manejo agroecológico do solo: aprendendo a conviver com os efeitos da seca

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O agricultor Tarcísio Carlos Pessoa e a agricultora Maria das Graças Saraiva residem com sua família no sítio Caetano, no município de Pereiro, distante oito quilômetros da zona urbana, no Vale do Jaguaribe. Eles vivem da agricultura, com o cultivo do feijão, milho, batata e jerimum no período chuvoso; e frutíferas: banana, manga, goiaba e mamão em período de estiagem. A história de Tarcísio e Maria é cheia de emoção. Ele vive um romance com a família, a comunidade e o meio ambiente. A paixão dos dois pela terra, pela água, pela vida faz com que acordem cedo e fiquem durante horas desenvolvendo práticas viáveis e adaptáveis à região. A cobertura do solo para manter a umidade, é um dos exemplos das atividades agroecológicas desenvolvidas pela família. Até bem pouco tempo a família de Tarcísio enfrentava grande desafio com a falta de terra e água. Logo quando se casou ele ficou com a esposa trabalhando na terra do sogro para garantir a alimentação da família. Somente depois, com a criação de uns bodes conseguiu adquirir três hectares de terra. “A gente precisava da terra, porque o/a trabalhador/a do campo sem terra não vive”, declara Maria. Depois de adquirir a terra, Tarcísio e sua família continuaram enfrentando dificuldades. A falta de água passou a ser o maior entrave. Andavam mais de três quilômetros com um jumento selado e duas ancoretas para pegar água. Às vezes chegavam à cacimba e não tinha, outras vezes o “dono” da propriedade os impedia de pegar. “O povo negava água. Colocava arame e espinho pra gente não passar, e o jeito era voltar pra casa sem água e sem saber o que fazer, porque eram os animais e a gente pra beber”, lamenta Tarcísio. No ano 2008, com a chegada do Programa Um Milhão de Cisternas (P1MC), da Articulação no Semi-Árido Brasileiro (ASA) na comunidade, Tarcísio foi convidado pela Comissão Municipal de Convivência com o Semiárido para uma reunião, onde seria discutido o Programa e Ceará Ano 6 | nº 993 | Outubro | 2012 Pereiro - Ceará Boletim Informativo do Programa Uma Terra e Duas Águas Manejo agroecológico do solo: aprendendo a conviver com os efeitos da seca 1 A união da família é vista como estratégia para lutar e viver melhor Com a cobertura, o solo permanece úmido por mais tempo

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O agricultor Tarcísio Carlos Pessoa e aagricultora Maria das Graças Saraiva residemcom sua família no sítio Caetano, no município dePereiro, distante oito quilômetros da zonaurbana, no Vale do Jaguaribe. Eles vivem daagricultura, com o cultivo do feijão, milho, batatae jerimum no período chuvoso; e frutíferas:banana, manga, goiaba e mamão em período deestiagem.

A história de Tarcísio e Maria é cheia de emoção.Ele vive um romance com a família, acomunidade e o meio ambiente. A paixão dosdois pela terra, pela água, pela vida faz com queacordem cedo e fiquem durante horasdesenvolvendo práticas viáveis e adaptáveis àregião. A cobertura do solo para manter aumidade, é um dos exemplos das atividadesagroecológicas desenvolvidas pela família.

Até bem pouco tempo a família de Tarcísio enfrentava grande desafio com a falta de terra e água. Logoquando se casou ele ficou com a esposa trabalhando na terra do sogro para garantir a alimentação dafamília. Somente depois, com a criação de uns bodes conseguiu adquirir três hectares de terra. “Agenteprecisava da terra, porque o/a trabalhador/a do campo sem terra não vive”, declara Maria.

Depois de adquirir a terra, Tarcísio e sua famíliacontinuaram enfrentando dificuldades. A falta deágua passou a ser o maior entrave. Andavammais de três quilômetros com um jumento seladoe duas ancoretas para pegar água. Às vezeschegavam à cacimba e não tinha, outras vezes o“dono” da propriedade os impedia de pegar. “Opovo negava água. Colocava arame e espinhopra gente não passar, e o jeito era voltar pra casasem água e sem saber o que fazer, porque eramos animais e a gente pra beber”, lamenta Tarcísio.

