nº 345 – março 2018 · revista sÍntese trabalhista e previdenciária ano xxix – nº 345 –...

248
Revista SÍNTESE Trabalhista e Previdenciária ANO XXIX – Nº 345 – MARÇO 2018 REPOSITÓRIO AUTORIZADO DE JURISPRUDÊNCIA Supremo Tribunal Federal – Nº 21/91 Superior Tribunal de Justiça – Nº 19/91 Tribunal Superior do Trabalho – Nº 01/94 Tribunal Regional Federal 1ª Região – Nº 06/92 Tribunal Regional Federal 2ª Região – Nº 1999.02.01.057040-0 Tribunal Regional Federal 3ª Região – Nº 21/2010 Tribunal Regional Federal 4ª Região – Nº 07/0042596-9 Tribunal Regional Federal 5ª Região – Nº 09/98 DIRETOR EXECUTIVO Elton José Donato GERENTE EDITORIAL Milena Sanches Tayano dos Santos COORDENADOR EDITORIAL Cristiano Basaglia EDITORA Valdinéia de Cássia Tessaro de Souza CONSELHO EDITORIAL Arion Sayão Romita, Carlos Henrique Bezerra Leite, Érica Paula Barcha Correia, Gustavo Filipe Barbosa Garcia, Jorge Luiz Souto Maior, José Carlos Arouca, Marcus Orione G. Correia, Maria Garcia, Marisa Ferreira dos Santos, Mauricio Godinho Delgado, Raimar Machado, Sergio Pinto Martins, Wladimir Novaes Filho, Wladimir Novaes Martinez COMITÊ TÉCNICO Enoque Ribeiro dos Santos, Ilse Marcelina Bernardi Lora, Rúbia Zanotelli de Alvarenga, Thereza Christina Nahas COLABORADORES DESTA EDIÇÃO Ben-Hur Silveira Claus, Fernando Rubin, Guilherme Ribeiro Venturin, Gustavo Filipe Barbosa Garcia, Isabel Cristina Amaral de Sousa Rosso Nelson, João Marcelino Soares, Júlio César Bebber, Luiz Fernando Calegari, Rocco Antonio Rangel Rosso Nelson, Tatiana Sada Jordão, Walkyria de Oliveira Rocha Teixeira ISSN 2179-1643

Upload: duongnhan

Post on 13-Sep-2018

220 views

Category:

Documents


0 download

TRANSCRIPT

Page 1: Nº 345 – Março 2018 · Revista SÍNTESE Trabalhista e Previdenciária Ano XXIX – nº 345 – MArço 2018 reposItórIo AutorIzAdo de JurIsprudêncIA Supremo Tribunal Federal

Revista SÍNTESETrabalhista e Previdenciária

Ano XXIX – nº 345 – MArço 2018

reposItórIo AutorIzAdo de JurIsprudêncIASupremo Tribunal Federal – Nº 21/91

Superior Tribunal de Justiça – Nº 19/91Tribunal Superior do Trabalho – Nº 01/94

Tribunal Regional Federal 1ª Região – Nº 06/92Tribunal Regional Federal 2ª Região – Nº 1999.02.01.057040-0

Tribunal Regional Federal 3ª Região – Nº 21/2010Tribunal Regional Federal 4ª Região – Nº 07/0042596-9

Tribunal Regional Federal 5ª Região – Nº 09/98

dIretor eXecutIvo

Elton José Donato

Gerente edItorIAl

Milena Sanches Tayano dos Santos

coordenAdor edItorIAl

Cristiano Basaglia

edItorA

Valdinéia de Cássia Tessaro de Souza

conselho edItorIAl

Arion Sayão Romita, Carlos Henrique Bezerra Leite, Érica Paula Barcha Correia, Gustavo Filipe Barbosa Garcia, Jorge Luiz Souto Maior, José Carlos Arouca,

Marcus Orione G. Correia, Maria Garcia, Marisa Ferreira dos Santos, Mauricio Godinho Delgado, Raimar Machado, Sergio Pinto Martins,

Wladimir Novaes Filho, Wladimir Novaes Martinez

coMItê técnIcoEnoque Ribeiro dos Santos, Ilse Marcelina Bernardi Lora,

Rúbia Zanotelli de Alvarenga, Thereza Christina Nahas

colAborAdores destA edIçãoBen-Hur Silveira Claus, Fernando Rubin, Guilherme Ribeiro Venturin,

Gustavo Filipe Barbosa Garcia, Isabel Cristina Amaral de Sousa Rosso Nelson, João Marcelino Soares, Júlio César Bebber, Luiz Fernando Calegari,

Rocco Antonio Rangel Rosso Nelson, Tatiana Sada Jordão, Walkyria de Oliveira Rocha Teixeira

ISSN 2179-1643

Page 2: Nº 345 – Março 2018 · Revista SÍNTESE Trabalhista e Previdenciária Ano XXIX – nº 345 – MArço 2018 reposItórIo AutorIzAdo de JurIsprudêncIA Supremo Tribunal Federal

1989 © SÍNTESE

Uma publicação da SÍNTESE, uma linha de produtos jurídicos do Grupo SAGE.

Publicação mensal de doutrina, jurisprudência, legislação e outros assuntos trabalhistas e previdenciários.

Todos os direitos reservados. Proibida a reprodução parcial ou total, sem consentimento expresso dos editores.

As opiniões emitidas nos artigos assinados são de total responsabilidade de seus autores.

Os acórdãos selecionados para esta Revista correspondem, na íntegra, às cópias obtidas nas secretarias dos respec-tivos tribunais.

A solicitação de cópias de acórdãos na íntegra, cujas ementas estejam aqui transcritas, e de textos legais pode ser feita pelo e-mail: [email protected] (serviço gratuito até o limite de 50 páginas mensais).

Distribuída em todo o território nacional.

Tiragem: 5.000 exemplares

Revisão e Diagramação: Dois Pontos Editoração

Artigos para possível publicação poderão ser enviados para o endereço [email protected]

Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)

REVISTA SÍNTESE TRABALHISTA E PREVIDENCIÁRIA Nota: Continuação da Revista IOB Trabalhista e Previdenciária

v. 1, n. 1, jul. 1989

Publicação periódica Mensal

v. 29, n. 345, Março 2018

ISSN 2179-1643

1. Direito trabalhista – periódicos – Brasil

CDU: 349.2(81)(05) CDD: 7340

Bibliotecária responsável: Helena Maria Maciel CRB 10/851

IOB Informações Objetivas Publicações Jurídicas Ltda.R. Antonio Nagib Ibrahim, 350 – Água Branca 05036‑060 – São Paulo – SPwww.sage.com

Telefones para ContatosCobrança: São Paulo e Grande São Paulo (11) 2188.7900Demais localidades 0800.7247900

SAC e Suporte Técnico: São Paulo e Grande São Paulo (11) 2188.7900Demais localidades 0800.7247900E-mail: [email protected]

Renovação: Grande São Paulo (11) 2188.7900Demais localidades 0800.7283888

Page 3: Nº 345 – Março 2018 · Revista SÍNTESE Trabalhista e Previdenciária Ano XXIX – nº 345 – MArço 2018 reposItórIo AutorIzAdo de JurIsprudêncIA Supremo Tribunal Federal

Carta do Editor

Caro leitor,

Chamamos a atenção para a publicação deste assunto especial, devida-mente atualizado, com a vigência da Portaria nº 1.293/2017.

Os Drs. Gustavo Filipe Barbosa Garcia, Rocco Antonio Rangel Rosso Nelson, Isabel Cristina Amaral de Sousa Rosso Nelson, Walkyria de Oliveira Rocha Teixeira e Luiz Fernando Calegari, novamente, contribuíram para um debate acerca do conceito do trabalho escravo e as consequências jurídicas impostas a quem comete essa prática.

Já na Parte Geral publicamos um vasto conteúdo nas searas trabalhista e previdenciária, como íntegra dos Tribunais, ementário de jurisprudência com valores agregados, clipping jurídico, tabelas práticas e bibliografia comple-mentar.

Publicamos, também, três doutrinas abordando os seguintes temas: “A Aplicação do Regime Jurídico Especial da Fraude à Execução Fiscal no Processo do Trabalho”, de autoria dos Drs. Ben-Hur Silveira Claus e Júlio César Bebber; “Mecanismos de Prevenção Acidentária: a Proteção ao Ambiente de Trabalho Bancário”, pelos Drs. Fernando Rubin e Guilherme Ribeiro Venturin; e “Identifi-cação da Deficiência para Fins de Aposentadoria Diferenciada no Regime Geral de Previdência Social Brasileira”, pelo Dr. João Marcelino Soares.

Por fim, na Seção Especial “Com a Palavra, o Procurador”, trazemos um artigo da Procuradora Federal, Dra. Tatiana Sada Jordão, trazendo a lição sobre a “Competição Interprofissional: Breve Estudo de Caso Envolvendo a Concessão Judicial de Benefício Previdenciário”.

Desejamos a você uma excelente leitura!

Milena Sanches Tayano dos Santos

Gerente Editorial

Page 4: Nº 345 – Março 2018 · Revista SÍNTESE Trabalhista e Previdenciária Ano XXIX – nº 345 – MArço 2018 reposItórIo AutorIzAdo de JurIsprudêncIA Supremo Tribunal Federal
Page 5: Nº 345 – Março 2018 · Revista SÍNTESE Trabalhista e Previdenciária Ano XXIX – nº 345 – MArço 2018 reposItórIo AutorIzAdo de JurIsprudêncIA Supremo Tribunal Federal

Sumário

Normas Editoriais para Envio de Artigos ......................................................................7

Assunto Especial

Trabalho Escravo – as alTEraçõEs

DouTrinas

1. Trabalho em Condições Análogas à de Escravo e Nova Portaria nº 1.293/2017: Retorno à LegalidadeGustavo Filipe Barbosa Garcia ................................................................................ 9

2. Do Trabalho em Condições Análogas às de Escravo e a Nova Portaria nº 1.293/2017 do Ministério do TrabalhoRocco Antonio Rangel Rosso Nelson, Isabel Cristina Amaral de Sousa Rosso Nelson e Walkyria de Oliveira Rocha Teixeira ........................................... 14

3. A Suspensão da Eficácia da Portaria nº 1.129/2017 e a Publicação da Portaria nº 1.293/2017: Análise Comparativa das Normas Que Versam sobre o Combate ao Trabalho Escravo ContemporâneoLuiz Fernando Calegari ......................................................................................... 32

Parte Geral

DouTrinas

1. A Aplicação do Regime Jurídico Especial da Fraude à Execução Fiscal no Processo do TrabalhoBen-Hur Silveira Claus e Júlio César Bebber ......................................................... 45

2. Mecanismos de Prevenção Acidentária: a Proteção ao Ambiente de Trabalho BancárioFernando Rubin e Guilherme Ribeiro Venturin ..................................................... 79

3. Identificação da Deficiência para Fins de Aposentadoria Diferenciada no Regime Geral de Previdência Social BrasileiraJoão Marcelino Soares ........................................................................................ 101

JurispruDência TrabalhisTa

Acórdãos nA ÍntegrA

1. Tribunal Superior do Trabalho ............................................................................ 123

ementário

1. Ementário de Jurisprudência Trabalhista ............................................................. 129

JurispruDência prEviDEnciária

Acórdãos nA ÍntegrA

1. Supremo Tribunal Federal ................................................................................... 152

2. Superior Tribunal de Justiça ................................................................................ 156

3. Superior Tribunal de Justiça ................................................................................ 162

Page 6: Nº 345 – Março 2018 · Revista SÍNTESE Trabalhista e Previdenciária Ano XXIX – nº 345 – MArço 2018 reposItórIo AutorIzAdo de JurIsprudêncIA Supremo Tribunal Federal

4. Superior Tribunal de Justiça ................................................................................ 167

5. Tribunal Regional Federal da 1ª Região .............................................................. 174

6. Tribunal Regional Federal da 2ª Região .............................................................. 184

7. Tribunal Regional Federal da 3ª Região .............................................................. 199

8. Tribunal Regional Federal da 4ª Região .............................................................. 207

9. Tribunal Regional Federal da 5ª Região .............................................................. 212

ementário

1. Ementário de Jurisprudência Previdenciária ........................................................ 216

Seção Especial

com a palavra, o procuraDor

1. Competição Interprofissional: Breve Estudo de Caso Envolvendo a Concessão Judicial de Benefício PrevidenciárioTatiana Sada Jordão ............................................................................................ 227

Clipping Jurídico ......................................................................................................... 238

Tabelas Práticas .......................................................................................................... 240

Bibliografia Complementar ............................................................................................ 244

Índice Alfabético e Remissivo ....................................................................................... 245

Page 7: Nº 345 – Março 2018 · Revista SÍNTESE Trabalhista e Previdenciária Ano XXIX – nº 345 – MArço 2018 reposItórIo AutorIzAdo de JurIsprudêncIA Supremo Tribunal Federal

Normas Editoriais para Envio de Artigos1. Os artigos para publicação nas Revistas SÍNTESE deverão ser técnico-científicos e fo-

cados em sua área temática.2. Será dada preferência para artigos inéditos, os quais serão submetidos à apreciação do

Conselho Editorial responsável pela Revista, que recomendará ou não as suas publi-cações.

3. A priorização da publicação dos artigos enviados decorrerá de juízo de oportunidade da Revista, sendo reservado a ela o direito de aceitar ou vetar qualquer trabalho recebido e, também, o de propor eventuais alterações, desde que aprovadas pelo autor.

4. O autor, ao submeter o seu artigo, concorda, desde já, com a sua publicação na Re-vista para a qual foi enviado ou em outros produtos editoriais da SÍNTESE, desde que com o devido crédito de autoria, fazendo jus o autor a um exemplar da edição da Revista em que o artigo foi publicado, a título de direitos autorais patrimoniais, sem outra remuneração ou contraprestação em dinheiro ou produtos.

5. As opiniões emitidas pelo autor em seu artigo são de sua exclusiva responsabilidade.6. À Editora reserva-se o direito de publicar os artigos enviados em outros produtos jurí-

dicos da Síntese.7. À Editora reserva-se o direito de proceder às revisões gramaticais e à adequação dos

artigos às normas disciplinadas pela ABNT, caso seja necessário.8. O artigo deverá conter além de TÍTULO, NOME DO AUTOR e TITULAÇÃO DO AU-

TOR, um “RESUMO” informativo de até 250 palavras, que apresente concisamente os pontos relevantes do texto, as finalidades, os aspectos abordados e as conclusões.

9. Após o “RESUMO”, deverá constar uma relação de “PALAVRAS-CHAVE” (palavras ou expressões que retratem as ideias centrais do texto), que facilitem a posterior pesquisa ao conteúdo. As palavras-chave são separadas entre si por ponto e vírgula, e finaliza-das por ponto.

10. Terão preferência de publicação os artigos acrescidos de “ABSTRACT” e “KEYWORDS”.

11. Todos os artigos deverão ser enviados com “SUMÁRIO” numerado no formato “arábi-co”. A Editora reserva-se ao direito de inserir SUMÁRIO nos artigos enviados sem este item.

12. Os artigos encaminhados à Revista deverão ser produzidos na versão do aplicativo Word, utilizando-se a fonte Arial, corpo 12, com títulos e subtítulos em caixa alta e alinhados à esquerda, em negrito. Os artigos deverão ter entre 7 e 20 laudas. A pri-meira lauda deve conter o título do artigo, o nome completo do autor e os respectivos créditos.

13. As citações bibliográficas deverão ser indicadas com a numeração ao final de cada citação, em ordem de notas de rodapé. Essas citações bibliográficas deverão seguir as normas da Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT).

14. As referências bibliográficas deverão ser apresentadas no final do texto, organizadas em ordem alfabética e alinhadas à esquerda, obedecendo às normas da ABNT.

15. Observadas as regras anteriores, havendo interesse no envio de textos com comentá-rios à jurisprudência, o número de páginas será no máximo de 8 (oito).

16. Os trabalhos devem ser encaminhados preferencialmente para os endereços eletrôni-cos [email protected]. Juntamente com o artigo, o autor deverá preencher os formulários constantes dos seguintes endereços: www.sintese.com/cadastrodeauto-res e www.sintese.com/cadastrodeautores/autorizacao.

17. Quaisquer dúvidas a respeito das normas para publicação deverão ser dirimidas pelo e-mail [email protected].

Page 8: Nº 345 – Março 2018 · Revista SÍNTESE Trabalhista e Previdenciária Ano XXIX – nº 345 – MArço 2018 reposItórIo AutorIzAdo de JurIsprudêncIA Supremo Tribunal Federal
Page 9: Nº 345 – Março 2018 · Revista SÍNTESE Trabalhista e Previdenciária Ano XXIX – nº 345 – MArço 2018 reposItórIo AutorIzAdo de JurIsprudêncIA Supremo Tribunal Federal

Assunto Especial – Doutrina

Trabalho Escravo – As Alterações

Trabalho em Condições Análogas à de Escravo e Nova Portaria nº 1.293/2017: Retorno à Legalidade

GUSTAVO FILIPE BARBOSA GARCIALivre-Docente pela Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo, Doutor em Direito pela Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo, Especialista em Direito pela Universida-de de Sevilla, Pós-Doutorado em Direito na Universidade de Sevilla, Membro da Academia Brasileira de Direito do Trabalho, Titular da Cadeira nº 27, Membro Pesquisador do IBDSCJ, Professor Universitário em Cursos de Graduação e Pós-Graduação em Direito, Advogado, Ex-Juiz do Trabalho das 2ª, 8ª e 24ª Regiões, Ex-Procurador do Trabalho do Ministério Público da União, Ex-Auditor-Fiscal do Trabalho.

A Portaria nº 1.293, de 28 de dezembro de 2017, do Ministério do Traba-lho, publicada no Diário Oficial da União de 29.12.2017, dispõe sobre os con-ceitos de trabalho em condições análogas à de escravo para fins de concessão de seguro-desemprego ao trabalhador que vier a ser resgatado em fiscalização do Ministério do Trabalho, nos termos do art. 2º-C da Lei nº 7.998/1990, e trata da divulgação do Cadastro de Empregadores que tenham submetido trabalha-dores à condição análoga à de escravo, estabelecido pela Portaria Interministe-rial MTPS/MMIRDH nº 4/2016.

O referido ato administrativo foi publicado em substituição à Portaria nº 1.129/2017, que tratava da mesma matéria e foi objeto de fundadas críticas, entre outros aspectos, por conceituar restritivamente o trabalho forçado, a jor-nada exaustiva, a condição degradante e a condição análoga à de escravo.

Justamente por isso, chegou a ser ajuizada perante o Supremo Tribunal Federal arguição de descumprimento de preceito fundamental em face da Por-taria nº 1.129/2017 do Ministério do Trabalho, tendo sido deferido o pedido de liminar para suspender, até o julgamento do mérito da ação, os efeitos da referida Portaria (MC-ADPF 489/DF, Relª Min. Rosa Weber, DJe 26.10.2017)1.

1 “Como revela a evolução do direito internacional sobre o tema, a ‘escravidão moderna’ é mais sutil e o cerceamento da liberdade pode decorrer de diversos constrangimentos econômicos e não necessariamente físicos. O ato de privar alguém de sua liberdade e de sua dignidade, tratando-o como coisa e não como pessoa humana, é repudiado pela ordem constitucional, quer se faça mediante coação, quer pela violação intensa e persistente de seus direitos básicos, inclusive do direito ao trabalho digno. A violação do direito ao trabalho digno, com impacto na capacidade da vítima de realizar escolhas segundo a sua livre determinação, também significa ‘reduzir alguém a condição análoga à de escravo’. Por evidente, não é qualquer violação dos direitos

Page 10: Nº 345 – Março 2018 · Revista SÍNTESE Trabalhista e Previdenciária Ano XXIX – nº 345 – MArço 2018 reposItórIo AutorIzAdo de JurIsprudêncIA Supremo Tribunal Federal

10 ......................................................................................................... RST Nº 345 – Março/2018 – ASSUNTO ESPECIAL – DOUTRINA

Entendeu-se, assim, que a “conceituação restritiva presente no ato nor-mativo impugnado divorcia-se da compreensão contemporânea, amparada na legislação penal vigente no País, em instrumentos internacionais dos quais o Brasil é signatário e na jurisprudência desta Suprema Corte” (STF, MC-ADPF 489/DF, Relª Min. Rosa Weber, J. 23.10.2017)2.

Curiosamente, em termos formais, não constou na Portaria nº 1.293/2017 a revogação expressa da Portaria nº 1.129/2017, nem mesmo a menção, em dispositivo final, de que as previsões anteriores, em sentido diverso, estariam revogadas.

Ainda assim, como os referidos atos administrativos normativos dis-põem sobre a mesma matéria, entende-se que deve prevalecer o mais recente (Portaria nº 1.293/2017), tendo havido a revogação tácita da anterior Portaria nº 1.129/2017, inclusive com fundamento no art. 2º, § 1º, parte final, da Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro3, mesmo que por analogia, uma vez que, no caso, não se trata de lei propriamente.

Desse modo, retorna-se à concepção de que, para fins de concessão de benefício de seguro-desemprego ao trabalhador que for encontrado em condi-ção análoga à de escravo no curso de fiscalização do Ministério do Trabalho, nos termos da Portaria MTE nº 1.153/2003, bem como para inclusão de admi-nistrados no Cadastro de Empregadores que tenham submetido trabalhadores à condição análoga à de escravo, estabelecido pela Portaria Interministerial MTPS/MMIRDH nº 4/2016, considera-se em condição análoga à de escravo o trabalhador submetido, de forma isolada ou conjuntamente, a: I – trabalho forçado; II – jornada exaustiva; III – condição degradante de trabalho; IV – res-trição, por qualquer meio, de locomoção em razão de dívida contraída com empregador ou preposto, no momento da contratação ou no curso do contrato de trabalho; V – retenção no local de trabalho em razão de: a) cerceamento do uso de qualquer meio de transporte; b) manutenção de vigilância ostensi-va; c) apoderamento de documentos ou objetos pessoais (art. 1º da Portaria nº 1.293/2017).

Na mesma linha é a previsão da recente Instrução Normativa nº 139, de 22 de janeiro de 2018, da Secretaria de Inspeção do Trabalho, que dispõe sobre

trabalhistas que configura trabalho escravo. Se, no entanto, a afronta aos direitos assegurados pela legislação regente do trabalho é intensa e persistente, se atinge níveis gritantes e se submetidos os trabalhadores a trabalhos forçados, jornadas exaustivas ou a condições degradantes, com a privação de sua liberdade e de sua dignidade, resulta configurada, mesmo na ausência de coação direta contra a liberdade de ir e vir, hipótese de sujeição de trabalhadores a tratamento análogo ao de escravos, nos moldes do art. 149 do Código Penal, com a redação que lhe foi conferida pela Lei nº 10.803/2003.” (STF, MC-ADPF 489/DF, Relª Min. Rosa Weber, J. 23.10.2017)

2 Disponível em: <http://www.stf.jus.br/arquivo/cms/noticiaNoticiaStf/anexo/ADPF489liminar.pdf>.3 “§ 1º A lei posterior revoga a anterior quando expressamente o declare, quando seja com ela incompatível ou

quando regule inteiramente a matéria de que tratava a lei anterior”.

Page 11: Nº 345 – Março 2018 · Revista SÍNTESE Trabalhista e Previdenciária Ano XXIX – nº 345 – MArço 2018 reposItórIo AutorIzAdo de JurIsprudêncIA Supremo Tribunal Federal

RST Nº 345 – Março/2018 – ASSUNTO ESPECIAL – DOUTRINA ..............................................................................................................11

a fiscalização para a erradicação de trabalho em condição análoga à de escravo e dá outras providências (art. 6º).

Efetivamente, o conceito contemporâneo de trabalho em condições aná-logas à de escravo é bem mais amplo do que o cerceamento da liberdade de ir e vir4.

Nesse sentido, em consonância com o art. 149 do Código Penal, com redação dada pela Lei nº 10.803/2003, que tipifica o crime de redução a con-dição análoga à de escravo:

Art. 149. Reduzir alguém a condição análoga à de escravo, quer submetendo-o a trabalhados forçados ou a jornada excessiva, quer sujeitando-o a condições degradantes de trabalho, quer restringindo, por qualquer meio, sua locomoção em razão de dívida contraída com o empregador ou preposto.

Pena – reclusão, de 2 (dois) a 8 (oito) anos, e multa, além da pena correspondente à violência.

§ 1º Nas mesmas penas incorre quem:

I – cerceia o uso de qualquer meio de transporte por parte do trabalhador, com o fim de retê-lo no local de trabalho;

II – mantém vigilância ostensiva no local de trabalho ou se apodera de documen-tos ou objetos pessoais do trabalhador, com o fim de retê-lo no local de trabalho.

Logo, de acordo com a previsão legal, o trabalho em condições análogas à de escravo engloba as seguintes condutas típicas: a) trabalho forçado; b) jor-nada exaustiva; c) condição degradante de trabalho; d) restrição da locomoção em razão de dívida; e) cerceamento do uso de qualquer meio de transporte por parte do trabalhador, com o fim de retê-lo no local de trabalho; f) manutenção de vigilância ostensiva no local de trabalho; g) apoderar-se de documentos ou objetos pessoais do trabalhador, com o fim de retê-lo no local de trabalho.

4 “Recurso extraordinário. Constitucional. Penal. Processual penal. Competência. Redução à condição análoga à de escravo. Conduta tipificada no art. 149 do Código Penal. Crime contra a organização do trabalho. Competência da Justiça Federal. Art. 109, VI, da Constituição Federal. Conhecimento e provimento do recurso. 1. O bem jurídico objeto de tutela pelo art. 149 do Código Penal vai além da liberdade individual, já que a prática da conduta em questão acaba por vilipendiar outros bens jurídicos protegidos constitucionalmente como a dignidade da pessoa humana, os direitos trabalhistas e previdenciários, indistintamente considerados. 2. A referida conduta acaba por frustrar os direitos assegurados pela lei trabalhista, atingindo, sobremodo, a organização do trabalho, que visa exatamente a consubstanciar o sistema social trazido pela Constituição Federal em seus arts. 7º e 8º, em conjunto com os postulados do art. 5º, cujo escopo, evidentemente, é proteger o trabalhador em todos os sentidos, evitando a usurpação de sua força de trabalho de forma vil. 3. É dever do Estado (lato sensu) proteger a atividade laboral do trabalhador por meio de sua organização social e trabalhista, bem como zelar pelo respeito à dignidade da pessoa humana (CF, art. 1º, III). 4. A conjugação harmoniosa dessas circunstâncias se mostra hábil para atrair para a competência da Justiça Federal (CF, art. 109, VI) o processamento e o julgamento do feito. 5. Recurso extraordinário do qual se conhece e ao qual se dá provimento.” (STF, RE 459.510/MT, Pleno, Red. p/o Ac. Min. Dias Toffoli, DJe 12.04.2016 – grifos nossos)

Page 12: Nº 345 – Março 2018 · Revista SÍNTESE Trabalhista e Previdenciária Ano XXIX – nº 345 – MArço 2018 reposItórIo AutorIzAdo de JurIsprudêncIA Supremo Tribunal Federal

12 ......................................................................................................... RST Nº 345 – Março/2018 – ASSUNTO ESPECIAL – DOUTRINA

Em conformidade com o exposto, segundo a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal:

Penal. Redução à condição análoga à de escravo. Escravidão moderna. Desne-cessidade de coação direta contra a liberdade de ir e vir. Denúncia recebida. Para configuração do crime do art. 149 do Código Penal, não é necessário que se pro-ve a coação física da liberdade de ir e vir ou mesmo o cerceamento da liberdade de locomoção, bastando a submissão da vítima “a trabalhos forçados ou a jor-nada exaustiva” ou “a condições degradantes de trabalho”, condutas alternativas previstas no tipo penal. A “escravidão moderna” é mais sutil do que a do século XIX e o cerceamento da liberdade pode decorrer de diversos constrangimentos econômicos e não necessariamente físicos. Priva-se alguém de sua liberdade e de sua dignidade tratando-o como coisa, e não como pessoa humana, o que pode ser feito não só mediante coação, mas também pela violação intensa e persistente de seus direitos básicos, inclusive do direito ao trabalho digno. A violação do direito ao trabalho digno impacta a capacidade da vítima de realizar escolhas segundo a sua livre determinação. Isso também significa “reduzir alguém a con-dição análoga à de escravo”. Não é qualquer violação dos direitos trabalhistas que configura trabalho escravo. Se a violação aos direitos do trabalho é intensa e persistente, se atinge níveis gritantes e se os trabalhadores são submetidos a trabalhos forçados, jornadas exaustivas ou a condições degradantes de trabalho, é possível, em tese, o enquadramento no crime do art. 149 do Código Penal, pois os trabalhadores estão recebendo o tratamento análogo ao de escravos, sendo privados de sua liberdade e de sua dignidade. Denúncia recebida pela presença dos requisitos legais. (STF, INQ 3.412/AL, Pleno, Rel. Min. Marco Aurélio, Red. p/o Ac. Min. Rosa Weber, m.v., DJe 12.11.2012 – grifos nossos)

Frise-se ainda que, para os fins previstos na atual Portaria nº 1.293/2017 (art. 2º) e na referida Instrução Normativa nº 139/2018 (art. 6º):

Trabalho forçado é aquele exigido sob ameaça de sanção física ou psicológica e para o qual o trabalhador não tenha se oferecido ou no qual não deseje perma-necer espontaneamente.

Jornada exaustiva é toda forma de trabalho, de natureza física ou mental, que, por sua extensão ou por sua intensidade, acarrete violação de direito fundamen-tal do trabalhador, notadamente os relacionados a segurança, saúde, descanso e convívio familiar e social.

Condição degradante de trabalho é qualquer forma de negação da dignidade humana pela violação de direito fundamental do trabalhador, notadamente os dispostos nas normas de proteção do trabalho e de segurança, higiene e saúde no trabalho.

Restrição, por qualquer meio, da locomoção do trabalhador em razão de dívida é a limitação ao direito fundamental de ir e vir ou de encerrar a prestação do tra-balho, em razão de débito imputado pelo empregador ou preposto ou da indução ao endividamento com terceiros.

Page 13: Nº 345 – Março 2018 · Revista SÍNTESE Trabalhista e Previdenciária Ano XXIX – nº 345 – MArço 2018 reposItórIo AutorIzAdo de JurIsprudêncIA Supremo Tribunal Federal

RST Nº 345 – Março/2018 – ASSUNTO ESPECIAL – DOUTRINA ..............................................................................................................13

Cerceamento do uso de qualquer meio de transporte é toda forma de limitação ao uso de meio de transporte existente, particular ou público, possível de ser utiliza-do pelo trabalhador para deixar local de trabalho ou de alojamento.

Vigilância ostensiva no local de trabalho é qualquer forma de controle ou fisca-lização, direta ou indireta, por parte do empregador ou preposto, sobre a pessoa do trabalhador que o impeça de deixar local de trabalho ou alojamento.

Apoderamento de documentos ou objetos pessoais é qualquer forma de posse ilícita do empregador ou preposto sobre documentos ou objetos pessoais do tra-balhador.

De forma sistematizada, pode-se dizer que o trabalho em condições aná-logas à de escravo, como gênero, abrange o trabalho forçado, a jornada exaus-tiva e o trabalho em condições degradantes.

Nesse contexto, entende-se que o trabalho degradante, como modalida-de de trabalho em condições análogas à de escravo, é caracterizado por condi-ções precárias de labor, sem a observância das normas mínimas de segurança, higiene e saúde do trabalho, em afronta à dignidade humana.

De todo modo, a redução de trabalhador à condição análoga à de es-cravo, em qualquer de suas espécies, configura grave violação à dignidade da pessoa humana, garantida como fundamento do Estado Democrático de Direito (art. 1º, III, da Constituição da República), o que resulta em manifesta contrarie-dade ao chamado trabalho decente, exigido também na esfera internacional5.

Portanto, revela-se adequada, por estar em consonância com o siste-ma jurídico contemporâneo, a atual sistematização decorrente da Portaria nº 1.293/2017, esperando-se que não haja novos retrocessos quanto à matéria.

5 Cf. GARCIA, Gustavo Filipe Barbosa. Curso de direito do trabalho. 12. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2018. p. 174.

Page 14: Nº 345 – Março 2018 · Revista SÍNTESE Trabalhista e Previdenciária Ano XXIX – nº 345 – MArço 2018 reposItórIo AutorIzAdo de JurIsprudêncIA Supremo Tribunal Federal

Assunto Especial – Doutrina

Trabalho Escravo – As Alterações

Do Trabalho em Condições Análogas às de Escravo e a Nova Portaria nº 1.293/2017 do Ministério do Trabalho*

The Work on Compulsory Conditions of Slavery and the New Ordinance nº 1.293/2017 of Labor Ministry

ROCCO ANTONIO RANGEL ROSSO NELSON**

Mestre em Direito Constitucional pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN), Especialista em Ministério Público, Direito e Cidadania pela Escola Superior do Ministério Pú-blico do Rio Grande do Norte, Especialista em Direito Penal e Criminologia pela Universidade Potiguar, Ex-Professor do Curso de Direito e de outros cursos de Graduação e Pós-Graduação do Centro Universitário Facex, Membro do Grupo de Estudo e Pesquisa em Extensão e Res-ponsabilidade Social – vinculado à linha de pesquisa “Democracia, Cidadania e Direitos Funda-mentais” do Instituto Federal do Rio Grande do Norte (IFRN) – campus Natal-Central, Professor efetivo de Direito do Instituto Federal do Rio Grande do Norte (IFRN) – campus João Câmara. Autor dos livros Curso de Direito Penal – Teoria Geral do Crime (1. ed. Curitiba, v. I, 2016) e Curso de Direito Penal – Teoria Geral da Pena (1. ed. Curitiba, v. II, 2017).

ISABEL CRISTINA AMARAL DE SOUSA ROSSO NELSON***

Doutora em educação pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN), Bacharela e Licenciada em Enfermagem pela Universidade Estadual da Paraíba (UEPB), Especialista em Formação Profissional na Área de Saúde pela Fiocruz/UFRN, Especialista em Saúde da Família (Universidade Castelo Branco), Especialista em Enfermagem do Trabalho pela Faculdade de Ciências Sociais Aplicadas (Facisa), Especialista em Educação Desenvolvimento e Políticas Educativas pelas Faculdades Integradas de Patos (FIP), Docente da Faculdade de Enfermagem e do Programa de Pós-Graduação stricto sensu Saúde e Sociedade da Universidade Estadual do Rio Grande do Norte.

WALKYRIA DE OLIVEIRA ROCHA TEIXEIRA****

Mestre em Educação pelo Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Rio Grande do Norte (IFRN), Especialista em Jurisdição e Direito Privado pela ESMARN/UNP, Especialista

* Artigo de investigação elaborado de estudo desenvolvido na linha de pesquisa “Democracia, Cidadania e Direitos Fundamentais”, inscrito no Grupo de Estudo e Pesquisa em Extensão e Responsabilidade Social, do Instituto Federal do Rio Grande do Norte (IFRN), Brasil.

** E-mail: [email protected].

*** E-mail: [email protected].

**** E-mail: [email protected].

Page 15: Nº 345 – Março 2018 · Revista SÍNTESE Trabalhista e Previdenciária Ano XXIX – nº 345 – MArço 2018 reposItórIo AutorIzAdo de JurIsprudêncIA Supremo Tribunal Federal

RST Nº 345 – Março/2018 – ASSUNTO ESPECIAL – DOUTRINA ..............................................................................................................15

em Ministério Público, Direito e Cidadania pela FESMP, Membro do Grupo de Estudo e Pesqui-sa em Extensão e Responsabilidade Social – vinculado à linha de pesquisa “Democracia, Cida-dania e Direitos Fundamentais” do Instituto Federal do Rio Grande do Norte (IFRN) – campus Natal-Central, Auditora Federal, Advogada, Chefe da Auditoria-Geral do IFRN.

RESUMO: Fazendo uso de uma metodologia de análise qualitativa, usando-se os métodos de abor-dagem hipotético-dedutivos de caráter descritivo e analítico, e adotando-se técnica de pesquisa bibliográfica, tem por objetivo específico do presente ensaio apresentar considerações críticas à recentíssima Portaria nº 1.293/2017 do Ministério do Trabalho, que dispõe sobre os conceitos de trabalho em condições análogas às de escravo para fins de concessão de seguro-desemprego ao trabalhador que vier a ser resgatado em fiscalização do Ministério do Trabalho, nos termos do art. 2º-C da Lei nº 7.998, de 11 de janeiro de 1990, e trata da divulgação do cadastro de empregado-res que tenham submetido trabalhadores à condição análoga à de escravo, estabelecido pela Portaria Interministerial MTPS/MMIRDH nº 4, de 11 de maio de 2016, realizando uma análise comparativa com a suspensa Portaria nº 1.129/2017 do Ministério do Trabalho.

PALAVRAS-CHAVE: Direitos sociais fundamentais; busca do trabalho digno; trabalho análogo ao de escravo; Portaria nº 1.293/2017 do Ministério do Trabalho.

ABSTRACT: Using a qualitative analysis methodology, using the methods of hypothetical-deductive approach of descriptive and analytical character, adopting a technique of bibliographical research, has the specific objective of this essay to present critical considerations to the most recent Administra-tive Rule nº 1.293/17 of the Ministry of Labor, which provides for the concepts of work in conditions analogous to that of slave labor, for the purpose of granting unemployment insurance to the worker who will be rescued under the supervision of the Ministry of Labor, pursuant to article 2-C of Law nº 7.998, of January 11, 1990, and deals with the disclosure of the Register of Employers who have submitted workers to the condition analogous to that of slave, established by Interministerial Order MTPS/MMIRDH nº 4, dated May 11, 2016, performing a comparative analysis with the suspended Ordinance nº 1.129/17 of the Ministry of Labor.

KEYWORDS: Fundamental social rights; search for decent work; work analogous to slave labor; Ordi-nance nº 1.293/2017 of Labor Ministry.

SUMÁRIO: Das considerações iniciais; 1 Brevíssima e parcial análise do tipo penal “redução à condi-ção análoga à de escravo”; 1.1 Do núcleo do tipo; 1.2 Do elemento subjetivo do tipo; 1.3 Do bem ju-rídico e do objeto material; 2 Da análise comparativa entre as Portarias nºs 1.129/2017 e 1.293/2017 do Ministério do Trabalho; 2.1 Da definição de trabalho análogo ao de escravo; 2.2 Da “lista suja do trabalho escravo”; Das considerações finais; Referências.

DAS CONSIDERAÇÕES INICIAIS

O Brasil é signatário de diversos tratados/convenções internacionais que vedam a escravidão, o tráfico de escravos, a servidão, os trabalhos exaustivos e

Page 16: Nº 345 – Março 2018 · Revista SÍNTESE Trabalhista e Previdenciária Ano XXIX – nº 345 – MArço 2018 reposItórIo AutorIzAdo de JurIsprudêncIA Supremo Tribunal Federal

16 ......................................................................................................... RST Nº 345 – Março/2018 – ASSUNTO ESPECIAL – DOUTRINA

degradantes, além daqueles que buscam garantir e promover o trabalho decente e digno do trabalhador1.

Entretanto, constitui-se em uma triste realidade a submissão de milhares de trabalhadores a condições análogas às de escravo, em pleno século XXI, no Brasil, seja em áreas rurais ou mesmo em grandes centros urbanos.

No Brasil, de forma particular pode se apontar que a essência da cons-trução do regramento jurídico proibitivo da conduta do trabalho análogo ao de escravo encontra-se prescrita no art. 149 do Código Penal.

Art. 149. Reduzir alguém a condição análoga à de escravo, quer submetendo-o a trabalhos forçados ou a jornada exaustiva, quer sujeitando-o a condições de-gradantes de trabalho, quer restringindo, por qualquer meio, sua locomoção em razão de dívida contraída com o empregador ou preposto:

Pena – reclusão, de dois a oito anos, e multa, além da pena correspondente à violência.

§ 1º Nas mesmas penas incorre quem:

I – cerceia o uso de qualquer meio de transporte por parte do trabalhador, com o fim de retê-lo no local de trabalho;

II – mantém vigilância ostensiva no local de trabalho ou se apodera de documen-tos ou objetos pessoais do trabalhador, com o fim de retê-lo no local de trabalho.

§ 2º A pena é aumentada de metade, se o crime é cometido:

I – contra criança ou adolescente;

II – por motivo de preconceito de raça, cor, etnia, religião ou origem.

O legislador pátrio fixou, de maneira indiscutível, a intenção de coibir ações que desrespeitassem a dignidade da pessoa humana, criminalizando con-dutas que redundariam na exploração do trabalhador.

Em sede de Poder Executivo federal, o Ministério do Trabalho, em outu-bro de 2017, por meio da Portaria nº 1.129/2017, regulamentou desastrosamen-te os conceitos de trabalho forçado, jornada exaustiva e condições análogas às de escravo para fins de concessão de seguro-desemprego ao trabalhador que vier a ser resgatado em fiscalização do Ministério do Trabalho, bem como alte-rou dispositivos Portaria Interministerial MTPS/MMIRDH nº 4, de 11.05.2016, que versa sobre as regras relativas ao cadastro de empregadores que tenham submetido trabalhadores a condições análogas às de escravo.

1 O trabalho decente seria o ápice dos objetivos da Organização Internacional do Trabalho (OIT), pautado na promoção da liberdade sindical, na eliminação do trabalho forçado, na abolição do trabalho infantil e na eliminação de todas as formas de descriminação. Cf. Disponível em: <http://www.ilo.org/brasilia/temas/trabalho-decente/lang--pt/index.htm>. Acesso em: 30 out. 2017.

Page 17: Nº 345 – Março 2018 · Revista SÍNTESE Trabalhista e Previdenciária Ano XXIX – nº 345 – MArço 2018 reposItórIo AutorIzAdo de JurIsprudêncIA Supremo Tribunal Federal

RST Nº 345 – Março/2018 – ASSUNTO ESPECIAL – DOUTRINA ..............................................................................................................17

As críticas à Portaria nº 1.129/2017 do Ministério do Trabalho resplan-deceram na mídia, no seio da doutrina jurídica, entre os auditores do traba-lho, a comunidade internacional, posto ter ventilado um conceito restritíssimo para configuração do trabalho análogo ao de escravo, divergindo dos termos do Código Penal e do vetor axiológico de máxima proteção ao trabalhador, nos termos dos direitos sociais fundamentais esculpidos na Constituição e nos documentos internacionais ratificados pelo Brasil.

O teor da referida portaria é de tal maneira divorciada de todo o conjunto normativo histórico de proteção ao trabalhador que não tardou (exatos 4 dias da publicação da portaria no Diário Oficial) da impetração de uma ação de Argui-ção de Descumprimento de Preceito Fundamental nº 4892 interposta pelo parti-do Rede, sendo a Relatora a Ministra Rosa Weber, a qual deferiu o pleito liminar de suspensão dos efeitos da Portaria nº 1.129/2017 do Ministério do Trabalho.

Destaca-se que no mesmo dia da impetração da ADPF 489 fora impetra-da, com o mesmo desiderato – suspensão dos efeitos da Portaria nº 1.129/2017 –, a ADPF 491 pela Confederação Nacional das Profissões Liberais, a qual aca-bou sendo apensada aos autos da ADPF 489.

Além dessas duas ADPFs, fora interposta Ação Direta de Inconstituciona-lidade nº 5.802, a qual tem por requente o partido Democrático Trabalhista no dia 23 de outubro de 2017.

No “apagar das luzes” do ano de 2017 tem-se a publicação, no Diário Oficial de 29 de dezembro, a nova Portaria nº 1.293 do Ministério do Trabalho, que vem por corrigir o trágico “soneto” da Portaria nº 1.129/2017, versando so-bre os conceitos de trabalho em condições análogas às de escravo para fins de concessão de seguro-desemprego ao trabalhador que vier a ser resgatado em fis-calização do Ministério do Trabalho, nos termos do art. 2º-C da Lei nº 7.998, de 11 de janeiro de 1990, e trata da divulgação do cadastro de empregadores que tenham submetido trabalhadores à condição análoga à de escravo, estabelecido pela Portaria Interministerial MTPS/MMIRDH nº 4, de 11 de maio de 20163.

Fazendo uso de uma metodologia de análise qualitativa, usando-se os métodos de abordagem hipotético-dedutivos de caráter descritivo e analítico, e adotando-se técnica de pesquisa bibliográfica, tem por objetivo específico do presente ensaio apresentar considerações críticas à recentíssima Portaria nº 1.293/2017 do Ministério do Trabalho, realizando uma análise comparativa com a suspensa Portaria nº 1.129/2017 do Ministério do Trabalho.

2 A ADPF 489 fora protocolada no dia 20 de outubro de 2017.3 Detalhe temporal. Tem-se duas portarias para regulamentar o mesmo assunto com uma diferença de exatos

74 dias.

Page 18: Nº 345 – Março 2018 · Revista SÍNTESE Trabalhista e Previdenciária Ano XXIX – nº 345 – MArço 2018 reposItórIo AutorIzAdo de JurIsprudêncIA Supremo Tribunal Federal

18 ......................................................................................................... RST Nº 345 – Março/2018 – ASSUNTO ESPECIAL – DOUTRINA

1 BREVÍSSIMA E PARCIAL ANÁLISE DO TIPO PENAL “REDUÇÃO À CONDIÇÃO ANÁLOGA À DE ESCRAVO”

1.1 Do núcleo Do tipo

No art. 149, caput, a redução à condição análoga à de escravo se dá pelas seguintes formas: submissão a trabalhos forçados, submissão à jornada exaustiva, sujeição a condições degradantes de trabalho e restrição por qual-quer meio, sua locomoção em razão de dívida contraída com o empregador ou preposto.

Já, no parágrafo único do referido artigo, ter-se-ia a redução à condição análoga à de escravo por equiparação, apresentando mais duas formas de con-dutas típicas: cercear o uso de qualquer meio de transporte por parte do traba-lhador, com o fim de retê-lo no local de trabalho; e manter vigilância ostensiva no local de trabalho ou se apoderar de documentos ou objetos pessoais do trabalhador, com o fim de retê-lo no local de trabalho.

Quatro 1 – comparação entre a reDução à conDição análoga à De escravo e a reDução à conDição análoga à De escravo por eQuiparação

Redução à condição aná-loga à de eScRavo

Redução à condição análoga à de eScRavo poR equipaRação

Submissão a trabalhos forçados Cercear o uso de qualquer meio de transporte por parte do trabalhador, com o fim de retê-lo no local de trabalho

Submissão à jornada exaustiva Manter vigilância ostensiva no local de trabalho ou se apo-derar de documentos ou objetos pessoais do trabalhador, com o fim de retê-lo no local de trabalho

Sujeição a condições degradantes de trabalho

Restrição por qualquer meio, sua locomoção em razão de dívida contraída com o empregador ou preposto

Fonte: Elaborado pelos autores.

Avulta-se que a presente redação do art. 149, com a especificidade que o princípio da taxatividade exige4, deu-se em face da alteração do Código Penal pela Lei específica nº 10.803/2003, posto que na redação original do Código

4 “Nulo o crime e a pena sem lei certa. Desse apotegma extrai-se o princípio da taxatividade e da precisão, o qual exige, por parte do legislador, a constituição de tipos penais de forma clarividentes, certos, os quais não deixem margens a dubiedades, delimitando de forma devida a conduta humana proibida.

[...]

A norma incerta não só viola o princípio da legalidade como também a da separação dos poderes, pois os magistrados estariam a criar a norma penal incriminadora, quando de sua aplicação, conforme o seu subjetivismo, estando o cidadão a mercê do arbítrio estatal, configurando um Direito Penal autoritário.” (NELSON, Rocco Antonio Rangel Rosso. Curso de direito penal – Parte geral – Teoria geral do crime. Curitiba: Juruá, v. I, 2016. p. 41-42)

Page 19: Nº 345 – Março 2018 · Revista SÍNTESE Trabalhista e Previdenciária Ano XXIX – nº 345 – MArço 2018 reposItórIo AutorIzAdo de JurIsprudêncIA Supremo Tribunal Federal

RST Nº 345 – Março/2018 – ASSUNTO ESPECIAL – DOUTRINA ..............................................................................................................19

de 1940 constituía-se em um tipo penal aberto, extremamente conciso, dando margens a uma ampla possibilidade de interpretações5.

In verbis, redação original do tipo de redução à condição análoga à de escravo:

Art. 149. Reduzir alguém a condição análoga à de escravo:

Pena – reclusão, de 2 (dois) a 8 (oito) anos.

1.2 Do elemento subjetivo Do tipo

O presente tipo penal é perpetrado na modalidade dolosa da conduta, seja o dolo direto ou eventual6.

O legislador não contemplou o crime de redução à condição análoga à de escravo na dimensão subjetiva da culpa7.

É importante destacar que, na modalidade da redução à condição análo-ga à de escravo por equiparação há especial fim de agir para configuração do tipo penal, que é a intenção do empregador ou preposto em reter o trabalhador no local de trabalho.

1.3 Do bem juríDico e Do objeto material

O bem jurídico, de forma preliminar, é apresentado no capítulo do Có-digo Penal em que se encontra o art. 149, ou seja, o bem que se busca proteger seria a liberdade individual.

Entretanto, ao aferir as formas de redução à condição análoga à de es-cravo apontadas na redação do artigo supra, identifica-se como bem jurídico, além da liberdade individual, a violação da dignidade do trabalhador usurpado pelo trabalho forçado, pelo trabalho exaustivo e pelas condições degradantes de trabalho.

5 “Contudo, a nova redação trouxe um sério problema: se o Código do Império não gerava dúvidas ao intérprete, pois punia a redução de alguém à condição efetiva de escravo com a supressão da liberdade, o novo artigo já não permitia uma análise tão segura, pois trazia uma redação imprecisa; a expressão ‘condição análoga à de escravo’ era uma folha em branco, uma fonte inesgotável de interpretações. O tipo penal do Código de 1940 era um tipo aberto, não apresentava qualquer descrição da conduta típica, deixando, ao final das contas, a definição do crime ao ‘prudente arbítrio’ judicial.

O artigo, como fora elaborado, permitia, ao final das contas, a impunidade dos escravocratas. A dúvida milita sempre a favor do réu, a imprecisão típica era o caminho aberto para absolvições ou mesmo para a desclassificação da conduta para crimes mais brandos, [...].” (LORENTZ, Lutiana Nacur; MELO, Guilherme Orlando Anchieta. Uma abordagem interdisciplinar do trabalho análogo ao de escravo nas clivagens: trabalho forçado, degradante e desumano. Revista do Tribunal Regional do Trabalho da 3ª Região, v. 54, n. 84, p. 278, jul./dez. 2011)

6 “No caso do dolo eventual há representação de uma pluralidade de resultados, todavia, o sujeito dirige sua vontade em relação a um desses resultados (este não precisa ser ilícito), vindo assumir e aceitar o risco em relação ao outro. [...].” (NELSON, Rocco Antonio Rangel Rosso. Curso de direito penal – Parte geral – Teoria geral do crime. Curitiba: Juruá, v. I, 2016. p. 284)

7 “[...], faz-se luzir que a regra geral, adotado pelo Código Penal, a partir da redação do parágrafo único do art. 18, é o elemento subjetivo doloso nos tipos penais. De tal sorte, só poderá falar em delito culposo, quando assim estiver previsto expressamente do respectivo tipo penal.” (NELSON, Rocco Antonio Rangel Rosso. Curso de direito penal – Parte geral – Teoria geral do crime. Curitiba: Juruá, v. I, 2016. p. 279)

Page 20: Nº 345 – Março 2018 · Revista SÍNTESE Trabalhista e Previdenciária Ano XXIX – nº 345 – MArço 2018 reposItórIo AutorIzAdo de JurIsprudêncIA Supremo Tribunal Federal

20 ......................................................................................................... RST Nº 345 – Março/2018 – ASSUNTO ESPECIAL – DOUTRINA

De tal sorte, a restrição da liberdade de ir e vir não seria imprescindível para ocorrer a consumação do delito, podendo subsumir ao tipo penal quando diante das hipóteses de execução prescrita no art. 149 que retiram e rebaixam a dignidade da pessoa do trabalhador.

É nesse sentido julgado da Suprema Corte:

PENAL – REDUÇÃO A CONDIÇÃO ANÁLOGA A DE ESCRAVO – ESCRAVIDÃO MODERNA – DESNECESSIDADE DE COAÇÃO DIRETA CONTRA A LIBERDADE DE IR E VIR – DENÚNCIA RECEBIDA

Para configuração do crime do art. 149 do Código Penal, não é necessário que se prove a coação física da liberdade de ir e vir ou mesmo o cerceamento da liberdade de locomoção, bastando a submissão da vítima “a trabalhos forçados ou a jornada exaustiva” ou “a condições degradantes de trabalho”, condutas al-ternativas previstas no tipo penal. A “escravidão moderna” é mais sutil do que a do século XIX e o cerceamento da liberdade pode decorrer de diversos cons-trangimentos econômicos e não necessariamente físicos. Priva-se alguém de sua liberdade e de sua dignidade tratando-o como coisa e não como pessoa humana, o que pode ser feito não só mediante coação, mas também pela violação intensa e persistente de seus direitos básicos, inclusive do direito ao trabalho digno. A violação do direito ao trabalho digno impacta a capacidade da vítima de reali-zar escolhas segundo a sua livre determinação. Isso também significa “reduzir alguém a condição análoga à de escravo”. Não é qualquer violação dos direitos trabalhistas que configura trabalho escravo. Se a violação aos direitos do trabalho é intensa e persistente, se atinge níveis gritantes e se os trabalhadores são sub-metidos a trabalhos forçados, jornadas exaustivas ou a condições degradantes de trabalho, é possível, em tese, o enquadramento no crime do art. 149 do Código Penal, pois os trabalhadores estão recebendo o tratamento análogo ao de escra-vos, sendo privados de sua liberdade e de sua dignidade. Denúncia recebida pela presença dos requisitos legais.8 (grifos nossos)

Já o objeto material, o delito, seria a pessoa do trabalhador sobre o qual recai a conduta de redução à condição análoga à de escravo.

2 DA ANÁLISE COMPARATIVA ENTRE AS PORTARIAS NºS 1.129/2017 E 1.293/2017 DO MINISTÉRIO DO TRABALHO

2.1 Da Definição De trabalho análogo ao De escravo

2.1.1 No seio da Portaria nº 1.129/2017

Em 16 de outubro de 2017, é publicada no Diário Oficial da União a Portaria nº 1.129, de 13 de outubro de 2017, do Ministério do Trabalho9, vin-do, assim, a definir trabalho forçado, jornada exaustiva, condição degradante e condição análoga à de escravo:

8 STF, Inq 3412/AL, Pleno, Relª Min. Rosa Weber, J. 29.03.2012, DJe 09.11.2012.9 Disponível em: <http://www.trtsp.jus.br/geral/tribunal2/ORGAOS/MTE/Portaria/P1129_17.html>. Acesso

em: 27 out. 2017.

Page 21: Nº 345 – Março 2018 · Revista SÍNTESE Trabalhista e Previdenciária Ano XXIX – nº 345 – MArço 2018 reposItórIo AutorIzAdo de JurIsprudêncIA Supremo Tribunal Federal

RST Nº 345 – Março/2018 – ASSUNTO ESPECIAL – DOUTRINA ..............................................................................................................21

Art. 1º Para fins de concessão de benefício de seguro-desemprego ao trabalhador que vier a ser identificado como submetido a regime de trabalho forçado ou re-duzido a condição análoga à de escravo, nos termos da Portaria MTE nº 1.153, de 13 de outubro de 2003, em decorrência de fiscalização do Ministério do Trabalho, bem como para inclusão do nome de empregadores no Cadastro de Empregadores que tenham submetido trabalhadores à condição análoga à de es-cravo, estabelecido pela PI MTPS/MMIRDH nº 4, de 11.05.2016, considerar-se-á:

I – trabalho forçado: aquele exercido sem o consentimento por parte do trabalha-dor e que lhe retire a possibilidade de expressar sua vontade;

II – jornada exaustiva: a submissão do trabalhador, contra a sua vontade e com privação do direito de ir e vir, a trabalho fora dos ditames legais aplicáveis a sua categoria;

III – condição degradante: caracterizada por atos comissivos de violação dos di-reitos fundamentais da pessoa do trabalhador, consubstanciados no cerceamento da liberdade de ir e vir, seja por meios morais ou físicos, e que impliquem na privação da sua dignidade;

IV – condição análoga à de escravo:

a) a submissão do trabalhador a trabalho exigido sob ameaça de punição, com uso de coação, realizado de maneira involuntária;

b) o cerceamento do uso de qualquer meio de transporte por parte do trabalha-dor, com o fim de retê-lo no local de trabalho em razão de dívida contraída com o empregador ou preposto, caracterizando isolamento geográfico;

c) a manutenção de segurança armada com o fim de reter o trabalhador no local de trabalho em razão de dívida contraída com o empregador ou preposto;

d) a retenção de documentação pessoal do trabalhador, com o fim de reter o trabalhador no local de trabalho;

[...]. (grifos nossos)

Aponta-se que, ao explicitar as formas de redução à análoga à de escra-vo, vinculou às formas de execução, em seu bojo, a limitação do seu direito de liberdade de ir e vir.

Percebe-se que o elemento normativo da limitação do seu direito de li-berdade de ir e vir, posto na Portaria nº 1.129/2017, limita sobremaneira a caracterização do crime do art. 149 do Código Penal, além de ser um obstáculo não especificado na descrição típica do delito em comento.

Tal afirmação pode ser facilmente corroborada pelo dado estatístico refe-rente a denúncias sobre “trabalho escravo”, nos anos de 2011 e 2012, retirado do sítio do Ministério dos Direitos Humanos.

Page 22: Nº 345 – Março 2018 · Revista SÍNTESE Trabalhista e Previdenciária Ano XXIX – nº 345 – MArço 2018 reposItórIo AutorIzAdo de JurIsprudêncIA Supremo Tribunal Federal

22 ......................................................................................................... RST Nº 345 – Março/2018 – ASSUNTO ESPECIAL – DOUTRINA

QuaDro 2 – Quantitativo De pessoas liberaDas Do “trabalho escravo” (brasil, 2011-2012)10

Tipo de violação – 2011 núMeRoS

Aprisionamento do trabalhador 7

Condições degradantes de trabalho 29

Jornada excessiva de trabalho 30

Outros 17

Retenção de salários 35

Total 118

Tipo de violação – 2012 núMeRoS

Aprisionamento do trabalhador 20

Condições degradantes de trabalho 72

Jornada excessiva de trabalho 100

Outros 30

Retenção de salários 59

Total 281

Fonte: Elaborado pelos autores.

Constata na tabela retro que, em um conjunto de quase 400 denúncias, apenas 27 versavam sobre a restrição do direito de ir e vir, configurando, assim, tão somente 6,76% do total de denúncias. Destaca-se que só a prática da jorna-da exaustiva fora responsável por 32,58% das denúncias.

Apesar de já explicitado anteriormente, repita-se que no tipo penal redu-ção análoga à de escravo que o restringir, por qualquer meio, a locomoção do trabalhador em razão de dívida contraída com o empregador ou preposto é uma das formas de redução análoga à de escravo.

Aquele empregador ou preposto que impingir trabalhos forçados, jorna-da exaustiva ou condições degradantes de trabalho ao trabalhador já consuma o delito em questão, não sendo necessária a presença, em tais modalidades, do cerceamento do direito de ir e vir.

Sem maiores esforços argumentativos é flagrante a violação do princípio da legalidade quanto ao conteúdo normativo veiculado nessa novel portaria do Ministério do Trabalho, visto o caráter inovativo da portaria indo muito além do conteúdo legal.

Na mesma senda, percebe-se a violação dos compromissos internacio-nais no combate ao trabalho escravo e daqueles que buscam promover o traba-lho decente em face da dificuldade que a Portaria nº 1.129/2017 acarreta para a subsunção da prática do crime de redução análoga à de escravo.

10 Cf. Combate ao trabalho escravo. Disponível em: <http://www.sdh.gov.br/assuntos/conatrae/dados-estatis - -ticos>. Acesso em: 30 out. 2017.

Page 23: Nº 345 – Março 2018 · Revista SÍNTESE Trabalhista e Previdenciária Ano XXIX – nº 345 – MArço 2018 reposItórIo AutorIzAdo de JurIsprudêncIA Supremo Tribunal Federal

RST Nº 345 – Março/2018 – ASSUNTO ESPECIAL – DOUTRINA ..............................................................................................................23

É evidente que a concepção de “trabalho escravo” veiculada na Portaria nº 1.129/2017 é do “trabalho escravo” dos séculos XV a XVIII, o que diverge do que é praticado na contemporaneidade11.

2.1.1.1 Uma breve especulação política

Tenta-se vislumbrar quais as razões e os pretextos na publicação da de-sastrosa Portaria nº 1.129/2017.

A título de mera especulação, pode-se vislumbrar que a portaria vinha a atender o interesse da bancada ruralista do Congresso Nacional.

Perceba que há repercussões sensíveis no que tange ao enquadrar situ-ações de mero desrespeito a direitos trabalhistas e um contexto onde, além de violações dos direitos sociais mínimos, tem-se a subsunção no tipo penal de trabalho em condição análoga à de escravo.

Afira que, no momento que a conduta do empregador se enquadra no crime trabalho em condição análoga à de escravo, a sanção principal não está em sede de direito penal, mas, sim, de dimensão de efeitos civis prevista no art. 243 da Constituição Federal de 1988, por meio da Emenda Constitucional nº 81, de 2014, acrescentando como hipótese de expropriação, sem indeniza-ção, imóveis onde haja exploração de mão de obra escrava.

In verbis, o texto constitucional alterado:

Art. 243. As propriedades rurais e urbanas de qualquer região do País onde forem localizadas culturas ilegais de plantas psicotrópicas ou a exploração de trabalho escravo na forma da lei serão expropriadas e destinadas à reforma agrária e a programas de habitação popular, sem qualquer indenização ao proprietário e

11 “[...]. A escravidão do século XX e XXI não se confunde com a forma tradicional de escravidão, na qual o escravo era compreendido como um bem de valor, o que, de uma certa forma, poderia ser compreendido como uma vantagem, pois nenhum senhor dilapidaria o seu patrimônio, a coisificação evitava a destruição do servo. Contudo, o vassalo moderno foi reduzido a uma escala inferior, ele agora é pura energia de trabalho, dispensável, na medida em que a ameaça do desemprego garante um exército de miseráveis para compor as fileiras da escravidão.

O escravo moderno é essencialmente um ser descartável, privado da dignidade humana e da mais ínfima possibilidade de emancipar-se através do seu trabalho. O novo crime destrói a um só tempo a dignidade da pessoa humana e o valor social do trabalho, dois pilares inseridos no art. 1º da Constituição, respectivamente nos incisos III e IV; são eles fundamentos do nosso Estado Democrático de Direito. [...].” (LORENTZ, Lutiana Nacur; MELO, Guilherme Orlando Anchieta. Uma abordagem interdisciplinar do trabalho análogo ao de escravo nas clivagens: trabalho forçado, degradante e desumano. Revista do Tribunal Regional do Trabalho da 3ª Região, v. 54, n. 84, p. 277, jul./dez. 2011)

“Desse modo, equiparar conceitualmente trabalho escravo e trabalho análogo ao escravo é um profundo equívoco, pois abstrai a natureza específica do fenômeno contemporâneo, qual seja, a operação da coação do mercado – o moinho satânico de Polanyi (2000) – sobre o trabalho como agente de imposição de condições de uso da força de trabalho iguais àquelas vigentes em outros modos de produção. Em muitos casos, ocorrem condições piores do que as dos escravos, pois o exército industrial de reserva permite a reposição sem custos do trabalhador (na escravidão típica a reposição dependia da compra de escravo, desestimulando a destruição do ativo).” (SALES, Jeane; FILGUEIRAS, Vitor Araújo. Trabalho análogo ao escravo no Brasil: natureza do fenômeno e regulação. Revista da ABET, v. 12, n. 2, p. 41, jul./dez. 2013. Disponível em: <http://periodicos.ufpb.br/index.php/abet/article/view/20206>. Acesso em: 30 out. 2017)

Page 24: Nº 345 – Março 2018 · Revista SÍNTESE Trabalhista e Previdenciária Ano XXIX – nº 345 – MArço 2018 reposItórIo AutorIzAdo de JurIsprudêncIA Supremo Tribunal Federal

24 ......................................................................................................... RST Nº 345 – Março/2018 – ASSUNTO ESPECIAL – DOUTRINA

sem prejuízo de outras sanções previstas em lei, observado, no que couber, o disposto no art. 5º.

Parágrafo único. Todo e qualquer bem de valor econômico apreendido em de-corrência do tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins e da exploração de trabalho escravo será confiscado e reverterá a fundo especial com destinação específica, na forma da lei. (grifos nossos)

Em síntese, o novo regramento constitucional permite a expropriação de imóveis, seja rural ou urbano, não só no caso de culturas ilegais de plantas psicotrópicas, como também no caso de exploração de mãos de obra quando reduzido à condição análoga à de escravo por flagrante descumprimento da função social da propriedade, o que limita ampla disposição da propriedade, devendo esta ser utilizada conforme o princípio da socialidade.

Ou seja, no momento que a Portaria nº 1.129/2017 restringia a configu-ração do tipo penal de trabalho em condição análoga à de escravo a apenas as hipóteses onde se tivesse presente a restrição do direito de ir e vir está a bene-ficiar que os empregadores proprietários de terra evitassem a expropriação dos seus imóveis.

Constate que de todas as sanções previstas no que tange à prática redu-ção do trabalhador à condição análoga à de escravo a prevista na norma cons-titucional é avassaladora, pois impede com a expropriação que seja perpetrado o “trabalho escravo” novamente naquele imóvel.

2.1.2 Definição pela nova Portaria nº 1.293/2017

Afere-se no bojo da Portaria nº 1.293/2017 uma redação totalmente di-versa da sua antecessora seja pela sua melhor redação, seja na busca de atender o telos da Constituição e das normas internacionais do trabalho.

Segue-se a transcrição do art. 1º da nova portaria:

Art. 1º Para fins de concessão de benefício de seguro-desemprego ao trabalhador que for encontrado em condição análoga à de escravo no curso de fiscalização do Ministério do Trabalho, nos termos da Portaria MTE nº 1.153, de 13 de outu-bro de 2003, bem como para inclusão de administrados no Cadastro de Empre-gadores que tenham submetido trabalhadores à condição análoga à de escravo, estabelecido pela Portaria Interministerial MTPS/MMIRDH nº 4, de 11 de maio de 2016, considera-se em condição análoga à de escravo o trabalhador submetido, de forma isolada ou conjuntamente, a:

I – Trabalho forçado;

II – Jornada exaustiva;

III – Condição degradante de trabalho;

Page 25: Nº 345 – Março 2018 · Revista SÍNTESE Trabalhista e Previdenciária Ano XXIX – nº 345 – MArço 2018 reposItórIo AutorIzAdo de JurIsprudêncIA Supremo Tribunal Federal

RST Nº 345 – Março/2018 – ASSUNTO ESPECIAL – DOUTRINA ..............................................................................................................25

IV – Restrição, por qualquer meio, de locomoção em razão de dívida contraída com empregador ou preposto, no momento da contratação ou no curso do con-trato de trabalho;

V – Retenção no local de trabalho em razão de:

a) Cerceamento do uso de qualquer meio de transporte;

b) Manutenção de vigilância ostensiva;

c) Apoderamento de documentos ou objetos pessoais.

De forma muito evidente constata-se que se buscou a construção da de-finição de condição análoga à de escravo nos termos prescrito no art. 149 do Código Penal, posto que os núcleos da conduta, seja praticada isoladamente ou em conjunto, estaria na realização de trabalho forçado, jornada exaustiva, condição degradante, restrição de locomoção por dívida; e retenção no local de trabalho por cerceamento de transporte, vigilância ostensiva ou apoderamento de documentos ou objetos pessoais.

No art. 2º é onde se encontra a grande diferença em termos normativos da Portaria nº 1.129/2017, pois, ao definir cada conduta que se especificou como forma de redução à condição análoga à de escravo, tem-se conceitos bem traçados e que não consta a limitação veiculada à portaria retro, em que a execução da conduta de redução à condição análoga à de escravo ficava limitada apenas quando presente a restrição do direito de liberdade de ir e vir do trabalhador.

Segue quadro comparativo:

poRTaRia nº 1.129/2017 poRTaRia nº 1.293/2017

Art. 1º Art. 2º

I – trabalho forçado: aquele exercido sem o consenti-mento por parte do trabalhador e que lhe retire a pos-sibilidade de expressar sua vontade;

I – Trabalho forçado é aquele exigido sob ameaça de sanção física ou psicológica e para o qual o trabalha-dor não tenha se oferecido ou no qual não deseje per-manecer espontaneamente.

II – jornada exaustiva: a submissão do trabalhador, contra a sua vontade e com privação do direito de ir e vir, a trabalho fora dos ditames legais aplicáveis a sua categoria;

II – Jornada exaustiva é toda forma de trabalho, de natureza física ou mental, que, por sua extensão ou por sua intensidade, acarrete violação de direito fun-damental do trabalhador, notadamente os relaciona-dos a segurança, saúde, descanso e convívio familiar e social.

III – condição degradante: caracterizada por atos co-missivos de violação dos direitos fundamentais da pes-soa do trabalhador, consubstanciados no cerceamento da liberdade de ir e vir, seja por meios morais ou físi-cos, e que impliquem na privação da sua dignidade;

III – Condição degradante de trabalho é qualquer for-ma de negação da dignidade humana pela violação de direito fundamental do trabalhador, notadamente os dispostos nas normas de proteção do trabalho e de segurança, higiene e saúde no trabalho.

IV – condição análoga à de escravo:a) a submissão do trabalhador a trabalho exigido sob ameaça de punição, com uso de coação, realizado de maneira involuntária;

-----

Page 26: Nº 345 – Março 2018 · Revista SÍNTESE Trabalhista e Previdenciária Ano XXIX – nº 345 – MArço 2018 reposItórIo AutorIzAdo de JurIsprudêncIA Supremo Tribunal Federal

26 ......................................................................................................... RST Nº 345 – Março/2018 – ASSUNTO ESPECIAL – DOUTRINA

poRTaRia nº 1.129/2017 poRTaRia nº 1.293/2017

----IV – Restrição, por qualquer meio, da locomoção do trabalhador em razão de dívida é a limitação ao direito fundamental de ir e vir ou de encerrar a prestação do trabalho, em razão de débito imputado pelo empre-gador ou preposto ou da indução ao endividamento com terceiros.

b) o cerceamento do uso de qualquer meio de trans-porte por parte do trabalhador, com o fim de retê-lo no local de trabalho em razão de dívida contraída com o empregador ou preposto, caracterizando isolamento geográfico;

V – Cerceamento do uso de qualquer meio de trans-porte é toda forma de limitação ao uso de meio de transporte existente, particular ou público, possível de ser utilizado pelo trabalhador para deixar local de tra-balho ou de alojamento.

c) a manutenção de segurança armada com o fim de reter o trabalhador no local de trabalho em razão de dívida contraída com o empregador ou preposto;

VI – Vigilância ostensiva no local de trabalho é qual-quer forma de controle ou fiscalização, direta ou in-direta, por parte do empregador ou preposto, sobre a pessoa do trabalhador que o impeça de deixar local de trabalho ou alojamento.

d) a retenção de documentação pessoal do trabalha-dor, com o fim de reter o trabalhador no local de tra-balho;

VII – Apoderamento de documentos ou objetos pes-soais é qualquer forma de posse ilícita do empregador ou preposto sobre documentos ou objetos pessoais do trabalhador.

Nesse quadro comparativo percebe-se, de forma clara, como as redações são diversas, ocorrendo um salto qualitativo extremamente elevado na Portaria nº 1.293/2017.

Percebe-se que, pela redação da antiga Portaria nº 1.129/2017, se colo-cava a condição análoga à de escravo como algo diverso da prática da condi-ção degradante, jornada exaustiva e trabalho forçado. Isso é corrigido no art. 1º da nova Portaria nº 1.293/2017, transcrito anteriormente.

2.2 Da “lista suja Do trabalho escravo”

A chamada “lista suja do trabalho escravo” fora instituída por meio da Portaria nº 540, de 15 de outubro de 2004, do Ministério do Trabalho e Empre-go12, o qual instituiu o cadastro de empregadores que tenham mantido trabalha-dores em condições análogas às de escravo.

Não há dúvidas quanto a importância do referido cadastro, posto ofer-tar a transparência necessária à sociedade, além de configurar instrumento de combate à prática da redução a condições análogas às de escravo, visto que o vetor axiológico trazido pela palavra “escravidão” é extremamente significativo no aspecto negativo, não havendo pessoa física ou jurídica que queira ter seu nome e sua imagem associados a pessoas e empresas que tenham em seu qua-dro trabalhadores reduzidos a “escravos”.

12 Disponível em: <http://www.trtsp.jus.br/geral/tribunal2/ORGAOS/MTE/Portaria/P540_04.html>. Acesso em: 27 out. 2017.

Page 27: Nº 345 – Março 2018 · Revista SÍNTESE Trabalhista e Previdenciária Ano XXIX – nº 345 – MArço 2018 reposItórIo AutorIzAdo de JurIsprudêncIA Supremo Tribunal Federal

RST Nº 345 – Março/2018 – ASSUNTO ESPECIAL – DOUTRINA ..............................................................................................................27

Por óbvio, a portaria supra fora questionada no âmbito do Poder Judi-ciário, vindo a ser ventilada, no seio do Superior Tribunal de Justiça, em sede do Mandado de Segurança nº 14017/DF13, sendo alegada violação ao princípio da legalidade, da presunção de inocência e da falta de legitimidade para fiscali-zação dos auditores-fiscais do trabalho, o qual acabou sendo denegado, sendo reconhecido sua legitimidade.

O referido cadastro fora regulamentado, posteriormente, por meio da Portaria Interministerial nº 2, de 12 de maio 2011 (Ministério do Trabalho e Emprego e Secretaria de Direitos Humanos da Presidência República)14.

Mais uma vez a questão é levada ao Poder Judiciário, agora, na esfera do STF, por meio de Medida Cautelar na Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 5.209/DF, tendo por requerente a Associação Brasileira de Incorporadoras Imobiliárias – Abrainc, sendo pontificada violação ao art. 87, II, e art. 186, III e IV, da Constituição, além dos princípios da separação dos poderes, da reserva legal e da presunção de inocência.

Em decisão monocrática do Ministro Ricardo Lewandowski, publicada em 3 de fevereiro de 2015, concedeu o pedido liminar para suspender a Porta-ria Interministerial nº 2, de 12 de maio 2011, entendendo que a expedição de atos por parte do Ministro de Estado depende de regulamentação formal por lei, a qual inexiste, além da aparente violação do devido processo legal, posto que a inclusão do infrator no referido cadastro dependeria, exclusivamente, de ato unilateral fruto da ação fiscal, o que não asseguraria o contraditório e a ampla defesa.

Em virtude da nova Portaria Interministerial nº 2, de 31 de março de 2015, do Ministério do Trabalho e Emprego e Secretaria de Direitos Humanos da Presidência República15, que volta a regulamentar o assunto e vem por re-vogar a Portaria Interministerial nº 2, de 12 de maio 2011, a explicitada Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 5.209/DF não chegou a ter seu mérito anali-sado, em face da perda do objeto16.

De forma contínua, a “lista suja do trabalho escravo” veio a ser regula-mentada pela Portaria Interministerial nº 4, de 11 de maio de 2016, do Minis-tério do Trabalho e Previdência social e Ministério das Mulheres, da Igualdade Racial, da Juventude e dos Direitos Humanos17.

13 STJ, MS 14017/DF, 1ª Seção, Rel. Min. Herman Benjamin, J. 27.05.2009, DJe 01.07.2009.14 Disponível em: <http://www.trtsp.jus.br/geral/tribunal2/ORGAOS/MTE/Portaria/P02_11.html>. Acesso em:

27 out. 2017.15 Disponível em: <http://www.trtsp.jus.br/geral/tribunal2/ORGAOS/MTE/Portaria/PORT_INT_02_15.html>.

Acesso em: 27 out. 2017.16 Cf. STF, ADI 5209/DF, Relª Min. Cármen Lúcia, decisão monocrática, J. 16.05.2016, DJe 23.05.2016.17 Disponível em: <http://www.trtsp.jus.br/geral/tribunal2/ORGAOS/MTPS/PORT_INTER_04_16.html>. Acesso

em: 27 out. 2017.

Page 28: Nº 345 – Março 2018 · Revista SÍNTESE Trabalhista e Previdenciária Ano XXIX – nº 345 – MArço 2018 reposItórIo AutorIzAdo de JurIsprudêncIA Supremo Tribunal Federal

28 ......................................................................................................... RST Nº 345 – Março/2018 – ASSUNTO ESPECIAL – DOUTRINA

2.2.1 Da Portaria nº 1.129/2017

A outra novidade trazida pela Portaria nº 1.129/2017, que não passou incólume a severíssimas críticas fora a do conteúdo versado do art. 3º, § 3º, e do art. 4º, § 1º, da portaria supra, que tratada da inscrição do infrator “lista suja do trabalho escravo”:

Art. 3º [...]

[...]

§ 3º Diante da decisão administrativa final de procedência do auto de infração ou do conjunto de autos, o Ministro de Estado do Trabalho determinará a inscrição do empregador condenado no Cadastro de Empregadores que submetem traba-lhadores a condição análoga às de escravo.

Art. 4º [...]

§ 1º A organização do Cadastro ficará a cargo da Secretaria de Inspeção do Tra-balho (SIT), cuja divulgação será realizada por determinação expressa do Minis-tro do Trabalho.

Constata-se que, a partir de agora, a inscrição do empregador na “lista suja”, bem como sua divulgação, dependerá de determinação expressa do Mi-nistro do Trabalho, transformando algo antes realizado por um juízo técnico para uma análise de conveniência política, o que fragiliza o processo de trans-parência, o controle social e, consequentemente, o combate a tal delito.

2.2.2 Da Portaria nº 1.293/2017

Pela nova portaria, em seu art. 14, a inscrição do empregador na “lista suja” deixa de perpassar por uma decisão de um agente político e retorna aos setores técnicos do Ministério do Trabalho, não dependendo mais de decisão Ministro do Trabalho.

Art. 14. O Cadastro de Empregadores previsto na Portaria Interministerial MTPS/MMIRDH nº 4/2016 será divulgado no sítio institucional do Ministério do Tra-balho na rede mundial de computadores, contendo a relação dos administrados autuados em ação fiscal em que tenham sido identificados trabalhadores subme-tidos a condições análogas à de escravo.

§ 1º A inclusão do empregador somente ocorrerá após a prolação de decisão administrativa irrecorrível de procedência do auto de infração lavrado na ação fiscal em razão da constatação de submissão de trabalhadores em condições análogas à de escravo.

§ 2º A organização e divulgação do Cadastro ficará a cargo da Detrae, cuja divul-gação será realizada na forma do caput.

§ 3º A Assessoria de Comunicação e demais órgãos do Ministério do Trabalho deverão garantir todos os meios necessários para que a Secretaria de Inspeção do

Page 29: Nº 345 – Março 2018 · Revista SÍNTESE Trabalhista e Previdenciária Ano XXIX – nº 345 – MArço 2018 reposItórIo AutorIzAdo de JurIsprudêncIA Supremo Tribunal Federal

RST Nº 345 – Março/2018 – ASSUNTO ESPECIAL – DOUTRINA ..............................................................................................................29

Trabalho possa realizar a divulgação do Cadastro prevista no caput e no art. 2º da Portaria Interministerial MTPS/MMIRDH nº 4/2016. (grifos nossos)

Nos termos da Portaria nº 1.293/2017, a organização e divulgação da “lista suja” é transferida para a Divisão de Fiscalização para Erradicação do Trabalho Escravo (Detrae), órgão técnico especializado, saindo das atribuições da Secretaria de Inspeção do Trabalho (SIT).

DAS CONSIDERAÇÕES FINAIS

Depois tudo que fora apresentado neste ensaio, fica muito claro que a Portaria nº 1.129/2017 do Ministério do Trabalho choca-se frontalmente com o conjunto de convenções e documentos internacionais que o Brasil é signatário referente ao combate ao trabalho escravo, aos trabalhos forçados, à jornada exaustiva e à servidão, em claro contraponto ao direito fundamental ao trabalho digno, por flexibilizar a definição de redução análoga à escravo, tornando-se sua configuração quase inalcançável em face de uma percepção quinhentista de “trabalho escravo”.

Com o fito de resgatar a imagem do Brasil na seara internacional, além de estancar a avalanche de críticas decorrente da tétrica Portaria nº 1.129/2017, sobreveio a Portaria nº 1.293/2017 do Ministério do Trabalho, o qual encontra--se alinhado com os documentos internacionais, com o plexo de direitos sociais prescrito na Constituição e em matéria infraconstitucional com o Código Penal.

Em síntese, a nova portaria oferta conceito claro e amplo do que seja trabalho análogo ao de escravo, estando ele configurado quando da prática isoladamente ou em conjunto de trabalho forçado, jornada exaustiva, condição degradante e restrição de locomoção por dívida; e retenção no local de trabalho por cerceamento de transporte, vigilância ostensiva ou apoderamento de docu-mentos ou objetos pessoais.

Deu-se a correção quanto à visão estreita e limitadíssima de que trabalho análogo ao de escravo dar-se-ia, apenas, quando da restrição do direito de ir e vir do trabalhador.

Por fim, no que tange à inscrição do empregador na “lista suja” e de sua divulgação, a nova portaria retirou das atribuições da Secretaria de Inspeção do Trabalho e da dependência de decisão/autorização do Ministro do Trabalho, estancando, assim, a discricionariedade política e devolvendo para o setor téc-nico Divisão de Fiscalização para Erradicação do Trabalho Escravo.

Acredita-se que uma consequência lógica decorrente da Portaria nº 1.293/2017 será a extinção das ações de Arguições de Descumprimento de Preceito Fundamental nºs 489 e 491, bem como da Ação Direta de Inconstitu-cionalidade nº 5.802 em face da perda do objeto.

Page 30: Nº 345 – Março 2018 · Revista SÍNTESE Trabalhista e Previdenciária Ano XXIX – nº 345 – MArço 2018 reposItórIo AutorIzAdo de JurIsprudêncIA Supremo Tribunal Federal

30 ......................................................................................................... RST Nº 345 – Março/2018 – ASSUNTO ESPECIAL – DOUTRINA

REFERÊNCIASBRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil: atualizada até a Emenda Constitucional nº 99. Brasília/DF, 5 de outubro de 1988. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/ConstituicaoCompilado.htm>. Acesso em: 17 fev. 2018.

______. Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940. Código Penal. Diário Oficial da União. Brasília/DF, 31 de dezembro de 1940. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/Del2848compilado.htm>. Acesso em: 20 jan. 2018.

______. Decreto-Lei nº 5.452, de 1º de maio de 1943. Aprova a Consolidação das Leis do Trabalho. Diário Oficial da União. Brasília/DF, 9 de agosto de 1943. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del5452.htm>. Acesso em: 17 fev. 2018.

______. Portaria do Ministério do Trabalho e Emprego nº 540, de 15 de outubro de 2004. Diário Oficial da União, Brasília/DF, 19 de outubro de 2004. Disponível em: <http://www.trtsp.jus.br/geral/tribunal2/ORGAOS/MTE/Portaria/P540_04.html>. Acesso em: 17 fev. 2018.

______. Portaria Interministerial nº 2, de 12 de maio de 2011. Enuncia regras sobre o Cadastro de Empregadores que tenham submetido trabalhadores a condições análogas à de escravo e revoga a Portaria MTE nº 540, de 19 de outubro de 2004. Diário Oficial da União, Brasília/DF, 13 de maio de 2015. Disponível em: <http://www.trtsp.jus.br/geral/tribunal2/ORGAOS/MTE/Portaria/P02_11.html>. Acesso em: 17 fev. 2018.

______. Portaria Interministerial nº 2, de 31 de março de 2015. Enuncia regras sobre o Cadastro de Empregadores que tenham submetido trabalhadores a condição análoga à de escravo e revoga a Portaria Interministerial nº 2, de 12 de maio de 2011. Diário Oficial da União, Brasília/DF, 1º de abril de 2015. Disponível em: <http://www.trtsp.jus.br/geral/tribunal2/ORGAOS/MTE/Portaria/PORT_INT_02_15.html>. Acesso em: 17 fev. 2018.

______. Portaria Interministerial nº 4, de 11 de maio de 2016. Dispõe sobre as regras relativas ao Cadastro de Empregadores que tenham submetido trabalhadores a condi-ções análogas à de escravo. Diário Oficial da União, Brasília/DF, 13 de maio de 2016. Disponível em: <http://www.trtsp.jus.br/geral/tribunal2/ORGAOS/MTPS/PORT_IN-TER_04_16.html>. Acesso em: 17 fev. 2018.

______. Portaria do Ministério do Trabalho nº 1.129, de 13 de outubro de 2016. Dispõe sobre os conceitos de trabalho forçado, jornada exaustiva e condições análogas à de escravo para fins de concessão de seguro-desemprego ao trabalhador que vier a ser resgatado em fiscalização do Ministério do Trabalho, nos termos do artigo 2º-C da Lei nº 7.998, de 11 de janeiro de 1990; bem como altera dispositivos da PI MTPS/MMIRDH nº 4, de 11 de maio de 2016. Diário Oficial da União, Brasília/DF, 16 de outubro de 2016. Disponível em: <http://www.lex.com.br/legis_27525737_PORTARIA_N_1129_DE_13_DE_OUTUBRO_DE_2017.aspx>. Acesso em: 17 fev. 2018.

______. Portaria do Ministério do Trabalho nº 1.293, de 28 de dezembro de 2017. Dispõe sobre os conceitos de trabalho em condições análogas à de escravo para fins de

Page 31: Nº 345 – Março 2018 · Revista SÍNTESE Trabalhista e Previdenciária Ano XXIX – nº 345 – MArço 2018 reposItórIo AutorIzAdo de JurIsprudêncIA Supremo Tribunal Federal

RST Nº 345 – Março/2018 – ASSUNTO ESPECIAL – DOUTRINA ..............................................................................................................31

concessão de seguro-desemprego ao trabalhador que vier a ser resgatado em fisca-lização do Ministério do Trabalho, nos termos do artigo 2º-C da Lei nº 7.998, de 11 de janeiro de 1990, e trata da divulgação do Cadastro de Empregadores que tenham submetido trabalhadores à condição análoga à de escravo, estabelecido pela Portaria Interministerial MTPS/MMIRDH nº 4, de 11 de maio de 2016. Diário Oficial da União, Brasília/DF, 16 de outubro de 2016. Disponível em: <http://www.lexeditora.com.br/le-gis_27595147_PORTARIA_N_1293_DE_28_DE_DEZEMBRO_DE_2017.aspx>. Acesso em: 17 fev. 2018.

LORENTZ, Lutiana Nacur; MELO, Guilherme Orlando Anchieta. Uma abordagem interdisciplinar do trabalho análogo ao de escravo nas clivagens: trabalho forçado, degradante e desumano. Revista do Tribunal Regional do Trabalho da 3ª Região, v. 54, n. 84, jul./dez. 2011.

NELSON, Rocco Antonio Rangel Rosso. Curso de direito penal – Parte geral – Teoria geral do crime. Curitiba: Juruá, v. I, 2016.

SALES, Jeane; FILGUEIRAS, Vitor Araújo. Trabalho análogo ao escravo no Brasil: natu-reza do fenômeno e regulação. Revista da ABET, v. 12, n. 2, jul./dez. 2013. Disponível em: <http://periodicos.ufpb.br/index.php/abet/article/view/20206>. Acesso em: 30 out. 2017.

Page 32: Nº 345 – Março 2018 · Revista SÍNTESE Trabalhista e Previdenciária Ano XXIX – nº 345 – MArço 2018 reposItórIo AutorIzAdo de JurIsprudêncIA Supremo Tribunal Federal

Assunto Especial – Doutrina

Trabalho Escravo – As Alterações

A Suspensão da Eficácia da Portaria nº 1.129/2017 e a Publicação da Portaria nº 1.293/2017: Análise Comparativa das Normas Que Versam sobre o Combate ao Trabalho Escravo Contemporâneo

LUIZ FERNANDO CALEGARIAdvogado, Graduado em Direito pela Universidade Federal de Santa Catarina – UFSC, Pós--Graduando em Direito Civil pela Rede LFG – Anhanguera.

RESUMO: A Portaria nº 1.129/2017 mal foi publicada e logo já teve a sua eficácia suspensa por meio de decisão liminar proferida pelo Supremo Tribunal Federal. Alvo de duras críticas, a legislação era tida como um retrocesso no combate ao trabalho escravo, uma vez que engessava a atuação dos órgãos fiscalizadores e, sobretudo, alterava definições de institutos, fazendo com que a configuração da prática escravista fosse mais dificultosa. Como resposta a isso, no dia 29 de dezembro de 2017 foi publicada a Portaria nº 1.293/2017, versando também sobre o tema. Tal portaria trouxe novidades de conceituação, buscando adequar-se à realidade brasileira e, além disso, objetivando também adaptar seus conceitos às necessidades sociais contemporâneas. Dessa maneira, o presente artigo tende a realizar um exame comparativo entre as normas constantes na Portaria nº 1.129/2017 e os dispositivos legais trazidos pela Portaria nº 1.293/2017, tentando compreender se a nova legislação publicada efetivamente apresenta avanços em relação àquela cuja eficácia fora suspensa.

PALAVRAS-CHAVE: Portaria nº 1.129/2017; Portaria nº 1.293/2017; trabalho escravo; trabalho força-do; condições análogas à de escravo; tráfico de pessoas.

SUMÁRIO: Introdução; Exame dos dispositivos constantes na Portaria nº 1.129/2017 em compara-ção com as normas previstas pela Portaria nº 1.293/2017; a) Das diferenças de conceitos existentes entre a Portaria nº 1.129/2017 e a Portaria nº 1.293/2017 no que tange à caracterização do trabalho escravo; b) A autonomia para atuação dos órgãos fiscalizadores; c) A divulgação da chamada “lista suja”; d) Uma novidade: a previsão acerca do tráfico de pessoas; Conclusões; Referências.

INTRODUÇÃO

No dia 16 de outubro de 2017 foi publicada no Diário Oficial da União a Portaria nº 1.129/20171, que trazia novas definições para o trabalho escravo

1 BRASIL. Ministério do Trabalho e Previdência Social. Portaria MTB nº 1.129, de 13 de outubro de 2017. Dispõe sobre os conceitos de trabalho forçado, jornada exaustiva e condições análogas à de escravo para fins de concessão de seguro-desemprego ao trabalhador que vier a ser resgatado em fiscalização do Ministério do Trabalho, nos termos do art. 2º-C da Lei nº 7.998, de 11 de janeiro de 1990; bem como altera dispositivos

Page 33: Nº 345 – Março 2018 · Revista SÍNTESE Trabalhista e Previdenciária Ano XXIX – nº 345 – MArço 2018 reposItórIo AutorIzAdo de JurIsprudêncIA Supremo Tribunal Federal

RST Nº 345 – Março/2018 – ASSUNTO ESPECIAL – DOUTRINA ..............................................................................................................33

contemporâneo, especialmente no que dizia respeito a conceitos como traba-lho forçado, jornada exaustiva e condições análogas à de escravo.

Amplamente divulgada, tal portaria foi alvo de severas críticas por grande parte da comunidade em geral. As críticas não provinham tão somente da opi-nião pública, mas destacavam-se também argumentos desfavoráveis levantados por jornalistas, doutrinadores, juristas, entre outros.

Isso porque a referida legislação tocou em pontos sensíveis na caracte-rização do trabalho escravo moderno, fazendo com que as definições por ela trazidas efetivamente não se coadunassem com o que se via na prática, ou seja, as normas que estavam redefinindo conceitos para o trabalho escravo contem-porâneo distanciavam-se da realidade brasileira.

As restrições conceituais trazidas por tal legislação, ao invés de corro-borarem com o combate da referida prática nefasta, atuariam em sentido dia-metralmente oposto a este, tornando ainda mais dificultosas as hipóteses de enquadramento de trabalhos forçados na atualidade.

Diante de tal constatação, o debate alcançou amplitude tal que o tema chegou a ser analisado pelo Supremo Tribunal Federal (STF). Isso porque o partido político brasileiro Rede Sustentabilidade ajuizou ação de arguição de descumprimento de preceito fundamental (ADPF)2 com pedido liminar pela sus-pensão da eficácia da mencionada portaria.

Destarte, o STF demonstrou estar em consonância com a realidade brasi-leira ao suspender os efeitos da nova legislação, por meio de decisão de relato-ria da Ministra Rosa Weber. A correição do entendimento esposado pela Corte Superior foi, de maneira geral, bem recebida pela maior parte da sociedade tupiniquim. Não poderia ser diferente, tendo em vista que a situação da escra-vidão moderna no Brasil demandava uma legislação mais protetiva, e não uma portaria que viesse a engessar ainda mais o combate à prática.

Polêmicas à parte, no dia 29 de dezembro de 2017 foi novamente pu-blicada no Diário Oficial da União uma nova legislação que tratava da concei-tuação do trabalho escravo contemporâneo: a Portaria nº 1.293/20173. Desse

da Portaria Interministerial MTPS/MMIRDH nº 4, de 11 de maio de 2016. Publicada no Diário Oficial de 16 de outubro de 2017.

2 BRASIL. Supremo Tribunal Federal, Medida Cautelar na Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental nº 489, Distrito Federal, Relª Min. Rosa Weber, Data de Julgamento: 23.10.2017. Disponível em: <https://d2f17dr7ourrh3.cloudfront.net/wp-content/uploads/2017/10/ADPF-489_liminar_RW.pdf>. Acesso em: 9 fev. 2018.

3 BRASIL. Ministério do Trabalho e Previdência Social. Portaria MTB nº 1.293, de 28 de dezembro de 2017. Dispõe sobre os conceitos de trabalho em condições análogas à de escravo para fins de concessão de seguro--desemprego ao trabalhador que vier a ser resgatado em fiscalização do Ministério do Trabalho, nos termos do art. 2º-C da Lei nº 7.998, de 11 de janeiro de 1990, e trata da divulgação do Cadastro de Empregadores que tenham submetido trabalhadores à condição análoga à de escravo, estabelecido pela Portaria Interministerial MTPS/MMIRDH nº 4, de 11 de maio de 2016. Publicada no Diário Oficial de 16 de outubro de 2017.

Page 34: Nº 345 – Março 2018 · Revista SÍNTESE Trabalhista e Previdenciária Ano XXIX – nº 345 – MArço 2018 reposItórIo AutorIzAdo de JurIsprudêncIA Supremo Tribunal Federal

34 ......................................................................................................... RST Nº 345 – Março/2018 – ASSUNTO ESPECIAL – DOUTRINA

modo, far-se-á, a partir de agora, um apanhado geral sobre as normas dispostas em tal portaria, analisando-as comparativamente com os dispositivos legais tra-zidos pela portaria cuja eficácia foi suspensa.

Desde já, é preciso que fique claro que o presente artigo não tem o con-dão de concluir se a nova portaria é ou não o instrumento mais apropriado para erradicar o trabalho escravo como um todo, nem sequer se fará um juízo de valor acerca da nova legislação. O presente trabalho tem o viés de tão so-mente examinar ambas as portarias anteriormente referidas, analisando se os pontos criticados na Portaria nº 1.129/2017 foram, agora, superados a partir da publicação da Portaria nº 1.293/2017 e, caso tenham sido, analisar os pontos positivos advindos de tal superação.

EXAME DOS DISPOSITIVOS CONSTANTES NA PORTARIA Nº 1.129/2017 EM COMPARAÇÃO COM AS NORMAS PREVISTAS PELA PORTARIA Nº 1.293/2017

A Portaria nº 1.129/2017 demonstrava evidente descompasso entre as normas por ela previstas e a realidade do trabalho escravo contemporâneo no Brasil. Isso porque diversas de suas conceituações apresentavam restrição na possibilidade de enquadramento, como trabalho escravo, de comportamentos encontrados na prática.

Conforme já esposado em trabalho anterior4, a publicação de tal portaria faria com que a efetiva possibilidade de erradicação do trabalho escravo em solo brasileiro fosse dizimada, tendo em vista a dificuldade imposta por meio dela aos Auditores Fiscais para conseguirem, de fato, fazer com que uma situa-ção por eles flagrada fosse considerada como trabalho escravo.

Isso porque haviam sido trazidas conceituações que não se coadunavam com a realidade, ou seja, as novas definições de alguns institutos, tais como trabalhos forçados, jornadas exaustivas, condições degradantes, entre outros, fariam com que os trabalhadores continuassem sendo explorados pelos em-pregadores sem que tal comportamento patronal fosse tido como uma prática escravista. Fechavam-se os olhos, dessa maneira, para situações como o de-semprego e a necessidade de prover a própria subsistência, que faziam com que diversos trabalhadores tivessem de se submeter a condições análogas às de escravo por exclusiva falta de opção.

Destarte, o que se pretende a partir de agora é realizar um rápido apa-nhado dos conceitos estabelecidos pela legislação cuja eficácia fora suspensa e compará-los às novas disposições trazidas pela Portaria nº 1.293/2017 para que se possa chegar à conclusão no sentido de a nova legislação ter ou não

4 CALEGARI, Luiz Fernando. A Portaria nº 1.129/2017 e o retrocesso no combate à escravidão contemporânea: análise da suspensão de seus efeitos pelo STF à luz da realidade brasileira. Revista SínTESE Trabalhista e Previdenciária, São Paulo, v. 29, n. 342, p. 50-61, dez. 2017.

Page 35: Nº 345 – Março 2018 · Revista SÍNTESE Trabalhista e Previdenciária Ano XXIX – nº 345 – MArço 2018 reposItórIo AutorIzAdo de JurIsprudêncIA Supremo Tribunal Federal

RST Nº 345 – Março/2018 – ASSUNTO ESPECIAL – DOUTRINA ..............................................................................................................35

ter representado uma resposta positiva aos anseios dos críticos da Portaria nº 1.129/2017.

a) Das Diferenças De conceitos existentes entre a portaria nº 1.129/2017 e a portaria nº 1.293/2017 no Que tange à caracterização Do trabalho escravo

Por meio de seu art. 1º, II e III5, c/c o art. 3º, IV, a e b6, a Portaria nº 1.129/2017 passou a dificultar que fossem caracterizados dois importantes requisitos para a constatação do trabalho escravo moderno: as jornadas exaus-tivas e o tratamento degradante.

Isso porque tais normas passaram a exigir que, para que tais requisitos restassem configurados, não bastaria tão somente que o trabalho exercido se desenvolvesse em condições precárias, mas seria cogente que fosse constatada também a observância de vigilância por meio de coação ostensiva, impedindo fisicamente a livre movimentação do trabalhador e o isolamento geográfico.

Trocando em miúdos, a legislação exigia que restasse configurado o isolamento físico dos trabalhadores, não dando qualquer importância a outros fatores que inquestionavelmente condicionam o trabalho escravo moderno, como, por exemplo, ainda que não configurado o isolamento geográfico sob vigilância ostensiva, a existência de constrangimentos econômicos que fazem com que o trabalhador fique impossibilitado de se desvencilhar do vínculo que possui com o empregador ou mesmo o ferimento de sua dignidade humana ao ter de trabalhar sob condições degradantes.

5 “Art. 1º Para fins de concessão de benefício de seguro-desemprego ao trabalhador que vier a ser identificado como submetido a regime de trabalho forçado ou reduzido a condição análoga à de escravo, nos termos da Portaria MTE nº 1.153, de 13 de outubro de 2003, em decorrência de fiscalização do Ministério do Trabalho, bem como para inclusão do nome de empregadores no cadastro de empregadores que tenham submetido trabalhadores à condição análoga à de escravo, estabelecido pela Portaria Interministerial MTPS/MMIRDH nº 4, de 11.05.2016, considerar-se-á:

[...]

II – jornada exaustiva: a submissão do trabalhador, contra a sua vontade e com privação do direito de ir e vir, a trabalho fora dos ditames legais aplicáveis a sua categoria;

III – condição degradante: caracterizada por atos comissivos de violação dos direitos fundamentais da pessoa do trabalhador, consubstanciados no cerceamento da liberdade de ir e vir, seja por meios morais ou físicos, e que impliquem na privação da sua dignidade [...]”

6 “Art. 3º Lavrado o auto de infração pelo Auditor-Fiscal do Trabalho, com base na Portaria Interministerial MTPS/MMIRDH nº 4, de 11.05.2016, assegurar-se-á ao empregador o exercício do contraditório e da ampla defesa a respeito da conclusão da Inspeção do Trabalho de constatação de trabalho em condições análogas à de escravo, na forma do que determina a Lei nº 9.784, de 29 de janeiro de 1999 e a Portaria MTE nº 854, de 25 de junho de 2015.

[...]

IV – descrição detalhada da situação encontrada, com abordagem obrigatória aos seguintes itens, nos termos da Portaria MTE nº 1.153, de 14 de outubro de 2003:

a) existência de segurança armada diversa da proteção ao imóvel;

b) impedimento de deslocamento do trabalhador;

[...]”

Page 36: Nº 345 – Março 2018 · Revista SÍNTESE Trabalhista e Previdenciária Ano XXIX – nº 345 – MArço 2018 reposItórIo AutorIzAdo de JurIsprudêncIA Supremo Tribunal Federal

36 ......................................................................................................... RST Nº 345 – Março/2018 – ASSUNTO ESPECIAL – DOUTRINA

A nova legislação, entretanto, parece se coadunar mais estritamente com as exigências atuais.

A primeira novidade aparece logo no art. 1º, IV7, da Portaria nº 1.293/2017. A nova legislação já se mostra preocupada com uma das formas mais comuns de caracterização do trabalho escravo na modernidade, que é a “servidão por dívidas”, muito comum em locais mais isolados nos quais os trabalhadores pos-suem menores opções de transporte e menor variedade de escolha por onde comprar mantimentos.

Por meio de tal modalidade de trabalho, o empregador coage o trabalha-dor para que assuma dívidas cujos valores não poderão ser suportados por este último quando do recebimento do salário. Dessa forma, o trabalhador encontra--se sempre “em débito” perante o seu patrão, não encontrando forma de encer-rar o liame laboral sem que a dívida seja paga e, sobretudo, não encontrando maneira de quitar tal dívida.

Nesse sentido, a Portaria nº 1.293/2017 assevera enfaticamente que uma das formas de escravidão moderna se dá quando há a restrição de locomoção do trabalhador por conta de dívida contraída com o empregador ou preposto, seja tal dívida contraída no ato da contratação ou durante o contrato de tra-balho. O dispositivo é enfático ao informar que tal restrição pode ocorrer por qualquer meio, ou seja, não há a exigência de restrição física do trabalhador para que a “servidão por dívida” reste configurada.

