modulo 02 pÓs em psicopedagogia institucional

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    MDULO DE:

    FUNDAMENTOS GERAIS DA PSICOPEDAGOGIA CLNICA-INSTITUCIONAL

    AUTORIA:

    HIRAN PINEL

    Copyright 2008, ESAB Escola Superior Aberta do Brasil

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    Mdulo De: Fundamentos Gerais da Psicopedagogia Clnica-Institucional Autoria: Hiran Pinel

    Todos os direitos desta edio reservados

    ESAB ESCOLA SUPERIOR ABERTA DO BRASIL LTDA

    http://www.esab.edu.br

    Av. Santa Leopoldina, n 840/07

    Bairro Itaparica Vila Velha, ES

    CEP: 29102-040

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    Apresentao Esse texto, de natureza estritamente didtico-pedaggica, objetiva apresentar alguns

    fundamentos da psicopedagogia. Trata-se de um "guia" que pode dar sentido/norte vida

    acadmica do aluno e do seu ser leitor. Sendo apenas uma luz que ilumina a trajetria, ele

    no pretende ser exaustivo e muito menos definitivo, visto ser tendencioso, j que o

    organiza-dor do texto assume que suas escolhas so baseadas na vivncia de ser psiclogo,

    educa-dor, professor e pesquisa-dor. Para maior aprofundamento a pessoa interessada pode

    recorrer s bibliografias citadas.

    Muitas vezes, o leitor encontrar palavras que contm em si, outro termo. Para "brincar" com

    as muitas possibilidades de construir textos, muitas vezes quis, ao meu bel prazer, dar

    destaque por meio de um ou dois hfens, o ldico e a reutilizao dos sentidos da linguagem.

    Quando eu digo uma palavra, no quero diz-la apenas, mas desejo que ela se nos

    multiplique muitos significados-sentidos que possa ter ou vir a ter. Eu s no fiz esse jogo

    quando as palavras eram citaes na ntegra de outros autores.

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    Objetivo Conhecer as bases da Psicopedagogia Clnica-Institucional bem como os mltiplos fatores

    que contriburam para a sistematizao e consolidao desse campo do saber.

    Ementa Psicopedagogia: fundamentos scio-culturais, biolgicos-organicista, filosficos e

    psicolgicos. Campos norteadores da ao psicopedaggica.

    Sobre o Autor Hiran Pinel Doutor em Psicologia em Psicologia Escolar e do Desenvolvimento Humano

    pelo Instituto de Psicologia da Universidade do Estado de So Paulo (IPUSP). Mestre em

    Educao (rea de concentrao: Desenvolvimento Humano e Processos Educacionais) pelo

    Programa de Ps-Graduao em Educao da Universidade Federal do Esprito Santo

    (PPGE/UFES). Psiclogo pela Faculdade Dom Bosco de So Joo Del Rey, MG.

    Bacharel em Psicologia e Licenciado em Psicologia pelo Instituto Cultural Newton Paiva

    Ferreira de Belo Horizonte, MG. registro no Conselho Federal de Psicologia sob o nmero

    04/1798, onde obteve os ttulos de residncia em Psicologia Clnica e Psicopedagogia.

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    J foi: psiclogo educacional-comunitrio; psiclogo de instituies pblicas (FEBEM-ES;

    Juizado da Infncia e da Juventude; hospital pblico); psicopedagogo clnico-institucional;

    psicopedagogo de jovens e adultos; psicopedagogo dos Recursos Humanos em

    organizaes etc. Foi professor do ensino mdio (rede pblica) e de ensino superior (escola

    privada e pblica). Foi orientador educacional em escola pblica e particular.

    Desde 1977 psiclogo clnico e psicopedaggico. Atualmente professor adjunto da

    Universidade Federal do Esprito Santo (UFES), estando trabalhando no Centro Pedaggico

    (CP), no quadro docente do Departamento de Fundamentos em Educao e Orientao

    Educacional (DFEOE) e do Programa de Ps-Graduao em Educao (PPGE).

    Como pesquisador estas inserido no ncleo temtico: Contextos Scio-pedaggicos da

    Educao; na linha de pesquisa: Educao Especial: Abordagens e Tendncias; no subtema

    (singularidade na pluralidade de ser pesquisador): prticas educativas extra-escolares em

    Educao Especial e em Psicopedagogia Clnico-Institucional (os diversos sentidos-sentidos

    da psicopedagogia & da Educao Especial em contextos no-escolares).

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    SUMRIO UNIDADE 1 ........................................................................................................... 9

    O QUE PSICOPEDAGOGIA .......................................................................... 9 UNIDADE 2 ......................................................................................................... 13

    FUNDAMENTOS SCIOCULTURAIS ............................................................ 13 UNIDADE 3 ......................................................................................................... 16

    FUNDAMENTOS BIOLGICO-ORGANICISTAS ........................................... 16 UNIDADE 4 ......................................................................................................... 18

    FUNDAMENTOS FILOSFICOS .................................................................... 18 UNIDADE 5 ......................................................................................................... 24

    FUNDAMENTOS PSICOLGICOS................................................................. 24 UNIDADE 6 ......................................................................................................... 26

    CAMPOS NORTEADORES DA AO PSICOPEDAGGICA ...................... 26 UNIDADE 7 ......................................................................................................... 30

    UNIDADE 8 ......................................................................................................... 32 A PSICOLOGIA DO DESENVOLVIMENTO EM VYGOTSKY ........................ 32

    UNIDADE 9 ......................................................................................................... 36 A PSICOLOGIA DE APRENDIZAGEM EM VYGOTSKY ................................ 36

    UNIDADE 10 ....................................................................................................... 42 FUNDAMENTOS PSICANALTICOS .............................................................. 42

    UNIDADE 11 ....................................................................................................... 46 A ABORDAGEM PSICANALTICA NA PSICOPEDAGOGIA .......................... 46

    UNIDADE 12 ....................................................................................................... 48 CONCEITOS-CHAVES NA PSICANLISE ..................................................... 48

    UNIDADE 13 ....................................................................................................... 51

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    VISO DA NATUREZA HUMANA ................................................................... 51 UNIDADE 14 ....................................................................................................... 52

    CONSCINCIA E INCONSCINCIA ............................................................... 52 UNIDADE 15 ....................................................................................................... 54

    ANSIEDADE ..................................................................................................... 54 UNIDADE 16 ....................................................................................................... 55

    MECANISMOS DE DEFESA DO EGO ........................................................... 55 UNIDADE 17 ....................................................................................................... 58

    DESENVOLVIMENTO DA PERSONALIDADE ............................................... 58 UNIDADE 18 ....................................................................................................... 60

    O PRIMEIRO ANO DE VIDA: A FASE ORAL ................................................. 60 UNIDADE 19 ....................................................................................................... 62

    DO PRIMEIRO AO TERCEIRO ANO: A FASE ANAL ..................................... 62 UNIDADE 20 ....................................................................................................... 64

    DO TERCEIRO AO QUINTO ANO: A FASE FLICA ..................................... 64 UNIDADE 21 ....................................................................................................... 66

    O PROFISSIONAL QUE SE PROPE SENTIR-PENSAR-AGIR PSICOPEDAGOGIA ........................................................................................ 66

    UNIDADE 22 ....................................................................................................... 70 A ATUAO DO PSICOPEDAGOGO CLNICO ............................................. 70

    UNIDADE 23 ....................................................................................................... 72 A ATUAO PSICOPEDAGGICA INSTITUCIONAL ................................... 72

    UNIDADE 24 ....................................................................................................... 77 PSICOPEDAGOGIA, CINCIA, ARTE E PESQUISA ..................................... 77

    UNIDADE 25 ....................................................................................................... 84

    UNIDADE 26 ....................................................................................................... 87 ARTIGOS ESCOLHIDOS ................................................................................ 87

    UNIDADE 27 ....................................................................................................... 93

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    Uma parte do cotidiano do projeto ................................................................... 93 UNIDADE 28 ....................................................................................................... 97

    Concluso ........................................................................................................ 97 UNIDADE 29 ....................................................................................................... 99

    DESEMPENHO ESCOLAR, AUTOCONCEITO E .......................................... 99 UNIDADE 30 ..................................................................................................... 103

    "- OLHA O PASSARINHO! Diga "XIS"! : ....................................................... 103 BIBLIOGRAFIA ................................................................................................ 112

    GLOSSRIO ..................................................................................................... 113

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    UNIDADE 1 Objetivo: Permitir aos alunos uma compreenso geral do campo da Psicopedagogiga e suas principais caractersticas, bem como do papel da atuao do Psicopedagogo.

    O QUE PSICOPEDAGOGIA

    A primeira questo, a saber, : O que psicopedagogia? Para incio de

    conversa temos que concordar com Bossa (1994) que a palavra

    psicopedagogia complexa. Quanto mais tentamos elucid-la, menos

    clara ela nos parece.

    Se consultarmos um dicionrio clssico de termos tcnicos encontraremos:

    Psicopedagogia: Termo cujo aparecimento no incio do sculo XX no pde causar

    admirao, de tal modo parecia evidente, na poca, a privilegiada relao da pedagogia com

    a psicologia, que era considerada renovadora do conhecimento do sujeito da educao: a

    criana. No final do sculo, esse privilgio contestado. As realidades da educao

    dependem igualmente, e at mais, de uma sociopedagogia, cuja ausncia no inventrio das

    cincias demonstraria a fora de ideologia psicologista. A psicopedagogia uma das

    possveis abordagens da situao educacional, a que leva em considerao seus

    componentes psicolgicos: caractersticos dos indivduos e dos grupos, relaes

    professores-alunos, articulao dos contedos e dos mtodos com os processos

    individualizados de aprendizagem, etc.(HOMELINE, in DORON e PAROT, 1998; p. 634)

    J Allessandrini (1996) objetiva:

    A psicopedagogia estuda o processo de aprendizagem a partir da contextualizao terico-

    prtica que advm da pedagogia e da psicologia. A prxis psicopedaggica apresenta

    propostas educacionais que convidam a criana a participar ativamente de seu processo de

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    aprendizagem, o que configura a necessidade de uma mudana qualitativa no ensinar e no

    aprender. O aprender vivido de forma mais integrada prope intrnsecas e extrnsecas

    {questes} aquisio do conhecimento. (p.21)

    O fato que, segundo Visca (1987), a psicopedagogia nasceu com uma ocupao emprica

    pela necessidade de atender crianas com dificuldades de aprendizagem, cujas causas eram

    estudadas pela medicina e psicologia. Para ter-se uma idia, no Brasil, a profisso de

    psiclogo, registrada em 1962, diz em uma de suas leis que direito privativo deste

    profissional o uso de mtodos e tcnicas psicolgicas objetivando orientao

    psicopedaggica.

