as fontes do direito e o problema da positividade jurídica parte ii - castanheira neves

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UNIVERSIDADE DE COIMBRA

Boletimda

F acu ldade de D ireito

COMISSAO Rf;DACTORA

TEIXEIRA RIBEIRO -BRAGA DA CRUZ

ALMEIDA COSTA-CASTANHEIRA NEVES

VOL. LII197 6

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AS Fa NTES DO DIREITO

E

a PROBLEMA DA paSITIVIDADE TURIDICA

( CO l ll i nl l "f J " d o n o ' '' ' < 'TO a n t er i o r)

b ) a pensamento de F. GENY revela-se-nos de uma rnaiorcomplexidade, resultante que e da convergencia de varias soli-

citacoes culturais, tanto gerais como especificamente jurfdicas,

embora nem sempre facilmente conciliaveis. Provindo nao ja

do direito publico, mas do direito privado - 0 que nao ted

sido porventura indiferente para a sua maior sensibil idade a

densidade pratica do problema normative da realizacao juridica

e aos seus imediatos pressupostos, ja sociol6gicos j i axiol6gi-

cos - e influenciado por um outro sector da cultura francesa

de vivaz relevancia na passagem do seculo, que ele qualificava

de -filosofia nova» e onde avultava decerto BERGSON, diremos,

na verdade, que no seu pensamento se tentou a sintese de tres

dimens6es culturais distintas. A primeira manifesta-se na sua

fldelidade a «ciencia juridica» tradicional e a sua tauibem tradi-

cional dogmarica norrnativa, posto que repensada com base em

novos fundamentos, aqueles que GENY se propunha explicitar;

a segunda exprime-se no reconhecimento da importancia da

«escola sociologica», quer fixando um dos pressupostos do seu

pensamento e tambem um dos seus objectivos na realidade social,

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9 6 DOUTRINA

nos dados hisroricos-sociais, enquanto postulava «a necessidade

de tirar da observacao da vida social tudo 0 que ela pode dar

para a compreensao e para 0 conteudo do direito», quer rele-

vando nessa escola a exigencia, que tambem fez sua, do «ideal

da investigacao objectiva» 258; e a terceira temo-la na recupe-

rarraoda intentio jusnaturalista 259 com base exactamente naquela

rlilosofia novas, 260 a qual, tendo permitido acrescentar, segundo

o seu juizo, a atitude estritamente cientHica euma potencia

cornplemeutar do entendimento - chame-se ela crenca, ' intui-

rr~o,QU rnesmo sentimento -», alimentaria assim aquela «neces-

sidade de uma metafisica tao tenue e rudimentar que seja»261,

em que unicamente se revelariam os fms do homem, desde logo

os fins da sua social accao pratica. Se aquela fidelidade se

projecta na deterrninacao da «tecnica» que GENY imputa ao

pensamento juridico, como uma das suas tarefas principais,

e na hesitacao em tirar todas as consequencias das outras

dimensoes, e precisamente no problema concreto das fontes

do direito - hesitacao que vir ia a resultar numa indisfarcivel

cont di -0 262' •ra ica -, 0 certo e, no entanto, que 0 contnbuto

particular do seu pensamento Se pretendeu sobretudo levantar

sobre a conjugacao nao menos contradit6ria, C01110tambem

nos daremos conta, da intencao normativa jusnaturalista com a

25" Vide E. GENY, Science et f ec im iq ue e ll d ro it p rj ,,! posui], I I, I ll , 5S.;cfr. I , 92, ss,

259 F oi e ss e 0 objective e sp ec lf ic o d a «Segunda Pa rte. da 0 1 • . ci t . , quel ev a c om o s ub ti tu lo : L 'i rr ld u ct ib le . dr o it na tureb , .

260 V jd ~ o b, ci t . , I : 7 5 , ss. , Mas apenas co mo ba se f ilo s6 fic a e m q ue G EN Y

pretendeu apoiar 0seu jusnaturalismo, pois este n ao f o i d ir ec ta m en te suscitado

~o r essa . f il o s of l -a n ov a> e sim pelo renascimento do edireito naturale ou de

l~ ten ~6 es a fins n o pensamcnto juridico do seu tempo e sobre perspectivas

diversas - V. 0 p r6 pr io G ENY , ob. cit., II, c ap s. V I e VIII. V i de ainda 0ensaio

d e M. VILLEY, F ra nc ois G el ly e t la r en ai ss an ce d u d ro it n au re ! in S eiz e e ss ais d e

p hil os op hi e d u d ro it, 121, 55.. '

261 O b. ci t . , II, 85, S ..

262 V id e j "f ra .

AS FONT ES DO DIREITO 97

exigencia epistemologica da objectividade positivo-cienrifica 263.

Foi meS1l10a esta ultima dimensao do pensamento de GENY

~- nao obstante a sua veemente adesao aquela outra, nos

l imites embora que a essa adesao imporia a «consideracao das

exigencies da hora actual» 264, e querendo romper assim coma estreiteza do positivismo juridico reinante - que se flcaria,

no fundo, a dever a distincao, C0111 que toma posicao no

nosso problema e a que ficou definitivamente ligado 0 seu

nome, entre «(Ie d o n n b e « Ie c o ns tr ui t» 265.

Estamos decerto a situar-nos na segunda fase do pensa-

mento do GENY . Nao simplesmente porque foi nessa fase que

culminou a sua refiexao juridica num pensamento original 266,

mas sobretudo porque apenas at se pode vel claramente susten-

tada uma tesc geral de fontes materiais para 0 direito. Pois s6

entao, ultrapassado 0 estrito problema metodologico a que se

comecara por circunscrever numa primeira fase- aquela a que

263 0 que penuitiu a M . V IL LE Y di ze r, o b . l o c. c it s. , q ue . GE NY juxtapose

- en quoi l 'on trouve u n p rem ie r signc de so n edetisme, de son empirisrne

-l '~ncienne philosopliie regnante du positivisrne juridique et la philosophic

renaisssante du droi t nanireb (pag. 127), pelo que -G eny, dans la facon qu'ila de f al re u sa ge d e f on s ces phi losophies quil a I us , e st un peu comrne IeCiceron

du xx . siecle, C'est un adepte de l'eclerisrne; it disa i t plutot: 'sincretisme'

j e d ir ai s plutot: incertitude> (pag, 132). '

264 S c ie n ce e t t ec h" iq u e, I I, 1 0, ss., 353, 55., e pas s im ; IV , 21 3 ss . .

265 Qu e esta distincao - co m 0 s en ti d o q ue lhe corresponde enquanto e~la c ?r re la ti va d a distincao e n tr e . ci e nc ia . e < t ec n ic a » ou «artes: ". i nf ra - ia

implicada no s po stula do s do pcsitivismo s o ci o 16 gi co n o dominic d o p dt ic o

(no dominic normative da matureza morals, socia l OLl dos ecostumess] e doq ~ e GENY.t in h a explicita c o ~s ci en ci a - V id e o b. ci t . , I, 92, 55.; II, 81, 5S . (, qu e

na o exclui que a sugestao imediata daquela prirneira distincfo l he t en ha sido

dada por urn discipulo de BERGSON,LEROY- e 0pr op rio G EN Y e a afirrna-lo:

ob . ci t . , I , 97, nota 1 -, a ssim co mo rU o lhe fo i estranha a influencia do prece-

den,t~de SAVlGNY,que distinguia no direito, como vimos mpra , um o e le m en to

politicos de urn ~elemento tecnico» ( c fr . V ILLEY , o b. l oc o c it ., 134, e in f ra).

266 Cfr. MIRELLAURSO, F . G in y e !'ill te rp re ta zi on e d el d ir it to , i n F RAN -

CE SCOVIOLA , V ITTORIO VILLA , M IRELLA URSO , I ut tr p te ta z io n e e a p p/ ic a zi o ne

d el d ir it to Ira sc ien za e p ol it ic a, 5 4.

7- Bo!.d. Fac. d. Dil., Vol. trr

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98 DOUTRINA

j

j

!1II

!j,jj

corresponde a publicacao da 1.' edicao de «M e th od e d 'm te rp r{ ta -

lio n e t so urces en d ro i! pr ive positif i), dirigida tanto a critica da

E c ol e d 'e xe g es e, demarcando-Ihe em termos estritos as possibi-

lidades do seu legalismo, como a investigacao de outros criterios

normativos de decisio juridica para alern dos que se pudessemvalidamente considerar impostos pela lei, mas onde verda-

deirarnente nem a cornpreensao tradicional das Fontes (Fontes

form.ais), nem rnesmo a essencia do legalismo estavam postos

em causa e sim apenas circunscritos em limites que abriam

o espa~o para outras Fontes complementares : .J67, 0 costume,

a jurisprudencia e a doutrina 268, e ainda decerto para a «f ibre

r e c her c he s c ie n t t} i queY> do interprete 269 -, veio GBNY a elaborar

urn pensamento global do direito, em que tenta demonstrar

o seu fundamento e ernergencia normativa a partir de algo

diferente e mais profimdo do que poderia considerar-se atraves

apenas de uma teoria das Fontes concebida no sentido tradi-

cional: a partir de uma ultima e fundamental m.atriz material

do juridico, relativamente a qual as Fontes formais, sem excluir

a lei, teriam de ser confrontadas e compreendidas na sua

_i -

I:

267 Pa ra uma c ri tica gera l a e ssa teoria das fomes de GENY,cri tica que

a inda hoje mantem toda a sua val idade , v i d e Ross, Th e o n e , cit., 52, ss,

268 Pos to que GENYnao cons ide ra sse a ju ri sprudenc ia e a dout rina ,

em si mesrnas, como fontes fonnais, e apenas asvisse, ja com lima eautoridade

considerdveh, urn <a.scendentemoral e pniticos, susceptiveis assirnde sugerirem

solu~5es juridicas possiveis, ja como factores importantes para0 surgir de uma

normatividade consuetudinaria - Me t ho d e , cit., 2.' ed., II, 29, 55•.269 Neste ultimo caso era afinal 0 problema < l a s lacunas que estava em

causa e por essa. I i! n - e r e che r che sde n t i f ique o , ta l como entao G oo a caracterizava,devia 0 interprete obter apenas 0direito que afinnaria na sua decisao concreta

integrante - v. Ibidem, 74 , ss. E certo que ia ja aqui em germen a lgo mais,

como justamente observa VILLEY, l o c o dt., 123 e 126 - pois, na verdade, se 0

direito podia ser investigado cientificamenre, ou conhecido materialmente em

si mesrno, a 1 onde falecessem quaisquer fontes formais, nao era de admitir

que pudesse ser invest igado todo de do mesrno modo, pa ra a lem e indepen-

dentemente das fontes formais?

AS FONTES DO DlREITO 9 9

validade e na sua fun~ao juridico-normativas 270. Essa matriz

material continuaria a ser a «natureza das coisas»271, entendidn

todavia agora de urn modo particular em que iria recuperado 0

«sentido fundamental do direito natural», aquele sentido desse

direito que seria postulado pdo nosso (seu) tempo e compatlvelcom as exigencias da ciencia, e que acabou por identificar com

o primeiro terrno da iistin~ao referida: le d cjn ne .

o direito «em si»272 revelar-se-ia originariamente - pelo

menos no seu «principio»273, ou no «substratum essencial de

rodo 0 ediffcio do direito positivor 274 - atraves de certos

dados, «lesdonnees fundamentales du droit», os quais, havendoC d direi 275 die considerar-se a «tonte suprema 0 irertoi ,po lam

sustentar como tais, como «dadose ou mediante a sua pres-

suposi~ao na realidade natural, hist6rico-social e humana, uma

intencao objectiva de ciencia. E toda a actividade do pensa-

mento juddico (tanto do legislador, como do julgador e dojurista em geral) que estivesse para alem da estrita determinacao

do conteudo fundamental ali imediatamente oferecido, elabo-

rando de qualquer modo que Fosse{legislativa ou dogmatica-

mente) essa materia-prima, ao construir esquemas conceitnais,

modelos normativos, legras e criterios em que 0 direito se

objectivasse especi.ficamente e atraves dos quais de pudesse ser

aplicado praticamente na orientacao da vida social ou na decisao

dos casos juridicos concretos, tude isso seria ja construcao

t i cn ica. Assim, a primeira distincao objectiva - dado {ou «natu-

270 Vere rnos, todavia, que a conc lusao acaba por ser surpreendente epa radoxal , ja que apenas vern reafi rrna r a posi~o do pos it iv ismo lega li st s

tradicional. depois de terem sido procurados fundarnentos para a sua superacao,271 'A . enatureza das coisas- era tambem ja, fundamentalmente, refenda

a intenc fo Ul tima da teoria das fontes e laborada emMhhod e d ' jn t e r p re t a ti o l l,

2. ' ed. , II, 221 . Vide tambem S c ie n c e e t t e ch n i qu e , I , 12 , ss. , e pa s s im.

272 Cfr. Science et technique , I, 2.273 O b. cit., IV, 147.

274 O b. ci t . , II, 4.m T b M . , I I, 312.

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too DOUTRINA

reza das co isas») e construido (o u «artiffcio») 276 - correspondia

uma segunda distincao intencional, \ I SC i e I 1ce» e aedm ique» . E por

isso tambem para GENY as tradicionais «tontes formais» (0 cos-

tume, a lei, a jurisprudencia, a doutrina] nao seriam as verda-

dciras fontes do direito em sie apenas diferentes meios tecnicos 277

da «artet juridica 278 (embora C0111 relevo normativo diverso

que, todavia e mediante um desvio significative no seu pensa-

mento, acaba afmal por nao ser muito diferente do tradicional F").

E de tal modo vemos acentuada a intencao de ciencia para a

deterrninacao material do direito, que se pode bern perguntar

se foi 0 previo recouhecimento da possivel, ou necessaria,

inferencia do normativo a partir de urn pressuposto material

(a ideia do «direito natural» que suscitou a insercao de uma

dimensao de (<ciencia)~o seu pensamento juridico ou se foi antes

a precupacao de conferir a esse pensamento um tal estatuto

cognitivo, satisfazendo dessa forma as exigencias culturais docientismo e respondendo as criticas que 0 pensamento juddico

sofria cntfo uessa perspectiva, 0 que imp6s a procura de

certos dados do direito - i. e , a investigacao de pressupostos

materiais em que se houvesse cognitivamente de determina-lo.

A rarefaccao do conteiido normativo dos donnees parece condu-

zir-nos a segunda hip6tese - procuravam-se «dados i para 0

direito e os que foi possivel encontrar s6 ilusoriamente ofereciam

o seu fundamento material, como vereruos -; enquanto que a

concepcao alargada de «ciencia»a que GENY recorreu=concepcao

que seria, alias, exigida pela natureza de alguns desses dados e

imporia uma intencionalidade determinativa que se nao iden-

276 Ibid. , I, 12.277 V id e, o b. ci t . , III, 81, 22., e in fra.

278 Dai que GENY pudesse dizer que «ledroit consiste essentiellement en

une pratique fondce sur une connaissance» (ob . ci t . , I,2), eune art fondee sur

la science> (Ibid. , 71).279 Vide i n f ra .

AS FONTES DO D1RElTO 1 0 1

t ificava com a definida pelo conceito positivista c dominantc

da c ie nc ia - justifica antes a aceitacao da primeira hip6tesc.

Hesitac,:aoou dupIa possibilidade interpretativa esta que ja pOl'

si corrobora 0 que comecamos por afirrnar - que em G 'SNY

a intencso jusnaturalista e a intencao cientista comccaram porser concorrentes, embora viesseni a acabar por ser correlativas.

E que, se a intencao de objectividade cientifica postulava a

pressuposic,:ao e a investigacao de «dad,os»: ~ natu.reza desses

dados, como dados d o d ir eit o e suscepnveis de satisfazerem a

intenc,:aode uma inferencia jusnaturaHstica, impunha U111 alar-

gado e bern particular sentido de ciencia 280. . r

Na verdade, se 0 objectivo era determmar (Idesdonnees

de la nature et de la vie, oii nous devrons trouver les elements

fondamentaux et objectifs de toutes les regles juridiques» 281,

ja que s6 visando esse objectivo se cumpriria, simultanearnente,

de vi . . t in282 s >

o necessario «ponto e vista propnamente cien 1 lCO» , e e

repunha, no entendimento de GENY , 0 problema do direito

natural 283 , toda a dificuldade estaria, no entanto, no caracter

2B O Cremes, a ss im, que em GENY se manifestava ji uma atitude be~ll

caracteristica do renascirnento do jusnaturalismo do nosso.!ec~lo: a pretensao

de conciliar 0 rnesmo jusnaturalismo com a intenyao de. c iencta , ou de reme-

te-Io a plano cientif ico e nao tao-s6 £ilo:6f ico-es~ec~lat! vo, com~ fora cons-tante par secu los . Deste modo se impos ao proprio Ju~~tura li~lno aque la

dimensao cientihca, que 0 cientismo do seculo x~ pO~lt1Vlstal~ntifi~~acom a val idade cul tu ra l em si: sus tentar uma posicdo [usna tura li sta exigi-

ria que se a ssegura sse simul taneamente a val idade epist<:molog ia dessa

posiyao. Pede dizer-se que a essa preocupayao corresponde amda nos nossosdias em termos bern evidentes, 0 esclarecedor ensaio d e H. COlNG, adenuncia-la ja no proprio titulo, Naturrech t al s wissef l scha f i l i dJes Prob l em,

2.' ed. , 1966.281 Ibid. , II, 365.

282 V. Ibid., II, 82 .283 Tenhamos presente este enunciado deGENY , ob . ci t . , I I, 20: . .. . SOllS

quelque etiquette qu'en le veuille presente~ ou deg~jser, c 'es~e ~oujou~, au

fond l'eternel p ro bl em e d u d ro it naturel, qur, bon gre mal gre, s o ffre a nosinvestigations, quand nous voulons connaitre , d 'apres les seules donnees du

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10 2 DOUTRlNA

nonnativo do jurldico, pois era duvidosa, e mesrno geralmente

negada 2 B 4 , a possibilidade dc obter normas atraves de um

conhecimento estritamente cientifico dos dados da natureza

humana e social2B5• Dai, ou para veneer csta «dificuldade

capital do diagn6stico cientHico dos principios jurldicos» 286,

a necessidade ja aludida de «uma potencia complementar do

entendimento», que seria a intuicao ou a ecrenca», unicanienre

susceptfvel de compreender esses prindpios a partir daquela

natureza, se desta se nao pudessem inferir em termos de «pura

ciencia». Do que resultavam assim de£nidos tanto os limites

de possibilidade da intencao de ciencia estrita como 0 reconhe-

cimento tambem «de Ia necessite d'une metaphysique, si tenue

et S 1 rudimentaire soit-elle, sans laquelle l'humanite ne saurair,

particulierernent dans le domaine moral et juridique, donner

m onde et de la vie (representant la nature prise dans son e ns em b le ) , les regles

de conduite exterieure, qui s'imposent a l 'homme vivant en socie te .. Cfr . Ibid.

352, 369 , s.

284 Tao geralrncnte negada, com fundamento nao apenas na concepcao

posir ivista da ciencia (concepcao que GENY sobretudo tinha presente) , mas

inclusivarnente na critica gnoseologica neokantiana, a ponto deFEL IX KA U-

FMANN, L o gi k u n d R e ch ts w is s en s ch a ft ( a pu d A. Ross, Theo r i e , 8, nota 12 , e 55 )

ver numa «ciencia normativamente produtora» urn verdadeiro n ! )n s en s .Toca-se,

todavia , aqui 0 problema da ~c iCnc iauorma ti va» - com toda a sua ambigui-

dade (tanto ciencia que institui ou infere norrnas, como ciencia que conhecenonnas ou tem norrna s por objec to) e a sua duvidosa natu reza ( .c ienc ia pra-

t ic a. ou c ienc ia teoret ico-e specu la tiva e de ve rdade , ou, segundo a c la ssi -

fica~ao aristotelica, -eiencia e ti ca s ou .ciencia dianoet iea-P) - que ainda hojese nao podera considerar resolvido, Sobre este problema, em geral, vide

G. KAUNOWSKI, 1.£ p r !) bMm e d e la vM t e en mora l e et e n d r !) it ; Io., Qu e re ll e d e

In s c ie n c e n o rma ti v e.

28S Vide em S c i en c e e t t e c hn i qu e , I I, 8 4, S5., a manifesta hesitacao deGENY

quanto a cste ponto: se, por nrn lado, diz que c a c ieuda em si nao repugna

aideia denorm», admire, por outro lado, eque, naduvida, sehesite em reconhe-

cer a c ienc ia , p ropriamente di ta , a forca de sugeri r os fins necessaries paradirigir a conduta».0que mostra bern que 0 conceito d e ciencia, .propriamente

ditas, er~,tambern para GENY0 seu conceito positivista (empirico-positivista),como alias 0corrobora a necessidade de urna .potencia cornplementar do enten-

d imentos, a que ja nos re fe rimos .286 O b. c i t . , II, 354.

AS FONTES DO DlREITO 103

a ses efforts une direction assureeoi287. E para tanto ofere-

ceria urn contributo fundamental a bergsoniana { ( p h i l o s o p h i e

no IIve l i e » , com as suas particulates virtualidades metodologi-

cas 288. Tal era, pois, para GENY a «science) - com urn sell-

tido, podera dizer-se, positivo-metafisico 289 - que perrniriria

287 Ibid., I I, 86. E acrescentar ia mais adiante , tiu, 314: .Pour obtenir,

d e facon decisive, avec plenitude a s su re e e t u ne fern_Jd~~onva~ante, le p~incip.edes normes di rect rice s de l 'a ct ivi te mora le ou [uridique , 11faut aV01rpns

parti sur la conception generale de l'Univ~rs, l 'essence et la nature de!,~omme,

sur le nryster e de son origine e t de son existence ence moude , sur l 'enigme de

sa destinee»,288 V id e, o b. c it ., I, 7 5, S5., 181 , S5.

289 .Science> que tambem se poderia considerar .te6rico-praticat, ja . que

aquela .potencia eomplemenrars nao se ria, no fundo, s~nao : . ra rlo pra ti~a .,chamada desse modo a associar-se complementarmente a erazao puras, AsS1m,

expressamente, in ob . ci t . , I, 187 , podendo tambem ler: se ~~ Me t ho~ e d' in tef -

pmtion, 2.' ed. , I I, 100, esta formula~? sintese: .En ?efuutlve , la raison pra-

t ique doi t re ster, pour nous, le complement de la raison puree. .

o que s6 por si nos revela a inconcludencia, e mesmo uma maru~estacarencia de fundamentacao, deste ponto, alias decisive no pensamento deGENY.

Pois e rnbora a luda, na l inha ci a «philosophie nouvelle», a urna .e .xperi i !ncia

in tegral , niio sornente reveladora das coisas, mas infonnadora e cnadora a?rnesrno tempo. (ob . ci t . , I, 8 0, 1 83 ), 0 certo e que nao logrou ofe rece r man

do que urn inaceieivel s iner etis rno - muit o justamente criticado por M . V IL-

LEY, ob . cit., 132, ss, - quanto ao que dizia ser a .cienci» complementada p~la

«intuicao ou c renca» , a a razao pura- pel~. ~r~o ~r f~ca>, e scm a t~gu: a ssnna verdadeira cornpreensao de uma expenencia umtaria , que fossesimultanea-

mente superadora e fundamentante daqueles dois momentos. Sobre0problema

actual dessa experiencia realrnente integral, porque originaria e integrante, queanteceda e adrnita as discriminacocs gnoseologicas, pode ver-se, HEIDEGGER,

S ein u n Z eit, 4.' ed.,; J . MOREAU, RHe to r i que , Dia i e c t ique et E x ig e nc e P r em i ~r :,

in LA Thiorie de I'Argumet l ta t ion, 206, S5.; MIGUEL BAPTISTA PBREIRA, Ongl -

/ la /i da de e r lO v id ad e e m f il os of ia ~ A p ro po si f! ) d,l e x p er i 21 l c ia e d a h i st O r ia , 16, S5.,

39, ss.. e pa s s im . . .Sincretismo que igualmente impossibili ta que possamos fazer urna ideia

clara ci a Indole ultima da .scien~ que daquela modo nos foi proposta: decer to

«ciencia normariva-, mas que ciencia normativa (cfr. supra, nota 284)? Pois

apenas nos pode d izer que a <rarlo pc it i~ supr iria a insuficiencia ci a cr~ao

pura>na determinacao dos principios normativos, ~ vez que seria susceptivel

de sugerir spreceitos de natureza moral ou convementes, capazes, portanto,

por sua natureza, de ditar regras da conduta ~u~, e impon~o-se ~ to?OSe~vir tude desse sentimento e como que de urn msnnto, que eqUlvale a eVld!naa

racional. ( Ib id ., 1 8 7) .

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104 DOUTRINA

obtcr 290 jusnaturalis ticamente de certos dados (ou da totalidade

do <d o n ne J u rl d ic o ,» ) os fundamentos normativos do direito

positive 291.

Seriam quatro os tipos desses dados a ter em conta.

Os dados rea is - que «consisteru nas condicocs de facto em

que se encontra situada a humanidade», quer de natureza

fisica e moral ((clima, solo e as suas producoes, constituicao

anatomica e flsiologica do homern») e moral (<<estado psicolo-

g ico, conviccao moral, sen timentos religiosos, etc,»), quer de

natureza economica, polit ica e social . E certo que estas reali-

~ade~, positivas e actuais, nao criariam directamente as regras

jur idicas, mas desenhariam os contomos e, pelo menos, consti-

tuir.iam 0seu meio necessario, e desse modo teria «une importance

capitale, comrne conditions primordialles de son etablissements=",

Os d a d os h is t6 f 1c o s, 0 conjunto de tradicoes e preceitos que

enquadram e orientam historicamente a vida humana e social-

- conjunto que, ao contrario dos dados reais, «contient, toutes

Iormees, des regles d' o res et deja suffisantes, pour diriger les

volonres des hommes et constituant, des a present, le droit

postule par la vie», pois nele teriamos «toutes determinations

de regles, qui se sont consolidees par l' effet du temps et font

aujourd'hui partie de notre patrunoine juridique acquis» - e de

que seriarn exemplos desde logo as regras sobre 0 casamento,

sobre a propriedade privada, etc. 293. Os dados r a d o n a i s , aqueles

que marcar iain a «direction capitale», ja gue, «du moins, faut'il

290 Nos terrnos que sepodern ver e squerna tizados no vol . I da ob . c i t. ,

18&-194, onde temos como que uma sumula do pensarnento que os quatrovolumes da rnesma obra desenvolveriam.

291 Neste sentido, expressamente o b , ci t . II 353 S

292 b ' . " " .. a .CIt., II, 371, 55.: senam estes data que iriam referidos pela natura/i s

r a~1O d<:,sro~~s e tamb€m par MONTESQUlEU, ao considerar as <rapportsnece ssair es qui re sul tent de la nature des chase s>- sabre e ste ul timo pontov., no entanto, illfra . '

29J Ibid. , 376, 55..

AS FONTES DO DIRE ITOl O S

, rouvcr les rCsultats bruts de la nature et de ]'histoire, en lesep . 'il' dsOulllcttant a l'esprit, seul capable de Juger s s repon ent ou

but 'lui domine toute organisation [uridique» 294, c gue tradu-

zirial11 «0 fundo essencial do direito natural classico». «as regras

de conduta gue a razao deduz da natureza do homem e do seucontacto com 0mundo»: «cnquanto sao verdadeiralllente iinpos-

tas ao espirito e correspondem para e1e as exigencies .mais

cvidentes das coisas, apresentam um caracter de neceSSldade

e ao mesmo tempo de universalidade e de imutabilidade que as

distingue e lhes assegura um lugar eminente entre as regras

juridica~» 295. Alem de que ofereceriam aiD.da ~ base do quarto

ripos de dados, nos quais os dados raClonalS como g~e e

encontrariam 0 seu acabamento: os da do s idea is - 0 conjnnto

de «odas as aspiracoes humanas (fisicast psicologicas, rnorais,

religiosas, economicas, polit icas] com vista ao pi ogresso inces-

sante do direi to posi tive» 296.

Pois bern; determinado «cient if lcamente . . - i. e , positive--sociologicamente e intuitivo-metafisicamente - a partir dcstes

dados 0 fundamental conteiido normative do direito, seguir-

-se-ia uma segunda actividade, especiflcamente «tecnica», do

pensamento juridico com urn objective pa. rti.cular, que'Ata~l-

bern j:i foi aludido. Posto que reconheadas pela «~lencla»

squcl les sont les regles a pose1'll - ou «[a regIe de droit, telle

qu'elle ressort de la nature des choses et, autant que possible,

a l'etat brut» 297 -, agora «il s' agira, pour mettre ces regles

en circulation dans la pratique, et lcs faires en qualque sorte

passer de la puissance a l'acte, de poul/oir les ajuster a la ~c,

les adapter a ses exigences concretes, a sa molle structure, a sa

fluidite incessante, en degageant et ramenant a effet les precedes

29~ Ibid. 380 , 55..

295 Ibid., 384 , 55•.

296 ab. cit., I, 95 e 97 .

297 Ibid., 95 , 55., 192 SS.

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106 ]}OUrRINA

d'application du droit»; 298 e actividade «indispensable pour

donner aux regles juridiques cette Ierrnete, cette precision, cette

securite, et, pour tout dire d'un mot, cette adequa t ion a la de,

qui ne sauraient resulter d'une investigation purement scientifi-

299 p ,que» . ara nos, no entanto, 0 que sobretudo irnporta

ter presente, para alem deste objectivo em que vai 0 seu

conipromisso pratico, e 0verdadeiro sentido juridico da « techn i -

qU& , assim como 0 respectivo contributo normative, para que,

p~ndo-a em confronto com a « s ci en c e» - com 0sentido que esta

VllTIOS caber-lhe e tarnbem com a sua real virtualidade norrnativa

que melhor teremos de analisar -, possamos compreender rigo~

rosamente a disrincao proposta por GENY e depois, com funda-

mento nessa compreensao, responder a pergunta decisiva: a dis-

ti~t;:aoentre ~ <tdonnb e 0 «cons t ru i t» , entre « s d e n c o e «techniqu&

poe-nos efectivamente perante urn direito positivo que, objecti-

vado e actuado embora por uma fUllt;:aopratica, sepre-detennina

materialrnente mediante uma atitude cognitivo-objectiva?

Ora, segundo 0proprio enunciado de GENY , a «technique»

~epresel1t~,«dans l'ensemble du droit positif , la forme opposee

a la matiere, et cette forme reste assentiellement une cons-

tructi~n, la~gement ~rtificielle, du donne, oeuvre d'action plus

que I intelligence, ou la volonte du juriste se puisse mouvoir

librement, dirigee seulement pour Ie but predetermine de

l'or~a~sation juridique qui suggere les moyens de sa propre

realisation». E neste enunciado, que e uma sintese, 0 que se

hayed de por em relevo - para alem de todas as outias

antiteses complementares, que tarnbem aqui concorreriam, as

antiteses intencionais entre ciencia (teoria) e pratica, conheci-

, •29~ I b i d : , 193. Is to, porque <sans la technique Ie droit posiuf restera it

redu it a .des h~es vagues, t rop .generales, n'encadrant que d'1U1halo impal-

pable et}~defUllle noyau de la vie sociale. Grice a la technique, tout selimiteet se ~reClese...• ( p. 1 8 8 ) . Pelo que ass im se poderia dize r que -Ie dro it nousapa ra it comme un a rt fonde sur la sc ience. (p. 71).

299 Ob. dt., I II , 23.

AS FONTES DO DIRE ITO10 7

mento e aOrio, conhecimento e arte, mteligencia e vontade, etc.,

e as antiteses objectivas, entre a «natureza das coisas» e 0

ai tificio», entre « 6.n1» e emeio» 300 - e decerto a distincao

capital entre mater ia e f onna . que condicionaria as demais e se

tCl11 pelo criterio ultimo do que se deveria entender afinal por(ltecnica». Esta conotaria todos os modes de tratamento do

juddico (da materia do direito) elaborados especificamente

'pelos juristas - todos os «processos1)particulares da sua «artes

do seu «metier», para dominar pratica.mente a «rnaterias norma-

tiva revelada no «donnb, e revdada ai corn a indisponibilidade

c a vinculacao de um autentico pressuposto: 0 pressuposto

do conteudo intenciona1mente fundamental do direito, «qui

s'impose a nous et ne demande qu'a etre reconnu». No que

se reconhece 0 precedence, alias a:fi.rmado3D!, da analoga dis-

tin<;ao de SAVIGNY, a que ja arras fizemos referencia, entre 0

«elernento politico», enquanto expressao de intencionalidadenormativo-juridica que radica na natureza historico-cultural

da coruunidade, e 0 «elemento tecnico», a coincidir por sua

vez com a «ciencia do direito» ou com a elaboracao cientifica

do direito propria dos juristas. Mas devendo anotar-se uma

diferenca importante entre as duas disrincces, da qual porventura

G : E N Y nao ted sido de todo consciente assim como das suas

consequencias muito particulares. E que a tecnica em SAVIGNY

era pura e simplesmente, e toda, a ciencia do direito, ao passo

que em GENY soparte desta e discriminavel como tecnica, ja gue

nao cabe agora menos a ciencia do direito, e justamente como

sua parte decisiva, aquela «Science»que para ele seria distinta da«technique». A tecnica oferece-se em GENY mais circunscrita c

espedfica, limitada a actividade que volitivo-praticamente cria os

processos e os meios, os artificios e os «trues»da arte juridica, e a

300 Ob. c i t . , I, 11, 5S..

301 Ob. ci t . , Ill, 6, 12, 24.

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.1~

II

II

10 8 DounUNA---~----------

qual, por ranto -porque the cabe assim apenas a aplicacao de uma

cerra forn~ dcliberada e artificial a uma materia de todo pressu-

posta: obtida do «fundo substancia]» de que emergem aqucles fins

supenores em que sc manifesta «o elemento verdadeiramenje

natural do direito revelado cientificamenr-» 302 - , vai subtraldanao s6 a determinar;ao material do nonnat ivo juridico, mas sobre-

rudo a possibilidade normativamente consti tui tiva que va inipli-

cada nessa determmar;ao. Tudo isto ao contrario do que virnos

rer de acabar por imputar-se a SAVIGNYe a sua Escola, dado 0

reconhecimenro ai da ciencia do direito como uma das Fontes

dogmarico-normativas capitals do juridico. Pelo que, afinal,

menos que do enlendimento da tecnica juridica em SAVIGNY,

revela-se antes a concepr;ao que dela tern GENY muito proxima

da que era pensada por IHERING, ao dizer-nos 0 autor do

«Ge l s : de s r i im i s chen Rechts» que a questao da tecnica e a de

saber «como 0 direito, abstraccao feita do scu conteudo deveser organ~z~do e estabelecido para que 0 seu rnecanismo simpli-

fique, faCIhte c assegure tanto quanto possivel a aplicar;ao das

regras do direito aos casos concretes» - questao de pura forma

nao «quesrao de fimdo» 303. Que 0 rnesmo e afirmar a conclusao

d~ q~e a ~fo.nl1a» pcla qual actua a tecnica, segundo GENY,

nao e normanvamente constitutiva: nao e essa forma ou as suas

lllo~ali~ad_es ~~nstrutivas, nao sao as objectivar;6es e as precis6es

da tecnlca juridic, que consrituem 0normativo jurfdico enquanto

302 M hh od e, c it., I I, 3 29 _303 L'E . d droi .

sp n t u ro u r o m a t n , segundo e trad franc de 0 deM 1III 16 D' . . . eu enaere,~ .' S5.. eve ter- se a inda e rn con ta e ste enunc iado onde se anrecipa rn a s

propnas form~la~5~s de GENY: .Esta e xp re ss ao ( te cn ic a) designa em geral 0

~u~~ da arte juridica que tern por objecto apenei~oar a forma da materia~und!Ca,por outros ter.mos, 0ml t odo t ecn ico e 0mec a n i sme tecnico ou 0 conjunro

os .p rocesso~ por me io dos qua is e ste fun pode ser a tingidos ( o b _ c i t. , 2 0 ) _Teria a in da m te re ss e confrontar a concep~ao de .t€cnica» jur ldica deGENY

co& a ql~e nos ofe re :eu STAMMLER, Theo r i e de r RechtswisSeIlscha/t , cap. VU ,

e ,p~rar;a~os tamb~m com bastante, afinidades. Cfr. ainda P. ROUBIERTheone gene ra ie du droit, 2.' ed., 76, 55.. V. infra, nota 306. '

A S FON TES DO D IR EI TO 109

tal. Ern oposicao isto, observe-se, ao que acontecia na conccpcao

tradic ional e estr itamente positivis ta das Fontes do di rei to, pata

a qual as Fontes j o rm .1 i j - e s6 essas - manifestariam (criariam)

direito 304. Outra nota, assirn, da inteucao antipositivista de

GENY: a dirnensao decisive do juridico desloca-se de novo daforma para 0 conteiido.

E certo que GENY nos diz tambern conceber a «forma»

sob 0 <dngulo plenainente filosofico» - i . e , como aquele aris-

rotelico modus especificante do juridico que «distingue a sua

cultura de qualquer outra actividade humana» e s6 grar;as a qualo direito daria forma a materia social e realizaria 0 seu fim

proprio 305. E sabe-se como a «forma» em AruST6TELES306

eta constitutiva, enquanto justamcnte a ontol6gica «causa for-

mal» que estaria perante a materia como 0 «acco» ( ene rge i a ,

entdequla) perante a «potencia» ( d i namys ) , a «real idades perante a

«possibilidade ( jolma da t esse re i ) . Mas nao e menos ccrtoque este sentido da «forma)} nao e verdadeiramentc 0 que

corresponde a «recnicai no sistema do pensamento de GENY.

30 4 E 0 que, s e e st a na log ica do pensamento de GENY, de proprio I lio

deixa de expressamente afirmar: ' ...Je n'hesire pas 1 1 cd ui re l es sources formel les

du droi t pos it if, vo ire , au pr imie r r ang , la loi ecri te , au ro le d' inst ruments

techniques d e la jurisprudence. ( Sc ie nc e e t T e ch ni qu e, I II , 22, 5.). «Par leur

nature, les sources formel les du droit posi ti f flgurent entre les elements techni-

ques, qui, confirmant les donnees .... ( o b . c i t. , IV , 34) •. _.latechnique nos offre

un aut re ensemble de precedes, egalemenr generaux, constituant pour elle

une sorte de revetement exter ieur , dans les sources formelles du droit positif ,

loi ecrite, coutume, voire meme autorite (jurisprudence, doctrine) et rradition ....

( o b. c it ., I II , 81); e tc . .305 ot, ci t . , III, 12 e 17.30 6 Sendo cerro que 0 ecletismo acritico de GENY 0 leva a invocar

tambem, como precedences da aplica~ao daquela distincao «materia -forma-

ao dominic juridico, pensamentos que a concebem bern diversamente e que vao

de SAVIGNY a STAMMLER(v. ob . ci t . , III, 16, nota 1) - ecletismo onde, por-

tanto, tudo se rnistura, 0 aristotelismo e a historicismo, 0 positivismo-socio-

logico e 0 neokantismo! Para um acabado esclarecirnento sobre a utili2:a~ao

d aq ue la s d ua s categorias no pensarncnto juridico em geral, vide K. ENGISCH,Form un d S to ff i n d e r j ur is pr u de n z, in Fes tschri ff fur Fri tz V. Hippel , 63 , ss .

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110 DOUTRlNA

Assim, nao admitiria ague1e sentido splenamentc ~iIos6ficOf),m

primeiro lugar, gue a materia fosse 0 momenta fundamental

como 0 e em GENY 307; em segundo lugar, gue ela pudesse

ser investigada e determinada no donne , atraves de uma activi-

dade de conhecimento aut6noma da intervencao (posterior)da forma; e, por ultimo, gue a forma, como tecnica, fosse

urn processo deliberado e artificial. Na ontologia-gnoseologia

aristotelica a «forma» tern, bern ao contrario, a primazia sobre

a materia, assim como a tern a realidade sobre a simples possibi-

lidade 308- e tal como na gnoseologia kantiana e neokantiana,

embora decerto por OUtlOSfundanientos, 0 objecto nao pode

ser conhecido sern a simultaneidade constitutiva de materia e

forma. E sempre, ou em ambos ospensan:entos, a forma. e umaestrutura ontol6gica ou transcendental, tao essencialmente pres-

suposta, na pre-sfntese constituti va e subtraida por isso ao

alvedrio pratico de uma qualquer «arte», C01110 a pr6pria«rnarerias. Dai que, nao obstante a expressa invocacao da

distincao aristotelica, e de ter tarnbem manifestarnente presente

a hom6nima, mas neokantiana, distincao stammeleriana,

a «forma)) de GENY nao corresponda afinal ague ia pensada

tanto numa C01110 noutra destas duas ultimas disrincoes. A cor- .

robora-lo, temos a analise da «forma)), a cumprir-se em

tecnica juridica, que no! oferece 0 vol. III da Sc i ence e

Technique, com a discriminacso e a natureza dos quatro meios

tecnicos gue enuncia e a funyilO especifica que lhes comete.

Pois as pr6prias fontes formais, 0 quarto desses meios tecnicos,

sao expressamente afirmadas «parfaitement distints de la regIe

a laquelle ils donnent l'estampille de la positivites 309- «confir-

307 Como results de todo 0 scu pensamento e vai por de afirmado

repetidamente - V., por ex. , o b . c i t. , N, 60 e 61: <Le'donne ' doit, por son

essence meme, dominer le 'construit'». (...) .Le principe de subordinationde la ' technique' a la 'science' .....

308 Cfr. R. MARCIC, G es ch ic hte d er R ec ht sp hi lo so ph ie , 1 87 .

309 ab. ci t . , 82.

AS FONTES DO DIRE lTO 1 1 1

uunt des donnees toujours quelque peu incertaines, flottantes

ou equivoques)) 310-, e assim nao tendo, justamente como

meios tecnicos, «d'autre but que d'imprimer 00 sceau officieJ

et categorique a la regle de droit elle-meme» 311.Numa paIavra,

a funcso da tecnica e a de «mise en oeuvre Ie droit) 3I2---deli_mitanto, precisando e objectivando a regra material de direito,

revelada pelo donne , e em ordern a sua realizacao concreta,

a sua «adequaclo a vida» ou as «necessidades da vida pratica».

E rigorosamente nao mais do que isso: «mise en oeuvre»

e nao essencializante constituicao do direito. Pelo que, uma

outra conclusao, ja atras aludida e correlativa da que acaba de

enunciar-se: a coerencia do pensamento em analise exige que

seja a science, enquanto investiga 0 donne e releva 0 essen-

cial conteudo normativo do juridico, 0 momenta determi-

nante do proprio direito e nao apenas 0momento fundamental

do pensamento juridico, posto que a technique s6 a vernos cha-mada a actuacao juridico-pd.tica (elaboracao e aplicacac) dessc

norrnativamente pre-detenninado couteiido de juridicidade.

Compreendida nestes termos a distincao de GENY , logo

uma observacao irnporta fazer. E a de que essa sua distincao

entre science (conhecimento) e technique (pritica) nao se confunde

com a comum distincao - que ele niesmo expressamentc

rcpele :3 13 - entre «teoriae e «pratica», gue se generalizara no

pensamento juridico 314, fosseeste teoretico-positivista ou dogma-

tico-conceitual e sistematico. E isto justa.mente porque GENY

pretendia ver no pensamento juridico dogrnatico (a tradicional

«ciencia do direito») ta:o-s6 afmal uma obra de tecnica, a auto-noma elaboracao normativo-pratica dos juristas e do seu pensa-

310 ab. dt ., IV, 34 .311 ab. ci t . , I ll , 500.312 ab. ci t . , III, 4%.

313 ab. clt., Ill, 10, S. .

314 Sobre a origem jusnaturalista desta distincao, v.A. GIULIANI, R i che r -

th e i n t em a d i e sp er ic nz a j ur id ic a, 21, ss. , e pas s im .

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11 2 DOUTRIN,o,

mente: verdadeira ciencia, have-la-ia nao tanto 110 conheci-

mento do direito positivo ja tecnicamente prescrito, elaborado e

conformado, mas no conhecimento dos donnees , dos Iundamentos

e realidades matcriais constitutivas do direito positivo, os quais

a tradicional «ciencia do direito» haveria agora de pressupor.Aqui mesmo se nota, como bern se deu conta A. GIULIANI 315,

a inB.uencia em GENY dos postulados epistcmologicos do pensa-

mento juridico de oricntacao positivo-sociologica 316, pois foi

essa orientacao que, na linha do seu cientismo positivista,

pela primeira vez pos em causa a cientificidade da «jurispru-

d@nciaf), a tradicional ciencia dogrnatica do direito, para

reconhecer aquela qualidade unicamente a investigacao socio-

16gica dos factores socialmente determinantes do juridico ou,

mais estritamente, da sua materia social juridica (social-mate-

rialmente pre-juridica) 317.

o que nao significa que GENY tivesse entendido a sua« s c i e n c e » em termos puramente sociol6gicos. Pelo contrario;

ja observamos que ele se propos superar 0 radical positivismo

da « e w ie s o d o lo g iq u l? f> , acrescentando aos limites episternologicos

desse positivismo «uma potencia complementar do entendi-

mentes, e que s6 gracas a essa complementar potencia seriaiu

determinaveis «osfins universais de que depcnde a direccao da

conduta social» a partir da realidade social e humana. Mas

intcgrada que Fosse dessa outra dimensao, a s s c i e n c e » revelaria

efectivamente nesta realidade os fundamentos normativos do

direito - os seus fundamentos rnaterialmente constitutivos-

e, nesse sentido, 0 proprio direito na sua essencia, 0 «direito em

si»,sem recusa ou falsa reducao da sua essencialidade normativa.

Por isso mesmo se poderia afirmar, restaurando-a, a intencao

315 ab. ci t . , 49, 5S., 62, SS., 120, s s . .

316 Cfr., al ias , a proprio GENY, o b . c i t. , II, 8 1, s s..

317 Assirn, expressarnente, em E. EHRLICH, G r un d J eg u ng d e r S o zi ol o gi ed es R ec hts , p as sim . V. supra,

. - . s FONTES DO DlRElTO 11 3

jusnaturalista. Ou, talvez melhor, era a reassuncao do «direito

natura!», possibilitada epistemologicamente naqucles terrnos,

que implicaria que nos d o n n e e s , discriminados na realidade

social e humana, se houvessem de inferir os fundamentos-

-prindpios do direito. Os d o t m l e s nao eram assim, como seriaproprio de uma perspectiva apenas sociologica, tao-s6 factores

hist6rico-socialmente condicionantes ou geneticamente explica-

tivos do direito e, portanto, em si pre-jurldicos; mas antes 0

pr6prio direito em potencia, 0 dado fenomenol6gico do direito

em que ia imanente a essencia normativa do juridico. So

desse modo era possivel afirmar que, com base nesses d o n n e e s ,

se conhecia cientificamente 0 conteiido material fundamental

do direito - «os elementos cienclficos que guardam em si a

substancia mesmo do direito» 318, «0 conjunto das regras juridicas

que a ratio retira da natureza das coisas, da qual 0 homem

e uma parte», e que seria afinal 0 direito natural 319 - e, afrr-inando-o, sustentar que essadeterrninacao cientifica, essa « s c i e n c e » ,

era uma dimensao, e a dimensao fundamental, do pensamento

juridico enquanto tal.

Assim se conjugariam a exigencia epistemol6gica da objecti-

vidade teoretico-cientifica, a exigencia geral de ciencia, e a

compreensao jusnaturalista do direito. 0 direito, na sua essencia

ou no seu momento marerial-constitutivo, nao era criado,

construldo, antes se revelava natural-materialmente em certos

dados que se conheciam mediante uma ciencia espedfica. Ainda

que para 0 submeter em seguida a uma elaboracao tecnica,

a uma «construcao», indispensavel para 0 tornar praticamente

operante e adequado as concretas exigencies da vida social.

Mas s6 ali, na ~ciencia»,e nao aqui, na «tecnica», deparariamos

com 0 momento materia mente constitutive do direito; alias,

318 c » . ci t . , IV, 60.319 ab. ci t . , I I, 419.

