neves, castanheira. metodologia jurídica

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•• 2. O PROBLEMA ACfUAL DA INTERPRETAÇÃO JURíDICA Em termos estritos e próprios. e a implicar um problema espedfico no qua- dro do pensamenro jurídico. a interpretação é o acto mc£Oclol6gico de determi: C"' nação do sentido jurídico-normarivo de uma fome jurídica em ordem a obter dela ~ um critério jurídico (um critério normativo diram) no âmbito de uma proble- ~~~ márico realização do direito e enquanto momento normarivo-me[odológi~ dessa ~ mesma realização. E isto significa. por um lado, que o critério normarivoque a ~ fome jurídica inrerpreranda ofereça só pode oferecê-lo pela mediação da imer- ' 7-'\ peeração - «a norma será [aI como é interpretada» (AsCARELLI) -; por outrO ./ - I lado. que a imerpre_ia~1 .3:<>. propor-se referir a fonte-norma interpretancla às con- ~ eretas exigências ou ao mérito concreto do problema jurídico a resolver, para que". Ç' ~JS possa ser um critério adequado da sua solução, traduzir-se-J. sempre numa cons- '-.,)-.~ titutiva ((concretizaçãolt.A primeira nota mostra que «o nexo entre a norn13 (o pre- ceito jurídico) e a interpretação é incindível, (PARESCE); e pela segunda nota igual- \ mente se reconhecerá que a norma só vem a ser interpretativamente determinada ) através da concreta resolução dos problemas jurídicos que nela se fundamente ou que a invoque como seu critério - (la interpretação é o resultado do seu resul- tado. (RAoBRUCH) -. pelo que, também se falará aqui de um espedfico drculo metodológico, análogo ao «drculo ~ermenêuticolt em geral. 1) Problema hermenêutico ou problema norm~tivo? Dito isto em geral. o primeiro.ponto problemático a dilueidar é este: a inter- pretação jurídica é um problema estrita e rigorosamente h~ml~n;Uti(o ou um pro- blema essencialmente nonnativo? Ou seja, o problema da interpretação jurídica está em saber o que significa/ivo-uxtua/m(nt~ consta, p. ex., da lei, e como esta em termos puramente hermenêuricos se deverá determinar. ou ames em saber de que modo prdtico-nonnativam(nt( se deve assimilar o seu sentido jurídico-nor-

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Page 1: NEVES, Castanheira. Metodologia Jurídica

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2. O PROBLEMA ACfUAL DA INTERPRETAÇÃO JURíDICA

Em termos estritos e próprios. e a implicar um problema espedfico no qua-dro do pensamenro jurídico. a interpretação é o acto mc£Oclol6gico de determi: C"'nação do sentido jurídico-normarivo de uma fome jurídica em ordem a obter dela ~um critério jurídico (um critério normativo tÚ diram) no âmbito de uma proble- ~~~márico realização do direito e enquanto momento normarivo-me[odológi~ dessa ~mesma realização. E isto significa. por um lado, que o critério normarivoque a ~fome jurídica inrerpreranda ofereça só pode oferecê-lo pela mediação da imer- ' 7-'\peeração - «a norma será [aI como é interpretada» (AsCARELLI) -; por outrO ./ - I

lado. que a imerpre_ia~1 .3:<>. propor-se referir a fonte-norma interpretancla às con- ~eretas exigências ou ao mérito concreto do problema jurídico a resolver, para que". Ç' ~JSpossa ser um critério adequado da sua solução, traduzir-se-J. sempre numa cons- '-.,)-.~titutiva ((concretizaçãolt.A primeira nota mostra que «o nexo entre a norn13 (o pre-ceito jurídico) e a interpretação é incindível, (PARESCE); e pela segunda nota igual- \mente se reconhecerá que a norma só vem a ser interpretativamente determinada )através da concreta resolução dos problemas jurídicos que nela se fundamente ouque a invoque como seu critério - (la interpretação é o resultado do seu resul-tado. (RAoBRUCH) -. pelo que, também se falará aqui de um espedfico drculometodológico, análogo ao «drculo ~ermenêuticolt em geral.

1) Problema hermenêutico ou problema norm~tivo?

Dito isto em geral. o primeiro.ponto problemático a dilueidar é este: a inter-pretação jurídica é um problema estrita e rigorosamente h~ml~n;Uti(o ou um pro-blema essencialmente nonnativo? Ou seja, o problema da interpretação jurídicaestá em saber o que significa/ivo-uxtua/m(nt~ consta, p. ex., da lei, e como estaem termos puramente hermenêuricos se deverá determinar. ou ames em saber deque modo prdtico-nonnativam(nt( se deve assimilar o seu sentido jurídico-nor-

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• 84 Mdl:Jdologia Jurldiea 2 - O prohlmJJz actu4/ dA jnurpr~tafáo jurldica 85

mos comprovar. Sem deixar de anotar, desde já, que também esta tese não vaimenos compartilhada pelo pensamento mcrodológico-jurídico. Nesse sentido nosdizem - só para citarmos dois autores significativos - EssER (Vorvastãndnis,p. 136), que «o jurisra não compreende o texto que lhe vai dado, nem na sua rele-vância histórica, nem sociologicamente como produto de determinadas forças,ele não lhe interessa como expressão de um pensamento, mas como um prescritopadrão (WroUllgstnUSkr) significativo para a sua decisão - o jurista não quer com-preender no texto senão o.que, de acordo com a sua ratio, lhe fazou não possívelpronunciar uma decisão satisfatória»; e KRJ:ELE, pondo em relevo a distinção entre«texco»e .problema» e acentuando também que este e não aquele deve polarizara interpretação jurídica (ob. át.•p. 159 ss.), conclui que tt3 interpretação do textosó pode ser coreecra se ela resolver correctamente» -.i. é, de um modo (prático--normativameme) justificado - ((osproblemas concretos. (p. 215) e que, porisso, é em último termo (lajustiça que conduz e determina a própria interpreta •.çãOlt(I'"225). Nem deixe de observar-se que isto, nem por todos os juristas aindaentendido, vai já perfeitamente compreendido pelo próprio pensamento dahermenêutica geral. É nesses termos que se lê em GADAMER (.Hanuntutik undHistoriásmuSll, apêndice a Wahrh~;t und MdhotÚ, 2.a ed., p. 488 s.): ((que a her-menêutica jurídica pertença ao conjunto de problemas de uma hermenêutica geraié o que não é de modo algum evidente. De facto, não se trata nela de uma refle-xãq. de tipo metódico como para a filologia e para a .hermenêutica bíblica,mas propriamente de um princípio jurídico subsidiário. A sua tarefa não écompreender as proposiÇÓC5jurídicas vigemcs, mas encontrar direito, isto é, inter-pretar as leis de modo que a ordem jurídica cubra inteiramente a realidadesocial •.

2) A concepção tradicional da interpretação jurídica

A posição anterior só poderá, no entamo, sustentar a sua concludência depois.de uma prévia consideração crítica da concepção hermenêutica tradicion~ da inter-pretação jurídica. J:. o que se propõe esta alínea.

a) Assim, a interpretação tena por obj~(loo tato normativo-prescritivo dasfontes jurídicas, o texto das normas jurídicas formalmente prescritas (v. g.O textodas normas legais). Ou seja, à questão do saber o qu~se interpreta (que não seconfunde com a questão do objectivo da interpretação, o fim de determinaçãoque com ela se visa atingir), a resposta seria: um t~xtojurídico.

Esta concepção, em que o pensamenw jurídico dominante vê quase umaevidência, tem todavia uma história - podem-se-Ihe apontar origens culturais,que se viriam a conjugar com particulares factores políticos.

mativo para que ela possa ser critério também juridicamente adequado de umajusta decisão do problema jurídico concreto?

A resposta do lugar-comum frequentado pelo pensamento jurídico acrí-tico vai implicitamente no primeiro sentido. E de tal modo que na hermenêu-tica geral.como metódjca, a interpretação jurfdiCl deveria não só esclarecer-sesobrea sua essência, como procurar mesmo os critérios do seu coerecto inrerprcrar.O que também algumas relevantes posições do pensamento metodológico-jurí-dico tendem a corro botar. Assim H. CoING, Dir juristischm Auslrgungsmrthodmin dir úh" dn aUgrrnd,un Hrrmm(Utik, 1959; e especialmente BErIl, Tronagmr-rakdAia inurprttaziont, 2 vais., 1955. ainda que se reconheça em ambos que ainterpretação jurídica ocupa um lugar específico no quadro da hermenêutica geral,dada a sua .índole teleológica» (COINC) e a sua «fünção normativa» (BETIl).E todavia é esta uma resposta que nesse seu sentido geral não se pode conside-rar válida. O problema jurídico-normativo da interpretação não é o de determinara significação, ainda que significação juddica, que exprimam as leisou quaisquer~ormas jurídicas, mas o de obter dessas leis ou normas um mtmo prático nor-mativo tUÚquado de decisão dos casos concretos (como critério-hipótese exigido,por um lado, e a submeter, por outrO lado, ao discurso normarivamenre pro-blemárico do jufzo decisório desses casos). Uma «boa» interpretação não éaquela que, numa pura perspectiva hermenêutico-exegética, determina correc-tamente o sentido textual da norma; é antes aquela que numa perspectiva prá-tico-normativa utiliza bem a norma como critério da justa decisão do problemaooncreto. Não, evidentemente, que se negue a influência histórica da.hennenêuricasobre a interpretação jurfdica (cfr., por todos, HINDERUNG, Ruhúnorm u. lItrs-

~ tth~n, p. 95 ss.); não também que se ignorem os momentos hermenêuticos da. ». interpretação e da metodologia jurídicas. Vão eles, desde logo, no relevo do axio-»I. \I"'-.t~ " lógico contexto comunitário-consensual e histórico-culturalmente significante,

~ .1 \ ••.i na «pré-compreensão» jurídico-socialmente inrerrogante em cada problema jurí-

1EcUco concreto, na unidade intencional entre o objecto interpretando e o conteúdoda inrerpreução, no próprio drrulo metodológico da ({concretização»,etc. - tudo

0"_,~,.li o que foi posto especialmente em evidência por EsSER, F.MüllER, ART.KAUF-

, MANN,l..ARENZ, HtNDERUNG, etc. E pode mesmo reconhecer-se,com HRUSCHKA,

que uma dimensão hermenêutica é ((acondição de possibilidade. de compreen-f\. der os textos jurídicos. Mas nem aqueles momentos nos dizem só por si da índole

'. f\ I e inrencionalidade específicas da merodológica interpretação jurídica, nem esta~ ~' dimensão define os critérios de validade (da justeza) dessa mesma interpretação~i .(cCr.,no mesmo sentido, HRUSCHKA, Das Vrrsu/un vou R~chtstc<ltn.p. 11 ss.).

.~ ~i I[ Recusa da Indole puramente hermenêutica da interpretação jurídica :l favorJ11~."'"H"' ~m,_~""";f~,,~,,,"""""''','fm"" , ,,"- "••• ".

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Iv It '..:""... /-C'O 7{y I., ?87

;I ~ Fu e- I/Ie.: tU--

, l,ú~/o;,\/,~. úJ.ud (p foW2 - Oprobkma actua/ da int"1'ffl4(ão juridica

resultado geral. o direito é compreendido como uma normatividade que seinfere de fontes prescritivo-textuais - os textos prescritivos imputados tanto aoimperador (o Corpus iuris dvi/is) e aos soberanos ou poderes poHticos locais(os Estatutos), como ao Papa e a outras autoridades eclesiásticas (o Corpus iuriscanonici. as novas Dtcr~taks, documentos conciliares, etc.). Que o mesmo dizer:que se infere de kgts. Na Idade Média, pensar o direito mesmo teológico-filo-soficamente, era pensá-lo, decerto em referência à justiça, mas como üx-sirva de exe_mplofundamental São Tomás. Por isso os juristas medievais sediziam .kgistaJII e puderam fazer seu o princípio que liam no Coda imperial.não no DigtStum jurisprudencial: non "'''''plis. "d kgibus judicandum '" (C.7,45.13). Era como se, contrariamente a Paulus, se passasse a afirmar t'X rtguIa iussumamr ...

Por outro lado. o modus de que se socorria este último pensamento eradeceno o que lhe oferecia também o ambiente cultural do tempo: a base formativaera o tTÍvium e a metodologia era a da ~scoMstica (v. GRABMANN, Dit Gtsc!Jichud" scholdstischm Mtthod,. 1911) - a «aplicação dos métodos da lógica aristo-télica e da retórica» à disputalio sobre quatstionts, e assim uma discussãotópico-argumentativa sobre questões doutrinais, fossem elas suscitadas por pro-blemas práticos reais ou imaginados, que invocava sempre como argumentos tex-tos sancionados e opiniões de autores (autoridades), e estas com ranto maior relevoquanto se conjugassem numa commu"is opinio, pois isso o exigiria um pensamentoargumentativo-rerórico do domínio do «provável•. (Para uma análise deste pen-samento e da sua dialéctica argumenrativa com úgtS, rationts, auctoritaus, com-munis opirlio doctorum, v., por rodos, VIEHWEG, ob. cit., p. 50; L. LoMBARDI, ob.cit., capo li, p. 79-199: MARTIM DE ALBUQUERQUE-RuI DF. ALBUQUERQUE, His-tória do Diráto Portuguê', 1984-1985, p..234-265). Daí que o pensamento juri-dica fosse hermenêutica na intenção espistemológica. posro que dialéctico--argumcntativo ou iógico.dialéctico na perspectiva meródica (v. G. O'ITE,

Dial,ktik und juri'prudmz, 1971; P. MORTA RI, «Dialecrrica e giurisprudenza.Studio sui trattati di dialecnica legale dei secoXViii. in Dirillo Logíca Mdodo ntl,te% XVI, 1978 p. 117 ss.) - e daí rambém os argumentos, já sem dúvida uti-lizados pelos jurisras romanos (v. G. HANARD, 4(lmerprerario e narmes de droitprivé sous la République et le Pcincipa,., in L'lnttrpritatiofl m droit, Approch<plu-ridisâpIinairt, p. 41455.), mas só então de modo explícito e fundamental: a simiHou a pari, a contrario, a maion. ad minus, fi m;'lOri ad maius, a jôrtiori, ad absur-dum, etc. Conclusóes estas onde deparamos com duas dimensões essenciais deum tipo de pensamento jurídico que persistiu em grande pane até o nosso tempo,e por isso não será excessivo afirmar, como reperidamente se afirma, que a «ciên-cia jurídica europeiaP, tanto nos seus modelos hermenêuticas como inc!usivamente

M~todologi4 Juridira86

a) A origem cultural tem a ver com a concepção do direito e o pensamentojurídico medievais - a partir do séc. XI - e que desde emão, sobretudo atra-vés do jus commun~. não deixaria de determinar metodicamente pensamemo jurí-dico europeu até o positivismo legalista do séc. XIX - o qual. aliás, em muitosaspeCtos apenas continuou aquele pensamento tradicional. Sabe-se, com cfeim,que. (anto sociol6gica como culturalmente, o pensamento medieval especifica~mente se submetia a um característico prindpio tk autoridadr e isto viria aimplicar que o pensamento jurrdico medieval se viessea constituir essencialmentecomo inUTPrd4tio.' A inurpraatio do Corpusjuro civilis- a colectânea justinianeiarocuperaclapara o Ocidente europeu, nos fins do séc. XI, por Imério - e do entre-tanto elaborado Corpus iuriJ canoniti, pois que os seus textos eram tidos pelo pcn-

Isarnento júrídico, tal como a Bíblia pela teologia, como indiscuridos «latos d~autoritÚuÚ». «Ê um dos traços bem característicos da ciência medieval. -acenrua CoING, «Trois formes historiques d'interprétation du droir., in i?rrn« his-toriqu, d, droit francai, tt Itrangtr, 48.0 (1970), p. 535 - 'que da se funda emcada disciplina sobre livros de auroridade, nos quais o intelectual da IdadeMédia crê encomrar rodo o conjunto de saber possível. - já que esses livros deautoridade eram para eles (lnâo testemunhos hisróricos da verdade ou da realidadedas coisas, mas essa verdade e realidade em si mesmalt (WIEACK£R, Privatrt-chrsg'Khichu dtr Nruait, 2.' ed., p. 50). E isso porque, como acentua HElOEGGER

(Ho/zwtgt, segundo a trad. esp. de l. Rovira Armengol), tendo «enrretanto o Cris-tianismo trasladado a genuína possessão da verdade para a fé, para o assentimentoda palavra das Escrituras e para a doutrina da Igreja», e a implicar assim que

1 -o supremo conhecimento e doutrina fosse a teologia, enquanto interprcração dapalavra divina da Revelação consignada nas Escrituras c proclamada pela Igrejalt,também em geral para a culrura medieval ••conhecer não é investigar, mas enten-der devidamente a palavra decisiva e as doutrinas das autoridades que a prada-mamj daí que o comentário das palavras e doutrinas tenha a prioridade na IdadeMédia, no que toca à aquisição de conhecimemoslt. E desse modo, também o cor-pus justinianeu era considerado para o jurista medieval a ratio scripta no domí-.nio jurídico: «ele continha as regras da razão prática. da própria justiça. (CoING).ItOS legistas da época - acemuam também F. OST e M. V. DE KERCHOVE,

,Imerpréra,ion., in Archiv, d.Phil d.Droit, 35 (1990), p. 178 - estão conven-cidos de poder encontrar no corpus iuris civilú a solução para qualquer ques-tão jurídica; o texto, pensado completo e coerente é a expressãoda mtio e da tuquí~tllJll. E nessa perspectiva o pensamento jurídico assumiu.se decerto comointerpretação de /(xtos: a direito oferecia-se enunciado em tex[Ose através des-ses textos. no modo exegético-comentarístico e sob o argummtum O( vabo,obrer-se-iam todos os critérios jurídicos para a prática jurídica. Ou seja. e como

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No contexto cultural. muito dos nossos dias, que nos permite com-preender esta intenção. no pensamento jurídico - aliás, veêm-se hojeintenções análogas em quase todos os domínios do pensamento -;- avulta~mo fundamental o que bem se diz ser a acrual ((Viragempara a linguagem"(thi linguistic turn)- a radical perspectivaçáo linguística de todos os fenó-menos e problemas culturais, e em todos os níveis (filosófico, epiSlemoió-gico e metodológico), em termos de se pensar que esses problemas ou sãoproblemas de linguagem (p. ex., WIlTlGENSrEINdiz que «alie I'hilosophieist Sprachkritib - «toda a filosofia é crítica de linguagem» -, Tractatus,4.0031, e CARNAP sustentou num ensaio célebre a ""Obawindung daM,taphysik durch IngisclNAndlyu d" Sprach<o- a .superação da metafísicamediante a análise lógica da linguagemlt) ou se hão-de resolver mobilizandopara tanto e decisivamente o instrum~ntanum linguístico. Pois que, posru-

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lando-se que não há nenhuma experiência inteligível pré-linguística. jáque a linguagem será o último e constitutivo transcendental de todo o sen-tido e bem assim da comunicação em que ele é possível - deste modoficará excluída a evidência primeira, seja da racional (como em DESCAR~TES) ou empírica (como em LOCKE), e igualmente qualquer pretensadirecta e privilegiada representação intencional-objecriva pré-linguística(como na fenomenologia de HUSSERL) -. conclui-se que a referencia. aorientação e a ordenação do mundo, que a sua experiência no mundo fá-Iaso homem pela linguagem. enquanto é ela o radical mediador do seu acessocultural ao mundo: ((oque há no mundo não depende em geral do nossouso da linguagem, mas já depende deste uso o que podemos dizer quehá. (W V.O. QUINE). Dal indusivamente a linguagem como o fundo' filosó-firo (.a palavra.é a morada do Se", - HEIDEGGER)e a filosofia como Iingufs-tica hermenêutica ({(Oser que pode ser compreendido é linguagem» - GADA~

MER)- ou assim de tal modo que nos pode dizer H. SElFFERT(Illtrod~etióna la uona fÚ úzci~ncia, trad. esp., p. 32) que ((certamente não exageramosse designarmos a época da urzguagan como a terceira era da filosofia, depoisda época do ser (antiguidade e idade média) e da época da consciência (idademoderna até à análise da linguagem)". O que significará, em tudo, a prio-ridade do quidmodo sobre o quid ou a transferência intencional da ((essên-cia" para a «(significação", Que tanto é dizer que não terá sentido referirmo., •-nos a um qualquer ser, ente ou objecco em si, pois a conclusão linguísticaimpõe que um ((objeao» é aquilo que designo com uma palavra da linguagem- «objecto é tudo aquilo para o qual temos uma palavra na nossa lingua-gem. (SEIFFERT), do mesmo modo que «ter um conceito é empregar umapalavrall(SEUARS) - e, então, {,desdeque se define um objt'cto como aquiloque se designa com uma palavra da linguagem, deixam-se de lado proble-mas sem fronteiras que há quase três mil anos se têm fixado em torno de coi-sas como 'ser' e 'conhecimento', (... ) toda a 'ontologia' e a teoria do conhe-cimento; com efeito, o analítico da linguagem já não neces.'iitade perguntar-se. ""'que' (é' um objecto ou 'como' o conhecemos, basta-lhe que se fak do '"

objeclO' (SEIFF.ERT.,ob..cit., p. 32). Numa_p_~av..ra,~. I'..ottante edecisivo I ~ l' I

n~~ em saber o que são as cois~ c:m si,_mas sa-º~_r..<> _quç_.dizcmos I \.~ "q~amos º_~ta_~)_o_q~ueremos dj~ÇLcoml_9u_qu~_signifi~~~têm, . "'.jas~p'ressões linguísticas (a linguagem) com g~~~0:tarn~ ....eco~uni- II "camos esse dizer das coisas. Isto por uma lado; por outro lado, trata-reda . ~l~lguagem a conSiderar não decerto a nível gramalicai (a ;'cr a ver com as for- Zmas e o uso concretamente expressivo de uma certa língua), mas a nívellin- ~guístico em sentido próprio (a ter a ver com a intencionaJ significatividade ):

~'}, .

2 - Oprobkm4 iletu41 d.t in(""r~l4fáojurldic4M~toJqlogiaJurúlit'1l88

nas suas estruturas dogmáticas (construídas com base no Direito Romano e acei-tes como ius commuru) nasceu na Idade Média.

~} Quanto aos bClores polfticos, há que considerar os que resultam do lega-lismo contr3malisco-consrirucional assumido pelo positivismo jurídico. Pois paraesse positivismo o direito reduziu-se ao direim posto (imposto) nas leis e as leisidentificavam-se com o seu texto - porque é no texto "da lei que se exprime o

\ imperativo do legislador e se manifesta vinculativameme a suoa autoridatÚ legis-Ilativa. porque no texto da lei encontra o direim a objocrivação que garante a s~gu.rança juridica. e porque em referência ao texto da lei se poderá aferir do cum-primento do principio da uparação dospod~us. ou ~ejada o~diê.ncia ou rebeldiado poder ou função judicial peranre o poder legislativo.. E então a lei não se expri-mÍria só num texto - ~ra~ssttato. Pelo que o objecro da interpretação seriatambém o tato da ki - a expressão texwal da norma legal.

X) O que tende mesmo hoje a radicaliz.ar-se no que poderemos dizer a«redução linguística» do pensamento jurídico - ou na perspectiva analítico--linguística do positivismo jurídico. Trata-se de uma redução que pretende vero pensamento jurídico a assimilar e a determinar-se epistemol6gico-metodologica-mente pelas estruturas e modelos da analítica linguhtica (do pensamento teore-ticamente empírico-analítico de perspectivaçáo linguística). E em termos de sepoder afirmar que, através desta conversão do pensamento jurídico em «análise

....... da linguagem. (cfr. N. BOBBIO.Scimza dA diritto, analisi tkllinguaggio. inU. SCARPEW, org .• Diritto ~analisi dei linguaggiu,e bem assim todos os demaisensaios incluídos na mesma colecção). é o positivismo jurídico que recupera eregressa, posto que convocando outros pressupostoS e noutro contexto, e por issose poderá dizer estarmos aqui perante um n~opositivismojurídico.

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jours, 001. de ensaios. em que anotaremos sobretudo, para o nosso ponto, osensaios de W. V. O. QUINE, L<sd<ux dogmu d, !'''''pirism<, e de P. FEYE-

RABEND, Commtllt RIu un bon ~mpiriJ/(. PlayotÚr ~flfavror tk la toltranu~1lmatih~ (spistnnologiqu~ para o pensamento filosófico em geral, ainda oconjunto de ensaios de R. RORTY, sob o tírulo geral COllS<qumm o[Prag-matism, 1982). Todavia, todo o pensamento analítico (pensamento teoré-ticó-anaIrtico numa pressuposição lingu[stica) se mantém na exigência deuma radonalmente objectiva W"tftnh~jt.a implicar, se não já em absolutoa identificação do pensamento significante. em todo o caso do pensamentovalidamente fundamenrante ao pensamento que cumpre formalmente a com-possibilidade lógica e que materialmente se sustenta por uma referência objec-tiva (por uma referência a pressupostos «objectosll dados numa particularexperiência). E assim [ambérn nas «ciências do espíritoll e nos pensamenp[tos práticos, já que exigiram igualmente umas e outros, na intenção de episp I ...~tcmológica objeaividade empírica postulado pelo pensamento analítico, uma I~ 'to«linguagem objectiva sobre coisas e acontecimentosll (crr. K. O. ArEL, «Diel' I ~.'"Emfalrung der 'sprachanalytischen' Philosophie und das I'roblem des 'Gei. ~ to ~,teswissenschaften\, in Transfônnation dtT Phjlosophj~, li, p. 33). Trata-sei 1tode um postulado de objectividade que privilegia o esquema cognitivo. \\ ~sujciro/objecto contra, desde logo. o esquema Prático-comunicativo\ r;-sujeito/sujeito; e de tal modo que o próprio smtido (as significações comup I f P"icadas e que se hão-de comunicativamente compreender) haveria de sofrer~uma redução objectiva (objectivo-empírica): pela ((redução do compreender .f,do sentido à objectiva e empírica descrição do componamento», por uma ':':\.'\redução em último termo psicológica, de um lado; pela «reclutiva eliminap ~ção .do sujeitôll. do próprio sujeito da ciência ou do compreender. através ida sua conversão a um objecto também da ciência, ohjeao de conhecimentopsicológico, sociológico, histórico, etc., de outro lado (v., sobre estcs ponptos, K. O. APEL,. oh. Ioe: dts., p. 73, e ainda SzienliJmus od~r trallSZ~llpdmtal< H<rmmrntik?,loc. cit., li, p. 183 ss.).