O art. 2º8, em seu inciso IV, ainda define mais detalhadamente a ideia de restrição em razão de dívida, deixando claro que tal limitação ao direito fun-damental de ir e vir do trabalhador, ou mesmo de extinguir o vínculo laboral, se dá não apenas em razão de débito imputado por empregador ou preposto, mas amplia esse conceito ao considerar também os casos em que o obreiro é induzido a endividar-se perante terceiros.

Vê-se claramente a intenção do legislador ao redigir tal portaria: perce-bendo as críticas feitas sobre a limitação do combate à prática escravista por

7 “Art. 1º Para fins de concessão de benefício de seguro-desemprego ao trabalhador que for encontrado em condição análoga à de escravo no curso de fiscalização do Ministério do Trabalho, nos termos da Portaria MTE nº 1.153, de 13 de outubro de 2003, bem como para inclusão de administrados no Cadastro de Empregadores que tenham submetido trabalhadores à condição análoga à de escravo, estabelecido pela Portaria Interministerial MTPS/MMIRDH nº 4, de 11 de maio de 2016, considera-se em condição análoga à de escravo o trabalhador submetido, de forma isolada ou conjuntamente, a:

[...]

IV – Restrição, por qualquer meio, de locomoção em razão de dívida contraída com empregador ou preposto, no momento da contratação ou no curso do contrato de trabalho.”

8 “Art. 2º Para os fins previstos na presente Portaria:

[...]

IV – Restrição, por qualquer meio, da locomoção do trabalhador em razão de dívida é a limitação ao direito fundamental de ir e vir ou de encerrar a prestação do trabalho, em razão de débito imputado pelo empregador ou preposto ou da indução ao endividamento com terceiros.”

Page 37: Nº 345 – Março 2018 · Revista SÍNTESE Trabalhista e Previdenciária Ano XXIX – nº 345 – MArço 2018 reposItórIo AutorIzAdo de JurIsprudêncIA Supremo Tribunal Federal

RST Nº 345 – Março/2018 – ASSUNTO ESPECIAL – DOUTRINA ..............................................................................................................37

meio da Portaria nº 1.153/2017, a nova legislação apresenta diversos pequenos detalhes que, em maior ou menor grau, demonstram a percepção das exigências sociais para uma ampliação na tentativa da erradicação de tal prática nefasta.

Em consonância com esse entendimento, voltando ao art. 1º, em seu inciso V9, nota-se a manutenção do esforço para a dita ampliação do combate à prática escravista quando o dispositivo estabelece que o trabalho forçado tam-bém resta configurado a partir do momento em que o trabalhador é impedido de deixar o local de prestação de serviços por conta do cerceamento do uso de qualquer meio de transporte, da manutenção de vigilância ostensiva ou de apoderamento de documentos ou objetos pessoais do trabalhador.

Adiante, o já mencionado art. 2º da Portaria nº 1.293/2017 serve como um parâmetro delineador de toda a conceituação necessária para o enquadra-mento do trabalho escravo contemporâneo, tendo em vista que traz para a le-gislação elementos da realidade fática para que se possa, então, caracterizar a prática dos trabalhos forçados de uma maneira muito mais genérica do que era feito por meio da Portaria nº 1.153/2017.

Tal ideia fica bastante evidente quando se observam, pontualmente, as diferenças existentes entre a conceituação estabelecida por cada portaria, em especial no que diz respeito pelo próprio artigo recém-mencionado. Veja-se, pois.

Pela legislação anterior o trabalho forçado era visto tão somente como o labor exercido sem o consentimento do trabalhador, lhe retirando a possibi-lidade de expressar sua vontade – as altas taxas de desemprego que assolam o País eram solenemente ignoradas, de tal forma que não havia qualquer preocu-pação com o trabalhador que era obrigado a aceitar o trabalho em condições degradantes com o único propósito de se agarrar a uma chance mínima de prover o sustento próprio e de sua família, ou seja, ignorava-se o trabalhador que consentia com o labor em condições degradantes não por vontade, mas por falta de opção.

Agora, a nova legislação estabelece uma conceituação absolutamente diferente, no sentido de que o trabalho forçado é aquele para o qual o trabalha-

9 “Art. 1º [...]

[...]

V – Retenção no local de trabalho em razão de:

a) Cerceamento do uso de qualquer meio de transporte;

b) Manutenção de vigilância ostensiva;

c) Apoderamento de documentos ou objetos pessoais.”

Page 38: Nº 345 – Março 2018 · Revista SÍNTESE Trabalhista e Previdenciária Ano XXIX – nº 345 – MArço 2018 reposItórIo AutorIzAdo de JurIsprudêncIA Supremo Tribunal Federal

38 ......................................................................................................... RST Nº 345 – Março/2018 – ASSUNTO ESPECIAL – DOUTRINA

dor não se ofereceu ou não deseje nele permanecer espontaneamente, sendo dele exigido o serviço por meio de ameaças de sanções físicas ou psicológicas10.

A ampliação da definição é percebida principalmente quando se nota que sequer é necessária a efetiva violência física ou psicológica, bastando que reste constada a ameaça de sanção capaz de coagir o trabalhador. Ademais, contrariamente à exigência anterior de efetiva falta de consentimento do traba-lhador, agora se exige simplesmente a sua não espontaneidade para continuar executando o serviço – em outras palavras, por mais que o trabalhador tenha consentido com a execução das tarefas sob condições degradantes por falta de opção, a falta de espontaneidade para a permanência serve como um dos fun-damentos de caracterização dos trabalhos forçados.

As jornadas exaustivas, já mencionadas no início deste tópico, ganham, com o inciso II do art. 2º da Portaria nº 1.293/201711, um ar de muito maior am-plidão do que se tinha com a legislação anterior, visto que há agora uma intrín-seca correlação de sua caracterização com a violação de direitos fundamentais do trabalhador, em especial aqueles atinentes à sua saúde, à sua segurança, ao seu descanso e ao seu convívio familiar e social. Anteriormente, era necessário que houvesse a contrariedade da vontade do trabalhador (não se preocupando novamente com aqueles que se submetem a tais condições por falta de opção), a efetiva restrição de ir e vir e o exercício do labor fora dos ditames legais apli-cáveis a sua categoria – as implicações eram mais objetivas, sendo que não havia, portanto, qualquer preocupação com o bem-estar, a saúde e a segurança do trabalhador.

Outro ponto de destaque se dá quando há um maior detalhamento, tam-bém, sobre a configuração das já mencionadas condições degradantes. A Por-taria nº 1.153/2017 exigia a existência de atos comissivos violadores de direitos fundamentais que desencadeassem a efetiva restrição da liberdade de ir e vir do trabalhador. Nesse caso, outra vez a legislação não se mostrava preocupada com os trabalhadores que, por mais que tivessem ao seu alcance a possibilidade de ir e vir, eram obrigados a submeter-se a condições desumanas com o único intuito de não perder o que, possivelmente, era sua única fonte de renda.

A Portaria nº 1.293/2017, por sua vez, não mais vincula a ideia de con-dição degradante com a de restrição da liberdade do trabalhador, o que, de fato, como visto, era um visível contrassenso. A conceituação torna-se, agora,

10 “Art. 2º Para os fins previstos na presente Portaria:

I – Trabalho forçado é aquele exigido sob ameaça de sanção física ou psicológica e para o qual o trabalhador não tenha se oferecido ou no qual não deseje permanecer espontaneamente.”

11 “Art. 2º [...]

[...]

II – Jornada exaustiva é toda forma de trabalho, de natureza física ou mental, que, por sua extensão ou por sua intensidade, acarrete violação de direito fundamental do trabalhador, notadamente os relacionados a segurança, saúde, descanso e convívio familiar e social.”

Page 39: Nº 345 – Março 2018 · Revista SÍNTESE Trabalhista e Previdenciária Ano XXIX – nº 345 – MArço 2018 reposItórIo AutorIzAdo de JurIsprudêncIA Supremo Tribunal Federal

RST Nº 345 – Março/2018 – ASSUNTO ESPECIAL – DOUTRINA ..............................................................................................................39

muito mais genérica, na medida em que sua caracterização se dá por meio da expressão “qualquer forma de negação da dignidade humana pela violação de direito fundamental do trabalhador”, repita-se, “qualquer forma”, expressão que mostra não um afunilamento das hipóteses de configuração, mas, longe disso, a possibilidade inclusive de que diversas outras situações não previsíveis atual-mente, em face da rápida modernização das relações humanas que ocorre no cotidiano, subsumam-se à norma quando de sua ocorrência12.

Nesse mesmo diapasão de ampliação dos conceitos, o art. 2º da Portaria nº 1.293/2017 ainda estabelece parâmetros norteadores para a configuração do cerceamento do uso de transporte, da vigilância ostensiva e do apoderamento de documentos pessoais13. Em todos esses casos há certa preocupação do legis-lador de, claro, definir o instituto, mas acima disso a preocupação de não limitar as possibilidades de configuração, trazendo conceitos bastante abertos a novos enquadramentos também por meio de expressões como “qualquer forma” e “toda forma”.

Como dito, a utilização de tais expressões, além de tentar abranger o má-ximo de situações percebidas atualmente, ainda tem o condão de dar longevi-dade à legislação, deixando-a aberta a hipóteses futuras de configuração sequer imagináveis atualmente, com vistas a fazer com que as normas acompanhem – pelo menos parece ser essa a intenção – o intenso desenvolvimento das relações interpessoais, cuja complexidade está, desde muito, em franco crescimento.

b) a autonomia para atuação Dos órgãos fiscalizaDores

Outra ferrenha crítica feita à Portaria nº 1.129/2017 se dava no sentido da limitação da liberdade de atuação dos órgãos fiscalizadores. Isso porque, por meio do art. 4º, § 3º, I14, havia a expressa exigência de que o ato fiscaliza-

12 “Art. 2º [...]

[...]

III – Condição degradante de trabalho é qualquer forma de negação da dignidade humana pela violação de direito fundamental do trabalhador, notadamente os dispostos nas normas de proteção do trabalho e de segurança, higiene e saúde no trabalho.”

13 “Art. 2º [...]

[...]

V – Cerceamento do uso de qualquer meio de transporte é toda forma de limitação ao uso de meio de transporte existente, particular ou público, possível de ser utilizado pelo trabalhador para deixar local de trabalho ou de alojamento.

VI – Vigilância ostensiva no local de trabalho é qualquer forma de controle ou fiscalização, direta ou indireta, por parte do empregador ou preposto, sobre a pessoa do trabalhador que o impeça de deixar local de trabalho ou alojamento.

VII – Apoderamento de documentos ou objetos pessoais é qualquer forma de posse ilícita do empregador ou preposto sobre documentos ou objetos pessoais do trabalhador.”

14 “Art. 4º O Cadastro de Empregadores previsto na PI MTPS/MMIRDH nº 4, de 11.05.2016, será divulgado no sítio eletrônico oficial do Ministério do Trabalho, contendo a relação de pessoas físicas ou jurídicas autuadas em ação fiscal que tenha identificado trabalhadores submetidos a condições análogas à de escravo.

Page 40: Nº 345 – Março 2018 · Revista SÍNTESE Trabalhista e Previdenciária Ano XXIX – nº 345 – MArço 2018 reposItórIo AutorIzAdo de JurIsprudêncIA Supremo Tribunal Federal

40 ......................................................................................................... RST Nº 345 – Março/2018 – ASSUNTO ESPECIAL – DOUTRINA

tório fosse acompanhado por autoridade policial. Destarte, deveria ser lavrado boletim de ocorrência que passava a ser documento imprescindível para que o processo fosse recebido e, posteriormente, julgado pelo órgão competente.

Vê-se claramente que havia certa limitação do poder de atuação do Mi-nistério do Trabalho ao realizar a fiscalização, uma vez que o órgão já não poderia dispor de completa autonomia para realizar atividade de sua compe-tência.

A Portaria nº 1.293/2017, em contrapartida, enfrenta a situação de forma um pouco diversa.

Em seu art. 7º, parágrafo único15, a nova legislação prevê que a presença de autoridades policiais ainda é imprescindível para que a fiscalização possa ocorrer. No entanto, parece agora que o sistema legal se preocupa mais em garantir a finalidade do ato fiscalizador, assegurando que cumpra seu objetivo, do que efetivamente em engessar a atuação dos fiscalizadores.

Diz-se isso pois a presença da autoridade policial, em que pese continue sendo exigida, tem vistas de afiançar a segurança daqueles que fiscalizarão os locais de trabalho. Em um primeiro momento, pode-se pensar que a exigência da presença policial mantém o grau de engessamento do ato.

Todavia, em uma análise comparativa, antes se tinha a obrigatoriedade inclusive de lavratura de boletim de ocorrência pela autoridade policial que acompanhava o ato, sendo mais uma formalidade para que o processo pudesse ser recebido pelo órgão julgador – nesse caso, diante da falta do documento, havia inclusive a real possibilidade de o resultado da fiscalização reduzir-se a zero, caso o processo não viesse a ser aceito e não mais pudesse ser correta-mente instruído; agora, no entanto, tal documento já não é mais exigido, além do fato de a autoridade policial não mais estar presente para dar azo a essa formalidade processual, mas sim para, em tese, garantir, materialmente, a con-cretização da fiscalização a ser realizada pelos responsáveis com segurança.

Soma-se a isso o discurso adotado pelo art. 6º da Portaria nº 1.293/201716, já que assevera que o combate à prática escravista deve ser prioritário nos pla-

[...]

§ 3º Para o recebimento do processo pelo órgão julgador, o Auditor-Fiscal do Trabalho deverá promover a juntada dos seguintes documentos:

[...]

II – Boletim de Ocorrência lavrado pela autoridade policial que participou da fiscalização.”15 “Art. 7º As ações fiscais para erradicação do trabalho em condição análoga à de escravo serão planejadas

e coordenadas pela Secretaria de Inspeção do Trabalho, que as realizará diretamente, por intermédio das equipes do Grupo Especial de Fiscalização Móvel, e pelas Superintendências Regionais do Trabalho (SRT), por meio de grupos ou equipes de fiscalização.

Parágrafo único. As ações fiscais previstas no caput deverão contar com a participação de representantes da Polícia Federal, Polícia Rodoviária Federal, Polícia Militar Ambiental, Polícia Militar, Polícia Civil, ou outra autoridade policial que garanta a segurança da fiscalização.”

16 “Art. 6º A Administração Central do Ministério do Trabalho e as Superintendências Regionais do Trabalho deverão prover a Inspeção do Trabalho de todos os recursos necessários para a fiscalização e combate ao

Page 41: Nº 345 – Março 2018 · Revista SÍNTESE Trabalhista e Previdenciária Ano XXIX – nº 345 – MArço 2018 reposItórIo AutorIzAdo de JurIsprudêncIA Supremo Tribunal Federal

RST Nº 345 – Março/2018 – ASSUNTO ESPECIAL – DOUTRINA ..............................................................................................................41

nejamentos e nas ações, de tal sorte que tanto a Administração Central do Mi-nistério do Trabalho quanto as Superintendências Regionais do Trabalho têm o dever de prover todos os recursos necessários para que a inspeção do trabalho possa efetivar, na prática, a fiscalização.

Apesar de, como dito, este ser um discurso adotado pela legislação, ten-do em vista que se trata de uma determinação cujo resultado prático ainda é impossível de ser previsto, vale ressaltar que esse é mais um ponto em que a nova portaria destoa da antiga, uma vez que mostra a nítida preocupação com a existência de trabalho escravo e ao menos a intenção de dar suporte aos atos que visem a sua erradicação.

c) a Divulgação Da chamaDa “lista suja”

De forma absolutamente simplificada, o termo “lista suja” é utilizado para referir-se ao cadastro de empregadores que são flagrados se utilizando de mão de obra escrava, conforme disposto na Portaria Interministerial MTPS/MMIRDH nº 4, de 11.05.201617. A inclusão dos nomes dos empregadores era de responsabilidade da área técnica do Ministério do Trabalho até que a Porta-ria nº 1.129/2017, mais especificamente por meio de seu art. 4º, § 1º18, passou a estabelecer que seria necessária a prévia determinação do Ministro do Trabalho.

Tal determinação se mostrava um tanto quanto perigosa, já que, segundo críticas tecidas por diversos doutrinadores, e aqui compartilhadas, a decisão de incluir ou não determinado empregador na “lista suja” deixava de ter caráter administrativo, passando a possuir nítida natureza política, tendo em vista que o Ministro do Trabalho poderia, de certa forma, determinar que os nomes de determinados empregadores não fossem incluídos no cadastro mesmo depois de eles terem sido flagrados se utilizando de mão de obra escrava.

A Portaria nº 1.293/2017, por sua vez, já não mais traz a determinação do Ministro do Trabalho como ato crucial para que haja a inclusão na “lista suja”, consolidando novamente a natureza administrativa do ato.

Em seu art. 1419 e parágrafos constam as novas disposições para a inclu-são no cadastro e posterior divulgação da “lista suja”. O que se vê, agora, é que

trabalho em condições análogas às de escravo, cujo combate será prioritário em seus planejamentos e ações.”17 BRASIL. Ministério do Trabalho e Previdência Social. Portaria Interministerial MTPS/MMIRDH nº 4, de 11

de maio de 2016. Dispõe sobre as regras relativas ao cadastro de empregadores que tenham submetido trabalhadores a condições análogas à de escravo. Publicada no Diário Oficial em 13 de maio de 2016.

18 “Art. 4º O Cadastro de Empregadores previsto na Portaria Interministerial MTPS/MMIRDH nº 4, de 11.05.2016, será divulgado no sítio eletrônico oficial do Ministério do Trabalho, contendo a relação de pessoas físicas ou jurídicas autuadas em ação fiscal que tenha identificado trabalhadores submetidos a condições análogas à de escravo.

§ 1º A organização do Cadastro ficará a cargo da Secretaria de Inspeção do Trabalho (SIT), cuja divulgação será realizada por determinação expressa do Ministro do Trabalho.”

19 “Art. 14 O Cadastro de Empregadores previsto na Portaria Interministerial MTPS/MMIRDH nº 4/2016 será divulgado no sítio institucional do Ministério do Trabalho na rede mundial de computadores, contendo a relação

Page 42: Nº 345 – Março 2018 · Revista SÍNTESE Trabalhista e Previdenciária Ano XXIX – nº 345 – MArço 2018 reposItórIo AutorIzAdo de JurIsprudêncIA Supremo Tribunal Federal

42 ......................................................................................................... RST Nº 345 – Março/2018 – ASSUNTO ESPECIAL – DOUTRINA

a inserção daquele que é flagrado se utilizando de mão de obra escrava passa a ser consequência lógica de todo um procedimento que teve início no momento da fiscalização, quando o empregador escravocrata sofre a autuação, perpas-sando naturalmente pelo devido processo legal, por meio do qual o autuado teve a oportunidade de se valer do contraditório e da ampla defesa.

Em se constatada a efetiva responsabilidade do empregador, seu nome será inserto no cadastro após a decisão não ser mais administrativamente re-corrível, o que dá segurança para ambas as partes: de um lado, é dada a opor-tunidade para o empregador defender-se; de outro, a sociedade possui como garantia que aqueles responsabilizados pela prática escravista serão, de certa forma, punidos com a divulgação de seus nomes na “lista suja”, não mais ha-vendo a possibilidade de serem flagrados e, ainda assim, se verem agraciados com decisão política que não os sancionasse da forma legalmente adequada.

Ademais, a legislação que antes trazia uma limitação à inclusão na “lista suja” traz agora novamente um discurso cuja eficácia prática ainda não pode ser prevista, mas que demonstra a sintonia da Portaria nº 1.293/2017 com os valores sociais modernos, tendo em vista que o § 3º do art. 14 visa dar garantia de que serão utilizados todos os meios necessários para que o cadastro possa ser divulgado.

D) uma noviDaDe: a previsão acerca Do tráfico De pessoas

Uma novidade abarcada pela Portaria nº 1.293/2017 que não possui correspondente na Portaria nº 1.129/2017 diz respeito à previsão, no art. 4º e parágrafo único20 da nova portaria, da possibilidade de identificação do que é conceituado como tráfico de pessoas, quando resta constatado o recrutamento, o transporte, a transferência, o alojamento ou o acolhimento de pessoas com a finalidade de que sirvam à prática escravista.

dos administrados autuados em ação fiscal em que tenham sido identificados trabalhadores submetidos a condições análogas à de escravo.

§ 1º A inclusão do empregador somente ocorrerá após a prolação de decisão administrativa irrecorrível de procedência do auto de infração lavrado na ação fiscal em razão da constatação de submissão de trabalhadores em condições análogas à de escravo.

§ 2º A organização e divulgação do Cadastro ficará a cargo da Detrae, cuja divulgação será realizada na forma do caput.

§ 3º A Assessoria de Comunicação e demais órgãos do Ministério do Trabalho deverão garantir todos os meios necessários para que a Secretaria de Inspeção do Trabalho possa realizar a divulgação do Cadastro prevista no caput e no art. 2º da Portaria Interministerial MTPS/MMIRDH nº 4/2016.”

20 “Art. 4º Aplica-se o disposto nesta Portaria aos casos em que o Auditor-Fiscal do Trabalho identifique tráfico de pessoas para fins de exploração de trabalho em condição análoga à de escravo, desde que presente qualquer das hipóteses previstas nos incisos I a V do art. 1º desta Portaria.

Parágrafo único. Considera-se tráfico de pessoas para fins de exploração de trabalho em condição análoga à de escravo o recrutamento, o transporte, a transferência, o alojamento ou o acolhimento de pessoas, recorrendo à ameaça ou uso da força ou a outras formas de coação, ao rapto, à fraude, ao engano, ao abuso de autoridade ou à situação de vulnerabilidade ou à entrega ou aceitação de pagamentos ou benefícios para obter o consentimento de uma pessoa que tenha autoridade sobre outra.”

Page 43: Nº 345 – Março 2018 · Revista SÍNTESE Trabalhista e Previdenciária Ano XXIX – nº 345 – MArço 2018 reposItórIo AutorIzAdo de JurIsprudêncIA Supremo Tribunal Federal

RST Nº 345 – Março/2018 – ASSUNTO ESPECIAL – DOUTRINA ..............................................................................................................43

Vê-se que há uma vasta gama de comportamentos que visam caracterizar o tráfico de pessoas, sendo que o recrutamento, o transporte, a transferência, o alojamento ou o acolhimento de pessoas pode se dar por meio de ameaça, coação, uso da força, rapto, fraude, abuso de autoridade, engano, situação de vulnerabilidade e até mesmo, nas palavras do próprio dispositivo, a entrega ou aceitação de pagamentos ou benefícios para obter o consentimento de uma pessoa que tenha autoridade sobre outra.

Nota-se, outra vez, que a nova portaria tem a intenção de dar a maior amplitude possível à possibilidade de identificação e caracterização de práticas nefastas, como é o caso tráfico de pessoas para o fim da prática escravista. No-vamente a legislação faz o uso da expressão “outras formas” de coação, o que indica a abertura para que diferentes comportamentos não previstos não apenas pela lei, mas também pelo conhecimento humano atual, e que venham a ser identificados no futuro possam subsumir-se à norma legal.

CONCLUSÕESComo dito alhures, o presente artigo não pretendia esgotar a análise da

Portaria nº 1.293/2017, e também não se destinava a chegar à constatação so-bre a nova legislação ser ou não suficiente para definitivamente erradicar o trabalho escravo no Brasil.

Longe disso, o anseio deste trabalho era analisar, de forma comparativa, a legislação referida no parágrafo supra e a suspensa Portaria nº 1.129/2017, uma vez que esta foi alvo de severas críticas por não se coadunar com as ne-cessidades contemporâneas no que diz respeito à tentativa de erradicação do trabalho escravo moderno.

Nesse sentido, foi possível constatar que a nova portaria demonstra estar em maior harmonia com os anseios sociais do que a legislação cuja eficácia foi suspensa, já que, ao invés de restringir as possibilidades de configuração da prática escravista, traz diversos pequenos detalhes que visam dar amplidão a tal caracterização.

A utilização de termos abertos como “qualquer forma”, “outras formas”, entre outros, traz, como visto, a possibilidade de que as normas legais não apre-sentem um rol taxativo de possibilidades de identificação da prática escravista, mês que estejam abertas a diversas outras possibilidades não previstas pela le-gislação. Ademais, de certa forma tais expressões dão uma maior longevidade à portaria, tendo em vista que situações que atualmente são impensáveis po-derão, no futuro, também subsumir-se às normas legais – como visto, as rela-ções sociais passam por constante e complexa transformação, de tal forma que dentro de pouco tempo uma prática que sequer existe atualmente poderá, a partir do momento em que passar a acontecer, vir a ser abarcada também pelos dispositivos legais.

Adiante, a maior autonomia novamente concedida aos órgãos fiscaliza-dores, somada à exclusão do caráter político da decisão de inclusão ou não dos

Page 44: Nº 345 – Março 2018 · Revista SÍNTESE Trabalhista e Previdenciária Ano XXIX – nº 345 – MArço 2018 reposItórIo AutorIzAdo de JurIsprudêncIA Supremo Tribunal Federal

44 ......................................................................................................... RST Nº 345 – Março/2018 – ASSUNTO ESPECIAL – DOUTRINA

nomes dos empregadores na “lista suja”, faz com que todo o procedimento fis-calizatório possa transcorrer com maior transparência e segurança, de tal sorte que o escravocrata moderno terá menos opções de safar-se quando constatado se utilizando de mão de obra escrava.

Por fim, talvez o mais importante trazido pela da Portaria nº 1.293/2017 foi a conceituação dos institutos de forma mais ampla, a exemplo do que fez com as definições de jornada exaustiva, condições degradantes, trabalho força-do e restrição de locomoção. As diversas acepções que são assumidas por cada instituto dão maior abrangência à possibilidade de sua caracterização, respei-tando não só preceitos legislativos, mas principalmente estando em compasso com a realidade brasileira. Destarte, não se pode prever se a legislação será, efe-tivamente, o mecanismo que erradicará a prática do trabalho escravo moderno.

Entretanto, o que se pode afirmar, desde já, é que em uma análise com-parativa, a nova portaria se mostra muito mais em harmonia com as exigências sociais do que acontecia com a legislação cuja eficácia foi suspensa.

REFERÊNCIASBRASIL. Ministério do Trabalho e Previdência Social. Portaria MTB nº 1.129, de 13 de outubro de 2017. Dispõe sobre os conceitos de trabalho forçado, jornada exausti-va e condições análogas à de escravo para fins de concessão de seguro-desemprego ao trabalhador que vier a ser resgatado em fiscalização do Ministério do Trabalho, nos termos do art. 2º-C da Lei nº 7.998, de 11 de janeiro de 1990; bem como altera dispositivos da Portaria Interministerial MTPS/MMIRDH nº 4, de 11 de maio de 2016. Publicada no Diário Oficial de 16 de outubro de 2017.

______. Ministério do Trabalho e Previdência Social. Portaria MTB nº 1.293, de 28 de dezembro de 2017. Dispõe sobre os conceitos de trabalho em condições análogas à de escravo para fins de concessão de seguro-desemprego ao trabalhador que vier a ser resgatado em fiscalização do Ministério do Trabalho, nos termos do art. 2º-C da Lei nº 7.998, de 11 de janeiro de 1990, e trata da divulgação do Cadastro de Empregadores que tenham submetido trabalhadores à condição análoga à de escravo, estabelecido pela Portaria Interministerial MTPS/MMIRDH nº 4, de 11 de maio de 2016. Publicada no Diário Oficial de 16 de outubro de 2017.

______. Supremo Tribunal Federal, Medida Cautelar na Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental nº 489, Distrito Federal, Relª Min. Rosa Weber, Data de Julga-mento: 23.10.2017. Disponível em: <https://d2f17dr7ourrh3.cloudfront.net/wp-content/uploads/2017/10/ADPF-489_liminar_RW.pdf>. Acesso em: 24 out. 2017.

______. Ministério do Trabalho e Previdência Social. Portaria Interministerial MTPS/MMIRDH nº 4, de 11 de maio de 2016. Dispõe sobre as regras relativas ao cadastro de empregadores que tenham submetido trabalhadores a condições análogas à de escravo. Publicada no Diário Oficial em 13 de maio de 2016.

CALEGARI, Luiz Fernando. A Portaria nº 1.129/2017 e o retrocesso no combate à es-cravidão contemporânea: análise da suspensão de seus efeitos pelo STF à luz da realidade brasileira. Revista SíNTESE Trabalhista e Previdenciária, São Paulo, v. 29, n. 342, p. 50-61, dez. 2017.

Page 45: Nº 345 – Março 2018 · Revista SÍNTESE Trabalhista e Previdenciária Ano XXIX – nº 345 – MArço 2018 reposItórIo AutorIzAdo de JurIsprudêncIA Supremo Tribunal Federal

Parte Geral – Doutrina

A Aplicação do Regime Jurídico Especial da Fraude à Execução Fiscal no Processo do Trabalho1

BEN-HUR SILVEIRA CLAUSJuiz do Trabalho, Mestre em Direito.

JÚLIO CÉSAR BEBBERJuiz do Trabalho, Doutor em Direito do Trabalho.

As conclusões por analogia não têm apenas cabimento dentro do mesmo ramo do Direito, nem tão-pouco dentro de cada Código, mas verificam-se também de um para outro Código e de um ramo do Direito para outro.

Karl Engisch

[...] o raciocínio jurídico será sempre analógico, por isso que as hi-póteses singulares nunca serão entre si idênticas, mas apenas “afins na essência”.

Ovídio Baptista da Silva

RESUMO: O presente artigo estuda a juridicidade da aplicação do regime jurídico especial da fraude à execução fiscal à execução trabalhista, com vistas a promover a efetividade da jurisdição na Justiça do Trabalho. Para tanto, articula-se a proposta de interpretação extensiva do art. 889 da CLT à inter-pretação sistemática do art. 186 do Código Tributário Nacional, com vistas à assimilação produtiva da modalidade de fraude à execução prevista no art. 185 do CTN à execução trabalhista, que se revela mais favorável ao credor do que o regime jurídico geral de fraude à execução previsto no art. 593, II, do CPC de 1973 e no art. 792 do CPC de 2015.

PALAVRAS-CHAVE: Fraude à execução; execução fiscal; execução trabalhista; efetividade da jurisdi-ção; crédito trabalhista; Súmula nº 375 do STJ.

SUMÁRIO: Introdução; 1 As modalidades de fraude à execução no direito positivo; 2 Fraude à exe-cução fiscal: a presunção de fraude é absoluta; não se admite prova em contrário; 3 A histórica opção da teoria jurídica brasileira de conferir ao crédito trabalhista privilégio legal superior àquele reconhecido ao crédito fiscal; 4 Hermenêutica e método sistemático de interpretação: do postulado da unidade do sistema jurídico à compatibilização dos artigos 29 da Lei nº 6.830/1980 e 186 do CTN; 5 A aplicação do sistema legal dos executivos fiscais à execução trabalhista: à efetividade do direito material do credor trabalhista corresponde interpretação extensiva do artigo 889 da CLT; 6 A jurispru-

1 O presente artigo foi publicado na Revista Justiça do Trabalho, n. 377, de maio de 2015, da Editora HS, Porto Alegre, p. 7-37; e na Revista LTr, n. 6, ano 79, junho de 2015, da Editora LTr, São Paulo, p. 647-662.

Page 46: Nº 345 – Março 2018 · Revista SÍNTESE Trabalhista e Previdenciária Ano XXIX – nº 345 – MArço 2018 reposItórIo AutorIzAdo de JurIsprudêncIA Supremo Tribunal Federal

46 ...................................................................................................................RST Nº 345 – Março/2018 – PARTE GERAL – DOUTRINA

dência do STJ acerca da aplicação da Súmula nº 375: fraude à execução fiscal x fraude à execução civil. A questão da aplicação do regime jurídico especial da fraude à execução fiscal previsto no artigo 185 do CTN à execução trabalhista; 7 A fraude à execução no novo CPC (e a necessidade de revisão da Súmula nº 375/STJ); 8 O marco temporal a partir do qual a alienação faz presumir fraude absoluta à execução trabalhista: ajuizamento x citação; 9 Acórdãos pioneiros prenunciam debate na jurisprudência; Conclusão; Referências.

INTRODUÇÃO

O Direito pressupõe a boa-fé das pessoas na vida de relação. É a boa-fé que fundamenta o princípio da responsabilidade patrimonial. De acordo com esse princípio, o patrimônio do contratante responde por suas obrigações: o patrimônio do sujeito obrigado é expropriado pelo Estado para satisfazer coer-citivamente a obrigação não adimplida espontaneamente, restabelecendo-se o equilíbrio da relação contratual e a integridade da ordem jurídica.

Esse princípio encontra expressão literal no art. 591 do CPC de 1973 e no art. 789 do CPC de 2015, preceito que estabelece que “o devedor responde, para o cumprimento de suas obrigações, com todos os seus bens presentes e futuros, salvo as restrições estabelecidas em lei”. Trata-se de preceito localiza-do no título em que o Código de Processo Civil trata da execução forçada das obrigações não cumpridas espontaneamente. Na Lei nº 6.830/1980, o princípio da responsabilidade patrimonial tem expressão nos arts. 10 e 30.

Para coarctar condutas de má-fé do devedor, a teoria jurídica extraiu do princípio de responsabilidade patrimonial dois institutos jurídicos destinados a combater fraude patrimonial praticada pelo sujeito passivo da obrigação: a frau-de contra credores (CC, arts. 158 e 159) e a fraude à execução (CPC de 1973, art. 593; CPC de 2015, art. 792). O fato de não haver processo contra o obriga-do quando da alienação do bem revela que a fraude contra credores é ato ilícito menos grave do que o ato ilícito de fraude à execução2, modalidade de fraude patrimonial na qual já há processo contra o obrigado3 quando da alienação do bem que torna o obrigado insolvente para responder pela obrigação.

2 A fraude à execução tipifica, além de ilícito processual civil, o ilícito penal de fraude à execução capitulado no art. 179 do Código Penal. Outrossim, configura ato atentatório à dignidade da justiça (CPC de 1973, art. 600, I; CPC de 2015, art. 774, I) sancionado com a multa do art. 601 do CPC de 1973 (CPC de 2015, art. 774, parágrafo único). A ordem jurídica atua contra a fraude à execução mediante a declaração de ineficácia do ato fraudulento (CPC de 1973, art. 592, V; CPC de 2015, art. 790, V), autorizando a penhora do bem alienado em fraude como se permanecesse no patrimônio do executado. Para facilitar o combate a essa espécie de fraude patrimonial, a declaração de ineficácia da alienação é pronunciada nos próprios autos em que flagrada a fraude, de ofício. Conclusão ainda mais evidente na execução trabalhista, por força da previsão dos arts. 765 e 878, caput, da CLT.

3 A hipótese de fraude à execução fiscal prevista no art. 185, caput, do Código Tributário Nacional constitui exceção à regra. Introduzida pela Lei Complementar nº 118, de 09.06.2005, a atual redação do art. 185, caput, do CTN radicalizou a figura da fraude à execução fiscal, estabelecendo que a fraude à execução fiscal caracteriza-se quando a obrigação tributária já estiver inscrita em Dívida Ativa à época da alienação do bem. Na redação anterior do art. 185, caput, do CTN, a disciplina da fraude à execução era mais favorável ao devedor tributário: somente se caracterizava a fraude se já estivesse em curso a execução fiscal à época

Page 47: Nº 345 – Março 2018 · Revista SÍNTESE Trabalhista e Previdenciária Ano XXIX – nº 345 – MArço 2018 reposItórIo AutorIzAdo de JurIsprudêncIA Supremo Tribunal Federal

RST Nº 345 – Março/2018 – PARTE GERAL – DOUTRINA .......................................................................................................................47

No presente artigo, estuda-se a juridicidade da aplicação do regime ju-rídico especial da fraude à execução fiscal à execução trabalhista, com vistas a promover a efetividade da jurisdição na Justiça do Trabalho (CF, art. 5º, XXXV; CLT, art. 765). Para tanto, articula-se a proposta de interpretação extensiva do art. 889 da CLT à interpretação sistemática do art. 186 do Código Tributário Na-cional, com vistas à assimilação produtiva da modalidade de fraude à execução prevista no art. 185 do CTN à execução trabalhista, uma das diversas modalida-des de fraude à execução previstas no direito positivo.

1 AS MODALIDADES DE FRAUDE À EXECUÇÃO NO DIREITO POSITIVO

Ao lado da modalidade geral de fraude à execução prevista no inciso II do art. 593 do CPC de 1973, o sistema legal prevê uma modalidade específica de fraude à execução no inciso I do art. 593 do CPC e abrange as demais moda-lidades de fraude à execução previstas em diversas leis na genérica hipótese do inciso III do art. 593 do CPC de 19734 (CPC de 2015, art. 792, V5).

A fraude à execução prevista no inciso II do art. 593 do CPC de 1973 tem sido considerada a modalidade geral de fraude à execução por se tratar do tipo de fraude à execução que ocorre com maior frequência. Caracteriza-se quando, ao tempo da alienação do bem, já corria demanda capaz de reduzir o demanda-do à insolvência. A hipótese está prevista no CPC de 2015 (art. 792, IV).

Menos frequente é a modalidade de fraude à execução prevista no inciso I do art. 593 do CPC de 1973, que se caracteriza quando o devedor aliena de-terminado bem sobre o qual há ação judicial fundada em direito real. Essa mo-dalidade de fraude à execução decorre do direito de sequela próprio ao direito

da alienação do bem. Exigia-se a litispendência da execução fiscal. Essa exigência foi suprimida pela Lei Complementar nº 118, de 09.06.2005.

4 CPC de 1973:

“Art. 593. Considera-se em fraude à execução a alienação ou oneração de bens:

I – quando sobre eles pender ação fundada em direito real;

II – quando, ao tempo de alienação ou oneração, corria contra o devedor demanda capaz de reduzi-lo à insolvência;

III – nos demais casos expressos em lei.”5 CPC de 2015:

“Art. 792. A alienação ou a oneração é considerada fraude à execução:

I – quando sobre o bem pender ação fundada em direito real ou com pretensão reipersecutória, desde que a pendência do processo tenha sido averbada no respectivo registro público, se houver;

II – quando tiver sido averbada, no registro do bem, a pendência do processo de execução, na forma do art. 828;

III – quando tiver sido averbado, no registro do bem, hipoteca judiciária ou outro ato de constrição judicial originário do processo onde foi arguida a fraude;

IV – quando, ao tempo de alienação ou da oneração, tramitava contra o devedor ação capaz de reduzi-lo à insolvência;

V – nos demais casos expressos em lei.”

Page 48: Nº 345 – Março 2018 · Revista SÍNTESE Trabalhista e Previdenciária Ano XXIX – nº 345 – MArço 2018 reposItórIo AutorIzAdo de JurIsprudêncIA Supremo Tribunal Federal

48 ...................................................................................................................RST Nº 345 – Março/2018 – PARTE GERAL – DOUTRINA

real. Nesse caso, a configuração da fraude à execução independe do estado de insolvência do devedor. A hipótese está prevista no CPC de 2015 (art. 792, I).

Entretanto, as modalidades de fraude à execução são mais numerosas do que normalmente se percebe, sobretudo quando se atenta para as diversas modalidades de fraude à execução previstas em distintos diplomas legais. Nada obstante passem despercebidas algumas vezes, as demais modalidades de frau-de à execução previstas em distintos diplomas legais foram consideradas pelo legislador na abrangente previsão do inciso III do art. 593 do CPC de 1973, preceito que faz remissão a outras modalidades de fraude à execução, assim consideradas aquelas previstas “nos demais casos expressos em lei”. O CPC de 2015 faz referência às demais modalidades de fraude à execução no art. 792, V.

Ao legislador é dado estabelecer, para a tutela do princípio da responsa-bilidade patrimonial, hipóteses outras em que a conduta do devedor caracteri-ze fraude patrimonial a ser rejeitada pelo sistema normativo, tipificando novas modalidades de fraude à execução com o objetivo último de assegurar a inte-gridade da ordem jurídica. Entre as demais modalidades de fraude à execução tipificadas em distintos diplomas legais, a teoria jurídica tem identificado – sem prejuízo de outras modalidades dessa espécie de ato ilícito6 – as seguintes hi-póteses:

a) há fraude à execução quando, na penhora de crédito, o terceiro deixa de depositar em juízo a importância por ele devida ao execu-tado, nada obstante intimado pelo juízo para assim proceder (CPC de 1973, arts. 671 e 672, §§ 2º e 3º7); a hipótese está prevista nos arts. 855 e 856, §§ 2º e 3º, do CPC de 2015;

b) há fraude à execução quando há registro de averbação premoni-tória de existência de ação à época da alienação do bem (CPC de

6 Araken de Assis relaciona outras hipóteses de fraude à execução, que costumam passar despercebidas: “Além disso, atos de índole diversa, como a dação em pagamento, a renúncia à herança, a interrupção da prescrição e, conforme caso julgado pela 3ª Câmara Cível do extinto TARS, a partilha de bens em separação consensual, igualmente representam fraude contra a execução” (Manual da execução. 14. ed. São Paulo: RT, 2012. p. 303).

7 CPC de 1973:

“Art. 671. Quando a penhora recair em crédito do devedor, o oficial de justiça o penhorará. Enquanto não ocorrer a hipótese prevista no artigo seguinte, considerar-se-á feita a penhora pela intimação:

I – ao terceiro devedor para que não pague ao executado, seu credor;

II – ao executado, credor do terceiro, para que não pratique ato de disposição do crédito.

Art. 672. A penhora de crédito, representada por letra de câmbio, nota promissória, duplicata, cheque ou outros títulos, far-se-á pela apreensão do documento, esteja ou não em poder do devedor.

[...]

§ 2º O terceiro só se exonerará da obrigação, depositando em juízo a importância da dívida.

§ 3º Se o terceiro negar o débito em conluio com o devedor, a quitação, que este lhe der, considerar-se-á em fraude de execução.”

Page 49: Nº 345 – Março 2018 · Revista SÍNTESE Trabalhista e Previdenciária Ano XXIX – nº 345 – MArço 2018 reposItórIo AutorIzAdo de JurIsprudêncIA Supremo Tribunal Federal

RST Nº 345 – Março/2018 – PARTE GERAL – DOUTRINA .......................................................................................................................49

1973, art. 615-A, § 3º8); a hipótese está prevista no art. 828, § 4º, do CPC de 2015;

c) há fraude à execução quando o executado insolvente adquire bem residencial mais valioso, hipótese em que não poderá mais fazer prevalecer a alegação de impenhorabilidade de bem de família (Lei nº 8.009/90, art. 4º, caput e § 1º9);

d) há fraude à execução fiscal quando o crédito tributário já se encon-trava regularmente inscrito como dívida ativa à época da alienação do bem pelo executado (CTN, art. 185, caput).10

Esse resumido inventário das modalidades de fraude à execução autori-za a conclusão de que o sistema legal inclui a fraude à execução fiscal entre os casos de fraude à execução capitulados no inciso III do art. 593 do CPC de 1973 e no inciso V do art. 792 do CPC de 2015, identificando na previsão do art. 185, caput, do CTN particular modalidade de fraude à execução inserida pelo direito positivo entre os “demais casos expressos em lei”, modalidade de fraude à execução em que a presunção de fraude é considerada absoluta.

2 FRAUDE À EXECUÇÃO FISCAL: A PRESUNÇÃO DE FRAUDE É ABSOLUTA; NÃO SE ADMITE PROVA EM CONTRÁRIO

No debate que conduziu à edição da controvertida Súmula nº 375 do STJ11, a doutrina e a jurisprudência desenvolveram, na vigência do art. 593 do CPC de 1973, rica controvérsia acerca da natureza jurídica da fraude à execução.

8 CPC:

“Art. 615-A. O exequente poderá, no ato da distribuição, obter certidão comprobatória do ajuizamento da execução, com identificação das partes e valor da causa, para fins de averbação no registro de imóveis, registro de veículos ou registro de outros bens sujeitos à penhora ou arresto.

[...]

§ 3º Presume-se em fraude à execução a alienação ou oneração de bens efetuada após a averbação (593).”9 Lei nº 8.009/1990:

“Art. 4º Não se beneficiará do disposto nesta Lei aquele que, sabendo-se insolvente, adquire de má-fé imóvel mais valioso para transferir a residência familiar, desfazendo-se ou não da moradia antiga.

§ 1º Neste caso poderá o juiz, na respectiva ação do credor, transferir a impenhorabilidade para a moradia familiar anterior, ou anular-lhe a venda, liberando a mais valiosa para execução ou concurso, conforme a hipótese.”

10 CTN:

“Art. 185. Presume-se fraudulenta a alienação ou oneração de bens ou rendas, ou seu começo, por sujeito passivo em débito para com a Fazenda Pública, por crédito tributário regularmente inscrito como dívida ativa.

Parágrafo único. O disposto neste artigo não se aplica na hipótese de terem sido reservados, pelo devedor, bens ou rendas suficientes ao total pagamento da dívida inscrita.”

11 Súmula nº 375 do STJ: “O reconhecimento da fraude à execução depende do registro da penhora do bem alienado ou da prova da má-fé do terceiro adquirente”. A Súmula nº 375 do STJ foi editada em 30.03.2009.

Page 50: Nº 345 – Março 2018 · Revista SÍNTESE Trabalhista e Previdenciária Ano XXIX – nº 345 – MArço 2018 reposItórIo AutorIzAdo de JurIsprudêncIA Supremo Tribunal Federal

50 ...................................................................................................................RST Nº 345 – Março/2018 – PARTE GERAL – DOUTRINA

De um lado, alinhou-se a corrente tradicional de opinião, sustentando que a fraude à execução continuava a caracterizar-se de forma objetiva (in re ipsa), exigindo apenas:

a) litispendência por ocasião da alienação do bem: demanda ajuizada em face do demandado à época do negócio fraudulento;

b) alienação essa capaz de reduzir o demandado à insolvência.

Para essa corrente de opinião, não se conhece do elemento subjetivo da boa-fé do terceiro adquirente na fraude à execução, ou seja, dispensa-se a prova acerca de consilium fraudis, requisito exigível apenas para a caracterização do ilícito civil de fraude contra credores (CC, arts. 158 e 159). No âmbito da teoria justrabalhista, essa corrente de opinião tem em Manoel Antonio Teixeira Filho um histórico representante12.

De outro lado, articulou-se o entendimento de que a fraude à execução somente configurar-se-ia na hipótese de estar caracterizada – ao lado dos de-mais elementos objetivos mencionados – a má-fé do terceiro adquirente, com-preendida na ciência do terceiro adquirente quanto à existência da ação mo-vida em face do executado-alienante, ou seja, o elemento subjetivo (má-fé do terceiro adquirente) teria passado a ser exigível para a caracterização de fraude à execução. Em outras palavras: o elemento subjetivo do consilium fraudis teria passado a integrar o suporte fático da fraude à execução, conforme indica o enunciado da Súmula nº 375 do STJ, in litteris: “O reconhecimento da fraude à execução depende do registro da penhora do bem alienado ou da prova da má-fé do terceiro adquirente”.

A jurisprudência trabalhista predominante assumiu essa posição sob ins-piração da Súmula nº 375 do STJ, que passou a ser adotada por ocasião do julgamento de embargos de terceiro adquirente do bem.

Enquanto o primeiro entendimento faz resgate efetivo do compromisso da ordem jurídica com o princípio da responsabilidade patrimonial (CPC de 1973, art. 591) em detrimento da boa-fé do terceiro adquirente, o segundo en-tendimento tutela a boa-fé deste, privilegiando o interesse privado em detrimen-to do princípio da responsabilidade patrimonial.

A concepção de fraude à execução fiscal, todavia, passou praticamente incólume por tal controvérsia13. Isso porque a teoria jurídica do Direito Tri-butário sempre identificou na supremacia do interesse público tutelado pelo direito fiscal o histórico fundamento segundo o qual a fraude à execução fiscal configura-se de forma objetiva (in re ipsa) e caracteriza hipótese de presunção absoluta de fraude, não abrindo ensejo à discussão acerca da conduta subjetiva

12 Execução no processo do trabalho. 11. ed. São Paulo: LTr, 2013. p. 200.13 Em 19.11.2010, o STJ uniformiza sua jurisprudência para afirmar ser inaplicável à execução fiscal a Súmula

nº 375/STJ, editada em 30.03.2009. A matéria é desenvolvida no item 6 do presente estudo.

Page 51: Nº 345 – Março 2018 · Revista SÍNTESE Trabalhista e Previdenciária Ano XXIX – nº 345 – MArço 2018 reposItórIo AutorIzAdo de JurIsprudêncIA Supremo Tribunal Federal

RST Nº 345 – Março/2018 – PARTE GERAL – DOUTRINA .......................................................................................................................51

do terceiro adquirente, de modo a impedir a hipótese jurídica de convalidação do negócio fraudulento pela boa-fé do terceiro adquirente. Sequer a possibili-dade da respectiva hipótese jurídica é admitida na fraude à execução fiscal, em um autêntico resgate da categoria dos deveres patrocinado pela verticalização do princípio de responsabilidade patrimonial, que se alicerça na boa-fé indis-pensável à construção de uma vida de relação fundada na honestidade dos contratantes14.

É da lição clássica de Aliomar Baleeiro que a fraude à execução fiscal não admite prova em contrário, precisamente por se caracterizar como ato ilí-cito cujo vício faz constituir presunção absoluta de fraude contra o interesse tributário. Segundo o autor:

O CTN, no art. 185, estabelece uma presunção geral, iuris et de iure, isto é, sem possibilidade de prova em contrário, de que é fraudulenta contra o Fisco, a alienação de bens ou rendas, ou seu começo, por sujeito passivo, desde que o crédito tributário contra ele esteja regularmente inscrito (CTN, arts. 201 a 204) e em fase de execução. Mas entender-se-á que esta presunção absoluta está limi-tada ao caso de o sujeito passivo alienar seus bens ou rendas em tal proporção, que não lhe reste o suficiente par o total pagamento da dívida em execução.15

No mesmo sentido, alinha-se praticamente toda a doutrina do Direito Tributário. Depois de assinalar que o art. 185 do Código Tributário Nacional estabelece presunção de fraude à execução quando ocorre alienação de bem por sujeito passivo em débito para com a Fazenda Pública, por crédito tributário regularmente inscrito como dívida ativa, o tributarista Hugo de Brito Machado afirma que “tal presunção é absoluta. Uma presunção de direito contra a qual não cabe nenhuma espécie de prova”16. O autor volta a explicitar referido en-tendimento quando contextualiza o tema do interesse do terceiro adquirente de boa-fé no âmbito da fraude à execução fiscal à luz da atual redação do art. 185 do CTN17:

No âmbito do Direito Privado, a lei protege o terceiro de boa-fé, estabelecendo que são anuláveis os contratos onerosos de devedor insolvente, quando a insol-vência for notória, ou houver motivo para ser conhecida do outro contratante. O fato de ser devedor de um tributo com crédito tributário inscrito em dívida ativa, todavia, não pode ser considerado indicador de notória insolvência, e mesmo as-sim o Código Tributário Nacional considera sem validade, em face da presunção de fraude, a alienação ou oneração do bem, sem qualquer consideração para com o terceiro de boa-fé.

14 A responsabilidade socioeconômica dos sujeitos funda-se na boa-fé exigida pelo art. 422 do CC de 2002, preceito que irradia saneador efeito ético aos contratos em geral e a toda a vida de relação.

15 Direito tributário brasileiro. 11. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1999. p. 970. O autor está a comentar o art. 185 do CTN, na redação anterior à Lei Complementar nº 118, de 09.02.2005, quando se exigia estivesse já ajuizado o executivo fiscal para configurar-se a fraude à execução.

16 Comentários ao Código Tributário nacional. 2. ed. São Paulo: Atlas, v. III, 2009. p. 649.17 Ibidem, p. 677.

Page 52: Nº 345 – Março 2018 · Revista SÍNTESE Trabalhista e Previdenciária Ano XXIX – nº 345 – MArço 2018 reposItórIo AutorIzAdo de JurIsprudêncIA Supremo Tribunal Federal

52 ...................................................................................................................RST Nº 345 – Março/2018 – PARTE GERAL – DOUTRINA

Em sintonia com Aliomar Baleeiro e Hugo de Brito Machado, Zelmo Denari também identifica a presunção absoluta de fraude na fraude à execução fiscal18 e a irrelevância da conduta subjetiva do terceiro-adquirente para o re-conhecimento de ineficácia do negócio fraudulento. A presunção absoluta de fraude, segundo ele, opera de tal modo que não é facultado ao terceiro adqui-rente produzir prova de sua eventual boa-fé19, in litteris:

A presunção acautelatória aqui estabelecida é juris et de jure, isto é, não admite prova em contrário. Irrelevante, portanto, se de boa ou má-fé o adquirente do bem ou o titular do direito real de garantia. A fraude se presume e a presunção é absoluta.20

Na medida em que a fraude à execução fiscal é interpretada como hipó-tese de presunção absoluta de fraude no Direito Tributário, a vantagem jurídica com que essa concepção de fraude à execução tutela o crédito fiscal conduz o operador do processo do trabalho a interrogar-se acerca da juridicidade da ex-tensão dessa concepção de fraude à fraude à execução ao processo do trabalho – quem sabe se conduzido pelas mãos de Karl Engisch21 – mediante recurso à analogia e com os olhos postos na promessa constitucional de jurisdição efetiva (CF, art. 5º, XXXV). Para tanto, é intuitivo ao operador do processo do trabalho dirigir especial atenção à histórica opção da teoria jurídica brasileira de conferir ao crédito trabalhista privilégio legal superior àquele reconhecido ao crédito fiscal.

3 A HISTÓRICA OPÇÃO DA TEORIA JURÍDICA BRASILEIRA DE CONFERIR AO CRÉDITO TRABALHISTA PRIVILÉGIO LEGAL SUPERIOR ÀQUELE RECONHECIDO AO CRÉDITO FISCAL

O privilégio do crédito trabalhista tem por fundamento próximo a na-tureza alimentar dos créditos decorrentes do trabalho22, enquanto que o fun-

18 Enquanto Aliomar Baleeiro escreveu à época da redação anterior do art. 185 do CTN, Zelmo Denari escreve sob a nova redação do art. 185 do CTN, introduzida pela Lei Complementar nº 118, de 09.02.2005. Contudo, ambos chegam à conclusão idêntica: a fraude à execução fiscal caracteriza hipótese de presunção absoluta de fraude e não admite prova em contrário.

19 Nesse mesmo sentido orienta-se o entendimento de Mauro Luís Rocha Lopes. Comentando o art. 185 do CTN, o autor observa que a doutrina do Direito Tributário considera absoluta a presunção de fraude, sendo dispensável a prova do “consílio fraudulento” à sua caracterização (Processo judicial tributário: execução fiscal e ações tributárias. 7. ed. Niterói/RJ: Impetus, 2012. p. 106).

20 Comentários ao Código Tributário nacional. 3 ed. Coord. Ives Gandra da Silva Martins. São Paulo: Saraiva, v. 2, 2002. p. 496.

21 “Toda a regra jurídica é susceptível de aplicação analógica – não só a lei em sentido estrito, mas também qualquer espécie de estatuto e ainda a norma de Direito Consuetudinário. As conclusões por analogia não têm apenas cabimento dentro do mesmo ramo do Direito, nem tão-pouco dentro de cada Código, mas verificam-se também de um para outro Código e de um ramo do Direito para outro.” (Introdução ao pensamento jurídico. 10. ed. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 2008. p. 293)

22 CF:

“Art. 100. [...]

§ 1º Os débitos de natureza alimentícia compreendem aqueles decorrentes de salários, vencimentos, proventos, pensões e suas complementações, benefícios previdenciários, e indenizações por morte e invalidez,

Page 53: Nº 345 – Março 2018 · Revista SÍNTESE Trabalhista e Previdenciária Ano XXIX – nº 345 – MArço 2018 reposItórIo AutorIzAdo de JurIsprudêncIA Supremo Tribunal Federal

RST Nº 345 – Março/2018 – PARTE GERAL – DOUTRINA .......................................................................................................................53

damento remoto radica na dignidade humana da pessoa do trabalhador, cuja prestação laboral transforma-se em riqueza apropriada pelo tomador de servi-ços inadimplente.

Mesmo na jurisdição fiscal, encarregada de fazer valer o privilégio legal assegurado ao crédito fiscal pelo art. 186 do CTN, o crédito trabalhista tem sido historicamente reconhecido como privilegiado em face deste, em razão da sua qualidade de crédito necessarium vitae (STJ, REsp 442.325, 1ª Turma, Rel. Min. Luiz Fux, DJU 25.11.2002, p. 207).

A ponderação de se tratar de um crédito necessário à subsistência do ser humano que vive do próprio trabalho integra o arcabouço axiológico sob o qual a consciência jurídica tem conformado a estrutura hierárquica normativa em que são classificadas as diversas espécies de créditos ao longo da tradição jurídica brasileira. Com efeito, o predicado de crédito necessarium vitae tem sido, na verdade, o principal fundamento material da opção da consciência jurídica nacional de privilegiar o crédito trabalhista na concorrência com os demais créditos previstos no sistema legal brasileiro, ratificando nessa histórica opção da teoria jurídica brasileira a primazia da dignidade da pessoa humana enquanto valor superior que viria a ser eleito pela Constituição como funda-mento da República23.

Nada obstante o reconhecimento doutrinário de que a relevância do cré-dito tributário funda-se na supremacia do interesse público que lhe é imanen-te24, ainda assim a consciência jurídica nacional tem posicionado – trata-se de tradição histórica – o crédito trabalhista em um patamar superior àquele confe-rido ao crédito fiscal, sugerindo concretamente possa a supremacia do interesse público vir a ser superada em determinada situação especial, na qual a ordem jurídica identifique interesse ainda mais relevante a tutelar – no caso do privi-légio do crédito trabalhista, o interesse fundamental social a tutelar é satisfação prioritária dos créditos decorrentes da prestação do trabalho humano. Desse interesse fundamental social deriva a formulação conceitual que conduziria a teoria jurídica a conceber a expressão superprivilégio para bem significar a pri-mazia conferida pelo sistema jurídico nacional ao crédito trabalhista.

Essa tradição histórica de a ordem jurídica nacional conferir primazia ao crédito trabalhista sofreu revés significativo com o advento da nova Lei de

fundadas em responsabilidade civil, em virtude de sentença judicial transitada em julgado, e serão pagos com preferência sobre todos os demais débitos, exceto sobre aqueles referidos no § 2º deste artigo.”

23 CF:

“Art. 1º A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos:

[...]

III – a dignidade da pessoa humana.”24 Cf. MACHADO, Hugo de Brito. Comentários ao Código Tributário nacional. 2. ed. São Paulo: Atlas, v. III,

2009. p. 660.

Page 54: Nº 345 – Março 2018 · Revista SÍNTESE Trabalhista e Previdenciária Ano XXIX – nº 345 – MArço 2018 reposItórIo AutorIzAdo de JurIsprudêncIA Supremo Tribunal Federal

54 ...................................................................................................................RST Nº 345 – Março/2018 – PARTE GERAL – DOUTRINA

Falências e Recuperação Judicial. Entre outros preceitos representativos dessa nova orientação, o art. 83, I, da Lei nº 11.101/2005 limitou o privilégio do crédito trabalhista ao valor de 150 (cento e cinquenta) salários-mínimos na fa-lência, classificando como quirografário o crédito trabalhista excedente des-se montante. A possibilidade de limitação do privilégio do crédito trabalhista a determinado montante foi reservada ao legislador ordinário pela Lei Com-plementar nº 118, também de 09.02.2005, que introduziu parágrafo único no art. 186 do CTN para conferir a prerrogativa que o legislador comum exerceria nessa mesma data mediante a edição da Lei nº 11.101/2005. Daí a eficácia que a medida legal da hipoteca judiciária pode conferir à exequibilidade do crédito trabalhista na hipótese de superveniência de falência da empresa, conforme a arguta lição de Élisson Miessa25.

Na legislação anterior, não havia limitação do privilégio do crédito traba-lhista a determinado valor (Decreto-Lei nº 7.661/1945). A alteração em questão foi recebida com reservas por expressiva parte da doutrina, tendo Francisco Antonio de Oliveira registrado ser essa restrição imposta ao privilégio do crédito trabalhista pela nova Lei de Falências desejo de setores empresariais e do pró-prio governo sob a alegação infundada de excesso de vantagens trabalhistas26. Depois de identificar afronta da nova Lei de Falências e Recuperação Judicial aos princípios constitucionais da dignidade da pessoa humana, da valoriza-ção do trabalho e da submissão da propriedade à sua função social, Mauricio Godinho Delgado27 assevera com sua reconhecida autoridade teórica:

A Lei nº 11.101, de 2005, ignorando a filosofia e a determinação constitucio-nais, confere enfática prevalência aos interesses essencialmente econômicos, em detrimento dos interesses sociais. Arrogantemente, tenta inverter a ordem jurí-dica do País. [...] A nova Lei de Falências, entretanto, com vigência a partir de 09.06.2005, abrangendo, essencialmente, processos novos (art. 201, combinado com art. 192, Lei nº 11.101/2005), manifesta direção normativa claramente an-titética à tradicional do Direito brasileiro, no que tange à hierarquia de direitos e créditos cotejados no concurso falimentar.

Em sentido contrário, André de Melo Ribeiro posiciona-se a favor da orientação adotada pela Lei nº 11.101/2005, destacando que a Convenção nº 95 da Organização Internacional do Trabalho autoriza a lei nacional a limitar o privilégio do crédito trabalhista a determinado valor. A nova Lei de Falências

25 Hipoteca judiciária e protesto da decisão judicial no novo CPC e seus impactos no processo do trabalho. In: MIESSA, Élisson (Org.). O novo Código de Processo Civil e seus reflexos no processo do trabalho. Salvador: Juspodivm, 2015. p. 475-6: “No entanto, conforme se verifica pelo art. 83, inciso I, da Lei nº 11.101/2005, a preferência apenas é observada no limite de 150 salários-mínimos. Dessa forma, o valor restante poderá ser analisado em consonância com o inciso II de referido dispositivo que determina que, logo após os créditos trabalhistas até o limite de 150 salários-mínimos, possuem preferência os créditos com garantia real até o limite do valor do bem gravado. Com efeito, na falência, a hipoteca judiciária produzirá duas preferências ao credor trabalhista. Uma em decorrência [da natureza jurídica alimentar] de seu crédito, limitada ao montante descrito na lei. E outra em razão da hipoteca judiciária, limitada ao valor do bem hipotecado”.

26 Execução na Justiça do Trabalho. 6. ed. São Paulo: RT, 2008. p. 257.27 Curso de direito do trabalho. 10. ed. São Paulo: LTr, 2011. p. 793-5 – sem itálico no original.

Page 55: Nº 345 – Março 2018 · Revista SÍNTESE Trabalhista e Previdenciária Ano XXIX – nº 345 – MArço 2018 reposItórIo AutorIzAdo de JurIsprudêncIA Supremo Tribunal Federal

RST Nº 345 – Março/2018 – PARTE GERAL – DOUTRINA .......................................................................................................................55

e Recuperação Judicial “[...] consolida no ordenamento jurídico brasileiro – no entender do autor28 – a orientação axiológica pela manutenção e recuperação das unidades produtivas viáveis, enquanto núcleo de um feixe de interesses sociais”. Essa orientação o autor reputa amparada nos valores eleitos pelo legis-lador constitucional relacionados à valorização do trabalho e da livre iniciativa, bem como na função social da propriedade e na busca do pleno emprego. Para o jurista, o legislador definiu a recuperação da atividade econômica como o objetivo precípuo:

Tal objetivo busca preservar a empresa – enquanto atividade econômica – por reconhecê-la como núcleo de um feixe de interesses sociais, mais amplo do que aquele composto pelos interesses patrimoniais individuais dos credores (resguar-dado o limite do crédito privilegiado dos credores trabalhistas), da Fazenda ou do empresário.

Na fundada crítica do tributarista João Damasceno Borges de Miranda à nova diretriz adotada pela Lei de Falências e Recuperação Judicial (Lei nº 11.101/2005), de privilegiar, na falência, os créditos dotados de garantia real em detrimento do crédito fiscal, o autor conclui que “jamais se poderia deferir privilégio aos credores financeiros com garantia real, pois os mesmos estão alocados no ramo do Direito Privado e devem ser tratados com as regras próprias”. A consistência da fundamentação adotada pelo autor para chegar à referida conclusão justifica – note-se que se trata de jurista do campo do direito tributário – a reprodução do argumento cuja extração sistemática implícita é revelada pela ponderação do privilégio do crédito trabalhista29:

Pacífico o entendimento quanto à prevalência do crédito trabalhista por se tratar de crédito social com natureza alimentar e ser, reconhecidamente, a contrapres-tação pelo esforço físico posto em função da riqueza de outrem. D’outra banda, o crédito tributário diz respeito ao interesse público e coletivo, de interesse geral da sociedade, e, sendo assim, conforme a previsão principiológica constitucional, este tem prevalência sobre os interesses privados.

O argumento do jurista faz evocar o acórdão do STJ anteriormente refe-rido, porquanto à natureza alimentar do crédito trabalhista destacada por João Damasceno Borges de Miranda corresponde à identificação pretoriana – esta-mos a examinar jurisprudência cível – do crédito trabalhista na qualidade de crédito necessarium vitae (STJ, Recurso Especial nº 442.325, 1ª Turma, Rel. Min. Luiz Fux, DJU 25.11.2002, p. 207). Além disso, o argumento do tributa-rista tem o mérito de colocar em destaque relevante componente hermenêutico de feição socioeconômica, ao sublinhar a circunstância de que o crédito tra-

28 “O novo eixo axiológico de interpretação do fenômeno da empresa e a modulação necessária entre o direito do trabalho e o direito concursal após a Lei nº 11.101/2005.” (In: GARCIA, Gustavo Filipe Barbosa; ALVARENGA, Rúbia Zanotelli de (Org.). Direito do trabalho e direito empresarial sob o enfoque dos direitos fundamentais. São Paulo: LTr, 2015. p. 166)

29 Comentários ao Código Tributário nacional. Coord. Marcelo Magalhães Peixoto e Rodrigo Santos Masset Lacombe. São Paulo: Magalhães Peixoto Editora Ltda., 2005. p. 1319.

Page 56: Nº 345 – Março 2018 · Revista SÍNTESE Trabalhista e Previdenciária Ano XXIX – nº 345 – MArço 2018 reposItórIo AutorIzAdo de JurIsprudêncIA Supremo Tribunal Federal

56 ...................................................................................................................RST Nº 345 – Março/2018 – PARTE GERAL – DOUTRINA

balhista é consequência da exploração econômica do trabalho humano e do inadimplemento da devida contraprestação ao trabalhador – a contraprestação pelo esforço físico posto em função da riqueza de outrem, na feliz síntese do tributarista.

Com efeito, o crédito trabalhista tem natureza jusfundamental (CF, art. 7º) e constitui-se como expressão objetiva de inadimplemento à contraprestação devida ao trabalhador pelo tomador dos serviços, trabalho esse cuja prestação incorpora-se ao patrimônio do tomador de serviços na condição de riqueza apropriada sob a forma de mais-valia. É o fato objetivo de que essa apropriação se faz inexorável na relação de produção capitalista que conduz a consciência jurídica a sobrevalorizar o crédito trabalhista na disputa com outras espécies de créditos, reconhecendo-lhe posição de superprivilégio indispensável à concre-tização do valor da dignidade da pessoa humana que vive do trabalho. É nesse ambiente axiológico que se contextualiza o desafio hermenêutico de compati-bilizar os arts. 29 da Lei nº 6.830/1980 e 186 do CTN sob a condução do pos-tulado da unidade do sistema jurídico.

4 HERMENÊUTICA E MÉTODO SISTEMÁTICO DE INTERPRETAÇÃO: DO POSTULADO DA UNIDADE DO SISTEMA JURÍDICO À COMPATIBILIZAÇÃO DOS ARTIGOS 29 DA LEI Nº 6.830/1980 E 186 DO CTN

A hermenêutica jurídica é a ciência da interpretação das leis. Para cum-prir o objetivo de definir o alcance dos preceitos legais, estuda os diversos mé-todos de interpretação da lei e as respectivas interações. O método sistemático disputa – a observação é de Luís Roberto Barroso – com o teleológico a primazia no processo interpretativo30. Se o método teleológico de interpretação orienta--se à finalidade da norma jurídica interpretada, o método sistemático de inter-pretação funda-se na ideia de que o ordenamento jurídico constitui um “sistema de preceitos coordenados ou subordinados, que convivem harmonicamente”31.

Conformando uma estrutura orgânica que pressupõe ordem e unidade, esse organismo jurídico unitário relaciona suas partes ao todo, de tal modo que o dispositivo legal interpretado seja em harmonia com o contexto normativo no qual está compreendido. O postulado da unidade do ordenamento normativo enquanto sistema é conformado pela lógica da não contradição: as partes são interpretadas em harmonia com o seu conjunto, superando-se eventuais contra-dições por uma interpretação preordenada a reconduzir o dispositivo interpre-tado à unidade do sistema e de sua autopoiética coerência interna.

O fato de o art. 29 da Lei de Executivos Fiscais estabelecer que o crédito fiscal não está sujeito a concurso de credores e não se submete à habilitação em falência, concordata, liquidação, inventário ou arrolamento32 acabou dando en-

30 Interpretação e aplicação da Constituição. 7. ed. São Paulo: Saraiva, 2010. p. 140.31 Idem, ibidem.32 A previsão do art. 187 do CTN é semelhante à previsão do art. 29 da Lei nº 6.830/1980.

Page 57: Nº 345 – Março 2018 · Revista SÍNTESE Trabalhista e Previdenciária Ano XXIX – nº 345 – MArço 2018 reposItórIo AutorIzAdo de JurIsprudêncIA Supremo Tribunal Federal

RST Nº 345 – Março/2018 – PARTE GERAL – DOUTRINA .......................................................................................................................57

sejo a interpretações no sentido de que, nada obstante o privilégio assegurado ao crédito trabalhista sobre o crédito fiscal no art. 186 do CTN, o crédito tributá-rio poderia ser satisfeito no juízo fiscal de forma definitiva, inclusive sem obser-vância ao pagamento prioritário devido ao crédito trabalhista em decorrência do privilégio legal previsto na precitada regra do Código Tributário Nacional.

Humberto Theodoro Júnior relata, no particular, que, diante dos termos exageradamente amplos do art. 29 da Lei nº 6.830/1980, entendeu Ricardo Mariz de Oliveira33 que até as garantias legais de preferência dos créditos tra-balhistas teriam sido preteridas pelo preceito da Lei de Executivos Fiscais, com o abandono da sistemática do próprio Código Tributário Nacional (art. 186). Contudo, o processualista mineiro demonstra o equívoco da interpretação pos-tulada por Ricardo Mariz de Oliveira, ao esclarecer que o art. 29 da Lei de Exe-cução Fiscal quis apenas excluir a Fazenda Pública da participação nos juízos universais como o da falência e o do concurso civil de credores. Entretanto, não entrou em linha de cogitação alterar privilégios instituídos pelas leis de direito material em vigor. Isso porque – pondera Humberto Theodoro Júnior – não seria razoável que, em questão de direito material como essa, pudesse ocorrer revogação de uma lei complementar, como é o Código Tributário Nacional, por uma simples lei ordinária34, como é a Lei nº 6.830/1980.

A interpretação postulada por Ricardo Mariz de Oliveira somente pode ser compreendida como fruto de uma concepção não sistemática do ordena-mento jurídico, interpretação que incorre no equívoco de tomar isoladamente o preceito do art. 29 da LEF quando deveria considerá-lo – o método sistemático de interpretação visa a preservar a unidade do ordenamento normativo – no contexto dos demais diplomas legais correlatos, especialmente o Código Tri-butário Nacional, sob pena de perder de vista o fato de que esse “[...] diploma legal predica a prevalência dos créditos trabalhistas sobre os créditos fiscais”, conforme preleciona João Damasceno Borges de Miranda diante da correlata antinomia também sugerida pela primeira leitura do art. 187 do CTN35.

A interpretação de uma norma isolada do contexto no qual está com-preendida pode conduzir o intérprete a equívoco, como geralmente acontece quando se despreza o elemento contextual na interpretação da lei. Isso ocorre porque “[...] a interpretação de uma norma – a observação é do tributarista Hugo de Brito Machado36 – não deve ser feita fora do contexto em que se encar-ta, mas tendo-se em consideração outras normas com as quais se deve harmo-nizar”. Por vezes identificada como a mais racional e científica, à interpretação sistemática importa a coerência interna do ordenamento jurídico, conforme re-

33 Dívida Ativa da Fazenda Pública. RT Informa, 261:5.34 Lei de execução fiscal. 11. ed. São Paulo: Saraiva, 2009. p. 179.35 Comentários ao Código Tributário nacional. Coord. Marcelo Magalhães Peixoto e Rodrigo Santos Masset

Lacombe. São Paulo: Magalhães Peixoto Editora Ltda., 2005. p. 1315.36 Comentários ao Código Tributário nacional. 2. ed. São Paulo: Atlas, v. III, 2009. p. 676.

Page 58: Nº 345 – Março 2018 · Revista SÍNTESE Trabalhista e Previdenciária Ano XXIX – nº 345 – MArço 2018 reposItórIo AutorIzAdo de JurIsprudêncIA Supremo Tribunal Federal

58 ...................................................................................................................RST Nº 345 – Março/2018 – PARTE GERAL – DOUTRINA

vela a didática lição de Luís Roberto Barroso37 sobre a interpretação da Consti-tuição: “Mesmo as regras que regem situações específicas, particulares, devem ser interpretadas de forma que não se choquem com o plano geral da Carta”.

A precisão da interpretação sistemática sustentada por Humberto Theodoro Júnior acerca do art. 29 da Lei de Executivos Fiscais pode ser aferida tanto na doutrina quanto na jurisprudência. Na doutrina, essa aferição é obtida nos comentários de Anderson Soares Madeira acerca da relação de coorde-nação com que o art. 186 do CTN conforma a interpretação do art. 29 da Lei nº 6.830/1980. Ao comentar a interpretação dada ao art. 29 da Lei nº 6.830/1980 pelos tribunais, o autor observa que a “jurisprudência se quedou a entender que não poderia o Fisco se sobrepor à preferência dos credores protegidos pela le-gislação trabalhista”.

A acertada observação de Anderson Soares Madeira decorre da suprema-cia da legislação complementar sobre a legislação ordinária. O autor contextua-liza o dispositivo do art. 29 da LEF no âmbito do sistema dos executivos fiscais, identificando na supremacia do Código Tributário Nacional o consagrado cri-tério hermenêutico que orienta a subordinar a lei ordinária (Lei nº 6.830/1980 – LEF, art. 29) à lei complementar (Lei nº 5.174/1966 – CTN, art. 186). Na har-monização dos preceitos legais em cotejo, a interpretação sistemática conduz o autor à consideração de que, “[...] sendo a Lei de Execução Fiscal lei ordinária, esta não poderia se sobrepor à lei complementar, como assim foi recepcionado pela Constituição Federal, o CTN, que em seu art. 186 prevê a ressalva de pre-ferência da legislação do trabalho”38.

Na jurisprudência, o acerto da interpretação sistemática com a qual Humberto Theodoro Júnior harmoniza os arts. 29 da LEF e 186 do CTN pode ser apurado no julgamento do Recurso Especial nº 188.148/RS realizado pela Corte Especial do STJ. A síntese do julgamento da Corte Especial do STJ é a de que os créditos fiscais não estão sujeitos à habilitação, mas se submetem à clas-sificação, para disputa de preferência com os créditos trabalhistas. Eis a ementa do acórdão:

PROCESSUAL – EXECUÇÃO FISCAL – MASSA FALIDA – BENS PENHORADOS – DINHEIRO OBTIDO COM A ARREMATAÇÃO – ENTREGA AO JUÍZO UNIVER-SAL – CREDORES PRIVILEGIADOS – I – A decretação da falência não paralisa o processo de execução fiscal, nem desconstitui a penhora. A execução continuará a se desenvolver, até à alienação dos bens penhorados. II – Os créditos fiscais não estão sujeitos a habilitação no juízo falimentar, mas não se livram de clas-sificação, para disputa de preferência com créditos trabalhistas (DL 7.661/1945,

37 Interpretação e aplicação da Constituição. 7. ed. São Paulo: Saraiva, 2010. p. 141-2. O autor informa que devemos a Pietro Merola Chiercia o mais amplo estudo sobre interpretação sistemática do direito constitucional, destacando que o jurista italiano atribui à interpretação sistemática uma posição de “prioridade lógica com respeito a outros critérios interpretativos” (L’interpretazione sistemática della Constituzione. Padova: Cedam, 1978. p. 243 e s.).

38 Lei de execuções fiscais. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2001. p. 214.

Page 59: Nº 345 – Março 2018 · Revista SÍNTESE Trabalhista e Previdenciária Ano XXIX – nº 345 – MArço 2018 reposItórIo AutorIzAdo de JurIsprudêncIA Supremo Tribunal Federal

RST Nº 345 – Março/2018 – PARTE GERAL – DOUTRINA .......................................................................................................................59

art. 126). III – Na execução fiscal contra falido, o dinheiro resultante da alienação de bens penhorados deve ser entregue ao juízo da falência, para que se incorpore ao monte e seja distribuído, observadas as preferências e as forças da massa. (STJ, Recurso Especial nº 188.148/RS, Corte Especial, Rel. Min. Humberto Gomes de Barros,. DJU 27.05.2002, p. 121 – sem grifo no original)

As considerações da tributarista Valéria Gutjahr sobre o precitado acór-dão da Corte Especial do STJ revelam-se didáticas à compreensão da matéria. Tais considerações estão situadas nos comentários da autora aos arts. 186 e 187 do CTN. Observa a jurista que, na falência, o produto arrecadado com a alienação de bens deve ser entregue ao juízo falimentar, para que esse faça a posterior distribuição dos respectivos valores, conforme a classificação dos créditos em disputa.

Nesse julgamento da Corte Especial do STJ – prossegue Valéria Gutjahr –, consolidou-se o entendimento que reconhece a independência da processualís-tica do executivo fiscal. Contudo, essa independência procedimental da Lei de Executivos Fiscais não assegura a imediata satisfação do crédito tributário quan-do houver credores preferenciais – e esse é o caso dos credores trabalhistas, por força do art. 186 do CTN. Vale dizer, observam-se as normas procedimentais da Lei de Executivos Fiscais, o que significa excluir o crédito fiscal de habilitação; mas à distribuição do valor apurado aplicam-se as normas de direito material (CC, arts. 957, 958 e 961) que classificam os créditos em disputa e observam--se os respectivos privilégios legais (CTN, art. 186) ao estabelecer a ordem de prioridade a ser observada no pagamento dos credores concorrentes. Preleciona a jurista39:

Em outras palavras, trata-se do reconhecimento do princípio de que a lei especial (Lei de Execuções Fiscais) sobrepõe-se à geral (Lei de Falências) na aplicação do procedimento por aquela instituído, passando-se, após, à observância das normas gerais aplicáveis ao processo falimentar e obedecendo-se, inclusive, o disposto no próprio Código Tributário Nacional (art. 186 e seu parágrafo único).

É de ver que a solução preconizada para a hipótese de falência do deve-dor também se aplica quando a disputa entre crédito fiscal e crédito trabalhista ocorre perante devedor solvente.

Haverá, então, um concurso de penhoras de natureza particular (e não um con-curso universal) entre a Fazenda e o credor trabalhista, devendo aquela – na lição de Humberto Theodoro Júnior – respeitar a preferência legal deste no pagamento que se realizar com o produto do bem penhorado por ambos.40

Também aqui o comando do art. 186 do CTN protagoniza a interpreta-ção sistemática do ordenamento jurídico em aplicação.

39 Comentários ao Código Tributário nacional. Coord. Marcelo Magalhães Peixoto e Rodrigo Santos Masset Lacombe. São Paulo: Magalhães Peixoto Editora Ltda., 2005. p. 1337.

40 Lei de execução fiscal. 11. ed. São Paulo: Saraiva, 2009. p. 180.

Page 60: Nº 345 – Março 2018 · Revista SÍNTESE Trabalhista e Previdenciária Ano XXIX – nº 345 – MArço 2018 reposItórIo AutorIzAdo de JurIsprudêncIA Supremo Tribunal Federal

60 ...................................................................................................................RST Nº 345 – Março/2018 – PARTE GERAL – DOUTRINA

Nesse particular, cumpre observar que, ao protagonismo do comando do art. 186 do CTN na regência jurídica da classificação dos créditos, a interpreta-ção sistemática do ordenamento normativo revela confluírem tanto o art. 30 da Lei de Executivos Fiscais quanto o art. 711 do Código de Processo Civil de 1973 (no CPC de 2015, trata-se do art. 908), preceitos que reconduzem o intérprete à diretriz superior de se fazer respeitar, na disputa entre credores, a primazia assegurada aos créditos dotados de privilégio legal pelo direito material (CC, arts. 957, 958 e 961).

Enquanto o art. 30 da LEF afirma que o devedor responde pelo pagamen-to da Dívida Ativa com a totalidade de seus bens, ressalvando, contudo, que a responsabilidade do devedor é apurada “sem prejuízo dos privilégios espe-ciais sobre determinados bens, que sejam previstos em lei” (Lei nº 6.830/1980, art. 30, parte final), colmatando a lacuna do art. 29 da LEF que teria induzi-do Ricardo Mariz de Oliveira ao equívoco apontado por Humberto Theodoro Júnior41, o art. 711 do CPC de 1973 colmata a lacuna dos arts. 612 e 613 do CPC de 1973 para esclarecer que o critério cronológico da anterioridade da pe-nhora somente define a ordem de pagamento aos credores se não houver, entre eles, credores detentores de crédito dotado de privilégio legal:

Concorrendo vários credores, o dinheiro ser-lhes-á distribuído e entregue con- soante a ordem das respectivas prelações; não havendo título legal à preferência, receberá em primeiro lugar o credor que promoveu a execução, cabendo aos de-mais concorrentes direito sobre a importância restante, observada a anterioridade de cada penhora. (CPC de 1973, art. 711 – sem destaque no original)

No CPC de 2015, o preceito do art. 908 corresponde ao art. 711 do CPC de 1973.

Se à compatibilização dos arts. 29 da LEF e 186 do CTN o método sis-temático de interpretação faz prevalecer o postulado da unidade do sistema jurídico mediante o resgate de sua coerência interna sob a condução dirigente do comando superior do art. 186 do CTN, o desafio subsequente que a presente pesquisa propõe é responder se à execução trabalhista aplicam-se apenas os preceitos da Lei nº 6.830/1980 ou se há um sistema legal de executivos fiscais a aplicar à execução trabalhista por força da previsão do art. 889 da CLT.

5 A APLICAÇÃO DO SISTEMA LEGAL DOS EXECUTIVOS FISCAIS À EXECUÇÃO TRABALHISTA: À EFETIVIDADE DO DIREITO MATERIAL DO CREDOR TRABALHISTA CORRESPONDE INTERPRETAÇÃO EXTENSIVA DO ARTIGO 889 DA CLT

À primeira vista, pode parecer que a incidência subsidiária prevista no art. 889 da CLT estaria limitada a aplicarem-se à execução trabalhista apenas os dispositivos da Lei de Executivos Fiscais. A interpretação literal do art. 889

41 Ver notas de rodapé 35 e 36.

Page 61: Nº 345 – Março 2018 · Revista SÍNTESE Trabalhista e Previdenciária Ano XXIX – nº 345 – MArço 2018 reposItórIo AutorIzAdo de JurIsprudêncIA Supremo Tribunal Federal

RST Nº 345 – Março/2018 – PARTE GERAL – DOUTRINA .......................................................................................................................61

da CLT poderia conduzir a essa estrita compreensão do preceito. Entretanto, mais do que aplicar à execução trabalhista apenas os dispositivos da Lei de Executivos Fiscais, a necessidade de potencializar o direito fundamental à tutela jurisdicional efetiva (CF, art. 5º, XXXV) tem fomentado interpretação extensiva do comando do art. 889 da CLT, na perspectiva de se compreender que todo o sistema dos executivos fiscais seria aplicável à execução trabalhista42.

Se pode ser controvertida a proposta de conferir interpretação extensiva ao art. 889 da CLT, parece razoável considerar que da teoria jurídica recolhe-se o reconhecimento implícito de que os executivos fiscais constituem um siste-ma. Se a própria natureza sistêmica ínsita ao ordenamento jurídico em geral é indicativo teórico de que também os executivos fiscais em particular podem ser compreendidos enquanto sistema, uma percepção ainda mais clara de que se estaria a tratar de um sistema de execução fiscal pode ser haurida da relação de coordenação e complementaridade existente entre os diplomas legais inciden-tes na matéria, como ressalta Humberto Theodoro Júnior nas sucessivas edições da obra Lei de execução fiscal.

Já, na introdução a essa obra, o jurista mineiro adota a precaução cien-tífica de sublinhar o fato de que seus comentários à Lei nº 6.830/1980 não poderiam ser desenvolvidos sem o necessário recurso aos preceitos do Código Tributário Nacional correlatos à execução fiscal, deixando implícita a conside-ração de que os executivos fiscais, por conformarem-se à interpretação imposta pelo CTN, constituiriam um verdadeiro sistema. Essa implícita consideração parece decorrer da mencionada advertência com a qual o autor inaugura seus comentários43:

Também, os dispositivos do Código Tributário Nacional serão colocados em con-fronto com o texto da nova Lei, sempre que se fizer aconselhável para a melhor interpretação das regras que comandam o processo da execução judicial da Dí-vida Ativa.

O fato de a Exposição de Motivos nº 223 da Lei nº 6.830/1980 fazer remissão ao Código Tributário Nacional diversas vezes também sugere a re-lação de coordenação e de complementaridade com qual o CTN conforma a Lei de Executivos Fiscais, a indicar a conformação de um verdadeiro sistema de executivos fiscais, complementado pela aplicação subsidiária do CPC (Lei

42 Sem prejuízo da aplicação subsidiária do CPC quando mais apta a fazer realizar a efetividade da execução prometida tanto na legislação ordinária (CLT, art. 765) quanto na legislação constitucional (CF, art. 5º, XXXV). Essa assertiva não é inovadora. A jurisprudência já atua no sentido de sobrepor algumas regras processuais comuns às trabalhistas sempre que aquelas se mostrarem mais efetivas, no escopo de fazer justiça, à moda do Tribunal Constitucional da Espanha, que enunciou o dever dos juízes de promover e colaborar ativamente para a realização da efetividade da tutela jurisdicional. Esse dever, segundo a Corte espanhola, é um dever jurídico- -constitucional, uma vez que os juízes e tribunais têm a “obrigação de proteção eficaz do direito fundamental” (BERNAL, Francisco Chamorro. La Tutela Judicial Efectiva – Derechos y garantias procesales derivados del artículo 24.1 de La Constitución. Barcelona: Bosch, 1994. p. 329).

43 Lei de execução fiscal. 11. ed. São Paulo: Saraiva, 2009. p. 3 – sem grifo no original.

Page 62: Nº 345 – Março 2018 · Revista SÍNTESE Trabalhista e Previdenciária Ano XXIX – nº 345 – MArço 2018 reposItórIo AutorIzAdo de JurIsprudêncIA Supremo Tribunal Federal

62 ...................................................................................................................RST Nº 345 – Março/2018 – PARTE GERAL – DOUTRINA

nº 6.830/1980, art. 1º), sistema esse que encontra na sua compatibilidade com a Constituição Federal o fundamento de sua validade na ordem jurídica nacional.

No âmbito da teoria jurídica do processo do trabalho, a doutrina de Luciano Athayde Chaves também parece sugerir a existência desse sistema de execução fiscal, na medida em que o processualista sustenta, com fundamento na interpretação sistemática do art. 186 do Código Tributário Nacional ao pro-cesso do trabalho, a aplicação da medida legal de indisponibilidade de bens prevista no art. 185-A do CTN à execução trabalhista44. Em outras palavras, ao sustentar a aplicação subsidiária de providência legal não prevista na Lei nº 6.830/1990 – a respectiva previsão legal consta do Código Tributário Nacional45 – à execução trabalhista com suporte jurídico no art. 186 do CTN, o jurista pa-rece estar a reconhecer implicitamente a existência desse sistema de executivos fiscais, cuja incidência subsidiária ao processo do trabalho alicerça-se no solo hermenêutico em que se conformará, então, a necessidade de conferir interpre-tação extensiva à norma do art. 889 da CLT, na perspectiva da promoção da efetividade da jurisdição trabalhista (CF, art. 5º, XXXV; CLT, art. 765).

A jurisprudência trabalhista tem reconhecido a juridicidade da aplicação da medida legal de indisponibilidade de bens capitulada no art. 185-A do CTN ao processo do trabalho, autorizando o entendimento de que, mais do que ape-nas os preceitos da Lei nº 6.830/1980, também preceitos do CTN correlatos à execução fiscal aplicam-se à execução trabalhista, o que parece corroborar a ideia de que há mesmo um sistema de executivos fiscais e que é todo esse sis-tema que ingressa no âmbito da execução trabalhista pelas portas abertas pelo permissivo do art. 889 da CLT. A seguinte ementa é ilustrativa dessa perspectiva de interpretação extensiva:

CONTRIBUIÇÕES PREVIDENCIÁRIAS – IMPOSSIBILIDADE DE PROSSEGUI-MENTO REGULAR DA EXECUÇÃO – APLICAÇÃO DO ART. 185-A DO CTN – A ausência de bens em nome do executado constitui justamente o pressuposto para a determinação de indisponibilidade de bens, nos termos do disposto no caput do novel art. 185-A do Código Tributário Nacional. Trata-se, enfim, de medida a ser tomada na hipótese de impossibilidade de prosseguimento regular da execução, servindo como garantia de que bens futuros possam ser objeto de apreensão ju-dicial. Isto é o que, aliás, está preceituado, há muito tempo, no art. 591 do CPC, que registra que “o devedor responde, para o cumprimento de suas obrigações, com todos os seus bens presentes e futuros, salvo as restrições estabelecidas em lei”. O art. 646 do mesmo Diploma de Lei respalda este entendimento, na me-dida em que fixa que “a execução por quantia certa tem por objeto expropriar

44 Ferramentas eletrônicas na execução trabalhista. In: CHAVES, Luciano Athayde (Org.). Curso de processo do trabalho. São Paulo: LTr, 2009. p. 968.

45 Atualmente, a medida legal de indisponibilidade de bens pode ser ordenada pelo magistrado mediante comando eletrônico por meio da Central Nacional de Indisponibilidade de Bens – CNIB, providência que representa considerável aporte à efetividade da execução, na medida em que atinge bens imóveis registrados em nome do executado em todo o território nacional. O comando de indisponibilidade é realizado mediante informação do CNPJ/CPF do executado. Para mais informações, consultar o Provimento CNJ nº 39/2014 da Corregedoria Nacional de Justiça (CNJ) e o site <http://www.indisponibilidade.org.br>.

Page 63: Nº 345 – Março 2018 · Revista SÍNTESE Trabalhista e Previdenciária Ano XXIX – nº 345 – MArço 2018 reposItórIo AutorIzAdo de JurIsprudêncIA Supremo Tribunal Federal

RST Nº 345 – Março/2018 – PARTE GERAL – DOUTRINA .......................................................................................................................63

bens do devedor, a fim de satisfazer o direito do credor (art. 591)”. Veja-se, com isto, que, mais que se discutir sobre a perspectiva da moralidade – dar efetividade à jurisdição conferida à parte – tem-se uma questão de interpretação literal do texto de lei, não sendo demais praticar atos expropriatórios contra quem se nega, mesmo que seja forçado, a cumprir o que lhe foi determinado por sentença. A expropriação não se traduz em ato brutal contra o devedor e, muito menos, a decretação de indisponibilidade dos seus bens futuros, já que, quanto a estes, não há, nem mesmo, a suposição de que são essenciais à sobrevivência, não fazendo parte do que é esperado pelo devedor, diariamente. Cumpre ressaltar que o Direito Processual Moderno – especialmente, o do Trabalho – admite este tipo de procedimento. O juiz tem de buscar os bens do devedor e a efetivida-de da justiça, que deve ser buscada. (TRT3 (MG), AP-00264-1995-038-03-00-0, 3ª Turma, Rel. Milton Vasques Thibau de Almeida, DJMG 05.08.2006)

Parece razoável concluir, portanto, que os executivos fiscais constituem propriamente um sistema46, conformado pela Lei de Executivos Fiscais (Lei nº 6.830/1980), pelo Código Tributário Nacional (Lei nº 5.172/1966), pelo CPC de aplicação subsidiária à LEF (Lei nº 6.830/1980, art. 1º) e pela Constituição Federal, esta última a conferir validade a todo o sistema de executivos fiscais.

Assimilada a ideia de que os executivos fiscais constituem verdadeira-mente um sistema, é razoável concluir, então, que esse sistema – e não apenas os preceitos da Lei nº 6.830/1980 – se aplica subsidiariamente à execução tra-balhista, por força da previsão do art. 889 da CLT em interpretação extensiva47. Essa conclusão acaba por colocar a relevante questão de saber se, na omissão da Consolidação das Leis do Trabalho sobre a matéria de fraude à execução (CLT, arts. 769 e 889), aplicar-se-ia ao processo do trabalho o regime jurídico especial da fraude à execução fiscal previsto no art. 185 do CTN48.

6 A JURISPRUDÊNCIA DO STJ ACERCA DA APLICAÇÃO DA SÚMULA Nº 375: FRAUDE À EXECUÇÃO FISCAL X FRAUDE À EXECUÇÃO CIVIL. A QUESTÃO DA APLICAÇÃO DO REGIME JURÍDICO ESPECIAL DA FRAUDE À EXECUÇÃO FISCAL PREVISTO NO ARTIGO 185 DO CTN À EXECUÇÃO TRABALHISTA

Em 30.03.2009, o Superior Tribunal de Justiça editou a Súmula nº 375, fixando importante diretriz acerca do instituto da fraude à execução, com o se-

46 Francisco Antonio de Oliveira sugere essa ideia de sistema quando, ao afirmar que a indisponibilidade de bens prevista no § 1º do art. 53 da Lei nº 8.212/1991 não exclui os respectivos bens da execução trabalhista, sustenta que esse preceito da Lei de Custeio da Previdência Social deve ser interpretado “[...] em consonância com o art. 100 da CF, o art. 29 da Lei nº 6.830/1980 (LEF) e os arts. 186 e 187 do CTN, os quais informam sobre a execução trabalhista (art. 889, da CLT)” (Cf. Execução na Justiça do Trabalho. 6. ed. São Paulo: RT, 2008. p. 196 – sem grifo no original).

47 De acordo com o ensinamento de Luís Roberto Barroso, a interpretação extensiva tem cabimento diante de situação em que o legislador disse menos quando queria dizer mais. Nesse caso, a correção da imprecisão linguística do dispositivo legal ocorre, então, mediante a adoção de “[...] uma interpretação extensiva, com o alargamento do sentido da lei, pois este ultrapassa a expressão literal da norma (Lex minus scripsit quam voluit)” (Cf. Interpretação e aplicação da Constituição. 7. ed. São Paulo: Saraiva, 2010. p. 125).

48 Observadas as adaptações necessárias. Entre elas, a distinta definição do marco temporal a partir do qual se configura a fraude à execução trabalhista. O que é objeto do item 8 do presente estudo.

Page 64: Nº 345 – Março 2018 · Revista SÍNTESE Trabalhista e Previdenciária Ano XXIX – nº 345 – MArço 2018 reposItórIo AutorIzAdo de JurIsprudêncIA Supremo Tribunal Federal

64 ...................................................................................................................RST Nº 345 – Março/2018 – PARTE GERAL – DOUTRINA

guinte enunciado: “O reconhecimento da fraude à execução depende do regis-tro da penhora do bem alienado ou da prova da má-fé do terceiro adquirente”.

A diretriz da Súmula nº 375 do STJ é controvertida, na medida em que tutela a posição jurídica do terceiro de boa-fé à custa da posição jurídica do credor-exequente, estimulando – involuntariamente, é certo – indireta descons-tituição do princípio da responsabilidade patrimonial do executado (CPC de 1973, art. 591; CPC de 2015, art. 789). Com isso, estimula o executado a prática da fraude patrimonial, em conduta de autotutela. Conforme foi observado por Manoel Antonio Teixeira Filho em análise crítica à Súmula nº 375 do STJ, “a orientação jurisprudencial cristalizada nessa Súmula estimula as velhacadas do devedor ao tornar mais difícil a configuração do ilícito processual da fraude à execução”49.

Deveras, consoante já foi ponderado alhures, ao executado, em face dos termos da Súmula nº 375/STJ, certamente ocorrerá alienar seus bens antes do registro da penhora. Fará isso intuitivamente para não perder seus bens; alienará seus bens e desviará o dinheiro apurado. Como o terceiro adquirente terá êxito nos embargos de terceiro em face da aplicação da diretriz da Súmula nº 375 do STJ, o executado safar-se-á ileso, sem ter que assumir perante o terceiro adqui-rente a responsabilidade regressiva que decorreria da declaração de ineficácia jurídica da alienação realizada em prejuízo ao credor. A experiência ordinária fartamente revela essa conduta de autotutela dos executados em geral e não apenas dos devedores contumazes, uma vez que desviar imóveis e veículos é muito mais difícil do que desviar o dinheiro apurado com a alienação particular dos bens50. Não há exagero quando Manoel Antonio Teixeira Filho perscruta na Súmula nº 375/STJ estímulo à desonestidade do devedor.

Até o advento do Recurso Especial nº 1.141.990/PR, julgado pela 1ª Se-ção, tendo como Relator o Ministro Luiz Fux, DJe 19.11.2010, a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça oscilava na aplicação da Súmula nº 375 do STJ à execução fiscal.

No julgamento do referido recurso, realizado sob o rito do regime dos recursos repetitivos representativos de controvérsia (CPC de 1973, art. 543-C)51, o Superior Tribunal de Justiça definiu a sua jurisprudência acerca da aplicabi-lidade da Súmula nº 375 do STJ na hipótese de fraude à execução, estabele-

49 Execução no processo do trabalho. 11. ed. São Paulo: LTr, 2013. p. 19. O autor sustenta a incompatibilidade da Súmula nº 375/STJ com o processo do trabalho, ponderando ser da tradição jurídica considerar-se que a fraude à execução caracteriza-se pelos fatos objetivos da alienação do bem e da consequente insolvência do devedor, com presunção de má-fé do devedor. Na sequência, argumenta que o art. 593 do CPC não exige o registro da penhora ou má-fé do terceiro adquirente para a configuração de fraude à execução; e recusa se transferir ao credor o ônus da prova quanto à existência de má-fé do terceiro adquirente, por ser ônus probatório de difícil atendimento.

50 FIOREZE, Ricardo; CLAUS, Ben-Hur Silveira. Execução efetiva: a aplicação da averbação premonitória do artigo 615-A do CPC ao processo do trabalho, de ofício. Justiça do Trabalho, Porto Alegre: HS Editora, n. 366, p. 8, jun. 2014, nota 37.

51 STJ, REsp 1.141.990/PR, 1ª Seção, Rel. Min. Luiz Fux, DJe 19.11.2010.

Page 65: Nº 345 – Março 2018 · Revista SÍNTESE Trabalhista e Previdenciária Ano XXIX – nº 345 – MArço 2018 reposItórIo AutorIzAdo de JurIsprudêncIA Supremo Tribunal Federal

RST Nº 345 – Março/2018 – PARTE GERAL – DOUTRINA .......................................................................................................................65

cendo posicionamento distinto conforme a modalidade de fraude à execução caracterizada no caso concreto, a partir de distinção estabelecida entre fraude à execução fiscal e fraude à execução civil, nos seguintes termos:

a) inaplicabilidade da Súmula nº 375 do STJ à execução fiscal;

b) aplicabilidade da Súmula nº 375 do STJ à execução civil.

No item 5 da ementa do acórdão proferido no julgamento do referido REsp 1.141.990/PR, revelou-se a distinção de tratamento conferido à fraude à execução fiscal, na comparação com a fraude à execução civil, na diferença de qualidade do interesse jurídico tutelado em cada uma das modalidades de fraude:

5. A diferença de tratamento entre a fraude civil e a fraude fiscal justifica-se pelo fato de que, na primeira hipótese, afronta-se interesse privado, ao passo que na segunda, interesse público, porquanto o recolhimento de tributos serve à satisfa-ção das necessidades coletivas.

A distinção estabelecida pelo STJ partiu da premissa de que na fraude à execução fiscal há afronta a interesse público, que justifica sujeitá-la ao regime jurídico especial do art. 185 do CTN52, sendo irrelevante, então, a boa-fé do ter-ceiro adquirente. Daí a conclusão de ser inaplicável a Súmula nº 375/STJ à exe-cução fiscal. Nesse caso, subsistirá a penhora do bem alienado e os eventuais embargos do terceiro adquirente serão rejeitados, prosseguindo-se a execução fiscal com o leilão do bem e o pagamento do credor tributário.

Já no caso de fraude à execução civil, em que a execução se sujeita ao regime jurídico geral do art. 593, II, do CPC de 197353, o STJ considerou exis-tente afronta a interesse privado, fundamento pelo qual concluiu não haver presunção absoluta de fraude, situação em que a boa-fé do terceiro adquirente descaracteriza o ilícito. Daí a conclusão de ser aplicável a Súmula nº 375/STJ à execução civil. Nesse caso, não subsistirá a penhora do bem alienado e os eventuais embargos do terceiro adquirente serão acolhidos, com livramento do bem constrito.

Pode-se argumentar que a parte final Súmula nº 375/STJ abre a possibili-dade de que a penhora venha a subsistir e de que os embargos de terceiros ve-nham a ser rejeitados caso o credor prejudicado logre comprovar que o terceiro adquirente tinha conhecimento da existência da demanda quando da aquisição do bem do executado54. De fato, a parte final da súmula – “[...] ou da prova da má-fé do terceiro adquirente” – opera como uma espécie de válvula de escape

52 No item 1 da ementa, o STJ começa por afirmar que a lei especial prevalece sobre a lei geral, em uma referência à prevalência do regime jurídico especial do art. 185 do CTn sobre regime jurídico geral do art. 593, II, do CPC, no que respeita à regência jurídica da fraude à execução.

53 No CPC de 2015, o regime geral de fraude à execução está previsto no art. 792, IV.54 Na inteligência da Súmula nº 375/STJ, reputa-se verificada a má-fé do terceiro adquirente quando comprovado

que esse tinha ciência da existência da demanda contra o executado à época da aquisição do bem.

Page 66: Nº 345 – Março 2018 · Revista SÍNTESE Trabalhista e Previdenciária Ano XXIX – nº 345 – MArço 2018 reposItórIo AutorIzAdo de JurIsprudêncIA Supremo Tribunal Federal

66 ...................................................................................................................RST Nº 345 – Março/2018 – PARTE GERAL – DOUTRINA

à restrição que a Súmula nº 375/STJ impõe à esfera jurídica do credor-exequente civil. Entretanto, o ônus da prova ali atribuído ao credor-exequente é de tão difí-cil atendimento que, se não evoca a figura da chamada prova diabólica, remete o intérprete a perguntar-se sobre a razoabilidade da atribuição desse ônus de prova ao credor em sistema processual que reputa nula a convenção que dis-tribui de maneira diversa o ônus da prova quando tornar excessivamente difícil a uma parte o exercício do direito (CPC de 1973, art. 333, parágrafo único, II; CPC de 2015, art. 373, § 3º, II).