    Com o decorrer do tempo, o que inicialmente foi uma ao subsidiria destas disciplinas, foi

    se perfilando como um conhecimento independente e complementar, possuidor de um objeto

    de estudo (o processo de aprendizagem) e de recursos diagnsticos, corretores/tratamento e

    preventivos prprios.

    Geralmente o especialista em psicopedagogia obtm este "ttulo" em algum curso oficial e/ou

    livre/aberto. Ele deve intitular-se usando sua graduao. Em um carto profissional de

    apresentao, o correto, por exemplo: "PEDAGOGO COM ESPECIALIZAO EM

    PSICOPEDAGOGIA" OU "PROFESSOR DE PSICOLOGIA COM ESPECIALIZAO..."

    OU...

    O psicopedagogo, para Allessandrini (1996), pode reprogramar projetos

    educacionais, facilitadores de uma aprendizagem mais dinmica e

    significante, supervisionando programas, treinando educadores e atuando

    junto a profissionais de educao, ou ento buscando o aprimoramento de

    qualidade de aprendizagem do sujeito que apresenta dificuldades escolares.

    O especialista em Psicopedagogia pode atuar tanto em nvel clnico quanto institucional, pois

    ele se prope a compreender e atuar nos vnculos presentes entre o ato de ensinar e a ao

    de aprender, assim como nas possveis barreiras que impedem seu fluir harmonioso. Para

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    Fagali (1987) a proposta da Psicopedagogia trabalhar basicamente com as relaes

    afetivas ocorridas durante a aprendizagem, de modo a garantir que o sujeito seja criativo,

    espontneo, perseverante e transforma-dor ao trabalhar seu prprio pensamento.

    Para tornar-se especialista nessa rea, todo e qualquer profissional de nvel superior,

    preferencialmente, deve fazer um curso de Psicopedagogia. Normalmente, o carter

    multidisciplinar da Psicopedagogia se revela pelo nmero de graduaes diferenciadas que

    freqentemente comparecem a tal curso: pedagogos, psicolgicos, fonoaudilogos,

    terapeutas ocupacionais, assistentes sociais, licenciados, mdicos (pediatras, psiquiatras,

    neurologistas etc.).

    Para Alicia Fernandez (1990) esse saber, o da Psicopedagogia, s possvel com uma

    formao que se oriente sobre trs pilares:

    a) Prtica clnica: Em consultrio individual-grupal-familiar; em instituies educativas e

    sanitrias;

    b) Construo Terica: Permeada pela prtica de forma que, a partir desta, a teoria

    psicopedaggica possa ser tecida;

    c) Tratamento psicopedaggico-didtico: Constitui num espao para a construo do

    olhar e da escuta clnica, a partir de anlise de seu prprio aprender, que configuram a

    atitude psicopedaggica. Refere-se super-viso clnica e tcnica do psicopedagogo,

    onde ter sua disposio um profissional mais abalizado a orientar a prtica do

    outro.

    Em um sentido mais amplo, concordamos com Bossa (1994) que a Psicopedagogia se ocupa

    da aprendizagem humana, que adveio de uma demanda - o problema de aprendizagem,

    colocado num territrio pouco explorado, situado alm dos limites da Psicologia e da prpria

    Pedagogia - e evoluiu devido existncia de recursos, ainda que embrionrios, para atender

    esta demanda, constituindo-se, assim, numa prtica. O trabalho psicopedaggico ilumina-se

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    curativo (clnico) ou preventivo. Para os psicopedagogos existencialistas ele se ilumina

    CUIDADOR: CUIDAR DO OUTRO SER EM SER.

    No trabalho preventivo, a instituio, enquanto espao fsico e psquico da aprendizagem

    objeto de estudo da Psicopedagogia, uma vez que so avaliados os processos didtico-

    metodolgicos e a dinmica institucional que interferem no processo de aprendizagem.

    (BOSSA, 1994; p. 12). Geralmente realizado um diagnstico da instituio, seu clima e

    cultura e se faz uma proposta de interveno, geralmente grupal.

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    UNIDADE 2 Objetivo: Permitir aos alunos visualizar as bases scio-culturais para o processo de produo histrica dos saberes em Psicopedagogia, registrando suas referncias fundamentais e suas tendncias.

    FUNDAMENTOS SCIOCULTURAIS

    Bossa (1994) fez um interessantssimo resgate histrico do campo da Psicopedagogia. O

    movimento da Psicopedagogia no Brasil remete-nos Argentina. Devido proximidade

    geogrfica e ao acesso fcil literatura (inclusive pela facilidade dos brasileiros

    compreenderem o espanhol), as idias dos argentinos muito tm influenciado nossas

    prticas.

    A psicopedagogia, tal qual proposta por este movimento ainda ensinada no Brasil por

    muitos argentinos, alm disso, autores argentinos escreveram os primeiros artigos,

    resultando dos primeiros esforos no sentido de sistematizar um corpo terico prprio da

    psicopedagogia. Vale citar: Sara Pan, Jorge Visca, Alicia Fernndez etc.

    A Psicopedagogia Argentina bem marcada por autores franceses como Jacques Lacan,

    Maud Mannoni, Fraoise Dolto, Jlian de Ajuriaguerra, Janine Mery, Michel Lobrot, Pierre

    Vayer, Maurice Debesse, Ren Diatkine, George Mauco, Pichn-Rivire etc. O famoso

    psicopedagogo argentino Jorge Visca, recentemente falecido (2000/2001), ao criar a

    Epistemologia Convergente na clnica psicopedaggica (Visca, 1987) fez convergir a

    Psicanlise, a Epistemologia Gentica de Piaget e a Psicologia Social de Enrique Pichon-

    Riviere, cujas teorias tem fortes tendncias marxistas.

    Vamos estudar, com base no mtodo e tcnica de pesquisa psicobiogrfico, um desses

    autores. Propomos o nome de Enrique Pichn-Riviere, e vamos dedicar essa pequena e

    audaciosa psicobiografia ao nosso querido amigo e estudioso da Psicanlise o Senhor Jlio

    Arturo Garcia, argentino-brasileiro-capixaba.

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    Rivire: nasceu em 1907; faleceu em 1977. Ele considerado por

    Roudinesco e Plon (1998) como o verdadeiro pai fundador do freudismo

    argentino. Ele exerceu o poder mais pelo seu magistrio oral (conferncias,

    cursos, etc) do que por seus escritos. Ao lado de Marie Langer constitui a

    figura mais eminente da escola psicanaltica latino-americana.

    Pichn-Rivire nasceu em Genebra, de uma famlia de origem francesa que

    se estabeleceu em 1911 no Chaco e depois em Goya, no norte do pas, regio povoada

    pelos ndios guaranis. Passou ali melanclica infncia: "seu desejo de ser analista lhe adveio

    de uma vontade de ver com clareza entre duas culturas". Enrique se revela ser da

    contestao, do prazer pelas vivncias antagnicas (ROADINESCO e PLON, 1998; p. 592).

    Com 19 anos, o jovem (dizem: o belo) Enrique comeou estudar medicina na Faculdade de

    Buenos Aires. Sempre melanclico e bebendo para "tratar" de suas depresses, interessou-

    se pela medicina, poltica e poesia. No hospital, onde j formado trabalhou, organizou uma

    equipe de futebol. Vejam os senhores leitores: sintam o ser ldico e expressivo de Enrique.

    Tambm atuou como cronista literrio. Seu melhor amigo foi o psiquiatra Frederico

    Aberastury, cuja irm, a j famosa e finrrima Lady Arminda Aberastury, desposou em 1936.

    No mesmo ano, engajou-se com entusiasmo no comit de apoio aos republicanos espanhis,

    com o escritor Robert Arlt (1900-1942).

    Esse renomado autor vem contribuir sobre o aspecto social do aprender. A importncia do

    trabalho em grupo vem ampliar o projeto psicopedaggico no sentido de no se prender a

    um psicologismo e uma reduo da individualidade no "ensinar". O conceito aprender implica

    uma relao dinmica e dialtica do homem no contexto social. Ele considera o homem

    como um ser de necessidades que s se satisfaz socialmente. Nas relaes de produo o

    homem emerge como sujeito, com uma forma de pensamento, sentimento e ao. Sua teoria

    afirma que temos de agir, refletir, incorporando teorias que expliquem nossas aes, e ai

    podemos transformar. A proposta de modificao sempre no "aqui-e-agora", pois nele est

    o presente, o passado e futuro. Refletir significa apreender o significado "daquilo-mesmo".

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    Neste sentido, o grupo o espao onde se aprende a pensar com novas matrizes,

    explicitando os padres passados j interiorizados e que muitas vezes geram resistncias s

    mudanas. O grupo o real contexto do aprender.

    O "grupo operativo" (GO) o grupo que se prope, atravs de tarefas, a aprender a pensar,

    operar uma dada realidade, fazer crtica e autocrtica, explicitando os medos para as

    mudanas, integrando teoria e prtica. Mas para aprender necessrio tornar explcito o que

    est implcito - medos, vnculos internos - tomando conscincia das resistncias para poder

    super-las. Esse processo se desenvolve atravs da dinmica do grupo, no jogo de papis,

    lidando com as projees, diferenas, limitaes e reais possibilidades (FAGALI e VALE,

    1993; p. 19-20).

    A ligao dos argentinos com os brasileiros ocorre em uma Argentina sob efeito dos

    governos dspotas tal qual no Brasil com sua ditadura militar apoiada pelo empresariado.

    Entretanto os psiclogos argentinos foram alvo do dio dos militares j que como se v, pelo

    trabalho desenvolvido por Pichn-Rivire, a proposta no de submisso, no de uma

    psicoterapia e/ou psicanlise fechada em um mundo chamado consultrio... O trabalho

    proposto desalienante. Desalienar era algo que o despotismo no esperava dos

    psiclogos. At hoje se espera que o psiclogo "doure plula". Como diz a cano de

    Caetano Veloso, na voz de Roberto Carlos: "Sou o que soa/sua, eu no douro plula {por

    isso} nenhuma fora vir me fazer calar".

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    UNIDADE 3 Objetivos:Permitir aos alunos visualizar as bases biolgico-organicistas para o processo de produo histrica dos saberes em Psicopedagogia, registrando suas referncias fundamentais e suas tendncias.

