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BIC Jr - Cetebio - Cloud Computing - Cetebio - Modernidades tardias - Aspirina e diabetes - Dengue - Plantas desprotegidas - Plantas do cerrado - Goumi - TV Digital

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3MINAS FAZ CIÊNCIA - SET. A NOV. / 2010

MINAS FAZ CIÊNCIA tem por finalidade divulgar a produção científica e tecnológica do Estado para a sociedade. A reprodução do seu conteúdo é permitida, desde que citada a fonte.

Fundação de Amparo à Pesquisado Estado de Minas Gerais

Pesquisadores da Hemominas estruturam o maior banco de tecidos da América Lati-na onde serão desenvolvidos estudos com seis tipos de tecidos humanos.

Conheça o divertido jogo de computador on-line destinado a crianças e jovens de 6 a 14 anos e que propõe formar pessoas que saibam lidar melhor com o dinheiro no dia a dia.

Projeto desenvolve aplicativos e serviços interativos, promovendo ações de inclu-são digital por meio da interação do te-lespectador com o conteúdo veiculado à televisão

Pesquisadores descobrem que ácaros são capazes de desarmar o sistema de defesa de plantas. Descoberta pode auxiliar com-bate às pragas na agricultra.

Biomas do Cerrado e Mata Atlântica têm seus DNAs investigados para o desenvol-vimento de estratégias de conservação de quatro espécies da flora mineira.

Estudo demonstra como as campanhas de comunicação coletiva podem ser eficientes no combate à doença, quando associadas a tecnologias como a Evidengue.

Há sete anos, a Fapemig, em parceria com o CNPq, concede Bolsas de Iniciação Cientifica Jr. a estudantes do ensino médio de Minas Gerais, com o objetivo de despertar nos jo-vens o interesse pela ciência e incentivar a criatividade em produções científicas.

BIC JR

Cloud computing

Aspirinas e diabetes

Saúde e educação

Plantas do Cerrado

Nova FAPEMIG

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Novo modelo de computação promete transformar a relação das pessoas com a Internet e o computador, facilitando a vida do cidadão.

Estudo desenvolvido no laboratório de genes do ICB/UFMG investiga as múlti-plas ações da aspirina contra doenças, como diabetes tipo 2 e câncer.

Novas assessorias, gerências e departamen-tos renovam a estrutura e aperfeiçoam o trabalho em prol da Ciência, Tecnologia e Ino-vação (CT&I) no Estado de Minas Gerais.

Cetebio

Plantas desprotegidas

Goumi

TV digital

Modernidades tardias

Lembra dessa?

Estudos de inovações estéticas e políticas no Brasil dos anos 40 e 50 buscam com-preender o modo como a vivência da mo-dernidade, em nações periféricas, difere do padrão hegemônico europeu.

Pesquisadores estudam o potencial farmacêu-tico de moléculas encontradas em toxinas de aranhas e escorpiões contra doenças causadas por bactérias e fungos e a hipertensão.

O professor e pesquisador Jairton Dupont é um dos 100 químicos escolhidos pela agência mun-dial de informações Thompson Reuters por ter se destacado mundialmente com maior número de publicações e citações por pesquisa.

A influência das novas tecnologias e técnicas multidisciplinares no desenvol-vimento dos desenhos cartográficos na sociedade contemporânea.

Cartografias urbanas

Cientistas brasileiros

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MINAS FAZ CIÊNCIA - SET. A NOV. / 20104

MINAS FAZ CIÊNCIA - SET. A NOV. / 20104

ExpedienteAo leitor

MINAS FAZ CIÊNCIAAssessora de Comunicação Social e Editora Geral: Ariadne Lima (MG09211/JP)Editor Executivo: Fabrício Marques Assessora Editorial: Vanessa Fagundes Redação: Ariadne Lima, Fabrício Marques, Vanessa Fagundes, Juliana Saragá, Maurício Guilherme Silva Jr., Ana Flávia de Oliveira, Carolina Braga, Kátia Brito (Bolsista de Iniciação Científica).Ilustrações: Beto PaixãoRevisão: Glísia RejaneProjeto gráfico/Editoração: Fazenda Comunicação & MarketingMontagem e impressão: Lastro EditoraTiragem: 20.000 exemplaresFotos: Marcelo Focado/Gláucia RodriguesAgradecimentos - Agradecemos a todos os colaboradores desta publicaçãoRedação - Rua Raul Pompéia, 101 - 12.º andar, São Pedro - CEP 30330-080Belo Horizonte - MG - BrasilTelefone: +55 (31) 3280-2105Fax: +55 (31) 3227-3864E-mail: [email protected]: http://revista.fapemig.br

GOVERNO DO ESTADODE MINAS GERAISGovernador: Antônio Augusto Junho Anastasia

SECRETARIA DE ESTADO DE CIÊNCIA, TECNOLOGIA E ENSINO SUPERIORSecretário: Narcio Rodrigues

Fundação de Amparo à Pesquisado Estado de Minas Gerais

Presidente: Mario Neto BorgesDiretor de Ciência, Tecnologia e Inovação: José Policarpo G. de AbreuDiretor de Planejamento, Gestão e Finanças: Paulo Kleber Duarte PereiraConselho CuradorPresidente: João Francisco de Abreu (PUC/MG) Membros: Afonso Henriques Borges Anna Bárbara de Freitas C. Proietti Evaldo Ferreira Vilela Francisco Sales Dias Horta Giana Marcellini José Cláudio Junqueira Ribeiro (FEAM) José Luiz Resende Pereira (UFJF) Magno Antônio Patto Ramalho (UFLA) Paulo César Gonçalves de Almeida (UNIMONTES) Paulo Sérgio Lacerda Beirão (UFMG) Rodrigo Corrêa de Oliveira (CPqRR)

Capa: Mosquito da Dengue – Aedes aegyptiFoto: Beto PaixãoNº43 set a nov. 2010

Entra ano, sai ano, os noticiários continuam estampando manchetes sobre a dengue no Brasil. Recentemente, a confirmação de casos do tipo quatro da do-ença no país preocupou especialistas, uma vez que a maior parte dos brasilei-ros não possuem imunidade contra essa variação do vírus. Apesar das constantes campanhas de conscientização para o combate à dengue, até a primeira quinzena de fevereiro, Belo Horizonte registrava 148 casos confirmados da doença e 793 aguardavam resultados de exames.

Na luta contra a dengue, a parceria entre conhecimento, educação e novas tec-nologias pode ser uma importante aliada. Ela é a base de um estudo do Centro de Pesquisas René Rachou (Fiocruz Minas), que testa a eficácia de um produto que veda os pratos coletores de água para plantas, evitando o depósito de ovos pelas fêmeas do mosquito transmissor. A equipe de pesquisadores trabalha, ainda, a educação em saúde, envolvendo estudantes no projeto e disseminando a cultura da prevenção.

O potencial de estudantes como disseminadores da ciência é também aprovei-tado no Programa de Bolsas de Iniciação Científica Júnior (BIC Jr.), fruto da parceria entre a FAPEMIG e o Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecno-lógico (CNPq), que oferece bolsas a alunos do ensino médio para a participação em projetos de pesquisa. Nesta edição, a MINAS FAZ CIÊNCIA mostra a evolução do Programa, criado em 2004, que hoje oferece mais de 1.200 bolsas e apresenta resultados positivos, conquistando prêmios nacionais, como o Jovem Cientista, um dos mais importantes da área.

E, por falar em nova geração, o leitor não deve deixar de conferir a reportagem sobre um tema que se tornou parte da vida de crianças, jovens e adultos: a compu-tação nas nuvens, ou cloud computing, modalidade tecnológica que permite o proces-samento de dados e o acesso a documentos particulares por meio da Internet, sem a necessidade de acessá-los do computador pessoal. Este ano, a FAPEMIG vai investir R$ 2 milhões para o desenvolvimento de projetos relacionados a essa tecnologia.

Na área de saúde, a revista também destaca os efeitos benéficos do ácido acetilsalicílico, a famosa aspirina. Além das conhecidas ações analgésica e anti-in-flamatória, a aspirina pode agir sobre determinadas proteínas, promovendo, por exemplo, melhor captação de glicose por células de gordura, o que possivelmente leva à redução de glicose no sangue. A comprovação dessa hipótese pode futu-ramente ajudar portadores da diabetes tipo 2, cujo organismo não é capaz de metabolizar a glicose no sangue.

Outra iniciativa que promete trazer alento à muita gente é a criação do Centro de Tecidos Biológicos (Cetebio), a ser inaugurado em 2013, que será o maior da América Latina e o primeiro do país na área por agregar várias especialidades em um só ambiente. A unidade funcionará em Lagoa Santa (MG) e reunirá pesquisas com seis tipos de tecidos humanos, entre eles pele, sangues raros, medula óssea e válvulas cardíacas. Isso significa oferecer novas perspectivas a pacientes portadores de leucemias, queimaduras de terceiro grau, entre outras doenças graves.

São boas notícias que afetam a sociedade nos seus mais variados campos e re-forçam a ideia de que o Brasil desenvolve boas pesquisas, com potencial para trazer resultados de grande impacto econômico e social. Além delas, a revista apresenta outras importantes ações nas áreas de geografia, história, biologia e química. São as muitas faces da ciência que convidamos você, leitor, a desvendar. Uma ótima leitura!

Ariadne LimaEditora Geral

Fabrício MarquesEditor Executivo

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5MINAS FAZ CIÊNCIA - SET. A NOV. / 2010

Cartas

Para receber gratuitamente a revista MINAS FAZ CIÊNCIA, preencha o cadastro no site http://revista.fapemig.br ou envie seus dados (nome, profis-são, instituição/empresa, endereço completo, telefone, fax e e-mail) para o e-mail: [email protected] ou para o seguinte endereço: FAPEMIG /

Revista MINAS FAZ CIÊNCIA - Rua Raul Pompéia, 101 - 12.º andar - Bairro São Pedro - Belo Horizonte/MG - Brasil - CEP 30330-080

Publicação trimestral da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de Minas Gerais - FAPEMIGnº 42 - jun. a ago. 2010

MINAS FAZ CIÊNCIA informa que as car-tas enviadas à Redação podem ou não ser publicadas e, ainda, que se reserva o direito de editá-las, buscando não alterar o teor e preservar a ideia geral do texto.

“Sou estudante do 5° período do curso de Biologia do Centro Uni-versitário do Triângulo (Unitri). Estou estudando sobre Bioética do Projeto Genoma. Fiz uma pesquisa sobre o tema em edições interiores e encontrei os seguintes números: Revista N°21 Dez/2004 a Maio/2005 e Revista N°15 Jun a Ago/2003.”

Simone Maria MarçalEstudante

Centro Universitário do Triângulo/ MG

“Gostaria de pedir o envio de edi-ções antigas da revista, além dos exem-plares atuais. Tenho muito interesse no conteúdo da revista, principalmente porque faço graduação no curso de Ci-ências Biológicas da Universidade Fede-ral de São João del-Rei (UFSJ). Sei que as revistas serão muito úteis na minha formação universitária e pessoal.”

Rafaela Guimarães SilvaEstudante

Univers. Federal de São João Del Rei/ MG

“Olá, pessoal da revista MINAS FAZ CIÊNCIA. Gostaria de receber essa con-ceituada revista no que se refere à produ-ção científica. Meu nome é Lilian Maria Barbosa Ferrari, sou estudante do curso de Ciência e Tecnologia de Laticínios na Universidade Federal de Viçosa (UFV). Desde já, agradeço a atenção e espero ser contemplada com essa maravilhosa publicação. Abraços.”

Lilian FerrariEstudante

Universidade Federal de Viçosa/ MG

“Olá, já recebi muitas indicações da revista MINAS FAZ CIÊNCIA. Gostaria, portanto, da oportunidade de adquiri-la. Sou aluno de Química do Centro Fede-ral de Educação Tecnológica (Cefet-MG). Logo, necessito de materiais informativos de tecnologia para me atualizar.”

Fabrício Carlos Aquino Estudante

Centro Federal de Educação Tecnológica (Cefet)/ MG

“Somos uma instituição chamada Casa Brasil/Obra kolping, patrocinada por órgãos Ministeriais. Nosso projeto visa ao exercício da cidadania, inclusão digital e cultural. Es-tamos em fase de implantação. O recebi-mento da revista nos seria de grande valia.”

Rosangela Silva Monitora Sala de Leitura

Belo Horizonte / MG

“Minha empresa desenvolve e faz captação de recursos para projetos cul-turais, comunitários, educativos e de meio ambiente. Gostaria de receber a Revista Minas Faz Ciência (inclusive as anterio-res, se possível for). Desenvolvo minhas atividades na cidade de São Paulo, mas a empresa está localizada na cidade de Cambuí (MG).”

Sebastião RoqueSão Paulo/ SP

“Sou Engenheiro Agrônomo aposen-tado, formado pela ESALQ-Piracicaba em 1964. Resido na cidade de Piracicaba e, por isso, ainda tenho o privilégio de fre-quentar a biblioteca da ESALQ. Tenho tido contato e o prazer de ler a revista, apesar de números passados. Fiquei muito feliz ao ver que a MINAS FAZ CIÊNCIA tem distribuição gratuita.”

José A. Guiololin Piracicaba/SP

“Olá, meu nome é Kleyton Torres Paulino. Escrevo porque fiquei sabendo, por meu professor de química, sobre a revista MINAS FAZ CIÊNCIA, que sua distribuição é gratuita e é de suma importância para o nosso aprendiza-do. Gostaria de parabenizar a iniciativa de distribuir gratuitamente informa-ções de qualidade, pois sabemos que, quanto mais pessoas bem-informadas, instruídas e satisfeitas com as oportu-nidades e ferramentas oferecidas ao seu conhecimento, maior o desenvolvi-mento, a produção, a independência e a riqueza de um país.”

Kleyton Torres Paulino Montes Claros/MG

“Recebi um e-mail do Instituto Na-cional de Colonização e Reforma Agrá-ria (Incra) falando a respeito das repor-tagens de qualidade da Revista MINAS FAZ CIÊNCIA e sobre a gratuidade das edições trimestrais. Solicito a assinatura da revista. Bom trabalho a todos!”

Alcenir Marcelino RodriguesExtensionista Bem Estar Social II

Emater / MG

“Conheci a revista editada por essa instituição e gostei muito da qualidade do trabalho realizado. Sou professor de Ciências do Colégio Santo Agostinho (Contagem) e professor de Genéti-ca do Instituto Superior de Educação Anísio Teixeira, na Fundação Helena Antipoff (Ibirité). Solicito a assinatura da revista.”

Moacir Alves MoreiraContagem/ MG

“Recebemos esporadicamente a revista MINAS FAZ CIÊNCIA. Como a coleção está com falhas, manifesto o interesse da Biblioteca da Embrapa Uva e Vinho em receber gratuitamente os exemplares da revista. Temos inte-resse também em receber a edição de número 29 (mar. a maio de 2007), que apresenta uma matéria sobre viti-vinicultura em Minas Gerais.”

Kátia Midori HiwatashiEmbrapa/MG

RESPOSTA: Caros leitores, as edições mais antigas da revista MINAS FAZ CIÊNCIA estão esgotadas. Enviaremos com prazer as edições mais recentes. Boa leitura!

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Bastaram garrafas pet, tinta preta, papelão, papel alumínio e criatividade para Júlia Soares, hoje com 21 anos, desenvolver um projeto de pesquisa vitorioso. Há cinco anos, quando era aluna do Centro Federal de Educa-ção Tecnológica (Cefet) de Belo Ho-rizonte, colocou água contaminada por bactérias do grupo Escherichia coli, (responsável por causar intoxicações alimentares e diarreias) no sol. As garrafas ficavam de quatro a seis ho-ras em exposição. O aquecimento dos recipientes era potencializado com o papelão e o papel alumínio. A água che-gou a atingir a temperatura de 50ºC, suficiente para que as bactérias mor-ressem. Com esse trabalho, desenvol-vido entre 2007 e 2008, a estudante venceu, na categoria ensino médio, o Prêmio Jovem Cientista, um dos mais importantes do país no incentivo à ci-ência. “Ganhar foi uma surpresa muito boa. Nunca havia imaginado”, recorda. O estudo apontou que a água não é potável, mas serve para tarefas domés-ticas, como lavar vasilhas ou tomar ba-nho. Também mostrou uma forma sim-ples e barata de tratar a água, evitando graves doenças em regiões com sérios problemas sociais e econômicos.

Apesar de ter ficado próxima da área biológica enquanto desenvolveu a pesquisa, Júlia escolheu outro caminho. Ela cursa o quinto período de Psicolo-gia, na Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG). O envolvimento com a ciência ainda na escola seguiu na uni-versidade. “Escolher o curso foi difícil como é para qualquer adolescente, ainda mais depois do prêmio. Mas eu continuo na área acadêmica”, conta. Há dois anos, atua como bolsista do mesmo programa, na versão criada

para estudantes universitários e parti-cipa de um grupo de pesquisa sobre o Desenvolvimento Humano.

Assim como Júlia, milhares de ado-lescentes já passaram pelo BIC Júnior em todo o Estado de Minas Gerais. O Programa de Bolsas de Iniciação Cien-tífica para estudantes do ensino médio surgiu há sete anos. Quando começou, em 2004, foram concedidas 280 bolsas pelo Conselho Nacional de Desen-volvimento Científico e Tecnológico (CNPq) que firmou um convênio com a FAPEMIG, administradora da cota de bolsas. Mas o projeto deu tão certo, que ano após ano, a oferta aumentava e, a partir de 2006, a Fundação também começou a distribuir o benefício. Em 2010, foram concedidas 1.273 bolsas. Dessas, 450 são do CNPq e as demais da Fundação. Para o presidente da FA-PEMIG, Mario Neto Borges, o progra-ma tem uma característica que o torna especial. “O BIC Júnior desperta talen-tos e os interesses da garotada por ci-ência e tecnologia”, destaca.

Atualmente, 42 instituições de en-sino superior e institutos de pesquisa de todo o Estado recebem bolsistas do BIC Júnior. “Só para citarmos al-guns exemplos, estamos presentes na Univale, em Governador Valadares (no Vale do Rio Doce), no Triângulo Mi-neiro, nos Institutos Federais de Edu-cação, Ciência e Tecnologia (Ifets) do Sul de Minas e de Januária, na região Norte”, enumera Mario Neto.

Ele lembra da relevância social e econômica ao se recordar com cari-nho de uma jovem que conheceu em Janaúba, ex-participante do programa. “Ela disse, emocionada, que o BIC Júnior foi o melhor emprego da vida dela”, recorda.

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“Este projeto é da mais alta

relevância porque desperta

o interesse dos alunos do ensino médio – a esperança

do Brasil – pela ciência.”

Mario Neto Borgespresidente da FAPEMIG

“Eles têm a chance de

aprender sobre os grandes cientistas brasileiros, como Oswaldo Cruz,

Carlos Chagas e o próprio Ezequiel

Dias.”

Maria Amélia Rossicoord. BIC Jr Funed (BH)

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Ajuda financeiraO programa não mudou apenas a

vida dessa moça. A oportunidade trans-formou a história de vários jovens e seus familiares. Cada aluno recebe uma bolsa de R$ 100 mensais para partici-parem das pesquisas. Na Fundação Eze-quiel Dias (Funed), por exemplo, eles cumprem uma carga horária semanal de oito horas, divididas em dois dias e o dinheiro ajuda nas despesas dos estu-dantes e dos familiares.