Pressuposto que implicaria, para a ciência do direito e o pensamentojurfdico, a consideração do direito em geral igualmente como objuto(objecto-facro social susceptível de descrição/explicação e análise) e da suaprópria normatividade não menos como um conjunto de ((dadosempíricos»ou de «factos observáveisll, de uma natureza particular embora: os ((factoslingufsticos» em que as normas jurfdicas se objectivam e oferecem suscep-tíveis, como tais e por sua vez, da teorético-objectiva analftica lillguística- cfr. L. FERRAJOU, La umantiea d~/Ia /(oria da diritto, in U. SCARI'ELl.l(ed.), La uoria gm~rak da diritto - Probkmi ~undmu a/tua/i, p. 84 ss.).

Metodologia Jurldiea

e a lógica da linguagem, enquanto um autG-ubsisrcme quidmodo signific:mre.na sua csrcutura, nas suas modalidades e nas suas possibilidades signiflcacipIvas). E se a linguagem é a esse nível o radical mediador e último rranscenp

dental da significação possível, então terá de pensar-se que a lógico-signi-

lificatividade da linguagem identifica agora a racionalidade: se a «análise dalin u em-, como análise ló ico-si nificame é a última .

nsar, a racionalidade é analítico-lin uIstica.Assim como é neste sentido que se poderá dizer que o direito é

linguagem. e (ccá de ser considerado em tudo e por tudo como umalinguagem. O que quer que seja e como quer que seja. o que quer que elese proponha e como quer que nos toque, o direito é-o"numa linguagem e ,I

como linguagem - propõe-se sê-lo nu~a linguagem.(nas significações lin-guísticas em que se constitui e exprime) e atinge-nos atravél',dessa lingua-gem, que é.

A esre básico pmsuposto cultural (ou fif"sófico-cuúura4 vai geralmenteassociado um segundo pressuposto, mais de sentido epístemológico, que dire-mos o pmsuporto do obj~etivismonnpírico-ana/ltico.O pensamento linguísticoé um pensamento analítico (lógico-analítico) e originariamente de referênciaobjecrivo-empírica. ~ certo que esta referência não é necessária e já hoje emlargos sectores daquele pensamento ela se não verifica. De um lado, aomonismo linguístico do empirismo ou posirivisI11ológico de exclusiva refe-"rência objectivo-empírica ou de intenção apenas assertório-descritivista(.the essential business oflanguage is to assert or deny factSll- B. RUSSEl)sucedeu um pluralismo linguístico em que se reconhece à linguagem nm-ções diversas, inclusivamente uma função constitutiva ou p~rfõmultiva (emque é possível to do thi"gs with words- J. L AUSTIN), e tantas possíveis lin-guagens diferentes quanto os possíveis «jogos da linguagem» (WITI'GENS-

TEIN), nos quais a significação deixou de definir-se por aquela referência e sepensa constituída pelo «uSOll,pela prática constitutiva de um sistema signifi-cante de comunicação; de outro lado, o principio do cmpirismo quatak-em que enconrrava expressão epistemológica aquele originirio monismo lin-gufstico e segundo o qual não só se postulava uma rigorosa distinção entreenunciados analíticos (fundados nas significações indcpendentes dos factos)e sintéticos (fundados nos factos) como se afirmava que um enunciado teriauma significação cognitiva se e só se, não sendo analítico nem contraditó-rio, fosse logicamcnte deduzível duma classedeterminável de enunciados deobservação ou empíricos, vêpsesubmetido a uma cada vez mais participadacrítica anti-empirista, com particular relevo para o actual neopragmatismo(dT. D< Vim,,< à Cambridg<. L'hlritag<du positivism<f"giqu, tÚ 1950 à "ous

2 - Oprobkma aaual dA int"putação juridica 91

Page 6: NEVES, Castanheira. Metodologia Jurídica

92 Mdodo/ogia jurldica 2 - O probkmtt adU4! á4 intt:rprtf4{áb jurldica 93

A que acresce um terceiro pressuposto, em que o jurídico positivismoIinguísdco-analítico também sempre converge - trata-se agora de umpr~ssupOJIO político. o pressuposw de uma sociedade democrático-pluralque se institucionaJiza por um Escada-cle-direito de legalidade e segundo oqual o direito voltaria a identificar-se com o sistema das prescrições legislatip

'\ vas, com a legalidade positiva (cft., por todos, KOCH/ROsSMANN, juri"is-

1che Bcgrundungslchrc, cits., p. 4 ss. e 112 ss. e passim). Seriam afinal essasprescrições (os seus enunciados prescritivos)os ufaaas linguísricosltque a ciên-

~ da do direito e o pensamento jurídico haviam de considerar; e no discursoS ~~. . que os consubStlIlcia. no «discursodo legislador».(edamos a linguagem que o-]::~ ~. '... direito é e manifesta: a .linguagem legal. (cfr. L FERRAjOLI, ob. Ioc. au.,~ K ~ p.84). .rt.~ .~ •. ~ Deste modo se compreende o universo jurídico mmo um universo linguístico~ ~ ~ ~ e se infere daí que o pe.ns~ento jurídico .haverá.de assumir co~o seu. mérodo

~ ~ específico a andlise da linguagem - .a análise da linguagem legal, I. é, a Interpre-'i.~ caçãojurídica daqueles dados empíricos que consistem nas proposições normativas~' ~ de que se compõe o discurso do legislador>(L. FERRAjOU, ibid., p. 86) - ~ndo

J decerto t..radicalmentt....romo obj~ctodirecro de análiS<=-QJ(.(to legal, os enuncia-dos linguísticos objectivados prescritiv~"2.~~~~ texto.

.....r- Análi;e esta que~ com ser anilise linguís1ica, implicaria três característicos'i-I '6 posculados metódicos - os quais, por isso, há que ter presentes antes de aten-~ -. dermos directamente ao seu modelo da interpretação jurídica.~ ~ 1) O p'lstulado da pura racionalidad~, em primeiro lugar, e a implicar um~ ~ estriro raciorlalismo ainda nos pensamentos dos domínios práticos. Com esse pos-~ 'iltuladO preç~nde-se,com efeito, excluir também nessespensamentos quaisquer pro-

,-"f ~ cessos, inferências ou conclusões que não se reconduzam, já às estruturas e infe-~ )- rências ,lÓgico-racionais, já ao quadro da intencional imanência de um sistema

:x acion~mente constru~do que permitisse uma ~alítico~r~cional fi.mdam~ntaç~o.

J'4~ ~ «R~o» é, na perspectiva deste posmlado; a razao analiticamente dedutiva e SIS-

~ temática, a «rigorosa razão em adstringentes inferências» que recusa a razão peá-'\j I ticd-retórica ou retórico-argurnenrativa - no domínio do ético e do prático em~ ge~alafirmar-se-ia ela no modo de um estrito «racionalismo ético» vs. uma qual-

quer teoria de argumentação (v., neste sentido e por rodos, U. SCARI'ELU, Intro-duziom a Dinuo e alUllisi drllinguaggio, cit., p. 25 ss.).

2) O postulado da nnJtralidad~ trórica, em segundo lugar, e a excluir o com-promisso prático na intenção analítica. roi ele afirmado no âmbito problemá.rico geral do pensamento prático justamente para sustentar, através das distin-ções entre «linguagem objecto» e «metalinguagem» e entre ética c meta-ética, a

legitimidade aí de uma intenção puramente teorético-analítica, enquantometa-intenção ou intenção de segundo grau, relativamente ao pensamento prá-rico em sentido estrito, o pensamento comprometido directamente com problemase intençócs práticas. Ou seja. da «ética normativa~ - tomada aqui a ((ética»comoparadigma do pensamento ou da linguagem práticos ~ haveria de distinguir-se S)

a ~meta-éticall ou «filosofia moral~) com base em dois tipos de perguntas admis.síveis e discrimináveis nesse universo globaÍ das linguagens práticas: «o que ~ l' ~,;devemos fazer?», «devo realizar esta acção?~. «é esta acção boa?», «é este com- ':t-~'1;-(porlamento justo?», erc., por um lado, e ~(oque significam 'dever-ser', 'bem', ~ . ~ ~'justo'?, .utilizamos correctamente essas expressões?', 'que lipo de fundamen- !.~.fração ou de racionalidade realizaremos, se quisermos justifiClr a .mesma acção como. "'I t tdevida ou o nosso componamento como justo?,., por outro lado. Pois o primeiro ,S.,tipo de perguntas tem a ver com questões normativas, i. é, são respondidas comjuizos nOT11Ultivos(valoradores e prescritivos) e cabem, por isso. à ética normativa,ou ética tout court, enquanto o segundo tipo de perguntas só implica proposiçõesanalíticas sobre aqueles primeiros juizos em ordem a saber das significações (ouda índole das significações) que enunciam e do tipo de discurso ou de lógica queeles manifestam, e<compete, por sua vez. à meta-ética ou filosofia moral. Aque-les juízos de ética são práticos, na sua normatividade, estas proposições dameta-ética são teóricas, na sua analiticidade. Daí poder dizer-se que o filósofo

....moral ou meta-ético ~(estudajuízos éticos, sem os fl1.Zml, que de «não utiliza quais-quer expressões éticas, mas mostra como elas são utilizadas ••(C. L. STEVENSON,Etica ~ linguaggio, trad. it., p. 15 ss.) - numa palavra, (Cofilósofo moral não énenhum moralista, nem juiz moral, nem reformador moral 11 (HANS LENK,

Mann dicSpracha1U1lytischeMoralphilosophic nculral sein?, in H. AU\ERT/E. TOPI-TSCli (Hrsg.), Wcrturtei/sslrút, p. 534). Pelo que. coerentemente; a possibilidadede se sustentar a afirmação de ne~tralidade na meta-étic.1, ou o posmlado de fCabso-luta neutralidade» do científico-analítico meta-ético em oposição ao compromissoprático de todas as intenções éticas ou prático-normativas. Perspectiva esta quepoderia ser convocada imediatamente pela teoria analítica da interpretação jurf-dica - com'o se verá que efectivamente acontece -; já que os juizos e a linguagemprático-normativos do direito interpretando seriam a linguagem-objecro deuma metaJinguagem que se dirigia àquele numa teorético-anaJhica intenção dedeterminação apenas das suas significações e da sua reorética lógica significante- teorético-analítica determinação das significações normativo-jurídicas, que seriajustamente a interpretação jurídica analítiC!o Nestes termos, pois, essa interpretaçãoseria uma metanormativa análise da normativa linguagem jurídica, num estritoestatuto teórico ou afastando dessa interpretação quaisquer compromissos prá-ticos, intenções normativas ou dimensões constitutivas.

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952 - Oprobkm4 actwz/ tÚl int"p"tafáo jurldic4

JOU, ob. Ioc. cits., p. 6, n.O 7, e p. 106 ss.). E a delerminar iSloduas consequências.Pela acentuação material do núcleo semântico, teremos a redução do e1ememonormacivo a um factor simplesmente formal- é ele decerto o dador da funçãoprático-normativa ao enunciado normacivo. mas sem lhe constituir uma específicaintencional idade significativo-material para além do i1ocur6rio dessa função. Umaoutra consequência, na coerência desta primeira e para o pensamento analíticoda maior importância, será a de que essa acemuação do núcleo semântico. ou doconteúdo descritivo dos enunciados em causa. permite que a actuação met6dicacom eles seja de todo «conciliável com processos 16gicos» (assim, W. SCHREC-

.. KENBERGER, Ob<r dcn Zugang d<r modmlcn Logik zur R,,!JtstÚJgmatik, in BALL-

WEG/SEIBERT (Hrsg.), Rc!J"orisc!Jc R,,!Jtst!Jcorú, p. 164; no mesmo sentido,SCARI'ELU, Contributo alia scmantica da linguagio nomiativa, n. ed. (1985), ';:). _

p. 106): se «as referências dos elementos frásticos dos enunciados em função pres- ~ ....•.criciva servem para determinar os sujeitos e as situações para as quais as prescri- I K~çóes são estabelecidas e os comportamentos que os enunciados regulam", (SCAR~ I f~:I'Elll. «Semantica giuridicall. in Novissimo Dig~sto Italiano, XVI, p. 986), a suaI ! "ap icação pode então pensar-se em termos de relação entre conceito representa-

tivo e objecto representado. em termos, pois, de uma relação lógica de subsun- '~"'~ção. que preserve o racionalismo analítico. • ~

b) Só que a concepção textual do objecto da interpretação jurídica - essa yinterpretação teria por objecto um tato - é susceptível de duas especificações,que não devemos ignorar. sobretudo pelas suas consequências metodológicas. 4Podem ser dois os conceitos do texto jurídico, ou melhor, podem ser dois os sc:n- \ .[idos com que metodologicamente ele é susceptível de ser compreendido. Um ,f ~umido htrmtnrotico. estrito. e um untido positivista. "

Será compreendido em sentido hermenêutico estrito, se a significação \: I;:) S:::jurídica a atingir pela interpretação houver de exprimir-se alravts do texto. ou ~ ~enquanro se considera este a sua objectivação cultural ou seu «icone_ (RICOEUR). '""'j-.. ~~as se constituir para al~m ~e1eou transcende~do-o ~ pelo relevo. desde logo.) ..• ~Ja do rodo ou contexto slgmficame em que se Insere, Já da pré:compreensão do ~ ~ ~~ferent~, já da situação histórico-concccta da compreensão. Foi este, p. ex., o sen. ~ •..ndo da Interpretação textual do pensamento jurídico medieval, quando se pro- t-= ~ ~punha a illurprrltltio iuris (para além da C5trita inurprttatio kgis) mediante uma "t I ~contínua reelaboração normativa das fontes. e que se designava por rxtmsio. Se .r-....."esse pensamento teve primeiro em vista, através de uma exegese gramatical-fiIo- /\lógica o esclarecimento, a conciliação, a distinção, a síntese. etc .• do sentido dos ~textos relevantes. mediame gltJsassingulares ou conjuntos de glosas (apparatusgltJs-3~~sa~m), d~tillc/iorus, summultu, rrguúu (Escola dos Glosadores); depois carac- ?t ~ten7.0u-se Já por uma atitude mais normativamcme inveni~ndi(para além da mera . ~ %

.1 =:1-"I, ".n~"''1,'J:vv ,~.t-Il~' O ~ ? . ;;; .~, I \. ~-~'J/ 7 , ',~ -"......"

MdQdologio Jurldiea94

3) O postulatÚJ tÚJobjmivitÚJtk, por úlrimo - em que se projecra meto-dicamente o pressuposto do objeaivismo empírico-analítico -, e segundo o quala linglÚsticasignificação valida (ou a significação qua ",k) só pode ser a de apreso

I\sóes ou enunciados em r~ftr;ncia dmotat;va - a r~r;ncia lógicaa algo comoobj~eto. Pelo que compreender ou interpretar uma expressãosignificante seria sem-

\

. pre determinar nuclearmente nela. com o seu conteúdo cxrcncional ou objeaivo.numa lógica referência denotativa ou numa sua relação lógica a um objecto (a umsó. a um tipo. a uma classede objeetos) - numa relação estritamente smzântica.Por outras palavras, o sentido ou a significação de um enunciado traduzir-se-iasempre numa certa relação entre os sinais linguIsricos e os «objecros do mundoltou.as coisas no mundo. (KOCl<lROsSMANN, ob. cit., p. 127 s. e 134).

E isto universalmente - não apenas para os enunciados ou proposições assec-tórias (declarativos, descritivos, cognitivos), mas ainda para os enunciados e asproposições prático-normativas. Quanto a estes últimos, mediante a distinçãoentre dois e1emencos ou componentes que participariam conjunta e insepara-velmente nesse tipo de enunciados ou proposições: um demento descritivo oucomponente com significado cognitivo e um elemento normativo ou componentecom função deôntica. Os primeiros designados «frásticoslt (H..ARE)«Iocuró-rio.proposicionaislt (SEARlE) ou «tópicoslt (Ross), os segundos «nêusticoslt(HARE).«ilocutórioslt (SEARLE)ou «fraseslt(Ross) - assim. «A. escrevelt é umaproposição. enunciado proporcional ou locução. objectivamence-referido (há neleuma referência e uma predicação). que pode ser elemento do acro locutório deasserção (<<éverdade que A. escrevelt).dc interrogação «((A. escreve?It),de prescrição(~escreve!»). de juíro de valor (<<é bom que A. escrevalt).ctc. E então haver-se-iade concluir que as proposições normativas são significantes justamente porquea sua função e o seu mamemo deônticos ou normativos específicos têm a sus-tentá-los um núcko srmântico ou significativo. É esta, com efeiw. uma distin-ção entre o «momento descritivolt (denotativo). consubstanciado no conteúdoobjeaivamente referenciale (laforça normativ<lJt.imputada por um «fimcror deôn-tico ..••em que se analisariam todas as proposições ou enunciados prático-nor-mativos, que vemos afirmada como um ltJeuscommunisdo pensamento analíticoe particularmente analítico-jurídico.

Pelo que no quadro deste pensamento analítico a interpretação jurídica será

Ifundamentalnente inurprrtafão urrulmica (v., por rodos. KOCH/ROsSI'-tANN,ob.eit., p. 22 ss. e 126 ss. e passim): traduzir.se-á na determinação do núcleo semân-tico ou significativamente referente das enunciados-prescrições jurídicas. Inter-pretação semâmica que se considera mesmo. e enquamo a referência objectivaimplicada o é a objecros ou coisas no mundo e assim a «dados» empiricos obser-váveis» (L. FERRAJOI.I).sinónima de «interpretação empíricalt (assim, L. FERRA-

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2 - Oproblnna actual da inl"pul4çáo jur/dica ~----2? ji

é que SAVIGNY coincidia neste (X>ntocom o legalismo exegético francês e que n "convergente concepção de ambõs sobre a interpretação da lei se viria a ~a Jfr • ...•,;r;;:;;; d ar a ""',Interpretaçao bu~~.u~ou tra lClonal. _ .- Podendo, por isso, dizer-se que o sentido hermenêurico leva referida u ( .•.•••l~.mediação significante - como vai já, aliás, na próprio sentido etimológico: ;;:a .mrs é o deus mensageiro, o intermediário ... mas também o deus do mistério~- ~ J Inão menos implícito no étimo de interpretação, jnta.pus - e o sentido ' .e ~dvista pretende justamente excluir essa mediação. Pelo que C5teúltimo s~~dSl- •,\\ ~ ~l~ . . . .. enu o .corresponde ngorosamente a ougtst (rxrguls ou rxp!tcatlo e, portanto '\.explicitação) e aquele primeiro sentido antes a humaliuticA ou ;nUrp1"(taf~ mera I\.~. '\

bém nos seus conceitos autênticos. Num caso é tão-só a análise da signif:~~- .~ ~textual de uma fonte jurídica. no outrO caso é,a procura do direito (de um çao •....•..tido de direito) através dessa fonte. A interpretação em sentido próprio abT~(5en-mativamente) a fonte ao direito, e distingue a la do jus; a exegese ficha ( n~~~ticamente) a fonte no seu próprio texto, e identifica o ;us à kx. ao 1-

. c) O que determina a principal consequência do sentido positivista do tjurídico enquanto objeeto da interpretação também jurídica - e que marca extonenhwna outra a índole metodológica desse sentido, como se fosse o seu oc~brn.oÀ interpretação jurídica não seria lícito impurar à fonte normativa um sen .;.jurídico que não pudesse corresponder a um dos sentidos textual-gramatical ti oou literalmente possfveis da fome interpretanda .• Pelo que o âmbito dess:entetidosposslvrisdelimitaria o próprio âmbito da interpretação: só se estaria a f:u

n-

interpretação (e não já integração ou desenvolvimento autonomamente cri :;-crdo direito) se:o sentido normativo imputável à fonte-norma fosse um do a artidos possíveis do seu texto enquanto tal (a Andrutungsthrorü ou rue s sen_

Srtlo aAusJruscksthtorúdos autores alemães; cfr. o art. 9.°, fi.O 2, do Código Ci\'iltuguês). Nestes termos, pois, o teor literal da lei não seria s6 o ponto de p ~~-e um dos' factores hermenêuticas da interpretação jurídica (o seu factor o:rr\~amenta «gramatical»), seria também o mtlrio dos /jm;us da interpretação. E e.e-se postulava a «prioridade do teor literal perante a interpretação» (A. Ma:~.HAvoz). , R

I) O motÚlo metódico da t,o"" tradicional (positivista) da interp,.. _jurldiea l4çao

Com a.origem histórica referida e ma~~~a por el~ no seu sentido funda_mental - nao s6 através dos postulados POSitiVistasgerats, que foram invocadcomo ainda nos pressupostos directamente metodológicos de que o texto d ~s:é o objecto da interpretação e de que esta é, assim. de índole hermenêul' a eltCa_

7 •

M~todologiaJurldita

compr(h(TlJio kgis. a exuns;o kgis) mediante interpretativos comentários dog~márico-cons[Nrivisras que, em resposta a novas exigênciasprático-sociais. iam paraalém do sentido filol6gico do tex[Q (litura ou verba) em ordem a um sentido nor-mativo (m(ns ou Unlnzria (Talio) que teria como critério decisivo, ou que sem-pre se havia de cOmpreender de modo a exprimir. a atquitas. a Tafio naturalisouius natura/( (Escola ~os Comenradores) - sobre estes últimos pon£Os,v.V. P.MORTARI, 4lU problema deU'interprer3tio iuris nei commentatoriot, in Amu:lidi SwrúI tkl Dirilto, 11(1958). p. 29 SS.; 1D.• Riclm-d" ruI!a~orúItkU,ntnprrtazion,tÚI diritto na stcolo XVI, passim, p. 85 55. e passim; sobre o pensamento jurídicomedieval em geral. v.• por todos. F.WIEACKER. ~b.cit.• p. 48 ss.

Já (crá um sentido positivista. se o tex[Q for compreendido em rermos nãoapenas expressivos, mas comt;tutivos- se se entender que a significação é coo5-'\ timfda exclusivamente prlo texto e que só no tex[Q.no seu conteúdo significativo,

I deve ser procurada. É deste modo que o positivismo legalista postula que a leito seu texto, e implicará isso não 56 que o direito positivo se tenha por auco-sufi-ciente e fechado em si (a excluir o recurso a critérios normativos além delepróprio para a sua determinação e a sua realização), como do mesmo modo seentenda que o direito posto ou legalmente imposto encontrará unicamente nosentido da sua formal expressão prescrita, no sentido incorporado na sua expres-são textual, o seu interpretando-sentido jurídico. Entendimentos estes em que

~

se podem ver, respectivameme, o Ildogma do existir-em-si-mesmo do direito posi-tivo., e a «teoria da imanência do 'sentido' no direito positivolt (HRUSCHKA) e

" pelos quais conjuntamente se definiram os princfpios capitais do positivismo jurí-,~'1 dico tradicional - a partir de SAVIGNY e de L'I:eok d, l'a/g's<,VI N SAVIGNY era. na verdade•.inequfvoco na sua juristieh, M<thotÚnkhrrde Mar-

lburgo: «Interpretação é'reconstrução do pensamento que se exprime na lei,

\. ~; contanto que c1eseja cognoscfvel na prÓP"riale,ilt,o intérprete deve colocar-se no\ " ..•.•...\ ponto de vista da lei, ,<desdeque este ponto de vista seja reconhecível na própria\ lei. (p. 19). E se no .&sum u~trapassou_o.-tstrim...p.Qsitivismoexeg~daquele

curso por uma visão orgânico-institucio~~mefl~e histórica, não é men~de----I q~ereretação contilluav~~ rescrevc:~_oobjectivo 'apenas de"«reconstrução~ j do pensamento conti~lei., atr~vés dos cãiihecidos ~quatro elementos» (gra-~ ~ matical, lógico, histórico_e sisteqtluco) e, port~~O, com ~xclU5ãodo próprio «fun-

I~ • damento» (G-wlld) da leilQ.2JlJotivoJlou _QJ~fim»)- já que: «seé a tarefa da inter.\,)\~ pretação trazer à consciência o conteúdo da lei, tudo o que não faça parte desse

~~k I conteúdo, qualquer que seja a sua afinidade com de. rigorosamente está fora dos:'\. limites daquela tarefa. (Sy,tml.l. p. 216 s.). Assim. fossequal fosse a úlrima deter-

'1'.t\. ,; I min~nte d:sta concepçã~ puramente exeg~tica da interpreta~ão jurídica (para a"' ,. co05tderaçao desta questao, v. KRJEU~, oh. Clt., p. 67 ss.), o que Importa reconhecer

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Page 9: NEVES, Castanheira. Metodologia Jurídica

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tinção entre "letra_ e ((esplrito» da lei (corpus c m(ns), pode dizer-se que as duasteorias identificavam esse algo, especialmente visado como o objectivo da imer~pretação, através de um entendimento diferente do que fosse esse «espírito. (noqual se encomraria «o verdadeiro sentido da lei.): para o subjectivismo a flvon-rade legislador., para o objecrivismo o sentido imaneme à própria norma.