    FUNDAMENTOS BIOLGICO-ORGANICISTAS

    Mery (1985) fez uma lista de personalidades da rea psicopedaggica. No final do sculo

    XIX, educadores como Itart, Pereire, Pestalozzi e Leguin comearam a se dedicar s

    crianas que apresentavam problemas de aprendizagem devido a mltiplos fatores. Segundo

    Bossa (1994), Mery aponta esses educadores como pioneiros no tratamento dos problemas

    de aprendizagem, observando, porm, que eles se preparavam mais pelas deficincias

    sensoriais e pela debilidade mental do que propriamente pela desadaptao infantil.

    Em 1898, Clarapde e Neville, introduziu na escola pblica as "classes especiais",

    destinadas educao de crianas com retardo mental. Esta foi a primeira iniciativa

    registrada de mdicos e educadores no campo da reeducao. Entre 1904 e 1908 iniciam-se

    as primeiras consultas mdico-pedaggicas, cujo objetivo era encaminhar crianas para as

    classes especiais.

    Ainda nos fins do sculo XIX surgiu Seguin e Esquirol. Ento a neuropsiquiatria infantil

    passou a se ocupar dos problemas neurolgicos que afetam a aprendizagem. Nessa poca a

    psiquiatra italiana Maria Montessori criou um mtodo de aprendizagem destinado

    inicialmente s crianas com algum retardo. Sua principal preocupao est na educao de

    vontade e na alfabetizao, via estimulao dos rgos dos sentidos - sendo por isso

    classificado como sensorial.

    Declory criou os famosos Centros de Interesse, que perduram at hoje. J na segunda

    metade do sculo XX surgem os primeiros centros de reeducao para delinqentes infantis

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    e juvenis. Nos Estados Unidos cresce o nmero de escolas particulares e de ensino

    individualizado para crianas de aprendizagem lenta.

    No Brasil perdurou a cresa de que os problemas de aprendizagem tinham como causa

    fatores orgnicos. Podemos verificar essa concepo organicista de "problema de

    aprendizagem" em vrios trabalhos que tratam da questo como "distrbio", onde em geral a

    sua causa atribuda a uma disfuno do sistema nervoso central. Em 1970, por exemplo,

    foi amplamente divulgado o trabalho dos brasileiros Antonio Lefvre (mdico) e sua esposa

    Beatriz Lefvre (pedagoga). Eles trabalharam com crianas agitadas, que apesar do bom

    potencial de inteligncia, rendiam de modo inadequado nas atividades escolares. Essas

    crianas que hoje so denominadas com Dficits de Ateno (com e sem hiperatividade),

    eram consideradas portadoras de Disfuno Cerebral Mnima (D.C.M.).

    Novos brasileiros famosos so: Helena Antipoff, Maria Helena Novaes, Dinah Martins de

    Souza Campos, Odette Loureno Van Kolk, Genny G. de Moraes, Maria Alice Vassimon,

    Madre Cristina Sodr Dria... O psiclogo Helvcio de Siqueira e Silva, professor da UFES2,

    criou a Comunidade Agrcola Gritizza para atender jovens delinqentes (SILVA, 1989).

    Constata-se nos trabalhos psicopedaggicos teorias atuais de Jean Piaget, Vygotsky, Emilia

    Ferreiro... Alm deles h o resgate de Freud, Jung, Lacan, Rogers, Skinner...

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    UNIDADE 4 Objetivos: Permitir aos alunos visualizar as bases filosficas para o processo de produo histrica dos saberes em Psicopedagogia, registrando suas referncias fundamentais e suas tendncias.

    FUNDAMENTOS FILOSFICOS

    Aspectos filosficos da psicopedagogia podem ser compreendidos pelos mais diversos

    enfoques. Poderamos estudar Heidegger e Sartre, por exemplo, que embasam psiclogos

    em algumas prticas psicopedaggicas fenomenolgicas existenciais. Neste tpico,

    entretanto estaremos nos referindo filosofia da incluso. Para alcanar esse objetivo

    recorreremos a Correia (1999), a Andr et al (1999) e um texto organizado por Carvalho

    (1997).

    As sociedades tm, ao longo da histria, utilizado de recursos punitivos para pessoas que

    "ousam" ou so diferentes, bem como agridem simblica ou concretamente pessoa com

    necessidades (de sade; educao; de afeto; de alimentao etc.) especiais e o aluno com

    necessidades educativas (Adaptao Curricular: individual e/ou grupal)

    especiais (n.e.e.).

    Ser portador de deficincia nunca foi fcil. No se aceita o diferente e suas

    diferenas. Pode-se esconder essa diferena, tanto melhor, pois a saciedade

    hipcrita e finge que no v a dor do outro que no pode dizer a que veio!

    Com base nos padres de normalidade estabelecidos pelo contexto sociocultural, legitima-se

    a ideologia do domina-dor. Assim, desde a Antiguidade at os nossos dias, as sociedades

    demonstram dificuldade em lidar com o diferente, as diferenas, aquilo que novo. Todos

    resistem ao que ameaa-dor nossa estrutura de personalidade, ao nosso pretenso e

    harmonioso ser.

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    A humanidade tem toda uma histria para comprovar como os caminhos das pessoas com

    deficincia tm sido repletos de obstculos, riscos e limitaes. O que observamos o

    quanto tem sido difcil a sobrevivncia do ser, seu desenvolvimento e sua convivncia

    (consigo mesmo e para com a sociedade). Pessoas nascem com deficincias em todas as

    culturas, etnias e nveis scio-econmicos e sociais, e de "perto so pessoas" (gente como a

    gente: o que humano no nos pode ser estranho) e se olharmos bem, tambm portamos

    temporria ou definitivamente nossos dficits. Todos somos diferentes e temos o direito de

    express-la.

    A forma de conceber a deficincia e de lidar com seus portadores tem variado ao longo dos

    sculos.

    Atualmente, os preconceitos ainda existem em diferentes graus, os mitos so perpetuados

    (em detrimento dos fatos), as contradies conceituais prevalecem, assim como as atitudes

    ambivalentes, as resistncias, a inquietao e as muitas formas de discriminaes. Isso

    acontece, no que seja um sinal dos tempos modernos, nem dos avanos contemporneos

    do conhecimento, nem da evoluo dos costumes ou dos valores essenciais do homem ou

    algo da "monstruosidade que a ps-modernidade", justo ela que propes a convivncia na

    diversidade do ser! Ao contrrio, os preconceitos, estigmas e esteretipos tem razes

    psicolgicas, psicanalticas (inconscientes), histricas e culturais. As atuais posturas

    discriminativas fortaleceram-se no tempo, no equvoco compartilhado e transmitido

    culturalmente.

    A evoluo da concepo de deficincia sofreu alguma evoluo, entretanto, vivenciamos,

    ainda, uma fase assistencialista. Nesta etapa a pessoa diferente vista como aquela que

    precisa de ajuda. H, nesse sentido, as pessoas que se dedicam a esse atendimento,

    fazendo-o (e a o assistencialismo) de forma caritativa, negando que o ser diferente deve

    ser includo, aceito com suas diferenas. Ser da Incluso significa isso: conviver

    saudavelmente com as diferenas. Saudvel entrar em conflito, sem deixar de respeitar e

    advogar ali mesmo h diferenas e necessidades educativas ou outra necessidade que

    clamam por serem satisfeitas.

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    Na viso da caridade, os ajuda-dor-es no reconhecem o impacto do social e poltico no ser.

    Tais caridosos devem ser cuidadosamente cuidados, pois podem ser perigosos, pois sua

    atuao tende a "calar" a voz do oprimido, gerando nele culpa e subservincia a quem doa

    alimentos, roupas etc. Obviamente que em um pas em crise como o Brasil, essencial

    assistir, mas ao faz-lo vital que se faa com dignidade, reconhecendo no outro seu direito

    de cidado de receber o que lhe concreta ou simbolicamente tirado, usurpado!

    Os tcnicos, mesmo os especializados so vistos como benemritos, e as pessoas que se

    dedicam como voluntrias causa dos portadores de deficincia, as que criam as

    instituies e lutam pela sua manuteno, costumam ser exaltados pelo seu esprito

    humanitrio. (Carvalho, 1997; p.19). Porque exaltar? Muitos desses benemritos abatem,

    com suas aes, no imposto de renda. Muitos ainda ganham tanto, e tanto, que o mnimo

    que a sociedade espera deles sua contribuio, o seu retorno e no depsitos em bancos

    suos!

    Goffman escreveu um excelente livro chamado "Estigma", e Foucault escreveu "Vigiar e

    Punir". Esses livros valem a pena serem lidos, estudados. A leitura servir para se

    compreender os modos como as pessoas diferentes so tratadas, abordadas... Nestes livros

    podemos detectar, sem entrarmos em detalhes, que:

    a) as pessoas diferentes ainda so identificadas e socialmente rotuladas;

    b) tende-se a generalizar as suas limitaes e a minimizar as suas limitaes e a

    minimizar os seus potenciais;

    c) a diferena est sempre to presente e enfatizada para o seu portador (porta a dor?) e

    para os que o cercam, que justifica os seus sucessos e fracassos, os seus atos e

    realizaes.

    Para se chegar filosofia inclusiva e a luta atual para a sua efetivao prtica, a sociedade

    passou pela excluso, segregao, institucionalizao,..., integrao e incluso. A integrao

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    propunha (na prtica) a colocao do aluno diferente ou com necessidades educativas

    especiais em sala comum, sem reconhecer-lhe as diferenas, sem propor modificaes que

    na instituio, na organizao, quer no desenvolvimento do processo ensino-aprendizagem.

    Hoje, no Brasil, a incluso garantida pela Constituio Federal. Entretanto, desde 1986, no

    mundo, esse tema discutido, pelo menos quando utilizamos o termo incluso.

    Madeleine Will, Secretria de Estado para a Educao Especial dos Estados Unidos da

    Amrica, fez um discurso que apelava para uma mudana radical no que dizia respeito ao

    atendimento das crianas com n.e.e. e em "risco educacional" (de rua; sob domnio de

    Ganges, drogadas e prostitudas etc). Dizia ela que, dos 39 milhes de alunos matriculados

    em escolas pblicas, cerca de 10% eram alunos com n.e.e. e que outros 10 a 20% embora

    fossem considerados com n.e.e., demonstravam problemas de aprendizagem e

    comportamento que interferiam com a sua realizao escolar.

