALHO, ob. cit.

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III – O caminho legislativo percorrido

A “narrativa” tem, pois, início há já algumas décadas, mais concretamente com a Lei

n.° 1:952, de 10 de Março de 1937. No seu artigo 11°, a existência de justa causa, quer para

efeitos de rescisão ou denúncia do contrato por qualquer uma das partes, deveria ser

apreciada pelo juiz, o qual, senhor de um “prudente arbítrio”, teria em consideração as

relações entre dirigentes e subordinados, a sua condição social, o seu grau de instrução e,

permitam-nos enfatizar, as “demais circunstâncias do caso”.

No parágrafo único que segue ao supra citado artigo, relativamente ao conceito de

justa causa, lia-se “qualquer facto ou circunstância grave que torne prática e imediatamente

impossível a subsistência das relações que o contrato de trabalho supõe, e em especial (…)”.

No artigo seguinte, o 12°, o elenco de três números especialmente destacados pelo

legislador da época, vem, não só ser alargado, como sistematizado separadamente consoante

as infracções ocorram por parte do “empregado” (hoje, “trabalhador”), ou da entidade

empregadora. Não deixa, pois, de ser “curioso” encontrar, na alínea b), que concerne aos

fundamentos da entidade empregadora para accionar o despedimento com justa causa, um

primeiro ponto que expressamente refere “A manifesta inaptidão do empregado para o

serviço ajustado;”.

Uns anos decorridos, a regulamentação jurídica da contratação individual de trabalho

torna-se necessária face “à evolução entretanto operada na doutrina”, tal como se pode ler,

desde logo, no ponto primeiro da exposição de motivos do Decreto-Lei n.° 47 032, de 27 de

Maio de 1966.

Assim, no que aos modos de cessação do contrato de trabalho diz respeito, vem a

alínea d) deste mesmo ponto primeiro referir-se ao Capítulo VI e, bem assim, à “revogação,

rescisão, denúncia e caducidade, com particular referência aos motivos de justa causa de

rescisão, tanto pela entidade patronal como pelo trabalhador (…)”.

Efectivamente, o art. 95°, c) do referido Decreto-Lei consagra, como causa extintiva da

relação laboral, a rescisão por justa causa e, desta feita, o art. 99° do mesmo diploma legal

refere-se especificamente à justa causa de rescisão por iniciativa da entidade patronal.

Facto deveras interessante do pensamento legiferante que presidiu à elaboração do

Decreto-Lei que ora analisamos é o de que, das 10 (dez) alíneas que constituem este artigo,

desde logo na primeira, na alínea a), se estatui “A manifesta inaptidão do trabalhador para as

funções ajustadas”.

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Cumpre salientar que, tal como em 1937, a justa causa seria alvo de apreciação

judicial, dentro dos mesmos moldes, isto é, de acordo com um prudente critério e tendo em

atenção, não só as relações laborais entre ambas as partes, bem como os seus graus social,

educacional e demais circunstâncias do caso concreto.

Do mesmo modo, no art. 97°, que cura da cessação por caducidade, num elenco desta

feita meramente exemplificativo, a alínea c) refere-se expressamente à verificação de uma

“impossibilidade superveniente absoluta e definitiva de o trabalhador prestar o trabalho ou de

a entidade patronal o receber”.

Muito embora consagrado no âmbito de diversos regimes de cessação do contrato de

trabalho, não serão de ler, nestes exemplos, não um despedimento por justa causa ou por

caducidade, mas verdadeiras situações de inadaptação do trabalhador ao posto de trabalho?

Esta impossibilidade de a entidade patronal “receber” a prestação laboral pelo trabalhador,

não poderá ser interpretada como um prejuízo em mantê-lo ao seu serviço? Quer-nos parecer,

portanto, que estávamos, não só nos primórdios do Despedimento por Inadaptação, como

perante uma sua versão encapotada.

De ressalvar que, no art. 132° do Decreto-Lei de que cuidamos, foi expressamente

consagrado o seu carácter provisório ou experimental, confirmado pelo diploma legal que se

lhe seguiu, sendo que foi mesmo estipulado o prazo de dois anos para a revisão deste diploma.

Sucede, porém, que a referida revisão não veio a ter lugar até 31 de Dezembro de

1968, mas com o Decreto-Lei 49 408, de 24 de Novembro de 1969, o qual consagrou a Lei do

Contrato Individual de Trabalho (LCT). Contudo, e como explicita o preâmbulo, no seu ponto

2., quase em jeito de justificação por um ano de “atraso” de revisão, esta “não determina,

todavia, transformações radicais na matéria, o que melhor vem demonstrar ainda o cuidado

que a elaboração desse diploma mereceu (o Decreto-Lei n.° 47 032) e a justiça da posição que

desde o início ocupou no contexto da mais moderna legislação europeia sobre o direito do

trabalho”.

A LCT veio, pois, manter, com uma ligeira alteração sistemática, no seu artigo 98°, nº 1,

c), a rescisão com justa causa como causa de cessação da relação laboral por qualquer uma das

partes; no seu art. 102°, a), como parte integrante do elenco taxativo das causas passíveis de

constituir justa causa a invocar pela entidade patronal, a inaptidão do trabalhador e, no seu

art. 100°, referente à caducidade do contrato de trabalho, a já aludida não possível

“recepção”, pela entidade patronal, do trabalhador.

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Todavia, o art. 101° veio, no seu nº 2, estabelecer uma cláusula geral do conceito de

justa causa, definindo-a ou defendendo a sua constituição “em geral” – o que desde logo nos

transporta para a consagração de um conceito amplo – “qualquer facto ou circunstância grave

que torne praticamente impossível a subsistência das relações que o contrato de trabalho

supõe, nomeadamente a falta de cumprimento dos deveres previstos nos artigos 19° e 20°.”

(sublinhado nosso). Aqui chegados, salientamos que os artigos 19° e 20° concernem,

respectivamente, aos deveres da entidade patronal e trabalhador, bem como a alínea f) do

referido art. 20°, a qual estipula o seguinte: “Promover ou executar todos os actos tendentes à

melhoria da produtividade da empresa;”. Não podemos deixar de denotar as similitudes

gramaticais com a actual configuração do regime do despedimento por inadaptação, bem

como os objectivos subjacentes à fixação de tal dever, dever este que, de resto, hoje se

encontra consagrado no artigo 128°, h) do Código do Trabalho.

Conhecemos bem a História do nosso país e a Revolução de 25 de Abril de 1974, bem

como as transformações que desta data derivaram. Por isso, não é, de todo, estranho que, em

16 de Julho de 1975, um novo Decreto-Lei viesse regular a cessação do contrato individual de

trabalho. Falamos do Decreto-Lei n.° 372-A/75.

Na verdade, no curto preâmbulo deste diploma legal, é difícil não ver espelhados os

“estandartes” da época, “de acordo com os mais legítimos anseios das organizações sindicais e

da generalidade do povo trabalhador”. Refere-se ainda, pela primeira vez, e pela positiva, os

direitos fundamentais, temática que serve também de alicerce a este trabalho (“(…) na defesa

dos direitos dos trabalhadores, nomeadamente do seu direito fundamental, o direito ao

trabalho”.).

Logo em sede de disposições gerais, este diploma legal revoga o Capítulo VI do

Decreto-Lei precedente, bem como todos os preceitos desconformes com o regime que então

se instituía, passo que abriria portas, pensaria um profissional, estudioso ou mesmo leigo, à

data e hoje, a uma inversão total do regime. Não obstante referências expressas a uma

“sociedade a caminho do socialismo” ou “camaradas”, como, aliás, era fruto da época, não

cremos que tal tenha acontecido.

Quanto ao despedimento colectivo, assiste-se, e é de grande importância referirmo-

nos, nesta sede, a este regime, como infra se verá, à consagração de “circunstâncias

objectivas”. Por via delas, a “manutenção da relação de trabalho” teria de tornar-se

“incompatível com os interesses globais da economia” (cfr. Art. 2.°, b) Decreto-Lei 372-A/75).

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O artigo 4.° do supra citado Decreto-Lei, não só consagra a justa causa como forma de

operar a cessação do contrato de trabalho, como, na sua alínea d), permite o despedimento

“com base em motivo atendível”, ou seja, um novo conceito indeterminado em sede de

legislação laboral.

A cessação por caducidade permanece, no ponto em que nos vimos focando, fiel à

redacção que lhe foi dada anteriormente. O art. 10° consagra uma cláusula geral de justa causa

de cariz condizente com o ano em questão, enfatizando a culpa, a gravidade e a ultima ratio do

despedimento em si como sanção a aplicar mas, no seu nº 2, consagra um elenco meramente

exemplificativo, o que nos leva a considerar que temos, aqui, não uma consagração efectiva de

um conceito restrito de justa causa (pela primeira vez na nossa ordem jurídica) mas, antes,

uma consagração meramente “aparente” do mesmo.

Senão vejamos. Neste nº 2, são de salientar duas alíneas pela amplitude que, em si

mesmas, encerram: as alíneas d) e f). A primeira, “O desinteresse repetido pelo cumprimento

das obrigações inerentes ao exercício do cargo ou posto de trabalho que lhe esteja confiado,

com a diligência devida”, porque a conjugação dos vocábulos “desinteresse”, “inerentes” e

“diligência” são passíveis de uma compatibilização com a actual redacção do art. 374° CT. A

segunda, “A lesão de interesses patrimoniais sérios da empresa”, porque nela não se lê algo

como os designados “crimes de colarinho branco” mas, precisamente, uma inadequação ao

modus operandi actual - leia-se, da data em questão - que apenas redunda no prejuízo que a

entidade empregadora suporta em manter um trabalhador não qualificado em determinado

posto de trabalho. Mais uma vez, somos a crer que estamos perante a consagração da figura

do despedimento por inadaptação.

Também o art. 12°, nº 5 não pode, ainda, deixar de ser alvo de menção, pois ao

consagrar o modo de apreciação da existência de justa causa de despedimento ou da

adequação da sanção aplicada ao comportamento concreto, dirige-se expressamente à “lesão

dos interessados da economia nacional ou da empresa”, para além das já aludidas relações

inter partes e demais circunstâncias do caso. Ora, não caberá, aqui, uma apreciação

semelhante à elaborada no parágrafo precedente?

Os interesses da economia, à luz do aludido prudente arbítrio do julgador, não se

poderiam incluir numa inadaptação de um trabalhador ao seu posto de trabalho, isto é, num

trabalhador que, sem intenção culposa ou dolo, reiteradamente se colocasse perante a

entidade empregadora numa posição produtivamente “dispensável” e, quiçá, provocadora de

prejuízos?

Este diploma legal destaca-se, ainda, por uma referência à cessação do contrato

individual de trabalho por motivo atendível. Esta novidade normativa, - de pouca dura, é certo

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- não só destoou espírito pós-revolucionário subjacente, como recebeu uma redacção

extremamente actual, tendo em vista as críticas com que nos debatemos e as conclusões que

pretendemos alcançar.

Assim, nos termos do art. 14°, nº 1, motivo atendível, seria todo “o facto, situação ou

circunstância objectiva, ligado à pessoa do trabalhador ou à empresa, que, dentro dos

condicionalismos da economia da empresa, torne contrária aos interesses desta e aos

interesses globais da economia a manutenção da relação de trabalho” (sublinhado nosso).

Deste modo, não podemos deixar de verificar como, em pleno ano de 1975, estava

consagrado o despedimento por motivos, não só subjectivos, como objectivos, internos e

externos à pessoa do trabalhador e em prol de um eficaz e competitivo funcionamento da

economia, considerada quer ao nível da empresa, quer ao nível nacional.

No seu nº 2, este mesmo artigo, adquire uma redacção, se nos permitem, caricata,

como à guisa de perdão e em clara contradição com a indubitável consagração do número

precedente.

Como é óbvio, a perda de um posto de trabalho nunca foi um fenómeno bem-vindo

por parte do trabalhador, podendo inclusive acarretar reflexos sociais e psicológicos negativos

na pessoa do mesmo, pelo que estipular a apreciação da “gravidade das consequências que

para o trabalhador representa a perda do emprego, nomeadamente face às condições do

mercado” e “características pessoais” do mesmo se nos assemelha utópico, senão mesmo

demagógico.

Destaque merece, por fim, o nº 3 do artigo que vimos analisando, em especial a sua

alínea b). Em primeiro lugar, este número, não consagra um elenco taxativo (“(…) poderão ser

considerados motivos atendíveis:”) e, em segundo, fez questão de considerar “a manifesta

inaptidão e impossibilidade de preparação do trabalhador para as modificações tecnológicas

que afectem o posto de trabalho”. Foi, portanto, clara a tentativa de instituir a figura do

despedimento por inadaptação já em 1975, ainda que sob uma diferente veste. Aliás, é nossa

convicção de que, à data, esta estava consagrada, pelo menos teleologicamente.

A revisão do regime estatuído no diploma supra citado não se fez esperar, de modo

que, logo em 28 de Janeiro de 1976, era publicado o Decreto-Lei n.° 84/76.

Este pouco extenso diploma legal foi o suficiente para levar a cabo a supressão da

matéria respeitante ao despedimento por motivo atendível, justificada no seu preâmbulo pela

inadequação da defesa da estabilidade do emprego e à contestação generalizada que

provocou.

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Também o despedimento por justa causa (cfr. art. 10.°, nº 2) sofreu alterações, vendo

o seu elenco, embora permanecendo não taxativo, reduzido a 6 (seis) alíneas e,

especialmente, a alínea d), passou a estipular uma “lesão culposa de interesses patrimoniais

sérios da empresa”. Assistiu-se, portanto, à introdução da vertente culposa na redacção e

espírito da figura, e ao consequente afastamento do regime de 1975, com o concomitante

regresso às redacções de 1966 e 1969.

Como referimos, todo o anterior Capítulo V dedicado ao despedimento por motivo

atendível foi revogado e substituído por disposições concernentes ao despedimento colectivo.

Bem sabendo que ora não tratamos desta matéria, não poderíamos deixar de referir a

absoluta incongruência de regimes entre despedimento colectivo e individual existente à data.

Na verdade, como se poderá ter alguma vez concebido a revogação/supressão do

supra aludido Capítulo V e da admissibilidade de despedimentos por causas objectivas e de

mercado ao nível do contrato individual de trabalho, quando, no art. 13.°, nº 2, semelhante

forma de cessação do contrato de trabalho é possível em sede de despedimento colectivo? E,

saliente-se, não nos focamos em despedimentos em massa, mas na mera possibilidade de

ocorrência do despedimento de, sublinhe-se, apenas 2 (dois) trabalhadores.

Vejamos: “Considera-se despedimento colectivo, para efeitos do presente diploma, a

cessação de contrato de trabalho (…) que abranja, pelo menos, dois ou cinco trabalhadores,

conforme se trata respectivamente de empresas com dois a cinquenta ou mais de cinquenta

trabalhadores, sempre que (…) ou redução do pessoal determinada por motivos tecnológicos

ou conjunturais”. Perguntamos, então, o que entender por “conjunturais”? Atrevemo-nos a

aventar que seriam, muito provavelmente, algumas das circunstâncias objectivas, como os

interesses da empresa, os interesses globais da economia a que aludia o Decreto-Lei 372-A/75,

entre outros, os quais, fruto da delicadeza temática e polémica que tendiam e ainda tendem a

gerar, conviria clarificar. Parece-nos, todavia, que se entendeu por bem ocultar.

Eis que é publicado o Decreto-Lei n.° 64-A/89, de 27 de Fevereiro, o qual vem aprovar

o Regime jurídico da cessação do contrato individual de trabalho e da celebração e caducidade

do contrato de trabalho a termo (LCCT).

