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REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS, órgão dos estudos e pesquisas do Ministério da Educação e Cul­tura, publica-se sob a responsabilidade do Instituto Nacional de Estudos Pedagógicos, e tem por fim expor e discutir questões gerais da pedagogia e, de modo especial, os problemas da vida educacional brasileira. Para isso aspira congregar os estudiosos dos fatos educacionais do país, e refletir o pensamento de seu magistério. REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓ­GICOS publica artigos de colaboração, sempre solicitada; regis­tra resultados de trabalhos realizados pelos diferentes órgãos do Ministério e peias Secretarias Estaduais de Educação. Tanto quanto possa, REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDA­GÓGICOS deseja contribuir para a renovação científica do tra­balho educativo e para a formação de uma esclarecida menta­lidade pública em matéria de educação.

A Revista não endossa os conceitos emitidos em artigos assinados e matéria transcrita.

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R E V I S T A B R A S I L E I R A

DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS

PUBLICADA PELO INSTITUTO NACIONAL

D E E S T U D O S P E D A G Ó G I C O S

MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO E CULTURA

VOL. XXXV JANEIRO-MARÇO 1961 N.° 81

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INSTITUTO NACIONAL DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS Diretor — Anísio Spinola Teixeira

CENTRO BRASILEIRO DE PESQUISAS EDUCACIONAIS

Diretor Executivo — Péricles Madureira de Pinho

Divisão de Aperfeiçoamento do Magistério

Coordenador — Lúcia Marques Pinheiro

Divisão de Documentação e Informação Pedagógica

Coordenador — Elza Rodrigues Martins

Divisão de Estudos e Pesquisas Educacionais

Coordenador — Jaime Abreu

Divisão de Estudos e Pesquisas Sociais

Coordenador — Darci Ribeiro

Toda correspondência relativa à REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS deverá ser endereçada ao Diretor do Instituto Nacional de Estudos Pedagógicos, Caixa Postal 1669 — Rio de Janeiro — Estado

da Guanabara — Brasil.

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R E V I S T A B R A S I L E I R A D E E S T U D O S P E D A G Ó G I C O S

Vol. XXXV Janeiro-março, 1961 N° 81

S U M A R I O

Editor ia l 3

Estudos e debates:

ABREU, Ja ime — Ensino médio em geral e ensino secundário 7

AZEVEDO, Fe rnando de — Gilberto Freyre e a cul tura brasi leira 25 LOURENÇO FILHO, M. B. — Educação pa ra o desenvolvimento 35 RENAULT, Abgar — Financ iamento do ensino pr imár io na América

La t ina 67 TEIXEIRA, Anísio — Educação e desenvolvimento 71

Documentação:

Ação do I N E P e Centros de Pesquisas no qüinqüênio 1956-1960 93

Ensino pr imár io complementar , iniciação profissional (Conclusões do

Encont ro Nacional de Educadores para o Desenvolvimento — Seção

de Recife) 136

NOTAS P A R A A HISTORIA DA EDUCAÇÃO

A educação na Consti tuinte da Guanabara 141

Informação do Pa ís 147

Informação do Es t range i ro . . . . ' 160

LIVROS:

AZEVEDO, Fe rnando de — Novos caminhos e novos fins; BARROS,

Roque Spencer Maciel de — A ilustração brasileira e a idéia da

universidade; LISBOA, J. Carlos — O estudo de letras neolatinas no

Brasil; MOREIRA, J. Roberto — Educação e desenvolvimento no

Brasil; SODHÉ, Nelson Werneck — O que se deve ler para conhecer

o Brasil 164

REVISTAS:

MOREIRA, J. Rober to — Sociologia política da Lei de Diretrizes e

Bases; TEIXEIRA, Anísio — Plano de construções escolares de

Brasília 172

J O R N A I S :

Bagrichevsky, Manuel — A informação ocupacional no ensino mé­

dio; Carvalho, Antônio Pinto de — Haverá u m a pedagogia operár ia? ,

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Lourenço Filho, M. B. — Dramat ização de t emas cívicos nas escolas; Mascaro, Carlos Corrêa — Novos horizontes pa ra a pes­quisa científica em S. Paulo 200

ATOS OFICIAIS: Lei nº 3.835, de 13 de dezembro de 1960 — Federa­

liza a Universidade da Paraíba, cria a Univ. Federal de S. Paulo

e dá outras providências; Lei nº 3.843, de 15 de dezembro de 1960 — Concede autonomia à Escola Nacional de Minas e Metalurgia,

a qual, desligada da Univ. do Brasil, passará a denominar-se Escola

de Minas de Ouro Preto Decreto nº 49.121-B, de 17 de outubro de 1960 — Aprova o Regimento do Serviço Nacional de Aprendiza­

gem Industrial (SENAI) ; Decreto nº 49.259, de 17 de novembro de 1960 — Institui a Campanha de Radiodifusão Educativa; De­creto nº 49.304, de 21 de novembro de 1960 — Modifica o Regula­

mento do Ensino Industrial, aprovado pelo Dec. n° 47.038, de

16/10/959; Decreto nº 49.305, de 21 de novembro de 1960 — Institui

a Campanha de Formação de Meteorologistas (CAME); Decre to nº 49.340, de 25 da novembro de 1960 — Dispõe sobre o Corpo de

Estagiários Permanentes do Instituto Benjamim Constant do Minis­

tério da Educação e Cultura; Decreto nº 49.355, de 28 de novembro de 1960 — Cria a Comissão Supervisora do Plano dos Institutos

(COSUPI), determina seu funcionamento sob a forma de Campa­

nha e dá outras providências; Po r t a r i a n° 202, de 10 de outubro de 1960 (DASP) — Expede instruções gerais para a realização de

concursos 215

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Editorial

PROGRAMA EDUCACIONAL DA MENSAGEM AO CONGRESSO

Já se encontram adiantados os estudos a serem enviados ao Congresso Nacional sobre a reforma da estrutura da Secretaria de Estado incumbida dos negócios da educação e cultura, cuja organização, arcaica e obsoleta, já não corresponde aos reclamos de uma ação eficiente e dinâmica. A tarefa do Poder Executivo de reestruturar o mecanismo institucional encontra-se, no en­tanto, na dependência do projeto de lei de diretrizes e bases, ainda sob a apreciação do Congresso Nacional, o qual visa a complementar os dispositivos constitucionais e a colocar a legis­lação ordinária em consonância com os princípios da Constitui­ção Federal. Na discussão dessa matéria, são descabidas falsas posições doutrinárias entre escola pública e escola particular, face aos inequívocos termos do mandamento constitucional, que incumbe aos poderes públicos ministrar o ensino dos diferentes ramos, e também o deixa livre à iniciativa particular, respeitadas as leis que o regulem. Escola pública e escola particular têm seu papel no esforço comum de redenção do País pela educação. O que se deve esperar desse novo estatuto legal é a regulamen­tação dos preceitos constitucionais, permitindo a libertação do processo educacional das peias e imposições burocráticas, para dar lugar à diversidade dos currículos e à flexibilidade dos pro­gramas. Nessas condições, reintegrar-se-á o Ministério da Edu­cação e Cultura nas suas funções precípuas de órgão orientador e estimulador dos programas das unidades federativas.

No setor do ensino primário, tradicionalmente de compe­tência dos Estados, residirão os principais esforços da Adminis­tração Pública, tanto por imperativo constitucional, que o manda gratuito e obrigatório, quanto por sua óbvia necessidade. Não se trata, apenas, de expandir, indiscriminadamente, a rede de esco­las primárias, através de artifícios simplificadores, que retirem a ela todo conteúdo educativo, para limitá-la a mera aquisição de técnicas. Importa enriquecer a substância da escola, sobre­tudo quando ela tem de compensar a deficiência dos lares menos favorecidos. A atividade da União exercer-se-á através da atua­ção indireta, pelo auxílio financeiro, pela assistência técnica, pelo aperfeiçoamento do pessoal docente e administrativo, pela manutenção de escolas experimentais, enfim, pela pesquisa, esti­mulando e favorecendo os esforços dos Estados e Municípios.

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Paralelamente, como medida de emergência, visando a sanar erros do passado, criar-se-á um movimento de âmbito nacional, mobilizando todos os recursos existentes e apelando para todas as pessoas de boa vontade, com o fim de combater, de forma inapelável, o analfabetismo.