Daí a importância – no combate à fraude de execução – do resgate do instituto da hipoteca judiciária, mediante subsidiária aplicação de ofício des-sa medida legal pelo juiz do trabalho na sentença55, orientação assumida por Manoel Antonio Teixeira Filho na 11ª edição de sua obra clássica Execução no processo do trabalho, a primeira edição posterior ao advento da Súmula nº 375 do STJ56. Conforme interpretação extensiva do instituto, a hipoteca judiciária poderá recair, inclusive, sobre bens móveis57. Também de ofício, o magistrado poderá se utilizar de outras duas medidas legais correlatas que ingressam sub-sidiariamente no processo do trabalho pelas portas que lhes abrem os arts. 769 e 889 da CLT:

a) fazer registrar averbação premonitória da existência de ação traba-lhista contra o demandado nos órgãos de registro de propriedade de bens (CPC de 1973, art. 615-A; CPC de 2015, art. 828)58;

b) fazer registrar ordem de indisponibilidade de bens do executado nos órgãos de registro de propriedade de bens (CTN, art. 185-A)59.

A orientação adotada no julgamento realizado sob o rito do regime dos recursos repetitivos representativos de controvérsia no REsp 1.141.990/PR uni-formizou a jurisprudência do STJ na matéria, conforme exemplificam os julga-mentos posteriores realizados nos seguintes processos: AgRg-REsp 241.691/PE, 2ª Turma, Rel. Min. Humberto Martins, publicado em 04.12.2012; REsp 1.347.022/PE, 2ª Turma, Rel. Min. Castro Meira, publicado em 10.04.2013; AgRg-REsp 289.499/DF, 1ª Turma, Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, pu-

55 CLAUS, Ben-Hur Silveira. Hipoteca judiciária: a (re)descoberta do instituto diante da Súmula nº 375 do STJ – Execução efetiva e atualidade da hipoteca judiciária. Revista do Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região, Porto Alegre: HS Editora, n. 41, p. 45-60, 2013.

56 Execução no processo do trabalho. 11. ed. São Paulo: LTr, 2013. p. 201/2: “Considerando que o nosso entendimento quanto à inaplicabilidade da Súmula nº 375, do STJ, ao processo do trabalho possa não vir a ser aceito, seria o caso de valorizar-se a hipoteca judiciária de que o trata o art. 466, do CPC”.

57 BORGES, Aline Veiga; CLAUS, Ben-Hur Silveira. Hipoteca judiciária sobre bens não elencados no artigo 1.473 do Código Civil – A efetividade da jurisdição como horizonte hermenêutico. Suplemento Trabalhista, São Paulo: LTr, n. 59, p. 267-72, 2014.

58 FIOREZE, Ricardo; CLAUS, Ben-Hur Silveira. Execução efetiva: a aplicação da averbação premonitória do artigo 615-A do CPC ao processo do trabalho, de ofício. Justiça do Trabalho, Porto Alegre: HS Editora, n. 366, p. 7-29, jun. 2014.

59 CLAUS, Ben-Hur Silveira. A aplicação da medida legal de indisponibilidade de bens prevista no artigo 185-A do CTN à execução trabalhista – Uma boa prática a serviço do resgate da responsabilidade patrimonial futura. Revista do TRT da 8ª Região, n. 92, 2014, p. 111-18.

Page 67: Nº 345 – Março 2018 · Revista SÍNTESE Trabalhista e Previdenciária Ano XXIX – nº 345 – MArço 2018 reposItórIo AutorIzAdo de JurIsprudêncIA Supremo Tribunal Federal

RST Nº 345 – Março/2018 – PARTE GERAL – DOUTRINA .......................................................................................................................67

blicado em 24.04.2013; AgRg-REsp 212.974/AL, 2ª Turma, Relª Min. Eliana Calmon, publicado em 29.11.2013. Essa orientação consolidou-se em defi-nitivo, na medida em que o Supremo Tribunal Federal nega seguimento ao respectivo recurso extraordinário: o exame da matéria de fraude à execução implicaria análise de legislação infraconstitucional (CPC e CTN)60, não se con-figurando nessa matéria a contrariedade à Constituição que o art. 102, III, a, da CF estabelece como pressuposto ao conhecimento de recurso extraordinário (STF, AI 712245/RS, Relª Min. Ellen Gracie, publicado em 27.03.2010; STF, ARE 793809/PE, Rel. Min. Roberto Barroso, publicado em 05.09.2014).

Analisada a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça acerca da apli-cabilidade da Súmula nº 375 e a distinção estabelecida entre fraude à execu-ção fiscal e fraude à execução civil, cumpre saber se é aplicável ao processo do trabalho o regime jurídico especial da fraude à execução fiscal previsto no art. 185 do CTN.

É positiva nossa resposta, tendo por fundamento a aplicação analógi-ca61 da orientação jurisprudencial adotada no precitado acórdão STJ, REsp 1.141.990/PR. Concorre, ainda, para tal aplicação analógica a inflexão da inter-pretação sistemática do art. 186 do CTN que se impõe ao intérprete nesse tema, submetido que está ao cânone hermenêutico da lógica da não contradição com o qual o método sistemático de interpretação – à delicadeza de sua “prioridade lógica com respeito a outros critérios interpretativos” (Pietro Merola Chiercia)62 – se impõe à racionalidade jurídica.

A recusa a essa conclusão significaria dar ao crédito tributário tutela ju-rídica superior àquela assegurada ao crédito trabalhista. Com efeito, recusar essa conclusão importaria indireta – mas inequívoca – preterição do crédito trabalhista pelo crédito tributário, em contradição lógico-sistemática à previsão do art. 186 do Código Tributário Nacional, preceito de direito material cujo comando acabaria por ser obliquamente violado. A preterição do crédito tra-balhista pelo crédito tributário expressar-se-ia no grau inferior de tutela jurídica que então seria atribuído ao crédito trabalhista por força de seu enquadramento no regime jurídico geral de fraude à execução previsto no art. 593, II, do CPC de 1973 (CPC de 2015, art. 792, IV), regime jurídico no qual a jurisprudência do STJ exclui a presunção absoluta de fraude, submetendo o credor civil à restritiva diretriz da Súmula nº 375 do STJ.

60 Cf. BEBBER, Júlio César. Recursos no processo do trabalho. 2. ed. São Paulo: LTr, 2009. p. 344.61 Ovídio Baptista da Silva, assíduo leitor de Karl Engisch e Arthur Kaufmann, rompe os grilhões que negam

aos juristas o recurso à analogia: “Ao socorrer-nos, na exposição precedente, das lições dos grandes filósofos do Direito contemporâneo, tivemos a intenção de mostrar que, como diz Kaufmann, a analogia não deve ser utilizada apenas como um instrumento auxiliar, de que o intérprete possa lançar mão, para a eliminação das lacunas. Ao contrário, o raciocínio jurídico será sempre analógico, por isso que as hipóteses singulares nunca serão entre si idênticas, mas apenas ‘afins na essência’” (Processo e ideologia: o paradigma racionalista. Rio de Janeiro: Forense, 2004. p. 285).

62 L’interpretazione sistemática della Constituzione. Padova: Cedam, 1978. p. 243 e s.

Page 68: Nº 345 – Março 2018 · Revista SÍNTESE Trabalhista e Previdenciária Ano XXIX – nº 345 – MArço 2018 reposItórIo AutorIzAdo de JurIsprudêncIA Supremo Tribunal Federal

68 ...................................................................................................................RST Nº 345 – Março/2018 – PARTE GERAL – DOUTRINA

A questão faz lembrar a doutrina de Francisco Antonio de Oliveira acerca de dois problemas jurídicos correlatos, cuja solução o jurista constrói pela siste-mática administração do mesmo preceito legal. O primeiro problema jurídico é saber se é lícito ao credor hipotecário obter a adjudicação de bem quando con-corre com credor trabalhista. Na solução desse problema jurídico, é o art. 186 do CTN que o jurista invoca para fundamentar o entendimento de que não é dado ao credor hipotecário obter a adjudicação quando há disputa com credor tra-balhista63. Ao recusar juridicidade à pretensão do credor hipotecário, Francisco Antonio de Oliveira obtempera “[...] que a tanto se opõe a preferência do crédi-to trabalhista (art. 186, CTN)”, explicitando sua conclusão nestes termos:

A permissão legal (art. 1.483, parágrafo único) somente terá lugar em se cuidan-do de execução que não envolva créditos preferenciais (acidentário – art. 83, I, Lei nº 11.101/2005 (LF) –, trabalhista e executivos fiscais), pena de frustrar-se a execução.64

O segundo problema consiste em definir o alcance da medida legal de indisponibilidade de bens prevista na Lei de Custeio da Previdência Social pe-rante o credor trabalhista. Quando afirma que os bens declarados indisponíveis pelo § 1º do art. 53 da Lei nº 8.212/1991 não estão excluídos da execução tra-balhista, a doutrina de Francisco Antonio de Oliveira está fundada no método sistemático de interpretação do ordenamento jurídico, porquanto o jurista su-bordina o preceito da Lei de Custeio da Previdência Social ao comando superior do art. 186 do CTN. Outrossim, alarga a interpretação sistemática à considera-ção do art. 100, § 1º, da Constituição Federal, trazendo à ponderação a natu-reza alimentícia que a própria Constituição reconhece ao crédito trabalhista.

Com efeito, caso a aplicação da norma do § 1º do art. 53 da Lei nº 8.212/1991 pudesse excluir – por força de sua interpretação literal e isolada – da execução trabalhista os bens tornados indisponíveis em execução previ-denciária, estaríamos, então, diante de contradição lógico-sistemática caracte-rizada pela indireta preterição do privilégio do crédito trabalhista em favor do crédito previdenciário, com subversão à ordem preferencial dos créditos estabe-lecida no Direito brasileiro (CC, arts. 957, 958 e 961; CTN, art. 186).

Essa contradição lógico-sistemática instalaria uma crise no ordenamento jurídico, cuja superação somente poderia ser alcançada mediante o restabele-cimento da coerência interna do conjunto normativo ministrada pelo método sistemático de interpretação do ordenamento jurídico, de modo a, harmonizan-do as partes ao todo, restaurar a unidade do sistema jurídico mediante o resgate de sua unitária estrutura hierárquica. A didática lição do processualista paulista justifica a reprodução do argumento65:

63 Na verdade, quando há disputa com credor dotado de privilégio superior ao credor hipotecário.64 Execução na Justiça do Trabalho. 6. ed. São Paulo: RT, 2008. p. 163.65 Ibidem, p. 196.

Page 69: Nº 345 – Março 2018 · Revista SÍNTESE Trabalhista e Previdenciária Ano XXIX – nº 345 – MArço 2018 reposItórIo AutorIzAdo de JurIsprudêncIA Supremo Tribunal Federal

RST Nº 345 – Março/2018 – PARTE GERAL – DOUTRINA .......................................................................................................................69

Dispõe a Lei nº 8.212, de 24.07.1991, art. 53, que, “na execução judicial da dívida ativa da União, suas autarquias e fundações públicas, será facultado ao exeqüente indicar bens à penhora, a qual será efetivada concomitantemente com a citação inicial do devedor. § 1º Os bens penhorados nos termos deste artigo fi-cam desde logo indisponíveis”. Evidentemente, referidos preceitos deverão ser in-terpretados em consonância com o art. 100 da CF, o art. 29 da Lei nº 6.830/1980 (LEF) e os arts. 186 e 187 do CTN, os quais informam sobre a execução trabalhista (art. 889, da CLT). Vale dizer, a “indisponibilidade” de que fala o § 1º retrocitado diz respeito àqueles créditos cuja preferência não esteja acima do crédito tribu-tário. [...] Mirando-se por outra ótica, tem-se que a “indisponibilidade” de que fala a lei diz respeito ao proprietário. Os bens declarados indisponíveis pela Lei nº 8.212/1991 não estão e não poderiam estar alijados da execução trabalhista. Essa não foi a mens legislatoris e não poderia sê-lo em face do superprivilégio e da natureza jurídica do crédito trabalhista.

Com efeito, somente uma resposta positiva à pergunta acerca da apli-cabilidade do regime jurídico especial da fraude à execução fiscal previsto no art. 185 do CTN à execução trabalhista pode conferir sentido à seguinte passa-gem do item 4 da Exposição de Motivos nº 223 da Lei nº 6.830/1980, na qual o legislador dos executivos fiscais, logo após sublinhar o predomínio de interesse público na realização do crédito tributário, afirma que “[...] nenhum outro cré-dito deve ter, em sua execução judicial, preferência, garantia ou rito processual que supere os do crédito público, à exceção de alguns créditos trabalhistas” (grifamos).

À construção sistemática semelhante seria conduzido o Superior Tribunal de Justiça quando defrontado com o desafio hermenêutico de superar a aparen-te antinomia existente entre o art. 185-A do CTN (indisponibilidade de bens e direitos do devedor executado) e os arts. 655 e 655-A do CPC de 1973 (penhora de dinheiro em depósito ou aplicação financeira). Enquanto ao credor comum se assegura a tutela jurídica da penhora eletrônica de depósitos ou aplicações fi-nanceiras independentemente do exaurimento das diligências extrajudiciais por parte do exequente (CPC de 1973, arts. 655 e 655-A), ao credor tributário não se assegurava essa tutela jurídica desde logo, exigindo-se-lhe o exaurimento de tais diligências para só depois poder chegar à penhora eletrônica de numerário. Isso nada obstante o privilégio legal que o ordenamento jurídico confere ao crédito tributário no art. 186 do CTN.

Diante da necessidade de preservar a coerência do sistema normativo, o STJ recorreu à aplicação da teoria do diálogo das fontes, que visa a harmo-nizar preceitos de diplomas legais distintos, para concluir que a interpretação sistemática do art. 185-A do CTN, com os arts. 11, da Lei nº 6.830/1980 e 655 e 655-A do CPC de 1973, autoriza a penhora eletrônica de depósitos ou aplica-ções financeiras independentemente do exaurimento das diligências extrajudi-ciais por parte do credor fiscal, porquanto se faltaria à coerência sistemática ao dar ao credor comum tutela jurídica superior àquela dada a credor privilegiado por norma de direito material (CTN, art. 186).

Page 70: Nº 345 – Março 2018 · Revista SÍNTESE Trabalhista e Previdenciária Ano XXIX – nº 345 – MArço 2018 reposItórIo AutorIzAdo de JurIsprudêncIA Supremo Tribunal Federal

70 ...................................................................................................................RST Nº 345 – Março/2018 – PARTE GERAL – DOUTRINA

A reprodução da ementa do acórdão justifica-se em razão da consistên-cia de sua fundamentação e visa a permitir ao leitor avaliar se de fato há seme-lhança entre a construção sistemática proposta no presente estudo e a constru-ção sistemática adotada no referido julgamento do Superior Tribunal de Justiça. Eis a ementa do acórdão:

A antinomia aparente entre o art. 185-A do CTN (que cuida da decretação da indisponibilidade de bens e direitos do devedor executado) e os arts. 655 e 655-A do CPC (penhora de dinheiro em depósito ou aplicação financeira) é superada com a aplicação da teoria pós-moderna do diálogo das fontes, idealizada pelo alemão Erik Jayme e aplicada, no Brasil, pela primeira vez, por Cláudia Lima Marques, a fim de preservar a coexistência entre o Código de Defesa do Consumi-dor e o novo Código Civil. Com efeito, consoante a teoria do diálogo das fontes, as normas mais benéficas supervenientes preferem à norma especial (concebida para conferir tratamento privilegiado a determinada categoria), a fim de preser-var a coerência do sistema normativo. Deveras, a ratio essendi do art. 185-A, do CTN, é erigir hipótese de privilégio do crédito tributário, não se revelando coerente “colocar o credor privado em situação melhor que o credor público, principalmente no que diz respeito à cobrança do crédito tributário, que deriva do dever fundamental de pagar tributos (artigos 145 e seguintes da Constituição Federal de 1988)” (REsp 1.074.228/MG, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, 2ª Turma, J. 07.10.2008, DJe 05.11.2008). Assim, a interpretação sistemática do art. 185-A do CTN, com os arts. 11, da Lei nº 6.830/1980, e 655 e 655-A do CPC, autoriza a penhora eletrônica de depósitos ou aplicações financeiras indepen-dentemente do exaurimento das diligências extrajudiciais por parte do exequen-te. (STJ, REsp 1184765/PA, 1ª Seção, Rel. Min. Luiz Fux, J. 03.12.2010)

As razões expostas conduzem à conclusão de que relegar a fraude à exe-cução trabalhista ao regime jurídico geral do art. 593, II, do CPC de 1973 (CPC de 2015, art. 792, IV), enquadrando-a na modalidade geral de fraude à exe-cução civil, significaria negar a primazia do crédito trabalhista sobre o crédito fiscal prevista no art. 186 do CTN. Para restabelecer a primazia do crédito tra-balhista sobre o crédito fiscal também no relevante tema da fraude à execução é necessário estender à execução trabalhista o regime jurídico especial da fraude à execução fiscal previsto no art. 185 do CTN mediante interpretação sistemáti-ca dos arts. 889 da CLT e 186 do CTN – a interpretação sistemática como ponte hermenêutica à assimilação produtiva do regime jurídico especial da fraude à execução prevista no art. 185 do CTN à execução trabalhista.

7 A FRAUDE À EXECUÇÃO NO NOVO CPC (E A NECESSIDADE DE REVISÃO DA SÚMULA Nº 375/STJ)

O novo Código de Processo Civil tratou da fraude à execução no art. 792 e exigirá a revisão da Súmula nº 375 do STJ, uma vez que disse textualmente o que parte da doutrina adverte há tempo: a fraude à execução pela alienação de bem no curso de demanda capaz de reduzir o alienante à insolvência (CPC de 2015, art. 792, IV) não se confunde com a fraude à execução pela alienação

Page 71: Nº 345 – Março 2018 · Revista SÍNTESE Trabalhista e Previdenciária Ano XXIX – nº 345 – MArço 2018 reposItórIo AutorIzAdo de JurIsprudêncIA Supremo Tribunal Federal

RST Nº 345 – Março/2018 – PARTE GERAL – DOUTRINA .......................................................................................................................71

de bem quando tiver sido averbado, em seu registro, ato de constrição judicial (CPC de 2015, art. 792, III)66.

A fraude à execução pela alienação de bem no curso de demanda capaz de reduzir o alienante à insolvência tem como elementos caracterizadores: a) a litispendência (demanda pendente); b) a alienação no curso da demanda; e c) a redução do alienante à insolvência. Não cogita, portanto, do consilium fraudis, uma vez que sanciona o intento de subtração ao poder jurisdicional67. Como dizia Amílcar de Castro,

a responsabilidade processual é sujeição inelutável ao poder do Estado [...]. E por isso mesmo devem ser tratadas com maior severidade as manobras praticadas pelo devedor, para fugir daquela responsabilidade, isto é, para suprimir efetiva-mente, ou sabendo que praticamente suprime, os efeitos de sua sujeição ao poder do Estado.68

A fraude à execução pela alienação de bem quando tiver sido averbado, em seu registro, ato de constrição judicial (CPC de 2015, art. 792, III) tem como elementos caracterizadores: a) a litispendência (demanda pendente); b) a cons-trição judicial de bem; c) a averbação da constrição judicial junto ao registro do bem; e d) a alienação no curso da demanda. Independe, portanto, da redução do alienante à insolvência, uma vez que sanciona a afronta à individualização do bem e sua separação do patrimônio pelo ato de constrição, e pressupõe o consilium fraudis, diante da averbação do ato de constrição no registro. Se o bem se encontra sob o império da apreensão judicial, “não pode sofrer qualquer limitação decorrente de ato voluntário do devedor e de outrem”69. Por isso, o ato de constrição que grava o bem o acompanha, “perseguindo-o no poder de quem quer que o detenha, mesmo que o alienante seja um devedor solvente”70.

66 Da distinção entre fraude à execução prevista no inciso II do art. 593 do CPC de 1973 e alienação de bem penhorado “resultam importantes consequências: se o devedor for solvente, a alienação de seus bens é válida e eficaz a não ser que (a) se trate de bem já penhorado ou, por qualquer outra forma, submetido a constrição judicial, e (b) que o terceiro adquirente tenha ciência – pelo registro ou por outro meio – da existência daquela constrição; mas, se o devedor for insolvente, a alienação será ineficaz em face da execução, independentemente de constrição judicial do bem ou da cientificação formal da litispendência e da insolvência ao terceiro adquirente” (ZAVASKI, Teori Albino. Comentários ao Código de Processo Civil. São Paulo: RT, v. 8, 2000. p. 286).

67 A fraude de execução caracteriza “ato de rebeldia à autoridade estatal exercida pelo juiz no processo”, uma vez que “alienar bens na pendência deste e reduzir-se à insolvência significaria tornar inútil o exercício da jurisdição e impossível a imposição do poder sobre o patrimônio do devedor” (DINAMARCO, Cândido Rangel. Execução civil. 3. ed. São Paulo: Malheiros, 1993. p. 275). A alienação e a oneração (CPC, art. 593) “dos bens do devedor vem constituir verdadeiro atentado contra o eficaz desenvolvimento da função jurisdicional já em curso, porque subtrai o objeto sobre o qual a execução deverá recair” (LIEBMAN, Enrico Tullio. Processo de execução. 4. ed. São Paulo: Saraiva, 1980. p. 108).

68 CASTRO, Amílcar de. Comentários ao Código de Processo Civil. 3. ed. São Paulo: RT, v. VIII, 1983. p. 84.69 GRECO, Leonardo. O processo de execução. Rio de Janeiro: Renovar, v. 2, 2001. p. 46.70 THEODORO JÚNIOR, Humberto. Curso de direito processual civil. 14. ed. Rio de Janeiro: Forense, v. II,

1995. p. 111. Os atos executórios continuam a incidir sobre o bem em razão de um vínculo que o prende “ao processo, e que pré-existe à aquisição do terceiro. A propriedade deste já nasceu limitada” (GRECO, Leonardo. O processo de execução. Rio de Janeiro: Renovar, v. 2, 2001. p. 46).

Page 72: Nº 345 – Março 2018 · Revista SÍNTESE Trabalhista e Previdenciária Ano XXIX – nº 345 – MArço 2018 reposItórIo AutorIzAdo de JurIsprudêncIA Supremo Tribunal Federal

72 ...................................................................................................................RST Nº 345 – Março/2018 – PARTE GERAL – DOUTRINA

8 O MARCO TEMPORAL A PARTIR DO QUAL A ALIENAÇÃO FAZ PRESUMIR FRAUDE À EXECUÇÃO TRABALHISTA: AJUIZAMENTO X CITAÇÃO

Diversamente do que ocorre no Direito Tributário atual71, em que a pre-sunção absoluta de fraude à execução fiscal configura-se quando o crédito tri-butário já se encontrava inscrito em Dívida Ativa à época da alienação do bem, no Direito do Trabalho não há uma fase administrativa de pré-constituição do crédito trabalhista; há, apenas, a fase judicial, que tem início com a propositura da ação reclamatória trabalhista e prossegue com a citação do reclamado e demais atos processuais.

No Direito Tributário, há um livro de lançamento da Dívida Ativa, regis-tro público que permite aos interessados livre consulta para saber se o alienante é sujeito passivo de obrigação tributária pendente. A referência doutrinária é do tributarista Paulo de Barros Carvalho72:

[...] inscrito o débito tributário pela Fazenda Pública, no livro de registro da dí-vida ativa, fica estabelecido o marco temporal, após o que qualquer alienação de bens ou rendas, ou seu começo, pelo sujeito devedor, será presumida como fraudulenta.

No Direito do Trabalho, a ausência de uma fase administrativa de pré--constituição do crédito trabalhista mediante registro público acaba por con-duzir o operador jurídico a cogitar de dois momentos possíveis para adotar-se como marco temporal a partir do qual há presunção de fraude na alienação do bem pelo reclamado: 1) o ajuizamento da demanda; 2) a citação do devedor.

No âmbito do processo civil, a doutrina inclina-se a identificar na cita-ção do réu o marco temporal definidor da fraude à execução. Luiz Guilherme Marinoni e Sérgio Cruz Arenhart ponderam que, embora toda ação se considere proposta no momento em que é distribuída (art. 263 do CPC de 1973), a ca-racterização da fraude à execução depende da ciência do réu da existência da demanda. “Assim – argumentam Marinoni e Arenhart – a alienação ou onera-ção de bens é considerada em fraude à execução apenas após a citação válida (art. 219 do CPC de 1973)”73.

No âmbito do processo do trabalho, a elaboração teórica tem se inclina-do a identificar tal marco temporal na data do ajuizamento da demanda. Isso porque o art. 593, II, do CPC de 1973 (CPC de 2015, art. 792, IV) exige apenas a existência de uma ação pendente (corria contra o devedor demanda), não fa-zendo referência ao fato de que nela o réu já deva ter sido citado. Tem-se ação

71 Desde o advento da Lei Complementar nº 118, de 09.06.2005.72 Curso de direito tributário. 19. ed. São Paulo: Saraiva, 2007. p. 558.73 Curso de processo civil – Execução. 6. ed. São Paulo: Forense, v. 3, 2014. p. 267.

Page 73: Nº 345 – Março 2018 · Revista SÍNTESE Trabalhista e Previdenciária Ano XXIX – nº 345 – MArço 2018 reposItórIo AutorIzAdo de JurIsprudêncIA Supremo Tribunal Federal

RST Nº 345 – Março/2018 – PARTE GERAL – DOUTRINA .......................................................................................................................73

pendente desde o momento em que ela é ajuizada pelo autor74 (ou exequente)75, nada obstante a tríplice angularização venha a ocorrer somente em momento posterior, com a citação do réu (ou executado)76. Portanto, se a alienação ocor-reu posteriormente ao ajuizamento da ação, caracterizada estará a fraude de execução77. A distribuição da ação

é o quanto basta para o reconhecimento da configuração da fraude de execução, pouco importando que a própria citação do devedor e a própria penhora do bem houvessem ocorrido após a alienação, que, na linguagem desenganada da lei, foi efetuada quando já em curso demanda capaz de reduzir o executado à insolvência.78

A opinião de Manoel Antonio Teixeira Filho em favor da adoção da data do ajuizamento da demanda como marco temporal a partir do qual se presume a fraude à execução do reclamado tem por fundamento o fato de que a doutrina justrabalhista não exige ato citatório para considerar interrompida a prescrição e estabelecida a prevenção, reputando suficiente, para tanto, o ajuizamento da demanda79. O autor argumenta que a exigência de citação poderia permitir que o devedor se beneficiasse da própria torpeza, exemplificando com situação em que o devedor, antes da citação, viesse a alienar todos os bens após dispensar os empregados, frustrando a execução dos respectivos créditos trabalhistas.

Diante da omissão da CLT e da LEF sobre a matéria, parece razoável ado-tar a data do ajuizamento da demanda como o marco temporal a partir do qual se tem por caracterizado o ilícito de fraude à execução trabalhista.

9 ACÓRDÃOS PIONEIROS PRENUNCIAM DEBATE NA JURISPRUDÊNCIA

Em 2016, o Enunciado nº 74 do Fórum Nacional de Processo do Traba-lho, realizado em Curitiba/PR, nos dias 4 e 5 de março de 2016, aprovado por unanimidade, sintetizou a tese do presente artigo, tese que já fora acolhida em dois pioneiros acórdãos proferidos pelo Tribunal Regional do Trabalho da 12ª Região (SC) sobre o tema.

74 CPC, art. 263. Considera-se proposta a ação, tanto que a petição inicial seja despachada pelo juiz, ou simplesmente distribuída, onde houver mais de uma vara. A propositura da ação, todavia, só produz, quanto ao réu, os efeitos mencionados no art. 219 depois que for validamente citado.

75 CPC, art. 617. A propositura da execução, deferida pelo juiz, interrompe a prescrição, mas a citação do devedor deve ser feita com observância do disposto no art. 219.

76 “FRAUDE À EXECUÇÃO – Débito fiscal. Caracterização. Transferência de uso de linha telefônica objeto de penhora. Antecedência de três meses depois da propositura da execução fiscal. Fraude que se caracteriza com a propositura da ação. Irrelevância do devedor ter ou não tomado ciência da citação. Aplicação dos arts. 185 do CTN e 593 do CPC. Recurso não provido.” (TJSP, Apelação Cível nº 228.959-2, Rel. Des. Ricardo Brancato)

77 Nesse sentido: Alcides de Mendonça Lima (Comentários ao Código de Processo Civil. 6. ed. Rio de Janeiro: Forense, v VI, p. 452), Belmiro Pedro Welter (Fraude de execução. Porto Alegre: Síntese, 1997. p. 37), Ronaldo Brêtas de Carvalho Dias (Fraude à execução. Digesto de processo. Rio de Janeiro: Forense, v. 3, 1985. p. 6) e Maria Berenice Dias (Fraude à execução. Revista Ajuris, 50/75).

78 CAHALI, Yussef Said. Fraudes contra credores. São Paulo: RT, 1989. p. 464.79 Execução no processo do trabalho. 11. ed. São Paulo: LTr, 2013. p. 204.

Page 74: Nº 345 – Março 2018 · Revista SÍNTESE Trabalhista e Previdenciária Ano XXIX – nº 345 – MArço 2018 reposItórIo AutorIzAdo de JurIsprudêncIA Supremo Tribunal Federal

74 ...................................................................................................................RST Nº 345 – Março/2018 – PARTE GERAL – DOUTRINA

Apresentado por iniciativa do Magistrado Reinaldo Branco de Moraes, o Enunciado nº 74 do Fórum Nacional de Processo do Trabalho foi aprovado com a seguinte redação:

CLT, ART. 889; CTN, ART. 185 – NCPC, ART. 792, IV; CPC/1973, ART. 593, II – FRAUDE À EXECUÇÃO – REGIME DO ART. 185 DO CTN – INAPLICABILIDADE DO REGIME DO ART. 792 DO NCPC – Nas execuções trabalhistas, aplica-se o regime especial da fraude à execução fiscal previsto no art. 185 do CTN e não o regime geral da fraude à execução previsto no art. 792, IV, do NCPC, tendo como marco inicial a notificação válida do executado.

Nos mencionados dois pioneiros acórdãos proferidos pelo TRT da 12ª Região, a tese foi acolhida. O mesmo Magistrado que apresentaria a proposta do Enunciado nº 74 em 2016 já atuará como Relator nos dois agravos de peti-ção supramencionados, julgamentos ocorridos em 2015, em Câmaras distintas, cujas ementas são a seguir reproduzidas:

FRAUDE À EXECUÇÃO – DIFERENÇA ENTRE A APLICAÇÃO DESSE INSTITUTO PROCESSUAL QUANDO CARACTERIZADA NA EXECUÇÃO CIVIL X EXECU-ÇÃO FISCAL – APLICAÇÃO DO REGIME ESPECIAL REGULADOR DO CRÉDITO FISCAL AO CRÉDITO TRABALHISTA PARA MANUTENÇÃO DA PREFERÊNCIA DESTE ÀQUELE – MARCO INICIAL DA FRAUDE À EXECUÇÃO TRABALHISTA

Até o advento do julgamento do Recurso Especial nº 1.141.990/PR, Relator Mi-nistro Luiz Fux, DJe de 19.11.2010, a jurisprudência do STJ oscilava na aplicação da Súmula nº 375 à execução fiscal. Nesse julgamento ficou definida a diferen-ça de tratamento conferido à fraude à execução fiscal em comparação à fraude à execução civil. Nesta há afronta ao interesse privado e naquela ao interesse público, daí por que, na fraude à execução fiscal, impõe-se sujeitá-la ao regime jurídico especial do art. 185 do CTN e, por consequência, irrelevante a boa-fé do terceiro adquirente (presunção absoluta de fraude à execução). Por isso, a partir de então, passou-se a entender pela inaplicabilidade nas execuções fiscais da Súmula nº 375 do STJ devendo ser mantida penhora efetuada, com a rejeição de eventuais embargos de terceiro pelo adquirente, prosseguindo a execução, independentemente da existência ou não de boa-fé do comprador. Idêntica in-terpretação deve ser aplicada no reconhecimento de fraude à execução na seara trabalhista a fim de que ao crédito trabalhista seja garantido o mesmo regime especial previsto ao fiscal, sob pena de negar a preferência daquele a este, in-clusive como forma de manter hígido o indispensável diálogo das fontes e a interpretação sistemática (CPC/1973, art. 593, III, NCPC – Lei nº 13.105/2015, art. 792, V, CLT, art. 889 e CTN, arts. 185 e 186), além da necessária coerência do conjunto de normas reguladoras do mesmo instituto processual (fraude à exe-cução) a credores com preferência especial. A aplicação do instituto processual da fraude à execução nas causas trabalhistas, apenas com base no art. 593, II, do CPC ou art. 792, IV, do NCPC (que conduz à presunção relativa daquela fraude por força do entendimento objeto da Súmula nº 375 do STJ – consoante entendimento hodierno –, colocaria o crédito trabalhista em situação inferior ao tributário, pois a este a lei prevê presunção absoluta da prefalada fraude desde momento anterior à existência da execução fiscal (CTN, art. 185). Equivale dizer:

Page 75: Nº 345 – Março 2018 · Revista SÍNTESE Trabalhista e Previdenciária Ano XXIX – nº 345 – MArço 2018 reposItórIo AutorIzAdo de JurIsprudêncIA Supremo Tribunal Federal

RST Nº 345 – Março/2018 – PARTE GERAL – DOUTRINA .......................................................................................................................75

o credor fiscal receberá seu crédito (por força de presunção absoluta de fraude) e o credor trabalhista estaria compelido a provar a má-fé do adquirente (presunção relativa de fraude) e, pois, sujeitando-se aos mais diversos expedientes normal-mente utilizados pelos envolvidos no negócio jurídico (comprador e vendedor) a fim de obstar a efetividade da execução trabalhista, em completa subversão da preferência do crédito trabalhista sobre o fiscal (CTN, art. 186). O marco inicial da fraude à execução trabalhista é o ajuizamento da ação – fase de conhecimen-to (inteligência CPC/1973, art. 263 e NCPC, art. 312), até pela inexistência da constituição do crédito trabalhista em fase anterior à judicial, como ocorre com o crédito tributário. (TRT 12ª R., AP 0010026-38.2015.5.12.0013, 1ª Câmara, Rel. Reinaldo Branco de Moraes, Data de Assinatura: 18.09.2015)

FRAUDE À EXECUÇÃO – DIFERENÇA ENTRE A APLICAÇÃO DESSE INSTITUTO PROCESSUAL QUANDO CARACTERIZADA NA EXECUÇÃO CIVIL X EXECU-ÇÃO FISCAL – APLICAÇÃO DO REGIME ESPECIAL REGULADOR DO CRÉDITO FISCAL AO CRÉDITO TRABALHISTA PARA MANUTENÇÃO DA PREFERÊNCIA DESTE ÀQUELE – MARCO INICIAL DA FRAUDE À EXECUÇÃO TRABALHISTA

Até o advento do julgamento do Recurso Especial nº 1.141.990/PR, Relator Minis-tro Luiz Fux, DJe de 19.11.2010, a jurisprudência do STJ oscilava na aplicação da Súmula nº 375 à execução fiscal. Nesse julgamento ficou definida a diferença de tratamento conferido à fraude à execução fiscal em comparação à fraude à exe-cução civil. Nesta há afronta ao interesse privado e naquela ao interesse público, daí por que, na fraude à execução fiscal, impõe-se sujeitá-la ao regime jurídico especial do art. 185 do CTN e, por consequência, irrelevante a boa-fé do terceiro adquirente (presunção absoluta de fraude à execução). Por isso, a partir de en-tão, passou-se a entender pela inaplicabilidade nas execuções fiscais da Súmula nº 375 do STJ devendo ser mantida penhora efetuada, com a rejeição de even-tuais embargos de terceiro pelo adquirente, prosseguindo a execução, indepen-dentemente da existência ou não de boa-fé do comprador. Idêntica interpretação deve ser aplicada no reconhecimento de fraude à execução na seara trabalhista a fim de que ao crédito trabalhista seja garantido o mesmo regime especial previsto ao fiscal, sob pena de negar a preferência daquele a este, inclusive como forma de manter hígido o indispensável diálogo das fontes e a interpretação sistemática (CPC/1973, art. 593, III, NCPC – Lei nº 13.105/2015, art. 792, V, CLT, art. 889 e CTN, arts. 185 e 186), além da necessária coerência do conjunto de normas reguladoras do mesmo instituto processual (fraude à execução) a credores com preferência especial. A aplicação do instituto processual da fraude à execução nas causas trabalhistas, apenas com base no art. 593, II, do CPC, ou art. 792, IV, do NCPC (que conduz à presunção relativa daquela fraude por força do enten-dimento objeto da Súmula nº 375 do STJ – consoante entendimento hodierno –, colocaria o crédito trabalhista em situação inferior ao tributário, pois a este a lei prevê presunção absoluta da prefalada fraude desde momento anterior à existên-cia da execução fiscal (CTN, art. 185). Equivale dizer: o credor fiscal receberá seu crédito (por força de presunção absoluta de fraude) e o credor trabalhista estaria compelido a provar a má-fé do adquirente (presunção relativa de fraude) e, pois, sujeitando-se aos mais diversos expedientes normalmente utilizados pelos envol-vidos no negócio jurídico (comprador e vendedor) a fim de obstar a efetividade da execução trabalhista. O marco inicial da fraude à execução trabalhista é o

Page 76: Nº 345 – Março 2018 · Revista SÍNTESE Trabalhista e Previdenciária Ano XXIX – nº 345 – MArço 2018 reposItórIo AutorIzAdo de JurIsprudêncIA Supremo Tribunal Federal

76 ...................................................................................................................RST Nº 345 – Março/2018 – PARTE GERAL – DOUTRINA

ajuizamento da ação - fase de conhecimento (inteligência CPC/1973, art. 263 e NCPC, art. 312), até pela inexistência da constituição do crédito trabalhista em fase anterior à judicial, como ocorre com o crédito tributário. (TRT 12ª R., Ap 0001224-13.2014.5.12.0037, 5ª Câmara, Rel. Reinaldo Branco de Moraes, Data de Assinatura: 20.05.2015)

Trata-se de jurisprudência benfazeja ao debate que o tema está a exigir tanto do Direito Processual do Trabalho quanto da jurisdição trabalhista.

CONCLUSÃO

O sistema legal inclui a fraude à execução fiscal entre os casos de fraude à execução capitulados no inciso III do art. 593 do CPC de 1973 (CPC de 2015, art. 792, V), identificando na previsão do art. 185, caput, do CTN particular modalidade de fraude à execução inserida pelo direito positivo entre os “demais casos expressos em lei”, modalidade de fraude à execução em que a presunção de fraude é considerada absoluta.

Na medida em que a fraude à execução fiscal é considerada hipótese de presunção absoluta de fraude no Direito Tributário, a vantagem jurídica com que essa concepção de fraude à execução tutela o crédito fiscal conduz o ope-rador do processo do trabalho a interrogar-se acerca da juridicidade da exten-são dessa concepção de fraude à execução ao processo do trabalho mediante recurso à analogia, em face da promessa constitucional de jurisdição efetiva (CF, art. 5º, XXXV).

O crédito trabalhista é expressão objetiva de inadimplemento à contra-prestação devida ao trabalhador pelo tomador dos serviços, trabalho esse cuja prestação incorpora-se ao patrimônio do tomador de serviços na condição de riqueza apropriada sob a forma de mais-valia. É o fato objetivo de que essa apropriação se faz inexorável na relação de produção capitalista que conduz a consciência jurídica a sobrevalorizar o crédito trabalhista na disputa com outras espécies de créditos, reconhecendo-lhe posição de superprivilégio indispen-sável à concretização do valor da dignidade da pessoa humana que vive do trabalho.

Assimilada a ideia de que os executivos fiscais constituem verdadeira-mente um sistema, é razoável concluir, então, que é esse sistema – e não apenas os preceitos da Lei nº 6.830/1980 – que se aplica subsidiariamente à execução trabalhista, por força da previsão do art. 889 da CLT em interpretação extensiva.

Relegar a fraude à execução trabalhista ao regime jurídico geral do art. 593, II, do CPC de 1973 (CPC de 2015, art. 792, IV), enquadrando-a na modalidade de fraude à execução civil, significaria negar a primazia do crédito trabalhista sobre o crédito fiscal prevista no art. 186 do CTN. Para restabelecer a primazia do crédito trabalhista sobre o crédito fiscal também no relevante tema da fraude à execução, é necessário estender à execução trabalhista o regime

Page 77: Nº 345 – Março 2018 · Revista SÍNTESE Trabalhista e Previdenciária Ano XXIX – nº 345 – MArço 2018 reposItórIo AutorIzAdo de JurIsprudêncIA Supremo Tribunal Federal

RST Nº 345 – Março/2018 – PARTE GERAL – DOUTRINA .......................................................................................................................77

jurídico especial da fraude à execução fiscal previsto no art. 185 do CTN me-diante interpretação sistemática dos arts. 889 da CLT e 186 do CTN.

REFERÊNCIASASSIS, Araken de. Manual da execução. 14. ed. São Paulo: RT, 2012.

BALEEIRO, Aliomar. Direito tributário brasileiro. 11. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1999.

BAPTISTA DA SILVA, Ovídio. Processo e ideologia – O paradigma racionalista. Rio de Janeiro: Forense, 2004.

BARROSO, Luís Roberto. Interpretação e aplicação da Constituição. 7. ed. São Paulo: Saraiva, 2010.

BEBBER, Júlio César. Recursos no processo do trabalho. 2. ed. São Paulo: LTr, 2009.

BERNAL, Francisco Chamorro. La Tutela Judicial Efectiva – Derechos y garantias proce-sales derivados del artículo 24.1 de La Constitución. Barcelona: Bosch, 1994.

BORGES, Aline Veiga; CLAUS, Ben-Hur Silveira. Hipoteca judiciária sobre bens não elencados no artigo 1.473 do Código Civil – A efetividade da jurisdição como horizon-te hermenêutico. Suplemento Trabalhista, São Paulo: LTr, n. 59, 2014.

CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de direito tributário. 19. ed. São Paulo: Saraiva, 2007.

CASTRO, Amílcar de. Comentários ao Código de Processo Civil. 3. ed. São Paulo: RT, v. VIII, 1983.

CAHALI, Yussef Said. Fraudes contra credores. São Paulo: RT, 1989.

CHAVES, Luciano Athayde. Ferramentas eletrônicas na execução trabalhista. In: CHAVES, Luciano Athayde (Org.). Curso de processo do trabalho. São Paulo: LTr, 2009.

CHIERCHIA, Pietro Merola. L’interpretazione sistemática della Constituzione. Padova: Cedam, 1978.

CLAUS, Ben-Hur Silveira. Hipoteca judiciária: a (re)descoberta do instituto diante da Súmula nº 375 do STJ – Execução efetiva e atualidade da hipoteca judiciária. Revista do Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região, Porto Alegre: HS Editora, n. 41, 2013.

______. A aplicação da medida legal de indisponibilidade de bens prevista no artigo 185-A do CTN à execução trabalhista – Uma boa prática a serviço do resgate da res-ponsabilidade patrimonial futura. Revista do TRT da 8ª Região, n. 92, 2014.

DELGADO, Mauricio Godinho. Curso de direito do trabalho. 10. ed. São Paulo: LTr, 2011.

DENARI, Zelmo. Comentários ao Código Tributário Nacional. 3. ed. Coord. Ives Gandra da Silva Martins. São Paulo: Saraiva, v. 2, 2002.

DIAS, Maria Berenice. Fraude à execução. Revista Ajuris, 50/75.

DIAS, Ronaldo Brêtas de Carvalho. Fraude à execução. Digesto de processo. Rio de Janeiro: Forense, v. 3, 1985.

DINAMARCO, Cândido Rangel. Execução civil. 3. ed. São Paulo: Malheiros, 1993.

Page 78: Nº 345 – Março 2018 · Revista SÍNTESE Trabalhista e Previdenciária Ano XXIX – nº 345 – MArço 2018 reposItórIo AutorIzAdo de JurIsprudêncIA Supremo Tribunal Federal

78 ...................................................................................................................RST Nº 345 – Março/2018 – PARTE GERAL – DOUTRINA

ENGISCH, Karl. Introdução ao pensamento jurídico. 10. ed. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 2008.

FIOREZE, Ricardo; CLAUS, Ben-Hur Silveira. Execução efetiva: a aplicação da averba-ção premonitória do artigo 615-A do CPC ao processo do trabalho, de ofício. Justiça do Trabalho, Porto Alegre: HS Editora, n. 366, jun. 2014.

GRECO, Leonardo. O processo de execução. Rio de Janeiro: Renovar, v. 2, 2001.

GUTJAHR, Valéria. Comentários ao Código Tributário Nacional. Coord. Marcelo Magalhães Peixoto e Rodrigo Santos Masset Lacombe. São Paulo: Magalhães Peixoto Editora Ltda., 2005.

LIMA, Alcides de Mendonça. Comentários ao Código de Processo Civil. 6. ed. Rio de Janeiro: Forense, v. VI.

LIEBMAN, Enrico Tullio. Processo de execução. 4. ed. São Paulo: Saraiva, 1980.

LOPES, Mauro Luís Rocha. Processo judicial tributário: execução fiscal e ações tributá-rias. 7. ed. Niterói/RJ: Impetus, 2012.

MACHADO, Hugo de Brito. Comentários ao Código Tributário Nacional. 2. ed. São Paulo: Atlas, v. III, 2009.

MADEIRA, Anderson Soares. Lei de execuções fiscais. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2001.

MARINONI, Luiz Guilherme; ARENHART, Sérgio Cruz. Curso de processo civil – Exe-cução. 6. ed. São Paulo: Forense, v. 3, 2014.

MIESSA, Élisson. Hipoteca judiciária e protesto da decisão judicial no novo CPC e seus impactos no processo do trabalho. In: MIESSA, Élisson (Org.). O novo Código de Pro-cesso Civil e seus reflexos no processo do trabalho. Salvador: Juspodivm, 2015.

MIRANDA, João Damasceno Borges de. Comentários ao Código Tributário Nacional. Coord. Marcelo Magalhães Peixoto e Rodrigo Santos Masset Lacombe. São Paulo: Magalhães Peixoto Editora Ltda., 2005.

OLIVEIRA, Francisco Antonio de. Execução na Justiça do Trabalho. 6. ed. São Paulo: RT, 2008.

OLIVEIRA, Ricardo Mariz de. Dívida Ativa da Fazenda Pública. RT Informa, 261:5.

RIBEIRO, André de Melo. O novo eixo axiológico de interpretação do fenômeno da empresa e a modulação necessária entre o direito do trabalho e o direito concursal após a Lei nº 11.101/2005. In: GARCIA, Gustavo Filipe Barbosa; ALVARENGA, Rúbia Zanotelli de (Org.). Direito do trabalho e direito empresarial sob o enfoque dos direitos fundamentais. São Paulo: LTr, 2015.

TEIXEIRA FILHO, Manoel Antonio. Execução no processo do trabalho. 11. ed. São Paulo: LTr, 2013.

THEODORO JÚNIOR, Humberto. Lei de execução fiscal. 11. ed. São Paulo: Saraiva, 2009.

______. Curso de direito processual civil. 14. ed. Rio de Janeiro: Forense, v. II, 1995.

WELTER, Belmiro Pedro. Fraude de execução. Porto Alegre: Síntese, 1997.

ZAVASCHI, Teori Albino. Comentários ao Código de Processo Civil. São Paulo: RT, v. 8, 2000.

Page 79: Nº 345 – Março 2018 · Revista SÍNTESE Trabalhista e Previdenciária Ano XXIX – nº 345 – MArço 2018 reposItórIo AutorIzAdo de JurIsprudêncIA Supremo Tribunal Federal

Parte Geral – Doutrina

Mecanismos de Prevenção Acidentária: a Proteção ao Ambiente de Trabalho Bancário

FERNANDO RUBINBacharel em Direito pela UFRGS (com a distinção da Láurea Acadêmica), Mestre em Proces-so Civil pela UFRGS, Doutorando pela PUCRS, Professor da Graduação e Pós-Graduação do Centro Universitário Ritter dos Reis – Uniritter, Laureate International Universities, Professor Colaborador da Escola Superior de Advocacia – ESA/RS, Professor Pesquisador do Centro de Estudos Trabalhistas do Rio Grande do Sul – CETRA-Imed, Professor convidado de Cursos de Pós-Graduação latu sensu, Parecerista, Colunista, Articulista, Advogado-Sócio do Escritório de Direito Social.

GUILHERME RIBEIRO VENTURINFormado em Direito pelo Centro Universitário Ritter dos Reis – Uniritter, Laureate International Universities – Campus Canoas (2016-2).

RESUMO: O presente artigo observa os mecanismos de prevenção acidentária, em especial no que diz respeito à proteção ao meio ambiente de trabalho do bancário. Analisa os principais mecanismos de prevenção acidentária impostos legalmente, objetivando destacar aqueles que apresentam maio-res preocupações e garantias para com a saúde do bancário. Identifica as principais características da classe trabalhadora bancária e suas especificidades legais. Aborda quais as consequências de um meio ambiente de trabalho prejudicial para o trabalhador, tanto no que diz respeito aos aspectos físicos quanto no que concerne ao âmbito psicológico. Posteriormente, explicita as formas de judi-cialização das demandas acidentárias, exibindo, por fim, uma análise jurisprudencial com o objetivo de demonstrar qual o sucesso obtido atualmente pelos bancários ao ingressarem no Judiciário do Estado do Rio Grande do Sul para buscar a devida indenização contra os empregadores.

PALAVRAS-CHAVE: Direito do Trabalho; acidente de trabalho; bancário; proteção.

SUMÁRIO: Introdução; 1 Mecanismos de prevenção acidentária; 2 Trabalhador bancário; 2.1 Condições de risco físico – LER/DORT; 2.2 Condições de risco psicológico; 2.2.1 Assédio moral; 2.2.2 Síndrome de Burnout; 2.2.3 Dano existencial; 3 A judicialização das questões acidentárias; 3.1 Ação acidentária contra o INSS; 3.2 Ação de reparação de danos contra o empregador; 3.3 Ação securitária; 4 Análise jurisprudencial; Conclusão; Referências.

INTRODUÇÃO

A gananciosa busca pelo lucro faz com que empresas exijam desempe-nho e produtividade sobre-humanos de seus funcionários, fazendo com que o trabalhador acabe por doar-se integralmente ao exercício de suas funções, de modo que possa corresponder às altas expectativas patronais. A atividade bancária está entre as que mais causam prejuízo aos empregados, de tal forma

Page 80: Nº 345 – Março 2018 · Revista SÍNTESE Trabalhista e Previdenciária Ano XXIX – nº 345 – MArço 2018 reposItórIo AutorIzAdo de JurIsprudêncIA Supremo Tribunal Federal

80 ...................................................................................................................RST Nº 345 – Março/2018 – PARTE GERAL – DOUTRINA

que a Consolidação das Leis do Trabalho trata da profissão de maneira aparta-da, incluindo-a no Título III, Seção I, que trata, especificamente, “Das Normas Especiais de Tutela do Trabalho”.

Diante desse panorama, o presente artigo aborda, de maneira sistemáti-ca, as questões envolvendo os mecanismos de proteção acidentária que cercam o ambiente de trabalho do empregado bancário no Brasil. Traz conceitos espe-cíficos sobre a atividade bancária, e se propõe a uma análise sobre as condições de risco à saúde física e mental do trabalhador desenvolvidas no decorrer de sua carreira profissional. Por último, demonstra as formas de judicialização das demandas acidentárias no Brasil, fazendo um estudo visando demonstrar qual o sucesso obtido atualmente pelos bancários quando ingressam no Judiciário vislumbrando as respectivas indenizações.

1 MECANISMOS DE PREVENÇÃO ACIDENTÁRIA

O ordenamento jurídico brasileiro estabelece regras para prevenção aci-dentária, as quais tentam tornar o ambiente de trabalho um local saudável e prazeroso para os empregados. No sentido de diminuir o número de acidentes de trabalho, a legislação evoluiu para exigir medidas preventivas mais sérias das empresas, tais como a Portaria nº 3.214/1978 do Ministério do Trabalho e Emprego, bem como a vigência das 33 Normas Regulamentadoras, as quais dispõem sobre procedimentos obrigatórios relacionados à saúde e à segurança do trabalho1.

No sentido de objetivar o estudo sobre os mecanismos de prevenção aci-dentária mais incidentes na atividade bancária, restringiu-se a presente pesquisa à Comissão Interna de Prevenção de Acidentes (Cipa), ao Serviço Especializado em Engenharia de Segurança e em Medicina do Trabalho (SEESMET), ao Pro-grama de Prevenção de Riscos Ambientais (PPRA) e ao Programa de Controle Médico de Saúde Ocupacional (PCMSO).

A Cipa tem como objetivo definido a prevenção de acidentes e doenças decorrentes do trabalho, no sentido de tornar compatível o trabalho com a pre-servação da vida, além da promoção da saúde do trabalhador. Entretanto, na maioria das pequenas e médias empresas, a Cipa só existe formalmente, tudo porque não encontra espaço ou liberdade de atuação2.

Organiza-se a Cipa de forma paritária, com representantes do empre-gador e empregados, tendo o número de membros estabelecidos diretamente em função do grau de risco e do número de empregados do estabelecimento

1 RUBIN, Fernando. Teatro de sombras: relatório da violência no trabalho e a apropriação da saúde dos bancários. Porto Alegre: SindBancários, 2011. p. 123.

2 OLIVEIRA, Sebastião Geraldo de. Proteção jurídica à saúde do trabalhador. 4. ed. rev., ampl. e atual. São Paulo: LTr, 2002. p. 372.

Page 81: Nº 345 – Março 2018 · Revista SÍNTESE Trabalhista e Previdenciária Ano XXIX – nº 345 – MArço 2018 reposItórIo AutorIzAdo de JurIsprudêncIA Supremo Tribunal Federal

RST Nº 345 – Março/2018 – PARTE GERAL – DOUTRINA .......................................................................................................................81

patronal, obedecendo aos parâmetros estabelecidos no Quadro I da NR 5. Os representantes dos empregadores, titulares e suplentes, serão por eles designa-dos; já os representantes dos empregados, titulares e suplentes, serão por eles eleitos independentemente de filiação sindical3.

Os cipeiros4 gozam de garantias de estabilidade constantes no subitem 5.8 da NR 5, bem como no art. 165 da CLT. No mesmo sentido, a Constituição Federal, por meio do art. 10, II, a, do ADCT, determinou a estabilidade provisó-ria para os membros eleitos da Cipa, desde o registro da candidatura até 1 (um) ano após o final do mandato. Ainda, a Súmula nº 339 do Tribunal Superior do Trabalho também estendeu a garantia de emprego ao suplente da Cipa.

Tratando do Serviço Especializado em Engenharia de Segurança e em Medicina do Trabalho (SESMET), imperioso trazer as conclusões de Sebastião Geraldo de Oliveira em relação à abrangência das medidas preventivas para o controle dos agentes prejudiciais, eis que assim professou: “De nada adian-taria medicar o trabalhador e deixá-lo exposto à causa geradora da doença”5. A Organização Internacional do Trabalho adotou, em 1959, a Recomendação nº 112, que versa sobre o serviço de medicina nos locais de trabalho, o que serviu de fonte inspiradora para a legislação nacional.

O primeiro texto legal a prever a criação de um serviço especializado em segurança e higiene do trabalho pelas empresas, no Brasil, foi o Decreto-Lei nº 229, de 28 de fevereiro de 1967, que deu nova redação ao Capítulo V do Título II da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT). Atualmente, a obrigatorie-dade do SESMET encontra-se no art. 162 da CLT. Ademais, o Ministério do Tra-balho e Emprego, por meio da NR 4, regulamentou a matéria, estabelecendo, entre outros, o dimensionamento, a qualificação dos profissionais, bem como as atribuições e a jornada de trabalho do SESMET6.

Por definição normativa do MTE, o SESMET tem a finalidade de “pro-mover a saúde e proteger a integridade do trabalhador no local de trabalho”7, devendo ser integrado por profissionais habilitados8, empregados da empresa, cuja prioridade está voltada para a eliminação dos riscos existentes no ambiente

3 SALIBA, Tuffi Messias. Curso básico de segurança e higiene ocupacional. São Paulo: LTr, 2004. p. 293.4 O termo “cipeiro” não consta no dicionário, tratando-se de jargão utilizado na área técnica, bem como no

ambiente de labor dos empregados.5 OLIVEIRA, Sebastião Geraldo de. Proteção jurídica à saúde do trabalhador. 4. ed. rev., ampl. e atual. São

Paulo: LTr, 2002. p. 375.6 SALIBA, Tuffi Messias. Curso básico de segurança e higiene ocupacional. São Paulo: LTr, 2004. p. 287.7 MINISTÉRIO DO TRABALHO. Portaria nº 3.214, de 8 de junho de 1978. Estabelece as Normas

Regulamentadoras de Segurança e Saúde no Trabalho – NR 4, item 4.1. Disponível em: <http://www.camara.gov.br/sileg/integras/839945.pdf>. Acesso em: 13 set. 2016.

8 Ibidem, p. 377.

Page 82: Nº 345 – Março 2018 · Revista SÍNTESE Trabalhista e Previdenciária Ano XXIX – nº 345 – MArço 2018 reposItórIo AutorIzAdo de JurIsprudêncIA Supremo Tribunal Federal

82 ...................................................................................................................RST Nº 345 – Março/2018 – PARTE GERAL – DOUTRINA

do trabalho9. Fazendo um encadeamento com os mecanismos de proteção à saúde do trabalhador, ensina Sebastião Geraldo de Oliveira que,

observando a Cipa possível causa do acidente e comunicando o fato ao Enge-nheiro de Segurança do Trabalho nasce nesse instante sua obrigação de plane-jar e desenvolver a implantação de técnicas preventivas pois se assim não agir, havendo o acidente, sujeitar-se-á às sanções penais e civis decorrentes, além de incriminar a empresa ante sua negligência, uma vez que o evento era-lhe previ-sível.10

Nessa linha, tem-se que o Serviço Especializado em Engenharia de Se-gurança e em Medicina do Trabalho (SESMET) e a Comissão Interna de Preven-ção de Acidentes (Cipa) trabalham conjuntamente, e de sua interação decorrem documentos de suma importância à segurança do ambiente de trabalho, tais como: o Programa de Controle Médico de Saúde Ocupacional (PCMSO), o Pro-grama de Prevenção de Riscos Ambientais (PPRA) e o controle sobre a utiliza-ção obrigatória dos equipamentos de proteção individual (EPIs)11.

Já em relação ao Programa de Controle Médico de Saúde Ocupacional (PCMSO), há que se referir que todas as empresas e instituições que admitam trabalhadores como empregados estão obrigadas, desde a edição da Portaria nº 24 do Ministério do Trabalho, a elaborar e implementar o referido progra-ma. As orientações formais para implementação, condução e desenvolvimento do PCMSO, inclusive as competências e responsabilidades, estão elencadas na Norma Regulamentadora nº 7 do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE).

Maria Cristina Galafassi caracteriza o PCMSO como sendo um conjunto de estudos de ações que visam à manutenção da saúde e à preservação de do-enças ocupacionais do trabalho, partindo do empregador para a coletividade dos funcionários, estreitando nas relações saúde-trabalho as abordagens clíni-cas epidemiológicas12. Também refere que o PCMSO tem como prerrogativa o objetivo de

promover e preservar a saúde do conjunto dos trabalhadores. O programa con-tém os parâmetros mínimos e as diretrizes gerais, podendo ser ampliado pelo coordenador, pelos agentes de inspeção do trabalho ou mediante negociação coletiva.13

9 MINISTÉRIO DO TRABALHO. Portaria nº 3.214, de 8 de junho de 1978. Estabelece as Normas Regulamentadoras de Segurança e Saúde no Trabalho – NR 4, item 4.12. Disponível em: <http://www.camara.gov.br/sileg/integras/839945.pdf>. Acesso em: 13 set. 2016.

10 OLIVEIRA, Sebastião Geraldo de. Proteção jurídica à saúde do trabalhador. 4. ed. rev., ampl. e atual. São Paulo: LTr, 2002. p. 377.

11 RUBIN, Fernando. Teatro de sombras: relatório da violência no trabalho e a apropriação da saúde dos bancários. Porto Alegre: SindBancários, 2011. p. 122.

12 GALAFASSI, Maria Cristina. Medicina do trabalho: programa de controle médico de saúde ocupacional (NR 7). São Paulo: Atlas, 1998. p. 15.

13 Idem.

Page 83: Nº 345 – Março 2018 · Revista SÍNTESE Trabalhista e Previdenciária Ano XXIX – nº 345 – MArço 2018 reposItórIo AutorIzAdo de JurIsprudêncIA Supremo Tribunal Federal

RST Nº 345 – Março/2018 – PARTE GERAL – DOUTRINA .......................................................................................................................83

Assim, é possível concluir que o PCMSO constitui parte integrante de um conjunto de iniciativas da empresa no campo da saúde dos trabalhadores, articulando-se de maneira intrínseca com as demais normas regulamentadoras na abordagem da relação entre a saúde e o trabalho.

São exames médicos de realização obrigatória no PCMSO: exame admis-sional, periódico, de retorno ao trabalho, de mudança de função e demissio-nal. Ainda, os exames compreendem a avaliação clínica abrangendo anamnese ocupacional, exame físico e mental, além de exames complementares, confor-me o especificado na legislação14.

Já no que diz respeito ao Programa de Prevenção de Riscos Ambientais, designado pela sigla PPRA, destaca-se que é uma atividade exigida legalmente por meio da Norma Regulamentadora nº 9 e tem como objetivo a preservação da saúde do trabalhador pela antecipação e pelo reconhecimento de riscos.

Em razão das diversas considerações e no sentido de orientar a adoção de medidas aos trabalhadores contra os riscos ambientais, optou o Ministério do Trabalho e Emprego por normatizar conceitos, etapas e procedimentos a serem utilizados em um programa de higiene do trabalho, denominando-o de Programa de Prevenção de Riscos Ambientais (PPRA)15. Compete ao gestor to-mar as providências cabíveis ao estabelecimento das medidas necessárias à proteção dos trabalhadores, visto que todo o processo produtivo, quer pelas ca-racterísticas da maquinaria, quer pela característica dos materiais empregados, de alguma forma, ainda que minimamente, oferece oportunidade de riscos aos trabalhadores16.

Aduz Tuffi Messias Saliba que, por esse prisma, “o PPRA deve ser visto como uma política gerencial no campo da preservação da saúde e da integrida-de dos trabalhadores”17. Além disso, possível constatar de pronto uma relação direta e articulada com o programa de prevenção analisado anteriormente, qual seja, o Programa de Controle Médico de Saúde Ocupacional (PCMSO).

Segundo Maria Cristina Galafassi, por determinação da NR 9, o PPRA deverá conter, no mínimo, a seguinte estrutura:

a) Planejamento anual com estabelecimento de metas, prioridades e cronograma;

b) Estratégia e metodologia de ação;

14 BENSOUSSAN, Eddy. Manual de gestão e prática em saúde ocupacional. 1. ed. Rio de Janeiro: GZ Editora, 2010. p. 14.

15 SALIBA, Tuffi Messias. Higiene do trabalho e PPRA. São Paulo: LTr, 1997. p. 171.16 BARBOSA FILHO, Antônio Nunes. Segurança do trabalho & gestão ambiental. 3. ed. São Paulo: Atlas, 2010.

p. 194.17 SALIBA, Tuffi Messias. Higiene do trabalho e PPRA. São Paulo: LTr, 1997. p. 171.

Page 84: Nº 345 – Março 2018 · Revista SÍNTESE Trabalhista e Previdenciária Ano XXIX – nº 345 – MArço 2018 reposItórIo AutorIzAdo de JurIsprudêncIA Supremo Tribunal Federal

84 ...................................................................................................................RST Nº 345 – Março/2018 – PARTE GERAL – DOUTRINA

c) Forma de registro, manutenção e divulgação dos dados;

d) Periodicidade e forma de avaliação do desenvolvimento do PPRA.18

Com o permanente monitoramento dos riscos ambientais, realiza-se o “mapa de riscos”, que constitui elemento fundamental na execução do PPRA e conta com a informação adequada sobre a presença e localização dos diferen-tes tipos e graus de riscos da empresa, devendo estar prontamente disponível a todos os interessados de todos os setores da empresa. Cada ambiente da empre-sa deverá manter atualizado seu “mapa de risco”, servindo de orientação sobre os procedimentos seguros pertinentes ao trabalho ou trânsito por aquele local de labor19.

2 TRABALHADOR BANCÁRIO

Adentrando na categoria a qual se voltou o estudo dos mecanismos de prevenção acidentária, necessário trazer o ensinamento de Segadas Viana so-bre os bancários, eis que relata com precisão a situação vivenciada por esses trabalhadores:

[...] as peculiaridades do exercício das atividades bancárias, propriamente ditas, colocam-nas, sem a menor dúvida, entre as profissões penosas extenuantes. A complexidade das operações, as responsabilidades no manuseio de grandes so-mas e até mesmo a posição de trabalho curvado sobre a mesa provocam, ao fim de curto tempo, o extenuamento do empregado bancário.20

Rodrigo Wasem Galia define o bancário como sendo “o trabalhador que presta serviços não eventuais a um banco, respeitando as ordens diretivas e recebendo, para isso, um salário, sem participar do risco do negócio”21. Assim, verifica-se a presença de todos os requisitos formais para o estabelecimento do contrato de trabalho, conforme destacado por Sergio Pinto Martins22.

A duração da jornada de trabalho dos bancos e das casas bancárias será de seis horas contínuas nos dias úteis, com exceção dos sábados, perfazendo um total de trinta horas de trabalho por semana. A duração normal de trabalho ficará compreendida entre sete e vinte e duas horas, assegurando ao emprega-do, no horário diário, um intervalo de quinze minutos para alimentação, sendo que o intervalo de quinze minutos não é computável na jornada de trabalho, nos termos da OJ SDI-1 178.

18 GALAFASSI, Maria Cristina. Medicina do trabalho: programa de controle médico de saúde ocupacional (NR 7). São Paulo: Atlas, 1998. p. 57.

19 BARBOSA FILHO, Antonio Nunes. Segurança do trabalho & gestão ambiental. 3. ed. São Paulo: Atlas, 2010. p. 196.

20 VIANNA, Segadas. Instituições de direito do trabalho. 19. ed., v. II, 1961, p. 1034.21 WÜNSCH, Guilherme. Inquietações sobre o dano existencial no direito do trabalho: o projeto de vida e a vida

de relação como proteção à saúde do trabalhador. Porto Alegre: HS Editora, 2015. p. 92.22 MARTINS, Sergio Pinto. Direito do trabalho. 24. ed. São Paulo: Atlas, 2008. p. 90.

Page 85: Nº 345 – Março 2018 · Revista SÍNTESE Trabalhista e Previdenciária Ano XXIX – nº 345 – MArço 2018 reposItórIo AutorIzAdo de JurIsprudêncIA Supremo Tribunal Federal

RST Nº 345 – Março/2018 – PARTE GERAL – DOUTRINA .......................................................................................................................85

Conforme o § 2º do art. 224 da CLT, a jornada de seis horas não se aplica aos que exercem funções de direção, gerência, fiscalização, chefia e equiva-lentes ou que desempenhem outros cargos de confiança, desde que o valor da gratificação não seja inferior a um terço do salário do cargo efetivo. Entretanto, comumente os bancos atribuem funções de nomenclatura gerencial a diversos empregados, para que eles se enquadrem na exceção supracitada para laborar mais do que seis horas, e, conforme destaca Rodrigo Wasem Galia:

O que se verifica, na prática, é que a nomenclatura do cargo não corresponde à função realmente exercida, existindo casos mais extremos, em que os bancos interpretam o § 2º do art. 24 da Consolidação das Leis do Trabalho, como se fosse o inciso II do art. 62 da mesma norma. Consequentemente, configuram situações em que os excessos são maiores, com jornadas de dez horas diárias ou até mais.23

Nessa linha, o Tribunal Superior do Trabalho firmou posicionamento acerca da interpretação do “cargo de confiança” e do “cargo de gestão” do bancário, por meio das Súmulas nºs 102 e 287 do TST. Assim, acabou o Tribu-nal Superior do Trabalho por deixar claro que os cargos de gerentes bancários subordinados são denominados “cargo de confiança”, possuindo jornada esten-dida para 8 horas, desde que a remuneração tenha o acréscimo necessário. Por sua vez, o gerente-geral é o considerado “cargo de gestão”, e este é regido pelo inciso II do art. 62 da CLT.

Em que pese a estruturação legal da CLT voltada à preocupação para com o trabalhador bancário, bem como as súmulas do TST que estabelecem de-limitações e enquadramentos específicos para o exercício das atividades bancá-rias, Mayte Raya Amazarray caracterizou o exercício dessa atividade no aspecto de que é executada sob forte pressão, sendo representada pela diminuição de pessoal, pelo alto volume de trabalho, bem como pelo cumprimento de prazos e metas muitas vezes inatingíveis, de modo que tais situações obrigam os ban-cários a exercer tarefas em ritmo acelerado e eliminando as pausas24.

2.1 conDições De risco físico – ler/Dort

No objetivo de tratar das condições de risco envolvendo a saúde física do trabalhador bancário, verificou-se que a imensa maioria das ocorrências de pro-blemas físicos envolvendo a categoria diz respeito às Lesões por Esforço Repeti-tivo/Distúrbios Osteomoleculares Relacionados ao Trabalho (LER/DORT). Diz--se isso pelo fato de que tais doenças, não obstante a considerável diminuição ao longo dos anos e o avanço na matéria de prevenção acidentária no interior

23 WÜNSCH, Guilherme. Inquietações sobre o dano existencial no direito do trabalho: o projeto de vida e a vida de relação como proteção à saúde do trabalhador. Porto Alegre: HS Editora, 2015. p. 93.

24 AMAZARRAY, Mayte Raya. Teatro de sombras: relatório da violência no trabalho e a apropriação da saúde dos bancários. Porto Alegre: SindBancários, 2011. p. 102.

Page 86: Nº 345 – Março 2018 · Revista SÍNTESE Trabalhista e Previdenciária Ano XXIX – nº 345 – MArço 2018 reposItórIo AutorIzAdo de JurIsprudêncIA Supremo Tribunal Federal

86 ...................................................................................................................RST Nº 345 – Março/2018 – PARTE GERAL – DOUTRINA

das empresas, ainda continuam bem presentes na classe bancária, conforme passa-se a demonstrar.

No Brasil, entre os anos de 2000 e 2005, foram afastados 25,1 mil profis-sionais bancários lesionados por LER/FORT, fato que resultou na concessão de benefícios previdenciários, totalizando 981,4 milhões de reais25.

Claudio Antonalia define DORT como “alterações que comprometem músculos e/ou tendões e/ou fáscias (membranas que recobrem tendões, nervos, músculos) e/ou nervos ocasionadas por utilização biomecânica incorreta do setor do corpo humano atingido em decorrência do trabalho”26. Refere, ainda, que os principais locais atingidos pela DORT são membros superiores, pescoço, ombro, dorso, e onde existem articulações, tais como músculos, tendão, fáscia e nervo. Ademais, ressalta-se que o resultado da DORT é dor, fadiga, fraqueza e queda na performance no trabalho27.

Quando se fala em LER/DORT, a dor é o pior sintoma, sendo que na maioria dos casos há grande dificuldade em definir um tipo localizado de dor, que costuma iniciar gradualmente por uma região anatômica – punho, cotovelo e ombro – e acaba atingindo todo o membro superior. Ainda, os portadores de LER/DORT queixam-se de dores irradiadas, inchaços, rigidez e limitação dos movimentos provocados pela dor, podendo ocorrer, também, sintomas gerais associados com a ansiedade, irritabilidade e alteração do humor e do sono28.

Imperioso destacar os diversos fatores que favorecem a LER/DORT, de modo que Silvia Meireles Bellusci assim leciona:

Más condições psicossociais no trabalho facilitam o desenvolvimento de LER/DORT, como, por exemplo, trabalho pobremente organizado, falta de influência no próprio trabalho, pouca variedade no conteúdo das tarefas, pressão contínua de tempo, falta de solidariedade no grupo, conflitos intra e extragrupo, pressão permanente da chefia/colega, falta de reconhecimento e apreciação, falta de oportunidade para desenvolvimento profissional, temor de fracasso e erro, entre outros.29

Importante destacar, nesse ponto, a existência de um elo entre a LER/DORT e um quadro de doença mental. Fora expedido pelo Instituto Nacional de Seguridade Social a Instrução Normativa INSS/DC nº 98, de 5 de dezembro

25 PERES, Leandro. País gasta R$ 981 milhões com LER em bancários. Recuperado em 30 set. 2016, de Folha de São Paulo. Disponível em: <http://www1.folha.uol.com.br/folha/dinheiro/ult91u116625.shtml>. Acesso em: 2 out. 2016.

26 ANTONALIA, Claudio. LER (lesão por esforço repetitivo); DORT (distúrbios osteomoleculares relacionados ao trabalho); prejuízos sociais e fator multiplicador do custo Brasil. São Paulo: LTr, 2001. p. 18.

27 Idem.28 GAIGHER, Walter Filho. LER/DORT – A psicossomatização no processo de surgimento e agravamento.

São Paulo: LTr, 2001. p. 26.29 BELLUSCI, Silva Meirelles. Doenças profissionais ou do trabalho. São Paulo: Editora Senac, 1999. p. 83.

Page 87: Nº 345 – Março 2018 · Revista SÍNTESE Trabalhista e Previdenciária Ano XXIX – nº 345 – MArço 2018 reposItórIo AutorIzAdo de JurIsprudêncIA Supremo Tribunal Federal

RST Nº 345 – Março/2018 – PARTE GERAL – DOUTRINA .......................................................................................................................87

de 2003, em que destaca com extrema clareza tal situação. Naquele documento é possível constatar que o diagnóstico da LER/DORT deve ser multidisciplinar, visto que é comum que se identifiquem, além das dores físicas envolvendo a doença ocupacional, um alto índice de ansiedade, angústia, medo e depressão, pela incerteza do futuro tanto do ponto de vista profissional quanto pessoal30.

Destaca o referido documento que,

embora esses sintomas sejam comuns a quase todos os pacientes, com o longo do tempo de evolução, às vezes, mesmo pacientes com pouco tempo de quei-xas também os apresentam, por testemunharem problemas que seus colegas na mesmas condições enfrentam, seja pela duração e dificuldade de tratamento, seja pela necessidade de peregrinação na estrutura burocrática da Previdência Social, seja pelas repercussões nas relações com a família, colegas e empresa.31

Assim, indica-se como tratamento, além de medicamentos, que devem ser prescritos de maneira cautelosa, a realização de atividades coletivas com grupos de adoecidos, apoio psicológico, participação em grupos informativo--psicoterapêutico-pedagógicos, além de terapia ocupacional e terapias comple-mentares32.

2.2 conDições De risco psicológico

Com a reestruturação produtiva e a adoção de um novo modo de gestão e organização do trabalho, especialmente a partir da década de 1990, inten-sificou-se o desemprego, a precarização, a terceirização e a flexibilização do trabalho, além da polivalência e maleabilidade de horários por parte dos traba-lhadores33.

Em empresas modernas, o perigo, atualmente, não reside necessariamen-te em ambientes escandalosamente insalubres, barulhentos e úmidos, mas nas imposições dos horários, de ritmo, de formação, de informação, das relações estabelecidas ali, além dos aspectos visíveis da organização e do processo de trabalho. Em relação aos bancários, muitas das adversidades patológicas não se observam diretamente em desgastes físicos, mas, sim, nas transgressões psíqui-cas que, ao longo de sua carreira, vão sofrendo34.

Em trabalho de pesquisa realizado na Cidade de Passo Fundo/RS, Claudia Mara Bosetto Cenci objetivou entender o contexto social ao qual os tra-

30 Instrução Normativa INSS/DC nº 98, de 5 de dezembro de 2003. Disponível em: <http://www.usp.br/drh/novo/legislacao/dou2003/mpasin98.html>. Acesso em: 15 nov. 2016.

31 Idem.32 Idem.33 MENDES, Jussara Maria Rosa. Teatro de sombras: relatório da violência no trabalho e a apropriação da saúde

dos bancários. Porto Alegre: SindBancários, 2011. p. 66.34 WÜNSCH, Guilherme. Inquietações sobre o dano existencial no direito do trabalho: o projeto de vida e a vida

de relação como proteção à saúde do trabalhador. Porto Alegre: HS Editora, 2015. p. 96-98.

Page 88: Nº 345 – Março 2018 · Revista SÍNTESE Trabalhista e Previdenciária Ano XXIX – nº 345 – MArço 2018 reposItórIo AutorIzAdo de JurIsprudêncIA Supremo Tribunal Federal

88 ...................................................................................................................RST Nº 345 – Março/2018 – PARTE GERAL – DOUTRINA

balhadores bancários se inserem, analisando como os obreiros veem a forma de organização do trabalho adotada, bem como a forma que se sentem ou reagem frente a ela. De tal modo, obteve as seguintes conclusões:

Os bancários, por medo do desemprego, buscam ajuda especializada, médica ou psicológica, somente quando a situação se torna insustentável por causa do sofrimento psíquico ou da dor física. Tal situação gera muito medo e desgaste constante, pois, com frequência, é ultrapassado o limite humano de tolerância em relação a cada atividade de seu trabalho. Em decorrência, o sofrimento men-tal é grande e com danos muitas vezes irreversíveis para o indivíduo.35

A atividade bancária é extremamente relacional. O resultado do negó-cio não depende apenas do empregado, mas depende fundamentalmente do cliente. É este quem decide qual o produto adquirir e qual o serviço que lhe in-teressa. Por sua vez, o empregado bancário tem metas a cumprir, portanto, sua avaliação resume-se a um número: o quanto ele produziu. Ele dorme pensando em metas, sonha com as metas, acorda pensando nas metas, e, em sua jornada diária, é cobrado duas, três, dez vezes pelo que já vendeu, ou deixou, e pelo que não vendeu. Resumindo, o bancário vive de metas36.

2.2.1 Assédio moral

Ana Carolina Gonçalves Vieira ensina que “o capitalismo, a globaliza-ção, a desvalorização do ser humano, o individualismo exacerbado e o temor relacionado com o desemprego emolduram, portanto, o cenário favorável (ou perfeito) para o surgimento do assédio moral”37.

Quando se fala em assédio moral, a conduta pode ser qualquer ação abusiva, de forma que é impossível estabelecer quais ações poderiam ser inter-pretadas como assédio moral, visto que esse pode se dar de diversas maneiras. Pode se dar na forma de reclamações aos gritos contra o empregado, gestos desabonadores, palavras ofensivas, um isolamento contínuo da vítima, a sua exclusão de tarefas, etc. Destaca-se que o caráter sistemático das agressões é sempre ressaltado, pois o assédio moral visa destruir a vítima, aniquilá-la física ou psiquicamente38.

Levando em consideração a categoria laboral estudada, há que se falar também do assédio moral organizacional, com caráter de política empresarial e instaurado em um modelo de gestão da empresa. Dessa forma, traz-se o concei-

35 Ibidem, p. 95.36 CERQUEIRA, Vinícius da Silva. Assédio moral organizacional nos bancos. São Paulo: LTr, 2015. p. 11-12.37 VIEIRA, Ana Carolina Gonçalves. Assédio moral no ambiente de trabalho: uma violação silenciosa à dignidade

humana no âmbito das relações de emprego. In: REIS, Daniela Muradas. Trabalho e justiça social: um tributo a Mauricio Godinho Delgado. São Paulo: LTr, 2013. p. 290.

38 Ibidem, p. 21.

Page 89: Nº 345 – Março 2018 · Revista SÍNTESE Trabalhista e Previdenciária Ano XXIX – nº 345 – MArço 2018 reposItórIo AutorIzAdo de JurIsprudêncIA Supremo Tribunal Federal

RST Nº 345 – Março/2018 – PARTE GERAL – DOUTRINA .......................................................................................................................89

to de Thereza Cristina Gosdal e Lis Andrea Soboll, citadas por Vinícius da Silva Cerqueira, conforme segue:

O assédio organizacional é um conjunto sistemático de práticas reiteradas, in-seridas nas estratégias e métodos de gestão, por meio de pressões, humilhações e constrangimentos, para que sejam alcançados determinados objetivos empre-sariais ou institucionais, relativos ao controle do trabalhador (aqui incluído o corpo, o comportamento e o tempo de trabalho), ou ao custo do trabalho, ou ao aumento de produtividade e resultados, ou exclusão ou prejuízo de indivíduos ou grupos com fundamentos discriminatórios.39

Em um estudo nacional sobre assédio moral na categoria bancária reali-zado em 2006, constatou-se que cerca de 40% dos bancários já passaram por situação constrangedora no trabalho. Em contrapartida, apenas 5,2% dos entre-vistados relataram ter sido vítimas de assédio moral e falaram sobre o assunto com alguém: 59,43% buscaram apoio na família, 44,48% comentaram com amigos, 32,64% procuraram um colega da empresa e apenas 19,54% buscaram o sindicato40.

Verifica-se, dessa forma, que se considera o assédio moral enquanto po-lítica de gestão de mão de obra um mecanismo de aprisionamento dos em-pregados para potencializar os lucros da empresa às custas da saúde de seus trabalhadores. Caracteriza-se, assim, o assédio moral como parte da estratégia da empresa de controlar seus empregados e aumentar sua produtividade, por meio de práticas violentas de gestão do trabalho41.

Uma matéria veiculada no Jornal do Sindicato dos Bancários e Financiá-rios de Bauru e Região, no Estado de São Paulo, em 25 de julho de 2016, traz o título: “Tragédia silenciosa: casos de suicídio entre os bancários necessita de atenção”. Naquela notícia é possível constatar que uma pesquisa divulgada pela Universidade Federal de Brasília fez uma análise sobre a relação “suicídio” e “bancários” junto de informações colhidas do Ministério da Saúde. O docu-mento revelou que, em média, entre 1993 a 2005, pelo menos um bancário co-meteu suicídio a cada 20 dias – estimando-se uma ocorrência diária de tentativa (não consumada) durante o período42.

39 CERQUEIRA, Vinícius da Silva. Assédio moral organizacional nos bancos. São Paulo: LTr, 2015. p. 34. Apud GOSDAL, Thereza Cristina; SOBOLL, Lis Andrea Pereira (Org.). Assédio moral interpessoal e organizacional. São Paulo: LTr, 2009. p. 37.

40 MACIEL, Regina Eloisa et al. Assédio moral no trabalho: impactos sobre a saúde dos bancários e sua relação com gênero e raça. Relatório de pesquisa. Recife: Sindicato dos Bancários de Pernambuco/Contraf, 2006, p. 44-81. Disponível em: <http://www.bancariospe.org.br/assedio/relatorio_final.pdf>. Acesso em: 21 out. 2016.

41 Ibidem, p. 34-35.42 JORNAL BANCÁRIOS NA FRENTE. Tragédia silenciosa: casos de suicídio entre os bancários necessita de

atenção. Disponível em: <http://www.seebbauru.org.br/admin/webeditor/uploads/files/20160725%20-%20banc%C3%A1rios%20na%20frente%20014_3.pdf>. Acesso em: 15 nov. 2016.

Page 90: Nº 345 – Março 2018 · Revista SÍNTESE Trabalhista e Previdenciária Ano XXIX – nº 345 – MArço 2018 reposItórIo AutorIzAdo de JurIsprudêncIA Supremo Tribunal Federal

90 ...................................................................................................................RST Nº 345 – Março/2018 – PARTE GERAL – DOUTRINA

Na mesma matéria é possível observar que o suicídio ligado ao trabalho bancário se tornou um fenômeno social, uma vez que, em 2015, e há pouco mais de um mês, novos casos envolvendo bancários foram revelados. Ainda, referem que há uma regra clara em meios de comunicação quando o tema é sui-cídio, que é o de que não se deve noticiar nenhum caso, sob pena de a impren-sa influenciar, involuntariamente, suicidas potenciais a cometerem o mesmo ato. Têm-se, dessa forma, que os números de suicídios possivelmente podem ser maiores; entretanto, não chegam a nosso conhecimento propositalmente43.

2.2.2 Síndrome de Burnout

O burnout pode ser definido como o resultado de uma inadequada ges-tão do estresse laborativo, em que um profissional, anteriormente empenhado, se desinteressa do trabalho em resposta ao estresse e à alta tensão experimenta-da no trabalho. É uma síndrome onde há uma progressiva perda do idealismo, de motivação e de expectativas para ser eficiente e fazer o bem, caracterizada pelo exaurimento emotivo e pela reduzida realização pessoal44.

Levando em consideração tais apontamentos, especificamente em re-lação aos bancários, fora realizado um estudo por parte de Maria da Graça Corrêa Jacques e Mayte Raya Amazarray, em que se constatou que tal categoria apresenta, em relação à síndrome de Burnout, dois fatores que concorrem para sua ocorrência: seus contextos de trabalho foram objeto de transformações or-ganizacionais e prestam serviços ao público. Assim, o envolvimento cotidiano com clientes expõe os bancários diariamente às problemáticas e dificuldades das pessoas atendidas45.

Para concluir, necessário referir que Diego Reato realizou trabalho sobre a prevalência da síndrome de Burnout no setor bancário no Município de Ara-çatuba/SP, concluindo que há a necessidade de o setor bancário rever as suas políticas e práticas de gestão para tentar reverter a situação dos elevados níveis de dimensão da síndrome, de modo que, do contrário, a tendência é de um dis-tanciamento cada vez maior entre os indivíduos e os valores, os objetivos e as missões da empresa46. Aduziu, ainda, que, “dentre as práticas de gestão possí-

43 Idem.44 NASSIF, Elaine. Burnout, mobbing e outros males do stress: aspectos jurídicos e psicológicos. Revista LTr, ano

70-06, p. 730, jun. 2006.45 JACQUES, Maria da Graça Corrêa; AMAZARRAY, Mayte Raya. Trabalho bancário e saúde mental no paradigma

da excelência. Disponível em: <http://www.medtrab.ufpr.br/arquivos%20para%20download/saude_mental/trabalho%20banc%c1rio%20e%20sa%dade%20mental%20no%20paradigma%20da%20excel%cancia.pdf>. Acesso em: 21 out. 2016.

46 REATTO, Diogo. Prevalência da síndrome de Burnout no setor bancário no Município de Araçatuba/SP. Disponível em: <http://www.archhealthinvestigation.com.br/index.php/ArcHI/article/view/662>. Acesso em: 21 out. 2016.

Page 91: Nº 345 – Março 2018 · Revista SÍNTESE Trabalhista e Previdenciária Ano XXIX – nº 345 – MArço 2018 reposItórIo AutorIzAdo de JurIsprudêncIA Supremo Tribunal Federal

RST Nº 345 – Março/2018 – PARTE GERAL – DOUTRINA .......................................................................................................................91

veis de serem adotadas estão aquelas que envolvem os programas de Qualidade de Vida no Trabalho”47.

2.2.3 Dano existencial

Rodrigo Wasem Galia, ao discorrer sobre os direitos da personalidade, refere que eles “estão baseados na dignidade da pessoa humana e figuram como a consequência do reconhecimento do princípio da dignidade e pelos demais princípios a estes subordinados”48. Nessa linha, Flaviana Rampazzo Soares le-ciona que, “por isso, não possuem expressão econômica imediata, são direitos subjetivos não patrimoniais, em que pese o fato de que tais atributos são impor-tantes para a pessoa alcançar bens materiais”49.

O assédio no local de trabalho reúne em si uma série de prejuízos na esfera existencial da pessoa, sendo que tais prejuízos são gravados na existên-cia do empregado, resultando em um dano existencial. Esses prejuízos podem decorrer de atos que não prejudicam a saúde, mas impedem-na de continuar a desenvolver uma atividade que lhe dê prazer e realização pessoal50.

Conforme discorrem Goldschmidt e Lora:

O dano existencial distingue-se do dano moral porque não se restringe a uma amargura, a uma aflição, caracterizando-se pela renúncia a uma atividade con-creta. O dano moral propriamente dito afeta negativamente o ânimo da pes-soa, estando relacionado ao sentimento, ou seja, é um sentir, enquanto o dano existencial é um não mais poder fazer, um dever de mudar a rotina. O dano existencial frustra projeto de vida da pessoa, prejudicando seu bem-estar e sua felicidade.51

O principal obstáculo levantando pelos críticos da teoria do dano exis-tencial reside na sua subsunção pelo dano moral. Em defesa da tese do dano existencial, Márcia Novaes Guedes argumenta que o dano moral devido, ge-ralmente, ocorre em virtude de uma conduta de tipo penal relevante, enquanto que o dano existencial implica em um “não fazer” e se caracteriza pelo fato de obstacularizar a atividade na qual a pessoa se sente realizada52.

47 Idem.48 WÜNSCH, Guilherme. Inquietações sobre o dano existencial no direito do trabalho: o projeto de vida e a vida

de relação como proteção à saúde do trabalhador. Porto Alegre: HS Editora, 2015. p. 60.49 SORES, Flaviana Rampazzo. Responsabilidade civil por dano existencial. Porto Alegre: Libraria do Advogado,

2009. p. 35.50 Ibidem, p. 61.51 GOLDSCHMIDT, Rodrigo Goldschmidt; LORA, Ilse Marcelina Bernardi. O dano existencial no Direito do

Trabalho. Jus navigandi, Teresina, ano 19, n. 3951, 26 abr. 2014. Disponível em: <https://jus.com.br/artigos/27899/o-dano-existencial-no-direito-do-trabalho>. Acesso em: 30 out. 2016.

52 GUEDES, Márcia Novaes. Terror psicológico no trabalho. São Paulo: LTr, 2005. p. 137-138.

Page 92: Nº 345 – Março 2018 · Revista SÍNTESE Trabalhista e Previdenciária Ano XXIX – nº 345 – MArço 2018 reposItórIo AutorIzAdo de JurIsprudêncIA Supremo Tribunal Federal

92 ...................................................................................................................RST Nº 345 – Março/2018 – PARTE GERAL – DOUTRINA

3 A JUDICIALIZAÇÃO DAS QUESTÕES ACIDENTÁRIAS

Inicia-se este título com uma reflexão de Vinícius da Silva Cerqueira so-bre o enfrentamento das demandas de acidente de trabalho envolvendo a cate-goria dos bancários, conforme segue:

Uma sentença que defira horas extras liquida-se pelo simples cálculo da quanti-dade de horas trabalhadas ou de uma estimativa. Mas quanto vale uma tendinite que impede a pessoa até de escrever seu nome? Quanto custa uma depressão? Dores de cabeça constantes? Qual o valor a se pagar a um indivíduo que passa o fim de semana trancado no quarto, longe do convívio social? Nas faculdades de direito, ensina-se que a condenação por assédio deve observar as condições econômicas do reclamado. Sendo assim, como explicar uma condenação de R$ 10 mil a uma empresa que lucra R$ 10 bilhões em um ano?53

Em razão do mesmo acidente de trabalho, poderá o trabalhador ajuizar três autônomas demandas judiciais, quais sejam: a ação acidentária contra o INSS, a ação de reparação de danos contra o empregador e, ainda, a ação con-tra a seguradora privada (ação securitária), tudo de acordo com a legislação em vigor, especialmente o art. 7º, XXVIII, da Constituição Federal de 1988.

3.1 ação aciDentária contra o inss

Ocorrendo um acidente de trabalho – acidente típico ou doença ocu-pacional – ou no trajeto para o trabalho (acidente in itinere), é possível que o trabalhador necessite de um período maior de afastamento das dependências da empresa. Sendo assim, a partir do 16º dia de afastamento cabe ao INSS conceder um benefício acidentário ao empregado lesionado, devendo realizar perícias de rotina, no sentido de avaliar o desenvolvimento do quadro clínico, bem como a perspectiva de retorno do acidentado ao mercado de trabalho54.

Permanecendo o trabalhador por mais de quinze dias afastado do tra-balho, será determinado pelo INSS a concessão de um benefício provisório (o auxílio-doença); é pouco provável a concessão de um benefício de natureza definitiva (o auxílio-acidente ou até mesmo a aposentadoria por invalidez). Em casos acidentários mais graves, é de praxe a concessão do INSS de certo perí-odo para análise de peculiaridades em um centro de reabilitação profissional, para um posterior encaminhamento da melhor solução ao obreiro55.

Qualquer discussão a respeito de eventual ilegalidade nessa seara ad-ministrativa de concessão de benefício acidentário deverá ser resolvida na via judicial (Justiça Estadual), nos termos do art. 129 da Lei nº 8.213/1991,

53 CERQUEIRA, Vinícius da Silva. Assédio moral organizacional nos bancos. São Paulo: LTr, 2015. p. 12.54 ARAÚJO, Francisco Rossal de; RUBIN, Fernando. Acidentes de trabalho. São Paulo: LTr, 2013. p. 163.55 Idem, ibidem.

Page 93: Nº 345 – Março 2018 · Revista SÍNTESE Trabalhista e Previdenciária Ano XXIX – nº 345 – MArço 2018 reposItórIo AutorIzAdo de JurIsprudêncIA Supremo Tribunal Federal

RST Nº 345 – Março/2018 – PARTE GERAL – DOUTRINA .......................................................................................................................93

bem como pela Súmula nº 15 do STJ. Sobre o tema, ensina Odonoel Urbano Gonçalves, em sua obra Manual de direito previdenciário: “Numa ação aci-dentária, o pólo passivo será ocupado por uma autarquia federal (INSS), órgão legalmente encarregado de materializar os benefícios e serviços previstos nas leis da infortunística”56.

3.2 ação De reparação De Danos contra o empregaDor

A adoção da teoria subjetiva nos casos de acidente de trabalho, ou seja, a responsabilidade civil do empregador por dolo ou culpa, se deve ao fato de que, ao lado da responsabilidade civil, existem os benefícios acidentários, que são inspirados na teoria objetiva (teoria do risco social)57.

Há que se referir que a simples culpa do empregador abre oportunidade ao trabalhador para obter indenização pelo direito comum. Pode-se afirmar que três são os pressupostos da ação de responsabilidade derivada de um acidente de trabalho, sendo elas: a) dano experimentado pelo operário; b) culpa do em-pregador ou do preposto; e c) nexo causal entre o ato culposo e o dano58.

Em relação aos danos morais suportados pela pessoa, há de se referir que estes se estendem da lesão corporal à morte. Se o ato ilícito redundou em homicídio, a indenização consistirá no ressarcimento das despesas com o trata-mento da vítima, seu funeral, o luto da família e, se for o caso, na prestação de uma pensão às pessoas a quem o falecido devia alimentos. Em se tratando de lesão corporal, a responsabilidade civil do ofensor variará conforme a extensão do gravame imposto ao ofendido: desde o simples ressarcimento das despesas médicas do tratamento e dos lucros cessantes ao tempo em que a vítima esteve impedida de laborar, até uma pensão correspondente à importância do trabalho para que o inabilitou59.

No caso específico dos bancários, a culpa da empresa que autoriza a ação autônoma trabalhista indenizatória comumente é comprovada pelo exces-so de horário extraordinário (superior à jornada de trabalho de seis horas), pela inexistência de intervalo intrajornada (que deveria ser de 15 minutos), além da inexistência de intervalo especial para os bancários que atuam em atividade de digitação60.

56 GONÇALVES, Odonel Urbano. Manual de direito previdenciário. São Paulo: Atlas, 2007. p. 254.57 Ibidem, p. 164.58 MONTENEGRO, Antonio Lindberg C. Ressarcimento de danos pessoais e materiais. Rio de Janeiro: Lumen

Juris, 1999. p. 355.59 THEODORO JÚNIOR, Humberto. Responsabilidade civil – Danos morais e patrimoniais – Acidente de trabalho

– Ato de preposto. In: NERY JUNIOR, Nelson. Responsabilidade civil. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2010. p. 568.

60 RUBIN, Fernando. Teatro de sombras: relatório da violência no trabalho e a apropriação da saúde dos bancários. Porto Alegre: SindBancários Publicações, 2011. p. 129.

Page 94: Nº 345 – Março 2018 · Revista SÍNTESE Trabalhista e Previdenciária Ano XXIX – nº 345 – MArço 2018 reposItórIo AutorIzAdo de JurIsprudêncIA Supremo Tribunal Federal

94 ...................................................................................................................RST Nº 345 – Março/2018 – PARTE GERAL – DOUTRINA

O prazo prescricional para reclamar qualquer direito reparatório é de três anos, constando ditado no art. 206, § 3º, inciso V, do Código Civil, conforme se observa: “Art. 206. Prescreve: [...] § 3º Em três anos: [...] V – a pretensão de reparação civil”.

Em relação à prática forense, Fernando Rubin refere que, na Cidade de Porto Alegre, há uma vara especializada no julgamento de processos envolven-do acidentes de trabalho, tendo como fundamento lógico para tal separação a natureza jurídica da matéria, a exigir conhecimentos mais específicos do magis-trado e, principalmente, pela instrução do feito que exige provas pericial e oral diversas daquelas exigidas para as demandas trabalhistas típicas61.

3.3 ação securitária

Em se tratando de incapacidade laborativa decorrente do trabalho, pode o obreiro ingressar com demanda jurídica contra a seguradora privada, a fim de buscar um prêmio em decorrência do sinistro pelo qual pagou por boa parte de sua vida dentro da instituição empregadora. O seguro privado em razão dos aci-dentes pessoais é, em tese, oferecido, e não imposto, aos empregados, e, sendo de interesse expresso do trabalhador, passa a ser descontado do contracheque62.

O grande diploma infraconstitucional que regula o tema é o Código Civil, ao qual consta, a partir do art. 757, que, pelo contrato de seguro, o segurador se obriga, mediante o pagamento de prêmio, a garantir interesse do segurado relativo à pessoa ou à coisa contra riscos predeterminados.

Fernando Rubin deixa claro que a demanda deve seguir o rito comum ordinário – procedimento comum na nomenclatura utilizada pelo novo Código de Processo Civil –, não sendo a hipótese de ingresso imediato com ação de execução, uma vez que o seguro contra acidentes pessoais não se configura mais como legítimo título executivo extrajudicial63.

O mesmo autor, ao destacar as dificuldades envolvendo a presente de-manda, refere que há a necessidade de superar questões preliminares, tais como a necessária negativa administrativa por parte da seguradora privada e, poste-riormente, a questão prejudicial de mérito de prescrição de um ano. Ao adentrar no mérito do seguro, dificuldade há na percepção do prêmio quando analisadas as cláusulas contratuais, especialmente aquelas que preveem os sinistros auto-rizadores do pagamento do prêmio64.

61 RUBIN, Fernando. Introdução geral à previdência social: dos conceitos teóricos, institutos fundamentais e rede de benefícios do regime previdenciário. São Paulo: LTr, 2016. p. 116.

62 Idem.63 Ibidem, p. 117.64 RUBIN, Fernando. Processo judicial de seguro (privado) em razão de acidente de trabalho. São Paulo, 2015.

p. 5. Disponível em: <http://www.artigos.com/index.php?option=com_mtree&task=att_download&link_id=9636&cf_id=2>. Acesso em: 30 out. 2016.

Page 95: Nº 345 – Março 2018 · Revista SÍNTESE Trabalhista e Previdenciária Ano XXIX – nº 345 – MArço 2018 reposItórIo AutorIzAdo de JurIsprudêncIA Supremo Tribunal Federal

RST Nº 345 – Março/2018 – PARTE GERAL – DOUTRINA .......................................................................................................................95

Igualmente, conclui-se que a demanda securitária é um opção possível para o segurado lesionado em virtude de acidente de trabalho buscar o prêmio para o qual optou contribuir ao longo do vínculo empregatício. Utiliza-se, para tanto, a legislação acidentária cumulada com o Código Civil, o Código de Pro-cesso Civil e o Código de Defesa do Consumidor65.

4 ANÁLISE JURISPRUDENCIALFinalizando o presente artigo, julgou-se necessário um estudo acerca da

atual situação envolvendo o valor das condenações no que se refere à matéria junto ao Tribunal Regional de Trabalho da 4ª Região. Dessa forma, procurou estabelecer-se um parâmetro acerca das indenizações envolvendo o trabalha-dor bancário e os temas relativos a assédio moral, dano existencial e doença ocupacional, eis que, conforme exposto no decurso deste trabalho de pesquisa, tais situações remontam o maior número de incidências acidentárias envolven-do a categoria bancária.

Nesse sentido, analisando primeiramente a relação havida entre o bancá-rio e o sofrimento de assédio moral, cumpre esclarecer que foram utilizados os seguintes parâmetros metodológicos para a análise da pesquisa: estabeleceram--se como busca as palavras “bancário” e “assédio moral”; utilizaram-se como classe de análise as decisões em sede de “recurso ordinário”; o período de análise compreendeu os acórdãos prolatados entre 30.07.2016 e 30.10.2016.

Dessa feita, tem-se o seguinte resultado:

tabela 1 – análise De jurispruDência (parâmetros De busca: “bancário” e “asséDio sexual”)

análiSe de JuRiSpRudência

núMeRo do pRoceSSo valoR da condenação

0020329-94.2015.5.04.0123 R$ 30.000,00

0020325-63.2014.5.04.0003 R$ 10.000,00

0001490-71.2012.5.04.0302 R$ 5.000,00

0021153-44.2014.5.04.0202 R$ 10.000,00

0020489-20.2013.5.04.0405 R$ 10.000,00

0020425-69.2015.5.04.0104 R$ 20.000,00

0020174-91.2015.5.04.0123 R$ 20.000,00

0000594-75.2014.5.04.0102 R$ 20.000,00

0020240-34.2014.5.04.0373 R$ 5.000,00

0000755-77.2013.5.04.0601 R$ 30.000,00

0000328-21.2014.5.04.0383 R$ 10.000,00

0021690-61.2014.5.04.0001 R$ 12.000,00

65 RUBIN, Fernando. Procedimentos judiciais em direito social. Disponível em: <http://www.artigos.com/index.php?option=com_mtree&task=att_download&link_id=12802&cf_id=24>. Acesso em: 15 nov. 2016. Ver item XIII, que trata dos contratos de seguro privado envolvendo incapacidade acidentária.

Page 96: Nº 345 – Março 2018 · Revista SÍNTESE Trabalhista e Previdenciária Ano XXIX – nº 345 – MArço 2018 reposItórIo AutorIzAdo de JurIsprudêncIA Supremo Tribunal Federal

96 ...................................................................................................................RST Nº 345 – Março/2018 – PARTE GERAL – DOUTRINA

análiSe de JuRiSpRudência

núMeRo do pRoceSSo valoR da condenação

0020419-27.2014.5.04.0030 R$ 15.000,00

0001033-32.2010.5.04.0521 R$ 15.000,00

0020342-84.2015.5.04.0029 R$ 15.000,00

0000065-66.2015.5.04.0831 R$ 50.000,00

0000861-39.2013.5.04.0601 R$ 15.000,00

0010108-93.2014.5.04.0541 R$ 10.000,00

0001037-29.2013.5.04.0662 R$ 15.000,00

0000493-84.2014.5.04.0701 R$ 20.000,00

Média R$ 16.850,00

Destaca-se que diversos foram os julgados em que os trabalhadores não alcançaram o sucesso na demanda em razão da dificuldade de provas, uma vez que não se conseguiu formar o convencimento dos Desembargadores quanto ao assédio praticado pelos empregadores.