B - Bol, d. Fac. de Dir., Vol. LH

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114 DOUTRINA

nao teria sentido a invocacao, que pretendia ser uma restau-

racao, do d ir e it o n a tu r al .

E , pais, nos termos desta conclusao que no pensamento

de GENY se da resposta a pergunta decisiva que atras enunciamos.

Pelo que tudo estara em saber se nos resultados efectivamenteoferecidos par esse pensamento encontramos verificada a vali-

dade daquela resposta. Ora, havemos de reconhecer que nao

deparamos ai com uma tal verificacao. E inconcludencia que se

nos revela no modo desta alternativa: enquanto se manteve

flel a sua intencao fundamental, GENY apenas nos oferece a vazio

que no seu pensamento, na verdade, se verifica no que toca

ao momenta verdadeiramente constitutivo do direito; enquanto

possamos dizer que nos deu (au se propos dar) uma solucao

ao problema desse momenta, depara-se-nos essa solucao mani-

festamente contradit6ria com aquela intencao fundamental.

E que as donnees conhecidos pda science, nao nos dao, afmal,materialmente a direito. E, par ism, au a «technique» e a seu

resultado «construi t» se mantem coerentemente como nao consti-

tutivos do direito - e nesse caso e todo a problema que fica

par resolver, pais a direito que aqueles nao revelem tambem

par estes nao e constituido -; au atraves da etecnicae,e particu-

larrnente do seu elemento capital que sao as fontes formais, se

obtern no fundo a direito que as edadoss nao logram oferecer

- e entao a tecnica e juridicamente constitutiva, mas a custa

isso de uma insanavel inconcludencia da tese sustentada, e onde

a resultado aeaba par nao ser em nada diferente da tradicional

teoria das fontes formais que se quis ultrapassar.Vejamos, com efeito, a que se obtern dos «donnees», tal

como GENY as compreendeu: a «cientificaedeterminacao destes

dados oferece-nos efectivamente s6 par si a micleo normativo

essencial do direito, em termos de pader dizer-se que toda a

tarefa jurfdica posterior a essa determinacao nao e rnais do que

a eonstrutiva au tecnica elaboracao - qualquer que seja a exten-

AS FONTES DO DlREITO 115

~ao e a iuiportancia pratica dessa elaboracao - de uma juridi-

cidade previamente definida rEa resposta nao pode deixar de

ser negativa. Logo 6 evidente que se nao trata apenas de quatro

dados diferentes, mas de elementos que, a serem considerados

em ordem a intencao jurfdica, se niostram de relevo fundamen-talmente distinto. Os «lados reais» nao traduzein outra coisa

que a conte lido hist6rico-material da situacao que as problemas

jurfdicos pressupi5em e a que vao referidos; nao oferecem a

direito, apenas apontam faetores relevantes au as dados cia

situacao perante a qual se poe a problema juridico: entre

eles e a direito vai toda a distancia que, como em qualquer

dominic problematico, separa as dados do problema da solucao

dele, dist:ineia que tao-s6 uma mediadora intencao aut6noma

que assuma a problema e a resolva podera veneer 320. Quer

dizer, as dados reais ocupam aqui a lugar que vimos caber ao

primeiro tipo de realidades (pr6-juridicas) que consider:imosrelativarnente ao pensamento da «natureza das COiSaSf} que

adiante analisaremos quanta a sua participacao no «pressuposto

material». J a e outro a relevo dos -dados bistoricoss e dos «dados

ideais»,posta que podendo eorresponder a ambos um conteudo

irnediatamente normative, nao deixarao de fazer pressao sabre a

direito no sentido dessa normatividade - como tambern ja aludi-

mas relativamente ao segundo tipo de realidades (parajuridicas) a

ter em conta na analise da «natureza das coisass e melhor veremos

na detida analise do s e le m e nt o ma te r ia l ». Mas ainda aqui, como

ali, nao se ve porque hi-de a direito limitar-se a aceitar sem

revisao e sem critica, no ponto de vista da sua aut6noma inten-

cionalidade, essas factores normativos, Tanto mais que essa

autonomia (a autonomia da inten~ao juridica), sendo decerto

necessaria, desde logo pela situacao de conflito em que se

320 Cfr. , num senrido malogo, DABIN, o b . c i t. , 205, S.; P. ROUBIER,

a b . ci t ." 193, 196, 55..

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116 DOUTRINA

pretendam impor aqueles dados - sobretudo os «dados idea i ss=- ,

nao sera menos justificada e exigfvel pela sua propria especihci-

dade normativa 321. 0 que, sern mais, nos permite coinpreender

que 0 momento de maior relevfincia esta na consideracao dos

«iados racionais», como alias, 0 afirma tarnbern expressamenteGENY 322 - apenas ueles se podera tentar deteiminar uma ime-

diata e especifica iutencao jurfdica. So que, se perguntarmos

tarnbem aqui «0 que se pode legitimamente pedir-lhe» (ao dado

racional) - pergunta que GENY a si mesmo faz -, 0 resultado

e deste teor: «essencialmente uma coisa, a nocao de justica,

a unica que permite estabelecer a ordern e a paz na vida

social»323. Quer dizer, 0 «direito natural irredutivel», 0 «justo

objectivo», vem-se afinal a identificar sem mais, ou sem qualquer

especial enriquecimento, com urn indeterminado e insuticienre

principio dc justis:a-sendo certo que para GEt-.,ry 0 principio da

justica significaria sobretudo a exigencia de um «equilibrio deinteresses»324. E entao, independentemente de saber se aquele

principio e urn dado da «razao teorica», a determinar teoreti-

camente au pela «ciencia», ou antes uma intencao axiologica a

assumir autonomarnente pela. «razac pratica» 325, bern longe

estamos de deparar com 0 direito nesse «lado». Traduz decerto

321 V. infra, § 2 .0 Cfr . tambem ROUBIIlR, ob . cit., 192 SS••

322 ab. ci t . , II, 380, 55., 389, 55.. .Un donne rationnel que contiendra

la direction capitale ...•; «Tous Ies efforts sedoivent concentrer auteur dudo rme

r a t ionne l , qui revele la substance propre, vraiment specifique, des regles de droit

a degager (...). Au fond, Ie droit reste essentiellrnent oeuvre rationnel. De fait,

aussi, le pivot de toute elaboration scientifique du droit a toujours reside dansce discernemenr d es regles par la ra ison considerant la vie, d'ou provient ce

que l 'on appelle , plus specialemenr et plus precisement, Ie droit natureh,323 Ibid., 390.

324 ab. cit., IV, «Conc l u s i on s gene ra le s t , 147.325 Neste sentido, e exactamente , v. P. ROUBIElI., ob . c i t. , 196. Embora

se possa dizer , com BASTIDE,o b. l ac . dts., 32, parafraseando KANT (0 dever

como foctum da razao pratica), que tambem 0 prindpio da justica e urn fac tum

rat ionls, e justamente 0 fo i t d u D ro i t - 0 qual etraduz, na consciencia instau-

radora, a presenca das exigencias indeclina veis do Espir itoa ,

AS FONTES DO DlREn:O 117

esse principio a intencao ultima da juridicidade c, como tal,

nao s6 funda 0 sentido do problema juddico, como indus iva-

mente enuncia 0 regulative capital da sua solucao, Mas scm que

tal signifique, por outro lado, que 0 problema esteja so por

isso resolvido e as solucoes juridicae sc possam sem ruais delededuzir 326. 0 prindpio da justica s6 guiara a intencao preble-

nuitica e constituiiva do pensamento jurfdico no seu esforco

de juricidade concreta - i. e , de uma juridicidade que e proble-rnatica e que se ted de constituir na sua continua posicao c

resoluc;:aodos problemas juridicos concretos. 0 direito como

tal- na sua juridicidade liistorico-positiva - nao se revela

pois, sem que urn especifico pensamento (acto ou processo

metodologico) concreramente 0 constitua atraves das solucoes

do hist6rico problema juridico. Pensamento espedfico que

nao e , deste modo, uma mera tecnica construtiva, mas verda-

deiramente a func;:aoconstitutiva do pr6prio direito. Tem porisso razao DABIN quando. em critica a todos os pensamentos

do «dado», afirrna que eo direiro e 'prudencia' e por conse-

quencia 'construido's ( ho c s en su ) 327. E, com efeito, mediante

326 V., alias, as proprias observacoes de GENY,lac . c i t . supra , nota 324:

«Le donne reste la base essentielle du droit positif , mais ne peut avoir qu'une

portee re st re inte, De moins fourni t' il l a 'regle', le 'principc'»,327 ab. dt., 197. No mesmo sentido, v. ROUBIER, ob. ci t . , 192, ss.,

196, ss. . Pelo que, na verdade, sao constituidas hist6rico-normativamentc,

mediante valoracoes normativamente aut6nomas, e nao deduzidas racional-

mente da natureza d a s coisas as solucoes jurldicas que GiNy via objectivadas

nas «principais instituicoes do direiro privados - o b . c it ., I I, 399, 55.. Basta

termos aqui presente uma dessas solucoes que, para GENY, ser ia necessaria:considerados de3 e ffe ts du mariage e t les l iens de fami lle qu i en derivent , ontombera sans peine d'accord sur la necessite d'une certaine subordination de la

femme au marl et des enfants au pere . . ,'. Por isso tern razao M. VILLEY,

quando afirrna, ob . locot l t s . , 136, que .Pour donner quelque consistance a soncode de droit narurel, Goo ne peut qu' incorporer a ce qu' il appelle le donnedes regles en verite cons/mites par legislateurs modernes c de valeur t r e s provi-scire, 11 est arrive 11 Goo le me rne echec, la meme impasse qu'a tous ces theo-

riciens du droit nature! qui s'obstinent a vouloir hire nn corps de regles inde-

pendantes de la construction des juristess,

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118 DOUTRlNA

a tomada de posicao (valoradora, regulativa e critica), fundada

e guiada por um principio de validade normativo, perante a

situacao hirtorico-social, que 0 direito se constitui. Ou dito

de outro modo e com urn pouco mais de rigor, e no pres-

suposto de uma particular realidade historico-social-humana,ou no pressuposto de certos dados, factores historico-sociais

e humano--culturais, como verernos, e com fundamento nnma

especifica intencao de validade que, atraves de certos actos

ou instancias socialmente legitimadas, se realiza a dialectics

problemarico-norrnativamente constituinte do juridico e que

culmina na sua objectivacao como direito 328.

Ora, GENY confunde os dados problematicos com 0

fundamento norrnativo - ou melhor, nao tendo discriminado

nem atendido a difeiente funrrao problematico-norrnativa de

uns e de O U t l O , atribui invalidamente a todos os dados a

gualidade de fundamentos e pensa 0 fundamento como se fosseurn mere dado - e dai as rrnis graves consequencios. Que

todas se resumem em nao ter verdadeiramente posto, porgue

o nao compreendeu na sua indole propria, 0 problema norma-

tivo do direito em si mesmo. Nao compreendeu esseproblema,

porquanto a sua preocupacao principal de inserir urn momento

de ciencia - urn momento de objectividade, nos terrnos de

apreensao-deterrninacao de um dado-pressuposto, no fundo urn

mornento de objectividade teoretica - no pensamento juri-

dico, ejustamente como 0seu momento fundamental ou substan-

tivo, obrigou-o a remeter 0 momento pratico (pratico-norma-

tivo) para a fimrrao da tecnica, para 0 dominic secundario e

dependente do «artiffcio», da dorma» e dos emeioss, para as

tarefas nao norrnativamente constituintes da objectivacao e da

concretizacao do jurldico. Quando e certo que 0 direito e uma

326 Enunciado que e uma conclusao antec ipada e que a invest iga~o

presente, uma vez acabada, comprovad..

AS FONTES DO DlRE ITO 119

func;aopratica - que s6 praticamente, i . e , mediante um modo

pratico-normativo se pode constituir e cumprir. Nao e s6

a pratica do direito, ou a sua funrrao concretamente regulativa,

que tem uma natureza pratico-normativa, pdtico-normativos

sao tambem a sua matriz constituinte e a essenciado pensamentojuridico 329 - ao qll:e GENY verdadeiramente nao atendeu, e

por isso procurou d a d o s em que 0 pensamento juridico encon-

trasse antecipadas ou ja constituidas as solucoes de um problema

que desse modo apenas se the ocultava, posto que unicamente

esse pensamento 0 tera de por e de resolver. Sendo certo,

por outro lado, que nao s6, como vimos, esses dados nao

oferecem afinal as solucoes, como ainda a invalid a referencia

cientista que se lhes fez, para obter deles sem mais essassolucoes,

foi 0 que nao permitiu que se desse conta da distincao entre 0

que e rigorosamente dado problematico (dado historico-social)

e 0 que e verdadeiramente fimdamento normativo, distincfoque a propria natureza diferenciada dos dados considerados

exigiria e que so por si definiria correctamente as coordenadas

do problema juridico. E problema este que, deparando assim

nos «dados» apenas com uma das suas coordenadas, tera de

procurar para alern deles a sua espedfica solucao - que 0

mesmo e dizer que a S O I U l f a O nao e dada em quaisquer dados

(digam-se des «natureza das coisass ou «direito naturals], mas

antes hayed de ser pratico-normativamente constituida 330.

Nao 0 havendo compreendido assim, abriu GBNY no seu

pensamento um vazio fundamental- nada menos do que 0

vazio do problema da constituicao hist6rica do direito, 0 vazio,

329 efr. tambem neste sentido, as pertinentes observacoes de P.Rou-

BIEB., ob. cit., 192, 196330 Tudo 0 que os pressupostos do pensamento d e GENY n110lhe per-

mitiarn cornpre ender: a inten~o cientista exigia que 0 direito fosse d t l d o

(objecto-pressuposto) e a inte~o jusnaturalista exigia que 0 direiro nao fosseauronomamente constituido e tarefa, mas previa e mater ia lmente revelado.

Cfr, VILLEY, ob. loc . d ts. , 135.

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12 0 DOUIRINA

podera dizer-se, do problema juridico pura e simplesmente.

Pois, de urn lado, os donnees sao afmal elementos ou factores

p re- ju r id i co s - ou sao apenas os dados problemaricos ou apon-

tam para uma intencao de validade, mas nao sao ainda, por

isso mesmo, 0 proprio direito. Elementos ou factores para aconstituicso do direito, mas nao ainda. 0 direito constituido.

Por outro lado, 0 construi t da tecnica pressup5e 0 direito

consti tuido na sua essencia (na sua normativa juridicidade) ,

uma vez que, como vimos ja, a tecnica, ocupando-se apenas dos

meios praticos da objectivacao-determinacao e realizacao do

direito, nao e dele em si mesmo, ou normativo-materialmente,

constituinte. Pelo que, ted de conduir-se, 0 que assim a science

nao chega a revelar tarnbem a technique 0nao constitui . 0 espac;o

que fica entre as duas - que esta para alem das possibilidades

juridicas da science e que e pressuposto ou fica aquern da func;ao

nao constitutiva da t ec hn iq ue - e 0 espac;o que tern de scrjustamente preenchido pelo problema normativamente consti-

tut ivo do direi to.

Se fosse esta a unica conclusao a tirar do pensamento de

GENY relativamente ao nosso tema-e e,no entanto, a conclusao

que, tendo presentes os seus pressupostos, melhor se adequa aint ima coerencia desse pensamento - , haveriamos de dizer que

fora frustrada a sua tentativa de dar uma solucao material ao

problema ja da origem-fundamento ja das fontes do direito.

Que indusivamente 0problema geral das fontes nao chegou a ser

devidamente posto, ao ter-se ocultado aquele problematico com-

ti tuinte do direi to em que ele se insere. Soque ja nos referimosa uma outra posslvel conclusao, a considerar como alternativa para

esta a que acabamos de chegar: a conclusao que se traduza em

atribuir a tecnica, pelo prec;o embora de uma incoerencia, uma

verdadeira func;ao constitutiva do juridico. E e esta, na verdade,

uma interpretacao que 0 pensamento de GENY tambem de todo

nao repudia, sobretudo se atendermos ao modo como acaba

AS FONIBS DO DlIlEITO 12 1

por considerar as fontes formais e em particular , dentrc elas, a

elei escrita».S e a vaguidade e a reconhecida insuficiencia dos resul-

tados normativos obtidos dos donnees ja por si abrem para a

«tecnica))uma ampla possibi lidade (que e uma necessidade)

de determinac;ao-conformac;ao do juridico e. se s6 na forma

actuada por aquela encontraria afinal 0 direito a sua espc-

cificac;ao331, nao sera violentar 0 pensamento em que uma

e outra coisa se aflImam - nao obstante 0 seu objectivo

ultimo, que vai em sentido contrario - seatribuirmos a «tecnic:u,

assim juridicamente conformadora e especificadora, tambem

a qualidade juridicamente constitutiva em que aquelas duas

outras qualidades se vem realmente a traduzir 332. E e, na

verdade, 0 que a paradoxa] solucao dada ao problema das fontes

formais s6 confirma.

Era GENY bern consciente de que a l6gica estrita doseu pensamento, dado 0 sentido que nela tinha a distincao

que analisimos, !he impunha reconhecer tarnbcm as «tontes

formais do direito positive», quaisquer que fossem - «leiescrita,

costume, mesmo a autoridade (iurisprudencia, doutrina) e a

tradicaos -, e enquanto integradas na tecnica, apenas como

«um outro conjunto de processos» 333 da arte juridica, mate-

rialmente dependentes e secundarios perante 0 direito mani-

festado nos edadoss, a sede essencial sua revelacao 333. Dai

que, tendo «Ie jurisconsulte en principe pleine liberte de

331 Cfr, supra , a referencia ao inspirador precedente da cforma~ aristo-

telica, « l a f o r m e, s o us / ' an g le p ie in e m en t p hi lo s op hi qu e o.332 Cfr, MIRELLA URSO, o b . l o c. c it s. , 71.333 Para alem, portanto, do s outtos processos t€aUcos esrudados no

III vo l. d a S c ie n c e e t t e ,h n i ~: os .ptOce5S0Splasticoss de primeiro grau - os

processes do formalismo e da publicidade - e osprocesses pla5ticos de segundo

grau - actuados 11M scategorias reais, as construcoes conceituais, as presun-

~oe5e as fioroes e a propria l inguagem juridicae.334 Cft. s up ra ; v id e ainda o b . c i t. , III, 81, S5. ;IV, 59 , 55.

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122 DOUTRINA

reconnaitre Ie droit positif au milieu des elements du donne-,

forcoso era aceitar que mesmo da loi ecrite non joue plus

que le role d'un moyen techniques 335. Par outras pala-

vras, nao The caberia, tambem em principio, um valor cons-

titutivo do direito - nao podendo, pois, admitir-se ~que 0direito positive se confunda com a lei escrita»326. E, todavia,

a valor que acaba efectivamente por ser atribuido a esse

«meio teenier», a fonte formal da «leiescrita», e bem a contrario

do que exigiria aquela 16gica. E que no estado actual da nossa

civilizacao haveria <Idesregles de droit qui postulent l'estampille

d'une formule legale. Et cette exigence, dont nous avons en

nous aujourd'hui le sentiment profond, se peut rattacher au

'principe de Ugahte', qui dornine l'organisation publique

moderne, baseee sur Ie regime, a nos yeux ineluctable, de l'Etat

de droit» 337. Dai que, se em geral «le donne doit, par son

essence meme, dominer Ie construio e, nos casos de contradicao,des elements techniques de l'elaboration juridique cederont

Ie pas aux elements scientifiques, qui enferment en eux la subs-

tance meme du droit» 338, 0 certo e que tudo se passara

surpreendentemente ao inves nas hipoteses de <lconflitoentre

a direito natural e a lei positiva escrita», ja que at a solw;:ao

sera antes a de prevalencia desta Ultima 339. A soberania do

Estado, «lone le pouvoir legislarif costitue l'atribut le plus elevee,

e 0 «principio da orden» - «principe superieur a taus autress

e a que se vincularia tambern 0 ~rincipio da legalidade.-

335 O b. ci t . , IV, 34, S 5 • •

336 Ibid. 34. E isto mo apenas extensivamente - como comecou apenas

por 0 ser no Methode , como vimos -, nus mesmo qua li ta tiva e fundamental -

mente, pois a lei seria meio tecnico de expre ssao e n a o sede constitutiva OIl

-dado- do direito.337 o b. ci t . , IV, 37 , s ..

338 Ibid., 60.339 IbM., 69, 55•.

AS FONTES DO DIRE ITO 123

justiflCariam 0 entorse, a completa inversao de planes e de

intenc;5es. 0 que, aceite embora em termos de excepcao e

nurna confessada contemporizacao pragmatica 340, nao pode

deixar de entender-se em termos de vermos aqui implicitamente

reconhecido urn valor juridicamente constitutive a fonte formalda lei. Sera esta uma solucao realista, mas nao e menos 0

sacriffcio de uma tese e de urn pensamento que esforcadamente

tentavam caminhar em sentido contrario.

E nao s6 a esta fonte formal, mas a todas as fontes formais

afmal, se ted verdadeiramente de atribuir esse valor constitu-

tivo. Porque, se sao elas no seu conjunto que, ao vencerem a

referida vaguidade e indeterminacao do normativo obtivel

dos «lades», acabam por determinar 0 juridico - seles seules,

a proprement parler, fo nt Ie d ro it po sit i f , en fixant les regles,

de leur nature inconsistantes, que nous offrait l' elaboration

scientifique»341 - e especificamente 0 confonnam como direitopositivo dando «l'estampilie de la positivitb as regras juri-

dicas, entao nao se ve porque 0 caracter constitutivo que

e possivel reconhecer a uma delas se haja de excluir das

outras. Nao estao todas revestidas, e certo, da eautoridade» 342que corresponde a lei escrita, mas todas elas cumprem a

mesma func;ao - a que ftcou aludida - na «elaboracao inte-

gral do direito positive». E se a distincao entre 0 «d o n nb

e 0 «ons t ru i t» , entre a « s c i e n c e » e a « t e c h n i q u e » , com 0 sentido

que The deveria corresponder essencialmente, nao faz obsta-

culo decisivo a que esse caracter constitutivo seja imputado

a uma das fontes formais, tambem a nao podera fazer perantequalquer das restantes. Quer dizer, nesta interpretacao do

pensamento de GENY a solucao que nele obtern 0 problema das

340 eft. I bi d.. 7 4.341 nu, III, 83.342 eft. os, cl t . , IV, 25.

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12 4 DOUTRINA

fontes coincide com a do rnaistradicional positivismo juridico 343;

sio as fontes formais que, derenninando positivamente 0 jud-

dico, constituem s6 por si 0 direito como direi to positivo.

Materialmente 0 direito pode pressupor dados-factores diversos,

mas 6 adquire a qualidade de direito positivo se e quando asfontes formais 0 positivam.

Por tudo 0que a condusio geral a enunciar s6podera ser, na

verdade, a seguinte, Ou a distincao entre 0 donne e 0 cons t rui t se

rnantern no sentido originirio com que foi pensada - e entre

os donne e s , que ecientihcamentee nao chegam a revelar 0

direi to, e 0 cons t rui t , que «temicamente» 0 hio-de pressupor,

ted de interpor-se um seu processo autonornamente cons-

titutivo, processo que aquela distincao em si mesma recusa,

mas da qual acaba, no entanto, por mostrar a necessidade no

vazio normative que manifests. Ou a t echnique se reconhece

juridicamente constitutiva nas fontes formais - e os donne e s ,

enquanto tais, nern sao, nem nos dio 0 direito, mais nio sendo

do que ji dados problemiticos, ji factores porventura mate-

rialmente influentes 11a constiruicso do direito, mas nio eles

pr6prios constitutivos do direito ou susceptiveis de pouparem

o esforco de uma sua nonnativa e aut6noma constituicao.

Em qualquer das hip6teses, nao deparamos com fontes

materiais - no sentido rigoroso que neste escudo lhes atri-

buimos - e sim, quer com 0 fracasso de uma tese sobre 0

fundamento e de uina concepcfo do direito que as implicava,

no primeiro caso 344; quer simplesmente com 0 por em

343 Posit ivismo juridico que seria mesmo reassumido expressamente

na s U l ti m a V e rb a , afirrnando-se ai que de droit posit if est le seul droit veritable».

(apua M. VULEY, ok l o c . c i t s . 133; c fr . S. BELAID, E s sa i s ur l e p o uv oi r e re at el lre il lo t ma ti f J u j ug e , c it ., 75, em nota , que nos fala de urn .detour inutib a s posi-<;:oesda escola d:issica, que GENY ao prindpio combatia),

344 Conchisao esta que coinc ide, na verdade , com a jus teza deste ju izo

de BELAlD, ob . c i t ., 75, em nota: trata-se de eun €chee presque total dans la recher-

che e t l a def in ition des moyens propres Ii remedier aux insufEsances constateesde l 'ordrc juridique posit if• .

AS FONTES DO DIREtTO 1 2 5

evidencia de um momenta material no problema das fOUlesdo

direito, a ultrapassar a exclusiva perspectiva formal desse por-

blema no pensamento juridico tradicional, no segundo caso.

Cremos que e sobretudo este segundo tenno da alterna-

tiva que se devers reter: a constituicao hist6rio-positiva dodireito pressup5e e e condicionada pelos dados naturais, histo-

ricos, culturais, eticos, etc., da realidade humano-social- condi-

dicionada embora de um modo que havemos de analisar 345.

Posto 0 que 0 reconhecimento de um momento material no

problema das fontes nao pode relevar acrescentando-o apenas

as «fontes formais.), no seu sentido comum e positivista, como

acabou por fazer GENY , mais antes atraves de uma revista

compreensao desse problema, como se prop5e mostrar este

estudo, em que ji nao teremos «fontes materiais» nem «fontes

formais», e sim um m om en to m ate ria l e um m o me nto fo rm a l,

a integrar ainda com os momentos de validade e constitut ive,de urn global processo normativo da constituicao e rnarrifestacao

do direito.

Numa Ultima palavra: como quer que interpretemos e 0

que quer que relevemos no pensamento de GENY , sempre

teremos de conduir nao ter ele ultrapassado a concepcao

POSltlVlSta das fontes do direito, ao continuar a entende-las

apesar de tudo como «fontes formais» - ja porque e essa

34 5 V i de i ll f ra . Trata-se de uma conclusio que salva 0maximo da intencdofundamental do pensamento de Gfurr, mas que verdadeirarnente nem corres-

ponde a sua tcse originaria do d O l i l i e , nem e aquela, puramente fonnal-posi-

t ivis ta, em que contraditoriamente 0 vemos cair po r ultimo . E d.isto se Ilio

di coma CAlIJIONNIER, F le xib le D ro it - T ex te s p ou r u ll e s oc ia /o gr e d u d ro it s on s

rigeur, 17 , quando interpreta sern r r u J s 0pensamento de GENY no sentido dessa

conclusso, ao dizer : .Seulement, pour Gfurr, les sources II~eI1espouvaient

b ien approvisionner, nourrir le d roit: au fond, elles n ' etaient pas le dro it

lui -meme. Ell es ne devenaient l e droit ver itable , le droit posi ti f, qu' une foi s

fil trees para les sources formelleso.

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1 2 6 DOUTRINA

concepcao que preside a sua explicita teoria das fontes 346,

Ja porque a tentativa de referir 0 direito a unia investigavel

matriz material acaba por fracassar e ceder mesmo a preferencia,nos terrnos mais tradicionais, pela fonte formal por excelencia,

que e a «leiescrita», e no seu sentido mais «ingenuo-positivista» 447

ou do estrito positivismo legalista.

c ) Uma atitude ern muiros pontos analoga, e COllI resul-

tados urn tanto semelhantes, e a que nos revela tambem 0

pensamento de G. GURVITCH. Poe este autor de uma forma

particulannente clara, e nao menos exacta, 0 problema das

fontes do direito, quando nos diz que «esta questao nao eoutra que a de saber em que consiste a positividade do

direito, i. e , como 0 direito pode ser siruultaneainente posi -

t ivo 348 e n o rma t i v e e porque deve de ser necessariamente uma

e outra co isa», E assim as fontes do direito nao seriam senao«oscriterios desta positividade, ligada indissoluvelmente a norma-tividades 349. Sendo certo que a positividade do direito teria

a caracteriza-la duas notas essenciais: 0 ser «instituida por uma

346 Assim, em Me t h o d e d ' in t b pr e t a ti o n e t s o u r c e s e n d r o i t p r i v e p o s it i ], 2.' ed..347 Qua1ifica~o de A. Ross, Th e o n e , cit ., 56.

348 Quanto a este ponto, importa ter presente 0 enunciado seguinte do

mesrno Autor, L 'I d ee d u d r o it s o c ia l , 107; «Laregie du d ro i t , a cause da sastructuremultilaterale et imperative-attributive, ne p eu t e ir e I me r eg Ie pur eme n t a uwn ome ,

c'est-a-dire tirant sa force obligatoire d'elle-merne; die ne pe u t bre , IIcause dela reciprocite qu'elle supposse, u n e r e gi e p u r e m en t n O n J la t iv e ,puisque la recipro-cite a pour premisse l'efficience reelle dela regle. Le droit ne peut, sans s'affirmercomme un droit positif, servir a r ca li se r l a justice qui demande l 'ezabl i ssement

de la securite et de la paix sociale prealable. C'est precisement la justice, enrant qu 'e Jement consri tut if du dro it , qui exige qu' il so it posi ti f. Done, t ou td ro it e st, p ar s on e ss en ce m ~m e, u n d ro it pos i t i fo .

Enunciado em que vao decerto pressupostas as concepcoes deGURVITCH,

tanto dajustica como do direito em geral- sobre estas concepcoes, v i d e o b . c i t. ,

95 , 55., e pa s s im.

349 T h eo ri e p lu ra li st e d e s s ou rc es d u d r oi t p os it i/ ' in A n nl la jr e c it ., 1 1 4.

AS FONTES DO P lREITO 127

autoridade 350 qualificada 351 que nao seja identica a autoridadc

da regra em si rnesma, e a eficiencia real desta regra num

meio social dado». Nestcs termos, «qualquer 'fonte' do direito

positive tern de fazer a prova de que corresponde a esta dupla

exigencia, i. e , que representa a autoridade e que garante a

eficiencia desta, unindo pela sua propria existencia os dois

termos num so. Fonte do direito quer assim dizer: autoridade

sobre a qual se apoia a forca obrigat6ria de uma regra juridica,

e que, pela sua propria existencia, d:i a garantia da eficiencia

real dessa regra~ 352. Mas nao apenas isso; pois, de outro lado,

a positividade deve ir imanente a normatividade, e dai que

uma terceira nota se liaveria ainda de verificar - que a sautori-

dade» em si mesma, na sua propria existencia, encamassc

«valores», enquanto fimdamentos e imposicoes axiol6gico-

-norrnativos. Por isso, 0 conceito correcto e acabado de

fonte do direito seria afinal este: «autoridade qualificada sobre

a qual se apoia a forca obrigat6ria de uma regra juridica e

que pela sua pr6pria existencia, encarnando valores, de a

garalltia da eficiencia real dessa regra» 353.

350 Sobre 0sentido particular de sautoridadee aqui refer ida, e cuja exi-

gencia resultaria da natureza imperativo-atributiva implicada na intersubjec-

tividade jur idica, v. G. GURVITCH, L 'I de e d u d ro it s oc ia l, 114 , ss., e 1Uor i e

plural is te , ci t . , 116. Sentido diferente daqueles que a mesma expressao atri-buia GENY,quer ao considerar como sautoridades - que garantiria a obriga-

triedade da dei escrira», p. ex. - 0poder prescritivo que manifestaria a esobe-

rania do Estados (Sc i en ce et Techn ique , IV, 75, 55.; Methode , cit. I , 115 S5.), querao incluir a doutr ina e a jur isprudencia na .denomination generique d 'Au t o -

ri te ' c(Mhho d e , III, 2, 5 5 . ) . Se em GENYestes sentidos correspondem, respecti-vamente, ao concei to pol it ico cornum de autoridade e ao sent ido romano e

sociologico de «auc tor l t as», em GURVITCH a autoridade, como memento cons-

titutivo das fontes do direito, tern antes urn especifico senrido social-institu-

clonal. Para 0 senrido de auc to t i ta s , v. in fra § 3.·.351 .Autoridade qua li ficada quer d izer - e sc la rece GU1I.VITCH Th eo -

tie, 117- autor idade rea lizando a jus tica e encamando va lore s posi tive s• .352 L 'I de e, c it ., 133.

353 TMo r ie p lu r a1 i st e , 117; L ' Id ee , 133, com enunciado equivalente .

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128 DOUTRINA

Ora, onde deparariamos com «fontes» que satisfizesseni

todas estas exigencies? Nao as satisfariam sem mais as «auto-

ridadess habitualmente citadas como fontes do di reito posi tivo:

a lei, 0 costume, a pritica judiciaria, as convencoes (actos-

-regras), estatutos, etc., porque essas nao dariam em si mesma

garantia, «nern quanto it sua qualificacao 354, nem quanto it sua

eficiencia real» 355. Seria assirn necessario procurar rnais profun-

damente a «base da validade das pr6prias autoridades», desco-

brindo as «fontes das fontes», i. e , as fo nte s p rim a ria s e materiais

em que se fundam as f on te s s ec un d a ri as , as quais verdadeiramente

nada mais seriam do que «processos tecnicos de consta tacao» 356

das primeiras 357. E se as fontes primarias nao podiam ser

«simples factos sociais» - pois careciam como tais de normati-

vidade -, ou apenas «posrulados ideais» - dado que a estes falta

positivi dade -, sendo certo que 0 direito mao pertenee inte ira-

354 A su a <qual if ic a"a: o- nao a te ri ar n es sas , fonte s> em s i mesmas, mas

na inteIl'<io e conteudo normarivo material que exprimissern, nos valores que

encarnassem,

355 Para explicacdo deste ponto, v. L ' Id ee , 133; Th i o r i e , 117 - e que se

resume no seguinte: urn costume, uma decisao judicial, etc., nao nos rnostram

s6 pot si que sejam qualificados para criar direito novo, derrogando 0 direito

ja existente; e a lei, mesmo se formalmente perfeita, nao garante gem mais que

nao entre em colisio com a .propria estrutura do direitos ou que nao fique

simplesrnente no papel e de facto normativamenre impotente,356 Observe-se no entanto que os «metodos de constatacdo dos·'factos

normativos', des quais 0 direiro ~ositivo tira a sua forca obrigatoriae, seriam,

segundo GURVITCH, de duas especies: «processos tecnicos formals- e euma visao

di rect a e imed iaza do ' fa ct o nor rnati vo 's, a t raduzir er n a cons ti tu ic ao, r espect i-

vamente, do .d irei to pos i t ive [o rma l . e do . J ir e i to p o s i tj v o imu i t i v t » . A estes

dois modes de dererminacio do direito vemos agora - in G r ll nd z# ge d e rS oz i% g ie d es Rech t s , 2.' ed. 148, ss . - a cre scent ado urn te rcei ro , 0do «direito

flexivel e determinado a d h o c> . Pelo que , ne sta nova classificacdo teriamos antes

•direito previarnente fixadc», edireito f lexi vel e determinado a d h oc >e odireitointui tivos, Sobre 0que deva entende r-s e por ed ire it o in tu irivos , v . GUl I.VITCH,

L e t em ps p re se l: ! e t /'id ee d u d r o it s o ci a l, 279, 55.; ID. L ' Ex pE r i e nc e j u ri d i qu e et

[a p h il o so p hi e p /u r a/ is t e d u d r o it , 130, S5.

357 L ' Id ee , 133; Theo r i e ,117 . Sobre a pluralidade e 05 d iversos t ipos de

•fontes formaiss, v i d e esta segunda ob . c i t . 120, 55.

AS FONTF.S DO masrro 129

mente nem a esfera do 'dcver-scr', neui a esfera do 'ser', mas a

uma esfera intermcdia que ultrapassa esta oposicao», aqucla csfera

ou «0 dominic das significacoes norrnativas, referidas a 'rcalidadeespiritualizada' da cultura (Ku/turl l l irkl ichkei t» 358, cntao aquelas

fontes seriam verdadeirarnente i f ac t os n o rma t i v o s» , i. e, realidades

sociais que «rnaterializam valores extra-temporais» 359, ao «encar-

narcrn pela sua propria existencia valoi es positives intrfnsecos

(da caracter juridico e nioral)», e sao por isso qualificados para

desempenharem «0 papel de autoridades impcrsonalizavcis no

estabelecimento de regra de direitoe 360 361. Reahdades em que

«se produz esta interpenetracao do ideal e do real, dos valor cs

e dos factos 3(,2 -- «idees objectives devenues faits sociaux» 363.

Factos normativos, neste sentido, te-los-iamos em todas

as formas socialmente reais de associacao, ja de caracter coor-

denador, ja de indole integradora - ou seja, c rcspectivamente,

«factos normativos de re l a f ao c om o utr o» c «factos norrnativosde ull i i io ou c omunhdo» . Os primeiros manifestariam 0 «comcrcio

juridicm e, tendo na base as relacoes sociais de simples «inter-

dependencia», dariam origem ao « d i r e i to i n d i v idua l » ; os segundos,

exprimindo a «sociabilidade por fusao c interpcrietracao» - que

iria desde a «111aSSa>l a «comunidades ate a «comunhao»-

358 L'Uh, 115.

359 I bi d., 2 0.

3(,0 Ibid. , 114 .

361 Sobre a origem da dcsignacao -facto normativos, eo propr io pensa-

mento basico que ela exprimc, devidos ambos a 1. PETRASIZKY, auror que pro-

fundamen te i nf luenc iou GURVITCH, sobrc tudo as sua s posi coe s no prob lemadas font es do di re it o, v ide GmvITCH, Le t emps pre I f l Il , cit., 279, 55., e L 'Expe -

r i ccnce jurid ique, cit., 153, S5.

362 T h e or ie , 1 1 8.

363 L ' Id ee , 115. Nesta base pod ia GURVITCH ahrrnar que .a posinvi-

dade necessaria do direito nao tern absoluramcnte qualquer re1a"ao com a inter -

ven~o do Esrado na vida juridici, porque a auroridade dos 'faetos norrnarivos'

e uma autoridade objeetiva e impcrsonalizivel ( ... ) e a sua existencia rUo is

coberta de modo algum pela do Esrado e dos corpos organizados em geral•

- L 'I df: e, lOB.

9 - Bot, <I. Fae. de Dir., Vol. Lll

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130 DOUTlllNA

seriam 0 fundamcnto do ( I{hre i to social» 3(,~. Mas de ambos estes

tipos de «faetos uormativos» se did. que «Sao intermedidrios

entre a sol idari edade idea l e a solidari edade de facto') ou «a mani-

festacao da solidariedade de facto realizando urn elemento da

solidariedade ideal»; pelo que, «num s6 e mesmo ac to engendramo direito e fundam a sua existencia sobre ele - 0mesmo e dizer

que, na sua existencia, a constituicao pelo direito e a geSla.c;ao

de um direito coincidem e identihcam-se» 365. 0 que irnplica

uma ultima nota decisiva: «estes factos norrnativos encon-

tram a sua justificacfo juridica no proprio facto da sua exis-

tencia, porque este facto apresenta nele mesmo urn valor

juridieo positive e serve a realizacao da justicai 366 667.

Nestes termos, ou com fundamento nesta concepcao das fon-

tes do direi to e da eorrelativa dis tincao entre os ( lactos nonnativos

ou fontes primarias» e «os processos tecnicos para os constatar

formalmente ou fontes formais», ter-se-ia de reconhecer que«UIlU lei, urn estatuto, uma convcncao, 0 propr io cos tume

nao produzem positividade juridica senao na medida em que se

apresentam como consta tacoes de 'factos nonuat ivos' pre-exis-

t entes». Que 0 mesmo era conduir que «a teoria dos factos

nonnat ivos, enquan to sao estes fontes prinui rias da posit ividade

do direito», anulava a doutrina tradicional e estatista das fontes

formais - «toda a tentativa pata erigir as 'fontes fonnais',

sublinha GURVITCH, em hipotcses absolutas (p. cx. , 0 'feiticismo

3 (04 L ' I d& , 141, 55., e p a ss ln i; T h eo r ie , 120, 55.; So z i o l o g i e , cir., 132, 55.,

139, S5 • •

365 T li eo ri e, 1 19 .

366 L' IdEe , 134; cfr. T I I e o r ie , 1 1 9 .367 Sendo certo que, scse quisesse «desmembrar 0 acto pelo qual sepro-

duz esta coincidencia, poder-se-ia talvez dizer que e pela ide ia de jus ti ca que os' factos norrnativos ' sao consrituidos (impregnando-se de valores correspon-

dentes, por exernplo, a seguranca , a ordern estavel , erc. ) e que 0 direito eoque de s engendram •. Assim, os factos normativos deveriarn sec considerados a

«caregori a const itut iva» do direi to , e est e <0 seu produto» - L 'I de e, 1 19 .

Cfr. i l l f r a , no ta 38 9_

AS FONTES DO Drl !E ITO 131

da lei' do Estado) sofrc assim urn fracasso definitive, ao

deseer-se a te aos 'facto s nonnat ivos' na p roeura do fundamento

da Iorca obrigat6ria do direito positive» 368.

Entendimento este das fontes do direito (}ue importaria,

nos seus corolarios, consequencias importantes, Desde logo,as seguintes. 1 ) Em primeiro lugar, havia de reeonhecer-se

um p l u r t 1 1 i s m o tanto de fontes primarias (<<factosnormativos»)

como de fontes formais. No que toea a estas ultimas, afmua

GURVITCH que (pode haver em principio Ulll numero ilimitado

de fontes fonnais, posto que os processos tecnicos para cons-

tatar 'os factos normativos' sao variaveis e podem sempre ser

inventados novos, A restricao do numero desses processos a

certas especies exclusivas (por exemplo, so a lei do Estado,

a lei e 0 costume, etc.) nao tern qualquer valor cientifico e nao

representa senao um dogmatismoi 369. E a querer enuncia r-se

a lista dessas fontes fonna is, deviam incluir-se ne la pelos menos(<<atitulo provisorio») dez: 1.0 0 costume; 2.0 os estatutos

auton 0 1 11os; 3." a lei estatal e 0 decre to administrative: 4.0 a pra-

t iea dos tribunais ; 5 .0 a pratica de orgaos nao judicidrios; 6 .0 a dou-

trina; 7.0 as convencoes e aetos-regras; 8.0 declaracoes sociais

(promessas, programas, sentcncas]; 9.0 precedentes; 10.0 reconhe-

cimento de um novo estado de coisas por aqueles meSl110Sque

ele lesa 370. 2) E111 segundo lugar, nao poderia afmuar-se

qualquer «hierarquia apriorica» entre as diversas especies de

fontes fonnais - pois mao sao elas mais do que constatacfies

de ' factos nonnativos' pre-existentes e t irarn des ta funC;ao tecnica

toda a sua autoridade». Pelo que (a afirma<;ao de preponde-

raucia necessaria de uma Fonte formal sobre as outras (p. ex.,

da lei sobre 0 costume e a convencao, etc.) nao pode ser just ifi cada

368 L' Idee , 1 3 4 _

369 uu«, 135; Thiorie, 119.

319 L' Idee , 137, so ; c T he otie , 1 20 .

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132 DOUTIUNA

de modo algum» 37l. 3) Em tereciro Ingar, havia tambem

de eoncluir-sc, cousiderada a natu reza da fonte primaria pr6pria

dos «faetos normativos» e a func;:ao sccundaria e meramente

tecnica que perante eles tern as fontes formais, que estas nao

scriarn afmal ind ispensave is, antes poderia obre r-se 0 direito

directauiente do facto normative «sem 0 intermediario dos

proeessos formais de constatacao» ~ «para a positividade de

uma regra de direito basta que 0 facto nonnativo, sobre 0

qual ela se funda, scja eonstatado». Constatacao quc se poderia

realizar por uma «visao imcdiata» daquele facto ou sem pro-

ee5SOS tecnicos fonnais e reflecridos: easo em que teriarnos 0

«d i r ei t o p o s it i ve hi tuit lvos, a distinguir do « d ir e it o p o si ti ve f o rma l ».

Este pensamento das fontes do direito, exposto assim Has

suas eoordenadas fundamentais, ofcrece sem duvida contri-

butos importantes para a teo ria geral das fontes, alguns dos

quais se pode mesmo dizer terern fleado definitivamcnte adqui-ridos, E urn desses contributes definitivos foi justamente 0

reconhecimcnto do pluralismo das fontes do direito. Senao

em tcrmos em tudo identicos aos que foram susreutados por

GURVITCH 372, 0 eerto e que se te rn hoje por irrecusavel a plural i-

dade dos polos ou mediacoes eonstitutivas da normatividade

juridica, a recusar a ideol6gica pretensao <.Juer d o monopolio

da sua criacao, quer da sua titularidade redutiva no legislador

politico-estadual '?. A n6s, porem, 0 que ncste momento

J71 L' Idec , 135. Para 0 desenvolvimento deste ponto, ass im como para

a consideracao dasrelacoes que sehaveria de reconhecer entre os <factosnorma-tivos», v id e T hi or ie 123, 5S . .

372 Os quais , alias , na propria tese do pluralisrno das .fontes materials»

~ como tais seriam os . f a e /o s n o n u a t i v o s , como v imos ~ nao deixar am de rer

adeptos - V. LEGAZ Y LACAMBRA, Fi lo .~(~~ae! Dered io , 3.' ed., 530, S5., 537, S.J73 Pluralismo que sed. mesrno conscquencia necessaria, segundo A. R. rN-

KEN, Ei l l ( i ihmng ill da s iuris t i scl« Studium, 227 s., dos Ienomcnos juridicos

actuais ci a <tendencia da descentralizacao- e da «pluralizacao material> (plura-

l ismo do «ri te rios dos valcres e fi cazcs na cri acao do direi to- ou plura li smo

de padroes normativos).

AS FONTES DO D lREI TO 13 3

antes de mais importa 374 e ponderar do sentido e do cxacto

fundamento desta concepcao das fontes do direito, e na mcdida

em que ncla sc reafirma, a sell modo, a tcsc das Ionrcs

materiais,

Ecsta concepcao 0 resultado de urn pensamento sincretico,

em que convergem influencias viirias. Confessadamente 375

in spi rado nas ca tegorias-di srincoes de DUGUlT (ent re «d:gle

de droit» e «rcgle techniques) e de GENY (entre «lc donne- e (ae

construit»}, c guiado pclo primeiro na proeura de 111il direito

socialmente fundada e anterior ao Estado 376 e pelo segundo

na pressuposicao de eertos «dados» ern que se verihcasse a Sua

emergcncia 377, vcio GURVITCH a iden tifi car esses dados de 11m

direito espontfinea c imediatamente social com (lactos norma-

tivos». Esta ultima categoria fora, por sua vez, sugerida por

PETRASIZKY nB, mas os factos normati.vos seriam cntendidos

agora sobretudo na perspec tiva do insti tuc ional ismo dc HAURIOU

~- com gue no fundo GURVITCH oincide, pois os «factos

normativos» nao seriam afiual out ra coisa do que «insti tuicoess:

«1 instituicao mais objectiva que a regra, enquanto tal, e preci-

samentc U111 facto normativo» .179, 0 di reito revelar-se-i a, numa

espontanea manifestacao social, em dados «£aetos normativos

de indole objectivamentc institucional ~ tal e , em suma, a tese

das fqntes materiais de GURVITCH.

374 Deixaremos, por isso, tarnbcrn inconsiderada a quesrao da validadc daenumeracao que GURVlTCH faz das fontes formais ou dos modes da dete rrni -

na~ao jurid ica, Sendo certo que, por u rn lade, essa cnurneracso pressupoeuma dis tin~ao entre fontes materiais (<factos normativos-) e fontes formais ,

que dis cuti re rnos a segui r, e , por out ro lado, e mniro dnvidoso que possarnos

inclui r todas essas . fontes for rnais s nos modes consti tu tivos do direi to , de

que tar nbern nos ocuparer nos - v. i n f ra .m T h eo r ic , 1 18 .J76 L'Ide( ' , 595, 5S.