No ensino médio reside o ponto nevrálgico do problema educacional, que no mundo atual enfrentam todos os países civi­lizados. A sociedade democrática, pela qual lutarnos, não se pode compadecer com a existência de um sistema dual de ensi­no: um, supostamente intelectual, para desenvolver as atividades do espírito, e que constituiria uma etapa propedêutica ao supe­rior; outro, de tipo vocacional, com horizontes limitados, e des­tinado às classes menos favorecidas. Na verdade, deve-se en­carar o ensino médio como uma preparação para as múltiplas e diversificadas tarefas de uma sociedade industrial, em que se vai transformando o Brasil. Temos urgentemente de estabelecer um sistema de igualdade das oportunidades educacionais, em que todos, sem exceção, tenham possibilidade de ascender aos níveis mais altos da escala educacional, sem outras limitações que as oriundas de suas capacidades e aptidões. A solução mais aconselhável, a demandar entretanto maiores estudos e indaga­ções, seria a instituição de um tronco comum para todos os estu­dantes do ensino médio, findo o qual se abririam largas oportu­nidades de escolha, a fim de atender às necessidades dos mer­cados de trabalho. O que não é justo e razoável é prolongar a situação atual, acenando a milhares de jovens com a perspectiva de um curso secundário, de tipo acadêmico, que não lhes pro­porcionará nenhuma ferramenta de trabalho para o sustento, mas possibilitará unicamente o eventual ingresso num curso su­perior de tipo profissional, apesar de estarem as portas da Universidade abertas a uma pequena parcela desses moços. Essa preocupação de vincular o sistema educacional do País a neces­sidades de sua economia, evitando, destarte, graves problemas de natureza social, não exclui, antes impõe, a compreensão do fenômeno educacional numa ampla base cultural, de sentido pro­fundamente humanístico, em que se dê a devida atenção às di­mensões mais autênticas da personalidade humana.

Não menos grave se apresenta o problema ão ensino supe­rior. A criação indiscriminada de novas universidades e a incorporação ao sistema federal de ensino de outras instituições desse tipo. com pesados encargos de ordem financeira, não re­dundaram em qualquer vantagem de caráter pedagógico. Não pretendamos apresentar-nos como um país de numerosas univer­sidades; esforcemo-nos, antes, por contar com verdadeiras uni­versidades, com alunos e professores congregados nas tarefas de cultura, e integrados nas investigações científicas. Cumpre es-

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tabelecer criterioso levantamento das necessidades de pessoal de nível superior que o desenvolvimento econômico postula, pro­curando por aí canalizar recursos na expansão dos ramos que as análises objetivas revelarem de caráter prioritário. Proceder de outra forma será contribuir para a criação de um proleta­riado intelectual, incapaz de se inserir no processo produtivo da Nação, e cuja ação maléfica poderá abalar a ordem social.

O desenvolvimento cultural e tecnológico do País requer especial atenção para o ensino técnico-profissional, a ser inten­sificado e ampliado. Qualquer programa neste sentido deve, no entanto, articular-se e apoiar-se no programa geral de educação, em todos os níveis, e ser realizado em coordenação com a indús­tria. Mais do que em qualquer outro ramo de ensino, aqui se hão de unir intimamente educação e trabalho. Eis alguns pon­tos cuja execução já determinou o Governo:

— iniciação profissional e artesanato, sobretudo para jo­vens analfabetos e para aqueles que cursaram apenas parte da escola primária (de preferência nas regiões do Norte, Nordeste e Centro-Oeste do País);

— incremento nas zonas industrializadas da formação de mão-de-obra especializada, construindo-se novas escolas e estimulando as organizações já existentes (SENAI, SENAC, SESI, SESC etc);

— incentivo nas últimas séries ão curso primário e ginasial de ensino e de prática de artes industriais e agrícolas, com o que se coibirão o verbalismo e a frondosidade dos atuais currículos;

— entrosamento da Confederação Nacional da Indústria, da Confederação Nacional do Comércio, das Universidades e de algumas indústrias em particular (como a Petro-brás, a indústria de energia elétrica etc.) para evitar-se a dispersão de esforços na formação de técnicos de nível superior.

Não se poderia iludir a Nação acenando-lhe com promessas de empregar na educação maiores verbas, quando todos sabemos os fortes encargos que oneram presentemente os cofres públicos. Durante o atual Governo, 'porém, será cumprida em toda a sua extensão o dispositivo constitucional que exige a aplicação, na manutenção e desenvolvimento do ensino, de dez por cento da renda resultante dos impostos. Esses recursos, que crescem de ano para ano, se aplicados segundo critérios de prioridade e dentro de sábia distribuição, poderão atender a contento às exi­gências do planejamento educacional aqui delineado. Por outro lado, a conexão estreita do processo educacional com as necessi­dades da economia brasileira conduziria à criação de uma cons-

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ciência mais nítida entre o Povo dos benefícios e vantagens ad­vindos de um sistema de educação mais eficiente e que, ao invés de se tornar uma fonte de privilégios e regalias para aqueles que anualmente dele se beneficiam, será fator de responsabilidade e de deveres acrescidos. Tal mudança de mentalidade, de atitu­des, possibilitará criar-se, numa segunda etapa, o consenso geral da necessidade de serem destinadas para os serviços da educação verbas mais vultosas. Ensejar-se-á por aí, ao se comprovarem os aumentos de produtividade decorrentes de uma, formação educacional mais apurada, a nítida idéia de que a educação é um investimento a longo prazo, a ser encarado de forma seme­lhante ao dispêndio de recursos nos setores da indústria de base, dos bens da produção, da energia e dos transportes. A utiliza­ção de fundos especiais, à semelhança do Fundo Nacional de Ensino Primário, de previsão constitucional, e a vinculação das cotas destinadas aos Estados para o pagamento de juros e amor­tização de empréstimos, sob a forma de delegação em garantia, como reserva irrevogável de meios de pagamento, constituirá o mecanismo financeiro destinado a custear o reaparelhamento do sistema educacional. Na verdade, a construção de prédios e a instalação de equipamentos, na proporção em que se tornam ne­cessários, não podem mais ser atendidas na base anua dos recursos orçamentários comuns.

A ênfase dada aos problemas da educação não implica relegar a segundo plano, como tem ocorrido até agora, os assun­tos de cultura. Nesse sentido, já foi criado o Conselho Nacional de Cultura, com a função precípua de estabelecer a política cul­tural do Governo, mediante plano a ser elaborado e subdividido em programas anuais de trabalho. É a mesma idéia de plane­jamento das atividades administrativas, que aqui de novo surge, a indicar o propósito de se obter da máquina burocrática todas as virtualidades que pode oferecer. De par com o auxílio ines­timável que irão prestar à extensão das oportunidades educacio­nais, o rádio, o cinema, o livro, o teatro, o museu se tomarão agentes dinâmicos da obra de levantamento do nível cultural da população brasileira. É indispensável que os benefícios da cul­tura cheguem a todas as camadas sociais, e deixem de ser regalia das classes economicamente bem dotadas.

O programa aqui esboçado não poderá, evidentemente, ser executado integralmente nos limites de um qüinqüênio. Mas o adequado planejamento das atividades, a sólida implantação dos programas, o eficiente funcionamento da máquina administra­tiva, dentro de diretivas seguras e segundo critérios de priori­dade e ordenação, poderão, por certo, dar o arranque decisivo para livrar o nosso País dos males da ignorância e do analfa­betismo.

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Estudos c debates

ENSINO MÉDIO EM GERAL E ENSINO SECUNDÁRIO

JAIME ABREU Do C.B.P.E.

Aceitamos e aqui nos desobrigamos do honroso convite rece­bido para sermos co-relator do tema "Ensino Médio em Geral; Secundário", a ser debatido nos "Encontros Regionais de Educa­dores Brasileiros" (6.a Região), promoção oportuna de importan­tes entidades públicas e privadas, como, entre outras, o M.E.C. e a C.N.I .

A plena liberdade de apreciação, outorgada aos profissionais mobilizados para o debate e a confluência de interesses em torno à educação brasileira, por parte de entidades públicas e privadas, motivaram-nos suficientemente a dar nossa modesta contribuição à discussão do tema, que entendemos como uma tomada de cons­ciência do pensamento educacional brasileiro, sobre questões edu­cacionais da máxima relevância.

A ampliação e diversificação dos quadros da educação ins­titucionalizada, sendo o fato social de maior presença e demais contínuo alargamento em nosso tempo, é bem congregue êle em torno a si os esforços e preocupações do setor público e do pri­vado, numa sinergia de empenhos que a multidimensional latitude do empreendimento educacional reclama e exige.

Se o ministrar instrução é tarefa precípua, intransferível e característica do Estado moderno, deve reconhecer-se que a pre­sença privada tem o seu papel complementar a cumprir nesse complexo empreendimento social, e que nele há virtualidades po-

Relatório apresentado ao "Encontro Regional de Educadores Brasileiros" promovido pela Confederação Nacional da Indústria e pelo Ministério da Educação, em janeiro último.

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sitivas, indiscutíveis, seja de um ponto-de-vista pedagógico, seja em relação ao sadio funcionamento político de uma sociedade plu­ral e democrática, tal como se define a nossa.