No seu relativamente extenso preâmbulo, assumem relevância novas preocupações,

principalmente derivadas do mercado único europeu e, bem assim, enfatiza-se a necessidade

de modernização das empresas portuguesas, nomeadamente através dos seus processos

produtivos, inovação tecnológica, actividades de investigação, introdução de modernos

métodos de gestão, estratégias de internacionalização e mesmo de marketing (cfr. 2º

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parágrafo do aludido preâmbulo). Os trabalhadores não poderiam deixar de ser envolvidos

neste processo evolutivo, na medida em que são e, aliás, não poderiam deixar de ser vistos

como a «pedra de toque» do mesmo, “visando o aumento da produtividade” e, novamente, “a

modernização das empresas, designadamente na introdução de novos métodos de trabalho”.

Consequentemente, chama-se à prolação o “espírito de concertação” de ideias e

“diálogo construtivo” entre sindicatos e empresários na prossecução destes objectivos, ao

mesmo tempo que se reconhece abertamente a desadequação dos mecanismos até então

previstos (“anquilosados e tecnicamente ultrapassados”), “concebidos em épocas onde as

condições prevalecentes eram significativamente diferentes das que hoje nos são

proporcionadas pela integração nas Comunidades Europeias”. Assim, seguindo a linha dos

países-membros da então Comunidade Económica Europeia (CEE), a cessação da relação de

trabalho poderia resultar de um conjunto de circunstâncias objectivas decorrentes de

necessidades da empresa, sempre com as devidas garantias dos trabalhadores, seus direitos e

princípios, quer ao nível do Direito Substantivo, quer Processual do Trabalho.

Outra preocupação deste diploma foi, sem dúvida, a dispersão legislativa em matéria

laboral da época, influenciada, inclusive, nas palavras do mesmo preâmbulo “por diferentes

concepções, que conduzirão progressivamente à sua descaracterização”. Permitam-nos

acrescentar que muitas destas concepções já o estavam e, no fundo, dada a sua proliferação e

constante mutação, talvez nunca tenham estado verdadeiramente “caracterizadas” no seio da

nossa ordem jurídica.

Assume, portanto, a LCCT, o compromisso de alcançar e executar o mais justo

equilíbrio e estabilidade do emprego no seio da modernização, colocando a empresa como

foco de realização profissional e pessoal. Para tanto, uma profunda e equilibrada revisão dos

regimes de cessação contratual de então tornava-se imperiosa, bem como reinava a

“preocupação de não fomentar o desenvolvimento de estruturas rigidificantes, que, na prática,

acabam por impossibilitar as empresas de se adaptarem às exigências externas”, pondo em

causa a sua “própria subsistência”.

Deste modo, se temia o que designou por “proteccionismo excessivo”, a LCCT manteve

a preocupação de afastar os despedimentos arbitrários, consagrando-os em conformidade

com os desígnios constitucionais. Por outro lado, procurou salvaguardar a “inércia do

trabalhador”.

Vejamos como.

No seu art. 3.°, consagrou, desde logo, as formas de cessação do contrato de trabalho,

admitindo, no nº 2, f), que causas objectivas de ordem estrutural, tecnológica ou conjuntural

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relativas à empresa presidissem à cessação por extinção do posto de trabalho, razão pela qual

dois destes conceitos apareceram desenvolvidos no art. 26.° do mesmo diploma.

O art. 4.° regulou as causas de caducidade do vínculo laboral, verificando-se a

manutenção da fórmula já adoptada no Decreto-Lei n.° 47 032, de 27 de Maio de 1966, ou

seja, “a impossibilidade superveniente, absoluta e definitiva de o trabalhador prestar o seu

trabalho ou de a entidade empregadora o receber” (cfr. art. 4.°, b)).

Por nossa parte, reiteramos que nesta fórmula legal se confundem, indevidamente,

duas situações distintas. Uma impossibilidade superveniente, absoluta e definitiva poderá

ocorrer e originar a caducidade do contrato de trabalho, por exemplo, em virtude de um

acidente de trabalho ou de um acidente de cariz não laboral que provoque um grau de

incapacidade tal do trabalhador que o impeça do desempenho das suas funções, ou mesmo

ocorrendo uma situação análoga à que deu origem ao Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça

(STJ) de 24/09/2008, em que o funcionário da Sociedade Hoteleira em questão, exercendo as

funções de cozinheiro, contraiu o vírus de HIV positivo11. Por seu turno, a impossibilidade de a

entidade patronal receber o trabalhador poderá decorrer da circunstância de o trabalhador,

por motivos objectivos e/ou subjectivos, tornar-se um elemento não válido à empresa que o

emprega. Devidamente documentada, e assegurados que estejam os direitos do trabalhador

visado, defendemos que poderá ocorrer a cessação do vínculo entre ambas as partes, não à luz

da caducidade, mas à luz da inadaptação do trabalhador ao respectivo posto de trabalho.

No que concerne à justa causa de despedimento, o art. 9.°, nº 1, procede a ligeiras

alterações de construção frásica, mas mantém o enfoque no comportamento culposo do

trabalhador, cuja gravidade e consequências tornem a manutenção da relação laboral

imediatamente impossível. Já o seu nº 2, num elenco não taxativo (“Constituirão,

nomeadamente (…)”) e bem mais extenso do que os consagrados até então, não deixa de

consagrar alguns comportamentos dignos de destaque, como sejam o “Desinteresse repetido

pelo cumprimento, com a diligência devida (…)”, a “Lesão de interesses patrimoniais sérios da

empresa” – e, desta feita, não uma lesão culposa, como à luz dos art.s 10°, nº 2, d) do Decreto-

Lei n.° 84-/76, 102°, g) do Decreto-Lei n.° 49 408 e 99.°, g) do Decreto-Lei n.° 47 032 – ou as

“reduções anormais da produtividade do trabalhador” (cfr. alíneas d), e) e f), respectivamente,

do citado artigo). Todas estas situações são, na linha de entendimento que adoptamos,

passíveis de integrar o actual regime de despedimento por inadaptação ao posto de trabalho,

como passaremos a explicar.

11 Cfr. Acórdão STJ nº SJ20080924037934, Processo 07S3793, de 24-09-2008, disponível em www.dgsi.pt

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A propósito do disposto na alínea d), lembremos o Acórdão do STJ de 21/09/2004, no

qual, muito embora se discutisse a cessação do contrato de trabalho por extinção do posto de

trabalho, a Autora não conseguiu evitar o seu despedimento, nomeadamente por falta de

empenho em se adaptar a uma nova função dentro da empresa, tendo sido provado que, face

a dificuldades perante formação ministrada, a trabalhadora/Autora “desistiu de concluir tal

formação” e “não aceitou ir para Espanha para fazer formação e integrar o projecto T0, no

qual não existia soldadura automática”12, área de trabalho em que laborava e que se viria a

extinguir. Assim, verificamos que esta trabalhadora demonstrou, precisamente, um

“desinteresse repetido” pela manutenção de uma função no seio da empresa, não tendo, de

todo, actuado com a “diligência devida”.

Não podemos ainda, está claro, deixar de estabelecer um paralelismo entre a referida

alínea f) e o actual regime do despedimento por inadaptação que, recorde-se, à data, não

estava instituído no nosso ordenamento jurídico. Como sabemos, o actual art. 374°, nº 1, a) e

b), estipulam o seguinte: “Redução continuada de produtividade ou de qualidade” e “Avarias

repetidas nos meios afectos ao posto de trabalho”. Ora, para além de constituírem fórmulas

muito pouco diferenciadas de transmitir o mesmo pensamento legislativo, estamos,

inequivocamente, perante, uma “(…) inadaptação superveniente do trabalhador ao posto de

trabalho” (cfr. art. 373° CT actual), “(…) determinada pelo modo de exercício de funções do

trabalhador” (cfr. art. 374° CT actual), tornando praticamente impossível a subsistência da

relação de trabalho.

Uma última referência ao art. 16° do Decreto-Lei sub judice, que optou por manter a já

aludida incompreensibilidade no que concerne ao regime de cessação de contrato de trabalho

por extinção de posto de trabalho, fundada, esta sim, em causas objectivas, e admitida para

um mínimo de, relembre-se dois trabalhadores.

Introdução ou Reintrodução?

Foi, finalmente, com o Decreto-Lei n.° 400/91, de 16 de Outubro, que a figura do

despedimento por inadaptação foi expressamente introduzida na ordem jurídica portuguesa.

Porém, muitos são os autores que aqui leêm uma “reintrodução” e não uma verdadeira

12 Cfr. Acórdão STJ nº SJ200506220009234, Processo 05S923, de 22-06-2005, disponível em www.dgsi.pt

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“introdução”, face ao caminho legislativo que vimos analisando13. Alinhamos, naturalmente,

com aqueles.

Dispõe o preâmbulo deste DL que, à semelhança do que ocorre ao nível do regime

previsto para o despedimento por extinção do posto de trabalho, em virtude da introdução de

“modificações para as quais o trabalhador venha a revelar impossibilidade de adaptação”,

também o funcionamento da empresa sairá perturbado, o seu equilíbrio económico-financeiro

posto em risco e, a prazo, outros postos de trabalho extintos. Assim, “atenta a objectividade

que deve ser assegurada” nestes casos, estabelece-se uma “regulamentação substantiva e

processual que confira segurança e justiça à decisão de fazer cessar o contrato por aquele

motivo”, obedecendo mesmo a 7 (sete) princípios fundamentais, quais sejam, uma tipificação

rigorosa de situações que revelam a aludida inadaptação do trabalhador; a definição dos

requisitos de licitude da cessação do contrato com este fundamento; a especificidade e

exigibilidade de objectivos no regime dos cargos de complexidade técnica ou de direcção; a

salvaguarda do direito de oposição do trabalhador; o seu direito de acção judicial, com vista à

eventual declaração de nulidade da cessação do contrato de trabalho por inadaptação; a

instituição de uma providência cautelar de suspensão da cessação do contrato e, por fim, a

proibição da diminuição do volume de emprego permanente da entidade empregadora (cfr.

preâmbulo do supra citado Decreto-Lei n.° 400/91).

Isto posto, os artigos 1° a 12° estabeleceram o regime da cessação do contrato de

trabalho com fundamento em inadaptação do trabalhador ao posto de trabalho, sendo de

destacar o art. 2° e o seu nº 1, com um elenco taxativo de três situações em que,

objectivamente, “pelo modo de exercício de funções do trabalhador”, o vínculo laboral se

tornava impossível de manter (“a) Redução reiterada de produtividade ou de qualidade; b)

Avarias reiteradas nos meios afectos ao posto de trabalho; c) Riscos para a segurança e saúde

do próprio ou dos restantes trabalhadores ou de terceiros.”).

O nº 2 do mencionado artigo cuidava do regime específico previsto para os cargos de

complexidade técnica ou de direcção, binómio que hoje se mantém e cremos que bem. Não

perfilhamos inteiramente a crítica tecida por Abílio Neto quando se refere, a nosso ver, com

demasiado afinco terminológico, ao facto de o CT “não ter definido, directa ou indirectamente,

o que deva entender-se por «cargos de complexidade técnica ou de direcção»”14 pois, no caso

concreto, será de relativa facilidade, a qualquer uma das partes, demonstrar, através das

funções desempenhadas/exigidas, se estamos perante um cargo que poderá merecer tais

13

Cfr. PALMA RAMALHO, ob. cit., pp. 913 e ss. e ROMANO MATINEZ, ob. cit., pp. 1075 e ss.. Em sentido diverso, cfr. MONTEIRO FERNANDES, “Direito do Trabalho”, pp. 416 e ss., especialmente pp. 514 a 517. 14 Cfr. NETO, ob. cit., pp. 910 e ss.

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configuração e designação. Não será, portanto, necessariamente, um cargo que exija, no

mínimo, uma licenciatura ou um grau de estudos ainda superior.

Obedecendo à mesma objectividade e impossibilidade de manutenção da relação

laboral, a inadaptação, nestas situações, verifica-se aquando do não cumprimento dos

“objectivos previamente fixados e formalmente aceites” entre as partes. Trata-se, aqui, nas

palavras do supra citado autor, de um “acordo de rendimento”, cuja redução a escrito se

afigura essencial e poderá ocorrer, “quer na altura da admissão do trabalhador, quer no

decurso da vigência do contrato, abarcando um período de tempo mais ou menos longo, mas

não tão exíguo que não permita uma avaliação séria e ponderada”. Aliás, continua o autor,

“perante uma proposta de acordo deste tipo, o trabalhador deve ponderar bem se lhe convém

aceitá-la – e essa recusa/aceitação é inteiramente livre -, pois bem pode suceder que se trate

de uma “armadilha”, destinada a pôr termo ao contrato (…)”.15 Convém, no entanto, não

esquecer aqueles postos de trabalho, como sejam, por exemplo, os comerciais de vendas, em

que a definição e o alcance de determinados objectivos ou metas temporalmente fixados,

constitui, normalmente, uma vertente implícita do seu exercício, objectivos estes que,

precisamente em virtude da economia de mercado e de factores de vária ordem interna e

externa da empresa, podem e variam certamente com regularidade. Somos da opinião de que,

nestes cenários, a opção entre optar/recusar não será, de todo, equacionável. Temos vindo a

defender e a sustentar doutrinalmente a fraca adesão a esta figura para fazer cessar o

contrato de trabalho, pelo que se nos afigura extremo e quase maquiavélico imaginar que nos

tempos hodiernos uma entidade empregadora, visando alcançar tal objectivo, delineie

semelhante trajecto tão meticuloso e dispendioso. Mesmo assim, não deixa, de todo, de ser

uma possibilidade perfeitamente compaginável com o regime em mãos e, de resto, com a

natureza humana.

Pedro Romano Martinez, entende que “complexidade técnica” se trata de um

“conceito indeterminado que abrange um número elevado de situações, carecendo, pois, de

concretização”16, concretização que, contudo, não adianta. Os já aludidos objectivos

previamente fixados serão, na óptica do mesmo autor, uma condição “que não é, por si,

resolutiva, mas que funciona como requisito da inadaptação”. Lamentamos que esta posição

se encontre, apesar de apreensível, pouco desenvolvida no que concerne à sua contribuição

para a praticabilidade do regime.

15

Cfr. NETO, ibidem. 16

Cfr. ROMANO MARTINEZ, em coautoria com MONTEIRO, VASCONCELOS, MADEIRA DE BRITO, DRAY e GONÇALVES DA SILVA, “Código do Trabalho Anotado”, pp. 973 e ss.

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Quanto à impossibilidade de subsistência da relação de trabalho, elemento basilar de

ambos os regimes (inadaptação tout court e inadaptação nos casos de cargos de complexidade

técnica ou de direcção), entende, ainda, que deve ser vista como a “inviabilidade de o

empregador manter aquele trabalhador inadaptado, para o qual não tem posto de trabalho

compatível”, aludindo ao preceituado no art. 368°, nº 4 CT a propósito do regime de

despedimento por extinção de posto de trabalho (“4. Para efeito da alínea b) no n.° 1, uma vez

extinto o posto de trabalho, considera-se que a subsistência da relação de trabalho é

praticamente impossível quando o empregador demonstre ter observado critérios relevantes e

não discriminatórios face aos objectivos subjacentes à extinção do posto de trabalho.”)17

Atentemos, agora, no art. 3.° do Decreto-Lei n.° 400/91, o qual estabelecia as

condições desta forma de cessação do contrato de trabalho. Verificamos, pois, que se tratava

de um elenco taxativo de 6 (seis) requisitos cumulativos, o que não só atestava as pretensões

aludidas no preâmbulo do diploma, como tornava extremamente difícil o recurso a este

mecanismo como forma de uma entidade empregadora se “ver livre”, facilmente, de qualquer

trabalhador, o que, de resto, fica patente pela leitura do restante regime consagrado neste

diploma legal (cfr., nomeadamente, os artigos 4.° (Comunicações), 5.° (Processo), 8.° (Ilicitude

da cessação do contrato) e 10.° (Manutenção do nível de emprego permanente).