Já em relação ao trabalhador bancário e ao dano existencial, utilizaram--se os seguintes parâmetros metodológicos para a análise da pesquisa: estabele-ceram-se como busca as palavras “bancário” e “dano existencial”; utilizaram-se como classe de análise as decisões em sede de “recurso ordinário”; o período de análise compreendeu os acórdãos prolatados entre 01.01.2016 e 30.10.2016.

De tal modo, tem-se o seguinte resultado:

tabela 2 – análise De jurispruDência (parâmetros De busca: “bancário” e “Dano existencial”)

análiSe de JuRiSpRudência

núMeRo do pRoceSSo valoR da condenação

0000785-55.2013.5.04.0232 R$ 20.000,00

0000149-37.2015.5.04.0841 R$ 2.000,00

0000721-16.2015.5.04.0801 R$ 15.000,00

0020210-85.2014.5.04.0021 R$ 50.000,00

0020315-14.2014.5.04.0522 R$ 30.000,00

0000503-31.2014.5.04.0701 R$ 35.000,00

Média R$ 25.333,33

Constata-se, primeiramente, o aumento do período de pesquisa e o re-duzido número de condenações, eis que denota a flagrante dificuldade de con-denação em relação ao pedido de dano existencial. Infere-se que, na grande maioria dos acórdãos em que não se obteve sucesso na demanda, os Desem-bargadores debruçaram-se sob o argumento de que o mero cumprimento de jornada de trabalho extensa não seria capaz de gerar o convencimento acerca do sofrimento de um dano existencial.

Page 97: Nº 345 – Março 2018 · Revista SÍNTESE Trabalhista e Previdenciária Ano XXIX – nº 345 – MArço 2018 reposItórIo AutorIzAdo de JurIsprudêncIA Supremo Tribunal Federal

RST Nº 345 – Março/2018 – PARTE GERAL – DOUTRINA .......................................................................................................................97

Ademais, em relação aos julgados, cabe mencionar ainda que o TRT 4ª Região formulou a Tese Jurídica Prevalecente nº 2, que trata especificamente sobre a jornada de trabalho excessiva e a indenização por dano existencial, conforme se verifica:

JORNADAS DE TRABALHO EXCESSIVAS – INDENIZAÇÃO POR DANO EXIS-TENCIAL

Não configura dano existencial, passível de indenização, por si só, a prática de jornadas de trabalho excessivas.66

Quanto à análise acerca da LER/DORT e o trabalhador bancário, foram utilizados os seguintes parâmetros metodológicos para a análise da pesquisa: estabeleceram-se como busca as palavras “bancário” e “doença ocupacio-nal”; utilizaram-se como classe de análise as decisões em sede de “recurso ordinário”; o período de análise compreendeu os acórdãos prolatados entre 30.07.2016 e 30.10.2016.

Sendo assim, tem-se o seguinte resultado:

tabela 2 – análise De jurispruDência (parâmetros De busca: “bancário” e “Doença ocupacional”)

análiSe de JuRiSpRudência

núMeRo do pRoceSSo valoR da condenação

0001497-69.2013.5.04.0030 R$ 40.000,00

0000513-90.2014.5.04.0211 R$ 18.800,00

0010109-69.2012.5.04.0211 R$ 44.469,55

0020393-63.2013.5.04.0030 R$ 40.000,00

0020288-18.2015.5.04.0030 R$ 20.000,00

0000823-28.2012.5.04.0030 R$ 50.000,00

0000888-43.2013.5.04.0012 R$ 20.000,00

0000328-21.2014.5.04.0383 R$ 10.000,00

0000866-28.2013.5.04.0030 R$ 20.000,00

0021458-59.2014.5.04.0030 R$ 20.000,00

0020148-18.2014.5.04.0030 R$ 25.000,00

0020419-27.2014.5.04.0030 R$ 15.000,00

0020105-47.2015.5.04.0030 R$ 20.000,00

0020069-39.2014.5.04.0030 R$ 40.000,00

0000568-36.2013.5.04.0030 R$ 10.000,00

0001332-22.2013.5.04.0030 R$ 7.000,00

0000594-75.2014.5.04.0102 R$ 20.000,00

0000755-77.2013.5.04.0601 R$ 30.000,00

0000493-84.2014.5.04.0701 R$ 20.000,00

Média R$ 24.751,03

66 BRASIL. Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região, Tese Jurídica Prevalecente nº 2. Disponível em: <http://www.trt4.jus.br/portal/portal/trt4/consultas/jurisprudencia/teseJurIdicaPrevalescente>. Acesso em: 2 out. 2016.

Page 98: Nº 345 – Março 2018 · Revista SÍNTESE Trabalhista e Previdenciária Ano XXIX – nº 345 – MArço 2018 reposItórIo AutorIzAdo de JurIsprudêncIA Supremo Tribunal Federal

98 ...................................................................................................................RST Nº 345 – Março/2018 – PARTE GERAL – DOUTRINA

No que tange à doença ocupacional, constatou-se um grande número de acórdãos analisando tal matéria decorrente das atividades laborais do bancário; entretanto, a grande dificuldade probatória consistia em efetivar a existência do nexo técnico epistemiológico, o qual também fora objeto deste trabalho de pesquisa. Gize-se que a imensa maioria das demandas que obtiveram sucesso em relação à doença ocupacional estava calcada em laudo pericial formalizado por médico de confiança do magistrado de primeiro grau.

CONCLUSÃO

Destaca-se que a categoria estudada, qual seja, o bancário, não está ex-posta a ambiente insalubre ou perigoso, de modo que, como visto, seus aciden-tes de trabalho não podem ser considerados “inesperados”. O que se demons-trou é que o bancário sofre pela “condição de trabalho” ao qual é exposto, seja em relação aos acidentes de ordem física, seja pelas lesões de esforço repetitivo e àquelas de ordem ergonômica, como também em relação aos acidentes de ordem psíquica, onde acabam por estar à mercê de superiores que praticam assédio moral ante o não atingimento de metas absurdas ou, ainda, pelo dano existencial e pela síndrome de Burnout, por ter de cumprir jornadas extenuantes para atingir as expectativas patronais.

Espera-se que o objetivo inicial tenha sido alcançado, qual seja, o de sub-sidiar profissionais das áreas bancária e jurídica a, em um primeiro momento, tomarem conhecimento acerca da dimensão negativa que o modelo de gestão atual empregado pelos bancos repercute na saúde do indivíduo, uma vez que, conforme evidenciado, reiterados danos físicos e psíquicos são constatados anualmente nos bancários.

REFERÊNCIASAMAZARRAY, Mayte Raya. Teatro de sombras: relatório da violência no trabalho e a apropriação da saúde dos bancários. Porto Alegre: SindBancários, 2011.

ANTONALIA, Claudio. LER (lesão por esforço repetitivo); DORT (distúrbios osteomo-leculares relacionados ao trabalho); prejuízos sociais e fator multiplicador do custo Brasil. São Paulo: LTr, 2001.

ARAÚJO, Francisco Rossal de; RUBIN, Fernando. Acidentes de trabalho. São Paulo: LTr, 2013.

BARBOSA FILHO, Antonio Nunes. Segurança do trabalho & gestão ambiental. 3. ed. São Paulo: Atlas, 2010.

BELLUSCI, Silva Meirelles. Doenças profissionais ou do trabalho. São Paulo: Senac São Paulo, 1999.

BENSOUSSAN, Eddy. Manual de gestão e prática em saúde ocupacional. 1. ed. Rio de Janeiro: GZ Editora, 2010.

Page 99: Nº 345 – Março 2018 · Revista SÍNTESE Trabalhista e Previdenciária Ano XXIX – nº 345 – MArço 2018 reposItórIo AutorIzAdo de JurIsprudêncIA Supremo Tribunal Federal

RST Nº 345 – Março/2018 – PARTE GERAL – DOUTRINA .......................................................................................................................99

BRASIL. Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região, Tese Jurídica Prevalecente nº 2. Disponível em: <http://www.trt4.jus.br/portal/portal/trt4/consultas/jurisprudencia/teseJu--ridicaPrevalescente>. Acesso em: 2 out. 2016.

CERQUEIRA, Vinícius da Silva. Assédio moral organizacional nos bancos. São Paulo: LTr, 2015.

GALAFASSI, Maria Cristina. Medicina do trabalho: programa de controle médico de saúde ocupacional (NR 7). São Paulo: Atlas, 1998.

GOLDSCHMIDT, Rodrigo Goldschmidt; LORA, Ilse Marcelina Bernardi. O dano existencial no Direito do Trabalho. Jus Navigandi, Teresina, ano 19, n. 3951, 26 abr. 2014. Disponível em: <https://jus.com.br/artigos/27899/o-dano-existencial-no-direito--do-trabalho>. Acesso em: 30 out. 2016.

GONÇALVES, Odonel Urbano. Manual de direito previdenciário. São Paulo: Atlas, 2007.

GOSDAL, Thereza Cristina; SOBOLL, Lis Andrea Pereira (Org.). Assédio moral interpes-soal e organizacional. São Paulo: LTr, 2009.

GUEDES, Márcia Novaes. Terror psicológico no trabalho. São Paulo: LTr, 2003.

IGHER, Walter Filho. LER/DORT – A psicossomatização no processo de surgimento e agravamento. São Paulo: LTr, 2001.

JACQUES, Maria da Graça Corrêa; AMAZARRAY, Mayte Raya. Trabalho bancário e saúde mental no paradigma da excelência. Disponível em: <http://www.medtrab.ufpr.br/arquivos%20para%20download/saude_mental/trabalho%20banc%c1rio%20e%20sa%dade%20mental%20no%20paradigma%20da%20excel%cancia.pdf>. Acesso em: 21 out. 2016.

MACIEL, Regina Eloisa et al. Assédio moral no trabalho: impactos sobre a saúde dos bancários e sua relação com gênero e raça. Relatório de pesquisa. Recife: Sindicato dos Bancários de Pernambuco/Contraf, 2006. Disponível em: <http://www.bancariospe.org.br/assedio/relatorio_final.pdf>. Acesso em: 21 out. 2016.

MARTINS, Sergio Pinto. Direito do trabalho. 24. ed. São Paulo: Atlas, 2008.

MENDES, Jussara Maria Rosa. Teatro de sombras: relatório da violência no trabalho e a apropriação da saúde dos bancários. Porto Alegre: SindBancários, 2011.

MINISTÉRIO DO TRABALHO E EMPREGO SECRETARIA DE INSPEÇÃO DO TRABA-LHO. Portaria nº 3.214, 8 de junho de 1978. “Aprova as Normas Regulamentadoras – NR – do Capítulo V, Título II, da Consolidação das Leis do Trabalho, relativas à Segurança e Medicina do Trabalho”. Disponível em: <http://www.camara.gov.br/sileg/integras/839945.pdf>. Acesso em: 11 set. 2016.

MONTENEGRO, Antonio Lindberg C. Ressarcimento de danos pessoais e materiais. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 1999.

NASSIF, Elaine. Burnout, mobbing e outros males do stress: aspectos jurídicos e psico-lógicos. Revista LTr, ano 70-06, jun. 2006.

OLIVEIRA, Sebastião Geraldo de. Proteção jurídica à saúde do trabalhador. 4. ed. rev., ampl. e atual. São Paulo: LTr, 2002.

Page 100: Nº 345 – Março 2018 · Revista SÍNTESE Trabalhista e Previdenciária Ano XXIX – nº 345 – MArço 2018 reposItórIo AutorIzAdo de JurIsprudêncIA Supremo Tribunal Federal

100 ................................................................................................................RST Nº 345 – Março/2018 – PARTE GERAL – DOUTRINA

PERES, Leandro. País gasta R$ 981 milhões com LER em bancários. Recuperado em 30 set. 2016, de Folha de São Paulo. Disponível em: <http://www1.folha.uol.com.br/folha/dinheiro/ult91u116625.shtml>. Acesso em: 2 out. 2016.

REATTO, Diogo. Prevalência da síndrome de Burnout no setor bancário no Município de Araçatuba/SP. Disponível em: <http://www.archhealthinvestigation.com.br/index.php/ArcHI/article/view/662>. Acesso em: 21 out. 2016.

RUBIN, Fernando. Introdução geral à previdência social: dos conceitos teóricos, institu-tos fundamentais e rede de benefícios do regime previdenciário. São Paulo: LTr, 2016.

______. Teatro de sombras: relatório da violência no trabalho e a apropriação da saúde dos bancários. Porto Alegre: SindBancários, 2011.

SALIBA, Tuffi Messias. Curso básico de segurança e higiene ocupacional. São Paulo: LTr, 2004.

______. Higiene do trabalho e PPRA. São Paulo: LTr, 1997.

SORES, Flaviana Rampazzo. Responsabilidade civil por dano existencial. Porto Alegre: Libraria do Advogado, 2009.

THEODORO JÚNIOR, Humberto. Responsabilidade civil – Danos morais e patrimo-niais – Acidente de trabalho – Ato de preposto. In: NERY JUNIOR, Nelson. Responsabi-lidade civil. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2010.

VIANNA, Segadas. Instituições de direito do trabalho. 19. ed., v. II, 1961.

VIEIRA, Ana Carolina Gonçalves. Assédio moral no ambiente de trabalho: uma vio-lação silenciosa à dignidade humana no âmbito das relações de emprego. In: REIS, Daniela Muradas. Trabalho e justiça social: um tributo a Mauricio Godinho Delgado. São Paulo: LTr, 2013.

WÜNSCH, Guilherme. Inquietações sobre o dano existencial no direito do trabalho: o projeto de vida e a vida de relação como proteção à saúde do trabalhador. Porto Alegre: HS Editora, 2015.

Page 101: Nº 345 – Março 2018 · Revista SÍNTESE Trabalhista e Previdenciária Ano XXIX – nº 345 – MArço 2018 reposItórIo AutorIzAdo de JurIsprudêncIA Supremo Tribunal Federal

Parte Geral – Doutrina

Identificação da Deficiência para Fins de Aposentadoria Diferenciada no Regime Geral de Previdência Social Brasileira

JOÃO MARCELINO SOARESAdvogado, Membro da Comissão de Direito Previdenciário da Ordem dos Advogados do Brasil – OAB/PR, Gerente de APS do Instituto Nacional do Seguro Social – INSS, Especialista em Direito Previdenciário e Processual Previdenciário pela PUC/PR, Bacharel em Direito pela PUC/PR, Palestrante, Professor e Autor de artigos e livros de Direito Previdenciário.

RESUMO: A Convenção Internacional sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência (Convenção de Nova York), assinada em Nova York em 30.03.2007, traz o seguinte conceito de deficiência: “Impe-dimentos de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, os quais, em interação com diversas barreiras, podem obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas”. Tal conceito, fundado em um novo panorama estabelecido pela Classificação Internacional de Funcionalidade, Incapacidade e Saúde – CIF, foi internalizado no ordenamento jurídico pátrio com status constitucional, com fulcro no art. 5º, § 3º, da Constituição da República. Nesse contexto, o presente estudo propõe detalhar tal conceito e investigar a metodo-logia utilizada pela previdência social brasileira na identificação e gradação da deficiência para fins de redução de requisitos concessórios da aposentadoria por tempo de contribuição e aposentadoria por idade.

PALAVRAS-CHAVE: Aposentadorias; deficiência; identificação.

SUMÁRIO: Introdução; 1 Fundamentos do tratamento diferenciado na aposentadoria da pessoa com deficiência; 1.1 Princípio da igualdade material; 1.2 Vedação de critérios diferenciados; 2.3 Exceções à vedação de critérios diferenciados; 2 Pessoa com deficiência; 2.1 Conceito constitucional de defi-ciência (Convenção de Nova York); 2.2 Classificação Internacional de Funcionalidade, Incapacidade e Saúde – CIF; 2.3 Gradação da deficiência; 2.3.1 Índice de Funcionalidade Brasileiro aplicado para fins de aposentadoria – IFBrA; 2.3.1.1 Identificação das barreiras externas; 2.3.1.2 Método linguístico fuzzy; 2.3.1.3 Cálculo final; 2.4 Perícia judicial; Conclusão; Referências.

INTRODUÇÃO

As pessoas com deficiência devem ser discriminadas. Em verdade, todas as minorias possuem o direito de serem discriminadas. Não no plano fático, em que tal segregação, aviltante à dignidade humana, é odiosa e deve ser rechaça-da. A discriminação deve existir no plano normativo, tratando-se diferenciada-mente tais destinatários, com vistas à concretização da igualdade material e o nivelamento jurídico de situações faticamente desiguais.

A embriaguez de governos déspotas, a asfixia subordinante do absolu-tismo, a isonomia formal do liberalismo, o relativismo moral, o coronelismo

Page 102: Nº 345 – Março 2018 · Revista SÍNTESE Trabalhista e Previdenciária Ano XXIX – nº 345 – MArço 2018 reposItórIo AutorIzAdo de JurIsprudêncIA Supremo Tribunal Federal

102 ................................................................................................................RST Nº 345 – Março/2018 – PARTE GERAL – DOUTRINA

autoritário, a opressão de sistemas ditatoriais, a ganância do capital, tudo isso construiu séculos de violações, exclusões, intolerâncias e discriminações. A desconstrução cabe a nós, com a realização de ações afirmativas, proteção dos direitos humanos, concretização da fundamentalidade constitucional, interpre-tação principiológica do Direito, como ferramentas para um tratamento especí-fico e diferenciado às minorias.

Essa proteção às minorias encontra agudo interesse no direito previden-ciário, que, por detrás de toda sua edificação científica, não passa de um instru-mento de proteção da sociedade e do indivíduo, com atenuação de riscos so-ciais, tutela da dignidade e emancipação civilizatória do sujeito, possibilitando que este desenvolva, com tranquilidade, sua personalidade e potencialidade.

Neste norte, a Constituição da República também prevê esse “direito à diferença” no momento da jubilação. Uma pessoa que é diariamente invadida em sua higidez por um labor nocivo, um sujeito que desafia uma jornada de trabalho superando barreiras impostas pela deficiência, um trabalhador que en-frenta a penosa labuta no campo ou que se entrega à árdua tarefa da docência básica, todos certamente devem ser recompensados com a redução de requisi-tos concessórios em suas aposentadorias.

No particular da pessoa com deficiência, a jubilação diferenciada foi prevista no art. 201, § 1º, da Constituição da República pela Emenda Constitu-cional nº 47/2005:

É vedada a adoção de requisitos e critérios diferenciados para a concessão de aposentadoria aos beneficiários do regime geral de previdência social, ressalva-dos os casos de atividades exercidas sob condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física e quando se tratar de segurados portadores de deficiência, nos termos definidos em lei complementar.

A lei complementar a que alude o texto constitucional entrou em vigor em 09.11.2013 (LC 142), com previsão de uma redução de 5 anos no requisito concessório da aposentadoria por idade, independentemente do grau de defici-ência, e uma redução do requisito contributivo da aposentadoria por tempo de contribuição, a depender do grau de deficiência, da seguinte maneira:

deficiência HoMeM MulHeR

Grave 25 anos 20 anos

Moderada 29 anos 24 anos

Leve 33 anos 28 anos

Hoje, o principal motivo de ações judiciais com base na LC 142/2013 é discordância do segurado em relação ao resultado da perícia médica em rela-ção à identificação ou não da deficiência.

Page 103: Nº 345 – Março 2018 · Revista SÍNTESE Trabalhista e Previdenciária Ano XXIX – nº 345 – MArço 2018 reposItórIo AutorIzAdo de JurIsprudêncIA Supremo Tribunal Federal

RST Nº 345 – Março/2018 – PARTE GERAL – DOUTRINA ....................................................................................................................103

Diante disso, o presente estudo expõe a metodologia utilizada pelo INSS para identificação e análise da deficiência para fins de aplicação da LC 142/2013, bem como a maneira que a temática está se desenvolvendo nas pe-rícias do Poder Judiciário.

1 FUNDAMENTOS DO TRATAMENTO DIFERENCIADO NA APOSENTADORIA DA PESSOA COM DEFICIÊNCIA

A Lei Complementar nº 142/2013 possui fulcro constitucional na veda-ção de critérios diferenciados, estampado no art. 201, § 1º, da Constituição Cidadã. Tal dispositivo proíbe o legislador infraconstitucional de criar requisitos e critérios diversificados para a jubilação de determinados grupos ou classes sociais. Se todos são iguais perante a lei, todos devem se aposentar com os mesmos critérios e requisitos, admitindo-se exceções tão somente para igualar ou atenuar relações fáticas naturalmente desiguais. É dizer: as exceções à veda-ção de critérios diferenciados somente podem subsistir validamente se previstas constitucionalmente e fundamentadas na igualdade material.

1.1 princípio Da igualDaDe material

Princípio possui o sentido de início, origem, começo, fonte. É por meio dos princípios que se constrói todo o ordenamento jurídico, como pilares que sustentam a estrutura normativa e fundamentam a aplicação e interpretação do Direito. Nesse passo, os princípios jurídicos possuem uma tripla função: informadora, no momento que inspiram o legislador a criar normas de acordo com o direcionamento axiológico daqueles; interpretativa, quando servem de elementos condutores na hermenêutica de operadores e aplicadores do Direi-to; normativa, pois criam direitos subjetivos de per si na ausência de regras ou como elementos integradores nas lacunas normativas.

A função normativa dos princípios demonstra que estes são espécies de normas jurídicas, ao lado das regras jurídicas. Entretanto, os princípios pos-suem menor densidade normativa, pois são mais abertos e podem amoldar-se a inúmeras situações concretas a fim de solucionar litígios e concretizar direitos subjetivos. As regras, por sua vez, possuem maior densidade normativa e são mais fechadas, criadas para atender a determinada e específica situação fática. Por isto, diz-se que os princípios possuem alto grau de abstração, enquanto que, para as regras, esse grau de abstração é reduzido1.

Mas a principal diferença entre princípios e regras está na possibilidade de colisão. As regras são aplicadas com base no “tudo ou nada”: ou se aplicam integralmente ao caso concreto ou não há subsunção. Diferentemente, os prin-

1 CANOTILHO, José Joaquim. Direito constitucional e teoria da Constituição. 2. ed. Coimbra: Almedina, 1998. p. 86.

Page 104: Nº 345 – Março 2018 · Revista SÍNTESE Trabalhista e Previdenciária Ano XXIX – nº 345 – MArço 2018 reposItórIo AutorIzAdo de JurIsprudêncIA Supremo Tribunal Federal

104 ................................................................................................................RST Nº 345 – Março/2018 – PARTE GERAL – DOUTRINA

cípios admitem colisão e aplicação conjunta na mesma exigência fática, com mediação e restrição recíproca entre eles.

Uma regra não pode ser aplicada com outra que lhe é contrária na mes-ma situação fática, e a antinomia deve ser resolvida com os critérios consagra-dos na hermenêutica jurídica: cronológico, pelo qual regra posterior revoga a regra anterior incompatível; hierárquico, pelo qual norma hierarquicamente superior prevalece sobre a regra inferior; e de especialidade, em que regra es-pecífica prevalece sobre a regra geral. Ou seja: ou se aplica uma regra, ou se aplica outra.

De forma diversa, a aplicação dos princípios não assume essa lógica e admite coexistência com o fato de solucionar dado caso concreto com pon-deração entre eles. É possível que uma mesma situação fática exija o esforço interpretativo derivado de dois ou mais princípios a fim de encontrar a melhor solução no caso concreto2. Isto normalmente ocorre nos chamados hard cases, em que há falta ou insuficiência de regra, ou ainda nos casos em que a regra escrita não traduz o senso ético da sociedade. Por isto, os princípios aplicáveis com carga normativa são elementos de otimização pós-positivistas que permi-tem variação conforme a exigência fática, sem o prendimento silogístico da regra formal.

O grande instrumento disponível ao hermeneuta para a solução de coli-são de princípios é outro princípio: da proporcionalidade, com os subprincípios da necessidade, adequação e razoabilidade (ou proporcionalidade em sentido estrito)3. Isto significa que a ponderação entre princípios se faz por meio da máxima da proporcionalidade, na qual se verifica a necessidade, adequação e razoabilidade dos meios utilizados para se atingir a tutela do bem ou valor em questão. Sopesam-se os bens ou valores envolvidos no conflito e verifica--se qual o meio mais adequado, necessário e razoável para a proteção de um, prevalecente, em detrimento do outro, restringido, porém ambos coexistentes.

Neste artigo, em particular, importa-nos abordar o princípio da igualdade material como base para a vedação de requisitos diferenciados para aposen-tadorias, cujas exceções somente subsistem quando fundadas em um critério material de justiça distributiva e de discriminação positiva, como previsto para as pessoas com deficiência pela Lei Complementar nº 142/2013.

Com o surgimento do Estado moderno, após o regime absolutista, a liber-dade e a igualdade eram valores convenientes à burguesia da época, na medida em que a paridade de condições e a liberdade contratual mostravam-se como pressupostos necessários ao desenvolvimento do liberalismo que se impunha.

2 BARROSO, Luiz Roberto. Interpretação e aplicação da Constituição. São Paulo: Saraiva, 2003. p. 329.3 ALEXY, Robert. Teoría de los derechos fundamentales. Madri: Centro de Estudos Constitucionais, 1997.

p. 111.

Page 105: Nº 345 – Março 2018 · Revista SÍNTESE Trabalhista e Previdenciária Ano XXIX – nº 345 – MArço 2018 reposItórIo AutorIzAdo de JurIsprudêncIA Supremo Tribunal Federal

RST Nº 345 – Março/2018 – PARTE GERAL – DOUTRINA ....................................................................................................................105

Neste sentido, dispunha o art. 1º da Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão de 1789: “Os homens nascem e são livres e iguais em direitos. As dis-tinções sociais só podem fundar-se na utilidade comum”.

Entretanto, inexistia à época um desenvolvimento suficiente da ideia de igualdade, sendo ela mantida apenas em termos formais, face ao próprio sis-tema econômico que ganhava força. Logo, a isonomia declarada pautava-se em uma justiça formal, de “dar a cada um o que é seu”, na mesma trilha do senso de justiça dos romanos: viver honestamente, não prejudicar os outros e dar a cada um o que é seu – honeste vivere, alterum non laedere, suum cuique tribuere4.

Assim, mantinha-se o status quo por meio de uma igualdade garantida pela lei, suficiente para inibir privilégios excessivos da época, mas sem apro-fundamento às desigualdades fáticas e sociais. Por isto, a igualdade formal mos-trou-se insuficiente, sobretudo com o fracasso do liberalismo e o advento de ideias intervencionistas.

Afinal, “dar a cada um o que é seu” não faz sentido algum para quem não tem nada ou para quem se encontra em desigualdade de condições perante os demais. A desigualdade existe por natureza e é preciso remediá-la por meio de mecanismos legais pautados em um lastro axiológico universal de solidariedade e dignidade humana. Neste sentido, Norberto Bobbio: “Na realidade, os ho-mens não nascem nem livres nem iguais. Que os homens nasçam livres e iguais é uma exigência da razão, não uma constatação de fato ou um dado histórico”5.

Deste modo, cabe ao legislador criar distinções para que se igualem situa-ções faticamente desiguais: trata-se da igualdade material, resumida na clássica fórmula de tratar desigualmente os desiguais na medida de suas desigualdades, conhecida por Rui Barbosa, mas cuja ideia advém de Aristóteles: “Parece que a igualdade seja justiça, e o é, com efeito; mas não para todos, e sim somente entre os iguais. A desigualdade também parece ser, e o é com efeito, mas não para todos; só o é entre aqueles que não são iguais”6.

Essa igualdade material encontra espeque em uma justiça distributiva, que leva em consideração os méritos e, principalmente, a necessidade de cada um. Claro que não são todas as necessidades que devem ser ponderadas, mas tão somente aquelas balizadas em parâmetros universais para a manutenção de

4 Entre as seis concepções de justiça exemplificadas por Chaim Perelman, a igualdade garantida no liberalismo equivale à formula “a cada qual segundo o que a lei lhe atribui”. Conforme o referido autor: “Se ser justo é atribuir a cada um o que lhe cabe, cumpre, para evitar um círculo vicioso, poder determinar o que cabe a cada homem. Se atribuímos à expressão ‘o que cabe a cada homem’ um sentido jurídico, chegamos à conclusão de que ser justo é conceder a cada ser o que a lei lhe atribui” (Ética e Direito. Trad. Maria Ermantina Galvão. São Paulo: Martins Fontes, 1996. p. 12).

5 BOBBIO, Norberto. A era dos direitos. Trad. Carlos Nelson Coutinho. Rio de Janeiro: Campus, 1992. p. 118.6 ARISTÓTELES. A política. Trad. Nestor Silveira Chaves. Rio de Janeiro: Ediouro, 1997. p. 60.

Page 106: Nº 345 – Março 2018 · Revista SÍNTESE Trabalhista e Previdenciária Ano XXIX – nº 345 – MArço 2018 reposItórIo AutorIzAdo de JurIsprudêncIA Supremo Tribunal Federal

106 ................................................................................................................RST Nº 345 – Março/2018 – PARTE GERAL – DOUTRINA

um mínimo existencial, no qual o ser humano possa desenvolver sua personali-dade e potencialidade de forma digna7.

A igualdade material, neste passo, impõe um “direito à diferença”8, isto é, um direito de ser tratado de forma díspar em relação aos demais, para que o sujeito seja alçado a um nível de igualdade perante estes. Como expõe Boaventura de Souza Santos9:

Temos o direito a ser iguais quando a nossa diferença nos inferioriza; e temos o direito a ser diferentes quando a nossa igualdade nos descaracteriza. Daí a ne-cessidade de uma igualdade que reconheça as diferenças e de uma diferença que não produza, alimente ou reproduza as desigualdades.

Percebe-se, diante disso, que o tratamento diferenciado exige uma dis-paridade fática razoável que justifique um tratamento particularizado. Não se pode criar distinções sem que exista um critério diferenciador proporcional. Ou, nas palavras de Humberto Ávila10:

A concretização do princípio da igualdade depende do critério-medida objeto de diferenciação. Isso porque o princípio da igualdade, ele próprio, nada diz quanto aos bens ou aos fins de que se serve a igualdade para diferenciar ou igualar pes-soas. As pessoas ou situações são iguais ou desiguais em função de um critério diferenciador. Duas pessoas são formalmente iguais ou diferentes em razão da idade, do sexo ou da capacidade econômica. Essa diferenciação somente adquire relevo material na medida em que se lhe agrega uma finalidade, de tal sorte que as pessoas passam a ser iguais ou diferentes de acordo com um mesmo critério, dependendo da finalidade a que ele serve.

Neste sentido, impera afirmar-se que não subsistem validamente propo-sições legislativas que, ao tratarem diferenciadamente determinados grupos ou pessoas, não levam em consideração o critério-medida justificador da distinção.

7 Esta verificação, por certo, não é tarefa fácil. Como explana Chaim Perelman, quando versa sobre outra de suas seis fórmulas de justiça: “Quem deseja aplicar a fórmula ‘a cada qual segundo suas necessidades’ deverá não só estabelecer uma distinção entre as necessidades essenciais e as outras, mas também hierarquizar as necessidades essenciais, de modo que se conheçam aquelas que se há de satisfazer em primeiro lugar e determinar o preço que custará a sua satisfação: essa operação conduzirá à definição de noção de mínimo vital” (Ética e Direito. Trad. Maria Ermantina Galvão. São Paulo: Martins Fontes, 1996. p. 26).

8 Este direito a uma discriminação positiva, mutatis mutandis, encontra reforço no art. 1º, item 4, da Convenção Internacional sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação Racial, internalizado em âmbito pátrio pelo Decreto nº 65.810, de 8 de dezembro de 1969. Conforme o citado dispositivo, “não serão consideradas discriminações raciais as medidas especiais tomadas como o único objetivo de assegurar progresso adequado de certos grupos raciais ou étnicos ou indivíduos que necessitem da proteção que possa ser necessária para proporcionar a tais grupos ou indivíduos igual gozo ou exercício de direitos humanos e liberdades fundamentais, contanto que tais medidas não conduzam, em consequência, à manutenção de direitos separados para diferentes grupos raciais e não prossigam após terem sidos alcançados os seus objetivos”.

9 SANTOS, Boaventura de Souza. Introdução para ampliar o cânone do reconhecimento da diferença e da igualdade. In: Reconhecer para libertar: os caminhos do cosmopolitismo multicultural. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2003. p. 56.

10 ÁVILA, Humberto. Teoria dos princípios jurídicos. Da definição à aplicação dos princípios jurídicos. 9. ed. São Paulo: Malheiros, 2009. p. 150.

Page 107: Nº 345 – Março 2018 · Revista SÍNTESE Trabalhista e Previdenciária Ano XXIX – nº 345 – MArço 2018 reposItórIo AutorIzAdo de JurIsprudêncIA Supremo Tribunal Federal

RST Nº 345 – Março/2018 – PARTE GERAL – DOUTRINA ....................................................................................................................107

Cozinheiros, confeiteiros e garçons, por exemplo, não devem ter requisitos ju-bilatórios diferenciados pelo simples fato de exercerem tal função, como pre-vê o Projeto de Lei Complementar nº 201/2012. Se, no caso concreto, eles se encontram expostos a agentes nocivos, a aposentadoria especial os tutela. Do contrário, não há desigualdade fática razoável em relação às inúmeras outras profissões – também penosas – que justifique um tratamento díspar, não encon-trando tal discriminação qualquer fundamento perante a igualdade material.

Feitas essas breves considerações sobre o princípio da igualdade sob a ótica material e distributiva, com alerta da correta verificação do critério-medi-da para sua aplicação, passa-se a expor o consectário lógico do princípio iso-nômico: a vedação de critérios jubilatórios diferenciados, exposta no art. 201, § 1º, da Constituição Cidadã.

1.2 veDação De critérios DiferenciaDos

Previa-se no texto original do art. 202, II, da Constituição Federal que a então aposentadoria por tempo de serviço do RGPS poderia ter critérios dife-renciados tendo em vista as atividades exercidas em condições especiais que prejudiquem a saúde e integridade física. A EC 20/1998, no mesmo sentido, de-terminou que as aposentadorias do RGPS não poderiam ter critérios e requisitos diferenciados, exceto os casos de atividades exercidas sob condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física, exigindo-se, entretanto, a edi-ção de lei complementar a fim de regulamentar essas exceções.

A EC 47/2005, então, alterou novamente o art. 201, § 1º, da CF/1988, au-mentando o rol de exceções: i) pessoa com deficiência; ii) atividades exercidas em condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física.

Quanto às atividades exercidas em condições especiais, a lei comple-mentar até hoje não foi criada e continua-se aplicando os arts. 57 e seguintes da Lei nº 8.213/1991, por expressa disposição do art. 15 da EC 20/1998. Já quanto aos critérios diferenciados para aposentadoria da pessoa com deficiência, a re-gulamentação infraconstitucional surgiu com a Lei Complementar nº 142/2013, objeto desta obra.

Portanto, desde o advento da CF/1988, vedou-se a existência de requisi-tos e critérios diferenciados para a concessão de aposentadorias. Antes, havia critérios de cálculo e requisitos concessórios diferenciados para determinadas categorias profissionais, sem fundamento razoável para a distinção.

Um exemplo foi a Lei nº 5.939/1973, que previa, além de um custeio patronal diferenciado para as associações desportivas, critérios diferenciados para o cálculo da aposentadoria do atleta profissional de futebol, com uma média ponderada entre os salários-de-contribuição do momento da jubilação e os salários-de-contribuição do período da atividade como jogador profissional

Page 108: Nº 345 – Março 2018 · Revista SÍNTESE Trabalhista e Previdenciária Ano XXIX – nº 345 – MArço 2018 reposItórIo AutorIzAdo de JurIsprudêncIA Supremo Tribunal Federal

108 ................................................................................................................RST Nº 345 – Março/2018 – PARTE GERAL – DOUTRINA

de futebol. A Lei nº 5.939/1973 foi revogada pela MP 1.523/1996 (convertida na Lei nº 9.528/1997), e os critérios diferenciados de cálculo aplicam-se apenas a quem completou os requisitos para a aposentação até 13.10.1996, à luz do direito adquirido. Entretanto, a cota patronal diferenciada persiste até hoje para as entidades que mantêm equipe de futebol profissional, consoante art. 22, § 6º, da Lei nº 8.212/1991, com permissivo no art. 195, § 9º, da CF/1988.

Outro exemplo era a aposentadoria do jornalista profissional criada pela Lei nº 3.529/1959, que permitia a aposentadoria quando comprovados 30 anos de serviço em empresas jornalísticas, que também se aplica apenas a quem completou os requisitos antes de 13.10.1996, véspera da MP 1.523/1996 (con-vertida na Lei nº 9.528/1997), que revogou a Lei nº 3.529/1959.

Um terceiro exemplo é a Lei nº 3.501/1958, que previa critérios de cál-culo e requisitos concessórios diferenciados para o aeronauta, com previsão de aposentadoria aos 25 anos de serviço e 45 anos de idade. Respeitado o direito adquirido, a Lei nº 3.501/1958 foi revogada com o advento da EC 20/1998, conforme art. 12, § 1º, da Portaria MPAS nº 4.883/1998.

Todavia, deixe-se claro que o princípio da vedação de critérios dife-renciados impõe a uniformidade de requisitos ou critérios para a concessão de aposentadorias. Portanto, não alcança os benefícios assistenciais, pagos às expensas do Tesouro Nacional, criados justamente para tutelar determinados grupos, identificados por um evento trágico e danoso. Entre eles citam-se os benefícios: i) dos portadores da Síndrome de Talidomida (Lei nº 7.070/1982); ii) das vítimas da hemodiálise de Caruaru (Lei nº 9.422/1996); iii) das vítimas do Césio 137 em Goiânia (Lei nº 9.425/1996); iv) dos seringueiros da Amazônia (art. 54 do ADCT, Lei nº 7.986/1989); v) dos portadores de hanseníase (Lei nº 11.520/2007).

Em suma, o princípio da vedação de critérios diferenciados proíbe que o legislador crie distinções para a concessão de aposentadorias, vedando-se, as-sim, a criação de leis casuísticas visando à angariação de votos e apelo popular de determinadas classes profissionais ou grupos específicos da sociedade, como ocorria no passado. As distinções somente podem existir quando previstas no texto constitucional e desde que guardem fundamento de razoabilidade a fim de contemplar o princípio da igualdade em seu sentido material.

Dito isto, passa-se a expor as exceções à vedação de critérios jubilatórios diferenciados.

1.3 exceções à veDação De critérios DiferenciaDos

Justamente pela sobreposição principiológica da igualdade material é que existem exceções à vedação de critérios diferenciados. Pela desigualdade empírica em que se encontram determinadas categorias de pessoas, o próprio

Page 109: Nº 345 – Março 2018 · Revista SÍNTESE Trabalhista e Previdenciária Ano XXIX – nº 345 – MArço 2018 reposItórIo AutorIzAdo de JurIsprudêncIA Supremo Tribunal Federal

RST Nº 345 – Março/2018 – PARTE GERAL – DOUTRINA ....................................................................................................................109

Constituinte prevê uma desigualdade normativa com a finalidade de igualar uma situação fática naturalmente desigual. Destarte, as seguintes hipóteses ad-mitem distinções nos requisitos concessórios de aposentadorias no regime geral de previdência social: i) gênero; ii) trabalhadores rurais; iii) professores; iv) ati-vidade especial; v) pessoas com deficiência.

Por primeiro, o Constituinte repetiu a histórica redução de idade e tempo de contribuição para as aposentadorias das mulheres, diminuindo-se, respecti-vamente, o requisito etário e contributivo em cinco anos. É certo que a estru-tura física da mulher é mais frágil, com desgaste mais rápido no processo de envelhecimento, muito embora sua expectativa de vida seja maior em relação à dos homens. Além disso, existe outro fundamento: historicamente, as mulheres trabalhavam apenas no âmbito residencial; com a evolução da sociedade, a mulher conquistou espaço no mercado de trabalho, mas, de regra, ainda realiza ou administra as tarefas domésticas, possuindo uma “dupla jornada de traba-lho”. Em um contexto histórico, estas seriam as principais justificativas para a redução dos requisitos concessórios, o que certamente deve ser rediscutido em um futuro panorama de efetiva igualdade entre homens e mulheres.

Por segundo, o art. 201, § 7º, I, da CF/1988 prevê a redução do requisito etário para a aposentadoria por idade em cinco anos a todos os trabalhadores rurais. Infraconstitucionalmente, também se prevê a desnecessidade de com-provação da efetiva contribuição para o cumprimento do interregno carencial dos benefícios previdenciários, desde que comprovada a efetiva atividade como segurado especial em igual período, com base nos arts. 39, I, e 143 da Lei nº 8.213/1991 (com alterações do art. 3º da Lei nº 11.718/2008). Na aposenta-doria por tempo de contribuição, também se prevê que a atividade como segu-rado especial até 25.07.1991 pode ser contada como tempo de contribuição, independentemente do efetivo recolhimento, exceto para efeito de carência, consoante art. 55, § 2º, da Lei nº 8.213/1991.

Por terceiro, o art. 201, § 8º, prevê a redução de cinco anos de contribui-ção aos professores de educação básica para a concessão de aposentadoria por tempo de contribuição. Assim, tais profissionais aposentam-se com 25 anos de magistério se mulher, ou 30 anos de docência se homem.

Por quarto, o art. 201, § 1º, prevê a redução no tempo de contribuição aos que exercem atividade em condições especiais que prejudicam a saúde ou integridade física, que varia conforme o grau de nocividade do agente prejudi-cial à saúde, conforme arts. 57 e seguintes da Lei nº 8.213/1991.

E, por fim, o art. 201, § 1º, regulamentado pela Lei Complementar nº 142/2013, prevê a redução nos requisitos concessórios de aposentadorias às pessoas com deficiência, com diminuição de cinco anos no requisito etário da aposentadoria por idade e uma redução no requisito contributivo da aposenta-doria por tempo de contribuição a depender do grau de deficiência.

Page 110: Nº 345 – Março 2018 · Revista SÍNTESE Trabalhista e Previdenciária Ano XXIX – nº 345 – MArço 2018 reposItórIo AutorIzAdo de JurIsprudêncIA Supremo Tribunal Federal

110 ................................................................................................................RST Nº 345 – Março/2018 – PARTE GERAL – DOUTRINA

Percebe-se claramente nessas exceções que o princípio da vedação de critérios diferenciados é restringido pelo bem maior da justiça distributiva. Não há como tratar igualmente, exigindo-se os mesmos requisitos concessórios, gru-pos que faticamente se encontram em situação de desigualdade. Uma pessoa que é diariamente invadida em sua higidez por um labor nocivo, um sujeito que desafia uma jornada de trabalho superando barreiras impostas pela deficiência, um trabalhador que enfrenta a penosa labuta no campo ou que se entrega à árdua tarefa da docência básica, todos certamente devem ser recompensados com a redução de requisitos concessórios.

Dito isto, passa-se a analisar especificamente a distinção feita para as pes-soas com deficiência, perscrutando-se, neste estudo, o conceito de defi ciência.

2 PESSOA COM DEFICIÊNCIA

A Declaração Universal dos Direitos Humanos de 1948 determina que “todas as pessoas nascem livres e iguais em dignidade e direitos” e que “todos têm direito a igual proteção contra qualquer discriminação”. Nesse prisma, a Constituição da República impõe a promoção do “bem de todos, sem precon-ceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discrimi-nação”.

Por sua vez, o Decreto nº 3.956/2001 internalizou a Convenção Inte-ramericana Para a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação Contra as Pessoas Portadoras de Deficiência. Em seu art. 1º, prevê-se que deficiência significa “uma restrição física, mental ou sensorial, de natureza permanente ou transitória, que limita a capacidade de exercer uma ou mais atividades essen-ciais da vida diária, causada ou agravada pelo ambiente econômico e social”.

Neste sentido, o art. 37, VIII, da Constituição Federal prevê a reserva de vagas para cargos e empregos públicos para pessoas com deficiência. Já o art. 208, V, da CF/1988 prevê o atendimento educacional especializado às pes-soas com deficiência, em consonância com o art. 227, § 1º, II, que prevê a assistência integral à saúde da criança, do adolescente e do jovem com a

criação de programas de prevenção e atendimento especializado para as pessoas portadoras de deficiência física, sensorial ou mental, bem como de integração social do adolescente e do jovem portador de deficiência, mediante o treinamen-to para o trabalho e a convivência, e a facilitação do acesso aos bens e serviços coletivos, com a eliminação de obstáculos arquitetônicos e de todas as formas de discriminação.11

11 Outrossim, o art. 23, II, da Constituição Federal prevê a competência administrativa comum entre todos os entes federativos para a proteção e garantia das pessoas com deficiência. De igual maneira, o art. 24, XIV, prevê a competência legislativa concorrente entre União, Estados-membros e Distrito Federal no tocante à proteção e integração social das pessoas com deficiência.

Page 111: Nº 345 – Março 2018 · Revista SÍNTESE Trabalhista e Previdenciária Ano XXIX – nº 345 – MArço 2018 reposItórIo AutorIzAdo de JurIsprudêncIA Supremo Tribunal Federal

RST Nº 345 – Março/2018 – PARTE GERAL – DOUTRINA ....................................................................................................................111

Especificamente no âmbito laboral, a Convenção nº 159 da OIT, interna-lizada pelo Decreto nº 129/1991, dispõe sobre a habilitação e reabilitação pro-fissional das pessoas com deficiência, entendendo estas como “todas as pessoas cujas possibilidades de obter e conservar um emprego adequado e de progredir no mesmo fiquem substancialmente reduzidas devido a uma deficiência de ca-ráter físico ou mental devidamente comprovada”.

Neste particular, o art. 203, IV, da CF/1988 prevê a habilitação e reabi-litação das pessoas com deficiência e a promoção de sua integração à vida co-munitária, independentemente de contribuição. E, em seu art. 7º, XXX, a Cons-tituição Cidadã proíbe qualquer discriminação no tocante a salário e critérios de admissão do trabalhador com deficiência. Sua inclusão no mercado de trabalho encontra política de inserção no art. 93 da Lei nº 8.213/1991, que estabelece, para empresas com mais de 100 empregados, uma cota de 2 a 5% de ocupa-ções para beneficiários reabilitados ou pessoas com deficiência.

Ainda sobre a proteção das pessoas com deficiência em âmbito interna-cional, cita-se: i) a Declaração dos Direitos de Pessoas com Deficiência Men-tal (Resolução da ONU nº 2.856/1971); ii) a Declaração dos Direitos das Pes-soas Portadoras de Deficiências (Resolução nº 30/1984, de 1975, da ONU); iii) a Declaração de Salamanca Sobre Princípios, Política e Prática em Educação Especial; iv) a Declaração de Washington sobre Movimento de Vida Indepen-dente e dos Direitos das Pessoas Portadoras de Deficiência; v) a Declaração Internacional de Montreal Sobre Inclusão; vi) Declaração de Madri de 2002; vii) a Declaração de Caracas de 2002; viii) e a Declaração de Sapporo de 2002.

2.1 conceito constitucional De Deficiência (convenção De nova York)

Inobstante as várias disposições protetivas às pessoas com deficiência acima citadas, o grande avanço no Brasil ocorreu com o advento da Convenção Internacional sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência (Convenção de Nova York), assinada em Nova York em 30.03.2007, aprovada no Congresso Nacional pelo Decreto Legislativo nº 186, de 09.07.2008, e internalizada pelo Presidente da República por intermédio do Decreto nº 6.949, de 25.08.2009.

Isto porque tal convenção foi a primeira a passar pelo crivo do art. 5º, § 3º, da Constituição Federal, sendo internalizada no ordenamento jurídico pá-trio como se fosse a própria manifestação do poder constituinte reformador. Isto significa que a Convenção de Nova York integrou-se à Constituição da República como uma emenda constitucional. Apesar de não constar no texto da CF/1988, ela é formalmente e materialmente constitucional, eis que observou os requisitos formais de aprovação e possui conteúdo constitucional, relativo aos direitos fundamentais da pessoa com deficiência12.

12 PIOVESAN, Flávia. Direitos humanos e o direito constitucional internacional. 7. ed. São Paulo: Saraiva, 2006. p. 79.

Page 112: Nº 345 – Março 2018 · Revista SÍNTESE Trabalhista e Previdenciária Ano XXIX – nº 345 – MArço 2018 reposItórIo AutorIzAdo de JurIsprudêncIA Supremo Tribunal Federal

112 ................................................................................................................RST Nº 345 – Março/2018 – PARTE GERAL – DOUTRINA

Logo, hoje existe um conceito constitucional de deficiência: “Impedimen-tos de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, os quais, em interação com diversas barreiras, podem obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdades de condições com as demais pessoas”.

Tal conceito parte de uma análise multidisciplinar da deficiência, ve-rificando-se não apenas os aspectos físicos da pessoa, mas também como ela interage socialmente com suas limitações, de acordo com um novo panorama estabelecido pela Classificação Internacional de Funcionalidade, Incapacidade e Saúde – CIF, conforme abaixo exposto.

2.2 classificação internacional De funcionaliDaDe, incapaciDaDe e saúDe – cif

A Classificação Internacional de Funcionalidade, Incapacidade e Saúde – CIF é um estudo feito pela OMS (Organização Mundial da Saúde) e aprovada em 2001, na 54ª Assembleia Mundial de Saúde, em substituição à antiga Clas-sificação Internacional das Deficiências, Incapacidades e Desvantagens, cuja versão em português foi publicada em 1989.

Partindo-se de um novo paradigma, a CIF leva em consideração vários fatores para a identificação de uma pessoa com deficiência. Entende-se que as funções mentais13 e as estruturas do corpo14 não são suficientes para a identifi-cação de uma deficiência. É preciso, além disso, verificar os chamados fatores contextuais, divididos em:

a) fatores pessoais – “são o histórico particular da vida e do estilo de vida de um indivíduo e englobam as características do indivíduo [...]. Esses fatores podem incluir sexo, raça, idade, outros estados de saúde, condição física, estilo de vida, hábitos, educação recebida, diferentes maneiras de enfrentar problemas, antecedentes sociais, nível de instrução, profissão, experiência passada e pre-sente (eventos na vida passada e na atual), padrão geral de comportamento, caráter, características psicológicas individuais e outras características, todas ou algumas das quais podem desempenhar um papel na incapacidade em qualquer nível”;

b) fatores ambientais – que, por seu turno, são subdivididos em um nível indivi-dual e um nível social.

• Os fatores ambientais individuais são aqueles verificados “no ambiente ime-diato do indivíduo, englobando espaços como o domicílio, o local de tra-

13 Funções sensoriais e dor; funções da voz e da fala; funções do aparelho cardiovascular, dos sistemas hematológico e imunológico e do aparelho respiratório; funções do aparelho digestivo e dos sistemas metabólico e endócrino; funções geniturinárias e reprodutivas; funções neuromusculoesqueléticas e relacionadas com o movimento; funções da pele e estruturas relacionadas.

14 Estruturas do sistema nervoso; olho, ouvido e estruturas relacionadas; estruturas relacionadas com a voz e a fala; estruturas do aparelho cardiovascular, do sistema imunológico e do aparelho respiratório; estruturas relacionadas com o aparelho digestivo e com os sistemas metabólico e endócrino; estruturas relacionadas com os aparelhos geniturinário e reprodutivo; estruturas relacionadas com o movimento; pele e estruturas relacionadas.

Page 113: Nº 345 – Março 2018 · Revista SÍNTESE Trabalhista e Previdenciária Ano XXIX – nº 345 – MArço 2018 reposItórIo AutorIzAdo de JurIsprudêncIA Supremo Tribunal Federal

RST Nº 345 – Março/2018 – PARTE GERAL – DOUTRINA ....................................................................................................................113

balho e a escola. Esse nível inclui as características físicas e materiais do ambiente em que o indivíduo se encontra, bem como o contato direto com outros indivíduos, tais como, família, conhecidos, colegas e estranhos”.

• Já os fatores ambientais sociais são as “estruturas sociais formais e informais, serviços e regras de conduta ou sistemas na comunidade ou cultura que têm um impacto sobre os indivíduos. Este nível inclui organizações e serviços relacionados com o trabalho, com atividades na comunidade, com organis-mos governamentais, serviços de comunicação e de transporte e redes sociais informais, bem como leis, regulamentos, regras formais e informais, atitudes e ideologias”.

A identificação da deficiência, assim, está além da verificação da incor-reta funcionalidade do corpo ou da mente. É preciso conjugar tal incapacidade com a maneira como isto é sentido pela pessoa no contexto social em que ela vive. Por exemplo: uma pessoa com deficiência que mora e trabalha em um local afastado, com pouca acessibilidade, possui maior dificuldade de interação social, em igualdade de condições, se comparado à outra pessoa, com a mesma deficiência, que vive em um local com plena acessibilidade aos espaços, mobi-liários, equipamentos urbanos, transportes e meios de comunicação.

Logo, a constatação da deficiência precisa de uma verificação multidis-ciplinar. É preciso uma análise médico-pericial para identificar a existência de “impedimentos de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou senso-rial”. Por outro lado, também é necessária uma avaliação social para verificar se esses impedimentos podem obstruir participação plena e efetiva do indivíduo na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas.

É justamente isso que impõe a Lei Complementar nº 142 ao reproduzir o conceito constitucional de deficiência e impor que a avaliação da deficiência deve ser médica e funcional, como ocorre, inclusive, para fins de concessão do benefício assistencial à pessoa com deficiência após a nova redação do art. 20, § 2º, da Lei nº 8.742/1993, dada pela Lei nº 12.435/2011.

2.3 graDação Da Deficiência

A Lei Complementar nº 142/2013 limitou-se a reproduzir o conceito constitucional de deficiência. Porém, inovou em apontar uma gradação dessa deficiência para fins da aposentadoria por tempo de contribuição em grave, leve e moderada. Quanto à sua verificação, impôs que sua prova não pode ser feita exclusivamente pelo meio testemunhal e que sua análise deve ser médica e funcional pelo INSS.

A regulamentação da Lei Complementar nº 142/2013 ocorreu com o De-creto nº 8.145/2013, que alterou o Decreto nº 3.048/1999. Tal regulamento determinou que a perícia do INSS deve avaliar o segurado e fixar a data pro-vável do início da deficiência e o seu grau. Além disso, deve-se identificar a

Page 114: Nº 345 – Março 2018 · Revista SÍNTESE Trabalhista e Previdenciária Ano XXIX – nº 345 – MArço 2018 reposItórIo AutorIzAdo de JurIsprudêncIA Supremo Tribunal Federal

114 ................................................................................................................RST Nº 345 – Março/2018 – PARTE GERAL – DOUTRINA

ocorrência de variação no grau de deficiência e indicar os respectivos períodos em cada grau.

Entretanto, a definição de impedimentos de longo prazo, para fins da Lei Complementar nº 142/2013, e a classificação da deficiência em grave, leve e moderada foram repassadas para um ato conjunto do Ministro de Estado Chefe da Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República, dos Ministros de Estado da Previdência Social, da Fazenda, do Planejamento, Orçamento e Gestão e do Advogado-Geral da União.

Assim, em 30.01.2014, foi publicada a Portaria Interministerial AGU/MPS/MF/SEDH/MP nº 01/2014, que define impedimentos de longo prazo e aprova o instrumento metodológico para a aferição do grau de deficiência para fins da aposentadoria por idade e por tempo de contribuição à pessoa com de-ficiência, como abaixo exposto.

2.3.1 Índice de Funcionalidade Brasileiro Aplicado para Fins de Aposentadoria – IFBrA

A Portaria Interministerial nº 01/2014 definiu o impedimento de longo prazo como aquele que produz efeitos de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, pelo prazo mínimo de 2 anos, contados de forma ininterrupta. Assim, estabeleceu-se o mesmo prazo definido para a concessão do benefício assisten-cial de amparo ao deficiente, contido no art. 20, § 10, da Lei nº 8.742/1993. Não poderia ser diferente. Se o conceito de deficiência para ambas as situa-ções é o mesmo, oriundo da Convenção de Nova York e internalizado com força constitucional, não poderia o prazo ser diverso, pois ambos os diplomas (8.742/1993 e LC 142/2013) tutelam uma única e especifica classe: as pessoas com deficiência, conceito esse que, por óbvio, não pode ser modificado a de-pender da espécie do benefício15.

Note-se que a Convenção de Nova York não estabeleceu prazo algum na definição de impedimentos de longo prazo. Todavia, para efeitos das aposenta-rias é preciso realmente que esses impedimentos persistam para que haja a re-dução etária na aposentadoria por idade e uma efetiva redução contributiva na aposentadoria por tempo de contribuição, como será visto no tópico 3 adiante.

No que tange à análise da deficiência, a Portaria Interministerial nº 01/2014 baseou-se na Classificação Internacional de Funcionalidade, Inca-pacidade e Saúde – CIF, vista no tópico acima. Assim, não basta o diagnóstico médico para a identificação e gradação da deficiência, sendo imprescindível uma análise social e individual às diversas barreiras existentes na realidade do

15 Contudo, a diferença reside na existência de uma gradação da deficiência. Para a Lei nº 8.742/1993, pouco importa a intensidade da deficiência para a concessão do benefício: uma vez identificada, tal requisito é preenchido. Já para a LC 142/2013, a gradação da deficiência é fundamental para a análise do requisito contributivo da aposentadoria por tempo de contribuição. Por isso as avaliações, embora fundadas no mesmo diploma internacional (CIF), possuem critérios metodológicos diferentes a depender do benefício.

Page 115: Nº 345 – Março 2018 · Revista SÍNTESE Trabalhista e Previdenciária Ano XXIX – nº 345 – MArço 2018 reposItórIo AutorIzAdo de JurIsprudêncIA Supremo Tribunal Federal

RST Nº 345 – Março/2018 – PARTE GERAL – DOUTRINA ....................................................................................................................115

requerente. O resultado pericial, portanto, é fruto da conjugação de duas análi-ses: do médico pericial e do assistente social, ambos servidores do INSS.

Ao trazer os conceitos da CIF, criou-se o Índice de Funcionalidade Bra-sileiro Aplicado para Fins de Aposentadoria – IFBrA, instrumento metodológico criado especificamente para fins da Lei Complementar nº 142/2013, que exige o preenchimento de formulários pelos médicos e assistentes sociais, que resultam na identificação e gradação da deficiência16.

A um primeiro momento, exige-se a identificação do avaliador e do pe-riciando, com dados que vão desde o nome e cor de pele até o diagnóstico médico (CID10), tipo de deficiência (sensorial/auditiva, física/motora etc.) e as funções corporais acometidas.

A um segundo momento, exige-se a aplicação do instrumento, que nada mais é, grosso modo, que a soma da pontuação atribuída ao periciando pelo médico com a pontuação atribuída pelo assistente social17. Essas pontuações podem ser de 25, 50, 75 ou 100 pontos, e variam conforme o grau de depen-dência de terceiros. Quanto maior a dependência de terceiros, menor é a pon-tuação. Logo, quanto mais pontos, maior é a independência do requerente e menor é seu grau de deficiência.

Escala de Pontuação para o IF-Br:

25: Não realiza a atividade ou é totalmente dependente de terceiros para realizá-la. Não participa de nenhu-ma etapa da atividade. Se é necessário o auxílio de duas ou mais pessoas, o escore deve ser 25: totalmente dependente.

50: Realiza a atividade com o auxílio de terceiros. O indivíduo participa de alguma etapa da atividade. Inclui preparo e supervisão. Nessa pontuação, sempre há necessidade do auxílio de outra pessoa para a atividade ser realizada: quando alguém participa em alguma etapa da atividade, ou realiza algum preparo necessário para a realização da atividade ou supervisiona a atividade. Nessa pontuação, o indivíduo que está sendo avaliado deve participar de alguma etapa da atividade. Supervisão: quando há necessidade da presença de terceiros sem a necessidade de um contato físico. Por exemplo: a pessoa necessita de incentivo, de pistas para completar uma atividade, ou a presença de outra pessoa é necessária como medida de segurança. Preparo: quando há neces-sidade de um preparo prévio para a atividade ser realizada. Por exemplo, a colocação de uma adaptação para alimentação, colocar pasta na escova de dente.

16 Tais formulários são preenchidos pelos respectivos profissionais diretamente no sistema de benefícios Prisma (Projeto de Regionalização de Informações e Sistemas, criado em 1991), o que causou dificuldades iniciais, haja vista que os médicos-peritos, em geral, estão habituados a trabalhar com os benefícios incapacitantes no SABI (Sistema de Administração de Benefícios por Incapacidade).

17 No primeiro artigo científico escrito sobre o tema e publicado em âmbito nacional, antes mesmo da entrada em vigor da Lei Complementar nº 142/2013, já criticávamos a quantificação da deficiência em pontos, como ocorrido outrora na caracterização de incapacidade para fins de benefício assistencial com a Resolução INSS/PR nº 435/97 e Ordem de Serviço DSS nº 579/97 (Acróstico: Avaliemos). Embora seja necessário afastar o excesso de subjetivismo na análise com a fixação de elementos objetivos, a dignidade humana não pode ser mensurada em termos matemáticos e, menos ainda, quantificada em pontos. (SOARES, João Marcelino; TANAKA, Eder Eiji. Considerações preliminares sobre a Lei Complementar nº 142/2013. Revista SínTESE de Direito Previdenciário, São Paulo: IOB, p. 88-101, jul./ago. 2013)

Page 116: Nº 345 – Março 2018 · Revista SÍNTESE Trabalhista e Previdenciária Ano XXIX – nº 345 – MArço 2018 reposItórIo AutorIzAdo de JurIsprudêncIA Supremo Tribunal Federal

116 ................................................................................................................RST Nº 345 – Março/2018 – PARTE GERAL – DOUTRINA

75: Realiza a atividade de forma adaptada, sendo necessário algum tipo de modificação ou realiza a ativida-de de forma diferente da habitual ou mais lentamente. Para realizar a atividade, necessita de algum tipo de modificação do ambiente ou do mobiliário ou da forma de execução, como, por exemplo, passar a fazer uma atividade sentado que antes realizava em pé; ou de alguma adaptação que permita a execução da atividade, por exemplo, uma lupa para leitura ou um aparelho auditivo. Com as adaptações e modificações não depende de terceiros para realizar a atividade: tem uma independência modificada. Nessa pontuação, o indivíduo deve ser independente para colocar a adaptação necessária para a atividade, não dependendo de terceiros para tal.

100: Realiza a atividade de forma independente, sem nenhum tipo de adaptação ou modificação, na veloci-dade habitual e em segurança. Não tem nenhuma restrição ou limitação para realizar a atividade da maneira considerada normal para uma pessoa da mesma idade, cultura e educação. Realiza a atividade sem nenhuma modificação, realizando-a da forma e velocidade habitual.

Esses pontos são atribuídos para 41 atividades, que já se encontram pre-definidas e são distribuídas em 7 domínios, da seguinte maneira:

1. Domínio Sensorial– Atividades:1.1 Observar1.2 Ouvir2. Domínio Comunicação– Atividades:2.1 Comunicar-se/recepção de mensagens2.2 Comunicar-se/produção de mensagens2.3 Conversar2.4 Discutir2.5 Utilização de dispositivos de comunicação à distância3. Domínio Mobilidade– Atividades:3.1 Mudar e manter a posição do corpo3.2 Alcançar, transportar e mover objetos3.3 Movimentos finos da mão3.4 Deslocar-se dentro de casa3.5 Deslocar-se dentro de edifícios que não a pró-pria casa3.6 Deslocar-se fora de sua casa e de outros edi-fícios3.7 Utilizar transporte coletivo3.8 Utilizar transporte individual como passageiro4. Domínio Cuidados Pessoais– Atividades:4.1 Lavar-se4.2 Cuidar de partes do corpo4.3 Regulação da micção4.4 Regulação da defecação4.5 Vestir-se4.6 Comer4.7 Beber4.8 Capacidade de identificar agravos à saúde

5. Domínio Vida Doméstica

– Atividades:

5.1 Preparar refeições tipo lanches

5.2 Cozinhar

5.3 Realizar tarefas domésticas

5.4 Manutenção e uso apropriado de objetos pessoais e utensílios da casa

5.5 Cuidar dos outros

6. Domínio Educação, Trabalho e Vida Econômica

– Atividades:

6.1 Educação

6.2 Qualificação profissional

6.3 Trabalho remunerado

6.4 Fazer compras e contratar serviços

6.5 Administração de recursos econômicos pessoais

7. Domínio Socialização e Vida Comunitária

– Atividades:

7.1 Regular o comportamento nas interações

7.2 Interagir de acordo com as regras sociais

7.3 Relacionamentos com estranhos

7.4 Relacionamentos familiares e com pessoas familiares

7.5 Relacionamentos íntimos

7.6 Socialização

7.7 Fazer as próprias escolhas

7.8 Vida Política e Cidadania

Mas a soma dos pontos das 41 atividades feitas tanto pelo médico-perito como pelo assistente social sofre influência de duas variáveis: a identificação de barreiras externas (fatores ambientais) e o método linguístico fuzzy.

Page 117: Nº 345 – Março 2018 · Revista SÍNTESE Trabalhista e Previdenciária Ano XXIX – nº 345 – MArço 2018 reposItórIo AutorIzAdo de JurIsprudêncIA Supremo Tribunal Federal

RST Nº 345 – Março/2018 – PARTE GERAL – DOUTRINA ....................................................................................................................117

2.3.1.1 Identificação das barreiras externas

As barreiras externas são divididas em 5 categorias: produtos e tecnolo-gia; ambiente; apoio e relacionamentos; atitudes; e serviços sistemas e políti-cas. Esses fatores têm um impacto sobre a funcionalidade do sujeito, podendo aumentá-la, atuando como facilitadores, ou podem ser limitantes, agindo como barreiras.

Na aplicação do instrumental, deve obrigatoriamente o profissional iden-tificar qual dessas barreiras serve como limitador quando a pontuação é míni-ma. Assim, se alguma atividade pontuar 25 (quando o indivíduo não realiza a atividade ou terceiros realizam por ele), deve-se investigar se alguma barreira externa é a causa dessa pontuação. Se o que impede o indivíduo de pontuar acima de 25 é uma ou mais barreiras externas, deve-se assinalar ao lado dessa atividade quais são essas barreiras. Nesse caso, a pontuação seria mantida.

Portanto, na aplicação do instrumento, o apontamento dessas barreiras serve para justificar e identificar quais fatores agem como barreira impedindo a execução de uma atividade.

2.3.1.2 Método linguístico fuzzy

O uso do método linguístico fuzzy18, por sua vez, serve para contornar e uniformizar a pontuação de atividades nas situações de maior risco funcional para cada tipo de deficiência. Trata-se de um fator qualitativo trazido para a análise, evitando-se distorções no resultado puramente quantitativo que ocorre-ria com a simples soma das pontuações.

Para isso, identificou-se que, a depender do tipo de deficiência, alguns dos 7 domínios são mais sensíveis que outros para a vida do avaliado, em ter-mos gerais. Por exemplo: se a deficiência é auditiva, o domínio comunicação é mais prejudicado do que o domínio cuidados pessoais. Se a deficiência é mo-tora, o domínio mobilidade é mais prejudicado que o domínio comunicação.

Assim, dividiu-se a deficiência em 4 categorias, relacionando cada uma a 2 domínios em que o avaliado é mais vulnerável, de forma abstrata, da seguinte maneira:

a) deficiência auditiva: domínios comunicação e socialização;

b) deficiência visual: domínios mobilidade e vida doméstica;

18 A palavra fuzzy, de origem inglesa, significa impreciso, nebuloso, vago. A lógica fuzzy foi criada em 1965, por Lotfi Zadeh, através da publicação do artigo Fuzzy Sets, e vem sendo desenvolvida e aplicada em várias áreas do conhecimento. Trata-se, bem resumidamente, de uma teoria de raciocínio lógico aplicada a casos de incerteza que, na matemática clássica, seria impossível de identificar ou classificar. Consegue-se, por meio desse raciocínio, converter variáveis linguísticas incertas (grande, alto, ao redor de, longe, frio) para um formato numérico, através da função de pertinência entre os elementos estudados.

Page 118: Nº 345 – Março 2018 · Revista SÍNTESE Trabalhista e Previdenciária Ano XXIX – nº 345 – MArço 2018 reposItórIo AutorIzAdo de JurIsprudêncIA Supremo Tribunal Federal

118 ................................................................................................................RST Nº 345 – Março/2018 – PARTE GERAL – DOUTRINA

c) deficiência motora: domínios mobilidade e cuidados pessoais;

d) deficiência intelectual cognitiva/mental: domínios vida doméstica e socialização.

Com isto, exige-se que o avaliador responda:

a) se houve pontuação 25 ou 50 para alguma das atividades de algum dos 2 domínios relevantes; ou se houve pontuação 75 em todas as atividades de algum dos mesmos domínios;

b) se o avaliado não dispõe do auxílio de terceiros sempre que neces-sário.

De igual maneira, também se exige que o avaliador responda a uma questão emblemática predefinida segundo o tipo de deficiência, da seguinte maneira:

audiTivainTelecTual

cogniTiva/MenTalMoToRa viSual

DomíniosComunicação/socialização

Vida doméstica/socialização

M.obilidade/cui-dados pessoais

Mobilidade/vida doméstica

Questão emble-mática

A surdez ocorreu antes dos 6 anos

Não pode ficar sozinho em segurança

Desloca-se ex-clusivamente em cadeira de rodas

A pessoa já não enxerga ao nascer

Em caso de resposta afirmativa para qualquer uma dessas situações, será automaticamente atribuída a todas as atividades que compõem o domínio a menor nota de atividade atribuída dentro do domínio sensível pelo avaliador, corrigindo, assim, a nota final.

Vamos a um exemplo para melhor compreender:

Exemplo: uma avaliação de deficiência mental em que os domínios relevantes são vida doméstica e socializa-ção, a aplicação do fuzzy dependerá do preenchimento de alguma destas condições:a) houve pontuação 25 ou 50 em alguma atividade dos domínios vida doméstica ou socialização; ou houve pontuação 75 em todas as atividades dos domínios vida doméstica ou socialização;b) não pode ficar sozinho em segurança;c) não dispõe do auxílio de terceiros sempre que necessário.Imagine-se que, no exemplo, fora atribuída a seguinte pontuação:a) domínio socialização e vida comunitária (que possui 8 atividades): 50, 75, 100, 100, 100, 75, 50 e 75;b) domínio vida doméstica (que possui 5 atividades): tudo 75.Com a aplicação do fuzzy, a pontuação seria automaticamente convertida para:a) domínio socialização e vida comunitária (que possui 8 atividades): 50, 50, 50, 50, 50, 50, 50 e 50;b) domínio vida doméstica (que possui 5 atividades): manteria tudo 75.

Percebe-se, assim, que o método fuzzy introduziu um fator qualitativo na análise, balanceando-se a pontuação com uma avaliação qualificada conforme o maior risco segundo o tipo de deficiência do avaliado, afastando-se, ao menos nos domínios mais relevantes para aquele tipo de deficiência, a mera análise quantitativa que ocorreria com a simples soma dos pontos.

Page 119: Nº 345 – Março 2018 · Revista SÍNTESE Trabalhista e Previdenciária Ano XXIX – nº 345 – MArço 2018 reposItórIo AutorIzAdo de JurIsprudêncIA Supremo Tribunal Federal

RST Nº 345 – Março/2018 – PARTE GERAL – DOUTRINA ....................................................................................................................119

2.3.1.3 Cálculo final

A pontuação final será a soma das pontuações de cada domínio, aplicada pela medicina pericial e serviço social, observada a aplicação do modelo fuzzy em cada uma das análises.

O resultado mínimo que pode ser obtido é de 2.050: 25 (pontuação mí-nima) multiplicado por 41 (número total de atividades em todos os domínios) vezes 2 (número de aplicadores – médico e assistente social). E, por seu turno, a pontuação total máxima é de 8.200: 100 (pontuação mínima) multiplicado por 41 (número total de atividades em todos os domínios) vezes 2 (número de aplicadores – médico e assistente social).

E a gradação da deficiência se faz conforme o número total de pontos obtidos:

a) deficiência grave: quando a pontuação for menor ou igual a 5.739;

b) deficiência moderada: quando a pontuação total for maior ou igual a 5.740 e menor ou igual a 6.354;

c) deficiência leve: quando a pontuação total for maior ou igual a 6.355 e menor ou igual a 7.584.

Caso a pontuação seja igual ou maior que 7.585, ela é considerada insu-ficiente para a concessão do benefício.

2.4 perícia juDicial

Conforme acima exposto, a identificação e gradação da deficiência se faz por meio da aplicação do Índice de Funcionalidade Aplicado para Fins de Aposentadoria – IFBrA, constante na Portaria Interministerial nº 01/2014. Na es-fera administrativa, tal instrumento é de aplicação obrigatória pelo profissional médico e assistente social.

Mas, a partir do momento em que há uma propositura de ação judicial, a perícia judicial estaria também adstrita a esse instrumento para a realização e conclusão pericial? E estaria o juiz vinculado a essa conclusão?

Pelo princípio do livre convencimento motivado, o juiz jamais está vin-culado à decisão pericial, seja esta realizada ou não com base no Índice de Funcionalidade Aplicado para Fins de Aposentadoria – IFBrA. Pode o juiz sim-plesmente rechaçar a conclusão pericial e decidir em contrário a ela, desde que traga elementos razoáveis e consistentes na motivação decisória.

Quanto ao perito, uma portaria interministerial também não pode vin-culá-lo a aplicar obrigatoriamente a metodologia do Índice de Funcionalidade Aplicado para Fins de Aposentadoria – IFBrA. Contudo, não se pode olvidar que tal instrumento é totalmente baseado na Classificação Internacional de Fun-

Page 120: Nº 345 – Março 2018 · Revista SÍNTESE Trabalhista e Previdenciária Ano XXIX – nº 345 – MArço 2018 reposItórIo AutorIzAdo de JurIsprudêncIA Supremo Tribunal Federal

120 ................................................................................................................RST Nº 345 – Março/2018 – PARTE GERAL – DOUTRINA

cionalidade, Incapacidade e Saúde – CIF, da OMS, e encontra-se em absoluta consonância com o conceito constitucional de deficiência trazido pela Conven-ção de Nova York: “Impedimentos de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, os quais, em interação com diversas barreiras, podem obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condi-ções com as demais pessoas”.

Por isto, é absolutamente recomendável que a perícia médica judicial utilize o IFBrA, ou, caso utilize outra metodologia, que esta esteja devidamente comprovada e baseada em estudo médico e social, a fim de contemplar o con-ceito acima que, fundado na CIF, afastou a mera análise física com a consagra-ção da análise biopsicossocial para identificação de deficiências.

O que não se pode admitir é que o perito judicial analise tais casos como se fosse um auxílio-doença, como já vem ocorrendo, inclusive com conclusões de que o segurado está ou não incapacitado para o trabalho, temporária ou permanentemente. Ora, isto é uma confusão conceitual sem tamanho: pouco importa se existe ou não incapacidade laborativa e se esta é temporária ou per-manente. Não está se tratando de benefícios por incapacidade, mas sim de um benefício programado que pressupõe a identificação da deficiência analisada sob a ótica biológica, psicológica e social.

Por isso, a perícia judicial, nesses casos, deve, sim, ser realizada por profissional médico e assistente social. Neste particular, pode-se, por analogia, utilizar a Súmula nº 80 da TNU:

Nos pedidos de benefício de prestação continuada (LOAS), tendo em vista o advento da Lei nº 12.470/2011, para adequada valoração dos fatores ambientais, sociais, econômicos e pessoais que impactam na participação da pessoa com deficiência na sociedade, é necessária a realização de avaliação social por assis-tente social ou outras providências aptas a revelar a efetiva condição vivida no meio social pelo requerente.

Esse entendimento sumular é perfeitamente aplicável ao caso, pois o conceito de deficiência para a percepção do benefício assistencial ao deficien-te, inserto no art. 20, § 2º, da Lei nº 8.742/1993, é o mesmo conceito do art. 2º da LC 42/2013, ambos reflexos do conceito trazido pela Convenção de Nova York, que possui status constitucional devido ao art. 5º, § 3º, da CF/1988. Exis-tem diferenças na metodologia para ambos os benefícios tão somente porque, para fins de aposentadorias, existe a gradação da deficiência, que não importa para o benefício assistencial. Inobstante, ambas as análises são realizadas com fulcro na CIF, com perquirição do ponto de vista médico e social.

Para corroborar esse entendimento, o próprio Estatuto da Pessoa com Deficiência (Lei nº 13.146/2015), em seu art. 2º, § 1º, determina que a avaliação

Page 121: Nº 345 – Março 2018 · Revista SÍNTESE Trabalhista e Previdenciária Ano XXIX – nº 345 – MArço 2018 reposItórIo AutorIzAdo de JurIsprudêncIA Supremo Tribunal Federal

RST Nº 345 – Março/2018 – PARTE GERAL – DOUTRINA ....................................................................................................................121

da deficiência, quando necessária, será biopsicossocial, realizada por equipe multiprofissional e interdisciplinar e considerará:

a) as funções e as estruturas do corpo;

b) os fatores socioambientais, psicológicos e pessoais;

c) a limitação no desempenho de atividades; e

d) a restrição de participação.

Ainda prevê que cabe ao Poder Executivo criar os instrumentos de ava-liação da deficiência. Esse dispositivo dissipa qualquer dúvida sobre o assunto e aponta pela necessidade de avaliação biopsicossocial para identificação da deficiência, em qualquer avaliação pericial, seja no âmbito administrativo (que já ocorre), seja na esfera judicial.

CONCLUSÃO

A aposentadoria com critérios diversos para pessoa com deficiência en-contra espeque no princípio da igualdade material e em seu reflexo previdenci-ário de vedação de critérios diferenciados para jubilação, exceto quando neces-sários para o nivelamento jurídico de situações faticamente desiguais.

Quanto à averiguação da deficiência, conclui-se que o IFBrA, se correta-mente aplicado, é instrumento adequado para fins de identificação e gradação dela, eis que totalmente fundado na CIF e em consonância com o conceito constitucional de deficiência trazido pela Convenção de Nova York: “Impe-dimentos de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, os quais, em interação com diversas barreiras, podem obstruir sua participa-ção plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas”.

E, embora não obrigatório seu uso em âmbito judicial, é absolutamente recomendável; ou, caso se utilize outra metodologia, que ela esteja devida-mente comprovada e baseada em estudo médico e social, com observância da consagração da análise biopsicossocial para identificação de deficiências.

REFERÊNCIASALEXY, Robert. Teoría de los derechos fundamentales. Madri: Centro de Estudos Cons-titucionais, 1997.

ARISTÓTELES. A política. Trad. Nestor Silveira Chaves. Rio de Janeiro: Ediouro, 1997.

AVILA, Humberto. Teoria dos princípios jurídicos. Da definição à aplicação dos princí-pios jurídicos. 9. ed. São Paulo: Malheiros, 2009.

BARROSO, Luiz Roberto. Interpretação e aplicação da Constituição. São Paulo: Saraiva, 2003.

Page 122: Nº 345 – Março 2018 · Revista SÍNTESE Trabalhista e Previdenciária Ano XXIX – nº 345 – MArço 2018 reposItórIo AutorIzAdo de JurIsprudêncIA Supremo Tribunal Federal

122 ................................................................................................................RST Nº 345 – Março/2018 – PARTE GERAL – DOUTRINA

BOBBIO, Norberto. A era dos direitos. Trad. Carlos Nelson Coutinho. Rio de Janeiro: Campus, 1992.

CANOTILHO, José Joaquim. Direito constitucional e teoria da Constituição. 2. ed. Coimbra: Almedina, 1998.

SANTOS, Boaventura de Souza. Introdução para ampliar o cânone do reconhecimento da diferença e da igualdade. In: Reconhecer para libertar: os caminhos do cosmopoli-tismo multicultural. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2003.

SOARES, João Marcelino. Aposentadoria da pessoa com deficiência. 4. ed. Curitiba: Juruá, 2016.

PERELMAN, Chaim. Ética e Direito. Trad. Maria Ermantina Galvão. São Paulo: Martins Fontes, 1996.

PIOVESAN, Flávia. Direitos humanos e o direito constitucional internacional. 7. ed. São Paulo: Saraiva, 2006.

Page 123: Nº 345 – Março 2018 · Revista SÍNTESE Trabalhista e Previdenciária Ano XXIX – nº 345 – MArço 2018 reposItórIo AutorIzAdo de JurIsprudêncIA Supremo Tribunal Federal

Parte Geral – Jurisprudência Trabalhista – Acórdão na Íntegra

34785

Tribunal Superior do TrabalhoProcesso nº TST‑AgR‑E‑ED‑RR‑107‑56.2012.5.08.0008 Acórdão (SDI‑1) GMCB/cf

AGRAVO REGIMENTAL – EMBARGOS REGIDOS PELA LEI Nº 11.496/2007 – HORAS EXTRAOR- DINÁRIAS – BANCÁRIO – DIVISOR – NÃO PROVIMENTO

1. A SBDI-1 Plena deste egrégio Tribunal, ao julgar o Incidente de Recurso de Revista Repetitivo nos autos do Processo IRRR-849-83.2013.5.03.0138 (acórdão publicado no DEJT de 19.12.2016), alterou o entendimento ju-risprudencial que, até então, vinha sendo adotado no âmbito desta Corte acerca do tema “bancário-divisor” para definir que, no cálculo do salá-rio-hora dos bancários, hão de ser adotados os divisores 180 e 220 para os empregados submetidos, respectivamente, às jornadas diárias de 6 (seis) e 8 (oito) horas, independentemente da natureza jurídica atribuída ao sábado em norma coletiva.

2. Acresça-se, ainda, que, por ocasião do aludido julgamento, a SBDI-1 Plena, em observância ao princípio da segurança jurídica, procedeu à modulação dos efeitos da decisão proferida (art. 896-C, § 17, da CLT) com o objetivo de preservar as decisões de mérito emanadas de Tur-ma ou da SBDI-1 do TST no período compreendido entre 27.09.2012 (DEJT em que se publicou a atual redação da Súmula nº 124, item I) e 21.11.2016, data de julgamento do aludido Incidente de Recurso de Revista Repetitivo.

3. No caso vertente, a egrégia Quarta Turma desta Corte, mediante acór-dão proferido em período abrangido pelo critério de modulação fixado no julgamento do referido IRRR, concluiu que seria inaplicável o divisor 150, no caso, tendo em vista que conforme registrado por aquela corte, “o sábado, no caso dos bancários, não é considerado como dia referente a repouso semanal remunerado, mas sim dia útil não trabalhado”.

4. Com efeito, não havendo nos autos qualquer menção à existência de norma coletiva prevendo o sábado como dia de repouso semanal re-munerado, verifica-se que o v. acórdão turmário foi proferido em con-sonância com a Súmula nº 124, II, a, com a redação vigente à época, no sentido de que, nas hipóteses em que não há previsão expressa em acordo individual ou coletivo no sentido de considerar o sábado como

Page 124: Nº 345 – Março 2018 · Revista SÍNTESE Trabalhista e Previdenciária Ano XXIX – nº 345 – MArço 2018 reposItórIo AutorIzAdo de JurIsprudêncIA Supremo Tribunal Federal

124 ....................................... RST Nº 345 – Março/2018 – PARTE GERAL – JURISPRUDÊNCIA TRABALHISTA – ACÓRDÃO NA ÍNTEGRA

repouso semanal remunerado, aplica-se para os empregados submetidos à jornada de seis horas o divisor 180. Não há falar na incidência do teor da Súmula nº 124, I, a.

5. Irretocável, pois, a decisão ora agravada.

6. Agravo regimental a que se nega provimento.

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Agravo Regimental em Em-bargos em Embargos de Declaração em Recurso de Revista nº TST-AgR-E-ED--RR-107-56.2012.5.08.0008, em que é Agravante Roseneide do Socorro Lauri-do e Agravado Caixa Econômica Federal – CEF.

Trata-se de agravo regimental interposto contra a decisão proferida pela Presidência da egrégia 4ª Turma desta Corte Superior, por meio da qual não se admitiu o recurso de embargos, uma vez que não preenchidos os pressupostos previstos no art. 894, II, da CLT.

Nas razões do agravo regimental, a reclamante defende o cabimento do recurso de embargos, ante a especificidade dos arestos colacionados para co-tejo de teses.

Contrarrazões ao agravo regimental apresentadas às fls. 382/384 e im-pugnação aos embargos ofertada às fls. 388/391.

Os autos não foram remetidos ao d. Ministério Público do Trabalho, a teor do disposto no art. 83, § 2º, II, do RI/TST.

É o relatório.

voto

1 CONHECIMENTO

Atendidos os pressupostos de admissibilidade recursal, consideradas a tempestividade e a representação processual regular, conheço do agravo regi-mental.

2 MÉRITO

2.1 horas extraorDinárias. bancário. Divisor

A egrégia 4ª Turma não conheceu do recurso de revista interposto pela reclamante, mantendo o v. acórdão regional que considerou inaplicável o divi-sor 150 para o cálculo das horas extraordinárias, na hipótese.

Page 125: Nº 345 – Março 2018 · Revista SÍNTESE Trabalhista e Previdenciária Ano XXIX – nº 345 – MArço 2018 reposItórIo AutorIzAdo de JurIsprudêncIA Supremo Tribunal Federal

RST Nº 345 – Março/2018 – PARTE GERAL – JURISPRUDÊNCIA TRABALHISTA – ACÓRDÃO NA ÍNTEGRA ...........................................125

Eis o teor da decisão proferida na ocasião, no que ora interessa:

“DIVISOR A SER OBSERVADO NO CÁLCULO DE HORAS EXTRAS

O Regional assim se manifestou sobre a matéria:

‘In casu, o sábado, no caso dos bancários, não é considerado como dia refe-rente a repouso semanal remunerado, mas sim dia útil não trabalhado, o que repele a aplicação do divisor 150, conforme, acertadamente, decidiu o MM. Juízo de 1º grau, razão pela qual mantenho a Decisão.’

A Recorrente entende que deve ser observado o divisor de 150 horas, consideran-do que o sábado é, para o bancário, dia de repouso semanal remunerado, e não dia útil não trabalhado. Diz violado o art. 7º, XXVI, da Constituição Federal. Traz arestos ao confronto jurisprudencial.

A decisão regional encontra-se em consonância com o disposto na Súmula nº 124, II, a, desta Corte, fato que inviabiliza o conhecimento da Revista pela aplicação da Súmula nº 333 do TST e do art. 896, § 4º, da CLT.

Não conheço, no particular.”

Opostos embargos de declaração pelo reclamante, a egrégia Turma deci-diu negar-lhe provimento sob o seguinte fundamento:

“O Embargante alega a ocorrência de erro material no julgado. Sustenta que constou expressamente no acórdão regional a existência de norma coletiva que estabelece o sábado bancário como dia de repouso semanal remunerado, fato que, ao contrário do decidido por esta Turma, acarreta a aplicação do divisor de 150 horas, nos termos da Súmula nº 124, I, a, do TST.

Os Declaratórios estão fundados na ocorrência de erro material como fato capaz de justificar a adoção do efeito modificativo.

Sob tal ótica a alegação recursal não se sustenta.

O erro material consiste na ocorrência de equívoco de fácil identificação no julgado e, portanto, sanável por meio dos Declaratórios ou mesmo de ofício pelo juízo. O instituto, entretanto, difere da tentativa da parte em promover nova dis-cussão acerca da matéria já decidida. Cumpre observar que os efeitos modifica-tivos autorizados por meio dos Embargos de Declaração limitam-se à ocorrência de omissão capaz de justificá-los, conforme os termos da Súmula nº 278 desta Corte, vício sequer alegado pela parte.

Também não há como se falar na possibilidade de exame acerca da contrarie-dade à Súmula nº 124, I, do TST, por meio dos Embargos de Declaração, como requer o Embargante, diante a especificidade estabelecida no art. 535 do CPC.

Dentro de tal contexto, a questão posta pelo Embargante desafia remédio proces-sual diverso do ora tentado.

Portanto, não há fundamento na alegação do Embargante capaz de promover a reforma do julgado pela via processual eleita.

Page 126: Nº 345 – Março 2018 · Revista SÍNTESE Trabalhista e Previdenciária Ano XXIX – nº 345 – MArço 2018 reposItórIo AutorIzAdo de JurIsprudêncIA Supremo Tribunal Federal

126 ....................................... RST Nº 345 – Março/2018 – PARTE GERAL – JURISPRUDÊNCIA TRABALHISTA – ACÓRDÃO NA ÍNTEGRA

Por esses motivos, os Embargos de Declaração merecem ser desprovidos, visto que não foram configuradas as hipóteses ventiladas nos arts. 897-A da CLT e 535 do CPC.”

Inconformada, a reclamante interpôs recurso de embargos à SBDI-1, ao argumento de que o v. acórdão turmário teria contrariado a Súmula nº 124, I, a, além de divergir do posicionamento de outras Turmas desta colenda Corte Superior.

A Presidência da egrégia 4ª Turma, em juízo de admissibilidade, dene-gou seguimento ao recurso sob o seguinte fundamento:

“A Eg. Quarta Turma do Tribunal Superior do Trabalho, mediante o v. acórdão de fls. 309/315, complementado pela decisão de fls. 330/331, proferida em embar-gos de declaração, não conheceu do recurso de revista da Reclamante no tocante ao tema ‘Horas Extras. Divisor’, pois concluiu que a decisão regional encontra-se em consonância com a Súmula nº 124, II, a, desta Corte.

Assim constou do acórdão embargado:

‘A Recorrente entende que deve ser observado o divisor de 150 horas, consi-derando que o sábado é, para o bancário, dia de repouso semanal remunera-do, e não dia útil não trabalhado. Diz violado o art. 7º, XXVI, da Constituição Federal. Traz arestos ao confronto jurisprudencial.

A decisão regional encontra-se em consonância com o disposto na Súmula nº 124, II, a, desta Corte, fato que inviabiliza o conhecimento da Revista pela aplicação da Súmula nº 333 do TST e do art. 896, § 4º, da CLT.’

Inconformada, a Reclamante interpõe embargos (fls. 333/342), sob a égide da Lei nº 11.496/2007. Transcreve arestos para o cotejo de teses.

Considero satisfeitos os pressupostos extrínsecos de admissibilidade do recurso de embargos concernentes à tempestividade (fls. 332 e 369) e à regularidade de representação processual (fl. 21). Inexigível o depósito recursal.

Os presentes embargos, contudo, revelam-se inadmissíveis.

Como cediço, consoante a nova redação do art. 894, II, da CLT, a admissibilida-de do recurso de embargos encontra-se jungida à demonstração de divergência jurisprudencial entre Turmas ou entre Turma e a Seção de Dissídios Individuais, salvo se a decisão recorrida estiver em consonância com súmula ou orientação jurisprudencial do Tribunal Superior do Trabalho ou do Supremo Tribunal Fe-deral.

No caso dos autos, a Eg. Quarta Turma manteve a decisão regional que aplicou o divisor 180 para o cálculo das horas extras, considerando o fato de que o sábado do bancário é dia útil não trabalhado. Por isso, entendeu incidente a Súmula nº 124, II, a, desta Corte.

Não diviso, todavia, divergência jurisprudencial, pois os arestos apontados para o confronto de teses (fls. 354/359 e 360/368), ao reconhecerem a incidência do

Page 127: Nº 345 – Março 2018 · Revista SÍNTESE Trabalhista e Previdenciária Ano XXIX – nº 345 – MArço 2018 reposItórIo AutorIzAdo de JurIsprudêncIA Supremo Tribunal Federal

RST Nº 345 – Março/2018 – PARTE GERAL – JURISPRUDÊNCIA TRABALHISTA – ACÓRDÃO NA ÍNTEGRA ...........................................127

divisor 150, partiram de premissa estranha ao acórdão embargado, consistente na existência de norma coletiva referente aos empregados bancários incluindo o sábado como dia de repouso remunerado. Revelam-se, pois, inespecíficos os julgados paradigmas. Incidência da Súmula nº 296 do TST.

Ante o exposto, denego seguimento aos embargos, com fulcro nos arts. 894, II, da CLT e 2º, § 2º, da Instrução Normativa nº 35/2012 do TST.”

Na minuta em exame, a agravante pugna pelo processamento dos em-bargos, ao argumento de que a egrégia Turma teria incorrido em contrariedade à Súmula nº 124, I, a. Afirma que os arestos colacionados para fins de cotejo guardam especificidade com o caso em exame.

Passo à análise.

Inicialmente, cumpre salientar que, nos termos do art. 894, II, da CLT, de acordo com a redação conferida pela Lei nº 11.496/2007, cabem embargos “das decisões das Turmas que divergirem entre si, ou das decisões proferidas pela Seção de Dissídios Individuais, salvo se a decisão recorrida estiver em consonância com súmula ou orientação jurisprudencial do Tribunal Superior do Trabalho ou do Supremo Tribunal Federal”.

No caso em exame, a parte busca ver reconhecido o seu direito à apli-cação do divisor 150 no cálculo horas extraordinárias. Defende por ser empre-gada bancária submetida à jornada de 6horas por dia e diante da disposição expressa em norma coletiva prevendo o sábado como dia de repouso semanal remunerado, deve incidir o teor da Súmula nº 124, I, a.

Pois bem.

A SBDI-1 Plena deste egrégio Tribunal, ao julgar o Incidente de Recur-so de Revista Repetitivo nos autos do Processo IRRR-849-83.2013.5.03.0138 (acórdão publicado no DEJT de 19.12.2016), alterou o entendimento jurispru-dencial que, até então, vinha sendo adotado no âmbito desta Corte acerca do tema “bancário-divisor” para definir que, no cálculo do salário-hora dos ban-cários, hão de ser adotados os divisores 180 e 220 para os empregados subme-tidos, respectivamente, às jornadas diárias de 6 (seis) e 8 (oito) horas, indepen-dentemente da natureza jurídica atribuída ao sábado em norma coletiva.

Acresça-se, ainda, que, por ocasião do aludido julgamento, a SBDI-1 Plena, em observância ao princípio da segurança jurídica, procedeu à modula-ção dos efeitos da decisão proferida (art. 896-C, § 17, da CLT) com o objetivo de preservar as decisões de mérito emanadas de Turma ou da SBDI-1 do TST no período compreendido entre 27.09.2012 (DEJT em que se publicou a atual redação da Súmula nº 124, item I) e 21.11.2016, data de julgamento do aludido Incidente de Recurso de Revista Repetitivo.

Page 128: Nº 345 – Março 2018 · Revista SÍNTESE Trabalhista e Previdenciária Ano XXIX – nº 345 – MArço 2018 reposItórIo AutorIzAdo de JurIsprudêncIA Supremo Tribunal Federal

128 ....................................... RST Nº 345 – Março/2018 – PARTE GERAL – JURISPRUDÊNCIA TRABALHISTA – ACÓRDÃO NA ÍNTEGRA

No caso vertente, a egrégia Quarta Turma desta Corte, mediante acórdão proferido em período abrangido pelo critério de modulação fixado no julga-mento do referido IRRR, concluiu que seria inaplicável o divisor 150, no caso, tendo em vista que conforme registrado por aquela corte, “o sábado, no caso dos bancários, não é considerado como dia referente a repouso semanal remu-nerado, mas sim dia útil não trabalhado”.

Com efeito, não havendo nos autos qualquer menção à existência de norma coletiva prevendo o sábado como dia de repouso semanal remunera-do, verifica-se que o v. acórdão turmário foi proferido em consonância com a Súmula nº 124, II, a, com a redação vigente à época, no sentido de que, nas hipóteses em que não há previsão expressa em acordo individual ou coletivo no sentido de considerar o sábado como repouso semanal remunerado, aplica-se para os empregados submetidos à jornada de seis horas o divisor 180.

Não há falar na incidência do teor da Súmula nº 124, I, a.

Irretocável, pois, a decisão ora agravada.

Ante o exposto, nego provimento ao agravo regimental.

isto posto

Acordam os Ministros da Subseção I Especializada em Dissídios Indivi-duais do Tribunal Superior do Trabalho, por unanimidade, conhecer do agravo regimental e, no mérito, negar-lhe provimento.

Brasília, 14 de dezembro de 2017.