No caso brasileiro, em que arraigada tendência privatista responde por não pequenas distorções na autenticidade do fun­cionamento democrático do poder público nacional, é ainda mais ingentemente necessário o estímulo a qualquer esforço que en­cerre virtualidades de publicização de áreas de serviços privados, opondo contenção retificadora aos comuns desvios particularistas de privatização do público, de que tanto se entretece nossa his­tória cultural, em seus aspectos menos democráticos.

Na análise sumária do tema, que a seguir empreenderemos, esboçando a abordagem de aspectos que nele se nos afiguram mais essenciais, não ficaremos adstritos ao exame do texto do ilustre relator.

Com esse texto, temos áreas de concordância, ao lado de ou­tras de divergência essencial, havendo ainda aquelas outras em que nos arreceamos de não ter, quiçá, logrado apreender com perfeita segurança o pensamento do autor.

Isto posto, preferimos fazer uma exposição de nossos pontos-de-vista,. pela qual, no cotejo com o texto do ilustre relator, se possa aferir em que se aproximam e em que divergem nossas visões do assunto.

Ensino médio e ensino secundário

(Aspectos Universais)

Pode afirmar-se, sem impropriedade ou exagero, que o pro-blema-chave na problemática universal da educação de nosso tempo é o da educação de segundo grau ou pós-primária.

Se é certo que o século XIX foi o da universalização da es­cola primária, é rigorosamente exato definir-se o século XX, como o fêz Kandel, como sendo o da universalização da escola média, de segundo grau ou pós-primária.

É óbvio que no cerne dessa irreversível opção social pela extensão da escolaridade comum ao nível de segundo grau, es­tão fatores condicionantes, como ciência, tecnologia, industriali­zação, urbanização, democracia, secularização da cultura.

Dessa opção social nitidamente emergem uma conseqüência necessária e problemas inevitáveis.

A conseqüência necessária, irrefugível mesmo, é a de que quanto maior fôr a expansão da escolarização comum ao nível de segundo grau, mais inevitável, mais básica, mais essencial e menos supletiva será a presença do Estado nessa expansão.

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Isto porque cabe ao Estado, no caso o poder político federal, formular os objetivos gerais da educação, não apenas para as suas agências, como para as de outros grupos sociais aos quais reserva êle a prerrogativa de acrescer objetivos outros, parti­culares, não colidentes com esses objetivos gerais; porque o Es­tado, no regime representativo, é não apenas o procurador auto­rizado das necessidades do povo, como também é quem dispõe de meios e instrumentos para atendê-las; porque só o Estado tem condições de harmonizar interesses, de regra imediatos e restri­tos, de grupos particulares com os amplos e longos interesses da comunidade e, outrossim, como estado democrático, tem o dever e o poder de garantir a independência da pesquisa e da trans­missão da cultura.

Os problemas emergentes dessa opção social pela extensão da escolarização comum ao nível de segundo grau constituem, realmente, a pedra de toque dos sistemas educacionais contem­porâneos, justificando, inteiramente, a afirmativa de Kandel1

de que "o problema crucial da educação, na maioria dos países, hoje em dia, é o da reorganização do sistema educacional no ní­vel secundário".

Não há mesmo por onde deixar de reconhecer que no campo da escola de nível elementar e no da de nível superior já um consenso mais seguro de opinião pode funcionar, quanto a obje­tivos a serem atingidos e quanto à estrutura organizatória cor­respondente a esses objetivos.

Veja-se que há nessa escola média do nosso tempo proble­mas a bem dizer específicos, inexistentes nos outros níveis de ensino, quais sejam, por exemplo, os de harmonizar e ministrar a cultura geral ao lado de proporcionar iniciação e mesmo for­mação profissional, e, ainda, os da atenção devida e equilibrada a objetivos próprios e imediatos e objetivos indiretos e mediatos, ambos relevantes.

Note-se que, devendo funcionar ligada, como última instân­cia, à ampliação de uma cultura geral comum do cidadão, a qual os quadros do ensino elementar já não podem, hoje, dar sufi­cientemente, também deve funcionar em termos de ministradora de cultura profissional especializada, não só em seu mesmo nível, mas ainda como propedêutica e fundamental a estudos supe­riores, ficando assim na interseção de uma cultura destinada às massas e de outra preparatória de múltiplas elites.

Para atender com justo equilíbrio a esta série de problemas da educação institucionalizada a que é convocada, para funcio­nar pertinentemente na importante dimensão de agência de dis-

1 Uma nova era em educação. Editora Fundo de Cultura S.A. Rio, 1959, 416 págs.

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tributividade social que lhe é intrínseca, ensejando adequada e oportuna oferta de opções de modalidades de ensino à gama he­terogênea de interesses e vocações dos que a buscam e dosagem harmoniosa dessas oportunidades, tendo em conta as necessi­dades do contexto social em que se insere, toda uma série de problemas cruciais há de ser examinada e equacionada por essa escola média do nosso tempo, buscando as soluções mais adequa­das e que são difíceis e complexas por natureza.

Como decorrência desses múltiplos objetivos simultâneos, às vezes contraditórios em si mesmos, problemas relevantes de pa­drão organizatório se colocam, como estes: escolas médias mul-tipartidas ou escolas médias multilaterais, ou um e outro tipo de organização?

Estes são, como se pode ver, problemas importantes, de na­tureza universal, que atingem a escola média de nosso tempo e dos quais não poderia estar e não está indene a escola média bra­sileira.

O ensino médio e o ensino secundário na perspectiva brasileira

Deixando de lado, nos quadros e análises aqui utilizados, o problema do ensino normal, por nos parecer mais próprio vin­culá-lo ao problema do ensino primário por suas intrínsecas co­nexões, pode afirmar-se que em matéria de ensino médio brasi­leiro, até bem pouco, praticamente tudo era escola secundária...

Nem haveria como deixar de ser assim na sociedade nacio­nal brasileira em que o ensino de nível médio era pura, rápida e simples etapa de passagem de uns poucos para a escola supe­rior, com pouca ou nenhuma finalidade em si mesmo. Lembre-se que essa etapa foi, longamente, a de uma escola de "prepara­tórios" para o nível superior.

O ensino industrial de nível médio nasceu e ainda vive em parte com a eiva desprestigiante de ensino destinado às "classes desfavorecidas" e se fora mister provar a inexistência de qual­quer propósito de correlacioná-lo autenticamente com o tipo de estrutura social em que se costumava inseri-lo, bastaria refletir na sua instituição simultânea, pelo poder federal, em todos os estados brasileiros, com tipos e estágios de economia os mais diferentes entre si, desde o industrial então incipiente até o de uma prevalecente estrutura econômica agrária, onde esse ensino industrial de nível médio pouco ou nada tinha a fazer.

O ensino comercial, porque, de certo modo, corresponde a necessidades mais vivamente sentidas na estrutura ocupacional brasileira, se tem expandido bem mais ponderàvelmente que o ensino" industrial, não se devendo todavia perder de vista aquela

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sua situação de "ensino secundário auxiliar", corno o define Lou­renço Filho, uma espécie de escola secundária de segundo plano, instrumento menos dificil para alcançar o diploma de conclusão de curso de nível médio, com as vantagens da equivalência de cursos.

Quanto ao ensino agrícola de nível médio, não chegando ainda a atingir mais de meio por cento da matrícula total do ensino médio, é, evidentemente, setor marginalizado nesse nível de ensino de segundo grau, estando por encontrar ainda um equilíbrio entre sua estrutura e finalidades e as necessidades sentidas no setor específico de atividades a que deve servir.

Busquemos assim caracterizar o que vem constituindo essa escola secundária dominante na educação brasileira, que tão avas-saladoramente se expande em relação aos outros ramos de ensino, concentrando predomínio maciço na escolha do discipulado de nível médio.

Para demonstrá-lo, basta considerar que, se da população brasileira escolarizável em nível médio (12 a 18 anos) apenas ínfima parcela de 10% freqüentava em 1958 essas escolas, não é menos certo que o incremento, em termos relativos, da matrí­cula na escola secundária teria sido de 500% nesses últimos trinta anos (lembremo-nos de que, nesse período, o acréscimo, em ter­mos relativos da matrícula na escola primária, foi pouco além de 100% . . . ) e que nela se concentrava 75% da matrícula nesse ní­vel de ensino, com 16% no ensino comercial, 2% no ensino indus­trial e 0,5% no ensino agrícola e o restante no ensino normal.

como já tivemos oportunidade de registrar em trabalho an­terior2, o caso presente da escola secundária brasileira é, em ver­dade, um fenômeno típico de desajuste entre uma rígida e ar­caica superestrutura educacional e a estrutura social a que serve e de que é projeção.