    A soluo para Will passava por uma cooperao entre professores - do ensino regular e de

    educao especial - que permitisse a anlise das necessidades educativas dos alunos com

    problemas de aprendizagem e o desenvolvimento de estratgias que respondessem a essas

    mesmas necessidades.

    Essa proposta consagrou-se como princpio da filosofia de incluso. Nesse sentido cada

    vez maior o nmero de pais e educadores que defendem a integrao (no sentido mesmo da

    incluso) da criana deficiente na classe regular, incluindo as deficientes mentais severas ou

    profundos. Afirma-se que as necessidades educativas dos alunos no devem requerer um

    sistema dual, pois ele pode fomentar atitudes injustas e desapropriadas em relao sua

    educao.

    Em junho de 1994, realizou em SALAMANCA, na Espanha, a "Conferncia Mundial sobre

    necessidades educativas especiais (n.e.e): Acesso e Qualidade". Esse evento inspirou-se no

    "princpio da incluso" e no reconhecimento da necessidade de atuar com o objetivo de

    conseguir escola para todos, instituies que incluam todas as pessoas, aceitem as

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    diferenas, apiem a aprendizagem e respondam as necessidades educativas especiais

    individuais e em pequenos grupos.

    Segundo a maioria dos especialistas, a incluso significa atender o aluno com n.e.e.,

    incluindo aquele com n.e.e. severas, na classe regular com o apoio de servios especiais

    pertencentes educao especial (sala de apoio, de recursos e/ou consultrios ou sala de

    psicopedagogia, por exemplo, dentro ou fora da escola).

    Entretanto para efetivar a incluso necessria a participao total do Estado, bem como da

    comunidade, da escola, da famlia e finalmente do aluno.

    Todo o sentir-pensar-agir a incluso na escola, junto ao aluno com n.e.e., tende estimular o

    seu desenvolvimento nos planos acadmicos, scio-emocional e pessoal. Nem sempre esta

    tarefa fcil, mas existem relatos tcnico-cientficos onde se desenvolveram os sucessos

    como os encontrados em Andr et al. (1999)

    Entretanto quando se l a DECLARAO DE SALAMANCA o que se checa um discurso

    legal situado no plano ideal, pois os governos so suficientemente cnicos para desviar

    verbas da educao, e na mdia revelem o interesse pelos "descamisados". Puro engodo! Se

    a lei fosse para beneficiar os legitimadores do sistema, aplicava-se uma Medida Provisria.

    Mas como para beneficiar crianas, descreve-se o fato: justia morosa, burocracia etc.

    Essas justificativas, nesse contexto, so arte-e-manhs da qual, o povo est

    desesperanado, descrente... Nesse sentido vale a pena estudarmos os trabalhos de

    Seligman sobre a produo do desamparo adquirido, uma infelicidade apreendida: de nada

    adianta emitir um comportamento, pois no serei escutado (recompensado)!

    O movimento de incluso, entretanto sempre existiu! So focos de luta, de resistncia, de

    enfrentamento... Os movimentos de oposio mundiais e nacionais so a base dessa

    discusso... H que se destacar o movimento dos jovens pela paz e pelo amor ("hippie"), os

    movimentos negros, a violncia do nazismo como uma imagem de que aquilo no pode mais

    ocorrer (apesar de continuar acontecendo, no de modo to frontal), a resistncia de M.

    Gandhi (desobedincia civil), o movimento i-i-i (Jovem Guarda), o Tropicalismo e o grito

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    de " proibido proibir" (grito de Caetano Veloso e dos jovens estudantes franceses nas suas

    trincheiras urbanas), um cantor de rock (Elvis Presley) que ao cantar revelava portar em si os

    cantores de blues do Harlm (negros), oposio dos brasileiros ditadura militar, os atuais

    movimentos dos gays etc. Os pais de crianas portadoras de necessidades especiais foram

    planejando, executando e avaliando associaes, Organizaes No Governamentais,

    grupos de auto-ajuda etc. A sociedade civil, diante a pandemia da AIDS mostrou sua fora

    em contraposio a um Estado perverso e inoperante. Os gays comearam amostrar suas

    caras, a no Ter vergonha do amor que sentem. As mulheres passaram a exigir mais

    dignidade e a participar das situaes de mando: Pinel (2001) diz que o homem no poder

    revelou seu fracasso, pois seu smbolo, a JUSTIA, no conseguiu dar conta de si-do-outro;

    j a mulher, e aquilo que a melhor representa, no plano mitolgico, a MISERICRDIA,

    mostra-se disponvel a s-lo... Como se observa, o movimento inclusivista aconteceu na

    sociedade como o todo e contaminou a escola com seus princpios de cidadania, justia e

    respeito/permisso DIVERSIDADE.

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    UNIDADE 5 Objetivos: Permitir aos alunos visualizar as bases psicolgicas para o processo de produo histrica dos saberes em Psicopedagogia, registrando suas referncias fundamentais e suas tendncias.

    FUNDAMENTOS PSICOLGICOS

    Quando se fala em aspectos psicolgicos da psicopedagogia se pensa basicamente no

    desenvolvimento e aprendizagem do ser humano. H nestas reas nomes significativos de

    pesquisadores: Jean Piaget, Lev Semenovich Vygotsky, David Ausubel, Jerome Bruner,

    Sigmund Freud, Carl Ronson Rogers, Paulo Freire, Emlia Ferreiro etc.

    Neste tpico estudaremos um representante da corrente scio-histrica e cognitivista: seu

    nome Vygotsky. Suas idias so muito discutidas e utilizadas. Entretanto livros didticos,

    de excelentes nveis, como os de Bock, Furtado e Teixeira (1999) e Pinel (2001) trazem

    todos esses tericos citados. Sobre Piaget vale pena ler seus livros editados em 1970 e

    1975. Sobre Vygotsky (1991, 1984; Calvio e Torre, 1996). Sobre Ausubel (Moreira e Masini,

    1982). Sobre Bruner (1973, 1971). Sobre Rogers e Freire (Misukami, 1986). Sobre Freud e

    outros tericos (Hall e Lindsey, 1998). De Ferreiro (1985).

    Para abordarmos Vygotsky, recorreremos fundamentalmente a Bock, Furtado e Teixeira

    (1999).

    Vygotsky (ou Vygotsky ou Vigotskii etc.) nasceu em 1896, no Bielo-Rus, e faleceu

    prematuramente aos 37 anos de idade. Ele foi um dos tericos que buscou uma alternativa

    dentro do materialismo dialtico para o conflito entre as concepes idealistas e mecanicistas

    na Psicologia. Ele foi ignorado no Ocidente, e entre 1936 e 1956. Tambm, por motivos

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    polticos, foi rechaado na ex-Unio Sovitica, sua terra: alguns comentam que os

    camaradas bolchevistas achavam sua teoria por demais elaborada, a ponto de confundir e

    no esclarecer classe operria. adequado pontuar que a Psicologia sovitica tinha,

    naquele tempo de "alimentar-se" nos trabalhos do fisiologista e prmio Nobel I. Pavlov!

    Porm, atualmente, seu trabalho vem sendo estudado e valorizado em todo mundo. Bruner o

    estuda nos Estados unidos da Amrica; Khol e outros o estudam no Brasil.

    Vygotsky concebia uma inter-relao (indissociabilidade) entre desenvolvimento e

    aprendizagem, um aspecto interferindo dialeticamente no outro: afeto-cognio se interagem.

    Entretanto, para fins didticos, utilizaremos produo de Bock, Furtado e Teixeira (1999) que

    apresentam o tema de modo dividido: a abordagem de Vigotski para o desenvolvimento; a

    abordagem de Vigotskii para a aprendizagem.

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    UNIDADE 6 Objetivos: Apresentar reflexes acerca dos campos norteadores da ao psicopedaggica

    CAMPOS NORTEADORES DA AO PSICOPEDAGGICA

    No livro "Psicopedagogia: teoria e prtica", Lamonico (1992) enuncia os campos tericos

    norteadores da ao psicopedaggica:

    a) Abordagem psiconeurolgica

    Abordagem fundamentada na biologia, psicologia e processos educativos e de treinamento.

    Pinel (2001/2002;p.107-114) estudou as bases neurais da aprendizagem-

    desenvolvimento, buscando compreender alguns mecanismos

    psicofisiolgicos e neuropsicolgicos associados aos aspectos cognitivos.

    Destaca Pinel (2001/2002; p.108) que importante ai estudioso do

    psicopedagogia uma atitude de compreenso e esforo intelectual na

    pesquisa do aluno com problemas de aprendizagem escolar: o aluno deve

    abordado no seu ser total (holstico), que envolve o ORGANISMO

    (fisiologia), CORPO (o modo como se percebe; como percebe e se

    movimenta no espao; seu esquema corporal: imagem e conceito corporal; introjeo das

    partes do corpo e todo o corpo), o DESEJO (sua vontade de sentido; sua motivao mais

    profunda; seu querer; sua auto-estima; suas foras e fragilidades etc.) e a INTELIGNCIA

    (aspecto no mensurvel, referindo-se a capacidade do aluno/pessoa solucionar os

    problemas que se interpem a sal frente, no seu cotidiano de ser; aborda o modo - criativo ou

    no - de solucionar problemas etc.).

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    Os distrbios biolgicos do crescimento e do desenvolvimento que for capaz de interferir

    prolongadamente no METABOLISMO refletem de modo negativo no crescimento e

    desenvolvimento. Os principais fatores podem ser agrupados em:

    Disfunes endcrinas. Ex.: nanismo hipofisrio e tireoidiano; gigantismo; puberdade

    precoce etc.

    2. Fatores genticos. Ex.: acondroplasia; sndrome de Down; sndrome de Turner etc.

    3. Desnutrio. O mecanismo de desnutrio gera um atraso no desenvolvimento-

    aprendizagem, e esse muito complexo e inclui a formao escassa de somatomedina C.

    4. Doenas crnicas. Essas doenas, quando de longa durao perturbam o metabolismo,

    atrasando o crescimento.Como o caso da insuficincia digestiva e de certas afeces

    renais, pulmonares e cardacas.

    5. Alm desses fatores, reafirmamos que problemas emocionais (conflitos e violncias no lar;

    o modo de ser da criana diante do alcoolismo paterno, por exemplo, e o sentimento da

    criana diante dos jogos psicopatolgicos da famlia; abuso sexual etc.) e infeces

    freqentes (verminoses e intoxicaes etc.) tambm prejudicam o desenvolvimento-

    aprendizagem.