377 L e te mp s p re se nt, 216 , 55.,

378 Lc 1(·IfI!'.' present , 279, s s.; L 'Exp e ri e rl c e J . ,r i d iq u ( ·, 153, S5"

379 L'Idh·, 119, s.; 647, 55..

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13 4 DOUTRlNA

So que, nao obstante, este pensamento nao e apenas a

repeticao dessas inf luencias conjugadas, pois tenta 0 seu proprio

caminho com uma autonomia que justifica que dele nos ocupe-

mos depois de termos considerado ja os outros em que se inspira.

Autonomia que se reconhece tanto na sua particular concepcao

da iusti tuc ionahdade normativa dos «fac tos norrnat ivos» como

na metodologia da deterrninacao da normatividade institu-

cionalizada em tais factos. Para alem de DUGUIT, preso no sen

elernentar naturalismo e no seu empirismo sociologico, e ultra-

passando tambem GENY , que nao deixou de oscilar entre urn

posit ivismo sociologico e um psicologico intuic ioni srno et ico -,

afmal tudo a mostrar-nos que ambos se mantinham ainda no

sec. XIX -, GURVITCH assimi lou ji a especi fic idade , se nao onto-

logica, pelo menos fenomcnologicamente cultural dos valores e

pode assim consumar 0 que diz ser 0 «ideal-realismo» de HAURIOU

(sinc reti ca sintese , tambem, de urn pensamento soc iol6g ico comdirnensoes metaf i s icas) no fenomenologismo s6cio-cul tura l dos

-faccos norrnativos». Pois estes nao serao verdadeirarnente outra

coisa do que ins ti tucionalizacoes sociais de sentidos axiologico-

-culturais - nada mais, em ultimo termo, do que positivacao

inst itucionalizada de valores .

Por outro lado, como conjunto de valores insritucional-

mente positivados se compreende tambem aqui 0 direito 380,

pelo que os ~factos norrnativoss serao simplesmente os factos

do dire ito (fac tos institucionai s) e 0 direito 0 contetido fenome-

nologico-intencional desses factos. E dai a «intuicaos, a evisao

imediata» como 0metodo - que se pretende fenornenologico ~

da deterrninacao originaria do direito naqueles seus factos-

-fontes 381. Metodologia que, comecando por inspirar-se no

380 v. L'Idee, 95, 5S., e passim,

381 L'Idh, 132, ss.. E que se GRUVITCH distingue, como j:i foi alu-

dido, uma constatacao .intuitiva. do direito nos factos normativos de

uma constat acao . tecnica, formal e ref iect ida» , e ass im urn «li re iro posi tive

A5 J-ONTES DO DlRUrO 13 5

psicologico intuic ioni smo emocional de PETRASIZKY, acaba por

coincidir com a fenomenol6gica «intu icao emocional dos valorcs»

de M. SCHELER 382 - que outra coi sa nao e tambem aquelc ideal-

-realislllo que GURVJTCH assumiu c pretendc refundamentar J81.

Tudo assim a convergir nesta conclusao: os faetos ({£actos

normativos)}) e 0 dire ito sao apenas dois aspectos correlatives

de urna 111eS111aealidade, pclo que entre este e aqueles nao hi

distancia problematica. 0 mesmo e dize r que 0 di reito tem

a sua «fonte) no facto da sua existencia - que fonte do

direito e 0 proprio direito! Ora, nesta tautologia e como se

o problema das fontes se resolvcsse pela sua eliminacao

_ tal como, decerto com pressupostos e fundamentos diversos,

rlnhanios visto que outra nao era a conclusao do positivisrno

jurid ico tradicional na sua aproblemit ica conside racao do nosso

terna. Pois, na verdade, nao se contundira tambem em GURVITCH

o modo-de-ser do direitoCOIll

a fonte do direito e0

problemada determinacao objectivo-cientffica dele (0 problema das

-fontes da ciencia do direitos) com 0 problema da sua cons-

tituicao normativa (0 problema das «fontes do direito») 384?

Afirmar uma natureza ou modo-de-ser institucional ao direito,

contra 0 entendimen to normativi stico desse modo-de-set . reco-

nheccr que c a «instituicao» e nao a «norma» 0 objecto-fonte

da ciencia do direito, sera 0 mesmo que resolver 0 problema

i ntui rivo- de urn .di re ito pos it ive for r- iab, deve ter -s e igualmente em conta

que as -Fontes formais- sao modes ou Fontes secundirias da detertnina~ao do

direi to e de que este, por tanto, h i-de seuipre manitesrar-se originaria OLi pri-

mar iamente nos . faetos normativos- , na «ideal-real» normatividadc desses

faeces, qLIes6 lima aprecnsao unid.rio-fcnomeno16gica pode determinar. Por

i5S0 afLIll1aGURVITCH que a sua teori a dos <factos nor rnat ivos» e euma teori a

intuicionista dos valores apreendidos imediatamente nos faetos>- Thiorie, 11().

382 Cfr. L e t em ps p re se nt , c it ., 279, 55.; L ' E x p e ri e n ce j l lr i d iq u c , tii., 153, 55.

:\83 ViJ e L ' i de e , 113, 5S.384 Para a dis tincso entre . fo ll te s da ciencia do d ir eito» e .fon tes do

direiro», v. G. PEREZ , a p u d J . M. DESANTES GUANTER, Fuudame n t o s d e l derec lw

d e J a illjoffllaci<Jrr, 434.

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5/12/2018 As Fontes do Direito e o Problema da Positividade Jur dica PARTE II - Castanheira Neves - slidepdf.com

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136 DOUTitlNA

da sua const ituicdo norrna tiva , ainda que porventura 0 direito

sc manifesto em termos institucionais e HaO normativlsticos?

Anali sa r a «real idade especi fica do dirci to» J85 e 0 mesmo que

resolver 0 problema da constituicao especif ica da normatividade

juridica?

E essa analise, ela pr6pria, revelou a GURVITCH que na

realidade juridica, e assim na sua experiencia normativa, concor-

rem tres rnomentos irredutiveis: um fundamento normativo

(axiolcgico) de validade, a referencia a realidade hist6rico-social

c a relacao entre ambos, relacao espedfica c segundo um

processo norrnativo pr6prio em que 0direi to ted verdadeira-

mente a Sua rnatriz constituinte. S6 que 0 problema desta

relacao ve-se convertido no postulado de uma assimilacao do

va lor pela rea lidade hi stori co-socia l grac; :as a uma autoridade

institucional, 0 «facto normative», que 0 pensamento juridico

teria de pressupor, para s6 p o st f a ct um the apreender (cons tatar)o respectivo conteudo normativo-juddico. Nao se diz que

o direito nasce dos factos (como diz 0 sociologismo, seja de

DUGUIT ou outro) , nao se aceita que 0 direito se infira de

dados originariamente pre-juridicos (como 0 vimos preten-

dido por G E N Y ) , afirma-se que 0 direito e uma sintese inst i-

tucional ( tal como igualmente 0 afmna HAURIOU), mas 0 pro-

blema dessa sintese, no seu processo constituinte, nao chega

a por-se. Ou melhor , 0 processo norrnativamente constituinte

nao seria considerado pelo problema das fontes, seria apenas

tido em conta C01110 f ac tum no ~facto normative».

o ponto decisive esta, pois, aqui: isso que e facto parauma intencao de mera deterrninacao objectivo-cognitiva sed

urn irredutivel para a analise problemitica da consrituicao

do direito, uma realidade primeira tal como 0 e a criacao

385 Dessa analise se OCUpa,afinal, 0 .id.eal-realismo juridicos de GURVITCH

- v. L' Idee , 113, 55 . .

A.I FONTES DO IHREno 13 7

depois de ncla e por cla se ter manitestado a vontade do

Criador, e assim apenas susccptivcl de uma dcterminacao

e x po st -- 0 facto-result ado de Ulna consti tuicao insondavcl ou

entao 0 facto-resultado de urna constituicao cspontanea (se

naa irracional) que s6 a b e x tr a pode ser considerada 386?

Ou a constituicao do direito e antes aquilo mesmo que 0

problema das fontes devera explici tar, no processo problemarico

da sua normatividadc, c para 0 dominar nessa sua normativa

fenomenologia constitutiva? A racionalizacao das fontes do

direito, pdo pensamento jurfdico, corneca so depois destas

terem constituido 0 direito ou 0 problema das fontes e justa-mente 0problema da racionalizacao dessa const ituicao ?

Decerto que numa realidade valiosa, numa concreta reali-

za9ao axiologica, 0 inomento intencional de valor, «ideal» ou

de «devcr-ser», se assimila e integra numa unidade especifica

com a reahdade que forma 0 subs t ra tum material dessa reali-zacao valiosa - tomada assim urn «bem» -, pelo que a valor

s6 pode ser apreendido na intuicao fenomenologica-intencional

dessa unidade . Trata-se de aquela unidade espec ifica en: que a

objectivacao constituida se compreende C01110 correlato inten-

cional do acto e inteucao constituinte, c na qual 0 acto e a

intencao nao se cornpreendem menos, tambeni , C01110 correlates

intencionantes da objectivacao intencionada e constituida - do

mesmo modo que 0noeruatico e correlato objectivo do noetico

e 0 noetico correlato activo do noematico, S6 tendo, efecti-

vamente, presente esta particular unidade fenomeno16gica se

pode entender que se diga (e porque se diz) que nos «factosnormativos» - na sua unidade de realidade interpenetrada de

386 Tese que a plena ace it acao , no problema das fontes, da perspec tiva

epistemologica de HAURlOU decer to inculca ri a, s e dele pudessemos dizer ,

com GURVITCH, que via 0 direito <comouma verdadeira realidade espontanea»,

na qual a <pcnetrac;:ao.de uma ideia 011 valor numa realidade social se operaria

como uma .transubstanci~ao. - v. L' I de e , 6 6 2.

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138 DOUTRINA

valor - «a constituicao pelo direito c a gcstao dum direito

coincident c se identificam», que «num s6 e mesmo acto (os

factos normativos) engendrarn 0 direiro e fundam a sua exis-

tencia sobre ele», c que esta constatacao s6 possa realizar-sc

«por uma v is d o i m ed ia ta do facto normative», par uma «intui-

yao~. Simplesmentc, esta atitude metodo16gica s6 seria neces-

sari a (e a unica possivel ) tarnbem no nosso caso, se estivessemos

aqui perante realidades valiosas originarias ou a prio r i - i. e,

sc 0 «bem» em causa (a ins ti tu icao, 0 ( lacto normativo»] fosse

o primeiro, 0 originario e irredutivel «dado» da experiencia

em causa. Ou se, embora haven do de considerar-se essas reali-

dades como p osterius, a Bossa intencao em face delas fosse

apenas de constatacao, fenomeno16gico-compreensiva ou descr i-

tiva (se a nossa intencao fosse apenas a de aceitar e reconhecer

teoreticamente essas realidades).

Ora, nem 0 «facto normative», a objectiva inst itucionali-ZayaO do normativo juridico e 0 prius, quer na ordern histor ica,

quer na ordem de validade, ncm a atitude problematicamente

correcta, no que ao BOSSO tema se ref e re e perante 0 manifesto

a p os te r io r i da const ituicao hist6rico-social do direi to, e a de

mera aprecnsao e descricao fenomcnol6gica do seu dado-resul -

tado normative.

Que a ojectiva institucionalizacao do normative juridico,

indusivamente de todas as «instituicoess e de todas as «ordens»,

na sua material especificidade, nao e 0 prius e 0 corneco,

mas 0 posterius C 0 resultado de um csforco his torico-cultural

problematicamente analisavel387

, c hoje cada vez mais conscientee deliberado, C 0 que nos mostra a hist6ria cultural e jurfdica,

J87 Vide agora, no mesmo senrido, H. HENKEL, EinHihrul lg ill d i e R e e n ts -phi losophic, 2. a ed., 360-.Ainst itui cao como «sta tus. t ed . s ernpre de se r

precedida por uma acto de . inst itLJere>e este acto de pos~o e , para qualquer

consideracao cientifico-social, 0 agi r humane que fundamenta a qua lidade--status da insrituicao •.

AS FONTES DO DlRUrO 139

e sem que com isso se lIeguc a objectividade human a c a

digllidade ontologies que nessas instituicoes c ordens se rnani-

festam. Ja haviamos aludido e este ponto ao considerarmos

criticamente a «natureza das coisas». Assim como devcmos

reafirmar 0 que entao dissemos para recusar

aobjcctiva~ao

normativa ins ti tucionalmente histor ica 0 prius na ordcm de

validade. Pois nao se pode ignorar, digamo-lo agora com

ENGISCH, «que valoracoes como factos hist6ricos nao funda-

mell tall l a 'justeza' de urna regulamentacao, possam elas ofe re-

cer-se-nos sob a roupagem da 'natureza das coisas'. Precisamente

aqui se deve muito rigorosamente distinguir a q u ae s ti o f a ct i da

q ua e st io i ur is : e assim 0 problema de validade, mesmo relati-

vamente a norrnatividade institucionalizada, e sempre uma

questao em aberto» 388. Pelo que 0 «facto normative», e a sua

institucionalidade, nao pode ter-se por um qualquer absoluto

ponto de partida normativo-juridico, antes ted de ver-se semprenele urn ponto de chegada, 0 resultado ou a solucao de um

problema normat ive suscit ado pe la intencao de um fundamento

[ t ranscendens] dc validadc constituinte 389.

388 A uf d er S uc hc u ac h G e rc cl lt ig ke it . cil., 245. So ass im nao sera para

o tradicionalismo acrit ico, que confunde 0 institucionalmente existcnte com

a validade e atribui valor ao facto social so por ser de existente - 0que

significa, numa expressiva formllk{ao de LOMBARDI, como que ver 0 'passado

feito natureza',

3B9 0 que nao deixa de ter, verdadeiramentc, a concordancia de GUR-

VItCH, quando de propr io observa , depoi s de afmuar a -coincidenc ia», nos

. faetos normativos- , ent re a «cons tituicao pelo direi to» e a .gest alj :ao de um

direi to-, que .se poderia talvez dizer que e pela ide ia de just ica que os ' factos

normativos' sao constituidos (impregnando-se de valores correspondentes ,

por exemplo a seguranca, a ordern estavel , e tc .) e que e 0 direito 0 que eles

criarn. Pelo que e rnenos 0direi to do que a justica e osvalores que dela depen-

dem que deveriam ser considerados como a 'categoria const itut iva' dos ' factos

normativos', MOse oferecendo 0 direi to senao como sellproduto. No entanto,

para evitar a perigo da hip6stase d a justicaem 'direito haw ral ' e tendo em conta

a unidade essencial do acto pelo qual os ' faetos normativos' eriam 0 direi to c

fundam nele 0seu ser, sed. melhor ter em eonta sirnplesrnente, na carncteristica

dos 'factos normativos', a constatacao da identidade mcncionadas ~ L' Idee , 119,

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141) UOUTlUNA

Depois, sociologico-teoreticamentc 0 direito e uma rca li-

dade uorruativo-cultural, niu facto normative, um «dado» au

«sere social; mas normativo-juridicamente c uma intencao norma-

tiva que toma uma posicao rcgulativa e de validade perante

uma determinada realidade social 390 - uma intencao de vali-

dade normativarnente const itninte da realidade social. 0mesmo

e afmnar - importa repet i-Io - que normativo-juridicamente

o direito nao pod era ser compreendido sem a mediacao do scu

cspecf f ico p ro b le m a n o rm a ti ve 3')1 - com 0 t e lo s de normarivi-

dade que the e proprio, a problematizar regulativamente a

realidadc pda validade, 0 facto pelo valor, e assim, igualmente,

com 0 processo constitutivo que resolve 0 problema mediante

a fonnacso e a realizacfo his tor icas de uma concreta juridi-

cidade. E se sempre assim e , seru excluir decerto 0 pensar

juridicamente uma instituicao - outra coisa sed. pensa-la socio-

logica, hist6rica ou culturalmente -, ja que a sua norrnativa

juridicidade nao menos exigira que seja reassumida a b in tr a a

rnediacao normativamente instituinte, muito mais 0 problema

da formacao-object ivacao histori co-posi tiva do dire ito - 0 pro-

blema das fontes - exigid. essa mediacao normative-problema-

tico-consti tuti va.

Persiste, pois, em G. GURVITCH, como em EHRLICH, no

pensamento da «natureza das coisas», em DUGUIT e em GENY,

a tradicional atitude apenas epistemologica (ou teorerica) do

pensamento juridico: 0direito hi-de ser um pressuposto-objecto

a revelar-se, como tal, em certos tarnbem pressupostos dados.

o dado deixa de ser 0 voluntaristico pos i tum estadual da leipara ser antes referido a todas as realidades p o ss iv ei s - seja

390 E exacta, nest e sentido , a observacfo de HUSSON, o b . l o c. , dts., 40 :

< . . . 0propr io do direi ro nlo e exprimir este estado nele rnesmo, mas 0 esforco

que a sociedade, ou aqueles que neb sa o 05 condurores (meneurs), oficiais ou

reais, realizarn para 0 manter ou rnodificar».

391 Cfr. P. ROUBIER, ob . c i t . , 193; O. CONDORELLI, E x fa cio o ri tur iu s,

in S c ri tt i 5 u I dir i t to e sul lo s ta t o , 2 7 1.

As H)NlF.S DO DlHElTO 14 1

a I lleral llcl lte empir ico-sociologica, seja a onr ico-social , seja a his -

t6rico-cultural, ete.-, a todas as carnadas onticas que a dircito

dcccrto implica. So que, se as implica, por nao poder ser alheio

as realidades com que tern aver 0 homem, nem par isso

sera Hcito pensar que de qualquer dessas realidades elc jorre

sem dor (sem um particular esforco constituinre), originaria e

espontanealllente, como fru.to silvestrc que apenas houvesse

de co lher-se na rea lidade historico-soc ial , querendo assim dar-se

por resolvido 0 que justamcnte 0 direito e chamado a resolver

e 0 problema das fontes a esclarecer: 0 problema da objecti-

vayao historica de uma validade norrnativa. Sendo certo, par

out ro lado, que a recurso a (~fac tosnormat ivos» au a fenomenos

analogos, implicantcs de vis6es imediatas e do simples apelo aintuicao, traduz a renuncia - hoje inaceitavel - aos processos

reflexivos e problematicamente criticos, a favor dc uma espon-

taneidade que s6 pode ser honiologada por unia C01110 q ue

nristica do factual historico - Ulna das faces do historicismo

e do sociologismo - que desde SAVIGNY nao deixa de fazer

pressao no pensamento juridico. Pdo que rambem aqui se

poderia dizer que assim a direito deixaria porventura de ser

um «probema» - nao s6 porque estariamos nos com de nnersos

nos «factos normativos», mas ainda porque nesses «factos» ia

pressuposto ou realizada sem mais «a liga<;:ao entre a aCyao

empirica duma comunidade real e a accao eterna dos valorcs

moraisi 392, ia pressuposto numa palavra 0 proprio direito posi-

tivo e a sua positividade - mas nern por isso, ou sobretudo

por isso, deixaria de de ser urn autentico emis ter io».E a tudo isto acresce uma ultima observacao, E que,

mesmo que part issemos da ace it acao a b e xt ra de uma normativi-

dade que imediatamente se ofereccsse C111 certas realidades

socia lmente in sri tucionai s, continuaria a nao scr exacto a flfl lla r

J92 GURVITeH, ' Id e e, 1 1 7.

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142 DOUTRINA

e x fa cto iu s o ri tu r , pois a manitestacao do jurfdico enquanto

tal (da intencao e nonnatividade especihcamente jurfdicas) ainda

nesse caso nao poderia dispensar a inte rvencao de urn particular

niomento constitutive. Com efeito, a nonnatividade simples-

mente social oferece-se nao 56 com uma tal inde cermina <;:ao,mas ainda ao service de intencoes tao diversas (economicas,

politicas, culturais, etc.) que a qefmi<;:ao da sua juridicidade

nao pode deixar de implicar uma particular determinacao,

seleccao e reelaboracao, orientadas por uma especi fica intencao

normativo-juridica a objectivar de certo modo (mediante certa

«forma»). Reconheceu-o tamberu de forma expressa N. BOBBIO

- autor que vimos, numa primeira fase do seu pensamento,

nao menos interessado em sustentar que 0 direito emerge da

factual realidade social, como um certo conteiido de regula-

mentacao e de organizacao que os grupos sociais revelariam

em si ruesmos por «necessidade real» 393 -, ao ahrrnar que«a normatividade (juridica) ( ... ) cobra de uma seleccao operada

entre as multiplas relacoes que sao de inicio virtualmente

equivalentes na correspondencia ao fim a conscguir, a consti-

tuicao e a conservacao da convivencia» 394. Por i sso, «as fontes

do direito tem de ser consideradas como os instrumencos

da obra se1ectiva do direico: poem em acto 0 que e rueramentevirtual, atribuem validade hist6rica a informes exigencias,

orientarn a conduta social para urna mais do que para outra

direccao, contribuem a concentrar em formas rigidas e vilidas

~q3 LA c o n s uc t ud l u e, cit., 31, 5S., 75 , S5., e passim.

394 Ibid. , 79 , onde acrescenta: .I nfinitos sao os acto s e os facto s que

cons ti tuem tendencialmente mater ia para uma regulamenta . .ao soc ia l, mas

poucos sao aqueles que acabam por ser assumidos na esfera da regular idade

constitut ive de um determinado direito vigenre: esta obra de assun. .ao dos

facros e realizada pela autoridade social que age, ora mediante 0mecanismo

da tradi . .ao, onde tern lugar 0costume juridico, ora mediante 0mecanisme da

vontade dominante, onde tern lugar os actos no rmativos em geral, a lei em

espec ial», Cfr., em sentido ana logo, N. LUHMANN, S o zi o lo g le , c i t. , II, 207, 55..

AS FONTES DO D lREl TO 14.1

para a gcncralidade a tcndeucia dos membros de urn grupo

a propria organizacao; por isso tern valor constitutive da norma-

t ividadc, e nao meramente declarativo» 390. E dai que tambem a

«forma» - ou melhor, 0conjunto dos mementos constitutive e

objectivante -396

nao seja apenas um «factor tecnico» e «secun-dariof) de «constatacaos e antes um m e m e nt o e ~ pe d fi co no pro-

blema das fontes do direi to 397 398, no problema da constituicfo

his t6rica do direi to pos it ive.

Relativamente a estc pensamento se podera, pois, dizer

em resumo 0 que sempre se hayed dc dizer de todas as

tentativas de captacao iniediata do direito pre-constituido em

quai squer entidades normat ivarnente mate riai s que pudessem

discriminar-se na realidade humane-social. Que sed em vao

que sc pretended suprimir a mediacao e 0 problema do

processo constitutivo intcncionalmente jurfdico, ja que 56 por

esse processo 0 direito, enquanto tal, vem a sua manifesta<;:aoe logra positivar-sc. E sendo assim, 0 apelo a quaisquer fac tos,

dados ou pressupostos institucionais que ultrapasse os limites

da reterencia a relevancia juridica, da consideracao de uma

smateria» apenas condicionante ou mesmo codeterminante da

uorrnatividadc constituenda do direi to 399, para ver neles mesmos

395 O b . c it ., 79, s. V. tambem ROUBIER, a b. cit." RO.s.; TASSlTCH, L6

s uma ' s dll d ro i t po.!itlj; in AllllrIllire, ci t . , 136; cfr. LEGAZ Y LACAMBRA, Ilk c i t ., 535 .

396 Mementos estes dois que ROBBIO nao dis tinguia, para apenas falarde um memento formal.

397 Em scnrido malogo, HENKEL, o b . c i t. , 36B, que acentua a espccifi-cidade de -um processo comp licado s por que se realiza a ju ridiza . .ao dos

conteudos sociais institucionalizados, submetidos a uma a s s i rn i l a . .ao e trans-

forma ..ao constitutiva pelos varies modes da positiva ..ao da inten ..ao juridica,Ponto a que voltarernos com desenvolvimento illj;n.

398 V. TA55ITCH, ob . /0(, ci ts . , 236,55. Scm essemomento (ou momentos),

podera a inda dize r-se , nao se ult rapassa 0 nivel sirnplesmente socio16gico,

sern atingir 0 nivcl juridico do problema da s fontes do direiro - cfr . BOBBIO.

o b . c i t. , 15; e esp .[0 GANEFF, Le s S ou rc es d H d ro it pos i t i !; in AWl l la i re , c it ., 1 4 6,3 9 9 Vide i l l f r a .

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144 DOUTRlNA

o direito imediatamente oferecido, csra condenado a urn dos

dois resultados: ou a confundir uin pressuposto material do

dircito - um momento matcrialmente condicionante ou code-

tcrminante da sua autonorna constituicao - C0111 0 proprio

d irei to, ou aver nas objec tivacoes socia l-posit ivamente consti-

tuidas do dircito, e constituidas por U111 processo espedfico

que sc ignora ou oculta, 0scu fundamento originario pre-cons-

tituido ou espontineo. No primeiro caso, particulannente

caracteristico do sociologismo, do pensainento da «natureza

das coisas» e nao menos de GENY , reduz-se 0condicionado ao

condicionante, Ido compreendendo a distancia problem:itica

e constituinte que vai deste aquele; no segundo caso, em que

cabcm DUGUIT e de modo especial GURVITCH, identiticam-se

tautologicamente as fontes do direito com 0 pr6pr io direi to ,

vendo 0 sell fundamento e origem 110 que e a sua obra e

resulrado,

5. Considerados os pensalllentos que em tenuos mais

relevantes sustcntaram a tese das (~fontes rnate riai s», facamos

urna sintese dos resultados obtidos e simultaneamente uma

breve just ifi cacao do rumo a prosseguir.

ll) Nao lograram esses pensamentos denionstrar a tese

que se propunham: que 0 dirci to se ofereiYa imediata e origina-

ri amcnte em certos «dados» on num qualquer pressuposto mate -

ria l da realidade humano-socia l, ja que a manifestacao do

juridico nao se verifica sent uma especifica mediacao norrnati-

vamente constitutiva. Nem seria diflcil comprovar 400 pelaanalise da propr ia intencionalidade do jur idico, enquanto norma-

tivo, a inelinnnavel distancia de um predicante «dever-ser»,

que de modo catacteristico the corresponde, perante 0 «serl'>do

400 Alias , nao deixarernos de obter uma das formas dessa comprovacao

ao considerarmos, i n f ra , 0 «momen t o d e o a li d ad e s,

AS FONTES DO O lREl TO 145

scu «objecto» (a sociedade, a realidade humano-social), e que

assim , pela sua propria estrutura, 0 direito ndo podcra ser

nunca uiu origin:irio-pressuposto e siin apenas 0 objectivado

resultado de U111 juizo. Nao «dado» ou um qualquer «iacto»

scm iuais, mas sempre um «construido» em fun<;ao de uma

problem:i tica assurnida intencao regulat iva 401.

Todavia, sc nao lograram aquele scu objectivo, muito nos

ofereceram, no entanto, esses mesmos pensamentos para se

nao poder niais considerar 0 problema das fontes do direito sern

atender aos pressupostos materiais - sc s6 condicionantes ou

tambern codererminantes, ve-lo-cmos - que, enquanto tais, se

inipoem como factores irredutiveis no contexte global (hist6r ico-

-social e cultur al) da const ituicao problcm:it ica e da posit ivante

manifestacao do direito. Pois se e exacto que «as relacoes

soc iai s nao cunham 0 direito», tambem este nao forma em

401 Conclusao que esr.ina coerencia de tudo 0 que tcrnos vindo de dizer

e em que analogamente convergem hoje analises de perspectivas tao diferences ,

como as de A. BARATTA, Ric l ie rchc sri 'e ss er e' e ' do~er -essere ' ne i le spcr ienza

I lo r ll la t i~ t I e n el !« s cie ne a d el d i r i t t o ; R. KONIG, D as R ec ut ; 1 1 1 ZUSLl I l1l I l c I I /"mg

d er s oz in ie n N on nc ns ys tc mc , in S tu die n u od M atc ria lie u z ur R ech ts so zi% gic ,

2.' ed., 36, 5S., esp." 45 , S5.; M. DRATH, Grund IIl1d G re tizen d er Vetbin-

d l ic h ke it d e s R c c/ tt s, p a ss lt n ; N. LUHMANN, P o s i( iv ;l ii t d e s R e cl w a ls V o ra u ss e tz un g

t il le r / II o dc m e o C e s e ll .d w j i, in D ie F un le tio n d es Reclus i" dcr u t odeme n Cesel i sch4}i

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KAUFMANN, A tln /o gie un d «N atur d er S athe », pa ss im a le rn dos out ros ensa ios

do mesmo Autor incluidos in Rechl sph i /osophie is n Wal ldel ; a nossa Que s t i 1 o -

- de -j ac to - Q u e sl ii o -J e -J ir ei lo , 579, S5., 667, 55., e pas s im ; a lem das mui tas

posicoes gerais que sepoderiarn citar e de que apenas referiremos algumas das

mais conhecidas, como sejarn as de H. COING (Cru"dz i ige de r Rcch t sph i /osophie,

4. a ed.) , R. MARC IC (RechISphi iosop i l i e) , FECHNER (Rech t sp l l i /osophie, 2.' ed.)

e HENKEL (Einji"ihrulig ill die Reciltsphi/osophle, 2.' ed.): P. ROUBIER, Thlor i cg e , l e r a / e du dro i t , 2.' ed. , 192, 55. 203, 55. C pass i tu ,

10 - Bol. d. Fa c, de Dir., Vol. LTI

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5/12/2018 As Fontes do Direito e o Problema da Positividade Jur dica PARTE II - Castanheira Neves - slidepdf.com

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146 bOUTRINA

absoluto a realidade social, havcndo Si111entre ambos a solida-

riedade de compossiveis uma dialectica de condicionante-condi-

cionado, que, nao obstante a distancia e a mediacao referidas,

permite dizer exactamente que «entre 0 social e 0 direito nao

cxiste um qualquer abismos 402 e antes uma historico-intencional

correlatividade: se e certo que 0 social nao existe simples-

mente pelo direito, embora nao se constitua sem 0 direito,

nao e menos certo que 0 direito nao provern sem mais da

realidade hurnano-socia l pressuposta, ainda que se nao constitua

tarnbem sem essa realidade.

E dai que nao possa aceitar-se ja hoje a concepcao abst racto-

-atemporal da constituicao e da positividade juridicas - pese

embora Ulna sua particular recuperacao no actual pensamento

sistemico-social sobre 0 direito 403 - e se tenha de subscrever

em comunhao C0111os pensamentos anal isados, mas em outros

termos, a intencao capital que os movia, e que era, C01110sabemos, a de romper com a unilateralidade formalista e

ideo16gico-estatista da tese tradicional das «fontes formais»,

propria do positivisrno juridico, chamando agora 0 direito do

plano abstracto, meramente analir ico e problemat icamente ahis-

torico, em que esse positivismo norrnativista 0 havia flxado,

a uma indispensivel referencia a realidade hist6rica e social

- realidade historico-social na qual 0 direito consti tut ivamente

se manifesta e tem a sua possibilidade, relativamente a qual e

402 FECHNER, o b . c it ., 202.

403 Referimo-nos especialmente ao pensamento sociologico-juridico

dc_No LUHMANN, 110 quadro da sua Iuncionalisrico-esrrucural cornpreensfo do

direito como lllll «s istemas chamado a da r uma re spos ta , a un ica que seria

adequada, a «complexidadc» d a realidade humano social actual a traves de uma«dccidida» ( imposta ou pos it iva) organizacdo de gene ra lizacao e redur;ao

congruences - V. o b. l ac . ci t . s upra , nota 401 e ainda P o si ti v es R e c ht Il/ld Id eo -

l o g i e in Archiv fUr Rcchts- 1I. Sozialphilosophie, 53 (1967), 531, ss.!D. Rech t s -

s o z i o l o g i e , I, 196, 55., II, 207, ss.; cfr. ainda do mesmo A., ug i t imMio l l d i l l e / '

Ver{ahre t l , 2.' ed., pas s im . Volraremos, in f ra, a este pensamento,

AS H)NTES bO DIREITO 147

solicitado a encontrar 0 seu campo de realizacao e tem de

just if icar 0 seu sent ido,

Mas intencao essa a exigir 0 seu cumpriruento em outros

termos, justamente porque nao e valida a tese das «fontes mate-

riais». Pois e de todo inacei tavel querer cumprir aque1a intencao

mediante esta tese, antepondo as comuns fontes formais a

propria realidade social elevada a imediata fonte primaria e

material, e cujo conteudo juridico originario aquelas fontes

formais se limitariam a constatar e a enunciar: se a tese eoutra, a perspectiva metodica c a mesma, e dai que 0 erro

capital subsisra, como nos pudemos ja dar conta, 0 erro

de perspectivar so teoretico-epistemologicamente a positiva

manifestacao do juridico, ignorando 0 processo problernatica

e norrnativamente constituinte. 0 direito COmO «preSSUposlO-

-dado», e 0 que num e noutro caso, e neste sentido sern

diferenca, se continua a sustentar. Recusa-se , e certo, 0 postu-lado politico do estatismo - «0 direito e a vontade prcscri-

tiva do Estador - , mas mantern-se 0 postulado epistemologico

do positivismo, Inclusivamente, podera mesmo dizer-se, man-

tern-se a estrutura fundamental de pensamento juridico propria

desse positivismo, pois 0 esquema dicot6mico «normas=-tactosr

nao deixa de ir presellte na preferencia por «factos~ que sao

normas ou tem normas: 0 dualismo estrutural dos dois terrnos

pressupostos em S1- afinal 0 modo errado de conceber a

intencao normativa - nao se ve superado ao subsrituir-se UIJ1a

separacao abstracta por uma coincidencia objectiva ou uma

simultaneidade de rnanifestacao.Erro este na verdade ftmdamental e 0 responsavel pelos

outros dois, tambern ja aludidos, em que se desimplica. Tanto

o erro de con6mdir 0 memento material do problema das

fontes - 0 memento daquela indispensavel referenda a reali-

dade humane-cultural e historico-social, que analisaremos=-com

as proprias «fonres», C011100 erro de anular 0 processo norma-

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1 4 8 DOUTR1NA

tivauiente constitutive do direito -- em que concorrcin ainda

os outros t res monientos, os mouientos de validade, constitutive

e de objectivacao - reduzido a simples acto e expediente tccnico

de manipulacao de uma juridicidadc que se teria a D essen t la

reve lado antes e iudependente inen te deles.

Se dissermos (1acto ) aque la rea lidade histori co-socia l cue

globalmente no «pressuposto mater ia l» e especialmente no

m em e nt o m a te ri al se havera de a tender, poderemos entao afirmar,

numa formulacao de CESARINI SFORZA404, excluindo embora

inteira coincidenc ia de sent ido 405, que «sem 0 facto 0 direito

nao nasce», sendo certo tambeui, e correlativamente, que 0

direito nao uasce do facto nem se manifesta no facto - trans-

cende regulativo-normativamente 0 £acto 406, ao mesmo tempo

que nao deixa de vincular-se aos seus pressupostos de facto.

Este primeiro ponto permitir-nos-a reconhecer - ainda aqui -

que 0 facto tambem faz parte do problema do diieito, c aconsideracao dos termos exactos dessa participacao, autono-

mizaudo 0 memento material do problema das fontes, e 0

objective que, de imediato, nos propolllos. A consideracao

especihca da consti tutiva inediacao nonna tiva remeter-nos-d,

depois, a analise dos outros mementos do problema.

b ) Sendo este 0 ponto que agora nos importa, 0 ponto

de saber como 0 «facto» - a realidade lrumana, his torico-social

4<)4 E x [a ct o ills ori tur, in Vecch l c C I ll IO V C pagine di f i/ os o fi a, s to r ia e dititto,IFilosojin e ( co ri a g me ra /c ), 1 60 .

405 J: i que 0 .facto. e pensado por SFORZA apenas como 0 «objecto-

-causas OLl 0 prcssuposto condicionante , no sent ido comum da relevfmcia

do -dado> para 0 problema jur id ico - e verernos i l l fra que no pressuposto

materia] do direito van a inda outras dimensoes constitutivas.

406 Ainda com alguma analogia com 0 que afinnamos no texto , diz

SFORZA, Ibidem, que «0 direito surge njio CO Il l 0 facto. mas com a qualiflCa~o

do facto .. Neste senrido tarnbem, e com mais detido desenvolvimen to,

v, SIMONE GOYARD-FADRE, E ssa i de cri t ique pl l e l l omer lO/ogiq l l e du droit, 66, ss,

entendendo a «iual if icac io jur id icae como urn .fen6meno de ideacao» que

resulta duma .valoriza~ao ».

AS fONTE' DO DfREIlO 1 4 1 )

c cultural, c ellquanto pressuposto material -- participa llJ

cOllstituiyao nonnativa do juddico, logo sc comprcendc que

aqui se c ruz a 0problema das Iontes com os problemas ontologico

c sociologico do direito.

o problema ontol6gico, porque, como pano de fuudo da

nossa questao, nao pode deixar de estar a compreeusao da

propria estrutura subsistence do jurfdico, a comprcensao dos

factorcs que concorrem, assim como da rclacao que eles entre

si cstabelece, na cssencializacao do dircito, Sera 0 problema

da possibilidade em geral do direito. 0 problema sociolo-

gico, em segundo lugar, porquc a esta possibil idade em gera l

acrcscc a ponderacso da sua possibilidade concreta, referida a

uma circunstdncia historico-social e humano-cultural. Ali as

d i l l 1 e ' 1 S o e s essenciahnentc const i tut iuas do direito, aqui a rea l i dade

que pa rticipa na cOl1stituifiio de urn certo direito.

Sem tcr de signiflcar isto, por outro lado, que a questaodo uiornento material do problema das fontes coincida C0111

o problema sociologico, poi s ueste Ul timo inte rvern mementos

quc vao para a lem do «momen to materia l», no seu scnt ido cspec i-

f lco, ou enquanto aquele memento, COUlO veremos, de uma pres-

suposta intcncionalidadc norrnativa social que codetermina mate-

rialmentc (peIo conte iido) a consti tuicao do normat ive juridico

c que no processo desta constituicao vai discriminada e explici-

tamenre assumida. Muito embora a possibilidadc sociologica,

com rodos os seus momentos - uns, nao tematizados mas

condicionantes, outros, tcmatizados mas nao nonnativos-,

sc venha a revelar como 0 contexte nao s6 de cmergencia,mas ainda de compreensao daquele especifico momcnto mate-

rial ,

Ass im, 0 problema das fontes pressupoe 0 problema e a

possibilidadc socio16gica, como csta pressup5e, por sua vez,

o problema c a possibilidade ontol6gica. Mas 0 que compete

espccificauicnte ao problema das fontes do direito nao sao os

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15 0 DOUTRINA

problemas des las duas possibilidades - esscs problemas importam

sirn ao problema do direito to ut c ou rt -, e s6 a comprecnsao,

na base cmbora dessa outra problenuitica, daquelc momento

material quc desta se discrimina para actuar explicitamente no

processo da constituicao norrnativa de um direito vigente 407.

Dai tambem uma indispensivel mera alusao aqueles dois pro-

blemas, comecando pelo primeiro.

6. Contra 0ontologismo juridico, com 0 seu essencialismo

ou apriorismo onto16gico de diverso cariz - a postular que 0

direito e imediatamente inferivel do ser ou de uru qualquer

ser, posto que at raves da maieutica de urna explicitacao racional

- e contra 0 voluntarismo nominalista tambem juridico, seja

incondicional ou «selectivo» 408 - que admite a plena dispo-

nibilidade normativa das cornpetencias formalmente legitimadas

como criadoras do juridico - e ainda, paralelamente, contra

urn radical object ivismo e um absoluto ideal ismo, reconhece-se

hoje que 0 direito, como todas as outras manitestacoes cul turais

em que 0 hom em procura realizar historicamente os seus

sentidos, nao e um pr6-detenninado sem autonomia nem uma

407 Podera dizer-se que os diversos pensamentos das -fontes niateriais»

como que pretendiam resolver 0 problemas da s Fontes do direito desdc logo

ou ao nivel ontologico e como problema ontologico ~ p. ex. ,0pensamento da«natureza das coisass ~ au ao nivel sociologico e como problema sociol6gico

~ p. ex., os sociologismos de DUGUIT, GENY e GURVITCH. Quando e cerroque, se 0 direito I lia se manifesta sem 0 seu fundamento ontol6gico e nao se

constitui sern 0 seu condicionamento sociologico, nao sao porern aquele

fundamento e este condicionamento que, respectivarnente, determinam concre-

tarnente e const ituent normativamente a di re ito vigente, Al ia s, quanto ao

pr ime iro ponto destes do is a que agora a ludimos, c fr. ja a pa rte de ste e studo

publicada no vol. anter ior (LI) do Bo l e t im, p ag s. 1 94 , 5S..

408 Como voluntarisrno selective se apresenta, na verdade, a concepcao

geral do direito, e da sua moderna pos it ivacdo, sustentada por urn LUHMANN -

a direito positivo ser ia , segundo essa concepcao, a decisdo selectiva de possi-

bilidades socia is numa intencdo de generalizacao congruente. V.Rech t s s o z i v -

l o g ie , c i t. , I, 27, 55., 190, 5S., II, 207, 55. e pa s s im; cfr. s upra , nota 403.

AS FONTES DO DlRHTO lS I

cria~ao scm condicoes. ji que, se pressupoc, scm duvida, lim

condicionamento que 0 possibili ta ao nivel da cxistencia histories

(existencia historico-social concreta), 0 decisive scntido (lue

c chamado a realizar, 0 sentido que 0 fundament a c sera 0

criterio ultimo do esforco concreto da sua rcalizacao, implica,

nao menos indubitavelmentc, uma autonorna detcrminacao

espiritual. E que se um certo direito nao sera scnao em conso-

nancia com urna realidade historico-social que 0 pennita, 0 soli-

cite e em parte 0 codetermine - scm cssa consonfincia, diga-

1110-10 com uma expressao em SCHELER 409, « e como se mordessc

em granito e a sua 'utopia' se desvanecesse no n ad a» - , de outro

lado ele tambem nao sera, no entanto, CO l 1 l 0 direi to e na sua

determiI1<l~ao normativa, scm a espiritual mediacao human a

siO'niflcantemente constituinte. Por isso se podera dizer, emto

gera1, c C0111 FECHNER, que, numa par te, teremos de considerar

«a forca cocrciva dos factores que se impoem ao direito a

partie do estrato real», mas em outra parte « f: responsavel pelo

dire ito a liberdadc do hornem» - havendo, pois, de COIll-

preender-sc que 0 processo juridico essencialmente se caractcriza

pda simultaueidade constitutiva da reterencia a urn «pressuposto'

de material relevancia com a autonornia de urn sentido «pro-

-postO» e111regulativa validade, a simultaneidade dialectica entre

urna Gcgebenhei t e uma Aufgegebef1hdt 4W.

E ao procurarmos agora saber qual e esse prcs supos t o , dcpa-

rarnos com uru campo pluridimensional de realidades (de con-

dicoes e faetores) que se conjugam, rclativamellle ao direito,

de urn modo especifico. Porquanto 0 seu pressuposto material

geral temo-lo na existencia de uma reahdade humana, his torico-

-social e cultural, em que, como tal, concorrem ndo apenas

409 Probietuc e in er S oz i% g ie d es W i ss el/ s, in Ve t s uche zu e i ne r S o zi % g ie

d es W is se ns , 1 0.410 O b . c i t. , 203, e pa s s i ru ; Cfr. no Bo l e t im anterior (LI), 193, s..

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15 2 DOUTRINA

«factores reais», cm scntido estri to - a realidade ffsica e biol6gica,

quer natural quer humana, e nao menos a realidade dos

factores cconomicos e das relacoes de poder-c ({actores ideais»-

cri terios racionais e eticos, val idades axiol6gicas e fundamentos

religiosos -, como ainda «tactores sociais» ou a traduzirem

objectivacoes especificamente sociais e mesmo norrnativo-sociais

- os costumes, as instituicoes, etc. S6 que e assim sobretudo

ao nivel socioI6gico e com 0 relevo que adiante analisaremos,

Ao nivel ontol6gico impoe-se-nos a reducao a dois tipos

apenas de factores - factores reais dc um lado e factores

ideais de outro lado -, sendo cerro que todos aqueles factores

aludidos exprimern ou U111se r rea l ou um se r id ea l, ou uma

particular sintese de real e ideal. Particular sintese que justa-

mente as 0bjec tivacoes culturai s hist6ricas (<<positivas») e as

objectivacoes de institucionalizacao sociais sempre realizam

-e dentre Ulnas e outras ternos tambern decerto «0 direitc» -,

a eXlglrem, por isso mesmo.. cada uma delas urn especffico

«factor ou prindpio de determinacao»: a determinacao do

sentido de intencao ideal a realizer no real ou a assimilar

pelo real 411.

.Com 0 que qucremos dizer, em prirneiro lugar, que a

rcducao a dualidadc destes dois tipos de seres e factores e a

ultima ontologicamente possfvel. 0 111eS1110 ainda sustentar

que tanto 0 redutivismo materialista como 0 redutivismo

espiritualista sao falsos na sua ideol6gica unilateralidade 412.

Pois sempre temos, de urn lado, os factores que potenciam a

material subsistencia, nao apenas do ser em geral, mas imedia-

tamente de urn concreto ser «exclusivo» (ou 0 conjunto dos

411 Sobre 0 . factor ou princ ip io de determinacao», a que nos est amos a

refer ir , e no sentido est ri to que a essa categor ia foi dado pot SCHELER, o b . c i t. ,v ide a seguir no texto,

412 Sobre «ideologia», 0 seu concei to (ou seue idos possiveis) e os seuselementos, v. in frn.

AS FONTES DO Dll !E lTO 15 3

«bens)) exclusives) 41J c quc, scndo assiru lactores da mcra exis-

tencia ou da imediata realidadc desse ser c que nessa mcsma

existenc ia e realidade se aftnnam, nierecem por i sso a designacao

de factores r ea is o u m at er ia ls . No dcuriuio da cxistencia-rcalidadc

human a ou do ser subsistente e exclusivo do lio 1 1 1C 1 1 1, sao

facto res dessa indole , decerto a na tureza soina tico-psiquica, mas

sobretudo os impulses ou pulsoes humanas espccificas, scjam

os impulses biol6gicos e as puls5es bio-psicologicas, sejam as

pulsoes dos interesses (econ6micos) c as puls6es de poder ou

de dominic. De outro lado, os factores que manifestam a

transcensao do ser ao seu sentido, a assuncao na cxistencia do

sentido da existencia, e que relativaruente a um qualqucr ser

[nnnano, individual au social, exprirnem tambern urn trans-

cender-se a uma intencionalidade de valida de signjficante,

a implicar uma universal nao-exclusao e meSl110 uma «inclusao»

comungada, que s6 pede ser comprccndida-assumida como

urn pressuposto e U111«berm espiri tual-ideal . Trata-se agora dos

factores M e ais o u e sp ir itu ais 414 - e que na realidade hU111al18

413 Os concei tos de sercs on bcns «cxclusivos»e de scres ou hens onao-

-cxclusivos» e «inc lus ivose VaG utilizados com 0 senrido que lhes irnpurou

L. LOMBARDI VALLA URI, C rite ri p er u n« p olitic « d el d ir ifto c om e s cie nz a. 61 , 55..

Assim, «bens exclusives» sao aqueles cuja «posseou gozo POt parte de urn snjcito

exc lu i logicamente a sua pos se ou gozo por par te de ourros. A procuta desres

bens funda lima espectalidade social de mutua exclnsao, C01110 as rex exteusae

cartesianas: aquilo que e ll lCU ( . •. ) njio e t en , ondc estou e ll nao hi lugar parati: 0 espaco ocupado por urn suje ito e subtraido a ocupacao dos out ros, os

sujeitos sao natutalmente exclusives, inimpenetravcis. Neste espaco, a expansao

de urn suje ito l imit a a de out ros: e portanto urn cspaco incompativeb. Bens

mao-exclusivos. sao aqueles «que nao cornportarn esta l imitacao (p. exem-plo, a verdade: quem conquis ta uma verda de nao 56 nao exdui dela osourros,

como pode facilitar-lhes a sua aquisi<,:ao).;«bens inclusivos- sao aqueles .cuja

posse ou gozo por parte de urn sujei to implica essencialmente a posse e 0 gozo

por parte de outros (p. cxernplo: 0 nos, ou 0 praze t do amor)• .