A persistência da rotina educacional e de suas forças imobi-listas anula, freqüentemente, a consideração de novas situações objetivas, sociais e políticas, de cujas necessidades a escola deixa de ser instrumento de solução.

Reflita-se como a escola secundária brasileira, montada his­toricamente como instituição propedêutica para uns poucos can­didatos aos estudos de nível superior, viu, impassível, o engrossar progressivo de suas fileiras com o afluxo de camadas populares à sua clientela, permanecendo surda e cega às novas e multifor­mes exigências da maioria do seu discipulado, tão diferente do de outróra.

Não considerou ela que menos de vinte por cento de sua po­pulação discente é que chega à conclusão do seu curso; não levou

2 A educação secundária no Brasil — INEP, Rio, 1955, 156 págs.

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em conta que sua clientela é sobretudo a de uma classe média urbana em ascensão social e não mais aquela que representava a fina flor ornamental do patriciado rural brasileiro; não atentou para que a sociedade brasileira é uma sociedade em mudança, por múltiplos fatores determinantes, como sejam: crescimento demográfico, aumento da renda nacional em moeda de poder aquisitivo constante, incremento sensível da população urbano-suburbana, aumento de valor da produção industrial, modifica­ções na estrutura ocupacional, maiores facilidades de comunica­ção, mudança dos estilos de vida na estrutura familiar, tecnolo­gia, industrialização, ideologia, secularização da cultura, enfim, por toda uma congérie de fatores que fazem da sociedade brasi­leira uma sociedade realmente em mudança para uma democra­cia industrial.

A estratificação de nossa escola secundária em torno a um conservadorismo anacrônico que a leva a insistir enfaticamente no seu papel básico de "preparadora de individualidades condu-toras" já pelos idos de abril de 1942, quando da Exposição de Motivos da Lei Orgânica do Ensino Secundário, apresentada pelo Ministro da Educação, conduziu-a a uma crise estrutural pelo desajuste flagrante de suas práticas desatualizadas em relação aos interesses e necessidades dominantes na sua população dis­cente.

É freqüente entre nós o estereótipo de atribuir-se à lamen­tável centralização pedagógica exercida pelo Ministério da Edu­cação e Cultura, impondo formalmente ao país um modelo único de escola secundária, o descoroçoar de vocações reformadoras, manietadas, malgrado elas, à camisa-de-fôrça da legislação ofi­cial.

Em verdade, todavia, razões culturais muito mais profundas são as que devem responder por essa imobilista e estática inércia pedagógica, o que é fácil de provar pelo inaproveitamento das oportunidades de afirmação de autonomia educacional, como aque­las concedidas, por exemplo, ao ensejo recente da organização das classes secundárias experimentais, tão minimamente, quase in­significantemente utilizada por parte daqueles em que se admitia aguardarem apenas ensejo de auto-afirmação educacional.

A nós se nos afigura que a sobrevivência de certos moldes de colonialismo cultural, outróra concentrados na Metrópole lu­sitana e hoje na União, devem mais autêntica e profundamente responder por esse estado de coisas, em que o pensamento da "ca­beça" federal passa a ser o verdadeiro e único pensamento na­cional, em que um permanente atestado de minoridade é passado (sem nada em nossa história educacional que o legitime) à com­petência e ao critério estaduais e municipais, fazendo inclusive

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que qualquer singelo propósito de cumprir nossa Carta Magna de Estado federativo no terreno da educação, seja considerado perigoso "atentado à unidade nacional".

Vista em relação à amplitude de objetivos que lhe caberia realizar, por definição legal e por propósitos coerentes, a nossa escola secundária é, numa caracterização global, instituição res­trita em finalidade e pobre em conteúdo, montada em termos de agência ministradora de noções para exame e de preparação para cursos superiores, com uma visão "intelectualista" concentrada no prestígio dos talentos verbais, sem maior atenção a fundamen­tais aspectos cívico-sociais de preparação para a cidadania, ou aos de formação de critérios objetivos de apreciação de valores, tampouco volvida efetivamente para um "desenvolvimento harmo­nioso da personalidade" que a lei consagra, mas que a sua praris funcional nega categoricamente a possibilidade de alcançar.

Escola de dois e de três turnos, com uma média de cento e sessenta dias de efetivo ano letivo, com turmas superlotadas e problemas sérios de magistério, direção e equipamento; confia­da, prevalecentemente, a pequenas empresas organizadas com fins de lucro, a cuja obtenção se ajusta toda uma política de fun­cionamento em precaríssimos padrões; com uma equivalência for­mal de resultados que padrões antípodas de funcionamento ne­gam categoricamente; atida a uma filosofia educacional entre regressivista e conservadora que é a mais total negação de qual­quer veleidade de poder ser instrumento no processo de mudança cultural brasileira, está claro que esta nossa escola secundária, quase detentora do monopólio do nosso ensino médio, vem adoe­cendo de males estruturais que só uma profunda reestruturação pode corrigir e cujo âmbito em verdade transcende, de muito a órbita estritamente pedagógica para se filiar a moldes do nosso contexto cultural que em parte representa e reflete. Não cremos possa haver dúvida de que, na transplantação de modelos educa­cionais que a educação brasileira realizou, esteja em boa parte a razão de muitos dos nossos vícios educacionais atuais e dos quais as fontes originais já se procuram dar conta.

Este modelo educacional teria sido, por excelência, o latino, francês, particularmente, e sabe-se seguramente que distâncias imensas medeiam, por exemplo, entre a concepção educacional norte-americana e a francesa.

É notório que o controle das escolas públicas americanas que acolhem 87,5% da população discente primária e 88,5% da se­cundária, compete em última análise ao povo, exercido por jun­tas escolares com o caráter de representação social, quase todas eleitas pelos membros da comunidade, que controlam e aprovam os rumos de funcionamento dessas escolas públicas.

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Já na tradição escolar européia ocidental, de que a França representa expoente representativo para nós, com a adoção de um programa escolar restrito para as massas e extenso e rico para as classes privilegiadas, foi sempre comum a imposição de cima para baixo de modelos escolares, seja por altas castas buro­cráticas, comitês de sábios ou de sacerdotes, estadistas ou por alguns membros da classe intelectual de governos em moldes cen­tralizados, sem considerar a necessidade ou pertinência de qual­quer diálogo com o povo.

Outrossim, será ainda nesse modelo educacional transplan­tado que vamos encontrar muito da gênese do nosso verbalismo escolar, onde o conhecimento é bem mais platônica fruição esté­tica do que instrumento dinâmico para ganhar a vida.

Sabe-se como a concepção educacional, que prevalece na Amé­rica do Norte, sempre distinguiu entre o cultivo escolar da ação inteligente e um intelectualismo sofisticado, preferindo alcançar conhecimento em visível conexão com a experiência, do que armazenar erudição ornamental.

Quase trinta anos de observação refletida sobre o funciona­mento de nossa escola média (secundária especialmente) levam-nos a tentar assim esquematizar os seus defeitos que se nos afiguram mais importantes.

Deficiências quantitativas

1 — Insuficiência quantitativa geral em relação à popula­ção escolarizável e às exigências da estrutura ocupacional, nacio­nal, no nível das atividades secundárias e terciárias.

2 — Prevalecimento desproporcional da matrícula nas es­colas secundárias acadêmicas.

3 — Insuficiência da rede escolar pública, com a prolifera­ção de empresas em que o objetivo prevalecente não é a finali­dade educativa ou de outras instituições onde há existência de critérios discriminativos antidemocráticos e dominantes propó­sitos proselitistas.

Deficiências qualitativas

Decorrentes principalmente da legislação:

1 — Congestionamento dos currículos — Aspecto comum a todos os ramos do ensino médio é particularmente sensível no ensino secundário, onde chega a raiar a extravagância pedagó­gica.

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2 — Uniformidade de organização, centralização pedagó­gica.

É uniformemente imposta a todo o país a organização e re­gulamentação do ensino, sem tomar em consideração diversida­des sociais, regionais e individuais, particularmente vivas no vasto arquipélago cultural brasileiro.

3 — Currículos e programas uniformes — O currículo é o mesmo para todo o país e as oportunidades efetivas de diversi­ficação regional de programas são irrelevantes e fora mesmo da praxis.

4 — Extensão dos programas — A ampliação desmedida dos programas é a lamentável regra, conduzindo a uma superficiali-dade extensiva e aleatória em detrimento do domínio seguro de noções fundamentais.

5 — Multiplicidade de ramos de ensino — Há uma prema­tura diversificação de cursos desde o ciclo básico, sejam eles gi­nasial, comercial, normal, industrial, agrícola, impondo uma op­ção precoce antes de um mais seguro delinear de interesses, apti­dões, vocações e aspirações profissionais.