    As caractersticas fsicas de uma criana estimulam seus familiares, coleguinhas,

    professores e outras pessoas significativas em sua vida-vivida, a criar, de modo fantasiaso, a

    respeito dela, uma imagem marcada pelos estigmas, esteretipos e preconceitos. Muitas

    vezes, esses algozes so destruidores do ser, e ento persistem, pois esto localizados no

    inconsciente (Pinel, 2001/2002). Quais as conseqncias desses atos

    perversos e to pr-sentes na nossa hipcrita sociedade?

    O ambiente escolar poder ser percebido como agradvel, suportvel

    ou intolervel... E isso ser resultado do modo como a criana (ou

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    se sente), como se aceita. Tais subjetividades e comportamentos explcitos foram e so

    construdo por meio dessas intersubjetividades patologizadas, desrespeita-dor - as do

    desenvolvimento e aprendizagem do ser. Pode ser que toda essa vivncia dolorida faa a

    criana/adolescente ou quaisquer pessoas sentir-se (ou de fato) segregada ou ridicularizada.

    Evidentemente, essas situaes, de alguma forma interferem na aprendizagem e afetam

    todo o conjunto da vida humana. Pinel (2002) estudou os efeito de uma guerra (nazismo X

    crianas judaicas) na produo artstica da criana, revela-dor-a de tristeza, sentimentos de

    ser pior e culpada pelo que a se colocou, apesar de ter tambm detectado o "otimismo

    trgico" (Frankl, 1981), isto , apesar das adversidades, o ser enfrenta e resiste, mas porque

    h uma guerra? Interesse de quem se mantm uma guerra? Etc.

    A auto-estima (Pinel, 2001/2002) uma varivel psicolgica muito importante para o

    rendimento (sucesso-fracasso) da criana na escola. No gostar de si implica em um alto

    grau de contaminao psquica, que fere inclusive o organismo, o corpo, o desejo e a

    inteligncia.

    Moura (1993) pontua que "muitas crianas crescem precocemente, apresentando peso e

    altura que sugerem uma idade maior que a real. Quem convive com essas crianas, inclusive

    os professores, tende a esperar demais delas e a julg-las unicamente por seu fsico,

    esquecendo (?) (grifo e interrogao nossos) que uma criana cuja maturao fsica

    precoce enfrenta exigncias para as quais no est psicologicamente

    pronta, e isso uma causa geradora de ansiedade" (p. 55).

    Assim, a vida escolar da criana, sob cruis presses, por parte de outras

    crianas e por parte dos adultos (professores, diretores, merendeiras,

    outros adultos presentes na escola etc.) podem produzir no ser

    desprezado, ansiedade e sentimento de inadequao, aponto desses

    sentimentos de menos-valia acompanh-la e, mais tarde, perturbar sua vida. que a

    imagem negativa de si mesma elaborada na construo EU+TU+NS pode ficar

    profundamente arraigada e, quando adolescente, adulta e idosa, embora tenha crescido e

    mudado, ela ainda se sentir inadequada, desagradvel e indesejvel.

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    Essas questes psico-afetivas so vitais quando pensamos, sentimos e principalmente

    agimos para efetivao da FILOSOFIA DA INCLUSO: Como criar alternativas de incluir o

    outro se no me incluo no mundo dos diferentes? Como dar passos maiores de incluso, se

    nem respeitar o ser de mim eu consigo?

    O ajudador, por meio de uma psicopedagogia institucional, pode desenvolver trabalhos

    grupais, desenvolvendo o esprito crtico. Para isso, pode, por exemplo, ensinar ao grupo

    VER a realidade e detalhes de injustias elaboradas na intersubjetividades. Depois

    necessrio levar ao grupo AVALIAR a situao concreta de pessoas que se desprezam e

    desprezam os outros, constando os efeitos dessas relaes desrespeitosas. E, finalmente,

    estimular o grupo a AGIR, por meio de planos de interveno, objetivando mudar atitudes e,

    de imediato, os comportamentos indesejveis socializao do ser.

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    UNIDADE 7 Objetivo: Apresentar de forma sinttica os cinco campos norteadores para a ao Psicopedaggica. Abordagens: Psiconeurolgica, Neuropsiquitrica, Comportamental, Epistemologia Convergente, Fenomenologia

    a) Abordagem neuropsiquitrica

    Abordagem fundamentada na medicina e medicalizao dos problemas de aprendizagem.

    b) Abordagem comportamental

    Abordagem fundamentada nos trabalhos de laboratrio de Psicologia experimental de

    Watson (Behaviorismo Metodolgico) e B.F. Skinner (Behaviorismo Radical). O enfoque est

    na observao e descrio clara dos comportamentos inadequados, a identificao daquilo

    que mantm (refora/recompensa) esse comportamento patolgico e a interveno de

    modificao, por meio de tcnicas, do comportamento e a instalao de um novo mais

    adequado. Programas psicopedaggicos como a ANLISE DE TAREFAS (Pinel, 1987)

    utilizam-se das propostas do neobehaviorismos. Filosoficamente o behaviorismo

    condenvel, pois defende a tese que o homem uma tabula rasa, sem histria e dele

    fazemos nosso bel prazer. Entretanto, mesmo psiclogos scio-histricos como Bock et al.

    Tem defendido as benesses desses treinamentos para a psicologia do Excepcional.

    c) Abordagem da Epistemologia Convergente

    Criada por JORGE VISCA, essa abordagem trabalha com a Psicanlise (transferncia e

    contra-transferncia; resistncia etc.); a Epistemologia Gentica de Jean Piaget (exame

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    clnico de Piaget; raciocnio clnico; etapas universais de idade etc.) e a Psicologia Social de

    E. Pichn-Rivire (aprendizagem centrada na tarefa). uma das abordagens mais modernas

    da psicopedagogia, e que fornece muita identidade no ofcio de quem atua.

    d) Abordagem Fenomenolgica

    O mais importante nessa abordagem so as atitudes e posturas de envolvimento existencial

    com aquilo que se pe ao meu ser holstico e o necessrio distanciamento reflexivo da coisa,

    e ento apreender o sentido. Heidegger e Sartre so dois filsofos que fundamentam tais

    prticas. Viktoe Emil ou Emanuel Frakl, Boss, Binswanger, Rdio, J. Wood et al.,

    Angerami-Camom e Pinel so alguns psiclogos, que fundamentados nos filsofos,

    recriaram alternativas de diagnstico, preveno e tratamento psicopedaggico.

    Hoje a formao de especialistas em Psicopedagogia se d via cursos, livros, curso de ps-

    graduao "latu-sensu", e no Rio de Janeiro j h escolas superiores de Psicopedagogia

    como a da Universidade Estcio de S. No curso de Pedagogia da Universidade Federal do

    Esprito Santo j consta h mais de 6 anos a disciplina "Introduo Psicopedagogia", tendo

    j sido oferecida a disciplina "Pedagogia Teraputica". Para o semestre 2001/2 est previsto

    o oferecimento da disciplina "Interveno Psicopedaggica". A BOL parece ser a primeira

    Instituio a oferecer um curso livre, na rea da Psicopedagogia.

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    UNIDADE 8 Objetivo: Possibilitar aos alunos a compreenso dos conceitos principais da teoria acerca do desenvolvimento infantil desenvolvida por Vygotsky, Luria e Leontiev.

    A PSICOLOGIA DO DESENVOLVIMENTO EM VYGOTSKY

    Um pressuposto bsico da obra de Vygotsky que as origens das

    formas superiores de comportamento consciente - pensamento,

    memria, ateno voluntria etc. -, formas essas que diferenciam

    o homem dos outros animais, devem ser achadas nas relaes

    sociais que o homem mantm. Vygotsky percebia o homem como

    um ser ativo, cidado, com possibilidade de ser, conseqncia dessas relaes advindas de

    fora (meio) para dentro (eu). Entendia o homem como ser de cuidado na alteridade, que age

    sobre o mundo, sempre em relaes sociais, e transforma essas aes para que constituam

    o funcionamento do seu ser (interno).

    O desenvolvimento infantil visto a partir de trs aspectos: instrumental, cultural e histrico.

    E Luria, seu seguidor, que ao lado de Leontiev, o mais famoso, que nos ajuda a

    compreender esses trs aspectos:

    O aspecto instrumental refere-se natureza basicamente mediadora das funes

    psicolgicas complexas. No apenas respondemos aos estmulos apresentados no

    ambiente, mas os alteramos e usamos suas modificaes como um instrumento de

    nosso comportamento. Bock et al. (1999) d-nos um exemplo disso: trata-se do

    costume de amarrar um barbante no dedo para lembrar algo. O estmulo - o lao no

    dedo - objetivamente significa apenas que o dedo est amarrado. Ele adquire sentido,

    por sua funo mediadora, fazendo-nos lembrar algo importante.

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    O aspecto cultural da teoria envolve os meios socialmente estruturados pelos quais a

    sociedade organiza os tipos de tarefa que a criana em crescimento enfrenta, e os

    tipos de instrumentos, tanto mentais como fsicos, de que a criana pequena dispe

    para dominar aquelas tarefas. Um dos instrumentos bsicos criados pela humanidade

    a linguagem. Vygotsky ento passou a dar nfase, em toda sua obra, linguagem e

    sua relao com o pensamento.

    O aspecto histrico funde-se com o cultural, pois os instrumentos que o homem usa,

    para dominar seu ambiente e seu prprio comportamento, ,foram criados e

    modificados ao longo da histria social da civilizao. Os instrumentos culturais

    expandiram os poderes do homem e estruturaram seu pensamento, de maneira que,

    se no tivssemos desenvolvimento, a linguagem escrita e a aritmtica, por exemplo,

    no possuiramos hoje a organizao dos processos superiores que possumos.

    Assim a histria da sociedade e o desenvolvimento do homem caminham juntos e, mais do

    que isso esto de tal forma intrincados, que um no seria o que sem o outro. Com essa

    perspectiva, que Vygotsky estudou o desenvolvimento infantil.

    As crianas, desde o nascimento, esto em constante interao com

    os adultos, que ativamente procuram incorpor-las a suas relaes e a

    sua cultura. No incio, as respostas das crianas so dominadas por

    processos naturais, especialmente aqueles proporcionados pela

    herana biolgica. atravs da mediao dos adultos que os

    processos psicolgicos mais complexos tomam forma. Inicialmente,

    esses processos so interpsquicos (partilhados entre pessoas), isto ,

    s podem funcionar durante a interao das crianas com os adultos.

    medida que a criana cresce, os processos acabam por ser executados dentro das

    prprias crianas - intrapsquicos.