Firmado por assinatura digital (MP 2.200-2/2001) Caputo Bastos Ministro Relator

Page 129: Nº 345 – Março 2018 · Revista SÍNTESE Trabalhista e Previdenciária Ano XXIX – nº 345 – MArço 2018 reposItórIo AutorIzAdo de JurIsprudêncIA Supremo Tribunal Federal

Parte Geral – Jurisprudência Trabalhista – Ementário34786 – acordo coletivo de trabalho – norma que prevê o enquadramento sindical – inaplicabi-

lidade – efeitos

“Recurso de revista. Processo sob égide da Lei nº 13.015/2014. 1. Enquadramento sindical. Nor-mas coletivas inaplicáveis. Matéria fática. Súmula nº 126. 2. Adicional de insalubridade. Indeni-zação por dano moral. FGTS. Não recolhimento. Intervalo intrajornada. Atraso no pagamento dos salários. Multa convencional. Honorários advocatícios. Análises prejudicadas. O art. 511, § 1º, da CLT fixa como vínculo social básico da categoria econômica ‘a solidariedade de interesses eco-nômicos dos que empreendem atividades idênticas, similares ou conexas’. Portanto, a natureza da atividade é que se apresenta como critério de vinculação da categoria, criando a relação social inerente à associação sindical. Por outro lado, o enquadramento sindical deve ser feito de acordo com a atividade preponderante da empresa, a teor dos arts. 570 e 581 da CLT. No caso concreto, o TRT assentou que ‘a ré integra a categoria econômica representada pelo Seclitus, e, não tendo o Sindesc firmado convenção coletiva com esta entidade, inexiste, portanto, o enquadramento dos empregados da ré nas atividades exercidas pelos representados do sindicato autor e, igualmente, inexiste legitimidade ativa para este representá-los em Juízo, já que a atividade econômica pre-ponderante da empresa é a de ‘Instituição de Longa Permanência para Idosos’, não podendo esta ser enquadrada como Hospital ou Estabelecimento de Serviços de Saúde, mas sim como asilo’. O acórdão recorrido consignou ainda que são ‘inaplicáveis as normas coletivas firmadas pelo Sindesc e o Sindipar, porquanto não foi provado nos autos que a atividade preponderante da ré é a prestação de serviços de saúde, não podendo esta ser representada pelo sindicato que abrange os trabalhadores de hospitais e estabelecimentos de saúde’. Assim sendo, afirmando a Instância Ordinária, quer pela sentença, quer pelo acórdão, não serem aplicáveis ao caso em análise as normas coletivas firmadas entre o Sindesc e o Sindipar, torna-se inviável, em recurso de revista, reexaminar o conjunto probatório dos autos, por não se tratar o TST de suposta terceira instância, mas de Juízo rigorosamente extraordinário – limites da Súmula nº 126/TST. Recurso de revista não conhecido.” (TST – RR 1951-17.2015.5.09.0652 – 3ª T. – Rel. Min. Mauricio Godinho Delgado – DJe 27.10.2017)

34787 – adicional de transferência – provisoriedade – pagamento devido

“Recurso ordinário. 1. Término do contrato de trabalho. Pedido de demissão. Não comprova-ção. Dispensa imotivada. Conforme entendimento da Súmula nº 212 do TST, o ônus de provar o término do contrato de trabalho, quando negados a prestação de serviço e o despedimento, é do empregador, pois o princípio da continuidade da relação de emprego constitui presunção favorável ao empregado. Assim, incumbe a empresa demonstrar a alegação de que o empregado deixou o emprego por vontade própria, o que não ocorreu no caso vertente. Dessa forma, devidas se tornam as verbas rescisórias cabíveis em caso de dispensa imotivada por parte do empregador. 2. RSR – Labor aos domingos. O art. 9º, Lei nº 605/1949, que regula o repouso semanal remunera-do, prevê que os repousos devem ser pagos de forma dobrada, quando trabalhados sem a corres-pondente folga compensatória. Consoante demonstra o conjunto probatório dos autos, verifica-se que, nos domingos trabalhados pela reclamante, havia sempre uma folga compensatória, o que faz com que seja indevido o pleito referente à dobra salarial. 3. Adicional de transferência. Art. 469 da CLT. Nos termos da atual jurisprudência da SDI/TST, a provisoriedade é o fator determi-nante a ensejar o pagamento do adicional de transferência previsto no art. 469, § 3º, da CLT, pouco importando se o empregado exercia cargo de confiança ou se havia cláusula prevendo a possibilidade da transferência. Recurso ordinário conhecido e parcialmente provido.” (TRT 7ª R. – RO 0001461-59.2016.5.07.0023 – Rel. Claudio Soares Pires – DJe 05.12.2017 – p. 400)

Transcrição Editorial SÍNTESESúmula nº 212 do Tribunal Superior do Trabalho:“DESPEDIMENTO. ÔNUS DA PROVA.O ônus de provar o término do contrato de trabalho, quando negados a prestação de serviço e o despedimento, é do empregador, pois o princípio da continuidade da relação de emprego constitui presunção favorável ao empregado. (Res. 14/1985, DJ 19.09.1985)”

Page 130: Nº 345 – Março 2018 · Revista SÍNTESE Trabalhista e Previdenciária Ano XXIX – nº 345 – MArço 2018 reposItórIo AutorIzAdo de JurIsprudêncIA Supremo Tribunal Federal

130 ........................................................RST Nº 345 – Março/2018 – PARTE GERAL – JURISPRUDÊNCIA TRABALHISTA – EMENTÁRIO

34788 – auxílio-alimentação – participação do empregado no custeio – descontos de pequena monta – verba indenizatória e salarial – integração ao salário – descabimento

“Auxílio-alimentação. Participação do empregado no custeio. Descontos de pequena monta. Ver-ba indenizatória e salarial. Integração ao salário. O art. 458 da CLT prevê que a alimentação, ha-bitação, vestuário ou outras prestações in natura que, por força do contrato o empregador fornecer habitualmente têm natureza salarial. No entanto, norma jurídica poderá modificar a natureza da utilidade fornecida. No presente caso, houve desconto a título de participação do auxílio-alimen-tação, fato que retira a natureza remuneratória do benefício. Sobrevindo norma coletiva posterior que silencia sobre a coparticipação dos empregados e a cessação dos descontos, transmuda-se a parcela da natureza indenizatória anterior para natureza salarial.” (TRT 10ª R. – RO 0001041-21.2016.5.10.0007 – Rel. Dorival Borges de Souza Neto – DJe 30.10.2017 – p. 496)

Comentário Editorial SÍNTESETrata-se de recurso ordinário interposto no TRT para pleitear a integração do auxílio-alimen-tação ao salário.Reza o art. 457 da CLT:“Art. 457. Compreendem-se na remuneração do empregado, para todos os efeitos legais, além do salário devido e pago diretamente pelo empregador, como contraprestação do serviço, as gorjetas que receber. (Redação dada ao caput pela Lei nº 1.999, de 01.10.1953, DOU 07.10.1953)§ 1º Integram o salário a importância fixa estipulada, as gratificações legais e as comissões pagas pelo empregador.§ 2º As importâncias, ainda que habituais, pagas a título de ajuda de custo, auxílio-alimenta-ção, vedado seu pagamento em dinheiro, diárias para viagem, prêmios e abonos não integram a remuneração do empregado, não se incorporam ao contrato de trabalho e não constituem base de incidência de qualquer encargo trabalhista e previdenciário.§ 3º Considera-se gorjeta não só a importância espontaneamente dada pelo cliente ao em-pregado, como também o valor cobrado pela empresa, como serviço ou adicional, a qualquer título, e destinado à distribuição aos empregados. (Redação dada pela Lei nº 13.419, de 13.03.2017 – DOU de 14.03.2017, com efeitos a partir de sessenta dias de sua publicação oficial)§ 4º Consideram-se prêmios as liberalidades concedidas pelo empregador em forma de bens, serviços ou valor em dinheiro a empregado ou a grupo de empregados, em razão de desempe-nho superior ao ordinariamente esperado no exercício de suas atividades.§ 5º Inexistindo previsão em convenção ou acordo coletivo de trabalho, os critérios de rateio e distribuição da gorjeta e os percentuais de retenção previstos nos §§ 6º e 7º deste artigo serão definidos em assembleia geral dos trabalhadores, na forma do art. 612 desta Consolidação. (Parágrafo acrescentado pela Lei nº 13.419, de 13.03.2017 – DOU de 14.03.2017, com efeitos a partir de sessenta dias de sua publicação oficial)§ 6º As empresas que cobrarem a gorjeta de que trata o § 3º deverão:I – para as empresas inscritas em regime de tributação federal diferenciado, lançá-la na res-pectiva nota de consumo, facultada a retenção de até 20% (vinte por cento) da arrecadação correspondente, mediante previsão em convenção ou acordo coletivo de trabalho, para custear os encargos sociais, previdenciários e trabalhistas derivados da sua integração à remunera-ção dos empregados, devendo o valor remanescente ser revertido integralmente em favor do trabalhador;II – para as empresas não inscritas em regime de tributação federal diferenciado, lançá-la na respectiva nota de consumo, facultada a retenção de até 33% (trinta e três por cento) da arrecadação correspondente, mediante previsão em convenção ou acordo coletivo de trabalho, para custear os encargos sociais, previdenciários e trabalhistas derivados da sua integração à remuneração dos empregados, devendo o valor remanescente ser revertido integralmente em favor do trabalhador;III – anotar na Carteira de Trabalho e Previdência Social e no contracheque de seus empre-gados o salário contratual fixo e o percentual percebido a título de gorjeta. (Parágrafo acres-centado pela Lei nº 13.419, de 13.03.2017 – DOU de 14.03.2017, com efeitos a partir de sessenta dias de sua publicação oficial)

Page 131: Nº 345 – Março 2018 · Revista SÍNTESE Trabalhista e Previdenciária Ano XXIX – nº 345 – MArço 2018 reposItórIo AutorIzAdo de JurIsprudêncIA Supremo Tribunal Federal

RST Nº 345 – Março/2018 – PARTE GERAL – JURISPRUDÊNCIA TRABALHISTA – EMENTÁRIO ............................................................131

§ 7º A gorjeta, quando entregue pelo consumidor diretamente ao empregado, terá seus crité-rios definidos em convenção ou acordo coletivo de trabalho, facultada a retenção nos parâme-tros do § 6º deste artigo. (Parágrafo acrescentado pela Lei nº 13.419, de 13.03.2017 – DOU de 14.03.2017, com efeitos a partir de sessenta dias de sua publicação oficial)§ 8º As empresas deverão anotar na Carteira de Trabalho e Previdência Social de seus em-pregados o salário fixo e a média dos valores das gorjetas referente aos últimos doze meses. (Parágrafo acrescentado pela Lei nº 13.419, de 13.03.2017 – DOU de 14.03.2017, com efeitos a partir de sessenta dias de sua publicação oficial)§ 9º Cessada pela empresa a cobrança da gorjeta de que trata o § 3º deste artigo, desde que cobrada por mais de doze meses, essa se incorporará ao salário do empregado, tendo como base a média dos últimos doze meses, salvo o estabelecido em convenção ou acordo coletivo de trabalho. (Parágrafo acrescentado pela Lei nº 13.419, de 13.03.2017 – DOU de 14.03.2017, com efeitos a partir de sessenta dias de sua publicação oficial)§ 10. Para empresas com mais de sessenta empregados, será constituída comissão de em-pregados, mediante previsão em convenção ou acordo coletivo de trabalho, para acompanha-mento e fiscalização da regularidade da cobrança e distribuição da gorjeta de que trata o § 3º deste artigo, cujos representantes serão eleitos em assembleia geral convocada para esse fim pelo sindicato laboral e gozarão de garantia de emprego vinculada ao desempenho das funções para que foram eleitos, e, para as demais empresas, será constituída comissão intersindical para o referido fim. (Parágrafo acrescentado pela Lei nº 13.419, de 13.03.2017 – DOU de 14.03.2017, com efeitos a partir de sessenta dias de sua publicação oficial)§ 11. Comprovado o descumprimento do disposto nos §§ 4º, 6º, 7º e 9º deste artigo, o empre-gador pagará ao trabalhador prejudicado, a título de multa, o valor correspondente a 1/30 (um trinta avos) da média da gorjeta por dia de atraso, limitada ao piso da categoria, assegurados em qualquer hipótese o contraditório e a ampla defesa, observadas as seguintes regras:I – a limitação prevista neste parágrafo será triplicada caso o empregador seja reincidente;II – considera-se reincidente o empregador que, durante o período de doze meses, descumpre o disposto nos §§ 4º, 6º, 7º e 9º deste artigo por mais de sessenta dias. (Parágrafo acres-centado pela Lei nº 13.419, de 13.03.2017 – DOU de 14.03.2017, com efeitos a partir de sessenta dias de sua publicação oficial)”Oportuna também a transcrição do art. 458:“Art. 458. Além do pagamento em dinheiro, compreendem-se no salário, para todos os efeitos legais, a alimentação, habitação, vestuário ou outras prestações in natura que a empresa, por força do contrato ou do costume, fornecer habitualmente ao empregado. Em caso algum será permitido o pagamento com bebidas alcoólicas ou drogas nocivas. (Redação dada ao caput Decreto-Lei nº 229, de 28.02.1967, DOU 28.02.1967)§ 1º Os valores atribuídos às prestações in natura deverão ser justos e razoáveis, não poden-do exceder, em cada caso, os dos percentuais das parcelas componentes do salário mínimo (arts. 81 e 82). (Parágrafo acrescentado pelo Decreto-Lei nº 229, de 28.02.1967, DOU 28.02.1967)§ 2º Para os efeitos previstos neste artigo, não serão consideradas como salário as seguintes utilidades concedidas pelo empregador: (Redação dada pela Lei nº 10.243, de 19.06.2001, DOU 20.06.2001)I – vestuários, equipamentos e outros acessórios fornecidos aos empregados e utilizados no local de trabalho, para a prestação do serviço; (Inciso acrescentado pela Lei nº 10.243, de 19.06.2001, DOU 20.06.2001)II – educação, em estabelecimento de ensino próprio ou de terceiros, compreendendo os valo-res relativos à matrícula, mensalidade, anuidade, livros e material didático; (Inciso acrescen-tado pela Lei nº 10.243, de 19.06.2001, DOU 20.06.2001)III – transporte destinado ao deslocamento para o trabalho e retorno, em percurso servido ou não por transporte público; (Inciso acrescentado pela Lei nº 10.243, de 19.06.2001, DOU 20.06.2001)IV – assistência médica, hospitalar e odontológica, prestada diretamente ou mediante seguro--saúde; (Inciso acrescentado pela Lei nº 10.243, de 19.06.2001, DOU 20.06.2001)V – seguros de vida e de acidentes pessoais; (Inciso acrescentado pela Lei nº 10.243, de 19.06.2001, DOU 20.06.2001)VI – previdência privada; (Inciso acrescentado pela Lei nº 10.243, de 19.06.2001, DOU 20.06.2001)

Page 132: Nº 345 – Março 2018 · Revista SÍNTESE Trabalhista e Previdenciária Ano XXIX – nº 345 – MArço 2018 reposItórIo AutorIzAdo de JurIsprudêncIA Supremo Tribunal Federal

132 ........................................................RST Nº 345 – Março/2018 – PARTE GERAL – JURISPRUDÊNCIA TRABALHISTA – EMENTÁRIO

VII – (Vetado na Lei nº 10.243, de 19.06.2001, DOU 20.06.2001)VIII – o valor correspondente ao vale-cultura. (NR) (Inciso acrescentado pela Lei nº 12.761, de 27.12.2012, DOU de 27.12.2012 – Ed. Extra)§ 3º A habitação e a alimentação fornecidas como salário-utilidade deverão atender aos fins a que se destinam e não poderão exceder, respectivamente, a 25% (vinte e cinco por cento) e 20% (vinte por cento) do salário-contratual. (Parágrafo acrescentado pela Lei nº 8.860, de 24.03.1994, DOU 25.03.1994)§ 4º Tratando-se de habitação coletiva, o valor do salário-utilidade a ela correspondente será obtido mediante a divisão do justo valor da habitação pelo número de co-ocupantes, vedada, em qualquer hipótese, a utilização da mesma unidade residencial por mais de uma família. (Parágrafo acrescentado pela Lei nº 8.860, de 24.03.1994, DOU 25.03.1994)§ 5º O valor relativo à assistência prestada por serviço médico ou odontológico, próprio ou não, inclusive o reembolso de despesas com medicamentos, óculos, aparelhos ortopédicos, próteses, órteses, despesas médico-hospitalares e outras similares, mesmo quando concedido em diferentes modalidades de planos e coberturas, não integram o salário do empregado para qualquer efeito nem o salário de contribuição, para efeitos do previsto na alínea q do § 9º do art. 28 da Lei nº 8.212, de 24 de julho de 1991.”Sabemos que o salário é a contraprestação devida ao empregado, pela prestação dos serviços, em decorrência do contrato de trabalho, devido e pago diretamente pelo empregador.A remuneração é a soma do salário com outras vantagens percebidas pelo empregado, geral-mente pagas diretamente pelo empregador. Contudo, há situações em que o pagamento é feito por terceiros, como, por exemplo, a gorjeta.Com a vigência da Lei nº 13.467/2017, ainda que o pagamento seja habitual o art. 457 menciona que não haverá integração do auxílio-alimentação, indo em contraponto ao caput do art. 458 cuja redação não foi alterada.Após a reforma trabalhista teremos:Integram o salário:a) a importância fixa estipulada;b) as gorjetas;c) as gratificações legais; ed) as comissões pagas pelo empregador.Não integram a remuneração, ainda que pagas com habitualidade:a) ajuda de custo;b) auxílio-alimentação (vedado o pagamento em dinheiro);c) diárias para viagem (independentemente do valor);d) prêmios;e) abonos;f) assistência médica ou odontológica (própria ou conveniada);g) reembolso de despesas médico-hospitalares, com medicamentos, óculos, aparelhos ortopé-dicos, próteses, órteses e outras similares.São considerados prêmios as liberalidades concedidas pelo empregador em forma de bens, serviços ou valor em dinheiro a empregado ou a grupo de empregados, em razão de desempe-nho superior ao ordinariamente esperado no exercício de suas atividades.O § 8º do art. 28 da Lei nº 8.212/1991, o qual define que integram o salário de contribuição pelo seu valor total, as diárias para viagem com valor superior a 50% da remuneração do trabalhador foi revogado para adequá-lo às novas determinações da reforma.Da mesma forma, foi acrescido ao parágrafo 9º do mesmo artigo, as letras h, q e z para deter-minar que não integram o salário-de-contribuição: as diárias para viagem, independentemente do seu valor, as despesas com assistência médica, odontológico e reembolsos de despesas, independentemente de abrangerem a totalidade de empregados e dirigente, bem como, os prêmios e os abonos.

34789 – Banco de horas – ajustamento por negociação coletiva – necessidade

“Banco de horas. Necessidade de ajustamento por negociação coletiva. ‘O regime de compen-sação anual previsto pelo novo art. 59 da CLT (o chamado banco de horas) somente pode ser pactuado pelos instrumentos formais da negociação coletiva trabalhista, em virtude de a Consti-tuição da República não permitir que a transação meramente bilateral pactue medida desfavorá-

Page 133: Nº 345 – Março 2018 · Revista SÍNTESE Trabalhista e Previdenciária Ano XXIX – nº 345 – MArço 2018 reposItórIo AutorIzAdo de JurIsprudêncIA Supremo Tribunal Federal

RST Nº 345 – Março/2018 – PARTE GERAL – JURISPRUDÊNCIA TRABALHISTA – EMENTÁRIO ............................................................133

vel à saúde e segurança obreiras’ (In Curso de Direito do Trabalho, 16. ed. São Paulo: LTr, 2017, p. 1013). Não havendo prova do ajuste coletivo no presente caso, prevalece a declaração da nu-lidade do banco de horas, bem como pagamento das horas destinadas à compensação como ex-tras. Recurso patronal desprovido, no particular.” (TRT 18ª R. – RO 0010074-85.2017.5.18.0101 – Rel. Geraldo Rodrigues do Nascimento – DJe 01.12.2017 – p. 369)

34790 – compensação de horário – ambiente insalubre – impossibilidade

“Regime de compensação em ambiente insalubre. Invalidade. ‘É inválido o regime de compen-sação horária em atividade insalubre quando não atendidas as exigências do art. 60 da CLT. No caso de regime de compensação horária semanal, será devido apenas o adicional de horas extras sobre as horas irregularmente compensadas’.” (TRT 4ª R. – RO 0000818-23.2013.5.04.0013 – 2ª T. – Relª Desª Tânia Regina Silva Reckziegel – DJe 31.10.2017)

Transcrição Editorial SÍNTESEConsolidação das Leis do Trabalho:“Art. 60. Nas atividades insalubres, assim consideradas as constantes dos quadros menciona-dos no capítulo ‘Da Segurança e da Medicina do Trabalho’ ou que neles venham a ser incluídas por ato do Ministro do Trabalho, quaisquer prorrogações só poderão ser acordadas mediante licença prévia das autoridades competentes em matéria de medicina do trabalho, as quais, para esse efeito, procederão aos necessários exames locais e à verificação dos métodos e pro-cessos de trabalho, quer diretamente, quer por intermédio de autoridades sanitárias federais, estaduais e municipais, com quem entrarão em entendimento para tal fim.Parágrafo único. Excetuam-se da exigência de licença prévia as jornadas de doze horas de trabalho por trinta e seis horas ininterruptas de descanso.” (NR)

34791 – competência – Justiça do Trabalho – contrato de empreitada – saldo remanescente para cobrança – alcance

“Empreitada. Competência da Justiça do Trabalho. Saldo remanescente. Dissídio de alçada. Não cabimento de recurso. Compete à Justiça do Trabalho conciliar e julgar os dissídios resultantes de contratos de empreitada entre trabalhador e empresa privada, na forma do art. 114, inc. I, da Constituição da República, c/c o art. 652, inc. III, da CLT. Tratando-se de dissídio da alçada exclusiva da Vara do Trabalho, já que seu objeto não ultrapassa dois salários mínimos, o recurso é incabível, sobretudo por não envolver matéria constitucional.” (TRT 11ª R. – RO 0000873-35.2015.5.11.0101 – Relª Francisca Rita Alencar Albuquerque – DJe 05.12.2017 – p. 245)

34792 – competência material – Justiça do Trabalho – relação jurídica de cunho celetista – al-cance

“Competência material. Justiça do Trabalho. Relação jurídica de cunho celetista. Eletroacre. Con-curso. A competência material é definida em função da natureza da lide descrita na peça inaugu-ral, ou seja, a competência é firmada em função da causa de pedir e dos pedidos. Dessa forma, o juízo preliminar faz-se mediante o simples confronto entre a afirmativa feita na inicial pelo autor, considerada in statu assertionis, e as condições da ação, que são a possibilidade jurídica, o interesse de agir e a legitimidade para agir. Nesse pensar, se, hipoteticamente, para a solução dos conflitos havidos na possível relação jurídica tem natureza celetista, decorrente de contrato de emprego, exsurge daí cristalina a competência da Justiça do Trabalho, incluídas as fases pré e pós contratual. Prescrição. Concurso. Fase pré-contratual. No tocante ao termo inicial para contagem do prazo prescricional, deve ser considerada data do término da validade do concurso, momento em que surgiu para o reclamante o direito de buscar em Juízo os meios para reparar a lesão decorrente da inércia da empresa em efetivar sua nomeação durante o período de vigência do certame. Candidato de concurso público para o cargo de ‘eletricista auxiliar’. Terceirização das atividades para qual se prestou o aludido certame pela Companhia de Eletricidade do Acre S/A. Eletroacre. Ilicitude. Direito à contratação. É posição pacífica do Supremo Tribunal Federal que, havendo vaga disponível e candidatos aprovados em concurso público vigente, o exercício precário, por terceirização, de empregado com atribuições próprias do cargo objeto do concurso

Page 134: Nº 345 – Março 2018 · Revista SÍNTESE Trabalhista e Previdenciária Ano XXIX – nº 345 – MArço 2018 reposItórIo AutorIzAdo de JurIsprudêncIA Supremo Tribunal Federal

134 ........................................................RST Nº 345 – Março/2018 – PARTE GERAL – JURISPRUDÊNCIA TRABALHISTA – EMENTÁRIO

faz nascer para o concursado o direito à nomeação, por imposição do art. 37, inciso IV, da Cons-tituição Federal. Desse modo, a contratação de profissionais terceirizados, mediante atuação de empresas interpostas, cujas atribuições correspondem exatamente àquelas inerentes à função de eletrotécnico, cargo para o qual o reclamante foi aprovado, em cadastro de reserva, comprova a existência de vaga para a função e a necessidade do referido profissional no quadro de pessoal da Eletroacre, devendo ser reconhecido o direito subjetivo à nomeação.” (TRT 14ª R. – RO 0000569-45.2017.5.14.0404 – 2ª T. – Rel. Des. Carlos Augusto Gomes Lôbo – DJe 06.12.2017 – p. 1229)

34793 – contrato de experiência – rescisão antecipada pelo reclamante – indenização

“Contrato de experiência. Rescisão antecipada pelo reclamante. Indenização do art. 479 da CLT. Verificando-se no TRCT o pagamento da parcela ‘multa do art. 479 da CLT’, no valor deferido na sentença, impõe-se a reforma desta, a fim de se excluir da condenação o pagamento da referida verba.” (TRT 18ª R. – ROPS 0010829-17.2017.5.18.0261 – Rel. Gentil Pio de Oliveira – DJe 05.12.2017 – p. 1350)

34794 – contribuição previdenciária – empresa optante pelo Simples – isenção da cota patronal – alcance

“Simples Nacional. Regime tributário privilegiado. Isenção da cota patronal. Conforme disposto no art. 13, VI, da Lei Complementar nº 123/2006, a opção da empresa pelo Simples Nacional impõe o recolhimento mensal dos impostos e contribuições, mediante documento único de arre-cadação, que inclui contribuição patronal previdenciária. Assim, não há falar em nova obrigação oriunda de situação jurídica posterior, eis que a obrigação tributária exauriu-se no cumprimento da lei, diante do recolhimento unificado da contribuição à Seguridade Social de que tratam o art. 195, I, alínea a, da Constituição da República e o art. 22 da Lei nº 8.212/1991. TRT – 00813-2013-003-03-00-5-AP.” (TRT 3ª R. – Ap 0000813-58.2013.5.03.0003 – 3ª T. – Relª Conv. Maria Cristina Diniz Caixeta – DJe 31.10.2017)

Remissão Editorial SÍNTESEVide RST nº 335, maio/2017, ementa nº 34198 do TRT 3ª R.

Transcrição Editorial SÍNTESELC 123/2016:“Art. 13. O Simples Nacional implica o recolhimento mensal, mediante documento único de arrecadação, dos seguintes impostos e contribuições:I – Imposto sobre a Renda da Pessoa Jurídica – IRPJ;II – Imposto sobre Produtos Industrializados – IPI, observado o disposto no inciso XII do § 1º deste artigo;III – Contribuição Social sobre o Lucro Líquido – CSLL;IV – Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social – Cofins, observado o disposto no inciso XII do § 1º deste artigo;V – Contribuição para o PIS/Pasep, observado o disposto no inciso XII do § 1º deste artigo;VI – Contribuição Patronal Previdenciária – CPP para a Seguridade Social, a cargo da pessoa jurídica, de que trata o art. 22 da Lei nº 8.212, de 24 de julho de 1991, exceto no caso da microempresa e da empresa de pequeno porte que se dedique às atividades de prestação de serviços referidas no § 5º-C do art. 18 desta Lei Complementar; VII – Imposto sobre Operações Relativas à Circulação de Mercadorias e Sobre Prestações de Serviços de Transporte Interestadual e Intermunicipal e de Comunicação – ICMS;VIII – Imposto sobre Serviços de Qualquer Natureza – ISS.§ 1º O recolhimento na forma deste artigo não exclui a incidência dos seguintes impostos ou contribuições, devidos na qualidade de contribuinte ou responsável, em relação aos quais será observada a legislação aplicável às demais pessoas jurídicas:I – Imposto sobre Operações de Crédito, Câmbio e Seguro, ou Relativas a Títulos ou Valores Mobiliários – IOF;II – Imposto sobre a Importação de Produtos Estrangeiros – II;III – Imposto sobre a Exportação, para o Exterior, de Produtos Nacionais ou Nacionalizados – IE;

Page 135: Nº 345 – Março 2018 · Revista SÍNTESE Trabalhista e Previdenciária Ano XXIX – nº 345 – MArço 2018 reposItórIo AutorIzAdo de JurIsprudêncIA Supremo Tribunal Federal

RST Nº 345 – Março/2018 – PARTE GERAL – JURISPRUDÊNCIA TRABALHISTA – EMENTÁRIO ............................................................135

IV – Imposto sobre a Propriedade Territorial Rural – ITR;V – Imposto de Renda, relativo aos rendimentos ou ganhos líquidos auferidos em aplicações de renda fixa ou variável;VI – Imposto de Renda relativo aos ganhos de capital auferidos na alienação de bens do ativo permanente;VII – Contribuição Provisória sobre Movimentação ou Transmissão de Valores e de Créditos e Direitos de Natureza Financeira – CPMF;VIII – Contribuição para o Fundo de Garantia do Tempo de Serviço – FGTS;IX – Contribuição para manutenção da Seguridade Social, relativa ao trabalhador;X – Contribuição para a Seguridade Social, relativa à pessoa do empresário, na qualidade de contribuinte individual;XI – Imposto de Renda relativo aos pagamentos ou créditos efetuados pela pessoa jurídica a pessoas físicas;XII – Contribuição para o PIS/Pasep, Cofins e IPI incidentes na importação de bens e serviços;XIII – ICMS devido:a) nas operações sujeitas ao regime de substituição tributária, tributação concentrada em uma única etapa (monofásica) e sujeitas ao regime de antecipação do recolhimento do imposto com encerramento de tributação, envolvendo combustíveis e lubrificantes; energia elétrica; cigarros e outros produtos derivados do fumo; bebidas; óleos e azeites vegetais comestíveis; farinha de trigo e misturas de farinha de trigo; massas alimentícias; açúcares; produtos lácteos; carnes e suas preparações; preparações à base de cereais; chocolates; produtos de padaria e da indús-tria de bolachas e biscoitos; sorvetes e preparados para fabricação de sorvetes em máquinas; cafés e mates, seus extratos, essências e concentrados; preparações para molhos e molhos preparados; preparações de produtos vegetais; rações para animais domésticos; veículos au-tomotivos e automotores, suas peças, componentes e acessórios; pneumáticos; câmaras de ar e protetores de borracha; medicamentos e outros produtos farmacêuticos para uso humano ou veterinário; cosméticos; produtos de perfumaria e de higiene pessoal; papéis; plásticos; cane-tas e malas; cimentos; cal e argamassas; produtos cerâmicos; vidros; obras de metal e plástico para construção; telhas e caixas d’água; tintas e vernizes; produtos eletrônicos, eletroeletrôni-cos e eletrodomésticos; fios; cabos e outros condutores; transformadores elétricos e reatores; disjuntores; interruptores e tomadas; isoladores; pára-raios e lâmpadas; máquinas e aparelhos de ar-condicionado; centrifugadores de uso doméstico; aparelhos e instrumentos de pesagem de uso doméstico; extintores; aparelhos ou máquinas de barbear; máquinas de cortar o cabelo ou de tosquiar; aparelhos de depilar, com motor elétrico incorporado; aquecedores elétricos de água para uso doméstico e termômetros; ferramentas; álcool etílico; sabões em pó e líquidos para roupas; detergentes; alvejantes; esponjas; palhas de aço e amaciantes de roupas; venda de mercadorias pelo sistema porta a porta; nas operações sujeitas ao regime de substituição tributária pelas operações anteriores; e nas prestações de serviços sujeitas aos regimes de substituição tributária e de antecipação de recolhimento do imposto com encerramento de tributação; (Redação dada pele Lei Complementar nº 147, de 2014) (Produção de efeito)b) por terceiro, a que o contribuinte se ache obrigado, por força da legislação estadual ou distrital vigente;c) na entrada, no território do Estado ou do Distrito Federal, de petróleo, inclusive lubrificantes e combustíveis líquidos e gasosos dele derivados, bem como energia elétrica, quando não destinados à comercialização ou industrialização;d) por ocasião do desembaraço aduaneiro;e) na aquisição ou manutenção em estoque de mercadoria desacobertada de documento fiscal;f) na operação ou prestação desacobertada de documento fiscal;g) nas operações com bens ou mercadorias sujeitas ao regime de antecipação do recolhimento do imposto, nas aquisições em outros Estados e Distrito Federal:1. com encerramento da tributação, observado o disposto no inciso IV do § 4º do art. 18 desta Lei Complementar;2. sem encerramento da tributação, hipótese em que será cobrada a diferença entre a alíquota interna e a interestadual, sendo vedada a agregação de qualquer valor;h) nas aquisições em outros Estados e no Distrito Federal de bens ou mercadorias, não sujeitas ao regime de antecipação do recolhimento do imposto, relativo à diferença entre a alíquota interna e a interestadual;XIV – ISS devido:

Page 136: Nº 345 – Março 2018 · Revista SÍNTESE Trabalhista e Previdenciária Ano XXIX – nº 345 – MArço 2018 reposItórIo AutorIzAdo de JurIsprudêncIA Supremo Tribunal Federal

136 ........................................................RST Nº 345 – Março/2018 – PARTE GERAL – JURISPRUDÊNCIA TRABALHISTA – EMENTÁRIO

a) em relação aos serviços sujeitos à substituição tributária ou retenção na fonte;b) na importação de serviços;XV – demais tributos de competência da União, dos Estados, do Distrito Federal ou dos Muni-cípios, não relacionados nos incisos anteriores.§ 1º-A. Os valores repassados aos profissionais de que trata a Lei no 12.592, de 18 de janeiro de 2012, contratados por meio de parceria, nos termos da legislação civil, não integrarão a receita bruta da empresa contratante para fins de tributação, cabendo ao contratante a reten-ção e o recolhimento dos tributos devidos pelo contratado. (Incluído pela Lei Complementar nº 155, de 2016) Produção de efeito§ 2º Observada a legislação aplicável, a incidência do imposto de renda na fonte, na hipótese do inciso V do § 1º deste artigo, será definitiva.§ 3º As microempresas e empresas de pequeno porte optantes pelo Simples Nacional ficam dispensadas do pagamento das demais contribuições instituídas pela União, inclusive as con-tribuições para as entidades privadas de serviço social e de formação profissional vinculadas ao sistema sindical, de que trata o art. 240 da Constituição Federal, e demais entidades de serviço social autônomo.§ 4º (Vetado).§ 5º A diferença entre a alíquota interna e a interestadual de que tratam as alíneas g e h do inciso XIII do § 1º deste artigo será calculada tomando-se por base as alíquotas aplicáveis às pessoas jurídicas não optantes pelo Simples Nacional.§ 6º O Comitê Gestor do Simples Nacional:I – disciplinará a forma e as condições em que será atribuída à microempresa ou empresa de pequeno porte optante pelo Simples Nacional a qualidade de substituta tributária; eII – poderá disciplinar a forma e as condições em que será estabelecido o regime de antecipa-ção do ICMS previsto na alínea g do inciso XIII do § 1º deste artigo.§ 7º O disposto na alínea a do inciso XIII do § 1º será disciplinado por convênio celebrado pelos Estados e pelo Distrito Federal, ouvidos o CGSN e os representantes dos segmentos eco-nômicos envolvidos. (Incluído pela Lei Complementar nº 147, de 2014) (Produção de efeito)§ 8º Em relação às bebidas não alcoólicas, massas alimentícias, produtos lácteos, carnes e suas preparações, preparações à base de cereais, chocolates, produtos de padaria e da indús-tria de bolachas e biscoitos, preparações para molhos e molhos preparados, preparações de produtos vegetais, telhas e outros produtos cerâmicos para construção e detergentes, aplica-se o disposto na alínea a do inciso XIII do § 1º aos fabricados em escala industrial relevante em cada segmento, observado o disposto no § 7º. (Incluído pela Lei Complementar nº 147, de 2014)”

Comentário Editorial SÍNTESENo caso em apreço a discussão girou em torno da isenção da cota patronal relativo ao recolhi-mento da contribuição previdenciária pelo fato de a empresa ser optante pelo Simples.Em um julgado proferido pela ilustre Desembargadora Dra. Sônia Maria Forster do Amaral, no RO 00180.2007.0590.2007, o voto foi proferido sob o seguinte argumento:“De acordo com a Lei nº 9.317/1996, § 4º, a empresa optante pelo sistema Simples está dispensada do recolhimento das demais contribuições instituídas pela União, que não as elen-cadas em seu § 3º.De igual sorte, o art. 13, § 3º, da Lei Complementar nº123/2006, que trata do chamado Simples Nacional, dispõe que:“Art. 13. O Simples Nacional implica o recolhimento mensal, mediante documento único de arrecadação, dos seguintes impostos e contribuições:[...]§ 3º As microempresas e empresas de pequeno porte optantes pelo Simples Nacional ficam dispensadas do pagamento das demais contribuições instituídas pela União, inclusive as con-tribuições para as entidades privadas de serviço social e de formação profissional vinculadas ao sistema sindical, de que trata o art. 240 da Constituição Federal, e demais entidades de serviço social autônomo.”Dentro desse contexto, comprovada a inscrição da recorrida no Simples, consoante documen-tação encartada às fls. 64/65 e 80, impunha-se o indeferimento do pretendido pelo autor, restando irretocável a decisão de 1º Grau.

Page 137: Nº 345 – Março 2018 · Revista SÍNTESE Trabalhista e Previdenciária Ano XXIX – nº 345 – MArço 2018 reposItórIo AutorIzAdo de JurIsprudêncIA Supremo Tribunal Federal

RST Nº 345 – Março/2018 – PARTE GERAL – JURISPRUDÊNCIA TRABALHISTA – EMENTÁRIO ............................................................137

Ressalte-se, ante as alegações recursais, e como já apreciado, a sentença recorria baseou-se em artigos de lei, inexistindo as violações apontadas pelo recorrente.Por fim, descabida a pretendida discussão acerca da possibilidade ou não de ser a ré optante do Simples, a uma porque tese inovatória do recurso, e a duas porque os documentos anexa-dos demonstram sua efetiva inscrição.Pelas razões expostas, não conheço do recurso no tocante às contribuições assistenciais; co-nheço quanto à contribuição sindical, e, no mérito, nego provimento ao recurso ordinário interposto pelo reclamante, nos termos da fundamentação.”Nessa linha de raciocínio, destacamos a redação contida na Nova Lei Processual Civil:“Art. 926. Os tribunais devem uniformizar sua jurisprudência e mantê-la estável, íntegra e coerente. § 1º Na forma estabelecida e segundo os pressupostos fixados no regimento interno, os tribu-nais editarão enunciados de súmula correspondentes a sua jurisprudência dominante.§ 2º Ao editar enunciados de súmula, os tribunais devem ater-se às circunstâncias fáticas dos precedentes que motivaram sua criação.”Com efeito, quando uma empresa está cadastrada no Sistema Integrado de Pagamento de Impostos e Contribuições das Microempresas e Empresas de Pequeno Porte – Simples, de acordo com a LC 123/2006, referida inscrição implica no pagamento mensal unificado de vários impostos e contribuições, nos termos dos arts. 12 e 13 da citada Lei, descritos a seguir:“Art. 12. Fica instituído o Regime Especial Unificado de Arrecadação de Tributos e Contribui-ções devidos pelas Microempresas e Empresas de Pequeno Porte – Simples Nacional.Art. 13. O Simples Nacional implica o recolhimento mensal, mediante documento único de arrecadação, dos seguintes impostos e contribuições:[...]XV – demais tributos de competência da União, dos Estados, do Distrito Federal ou dos Muni-cípios, não relacionados nos incisos anteriores.[...]§ 3º As microempresas e empresas de pequeno porte optantes pelo Simples Nacional ficam dispensadas do pagamento das demais contribuições instituídas pela União, inclusive as con-tribuições para as entidades privadas de serviço social e de formação profissional vinculadas ao sistema sindical, de que trata o art. 240 da Constituição Federal, e demais entidades de serviço social autônomo.”Constata-se que o § 3º prevê a dispensa “do pagamento das demais contribuições instituídas pela União” sem especificar quais são essas contribuições.Em relação às contribuições instituídas pela União, o caput do art. 149 da CF/1988 deter-mina:“Art. 149. Compete exclusivamente à União instituir contribuições sociais, de intervenção no domínio econômico e de interesse das categorias profissionais ou econômicas, como instru-mento de sua atuação nas respectivas áreas, observado o disposto nos arts. 146, III, e 150, I e III, e sem prejuízo do previsto no art. 195, § 6º relativamente às contribuições a que alude o dispositivo.”Nesse aspecto, ressalta-se que o Secretário da Receita Federal expediu a Instrução Normativa (IN) nº 608/2006, que dispõe sobre o Simples. Esse ato analisa a questão da contribuição sindical patronal em seu art. 5º, § 8º:“Art. 5º [...][...]§ 8º A inscrição no Simples dispensa a pessoa jurídica do pagamento das demais contribui-ções instituídas pela União, inclusive as destinadas ao Serviço Social do Comércio (Sesc), ao Serviço Social da Indústria (Sesi), ao Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial (Senai), ao Serviço Nacional de Aprendizagem Comercial (Senac), ao Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (Sebrae), e seus congêneres, bem assim as relativas ao salário--educação e à contribuição sindical patronal.” (grifos nossos)Recorda-se, historicamente, que a Secretaria da Receita Federal já vinha se posicionando sobre a citada questão desde 12.02.1999, ocasião em que o § 6º do art. 3º da Instrução Normativa nº 9/1999 dispunha que a inscrição no Simples dispensaria a pessoa jurídica do pagamento, entre outras contribuições, da contribuição sindical patronal. Posteriormente, a IN 9/1999 foi revogada pela Instrução Normativa nº 34/2001, a qual, por sua vez, foi revogada pela Instrução Normativa nº 250/2002, e esta, pela Instrução Normativa nº 355/2003.

Page 138: Nº 345 – Março 2018 · Revista SÍNTESE Trabalhista e Previdenciária Ano XXIX – nº 345 – MArço 2018 reposItórIo AutorIzAdo de JurIsprudêncIA Supremo Tribunal Federal

138 ........................................................RST Nº 345 – Março/2018 – PARTE GERAL – JURISPRUDÊNCIA TRABALHISTA – EMENTÁRIO

Atualmente, vigora a citada IN/SRF 608/2006, que revogou a Instrução Normativa nº 355/2003, sem provocar, contudo, qualquer mudança nos posicionamentos adotados an-teriormente. A própria Constituição Federal de 1988, assegura, no art. 170, IX, tratamento favorecido às empresas de pequeno porte. A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios dispen-sarão às microempresas e às empresas de pequeno porte, assim definidas em lei, tratamento jurídico diferenciado, visando a incentivá-las pela simplificação de suas obrigações administra-tivas, tributárias, previdenciárias e creditícias ou pela eliminação ou redução destas por meio de lei (art. 179, da CF/1988).

34795 – convenção coletiva de trabalho – violação de norma legal – nulidade

“Nulidade das cláusulas de convenção coletiva que viola norma legal. Somente mediante autori-zação expressa do empregado poderia haver o desconto sendo ilícito qualquer desconto efetuado em sentido contrário, pois tal prática é a transferência do risco do empreendimento ao trabalhador que tem apenas sua força de trabalho, encontrando assim vedação no ordenamento jurídico, em virtude do principio da intangibilidade salarial cujo objetivo é a proteção do salário.” (TRT 8ª R. – AACC 0000214-51.2017.5.08.0000 – Relª Desª Ida Selene Duarte Sirotheau Correa Braga – DJe 04.12.2017 – p. 18)

Transcrição Editorial SÍNTESEConsolidação das Leis do Trabalho:“Art. 611-A. A convenção coletiva e o acordo coletivo de trabalho, observados os incisos III e VI do caput do art. 8º da Constituição, têm prevalência sobre a lei quando, entre outros, dispuserem sobre:I – pacto quanto à jornada de trabalho, observados os limites constitucionais;II – banco de horas anual;III – intervalo intrajornada, respeitado o limite mínimo de trinta minutos para jornadas supe-riores a seis horas;IV – adesão ao Programa Seguro-Emprego (PSE), de que trata a Lei nº 13.189, de 19 de novembro de 2015;V – plano de cargos, salários e funções compatíveis com a condição pessoal do empregado, bem como identificação dos cargos que se enquadram como funções de confiança;VI – regulamento empresarial;VII – representante dos trabalhadores no local de trabalho;VIII – teletrabalho, regime de sobreaviso, e trabalho intermitente;IX – remuneração por produtividade, incluídas as gorjetas percebidas pelo empregado, e remu-neração por desempenho individual;X – modalidade de registro de jornada de trabalho;XI – troca do dia de feriado;XII – enquadramento do grau de insalubridade e prorrogação de jornada em locais insalubres, incluída a possibilidade de contratação de perícia, afastada a licença prévia das autoridades competentes do Ministério do Trabalho, desde que respeitadas, na integralidade, as normas de saúde, higiene e segurança do trabalho previstas em lei ou em normas regulamentadoras do Ministério do Trabalho;XIII – prorrogação de jornada em ambientes insalubres, sem licença prévia das autoridades competentes do Ministério do Trabalho;XIV – prêmios de incentivo em bens ou serviços, eventualmente concedidos em programas de incentivo;XV – participação nos lucros ou resultados da empresa.§ 1º No exame da convenção coletiva ou do acordo coletivo de trabalho, a Justiça do Trabalho observará o disposto no § 3º do art. 8º desta Consolidação.§ 2º A inexistência de expressa indicação de contrapartidas recíprocas em convenção coletiva ou acordo coletivo de trabalho não ensejará sua nulidade por não caracterizar um vício do negócio jurídico.§ 3º Se for pactuada cláusula que reduza o salário ou a jornada, a convenção coletiva ou o acordo coletivo de trabalho deverão prever a proteção dos empregados contra dispensa imoti-vada durante o prazo de vigência do instrumento coletivo.

Page 139: Nº 345 – Março 2018 · Revista SÍNTESE Trabalhista e Previdenciária Ano XXIX – nº 345 – MArço 2018 reposItórIo AutorIzAdo de JurIsprudêncIA Supremo Tribunal Federal

RST Nº 345 – Março/2018 – PARTE GERAL – JURISPRUDÊNCIA TRABALHISTA – EMENTÁRIO ............................................................139

§ 4º Na hipótese de procedência de ação anulatória de cláusula de convenção coletiva ou de acordo coletivo de trabalho, quando houver a cláusula compensatória, esta deverá ser igual-mente anulada, sem repetição do indébito.§ 5º Os sindicatos subscritores de convenção coletiva ou de acordo coletivo de trabalho parti-ciparão, como litisconsortes necessários, em ação coletiva que tenha como objeto a anulação de cláusulas desses instrumentos, vedada a apreciação por ação individual.” (NR)“Art. 611-B. Constituem objeto ilícito de convenção coletiva ou de acordo coletivo de trabalho, exclusivamente, a supressão ou a redução dos seguintes direitos:I – normas de identificação profissional, inclusive as anotações na Carteira de Trabalho e Previdência Social;II – seguro-desemprego, em caso de desemprego involuntário;III – valor dos depósitos mensais e da indenização rescisória do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS);IV – salário mínimo;V – valor nominal do décimo terceiro salário;VI – remuneração do trabalho noturno superior à do diurno;VII – proteção do salário na forma da lei, constituindo crime sua retenção dolosa;VIII – salário-família;IX – repouso semanal remunerado;X – remuneração do serviço extraordinário superior, no mínimo, em 50% (cinquenta por cento) à do normal;XI – número de dias de férias devidas ao empregado;XII – gozo de férias anuais remuneradas com, pelo menos, um terço a mais do que o salário normal;XIII – licença-maternidade com a duração mínima de cento e vinte dias;XIV – licença-paternidade nos termos fixados em lei;XV – proteção do mercado de trabalho da mulher, mediante incentivos específicos, nos termos da lei;XVI – aviso-prévio proporcional ao tempo de serviço, sendo no mínimo de trinta dias, nos termos da lei;XVII – normas de saúde, higiene e segurança do trabalho previstas em lei ou em normas regu-lamentadoras do Ministério do Trabalho;XVIII – adicional de remuneração para as atividades penosas, insalubres ou perigosas;XIX – aposentadoria;XX – seguro contra acidentes de trabalho, a cargo do empregador;XXI – ação, quanto aos créditos resultantes das relações de trabalho, com prazo prescricional de cinco anos para os trabalhadores urbanos e rurais, até o limite de dois anos após a extinção do contrato de trabalho;XXII – proibição de qualquer discriminação no tocante a salário e critérios de admissão do trabalhador com deficiência;XXIII – proibição de trabalho noturno, perigoso ou insalubre a menores de dezoito anos e de qualquer trabalho a menores de dezesseis anos, salvo na condição de aprendiz, a partir de quatorze anos;XXIV – medidas de proteção legal de crianças e adolescentes;XXV – igualdade de direitos entre o trabalhador com vínculo empregatício permanente e o trabalhador avulso;XXVI – liberdade de associação profissional ou sindical do trabalhador, inclusive o direito de não sofrer, sem sua expressa e prévia anuência, qualquer cobrança ou desconto salarial esta-belecidos em convenção coletiva ou acordo coletivo de trabalho;XXVII – direito de greve, competindo aos trabalhadores decidir sobre a oportunidade de exercê--lo e sobre os interesses que devam por meio dele defender;XXVIII – definição legal sobre os serviços ou atividades essenciais e disposições legais sobre o atendimento das necessidades inadiáveis da comunidade em caso de greve;XXIX – tributos e outros créditos de terceiros;XXX – as disposições previstas nos arts. 373-A, 390, 392, 392-A, 394, 394-A, 395, 396 e 400 desta Consolidação.

Page 140: Nº 345 – Março 2018 · Revista SÍNTESE Trabalhista e Previdenciária Ano XXIX – nº 345 – MArço 2018 reposItórIo AutorIzAdo de JurIsprudêncIA Supremo Tribunal Federal

140 ........................................................RST Nº 345 – Março/2018 – PARTE GERAL – JURISPRUDÊNCIA TRABALHISTA – EMENTÁRIO

Parágrafo único. Regras sobre duração do trabalho e intervalos não são consideradas como normas de saúde, higiene e segurança do trabalho para os fins do disposto neste artigo.”

34796 – dano moral coletivo – afastamento por doença por mais de 15 dias – atestados médicos – validação por médico da empresa – abuso – inexistência

“Danos morais coletivos. Afastamento por doença por mais de 15 (quinze) dias. Validação de atestados médicos particulares por médico da empresa. Inexistência de abuso. A ofensa a direitos transindividuais que enseja a indenização por danos morais coletivos é a lesão à ordem e ao pa-trimônio jurídicos de toda a coletividade. A necessidade de punição da empresa pela possível ino-bservância das normas que regulam a concessão de licenças médicas, em decorrência dos efeitos que seu descumprimento causa à saúde física e mental dos trabalhadores, dos quais decorre maior risco de doenças e acidentes de trabalho, transcende o interesse jurídico das pessoas diretamente envolvidas no litígio, para atingir, difusamente, toda a universalidade dos trabalhadores que se encontra ao abrigo desta tutela jurídica. Entretanto, no caso em análise, não ficou configurada a conduta ilícita da recorrida porque, não se observou violação às normas trabalhistas que regem a concessão de licenças médicas aos seus empregados. Com efeito, o médico da empresa detém primazia sobre qualquer outro para abonar as ausências dos trabalhadores decorrente de doença, nos primeiros 15 (quinze) dias de afastamento. Não se vislumbra, em absoluto, ilicitude na con-duta da reclamada em exigir que o empregado seja examinado por médico da empresa, para fins de concessão de licença por motivo de doença. Vale dizer: o veredicto do médico da empresa se sobrepõe àquele realizado pelos médicos assistentes e particulares dos trabalhadores, conside-rando-se a ordem preferencial dos atestados estabelecidos em lei e, também, por ser o médico da empresa o responsável legal em abonar os primeiros 15 (quinze) dias de afastamento em razão de doença, não sendo hipótese de procedimento destinado a verificar a autenticidade dos atestados emitidos por médicos particulares,nem mesmo representando a sua rejeição. Também não se co-gita de presunção de má-fé do empregado ao apresentar atestados médicos emitidos por médicos assistentes, tratando-se, na verdade, de cumprimento da legislação de regência da matéria e da jurisprudência consolidada dos Tribunais. Inteligência do comando inscrito no art. 175, inciso I, da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT). Recurso ordinário do autor de que se conhece e a que se nega provimento. Justiça gratuita. Pessoa jurídica. Sindicato. Necessidade de comprovação da insuficiência econômica. O benefício da justiça gratuita estende-se à pessoa jurídica, uma vez que o disposto no inciso LXXIX do art. 5º da Constituição Federal (CF) não faz distinção entre esta e a pessoa física, cabendo ao Estado a obrigação de prestar a assistência jurídica integral e gratuita aos que comprovarem insuficiência econômica. Contudo, na esteira da jurisprudência do colendo Tribunal Superior do Trabalho (TST), para a concessão do benefício é necessário que a pessoa jurídica comprove a impossibilidade de suportar o pagamento das custas e demais despesas pro-cessuais, não bastando a simples afirmação de ausência de recursos. Recurso ordinário do autor de que se conhece e a que se nega provimento.” (TRT 9ª R. – RO 0000048-81.2016.5.09.0014 – Rel. Altino Pedrozo dos Santos – DJe 27.10.2017 – p. 301)

34797 – empregador – responsabilidade objetiva – lesão na coluna lombossacra – vendedor ex-terno – condução de veículo em jornadas superiores a 13h diárias – configuração

“Doença laboral. Lesão na coluna lombossacra. Vendedor externo. Condução de veículo em jornadas superiores a 13h diárias. Responsabilidade do empregador. Meio ambiente do trabalho. Eliminação dos riscos. Convenção nº 155 da OIT. Presença de elementos a autorizar a respon-sabilidade objetiva empresarial. Elemento subjetivo igualmente configurado para imputação do empregador. 1. O art. 16 da Convenção nº 155 da Organização Internacional do Trabalho, ra-tificada pelo Brasil por meio do Decreto nº 1.254/1994, que dispõe sobre segurança e saúde no meio ambiente de trabalho, ao disciplinar a ação em nível de empresa explicita que, ‘1.Deverá ser exigido dos empregadores que, na medida que for razoável e possível, garantam que os locais de trabalho, o maquinário, os equipamentos e as operações e processos que estiverem sob seu controle são seguros e não envolvem risco algum para a segurança e a saúde dos trabalhadores’. 2. Função desempenhada pelo autor representada de acordo com o CNAE 4930-2 (em consonân-

Page 141: Nº 345 – Março 2018 · Revista SÍNTESE Trabalhista e Previdenciária Ano XXIX – nº 345 – MArço 2018 reposItórIo AutorIzAdo de JurIsprudêncIA Supremo Tribunal Federal

RST Nº 345 – Março/2018 – PARTE GERAL – JURISPRUDÊNCIA TRABALHISTA – EMENTÁRIO ............................................................141

cia da atividade desempenhada), com grau de risco 3 para acidentes do trabalho, conforme Anexo V (Relação de Atividades Preponderantes e Correspondentes Graus de Risco conforme a Classifi-cação Nacional de Atividades Econômicas) do Decreto nº 6.957/2009, atraindo a responsabiliza-ção objetiva pelo risco da atividade, na forma do art. 927, parágrafo único, do CC, c/c Anexo V do Decreto nº 6.957/2009 e Lei nº 12.009/2009, conclusão reforçada pela presença de nexo técnico--epidemiológico (NTEP) com a atividade desempenhada pelo autor, que guarda relação com a moléstia diagnosticada (CID M51). A existência de NTEP firma presunção de causalidade do agravo pelo trabalho. 3. A documentação da existência ou não de condições ambientais nocivas e de risco à saúde e à segurança do empregado incumbe ao empregador, assim como a adoção das medidas necessárias para eliminação ou redução da intensidade dos agentes agressivos. Estas obrigações ambientais desdobram-se, em sede processual, no dever do empregador de demons-trar, nos autos, de forma cabal, o correto cumprimento das medidas preventivas e compensatórias adotadas no ambiente de trabalho para evitar danos aos trabalhadores. A ausência da juntada dos documentos ambientais obrigatórios também firma presunção de causalidade do agravo pelo trabalho. 4. Trabalho desempenhado pelo empregado que exigia condução de veículo por cerca de 12 a 13 horas diárias, necessitando estacionar diversas vezes durante a rotina laboral, em ra-zão das visitas a clientes em venda de cigarros, sendo de amplo conhecimento que tal atividade é propensa a lesões da coluna diante das constantes vibrações a que o empregado fica sujeito, além do esforço repetitivo realizado na condução do veículo, em condições, não raras vezes, de-satentas às regras de ergonomia. 5. A responsabilidade da demandada decorre tanto da presença do elemento objetivo, pela aplicação da teoria do risco da atividade e do princípio do poluidor pagador, quanto do subjetivo (culpabilidade empresarial), restando inegavelmente presentes os requisitos caracterizadores da responsabilidade civil: ilicitude do ato (a conduta desidiosa do em-pregador) a existência de dano (lesão à integridade física do trabalhador) e o nexo de causalidade entre as doenças e o labor. Delitos ambientais trabalhistas. Art. 132 do CP e art. 19, § 2º, da Lei nº 8.213/1991. Expedição de ofícios. Tendo em conta que o descumprimento de normas de saú-de, segurança, medicina e higiene do trabalho constitui contravenção penal, em tese, na forma do art. 19, § 2º, da Lei nº 8.213/1991, como também a desconsideração de risco ergonômico na atividade exigida do trabalhador é conduta que constitui, em tese, o crime do art. 132 do CP, ca-bível a comunicação ao Ministério Público do Trabalho, em cumprimento ao disposto no art. 7º da Lei nº 7.347/1985 e arts. 5º, II, e 40 do CPP.” (TRT 4ª R. – RO 0001138-28.2013.5.04.0028 – 2ª T. – Rel. Des. Marcelo José Ferlin D’Ambroso – DJe 31.10.2017)

34798 – enquadramento sindical – prestação de serviços em prol de empresa financeira – alcance

“Recurso ordinário. Prestação de serviços em prol de empresa financeira a despeito de contra-tação formal por outra empresa integrante do mesmo grupo econômico. Enquadramento como financiária. Ratificado ter a parte ativa laborado em prol de empresa financeira durante todo o período da relação mantida com o grupo econômico, a despeito de ter sido contratada por outra firma integrante do conglomerado, atribui-se-lhe a condição de financiária, razão pela qual, se o enquadramento do empregado se dá de acordo com a atividade preponderante de seu real empregador, aplicam-se-lhe as normas coletivas vigentes no âmbito da categoria dos financiá-rios.” (TRT 17ª R. – RO 0000371-70.2016.5.17.0012 – Relª Ana Paula Tauceda Branco – DJe 07.12.2017 – p. 200)

34799 – fraude – execução – penhora de imóvel do sócio – alienação antes da desconsideração da personalidade jurídica – não configuração

“Fraude à execução não configurada. Penhora de imóvel do sócio. Alienação antes da descon-sideração da personalidade jurídica. Verificando-se que a alienação do imóvel de propriedade do sócio da empresa reclamada ocorreu antes da desconsideração da personalidade jurídica, e inexistindo prova de negócio jurídico simulado ou má-fé do terceiro adquirente, não há que se falar em fraude à execução na forma do art. 792, II, do novo CPC.” (TRT 17ª R. – Ap 0000369-75.2017.5.17.0009 – Relª Wanda Lucia Costa Leite Franca Decuzzi – DJe 31.10.2017 – p. 474)

Page 142: Nº 345 – Março 2018 · Revista SÍNTESE Trabalhista e Previdenciária Ano XXIX – nº 345 – MArço 2018 reposItórIo AutorIzAdo de JurIsprudêncIA Supremo Tribunal Federal

142 ........................................................RST Nº 345 – Março/2018 – PARTE GERAL – JURISPRUDÊNCIA TRABALHISTA – EMENTÁRIO

Remissão Editorial SÍNTESEVide RST nº 343, jan./2018, ementa nº 34686 do TRT 17ª R.

34800 – Horas extras – marítimo embarcado – fixação por norma coletiva – possibilidade

“Marítimo embarcado. Horas extras limitadas fixadas através de norma coletiva. Possibilidade. Considerando as peculiaridades das atividades do marítimo embarcado, por ter disciplina própria nos termos dos arts. 248 a 252 da CLT, o egrégio TST tem entendido ser possível haver previsão em norma coletiva quanto ao pagamento de número fixo de horas extras ao empregado maríti-mo, independentemente de seu cumprimento.” (TRT 14ª R. – RO 0000092-64.2017.5.14.0002 – 1ª T. – Rel. Juiz Conv. Afrânio Viana Gonçalves – DJe 31.10.2017 – p. 1933)

34801 – Horas extras – prestação excessiva e contínua – dano existencial – configuração

“A) Agravo de instrumento. Recurso de revista. Processo sob a égide da Lei nº 13.015/2014. Condenação em verbas de trato sucessivo. Limitação temporal. Parcelas vincendas. Demonstrado no agravo de instrumento que o recurso de revista preenchia os requisitos do art. 896 da CLT, dá-se provimento ao agravo de instrumento, para melhor análise da arguição de violação do art. 290 do CPC/1973 (art. 323 do CPC/2015), suscitada no recurso de revista. Agravo de instrumento provido. B) Recurso de revista. Processo sob a égide da Lei nº 13.015/2014. 1. Devolução de des-contos. Previsão em ACT. Matéria fática matéria fática. Súmula nº 126/TST. 2. Vale-alimentação. Diferenças. Matéria fática. Súmula nº 126/TST. 3. Aluguel de veículo. Previsão em norma cole-tiva. Natureza indenizatória. 4. Multa convencional. Não configuração do descumprimento de obrigação de fazer. Recurso de natureza extraordinária, como o recurso de revista, não se presta a reexaminar o conjunto fático-probatório produzido nos autos, porquanto, nesse aspecto, os Tribunais Regionais do Trabalho revelam-se soberanos. Inadmissível, assim, recurso de revista em que, para se chegar a conclusão diversa, seria imprescindível o revolvimento de fatos e provas, nos termos da Súmula nº 126 desta Corte. Recurso de revista não conhecido quanto ao tema. 5. Dano existencial. Prestação excessiva, contínua e dezarrazoada de horas extras. Configuração. O excesso de jornada extraordinária, para muito além das duas horas previstas na Constituição e na CLT, cumprido de forma habitual e por longo período, tipifica, em tese, o dano existencial, por configurar manifesto comprometimento do tempo útil de disponibilidade que todo indivíduo livre, inclusive o empregado, ostenta para usufruir de suas atividades pessoais, familiares e sociais. A esse respeito é preciso compreender o sentido da ordem jurídica criada no País em cinco de outubro de 1988 (CF/1988). É que a Constituição da República determinou a instauração, no Brasil, de um Estado Democrático de Direito (art. 1º da CF), composto, segundo a doutrina, de um tripé conceitual: a pessoa humana, com sua dignidade; a sociedade política, necessariamente democrática e inclusiva; e a sociedade civil, também necessariamente democrática e inclusiva (Constituição da República e Direitos Fundamentais – dignidade da pessoa humana, justiça social e Direito do Trabalho. 3. ed. São Paulo: LTr, 2015, Capítulo II). Ora, a realização dos princípios constitucionais humanísticos e sociais (inviolabilidade física e psíquica do indivíduo; bem-estar individual e social; segurança das pessoas humanas, ao invés de apenas da propriedade e das empresas, como no passado; valorização do trabalho e do emprego; justiça social; subordinação da propriedade à sua função social, entre outros princípios) é instrumento importante de garantia e cumprimento da centralidade da pessoa humana na vida socioeconômica e na ordem jurídi-ca, concretizando sua dignidade e o próprio princípio correlato da dignidade do ser humano. Essa realização tem de ocorrer também no plano das relações humanas, sociais e econômicas, inclusive no âmbito do sistema produtivo, dentro da dinâmica da economia capitalista, segun-do a Constituição da República Federativa do Brasil. Dessa maneira, uma gestão empregatícia que submeta o indivíduo a reiterada e contínua jornada extenuante, que se concretize muito acima dos limites legais, em dias sequenciais, agride todos os princípios constitucionais acima explicitados e a própria noção estruturante de Estado Democrático de Direito. Se não bastasse, essa jornada gravemente excessiva reduz acentuadamente e de modo injustificável, por longo período, o direito à razoável disponibilidade temporal inerente a todo indivíduo, direito que é assegurado pelos princípios constitucionais mencionados e pelas regras constitucionais e legais

Page 143: Nº 345 – Março 2018 · Revista SÍNTESE Trabalhista e Previdenciária Ano XXIX – nº 345 – MArço 2018 reposItórIo AutorIzAdo de JurIsprudêncIA Supremo Tribunal Federal

RST Nº 345 – Março/2018 – PARTE GERAL – JURISPRUDÊNCIA TRABALHISTA – EMENTÁRIO ............................................................143

regentes da jornada de trabalho. Tal situação anômala deflagra, assim, o dano existencial, que consiste em lesão ao tempo razoável e proporcional, assegurado pela ordem jurídica, à pessoa humana do trabalhador, para que possa se dedicar às atividades individuais, familiares e sociais inerentes a todos os indivíduos, sem a sobrecarga horária desproporcional, desarrazoada e ile-gal, de intensidade repetida e contínua, em decorrência do contrato de trabalho mantido com o empregador. Logo, configurada essa situação no caso dos autos, deve ser restabelecida a senten-ça, que condenou a Reclamada no pagamento de indenização por danos morais no importe de R$ 5.000,00. Recurso de revista conhecido e provido no aspecto. 6. Condenação em verbas de trato sucessivo. Limitação temporal. Parcelas vincendas. Tratando-se de prestações sucessivas por tempo indeterminado, a execução compreenderá inicialmente as prestações devidas até a data do ingresso na execução, consoante dicção do art. 892 da CLT. Por outro lado, segundo estabelece o art. 290 do CPC/1973, atual art. 323 do CPC/2015, se o devedor deixar de pagar ou de consignar, no curso do processo, obrigações consistentes em prestações periódicas, a sentença as incluirá na condenação, enquanto durar a obrigação, até mesmo no caso de ausência de pedido expresso. É o caso das parcelas de horas extras, vale-alimentação, adicional de periculosidade, etc. Atente-se que, sobrevindo alteração na situação fática suscetível de modificação da decisão, a Reclamada dispõe da ação revisional (art. 471, I, do CPC/1973, atual 505, I, do CPC/2015). Recurso de revista conhecido e provido no aspecto.” (TST – RR 1355-21.2015.5.12.0047 – 3ª T. – Rel. Min. Mauricio Godinho Delgado – DJe 10.11.2017)

34802 – indenização – dispensa discriminatória – empregado portador de doença grave – trans-tornos psicóticos agudos – esquizofrenia – pagamento devido

“Recurso de revista interposto na vigência da Lei nº 13.015/2014. Indenização por dispensa dis-criminatória. Empregado portador de doença grave. Transtornos psicóticos agudos. Esquizofrenia. A Corte regional registrou que ‘o reclamante, após afastamento para tratamento de sua enfermi-dade (08.02.2012 a 09.10.2014) junto à Autarquia Previdenciária, retornou apto para o desem-penho da função de mecânico de freios, suspensão e direção de carros leves (id aa375b2), sendo certo a sua incapacidade laborativa para a função anteriormente desempenhada de motorista de caminhão coletor’ e que sofria de ‘esquizofrenia e outros transtornos psicóticos agudos, essencial-mente, delirantes’, ‘mas plenamente controlável pelo uso de medicamentos e acompanhamento psiquiátrico, podendo desempenhar outras funções como Porteiro, Gerente, dentre outras’. Nos termos da Súmula nº 443, do TST, a jurisprudência prevalecente nesta Corte superior estabeleceu uma presunção juris tantum acerca da discriminação de dispensa do empregado por ser portador de doença grave, in verbis: ‘Dispensa discriminatória. Presunção. Empregado portador de doença grave. Estigma ou preconceito. Direito à reintegração. Presume-se discriminatória a despedida de empregado portador do vírus HIV ou de outra doença grave que suscite estigma ou preconceito. Inválido o ato, o empregado tem direito à reintegração no emprego’. Caberia à empregadora pro-var, de forma robusta, que dispensou o reclamante, portador de doença grave, por algum motivo plausível, razoável e socialmente justificável, de modo a afastar o caráter discriminatório da res-cisão contratual, o que não ocorreu no caso dos autos. Recurso de revista conhecido e provido.” (TST – RR 535-93.2015.5.17.0004 – 2ª T. – Rel. Min. Ministro José Roberto Freire Pimenta – DJe 20.10.2017)

34803 – Jornada de trabalho – propagandista – horas extras – ausência de controle – pagamento indevido

“Propagandista. Horas extras. Jornada de trabalho. Atividade externa. Art. 62, I, da CLT. Enqua-dramento da empregada na exceção do art. 62, I, da CLT, quando a prova oral/testemunhal revela que inexistia controle e fiscalização da jornada de trabalho por parte da ré, mas mera possibili-dade de acesso ao roteiro de visitas, sem prova do efetivo controle e cobrança quanto à jornada desempenhada. Interesse do propagandista, pelo sistema remuneratório, na ampliação da presta-ção de serviços para majoração de seus ganhos. Indevidas as horas extras postuladas. Retenção indevida e injustificada da CTPS. Indenização por dano moral. O art. 53 da CLT estabelece o pra-zo de 48 horas para o empregador efetuar as devidas anotações na carteira de trabalho, sob pena

Page 144: Nº 345 – Março 2018 · Revista SÍNTESE Trabalhista e Previdenciária Ano XXIX – nº 345 – MArço 2018 reposItórIo AutorIzAdo de JurIsprudêncIA Supremo Tribunal Federal

144 ........................................................RST Nº 345 – Março/2018 – PARTE GERAL – JURISPRUDÊNCIA TRABALHISTA – EMENTÁRIO

de multa. Logo, a retenção injustificada do referido documento constitui ato ilícito, por acarretar prejuízos ao trabalhador, que necessita do referido documento, indispensável para a colocação em novo trabalho. Inexistindo justificativa para a indevida retenção da CTPS, a qual deveria ter sido entregue à autora logo após efetivadas as anotações pertinentes, e não mais de 30 dias após a data do afastamento, caracterizada está, em tese, inclusive a contravenção penal prevista na Lei nº 5.553/1968, punível com multa (art. 3º e parágrafo único). Evidenciado o dano moral sofrido pela trabalhadora. Conduta ilícita da ré, contrária aos arts. 29 e 53 da CLT e art. 1º da Lei nº 5.553/1968. Devida a reparação moral postulada, nos termos dos arts. 186 e 927 do Código Civil, c/c art. 5º, X da CF/1988.” (TRT 4ª R. – RO 0000561-98.2013.5.04.0012 – 2ª T. – Rel. Des. Marcelo José Ferlin D’ Ambroso – DJe 29.11.2017)

Transcrição Editorial SÍNTESEConsolidação das Leis do Trabalho:“Art. 62. Não são abrangidos pelo regime previsto neste capítulo:I – os empregados que exercem atividade externa incompatível com a fixação de horário de trabalho, devendo tal condição ser anotada na Carteira de Trabalho e Previdência Social e no registro de empregados;[...].”

34804 – Jornada de trabalho – regime 12 x 36 – nulidade

“Regime de trabalho 12 x 36. Nulidade. A invalidade dos registros de horário em função de diversas irregularidades ocasiona a nulidade do regime compensatório adotado na modalidade 12 x 36. Caso que não se enquadra na hipótese da Súmula nº 117.” (TRT 4ª R. – RO 0000163-24.2013.5.04.0022 – 3ª T. – Rel. Des. Ricardo Carvalho Fraga – DJe 04.12.2017)

Comentário Editorial SÍNTESEO Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região reconheceu nula a jornada de trabalho 12 x 36 realizada pelo empregado.A decisão se deu com base nas provas apresentadas as quais restaram incontroversas.Além disso, do voto do relator, destacamos:“A respeito da matéria, entendimento deste TRT, consubstanciado na Súmula nº 117, in verbis:Súmula nº 117 – REGIME DE TRABALHO 12 X 36. VALIDADE. É válida a escala de 12 (doze) horas de trabalho por 36 (trinta e seis) de descanso, quando esta for autorizada por lei, acordo coletivo de trabalho ou convenção coletiva de trabalho. (Resolução Administrativa nº 11/2017, Disponibilizada no DEJT dos dias 17, 18 e 19.05.2017, considerada publicada nos dias 18, 19 e 22.05.2017. Acórdão Proc. TRT nº 0007056-29.2015.5.04.0000 IUJ).Todavia, conforme referido no acórdão, foram reputados inválidos os registros de horário e, por consequência, também o regime compensatório adotado na modalidade 12 x 36, con-siderando as conclusões alcançadas pela perícia grafodocumentoscópica, no sentido de que os registros de jornada foram efetuados numa única oportunidade, assim como o depoimento da testemunha Paulo, que atestou não haver correspondência entre a jornada consignada nos cartões e aquela efetivamente realizada.Portanto, apesar da redação da citada Súmula nº 117 deste TRT, diante das irregularidades comprovadas nos autos, o caso em tela não se amolda à hipótese sumular, nada havendo a ser adequado. Sendo assim, por unanimidade, em novo julgamento, mantém-se o aresto anterior que negou provimento ao recurso ordinário da reclamada, no tópico.”A Lei nº 13.467/2017, alterada pela Medida Provisória nº 808, permite a jornada de trabalho 12 x 36 em qualquer atividade:“Art. 59-A. Em exceção ao disposto no art. 59 e em leis específicas, é facultado às partes, por meio de convenção coletiva ou acordo coletivo de trabalho, estabelecer horário de trabalho de doze horas seguidas por trinta e seis horas ininterruptas de descanso, observados ou indeniza-dos os intervalos para repouso e alimentação.§ 1º A remuneração mensal pactuada pelo horário previsto no caput abrange os pagamentos devidos pelo descanso semanal remunerado e pelo descanso em feriados e serão considerados compensados os feriados e as prorrogações de trabalho noturno, quando houver, de que tratam o art. 70 e o § 5º do art. 73.

Page 145: Nº 345 – Março 2018 · Revista SÍNTESE Trabalhista e Previdenciária Ano XXIX – nº 345 – MArço 2018 reposItórIo AutorIzAdo de JurIsprudêncIA Supremo Tribunal Federal

RST Nº 345 – Março/2018 – PARTE GERAL – JURISPRUDÊNCIA TRABALHISTA – EMENTÁRIO ............................................................145

§ 2º É facultado às entidades atuantes no setor de saúde estabelecer, por meio de acordo indi-vidual escrito, convenção coletiva ou acordo coletivo de trabalho, horário de trabalho de doze horas seguidas por trinta e seis horas ininterruptas de descanso, observados ou indenizados os intervalos para repouso e alimentação.” (NR)Nessa modalidade de escala, o empregado trabalha doze horas seguidas e descansa trinta e seis horas.A Súmula nº 444, do TST, aceita esse tipo de jornada. Vejamos:“Nº 444 – JORNADA DE TRABALHO – NORMA COLETIVA – LEI – ESCALA DE 12 POR 36 – VALIDADE – É valida, em caráter excepcional, a jornada de doze horas de trabalho por trinta e seis de descanso, prevista em lei ou ajustada exclusivamente mediante acordo cole-tivo de trabalho ou convenção coletiva de trabalho, assegurada a remuneração em dobro dos feriados trabalhados. O empregado não tem direito ao pagamento de adicional referente ao labor prestado na décima primeira e décima segunda horas. (Publicada pela Resolução TST nº 185, de 14.09.2012, DJe TST de 26.09.2012, rep. DJe TST de 27.09.2012 e DJe TST de 28.09.2012)”

34805 – Jornada de trabalho externa – possibilidade de controle – horas extras – pagamento devido

“Vínculo de emprego. Substituição eventual de irmão. Demonstrado que o autor prestou servi-ços em favor da ré de modo eventual, substituindo o seu irmão (empregado da ré) na rota por ele exercida, a conta e risco do empregado substituído, tenho que não há como reconhecer os requisitos para configurar o vínculo empregatício, tal qual previsto nos arts. 2º e 3º da CLT. Recurso ordinário do reclamante. A ausência de investida contra os fundamentos que esteiam a decisão importa não conhecimento de tópicos do recurso ordinário da parte autora, nos termos do art. 1.010, II e III, do NCPC. Horas extras. Trabalho externo. A realização de trabalho externo não afasta o direito do empregado à percepção de horas extras. Havia a possibilidade de controle de jornada. Recurso ordinário das rés parcialmente providos apenas para minorar a condenação ante a minoração da jornada arbitrada. Diferenças do FGTS. É da reclamada o ônus da prova quanto ao correto recolhimento do FGTS, cabendo-lhe, neste sentido, apresentar os documentos neces-sários para tal averiguação, por deter o dever de documentação dos fatos referentes ao contrato de trabalho, obrigação da qual não se desincumbiu satisfatoriamente. Recurso da primeira ré não provido, no ponto.” (TRT 4ª R. – RO 0000198-24.2015.5.04.0471 – 11ª T. – Relª Desª Flávia Lorena Pacheco – DJe 31.10.2017)

Transcrição Editorial SÍNTESEConsolidação das Leis do Trabalho:“Art. 2º Considera-se empregador a empresa, individual ou coletiva, que, assumindo os riscos da atividade econômica, admite, assalaria e dirige a prestação pessoal de serviços.§ 1º Equiparam-se ao empregador, para os efeitos exclusivos da relação de emprego, os pro-fissionais liberais, as instituições de beneficência, as associações recreativas ou outras institui-ções sem fins lucrativos, que admitirem trabalhadores como empregados.§ 2º Sempre que uma ou mais empresas, tendo, embora, cada uma delas, personalidade ju-rídica própria, estiverem sob a direção, controle ou administração de outra, ou ainda quando, mesmo guardando cada uma sua autonomia, integrem grupo econômico, serão responsáveis solidariamente pelas obrigações decorrentes da relação de emprego. (NR)§ 3º Não caracteriza grupo econômico a mera identidade de sócios, sendo necessárias, para a configuração do grupo, a demonstração do interesse integrado, a efetiva comunhão de interes-ses e a atuação conjunta das empresas dele integrantes.” (NR)

34806 – Justiça gratuita – pessoa jurídica – impossibilidade de arcar com as despesas do processo – não comprovação – benefício não concedido

“Agravo de instrumento em recurso ordinário. Pessoa jurídica. Recuperação judicial. Requeri-mento de concessão dos benefícios da justiça gratuita. Requisitos não preenchidos. Deserção. A concessão das benesses da justiça gratuita ao empregador pessoa jurídica só é possível quando efetivamente comprovada a impossibilidade de arcar com as despesas do processo, o que não

Page 146: Nº 345 – Março 2018 · Revista SÍNTESE Trabalhista e Previdenciária Ano XXIX – nº 345 – MArço 2018 reposItórIo AutorIzAdo de JurIsprudêncIA Supremo Tribunal Federal

146 ........................................................RST Nº 345 – Março/2018 – PARTE GERAL – JURISPRUDÊNCIA TRABALHISTA – EMENTÁRIO

ocorreu na hipótese. Ademais a gratuidade judiciária prevista no art. 98, VIII, do CPC/2015, não alcança o depósito recursal trabalhista, porquanto dotado de natureza de garantia do Juízo. Agra-vo de instrumento. Recolhimento recursal específico. Deserção. A Lei nº 12.275/2010 criou uma condição de admissibilidade para o agravo de instrumento, consistente no recolhimento de 50% (cinquenta por cento) do valor do depósito do recurso ao qual se pretende destrancar. Inexistente tal comprovação, impossível o conhecimento do agravo porque deserto. Agravo de Instrumen-to não conhecido, por deserção.” (TRT 6ª R. – AIRO 0000500-59.2016.5.06.0181 – Rel. Paulo Alcantara – DJe 07.12.2017 – p. 1208)

34807 – pensão mensal – incapacidade permanente e parcial devidamente configurada pela via de laudo técnico idôneo – pagamento devido

“Do pensionamento mensal. Incapacidade permanente e parcial devidamente configurada pela via de laudo técnico idôneo. ‘Amortização’ que se impõe como compulsoriamente apropriável em um percentual equivalente a 50%. Uma vez conhecida e admitida, pelo C. TST, matéria alu-siva ao direito de a vindicante (CLT, art. 3º) vir a obter indenização por danos materiais em razão de sua incapacidade permanente e parcial, cumpre, nesse momento, determinar que o pensiona-mento deve ser mensal, fixado em 50% da última remuneração percebida pela testilhante (CLT, art. 3º), que deverá ser reajustado nas mesmas bases e quando da data-base da categoria à qual esteja/estava vinculada, objetivando-se, com isso, garantir ao máximo a minoração dos ‘reveses’ aqui avaliados, até o atingimento da idade prevista na tabela de expectativa de vida do IBGE ou seu falecimento, o que ocorrer primeiro, nos termos do art. 950 do Código Civil.” (TRT 20ª R. – RO 0000157-86.2011.5.0007 – 2ª T. – Rel. Des. João Aurino Mendes Brito – DJe 04.12.2017)

34808 – periculosidade – trabalho com motocicleta – pagamento devido

“Periculosidade. Trabalho com motocicleta. Portaria Ministerial Regulamentadora nº 1.565/2014. Vigência. Não provido. Reputa-se regularmente publicada e vigente a Portaria MTE nº 1.565/2014, que aprovou o Anexo 5 da Norma Regulamentadora NR-16 – Atividades e Operações Pe-rigosas regulando o adicional de periculosidade decorrente da alteração introduzida pela Lei nº 12.997/2014 no art. 193 da CLT, inexistindo declaração definitiva de sua invalidade pelo órgão jurisdicional competente, tampouco havendo que se falar em declaração de inconstitucionalida-de formal da Portaria Ministerial, haja vista sua posição hierárquica no sistema normativo, ou em impossibilidade de repristinação da norma revogada, pois jamais houve revogação da Portaria nº 1.565/2014, mas apenas a suspensão de efeitos. Adicional de periculosidade. Utilização de motocicleta. Habitualidade. Caracterização. Devido. Exposição ao risco. Não provido. Compro-vada, mediante competente prova pericial, a exposição habitual do trabalhador aos riscos do trânsito em vias públicas mediante o deslocamento em motocicleta, inexistindo demonstração da exposição fortuita ou por tempo extremamente reduzido, resta devido o pagamento do adicional de periculosidade previsto no Anexo 5 da NR-16. Fazenda pública. Prerrogativas. Sociedade de economia mista. Equiparação. Atividade econômica. Impossibilidade. Manutenção. Não provido. A CAERN, sociedade de economia mista com personalidade jurídica de direito privado, explora atividade econômica de interesse coletivo, porquanto se mantém com o faturamento das tarifas dos serviços de fornecimento de água e esgotamento sanitário, havendo em seu Estatuto previsão de participação de acionistas, pessoas físicas ou jurídicas, bem como de distribuição de dividen-dos, enquadrando-se dessa forma, na disposição contida no art. 173, § 1º, inciso II, da Consti-tuição da República, restando incabível a pretendida equiparação à Fazenda Pública. Recurso Ordinário conhecido e não provido.” (TRT 21ª R. – ROPS 0000677-16.2016.5.21.0016 – 1ª T. – Rel. Jose Rego Junior – DJe 27.11.2017 – p. 1549)

34809 – quebra de caixa – empregado que labora em tesouraria na contagem de numerário – adicional devido

“Empregado que labora em tesouraria na contagem de numerário. Adicional de quebra de caixa devido. A verba ‘quebra de caixa’ tem natureza salarial, nos termos da Súmula nº 247 do C. TST, sendo devida ao empregado que exerce funções de caixa, ou assemelhadas a esta, como no

Page 147: Nº 345 – Março 2018 · Revista SÍNTESE Trabalhista e Previdenciária Ano XXIX – nº 345 – MArço 2018 reposItórIo AutorIzAdo de JurIsprudêncIA Supremo Tribunal Federal

RST Nº 345 – Março/2018 – PARTE GERAL – JURISPRUDÊNCIA TRABALHISTA – EMENTÁRIO ............................................................147

caso dos autos, e se destina a cobrir dispêndios do trabalhador que manuseia numerário e que even tualmente encontre diferenças de valores. Se o empregado é responsável pelo pagamento de valores resultantes de erros ou diferenças do próprio caixa, tem direito à percepção do refe-rido adicional, independentemente de ter havido ou não diferenças no caixa.” (TRT 22ª R. – RO 0001256-76.2016.5.22.0002 – Rel. Tiberio Freire Villar da Silva – DJe 26.10.2017 – p. 1347)

34810 – Reintegração no emprego – empregado portador de doença grave – discriminação – re-conhecimento

“Empregado portador de doença no momento em que foi despedido sem justa causa. Nulidade da dispensa. Reintegração. Ainda que não exista prova nos autos acerca da natureza discriminatória da despedida obreira, se os documentos neles colacionados demonstram que, na data da rescisão do vínculo de emprego sem justa causa, o empregado estava doente, deve ser declarada nula referida dispensa, com consequente reintegração do trabalhador ao emprego, ou indenização do período de afastamento, pois não pode o empregador, sob o fundamento de que essa despedida seria intrínseca ao exercício do seu direito potestativo, despedir empregado que, nessa ocasião, mais do que nunca necessitava do emprego e da renda dele proveniente para que, em flagrante estado de vulnerabilidade, pudesse tratar doença grave de que é portador, a qual requer trata-mentos médicos altamente dispendiosos. Nulidade da despedida. Empregado doente. Ônus da prova. Compete ao empregado o ônus de provar que foi despedido doente, por se tratar de fato constitutivo do seu direito, nos termos do quanto disposto no art. 818 da CLT c/c o inciso I do art. 373 do Código de Processo Civil.” (TRT 5ª R. – RO 0001576-80.2014.5.05.0581 – 2ª T. – Relª Desª Débora Machado – DJe 30.10.2017

34811 – Rescisão do contrato de trabalho – pedido de demissão – empregado com mais de um ano de serviço – homologação – ausência – irregularidade

“Recurso de revista. Pedido de demissão sem homologação sindical. Empregado com mais de um ano de serviço. Irregularidade. Nos termos do § 1º do art. 477 da CLT, o pedido de demissão firmado por empregado com mais de um ano de serviço só tem validade se homologado mediante assistência sindical ou perante o Ministério do Trabalho. A inobservância dessa formalidade legal implica a nulidade do referido ato. Recurso de Revista de que não se conhece.” (TST – RR 10072-34.2015.5.03.0027 – Rel. Min. João Batista Brito Pereira – DJe 17.11.2017)

34812 – Responsabilidade civil – policial militar – assalto – acidente fatal – reconhecimento

“Recurso de revista. Responsabilidade civil. Policial militar. Assalto. Acidente fatal. Precarização da atividade de segurança patrimonial. Risco da atividade. Obrigatoriedade de fornecimento de treinamento, uniforme especial e armamento. Conduta do lesado no resultado. Concorrência da vítima para o resultado do evento. Culpa exclusiva da primeira-reclamada. 1. A Corte regional não reconheceu a responsabilidade civil da empregadora, asseverando a existência de fato ex-clusivo da vítima, caracterizado pela decisão dos membros da equipe de fazerem determinadas entregas com o caminhão, enquanto o veículo de escolta passaria a realizar outras. 2. Responde subjetivamente a empresa por culpa pela contratação de policiais militares, que realizavam ‘bi-cos’ para melhorar seus rendimentos, em condições precárias, para a realização de serviços de guarda patrimonial armada, sem a observância das normas pertinentes às empresas de segurança e vigilância fiscalizadas pelos entes públicos. 3. Nessas hipóteses, a atividade se realiza de forma precária, pois o contratante ampara-se na formação militar do trabalhador e na sua expertise, descurando-se das normas necessárias para a contratação de um serviço especializado para a realização de guarda patrimonial armada, assumindo, assim, os riscos do resultado em proveito de sua atividade econômica. 4. Restou consignado ainda que as reclamadas não forneceram coletes à prova de balas, o que ensejou o uso pelos policiais militares de seus próprios coletes, disponibilizados pela Corporação, muito embora o art. 19, I, da Lei nº 7.102/1983 assegure aos vigilantes o uso de uniforme especial às expensas da empregadora. 5. Tal circunstância expõe a risco a vida dos cidadãos, que podem ser colhidos a qualquer momento por esse confronto armado nas ruas de sua cidade e, em especial, a vida dos trabalhadores arrebanhados para essas

Page 148: Nº 345 – Março 2018 · Revista SÍNTESE Trabalhista e Previdenciária Ano XXIX – nº 345 – MArço 2018 reposItórIo AutorIzAdo de JurIsprudêncIA Supremo Tribunal Federal

148 ........................................................RST Nº 345 – Março/2018 – PARTE GERAL – JURISPRUDÊNCIA TRABALHISTA – EMENTÁRIO

tarefas sem a necessária indumentária ou armamento de proteção. 6. Em atividades de risco, cuja responsabilidade objetiva ou por equidade decorre do risco inerente ao empreendimento, situação também dos autos, deve haver a comprovação de que uma ação específica da vítima concorreu de forma fundamental para o evento danoso visando a afastar exclusão da respectiva responsabilidade. 7. O fato exclusivo da vítima, capaz de inviabilizar a responsabilização objetiva ou o nexo de causalidade ocorre apenas quando há a comprovação de que uma ação específica da vítima concorreu de forma fundamental para o evento danoso. 8. Na hipótese, a ação da vítima não foi fundamental para o evento assalto, pois a relação de causalidade é um fato naturalístico que não pode ser afetado por construções de vontade dos envolvidos, daí por que a discussão ultrapassa a ação da vítima, pois é na reação das vítimas ao assalto que se consumaria é que reside esse aspecto da vontade da vítima, ou seja, se presentes dois ou quatro membros da equipe poder--se-ia cogitar apenas de outro desfecho, melhor ou pior, mas não da ocorrência do assalto. 9. No caso, ainda que houvesse a desconsideração do ato da vítima, em conjunto com a equipe de tra-balho, tendo em vista que o de cujus não estava utilizando colete à prova de balas, equipamento que a primeira reclamada tinha o dever de fornecer, não haveria alteração do resultado trágico. 10. Responsabilidade civil que se reconhece para a fixação de pensão aos dependentes e dano moral. Recurso de revista conhecido e provido.” (TST – AIRR 56500-28.2008.5.02.0066 – 7ª T. – Rel. Min. Vieira de Mello Filho – DJe 24.11.2017)

Transcrição Editorial SÍNTESELei nº 7.102/1983:“Art. 19. É assegurado ao vigilante:I – uniforme especial às expensas da empresa a que se vincular;II – porte de arma, quando em serviço;III – prisão especial por ato decorrente do serviço;IV – seguro de vida em grupo, feito pela empresa empregadora.”

34813 – Seguro-desemprego – requisitos para percepção do benefício – ausência de prova de ingresso em novo emprego ao tempo da dispensa – pagamento devido

“Seguro-desemprego. Requisitos para percepção do benefício. Ausência de prova de ingresso em novo emprego ao tempo da dispensa. Nos termos dos incisos I e II do art. 3º da Resolução nº 467/2005, Codefat, terá direito a perceber o seguro-desemprego o trabalhador dispensado sem justa causa que comprove ter recebido salários consecutivos no período de 6 (seis) meses ime-diatamente anteriores à data da dispensa e ter sido empregado de pessoa jurídica ou pessoa física equiparada à jurídica durante, pelo menos, 06 (seis) meses nos últimos 36 (trinta e seis) meses que antecederam a data de dispensa que deu origem ao requerimento do seguro-desemprego. Considerando que o reclamante satisfaz os requisitos para percepção do benefício, ilegalmente sonegado pela reclamada, e não havendo nos autos prova de que, ao tempo da ruptura do víncu-lo, teve imediata recolocação no mercado de trabalho, faz jus ao recebimento da verba. Emerson José da Silva, nos autos da reclamação trabalhista em que litiga com W Baruzzo Construções Ltda., inconformado com a sentença de fls. 59/61, interpõe Recurso Ordinário, mediante razões às fls. 68/74. A reclamada apresentou contrarrazões ao recurso às fls. 78/84.” (TRT 5ª R. – RO 0001621-38.2014.5.05.0661 – 2ª T. – Relª Desª Margareth Rodrigues Costa – DJe 30.10.2017)

34814 – Seguro-desemprego – suspensão – registro no caged na fase pré-contrato – não concre-tização do pacto laboral – indenização por dano moral – pagamento devido

“Registro no Caged na fase pré-contrato. Não concretização do pacto laboral. Suspensão do segu-ro-desemprego. Indenização por dano material e moral. Tendo havido a suspensão do pagamento do seguro-desemprego à Autora por culpa da Reclamada que a incluiu no Cadastro Geral de Empregados e Desempregados – Caged, do TEM, na fase pré-contrato, o qual não se concretizou, impõe-se o deferimento de indenização por danos morais e materiais. Isso porque, nos termos do art. 6º, da Portaria nº 1.129/2014, do MTE, as informações relativas a admissões somente de-verão ser prestadas ao MTE, para fins de suspensão do seguro-desemprego, na data do início das atividades do empregado, sendo que, no caso, a Autora comunicou à empresa sua desistência em

Page 149: Nº 345 – Março 2018 · Revista SÍNTESE Trabalhista e Previdenciária Ano XXIX – nº 345 – MArço 2018 reposItórIo AutorIzAdo de JurIsprudêncIA Supremo Tribunal Federal

RST Nº 345 – Março/2018 – PARTE GERAL – JURISPRUDÊNCIA TRABALHISTA – EMENTÁRIO ............................................................149

relação ao emprego, antes da assinatura do contrato e da data prevista para o início da prestação de serviços.” (TRT 18ª R. – RO 0010956-34.2016.5.18.0052 – Rel. Elvecio Moura dos Santos – DJe 30.10.2017 – p. 3450)

34815 – Sindicato – desmembramento – criação por empresa – impossibilidade

“Desmembramento de sindicato. Criação de sindicato por empresa. Impossibilidade. O art. 571 da CLT possibilita o desmembramento de uma determinada categoria do sindicato principal, quando este detém a representação de várias categorias similares e conexas. Tal desmembramen-to não ofende o Princípio da Unicidade Sindical, já que este está voltado para a indivisibilidade da categoria e não do sindicato que representa diversas categorias, ainda que similares ou conexas. Entretanto, o sistema constitucional previu a reunião sindical para a defesa dos direitos e interes-ses coletivos e individuais da categoria, não se adequando tal conceito à classe dos empregados de uma única empresa, considerando que, no caso, o Sintracafé-Eusébio/ CE conta como base territorial limitada ao Município do Eusébio e, nesta localidade, consta no referido seguimento empresarial apenas a empresa Três Corações, ramo de atividade da qual se pretende o desmem-bramento. Sentença reformada. Honorários advocatícios. Reclamante assistido por sindicato. Pa-gamento devido. A presente lide não versa sobre relação de emprego. Logo, aplicável o princípio da sucumbência, de acordo com a Instrução Normativa nº 27, do TST, que preconiza o seguinte: ‘Exceto nas lides decorrentes da relação de emprego, os honorários advocatícios são devidos pela mera sucumbência’. Por sua vez, a Súmula nº 219, III, do TST, assim dispõe: ‘São devidos os honorários advocatícios nas causas em que o ente sindical figure como substituto processual e nas lides que não derivem da relação de emprego’. Sendo assim, condena-se as reclamadas ao pagamento de honorários advocatícios de 15% (quinze) por cento sobre o valor da causa. Recurso conhecido e dado provimento.” (TRT 7ª R. – RO 0002945-76.2016.5.07.0034 – Rel. Francisco José Gomes da Silva – DJe 31.10.2017 – p. 1237)

34816 – Sobreaviso – ferroviários – aplicação analógica – comprovação dos requisitos – paga-mento devido

“Horas de sobreaviso. Art. 244, § 2º, da CLT. Aplicação analógica. Súmula nº 428 do TST. Com-provação dos requisitos. Pagamento devido. Nos termos do art. 244, § 2º, da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), considera-se de sobreaviso o empregado ‘que permanecer em sua própria casa, aguardando a qualquer momento o chamado para o serviço’, cuja escala será de, no máxi-mo, vinte e quatro horas, que serão remuneradas à razão de um terço do salário normal. Embora se trate de uma disposição especial sobre duração do trabalho originalmente restrita aos trabalha-dores ferroviários, com o passar do tempo e com a evolução das relações juslaborais, tal instituto passou a ser aplicável, por analogia, às categorias que vivenciam circunstâncias semelhantes, tendo sido objeto, inclusive, da Súmula nº 428 do Colendo Tribunal Superior do Trabalho (TST). Assim, constatado, após regular instrução probatória, que o reclamante permanecia aguardando a qualquer momento o chamado para o serviço durante os seus períodos de descanso, é devido o pagamento das horas que esteve em regime de plantão ou equivalente como de sobreaviso, na forma do art. 244, § 2º, da CLT.” (TRT 14ª R. – RO 0000206-91.2017.5.14.0005 – 2ª T. – Rel. Des. Ilson Alves Pequeno Junior – DJe 06.12.2017 – p. 697)

Transcrição Editorial SÍNTESEConsolidação das Leis do Trabalho:“Art. 244. As estradas de ferro poderão ter empregados extranumerários, de sobreaviso e de prontidão, para executarem serviços imprevistos ou para substituições de outros empregados que faltem à escala organizada. (Caput restabelecido pelo Decreto-Lei nº 5, de 04.04.1966, DOU 05.04.1966)§ 1º Considera-se ‘extranumerário’ o empregado não efetivo, candidato à efetivação, que se apresentar normalmente ao serviço, embora só trabalhe quando for necessário. O extranume-rário só receberá os dias de trabalho efetivo. (Parágrafo restaurado pelo Decreto-Lei nº 5, de 04.04.1966, DOU 05.04.1966)

Page 150: Nº 345 – Março 2018 · Revista SÍNTESE Trabalhista e Previdenciária Ano XXIX – nº 345 – MArço 2018 reposItórIo AutorIzAdo de JurIsprudêncIA Supremo Tribunal Federal

150 ........................................................RST Nº 345 – Março/2018 – PARTE GERAL – JURISPRUDÊNCIA TRABALHISTA – EMENTÁRIO

§ 2º Considera-se de ‘sobreaviso’ o empregado efetivo, que permanecer em sua própria casa, aguardando a qualquer momento o chamado para o serviço. Cada escala de ‘sobreaviso’ será, no máximo, de vinte e quatro horas. As horas de ‘sobreaviso’, para todos os efeitos, serão contadas à razão de 1/3 (um terço) do salário normal. (Parágrafo restaurado pelo Decreto-Lei nº 5, de 04.04.1966, DOU 05.04.1966)§ 3º Considera-se de ‘prontidão’ o empregado que ficar nas dependências da estrada, aguar-dando ordens. A escala de prontidão será, no máximo, de doze horas. As horas de prontidão serão, para todos os efeitos, contadas à razão de 2/3 (dois terços) do salário-hora normal. (Parágrafo restaurado pelo Decreto-Lei nº 5, de 04.04.1966, DOU 05.04.1966)§ 4º Quando, no estabelecimento ou dependência em que se achar o empregado, houver facilidade de alimentação, as doze horas de prontidão, a que se refere o parágrafo anterior, poderão ser contínuas. Quando não existir essa facilidade, depois de seis horas de prontidão, haverá sempre um intervalo de uma hora para cada refeição, que não será, nesse caso, com-putada como de serviço. (Parágrafo restaurado pelo Decreto-Lei nº 5, de 04.04.1966, DOU 05.04.1966)”

34817 – Terceirização – contratação por empresa sucessora – cláusula de continuidade – aviso--prévio – descabimento

“Cláusula de continuidade. Aviso-prévio. Concessão. Dispensa. Comprovando a reclamada que o reclamante foi contratado pela empresa sucessora na prestação dos serviços terceirizados, a cláu-sula de continuidade firmada na Convenção Coletiva lhe dispensa da concessão do aviso-prévio, o que afasta o pleito de pagamento da indenização correspondente. Conduta antissindical. Danos morais. A oposição do empregador junto ao Sindicato laboral no ato das homologações das resci-sões contratuais dos empregados, impedindo a entidade de classe de apor no termos de rescisão contratual as ressalvas à homologação, caracteriza-se como conduta antissindical de inequívoca ilicitude, violando direito assegurado pela Constituição Federal, pelos Tratados Internacionais e pela legislação infraconstitucional, revelando desrespeito aos princípios do valor social do tra-balho e da função social da empresa. A par da ilicitude, a referida conduta é apta de provocar danos morais ao trabalhador, gerando, por consequência o dever de reparação.” (TRT 10ª R. – RO 0000467-50.2016.5.10.0022 – Rel. Dorival Borges de Souza Neto – DJe 30.10.2017 – p. 321)

Comentário Editorial SÍNTESECuida a ementa em destaque do descabimento da cláusula de continuidade do aviso-prévio no empregado que passa a ser terceirizado pela empresa sucessora.Salientamos que, diante da previsão contida na Lei nº 6.019/1974 com a inclusão do art. 5º-D pela Lei nº 13.429/2017, o empregado só poderá prestar o serviço após decorrido o prazo de 18 meses.Vejamos:“Art. 5º-D. O empregado que for demitido não poderá prestar serviços para esta mesma em-presa na qualidade de empregado de empresa prestadora de serviços antes do decurso de prazo de dezoito meses, contados a partir da demissão do empregado. (Incluído pela Lei nº 13.467, de 2017)”Oportuna a transcrição da análise da Lei em estudo feita pelo Dr. Jorge Luiz Souto Maior:“6) eliminação da terceirização como prestação de serviços: a autorização para a terceirização da atividade-fim, se assim puder ser extraído das leis em questão, representa em si uma supe-ração da terceirização como um todo, inclusive da denominada terceirização da atividade-meio (tratada como um modelo mitigado de intermediação de mão de obra, com o eufemismo de especialização de serviços). Do ponto de vista estritamente positivista, uma regulação jurídica não pode ser e, ao mesmo tempo, não ser. Não pode ser o imperativo de um dever-ser e também do seu inverso. Não é possível que um ato se insira na órbita da licitude e ao mesmo tempo seja considerado um ilícito. Dito de outro modo, mirando a situação posta pelo advento dessas leis, o ordenamento não pode estabelecer um padrão jurídico e, em paralelo, criar outro padrão contraposto ao primeiro. A ordem jurídica, por razões de ordem lógica, na qual precisa estar baseada para existir enquanto tal, se estabelece a partir do parâmetro de regras e exceções, sendo que as exceções, direcionadas a fatos específicos, não regulados pela regra, precisam, além disso, ser claramente justificadas e delimitadas. Falando de modo ainda mais direto, não é possível que a ordem jurídica estabeleça a relação de emprego como regra geral

Page 151: Nº 345 – Março 2018 · Revista SÍNTESE Trabalhista e Previdenciária Ano XXIX – nº 345 – MArço 2018 reposItórIo AutorIzAdo de JurIsprudêncIA Supremo Tribunal Federal

RST Nº 345 – Março/2018 – PARTE GERAL – JURISPRUDÊNCIA TRABALHISTA – EMENTÁRIO ............................................................151

da vinculação entre o capital e o trabalho e se permita, ao mesmo tempo, que a relação de emprego não seja esse mecanismo de vinculação do capital ao trabalho, vendo-a tão somente como o efeito de um ajuste de vontades, que possibilita ao capital se distanciar, quando queira, do trabalho pela contratação de entes interpostos. Quando uma lei diz que todo serviço de uma empresa pode ser terceirizado, o que se cria é uma regra generalizante, que, inclusive, preconiza que o capital não se vincula diretamente ao trabalho, institucionalizando, pois, a mera intermediação de mão de obra. Aliás, se uma empresa transfere para outra empresa aquilo que justifica a sua existência como unidade empreendedora, é lógico que perece. E ain-da que se queira entender juridicamente válida a terceirização, esta não pode ser confundida com intermediação de mão de obra, até a impossibilidade do comércio de gente está na base da existência de toda a ordem projetada para o capitalismo nos pactos firmados nos períodos imediatamente posteriores às duas guerras mundiais. Consequentemente, a terceirização au-torizada pelas Leis nºs 13.429/2017 e 13.467/2017, até para não se contraporem à regra da relação de emprego, que continua em vigor, com sede, inclusive, constitucional, conforme explicitado no inciso I do art. 7º, só pode ser tomada no sentido de subcontratação para a realização de uma atividade específica e não, como dito, para a locação de força de trabalho. São esses, ademais, precisamente, os termos do art. 4º-A da Lei nº 13.429/1977, conforme a redação que lhe fora dada pela Lei nº 13.467/2017: ‘Art. 4º-A. Considera-se prestação de serviços a terceiros a transferência feita pela contratante da execução de quaisquer de suas atividades, inclusive sua atividade principal, à pessoa jurídica de direito privado prestadora de serviços que possua capacidade econômica compatível com a sua execução’. Desse modo, ainda que, certamente, não tenha sido o propósito do legislador, estaria interditada pelas refe-ridas leis a situação em que uma empresa contrata outra para lhe oferecer força de trabalho. Ora, o que se autorizou foi, unicamente, a ‘transferência’ de atividades e não, meramente, uma locação de força de trabalho, o que é bastante distinto. Não se concebe, pois, dentro do mo-delo jurídico atual, como, ademais, nunca se concebeu, que uma empresa se constitua apenas para a finalidade de locar força de trabalho. O que se permitiria seria apenas a transferência de atividade, que deve ser empreendida e gerida integralmente pela prestadora, que, por con-sequência, teria que possuir a expertise e os meios de produção necessários à sua execução, o que pressupõe, igualmente, ‘capacidade econômica compatível com a sua execução’, como dito na própria lei. Não é juridicamente válida, portanto, por exemplo, a terceirização em que uma escola contrate uma empresa para que esta contrate professores sem que seja a empresa contratada também uma entidade de ensino. Também não se pode conceber como regular, da mesma forma, a terceirização em que uma empresa contrate outra para simplesmente lhe oferecer operadores de máquina, mantendo-se a propriedade da máquina com a empresa dita ‘tomadora’ dos serviços, ou quando houver a contratação de mais de uma empresa para a exe-cução da mesma atividade, ou, ainda, a hipótese em que os empregados da prestadora sejam deslocados de uma tomadora para outra apenas como forma de dificultar a socialização do trabalhador e a efetividade de seus direitos. Na construção civil, está interrompida a aberração de uma empresa construtora realizar suas obras por meio de empresas cuja expertise resume--se a encontrar pedreiros no mercado e colocá-los nas obras. As atividades de fundação, de esquadria, de concretização etc. poderiam ser terceirizadas, mas para empresas especializa-das e devidamente habilitadas para esses serviços;[...].” (Impactos do Golpe Trabalhista (a Lei nº 13.467/2017). Revista SínTESE Trabalhista e Previdenciária, n. 340, out. 2017. p. 09)

Page 152: Nº 345 – Março 2018 · Revista SÍNTESE Trabalhista e Previdenciária Ano XXIX – nº 345 – MArço 2018 reposItórIo AutorIzAdo de JurIsprudêncIA Supremo Tribunal Federal

Parte Geral – Jurisprudência Previdenciária – Acórdão na Íntegra

34818

Supremo Tribunal Federal11.12.2017 Primeira TurmaAgRg‑Recurso Extraordinário com Agravo nº 1.080.541 Distrito FederalRelator: Min. Luiz FuxAgte.(s): Martin WurzmannAdv.(a/s): Paulo Sanches CampoiAgdo.(a/s): Massa Falida da KM Indústria e Comércio de Papel Ltda.Agdo.(a/s): Daniel Klabin Lorch WurzmannAgdo.(a/s): Heleno Wander Carvalho ApolinárioAdv.(a/s): Francisco de Oliveira Sabino

ementa

AGRAVO INTERNO NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO COM AGRAVO – PROCESSUAL CIVIL – EXECUÇÃO TRABALHISTA – DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE JURÍDICA – COM - PETÊNCIA – NECESSIDADE DE INTERPRETAÇÃO DE LEGISLAÇÃO INFRACONSTITUCIONAL – OFENSA REFLEXA – REVOLVIMENTO DO CONJUNTO FÁTICO-PROBATÓRIO DOS AUTOS – IMPOSSIBILIDADE – SÚMULA Nº 279 DO STF – AGRAVO INTERNO DESPROVIDO.

acórDão

A Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal, na conformidade da ata de julgamento virtual de 1º a 7.12.2017, por unanimidade, negou provimento ao agravo, nos termos do voto do Relator.

Brasília, 11 de dezembro de 2017.

Ministro Luiz Fux Relator Documento assinado digitalmente

relatório

O Senhor Ministro Luiz Fux (Relator): Trata-se de agravo interno inter-posto por Martin Wurzmann, contra decisão que prolatei, assim ementada, in verbis:

“RECURSO EXTRAORDINÁRIO COM AGRAVO – PROCESSUAL CIVIL – EXE-CUÇÃO TRABALHISTA – DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE JURÍDI-CA – COMPETÊNCIA – INTERPRETAÇÃO DE NORMAS INFRACONSTITUCIO-

Page 153: Nº 345 – Março 2018 · Revista SÍNTESE Trabalhista e Previdenciária Ano XXIX – nº 345 – MArço 2018 reposItórIo AutorIzAdo de JurIsprudêncIA Supremo Tribunal Federal

RST Nº 345 – Março/2018 – PARTE GERAL – JURISPRUDÊNCIA PREVIDENCIÁRIA – ACÓRDÃO NA ÍNTEGRA ......................................153

NAIS – NECESSIDADE DE REEXAME DO CONJUNTO FÁTICO-PROBATÓRIO CARREADO AOS AUTOS – INCIDÊNCIA DA SÚMULA Nº 279 DO STF – AGRA-VO INTERPOSTO SOB A ÉGIDE DO NOVO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL – AUSÊNCIA DE CONDENAÇÃO EM HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS NO JUÍZO RECORRIDO – IMPOSSIBILIDADE DE MAJORAÇÃO NESTA SEDE RE-CURSAL – ART. 85, § 11, DO CPC/2015 – AGRAVO DESPROVIDO.”