6 — Tendência acadêmica do ensino — Fruto de uma tra­dição educacional consolidada na legislação, o esforço escolar se concentra em aspectos intelectuais (encarados de modo formal e livresco), onde não contam os demais aspectos da formação do aluno.

Nada obstante, a pequena percentagem de alunos do ensino secundário que galgam a escola superior, a escola secundária sub­siste teoricamente estruturada em função dessa finalidade, que, inclusive, não alcança satisfatoriamente.

7 — Sistema inadequado de exames — As minúcias regula­mentares do ensino prevêem padrões únicos de provas e de exa­mes, não apenas inatualizados e visando somente aspectos par­ciais do processo de desenvolvimento do aluno, como retirando qualquer autoridade ao professor, ainda quando capaz, para co­mandar esse sistema de aferição.

O coroamento desse sistema falho de avaliação da apren­dizagem, com reflexos prejudiciais nas últimas séries do curso de colégio, está no exame de admissão às escolas superiores que, longe de ser um processo razoável de verificação de capacidade para ingresso nelas, se propõe a eliminar candidatos em função do maltusianismo educacional do numerus clausus.

Decorrentes principalmente da estrutura econômica do país:

1 — Em que pese à expansão da matrícula no nosso ensino secundário, está ela muito longe ainda de atingir proporção sa-

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tisfatória em relação às necessidades de um país que se indus­trializa, urbaniza e politiza, com a emergência decorrente de ati­vidades secundárias e terciárias em expansão contínua e exigência de mais consciente exercício de cidadania.

Basta que se diga que na maioria dos municípios brasileiros não há ainda estabelecimentos de nível médio.

Assim, por deficiência de recursos financeiros, ficam mui­tos alunos tolhidos de prosseguir os seus estudos.

Para remediar essa grave deficiência vem-se procurando con­solidar a tendência de expandir o ensino médio pela concessão de bolsas ou com apelo a soluções de campanhas precárias, de tipo assistencialista, financiadas pelo poder público.

Isto ao nosso ver é descaminho que exige pronta e séria re­visão, pois não é possível substituir a básica expansão da escola pública por intermédio de agências escolares outras que não a substituem, que dela diferem por natureza e que devem comple­mentar e não substituir sua tarefa.

Se é exato que já hoje nunca menos de 50% dos alunos que fazem os cursos de ensino médio são ou alunos de escolas públicas ou bolsistas dos cofres públicos, não é defensável todavia qual­quer política de investimento educacional público que restrinja, por desvio de recursos, a expansão da escola pública, agindo à base de falsos pressupostos, como inclusive o de custo mais ba­rato do ensino, o que representa em verdade preços que pelo erário não podem ser pagos: inferiorização do ensino, sacrifício da re­muneração docente, estímulo a segregações escolares por discri­minações particularistas.

2 — Remuneração inadequada de professores — Se os ho­norários e vantagens dos professores oficiais, pagos pela União e por alguns Estados, já atingem níveis menos desfavoráveis den­tro dos padrões brasileiros, o mesmo não ocorre com a maioria dos professores de colégios particulares, onde vêm freqüentemente ocorrendo dissídios coletivos, esforços por obter suplementação pública de salários, etc. etc.

Cremos mesmo que dentro em pouco, praticamente, só dois tipos de estabelecimento terão condições de subsistir: o público, por motivos óbvios, e o confessional, por ser capaz de mobilizar e aglutinar interesses mais atuantes em sua manutenção.

Enquanto perdurar o atual status quo em relação aos que vi­vem do magistério particular, haverá a contingência inevitável e profundamente prejudicial do acúmulo de trabalho letivo em vários estabelecimentos, pelo mesmo professor, assim dividido e subdividido.

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3 — Deficiência da formação de diretores e professores — É freqüente o caso de diretores serem homens sem qualquer for­mação de educador, pequenos empresários volvidos absorvente-mente para os problemas de equilíbrio orçamentário da sua em­presa, ou professores de matérias destituídos de visão global da educação.

Quanto ao magistério, há grande número de integrantes dele sem formação própria nem ingresso qualificado para o desem­penho da função, vivendo do preenchimento de formas de emer­gência de licença docente, a título precário, que se eternizam, ou de expedientes de breves "aperfeiçoamentos" que não resolvem.

Por outro lado, nem sempre é assinalável uma pertinente orientação pedagógica por parte dos egressos de Faculdades de Filosofia, muitas vezes improvisadas e desaparelhadas para a satisfatória desobriga de suas tarefas.

4 — Deficiências de prédios e equipamento — Se existem estabelecimentos adequada e até luxuosamente instalados, o que predomina é a deficiência de instalações e de equipamento, em casas sem vislumbre de arquitetura funcionalmente pedagógica, com higiene insuficiente, sem bibliotecas, nem bom mobiliário e razoável equipamento didático.

Este às vezes existe por empréstimo, para atender momen­tâneas exigências legais e outras vezes acumula camadas de poeira que atestam o seu desuso.

Deficiências oriundas de má tradição do ensino

1 — Preocupação absorvente com os resultados dos exames — Alunos, responsáveis, diretores e professores concebem fre­qüentemente a atividade da escola como sendo a de uma agência que emprega pessoas para adestrar para exames, que passam a constituir a suprema razão de ser da vida da escola.

O diploma e o certificado perdem o seu real valor simbólico para se converter em fins em si mesmos e a escola deixa de ser uma casa de educação.

2 — Formalismo do ensino — O ensino é predominante­mente livresco e formal, esvaindo-se numa superficial memoriza­ção de regras, fórmulas e noções que estão longe de constituir o conhecimento assimilado e incorporado e cujo preenchimento formal define o "bom" professor e o "bom" aluno.

3 — Alienação da escola em relação à comunidade — Desde que o ensino é essencialmente formal, não pode interessar-se a escola pela vida da comunidade nem cooperar com a família para a formação moral e cívica e para integração social do aluno.

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São poucos e de regra sem rumos seguros os serviços de orientação educacional e profissional, muitas vezes deportamentos estanques no que deveria ser o organismo escolar.

4 — Mercantilismo educacional — fatores vários dos acima enumerados contribuem decisivamente para que muitos estabele­cimentos particulares de ensino funcionem como casas de negócio do ensino, autênticos "pague e passe", o que, além dos inconve­nientes próprios, têm dois outros não despiciendos: o de as vezes forçar, pela ilicitude da concorrência, a que outros estabelecimen­tos baixem, para sobreviver, os seus padrões educacionais e o de fazer com que outros estabelecimentos, públicos especialmente, disparem para um excessivo rigor nos exames, como pedra de toque da excelência do ensino.

Insuficiências decorrentes de filosofia educacional

1 — como dissemos anteriormente, a filosofia educacional como teoria de valores da nossa escola, oscila de um ponto-de-vista cultural, entre o regressivismo e o conservadorismo.

como ta l não inclui na sua pauta programática propósitos de agência de reconstrução cultural.

2 — O seu conceito de humanismo está longe de se filiar ao humanismo moderno, aquele que entende que nada do que é hu­mano lhe é estranho.

esse humanismo clássico se esgota numa concepção beletris-ta, lítero-clássica que corresponde à sobrevivência de formas dua-listas de interpretação do comportamento humano, superadas em face de uma visão moderna, global, integrada e unificada desse comportamento.

3 — como decorrência de uma subjacente filosofia antide­mocrática, a expansão da nossa escola média se processou apenas mediante o sistema divisionista de escolas multipartidas (secun­dária, industrial, comercial, agrícola), em vez de ensejar tam­bém a expansão de escolas multilaterais, centros integrados ou compreensivos de ensino médio, como as comprehensive schools americanas ou como as escolas secundárias-técnicas de que Anísio Teixeira foi precursor, quando dirigiu a educação no antigo Dis­trito Federal

Lei e educação no Brasil

Há, no Brasil, uma concepção arraigada de crença absoluta nos poderes da lei, filha da convicção de um poder demiúrgico delas, como modeladoras da realidade.

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Daí o empenho na elaboração de leis casuísticas e regulamen-tadoras que tentam modelar na previsão legal toda a realidade da vida, multiforme, vária e cambiante.

desse estereótipo, infecundo em si mesmo, não se tem fur­tado nem mesmo leis que, por definição de âmbito, não se pode­riam permitir tamanha impropriedade de técnica legislativa edu­cacional.

esse é, por exemplo, o caso das Leis. de Diretrizes e Bases da Educação apresentadas no plano federal e que têm, em grande medida, um indisfarçável caráter de Leis Orgânicas que não po­dem conservar, salvo no que concerne à competência legal, para o que se aplicasse ao próprio sistema federal de ensino.

Trata-se, de um modo geral, de leis centralizadoras (talvez algumas sem o saber. . . ) que utilizam uma técnica legislativa quiçá própria a um estado político unitário e jamais a um estado político federativo, tal como é o nosso caso.