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    atravs desta interiorizao dos meios de operao das informaes, meios estes

    historicamente determinados e culturalmente organizados, que a natureza social das

    pessoas tornou-se igualmente sua natureza psicolgica.

    No estudo feito por Vygotsky, sobre o desenvolvimento da fala, sua

    viso fica bastante clara: inicialmente, os aspectos motores e verbais

    do comportamento esto misturados. A fala envolve os elementos

    referenciais, a conversao orientada pelo objeto, as expresses

    emocionais e outros tipos de fala social. Como a criana est cercada por adultos na famlia,

    a fala comea a adquirir traos demonstrativos, e ela comea a indicar o que est fazendo e

    de que est precisando. Aps algum tempo, a criana, comea a fazer distines para os

    outros com o auxlio da fala, comea a fazer distines para si mesma. Ento a fala vai

    deixando de ser um meio para dirigir o comportamento dos outros e vai adquirindo a funo

    de autodireo.

    Fala e ao, que se desenvolvem independentes uma da outra, em determinado momento

    do desenvolvimento convergem, e esse o momento de maior significado no curso do

    desenvolvimento intelectual, que d origem s formas puramente humanas de inteligncia.

    Forma-se, ento, um amlgama entre fala e ao; inicialmente a fala acompanha as aes e,

    posteriormente, dirige, determina e domina o curso da ao, com sua funo planejadora.

    O desenvolvimento est, pois, alicerado sobre o plano das interaes. O sujeito faz sua,

    uma ao que tem, dando-lhe um significado partilhado. Assim, a criana que deseja um

    objeto inacessvel apresenta movimentos de alcan-lo, e esses movimentos

    so interpretados pelo adulto como "desejo de obt-lo", e ento lhe d o objeto.

    Os movimentos da criana afetam o adulto e no o objeto diretamente; e a

    interpretao do movimento pelo adulto permite que a criana transforme o

    movimento de agarrar em gesto de apontar. O gesto criado na interao, e a

    criana passa a ter controle de uma forma de sinal, a partir das relaes sociais.

    Todos os movimentos e expresses verbais da criana, no incio de sua vida, so

    importantes, pois afetam o adulto, que os interpreta e os devolve criana com ao e/ou

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    com fala. A fala egocntrica (conversar "comigo-mesmo" ou com um imaginrio),

    vigotsnianamente como uma forma de transio entre a fala exterior e a interior. A fala inicial

    da criana tem, portanto, um papel fundamental no desenvolvimento de suas funes

    psicolgicas.

    Para Vygotsky, as funes psicolgicas emergem e se consolidam no plano da ao entre

    pessoas e tornam-se internalizadas, isto , transformam-se para constituir o funcionamento

    interno. O plano interno no a reproduo do plano externo, pois ocorrem transformaes

    ao longo do processo de internalizao. Do plano interpsquico, as aes passam para o

    plano intrapsquico. Considera, portanto, as relaes sociais como constitutivas das funes

    psicolgicas do homem. Essa viso interacionista.

    Vygotsky deu nfase ao processo de internalizao como mecanismo que intervm no

    desenvolvimento das funes psicolgicas complexas. Essa reconstruo interna de uma

    operao externa e tem como base a linguagem. O plano interno no preexiste, mas

    constitudo pelo processo de internalizao, fundado nas aes, nas interaes sociais e na

    linguagem.

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    UNIDADE 9 Objetivo: Apresentar a teoria da Aprendizagem segundo Vygotsky

    A PSICOLOGIA DE APRENDIZAGEM EM VYGOTSKY

    Aps 60 anos depois da morte de Vygotsky, o autor volta tona com o merecido

    reconhecimento pela sua contribuio Educao Especial, a Psicopedagogia e

    Psicologia.

    Na dcada de 20 e incio dos anos 30, Vygotsky dedicou-se construo da

    crtica noo de que se poderia construir conhecimento sobre as funes psicolgicas

    superiores humanas a partir de experincias com animais. Ele criticou, tambm, as

    concepes que afirmavam serem as propriedades intelectuais dos homens resultado da

    maturao do organismo, como se o desenvolvimento estivesse predeterminado e, o seu

    afloramento, vinculado apenas a uma questo de tempo. Vygotsky buscou as origens sociais

    destas capacidades humanas. Alm disso, via o pensamento marxista como uma fonte

    cientfica de grande valor para a soluo dos paradoxos cientficos fundamentais que

    incomodavam a Psicologia no incio do sculo.

    Bock et al (1999) sistematizam as idias de aprendizagem em Vygotsky:

    Os fenmenos devem ser estudados em movimentos e compreendidos como em

    permanente transformao. Na Psicologia, isso significa estudar o fenmeno

    psicolgico em sua origem e no curso de seu desenvolvimento.

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    A histria dos fenmenos caracterizada por mudanas qualitativas e quantitativas.

    Assim, o fenmeno psicolgico transforma-se no decorrer da histria da humanidade,

    e processos elementares tornam-se complexos.

    As mudanas na natureza do homem" so produzidas por mudanas na vida material

    e na sociedade.

    O sistema de signos (a linguagem, a escrita, o sistema de nmeros) pensado como

    um sistema de instrumentos, os quais foram criados pela sociedade, ao longo de sua

    histria. Esse sistema muda a forma social e o nvel de desenvolvimento cultural da

    humanidade. A internalizao desses signos provoca mudanas no homem. Seguindo

    a tradio marxista, Vygotsky considera que as mudanas que ocorrem em cada um

    de ns tm sua raiz na sociedade e na cultura.

    Vygotsky tem parte de sua obra dedicada s questes escolares.Por isso vamos reunir

    algumas consideraes importantes feitas por esse renomado pedagogo e psiclogo bielo-

    russo (judeu, portanto!) e que podem contribuir para olharmos os chamados "problemas de

    aprendizagem" sob uma nova perspectiva: a das relaes sociais que caracterizam o

    processo de ensino-aprendizagem.

    Para Vygotsky, a aprendizagem sempre inclui relaes entre as pessoas. A relao do

    indivduo com o mundo, est sempre mediada pelo outro. No h como aprender o mundo se

    no tivermos o outro, aquele que nos fornece os significados que permitem pensar o mundo

    a nossa volta. Veja bem, Vygotsky defende a idia de que no h um desenvolvimento

    pronto e previsto dentro de ns que vai se atualizando conforme o tempo passa ou

    recebemos influncia externa. O desenvolvimento no pensado como algo natural nem

    mesmo como produto exclusivo da maturao do organismo, mas como um processo em

    que esto presentes a maturao do organismo, o contato com a cultura produzida pela

    humanidade e as relaes sociais que permitem a aprendizagem. E a aparece o "outro"

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    como algum fundamental, pois este outro quem nos orienta no processo de apropriao

    da cultura.

    Para Vygotsky, o desenvolvimento um processo que se d de fora para dentro. no

    processo de ensino-aprendizagem que ocorre a apropriao da cultura e o conseqente

    desenvolvimento do indivduo.

    A aprendizagem da criana inicia-se muito antes de sua entrada na escola, isto porque

    desde o primeiro dia de vida, ela j est exposta aos elementos da cultura e presena do

    outro, que se torna o mediador entre ela e a cultura. A criana vai aprendendo a falar e a

    gesticular, a nomear objetos, a adquirir informaes a respeito do mundo que a rodeia, a

    manusear objetos da cultura; ela vai se comportando de acordo com as necessidades e as

    possibilidades. Em todas essas atividades est o "outro". Parceiro de todas as horas ele

    que lhe diz o nome das coisas, a forma certa de se comportar; ele que lhe explica o mundo,

    que lhe responde aos "porqus", enfim, o seu grande intrprete do mundo. So esses

    elementos apropriados do mundo exterior que possibilitam o desenvolvimento do organismo

    e a aquisio das capacidades superiores que caracterizam o psiquismo humano.

    A escola surgir, ento, como lugar privilegiado para este desenvolvimento, pois o espao

    em que o contato com a cultura feito de forma sistemtica, intencional e planejada. O

    desenvolvimento - que s ocorre quando situaes de aprendizagem o provocam - tem seu

    ritmo acelerado no ambiente escolar. O professor e os colegas formam um conjunto de

    mediadores da cultura que possibilita um grande avano no desenvolvimento da criana.

    A criana no possui instrumentos endgenos para o seu desenvolvimento. Os mecanismos

    de desenvolvimento so dependentes dos processos de aprendizagem, estes, sim,

    responsveis pela emergncia de caractersticas psicolgicas tipicamente humanas, que

    transcendem programao biolgica da espcie. O contato e o aprendizado da escrita e

    das operaes matemticas fornecem a base para o desenvolvimento de processos internos

    altamente complexos no pensamento da criana.

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    O aprendizado, continuam Bock et al (1999), quando adequadamente organizado, resulta em

    desenvolvimento mental, pondo em movimento processos que seriam impossveis de

    acontecer. Esses princpios diferenciam-se de vises que pensam o desenvolvimento como

    um processo que antecede aprendizagem, ou como um processo j completo, que a

    viabiliza.

    A partir destas concepes, Vygotsky construiu o conceito de zona de desenvolvimento

    proximal, referindo-se s potencialidades da criana que podem ser desenvolvidas a partir do

    ensino sistemtico. A zona de desenvolvimento proximal a distncia entre o nvel de

    desenvolvimento real, que se costuma determinar atravs da soluo independente de

    problemas pela criana, e o nvel de desenvolvimento potencial, determinado pela soluo de

    problema sob a orientao de um adulto ou em colaborao com companheiros.

    Este conceito de zonas (proximal; real; potencial) importante porque nos possibilita delinear

    o futuro imediato da criana e seu estado dinmico de desenvolvimento. Alm disso, permite

    ao professor olhar seu educando de outra perspectiva, bem como o trabalho conjunto entre

    colegas. Alis, Vygotsky acreditava que a noo de zona de desenvolvimento proximal j

    estava presente no bom senso do professor, quando este planejava seu trabalho.

    Assim, Vygotsky insistia na importncia de a Educao pensar o desenvolvimento da criana

    de forma prospectiva, e no retrospectiva, como era feito. Sua crtica foi contundente.

    Segundo Vygotsky, a escola pensa a criana e planeja o ensino de forma retrospectiva por

    considerar, como condio para a aprendizagem, o nvel de desenvolvimento j conquistado

    pela criana. No seu entender, a escola deveria inverter esse raciocnio e pensar o ensino

    das possibilidades que o aprendizado j obtido traz. O bom ensino aquele que se volta

    para as funes psicolgicas emergentes, potenciais, e pode ser facilmente estimulado pelo

    contato com os colegas que j aprenderam determinado contedo.