Inconformada com a decisão supra, a parte agravante interpõe o presente recurso, alegando, em síntese:

“Em que pese a Douta origem e d.m.v., deve ser reformada a r. decisão monocrá-tica a fim de que este Supremo Tribunal Federal adentre ao julgamento de mérito do recurso extraordinário, que trata de matéria com repercussão geral já reconhe-cida por esta Suprema Corte (competência da justiça do trabalho para prosseguir com a execução e desconsiderar a personalidade jurídica de sociedade falida).

Ora, se trata de matéria com repercussão geral reconhecida e já julgada por este Supremo Tribunal, não há como cogitar de não conhecimento por tratar de matéria infraconstitucional ou por envolver o conjunto fático-probatório, mesmo porque trata-se de matéria de direito (divisão constitucional de competência).” (Doc. 31, fl. 3)

É o relatório.

voto

O Senhor Ministro Luiz Fux (Relator): A presente irresignação não merece prosperar.

Em que pesem os argumentos expendidos no agravo, resta evidenciado das razões recursais que a parte agravante não trouxe nenhum argumento capaz de infirmar a decisão hostilizada, razão pela qual deve ela ser mantida, por seus próprios fundamentos.

Ab initio, pontuo que o Plenário desta Corte, no julgamento RE 583.955, Rel. Min. Ricardo Lewandowski, DJe 28.08.2009, assentou que “a opção do legislador infraconstitucional foi manter o regime anterior de execução dos cré-ditos trabalhistas pelo juízo universal da falência, sem prejuízo da competência da Justiça Laboral quanto ao julgamento do processo de conhecimento”.

Nada obstante, esse precedente não tem aplicação à hipótese em exame. Isso porque o Tribunal de origem consignou que o redirecionamento da exe-cução trabalhista para atingir os sócios da empresa em regime falimentar afasta a competência do Juízo Universal da Falência, uma vez que os bens objeto de constrição no âmbito do Juízo do Trabalho não estão abrangidos pelo patrimô-nio integrante da massa falida.

Page 154: Nº 345 – Março 2018 · Revista SÍNTESE Trabalhista e Previdenciária Ano XXIX – nº 345 – MArço 2018 reposItórIo AutorIzAdo de JurIsprudêncIA Supremo Tribunal Federal

154 ..................................RST Nº 345 – Março/2018 – PARTE GERAL – JURISPRUDÊNCIA PREVIDENCIÁRIA – ACÓRDÃO NA ÍNTEGRA

Destaco passagem ilustrativa do acórdão recorrido:

“Trata-se de Recurso de Revista interposto a decisão proferida em processo de execução. O conhecimento do recurso, em tais circunstâncias, somente se viabi-liza com a demonstração de ofensa direta e literal a dispositivo da Constituição da República, considerando-se o disposto no art. 896, § 2º, da Consolidação das Leis do Trabalho, bem como a orientação contida na Súmula nº 266 do Tribunal Superior do Trabalho.

A jurisprudência desta Corte superior tem-se firmado no sentido de que o redire-cionamento da execução contra os sócios da empresa falida não afasta a compe-tência desta Justiça especializada para prosseguir nos atos executórios.

Verifica-se que a execução prossegue em face de sócio da devedora principal, em decorrência da desconsideração da personalidade jurídica. Nesse contexto, se mostra competente esta Justiça do Trabalho para prosseguir a execução, visto que eventual constrição não recairá sobre bens da massa falida, a atrair a compe-tência do juízo universal.” (Doc. 8, fl. 4)

Portanto, não se discute, aqui, a legitimidade da execução de créditos trabalhistas pela Justiça Estadual em face do que dispõe o art. 114 da Consti-tuição Federal, mas sim a execução, na Justiça do Trabalho, de bens que não compõem o acervo da massa falida.

Nesse contexto, verifica-se que a controvérsia acerca da legitimidade da constrição, pelo Juízo Trabalhista, de bens pertencentes aos sócios da empresa falida, porém não integrantes da massa falida, foi decidida pelo Tribunal de ori-gem a partir de interpretação e aplicação das normas infraconstitucionais perti-nentes (Lei nº 11.101/2003 e Consolidação das Leis Trabalhistas), e do conjunto fático-probatório constante dos autos, o que torna inviável o apelo extremo, além de atrair a incidência da Súmula nº 279 do STF de seguinte teor, in verbis: “Para simples reexame de prova não cabe recurso extraordinário”. Nesse sen-tido, aliás, é a jurisprudência desta Corte, como se infere do seguinte julgado:

“PROCESSUAL CIVIL – RECURSO EXTRAORDINÁRIO – CONFLITO DE COM-PETÊNCIA ENTRE OS JUÍZOS TRABALHISTA E FALIMENTAR – EXECUÇÃO DE SENTENÇA TRABALHISTA PROFERIDA CONTRA PESSOA JURÍDICA EM RECU-PERAÇÃO JUDICIAL – LEGITIMIDADE DA CONSTRIÇÃO DE BENS DE PESSOA JURÍDICA QUE NÃO INTEGRAM O ACERVO DA MASSA FALIDA – MATÉRIA INFRACONSTITUCIONAL – AUSÊNCIA DE REPERCUSSÃO GERAL – 1. É de natureza infraconstitucional a controvérsia, fundada na interpretação da Lei nº 11.101/2003, acerca da legitimidade da constrição, pelo Juízo Trabalhista, de bens pertencentes a pessoa jurídica do mesmo grupo econômico que empresa sob recuperação judicial, porém não integrantes da massa falida. 2. É cabível a atribuição dos efeitos da declaração de ausência de repercussão geral quando não há matéria constitucional a ser apreciada ou quando eventual ofensa à Car-ta Magna ocorra de forma indireta ou reflexa (RE 584.608-RG, Relª Min. Ellen Gracie, DJe de 13.03.2009). 3. Ausência de repercussão geral da questão susci-

Page 155: Nº 345 – Março 2018 · Revista SÍNTESE Trabalhista e Previdenciária Ano XXIX – nº 345 – MArço 2018 reposItórIo AutorIzAdo de JurIsprudêncIA Supremo Tribunal Federal

RST Nº 345 – Março/2018 – PARTE GERAL – JURISPRUDÊNCIA PREVIDENCIÁRIA – ACÓRDÃO NA ÍNTEGRA ......................................155

tada, nos termos do art. 543-A do CPC.” (RE 864.264, Rel. Min. Teori Zavascki, Plenário, DJe de 11.04.2016)

“PROCESSUAL CIVIL – AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO EXTRAORDI-NÁRIO COM AGRAVO – PRELIMINAR DE REPERCUSSÃO GERAL – FUNDA-MENTAÇÃO INSUFICIENTE – ÔNUS DA PARTE RECORRENTE – CONFLITO DE COMPETÊNCIA – JUSTIÇA DO TRABALHO – JUÍZO DE FALÊNCIAS – COM-PETÊNCIA PARA EXECUÇÃO DE BENS QUE, SEGUNDO O PRÓPRIO JUÍZO FALIMENTAR, NÃO SÃO PARTE DO ACERVO DA MASSA FALIDA – MATÉRIA INFRACONSTITUCIONAL – OFENSA CONSTITUCIONAL REFLEXA – AGRAVO REGIMENTAL A QUE SE NEGA PROVIMENTO.” (ARE 766.429-AgR, Rel. Min. Teori Zavascki, 2ª T., DJe de 29.10.2015)

Destaco, por oportuno, que não houve a intimação para apresentação de contrarrazões ao presente recurso, em obediência ao princípio da celeridade processual e por não se verificar prejuízo à parte ora agravada, uma vez que voto pela manutenção da decisão recorrida (art. 6º c/c art. 9º do CPC/2015).

Ex positis, nego provimento ao agravo interno.

É como voto.

primeira turma extrato De ata

AgRg no Recurso Extraordinário com Agravo nº 1.080.541Proced.: Distrito FederalRelator: Min. Luiz FuxAgte.(s): Martin WurzmannAdv.(a/s): Paulo Sanches Campoi (166115/MG, 60284/SP)Agdo.(a/s): Massa Falida da KM Indústria e Comércio de Papel Ltda.Agdo.(a/s): Daniel Klabin Lorch WurzmannAgdo.(a/s): Heleno Wander Carvalho ApolinárioAdv.(a/s): Francisco de Oliveira Sabino (145580/MG, 116525/RJ)

Decisão: A Turma, por unanimidade, negou provimento ao agravo, nos termos do voto do Relator. 1ª T., Sessão Virtual de 01.12.2017 a 07.12.2017.

Composição: Ministros Marco Aurélio (Presidente), Luiz Fux, Rosa Weber, Luís Roberto Barroso e Alexandre de Moraes.

Disponibilizou processos para esta Sessão o Ministro Edson Fachin, não tendo participado do julgamento desses feitos o Ministro Alexandre de Moraes por sucedê-lo na Primeira Turma.

Carmen Lilian Oliveira de Souza Secretária da Primeira Turma

Page 156: Nº 345 – Março 2018 · Revista SÍNTESE Trabalhista e Previdenciária Ano XXIX – nº 345 – MArço 2018 reposItórIo AutorIzAdo de JurIsprudêncIA Supremo Tribunal Federal

Parte Geral – Jurisprudência Previdenciária – Acórdão na Íntegra

34819

Superior Tribunal de JustiçaAgInt no Recurso Especial nº 1.603.152 – RS (2016/0139625‑7)Relator: Ministro Francisco FalcãoAgravante: Vaucher & Cia. Ltda.Advogados: Gleison Machado Schütz e outro(s) – RS062206

Lucas Heck – RS067671Agravado: Fazenda Nacional

ementa

TRIBUTÁRIO – INCIDÊNCIA DE CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA SOBRE VERBAS SALARIAIS – FÉRIAS GOZADAS – ADICIONAL DE INSALUBRIDADE E NOTURNO – QUEBRA DE CAIXA – AUXÍLIO-ALIMENTAÇÃO – CONSONÂNCIA COM A JURISPRUDÊNCIA DO STJ

I – A jurisprudência do STJ é pacífica no sentido de que incide contri-buição previdenciária sobre as férias gozadas, dado seu caráter salarial. Precedentes: AgRg-EREsp 1456440/RS, Rel. Min. Benedito Gonçalves, 1ª S., DJe 16.12.2014; AgRg-REsp 1514627/RS, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, 2ª T., DJe 14.04.2015; AgRg-AREsp 93.046/CE, Relª Min. Marga Tessler (Juíza Federal Convocada do TRF 4ª R.), 1ª T., DJe 13.04.2015; e AgRg-REsp 1472237/RS, Rel. Min. Herman Benjamin, 2ª T., DJe 31.03.2015; AgRg-REsp 1.450.705/RS, Rel. Min. Sérgio Kukina, 1ª T., J. 07.04.2016, DJe 13.04.2016.

II – O entendimento da Primeira Seção já se consolidou no sentido de que incide contribuição previdenciária sobre o valor correspondente às férias gozadas, gratificação-natalina, adicional noturno, periculosidade e auxílio-alimentação. Precedentes: AgRg-REsp 1.551.950/SC, Rel. Min. Herman Benjamin, 2ª T., J. 10.11.2015, DJe 03.02.2016.

III – A orientação desta Corte é firme no sentido de que o adicional de insalubridade integra o conceito de remuneração e se sujeita à incidên-cia de contribuição previdenciária (AgRg-AREsp 69.958/DF, 2ª T., Rel. Min. Castro Meira, DJe de 20.06.2012; AgRg-REsp 957.719/SC, 1ª T., Rel. Min. Luiz Fux, DJe de 02.12.2009; AgRg-REsp 1.473.523/SC, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, 2ª T., J. 21.10.2014, DJe 28.10.2014; AgRg-AREsp 69.958/DF, Rel. Min. Castro Meira, 2ª T., J. 12.06.2012, DJe 20.06.2012).

IV – A incidência da contribuição previdenciária sobre o adicional de periculosidade e o adicional noturno foi reiterada pelo rito dos recur-

Page 157: Nº 345 – Março 2018 · Revista SÍNTESE Trabalhista e Previdenciária Ano XXIX – nº 345 – MArço 2018 reposItórIo AutorIzAdo de JurIsprudêncIA Supremo Tribunal Federal

RST Nº 345 – Março/2018 – PARTE GERAL – JURISPRUDÊNCIA PREVIDENCIÁRIA – ACÓRDÃO NA ÍNTEGRA ......................................157

sos repetitivos (art. 543-C do CPC/1973): REsp 1.358.281/SP, Rel. Min. Herman Benjamin, 1ª S., J. 23.04.2014, DJe 05.12.2014.

V – A incidência da contribuição previdenciária sobre a quebra de caixa foi reconhecida pela Segunda Turma no julgamento do REsp 1.443.271/RS; AgRg-REsp 1.545.374/SC, Relª Min. Diva Malerbi (Desembargadora Convocada TRF 3ª Região), 2ª T., J. 19.04.2016, DJe 27.04.2016; AgRg--REsp 1.556.354/RS, Rel. Min. Humberto Martins, 2ª T., J. 03.03.2016, DJe 11.03.2016.

VI – Do mesmo modo incide a exação sobre o auxílio-alimentação pago em pecúnia. Precedentes: AgRg-REsp 1562484/PR, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, 2ª T., DJe 18.12.2015; e AgRg-REsp 1493587/RS, Rel. Min. Benedito Gonçalves, 1ª T., DJe 23.02.2015; AgRg-REsp 1.450.705/RS, Rel. Min. Sérgio Kukina, 1ª T., J. 07.04.2016, DJe 13.04.2016.

VII – Agravo interno improvido.

acórDão

Vistos, relatados e discutidos os autos em que são partes as acima indi-cadas, acordam os Ministros da Segunda Turma do Superior Tribunal de Jus-tiça, por unanimidade, negou provimento ao agravo interno, nos termos do voto do(a) Sr(a). Ministro(a)-Relator(a). Os Srs. Ministros Herman Benjamin, Og Fernandes, Mauro Campbell Marques e Assusete Magalhães votaram com o Sr. Ministro Relator.

Brasília (DF), 12 de dezembro de 2017 (data do Julgamento).

Ministro Francisco Falcão Relator

relatório

O Exmo. Sr. Ministro Francisco Falcão (Relator):

Na origem, trata-se de mandado de segurança contra ato do delegado da Receita Federal do Brasil – Santa Maria, em que a parte impetrante preten-de a declaração de inexigibilidade da contribuição social incidente sobre as verbas de natureza indenizatória, quais sejam: a) Gratificação por participação nos lucros; b) Férias; c) Vale-alimentação; d) Auxílio-creche e babá; e) Auxílio--escolar; f) Auxílio-condução; g) Convênio-saúde; h) Adicional noturno, insalu-bridade e periculosidade; i) Abono assiduidade e folgas não gozadas; j) Auxílio quebra de caixa.

Page 158: Nº 345 – Março 2018 · Revista SÍNTESE Trabalhista e Previdenciária Ano XXIX – nº 345 – MArço 2018 reposItórIo AutorIzAdo de JurIsprudêncIA Supremo Tribunal Federal

158 ..................................RST Nº 345 – Março/2018 – PARTE GERAL – JURISPRUDÊNCIA PREVIDENCIÁRIA – ACÓRDÃO NA ÍNTEGRA

Na sentença concedeu-se parcialmente a segurança. No Tribunal Regio-nal Federal da 4ª Região, a sentença foi parcialmente reformada, conforme a seguinte ementa do acórdão:

MANDADO DE SEGURANÇA – CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA – FALTA DE INTERESSE DE AGIR – AUXÍLIO-EDUCAÇÃO – PARTICIPAÇÃO OS LU-CROS – FÉRIAS USUFRUÍDAS – ADICIONAIS DE INSALUBRIDADE, PERICU-LOSIDADE E NOTURNO – AUXÍLIO-ALIMENTAÇÃO – ADICIONAL DE QUE-BRA DE CAIXA – CONVÊNIO-SAÚDE – AUXÍLIO-CRECHE – AUXÍLIO-BABÁ – ABONO ASSIDUIDADE PAGO EM PECÚNIA – FOLGAS NÃO GOZADAS – VALE-TRANSPORTE

1. Inexiste interesse de agir quanto ao pedido de afastamento da incidência de contribuição previdenciária sobre valores recebidos a título de auxílio-educação e participação nos lucros, uma vez que tais verbas já estão excluídas da base de cálculo das contribuições previdenciárias por expressa disposição legal (art. 28, § 9º, da Lei nº 8.212/1991).

2. Não incide contribuição previdenciária sobre convênio-saúde, auxílio-creche, auxílio-babá, abono assiduidade, folgas não gozadas e vale-transporte.

3. É legítima a incidência de contribuição previdenciária sobre os valores rece-bidos a título de férias gozadas, adicional de quebra de caixa e adicionais de periculosidade, de insalubridade e noturno.

4. É inexigível a contribuição previdenciária sobre o auxílio-alimentação in na-tura, nos termos do art. 28, § 9º, da Lei nº 8.212/1991, integrando o salário-de--contribuição quando for pago em pecúnia.

Opostos embargos declaratórios, foram rejeitados.

Em decisão monocrática, os recursos especiais foram desprovidos, con-forme os seguintes resumos das decisões:

TRIBUTÁRIO – CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA – FÉRIAS GOZADAS – INCI-DÊNCIA – INÚMEROS PRECEDENTES – INSALUBRIDADE – INCIDÊNCIA – ADI-CIONAL NOTURNO E ADICIONAL DE PERICULOSIDADE – INCIDÊNCIA – EN-TENDIMENTO FIRMADO EM REPETITIVO – RESP PARADIGMA 1.358.281/SP – QUEBRA DE CAIXA – INCIDÊNCIA – AUXÍLIO-ALIMENTAÇÃO PAGO EM PECÚNIA – INCIDÊNCIA – RECURSO ESPECIAL DE VAUCHER & CIA. LTDA. – IMPROVIDO – PROCESSUAL CIVIL – TRIBUTÁRIO – OMISSÃO – ALEGAÇÃO GENÉRICA – SÚMULA Nº 284/STF – ABONO ASSIDUIDADE – NÃO INCIDÊN-CIA – PRECEDENTES – AUXÍLIO-CRECHE E AUXÍLIO-BABÁ – LIMITAÇÃO DE IDADE – FALTA DE PREQUESTIONAMENTO – SÚMULA Nº 211/STJ – CONVÊ-NIO-SAÚDE – ABRANGÊNCIA DO BENEFÍCIO – FALTA DE PREQUESTIONA-MENTO – SÚMULA Nº 211/STJ – RECURSO ESPECIAL DA FAZENDA NACIO-NAL CONHECIDO EM PARTE E IMPROVIDO.

Interposto agravo interno, requer a parte agravante a não-incidência da contribuição previdenciária patronal sobre o as férias gozadas, adicional de

Page 159: Nº 345 – Março 2018 · Revista SÍNTESE Trabalhista e Previdenciária Ano XXIX – nº 345 – MArço 2018 reposItórIo AutorIzAdo de JurIsprudêncIA Supremo Tribunal Federal

RST Nº 345 – Março/2018 – PARTE GERAL – JURISPRUDÊNCIA PREVIDENCIÁRIA – ACÓRDÃO NA ÍNTEGRA ......................................159

insalubridade, periculosidade e noturno, auxílio-alimentação e de quebra de caixa.

Intimada, a parte agravada não apresentou impugnação.

É o relatório.

voto

O Exmo. Sr. Ministro Francisco Falcão (Relator):

O recurso não merece provimento.

A jurisprudência do STJ é pacífica no sentido de que incide contribuição previdenciária sobre as férias gozadas, dado seu caráter salarial. Precedentes: AgRg-EREsp 1456440/RS, Rel. Min. Benedito Gonçalves, 1ª S., DJe 16.12.2014; AgRg-REsp 1514627/RS, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, 2ª T., DJe 14.04.2015; AgRg-AREsp 93.046/CE, Relª Min. Marga Tessler (Juíza Federal Convocada do TRF 4ª Região), 1ª T., DJe 13.04.2015; e AgRg-REsp 1472237/RS, Rel. Min. Herman Benjamin, 2ª T., DJe 31.03.2015; AgRg-REsp 1.450.705/RS, Rel. Min. Sérgio Kukina, 1ª T., J. 07.04.2016, DJe 13.04.2016.

O entendimento da Primeira Seção já se consolidou no sentido de que incide contribuição previdenciária sobre o valor correspondente às férias goza-das, gratificação-natalina, adicional noturno, periculosidade e auxílio-alimenta-ção. Precedentes: AgRg-REsp 1.551.950/SC, Rel. Min. Herman Benjamin, 2ª T., J. 10.11.2015, DJe 03.02.2016.

A orientação desta Corte é firme no sentido de que o adicional de insa-lubridade integra o conceito de remuneração e se sujeita à incidência de con-tribuição previdenciária (AgRg-AREsp 69.958/DF, 2ª T., Rel. Min. Castro Meira, DJe de 20.06.2012; AgRg-REsp 957.719/SC, 1ª Turma, Rel. Min. Luiz Fux, DJe 02.12.2009; AgRg-REsp 1.473.523/SC, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, 2ª T., J. 21.10.2014, DJe 28.10.2014; AgRg-AREsp 69.958/DF, Rel. Min. Castro Meira, 2ª T., J. 12.06.2012, DJe 20.06.2012).

A incidência da contribuição previdenciária sobre o adicional de peri-culosidade e o adicional noturno foi reiterada pelo rito dos recursos repetitivos (art. 543-C do CPC/1973): REsp 1.358.281/SP, Rel. Min. Herman Benjamin, 1ª S., J. 23.04.2014, DJe 05.12.2014.

A incidência da contribuição previdenciária sobre a quebra de caixa foi reconhecida pela Segunda Turma no julgamento do REsp 1.443.271/RS; AgRg--REsp 1.545.374/SC, Relª Min. Diva Malerbi (Desembargadora Convocada TRF 3ª Região), 2ª T., J. 19.04.2016, DJe 27.04.2016; AgRg-REsp 1.556.354/RS, Rel. Min. Humberto Martins, 2ª T., J. 03.03.2016, DJe 11.03.2016.

Page 160: Nº 345 – Março 2018 · Revista SÍNTESE Trabalhista e Previdenciária Ano XXIX – nº 345 – MArço 2018 reposItórIo AutorIzAdo de JurIsprudêncIA Supremo Tribunal Federal

160 ..................................RST Nº 345 – Março/2018 – PARTE GERAL – JURISPRUDÊNCIA PREVIDENCIÁRIA – ACÓRDÃO NA ÍNTEGRA

Do mesmo modo incide a exação sobre o auxílio-alimentação pago em pecúnia. Precedentes: AgRg-REsp 1562484/PR, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, 2ª T., DJe 18.12.2015; e AgRg-REsp 1493587/RS, Rel. Min. Benedito Gonçalves, 1ª T., DJe 23.02.2015; AgRg-REsp 1.450.705/RS, Rel. Min. Sérgio Kukina, 1ª T., J. 07.04.2016, DJe 13.04.2016.

Ante o exposto, não havendo razões para modificar a decisão recorrida, nego provimento ao agravo interno.

É o voto.

certiDão De julgamento segunDa turma

Número Registro: 2016/0139625-7 AgInt-REsp 1.603.152/RS

Números Origem: 50000803320154047103 RS-50000803320154047103

Pauta: 12.12.2017 Julgado: 12.12.2017

Relator: Exmo. Sr. Ministro Francisco Falcão

Presidente da Sessão: Exmo. Sr. Ministro Francisco Falcão

Subprocuradora-Geral da República: Exma. Sra. Dra. Sandra Verônica Cureau

Secretária: Belª Valéria Alvim Dusi

autuação

Recorrente: Vaucher & Cia. Ltda.

Advogados: Gleison Machado Schütz e outro(s) – RS062206 Lucas Heck – RS067671

Recorrente: Fazenda Nacional

Recorrido: os mesmos

Assunto: Direito Tributário – Contribuições – Contribuições previdenciárias – Contribuição sobre a folha de salários

agravo interno

Agravante: Vaucher & Cia. Ltda.

Advogados: Gleison Machado Schütz e outro(s) – RS062206 Lucas Heck – RS067671

Agravado: Fazenda Nacional

Page 161: Nº 345 – Março 2018 · Revista SÍNTESE Trabalhista e Previdenciária Ano XXIX – nº 345 – MArço 2018 reposItórIo AutorIzAdo de JurIsprudêncIA Supremo Tribunal Federal

RST Nº 345 – Março/2018 – PARTE GERAL – JURISPRUDÊNCIA PREVIDENCIÁRIA – ACÓRDÃO NA ÍNTEGRA ......................................161

certiDão

Certifico que a egrégia Segunda Turma, ao apreciar o processo em epí-grafe na sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:

“A Turma, por unanimidade, negou provimento ao agravo interno, nos termos do voto do(a) Sr(a). Ministro(a)-Relator(a).”

Os Srs. Ministros Herman Benjamin, Og Fernandes, Mauro Campbell Marques e Assusete Magalhães votaram com o Sr. Ministro Relator.

Page 162: Nº 345 – Março 2018 · Revista SÍNTESE Trabalhista e Previdenciária Ano XXIX – nº 345 – MArço 2018 reposItórIo AutorIzAdo de JurIsprudêncIA Supremo Tribunal Federal

Parte Geral – Jurisprudência Previdenciária – Acórdão na Íntegra

34820

Superior Tribunal de JustiçaAgInt no Agravo em Recurso Especial nº 938.333 – MS (2016/0161244‑5)Relator: Ministro Gurgel de FariaAgravante: Maria Lucia Alexandre da CostaAdvogado: José Antonio Soares Neto – MS008984Agravado: Instituto Nacional do Seguro Social

ementa

PROCESSUAL CIVIL E PREVIDENCIÁRIO – APOSENTADORIA RURAL POR IDADE – CARÊNCIA – NÃO COMPROVAÇÃO DO LABOR NO PERÍODO IMEDIATAMENTE ANTERIOR AO REQUERIMENTO – INÍCIO DE PROVA MATERIAL AMPLIADO POR TESTEMUNHAL – INSUFICIÊNCIA – SÚMULA Nº 7 DO STJ

1. Conforme estabelecido pelo Plenário do STJ, “aos recursos interpostos com fundamento no CPC/1973 (relativos a decisões publicadas até 17 de março de 2016) devem ser exigidos os requisitos de admissibilidade na forma nele prevista, com as interpretações dadas até então pela jurispru-dência do Superior Tribunal de Justiça” (Enunciado Administrativo nº 2).

2. Nos termos dos arts. 48, § 1º, 55, § 3º, e 143 da Lei nº 8.213/1991, é devida a aposentadoria por idade ao trabalhador rural que completar 60 anos de idade, se homem, e 55 anos, se mulher, desde que esteja demonstrado o exercício de atividade agrícola, por um início de prova material, ainda que de forma descontínua, no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício, em número de meses idêntico ao período de carência.

3. Na esteira do REsp 1.348.633/SP, da Primeira Seção, para efeito de reconhecimento do labor agrícola, mostra-se desnecessário que o início de prova material seja contemporâneo a todo o período de carência exi-gido, desde que a eficácia daquele seja ampliada por prova testemunhal idônea.

4. Caso em que a instância ordinária concluiu pela insuficiência das pro-vas colhidas, porquanto subsistiram dúvidas acerca da alegada ativida-de rural, cuja inversão do julgado esbarra no óbice do Verbete Sumular nº 7 do STJ.

5. Agravo interno desprovido.

Page 163: Nº 345 – Março 2018 · Revista SÍNTESE Trabalhista e Previdenciária Ano XXIX – nº 345 – MArço 2018 reposItórIo AutorIzAdo de JurIsprudêncIA Supremo Tribunal Federal

RST Nº 345 – Março/2018 – PARTE GERAL – JURISPRUDÊNCIA PREVIDENCIÁRIA – ACÓRDÃO NA ÍNTEGRA ......................................163

acórDão

Vistos, relatados e discutidos os autos em que são partes as acima indi-cadas, acordam os Ministros da Primeira Turma do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade, negar provimento ao agravo interno, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator. Os Srs. Ministros Napoleão Nunes Maia Filho, Benedito Gonçalves, Sérgio Kukina e Regina Helena Costa (Presidente) votaram com o Sr. Ministro Relator.

Brasília, 28 de novembro de 2017 (data do julgamento).

Ministro Gurgel de Faria Relator

relatório

Exmo. Sr. Ministro Gurgel de Faria (Relator):

Trata-se de agravo interno interposto por Maria Lúcia Alexandre da Costa contra decisão de minha lavra, em que conheci do agravo para negar provi-mento ao recurso especial, visto que a análise da comprovação da condição de segurado especial da autora demandaria o reexame de provas, a teor da Súmula nº 7 do STJ (e-STJ fls. 184/188).

A agravante sustenta que não pretende o reexame de matéria fática, mas a discussão no sentido de que “é possível o labor rural descontínuo desde que não haja o desligamento efeito desta labuta” (e-STJ fl. 195).

Intimada, a parte agravada não formulou impugnação (e-STJ fl. 203).

É o relatório.

voto

Exmo. Sr. Ministro Gurgel de Faria (Relator):

Conforme estabelecido pelo Plenário do STJ, “aos recursos interpostos com fundamento no CPC/1973 (relativos a decisões publicadas até 17 de mar-ço de 2016) devem ser exigidos os requisitos de admissibilidade na forma nele prevista, com as interpretações dadas até então pela jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça” (Enunciado Administrativo nº 2).

Feito tal registro, verifica-se que o caso dos autos diz respeito ao meio de comprovação do tempo de labor agrícola da segurada para efeito de aposenta-doria rural por idade.

Page 164: Nº 345 – Março 2018 · Revista SÍNTESE Trabalhista e Previdenciária Ano XXIX – nº 345 – MArço 2018 reposItórIo AutorIzAdo de JurIsprudêncIA Supremo Tribunal Federal

164 ..................................RST Nº 345 – Março/2018 – PARTE GERAL – JURISPRUDÊNCIA PREVIDENCIÁRIA – ACÓRDÃO NA ÍNTEGRA

Nos termos dos arts. 48, § 1º, 55, § 3º, e 143 da Lei nº 8.213/1991, é de-vida a aposentadoria por idade ao trabalhador rural que completar 60 anos de idade, se homem, e 55 anos, se mulher, desde que esteja demonstrado o exercí-cio de atividade agrícola, por um início de prova material, ainda que de forma descontínua, no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício, em número de meses idêntico ao período de carência.

No caso concreto, o Tribunal a quo rejeitou a qualidade de segurada especial da parte autora após constatar a insuficiência das provas colhidas para comprovação do tempo de serviço rural alegado, in verbis (e-STJ fls. 77/86):

No caso concreto, os documentos apresentados são insuficientes para comprovar o tempo de trabalho rural necessário à concessão do benefício pretendido pela autora. Isto porque o início de prova material apresentado pela autora deve ser computado a partir da data de seu casamento com lavrador em 27.08.1977, tendo em vista que não há qualquer documento apto a comprovar o trabalho rural da au-tora, em regime de economia familiar, em companhia de seus pais. Outrossim, de 01.02.1988 a 22.06.1990, o marido da autora trabalhou como empregado urbano e, no período de 01.10.2007 a 16.02.2009, como empregado rural (fl. 36), não tendo sido apresentado documento comprovando a atividade da autora em regime de economia familiar, conforme relatado pelas testemunhas (fls. 49/50).

Com efeito, conjugadas as provas colhidas (material e oral), vê-se que são insufi-cientes para amparar as assertivas da parte autora, subsistindo dúvidas a respeito da atividade rural exercida, quer quanto à natureza, local, frequência e perio-dicidade, não estando reunidos os requisitos para a concessão do benefício de aposentadoria, pelo que se impõe a manutenção da sentença recorrida.

De observar que o decisum ora recorrido não destoa do entendimento da Primeira Seção, no julgamento do Recurso repetitivo nº 1.348.633/SP, sub-metido ao rito do art. 543-C do Código de Processo Civil/1973, o qual firmou compreensão no sentido de ser possível o reconhecimento de período de traba-lho rural anterior ao documento mais antigo apresentado nos autos desde que amparado por convincente prova testemunhal colhida sob o contraditório, o que não ocorreu na espécie.

A propósito:

PREVIDENCIÁRIO – RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DA CONTROVÉR-SIA – APOSENTADORIA POR TEMPO DE SERVIÇO – ART. 55, § 3º, DA LEI Nº 8.213/1991 – TEMPO DE SERVIÇO RURAL – RECONHECIMENTO A PARTIR DO DOCUMENTO MAIS ANTIGO – DESNECESSIDADE – INÍCIO DE PROVA MATERIAL CONJUGADO COM PROVA TESTEMUNHAL – PERÍODO DE ATI-VIDADE RURAL COINCIDENTE COM INÍCIO DE ATIVIDADE URBANA REGIS-TRADA EM CTPS – RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO – 1. A controvérsia cinge-se em saber sobre a possibilidade, ou não, de reconhecimento do período de trabalho rural anterior ao documento mais antigo juntado como início de prova material.

Page 165: Nº 345 – Março 2018 · Revista SÍNTESE Trabalhista e Previdenciária Ano XXIX – nº 345 – MArço 2018 reposItórIo AutorIzAdo de JurIsprudêncIA Supremo Tribunal Federal

RST Nº 345 – Março/2018 – PARTE GERAL – JURISPRUDÊNCIA PREVIDENCIÁRIA – ACÓRDÃO NA ÍNTEGRA ......................................165

2. De acordo com o art. 400 do Código de Processo Civil “a prova testemunhal é sempre admissível, não dispondo a lei de modo diverso”. Por sua vez, a Lei de Benefícios, ao disciplinar a aposentadoria por tempo de serviço, expressamente estabelece no § 3º do art. 55 que a comprovação do tempo de serviço só pro-duzirá efeito quando baseada em início de prova material, “não sendo admitida prova exclusivamente testemunhal, salvo na ocorrência de motivo de força maior ou caso fortuito, conforme disposto no Regulamento” (Súmula nº 149/STJ).

3. No âmbito desta Corte, é pacífico o entendimento de ser possível o reconheci-mento do tempo de serviço mediante apresentação de um início de prova mate-rial, desde que corroborado por testemunhos idôneos. Precedentes.

4. A Lei de Benefícios, ao exigir um “início de prova material”, teve por pressu-posto assegurar o direito à contagem do tempo de atividade exercida por traba-lhador rural em período anterior ao advento da Lei nº 8.213/1991 levando em conta as dificuldades deste, notadamente hipossuficiente.

5. Ainda que inexista prova documental do período antecedente ao casamento do segurado, ocorrido em 1974, os testemunhos colhidos em juízo, conforme reconhecido pelas instâncias ordinárias, corroboraram a alegação da inicial e confirmaram o trabalho do autor desde 1967.

6. No caso concreto, mostra-se necessário decotar, dos períodos reconhecidos na sentença, alguns poucos meses em função de os autos evidenciarem os registros de contratos de trabalho urbano em datas que coincidem com o termo final dos interregnos de labor como rurícola, não impedindo, contudo, o reconhecimento do direito à aposentadoria por tempo de serviço, mormente por estar incontro-versa a circunstância de que o autor cumpriu a carência devida no exercício de atividade urbana, conforme exige o inc. II do art. 25 da Lei nº 8.213/1991.

7. Os juros de mora devem incidir em 1% ao mês, a partir da citação válida, nos termos da Súmula nº 204/STJ, por se tratar de matéria previdenciária. E, a partir do advento da Lei nº 11.960/2009, no percentual estabelecido para caderneta de poupança. Acórdão sujeito ao regime do art. 543-C do Código de Processo Civil.

(REsp 1348633/SP, Rel. Min. Arnaldo Esteves Lima, 1ª S., J. 28.08.2013, DJe 05.12.2014) (Grifos acrescidos)

Não há, portanto, como acolher a tese recursal sem esbarrar no Verbete Sumular nº 7 do STJ.

Por fim, não haverá majoração de honorários recursais, por se tratar de recurso especial deduzido na vigência do Código de Processo Civil de 1973.

Ante o exposto, nego provimento ao agravo interno.

É como voto.

certiDão De julgamento primeira turma

Número Registro: 2016/0161244-5 AgInt-AREsp 938.333/MS

Page 166: Nº 345 – Março 2018 · Revista SÍNTESE Trabalhista e Previdenciária Ano XXIX – nº 345 – MArço 2018 reposItórIo AutorIzAdo de JurIsprudêncIA Supremo Tribunal Federal

166 ..................................RST Nº 345 – Março/2018 – PARTE GERAL – JURISPRUDÊNCIA PREVIDENCIÁRIA – ACÓRDÃO NA ÍNTEGRA

Números Origem: 00399943520134039999 1100001331 1100013340 201303990399945 399943520134039999

Pauta: 28.11.2017 Julgado: 28.11.2017

Relator: Exmo. Sr. Ministro Gurgel de Faria

Presidente da Sessão: Exma. Sra. Ministra Regina Helena Costa

Subprocurador-Geral da República: Exmo. Sr. Dr. Brasilino Pereira dos Santos

Secretária: Belª Bárbara Amorim Sousa Camuña

autuação

Agravante: Maria Lucia Alexandre da Costa

Advogado: José Antonio Soares Neto – MS008984

Agravado: Instituto Nacional do Seguro Social

Assunto: Direito previdenciário – Benefícios em espécie – Aposentadoria por Idade (arts. 48/51) – Rural (arts. 48/51)

agravo interno

Agravante: Maria Lucia Alexandre da Costa

Advogado: José Antonio Soares Neto – MS008984

Agravado: Instituto Nacional do Seguro Social

certiDão

Certifico que a egrégia Primeira Turma, ao apreciar o processo em epí-grafe na sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:

A Turma, por unanimidade, negou provimento ao agravo interno, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator.

Os Srs. Ministros Napoleão Nunes Maia Filho, Benedito Gonçalves, Sérgio Kukina e Regina Helena Costa (Presidente) votaram com o Sr. Ministro Relator.

Page 167: Nº 345 – Março 2018 · Revista SÍNTESE Trabalhista e Previdenciária Ano XXIX – nº 345 – MArço 2018 reposItórIo AutorIzAdo de JurIsprudêncIA Supremo Tribunal Federal

Parte Geral – Jurisprudência Previdenciária – Acórdão na Íntegra

34821

Superior Tribunal de JustiçaAgravo em Recurso Especial nº 1.183.086 – SP (2017/0258502‑6)Relator: Ministro Herman BenjaminAgravante: Benedicto Stipp Cruz Neto Advogado: Maria Cláudia Canale – SP121188Agravado: São Paulo Previdência – SPPREVProcurador: Luciana Regina Micelli Lupinacci dos Santos e outro(s) – SP246319

ementa

AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL – PREVIDENCIÁRIO – PLEITO DE CONCESSÃO DE PENSÃO POR MORTE A SOBRINHO-NETO – IMPOSSIBILIDADE DE ANÁLISE DO CONTEÚDO FÁTICO-PROBATÓRIO – INCIDÊNCIA DA SÚMULA Nº 7/STJ – LCE 180/1978 – IMPOSSIBILIDADE DE DISCUSSÃO ACERCA DE NORMA LOCAL – SÚMULA Nº 280/STJ – PRECEDENTES – SÚMULA Nº 83/STJ

1. Cuida-se de inconformismo contra decisum do Tribunal de origem, que não conheceu do Recurso Especial, sob o fundamento de incidência das Súmulas nºs 7/STJ e 280/STF, haja vista que não há previsão legal de sobrinho-neto como beneficiário de pensão por morte, consoante o art. 153 e § 4º do art. 147 da LCE 180/1978, motivo pelo qual não se pode conceder o benefício.

2. O órgão julgador decidiu a questão após percuciente análise dos fatos e das provas relacionados à causa, sendo certo asseverar que reexaminá--los é vedado em Recurso Especial, pois encontra óbice no édito 7/STJ: “A pretensão de simples reexame de prova não enseja recurso especial”.

3. Verifica-se que o Tribunal a quo decidiu de acordo com a jurispru-dência do STJ, de modo que se aplica à espécie o enunciado da Súmula nº 83/STJ: “Não se conhece do recurso especial pela divergência, quan-do a orientação do tribunal se firmou no mesmo sentido da decisão recorrida”.

4. O aprofundamento da presente questão demanda reexame de direito local, o que se mostra obstado em Recurso Especial, em face da atuação da Súmula nº 280 do Supremo Tribunal Federal, adotada pelo STJ: “Por ofensa a direito local não cabe recurso extraordinário”.

5. Agravo a que se nega provimento.

Page 168: Nº 345 – Março 2018 · Revista SÍNTESE Trabalhista e Previdenciária Ano XXIX – nº 345 – MArço 2018 reposItórIo AutorIzAdo de JurIsprudêncIA Supremo Tribunal Federal

168 ..................................RST Nº 345 – Março/2018 – PARTE GERAL – JURISPRUDÊNCIA PREVIDENCIÁRIA – ACÓRDÃO NA ÍNTEGRA

acórDão

Vistos, relatados e discutidos os autos em que são partes as acima indica-das, acordam os Ministros da Segunda Turma do Superior Tribunal de Justiça: “‘A Turma, por unanimidade, negou provimento ao agravo em recurso espe-cial, nos termos do voto do(a) Sr(a). Ministro(a)-Relator(a).’ Os Srs. Ministros Og Fernandes, Mauro Campbell Marques e Assusete Magalhães votaram com o Sr. Ministro Relator.

Ausente, justificadamente, o Sr. Ministro Francisco Falcão.”

Brasília, 28 de novembro de 2017 (data do Julgamento).

Ministro Herman Benjamin Relator

relatório

O Exmo. Sr. Ministro Herman Benjamin (Relator):

Trata-se de Agravo de decisão que inadmitiu Recurso Especial (art. 105, III, a e c, da CF) interposto contra acórdão do Tribunal de origem sob o pálio da seguinte ementa:

APELAÇÃO – SERVIDOR PÚBLICO ESTADUAL – PENSÃO POR MORTE – Pre-tensão do autor de que seja deferido o pagamento de pensão por morte em vir-tude do falecimento de sua tia-avó, ocorrido em 15.07.2010. Impossibilidade. Art. 153 e § 4º do art. 147 da LCE 180/78 que estão com sua exigibilidade sus-pensa desde a edição da Lei Federal nº 9.717/1998. Ausência de previsão legal de “sobrinho-neto” como beneficiário de pensão por morte no Regime Geral da Previdência Social. Benefício que não pode ser concedido. Sentença de impro-cedência mantida. Recurso não provido.

Recurso Especial às fls. 168-179.

Contrarrazões apresentadas às fls. 212-230.

Decisão pela inadmissibilidade do Recurso Especial às fls. 242, cuja con-clusão transcreve-se:

A parte agravante sustenta que ocorreu, além de divergência jurisprudencial, vio-lação dos arts. 5º da Lei Federal nº 9.717/1998, do art. 24, inc. XII, e §§ 1, 2º, 3º e 4º do art. 24 da Constituição Federal, sob o argumento de que “o benefício da pensão por morte não é distinto daquele previsto no regime geral de previdência, porém não há nenhum óbice para que o Estado federado estabeleça outros bene-ficiários para fins do percebimento dá pensão por morte”.

Contraminuta às fls. 268-274.

Page 169: Nº 345 – Março 2018 · Revista SÍNTESE Trabalhista e Previdenciária Ano XXIX – nº 345 – MArço 2018 reposItórIo AutorIzAdo de JurIsprudêncIA Supremo Tribunal Federal

RST Nº 345 – Março/2018 – PARTE GERAL – JURISPRUDÊNCIA PREVIDENCIÁRIA – ACÓRDÃO NA ÍNTEGRA ......................................169

Despacho do Tribunal de origem que mantém a decisão agravada por seus próprios fundamentos, à fl. 282.

É o relatório.

voto

O Exmo. Sr. Ministro Herman Benjamin (Relator):

Os autos foram recebidos neste Gabinete em 27.10.2017.

Cuida-se de inconformismo contra decisum do Tribunal de origem, que não conheceu do Recurso Especial, sob o fundamento de incidência das Súmu-las nºs 7/STJ e 280/STF, haja vista que não há previsão legal de sobrinho-neto como beneficiário de pensão por morte, consoante o art. 153 e § 4º do art. 147 da LCE 180/1978, motivo pelo qual não se pode conceder o benefício.

A irresignação não merece prosperar.

O órgão julgador decidiu a questão após percuciente análise dos fatos e das provas relacionados à causa, sendo certo asseverar que reexaminá-los é vedado em Recurso Especial, pois encontra óbice no édito 7/STJ: “A pretensão de simples reexame de prova não enseja recurso especial”.

A esse respeito, citam-se trechos do voto:

O apelante pretende a concessão de benefício previdenciário denominado pen-são por morte, sob o fundamento de que, embora na qualidade de sobrinho--neto, era dependente econômico de servidora pública estadual inativa que veio a óbito.

Partindo desta premissa, nota-se que no caso concreto o óbito se deu em 15 de julho de 2010, época em que já estava em vigor a Lei Federal nº 9.717, de, 27 de novembro de 1998, que dispõe sobre normas gerais para organização e funcio-namento dos regimes próprios de previdência social dos servidores públicos dos Estados, dentre outras providências.

Portanto, desde 1998 resta suspensa a eficácia do disposto no art. 153 3 da Lei Complementar Estadual nº 180/1978 com sua redação originária, sendo que, nos termos do art. 54 da Lei Federal nº 9.717/1998, os Regimes Próprios de Pre-vidência dos servidores estaduais não poderiam beneficiários) Poder Judiciário São Paulo Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo Seção de Direito Público conceder benefícios (e nem instituir distintos dos previstos no Regime Geral de Previdência Social.

Note-se que, o rol não abrange o “sobrinho-neto”, como é o caso do apelante em relação ao de cujus, razão pela qual não lhe é devido o benefício.

Não se ignora a declaração firmada por instrumento público pela servidora ainda em vida (fl. 28), nem tampouco os documentos comprobatórios de fls. 25/27 e

Page 170: Nº 345 – Março 2018 · Revista SÍNTESE Trabalhista e Previdenciária Ano XXIX – nº 345 – MArço 2018 reposItórIo AutorIzAdo de JurIsprudêncIA Supremo Tribunal Federal

170 ..................................RST Nº 345 – Março/2018 – PARTE GERAL – JURISPRUDÊNCIA PREVIDENCIÁRIA – ACÓRDÃO NA ÍNTEGRA

29/32 no sentido de que o apelante era seu dependente econômico enquanto menor de idade.

Entretanto, seguindo o raciocínio acima exposto, conclui-se igualmente pela sus-pensão da eficácia do art. 540 o 147 7 da LC 180/1978; aplicável por analogia, uma vez comprovada a dependência econômica, considerando que a Lei Federal nº 9.717/1998 não prevê tal hipótese.

Os fatos são aqui recebidos tais como estabelecidos pelo Tribunal a quo, senhor da análise probatória. E, se o exame da violação do dispositivo legal in-vocado perpassa pela necessidade de fixar premissa fática diversa da que consta do acórdão impugnado, inviável o apelo nobre (Agravo Regimental no Agravo em Recurso Especial nº 490.526/SP, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, in DJe de 27.06.2016).

Por conseguinte, o presente recurso não pretende a aferição da interpre-tação da norma legal, mas a reanálise de documentos e fatos, já cristalizados na instância a quo. Logo, não há como modificar a premissa fática adotada na instância ordinária no presente iter procedimental.

Ademais o entendimento do Tribunal de origem espelha a orientação do STJ em caso análogo. Cita-se Precedente:

ADMINISTRATIVO – RECURSO ESPECIAL – PENSÃO POR MORTE – LIMITE DE IDADE – PRORROGAÇÃO – REQUISITOS NÃO PREENCHIDOS – AUSÊNCIA DE DIREITO ADQUIRIDO – RECURSO CONHECIDO E PROVIDO

1. A Lei Federal nº 9.717, de 27.11.1998, editada no âmbito da legislação con-corrente, vedou à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios, nos seus regimes próprios de previdência, a concessão de benefícios distintos dos previstos no Regime Geral de Previdência Social.

2. Não há, no RGPS, previsão legal de extensão da pensão por morte até os 24 anos de idade para os estudantes universitários.

3. Se o dependente do segurado, ao tempo da edição da Lei nº 9.717/1998, ainda não havia reunido todos os requisitos previstos em lei estadual para receber a pensão por morte até os 24 anos de idade, não possui direito adquirido ao be-nefício e a sua concessão fere o disposto na mencionada lei federal. Precedente do STJ.

4. Recurso especial conhecido e provido para denegar a segurança. (REsp 846.902/ES, Rel. Min. Arnaldo Esteves Lima, J. 02.09.2008)

Portanto, diante das razões acima expendidas, verifica-se que o Tribunal a quo decidiu de acordo com a jurisprudência do STJ, de modo que se aplica à espécie o enunciado da Súmula nº 83/STJ: “Não se conhece do recurso especial pela divergência, quando a orientação do tribunal se firmou no mesmo sentido da decisão recorrida.”

Page 171: Nº 345 – Março 2018 · Revista SÍNTESE Trabalhista e Previdenciária Ano XXIX – nº 345 – MArço 2018 reposItórIo AutorIzAdo de JurIsprudêncIA Supremo Tribunal Federal

RST Nº 345 – Março/2018 – PARTE GERAL – JURISPRUDÊNCIA PREVIDENCIÁRIA – ACÓRDÃO NA ÍNTEGRA ......................................171

Ressalte-se que o entendimento pacificado no âmbito do egrégio Superior Tribunal de Justiça é de admitir a aplicação da Súmula nº 83/STJ aos Recursos Especiais interpostos com fundamento na alínea a do aludido permissivo cons-titucional (cf. AgRg-AREsp 354.886/PI, Relª Min. Regina Helena Costa, 1ª T., J. 26.04.2016, DJe 11.05.2016).

Ademais a incidência do enunciado da Súmula nº 83/STJ obsta a análise recursal pela alínea c, ficando prejudicado o exame do dissídio jurisprudencial, conforme sinaliza a jurisprudência do STJ (AgInt-AREsp 828.816/SP, Relª Min. Regina Helena Costa, 1ª T., J. 13.09.2016, DJe 21.09.2016).

Por fim, consoante se depreende do acórdão vergastado, os fundamentos legais que lastrearam a presente questão repousam eminentemente na Lei Esta-dual LCE nº 180/1978.

Portanto, o aprofundamento de tal questão demanda reexame de direito local, o que se mostra obstado em Recurso Especial, em face da atuação da Súmula nº 280 do Supremo Tribunal Federal, adotada pelo STJ: “Por ofensa a direito local não cabe recurso extraordinário.”

Isso posto, eventual violação a lei federal seria reflexa, uma vez que a análise da controvérsia demandaria o exame da legislação estadual citada, o que não se admite em Recurso Especial.

ADMINISTRAÇÃO – SERVIDOR PÚBLICO – URV – LEI DELEGADA Nº 43/2000 – DIREITO LOCAL – SÚMULA Nº 280/STF – AUSÊNCIA DE PREQUESTIONA-MENTO – SÚMULA Nº 211/STJ

1. Controverte-se sobre o direito de servidores públicos de receber diferenças oriundas da URV em virtude de reestruturação do sistema remuneratório dos militares determinada pela Lei Delegada nº 43/2000.

2. A alegação de ofensa aos arts. 368 e 369 do CC, a despeito da oposição de Embargos Declaratórios, não foi apreciada pelo Tribunal de origem. Incidência da Súmula nº 211/STJ.

3. A conclusão assentada na origem teve como premissa a interpretação de lei local, de modo que a reforma daquele entendimento esbarra no óbice da Súmula nº 280/STF: “Por ofensa a direito local, não cabe recurso extraordinário”. Prece-dentes: REsp 1.290.833/MG, Rel. Min. Castro Meira, DJe 19.12.2011; AgRg-REsp 1.312.402/MG, Rel. Min. Benedito Gonçalves, DJe 22.05.2012; AgRg-REsp 1.253.650/MG, Rel. Min. Humberto Martins, DJe 04.10.2011.

4. Agravo Regimental não provido.

(AgRg-REsp 1256721/MG, Rel. Min. Herman Benjamin, 2ª T., J. 18.09.2012, DJe 24.09.2012).

PROCESSO CIVIL – RECURSO ESPECIAL – LEI LOCAL

Se a reforma do julgado demanda a interpretação de lei local, o recurso especial é inviável (STF, Súmula nº 280). Agravo regimental não provido.

(AgRg-AREsp 325.430/PE, Rel. Min. Ari Pargendler, 1ª T., J. 27.05.2014, DJe 03.06.2014)

Page 172: Nº 345 – Março 2018 · Revista SÍNTESE Trabalhista e Previdenciária Ano XXIX – nº 345 – MArço 2018 reposItórIo AutorIzAdo de JurIsprudêncIA Supremo Tribunal Federal

172 ..................................RST Nº 345 – Março/2018 – PARTE GERAL – JURISPRUDÊNCIA PREVIDENCIÁRIA – ACÓRDÃO NA ÍNTEGRA

IMPOSTO SOBRE A RENDA DE PESSOA JURÍDICA (IRPJ) – SUBVENÇÃO PARA INVESTIMENTO – PRODEC – LEI LOCAL – SÚMULA Nº 280/STF

1. Verifica-se que a demanda foi dirimida com base em Direito local, in casu, na legislação estadual catarinense (Lei nº 3.342/2005 e no Decreto nº 704/2007). Logo, é inviável sua apreciação em Recurso Especial, em face da incidência, por analogia, da Súmula nº 280 do STF: “por ofensa a direito local não cabe recurso extraordinário.”

2. Agravo Regimental não provido.

(AgRg-REsp 1.433.745/SC, Rel. Min. Herman Benjamin, 2ª T., J. 08.04.2014, DJe 22.04.2014)

Ao lume do exposto, nega-se provimento ao Agravo em Recurso Especial.

É o voto.

certiDão De julgamento segunDa turma

Número Registro: 2017/0258502-6 AREsp 1.183.086/SP

Números Origem: 00257419720118260053 1344/2011 13442011

20140000298726 257419720118260053

Pauta: 28.11.2017 Julgado: 28.11.2017

Relator: Exmo. Sr. Ministro Herman Benjamin

Presidente da Sessão: Exmo. Sr. Ministro Herman Benjamin

Subprocurador-Geral da República: Exmo. Sr. Dr. Nívio de Freitas Silva Filho

Secretária: Belª Valéria Alvim Dusi

autuação

Agravante: Benedicto Stipp Cruz Neto

Advogado: Maria Cláudia Canale – SP121188

Agravado: São Paulo Previdência – SPPREV

Procurador: Luciana Regina Micelli Lupinacci dos Santos e outro(s) –

SP246319

Assunto: Direito administrativo e outras matérias de direito público – Servidor

público civil – Pensão

Page 173: Nº 345 – Março 2018 · Revista SÍNTESE Trabalhista e Previdenciária Ano XXIX – nº 345 – MArço 2018 reposItórIo AutorIzAdo de JurIsprudêncIA Supremo Tribunal Federal

RST Nº 345 – Março/2018 – PARTE GERAL – JURISPRUDÊNCIA PREVIDENCIÁRIA – ACÓRDÃO NA ÍNTEGRA ......................................173

certiDão

Certifico que a egrégia Segunda Turma, ao apreciar o processo em epí-grafe na sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:

“A Turma, por unanimidade, negou provimento ao agravo em recurso especial, nos termos do voto do(a) Sr(a). Ministro(a)-Relator(a).”

Os Srs. Ministros Og Fernandes, Mauro Campbell Marques e Assusete Magalhães votaram com o Sr. Ministro Relator.

Ausente, justificadamente, o Sr. Ministro Francisco Falcão.

Page 174: Nº 345 – Março 2018 · Revista SÍNTESE Trabalhista e Previdenciária Ano XXIX – nº 345 – MArço 2018 reposItórIo AutorIzAdo de JurIsprudêncIA Supremo Tribunal Federal

Parte Geral – Jurisprudência Previdenciária – Acórdão na Íntegra

34822

Tribunal Regional Federal da 1ª RegiãoNumeração Única: 0002507‑65.2007.4.01.3801Apelação/Reexame Necessário nº 2007.38.01.002711‑3/MG Relator: Desembargador Federal Jirair Aram MeguerianApelante: Instituto Nacional do Seguro Social – INSSProcurador: DF00025372 – Adriana Maia VenturiniApelado: Antonio PereiraAdvogado: MG00072323 – Leonardo Oliveira Mokdeci e outros(as)Rec. Adesivo: Antonio PereiraRemetente: Juízo Federal da 2ª Vara da Subseção Judiciária de Juiz de Fora/MG

ementa

REMESSA NECESSÁRIA E APELAÇÃO CÍVEL – INSS – DESCONTOS INDEVIDOS DE VALORES RELATIVOS À PENSÃO ALIMENTÍCIA SOBRE BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO – CERCEAMENTO DE DEFESA – INEXISTÊNCIA – PRESCRIÇÃO PARCIAL – OCORRÊNCIA – DANOS MATERIAIS – EXISTÊNCIA DE ATO ILÍCITO – COMPROVAÇÃO – DANOS MORAIS – NATUREZA IN RE IPSA – SENTENÇA MANTIDA

I – A ausência de reiteração, por ocasião de interposição de recurso de apelação, impede o conhecimento de agravo retido, pois descumprido o requisito exigido pelo art. 523, § 1º, do CPC/1973.

II – Conforme dispõe o art. 370, parágrafo único, do CPC/2015 (art. 130, parte final, do CPC/1973), tendo em vista que o juiz é o destinatário das provas, a ele incumbe indeferir as diligências que entender inúteis ou meramente protelatórias. No caso em apreço, tendo em vista que a des-tinação dos valores descontados é irrelevante para aferir a existência de ato ilícito administrativo, bem como que os danos morais se presumem pela situação descrita nos autos, não padece de nulidade a sentença que indefere requerimento de depoimento pessoal do autor e oitiva de teste-munha. Preliminar de cerceamento de defesa rejeitada.

III – À luz da Súmula nº 85, do STJ, tem-se que se foi reconhecido o direito de fundo ao administrado em relação de trato sucessivo, o que prescreve são as prestações anteriores ao quinquênio da data em que ele ajuizou a ação. A sua interpretação a contrario sensu, por outro lado, conduz ao entendimento de que, se houver negativa do direito reclama-do pela Administração, passados os cinco anos do prazo prescricional para exercício da pretensão decorrente de sua violação, não prescrevem

Page 175: Nº 345 – Março 2018 · Revista SÍNTESE Trabalhista e Previdenciária Ano XXIX – nº 345 – MArço 2018 reposItórIo AutorIzAdo de JurIsprudêncIA Supremo Tribunal Federal

RST Nº 345 – Março/2018 – PARTE GERAL – JURISPRUDÊNCIA PREVIDENCIÁRIA – ACÓRDÃO NA ÍNTEGRA ......................................175

apenas as prestações vencidas, mas sim o próprio fundo do direito. Pres-crição parcial da pretensão autoral mantida.

IV – A responsabilidade civil da Administração Pública encontra guarida no art. 37, § 6º da Constituição Federal, sendo de natureza objetiva, à vis-ta da adoção do risco administrativo. Assim, para sua configuração, basta a demonstração de conduta administrativa, dano e nexo de causalidade entre ambos, sendo desnecessária perquirição de dolo ou culpa por parte do agente público que a praticou. Precedentes.

V – No caso, restou demonstrado que o INSS, apesar de instado judicial-mente a não realizar descontos a título de pensão alimentícia sobre os proventos de aposentadoria do autor, praticou tal conduta indevida ao longo de 14 (quatorze) anos, ensejando danos materiais ao autor.

VI – Quanto aos danos morais, tendo em vista que proventos de aposenta-doria possuem natureza evidentemente alimentar, o desconto de 40% de seu valor, condenou o autor e a sua família à míngua, sobretudo porque o total do benefício auferido era de um salário mínimo e o requerente era aposentado por invalidez, ou seja, impossibilitado de trabalhar. Ademais, a prolongada inércia administrativa em retificar a conduta indevida e sua renitência em cumprir decisão judicial para fazer cessar os descontos, justificam a imposição de indenização no valor de R$ 30.000,00 (trinta mil reais) no caso concreto.

VII – Agravo retido interposto pelo autor de que não se conhece. Remessa necessária, recurso de apelação do INSS e recurso adesivo do autor aos quais se nega provimento.

acórDão

Decide a Sexta Turma, por unanimidade, não conhecer do agravo retido interposto pelo autor, negar provimento à remessa necessária, ao apelo do INSS e ao recurso adesivo do autor.

Sexta Turma do TRF da 1ª Região – 11.09.2017.

Desembargador Federal Jirair Aram Meguerian Relator

relatório

O Exmo. Sr. Desembargador Federal Jirair Aram Meguerian (Relator):

Page 176: Nº 345 – Março 2018 · Revista SÍNTESE Trabalhista e Previdenciária Ano XXIX – nº 345 – MArço 2018 reposItórIo AutorIzAdo de JurIsprudêncIA Supremo Tribunal Federal

176 ..................................RST Nº 345 – Março/2018 – PARTE GERAL – JURISPRUDÊNCIA PREVIDENCIÁRIA – ACÓRDÃO NA ÍNTEGRA

Trata-se de remessa necessária, de recurso de apelação interposto pelo Instituto Nacional do Seguro Social – INSS e de recurso adesivo interposto por Antonio Pereira em face de sentença proferida pelo MM. Juiz Federal Substi-tuto em mutirão de auxílio à 2ª Vara Federal da Subseção Judiciária de Juiz de Fora/MG, fls. 344/352, que julgou parcialmente procedente o pedido, con-denando o INSS à restituição dos valores indevidamente descontados a título de pensão alimentícia do benefício previdenciário pago a Antonio Pereira entre 24.05.2002 a 01.09.2003, além de pagamento de indenização por danos mo-rais no valor de R$ 30.000,00 (trinta mil reais) e honorários advocatícios fixados no montante de 10% sobre o valor da condenação. Reconhecem, outrossim, a prescrição das parcelas anteriores a 24.05.2002.

2. Irresignado, o INSS apelou às fls. 358/368 sustentando que: a) prelimi-narmente, a sentença é nula por cerceamento de defesa, eis que a ré requereu produção prova consistente no depoimento pessoal do autor, diligência que foi indeferida por ocasião da prolação de sentença; b) a prova aludida é impres-cindível para a aferição da extensão dos danos morais supostamente sofridos pelo autor, nisso consistindo o prejuízo da ausência de sua produção; c) se os valores descontados do benefício previdenciário do autor foram empregados para o sustento de seus filhos, não haveria que se falar em abalo moral, mas em cumprimento de dever legal por parte do autor; d) quanto ao mérito, não há que se falar em dolo da autarquia no caso em apreço, não havendo fundamento legal para sua condenação; e) ainda que tenha havido conduta irregular da au-tarquia, o autor não demonstrou a ocorrência de danos morais; f) não demons-trada a ofensa à honra do autor, não há que se falar em indenização por danos morais; g) nesse caso, a responsabilidade civil estaria excluída porque o INSS agiu em exercício regular de um direito, não havendo que se falar na prática de ato ilícito, visto que os descontos foram efetivados em razão de ordem judicial; h) a indenização por danos morais deve ter em vista o período de sofrimen-to não acobertado pela prescrição, qual seja, de 24.05.2002 a 01.09.2003 e não os 14 anos de desconto indevido realizados no benefício previdenciário do autor, assim, se mantida tal condenação, deve seu valor ser reduzido para R$ 3.000,00 (três mil reais). Requer, ao final, reforma da sentença recorrida.

3. O autor, por sua vez, recorreu adesivamente às fls. 372/386 aduzindo que: a) faz jus à concessão de antecipação de tutela no que se refere à devo-lução dos valores indevidamente descontados de seu benefício previdenciário, até porque houve confissão da prática ilícita pela própria ré, além de tais va-lores possuírem natureza alimentar; b) por entendimento a contrario sensu da Súmula nº 85, STJ, diante da negativa reiterada do INSS em reconhecer o direito reclamado pelo autor, não há que se falar em prescrição de sua pretensão res-sarcitória. Requer, assim, reforma da sentença recorrida, a fim de que lhe seja concedida antecipação de tutela e afastamento da prescrição.

Page 177: Nº 345 – Março 2018 · Revista SÍNTESE Trabalhista e Previdenciária Ano XXIX – nº 345 – MArço 2018 reposItórIo AutorIzAdo de JurIsprudêncIA Supremo Tribunal Federal

RST Nº 345 – Março/2018 – PARTE GERAL – JURISPRUDÊNCIA PREVIDENCIÁRIA – ACÓRDÃO NA ÍNTEGRA ......................................177

4. O autor apresentou contrarrazões às fls. 379/386.

5. O INSS contrarrazoou o feito às fls. 393/396.

É o relatório.

Desembargador Federal Jirair Aram Meguerian Relator

voto1

O Exmo. Sr. Desembargador Federal Jirair Aram Meguerian (Relator):

Inicialmente, deixo de conhecer do agravo retido interposto pelo autor às fls. 290/292 quanto à remessa do feito a uma das varas de competência geral, por ausência de reiteração por ocasião de interposição de recurso de apelação, descumprido, dessa maneira, o requisito exigido pelo art. 523, § 1º, do CPC/1973.

2. Em sede preliminar, compulsando os autos, tem-se que o autor pre-tendeu ressarcimento de valores que foram descontados indevidamente de seu benefício previdenciário de aposentadoria por invalidez, a título de pensão ali-mentícia, entre 1989 e 2003, apesar de o INSS ter sido notificado judicialmente a cessar tais descontos. Além disso, requereu também indenização por danos morais, visto que a conduta descrita afetou-lhe direitos da personalidade, tendo influído diretamente em seu sustento e no de sua família.

3. A sentença recorrida reconheceu a conduta indevida praticada pelo INSS, que, apesar de notificado judicialmente a não proceder aos descontos aludidos, continuou perpetrando-os por longo período de tempo. No entanto, o magistrado de primeiro grau entendeu que parte da pretensão autoral estaria acobertada pela prescrição, reconhecido o direito a ressarcimento ao autor ape-nas do que foi descontado entre 24.05.2002 e 01.09.2003.

4. Além disso, o magistrado de primeiro grau também condenou o INSS ao pagamento de indenização por danos morais no valor de R$ 30.000,00 (trin-ta mil reais), tendo em vista que houve expedição de diversos ofícios judiciais para que a autarquia cessasse os descontos, demorando mais de 14 (quatorze) anos para se obedecer ao comando judicial, o que configuraria dano moral in re ipsa.

5. Em seu recurso de apelação, o INSS aduz cerceamento de defesa em razão do indeferimento de seu pedido de depoimento pessoal do autor e da oitiva de sua ex-esposa, que teria recebido os valores descontados do benefício

1 Participaram do Julgamento o Exmo. Sr. Desembargador Federal Kassio Nunes Marques e o Exmo. Sr. Desem-bargador Federal Daniel Paes Ribeiro.

Page 178: Nº 345 – Março 2018 · Revista SÍNTESE Trabalhista e Previdenciária Ano XXIX – nº 345 – MArço 2018 reposItórIo AutorIzAdo de JurIsprudêncIA Supremo Tribunal Federal

178 ..................................RST Nº 345 – Março/2018 – PARTE GERAL – JURISPRUDÊNCIA PREVIDENCIÁRIA – ACÓRDÃO NA ÍNTEGRA

previdenciário do autor, com o consequente julgamento antecipado da lide, o que lhe teria ocasionado prejuízo, conduzindo à nulidade da sentença recorri-da, visto que tal diligência probatória seria essencial a examinar a existência de danos morais, bem como sua extensão.

6. In casu, entendo que o magistrado bem procedeu ao indeferir a dila-ção probatória requerida pelo INSS. Conforme dispõe o art. 370, parágrafo úni-co, do CPC/2015 (art. 130, parte final, do CPC/1973), tendo em vista que o juiz é o destinatário das provas, a ele incumbe indeferir as diligências que entender inúteis ou meramente protelatórias.

7. No caso, como foi reconhecida a existência de danos morais objetivos, ou seja, in re ipsa, desnecessária a oitiva do autor para aferir a violação a seu direito da personalidade. Em se tratando de desconto realizado indevidamente sobre parcela de natureza evidentemente alimentar, tem-se que a violação a direito da personalidade, consistente no sustento, é presumida, dispensando a realização de outras provas.

8. Quanto à oitiva de sua ex-esposa, igualmente se mostraria irrelevante nos presentes autos. Isso porque, os documentos de fls. 177/221 e 225/273 de-monstram que ela efetivamente recebeu os valores descontados. Se eram eles destinados ou não ao sustento dos filhos do autor isso é irrelevante para o feito, já que não poderiam ter sido realizados, ainda que fosse essa a sua finalidade, à míngua de determinação judicial nesse sentido.

9. Em outros termos, quem deve definir se o genitor tem ou não obriga-ção de prestar alimentos a seus filhos é o juízo da vara de família e não o INSS; portanto, ainda que tais repasses efetivamente ocorressem, tal não teria o con-dão de abrandar a ilicitude da conduta perpetrada pela autarquia-ré.

10. Em suma, andou bem o magistrado de primeiro grau ao indeferir as diligências probatórias requeridas pelo INSS visto que não influenciariam no deslinde do feito, não havendo, dessa forma nulidade a macular a sentença recorrida.

11. Em sede prejudicial de mérito, aduz o autor que sua pretensão não estaria colhida pela prescrição em nenhuma medida, por interpretação a con-trario sensu da Súmula nº 85, do STJ, ressaltando que houve negativa reiterada por parte do INSS em reconhecer o direito do autor e que por isso não haveria incidência de prescrição.

12. O Enunciado nº 85 da Súmula de Jurisprudência do C. STJ assim dis-põe: “Nas relações jurídicas de trato sucessivo em que a fazenda publica figure como devedora, quando não tiver sido negado o próprio direito reclamado, a prescrição atinge apenas as prestações vencidas antes do quinquênio anterior a propositura da ação.”

Page 179: Nº 345 – Março 2018 · Revista SÍNTESE Trabalhista e Previdenciária Ano XXIX – nº 345 – MArço 2018 reposItórIo AutorIzAdo de JurIsprudêncIA Supremo Tribunal Federal

RST Nº 345 – Março/2018 – PARTE GERAL – JURISPRUDÊNCIA PREVIDENCIÁRIA – ACÓRDÃO NA ÍNTEGRA ......................................179

13. Inicialmente, a prescrição, no que concerne às pretensões em face da Fazenda Pública rege-se pelo disposto no art. 1º, do Decreto nº 20.910/1932, sendo quinquenal.

14. No caso em apreço, o autor pretendeu o ressarcimento de valores indevidamente descontados de sua aposentadoria pelo INSS. Assim, tem-se que a prescrição, na espécie, incide individualmente sobre cada parcela descon-tada, visto que a cada desconto houve a prática de um ato ilícito distinto pela Administração Pública.

15. Dessa forma, considerando individualmente os descontos efetivados, e tendo como parâmetro o prazo quinquenal para cobrar o seu ressarcimento, ajuizada a presente demanda em 24.05.2007, tem-se que os valores descon-tados anteriormente a 24.05.2002 encontram-se acobertados pela prescrição. Ademais, sustado o desconto no próprio ano de 1986, fl. 39, apesar de efetuado todo mês, ficou inerte o autor até 2003, fl. 43, não tendo interrompido o decur-so do prazo prescricional.

16. À luz do que dispõe o enunciado sumular supra, tem-se que se foi reconhecido o direito de fundo do administrado, o que prescreve são as presta-ções anteriores ao quinquênio da data em que ele ajuizou a ação.

17. Em verdade, a interpretação a contrario sensu da súmula anterior-mente enunciada conduz a entendimento diverso do pretendido pelo autor. É que, se houver negativa do direito reclamado pela Administração, passados os cinco anos do prazo prescricional para exercício de pretensão em decorrência de sua violação, não prescrevem apenas as prestações vencidas, mas sim o próprio fundo do direito.

18. Assim, tem-se que a sentença manteve-se correta no ponto, não me-recendo reparos.

19. Quanto ao mérito, tem-se que a responsabilidade civil da Adminis-tração Pública encontra guarida no art. 37, § 6º da Constituição Federal, sendo de natureza objetiva, à vista da adoção do risco administrativo. Assim, para sua configuração, basta a demonstração de conduta administrativa, dano e nexo de causalidade entre ambos, sendo desnecessária perquirição de dolo ou culpa por parte do agente público que a praticou. Nesse sentido:

APELAÇÃO CÍVEL – UNIÃO – AUTOR – ACIDENTE DURANTE A REALIZAÇÃO DE VIGILÂNCIA – READAPTAÇÃO EM SERVIÇO INCOMPATÍVEL COM OS PROBLEMAS DE SAÚDE DO AUTOR – OMISSÃO ADMINISTRATIVA – CONFI-GURAÇÃO – EXISTÊNCIA DE CULPA CONCORRENTE, JÁ QUE A VIGILÂNCIA ERA REALIZADA DE MOTOCICLETA, SEM USO DE CAPACETE – SEQUELAS FÍSICAS – CONCESSÃO PARCIAL DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS – ELEVAÇÃO DA QUANTIA ARBITRADA EM RAZÃO DOS PARÂMETROS JU-RISPRUDENCIAIS – DANOS MATERIAIS – AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO ES-PECÍFICA – SENTENÇA PARCIALMENTE REFORMADA – I – A responsabilidade

Page 180: Nº 345 – Março 2018 · Revista SÍNTESE Trabalhista e Previdenciária Ano XXIX – nº 345 – MArço 2018 reposItórIo AutorIzAdo de JurIsprudêncIA Supremo Tribunal Federal

180 ..................................RST Nº 345 – Março/2018 – PARTE GERAL – JURISPRUDÊNCIA PREVIDENCIÁRIA – ACÓRDÃO NA ÍNTEGRA

civil da Administração Pública encontra amparo no art. 37, § 6º da Constituição Federal, sendo de natureza objetiva, em razão da adoção da teoria do risco ad-ministrativo. Por tais razões, a fim de que se concretize o dever de indenizar, impende ao administrado, servidor público ou não, demonstrar a existência de conduta por parte de agente público, dano e nexo de causalidade entre ambos. Precedentes. II – No que diz respeito a eventuais condutas omissivas do ente pú-blico, prevalece na jurisprudência pátria que a responsabilidade da Administra-ção Pública é de natureza subjetiva, sendo necessária a demonstração de culpa administrativa. Esta, por sua vez, consiste no que se chama de “falta do serviço”, ou seja, apesar de o órgão público estar ciente de suas atribuições, mantém--se inerte, de maneira a causar prejuízos a seus administrados. Precedentes. III – Caso em que o autor foi readaptado em função incompatível com seu estado de saúde (portador de doença cardíaca grave), tendo de realizar vigilância a pé em área de 3.000m². Em razão da incapacidade física de realizar tal tarefa, utili-zava-se de motocicleta, vindo a desmaiar, cair, bater a cabeça e a sofrer sequelas físicas (perda da visão do olho direito, fratura na clavícula direita, traumatismo crânio-encefálico e epilepsia), que ocasionaram sua precoce aposentadoria por invalidez. IV – Existência de culpa concorrente do autor, eis que no momento do acidente não se utilizava de capacete. V – Indenização por danos morais elevada para R$ 25.000,00 (vinte e cinco mil reais), à vista do direito de indenização parcial e dos parâmetros jurisprudenciais desta E. Corte, no que diz respeito a acidentes que causem violação à integridade física e danos à saúde. Precedentes. VI – Tendo em vista a não comprovação dos gastos efetivados com realização de procedimentos médicos, incabível a reparação por danos materiais. VII – Recurso de apelação da União a que se nega provimento. Recurso de apelação do autor a que se dá parcial provimento (item V).”

(AC 0002613-34.2006.4.01.4101/RO, Rel. Des. Fed. Jirair Aram Meguerian, Relª Conv. Juíza Fed. Maria da Penha Gomes Fontenele Meneses (Conv.), 6ª T., e-DJF1 de 30.06.2017) (Grifei)

“APELAÇÃO CÍVEL – UNIÃO – NEGATIVA DE REGISTRO DE CANDIDATURA – DUPLA FILIAÇÃO DECORRENTE DE EQUÍVOCO ADMINISTRATIVO – ATO ILÍCITO – CONFIGURAÇÃO – DANOS MORAIS – OCORRÊNCIA – NEXO DE CAUSALIDADE – ADMISSÃO POR DECISÃO DO PRÓPRIO TRE – RESPONSABI-LIDADE CIVIL DA ADMINISTRAÇÃO – EXISTÊNCIA – VALOR – MODICIDADE – SENTENÇA MANTIDA – I – A Administração Pública responde objetivamente pelos atos praticados por seus agentes, nos termos do art. 37, § 6º da Constituição Federal, adotada a teoria do risco administrativo, de maneira que, para configu-ração do dever de indenizar cumpre ao ofendido apenas a demonstração da con-duta ilícita perpetrada, do dano e do nexo de causalidade entre ambos. Preceden-tes. II – Caso em que restou cabalmente demonstrado nos autos que, apesar de a parte autora ter procedido regularmente ao pedido de desfiliação partidária para posterior filiação em outra agremiação política, tal alteração de sua situação não foi modificada cadastralmente a contento pela Justiça Eleitoral, o que ocasionou o cancelamento de ambas as inscrições, impossibilitando seu registro de candi-datura em momento posterior. III – Os danos morais são aqueles que decorrem de violação a direitos da personalidade, ínsitos à dignidade da pessoa humana,

Page 181: Nº 345 – Março 2018 · Revista SÍNTESE Trabalhista e Previdenciária Ano XXIX – nº 345 – MArço 2018 reposItórIo AutorIzAdo de JurIsprudêncIA Supremo Tribunal Federal

RST Nº 345 – Março/2018 – PARTE GERAL – JURISPRUDÊNCIA PREVIDENCIÁRIA – ACÓRDÃO NA ÍNTEGRA ......................................181

a exemplo da honra, boa fama, integridade psíquica, saúde, entre outros. IV – O impedimento de exercício de direitos políticos, combinado à desconfiança gerada por possível inidoneidade advinda do indeferimento de registro de can-didatura, viola a honra e a boa fama, sendo hábil a ocasionar danos de ordem moral. Precedente. V – Indenização por danos morais fixada em R$ 10.000,00 (dez mil reais) que se mostra até mesmo modesta em face da situação descrita nos autos, mas mantida à míngua de impugnação da parte autora. VI – Nos termos do art. 333, II, CPC/1973 (art. 373, II, CPC/2015), incumbe ao réu a alegação de cul-pa exclusiva da autora, já que se trata de fato impeditivo de seu direito. A União não logrou desincumbir-se do referido ônus, vez que demonstrado nos autos que a parte autora tentou por mais de uma ocasião sanar administrativamente o vício existente em sua filiação partidária, embora fosse este exclusivamente decorrente de ato administrativo praticado pela Justiça Eleitoral. VII – Recurso de apelação da União a que se nega provimento.”

(AC 0001847-14.2006.4.01.3702/MA, Rel. Des. Fed. Jirair Aram Meguerian, 6ª T., e-DJF1 de 02.06.2017)

20. No caso em apreço, restou patente o descumprimento de ordem judi-cial pelo INSS em inúmeras oportunidades, realizando durante 14 anos descon-tos indevidos a título de pensão alimentícia sobre o benefício previdenciário de aposentadoria do autor, apesar de instado em mais de uma ocasião a cessá-los.

21. In casu, tem-se que a sua ex-esposa do autor ingressou com ação de alimentos em 14.08.1986 (fl. 22), tendo obtido decisão liminar favorável em 15.08.1986 (fl. 32). Conforme fls. 33/34, houve expedição do Ofício nº 5240 em 20.08.1986, determinando o cumprimento da decisão.

22. À fl. 37, houve pedido de desistência da ação, em 01.09.1986. À fl. 39, depois de analisado o pedido pelo magistrado, foi emitido novo ofício pelo Juízo à Agência de Previdência Social para cancelar os descontos determi-nados, em 03.09.1986.

23. O processo de alimentos, por sua vez, foi extinto com homologação da desistência em 04.09.1986 (fl. 41). Adicionalmente, à fl. 42, consta Ofício nº 411-020.0/544/86, da Agência de Previdência Social em Juiz de Fora dando conta do cumprimento da determinação judicial, esclarecendo que ainda não havia sido realizado qualquer desconto no benefício previdenciário do autor, datado de 22.12.1986.

23. Assim, tem-se que todos os descontos realizados a título de pensão alimentícia sobre o benefício previdenciário do autor foram indevidos, consti-tuindo ato ilícito administrativo, visto que não possuíam qualquer embasamen-to judicial.

24. O dano material, evidentemente, consiste nos valores indevidamente descontados, mas que, em virtude da incidência de prescrição, só podem ser

Page 182: Nº 345 – Março 2018 · Revista SÍNTESE Trabalhista e Previdenciária Ano XXIX – nº 345 – MArço 2018 reposItórIo AutorIzAdo de JurIsprudêncIA Supremo Tribunal Federal

182 ..................................RST Nº 345 – Março/2018 – PARTE GERAL – JURISPRUDÊNCIA PREVIDENCIÁRIA – ACÓRDÃO NA ÍNTEGRA

considerados os descontos ocorridos entre 24.05.2002 e 01.09.2003, conforme fls. 76-verso e 81.

25. Se tais quantias foram pagas a terceiro ou se elas foram destinadas ou não aos filhos do autor isso é irrelevante, não abrandando a prática do ato admi-nistrativo indevido pela ré, sendo apenas importante em uma eventual ação de ressarcimento a ser por ela manejada em face dos indevidamente beneficiados.

26. Ademais, como já dito anteriormente, quem tem a incumbência de determinar a prestação de alimentos pelo genitor é o Poder Judiciário e não o INSS, não podendo a autarquia em questão atuar de maneira arredia à ordem judicial, posto que ilegal a adoção de tal conduta.

27. Os danos morais, por sua vez, são presumíveis no caso em apreço. Primeiramente, os danos extrapatrimoniais decorrem de violação a direitos da personalidade, tais como a honra, a boa fama, a integridade física e psíquica, entre tantos outros ínsitos à dignidade da pessoa humana.

28. Pois bem, no caso em apreço, o autor é aposentado por invalidez, auferindo a título de benefício previdenciário um salário mínimo. Assim, tem--se que o desconto indevido de quantia equivalente a 40% de tais rendimentos golpeia de maneira profunda seu meio de sustento, donde se pode concluir pela vulneração de seu direito da personalidade, com comprometimento de sua dignidade, situação esta que dispensa outras provas, sendo suficientes as já encartadas aos autos, onde se nota a pequena quantia por ele recebida ante os descontos indevidamente realizados.

29. No que concerne ao montante indenizatório, estipulado pelo magis-trado de primeiro grau em R$ 30.000,00 (trinta mil reais), vislumbro tratar-se de quantia justa e adequada à violação sofrida pelo autor.

30. Isso porque, os descontos indevidos ocorreram por 14 anos, ou seja, por um longo período de tempo. E resta evidente que uma pessoa que aufere a título de rendimentos 60% de um salário mínimo por mês, tendo ainda de sustentar sua família, não teria condições de buscar guarida de suas pretensões junto ao Poder Judiciário, sendo a inércia do autor não apenas fruto de desídia, mas muito provavelmente de falta de condições econômicas de acesso à justiça.

31. Ademais, a prescrição não justifica a inércia da Administração em exercer seu poder de autotutela e retificar os atos administrativos ilícitos por ela praticados, ressaltando-se, inclusive, que no caso em apreço houve pedidos reiterados para que a tal se desse, conforme se nota dos ofícios colacionados às fls. 49/50, em que instada a justificar os descontos, a recorrente dizia que os es-tava fazendo, mas não que não possuía cópia da decisão judicial que os deter-minava (fl. 51), justamente porque tal ordem já havia sido revogada; novamen-te, às fl. 55, foi encaminhado ofício ao INSS, para fazer cessar os descontos, no entanto, em vez de cumpri-lo, quedou-se a informar que os estava realizando

Page 183: Nº 345 – Março 2018 · Revista SÍNTESE Trabalhista e Previdenciária Ano XXIX – nº 345 – MArço 2018 reposItórIo AutorIzAdo de JurIsprudêncIA Supremo Tribunal Federal

RST Nº 345 – Março/2018 – PARTE GERAL – JURISPRUDÊNCIA PREVIDENCIÁRIA – ACÓRDÃO NA ÍNTEGRA ......................................183

em benefício da ex-mulher do autor. Daí porque não assistir razão ao INSS no que diz respeito à redução do montante fixado.

32. Em verdade, a fixação da indenização por danos morais deve levar em consideração inúmeros fatores, tais como as condições socioeconômicas do ofendido e do ofensor, o grau de instrução, as consequências do dano, os bens jurídicos vulnerados, entre tantos outros.

33. A quantia estipulada, ainda, não deve ser excessiva, sob pena de cau-sar enriquecimento indevido, nem irrisória, sob pena de nada reparar e ainda incentivar a prática de comportamentos deletérios por parte do ofensor.

34. Por fim, não se pode descurar de parâmetros jurisprudenciais, a fim de se preservar a segurança jurídica e a isonomia.

35. Considerando todos os requisitos aludidos, bem como as circunstân-cias do caso concreto já declinadas, em especial, o grande valor, em termos proporcionais, dos descontos efetivados sobre o benefício previdenciário do autor, bem como sua longa duração e a renitência do INSS em cumprir a deci-são judicial de fazer cessá-los, deve ser mantida a quantia indenizatória fixada em R$ 30.000,00 (trinta mil reais).

36. No que diz respeito à antecipação dos efeitos da tutela pretendi-da, incabível na espécie. Isso porque, ainda que presente o fumus boni iuris, com a confirmação da sentença na presente instância, não resta evidenciado periculum in mora, já que o INSS, teoricamente, é solvente e o que pretende o autor é o ressarcimento do que lhe foi descontado em 2002 e 2003, ou seja, há muitos anos, inclusive, entre 5 e 4 anos antes do ajuizamento da ação. Em verdade, sua pretensão, quanto a tal pedido, confunde-se com cumprimento provisório de sentença, não sendo o presente recurso o meio adequado para tal pretensão.

Pelo exposto, deixo de conhecer do agravo retido interposto pelo autor, nego provimento à remessa necessária, ao apelo do INSS e ao recurso adesivo do autor.

É como voto.

Desembargador Federal Jirair Aram Meguerian Relator

Page 184: Nº 345 – Março 2018 · Revista SÍNTESE Trabalhista e Previdenciária Ano XXIX – nº 345 – MArço 2018 reposItórIo AutorIzAdo de JurIsprudêncIA Supremo Tribunal Federal

Parte Geral – Jurisprudência Previdenciária – Acórdão na Íntegra

34823

Tribunal Regional Federal da 2ª RegiãoApelação Cível – Turma Espec. III – Administrativo e CívelNº CNJ: 0002817‑50.2009.4.02.5102 (2009.51.02.002817‑0)Relator: Desembargador Federal Ricardo PerlingeiroApelante: INSS – Instituto Nacional do Seguro Social e OutrosProcurador: Procurador Federal e outrosApelado: Os mesmosOrigem: 03ª Vara Federal de Niterói (00028175020094025102)

ementa

APELAÇÃO – ADMINISTRATIVO – RESPONSABILIDADE CIVIL – AÇÃO REGRESSIVA – INSS – ACIDENTE DE TRABALHO – ART. 120 DA LEI Nº 8.213/1991 – LAUDO PERICIAL – NEGLIGÊNCIA DO EMPREGADOR CONFIGURADA

1. Apelações interpostas em face de sentença proferida pelo Juízo da 3ª Vara Federal de Niterói, de fls. 288/298 que julgou parcialmente proce-dente o pedido veiculado na exordial, para condenar, solidariamente, as Empresas (i) “a pagar ao INSS os valores despendidos até a presen-te data em razão do benefício previdenciário NB 146.908.238-9, desde 01.07.2008 [...] corrigidos monetariamente de acordo com os índices aprovados pelo CJF e com juros de mora de 1% ao mês a contar da cita-ção” e (ii) a pagar ao INSS os valores, “relativos às parcelas vincendas do benefício previdenciário NB 146.908.238-9, durante toda a sua duração, que deverão ser efetuados até o dia 15 (quinze) do mês seguinte ao paga-mento pela Autarquia”, cabendo ao INSS informar e “comprovar às Rés, até o último dia útil do mês em que for pago o benefício, o respectivo valor despendido”.

2. Caso em análise diz respeito à Ação regressiva acidentária, em sede ordinária, por meio da qual o INSS objetivava o ressarcimento por gastos correspondentes a parcelas vencidas e vincendas decorrentes da conces-são do benefício previdenciário de pensão por morte à viúva de segurado falecido, enquanto se encontrava prestando atividades laborativas junto às Empresas demandadas.

3. A ação regressiva proposta pelo INSS encontra previsão legal nos arts. 120 e 121 da Lei nº 8.213/1991 e é instrumento que possui dupla finalidade, pois, ao mesmo tempo em que possui caráter ressarcitório buscando devolver aos cofres públicos o valor gasto com o pagamento

Page 185: Nº 345 – Março 2018 · Revista SÍNTESE Trabalhista e Previdenciária Ano XXIX – nº 345 – MArço 2018 reposItórIo AutorIzAdo de JurIsprudêncIA Supremo Tribunal Federal

RST Nº 345 – Março/2018 – PARTE GERAL – JURISPRUDÊNCIA PREVIDENCIÁRIA – ACÓRDÃO NA ÍNTEGRA ......................................185

de benefícios previdenciários, concedidos em razão da negligência das empresas empregadoras em relação às normas de segurança do trabalho – possui caráter pedagógico/preventivo – visando adequar a empresa in-fratora aos padrões de segurança, para que sejam evitados novos aciden-tes. (TRF 2ª R., 5ª T.Esp., AC 012705268.2014.4.02.5117, Rel. Des. Fed. Aluisio Gonçalves de Castro Mendes, e-DJF2R 07.08.2017)

4. Cabe ressaltar que eventual responsabilidade do empregador em casos semelhantes ao dos autos tem como fundamento a repartição do risco so-cial, haja vista que os danos gerados pela conduta culposa do emprega-dor ao INSS, decorrentes de acidentes do trabalho, não devem ser supor-tados por toda a sociedade, por se tratar de conduta ilícita da empresa, que não observou as medidas de proteção à segurança do trabalhador. (TRF 2ª R., 5ª T.Esp., AC 0005720-56.2012.4.02.5101, Rel. Des. Fed. Aluisio Gonçalves de Castro Mendes, e-DJF2R 18.02.2014)

5. Nesse contexto, a procedência do pleito de regresso, formulado na forma do art. 120 da Lei nº 8.213/1991, pressupõe ação dolosa ou ne-gligência por parte das empresas demandadas, tendo em vista que o INSS somente atua na qualidade de segurador quando o sinistro decor-rer de caso fortuito ou força maior. (TRF 2ª R., 5ª T.Esp., AC 0100559-79.2012.4.02.5002, e-DJF2R 25.04.2017)

6. Caso em que ficou configurado que o acidente do segurado decorreu da ausência de distribuição de equipamentos de proteção, não se cogi-tando de atuação negligente do próprio ou de terceiros. Nesse sentido: TRF 2ª R., 7ª T.Esp., AC 200750010109240, Rel. Des. Fed. Reis Friede, e-DJF2R 12.11.2013; TRF 2ª R., 8ª T.Esp., AC 200950010000408, Rel. Des. Fed. Poul Erik Dyrlund, e-DJF2R 20.04.2010.

7. Descabe a aplicação do art. 475-Q, CPC/1973, equivalente ao atual art. 533, CPC/2015, ainda que por analogia, porquanto o dispositivo le-gal em comento se refere às prestações de natureza alimentar, com o ob-jetivo de assegurar que o alimentando não fique desprovido da parcela. No caso em análise, o pedido formulado na exordial objetiva apenas o ressarcimento de prestações pagas pelo INSS à viúva da vítima. Prece-dentes: STJ, 2ª T., AgRg-REsp 1.332.079, Rel. Min. Humberto Martins, DJe 01.03.2013; STJ, 2ª T., AgRg-REsp 1.347.352, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, DJe 12.12.2012; TRF 2ª R., 6ª T.Esp., AC 0011558-23.2011.4.02.5001, Rel. Des. Fed. Marcelo Pereira da Silva, e-DJF2R 15.02.2017; TRF 2ª R., 7ª T.Esp., AC 00035791020114025001, Rel. Des. Fed. Luiz Paulo da Silva Araújo, e-DJF2R 17.05.2016.

8. Havendo cumulação simples de pedidos e tendo o litigante sucumbido em um dos pedidos, todavia, ainda que no contexto da demanda seja de

Page 186: Nº 345 – Março 2018 · Revista SÍNTESE Trabalhista e Previdenciária Ano XXIX – nº 345 – MArço 2018 reposItórIo AutorIzAdo de JurIsprudêncIA Supremo Tribunal Federal

186 ..................................RST Nº 345 – Março/2018 – PARTE GERAL – JURISPRUDÊNCIA PREVIDENCIÁRIA – ACÓRDÃO NA ÍNTEGRA

menor monta, responde pelas despesas proporcionalmente (STJ, 5ª T., AgRg-REsp 893.649/RS, Rel. Min. Gilson Dipp, DJ 11.06.2007).

9. Apelação do INSS parcialmente provida. Apelações das demandadas não providas.

acórDão

Vistos, relatados e discutidos estes autos, em que são partes as acima indicadas, decide a 5ª Turma Especializada do Tribunal Regional Federal da 2ª Região, por unanimidade, negar provimento às Apelações de Offshore Reparos Navais Ltda. e Sealion Navegação do Brasil Ltda. e dar parcial provimento à Apelação do INSS, na forma do relatório e do voto constantes dos autos, que ficam fazendo parte do presente julgado.

Rio de Janeiro, 30 de janeiro de 2018.

Ricardo Perlingeiro Desembargador Federal

relatório

Trata-se de Apelações interpostas por Offshore Reparos Navais Ltda., pri-meira apelante, Sealion Navegação do Brasil Ltda., segunda apelante e Institu-to Nacional do Seguro Social – INSS, terceiro Apelante, em face de sentença proferida pelo Juízo da 3ª Vara Federal de Niterói, de fls. 288/298 que julgou parcialmente procedente o pedido veiculado na exordial, para condenar, soli-dariamente, Offshore Reparos Navais Ltda. e Sealion do Brasil Navegação Ltda. (i) “a pagar ao INSS os valores despendidos até a presente data em razão do benefício previdenciário NB 146.908.238-9, desde 01.07.2008 [...] corrigidos monetariamente de acordo com os índices aprovados pelo CJF e com juros de mora de 1% ao mês a contar da citação” e (ii) a pagar ao INSS os valores, “re-lativos às parcelas vincendas do benefício previdenciário NB 146.908.238-9, durante toda a sua duração, que deverão ser efetuados até o dia 15 (quinze) do mês seguinte ao pagamento pela Autarquia”, cabendo ao INSS “informar e comprovar às Rés, até o último dia útil do mês em que for pago o benefício, o respectivo valor despendido”.

Em suas razões recursais, às fls. 309/334, Offshore Reparos Navais Ltda., primeira apelante, sustenta, em síntese, que (i) “para a realização dos serviços não era necessária a utilização de cinto de segurança”; (ii) a primeira Recorrente observou todas as exigências e normas de segurança e proteção do trabalho; (iii) a primeira Apelante não concorreu com qualquer grau de culpa no infeliz

Page 187: Nº 345 – Março 2018 · Revista SÍNTESE Trabalhista e Previdenciária Ano XXIX – nº 345 – MArço 2018 reposItórIo AutorIzAdo de JurIsprudêncIA Supremo Tribunal Federal

RST Nº 345 – Março/2018 – PARTE GERAL – JURISPRUDÊNCIA PREVIDENCIÁRIA – ACÓRDÃO NA ÍNTEGRA ......................................187

acidente, pois “este deu-se por caso fortuito, veraz fatalidade, não concorrendo a recorrente por omissão ou por ação com o mesmo”.

A seu turno, a segunda apelante, Sealion Navegação do Brasil Ltda., às fls. 337/346, aduz que (i) não houve ingerência alguma da segunda Recorrente nos serviços prestados pela primeira Apelante, cabendo “a esta a execução total dos serviços sob a sua conta e risco” e (ii) não houve o preenchimento do requi-sito previsto no art. 120 da Lei nº 8.213/1991.

Com efeito, o INSS, terceiro Apelante, sustenta, em suas razões recursais, às fls. 350/361, que (i) deve ser deferida a constituição do capital, (ii) Offshore Reparos Navais Ltda. e Sealion Navegação do Brasil Ltda. devem ser condena-dos em honorários advocatícios. Ademais, (iii) deve ser assegurado o pagamen-to das parcelas vencidas até o julgamento definitivo da lide.

Contrarrazões de Offshore Reparos Navais Ltda. à Apelação de Sealion Navegação do Brasil Ltda., às fls. 364/367.

Contrarrazões de Offshore Reparos Navais Ltda. à Apelação do INSS, às fls. 369/373.

Contrarrazões de Sealion Navegação do Brasil Ltda. à Apelação do INSS, às fls. 375/382.

Contrarrazões do INSS, às fls. 384/388, às Apelações de Offshore Repa-ros Navais Ltda. e Sealion Navegação do Brasil Ltda.

O Ministério Público Federal não vê interesse público que justifique a sua intervenção no feito (fls. 393/397).

É o relatório. Peço dia para julgamento.

Ricardo Perlingeiro Desembargador Federal

voto

O Exmo. Sr. Desembargador Federal Ricardo Perlingeiro (Relator)

Conforme relatado, cuida-se de Apelações interpostas por Offshore Re-paros Navais Ltda., primeira apelante, Sealion Navegação do Brasil Ltda., se-gunda apelante e Instituto Nacional do Seguro Social – INSS, terceiro Apelante, em face de sentença proferida pelo Juízo da 3ª Vara Federal de Niterói, de fls. 288/298 que julgou parcialmente procedente o pedido veiculado na exor-dial, para condenar, solidariamente, Offshore Reparos Navais Ltda. e Sealion do Brasil Navegação Ltda., (i) “a pagar ao INSS os valores despendidos até a presente data em razão do benefício previdenciário NB 146.908.238-9, desde

Page 188: Nº 345 – Março 2018 · Revista SÍNTESE Trabalhista e Previdenciária Ano XXIX – nº 345 – MArço 2018 reposItórIo AutorIzAdo de JurIsprudêncIA Supremo Tribunal Federal

188 ..................................RST Nº 345 – Março/2018 – PARTE GERAL – JURISPRUDÊNCIA PREVIDENCIÁRIA – ACÓRDÃO NA ÍNTEGRA

01.07.2008 [...] corrigidos monetariamente de acordo com os índices aprova-dos pelo CJF e com juros de mora de 1% ao mês a contar da citação” e (ii) a pagar ao INSS os valores, “relativos às parcelas vincendas do benefício pre-videnciário NB 146.908.238-9, durante toda a sua duração, que deverão ser efetuados até o dia 15 (quinze) do mês seguinte ao pagamento pela Autarquia”, cabendo ao INSS “informar e comprovar às Rés, até o último dia útil do mês em que for pago o benefício, o respectivo valor despendido.”

Em suas razões recursais, às fls. 309/334, Offshore Reparos Navais Ltda., primeira apelante, sustenta, em síntese, que (i) “para a realização dos serviços não era necessária a utilização de cinto de segurança”; (ii) a primeira Recorrente observou todas as exigências e normas de segurança e proteção do trabalho; (iii) a primeira Apelante não concorreu com qualquer grau de culpa no infeliz acidente, pois “este deu-se por caso fortuito, veraz fatalidade, não concorrendo a recorrente por omissão ou por ação com o mesmo”.

A seu turno, a segunda apelante, Sealion Navegação do Brasil Ltda., às fls. 337/346, aduz que (i) não houve ingerência alguma da segunda Recorrente nos serviços prestados pela primeira Apelante, cabendo “a esta a execução total dos serviços sob a sua conta e risco” e (ii) não houve o preenchimento do requi-sito previsto no art. 120 da Lei nº 8.213/1991.

Com efeito, o INSS, terceiro Apelante, defende, em suas razões recursais, às fls. 350/361, que (i) deve ser deferida a constituição do capital, (ii) Offshore Reparos Navais Ltda. e Sealion Navegação do Brasil Ltda. devem ser condena-dos em honorários advocatícios. Ademais, (iii) deve ser assegurado o pagamen-to das parcelas vencidas até o julgamento definitivo da lide.

Contrarrazões de Offshore Reparos Navais Ltda. à Apelação de Sealion Navegação do Brasil Ltda., às fls. 364/367, alegando, em síntese, que para a realização dos serviços não era necessária a utilização de cinto de segurança, “pois a vítima não trabalhava em altura”, não concorrendo a primeira Apelante com “qualquer grau de culpa no infeliz acidente”.

Contrarrazões de Offshore Reparos Navais Ltda. à Apelação do INSS, às fls. 369/373, aduzindo que não é aplicável o art. 475-Q uma vez que o caso diz respeito à parcela previdenciária, não alimentar.

Contrarrazões de Sealion Navegação do Brasil Ltda. à Apelação do INSS, às fls. 375/382, defendendo que não se aplica o capital garantidor, na forma do art. 475-Q, por não se tratar “a hipótese dos autos de verbas alimentícias”.

Contrarrazões do INSS, às fls. 384/388, às Apelações de Offshore Repa-ros Navais Ltda. e Sealion Navegação do Brasil Ltda., sustentando que o polo passivo das ações regressivas acidentárias deve ser composto pelos “responsá-veis” pelo descumprimento das normas de saúde e segurança do trabalho, o

Page 189: Nº 345 – Março 2018 · Revista SÍNTESE Trabalhista e Previdenciária Ano XXIX – nº 345 – MArço 2018 reposItórIo AutorIzAdo de JurIsprudêncIA Supremo Tribunal Federal

RST Nº 345 – Março/2018 – PARTE GERAL – JURISPRUDÊNCIA PREVIDENCIÁRIA – ACÓRDÃO NA ÍNTEGRA ......................................189

que inclui tanto a Offshore Reparos Navais Ltda., quanto à Sealion Navegação do Brasil Ltda.

O Ministério Público Federal não vê interesse público que justifique a sua intervenção no feito (fls. 393/397).