17

Cfr. ROMANO MARTINEZ, em coautoria com MONTEIRO, VASCONCELOS, MADEIRA DE BRITO, DRAY, e GONÇALVES DA SILVA, ob. cit.

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IV – Os Acórdãos n.°s 107/88, de 31 de Maio e 64/91, de 4 de Abril do Tribunal

Constitucional e a Constituição da República Portuguesa

Surgido na sequência de um requerimento do então Presidente da República (PR)

Mário Soares, o Acórdão n.° 107/88, de 31 de Maio, do Tribunal Constitucional (TC), veio

fiscalizar preventivamente 5 (cinco) normas do Decreto da Assembleia da República (AR) n°

81/V, decreto de autorização legislativa que procedia à revisão do regime jurídico da cessação

do contrato individual de trabalho, do contrato a termo e do regime processual da suspensão e

redução da prestação de trabalho. Das normas submetidas a apreciação constitucional, releva

para o presente trabalho o art. 2°, a) do citado Decreto, que visava alargar o conceito de justa

causa para despedimento individual a factos, situações ou circunstâncias objectivas que

inviabilizassem a relação de trabalho e estivessem ligados à aptidão do trabalhador ou fossem

fundados em motivos económicos relativos à empresa, estabelecimento ou serviço. Estaria,

pois, em vista, a legitimação do despedimento por factos não ligados à conduta estritamente

culposa do trabalhador.

Na sua fundamentação, entendeu o PR que tal contenderia com os direitos de

segurança no emprego e no trabalho e ao trabalho, previstos nos art.s 53° (“Segurança no

emprego – É garantida aos trabalhadores a segurança no emprego, sendo proibidos os

despedimentos sem justa causa ou por motivos políticos ou ideológicos”) e 59°, nº 1 - hoje 58°,

nº 1 (“Direito ao trabalho – 1. Todos têm direito ao trabalho.”) - da Constituição da República

Portuguesa (CRP).

O Acórdão viria a pronunciar-se pela inconstitucionalidade da norma “por violação no

disposto nos artigos 55º, alínea d), 57º, nº 2, alínea a) e também do disposto no artigo 53º,

todos da Constituição”18, aderindo a uma natureza restrita do conceito de justa causa,

incluindo nele apenas as situações subjectivas disciplinares, de comportamento culposo do

trabalhador que, pela sua gravidade e consequências, levasse a uma imediata e impossível

subsistência da relação laboral. O TC escudou a sua decisão em fundamentos e argumentos

históricos pois, “não definindo a Constituição o que sejam despedimentos sem justa causa,

cabe apurar se, aquando do recebimento do conceito, este foi acolhido com o sentido que lhe

vinha sendo dado na ordem jurídica interna anterior, ou se, porventura, foi transformado o seu

significado e sentido, isto é, o seu espaço semântico.”19 Seguindo o entendimento de J. J.

Gomes Canotilho e Vital Moreira, sustentou o douto Acórdão que “quando a Constituição

18

Cfr. Acórdão do Tribunal Constitucional n.° 107/88, de 31 de Maio, Processo nº 220/88, disponível em www.tribunalconstitucional.pt 19 Cfr. ibidem.

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recebe um determinado conceito legal com um certo sentido, este fica, por assim dizer,

«constitucionalizado», deixando de estar à disposição do legislador”.

Assim, ao rejeitar cabalmente uma concepção do conceito de justa causa em sentido

amplo, afastou a inaptidão/inadaptação do trabalhador. Considerou o douto Acórdão (Ac.) que

a CRP, ao acolher o conceito de “justa causa”, fê-lo com um sentido “rigorosamente

delimitado”, não podendo a lei ordinária vir, posteriormente, modificá-lo de forma a fazer

corresponder ao dito preceito “coisas substancialmente diferentes do que originariamente

dizia”.

Contradizendo um pouco a sua fundamentação, continua o Ac. referindo que, “como

em qualquer outro conceito constitucional, existe, é certo, uma determinada margem de

liberdade de configuração legislativa concreta de justa causa.” O que não pode suceder é vir o

legislador “transfigurar o conceito, de modo a fazer com que ele cubra dimensões essenciais e

qualitativamente distintas daquelas que caracterizam a sua intenção (…)”, concluindo, por

isso, que o alargamento em análise configuraria uma “transmutação substancial”. Não

podemos, de modo algum, perfilhar esta linha de pensamento, não só porque entendemos

não se tratar de qualquer transmutação conceptual, como a escolha de tal vocábulo foi infeliz

e abrupta. De facto, na precipitação de votar a inconstitucionalidade, parece-nos que foi

verdadeiramente descurada a adaptabilidade e oportunidade legislativas que a Proposta de lei

em análise mereciam. Falamos do acompanhamento e evolução da realidade legislativa à

realidade social e económica e não de uma subversão insultuosa à Lei Fundamental.

De maior relevância se nos afigura a grande questão que o TC deixa expressamente em

aberto. Aparentemente, não mereceu importância determinar se, “à proibição constitucional

do despedimento sem justa causa corresponde, necessariamente, a exclusiva legitimidade

constitucional do despedimento com justa causa, ou se, pelo contrário, ainda seria igualmente

lícita a previsão de despedimentos fundados em causas objectivas não imputáveis a culpa do

empregador que, em cada caso concreto tornem praticamente impossível a subsistência da

relação de trabalho”. Simplificando, seriam estes despedimentos realmente proibidos/ilícitos,

ou foi esta redacção infeliz? Continuou argumentando que, se “se seguisse tal entendimento,

(…) sempre se exigiria um tratamento distinto”20 daquele porque se regem os despedimentos

por justa causa em termos substantivos e processuais.

Não admitiu, ainda, o douto Ac. que a figura consagrada no supra analisado Decreto-

Lei n.° 372-A/75 do despedimento por motivo atendível “renascesse”.

20 Cfr. ibidem.

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Tal decisão do TC não foi, contudo, unânime, tendo inclusive suscitado quatro

declarações de voto de vencido dos Conselheiros Raúl Mateus, Messias Bento, José Manuel

Cardoso da Costa e Armando Manuel Marques Guedes, os quais consideraram que a CRP

admitia um conceito amplo de justa causa e, por consequência, o despedimento fundado em

causa objectivas. Nesta parte, o diploma não seria, portanto, inconstitucional.

Assim, Raúl Mateus, partindo do mesmo pressuposto histórico que levou o douto Ac. a

considerar inconstitucional o alargamento do conceito de justa causa, na medida em que este

apenas abarcaria um critério subjectivo (um comportamento culposo e censurável do

trabalhador) e já não um critério objectivo (um qualquer outro motivo baseado em razões

puramente externas), vem, de encontro ao nosso entendimento, inferir dos diplomas

publicados desde 1937 uma conclusão oposta. Este juiz Conselheiro considerou que, na Lei

1952, de 10 de Março de 1937, o conceito de justa causa consagrado era amplo, atendendo

tanto a motivos subjectivos - ligados à conduta do trabalhador -, como a motivos objectivos -

circunstâncias alheias à vontade deste último -, desde que a gravidade então verificada fosse

de tal ordem que não tornasse possível a manutenção da relação laboral entre as partes. Os

diplomas que se lhe seguiram (DL 47 032, de 27 de Maio de 1966 e DL 49 408, de 21 de

Novembro de 1969 - LCT) mantiveram este conceito amplo de justa causa, não obstante as

suas já analisadas alterações de ordem sistemática e o facto de terem, ainda, “sucessivamente,

implementado novo regimes jurídicos do contrato individual de trabalho”.21 Acrescenta,

relativamente ao DL 49 408, que o mesmo nos “dá uma definição de justa causa de tal modo

lata que nela se hão-de compreender necessariamente tanto causas subjectivas como

objectivas de despedimento, e, por outro lado, porque o artigo 102° do mesmo diploma legal

faz uma enumeração meramente exemplificativa, como nele expressamente se refere, dos

factos constitutivos de justa causa.”22

Prossegue a sua análise histórica de forma minuciosa, de modo que, chegados a 1975,

entende ter sido o regime patente na LCT simplesmente suspenso, pelo prazo de 30 dias,

estipulado pelos art.s 21° a 23° do DL 292/75, de 16 de Julho, o que o leva a concluir, e bem,

segundo cremos, que o regime estatuído naquele diploma legal e, consequentemente, o

conceito de justa causa nele expresso, “ao menos em termos absolutos, não foi então posto à

margem. Simplesmente, e para aquele período transitório de congelamento de despedimentos,

se estabeleceu, e excepcionalmente, um regime de ínterim.”23

21 Declaração de voto de vencido do Juiz Conselheiro Raúl Mateus no supra citado Acórdão n.° 107/88 do Tribunal Constitucional. 22

Cfr. ibidem. 23 Cfr. ibidem.

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Continua com alusão aos projectos de revisão constitucional apresentados à

Assembleia Constituinte pelos partidos Socialista (PS) e Popular Democrático (PPD) pois, da sua

leitura, no que se refere à matéria de segurança no emprego, retira a consagração de um

“conceito amplo de justa causa de despedimento” que, reitera, “desde 1937, e sem

interrupções, vinha vigorando na ordem jurídica portuguesa. De facto, nem num, nem noutro

projecto, se estabelecem limitações a tal conceito, cuja amplitude e significado se manteve

naturalmente por adquirida”.24

Entretanto, no decorrer dos aludidos trabalhos da Assembleia Constituinte, foi

publicado o supra analisado DL 372-A/75, de 16 de Julho, o qual, como vimos, consagrou, nas

palavras de Raúl Mateus, “pela primeira vez no nosso ordenamento jurídico laboral, um

conceito restrito de justa causa”, mas cujas causas, entende, passaram a ser catalogadas “à

parte, na categoria dos motivos atendíveis, motivos com base nos quais ficou a ser consentido

o despedimento com aviso prévio, e não já o despedimento imediato”.25

O supra aludido diploma legal tinha um mês e meio de vigência e prosseguiram os

trabalhos da Assembleia Constituinte, destacando o conselheiro as propostas do PS e PPD a

propósito da Garantia do direito ao trabalho. Salienta o entendimento dos dois partidos, em

17 de Setembro de 1975, tendo o PS retirado a sua proposta e apresentado uma outra em sua

substituição, proposta essa que o PPD (bem como os restantes partidos, que não tomaram

parte na discussão) veio a aprovar, por repensada a redacção que havia dado à sua. Vai ainda

mais longe e transcreve excertos do debate dos deputados Marcelo Curto (pelo PS) e Mário

Pinto (pelo PPD). Deste modo, entendeu Marcelo Curto, ficarem de “fora desta proibição os

despedimentos tecnológicos ou os chamados despedimentos colectivos, porque esses

despedimentos ou essa colocação no desemprego de alguns trabalhadores é uma constante da

própria reorganização económica” e, na mesma linha de raciocínio, entendeu Mário Pinto, que

“ficou claro qual o alcance dado ao conceito «justa causa», alcance que não corresponde

exactamente ao sentido, ao âmbito técnico e clássico do termo ou da expressão, mas que é um

pouco mais amplo, abrangendo situações objectivas socialmente relevantes e justificadas,

designadamente face aos planos socio-económicos. Esse entendimento corresponde à posição

do Partido Popular Democrático, que, aliás, já tinha repensado a proposta de ontem (…),

substituindo a expressão «motivo atendível» por «motivo socialmente justificado».”26

Face ao exposto, acusando o douto Acórdão de ter feito uma leitura errada dos

acontecimentos que culminaram com a aprovação da proposta do PS e com o sentido da

24

Cfr. ibidem. 25

Cfr. ibidem. 26 Cfr. ibidem.

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26

mesma, conclui Raúl Mateus que não era lícito ao mesmo pugnar pela consagração de um

conceito restrito de justa causa, bem como o entendimento de que “a Constituição há-de

cristalizar necessariamente os conceitos legais vigentes ao tempo da sua aprovação”.27

Neste sentido, parece-nos adequado fazer referência à concepção constitucional de

justa causa defendida por Monteiro Fernandes, a qual abrangerá “toda e qualquer situação (de

natureza disciplinar ou outra) capaz de, em concreto, suscitar a impossibilidade prática da

subsistência das relações que o contrato de trabalho supõe”28, não podendo resultar de uma

determinação acidental mas, antes, de uma consolidação legislativa. O autor dá, aliás, como

exemplo desta determinação acidental, o conturbado período legiferante que Portugal viveu

nos anos de 1975 e 1976, os quais tivemos oportunidade de analisar, e que caracteriza de

“instabilidade social e cultural”29. Acrescentaríamos, política.

Perante tão detalhada análise por parte de Raul Mateus, e o que se nos assemelha

como uma inequívoca opção pela consagração de um conceito amplo de justa causa no

ordenamento jurídico laboral português, não podemos compreender a posição do TC ou a sua

interpretação da Proposta de lei sujeita a fiscalização preventiva, a qual patenteia uma

autêntica “teimosia” em não querer suscitar querelas doutrinais de grande monta.

Avançando para a Revisão constitucional de 1982, o juiz conselheiro que temos vindo a

citar salienta, não só a transformação da segurança no emprego como mera incumbência do

Estado em garantia dos trabalhadores (Cfr. art.s 52°, b) do texto de 1976 e art. 53° actual CRP),

como também a proposta de alteração apresentada pelo Partido Comunista Português (PCP), a

qual mereceu uma rejeição que, no seu entendimento – o qual, aliás, secundamos – “não pode

deixar de ter uma clara significação: a de que o poder constituinte derivado recusou

expressamente restringir o conceito constitucional de justa causa”. Não deixa de ser curioso

que esta passagem da história constitucional portuguesa seja omitida no acórdão.

Incompreensivelmente? Talvez não.

Posteriormente, segundo o douto Acórdão, tanto a LCCT, como a legislação ordinária

terão interpretado o conceito de justa causa em sentido estrito, lendo-o unicamente à luz de

motivações do tipo subjectivo. Também aqui o voto de vencido faz uma chamada de atenção

para um diploma em particular: o DL 508/80, de 21 de Outubro, que veio regulamentar o

contrato de serviço doméstico e veio dar ao conceito de justa causa uma “definição alargada”,

tendo em atenção a sua “natureza especial”.30

27 Cfr. ibidem. 28

Cfr. MONTEIRO FERNANDES, ob. cit. 29

Cfr. MONTEIRO FERNANDES, ob. cit. 30 Cfr. art. 16°, nº 1 do DL 508/80, de 21 de Outubro.

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27

Muito embora seja o argumento histórico a base da argumentação de Raúl Mateus,

esta não finda com ele. Desta feita, encontra fundamentos também no Direito Internacional.

De acordo com o preceituado no artigo 23°, nº 1 da Declaração Universal dos Direitos do

Homem (DUDH) - cujos preceitos a CRP recebe e interpreta em conformidade (16°, nº 2 CRP) -,

“toda a pessoa tem direito ao trabalho, à livre escolha do trabalho, a condições equitativas e

satisfatórias de trabalho e à protecção contra o desemprego”. Deste modo, causas objectivas

que tornem impossível a continuidade da relação laboral, não serão, de modo algum,

condições equitativas e satisfatórias de trabalho.