Segundo estudo realizado ano passado por Matheus Barbosa Ama-ral, um dos bolsistas do programa na Funed, em Belo Horizonte, juntamen-te com o orientador, Fábio de Sou-za Luiz, mostrou que, para 10% dos jovens, o Programa contribui com o orçamento doméstico. A pesquisa revelou ainda que 76% dos bolsistas têm renda familiar entre um e três sa-lários mínimos. As famílias são com-postas por três integrantes, em mé-dia, com uma renda per capta de 0,86 salário mínimo, cerca de R$ 440 por pessoa. Outro aspecto apontado pelo estudo é que 52% dos entrevistados responderam que usam a verba com vestuário e 14% com poupança.

Por meio desse trabalho, Matheus viu de perto a realidade dos colegas

participantes do BIC Júnior e notou que era bem parecida com a dele. O bolsista realizou um estudo com as duas escolas integrantes do programa na Funed e constatou a importância desse projeto para a vida dos alunos. “Eles disseram que passaram a se de-dicar mais aos estudos e ficaram mais responsáveis”, esclarece.

Matheus já terminou o ensino médio e atualmente trabalha no se-tor financeiro de uma clínica médica enquanto faz planos para entrar na faculdade de Administração, curso que escolheu durante o tempo em que atuou no programa. Ao longo do trabalho, o estudante se deparou com casos interessantes. “Um colega meu tinha ódio de Química, entrou no programa e mudou de ideia. Disse que quer fazer o curso de técnico em Química”, exemplifica.

O professor Fábio Luiz, que orien-tou o trabalho de Matheus, confirma os resultados encontrados pelo aluno. “Muitos não sabem o que vão fazer quando concluírem os estudos. E essa

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“Um colega meu tinha ódio de

química, entrou no programa e mudou de ideia. Disse que

quer fazer o curso de técnico em química.”

Matheus Barbosa Amaralex-bolsista Funed

Grupo de bolsistas BIC Júnior da Fundação Ezequiel Dias, em Belo Horizonte

Foto: Marcelo Focado

Foto: Marcelo Focado

Matheus Barbosa e Fábio Luiz pesquisaram como os jovens empregam o dinheiro das bolsas

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9MINAS FAZ CIÊNCIA - SET. A NOV. / 2010

oportunidade é um diferencial porque traz responsabilidade para eles, além de ser a primeira experiência com o ambiente de trabalho”, afirma.

A coordenadora do BIC Júnior na Fundação Ezequiel Dias, Maria Amélia Rossi, reitera o que o estudante verifi-cou durante a pesquisa. “Nós seguimos a linha da pedagogia construtivista, por isso os adolescentes desenvolvem os trabalhos nas áreas em que têm mais habilidade”, explica. O programa co-meçou a ser aplicado na Funed a partir de 2004 e o retorno, de acordo com a coordenadora, é grande. “Vários me-ninos e meninas que participaram do BIC Júnior voltam depois como estagi-ários e fazem o curso superior naque-la área”, comenta.

O estudo também apontou que os alunos tornam-se mais respeitados dentro de casa. “O olhar da família so-bre eles muda porque são considera-dos mais responsáveis”, diz Luiz.

A coordenadora lembra ainda que os estudantes são acompanhados e avaliados constantemente. O trabalho vai além da pesquisa. Todo mês são re-alizados encontros em que acontecem palestras sobre vários assuntos, como nutrição e oratória, por exemplo. Ma-ria Amélia acrescenta que os bolsistas conhecem o funcionamento da Funda-ção e não apenas da área em que estão inseridos. “Eles também têm a chance de aprender sobre os grandes cientis-tas brasileiros, como Oswaldo Cruz, Carlos Chagas e o próprio Ezequiel Dias”, esclarece.

Na Funed, participam do progra-ma estudantes de duas escolas públi-cas da área onde funciona a Fundação, na região Oeste de Belo Horizonte. Todo ano é feito um levantamento com as escolas, por meio de palestras e encontros, para filtrar os interesses dos alunos e adequar os projetos. “Para participar do BIC Júnior, além do interesse pela área científica, os alunos precisam apresentar um bom desempenho escolar”, complementa Maria Amélia Rossi.

Ampliando os horizontesNo Sul de Minas, o programa tam-

bém dá bons resultados na Universida-

de Federal de Lavras (Ufla). De acordo com a coordenadora Carolina Faria Alvarenga, desde a implantação do BIC Júnior há sete anos, 270 alunos já foram beneficiados. As bolsas foram aumentan-do gradualmente. “Começamos com 20, passamos para 40, 80, 110 e há dois anos estamos com 150 bolsistas”, explica.

Os estudantes estão distribuídos em projetos de todos os departamentos da universidade. Desde as ciências agrá-rias, área mais tradicional da Ufla, como nos cursos de Veterinária e Zootecnia, até em outros criados recentemente, como Ciência dos Alimentos, Química, Educação Física, os de Educação e Ci-ências Humanas. E 32% dos bolsistas do programa em 2010, este ano, voltaram à universidade na condição de alunos. “Dos 50 que estavam com a gente no ano passado, 16 foram aprovados no vestibular e continuam conosco”, co-memora. Quando eles passam no ves-tibular na primeira tentativa, já recebem automaticamente a bolsa do Bic Insti-tucional, voltada para os universitários.

Carolina destaca que o programa tem uma função social. “Antes, muitos não tinham perspectiva de fazer um curso superior, e isso mudou depois que ingressaram no BIC Júnior”, res-

salta. Ela acrescenta ainda que vários se esforçam para se saírem bem na escola e conseguirem uma chance no projeto.

Sempre que pode, a universidade realiza trabalhos de aproximação com os moradores por meio da realização de eventos, como palestras e exposi-ções para divulgar o que está sendo produzido. Todo ano, os estudantes participam do Congresso de Iniciação Científica da Ufla, o Ciufla. Em 2009, 40 alunos participaram do Seminário de Iniciação Científica Júnior “Provoc Ino-vação”, da UFMG, em Belo Horizon-

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“Quis participar do BiC Júnior porque sempre sonhei em

fazer faculdade e esta era uma oportunidade de estar em contato

com o meio acadêmico.”

Sarah Andradeex-bolsista BIC Jr e bolsista PIBIC

(Ufla)

Foto: Marcelo Focado

Maria Amélia Rossi coordena o Programa na Fundação Ezequiel Dias

É uma linha pedagógica que incentiva o aluno a ser mais independente. O estudante

não recebe as respostas prontas, deve procurar cons-truir o conhecimento, além de ser estimulado a encon-trar os próprios erros nos exercícios e aprender que

eles fazem parte do processo de aprendizado.

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fazíamos o Diagnóstico e Controle de Doenças em Sistemas de Produ-ção de Bovinos de Leite da Região de Lavras”, comenta.

Para ela, a oportunidade a fez esco-lher a profissão que queria seguir. Ago-ra, está no terceiro período e já desen-volve outro projeto como bolsista do BIC Institucional. “Recomendaria aos jovens que querem fazer parte do pro-grama, ou que já fazem, que aproveitem essa oportunidade, porque o mundo da universidade pode nos parecer distante e difícil, mas não é. Por desconhecimen-to, algumas pessoas preferem trabalhar a estudar”, aconselha.

te. “Para muitos é a oportunidade de conhecer outras pessoas e cidades. O BIC extrapola o universo do conheci-mento científico e amplia os horizon-tes desses jovens”, diz.

A estudante do segundo ano do ensino médio Lethícia Barbosa de Pau-la, que participa do programa desde o ano passado, desenvolve projetos na área biológica. No momento, está tra-balhando no desenvolvimento de um tipo de tomate pequeno, próprio para plantação em hortas. Ela aponta diver-sas vantagens no BIC Júnior que vão desde a aceitação da família até lições que ajudam a decidir qual carreira se-guir e no amadurecimento pessoal.

A adolescente, de 16 anos, pretende estudar Direito, mas mesmo assim, está feliz com o trabalho nessa área. Para ela, participando de um projeto como esse, as chances de fazer a escolha pro-fissional correta aumentam porque se conhece a área na prática, facilitando a decisão. “A minha vida mudou mui-to depois que entrei para o programa porque fiz contatos com pessoas que já estão no mercado. É uma experiência que não se vive na escola”, explica.

O benefício de R$ 100 ajuda Lethí-cia tanto em algumas despesas como, por exemplo, o xerox de algum mate-rial didático, transporte e até para o lazer. Realidade bem parecida com a verificada no estudo sobre o perfil dos estudantes participantes do programa, realizado por um bolsista na Funed, na capital. E ela fica feliz com o reconheci-mento que vem da família. “Eles acham maravilhoso porque é, ao mesmo tem-

Ana Flávia de Oliveira

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“Antes, muitos não tinham a perspectiva de fazer um curso superior, e o programa incentiva isso, além de extrapolar

o conhecimento científico.”

Carolina Faria Alvarengacood. BIC Jr Ufla

“Com o BiC Jr, eu já tive a oportunidade de conhecer pessoas de

vários lugares, inclusive de outros países, e isso

é bom porque nos deixa mais seguros.”

Lethícia Barbosa de Paulabolsista BIC Jr (Ufla)

po, uma oportunidade de aprender e ensinar”, explica.

A estudante ainda terá mais um ano de participação no projeto, mas já sabe que quando terminar, vai sen-tir falta. “O contato com as pessoas é bem agradável porque aprendi a convi-ver e aceitar as diferenças”, diz.

Outra aluna que viveu a experiên-cia de participar do programa foi Sa-rah Andrade, de 19 anos. Ela entrou aos 16, quando estava no segundo

ano do ensino médio e desenvolveu um projeto com pesquisadores do curso de Medicina Veterinária. “Nós

“Essa oportunidade é um diferencial porque traz responsabilidade para eles, além de ser a primeira experiência

com o ambiente de trabalho.”

Fábio de Souza Luizorientador BIC Jr Funed (BH)

A coordenadora do Programa na Ufla, Carolina Faria Alvarenga, e a vice-coordenadora, Patricia Vasconcelos Almeida

A bolsista Lethícia Barbosa de Paula e Sarah Conceição Andrade, ex-bolsista e aluna do 3º período de Medicina Veterinária

Foto: Rocelle de Barros Naves

Foto: Rocelle de Barros Naves

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11MINAS FAZ CIÊNCIA - SET. A NOV. / 2010

Saiba mais sobre essa modalidade de bolsa

BIC InstitucionalOs incentivos à carreira científica não se restrin-

gem ao ensino médio, seguem no ensino superior. Para isso, existe o Programa de Iniciação Científica, o BIC Institucional, voltado para universitários. O projeto, criado pelo CNPq, tem a FAPEMIG como parceira com os seguintes objetivos:

• Despertar vocação científica e incentivar novos talentos potenciais entre estudantes de graduação.

• Contribuir para reduzir o tempo médio de titula-ção de mestres e doutores.

• Propiciar à instituição um instrumento de formu-lação de política de iniciação à pesquisa para alunos de graduação.

• Estimular uma maior articulação entre a gradua-ção e pós-graduação.

• Contribuir para a formação de recursos humanos para a pesquisa.

• Contribuir de forma decisiva para reduzir o tempo médio de permanência dos alunos na pós-graduação.

• Estimular pesquisadores produtivos a envolverem alunos de graduação nas atividades científica, tecnoló-gica e artística-cultural.

• Proporcionar ao bolsista, orientado por pesquisa-dor qualificado, a aprendizagem de técnicas e métodos de pesquisa, bem como estimular o desenvolvimento do pensar cientificamente e da criatividade, decorren-

tes das condições criadas pelo confronto direto com os problemas de pesquisa.

Fonte: CNPq

Como participar do BIC JrO programa existe em todo o país e funciona

sempre em parceria com as Fundações de Amparo à Pesquisa ou secretarias estaduais. As universidades e institutos de pesquisa fazem uma aproximação com al-gumas escolas para divulgar o programa e convidar os alunos a participarem. Para se candidatar, o estudante deve ficar atento aos prazos de inscrição ao projeto na instituição de ensino superior da sua cidade. Mas o aluno deve preencher alguns pré-requisitos:

• Estar regularmente matriculado no ensino funda-mental, médio ou profissional de escolas públicas. No caso de Minas, escolas públicas estaduais.

• Estar desvinculado do mercado de trabalho.• Possuir frequência igual ou superior a 80%.• Apresentar histórico escolar.• Executar o plano de atividades com dedicação

mínima de oito horas semanais.• Elaborar relatório de suas atividades semestral-

mente e ao final de sua participação.• Apresentar os resultados parciais e finais da ativi-

dade, sob a forma de painel ou exposição oral, acom-panhados de relatório, nos encontros de iniciação científica e tecnológica promovidos pela instituição.

Evolução BIC JúniorDesde a implantação do programa, em 2004, o BIC Júnior cresceu ano a ano,

tanto na distribuição de bolsas, quanto no valor investido.

Ano Bolsas Investimento

2004 280 R$ 232.240

2005* 332 R$ 322.800

2006** 534 R$ 580.499

2007 643 R$ 771.600

2008 819 R$ 982.800

2009 1.133 R$ 1.359.600

2010 1.273 R$ 1.527.600

Fonte: FAPEMIG*As bolsas sofreram reajuste e passaram de R$ 80,00 para R$ 100,00.**A partir de 2006, a FAPEMIG também começou a distribuir bolsas.

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Vida digital

Mundo

dasnuvens

Conheça o cloud computing, modelo de computação que promete facilitar a vida do cidadão comum e ampliar ainda mais os serviços de informática

MINAS FAZ CIÊNCIA - SET. A NOV. / 201012

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13MINAS FAZ CIÊNCIA - SET. A NOV. / 2010

Acessar a planilha de custos, es-tando longe do seu computador. Ouvir a música predileta, sem passar perto do próprio notebook e – de-talhe - também bem distante de uma mídia física, tipo CD ou DVD. Editar uma foto sem programas específicos, como Photoshop, por exemplo. En-contrar e modificar os arquivos mais importantes da sua vida digital, inde-pendente de onde esteja ou mesmo de qual dispositivo utiliza. Coisa dos Jetsons? Quase. Se o herói futurista dos anos 60 do século passado es-tacionava o carro no espaço, ainda não chegamos lá, mas músicas, ima-gens, textos, planilhas e muito mais já encontram conforto nas alturas. É a chamada computação nas nuvens (em inglês cloud computing), modelo que adere à missão universal de trazer mais praticidade às nossas vidas.

A menina dos olhos do proces-samento de dados moderno, o cloud computing, pode ser resumido como a computação simples e acessível. “Quando um usuário hoje acessa o e-mail no Gmail, não precisa de nada instalado, só do browser (ver glossário) para navegar. Quando ele entra em um software de planilha on-line, também não. Simplesmente utiliza”, explica Da-niel Viveiros, gerente de produto cloud computing da Ci&T, empresa de tecno-logia com sede em Campinas, Estado de São Paulo.

Com o objetivo de incentivar a pesquisa na área, a FAPEMIG e a Ci&T desenvolveram em parceria o edital de apoio a projetos de tecnologia da informação e comunicação com foco nessa área. Serão investidos R$ 2 mi-lhões em projetos que busquem pro-moção do conhecimento profissional sobre as plataformas do cloud compu-ting e também em estudos sobre o de-senvolvimento de frameworks e arqui-tetura de referência para plataformas nessa tecnologia. “As universidades de Minas Gerais são ricas em recursos humanos. Queremos saber como va-mos convergir o conceito e o que está

sendo produzido, como será possível, através da pesquisa, montar uma pro-posta de valor para o mercado e ofe-recer uma computação diferenciada”, espera o representante da Ci&T.

Segundo Viveiros, a busca de defi-nições para a computação nas nuvens ainda causa confusão na comunidade especializada. “A internet é a base e, se ela é nova, cloud computing é um termo mais novo ainda”. De fato, são inúme-ros vídeos em plataformas, como You Tube ou Vimeo, que trazem profissio-nais em tentativas de definir o que já é cotidiano. “Cloud computing já está na nossa vida faz um tempo, desde o sur-gimento de algumas aplicações como o Gmail”, comenta.

O serviço de e-mail do Google existe desde 2004 e pode ser encara-do como um divisor de águas na po-pularização do cloud computing para o cidadão comum, pois representou o fim do limite nas caixas de correio eletrônico e o início da cultura de usar a Internet não só para a troca de mensagens, mas também para o arma-zenamento de arquivos pessoais. “Ao invés de salvar no seu computador, no seu pen drive, você tem todos os seus arquivos na nuvem. Então, se sair do seu computador, ou puxar pelo celular, você vai conseguir ter aces-so àqueles documentos, ler, escrever, tudo isso de maneira integrada”, ex-plica. E a tendência é que essa pratici-dade se consolide também em outros dispositivos, como celulares e tablets, todos com acesso à Internet. “Se você pensar em música, por exemplo, hoje, há os CDs. Quando todas es-sas músicas estiverem na nuvem, você consegue tê-las com você. E prova-velmente, em pouco tempo, todos os dispositivos vão conseguir ler essas músicas direto da nuvem para tocar no seu celular”, acrescenta.

Além da praticidade, outra parti-cularidade dessa tecnologia é o custo para o consumidor final, bastante re-duzido. Isso porque, ao invés de pagar um valor para adquirir determinado

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programa como, por exemplo, um Pho-toshop, para editar fotos nas nuvens o usuário não precisa comprar o pro-grama, basta utilizá-lo pela Internet e, caso queira acesso a uma versão ampliada do aplicativo, paga propor-cionalmente ao uso. Trata-se, portanto, de uma reconfiguração do modelo co-mercial vigente e que chama a atenção do mercado. Para Daniel Viveiros, o mundo corporativo ainda tem muito o que lucrar com o cloud computing. “As empresas param de ter os seus próprios datacenters. Deixam de ter máquinas, servidores fixos, começam a usar isso como serviço”, defende.

Desenvolvimento tecnológico

Do ponto de vista de desenvolvi-mento, o cloud computing também é sim-ples. Não é uma nova linguagem de pro-

gramação. A base tecnológica é a mesma da Internet, o que muda é que os pro-fissionais desenvolvem softwares, aplica-tivos para serem implantados em uma máquina que está nas nuvens, acessível a todos que navegam pela rede. Por isso, mesmo sem ter o CD, todas as músicas de Caetano Veloso, por exemplo, podem ser ouvidas, por streaming pela Internet, por exemplo. Como as plataformas já estão padronizadas, uma questão chave para a comunidade de implementadores é a forma de utilizá-las.

Tecnicamente, a computação em nuvens se divide em cinco tipos, re-conhecidos pelas seguintes siglas: IaaS, PaaS, DaaS, SaaS e CaaS. A utilização de porcentagens em servidores nas nuvens é a chamada infraestrututra como serviço (IaaS). Tem ainda a pla-taforma como serviço (PaaS), que é o uso de uma plataforma como um

banco de dados, as ferramentas de de-senvolvimento (DaaS), a comunicação como serviço (CaaS) e, o tipo mais popular, os softwares usados como serviço (SaaS), que podem ser exem-plificados pelo Google Docs ou o Micro-soft Sharepoint Online.

“Eu acho que a oferta de serviços nesta plataforma vai amadurecer bas-tante nos próximos anos e os imple-mentadores vão poder fazer aplicações com mais agilidade, numa plataforma mais robusta, com muito mais produ-titividade”, aposta Daniel Viveiros. Mas, para chegar a esse ponto, o Brasil ainda precisa ultrapassar certas barreiras. A qualidade da banda larga oferecida no país é incomparável com a oferta ame-ricana ou coreana. “A rede 3G ainda é limitada, mas não acredito que a evo-lução tecnológica não contorne este problema”, acredita.

O que é Cloud Computing?