Por oportuno, na decisão impugnada, de fls. 288/298, o MM. Juízo a quo entendeu que

Conforme narra a inicial, o falecido segurado José Luiz Pereira da Silva, quando em vida, era empregado da Offshore Reparos Navais Ltda., ora 1ª ré, quando, em 01.07.2008, enquanto se encontrava exercendo suas atividades profissionais no convés do navio Toisa Conqueror, de propriedade da Selion Brasil Navegação Ltda., ora 2ª ré, foi vítima de acidente de trabalho, consubstanciado em queda de uma altura de cerca de 9 (nove) metros, vindo a falecer. [...]

Infere-se pela possibilidade de a previdência social exercer seu direito de regres-so contra responsáveis que, em caso de negligencia no atendimento às normas e exigências de segurança e higiene de trabalho, provarem danos a segurados, danos esses que gerem a concessão de benefícios previdenciários aos mesmos ou a seus dependentes.

Constata-se que o falecido segurado, José Luiz Pereira da Silva, era empregado da Offshore Reparos Navais Ltda. desde 09.06.2003 onde se manteve até o dia 01.07.2008 quando faleceu. [...]

Com efeito, apesar de ambas as empresas eximirem-se de culpa no ocorrido, pelo conteúdo probatório produzido em conjunto com os depoimentos colhidos por ocasião da audiência de instrução e julgamento, denota-se, no mínimo, a ocor-rência do elemento culpa, de forma solidária:

Tanto o laudo exarado pelo auditor do MTE, como pelo depoimento da testemu-nha José Pereira Bastos, também empregado da Offshore, bem como a própria Offshore informa em sua contestação, o falecido empregado José Luiz Pereira da Silva, no momento em que sofreu o acidente que o vitimou, encontrava-se sem usar cinto de segurança.

Ademais, dentre os equipamentos de proteção individual fornecidos ao falecido, discriminados nos termos de responsabilidade às fls. 84/87 não consta o item cinto de segurança.

Ainda, embora a Offshore alegue que o empregado não trabalhava em altura, e que não havia a necessidade do uso do cinto de segurança, o laudo do MTE, à fl. 76, e o depoimento da testemunha contradizem essas alegações ao afirmarem que o de cujus faleceu ao cair de uma altura de aproximadamente 9 metros. Ressalte-se que a própria testemunha relata que, embora achasse desnecessário o uso do cinto de segurança, admite que, caso estivesse ele utilizando esse equipa-mento, possivelmente não teria morrido.

Outrossim, o dano, o nexo e a culpa das Rés restaram comprovados no inquérito policial nº 369/2008, instaurado pela 76ª Delegacia de Polícia, e na denúncia

Page 190: Nº 345 – Março 2018 · Revista SÍNTESE Trabalhista e Previdenciária Ano XXIX – nº 345 – MArço 2018 reposItórIo AutorIzAdo de JurIsprudêncIA Supremo Tribunal Federal

190 ..................................RST Nº 345 – Março/2018 – PARTE GERAL – JURISPRUDÊNCIA PREVIDENCIÁRIA – ACÓRDÃO NA ÍNTEGRA

oferecida pelo MP (fls. 128/134), nos quais se concluiu pela responsabilização, de forma culposa, dos sócios e de prepostos da empresa Offshore no ocorrido.

Por todo exposto, resta induvidosa a responsabilidade solidaria das Rés, havendo a demonstração de que o acidente que vitimou o segurado José Luiz Pereira da Silva poderia ter sido evitado caso tivesse havido a disponibilização de cinto de segurança em suas atividades laborativas em nível, até certo ponto, considerável do solo, bem como se houvesse responsável técnico por segurança presente em local em substituição à profissional que se encontrava em período de férias e sem substituto. [...]

Com efeito, os fatos e documentos trazidos aos autos conspiram contra a defesa das Rés e reafirmam o direito de a Previdência Social de ter recomposto os valo-res que teve e que vem tendo que disponibilizar para a manutenção do benefício de pensão por morte à viúva do segurado, não havendo como se aceitar que a sociedade tenha que arcar com tais prejuízos. [...] Por outro lado, não merece prosperar o pedido de constituição de capital a fim de se garantir cobrança de eventual inadimplência futura, com a aplicação analógica do art. 475-Q do CPC. Isso porque o disposto no referido diploma legal somente é previsto e cabível para as demandas que envolvam alimentos, e não se aplicam a ações de cunho ressarcitório e/ou indenizatório como a presente. [...]

Por todo o exposto, julgo procedente em parte os pedidos, nos termos do art. 269, inc. I, do CPC para: 1) condenar ambas as rés, solidariamente, a pagar ao INSS os valores despendidos até a presente data em razão do benefício previdenciário NB 146.908.238-9, desde 01.07.2008 [...] corrigidos monetariamente de acordo com os índices aprovados pelo CJF e com juros de mora de 1% ao mês a contar da citação; 2) condenar, também ambas as rés, de maneira solidaria, a pagar ao INSS os valores, relativos às parcelas vincendas do benefício previdenciário NB 146.908.238-9, durante toda a sua duração, que deverão ser efetuados até o dia 15 (quinze) do mês seguinte ao pagamento pela Autarquia. Ressalvo que, a fim de operacionalizar o recebimento das prestações mensais, caberá ao INSS informar e comprovar às Rés, até o último dia útil do mês em que for pago o benefício, o respectivo valor despendido. [...]

O caso em análise diz respeito à Ação Regressiva acidentária, em sede ordinária, por meio da qual o INSS objetivava o ressarcimento por gastos corres-pondentes a parcelas vencidas e vincendas decorrentes da concessão do bene-fício previdenciário de pensão por morte nº 146.908.238-9 à viúva de segurado falecido em 01.07.2008, enquanto se encontrava prestando atividades laborati-vas junto à Offshore Reparos Navais Ltda. e Sealion Navegação do Brasil Ltda.

Constata-se que o falecido segurado, José Luiz Pereira da Silva, era em-pregado da Offshore Reparos Navais Ltda. desde 09.06.2003 onde se manteve até o dia 01.07.2008 quando faleceu (fl. 24).

À luz do da cópia do laudo exarado pela Auditoria do MTE, infere-se que o acidente ocorreu no navio Toisa Conqueror pertencente à empresa Sealion do Brasil Navegação Ltda. Outrossim, o auditor fiscal informa que o empregado,

Page 191: Nº 345 – Março 2018 · Revista SÍNTESE Trabalhista e Previdenciária Ano XXIX – nº 345 – MArço 2018 reposItórIo AutorIzAdo de JurIsprudêncIA Supremo Tribunal Federal

RST Nº 345 – Março/2018 – PARTE GERAL – JURISPRUDÊNCIA PREVIDENCIÁRIA – ACÓRDÃO NA ÍNTEGRA ......................................191

durante suas atividades, desequilibrou-se, caindo de uma altura de aproxima-damente 09 (nove) metros, sem que estivesse utilizando qualquer equipamento de proteção individual adequado.

Com efeito, a ação regressiva proposta pelo INSS encontra previsão legal nos arts. 120 e 121 da Lei nº 8.213/1991 e é instrumento que possui dupla fina-lidade, pois, ao mesmo tempo em que possui caráter ressarcitório – buscando devolver aos cofres públicos o valor gasto com o pagamento de benefícios pre-videnciários, concedidos em razão da negligência das empresas empregadoras em relação às normas de segurança do trabalho – possui caráter pedagógico/preventivo – visando adequar a empresa infratora aos padrões de segurança, para que sejam evitados novos acidentes. (TRF 2ª R., 5ª T.Esp., AC 0127052-68.2014.4.02.5117, Rel. Des. Fed. Aluisio Gonçalves de Castro Mendes, e-DJF2R 07.08.2017)

Desta forma, constitui importante instrumento para defesa dos valo-res sociais do trabalho e do princípio da dignidade humana, nos termos dos arts. 1º, III e IV, 7º, XXII e 170, todos da Constituição Federal.

Cabe ressaltar que eventual responsabilidade do empregador em ca-sos semelhantes ao dos autos tem como fundamento a repartição do risco social, haja vista que os danos gerados pela conduta culposa do empregador ao INSS, decorrentes de acidentes do trabalho, não devem ser suportados por toda a sociedade, por se tratar de conduta ilícita da empresa, que não obser-vou as medidas de proteção à segurança do trabalhador. (TRF 2ª R., 5ª T.Esp., AC 0005720-56.2012.4.02.5101, Rel. Des. Fed. Aluisio Gonçalves de Castro Mendes, e-DJF2R 18.02.2014)

O primeiro e o segundo apelantes asseveram, em síntese, que não con-tribuíram, seja por ação ou omissão, com quaisquer dos fatos que deram ensejo à morte do segurado José Luiz Pereira da Silva, a qual teria decorrido por culpa de terceiro.

Com efeito, para atribuição de responsabilidade nos autos da presente ação de regresso, convém perquirir os aspectos fáticos do acidente de trabalho em questão, bem como o cumprimento, por parte das Recorrentes solidaria-mente responsáveis, das normas de segurança e saúde do trabalhador, na forma do art. 19, § 1º da Lei nº 8.213/1991.

Nesse contexto, a procedência do pleito de regresso, formulado na forma do art. 120 da Lei nº 8.213/1991, pressupõe ação dolosa ou negligência por par-te das empresas demandadas, tendo em vista que o INSS somente atua na qua-lidade de segurador quando o sinistro decorrer de caso fortuito ou força maior. (TRF 2ª R., 5ª T.Esp., AC 0100559-79.2012.4.02.5002, e-DJF2R 25.04.2017)

Os acontecimentos fáticos ora discutidos e as conclusões de perícia rea-lizada foram pontuados na sentença nos seguintes termos:

Page 192: Nº 345 – Março 2018 · Revista SÍNTESE Trabalhista e Previdenciária Ano XXIX – nº 345 – MArço 2018 reposItórIo AutorIzAdo de JurIsprudêncIA Supremo Tribunal Federal

192 ..................................RST Nº 345 – Março/2018 – PARTE GERAL – JURISPRUDÊNCIA PREVIDENCIÁRIA – ACÓRDÃO NA ÍNTEGRA

À fl. 76, junta-se a cópia do laudo exarado pela auditoria do Ministério do Traba-lho, referente ao processo nº 46230.00295/2008-10, onde consta a informação de que o acidente que vitimou o referido segurado ocorreu no navio Toisa Con-queror pertencente à empresa Sealion do Brasil Navegação Ltda.

Ainda, no mesmo documento, o auditor fiscal que o assina informa que o em-pregado, durante suas atividades, desequilibrou-se, vindo a cair de uma altura de cerca de 09 (nove) metros de altura, causando seu falecimento. Ressalta que, quando do acidente, o empregado não utilizava equipamento de proteção indi-vidual adequado (cinto de segurança limitador de movimento), e nem havia, no local, proteção coletiva (guarda corpo regulamentar). [...]

Ainda, às fls. 84/87, constam cópias de Termos de Responsabilidade devidamen-te assinados pelo mencionado empregado se responsabiliza pelo uso, guarda e conservação de diversos equipamentos de proteção individual durante sua jor-nada de trabalho. [...]

Tais documentos devem ser analisados juntamente com o depoimento das tes-temunhas por ocasião da realização de audiência de instrução e julgamento (fls. 139/147). [...] Por sua vez, em seu depoimento, às fls. 146/147, a testemunha José Pereira Bastos esclareceu “que a segunda ré possuía autoridade perante os empregados da primeira ré quando das rotinas na embarcação; [...]; que a víti-ma não estava usando cinto de segurança; [...] que acha que era desnecessário utilizar cinto, mas se tivesse com cinto possivelmente não tinha morrido, que conhecia a senhora Iracema, que é técnica de segurança, que na data do fato a senhora Iracema estava de férias e não esteve no navio, que não havia um subs-tituto técnico de segurança”.

Tanto o laudo exarado pelo auditor do MTE, como pelo depoimento da testemu-nha José Pereira Bastos, também empregado da Offshore, bem como a própria Offshore informa em sua contestação, o falecido empregado José Luiz Pereira da Silva, no momento em que sofreu o acidente que o vitimou, encontrava-se sem usar cinto de segurança.

Ademais, dentre os equipamentos de proteção individual fornecidos ao falecido, discriminados nos termos de responsabilidade às fls. 84/87 não consta o item cinto de segurança.

Ainda, embora a Offshore alegue que o empregado não trabalhava em altura, e que não havia a necessidade do uso do cinto de segurança, o laudo do MTE, à fl. 76, e o depoimento da testemunha contradizem essas alegações ao afirmarem que o de cujus faleceu ao cair de uma altura de aproximadamente 9 metros. Ressalte-se que a própria testemunha relata que, embora achasse desnecessário o uso do cinto de segurança, admite que, caso estivesse ele utilizando esse equipa-mento, possivelmente não teria morrido.

Da mesma forma, o Laudo de Exame em Local de Acidente de Trabalho (fl. 76), também identificou como causa do acidente a falha no cumprimento das normas relativas à segurança do trabalho, sendo certo que, nos termos do estabelecido pelo art. 157 da CLT e pelo item 1.7 da NR-01 anexa a Portaria

Page 193: Nº 345 – Março 2018 · Revista SÍNTESE Trabalhista e Previdenciária Ano XXIX – nº 345 – MArço 2018 reposItórIo AutorIzAdo de JurIsprudêncIA Supremo Tribunal Federal

RST Nº 345 – Março/2018 – PARTE GERAL – JURISPRUDÊNCIA PREVIDENCIÁRIA – ACÓRDÃO NA ÍNTEGRA ......................................193

nº 3.214/1978, abaixo transcritos, é obrigação do empregador fazer cumprir as normas de segurança e medicina do trabalho, o que não ocorrera no caso concreto.

Art. 157. Cabe às empresas: (Redação dada pela Lei nº 6.514, de 22.12.1977)

I – cumprir e fazer cumprir as normas de segurança e medicina do trabalho; (In-cluído pela Lei nº 6.514, de 22.12.1977)

II – instruir os empregados, através de ordens de serviço, quanto às precauções a tomar no sentido de evitar acidentes do trabalho ou doenças ocupacionais; (Incluído pela Lei nº 6.514, de 22.12.1977)

III – adotar as medidas que lhes sejam determinadas pelo órgão regional compe-tente; (Incluído pela Lei nº 6.514, de 22.12.1977)

IV – facilitar o exercício da fiscalização pela autoridade competente. (Incluído pela Lei nº 6.514, de 22.12.1977)

1.7 Cabe ao empregador:

a) cumprir e fazer cumprir as disposições legais e regulamentares sobre segurança e medicina do trabalho; (101.001-8/I1)

b) elaborar ordens de serviço sobre segurança e saúde no trabalho, dando ciência aos empregados por comunicados, cartazes ou meios eletrônicos. (101.002-6/I1) (Alterado pela Portaria SIT nº 84/2009)

c) informar aos trabalhadores: (101.003-4/I1)

I – os riscos profissionais que possam originar-se nos locais de trabalho;

II – os meios para prevenir e limitar tais riscos e as medidas adotadas pela em-presa;

III – os resultados dos exames médicos e de exames complementares de diagnós-tico aos quais os próprios trabalhadores forem submetidos;

IV – os resultados das avaliações ambientais realizadas nos locais de trabalho.

d) permitir que representantes dos trabalhadores acompanhem a fiscalização dos preceitos legais e regulamentares sobre segurança e medicina do trabalho. (101.004-2/I1)

e) determinar os procedimentos que devem ser adotados em caso de acidente ou doença relacionada ao trabalho. (Redação dada pela Portaria SIT nº 84/2009)

Ademais, como bem asseverou a União em suas contrarrazões, o item 4.5 da NR nº 4 do MTE estabelece a obrigatoriedade da empresa contratante estender seus serviços especializados em engenharia de segurança aos empre-gados da contratada, o que justifica a responsabilidade solidária do Offshore Reparos Navais Ltda. e da Sealion Navegação do Brasil Ltda.

Page 194: Nº 345 – Março 2018 · Revista SÍNTESE Trabalhista e Previdenciária Ano XXIX – nº 345 – MArço 2018 reposItórIo AutorIzAdo de JurIsprudêncIA Supremo Tribunal Federal

194 ..................................RST Nº 345 – Março/2018 – PARTE GERAL – JURISPRUDÊNCIA PREVIDENCIÁRIA – ACÓRDÃO NA ÍNTEGRA

Assim, diante dos elementos em questão, não subsistem as teses espo-sadas por Offshore Reparos Navais Ltda. e Sealion Navegação do Brasil Ltda. quanto à ausência de responsabilidade pelo ocorrido, evidenciando-se que o acidente do segurado decorreu da ausência de distribuição de equipamentos de proteção, não se cogitando de atuação negligente do próprio ou de terceiros.

Depreende-se, portanto, que as provas documentais colacionadas aos autos, e detalhadamente analisadas pelo MM. Juízo a quo, apontam a negligên-cia das recorrentes quanto aos padrões de segurança do trabalho aplicáveis ao caso concreto, verificando-se nexo causal suficiente para o ressarcimento.

Nesse sentido, confiram-se os seguintes julgados:

CIVIL E PROCESSUAL CIVIL – AÇÃO REGRESSIVA – INSS – CERCEAMENTO DE DEFESA – INOCORRÊNCIA – RESPONSABILIDADE CIVIL – ACIDENTE DE TRA-BALHO – MORTE DE TRABALHADOR – NEGLIGÊNCIA DO EMPREGADOR E DO TOMADOR DE SERVIÇO

I – É dever da empresa fiscalizar o cumprimento das determinações e procedi-mentos de segurança do trabalho. Nesse prisma, a não-adoção de precauções recomendáveis, se não constitui a causa em si do acidente, evidencia negligência da empresa que, com sua conduta omissiva, deixou de evitar o acidente, sendo responsável, pois, pela reparação do dano, inclusive em ação regressiva ajuizada pelo INSS.

II – A EC 20/1998 estabeleceu expressamente a previsão de que a cobertura do risco de acidente do trabalho há de ser atendida, concorrentemente, pela Previ-dência Social e pelo setor privado, o que afasta qualquer alegação de inconsti-tucionalidade no tocante ao art. 120 da Lei nº 8.213/1991, igualmente não se verificando bis in idem em razão de a empresa ser contribuinte do Seguro de Acidente de Trabalho – SAT/RAT.

III – O art. 120 da Lei nº 8.213, de 1991, determina que a Autarquia Previdenci-ária proponha ação em face dos responsáveis pelo acidente do trabalho, e não necessariamente em face apenas do empregador. Sendo assim, o empregador pode ser responsabilizado isoladamente ou, ainda, em conjunto com o tomador de serviços, no caso de se considerar que este também é responsável pelo aci-dente (AC 200550020013984, Des. Fed. Poul Erik Dyrlund, TRF 2ª R., 8ª T.Esp., e-DJF2R, Data: 04.09.2012, p. 370).

IV – Os técnicos do Ministério do trabalho atestaram que o acidente de trabalho teve como causas: a) A inexistência de sustentação hidráulica do berço de bobi-namento no momento da retirada da sustentação mecânica; b) Desconhecimen-to, por parte dos trabalhadores, de um roteiro claro e inequívoco através do qual a sequência das tarefas referentes aos desimpedimentos pudessem ser seguidos com segurança por eles; c) Insegurança no destravamento mecânico. Ou seja, totalmente afastada a culpa exclusiva da vítima.

V – Apelação da Parte Ré improvida. (TRF 2ª R., 7ª T.Esp., AC 200750010109240, Rel. Des. Fed. Reis Friede, e-DJF2R 12.11.2013)

Page 195: Nº 345 – Março 2018 · Revista SÍNTESE Trabalhista e Previdenciária Ano XXIX – nº 345 – MArço 2018 reposItórIo AutorIzAdo de JurIsprudêncIA Supremo Tribunal Federal

RST Nº 345 – Março/2018 – PARTE GERAL – JURISPRUDÊNCIA PREVIDENCIÁRIA – ACÓRDÃO NA ÍNTEGRA ......................................195

ADMINISTRATIVO – INSS – AÇÃO REGRESSIVA DE COBRANÇA – PENSÃO POR ÓBITO – ACIDENTE DE TRABALHO EM OBRA DE CONSTRUÇÃO DA RÉ – RESPONSABILIDADE DA RÉ – NEGLIGÊNCIA – DESCUMPRIMENTO DE NORMAS DE SEGURANÇA – RESSARCIMENTO DOS VALORES DESPENDIDOS COM OS BENEFÍCIOS PAGOS

Cuida-se de ação progressiva de cobrança, de rito ordinário, ajuizada pelo INSS, objetivando o ressarcimento, de uma só vez, de todos os gastos já efetuados com o benefício acidentário já concedido (NB 143.458.366-7-pensão por morte), des-de o primeiro pagamento pelo INSS, alegando, em suma, que o acidente decorre do desrespeito às normas de segurança e medicina do trabalho, asseverando, ain-da, que, nos termos da Lei nº 8.213/1991, a Previdência Social proporá ação re-gressiva contra quem deixar de cumprir o dever legal de observância das normas de segurança e higiene do trabalho, objetivando a reparação dos cofres públicos de seguros acidentários concedidos em função de acidente.

[...]

Recurso do INSS desprovido, e parcialmente provido o recurso da parte ré, man-tidos os ônus sucumbenciais, a teor do § único, do art. 21, do CPC. (TRF 2ª R., 8ª T.Esp., AC 200950010000408, Rel. Des. Fed. Poul Erik Dyrlund, e-DJF2R 20.04.2010)

Com efeito, passa-se à análise das seguintes alegações do INSS: (i) deve ser deferida a constituição do capital, (ii) Offshore Reparos Navais Ltda. e Se-alion Navegação do Brasil Ltda. devem ser condenados em honorários advo-catícios e (iii) deve ser assegurado o pagamento das parcelas vencidas até o julgamento definitivo da lide.

Quanto ao pleito de constituição de capital, os valores pagos não apre-sentam caráter alimentar, não se aplicando, portanto, o art. 475-Q do CPC/1973. Nesse sentido os seguintes precedentes:

PROCESSUAL CIVIL E PREVIDENCIÁRIO – CONSTITUIÇÃO DE CAPITAL – PA-GAMENTO DE PARCELAS VINCENDAS – ART. 475-Q DO CPC – ACÓRDÃO RECORRIDO EM SINTONIA COM A JURISPRUDÊNCIA DO STJ – PRETENSÃO DE REEXAME DE PROVAS

1. Discute-se nos presentes autos a possibilidade de deferimento de pedido de constituição de capital, nos termos do art. 475-Q do CPC, para garantir o ressarci-mento de benefício pensão por morte a ser pago aos dependentes de empregado falecido, em parcelas vincendas.

2. Consoante jurisprudência desta Corte, a constituição de capital destina-se a garantir o adimplemento da prestação de alimentos, e não pode abranger outras parcelas da condenação.

3. O agravante alega que o caso concreto envolve “indiretamente a cobrança de verbas de natureza alimentar”. O acórdão recorrido, ao contrário, afirma que “a hipótese em tela trata de ressarcimento, isto é, restituição, afastando o caráter

Page 196: Nº 345 – Março 2018 · Revista SÍNTESE Trabalhista e Previdenciária Ano XXIX – nº 345 – MArço 2018 reposItórIo AutorIzAdo de JurIsprudêncIA Supremo Tribunal Federal

196 ..................................RST Nº 345 – Março/2018 – PARTE GERAL – JURISPRUDÊNCIA PREVIDENCIÁRIA – ACÓRDÃO NA ÍNTEGRA

alimentar das parcelas, de forma que o deferimento da medida desvirtuaria a finalidade do instituto”. Assim, verifica-se que a avaliação da necessidade ou não da constituição de capital que garanta a obrigação de pagar parcelas vincendas decorrentes da ação de indenização em comento envolve o exame de matéria de prova, o que não se inclui no âmbito do recurso especial ante o óbice da Súmula nº 7/STJ. Agravo regimental improvido. (STJ, 2ª T., AgRg-REsp 1.332.079, Rel. Min. Humberto Martins, DJe 01.03.2013)

PROCESSUAL CIVIL E PREVIDENCIÁRIO – AGRAVO REGIMENTAL NO RE-CURSO ESPECIAL – AÇÃO REGRESSIVA – ART. 120 DA LEI Nº 8.213/1991 – CONSTITUIÇÃO DE CAPITAL – PAGAMENTO DE PARCELAS VINCENDAS – ART. 475-Q DO CPC – ACÓRDÃO RECORRIDO EM SINTONIA COM A JURIS-PRUDÊNCIA DO STJ – AGRAVO REGIMENTAL A QUE SE NEGA PROVIMENTO

1. Conforme delimitado na decisão ora agravada, a questão jurídica diz respeito ao cabimento de constituição de capital, de acordo com o art. 475-Q do CPC, para garantia da ação regressiva movida pelo INSS em face de empresa, nos ter-mos do art. 120 do CPC.

2. Consoante jurisprudência do STJ, a constituição de capital se destina a garantir o adimplemento da prestação de alimentos e não pode abranger outras parcelas da condenação.

3. Outrossim, a avaliação da necessidade ou não da constituição de capital que garanta a obrigação de pagar parcelas vincendas decorrentes de ação de indeni-zação envolve o exame de matéria de prova, o que não se inclui no âmbito do recurso especial ante o óbice da Súmula nº 07/STJ. Precedentes do STJ.

4. Agravo regimental a que se nega provimento.

(STJ, 2ª T., AgRg-REsp 1.347.352, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, DJe 12.12.2012)

DIREITO ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL – APELAÇÕES CÍVEIS – AÇÃO REGRESSIVA – INSS – ACIDENTE DE TRABALHO – PRESCRIÇÃO – INO-CORRÊNCIA – ÓBITO DE EMPREGADO DA RÉ, POR FORÇA DE ACIDENTE EM SERVIÇO (MANOBRA COM CAMINHÃO MUNCKQUE ATINGIU A REDE ELÉTRICA, DURANTE DESCARREGAMENTO DE PRÉ-MOLDADOS, CAUSAN-DO ÓBITO IMEDIATO) – PROVA TESTEMUNHAL INÚTIL PARA O DESLINDE DA LIDE – CERCEAMENTO DE DEFESA – INOCORRÊNCIA – RESSARCIMEN-TO ACIDENTÁRIO – ANÁLISE DO CASO CONCRETO – RESPONSABILIDADE CONSTATADA QUANTO À RÉ – CABIMENTO DO RESSARCIMENTO POSTU-LADO (ARTS. 120 E 121, LEI Nº 8.213/1991) – CONSTITUIÇÃO DE CAPITAL (ART. 475-Q, CPC/1973) – INAPLICABILIDADE – INCLUSÃO DO CREDOR EM FOLHA DE PAGAMENTO DA RÉ – POSSIBILIDADE – PODER GERAL DE CAUTELA DO JUÍZO – JUROS DE MORA APLICÁVEIS DESDE O DESEMBOLSO DE CADA PARCELA DO BENEFÍCIO (SÚMULA Nº 54/STJ) – APELAÇÃO DA RÉ DESPROVIDA – APELAÇÃO DO INSS PARCIALMENTE PROVIDA – REFORMA PARCIAL DA SENTENÇA ATACADA

Page 197: Nº 345 – Março 2018 · Revista SÍNTESE Trabalhista e Previdenciária Ano XXIX – nº 345 – MArço 2018 reposItórIo AutorIzAdo de JurIsprudêncIA Supremo Tribunal Federal

RST Nº 345 – Março/2018 – PARTE GERAL – JURISPRUDÊNCIA PREVIDENCIÁRIA – ACÓRDÃO NA ÍNTEGRA ......................................197

1. Autor, ora Apelante (INSS), que postula, em ação ajuizada em 29.09.2011, a condenação da Ré (Sibre Indústria de Pré-Moldados Ltda. – ME), também Apelan-te, ao ressarcimento pelo pagamento de benefício de pensão por morte aciden-tária (NB 154.727.866-5), inicialmente paga à viúva e ao então filho menor e, a partir de 02.10.2014, integralmente paga à viúva de empregado da Ré, morto em decorrência de eletrocussão advinda de rompimento de rede elétrica próximo à área em que descarregava pré-moldados, em decorrência de choque com o gan-cho de caminhão Munck manobrado pela vítima.

[...]

5. Descabe a aplicação do art. 475-Q, CPC/1973, equivalente ao atual art. 533, CPC/2015, ainda que por analogia, porquanto o dispositivo legal em comento se refere às prestações de natureza alimentar, com o objetivo de assegurar que o alimentando não fique desprovido da parcela. E, in casu, o pedido formulado na exordial objetiva apenas o ressarcimento de prestações pagas pelo INSS à viúva da vítima (integralmente, desde 02.10.2014 e, entre 26.11.2010 e 02.10.2014, em cotas-partes à viúva e ao então filho menor do de cujus), sendo dever do INSS – e não da Ré – pagar a prestação de natureza alimentar, qual seja, o benefício de pensão por morte acidentária. Precedentes do Eg. STJ e deste Tribunal Regional Federal. [...]

10. Apelação da Ré desprovida. Apelação do INSS parcialmente provida, com reforma parcial da sentença atacada, apenas para determinar que os juros de mora são aplicáveis a partir de cada desembolso efetivo do benefício pelo INSS (Súmula nº 54/STJ), na forma da fundamentação, e mantidos os demais termos da sentença atacada. (TRF 2ª R., 6ª T.Esp., AC 0011558-23.2011.4.02.5001, Rel. Des. Fed. Marcelo Pereira da Silva, e-DJF2R 15.02.2017) (grifo nosso)

ADMINISTRATIVO – ACIDENTE DE TRABALHO – BENEFÍCIO PREVIDEN-CIÁRIO – AÇÃO REGRESSIVA – NORMAS DE SEGURANÇA DO TRABALHO – INOBSERVÂNCIA – SAT – CONSTITUIÇÃO DE CAPITAL – LIMITAÇÃO DE IDADE – JUROS DE MORA

1. Não há falar em inépcia da inicial, nos termos do art. 283 do CPC/1973, por ausência de juntada do ato administrativo que concedeu o benefício previden-ciário, dado que comprovada a concessão do benefício de pensão por morte aos dependentes do falecido, filha do falecido e cônjuge supérstite, com respectivas datas da concessão e início do pagamento, bem como os respectivos valores.

[...]

5. No que concerne ao pleito de constituição de capital, a pretensão do INSS de ver ressarcidos os valores pagos aos dependentes do falecido não apresenta caráter alimentar, não se aplicando, em decorrência, o art. 475-Q do CPC/1973.

6. Conforme posicionamento desta Corte Regional, o dever de ressarcir integral-mente os valores dos benefícios que forem pagos, mensalmente, está limitado à data em que o trabalhador vitimado faria 65 anos, dado que, com a referida idade, já teria direito à aposentadoria por idade. Precedentes.

Page 198: Nº 345 – Março 2018 · Revista SÍNTESE Trabalhista e Previdenciária Ano XXIX – nº 345 – MArço 2018 reposItórIo AutorIzAdo de JurIsprudêncIA Supremo Tribunal Federal

198 ..................................RST Nº 345 – Março/2018 – PARTE GERAL – JURISPRUDÊNCIA PREVIDENCIÁRIA – ACÓRDÃO NA ÍNTEGRA

7. No que diz respeito aos juros, nos termos do Enunciado nº 54 da Súmula do STJ, “Os juros moratórios fluem a partir do evento danoso, em caso de respon-sabilidade extracontratual. Em decorrência, deve ser reformada a sentença nessa parte, de modo que os juros fluam da data do efetivo desembolso pelo INSS das parcelas dos benefícios previdenciários, devendo ser aplicada a taxa Selic, nos termos do art. 406 do CC/2002, que engloba juros e correção monetária”.

8. Apelação da ré desprovida. Remessa necessária e apelação do INSS parcial-mente provida. (TRF 2ª R., 7ª T.Esp., AC 00035791020114025001, Rel. Des. Fed. Luiz Paulo da Silva Araújo, e-DJF2R 17.05.2016) (grifo nosso)

Por oportuno, quanto à condenação do Offshore Reparos Navais Ltda. e Sealion Navegação do Brasil Ltda. em honorários advocatícios, havendo cumu-lação simples de pedidos e tendo o litigante sucumbido em um dos pedidos, todavia, ainda que no contexto da demanda seja de menor monta, responde pelas despesas proporcionalmente (STJ, 5ª T., AgRg-REsp 893.649/RS, Rel. Min. Gilson Dipp, DJ 11.06.2007).

Assim, tendo em vista o não acolhimento do pleito do INSS quanto à constituição de capital, existindo, pois, sucumbência recíproca, não se mostra viável a condenação do Offshore Reparos Navais Ltda. e Sealion Navegação do Brasil Ltda. em honorários advocatícios.

Por fim, deve ser concedido o pedido do INSS para que seja assegurado o pagamento das parcelas vencidas até o julgamento definitivo da lide.

Ante o exposto, com fulcro na fundamentação supra, nego provimento às apelações de Offshore Reparos Navais Ltda. e Sealion Navegação do Brasil Ltda. e dou parcial provimento à apelação do INSS, apenas para assegurar o pagamento das parcelas vencidas até o julgamento final da lide.

É como voto.

Ricardo Perlingeiro Desembargador Federal

Page 199: Nº 345 – Março 2018 · Revista SÍNTESE Trabalhista e Previdenciária Ano XXIX – nº 345 – MArço 2018 reposItórIo AutorIzAdo de JurIsprudêncIA Supremo Tribunal Federal

Parte Geral – Jurisprudência Previdenciária – Acórdão na Íntegra

34824

Tribunal Regional Federal da 3ª RegiãoApelação/Remessa Necessária nº 0002296‑88.2010.4.03.6316/SP2010.63.16.002296‑3/SPRelator: Juiz Federal Convocado Rodrigo ZachariasApelante: Instituto Nacional do Seguro Social – INSSApelado(a): Joaquim Andrade AlvesAdvogado: SP084539 Nobuaki Hara e outro(a)Remetente: Juízo Federal da 2ª Vara de Araçatuba Sec. Jud./SPNº Orig.: 00022968820104036316 2ª Vr. Araçatuba/SP

ementa

PREVIDENCIÁRIO – REMESSA OFICIAL – NÃO CONHECIMENTO – ATIVIDADE ESPECIAL – HIDROCARBONETOS – ENQUADRAMENTO – REQUISITOS PREENCHIDOS À APOSENTADORIA ESPECIALA remessa oficial não deve ser conhecida, por ter sido proferida a senten-ça na vigência do Novo CPC, cujo art. 496, § 3º, I, afasta a exigência do duplo grau de jurisdição quando a condenação ou o proveito econômico for inferior a 1.000 (mil) salários-mínimos. No caso, a toda evidência não se excede esse montante, devendo a certeza matemática prevalecer sobre o teor da Súmula nº 490 do Superior Tribunal de Justiça.

Discute-se o atendimento das exigências à concessão de aposentadoria especial, após reconhecimento do lapso especial vindicado.

O tempo de trabalho sob condições especiais poderá ser convertido em comum, observada a legislação aplicada à época na qual o trabalho foi prestado. Além disso, os trabalhadores assim enquadrados poderão fazer a conversão dos anos trabalhados a “qualquer tempo”, independente-mente do preenchimento dos requisitos necessários à concessão da apo-sentadoria.

Em razão do novo regramento, encontram-se superadas a limitação temporal, prevista no art. 28 da Lei nº 9.711/1998, e qualquer alegação quanto à impossibilidade de enquadramento e conversão dos lapsos an-teriores à vigência da Lei nº 6.887/1980.

Cumpre observar que antes da entrada em vigor do Decreto nº 2.172, de 5 de março de 1997, regulamentador da Lei nº 9.032/1995, de 28 de abril de 1995, não se exigia (exceto em algumas hipóteses) a apresentação de laudo técnico para a comprovação do tempo de serviço especial, pois bastava o formulário preenchido pelo empregador (SB40 ou DSS8030) para atestar a existência das condições prejudiciais.

Page 200: Nº 345 – Março 2018 · Revista SÍNTESE Trabalhista e Previdenciária Ano XXIX – nº 345 – MArço 2018 reposItórIo AutorIzAdo de JurIsprudêncIA Supremo Tribunal Federal

200 ..................................RST Nº 345 – Março/2018 – PARTE GERAL – JURISPRUDÊNCIA PREVIDENCIÁRIA – ACÓRDÃO NA ÍNTEGRA

Nesse particular, ressalto que vinha adotando a posição de que o enqua-dramento pela categoria profissional no rol dos Decretos nºs 53.831/1964 e 83.080/1979 também era possível até a entrada em vigor do referido Decreto nº 2.172/1997. Entretanto, verifico que a jurisprudência majori-tária, a qual passo a adotar, tanto nesta Corte quanto no e. STJ, assentou--se no sentido de que o enquadramento apenas pela categoria profissio-nal é possível tão-somente até 28.04.1995 (Lei nº 9.032/1995). Nesse sentido: STJ, AgInt-AREsp 894.266/SP, Rel. Min. Herman Benjamin, 2ª T., J. 06.10.2016, DJe 17.10.2016.

Contudo, tem-se que, para a demonstração do exercício de atividade especial cujo agente agressivo seja o ruído, sempre houve a necessida-de da apresentação de laudo pericial, independentemente da época de prestação do serviço.

A exposição superior a 80 decibéis era considerada atividade insalubre até a edição do Decreto nº 2.172/1997, que majorou o nível para 90 decibéis. Com a edição do Decreto nº 4.882, de 18.11.2003, o limite mínimo de ruído para reconhecimento da atividade especial foi reduzi-do para 85 decibéis, sem possibilidade de retroação ao regulamento de 1997. Nesse sentido: Recurso Especial nº 1.398.260, sob o regime do art. 543-C do CPC, do C. STJ.

Com a edição da Medida Provisória nº 1.729/1998 (convertida na Lei nº 9.732/1998), foi inserida na legislação previdenciária a exigência de informação, no laudo técnico de condições ambientais do trabalho, quanto à utilização do Equipamento de Proteção Individual (EPI).

Desde então, com base na informação sobre a eficácia do EPI, a au-tarquia deixou de promover o enquadramento especial das atividades desenvolvidas posteriormente a 03.12.1998.

Sobre a questão, entretanto, o C. Supremo Tribunal Federal, ao apreciar o ARE 664.335, em regime de repercussão geral, decidiu que: (i) se o EPI for realmente capaz de neutralizar a nocividade, não haverá respaldo ao enquadramento especial; (ii) havendo, no caso concreto, divergência ou dúvida sobre a real eficácia do EPI para descaracterizar completamen-te a nocividade, deve-se optar pelo reconhecimento da especialidade; (iii) na hipótese de exposição do trabalhador a ruído acima dos limites de tolerância, a utilização do EPI não afasta a nocividade do agente.

Sublinhe-se o fato de que o campo “EPI Eficaz (S/N)” constante no Per-fil Profissiográfico Previdenciário (PPP) é preenchido pelo empregador considerando-se, tão somente, se houve ou não atenuação dos fatores de risco, consoante determinam as respectivas instruções de preenchimento previstas nas normas regulamentares. Vale dizer: essa informação não se refere à real eficácia do EPI para descaracterizar a nocividade do agente.

Page 201: Nº 345 – Março 2018 · Revista SÍNTESE Trabalhista e Previdenciária Ano XXIX – nº 345 – MArço 2018 reposItórIo AutorIzAdo de JurIsprudêncIA Supremo Tribunal Federal

RST Nº 345 – Março/2018 – PARTE GERAL – JURISPRUDÊNCIA PREVIDENCIÁRIA – ACÓRDÃO NA ÍNTEGRA ......................................201

Depreende-se dos PPPs apresentados, a exposição habitual e permanente a agentes químicos (graxa, óleo queimado, óleo lubrificante, gasolina e óleo diesel), fato que possibilita o enquadramento nos códigos 1.2.11 do anexo do Decreto nº 53.831/1964, 1.2.10 do anexo do Decreto nº 83.080/1979 e 1.0.17 do anexo do Decreto nº 3.048/1999. Com efei-to, os riscos ocupacionais gerados pela exposição a hidrocarbonetos não requerem análise quantitativa e sim qualitativa. Precedentes.

A parte autora conta 25 (vinte e cinco) anos de trabalho em atividade especial e, desse modo, faz jus ao benefício de aposentadoria especial.

Fica mantida a condenação do INSS a pagar honorários de advogado, cujo percentual majoro para 12% (doze por cento) sobre a condenação, excluindo-se as prestações vencidas após a data da sentença, consoante Súmula nº 111 do Superior Tribunal de Justiça e critérios do art. 85, §§ 1º, 2º, 3º, I, e 11, do Novo CPC. Todavia, na fase de execução, o percentual deverá ser reduzido, se o caso, na hipótese do art. 85, § 4º, II, do mesmo código, se a condenação ou o proveito econômico ultrapassar duzentos salários mínimos.

Remessa oficial não conhecida. Apelação conhecida e desprovida.

acórDão

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, de-cide a Egrégia Nona Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por una-nimidade, não conhecer da remessa oficial, conhecer da apelação e lhe negar provimento, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

São Paulo, 24 de janeiro de 2018.

Rodrigo Zacharias Juiz Federal Convocado

relatório

O Exmo. Sr. Juiz Federal Convocado Rodrigo Zacharias: Trata-se de ação de conhecimento proposta em face do INSS, na qual a parte autora pleiteia o reconhecimento de tempo de serviço especial, com vistas à concessão de apo-sentadoria especial.

O pedido foi julgado procedente para: (i) reconhecer como espe-ciais as atividades desempenhadas pelo autor de 01.09.1980 a 16.08.1988, de 01.12.1988 a 17.03.1990, de 19.03.1990 a 25.03.1997, de 01.11.1997 a 09.11.1998, de 01.03.2000 a 11.12.2000 e de 02.01.2001 a 25.07.2008; (ii) conceder a aposentadoria especial, a partir do requerimento administrativo;

Page 202: Nº 345 – Março 2018 · Revista SÍNTESE Trabalhista e Previdenciária Ano XXIX – nº 345 – MArço 2018 reposItórIo AutorIzAdo de JurIsprudêncIA Supremo Tribunal Federal

202 ..................................RST Nº 345 – Março/2018 – PARTE GERAL – JURISPRUDÊNCIA PREVIDENCIÁRIA – ACÓRDÃO NA ÍNTEGRA

(iii) fixar os consectários; (iv) conceder a antecipação dos efeitos da tutela jurí-dica.

Decisão submetida ao reexame necessário.

Inconformada, a autarquia interpôs apelação, na qual alega a impossibi-lidade dos enquadramentos efetuados e da concessão do benefício.

Com contrarrazões, os autos subiram a esta Egrégia Corte.

É o relatório.

voto

O Exmo. Sr. Juiz Federal Convocado Rodrigo Zacharias: Conheço da apelação, porquanto presentes os requisitos de admissibilidade.

Preambularmente, não conheço da remessa oficial, por ter sido proferida a sentença na vigência do Novo CPC, cujo art. 496, § 3º, I, afasta a exigência do duplo grau de jurisdição quando a condenação for inferior a 1.000 (mil) salários-mínimos.

No presente caso, a toda evidência não se excede esse montante.

Inadmissível, assim, o reexame necessário.

Passo à análise das questões trazidas a julgamento.

DO ENQUADRAMENTO DE PERÍODO ESPECIAL

Editado em 3 de setembro de 2003, o Decreto nº 4.827 alterou o art. 70 do Regulamento da Previdência Social, aprovado pelo Decreto nº 3.048, de 6 de maio de 1999, o qual passou a ter a seguinte redação:

“Art. 70. A conversão de tempo de atividade sob condições especiais em tempo de atividade comum dar-se-á de acordo com a seguinte tabela:

[...]

§ 1º A caracterização e a comprovação do tempo de atividade sob condições especiais obedecerá ao disposto na legislação em vigor na época da prestação do serviço.

§ 2º As regras de conversão de tempo de atividade sob condições especiais em tempo de atividade comum constantes deste artigo aplicam-se ao trabalho pres-tado em qualquer período.”

Por conseguinte, o tempo de trabalho sob condições especiais poderá ser convertido em comum, observada a legislação aplicada à época na qual o trabalho foi prestado. Além disso, os trabalhadores assim enquadrados poderão fazer a conversão dos anos trabalhados a “qualquer tempo”, independentemen-te do preenchimento dos requisitos necessários à concessão da aposentadoria.

Page 203: Nº 345 – Março 2018 · Revista SÍNTESE Trabalhista e Previdenciária Ano XXIX – nº 345 – MArço 2018 reposItórIo AutorIzAdo de JurIsprudêncIA Supremo Tribunal Federal

RST Nº 345 – Março/2018 – PARTE GERAL – JURISPRUDÊNCIA PREVIDENCIÁRIA – ACÓRDÃO NA ÍNTEGRA ......................................203

Ademais, em razão do novo regramento, encontram-se superadas a limi-tação temporal, prevista no art. 28 da Lei nº 9.711/1998, e qualquer alegação quanto à impossibilidade de enquadramento e conversão dos lapsos anteriores à vigência da Lei nº 6.887/1980.

Nesse sentido, reporto-me à jurisprudência firmada pelo Colendo STJ:

“PREVIDENCIÁRIO – RECURSO ESPECIAL – CONVERSÃO DE TEMPO DE SER-VIÇO ESPECIAL EM COMUM – AUSÊNCIA DE LIMITAÇÃO AO PERÍODO TRA-BALHADO

1. Com as modificações legislativas acerca da possibilidade de conversão do tempo exercido em atividades insalubres, perigosas ou penosas, em atividade comum, infere-se que não há mais qualquer tipo de limitação quanto ao período laborado, ou seja, as regras aplicam-se ao trabalho prestado em qualquer perío-do, inclusive após 28.05.1998. Precedente desta 5ª Turma.

2. Recurso especial desprovido.”

(STJ, REsp 1010028/RN, 5ª T., Relª Min. Laurita Vaz, J. 28.02.2008, DJe 07.04.2008)

Cumpre observar que antes da entrada em vigor do Decreto nº 2.172, de 5 de março de 1997, regulamentador da Lei nº 9.032/1995, de 28 de abril de 1995, não se exigia (exceto em algumas hipóteses) a apresentação de laudo téc-nico para a comprovação do tempo de serviço especial, pois bastava o formu-lário preenchido pelo empregador (SB40 ou DSS8030) para atestar a existência das condições prejudiciais.

Nesse particular, ressalto que vinha adotando a posição de que o en-quadramento pela categoria profissional no rol dos Decretos nºs 53.831/1964 e 83.080/1979 também era possível até a entrada em vigor do referido Decreto nº 2.172/1997. Entretanto, verifico que a jurisprudência majoritária, a qual pas-so a adotar, tanto nesta Corte quanto no e. STJ, assentou-se no sentido de que o enquadramento apenas pela categoria profissional é possível tão-somente até 28.04.1995 (Lei nº 9.032/1995). Nesse sentido: STJ, AgInt-AREsp 894.266/SP, Rel. Min. Herman Benjamin, 2ª T., J. 06.10.2016, DJe 17.10.2016.

Contudo, tem-se que, para a demonstração do exercício de atividade especial cujo agente agressivo seja o ruído, sempre houve a necessidade da apresentação de laudo pericial, independentemente da época de prestação do serviço.

Nesse contexto, a exposição superior a 80 decibéis era considerada ati-vidade insalubre até a edição do Decreto nº 2.172/1997, que majorou o nível para 90 decibéis. Isso porque os Decretos nºs 83.080/1979 e 53.831/1964 vigo-raram concomitantemente até o advento do Decreto nº 2.172/1997.

Com a edição do Decreto nº 4.882, de 18.11.2003, o limite mínimo de ruído para reconhecimento da atividade especial foi reduzido para 85 decibéis

Page 204: Nº 345 – Março 2018 · Revista SÍNTESE Trabalhista e Previdenciária Ano XXIX – nº 345 – MArço 2018 reposItórIo AutorIzAdo de JurIsprudêncIA Supremo Tribunal Federal

204 ..................................RST Nº 345 – Março/2018 – PARTE GERAL – JURISPRUDÊNCIA PREVIDENCIÁRIA – ACÓRDÃO NA ÍNTEGRA

(art. 2º do Decreto nº 4.882/2003, que deu nova redação aos itens 2.0.1, 3.0.1 e 4.0.0 do Anexo IV do Regulamento da Previdência Social, aprovado pelo Decreto nº 3.048/1999).

Quanto a esse ponto, à míngua de expressa previsão legal, não há como conferir efeito retroativo à norma regulamentadora que reduziu o limite de ex-posição para 85 dB(A) a partir de novembro de 2003.

Sobre essa questão, o STJ, ao apreciar o Recurso Especial nº 1.398.260, sob o regime do art. 543-C do CPC, consolidou entendimento acerca da invia-bilidade da aplicação retroativa do decreto que reduziu o limite de ruído no ambiente de trabalho (de 90 para 85 dB) para configuração do tempo de serviço especial (julgamento em 14.05.2014).

Com a edição da Medida Provisória nº 1.729/1998 (convertida na Lei nº 9.732/1998), foi inserida na legislação previdenciária a exigência de informa-ção, no laudo técnico de condições ambientais do trabalho, quanto à utilização do Equipamento de Proteção Individual (EPI).

Desde então, com base na informação sobre a eficácia do EPI, a autar-quia deixou de promover o enquadramento especial das atividades desenvolvi-das posteriormente a 03.12.1998.

Sobre a questão, entretanto, o C. Supremo Tribunal Federal, ao apreciar o ARE 664.335, em regime de repercussão geral, decidiu que: (i) se o EPI for realmente capaz de neutralizar a nocividade, não haverá respaldo ao enquadra-mento especial; (ii) havendo, no caso concreto, divergência ou dúvida sobre a real eficácia do EPI para descaracterizar completamente a nocividade, deve-se optar pelo reconhecimento da especialidade; (iii) na hipótese de exposição do trabalhador a ruído acima dos limites de tolerância, a utilização do EPI não afasta a nocividade do agente.

Quanto a esses aspectos, sublinhe-se o fato de que o campo “EPI Eficaz (S/N)” constante no Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP) é preenchido pelo empregador considerando-se, tão somente, se houve ou não atenuação dos fatores de risco, consoante determinam as respectivas instruções de pre-enchimento previstas nas normas regulamentares. Vale dizer: essa informação não se refere à real eficácia do EPI para descaracterizar a nocividade do agente.

No caso, em relação aos intervalos de 01.09.1980 a 16.08.1988, de 01.12.1988 a 17.03.1990, de 19.03.1990 a 23.05.1997, de 01.11.1997 a 09.11.1998, de 01.03.2000 a 11.12.2000 e de 02.01.2001 a 25.07.2008, de-preende-se dos PPPs apresentados, a exposição habitual e permanente a agen-tes químicos (graxa, óleo queimado, óleo lubrificante, gasolina e óleo diesel), fato que possibilita o enquadramento nos códigos 1.2.11 do anexo do Decreto nº 53.831/1964, 1.2.10 do anexo do Decreto nº 83.080/1979 e 1.0.17 do anexo do Decreto nº 3.048/1999.

Page 205: Nº 345 – Março 2018 · Revista SÍNTESE Trabalhista e Previdenciária Ano XXIX – nº 345 – MArço 2018 reposItórIo AutorIzAdo de JurIsprudêncIA Supremo Tribunal Federal

RST Nº 345 – Março/2018 – PARTE GERAL – JURISPRUDÊNCIA PREVIDENCIÁRIA – ACÓRDÃO NA ÍNTEGRA ......................................205

Com efeito, os riscos ocupacionais gerados pela exposição a hidrocarbo-netos não requerem análise quantitativa e sim qualitativa.

Nesse diapasão, é a iterativa jurisprudência das cortes federais do País (g.n.):

“PREVIDENCIÁRIO – TEMPO ESPECIAL – AGENTES QUÍMICOS NOCIVOS – HIDROCARBONETOS – APOSENTADORIA – 1. Os riscos ocupacionais gerados pela exposição a agentes químicos não requerem a análise quantitativa de con-centração ou intensidade máxima e mínima no ambiente de trabalho, dado que são caracterizados pela avaliação qualitativa. 2. Em relação à atividade profis-sional sujeita aos efeitos dos hidrocarbonetos, a sua manipulação já é suficiente para o reconhecimento da atividade especial. Não somente a fabricação desses produtos, mas também o manuseio rotineiro e habitual deve ser considerado para fins de enquadramento como atividade especial. 3. Preenchidos os requisitos le-gais, tem o segurado direito à concessão da aposentadoria por tempo de serviço ou aposentadoria por tempo de contribuição, a contar da data do requerimento administrativo, devendo ser implantada a RMI mais favorável.”

(TRF 4ª R., Ap-Reex 50611258620114047100/RS, 5061125-86.2011.404.7100, Relator: (Auxílio Vânia) Paulo Paim da Silva, Data de Julgamento: 09.07.2014, 6ª T., Data de Publicação: DE 10.07.2014)

“PREVIDENCIÁRIO – CONVERSÃO DE APOSENTADORIA INTEGRAL POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO EM APOSENTADORIA ESPECIAL – COMPRO-VADA A EXPOSIÇÃO A HIDROCARBONETOS – PPP – JUROS – CORREÇÃO MONETÁRIA – HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS – 1. Até o advento da Lei nº 9.032/1995 era possível a comprovação do tempo de trabalho em condições especiais mediante o simples enquadramento da atividade profissional exercida nos quadros anexos aos Decretos nºs 53.831/1964 e 83.080/1979. 2. A partir da entrada em vigor da Lei nº 9.032, em 29.04.1995, a comprovação da natureza especial do labor passou a se dar mediante o preenchimento pelo empregador dos formulários SB-40 e DSS-8030, expedidos pelo INSS. Finalmente, com a pu-blicação da Lei nº 9.528, em 11.12.1997, que, convalidando a Medida Provisória nº 1.596-14/1997, alterou o art. 58, § 1º, da Lei nº 8.213/1991, a mencionada comprovação passou a exigir laudo técnico de condições ambientais do traba-lho (LTCAT) expedido por médico do trabalho ou engenheiro de segurança do trabalho. 3. A exigência legal de que a exposição aos agentes agressivos se dê de modo permanente somente alcança o tempo de serviço prestado após a entrada em vigor da Lei nº 9.032/1995. De todo modo, a constatação do caráter perma-nente da atividade especial não exige que o trabalho desempenhado pelo segu-rado esteja ininterruptamente submetido a um risco para a sua incolumidade. 4. O PPP de fls. 126/128 é suficiente para comprovar a exposição do trabalha-dor a hidrocarbonetos aromáticos, alifáticos e parafínicos durante todo o vínculo com a Associação das Pioneiras Sociais. Dele consta também a identificação de todos os profissionais responsáveis pela monitoração biológica. 5. Os riscos ocupacionais gerados pela exposição a agentes químicos, especialmente hidro-carbonetos, não requerem a análise quantitativa de concentração ou intensidade máxima e mínima no ambiente de trabalho, dado que são caracterizados pela avaliação qualitativa. Precedentes.

Page 206: Nº 345 – Março 2018 · Revista SÍNTESE Trabalhista e Previdenciária Ano XXIX – nº 345 – MArço 2018 reposItórIo AutorIzAdo de JurIsprudêncIA Supremo Tribunal Federal

206 ..................................RST Nº 345 – Março/2018 – PARTE GERAL – JURISPRUDÊNCIA PREVIDENCIÁRIA – ACÓRDÃO NA ÍNTEGRA

[...]”

(TRF 1ª R., AC 00435736820104013300, 0043573-68.2010.4.01.3300, Rel. Juiz Federal Antonio Oswaldo Scarpa, Data de Julgamento: 14.12.2015, 1ª Câma-ra Regional Previdenciária da Bahia, Data de Publicação: 22.01.2016 e-DJF1 p. 281)

Insta registrar, ainda, que em recente decisão exarada nos autos nº 5004737-08.2012.4.04.7108, a Turma Nacional de Uniformização dos Jui-zados Especiais Federais (TNU) firmou a tese de que a análise do caráter degra-dante do ofício em decorrência da exposição a agentes químicos previstos no Anexo XIII da NR-15, como os hidrocarbonetos aromáticos, é qualitativa e não se sujeita a limites de tolerância, independentemente do período de prestação do labor (cf. notícia veiculada em 27.07.2016 extraída do site do Conselho da Justiça Federal – http://www.cjf.jus.br/cjf/noticias/2016-1/julho/analise-da-ex--posicao-de-trabalhador-a-agentes-quimicos-deve-ser-qualitativa-e-nao-sujeita--a-limites-de-tolerancia).

Diante das circunstâncias da prestação laboral descritas, conclui-se que, na hipótese, o EPI não é realmente capaz de neutralizar a nocividade do agente.

Dessa forma, os períodos de 01.09.1980 a 16.08.1988, de 01.12.1988 a 17.03.1990, de 19.03.1990 a 23.05.1997, de 01.11.1997 a 09.11.1998, de 01.03.2000 a 11.12.2000 e de 02.01.2001 a 25.07.2008 devem ser enquadra-dos como especiais.

A parte autora conta 25 (vinte e cinco) anos de trabalho em atividade especial e, desse modo, faz jus ao benefício de aposentadoria especial.

Fica mantida a condenação do INSS a pagar honorários de advogado, cujo percentual majoro para 12% (doze por cento) sobre a condenação, ex-cluindo-se as prestações vencidas após a data da sentença, consoante súmula nº 111 do Superior Tribunal de Justiça e critérios do art. 85, §§ 1º, 2º, 3º, I, e 11, do Novo CPC.

Todavia, na fase de execução, o percentual deverá ser reduzido, se o caso, na hipótese do art. 85, § 4º, II, do mesmo código, se a condenação ou o proveito econômico ultrapassar duzentos salários mínimos.

Diante do exposto, não conheço da remessa oficial, conheço da apela-ção e lhe nego provimento.

É o voto.

Rodrigo Zacharias Juiz Federal Convocado

Page 207: Nº 345 – Março 2018 · Revista SÍNTESE Trabalhista e Previdenciária Ano XXIX – nº 345 – MArço 2018 reposItórIo AutorIzAdo de JurIsprudêncIA Supremo Tribunal Federal

Parte Geral – Jurisprudência Previdenciária – Acórdão na Íntegra

34825

Tribunal Regional Federal da 4ª RegiãoApelação Cível nº 5066973‑77.2017.4.04.9999/SCRelator: Jorge Antonio MauriqueApelante: Reginaldo BrechbullerAdvogado: Frederico Valdomiro SlompApelado: Instituto Nacional do Seguro Social – INSS

ementa

PREVIDENCIÁRIO – AUXÍLIO-ACIDENTE – LAUDO PERICIAL INSUFICIENTE – SENTENÇA ANULADA

1. Quando a perícia judicial não cumpre os pressupostos mínimos de idoneidade da prova técnica, ela é produzida, na verdade, de maneira a furtar do magistrado o poder de decisão.

2. Hipótese em que foi anulada a sentença para a realização de prova pericial por médico especialista.

acórDão

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, deci-de a Egrégia Turma Regional Suplementar de Santa Catarina do Tribunal Regio-nal Federal da 4ª Região, por unanimidade, anular, de ofício, o processo a partir da prova pericial, e julgar prejudicada a apelação, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Florianópolis, 31 de janeiro de 2018.

Des. Federal Jorge Antonio Maurique Relator

relatório

Trata-se de apelação interposta por Reginaldo Brechbuller em face da sentença que julgou improcedente o pedido de concessão de benefício de au-xílio-acidente.

Sustenta, em síntese, que está comprovada a redução da sua capacidade laboral, sendo que devem ser observadas as suas condições pessoais. Requer a reforma da sentença para que seja julgada procedente a demanda.

Page 208: Nº 345 – Março 2018 · Revista SÍNTESE Trabalhista e Previdenciária Ano XXIX – nº 345 – MArço 2018 reposItórIo AutorIzAdo de JurIsprudêncIA Supremo Tribunal Federal

208 ..................................RST Nº 345 – Março/2018 – PARTE GERAL – JURISPRUDÊNCIA PREVIDENCIÁRIA – ACÓRDÃO NA ÍNTEGRA

Com contrarrazões, vieram os autos conclusos.

É o relatório.

voto

No caso sub examine, a controvérsia cinge-se à verificação da incapaci-dade do autor.

Diante disso, foi realizada perícia médica, em 07.07.2017, pelo Dr. Gerson Luiz Weissheimer, CRM/SC 5278, especialista em Medicina Legal e Perícias Médicas, perito de confiança do juízo (evento 02, PET41). Respon-dendo aos quesitos formulados, o perito apurou que o autor sofreu acidente de trânsito em 06.01.2007, da qual resultou traumatismo do músculo extensor e tendão de outro dedo ao nível do punho e da mão (CID10 S66.3). Concluiu que o autor está apto ao labor, sem limitações.

Quanto à perícia, cabe referir que o entendimento desta Corte é no sen-tido de que, em regra, mesmo que o perito nomeado pelo Juízo não seja expert na área específica de diagnóstico e tratamento da doença em discussão, não haveria de se declarar a nulidade da prova por se tratar de profissional médico e, portanto, com formação adequada à apreciação do caso.

Entretanto, a despeito do entendimento acima mencionado e ainda que o perito nomeado pelo Juízo a quo, seja especializado em perícias médicas, não se pode olvidar que esta Corte vem reiteradamente anulando perícias feitas por ele (v.g. AC 0018203-46.2014.404.9999, 5ª T., Rel. Des. Federal Rogério Favreto, unânime, DE 02.12.2014; 0013855-19.2013.404.9999, 5ª T., DE 15.10.2015, DE 16.10.2015; e AC 0010990-86.2014.404.9999, 6ª T., Rel. Des. Federal João Batista Pinto Silveira, J. 03.12.2014), o que fragiliza a formação de convicção sobre o estado de saúde da parte autora, considerando, ainda, a existência de documentação médica dando respaldo à alegação da apelante de que se encontra incapacitada ao trabalho.

De fato, inexiste liberdade absoluta na elaboração da prova pericial por parte do expert, que deve se empenhar em elucidar ao juízo e às partes todos os elementos necessários à verificação do real estado de saúde do segurado que objetiva a concessão de benefício por incapacidade. A propósito do tema, le-ciona o eminente Juiz Federal José Antonio Savaris (Curso sobre perícia judicial previdenciária. Curitiba: Alteridade Editora, 2014, p. 32-33):

Com efeito, o médico perito nomeado pelo Juízo, nada obstante – formalmente – atue como perito de confiança em processo judicial, tem o dever inderrogável de prestar todos os esclarecimentos de forma racional, de molde a permitir real debate sobre a prova que é crucial para os processos previdenciários por inca-pacidade.

Page 209: Nº 345 – Março 2018 · Revista SÍNTESE Trabalhista e Previdenciária Ano XXIX – nº 345 – MArço 2018 reposItórIo AutorIzAdo de JurIsprudêncIA Supremo Tribunal Federal

RST Nº 345 – Março/2018 – PARTE GERAL – JURISPRUDÊNCIA PREVIDENCIÁRIA – ACÓRDÃO NA ÍNTEGRA ......................................209

O perito não é um senhor absoluto erigido acima de todos os postulados proces-so-constitucionais. Não pode ser tido tampouco como um ser mítico que acessa o impenetrável e revela a verdade oculta e que somente por ele pode ser obtida. A prova técnica, como qualquer outra etapa processual, não pode ser arbitrária e assim será toda vez que não se mostrar devidamente justificada ou, tanto quanto possível, fundamentada em dados técnicos objetivos ou que possam ser obtidos por sua experiência profissional (não se pretende excluir aqui, evidentemente, o elemento subjetivo do exame pericial).

Não se exigirá do perito, qualquer que seja sua especialidade, que realize diag-nóstico para prescrição do tratamento, faça prognóstico da evolução clínica, oriente ou acompanhe o periciando (o que seria ideal numa perspectiva de aten-dimento não fracionado à pessoa), mas é atribuição do perito determinar, com a necessária fundamentação, a aptidão laboral para fins do benefício por incapa-cidade.

O laudo técnico pericial, reconhecidamente a mais relevante prova nas ações previdenciárias por incapacidade, deve conter, pelo menos: as queixas do peri-ciando; a história ocupacional do trabalhador; a história clínica e exame clínico (registrando dados observados nos diversos aparelhos, órgãos e segmentos exa-minados, sinais, sintomas e resultados de testes realizados); os principais resulta-dos e provas diagnósticas (registrar exames realizados com as respectivas datas e resultados); o provável diagnóstico (com referência à natureza e localização da lesão); o significado dos exames complementares em que apoiou suas con-vicções; as consequências do desempenho de atividade profissional à saúde do periciando.

Quando a perícia judicial não cumpre os pressupostos mínimos de idoneidade da prova técnica, ela é produzida, na verdade, de maneira a furtar do magistrado o poder de decisão, porque respostas periciais categóricas, porém sem qualquer fundamentação, revestem um elemento autoritário que contribui para o que se chama decisionismo processual. Em face da ausência de referências fáticas deter-minadas, a solução judicial se traduziria em uma subjetividade desvinculada aos fatos, resultando mais de valorações e suspeitas subjetivas do que de circunstân-cias de fato (FERRAJOLI, Luigi. Direito e razão: teoria do garantismo penal. São Paulo: RT, 2002. p. 36).

Nessa direção também se alinha a jurisprudência deste Colegiado:

PREVIDENCIÁRIO – AUXÍLIO-DOENÇA E APOSENTADORIA POR INVALIDEZ – INCAPACIDADE LABORATIVA – DÚVIDA – ANULAÇÃO DA SENTENÇA – REABERTURA DA INSTRUÇÃO PROCESSUAL – Anulada a sentença a fim de ser aberta a instrução, para que seja realizada nova perícia com médico ortopedista avaliando as implicações decorrentes da patologia e as influências desta na ca-pacidade laborativa da parte autora. (AC 0000542-54.2014.404.9999, 5ª T., Rel. Des. Fed. Luiz Carlos de Castro Lugon, unânime, DE 10.03.2015)

PREVIDENCIÁRIO – AUXÍLIO-DOENÇA – MOLÉSTIA PSIQUIÁTRICA – ANU-LAÇÃO DA SENTENÇA – DETERMINAÇÃO DE NOVA PERÍCIA POR PSIQUIA-TRA – I – Nas ações em que se objetiva a concessão de auxílio-doença ou apo-

Page 210: Nº 345 – Março 2018 · Revista SÍNTESE Trabalhista e Previdenciária Ano XXIX – nº 345 – MArço 2018 reposItórIo AutorIzAdo de JurIsprudêncIA Supremo Tribunal Federal

210 ..................................RST Nº 345 – Março/2018 – PARTE GERAL – JURISPRUDÊNCIA PREVIDENCIÁRIA – ACÓRDÃO NA ÍNTEGRA

sentadoria por invalidez, o julgador, via de regra, firma sua convicção por meio da prova pericial. II – Sentença anulada para realização de perícia médica por médico especialista em psiquiatria. (TRF 4ª R., AC 0010087-85.2013.404.9999, 5ª T., Rel. Des. Fed. Rogerio Favreto, DE 06.08.2013)

Por conseguinte, impõe-se a anulação da sentença e a reabertura da ins-trução com a realização de perícia judicial por médico especialista em ortope-dia, para avaliar, exaustivamente, a alegada incapacidade do autor.

Ante o exposto, voto por, de ofício, anular o processo a partir da prova pericial, que deverá ser refeita por especialista em ortopedia, restando prejudi-cada a análise da apelação.

Des. Federal Jorge Antonio Maurique Relator

extrato De ata Da sessão De 31.01.2018

Apelação Cível nº 5066973-77.2017.4.04.9999/SC

Origem: SC 03003245320168240052

Relator: Des. Federal Jorge Antonio Maurique

Presidente: Celso Kipper

Procurador: Dr. Claudio Dutra Fontella

Apelante: Reginaldo Brechbuller

Advogado: Frederico Valdomiro Slomp

Apelado: Instituto Nacional do Seguro Social – INSS

Certifico que este processo foi incluído na Pauta do dia 31.01.2018, na sequência 671, disponibilizada no DE de 22.01.2018, da qual foi intimado(a) Instituto Nacional do Seguro Social – INSS, o Ministério Público Federal e as demais Procuradorias Federais.

Certifico que o(a) Turma Regional suplementar de Santa Catarina, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, pro-feriu a seguinte decisão:

A turma, por unanimidade, decidiu, de ofício, anular o processo a partir da prova pericial, que deverá ser refeita por especialista em ortopedia, restando prejudica-da a análise da apelação, nos termos do voto do relator, com ressalva de enten-dimento do Desembargador Federal Celso Kipper.

Relator Acórdão: Des. Federal Jorge Antonio Maurique

Page 211: Nº 345 – Março 2018 · Revista SÍNTESE Trabalhista e Previdenciária Ano XXIX – nº 345 – MArço 2018 reposItórIo AutorIzAdo de JurIsprudêncIA Supremo Tribunal Federal

RST Nº 345 – Março/2018 – PARTE GERAL – JURISPRUDÊNCIA PREVIDENCIÁRIA – ACÓRDÃO NA ÍNTEGRA ......................................211

Votante(s): Des. Federal Jorge Antonio Maurique Juiz Federal Hermes S da Conceição Jr. Des. Federal Celso Kipper

Ligia Fuhrmann Gonçalves de Oliveira Secretária

manifestações Dos magistraDos votantes DestaQue Da sessão – processo pautaDo

Ressalva em 30.01.2018 15:25:31 (Secretaria da Turma Regional de SC)

Nos processos de sequência 659, 660, 661, 671, 674, 675, 676, 677, 680, 681, 682, 683, 700, 701, 702, 703, 704, 705, 706, 707, 708, 1057 e 1063 ressalvo meu entendimento quanto ao decreto de nulidade da sentença procla-mado pelo relator.

A meu pensar, ainda quando produzido precariamente – é dizer, de modo a não refletir total e integralmente a realidade dos autos –, o laudo mé-dico deve ser renovado mediante simples conversão em diligência, conforme a orientação pretoriana.

Assim já era à luz do art. 560 do Código de Processo Civil de 1973 (TRF4, 6ª T., AC 0002020-34.2013.404.9999, de minha relatoria, de 03.06.2013) e da mesma forma permanece sob o regramento da nova Lei Adjetiva Civil, nota-damente seu art. 938, § 3º (v.g. EXCSUSP 0033997-66.2016.403.9999, TRF3, 8ª T., Rel. Des. Fed. David Dantas, e-DJF3 20.04.2017; Remessa nº 0057033-79.2010.401.9199, TRF1, 2ª Câmara Regional Previdenciária de Minas Gerais, Rel. Juiz Fed. Alexandre Ferreira Infante Vieira, e-DJF1 07.03.2017; AC 0003288-91.2016.405.9999, TRF5, Rel. Des. Fed. Manoel Erhardt, DJe 09.02.2017).

(Magistrado(a): Des. Federal Celso Kipper).

Page 212: Nº 345 – Março 2018 · Revista SÍNTESE Trabalhista e Previdenciária Ano XXIX – nº 345 – MArço 2018 reposItórIo AutorIzAdo de JurIsprudêncIA Supremo Tribunal Federal

Parte Geral – Jurisprudência Previdenciária – Acórdão na Íntegra

34826

Tribunal Regional Federal da 5ª RegiãoGabinete do Desembargador Federal Rogério Fialho MoreiraAC 597242‑PB 0002829‑55.2017.4.05.9999Apte.: Reginaldo Pereira dos SantosAdv./Proc.: Decio Geovanio da Silva (PB007692)Apdo.: INSS – Instituto Nacional do Seguro SocialRepte.: Procuradoria Representante da EntidadeOrigem: Vara Única da Comarca de Remígio/PBJuíza de Direito Juliana Dantas de AlmeidaRelator: Des. Federal Convocado Emiliano Zapata Leitão

ementa

PREVIDENCIÁRIO – AUXÍLIO-ACIDENTE – NÃO REDUÇÃO DA CAPACIDADE LABORAL – RESTABELECIMENTO DE AUXÍLIO-DOENÇA – INCAPACIDADE LABORAL CESSADA – APELAÇÃO IMPROVIDA

1. Consoante o art. 86 da Lei nº 8.213/1991, para a concessão do auxílio--acidente, faz-se necessário o preenchimento de dois requisitos, quais se-jam a qualidade de segurado e a redução da capacidade para o trabalho habitualmente exercido em razão de lesões consolidadas decorrentes de acidente de qualquer natureza.

2. Conforme perícia médica judicial realizada em abril de 2015, o su-plicante, em razão de sequelas de fratura no cotovelo, punho e fêmur (CID10 S52.0, S52.5 e S72.3), já se apresentou incapacitado parcialmen-te e temporariamente para sua atividade habitual, o que fundou a conces-são do auxílio-doença requerido em 06/2012. Conforme o laudo, contu-do, essa incapacidade se estenderia por até três meses após a cirurgia, e, à época da perícia, se evidenciava cessada.

3. Findado o gozo do auxílio-doença, não restaram caracterizadas seque-las capazes de ocasionar redução da capacidade laborativa do autor. O suplicante não faz jus ao benefício de auxílio-acidente.

4. Em harmonia com o alinhado no art. 59 da Lei nº 8.213/1991, o auxí-lio-doença alcança tão somente aqueles segurados que estão em situação de incapacidade temporária para o trabalho.

5. O laudo pericial concluiu que, à época da realização da perícia médi-ca judicial, a incapacidade laboral do suplicante já se encontrava cessa-

Page 213: Nº 345 – Março 2018 · Revista SÍNTESE Trabalhista e Previdenciária Ano XXIX – nº 345 – MArço 2018 reposItórIo AutorIzAdo de JurIsprudêncIA Supremo Tribunal Federal

RST Nº 345 – Março/2018 – PARTE GERAL – JURISPRUDÊNCIA PREVIDENCIÁRIA – ACÓRDÃO NA ÍNTEGRA ......................................213

da, razão pela qual não há cabimento para o restabelecimento do bene-fício previdenciário pretendido.

6. Apelação do autor não provida.

7. Honorários recursais, nos termos do art. 85, § 11, CPC/2015, ficando os honorários sucumbenciais majorados de 10% para 12%. Sendo o par-ticular beneficiário da gratuidade da justiça, fica suspensa a exigibilidade de tal verba no período de 5 anos subsequentes ao trânsito em julgado. Passado esse prazo, extingue-se a obrigação, nos termos do art. 98, § 3º, do CPC/2015.

acórDão

Vistos, etc.

Decide a Terceira Turma do Tribunal Regional Federal da 5ª Região, à unanimidade, negar provimento à Apelação, nos termos do voto do relator, na forma do relatório e notas taquigráficas constantes dos autos, que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Recife, 25 de janeiro de 2018.

Des. Federal Emiliano Zapata Leitão Relator convocado

relatório

Trata-se de Apelação interposta pelo particular (fls. 104/107) em face de sentença (99/101) que julgou improcedentes o pedido de auxílio-acidente, ao entendimento de que não restou caracterizada redução da capacidade labora-tiva, e o pedido de restabelecimento de auxílio-doença, em razão da ausência de incapacidade temporária para o exercício de atividade laboral. Condenou o autor ao pagamento das custas processuais e dos honorários advocatícios fixados em 10% (dez por cento) sobre o valor da causa, devendo ser suspensa a cobrança em razão do deferimento da Gratuidade da Justiça.

Em suas razões de apelo, sustentou o suplicante que restou constatada a redução de sua capacidade laborativa, depois de cessado o gozo do benefício de auxílio-doença concedido administrativamente pelo INSS em razão de inca-pacidade temporária para o trabalho decorrente de acidente automobilístico. Subsidiariamente, requereu o restabelecimento do auxílio-doença e avaliação para conversão do benefício pretendido em auxílio-acidente.

Contrarrazões apresentadas pelo INSS (fls. 110/112).

Page 214: Nº 345 – Março 2018 · Revista SÍNTESE Trabalhista e Previdenciária Ano XXIX – nº 345 – MArço 2018 reposItórIo AutorIzAdo de JurIsprudêncIA Supremo Tribunal Federal

214 ..................................RST Nº 345 – Março/2018 – PARTE GERAL – JURISPRUDÊNCIA PREVIDENCIÁRIA – ACÓRDÃO NA ÍNTEGRA

É o relatório.

voto

De início, cumpre-me admitir a Apelação do particular, considerando presentes os seus requisitos intrínsecos e extrínsecos.

A Lei nº 8.213/1991, em seu art. 86, assim dispõe sobre o benefício pre-videnciário de auxílio-acidente:

“Art. 86. O auxílio-acidente será concedido, como indenização, ao segurado quando, após consolidação das lesões decorrentes de acidente de qualquer natu-reza, resultarem sequelas que impliquem redução da capacidade para o trabalho que habitualmente exercia.”

Assim, para a concessão do auxílio-acidente, faz-se necessário o preen-chimento de dois requisitos, quais sejam a qualidade de segurado e a redução da capacidade para o trabalho habitualmente exercido em razão de lesões con-solidadas decorrentes de acidente de qualquer natureza.

Cinge-se a controvérsia do caso em apreço à verificação da redução da capacidade laboral do autor. Consoante perícia médica judicial realizada em abril de 2015 (fls. 71/72 e 80), o suplicante, em razão de sequelas de fratura no cotovelo, punho e fêmur (CID10 S52.0, S52.5 e S72.3), já se apresentou incapacitado parcialmente e temporariamente para sua atividade habitual, o que fundou a concessão do auxílio-doença requerido em 06/2012 (fls. 26 e 59). Conforme o laudo, contudo, essa incapacidade se estenderia por até três meses após a cirurgia, e, à época da perícia, se evidenciava cessada.

Findado o gozo do auxílio-doença, portanto, não restaram caracterizadas sequelas capazes de ocasionar redução da capacidade laborativa do autor. Nes-se sentido, o suplicante não faz jus ao benefício de auxílio-acidente.

Quanto ao pedido de restabelecimento do benefício de auxílio-doença, impende destacar, em harmonia com o alinhado no art. 59 da Lei nº 8.213/1991, que o auxílio-doença alcança tão somente aqueles segurados que estão em si-tuação de incapacidade temporária para o trabalho. À vista do exposto, o laudo pericial concluiu que, à época da realização da perícia médica judicial, a inca-pacidade laboral do suplicante já se encontrava cessada, razão pela qual não há cabimento para o restabelecimento do benefício previdenciário pretendido.

Ante o exposto, nego provimento à apelação. Condeno o recorrente ao pagamento de honorários recursais, nos termos do art. 85, § 11, CPC/2015, ficando os honorários sucumbenciais majorados de 10% (dez por cento) para 12% (doze por cento).

Page 215: Nº 345 – Março 2018 · Revista SÍNTESE Trabalhista e Previdenciária Ano XXIX – nº 345 – MArço 2018 reposItórIo AutorIzAdo de JurIsprudêncIA Supremo Tribunal Federal

RST Nº 345 – Março/2018 – PARTE GERAL – JURISPRUDÊNCIA PREVIDENCIÁRIA – ACÓRDÃO NA ÍNTEGRA ......................................215

Restando, todavia, indubitável que o autor não possui condições de arcar por ora com as verbas de sucumbência sem colocar em risco a sua manutenção, sendo, pois, beneficiária da gratuidade da justiça, fica suspensa a exigibilidade de tal verba no período de 05 (cinco) anos subsequentes ao trânsito em julga-do. Passado esse prazo, extingue-se a obrigação da beneficiária, nos termos do art. 98, § 3º, do CPC/2015.

É como voto.

Recife, 25 de janeiro de 2018.

Des. Federal Emiliano Zapata Leitão Relator convocado

Page 216: Nº 345 – Março 2018 · Revista SÍNTESE Trabalhista e Previdenciária Ano XXIX – nº 345 – MArço 2018 reposItórIo AutorIzAdo de JurIsprudêncIA Supremo Tribunal Federal

Parte Geral – Jurisprudência Previdenciária – Ementário34827 – aposentadoria especial – auxiliar de copa e serviços gerais – atendente e monitor da

febem – reconhecimento

“Previdenciário. Apelação. Aposentadoria especial. Comprovação das condições especiais. Au-xiliar de copa e serviços gerais, atendente e monitor da Febem. Agentes biológicos. EPI. Imple-mentação dos requisitos. DIB. Juros e correção monetária. Manual de Cálculos na Justiça Federal. Lei nº 11.960/2009. Inversão do ônus da sucumbência. Custas. Justiça Federal. Isenção. 1. Deve ser observada a legislação vigente à época da prestação do trabalho para o reconhecimento da natureza da atividade exercida pelo segurado e os meios de sua demonstração. 2. A especialidade do tempo de trabalho é reconhecida por mero enquadramento legal da atividade profissional (até 28.04.1995), por meio da confecção de informativos ou formulários (no período de 29.04.1995 a 10.12.1997) e via laudo técnico ou Perfil Profissiográfico Previdenciário (a partir de 11.12.1997). 3. Embora a lei não preveja expressamente o enquadramento das funções de Agente de Segurança no rol de atividades especiais, é forçoso reconhecer sua periculosidade, independente do uso de arma de fogo, por analogia à função de guarda, prevista no item 2.5.7 do Decreto nº 53.831/1964 (REsp 449.221/SC, Min. Felix Fischer). 4. Atividades de Auxiliar de Copa e Cozinha/Auxiliar de Serviços, Atendente/Auxiliar de Educação e Monitoria e Coordenação de Equipe da Febem. Ca-racterizada a exposição habitual e permanente a condições insalubres (agentes biológicos) per-mite o enquadramento, por analogia, no código 1.3.2 do Decreto nº 53.831/1964 e código 1.3.4 do Decreto nº 83.080/1979. 5. A soma dos períodos redunda no total de mais de 25 anos de tempo de serviço especial, o que autoriza a concessão da aposentadoria especial, nos termos do art. 57 da Lei nº 8.213/1991. 6. DIB na data do requerimento administrativo (28.02.2005). 7. Juros e correção monetária de acordo com os critérios do Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal, naquilo que não conflitar como o disposto na Lei nº 11.960/2009. 8. Inversão do ônus da sucumbência. 9. O Instituto Nacional do Seguro Social – INSS é isento do pagamento de custas processuais nos processos em trâmite na Justiça Federal, exceto as de reembolso. Art. 4º, I, da Lei nº 9.289/1996. 10. Apelação da parte autora provida.” (TRF 3ª R. – AC 0006720-29.2006.4.03.6183/SP – 7ª T. – Rel. Des. Fed. Paulo Domingues – DJe 31.10.2017 – p. 683)

34828 – aposentadoria por tempo de serviço – professor – fator previdenciário – aplicabilidade

“Processual civil e previdenciário. Agravo interno no recurso especial. Aposentadoria por tempo de serviço/contribuição. Professor. Fator previdenciário. Acórdão proferido pelo Tribunal a quo de índole exclusivamente constitucional. Impossibilidade de revisão em sede de recurso especial. Art. 949 do CPC/2015. Fundamento não atacado. Súmula nº 283/STF. Agravo interno do INSS a que se nega provimento. 1. Verifica-se que a alegada violação ao art. 949 CPC/2015, foi rechaça-da pelo acórdão recorrido ao fundamento de que tal questão restou superada com o trânsito em julgado do Incidente de Arguição de Inconstitucionalidade em 24.10.2016, devendo tal questão ter sido levantada nesta ação, onde foi declarada a inconstitucionalidade. 2. Contudo esse fun-damento autônomo e suficiente à manutenção do aresto recorrido não foi impugnado nas razões do Recurso Especial, permanecendo, portanto, incólume. Dessa forma, aplicável, na espécie, por analogia, a Súmula nº 283 do STF. 3. A controvérsia foi dirimida na Corte de origem com fundamento da declaração da inconstitucionalidade do inciso I do art. 29 da Lei nº 8.213/1991, sem redução do texto, e dos incisos II e III do § 9º do mesmo dispositivo, declarada pela Corte Especial do Tribunal Regional Federal da 4ª Região. Nestes termos, se a matéria de fundo foi resol-vida no acórdão recorrido sob o enfoque estritamente constitucional é inviável a sua reforma em sede de Recurso Especial, sob pena de usurpação da competência do Supremo Tribunal Federal. 4. Esta Corte na análise de processos que decorrem da mesma declaração de inconstituciona-lidade já consolidou a orientação de que não é possível a desconstituição do acórdão, como pretende o INSS. Ilustrando tal conclusão, os seguintes precedentes: REsp 1.673.317/RS, Rel. Min. Sérgio Kukina, DJe 9.6.2017; REsp 1.674.492/RS, Rel. Min. Sérgio Kukina, DJe 14.06.2017; REsp 1.672.911/RS, Rel. Min. Sérgio Kukina, DJe 08.06.2017, REsp 1.662.698/RS, Relª Min. Assusete Magalhães, DJe 26.06.2017; REsp 1.660.678/RS, Relª Min. Assusete Magalhães, DJe 26.06.2017; REsp 1.659.017/RS, Relª Min. Assusete Magalhães, DJe 26.06.2017, REsp 1.670.701/SC,

Page 217: Nº 345 – Março 2018 · Revista SÍNTESE Trabalhista e Previdenciária Ano XXIX – nº 345 – MArço 2018 reposItórIo AutorIzAdo de JurIsprudêncIA Supremo Tribunal Federal

RST Nº 345 – Março/2018 – PARTE GERAL – JURISPRUDÊNCIA PREVIDENCIÁRIA – EMENTÁRIO .......................................................217

Rel. Min. Francisco Falcão, DJe 22.06.2017; REsp 1.668.189/RS, Rel. Min. Francisco Falcão, DJe 22.06.2017; REsp 1.657.617/RS, Rel. Min. Francisco Falcão, DJe 22.06.2017; REsp 1.674.432/RS, Rel. Min. Og Fernandes, DJe 16.06.2017; REsp 1.672.858/RS, Rel. Min. Og Fernandes, DJe 16.06.2017; REsp 1.667.294/RS, Rel. Min. Og Fernandes, DJe 14.06.2017. 5. Agravo Interno do INSS a que se nega provimento.” (STJ – AgInt-REsp 1.664.900 – (2017/0073490-8) – 1ª T. – Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho – DJe 27.10.2017 – p. 1619)

Remissão Editorial SÍNTESEVide RST nº 343, jan./2018, ementa nº 34711 do TRF 2ª R.

Transcrição Editorial SÍNTESELei nº 8.213/1991:“Art. 29. O salário-de-benefício consiste: (NR) (Redação dada pela Lei nº 9.876, de 26.11.1999, DOU 29.11.1999)I – para os benefícios de que tratam as alíneas b e c do inciso I do art. 18, na média aritmética simples dos maiores salários-de-contribuição correspondentes a oitenta por cento de todo o período contributivo, multiplicada pelo fator previdenciário; (Inciso acrescentado pela Lei nº 9.876, de 26.11.1999, DOU 29.11.1999)II – para os benefícios de que tratam as alíneas a, d, e e h do inciso I do art. 18, na média aritmética simples dos maiores salários-de-contribuição correspondentes a oitenta por cento de todo o período contributivo. (Inciso acrescentado pela Lei nº 9.876, de 26.11.1999, DOU 29.11.1999)”

34829 – auxílio-acidente – redução da capacidade laborativa demonstrada – qualidade de segu-rado mantida – benefício devido

“Previdenciário. Apelação cível. Auxílio-acidente. Redução da capacidade laborativa demons-trada. Qualidade de segurado no momento do acidente. Juros e correção monetária. Manual de cálculos na Justiça Federal e Lei nº 11.960/2009. 1. Conhece-se do agravo retido interposto pela parte autora, uma vez que sua apreciação por esta Corte foi expressamente requerida nas razões do recurso, nos termos do art. 523, § 1º, do CPC/1973, vigente à época da interposição. No entan-to, o laudo pericial foi elaborado com boa técnica e forneceu ao Juízo os elementos necessários à análise da demanda. Não se vislumbram no laudo as inconsistências alegadas. Preliminar de cer-ceamento de defesa rejeitada. Agravo retido não provido. 2. Comprovados acidente de qualquer natureza, redução permanente da capacidade laborativa, nexo causal e qualidade de segurado, a parte autora faz jus ao benefício de auxílio-acidente. 3. Juros e correção monetária de acordo com os critérios do Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal, naquilo que não conflitar como o disposto na Lei nº 11.960/2009. Correção de ofício. 4. Sucum-bência recíproca. 5. O indeferimento de pedidos administrativos, por si só, não configura o dano moral, exigindo-se a comprovação do prejuízo e do seu nexo de causalidade com o ato adminis-trativo. 6. Sentença corrigida de ofício. Agravo retido não provido. Preliminar rejeitada e, no mé-rito, apelações do INSS e do autor não providas.” (TRF 3ª R. – AC 0000827-97.2011.4.03.6113/SP – 7ª T. – Rel. Des. Fed. Paulo Domingues – DJe 06.12.2017 – p. 1663)

Remisssão Editorial SÍNTESEVide RST nº 340, out./2017, ementa nº 34545 do TRF 5ª R.

34830 – auxílio-doença – concessão – conversão em aposentadoria por invalidez – impossibili-dade

“Previdenciário. Auxílio-doença. Concessão. Impossibilidade de conversão em aposentadoria por invalidez. Consectários legais fixados de ofício. 1. São requisitos dos benefícios postulados a inca-pacidade laboral, a qualidade de segurado e a carência, esta fixada em 12 contribuições mensais, nos termos do art. 25 e seguintes da Lei nº 8.213/1991. 2. No caso vertente, restou incontroverso o preenchimento dos requisitos pertinentes à carência e à qualidade de segurado, ante a ausência de impugnação pela autarquia previdenciária e, quanto à incapacidade laboral, não obstante a conclusão do médico perito no sentido da incapacidade parcial e permanente da parte autora,

Page 218: Nº 345 – Março 2018 · Revista SÍNTESE Trabalhista e Previdenciária Ano XXIX – nº 345 – MArço 2018 reposItórIo AutorIzAdo de JurIsprudêncIA Supremo Tribunal Federal

218 ...................................................RST Nº 345 – Março/2018 – PARTE GERAL – JURISPRUDÊNCIA PREVIDENCIÁRIA – EMENTÁRIO

em razão de hérnia discal lombar, síndrome do túnel do carpo bilateral e neuropatia diabética dos membros superiores e inferiores, afirmou que esta poderá exercer determinadas atividades que não exijam esforços físicos e movimentos repetitivos (fls. 63/66 e fls. 80/81). 3. De acordo com os arts. 59 e 62 da Lei nº 8.213/1991, o benefício de auxílio-doença é devido ao segurado que fica incapacitado temporariamente para o exercício de suas atividades profissionais habi-tuais, bem como àquele cuja incapacidade, embora permanente, não seja total, isto é, que haja a possibilidade de reabilitação para outra atividade que garanta o seu sustento, como na hipótese. 4. A correção monetária deverá incidir sobre as prestações em atraso desde as respectivas compe-tências e os juros de mora desde a citação, observada eventual prescrição quinquenal, nos termos do Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal, aprovado pela Resolução nº 267/2013, do Conselho da Justiça Federal (ou aquele que estiver em vigor na fase de liquidação de sentença). Os juros de mora deverão incidir até a data da expedição do Precatório/RPV, conforme entendimento consolidado pela colenda 3ª Seção desta Corte. Após a expedição, deverá ser observada a Súmula Vinculante nº 17. 5. Apelações desprovidas. Consectários legais fixados de ofício.” (TRF 3ª R. – AC 0008778-17.2017.4.03.9999/SP – 10ª T. – Rel. Des. Fed. Nelson Porfirio – DJe 06.12.2017 – p. 2656)

Remissão Editorial SÍNTESEVide RST nº 336, jun./2017, ementa nº 34301 do TRF 1ª R.

34831 – auxílio-reclusão – tutela de urgência – pagamento após a soltura do segurado – flexibili-zação da regra – possibilidade

“Direito previdenciário e processual civil. Agravo de instrumento. Auxílio-reclusão. Tutela de urgência deferida. Art. 300 do Código de Processo Civil/2015. Pagamento após a soltura do segu-rado. Possibilidade. Flexibilização da regra. Proteção aos dependentes de baixa renda. Proteção familiar. Princípio fundamental da dignidade da pessoa humana, inciso III, art. 1º da Constituição Federal. Precedentes STJ. Manutenção da decisão agravada. Art. 201, inciso IV, da Constituição Federal. Art. 80 da Lei nº 8.213/1991. Inexistência de teratologia e abuso de poder. Recurso desprovido. I – Decisão agravada que deferiu o pedido de tutela de urgência, no sentido de ser concedido à requerente, menor de idade, o benefício de auxílio-reclusão, pelo prazo de 3 meses, em consonância com o art. 300, do Código de Processo Civil/2015. II – Reconhecido o direito ao recebimento do benefício, após a soltura do segurado, pela flexibilização das regras apresentadas na legislação vigente, em proteção aos dependentes de baixa renda, no intuito de atender à prote-ção familiar e ao princípio fundamental da dignidade da pessoa humana, conforme inciso III, do art. 1º da Constituição Federal. Precedente STJ. III – Manutenção da decisão agravada, de acordo com o previsto no art. 201, inciso IV, da Constituição Federal e art. 80, da Lei nº 8.213/1991, por além de não incorrer em teratologia, descompasso com a CRFB/1988, manifesta ilegalidade ou abuso de poder, não confronta precedente segundo a sistemática do NCPC ou posicionamen-to pacificado pelos membros desta Corte ou tribunais superiores sobre a matéria em questão. IV – Agravo de instrumento conhecido e desprovido.” (TRF 2ª R. – AI 0007856-27.2017.4.02.0000 – 2ª T.Esp. – Rel. Des. Fed. Marcello Granado – DJe 31.10.2017 – p. 360)

Comentário Editorial SÍNTESEO v. acórdão tem por escopo cuidar da concessão do auxílio-reclusão após a soltura do preso.Previsto nos arts. 18, II, b, e 80 da Lei nº 8.213/1991 e regulamentado pelos arts. 116 e 119 do Decreto nº 3.048/1999, é um benefício previdenciário de trato continuado, devido men-salmente aos dependentes do segurado preso por qualquer motivo, independente de carência.A cessação do benefício poderá ocorrer: a) com a soltura do segurado; b) com o seu óbito, hipótese em que o auxílio-reclusão é automaticamente convertido em pensão por morte; ou c) caso haja a cessação da relação de dependência dos beneficiários para com o segurado. Após a concessão do benefício, os dependentes devem apresentar à Previdência Social, de três em três meses, atestado de que o segurado continua detido ou recluso. Esse benefício também deixa de ser pago em caso de fuga, suspensão da pena e liberdade.Salientamos que o STF proferiu decisão que manteve o critério de concessão do benefício previdenciário de auxílio-reclusão aos dependentes do preso segurado da Previdência Social.

Page 219: Nº 345 – Março 2018 · Revista SÍNTESE Trabalhista e Previdenciária Ano XXIX – nº 345 – MArço 2018 reposItórIo AutorIzAdo de JurIsprudêncIA Supremo Tribunal Federal

RST Nº 345 – Março/2018 – PARTE GERAL – JURISPRUDÊNCIA PREVIDENCIÁRIA – EMENTÁRIO .......................................................219

O Supremo considerou constitucional a legislação que determina a concessão do benefício à família do preso que mantém a qualidade de segurado ou que ainda esteja no período de gra-ça, condição atrelada à análise de renda do preso. O preso mantém a qualidade de segurado enquanto está contribuindo para a Previdência Social.Em seu brilhante artigo acerca do tema em destaque, a advogada Rúbia Zanotelli de Alvarenga alude:“Como bem assevera Sergio Pinto Martins: ‘A ideia do benefício é o fato de que o preso deixa de ter uma renda. Sua família fica desamparada [...]. A família do preso perde o rendimento que ele tinha e precisa manter a sua subsistência’.O auxílio-reclusão engloba o núcleo basilar dos direitos humanos sociais do segurado na rela-ção jurídica de seguro social. Nesse aspecto, o benefício em questão tem por finalidade básica a melhoria das condições mínimas de vida, digna dos hipossuficientes, visando à concretiza-ção da igualdade social e à proteção à dignidade da pessoa.Segundo Lauro Cesar Mazetto Ferreira: ‘A dignidade da pessoa, fundamento de nosso sistema jurídico, é o ponto-chave do reconhecimento e proteção dos direitos humanos. É o fim último que garante um patamar de direitos que seja capaz de preservar seu objetivo fundamental’.O papel da previdência social é reduzir as desigualdades sociais e econômicas por intermédio de uma política de distribuição de renda, retirando maiores contribuições das camadas mais favorecidas, com o objetivo de conceder benefícios para as populações mais carentes.Nesse contexto, para que os dependentes do segurado recolhido à prisão façam jus a tal direi-to, é necessário que o segurado, recolhido à prisão provisória ou definitiva, esteja cumprindo pena privativa de liberdade, em regime fechado ou semiaberto, e que não esteja recebendo remuneração da empresa.” (O auxílio-reclusão como um direito humano e fundamental dos dependentes do segurado recolhido à prisão. Revista SínTESE Trabalhista e Previdenciário, n. 241, jun. 2009. p. 36)

34832 – Benefício assistencial – menor portador de paralisia cerebral e estado de miserabilidade – perícia – incapacidade para a vida – ausência – benefício indevido

“Previdenciário. Amparo social ao deficiente. Menor. Perícia social. Estado de miserabilidade comprovado. Laudo médico. Ausência de incapacidade para vida independente. 1. Trata-se de apelação interposta pela parte autora, menor, contra sentença que julgou improcedente o pedido de concessão do benefício de amparo social ao deficiente, sob o fundamento de que não foi cons-tatada incapacidade do autor. 2. In casu, irrelevante averiguar se o autor é ou não incapaz para desempenhar trabalho rentável, pois sua condição de menor, por si só, já o torna incompatível com o exercício de atividade laboral. 3. Da análise do laudo médico pericial, verifica-se que o perito judicial afirmou que o autor, nascido em 23.11.2004, ‘é portador de deficiência física por paralisia cerebral CID G80 levando ao comprometimento motor do membro inferior direito com pé em equino-varo mais atrofia e impotência funcional dos músculos fibulares, músculos tibais anteriores e encurtamento de 3cm do membro inferior direito levando a marcha claudicante’. Respondeu, ao final, que a deficiência/patologia/lesão/sequela ‘não incapacita para o trabalho’. 4. A perícia social, por outro lado, constatou que o demandante reside com seus pais e mais dois irmãos menores, e que a renda auferida corresponde ao repasse do Programa Bolsa Família, no valor de R$ 422,00, sobrevivendo a família, ainda, da agricultura de subsistência, concluindo que esta se encontra em situação de vulnerabilidade social. Destaque-se que no momento da realização da perícia social, o requerente encontrava-se em horário escolar. 5. Embora o termo utilizado pelo perito judicial não seja o adequado (incapaz para o trabalho), uma vez que o autor é adolescente, extrai-se dos laudos apresentados que o periciando não se encontra incapacitado para atos da vida independente, uma vez que a deficiência é física, causando marcha claudicante, não o impedindo de frequentar a escola, inexistindo elementos nos autos reveladores de restrições quanto ao desempenho de atividades, tampouco de obstáculos à participação no meio social em que vive a criança. 6. Isso posto, a doença alegada não o incapacita de modo a exigir atenção especial e constante de seus genitores, restando indevida a concessão do benefício. 7. Apelação improvida.” (TRF 5ª R. – AC 0001432-58.2017.4.05.9999 – (595098/PB) – 3ª T. – Rel. Des. Fed. Fernando Braga – DJe 30.10.2017 – p. 26)

Page 220: Nº 345 – Março 2018 · Revista SÍNTESE Trabalhista e Previdenciária Ano XXIX – nº 345 – MArço 2018 reposItórIo AutorIzAdo de JurIsprudêncIA Supremo Tribunal Federal

220 ...................................................RST Nº 345 – Março/2018 – PARTE GERAL – JURISPRUDÊNCIA PREVIDENCIÁRIA – EMENTÁRIO

34833 – Benefício previdenciário – acidente do trabalho – comprovação dos requisitos – paga-mento devido

“Direito previdenciário e processual civil. Apelação cível. Ação previdenciária. Pleito de con-cessão de benefício acidentário. Redução permanente da capacidade laborativa. Demonstração. Enquadramento da lesão no Anexo III do Decreto nº 3.048/1999. Irrelevância. Rol exemplifica-tivo. Auxílio-acidente devido. Recurso provido. O auxílio-acidente é devido ao segurado que demonstre a redução de sua capacidade para o trabalho habitualmente exercido e o nexo de causalidade entre a debilidade e o acidente sofrido – ‘O benefício acidentário é devido ainda que mínima a lesão, porquanto o nível do dano e, consequentemente, o grau do maior esforço não interferem na sua concessão’ (STJ, AgRg-Ag 1427123/SC) – a mera ausência de enquadramento da lesão no Anexo III do Decreto nº 3.048/1999 não afasta, por si só, a possibilidade de percepção do auxílio-acidente, por veicular o regulamento rol exemplificativo de situações que dão direito ao benefício.” (TJMG – AC 1.0024.14.229921-3/001 – 9ª C.Cív. – Rel. Márcio Idalmo Santos Miranda – DJe 05.12.2017)

Comentário Editorial SÍNTESENa ementa em destaque o Tribunal reconheceu que o segurado preencheu os requisitos para o recebimento do benefício acidentário.Previsto no art. 86 da Lei nº 8.213/1991, o auxílio-acidente será concedido, como indeniza-ção, ao segurado quando, após a consolidação das lesões decorrentes de acidente de qualquer natureza, resultarem sequelas que impliquem redução da capacidade para o trabalho que habitualmente exercia. O cidadão que vai requerer este tipo de benefício deve comprovar os seguintes requisitos:O benefício não exige carência, pois é somente para casos de acidente do trabalho.Os segurados que fazem jus ao benefício são: empregado urbano/rural (empresa), empregado doméstico (para acidentes ocorridos a partir de 01.06.2015), o trabalhador avulso (empresa) e o segurado especial (trabalhador rural).Em seu artigo, o Dr. Helio do Valle Pereira assim explica:“Relembro que o aspecto central da noticiada nova visão do auxílio-acidente está na utiliza-ção da expressão ‘acidente de qualquer natureza’, comum no art. 86, do PBPS, desde a Lei nº 9.032/1995.Tenho, no entanto, que esta fórmula deve ser adequadamente interpretada.Em realidade, o ponto decisivo na redação proposta pela Lei nº 9.032/1995 está na superação das distinções acidentárias quanto à gravidade, uma vez caracterizada redução funcional par-cial e permanente. A extensão das lesões, a implicação quanto à necessidade de modificação de profissão, a imprescindibilidade de reabilitação profissional, tudo ficou relegado a segundo plano; bastante a limitação da capacidade laborativa. Nesta perspectiva, quer parecer, é que se fala em ‘acidente de qualquer natureza’, é dizer, acidente de indiferente extensão, de irre-levante gravidade. Todo acidente gera direito ao auxílio-acidente, uma vez presente restrição física permanente. Mas a palavra acidente continua utilizada em seu sentido técnico preciso. Está implícita a referência a acidente do trabalho.O argumento que aparenta ser imperativo, a dicção literal do novo art. 86, do PBPS, não alcança, penso, a culminância proposta. Há, do ponto de vista teórico, justificativa bastante para o emprego da dúbia fórmula ‘acidente de qualquer natureza’. Suficiente a compreensão do novo texto em confronto com o precedente, notabilizado por confusa diferenciação quanto à gravidade das lesões de origem infortunística.A interpretação sistemática da Lei nº 8.213/1991 reforça este ponto de vista, eis que dá ela tratamento particularizado aos acidentes do trabalho, relativamente a demais cobertura previdenciária. Não seria razoável crer que houvesse, agora, dupla caracterização de acidentes albergados pela legislação: o acidente do trabalho e o acidente de qualquer natureza. Aliás, é a própria Constituição Federal que propõe regramento peculiar, ao se referir aos riscos ligados ao acidente do trabalho (arts. 201, inc. I, e 7º, XXVIII), como anota Daniel Lupino (Risco Pro-fissional e Risco Comum: Imposição Constitucional da Existência de Cobertura Diferenciada. In Revista da Procuradoria-Geral do INSS, v. III, n. 3, p. 9 e ss.).Não enxergo no dispositivo outra coisa senão deficiência de técnica legislativa, utilizando a palavra acidente tal qual trouxesse consigo, por tradição histórica evidente, a complementação vinculando-o a causa do trabalho.