Outrossim, a própria Organização Internacional do Trabalho (OIT), instituição

especializada da Organização das Nações Unidas (ONU), na Recomendação nº 119 que emitiu

– “Nenhum despedimento se deverá verificar sem que ocorra motivo válido (…) ligado à

aptidão ou à conduta do trabalhador ou devido a necessidades de funcionamento da empresa,

do estabelecimento ou do serviço.” – interpretou, “naturalmente nesse sentido a DUDH”, e

“considerou justificável o despedimento por razões objectivas, desde que impostas por

necessidades de funcionamento da empresa, estabelecimento ou serviço. Tendo, pois, em

conta o disposto no artigo 16°, nº 2, da Constituição, deveria ter sido interpretado nesta

mesma linha o artigo 53° da Constituição. Não foi, porém, o que se verificou”.31

Regressando ao direito nacional, termina lembrando que, uma vez que a própria CRP

não fixou quaisquer princípios de forma a proceder à sua interpretação, sempre se deverá

recorrer aos “geralmente considerados como princípios de aplicação universal na nossa ordem

jurídica”32, consagrados no art. 9° do Código Civil (CC). Face à realidade e à perpétua

dualidade/conflito que constituem os interesses do trabalhador e os interesses da empresa,

não seria, reconhece “naturalmente fácil, nem talvez possível, dizer-se (…) qual deveria ser a

solução mais acertada”. Porém, afirma e reitera que a aferição do Acórdão nº 107/88 foi

“extremista”, protegendo “quase absolutamente a estabilidade no emprego”, prejudicando

“quase absolutamente o equilíbrio económico das empresas, e que pela sua inflexibilidade”

viria “a ter, a prazo, efeitos devastadores na economia”.33 Não poderia, por isso, ser este o

caminho certo, um caminho tão afastado da equidade desejável, que abriu portas à discórdia,

não só em 1988, como nos dias de hoje.

O juiz conselheiro Messias Bento, secundado pelos conselheiros Cardoso da Costa e

Marques Guedes, votou vencido em termos bastante similares aos supra aludidos.

31

Cfr. ibidem. 32

Cfr. ibidem. 33 Cfr. ibidem.

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28

Desde logo, entendeu que o conceito constitucional de justa causa “é susceptível de

cobrir «factos, situações ou circunstâncias objectivas»” que fundamentem despedimentos

individuais, “liguem-se eles à aptidão do trabalhador ou fundem-se, antes, em motivos

económicos, tecnológicos, estruturais ou de mercado relativos à empresa”34, questão que,

enfatiza, o Tribunal deixou em aberto. Uma vez mais, confrontamo-nos com a perfilhação de

um conceito amplo de justa causa.

Percorrendo igualmente, mas de forma um pouco mais abreviada, o percurso

histórico-legislativo português, entende que, com o DL n.° 84/76, de 28 de Janeiro, foram

desatendidas, não só a “inaptidão ou incompetência do trabalhador”, como as “necessidades

de conservação empresarial, por mais imperiosas que fossem”35 e, citando Bernardo da Gama

Lobo Xavier, “não faz sentido que a Constituição recebesse um conceito tão restrito (…). A

Constituição, quando proíbe os despedimentos sem justa causa, coloca-se noutra perspectiva:

a de defesa do emprego e a necessidade de não consentir denúncias motivadas. (…) a proibição

constitucional pretende atingir os despedimentos arbitrários, isto é, sem motivo justificado.”36

Como verificamos, não estaria vedado o despedimento por motivos objectivos relacionados

com a evolução tecnológica e, claro está, com a capacidade de adaptação a esta pelo

trabalhador ou necessidades empresariais. Messias Bento coloca, deste modo, e cremos que

acertadamente, o enfoque, na proibição da discricionariedade, nos despedimentos sem

qualquer motivo – ad nutum – ou sem motivo justo/razoável, isto é, arbitrários. Mais, visto

tratar-se a justa causa de um conceito indeterminado, como o é a própria ideia de Justiça,

caberá ao legislador especificar ao máximo e dar forma ao seu conteúdo.

Considera mesmo “inexigível” a manutenção da relação laboral quando esta advenha

de factos, situações ou circunstâncias objectivas, quer por parte do trabalhador (inaptidão ou

falta de preparação para as modificações impostas), quer por parte da empresa

(desenvolvimento tecnológico, estrutural ou de mercado), podendo tornar-se “imperioso

proceder à extinção de postos de trabalho”37 em tais casos.

Mas, por razões de justiça e equidade, exige que tais despedimentos não ocorram sem

o pagamento da devida indemnização e aviso prévio, concluindo que “um despedimento

individual sujeito a um regime desta natureza (…) é algo que a própria dinâmica da economia

inelutavelmente acaba por impor”.38

34 Cfr. Declaração de voto de vencido do Juiz Conselheiro Messias Bento no supra citado Acórdão n.° 107/88, do Tribunal Constitucional. 35 Cfr. ibidem. 36

Cfr. ibidem. 37

Cfr. ibidem. 38 Cfr. ibidem.

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29

Este juiz conselheiro termina com dois pensamentos de extrema relevância. Em

primeiro lugar, considera “deveras incompreensível que razões do tipo apontado” possam

legitimar constitucionalmente despedimentos colectivos e já não o despedimento de um único

trabalhador e, em segundo lugar, que a palavra “modernização”, imposta aos empresários,

transforme o posto de trabalho num direito absoluto e incondicional, “uma espécie de direito

de propriedade”.39

Três anos decorridos, em virtude de um novo decreto de autorização legislativa

(Decreto nº 302/V da Assembleia da República, resultante da aprovação da Proposta de Lei nº

176/V, consequência de um processo de negociações em sede de Conselho Permanente de

Concertação Social que culminou, em 19 de Outubro de 1990, com a assinatura do Acordo

Económico e Social) que visava, entre outras matérias, regular a cessação do contrato de

trabalho por inadaptação do trabalhador, suscitou-se, uma vez mais, a questão da

constitucionalidade. Neste sentido, o Presidente da República (PR), Mário Soares, requereu a

fiscalização preventiva do diploma, não só dada “a importância das matérias em questão”,

mas também “a necessidade de ser aprofundada a doutrina que emana do acórdão nº

107/88”40 do TC que acabamos de analisar. Receava-se, então, na parte que nos concerne ao

presente estudo, que o que se entendeu por uma enunciação genérica das medidas a adoptar

em sede de despedimento por inadaptação poderiam pôr em causa o princípio da Tipicidade e

violar os princípios da Proibição do Excesso e da Segurança do emprego, consagrados nos

artigos 18°, nº 2 e 53° da CRP. Como já fizemos notar, na sequência de quaisquer “mal-

entendidos” que, desde 1988, tivessem permanecido, entendeu o TC apreciar de novo a

questão da delimitação da noção constitucional do conceito de justa causa de despedimento.

Certo é, no entanto, que o TC viria a pronunciar-se pela inconstitucionalidade de todas

as normas constantes do supra citado decreto por violação de normas que contenderam com

o processo de elaboração do mesmo, isto é, por falta de audição e participação das comissões

de trabalhadores e associações sindicais (cfr. art.s 54° e 56° CRP), tendo expressamente

declarado que “este Tribunal perfilha o entendimento de que não é constitucionalmente

ilegítima esta nova figura de cessação de contrato de trabalho, nos precisos termos em que

39

Cfr. ibidem. 40

Cfr. Acórdão do n.° 64/91, de 4 de Abril, do Tribunal Constitucional, disponível em www.tribunalconstitucional.pt

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está regulada no Decreto em apreciação, desenvolvendo assim a problemática do Acórdão nº

107/88” (sublinhado nosso).41

Não antecipando a questão em demasia, estavam em causa os artigos 2° e 6°, nº 2, a) e

c) do referido decreto, cuja única diferença substancial de redacção relativamente ao regime

actualmente estabelecido consiste, naturalmente, no facto de não estar prevista a

possibilidade de recurso a esta figura de cessação de contrato de trabalho nos casos em que

não tenha havido introdução de modificações tecnológicas no posto de trabalho.

Este acórdão salientou a posição tomada pelo seu “predecessor” e explanou as

motivações aduzidas por aquele. Porém, não deixou de referenciar a questão que o mesmo

teve o cuidado, senão a intenção, de deixar em aberto: será lícita a previsão de despedimentos

com justa causa objectiva não imputável à pessoa do empregador em situações analisadas

concretamente, que impossibilitem a manutenção do vínculo laboral? Sublinhou que, a serem

admitidos, tais despedimentos, necessitariam, aliás, como já havia sido salientado em 1988, de

regulamentação substantiva e processual própria.

Ora, este acórdão encontrava-se, à data, perante uma regulamentação desta exacta

natureza.

O acórdão passou, então, a enumerar os objectivos do Acordo Económico e Social

assinado em Outubro de 1990, salientando a criação da figura de que cuidamos, bem como

destacando os objectivos que presidiram à sua celebração, de entre os quais não podemos

deixar de salientar “a modernização do tecido empresarial”, a “reestruturação da empresas”, a

“introdução de novas tecnologias ou equipamentos”, “a racionalização e adequação dos

recursos humanos no quadro de uma situação favorável de emprego”, a prevenção de

“desequilíbrios estruturais” por via da inadaptação e perda de competitividade do trabalhador

ou o incentivo da “formação profissional”42, todos patenteando uma incrível verosimilhança

com os objectivos que presidiram ao Compromisso Para o Crescimento, Competitividade e

Emprego (2011) e ao Memorando de Entendimento sobre as Condicionalidades de Política

Económica (2012), como infra veremos.

Analisando em concreto o requerimento que lhe foi dirigido, o TC, pareceu considerar

o mesmo, no que às normas respeitantes ao despedimento por inadaptação concernem, algo

vago, porquanto não entendeu como poderiam estar os princípios da Igualdade e Tipicidade

postos em perigo quando as alíneas visadas do Decreto claramente distinguiam as situações

em que tal figura poderá ser aplicada ao trabalhador comum (alínea a) e aos trabalhadores

que exerçam cargos de complexidade técnica ou de direcção, distinção já nossa conhecida e

41

Cfr. ibidem. 42 Cfr. ibidem.

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31

analisada. Não compreendeu também o douto acórdão como pôde o visado decreto fazer

perigar a Segurança no emprego, visto constar das normas sujeitas a fiscalização a garantia de,

“nomeadamente, prévia formação formação profissional e um período de adaptação suficiente

no posto de trabalho”.43

Curiosamente, o PR, no requerimento elaborado ao TC, não se mostrou atingido pela

redacção da alínea que estabelecia as situações de inadaptação ou os seus condicionamentos,

mas sujeitou a fiscalização da alínea c) do nº 2 do art. 6° do decreto, a qual estabelecia,

precisamente, os condicionamentos específicos da cessação relativamente aos cargos de

complexidade técnica ou de direcção. Não é, pois, no mínimo, “estranho”, que os

condicionamentos gerais tenham escapado ao crivo constitucional? Não seria de esperar uma

ordem de factores precisamente inversa?

Citando o douto acórdão, “poderia mesmo concluir-se que o Presidente da República

não suscita dúvidas de constitucionalidade quanto à cessação do contrato de trabalho por

inadaptação do comum dos trabalhadores, mas tão-somente quanto aos trabalhadores que

desempenham cargos de complexidade técnica ou direcção. A verdade, porém, é que há-de

reconher-se que tal conclusão não é segura”.44 Por isso, procedeu o Tribunal a uma análise

ampla das normas e não tão restritiva quanto parecia pretender-se, tendo concluído que a

expressão/conceito indeterminado “cargos de complexidade técnica ou de direcção” haveria

de ser interpretada de modo a “abranger grosso modo os quadros técnicos da empresa”45.

Ademais, não haveria qualquer desproporcionalidade inconstitucional na distinção entre os

regimes das alíneas a) e c) sub judice, visto que, não só tratavam de características e exigências

inerentes a situações distintas de per si como, tal como aprendemos nos bancos da faculdade

de Direito, será de aplicar a máxima “tratar de forma igual o que é igual e de forma diferente,

o que é diferente”.

Como referimos supra, apesar da inconstitucionalidade que assolou todo o diploma

em apreço, a questão de que ora nos ocupamos recebeu o aval do TC, pelo que devemos fazer

referência aos argumentos esgrimidos pelo douto acórdão nesse sentido.

Em primeiro lugar, igualmente suportando a posição defendida por Bernardo da Gama

Lobo Xavier, entendeu que a CRP, quando recebe o conceito de justa causa, pretende tão-

somente, assegurar a defesa do emprego no sentido de prevenção de despedimentos

imotivados, arbitrários ou injustificados, remetendo neste ponto para a Declaração de voto

conjunta dos conselheiros Cardoso da Costa e Messias Bento, esmiuçada supra. Deduzimos,

43

Cfr. ibidem. 44

Cfr. ibidem. 45 Cfr. ibidem.

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assim, que o douto acórdão “não se limita à noção de justa causa disciplinar aceite no nosso

Direito do Trabalho desde 1976”.46

Em segundo lugar, assumindo que ainda que se perfilhasse um entendimento

diferente, sustentou, chamando a atenção para o afastamento do despedimento por “motivo

atendível”, a CRP “não vedou em absoluto ao legislador ordinário a consagração de certas

causas de rescisão unilateral do contrato de trabalho pela entidade patronal com base em

motivos objectivos, desde que as mesmas não derivem de culpa do empregador ou do

trabalhador e que tornem praticamente impossível a subsistência do vínculo laboral”.47

Todavia, de forma a salvaguardar o princípio da Proporcionalidade, consideração que

subscrevemos inteiramente, não poderá esta forma de cessação servir os “humores” da

entidade patronal ou as suas conveniências, pelo que, tal como vimos, haveria de ser alvo de

uma regulamentação própria e, desta feita, distinta da prevista para os despedimentos por

justa causa. Só assim se poderia evitar a transfiguração deste último conceito.

De resto, se uma “verdadeira impossibilidade objectiva de subsistência da relação

laboral é que justifica a legitimidade constitucional dos despedimentos colectivos”, seria uma

“impossibilidade objectiva análoga que há-de justificar também os despedimentos individuais

com base em motivos de inadaptação por evolução tecnológica”48, argumento que temos

vindo a sustentar, especialmente perante o incipiente número de trabalhadores que

estabelece a barreira de aplicabilidade de um e outro regimes. Também neste ponto remeteu

o douto acórdão para as declarações de voto dos conselheiros Raúl Mateus, Cardoso da Costa

e Messias Bento.

A respeito das garantias dos trabalhadores, salientou, também, o TC, a necessidade de

fiscalização dos procedimentos por via de uma entidade exterior ao vínculo laboral, bem como

a disponibilização da devida indemnização ao trabalhador despedido por recurso a esta figura.

À data, tais garantias apareciam asseguradas, quer a nível substantivo, quer a nível processual,

nomeadamente, através do estabelecimento da necessidade de administração de uma prévia

formação profissional e respectivo período de adaptação às modificações introduzidas; pela

necessidade de comunicação de aviso prévio pela entidade patronal fundamentando os

motivos do despedimento; pelo direito que assistia ao trabalhador de apreciar tais motivos e a

eles escolher, ou não, opor-se; pelo direito de crédito de horas durante o período de aviso

prévio; pelo direito a indemnização; pelo carácter urgente das acções judiciais que se

destinassem a declarar a ilicitude do despedimento por esta via ou pela previsão de uma

46

Cfr. ibidem. 47

Cfr. ibidem. 48 Cfr. ibidem.

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providência cautelar de suspensão desta causa de cessação de contrato de trabalho. Não

ficava – como, aliás, não fica actualmente – a entidade patronal, isenta de obrigações e

punições, pelo que se lhe impunha, ainda, a obrigação de informação e consulta das estruturas

representativas dos trabalhadores, bem como o nível de emprego deveria manter-se.

A regulamentação apresentava-se, em suma, suficientemente detalhada,

exigivelmente determinável e, como tal, sem qualquer “risco de subjectivismo na aplicação

judicial futura”.49

Concluiu o douto acórdão que o princípio da Tipicidade não surgiu, de todo, ferido pela

regulamentação do decreto submetido a apreciação, uma vez que a CRP “apenas exige que os

casos de cessação do contrato de trabalho por inadaptação do trabalhador sejam tipificados

pela lei em termo de se fornecerem ao juiz critérios seguros de decisão”50, não remetendo

inteiramente ao seu arbítrio o desfecho de uma decisão desta índole.