Servidores compartilhados que usam as capacida-des de memória e armazenamento da Internet, ou seja, das nuvens, para oferecer acesso remoto a dados de qualquer lugar do mundo, a qualquer hora, sem a neces-sidade de se instalar programas.

Serviço nas nuvens

Gmail – A alta capacidade de armazenamento do serviço de e-mail oferecido pelo Google marca o início da popularização da computa-ção nas nuvens. Além da troca de mensagens, a

caixa de correio é usada para guardar arquivos diversos, que podem ser acessados a partir de qualquer compu-tador. Mail.google.com

Google Docs – Também com a assinatura Google Inc., é um pacote de aplicativos que contém um processador de texto, um editor de apresentações, um editor de planilhas e um

editor de formulários. Os arquivos podem ser editados por mais de um usuário, todos em rede. Docs.google.com

Dropbox - Serviço para armazenamento de arquivos. A empresa desenvolvedora do pro-grama disponibiliza enormes e poderosas cen-trais de computadores que conseguem arma-

zenar os arquivos de seus clientes ao redor do mundo.

Uma vez que os arquivos sejam devidamente copiados para os servidores da empresa, passarão a ficar acessí-veis a partir de qualquer lugar que tenha acesso à Inter-net. www.dropbox.com

Grooveshark – Site de compartilhamento de músicas on-line. O usuário pode buscar o que quer ouvir pelo nome da faixa, artista ou álbum e as músicas são executadas por strea-

ming. O Grooveshark não permite que o usuário baixe os arquivos para seu computador, mas é possível criar playlists e compartilhá-los por e-mail em sites de re-lacionamento, como Facebook, Twitter e StumbleUpon. (listen.grooveshark.com)

Picnik – Permite edição de imagens sem a necessidade de software específico, como Pho-toshop ou similares. (www.picnik.com)

GLOSSÁRIOBroswer – programa utilizado para navegação na In-

ternet. Ex: Internet Explorer, Mozilla Firefox, Google Chrome.Frameworks - é um conjunto de códigos comuns uti-

lizados em uma linguagem de programação específica para auxiliar o desenvolvimento de software.

Datacenter - local onde são concentrados os equi-pamentos de processamento e armazenamento de da-dos de uma empresa ou organização.

Streaming – traduzido como fluxo de mídia, é uma forma de distribuir informação multimídia numa rede através de pacotes de dados.

Carolina Braga

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Saúde

Anti-tudo!Pesquisas desenvolvidas no Laboratório de Genes Inflamatórios do ICB/UFMG investigam múltiplos efeitos da aspirina e outros fármacos

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Durante a Antiguidade, do Egito à Grécia de Hipócrates, especialistas cos-tumavam produzir infusões, a partir da casca do salgueiro, para tratamento de febres e dores no corpo. Com o passar do tempo, a tradição se dissemina no pla-neta, a ponto de, já no século XVIII, o re-verendo inglês Edmund Stone, da Univer-sidade de Oxford, dedicar-se, justamente, à compreensão dos efeitos benéficos da

Foto

: Mar

celo

Foc

ado

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substância. Seus estudos culminariam com a descoberta do ácido salicílico, ingrediente ativo diretamente respon-sável pelas propriedades analgésicas e anti-inflamatórias daqueles famosos chás oferecidos aos enfermos.

O curioso clérigo inglês jamais poderia imaginar, contudo, a relevân-cia de seu achado, cujo desenrolar na ciência revela-se ainda hoje motivo de esperança para milhões e milhões de pacientes, vítimas de diversas en-fermidades, das diabetes ao câncer. Tudo isso porque, ao final do século XIX, sob o comando do químico Carl Duisberg, funcionários da empresa alemã Bayer encontram um modo de sintetizar o ácido salicílico, ao con-jugá-lo a um acetato. Nasce, então, o ácido acetilsalicílico que, em 1899, fruto das iniciativas de Felix Hoffman, será transformado no primeiro múlti-plo comprimido de que se tem notí-cia no mundo: a aspirina.

Neste jovem século XXI, dados indicam que, só nos Estados Unidos, são produzidas cerca de 80 milhões de unidades do medicamento por dia. Mais do que surpreender, os superla-tivos números da produção em série reafirmam – como já bem percebiam os sábios da antiguidade – a eficácia da substância, capaz de amenizar de dores e febres a reumatismos e artri-tes. Trata-se, além disso, do compri-mido há muito descrito na literatura especializada, por exemplo, em fun-ção de seus efeitos hipoglicêmicos, ao diminuir os níveis de glicose no sangue. “Hoje, sabemos que a aspirina realmente possui mil e uma utilida-des”, resume o pesquisador Aristó-bolo Mendes da Silva, professor do Departamento de Morfologia do Ins-tituto de Ciências Biológicas (ICB) da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), onde também coordena o Laboratório de Genes Inflamatórios.

Pois, bote utilidades nisso! Estudos desenvolvidos ou orientados pelo pró-prio professor Aristóbolo Mendes de-monstram que a aspirina – assim como outros medicamentos do gênero, os chamados salicilatos – detém a capaci-dade de atuar sobre uma série de pro-teínas celulares, de modo a ativá-las ou

desativá-las. Investigar tais mecanismos significa ter a oportunidade de compre-ender os porquês de diversos efeitos benéficos dos salicilatos – das ações anti-inflamatórias e analgésicas às refe-ridas propriedades antidiabetogênicas – e, futuramente, render subsídios ao tratamento de muitas doenças.

Do diabetes ao câncerA tentativa de compreensão das

formas de ação dos fármacos salicila-tos no organismo humano remonta, na verdade, às experiências do far-macêutico britânico John Robert Vane, prêmio Nobel, que, em 1971, torna-se o primeiro homem a descre-ver o mecanismo de ação anti-infla-matória da aspirina. Das experiências de Vane aos estudos mais recentes, a descoberta de vários mecanismos de atuação da aspirina e outros salicila-tos sobre os componentes celulares revela a multiplicidade de tais fárma-cos. Em 2007, como fruto de trabalho conduzido paralelamente ao de seu pós-doutorado na The Cleveland Cli-nic Foundation, nos Estados Unidos, o professor Aristóbolo Mendes pu-blicou estudo em que, pela primeira vez na literatura, é relevada a influ-ência da aspirina na ativação de ou-

O pesquisador é responsável por des-cobrir que, após administrado no paciente e absorvido pelas células, o medicamento liga-se à enzima Ciclo-oxigenase (COX), para, em seguida, ser metabolizado, trans-formando-se em ácido salicílico. “Vane des-cobre que a aspirina é responsável por agir sobre a Ciclo-oxigenase, tornando-a inativa. Ao fazer isso, tem-se início o processo anti--inflamatório”, explica Aristóbolo.

O coordenador do projeto, Aristóbolo Mendes da Silva, do ICB/UFMG

Fotos: Marcelo Focado

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Medicamento simples, barato, de fácil acesso e com múltiplas funções, a aspirina foi patenteada e produzida em série, pela primeira vez, por ação da Bayer, empresa farmacêutica fundada em Barmen (Alemanha), em 1863, por Friedrich Bayer e Johann Weskott. As origens do nome daquele que viria a se tornar um dos mais popula-res fármacos da história remonta à sua “origem vegetal”, pois que vêm do Salgueiro – Salix Alba, na nomenclatura científica – os seus princípios ativos.

Em explicação bastante sintética, pode-se afirmar que o “a”, de aspirina, diz respeito ao acetil; o “spir”, à raiz do ácido espírico – substância quimicamente idêntica ao ácido acetilsa-licílico – e o “ina”, ao sufixo adicionado ao nome de todos os medicamentos no final do século XIX. Como já dito, o uso de infusões de folhas de Salgueiro – e, consequentemente, de seus princípios ativos – remonta à antiguidade. Presentes no vegetal, a salicina e o salicilato eram usados, contra a cefaleia, na antiga Mesopotâmia, nada menos que três mil anos a.C.

Maurício Guilherme Silva Jr.

tra proteína celular, a PERK. “Surge, assim, um novo alvo farmacológico. Neste caso, uma proteína associada ao metabolismo”, explica o pesquisa-dor, ao lançar a importante indagação que então se descortina: “Será que o mecanismo de ativação da proteí-na, pelo medicamento salicilato, não contribuiria com a diminuição dos níveis de glicose no sangue?”

Ao buscar respostas para tal ques-tão, Aristóbolo e os outros pesquisa-dores sob sua orientação, no Labora-tório de Genes Inflamatórios do ICB, acabam por lançar-se ao desafio de descobrir algo que, no futuro, pode ajudar milhões de pacientes com dia-betes tipo 2, cujo organismo, apesar de produzir insulina, não é capaz de metabolizar a glicose do sangue. Nos estudos para compreensão da ação dos anti-inflamatórios não esterói-des (salicilatos) sobre a PERK e de proteínas por ela reguladas – projeto que em determinadas etapas contou com financiamento da FAPEMIG –, amostras de extratos de células, que recebem o tratamento com diferen-tes doses de salicilatos, são separadas em gel, para, então, seguirem à análise. “A partir daí, buscamos observar se há mudanças significativas nas prote-ínas. Experimentos já mostram, por exemplo, que os salicilatos melhoram a captação de glicose em células adi-posas”, afirma.

Além da ação sobre a PERK, tam-bém são estudados, no Laboratório, os efeitos dos salicilatos como ativa-dores – ou inativadores – de outras proteínas. Numa das atuais vertentes de investigação, busca-se compreen-der a ação dos referidos medicamen-tos sobre uma outra proteína. “Nes-se caso, nosso objetivo é entender a atuação dos salicilatos como antipro-liferativos”, explica o professor. Isso quer dizer que, além de analgésicos, anti-inflamatórios, antipiréticos e antidiabetôgênicos, os “poderosos” salicilatos parecem também ter a capacidade de diminuir os níveis de proliferação, por exemplo, de células cancerígenas. “Hoje, já se sabe que pacientes acostumados a tomar aspi-rinas têm 30% de chances a menos de

desenvolver câncer colorretal. Entre-tanto, como qualquer medicamento, o seu uso deve ser consultado previa-mente com um médico”, ressalta.

As pesquisas do laboratório em torno da múltipla capacidade de atuação dos salicilatos sobre as proteínas celulares, de modo a ativá-las ou desativá-las, prome-

tem ainda muitas novidades para os próximos anos. Afinal, segundo Aristóbolo Mendes, diversas – e imprevisíveis – funções da aspirina e outros fármacos do gênero ainda estão por ser descritas.

Origens do fármaco “milagre”

Título: “Exploração do uso de anti-inflamatórios não esteroides salicilatos sobre a modulação de vias de sinalização envolvidas nas respostas de estres-se do retículo endoplasmático e da regulação do metabolismo da glicose”Coordenador: Aristóbolo Mendes da SilvaModalidade: Edital PPSUSValor: R$ 90. 921,14

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Minas está perdendo a luta contra a dengue? Além do crescimento do nú-mero de notificações de dengue em di-versos municípios mineiros, incluindo a capital, a Secretaria de Estado de Saúde de Minas confirmou a primeira morte por dengue com complicação, em 2011, em Januária, no Norte de Minas.

Segundo a Secretaria Municipal de Saúde de Belo Horizonte, em apenas uma semana do mês de fe-vereiro de 2011, foram registrados 230 casos suspeitos da dengue. Até meados deste mês, havia 1.465 noti-ficações da doença na capital minei-ra. De acordo com a Secretaria, 148 casos foram confirmados, 524 foram

Lutacontraa dengue

Estudo demonstra como as campanhas de comunicação coletiva podem ser eficientes no combate à doença, quando associadas a uma nova tecnologia, a Evidengue

Prevenção

descartados e 793 ainda aguardam resultado de exames.

É possível derrotar a dengue? Talvez um dos caminhos possíveis seja a associa-ção de estudos de informação e educação em saúde com a adoção de novas tecnolo-gias, como a Evidengue®, uma capa de tela protetora de pratos coletores de água de vasos de planta. Esse produto, bem como a forma de difundir seu uso por uma co-munidade, têm sido objeto de estudos da pesquisadora Virgínia T. Schall, chefe do Laboratório de Educação em Saúde e Ambiente (Laesa) do Centro de Pesquisas René Rachou (Fiocruz Minas).

“Em estudos de laboratório, des-crevemos como a Evidengue® mos-

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trou-se 100% eficaz para vedar o aces-so de fêmeas de Ae. aegypti aos pratos de vasos de planta. Ficou demonstrado que a capa, se utilizada com proficiên-cia, ou seja, bem ajustada ao vaso e completamente amarrada, veda o pra-to coletor de água, impedindo que as fêmeas ponham ovos do mosquito ve-tor nesse tipo de recipiente, que é um dos mais apontados como positivos pelos levantamentos de índice larvar (LIRAa) em domicílios de Belo Hori-zonte”, explica Virgínia.

A pesquisadora ressalta, contu-do, que a comprovação de proteção total em laboratório requer estudos de campo, pois é preciso verificar se a população adota a capa e se a usa de modo proficiente, o que foi inves-tigado no estudo financiado pela FA-PEMIG e continua a ser avaliado em diversas áreas.

De acordo com Virgínia, o controle vetorial em recipientes domésticos de água requer do morador comporta-mentos capazes de atender a especifi-cações predeterminadas de segurança de uso. As capas de tela mosquiteiro têm se revelado eficazes como barrei-ras físicas ao acesso de Ae. aegypti a caixas d’água, baldes coletores de água de chuva e pratos de vasos de planta. “A adoção de tais dispositivos em re-sidências de áreas endêmicas constitui um claro indicador comportamental de que o morador faz uso seguro do recipiente”, observa.

As evidências de que se dispõem até o momento, segundo a pesquisadora da Fiocruz, mostram que a Evidengue, além de ser um promissor método de controle da dengue – pelo impedimen-

to da oviposição de fêmeas do vetor da doença em um dos mais frequentes criadouros domésticos do mosquito na Região Sudeste do país, e pela possibi-lidade de fornecer dados quantitativos de vigilância e controle epidemiológico importantes para a elaboração de es-tratégias contra a dengue –, constitui um importante modelo tecnológico. “Modelo tanto no sentido de desenvol-vimento de novas tecnologias contra a dengue, como telas para piscinas e cai-xas de água, quanto de desenvolvimen-to e aprimoramento de tecnologias educacionais, por também estudar, do ponto de vista comportamental, a for-ma como uma tecnologia preventiva é adotada pela população (sejam elas re-lacionadas à dengue ou não)”.

O professor e pesquisador do Centro de Pesquisas René Rachou, Fiocruz Minas, João Bosco Jardim, que co-orientou, com a professora Virgínia, todo o trabalho feito até agora e su-pervisionou as avaliações de laborató-rio e de campo, com a participação de alunos e bolsistas, vê outras vantagens na utilização da evidengue. Ele escla-rece que o produto é de fácil manejo pelo usuário e tem a vantagem de ser também facilmente visível e identifi-cável pelo agente de saúde que visita residências de regiões endêmicas de dengue. Essa ação permite a mensu-ração direta e objetiva da frequência de sua adoção em sucessivas visitas de verificação ou avaliação.

“Nós acreditamos que o empre-go da evidengue como modelo expe-rimental pode oferecer importante contribuição metodológica para uma área de pesquisa ainda carente de ins-

trumentos objetivos de mensuração”, diz João Bosco. Ele também destaca os resultados de laboratório que mos-tram a eficácia do método evidengue para bloquear o acesso de fêmeas grá-vidas do vetor ao interior de pratos de vaso de planta; e os resultados, também de laboratório, que realçam a importância da vedação em relação ao mero ato de tampar, recomendado pelas campanhas.

A importância da comunicação

A literatura de educação em saú-de para prevenção da dengue vem demonstrando que o mero conheci-mento é insuficiente para se alcançar a participação do morador no con-trole vetorial. Segundo Virgínia, há di-versos estudos indicando que muitos programas educativos resultam em ganhos de conhecimento do morador quanto aos comportamentos preven-tivos necessários ao uso seguro dos recipientes domésticos de água, mas mostram-se geralmente incapazes de oferecer instrumentos efetivos para a ocorrência desses comportamentos nas residências.

A pesquisadora tem uma opinião clara a respeito desse assunto. De acordo com Virgínia, de modo caracte-rístico, a informação educativa é pro-vidente e categórica quando aborda a necessidade de adoção de cinto em veículos, de preservativo nas relações sexuais, de roupas especiais em tarefas de risco e de vários outros dispositi-vos de segurança individual e coletiva em circunstâncias rotineiras de pre-venção. “Curiosamente, a despeito da

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fraca evidência de que a informação educativa seja capaz de se converter, por si só, em comportamentos de efe-tivo controle vetorial da dengue nos domicílios, não se verifica na educação em saúde a mesma providência e de-terminação para o estudo da adoção de dispositivos materiais preventivos quando se trata do uso seguro de recipientes domésticos de água por moradores de áreas endêmicas da do-ença. Portanto, essa é uma lacuna que nossos estudos buscam contemplar”.

As campanhas de comunicação coletiva na área da saúde têm por objetivo estimular a incorporação de práticas de prevenção a doenças e promoção da saúde. Com tal fim, veiculam informações que podem am-pliar o conhecimento sobre o proble-ma focalizado, questionar práticas que potencializam o risco de adoecer e in-centivar ações de cuidado e proteção do ambiente e de si próprio. Utilizam--se dos princípios da área de comuni-cação, buscando estimular a confiança da população, podendo associar a in-formação a abordagens que têm apelo emocional e também a processos pe-dagógicos, nesse último caso, podem ter um cunho mais educativo.

São numerosos os estudos que buscam avaliar o impacto das campa-nhas de comunicação e/ou de proces-sos educativos na adoção de práticas preventivas. “No caso da dengue, diz Virgínia, a literatura tem apontado como principal resultado a aquisição de conhecimento, contudo, esse sa-ber não tem potencializado as ações de cuidado”. O nó talvez resida nesse ponto, como observa a pesquisadora: “há toda uma discussão sobre a dis-tância entre o que se sabe e o que se faz e aí residem muitas dificuldades de sucesso das campanhas em promover de fato a saúde, ou seja, de alcançar a incorporação de comportamentos promotores de saúde”.

Mas o que explica o insucesso das campanhas de prevenção contra den-gue? As pesquisas conduzidas por Vir-gínia levaram-na à conclusão de que as campanhas, “a grosso modo, não têm alcançado o objetivo de promover a substituição de comportamentos de

risco por comportamentos de cui-dado”. Ela continua: “mas esse é um processo complexo e aqui é preciso sublinhar o que chamamos de ‘disso-nância cognitiva’ – que pode ser tra-duzida como incentivar as pessoas a adotarem determinados comporta-mentos, mas não serem dadas a elas condições para tal. A pesquisadora enumera alguns exemplos, não neces-sariamente ligados à dengue, mas a cuidados gerais: como incentivar pes-soas a cuidarem bem do lixo em áreas em que a coleta do lixo não é realizada pelo serviço público? Como incentivar pessoas ao uso adequado de água e sa-nitário em locais onde não há água en-canada e saneamento? Assim, a mensa-gem veiculada pode ser eficaz para a construção de um novo conhecimen-to e incentivar ações de cuidado, mas a pessoa não tem recursos mínimos para concretizar essas ações. “Isso vai gerar mais ansiedade, pois se antes a pessoa agia sem saber, agora ela deseja alterar a ação e não tem meios para tal. Portanto, as campanhas precisam vir associadas a melhorias ambientais e de condições de habitação para de fato gerarem impactos positivos na saúde”, comenta.