    A aprendizagem , portanto, um processo essencialmente social, que ocorre na interao

    com os adultos e os colegas. O desenvolvimento resultado desse processo, e a escola, o

    lugar privilegiado para essa estimulao. A Educao passa, ento, a ser vista como

    processo social sistemtico de construo da humanidade.

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    Sintetizando, poderamos dizer que, para Vygotsky, as relaes entre aprendizagem e

    desenvolvimento so indissociveis. O indivduo, imerso em um contexto cultural, tem seu

    desenvolvimento movido por mecanismo de aprendizagem acionados externamente. A

    matria-prima deste desenvolvimento encontra-se, fundamentalmente, no mundo externo,

    nos instrumentos culturais construdos pela humanidade. Assim, o homem, ao buscar

    respostas para as necessidades de seu tempo histrico, cria, junto com outros homens,

    instrumentos que consolidam o desenvolvimento psicolgico e fisiolgico obtido at ento.

    Os homens de outra gerao, ao manusearem estes instrumentos, apropriam-se do

    desenvolvimento ali consolidado. Eles aprendem e se desenvolvem ao mesmo tempo,

    adquirindo possibilidades de responder a novas necessidades com a construo de novos

    instrumentos. E assim caminha a humanidade...

    A partir destas concepes de Vygotsky, a escola torna-se um novo lugar - um espao que

    deve privilegiar o contato social entre seus membros e torn-los mediadores da cultura.

    Alunos e professores devem ser considerados parceiros nesta tarefa social. O aluno jamais

    poder ser visto como algum que no aprende, possuidor de algo interno que lhe dificulta a

    aprendizagem. O desafio est colocado. Todos so responsveis no processo. No h

    aprendizagem que no gere desenvolvimento; no h desenvolvimento que prescinda da

    aprendizagem. Aprender estar com o outro, que mediador da cultura. Qualquer

    dificuldade neste processo dever ser analisada como uma responsabilidade de todos os

    envolvidos. O professor torna-se figura fundamental; o colega de classe, um parceiro

    importante; o planejamento das atividades torna-se tarefa essencial e a escola, o lugar de

    construo humana. (p.123-126)

    1. Zona do Desenvolvimento Real (ZDRe) - Trata-se de considerar aquilo que a criana traz

    consigo; sua histria. A criana ento avaliada. A partir deste diagnstico dialgico e scio-

    cultural, o professor comea a trabalh-la, tendo em vista uma Zona do Desenvolvimento

    Potencial (ZDPot). O que planejamos (para o futuro) em relao criana.

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    2. Zona do Desenvolvimento Proximal (ZDProx) - O professor, nessa Zona extremamente

    abstrata, atravs da linguagem e outros signos e por meio de instrumentos (giz; lousa; livros;

    Vdeo; CDs etc.), vai aproximando a ZDRe para a ZDProx.

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    UNIDADE 10 Objetivo: Possibilitar ao aluno a compreenso dos principais conceitos da teoria Psicanaltica desenvolvida por Freud.

    FUNDAMENTOS PSICANALTICOS

    Vamos abordar neste tpico a questo da "transferncia", aspecto este que nos reporta

    relao psicopedagogo (a) e cliente/orientando/aluno. Para o desenvolvimento deste assunto

    recorreremos a Mery (1985) e Raudinesco e Plon (1998).

    O termo transferncia foi progressivamente introduzido por Sigmund Freud (s/d)

    e Sandor Ferenczi, entre 1900 e 1909, para designar um processo constitutivo

    do tratamento psicanaltico mediante o qual os desejos inconscientes do cliente

    concernentes a objetos externos passam a se repetir, no mbito da relao psicopedaggica

    clnica, na pessoa do psicopedagogo, colocado na posio desses diversos objetos.

    Na linguagem corrente, o termo inconsciente utilizado como adjetivo, para designar o

    conjunto dos processos mentais que no so conscientemente pensados. Pode tambm ser

    empregado como substantivo, como uma conotao pejorativa, para falar de um indivduo

    irresponsvel ou louco, incapaz de prestar contas do seu ato.

    Em psicanlise, o inconsciente um lugar desconhecido pela conscincia: uma "outra cena".

    Na primeira tpica elaborada por Freud, trata-se de uma instncia ou um sistema constitudo

    por contedos recalcados que escapam s outras instncias, o pr-consciente e o

    consciente. Na segunda tpica, deixa de ser uma instncia, passando a servir para qualificar

    o "isso" ou "id" e, em grande parte, o "eu" e o "supereu" ou "superego".

    A transferncia o desenvolvimento de uma atitude emocional do paciente, dirigida ao

    analista quer sob a forma de uma reao afetuosa (positiva) quer de uma reao hostil

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    (negativa), a atitude derivando, em ambos os casos, das relaes anteriores do paciente com

    um de seus pais ou com os dois, e no da situao analtica atual (Warren, in Mery, 1985;

    p.37). Mas, como j foi observado por vrios psicanalistas (Glover, Melaine Klein etc.), "o que

    transferido, no apenas um afeto, mas todo um tipo de comportamento" (Lagache, in

    Mery, 1987; p. 37), " uma situao total, a totalidade do desenvolvimento" (id., pg. 88).

    Por outro lado, o que surpreende nas manifestaes transferenciais o

    fato de que so "condutas anacrnicas ou irracionais" (Lagache) que se

    produzem sem levar em conta a situao real vivida pelo sujeito; "o fato

    de que ela ultrapassa a medida e afasta-se, (...) do que seria normal,

    racional, d transferncia um aspecto particular" (S.Freud). Isso pode

    ser explicado se tivermos em mente que "a transferncia se deve no

    apenas s idias e expectativas conscientes do paciente, mas tambm

    a tudo o que foi recalcado e tornou-se inconsciente" (id).

    Com a descoberta do complexo de dipo, Freud compreende que " a relao do indivduo

    com suas figuras parentais que revivida na transferncia, acompanhada, notadamente, da

    ambivalncia pulsional que a caracteriza" (Laplanche e Pontalis, in Mery, 1985; p. 37)

    Freud adotou duas teorias explicativas da transferncia:

    a) A teoria dinamista, que corresponde posio de Freud em A Dinmica da Transferncia

    (1912).

    Todo indivduo cuja necessidade de amor no satisfeita inteiramente pela realidade volta-

    se inevitavelmente, com certa expectativa libidinal, para todo e qualquer personagem novo

    que entrar em sua vida (S. Freud). Ele espera encontrar, junto a esse novo objeto,

    possibilidades de satisfaes instintivas, libidinais ou agressivas, em conformidade com a

    relao infantil da qual o sujeito no se desligou (Bouvet), a disposio para a transferncia

    implicando, com efeito, a persistncia de um conflito infantil no resolvido (Legache). Cada

    um viver essa experincia nova de maneira pessoal, uma vez que todo indivduo, pela ao

    concomitante de uma predisposio natural e dos ocorridos em sua infncia, possui uma

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    maneira pessoal, determinada, de viver sua vida amorosa (S. Freud), que forma uma espcie

    de clich que ele repete durante sua vida, mas que pode, numa certa medida, ser modificado

    por impresses ulteriores (id). No processo de estabelecimento desse clich, as tendncias

    libidinais satisfeitas desenvolveram-se e orientaram-se para a realidade; a outra parte,

    frustrada, encontrou "um expediente na imaginao ou ficou confinada no inconsciente,

    espera, (so essas) tendncias libidinais espera (que) so inevitavelmente despertadas

    quando o sujeito entra em contato com um novo objeto" (Legache); o novo objeto "

    assimilado aos prottipos preexistentes" (id.). "Em razo da predisposio para a

    transferncia, o paciente reprojeta suas imagos" (Schlumberger).

    b) A teoria mecanicista, que corresponde posio de Freud em Alm do princpio do prazer

    (1920)

    A transferncia usualmente definida "pela repetio, na

    anlise e fora dela, de atitudes emocionais inconscientes

    adquiridas durante a infncia no crculo de relaes do paciente

    e em particular em sua relao com os pais". (Legache). Esses

    afetos vividos na relao transferencial "emanam", escreve

    Anna Freud "das antigas relaes objetais, ou mesmo das totalmente arcaicas e durante a

    anlise, ressuscitam sob a influncia do automatismo de repetio". Em face de um

    personagem novo, o sujeito "revive em sua relao com o outro experincias precoces

    ligadas principalmente s imagens parentais" (Sami-Ali). Essa reproduo na transferncia

    "tem sempre por contedo um fragmento da vida sexual infantil, e portanto, do complexo de

    dipo e de suas ramificaes" (Freud). A situao face a face reatualiza no sujeito o conflito

    infantil no resolvido e pode conduzi-lo a manobras defensivas diante da abordagem de

    problemticas edipianas, tal a "afirmao das identificaes imaginrias" (D.Anzieu). H "um

    deslocamento para o analista dos imagos dos pais, o que permite no apenas pr em

    evidncia as relaes afetivas mantidas com elas, mas tambm ver a evoluo dessas

    relaes realizar-se sob os nossos olhos (...) vemos o complexo de dipo delinear-se, armar-

    se e desfazer-se" (Schlumberger). De fato, assistimos a tais processos, pois "o paciente age

    seu passado em vez de rememor-lo" (Lagache) levado por "uma necessidade especfica de

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    repetio" (id). Essa repetio contrria ao princpio do prazer, "a experincia sexual infantil

    tendo sido uma experincia dolorosa, um fracasso e uma ferida narcsica, seu recalcamento

    por parte do ego estava conforme ao princpio do prazer; sua repetio na transferncia (...)

    contrria ao princpio do prazer e est ligada compulso repetio". (Freud).

    A doutrina clssica no atribua nenhuma influncia especfica ao meio, atendo-se

    espontaneidade da transferncia, sem dvida para diferenciar-se da hipnose e, por outro

    lado, em razo da natureza libidinal da transferncia.

    Mas, "segundo a teoria dualista", o meio psicanaltico exerce uma ao positiva na produo

    da transferncia (Lagache). O conceito de transferncia ampliado; os objetos passveis de

    serem alvos de transferncia incluem no apenas a pessoa do analista, mas o ambiente, a

    tcnica analtica e a vida cotidiana.