Muitas interpretações especiosas e sibilinas se erigiram para racionalizar essa invasão da União em área de competência dos Estados, em matéria de legislação educacional, inclusive como se se propusessem a defender "a unidade nacional", pela uniformi­dade educacional.

Uma área todavia era pacificamente conferida à competência estadual, mesmo pelos mais fervorosos defensores de uma legis­lação educacional centralizada, coibidora da competência estadual na matéria, e que era a de organização, de estruturação adminis­trativa dos sistemas estaduais de ensino.

Nem mesmo, todavia, esta área perdurou respeitada pela Lei de Diretrizes e Bases da Educação, aprovada pela Câmara dos Deputados sob número 2.222 C, pois, por ela, os Estados receberão uma organização educacional para instalar e cumprir, com pre­visão compulsória de todos os detalhes de sua constituição, pouco importando o que pensem os Estados a respeito.

Devemos sublinhar que, do nosso ponto-de-vista pessoal, repu­tamos uma experiência quiçá interessante esta de organização de Conselhos Regionais de Educação no nível estadual e Comissões Educacionais, desde que parecesse aos Estados ser esta a fórmula mais adequada de organização de sua administração educacional, jamais, porém, como decorrência de imposição de uma lei federal, que a tanto não pode constitucionalmente chegar.

O projeto 2.222 C aprovado pela Câmara de Deputados, pa-recendo-nos frontalmente contrário à letra, ao espírito, à própria índole e às finalidades da Constituição brasileira, não comporta, como tal, a nosso ver, análise de seus dispositivos particulares, como seriam os relativos ao ensino médio.

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Nele há, claramente, uma anteposição da ordem privada à oficial ou pública, cujo fiel cumprimento poderia conduzir a um monopólio da educação nacional em favor de professores parti­culares e diretores de estabelecimentos privados, isto é, de grupos profissionais e econômicos, com a agravante de ser um monopólio financiado por dinheiros públicos, da União, dos Estados e Muni­cípios, de cuja autonomia faz tabula rasa.

Quanto ao Projeto de Lei apresentado pela Confederação Na­cional da Indústria, parece-nos buscar representar uma forma de composição entre pontos-de-vista públicos e privados em matéria de educação.

A nosso ver, porém, peca, em matéria de princípio, ao su­gerir uma fórmula de expansão da educação que seria não a pro­priamente pública ou a de empresas lucrativas, mas a de "funda­ções" e a de "entidades de fins altruísticos".

Talvez no fundo isto corresponda a certos movimentos que se vêm intitulando de "terceira força educacional" e que, em ver­dade, são formas hábeis de conseguir que o estado promova no todo ou em grande parte o financiamento da educação para interesses

privados disporem. Temos inclusive ouvido referências a uma 'escola "pública,

mas não estatal", o que, no caso brasileiro, soa-nos como algo de estapafúrdio ou solerte.

Entendemos que o sentido da expressão "escola estatal" se aplicaria a uma escola indoutrinadora ortodoxa, sectária, de um regime totalitário em que o estado concentra todos os poderes, o que está longe de ser o caso do estado democrático brasileiro.

O que entre nós existe não é nenhuma escola estatal totali­tária mas sim a escola pública de ampla franquia democrática, sem imposições proselitistas nem discriminações seletivistas à base de crenças, côr, raças, posição social, convicção política e esta escola é a que urge ser expandida prioritariamente com os recursos públicos (quiçá com o auxílio privado) pois é ela o nosso grande instrumento de coesão social, o grande cadinho comum de formação democrática da nacionalidade.

Sem deixar de admitir que há virtualidades mais positivas quanto ao funcionamento, em caráter complementar, de escolas mantidas por fundações ou cooperativas sem finalidades de lucro em relação ao de empresas lucrativas de ensino, nem por isso esta expansão pode ter caráter de substituição da escola pública ou de caminho preferencial para o aumento da escola média man­tida por dinheiros públicos.

Recorde-se, a propósito, que na mesma Inglaterra, houve o fato conhecido de organizações educacionais, sob a forma de "fun­dações autônomas", pertencerem a grupos de pura representação da classe dominante, que, afinal, visavam a empolgar, disfarçada-

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mente, as forças educacionais, para imporem à cultura as restri­ções e limitações dos seus valores particulares.

O substitutivo da Confederação Nacional da Indústria à Lei de Diretrizes e Bases da Educação, nada obstante o seu nítido e correto propósito de fugir aos moldes hipertrofiados de Lei Or­gânica, do que constituem prova seus cinqüenta e nove artigos, exíguos no cotejo com os artigos dos outros documentos apresen­tados, nem assim, todavia, se enquadra ainda completamente nos limites estritos do que pode ser uma lei federal de Diretrizes e Bases da Educação, face à nossa Constituição e à nossa organiza­ção política de estado federativo e que, a nosso ver, não podem ir além dos seguintes:

a) definição de objetivos da educação; b) classificação e definição dos graus e ramos de ensino e

seus objetivos; c) duração mínima dos graus de ensino e articulação de

níveis e cursos; d) forma de contribuição financeira ao ensino; e) determinação das áreas de competência em matéria de

legislação do ensino; f) definição da estrutura dos órgãos deliberativos e admi­

nistrativos de educação da União e suas atribuições.

Deixemos, assim, à margem, por se tratar de lei cuja essência são normas gerais, a análise de aspectos mais particularizados do substitutivo apresentado pela C.N.I . por não podermos san­cionar não apenas certas omissões do mesmo em matéria de pre­cisa definição de competência dos poderes públicos, das institui­ções privadas e da família quanto a direitos e deveres em educa­ção, como também por nos parecer êle pelo menos evasivo quanto ao formular a indispensável atuação do poder público na expansão de nossa rede escolar, mediante escolas por si instituídas, manti­das e dirigidas, sem infundados receios nem indefensáveis prete­rições quanto ao papel básico dessa escola pública no estado de­mocrático moderno, que não é nenhuma invenção socialista, mas tem caráter puramente republicano-democrático.

Considerações sobre reformulação de diretrizes para o ensino médio e secundário.

Ao nosso entender, a medida básica a empreender para pôr em termos adequados o problema da extensão e funcionamento de nossa escola média e secundária, seria a do planejamento edu­cacional no qual o problema aqui abordado constituiria parte inte­grante.

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Vamos tentar resumir a seguir alguns pontos de referência que nos parecem mais essenciais a esse planejamento, sem, é evi­dente, pretensão de aqui esgotar o assunto.

Financiamento escolar — Parece-nos medida importante a de conjugação de recursos públicos (federais, estaduais, munici­pais) para enfrentar, em conjugação de esforços planejada, os ônus de manutenção dos sistemas públicos de educação.

É também admissível, estimável e estimulável a cooperação privada a esse grande empreendimento social coletivo.

Afigura-se-nos inteiramente defensável a tese de que os mí­nimos de gastos previstos pela Constituição a serem feitos pela União, Estados e Municípios na educação, devem ter destinação pública, só podendo ser aplicados em qualquer forma de gasto em instituições privadas, o excedente desses mínimos constitucio­nais.

Seria assim um primeiro esforço ponderável e sério por tor­nar realidade, aquela formulação dos Constituintes de 1823, lide­rados por José Bonifácio e Martim Francisco, ao preverem, fun­dadas e custeadas pelo governo, "escolas primárias em cada termo, ginásio em cada comarca e universidades nos mais apropriados lugares", o que até hoje aguarda ensejo de realização. ..

Na distribuição desses recursos, prioridade básica haveria de ser, constitucional e democraticamente, concedida à educação primária, comum e obrigatória, despida do falso cunho seletivo que hoje a esgota em reprovações em massa, e cujo período de escolaridade nas áreas urbanas seria de quatro anos básicos e mais dois anos complementares e de quatro anos nas áreas ru­rais.

Logo em seguida, viriam os cálculos e projeções de metas a atingir em períodos determinados, na ampliação da escola de segundo grau, de primeiro e de segundo ciclo e da escola superior, tomando como ponto de referência os recursos disponíveis e as necessidades reveladas pela estrutura ocupacional nos níveis se­cundário e terciário.

Administração escolar — Todo esforço deveria ser feito no sentido de estimular a descentralização da administração escolar, o que nossas condições sócio-culturais e de extensão física indicam e uma consentânea visão do processo pedagógico referenda.

Exemplo eloqüente de boa proposição do problema no plano federal, temo-lo na Lei n.° 3 553, de 16 de fevereiro de 1959, onde se reformam os moldes de funcionamento das escolas de ensino industrial de nível médio da União, para o que se busca uma par­ticipação autêntica das comunidades a que servem nos rumos des­sas escolas, mobilizando em torno ao seu destino a atuação da sociedade local e não apenas recebendo a imposição de normas de altas e distantes castas burocráticas.