414 Se quiserrnos uma formula que, s implificando os resultados de Ull1J

necessaria fundarnentacao antropologica-filosofica, caracterize objectivamente

o espiritual-ideal, diremos que, na experiencia que dele tem 0 homern, 0 espi-

ritual-ideal manifesta-se sempre nurna distancia critica que 0 proprio homem

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15 4 DOUTRINA

mediante a razao e 0 cspirito 415, se explicitam como os

fundamentos e validadcs t ranscendent es , scjam religiosos ou

metaflsicos, et icos ou axiol6gicos, esteticos ou cognitivos: Deus

ou a sua assimilacao nos conteudos da fe, 0 bern, a justica,

a verdade, 0 belo, etc. Distincao esta que nfio sustenta a sua

valida de apenas ao nivel ontol6gico 416, pois a vernos confirmada

pela analise antropol6gico-fenomenol6gica 417 c vai inclusiva-

a ssume de si pa ra s iquando, no modo de l ima autod istancia ou t ranscende r,

exige ou assume, perante as suas impuls5es c apetencias exclusivas, urn funda-

mento e urn sentido universals para 0 que e e faz , pa ra 0 ser onticamente

experimentado e a aq:ao subjcctivo-interessadarnente actuada,

415 Nem deve , a inda , de ixar de se ter presentc a distincao ent re a r t l z i ia ,

a manifestar-se no pensamento racional, C 0 espir i to , a rnanifestar-se nas inten-

cional idades fundamentantes. Sea razao assume osp r inc i pi os ab s t ra c to - fo rma i s

da 16gica e aetna a racional idade critico-analitica do raciodnio objectivo-inte-

lectual, 0 cspirito assume os pnucipios intencionais-rnateriais signiticantes e

actua a racionalidade constitutiva da inteiigibilidade fundementanre , 0 espi-

rito c a fon te e sede da ide ia -princ ipio, que to ta liza e funda; a razao a fonte c

sedc do conceito-forma, que distinguc a objectiva. Disrincao que, partindo

de KANT e HEGEL, encontrou urn decisivo esclarecirnento existencial em JAS-

I'ERS, Razo l l y existenc in, trad. csp. de H. K ah ne ma nn, L ic ocs 2 . a e 4 . " e pcssiut ;

l!. ainda Phi losophic , 2. a ed., vol. III. E bern se podera dizer com J. LACROIX,

o p e rs o n al is m o c o mo a n ti -i de o lo g i« , trad. port. de Olga Magalhaes, 59, que«a grandeza do homem nao e a explicacso, ma s ;1 signiflcac;ao. No limite.

o absurdo e tudo aquilo que ser ia totalrnente explicado, mas nso ter ia sentido,

Alias, reconhecamos que a explica .;ao acontece na iminencia do ser e preSSL1-

pondo-o, e que 0 problema decisive e 0 do sentido do proprio ser».

I distincfo tambern para nos importante, porque e ao nivel espir itual,

nao no nivel simplesrnente racional, que 0 direito enconrra 0 seu principio

de determina.;ao':'_ v. i n fr a - , e por isso nao the sera nunca adequada uma

sua cornpreensao apenas instrumental-funcional ou racional- tecnologica,assim como se hayed de reconhecer insustcntavel no problema das Fontes urn

entendimento da sua positivacao em terrnos apenas Iormais.416 Cont inuarn a ser fundamentais, ne ste ponto, a s invest igacoes de

N. HARTMA,NN, D er A ufba u de r rea /e l l W el t (segundo a trad. espanhola deJ. GAOS, com 0 titulo: O nt% gia - III. La { J br ic < I d e l l !1 u nd o r e al ); e D as

P ro ble m d es G eis ti ge n S ei ns 15, 55., e pas s im , ao mostra rem no ser em gera l uma

lei categorial d a -independenc ia na dependenc ia - pela qual se a fi rma uma

especifica autonomia aosvdrios ~seres. oudominies da d i fe re n ci a ca o ( e sr ra t if i ca -

. ;ao) ontologica que exclui qualquer possibilidade de urn monisrno redurivo.417 Remeterno-nos para as analises dessa indole, entre rnuiras ourras,

de SCHELER, o b c it .; !D. D ie S te llu IIg d es M en sc He u ill Kosmos ; V. FRANKL D er

AS FONTES DO DIRE lTO 155

mente comprovada pcla expencncia historico-sociologica . Para

aqui basta que tenhamos presente esta (lltima comprovacao,

decerto de todas a mais «objective- e a rcferir num rapido

parenteses. E cremes que para tanto nada Fodera ser mais

concludente do que mostrar como uma analise dcssa cxperien-

cia inviabilizou a tese, e nao obstante se manter fic! aos scus

pressupostos cpistemologico-crit icos, que a partir tambcm da ana-

li se da mesma experiencia se propos negar radicalmente a distin-

t;aOenunciada - referimo-nos a tesc do material ismo marxista,

Pois, se MARX opes ao monismo (e redutivismo) espiritual-

-idealista de HEGEL um monismo (c redutivismo] econornico-

-materialista, sabe-se hoje que esta negayao da auronornia espc-

Mea da dimensao espiritual-culrural-c- a nega<;:aodo seu caracter

tambem de evariavel independente» relativamente a variavel

material-econ6mica - se fundou numa filosofia da hist6ria cons-

truida a partir da analise redutora de uma certa realidade social

que se pretendeu universalizar. Ora, nem essa realidade historico-

-social, como realidade humana que era tambem, admitia

aquela unidimensional reducao, nem e valida csta univcrsali-

zat;ao 418. A realidade ~ que nos referimos fo i, evidentemente,

a da sociedade industrial do sec. XIX europeu c a sua analise

redutiva ao econ6mico ou ao produtivo teve decerto a cxplici-la

a predominancia entao da funcional racionalidade tambem

eeon6mica - a instrumental racional idade «(POl' relacao a U11l

fiml> ( < < z w e c k r a t i o n a / » no sentido de M. WEBER) com motivacio

econ6mica - assim como a corre la tiva legit imacao social (<<aegi-

u n be d in g te M e n sd « ; FECHNER, o b . c i t. ; LOMBARDI, o b . c i t. ; P. RrCOEUR, T ra ua i! e t

pa r o l e , in H is to ri c e t Ver-ite, 210, 55., M . M f uL E R, Er {ah ru l I g lind Ge sch i cH t e , 81,55.,

223, S5., 297, 85.; MIGUEL BAPTISTA PERllIRA, Or i g i na l i d ade c n o v id a d e e m f i/ os o fi a .

418 Dai que .a sociologia do conhecimento. e a «ritica daideologies que

pode dize r terem as suas ra lzes emMARX, reconhecarn hoje no pensamento

do proprio MARX urn manifesto caracter id eo io gi co - v. R. KONIG-

W. KAUPEN, S ozi% g is cH e A nll ie rk un ge n zu m Thana .I de ol og ie u nd Re d u » , inS tu die n u nd M a te ria lie ll zu r R ed ,ts so zio lo gie , c it., 357, s ..

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15 6 I>OUTlHNf\

timacao de dominio») «por baixo» on com base sobretudo

numa institucionalizacao socio-economica quc se exprnma em

individuais titularidadcs juddico-sociais 4l'!. E rc la tivamcnte a

essa soc iedade que se podcra dize r que as «relacoes de producao»

se impuseram como fundamento de legitima~ao social c poli-

tica 420 e a partir dai sc suscitou a perspectiva que as via

como a determinante de toda a realidadc humano-social. S o

que esta legit il lla~ao e pcrspectivacao predominanternente econo-

mica, por referencia as «relacoes de producao», njio podia

afirmar-se para as sociedades anteriores (as sociedades «pre-

-capitalistas»] e nao pode afirmar-se tambem ja para as sociedades

pos teriores (as actuais sociedades cienr ihco-tecnologicas) aquela,

histor icamente bern c ircunsc rit a, que foi 0 ponto de referencia

do «materia li smo histor ico» de MARX.

Nao podia atirmar-se para as sociedades tradicionais ante-

riores, porque, como 0 mostram desde logo as anal i ses de urn

HABERMAS, que temos preselltes, a sua legitima~ao assentava

antes na institucionalizacao cu l t u ra l 421; e nao po de tarnbem

afirmar-se para as soc iedades avancadas do nosso tempo, porque,

419 Sobre todos e st es pontos a fiorados , vide J . HABERMAS, La tecillliqlle

et 1< 1 s c ie n c e c o tn n te < i d eo l og i l" , tr ad. fr anc. de J. - R. LADMIRAL, 25, ss ., e pass im.

420 o f. somente entfo -le-se em HABERMAS, o b . c i t. , 31 - que 0 esta-

tuto da propriedade, de reia (Jo poi l t ica que era, se rorna uma r e /a r J o d e p r od u ra o ,

porque ela encontra a sua legitimacao na racionalidade do mercado, na ideo-

logia da sociedade de troea e nao ja num estatuto de dominacao legitiina em si.

B antes 0 si st ema de dominacao que pode ser justificado invocando a legiti-

midade das relal( oes de pr oducao: e t al e 0 verdade iro sen tido da rae iona lidade

do direito na tu ral d e Loek e e Kant. 0 quadro institucional da sociedade nao

e senao media tamente polit ico; imediatamente e econ6mico (0 Estado cons-titucional burgues como 'superestrutura') •.

421 .A expr essao de 'sociedade tr adici onal' - acentua 0 Autor c itado,

Ibidem, 27 - refere-se ao facto de que 0 quadr o inst itucional repousa sobr e o

fund amento incontest ado d a leg it imac ao d ad a por c er tas int erpret ac oes mis ti ca s,

r el ig io sas ou metaf is ic as d a real id ad e no s el l conjun to , qu cr se t rat as se do cosmos

ou da sociedade. As sociedades 'tradicionais' existem enquanto 0 desenvolvi-

mento dos subsi st emas da acti vi dades racional por r ekl (ao a um fl fi l se mantcrn

n v i nt er io r do s lili l i tes da e f i cd c i a l e g i ti ! ll ( J ll t e da, tradicoes culturais •.

AS FONTES no DIREtTO 15 7

ainda segundo 0mcsrno Autor , «aciencia e a tecnica tornaram-sc

a forca produtiva principal» (e ndo os «meios de producao»

titulados em propriedade pri v ada) med i an t e 0 sistema de urn

cont i /J l I I I I I I racional- teeno16gico de global assimilacao que supr ime

inclusivamente «as condicoes da aplicacao da teo ria do va lo r-

- t r aba l ho tal como a vemos em MARX» 422. 0que, atraves de

infercncias que prescindimos de reproduzir, 0 leva ainda a

recol1hecer que «a polit ica ja nao e s omen t e um fen6meno dc

superestrutura) 423, suscitando-sc assim, para a dominacao politica,

a «necess idade de uma nova legit ima~ao)) 424. E de tude isto se

teria de concluir que «as relacoes de producao caractcrizam um

dominio a que sc liga 0 quadro inst itucional apenas durante

a fase de desenvolvimento correspondence ao capitalismo libe-

ral- 0 que nao foi 0 easo nern antes nem depois» 425. Conclusao

esta de tal importdncia, que 0 rcsul tado seria este: te r-sc -ia de

('fclativizar 0 campo de aplicacao do conccito de ideologia e da

teo r ia das classes», pdo que «0 guadro conccitual no seio da qual

MARX desenvolveu as h ip 6 te se s j im d am e nt ai s d o ma t e t i a l i smo hi s t6 -

r i c o exigird tarnbem de scr reformulado ern novos termos» 42{,.

Alias, s6 temos deste modo a confumacdo do que SCHELER,

depois de SOMBART, ja tinha acentuado, que «apenas na cpoca do

alto capitalismo (da hulha) se inicia de um modo lento a epoca

que pode denominar -se em tennos re la tives como predominan-

ternente ' e c o n om i c a , e cujas leis de descnvolvimcnto MARX nao

s6 exagerou de um modo naturalista, ate chcgar ao 'uiatcrialismo

422 Ibid., 35 , s s , , 43, s ..

423 Isto e , 0 proprio esquem» da analise marxista, «infra-cstrutura-superes-

rr ut ura-, ted. de ser fundamcnt alment c revisto, pois que nas actuai s soc iedades

avancadas ernudou a relal(ao entre 0 si st ema econ6mi co e 0 si st ema de dom.-

na l(1io pol it ic a; a pol it ic a j a n ao e so t n e n t e urn fen6meno de superes trutura. . o 'r Ibid., 38 ) .

424 Ibid., 39.

425 Ibid., 59 .

426 Ibid., 49 e 50 , respectivamente.

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15 8 DOUTRINA

historico', como generalizou ainda erradamente a toda a historia

universal» 427. Pois, «longe de valer, como queria MARX, para

a historic i n t e t ra do Ocidente, ou inc1usivamente para a historia

humana inteira, ao menos ate ao termo assinalado peIo niistico

'sal to para a liberdade' da futura soc iedade socia li st a superadora

da luta de classes , 0economismo s6 possui de fac to uma val idade

aprox imada e re lat ivamen te a uma epoca mui to definida da hist6-

ria ocidental moderna, e so da hist6ria ocidental- e ainda

assim se se libertar do seu geral caracter 'naturalista', que eaqui lo quc 0 converte no verdadeiro 'material isnio' econornico,

por referencia ao qual as relacoes econotnicas explicariam

univocamente 0 conteudo da natureza esp iritual» 428,

E dai, em primeiro lugar, que mesmo dentre os «faclores

reais» 0econ6mico nao se possa ter histor icamen te como sempre

o niais forte - «Nao hi no transcurso historico uma. variave l

independente constante entre os tres grupos supremos de facto res

reais, 0 sangue, 0 poder, a economia; hi sirn le is d e o rd em em

que corresponde a cada um 0 primado na aCyao de por ou tirar

obstaculos a hist6ria do espirito, i. e , hi uma lei de ordem

distinta para determinadas f a s e s no transcurso historico de LUna

cultura» 429. Mas sobretudo, e em $egundo lugar, que se exija

a participacao de variaveis de outro tipo para a compreensao

e analise de qualquer cultura (de uma qualquer realidade

hist6rico-soc ial cul tural ), posto que sao a hi storia e a sociologia

do conhecimento, elas pr6prias, a mostrarem-nos que uma

cultura nao e sornente uru processo ou U111 sistema de «autocon-

servacao», urn processo ou sistema de mera subsistencia doconjunto dos cntes e bens exclusivos, sendo cer to que os pr6prios

«interesses», que nessa cultura comandariam 0 conhec imento ou

427 Ob. dt. , 34.428 Ibid., 30, S..

429 Ibid., 31. Sobre a t ipologia das . fases. da evolu. .ao his torica, l ' ide as

paginas seguintes da mesma obra e Autor .

AS fONTES DO DIRElTO 1St)

imporiam 0 sentido da sua constituicao histories, provern

~ ainda agui e HABERMASa reconhece-lo - «ao mesmo tempo

da natureza c da r up tu m c ul tu ra l com esta natureza» 4.10. Possa

embora pretender-se, como pretendc HABERMAS,que esta ruptura

cultural e determinada pela l ibido de euma satisfacao utopica» 43J,

e portanto tarnbem ela refedvcl ao ssujeito transcendental (que)

en contra 0 seu fundamento na hist6ria natural da especie

humana» 432, nao deixa, todavia, de reconhecer-se simultanea-

mente que estamos ai num domlnio que stransccnde a pura e

simples autoconservacao» - nao se trataria ja de «rncios de

reproducao da vida», e sim de «defmicao» da vida. A implicar

isto, com efeito, uma outra variavel: ague1a que denotaria a

categoria « i n t e r a c c d o « ; distinta da ca tegoria « t r a D a l h o » c a csta

irredunvel 433. Se por «trabalho ou actividade racional em

relacao a um filii» se deve entcnder «quer uma actividade

instrumental, quer uma escolha racional ou ainda uma combi-

uayao das duas» ~ 0 domlnio da funcionalidade e da instru-

mentalidade tecnica -, por «interaccao» deve cntender-sc a

«(rela' fao moral» da «actividade comunicacional mediatizada for

sfmbolos», manifestada antes de mais na linguagelll, c que

pressupoe uma «tradicao cultural» ou um «conseuso» fundado

em valores e normas sociais. Pdo que aquela nova variave]

demarca um outro sector e uivel da realidade humane-cultural

4JO ,COIIIJ T i s s a li C C e t i t l fJrbso, na trad, francesa citada, 153 - que reproduz

a Ii~ao inaugur al pro ferid a pelo A. em 28 de Junho de 1965, em Frankfu rt,

e nao a monograf ia posterior com 0 mesmo titulo: E r kr n n tl li s u n d I n te r e ss e ,

4J1 Quante ao sem-sentido , em ult imo rer rno, des tas expli cacoes por

meras intencoes ou evasoes ut6picas, clr. a nossa . A R e vi l/ uf ii o e o D i te lt o» , 88 , 5S.

432 V id e i nf ra .

4JJ Trata-se de uma dicotomia car egor ia] que HABERMAS retoma de

HEGEL _ . V. 0ensaio « T r av a il e t i n te r ac ti o n» incluido na trad. ci t . , 1 63,5 5., - e da

qual diz. relat ivamente a MARX e depois de crit icar a rcdu~1ioque este Iaz da

segunda a primeira (v. i l l i r a e nota 440): d~.necessario substitnir 0 par forcas

produtivas e relacoes de producao por aquele ourro, rnais abstracto, de rrabalho

c interaccao-, L a t ec hn iq ue . . " ci t . , 59 .

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160 DOUTR1NA

e historico-social, 0dominio agora constituido pela «intersubjecti-

vidade de comprccnsao da intcncao» c do «sentido», pelos «factos

do espirito» [ Ta ts ac he « d es G eis te s) , C 0 dominio, pode ainda

dizer-se, de uma outra racionalidade, aqucla que MAX WEBER

dizia traduzir a «actividade racional por relacao a valores»

( ( W e r t r a t i o n t 1 I » ) 434. Trata-se, pois, da pariol'd c u l t u r a l consti-

tuida pelos factorcs e as dimensocs espirituais-ideais, insus-

ceptivel - pcla sua espedfica autonomia relativamente ao

natural de «autoconservacao» e ao instrumental- quer de uma

reducao ao «trabalho» 435, quer de uma simplificante interpre-

ta<;:aoideo16gica 436, enos remere as «questoes de ordem p n i t i c a Y > ,

que nao ja as «questocs de ordem t f c n i C t 1 » 437. E sc e isto,

ahna], retomar a aristotetica distincao entre 7t"pi~(~ e "t"bM"j,

4 : 1 4 Vide as ensaios cits., LI t e ch n iq u e . .. , 21, S5., 67, 55., c p a ss im ; C o n na is -

s au ce e t i l / terh , 148, ss. , c passim.

435 Dai a critica directa que HABERMAS faz a M AR X, po r ter jus ta mente

susrentado esta reducao - vide T ra rJ ai i e t i nt er ac ti on , l oc . c it ., 2 09 , ss., Cfr. M.

THEUNISSEN, Gese l l sc lwji IIl1d Geschichte -Zur Kritil: d e r k r it is c li e ll T h e or l e, 20, s.;

c 0 l lOSSO .A revoluf i io e 0 direito», 93, 55••4J(, Vide, alias, a critica que HABERMAS faz a tentativa de TOPlTSeI I de

uma interp re tacao dcsse t ipo, a propos iro do -dua li srno metodico» que nao

poderia deixar de sc irnpor entre as ciencias emplr ico-analir icas e as ciencias

hermeneuricas - L og ica d e Ill' s c ie n c e s o c la Ii, trad. italiana de A, Sanruceci 37, ss..437 Isto C , as «questoes praticass seriam as questocs hermeneutico-

-culturais que viio referidas a . «actividade comunicacionals au de rda~a:o signi-

ficante e que sao objecro das ciencias morais 01L culturais - c iencias que setiamorientadas pc lo f im «ie ga rant ir, no seio das t radi . .oe s cul tura is , uma auto-

concepcilo dos individuos e dos grupos susceptive! de orientar a aClj:aoe uma

compreensao reciproca entre os individuos e grupos diferentes» (Counaissat iceet illte rer , monogra f ia ja referida, segundo a ttad. francesa de J,-R.. LADMIRAL,

210) ou nas quais «acornpreensiio durn scntido esd vitado para a possibilidade

de urn consensus ent re su je iros agindo no quadro d e uma concepcao de si

que lhcs veni da tradilj:i io.- questoes que, segundo HABE RMA S, s er ia rn o ri en -

tadas par «urn interesse de conhecimento pratico par oposi. .1io ao interesse

teenier». ( C o nn a ts sa n ce e t in t f re r , li..ao inaugural cit. 149). .Pdtica. e, po i s, a

catcgoria para a significante da aClj:a:ohist6rica oposta a . categoria «tecnicas,

~ qual se refere apenas ao instrumental fmalistico do rrabalho, cnquanto aquela

l':llpilca 0 .factor humane» (efr. LADMIRAL, prcficio a . traducao da monografiacit., 19, nota 15) da cornunicacao ou da interaccao.

AS FONTES DO DIREITO 161

c assim porque a esta «critica da razao instrumental» c irre-

curavel «0 dualismo de real e ideal, de realidade c verdade»,

dualislllo que a ultima unidade que se afirme entre «teo ria c

pratica») nao anulara decerto, como a nao anulava a unidade

analoga que era ja pr6pria do pensamento escolastico 438 e de

novo se veio a encontrar em Vrco, Depois, se e no dorniniopreenchido pelas questoes de ordem pnitica ou axiologico-

-culturais que se defme 0 «quadro insti tucional» de uma socie-

dade - «0 quadro institucional de uma sociedade consiste num

conjunto de norrnas que guiam as interaccoes mediatizadas pela

linguagem» 439 -, t ele entao antes de mais, com a sua dimen-

sao axioI6gico-cultural, que importa relevar, ja que (Q conscien-

cia tecnocratica mascara 0 facto de que 0 quadro institucio-

nal ( ... ) nao pode ser assim reduzido segundo 0 modele dos

sistemas de actividade racional por relacao a urn fun senao ao

prc<;:odum cncerramento desta dimensao, que e a tinica essen-

cial, porque a suseeptivel de hurnanizacao» 440 - e sendo certo

que (0 progresso tecnico-cicntlfico de modo algum leva ja em

si urn progressivo desenvolvimento do agi r ccmunicativo» 441.

Estes os resultados que 1105 oferece uma anal ise historico-

-sociol6gica ideologicamente insuspcita 442 de reconhecida quali-

f iea<; :aocient lf ica, a corroborarem a disrincao que enunciarnos

entre os factores reais e os faetores ideais, enquanto os factores

438 Vide , sobre estes pon tos que acabarnos de aludir, M . T H F. UN IS S EN ,

ob. ci t . , 15-19, em directa referenda a HORKHElMER.

439 La t e chnique , cit. 23 .

440 Ibidem, 65. Cfr. nosso ensaio .A Reuo luc iio e 0 Dire t to» 121 ss« " ..J M , . THEUN I S SEN , o b . c i t. , 21; v ide , na verdade, HABERMAS , Dogma t i s -

IIIUS, V l 'T t lU l l ft u n d F n ts c he i du r lg , in T he or ie a tl d P ra xi s, ed. ' Suhtkamp, 1978,

307 ss..442 Queremos dizer : insusceprivel de ser imputada a u rn p en s am e nt o

que se conside re como . ideologia. na defe sa de uma certa soc iedade e , nelade terminados intcresses, ja que jus tamente se t ra ta de urn pensamcnro que '

numa linha de mspiracao marxista e dizendo-sc steoria a l t ica», se propoe ser

radicalmentc critica da actual sociedade.

11- Sol. da Pac, d. Dir" Vol. LU

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162 DOUTIUNA

ultimos e entre si irredutiveis que concorrem ua constituicao

hist6rica da reahdade humana e socio-cultural. E s6 nao

fecharnos aqui 0 nosso parenteses por nao podennos prescindir

de uma breve reterencia, tambem esdarecedora, ao problema

dos fWldamentos. 0 que nos obriga a mudar de plano. Pois

quanto a saber qual 0 fundamento da distincao ou do dualismoque ainda deste modo acabamos de reconhecer, e esse desertourn problema que nao pode ser resolvido ao nivel daquela

analise 443. Se esse dualismo «encontra 0 seu fundamento na

hist6ria natural da especie humanas ou, de outra forma, se «as

operacoes realizadas pelo sujeito transcendental encontram 0

seu fundamento na hist6ria natural da especie»444 - e funda-

mento assim, em ultimo termo, de reducao naturalista 445 que

teria os seus «transcendentais», os pontos de referencia e pers-

pectivantes ultirnos, em certos «interesses»tambem da especie 446

- ou se antes nele, e pela mediacao humana, se manifests

urn dualismo ontol6gico (que nao apenas sociologico-cultu-

443 Ainda que s e p os sa d iz er com LADM1RAL,o b . c i t. , 27 , nota 23 , que se

trata de urna analise que «continua a f.losofu por outros meios s.

444 V i d e C o n n a i ss a n c e et i n t e rR i , lio;:aoinaugural, loc. c i t . 151,55.; cfr. LADM1-

RAL, Pre/ado ci t . 16., sS..

445 Pos to que , na subjecrivacao da «natureza em sit , 0 genero ou e.pecic

hurnana, em sent ido b io- an tropol og ico , pass a a ocupar 0 lugar , e lugar empir ico

agora, da sconsciencia em gcral- ou transcendental kantiana - cfr. M. THEU-

NISSEN,o b . c i t. , 13, 5., 23, 55.. Mas ja nao natu ra li st a no modo do nat ura li smo

unidimensional ou de c on t i nuum moni st a, como e prop rio do natu ra li smo

comum, que a distincao entre «trabalhOl e dnteraccao» (a que haveria ainda de

acrescentar -se a cri rica <auto-ref lexao" emancipadora, v. C o nn a ls sa n ce e t i nt er et ,

Lio;:ao, cit., 1 4 5, 5 5 - ) , a distincao afinal ent re <natureza ' e «ultura», justamente se

propos superar (Ibid. , 153, 55.). Natur al ismo c ri ti co ou transcenden ta l e ste , d ig a-mo-I o a ss ir n, que foi p recedi do e concorr e hoje com na ru ral is rnos ma is radicai s

- recorde-se 0anterior, e com muitos pontes de afinidade, naturalismo bio-

-vitalisra de NIETZSCHE, e agora os naturalismos antropologico e cientista,

respectivamente, de urn GEtUEN e de urn E.MORIN (0 p a ra d ig m a p e rd i do :

a n at ur eza h um an a, trad, de Hermano Neves), alem de outros.

446 Para 0 entendimento do que sejarn esses «interessese, remeterno-nos

para a5 o bs . c its ., C o nn ais sa nc e e t inthb, Li?o passim; C o n na is sa n ce e t in!edt,monograiia, esp.1<: 225, ss.; Pre/aclO de LADMIRAL a esta Ultima ob . 16, 55••

AS FONTES DO DIRElTO 163

ral), a integrar decerto ua rotalidade de uma originaria expe-

riencia rranscendental+" e na unidade global do ser 448, i. e ,se 0 dualismo ser-real (natural) c ser-ideal (espiritual) nao sera

s6 socioI6gico-epistemologicamente, mas ainda ontologicamente

irredutivel, e esta na verdade uma questao metafisico-onto-

16gica que nos rernete para uma antropologia e exige umafilosofia. Nao se trata ji de U111 problema teoretico-analitico,

mas henneneutico-reflexivo - nao problema de «ciencia»,mas

de «sapiencias, se assim quisennos dizer . . Ora, desde logo,

ranro na eidetica dcterrninacao dos «modos-de-ser» como na

Ultima intdigibilidade do sentido ontol6gico nao se ha-de

rccusar, nurna reducao arbitraria, 0 que ao nivel do ontico se

manifesta no fenomenol6gico «modo-de-dar-se». Nao decerto

para repetir nessa compreensao final (ou originiria) dos modos-

-de-scr e do ser a analitica dos modos-de-dar-se, mas para

evitar que um qualquer nionismo ontol6gico decretado fa!fa

violencia ao que se ofereee como essencialmente distinto naexpenencia ontica. E deste «realismo», podera dizer-se, que

depois da Fenomenologia 0 pensamento filos6fico nao mais

havera de dispensar-se. 0 un o da pluralidade onto-fenorueno-

logics nao pode mais pensar-se pela redc!fao a urn qualquer

447 Expressao e conceito que utilizamos no sentido que lhes ci a MAX

MUuER, E rJ ab ru ng u nd G es cili ch te , G ru nd zu ge e in er P hilo so ph ie d er F re ih eit a ls

t r an e e nde n t a l e Er /a l l r ung , 223, 55.; cfr ., ent re nos , MIGUEL BAPTISTAPEREIRA,

Compreensiio e A l t e r i dade , 80 , ss . .

448 Sobre 0 problema desta unidade e os erros meta fl si cos a qne a sua

compreensao tern dado [ugar, especialmente sobre a err ada .interpretao;:aogenetica» d a diferenciacao ontologica, a opor-se a i negave l « lis crecao no con-

tinuo hipoterico», v . N. HARTMANN, D e r A uf ba u, trad. c it ., 1 67 , 5S., 5 5 5, s s .,

e 558 , 5S., 597, 55 .; c fr . a inda , em geral, Autores e obs, cits. na nota anterior.

Sobre a considcracso deste problema em directa referencia ao ponte que mais

directarnente nos importa, de modo especial tanto a distin~ao como a integracao

na ordem to ta l do ser , que co rr esponde aos s er es real -natu ra l e i dea l- espir i t ua l,

enquanto participantes na constituicao do direito, II. sobretudo FECHNER,

o b. c it . Ill, S. e 190, 55.

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164 DOUTRINA

UIlI de ultima instdncia 449, e sim como urn inteligivel t odo

integrante de compossiveis, em que a correlatividade e mutuco

condicionamento nao anule 0 que haja de diferenciado e

discreto em «essencia». Ate porque, se uma filosofia-metaffsica,

tendo de cumprir 0 drculo hermeneutica da propria com-

preensao da totalidade ontologica, hayed tambern de ser conclu-dente a p os te ri or i e nao apenas linearrnente coerente num

dedutivismo a prior i 450, ism lhe impoe que assirnile compreen-

sivelmentc, e nao iluda, os resultados e contr ibutos fundados

da ciencia, E entao, 0 que acabarnos de ver e que 0 referido

dualismo ontologico, nos terrnos por que 0 aludirnos, e con-

sonante com 0 dualismo «cientifico», enqu:mto que aquele

monismo ontologico que se the opoe tem de postular a esse

nivel uma reducao, por prejuizo naturalista, que cientifico-

-fenomenologicamente se exclui. Adrniramos, pois, ate por isto,

o que fenomenologicamente se revela e cientificamente se

contirma e nao 0 que, apesar das indicacoes cientificas, preju-dtcialmente se postula.

Nem deixaria de ser significativo ponderar a inflexao que

o sentido epistemologico do proprio pensarnento a que nos

temos estado a referir - como que numa contraprova - veio

a sofrer perante a critics a sua transcendental reducao dos

449 Sobretudo quando essa reducio a 1 1 1 1 1 posruladamente previlegiado

se t raduz , como e comum nurna cer ta a ti tude redut iv is ta que sepretende legi-

t imar em termos de cri ti ca ideologica, no procura r uma «expl icacao causa l.

(explica¢io causal que e sempre redutora do «superior. ao «infe rior», p . ex.,

do etico pelo b iolog ico, do valo r pelo interesse, etc.. Pois a rdal(ao, ja decondicionalidade, ja de compossibil idade, que entre os terrnos relacionados se

possa reconhecer, uao explica nem anula a especihcidade essencial-objectiva

do .explicado. perante 0expli cador. pdo qUt aqui, como em out ros dominies

(para 0 dominic sociol6gico, vide N. LUHMANNP os it iv es R e ch t u nd I de v/ rg ie ,

in 10c . c i t ., 532, s .) , uma redul (ao causa l dest e t ipo ( :demasiado simples para

fner justica a complex.idade da realidade ou do ser que pretende dominar.

450 Cfr. N. HARTMANN,M e t! lp i1 y si k d e s E r ke n nf n is , segundo a traducao

francesa de R. Vancourt, vol . I, Inl roduri fo e 55, SS . .

AS FONTES DO DlRElTO 165

«interesses»das divcrsas perspectivas de conhecimento e culturais,

i, c , a sua exclusiva «orientacao praxistica» 451. Pois passou

a reconhecer-se tambem nele que a aq:ao pratica e 0 consenso

c0111unicativopressup6em, afinal, e para alcm dos fundamentais

interesses da relatividade perspectivante, um sistema de valores

culturais. Ora, setivermos presente que acirua do nivel pulsional'd 452dos interesses, tornados estes agora no seu senti 0 comum ,

e acima ainda do nivel funcional e si tuacionalmente espedfico

dos f ins 453, sc situa 0 nivel da universal idade dos valores 454,

45! Diz-nos, quanto a este pouto, M. BAPTISTAPEREIRA, b . cit., 75 S5.:

,A discussao com Luhmann mostrou que nao e de modo algum defmitiv a

a pos icao de Haber rnas em 'Erkmnt l l i s ~m d I l l t e re s~:e ' . A ~u~s~tuio;ao do abs-

tracto e mono16gico egenero humane' por urna realidade historica em processo

de formao;ao perrnit iu urna inflexao no scntido cia concrecao hist6rica e inter-

-subjectiva, resultando uma 'teoria de cornunicacao pela lingua.gem corren~e',

em que osinreresses passam para segunco plano por sercm ~ec~sSldades.e desejos

rnonologicos, que se desprenderam do consenso comutucanvo rr1atlvaffien~e

a normas validas assentes em valores culrurais , que orientam a 'aC\(ao comuru-cat iva'. A fun~o t ranscendental do valor em Rickert sucedeu em 'Erke l lnt l l i s

l ind Inte resse ' de Habermas 0 prirnado condicionanre do interesse, cedido no

dialogo com Luhmann ao estatuto priorit :' ir io da aCl(ao,nova condicao trans-

cendental de possibilidade da exper ienc ia ( .. . ). Ao proper uma ' ac<;aoCOIllU-

uicariva' , Habcrrnas referiu-a a valores culturais . . .a. 0 que, depois de outras

conside racoes que aqui se ornit em, l evar ia a conclui r em geral que mao e acomunicacao nern a inrer -subjectividade que geram a signif icacao comU111

co sent ido, mas e , ao contrario, 0 fen6meno originario da vivencia de sentido

que fonda a comunicacao e intecsubjec tividade e , por i sso , 0 consenso na

comprcensao de sentido e muito rna is que nma simples convencfc».

452 Cfr. in fra .

453 Que bern se podem conside ra r ani logos aos ' in te resses ' no sent ido

de HABERMAS.Sobre a relal(ao entre interesse, fun e valor, v id e i nf ra .

454 Universalidadc esta do axiol6gico que vcmos afirrn ada, de modo

expresso, tambem pelo pensamento sis t€tnico-funcionalista. «0 aspect? uni-versa li st a dos valores - le -s e na s iimula d e T. PARSONSsobre 0 «SIstema

socials,publicado in Th io r i e soc io log ique, org. po e B. BIRNBAUMF. CHAZEL,242

- impliea que ao nivel pertinen te de ref erencia, d es nao s:jam especlficos,

nem de uma s icuacao, nem de urna funl(ao ( .. . ), Quando sedl.Zque os valo~es

nao sao especificos de urna simacac, vai implicado que a sua vahdade normatrva

nao e funl(ao das categorias particulates de personalidades disponi veis como

mcmbros, nem por exemplo dos niveis particulates dos conhecimento.s t :cno-

logicos disponiveis para a realizacao desses valores . Quando a especificidade

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16 6 DOUTRTt>iA

; ,

reconhecemos igualmente que essa universal idade do axiol6gico,

com a intencao de validade que the e pr6pria, s6 pode scr

assumida pelo que antropologicamente transcenda a contin-

gencia da situacao e a relatividade concreta da fun~ao para

atingir 0 absolute justamente de validade, ainda que esse

absoluto se manileste a uma humana perspectiva hist6rica 455.

Possibi lidade esta que, insri tuindo a proble rnati ca da universal

validade a diferenciar-se da problematica da praxistica funcio

nalidade, s6 pode compreender-se, na verdade, como possibi-

lidade esp iritual e imped ira, como tal, a pretensa irrecuperave]

politizacao do pensamento 456, implicada sempre numa qualquer

antropologia de monismo material is ta .

Isto, em primeiro lugar, Em segundo lugar, hi a inda que

considerar 0 problema da sintese entre os factores reais ~ser

natural), com as suas impuls6es cxclusivas, e os factores ideais

(ser espiritual), com as suas validades inclusivas, no processo

da constituicao cultural. Problema de imporrancia decisiva

decerto, mas que em ordem a nossa investiga~ao nao temos

de atender com particular desenvolvirnento. E que, qualquer

que seja, rigorosamente ou numa analise acabada 457, 0 modo

como se haja de pensar 0 cumprimento daquela sintese const i-

turiva, sempre se ted de aceitar 0 principio pos to em evidencia

c ia s ituacao se introduza falaremos anali ticamente, nao de valores , mas de fins.

De urn modo semelhance, os valores sao independentes da diferenciacao

in te rna do si st ema na qua l s ao ins ri tucionali zados, des sao per tinentes a um

n lvel de gcneralid ade que 'rr anscende' a difer enciacfo funcionaI . ( ... ) os

valores defmem a direc"ao da orienta~ao que e desejivel para 0 sis tema comourn todoe. Alias, de f lagran te analogia com 0 dito no texto e a distin~o dePARSONentre -condicionalidade, e «normatividadee: R. DAMM, Svs t emtheor i eun d Recht 39 , S5., 114, S5. Cfr. in fra . .

455 Cfr., sobre este ponto, 0nosso ensaio ja cit.• A Revoi ll fi io e 0 Direi to» ,

l OB , ss..

456 Que tal e , como se sabe , a t ese capit al da •T e or ia a tti ca » - Cfr., sobre

este ponte LADMlRAL,ob . 1 0 c. c it s. , p as si n« .

457 Analise que, no dominic especifico do direito, nos oferece justamente

a obra c icada de FECHNER, R£cht sph i !osophie.

AS fONTESDO D1REITO 1 6 7

por SCHELER ao afirmar 0 factor espir itual- ideal como 0 « fac to r

de [ e t e rm i na i do» do modo-de-ser essencial (So5eistlsbescllO(fel1heit)

das cspecff icas realidades ou realizacoes histor ica e socialmente

cultura is e 0 fac tor rea l-na tural como 0 < fa ct or d e r ea li za fi io »

au de possibilidade . Poi s se qua lquer concre to dorninio cul tura l

ou qualquer particular e hist6rica obra cultural s6 peIo espiri-

tua l-ideal podera ver defmido 0 scntido por que culturalmente

se compreende, e portanto a intencao siguificante que visa

cumpri r, nao e menos certo que apenas pelo real-natural esse

sentido pode adquirir realidade (efectividade) e no modo por

que ai concretamente se assimile 45B. Este ultimo ponto nao

cxclui que os factores ideais possam relevar na pr6pria confor-

macae dos factores reais 459 - os quais s6 se imp6em assim,

verdadeiramen te, com uma « fa ta N t e t 1 lO d i fi ab l el > - , mas exige que

se reconheca serern a liberdade e a autononna dos factores ideais

~scmpre susceptiveis de suspensao, na sua expressao real, pelo

efeito da causalidade pr6pria da 'infraesrrutura'e - por isso etambern a sua liberdade uma « i ib e rt l m o d i fi a bl e » 460 -, e que,

por outro lado, 0 impulso e a posicao mesma dos problemas

a resolver pda intencionalidade constituriva da deterrninacao

ideal nao possa provir da dinarnica dos factores reais - tudo

458 Neste sentido observa ainda SCHELER, o b. c it ., 9: 0 ambi to c ia sua

'p05sibil i~o' (dos conteudos da cultura) objectiva e real Ilio esci determinado

tfeltl na sua existencia, t l em na sua essencia pelos factores ideals, mas 5 6 pelos

factores reais dados e a SUanatureza (.. . ). Por outro lado, e sempre uma empresarad ica imen te e n o n ea querer deduzir univocamente das r ei af oe s r em 's J a v id a, sejam

ctnicas, econ6micas, politicas Oll geopoli ticas, 0 conteudo corn sentido e com

valor pos it ivos de uma dada rel ig iao, de uma ar te , de uma f llosof ia c de uma

ciencia, de uma criacao juridica. 0 estado da s rela~i3esreais, a correspondente

combinacao d05 factores reais s6 'explica' aquilo que Ilio chegou a ser, apesar

de se encontrar compreendido no dmbi to de determinaclo essencial e intrinseca

da histor ia do espir ito rel ig iose ou j uridico relativamente a s l ei s do seu pro-prio sentido , e ainda que do ponto de v ista c ia pura his toria do espirito Fosse

em potencia t ao c apaz : de chegar a ser como 0 que veio a scr efect ivamente •.

459 Cf r., quanto a esre particular, HARTMANN.b. ci t . 570 , 5S.; e FECHNER,

ob . cit. 122, s., e 124, ss..

460 Expressoes e sentidos que SCHELER recebeu de A. COMTE-V. o b . c i t., 1 1 .

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168 DOUTRINA

isto numa dialectica que tarnbem havemos de considerar rcla-

tivamente ao nosso problema. Permaneccndo, no entanto,

discutivel nao s6 que os <lactores de realizacao- positivos e

negatives se jam aqueles que SCHELLER apontou 461, como ainda

quc aquilo que «unicamente 0 cspiriro e a vontade humanos

podcm fazer perante a marcha da historia real seja d;rjg;r c

ori en t ar 462 uma serie ordenada e flxa de fascs, sucessos e

situacoes submetidas a leis proprias, produzidas automaticarnente,

independentes da vontade do homem c cegas para os valores do

espfrito» 463.

E dito isto em geral, importa refcri-lo ao direito. Tambem

aqui h£ que distinguir 0 factor espiritual-ideal de detcrminacao

(de determinacao do senrido intencional fundamental que 0

constitui c o mo d ir e it o] e 0 factor ou factores naturais-reais ou,

em termos mais gerais e quc ao direito melhor convcm, Iactores

mate riai s dc real izacao ou da sua possibil idade historico-concreta.

Com uma particularidade, no entanto. E que 0 direito e uma

entidade cultural que pressup6e ja uma reahdade tanibem

socialmente cultural e so sc constitui a partir dela - e , pod eradizer-se, uma entidade cultural de segundo grau. E assirn que

461 Como factores posit ives via SCHELER 56 os esforcos de urna eli te '0

acto l ivre e a l ivre vontade de urn 'pequeno mimero"; em primeiro lugar,

chefes, precursores , pioueiros , ql1e sao imitadas por urn grande ntimero, poruma multidao •.

462 «'Dirigir ' ~ exp1iea SCHELElI. - e a fun~ao p rimaria do esp irito ,

'derivar' a secundaria. Dirigir e manter 11frente urna i d e i « tingida de valor;

derivar e por e t irar obstaculos aos impulses, cujos movirnentos correlatives

realizam a ideia. A direccao determina a forma da derivacaoe - o b. c it .Cfr. rD. , D ie S te li un g, c it. (segundo a trad. esp. de J . Gaos), 95, 5S.

463 Ao que acrescenta Ibidem, 27: «Nao podem mais nada! Onde as

ideias nao encontram forcas, interesses, paixoes , impulses e 05 'rnovimentos'

destes objectivados em insti tuicoes, carecem - qualquer que seja 0 seu valor

espiritual- de significacao par a a h ist6ria real», Para urna critica a esta

tese, da relativa .impotencia. material do espirito, pode ver-se FECHNElI., ob . cit.,

124, 55., apoiado na investigacao de W. J . REVERS, P e rs c na le K r it er ie n d e r m e n s-

ch l i che t r Tr i eb sph i ir e . Cfr. alias , N. HARTMANN, o b . c i t. , 560, ss. , 570, ss. .

AS FONTES DO DIREITO 1 6 9

o direito vern depois na ordein constitutiva, se nao mes1110 na

ordem historica, dos mores , do e thos social e meSl110 da insti-

tucionalizar,:ao irnediatamente cultural-social 464. Pelo que no

sc u factor de realizacao e possibil idade, no sell pressuposto

materialmente condicionante, participam tanto facto res reais

como factores ideais, e com a natureza e objectividade espc-

dficas de cada um desses dois tipos de factores. Te-lo mos-

trade ~ ter mostrado quais sao esses facto res reais e ideais e

em que termos concorrem em geral uns e outros, na sua

autonomia relativa, para a formacao do direito - foi 0 merito

de FECHNER, seguido por HENKEL e ZIPPELIUS 465 .

So que - e e este urn outro ponto a ter em conta-,

e starmos perante esses factores e fica rmos esclarec idos quanto

ao modo geral da sua participacao espedfica nao e 0 iuesmo que

termos um certo direito au sequer a eexplicacao» de a direito,

pois cste nao e a mera soma ou a resultante necessaria do

conjunto desses £actores, mas sempre algo, dissemo-lo ja, de

autonorno «pro-posto» e assim a constituir com base decerto,

mas para alern tambein desse spre-suposto». 0 conjunto dos

£actores considerados sera, como veremos, amdic ionan te , e mesmo

em boa medida codeterminaute, mas nao a decisiva det erminant e

normativa do direito au de urn certo direito, A sua deter-

minacao propria porvir-lhe-a de um factor especificamentc

aut6nomo - a espedfica intencao uormativa de d ire i to - que

haveremos de explicitar no « mo me nto d a v alid ad e» . Mas sem

significar tambem isto que a «factor de determinacfo» do

juridico seja ontologicamente de uma outra e diferente Indole- sera simplesmente de natureza espiritual-ideal, tal como os

464 Cfr, in fra.

465 E esse Iundauienralmente, como disscmos ja, 0 objective da o b . ci t .

de FECHNER. Quante a HENKEL, v i d c E i n [ ii h ru n g ill d i e Rech i s ph il o s oph i e , 2.' ed. ,

2.' e 3.' partes; e de ZIPPELIUS importa atender ao capitulo dedicado a sDas

Rech t UIIJ s e in e r e al e n Vorgegebenhe i t e t u , na suamonograha <Da s W e se n d es Reth t s« ,

3.' ed., 52, 5S.

17J

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170 DOUTRINA

factores desta natureza que se nos deparain 110 conjunto-

-pressuposto condicionante - ou que esteja acirna, num outro

e superior estrato, dos factores analogos concorrentes nessc

pressuposto. Pode antes dizer-se que esse factor da deterrni-

nacao juridica, enquanto tal, e um mediador, em termos

const itutivamente espedficos, entre os factores reais e os factores

ideais que historico-socialmente pre-existem e 0 condicionam.

E de tal modo que a func;:ao determinante que respectivaniente

corresponda aos factores ideais e, portanto, tambem aqueles

com que condicionantemente depara, 0 factor ideal espedfico

do juridico, 0 principio espiritual-ideal de deterrninacao do

direito , ou 0 p rin clp io d e v al id ad e constitutivo do nouum norma-

tivo-cultural que se manifesta c om o d ir eito , vern a operar no

modo exactamente de urna sobrede te rminacdo 466.

o conjunto de facto res reais e ideais rnaterialruente pres-

supostos e que condicionam, nos termos que verernos, a

concreta constituicao hist6rica do direito, e 0 que designamos

por pressuposto mater i a l . Da sua analise e assim como dessa sua

condiciouante relevancia nos vamos agora ocupar.