A orientação subjecrivisra foi historicamente a primeira - era no seu sen-tido fundamentaI também a posição de SAVlGNY (cft., todavia, GROSCHNER, ob'

ldt., p. 105 ss.) e pode tet-se pot um cotolátio metodológico do legalismopós-revolucionário: o direito é a expressão da voIontl glnirak, a expressão legis- :lariva da vontade política tirulada no poder legislativo. A orientação objeaivistasurgiria já na segunda metade do séc. XIX (associada de início aos nomes dos juris-ras alemães BINDING,WACHe KOHLER),e como consequência de outro oontatocultural. de uma distinta concepção do direito e proposta a diferentes objecrivospráricos. Pois, não obstante a polémica entre as duas posições se rer apresentadodesde então como se elas debatessem uma questão de direito em sencido próprio(uma quesrão a resolver com fundamento no direiro pressuposto ou invocandoimediatos fundamentos e critérios jurídicos - é esseo significado dos «(argumentosjurídicos. ranto da soberania do legislador, da separação dos poderes. da vin-culação ao direito constituído, da segurança, erc., a favor do sujectivismo; comoo da forma da lei a dar unicamente o ser jurídico à norma legal, da publicidadee da confiança. da imputação das leis ao legislador actual, da dimensão tempo-ral das leis, etc., a favor do objeaivismo: para a consideração de alguns destes argu-mentos, v. PH. HECK, G~utusauskgung und lnt"(sunjurisprud~nz, cit., p. 67 ss.(na [[ad. pou .• p. 73 ss.); A. MENNINCKEN, Das Zit/ dtr GtsttZtsausitgung,p. 19 ss. e 26 ss.) -, o que verdadeiramente determina as suas opções são pres-supostos culturais, filosófico-jurídicos e rcleológicos de todo diversos. O sub~jecrivismo traduz uma concepção cultural e hermenêutica de cariz epistemolo- /iicamente posirivista, seg~~?o a q~~?_~_~en.~.aos.culturais_s-;ija~Rde~ios ,enudaqes empitlc~,Jenómenos psíquicos ou de redução psicológi_~~.en~.últimotermo, e p~_;.is~~-interpretá-los seria imputá~los psicologicamente ao seu autor,perspectivá-Iós. pelo processo da seu génese hisrórico-psíquica - assim na éticae na lógica, na história e na filosofia, na hermenêutica e mesmo nas «ciências doespírito», assim também no diteito. Enquanto o objectivlSmo é já o ~eflexoquer ~de um entendimento «espiri[Ual~.4~.culrux:aJ.=::.o~_.$.ençidQs_culruralssão reme~tidos ao.pla~~~toi6gico e";pistemologicamente _autónomo_da"~culrura-, per-tenCê~ nãoao domínio empírico, mas ao domínio do «ser espiritual- (N. HAAT-MÃNN)="qu;:-d~ma intenção especificamente «compreensivan (não explicativa)da hermenêutica. e assim as expressões significativas passam a reconhecer-se já naautonomia e objectividade próprias do ser cultural, já como irredutíveis maní~

. 2 - Oproblmuz acrua/ da int"pn'uráo jurídicaMetodologia Jurldica

o objtctivo da inttrpr<taçãoa)

essa teoria tradicional da interpretação jurídica (a «dogmática interpretativaI

canonizada_, como a designou ENGlSCH)veio a ser elaborada à volta de três temas

I1principais: O obj~etjvo (ou o fim) da interpretação, os (Ú1Mntos(factores ou cri-térios) da interpretação e os "suftados da interpretação. .

Se é o texto da lei o que se interpn:ra. qual, no entanto, o objeaivo ou o fimda imerpretação, i. é, o que com ela se visa determinar ou atingir?

a) Em resposta a esra pergunta, dividiu-se a domrina em duas conhecidasorientações conrrárias, respectivamente defendidas e reciprocamente combatidasad naUS(4m Uma !(on.a subj~ctivjstasustenta que o propósito decisivo da inter-preração estará na averiguação da vontade do legislador (da vontade real, sub-jectivo-histórica ou histórico-psicológica do legislador) que se exprime no textoda lei: o objeetivo essencial da interpretação seria o de reconstruir o real pensa-mento do legislador histórico (mms Itgislatoris) fotmulado na lei - que tanto édizer, a vontade Jegislativo-prescririva que está genericamente na base dotexto-norma legal. Uma t~oriaobjutivista, pelo contrário, entende que a inter-pretação se deverá orientar para o sentido objectivamente assimilado pelo pró-

'- prio rexto da lei, para o sentido que autonomamente (i. é, com abstracção ou des-I ~ • ligado 50 seu autor real) o rexto legal é susceptível de encarnar e exprimir (a m(ns

~-..t:: Irgis ou o noema jurídico do texto, enquanto corpus jurídico-significativo).:~ ~ ~ O ponto comum entte estas teotias é, como já se disse, a consideração do texto~. ~,como objeao de interpretação, os pontos de divergência estão no que wna e outra

!'1 O Ipretendem ver manifesrada no texto: se é este indeterminado, e por isso carecido

.'-t ~ de interptetação, há que visar algo parn além do estrito teor verbal que seja o deter-~ ~ minante dessa indererminação. (Isto se diz para evitar o erro, em que al~uns caem

- p. ex. l..ARENZ,ob. cit., 5.a ed., p. 302-, de pensar que o subjeaivismo escrito" I-S ~ deveria orientar-se para a vontade do legislador com indiferença ou toral sacri-~ t" f"io do texto: o que, se já na hermenêutica geral não seria exacto - recorde~se~ À... que a "interpretação psicológica», p. ex., de SCHlEIERMACHERnão prescindia da~ .j,~ mediação do texto -, menos o poderia ser para a hermenêutica exegético-legis-~ ~ lativa, vinculada como estava ao ser-texto da lei. Assim é que, como mostraVI Z J(BONNECASE, L'&:oit it /'txlgr,t m droit civi~ 1924, p. 128 ss. e 131 SS., esta Escola

Iassentavaem dois prindpios: «omlto do rexro da lei" e ..-apredominância da inten-ção do legislador na interpretação do texto da lei»; e por isso igualmente a fór~mula da AUBRY,vulto importante da mesma Escola: fltouce la loi, dans sonesprit aussi bien que dans son texte_ - v. ainda A. CAsTANHEIRANEVES, QU(S-

__ --. tão-dt-jàcto- QUtstão-dt-dirtito. p. 140 SS., nota 12). E com base na seculat dis-\--.;

-

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100 M~toáologiaJurldiea . 2 - OproblmuJ aetud/ dn intn-prtiaçlio jurldica 101

festações hist6rico-culturais do «espírico objeetivolt - aspectos que são, p. ex., /de todo evidemes no objectivismo jurídico de um RADBRUCH (v. flAnco derInterpretarion», in Rrcuúl d'itutÚs sur sourus du droit rn l'honnror fÚ FRANÇ01S

CtN!; 11, p. 217 ss.; &ch"phiwsophit, 4.' ed., p.p. ERlKWOLF, p. 210 ss.). É nes-tes rermos que, enquanto o subjecrivismo vê no sentido da lei a vontade do legis-lador a averiguar como facto hist6rico-empírico. o objectivismo compreende essemesmo sentido com um «sentido normativo», um sentido normativo-cultural areferir ao todo também normativo-culruralrnente significame que será o própriodireito. No que vai já implfeiro ~orresponderem-Ihes ainda diferentes concep-ções do direito. O subjecrivisrno. ~m coerência com a sua origem legalista, con-cebe o direito em termos imperativo-decisionistas: como um conjunto de impe-rativos, de comandos-regras simplesmente imputáveis a um poder que se timlae personaliza no legislador e que este imporia por livre decisão poHtico-jurfdica- pelo que as normas jurídicas só se compreenderiam averiguando essa decisãoimperativa do legislador. Pressuposto pelo o objeaivismo vai, bem diferemememe,um direito concebido como uma ordem significativo~normativameme objecrivaem que se assimila o projecto ou o conUnJus histórico-culruralmeme comunitá-rio. de uma intencional idade e racionalidade próprias, e perante o qual, por umlado, o próprio legislador será intérprete, e do qual, por outro lado, as leis,tomadas em si e não como livre criação de alguém (o autor da lei, diz RADBRUCH,não é o legislador, mas o Estado--.i.é, a comunidade poHtico-jurídica, e essa amo-ria não se exprime numa vontade empírica, «masexclusivameme na própria lei»).serão precipitados formalmente objectivos e só em fünção do s~u totalizante con-teúdo podem, ponamo, ser compreendidas (cfr., por todos, G. STRATINWERTIi,«Zum Streit der Auslegunstheorien", in Rtchtsfinding - Ftst. f o. A. GER-MANN, p. 258 ss.). Dal que o subjecdvismo se dirija sempre ao legislador e oobjecrivismo antes à lei (tomada na sua normativo~jurfdica autonomia) e queenquamo aquele se propõe uma imerpretação fixa (como histórico~psicolo~gicameme fixa seria a vontade do legislador a averiguar) o objectivismo aceita dahermenêutica gecal (v.GADAMER, Wahrhrit um! Mrthocú, cit., p. 171 S5. e 180e passim) a ideia de que a lei pode ser juridicameme mais sábia do que a inten-ção do seu autor ou de que o intérprete a poderi compreender melhor do quea entendeu o próprio legislador - é que a lei vai ser referida, na sua interpreta~ção actual, a hipóteses que o legislador não teve em mente e nessa actualidadereflecte comextos significantes distintos e mais evoluídos do que aquele que estevena sua odgem (cfr., por lOdos, RAnBRUCH, Rrch"phiwsophir, p. 211). Diferen-tes são também, em terceiro lugar, os imediatos objectivos prárico~juddicos decada uma das posições. Se assegurar uma estrita obediência ao poder constituído,em veste legislativa, e a segurança jurfdica são o que sobretudo determinam pra~

ticamente o subjectivismo, já o objectivismo, ao assumir uma perspectiva que lhepermite uma evolução adequada a acrualizadas exigências jurídicas da aplicaçãoe do contexto normativo (oferece, no dizer de MANUEL DEANDRADE,Ilmaiorespossibilidades de desentcanhar da lei as soluções «quecidas pelas necessidades daprática e pelas exigências do sentimento jurídico preponderante na comunidadesocial,,), visa antes de mais a JUStezaou a reaidão das soluções a obter pela interpre-tação. Entre nós, foi justamente neste plano daS capitais opções práticas - emúltimo termo a opção entre a «certeza» e a «justiça" e pela ponderação das van-tagens e das desvantagens que, relativamente a esses valores e às suas transacçõespossíveis. ofereciam tanto.o subjectivismo como o objectivismo --....:.que semprese moveram as reflexões de !v1.ANUELDE~DRADE sobre a interpretação jurídica,e a quem se deve, como se sabe, um importante contriburo para a sua teoria nalíngua portuguesa.

Deverá dizer~se,no entanto, que a polémica, mesmo quando nela ainda hojese insiste. perdeu muito da sua rigidez inicial, pois se as coordenadas culturais geraise filosófico-juddicas próprias do objectivismo - aliás a admitir mais que umamodalidade, uma modalidade «histórica» e uma modalidade t(actuaJista», talcomo subjectivismo conhece, por seu lado, uma versão mais rígida e outra maismoderada, e não exclui mesmo a distinção entre um subjectivismo radical.mente histórico e um subjectivisrno actualista (a fonte a averiguar seria a vontadedo legislador aaual), mas diferenciações que aqui não importa considerar - supe-raram historicamente aquelas outras coordenadas que se implicavam no subjec-tivismo, e se os objectivos práticos sobretudo acentuados por aquele primeiro igual-mente se têm por irrenunciáveis, não deixa, todavia, de acentuar.se também, porimperativo constitucional, a indispensável vinculação do intérprete às prescritasintenções legais e às decisórias opções do poder legislativo. Daí o predomínio \actual de ((teorias .mistas», (~~dua._listas" ou de síntese - como se.-Yt..p.!-çx--",_~mLAitENZ, Mrthodrnkhrr, 6.' e<1:,.I',~16 ss.Jy~d..porL...p.36ll.ss~;-para-um.<:Studodessas várias teorias na dQ!!~i.na_alemã,v. A. MENNICK£N,o,h.dt., p..58 ss. e pas-s~m._Po erá mesmo acrescenrar-se que o legislador português, através do art. 9.odo Código Civil, já exprime ele próprio uma atitude deste tipo. É isso inegá-vel se atendermos sobretudo à intenção que transparece dos trabalhos prepara-tórios deste art. 9.° (v. nomeadamente o discurso que o então Ministro da Jusp

tiça, ANll.JNESVARELA,dirigiu à Assembleia Nacional, na apresentação do ~ ~pcojecco do Código Civil, e publicado sob o titulo Do Projrcto ao Código Civi~ ê1966, p. 19 ss.). f.afa-seaí de dois momentos fUndamentais a ter em conta: o intér-/ ~prete deveria primeiro pro~~rar 0_ se~~do l{istó~l~oqu~ l~gisl:0or.tivessc .atri- ~ 1\ *buído à lei (componente subjec~~~ista); se esse momento não fosse decisivo >K~(e tenhamos presente o limite estabelecido no n.O 2). haveria de recorrer-se a outros ~""'-- ~s: 'J

~~ ~. ",1" .> ~

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102 MtrodtJfqgia JurúliCil 2 - Oproblmuz aetual dJI int"pr~ta(áo jurldica 103

a) Stgundo a ttoria tradicional

au) Os ~lmuntos da intaprttaçáo

b) A inttrprttaçáo mquanto tal

A. Decidido o objectivo da interpretação. seguia-se a definição do processohermenêutica através do qual a interpretação se realizaria para atingir esse objec- .tivo. Processo que se traduziria na utilização de uns tantos elementos, factoresou critérios de interpretação. Com uma distinção fUndamental ainda aqui -dis-tinção que, aliás, já era considerada na murputatio kgis romana, mas que seriãparticularmente acentuada na hermenêutica j~}dica medievaI e depoiS recebÚ:la,para ser um dos seus traços característicos, pela tcok tÚ /'ocigh~. A distinção entrea ktra (o corpushermenêllti~o) e o tp/riro (o sentido decisivo que deveria ser visadopelo objectivo da interpret~o). A-«Ietrall constituía só por SI o elemento gra-matiêã1, e o «espírito» ating;'se~ia pelo recurso a outros três elementos: emprincípio aqueles mesmos que SAVIGNY discrimin,ara. embora com posterior redu-ção do seu elemento (llógico» ao e1emenw sistemático e sobretudo com o reco-nhecimento de toda a importânóa do elemento (leeieológicoll(ratiokgis)- o qualS~1. quando o não exduía...na.sua~iCãCõncep-'~u cognitiva da interpre~taçáo,-só 3ccitav3-com-muita5- reservas. Pelo ue foram quatr~Iem-êri.tos emque a teoria tradicional de interpretação se veio a Ixar, numa verüaâê'ii-ãCãno- flljucão metódica: o elmullto g;.a"~6~al o ~k,~~to histórico.o tkmnl/"iiistmulti;o ke'o ~kmmto ttkológico (ou «racionaf;)-. --------------- ~-Na traâiCi"onaJ.compreensão simplesmente hermenêutica da interpretação "\' ~jurídica. o tkmmto gramatical seria o e1ememo básico. Já porque o objecto da -.~

. ~~

.~ ~À-.-0:~

a atenção para esta anaHcica distinção entre a explicitação semântica (F~sul~IUllg) e a impuração de sentido (Ftststtzung), v. KOCH/ROSSMANN, ob. ci<, p. 15,23, 163 e passim; em sentido análogo, B. SCHONEMANN,tlDie Geserz.esinter-prerarion im Schnirzfeld von Sprachphilosophie. Staatsverfassung und juriscis-cher Methodenlehrc., in Ftsr. f ULRICH KWG, z. 70. G. I, p. 179 ss. e 185 e pas-sim. Para o .postulado da dedutividade., KOCH/ROsSMANN, ibid., p. I 12 s. epassim).

Poderá deste modo dizer-se que a perspectiva anaHrico-linguística [emuma base objectivista. embora de um objectivismo próprio, justamente linguís~rico - pos(Qque a complememar com uma dimensão subjeaivista (pela refe•.rência à dimensão semântica do «querido» pelo legislador, como veremos infta)e com uma diferente intenção i.ntegrante.

dementos, orientando-se em último termo pela presunção do legislador razoá-vd - referida no 0.° 3 (componente ohjectivista). Aliás, este carácter ~mis[01Iresulta também com clareza dos próprios critérios proposcos no art. 9.° O reco-nheeimemo da importância das .circunstâncias em que a lei foi elaboradall- o momento histórico - pretende compa[ibilizar~se com o reconhecimentode um certo objectivismo acrualisu, ao relevarem-se as f(condições específicas dotempo em que é aplicada. (n.o 1); a aceiração do valor-limite do texto (n.o 2),compadvel com um subjeetivismo «moderadoll, mas de tradição essencialmenteobjectivista.liga-se à importância do elemento sistemático (0.0 1) e culmina, non.O 3, com a já aludida consagração da 'presunção do legislador razoável., de sen-tido claramente objeetivista (sobre esta «presunção», v. ROMEUN, apudKRlELE.

ob. cit., p. 174; BECK,ob. cit., p. 53 ss.; MANUELDEANDRADE,Smtido t valorda jurisprudincia, p. 21 ss.). Caráae, misto este que não deixa ainda de aceitar-sena expressão _pensamento legislativo. (0.0 1). já que da teria sido enunciada comuma del~berada ambiguidade (v. Comunicaçáo, cit.).

~) Assim na perspectiva metódica comum. Já na ptrsputiva anal/fico.l/ingulstica há lugar a algumas especificações. Se o objecto directo da análise éb tex[O legal ou os enunciados linguísticos manifestados legislarivo-prescriliva-~ente nesse texto, o objtetivo será o de obter, atravésde uma «interpretação semân-~icalt.as premissas lógico-jurídicas para uma aplicação racional (I6gico-dedutiva),'do mesmo texto-lei. Interpretação semântica que se realizaria de um modo ana-.,:llfdco.linguísrico e assim em termos de se poder dizer que com essa interpreta-liçãO não se faria mais do que a explicitação e determinação da significação(semântica) dos enunciados do texlOlegal- ou. se quisermos e mais claramente,'não se faria mais do que a «descrição»anaHtico-teorética do enunciado legal atra-i vés de enunciados que fossem sinónimos do enunciados interpretandos. (Sus-. tentando especificamente a tese da «interpretação do direito como descrição doI direito» e de que lhe correspondecl, portanto, um «discursodescritivo», v. R HER-\. NANDEZMARlN, .EI D(1who como dogma., 1984, e .Métodos jurfdicos., in

)

Anuario dt Filosofia dtl Dm:cho, N.E, III (1986), p. 182 ss.). Caso, todavia, umatal interpretação não pudesse ser conclusiva (e veremos quando o não poderá ser).i. é. se só com ela não se pudessem obter as premissas para a dedutiva aplicação.ter-se-ia de admitir que o intérprete-jurista impute constitutivamenre o signifi~cado jurídico decisivo ao texto~preceito legal- embora no quadro das possibi~

jlidades que linguisticamente o texto sempre definiria, mas já segundo umaracionalidade finalístico-empírica ou empírico-tecnológica - e sempre com oobjectivo de determinar as premissas para uma racional-dedutiva aplicação dedireito, já que a ((vinculação à lei» ou a sua obediente aplicação no Estado-de~-Direito implicariam um «postulAdo tk d~dutivitftuú". (Chamando particularmente

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105

«L'interprération logique c( sysrémarique ct le de rarionalité du législarcur-, inLllllrrprhation tn droit, cit., p. 97 55.), segundo o qual se deverá imputar à lei oupreferir nela aquele sentido que melhor satisfaça a coerência sistemática, não inten~dona em si sempre o mesmo. Pode pensar~se com ele ou a coerência do legis.lador histórico, i. é, a lógica do legislativo programa histórico (como pretenderáa interpretação subjectivo~hiS[6rica); ou a coerência do objectivo ~istema da lei,i. é, a unidade racional do sistema das normas ou do todo normartvístico em quea norma legal inrerpretancla se integra (como pretendia o ohjcaivismo originá-rio); ou ainda a coerência prática d~ opções teleol6gicas (fundem-se elas em inte-resses, fins ou valores) a';similadas pelo sistema jurídico positivo. i. é. a integrantecom possibilidade das suas intenções prático-normativas. Neste último caso.)trata-se da racionalidade do que. a pattir de HECK. se passou a designar por «sis~ . '-~tema interno .•••e que é fUnd~mentãlmente a racionãl~~ade postulada pela inter- '?pretação tdeológica. a racionalídãêIecomo "concordância pránca» Racionalidades :;;

~diferentes que se remetem também a (e neles em último termo se esclarecem) dis- .ttintos sentidos da unidade do sistema ou ordem jurídicos (Sobre estes sentidos. "v. A. CAsTANHEIRA NEVES, A Unidmi, do Sisuma Jurídico: o sm probknuz, o uusmtido. p. 81 S5. e passim). O ~kmnltQ ukológico ou racional. por último, a imporque o sentido da norma se determine pela ratio kgis, i. é. em função da própriarazão~de~serou do seu objectivo prático. Elemento este que. se começou por serminimizado pela tendência mais lTlarcadamente exegético-positivística da teoriatradicional (assim tanto na écol~d~l'~xlg(S(como em SAVIGNY), viria porém aadquirir uma crescente importância e a determinar mesmo a evolução dessa teo~ria, de tal modo que ela por este elemento (sobretudo com o alargamento da ratioúgis à mtio iuris) se foi a si mesma superando. Com efeito, se com o segundoIHERlNG (Zw<ck im Reei,,: "" fim é o criador de todo o direito,) o fim (tdos) não ::-t~.

mais deixou o primeiro plano dos facrores hermenêuticas, era cle, no entanto, sus-ceptível de entender-se ou só como o fim histórico~psicologicamente visadopelo legislador ou já como a intenção normativa que, quer a hipótese de um (\Icgis~ ~~"lador razoável•• quer a compreensão da opção-valoração legislativa perante os inte- I \:resses causais em conflito permitiriam imputar à norma, ou ainda como o fun- I; ~

" 0damemo normativo-jurídico (convocado dos valores e princípios normativosconstitutivos do próprio direito) que justificaria a compreensão da norma inter- !!)-pretanda, não apenas finalístico-intrumemalmenre, mas normativameme Jecun- I: ~

dum iuse a assimilaria assim à intencionalidade fundamental do direito enquanto lI' I,',,'

tal (ao ius, diferente da h). E o que estes sucessivos sentidos do elemento teleo- '"lógico. a traduzirem uma correlativa evolução de interpretação jurídica, nos ~mostram, na verdade. é essa interpretação a passar (e justamente por força da acen- ' ~::.tuada importância desse elemento) de um sentido puramente ~xegétiCO~~ ~

<~fr-l

2 - Oproblnna aetual d4 ;nt"puM(ão jurldka

if". ....., \1'.~~"~'l~104 M"odologiajuriJica-~{~f li! interpretação se idenrificava com o texto, já porque na expressão textual se I

~ cumpriria o cânone, prescrito pela hermenêutica geral. da autonomia do objecro~~ (v. BETTI, uoriagm<r.kd,Ua im<rpr<razion"I, p. 305 55.; H. COING, ob. cit.,. ~ :\ p. 13 s.). Podia discutir-se se o valor semântico a atribuir às palavras da «Ierrada

Q ~ \\ lei. devia resultar do sentido comum das mesmas palavras ou do seu sentido «téc-~ .:; . nico-jurfdico~. mas já era geralmente aceite a consideração da letra da lei com um~ l! I1valor ntgativo (o texto delimitaria a interpretação e SÓ seriam admissíveis os~ '\,}.•..~ sentidos da leique fossem possíveis segundo o texro) e porventura ainda com valor

,~~ positivo ou Stkctivo (de entre aqueles sentidos possíveis, seria mais forte o que,~~ melhor ou mais naturalmente correspondesse ao texto). O que não excluía algu~~ V;;.~ mas.divergências. condicionadas pelos diferentes objeetivos da interpretação: aque~

les dois Va.loreseram sobretudo acentuados pelo objectivismo. enquanto o sub-~J \ jecdvismo, se sacrificava facilmente o segundo. chegava também, pelo menos naI\. ' Isua versão teleológica (v. infra) a recusar um valor «normativo. (ou juridicamente

. • '\.. . aurónomo) à lerrada lei, atribuindo-lhe apenas um valor heurístico (HECK). O ,k-.~ ~ mtnto histórico- ou a consideração da génese do preceito interpretando, tendo

~ em conta já os (t"materiais.ou os «trabalhos preparatórios" da sua elaboração legis-~X lativa, já a circunstância juddico-social do seu aparecimento (occasiokgis). já a~ própria hisrória do direito e as «fontes» legislativas - seria decerto fundamen-

tal para a interpretação subjectivo-histórica, mas relevante ainda (sobretudoatravés da occasiokgis e da história do direito e legislativa) para o objectivismohistórico. ou menos evolurivamente acrualisra,sendo certo que a referência ao con-texto histórico nunca poderia deixar de ser um faetor hermenêutico indispensável.Sem deixar de observar que para o teleologismo histórico o elemento en causavisaria determinar antes de mais os factores jurídico-socialmente determinantesda norma (p. ex.; os _interesses causais", para a «jurisprudência dos interesses»).enquanto condições de compreensão da sua opção prática. O ~úmmto sisumá-ricoimplicaria a consideração da unidade e coerência juddico-sistemáticos (a com-preensão da norma e.mfunção do seu contexto, sobretudo pela sua inclusão noinS[ituto ou domínio jurídico de que seria parte e referindo~a inclusivamenre àunidade de toda a ordem jurídica), assim como a relevância dos «lugares para~lelos. (as posições inequfvocas ou já esclarecidas que o legislador e a lei houves~sem tomado em questões análogas). É este elemento a expressão de um pres-suposto, e simultaneamente de uma exigência fundamental da juridicidade: opressuposto e a exigência da racionalidade do todo unitário que o direito deveráconstituir, como vai implicado, desde logo, pelo sentido geral de «ordem. que odireito. como quer que seja, também não pode deixar de manifestar. Só que estapresunção ou este postulado de ({racionalidadell (v. Z. ZIEBINSKI. "La notion derationalité du législateur', in L'illurprl/ntion m droi/, 23 (1978), p. 1755.; E OST,

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f.,

107

PP) O, multado, da itlurpr<taçiio

2 - Oproblmuz actual da int"1'rcti1(ão jurldic4

Neste último tema, a teoria tradicional da imcrpretação repete em grandeparte as especificações da hermenêutica jurídica já daramemc relevadas desde osjuristas medievais, e pelas quais sempre se pretendeu definir a possibilidade dainterpretação através dos resultados que hermeneuticamente lhe seriam lfeitos.Assim, tendo em conta a distinção básica, referida no número anterior, entre a«letra» e o "espírito» da lei, poderá verificar-se uma de três hipóteses. Ou a letrae o espírito se correspondem naturalmente, i. é, o significado gramaticalmenteenunciado pelo texto da lei exprime adequadamente o sentido que a este éimputável pelos outros elementos da interpretação; ou a letra (o imediato ou onatural significado gramatical) é mais ampla do que o espírito (o sentido deter- 11'\1\"minável pelos outros e1ememos); ou a letra, [ambé~ no seu si~nifi~ado .natural }~ou mais carrcera, é menos ampla do que o espírito. Na primeira hipótese,diz-se estarmos perante uma intnpr~Jafão tkclarativa - o rexto admite sem mais, ~}já no seu significado imediato ou mais natural, já num dos seus significados ime-' '4diatos e naturais, o sentido determinável pelo espírito da lei e o intérprete ape •nas se fixa nesse sentido que o texto também narural e correctamente exprime.Na segunda hipótese, já seria caso de uma intaputaçáo rtstrit;vae na terceira seriapossível uma intnprttaçáo atm.siva - ali restringe-se o sentido naturalmente tex-rual da lei para o fazer coincidir com o seu espírito, aqui alarga.se aquele sentido. . •mas dentro dos seus significados possíveis, para obter, inversamente, a mesma coin-cidência. Para além destes, admite ainda a teoria tradicional outros dois tipos deinterpretação. O caso extremo da intaprttJ1çáo abrogallu ou rroogatória,quandoa conciliação entre aqueles dois elementos essenciais da norma legal- a expres-são verbal ou a letra e o pensamento normativo ou o espírito - seja de todoimpossível, já porque a expressão é absolutamente incorrecta (caso decertopouco provável), já porque o texto enuncia um sentido também absolutamenteincompatível com o pensamento normativo, como sobretudo acontecerá nas hipó-teses de antinomias insuperáveis (no caso concreto concorram normas lógica ou .normativamente contraditórias). E a inurprttafáo tnunciativa, que se verificaquando se infiram do preceito conclusões que c1evirtualmente admita, p. ex., osobtidos através de argumentos lógico-jurídicos, como os clássicos argumentos apari (ou por indentidade de razão), a jôrtiori (ou por maioria de razão, e tantono modo a minor; ad maius como no modo a maiori ad minus). ad absurdum,a contrario,etc. - sobre o exacto sentido destes argumentos, que têm sempre nasua base valo rações práticas. v. G. TAREllO, «Sur la spécificité du raisonnementjuridique., in ARSP, B, n." 7 (N.E), p. 103 ss.