Auxílio na prevenção

da doençaA difusão da Evidengue representa

uma oportunidade de pesquisa e de

potencializar a prevenção da dengue, acredita Virgínia. Sua certeza se baseia no seguinte: se há em nossa região (Su-deste) um hábito cultural arraigado que é o cultivo de plantas no domicílio e isso requer o uso de pratos coletores de água para proteger pisos e móveis da água (a qual pode causar manchas ou mesmo avarias nos ambientes e ob-jetos), o potencial de risco desse hábito para a dengue está colocado. O mos-quito vetor é comprovadamente um inseto domiciliar e utiliza os recipientes onde encontra água para a oviposição mantendo o ciclo de reprodução.

“Por mais que as campanhas reco-mendem retirar o prato coletor de água ou utilizar areia (essa comprovadamente ineficaz, pois esvazia com o derramamen-

MINAS FAZ CIÊNCIA - SET. A NOV. / 201020

“Muitas vezes uma caixa d´água está tampada e quando a tampa é

levantada, há milhares de larvas em seu interior.

isso porque, se houver uma mínima fresta

por falha de encaixe, o mosquito vai ter acesso

à água por ali”.

Virgínia T. Schall, pesquisadora

A Evidengue é um promissor método de controle da dengue

Foto: Marcelo Focado

Page 21: Minas faz Ciência 43

to de água que transborda no momen-to da rega das plantas e nem sempre é reposta, e ao derramar pode inclusive espalhar ovos do mosquito que possam estar a ela misturados), a população vol-ta a usar os pratos pela proteção que conferem a seus objetos e ambientes”, frisa. Aqui há então uma oportunidade de promover a prevenção sem mudar um hábito cultural, mas incorporar a ele uma proteção eficiente, durável e de fá-cil manutenção, ou seja, a Evidengue é um dispositivo que torna possível asso-ciar o saber (importância de proteger os recipientes domiciliares para evitar a presença e reprodução do vetor) ao fa-zer (utilizar um recurso capaz de vedar o recipiente e impedir a ovipostura).

Para Virgínia, a Evidengue permite também difundir o verbo vedar e sua importância no controle do mosquito, pois não basta tampar. “Muitas vezes uma caixa d´água está tampada e quan-do a tampa é levantada, há milhares de larvas em seu interior. Isso porque se houver uma mínima fresta por falha de encaixe, o mosquito vai ter acesso à água por ali. Assim, a pessoa pensa que tampou e de fato o fez, mas não vedou. E no caso do mosquito, o sucesso do controle depende do vedar”, diz.

O professor João Bosco concorda, e faz um alerta: “evidentemente, a ve-

dação do acesso de fêmeas grávidas de Aedes aegypti à água, dentro ou fora do domicílio, somente irá funcionar como estratégia preventiva quando uma mas-sa crítica de moradores compartilhar esse comportamento”. Ele explica que mesmo aqueles moradores que conse-guirem eliminar criadouros do mosqui-to por meio de vedação continuarão vulneráveis à doença se os vizinhos não fizerem o mesmo, e se não o fize-rem de modo duradouro e sustentável. “Lamentavelmente, não se encontra evidência na literatura de pesquisa de algum programa educativo que tenha conseguido estabelecer qualquer com-portamento preventivo da dengue em bases sustentáveis”, completa.

Para João Bosco, há três requisi-tos comportamentais que têm sido considerados nos projetos de progra-ma educativo com os quais o Laesa procura estudar o controle vetorial da dengue em recipientes domésticos de água: (1) a adoção coletiva de um dispositivo eficaz de vedação (“leia--se evidengue, no nosso caso”, frisa o professor) por moradores de áreas endêmicas da doença; (2) a proficiên-cia com que o dispositivo é usado; e (3) a manutenção proficiente da ado-ção (ou seja, a sustentabilidade do comportamento).

A Evidengue pode ainda despertar a pessoa em seu domicílio para a den-gue e os cuidados com os demais re-cipientes. Ela pode funcionar como um lembrete: ao vê-la, o morador lembra--se de que ela está ali devido à dengue e isso pode ser uma ativação da me-mória do cuidado.

A capa permite também realizar estudos sistemáticos que associam a informação e educação em saúde à adoção de novas tecnologias e poten-cializar ações de cuidados pelos esco-lares, contribuindo para a formação de hábitos participativos de controle da dengue. “No entanto, embora tenha-mos tais pressupostos, só os testes em campo podem de fato comprovar ou não nossas hipóteses e é isso que temos feito”, alerta.

Os primeiros resultadosOs estudos que associam a ado-

ção da evidengue com tecnologias educacionais têm sido tema de dis-sertações de mestrado de Programas de Pós-Graduação da Fiocruz e da Unimontes e foram parcialmente pu-blicados no último volume do Dengue Bulletin, publicação anual da Organiza-ção Mundial da Saúde (volume 33, de dezembro de 2009, pág. 176-186). O artigo, intitulado “The control of Aedes aegypti for water access in households: Case studies towards a school-based education programme through the use of net covers”, de autoria do pesqui-sador João Bosco Jardim e colabora-dores descreve e discute os primeiros resultados analisados.

Segundo o Dengue Bulletin, em 65,9% das residências de alunos que participaram das pesquisas coordena-das pelos professores Virgínia Schall e João Bosco Jardim houve adoção das evidengues. “Embora os números ab-solutos sejam pequenos, a proporção é muito promissora. Na pesquisa atual, com mais de duas mil residências, te-mos dados de adoção bem mais repre-sentativos, mas ainda estamos contabi-lizando e associando ao Levantamento de Índice Rápido do Aedes aegypti (LI-RAa.)”, diz Virgínia.

Só para se ter uma ideia, o resul-tado do LIRAa de outubro de 2010, apontou um índice de infestação de 0,9% na capital mineira. O dado mos-

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Os pesquisadores Virgínia T. Schall e João Bosco Jardim, ambos da Fiocruz (Minas)

Foto: Marcelo Focado

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tra que a cada 100 imóveis vistoriados, menos de um apresentou focos do mosquito da dengue. O LIRAa realiza-do no mesmo período do ano passado mostrou um resultado de 2,2% de in-festação. De acordo com a padroniza-ção do Ministério da Saúde, o índice de infestação larvária a partir de 4% denota risco de epidemia. O levanta-mento é feito três vezes ao ano - ja-neiro, março e outubro.

Os estudos até então realizados e em andamento no campo, pela equipe dos pesquisadores da Fiocruz, incluí-ram as áreas de Venda Nova, Prado e um bairro do município de Sabará, a partir de dados epidemiológicos que as apontam como de alta prevalência da dengue e altos índices do LIRAa. Há diversos resultados práticos em termos de compreensão dos proces-sos de difusão, adoção e proficiência de uso da tecnologia, e de metodo-logias e alternativas de informação e educação em saúde associadas a tais processos. Alguns dos resultados estão descritos em dissertações de mestrados já defendidas e em desen-volvimento e revelam o potencial de estímulo à adoção de práticas seguras de controle no domicílio, bem como o papel dos escolares como multipli-cadores de informação e de ações preventivas em suas residências.

As evidengues utilizadas nas comu-nidades e escolas que participam do estudo são gratuitas. O custo para a pesquisa é de cerca de 2,50 a pequena (para vasos de violeta) até 4,00 reais

a grande. Esse custo pode diminuir se forem adquiridas em grande quanti-dade, pois até o momento foram feitas apenas para cobrir as necessidades das pesquisas.

Virgínia esclarece que, no momen-to, está realizando um estudo em um bairro inteiro (antes realizado apenas por amostragem em domicílios de es-colares ou de moradores) e medindo o efeito da adoção da evidengue nos índices larvários do vetor (estimado pelo LIRAa). Há questões a serem re-solvidas como, por exemplo, a cor da capa associada à adoção e o processo de ajustá-la ao vaso para que tenha

nível máximo de proficiência de ve-dação. “Os dados encontram-se em análise com indicações encorajadoras para o controle do vetor e espera-mos em breve poder divulgá-los”.

A pesquisadora também lembra que o poder público só se interessa por ino-vações já comprovadamente testadas e, como estão ainda finalizando os estudos, não têm investido na difusão ampla.

Como observa João Bosco, a difusão da evidengue é parte do desenvolvimen-to de um novo método de controle vetorial da dengue nos domicílios. “Não se trata de novo método para substituir outros, mas de método para se integrar a outros métodos existentes. Um pro-grama integrado usa todas as técnicas disponíveis de controle vetorial da for-ma potencialmente mais efetiva, mais econômica e mais segura para manter as populações de vetores em níveis pelo menos aceitáveis”, ressalta.

Na falta de vacina contra o vírus da dengue, comenta João Bosco, a maioria das iniciativas de prevenção da doença tem se concentrado no combate quí-mico ao vetor, geralmente com resulta-dos desapontadores. Outras iniciativas são as ações ambientais, o controle bio-lógico, a vigilância epidemiológica e en-tomológica e as campanhas educativas que procuram envolver as populações afetadas na prevenção da doença. “Ne-nhuma dessas estratégias, porém, tem se mostrado efetiva o bastante para conter a proliferação do mosquito. Ante a reconhecida impossibilidade de erradicação do Aedes aegypti em curto prazo no Brasil, o Programa Nacional de Controle da Dengue preconiza que o impacto da doença pode ser subs-tancialmente minorado se o conjunto das medidas existentes for associado a iniciativas que visem incrementar a par-ticipação popular na prevenção da for-mação de focos de proliferação domi-ciliar do mosquito”, afirma João Bosco.

MINAS FAZ CIÊNCIA - SET. A NOV. / 201022

“Não se trata de novo método para substituir outros, mas de método

para se integrar a outros métodos existentes. Um

programa integrado usa todas as técnicas

disponíveis de controle vetorial da forma

potencialmente mais efetiva, mais econômica

e mais segura para manter as populações

de vetores em níveis pelo menos aceitáveis”.

João Bosco Jardim, pesquisador

Fabrício Marques

Projeto: Investigação de um mo-delo experimental para difusão de tecnologias de controle da dengue em ambiente domiciliarCoordenador: Virgínia Torres SchallModalidade: Edital UniversalValor: R$ 46.643,00

No centro, vaso com a Evidengue, dispositivo que torna possível associar o saber ao fazer

Foto: Marcelo Focado

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23MINAS FAZ CIÊNCIA - SET. A NOV. / 2010

Saiba mais sobre a Evidengue

A Evidengue® é uma capa de tela protetora de pratos coletores de água de vasos de planta. É feita de tela-mosqui-teiro, material utilizado para vedar janelas, que consiste de uma trama de resina sintética de poliéster resistente a mofo e incêndio, com malha igual ou inferior a 2 mm x 1 mm. O protótipo avaliado (figura ao lado) no projeto financiado pela Fapemig possui um franzido junto à borda de abertura por onde se embutem uma tira do mesmo material e um elástico que permitem o fechamento e o ajuste da capa ao vaso de planta. Quando ajustada adequadamente, a evidengue® veda por completo o acesso de fêmeas de Aedes aegypti ao prato.

Capa Evidengue®. Lado esquerdo: protótipo da capa. Lado direito: prato de vaso de planta envolvido com a evidengue

Primeiro passo:

Escolhidas as turmas de alunos que vão participar do estudo, a equipe de pesquisa visita as casas dos estudantes para verificar como é o ambiente em relação a riscos de transmissão da dengue.

Quarto passo:

A equipe de pesquisa repete os questionários/entrevistas sobre conhecimento com os mesmos entrevistados anteriormente para verificar mudança ou acréscimo no saber deles.

Os mesmos passos são seguidos com a diferença de que não há programa educativo, mas entrega de um folheto informativo sobre prevenção da dengue e uso proficiente da evidengue.

Quinto passo:

A equipe visita novamente os domicílios dos estudantes 15 dias após o programa educativo e observa se as capas foram adotadas e se melhorou ou não o cuidado com o domicílio em relação à dengue. A cada 15 dias, até completar 60 dias as visitas, são repetidas para avaliar a adoção e proficiência de uso das capas nas residências dos alunos.

Segundo passo:

A equipe de pesquisa realiza um programa educativo participativo com os alunos em sala de aula após realizar questionários e/ou entrevistas sobre conhecimento e prevenção da dengue com professores e estudantes.

Terceiro passo:

Cada aluno das chamadas turmas experimentais recebem três evidengues, uma pequena, uma média e uma grande, todas numeradas para identificação posterior no domicílio. As turmas de controle recebem apenas o programa educativo para comparar.

NAESCOLA

NAESCOLA

NAESCOLA

NAESCOLA

NAS COMUNIDADES NAESCOLAPA

SSO

A P

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OComo acontece, na prática, em uma comunidade, a associação de estudos de informação e educação em saúde com a adoção de novas tecnologias, como a Evidengue.

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Meio ambiente

Entre jatobáse jacarandásPesquisadores investigam DNA para

orientar a conservação de quatro espécies do Cerrado e da Mata Atlântica

O Brasil ostenta o título de país com maior biodiver-sidade do mundo. Só o Cerrado, segundo maior bioma brasileiro, contabiliza 11.267 plantas nativas, ocupando 22% do território brasileiro. Contudo, de acordo com o Ministério do Meio Ambiente, depois da Mata Atlântica, o Cerrado é o bioma brasileiro que mais sofreu alterações com a ocupação humana. Onde está escrito alterações, leia-se devastação.

Para investigar o DNA de algumas espécies da flora desse bioma, e que sofrem ameaça de desaparecimento, um grupo de pesquisadores do Instituto de Ciências Bio-lógicas (ICB) da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), sob a coordenação de Maria Bernadete Lovato e José Pires de Lemos Filho, saiu a campo para amostrar árvores de quatro espécies: jacarandá-da-bahia, vinhático, jatobá-do-cerrado e jatobá-da-mata. O Parque Estadual do Rio Doce - a 248 km de Belo Horizonte, na Região do Vale do Aço, foi um dos locais da pesquisa que contou com financiamento da FAPEMIG e do CNPq.

A principal conclusão do estudo, de acordo com Lo-vato, é que os resultados obtidos apontam para a ocor-rência em determinados locais de maior diversidade ge-

nética e com ocorrência de plantas com características genéticas distintas dos indivíduos de outros locais. “As áreas com essas características são extremamente im-portantes e devem ser levadas em consideração como prioritárias nas estratégias de conservação das espécies. Essas características foram observadas algumas vezes e é o caso, por exemplo, de uma população de jacarandá--da-bahia amostrada no Nordeste de Minas”, afirma a pesquisadora. E completa Lemos Filho: “esse resultado indicou a priorização de se estabelecer áreas de conser-vação de Mata Atlântica nessa parte do Estado que, além de contribuir para a conservação dessa espécie ameaça-da, certamente, por um efeito ‘guarda-chuva’, contribui-rá para a conservação de outras espécies de plantas e animais”. Além disso, a pesquisa pode contribuir para a identificação de áreas prioritárias para a conservação.

Como explica Lemos Filho, o Cerrado não é um bio-ma exclusivamente brasileiro como a Caatinga, mas sua maior extensão ocorre no país. É muito rico em espécies e endemismos, ou seja, em grupos taxonômicos que se desenvolveram numa região restrita. Essas características e o nível de ameaça pelas atividades econômicas, princi-

MINAS FAZ CIÊNCIA - SET. A NOV. / 201024

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Fabrício Marques

palmente a expansão agrícola, levou a sua inclusão entre as áreas prioritárias de conservação em nível mundial.

As espéciesA escolha das espécies investigadas

não se deu por acaso e muito menos a pesquisa se restringiu ao Cerrado. O Jacarandá-da-bahia (Dalbergia nigra) é uma espécie endêmica da Mata Atlân-tica e ameaçada de extinção devido à exploração de sua valiosa madeira desde o Brasil Colônia.

O vinhático também é uma impor-tante espécie madeireira e até pouco tempo atrás, era, do ponto de vista bo-tânico, considerado como duas espécies, o vinhático da mata e o do Cerrado. “Com base em estudos de nosso grupo evidenciando a possibilidade de fluxo gê-nico (a troca de genes entre populações, que são normalmente da mesma espé-cie) entre essas duas espécies na chama-da área ecotonal, ou seja, de transição entre duas comunidades ecológicas ad-jacentes, tais como floresta e cerrado, foi realizado um estudo taxonômico que as agrupou em uma única espécie (Plathy-menia reticulata). Esta, por sua vez, se dis-tribui tanto na Mata Atlântica como no Cerrado”, observa Lovato.

Lemos Filho caracteriza os jato-bás: “eles também fornecem madeira de qualidade, tendo o jatobá da mata (Hymenaea courbaril) distribuição am-pla incluindo a Mata Atlântica e matas ripárias do bioma Cerrado, enquanto que o jatobá-do-Cerrado (Hymenaea stigonocarpa) é encontrado exclusiva-mente no bioma que lhe dá nome”.

Essas espécies, além da importân-cia econômica, tem ocorrência na-tural em dois biomas de importância mundial para conservação da biodi-versidade. São territórios cuja pre-servação é prioritária - denonimados de Hotspots – devido a alta riqueza de espécies, endemismos e alto grau de ameaça devido às atividades humanas.

Para investigar essas espécies, a equipe de Lovato e Lemos Filho ex-traiu amostras de plantas de várias po-pulações em diferentes locais do Cer-rado e da Mata Atlântica, procurando amostrar o máximo possível da área de ocorrência das espécies. As amos-tras de folha ou caule foram conduzi-das ao laboratório para o isolamento e amplificação do DNA.

Posteriormente, para cada planta, partes das sequências DNA foram ana-lisadas e utilizadas para se determinar a diversidade genética dentro das popu-lações e entre as populações de cada espécie. “Para cada espécie, essa diver-sidade foi estudada no contexto da sua distribuição geográfica, agrupando-se as populações com base na sua proximida-de genética, resultando nos grupos filo-geográficos, isto é, considerando a distri-buição geográfica dessas populações e a sua genealogia”, observa Lovato.

Investigando o DNA dessas plan-tas, quais as chances de adaptação e sobrevivência delas hoje? “De acordo com os pesquisadores, a sobrevivência em longo prazo de uma espécie de-pende da diversidade genética. A aná-lise do DNA das populações permite inferir o grau de diversidade de cada população e se estabelecer estratégias conservacionistas”, ressalta Lovato.

Para Lemos Filho, os estudos apon-tam em alguns casos o efeito deletério das atividades humanas, reduzindo a variabilidade genética das populações. Por outro lado apontam áreas que foram preservadas como reservas, de-tendo significativa variabilidade genéti-ca. “Uma importante contribuição se refere à identificação de áreas deten-toras de alta diversidade e contando com indivíduos únicos geneticamente, que carecem de ações para o estabele-cimento de áreas de preservação que poderiam manter uma amostragem significativa da diversidade genética das espécies”, comenta o pesquisador.

Os pesquisadores adiantam os próxi-mos passos de sua equipe: “estamos am-pliando o número de espécies a serem analisadas, bem como ampliando a abran-gência geográfica das populações amos-tradas, visando a não somente conhecer a diversidade genética e história evolutiva do Cerrado e da Mata Atlântica, mas tam-bém contribuir para fornecer subsídios para medidas conservacionistas”.

25MINAS FAZ CIÊNCIA - SET. A NOV. / 2010

Saiba maissobre o Cerrado

O bioma Cerrado possui uma área de aproximadamente 203 mi-lhões de hectares, ocupando porção central do Brasil. É o segundo maior bioma da América do Sul, ocupando cerca de 25% do território nacional. A sua área contínua incide sobre os Es-tados de Goiás, Tocantins, Mato Gros-so, Mato Grosso do Sul, Minas Gerais, Bahia, Maranhão, Piauí, Rondônia, Para-ná, São Paulo e Distrito Federal, além dos encraves no Amapá, Roraima e Amazonas.