{ I

" i

7. Esta reterencia - decerto demasiado breve, mas que

desenvolv imento posteriores compensarao - a indole e posicao

ontol6gica dos factores que concorrem na constituicao do

direito apenas nos pas perante a discriminacao abstracta dos

tipos desses factores e ndo apontou mais do que a natureza

geral da sua participacao consti tut iva . Teremos agora de avancar

para uma perspect iva mais sociol6gica , ou para urna maior deter-

rninacao analitica, em ordem a atingirmos 0m o d o c o nc re to dessa

participacao no pressuposto material a que acabamos de aludir,

466 «Sobredeternunacios que formalmente nao deixara em muitos casos

de se oferecer em termos de (sobreconstru"aot ou de osobreconforrna ..a:o.

- no sentido que a estes conceitos e confe rido por N. HARTMANN, ob. dt.,

54 7 e 5 8 8 .

AS FONTES DO DIREITO

Poderia pensar-se que a consideracao dos dois tipos de

factores discriminados, por urn lado, c a tainbeni ja aludida

simultalleidade da sua relativa autonomia com a sua corre la tiva

dependencia (ou nuituo condicionamento) no processo consti-

tutivo em que participain, por outro lado, bastariam para definir

pelo menos 0 t ipo do respect ive relevo concreto. E, todavia,nao e assim. Decerto que aqucla relativa autonomia exclui

uma solucao tanto de tipo essencial-jusnaturalistico como unia

soluc;:aode tipo causal-sociologico, e esta correlativa dependencia

recusa tanto U111 apriorismo racionaHstico como um incondi-

c ionado voluntarismo posit ivist ico, Mas cont inua por esclareccr

o modo exacto da dialecrica constituenda. Pe10 que mesino para

cste aspecto do problema sao indispensiveis os desenvolvimentos

seguintes.

a ) Urn primeiro ponto ted de ser de anteiuao ponderado:

e exactamente qual a natureza da rclacao que havcmos de

pensar entre 0 direito e 0 seu pressuposto material no proeesso

normative global da sua const ituicao. E que sao at pensaveis

quatro tipos de relacao. E, como base para 0 enunciado dessa

tipologia e seu eselareeimento, sirva-nos uma alusao ao pensa-

inento de MONTESQUIEU,ja que e ele um classieo precedente

na problematica que estamos a eonsiderar 467.

467 Nao, evident emen te , por acaso, Mas porque pode dizer-se que

MONTESQillEU foi quem primeiro (e de can early enough point of modern

depar ture», na afl rma . .a :o de J . STONE, Socia l d im ensions o f Jaw arJd justice, 36

~ nao obst ant e 0jusnaruralisrno do seu tempo e resistindo a indole puramente

especuiat iva do utopismo eontratuali sta em que esse [usnaturali smo se expri rniue s e pensou t ri un fan te depo is ) ve rnos r ef er ir 0 direito aos seus pressupostos, na

tentativa de 0 compreender em fu~a:o deles ou pelo menos no quadro do seu

condicionamento por des. Tentativa que rigorosamente significou uma muta-

"a D de perspectiva: ao pensamento puramente especulativo-dedurivista (J priori

subst ituia-se urn pensamento d e in tencao object ivament e .c ienti fi ca ., numa

indole historico-sociologica e tipo16gica-analitica. Sem que isso exclua,

todavia , que no seu pensamento sc poss am dist ingu ir dua s o ri cn tacdes , a o rien-

ta. .a :o est ri tarnente ccienti fico-descr it iva. e uma orienta . .ao ja rnais .ideo16gico-

AS FONTESDO D1REITO 1 7 3

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17 2 DOUTRINA

Sabe-se, com efeito, que foi , analogamente, 0 seu problema

o dc compreender as «leis» (0 direito) por rden~ncia aos

pressupostos gerais quc as condicionariam ou dcterminariam

e com 0 objectivo, podera afirmar-sc, de ofereeer assim os

fundamentos de uma «c iencia da legislacao» 468 - que 0 rnesmo

e dizer, da constituicao do direito. E 0 principio com que

abre 0 «grande livro», para ao longo de demoradas analises e

reflex6es 0 pretender comprovar - «les lois, dans la signification

la plus etendue, sont lcs rapports necessaires qui derivent de la

nature des choses» -, decerto que, se niio significa ja urua

solucao na linha do essencialismo jusnaturalistico - essas «rela-

c;6es necessar iasi impostas pela natureza das coisas nao traduzern

urn ser juridico OU uma entidade normative-mater ial ontologi-

camente a prior i , mas impoein-se como a base da explicacao

e da cornpreensao do seu processo normativo constituinte-,

nao e menos evidentemente incompadvel C0111 a pos icao de

urn incondicionado voluntarismo positivista. Mas nern por

isso deixa de ser equivoco 0 sentido da rclacao ou das diversas

re lacoes das «lei s» C0111 os pressupostos ou factores que con-

correm para a sua formacao - pressupostos-factores naturais

(clima, territ6rio) sociais (populacao, economia), historico-culru-

rais (costumes, tradicoes, insti tuicoes) e espi ritua is (moral, rel i-

giao) -, relacoes que «fonuent tous ensemble ce qu'on appelle

H i' t , l": l

! \

~~

·l.,

-poli ti cas - para usa rrnos as expressoes de M. A. CATTANEO, lu min ism o e

l egislaz ione , 29-, ao mesmo tempo que aquela muracao de perspcctiva auroriza

que se diga MONTESQUrEU,om nao menos verdade, <0 fundador da ciencia

politica- (efr. L. ALTHUSSER,Monte squieu, a podti c« e a i r i s/or ia, tr ad, po rt. deLu z Cary e LUisa Costa, 17).

46B Cfr. G . TARELLO, P er u na in te rp re ta zio ne s is te ma ti ca d e « Ll es pr it d es

l o i s» , in Mater ia l ! pe r un a s to tia d ella c uitur a jU dd ica , vol, I, 18, 51 - .Uma

primeira linha de influencia de Montesquieu (. .. ) consiste em fazer acreditar

a ideia de que seja possivel uma ciencia de legis lacao, isto e , que 0 direito

a rbit ra rio, ou pos it ive, possa ser subrne tido ao t ribuna l da c ienc ia e que , por

consequencia, 0 legis lador pode (e, uma vez que pode, deve) legis lar segundo a

ciencia»,

1 .

"

l'espri t des loi s» 469. Pois sao vanos os possiveis scntidos dessa

re lac ;ao ou re lacoes, Dist ingui remos quat ro: 0 de uma relacao

de neces s i dade e 0 de uina relacao de oportunidade, assiiu C01110

os que correspondent ja a uma relacao de condi c i onol i dade, ja a

uma relacao de code te rminacdo constitutiva. 0 primeiro di r-nos-a

que 0 pressuposto I: «causa», de tenninante genet ico do di rei to,e implica uina t eo r ia e x pl ic a ti ve deste. 0 segundo ve no

pressuposto apenas 0 dado, 0 meio ou 0 contexto que, em

rerrnos de eficacia, deve ser tido em conta, ua sua virtualidade

quer motivadora, quer instrumental ou obstativa, por uma

intencao prograinatica ou poll t ica. 0 terceiro considera 0

pressuposto enquanto a base, tanto de possibil idade intenciona l

COlllO de realizacao historico-social do direito, a sua base-

-contexto de c on d id o na m en to s oc io 1 6g ic o que 0possibilita e situa

-hist6rieo-socialmente. E 0 quarto, por sua vez, integra 0

pressuposto na total idade do complexo no rma t l v amen t e cons t i tu t i ve

do direito, cornplexo constitutivo em que 0pressuposto parti-

cipa justamente como um clemento de particular relevo

codeterminante da norrnat ividade ju ridicae - se nao impl ica unia

nccessidade, tarnbeiu nao sugere apenas uma politica, nem se

limita a por em relevo 0seu unil tiplo condic ionamento e antes

imp6e 0 espedfica probl ema da concreta formacao do direito,

mediante a analise das suas dimensoes const itut ivas .

Ora, nao obstante tudo 0 que possa concorrcr para a tribuir

a MONTEsQUIEU0 primeiro destes sentidos da referencia do

direito a uru seu pressuposto material- desde logo a ambigui-

dade do seu conceito de «lei» 470 e 0cientisnio i luminista em que

469 D e /' E s pr it d es lo is , O eu vr es d e M o nte sq ui eu , p. p.. Destutt de Tracy

(1822), n, Liv . I, cap. Ill, 145.470 .Les lois, dans la signification la plus entendue, sont lesrapports neces-

sairesqui derivent de la nature des choses; er, dans cesens tous les etrcs om leurs

loi s: l a d iv in it e a ses lo is, [e monde mater ia l a ses lois , l cs int el ligences supe-

ricurs a l'h omme om leu rs lo is, les betes ont leur s lois, l'homme a ses lois.

Ceux qui ont dit qu'une faralitc aveugle a p roduti tou s les effets que nous

174 DOUTRINA AS FONTES DO DlRE1TO 175

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. J

I.

manitestamente COllllUlgoU, e hem duvidoso que fosse esse

o seu verdadeiro pensamento, tanto aque1e sentido determinista

e incompativel com 0 seu expresso entendimento da «lei dos

homens», de que sao elementos essenciais a inteligencia e a

liberdade 47\ e se mostra contradit6rio com 0 total desen-

volvimento da sua obra. 0 certo, todavia, e que nao pode serhoje essa a nossa cornpreensao do pressuposto material do

juridico. Urn estrito determinismo redutivo, 110 seu cientisrno

causalista e segundo 0 qual- na expressao de R. ARON 472 - as

voyons dans Ie monde ont dit une grande absurdite; car quelle plus grande

absurdite qu'une fatalite aveugle qui auroit produit des er re s intelligens?

Il y a d onc une raison primitive; et lcs lois sont les rapports que se trouvent entre

elle et les lois des differens etres, et les rapport, de ce divers etrcs entre euxs

(Liv I, Cap. 1,133, s.). E dasleis do emundo inteligentes ou dos homens d iz -nos

que elas nao sao seguidas constantemente como 0 mundo Fis ico s egue a s sua s,

ja que .l a ra is on en est que l es e tte s parti cul ie rs i nt elli gens sont bornes per l eu r

natu re , et par consequen t sujets 11 l 'e rreut; e t, d 'un autre cote, il est de leur

nature qu'il agissent par eux-memess

i iu«.pag. 136). Depois, quanto

a sdeis posinvass da sociedade humana vern a concluir que .la loi en general ,

est la raison humaine, en tant qu'elle gouverne tous les peuples de la terre;

et les lois politiques et civiles de chaque nation ne doivent etre que les caspa rt iculi er s ou s' ap lique cett e ra ison humai ne s (pag . 143). Niio deveni, assini,

admitir-se que, contra uma concepcao determinista e monis ta das «leis>, MON-

TESQUIBUpensou em var ios tipos de leis - cada tipo de ser teria 0 seu tipo

especifico de leis - e que 0 tipo de racionalidade ou de determinacao nao sc

confundia corn a racionalidade determinista, pelo menos no dominic humane

ou das leis juridicas e politico-civis? Pols nao e certo que as «causa s f ls ic as .

sc distinguiam, e se opunham as «ausas ruorais»- .Plus les causes physiques

portent lcs hommes au repos, plus les causes morales les en doivent elolgncr»

(Liv, XIV, Cap. 5, 158) - e que de todo 0 " es pr it d es l oi s> se pode condnir ,

com CASSlRER,que sele recusa a simples de du (J o a par ti r dos fact o r es purarnente

f !s icos e subordina as causas mater ia is a s causas espir iruais-? Sobre estes pontos

podem ve r-s e, com pos i~5es d if erent es, P. HAZARD, a p en s am e nt o e ur o pe u 110

seculo XVIII, trad, port. de C. Grifo Babo, II, 176,55.; E. CASSlRER, La phi lo-

s o ph ie d e s / um i er es , trad. f ranc. de P. Quiller, 217, 5S.; L. ALTHUSSER, o b . c it .,

39,55.; RAYMOND ARON, u s h ap es d e 1 a pe ns h: s oc lo lo gi qu e, 53, SS.; N. HAMPSON,

a i iuminismo (trad. port. de R. G. Gomes Filipe) 144, ss.; G. RADBRUCH,

D ie N a tu r d er S a di e a ls j u rj st ic he D e nk fo rm , E xc ur su s III; G. GURVITCH, Grundz i ige

d er S ozi olo gie d as R ec hts , 2.' ed. , 53. V. ainda 0 desenvolv imen to do texto ,

471 V i de nota nt er io r. Cf t. CASSlRERe R. ARON, obs . e l o c s. c i ts . .

472 ab. ci t . , 54.

«leis-c01l1andos~~eriam explicadas por «leis-causais», nao tem

niais lugar 11aproblematica do pratico-normativo 473, e a deter-

minacao uorrnativa que 0 pensamento da «natureza das coisas»

afirma 110 ser-pressuposto do direito .I i virnos porque nao

pode scr aceite.

o segundo sentido do relevo a atribuir ao pressupostomaterial do juridico tambern se nao pode excluir i ll l im in e de

MONTESQUIEU, se pensarrnos no entendimento iluminista do

pratico (e do normative] que haveria de encontrar as suas bases

na ciencia e se constituiria atraves de uma conversao pragmatics

(<<tecnica»)74 desta. Convertendo 0 conhecimento cientffico,

as leis da «ciencia»,em «imperatives hipoteticosi de u1I1aracio-

nalidade pragmatics - a racionalidade pratica seria a raciona-

lidade do esquema «meio-fim» 475 - obtinham-se regras praticas

de uma a rs moral ou polit ica que a ciencia sustentaria: assim

se falaria ate hoje de «moral cientifica», de «polltica cienti-

fica», etc. 476. Deste modo pode pensar-se ter sido tambemem MONTESQUIEU, que entao «se limitaria a tirar do estudo

473 Como 0 nao tent qualquer outro tipo de monismo e redutivismo

explicative que anule a espedfica autonornia constituriva do normativo ou

a sua mediacio propria, ainda que aquele monismo e redutivismo (ou a sncces-

sidadcs) se afirme apenas urn postulado da «cienda polirica e da historias

- assim ALTHUSSER, o b . c it ., 23, que considera ter MONTEsQUIEu, numa das

interpretacoes possiveis do seu pensarnento e aquela que 0 tevelaria verda dei-

ramente inovador, extraido .a s le is reais da conduta dos humanos das leisaparentes que eles criam» ( pag. 50 ).

474 Cfr., por todos P. HAZARD, La c ri se d e la c o n sc i en c e e U l Op el 'r m e ,

scg. a trad. port. de 6scar de Freitas Lopes, 235, ss .; J. HABERMAS, Dogma t i smus ,V (' T nu n ft u n d E n ts c he id u ng , loco cit., 312.

475 A racionalidade pratico-Iinalistica t Zweoaational}, dis tinta da racio-

nalidade pratica de fundamenta~o axiologica (Wertrational}, na rerminologia

de MAX WEBER, e que 0 racionali smo anall rico-posit ivis ta apenas conhece

- v ., p. ex., N. BOBBIO, U ber d en B eg rif f d er .N atu r d er S athe , loco cit., passim

- e esta na base do pragmatisrno recnologico dos nossos dias - Cfr. J . HABER-MAS, L A I Ic hn iq ue e t f a s ci en ce c om me id e% gi e, cit., pas s im .

476 Cfr . E . HUSSERL, I n ve s ti g at io n e s I O g ic a s, t rad. cit ., Lss ., 11 e 13 e ss .:

G. KALINOWSKI, Q u L' Te ll e d e l a s ci en ce n or ma ti ve , 133, 55.

17 8 DOUTRINA AS FONTES DO DIRE lTO 17 9

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o legislador, numa palavra, deveria eriar as suas leis em

relacao com «les principes qui ferment l'esprit general, les

moeurs, et les manieres d'une nation» 484. E certo que ainda deste

modo as interencias seriam fundamentalmente de indole politica,

pois 0 contribute do sentido que assim se poe em relevo

continuaria a traduzir-se em «directivas praticass tendo 0 legis-

lador por destinatario - pretenderia prescrever ao legislador

uma «politica do direitos C0111 base no prindpio de que as suas

leis devem corresponder ou adaptar-se as circunstancias naturais,

sociais e culturais do seu povo, ao seu e s p ri t g e n e ra l 485, Mas nem

por isso este sentido se confunde com 0 segundo antes aludido:

agora nao se trata apenas de sugerir ao legislador umas tantas

regras tecnicas obtidas de uma «ciencias convertida em «arte»,

e sim de 0 confrontar com 0 pressuposto-condicao da sua

obra e, portanto, com os limites e a relatividade do seu poder

de criacao jurfdica, com a nao ignodvel condicionalidade

material das suas leis assim como com a validade delas apeqasem func;ao da realidade hist6rico-social em que fixava os seus

objectivos normativos. 0 que nao seria pequena originalidade

perante 0 raeionalismo abstracto e 0 dedutivismo normativo

dominantes ao tempo, que era 0 setecentos iluminista,

S6 que as coisas nao ficam por aqui. Pensar as leis ou

como as resultantes necessirias de urn conjunto de factores ou

como as prescricoes de urn poder que pode ser tecnico-politica-

mente aconselhado ou como expressao de uma pratica politica,

que s6 cobra 0 seu sentido e a sua viabilidade no contexte de

uma bern defmida realidade ou sistema natural-historico-polftico,

nao esgota as altemativas possiveis, Uma quarta altemativa

484 Como se Ie na propria epigrafe do celebre Liv. XIX, cujo enunciado

completo e : s De s l ois , d an s l a r ap po rt q u'e Il es o n! a ve c le s p ri nc ip es q ui [ om t e n t

l'espti; g en er al , l es m oe ur s, e t l es m an ii rc s d 'u ne n ati on • .

485 Em sent ido ana logo , d iz RADBRueH, o b . l a c. c i ts ., que para MON-

TF.SQUlEU, eas leis njio es tdo determinadas pelas relac;:5esvitais, mas devem

adequa r- se a e la s em certo grau e sent idos ,

ainda se ted. de considerar. Aquela que inclui 0 pressuposto

material no processo normativo da constituicao do direito, e assim

como seu irredutivel e l emento constitutivo, mas sem que ele seja

ai determinante ou 0 determinante do normativo juridico

constituendo ou constituido, na intencionalidade e validade

especfficas desse normativo: simplesmente, 0 problema da

eonstituic;ao do direito e 0 pr6prio direito nao se poderiam

pensar sem esse pressuposto e 0 seu relev~ e~peci£co:. ?e

outro modo, 0 processo normativamente constitutrvo do cnreito

nao pode compreender-se sem 0 pressuposto material, mas

este nao decide s6 por si desse processo nern esgota a intencio-

nalidade constitutivamente detenninante: estando na base ou

concorrendo em termos codeterrninantes no processo constitu-

tivo, 0pressuposto (ejustamente como pre-suposto) nao exclui e

antes exige a autonomia de uma Ultima intencao normativa

detcrminante. E dai que seja agora imprescindivel um outro

momento de que os sentidos anteriores nao careciam. Exige-seaqui uma totalidade (um «todc») em que 0 pressuposto condi-

cionante-codeterminante e a decisiva intencionalidade deter-

minante possam ser pensadas como tais, i. e , nas correlatividadee assimilacao dialecticas implicadas na sua participacao integrada,

justamente como condicionante-codeterminante e determinante.

J i que a autonomia determinante 0 ted de ser relativamente ao

pressuposto e no quadro de possibilidades de realizacao e

intencionais por este abertas - 0 que significa simultaneamente

um abrir e urn circunscrever 0 campo para a autonoma

determinacao ou uma abertura condicionada e codeterminante

para ela -, tal como 0 condicionante s6 podera se- lo relativa-mente a urn determinante que 0 implique na sua pressuposicao.

Totalidade constituinte e significante que ted de compreen-

der-se como un i dad e , se a analise for a p o s te r io r i 486; e que sera a

486 Recorde-se 0 que dissemos supra, sobre a totalizacao analogica d a

<natureza da s coisass ,

17 6 DOUTRINAAS FONTES DO DIREITO 17 7

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causal consequencias pragll lat icas pressupondo os objeetivos do

legisladoD> 477 e as suas analiscs propor-sc-iam afinal dar apenas

conselhos ou einstrucoes» 478 ao mesmo legislador - seria sim-

plesnieutc esta a sua «cifncia da legislacao». Nao e para n6s

decisive saber se este entendimento, em que se confunde a

«(pratica» com a «recnica» ou a «p r ax i s » com tecnologia , corrcs-pondc ou nao exactarneute ao « esp ri t d es lo is» - e hi fundadas

razoes para duvidar, nao 0bstantc 0 utili tarismo iluminista, pois

a coerencia do pensamento de MONTESQUIEU e as suas dimensoes

culturais apontam antes nU111 outro sentido -, mas ja nos

intercssa coinpreender 0 que este cntendimeuto do pressuposto

material implicaria no problema da constituicao da nonnativi-

dade juridica. Os dados pressupostos, a que apenas se deveria

atender numa tecno16gica prudencia ou polirica legislativa,

mantinharn-se verdadeiraruente alheios ao processo nonnat ivo

enquanto tal- podiam ou nao ser ai considerados, em bora

convenienteniente 0 devessem ser em fuw;:ao de certos objec-tivos - e por isso tarnbem nao seriam suficientcs para anular

a hip6tese de U111 estrito voluntarismo a que de todo estivesse

disponivel 0 dirci to - i, e , nao excluir iam a constitut iva imp uta-

r;:aodeste ao simples poder . No primeiro sentido, 0 pressuposto

decidiria tudo, no seu dererminismo; neste segundo sentido,

acabava por pouco ou nada decidir, na sua apenas hipotetica

rclevancia.

Pode, todavia, pensar-se num sentido algo diterente do

anterior, considerando que 0pressuposto material, ou 0 conjunto

dos seus elementos, implicaria para 0 nonnative uma relacao

geral de condicionalidade. As circunstancias naturais, sociais,

historicas, culturais e polfticas (a natureza do governo c 0

477 Vide R. ARON, a b. c it ., 54, s.; G. TARELLO, o b. lo c. ci ts ., 51 .

Cfr. ALTHUSSER, ob . ci t . , 51, 55..

478 As s im R. ARON, Ibidem; e G. TARELLO, Ibidem.

seu «principio» 479), impor-se-iam como a condicao=mcio ou

o cOlltexto-dominio, com uma natureza propria com que se

havcria de contar, da constituicao e realizacao do direito (das

deis»). Pois s6 as tendo em conta na sua «rcsistenciar 480

especifica, i. e , nas possibilidades ou impossibi lidades que elas ,

tal como sao, oferecem ou excluem, nas intencoes que sugerem

ou recusarn - s6 vendo nelas 0campo, os meios e os objectivos

da intencao normativo-jurfdica, esta seria coerente com a

soeiedade ou 0 (CPOVO» a que se dirige e teria, por isso,

viabilidade hisrorico-social t'". E se a sintese de todos aqueles

elementos, que caracterizam urn povo, the consti tui 0 seu espri t

g e t l i r a /482, decerto que sc'est au legislateur a suivre l 'esprit

de la nation lorsqu'il n'est pas contraire aux principes du

gouvernemenD) - «car nous ne faisons rien de rnieux que ce

que nous faisons l ibrement, e t en suivant not re genie naturel» 483.

479 Categorias estas, a «natureza do governo» 011 a ripologia dos regimes

politicos e 0 eprincipio do governo» 011 a intencionalidade axiologica funda-mental relativa a cada urn dos regimes po l i t i co s t ipif icavcis, que sao, como sesabe, dos contributes capitais deMONTRSQUIEU para a teoria politica eo objecto

des Livros II a VIII.480 Cfr. in fra.

481 As leis «doivent e rre tel lement proprc s au peuplc pour leque l e lles

sont faites -le-se logo no Livro I, Cap. III, 144 - que c'est un tres grand

hasard si cellcs d'une nation peuvent convenir a une aut re . II fant qu'el le s se

rapportent it la nature et le principe du gouvernement qui est e tabli, ou qu'on

veut etablir . .. ( .. .J. Elles doivent etre relatives au physique du pays ( .. )

au genre de v ie des peuples ( .. . J it la religion des habitants, 11leurs inclinations,it leurs richesses, a leur nombre , a son commerce, 11 eurs rn oe urs , 1 1eurs manieres .

Enfin, e lles on t des rappor ts ent re e lles , d ie s en ont avec leur or igine , avec

l'objet du legisla teur ave, I 'ordre des clroses sur lesquelles dies sonr etablies.C'es t dans toure s ces vues qu 'i l f aut le s considercn.

482 Dutra categoria fundamental, como tambem se nao ignora, dopensamento de L 'e sp ri l d es l oi s e que ai vemos expressarnente compreendido

nestes terrnos: .PIllsieurs choses gouvernent les homems; le climat, la religion,

les lois, les maximes du gouve rnement , les exemples des choses passee s, les

moeurs, lesmanieres: d'ou ilseforme lUl esprit general qui enresulte - Liv XIX

Cap. IV, 297, 5.. Sobre a importsncia que este e s p ri t g e n e ra l rem no pensamenro

e no sistema de MONTESQUIEU, vide R. ARON, ob . dt., 30, 55..483 Liv. XIX, Cap. V, 299.

12-Bol. da Fac .de Dlr. , Vol. LTI

178 DOUTRINAAS FONTES DO DlllEITO 179

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o legislador, numa palavra, deveria criar as suas leis em

relacao com «lcs principes qui forment l'esprit general, les

moeurs, et Ies manieres d'une nation» 4B4. E certo que ainda deste

modo as inferencias seriaiu fundamentalmente de indole polftica,

pois 0 contributo do sentido que assini se poe em relevo

continuaria a traduzir-se em sdircctivas praticas» tendo 0 legis-

lador por destiuatario - pretenderia prescrever ao legislador

uma «politica do direito» com base no principio de que as suas

leis devem corresponder ou adaptar-se as circunstancias naturais,

sociais e culturais do seu povo, ao seu espr i t g e n e r a l 485. Mas nem

por isso este sentido se confunde com 0 segundo antes aludido:

agora nao se trata apenas de sugerir ao legislador umas tantas

regras tecnicas obtidas de uma «ciencia»convertida em sarte»,

e sim de 0 confrontar com 0 pressuposto-condicao da sua

obra e, portanto, com os limites e a relatividade do seu poder

de criacao juridica, com a nao ignoravel condicionalidade

material das suas leis assim como com a validade delas apenas

em fun~ao da realidade hist6rico-social em que fixava os seus

objectivos normativos. 0que nao seria pequena originalidade

perante 0 racionalismo abstracto e 0 dedutivismo normativo

dorninantes ao tempo, que era 0 setecentos iluminista.

S6 que as coisas nao flcam por aqui. Pensar as leis ou

como as resultantes necessarias de urn conjunto de factores ou

como as prescricoes de urn poder que pode ser tecnico-politica-

mente aconselhado ou como expressao de uma pratica politica,

que s6 cobra 0 seu sentido e a sua viabilidade no contexto de

uma bern definida realidade ou sistema natural-historico-polftico,

nao csgota as alternativas possfvei s , Uma quarta alternativa

484 Como se Ie na propria epigrafe do celebre Liv. XIX, cujo enunciadocomplete e ; ~ D es l oi s, d o ns L a r a pp or t q u' e ll es a li t a v ec l es p ri nc ip es q ui [ or m er ttl 'e s pr i t g e n e ra l , l e s m oe uts , e t l es m an ie re s d'ul le na t i on» ,

485 Em sentido :malogo, diz RADBRUCH, ob. lac. clts. , que para MON-

TESQUlEU, <as leis nlo es tdo dererminadas pelas rela~6es vitais, mas d even :

adequar-se a e la s em cer to grau e sent ido ••

niuda se ted. de considerar. Aquela que inclui 0 pressuposto

material no processo normative da constituicao do direito, e ass i in

como seu irredutivcl e l emen to constitutivo, mas scm que de seja

ai determinante ou 0 determinante do normativo juridico

constituendo ou constituido, 11a intencionalidade e validade

cspedficas desse normativo: simplesmente, 0 problema daconstituicao do direito e 0 pr6prio direito nao se poderiam

pensar sem esse prcssuposto e 0 seu relevo especlfico. De

outro modo, 0processo normativamente constitutive do direito

nao pode compreender-se sem 0 pressuposto material, mas

este nao decide s6 por si desse processo nem esgota a intencio-

nalidade constitutivamente deterrninante: estando na base ou

concorrendo em termos codeterminantes no processo C011StitU-

tiYO, 0 pressuposto (ejustamcnte como pre-suposto] nao exdui e

antes exige a autonomia de um.a ultima intencao normativa

determinante. E da f que scja agora imprescindivel um outro

momento de que os sentidos anteriores nao careciam. Exige-seaqui uma totalidade (um etodo» em que 0 pressuposto condi-

cionante-codeterrninante e a decisiva intencionalidade deter-

minante possam ser pensadas como tats, i. e , nas correlatividadce assirnilacao diaIecticas irnplicadas na sua participacao integrada,

justamente como condicionante-codeterminante e detenninante.

J a que a autonomia determinante 0 ted de ser relativamente ao

pressuposto e no quadro de possibilidades de realizacao e

intencionais por este abertas - 0 que signifies simultaneamente

urn abrir e um circunscrever 0 campo para a autonoma

determinacao ou uma abertura condicionada e codeterminante

para ela -, tal como 0 condicionante s6 podera se-lo relativa-mente a um determinante que 0 implique na sua pressuposicao.

Totalidade constituinte e significante que ted de compreen-

der-se como un idade , se a analise for a pos t er i o r i 486; e que sera a

486 Recorde-se 0 que dissemos supra , sobre a totalizacao analogica da

«natureza das coisas•.

18 0 DOUTIUNAAS FONTESDO DIREITO 18 1

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global intencionalidade constitutiva de um proccsso - de uni

(Ictus na pluralidade integrada dos seuselementos ou ruomentos=-,

se a analise pretender eselarecer a fenomenologia do proprio

i ter constitutive. Andlises estas duas que hao-de ser evidente-

mente coerentes entre si, uma vez que a segunda antecipa como

processo 0 que a primeira objectiva como resultado. Assim,o que se object iva como uma prat ica e como object ivacao dessa

pdtica -- e e 0 caso do direi to - nfo pode deixar de ter C01110

correspondente a unidade material do complexo dos seus elemen-tos const irutivos a unidade intencional do seu processo consti-

ruinte,

Quando MONTEsQUlEudistingue os factores materiais dos

factores morais ou espirituais e reconhece que aqueles s6 podem

ser condicionantes, mas nao determinantes - a dererminacao

decisiva cabe a estes e nao aqueles 487 - e os integra como

que numa «hierarquia dos seres»488 (do ser inorganico ao ser

humane, com as suas «leis»especihcas, leis da necessidade naquele,leis da liberdade neste 489), e para concluir que aqueles factores

- em alguns dos quais, v. g. nos factores morais, ja participa

decerto a l iberdade - sao s6 factores condicionantes ou quando

muito codeterminantes e, assim, faetores que implicant urn

espa~o de autonomia (deternrinante) para as rnesmas leis e

que a liberdade do «legislador», enquanto significa essaliberdade

elemento de autonomia no todo constituinte das leis, ted de

preencher. Mas a preencher sem arbitrio, e por isso determi-

nando-se tambern ele por um fundamento que, atenta aquela

hierarquia dos seres e as leis respectivas, ted de ser analogo

487 Vide , tambem nes te sent ido, a conclusso das andlises de CASSIRER,

ob . cit.; e de R. ARON, ob. dt..466 R. ARON, Ib i d em , 58. Vejarn-se tambem as transcricdes reitas supra ,

na nota 470.

469 Cfr. supra , tambem nota 47 0 e todo 0 cap. I,do Liv . I. Cfr., alias,

o proprio ALTHUSSER,b., dt., 51 , SS., e os [ugares de L ie sp rl t d es l oi s para que

al chama a ate~ao.

(em a ll a/ og ia e n ti s, digamos) a essa autonomia - fundamento-

-determinacao que, nestes termos, s6 podera ser de natureza

racional-espiritual. E nao e esse fundamento, na verdade,

o que nos oferecem aqueles principios uorrnativo-racionais

gra~as aos quais se devia dizer que «avant qu' il y eut des lois

faites, il y avait des rapports de justice possibles»490? Depois,

nfio e tudo isto referido a uma unidade signif icante (consti tu-

tivamente significante de um todo que a analise pressupoe e

que se recupera esclarecido nos seus resultados) , unidade que

os interpretes tendem a considerar inegavel 491, embora divirjarn

na sua identificacao e compreensao P 492?

Seja ou nao esta a interpretacao que melhor compreende 0

espirito do «Esprit d es lo is» - e, se for, revela-se-nos decerto

este pensamento, assim interpretado, surpreendentemente actual,

que tanto e dizer genialmente vilido (493) -, 0 certo e , no

490 Liv. I, Cap. I, 135. Sobre 0 scntido .jusnatu ralistico~ desta tese,cu. ALTHUSSER,b. dt., 51 , ss. , e R. ARON, i b. c it ., 59 , s..

491 Depoi s que as teses interpret ativas, que afi rrnavam em MONTF.S-

QUIEUurn pensamento contraditorio, sc rnostraram inaceitaveis - sobre elas,

em que devemos inclu ir tambern a posi~ao de CATTANEO,o b . c it ., 29, 55.,

submetendo-as a nma cri tica concludente, v ide R. ARON, ob . dt., 61, ss. .

A dificuldade esta em que , como diz RABBRUCH,b. 1 0 e . , cits., «arela~o dos

e lementos causa is e normativos ent re si mo chegou a sc r problema para MON-

TESQUIEU», por iS50parece depararmos constantemente com duas l_?gicas,

uma determin ista-explicativa e outra no rmanva-valoradora, que so uma

toral iza ..ao reconst ru ida, que apreenda 0 verdade iro objec tive e sentido do

Autor, pode superar. Cf r. nota seguin te,

492 R. MON ve a chave dessa unidade totalizante no e s p ri t g e u e ra l -

ob., cit., 50 , 5S. -, ALTHUSSER,a conjugacao do eprincipio do governos COrn

os fCOstumes>do povo, que convergem a const itui r 0 espri t gbll:ral- ob . tlt.,

59 SS.- e CASSlRERconsidera que em MONTESQUlEU<todos os elementosconst iturivos de uma sociedade detenninada estdo entre e1esnuma situa,.ao de

estrita eorre laf i io. Ndo sao aspartes d e uma soma, mas for ..asinterdependentes

cuja ac~ao r eciproca depende da fo rma do todo . Ate no mais pequeno por-

menor se ver ifica esta comunidade de ac~o e esta organizacao estrutu rah

- o b ., c i t. , 2 1 9.493 Por isso considerou ALTHUSSERue 0 sentido irnputado pela inter-

preta~o de CASSlRER,eferida na nota anterior, e «lemasiado mod:r tW-: -ob . ,cit., 71. Como quer que seja, 0 que nio pode deixa r de ter -s e por insuf ic iente

182 DOUTRINAAI; FONTES DO Dli lEITO 183

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entanto, que apenas num sentido an:ilogo a este ultimo podemos

hoje pensar a relacao do direito COm0 seu pressuposto material.

Sentido esse que ja ficou aludido: 0 direito nao decorre neces-

sariamente desse seu pressuposto material, nem este e para

aquele apenas 0 factor de efidcia ou tao-so de condicionalidade

que ja prudente, ja politicamente se deva ter em eonta, antese dimensao e momento do proprio processo da sua constituicao

historica, 0pressuposto material esta para a norrnatividade juri-

dica COmo os factores reais estao para a idealidade dos factores

espirituais na constituicao comum da cultura: participa neces-

sariamente dela sem a impor necessariamente.

E dito isto numa primeira aproxiniacao, e enquanto quadro

geral de referencia, hi que fazer agora a analise do modo

concreto dessa participacao.

b ) Uma distincao sevai mostrar aqui fundamental. A que

separa, no todo do pessuposto material ou tornado ele global-

mente, 0 que se pode dizer 0 p re ss up o st o c on d id o na n te , em

sentido estrito, do e le m en to m a te r ia l, tambem em sentido estrito

- i. e , 0 momento que, participando embora ainda do pres-

suposto material global, nao deixa de ser tambem material-

mente codeterminante ao nivel do nonnative - e os dois

anteriores das sociais fo rfa s in fiu en te s - aquelas « . fo r c e s a ea t r ic e s »

do direito, na expressao de RIPPERT 494, que, de natureza diversa,

pretendem orientar 0 direito constituendo, ateieoando-o a seu

favor.

Estes tres faetores, ou eonjuntos de factores, concorrem

no p ro b le m a s od o i6 g ic o da formacao do direito e hao-de, por isso

mesmo, ser atendidos especifieamente numa t eor i a dessa forma-

e a propria tese de ALTHUSSER, enquanto sustenta que s6 duas ser iam as inter-preta\=Oespossiveis para 0 entendimento montesquiano de . le i. ; uma inter-

preta\=ao de caracter determinists e outra de caracter jusnaturalista.494 Na monogra fia sob esse t itulo: L es f or ce s c re at ri ce s d u d ro it , 1955.

Cfr. in fra.

crao- ou considerada esta fOflnarrao como f en6l11et lO-objec t o de

um estudo analitico que socialmente 0 pressuponha -, mas nao

nos niesmos temos no p ro b le m a n o rm a ti ve do processo constituinte

do direito, e assini no p ro b le m a J ur ld ic o das «fontes do direito».

E que um deles - - 0 primeiro - nao e elemento autonomo

deste ultimo problema - queremos dizer, nao e elemento dife-

renciado e assumido como dimensao espedfica no processo

norrnativo e, como tal, at tematizado como elemento proble-

matico autonoruo, muito embora va implicito, e justamente

como 0 pressuposto contexte condicionante, nesse processo.

E um outro - 0 terceiro - apenas traduz a concorrencia de

outras forcas sociais com a intencao espedfica do direito, for-

cas que podem vir a obter 0 exito hist6rico, dominando-o

(dominando 0 conteudo da sua formal positivacao), sem que

todavia anulem a especificidade do seu proeesso normativo

constitutivo.

o que nao exclui - de novo se repete - uina prinieira

perspectivacao sociologic, do pressuposto ma.terial em geral,

enquanto enquadramento indispensavel para 0 exacto entendi-

mento daquele elemenro que a partir dai se autonomiza como

espedfico do problema normative das fontes.

8. Sabe-se que a RADBRUCH se deve, nos tempos mais

recentes 495, a generalizada reposicao do problema do condi-

cionamento material (natural e hist6rieo-social) do direito,

495 Nao esquecemos=-como severa a seguir no texto - 0 relevo e mesmo

a precedencia que para esta reposicao, em que sepoderi ver como que reassu-mida a inten~o de MONTESQUJEU. teve 0 importance contr ibute de E.HUllER,

na sua conhecida obra - R e c ht u n d R . e ch t sl le rw j r ki u n gt , que passaremos a citar

na traducao espanhola de Hertha Grimma, e obra que rnanifestamente influen-

ciou R.ADBRUCH. Ma s eerto e que pelos termos por que cste ultimo autor

chamou a aten~ao para 0problema, rnais sintonizados com 0 contexte cultural

do tempo, e a inda pela sua a ssoc iadio ao pensamento, tambem ent iio por e le

retomado, da snatureza d a s coisas»,a R.ADBRUCH sobretudo que seliga 0 exito

daquela reposicao e 0 proprio modo da sua relimo.

18 4 DOUTRINA AS FONTES DO DlRElTO 18 5

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pensado tanto contra a abstracto-especulativa indcpendencia,

relarivaniente a real idadc historica e social da sua emergencia

e cumpriuiento, C0111 que 0 pensava 0 norniativismo jusnatu-

ralista de todos os tempos -- neste pouto em paradoxal conso-

nancia com 0voluntarismo positivists -, como contra 0 radical

hist6rico-sociologismo juridico tambem de outem e de lioje,

proposto por sua vez a anular 0 transcender da intencionalidadc

normativa 496. Pode mesmo cunhar a formula para expnmlr

esse condicionamento: disse-o, como referimos, «a determi-

nacao material da ideia»,

S6 que - vimo-lo tambern - esse pensamento, que assim

se exprimia, analisava-se em duas proposicocs: 1) 0 du eito,

o normativo da sideia»em geral, vai sempre orientado pa ra uma

certa materia; 2) e por isso e, por sua vez, determ.inado po r

essa materia que quer dominar - { " e determinado a t raves da

materia, porgue e deterrninado pa m a materia» 497. E pudemos

ja dizer que esta interencia de determinacao norniativa nao e

aceitavel, se tornada a letra ou rigorosamente no seu maximo

alcance, i. e, se se quiser pensar a materia a que vai referido

o normative, e s6 por 0 ser materia 498, como Uti! imediato

cri terio de determinacao, ainda que nao 0 criterio de determi-

nacao do proprio normativo enquanto tal . Por outras palavras,

nao e exacta a tese que resultar ia da sintese mais compreensiva

daquelas duas proposicoes, Mas isso nao impede gue tenhamos

496 fA doutrina do direito natural- diz-nos RADBRUGH, Rech l s rd ee

u n J R e c ht ss to /f , in D ie o nt ol og is ch e B e gr ii nd un g d es R £ ch ts , col. p,p, ART.KAUFMANN, 6, S. - ere poder considerar como igual a zero a resistencia

(Wi Je r s t a n J s kra / t ) da materia con tra a ideia> e co hi s tor i c i smo e depois 0 ma t e -

r ia l i smo his t6rico. , em radical oposicao, «onsideram 0 elernento formal eta

i de ia do direi to igual a zero, concebendo a ide ia do direito merarnente como

urn modo de manifestacao da materia do direi to •.

497 Ib i d em, 5. Cfr, Rechtsphi losophie, ed. c it ., 98.

498 So por ser a «materia- que conco rre na constitu icao concrcta do

normative.

de reconhecer agora a validade da primeira proposicao ou mesmo

do conjunto das duas, se tornado ele, nao no sentido de

postular uma iuiediata determinacao normativa e em termos

de inferencia tambem normativa, mas simplesmente no sentido

de a norrnatividade juridica nao poder ser comprecndida na sua

constituicao sem relerfncia a U111 pressuposto material quelhe sera condicionantc e, decerto ainda, mediatamente code-

minante. RADBRUCH nao ultrapassou a ambiguidade que vai

implicada 11apossibilidade de se entender 0 seu pensamento de

urn ou outro modo 499 - ambiguidade que haveria de onerar

todo 0 pensaniento da «natureza das coisas» que no nosso

tempo tambem dele partiu -, mas sabendo n6s que 0 primeiro

se ted. de afastar, e perante 0segundo qee teremos de perguntar:

pa ra que «materia» vai correlacionada a intencao normativo-

-juridica (a intencao do direito) e como e esta condi c i onada, no

seu processo constituinte, po r essa materia?

a) Dos quatro sentidos do pressuposto material arras discri-

minados, e evidente que s6 podem ter aqui relevo 0 terceiro

e 0 quarto, ja que 0 primeiro vimo-lo desde logo falso c 0

segundo s6 aparentemente, ou muito indirectamente, conside-

rava uma relacao condicionante, E, sendo assim, temos de dis-

tinguir tao-s6 0 pressuposto que impoe uma mera condicao

de possibil idade (e de real izacao] de aquele outro pressuposto

gue seja, de mesnio, urn moniento do processo normativo

499 Nao tanto assim quando, num primeiro memento, considerava arela-

~ao spara-pore como uma relacao 16gica (de 16gica transcendental), a rel~aoen tre econteudos e «fo rnu> numa sintese constitutiva - e nesse sentido 0

prirneiro ensaio citado -, nus sobretudo quando passou a entender cssarela~ao

nos ter rnos de uma inferencia normariva que se exprimia na ena tureza da s

coisase, ja que entfo nos fal a de se iner Vo r g e /o rm t he i l J e T I d e e im Stol fo (Reth ts -

phi losoph ie, cit., 98) - como que a «materia. ou as «coisase a pre-consrituirem

ou a pre-deterrninarern 0normative d a eideia». Vide ainda, em geral, 0ja citado

ensaio sobre eDie Na t J IT d e r S a d i e a l s j u ri s ti s c he De n k / or n J ., que continuarernos a

c it ar na sua t raducfo espanhola de E. Garzon Valdes.

18 6 DOUTRINA AS FONTES DO DII \El TO 18 7

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consti tuinte - nao apenas condicionante externo, mas condi-

cionante interno ou elernento do pr6prio problema. E estc

ultimo que sobretudo nos importa considerar, sem todavia poder-

mos prescindir de uma referencia ao primeiro, ate porque nele

se define, como veremos, um decisivo factor da positiva<;ao

juridica - sendo certo, nao deixe de dizer-se ainda, que mais

sobre 0 pressuposto-possibilidade do que sobre 0 pressuposto-

-elemento 0 pensamento juridico tern reflectido.

Assim, havemos de comecar por atender a realidade que

vai pressuposta ao direito - e pressuposta quer enquanto a

tem de aceitar tal como e em si mesma, na sua natureza

pr6pria pre-juridica, quer enquanto a ela tera de ir referido

tanto na Sua normacao Como na intencao regulativa da Sua

ponderacao normativa, E neste sentido amplo, exactamente,

pode dizer-se ter sido considerado 0 pressuposto material do

juridico, ja nos « Re alie n d er G es et zg eb un g» 500 de HUBER como

na «Recht s s t o f J» de RADBRUCH, e mais recenternente nos Vorge -

g e be n he it en d e s R e ch ts de FECHNER 501 , HENKEL 502 e ZIPPELIUS 503 504 .

b ) E, com cfeito, a partir de HUBER, e sempre em

consideracao explici ta desse seu prirneiro contr il juto, que se

desenvolveu 0 pensamento a que audimos, s6 aparentemente

superado pelo pensarnento da «natureza das coisass 505. E por

500 D b. c i t . , vol. II, 33, ss ..

5 0 1 D b. cit., 203, e p a s s i m .

502 D b. c i t . , 227, S5 . .

503 Db. cit., 52, 22 . .

504 Aut on:s a que deverao acrescentar-se outros, desde logo L. RECASENSSICHES, 0qual na sua . Il l tr o d Jl c c; o n a l e s tu d o d e l derecno», 3.' ed. , faz uma analise

da eexperiencia juridicae (p.p. 49, ss.) em ordern a determiner os .factoreo e

condi coes da producao do dir eir o», em que e manifes ta a inf luencia de FECHNER;

assirn como P. ROUBIER, T h eo r ie g ft le ra le d u d r oi t, cit., 293, ss., ao pondera r a

relevo de des donnees de la vie en soc ie te - ,

505 S6 aparentemente superado, porque ou 0 pensamento da matureza

das coisas» nada mais diz, ou, quando pretende dizer mais ja virnos que nao

e concludente. '

«Real i e l l l ) entendia HUBER - distinguindo-os das «ideias, as quais

deduziriam «de dentro para fora, a partir da consciencia racional,

o conteiido do direito», enquanto que «os 'reais' actuam de fora,

influindo na deterrninacao das disposicoes juridicas, como reali-

dades existentes que se oferecem a consciencia mediante a

obscrvacao» 506 - 0 conjunto daquelas real idades do mundo

humano-social que se oferecem como «as condicoes efectivas,

as determinacoes reais em que consiste a estrutura da sociedade

humana» 507 e que, enquanto tais, nao podem deixar de ser

506 Db. ci t . , 34. Sobre a relacao que HUllER pensava ent re as -r eais-

e as ddeiass, v. nota seguinte i n f ir re .