Como hem se entende, todos estes «resulrados da imerpretaçãolt cabiam no

M~todoÚJgia jurldic4106

,-hermenêutico para um sentido normativo, de um objectivo dogmático para um

\

objectivo teleol6gico. de uma imcrprcraçâo como acro metódico 3mónomopara uma interpretação como mamemo da realização do direito - como melhorcompreenderemos infra.

B. Ainda na temática dos elementos da interpretação. há que aludir a doispomos. Em primeiro lugar. esseselementos são como tais (como elementos) efec-

~ tivamente considerados e não em termos de facrores para interpretações diver-~~/as e aut6nomas. A interpretação jurídica é compreendida como um acro uni-~"i. tário em que concorrem integraclamenre aqueles vários elementos - pelo que

\ '_ não há uma interpretação gramatical. uma interpretação hi$t6rica, etc., mas~J ~um elemento gramatical. um elemento histórico, etc., de.uma una interpretação~ _ IA (v., por rodos, SAVIGNY, Sy,um, I, p. 33 e 46; BETn, inurprrrazion, da", úgg"

\" \~ iÚgli areigiuridici, 2.' ed., p. 274 ss.). E daí um segundo pomo; como se con-~ jugam todos esses elementos numa mesma interpretação ou qual a relação que

~ entre eles ai deve ser pensada? '~ < 56 que este é um ponto para o qual a teoria tradicional não logrou uma solu-...:!. \\ ção - não obsrame a importância que para ela reria definir um esquema fixo ou

•~ ~ ~ um algoritmo metódico para a interpretação (a estrita vinculação da decisão con-,~ creta, a certeza. e a segurança jurídicas, a uniformidade e a igualdade da aplica-

i ~ ~* ção da lei, etc., potenciavam essa importância) e as muitas propostas doutrinais~ ~. t:$ feitas nesse sentido (v., como uma das últimas e melhor fundamentadas, a de

~ ~ ~ ::s F. MülLER, juriJtÍJch, M"hodik, 3.' ed., p. 250 ss.; cfr. ainda URENZ, M,tho-~ ~ iÚnkhr<, 6.' ed., p. 343 ss.). Nem é, efecrivameme, possível obter-se aqui uma

~ ~ solução absoluta, ou sequer uma solução abstractamente definível uma vez por~ todas, considerado que seja jusrameme o sentido prático-normativo e proble-b\::: \I mático-roncreto da interpretação jurídica. pois nesta ~rspecriva o relevo dos e1e-

. J O1ffi1OS.-da~pretação só pode se~aquele que o problem= concreto justlhque,r-. / I~ou melhor,_non:nãtiVo-argumentativamente ~e. Que o mesmo é dizer que~ ---.... terá maior relevo ou polarizará a interpretação aqude elemento que, per~nte os

pontos problemáticos especificamente acentuados no caso concreto, tenh:un~~ ~ ••força arg~nt~ª-Jltilização.da no~omo critério de solq ão desses

~ ~ '-, pontos. É o que os autores ~ambém reconhecem, ao dizerem que os elementos

~

~' da interpretação e a sua relação ,têm carácter tópico (cfr., por todos, COING, oh.~..f ciL, p. 22 s.; EsSER, VorvmtiindnÍJ. p. 121 SS.; ZIPPEllUS, ob. ciL, p. 60 ss.). Isto,'j por um lado; por outro lado, haverá mesmo de perguntar-se se não terá de reco-

nhecer-se uma irredutível antinomia intencional entre os diversos elementos rra-~ dicionais, a excluir a possibilidade de uma sua qualquer hierarquização e a

impor, já por isso, uma problemático-concreta opção entre eles (v., neste sentido,EssER, ob. cit., p. 123 s.). (l"

'x" t C\"<" ~ '\ .

, .c;j)r ..I-,} n -l\~,,\- (,~ .( '< -r '"

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quadro dos objectivos rradicionais da interpretação, fosse o definido pela/

orientação subjectivista - caso em que o {(espíritoda lei» se identificava à 4lvon-

tade do legislador» -, fosse o proposto pela oriemação objectÍvista - sendoentão aquele «espírito» a m~mkgis. Com a acentuação da interpretação teleo-lógica (efr. infta). os resultados da interpretação enriqueceram-se de outros tiposde grande relevo prático. e que têm de comum o aceitarem já a preterição dotexto a favor do cumprimento efecrivo da intenção prático-normativa danorma. É o que se verifica com a illurprttl1ção (orr(ctiva, inicialmente propostapela {(jurisprudência dos interesses,. e depois geralmente aceite (v.• entre nós,MANUEL DE ANDRADE, Smtido , Valor da jurisprud;ncia, p. 33 s.), e pela qualse admite que o imérprete sacrifique (corrija) o texto da lei para realizar a inten~ção prática da sua norma sempre que. em yirtucle desde logo da alceração dascircunstâncias que houvessem sido determinantes da previsão e da formulaçãoexpressa da lei. o respeito pelo teor verbal implicasse a frustração daquelaintenção prático-normativa. E analogamente se passem as coisas com osmodos imerpretativos que se designam por rtdurão ukológica (v. lARENZ. ab.cit., 6.' ed., p. 391 ss.; !rad. pon., p. 450 ss.; ENNECERUS.NIPPERDEY, ob. cit.,59. p. 344 55., onde é designada apenas por «Rtstriktion») e por lXUmãO uko-lógica (v. CANARIS, Di, Fmsul/ung von Lückm im G(S(tz, p. 89 ss.; 1.ARENZ, ob.eits., p. 397 55. e 457. respectivamente). Traca-se, na primeira. de reduzir oude excluir do campo de aplicação de uma norma casos que estão abrangidos pelasua letra (contra. portanto, o texto da lei) com fundamento na tcleologia ima-nente à mesma norma. Na segunda, de alargar. ao contrário, o campo de apli.cação de urna norma. definido pelo texto. com fundamento também na sua ima-nente teleologia. a casos que por esse texto não estariam formalmente abrangidos.A redução teleológica e a extensão teleológica não se confundem, respectiva- .mente. com a interpretação restritiva e com a interpretação extensiva, porqueo que se verifica nas primeiras não é já a procura da adequação ou de uma finalcorrespondência entre letra e espírito, entre texto e pensamento normativo, masantes uma «correcção do texto fundada teleologicamente» ,(l..ARENZ), prosse-guindo. portanto. a interpretação para além dos possíveis sentidos do texto ousacrificando o seu formal sentido impositivo. E se assim estamos já a ultrapassaros limites tradicionalmente traçados à interpretação, isso afinal só nos mostra. "uma vez mais, que a acentuação do flelemento tcleológico» - ou seja. acompreensão prático-normativa e não apenas filológico-histórica ou dogmá-tico-analítica das normas jurídicas - implica o abandono de um sen-tido puramente hermenêutico (hermenêutica-exegético) e a assunção de umsentido verdadeiramente normativo (prático-normativo) na interpretaçãojurídiC!o

109

(3) Srgundo a uoria a"alltico.lingulstica

2 - Oproblnna aetual d4 jnlapr~tIlfáo jurú1ica

Nesta perspectiva. a interpretação jurídica como interpretação semântica diri- 11gir-se--iaem primeiro lugar ao dito (ao lingufstico enunciado do texto legal) e com-ple"mentarmente ao qu~,idopelo legislador (nesse enunciado)j com o objectivode determinar, através dessa semântica significação dos enunciados legais, os objec-tos de refe~ência (e de aplicação) dos mesmos enunciados - objcetos que seriamdefiníveis por um conjunto dê propriedades empíricas, pelas tequalidades que osobjectos podem leI ou não te'" (KOCH/ROsSMANN, ob. cit., p. 158).

aa), Nessa significação objectivo-referenciaJ haverá, porém. que distin.guir:-sea inunsão da a:tmsão significantes: a «intensáolt tem a ver com o conteúdoinrencio'nal das expressões ou enunciados. com aquilo que eles intencional e pre-dicativamente dão a entender dos objeaos (ou as qualidades que lhes referem),oferecendo assim uma determinação conotativa ou a significação em sij enquantoa «extensão. designa o concreto objeao referido ou a totalidade, a classe, oconjunto. etc., dos objectos referidos pela intencional significação das expressõesou enunciados. pelo que se traduz numa determinação denotativa - os enun~ciados lingufsticos rifêr~m-ua objectos, realizando uma denotação e aprim~mum sentido. um modo particular de entender esses objectos. constituindouma significação em sentido estrito. E não têm entre si de coincidir - p. ex.• àsexpressões «a estrela da alva. e ~a estrela vespertina» corresponde a mesma exten-são (o mesmo astro real), mas têm sentidos-significações diferentes, pois pensamaquele mesmo astro segundo predicações e contextos diversos, sendo desse modointencionalmente diferentes e extencionalmente iguais. Dal que a «intensão» nosponha perante a dimensão estritamente linguística da expressão ou enunciado ea «extensão» pcrarlte a sua dimensão empfrica (<<Adeterminação da extensão exigeinvestigações empíricas. - H. J. KOCH, «Über juristisch-dogmatisches Argu-memieren im Slaarsrech"" in Snnillilr: Di, jurisrisch, M"hoM im Stilanrrcht, p. 34),sendo ceno que esta SÓ se pode determinar em função daquela e constiruindo assimambas uma unidade intencional que nos permite claramente compreender quese diga a _interpretação semântica» simultaneamente «interpretação empfrica».Por outro lado. à significação, neste seu particular entendimento, compete sem-pre um sentido Mscritivo: define qualidades objectivas e identifica objectos quelhes cOllespondem.

~~) Tal seria, pois, exactamente a jurídica interpretação semântica:traduzir-se~ia na d~te~inação objectivo-inte':lcional das qualidades ou prop_rie- ~dades que, segund.o a norma legãl:lmpãifariam no comportamento ou na Situa-ção jurídica decidendos.--Interpretar as normas ou as prescrlçóCs legaISseria expli:citar a signi-fi~;ção d~unciadàs lin~~ticõs dês~_asnormãseprescríç6es,

M~/odologi4 Jurldica108

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110 Mrtodologia Jurldiea 2 - Oproblnna 4et'Ual da intrrprttafão jurldica 111

IldC:finind~ •.através de reg~assemânticas adç!l!:ladasL~----:q~~idadesou -p-rop-LÍed~-\ dss desçnClv~.-9~eos oh cetos com ortamentos ou situa ões da sua referênciahaYiam dcmanifes.I.1.Ll'-ª!1que essas normas e F'9~Ijçºwh<:J<illeIPJ~is.O que: leva impllcita a aceitação. igualmente para a linguagem jurídica e a sua sig-nificação inrcrprctanda. da teoria analítica dos dois elementos. a considerar emgeral nos enunciados das linguagens prático-normativas. a que já antes aludimos- um ~kmmto Mscritivoou de intencionaJidacle objectivo-referencial e umrlnlunto pr~scritivo ou de imencionalidade prescritivo-normativa. mas comessencial relevo do primeiro para a determinação da respectiva significação. Detal forma que os pr6prios «conceitos de va1or~que 'sejam utilizados para enun-ciar o comeúdo normativo dos preceitos jurídico-legais se não subtrairiam a essemodelo duallstico e às suas consequências metódico-analíticas: se seriam eles con-ceitos tÚ valor porque implicariam uma valoração (uma tomada de posiçãopositiva ou negativa perame certos comportaritenros ou situações), essa tomadade posição seria correlativa às qualidades objeccivas descritivamente intenciona-das nesses comportamentos ou situações, enquamo seus objectos. Pelo quetodos os conceitos dessa índole teriam também «um mais ou menos claro con.teúdo descritivo_o Sendo ainda de sublinhar que «da componente descritiva dasignificaçãoe só dessa componeme pode o aplicador do direito obter a informaçãoquanto às qualidades de um certo caso decidendo que são juridicamente rele-vantes., e daI que tlpara a aplicação da lei ao caso.concreto s6 é relevante a com-ponente descritiva da significação. - «a força vinculante dos conceitos de valordepende por isso unicamente da respectiva componeme descriciva da significa-ção. (assim, por rodos, KOCH/ROSSMANN, ob. cir., p. 203 ss.).

xxl O problema da imerpretação jurídica (com este objecro, este objecrivoe este sentido) põr-se-ia. no entanto, porque os enunciados das prescrições legaisnão manifestam sem mais, ou de uma forma evidente, essasua significação. E nãoa manifestam assim porquanto na sua linguagem, como em geral em qualquerlinguagem, se reconhecem vários tipos de indeterminações significativas. Desdelogo, e para além decerto dos casos dos «conceitos de valor., «conceitos inde-terminados», «cláusulas gerais»e mesmo dos «conceitos de prognose» e «conceitosripo. (v.• por rodos, K. ENGISCH. Einfiihrung in dasjurisrischm Dmkm, 8.' ed.,p. 106 ss.; KOCH/ROsSMANN. ob. cit, p. 201 ss.), as indererminaçóes especifi-cameme lingulsticas resultames de ambiguidatÚs, vaguidatús e porosidades. fuambiguidades (equivocidades ou plurivocidades) são as indeterminações queatingem a «intensão» e a consequência de serem as significações sempre variáveiscontexrualmenre dependemes ou susceptíveis de alteraçõe~tido em fim-ção dos «contextos de significação» que vão pressupondo. As vaguidades têm aver já com a (lextensão»e verificam-sepor não poderem quase nunca identificar-se

()1P.hífjhdvdt --j) (av..do~IJ,f~.fkJ.u>----t> rJu;Pf~

os objectos concretos de referência de um modo absolutamente seguro ou rigo-rosamente certo, em virtude da assimetria ou incomensurabilidade entre a lin-guagem e a realidade - sempre mais específica. rica e complexa - e implicar Ç)isso que a intencionalidade significativa nunca deixe de revelar-se incompleta ~ ~(quanto ao conteúdo) e aberta (quanto ao âmbito objectivo ou aos seus limites) \)relativamente à realidade referida. DaI que a significação intencional, para se cum- ~ f="-prir neSta realidade não po~~aprescindir de uma «concretização. (d~m desen. ~'v<2lvimentoobjecrivamçnte cletegn-Lll.ativo)em fi.1n~~de u~ parti~£ar «contexto ~'. ~d~cação». As porosidades, por sua vez, são as indeterminações referenciaisprovocadas quer pela sempre possível alteração ou novidade problemáticas, quer • t;) ~

pela temporal modificação das situações e dos contextos práticos: ainda que se" ~ 0."'~::.tenham eliminado as ambiguidades e superado as vaguidades de um enunciado ~ \'.""t~prescritivo, não se pode sa~er a prior; e uma vez por todas que problem~....casos \ \

ou circunstâncias futuras se oferecerão no se~t.h_omQIltcde posslveLreferênçia. IRelo que a sua significação não se p--ºqet_eL~~m!>ç~!1__IJ~n~,P?..!:defini~vartl:ente Rdeterminada. Havendo assim de dizer-se que. se a vaguidade designa a indeter-jl ,nlmação quanto a «fe~6n~enos.conhe~id~s»J a porosidade considera a.i~_~ete.!fl.li-I ~nãÇao re ativamente a fenóme~o~_ainda não conhecid~!,_ como que se traduzindo li ~ ~.numa "vaguiadade porencial. (H. J. KOCH. Oba juristúch dogmatisch" Argu- .' "';:. l>:mmtin-m, cit., p. 45)- pense-se, p. ex., na significação da expressão «coisa» nos ''':I ~tipos criminais de furro, que viria a abranger, a mais d~s comuns objectos cor-p6reos, ainda energias, como a electricidade, depois que estas se mostraramsusceptíveis de apropriação. (Para maiores desenvolvimemos e indicações biblio-gráficas relativamente a estes três tipos de indeterminações aludidos, v. o nossoO principio da kga/idad, crimilla~ p. 116 ss.).

&'l) A interpreração jurídica, como interpretação semânrica, competiria, pois. ~vencer estas possíveis indeterminações das expressões ou enunciados das prescrições 'flegais através de uma específica «a~á1iseda linguagem», i. é. através da aplicação I: '. .5:de particulares regras semânticas (CARNAr) - regras pelas quais se explicit~rão j ~~ ~ou determil}arão as condições gerais e as qualidades que os objecros nelas refe-. ~ ~ridos hão-de preencher, enquanto são essas condições e.qualidades o conteúdo •~ r::; ~intencional da sua significação. E que serão as regras da interpretação jurídica. ~

Em primeiro lugar, a regra que convoca o dito. para o analisar nas suas ime~ >dia tas virtualidades l6gico-linguísticas e lógico-significantes - para determinar .~a sua significação mediante relevantes e aplicáveis «convenções linguísticas».Assim, se o «dito» deve ser considerado no seu (.contexto» (o que se traduz no ((e1e-lmenta sistemático» da hermenêutica jurídica tradicional- cfr. KOCH/ROsSMANN, \

oh. cit., p. 167 e 171). também se ter}~~<:=conclll.ir que a sua vaguida4e-º~ ~~9.e-1termina£~o referencial não é sin6nima de indeterminação ro~al~u de exclusão de I

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1132 - O problnna actual da inUrprcldfdo juridica

siS[ira, já aquele semido que o legislador tivesse pensado para o texto prescritivoou que através dele quereria exprimir e comunicar, segundo a fórmula ud signi-fica n, porque issoe",endia significar o legislado,,"(GUASllNl, Laioni sul ü"guoggiogiuridico, p. 109); já aquele semido que melhor e funcionalmente corrcspondesseà «imenção da regulamentação do legislador», aos fins que ele se propuseraa<ingir com a prescrição da norma (cfr. KOCH/ROSSMANN,ob. cit., p. 220 ss.).

Devendo todavia acrescemar-se a consideração de um Outro pomo que, aser viável. poderia levar a excluir ou a adiar o recurso ao «querido». É que nãoesrariam ainda esgotadas, com a análise do «dito», nos termos referidos. as pos-

. sibilidades de uma maior determinação, ,no próprio âmbito dos candidatos neu-trais, através da anaHdca simplesmeme lógico-linguística. As distinções ~ferenciais.e que se traduziram na discriminação das três Categorias de candidatos à aplica-ção prescririva. são p~ocuradas a um certo nívellinguísrico, ao nível da lingua-gem prescritivo-Iegal ou legislativa, e haveria de perguntar-se se as indetermina-ções verificáveis a esse nível não poderão ser porventura corrigidas mediante umaanálise de segundo grau que submeta a linguagem desse mesmo nível à crüica deuma correlativa metalinguagem. Há efectivamente propostas nesse scmido.(Assim B. SCHONEMANN, Di( G(utzillurpr(tation. cit., p. 175 ss.;e Nulla po(na,in, kg'?, p. 19 ss. Cfr. ainda GUASllNI,Laioni, ci•., 1'. 105). A linguagem jurí-dico-Iegislariva consd[Uir-se-ia pela utilização da linguagem ordinária ou comummediante uma imencionalidade especificamente jurídica, sobrerudo numa sua fun-cionalização finaHstico-prádca, e isso, ao postular uma relação de comensurai i-dade entre a linguagem jurldica e a linguagem comum, permitiria ver rambémnaquela uma «linguagem-objeetol) peranre esta última com uma «meralinguagem»que não só imporia limires à possibilidade significante como ofereceria ainda cri-térios de determinação da primeira: a linguagem jurídica. como linguagem--objecro, poderia ser co~frontada com a linguagem comum, como meralingua-gero. e sendo. esta (IComp!etament~ livre de considerações ~nalísricas e seg~i~do " ~as suas própnas convençoes e práticas» (SCHONEMANN, Du G(utzintapr(tattoll, ~ ~p; 1~1).esse ~onfron~o justifica:ia li~ites à in,t:r~retação finalística das ex.pr~s- _ ~soes ou c~nceltos da h~guagem Jurí~lCa, permmna (ldesse modo que se dehm~re ~ .sem a rt.ta1speq~~~dlficuldade.lóglca o SIStemada determin'-':.ção jurfdica atra- ) ~vés do Sistemado uso nam.rol da l!!1gtJ~m, (SCHONEMANN,NuUa poma ,in, kgd, ~p. 20). Como exemplo, Sirva-nos aquele mesmo que KOCH/RoSSMANN,ob. cit., ~ ,~p. 15 ss., convocam para mOstrar como se deverá «trazer o texto legal à linguã- ~ ~-tgem» (~omum): se uma norma penal .prescreve que «a lesão corporal que tenha . ~ ~ ~por efeJto a perda de um elemento Imporrame do corpo será punida com a ~pena X», e se uma ofensa real provocar a perda de um rim, ter-se~ia de imerrogara linguagem comum. nas suas significações universais. para saber se um rim é nesra,

M~todo/ogia Jurldiea112

V ual ucr núcleo de determinação objeaiva. pois «indeterminação linguística não1 é_Ç!lIgeral ~sêneia de conteú o' KOCH OSSMANN;Dt.eit., p. 191). JUSli-,ficá-lo-ia uma exacta «uoria da vaguitÚ:uÚ». Uma tcoria da vaguidade que,f reconstruindo tanto a distinção de HECKentre o núcúo conceitual (Btgriffikan)e a aurto/a conceitual (Bq;ri.ffihoft como a análoga de HART entre um COTt ofut-tkd 11Uaningeuma pmumbra of tÚbatabkcas<se bem assim a distinção de W. JEL-UNECK entre a «certeza posirivtlJt. a «certeza ntgtltivll» e a lldúvida possivti». rela-tivamente à significação ou imencionalidade objectiva do comum dos conceirosjurídico-legais, vem a definir um mais preciso «modelo de tT2s domlnioSJ) pela dife-renciação entre os _candidatos positivos., os «candidatos negativos» c os «can-didatos ocurrais» à aplicação dos mesmos conceitos (ou das suas expressões lin~gu(sticas) - v., por [000;, ,KocH/ROssMANN, ob. cit., p. 124 ss.). Os primeiroscandidatos serão aqueles o~jectos, factos ou casos que o coJ.1cdtoou a expressãojurídico-legal, na sua imediata intencional idade objectiva, inequivocamenteabrange, os segundos candidatos aqueles que o conceito ou a expressão inequi-vocamente exclui e os terceiros candidaros aqueles relativamente aos quais nãoé possível tomar desde logo uma clara posição intencional de objectiva inclusãoou exclusão - c:então, poderá dizer-se que ..-conceirosvagos são aqueles conceiros

. , que [êm candida<os neunais' (KocH/ROSSMANN,ob. cit., p. 196). Sem omidrI.~~~, ~nda que par~ esta analldc: de<erminação seria da ~aio[ impo~ância uma £<0-

~ ',~" Cla das ••.defimções legIslativas» (v.•G. TARELLO, Lmurpr(tI1ZJon( d(lIA kgg(,'f ,\':1,. . p. 153 ss.; cfr. H. L A HARr, .Defini[ion and Thoo<y in Jurisprudence" in EssaY',~ _~ ~ J cits., p. 21 ss.). Deste modo, se não ficaria de todo eliminada a indeterminado

~ ~ / ou a vaguidade, via-se ela ngorosameme delimitada. Com a consequência tam-~ ~ ~ Iiéffi(le no Lnbito dos candidatos positivos e negativos a aplicação ser segura e~ ~actuável mediante um raciocínio de tipo dedutivo (Iógico-subsuntivo) - cfr.,~"~ HART, PositivÍ!m and th( uparation of IAw and morais, cit., p. 62 (na trad. it.