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Organização Escolar — Cremos deveriam ser consideradas as seguintes novas modalidades na organização de oportunidades educacionais, no campo do ensino médio:

1 — ampliação de dois anos de escolarização na escola pri­mária dos grandes centros urbanos (5.a e 6.a séries), nos moldes das classes primárias complementares do programa do INEP, valendo esses dois anos também para possibilitar acesso à terceira série do ensino mé­dio;

2 — instituição de centros compreensivos ou integrados de ensino médio nos grandes centros urbanos, nos quais, na mesma escola e com direção comum, se promoveria educação geral (em cursos e classes comuns), progra­mas eletivos para habilidades práticas e programas avançados de matérias acadêmicas;

3 — revisão dos moldes de funcionamento do último ano do segundo ciclo, em relação aos objetivos de ingresso em escolas superiores.

Estrutura didática — Parece matéria pacifica a necessidade de revisão, por quem de direito, de conceitos superados sobre o currículo, confundido, geralmente, com o curso de estudos e tendo como forma única a organização à base de matérias; revisão, igualmente, do número excessivo de matérias por série e exame da possibilidade da integração de algumas delas; revisão da extensão e da elaboração dos programas; revisão dos processos uniformes, desatualizados e parciais de verificação do rendimento escolar; revisão da ênfase a ser concedida à autonomia didática; revisão dos métodos e técnicas de ensino; revisão da pertinência de um tronco comum de matérias para o primeiro ciclo do ensino médio; revisão das deturpações pedagógicas oriundas da visão de espe­cialistas de matérias nas séries iniciais da escola média; revisão de critérios de classificação de estabelecimentos ao invés da falsa, formal equivalência legal ora vigente; revisão do problema da profissionalização do corpo diretivo das escolas; revisão da alie­nação "intelectualista" da escola secundária; revisão do sistema atual de inspeção; revisão das necessidades de pesquisa e de ex­perimentação pedagógicas, esta última campo de particular aten­ção para a escola privada.

Filosofia educacional — Órgãos de estudo, dos poderes res­ponsáveis pela educação, deveriam estimular e promover observa­ções e estudos objetivos da filosofia educacional prevalecente em nossas escolas e da correspondência que guarda ela com a cultura de nosso tempo, com a forma democrática de nossa organização política, com as situações decorrentes do processo de reconstrução cultural em marcha.

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Magistério — como tese para estudo deveria ser acolhida a de analisar em que medida se justificaria o confiar a professores saídos dos Institutos de Educação, com cursos especializados, a possibilidade de exercerem a docência no primeiro ciclo do ensino médio, pelo menos a título de emergência.

Quanto às Faculdades de Filosofia, Ciências e Letras, cremos que urge ser feita uma verificação objetiva dos resultados de seu trabalho, como preparadora de professores.

Parece-nos haver pressupostos razoavelmente fundamenta­dos de que não está sendo viável, mesmo nas escolas melhor apa­relhadas, conciliar tarefas simultâneas de preparação de docen­tes, difusores horizontais do conhecimento, com a de formação de cientistas, aprofundadores verticais do conhecimento.

A amplitude de propósitos dessas Faculdades de Filosofia, Ciências e Letras, que termina por convertê-las em verdadeiras Universidades, parece vir conspirando contra uma aficaz realiza­ção simultânea de seus múltiplos e diversos propósitos.

Não nos parece assim fora de propósito, antes, pelo contrá­rio, se nos afigura tema da maior oportunidade, esse do reestudo das instituições, em nível universitário, mais próprias à formação dos quadros técnico-docentes do nosso ensino médio em geral, como sejam, por exemplo, Faculdades de Educação ou outras institui­ções equivalentes.

Essas instituições estariam propostas a exercer uma autên­tica liderança profissional da educação institucionalizada que até hoje, em verdade, não lograram realizar as Faculdades de Filo­sofia.

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GILBERTO FREYRE E A CULTURA BRASILEIRA

FERNANDO DE AZEVEDO Da Universidade de S. Paulo

Pretende-se às vezes que os escritores não sabem fazer-se justiça uns aos outros. Entre eles, dos maiores aos menores, como em todos os setores da vida social, existem sem dúvida e sempre existiram incompreensões e hostilidades e, em conseqüên­cia, erros e desvios de apreciação. A vaidade, a malquerença e a inveja, geradoras de tensões e conflitos; a tolerância, tão fre­qüente, do indivíduo para consigo mesmo em contraste com o ri­gor tantas vezes excessivo no julgamento do trabalho alheio e a interferência de fatores emocionais em nossas opiniões, sendo tão próprias da natureza humana e variando com os temperamen­tos individuais e as formas de competição, não constituem apa­nágio de nenhuma classe de trabalhadores. como o senso de jus­tiça, o gosto da exatidão nos julgamentos e a probidade repar­tem-se por todas elas em graus diferentes e conforme o nível de cultura e as condições de trabalho. Que os escritores, os mais capazes de se julgarem uns aos outros, não se façam justiça entre si, é, pois, uma dessas generalizações apressadas que não passam por verdade senão a poder de repetidas. O volume que os ami­gos e admiradores de Gilberto Freyre tomaram a iniciativa de organizar e editar, comemorativo do 25.° aniversário da publica­ção de Casa Grande e Senzala, é um dos que colaboram na des­truição dessa lenda. Mas, no caso do grande sociólogo e escritor, não precisava essa coleção, que se planejou, para desfazer o pre­conceito. Logo que apareceu o seu primeiro livro, formou-se, para envolvê-lo até hoje, um caloroso ambiente de curiosidade, respeito e admiração. Poucos escritores no Brasil (e entre eles está Euclides da Cunha) terão provocado, com sua obra de es­tréia, o interesse que Gilberto Freyre despertou.

Essa larga repercussão de Casa Grande e Senzala, cuja pri­meira edição data de 1933, proveio de seu profundo significado na cultura do país, a que trazia uma contribuição original. Nesse livro, — livro humano, mas fortemente brasileiro, nas raízes e

Do volume Figuras do meu convívio, editado pela "Melhoramentos" na

coleção das Obras Completas do Prof. Fe rnando de Azevedo.

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na essência como no colorido e no sabor, — continha-se, de fato, a mensagem científica e literária do escritor em quem logo se reconheceu uma força nova, por suas idéias e atitudes, pela ma­neira de abordar os estudos histórico-sociais, pelas luzes consi­deráveis que projetou sobre a formação da família patriarcal e pelo poder de sedução da linguagem e do estilo. Obra de antro­pólogo e de artista a um tempo. Era alguma coisa de singular que cruzava então e em direções diferentes a atmosfera cultural, contribuindo para sacudi-la e renová-la. Da América do Norte, onde fizera seus estudos com mestres eminentes e, entre esses, Franz Boas, cuja influência sofreu, voltava Gilberto Freyre, — e depois de longa ausência, — com sede do Brasil e do vasto mun­do a explorar, pela aplicação de seus conhecimentos à compreen­são, clara e objetiva, do país e, particularmente, da região, tão rica de tradições, em que viveu. O contato com o seu meio deve ter sido para os olhos, em que ainda passeavam imagens de ter­ras estranhas, uma cura de repouso e um excitante poderoso da inteligência. Êle retornou, não para viver como um "desenrai-zado", com o espírito voltado para o estrangeiro, mas para mer­gulhar nas paisagens humanas, na cultura e na história das re­giões do açúcar, e penetrar, com um olhar novo e perscrutador, todo o processo de formação do patriarcalismo rural. Daí o êxito notável desse livro que não forçará nossa atenção, mas a atrai e, se ela pousa em suas páginas, a retém até voltarmos a última delas.

Por importante que seja a parte que teve Gilberto Freyre na introdução, por essa obra fundamental, dos estudos e pesquisas de antropologia cultural e de história social, não estará aí a sua maior contribuição à cultura brasileira. Transportando ao Bra­sil para aplicá-los em suas investigações antropológicas os mé­todos americanos, foi êle certamente um pioneiro desses estudos: não só abriu caminhos novos mas soube atrair outros para ex­plorá-los. Concorreu, por essa forma, para enriquecer e alargar a cultura no país, inaugurando, em seus quadros tradicionais, um novo setor de trabalho e de investigações científicas. Todos lhe devemos um pouco do que somos e muito do que sabemos, sobre­tudo a respeito do ciclo da cana e da formação da família patri­arcal, como de sua decadência e da formação da burguesia urbana, admiràvelmente analisadas em Sobrados e Mucambos. Foi, nesse terreno, um renovador, em quem andaram juntas a lucidez e a eficácia. É claro que, quando publicou Casa Grande e Senzala, já havia começado um movimento de renovação cultural nas ar­tes e na literatura, com a Semana de Arte Moderna, em 1922, e na esfera de educação em que, rompendo em 1920, se desenvolveu com extraordinário impulso, no decênio de 1926 a 1935, e alcan-

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çou em 32, com o Manifesto dos Pioneiros da Educação Nova, um de seus pontos culminantes. A atmosfera que então se res­pirava e nos envolvia a todos, já era de inquietação, de ruptura com a tradição e de busca de novos caminhos. Mas, no campo dos estudos e das pesquisas antropológicas, a força nova que sur­giu, impondo-lhes uma orientação conceptual e metodológica di­ferente senão oposta, sob vários aspectos, à de Oliveira Viana, pensador social e político, pioneiro dos estudos histórico-sociais, foi, sem dúvida, Gilberto Freyre. Penso, porém, que Casa Gran­de e Senzala ficou menos por ser iniciadora de um movimento do que por se situar em perspectivas novas e constituir a mais importante contribuição à inteligência da estrutura e dos costu­mes da sociedade patriarcal.