O bioma Cerrado possui ape-nas 7,44% de sua área protegida por unidades de conservação, federais, estaduais e municipais, sendo que aproximadamente 2,91% do Cerrado é protegida na forma de unidades de conservação de proteção integral, tais como os parques nacionais.

FONTE: Relatório técnico de Monito-ramento do desmatamento no bioma Cer-rado, divulgado em 2009.

Árvores de jatobá-da-mata

Exemplo de vegetação do Cerrado

Fotos: José Pires de Lemos Filho

Projeto: Abordagem filogeográfica e eco-fisiológica em populações de leguminosas arbóreas da Mata Atlântica e do CerradoCoordenadora: Maria Bernadete LovatoModalidade: 1M EAP - Projeto de Pesquisa Científica e TecnológicaValor liberado: 26.659,50

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Cartografias urbanas

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Uso de novas tecnologias e apropriação de técnicas multidisciplinares ampliam o sentido da arte da representação cartográfica na sociedade contemporânea

MINAS FAZ CIÊNCIA - SET. A NOV. / 201026

Page 27: Minas faz Ciência 43

A cartografia surgiu para dar nome à arte da representação do espaço em mapas. Fundamental na época das navegações para o domí-nio do mundo, essa ciência que tem as origens ligadas aos homens das ca-vernas passa por um momento-chave. Os mapas estão por aí, em papel, nas telas, no celular, no GPS ou no com-putador. Talvez, mais presentes como nunca, até transparentes em nossas vidas. Usamos mesmo sem perceber e, assim, a cartografia é imersa numa banalidade que faz brotar novos desa-fios para a ciência da representação. Digitais, analógicos, preto e branco ou coloridos, os mapas se transfor-mam influenciados pela vida digital. Qual será o futuro da cartografia?

“É difícil dizer o que o cartógrafo vai estar fazendo daqui a dez anos. Mas se a gente acompanhar os processos de transformação do mundo, tanto tecno-lógicos, quanto conceituais, não teremos problema em ser profissionais conecta-dos”, acredita o geógrafo Lucas Mello de Souza, coordenador do projeto Canta Cantos, ligado à Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG). Segundo ele, o primeiro passo para entender a carto-grafia do futuro é se desapegar da ideia dos mapas estáticos. “O desafio é, em um tempo de grande mobilidade, você desenvolver uma cartografia que tam-bém seja móvel, dinâmica”, aposta Souza.

É essa a meta que a professora Re-gina Helena Alves da Silva e sua equipe encaram desde 2004. O grupo trabalha com novas formas de olhar para a cidade e assim se dedica a elaborar metodologias cartográficas que dialoguem com o passado dessa ciência, com o presente e com o futu-ro. O que isso quer dizer? Uma carto-grafia dos fluxos. “É a compressão do espaço/tempo, no mundo da velocida-de, da comunicação fácil e rápida com os lugares”, detalha.

Para Silva, uma questão fundamen-tal para a cidade hoje é o movimento, e, é justamente o que a faz funcionar e existir. Os primeiros passos da pes-quisa que caminha para o entendimen-to desses movimentos foram dados nos arredores do Centro Cultural da UFMG. O objetivo era procurar formas alternativas à cartografia tra-dicional de mapas e gráficos. Nesse contexto, a professora se perguntou: “com tudo o que a gente tem hoje, como fazer tentativas de mapeamento e construção de mapas cartográficos que pudessem minimamente dizer do movimento e da dinâmica urbana?”.

Diante desse questionamento a equipe de pesquisadores foi para as ruas e começou a filmar, fotografar, gravar sons, de noite e de dia, em percursos diferenciados. “Recortamos os espa-

27MINAS FAZ CIÊNCIA - SET. A NOV. / 2010

ços, o tem-po, saíamos em dias e horários diversos, andando de formas diferentes e come-çamos a captar os sons, a filmar, a fotografar, a anotar em caderneta de campo para criar vários tipos de registros”, lembra. Era a primeira ten-tativa de mapear o fluxo. O desafio se-guinte era elaborar metodologias que pudessem não apenas registrar, mas, sobretudo, compreender o fluxo vital do centro de Belo Horizonte. “A ques-tão é como transformo esse registro em algo que pode ser ‘capturável’ em outros momentos por outros regis-tros? É colocar o registro em fluxo, também”, comenta a professora.

Para entender melhor, imagine o registro dos fluxos da prostituição na avenida Afonso Pena, na região central de Belo Horizonte. Dependendo dos horários, dos lugares, a prostituição se instala mais em um ponto que em outro. Há o lugar dos travestis, das profissionais mais jovens. Isso em um momento está de um jeito, outro mo-mento está de outro. “Entender essas múltiplas possibilidades é fundamental

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MINAS FAZ CIÊNCIA - SET. A NOV. / 201028

se eu quero propor uma política públi-ca para a cidade. Se eu conseguir de-monstrar por múltiplos registros que isso muda, já é um avanço”, acredita a professora. Por meio desses múltiplos registros, os pesquisadores conseguem ter uma dimensão de uma temporali-dade histórica do local. “É esse tipo de discussão que a gente esta fazendo”, completa.

Dispositivos de memóriaO trabalho, ainda em desenvol-

vimento, demandou encontros com profissionais de outras áreas como física, computação, além de experi-ências em outras cidades. A primei-ra parada do projeto foi em Salva-dor, quando Silva propôs à equipe o mapeamento comparado do cen-tro histórico da cidade e o centro de Belo Horizonte. O estudo teve o apoio da FAPEMIG por meio do projeto Cartografias Urbanas: Redes, Espaços e Fluxos Comunicativos. “A única coisa que diz que um centro é histórico e o outro não é o tem-po dos prédios. Densidade histórica você não calcula pela idade. Então, o que define isso?”, pergunta.

Já em Portugal foram estudados os planos de intervenção nos centros ur-banos. “Eles descobriram que a única

forma de se intervir em um lugar sem que a população se rebele é quando muda a ideia de tempo e espaço. O sentido de tempo e memória. Aí sim você quebra a resistência”, comenta Silva. Técnicas assim foram usadas em cidades como Porto, no norte do país, e no Largo das Fontaínhas, em Lisboa.

As primeiras conclusões do pro-jeto indicam a importância de se compreender o que Silva chama de dispositivos de memória. “É a primeira questão conceitual do projeto a qual chegamos. É a ideia de que, em alguns momentos, os registros (dos fluxos) acionam a memória e produzem o sentido”, explica. O objetivo da pro-fessora e sua equipe, nesse caso, é romper com o conceito cartesiano da representação cartográfica. “Hoje isso é possível justamente porque temos a compreensão do espaço, do tempo e das possibilidades geradas pelas novas tecnologias”, comemora.

Obviamente, ainda há um longo percurso pela frente. O diálogo com as outras áreas, por exemplo, ainda precisa alcançar uma melhor sincronia. “Só agora é que a gente conseguiu um banco de dados para entrar com múl-tiplos registros: o sonoro, o visual e o fotográfico. Os vídeos eles ainda não conseguem colocar”, detalha a pro-

fessora sobre o trabalho da equipe de processamento de dados.

Realidade virtualEmbora considere que as novas

tecnologias representem avanços para a cartografia em fluxo, a professora Regina Helena Alves da Silva ainda é reticente em relação às proximidades com as técnicas de realidade virtual. “Acho complicado porque as pessoas pensam que a realidade virtual seria quase uma cópia da realidade”, pon-dera. Mas o professor de engenharia elétrica da Universidade Federal de Uberlândia, Alexandre Cardoso, escla-rece que não é bem assim. “Qualquer coisa que você queira melhorar em termos de visualizar a informação e de permitir um acesso a ela com uma manipulação muito mais realista, passa pela realidade virtual. Uma delas, com certeza, é a cartografia”, acredita.

A possibilidade de interação ofe-recida pela realidade virtual é o que a diferencia. Assim, usando o mesmo exemplo do mapeamento da pros-tituição na avenida Afonso Pena, em Belo Horizonte, se a metodologia da cartografia em fluxo fosse aplica-da com sistemas de realidade virtual seria possível experimentar as alte-rações, seja de regiões, de mapas, de objetos, de construções e, por que não do movimento. “Depois dos ce-nários cartografados, você não tem possibilidade só de visualizá-los. Pode modificá-los”, acrescenta Cardoso.

Os cenários descritos pelo pro-fessor Alexandre Cardoso - que en-volvem cartografia e realidade virtual – parecem enredos de ficção científica. No longa-metragem Minority Report - A Nova Lei, com direção de Steven Spielberg, Tom Cruise interpreta o policial do futuro capaz de capturar o criminoso antes da infração. Segundo Cardoso, a passagem em que ele en-tra em um shopping e todas as suas preferências são oferecidas em telas suspensas não estão muito longe de se tornarem reais. “Você está com o seu telefone e vira a câmera para uma determinada região. O aparelho traz automaticamente informações como ofertas e como você faz para chegar até elas”, conta. Eis mais um exemplo de cartografia moderna.

Foto: Marcelo Focado

O fluxo de prostituição na avenida Afonso Pena, região central de BH, também foi pesquisado pelo projeto

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Sistemas assim tendem a se popu-larizar porque os custos finais para o consumidor já não são tão altos. Se, há 14 anos, quando iniciaram as pesquisas sobre realidade virtual e aumentada no Brasil, a imersão neste universo deman-dava o uso de capacetes e óculos alta-mente tecnológicos cujos valores não eram inferiores a R$ 12 mil, atualmente, modelos de celulares são vendidos com programas de realidade aumentada em-butidos, com altas potências cartográfi-cas. “Estamos comprando agora óculos na faixa de US$ 500 dólares. Eles têm uma lente transparente que é uma tela com uma câmera. Então, quando você olha para uma pessoa e a identifica, apa-recem na tela os dados daquele indiví-duo”, detalha Cardoso.

Realidade virtual e aumentada no BrasilOs estudos sobre realidade virtual

e aumentada no Brasil são recentes. O primeiro workshop realizado no país foi em 1997 e agora, em maio de 2011, a Universidade Federal de Uberlândia se prepara para sediar o 13º Simpósio In-ternacional da área, que terá apoio da FAPEMIG. As atividades planejadas para o simpósio incluem minicursos, pales-tras de convidados internacionais, tuto-riais, sessões técnicas para apresentação de trabalhos relacionados, demonstra-ção e exposição de protótipos e oficinas.

Atualmente, estão em atividade gru-pos de pesquisa do Rio Grande do Sul a Pernambuco, com estudos aplicados à medicina, educação, engenharia elétrica e outras áreas com resultados práticos e inovadores em teste. De acordo com Alexandre Cardoso, grandes empresas nacionais, como a Embraer e a Petro-brás já utilizam sistemas de sistemas de realidade virtual gerados no Brasil por grupos de pesquisa brasileiros.

Palavra-chavePalavra-chave

LEI ÁUREA DA INOVAÇÃO?

Mario Neto Borges* Ildeu Viana da Silva**

Ainda não! Mas foi um avanço a sanção da Lei Federal nº 12.349, no dia 15 dezembro último. A lei trouxe importantes aperfeiçoamentos na legislação que atualmente rege a ciência, a tecnologia e a inovação (CT&I) no Brasil. De maneira especial, altera de forma importante as leis de licitações, de inovação e das fundações de apoio no que diz respeito à regulamentação legal para a ciência nacional.

Atendendo ao clamor das áreas científicas e tecnológicas do país, o go-verno federal editou em julho de 2010 a Medida Provisória nº 495, operando consideráveis mudanças no arcabouço atual. A Medida Provisória foi uma res-posta à demanda da 4ª Conferência Nacional de CT&I que ocorreu em maio passado. Enviada ao Congresso, esperava-se que os parlamentares dessem sua contribuição efetiva para por fim a alguns entraves que ainda dificultam o desenvolvimento da CT&I no Brasil. Apesar de terem sido apresentadas trinta e uma emendas, apenas algumas delas foram acrescentadas pelas comissões ao texto original da MP, mas sem qualquer impacto que mereça destaque. Perdeu-se uma grande oportunidade!

Em que pese o cochilo por parte do Congresso Nacional, o novo diploma fortaleceu, principalmente, o papel das fundações de apoio. Elas são de suma importância para as Instituições Federais de Ensino Superior (IFES) nas áreas de pesquisa, ensino e outros, além de conferir maior flexibilidade nas relações universidade/empresa que investem em pesquisa e no desenvolvimento de tecnologia no país, estimulando o consumo dos produtos e serviços nacionais.

As fundações de apoio foram criadas pela Lei nº 8.958, de 1994, com o objetivo de apoiar as instituições de ensino superior e de pesquisa científica e tecnológica na execução dos projetos de pesquisa, ensino e extensão e de desenvolvimento institucional. Em razão de situações casuísticas, e pelo fato de não haver um aparato jurídico conclusivo, o Tribunal de Contas da União (TCU) avocou para si o papel de legislador do assunto, através da emissão de acórdãos que inibiam as atuações das fundações e causavam insegurança jurídica para todos.

Como forma de sanear a questão, o novo diploma introduz modificação na lei das fundações e na de inovação, com a redação que autoriza a Finan-ciadora de Estudos e Projetos (Finep), o Conselho Nacional de Desenvolvi-mento Científico e Tecnológico (CNPq) e as Agências Oficiais de Fomento a realizar convênios e contratos com as fundações de apoio, com finalidade de dar apoio às IFES e às ICTs, inclusive na gestão administrativa e financeira dos projetos. Esse artigo põe termo às intervenções do TCU no que diz respeito às competências das fundações de apoio.

Com relação à Lei nº 8.666 de 1993 - Lei das Licitações - outra modifica-ção importante é a possibilidade de se estabelecer preferências nas licitações para o setor produtivo e de serviços nacionais – fato conhecido como uso do poder de compra do Estado, já praticado nos países da Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE). No que diz respeito à Lei 10.973/04 - Lei de Inovação - ficou prevista a dispensa de licitação para as contratações pressupostas nessa lei.

Ainda que modestas, pode-se dizer que as alterações constantes da nova lei constituem um avanço que nos permitem vislumbrar um futuro promissor para CT&I no Brasil. O país já vem tendo reconhecimento científico e tec-nológico internacional, como comprovam reportagens publicadas na revista Science de 3 de dezembro de 2010 e no The Economist de 26 de janeiro de 2011. Mas ainda é preciso arrumar a casa.

*Presidente da FAPEMIG e do Confap**Assessor da FAPEMIG

29MINAS FAZ CIÊNCIA - SET. A NOV. / 2010

Projeto: Cartografias Urbanas: Re-des, Espaços E Fluxos ComunicativosCoordenador: Regina Helena Alves da SilvaModalidade: Programa Pesquisa-dor MineiroValor: R$ 48.000,00

Carolina Braga

Page 30: Minas faz Ciência 43

Especial

Continuidade dos esforços em prol da Ciência, Tecnologia e Inovação (CT&I) em Minas Gerais e consolida-ção do posicionamento estratégico da FAPEMIG para o Estado. Isso é o que representa a nova estrutura organi-zacional da Fundação, criada através da Lei Delegada 180/182/11, Decreto 45.536/11, que inclui novas assesso-rias, gerências e departamentos, além da reestruturação dos já existentes.

“Esta nova estrutura foi de-mandada por três razões prin-

cipais. A primeira foi o cres-cimento exorbitante da

FAPEMIG nos últimos oito anos, já que

nosso orça-mento está

11 vezes

Nova FAPEMIGNovas assessorias, gerências e departamentos renovam a estrutura e otimizam o trabalho

maior. A segunda diz respeito à Lei de Inovação que abriu portas para que a Fundação atuasse também no setor privado, nas áreas de tecnolo-gia e inovação. Por último, a dimen-são das duas razões anteriores abriu outro braço de atuação da FAPEMIG: o internacional”, explica o presiden-te da Fundação, Mario Neto Borges.

Somente nos últimos oito anos, a FAPEMIG recebeu 81% de todos os seus recursos. Naturalmente, o au-mento reflete no número de projetos apoiados, bolsas concedidas e eventos financiados. Exemplo disso é o próprio orçamento de 2010 da Fundação que, mais uma vez, bateu o próprio recor-de, chegando aos R$ 284 milhões. As parcerias com grandes empresas fo-ram consolidadas por meio de editais lançados, projetos aprovados e even-tos voltados especificamente para sa-nar dúvidas da comunidade científica.

Fiat, Whirlpool, Vale e Ci&T são alguns exemplos de em-

presas que lançaram editais em conjunto

com a Funda-ção em

2010,

totalizando R$ 47 milhões em recur-sos. A internacionalização da FAPEMIG também ganhou formas mais robustas. No início do ano passado, o trabalho em torno do tema era incipiente, com visitas e diálogos ainda em estágio ini-cial. No fim do exercício, os resultados já eram visíveis, com parcerias firma-das, projetos aprovados e eventos re-alizados. Atualmente, já existem editais e projetos em andamento com Alema-nha, Itália, França, Austrália e Inglaterra.

Nova estruturaPara este ano, em que a FAPEMIG

comemora 25 anos de existência, a nova estrutura objetiva a execução dos três eixos em que a instituição atua – Ciência, Tecnologia e Inovação – de acordo com novas necessidades. Para dar suporte à Presidência, foi criada a Chefia de Gabinete, à qual a Central de Informações está subordi-nada, e a Assessoria Científica Interna-cional, para tratar especificamente das parcerias e projetos internacionais.

A Diretoria Científica transfor-mou-se em Diretoria de Ciência, Tec-nologia e Inovação, considerando os três eixos de atuação da entidade. Ela recebeu duas assessorias de apoio -

Assessoria Adjunta de Ciência e Assessoria Adjunta de

Inovação - e tam-bém uma

n o v a

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Criados recentemente(Lei Delegada 180/182/11)

Criados em 2007(Lei Delegada 138/2007)

gerência: a de Inovação. Resultado di-reto da Lei de Inovação, a gerência vai cuidar diretamente das parcerias com o setor empresarial.

A Diretoria de Planejamento, Gestão e Finanças também recebeu duas assessorias adjuntas: a Assesso-ria Adjunta de Finanças e a Assessoria

Adjunta de Planejamento e Gestão. A Gerência de Planejamento e Finan-ças foi desmembrada, tornando-se Gerência de Planejamento e Gestão e Gerência de Finanças. Essa área na FAPEMIG é diferente de outros ór-gãos do Estado, já que cuida da admi-nistração interna e também da gestão

dos programas da Fundação, de onde parte a maior demanda. “Esta nova estrutura tem o objetivo institucio-nal de colocar as peças do tabuleiro nos lugares certos. Com isso, vamos continuar executando nosso trabalho com qualidade e efetividade”, decla-rou o presidente.

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Organograma da FAPEMIG 2011

DTT - Depto de Transferência de TecnologiaDPI - Depto de Propriedade IntelectualDAV - Depto de AvaliaçãoDEA - Depto de Estudos e AnálisesDPB - Depto de Programas de BolsasDIT - Depto de Informações TécnicasDRE - Depto de Relações EmpresariaisDIN - Depto de Propostas de InovaçãoDPL - Depto de Planejamento

DGP - Depto de Gestão de PessoasDCO - Depto de Controle OperacionalDFI - Depto de FinançasDCT - Depto de ContabilidadeDPC - Depto de Prestação de ContasDTI - Depto de Tecnologia da InformaçãoDCL - Depto de ComprasDML - Depto de Materiais, Patrimônio e Serviços Gerais

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Engenharia de tecidos

Banco queguarda vidas

Pesquisadores trabalham para criar o maior centro público integrado de tecidosbiológicos da América Latina

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Um núcleo de estudos e armazena-mento de tecidos humanos. A proposta inovadora e que pode ajudar a salvar vidas é de um grupo de técnicos e ges-tores que trabalham para a criação do Centro de Tecidos Biológicos (Cetebio).