~ indulda na Col. Contributi al/anali,i tÚl dirirro, p. 130 - e o âmbi<odelimi<ador/ dos candidatOsneurrais definir, por sua vez,os limites dos possíveislimites de inten~~n cionalidade semântica da prescrição interpretanda e assim os limites do próprio~ '" âmbito da interpretação (tenha-se em Conta o relevo que a demarcação deste\S ~ \~ âmbito pelos limites significativo-textuais, pelos «sentidos possíveis da letra da~ ....~ ~', lei», sempre teve na teoria tradicional da interpretação jurídica) - posto que exi-~~ "' ~ gindo-se agora outros factores ou regras interpretativas para além da directa~ ~ ~ndálisedo «did<o','e sejam esses facrores ou regras ainda de índole semântica ou"" Ji e ou<ra (n o e.

rS Um desses factores ou regras complementares, no qua~da da «inter~pretação semântica» estrica, seria a convocação dererminariva do «querido». Ededois modos. Ou ftxando. no domínio da indererminação signiftcadva que sub-

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115

11) Sup"açáo e critiea de,u modelo

2 - Oprohkma at:twz[ da intrrprttiZ(iío jurldica

A evolução do modelo tradicional da interpretação jurídica mostra-na-locomo que numa sua auro~superação. em termos de o seu originário sentido her-menêutica (hermenêutico-positivista) ter vindo a ser substituído por um sentidonormativo (prático-normativo). Importa acentuar este ponto, chamando sobre-tudo a atenção para os seus corolários metódicos. Antes, porém, há que ajuizarcriticamente do critério básico daquele sentido hermenêutico: o critério dos sen-tidos _possíveisdo texto como quadro e limite da interpretação.

a) Reconheça-se o significativo decisivo do critério em causa: a expressãoou o teor verbal das leis hão-de impor s6 por si e previamente os senrid.os pos-síveis da interpretação. E isto significa que esses sentidos hão-de oferecer-se ime-diatamente (i. é, antes da interpretação e sem-interpretação, pois é a imerpreca-ção que eles hão-de delimitar) e determinados (se ~o determinantes de um qu.adrode possibilidades, hão-de ser determinados ou certos nos limiccs que definem)na própria expressão ou teor verbal.

E quanto a isto há lugar, desde logo, para duas observações preliminares.Sempre os amores que perfilham o critério em discussão acabam por reconhe-cer - é a primeira observaçáo - que o imediaro sencido das palavras (o sentidodas palavras da lei tomadas elas na sua geral e aucónoma competência significa.riva) que deve impor-se à interpretação como seu limite é ele próprio as mais dasvezes duvidoso e indeterminado - pelo que aquilo que devia dar certeza (comopré-cieterminante e delimitarivo) é afinal também incerto. E não é esta uma difi-

modo se intenciona, e mesmo expressamente se pretende que o jurista-julgadoraqui assuma, é a racionalidade empírico-tecnológica e instrumental, que já I .::,conhecemos - no pressuposto também de que o direim não seria, ou havia deIdeixar de ser, uma normarividade axiologicamenrc: sustentada e razoável-pru- . "qdencialmenre jurisprudencial, mas antes um instrumenro sócio-tecnológico, .~uma politicamente orientada tecnologia social. E sempre em ordem a obter as ' '\:{premissas para uma sua aplicação dedutiva (l6gico-racional) que iria exigidapelo .postulado da dedutividade •. E analogamente se deveria proceder tanto no ~caso de tipos legais abertos ou carecidos de uma concretização (p. ex., t:laship6- ~teses das ((cláusulas geraislt, nos casos de discrici~nariedade, etc.) como nas hipó- ~_"teses de integração ou desenvolvimento constituinte do direito positivo (R~chts- ~fortbildung, na expressão alemã). Convergência esta e nestes termos.das t iiracionalidades lógico-Iínguística dedutiva e empírico-tecnológica também carac- ,tcrfstica do pensamento anaHtico e que s6 nos confirma os pressupostos episte- ~mológico e cultural que começámos por considerar nesse pensamemo. b:'""'"

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M~tJ)tÚJlogiiZJurúliciZ

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~'t~,~14 '•...•.entendida como um •.elemento importante do corpo»). Teríamos deste modo a«linguagem comum como ftrap~utikum (R. CHRISTENSEN, ~s h~jsstG~s~tus-bindung?, p. 62) e nela a chave para a resolução dos 'problemas de penumbra.(HART). O que temos de considerar, no entanto, a exprimir apenas um postu-lado de todo inconducleme (v. infra). Por último, diremos que levamos referi-das até aqui as regras analítico-semânticas que seriam susceptíveis de vencer ou

1\ pelo menos de delimitar a ambiguidade e a vaguidade. Ji no que toca à poro-~ . sidade, se teria de reconhecer. jusrameme pela sua referência a uma experiência~ ' futura ineliminável e de momento não objecrivável. que a semântica analítica a

, não poderia dominar - «contra a porosidade não há remédio nenhumlt (H. J.~ KOCH, Das Po,tula~ cit., p. 37; lo., Ub" juristiseh-dogmatÍJehe Argumentie-~ rung. cit., p. 45). Nela enconcraria, pois. a interpretação semâmica um seu invcn-.

~ '.... dvcllimite mctódico.

~

j' £E) Scriam também estcs os limitcs da «intcrprctação semântica» cm se~-:1 tido estrito - a explicitação-fixação ou .descrição» (F~sul!ung)da significaçãoJ~.< exprcssa, que cumpriria à interpre.tação ~trita~ent~ analítico-li~gu(sti~a. Pelo~ _~~ que o que ela não resolvesseou deixasse ainda mdeclso só poderia solUCIOnar-se~ ~ pelo que se aceita ser já uma impucação constitutiva de sentido (F(Stutzung). de

que seria agora responsável o imérprcte-julgador. Socorrendo~se de um terceirotipo de regras: do .fim da lei•. Não ji do fim ou do objectivo real do legislador,mas do fim ou objectivo racional imputável à norma (v, KOCH/ROSSMANN,ibid, p. 166 ss. e 221 ss.), i. é, operando uma .racional. ou objectivo-teleológicaautónoma reconstituição da norma legal - pois que «a convocação do fim dalei SÓ representa um disfarce de uma imputação finalfstica por parte do decidenrejurídico. (ibid, p. 170). Assim, no quadro embora dos "sentidos posslveis. per-mitidos pelo «dito» e que no fundo se identificariam, como vimos, com oâmbito dos candidatos neutrais (cfr. J. M. PRJESTER, Zum AnaÚJgieverbot inStrafteeht, in H. J. KOCH (Hrsg.), Juristische Methodenlehre und anaiytÍJehe Phi-ÚJ,ophie,p. 160 s.; o nosso O prindpio da legalidade criminal, cit.,. p. 125 s.)- e nestes termos ainda aqui a interpretação semântica, se já não decidiriapor si só, continuaria a definir o campo de possibilidade da aplicação das nor.mas legais -, considerar-se-iam os fins que o intérprete tivesse por justificada-mente imputáveis à norma legal e, tendo em conta as considerações empíricas dasituação ou os dados empíricos relevantes (para desenvolvimento deste pontO, emque o pensamento analítico, com ser pensamento de perspectiva ~mplrico.aruz.iltiea, insiste, v. especialmente KOCH/ROSSMANN, ob. cit, p. 219 ss.), decidir-se-iapor aquele «meio» prescritivo (i. é, por aquele conteúdo jurídico imputável ànorma) que tivesse por mais adequado para realizaraqueles fins ou racional-fina-iisticamenre exigido por eles. Devendo acenruar.se que a racionalidade que deste

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midade marginal da aplicação do critério, como a propendem a considerar os mes- I

mos autores - é uma antes uma impossibilidade essencial do próprio critério.Pois que essa incerteza ou determinação dos limites dos sentidos que haviam de

,\, ser.ddimirivos só poderá ser superada por uma determinação inrerprerariva.e entãoos limites qu~ deviam impor-se à interpretação é afinal a interpretação que osdecide, não podendo assim determinar (pré-objeetivar e delimitar) a interpreta-ção o que a própria interpretação determina. t. o que iremos comprovar.

A segunda observação quer chamar a atenção para os resultados de algumasinvestigações sobre a prática jurisprudencial da aplicação do critério, ainda que'em ordens jurídicas que não as nossas, pois revelam-nos que, embora o critériodos possfveis sentidos do teor verbal da lei não deixe de ser af geralmente invo.cado, o ceno é que ele não é efeaivamente cumprido na sua pretendida pré-deter.minação delimitativa (v. U. NEUMANN,Da «mõglicht Wortsinn» als Ausl~-gungsgmzu in tkr Rrchtsp",ehung da Strafimau das BHG. in EIK£ v. SAVIGNY(Hrsg.).juristiseh( Dogmatik und WtsSmsehajisth(ori(.p. 42 ss.;SCHMIDHAUSSER.ob cito Cfr, J.-M. PRlESTER. Zum Analogiroabot im Strafrrcht, in G.-J. KOCH.juristiseh( M"hodm"'", und arutlytiseh(Philosophi(. p. 172 ss.). Divergência estaentre as explicitas declarações metodológicas e a prática real que uma tlestratégiade evitação de conflitos» poderá porventura explicar, mas que na sua pretensãode «fazer o impossível possível» o que verdadeiramente confirma é afinal aimpossibilidade merodol6gica do critério.

Não tem interesse, para o compreendermos. discutir a questão de saber sea linguagem a ter em conta no teor verbal é a «linguagem comum» ou se deveráantes considerar-se as leis a exprimirem-s~ numa autónoma «linguagem jurídica»_ embora, p. oc., quanto ao direito criminal a doutrina vá claramente pela pri-meira'posição, pois só um teor verbal com uma significação acessível a todosdesempenharia a função de geral garantia formal que dele se espera. Assim comonão é também decisiva a opção sobre o sentido especifico com que as palavras eas expressões verbais, na linguagem comum, cumpririam a função de limite àinterpretação - a opção entre o «sentido natural» (o sentido que imediata e.comummente têm as palavras e as expressões verbais na comunicação geral) e o_sentido possfvelll (o sentido que, de acordo com a conhecida Andtutungsthtoritda doutrina alemã, as mesmas palavras e expressões gramaticalmente ou lin.guisticamente admitam, ainda que não o narural ou imediatamente comum), postoque o pensamento dominante se decida a favor do segundo e deva reconhecer-seque só o «sentido natural. se poderá dizer um sentido _ceallt,enquanto o «sen~tido possível»é já um sentido «ideallt,a remeter para uma d~ação que ultra-passa o estádio pré-interpretativo, em que o critério verbal se deveria manter, ede limites praticamt:rltl' indefinidos (o critério-limite seria desde logo indefinido

1172 - Oprobkm.z dCtual tÚl intrrprtta(áo jurldica

nos seus próprios limites). Ou sequer importa interrogarmo b-nos 50 re omomento cronológico a que o sentido verbal deverá referir-se se a I d' o empo a pro-mulgação da lei, se ao tempo actual. E não relevam para nós eSl" -~ questocs, por.que com qualquer dos sentidos verbais em opção o que se pretend bee, como sa -mos, é ver nas palavras e expressões I~js uma significaça-o amer,'orà ' - .-0- Interpretaçao(dela não necessitada e antes dela pré.determinante) uma sign',e, -.. . ... • [Icaçaoque, nasua Universalidade e poSSibilIdade,sena como que consubstanciai às 6' ai_ ., prpnaspa-vras e expressoes e que só por ISSOpoderia ser considerada conlo U 'd I'

o m P"us e I-mitativo da interpretação. O que, se começou por afirmar-se num d".. ," quaroln-gUlstlcamente acntlco - e assim como uma pretensão melodo! '. . . . oglcamentemgénua -, vemos todaVia hOJereconstruído por uma crítica c.-lIdam t -;' •. _ _ lU enaçaoana-IltIco-lmguístlca. Mas em vao em qüalquer das atitudes.

a) O teor verbal das leis, na sua função prático-comunicativa e de fndolen.orma~iva,~e que es~á.excluído o carácter puramente formal de uma linguagemslmbóitca, e necessariamente de uma «textura abertalt' à sign,'e,caça-o' ri ou ao con-teúdo significativo das palavras e expressões legais é própria uma irredudvelabertura semântica (umll1ltisch~ SpitlraumJ, pois que são tanto ' . aiIntenClon -mente como extencionalmente indeterminadas, e já por isso não é susceptívelessasignificação ou esse sentido de ser abstracta e absolutamente definido (' é ..I.• umro,certo e.fix~), sen~o antes sempre função pragmática do seu variável ((uso. pro-blemátiCO-intencionalmente concretO. Quer dizer terá de exclu',r 'd-. ' -se um senti oessencial a essas palavras e expressões lingu~sticas. ou uma qualquer significaçãoque lhe correspondesse ab~lut: e nece~sanamente, pois o seu sentido é sempreo resultado de uma determmaçao funCionai numa indeterminação _ determi-n.açãoque p~derá ser imediatamente «compreensão>!,mas que explicitamente é«Itlterpretaçao» (HEIDEGGER, RICOEUR), Com efeito, nenhuma linguagem é tãoambígua como a linguagem comum - disponível para todos os usos, aberta atodas as realidades -. correlativa como é à imprevisível pluralidade e variedadede todos os contextos significantes (significat~vamente determinantes), pelo quenela e em cada um dos seus elementos os sentidos são tanws e tão diversoscomoos contextos possíveis- radicalmente indeterminada, exige uma contínua e inten•ci~nal deter~ninação. ~ é .de~~ linguagem ~ue se esperaria um critério pré-deter-mmante da ulterpretaçao Jutldlca pelos sentidos ((naturais. ou «possíveis"das suaspalavras e ~xpres~ões(!).- quando é certo que os sentidos «naturais>!são apenasuma pluralidade unpn..--vlstade sentidos contextualmente possíveis.que destemodoo «natural» acaba por coincidir com o «possívellt e que «possível••é todo o sen-tido contex~ual.men~edeterminável. A possibilidade não é aqui uma pluralidadede pontos Significativos demarcada por um quadro fixo de significação, é antesa abertura de um variável e contínuo constituendo de significações.

MttotÚJlugia Jurldit'allG

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1192 - Oproblnna a.tual da inurpr~li1fáojurídi.a

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O que postula uma unidade (seja significativa, seja hermenêutica, seja normativa) ,entre palavra/expressão e sentido - a palavra/expressão legal é-o de ~m sentido ~jurídico, o sentido jurídico deverá ler-se naquela palavra/expressão. Quer dizer, "V~a leitura do texto legal como texto jurídico não poderá ficar-se nunca tão-só pelo ~(:i-.«elemento gramatical», na sua autonomia filológica, ou pela estrita significação çj ~semântica comum, na sua autonomia lógico.linguística, pois que ficando por aí Ihou abstraindo da referência ao sentido jurídico não se faria uma leitura desse texto .c~m~ t.exto!urídico: a leitu~a ~o texto como te~to ju~íd~c~,ao ex.igir~quela refe-rencla Jurídica, há-de ser onglnalmente uma leitura Jundlca. E ISto Impõe duas "J .,conclusões. A primeira, é que o teor verbal da lei não manifesta um sentido ((gra- ~maticallt ou linguístico comum a que se venha aCTtJuntar (corno que num ato- f ~mismo exegécicoque operaria segundo uma mera soma de significações diferentesl _ ~'~o sentido jurídico convocado pelos outros elementos da interpretação - o teor }~ ,~verbal manifesta originariamente o sentido jurídico. A segunda diz-nos que a sig- ~.•.rnificação das palavras e expressões legais, como palavras expressões de um sen- ',~~tido jurídico. só encontram a determinação da sua indetcrminação significativa \~no próprio sentido jurídico interpretando - a própria indeterminação verbal sóé detenninável pelo sentido da norma ou, como diz HASSEMER, (CO tcor literal nãose pode saber sem ter em coma o sentido (jurídico))!. Duas conclusões cuja sín. ftese é esta: o teor verbal das leis, considerado ~tiv~_p'roblemática da inter.pretação ju~!?ica, não te,:!,significação difercIlt"eda que.lh~et~rm~~_~sa inter- I ~pretação. ~ send~_~"~signiflcação, ou a sua determinação, um resulta9"o_~~ j ~ ~--.:.rin_t~~ret~çã?,_~e novo se .~econhccerá que não pod,eser ~I~pré-deterrnina~iya ou I . \)dellmltanva ôessa mesma Interpretação, que afinal_a~.!e~mll1a - sendº"!!Jl~.1,!l:- j ~ "~tad~-d; i~~~!pretação, não pode obter-se anUs ou fira do próprio processo CO~l-/1 ,~c;-~to_dainterpretação. " ....

b) Voltando-nos agora directameme para a superação evolutiva. há que con- ., "'siderar como seus resuhados metódicos os seguintes. ~

0.) A acemuação do sentido normativo (prático-tdeológico) da imerpretaçâo --:jurídica obriga a dar relevo a uma outra Jico[Qlllia definidora do objcctivo .",dessa iIHerpre[açáo,e justamente para bem nos darmos conta da diferença e alcance l' \J ~daquele sentido elHretanto adquirido. Referimo-nos à distinção entre i11lap,t- ,, ,tarão dogmdtica e interputariio teko/ógica - nem sempre devidamente acen. :]toada pelo pensamenw jurídico (cfr., todavia, J. EsSER, juriJwc/J(J Argumtmie-' '\",,-rm im \'(Iandtl dtJ RtchtJjindungsko1JuptJ UflJ~rtJjahrlmlldatJ, 1939; L. BAGOLlNI, l(credeltà ai diriuo e intcrpretazione», in EstudoJ rm hOm(fUlgem a Migur/ Rrale,p. 125 5S.). Por ela o que agora se pergunta é se a ilHerpretação se dcve propor ~d.e[crminar~~~fonte jurídic.1 interprctanda um senMi)redutÍve! ao pressupos[Q ~-.l'-~Sl~~~~~~j"~~í_dicodogmático, i. é, um sentido pelo qual aquda fonte seja assimi- ~ ~.

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~. GIS}. V

..J:. ~ Sendo assim as coisas, teremos de perguntar por que COntextose haverá de~ {~ perspectivar o teor verbal das leis para a superação da sua ambiguidade, e bem'J' ~ assim qual a inrencionaliclade da indispensável determinação da sua indetermí-

~~\

nação. E a resposta não pode ser senão uma: o cont'lto perspeaivwrc será o ron-'. texto jurídico c alntencionalidade dercrminant1.será o «USOIt jurídico. pois

V quaisquer QuerasJriam arbitrários para uma determinação de relevânc.iajurídica.E, se não terá isto de significar necessariamente substituir a linguagem comumpor uma outra totalmente distinta linguagem jurídica. já significa todavia que aambiguidade do teor verbal s6 pode ser vencida por uma determinação de sen-tido jurfdico. Ou se"a essa determina -o do smtido v(rbai osslva como deter-mina -o .á de sentido juridicamrn« posslvaé indiscemfvel no continuum a Inter_"retação jurídica, e assim o que avena e pr eterminar essa interpretação ladefinição os imites IntenaonaIS reve a-se n um seu resu ta o - e dizer isto,é dizer que o critério verbal não pré-determina efeetivamente a inte!pretação'...9.ueo sentido intencional desse critério não é um prius, e sim também ele um p'~J-ttnus interpretativo.

~) Isto por um lado e já a nlvel puramenre lingulstico. Mas havemos dereconhecer, por outro lado, que a pretensão de ver definidos na letra da lei ou n1teor verba..!desta os limites da interpretação leva implícito um pressuposto her. ~ .menêutico qm: havemos de considerar inaceitável- o pressuposto de que"a letrda lei ou o «demento gramatical» têm um valor hermenêutica autónomo, e autó-nomo já relativamente aos outros «elementos. interpretativos já inc!UJivt relati-vamente ao sentido jurídico espedfico do texto-norma. É deste modo que a tco-

~ ria tradiciona..!da interpretação jurídica distinguia nas leis a «letra» do ((espírito»,,,-"-,£\" para ver na primeira a significação puramente filológico-gramatical do teor ver.\ bal (constituiria essa significaçãoo «elemento gramatical li) e a base (enqua~1todefl.1:\ nidora do quadro de possibilidades significativas) da postetior determinação do

,,-" «espírito» através dos outroS elementos interpretativos. Enquanto a actua..!teo-I 1t, ria analítico-lingufstica da interpretação juddica vê na determinação da signifi-

~ P '1~,:cação lógico-linguístíca do teor verbal, mais do que o elemento básico, verda-""' q _ deiramente o "momento preferente da interpretação, entendida como (C interpretação~ ~: ~~ semântica», pois só se haveria de convocar os outros factores interpretativos, se

~ bquda primeira determinação ficasseinconclusiva ao seu próprio e exclusivo nível., Ora o que, bem ao contrário, se d~e compreender éque o legislador não usa nas

~ .\.~ ~ leis palavras e expressõesque tenham porventura um sentido linguístico-gramatical~ ~ comum para enunciar esse sentido comum, e sim para prescrever uma intmção. VJ~~ ..~ juridica através dessas palavras e expressões - e então um J(f1~dico é o ime-

~ diato referente do texto legal, pois só na relação referencial a esse semido o textolegal é prescritivo de uma intenção jurídica e, portanto, ele próprio latO jurldico.

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lável ou pensável na auto-subsistência dogmática desse sistema - em termos de /uma ana1rticahermenêucica que supere a indeterminação exigível de interpreta-ção através da sua perspecrivaçâo e compreensão pelos conceitos. as estruturas ins~titucionais e as coordenadas intencionais por que dogmaticamenre se construao sistema, ou seja. privilegiando uma imenção dcrcnninariva própria de urna racio-nalidade «sintácrica» (jurídico-sistemática) em que o direito (cada um dos seusdememos de manifestação e o conjunto de todos eles) como que se compreen.deria por si próprio - ou se deve antes propor-se determinar um sentido à fonteinterpretancla que se obtenha e se justifique perspectivandó-a sobretudo pelos finspráticos que com ela se visam alcançar, um sentido releologicamente funcionate assim mediante uma hermenêutica de racionalidade prática (comprometida coma praxis e as suas exigências) que privilegie ames a intenção de justeza ou plau-sibilidade apragmáticall - e pela qual o direito como que se compreende essen-cialmente pela sua prádca realização. A primeira é uma interpretação dogmática(ou de objeaivo dogmático), a implicar o direito como uma ordem que em si sub-siste - e a interpretação uma explicitação, uma determinante explicitação dessaordem -; a segunda é uma interpretação teleológica (ou de objeetivo teleológico),a implicar o direito como uma particular intenção prática que se visa cumprir- e a interpretação uma realização, a determinante realizaçãodessa intenção (nosseus valores e nos seus fins).

Distinção esta que não se confunde com a anterior, entre ~subjectivismo»e ~objeaivismo», posto que, se vemos o objcerivismo a ultrapassar os limites pura-mente exegéticos ou filol6gico-hist6ricos próprios do subjeeti~ismo e mesmo, nasua maior abertura e autonomia hermenêuticas, a acentuar o factor interpre-tativo da ralio kgis (convocando inclusivamente como modelo da sua deter-

o minação a ••hipótese» de um «legislador razoável»), não é todavia isto umaconsequência necessária do mesmo objectivismo enquanto tal, mas já o resultadode uma interpretação de sentido tdeol6gico que entretanto se vinha impondo_ como o comprova o facro de o objectivismo ter nascido ainda no quadrodo racionalismo normativístico-sistemático da B~griffijurisprudulz alemã(v.K 1..ARENz, oh. cit., 6.' 00., p. 32-35; <rad.port., p. 30 ss.) e de em si não excluir,e antes ter praticado, urna determinação interpretariva de vincada imençãoconstrudvo-conceitual (v. R. REINHARDT, RicIJur und R~chlsfilldullg,p. 13 s.).A libertação da ••vontade do legisladorlt foi nele s~bretudo liberdade para acen-tuar o evolutivo contexto jurídico-rulrural sistematicamente significante. Por outrolado, também a interpretação subjectivo-hisr6rica admitirá uma versão teleol6-gica, s~ nela se rele.var.menos a averigu~ção do vo~itivo-psi~o pe~samentodo legislador e mais a IIltenção normativa determlllada pelos fins práticos que omoveram - interpretação «hist6rico-teleológica», na expressãode HECK. Quer

dizer, não s6 as duas distinçóes se não confundem, corno a polémica subjecti-vismo-objectivismo pode pensar-se no âmbito apenas da interpretação dogmá-tica. Acresce ainda que a interpretação dogmáCica não implica a ruptura com umaintenção teorética do pensamento jurídico (tal como de intenção teorética eramo positivismo jurídico exegético e o positivismo jurídico sistemático-con-ceitua!), enquanto a interpretação teleol6gica opta claramente por uma inten-ção prática em sentido próprio - a razão daquela interpretação pode ser a((razão teóricv, mas a razão desta última terá de ser «a razão prática». Além dissorepresentam tipos antagonicamente diferentes do pensamento jurídico - ainterpretação dogmátic;o aproxima-se da tendência «formalista» desse pen-sa..rt\ento e a interpretação teleológica da sua tendência «finalista» (sobre estascategorias, v. H. KANTAROWICZ. Di~ Epochol da RuhtswisuflScIJaft, artigoreproduzindo por G. RADBRUCH, na sua Vorschuk da R«htsphilosophir, 3.' ed.,p. 63 ss.).