Uma última nota para referir que também esta decisão do TC não foi unânime, tendo o

Conselheiro Mário de Brito declarado vencido e pugnado por um conceito restrito de justa

causa, ou seja, de cariz puramente culposo, disciplinar e de ultima ratio na hierarquia das

sanções laborais.

A Constituição da República Portuguesa

Face ao supra exposto, é chegada a altura de tecer algumas considerações aos

normativos constitucionais que instituem a Segurança no emprego (artigo 53° CRP) e o Direito

ao Trabalho (artigo 58° CRP).

A primeira revisão constitucional (LC nº 1/82) reuniu num capítulo próprio os direitos

dos trabalhadores, tendo também transferido os mesmos para o título dos Direitos, Liberdades

e Garantias (DLG), nos art.s 53° a 57°, anteriormente previstos entre os Direitos económicos,

sociais e culturais (DESC). Tal individualização, no entender dos ilustres constitucionalistas

Gomes Canotilho e Vital Moreira, significou não apenas o abandonar de uma concepção dos

DLG como direitos exclusivamente do Homem ou do Cidadão, que seriam demasiado

genéricos, como a intervenção do Homem enquanto Trabalhador, mais concretamente do

49

Cfr. ibidem. 50 Cfr. ibidem.

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trabalhador subordinado, “como titular de direitos de igual dignidade”.51 Soar-nos-á algo

bizarro separar o “Homem” do “Trabalhador”, como que imaginando duas personalidades

num só corpo, mas quiseram os autores significar que, a partir desse momento, os direitos dos

trabalhadores adquiriram uma dimensão objectiva e, consequentemente, o conceito de

empresa terá sofrido uma transformação, de modo que não mais seria compreendida como

“domínio privado dos seus titulares”, bem como terão os empregadores sofrido uma

compressão dos seus poderes, perdendo “a liberdade de despedir e dispor dos empregos”.52

Para tal, terá ainda contribuído a consagração, nos art.s 54° e 55° da CRP das Comissões de

Trabalhadores e Liberdade Sindical, respectivamente.

Ocorreu, portanto, 1982, uma tentativa de contrabalançar a clássica definição de

relação laboral, em que os dois pólos da mesma aparecem em desigualdade de armas: o

trabalhador, numa posição inferior, de dependência e o empregador, numa posição superior,

de poder.

O Direito à segurança no emprego (art. 53º CRP), como primeiro direito, liberdade e

garantia dos trabalhadores consagrado, reveste a maior importância, particularmente no que

concerne à proibição dos despedimentos sem justa causa. Será uma “expressão directa do

direito ao trabalho” (cfr. art. 58° CRP), o qual encerra duas vertentes. “Na sua vertente

positiva, (…) consiste no direito a procurar e a obter emprego; na sua vertente negativa, (…)

garante a manutenção do emprego, o direito a não ser privado dele”.53 Sucede, porém, que

surgem dificuldades e, como temos vindo a destacar, divergências no que tange às

consequências da, a nosso ver, aparentemente pacífica conceptualização desta segunda

vertente. Mas, sem dúvida de que estamos perante uma garantia de proibição de acções ou

comportamentos que conduzam a um despedimento injustificado. Gomes Canotilho e Vital

Moreira têm o cuidado de salientar de que “o direito à segurança no emprego significa, assim,

não por certo um «direito real» dos trabalhadores sobre o posto de trabalho adquirido (…)

mas, pelo menos, uma alteração qualitativa do estatuto do titular da empresa enquanto

proprietário, empresário, patrão”.54

Aqui chegados, cabe discutir uma vez mais aquela que será a mais importante

dimensão deste direito: a proibição dos despedimentos sem justa causa. Para estes

constitucionalistas, é “evidente” que se trata de “uma negação clara ao despedimento livre ou

51 Cfr. GOMES CANOTILHO e VITAL MOREIRA, “CRP – Anotada, Volume I, Artigos 1° a 107°”, 4ª edição revista, p. 702 e ss. 52

Cfr. ibidem. 53

Cfr. ibidem. 54 Cfr. ibidem.

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discricionário por parte dos empregadores”55 que, salvo sem justa causa e, portanto, por sua

livre iniciativa, não poderão fazer cessar o vínculo laboral. Tal garantia parece-nos, de igual

modo, evidente. Contudo, o problema coloca-se a posteriori, pois a Lei Fundamental não

fornece, como também já tivemos oportunidade de realçar, qualquer definição de justa causa.

Este é um conceito indeterminado e, nas palavras dos supra citados constitucionalistas,

“existem (…) duas posições distintas, aliás sucessivamente perfilhadas pelo Tribunal

Constitucional”.56 A primeira, adopta o conceito restrito de justa causa, “em princípio” – note-

se a redacção cuidadosamente escolhida pelos autores - recebido pela Constituição. A

segunda, adopta um conceito não tão arreigado a uma interpretação puramente histórica e,

por isso, mais aberto, apesar de excluir, como entendemos que deve em todo o tempo, os

despedimentos ad nutum. Não exclui os despedimentos por motivos objectivos, isto é, não

imputáveis nem ao empregador, nem ao trabalhador, sendo que aqui se inclui o despedimento

por inadaptação. “Tal é a solução perfilhada pela lei, com o beneplácito do Tribunal

Cnstitucional” (sublinhado nosso).57

O Direito ao trabalho, consagrado no art. 58° CRP, é o primeiro do catálogo do DESC, o

que se afigura de extrema relevância, sendo que Gomes Canotilho e Vital Moreira entendem

que este estará “para os direitos económicos, sociais e culturais, na mesma posição em que se

encontra o direito à vida para os direitos, liberdades e garantias, cujo elenco igualmente

inicia”.58 Na verdade, seguindo as considerações destes autores, uma vez que a sobrevivência

humana dependerá, em princípio, da sua actividade laboral e dos dividendos dela auferidos,

este será um pressuposto e antecedente, não apenas de todos os direitos económicos, sociais

e culturais, mas também do próprio direito à vida, consagrado no art. 24° da CRP.

O direito ao trabalho contém igualmente duas vertentes, uma positiva e outra

negativa. A vertente positiva, podemos traduzir como o direito a obter um emprego, o que

transforma este direito eminentemente social, uma vez que caberá ao Estado promover que

tal pretensão se concretize. Todavia, não confundamos esta incumbência social estatal com

um direito subjectivo de que gozam os trabalhadores, pois, como frisamos – e frisam os

autores que temos vindo a citar – existe também uma vertente negativa. Cumpre-nos salientar

que estas dimensões entroncam directamente com o direito supra analisado, isto é, “o direito

a não ser privado de trabalho alcançado (direito à segurança no emprego), sendo proibidos

55 Cfr. ibidem. 56

Cfr. ibidem. 57

Cfr. ibidem. 58 Cfr. ibidem, p. 761 e ss.

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designadamente os despedimentos sem justa causa”59. Numa primeira análise, contudo, e em

termos práticos, a distinção não se torna tão clara.

Já nos referimos ao direito ao trabalho como uma incumbência estatal, ou seja, uma

obrigação do Estado em agir em determinado sentido e, também aqui, duas alíneas do artigo

58° CRP se nos afiguram de extrema importância no cerne da figura do despedimento por

inadaptação. Em primeiro lugar, em conformidade com o disposto no nº2, a) do referido

preceito constitucional, cabe ao Estado levar a cabo a promoção de políticas de económicas e

laborais cujo objectivo vise a manutenção e favorecimento dos níveis mais estáveis e elevados

possíveis de emprego. Ora, como vimos supra, pela análise do percurso legislativo percorrido

especialmente desde 1937 e veremos infra, pela análise e contexto actual da política laboral

em vigor, concluímos que tal preceito se encontra cabalmente preenchido, não só do ponto de

vista das exigências com que nos vimos hodiernamente confrontados, como do ponto de vista

de salvaguarda da posição do trabalhador. Em segundo lugar, e tendo agora em atenção o

disposto no nº2, c) do mesmo preceito constitucional, somos a entender que tais políticas

devem consubstanciar a devida formação cultural, técnica e profissional, com vista a evitar que

as mesmas acarretem, não só a impossibilidade de obtenção de emprego por parte dos

trabalhadores, salvaguardando-lhes a devida possibilidade de adaptação a quaisquer

inovações técnicas e tecnológicas que possam surgir, bem como possibilitando-lhes a

progressão nas suas carreiras. Claro está que tal implica um aumento nas obrigações das

entidades patronais, às quais incumbe de igual forma prover a que esta formação tenha lugar

não apenas num momento inicial, mas também numa fase posterior. “Esta formação é

indissociável do direito ao trabalho, configurando-se aqui um direito individual do trabalhador

à formação”.60 Ora, como veremos, a prestação da devida formação é um dos requisitos a

preencher pela entidade patronal que pretenda fazer cessar o contrato de trabalho por via do

despedimento por inadaptação, de acordo com o disposto no art. 375°, nº 1, b), assim como

deve este, bem como os restantes requisitos, constar da decisão de despedimento constante

do art. 378°, nº 1, b) do CT. Ainda, de acordo com o art. 385°, a) do CT, caso o despedimento

por inadaptação não obedeça aos requisitos do supra citado art. 375° do mesmo diploma legal,

este será tido como ilícito. Antecipamos, assim, a conclusão de que o regime instituído cumpre

com os ditames da Lei Fundamental.

59

Cfr. ibidem. 60 Cfr. ibidem.

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V – O Memorando de Entendimento sobre as Condicionalidades de Política Económica e o

Compromisso Para o Crescimento, Competitividade e Emprego

Em 17 de Maio de 2011, O Governo Português, o Fundo Monetário Internacional e o

Banco Central Europeu assinaram um Memorando de Entendimento sobre as

Condicionalidades de Política Económica, no contexto do programa de auxílio financeiro

efectuado pelo nosso país às aludidas organizações.

O ponto 4. do referido documento, sob a epígrafe “Mercado de Trabalho e Educação”,

tem como objectivos, nomeadamente, “rever o sistema de prestações de desemprego (…)

reduzir o risco de desemprego de longa duração e, ao mesmo tempo, fortalecer as redes de

apoio social; implementar reformas na legislação relativa à protecção ao emprego para

combater a segmentação do mercado de trabalho; promover a criação de emprego e facilitar a

transição dos trabalhadores entre várias actividades, empresas e sectores; (…) acomodar

melhor as diferenças de padrões de trabalho nos diferentes sectores e empresas e aumentar a

competitividade das empresas; (…) garantir boas práticas e recursos apropriados para Políticas

Activas do Mercado de Trabalho, com o objectivo de melhorar a empregabilidade dos jovens e

das categorias desfavorecidas e minorar os desajustamentos no mercado de trabalho”, ao

mesmo tempo afiançando que, “Serão implementadas reformas na legislação do trabalho e de

segurança social após consultas aos parceiros sociais, tendo em consideração as possíveis

implicações constitucionais e respeitando as Directivas da UE e as normas fundamentais do

trabalho.”61

No seu ponto 4.5., em a “Definição de despedimentos”, o Governo português

comprometeu-se a preparar uma proposta de lei, com prazo limite até ao primeiro trimestre

de 2012, cujo objectivo seria o de introduzir ajustamentos aos casos de despedimentos

individuais com justa causa previstos no CT, com vista a “combater a segmentação do mercado

de trabalho e aumentar a utilização dos contratos sem termo.”

Previa-se, ainda, no Memorando, no ponto 4.5., i., que “os despedimentos individuais

por inadaptação do trabalhador deverão ser possíveis mesmo sem a introdução de novas

tecnologias ou outras alterações no local do trabalho”. O regime do despedimento por

inadaptação nas situações de cargos de complexidade técnica ou de direcção não foi olvidado,

sendo que, uma nova causa justificativa “pode ser acrescentada”. Assim, tendo acordado com

a entidade empregadora atingir determinados objectivos que não cumpriu, o trabalhador pode

61

Cfr. Memorando de Entendimento sobre as Condicionalidades de Política Económica, celebrado entre o Estado Português, a Comissão Europeia, o Fundo Monetário Internacional e o Banco Central Europeu, em 17 de Maio de 2011, pp. 20 e ss.

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ser alvo desta forma de cessação do contrato de trabalho, desde que tal tenha sucedido “por

razões que sejam da sua exclusiva responsabilidade”62. Mas, atentemos, esta sua

responsabilidade deve ser entendida sob o ponto de vista de desempenho das suas funções e,

insistimos, não como uma violação culposa das mesmas.

Em Janeiro de 2012, a Comissão Permanente de Concertação Social procedeu a uma

discussão em sede de concertação social com os Parceiros Sociais, em virtude das tão

conhecidas obrigações assumidas pelas autoridades portuguesas junto da Comissão Europeia

(CE), do Fundo Monetário Internacional (FMI) e do Banco Central Europeu (BCE). Imperioso

era, e é, que, a par da redução do défice orçamental, fossem “criadas condições para uma

recuperação forte e duradoura do crescimento económico, multiplicando as oportunidades de

investimento, para a criação de emprego e manutenção e melhoria da sua qualidade”63. Esta

Comissão pretendeu (e pretende), através do Compromisso para o Crescimento,

Competitividade e Emprego, combater o denominado “flagelo do desemprego” com modelos

de desenvolvimento sustentáveis geradores de emprego, bem como “reforçar as políticas

activas de emprego (…), incentivar a criação e manutenção de emprego e reforçar a

qualificação e empregabilidade dos trabalhadores no activo e dos desempregados”64.

Assim, este documento, procurando sempre “salvaguardar as categorias dos

trabalhadores mais vulneráveis e com maior dificuldade de acesso ao mercado de trabalho”,

preocupando-se com os trabalhadores “mais jovens, bem como com aqueles que se encontram

afastados do mercado de trabalho há um período de tempo considerável”65, veio consagrar

importantes alterações em matéria de legislação laboral, designadamente no que concerne ao

despedimento por motivos objectivos, entre as quais podemos encontrar a admissibilidade do

recurso ao mecanismo do despedimento por inadaptação sem que ocorram modificações no

posto de trabalho, obedecendo a um regime substantivo rígido e, é claro, a uma série de

princípios cumulativos, que o torna protecionista o bastante para desencorajar a sua efectiva

utilização e, concomitantemente, afasta os afincados receios laborais e constitucionais que

tantas vozes clamam desrespeitados.

62 Cfr. ibidem. 63 Cfr. Conselho Económico e Social, Comissão Permanente de Concertação Social, “Compromisso Para o Crescimento, Competitividade e Emprego” de Janeiro de 2012, p. 3 e ss. 64

Cfr. ibidem. 65 Cfr. ibidem, p. 39 e ss.

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VI – O Regime da Lei 23/2012, de 25 de Junho

Não vamos, agora, repetir as considerações já tecidas a propósito destas alterações,

designadamente citando legislação anotada, pelo que nos referiremos apenas àquelas a que

não aludimos ainda.

Deste modo, em sede dos requisitos de despedimento por inadaptação, a alínea b), do

nº 1 do art. 375° CT surge numa redacção mais exigente do que aquela que a precedeu, na

medida em que a formação profissional adequada às modificações introduzidas não se basta

com um “controlo pedagógico da autoridade competente ou de entidade formadora

certificada”, tendo mesmo que ser ministrada por aquela autoridade ou entidade. Este é, de

resto, o entendimento de Abílio Neto66, o qual perfilhamos na íntegra e vem, a nosso ver, criar

claras e musculadas dificuldades para as entidades empregadoras que se queiram servir desta

figura como recurso ao despedimento dos seus trabalhadores.