A ideia surgiu durante um congres-so em 2000, quando a doutora Ana Bárbara Proietti era presidente do Hemominas. A atual referência técnica da instituição para o desenvolvimento de projetos internacionais, em viagens à França e Estados Unidos, sempre ouvia falar sobre os bancos de pes-quisa de tecidos humanos. Eles faziam estudos e a estocagem dos materiais para fornecimento a pacientes que ne-cessitassem de enxerto ósseo ou de pele, por exemplo. “Nós começamos a pensar nesse banco integrado quando o assunto ainda não era comentado como hoje”, lembra Proietti.

Em 2007, em congresso no Ca-nadá, a Fundação Hemominas firmou convênio com o Hemocentro Público de Québec (Héma-Québec) a fim de compartilharem conhecimento técni-co para a implantação do Cetebio. “A vantagem é que com a união dos ban-cos é possível fazer um melhor con-trole de qualidade e de produção dos materiais fornecidos, além de prevenir, curar doenças graves, facilitar para re-alização de transplantes e tratamentos hemoterápicos”, explica.

Hoje, as atividades são desenvol-vidas por profissionais da Fundação Hemominas. O projeto tem como objetivo criar o primeiro Centro do país na área e o maior da América La-tina, de acordo com a gerente exe-cutiva, Daniela Marra. “Doze pessoas, entre médicos, biólogos e empreen-dedores, atuam no desenvolvimento do Cetebio”, conta.

Segundo Daniela Marra, no Brasil já existem os bancos de tecidos. Por exemplo: um de pele em Porto Alegre, no Rio Grande do Sul, e dois de válvu-las cardíacas, no mesmo Estado. A dife-rença deste é que será o único do país que vai juntar várias especialidades em um único ambiente. “Com isso, nós conseguimos reduzir custos”, destaca.

Na unidade que funcionará em Lagoa Santa, na Grande BH, serão de-

Foto: Gláucia Rodrigues

senvolvidas pesquisas com seis tipos de tecidos humanos. Pele e sangues raros, além dos bancos de medu-la óssea, válvulas cardíacas, cordão umbilical e placentário e de tecidos musculo-esqueléticos.

O projeto tem o apoio de vários órgãos estaduais, entre eles, a FAPE-MIG, que foi a responsável pela verba para a aquisição dos equipamentos necessários à realização dos estudos. A missão do grupo é sempre dar se-quência ao trabalho que já vem sendo

desenvolvido. “Nosso objetivo, no fu-turo, é atender os pacientes, buscando uma melhora contínua na qualidade dos produtos ofertados e, para isso, vamos continuar expandindo as pes-quisas”, comenta Marra.

O Centro deverá ser inaugurado apenas em 2013. Antes é necessário que cada uma das unidades sejam tes-tadas para que a instituição possa fazer o pedido de funcionamento ao Minis-tério da Saúde e para a Agência Na-cional de Vigilância Sanitária (Anvisa).

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“O Cetebio beneficiará, entre outros pacientes portadores de leucemias e aqueles que tiverem queimaduras de terceiro grau”, conta Marra.

Segundo uma das biólogas do proje-to, Paula Passos, o Hospital João XXIII é referência na América Latina no que diz respeito ao tratamento de queimados. Quando o Banco de Peles estiver em fun-cionamento, ele deverá atender a toda a demanda local. “Estatísticas do Banco do Rio Grande do Sul mostram que, das 17 doações realizadas em 2009, dez foram para pacientes de Minas”, revela.

Cada um dos bancos será mon-tado dentro dos padrões de quali-dade internacionais, mas, a princípio, o material será usado apenas com pacientes atendidos pelo Sistema Único de Saúde (SUS). Porém, a in-tenção é, segundo Daniela Marra, que no futuro haja um intercâmbio com Centros de outros países. Ana Bárbara Proietti, idealizadora do projeto, explica ainda porque foram escolhidos esses tecidos para co-meçarem os testes. “São os que a população brasileira mais necessita atualmente. Depois de implantado o Cetebio, nós vamos estudar novos produtos”, esclarece.

Por dentro dos BancosCada unidade trabalhará com ma-

teriais de doadores vivos (medula ós-sea, sangues raros e cordão umbilical) e mortos (pele, válvulas cardíacas e os-sos). As coletas não ocorrem no Centro e sim em hospitais conveniados com o Cetebio. Por enquanto, foram realiza-das as pesquisas sobre a viabilidade da implantação do banco de peles. A par-te prática dos trabalhos começou em setembro de 2010 e foi concluída em fevereiro de 2011. Os pesquisadores ficaram satisfeitos com os resultados. “Tivemos 100% de aproveitamento, ou seja, atestamos a qualidade da pele que foi retirada e tratada nos nossos labo-ratórios”, conta Paula Passos.

A próxima etapa é a pesquisa dos sangues raros. O início está previsto ainda para este ano. No segundo se-mestre, devem começar os estudos com cordão umbilical e tecidos mus-culo-esqueléticos. Para 2012, serão testados os bancos de válvulas cardí-acas e de medula óssea.

Os processos produtivos das unida-des do Centro acontecem em quatro fases. Na primeira, é feita a recepção, seleção do material e o cadastro com

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informações sobre o doador. Depois, acontece o processamento. Os materiais são testados para ver se há a presença de micro-organismos. Quando detectados, os tecidos passam por novos testes.

Caso o problema continue, eles são descartados ou enviados para pesquisas. Em seguida, ocorre a dis-tribuição que consiste no envio dos tecidos e materiais biológicos com instruções técnicas, visando à ma-nutenção da qualidade e preparação para utilização dos produtos. Por úl-timo, acontece a etapa das pesquisas. São realizados estudos específicos aplicáveis aos bancos do Cetebio para melhoria dos processos e produtos, bem como do desenvolvimento de estudos nas áreas de biologia celular, molecular e engenharia de tecidos.

Ana Flávia de Oliveira

Fotos: Arquivo Cetebio

Título: Subsídio para a aquisição de equipamentosCoordenadora: Daniela MarraModalidade: Edital PPSUSValor: R$ 2.106.749,79

Sequência de fotos ilustra como, após a retirada, a pele é preparada para ser esterilizada ainda no centro cirúrgico

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Como deverá funcionar cada unidade

Banco de Peles: aqueles que são aprovados no tes-te de qualidade passam pelo processamento. Ficam em soluções específicas que esterilizam e preservam as ca-racterísticas naturais da pele.

Banco de Sangues Raros: funcionará em parceria com hemocentros onde será feita triagem de doadores, coleta e fracionamento do sangue. Os hemocentros en-viarão o material com os resultados de exames. Após o recebimento, será encaminhado ao laboratório de proces-samento onde será transferido para uma bolsa de conge-lamento. Nessa fase, são retiradas amostras para testes de compatibilidade antes das transfusões e de controle de qualidade. O sangue recebe um conservante e é congelado. Ele pode ficar, pelo menos, dez anos sem perder as pro-priedades. Assim que houver a solicitação de bolsa e sua compatibilidade for atestada, ela deverá ser descongelada.

Banco de Cordão Umbilical e Placentário: após a captação e triagem do potencial doador e a coleta do sangue de cordão umbilical e placentário, o material pas-sa por um teste de qualidade. Quando estão dentro dos padrões, as bolsas são encaminhadas a um processador, que realizará a separação de cada componente do san-gue e acondicionamento das células-tronco em bolsa de congelamento.

Banco de Tecidos Musculo-esqueléticos: o pro-cessamento consiste na preservação do tecido, por meio

da infusão de uma solução protetora e antibiótico. Ao fi-nal do processo, o tecido é empacotado em embalagem tripla. Assim, poderá ser congelado a uma temperatura de -80°C, por no máximo, cinco anos.

Banco de Medula Óssea: o processamento da me-dula é similar ao de cordão umbilical. Ela deve ser centri-fugada em equipamento refrigerado para realizar a sepa-ração de fases e concentração das células-tronco. Após a centrifugação deverá ser realizada a remoção da camada superior, rica em gorduras. O plasma, camada formada entre a camada rica em gorduras e o concentrado de células-tronco, deverão ser parcialmente removidos.

Em seguida, as células-tronco deverão ser transferidas para bolsa de congelamento apropriada, quando recebe uma solução que auxilia na conservação da medula e se-gue para o congelamento.

Banco de Válvulas Cardíacas: o processamento das válvulas compreende duas etapas – processamento primário e secundário. No primeiro caso, é feita a disse-cação do coração para a extração das válvulas. O tecido fica em uma solução com antibióticos.

No segundo, as válvulas serão lavadas em solução fisio-lógica estéril com o objetivo de retirar todos os resíduos de antibióticos. O tecido deve ser embalado juntamente com uma solução protetora e congelado. Essa metodolo-gia permite armazenar os tecidos por cinco anos.

Fotos: Arquivo Cetebio

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História

Estudos de inovações estéticas e políticas no Brasil dos anos 40 e 50 revelam particularidades do processo de aclimatação dos ideais modernos em países periféricos

Modernidade,ainda que tardia

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O Brasil e a Belo Horizonte de meados do século passado são o palco para a atuação de Vinicius de Moraes e João Cabral de Melo Neto, como diplomatas e poetas, e Juscelino Kubitscheck, como político

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No início da década de 40, quando era prefeito de Belo Horizonte, Jusce-lino Kubitschek atinou, do alto de sua singular perspicácia, para a necessidade de investimento em inovadora propos-ta arquitetônica, cujas peculiaridades seriam posteriormente reconhecidas como os primeiros e irreversíveis pas-sos rumo à grande transformação da estrutura político-cultural da sociedade brasileira. Ao convidar o jovem e pro-missor Oscar Niemeyer a desenhar as imprevistas curvas do complexo da Pampulha – Igrejinha, Casa do Baile e Cassino –, JK não só estimulou o rom-pimento da arquitetura nacional para com os tradicionais traços retos e con-servadores como instaurou, de vez, a discussão em torno da vasta questão: o Brasil deseja tornar-se moderno?

Diante da intrincada pergunta, avolumam-se outros diversos conjun-tos de interrogações, todos referentes ao futuro da grande nação periférica. Nesse cenário, a iniciativa oficial do então prefeito JK, capaz de aproximar políticas de estado a nuances de arte e tecnologia, lança definitivamente o país no processo de modernização que culminará com a construção de Brasília e a consolidação do ideário desenvolvi-mentista expresso no jargão do futuro presidente: “50 anos em 5”.

O gesto de Juscelino como man-datário da capital mineira revela-se imprescindível ao debate de algo ainda mais amplo: o Brasil e sua experiência de modernidade. Afinal, a construção do complexo da Pampulha é o símbo-lo de uma “espécie de narrativa fun-dadora de nossa modernidade tardia”, como ressalta a pesquisadora Eneida Maria de Souza, professora emérita da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) e hoje docente visitante na-cional sênior, pela Capes, da Univer-sidade Federal de São João del-Rei (UFSJ). Desde 1996, quando da criação do projeto de pesquisa Modernidades tardias, que contava com financiamen-to da Fundação Rockfeller, Eneida de-dica-se ao desenvolvimento, ou orien-tação, de diversos estudos que buscam

discutir e desnudar “a(s) face(s)” da modernidade brasileira.

Desde o início do projeto, que se dividiu em três distintas etapas de in-vestigação de aspectos, definições e mutações do “moderno” – Belo Ho-rizonte, Brasil e América Latina –, bus-cou-se compreender o modo – ou “os modos – como a vivência da moderni-dade, em nações periféricas, difere do padrão hegemônico europeu (ver boxe). “No fundo, nossa preocupação sem-pre foi estudar, nesses países, as novas acepções do pós-moderno. Importante ressaltar, contudo, que, ao falarmos de modernidade ‘tardia’, não pensamos em atraso”, afirma a pesquisadora, ao explicar que se trata, na verdade, da observação de “outras experiências de modernidade, considerando o des-compasso temporal de sua atualização, assim como as singularidades múltiplas e divergentes dessa vivência dentro das próprias culturais locais”.

Como se pode perceber, as ativi-dades do projeto de pesquisa, assim como os diversos estudos e produtos que dele se originaram (e ainda se ori-ginam), não se restringem aos efeitos da veia desenvolvimentista de Jusce-lino Kubitschek – como prefeito, na década de 40 ou presidente, nos anos 50. Na verdade, a ideia de “moderni-dades tardias” –ou, em outros termos, de “pós-modernidade” em soberanias periféricas – remonta ao mundo Pós--Segunda Guerra Mundial, quando a hegemonia cultural, política e econô-mica europeia perde terreno para a capacidade de influência dos Estados Unidos. “Importante lembrar que, nesse processo, o desenvolvimento da cultura de massas revela-se muito importante”, conclui Eneida de Souza.

Como forma de explicitar o(s) modo(s) de acepção da modernida-de pelas nações periféricas – ou, mais especificamente, pelo Brasil –, o pro-jeto Modernidades tardias fixou-se, em grande medida, no estudo das expres-sões artísticas. Afora a observação dos traços de Niemeyer, cujos servi-ços são requisitados por JK em dois

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antológicos momentos da história do país, os pesquisadores enfatizaram o estudo de experiências estéticas em literatura, artes plásticas e música. Ao longo dos anos, daí surgiram dezenas de produtos, trabalhos acadêmicos e eventos, além da revista Margens/Márgenes, fruto de parceria entre ins-tituições brasileiras e argentinas, e de pesquisa, financiada pelo CNPq, sobre os intelectuais a serviço de Juscelino.

Do ofício ao poema Fruto do estudo de doutorado do

pesquisador Roniere Menezes, orien-tado por Eneida Maria de Souza e defendido junto à Pós-graduação em Estudos Literários da Faculdade de Le-tras da UFMG em 2008, o livro O traço, a letra e a bossa – literatura e diploma-cia em Cabral, Rosa e Vinícius, lançado pela Editora UFMG, revela, justamente, a intensa relação entre as artes e as modernidades tardias. Ao investigar o diálogo da produção artístico-literária dos escritores e diplomatas João Ca-bral de Melo Neto, João Guimarães Rosa e Vinícius de Moraes com o dis-

curso “do moderno”, o autor acaba por revelar artistas extremamente preocupados com as fissuras propor-cionadas por uma ideia de modernida-de hegemônica.

Além de ler grande parte das obras de Cabral, Rosa e Vinícius, o pesquisa-dor teve acesso a vasto material – em grande parte, inédito – sobre a atua-ção dos três escritores como funcio-nários de carreira do Itamaraty. “Bus-quei trabalhar com escritores que, ao mesmo tempo, fossem intelectuais e pensassem as políticas do cotidiano. Assim, enfatizo, tanto nas obras como nos atos oficiais dos escritores, suas relações de afeto e compartilhamento com o homem comum”, explica Me-nezes ao comentar que se dedicou à compreensão do modo como os três discutiram as fissuras da sociedade en-tão em processo de desenvolvimento e autointerpretação: “fazem isso, con-tudo, sem desprezar a qualidade da linguagem”, acrescenta. Nesse sentido, principalmente nas obras ficcionais, salta aos olhos a aguçada percepção dos escritores em relação a um Brasil

ainda marcado pelo grande abismo en-tre o acelerado processo de moderni-zação e a construção de um projeto – diferenciado – de modernidade.

Em suas iniciativas estéticas indi-viduais, se, por um lado, João Cabral e Guimarães Rosa avançam na ex-perimentação da linguagem, Vinicius mostra-se bastante corajoso ao tran-sitar por searas artísticas diversas, do teatro à música popular. “Em comum, todos fazem literatura moderna, com influência do Brasil popular. Afinal, sa-bem que, nos anos 50, o país está em transformação. De modos distintos, as obras dos três abordam, por exemplo, o diálogo entre tecnologia, homem e natureza”. Roniere chama a atenção, na obra do trio, para a construção de personagens ficcionais preguiçosos, por vezes loucos ou à margem de padrões tradicionais, em atitude intei-ramente resistente à ordem estabele-cida pela temida modernização sem inclusão social.

Maurício Guilherme Silva Jr.

Coisas da pós-modernidade...

Diante da expressão “modernidades tardias”, mui-tos podem traduzi-la como sinônimo de atraso histó-rico, político e/ou cultural, por parte dos países perifé-ricos, em relação às nações dominantes. O complexo conceito, contudo, refere-se, direta e temporalmente, à ideia de “pós-modernidade”, ideário anglo-saxão cuja difusão dá-se, com maior intensidade, após a Segunda Guerra Mundial. Apesar disso, trata-se da versão teó-rica do ideal pós-moderno adequada à compreensão, principalmente, dos países latino-americanos.

Além de não se restringir à ideia do “atraso”, a ideia de “modernidades tardias” busca concentrar, num só “corpo”, as múltiplas formas como os princípios da modernidade aclimataram-se em diversas realidades locais. Além de nova, tal proposta conceitual revela--se ousada por natureza. Afinal, “o modelo ocidental e eurocêntrico das teorias sobre a modernidade foi, por

muito tempo, aceito como único, sem que sua hege-monia fosse contestada”, explica a professora Eneida Maria de Souza.

Ao longo dos tempos, uma série de pensadores e teóricos investe na compreensão do singular proces-so “pós-moderno” das nações periféricas. Vem daí a infinidade de expressões, cunhadas em estudos com objetivos os mais variados, que hoje se entrelaçam à questão. Eis, sinteticamente, alguns dos mais famosos conceitos já criados em tal seara, seguidos por seus autores originais: “modernidade descentrada” (Jesús Martin-Barbero); “modernismo tardio” (Fredric Ja-meson); “modernidades alternativas” (Stuart Hall); “modernidades periféricas” (Beatriz Sarlo); “moder-nização reflexiva” (Anthony Giddens); “contra-mo-dernidade cultural” (Homi Bhabha) e “modernidade líquida” (Zigmund Bauman).

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Lembra dessa?

Animais peçonhentos são normalmente encarados como vilões dos seres humanos, principalmente porque o encontro entre os dois seres vivos pode resultar em uma pica-da venenosa. Entretanto, apesar de serem perigosas, algumas moléculas, encontradas no gene do veneno desses animais, podem ser transformadas em remédios benéficos à saú-de do homem.

Desde 2005, a Rede Mineira de Estudos de Estrutura e Função de Biomoléculas, finan-ciada pela FAPEMIG, faz o estudo de molécu-las encontradas nas toxinas de animais como aranhas do gênero Lycosa, popularmente co-nhecidas como tarântulas, e escorpiões ama-relos, espécie típica da região Sudeste. Em re-portagem publicada na edição nº22 da MINAS FAZ CIÊNCIA, os cientistas já haviam desco-berto que algumas moléculas encontradas no veneno do escorpião tinham ação anti-hiper-tensiva. Na época, duas patentes, uma nacional e outra internacional, foram registradas.

Atualmente, seis anos depois da publi-cação da matéria, o estudo concentra seus esforços na criação de drogas contra hiper-tensão. Segundo Adriano Pimenta, professor do Instituto de Ciências Biológicas (ICB) da UFMG e coordenador da pesquisa, a partir da extração de um peptídeo (proteína formada pela ligação de aminoácidos) encontrado no veneno do escorpião, a proteína passou por uma redução em seu tamanho, preservando os aminoácidos que apresentaram potencial anti-hipertensivo. “Com essa redução, é pos-

sível diminuir custos de produção, elaborar formulações de uso oral, minimizar efeitos colaterais e reações imunológicas e localizar pontos da estrutura protéica com caracterís-ticas farmacológicas”, afirma.