A chamada do pensamento jurídico para a interpretação tdeológica come-rçou por dever-se, nos tempos mais próximos, ao movimolto do dirnto livr~e haviade afirmar.se como orientação lograda graças à jurisprudblCia dos jm~USUJ.ComHECK, sob a inspiração de IHERING, esta corrente metodol6gica compreendeu alei como ((uma solução valoradora de um conniro de interesses» e o direitocomo uma função normativa de tutela e realização de interesses sociais; e dis~tinguindo na «ciência do direito» os «problemas normativos» (os problemas dedecisão prática dos interesses) dos «problemas de formulação ••(os problemas deexposição sistemático-dogmática das soluções daquele primeiro tipo de proble-mas), convocou.a a substituir «o primado da lógica pelo primado da investiga-ção da vidall e a assumir-se como uma (~ciênciapráticall - em ordem essencial.mente ,aorientar o julgador e o jurista em geral no sentido de uma juridicamentecorrecta ponderação de interesses socialmente afirmados e socialmente confli-mantes. S6 que esta perspectiva não parecia impor desde logo um total abandonodo pensamento heçmenêurico tradicional. Pois nas próprias normas legaisentendia HECK se havia de considerar tanto um G~bOISÚU (o preceito prescritivoenquanto tal) como um l1lta~SSnlui/r (o seu conteúdo prático-normativo eteleologicamenre relevante), sendo por isso possível manter, através daquele pri-meiro elemento, o tradicional esquema hermenêutico (sobretudo o esquema dosvários factores da interpretação), posto que o segundo elemento conferisse já aesse esquema um outro e bem diferente sentido - odres velhos para vinho novo.Foi, aliás, esta conjugação do tradicional como o inovador decerto uma das cha-ves do êxito da jurisprudência dos interesses - e o que pôde ocultar durame algumtempo que se estava aqui perante uma perspectiva da interpretação jurídica quese situava já para além da (radicional distinção entre o subjectivismo e o objec.

1212 - O probkm4 aetual da ;nl"pr~ti1(á()jurldka

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Mrfodologia jurldica120

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122 M~lotÚJ!tJgiajurúlica 2 - Oprobkma at:tu4/ d4 int"1'r~tarão jurldi£a 123

tlVlSmo. (O próprio HECK não teve clara consciência disso: inicia o seu livro fun-damentai, C,utzsauskgung und Intaasmjurisprudmz. dizendn que se propõe estu.dar a divergência emrc «imerpretação histórica. e cimerpretação objectivaltsegundo o mécodo da jurisprudência dos interesses). Ou seja, que se estava verp

dadeirameme na viragem da interpretação dogmática para a imerp~taçáo reieo-lógica.

Mas o que se seguiu. no ponto que agora nos importa. foi um claro extre-mar dos campos, numa mais aguda consciência metodoI6gico-problemática.Por um lado, tornou-se explícita a opção pela interpretação teleol6gica (efr.F. SCHAFESTEIN, .Zur Problemadk der le1eologischen Begriffsbildung im Stra.frech!>. in Fmschrift tÚr úipzjga juristmfizkultiit fir RJCHARDSCHMIDT,1936.p. 47 ss.; E. SCHWJNGE. Th,úologisch, E-griffibildung im Strafrrcht. 1930, e. emgera!, O. D. EKELOF•• Te1eologische Geserzsanwendung •• in Owifr.• IX. n.f..1958/59. p. 174 ss.). E o sentido pr.itico-ldeológico não deixaria de suscitarmesmo um .pensamento jurídico-causal_ (MOUER~ERZBACH), em que o releo-lógico (encle a confUndir-se com a determinação sociológica. embora pela medja~ção. não de rodo esclarecida, de uma «valoração», e de vir a radicalizar-se numfuncional pragmacismo sociológico através do entendimemo do direito já comouma social mginuring(PoUND), como uma tecnologia política-social em que ocritério decisivo são os efeitos (cfr. W. KRAWlETZ. «Zum Paradigmenwechsd imjurisrischen Methooenstreitlt, in Argummtation und HtTm~nrotjk in daJuris~prndmz, cad. esp. de Rechtstheorie. p. 113 ss.; THOMASW. WALDE.juristiscl"Folgmorúntinung). Por oucro lado. opõe-se-Ihe uma radicaliza~o de sinal con-trário, mediante uma opção incondicional pela intenção dogmática. com basenuma perspecdva sociológico-funcionalmente sistémica sobretudo preocupadacom a «redução da complexidadelt das nossas sociedades"actuais e em que a (csegu~rança das expectativaslt e a «igualdade de tratamentoll, como condições dessa redu-

~ ção, só poderiam ser conseguidas através da racionalidade de um direito conce~• I • bido, e elaborado, como dogmático «programa condicionallt que desonerasse as

':-- ~ '!.' decisões ~urfdicasda «res~ons~bílidadepel~s éfeitosll (e assim das indetermina-~ r çóes e as IOcertezas nesres Impilcadas) - vid,. sobretudo. U. LUHMANN•• Funk.

-'\:i ~ óona!e Methode und jurisrische Enrscheidung>. in Archivd aif &chts. 94 (J 969).

1 ~"K. p. 1 SS.; ID.• &chtssystnn ufld &chtsdogmatik. 1974; mas cabem ainda aqui as ana.~ .) líticas «metodologias fechadas» - crr. PARESCE, Llntdpr~tazioll~ 1l~11adinamica

. -- tÚ/ diritto, p. 420 ss. (c mesmo o «Zümck zu Savigny» de um FORSTI-IOFF, Zur~.. ( Problnnatikda V<ifassungsausúgung,1961). .~~~I Cerco é que nenhum deS[es extremos é aceitável. Nem~dical re1eo~

~ ~ logismo, s~jaqual for a su~ fndo~e,.q~e.sacrifiq~Je.por inteiro ~ tam~m indi~~~ ~ ~ pensável dimensão dogmánca da JundlC,dade, eXigida quer pela mrençao de UnI~.~1

dade do sisrema jurídico (v. H. COING, ,SYSlem. Geschichte und Interesse in derPrivatrechtswissenschatt •• in jZ, 1951. p. 483 ss.), assim como pela intenção de«ordem» e de segurança normativas (v. PAWL0'rSKI, «Problemarik der Interes-senjurisprudenZ>o. in N.j. w.. I I (1959). p. 1561 ss.). quer pela exigência da pre.dererminação dogmática dos critérios normativos que o prático jurfdico enquancola! não dispensa (v. T. VIEHWEG•• Ober den zusammenhang zwischerm Rechtsphi-losophie, Rechtstheorie und Rechtsdogmatih. in Estudios juridico-sociaús.Homrnaj' ai ProjrssorLuis úgaz y Lacambra, I. p. 203 SS.; EsSER. Vorvrrstiindnis.p. 120; A. CAsTANHEIRANh'VES, Uflidacú do Sisranajuridico. p. 61 ss.). quer aindaporque a oportunidade dos efeitos político-sociais ,não. pode suprimir a exigên-cia da validade axiológico-normativa, e esta implica fundamentos que norma.tivo-dogmaticamente se invoquem (v. A. CAsrANHEIRA NEVES, O /mtituto dosdumtos. , a Função jurldica dos Supumos Tribu"ais. p. 449 ss. e 463 ss.).Nem um radical dogmatismo que sacrifique, por sua vez, já as exigências teleo-logicamente materiais da justiça, já a justcza problemático-concreta das soluçõesjurfdicas, e que vemos particularmente postuladas pelos movimentos merodo-lógico~jurfdicosmais significativos dos nossos dias, desde a W~rtungrjurisprutÚllz(v. H. HUBMANN. Wmung und Abwãgu"g im Ruhl. 1977; cfr. K. LARENZ. ob.cit., 6.a ed., p. 119 sS.j trad. pore, p. 151 ss.) à jurisprudência tópico-retórica(T. VIEHWEG, Topikund jurisprudmz, CH. PEREIMANN, Logiqu, juridiqu,- Nou-vaú rhitoriqu" 1976; G. STRUCK. Topischrjurisprudmz, 1971). desde a metó.dica da FaUnonn (FIKETSCHER.M,thodm da &chts. vol. IV) ao pensamento jurí-dico problemático~normativo e prático-argumentativo U. EsSER, Grundsatz undNonn, 3.' ed.; ID.• Vorvrrstã"d"is und M,thodmwahl i" d" Ru!Jtsfi"du"g. 1970;I O., Juristisch~sAtgum~lIuirnl im Wandrl tÚs Rrchtsjindungrkonupts um~r(JJabr-bu,ukrrs, 1979; L RECANSF.NSSICHES. Nuroafilosofia d, la illl"pmación"da tÚr"cho, 1973; KRIELE. 77"ori, d" Ruhtsgrwi"nu"g. 2.' ed.; 1D., Ruht u"d praktis-ch~Vallunfi, 1979). A linha de orientação exacta só pode ser. pois, aquela emque as exigências de sistema e de pressupostos fundamentos dogmáticos n~ose ~fechem numa auto-suficiência. a implicar também a auto-subsistência de uma her~" t~menêutica unicamente explicitante, e antes se abram a uma intencionalidade ~~fmaterialmente normativa que. na sua concreta e judicativo-deeisória realiza- !~I:l ,:ção, se oriente decerto por aqi.lelas mediações dogmáticas, mas que ao mesmo ~tempo as problematize e as reconstitua pela sua experimentação concrerizadora. ,I 'r:~Nem é outro o sentido da interpretação enquanto problema normativo, e em que, ~~ ~portanto, também estarão presentes as duas grandes coordenadas da racionalidade " ~~:;s.:.....• ,jurfdica. o sisuma e o probúmi1.

P) Para além da definição de um novo objectivo para a interpretação jurí- ~dica, a evolução a que aludimos pôs também a claro outros pontos .

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124 Mewdologia Jurláiea 2 - Oproblnrut aClUa/ da int"!,r~tl1fáo jurldicl1 125

na monografia Crundsatz UluI Norm in drr rirh,rrlichrr FOrlbi/dung drs i'rivatrrchts,passou a ser urna verdade adquirida. Em termos de já hoje se poder fazer urnasistematização desses complementares «factores de concretização» (F. MÜLLER)."Assim, podem distinguir-se: l) factous ontológicas, corno o apelo, na medida em i

que sejametodologicamente justificado, à «natureza das coisas»e, mais geralmente. :a todos os argumentos de caráeter instirucional; 2) faetor~s sociais, como os I«interessesll (HECK), as tipificadas siruações sociais relevantes (MOLLER-ERZ#BACH),a estrutura juddico-social referida intencionalmente pela norma (O Nonn-baeich, na designação de E MOllERL a própria situação social juridicamente pro-blemática, os efeitos jurídico-sociais da decisão, etc.; 3) jactous normativos emsentido estrito, tais como os critérios ético-jurídicos, normativo-sociais e ossiandards translegais, sejam ou não solicitados.pelas «cláusulas gerais», os «con-ceitos de valorll, etc.; os modelos normativo-dogmáticos (as «teoriaslt dogmád-cas de sentido normativo, e não conceitual) e os precedentes (os «pré-juízoSIt)dacasuística jurisprudencial; os princípios normativo-jurídicos e a ordem materialdos valores pressuposta pela ordem jurldica; a própria justiça do [esultado da deci-são (cfr. URENZ, ob. cit .• 5.' ed., p. 332 55.), etc. Pluralidade de faCCO[esque nãodeixa também de suscitar o problema de saber se todos se podem aceitar, se algumou alguns deles merecem preferência ou como se hão-de entre si conjugar. etc,mas de que aqui [eremos de absttair (cf[. A. CAsrANHEIRA NEVES. O Instituto do,.Asuntos», p. 443 ss.; e infra). E o resultado de rudo isto pode de novo enun-ciar~secom a formulação já referida de EssER:«Cada interpretação representa umaassociaçãode kx seripta e ius non seriptum, a qual unicamente cria a própria normapositiva». Com o que. poderá dizer-se, a illt(rpr~tatio kgisvolta a ser in/rrpreta-tio iuris.

XX) Por outro lado ainda, há que reconhecer um cOlltinuum na realizaçãodo diuito em que participa a intapretl1ção jurídica. Era também característica da ~ .teoria tradicional da interpretação jurídica a formal discriminação metodOlógica~. ~. •de «interpretação» e"«aplicaçãolt, por um lado, e de «interpretaçãolt e ((integração», ~.por outro lado, considerando-as operações discretas e de todo d~stintas umas das I' .~••..

outras. E também aqui a índole problemático-concreta e prático':'normativa da '"";;interpretação jurídica impõe a superação deste esquema discriminatório. Em pri. \ . (meiro lugar, e como resulra já do que remos dito quanro à (ndole co~sti~~tiva. ~.mente concrerizadora dessa interpretação. há que reconhecer urna IOdlVlsívellJsolidariedade, uma verdadeira unidade metodológica, ent!0Uluu[adlcional-~\1mente se dizia «interEretaçãoll e «aplicação». Ainda nesse pontO, desde BOLOWe RAnBRUCH,passando pelas investigações metodol6gica de HECK, mas antes ~de mais com base na análise específica deste ponto que nos oferecem ENGISCH,ART. KAUFMANN, EsSER, !<RIELE,LARENZ, F. MÜLLER. HESSE, FlKENTSCHER,

/na) Por um lado. o elemento básico e decisivo da «letra da lei_ viu-se relap

tivizado por um relevo simplesmente heurístico e a não excluir indusivamentea sua preterição a favor de uma realização jurídica de imencionalidade prá-rico-releo16gica. Vimo-lo nos «resultados da interpretação., enrretamo reco-nhecidos. da «interpretação correctiv3., da «redução teleológicalt e da «extensão[cleológica •.

~~) Por outro lado. passaram a ser indispensáveis ekmmtos lwrmativos o:tra-

\tatuais (r transpositivos) para a interpretação jurídica.

, --Como foi referido, a teoria tradicional elaborou-se a panir do «dogma daimanência do sentido no direito positivo. e isso, se permitia que o cânone her-menêutica da «(autonomia do objectolt lhe fosse direcramenrc aplicado na iden-

~, tificação do objeeto da interpretação com o texto legal, impunha também que<) SÓ pelos faetores perspeetiváveispelo texto (e contexto) se haveria de realizara imer-~ pretação. Compreendida, no entanto, a interpretação em sentido normativo e

~ considerada a sua função não em termos cognitivamente hermenêuticos, mas judi-~ cativo-decisoriamente práticos, logo se viria a reconhecer que nem todos os cri-

~ I térios indispensáveis ao juízo decisório se podiam obter do texto-norma inter-~~ \ pretanda, pois que esta só tinha possibilidade de fundamentar esse juíw, como"'l" concreta "norma de decisãoll, pela assimilação que nela se fizessede faetores oor-~ mativos que a transcendiam - ou seja. o sentido normativo na e para a pro-_~.l\blemático-concreta realização do direito só era determinável em função de fac#~ ~ tores normativos extratextuais (extralegais)ou transpositivos. E faetoresnormativos~ em sentido próprio, i. é, critérios de co.constituição normativa, que não apenas

faaores de informação e de explicitação do sentido normativo imanente - comoseria particularmente o caso dos «trabalhos preparatórios» para a orientação tra.dicional. Nestes termos, pôde EsSERconcluir que verdadeiramente «a norma dedecisão não é pré-dada, mas constituída (Aujgegebwj» - Vorverstibldl1is, cit.,p. 132. Conclusão que desde BÜLOW(Crutz wul Rirh'rram~ 1885) se anunciavae que a compreensão problemático-concreta e prático-normativa da realização dodireito tornaria de todo evidente, porquanto a realizaçãodo direito com essa índole

(

mostrava que o juízo decisório, invocando embora uma norma positiva como seu

I critério jurídico, não se cumpria na mera aplicação de uma inteiramente acabadaou de definitiva suficiência, mas se traduzia numa c,?ostitutiva ((concretização»dessa norma - como um acto normativo-jurídico de desenvolvimento e inte-gração da norma-critério. O que não poderia fazer-se, sem arbftrio ou puro sub-jectivismo do decidente, senão por recurso a outros elementos normativos sus-ceptfveis de fundamentarem e de orientarem essa ac{ividad~retizadora eintegrante - e elementos sempre efectivamente convocados na prática realiza-ção do direito. O que depois da investigação de EsSER,a comprovar isso mesmo,

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1272 - Oproblnna amai da inurpr~ta('iiojurldi(a

como discriminações formais e a definiram aaos metodológicos imeirameme dis-tintos. Uma diferenciação a considerar será desde logo esta: entre a realização dodireito que possa (c por isso deva) fazer-se por mediação de uma norma (ou nor-mas) do pré-constituído direico positivo e a realização do direico que já não possaoperar com apoio num critério dessa natureza. E se quisermos cominuar a desig-nar aquele primeiro tipo de realização do direito por .interpretaçãolt (interpre-tação em sentido estrito) é isso decerto lícita. S6 que não se deverá esquecer quese trata agora de uma simples modalidade no todo continuum da realização dodireito; e que. cabendo a este todo um sentido metodol6gico-jurídico globalmenteunitário, só tendo presente esse sentido unitário e em fUnçãodele se poderá enten-der exacrameme aquela modalidade. A perspectiva tradicional partia da inter~pretação £Q!!!..~uma actividade metodológica em si, pãra !~e vir a somar oU[rasa.ct~dades metod~lógicaSque se foram re~~I,ando ~~disP'£!!~_para_.alémdaquela e que 'guãImeme'iinha por ouiras 'aãividades aU[ón~.m~.2u em si (a inte-gfãÇIodãSlãcu~as, p~T;.;t~iro;õ desenvolvimenco do di~eito,_.d_~pois)~~qua;;toa perspectiva actualmente correcta só pode ser aquela que, considerando aintencionalidade normativa unitária e o sentido metodológico global da realização ~ ~do direito. e no horiwnte dessa realização (no horiwnte do seu problema e da €"'" --sua intenção unitários). procure saber de que modos metodologicamente espe-~. "",,'-f .cíficos ou diferenciados a realização do direito poderá actuar-se - concretamente. ~~ \~de que modo e até onde ela poderá fazer-se através~u. pela mediação de uma pres- t~'"1

suposta norma jurídica, A interpretação jurfdica deixa de ser, assim, um pres- t J:-suposto algoritmo metódico ou uma técnica que simplesmente se postule, para '" \.J-

ser um acto metodológico que se problematiza pelo problema geral da realizaçãodo direito - o seu problema é o próprio problema da realg.ação do direito, e a ~ -~su~ intenção. (jurídico-metodológica! a própria ifi.:~~çã~lli~í9!co-normativa \~ ~ tdessa realiz~ção. Ou seja, a realização do dircitõr.í~o é o que for a interpretação I;~,~ ~

jurídica consid~~~f~~~J!lo._m!>ment9 determinante daquela, antes a 1\.'" ,\:interpretação Jurfdica deverá ser o que a realização do direito, compreendida no I ;;, ~ ~seusentiooproble~ático-norm-;tivo e~pecífico, implique que ela deve ser. ~ o ~"que veremos infra. " \~

c) Antes disso, haverá ainda lugar para uma crítica específica à tese da inter-pretação jurídica como interpretação semântica, Assim, diremos que essa tesc ~implica de novo aquele radical (Cplatonismo de regras» a que já nos referimos,quando é cena que as prescrições jurídicas (ou as suas «regras») não operam inter-

pretatív'!.fi.l~~!e!!~~~aliz.açãodo _~.ir~t~.~.~n~_~_~_tr.,~~~.~.d.!a1éC~~~~19~~.:~..:~~ela ~I'\'~:~p~~ífica ~ metodo!?g~.<:~p..:~£~Le~~t~e_~~u.<:l_t!,!~çf!c..~Qr:!ali!Aa.~:.~~~~t.,:ae ~ :o~a realidade problemático-decid~n4~_ (Ç)s.casos, concretos .4~c:l~~n~os)_qt!_~_de \ \~ ~\todo lhes recusa aquele platonismo - dialéctica essa em que, como temos ~ ~~-) '-~ ""~J "i., ".l\ ~ " , ',"

~ '" \\ ~ '1 ~ \i. •••.- ...•.•.••... "-. ~ "'""J: ~ t('-~.....~, f ~~~o ~ ~~ ~', '0'-" ~ 1'\ R. !:" l, ~, ,x__ •

!\. 126

~:'""~ HAsSEMER, etc., se sabe que «a interpretação é o resuhado do seu resultado~, que~ não é ela uma determinação a priori, seja exegética ou analícica, de uma nor-__,i ividade em abmaClO ou em si, mas é pelo co",~no constltulda pela «laça0

~. '" problemático-normativa entre a norma e o caso concreto. ngan o assim a con-~ . "J... duir que a interpretação apenas se consuma na decisão concreta (no concreto juízo

i~.J normativ~e.nte decisório) oeque é o conteúdo normativo-jurídico desse modo." ~ determinado e constiuído - num processo dialéctico análogo ao do ~drculo~ ~ hermenêutico. - que acaba por imputar-se à norma imerpretanda, reconsti-

)~ ~."...." ruindo-a e enriquecendo-a nessa mesma medida. Depois, não menos se reconhece\1 ~ um conlÍnuum entre a «interpretação. e a «integração» - integração que, como.""~, ~ d .~~ ....•. já se isse. se alarga para além do domínio estrito das t1lacunaslt,o domínio das~ ~ 'J omissões intrassistemácicaS, para abranger ainda a autónoma constituição nor-

'f. mativa transistemática. Ponto este que também só se viria a acentuar desde que'{ I. --{.... : HECK começou a chamar a atenção para ele e que é hoje um resultado indis-..~ ~ ~ cutido pelo pensamento metodológico, ao dar~seconta de que o núcleo da nor-~ t ~ mativa realização do direito - e a própria interpretação implicada - é sempre'li ~ _uma dialéctica entre um constituído (o Clitério jurídico fotmalmente pressuposto)~ ~ e um constiruendo (a intenção normativa convocada integrantemente como o con-

~ creto e decisivo critério jurídico). Coostituendo esseque se acentua à medida queo normativo constituído se vai rarefazendo (_cláusulas geraisll, etc.) ou mesmo

""-....~. formalmente desaparece, mas sem que esteja ausente em nenhum tipo da con-~ ~j creta realização do direito. É assim que se pode afirmar, a exprimir um pensa-

~ ~ S~ mento também já comum, que «a interpretação como determinação do sentido........:.t ~ ~ s(cundum kgtm não pode separar-se do desenvolvimento do direitoll (RHlNOW,-l.~~ oh, tit., p. 5), que ~uma diferença d~ princípio entre interpretação extensiva e inte-~. ~ ~ \ g~ação de lacun~ através-da ~n~ogi~ não existe~, que «neste sentido interpreta-~ ~ ~o çao e desenvolVimento do dtretto sao um e o mesmo» (EsSER, Grundsatz und

~ Norm, p, 255 e 259), ere,Daí que os três momentos tradicionalmenOtediscriminados. se logicamentet. distintos em abstracto. sejam na verdade ometodologicamente integrados em

'. ft ~ 'concreto, já qúe todos eles participam, sem solução de continuidade. num\~ ::2 ~ mesmo unitário e decisivamente determinante objectivo problemático-norma-h -f.:::i I tivo: a canecta (materialmente adequada e normativamente justa) realização do~ ~ ~ direito - através dos critérios que ofereça, enquanto e no grau em que os ofe-<:\. ~ h reça, o pressuposto direito positivo.\0 ~1 O que não significa, é evidente. que deixe de haver lugar para diferencia.

~& ções neste todo e intencionalmente unitário âmbito metodo~. Mas já sig.r---.. -..(\ nifica - e é isso o fundamental- que o sentido tradicional da interpretação teráV ""'-..;. de ser essencialmente revisto, pois essasdiferenciações não poderão mais pensar-se

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1292 - Oprobkma actuaJ dJJintaprrtação jurldica

lisadas pela interpretação, seriam inequívocas, identificavam de modo determi-nado e suficiente a sua realidade-objecto de aplicação e a sua aplicação a essa rea-lidade seria aproblemática ou só por elas próprias decidida - i. é, as significa-ções ofereciam-se potencialmente preservadas de ambiguidade. garantidas contraa vaguidade e pré-determinantes da sua própria aplicação. Pelo que conhecê-Iasanaliticamente na sua semântica significação era quanto bastaria para decidirjuridicamente com elas, para que fossem critérios auto-suficientes das decisõesjurídicas.