507 Sedam eles 0 . ho nlem> - 0 diomem na s ua ex is te nc ia an tropolo-

16gicat (as imediatas condicoes antropologicas assim como a concep .. ao que 0

homem de si mesmo tern com as exigencias sociais nela irnplicadas), - .os

naturals> - -as rela ..5es naturais, segundo as quais se desenvolve a vida dos

homens em part icular e 0seu rnu tuo cornerc io» (sobretudo as condi . .oes econo-

micas e a tecnica ) - e eas tradi~oes. - de modo especial a pr6pria situa~ao

juridico-social exisrente, «0 estado anterior do direit o ou, 0 que e 0 mesmo,o estudo soci al i ncluindo as insri tuicoes eticas e os juizos e cri terios que as

acompanharrn ( o b . c i t ., 38 , 5., e 41 , ss.) , Real idades ou factores t odos estes

qu e, c om rekvf in ci a c ondicion an te , i nflui ri am mater ialmeute u a cons ri tui cdo

concreta do dir ei to, sobretudo na r nedida em que estariam na base, ou ser iam

o fundamento sociologicamente real e tipico, dos i n t e r e s s e s (os einceresscs e

necessidadess), e estes se deveriam considerar, como tais, a motivacfo e 0

obj ecto imedi ato do dir ei to, da or denacao j ur idica, Os sintcrcsses pr 6pri os

dos homens na vida social. ofereceriam a ernateria que hi-de ser formada

segundo deterrninada ordem- e esta ordern constituir-se-ia equando 0 legis-

l ado r poe urn l im it e e di u rn a r eg ra ? t consecucao dos i nre rc ss es e 1 1satisf~ao

da s n ec es sida de ss qu ando va le ra e c on cede sp ro te cc ao jur id ic a a os int eres se s»

- verdadeiramente, os R e a / i e l 1 e os interesses s o se distinguiriarn enquanto

«modos di ferentes de consi derar os mesmos mornentos r eais ou como os seus

mode s di fe re nt es d e inf luir nas rarefas legis lat ivass (pag. 36). Veremos que

esta acentuadlo do s einreresses» como 0 rnonien to dec is ivo da pressupostarelevancia soc io-materia l para 0 di reiro nao pode levar a i ndui r 0 pensarnento

de HUBER na eperspect iva soci ol ogies- do pensamento j ur idico que consi de-

rarernos i n f r a , ja que p ara e st a p er sp ect iva os int eress es na o s ao apenas a materia--ob jecto relevance , mas verdade iramente 0 determinante do direito - 0 que

na ve rd ade nao co rres ponde a posi~o de HUBER e e rnesrno por de expr es-

sament e r epelido: <sao dois - assim se expr ime em conclusao - os rnor nentos

potenciais a que pode ser referida a origem das disposicoes juridicas, ja fc)!-

mulad as : a s idei as e o s 'r ea is ', As idei as sign if ic an t 0 impulse de rea liza~o da

18!) DOUTRINAA~ FONTES DO DIREITO 1 8 9

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tidas ern conta pelo direito - «as relacoes reais que 0 legislador

hi-de aceitar tal C01110 sao e que constituem 0 material neces-

sario da pr6pria legislacao». Impondo-se III sua Indole pr6pria,

ja como material de consrrucao, ja como factor de realizacao

do direito - e influenciando-o rnesmo niaterialmente, uma vez

que atraves delas 0 juridico receberia urn «determinado con-teudoi -, dessas realidades ou relacoes reais havia de dizer-se

que « S a O um poder que pela sua mesma natureza se imp6e a

legislacao, nao como se imp6em os postulados juddicos, mas

como se irnpoe a materia de que ha-de ser feita uma obra, a obra

mesma» 508. Por outro lado, nao se tinha em vista a contingente

multiplicidade e variabilidade fenorueruca, a infinidade das

manifestacoes concretamente individualizadas dessas realidades,

e sim os seus momentos estruturais ou os seus modos «tfpicos»:

o que uelas permaneceria, nao obstante a sua concreta variabili-

dade, e assim revelaria «algo gue nao inuda» 509. E daf, tendo

aquele relevo e esta constancia, se houvesse de conduir que

«existem mornentos com os quais a legislac;:ao ha-de en con-

trar-se em todo 0 tempo e que sao para ela, por conseguinte,

tao necessaries como a propria ideia juridica» 510. Numa palavra,

em que tudo se resume, a realidade humane-social, com a sua

natureza e est rutura pr6prias (i. e, prb-jurfdicas), havia de ser

reconhecida como elemento constitutivo do direito, como

aquele elemento real-material pre-dado que concorreria com 0

jus tica na ordeni da comunidade humana ; nao nascem dos inter esses ante s

exercem na convivencia humana urn influxo regulativo, reproduzindo a ima-gem da n055aconsciencia juridicae { ab . c i t . , pags. 33, 55.}. E por isso, ao acentuar

a i~ortancia condicionante dos Rea l i e n , nao deixa de observer: motemos quecom isto nao se diz que 0 direito haja de deduzir-se da s realidades, a direito

nao.tem origem na varia causalidade das condicoes naturals mas nas capacidadese virtudes da mente humana ...• (pag. 36 nota 1).

5{tS ab . ci t . , 33-37. '

509 Ib id . , 35.5 1 ( 1 I bi d ., 3 5 .

sen espedfico principio de detenninacao na constituicao da

norniatividade juddica.

Em sentido analogo vcio depois RADBRUCH a referir-sc a«inateria» do direito, e nem mesmo seriam [undamentalmcntc

diferente dos «Rea l i en» , no seu relevo condicionante espedfico,

as «coisasi que, ainda segundo RADBRUCH, haviam de se

consideradas na perspectiva de (Q natureza das coisas como

forma juridica de pensamento) - scoisas» que nao seriam senao

os modos objectivados ou em que se analisava aquela «materias.

«A coisa que aqui se designa, dizia RADBRUCH, e 0 substrato,

o material, a substancia a que 0 direito tem de dar forma»;

«materia do direito e a vida em comum dos homens, a totali-

dade das relacoes e das ordenacoes vitais na sociedade, assim

como os factos vitais que sao elementos constitutivos daquelas

relacoes e ordenacoes» 511. Em FECHNER, por seu lado, vemos a

importfincia e 0 relevo pr6prio dos [ aa or es r ea is , tambern com

a sua autonomia e objectividade especincas, em dialectica juri-dicamente consti tutiva com os f a ct o re s i d ea i s. E HENKEL ofcrece-

-nos uma analise detida dos pressupostos ou «pre-dadose

( Vo r g e g e n hd t e n ) do direito gue concorrem no contexto global

da sua constituicao. Do mesrno modo em ZIPPELIUS os «pre-

-dados reais» do direito, que poe em evidencia, relevam-nos

a sua «referencia material» (Sachbezogenhe i t ) , ou «a fundamental

relacao entre 0 direito e a sua materias e a nianifestar urua

particular «vinculacao materia l» daquele .

c) Nao iremos reproduzir as distincoes classificat6rias que

estes Autores £tzem desses «reais», «materia», «coisas», «factores

reais» e «pre-dados», neru mesrno poderemos acornpanhd-losHas analises acumulativas que os tem por objecto para ruostrar

a influencia esped£ica e os modos concretos da sua relevancia na

constituicao do direito, como seus «elementos de construcao»

511 Ob. cit ., 71.

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[Bauel ement e] , «estruturasi e «pn~-fonl1as», etc 512. Indispensivel

desde ja c ter presente as modal idades fundamentais dessa rele-

vanci a e influencia, e na medida em que e1asn os podem revelar

os seus fundamentos (onto-socioI6gicos) e os seus limi tes (meto-

dol6gico-const itu tivos), pois s6 assim compreenderemos de que

pressuposto material aqui verdadei ramente se trata . E veremos,

por um lado, que sendo ele condicionante mas nao determi-

nante, por isso mesmo excluisimultaneamente as posicoes tanto

do jusnatural ismo normativis ta (que nao considera aquele condi-

cionamento) como do hisrorico-sociologismo determinista (que

postula 0 condicionamento como determinante); por out ro lado,

que esse pressuposto , tornado globalmente, esta longe de ser uni-

tario, quer na natureza do que vai pre-suposto quer na indole

do vinculo a atender na sua pressuposicao. E por isso participard

tambem diversamente , em planes e com dimensoes di ferentes , no

quadro da relevfincia const itu tiva . Eo que se comecara por escla-

recer tornando como ponto de partida a discriminacao seguinte.

( ; I . ) 0c on te xt o o u 0 m un do m ate ria l-hu ma no - a ba se m ate ria l

e a po ss ib ilid a d e em gcra l d o d ire ito . A realidade material,

natural e humana, cultural e social com que a intencao juridica

depara, ji como 0 seu campo (0 seu mundo) de realizacao,

ja como 0 seu objecto problematico, nao se oferece a essa inten-

r;:ao como simples materia, materia bruta e informada ou zero

de estrutura e organizacao que fosse livremente moldavel pelos

512 No decurso da nossainvestigacao nos darernos conta da nossa con-

vergencia e da nossa divergencia relativamente a essasanalises , Depois, e certo

que estas classifica..5es ou as suas tipologias dos factores juridicamente rele-vantes nada te m de necessario - cfr, i n f ra , a proposi to de POUND - e be rnsc podiam a la rgar. Como exe rnplo de uma c la ss ifica ..a :o, na mesma l inha

e mais ampla, v. 0 ja citado ensaio de O. BALLWEG, Z u e in er Lehre v on

de r N a t u r de r Sa d i e , onde se veem discriminados .os naturaiss (.die Naturalier»),

«os reais- (die Realiens), lOS vitals» (.die Vicaliene), tas formas sociaiss, *05

papeis sociaiss,casordens concretass, «asinstitui ..5es, caordem juridicae, canatu-

reza do homerro, e ca tecnica • .

scus projectos C object ivos. Antes the corresponde unia natureza

propria - urna cstrutura e uma Indole objectivamente aut6--

nornas, «indiferentes» 513 e previas a intencao juridica e que,

como tais, a esta se irnpoe e ela ted de aceitar «tal como SaO»514.

E dai uma primeira interencia, que se pode enunciar nos termos

da hartmaniana «lei categoria l da materia»: «a categoria superior

nao pode conform.ar com a materia da inferior tudo 0que queira,

mas s6 0 que e possivel nessa materia». Inferencia que e , porern,susceptivel de um duple sentido. Por um lado, a estrutura

propria e a objectiva autonoinia da real idade humana e historico-

-social 515, enquanto materia do direito, impoe-se como uma

geral condi i do d e po s s ib i l id a d e da sua realizacao, no que toca tanto

aos objectivos como aos meios. S6 podendo realizar-se nessa

materia e atraves dela, a intencao juridica apenas lograra cum-

prir-se nos termos (no quadro de possibilidades) e utilizando os

rneios que aquela estrutura e conreudo-objecto pr6-supostamente

513 Em sentido harrmaniano, aquele sentido que llre permite enunciar

uma . le i d a i n di {e r en t ;a t no quadro da est ra ti fica . .ao ontologica : .0 e st ra toinferior de categorias e sem duvida base do supe rio r, mas nao se e sgota neste

scr base. ~da se~ 0 esrrato superior c um estrato de principios autarquica-

mente pre-determinantes. Tambem rut sua totalidade esta condicionado debaixo e nao decima. Ii indiferente a qualquer superior. 0 ser infer ior nao tern

em si qualque r de st ine de chega r ao supe rior; conduz -se como indi fe rente a

toda a sobreconformacio ou sobreconstrudio. Nisto consiste a sua autarquiacomo estrato» - N. HARTMANN, o b . c i t. , 5 65 , 5 7 0, ss. . De ixamos agora de

!ado 0 proble~ de saber se a unidade do ser ou de urn certo ser em que

os .estr~tos~ se integrarn nao sc terii de considerar ontologicamente recorrente

e consntunvo para todos e le s, a impor-lhe s uma espec ifica so lida riedadcestrutural-marcrial totalizante.

514 Neste mesrno sentido, vimos ja HUBER, e tambcm agora ZlPPEUUS

ob . ci~.,55. J:?eI_U?doanalogo se falar ia , com FECHNER, o b . d t ., 129, ss. , d~especlf ica eobjectividades dos factores reais, da .legalidade do mundo real•.

515 A esta realidade nos podemos limitar a referir, posto que asrealidades

nat~ral. biologica, ~~ropo16gica, etc., apenas atraves da media ..ao humane--SOCIal relevam juridicamentc - dr., neste senrido, RADBRUCH, &ch t s i d ec

u l l d l ! - e ch tS$ t o f J ,f ~c . c i t ., 10, ss .; ID., D ie N atur d er S ac he , cit ., 71, ss .; HENKEl,

o b . c i t . , 231; e ainda HUBER, s upra , nota ' 5 I J 7 .

192 DOUTRINA ASFONTESDO DIREITO 19 3

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[he oferecaru 516. Dependencia de condicionalidade esta 517 que,

se njio podera traduzir-sc siruplesmente pela sresistencia da

material) a realizacao da ideia 518, nao deixa de exigir U1l1a

adaptacao 519 ou conforrnacso nos modes da concreta mani-

festa<;ao dele (da intencionalidade regultiva) a estrutura e indole

da materia considerada 520.

~0~ j ec t o -p r e ss u po s t o- a c o r re l a ti v id a d e o l lt o l6 g i c a e a j us t ez a

m a te ri al d o d ir ei to . Para alem de aquele sentido, que podeinos

dizer negat ivo, de resistencia e de possibilidade , ha que consi-

derar, por outro lado, 0sentido positive da vinculacao intencional

entre a materia e 0 regula tivo normativo-juridico sempre que

este haja de assurnir-se com uma «val idade material» ou em

516 No modo de .dcriv~ao., se 0 quisermos dizer com SCHELER-

v. supra. Cfr. ZIPPELIUS,o b . c it ., 56, s s . .

517 Dependenc ia de cer tos fac tores «le rivados- e dos l imit es rea is por

e1es tracados a intencfo normativa.

518 0 que scria, segundo MAlHOFER, D ro it e t n ature d es choses d an s fap hilo so ph ie a lle ma nd e d u d ro it, in Anna l e s de fa Fa culte d e D ro it de Toulouse,

XI I (1964 ), 127 - urn dos sentidos do pensamen to de RADBRUCHsobr e 0

rel evo da <na tureza das coi sas- para 0 d ir eito . .Deste ponto de vista, diz

efectivamente 0 pr6prio RADBRUCHD ie N atur d es S ac he , cit., 80), a natureza

da coisa signifies a resis tencia do rnundo indolence a que tern de adaptar -se

a ideia juridica para lograr a sua realizacao, r at io n e t em po r um h ab it a e,

519 .Adaptalj(ao. que significa sobrerudo conlr8Je das tendencias da <mate-

ria. segundo as possibi lidades ci a propria materia. Adaptal j(ao conrrolada

que se pode maniiestar aparen temente em contr adicao com as tendencias

mater ia is - ex. : 0 vfio de aeronaves relativamente a lei da gravidade -, mas

que 56 ser a eflcaz sc se tr aduzir numa assir nilacso , embo ra super ador a on

sublimadora, dessas tendencias. 0 esquecimento deste principio nao explicara

muitos fracassos dos objectivos socialmenre pedag6gicos e recuperadores de

certas medidas e actuacdes juridicas?

52IJ Sobre este ponto, alem dos dcsenvolvirnentos categoriais deN. HARTMANN,b. ci t . , 586, ss., v ide , quanta ao direi to , HtmER, ob . cit., 67 ;

FECHNER,109, s, (com analise exernplificadora); HENKEL,ob . ci t . , 221, ss. ;

ZIPPEUUS,ob . ci t . , 56. Nem deixara de observar-se que tudo i sto ad de

acordo e como cumpre 0 que, numa outra linha, e prescrito por HANs

ALBERT,T ra kt at U b er k ri ll sc he V er nu nj t, 3.' ed., 77 ( cf. a trad, por t. T ra t ado

s ob re a r aziio c rltic a, de Idalina Azevedo da Silva e outros, 96, ss.) no sen

• p os t ul a d o d e r e a li z ab i li d a d e. .

terruos de unia adequacao material que tern 110 ser ou realidade

pressuposta 0seu criterio, Sed esse 0caso, p. ex., da norma-

r ividade penal relat ivameute a natureza do comportaiueuto

humano 521. As valoracoes penais, que a este se rehrarn, hao-de

pressupor a Indole ontologicamcnte espedfica desse cornporta -

niento e s6 serao val idas , de validade ou (~ustcza» material , seui

deixarem porern de ser valoracoes e assim com a autonomia

de juizo e de intencao normativa que nelas, enquanto valo racoes,

vai implicada, se nao negarem a correlatividade (que bern se

dira ser «onto16gica») 522 daquele pressupos to: se a sua autonoma

solucao norinativa for intencionalmente coerente com a seu

pressuposto 523. Uma contrad icao iutencional ent re aquele e este,

Olinda que nao susceptivel de atingir a validade normariva em

si da valoracao, afecta decerto a adcquacao ou justeza material

da mesma valoracao e em ultimo termo a efidcia normariva

desta, A correlatividade entre 0 pressuposto e a valoracao

demarca assim, pela propria exgencia daquda adequacao ou jus-

teza materi al (adequacao ou correspondeucia a natureza do

pressuposto-objecto de valoracao), um quadro de possibi lidades

a respei tar pela autono rnia normat iva da valoracao 524. E nestes

terrnos, mas 5 6 nestes terrnos ou no modo de uma condiciona-

lidade positiva que bem se podcra dizer urn modo de «verdader

521 E exs. d e outro tipo podiam ser dados - assim desde a Iib erdade,

euquanto pressupos to onrologiro-antropologico para a norrnacao e juizo

jur id ico-cr iruina l da culpa (v, sobre est c problema em geral , J . FIGUEIREDODIAS, A /iberda de , a cu lpa e 0 d i r e i/ o pe nn i ,pa s s i ll l ) , ate a .pre-determina~ao

biologics da comunidade famil ia r para 0 direi to da famil ia : v ide FECHNER,

(lb. ci t . , 130 , ss. . Alias , veremos que 0pressuposto da institucionalidade social

ou pre-juridica, na sua relevmcia coderemunante para a const ituicao do dire-itoe da sua ordem especifica, imp6e sempr e numa .cond i~a:o de adequacao -

desta indole.

522 Cfr. ART. KAUFMANN, H a/o gie u nd « Na tu : d er Sache t , cit., passim.

523 Tarnbem aqui H. ALBERT,embora no sell empirico tracionalismo

criticos, afirmaria 0 «postulado de congruencia»- ob . cit., 77 ( trad . c it . 97) .

524 Cfr. ZIPPELIUS,o b. c it ., 58; HENKEL,ob . tit., 296, 386; BALLWEG,

ob. cit., %, ss..

13- Do l. da Fae . do Dir., Vol. LII

194 DOUTRINA

AS FONTES DO DlRE ITO 195

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ontologico-normativa ~ a referida justeza niaterial uao C outra

coisa, afi.nal~, que 0 proprio pressuposto-objecto de valoracao

participa no processo global da constituicao da valoracao

nonnativo-juridica 525. Se nao foram pensadas apenas assim as

«estruturas logico-mai eriais»para que WELZEL chamou a atencao

do pensamento juridico ~ ja que 0 seu relevo constituinte

atingiria inclusivamente 0 sentido c a intencionalidade dogma-

tico-juridica 526 da valoracao=--, no entendiinenro agora esbo-

cado tem decerto justificacao e devem scr retidas,

Conjugados estes dois sentidos gerais por que se pode

considerar a «materia» do pressuposto material do direito, vemos

que eles defmem globalmente a possibilidade material do norma-

tivo-juridico ~possibilidade negativa de realizacao, num caso, e

possibilidade positiva de adequacso , no outro caso~ pela refe-

rencia de cumprimento e intencional do direito ao ser da

realidade que The vai pressuposta ~ a estrutura e natureza

pr6prias, ou pre-juridicas, dessa realidadc. Urn outro pontoa atender por-nos-a ja para alem destes dois tipos de condicio-

namento possibilitante, ao manifestar antes 0 condicionamento

de relevancia normativa com que a realidade social {rectius,

o conjunto dos factores sociais gerais determinantes do compor-

tarnento e das relacoes humano-sociais comuns) concorre para

a constituicao do pr6prio conteudo do direito ou para a

constituicao das suas particulares solucoes nonnativo-juddicas.

Trata-se agora daqueles factores que, dinamizando a vida social

numa convergencia problematica, ja por isso solicitam do

direito e como seu concreto objecto relevante, uma resposta

normativo-ordenadora ou normativo-valoradora, a qual, porsua vez, tera de justificar-se perante a relevfincia juridica desses

mesmos factores-objecto. Se 0 direito os intenciona com um

525 Cfr., na parte destc estudo publicada no mimcro anter ior doBo l e t u n ,

194, 55..

52 6 Vide a nossa Q uest iio d e f ac to - Q ues tiio d e d ir e ito , 699, ss..

deccrminado sentido (axiologico-norruativamente], essesfactores-

-objecto exigem 0 direito de um certo modo (problcn.atico-

-socialmente) e aqucla intencfo e esta exigencia sao correlativas.

Y ) OS fac to re s co nd ic ion an te s da con stitulfi io do d ire ito ~ o s

« da do s» p ro ble mJ ti co s e o s p re ss up os to s s oc ia i s d e nleudnda j udd ica .

o direito, na assuncao c cumprimento da sua intencao norma-

tiva e a definir embora com fundamento no seu espedfico priu-

dpio de determinacao, e decerto func;:io da propria realidadc

social (realidade humana, hist6rico-social e cultural) 527 que se

propoe norinativo-juridicamente conformal. Pois nessa confor-

niacao 0 direito depara com uma realidade humano-social

que se nao oferece como urn simples objecto passivo e de vazio

intencional, mas em que actuam forcas socialmente relevantes

e intencoes de deterrninacao autonorna que, como tais, 0direito

nao pode deixar tambern de relevar no seu projecto normativo-

-social, Se sao essasforcas e intencoes socio-culrurais aut6nomasque ao convergirem na sua diversidade, oposicao e mesmo

conflito, poem os problemas juridicos ~ os problemas da vali-

dade normativa de uma universal integracao comunitaria -, e , deoutro lado.assumindo-se numa intencao normativo-valoradora

que toma posicao perante elas, para a resolucao destes proble-

mas, que 0 direito se constitui. Nao se trata, pois, agora de uma

materia-realidade em geral como campo de possibilidade para 0

cumprimento do jurldico ou de uma materia-objecto essencial

527 Diga-se, desde ji, que a reahdade que queremos referir e que a

seguir sed objecto d a s n o ss as c o ns id er ac o es n5:o deve confundir-se com a

«rea l idade social>no sentido s o ci o lo g ic am e nt e e st ri to do termo (cfr. H. FREYER,I n tr o du c ci o ll a l a s o d ol o gi a , trad. esp, de F. Gonzalez Vicen, 5-15), posto que nao

s6 o s elementos e factores ernpirico-socia i s , mas ainda os elementos e factorescul tura i s-espi ri tua i s ou do s e sp i ri to o b j ec ti v es participam da rea l idade humane-

-histor ica global a que iremos atender . Dirernos que esta realidade e a mesmaque DILTHEYdi:z ser 0 objecto das Gei te swissenschaf ten, ' a humana realidade

hiseorico-social (Int roduct ion J I 'i tu de d es s ci en ce s h um a in es , trad, franc. de

L. Sau:zin, 13, 55.), ea humanidade ou realidade historico-socia l -humanas (EI

II1rmdo h, stOrico, ed. e trad, da F. e. E., Mexico, 101).

196 DOUTRINA AS FONTES DO mREITO 197

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C01110 pressuposto estrutural-ontologico da sua inteucao norma-

tiva, e sim de uma materia-realidade historico-social autonoma

e com uma determinacao socialmente concorrente que se ted:

de pressupor em termos problematico-normativarnente rele-

vantes. E relevantes nao apenas com 0 COll1Ulll relevo dos

dado s , dos «dados do problema» 528, mas ainda no sentido deque 0 direito, na sua normatividade constituenda e constituida,

sera funcao, no seu pr6prio normative, da autonomia social-

mente determinante das forcas e intencoes manifestadas nessa

realidade humano-social- i . e , a natureza e intencao desses

factores, por urn lado, e 0 peso e importancia deles, por outro

lado, no contexto hist6rico de uma certa realidade humana e

social condicionarao, C01110 seus e l ementos 529, a pr6pria ponde-

ras;ao e valoracao normativas que 0 direito constitutivamente

lhes dirige, posto que nessas ponderacao e valoracao veremos ir

implicada uma sua material assimilacao (positiva ou negativa,

integraute ou delimitativa) pelo normativo juridico. Que 0

mesmo sera dizer que 0«se»e0 «como»da valoradora assimilacao

juridica desses factores depende do meri to autonomo que des

humano-socialmente tenham. 0 direito, enquanto intencao de

validade normativa com funs;ao ordenadora e regulativa da vida

social, nao pode abstrair das outras dirnensoes e das outras

intencoes que concorrem na realidade hist6rica a detenninar essa

mesma vida social e perante elas rcra de justiftear a sobredeter-

minacao, que por ser normativa nao deixa de ser tambem

social, da sua intencao especffica. JusLiflcas;aoesta que implicara,

528 Como tai s se nos oferecem afinal a maioria d o s d ad o s considerados

rel evantes pelo pensamento da <na tureza das coi sas»- c fr . sobre est e ponto ,

H. COlNG, N a tu rr et h! a ls w is se ns ch aj ti it he s P ro hi an , 16, ss . , Se ra o , alih, rna is

do que i5S0o s «R e a/ je l l de r Gese tzgebutJ t" de HUBER, os quais COING (Ibid., 18 )

expressamente considera como «lados da legisla~o.? V. j:i a seguir no texto,

529 Se em termos cstrita e rigorosamente cond i t i onan tes (i. e, so condicio-

nantes) ou tambem em termos c ode t e tm i nan t e s , senao apenas elementos pa ra 0

direito mas inclusivarnente elementos do direito, ve-lo-emos in f ra.

numa palavra, que entre 0 direito e a realidade humano-social

haja de verificar-se uma consonancia de validade regulativa ou

uma coerencia materialmente normativa 5.10.

d) Este ultimo enunciado, no seu sentido mais o-eTalt> '

pareee afirmar apenas uma clernentar evidencia. E, no entanto,

poe-nos ele perante 0pr6prio micleo do problema da pressupo-sis;aoque se tenta de esclarecer, pois impliea, no seu verdadeiro

significado, 0 reconhecimento de urna vinculacao material do

juridico que atinge 0 pr6prio entendimento fundamental do

direito e toea a essenciado processo constitutive da sua normati-

vidade.

Com efeito, 0que aquela consonancia materialmente norma-

tiva do direito com a realidade humano-social pretende exprimir

e que 0 direito nso tem nessa realidade apenas 0 impulso ou as

solicitacoes para a concretizacao historico-positiva de uma essen-

cial normatividade jurfdica que se assuinisse em essencial inde-

pendeneia da mesma realidade - como era pr6prio, v. g., dojusnaturalismo pre-moderno, quer de S. TOMAS, quer de SUAREZ,

com 0 seu entendimento da l ex t em p o ra li s ou posi t iva tao-s6

em terrnos de temporal-circunstancial modalidade da lex natu-

Ta l is 531 -, mas uma dimcnsao constitutiva da pr6pria inten-

cionalidade juridica, e enquanto esia, na sua concreta intencao

normativa, sed funs;ao da realidade social que lhe seja correla-

530 Nestes termos sepodeci [alar, com COING,ob . cit., 22, numa «recta

rela~o ( . re c h ti g e B e . zi e hu t lt " ) entre os dados pressupostos e 0valor ctico on a

ideia etica que esta em causa•. E como paradigrna da rectidao ou justeza dessa

rel a. ;:ao podernos conside ra r a . analogia . com que ART. KAUFMANN com-

precnde a assimilacao normariva entre 0 valor-norma e a realidade-objecto

da valoracao jur id ica, no ensaio c it ., A lJ alo gie u nd " Na tu r d er Sathe', passint ,

53 1 V i de , por todo s, H. WELZEL, N a t ur te c ht W I d m a te r ia l e G e re c ht ig k ei t,

4.' ed., 57, ss., 108, ss . ; H. ROMMEN,D ie e wi ge W ie de rk eh r d es N at ur re th ts

39, 55.; A. F. UTZ, Na t u r r e ch t im W i de rs tr ei : z um p os it i~ en G es et z, in Na t u r r e c ! J ;

ode r Re ch t spo s it l v ismus , col . p . p . W. Maihofer , 232, ss.; A. GOMEZ ROBLEDO

M e d il a ri o n s a br e la just /c ia, 96, SS.; A. VINCENT, La no t i on moderne d e d r oi t n a tu r el

e t le v olo nt ar is me ( de S ua re z a Rous se au ) , in Archives d. Phil. d. Droit, VIII

(1963), 237, S5.

198 DOUTRINAAS FONTES DO DIRElTO 199

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tiva. 0que nao significa decerto uma relacao de causa para

efeito, ou qualquer outro tipo de relacao determinante que

eliminasse a especifica autonornia de validade e constitutiva da

mesma intencionalidade jurfdica - tal como a funyao que 0

predicado manifesta do sujeito apofinrico nao elimina a 16gica

autonornia daquele e 0 constituinte especitico da predicacao -;

ou sequer traduz a linearidade de uma s6 direccao (da autonorna

realidade da sociedade para 0 direito) e antes irnplica urna

particular dialectica em reciproca constiiutividade, que havera

de compreender-se, Por outro lado, esta funcicnalidade cons-

titutiva do direito relativamente a realidade social exclui com

igual concludencia - e nao sera esse um resultado de pequena

importancia - 0 entendimento do juridico que corresponde ao

positivisrno normativista e abstracto-formal, quer cnquanto

esse entendimento postula a compreensao do juridico apenas na

imanencia logica de urn pressuposto sistema normative 532,

quer enquanto refere a sua positividade simplesmente as pres-cricoes formais de inteira disponibilidade de urn podei 533.

o relevo da realidade humane-social , nao s6 para a constiruicao

da normatividade juridica, mas ainda para a compreensao da

sua funryao pratico-normativa e mesmo - importa sobretudo

acentua-lo - para a assuncao da sua intencao norinativa espe-

utica, opee ao jusnaturali smo a essencial his toricidade do direi to,

e a valida compreensao da consondncia-adequacao hist6rico-

-social do direito, pela consideracao dessa relevancia, op5e ao

normativismo positivista 0nao menos essencial caracter mate-

rialrnente humano-historico-social condicionado da sua positiva

normatividade. Superacao de qualquer perspectiva apriorfs ticado jurfdico, de uma sua qualquer elaboracao meramente especula-

tiva num auto-subsistence plano absoluto do tempo e do esparyo

532 Cfr. MULLER-ERZBACH, D i e R e c h lS l IJ i s se t ls c h af i im U mbau, 3, 55.;

SIMONE GoYARD-FABRE, Essa i d e c r it iq ue p hE r lO m e n ol o gi qu e d u d r o it , 54, 55..

533 C fr. G . RlPERT, L e s f o rc e s aeatr ices d u d r oi t, 78 , S5..

hist6rico-culturais, que na ilusao metafisica de indentihcar 0

ser C0111 0 pensainento ere poder «reduzir a zero» a densi-

dade e a probleniatividade pr6prias da realidadc autonoma a

que vai referida - no primeiro caso -; superacao da perspectiva

16gico-abstracto e apenas dedut ivo-construt ivis ta do norrnati-

vismo, seja 0 ciogmat ico trad icional , se ja 0 crir ico-formal dasisteinica gnoseologia de KELsEN, seja 0 analitico de quaisquer

neoposit ivismos ou estruturais positivismos, a ahrmarem por sua

vez, pelo menos nos planes epistemo16gico e metodol6gico,

a plena autonomia e a normativa incondicionalidade do pre~-

erito «dever-ser» junctico perantc 0 «sen) da sua realizacao - no

segundo caso. E superacao em ambos os casos, nao s6 em terrnos

do normativo jurfdico se situar predicativamente sempre numa

certa realidade, mas ainda de nao menos se afirmar, atraves

dessa sua situacao e peIa referencia material que ela implica, urn

especffico condicionamento consti tut ivo daquele nonnative por

esta realidade e que vern a traduzi r-se C01110 que numa anal6gica

assimilacao do real pelo normativo, 0qual s6 0e para um certo

real. Pdo que tambem aqui se podera dizer que (h a uma vincu-

laryao entre as exigencias da materia e as exigencias do espirito,

que pertence a existencia incomovivel do mundo objecrivo» 534.

Ora, se nestes termos se confirma que entre a realidade

humane-socia l e 0 direi to (<naohi urn qualquer abi smo», posto

que na realidade humano-cultural e historico-social temos 0

prcssuposto da constituinte existencia de qualquer ordemjuddica,

pode entao ahrmar-se que essa realidade e para 0direito 0que,

analogamente, 0mundo e para 0 homem. Definindo-lhe sos

limites do historicamente possiveb, i. e, os limites do que

entao e ali e juridicamente intencionavel, a realidade cultural-

-social e a condicao da possibilidade hist6rica, 0 campo-circuns-

rancia e 0 horizonte problemitico da assuncao c do modo

534 MAX BENSE, Te chn lse he Bs i s t en z , B5, apud O. BALLWEG, Db . c i t. ,

47, nota 12.

2 C X ) DOUTIUNA AS FONTES DO D]R£ITO 201

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concreto de assuncao da intcncao juridica: e a condicao de

cxistencia (do aparecimcnto) c de uma certa existencia (do

modo concreto de deterrninacfo) da normatividade juridica,

ja que e no pressuposto de uma rcalidade hist6rico-social,

transcendendo d e essa realidade (em intencao normativo-regula-

tiva), mas para ela (em cumprimento normativo-inst itucional) que

o dircito se const itui . «Sen numa ccr ta realidade hist6r ico-social ,

ter existencia historico-socin] e , pais, da essencia do direito 535.

9. S6 que, seria fundamentalmente errado infer ir des ta

conclusao que somas par ela remetidos a uma pers pec t i ua apenas

s o c i o 1 6 g i c a da consideracao do nosso problema - 0 problema da

consideracao do mundo ou realidade humano-cultural e hist6-

r ico-social enquanto pressupos to material const itut ivo da norma-

t ividade jurldica. Aquela perspectiva que e propria do pensamento

juridico sociol6gico em geral, sem excluir qualquer das moda-

lidades da (9urisprudencia sociologies» 536, c que se caracteri za,

535 Poderemos tambe in dizer que a referencia it realidade hist6rico--

-social e 0 spressuposto de realidade» do direi to - cfr, F. WIEACKBll ,Pr i v a t -r e c hl s ge s c hi c li te d e r Neueeit, 2.' ed., 569.

536 Aludimos a <jurisprudencia sociologica- em sentido estrito e rigoroso

c assirn ao pe usame n t o jur rd ico que , sem deixar de 0ser ou de 0querer ser (ser

ou querer ser jurldica, normativo-juridico), se orienta numa perspectiva socio-

16gica, j a porque ve nos tactores ou fac tos soc iai s e neles apenas os fac tores

dec isivamente rel evames, se nao mesmo exc lusivamente dete rminanres do

direito, j:i porquc a SUametodo logia, nos seus objectivo s e na sua pratica

juridica (dc consrituicao e aplicacao do diteito), prerende set uma metodologia

de ariz socio16gico - i, e , com a indole geral e apoio nos metodos das <C1en-

cias sociais». As duas linhas caracterizadoras podcm ir assoc iadas, e e assim

no caso do que podemos dizer a «ciencia do direito sociologic» - a ciencia

do dirci to reduzida a uma modal idade da sociologia (como 0 e caracteristi-camente em Buucn) ou pensada em rerrnos estritamente empirico-sociolo-

gicos (como se verifies nos varies «realismo,», seja 0 americano , seja 0 escandi-

navo) ou ainda convert ida numa particular <ciencia social> (orientacao hoje

com urn peso ja c on side rf ve l) . Mas em r eg ra s 6 urna dessas linhas e prevalence:ou seda especial relevo a origem e determinacao social do direiro, compreen-

dendo-o a.l?artir (predominantemente 011exclusivamenre) dos factores sociais,

para condicionar POt essaorigem e compreensao a propria metodologia espe-

nao apenas pe la indi spensavel refcrencia do direito a realidadc

e aos facto res sociais que 0 condicionam 537, mas sobretudo

par ver ncssa referencia au a decisiva dctcrminante da propria

normati vidade juridica ou em todo a caso nos factorcs sociolo-

gicos apenas a momenta material dessa norrnarividade: um

sociologismo nas duas hip6teses c mesmo um naturalismo

causalista na primeira 538

Pais se nao e decerto Hcito negar-se, como vimos ja, que

o direito tern a sua «origem a partir de uma determinada

cornunidade concreta» 539, podendo assim dizer-se que nessa

comunidade da sua origem tem de C01110 que a sua «Un terbau»

ciflcamentc juridica - e 0 caso da orieuracio sociologies do pensarnenro

juridico alemao, desde IlIEllINGate it « l n t e r e s s e n i u r i sp t ude z n» e ao . k a u s a l c s

R e c ht sd e t1 k e t1 . - , ou se perspectivam antes em terrnos epistemolcgicarnenre

sociologicos tanto a analise como as propostas solucoes dos problemas juridicos,

como se verifica sobrerudo na «jurisprudencia sociologica» americana, com

POUNDe a sua escola, Da jurisprudencia ou pensarnento juridico sociologico,no sentido ample mas rigoroso enunciado, se distingue a soc lo lag ia j r r r I d i c a

Oll s o c io l o gi a d o d i r ei to , que nao pretende set pensamento juridico e sim exclusiva

e cstritamenre . w c i % g i a . Decerro que a <cieneiajuridica sociologica» e a socio-

I ogia juridica tendem a confundir-se - como justarnen re aconreceu em

EHlU.ICH,que , POt is so mesmo, cabe hoje na sociologia e nao na ' cienc ia do

direiro- - e nessa rendencia vai, sem duvida, 0 fiacasso daquela primeira,

euquanro urna <ciencia do di reito sem di reiro» ( scm direi to enquanto tal , na

sua especifica intcncionalidade normativa e como criterio de valoracao prarica).

Por i5S0,nesre memento, s6 consideraremos no texto 0 pensamento juridico

de perspectiva sociol6gica nas suas mais conhecidas orientacoes , tcndo-nos

Slrpra ocupado jii (a proposito das . fontes mate ri ai s- da outra linha do soc~o-

logismo juridico. Sobre estas distincoes em geral, pode ver-se a nossa Ques t a o -

- de -f ac to - Q l te s ta o -J e -J ir e it o, com indicacao bibliografica: de modo especial

sobre a disrincao entre a .jurisprudencia sociologicas e a «sociologia juridicae,

v. R. TREvEs, C o ns id er az io n ! i nt er ne a ll a s oc io lo g ia giur id i ca , in Riv. Trim.d . Di ri tt o e Prccedura Civi le , 14 (1960), 169, ss ., e R. W. DIAS,jur jspmdf l l c e,

4.' ed., 584, onde se pre fe re a subject ivada dicoromia . Ie g a l s o c io l o g is t » e

< . S o c i o l o g a l j u ri s t. it comum de < so c i a lo g y o f l a u» e < s o c io l o gi ca l j ur is p ru d eI Jc e • .

537 0principal contribute que, segundo acenruam WIEACKEll ,o b . c i t. ,

569, e SIMONBGOYAllD-FAB1lF"b. cit., 55, sedevc a essaperspectiva do pensa-

menta juridico,

538 Como sed exp licitado no desenvolvirn en to do tex to .

5J9 FECHNE1l,o b . c i t. , 96.

2 0 2 DOUIRINA

AS fONTES DO DIREITO2 0 3

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(hist6rico-social) 540, ja e inaceitavel confundir, nessa base, urnclemento constitutive ou uru conjunto de factores de relevancia

cO~lstitutiva com a pr6pria constituicao, para imputar a deter-

minacao ~o que e apenas pressuposicao. Ver-se-a que 0 vinculo

de material pressuposicao pode ter uma dupla indole - 0 da

pressuposicao apenas re l evant e e 0 da pressuposicao ja codet ermi -n a n t e . Mas se~lpre sed. inexacto pensar em esgotar no pres-

~uposto material ou no coujunto sem factores os criterios da

intencao deterruinante, i. e , tentar reduzir esta aquele. E e issomes1~1~que a~ue~esociologsmo fundamentalmente visa - pelo

q~e ~ ll11prescl~dlVelesclarecermo-nos desde ja da sua inconclu-

denna. Com ISS0, nao s6 teremos afastado urn obstaculo asolucao exacta, como abrireuios do mesmo passo 0acesso ascoor-

denadas da anilise e (Iltima dilucidacao do nosso ponto.

Aquele esclarecimento de inconcludencia ircmos obte-lo

atraves da ~o~siderac;:aocriiica da <9urisprudenda sociologies»,

nas suas mats nnportantes orientacoes-c-ja que nela esta presente,p.retende-se mesmo sustentar C01110 tese, 0 sociologismo denun-

ciado, C0111odas as consequencias referidas -, e em ordem

a obter desse modo resposta a estas suas perguntas: a ) quais os

factores. o~ .anatureza dos factores que, participando da reali-

dade histonco-so~ial, se pcdem ver a defmir em geral 0

~ressuposto material que essa realidade imponha?; b ) qual a

mdole, tambem em geral, da sua vinculacao material?

. a ) . Na «jurisprudencia sociologies», com 0 seu sociolo-

gIsmo juridico incluimos a «jurisprudencia dos interesses» 541.

540 Vide~. SAUER, ob . ci t . , 215, 55.; RENB KONIG , Das Rech t im Zusam-

1II~lIlla~g de r s o zi a le n N o r m en s y st em e , in S lu d le /! u ll d Mat e r i a i c n zu r Rcch t s so -

;Zl%gle, 2.' ed., 40.541 In 1 - doutri - d e 'usao que a ?utnna nao ixa tambcm d e e xp re ss am en re f az er

(v . COING, S ~s te tl l, G e s~ hl :h te u rl d I nt ~r es se i n de r Privatrechw;ssel tSchaf t , in

~ . Z e 1951 ,. 4 8? , ro, L a g l U r r sp r u de l lz a sodologica e Ia si tuaz ione d e l d i ri t to p r iv a t o

d

fll. erlllall~a'i in Nueva Riv, d . D iritto C om mer cia le , d iritto d ell ec ono mia

In tto so cia e, 179 55). '

E ccrto que a I t l t eres se l1 jur i sprudenz propos-se ser tao-s6 uma

metodologia da pratica aplicacao do direito (e do direito legal

apenas) e nao directamente urn pensamcnto de refl.exao funda-

l11ental sobre 0 juridico 542. E HaO 0 chegou, com efeito,

a ser 543 _ dai tarnbem 0 scu sociologismo menos radical ou

111cnosistematico -, mas nern por isso the deixa de ir implicita

uma capital mudanca de perspectiva para 0 entendimento do

direito 544, justamente a que setraduziu no repudio do idealismo

sistematico-racionalista da Begri f f s jur i sprudenz e na sua substi-

tui~ao pelo positivismo empirista, e l11eSl110aturalista, de uma

111etodol6gica teleologia de detennina~ao sociol6gica. Pen-

pectiva esta em que afinal se cumpria 1l1etodologicamente,

adquirindo assim efcctivo relevo no pensamento juridico pratico,

o teleologismo sociol6gico-naturalista e pragmatico de BENTHAM

e de IHERING 545. Por iS50se podera afirmar, com FECHNER 546,

que «de todo 0 modo, a ' In t eres senjur i sprudenz ' constitui a

grande porta pela qual 0pensamento sociol6gico entrou na teoria

e na pratica juridica~.

54 2 Vide PH . HECK, Begr i i f s bi !du lIg u t l d I l l te re s s en ju r is p rude l lz , 16, 5S.;

C 50bretudo R e ch ts p b i! o s op h ie t wd I lI l er e s s et lj u ri s pr u d e ll z, in A rc h. c iv . P ra xis ,

1 43 ( 19 37 ), 1 29 , s s.5 43 C fr. WIEhCKER" o b . c it ., 574. 5S., A A . EH REN ZW ElG ,Psychomla -

Iy i s che Rech t swi s s e ll s cha ft , 83 .54 4 Vide, n es te s en ti do , K. LA.:RENZ,Rech t swi s s e tl Scha f t l l n d Rech t s phi l o s o -

p hie _ B ille B rtv id er un g, in A rch. civ. Prax is , 143 (1937 ), 25 7, 55 .; A rO N~ O

R. QUEIR6, C itn cia d o dire i to e f il os o fi a d o d i re il o, p a ss im .545 C fr., po r todos, K . L AR EN Z, Me t h o de u le h r e d e r R e c h rs w i s se n s c ha f i,

3. a e d. , 4 7 , 5S.; COING, Grundzuge de r Rech t s p ll i l o sop i l ie , 3 .• ed., 48 , 5S.; WlI!ACKER,

ob . ci t . , 563, 55.•54 6 L A m e th o de s o ci ol og iq ue et l es d o ar iu e s c o nt em p or a it le s d e In phi losophic

d u d ro it e n A ll em a gl le , in Me t ho d e s o d% g jq ue et d ro i t ( Sr ra sb ou rg . 1 95 6) , 7 7;

c fr . CO ING , S y st em l ee . c i t ., 4 83 . A flrm a~ o q ue s e re fere e sp ec ia lm ente a o p en -

s am enr o ju rid ico a le ma o, m as qu e va le a ind a p ara a qu ele s o utro s q ue s e v ira m

influenciado s po r esse pem am ento - co mo fo i 0 ca so do p en sa m en to m et od o-

1 6g i.co -ju rid ico po rtu gue s a pa rtir s obr etu do d e M AN UE L DE ANDRADE. NaPranca, 0 s o c io l o gi 5mo j u ri d ic o l."Stl ligado , co mo s e sabe, a D UG UIT e a inda,

embora d e outro modo , a GENY e a H AUR IO U ; n o mundo a ng lo -s ax 6n ic o f oi

d ec is iv a a in fln en cia d e E . P OU ND (I'. J . STONE, o h . c i t. , 1 64 , s s .) .

204 DOUTRINA AS FONTES DO DIREITO205

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E para csta perspectiva c pCl lsamcnto (perspcctiva dc meto-

dologia sociol6gica e pensamcnto juridico-sociologico) os factores

materialmente relevantes no pressuposto constitutivo do direito

scriarn apenas os i n t eres ses 547, tornados estes agora num sentido

ample em que sc denotem as impulsoes e os motives, as

forcas e os fms que, em tcrmos de factualidade psicol6gica e

sociol6gica ou psico-sociologica, se manifestam na realidade

social. A querer isto dizer, rigorosamente, que os factores

juridicamcnte rclevantes do mundo-realidade em que 0 direito

«e» c a que vai referido nao scriam senao fa cto re s s oc ia is - i. e,

condicoes e faetos socia is ou de real idade unicamente sociologies

e assirn com cxclusao das in tencionalidades ideais-espi rituais , se

tomadas estas na sua onto16gica especificidade ou com a objectiva

autonomia intencional de rcalidades justamente culturais-espiri-

tuais, Nao sc pretende assim afmnar que essas intencional idades

sejam de todo ignoradas, mas que so van consideradas na

medida ern que se rcduzem psico-sociologicamente a outrostautos factos psicol6gicos c sociais, e sujeitas a um tratamento

igualmente cmpirico-sociologico 5 4B - quando e certo que elas,

enquanto tais ou como elementos do «espir ito objectivo» e com-

titutivas dos respectivos «sistemas de cultural) 549, nao se podem

confundir, nem sao assimilaveis pda realidade social, tambem

no seu sentido c natureza cspecificos 5S0. Como diz WIEACKER,

«visto que 0 direito no seu aspecto extcmo e de facto urn

fen6meno social, ve-se submetido pelos disdpulos juddicos das

547 Assirn tarnbern, postulando em terrnos episternologicamcnte acriticos

eos interesses humanos d e { a ct o como 0 objecto-rnateria (.subjec t -rnat te , . ) dodireitos, J. STONE, ob . cit." 164, 5S. Cfr. sup r a . HUBER, ill nota 507.

548 Nos tennos, p. ex., em que [, STONE expressamente considera

as «conviccoes erico-sociais- como factores da realidade social relevante parao direito - C01110 emen's d e { a ct o ideas of justice» ( ob . ci t . , 546, S5.).