Um dos grandes tumultos gerou-se em torno da eliminação da alínea d) do mesmo

preceito. Assim, as entidades empregadoras deixarão de ter de provar que, aquando destes

despedimentos, existe na empresa um outro posto de trabalho compatível com a capacidade

técnica do trabalhador despedido. Entende o supra citado autor que, tal facto “na prática,

assume assinalável relevância, na medida em que era esse factor cuja falta de prova acarretava

a procedência da maioria das acções de impugnação desta modalidade de despedimento”67.

Parece, contudo, ter o mesmo autor esquecido em parte as considerações que teceu

relativamente ao recurso prático e efectivo a esta figura – que considerou, recorde-se, raro

face à sua estruturação regimental e escassez de jurisprudência –, bem como, de nossa parte,

não podemos esquecer os restantes requisitos cumulativos deste nº 1, nem dos números 2 e 3

deste art. 375° que concorrem, claramente, para que a eliminação desse factor não possa ser,

de todo, avaliado de forma isolada, muito pelo contrário. Neste aspecto, outros elementos

colidem, como sejam, por exemplo, a viabilidade económica da própria empregadora, ou o

facto de o número de trabalhadores no sector em que aquele que está em vias de ser

despedido poderia ser inserido encontrar-se plenamente preenchido.

(Revogação da alínea em questão declarada inconstitucional pelo Ac. 603/2013, de 20 de

Setembro – Mantemos considerações tecidas)

66

Cfr. NETO, ob. cit. 67 Cfr. NETO, ibidem.

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O nº 2 do art. 375° e as suas 4 (quatro) alíneas constituem, na nossa opinião, face a

tudo quanto tem vindo a ser explanado, a grande novidade desta Lei. O despedimento por

inadaptação passa a ser possível mesmo nos casos em que não tenha havido modificações no

posto de trabalho. Há, todavia, um grande “senão” nesta aparente porta aberta aos

despedimentos, como muitos a rotularam: os quatro (que, pela leitura da alínea d) podemos

concluir que são, na verdade, cinco) elaborados requisitos cumulativos para que tal

despedimento possa ocorrer. Convém, aliás, acrescentar que, nos termos do art. 378°, nº 1, b),

estes requisitos, terão de ser confirmados na decisão de despedimento.

O art. 376°, nº 1, a) introduz uma alteração terminológica que vemos com bons olhos.

A “necessidade” de despedir é, hoje, uma “intenção” de despedir. Ora, a verdade é a de que,

em virtude da verificação das circunstâncias elencadas nas várias hipóteses previstas no artigo

que o precede, muito embora esta forma de cessação do contrato de trabalho seja, no fundo,

uma necessidade para a empresa que não pode continuar a laborar com um trabalhador que

não corresponde às expectativas e, a prazo, poderá colocar em risco muito mais do que apenas

o seu posto de trabalho, o que a empresa comunica, verdadeiramente, é uma intenção de

proceder ao ser despedimento.

O art. 377°, nº 1 vem, no nosso entendimento, reforçar as garantias na pessoa do

trabalhador. Cremos, então, que a junção de documentos e a possibilidade de requerer

diligências probatórias (nos termos do regime do despedimento por justa causa para que

remete o nº 2 do preceito aludido), surgem reforçadas face à anterior redacção, a qual previa a

emissão de um parecer fundamentado e a possibilidade de mera apresentação de meios de

prova, meios de prova que seriam mais susceptíveis de “ataque” pela outra parte.

O art. 379° foi integralmente reformulado. Assim, como salienta Abílio Neto, “o

regime do aviso prévio (art. 363° - 4), do crédito de horas (art. 364°), da denúncia do contrato

pelo trabalhador (art. 365°) e do pagamento da compensação (art. 366°), fixado para o

despedimento colectivo, aplica-se, de igual modo, no âmbito do despedimento por

inadaptação”. Neste ponto, coloca o autor, uma questão de não menor importância. Será

legítimo ao trabalhador, face ao depósito da quantia compensatória pela entidade patronal e

comunicada a tal título, não a devolver, movimentar e, mesmo assim, contestar o seu

despedimento? Veio já o STJ, em 29 de Janeiro de 2003, sustentar que não, e somos a crer que

tal entendimento mantém toda a actualidade. Realmente, exercendo “actos de domínio e de

disposição sobre o respectivo dinheiro”, o trabalhador declara que “aceitou essa

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compensação”. O recebimento da compensação funcionará, assim, como uma presunção juris

et de jure da aceitação do despedimento. Mas, tal não quer significar que o recebimento da

compensação tenha como cominação a fragilização da “segurança do emprego e o direito ao

trabalho, pois, para o trabalhador se furtar a tal cominação, bastar-lhe-á rejeitar a dita

indemnização”. Por outro lado, se a receber, “terá de se sujeitar às consequências que a lei

atribui a esse acto: a aceitação do despedimento e a cessação da relação laboral”.68

O art. 380° permaneceu inalterado, pelo que sustentamos a posição do autor que

temos vindo a citar, na medida em que a manutenção do nível de emprego deve ser

assegurada pela entidade empregadora, através da “integração no quadro permanente de um

trabalhador a termo”69, bem como pela intervenção da Autoridade para as Condições do

Trabalho (ACT) para os casos em que se verifique qualquer incumprimento do disposto neste

preceito. Fica, também aqui, patente, mais uma forma de salvaguardar os direitos do

trabalhador despedido à luz deste regime, bem como mais uma imposição para a entidade

empregadora. Esta é, de resto, mais uma forma de demonstrar que não estamos perante uma

forma de “disfarçar” despedimentos injustificados.

Por fim, uma breve referência ao art. 385°, que foi alvo da Declaração de Rectificação

nº 38/2012, de 23 de Julho, estipulando a ilicitude do despedimento por inadaptação por

incumprimento do disposto nos já analisados art.s 374°, nºs 3 e 4 (Situações de inadaptação) e

375°, nºs 1 a 3 (Requisitos de despedimento por inadaptação), bem como nos casos em que

não tenha sido posto à disposição do trabalhador a devida compensação e créditos vencidos e

exigíveis.

68

Cfr. NETO, ibidem. 69 Cfr. NETO, ibidem.

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VII – As reacções ao actual regime

Como não poderia deixar de ser, as reacções às alterações supra descritas não se

fizeram esperar, quer por parte de associações profissionais, partidos políticos e mesmo

advogados e sociedades de advogados.

No “portal de informação alternativa, que aspira a concorrer com os portais dos

órgãos de informação, mas apresentando uma óptica crítica, de esquerda”, encontramos

artigos perante os quais, com as presentes alterações, o Governo visa reforçar o despedimento

por inadaptação e facilitar despedimentos, em dois artigos de 21 de Setembro de 2011 e 16 de

Janeiro de 2012, respectivamente. De facto, segundo os referidos artigos, os novos “critérios

tornarão os trabalhadores «descartáveis»”, bem como levantam dúvidas ao que será

futuramente entendido como “qualidade de trabalho prestado”, acusando tal conceito de

“arbitrário” e facilitador de despedimentos. Não descura, ainda, uma alusão ao despedimento

com justa causa aquando do não cumprimento dos “objectivos definidos pelo patronato” por

parte do trabalhador.70

Também em sentido oposto pelo que temos vindo a pugnar, o Bloco de Esquerda (BE)

assumia, em 23 de Março de 2012, que o trabalhador fica, com a então proposta de Lei,

“isolado e mais fragilizado”. Acusa, então, o Governo de reduzir os direitos dos trabalhadores

e destruir a economia e o emprego, não apresentando “proposta alguma para a criação de

emprego mas, extraordinária e insolitamente, anunciando uma lei que facilita os

despedimentos”. O Executivo português, a seus olhos, não tem “nenhum pejo em aumentar a

crise social provocada pela sangria dos despedimentos” e “lança uma enorme ofensiva contra

a noção de justa causa, permitindo o despedimento por inadaptação baseado em critérios

subjectivos”. O BE entende, pois, haver lugar a uma “total arbitrariedade e discricionariedade

por parte dos patrões”71.

Verificamos que o BE parece confundir o conceito de despedimento por justa causa nas suas

vertentes objectiva e subjectiva com a figura do despedimento por inadaptação pois, como

temos vindo a sustentar, este último coloca o ênfase no modo como o trabalhador labora e

não na culpa.

70

Cfr. www.esquerda.net 71 Cfr. www.beparlamento.net

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O deputado do CDS-PP, Raúl de Almeida, escrevia, em 15 de Abril de 2012, que

durante a discussão na especialidade do CT, o qual veio a ser aprovado em plenário da

Assembleia da República (AR), o grupo parlamentar deste partido iria “propor um «regime de

excepção» que salvaguarde os deficientes de uma maior vulnerabilidade ao despedimento por

inadaptação”, dado que “nunca esteve na mente do Governo quando fez o pacote de

legislação laboral permitir que tal lacuna acontecesse”, ficando “salvaguardada a

especificidade da situação do trabalhador com deficiência” e respeitando as convenções e

directivas europeias neste sentido.72 Esta posição veio, efectivamente, a ficar claramente

prevista no actual regime no art. 374°, nº 3 do CT.

Ricardo Meireles Vieira, advogado na sociedade “António Vilar, Luís Cameirão &

Associados” acentua como “tónica única” das alterações à lei laboral a “flexibilização (interna e

externa) das relações laborais”73, aguardando qual a aplicabilidade e eficiência prática que

estas novas regras trariam pois, à data em que escreve, a Proposta de Lei não havia ainda sido

aprovada. Ressalva, contudo, não obstante a possibilidade de ocorrência de despedimento por

inadaptação ainda que não tenham sido introduzidas modificações no posto de trabalho, o

procedimento a observar pelo empregador: este teria o dever de informar o trabalhador por

escrito, juntando cópia dos documentos relevantes com descrição circunstanciada e

demonstrativa dos factos, isto é, da modificação substancial da prestação, bem como os

direitos de defesa deste último.

Na Newsletter nº 36 da sociedade “Abreu & Marques E Associados, RL”, pode ler-se,

um pouco na mesma linha do artigo precedente, que, “não obstante a aparente flexibilização

dos motivos, mantém-se a estrutura formal e relativamente complexa da tramitação que

impõe, nomeadamente, a necessidade de prestação de formação e da concessão de um

período de adaptação pós formação”.74

Joana Carneiro, advogada do Departamento de Direito do Trabalho da “JPAB – José

Pedro Aguiar Branco & Associados”, ao enunciar e analisar as alterações operadas pela Lei

23/2012, de 25 de Junho, no dia da sua entrada em vigor (1 de Agosto de 2012), escrevia que

“é ainda estabelecido um novo procedimento para a concretização do despedimento, de modo

72

Cfr. www.cds.pt 73

Cfr. www.antoniovilar.pt 74 Cfr. Newsletter nº 36, in www.amsa.pt

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a acautelar a possibilidade de defesa do trabalhador, em moldes semelhantes aos do

despedimento colectivo e por extinção do posto de trabalho”.75

Luís Couto, sócio da “TLCB Advogados”, em 11 de Fevereiro de 2013, pronunciava-se

em sentido diverso do que temos defendido até agora, vendo no alargamento conceptual da

figura do despedimento por inadaptação uma “contradição essencial”. Contudo, não deixava

de sublinhar, e aqui subscrevemos a sua opinião, que a aplicabilidade deste mecanismo, “como

o demonstra a escassa jurisprudência produzida a respeito do mesmo, na sua actual

configuração, é de difícil concretização, pelo recurso excessivo a conceitos indeterminados, cuja

concretização em juízo se torna tarefa hercúlea”. Entende, ainda, e neste ponto reiteramos as

nossa discordância e profundas dúvidas, que a positivação do acordado em sede de

concertação social “corre o risco de apenas servir para avolumar a conflitualidade laboral”.76

Manuel Teixeira Gomes, advogado na sociedade “Gameiro & Associados, RL”,

considerou “imprescindível referir o carácter indeterminado e abstracto” da nova imposição de

verificação de uma nova modificação substancial e/ou diminuição de produtividade

continuada que faça prever um carácter definitivo no exercício de funções pelo trabalhador.

Obviamente, e como já vimos salientando ao longo do presente trabalho, o recurso a conceitos

indeterminados ou, se preferirmos, neste caso, “não tão fáceis de determinar à partida”, tem

vindo a ser frequente. Destarte, não nos parece, e mais uma vez reiterando os requisitos

cumulativos instituídos no mesmo regime, que tal imposição venha trazer problemas de maior

monta, passando apenas pela interpretação deste diploma à luz dos objectivos que lhe

subjazem. O Advogado não deixa de dar ênfase e, por isso, reforçamos o que temos vindo a

explanar, à necessidade de o empregador se precaver se, realmente, quiser lançar mão desta

forma de despedimento, pois está assegurada a existência de “mecanismos que proporcionam

a eliminação da situação de inadaptação”, como sejam a “concessão de formação

adequada”77, reunindo uma voz mais nesta linha de raciocínio que temos vindo a defender.

A sociedade “Macedo Vitorino & Associados”, RL, em 30 de Janeiro de 2012, também

num artigo sobre as alterações concernentes à terceira alteração ao CT de 2009, pronunciou-

se simultaneamente em dois sentidos opostos. Tentando exemplificar, se por um lado

reconheceu que as medidas, no seu conjunto, “visam potenciar um acréscimo de produtividade

75

Cfr. www.advocatus.pt 76

Cfr. www.advocatus.pt 77 Cfr. www.advocatus.pt

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nas empresas”, e que foi preocupação do Governo português “a mantenção/aumento da

qualidade de trabalho e o aumento da produção empresarial”, por outro, viu com preocupação

as alterações introduzidas no regime do despedimento por inadaptação, cuja preocupação

terá sido “a de acelerar e flexibilizar procedimentos que conduzam ao despedimento (…)”,

tornando-o fácil e célere para o empregador. Aliás, para esta sociedade, o alargamento do

elenco de “possibilidades que o empregador tem ao seu dispor” terá como consequência “a

previsão de novos fundamentos (…) com vista a cessar os contratos de trabalho”. Todavia, as

contradições não ficam por aqui. Desta clara afectação das prerrogativas do trabalhador

(itálico nosso), este artigo expressamente declara que “importará verificar se estas alterações

serão suficientes para promover a aplicação” desta figura, “praticamente sem utilização desde

que foi criada”, concluindo que “somente o futuro revelará se foi mantido um equilíbrio”78

entre as posições entidade empregadora – trabalhador.

Também a secção “Press Center” do site da Associação Sindical dos Juízes Portugueses

(ASJP) fez publicar alguns artigos sobre as alterações de que ora cuidamos, sendo de destacar

um de Glória Rebelo em que a autora conclui com uma série de preocupações relacionadas

com o “impacto socioeconómico”, nomeadamente estabelecendo uma relação directa entre a

possibilidade de redução dos custos salariais pelas empresas e a cessação do contrato de

trabalho com os trabalhadores mais antigos e consequente “aumento do desemprego junto da

população sénior”79, preterida por jovens pior pagos, bem como com o desemprego de longa

duração.

Por seu turno, para Filomena Lança, citando a advogada Maria da Glória Leitão, “o

despedimento por inadaptação será a alteração passível de suscitar mais litígios”, posição não

inteiramente sufragada pelo seu colega, Tiago Cortes, que prevê que o aumento da

conflitualidade e consequente número de processos que dá entrada nos tribunais poderá “ser

travado pelo próprio contexto de crise que o País atravessa e começa a traduzir-se numa certa

«anemia reinvindicativa»”. Ainda o magistrado Azevedo Mendes reconhece que “o

despedimento por inadaptação é de prova muito difícil”, o que já não acontece com os

mecanismos de despedimento por extinção de posto de trabalho ou despedimento colectivo,

pelo que, “neste contexto de crise é possível que as empresas recorram mais a esses”. 80

78

Cfr. www.macedovitorino.com/pt/ 79

Cfr. www.asjp.pt, e Diário de Notícias, em 22 de Dezembro de 2011. 80 Cfr. www.asjp.pt e Jornal de Negócios, em 22 de Fevereiro de 2012.