Simplesmente. tudo isto se vê fundamentalmente POStoem causa se con-siderarmos que o direito (e não s6 no universo jurídico, no próprio plano geraldas significações linguísticas a estrita semântica intencional não satisfaz as con-dições da aplicação real daquelas - cfr. D. BUSSE,WaruI di, &kurung nna G=I-IUSla"'?, in F. MüLLER (Hrsg.), Unrmuehungm zur &ehrs/inguisrik, p. 98 ss.),não pode entender-se como uma pura ideal idade prescritivo-proposicional mani-festada e subsistente numa intencional idade linguístico-sistematicamente .signi-ficante perante um mundo a relevar só no modo como essa significante ideal i-dade o pensa; pois é ele uma normatividade dirigida à realidade histórico-socialtal como esta na sua específica autonomia se constitui e objecriva, e com a fun-ção prática já de impor um padrão regulativo e ordenador a essa realidade aut6-noma, já de oferecer os critérios normativo-jurfdicos de validade, ou de uma válidajusreza normativa, para os problemas sócio-jurídicos que a mesma realidadesuscita no seu dinamismo próprio: o direito como ordtm t 1I0nno d( ordmaçáo( tÚ tÚurmillaçáo e como ortÚm ( 1I0rma d( va/idadt ( dt valoração - sem ter-mos de ponderar agora se esta distinção traduz uma simples dualidade ou ver-dadeiramente uma alternativa (sobre este ponto, v., por todos, K. LARENZ, ~DerReehrssa12ais Bestimmungsatz», in Pat.f Engiseh,p. 150 ss.). E esre último ponto,

9;1~é aquele que te~ a '!.~rmais dire:t~e~~~ co~ as q~j~i'rieto~?~gdico-)uai- I tcativas que con"y_ocama Interpretaçao Jm lca, ogo nos raz compreen er que oprius metodológic:,. não é a norma-prescrição l&h""ãdãõãSüãSignifieaç5õesubsistente na sua ideal idade, mas pelo contrário o caso concreto dro enClõ:IlãSúa ?' .aut6noma e espedlrca PCOblem~iCidadejUr(dica-=-CO~- temõS~i.n-dOã~" ~ ~ruar e rende ase'Jf~oje ~m l~gar.:~m.".rT1:..~" ~Ot rodos FI~l'ITSCHER, M<lho- ~ ~dmd<t R<lh,!, IV.0" 202: .0 ponro de partida é o cas partlculaukçJdendo.; ~ ,R. GROSCHNE~,Dialogik und jurisprudmz. p. 91: 'não o rexco da lei, mas o caso (é o A e O dos JUristas» - e é em função desse caso e para a sua judicativa deci- •são que se interrogam i~te~pretativamenre as normas jurídicas aplicáveis, as .'~normas que possam ser cnténo normativo~jurídico da solução-decisão do mesmo ~caso. Pelo que, interpretar juridicamente essas normas não se traduz na simplesanálise semanticamente determinativa da sua significação abstracto-ideal, visará

9

/

MttotÚJlogia ju,.{áicai' t' -J' ..f~~ ~.~

'i:'~~ ~ ~128 ~ ~~ \ vindo a dizer, se traduz verdadeiramente a interpretação como momento daquela

[realização e em que aquelas prescriçóes vêem afinal constituída a sua significa-ção e o seu sentido juridicameme decisivos. Que o mesmo é dizer que a inter-pretação jurídica exigirá mais do que simplesmente wna análiseda linguagem (aná-lise da linguagem juddico~legislativa). ou que ela não põe apenas um problemalinguístico (l6gico-lingufsdco) - revelando-se assim uma sua concepção tão-sólinguisticameme semântica de codo inviável. .

Na verdade, para que essa concepção fosse viável (cr-se-ia de admitir que alinguagem prescritivo-jurídica (a linguagem das ,regras. jurídicas) possibilitariauma semântica (uma determinação intencional-extencionaI das significações) emque s~cumprissem três condições, a saber: 1) Uma biunivocidade signifjcativo--refere:ncial- em que fossem correlauvamente unívocos o «semido~ (a imensão)e a «significação~ (a referência-extensão) e de tal modo que o conteúdo i~tencio-nal objectivo da prescrição-regra (o seu momemo «e1ocutivo. ou «frásticol) ofe-recesse uma exacta determinação da realidade da sua aplicação (a realidade rele-vante), i. é, esse conteúdo significativo teria uma un(voca exactidão em termosde se poder também dizer que «se compreendo a proposição, então conheço asituação por este representada. (WIITGENSTEIN, Tractatus, 4.021: «A proposiçãoé uma imagem da realidade::se compreendo a proposição, então conheço por elarepresentada.) e a realidade de aplicação ou a realidade relevante teria a sua deter-minação exaeta nesse comeúdo intencional da prescrição-regra: a realidade rele-vante é exactamente determinada e referida pela prescrição-regra e só a realidadeassim determinada e referida é a realidade efectiva e unicamente relevante.2) Um sistema determinado e acabado de significações em que o «mundo» (a glo-bal realidade intencionalmente referida e relevame) se visse, como seu correlatoobjeetivo. exclusiva e rigorosamente represemado - um sistema de significaçõescomo uma acabada «imagem da realidade»ou u~ sistema que perante esta e comosua acabada representação fosse pleno (sem lacunas), consistente (sem equh:,o-cidades e contradições) e fechado (auro-suficiente). 3) Uma aplicabilidadelógico-ideal ou analitico-dedutiva das significações, aplicabilidade essa possibi-litada pelas duas condiçõeS anreriores e a implicar que a realidade da concreta apli-cação seja considerada apenas como fungível representante real (sobre este pontOimponante, mas que aqui não impona desenvolver, v. QUtstão-tÚ-facto - QUtS-riio-fÚ-dirrito, p. 172 ss.) da significação (do se~ 'conteúdo intencionalmente objec-tivo ou conceitual) e assim sem diferença perante ela - ou seja, sem espedficadensidade ontológica ou autonomia problemático-concreta, mas a atender antese apenas nos termos como a significação a concebe e~ro seu cor~elatol6gieo-objectivo. Pois, só cumpridas real ou virtualmente estas três condições,as significações prescritivas, enquanto Ildados» significantes objectivamente ana-

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...•

I

1312 - Oproblnna aaua/ d4 int~rp"tafáo jur/dica

adquire um sentido aetU<11(cfr. supra; e ainda D. BUSSE,War ist dic Rtdcutung rines ,Gcsctustcxtes?, cit., p. 119 's. Em geral e analogamente, P. RICOEUR,O q"" t um .texto?, ensaio incluído no conjunto de ensaios do mesmo Autor, Do texlo àacrão, trad. porto, p. 156) através justamente de uma «competência pragmática(N. CHOMSKY,.Linguagem., in Enc. Ein4udi, 2, p. 14, que diz essa competên- .cia referida «ao conhecimento das situaçóes e do uso adequado (da língua) emconformidade com váriaSfinalidades,) em que a .lJngua> dos signos ou das expres-sóes linguísticas - que, como tal, «não tem relação com a realidade- e cuja meraanálise linguística «remete as palavras para outras palavras na roda sem fil'!1dodicionário» (P..RICOEUR,A função hennen;utica da distanciarão, cal. de ensaioscit., p. 20)'- é substituída pelo .discurso. (no sentido de RICOEUR,AjUnção her-menêutica, cit., p. 111 ss.) ou a argumentação interpretativos. Discurso e argu-mentação que, também como tais, visam o problema concreto e assim a sua rea-lidade com sentido normativo-jurídico. Tudo o que também implica, por umlado, que a interpretação jurídica. como momento da problemático-concretarealização do direito, obtém da significação normativa, convocada como crité-rio do individualizado juízo decisório, um sentido normativo panicular (é estatambém a conclusão que se infere do ensaio de HART, uL'Ascrizione di respon-sabilità e di dirini., in col. Contributi aU'an4lisi dei diritto (rrad. e sei. p.p. V. FRo-SINI, p. 3 ss. - com a inteira concordância de P.RICOEUR,«O modelo do textoj I'a acção sensata considerada como um texto», in col. cit., p. 205, que diz: «Num ;artigo famoso (... ) L A HARTmostra, de modo absolutamente: convincente. que I

o raciocínio jurídico não consiste, de modo nenhum, em aplicar leis gerais a umcaso particular, mas em construir, de cada vez, decisões com referência única»)e. por OUtrOlado, que o sentido normativo imputável à norma-prescrição apli-cável variará sempre, ainda que decerto no quadro e limites práticos definidos pelaratio kgis ou a normativa teleologia da norma, em h.lOção da diversidade doproblemático contexto siruacionalppragmático ou do caso que interprctativo-norp

mativamente o exige. (No mesm,o sentido, e por todos, T. GIZBERT-STUD-iNICKl,ob. Ioc. cits., p. 357: .aos jurisras o sentido de um texto legaLsó''õ-~ferece O-em referência aum determinado caso, real ou p..snsadql.que_sc..1enhade decidir. ~~sim a interpre~Cjão jurídica é sempre: referida a casos (jallbe¥genp.; BUSSE, .1

ob. Ioc. cirs., p. 320; R. CHRlSTENSEN,ob.pt., p. 272: .A significação do !Cxtoda norma sÓse c~~fty.i.n~.acçã~práti~ do~operador jurídico», idem, p. 273 s.,e, em geral, p. 123. nota 62: .não há nenhuma significaçãõencsi .como. úso~geral fora.de uma concreta situação da fala, mas sÓo uso de uma palavra no seio' ~de um determinado jogo linguístico. Só este constitui a significação». Sobre 1fo que seja «jogo linguístico», conceito devido a Wingenstein. v. infra). Pe.loque,1\se isto se:traduz em contínuas «inovações semânticas" pragmaticamente Impos- ~

<.~ ,i1--•

~'t 130 M,,,,J.logia lurlái,a

--t-t.Ji~"antes atingir aquele seu sentido normativ~juddico que lhes permita ser critério I

, t'\..... juridicamente adequado para a solução dos problemas ou dos casos decidendos~, que as solicitam. E se isto significa que a interpretação nesta perspectiva haverá

~ de ser uma resposta (normarivo-juridicamenre adequada. ou com normarivo-jur'-~ '<! ~ dica justeza) à pergunta que a intencionalidade problemática do caso justifica

~ (a pergunta que o problema do caso dirige à norma quanto a saber tan[o da pos-sibilidade como do semido do critério normadvo-jurldico que ela ofereça paraa soluçiio desse mesmo problema), então, por um lado, a pergunta é funçiiosituacionaI ou constitui o seu sentido interroganre em ordem à situação espe~cificamente.~oncre(a do caso decidendo (que a interpretação postula uma per.guma panicular suscitada pelo problema que a convoca e que ela deverá ser res-1>95[3 adequada a essa pergunta numa .fusão de horizont~». do texto e do seuintérprete. é ponto que também a hermenêutica tem por adquirido depois deGADAMER,Wahrhrit und M<thodm, 2.' ed., p. 344 SS., 'esp. p. 351 ss. Pata um.comentário, e portados. R. E. PALMER,Htrmentutica, trad. port., p. 261 ss.) e,por outro lado, a resposta que interpretativamente se deverá obter, e que con-substancia a própria interpretação, ser:!.funçiio pragmática da problematicidadedo caso, do seu concreto c<contextoproblem<iticolt(cfr. U. NEUMANN,Die Kri-tik da juristiJchm Logik, in A KAUFMANNtw.HAsSEMER(Hrsg.), Einfiihrung inRtchtsphilosophit und Rtchmhcoric da Gcgmwart, p. 142; e pata uma particulare mono~áfi~ insistência neste ponto, v. J. SCHMIDT.~:Zur «Be.~~,lJtungltvonRcehtssãrzcn', in Rtchtsstaat und Mcnschmwürde (FcS!.f W. Maihoftr z. 70Gcb.), p. 445 ss. e passirrr,R. HEGENBAJmI,juristiJchc Hcrmcnrutik und linguistischcPragmatik, passim). Ou seja, há-de ter sentido no quadro das expectativas pro-blematicamente pré-compreendidas, e portanto heurísticas, que o caso deter-mina e ofereccrpsecomo solução coerente com essasexpectativas. (Especialmenteimportante para este ponto, J. EssER, Vorvcrstiindnis, eit., p. 133 ss. e passim).£ DeStesentido que a hermenêutica em geral afirma em toda a imerpretação,en uanto histórico-situacionalmente referida, uma ap ficarioe na determinação

e esta confere à expressão cu tur Interpretan a uma articular concretizarão.(Sobre a appficatio como momento caraCter snco da hermenêutica e que, aliás,teria na hermenêutica jurídica a sua «significaçãoexemplar». v. GADAMER,oh. cit.,p. 290 ss.; cfr. T. GIZBERT-STUDNICKJ,.Das Hermeneutische BcwusslSein derJuristen" in Rcchmhcoric, 18 (1987), p. 364;1R. E. PALMER,ob. cit., p. 190 ss.e 245 s. - embora se tenha de reconhecer, pomo também j<iconsiderado, quea realização problemático-concreta do direito poderá exigir mais do que apenasuma «aplicação» e uma «concretizaçáo», nos sentidos qu~ considerados pelanova hermenêutica: v. o nosso estudo A unidAde do sistttna /iJrfdico, p. 41 ss. esupra). E assim a significação potencial da expressão cultural ou Iinguística

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-_.

1332 - OproblnniZ iZctuiZl diZ inurpr~tiZfáo jurldiciZ

danaram o nfvel da ideal idade puramente lingufstica e tiveram de inserir-se, comoelementos expressivo-determinativos de um cri(ério normativo, no problema daconcreta realização do direito. E nesse sentido poder-se-á falar de uma ambi-guidade essencial nas abstractas significações jurfdicas. .

A primeira condição não se verifica, pois. porque a relação entre a signifi-cação e a realidade da aplicação (a realidade dos casos jurfdicos decidendos) não'acma na vertical de uma unidimensional determinação lógica desta por aquela.mas se constitui numa dialéctica pragmática em que os dois pólos, com as suasrespectivas e específicas autonomias, correlativam~nte se codeterminam no qua. '.dro do tertium comparationis de um concreto problema decidendo.

Resultado este que em nada se altera com a convocação complemen~ar do«querjdo», uma vez que aquilo que porventura assim se ganhe em determinaçãosignificativa da prescrição abstracta (tal como também acontece mediante as defi-nições legais) não exclui decerro os problemas da relação entre essa significaçãocomplementarmente mais determinada e a intencional idade problemático-nor-mativa que particular e pragmaticamente é exigida pela adequada decisão do casoconcreto - é desta relação que surgem os problemas e não ficam eles elimina-dos ao nível da significação abstracta ou com uma maior determinação desta sóa esse nível.

E igualmente se não cumpre a segunda condição - e por razões análogas.Assim, é decerto pensável tanto a prescrição legislativa como a construção dou-trinai de um sistema dogmático de significações que axiomaticamenre (sobreo sentido de uma axiomática construída para o sistema jurídico, os limites da pos-sibilidade e mesmo a inadequação dessa construção. pontos de que aqui pode-mos abstrair. v.• por todos, K. ENGlSCH, AuJiabm eina Logik lmd M~todik d<sJuris-tich~nD~nk~m e Siml mld Tragwúu juristisclur Systematik. ambos os ensaios 'inBtitriig~ zur Rtchtstluorie. p. 5 ss. e 88 55., respectivamente; U. NEUMANN. For-malisünmg und Axiomatisimmg von R~chtssiitzal, in A. KAUFMANN/W HASSE-

MER (Hrsg.), Einfii!mmg, cit., p. 136 ss.; EIKE V. SAVlGNY,Z"r RolI, da d,duk-tiv~-axiomatischnl M~fhodt il1da RahtswiSJtllSChaft. in G. JAUR!W. MAlHOFER.

Rrchtsth~orü, p. 315 ss.) lograsse uma lógica completude e exactiJão e medianteo qual a referência a um «mundo., como o correcm objectivo d.:l sua intencio-nalidade, fosse inequivocamente determi[~ada. Só que eSS:l .:lxiomárico-dogmá-tica exactidão e essa referencial determinaçã~ só seriam possíveis na imanênciado sistema ou na sua aura-subsistente ideal idade - por outras palavras, enquantonos mantivessemos nas relações internas. estruturais e significativas, do própriosistema - onde inclusivamenre «interpretação» significaria, tal como nos siste-mas simbolicamente formais. «explicação. sis(emática, i. é, a conversão semân-tica das significações particulares aos f.'1ctores da construção do sistema e com que

V:: "'i ~~~~it""132 . M"odo"'gioJuridico

~ ~ I' \ tas, obriga igualmente a concluir que sempre «o direito é hermeneuticamenrc"\ ~ { aberto» (O. WEINBERGER, «Logische Analyse ais Basis der jurisrÍschen Argu-

roem,aion», in Metath~ori~ juristisch(T Argummtation. Hift 108. dLJRuhtsthai~.p. 229) ou de uma «open tCJ(tur~. que as expressões das prescrições jurídicas não

Itêffi um sentido único e fixo, pois admitem sempre sentidos comextual--pragmacicamenrc diferentes e lhes é assim cooatural e i~eliminável uma virrualambiguidade. E nada podem umtra esta conclusão as definiçócs legais, porquanto,à parte os limites de eficácia que se lhes terão de reconhecer e sejam ou não elasjuridicamente vinculantes - sobre estas duas questões, v. G. TARELLO, L'jnur-p"tazion"MId kgg', p. 155 ss. e 157 ss., respectivamente-, as definiçócs legaiss6 operam ao nível da «língua» prescritivamente expressiva e na imanência do seusistema lingufstico significante e não podem. por isso. excluir tudo a que nos refe-rimos e que resulta da relação normativamente pragmática com a realidadeproblemática do caso concreto decidendo. A definição só logrará conferir umasignificação mais precisa ou uma pretensa univocidade aos signos expressivos nolingu!stico «(contexto de significação •• mas não poderá com isso eliminar osproblemas específicos da jurídica realização concreta ou os problemas de cons-titutiva concretização postos pdo «contexto de aplicação •. Pelo que às definiçõeslegais se haverá de reconhecer. quando muito. um valor heurístico na sua tenta-tiva de limitarem as possibilidades interpretativas, posto não sejam verdadeira-mente outra coisa do que a tal conversão de «palavras na ro~a .sem fim da lin-guagem_ com recurso à sinonimia ou à paráfrase. Exemplos a confirmarem todasestas conclusões. oferece-no-los decerto a prática diária da interpretação jurídicanas concretas decisões judicativas, mas não deixaremos de invOCar dois exemplosparadigmáticos. aliás sempre referidos e que se tornaram por isso exemplos clás-sicos e de escola: seja o primeiro a compreensão na jurisprudência superioralemã do sentido normativo da expressão «coisa» (no tipo legal do crime de furto),em termos de abranger também a energia eléctrica; e o segundo o sentido nor-mativo de ((cão» nas proibições de acesso de animais prescritas por um regulamentoadministrativo de um caminho de ferro, de modo a atingir igualmente um urso

\\ de que alguém se fizesse acompanhar (v. L. RECASENSSICHES,Nuroa filosofia d,'\ la int~rprnation d~l da~cho, 2.a ed., p. 165 ss. - não deIXando de notar que osentido tradicional da «interpretação extensivall não permitiria este resultado; cfr.,

\aliás, o art. 9.°, /l.0 2, do Código Civil). Esras imputações de sentido, decertoteleológico-pragmaticamente válidas em referência às respectivas situações pro-blemáticas, nunca poderiam ser obtidas analiticame~ antes seriam lingu!s-tico-analiticamente recusadas; assim como as prescritivas expressões em causa, queanaliticamente (directa ou definitoriamente) se poderiam porventura ter por un!-vocas, logo se revelaram plurissignificativas (e como tal ambíguas) quando ab-an-

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• 134 2 - O probkrna adU4/ d4 intn-putaçáo jurúiica 135

de tlcalculalt. Pois considerada a relação externa do sistema com a realidadehistórico-social - com o mundo real que o sistema visa regulativarneme e pre-tende ordenar, mas que se afirma na sua própria auwnomia constitutiva. evO-

lutiva e problemárica. posto que o direito também dele faça parte como e1emenwque é da üb,mwa, - logo se dá conta de que se trata ai da rdação entreuma idealidade autodefinícla. finita e conclusa e uma realidade dinâmica, plu~ridimensional e de contínua novidade. E sendo por isso esta realidade (rea.lidade-objeeto do sistema) sempre mais complexa (nas suas dimensões e ele-mentos constitutivos e na conexão cntrc eles), diferente (no modo concretode manifestação ou objectivação e de especificação) e nova (na sua dinâmica ehistoricidade humano-social) relativamente às possibilidades 16gico-referenciaisdo sistema, o resultado é uma irredutível assimetria entre as significações ofe-recidas por este, como quer que analiticamente se explicite, se os sentidosadequados e essa mais complexa, diferente e nova realidade. Também aqui oque seja. possivelmente exac[O e determinado ao nível do sistemático tlcon-texto de significação. revelar-se-á insuficiente (equívoco e indeterminado) aonível do «contexto de aplicação.: em consequência da assimetria referida, as sig-nificações exaaas e determinadas na imanência ideal-significativa do sistema mos-tram-se sempre, perante as significações exigidas com adequada justeza peladiferente realidade a regular e a ordenar, como significações incompletas (quantoao conteúdo referencial), insuficientes (quanto à densidade intencional) e imper-feitas (quanto à adequação concreta) - em sentido convergente, U. NEUMANN,

R~chtsontologüund juristische Argummtation, p. 72 s.; V. KNAPP, «Auslegung imRecht., in A.R.S.?. 1988 (LXXN/Heft 2). p. 148. A!; possíveis exaetidão, deter-minação e plenitude ideais volvem-se em inacabamemo, indeterminação e aber-[Ura reais. Por isso mesmo são as normas legais, consideradas na sua significa-ção normativa abstracta, também sempre abertas e limitadas, indeterminadase lacur:aosasperante as exigências significativo-normativas da concreta realizaçãodo direito - v. a nossa Qu~stão-d~-facto- QU(stão-d~-dir~ito, p. 214-219;A.. KAUFMANN, «Recht und Gerechtigkeit in schematischer Darstellung., inEinfiihrung. cit., p. 292.

E assim, se pelo fracasso da primeira condição vimos o aparecimento dumacom~ que essencial ambiguidade nas significações das normas-prescrições jurí-dicas - os seus sentidos nunca são unívocos. mas variáveis em função proble-mático-sit.uacional e pragmática -, pelo fracasso tam¥\!t da segunda condiçãpreconhecemos que a essas significações normativo-pre;cr1Nvas não lhes é menos,essencial uma caraaedstica vaguidade - a realidade ou os casos concretos da suaaplicação não se vêem nelas perfeitamente determinados e plenamente identifi-cados e representados.

Estas conclusões que têm simplesmente como pressuposto, já aludido edecerto irrecusável, a função prático-judicativa do direito e assim a sua intençãonormativa relativamente à realidade hist6rico-socia!- a matriz dos casos jurí-dicos decidendos, que se constitui e evolui com auronomia perante o sistema dasprescrições legais e as suas significaçóes linguísticas - são a base suficiente paracompreendermos que a procura e a determinação do sentido das normas pres-crições-jurídicas para o cumprimento daquela função prático-normativa dodireito, em. adequação problemático-decisória ou pragmá~ica, exige uma pani-cular actividade de contínua recom reensão e reelabora -o do sentido das nor-n~~J!!!õiÇriçóc:s.que-sej:Husc.c:ptfyeld<:.Y<Jlcer..aqud:uljferenentre a si ni .cação.linguístico-semanticamente ideal e o sent~áriÇQ-normativamente a e-~quado- Isto, repita-se, no quadro também da diferença entcc.os ~objectos~inten-cionalmente referidos pelo sistema dogmático-ideal das significaçóes linguísticase a realidade objectiva dos casos concretos decidendos, com o seu panicular con-texto situaciona! e pragmático. Exigível actividade essa que é justamente onúcleo metodol6gico da interpretação jurídica. Com o que sem mais tambémreconhecemos que esta interpretação não tem uma índole analítica e sim umaíndole sintética (sobre este juízo sintético e os problemas lógicos e metodológi-cos que suscita, v. os desenvolvimentos oferecidos na nossa Qu~stão-tÚ-facto"":"'"Qu(stáo-d~-direito, p. 156 ss.): os seus juizos não são puramente análises semân-ticas de U(i1asignificação segundo o principio da identidade e da contradição16gicas, mas sínteses superadoras daquelas diferenças e em que se visa umaassimilação normativo-pragmaticamente adequada - o que faz com que ainterpretação jurídica se revele verdadeiramente como «acontecimento" (nosentido de RJCOEUR, A Jünção h~nn~n;utica da distanciação, cir., p. 1II s.; cfr.E. ORHGUES, «lnterpretação», in Enc. Einaudi, li, p. 220: «(Diremos que inter-pretar é compreender, reformulando ou re-exprimindo sob uma forma nova; aInterpretação consiste em mostrar algo: ela vai do abstracto ao 'ooerem d~!JlUlaà respectiva aplicação, à sua inserção na vida)!). Qual seja o fundamentodesses juízos normativo-jurídicos Sintéticos - a analogia, como quer A. KAUF-

MANN, certas «regrasoperatórias» e metodologicamente específicas, uma judicativaracionalidade normativa autoconstitutiva da fundamentação -, não importa agora

. considerar. Importante é concluir que dado O caclcrer sintético, situacional-con-'cretamente variável e sempre constitutivamente retomado da interpretação jurí-dica e en uanto é ela com essas características momento indispensável da con-~_reta realização do direito, também esta realização se nao po e pensar em termosde ser pré-determinada, através de uma mera ap íêãbiliàãae anãIluco-dedutlva,pelas signific~çÕe_spresc-ri~ivas_~n_a!ítico~~ste.!!1~tica!!1enreaehnldas. O quenão exclui que ela possa orientar-se concretamente por modelos jurídicos de sín-

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•• 136 M~todologiaJurldüa 2 - O problmuz actual da inl"/'utação jurldica 137

tese abstraem-concreta, p. ex., os modelos em que se traduzam os .<tipos»jurf- /dico-normativos através de uma comparação decisória (v. R. ZIPPElIUS •• DerTypengeich aIs Instrumenr der Gesetzesauslegung., in R(Chtslh~orieals Grund-"'gmwissmsehaji da /?£ehsswisml1ehaji ljahrbueh f /?£chtssozio!cgische,/?£eh",hco-ric,U). p. 482 ss.; ID.•jurotischc Methodmlchrc, 4.' ed., p. 65 ss.}ou determinar-sepela sua prática anterior. pelo «uso»experimentado e estabilizado que ofereçam osprecedenres (cfr. BUSSE, ob. !cc. cit., p. 315) - nesse senrido se podem ler estesenunciados de WITTGENSTEIN: •.Seguir uma regra, fazer uma comunicação.dar uma ordem. jogar uma partida de xadrez. são costumes (usos, instituições)-- Phil Unt.,0..0 199-,"OI"seguir uma regra' é uma praxis» - ihid, 0.° 202-,dado que.o semido de uma palavra.é o seu uso na linguagem» - ihid.. n.O43.Ou seja, a terceira condição revela-se igualmente inviável.