Outra novidade da pesquisa é a inclusão das rãs e pererecas nos estudos do grupo. Entretanto, são as secreções encontradas na pele desses animais, liberadas durante a res-piração, que têm sido avaliadas para verificar quais proteínas têm potencial antimicrobiano. Porém, a identificação está menos avançada em relação ao veneno produzido pelas ara-nhas conhecidas como tarântulas. “Percebe-mos que algumas moléculas encontradas nas toxinas das tarântulas têm boa ação contra bactérias do tipo gram-positivas e negativas, e também contra fungos, mas ainda estamos avaliando estas ações”, explica.

Ainda existem moléculas de toxinas a serem isoladas. De alguns animais, foram descobertas cerca de 500 moléculas e até o momento o estudo conseguiu explorar em profundidade 1% deste total, ou seja, ainda há muito que se analisar e descobrir dentro dessa gama de possibilidades farmacêuticas. Para os próximos anos, algumas metas importantes foram esta-belecidas para o desenvolvimento da pesquisa. “Trabalhamos com duas metas primárias, uma trata-se da descoberta de novas moléculas com potencial científico e tecnológico, a outra, do avanço e aprofundamento nos estudos com moléculas que mostraram algum potencial bio-tecnológico”, observa Pimenta.

Vilões que salvamMoléculas encontradas em toxinas

de aranhas e escorpiões apresentam potencial para criação de remédios contra

bactérias, fungos e hipertensão

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Plantasdesprotegidas

Pesquisadores descobrem que os ácaros são capazes de desarmar o sistema de defesa de plantas. A descoberta pode auxiliar o combate às pragas na agricultura

Biologia

Assim como os seres humanos, as plantas estão cons-tantemente expostas a micro-organismos e desenvolvem sistemas de defesa para prevenir infecções. Os mecanis-mos de defesa variam desde um fortalecimento estrutural, como o enrijecimento das paredes das células, até um au-mento na produção de compostos tóxicos, como aconte-ce em plantas de fumo. Em caso de ataque de um herbívo-ro, as plantas também podem produzir odores que atraem os inimigos desses herbívoros. No entanto, as interações de plantas e herbívoros fazem parte de uma luta evolutiva contínua em que um tenta destruir o outro. Dessa forma, pesquisadores há muito tempo suspeitam que os herbívo-ros de fato possam estar aptos a interferir em alguns dos mecanismos de defesa das plantas.

Apoiados pelo Programa Bolsa Conhecimento Novo da FAPEMIG, um grupo de pesquisadores de Entomologia da Universidade Federal de Viçosa (UFV), da Universidade Federal de Tocantins (UFT) e da University of Amsterdam (UvA), na Holanda, descobriu que os ácaros herbívoros são capazes de manipular a planta e desarmar o seu siste-ma de defesa quando elas são atacadas. As pesquisas de-senvolvidas pelo grupo são as primeiras a produzir evidên-

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Juliana Saragá

cia experimental da defesa de planta pelos herbívoros. Os ácaros herbívo-ros são ácaros que se alimentam de plantas e podem se tornar pragas para a agricultura.

Os pesquisadores descobriram que o ácaro vermelho (Tetranychus evansi) é capaz de eliminar a indução de compostos de defesa em plantas de tomate. Esse tipo de ácaro é o que causa mais danos e perdas na produ-ção de hortaliças. “No tomateiro, esse ácaro produz uma teia muito densa sobre toda a folha. Essa teia serve de proteção contra os seus inimigos na-turais que não conseguem entrar nes-sa estrutura pegajosa. Protegido, esses ácaros se multiplicam rapidamente e começam a alimentar-se das folhas, que necrosadas, levam a planta à mor-te”, explica o pesquisador.

A interferência provou-se tão efe-tiva que as plantas atacadas tornaram--se melhores fontes de alimento e mais atrativas aos ácaros do que as plantas que não sofreram ataques. Os níveis de compostos de defesa tornaram-se ainda mais baixos que em plantas que não estiveram sob ataque.

O trabalho teve início em 2001. Na época, o grupo começou a pesqui-sa investigando a estruturação de teias alimentares em tomateiro. As teias ali-mentares são a estruturação de toda a comunidade de organismos que vivem em um dado local. “Especificamente, estudamos a teia no tomateiro verifi-cando como acontecem as interações de insetos e ácaros pragas com os seus inimigos naturais e a planta. Para o projeto, treinamos mais de seis es-tudantes de iniciação cientifica, três de mestrado e dois de doutorado”, conta Angelo Pallini, pesquisador da UFV e coordenador do projeto. Os estudos começaram investigando a ecologia comportamental dos organismos que compunham a teia no tomateiro e depois evoluíram para a investigação da comunicação química entre preda-dor-presa (praga-planta). O grupo in-vestigou vários insetos predadores e ácaros que podem atuar no controle do T. evansi. Em seguida, os pesquisado-res buscaram entender como o ácaro conseguia explorar a planta. A partir daí, iniciaram-se os estudos de defesa induzida da planta às pragas. “Há apro-ximadamente dois anos, começamos a

produzir alguns artigos com resulta-dos muito promissores, explicando a manipulação de herbívoros sobre as plantas atacadas”, diz.

Segundo Pallini, essas descobertas lançam uma nova luz nas pesquisas sobre as interações planta-herbívoro, proteção de plantas e resistência de plantas a espécies nocivas. “Esse novo conhecimento não é apenas de inte-resse científico, mas também tem im-plicações cruciais para a melhoria e as inovações dos sistemas de manejo sus-tentável de pragas em plantas cultivadas de interesse econômico na agricultura”, revela. A pesquisa foi desenvolvida pelo pesquisador Renato de Almeida Sar-mento, orientado por Pallini e pelo pro-fessor Arne Janssen, da University of Amsterdam. “Ao entendermos o me-canismo que leva a essa manipulação, podemos usar esses conhecimentos para proteção de plantas com interesse econômico, como na agricultura, e me-lhorar o procedimento de pesquisas de plantas resistentes a pragas”, esclarece.

Pesquisa internacionalDesde 1987, o Grupo de Entomo-

logia da UFV possui uma importante parceria com a University of Amster-dam (UvA). Desde então, estudan-tes da UFV vão para a UvA realizar estágios, mestrados e doutorados e vice-versa. “Esse fluxo de estudantes, e também de pesquisadores, torna os laboratórios das duas instituições um ambiente promissor para criar novas e boas ideias de pesquisa. Os dois grupos associam os seus pontos fortes, como equipamentos, recursos humanos, ins-talações, agências de financiamentos, e otimizam as ações para produzir ciência”, afirma Pallini, que também é coordenador desse convênio.

Além da parceria com a Holanda, a Entomologia da UFV também possui convênios com a Colômbia, Estados Unidos (Minessota, Kansas, Florida, Cali-fórnia), Europa (Alemanha, Suécia, Espa-nha, França e Inglaterra), Japão, Austrália, Egito e Moçambique, na África. As par-cerias visam promover o intercâmbio de pesquisa e de pesquisadores, objetivan-do a troca de informações e aferições das pesquisas produzidas em um padrão internacional. “O intercâmbio tem da-dos ótimos frutos para a Entomologia da UFV. Nosso programa de mestrado

e doutorado possui nota máxima na Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes). Essas pesquisas dão a Minas Gerais destaque na área e levam o nome do Estado para todo o Brasil e exterior, podendo ser medido pelo impacto das publicações de Minas nas citações dos indicadores internacionais”, orgulha-se.

Bolsa Conhecimento NovoA Bolsa Conhecimento Novo faz

parte do Programa de Apoio a Cur-sos notas 6 e 7 (PACSS), criada através de um Acordo de Cooperação entre a FAPEMIG e a Capes, assinado em 2009. No caso específico dos cursos com conceito 7, a proposta foi criar estímulos para que eles desenvolvam atividades de pesquisa e pós-gradua-ção em temas novos que representem desafios para as áreas de conhecimen-to. O apoio, concedido por meio da Bolsa Conhecimento Novo, é ofereci-do pelo período de três anos ao pes-quisador talentoso selecionado para atuar na fronteira do conhecimento. São concedidos R$ 300 mil por três anos, com bolsas mensais no valor de R$ 6 mil. O programa concede ainda um valor de custeio para apoio ao projeto do pesquisador.

Para Angelo Pallini, a modalidade é uma inovação. “O que acontece é que geralmente os projetos propostos mudam com o decorrer da pesquisa. Para mudar o que foi antes proposto, o pesquisador tem que mandar para a agência de fomento uma enormida-de de formulários, relatórios e outros documentos que acabam por desviar a energia da pesquisa para a burocracia. A bolsa Conhecimento Novo inova em tudo, inclusive em dar liberdade ao pesquisador para direcionar o uso do recurso. Isso não significa que o pesqui-sador não tem que comprovar o que fez, mas que pode se dedicar e canalizar suas energias na pesquisa”, relata Pallini.

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Projeto: Ecologia de Comunida-des e defesa de plantasCoordenador: Angelo PalliniModalidade: Bolsa Conhecimento NovoValor: R$ 300.000,00

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MercadoEducação financeira

Desenvolvido pela empresa Cedro Games, com financiamento da FAPEMIG, o game on-line Goumi diverte crianças e jovens ao tratar de noções básicas de economia

Ojogoem

dinheiro

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Dados divulgados pela Câmara Nacional dos Dirigentes Lojistas (CNDL), em parceria com o Serviço de Proteção ao Crédito (SPC), revelam que, ao longo de 12 meses, houve aumento de 10,23% no número de pessoas físicas registra-das no temido SPC. Preocupante, tal elevação no volume de devedores oficialmente cadastrados pode ser analisada como fruto de causas técni-cas diversas, entre as quais a enorme facilidade de crédito hoje em voga no mercado brasileiro. Uma das explicações mais relevantes e plausíveis para o fenômeno da inadimplência no país, con-tudo, diz respeito à rotina íntima dos cidadãos: a falta de cuidados com a própria saúde financeira é responsável por levar milhões de indivíduos ao desespero ou à bancarrota.

Para muito além dos chamados fatores eco-nomicistas, a capacidade de lidar com o dinheiro de forma saudável relaciona-se diretamente aos ensinamentos que, desde a infância, o cidadão/consumidor recebe de pessoas ou instituições próximas. Em outras palavras, como em tantas áreas do fazer humano, também na administra-ção do “dim-dim nosso de cada dia”, a palavra de ordem parece ser “educação”. De olhos abertos, justamente à proposta de formar pessoas que sai-bam lidar melhor com seus gastos e rendimentos cotidianos, os profissionais da Cedro Games –

dinheiro

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vertente de atuação da Cedro Finances, empresa especializada na concepção de tecnologias para o mercado financeiro – investiram na criação do inteligente e divertido Goumi (www.goumi.com.br), jogo de computador on-line destinado a crianças e jovens de 6 a 14 anos.

Em termos técnicos, a lúdica fer-ramenta pode ser definida como um Massive Multiplayer Online (MMO), cuja nomenclatura não possui tradução sa-tisfatória para o português, mas é capaz de resumir tanto as facilidades como as múltiplas ações do produto: em primei-ro lugar, para participar do Goumi, basta aos jovens internautas cadastrarem-se gratuitamente no site do jogo; a partir daí, passam a conviver, em ambiente virtual, com milhares de personagens, situações e desafios. “Dentro de nossa proposta de educar as crianças finan-ceiramente, o Goumi reproduz ambien-tes e fatos da vida em sociedade. No jogo, a todo momento, elas aprendem a conviver com demandas do dia a dia e a fazer escolhas importantes”, ressalta Clauton Veloso Pugas, executivo de ne-gócios da Cedro Games.

Eu “tô” com fome!Ao ingressar no Goumi, o novo

jogador transmuta-se num persona-

gem virtual que faz, simplesmente, de tudo: acorda, banha-se ao chuveiro, toma café, planta árvores, conversa com vizinhos (os jogadores on-line), ou compra, vende e troca objetos e produtos. Para que se dê bem nesse complexo cenário da vida cotidiana, o internauta precisará de muita orga-nização, paciência e disciplina. Afinal, além de controlar os movimentos de seu “alter ego” virtual, terá de acom-panhar a saúde da personagem que, a todo instante, tem baixas de energia, sente fome, carece de higiene ou de relacionamentos afetivos.

Além disso, de tempos em tempos, surgem, na tela do computador, contas a serem pagas em “Mics”, o dinheiro corrente no jogo. Trata-se dos valores gastos com água, luz, moradia etc. “Tudo isso permite que a criança compreenda a necessidade de equilibrar ações. Se o bonequinho não toma banho, por exemplo, uma série de moscas apare-ce em sua cabeça. Caso o jogador não aja rapidamente, seu personagem pode ficar doente e precisará ir ao hospital onde, se não tiver poupado dinheiro para comprar remédio e se curar, verá diminuir, na tela, a carga de seu ‘nível de vida’”, explica Pugas.

O “mundo Goumi”, comunidade virtual na qual os hoje cerca de 2.500

jogadores cadastrados no site reali-zam suas ações, conta com diversos ambientes diferenciados. Na brinca-deira eletrônica, além da “área dos iniciantes”, de onde começam os mais novos participantes, os bonequinhos – ou avatares – têm acesso a residências (próprias ou alheias), hospital, loja de roupas, bolsa de valores, praça, espaço de jogos, banco, loja de móveis ou casa da agricultura. O que salta aos olhos, em cada um desses estabelecimentos, é a riqueza de detalhes e de ações possíveis, tudo em tecnologia 3D.

Se desejar comprar uma roupa, por exemplo, o jogador segue à referi-da loja onde seu personagem virtual é recebido por vendedores devidamente treinados para o serviço. Além de esco-lher algo em meio à ampla variedade de produtos oferecidos – de bonés a vesti-dos, de sapatos a capacetes para ciclis-mo –, é preciso, porém, conferir a quan-tia de dinheiro que se tem “em mãos”. Do contrário, melhor deixar de lado a realização do negócio. Afinal, antes de adquirir qualquer coisa, é sempre vital lembrar que há contas a serem pagas ao final de cada passagem de “Tics”, a marca de tempo no Goumi: “Todos os produtos a serem adquiridos no jogo têm preço. E nenhum valor é fixo. De uma hora para outra, eles podem variar

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Fotos: Reprodução

Reprodução de situações enfrentadas pelos participantes do jogo Goumi

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bastante”, explica Pugas, ao ressaltar como tais variações são importantes para que as crianças compreendam as oscilações do mercado.

Outra interessante iniciativa de edu-cação financeira do jogo diz respeito à abordagem, implícita e divertida, em tor-no do valor intangível dos bens de con-sumo. No Goumi, o preço de um simples regador de plantas, necessário ao cultivo de sementes – uma das mais tradicionais atividades econômicas do brinquedo eletrônico –, pode apresentar variações de até 400%. Tal absurda disparidade de custo faz com o que os pequenos inter-nautas tenham ciência de um dos mais tradicionais duelos nas “arenas” do mer-cado: funcionalidade versus marca. “Vive-mos num mundo consumista. Nele, há produtos iguais, com a mesma finalidade, mas com preços completamente distin-tos. Ao abordar tal questão no jogo, as crianças podem perceber que, muitas vezes, as marcas têm valor superior ao de sua função prática”, ressalta Pugas.

A necessidade de “capital de giros” é outra questão trabalhada pedagogi-camente pelo Goumi. Afinal, na vida de carne e osso – assim como no ambien-te virtual –, nada mais relevante do que uma graninha guardada para mo-mentos de emergência. “As crianças aprendem a pagar e a juntar dinheiro,

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já que, sem reservas, terão problemas na hora de acertar as contas”, afirma o executivo de negócios da Cedro Ga-mes, ao lembrar outra surpreendente – e solidária – possibilidade do jogo: “Além de poupar, investir e gastar, os jogadores podem doar produtos uns aos outros. Temos percebido que mui-tos participantes fazem doações de sementes para que seus vizinhos, mui-tas vezes em dificuldade, possam reco-meçar a vida no mundo Goumi”.

Desde que entrou oficialmente “no ar”, o jogo não para de crescer, do número de participantes à quantidade de desafios e princípios pedagógicos propostos. Em breve, uma série de novidades será acrescida à brincadeira eletrônica, da inclusão de animais de estimação, que precisarão de cuidados especiais, à discussão em torno da pre-vidência privada. “Além disso, deseja-mos fazer com que as crianças e jovens compreendam, por exemplo, o papel das agências de seguro para proteção de casas ou carros”, afirma Pugas. Pelo que se infere, assim como nesse grande e complexo planeta Terra, os próximos tempos – ou seriam “Tics”? – do mun-do Goumi serão marcados por impres-sionante crescimento populacional.

Metas tridimensionais

Ainda em pleno estágio de desen-volvimento, apesar do já sofisticado nível de detalhes gráficos e da ampla possibilidade de ações, o Goumi se marca pela facilidade de operação. Para adentrar à realidade virtual, além do acesso à página www.goumi.com.br, basta ao internauta um computador com recursos básicos: Windows XP e 1 gigabyte de memória RAM. Após cadastrar-se e baixar um programi-nha open beta, o jogador deve criar e personalizar seu avatar (o bonequinho virtual), para, em seguida, ganhar di-nheiro, comprar itens para a nova casa e cuidar bem da personagem fictícia, impedindo-a de adoecer e morrer.

Todo realizado em tecnologia 3D, o Goumi foi criado por equipe composta de dez profissionais. Há cerca de qua-tro anos, após contratação de uma es-trutura de software junto à empresa de tecnologia norte-americana, os brasilei-ros da Cedro Games iniciaram o de-senvolvimento das mil e uma atrações pedagógicas do jogo. Além do executi-vo de negócios Clauton Pugas, o pro-jeto conta com especialistas em arte e responsáveis por servidores e clientes. “Nosso desejo, a partir do Goumi, é transformar a empresa em referência, nacional e internacional, no desenvolvi-mento de games”, afirma Pugas.

Maurício Guilherme Silva Jr.

Projeto: Desenvolvimento de métodos didáticos para o ensino de mercado de capitais a crianças e adolescentes Goumi Modalidade: PAPPE II – SubvençãoCoordenador: Leonardo dos Reis VilelaValor: R$ 414.938,00

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MercadoTecnologia

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As tecnologias digitais lançaram o mundo em um redemoinho em que é quase impossível acompanhar todas as mudanças que ocorrem quase que semanalmente. O Brasil não fica de fora das inovações nessa área, como o advento da Televisão Digital Interativa (TVDI). Com ela, surge a possibilidade de oferta de uma vasta gama de novos serviços e aplicações (comércio eletrô-nico, educação a distância e governo eletrônico são alguns típicos exemplos) que permitam a intervenção do teles-pectador, oferecendo formas de inte-ratividade até então desconhecidas no universo do sistema de televisão ana-lógico. Essa é a opinião do pesquisador Membro do Sistema Brasileiro de Tele-visão Digital Terrestre (SBTVD-T) João Benedito dos Santos Junior.