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Por fim, em Novembro de 2012, Manuel Ramirez Fernandes, num “Estudo elaborado

para ser apresentado nas delegações do Conselho Distrital de Lisboa da Ordem dos

Advogados” (OA), analisando a visada alteração ao CT de 2009, teceu algumas considerações

que não poderíamos deixar de parte. Desde logo, no âmbito do art. 375°, nº 6, entende o autor

que, “interpretado «a contrario sensu», caso o anterior posto de trabalho esteja ocupado

definitivamente, o trabalhador já não beneficia desta prerrogativa”. A Lei 23/2012 padecerá,

também, de alguma incompletude ou mesmo incongruência terminológica, uma vez que o

legislador “aproximou o despedimento por inadaptação do despedimento colectivo,

considerando que o empregador, ao enviar a comunicação ao trabalhador, deve manifestar (…)

a «intenção» de proceder ao despedimento” (vejam-se, a este respeito, os art.s 360°, nº 1 e

376°, nº1, a) do CT acerca comunicações em caso de despedimento em ambos os regimes).

Porém, o despedimento por extinção de posto de trabalho manteve a sua terminologia

anterior, sendo que o empregador, no art. 369°, nº 1, a) e b) do CT, na comunicação que faz ao

trabalhador, manifesta a “necessidade” de proceder ao seu despedimento. Neste ponto, não

podemos deixar de perfilhar o espanto de Manuel Ramirez Fernandes, visto que, tal como

defende, em confronto com os fundamentos que aos referidos regimes subjazem, adequado

“seria tratar os despedimentos colectivos e por extinção de posto de trabalho como uma

«necessidade» do empregador, relegando para o despedimento por inadaptação a «intenção»

de proceder ao despedimento”. Entende o autor que, não se tratando de um despedimento de

cariz disciplinar, esta figura apresenta requisitos objectivos bastante semelhantes a este tipo

de infracções, pelo que estabelece comparações entre as regras concernentes à produtividade,

às avarias repetidas e o velar pela boa conservação e utilização de bens relacionados com o

trabalho e os riscos para a segurança e o cumprimento das prescrições sobre a mesma que

decorram da lei laboral ou a falta culposa às mesmas. Claro que a tónica estará, nas suas

palavras “mais na imputação subjectiva do comportamento ao trabalhador, do que na

imputação objectiva”81, pois, tal como entendemos o regime estatuído, o trabalhador

inadaptado, não será, à partida, um causador consciente e resoluto das suas falhas. O autor

enumera, ainda, alguns pontos que entende merecerem apreciação constitucional, de entre os

quais nos aproveita a eliminação do ónus de verificação de inexistência de um outro posto de

trabalho compatível com a categoria profissional de um trabalhador inadaptado (o que, como

infra veremos, se revelou profético) e o art. 53° da CRP, isto é, a consagração (estrita ou

ampla?) da proibição de despedimento sem justa causa. Continuando na senda da

81

Cfr. RAMIREZ FERNANDES, “A terceira alteração ao Código do Trabalho de 2009 (Estudo elaborado para ser apresentado nas delegações do Conselho Distrital de Lisboa da Ordem dos Advogados)”, p. 32 e ss.

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constitucionalidade, apresenta algumas dúvidas quanto à necessidade das normas adoptadas

nesta terceira avaliação face ao controlo do deficit público, bem como advoga a insegurança

patente no art. 204° da CRP (“Apreciação da inconstitucionalidade – Nos feitos submetidos a

julgamento não podem os tribunais aplicar normas que infrinjam o disposto na Constituição ou

os princípios nela consignados”), através do qual, defende, “qualquer tribunal pode decidir não

aplicar determinada norma jurídica, se o magistrado judicial titular desse tribunal e processo

entender que a norma em causa é inconstitucional.”82 Não é essa a interpretação que podemos

fazer do mencionado preceito constitucional, o qual consagra uma vinculação funcional,

configurando os tribunais como bouche de la loi. Os tribunais são, nos termos do art. 202°, nº 1

CRP, “os órgãos de soberania com competência para administrar a justiça em nome do povo.”.

Todavia, a entidade com competência específica para apreciar da conformidade das normas

legais com a Constituição da República Portuguesa é o Tribunal Constitucional (TC), nos termos

do art. 221° e ss. CRP, o que, como de resto já tivemos ocasião de referir e analisar, já fez.

82 Cfr. RAMIREZ FERNANDES, ob. cit.

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VIII – O Acórdão nº 602/2013, de 20 de Setembro do Tribunal Constitucional

Um grupo de 24 (vinte e quatro) deputados dos partidos políticos CDU, BE e PEV

suscitou a fiscalização sucessiva abstracta da constitucionalidade de um conjunto de normas

atinentes ao CT, de entre as quais o nº 2 do art.375°, com a redacção da Lei 23/2012, de 25 de

Junho, e o nº 2 do art. 9° deste mesmo diploma legal.

Não obstante os equívocos cometidos pelos próprios requerentes na formulação do

pedido de apreciação da constitucionalidade destas normas, a verdade é que o TC veio a

pronunciar-se, em 20 de Setembro de 2013, pela constitucionalidade da figura do

despedimento por inadaptação tal como se apresenta estruturado no CT, mormente no nº 2

do art. 375°, disposição que enumera os seus requisitos.

No que ao nº 2 do art. 9° concerne, a questão que se suscitou não se prendeu com

uma fiscalização de constitucionalidade tout court, mas sim com a fiscalização da

constitucionalidade da revogação, sem mais, de duas alíneas (alíneas d) e e)) que,

actualmente, não fazem parte do elenco do art. 375°. Curiosamente, os requerentes não

parecem ter reparado que a aludida alínea e) foi “transportada” para o actual nº 4 do art. 374°

CT, pelo que o TC, após a devida chamada de atenção, não se debruçou sobre o pedido nesta

parte e, em consequência, pronunciou-se pela não inconstitucionalidade da mesma.

Diferente foi a posição deste douto tribunal quanto à alínea d) do supra citado artigo.

Na verdade, mais de um ano volvido sobre a vigência desta lei (a Lei 23/2012 de 25 de junho

foi aprovada em 11 de Maio de 2012, tendo entrado em vigor no primeiro dia do mês seguinte

ao da sua publicação – cfr. art. 11° do diploma), veio o TC decidir pela inconstitucionalidade da

revogação da disposição que instituía a entidade empregadora na obrigatoriedade de

recolocar o trabalhador tido como inadaptado num posto que, no seio da empresa, se

adequasse ao seu rendimento. Dispunha a alínea em questão: “d) Não exista na empresa outro

posto de trabalho disponível e compatível com a qualificação profissional do trabalhador;”.

À semelhança dos Acórdãos constitucionais que já tivemos oportunidade de analisar,

também este não recolheu unanimidade, pelo que cinco juízes conselheiros votaram vencido

relativamente à alínea j) da decisão do douto Acórdão, ou seja, pugnaram pela

inconstitucionalidade do nº 2 do art. 375° CT.

A fundamentação dos requerentes, na parte que ao nosso estudo releva, em nada

surpreendeu, não só pela história que precedeu e acompanha a instituição desta figura do

nosso direito laboral, como pela ideologia política que aos mesmos subjaz, não sendo, todavia,

por tal motivo que nos afastaremos da imparcialidade com que, até agora guiamos o nosso

trabalho. Não seria, aliás, ético fazê-lo.

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Posto isto, entenderam os requerentes que, uma vez que a lei ordinária não pode

diminuir os direitos dos trabalhadores plasmados na CRP, esta “vê” a relação laboral como um

desequilíbrio inato entre trabalhador e empregador, sendo o primeiro, claro está, o contraente

mais fraco e, portanto, o que melhor deve ser defendido. Salientaram que as diversas

alterações legislativas que têm sucedido no âmbito do Direito do Trabalho, não só têm vindo a

contribuir para um aumento da fragilidade desta relação, de si, já frágil, como vão mais longe,

sugerindo uma desvirtuação da matriz constitucional do direito laboral. Os deputados

requerentes entenderam, ainda, que a proliferação legislativa não tem vindo a cumprir com

“os desígnios constitucionais, infringindo vários dos seus princípios e normas, designadamente,

entre outros, o princípio da dignidade da pessoa humana, o princípio do direito ao trabalho e á

estabilidade no trabalho, o princípio da conciliação da vida profissional com a vida familiar, o

princípio da liberdade sindical, o princípio da autonomia coletiva”83.

Referindo-se especificamente às normas de que ora nos ocupamos, os requerentes

identificaram como “pontos de pressão” da nova redacção da figura do despedimento por

inadaptação, a desnecessidade de introdução de modificações no posto de trabalho para que a

ela se possa recorrer; o facto de a administração da adequada formação não ser suficiente

para suprir o recurso a esta figura e a dispensa da necessidade da existência de um outro

posto de trabalho na empresa adequado à capacidade – diminuída – do trabalhador.

Tal como referimos no início, existe uma confusão entre os conceitos de “inadaptação”

e “inaptidão”, e os requerentes pretenderam tirar partido da mesma (o que, como veremos

infra, não jogou em seu favor). Perante as diferenças com que, aparentemente, se depararam,

numa situação de inadaptação, “terá forçosamente que existir uma modificação objetiva no

posto de trabalho à qual o trabalhador, após a verificação de uma série de requisitos tendentes

à criação das condições para a sua adaptação a essas novas circunstâncias, não consiga

adaptar-se.”84 Já numa situação de inaptidão, será determinante “a falta de capacidade ou

predisposição (características meramente subjetivas), para a realização de determinada tarefa,

na qual se inclui a «modificação substancial da prestação realizada pelo trabalhador, de que

resultem, nomeadamente, a redução continuada de produtividade ou de qualidade, avarias

repetidas nos meios afetos ao posto de trabalho ou riscos para a segurança e saúde do

trabalhador, de outros trabalhadores ou de terceiros, determinados pelo modo do exercício das

funções”. Assim, concluem que o regime do art. 375° estatuí uma forma de despedimento por

83

Cfr. Ac. TC nº 602/2013, de 20 de Setembro, http://www.tribunalconstitucional.pt/tc//tc/acordaos/20130602.html 84 Ibidem.

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“inaptidão” e, por conseguinte, por motivos subjectivos, motivos estes avaliados pela entidade

patronal, aspecto com o qual discordam em absoluto.

Neste ponto, porém, não podemos deixar de anotar que, em primeiro lugar, não

estamos perante verdadeiros critérios subjectivos pois, muito embora afectos à pessoa do

trabalhador, não lhos são imputados a título de culpa e, em segundo lugar, se não for a

entidade empregadora a definir os seus objectivos/metas a atingir, os seus níveis de

produtividade, a avaliar os resultados das estratégias que implementa, bem como os seus

resultados, quem será? Não estaremos, aí sim, perante uma violação do direito à livre

iniciativa económica?

Face ao que já tivemos oportunidade de explanar a propósito dos requisitos plasmados

no actual art. 375º CT, aqui visado, não podemos, de forma alguma, concordar com os

requerentes quando reiteram que o novo despedimento por inadaptação veio e vem

possibilitar uma cessação do vínculo laboral sem mais, por via de critérios arbitrários,

unilaterais e sem qualquer possibilidade de reacção por parte do trabalhador, das suas

organizações representativas ou mesmo por parte da ACT.

A sua fundamentação traz também, e inevitavelmente, à colação o conceito de justa

causa de despedimento, o qual entendem profundamente afectado pela redacção da Lei

23/2012, na medida em que a CRP apenas admite “a consagração de certas causas de rescisão

unilateral do contrato de trabalho pela entidade empregadora com base em motivos objetivos,

desde que as mesmas não derivem de culpa do trabalhador ou da entidade patronal e que

tornem praticamente impossível a subsistência do vínculo laboral. No caso do despedimento

por inadaptação antes previsto nos artigos 373.º e seguintes do Código do Trabalho, a sua

admissibilidade constitucional resulta do facto de se fundar na causa objetiva de o trabalhador

não conseguir adaptar-se a uma alteração tecnológica do seu posto de trabalho, mesmo

depois de realizadas todas as diligências necessárias e adequadas a essa adaptação.” Agora,

ao invés, defendem, “passamos a estar perante uma causa subjetiva, um facto do próprio

trabalhador que, sem que tivesse ocorrido qualquer causa externa relacionada com o posto de

trabalho, passa a produzir menos ou com menos qualidade.” Já nos pronunciamos supra

relativamente à subjectividade/objectividade dos motivos do despedimento por inadaptação,

pelo que não vemos motivo para o fazer novamente e porque, como adiante constataremos,

esta questão será abordada na fundamentação da decisão do douto TC. Todavia, sempre se

dirá que o próprio conceito de justa causa sobressai algo confuso da fundamentação dos

requerentes, não se conseguindo destrinçar se pugnam por uma vertente ampla ou restrita do

mesmo, ou se, na falta de consenso, terão optado por não alargar em demasia as suas

considerações concernentes ao art. 53° CRP.

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Terminaram, referindo ser impossível uma determinação suficientemente clara das

causas de despedimento por inadaptação (entendimento que, reiteramos, não podemos

subscrever perante a detalhada conceptualização da figura no actual CT), assim como

consideraram não estarem fornecidos elementos necessários para que, tanto a entidade

empregadora, como o julgador possam aferir do que seja a “impossibilidade da subsistência do

vínculo laboral”. Ora, não nos parece, no universo das questões que aqui se levantam, ser esta

a mais relevante ou, dito de outro modo, a que mereça o maior grau de preocupação, pois,

como bem sabemos, em Direito, como na vida, tudo é mutável e “tudo” é algo que nunca se

conseguirá plasmar na lei. Por isso, caberá ao legislador fornecer critérios orientadores para o

que constituirá determinada situação; ao advogado, caberá fazer corresponder as situações da

realidade quotidiana com que se depara com a legislação vigente e, ao julgador, aferir dessa

mesma correspondência, decidindo em conformidade e de acordo com os padrões que lhe são

impostos, tanto pela ética profissional, como pela lei. Deste modo, entendemos que, numa

situação de despedimento por inadaptação, serão a entidade empregadora, por um lado, e o

trabalhador, por outro, quem irão justificar se se encontram perante uma situação de ruptura

que tornará a continuidade da relação insustentável ou não.

A Fundamentação do Tribunal Constitucional

Após devidamente delimitar o objecto do pedido de fiscalização, o TC principia a sua

douta fundamentação com as razões que estiveram na origem da redacção da Lei 23/2012 de

25 de Junho, ou seja, a necessidade de corresponder às exigências resultantes do Memorando

de Entendimento sobre as Condicionalidades de Política Económica, de 17 de Maio de 2011 e

do Compromisso para o Crescimento, Competitividade e Emprego, de 18 de Janeiro de 2012,

sobre as quais já nos debruçamos no presente trabalho e que deram origem a normas que,

naturalmente, geraram variadas opiniões. Na óptica do legislador, esta lei teve como objectivo

primordial proporcionar o devido reconhecimento normativo ao necessário equilíbrio entre os

direitos dos trabalhadores emergentes do contrato de trabalho e a liberdade de empresa, pelo

que, face a uma economia global, concorrencial e, actualmente, em crise a esta mesma escala,

para obter a satisfação dos primeiros, ter-se-á que passar pela prestação de garantias de

sustentabilidade e de eficácia à segunda.

Recuando no tempo, recorda o douto Acórdão que a figura do despedimento por

inadaptação foi instituída em Portugal em 1991, embora advoguemos, não obstante a

“oficialidade” de tal facto, que esta figura foi, na verdade, reintroduzida no nosso

ordenamento jurídico nesse ano. Recordando o seu propósito de controlo de eficácia por parte

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das empresas inseridas no mercado, nunca abandonando a segurança dos direitos dos

trabalhadores, não deixa de aludir à contestação que com ela nasceu e que culminou, como

também vimos, com a intervenção deste Tribunal (Cfr. Acórdãos nºs 108/88 e 64/91).