Estas conclusões negativas não poderão todavia considerar-se definitivas semponderarmos ainda a importância que possam ter, para uma sua possível revisão,dois pontos significativos da teoria analítico-linguística da interpretação jurídicae que vimos por ela particularmente acentuados. Referimo.nos à convocação dalinguagem comum ou ordinária como metalinguagem para a linguagem jurídicacomo linguagem-objeao - e enquanto considerada aquela uma instância de COll-

trôksusceptfvel de suprir ou anular as «ambiguidadeslt de «penumbralt desta-e igualmente ao relevo que a uma correcta ((teoria da vaguidade» poderá reco-nhecer-se para circunscrever e mesmo eliminar em parte as possíveis vaguidadesda linguagem jurídica.

A chamada da metalinguagem constituída pela linguagem comum assentadecerto no princípio. e segundo os termos que vimos, de que (a linguagem ordi-nária é a metalinguagem últimalt U. HA8ER~, Logicadelk sdmu soda li, trad.it., p. 206), e de que assim todas as linguagens paniculares se alimentarão e depen-derão dela, pelo que sempre se legitimaria a sua consideração como última ins-tância para qualquer linguagem particular, sem excluir a jurídica. Teria mesmopara esta uma dupla valência: ao mesmo tempo que preci~aria a significação dassuas expressócs (recorde-se o exemplo anterior da expressão ((órgão importante»),permitiria ainda a obtenção de premissas complementares e intermédias para aaplicação analítico-dedutiva dessas significações jurídicas (de que a referência a«rim»como determinação de «(órgãoimponantell é também exemplo) - i. é, paraaproximar aquelas significações, através de elos significanrememe mais precisose determinados obtidos analiticameme, dos casos ~a aplicação - lograndoassim, com esta cadeia dedutiva da aplicação, tambédt aquela fundamentaçãológico-dedutiva das decisóes jurídicas que seria exigida pelo princípio da vin-culação à lei. Só que quanto a este último pomo logo se terá de denunciar umerro capital: é que, como compreendemos atrás, a realidade dos casos deciden-

dos não é um pólo passivo. a simples realidade verificada das representações sig-nificativo-conceituais das normas-prescrições e desse modo por essas represen~eaçóesde todo detenninada, mas diferentemente um pólo dinâmico. de autonomiaconstiruciva e code(erminante na dialéctica que a interpretação jurídica é chamadaa actuar na problemático-concreta realização do direito - pelo que de novo sereconhecerá que esta realização não é redutível a um esquema lógico-dedutivo.E quanto à instância mecalinguística da linguagem ordinária que seria susceptí-vel de superar, relativamente à linguagem jurídica, as suas ambiguidades e de deter.minar a sua penumbra significativa, os resultados eambém não s~omelhores. Paratanto seriam necessários cais pressupostos que também de todo se não verificam.Em primeiro lugar, a linguagem comum haveria de realizar um sistema linguís-tico de todo pré-dado (completo, fechado e invariável), que tanto é dizer perfeitoe sem equivocidades; e, em segundo lugar, devia impor~se às linguagens parti-culares, especializadasou não, numa relação hierárquica (fosseontológica ou lógict)de superior para inferior. Só pelo primeiro pressuposco, com efeito, as ambi-guidades e indeterminações das linguagens particulares poderiam encontrar umcricério de superação na inequivocidade e determinação da linguagem comum;e desde que, agora pelo segundo pressuposto, esta linguagem se impusesse direc-tamente àquelas linguagens particulares como uma determinativa instância de COll-

trók. Ora, nem a linguagem comum se nos oferece nesses termos perfeitos e con-clusos, nem tem ela perante as linguagens particulares qual~uer preponderânciahierárquica que a imponha como essa instância de contrôk. É que a linguagemcomum não' é «somente linguagem, mas simultaneamenre ainda prllXi.Pl O. HABER-MAS,ob. cit., p. 2065.), e então campo e estrutura da comunicação prática emque continuamente se vê reconstruída pela dialéctiea da «língua» (languog~)I «fala.»(parok) ou de ucompetência linguística» I ((perfomumct'» - como se sabe, deve-sea primeira distinção a SAUSSUREe a segunda a CHOMSKY;sobre elas, e respecti.vamente, v. G. LEI'SCHY,Língualfala, e J. SrUMF,«Competência/performance»,in Enc. Einaudi, 2, p. 71 ss. e 57 ss. Não que, ao recusar-se assim a essas diver-sas linguagens o carácter de fenómenos puramente natúrais e de absoluta indis-ponibilidade. se tenha de aceitar a tese contrária que as tivesse por meros arte-factos ou arbitrários instrumentos dos locutores numa concraposição de naturalvs. artificial, ou de objectivo vs. subjectivo, pois.devem considerar-se antes como«fenómenos de um terceiro tip0lt: como estrutura antecipada, mas comu-nicacivo-praticamente reconstituívei (com algum paralelo na económico-social((mão invisível» de A. SCHMIDT?- cfr. R. CHR1STENSEN,ob. dt., p. 123 s.e 273 ss.). E tanto basta para reconhecermos a possibilidade de essa reconstru-ção ser variável e especificante consoante as diferenças de contexcos e práticascomunicativas - aliás, diferenças decerto particularmente acentuadas quamo a

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Por sua va., uma «teoria da vaguidadelt só lograria o seu objectivo se a dis-tinção entre as três categorias em causa - candidatos positivos, candidatosnegativos, candidatos neutros - fosse, por um lado, fixa e inequívoca e, por ourrolado, tivesse um valor puramente semântico ou aquelas categorias se discrimi-nassem por regras exclusivamente linguísticas. E nem uma coisa. nem outra severificam. A distinção não é fixa e inequívoca, porque ela não pode invocar umfundamento materialmente ontológico que de modo necessário a sustente - onto-logicarnenre, como observa U. NWMANN (ob. cit, p. 76), só poderá pensar-seem duas categorias. a positiva e a negativa, correspondente à existência ou à nãoexistência dos objecros referenciados, segundo o princípio do terceiro excluído,jáque um ente ontologicamente indeterminado é contraditório e inadmiss'vel- nem tem um sentido exclusivamente linguístico, porque não traduz uma estritadiferenciação lógica ou de puro ser ideal. uma va. que aquelas suas categorias nãoexprimem uma referência simplesmente intencional ou uma «referência opaca»(QUINE) - i. é, uma referência que a sua intencional idade por si mesma cons-titua -' e se propõem antes uma referência real (dirigida a seres ou objectos expe-rimentalmeme existentes e reais). Aquelas categorias por que se enuncia a dis-tinção não são verdadeiramente outra coisa do que qualificações ou designaçõeslinguísticoptipológicas com o objectivo de ordenarem, através de limites logica-mente definidos e correlativos, uma experiência que em si se revela num comi-mmm sem fronteiras rigorosas - como se infere já de se ter de reconhecer, mesmoconceitualmenre, uma zona difusa e indecidida entre dois pólos fixos, a zona doscandidatos neutrais. Mas então aquela distinção semântico-conceitual postaperame esta experiência, se não se revela desde logo contraditória - como aentende U. NEUMANN, ob. cit., p. 70, nestes termos: «A afirmação de limites rigo-rosos emre candidatos neurrais e positivos deve coerentemente ser compreendidade modo que para qualquer objecro possa ser decidido se ele é um candidato posi-tivo, um candidato neurral ou 'um candidato negativo da expressão. Dado, porém.que aS classes dos candidatos positivos, neurrais e negativos se excluem (. .. ), adeterminação de que um objecto é um candidato neurral implica a determina~ção de que ele não e um candidato positivo. Se se afirma todavia que ele não éum candidato positivo, não pode ser ele um candidato neutral; pois então podiaser decidido sobre a não aplicação da expressão quanto a ele, enquanto os candi-datos neurrais são precisamente caracterizados pelo facto de que quanto a eles nãopode ser decidido sobre a aplicação ou a não aplicação do conceito. A afirma-ção de um limite rigoroso entre o domínio dos candidatos neurrais é portanto(... ) coruradicórialt - de todo o modo a não pode substituir ou anular, já queo valor da dis[Ínção é apenas lógico-linguístico e a experiência problemática nãose esgota nem se reduz a essa logicidade, na sua específica autonomia relativamente

-, ' I'J ~~

:-~'4) ,~ •• ~ ~ 138 M<todologioJurldico

':t: ~~ campos especializados -, dando assim lugar a linguagens diversas ou a diversos~ \\ ~~~ «!ogos de ling~agem» (no semido com que Wr:rGENSTEIN cunho~ c:sta expres-~~ l~sao: .Chamarel, também ao (Odo formado pela lInguagem com as aalVldades com\J' I) as quais ela esrá entrelaçada o 'jogo da lingu~' - PhiL Unt, n,O7)'que se espe-

. ~ ahcam e dilerenaam entre SI numa horizontal incomensurabilidade (cfr. R CHR15-TENSEN,ob. cir., p. 86 ss.; T. G1ZBERT-SruONICKI,ob. /oe, cits" p, 361) e aindaque a denorarem porventura algum <ar de fãmflia. (WrrrGENSTEIN), E mesmoque se não queira ir tão longe e se aceite que a linguagem ordinária é o campocomum de «USOSlflingufsticos diversos ou particulares em que. não obstante, sehaverá de respeitar as estruturas da linguagem ordinária, sempre se terá de admkrir que há «usosespeciaislfdessa linguagem ordinária. E que, ponanro, negando-seembora que haja uma totalmente diferenáada «linguagem jurídiOJt {v.,neste sen-rido, A. LorEZ MORENO, <Filosofia dei lenguage. Implicaciones para la filo-sofia dei derecho., in Anaú, de Dmeho, Rev, de la Fac. de Derecho, Univ.de Murcia, 10 (1987-1990), p. 89 ss.; cfr. U. NWMANN, Reehrsonr%gi', cit.,p. 49 5.), não pode deixar de reconhecer-se, não s6 que o «uso jurídico da lin-guagem ordinária» se «orienta autonomamente por critérios histórico-sociais_. £1.10-cionalmente institucionais e normativameme tdeológicos que não têm corres-pondência na linguagem ordinária - critérios pelos quais apenas, eespecificamente, a linguagem jurídica pode ser controlada -. como ainda que.já por isso. esta linguagem jurfdica se vê imunizada de uma crIcia que se fun-damente simplesmente nas regras da linguagem ordinária (efr. NEUMANN, ibid .•p. 50). Ou seja. as especificações funcionais ou resultantes dos diversos usos dalinguagem não podem deixar de implicar qu~ as significações resultantes para osâmbitos correspondentes serão unicamente aquelas consentidas pelas perspecti-vas e usos respectivamente especificantes (tendo em conta a distinção, enunciadapor RAOBRUCH, R~chtsphilosophi~,4.1 ed., p. 219, entre conui~osjurídicos, con~ceitos autonomamente constituídos pelo direito, e conceitos juridicam~n/( r~k~vant~s, conceitos adaptados ou «naturalizadoslt pelo direiro mas originários deoutros domínios não jurídicos, deceno quo o que vem de dizer-se não deixa deaplicarpse mesmo a este segundo tipo de conceitos - dada a sua reconstrução oureconversão normativo-te1eológica -, posto que mais fortemente ainda aosconceitos do primeiro tipo) e que, portanto, no âmbito da ~pecífica função ouuso jurídicos não tem sentido tentar a prépdeterminação de significações jurídi-cas numa perspectiva de significação não jurídica (assf1i\ e voltando ao mesmoexemplo, um rim será um «órgão imponamelt do corpo hUJrlano,não porque dessemodo seja referido pela linguagem ordinária ou pelas concepções que ela veicula,mas porque a normativa teleologia do tipo legal de crime implica juridicam~n/(essa conclusão).

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2 - Oproblnna 4awz/ da int"1'r~tafá() jurúlica 139

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140 MnodoÚJgia Jurldiea 2 - OprobkmA actua/ da inurpr~/a(iio jurldica 141

a ela. Daí que os dois limites dos conceitos vagos ou indeterminados possamporventura definir-se ou serem determinados lógico-linguisticameme e revela-rem-se, não obstante, material ou experimentalmente indeterminados - ou seja.os dois limites referenciais dos conceitos indeterminados acabam por ser tambémdes sempre indeterminados. Por exemplo. a significaçãoda expressão«noite» podeanalisar-se semântico-conceitualmente em termos de se dizerem as caracrerísti.ClS que inequivocamente lhe corresponclem (as característicasdos candidatos posi-tivos) e correlativamente as características que inequivocamente não lhe corres-pondem por correspondere'ffi já à expressão «dia» (as característicasdos candidatosnegativos) e reconhecer-se ainda emre esse positivo e essenegativo uma zona quese subtrai à inequivocidade qualificativa (a zona da «penumbra,. ou do crepús-culo e própria dos candidatos neutr.Us),mas que não serámenos inequivocamentedemarcada pelos limites lógicos (definitórios) de «dia» e de Ilnoite». Só que narealidade da experiência o dia liga-se à noite sem solução de continuidade atra-vés da mediação indeterminada do crepúsculo - um certo acontecimento veri~ficado, já no início crepuscular, já no início da noite, passou-se de dia ou ao cre-púsculo, passou~seao crepúsculo ou de noite? As distinções são conceitualmentedeterminadas, mas os limites entre dia e crepúsculo e entre crepúsculo e noite sãoexperimentalmente difusos ou indeterminados - isto mesmo já sustentavatambém W. J ELUNEK, G~utz. C(5~tzanwtlJdung und Zuukmiis5igk~iturwiiguTlg,p. 37 s., ao afirmar exprCiSamente: tcO conceito indeterminado tem dois limitesconsuntes, mas também a condição destes limites é por sua vez indetermi-nada», embora apoiando-se num exemplo não inteiramente concludente, comoo mostram as interpretações contrárias que permitiu: cfr.KOCH, ••Der unbestimmtcRechtsbegriffim Verwaltungsrecht)l, in Juri5túch~M(thodmlehu und mJlllytisch(PhiÚJsophi<,p. 201; e U. NEUMANN,ob. cit., p. 74 s. Logo, a resposta à questãode saber se. p. ex., um furto foi ou não praticado de (moite»para efeitos da apli-cação do art. 297.°, n.O2, alínea c), do Código Penal, mas que se tenha realmenteverificado no período crepuscular, do fim do dia ou do anoitecer, não pode dar~sepor mera subsunção positiva ou negativa àquele conceito - i. é, tendo apenasem coma os limites semânticos e lógico-linguísticos por ele fixados-, exige umjuízo juridicamente espedfica que só o sentido normativo-penal do tipo legal decrime e a sua"particular te1eologia podem fundamentar. O mesmo é dizer queesse problema interprctativo não se resolve linguisticamente, postula antes cri-térios jurídicos mera-linguísticos. "\

Além de que - nota esta dccerto não menos import:fute - as próprias sig-nificações e conceirualizações lógico-juridicamente definidas, sc podem por~ventura estabilizar-se dogmática ou jurisprudencialmente (no «USOltda sua rea-lização). nunca são todavia definitivas, mas a todo o tempo revisíveise alteráveis

Ipela mesma prática jurídico-àecisória. E assim o que haveria de ter numa rigo-rosa ~ lógico-significativa «teoria da vaguidadelt um scu critério pré-determinanterevela-se um factor não menos codeterminanre desse possível critério, ~ mesmoa última instância de constituição do seu sentido normativo. Basta ter presenteque os limites entre as três categorias que estamos a considerar, posto que esta-bilizados dogmaricamente, não poderão subtrair-se como que à experimentaçãode novos «contextos de"aplicação» - ou"~ funcionalidade normativa implicadanas diversas situações problemáticas e nas correlativas diferentes intencional ida-des pragmáticas próprias desses novos contextos de aplicação. Aquilo que numcaso parece de imputar inequivocameme ao campo dos candidatos positivos poderánoutro caso, numa nova situação I)ormativo-juridicameme problemática, susci~tar dúvidas que imponham o alargar do campo dos candidatos positivos, trans-formando assim a qualificação certa em vaguidade. Pense~se,p. ex., na catego-ria semântico-conceitual de «filho», quer no art. 877.°, n.O I, do Código Civil,reiativame'nte a uma situação decisória em que seja sujeito um adoptado, querno art. 137.° do Código Penal, relativamente a um recém-nascido que seja pro-duto de um óvulo de A mas gerado na «mãe hospedeiralt B e que aquela ou estatenham matado. Se essas significações conceituais são em geral de uma semân-tica inequívoca, nestas hip6teses são decerto «vagas)l- pois se a solução na pri.meira hip6tese não será difícil, porventura mediante uma extensão teleológica oucom fundamento na analogia. e na segunda hip6tese através de uma interpreta~ção que convoque decisivamente, e sem ter sequer de ultrapassar o âmbito tra-dicionaI da interpretação extensiva, o sentido normativo~teleológico do tipo, ocerto é que os prindpios e regras, tão-só analítico-linguísticos não impedem a aber-tura de uma vaguidade que apenas fundamentos e critérios especificamemejurídicos podem vencer. Ou seja, um sistema "anaHtico-linguisticamente ((está-vel)l revela-se jurídico~pragmaticamente sempre «instável. (sobre o conceito de.sistema i'nstável., v. J.-F. LYOTARD,A condirão pós-modana, "ad. porr., p. 17).Isto por um lado; por outro lado e radicalizando o que acaba"dedizer-se, a «poro-sidade!>estará continuamente a subverter a possível determinação delimirativa entreas três categorias, já que não. podem excluir-se, não s6 experiências ou casos pro-blemático-normativos imprevistos - de que as hip6teses anteriores podemtambém ser exemplo. bem como todos os casos paralelos que exijam soluções já deredução teleológica e de extensão te1eológica, já de imerpretação correctiva _,como novas intenções normativas (desde logo, pela assunção de novos valores oude noVOSprincípios jurídicos) que obriguem a rever o próprio sentido normati-va.mente constitutivo da intencional idade significativa c:referencial dessas cate.gorias. E já se sabe que eontra a porosidade não há remédio (remédio analíticolingufstico e lógico-conceitual).

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2 - Oprobkm4 aetu4/ da intrrpu!açiÚJ jurldicaf'

143 \' ~"-\~ '\

I. d. . ó . \:1: \Itam, con IClonam ou sustentam a pr pna interpretação. No sistema jUrldiCO("" ~~ã~ fundarn~~tos, como veremos, os prin~ípios e são critérios as normas (legais, ~ ~.}unsprudenaals) ou os precedentes. E pantwlarmente nos «sistemasde legislação», ~ . \ •como os nossos, decerto que os critérios são, antes demais, as normas le~is Por- -::-:...."'"0-' ("'lo ,

que só elas (e não. p. ex.• os prindpios) podem desempenhar a função meródica ~ 'd 'é. • fa c ' I ~ "e cr~t n.o e ~rque tem. a seu vor a IOrçaVlncu ante de autoridad~ (amoridade ~ít.polítiCO-JurídIca) - v. mfra. Dal que se possa dizer que as normas legais cons- \7tituem o «núcleo duro» desses sistemas.

b) Só que a perspeaiva. ou o horizonte problemático e pragmático em fun-ção do qual se pergunta interpretativamenre, se constitui a inrencionalidade queorientará esseperguntar, não define 56 por si o obj«tpda pergJ1nra O ohjeçm inter.~gado segundo aquela perspectiva - um problema é sempre o interrogar algo.com fundamento na perspectiva'" algo. a algo (HElDEGGER;HRUSCHI>al...Daía questão: qual o 06j~çtorigorosamente da inrer~~ªçªQ. solicitada pelo ~a realizar se~un~o a intencio'~ãlidade p~Q.bl~~á~çª-qu~~J~~1!~itu~.? ~ . ~

Um pnmelro ponto é eVidente. ~e os cnténos em sistemas jurídicos como ~ '<... ~

J

OS nossos são as normas, decerto que são estaL.QJID,edJatCLObj~Ç.tQ..JD!ÇIpJ't-~ ~t.•n~~Nã." _qu!!qll~!..ma •.mas a 'norma aplicável. - 9!!!,giiCLe.s.Ja..a_.!~.~ta.r ~ ~1.'!/iEI..J10 .modelo met~d<?!~gl~O. ~~rém, a este_Eon~CL~çg~e.:~e_!1moutro j~ :\.~peno.s.:.vldent.~:_norma (nor~~~.pl,cávcl), mas ~"!..que t~!!...~_~n.~!9-Q3:r I 't~'exactamente como? __... \ ..•• ,'"'' ..••..• 1 f 'l;

Vimos a resposta que o modelo tradicional dava a esta questão do objecto I . ~- ~

da interpretação - o objecto da interpretação seria o texto da norma jurídica, .\'1E vim~s ~am~ém ~orque essa ~es~osta não pode :nanter-se: o problema da inter- • ~pretaçao }uricücanao é hermeneunco, mas normativo, Dai que o objecro em causa t

há-de ser correlativo a esta índole do problema, sendo certo que o problema intc:~- 1pretativo vai implicado pela natureza pritico-normativa do caso a resolver com Iapoio na solução desse problema. Por Outras.p.a:tavras,o object~ normativoimer- Ipretando não poderá ser um objecro.meramente significante, mas um obiecro sus- I~pdvel de oferecer lun~ério normatiyo para a solygQJ!J.9.i.çativado caso d_~j-dendo.--E então o objecro da interpretação não seri o texto das norm_asj~~!dicas,\enquanto a expre~s~o ou o 'º-'1'usde uma signifif3çª-º_?- eO~PJeender e a ana!i- \ r~sar, mas a normatlvldade ~u~ ess::snormas, como critérios jurídicos,_ constituem ~e possam oferecer: Se dlStlngUlrmos na norma a sua expressão significante ~(dimensão fenomenológica e CUlruCãIjdã sua normatividade (dimensão intencional ~~ ~ejurídica) e que a faz ser nOT7'fUl. podemos ~~~que a interp'reração jurl<lE:anão ~ ~ s.visa a expressão da norma, mas a nonna da norma- não ~a~pressão (tex,to) \'~ ,~q.':e tem uma significação, mas a sua ~0E..1!::...~c: tem. um seE.!.i.9~?especificamente't ,r-- '.•

3) A interpretação jurídica como momento da concreta e problemá-tico-decisória realização do dit.,;to •

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o uc:vai dito é suficiente ara termos, na verdade, de conduir globalmenteque a interpretação semântica, ou simplesmente anaHtico~linguística, não po eresolver o problema da interpretação e da aplicação jurídicas - esta imerpreta-cão e a metodológica realização do direito que a convoca não são apenas um pro--blema lingüístico. mas de outra natureza e a exigir outro tipo de: SQlu~Aca~bando por reconhecer igualmente a verdade desta conclusão, v. H. L A. HART,lntroduetion a Essays.cit., p. 17 5.: «In facr, as I carne later to sec:and to say inEssay 4. the question whether a rule applies or does not apply to some parti-cular situarian af faet is Dot the same as me question whcther according to chesellled conventions oflanguage this is determined or left open by the words of .that ruIe.; cfr. també;;'W. HAsSEMER•• Juristische Hermeneutik.. in A.R.S.P..1986. l.XXIl. H. 2. p. 198 s.). Isto. certamente quanto ao âmbito da interpretaçãojurídica que o pensamento ana1ítico-linguísticoafirma reduzir-sea uma explicitaçãosignificativa de: tipo também simplesmente linguístico - o âmbito da «inter-pretação semântica» -; ji quamo ao âmbito da imputação constitutiva que aca-baria por invocar um pensamento fundamentalmente tecnológico, o problemaé outro, não apenas analftico--linguístico, e por isso não temos de ° tratar aqui~~~. ,

a) Tendo em conta tudo o que concluímos até aqui, facilmente se reco- ~

tação jurídica terá de ser outra. .E.essamundanç:>de perspectiva vem a traduzir-se. "'}.,desde logo, no postular o caso juridico como o prius mttodo14gico. E com isto pre. ~ ~tende afirmar-se que o caso jurídico não é a enas o ob'ecto decisório-judicativo, ' •....~mas ver ad~ÜWJrnre a perspectiva Rroblemática-intencional que tudo con 1- ~ r~

ciona e em função da qual tudo deverá ser interrogado e resolvido. Pelo que a ~ ~~ l>-... interpret~Çio jurídica -;ó setá entendida em termos metodologicamente Correc- ~ ~

~', toSse for vista como a,...determinacãonQnnativa=pr'W"4tiç4wnt~ IUÚquada de um , ~"'" ctitério jurídico do sistema do direito vigente para a solução do caso decidendo. ~p Falamos de mtlrio em sentido próprio! a distinguir de fundam~ntu. «fun-

~ condudência racional de um discurso problematicament .udicativo; e «critério»~ antes um disponível operador técnico que pré-esquemati a a solução. telo que

. em qualquer metodologia visam-se primeiros o.ss:rijé~!9Se 56depois, e pc a mcdi~-ção destes, os fundamentos. Além de que s6 os critérios são interpred.veis, ou'".Seoferecem como objecto de interpretação! enquanto os fundamentos possibi-

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