Professor do curso de Ciência da Computação da PUC Minas Campus

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l Projeto desenvolve aplicativos e serviços interativos, promovendo ações de inclusão digital via interação do telespectador com o conteúdo televisivo

Poços de Caldas, ele faz uma ressalva: “No entanto, por ser uma tecnologia relativamente nova, com poucos pa-drões definidos e pesquisas em an-damento, a construção de aplicações, serviços e sistemas para TVDI ainda é um desafio, especialmente para aque-les que têm seus interesses comer-ciais e/ou pessoais associados ao uni-verso da televisão, mas não dominam tecnologias e ferramentas computa-cionais”, afirma. Em sua opinião, o que aparenta ser, num primeiro momento, uma adaptação do desenvolvimento de aplicações para computadores a um ambiente de televisão, mostra-se, na realidade, “um complexo e novo universo para atividades como pro-gramação e desenvolvimento, espe-cialmente em termos das estratégias que devem ser adotadas para a inte-ração do telespectador”.

Um sistema de Televisão Digital Interativa, observa Santos Junior, deve ser compreendido em todos os está-gios do ciclo de um programa televi-sivo e de suas aplicações interativas. “Essas aplicações têm início com a produção e distribuição do carrossel de dados (fluxos de áudio, vídeo e da-dos), seguidos da formatação do con-teúdo audiovisual e dos controles de interação para apresentação no termi-nal de acesso ao sistema de televisão digital”. E, depois, com o fechamento na interatividade do telespectador, tanto em nível local no terminal de acesso quanto à utilização de canal de retorno. Conhecendo a Dengue, Mé-dicos em sua Casa, Testes de Saúde e Por dentro da Administração Pública são alguns dos aplicativos e serviços interativos desenvolvidos na pesquisa coordenada por Santos Junior e que

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Fabrício Marques

estimulam a participação do telespec-tador, e, como consequência, a inclu-são digital.

As nove aplicações que compõem o Guia de Serviços Interativos para o Canal da Cidadania estão em estágio avançado de desenvolvimento. Todas as aplicações já se encontram em estado de protótipo funcional, sendo que a primeira versão completa do guia po-derá ser testada já no início do segundo semestre de 2011. A nossa expectativa é prover esse conjunto de aplicações sem qualquer custo para o telespecta-dor. Isso será possível através de par-cerias que envolvam a PUC Minas, o governo (em todas as suas esferas) e empresas fabricantes de equipamentos.

O projeto depende da implantação do Canal de Cidadania, cujas diretrizes foram lançadas em março de 2010. O Canal da Cidadania é um dos quatro canais que a União poderá explorar no serviço de radiodifusão de sons e imagens em tecnologia digital. A pro-posta é fazer programação com pro-duções locais independentes. Nesse contexto, espera-se que já em 2012 testes possam ser realizados para via-bilizar a distribuição das aplicações in-terativas para os telespectadores, bem como identificar eventuais problemas com a interação do telespectador.

ContextoSantos Junior explica que as pes-

quisas com Televisão Digital no Brasil tiveram início ainda na década de 80, quando diversos pesquisadores já tra-balhavam com multimídia interativa e com áudio e vídeo digitais. O pes-quisador faz um resumo do contexto histórico das discussões sobre o Siste-ma Brasileiro de Televisão Digital Ter-restre (SBTVD-T), que tiveram início no governo de Fernando Henrique Cardoso, quando o foco central estava simplesmente na escolha entre os três sistemas internacionais (americano, europeu e japonês) existentes à épo-ca. No início do primeiro mandato de Luis Inácio Lula da Silva, o debate avan-çou para a possibilidade de se criar um Sistema Brasileiro de Televisão Digital com tecnologia nacional. Ainda em 2003, houve diversas iniciativas para

definir as políticas de TV Digital.No Brasil, foram credenciados cer-

ca de oitenta centros de pesquisa para desenvolvimento dos componentes do SBTVD. Em Minas, grupos de pesquisa de três universidades foram credencia-dos: da UFMG, em Belo Horizonte; do INATEL, em Santa Rita do Sapucaí; e da PUC Minas, em Poços de Caldas, onde, desde 2002, funciona o Laboratório de Televisão Digital Interativa, também co-ordenado por Santos Junior.

Em junho de 2006, foi instituído oficialmente o Sistema Brasileiro de Televisão Digital, contemplando parte das tecnologias desenvolvidas no Brasil (especialmente na parte do software) e acolhendo parte da tecnologia japone-sa, fruto de uma parceria firmada entre os governos dos dois países. Em janeiro de 2007, o sistema nipo-brasileiro pas-sou, oficialmente, a ser denominado de ISDB-TB (Integrated System for Data Bro-adcasting – Terrestrial Brazilian).

A partir de 2 de dezembro de 2007, teve início a transmissão de sinal televisivo em formato digital, porém de forma restrita à cidade de São Pau-lo. Ao longo de 2008 e 2009, outras capitais, como Belo Horizonte, Rio de Janeiro, Brasília, Salvador, Manaus e Porto Alegre, também iniciaram a transmissão/recepção digital.

Em 2011, o SBTVD-T encontra-se em fase de expansão da cobertura do sinal televisivo digital e também em fase inicial de testes de algumas apli-cações interativas pelas emissoras que contam com maiores recursos para investimentos.

“As ‘maravilhas’ da TV digital são novidades vinculadas à criação de ser-viços comerciais, como venda intera-tiva, jogos, consultas personalizadas (previsão do tempo, resultado de jo-gos), pay-per-view, dentre outros servi-ços e aplicações”, frisa Santos Junior. Ele ressalta que, nesse sentido, muitas vezes, direciona-se o foco somente nos aspectos comerciais e no retor-no de investimentos para as emissoras de televisão. “No entanto, o sistema de televisão digital pode cumprir um importante papel na afirmação da ci-dadania”, diz. E exemplifica: “com o uso da interatividade, é possível dispo-nibilizar nos lares brasileiros serviços interativos de educação, de governo eletrônico (declaração de imposto de

renda, pagamento de tributos, extrato de fundo de garantia por tempo de serviço – FGTS, boletim escolar dos filhos, dentre outros), uso de correio eletrônico (cada brasileiro com uma conta de e-mail) e acesso irrestrito e gratuito à comunicação via Internet”.

O que éTelevisão Digital?

“O primeiro passo importante para compreender Televisão Digital é entender que ‘Televisão’ não é ‘Televi-sor”, diz o pesquisador João Benedito dos Santos Junior. Ele explica que o televisor é um equipamento capaz de receber sinais de televisão que, por sua vez, é um sistema se que utiliza das Te-lecomunicações para apresentar uma representação (visão) de um determi-nado conteúdo. Esse conceito de tele-visão é muito importante no contexto do sistema de televisão digital, uma vez que os aspectos de convergência entre sistemas digitais diferentes (televisão, telefonia móvel, telefonia fixa, dentre outros) permitirão que sinais televi-sivos digitais sejam recebidos em di-versos equipamentos diferentes e não somente no televisor, que é o único equipamento capaz de receber sinais de televisão no sistema analógico.

“A Televisão Digital é um sistema que envolve a produção, a distribuição, a recepção, a formatação e a apresen-tação do conteúdo televisivo em meio digital”, observa Santos Junior. De acor-do com o pesquisador, o sinal digital produzido nas emissoras é enviado aos aparelhos de recepção dos telespecta-dores e esses aparelhos devem estar preparados para receber sinal digital. Atualmente, as emissoras já produzem seu conteúdo em formato digital; no entanto, são obrigadas a transmiti-lo em meio analógico, uma vez que esse é o modelo em uso no Brasil.

Projeto: Uma plataforma conver-gente para distribuição de conteú-dos digitais multimídia em ambien-tes de televisão digital interativaCoordenador: João Benedito dos Santos JuniorModalidade: Programa Pesquisa-dor Mineiro - Fase III - 2009 a 2011Valor: R$ 48.000,00

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MercadoNotas

SBPC: NOVAS POLíTICAS DE C&T E 63ª REUNIÃO ANUAL

Os ministros da Educação, Fer-nando Haddad, da Saúde, Alexandre Padilha, de Ciência e Tecnologia, Alo-ísio Mercadante, e a ministra do Meio Ambiente, Izabella Teixeira, participa-ram de reunião com conselheiros da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência para discutir políticas go-vernamentais para a ciência e tecnolo-gia do Brasil. Os ministérios presentes foram convidados por apresentarem ações que interferem diretamente nas políticas de Ciência e Tecnologia. O objetivo da reunião é promover maior integração entre as políticas

dos ministérios e apresentar aos mi-nistros as expectativas da comuni-dade científica em relação aos seus mandatos. E no meio do ano aconte-ce na Universidade Federal de Goiás (UFG), em Goiânia, entre os dias 10 e 15 de julho, a 63ª Reunião Anual da SBPC. As conferências, simpósios e mesas-redondas com cientistas de todo o Brasil vão discursar sobre o tema: “Cerrado: água, alimento e energia”. Outras atividades pre-vistas na agenda são os minicursos para universitários, pesquisadores e professores e alunos do ensino bási-

co e técnico da rede pública brasilei-ra. Outras programações acontecem paralelamente, como a SBPC Jovem, exclusiva para estudantes do ensino básico e técnico; a Expo C e T, exposi-ção de ciência e tecnologia; e a SBPC Cultural, que mostra a cultura local da cidade onde ocorre a reunião. O evento é gratuito e para todos os pú-blicos. É necessária a inscrição apenas para quem vai apresentar trabalhos científicos ou participar de algum dos minicursos. Mais informações no site

http://www.sbpcnet.org.br/goiania/home/.

Trabalho apresentado no VI Simpósio ibero-americano de analises sensorial ocorrido na cidade de São Paulo, no fim de 2010, foi agraciado com o prêmio de melhor apresenta-ção da conferência. Desenvolvido pelos pesquisadores Clei-ton Nunes, Ana Carla Marques e Sabrina Bastos, da Univer-sidade Federal de Lavras, o estudo avaliou a opinião sensorial (visual, sabor, cheiro) dos consumidores em relação a alguns produtos alimentícios, como pães, hambúrgueres e iogurtes, determinando qual das marcas disponíveis é mais bem aceita no mercado. Segundo Nunes, o diferencial da pesquisa é a inclusão das percepções visuais, olfativas e gustativas. “Esse estudo consegue analisar todas as características sensoriais que classificam um produto alimentício como bem aceito pelo consumidor, conseguindo definir melhor qual o seu su-cesso nas prateleiras”, explica Nunes. A pesquisa está em fase de conclusão e uma nova perspectiva que surgiu é a de desenvolver um software de aplicação do teste sensorial.

Prêmio para pesquisa do departamento de ciência dos alimentos da UFLA

Em encontro promovido pelo Conselho Fe-deral de Engenharia, Arquitetura e Agronomia (Confea), o ministro de Ciência e Tecnologia, Aloizio Mercadante, anunciou que está em fase de estruturação um plano nacional para engenharias que tem como objetivo estimular profissionais formados a se especializarem e formar tecnólogos na profissão para preencher áreas com déficit de mão de obra especializada na indústria e constru-ção civil. A preocupação de Mercadante se revela em números. Segundo o Confea, o Brasil forma anualmente de 30 a 35 mil engenheiros, enquanto a demanda real do mercado é de 60 mil. O minis-tro salientou em seu discurso que o Brasil avan-çou na formação de mestres e doutores, que em 2010 chegou ao número de 50 mil pós-graduados, mas que é preciso investir na formação de tecnó-logos e na especialização dos engenheiros, princi-palmente porque 2011 é o ano do Pré-Sal. “Agora nós vamos ter que combinar uma engenharia mais longa com uma engenharia mais curta para aten-der a determinados setores da cadeia produtiva. Só no Pré-Sal, nós vamos precisar de 200 mil en-genheiros nos próximos 15 anos”, afirmou Mer-cadante. O plano nacional para engenharias terá a participação de instituições de ensino superior e agências de fomento à pesquisa.

MCT anuncia criação de programa Nacional para Engenharias

Foto: Divulgação

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Estudantes da Ufop participam do projeto Aerodesign

Alunos da Universidade Federal de Ouro Preto (Ufop) se preparam para par-ticipar da 13ª edição do projeto Aerode-sign. A competição envolve estudantes de engenharia aeronáutica de diversos países, como Índia, Estados Unidos e Venezuela, que devem projetar e construir uma ae-ronave rádio-controlada a partir de técni-cas empregadas na construção de grandes aviões. Para vencer a disputa, o projeto dos estudantes mineiros deve passar por duas etapas: a primeira é ter o projeto avaliado por comissão de engenheiros

da Embraer. A segunda etapa consiste em avaliar na prática se a aeronave consegue contrabalancear o seu peso com o trans-porte de carga máxima. Os três primeiros colocados na competição vão representar o Brasil na competição internacional nos Estados Unidos. O Projeto Aerodesign é organizado pela Sociedade dos Engenhei-ros da Mobilidade e acontece no período de 20 a 23 de outubro no Centro Técnico Aeroespacial de São José dos Campos-SP. As inscrições já foram encerradas.

3º PRÊMIO PAULO GONTIJOInstituto não governamental Pau-

lo Gontijo premia este ano o melhor estudo científico na área de medicina sobre a ELA, Esclerose Lateral Amio-trófica. O objetivo da premiação é estimular pesquisas na área médica e apresentar para a comunidade cientí-fica e população os avanços e novas descobertas sobre a doença. Con-correm ao prêmio pesquisadores do Brasil e do exterior. A premiação acontece no 22º Simpósio Interna-

cional ELA/Doença do Neurônio Motor, em Sydney, Austrália, no mês de novembro. Em 2009, o vencedor foi o cientista Belga Peter Carmeliet que inscreveu estudo inédito que de-monstra a ação de uma proteína que funciona como fator neuroprotetor da Esclerose Lateral Amiotrófica. Mais informações sobre o prêmio, novidades e pesquisas sobre a do-ença podem ser encontradas no site www.todosporela.com.br.

ONU anuncia 2011 como Ano Internacional da Química

Na 179ª reunião do Conselho Executivo da Organização das Nações Unidas para a Educa-ção, Ciência e Cultura (Unesco), foi aprovada pelos 24 países participantes do Conselho a proclamação de 2011 como Ano Internacio-nal da Química. O objetivo a ser alcançado com a efeméride é tornar os conhecimentos da química acessíveis ao grande público, des-pertar nos jovens o interesse por essa ciência e mostrar a importância dela para as neces-sidades do mundo. Outro ponto fundamental para a definição do calendário é o centenário de concessão do Prêmio Nobel de Química a Maria Sklodowska-Curie, que venceu o Nobel de Química por ter descoberto os elementos químicos rádio e polônio. Além da homenagem à química, a ONU também vai homenagear os

feitos científicos realizados por mulheres do mundo dessa ciência. Em todo o planeta, serão realizados eventos artísticos e científicos que vão exaltar as importantes contribuições dessa área para o conhecimento, a proteção do meio ambiente, os avanços proporcionados à saúde e a ajuda no desenvolvimento econômico mun-dial. A Unesco, em parceria com a União Inter-nacional de Química Pura e Aplicada (Iupac), e suas organizações e federações associadas em todo o mundo são responsáveis por organizar, promover e divulgar eventos que vão ocorrer ao longo do ano para celebração do ano da química. Informação sobre os eventos no Brasil acesse o site http://quimica2011.org.br/; para conferir a programação internacional o endereço é www.chemistry2011.org.

O acesso ao conteúdo da escola Britânica já está disponível e podem ser utilizadas nos laboratórios das escolas no desenvolvimento de ati-vidades ligadas as disciplinas de cada série do ensino fundamental. De acor-do com o INEP, Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira mais de 27 milhões de alunos vão utilizar o conteúdo on-line da escola britânica. Os ma-teriais oferecidos on-line são artigos de enciclopédia, imagens, vídeos, bio-grafias, noticias voltadas para crianças, jogos interativos e atlas e incorpora a tecnologia do Google Maps. Esse trabalho inaugura uma nova frente de trabalho do Portal de Periódicos da Capes que agora incluí em seus processos de formação e capacitação professores da rede pública e educa-ção de alunos do ensino fundamental e médio e educação à distância.

Conteúdo para aperfeiçoamento de professores e alunos do ensino fundamental

Foto: Divulgação

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Cientistas brasileiros

2011 foi escolhido pela Or-ganização das Nações Unidas (ONU) como o Ano Internacio-nal da Química. Essa ciência é de grande importância nacional e internacional, pois contribuiu e ainda colabora para o desen-volvimento de diversas áreas da ciência e tecnologia, como meio ambiente, saúde e economia. Nesse contexto de celebração da Química a Thompson Reuters, agência mundial de informações, elegeu os cem químicos que se destacaram mundialmente, nes-te ano, por apresentarem em seu currículo maior número de publi-cações e citações por pesquisa. O professor, pesquisador e membro da Academia Brasileira de Ciên-cias, o químico Jairton Dupont, teve seu nome em destaque na lista da Reuters. Atualmente, Jairton é professor do depar-tamento de Química Orgânica da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) onde de-senvolve pesquisas com líquidos iônicos e suas potenciais aplica-ções em catálise, nanomateriais e energias alternativas.

O que significa ter o seu nome na lista mundial da Thomson Re-auters dos cem químicos com maior número de publicações e citações por pesquisa?

Em primeiro lugar, reflete a quali-dade da Química desenvolvida pelo Grupo de Pesquisa em Catálise, ao qual pertenço, e a entrada definitiva da Química da UFRGS no mapa dos Cen-tros de Excelência. Em segundo lugar, simboliza o acerto no investimento contínuo feito pelo governo federal nos últimos anos na pesquisa e princi-palmente na pós-graduação brasileira.

O senhor é o único brasileiro e ibero-americano citado. Isso pode trazer uma maior visibilida-de para a ciência brasileira desen-volvida na área química?

Sim, pode trazer maior interesse, tendo em vista que não aparecem na lista países com maior tradição e in-vestimento em Ciência, como Espa-nha, Rússia, China e Índia. Entretanto, acho que temos que aprender muito com o lado de cima da lista: 70 traba-lham em instituições dos EUA e sete na Alemanha.

A Química brasileira precisa avançar em relação à internacio-nal? Deixa a desejar em algum ponto? No que avançou?

O número de cientistas atuantes do Brasil é ainda muito pequeno (so-mente a cidade de Boston, nos EUA, tem mais doutores em Química que no Brasil inteiro), muito aquém de nossas necessidades prementes. Certo, foram criadas as bases para a formação de pessoal, técnicos en-genheiros, professores e geração de ciência e tecnologia para inovação com a entrada no sistema dos Ins-titutos Federais de Educação Pro-fissional e Tecnológica (IFETs), no-vas universidades, PRO-Uni e novos campi, por exemplo.

Entretanto, não temos os mestres e doutores em quantidade e qualida-de (nas áreas de exatas e engenharias, principalmente) suficientes sequer para atender à expansão do ensino superior, sem mencionar a demanda do setor não acadêmico com a en-trada do Pré-Sal. O país necessita de gente qualificada em todos os níveis para fazer ciência.

2011 é o ano mundial da Quí-mica. Como essa efeméride pode

ajudar a desenvolver melhor essa ciência no Brasil?

Nós (brasileiros) estamos num momento singular de nossa história científica e tecnológica e poderemos brevemente passar de espectadores a atores de base tecnológica e compe-titividade global. Entretanto, isso so-mente ocorrerá com a continuidade nos investimentos públicos que vêm sendo feitos nos últimos oito anos.

Qual a mensagem do senhor para os cientistas químicos brasi-leiros e para os jovens que pen-sam em seguir carreira acadêmi-ca e de pesquisa?

Estamos num momento singu-lar em que já produzimos ciência em quantidade, mas ainda deixamos a desejar em qualidade e aplicabilidade. Portanto, o desafio é gerar mais ciên-cia, tecnologia e inovação de qualidade e nos dedicarmos com maior atenção à formação básica e global de nossos futuros mestres e doutores.

Foto: Divulgação

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