Entende o TC, em suma, que passaram a existir, lado a lado, dois regimes de

despedimento por inadaptação, classificação que, por mera facilidade de exposição teórica,

manteremos. Assim, por um lado, teremos a modalidade “tradicional”, que surge no

seguimento da introdução de modificações no posto de trabalho e, por outro, uma

modalidade “inovadora”, que permite, verificados determinados requisitos, o recurso a esta

via de despedimento sem que tenham ocorrido no posto de trabalho as aludidas modificações.

No que concerne à noção de inadaptação, pugna o TC por um entendimento objectivo,

“um minus, mas ainda assim suficientemente relevante para justificar a atribuição de um

direito de resolução do contrato ao empregador, atentos os interesses em jogo”, isto é, uma

causa objectiva que se reporta ao trabalhador e não à empresa; uma inadaptação que este

desenvolve no decorrer do cumprimento do seu contrato e, por isso mesmo, superveniente. A

tónica distintiva desta figura situa-se, então, no facto de que a inadaptação, nas palavras de

Maria do Rosário Palma Ramalho, “se fique a dever ao modo de exercício da função pelo

trabalhador”, fixando “a origem do facto extintivo na pessoa do trabalhador (ou melhor dito,

no modo como ele executa a sua prestação)”. Alude também a uma questão que inicialmente

abordamos, que se prende com a figura da caducidade. O TC assegura que o despedimento

por inadaptação com ela não se confunde, sendo que o que aqui “está em causa não é uma

impossibilidade de desenvolver a prestação mas antes a diminuição significativa da aptidão do

trabalhador para a função (i.e., no fundo uma redução grave da qualidade do trabalho

prestado) por uma razão atinente ao trabalhador, sendo que o caráter permanente desta

inaptidão superveniente torna inexigível ao empregador a continuação do vínculo.” Monteiro

Fernandes, autor citado para reforçar esta convicção, vê no despedimento por inadaptação

uma “perda de qualidade ou rendimento do trabalho”.

O TC tem, ainda, o cuidado de afastar qualquer equívoco que se possa estabelecer entre

esta figura e o despedimento com justa causa subjectiva ou com a existência de um período

experimental no tempo inicial de execução do contrato de trabalho, considerando tais

abordagens do problema sub judice, simplesmente, incorrectas.

Opta, ainda, pela designação de despedimento por “inaptidão”, conseguindo, sob o nosso

ponto de vista, ser bem sucedido na transmissão das considerações que o levam a tal

conclusão. Na verdade, apesar de este ser, à primeira vista, um aspecto de menor importância

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perante a grande questão com que nos debatemos, após reflexão, compreendemos o porquê

de estabelecer esta dicotomia e perfilhamos as conclusões deste Tribunal. Assim,

juridicamente, à “inaptidão”, corresponderá uma menor capacidade profissional do

trabalhador e, a “inadaptação”, não poderá prescindir da ocorrência de modificações no posto

de trabalho. Recorrendo uma vez mais às palavras de Monteiro Fernandes para suportar esta

tese, a inaptidão traduzirá realidades em que “o trabalhador, sem culpa, manifeste uma

redução ou mesmo cessação das aptidões físicas, psíquicas ou técnicas que levaram à sua

contratação e serviram de suporte à sua prestação de trabalho até certo momento. (…) A

ausência de culpa exclui a justa causa disciplinar, e a inaptidão pode não ser consequência de

qualquer modificação técnica ou organizacional, pelo que ficará também descartada invocação

de inadaptação.”

Desta feita, com a redacção da Lei 23/2012, quer o TC defender um ajuste da

denominação da figura que ocupa o nosso estudo. Porém, não nos parece comportável uma

nova reforma legislativa laboral com base em tal alteração perfeitamente perceptível.

Avança, então, para o regime concretamente estabelecido no CT.

Principia por saudar as imposições consagradas nos nºs 1 e 4 do art. 374°, bem como faz

questão de mencionar que os casos de assédio e outras formas de pressão sobre o trabalhador

que possam dar origem a uma redução da sua normal capacidade laboral afastam o recurso a

esta figura. Igualmente afastados pelo regime do despedimento por inadaptação ao posto de

trabalho estão as consequências dos acidentes de trabalho e de doenças profissionais, tal

como claramente estipula o nº 3 do art. 374º. Entende, tal como Maria do Rosário Palma

Ramalho, que tais medidas previnem a “utilização abusiva deste regime em relação a

trabalhadores com capacidade de trabalho reduzida, com deficiência ou doença crónica. (…)

Na verdade, embora esta regra seja formalmente enunciada como um pressuposto comum a

todas as modalidades de inadaptação (…), ela é particularmente vocacionada para esta nova

modalidade”.

Continuando a citar a supra citada autora, (…) No caso agora em apreço, a causa do

despedimento refere-se exclusivamente ao próprio trabalhador e ao modo de exercício das

suas funções, exigindo-se tão-somente que a inadaptação revelada pelos maus resultados da

sua prestação laboral – a aludida redução continuada da produtividade ou de qualidade da

prestação - não lhe seja imputável a título de culpa e que “seja razoável prever que tal

inadaptação tenha caráter definitivo”.). Deste modo, independentemente da “modalidade” de

despedimento por inadaptação de que nos ocupemos, deve esta sempre, em qualquer

circunstância, respeitar os requisitos impostos pelo CT e, acima de tudo, ser usada como

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última instância. Em bom rigor, o que haverá sempre a ponderar, serão os direitos à segurança

no emprego e à livre iniciativa económica. Deste modo, Maria do Rosário Palma Ramalho vem

suportar o que temos vindo a defender quando refere que “mesmo na ausência de

modificações introduzidas no posto de trabalho, continua a não ser exigível ao empregador a

manutenção do vínculo laboral com um trabalhador que, reconhecidamente, não consegue

trabalhar com o equipamento disponibilizado, que põe em risco a sua segurança ou a de outros

pelo modo como realiza a sua prestação ou cuja produtividade diminuiu drástica e

definitivamente.”

Pedro Romano Martinez defende, igualmente, uma ponderação, um apuramento das

causas subjacentes ao recurso ao despedimento por inadaptação. Aliás, vai mais longe e

salienta que, “o novo regime, ao permitir o despedimento sem necessidade de alteração do

posto de trabalho, passa a ser mais exigente do ponto de vista procedimental, dando-se ao

trabalhador a possibilidade de defesa, contestando a invocada redução de produtividade, etc.,

ou alegando que resulta de fatores empresariais.” Para o autor, o procedimento instituído no

art. 375º CT é complexo e revela duas fases: a primeira, corresponde à averiguação da

modificação substancial da prestação laboral e suas causas, sendo imperioso que não se

conclua que tal se ficou a dever a motivos empresariais mas, antes, estritamente relacionados

com a pessoa do trabalhador e, a segunda, à comunicação fundamentada ao trabalhador,

comunicação este perante a qual este pode apresentar a sua defesa.

O artigo 9°, nº 2, d) da Lei 23/2012, de 25 de Junho

Face à extinta alínea d) do preceito em análise, o TC parece não perfilhar o entendimento

de Pedro Romano Martinez e, deste modo, não consegue “desligar” a impossibilidade da

manutenção do vínculo contratual com a existência de um outro posto de trabalho na empresa

que o mesmo trabalhador possa ocupar. Decidiu, como tal, pela inconstitucionalidade da

revogação da norma em apreço, por violação da proibição do despedimento sem justa causa

consagrado no art. 53° da CRP. Perante o conflito dos direitos constitucionais que temos vindo

a analisar – segurança no emprego e livre iniciativa económica – o TC defende que o primeiro

só poderá cair na medida do estritamente necessário do segundo, impondo-se que, “existindo

na empresa outro posto de trabalho disponível e compatível com a qualificação profissional do

trabalhador e com a capacidade prestativa que o mesmo mantenha, tal posto seja oferecido ao

trabalhador em causa.” Outrossim, “o despedimento por causas objetivas deve ser configurado

como ultima ratio, o que não é compatível com a dispensa do dever de integrar o trabalhador

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em posto de trabalho alternativo, quando este exista. A mesma exigência pode extrair-se do

princípio da proporcionalidade, na vertente da proibição do excesso.” Sublinhamos, no

entanto, o excerto “quando este exista”, o que vem sufragar o nosso entendimento de que

não será exigível a uma empresa, cujos quadros de pessoal estejam preenchidos, face a uma

situação de despedimento por inadaptação, seja forçada a “encaixar” um trabalhador

comprovadamente inadaptado. Aliás, a sua manutenção redundará, desde logo, num prejuízo

salarial, pois colocamos a empresa numa delicada situação que obriga à criação de mais um

posto de trabalho, o que poderá não ser economicamente comportável. Na verdade, temos

que manifestar a nossa confusão perante esta decisão quando é o próprio TC que citando, uma

vez mais, Maria do Rosário Palma Ramalho, defende, e bem, que “mesmo na ausência de

modificações introduzidas no posto de trabalho, continua a não ser exigível ao empregador a

manutenção do vínculo laboral com um trabalhador que, reconhecidamente, não consegue

trabalhar com o equipamento disponibilizado, que põe em risco a sua segurança ou a de outros

pelo modo como realiza a sua prestação ou cuja produtividade diminuiu drástica e

definitivamente.”

As Declarações de voto de vencido

Como tivemos oportunidade de referir supra, o Acórdão nº 602/2013, de 20 de

Setembro mereceu cinco votos de vencido dos juízes Conselheiros Maria João Antunes, Maria

de Fátima Mata-Mouros, Catarina Sarmento e Castro, Fernando Vaz Ventura e Joaquim de

Sousa Ribeiro.

O seu teor debruçou-se, essencialmente, no entendimento de que esta nova

modalidade de despedimento por inadaptação não deixa de consagrar uma forma de

despedimento sem justa causa, violando, claro está, o art. 53° da CRP, por via de uma

imputação de factos ao trabalhador de que este não terá culpa. Assim, muito embora

estejamos perante um despedimento por motivos objectivos, distorcem o propósito deste

instituto e colocam a tónica na origem do “problema” e esta será subjectiva – a culpa – e,

portanto, disciplinar. Alguns temem mesmo a abertura de precedentes no que concerne ao

despedimento de trabalhadores de idade mais avançada.

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IX – Conclusões

A preocupação com os níveis de desemprego não é um tema de hoje, muito pelo

contrário. Representa uma preocupação social e económica dos Estados e seus governantes

desde sempre, e não é difícil perceber porquê.

Empregos estáveis e empresas, estabelecimentos e serviços economicamente

equilibrados, com capacidade de resposta às suas necessidades e metas, origina,

inevitavelmente, uma luta permanente entre trabalhadores e entidades empregadoras.

Ora, na era da economia globalizada em que vivemos, em que o dinamismo, a

inovação e a competitividade são palavras de ordem, como podemos dissociar-nos desta

arena? Simplesmente não podemos, pois empregadores sem trabalhadores não existem, e

vice-versa.

Aquilo que cabe aos governantes é fazer o melhor possível para equilibrar o desejo

insaciável pelo desenvolvimento económico, sem pôr em causa o bem-estar social e

económico dos seus povos. Na tentativa de prossecução deste objectivo, imperial é que, nos

quadros legais que se fixarem, não se afaste a estabilidade e a segurança no emprego e muito

menos o escrutínio dos tribunais, ou que a flexibilidade laboral aumente de tal ordem que se

abram portas ao livre arbítrio das entidades patronais ao nível dos despedimentos.

Pelo que acima ficou exposto, cremos que tal será evitado, pelo menos, através da

actual configuração da figura da cessação do despedimento por inadaptação. Mesmo a

Constituição da República Portuguesa, não pode ficar imune à evolução e pretender cristalizar

conceitos perpetuamente, qual relíquia de uma era de ouro que, por muito orgulho que nos

proporcione recordar, inevitavelmente passou. O legislador hodierno padece, cremos, do que

classificaríamos de uma “legiferação alucinante”, o que não raro redunda em precipitações e,

infelizmente, erros. Todavia, errar é humano e a correcção é a sua consequência, pelo que não

se deve esconder estes erros sob a capa constitucional. Urge inverter tal tendência pois, em

Direito, nas palavras do Professor António Almeida Costa, a resposta, na esmagadora maioria

das vezes é “depende” e a Lei Fundamental poderá revelar-se verdadeiramente impeditiva de

qualquer inovação.

Citando João Leal Amado, “quem não acompanha as mudanças, fica, inoperavelmente,

para trás. E, as mudanças, nos dias que correm, sucedem-se a um ritmo vertiginoso. Em suma:

quem não se adapta, morre!”.85

85 Cfr. LEAL AMADO, ob. cit.

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Muitas vozes se levantarão, especialmente após a publicação do Ac. TC 602/2013,

clamando pelo fim da controvérsia. Todavia, cabe-nos recordar que esta questão esteve como

que adormecida durante doze anos, tendo reavivado antigas querelas doutrinais ao longo

desta recente discussão. Não podemos, portanto, esperar que estabilize por completo, muito

menos se considerarmos os insistentes votos de vencido e a doutrina em que os mesmos se

apoiam.

Não obstante, acompanhando, em parte, a ideia de que a concepção de uma estrutura

dominial da empresa está, como defende Monteiro Fernandes, há muito, em profunda

ruptura; considerando a Lei 23/2012, de 25 de Junho na sua extensa regulamentação, nos seus

rígidos e cumulativos requisitos, nas suas exigências procedimentais, na consagração do ónus

probatório, na consagração de sanções que recaem sobre as entidades patronais e, claro, não

deixando de mencionar a fraca adesão destas últimas ao despedimento por inadaptação até

ao momento, antevemos que tal tendência se mantenha no futuro.

Arriscamo-nos, por isso, a reformular a frase de João Leal Amado: Em suma, quem não

se adapta, estagna! E, como temos vindo a justificar, a estagnação poderá levar a uma legítima

cessação do vínculo laboral.

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XI – Bibliografia e outros elementos de estudo

AMADO, João Leal – Contrato de Trabalho, 3ª edição, Coimbra Editora, 2011; CORDEIRO, António Menezes – Da cessação do contrato de trabalho por inadaptação do trabalhador perante a Constituição da República, RDES, Julho-Dezembro 1991, Ano XXXIII (VI da 2ª série, nºs 3 e 4, Almedina;

FERNANDES, António de Lemos Monteiro - Direito do Trabalho, 16ª edição, Almedina, 2012; GOMES, Júlio Manuel Vieira – Direito do Trabalho – Vol. I – Relações Individuais de Trabalho,

Coimbra Editora, 2007; LEITE, Jorge – Direito do Trabalho, Serviços de Acção Social da U.C., Serviço de Textos,

Coimbra, 2004; MARTINEZ, Pedro Romano – Direito do Trabalho, IDT da Faculdade de Direito de Lisboa, 5ª

edição, Almedina, 2010; QUINTAS, Paula e QUINTAS, Hélder - Manual de Direito do Trabalho e de Processo do Trabalho,

2ª edição, Almedina, 2012; RAMALHO, Maria do Rosário Palma – Direito do Trabalho, Parte II – Situações Laborais

Individuais, 4ª edição revista e actualizada ao Código do Trabalho de 2009 com as alterações de 2011 e 2012, Almedina, 2012;

RIBEIRO, João Soares - Cessação do contrato de trabalho por inadaptação do trabalhador, IV Congresso Nacional de Direito do Trabalho – Memórias, Coordenação de António Moreira, Almedina, 2002;

SOUSA, António Francisco de - Conceitos Indeterminados no Direito Administrativo, Almedina, 1994;

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