549 No sentido de DrLTHIlY, Int roduct ion, cit., 60, SS••550 Sobre a distincdo geral entre as realidades do .espirito objectivr»

c as realidades socio16gicas, v. H. FREYER, o b. c it., [ Cap., seguindo DILTHEY.

d. d d . 't d ~1

ciencias da natureza e a SOClCa e aos mesmos me 0 os» ,

submetido aos metodos dcssas ciencias e a compreensao geral

que des implicam: fen6meno social qu~, em. si e em todas as

suas diniensoes c factores, apenas sOClOloglCall lcl lte, mcsnio

COlllO direito ou na sua intencao normativa, ha-de ser COl1l-

preendido. . .Nem por outra razao a In t eres senjur i sprudene tern como

momento decisivo da sua metodologia a averiguacae lustorico-

-social dos interesses ecausa is» 552, aqueles que determillariam a

l11edia~ao-opyaO do legislador ou que explicariam a no:ma

juridica nao obstante essa mediayao-opyao. ~a mesma linha

decerto recusava STOLL a «causalidade dos concertos» e postula~a

a sua substituiyao pela (lCausalidade dos interessesr 553 e cntendia

HECK a lei como «3 resuitante, como que a diagonal-de-foryas

de factores em Iuta» 554, e dai, em e1ucidativa coerencia, sc

rccusasse mesmo a admitir a substituicao do conceito de «inte-

resse», no papel de conceito met6dico capital, pel~s de. «fl1n~),«bem juridicoe ou «valor», posto que aquele teria maior vi rtuali-

dade expl icative - virtualidade explicat iva justamente da genes.e

das leis nos contiitos de forces, pretensoes e factores SOCIalS

em sociol6gica parificacso e concorrencia 555. E certo que

HECK nao deixava de distinguir uma teoria juridica dos

interesses «gelletica» 556, que seria devida a IHERING, de uma

551 Ob. cit., 565. . h·552 HECK G e se u es a us J eg u ng i m d I nt er e ss m ju r is p nu ie n z, mArc . CIV.

Pra xis, 112 (19i4), 8, 65, s. e p a s si m ; B e g r if f sb i Jd u n g . cit., 73. . .

553 }t! r is ti sc he M e th o de , p r ak ti sc /l e G r tJ lJ d {o r d en m g d e r b lt er e ss e up m .s p ru 'i cl lzUJ l d ih re B ed eu tu ng i ll u ns er er Z ei t, 8, apud Ph. HECK, Di e In t e r e s se f l J un sp rude l l z

nn d ihre n eu m G eg ne r, in Archiv. c iv . Praxis, 142 , 301, no ta 169.

554 HECK, Begri f f sbiJdung, cit., 46. . .555 I b i d em , 43, 5S.; ID., D a s P r ~b le l1 J d e r Re ch t sgew /nnu I J g , na col. S~>ld,e~,

uu d Texte zur Theone u nd M e th od ol og :e d es Reen t s , p.p, r · ESSER, vol. II,.r., S~.

Cfr. in f ra.55 6 V i d e B e g r if fs b i/ d u r, g , cit., 30, s., 221; e A r CH . civ, Prax i s , 142, 301.

206 IJOUrnINA

ASFONTES DO lJIREITO 207

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outra. «pr~dutiva», mas era isso apenas para dizer que, acei tando

da pnmelr.a 0 entendimento de que «0 direito nasce pelo efeito

caus.al dos mteresses humanos» e assim tambern a compreensao de

sos mteresses como a base (Gr tmdlage) das normas juridicas exis-

tentes» 557, havia que partir dai para a elaboracao de um

metodo que orientasse a aplicacao judicial do direito - 0 quehmRING 11aO teria feito.

POls, ou se reduzam os factores sociais aos «interesses»

C~1110 faz a I nt er es se n ju ri sp ru d en z: - a proclarnar assim, como

diz RATZENHOFER558, que «110 principio eram os interesses»

e 0mesmo e dizer que so as pretensoes «exclusivas» dos homens

explic~riam 0direito, ainda que para tanto se de uma amplitude

excessrva a essa categoria 559, ta l como, alias , vemos acontecet

na americana ~urisprudencia sociolcgicai de POUND 560; ou se

alarguem esses factotes tarnbem as situacoes sociais de «con-

fianca» e de «responsabilidade» e sobretudo de «poder», alern

de outras, segundo a proposta de MUllER-ERZBACH 561. ou se

incluam ainda neles «todas as condicoes ficticas, sociais, polit icas

e outras com fundamento nas quais surgem as particulates regras

557 A h' . Pr . 42rc rv CIV . axi s , 1 , 301; e Begri jf sbi ldung, 30 ~ respectivamente.5,8 Apud FECHNER, Rechts :phjlosophie 33 nota 37559 H ".

. EC~, _pa ra pode r abrange r no concei to de « inrc rc sses todos os

rnteres~es ~osslvels socialmente relevantes, com inclusao expressa dos .inte-

resses l~eaI5" aflnlla,:"a que a In t e t essen jur i sprudenz -uriliza 3 palavra interesseno ma ts amplo senridos _ (R e ch t sg ew i n rl ll n g , l a c . c i t ." 34; B e g r ij fs b il d ul I g, 3 9 ) ,

que 5~t.rata.de u~ sconceito neutros que as exigencias metodol6gico-cientificasdo direiro imporiam (Di e In t eressu iur i spruden .c rm d ihre l ieu en G e gr re r l ac cit162, ss .). Cft . in fra . ' . .,

•560

~ i~ e.i S ur ve y0/

s o c i a l i n t e re s ts , in Harva rd La w Rev i ew, 57 (1943-44),1-39, Lo s p rr r t~d e l l a , f common l a u » , trad. it. de G. Butta , 175,ss.; Cfr . W. FRIED-

MANN,.T he on e g en er aI e d u d ro it, trad. franc. da B j bl ia th e qu e d e P h i/ os a ph ie

du droi t , 294, 5S.; J. STONE, ob . ci t ." 164, ss.; DIAS, Jurisprudence, cit., 597, 55.;

W. ~~~NTS~HER, M e ~h od en d es R e ch ts , II, 228, 5S.D ie Rech t swIs s en s cha f t i m U n tb a u, cit ., 9, 55. ,C pa s s im; D as Er f a s s en

~ e s R e c ht s ~ u s d e n ! 'e m en te n d e s Z u sa mm en le b en s , v e ra n sc ll au li ch t a m G e se ll sc h af t,

inA.reh. ClV. PraXIS, ~~4 (1955), 307, 55.. E certo que MULl.EIl.-ERZBACH pre-tendia dernarcar-se cnncarnente da In t eressen iur l sprudens: de Ph. HECK - objec-

juridicas», como se ptogramava 110 projecto da «Rechtstlltsrlcizetl-

forschutlg» de NUSSBAUM562;ou se identi fiquem com a geneta-

lidade das ~ fo r [e s C T t ?l It ri c es d u droit», no sentido em que as

compreende RIPERT 563, sempte se trataria em rodas estas posi-

croes de «causas que dao nascimentos ao direiro 564, sociologicos

factotes «determinantes» que nos poem perante uma «genetica

das le is»565. Assim tambem para 0direito, de todos estes modos,

ta l como, segundo NIETZSCHE, para 0 axiol6gico, reriauios

de reconhecer uma redutiva «genealogia da moral» 566: urn e

outro nfo se compreenderiam numa intencional fundamentacfo,

apenas se expli.cariam pelos factores de uma sua reducao

emplrica (social nU111caso, bio-antropologica e historica no

outro caso). 0 que bern justifies que se possa afinal caracterizar

em geral esta perspectiva como a de um epensamento juri-

dico causal», generalizando para toda ela a designacrao que

MULLER-ERZBACHquis reservar pata 0 seu pensamento jurfdico

proprio 567• 0 direito, nuina palavra, ter ia de set rernetido,

tivo especialmente acentuado na primeira monografia cit.~, mas nao s6 alinha fundamental de inspirao;:aoe a mesrna, como mclusivamente as efecti-

vas di ferencas metodicas sao Konsideravelmente pequenas», como exactamente

pode observar 0 proprio HECK, em apreciao;:aoa s proclzrnadas divergenciasde MfuLER-ERZlIACH ~ V. HECK, D i e n e ue M e t ho d er ll eh r e M u l le r -E r zb a rh s, in

Archiv c iv, Praxis, 14D, 257 , 55., cmbora este cstudo nao tenha rido em

conta a monogra ftia de MIiLUlR-ERZBACH, V i e R e cb ts w i s se r r sc h a ft jill Umba l l ,que the e posterior , mas onde se continua a posic ;ao anter ior, desenvolvida

e aprofundada.562 Die Rech (s (a t s a chcn f o r s chung , in Arch. c iv, Praxis, 154 (1955), 462-

mas programa Ilio cumprido, porque esta proposta «investigac;ao dos factos

do direitos acabou por sc traduzir unma investigacao sociologies do _dire ito

v ivo> (no sent ido de EHRLICH), i .~, do direito e do s t ipos de direito socia l

efectivamente praticados, na linha do .reaIismo [uridico- americano,563 Na monografia sob 0 mesmo titulo j:i cit.

564 G. RIpPERT, Ibidem, 79.565 G. RIPERT, Ib i d em, 80 .566 Paralelo que, em terrnos analogos ao do rexto, vemos expressamente

invocado por WlEACKER, ob . c i t " 565.567 Cfr. LARENZ,Methade t l l eh re , c it ., 55 , S., em directa refere nda a

In teressenjurispruderlz de HECK.

208 DOUTIUNA AS FONtES DO DIRI:ltO 209

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cxplicativamente rcrnctido ou reduzido, aos <lactores rcais»

(bio16gico-psico16gicos, econ6micos e politicos, v.g. 0 poder 5GB)

que sc mani testam como facrores soc io16gicos e perante os quais

se ornit ir ia , por isso mesmo, 0 «valor» 569 ou as intencionalidadcs

objecrivo-cul tura is espiri tua lmcnte fundamentantes. Nao, por-

tanto, para traduzir apcnas 0 rcconhecimento da concorrencia,

rclevo e importancia - decerto irrecusivel, C01110 elementos

do pressuposto material - e sim a preferencia e 0 cadcter

decisivo atribuido, 110 processo da constituicao do direito, as

«Iorcas reais da vida, as tendencias e as suas objectivacoes, em

particular as circuns tancias polit icas e economicas» 570.

E verdade que isto nao impede que entre essas forcas reais

da vida, ou as sociais «forr;:as c riadoras», se induam, a m.ais dos

factorcs e dos «inte resses mate riai s» , ta rnbem os fac tores e «lute-

resses ideais», as sideais morais», a «religiao», a «ideologia»,

a «t radicfo», ate os «sentimentos» 571, e que a repelir sobre-

tude as acusacoes de «materialismo» 572 e mesmo de

568 Segundo a di scr imi nacao qne dcsses .factor cs r ears» faz FECHNER,

Rech t s p h i l o s o p lu « , passim.

569 Cfr. WIF.ACKER, o b. c it ., 565. V. supra, 150, 55.

570 FECHNER, L a t rJ et ho de s oc io lo g iq ue , l ac . ci t . , 78. No mesmo sentido,

acentua WIEACKER, ob . cit., 565, 0 prcdorninio que no pensamcnto em cau sa

e dado a s scausas socials c econornicas •.

571 Ass im, RIPERT, o b. c it ., 8 5.

572 Vide HECK, Be .~ri f fSbi ldul1g, 219, s .; D ie l nt er es se nj ur is pr ud ct tz u nd i lu e

/lellell G eg ne r, l oc . c it ., 161, 55.; cfr. WIEAC)::ER, o b . c i t. , 575, nota 45; L . LEG.'\Z

Y LACAMBRA, P il os o ji a d e l d e re ch o , 3.' ed., 144. Para alem, no entanro, do que

ira dizer-se a scguir no texto, importa chamar a atencfo pa ra u rn equivoco

que, s 6 uma ve z d enunciado, p odc p er rni ri r 0 esclarecimento deste ponto, E que

nao bas ta , como pensava HECK bastar (ck tarnbern COlNG, System, o b. la c.

cits., 482), que se a fi rme entre os interesses tambem os -mtcrcsses ideaiss (e nao

56 econornicos c rnateriais) e entre as sociais aspiracoes relevantes tambem

as saspiracoes idcais», entre os bens ainda bens <com conteudc etico», etc.

(v . HECK, Begri f f sbi ldung, 220; D ie I nt er es se ni ur is pr ud en z u nd i hr e n eu el 1 G eg ne r,

162, ss.), para excluir uma perspectiva fundamenralmenre marcrialista. 0mar-

xismo c decerto urn pensarnento materialista e nem por isso ignora os

f actores idea is n o complexo dos fa ctores so ci ai s o u as pre tensoes de conretido

euco que os homens dirigem uns aos outros, numa eliminacao primaria e

«niilismo» 573 se ahrmc - afirma-o insistcntemente HECK - gue

nos interesses causai s se contam tanto os inte resses economicos c

maLeriais como os «interesses ideais» 574 - tambein os «interesses

cticos, rel igiosos, de moralidade, os interesses da just ir ;:a, da equi-

absurda de tudo 0que irnediatamente nao fosse cconornico-material; pois 0deci-sivo nao esta em reconhecer a inegavel existdncia desses fa ctores e desse con-

t eudo , mas 0 sentido com que sao compreendidos assim como a natureza e

fundamento ult imo que the sao imputados, Ora , n ao se pode dizer que a . ju ris-

prudenci a do s int eress es » reconhe ca a o . id eah e a o .€t ic o. uma subsi st en ci a on to -

log i c amcte a ut6noma, e nqu anto v al id ade s e sp ir it uai s em si , e na o os reduza so cio-

log ic amen te a pretensoes (a conreiido de pretensoes) que os homens de facto

postularn com relevo social, i e , a i n t eresses que, como tais, s6 subsistem por

referencia emplrico-subjectivo-sccial aos interessados e coruo (ou ao service de)

apetencias eexclusivass deles - pelo que, p. ex., nao se podera sustentar, nestes

tcrrnos, que a pretensao ou a apetencia de justica ( a inten~ ao de justica subjec-

rivo-interessadamente enunciada) de alguern ou de qualquer g rupo so ci al

tenha, enquanto tal, maier v a l o r que a preeensao ou a aperencia de sentido mate-

r ia l qu e out ro a lguem ou out ro qua lquer gr upo t he oponha, ja que arnbas as

pr et ensoes e apetenci as sao i nt er esses que socialmente se afi rr nar n e que como

tais se tern igualmente de relevar (como, com toda a logica, afirrna expressa-mente POUND, I l I t rodu(Ja J f il os o fi a d o d ir ei to , trad. port. de A. Cabr al , 52, S 5 ) .

Pelo que e st a indiferenca sociologica, ou e apenas urn postulado epistemolo-

gico que de ix a em su sp ens o 0problema antropologico e rnetaffsico-onrologico

da ul tima compreensao do emateriab c do ddcab - 0 que talvez s e d ev a consi -

derar ter sido afinal a posicao pessoal de HECK- ou significa (ou leva implicita)

a submi ssao do i deal e do eti co a uma reducao ou expl icacfo sociologica, at ra-

v es d e ap et enc ia s ee xclus iv ass , e n est e c as o se ra ine gav el uma per spe ct iv a mate-

rialista, E , alias, inegavel que ha uma afinidade entre a perspecciva sociologies

da ln te rsseniur isprudene e a sociologia marxista (v., neste sentido, COING,

S vs te m, c it ., 483 e nota 6), a perrnit ir por isso que aquela se viesse a

«resolver em verdadeiro pre-marxismo em juristas como DE BOOR e HAUPT

(ORLANDO DE CARVALHO, C rite ria e e str utu ra d o e sta be le dm en to c om er cia l, 7 86 ,

em nota). Depois, recordemos que BENTHAM rinha urua concepcao funda-

mental marerialista do direito ( 1 1 . M. E L SHAKANKIRI, L a p hl lo s op hi e j ur id i qu e

d e J e re my B en th am , 52, ss. ) e que de esta na ejurisprudencia dos interesses-

pela mediacfo de IHERING.

573 Cfr. FECHNER, D as k au sa le R e.h ts de nk en , e in e G efa hr fU r R ec ilts wis -

sensc lwf t , in Arch. civ. Praxis, 151 (1951-52), 357.

574 HECK, R e ch ts g ew i nn u ng , c it ., 33; ID. , Gese lzesausJegung, ci t . , 11, 17;

ID., Begri jf sbi !Jul1g, 40; cfr. H. STOLL, B e gr jf f a n d K o n st ru kt io n in d er L eh re d er

Inte ressenjur isprudenz , in F es tg ab e fu r P hil ip H ec k, etc., 67, nota 1; MWER-

-ERZBACH, D as E rfa sse l1 d es R ed us, lo c. c i t., ' ! I J 7 .

14 - Hoi. d . F . , . de Dir., Vol. LII

210 DOUTRINA ASFONTESDO DlRElTO 211

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dade, etc ., os rnais al tos interesses da humanidade» 575. Simples-

mente, se assim 0concei to daquelas «forps~~, tal como a de «inte-

resse», abrange afmal tudo a que aos hornens, ja particula tes ja em

comunidade, irnporta 576 e entia, como observava a critica

de OERTMANN, a conceito de interesse «se volatiliza numa

amplitude que tudo abrange, sendo par isso inutiliza~e1} 577, hi

ainda que ter sobretudo em conta os tres pontos segumtes. Em

primeiro lugar, aqueles factores au interesses ideais e marais

s6 como «forcas sociais» e «interesses», de expressao e efieacia

empirico-sociologica, ou apenas como factores «reais» (no sentido

ontologico, de oposicao a «ideal) sao considerados. Pelo que as

intencoes sideais» que sejam objecto au deem conteiido a essas

fortyas e interesses, nao via relevadas, par urn lado, senao co~~

motivos-iins susceptivcis de moverem certas pressoes SOCl~l1S

(certas fortyas sociais) que as pretendam fazer t riunfar,. ~m ~~ra

concorrencia ou conflito com presssoes au forcas SOCIalSdistin-

tas, movidas par intencoes possivelmente de natureza contraria

(de natureza material economica, de poder, etc.); par outro lado,

sao identihcados, sem qualquer diferenciacso em sentido de

relevancia, aos interesses em geral, no seu entendimento rnais

sexclusivc» e enquanto sao todos eles «disposity5es-de-apetencia

para as bens da vida» ( H E C K ) 578, seja de pessoas singulares ,

575 HECK, Begri f f tbi ldung, 37 .576 Vide a critica de H. ISAY, D ie M ethode de r l nu t es s en iw i sprudens ,

in Arch. civ. Praxis, 137 (1933), segundo a sua reproducdo na colecclnea

I n t e r e s s e n ju r i sp rude ne , p. p. G. Ellscheid e W. Hassmer, 226.577 In te re ss e un d B eg riff in de r Rech l swi s s en s cha f t , 35.

578 Observernos que a acenruacao do conceito e posta ~o. caracter. de

dispos iri io psiquica para a apetencia. Assim, para to:nar mals.explicito0~ent1docom que se re fe ria a s «Begehmngsd i s po s i t i o n en . , dizia HECK,In Rech t s gewmnun~,c i t . , 33: .Desejos latentes ou tendencias, que nao sao permanentemente actuais

na nossa consciencia, mas que sao despertadas por urn qualquer est1m~lo, pro-

vocam uma ape tenc ia actua l. A ape tenc ia em sie urn fen6mneo psiquico (.).

A ling nagem actual designa por inte tesses estas disposicoes-de-apeeencia,desde que refer idas a bens culturais, e asrespectivas representacdes, a sua base

e osseusobjectos, Pelo que utilizamos a palavra interesse para toda e qualquer

seja de grupos sociais ou de toda a colectividade, em concorren-

cia tambem, e ao mesmo myel, com quaisquer outros interesses

de igual au de diferente indole - sempre e todos apenas como

causas motivantes c parificados como i n t e re sse s . Quer dizer,

e em segundo lugar , como motives-fins de eflcacia socialmente

inobi lizante e conteudo de apetencias (individuais ou colect ivas)

socia lmente verif icadas, nao deixam aquelas intencoes de ir con-

sideradas tao-s6 como f ac to s , faetos psicol6gico-sociais 579, e, como

disposicao-de-apetencia , sern atender ao tipo especia l do objecto apetecido,

Falamos ho]e nao s6 de intere sse s rna te riais , mas igua lmente de intere sses

ideais, religiosos, nacionais, eticos», E em Begri f f shi Idu l lg , 37, volta a acentuar:.A linguagem comurn designa com a palavra .interesse> aquele significado que

os bens da vida tern para os homens e dai a apetencia para os bcns da vida.

Porcm, nao 56 a ape tenc ia acrual , que forma pa rte da consc ienc ia supe rio r,

mas ja a apetencia laeente, alojada na subconsciencia e que se manifesta atraves

deum estimulo, porranto, nao s6a apetencia , masja a dispoiscao-de-apetencia-.Nao deixa de ser esclarecedor que este conceito de iuteresse seja no fundamenta]

coincidente com 0conceito enunciado ja por OTA SIK,La t ro i si cm e v o ie , trad.

franc. deJ.-M. Brohrn e A. Streiff , 62- eos interesses sao disposicoes humanas

concent radas, r elativamente pe rrnanentes , que movem os homens j .a ra a

satisfa~o de necessidades objectives determinadas» - , ja por HAliERMAS,C o n na l ss a nc e e t i n te r et , mon. cit., 230 - «designo i n t e re s s e s as orientacoes de

bens ligadas a certas condicoes fundamentais da reproducao e da autoconstituiciiopossiveis da especie hurnana, i. e , ao t rabal /to e it i n t e t aa i i o» Em qualquer doscasos, a raiz e bio-psicol6gica ou impulsional, e vai-lhe implicada urnaCOIn-

prcensao naturalista do interesse (ou do fim) mobilizante dos homens. Nem

sao diferentes as coisas em POUND:basra ter presente os seus expresses conceitosde interesses: ~lainls or wants or desires (or, y would like to say, expectations)

which men assert de f a c t o , about which the law must do something if organisedsocie ties are to endure> (Ju r i s p rudence , III, 15 , apud DIAS, ob . cit, 596, s.);

«c la ims or demands or des ir e which human beings, e ithe r individua lly or in

groups or a ssoc ia tions or re la tions, seek to sat is fy , of which, the re fore , the

adjustement of relations and ordering of human behaviour through the force

of a politically organised society musr take account- (A s ur ve y o f s oc ia l in te -

re s t s , cit.),579 E esse, alih, 0 sentido deste enunciado de HECK,Ges e t ze s aus l egung ,

cit., 60: t... os interesses, que devem ser protegidos pela lei, sao justarncnte

grandezas historicas, i. e , reais. Sao desejos, aspiracoes que existiram na cons-

ciencia de homens reais•. De novo e esclarecedor, se aproximarmos urn enun-

c iado pa ra le lo de OTA SlK, o b . c it ., 84 - comentando a a fi rmada d ist incao

e mesrno a supraordenacao dos sprincipios morais» relativamenre aos interesses,

diz: .Dece rto os pr inc ipios morais influenc iam mui to for tementc a ac~ao

212 DOUTRINA AS FONTES DO DIRElTO 213

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ta is , sao fimdamentalmente distintos (a oporem-se mesmo, inten-

cional e objeetivamente) as va l idades- · e enquanto e a validadeo modo-de-set especifico da idea1idade. Faetos (<<interes.sesmate-

riais») ao lado de outros faetos (<<interessesideaiss) e uns e outros a

operarem numa causalidade tarnbem s6 sociol6gica - nos mes-

mos termos, portanto, em que a sociologia empiric a reconhece a

factualidade e a causalidade da motivacao real (psicologico-social)

por valores , mas sern que os valores sejam ai assumidos enquanto

tais, na sua ideal e objectiva validade 580. Assim, e em terceiro

lugar, afinnar «interesses ideaiss e enunciar uma contradicao e

acabar pela negacao do que se afirma. Se 0«interesse» e de refe-rencia rdativo-subjectiva (vai sempre referido a um sujeito inte-

ressado) e de imposicao exclusiva (s6 para 0 interessado tern

sentido reivindici-lo), enquanto 0 «ideal» e de referenda objec-

tivo-universal (0 ideal que assim nao seja assumido, como vali-

dade, nao participa da idealidade e nao e rnais do que um fen6-

meno psiquico ou sociol6gico) e de imposicao nao-exdusiva ou

inclusiva (diverge-se nos interesses, comunga-se nos valores), entao

nos «interesses ideais» vai, na verdade, afirmada a objectividade do

seu sentido e simultaneamente a subject ividade da sua intencao,

a universalidade da sua validade e siruultaneamente a rdativi-

dade da sua imputacao, a validade (a idealidade fundamentamen-

tante) e simultaneamente a contingencia (a factualidade psico-

-socioI6gica). 0 que torna inevitavel a opcso: no «interesse

humans, mas s6 sob a condicio de que des sejarn aceites pelos homens ouinteriorizados como os seus proprios principios, Esquece-se far ilmenre que

existern sistemas diterentes de moral, que a moral nao € criada artificial-

mente {. .. J . Esquece-se demasiado facilmente a essencia d a moral e a sualiga~ao com os interessess, De novo estamos perante uma bio-ernpirica .genea-

logia da morals,

560 Pelo que e bern pertinente a observacao de LARJ!NZ, ob . ci t ." 60,

quando nos diz que mlo e por acaso que HECK tal como STOLL, em vez d a s

expressoes «valor> e ecriter io de valon, que afrrmam algo de objective , pre-

f erem a expre ssdo .juizo de va lcn, que designs urn acto sub ject ive de pensa-rnento •.

ideal» ter-se-a de optar ou pelo i n t e re sse ou pelo i d ea l , pois s6

um ou outro pode ser determinante, E cremos nao fazcr

violencia ao seu pensamento, se dissermos que na I t ueres senjur i s -

p r ud e n z (como em toda a jurisprudencia sociol6gica) a prefe-

rencia vai peIo interesse.

Ora, e justamente este nivelamento do ideal com 0 mate-

rial 581, u.a reducao de ambos a factualidade sociol6gica 582

e assim sem verdadeiro rcconhecimento da idealidade em si

- e a Sua cornpreensao uniforrne como Iactores de uma

dinamica social e de conflitos de pretens5es concorrentes de

que ha-de nascer 0direito, enquanto sociol6gico produto directo

dessa dinamica ou resultante apenas desses confiitos, que nos

forca a conduir que na perspectiva do pensamento em causa s6 sao

[a d o r e s do direito os factores ernpiricamente sociais ou sociol6-

gicos, que a realidade para de pressuposta e relevante e unica-mente a realidade social sociologicamente entendida, Nao esta-

mos aqui, na verdade, perante urn pensamento sobre 0 direitodeterminado por urna sua compreensfo apenas enaturalis tica» 583

em que e nitida a continuidade do cientisrno empirista-causalism

de oitocentos?

Conclusao em que vai a£in.al r igorosamente caracterizado

o sociologismo juridico, sendo certo que neste, como se pode

dizer usando uma sintese de FECHNER5 84 «0 direito e exclusiva-

581 .Os fac tore s rnora is - obse rve COING, S ys te m, l oc . c it ., 484 - sao

considerados 00 I Q J o dos outros interesses: nao tern qua/quer f i m ( i i o especia l•.

582 Vt"Je FECHNER, Rechtsphi losophie, 35 , nota 41; 0 qual, relativamenreIIobservacfo de COING, no sentido de que a consideracao dos sinreresses ideaiss

afastaria da In teressenjurispruJenz a qual ifica~ao de n ii lismo, ponde ra : ds to

porern nao altera 0 facto de que a redu~o do direito a 'interesses causais'trata 0 etico como facto, como 0 que numa determinada comunidade e tidofacrualmenre por moral, born, decoroso, e tc .. 0 erro esta pois na equipar~o(G/eichsetzul1g) de 'inreresses' materials e eticos•. No mesmo sentido, LAllENZ.ob . cit., 55 , S., 57 .

58:3 No rnesmo senrido, COlNG, ob . l o c . c i t s. , 484: WlEACKER, ob . c i t ;568 , 577, s ., no ta 45 ; FECHNER, ob . ci t . , 34, S••

584 Ob. clt ., 35.

214 DOUTRINA AS FONTES DO DIREI TO 215

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mente considerado sob 0 ponto de vista (real-) sociol6gico e

dcduzido de forcas (real-) sociologicas», com radical pretericao,

portanto, das suas raizes erpirituais.

S6 que este sociologismo juridico, com 0 seu positivismo

naturalista, e de todo inaceitivel. E e inaccitavel para 0 direito,

como inaceitavel e para qualquer outro dominic cultural.

Tal Como 0 psicologismo na 16gica585, 0 bio-sociologismo na

etica 586, 0 uaturalismo nas «ciencias da cultura» 587, tambem 0

sociologismo (0 realismo sociol6gico, 0 positivisrno naturalista

sociol6gica, etc.) e opaco para a autentica corupreensao do

direito e do seu processo de constituicao normativa. 0 dircito

e decerto uma. realidade que hist6rico-socialmente se manifests,

mas isso nao deve impedir que 0 reconhecamos na sua piuri-

dimensionalidade consti tutiva, bern longe de se esgotar numa

factualidade social que se dinamize apenas pela natureza empirica

(psico-sociologicamente empirica) de urn conjunto de factores

concorrentes ou conflituantes e numa pretensao de logro apenasfinalistico. Uma factualidade social em que nao houvessc,

pois, Iugar para as intencoes e as validades espirituais que se

object ivam no dornfnio culturalmente significante -" aquele

dominio que nao e constitufdo quer por forcas empirico-sociais

actuantes, quer mesmo pclos fins que programaticamente sc

mobilizam nurna qualquer estratcgia social, e sim pelos sentidos

intencionais que, assurnidos numa pressuposicao espiritual, ofere-

cern as significacoes e os fundamentos de validade para a

aC!fao e os seus fins. Pelo que, nao abranger esses sentidos

intencionais e de validade enquanto tais - i. e, e importa

585 E. HUSSERL, I n ve s ti g a ci o ne s i 6 gi ca s , c it. , I , 67, 55., e pas s im .

586 SCHELIlR, D i e S t el /u l Ig , cit., 87, 55.; H. COING, Grundz j jg e , cit ., 3.' ed. ,

106, 55 . .

587 W. DILTHEY, I nt ro d uc ti on a / 'e tu d e d rs s ci en ce s h um n in e s, cit., pas s im ;

RICKERT, K u lt u rw i ss e ll sc h a ff u n d N a t un v is s et ls c ha f t; GUSDORF, I nt ro d uc ti on a u x

s c ie n ce s h u m ai n es ; GADAMER, W a h rh ei t u n d M e th o dr , 3. a ed.,; J . HABERMAS, Log i c a

d e ll e s ci en ee s oc la ll , cit., pas s im . Isto, nao obstante 0 actual Posi t iv i smusst te i t .

inslstlf, na sua especHica objeetividade espiritual-culrural Wc--,

nao e s6 truncar a realidade humane-cultural, embora na sua

n1J.nifesta<;aohist6rico-social, de dimensdes que the sao onto-

logicamente constitutivas (da dimensao significativo-cultural), esobretudo elirninar simultancarucnte factores de decisiva pres-

suposi<;aopara 0 direito (c de pressuposicfo nao ja s6 relc-vante mas, sobretudo codetcrrninantc, como se veri) no seu

processo normative a partir da realidade humane-social. Justa-

mente aqueles factores, desse processo constituinte, que havemos

de reconhecer nas intencionalidades racionais , axiol6gicas e

religiosas (e etico-religiosas) assurnidas historicamente na sua

universalidade fi.1lldamentante (como intencoes «nao-exclusivas»

ou dnclnsivase) e que assim, como pressupostos de validadc

significantes, comunicalizam no dialogo humano-espiri tuaI c

comunalizam na convivencia pratica de uma certa comunidade

num determinado momenta hist6rico - aqueles factores que

at nao causam ou simplesmente motivam, mas dao sentido cfundamentam 589. A comprovar esse seu relcvo constituinte,

embora na perspectiva do problema geral do q ui d i us , invoque-

mos desde ja as detidas e concludentes analiscs de FECHNER

sobre este ponto 590, sendo certo que tambem na parte que nos

toea as viremos a corroborar em todo 0 desenvolvimento

sucessivo deste estudo, Pelo que agora queremos s6 afirmar que

os faetores a induir no pressuposto material do direito, e que

58B 0 que inviabi li za ra todas as t enta tivas de as reduz ir a proposicoes

fac tualmente empir icas - c fr ., por todos , HABERMAS, ob . cit., cap. I I, 67, s s. .589 Decer to que aqui mesrno surge 0 problema do fac tor ideologico , a

suscitar a questfo de saber seossignficantes culturais nio serao afinal ddeologia-ou se em todo 0caso nio participam neles conteddos ou intencoes ideologicas.

E esta uma questfo - no fundo, a da relacao en tre a «cu lturas e a sid colog ias

- que considerar erno s na ultima parte da analise do p ressuposto material,

exactarnente ao discriminarmos neste 0 eelemento material. espedfico. Para

linos rernetemos.

S90 Na sua R e d us p hd o s op h ie , p a s si m . Numa perspectiva cultural geral,

recorde-se 0 que sc dis se sup r a , 150, S5.

2 1 6 DOUTRINA AS fONTES DO DIRE ITO 2 1 7

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como tais e em ter1110Sconsti tut ivamente relevantes se impoeni

na realidadc, 0 mundo ou a circunstancia humauo-cultural e

historico-social a que de vai referido, nao os teremos apenas nos

(~factores sociais - os factores sociologicamente reais de eficacia

empfrica-, pois com esses concorrern tarnbem, indefectlveis e

de Ulll modo que hayed de esclarecer-se, os efactores cul turais»,as intencionalidades espirituais de validade objectivamente signi-

ficante. Numa palavra de generalizante simplificacao, nao

s6 0 f ac t o , mas ainda 0 valor , nao s6 a ut i lMade social ( a s

pretens5es interessadas e sociologicamente redutiveis de que 0

direito fosse apenas instrumento de tutela e cont r81e) , mas ainda

a val i dade cultural (as intencoes manifestadas na axiologia humano-

-cultural de que a val ida de juridica sera urn modus espedfico) rele-

vam no pressuposto material do direito, 0 que, alias, vai ter

ja a seguir uma primeira, ainda que s6 indirecta, confirmacao.

b ) Trata-se de considerar 0outro ponto at rds enunciado:

para alern da questao que foi objecto da aHnea anterior, que tinhaa ver com a indole geral dos factores ou tipos de factores que

participam na realidade de pressuposicao relevante para 0 direito,

a questao agora que interroga sobre 0 modo especlfico dessa

relevancia. E tarnbem para este ponto importa cornecar por

atender a posicao que nde toma 0 pensamento juridico de

perspectiva sociologies, uma vez que e esse pensamento ? que

leva mais longe a tese da vinculacao do direito a realidade

hist6rico-social que the seja pressuposta.

E como vai implicito ua referencia que fizemos ja a

esse pensamento juridico sociologico, pode dizcr-se que de

sustenta que os factores sociais sao relevantes para a consti-

tuicao do direito, nao apenas em termos de uma geral condi-

cionalidade, mas verdadeiramente em termos determinantes.

Seria a sua uma relevancia determinante e nao s6 condic ionante :

os factores sociais ou 0 conjunto desses factores definiria,

digamo-lo em formulacao de FECHNER, euma ordem de te tmina t i va

das relacoes humanas sob 0 principio do facto» 591. E a querer

isto significar que «atraves da analise sociologies das relacoes

reais tambem a determinacao do direito duma sociedade pode

ser esclarecida sem residues 592, se nao mesmo que «ascondicoes

de realidade para 0 direito (como 'interesses', 'facticidade' ou

'ordens concretas da vida') pretendem ser ja em S 1 mesniasdireito» 593 -- ou entao, como se entre 0 «dever-scr» jurldico

e 0 «set» de facto existisse «uma relacao ontologicamente

fundada» 594, que permitiria ver 110d ireito tao-s6 «uma especie

de transubstanciacao do factO» 595. Pelo que bern se poderia

dizer que «s6 0 social fktico e reconhecido como fonte de

direito» 596 ja que aquela vinculacao determinante do juridico a

realidade social implicaria exactamente estas duas consequencias:

o direito nao s6 seria um produto-efeito dessa realidade como

teria ainda nela, ou nos factores ai para ele decisivamente

relevantes , 0 seu pr6prio criterio normat ive .

Era assim que HECK - retomemos tambem aqui a In t e -r es se nju sp ru de nz - tinha por base e micleo das suas propostas

metodologicas uma juridica «teoria genetica dos interesses»

e expressamente postulava que (iDS comandos legais nao visani

56 a delimitacao de inter esses, mas sao tambem, como todos os

comandos activos, verdadeiros produtos dos interesses»; que

591 La m e th o d e s o do L o gi qu e , ci t . , B2- onde acrescenra: <0 problema eentre tanto 0de saber sea ordem real das rd;u;:oes humanas a determinar socio-logicamente constitui uma especie de ordem pre-jur idica que sc aproxima da

ordem [uridica e a qual 0direito pode e deve ligar-se se quiser criar uma ordem

proxima da vida. Deste ponto de vista, a sociologia poderia dizer-nos '0qu e t,

e forneceria ao direito, considerado como «0 q ue d eo e s et » pontes, de apoio paraa ordern a rea lizan. 0 prob lema esta, na ve rdade , na cons ide racao e no modo

de consideracdo desta hipotese.592 ID., Rechtsphi losophie , 141, s.

593 WIEACKER, ob. dt., 570; cfr ., no entanto, ir lfra.

594 FECHNER, La m h ho d e s o ci o lo g iq u e, cit., 8 2.

595 SIMONI! GOURD-FABRE, o b. c it ., 6 5.596 FECHNER, R ec ht sp hi lo so p hi e, 3 4.

21H DOUTRINA

AS FONTES DO DlRE ITO219

na~ao se revelassern como socialmente afmnados 602, tambern

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«~ co~ndo juridico surge como cfeito dos interesscss; que as

leis sao «as resultantes dos interesscs de orientacao material

nacional, religiosa e etica que lutarn em qualquer comunidad;

juddica uns pcrante os outros pelo seu reconhecimento», etc. 597.

MULLE~ERZBACH, por seu lado, s6 acentuaria esta sociol6gica

determinacao ao pretender, com algum radicalismo, superar a

«Interessenjurisprudenzi por um « k a us a le n R e ch ts d en k e nv ., chamado

a orientar a ciencia do direito para urna epistemologicamente

indispensavel «investigacao de causas» 598 que lograsse <Jan~ar

a ponte, sao palavras suas, para as ciencias da natureza c

ultrapassar 0 abismo entre elas e as ciencias do espirito» 599.

o que se couseguiria atraves da averiguacao dos «factores da

vida que determinant pos i t i vamen te a format;ao do direito» 600

- factores que vimos ja quais fossem - e averiguacao essa,

expressamente subl inhava, que havia de ser «causal» e nao ete leo-

1" 601 E .gl.ca» . assim como para POUND 0 pesamennto jurfdico

devia entender-se como unia « s oc ia l e n g in e e ri ng& e 0 direito

como um modo apenas de «col l trole social» com vista a obter

mediante « th e b ala nc in g o f c om pe tin g in te re sts », 0 equilibrio dina-

nuco de todos aquels interesses que numa exaustiva discrim.i-

597 Respectivamente: Ge se t z e sau s l e gung , cir., 17; Begri f f sbi ldurlg c it. 73'Ce se t xe sau s l e gung , 60. ' , ,

59 R Di e R e cht s w is s e ns c h aj t im Umbau , 2, 69. efr. supra, nota 561

599 Ibidem, 3. .

600 Ibid., 9.

601 . I~id., 6~. Posicao que rem paralelo na ja referida recusa de HECK

em SU~S~ltU1r0 einteresses (causal) por .firm ou cvaJor»- eraduzindo ambas

as ~osl<;oes,.~rn claramente, 0 ernpenho de urna perspectiva gcnerico-expli-

catrva do ~re ,lt~ que sempre ;e reconduz it t entat iva de uma sua egenealogiasape~as sociologica (e naturalistica). efr., alias, bern elucidativarnente ncstesentido, POUND, Socia/ogia y jurisprudencia , in Soc i a l og ia d e l s i g l o XX , p.p. G. G t iR . -

7 C H J i vol. I , 271. . No enranto, sobre a adequacao daquele .recusa. a estruturap ura sta . ~s sociedades actuais, v. G. ELLSCHElD, In troduf i ia a colectaneaIn teressen}urlSprudenz, 4-7.

para RIPERT « I' analyse des forces creatriccs du droit explique

seule la leg isla tion d' une epoque» 603.

Seni duvida que esta determina~ao social do direito nao vai

agui confundida com urn puro determinislllo (com urn deter-

nUniSlllO tambem social) 604, pois nenhuma das modalidades

do pensamento juridico socio16gico a que nos estainos a referir

afirma que 0 direi to surge imediatamente dos factos ou factores

sociais, scm a mediacao, e mesmo mediacao valoradora, do

legislador ou do jurista em geral 605. :E assim expressamente

em HECK - para quem as normas juridicas seriam 0 resultado

de (~uizos de valor» sobre conflitos de interesses e juizos esses

que nao deixariam mesmo de ter na sua base «a representat;ao

de uma ordern desejave1. portanto um ideal social» 606. Ponto

que com particular acentuacao seria retomado por STOLL 607.

E POUND, se nos diz que a fun~ao do direito nao c a de

criar , mas simples mente a de reconhecet os interesses, logo

acrescenta, numa sintese do seu pensamento, que «todavia elc

nao rein s6 como fun~ao a de reconhecer os interesses que

602 a bs . c it s. , e ainda L a s g r an d es t en d al lc e s d e l p e n sa m ie n to j un d ic o , trad.

esp, de J . P. Brutau, 200, 55.. Cfr, por todos, DIAS, ob . ci t . , 595, ss ..

603 ab . clt., 83.604 a que, alias, 0 sociologismo juridico estrito, a que ja alud.imos

anteriormenre neste estudo, nao exclui de rodo, Para estc ponte, v. J . STONE,ob . c i t . , 472, 55., com arnpla informa~o das varias correntes que afirrnam esse

deterrninismo social no juridico. Cfr. a nota seguinte.605 E 0 que vcrdadeiramente distingue 0 sociologismo [uridico que

estarnos a cons ide ra r - e que caracteria a .juri sprudenc ia soc io logica» - de

aquele outro, tambern ja antes criticamente referido, que reduzia a ci6ncia dodireito a urna ciencia apenas sociologica ou a urna modalidade da sociologia,assirn como de todos os pensamentos que tentam investigar 0 direito ern (ou

inferi -lo) irnedia ta rnente a pa rt ir de certos dado s hist6rico-culrurais sociais

(Dl.lGUIT, GENY . Gtmvrrca). Cfr. supra, nota 536 .

606 Begri f !sbi ldurrg, cit., 41 .607 Begri f ! IlI1d -Kons trukt io t l itl d e r L eh r e d e r I nt er e ss e ns ju ri sp ru d en z,

09,55 ••

220 DOIJTRINA

cxistam autonouiamente: devc estabeleccr quais reconhecera,

AS fONTES DO DIREl1'O 221

c assim a caracter norrnativo-juridicamentc detenninante dos

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definir a medida em que lhes dara a sua e6dcia em relacao aos

outros interesses, individuais, publicos au sociais ( ... ) e por

fim estabelecer as meios com que garantid. esses niesmos

interesses»608. Quanta a MULLER-ERZBACH, problema da

«valoracao» (a «valoracao da vida por parte do direito»] 609

e espccificamente um dos problemas centrais do seu pensamento.

Para RIPERT,por sua vez, «[e droit est impose par les forces

sociales mais ilne jaill it pas spontanement du jeu de ces forces»,

scndo que «laloi est presque toujours le resultat d'une transaction

entre des forces opposees» que tem no legislador, no poder

politico, 0 seu «irbitro» 610 e para cuja decisao nao deixam de

relevar como criterios espedficos alguns «principiosjuridicos» 611.

Mas nao e menos certo que tudo isto nao exclui 0 pensamento

basico de uma estrita funcionalizacao social do direito 612,

606 Lo s pitito d ella < co mm on la w> , c it . 84; efr. Sociologie y jur i sprudeJ lc ia,cit., 302, s.. Dar 0 relevo dos p r i n c ip l e s , c o nc e pt io n s, d o ct ri n es , s ta n da r ds , alem

das rule s expressas, como criterios normativos na concreta ponderacao ou

reconhccimen to r el at ive dos i nt er ess cs - v: L a s g r an d es t en d en c ia s , cit ., 206, ss. .

Cfr . DIAS, D b . cit., 600, 5.. E por i5S0 nos diz tambem que as insrituicoes

juridicas nao sao s6 ecoisas que saoo, mas «oisas que se fazem», defmindo

a <soc i a l e ng i tme er jng r . como ca ordena~ao das rela~oes humanas atraves da

ac~ao da sociedade politicamente organizadas, em ultimo terrno como cum

meio de e lim inar fr ic~oes e cvi ta r desgas te s, na med ida do possi ve l, e s at is fa zer

as inumeciveis necessidades humanas com base numa reserva relativarnente

pequena de bens matcriais- - sendo 0 direito '0 conjunto de conhecimentos e

de experiencia com cuja ajuda esta parte da engenharia social se pode levar

a cabo- - La s g r a n d es t e n de n c il l S, 200 e 206. Pelo que, apesar de tudo e em

ultimo terrno, 0 direito apenas se compreende como urn modo de «con t rme

social> e numa intencao de compabilizar tanto quanto possivel todos os inte-

r es se s que socia lmente se r evelem.609 D ie R ec ht sw is se mc ha [t i rn U m im u, cit., 72,55.; D a s E rj as Se tl d es R ec ht s,

cit., 306, 55.

~10 O b. ci t . , respectivamente, 81, 83, 86.

61l tsu; 343, 55. , 411, 55.. Cfr, supra, nota 608.

612 0 que e par ri cu larmen te n it ido, porque ao propri o ni vel expre ss ive ,

em POUND e MiiLLER-ERzBACH, mas nao menos caraeterisrico em geral de

t oda es ta o rient acao do pensament o i url di co .

factores sociais, j:i que a «valoracac» seria destes fundamental-

mente dependente 613 - no fundo a direito nao traduziria mais

do que a decidida tutela da previa importancia social daqueles

factores ou 0 compromisso entre eles impasto par um con-

texto de convergencia e conilito -, sendo inclusivamente desse

relevo determinante que se tirariarn os corol:irios metodol6gicosque permiririam a estaperspectiva do pensamento juridico ofere-

cer-se como um pensamento «praticos de base ecieutifica», i. e ,como uma pr:itica fundada numa investigacao cientltico-redu-

tiva dos factores decisivos 614.

Pais, em primeiro lugar, aquela mediacao valoradora tra-

duzir-se-ia aftnal tao-so, quer na preferencia de um interesse

sobre outro ou outros em conflitos, quer no reconhecimento

do especial relevo social dos factores sociais concorrentes 615;

em segundo lugar, seria para cla decisive 0 proprio peso

relative dos interesses, j:i entre si au perante outros factores

sociais,j:i no quadro e em fun'Yaoda situacao social pre-juridica

dos factores relevantes 616; e, quando a nao fossc, erarn ainda, em

61J POn tO de modo especial acentuado por Mi.iLLER-ERZBACH, Di e

R e c il is w i ss e n sc h a [t i n Umba« , B4, 55., na sua in tcncao de impor como fundamento

da Bewe r t ung 05 factores sociais casualtnente investigados, e nao equa rsquer

abstractos crl rerios moraiss , c s . H. e O I N G , System, cit ., 4B4.

614 No que de novo comungam espec ia lmente , e em expr es sa in tencao ,

POUND e MfuLER-ERZBACH.

615 No primeiro ponto insiste, como se sabe, HECK e no segundo

sobretudo POUND e Mi.iLLBR-ERzBACH.

616 Nesse sentido sc orientam sobretudo as analises metodol6gicas de

Mi.iLLER-ERZBACH, D i e R e c ht s w js s en s c ha [ t, 79, 55.; D II S 1 ;j rf as se n d es R ec hl s,

cit ., 306, ss. . Por i sso, observe exactarnente K. KNAUTHE, K a u s al e s R e c ht s rk l lk e u

l i nd Re ch t s so z i o l og ie , 89, s., que have ra de di st ingu ir- se entr e Inte resse t rabl lJ i igung

(ponderacdo, consideracso dos interesses) e Inte ressenberwe tu.ng. (:valor~o.

avaliacao dos interesses) e que verdadeiramente 0.pensamento juridico causal-

preocupa-se mais com a .Abwi igung' do que com a «Bewe nung» . Cfr. J . [ .