No ano 2008, com a chegada do Programa UmMilhão de Cisternas (P1MC), da Articulação noSemi-Árido Brasileiro (ASA) na comunidade,Tarcísio foi convidado pela Comissão Municipalde Convivência com o Semiárido para umareunião, onde seria discutido o Programa e

Ceará

Ano 6 | nº 993 | Outubro | 2012Pereiro - Ceará

Boletim Informativo do Programa Uma Terra e Duas Águas

Manejo agroecológico do solo:aprendendo a conviver com os efeitos da seca

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A união da família é vista como estratégiapara lutar e viver melhor

Com a cobertura, o solo permaneceúmido por mais tempo

seleção das famílias a serem beneficiadas. Afamília de Tarcísio foi uma das indicadas parareceber a implementação (cisterna de placas).

Ele, que já tinha sido da Comissão, lembrou quenão poderia receber, pois o seu nome já estavaem outro projeto do governo. Tarcísio haviaparticipado de uma reunião da AssociaçãoComunitária dos/as Moradores/as do SítioCaetano e dado o nome para receber águaencanada pelo Projeto São José. “A águachegou até a casa da presidente da Associação,mas, na minha nem os canos apareceram”,lamenta o agricultor, enfatizando que, a partir deentão surgiu a ideia de cavar uma cacimba emsua propriedade.

Ao chegar em casa desceu até o roçado,escolheu o local mais baixo e começou a cavar.Ele conta que a trabalheira foi grande, teve até que disparar dinamite em pedras para poder chegar àfundura desejada. “Fazia de tudo, ficava até tarde da noite cavando e ainda acordava nas madrugadaspara adiantar o serviço” lembra. Mas, o esforço valeu apena, com pouco mais de três metros, o localcomeçou a jorrar.

Com a água da cacimba a família de Tarcísio passou o ano de 2011 cultivando frutíferas, hortaliças,dando de beber aos animas, fazendo as atividades domésticas e ainda beneficiando as famíliasvizinhas. Na época produziram e comercializaram muitas verduras: cheiro verde, alface, pimentão,pimenta de cheiro, entre outras. “A gente vendeu muito e ainda hoje o pessoal procura”. Mas, devido àestiagem prolongada de 2012, a água ficou pouca e não deu para continuar o cultivo. Para garantir maisrecurso hídricos, a família está aprofundando a cacimba.

Tarcísio e sua família têm consciência de que a água e a terra são recursos indispensáveis na vida do/aagricultor/a, e sabe que para preservá-los se faz necessário um bom manejo. Eles/as não queimamnada na terra e a reconhecem como mãe. “Eu faço isso para prevenir a cadeia alimentar, porque a terraé nossa mãe, precisa ser cuidada, precisa se alimentar. Se não cuidarmos da terra vamos pagar caro”.

Outra estratégia de otimização dos efeitos da estiagem desenvolvida pela família é a utilização defolhagem para cobertura do solo. “Agente pega tudo que encontra de folhagem e bagaço e joga aqui. Távendo como a terra fica molhada”, diz, mostrando uma mão cheia de terra úmida. Com a cobertura dosolo, mantêm vivas as plantações de mamão, banana, goiaba, manga, entre outras.

A experiência da família de Tarcísio tem sido referência para outras famílias na comunidade. E o desejoé que todos/as entendam que “para viver bem no Semiárido se faz necessário aprender a lidar com ascaracterísticas hídricas”. A família sonha com as tecnologias de captação de água da chuvaimplementadas pelos Programas da ASA, para beber e produzir. Para que isso aconteça, estãotentando se desligarem do projeto São José.

Atualmente, Tarcísio contribui como pedreiro na construção das cisternas do Programa Uma Terra eDuas Águas (P1+2). Além de construir a tecnologia, ele incentiva as famílias a desenvolveremestratégias adaptáveis à região.

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Com o pouco de água que resta na cacimba, mantêmvivas as plantas e ainda colhem de seus frutos

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