Page 221: Nº 345 – Março 2018 · Revista SÍNTESE Trabalhista e Previdenciária Ano XXIX – nº 345 – MArço 2018 reposItórIo AutorIzAdo de JurIsprudêncIA Supremo Tribunal Federal

RST Nº 345 – Março/2018 – PARTE GERAL – JURISPRUDÊNCIA PREVIDENCIÁRIA – EMENTÁRIO .......................................................221

Vejo, de outro norte, que há argumento irrespondível quanto à subsistência do nexo causal.É que o § 4º do art. 86, do PBPS, na redação ditada pela Lei nº 9.528/1997, diz que ‘a perda da audição, em qualquer grau, somente proporcionará a concessão do auxílio-acidente, quan-do, além do reconhecimento de causalidade entre o trabalho e a doença, resultar, compro-vadamente, na redução ou perda da capacidade para o trabalho que habitualmente exercia’.Conforme se infere do texto destacado, o nexo causal é expressamente referido como fator componente do suporte fático do auxílio-acidente vinculado a males auditivos. É princípio comezinho de hermenêutica que os diversos componentes de um dispositivo legal devem ser interpretados em harmonia. Logo, o caput não pode ser analisado insuladamente, desagregado da mesma base de raciocínio advinda dos seus parágrafos. Consequentemente, se a relação de causalidade entre doença e trabalho é exigida para os problemas de audição, identicamente ocorre quanto a todas as demais circunstâncias.Entende-se, aliás, a particularização perseguida pelo legislador, eis que a jurisprudência adotou posição liberalizante quanto aos padecimentos auditivos do obreiro, como é exemplo eloquente a Súmula nº 44, do Superior Tribunal de Justiça. De tal sorte, houve por bem o legislador, evidentemente movido pelo desejo de frear este impulso protecionista, ratificar a necessidade de ficar cumpridamente provado nexo causal. Isto porque são muitas vezes difíceis os diagnós-ticos da origem de tais doenças. Não se cuida, no entanto, de ditar regra unicamente válida quanto a este tipo de mal: é, tão somente, especial ênfase que apenas confirma a regra geral.Mas outros argumentos existem.Se a expressão ‘acidente de qualquer natureza’ tem sua compreensão ligada a estrita litera-lidade, deve-se fazer total dissociação da significação técnica do acidente do trabalho. Isto é importante lembrar porque o trabalho legislativo deu ao sinistro laboral horizonte muito mais amplo do que permitiria o seu simples entendimento vernacular. Acidente do trabalho, por si só, corresponde a evento casual e inesperado ocorrido no curso da jornada de trabalho e de evidente origem traumática (externa à pessoa do empregado), isto é, perda de segmentos corporais, lesões aos sentidos (por exemplo, explosão destacada que, em única oportunidade, levasse à privação da audição, ou ferimento dos olhos, conduzindo à perda da visão). Nesta linha de pensar, acidente é um fato que, por si só, leva à eclosão de situação de depreciação da saúde.Esta, em essência, é a definição de acidente do trabalho proposta pelo art. 19, do PBPS. Su-cede que no dispositivo seguinte, incluem-se entre os acidentes do trabalho, por equiparação, as doenças profissionais e as doenças do trabalho. Nestas hipóteses, a rigor, não se pode falar em acidente, justo que o padecimento físico do obreiro é proveniente de circunstância que gradativamente vai se instalando, apenas paulatinamente conduzindo à redução funcional.Ora, se o auxílio-acidente é estranho à origem acidentária, apenas situações que possam ser tipicamente definidas como ‘acidentes’ podem conduzir ao seu deferimento, jamais aquelas resultantes de processos patológicos gradativos. Se é proposta interpretação literal para o art. 86, do PBPS, é de se convir que seria sustentável, por identidade de razões, que todas as doenças profissionais estivessem alijadas da reparação previdenciária. Destarte, a lombalgia e a pneumoconiose, v.g., que acometem mineiros, não permitiriam mais a concessão de auxílio--acidente: não são ‘acidentes’, mas sim doenças profissionais. Enfim, ‘acidentes de qualquer natureza’ não são ‘doenças profissionais’. Estas são acidentes do trabalho apenas por equipa-ração, mas não são ‘acidentes’ em si.Decorrência dessa conclusão é que patologias dessa espécie não lograriam mais proteção no campo da infortunística (nem previdenciariamente), salvo se conduzissem à total incapaci-tação.A hermenêutica é inusitada, mas é lógica, se admitida como certa a interpretação que vem sendo dada à expressão ‘acidente de qualquer natureza’.Fundamento complementar refere-se ao rol de beneficiários do auxílio-acidente, que, nos ter-mos do art. 18, § 1º, da Lei nº 8.213/1991, exatamente na redação da Lei nº 9.032/1995, são apenas os segurados empregados, avulso e especial (art. 11, incs. I, VI e VII). Essa situação apenas reforça a necessidade de vincular o auxílio-acidente e o desempenho laboral. Caso contrário, não se justificaria a restrição proposta. É evidente que o legislador buscou conceder maior proteção àquelas classes de segurados que mais especialmente estão expostas aos riscos da atividade produtiva. Se fosse sustentável que todo evento causador de sequela incapacitante fosse passível de reparação pelo auxílio-acidente, não haveria motivo para afas-tar do seu contexto o empresário ou o trabalhador autônomo, e.g. (incs. III e IV do art. 11). Nem haveria sentido em se conceder proteção especial aos segurados hoje abrangidos pelo

Page 222: Nº 345 – Março 2018 · Revista SÍNTESE Trabalhista e Previdenciária Ano XXIX – nº 345 – MArço 2018 reposItórIo AutorIzAdo de JurIsprudêncIA Supremo Tribunal Federal

222 ...................................................RST Nº 345 – Março/2018 – PARTE GERAL – JURISPRUDÊNCIA PREVIDENCIÁRIA – EMENTÁRIO

auxílio-acidente se o evento que lhe desse origem pudesse ocorrer em circunstâncias alheias ao exercício profissional.Com maior riqueza de fundamentos, Ana Francisca Moreira de Souza Sandem (Auxílio-aci-dente – Alcance da expressão acidente ‘de qualquer natureza’ constante do art. 86 da Lei nº 8.213/1991, com a redação dada pela Lei nº 9.032/1995. In Revista da Previdência Social 185/319) chega a essa conclusão, ‘reforçando que a expressão “acidente de qualquer natureza” deve ser interpretada nos limites dos arts. 19, 20 e 21 da Lei nº 8.213/1991. Os sujeitos destinatários do benefício, quais sejam, o empregado, o segurado trabalhador avulso e segurado especial, uma vez sofrendo acidente fora dos lineamentos traçados pelos arts. 19, 20 e 21 da Lei nº 8.213/1991 não têm direito a receber o benefício’.” (Auxílio-acidente e nexo causal. Disponível em: http://online.sintese.com. Acesso em: 15 dez. 2016)

34834 – Benefício previdenciário – recebido mediante fraude – ressarcimento ao erário – cabi-mento

“Administrativo. Ação de cobrança. INSS. Benefício previdenciário recebido mediante fraude. Ressarcimento ao Erário. Cabimento. Decadência administrativa afastada. Cinge-se a controvérsia ao exame da possibilidade de ressarcimento ao erário de quantias depositadas pela parte autora, a título de aposentadoria, supostamente obtida por meio fraudulento. Afastada a alegação de de-cadência administrativa ante a comprovação da má-fé da parte ré na obtenção da aposentadoria. Instaurado o processo administrativo e oportunizado à ré o exercício do contraditório e da ampla defesa (fls. 21/24), o INSS procedeu às diligências destinadas a apurar os fatos junto ao CNIS, às empregas supostamente empregadoras e à Caixa Econômica Federal, tendo verificado, conforme relatório de fls. 30/32, de 08.07.199, que não foram confirmados os vínculos empregatícios com as empresas Calçados Luck Ltda., Hospital São Francisco de Paula, Depósito de Calçados S. Pena Ltda., Magus Confecções Ind. e Com. Ltda. e D F Ribeiro Auto Mecânica, haja vista apresentarem divergência quanto ao período ou não constarem do referido cadastro. Também não foram confir-madas as remunerações utilizadas na concessão do benefício [...] No decorrer das apurações tam-bém não ficaram comprovados os vínculos empregatícios da interessada em períodos anteriores ao CNIS, relativos às empresas Eletro MET e Peças de Raduio Ltda., de 01.06.1966 a 28.09.1970 e Gambier AS, de 02.10.1970 a 25.08.1975 [...] (fls. 42/44 e 61/93). Após regular processo admi-nistrativo, no qual foi garantida a ampla defesa e o contraditório, restou demonstrado que a autora aposentou-se, mas não apresentou, nem quando notificada pelo INSS, qualquer documento que comprovasse vínculo empregatício. Acrescente-se que o fato de o processo concessório do bene-fício não ter sido localizado não afasta a necessidade de registro mínimo no Cadastro Nacional de Informações Sociais – CNIS, a partir do ano de 1976, quando foi implantado. Decidir pelo não ressarcimento redundaria em enriquecimento ilícito da parte ré, uma vez que recebeu provento de aposentadoria durante anos, sem a devida contribuição, onerando ilícita e injustamente a Ad-ministração Pública Federal. Recurso desprovido.” (TRF 2ª R. – AC 0157419-89.2015.4.02.5101 – 8ª T.Esp. – Relª Desª Fed. Vera Lucia Lima – DJe 07.12.2017 – p. 779)

34835 – competência – Justiça federal – ação declaratória – reconhecimento de união estável para fins previdenciários – alcance

“Previdenciário. Ação declaratória. Reconhecimento de união estável para fins previdenciários. INSS como parte. Competência da Justiça Federal. União estável comprovada. 1. Trata-se de processo sujeito ao duplo grau obrigatório, em virtude de sentença que julgou procedente a pre-tensão autoral no sentido de declarar a qualidade de companheira e dependente econômica da autora em relação ao extinto, durante o período de 10.02.1989 a 25.05.1999. 2. O Supremo Tribunal Federal já firmou seu entendimento no sentido de que, nas causas que versem sobre reconhecimento de união estável, figurando o INSS como parte ou detendo a autarquia previ-denciária interessa na matéria, a competência é da Justiça Federal (RE-AgR 545199, Ellen Gracie, STF). 3. No mérito, em relação à comprovação da união estável, os elementos de prova junta-dos aos autos pela parte autora foram: (i) Certidão de Casamento do de cujus com a primeira esposa, de 09.06.1970; (ii) Certidão de Óbito da primeira esposa do extinto, que veio a fale-cer no dia 08.04.1987; (iii) Certidão de Casamento eclesiástico da autora com extinto, ocorrido

Page 223: Nº 345 – Março 2018 · Revista SÍNTESE Trabalhista e Previdenciária Ano XXIX – nº 345 – MArço 2018 reposItórIo AutorIzAdo de JurIsprudêncIA Supremo Tribunal Federal

RST Nº 345 – Março/2018 – PARTE GERAL – JURISPRUDÊNCIA PREVIDENCIÁRIA – EMENTÁRIO .......................................................223

em 10.02.1989; (iv) Documento de Identificação dos filhos do de cujus com a primeira esposa; (v) Certidão de Óbito do extinto, falecido em 24.05.1999. 4. Da análise de tais elementos, verifi-ca-se a autora trouxe início de prova material apto a demonstrar que ela e o de cujus mantiveram, até o óbito do segundo, uma vida em comum como companheiros. Destaque-se, inclusive, que tais provas foram corroboradas através de prova testemunhal, que se mostrou harmônica com os documentos juntados, bem como com a versão da autora. 5. Ademais, em parecer favorável à autora, o Ministério Público, opinou pela procedência do pedido, uma vez que ficou devidamen-te comprovado por certidão de casamento eclesiástico que era companheira do falecido, e no que concerne à dependência econômica apenas o fato de ser companheira, sem outra fonte de rendimentos do casal, deixa patente que a autora dependia do de cujus. 6. Dessa forma, a autora atendeu ao requisito necessário da dependência à época do ajuizamento da ação, qual seja, ser companheira do falecido, conforme disposto no art. 16, I, § 4º, da Lei nº 8.213/1991, restando presumida sua dependência econômica em relação ao de cujus. 7. Remessa oficial improvida.” (TRF 5ª R. – REOAC 0001763-40.2017.4.05.9999 – (595618/PE) – 3ª T. – Rel. Des. Fed. Fernando Braga – DJe 04.12.2017 – p. 29)

34836 – contribuição previdenciária – auxílio-alimentação pago em pecúnia – incidência

“Tributário. Agravo interno no recurso especial. Contribuição previdenciária. Auxílio-alimentação pago em pecúnia. Incidência. Precedentes. 1. A jurisprudência desta Corte Superior firmou o entendimento no sentido de que o auxílio-alimentação pago in natura não integra a base de cálculo da contribuição previdenciária, esteja ou não a empresa inscrita no PAT; por outro lado, quando pago habitual e em pecúnia, incide a referida contribuição. Precedentes: AgInt-REsp 1.453.569/SC, Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, 1ª T., DJe 09.03.2017; AgInt-REsp 1.617.204/RS, Rel. Min. Benedito Gonçalves, 1ª T., DJe 03.02.2017. 2. Agravo interno não pro-vido.” (STJ – AgInt-REsp 1.663.799 – (2017/0068526-0) – 1ª T. – Rel. Min. Benedito Gonçalves – DJe 06.12.2017 – p. 785)

34837 – cTpS – reconhecimento de atividade rural sem registro – prova testemunhal – necessi-dade

“Previdenciário. Reconhecimento de atividade rural sem registro em CTPS. Início de prova mate-rial. Necessidade de produção de prova testemunhal. Anulação da sentença. 1. Os documentos apresentados não contêm informações suficientes para se apurar se a parte autora efetivamente laborou no período rural alegado, sendo imprescindível, para o fim em apreço, a realização da prova oral solicitada. 2. A inexistência de designação de audiência de instrução para oitiva de testemunhas, com julgamento da lide apenas pela valorização da documentação acostada aos autos caracterizou, por conseguinte, cerceamento de defesa. 3. De rigor a anulação da r. sentença a fim de restabelecer a ordem processual e assegurar os direitos e garantias constitucionalmente previstos. 4. Remessa necessária provida para anular a sentença.” (TRF 3ª R. – RNC 0019156-76.2010.4.03.9999/SP – 10ª T. – Rel. Des. Fed. Nelson Porfirio – DJe 06.12.2017 – p. 2760)

34838 – desaposentação – ausência de previsão legal – inaplicabilidade

“Previdenciário. Embargos infringentes. Desaposentação. 1. De acordo com a jurisprudência do STF, se a matéria restou pacificada pelo Plenário daquele Tribunal Superior em processo dotado de repercussão geral, a orientação sufragada deve ser prontamente aplicada aos casos em an-damento. 2. No âmbito do Regime Geral de Previdência Social – RGPS, somente lei pode criar benefícios e vantagens previdenciárias, não havendo, por ora, previsão legal do direito à ‘desa-posentação’, sendo constitucional a regra do art. 18, § 2º, da Lei nº 8.213/1991 (RE 661.256/DF, submetido à sistemática de repercussão geral – Tema nº 503).” (TRF 4ª R. – EI 5001577-15.2011.4.04.7009 – 3ª S. – Rel. Jorge Antonio Maurique – J. 25.10.2017)

Remissão Editorial SÍNTESEVide RST nº 344, fev./2018, artigo de Dimitri Brandi De Abreu, Hermes Arrais Alencar, Juliana Rovai Rittes de Oliveira Silva, Luciane Serpa e Luiz Marcelo Cockell intitulado “Desa-posentação indireta”.

Page 224: Nº 345 – Março 2018 · Revista SÍNTESE Trabalhista e Previdenciária Ano XXIX – nº 345 – MArço 2018 reposItórIo AutorIzAdo de JurIsprudêncIA Supremo Tribunal Federal

224 ...................................................RST Nº 345 – Março/2018 – PARTE GERAL – JURISPRUDÊNCIA PREVIDENCIÁRIA – EMENTÁRIO

34839 – Justa causa – aposentado – plano de saúde – manutenção – pagamento integral – possi-bilidade

“Processo civil. Agravo interno no recurso especial. Recurso manejado sob a égide do NCPC. Pla-no de saúde. Demissão sem justa causa de ex-empregado aposentado. Manutenção da assistência médica. Art. 31 da Lei nº 9.656/1998. Permanência no plano de saúde nas mesmas condições quando da vigência do pacto laboral, desde que assuma o pagamento integral da mensalidade do contrato paradigma. Precedentes do STJ. Agravo não provido. 1. O presente agravo interno foi interposto contra decisão publicada na vigência do NCPC, razão pela qual devem ser exigidos os requisitos de admissibilidade recursal na forma nele prevista, nos termos do Enunciado nº 3 apro-vado pelo Plenário do STJ na sessão de 09.03.2016: Aos recursos interpostos com fundamento no CPC/2015 (relativos a decisões publicadas a partir de 18 de março de 2016) serão exigidos os requisitos de admissibilidade recursal na forma do novo CPC. 2. A eg. Terceira Turma desta Corte, no julgamento do REsp 1.585.584/SP, de relatoria do em. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, já teve a oportunidade de definir que é garantido ao trabalhador demitido sem justa causa ou ao apo-sentado que contribuiu para o plano de saúde em decorrência do vínculo empregatício o direito de manutenção como beneficiário nas mesmas condições de cobertura assistencial que gozava quando da vigência do contrato de trabalho desde que assuma o seu pagamento integral (arts. 30 e 31 da Lei nº 9.656/1998). Contudo, os valores de contribuição poderão variar conforme as alte-rações promovidas no plano paradigma, sempre em paridade com os que a ex-empregadora tiver que custear. 3. O beneficiário não apresentou argumento novo capaz de modificar a conclusão adotada, que se apoiou em entendimento aqui consolidado para dar parcial provimento ao re-curso especial manejado pela ex-empregadora. 4. Agravo interno não provido.” (STJ – AgInt-REsp 1.591.516 – (2016/0069146-3) – 3ª T. – Rel. Min. Moura Ribeiro – DJe 30.10.2017 – p. 1733)

34840 – Menor impúbere – dependente absolutamente incapaz – benefício previdenciário – pa-gamento devido – termo inicial

“Previdenciário e processual civil. Recurso especial. Dependente absolutamente incapaz. Menor impúbere. Termo inicial do benefício. Data da reclusão. O prazo prescricional não corre contra o incapaz. Inteligência dos arts. 198, I, do Código Civil c/c os arts. 79 e 103, parágrafo único da Lei nº 8.213/1991. Recurso especial do particular provido. 1. O termo inicial do benefício de auxílio--reclusão, quando devido a dependente absolutamente incapaz, é a data da prisão do segurado. 2. É firme o entendimento desta Corte de que os prazos decadenciais e prescricionais não correm em desfavor do absolutamente incapaz. Ademais, não se poderia admitir que o direito do menor fosse prejudicado pela inércia de seu representante legal. 3. Recurso Especial do particular provi-do.” (STJ – REsp 1.393.771 – (2013/0225154-6) – 1ª T. – Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho – DJe 06.12.2017 – p. 731)

34841 – pensão por morte – menor sob guarda – direito adquirido – ausência – benefício inde-vido

“Previdenciário. Pensão por morte. Menor sob guarda. Óbito da instituidora do benefício após a vigência da MP 1.523/1996, convertida na Lei nº 9.528/1997, que alterou o § 2º, do art. 16, da Lei nº 8.213/1991. Direito adquirido. Ausência. 1. Apelação contra sentença que julgou impro-cedente o pedido da autora em que objetivava a concessão do benefício de pensão por morte, tendo como fundamento a alegação de que sua avó, falecida em 23.06.2005, possuiria a sua guarda judicial, desde 03.08.1988. 2. A redação do § 2º do art. 16, da Lei nº 8.213/1991, excluiu a figura do menor sob guarda do rol de dependentes presumidos do segurado, motivo pelo qual não há que se falar em direito absoluto ao benefício postulado, vez que a concessão da pensão por morte deve obedecer ao princípio tempus regit actum. 3. No caso, embora a guarda judicial da parte autora tenha ocorrido em data anterior a MP 1.523/1996, o falecimento da instituidora do benefício ocorreu em 23.06.2005, quando já vigorava a nova redação do § 2º do art. 16, da Lei nº 8.213/1991, que excluiu o menor sob guarda do rol dos dependentes do segurado, motivo pelo

Page 225: Nº 345 – Março 2018 · Revista SÍNTESE Trabalhista e Previdenciária Ano XXIX – nº 345 – MArço 2018 reposItórIo AutorIzAdo de JurIsprudêncIA Supremo Tribunal Federal

RST Nº 345 – Março/2018 – PARTE GERAL – JURISPRUDÊNCIA PREVIDENCIÁRIA – EMENTÁRIO .......................................................225

qual, não há como acolher a sua pretensão de concessão do benefício de pensão. 4. Apelação improvida. VMB.” (TRF 5ª R. – AC 0002576-67.2017.4.05.9999 – (596859/CE) – 4ª T. – Rel. Des. Fed. Rubens de Mendonça Canuto Neto – DJe 27.11.2017 – p. 164)

34842 – pensão por morte – neto de ex-servidor municipal falecido – dependência econômica – não comprovação – benefício indevido

“Recurso de apelação cível. Direito previdenciário. Inclusão de dependente. Neto de ex-servidor municipal falecido. Requisitos legais. Dependência econômica, tutela judicial, opção do segu-rado. Não comprovados. Recurso conhecido e desprovido. 1. Cuida-se de recurso de apelação cível com vistas a modificar a sentença a quo que julgou improcedente o pleito autoral formulado em sede de ação declaratória proposta pelo apelante consistente na declaração de dependência econômica em relação ao seu avô materno, ex-servidor aposentado do município de fortaleza e falecido em 24 de dezembro de 2010, de sorte a ser incluído como dependente para fins previ-denciários, o que lhe daria o direito de perceber pensão por morte. 2. A constatação da qualidade de dependente de segurado requer dos menores que não sejam filhos do segurado a comprovação da existência de tutela judicial por meio de decisão judicial, bem como a opção do segurado para a inclusão do menor como seu dependente, além da efetiva comprovação da dependência econô-mica (art. 9º da Lei). 3. Inexiste qualquer documento que ateste que o promovente encontrava-se sob a tutela, ou mesmo sob a guarda, do segurado, seu avô. Existe, isso sim, expressa menção ao fato de que o promovente encontrava-se morando na residência do avô, mas juntamente com sua genitora, filha do segurado. 4. Ademais, não se acham presentes provas efetivas da dependência econômica, posto que extratos do cartão de crédito apresentam despesas genérica e que bem demonstram, apenas, que o avô encontrava-se presente na vida do menor, sem que isso possa ser compreendido como uma dependência econômica efetiva. 5. Recurso conhecido e despro-vido. Honorários sucumbenciais majorados para R$ 1.000,00 (mil reais), mantida a suspensão da exequibilidade em razão de ser o recorrente beneficiário da justiça gratuita (arts. 85, § 11º e 98, § 3º do CPC/2015).” (TJCE – Ap 0132133-78.2011.8.06.0001 – Rel. Paulo Francisco Banhos Ponte – DJe 29.11.2017 – p. 7)

34843 – Salário-maternidade – autora e advogado devidamente intimados da audiência de instru-ção e julgamento – não comparecimento da parte e da testemunha – efeitos

“Previdenciário. Salário-maternidade. Autora e advogado devidamente intimados da audiência de instrução e julgamento. Não comparecimento da parte e da testemunha à referida audiência. Conjunto probatório insuficiente. 1. A questão controversa restringe-se à averiguação do preen-chimento (ou não) pelo demandante dos requisitos basilares para a obtenção do benefício de salário-maternidade. 2. In casu, o MM. Juiz singular julgou improcedente o pedido da requerente, pois o início de prova material apresentado não pode ser confirmado pelo depoimento da autora ou mesmo pelas testemunhas, diante da ausência da requerente na audiência de instrução e julgamento. 3. A apelante, por sua vez, alega que o não comparecimento à referida audiência se deu em virtude de não ter sido intimada pessoalmente. Assim, defende que deveria ter sido deter-minada a intimação do seu advogado para que este realizasse a retificação do seu endereço, antes do julgamento pela improcedência do seu pedido. 4. Compulsando os autos, percebe-se, pelo documento de fl. 70, que foi determinada a intimação da apelante para a audiência de instrução e julgamento no endereço declinado na inicial e, conforme declaração do Oficial de Justiça, ela não foi encontrada no referido endereço, tendo ele obtido informações de que a parte não mora mais naquela localidade, não havendo qualquer notícia sobre seu novo paradeiro. 5. Existindo mudança de endereço, caberia à autora atualizar seus dados nos autos. Além disso, o advogado da parte apelante foi devidamente intimado da audiência através de Publicação Oficial do Tri-bunal de Justiça do Ceará, conforme fl. 75. Assim, não há de se falar que o magistrado singular deixou de proceder da maneira devida, já que não houve equívoco nas diligências. 6. O início de prova material não restou corroborado pela prova testemunhal, diante da ausência de audiência de instrução, devido ao não comparecimento do autor e da testemunhas. O particular não logrou

Page 226: Nº 345 – Março 2018 · Revista SÍNTESE Trabalhista e Previdenciária Ano XXIX – nº 345 – MArço 2018 reposItórIo AutorIzAdo de JurIsprudêncIA Supremo Tribunal Federal

226 ...................................................RST Nº 345 – Março/2018 – PARTE GERAL – JURISPRUDÊNCIA PREVIDENCIÁRIA – EMENTÁRIO

êxito em comprovar o exercício de atividade rural no período de carência necessário. 7. Apelação improvida.” (TRF 5ª R. – AC 0002332-41.2017.4.05.9999 – (596623/CE) – 1ª T. – Rel. Des. Fed. Élio Wanderley de Siqueira Filho – DJe 26.10.2017 – p. 49)

34844 – Servidor público – conversão de tempo de serviço especial em comum – período poste-rior à edição da lei nº 8.112/1990 – impossibilidade

“Processo civil. Embargos de declaração. Hipóteses de cabimento. Omissão. Administrativo. Ser-vidor público. Conversão de tempo de serviço especial em comum. Período posterior à edição da Lei nº 8.112/1990. Impossibilidade. 1. Os embargos de declaração são cabíveis para o suprimento de omissão, saneamento de contradição, esclarecimento de obscuridade ou correção de erro material no julgamento embargado. A jurisprudência também os admite para fins de preques-tionamento. 2. O Supremo Tribunal Federal não reconheceu o direito à conversão de períodos de atividade especial em comum, com cômputo privilegiado, de modo a garantir a concessão de aposentadoria com tempo de contribuição reduzido, em momento posterior à edição da Lei nº 8.112/1990. 3. Agregado efeitos infringentes aos presentes embargos de declaração para dar provimento à apelação da União e à remessa oficial, condenando a parte autora ao pagamento das custas processuais e dos honorários advocatícios, fixados em R$ 1.000,00 (mil reais), nos termos do art. 20, § 3º, alíneas a, b e c, e § 4º, do Código de Processo Civil anterior, tendo em vista o trabalho despendido e a complexidade da causa. 4. Embargos de declaração providos.” (TRF 4ª R. – EDcl-Ap-RN 5001133-75.2013.4.04.7214 – Rel. Des. Fed. Cândido Alfredo Silva Leal Junior – J. 25.10.2017)

Remissão Editorial SÍNTESEVide RST nº 343, jan./2018, ementa nº 34699 do TRT 2ª R.

Page 227: Nº 345 – Março 2018 · Revista SÍNTESE Trabalhista e Previdenciária Ano XXIX – nº 345 – MArço 2018 reposItórIo AutorIzAdo de JurIsprudêncIA Supremo Tribunal Federal

Seção Especial – Com a Palavra, o Procurador

Competição Interprofissional: Breve Estudo de Caso Envolvendo a Concessão Judicial de Benefício Previdenciário

TATIANA SADA JORDÃOProcuradora Federal (PRF2/CMF/PREV/JF).

RESUMO: Este trabalho tem por objetivo fazer um estudo de caso, em que será analisada a dinâmica do campo jurídico, especificamente no que concerne à competição profissional entre um juiz federal e um procurador federal no âmbito do Juizado Especial Federal da Seção Judiciária do Rio de Janeiro. Trata-se de uma disputa interprofissional travada nos autos de um processo envolvendo a concessão de benefício previdenciário, em que o juiz federal responsável pelo feito entendeu ser cabível a comi-nação de multa pessoal ao procurador federal. Para tanto, iremos utilizar a teoria de Pierre Bourdieu, que faz uma importante abordagem sociológica das profissões jurídicas.

PALAVRAS-CHAVE: Competição interprofissional; juiz federal; procurador federal.

ABSTRACT: This work aims to make a case study which will analyze the dynamics of the legal field, specifically with regard to professional competition between a federal judge and a federal prosecutor under the Federal Special Court of the Judiciary Section of Rio de Janeiro. This is an interbranch dis-pute foughtin there cords of a case involving the grant of social security benefits, in which the federal judge over seeing the feat considered it appropriate to sanction the fine folks federal prosecutor. For this we will use the theory of Pierre Bourdieu making na importante sociological approach to the legal professions.

KEYWORDS: Interbranch competition; federal judge; federal prosecutor.

SUMÁRIO: Introdução; 1 A contribuição da teoria de Bourdieu para a análise das profissões jurídicas; 2 O caso concreto; Considerações finais; Referências.

INTRODUÇÃO

As relações profissionais na área do Direito englobam, além de com-petições intraprofissionais, as competições interprofissionais. A primeira diz respeito à disputa vivenciada pelos pares no interior da profissão a que perten-cem. Por sua vez, a segunda se refere aos pontos de conflitos decorrentes “das disputas entre profissões distintas que atuam em áreas próximas e procuram imprimir sua forma de lidar com a questão comum a elas” (Bonelli, 1998: 186). Maria da Glória Bonelli adverte que “ambas as formas de competição são con-dicionadas pela posição que a profissão e o profissional ocupam neste sistema” (1998: 186).

Page 228: Nº 345 – Março 2018 · Revista SÍNTESE Trabalhista e Previdenciária Ano XXIX – nº 345 – MArço 2018 reposItórIo AutorIzAdo de JurIsprudêncIA Supremo Tribunal Federal

228 .......................................................................RST Nº 345 – Março/2018 – SEÇÃO ESPECIAL – COM A PALAVRA, O PROCURADOR

Segundo a autora, com relação à competição interprofissional, a própria estrutura que as profissões ocupam dentro do campo jurídico gera a interde-pendência das diferentes ocupações e as diversas perspectivas que elas adotam sobre a justiça e o seu funcionamento (Bonelli, 1998: 186).

Neste contexto, Bonelli afirma que “os lugares de onde cada uma des-sas profissões e seus segmentos internos se relacionam no universo profissional condicionam as interações mantidas entre elas ao mesmo tempo que geram possibilidades de ação em busca de melhores posições dentro do sistema profis-sional” (1998: 186). Assim, dentro dessa ótica, tanto os constrangimentos quan-to os incentivos se materializam nas tensões, nos conflitos e na dinâmica do campo de justiça, facilitando a compreensão de sua lógica.

O campo processual, na qualidade de campo jurídico, é “um campo mo-vido pela interação e pela competição entre os diversos profissionais que lidam com esta técnica como seu trabalho cotidiano” (Bonelli, 1998: 185).

No presente trabalho iremos analisar a competição profissional estabe-lecida entre um juiz federal e um procurador federal, em que houve aplicação de multa pessoal pelo primeiro profissional ao último no curso do processo judicial.

1 A CONTRIBUIÇÃO DA TEORIA DE BOURDIEU PARA A ANÁLISE DAS PROFISSÕES JURÍDICAS

Pierre Bourdieu foi um sociólogo francês que se dedicou, ao longo de sua vida, a criar a chamada teoria das estruturas sociais a partir de conceitos centrais. O método adotado pelo autor se presta à análise dos mecanismos de dominação, da produção de ideias e da gênese das condutas. Nas suas investi-gações, abordou assuntos bastante polêmicos, como escola, arte, religião, mí-dia, literatura e política. Esses objetos, aparentemente sem conexão, podem ser integrados a partir de um conjunto de conceitos centrais que foi sendo elabora-do de forma absolutamente coerente ao longo dos anos.

Ressalte-se que muito embora as pesquisas desenvolvidas por Bourdieu tenham como parâmetro a sociedade francesa, é perfeitamente possível utilizar suas concepções teóricas e discussões conceituais para a análise de outros cam-pos empíricos no Brasil.

Podemos considerar como conceitos centrais nas obras de Bourdieu os conceitos de campo, habitus e dos diferentes tipos de capital (econômico, so-cial, cultural e simbólico). Esses conceitos centrais permitem compreender me-lhor o mundo social, os diversos espaços que o compõem, suas hierarquias, sua luta interna e suas estratégias de dominação, colocando em destaque aspectos conflituosos dos diferentes campos da vida social e suas relações de poder.

Page 229: Nº 345 – Março 2018 · Revista SÍNTESE Trabalhista e Previdenciária Ano XXIX – nº 345 – MArço 2018 reposItórIo AutorIzAdo de JurIsprudêncIA Supremo Tribunal Federal

RST Nº 345 – Março/2018 – SEÇÃO ESPECIAL – COM A PALAVRA, O PROCURADOR ...........................................................................229

Para Bourdieu, qualquer sociedade é composta de diferentes campos de poder. O campo é um microcosmo social com valores, capitais, objetos e in-teresses específicos. O campo é um espaço onde ocorrem as relações entre os indivíduos, os grupos e as estruturas sociais. É, ao mesmo tempo, um campo de forças e um campo de lutas. Um campo de força para constranger os agentes que o integram. E um campo de luta no qual os agentes travam disputas em torno dos interesses específicos que caracterizam a área em questão: rique-za, poder, verdade, beleza, justiça, etc. Assim, atuam conforme suas posições, mantendo ou modificando sua estrutura. Com efeito, o campo é um espaço social estruturado, onde há dominantes e dominados, há relações permanentes de desigualdade que se exercem no interior desse espaço. E também um campo de forças para transformar ou conservar esse campo. Cada um, no interior desse universo, empenha em sua concorrência com os outros a força (relativa) que detém e que define sua posição no campo e, em consequência, suas estratégias.

Cada campo é estruturado de forma diferente e relativamente autônoma em relação a outros, isto é, possui uma lógica de funcionamento própria que orienta os indivíduos. Possui uma dinâmica que obedece a leis próprias, deno-minada de nomos, sendo certo que essas leis, ao serem reproduzidas de manei-ra constante, são consideradas frequentemente como realidades naturalizadas pelos indivíduos que se movimentam no campo. Essa realidade naturalizada que faz com que as dominações e desigualdades sociais sejam consideradas como algo comum e inquestionável é chamada de doxa.

Portanto, todo campo desenvolve uma doxa (pressupostos cognitivos e avaliativos aceitos e reconhecidos pelos agentes do campo; é uma verdade tão forte que se coloca como senso comum) e um nomos (leis gerais de funciona-mento do campo). Tanto a doxa quanto o nomos são aceitos, legitimados pelo meio e, pelo meio social, conformado pelo campo.

Outro conceito utilizado por Bourdieu que merece destaque é o de illusio, que significa uma forma particular de interesse, qual seja, o de estar envolvido no jogo. A illusio significa a crença em um determinado jogo, isto é, acreditar que vale a pena jogar, ou seja, dar importância a um jogo social, acreditando que os alvos merecem ser perseguidos.

Não podemos esquecer que o campo também é um espaço de conflitos e concorrências, onde os agentes competem pela dominação ou sua ruptura, utilizando-se de diferentes formas de capitais. Os agentes necessitam de diver-sas formas de capitais para ingressarem no campo e fazerem uso de estratégias para conservar ou conquistar posições no jogo. E eles só conseguem partici-par do jogo se dotados de um mínimo de capital específico do campo a que pertencem. Dependendo da lógica de funcionamento de determinado campo, um tipo diferente de capital é valorizado. Em outras palavras, em cada campo predomina um capital específico que funciona como uma moeda própria da-

Page 230: Nº 345 – Março 2018 · Revista SÍNTESE Trabalhista e Previdenciária Ano XXIX – nº 345 – MArço 2018 reposItórIo AutorIzAdo de JurIsprudêncIA Supremo Tribunal Federal

230 .......................................................................RST Nº 345 – Março/2018 – SEÇÃO ESPECIAL – COM A PALAVRA, O PROCURADOR

quele campo, cuja posse é condição para que os agentes continuem no jogo. A posição desses agentes na estrutura do campo é determinada pelo volume e pela qualidade do capital que eles detêm. Em cada campo social há dominados e dominantes, sendo certo que estes possuem a maior quantidade do capital disputado em determinado campo.

No campo científico, por exemplo, os pesquisadores ou as pesquisas do-minantes definem o que é, em um dado momento do tempo, o conjunto e os objetos importantes, isto é, o conjunto de questões que importam para os pes-quisadores, sobre os quais eles vão concentrar seus esforços (Bourdieu, 1997a).

No que concerne ao capital, Bourdieu assinala que o capital econômico é aquele que se acumula por operações de investimento, se transmite por he-rança e se reproduz de acordo com a habilidade do seu detentor em investir. Trata-se de um capital que exerce pressão sobre todos os outros capitais.

O capital cultural compreende o conjunto de qualificações intelectuais produzidas e transmitidas pela família e pelas instituições de ensino. Pode ser de três formas: incorporados no corpo (expressão oral), objetivos (posse de qua-dros ou obras de arte) e institucionalizados (diplomas e títulos). O capital social corresponde ao conjunto de acessos sociais que compreende o relacionamento e as redes de contatos.

Por fim, o capital simbólico é o conjunto de rituais de reconhecimento social. Compreende o prestígio, a honra, etc., evitando que a força bruta seja utilizada. O capital simbólico é o capital de legitimação. É uma forma transfor-mada de outras formas de poder. Qualquer capital pode se transformar em um capital simbólico dependendo da legitimidade. Por exemplo, o capital científico é uma espécie particular de capital simbólico que consiste no reconhecimento (ou no crédito) atribuído pelo conjunto de pares concorrentes no interior do campo científico (Bourdieu, 1997a). O capital simbólico é a espécie de capital por meio da qual os dominantes impõem aos dominados suas vontades. Essa capacidade de imposição consentida é chamada de violência simbólica.

De acordo com Bourdieu, violência simbólica “é uma violência que se exerce com a cumplicidade tácita dos que a sofrem e também, com frequên-cia, dos que a exercem, na medida em que uns e outros são inconscientes de exercê-la ou de sofrê-la” (Bourdieu, 1997: 22).

Por exemplo, o campo da comunicação, ao atrair a atenção para os cha-mados fatos-ônibus, aqueles que “não devem chocar ninguém, que não envol-vem disputa, que não dividem, que formam consenso, que interessam a todo mundo, mas de um modo tal que não tocam em nada de importante” (Bourdieu, 1997: 23), afastam o cidadão das informações pertinentes que deveria possuir para exercer seus direitos democráticos, representando verdadeira violência simbólica.

Page 231: Nº 345 – Março 2018 · Revista SÍNTESE Trabalhista e Previdenciária Ano XXIX – nº 345 – MArço 2018 reposItórIo AutorIzAdo de JurIsprudêncIA Supremo Tribunal Federal

RST Nº 345 – Março/2018 – SEÇÃO ESPECIAL – COM A PALAVRA, O PROCURADOR ...........................................................................231

As ideias de campo e capital estão associadas à definição de habitus. O habitus é o conjunto de conhecimentos práticos adquiridos ao longo do tem-po, um sistema de disposições interiorizadas que levam os agentes a agir de determinada forma em uma circunstância dada. São de tal forma internalizadas que os agentes chegam a ignorar que existem. São disposições de condutas padronizadas e incorporadas pelos agentes que modelam suas ações e práticas, não necessariamente conscientes. Não é só aquilo que se pensa, mas também o gesto e a linguagem. O habitus é composto pelo ethos (conjunto de disposições morais e princípios práticos), hexis (expressões comporais) e aidos (modo de pensar fundado em uma crença pré-reflexiva).

Ressalte-se que o habitus é tão forte que os agentes não têm necessidade de raciocinar para se orientarem e se situarem de maneira racional em um es-paço. Pode ser considerado produto de uma aquisição histórica. Por exemplo, aquele que tira o chapéu para cumprimentar, reativa sem saber, um sinal con-vencional herdado da idade média, no qual os homens de armas costumavam tirar o seu para manifestarem suas intenções pacíficas. Essa atualização da his-tória é consequência do habitus (Bourdieu, 2012).

Especificamente no que concerne ao campo jurídico, Bourdieu entende que as profissões jurídicas possuem o monopólio do “direito de dizer o direito” no qual se defrontam agentes investidos de competência ao mesmo tempo so-cial e técnica que consiste na capacidade reconhecida de interpretar um corpus de textos que consagram a visão legítima, justa, do mundo social (Bourdieu, 2012: 212).

Neste contexto, aparecem as profissões jurídicas que lutam pelo capital necessário ao exercício da dominação social. Nessa luta, os juristas possuem poderes, em graus bastante diferentes, para explorarem de diferentes maneiras “a polissemia ou a anfibologia das fórmulas jurídicas” (Bourdieu, 2012: 224), tentando tirar ao máximo partido da elasticidade, das contradições, das ambi-guidades e das lacunas das leis.

De acordo com Bourdieu, a decisão judicial é o resultado da luta simbó-lica travada entre os profissionais do Direito para fazer valer o seu posiciona-mento. Nesse sentido, esclarece o autor:

[...] O veredicto é o resultado de uma luta simbólica entre profissionais dotados de competência técnicas e sociais desiguais, portanto, capazes de mobilizar, em-bora de modo desigual, os meios ou recursos jurídicos disponíveis, pela explora-ção das “regras possíveis”’, e de os utilizar eficazmente, quer dizer, como armas simbólicas, para fazerem triunfar a sua causa; o efeito jurídico da regra, quer dizer, a sua significação real, determina-se na relação de força específica entre os profissionais, podendo-se pensar que essa relação tende a corresponder [...] à relação de força entre os que estão sujeitos à jurisdição respectiva. (Bourdieu, 2012: 224)

Page 232: Nº 345 – Março 2018 · Revista SÍNTESE Trabalhista e Previdenciária Ano XXIX – nº 345 – MArço 2018 reposItórIo AutorIzAdo de JurIsprudêncIA Supremo Tribunal Federal

232 .......................................................................RST Nº 345 – Março/2018 – SEÇÃO ESPECIAL – COM A PALAVRA, O PROCURADOR

Falando especificamente dos juízes, Bourdieu ressalta que eles não são meros executores da lei, na medida em que possuem parcela de autonomia. Vejamos a fala de autor a esse respeito:

Em resumo, o juiz, ao invés de ser sempre um simples executante que deduzisse da lei as conclusões diretamente aplicáveis ao caso particular, dispõe antes de uma parte de autonomia que constitui, sem dúvida a melhor medida da sua po-sição na estrutura da distribuição do capital específico de autoridade jurídica; os seus juízos, que se inspiram numa lógica e em valores muito próximos dos que estão nos textos submetidos à sua interpretação, têm uma verdadeira função de invenção. Se a existência de regras escritas tende sem qualquer dúvida a reduzir a variabilidade comportamental, não há dúvida também de que as condutas dos agentes jurídicos podem referir-se e sujeitar-se mais ou menos estritamente às exigências da lei, ficando sempre uma parte de arbitrário, imputável a variáveis organizacionais como a composição do grupo de decisão ou os atributos dos que estão sujeitos a uma jurisdição, nas decisões judiciais – há também uma parte de arbitrário no conjunto dos actos que os precedem e os predeterminam, caso das decisões da política que dizem respeito à prisão. (Bourdieu, 2012: 222)

Quanto ao discurso jurídico dos magistrados, Bourdieu destaca que ele se manifesta por meio da coesão dos habitus que compreendem não só a soleni-dade dos atos, a linguagem rebuscada e até os trajes dos julgadores. Os agentes especializados introduzem, mesmo sem querer e até mesmo sem saber, uma distância neutralizante que no caso dos magistrados é uma espécie de impera-tivo da função que está inscrita no âmago dos habitus.

As atitudes dos magistrados

ao mesmo tempo ascéticas e aristocráticas que são a realização incorporada do dever de reserva são constantemente lembradas e reforçadas pelos grupos pares, sempre pronto a condenar e a censurar os que se comprometeriam de modo demasiado aberto com questões de dinheiro e política. (Bourdieu, 2012: 227)

2 O CASO CONCRETO

Iremos analisar a competição interprofissional entre um juiz federal e um procurador federal1, em que funciona como arena os autos de um processo pre-

1 A representação judicial e extrajudicial do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) é feita por um Procurador Federal que integra a carreira da Advocacia-Geral da União (AGU). A AGU, por sua vez, é a instituição criada pela Constituição Federal de 1988 e regulamentada pela Lei Complementar nº 73/1993, para, diretamente ou por meio de órgão vinculado, exercer a defesa judicial ou extrajudicial da União Federal e as atividades de consultoria e assessoramento jurídico do Poder Executivo. Entre os órgãos que a integram, a Procuradoria-Geral Federal (PGF), criada pela Lei nº 10.480, de 2 de julho de 2002, é aquela responsável pela representação judicial e extrajudicial das autarquias e fundações públicas federais, incluindo as atividades de consultoria e assessoramento jurídicos dessas entidades. A criação da Procuradoria-Geral Federal representou, em síntese, a retirada da subordinação administrativa das atividades jurídicas dos procuradores federais em relação aos dirigentes das autarquias e fundações, conferindo maior autonomia administrativa e funcional aos membros da carreira. Trata-se, pois, de um novo modelo de atuação, o qual privilegia a padronização e coordenação das atividades de contencioso judicial e assessoramento jurídico, sob a direção de órgão jurídico único (a PGF),

Page 233: Nº 345 – Março 2018 · Revista SÍNTESE Trabalhista e Previdenciária Ano XXIX – nº 345 – MArço 2018 reposItórIo AutorIzAdo de JurIsprudêncIA Supremo Tribunal Federal

RST Nº 345 – Março/2018 – SEÇÃO ESPECIAL – COM A PALAVRA, O PROCURADOR ...........................................................................233

videnciário. No caso em comento, a parte autora postula o restabelecimento de seu benefício previdenciário de auxílio-doença e, sucessivamente, a conversão em aposentadoria por invalidez, alegando como causa de pedir que sofre de doença que a incapacita para todo e qualquer trabalho.

Após todo o trâmite processual, o juiz julgou procedente o pedido con-denando o Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) a restabelecer o benefício de auxílio-doença a partir da sua cessação e a conceder o benefício de aposen-tadoria por invalidez a partir da data do laudo judicial, bem como a efetuar o pagamento das prestações vencidas a contar da data da cessação do benefício. Não houve interposição de recurso e o INSS foi intimado para efetuar o cumpri-mento da obrigação de fazer e da obrigação de pagar quantia certa.

Verifica-se, portanto, que a condenação envolve duas obrigações: a im-plantação do benefício que fica à cargo da Agência de Atendimento de Deman-das Judiciais2 e a obrigação de pagar quantia certa. Nos Juizados Previdenciá-rios, é praxe a execução invertida. Vale destacar que, com relação à obrigação pecuniária, apesar de ser de responsabilidade da Autarquia Previdenciária reali-zar o pagamento, cabe ao procurador federal fixar os parâmetros para elabora-ção dos cálculos. Assim, o juiz determina duas intimações: uma para a Agência de Atendimento de Demandas Judiciais e outra para a procuradoria.

O juiz determinou a intimação da Agência de Atendimento de Deman-das Judiciais para que, no prazo de trinta dias, implantasse o benefício da parte autora. Determinou, ainda, a intimação da procuradoria para que, no mesmo prazo, apresentasse a memória do cálculo dos atrasados.

Frise-se que, para a elaboração dos cálculos, é indispensável que o bene-fício esteja implantado. Não existe possibilidade de o contador do INSS calcular o valor devido sem saber previamente a renda mensal do benefício.

Assim, deveria o juiz determinar que as intimações fossem sucessivas, conferindo prazos diferenciados e não prazo comum, de modo que apenas após o cumprimento da obrigação de fazer a procuradoria fosse intimada para apresentar os cálculos. Esse procedimento, além de ser o mais correto, do ponto de vista prático, é o mais eficaz, já que agiliza o cumprimento da obrigação. Isso porque o procurador federal não precisa ficar a todo tempo se certificando do cumprimento da obrigação de fazer para poder fixar os parâmetros para os cálculos dos atrasados.

No caso examinado, conforme verificamos, o juiz conferiu prazo comum para o cumprimento da obrigação de fazer e da obrigação de pagar. A adoção

com a criação de algumas Procuradorias Federais Especializadas junto às autarquias e fundações com maior capilaridade e de âmbito nacional (INSS, Incra, Ibama, Funai, etc.).

2 O órgão do INSS responsável por todo e qualquer cumprimento de decisão judicial é a Agência de Atendimento de Demandas Judiciais, e não uma Agência da Previdência Social.

Page 234: Nº 345 – Março 2018 · Revista SÍNTESE Trabalhista e Previdenciária Ano XXIX – nº 345 – MArço 2018 reposItórIo AutorIzAdo de JurIsprudêncIA Supremo Tribunal Federal

234 .......................................................................RST Nº 345 – Março/2018 – SEÇÃO ESPECIAL – COM A PALAVRA, O PROCURADOR

desse procedimento ineficaz, associada ao grande volume de condenações ju-diciais envolvendo o INSS, de seus precários serviços administrativos, além do assoberbamento de processos judiciais ao qual é submetida a procuradoria fe-deral, com recursos humanos cada vez mais escassos, fez com que os cálculos dos atrasados não fossem apresentados no prazo fixado pelo juiz federal.

Com efeito, o juiz determinou nova intimação da procuradoria federal para que esta apresentasse o cálculo dos atrasados, sob pena de ser fixada multa diária a ser suportada pessoalmente pelo procurador federal.

Os procuradores federais apenas representam judicialmente a Autarquia Previdenciária, sendo certo que sequer integram o quadro de seus servidores, mas sim o quadro da Advocacia-Geral da União. Ademais, não possuem pode-res administrativos para cumprir a decisão judicial. Apenas os servidores admi-nistrativos do INSS detêm competência para efetuar o cumprimento da obriga-ção de fazer e pagar benefícios previdenciários. Com efeito, não possuem poder hierárquico para compelir o INSS ao cumprimento de determinações judiciais. Assim, forçoso reconhecer que qualquer entendimento no sentido de ser pos-sível a aplicação da sanção prevista no art. 14, parágrafo único, do Código de Processo Civil aos procuradores federais, além de ilegal, é irrazoável.

Como se tudo isso não bastasse, cabe ressaltar que a aplicação de multa pessoal ao procurador federal afronta decisão judicial proferida, por unanimi-dade, em sede de controle abstrato de constitucionalidade pelo Supremo Tribu-nal Federal, ao julgar o mérito da Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADIn) nº 2652-6, proposta pela Associação Nacional dos Procuradores de Estado – Anape. De acordo com a Corte Superior, o parágrafo único do art. 14 do Código de Processo Civil exclui a possibilidade de aplicação de multa aos advogados (expressão na qual a ADIn reconheceu abrangidos os “advogados do setor pri-vado e do setor público”).

Bonelli (1998: 196), ao examinar determinadas profissões jurídicas (juízes, advogados, servidores de cartórios, promotores de justiça e delegados) atuando no mundo da justiça, observa como a competição interprofissional se manifesta condicionada pelo lugar que o profissional ocupa neste contexto. De acordo com a autora, “é esta interdependência das posições profissionais que estrutu-ra a disputa por enfoques, perspectivas, privilégios, monopólios sobre objetos, campo de atuação e poder de decisão” (Bonelli, 1998: 196). Assim, continua ela, “o conflito é decorrente da existência objetiva desses diferentes lugares no sistema de profissões e não se restringe a concepções de âmbito individual. Em-bora condicionados, os conflitos profissionais impulsionam mudanças e dão a dinâmica do sistema das profissões” (Bonelli, 1998: 196). Dessa forma, a autora constata que “o lugar ocupado neste campo condiciona as competições profis-sionais e fornece também os recursos para fomentar as mudanças demandadas pelos profissionais nas situações de conflito” (Bonelli, 1998: 196).

Page 235: Nº 345 – Março 2018 · Revista SÍNTESE Trabalhista e Previdenciária Ano XXIX – nº 345 – MArço 2018 reposItórIo AutorIzAdo de JurIsprudêncIA Supremo Tribunal Federal

RST Nº 345 – Março/2018 – SEÇÃO ESPECIAL – COM A PALAVRA, O PROCURADOR ...........................................................................235

A dinâmica dessas relações, segundo a autora, faz com que, por exem-plo, a opinião de um juiz passe a ser de um advogado ou de um delegado que vira promotor de justiça, sofrendo “redefinições em função desta nova posição de onde passa a interagir no mundo da justiça, mas sua experiência anterior também o acompanha nas interações que estabelece na nova posição cola-borando para modificá-la” (Bonelli, 1998: 197). E mais, para ela “os tipos de conflitos observados nesta pesquisa apontam para a existência de maior tensão entre aqueles que estão em posições mais próximas, reforçando a noção de que é a proximidade nos lugares ocupados no sistema de profissões que aumenta a disputa entre eles” (Bonelli, 1998: 197).

Ao examinarmos a decisão judicial que fixou multa pessoal ao procura-dor federal, observamos que a experiência anterior do juiz federal não o acom-panhou na nova posição que passou a ocupar. Isso porque o juiz federal que proferiu essa decisão, antes de pertencer aos quadros da magistratura, exerceu a função de procurador federal. Portanto, conhece perfeitamente a estrutura da carreira, as dificuldades enfrentadas por ela, bem como os direitos e as prerro-gativas dos procuradores federais.

A relação entre órgãos jurisdicionais e de representação judicial da Fa-zenda Pública não deve ser feita na base da ameaça, do amedrontamento ge-rando um clima de desconfiança mútua entre juiz e procurador federal e da fal-sa impressão de que o magistrado deteria qualquer tipo de superioridade sobre o membro da Advocacia-Geral da União, podendo ameaçá-lo de reprimenda caso não seja obedecida sua determinação judicial. Entendemos que como o juiz federal pertenceu ao quadro da Advocacia-Geral da União tinha obrigação, mais do que qualquer outro magistrado, de manter uma relação de harmonia e de cooperação.

No que tange à existência de maior tensão entre aqueles que estão em posições mais próximas, constatada por Bonelli, observamos que, realmente, existe uma maior tensão entre aqueles profissionais da área jurídica que estão em posições mais próximas. Juízes federais e procuradores federais possuem posições profissionais muito próximas. No caso dos Juizados Previdenciários da Seção Judiciária do Rio de Janeiro, essa proximidade é ainda maior, na medida em que o procurador federal atua em todos os processos pertencentes a esses Juizados, já que o INSS sempre figura como réu.

Essa constatação da existência de tensão entre profissionais (juiz federal e procurador federal) que pertencem a um mesmo campo, isto é, o campo jurí-dico, nos remete às lições de Bourdieu anteriormente analisadas.

No campo jurídico, com nos outros campos, existe uma constante luta pela dominação. Essa luta se dá entre sábios e profanos (entre aqueles que de-tém conhecimento jurídico e capacidade postulatória e os que não detém). A luta ocorre entre as diversas concepções de interpretação do direito, entre

Page 236: Nº 345 – Março 2018 · Revista SÍNTESE Trabalhista e Previdenciária Ano XXIX – nº 345 – MArço 2018 reposItórIo AutorIzAdo de JurIsprudêncIA Supremo Tribunal Federal

236 .......................................................................RST Nº 345 – Março/2018 – SEÇÃO ESPECIAL – COM A PALAVRA, O PROCURADOR

práxis e teoria, entre público e privado, etc. A luta também se dá entre juízes, advogados públicos e privados, promotores de justiça e os chamados doutrina-dores por dizer o direito. Os profissionais do direito lutam pelo capital necessá-rio ao exercício da dominação social.

No caso examinado, a luta travada entre o juiz federal e o procurador federal envolve o art. 14, parágrafo único, do Código de Processo Civil. Adverte Bourdieu que os textos jurídicos são “elásticos e muitas vezes chegam a ser até indeterminados” (2012: 223), permitindo, assim, que os intérpretes da lei atribuam diferentes significações para uma mesma norma. Portanto, há sempre uma parcela reservada ao arbítrio do juiz que naturalmente é influenciado pelo meio e pela sua experiência de vida. Contudo, fugindo toda a lógica da teoria bourdieusiana, também defendida por Bonelli, o juiz federal não foi influencia-do pelo meio, nem pela sua experiência de vida. Ele simplesmente apagou da memória tudo que aprendeu e vivenciou quando do exercício da atividade de procurador federal.

Isso demonstra que a competição profissional no mundo do Direito é tão forte que, em determinado caso concreto, é possível que ela não ceda para a experiência anterior do profissional. Nem mesmo com a presença de uma im-portante variante, qual seja, o exercício da função de procurador federal, antes de pertencer ao quadro da magistratura, foi capaz de apaziguar a competição profissional examinada.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Existe uma constante disputa no mundo do Direito entre os diversos gru-pos pelo domínio do campo jurídico, em que cada grupo defende seus próprios interesses. Neste contexto, examinamos a competição interprofissional estabe-lecida entre um juiz federal, que, antes de integrar a magistratura, pertenceu ao quadro da Advocacia-Geral da União, e um procurador federal.

Essa tensão interprofissional entre um juiz federal e um procurador fede-ral, envolvendo a aplicação de multa pessoal, nos fez concluir que a competi-ção não se restringe à mera discordância técnico-jurídica. Entendemos que ela vai além, envolvendo um jogo de forças e lutas, dentro da concepção desenvol-vida por Pierre Bourdieu de campo de poder.

Constatamos que, de fato, quanto mais próximas as profissões jurídicas, mais possibilidade de conflitos profissionais. As profissões de juiz federal e pro-curador federal são extremamente próximas e essa proximidade é ainda maior nos Juizados Previdenciários da Seção Judiciária do Rio de Janeiro.

Por fim, verificamos que, ao contrário do que defendido por Bourdieu e constatado por Bonelli quando da análise das relações profissionais no mundo do Direito, no caso concreto examinado, a experiência anterior do magistrado

Page 237: Nº 345 – Março 2018 · Revista SÍNTESE Trabalhista e Previdenciária Ano XXIX – nº 345 – MArço 2018 reposItórIo AutorIzAdo de JurIsprudêncIA Supremo Tribunal Federal

RST Nº 345 – Março/2018 – SEÇÃO ESPECIAL – COM A PALAVRA, O PROCURADOR ...........................................................................237

como procurador federal não o acompanhou na nova posição que passou a ocupar. O juiz federal, ao aplicar multa pessoal ao procurador federal, na forma do art. 14, parágrafo único, do Código de Processo Civil, simplesmente apagou da memória toda sua experiência quando do exercício da função de procura-dor federal. De toda sorte, é importante que se esclareça que se trata de uma exceção à regra, na medida em que, na grande maioria dos casos, o meio e a experiência de vida anteriores exercem influência no modo de julgar.

REFERÊNCIASBONELLI, Maria da Glória. A competição profissional no mundo do Direito. Tempo Social. Rev. Sociol. USP, São Paulo, 10 (1): 185-214, maio 1998.

BOURDIEU. Pierre. A distinção. Crítica social do julgamento. Porto Alegre: Zouk, 2013.

______. O poder simbólico. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil Ltda., 2012.

______. Os usos sociais da ciência. Por uma sociologia clínica do campo científico. São Paulo: Editora Unesp, 1997a.

______. Sobre a televisão. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 1997.

BRASIL. Justiça Federal do Rio de Janeiro, Ação Ordinária nº 0003721-83.2010.4.02.5151, Autor: Ademir Gonçalves Brum, Réu: Instituto Nacional do Seguro Social. Rio de Janeiro, 7 de agosto de 2013. Disponível em: <www.jfrj.jus.br>.

Page 238: Nº 345 – Março 2018 · Revista SÍNTESE Trabalhista e Previdenciária Ano XXIX – nº 345 – MArço 2018 reposItórIo AutorIzAdo de JurIsprudêncIA Supremo Tribunal Federal

Clipping Jurídico

Tribunal deve unificar jurisprudência sobre limite de desconto de consignado em folha de aposentadosO Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF4) deverá unificar jurisprudência a respeito da limitação do desconto do empréstimo consignado em folha de pa-gamento dos proventos de aposentadoria. A 2ª Seção admitiu em dezembro in-cidente de resolução de demandas repetitivas (IRDR) para tratar do tema. Como são muitas as ações questionando o limite do desconto de 30% com decisões divergentes na 4ª Região, o relator, desembargador federal Luís Alberto d’Azevedo Aurvalle, entendeu que existe risco de ofensa à isonomia e à segurança jurídica. Todos os processos que contenham essa demanda na 4ª Região da Justiça Federal estão suspensos desde 14.12.2017, data da admissão do IRDR, devendo voltar a tramitar após o julgamento do incidente, que ainda não tem data marcada. IRDR: Com a criação do IRDR, cada Tribunal Regional Federal ou Tribunal de Justiça pode criar temas repetitivos com abrangência em todo o território de sua jurisdi-ção. Firmado o entendimento, os incidentes irão nortear as decisões de primeiro grau dos Juizados Especiais Federais e do Tribunal na 4ª Região. A consulta à rela-ção dos IRDRs admitidos pelo TRF da 4ª Região pode ser realizada na página do Tribunal na Internet, em Serviços Judiciais/Demandas Repetitivas/IRDR (Processo nº 50656592320174040000). (Fonte: Tribunal Regional Federal da 4ª Região)

carnaval não consta no calendário de feriados nacionais e falta pode ser des-contada do salárioCarnaval é ou não é feriado? A resposta para essa pergunta ainda pega muitos bra-sileiros de surpresa. Afinal, é comum as empresas liberarem os trabalhadores no período. Mas a festa mais tradicional do País não faz parte do calendário oficial de feriados nacionais. Faltar nesses dias pode resultar em descontos no contracheque e passar a folia trabalhando não significa necessariamente o recebimento de horas extras. Segundo o juiz do trabalho André Molina, não há previsão de feriado de carnaval na legislação federal. Ele explica, todavia, que entre os feriados muni-cipais o carnaval pode ser um deles. Mas esse não é o caso de Cuiabá e Várzea Grande. Mesmo sem ser oficial, o fato é que a maioria das empresas decide liberar os empregados nesse período e isso pode acontecer, segundo o magistrado, por mera liberalidade do empregador, cumprimento de Acordo Coletivo de Trabalho ou mesmo uso de banco de horas. Para não ter problemas, o trabalhador deve verificar a legislação estadual e municipal da sua cidade e, também, o que foi decidido na convenção coletiva da categoria. Onde a folia for feriado local, quem trabalha nesses dias deve ter folga compensatória, e se isso não acontecer, deve receber essa remuneração em dobro. Por outro lado, se não há nenhuma previ-são de feriado nos dias de carnaval, eles devem ser trabalhados normalmente. A empresa pode, todavia, liberar o empregado ou o trabalhador pode negociar para compensar o horário posteriormente. Em dezembro de 2017, o Ministério do Pla-nejamento, Desenvolvimento e Gestão editou a Portaria nº 468 para tratar sobre o trabalho durante os períodos de festas. O texto considera ponto facultativo os dias 12 e 13 de fevereiro (segunda e terça-feira de Carnaval) e dia 14 (Quarta-feira de

Page 239: Nº 345 – Março 2018 · Revista SÍNTESE Trabalhista e Previdenciária Ano XXIX – nº 345 – MArço 2018 reposItórIo AutorIzAdo de JurIsprudêncIA Supremo Tribunal Federal

RST Nº 345 – Março/2018 – CLIPPING JURÍDICO ...............................................................................................................................239

Cinzas) até às 14h. O documento é válido para os órgãos e as entidades da Ad-ministração Pública federal direta, autárquica e fundacional do Poder Executivo e, apesar de poder ser utilizado como referência para as empresas em geral, não se aplica aos trabalhadores regidos pela Consolidação das Leis do Trabalho (CLT). (Fonte: Tribunal Regional do Trabalho da 23ª Região)

Supremo recebe mais três ações contra fim da contribuição sindical obrigatóriaO Supremo Tribunal Federal (STF) recebeu mais três ações diretas de inconstitu-cionalidade (ADIs 5887, 5888 e 5892) para questionar o fim da obrigatorieda-de da contribuição sindical prevista na Reforma Trabalhista, promovida pela Lei nº 13.467/2017, que alterou diversos dispositivos da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT). Os processos foram distribuídos, por prevenção, ao ministro Ed-son Fachin, que já relata as demais ações sobre a matéria. A ADI 5887 foi ajuizada pela Federação de Entidades Sindicais dos Oficiais de Justiça do Brasil (Fesojus/BR) e a ADI 5892 é de autoria da Confederação Nacional dos Trabalhadores Meta-lúrgicos (CNTM). Ambas pedem a concessão de medida cautelar para suspender os efeitos dos arts. 545, 578, 579, 582, 583, 587 e 602 da CLT, alterados pela Lei nº 13.467/2017. No mérito, pedem a declaração de inconstitucionalidade de tais dispositivos. Já a ADI 5888 foi ajuizada por quatro confederações nacionais re-presentantes de classes de trabalhadores ligadas ao turismo (Contratuh), aos trans-portes terrestres (CNTTT), à indústria (CNTI) e aos estabelecimentos de ensino e cultura (CNTEEC). As confederações pedem também a suspensão de dispositivos da Reforma Trabalhista referentes ao fim da obrigatoriedade de desconto automá-tico da contribuição sindical da folha de pagamento do mês de março dos funcio-nários. Nas ações, as entidades de classe sustentam basicamente que as alterações na CLT não poderiam ter sido feitas por meio de lei ordinária, mas apenas por lei complementar, conforme estabelece o art. 146 da Constituição Federal. Alegam ainda violação ao princípio da isonomia tributária ao criar categorias diferentes de contribuintes, além de afronta aos princípios da representatividade e da unicidade sindical. (Fonte: Supremo Tribunal Federal)

Fechamento do Edição: 23.02.2018

Page 240: Nº 345 – Março 2018 · Revista SÍNTESE Trabalhista e Previdenciária Ano XXIX – nº 345 – MArço 2018 reposItórIo AutorIzAdo de JurIsprudêncIA Supremo Tribunal Federal

Tabelas Práticas

Tabela Única para Atualização de Débitos TrabalhistasAté 28 de fevereiro de 2018 – Para 1º de março de 2018**TR prefixada de 1º fevereiro/2018 a 1º março/2018 (Banco Central) = 0,00% (zero)

Mês/Ano 1986 1987 1988 1989 1990 1991 1992 1993 1994 1995 1996

JAN 0,000272031 0,167557189 0,036485420 0,003529865 0,197460799 0,015706631 0,003000014 0,000238812 0,009275197 2,426631075 1,843627460

FEV 0,000234045 0,143444215 0,031315270 2,884819301 0,126488245 0,013065580 0,002390830 0,000188397 0,006557690 2,376689694 1,820819871

MAR 0,204656622 0,119916583 0,026547364 2,437532139 0,073207689 0,012210822 0,001903376 0,000149048 0,004688753 2,333448559 1,803461553

ABR 0,204881992 0,104721494 0,022883685 2,034498089 0,039717714 0,011254214 0,001531646 0,000118471 0,003305431 2,280990343 1,788901682

MAIO 0,203296281 0,086575309 0,019184847 1,833541881 0,039717714 0,010331602 0,001264986 0,000092397 0,002264459 2,204564699 1,777177642

JUN 0,200489429 0,070135538 0,016288714 1,667765952 0,037689991 0,009479404 0,001055827 0,000071803 0,001546339 2,135231594 1,766774871

JUL 0,197975145 0,059426825 0,013627301 1,336029767 0,034385540 0,008664903 0,000872224 0,000055199 2,895266094 2,075331306 1,756064633

AGO 0,195646946 0,057667952 0,010986215 1,037612434 0,031036683 0,007873605 0,000705169 0,042340591 2,756709676 2,015070619 1,745849667

SET 0,192249706 0,054219586 0,009105102 0,802236301 0,028067175 0,007033145 0,000572285 0,031753856 2,699184652 1,963920315 1,733477897

OUT 0,188998923 0,051305438 0,007342232 0,590096579 0,024871224 0,006022559 0,000456440 0,023587770 2,634916406 1,926558564 1,722077743

NOV 0,185651995 0,046991608 0,005769927 0,428786934 0,021872504 0,005028437 0,000364948 0,017276620 2,569269014 1,895211762 1,710859985

DEZ 0,179738596 0,041644459 0,004546113 0,303201057 0,018752147 0,003852618 0,000296008 0,012688470 2,496350612 1,868332068 1,697035930

Mês/Ano 1997 1998 1999 2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007

JAN 1,682370705 1,532423263 1,421623913 1,344585029 1,316977111 1,287553227 1,252452733 1,196817078 1,175442615 1,143053885 1,120226659

FEV 1,669946304 1,515062166 1,414321770 1,341701712 1,315176634 1,284225798 1,246372926 1,195287110 1,173236929 1,140401312 1,117779838

MAR 1,658970521 1,508333490 1,402682312 1,338585485 1,314692827 1,282723729 1,241263884 1,194739919 1,172109360 1,139575120 1,116974500

ABR 1,648558261 1,494886982 1,386578588 1,335591090 1,312430197 1,280472658 1,236587111 1,192619442 1,169028969 1,137217668 1,114882979

MAIO 1,638382269 1,487864262 1,378182699 1,333855744 1,310404312 1,277461681 1,231434788 1,191578003 1,166692085 1,136246177 1,113466650

JUN 1,628037717 1,481135464 1,370288467 1,330540038 1,308014570 1,274782089 1,225735120 1,189738667 1,163751285 1,134104987 1,111589176

JUL 1,617467567 1,473894222 1,366042806 1,327698763 1,306110261 1,272768569 1,220649892 1,187647220 1,160278571 1,131912473 1,110529730

AGO 1,606894203 1,465827772 1,362047920 1,325647985 1,302929809 1,269397050 1,214015299 1,185333449 1,157298528 1,129933958 1,108900755

SET 1,596881754 1,460352908 1,358048467 1,322968973 1,298468272 1,266255470 1,209132820 1,182961611 1,153301186 1,127188128 1,107277486

OUT 1,586610041 1,453793393 1,354371349 1,321597155 1,296359096 1,263784771 1,205078935 1,180920980 1,150267929 1,125476279 1,106887862

NOV 1,576280674 1,440980197 1,351310630 1,319860219 1,292593770 1,260296271 1,201219417 1,179613967 1,147857429 1,123369960 1,105625238

DEZ 1,552475022 1,432192265 1,348616095 1,318282235 1,290106445 1,256972835 1,199089833 1,178263677 1,145647475 1,121931644 1,104973304

Mês/Ano 2008 2009 2010 2011 2012 2013 2014 2015 2016 2017 2018

JAN 1,104266573 1,086503930 1,078854786 1,071474984 1,058687023 1,055628769 1,053616119 1,044639348 1,026213718 1,005967334 1,000000000

FEV 1,103152389 1,084508435 1,078854786 1,070709426 1,057773107 1,055628769 1,052431081 1,043722960 1,024860901 1,004260092 1,000000000

MAR 1,102884388 1,084019542 1,078854786 1,070148669 1,057773107 1,055628769 1,051866229 1,043547644 1,023881047 1,003956897 1,000000000

ABR 1,102433493 1,082462960 1,078001009 1,068853218 1,056644610 1,055628769 1,051586507 1,042196956 1,021666075 1,002434199

MAIO 1,101381673 1,081971745 1,078001009 1,068458957 1,056404806 1,055628769 1,051104050 1,041078838 1,020335558 1,002434199

JUN 1,100571653 1,081486158 1,077451509 1,066784106 1,055910640 1,055628769 1,050469567 1,039879856 1,018773777 1,001668924

JUL 1,099311841 1,080777168 1,076817264 1,065597031 1,055910640 1,055628769 1,049981325 1,037997966 1,016696666 1,001132317

AGO 1,097211778 1,079642464 1,075579272 1,064289020 1,055758611 1,055408188 1,048875810 1,035610883 1,015051268 1,000509000

SET 1,095487481 1,079429816 1,074602458 1,062084133 1,055628769 1,055408188 1,048244767 1,033681000 1,012474520 1,000000000

OUT 1,093333613 1,079429816 1,073848617 1,061019930 1,055628769 1,055324818 1,047330447 1,031700136 1,010882381 1,000000000

NOV 1,090600568 1,079429816 1,073341999 1,060362505 1,055628769 1,054354811 1,046244446 1,029856693 1,009266545 1,000000000

DEZ 1,088838827 1,079429816 1,072981478 1,059679012 1,055628769 1,054136605 1,045739354 1,028522699 1,007827367 1,000000000

Page 241: Nº 345 – Março 2018 · Revista SÍNTESE Trabalhista e Previdenciária Ano XXIX – nº 345 – MArço 2018 reposItórIo AutorIzAdo de JurIsprudêncIA Supremo Tribunal Federal

RST Nº 345 – Março/2018 – TABELAS PRÁTICAS ................................................................................................................................241

ÍNDICE DE ATUALIZAÇÃO – TR – DIÁRIA (PRO RATA DIE) mês fevereiro ano 2018

DIA/MÊS TR DIÁRIA TR ACUMULADA ÍNDICE 1º FEVEREIRO 0,000000% 0,000000% 1,00000000

02 FEVEREIRO 0,000000% 0,000000% 1,00000000

03 FEVEREIRO - 0,000000% 1,00000000

04 FEVEREIRO - 0,000000% 1,00000000

05 FEVEREIRO 0,000000% 0,000000% 1,00000000

06 FEVEREIRO 0,000000% 0,000000% 1,00000000

07 FEVEREIRO 0,000000% 0,000000% 1,00000000

08 FEVEREIRO 0,000000% 0,000000% 1,00000000

09 FEVEREIRO 0,000000% 0,000000% 1,00000000

10 FEVEREIRO - 0,000000% 1,00000000

11 FEVEREIRO - 0,000000% 1,00000000

12 FEVEREIRO 0,000000% 0,000000% 1,00000000

13 FEVEREIRO - 0,000000% 1,00000000

14 FEVEREIRO 0,000000% 0,000000% 1,00000000

15 FEVEREIRO 0,000000% 0,000000% 1,00000000

16 FEVEREIRO 0,000000% 0,000000% 1,00000000

17 FEVEREIRO - 0,000000% 1,00000000

18 FEVEREIRO - 0,000000% 1,00000000

19 FEVEREIRO 0,000000% 0,000000% 1,00000000

20 FEVEREIRO 0,000000% 0,000000% 1,00000000

21 FEVEREIRO 0,000000% 0,000000% 1,00000000

22 FEVEREIRO 0,000000% 0,000000% 1,00000000

23 FEVEREIRO 0,000000% 0,000000% 1,00000000

24 FEVEREIRO - 0,000000% 1,00000000

25 FEVEREIRO - 0,000000% 1,00000000

26 FEVEREIRO 0,000000% 0,000000% 1,00000000

27 FEVEREIRO 0,000000% 0,000000% 1,00000000

28 FEVEREIRO 0,000000% 0,000000% 1,00000000

1º MARÇO 0,000000% 0,000000% 1,00000000

Banco Central do Brasil, 02.02.2018 – A tR de FEV/2018 é zERO.

LIMITES DE DEPÓSITOS RECURSAIS NA JUSTIÇA DO TRABALHO

Novos valores para Depósitos Recursais na Justiça do Trabalho (Ato nº 360/2017 do TST, DJe de 13.07.2017, vigência a partir de 01.08.2017)

Recurso Ordinário R$ 9.189,00

Recurso de Revista, Embargos, Recurso Extraordinário e Recursos em Ação Rescisória R$ 18.378,26

Ação Rescisória – Depósito prévio de 20% do valor da causa, salvo prova de miserabilidade, nos termos do art. 836 da CLT, alterado pela Lei nº 11.495/2007, cujos efeitos começam a fluir a partir do dia 24.09.2007.

Page 242: Nº 345 – Março 2018 · Revista SÍNTESE Trabalhista e Previdenciária Ano XXIX – nº 345 – MArço 2018 reposItórIo AutorIzAdo de JurIsprudêncIA Supremo Tribunal Federal

242 ............................................................................................................................RST Nº 345 – Março/2018 – TABELAS PRÁTICAS

INSS – JANEIRO/2018Tabela de contribuição dos segurados empregado, empregado doméstico e trabalhador avulso, para pagamento de remuneração a partir de 1º de janeiro de 2018.

Salário-de-contribuição (R$) Alíquota para fins de recolhimento ao INSS (%) Até 1.693,72, 8,00%

De 1.693,73 até 2.822,90 9,00%

De 2.822,91 até 5.645,80 11,00%

IR FONTE – TABELA PROGRESSIVA MENSAL PARA CÁLCULO A PARTIR DE ABRIL/2015 – MP 670/2015 – DOU 11.03.2015 Base de cálculo em R$ Alíquota % Parcela a deduzir do imposto em R$ Até 1.903.98 – – De 1.903,99 até 2,826,65 7,5 142,80 De 2.826,66 até 3.751,05 15,0 354,80 De 3.751,06 até 4.664,68 22,5 636,13 Acima de 4.664,69 27,5 869,36 Dedução por dependente 189,59

TABELA DE ATUALIZAÇÃO MONETÁRIA DOS SALÁRIOS-DE-CONTRIBUIÇÃO PARA APURAÇÃO DO SALÁRIO-DE-BENEFÍCIO (ART. 33, DECRETO Nº 3.048/1999)Fevereiro/2018 (Portaria MF nº , .02.2018)

MêsFator Simplificado

(Multiplicar)

jul/94 7,724103

ago/94 7,281394

set/94 6,904413

out/94 6,801707

nov/94 6,677506

dez/94 6,466065

jan/95 6,327493

fev/95 6,223560

mar/95 6,162551

abr/95 6,076867

maio/95 5,962389

jun/95 5,812995

jul/95 5,709089

ago/95 5,572018

set/95 5,515757

out/95 5,451969

nov/95 5,376695

dez/95 5,296715

jan/96 5,210738

fev/96 5,135756

mar/96 5,099549

abr/96 5,084803

maio/96 5,049457

jun/96 4,966028

MêsFator Simplificado

(Multiplicar)

jul/96 4,906172

ago/96 4,853272

set/96 4,853077

out/96 4,846777

nov/96 4,836137

dez/96 4,822634

jan/97 4,780565

fev/97 4,706207

mar/97 4,686523

abr/97 4,632783

maio/97 4,605610

jun/97 4,591834

jul/97 4,559915

ago/97 4,555815

set/97 4,555815

out/97 4,529093

nov/97 4,513746

dez/97 4,476591

jan/98 4,445914

fev/98 4,407131

mar/98 4,406250

abr/98 4,396139

maio/98 4,396139

jun/98 4,386051

MêsFator Simplificado

(Multiplicar)

jul/98 4,373804

ago/98 4,373804

set/98 4,373804

out/98 4,373804

nov/98 4,373804

dez/98 4,373804

jan/99 4,331357

fev/99 4,282113

mar/99 4,100070

abr/99 4,020464

maio/99 4,019259

jun/99 4,019259

jul/99 3,978676

ago/99 3,916405

set/99 3,860429

out/99 3,804503

nov/99 3,733931

dez/99 3,641794

jan/00 3,597544

fev/00 3,561220

mar/00 3,554466

abr/00 3,548080

maio/00 3,543473

jun/00 3,519890

MêsFator Simplificado

(Multiplicar)

jul/00 3,487457

ago/00 3,410382

set/00 3,349423

out/00 3,326470

nov/00 3,314207

dez/00 3,301332

jan/01 3,276431

fev/01 3,260455

mar/01 3,249407

abr/01 3,223618

maio/01 3,187598

jun/01 3,173634

jul/01 3,127966

ago/01 3,078101

set/01 3,050645

out/01 3,039096

nov/01 2,995659

dez/01 2,973064

jan/02 2,967722

fev/02 2,962094

mar/02 2,956772

abr/02 2,953523

maio/02 2,932992

jun/02 2,900793

Page 243: Nº 345 – Março 2018 · Revista SÍNTESE Trabalhista e Previdenciária Ano XXIX – nº 345 – MArço 2018 reposItórIo AutorIzAdo de JurIsprudêncIA Supremo Tribunal Federal

RST Nº 345 – Março/2018 – TABELAS PRÁTICAS ................................................................................................................................243

MêsFator Simplificado

(Multiplicar)

jul/02 2,851183

ago/02 2,793908

set/02 2,729492

out/02 2,659286

nov/02 2,551853

dez/02 2,411048

jan/03 2,347661

fev/03 2,297799

mar/03 2,261836

abr/03 2,224903

maio/03 2,215818

jun/03 2,230764

jul/03 2,246489

ago/03 2,250991

set/03 2,237121

out/03 2,213875

nov/03 2,204177

dez/03 2,193648

jan/04 2,180564

fev/04 2,163258

mar/04 2,154854

abr/04 2,142641

maio/04 2,133892

jun/04 2,125391

jul/04 2,114816

ago/04 2,099490

set/04 2,089045

out/04 2,085500

nov/04 2,081960

dez/04 2,072840

jan/05 2,055165

fev/05 2,043517

mar/05 2,034565

abr/05 2,019821

maio/05 2,001606

jun/05 1,987692

jul/05 1,989881

ago/05 1,989284

set/05 1,989284

out/05 1,986305

nov/05 1,974851

dez/05 1,964244

jan/06 1,956418

fev/06 1,949012

mar/06 1,944539

abr/06 1,939303

maio/06 1,936979

MêsFator Simplificado

(Multiplicar)

jun/06 1,934464

jul/06 1,935819

ago/06 1,933692

set/06 1,934079

out/06 1,930989

nov/06 1,922722

dez/06 1,914680

jan/07 1,902882

fev/07 1,893603

mar/07 1,885684

abr/07 1,877423

maio/07 1,872554

jun/07 1,867698

jul/07 1,861926

ago/07 1,855987

set/07 1,845101

out/07 1,840500

nov/07 1,834995

dez/07 1,827138

jan/08 1,809585

fev/08 1,797184

mar/08 1,788065

abr/08 1,778992

maio/08 1,767679

jun/08 1,750871

jul/08 1,735082

ago/08 1,725076

set/08 1,721461

out/08 1,718883

nov/08 1,710331

dez/08 1,703857

jan/09 1,698930

fev/09 1,688126

mar/09 1,682909

abr/09 1,679550

maio/09 1,670363

jun/09 1,660400

jul/09 1,653456

ago/09 1,649661

set/09 1,648343

out/09 1,645710

nov/09 1,641769

dez/09 1,635717

jan/10 1,631801

fev/10 1,617566

mar/10 1,606322

abr/10 1,594998

MêsFator Simplificado

(Multiplicar)

maio/10 1,583438

jun/10 1,576659

jul/10 1,578395

ago/10 1,579501

set/10 1,580607

out/10 1,572118

nov/10 1,557786

dez/10 1,541904

jan/11 1,532708

fev/11 1,518435

mar/11 1,510279

abr/11 1,500377

maio/11 1,489651

jun/11 1,481209

jul/11 1,477957

ago/11 1,477957

set/11 1,471776

out/11 1,465182

nov/11 1,460509

dez/11 1,452231

jan/12 1,444862

fev/12 1,437531

mar/12 1,431946

abr/12 1,429373

maio/12 1,420283

jun/12 1,412515

jul/12 1,408852

ago/12 1,402819

set/12 1,396535

out/12 1,387792

nov/12 1,378008

dez/12 1,370607

jan/13 1,360539

fev/13 1,348136

mar/13 1,341162

abr/13 1,333163

maio/13 1,325343

jun/13 1,320721

jul/13 1,317033

ago/13 1,318748

set/13 1,316641

out/13 1,313096

nov/13 1,305134

dez/13 1,298124

jan/14 1,288845

fev/14 1,280776

mar/14 1,272631

MêsFator Simplificado

(Multiplicar)

abr/14 1,262280

maio/14 1,252511

jun/14 1,245041

jul/14 1,241812

ago/14 1,240200

set/14 1,237971

out/14 1,231935

nov/14 1,227271

dez/14 1,220801

jan/15 1,213279

fev/15 1,195584

mar/15 1,181874

abr/15 1,164293

maio/15 1,156085

jun/15 1,144752

jul/15 1,136005

ago/15 1,129454

set/15 1,126637

out/15 1,120921

nov/15 1,112356

dez/15 1,100144

jan/16 1,090331

fev/16 1,074112

mar/16 1,064004

abr/16 1,059343

maio/16 1,052606

jun/16 1,042391

jul/16 1,037514

ago/16 1,030916

set/16 1,027730

out/16 1,026909

nov/16 1,025166

dez/16 1,024449

jan/17 1,023017

fev/17 1,018738

mar/17 1,016299

abr/17 1,013057

maio/17 1,012247

jun/17 1,008616

jul/17 1,011651

ago/17 1,009934

set/17 1,010238

out/17 1,010440

nov/17 1,006715

dez/17 1,004906

jan/18 1,002300

Page 244: Nº 345 – Março 2018 · Revista SÍNTESE Trabalhista e Previdenciária Ano XXIX – nº 345 – MArço 2018 reposItórIo AutorIzAdo de JurIsprudêncIA Supremo Tribunal Federal

Bibliografia Complementar

Recomendamos como sugestão de leitura complementar aos assuntos abordados nesta edição o seguinte conteúdo:

ARTIGO DOUTRINÁRIO

• Acidente de Trabalho, Estabilidade do Trabalhador e a Reforma Tra-balhista (PEC 287 e a Lei nº 13.467, de 13 de Julho de 2017)

Lorena Grangeiro de Lucena Tôrres Juris SÍNTESE online e SÍNTESENET, disponíveis em: online.sintese.com

Page 245: Nº 345 – Março 2018 · Revista SÍNTESE Trabalhista e Previdenciária Ano XXIX – nº 345 – MArço 2018 reposItórIo AutorIzAdo de JurIsprudêncIA Supremo Tribunal Federal

Índice Alfabético e Remissivo

Índice por Assunto Especial

DOUTRINAS

assunto

Trabalho Escravo – as alTEraçõEs

• A Suspensão da Eficácia da Portaria nº 1.129/2017 e a Publicação da Portaria nº 1.293/2017: Análi-se Comparativa das Normas Que Versam sobre o Combate ao Trabalho Escravo Contemporâ-neo (Luiz Fernando Calegari) ...............................32

• Do Trabalho em Condições Análogas às de Escravo e a Nova Portaria nº 1.293/2017 do Ministério do Trabalho (Rocco Antonio Rangel Rosso Nelson, Isabel Cristina Amaral de Sousa Rosso Nelson e Walkyria de Oliveira RochaTeixeira) ..............................................................14

• Trabalho em Condições Análogas à de Escravo e Nova Portaria nº 1.293/2017: Retorno à Le-galidade (Gustavo Filipe Barbosa Garcia) ..............9

autor

GusTavo FilipE barbosa Garcia

• Trabalho em Condições Análogas à de Escra-vo e Nova Portaria nº 1.293/2017: Retorno àLegalidade .............................................................9

isabEl crisTina amaral DE sousa rosso nElson, rocco anTonio ranGEl rosso nElson E Walkyria DE olivEira rocha TEixEira

• Do Trabalho em Condições Análogas às de Es-cravo e a Nova Portaria nº 1.293/2017 do Mi-nistério do Trabalho .............................................14

luiz FErnanDo calEGari

• A Suspensão da Eficácia da Portaria nº 1.129/2017 e a Publicação da Portaria nº 1.293/2017: Análise Comparativa das Normas Que Versam sobre o Combate ao Trabalho Escravo Contem-porâneo ...............................................................32

rocco anTonio ranGEl rosso nElson, isabEl crisTina amaral DE sousa rosso nElson E Walkyria DE olivEira rocha TEixEira

• Do Trabalho em Condições Análogas às de Es-cravo e a Nova Portaria nº 1.293/2017 do Mi-nistério do Trabalho .............................................14

Walkyria DE olivEira rocha TEixEira, isabEl crisTina amaral DE sousa rosso nElson E rocco anTonio ranGEl rosso nElson

• Do Trabalho em Condições Análogas às de Es-cravo e a Nova Portaria nº 1.293/2017 do Mi-nistério do Trabalho .............................................14

Índice Geral

DOUTRINAS

assunto

aposEnTaDoria

• Identificação da Deficiência para Fins de Apo-sentadoria Diferenciada no Regime Geral de Previdência Social Brasileira (João MarcelinoSoares) ...............................................................101

ExEcução

• A Aplicação do Regime Jurídico Especial da Fraude à Execução Fiscal no Processo do Traba-lho (Ben-Hur Silveira Claus e Júlio César Bebber) ............................................................................45

mEio ambiEnTE Do Trabalho

• Mecanismos de Prevenção Acidentária: a Proteção ao Ambiente de Trabalho Bancário(Fernando Rubin e Guilherme Ribeiro Venturin) ..79

autor

bEn-hur silvEira claus E Júlio césar bEbbEr

• A Aplicação do Regime Jurídico Especial da Frau-de à Execução Fiscal no Processo do Trabalho ............................................................................45

FErnanDo rubin E GuilhErmE ribEiro vEnTurin

• Mecanismos de Prevenção Acidentária: a Pro-teção ao Ambiente de Trabalho Bancário ............79

GuilhErmE ribEiro vEnTurin E FErnanDo rubin

• Mecanismos de Prevenção Acidentária: a Pro-teção ao Ambiente de Trabalho Bancário ............79

João marcElino soarEs

• Identificação da Deficiência para Fins de Apo-sentadoria Diferenciada no Regime Geral de Previdência Social Brasileira ..............................101

Júlio césar bEbbEr E bEn-hur silvEira claus

• A Aplicação do Regime Jurídico Especial da Frau-de à Execução Fiscal no Processo do Trabalho ............................................................................45

COM A PALAVRA, O PROCURADOR

assunto

bEnEFício prEviDEnciário

• Competição Interprofissional: Breve Estudo de Caso Envolvendo a Concessão Judicial de Benefício Previdenciário (Tatiana Sada Jordão) ..........................................................................227

Page 246: Nº 345 – Março 2018 · Revista SÍNTESE Trabalhista e Previdenciária Ano XXIX – nº 345 – MArço 2018 reposItórIo AutorIzAdo de JurIsprudêncIA Supremo Tribunal Federal

246 .......................................................................................................... RST Nº 345 – Março/2018 – ÍNDICE ALFABÉTICO E REMISSIVO

autor

TaTiana saDa JorDão

• Competição Interprofissional: Breve Estudo de Caso Envolvendo a Concessão Judicial de Be-nefício Previdenciário .......................................227

ACÓRDÃOS NA ÍNTEGRA

Trabalhista

bancário

• Agravo regimental – Embargos regidos pela Lei nº 11.496/2007 – Horas extraordinárias – Bancário – Divisor – Não provimento (TST) ..............................................................34785, 123

previdenciária

aciDEnTE DE Trabalho

• Apelação – Administrativo – Responsabilida-de civil – Ação regressiva – INSS – Acidente de trabalho – Art. 120 da Lei nº 8.213/1991 – Laudo pericial – Negligência do empregador configurada (TRF 2ª R.) ..........................34823, 184

aposEnTaDoria

• Processual civil e previdenciário – Aposenta-doria rural por idade – Carência – Não com-provação do labor no período imediatamente anterior ao requerimento – Início de prova ma-terial ampliado por testemunhal – Insuficiência – Súmula nº 7 do STJ (STJ) ......................34820, 162

aposEnTaDoria EspEcial

• Previdenciário – Remessa oficial – Não conhe-cimento – Atividade especial – Hidrocarbonetos – Enquadramento – Requisitos preenchidos àaposentadoria especial (TRF 3ª R.) .........34824, 199

auxílio-aciDEnTE

• Previdenciário – Auxílio-acidente – Laudo peri-cial insuficiente – Sentença anulada (TRF 5ª R.) ..............................................................34825, 207

• Previdenciário – Auxílio-acidente – Não re-dução da capacidade laboral – Restabeleci-mento de auxílio-doença – incapacidade labo- ral cessada – Apelação improvida (TRF 5ª R.) ..............................................................34826, 212

conTribuição prEviDEnciária

• Tributário – Incidência de contribuição previ-denciária sobre verbas salariais – Férias goza- das – Adicional de insalubridade e noturno – Quebra de caixa – Auxílio-alimentação – Con- sonância com a jurisprudência do STJ (STJ) ..............................................................34819, 156

ExEcução

• Agravo interno no recurso extraordinário com agravo – Processual civil – Execução trabalhis-ta – Desconsideração da personalidade jurídica – Competência – Necessidade de interpretação de legislação infraconstitucional – Ofensa re-flexa – Revolvimento do conjunto fático-pro-batório dos autos – Impossibilidade – Súmula nº 279 do STF – Agravo interno desprovido (STF) ..............................................................34818, 152

pEnsão

• Agravo em recurso especial – Previdenciário – Pleito de concessão de pensão por morte a sobrinho-neto – Impossibilidade de análise do conteúdo fático-probatório – Incidência da Sú-mula nº 7/STJ – LCE 180/1978 – Impossibilidade de discussão acerca de norma local – Súmula nº 280/STJ – Precedentes – Súmula nº 83/STJ(STJ) .......................................................34821, 167

prEscrição

• Remessa necessária e apelação cível – INSS – Descontos indevidos de valores relativos à pensão alimentícia sobre benefício previden-ciário – Cerceamento de defesa – Inexistência – Prescrição parcial – Ocorrência – Danos ma-teriais – Existência de ato ilícito – Comprovação – Danos morais – Natureza in re ipsa – Senten-ça mantida (TRF 1ª R.) ...........................34822, 174

EMENTÁRIO

Trabalhista

acorDo colETivo DE Trabalho

• Acordo coletivo de trabalho – norma que pre-vê o enquadramento sindical – inaplicabilida-de – efeitos ............................................34786, 129

aDicional DE TransFErência

• Adicional de transferência – provisoriedade –pagamento devido .................................34787, 129

auxílio-alimEnTação

• Auxílio-alimentação – participação do empre-gado no custeio – descontos de pequena mon-ta – verba indenizatória e salarial – integraçãoao salário – descabimento .....................34788, 130

banco DE horas

• Banco de horas – ajustamento por negociação coletiva – necessidade ...........................34789, 132

compEnsação DE horário

• Compensação de horário – ambiente insalubre– impossibilidade ...................................34790, 133

Page 247: Nº 345 – Março 2018 · Revista SÍNTESE Trabalhista e Previdenciária Ano XXIX – nº 345 – MArço 2018 reposItórIo AutorIzAdo de JurIsprudêncIA Supremo Tribunal Federal

RST Nº 345 – Março/2018 – ÍNDICE ALFABÉTICO E REMISSIVO .........................................................................................................247 compETência

• Competência – Justiça do Trabalho – contra-to de empreitada – saldo remanescente paracobrança – alcance ................................34791, 133

• Competência material – Justiça do Trabalho – relação jurídica de cunho celetista – alcance ..............................................................34792, 133

conTraTo DE ExpEriência

• Contrato de experiência – rescisão antecipada pelo reclamante – indenização ..............34793, 134

conTribuição prEviDEnciária

• Contribuição previdenciária – empresa optan-te pelo Simples – isenção da cota patronal –alcance ..................................................34794, 134

convEnção colETiva DE Trabalho

• Convenção coletiva de trabalho – violação de norma legal – nulidade ..........................34795, 138

Dano moral

• Dano moral coletivo – afastamento por doen-ça por mais de 15 dias – atestados médicos – validação por médico da empresa – abuso– inexistência .........................................34796, 140

EmprEGaDor

• Empregador – responsabilidade objetiva – le-são na coluna lombossacra – vendedor exter-no – condução de veículo em jornadas supe-riores a 13h diárias – configuração ........34797, 140

EnquaDramEnTo sinDical

• Enquadramento sindical – prestação de servi-ços em prol de empresa financeira – alcance ..............................................................34798, 141

FrauDE

• Fraude – execução – penhora de imóvel do sócio – alienação antes da desconsideração da personalidade jurídica – não configuração ..............................................................34799, 141

horas ExTras

• Horas extras – marítimo embarcado – fixação por norma coletiva – possibilidade ........34800, 142

• Horas extras – prestação excessiva e contínua – dano existencial – configuração .............34801, 142

inDEnização

• Indenização – dispensa discriminatória – em-pregado portador de doença grave – transtor-nos psicóticos agudos – esquizofrenia – paga-mento devido ........................................34802, 143

JornaDa DE Trabalho

• Jornada de trabalho – propagandista – horas extras – ausência de controle – pagamento in-devido ...................................................34803, 143

• Jornada de trabalho – regime 12 x 36 – nuli-dade ......................................................34804, 144

• Jornada de trabalho externa – possibilidade de controle – horas extras – pagamento devido ..............................................................34805, 145

JusTiça GraTuiTa

• Justiça gratuita – pessoa jurídica – impossi-bilidade de arcar com as despesas do proces-so – não comprovação – benefício não con-cedido ...................................................34806, 145

pEnsão

• Pensão mensal – incapacidade permanente e parcial devidamente configurada pela via de laudo técnico idôneo – pagamento devido ..............................................................34807, 146

pEriculosiDaDE

• Periculosidade – trabalho com motocicleta – pagamento devido .................................34808, 146

quEbra DE caixa

• Quebra de caixa – empregado que labora em tesouraria na contagem de numerário –adicional devido ....................................34809, 146

rEinTEGração no EmprEGo

• Reintegração no emprego – empregado porta-dor de doença grave – discriminação – reco-nhecimento ...........................................34810, 147

rEscisão Do conTraTo DE Trabalho

• Rescisão do contrato de trabalho – pedido de demissão – empregado com mais de um ano de serviço – homologação – ausência – irregu-laridade .................................................34811, 147

rEsponsabiliDaDE civil

• Responsabilidade civil – policial militar – assal-to – acidente fatal – reconhecimento .....34812, 147

sEGuro-DEsEmprEGo

• Seguro-desemprego – requisitos para percep-ção do benefício – ausência de prova de in-gresso em novo emprego ao tempo da dispen-sa – pagamento devido ..........................34813, 148

• Seguro-desemprego – suspensão – registro no Caged na fase pré-contrato – não concretização do pacto laboral – indenização por dano mo-ral – pagamento devido .........................34814, 148

sinDicaTo

• Sindicato – desmembramento – criação por em-presa – impossibilidade .........................34815, 149

sobrEaviso

• Sobreaviso – ferroviários – aplicação analógi-ca – comprovação dos requisitos – pagamentodevido ...................................................34816, 149

Page 248: Nº 345 – Março 2018 · Revista SÍNTESE Trabalhista e Previdenciária Ano XXIX – nº 345 – MArço 2018 reposItórIo AutorIzAdo de JurIsprudêncIA Supremo Tribunal Federal

248 .......................................................................................................... RST Nº 345 – Março/2018 – ÍNDICE ALFABÉTICO E REMISSIVO

TErcEirização

• Terceirização – contratação por empresa suces-sora – cláusula de continuidade – aviso-prévio – descabimento ........................................34817, 150

previdenciária

aposEnTaDoria EspEcial

• Aposentadoria especial – auxiliar de copa e serviços gerais – atendente e monitor da Fe-bem – reconhecimento ..........................34827, 216

aposEnTaDoria por TEmpo DE sErviço

• Aposentadoria por tempo de serviço – pro-fessor – fator previdenciário – aplicabilidade ..............................................................34828, 216

auxílio-aciDEnTE

• Auxílio-acidente – redução da capacidade la-borativa demonstrada – qualidade de segurado mantida – benefício devido ...................34829, 217

auxílio-DoEnça

• Auxílio-doença – concessão – conversão em aposentadoria por invalidez – impossibili dade ..............................................................34830, 217

auxílio-rEclusão

• Auxílio-reclusão – tutela de urgência – paga-mento após a soltura do segurado – flexibiliza-ção da regra – possibilidade ..................34831, 218

bEnEFício assisTEncial

• Benefício assistencial – menor portador de paralisia cerebral e estado de miserabilidade – perícia – incapacidade para a vida – ausên-cia – benefício indevido .......................34832, 219

bEnEFício prEviDEnciário

• Benefício previdenciário – acidente do traba-lho – comprovação dos requisitos – pagamentodevido ...................................................34833, 220

• Benefício previdenciário – recebido mediante fraude – ressarcimento ao erário – cabimento ..............................................................34834, 222

compETência

• Competência – Justiça Federal – ação declara-tória – reconhecimento de união estável parafins previdenciários – alcance ................34835, 222

conTribuição prEviDEnciária

• Contribuição previdenciária – auxílio-alimen-tação pago em pecúnia – incidência......34836, 223

cTps

• CTPS – reconhecimento de atividade rural sem registro – prova testemunhal – necessi dade ..............................................................34837, 223

DEsaposEnTação

• Desaposentação – ausência de previsão le-gal – inaplicabilidade ............................34838, 223

JusTa causa

• Justa causa – aposentado – plano de saúde – ma-nutenção – pagamento integral – possibilidade ..............................................................34839, 224

mEnor

• Menor impúbere – dependente absolutamente incapaz – benefício previdenciário – pagamento devido – termo inicial ............................34840, 224

pEnsão

• Pensão por morte – menor sob guarda – direi-to adquirido – ausência – benefício inde vido ..............................................................34841, 224

• Pensão por morte – neto de ex-servidor muni-cipal falecido – dependência econômica – nãocomprovação – benefício indevido ........34842, 225

salário-maTErniDaDE

• Salário-maternidade – autora e advogado devi-damente intimados da audiência de instrução e julgamento – não comparecimento da parte e da testemunha – efeitos ........................34843, 225

sErviDor público

• Servidor público – conversão de tempo de serviço especial em comum – período pos-terior à edição da Lei nº 8.112/1990 – impos-sibilidade ...............................................34844, 226

CLIPPING JURÍDICO

• Carnaval não consta no calendário de feriados nacionais e falta pode ser descontada do sa-lário ...................................................................238

• Supremo recebe mais três ações contra fim da contribuição sindical obrigatória .......................239

• Tribunal deve unificar jurisprudência sobre li-mite de desconto de consignado em folha deaposentados .......................................................238

TABELAS PRÁTICAS ..............................................240

BIBLIOGRAFIA COMPLEMENTAR ........................244

ÍNDICE ALFABÉTICO E REMISSIVO ......................245