    A nfase colocada por Lagache e outros psicanalistas, como Ida Mc Alpine, na importncia

    do meio na produo da transferncia permite ao psicopedagogo diferenciar-se do

    psicoterapeuta. Com efeito, sua rea de ao diferente do campo analtico. A relao

    educativa vivida, num meio particular, cujas particularidades, portanto, devem ser

    precisadas.

    O meio psicopedaggico inclui os dois indivduos postos em presena, as atividades

    comumente empreendidas, bem como o conjunto das condies materiais e psicolgicas que

    regem o desenrolar desses encontros.

    A criana vem em presena do reeducador com suas predisposies naturais e sua histria

    pessoal. O psicopedagogo tambm comparece com suas predisposies e sua histria

    pessoal. O psicopedagogo tem um conhecimento desta histria, o que lhe permitir situar a

    maneira de ser da criana em seu contexto, ou seja, em seu passado; isso o ajudar a tomar

    uma distncia suficiente em relao criana para evitar entrar no jogo dela e reproduzir

    com ela um comportamento parental.

    Todos esses fundamentos sero retomados ao longo da vivncia do ser psicopedagogo.

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    UNIDADE 11 Objetivo: Possibilitar ao aluno a compreenso acerca da contribuio da abordagem da Psicanlise para o campo da Psicopedagogia.

    A ABORDAGEM PSICANALTICA NA PSICOPEDAGOGIA

    6.1. Bases da Psicanlise

    Uma das principais correntes na histria da psicologia a teoria psicanaltica de Sigmund

    Freud. Este sistema terico um modelo do desenvolvimento da personalidade, uma filosofia

    da natureza humana e um mtodo de psicoterapia. Historicamente, a psicanlise constitui a

    primeira das trs maiores escolas de psicologia, sendo o behaviorismo a segunda, e a

    terceira, ou "terceira fora", a psicologia humanista existencial. importante reconhecer que

    Freud foi o criador de uma abordagem psicodinmica psicologia, por lhe ter proporcionado

    um novo modo de olhar e descobrir novos horizontes. Freud estimulou uma grande soma de

    controvrsias, de atividade exploratria e de pesquisa, e lanou os fundamentos sobre os

    quais se fixam muitos sistemas posteriores.

    De um ponto de vista histrico, as maiores contribuies da teoria psicanaltica abrangem as

    seguintes:

    1) A vida mental do indivduo pode ser compreendida e possvel aplicar-se insight

    sobre a natureza humana para aliviar certas formas de sofrimento.

    2) O comportamento humano quase sempre governado por fatores inconscientes.

    3) O desenvolvimento durante a primeira infncia tem um efeito profundo sobre o

    funcionamento da pessoa adulta.

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    4) Esta teoria produziu um sistema de referncia significativo para a compreenso dos

    meios atravs dos quais um indivduo tenta enfrentar a ansiedade, postulando

    mecanismos que servem, ao mesmo indivduo, para evitar vir a ser dominado pela

    ansiedade.

    5) A abordagem psicanaltica oferece recursos de decifragem do inconsciente por meio

    da anlise dos sonhos, resistncias e transferncias.

    Esse artigo bibliogrfico, objetiva fornecer ao estudioso da psicopedagogia, fundamentos

    tericos bsicos sobre a Psicanlise. Para isso recorreremos ao texto de Gerald Corey

    (1983;p.25-33), Editado pela Campus, cidade do Rio de Janeiro, cujo ttulo "Tcnicas de

    Aconselhamento e Psicoterapia".Tambm aqui recorreremos nossa vivncia e outros

    referenciais.

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    UNIDADE 12 Objetivo: Possibilitar ao aluno a compreenso acerca da contribuio da abordagem da Psicanlise para o campo da Psicopedagogia, por meio da apresentao dos conceitos-chave da teoria psicanaltica.

    CONCEITOS-CHAVES NA PSICANLISE

    ESTRUTURA DA PERSONALIDADE

    De acordo com a viso psicanaltica, a estrutura da personalidade consiste em trs sistemas:

    o id/isso, o ego/eu e o superego/supereu. Trata-se de nomes para processos psicolgicos,

    no devendo ser imaginados como termos-vida que, separadamente, agenciem a

    personalidade: o processo desses trs sistemas dinmico, complexo e muito rico. O id/isso

    o componente biolgico (onde se localiza o inconsciente: outra cena), o ego/eu o

    componente psicolgico (a conscincia ou o que dela resta) e o superego/supereu, o

    componente social (moralidade).

    O Id (isso)

    O id o sistema original da personalidade. Ao nascer, a pessoa reduz-se ao

    id, puro desejo instintivo. Este a fonte primria da energia psquica e a sede

    dos instintos. Carece de organizao, cego, exigente e insistente. O id no

    pode tolerar tenso, funcionando no sentido de liberar as tenses

    imediatamente e voltar a uma condio homeosttica (de equilbrio interno).

    Regido pelo princpio do prazer, cujo objetivo reduzir a tenso, evitar a dor e obter prazer, o

    id ilgico, amoral e impulsionado por uma deliberao: satisfazer necessidades instintivas

    em conformidade com o princpio do prazer. O id nunca sofre maturao, permanecendo, de

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    modo metafrico como uma criana mimada da personalidade do ser: no pensa; apenas

    deseja ou age. O id inconsciente.

    O Ego (eu)

    O ego entra em contato com o mundo exterior, a realidade. O ego o executivo da

    personalidade, aquele que comanda, controla e regulamenta. Metaforicamente funciona

    como um "guarda de trnsito" para o id, o superego e o mundo exterior: sua tarefa principal

    a mediao entre os instintos e o meio circundante. O ego controla a conscincia e facilita o

    exerccio a censura. Regido pelo princpio de realidade, desenvolve o pensamento lgico e

    realista, e formula planos de ao para satisfazer as necessidades. Qual a relao entre o

    ego e o id? O primeiro a sede da inteligncia e da racionalidade, verificando e controlando

    os impulsos cegos do id. Enquanto o id conhece apenas a realidade subjetiva, o ego

    distingue entre as imagens mentais e as coisas no mundo exterior. Entretanto, o EU no

    SENHOR de sua prpria CASA, pois a estrutura, isto , o que segura a casa o

    inconsciente. Mas, se o, "terra onde ningum pisa", como ele fica? Desprovido da certeza,

    e temeroso daquilo que no sente, mas sabe que uma represa preste a estourar. Assim no

    se pode falar do exerccio de ser senhor de nada.

    O superego (supereu)

    O superego o setor moral, ou a instncia jurdica da personalidade. Constitui o cdigo

    moral de uma pessoa, preocupando-se centralmente com o fato de uma ao ser boa ou m,

    certa ou errada. Representa o ideal, mais do que o real, e luta no pelo prazer, mas pela

    perfeio. Representa os valores e ideais tradicionais da sociedade, da cultura sob a forma

    em que so transmitidos da sociedade pelos pais aos filhos. Funciona no sentido de inibir os

    impulsos do id, de persuadir o ego a substituir os objetivos realistas pelos morais e lutar pela

    perfeio. Assim, o superego, enquanto internalizao dos padres dos pais e da sociedade,

    est relacionado com recompensas e punies psicolgicas. As recompensas so os

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    sentimentos de orgulho e auto-estima; as punies so sentimentos de culpa e de

    inferioridade.

    O delinqente juvenil tem excesso de ID/ISSO? Ele no tem moralidade do

    SUPEREGO/SUPEREU?

    O delinqente juvenil teria tanto SUPEREGO que no suportando tamanha culpa, para

    aliviar-se, cometeria delitos, para assim justificar tanta culpabilidade introjetada?

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    UNIDADE 13 Objetivo: Possibilitar ao aluno a compreenso acerca da contribuio da abordagem da Psicanlise para o campo da Psicopedagogia, por meio da apresentao da viso de Freud acerca da Natureza Humana.

    VISO DA NATUREZA HUMANA

    A viso freudiana a respeito da natureza humana essencialmente

    pessimista, determinista, mecanicista e reducionista. Segundo Freud, o

    homem determinado por foras irracionais, motivaes inconscientes,

    necessidades e pulses biolgicas e instintivas, e por eventos

    psicosexuais que se do durante os primeiros cinco anos de vida.

    Os homens so vistos nos termos de sistemas de energia. Conforme o

    ponto de vista freudiano ortodoxo, a dinmica da personalidade consiste nos modos de

    distribuio da energia psquica entre id, ego e superego. J que a energia limitada, um

    sistema ganha o controle sobre a energia disponvel custa dos outros dois sistemas. O

    comportamento determinado por essa energia psquica.

    Freud dava tambm nfase ao papel dos instintos. Todos os instintos so inatos e biolgicos.

    Freud destacava os instintos sexuais e agressivos. Via todo o comportamento humano como

    determinado pelo desejo de obter prazer e evitar a dor. O homem possui tanto instintos de

    vida quanto instintos de morte; a vida no mais do que uma via indireta para a morte.

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    UNIDADE 14 Objetivo: Possibilitar ao aluno a compreenso acerca da contribuio da abordagem da Psicanlise para o campo da Psicopedagogia, por meio da apresentao da viso de Freud acerca dos estados de Conscincia e de Inconscincia.

    CONSCINCIA E INCONSCINCIA

    Talvez a maior contribuio de Freud sejam os conceitos de

    inconsciente e de nveis de conscincia, que constituem as chaves

    para a compreenso do comportamento e dos problemas da

    personalidade. O inconsciente no pode ser estudado diretamente;

    inferido do comportamento. Entre as evidncias clnicas para postular-se o conceito de

    inconsciente esto as seguintes:

    1) Os sonhos, que so representaes simblicas de necessidades, desejos e conflitos

    inconscientes;

    2) lapsos de lngua e o esquecimento, por exemplo, de um nome familiar. Nesses casos

    a pessoa troca nomes de algum, faz um gesto psicomotor antagnico ao que

    desejava etc., e esses "atos falhos" ou "lapsos" tem significados que a pessoa no

    sabe, e nem sente. E mesmo que se diga a ela o significado, ela resistir, e no ir

    escutar. Por isso dissemos que interpretar assim "psicanlise selvagem", pois a

    interpretao surge ao longo do tratamento psicanaltico, e referendado totalmente

    no estudo minucioso do caso;

    3) a sugesto ps-hipntica;

    4) material derivado por meio de tcnicas de associao livre;

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    5) material derivado pela aplicao de tcnicas projetivas (testes psicolgicos de

    personalidade que obedecem uma "lei": diante de estmulos confusos e ambguos o

    cliente "projeta", "joga