M. van der VAN, G er ec ht ig ke it u nd I nt er es se n, in Inte ressenjurjspruJenz , col.

cit., 452, 55., que ve na Abwi i gung urn juizo quantitativo e 56 na Beu/er tung

urn juizo quali ta tive.

222 DOUTRINA

terc~iro lugar, s6 os factores sociais 0 criterio da pr6pria opcao

AS FONTES DO DlREITO 223

SOCialS.Estes apenas, e nao quaisqucr diferentes intencfies

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medladora ou «valoradoras. Os interesses ou os factores sociais

em geral sao assirn tanto «objecto» como «causar das prescricoes

jurfdicas, s imultaneamente «objecto de valoracao» e «cri terio

de valoracao» 617. 0 que, com efeito, verdadeiramente significa

a nega~ao de uma intencfo materialmente especifica ao direito

ou de uma autonornia nao sociologicamente redutivel da suavaloracao 618.

Dai, teremos de concluir, que a mediacao legislativa,

enquanto a fundamental mediacao valoradora juridicamente

constitutiva, apenas acrescentasse ao relevo sociol6gico dos facto-

res sociais um momento j u d d i c o 1 " o rma l - 0momento formal da

vontade imperativo-coactivamente tuteladora do legislador 619_,

mas fosse mater ia /men te determinada pelos mesmos factores

. ~17 Cfr., HECK, Ge se t z e sou s l e gung , cit., 232, nota 357; ID., D i e I nt er es -

senjur isprudenz: un d ihre n eu m G e gn er , l o e . c i t. , 301, 5.. Em critica, e no sentidodo texto, vide LA~Z,. Methoden l eh re , cit., 57; K. KNAUTHE, o b . c i t. , 91, s ..

E ccr to que HECK disringue ( I o es . e i ts . ) os intcresses em geral (os interesses

relevan~es.e enquanto object?), ~05 « i n t e re s s e s d e de d sdo» , cabendo especialmente

a,e~tesulnmos ~ ~apel de cntenos da valoracao: s6 que na intencao epistemo-logico-meecdologica do seu pensarnento esta dis tinl(ao nao tern fundamento

como logo 0denuncia 0ver s6 como i n t e r e s s e s tanto 0factor relevante como o

~riterio da relevancia: 0monisrno de urna redul(ao sociologies rnantem-semalterado.

61S D' . " d.. ai a mt~lra j ust eza es ra c onc lu sao de COING. Sys tem, cit., 484:

.~~I/er-Erzbacl , ded ic ou u rna especial at encao ao problema da valoracso no

dl~e~to; mas res_?lve-o, no fundo, enquanto 0 nega: a valoracao r esu lta da

anahse ~a situacao concreta em fun~o dos intcresses; uma valoracso indepen-

denre nao e~te PO~to. Os facrores da vida trazem ja a solul(ao.. E se

STO~E, nos diz, ob . at., 473, que nes ta tese da «total dependencis» do direito

relativamenre a rea lidade soc ia l t emos de vet uma . simpli fl ca~o. e urn eexa-gem> quant o ao reconhecimento da <interdependencia do direito com outros

aspectos da vida.s?Ci~~, uma <simples sobreeseimacao do papel e efidcia das

outras for~as S~CJ.aIS" e ISS0 decerto exacto - 56 q ue essa simplificacao, exagero

e sobreestimacfo apenas foram possiveis , porque do direi to set inha uma COm-

preensao s6 s oc io lo gica e nao verdadeiramente normativa619 0 . idi f ] d .momento juri ico- o rma a ocoacl(ao . or ganizada - cfr . STONE,

ob . c i t . , 470, 5S.

(etico-culturais, axiologicas, prindpios especificamente norma-

t ivos, etc .), decidiani da deterrninacao material do normativo

juridico, atraves da vontade do legislador, motivando-a ou

«causando-a»: sem 0 legislador, sem a sua mediacao e von-

tade nao haveria direito, mas determinantes dessa vontade

mediadora, como causa-motivo e por isso tambem criterio dela,

terfamos tao-s6 os interesses e outros tactores sociais. pelo que,

na vcrdade, 0 legislador - e e HECK quem expressamente 0

diz - e «a designacao englobante para os interesses causais»620,

«adesignacao englobante daquels interesses da comunidade que

obtiveram vigencia na lei» 621. Estamos, pois, em todo este

pensamento perante um sociol6gico positivismo juridico que

apenas compreende 0 direito na intencao de um estrito fin a-

lismo social -- 0 direiro tao-s6 0 instrumento do poder politico

para a afirma~ao e tutela de interesses sociais e por eles

exclusivamente determinado.

Mas trata-se de novo de uma posicao insustentavel, A equi-

paracao de uma deterrninacao causal (cmpirico-sociologica) com

uma valoracao normativa, a confusao ou monista fungibilidadc

entre 0 objecto da valoracao c 0 seu criterio e ambos socio-

logicamente pressupostos ao direi to, na tentat iva va de redu-

zir 0 norrnativo a uma factual idade social iuvest igavel, para

que assim se sat isf izessem, por um lado, as exigencias cri tico-

-culturais do tempo 622 e, por outro lado, definitivamente se

vencesse a cspcculacao jusnaturalistica, que afinal 0 positivismo

620 Gesetzesaus legung, 8.

621 Ibidem, 64, s..

622 Vide, neste senrido, PAWLOWSKI, P r ob le m a ti k d c r I n t e n e s s e n ju r i sp ru -

denc , in N. J . W., 1958, 1962, que nos diz que os e inre ressess ser iam para a '

ciencia do direi to a ereal idade sem pressupostose que as ciencias da natureza

do seculo XIX ex igiam para a realidade em geral a con siderar por todas as

ciencias,

224 DOUTRINA

conceitual nao tinha superado, e se aproximasse a direito da

AS FONTES DO D1REIT( l 225

e HUHMANN 62'\ para a «ln t eres sen iur i sprudeuz», c KNAUTHE GJU

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realidade e da vida - tudo isto 0 que em ultimo termo tra-

duz, atraves de urna contradicao 623 e de uma impossibili-

dade 624, e a deliberada omissao, que e uma recusa, de fun-

damentos autonomos e especificamente normativos do jurf-

dico, sem os quais a direito nao sera verdadeiramente

direl to 625. Omissao e recusa estas que apenas denunciam a igno-

rancia da essencia axiologico-normativa da juridicidade, ja que

o juridico ndo assimila normativamente a realidade social rele-

vante sem a transcender pelo regulative axiol6gico de uma

intencao de validade autonorna. 0 direito nao e facto ou efeito

imediato da realidade humane-social, mas valor assumido numa

mediacao de liberdade 626. Por isso, puderam, por urn lado,

observat justamente, ja STAMMLER 627, mas sobretudo ISAY 628

62J FECHNER faz no tar, Da s kausa le Rechtsdenke tl- e in e Ge fo hr Jur d ie

Rech t swi ssenscha f t?, in Archiv f. civ. Praxis, 151 (1950-51), 357, que entre a

ccausalidade. do pensamento juridieo sociologico e a valoracao au decisio

axiologica h :l desde logo l ima cont radicao l og ica : na val or acf o es ta ir np li cada

a l iberdade e a causalidade pressupce a necessidade. V. ta rnbem R. REINHARDT,

R i ch te r u nd R e ch ts ji 7l du ng , 20; PAWLOWSKI, ( lb . l o c. d IS . , 1564; e KNAUTHE, ob .

c i t . , 102. Cfr. ja a seguir no texto,

6~4 Os fact os (au f ac to res r eai s) enquan to t ai s nao podem ser fundamento

e cri teria de valoracoes, as quais precisamentc 56 a sao no pressuposto de nrna

distancia cririca perante aqueles e esta s6 passive! pensar-se atraves de uma

media~ao (de uma inten¢.to) que Ihe seja aut6noma. Cfr. FECHNER, Me t h o d e

Soc io log iq l l e , ci t., 8 2, al. 5) .6~5 Pelo que, com PAWLOWSKI, ob . lee. cits., 1562, se devera conside-

rar que a problema esta em saber ese a rcalidade sem pressupostos dos inre-

resses exprime a realidade cornpleta do homem •.

626 Cfr. PAWLOWSKI, o b. lo c. d IS . , pass im.

627 T h e o ri e d e r R e c hs w is s en s ch a ft , 2.' ed., 442: (a jurisprudencia dos inte-

rcsscs- nao permitiria conhecer segundo que metoda se havera de ponderar

as interesses,

628 D ie M e th od e d er I nt er es se n ju ri sp ru de 7 lz , in Archiv f. c iv , Pr axi s, 137

(1933), r ep roduzi do in In t eressen iur i sprudenz ; col. p. p. G. Ellsheeid e N. Has-

smer, '22.7- a « jur is prud.enc ia dos in te re sse» n lo esclarece, sob que pontos d e

vista a legislador deve orin tar a sua valoracao, com que criterios as interesses

hao-de ser valorados .

para 0 «penSJmento juddico causal» ~ e 0 mcsmo sc did

perante todo 0 pensamento juridico de orien tacao soeio16giea

- que nao foi dada solucao, nem podia ela ser dada nessas

perspectivas, ao problema nuclear e decerto fundamental da

valoracao jurfdica, ao problema afinal da intencao norrnativo-

-jurfdica em si mesma; e concluir, por outro lado, FECHNER 631

numa critica que toea mais directamente os fundamentos inten-

cionais e epistemol6gicos, mas em especial referencia a MULLER-

ERZBACH, quc urn pensamento juridico «causal» e afinal uma

«ciencia do direito sem direito, sem principios eticos, sem valo-

racao» - sem autonornia norrnativa, numa palavra, e que nos

efeitos acaba si ruplesrnente por sacrif iear 0 direito ao poder

(social ou outro). E se esta critica provocou a MULLER-ERZBACH

o esclarccimento, em replica, de que «para 0 direito nao edeterminante a c il us a li d a de m e c d ni ca » , que «um qualquer eleinento

da vida social s6 media tament e» influencia a sua const itu icao,

«posto que «/l ,10 determina se rH sna ls a sua formacao, como uma

energia na natureza inorganica que produz efeitos s6 por si,

e antes tera 0direito de va io rar primeiro cada urn dos elementos

da vida» 632 - impondo-se ruesnio a conclusao de quc «a forma-

~ao do dircito exige scmpre uma decisao espiri tual» 6.13-, nao

era isso mais do que a acentuacao da diferenca entre urn

radical detcrminismo e a simples detcrrninacao socio16gica nos

termos quc ja vimos, mas scm afastar tambem as inferencias

629 Grrwsd i i l z e de r I r i t eresJenabwi iguIIg , i n Ar ch iv f. civ. Praxis, 115

(1956), 90, nota 20, e pass im, e agora in Wer l rmg Hlld Abwi igHl ig ill Rec ln 50 55.

- que diz nao se encontrarem em HECK quaisquer criterios que possibilitem

lima ponderacfo das v ;lr ia s forcas al l fa et ore s socia is em confli to , a ss im como

quaisquer principios para decidir sabre a modo como des reciprocarnente se

limitam all ent re si sc preferem.

6.10 D b. ci t . , 92, SS., 102 .

631 D b. lo c. c its ., s up ra nota 622, 363.

632 Das Er fo5Sel l , cit., 305, S..

633 I bi de m, 3 12 .

15 - Dol. d. Fac. de Dlr . . Vol . 1 .11

2 2 G DountNA

que igualmente explicitamos, E dai nao dcixar MULLER-ERZBACH

AS FONTES DO DJREITO 22 7

direito nao e abrangido por cssa determinacao nao sera, POt

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de insistir, atraves dessa replica, na consideracao de que para

esta «causalidade mediata», ou para a sua valoracao, iie porern

decisiva a constelacao global dos elementos da vida» 6J4, que

os seus criterios eram fundamenralmente determinados pela

rela~ao ou por ccrtos tipos de rclacao relevantcs entre os

interesses e as situacoes de poder em que aqueles se af irmavamsocialmente eficazes 635. Nada mudava, pois, no essencial. De

novo,' apenas 0 irnplicito reconhecimento agora de uma caren-

cia - a carencia dos fundamentos, principios ou criterios da

valoracao, da «decisao espirituab, a que havia afmal de imputar-se

a «lmediata» e decisiva deterrninacao normativa do direito,

e que a insistencia 110 relevo determinante , mas ja 56 «mediaro»,

dos factores sociais reais manifestamente nao podia suprir ,

Ora, 0 que todo este pensamenro, em sintese, verdadeira-

mente significa C 0 scguinte. A mediacao norrnativa ou a

valoracao juridica, que vcmos reconhecida como rnomento

indefecnvel do processo da constituicfo do dircito, so e cons i-

derada metodologicamente enquanto possa ou ate onde possa

ser reduzida em tennos sociologicos; para alem disso e U1H

dado jurfdico posit ive que imperativamente (porque enunciada

na lei e imposta por ela) se tern de ter em conta 636. No quc

vai decerto 0 postulado de que a Je t emrinarao do juridico .hi-de

entender-sc como deterrninacao sociologies, i.e , genetico-socio-

logicamentc explidvel, ja que aquilo que 11a constituicao do

634 I bi d~ fl l, 3 06 .

6]5 Ihit/CIII, 307, ~S. Cfr. D i e R c c ht s w is s w sc h a ji itu Uwh{l l / , 75, 55. Pode

dizer-se que annal a principal diferenca entre HECK e MULlER-ERZDACH esta

aqui: enquanto ,aqllele apenas entend ia nos in te re sse s s er n ma is , e st e tinha porrelevantes a inda as sociais situacoes dos interesses,

636 Dai a distino;:aometodologica de HECK entre 0 Gebo t s cu e 0 In teres -

sense i ! na constiruicio do direiro (Begri jJ sbi1duJ lg, 54, 55., G e se tz es a vs te g un g , 1 4) ,

a determiner 0 que de dizia ser afinal um «iualismo merodologicos e que

censur ava a MtiLLER-ERZBACH nao ter , 110 seu «ausalisruo-, devidamentc aren-

dido - v. D i e l Ie ll e M e tl lo J er rl eh re M i i/ Je r- E rz ba c h, loc . c it ., 354, ss. , e pa.~silll.

isso mes mo , detcrminavel (fundamentado socio16gico-redutiva-

mente). S6 assim sc podcra aflrtl1.ar que os factores sociais sao

determinantes do juridico: sao dcterminautcs do juridico, potque

determina- Io-iam ate onde podc haver determinacao. Simples-

mente, 0 quc fica para alem dessa dcterrninacao possivel Cnada

menos do que a pr6pria valoracao - 0 juizo juridico sobre os

interesses ou factores sociais c a opc,;aonorrnati va correlativa a esse

juizo. Que tanto c dizer que 0 mornento normativo-juridico

decisivo, 0 momenta juridico essencial , e 0 que se exclui da

determinacao, Irredutivcl mas indeterminavel, e 0 morncnto

que fica rescrvado para a autonomia volitivo-imperativa do

legislador (e do jurista pratico em geral) ou relativamente ao

qual se aceita, por resignacao cpistemologico-metodologica,

essa autonomia oJ7. E se 0 indcterrninavel e i rrac ional, i sto nos

mostra que na perspectiva sociologica do pensarnento juridico,

c ao contrario do que poderia fazer pensar a sua intencao

posi rivo-cieutihca c genetica de urna reducao empirica , 0direito

continua a ser nuclearmente um dccisionismo 638. Conclusao

esta cujo exacto sentido 56 bern comprecnderemos se tivermos

prcsentes 0 pressuposto epistemol6gico fundamental assim como

a capital consequencia mctodologica da perspectiva em causa.

Pressupoe ela, sem diivida, que so a reducao explicativa esusceptivel dc oferccei uma determiuacao, mesmo ao cultural

s ignificance e normat ive -- c de novo 0 prejuizo do cientisrno

637 efr . nota anter ior.

6JB 0 que, alias, ja foi observado em referencia directa a Inte ressenju-r l sp r u d en z : .A jurisprudencia dos interesses ace itou na ve rdade , e talvez com

razjio - diz-nos G. ELLSCHElD, na sua Inf rodu((1o a col. de ensaios ln te re ssenju-

r i spruden«, 6 -, a fundamental irracionalidade dos juizos de valor no senrido de

que as proposicoes de dever nao sao dcduziveis de proposicocs de ser e que por

i sso uma prescricao norrnariva nao surge sem decisao.. Sobre e ste pon to sao

de resto inequivocas as proprias consideracoes de HECK, Di e I f lu r c s s en ju r isp rude n z

un d ilrre n cueu G eg llcr lee . c it., 165, 55.; efr. ainda supra, nota 636.

2 2 8 DOUTRINA

naturalists c 0seu monismo cpistcmologico quc sc nio suspende

AS FONT~S no DIREITO 229

detenninac;:ao socio16gica do direito, e ternos de rcnunciar it

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peral1tea especificidadc do dominic do pratico e do axiol6gico 6J9.

Com a consequencia de ter de deixar sern col l t ro{e metodol6gico

o memento propriamente normative do juridico. 0 que e ,por sua vez, 0 implicado correlate e COUlO que 0 prec;:odo erro

de se pretender dorninar a juridicidade a partir do «factm e pelo

modo inadequado do «causalismo»on, em geral, da positivistica

explicacdo redutiva - causalismo redutivo que hoje, ao nivel

epistemol6gico c para qualquer das perspectivas que at se ofere-

cern as ({cienciassociats», e j a urn anacronismo,

A cousideracao, so por si, da mediacao ou valoracao espe-

cificamente juridica mostra assim como a esta perspectiva

socio16gica the escapa 0 pr6prio momenta da deterrninacao

normativa: os factores sociais relevantes para a constituicao

do direito nao sao em si normativamente determinantes e a

norrnativa determinacfo tern urna indole insusceptivel de se

definir c apreender apenas pela referencia aos factores SOCIalS

relevances MO. Pelo que, ou nos ficamos no plano da estrita

639 Cfr. supra , nota 622.

640 Por isso e j ust a a cr it ica, ar ras referida, de STAMMlER, ISAYe HUBMANN

a .jurisprudencia dos interesses», no que sc refere a sua carencia de pri nc ip ios c

criterios normativos que fundamcntcm e or ientem a valoracao, Prova dlSSO

mesrno e a solll~aode todo insuhciente que HECKda ao problema da inrcgracao

das lacunas, nao obstante esse problema ter-lhe sidooriginariamcnte motivante

- esgotada a possibilidade de se recorrer aos juizos de valor legais apenas

recomenda a consideracao dos «juizos de valor dominantes na conmnidadejuridicae, para acabar rnesruo poe remeter-se it «valoracao pessoal» (Eingen-

wc t t u n g } do julgador - Geset z es l lus!egu l lg , cit ., 238, ss. . E MUllER-ERZBAClf,

embora tivcsse ido mais longe no esforco de preencher essa lacuna metodologica

- D ie & c lr ts lV is se ll Sc /J ( J{ t, cit., 72 , 55.-, nern por isso p6de superar a carencia

normativamente e ssenc ia l que no texto vai referida.o que nao deve entcnder-se como seminirnizassemos0contribute meto-

dologico, efecrivamenre iruportantissimo, dos dois grandee juristas e da .juris-prudencia dos interesses- no seu conjunto, Contributo importance - e mesrno

decisive, a ponto de determinar uma viragem historica das intcncoes metodo-

l6gicas do pensarnento juridico com a definiriva superacfo da Begr i f J ' s jur i s -

p rl 4d et lZ - justamente porque charuou esse pensamento a compreensao da

natureza pratico-valoradora e a indispensdvel referencia social-material dos

sua deterrninacao normativa, ou propomo-nos atingir cssa Sua

normativa detcrrninacao e, entao, nao s6 a perspectiva ted

de set outra, como outros terao de ser os principios e criterios

quc a f~dal1lental11 c que os facrores sociais s6 como tais nao

podem oferecer. Dai 0 indispensivel c integrante esforco

de uma diversa [inha do pensamcnto jurldico, empreendido em

ordem a averiguacao desses mesmos tundamentos, principios

c criterios exigidos pcla intencao norrnativa, que 0 direito

cspecittca e autonornamcnte constitui. Esforco que nao s6

rnarca ja hem a diferenp entre 0 sociol6gico e 0 normativo,

seus juizos e decisoes, alem de ter ofe recido e lementos met6dicos ines-

t imave is para uma ma is e sc la recida e jur id icamente adequada inte rpre -

ta~ao e aplicaciio da lei. Mas iS50 nio exelui que os seus pressupos-

ros soc io l6gicos enfcnnassem des e reos de pe rspectiva e intenc ionais quedenunciimos c que em ultimo termo carecesse dos principios e criterios

metodologicos para Ulna aut6noma vn lo racao norr nat iva - para uma autentica

determinncao jur idica - , que aqueles pressupostos sociologicos nao Ihe per-miriam at ingir . Ass ir n e que a «jurisprudeneia dos interesses» 56 assume a

valoracao uormativa atraves da lei, cornpreendcndo analiticamcntc a valoracfoque a lei cnuncia pela redu~ao dessa pressuposta valoracao aosfacrores (sociais

e intencionalmente normarivos) que para c ia reriam sido relevantcs, mas naoatinge a determinacfo norrnariva, enquanto tal, dessa valoracao c por isso nao

e capaz de a realizar com antonornia, emterrnos rnetodologicaruentc fundados,

quando carece ( itnediata ou analogicarnence) do legislador, Diz-nos decertodos factores que concor re ram pa ra a va lo racao que 0 legislador fez e impoe ;

mas 0 que a determina especificamentc como valoracao normativa-os funda-

mentos e 0 processo eons ti tut ivo da sua norma tividade cnquanto tal - naofica esclarecido 56 com dize-Ia urna ponderacfo ou urn juizo de valor sobre 0

confliro dos intercsscs que lhe tcr iarn sido causais. Tem por isso razao, relati-vameute a estc ponto, A. A. EHRENZWEIG,b. cit ., 83, quando afirma que

'como 0 'rnctodo sociologico, de Gerry e de Durkheim orienta-se a doutr ina

de Heck sobretudo para a invest igacao dos interesses confliruantes, dos parti-culare s c dos grupos sociais, na sua influencia sobre 0 direito e nao para a

investigacao do direito em si rnesrno». S6 que a .jurisprt1dencia dosinteressese

opera, pcla propria exigencia da valora~ao pratica, com mais principios e cri-

t erios normat ivos do que 0 seu esquema metodol6gico, inspirado por uma

intencdo de rcducao sociologica , admitir ia . E C 0 qne ha nola de normative ,

para alem do lastro e da intencao sociologicos, que the perrnitiu na verdade

ser mctodologicamente tao rmportanre e fecunda.

230 DOUTRINA

como abre ainda a distincao explicita, no proccsso da consti-

A~ FONTES DO DIREtTO 23 1

capi ta l devia scr antes 0 de que a horneni C urn ser axiologiea-

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tuicao do di rei to, entre 0 cond icionautc (ou a pressuposto rele-

vante) c 0 determinante (ou a fundamento constituinte).

Foi ncs tes terrnos , COUl cfeito, que quase simultaneamentc

WESTERMANN 641, HUBMANN 642 c REINHARDT 64J se orientaram

naque le sent ido, inic iando 0 que vi ria a ser a orientacao

metodologica, logo dominante, da Wer tunos jur i spruden»: 644.

HUBMANN, dizendo embora partir da ~jurisprudencia dos inte-

resses» e nao querendo omitir tambern os contributos validos

do «pensamento juridico causal», propos-se como objective,

justamente chamado a supera r Esses dois pensamentos jur idicos

no seu car iz sociol6gico, uma «ponderacao teleoI6gico-norma-

t iva dos interessess, a fundar tambem numa « p er s pe a iv a t el e o1 6 gi c a»

e nao ja causal, normativa e nao genetica - posto que so

essa perspectiva poderia «descobrir os factores de valo racao para

o reconhecimento e ponderacao tuteladora dos interesses».

Eacentuando de tal modo essa intencao normativa que te riamos

como consequencia fundamental, desde logo, uma correlativa

mutacao no proprio entendimento do objecto de valoracao,

e assnn na compreensao mesma de «interesse». Pais que,

abandonado a naturalismo c empirismo sociol6gicos, para

se situar no plano de uma antropologia mais cornpreensiva

que - na linha do (<finalismo~ da accao responsabilizante posto

em relevo por WELZEL e da intencionalidade axiol6gica do

norrnativo juridico relevada por SAUER - via a ac~ao e 0

comportamento humanos deterrninados no seu sentido funda-

mental, nao por urna impulsao motivantc e sim por uma

assumida orien tacao axio-teleo16g ica , ja por i sso 0 pressuposto

641 We s e n un d Gren zen ae r r kh t e t l kh en Stre i tentsc /te idul ig i m Z i vi lr e c ht , 1 9 55 .

642 ab . l o c . cits., 1956 .

643 ab . ci t . , ( sup r a , nota 623), 1957.

644 Sobre a Wertungsjur ispruaer lz em geral, pode ver-se, por todos,

LARENZ, Me thoa r n l e h r e , cit., 128, 55.; C agora tarnbem HUBMANN, W er tu ng u na

A bw iig un g in R ec ht, cit., 3, 55., e p, rssi l l l .

mente intcncionado au que assume valorcs (< l I' e r tj u hl e l ld e s We s e l l» )

e, como tal, de Ull eomportamento que s6 ted sentido qu anda

« lspira a objectos que sc lhe olerecam como boris, como val iosos»,

pelo que seria cste «aspirar a bens e a valores» que HURMANN

propunha sc cntendesse como «interesse» - eo interesse nao esi11lplesmentc uma necessidade, mas U111;1 relacao humana para

bells e valores» (45. Dccerto que se podera discut ir este coneei to

de interesse c pcrguntar sc U111;1 mesma palavra nao encobre

simplesmcnte di feren tes categorias. Mas 0 qne importa obser-

var e que repel ido assim 0naturalismo genetico a Iavor de um

teleologismo axiologico, tudo cstaria agora em cieterminar os

prindpios que, com «for~a nonnativa» - i. e , como directivas

de uma opcao de liberdade e nao como factores que coagissem

«segundo a lei causal» - fundamentariam a ponderacao norma-

tivo-jurfdica dos interesses, A base dessa determinacao da- la-ia,

em primeiro lugar, a hierarquia objectiva dos valores, sendo

certo que «entre os valores materiais, culturais c eticos existe

uma relacao de grau ascendentc» e 0 «mais alto fim do

direito ( ... ) e a realizacao daideia de direito»; em segundo

lugar, nao deixaria de continuar a atender-se as circunstancias

cspeciais ou as situacocs concretas dos interesses (em que se

reconheeeriam a adequacao au a inadequacao mate rial , a acumu-

lacao integrada, a proximidade ou premencia e a intensidade dos

rnesmos inte resses, etc .), suscepriveis de sugerircm criterios

atendivcis para a definicao de principios da sua valoracao ou

para decidir das suas relacoes e preferencia nessas situacoes;

64; Num sentido anslogo, accntua J. J . M. van der VER, ob . l o c o cits.,

456 , que 0 «intcressee s6 pode cornpreender-se, normariva-juridicarnente,

conside rando a rnediacao axiologica da «pessoae , Cornpreensoes esras de

-interesse» que s6 entenderemos bem se ti vermes pr esen te a esclar ecedo ra

disr incao que ve1110Sagora enunc iada por H. H. v . ARNIM, Grl t le i l l l l10ld WId

Gmppe n i rHr r e $Se l l , 32, S5., entre «lst - inte re ssen» e .Sol l - inle rrs.<en s ,

23 2 POUTRINA

em terceiro Ingar, as posicoes cticas de ma-fe, de dolo, de culpa,

AS rONT£S DO DIR [;lTO 233

dcracoes de oportunidade c de justi.;:a, i. C , cntenos nao ofere-

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assim como 0 por 0 perigo c a omissao justificariam principios

normativos de imediato dir igidos a avaliacao do comporta-

mento juridicamente responsavel; a 1 6 1 1 de que seria ainda

possivel enunciar uns tantos principios para a solucao razoavcl

de situacoes de conflito (0 principio de cedencia que deixasse

abertas outras possibilidades, 0 principio do equilibrio, 0 prin-

cipio do meio mais conveniente, 0 principio da indenmiza-

s-ao, etc. ). Conjunto de principios normativos cuja validade

e nietodologia de inferencia nao importa aqui analisar mais

detidamente, ja que inrportante para nos e reconhecer que

des, pela sua fundaruenracgo axiol6gica, inrcncionalidade norma-

tiva e problematicidade pratica, claramente afirrnam aojuridico,

de que seriam cri terios determinativos, uma dimensso norma-

tivamente espedfica que 0 relevo condicionante da rcalidade

historico-social e cultural nao reduz nem detennina,

E 0 rnesmo sepodera concluir dos contributos de REINHARDT

e WESTERMANN. REINHARDT considera que «sese quiser analisar

justamente a conexao entre os fenomenos da realidade e 0

direito, deve reconhecer-sc, em primeiro lugar, que 0 direito

exprime urna categoria do dever-ser e que 0 decisivo sera

atingir os po n te s de v ista o td en a d o re s des ta ord em de d ev .e r-se r

que se encontram sob as relacoes dos interesses, dos conflieos de

interesses e das normas juridicas. Estes pontos de vista ordena-

dares nao pertencem a urn mundo que possa ser apreendido

e ponderado com 0 conceito de causalidade; trata-se aqui de

valoracoes que, como tais, so nos abreru 0 caminho para a

compreensao de determinados principios de ordenacao» 646. Tal

como ji WESTERMANN, na mesma linha, comecara por sublinhar

que. os interesses se devem «discriminar rigorosamente dos

cri terios legais de valoracaoi e que estes se traduzeni em consi-

646 D b. cit., 20 .

cidos pclos interesses mas a intcncionar para alcm dcles CHum

outro nivel, sendo certo que ern ultimo termo 0 lcgislador, C nao

menos 0 julgador, se hao-de orientar na rcalizacao coucreta do

direito pelas «inferencias da ideia de justica. ~47 -- i. e , pois nao

e outra coisa que tambem deste modo se preteudia afumar,

pela intencao normativamcnte esped£ica c autonoiua do direito.

Pensainentos estes c respectivas propostas mctodologicas

que estao ja hoje lange de rcpresentarcm a ultima palavra do

pensamento juridico de orientacao axiol6gica ou de sentido

rigorosamente uorinativo, tao ainplamentc enriq uecido e apro-

fundado dcsde entao - C0111 particular realce para asinvestigacoes

sobre os valores e principios jnridicos, assim como sobrc a

concreta constitucionalidade normativa da realizacao do

direito 1>48. Reterimo-los, no entanto, para reconhecermos, atra-

ves da sua cri tica e superacao do pensamento juridico de pers-

pectiva sociologica, imediatameute exigidas pelas proprias insu-

ficiencias praticas desscpens:unento, COIllO se adquiriu a evidencia

de que as factores da realidade pressuposta, objecto da iutencao

juridica e na sua relcvdncia para a constituicao do direito,

~6podem ser dele condicionantes e nao 0 criteria e fundamento

da sua deterrninacao,

E cdtica aualogas foram dirigidas a POUND dc outro

quadrante do pensamento juridico, mas para concluir igual-

mente pela invalidade da sua tentativa de uma determinacao

sociologica do direito ccntrada na relevancia social dos interesses.

Reconhecendo-sc embora a importancia que possa ter a analise

e a classihcacao dos interesses que0

legislador e a praticajuddica tenham de ter em conta como pressuposto social

647 D b. dt., 21 , S S • •

648 Basta pensar no s contributes con jugados de Co lNG, BErn, ART.

KAUFMANN, ESSER, LARENZ, CANAR1S , Z lPPELlUS , KlUELE, LOMBARDI, f INKENTS-

CHBR. etc..

23 4 DOUTRINA

relevance - em bora sc pondcrc tambcm que essa analise e

AS FONTE5 DO DIREITO 23 5

(Imdmnwto numn intcncao axiol(~~iw-/lorrlli1til"1, nao C um dado

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classificacao sera sel1lpre contingentc e insuficiente 649-, co lll-

preende-se exactamentc C01110 e inaccieivel ver no direito s6

unia funtyao de «conlrole social» mediante 0 equiHbrio de todos

as interesses atendiveis, quando e certo que 0 direito e impcu-

savcl, nern tern sentido, sem a telcologia de um pressuposto

sistema axio16gico que fundamen tc a pondcracao rcgula tiva dos

inte resses c a necessa ria opcao-deci sao sobrc des 650. A implicar

tam bern isto que juridicamentc decisivo nao e a discriminacao

social dos interesses e s im os norrnativos cri terios da sua avaliacao

gue objectivem uma espedfica intencao normative de validade.

Pois se e ccrto, por urn lade, que valores C0110 a igual-

dade, a conhanca, 0 respeito da dignidade da pessoa, digamo-Io

com COING 651 em crftica a MULLER-ERZBACH, «nao sao inte-

resses quai squer jun to de out ros interesses, sao antes os elementos

de ord~flafiJo que especi ficamente decidem do direi to (privado) ,

nao estao 11 0 l a d o , mas a c ima das situacoes a ordenar», e aeima

justarnente em virtude da diferenca essencial, intencional c

metodo16gica, gue distingue 0 fundamento normativo de valo-

ratyao do objecto dela problematicamente relevante 652 - e, por

isso, nos diz ainda 0 mesmo Autor, com expressiva verdadc ,

que «a relacao nao e a de causa e cfeito, mas a de problema

e soluyao: a norma juridica e a resposta cri adora do problema

posto na Si~lac,;aOsociologies» f t53 - , nao e menos exacto, por

ou tro lado, que 0 fundamento normativo enquanto tal , enquanto

649 Vide FRIEDMANN, o b . c it ., 297; Dtas, 0/,. dt., 603.

650 Vide FRIEDMANN, Ibkl., 297, s ., 300; DIAS, Ibid., 601, 55. -que con-

clui a sua analise cri tica ao pensarnento dePOUND

ncstes tcrmos: «Itis possiblethat h is work has not had the pract ical impac t tha t i t ought to have had because

of th is somewhat s te ri le preoccupa tion with interes t and too l it tl e a tt ention

to [he cri teria of evaluation. -; J . J. M. van der VEN, ob . l o c . c i t ., 459; flKEN-neHER, Me r ho d el 1 d e s R e c ht s, II, 231.

651 S yst em , J oe . c it ., 4 85 .

652 efr. KNAUTHE, ob . ci t . , 51, 55..

m I bi d ., 4 8 4.

' d: :!objectiva transcendencia cmpir ica que simplcsmentc se inves-

tigue c sim uma valida de regulativa de transccndencia ideal

gue autonorna-intenc iona lmcnte sc constitui ou assume. E dai,

como afirma WIEACKER, que «a inves tigacao genetics de causas

e a analise psi c o-individual ou psico-social de motivacao sejam

proeessos legit imos para 0 conhecimento da realidade a que

tenha de aphcar-se uma norma, mas nao oferecem todavia

como tais os criterios da aplicacao, da legislac,;ao e da poh'tica

do direito justas, visto que os valores da justica referem-sc

decerto as rcalidades sociais, mas njio se deduzem delas» &5~.

E que, di-lo tambem nao monos impressivamente FECHNER,

«as relacoes ideais podem fazer-sc objecto de exarnes sociol6-

gicos, em particular no gue toea a dependencia da Ideia do

Direito relativarnentc aos factos sociais, mas a ideia mesma de

justica nao se esgota sociologicamente», Numa palavra, nao sc

trata s6 da situaciio socio16gica c da sua analise, mas tambem,

c decis ivamente, da «ctica consciencia axioI6gica do homem» 655.

E isto gue sobretudo se diz para a consideracao s6 scciolo-

gica dos factores relevantcs devera dizer-se tambem, em analogia,

para qualquer consideracao exc lusiva , ainda qUE nao sob aquc la

perspcctiva, dos factorcs sociais e culturais, incIuindo pois os

factores ideais. Porquanto estes nao deixam de ser facto res de

pressuposicao tao-so condicionante - apenas elementos rele-

vantes a participarem do pressuposto material. Se 0 direito

nao e simples efeito ou deter min ado em si pelos interesses,

tambem IlaO e incondicional efeito ou deterrninado em si

pelas intencoes culturais-ideais que socialmente se afirmem.Veremos, e certo, que 0 seu condic ionamento mate ria l

pode ir ate a codeterminacao, enquanto alguns dos factores

654 O b . c it ., 56 8 S.

655 COING , ob . l o c o ci ts ., 484.

236 DOUTRTNA

c das intencoes que formam e dinamizam a realidade historico-

AS FONTES DO DIRETTO 2 3 7

criterios da sua cspccifica normatividade. Que sentido funda-

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-social, Como plessuposto rclcvantc, se veein materialrnentc

assimilados pelo direito on eoncorrem uicsmo para ele, de

varies modos que tambem estudaremos, como seus elementos

dircctamente consntutivos - e ncste caso estarao de modo

particular, cmbora nao so eles, as factores culturais -ideais,

como que a oferecerem, com as suas respectivas intencoes de

validade, a mediacao entre os factores rcais nao intencionais e

a intencao de validadc espedfica do direito. Mas a deter-

minacao normativa decisiva vem ao direito com fundamcnto

em principios e criterios normativo-juridicos proprios, e em

ultimo termo com fundamento na sua intencao normativa

aut6noma, enquanto 0 seu especifico prindpio de determinacao,

e nao por efeito de factores pre-juridicos, qualquer que seja

J sua natureza e relevo.

10. Chegados aqui, estarnos de posse de uma compreen-

sao geral do p re ss up os to m at er ia l, como dimensao do processo

norruativo da constituicao do direito. Digamo-lo a conjunto

dos factores rea i s e ideals que se oferecem, na rcalidade natural

e hi st6rico-social, numa pressuposicao cond icionante para essa

constituicao. E e perante a total idade destes fac tores, e portanto

a pluridimensional idade ontol6gica da rea lidade pressuposta ,

que continua a ser exacto afirmar-se que 0 direito nao euru mero produto dos seus factores, sejam des naturais e

historico-sociais ou tambem ideais-culturais, ja que, sc tem

naquela totalidade a sua condicao material, so na intencao

normativa espedfica, que historica e autonornamentc va assu-mindo, tem a sua fundamentante deterrninacao. Apenas no

sentido Ultimo da intencionalidade fundamentante em que se

assuma a validade a Impor pelo direito a vida comunitaria

hisrorica, em dialogo regulativo-crltico e probiematico-norrna-

tivo com ela, teremos a rnatriz constitutiva dos prindpios e

lllentante c intcncional validadc exactamente, e 0 que se tcra

de explicitar na posterior consideracao do m eme nto d e I'a lid ad e.

E se quisermos dizer, com DILTHEY 656, que a direito e a

sintese, urna certa sintese socio-institucional e norrnativo-cultural,

entr e as «si st emas da culturai (os sentidos cul tura is objec tivos)

c a «organizacao exterior da sociedadc» (as formas sociais da

organ iza~ao dos inte resses e dos fins) que se va i hi storicamente

constituindo pela «consciencia juridica» da comunidade, en t ao

a problema da detenninacao da normatividade juridici e no

fundo 0 problema da constituicao nonnativa e positive mani-

festacao dessa consciencia juridica.

a ) S6 que, nern por isso c pequcna a importancia do

«pressuposto material», Pois ja pudemos rcconhecer no scu esc la -

recimento ate este memento - e posto esteja ainda longe de scr

completo - que ele imp5c a constituicao do di reito uma tripla

condicionalidade. Se num dos sens aspectos se revelou como

c ol 1d i~ ii o d e p os si bi li da Je - enquanto campo ou a meio que, no

sell especifico modo-de-set, a intencao juridica tem de aceitar

para a sua realizacao -, num outro aspecto conipreendemo-lo

como co tld i~a o d e a de qua ~a o -- ja que a direito sc pora em

contradicao coin 0 seu objecto-prcssuposto, e contradicao que

scmpre se traduzira num fracasso normat ivo, sc nao 0 rcconhccer

na sua autonornia ontologica c assim na congruencia que ele

demarca a sua intencao regula tiva -e, por ul timo depara rnos C0111

uma c o nd i ~i io d e r e le v dn c i« , a manifestar-se nao s6 nos «dados do

problema», mas ainda em todos os factores que, coricorrendo na

constituicao concreta da realidade huuiano-his rorica c s6cio-cul-

tural que 0 direito devera ordenar normativamente, por isso

mesmo relevain na pos icao que ele ten, de tornar perante essa

656 Int roduct ion, cit., Cap. XII, 68, 55.. Sobre estc ponto do peusamento

de DILTHEY, " ide 0 estudo de N. KRI!ISSL, Da s Rechfspharwl l le l l ill de r Pf , i losophie

W i lh el ll l D i lt he ys , 1 I Parte, 38, ss..

2.3~ ])OUTI!!NA

rea lidade ou na espcdfica assimi lacao rcgulativo-va lorado ra que

As FONTES ])0 ])[RE!TO

da uorrnativa constituicio do direito, Os tres tipos de condi-

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dela ted de fazer no cumprimenro da sua intencao norrnativa,

b ) Com 0 que nem tudo fica, na verdade, esclarecido.

Porquanto, ha ainda que pergunta r: relevam espec ifi camente em

que termos? Pergunta esta que nos poe em face de UlIl ponto

capital a que temos aludido e que falta ainda considerar.

Trata-se da questao de saber se na condicao de relevinciaI

deparamos apenas com factores a ter constitutivamente em

conta pelo direito - elementos para 0 direi to , numa dis tancia

objectivo-intencionalmente problernatica entre esses factores e 0

dire ito - OU tambem com facto res constitutivos do direito-

elementos do direi to numa inianencia, seja estrutural seja material ,

C0111 ele. Num caso, temos uma r e/w a nd a d e c on did on alid ad e,

em sentido estrito, no outro caso temos uma r ele ud ncia d e

codet erminaf i i o . As posicoes radicais (socioI6gicas) quanto ao

relevo do pressuposto material tendem a afirrnar que neste

pressuposto se iuipoe a pr6pria deterrninacao do juridico, ele

seria, se nao mesrno 0 di rei to, pelo menos 0 seu factor deter-

minante. Dissernos, em geral, porque sao invalidas essas posi-

c;:oes r adicais, mas esta conclusao nao exclui, com efeito, que

muitos dos factores relevances 0 nao sejam apenas como

meras condicoes em func;:ao das quais 0 direito ted. de cons-

tituir-sc e sim ainda C01110 dimens6es codeterrninantes, ja

da sua indole estrutural, ja do seu conteudo intenciona1. Deste

ponto se ocuparao as analises seguintes e ai verificaremos que

essa codeterminacao ted de reconhecer-se a tres n fv ei s - - ao

nivel da inst itucionalizacao pre-jur idica ou imediatamente social,

ao nivel do tipo estrutural da comuuidade hist6rica e ao nivel da

cultura conjuntamente com as intencoes ideol6gicas.

c ) Ao que iruporta antecipar, no entanto, ainda uma outra

nota. E que 0 pressupos to material , na total idade dos elementos

e factores que 0 integram e nas diversas modalidades do seu

condiciouamento, nao se releva tao-s6 como momento material

cionamento ja re feridos, conjuntamente com a code terminacao

uormativa que Ihes corresponda, manifestam ainda, 110 seu

conjunto, uma iniludivel c o nd j fi io d e r e at iz a fi 10 do direito. E que

s6 a Sua consideracao permi te uma cornpat ibil idade, nao decerto

passiva mas em terrnos de snicronizacao problernatico-hisror ica

( intencional e crf tica), C0111 a realidade a que 0 direito vai

refer ido ua sua intencao e na sua func;:aonormativas 657. Compa-

tibilidade essa sem a qual 0 direito, nao sendo assimilavel por

essa realidade, do tnesmo passo sera inviabilizado pela cornu-

nidade hist6ri ca que tern nessa realidade a sua base de existencia

e nao passara entao do projecto de urn voluntarismo uropico

(ineficaz). Que tanto e dizer que nesta condicao de realizacao

temos. si rnult aneamente, a prop ria con difJo d e p os it iv id a de e de

Jl igencia d o d ir ei to . «Condic;:ao de realizacao», pois, nes te duplo

sentido: condicao da Jl igencia do direito e condicao que nos

imp5e tarnbem reconhece-lo tao-so como d i re i to pos i t i v e .

Isto, porque de todo 0 desenvolvimento anter ior rcsulta:

1) 0 direito e exigido por uma certa rea lidade hi st6rico-socia l

e humano-cultural e const itui-se para essa realidade respondendo

normativo-jur idicamente aquela exigencia - 0 direito e humane--socialmente h is t6 r ic o - ; 2) 56 logra cumprir-sc (vigorar) C0l110

tal numa certa realidade historico-social se for materialmente

adequado perante essa realidade, i. e , se re levar essa realidade

na sua perspec tiva de juridicidade - 0 direito e humano-histori.,camente social; 3) exigenc ia hist6rica c adequacao a social rele-vancia de que sera simultaneamente fimc;:ao a determinacao do

quid v igente «de di reito» -i . e , 0 quid que vigora e se cumpre

como direito hi-de, por um lado, manifestar uma validade que

regularivo-normativamente se justifique em intcncao da reali-

dade his tori co-social e cultural e tera, por outro lado, de

657 Cfr, FECHNER, Rcch fS p ll il ow ph ie , 1 1 0 .

DOUTRINA

determinar-sc normarivo-objectivamcnte para cssa realidadc -

o direito e regulativamellte e norrnativo-socialmente cous t i t ul do

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5/12/2018 As Fontes do Direito e o Problema da Positividade Jur dica PARTE II - Castanheira Neves - slidepdf.com

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(positivo); 4) se e exigido por aquela realidade e the devera ser

adequado na sua pr6pria intencao normativa, c se s6 se cumpre

relevando em positiva juridicidade essa rnesma realidade, tern

entao decerto, e por ultimo, uma existencia historico-social,

urna existencia normative-cultural analoga a da realidade histo-rica que assimila e em que se cumpre - 0dircito C hist6rico-

-social e culturalmente exis teute (vigente).

E deste modo, se a realidade humano-social vein a culminar

no juridico - numa das suas funcoes 658, a direito nao e senaoa ordenacao estabilizada e «intcrcoutida» (delimitada e ccrta] dessa

realidadc (,59, 0 sistema normativo em que ela seobjectiva, em

que se manifesta como «congruente generaliza<,:ao»c subsiste660_

e 0 juridico que, par sua vez, imp6e a essarealidade, na resposta

normativa que the constitui-resposta normativa nao ja agora s6

de COfl t role e institucionalizacao, mas ainda regulativa e de axiol6-

gica validade 661 -, uma vigencia cuja norrnatividade .0 sentidoultimo das historicas intencoes humano-sociais exige. Pontos

estes,urn e outro, que a analise a seguir do pressuposto material

codeterrninante tornarao daras.( Co n t i n ua )

A. CASTANHEIRA NEVES

658 A que podemos dizer . fnn;;ao sociologica» ou de globe) insti tucio-

naliza~o e 'c(}(I/rSlr social. da vida comunitaria.(,59 Cfr. FECHNER, Rrcht spJJi losop l l i e , cit., 96; H. RYFFEL, Grwl i /prob lemr

der Redu«: ! ll Id Staa t sph i !osop 'JJ 'c , 161, 55., e passim, Nesse sentido se podera

continuar a dizer com ARISTOTELES, como recorda SIMONE GOYARD-FABRE

( ob . c is ., 65) , que .0juridico e como a ossatura de qua lquer grnpo socials,

E nao sera em sentido analogo, com abstraccao ernbora dos scus particularesfundamentos filosoficos c das consequencias implicadas, que STAMMLER ~flr-

mava 0direito a trancendental .forma.o constitutiva da «materia» social?

660 Cfr. N. LUHMANN, Recht ssoz io log i r , I,94, ss . - por out ras palavras ,

a urn certo nivel 0 direi to Sera urn ssistema socials,

661 De novo nos rctomernos para in f ra, ao considerarrnos 0 pr inc lp io

d a v a li da d c.

II

I

!