É que Gilberto Freyre, inovador na sua obra, mas de vida retraída, homem mais de pensamento do que de ação, não fêz propriamente escola nem deixou discípulos. Não exerceu senão episòdicamente o magistério, que aliás nunca o atraiu, e, embora qualquer Universidade do país ou da América se honrasse com sua presença (e várias delas a terão disputado), o gosto do re­colhimento e da solidão, o amor aos estudos tranqüilos e o interesse

pela pesquisa livre não lhe permitiram atender às convoca­ções para um contato, direto e contínuo, com a mocidade das es­colas. A sua própria obra de caráter puramente teórico e de intenção didática se ressente da ausência desse contato; e pode-se defini-la tanto pelo que lhe falta de precisão e de ordem quanto pelo que ela tem de cultura e erudição. Foi antes um eficaz pro-vocador de idéias, uma espécie de atiçador para avivar o lume onde parecia extinguir-se, um autêntico criador de cultura. A influência que exerceu, — e foi grande e é incontestável, — é, sobretudo, pelos livros e, mais particularmente, pelo seu tríptico, — por esse magnífico painel sobre três planos que se dobram e se chamam Casa Grande e Senzala, Sobrados e Mucambos, e Nor­deste, que é uma monografia regional. Documento, um dos mais verdadeiros e mais vivos do regime escravocrata-senhorial, Casa Grande e Senzala disputa ainda com Sobrados e Mucambos as preferências dos leitores e dos cientistas sociais, unânimes em qualificá-los, a despeito das divergências que possam suscitar, entre as obras mais sólidas e atraentes de nossa literatura cien­tífica. Nenhum outro dá conta de uma época melhor do que os dois primeiros livros, escritos por um antropólogo que seria tam­bém um pouco poeta e um humanista. toda uma sociedade an­tiga, a do período colonial como a do Império, nas regiões do açúcar, apresenta-se à nossa compreensão com riqueza de de­talhes, poder de reconstituição histórica e social e uma documen­tação extraordinária que, salvo retificações nesse ou naquele ponto, não poderá senão ser completada e desenvolvida.

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O interesse dessa obra está todo inteiro no estudo da orga­nização econômica, da cultura, dos caracteres e dos tipos sociais; na observação exata e fina dos meios da sociedade patriarcal e das paisagens que a enquadram; na representação quanto possí­vel fiel dos fatos e na expressão dos sentimentos que distinguem as figuras, grandes ou humildes, em evidência ou obscuras, que se concentram no mundo duramente disciplinado das casas gran­des e das senzalas. Não é, porém, uma sociedade compacta que surge, rigidamente hierarquizada, segundo esquemas ideais, mas uma sociedade real, viva e inquieta, sacudida com toda a força dos instintos que tiram a sua desforra, criando, subjacente à estrutura fundada no princípio da autoridade, todo um mundo incoerente, mas humano, que se agita na sombra, feito de acomo­dações e de transigências. Por uma série de anotações concre­tas, significativas, tomadas tanto ao reino dos senhores quanto à escravaria e às relações de toda ordem entre essas duas esferas do espaço social, vemos nascer, na colônia, a sociedade patriar­cal, desenvolver-se, tomar corpo, ganhar força e prestígio, ex­pandir-se na opulência e entrar lentamente em declínio e, mais tarde, em processo de desagregação. A história do Império con­tinua a tantos respeitos a da colônia, e a da República desdobra-se sobre o velho tronco do patriarcalismo, "como os ramos novos de uma árvore abatida se nutrem da seiva das raízes subsisten­tes". Pesquisar, contar fatos tão múltiplos, encontrar a cadela ou a trama de suas conexões, explicá-los para nos fazer saltar dos quadros em que se desenvolveu, o retrato da sociedade patri­arcal, na colônia e no Império, era uma tarefa difícil. Mas Gil­berto Freyre a realizou silenciosamente, sem apregoá-la, surpre-endendo-nos afinal com sua obra, escrita com uma naturalidade e um encanto pitoresco que lhe dão às narrações um sabor apaixo-nante, e com precisão e veracidade tão notáveis que se diria ha­ver sido, êle próprio, testemunha da vida e dos costumes, já tão antigos, da sociedade que retratou.

As conclusões, válidas para as regiões abrangidas pela cha­mada civilização do açúcar, e, em certa medida e em determina­dos pontos, para as que mais tarde veio a compreender o ciclo do café, não se aplicam por certo nem podiam aplicar-se à inter­pretação de outras sociedades e culturas do país. É o seu (e esta afirmação em nada lhe diminui o valor) um estudo em pro­fundidade de uma fase ou de um dos aspectos de nossa civiliza­ção, de uma cultura que rompeu e se expandiu em três grandes regiões, mas de tamanha importância econômica, significação so­cial e política, solidez de tradições, que se projetou, para nele influir poderosamente, no plano nacional. A civilização do açú­car foi, de fato, em largo período, o eixo em torno do qual gra­vitou toda a nossa economia. Mas, nem por ter sido tão pro-

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funda a marca que, sob vários aspectos e em diversos setores, imprimiu o ciclo do açúcar à cultura e civilização brasileira, se poderia negar a fisionomia particular daquele ciclo econômico, no vasto complexo dessa civilização. Onde se expandiu o patri­arcalismo rural que Gilberto Freyre analisou, aí teve êle um dos pontos de concentração de suas forças criadoras e de irradiação de suas influências. Que tenha sido, pois, na colônia e no Im­pério, um dos focos mais vivos da civilização brasileira, que con­tribuiu notavelmente para criar, consolidar e desenvolver, não há sombra de dúvida; mas que seja bastante para explicá-la na extrema diversidade de suas paisagens sociais, ou suscetível de identificar-se com ela, em qualquer momento de nossa história, seria um exagero que Gilberto Freyre não perdoaria a nenhum de seus comentadores. O que êle fêz, — e ninguém depois dele produziu, nesse setor, coisa melhor, — foi uma série esplêndida de monografias, realmente importante para a interpretação do Brasil sob alguns de seus aspectos fundamentais.

No centro das preocupações de Gilberto Freyre acham-se ainda e sempre o regional (regionalismo), o passado (casa gran­de, o engenho, o folclore, o português, a tradição) e o roman­tismo, — três tendências que aparecem intimamente ligadas e provêm não raramente uma da outra, na mesma ordem de su­cessão. Mas todas elas têm, com seu lado positivo, seus aspec­tos negativos, e, junto aos seus impulsos criadores, se situa, para comprometê-los, toda uma zona de perigos. O regionalismo pren­de-se às próprias origens do país que se formou como um arqui­pélago, com suas ilhotas de cultura, tão distantes umas das ou­tras, e em que cada uma das regiões geográficas "corresponde a um estágio histórico diferente". A extensão territorial, a va­riedade de paisagens geográficas e humanas, as diferenças de nível e de aspectos econômicos e culturais, a formação, em con­seqüência, — e apesar das novas técnicas de transporte e comu­nicação, — de vários centros intelectuais, reforçam essa tendên­cia permanente do espírito brasileiro que é o regionalismo; e, se observarmos atentamente as letras contemporâneas, no Brasil, seremos levados a refletir sobre um provincialismo que parece re­jeitar, — sem disso ter consciência, — a idéia, exaltada por Goethe, de uma literatura universal. Em Gilberto Freyre, uma idéia não expeliu a outra; elas tiveram nele o seu ponto de en­contro. A largueza de horizontes e o sentido profundamente humano da vida, resultantes de sua formação científica, do con­tato com as artes e a literatura e de suas freqüentes viagens ao estrangeiro, já lhe haviam rasgado, no espírito, aberturas em múltiplas direções. Se êle, porém, sempre dispôs de recursos, enriquecidos pela experiência, para se cobrir contra os riscos

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a que o expunha o regionalismo, não é menos certo que o gosto pelos estudos e o interesse pelos movimentos regionais de que teve a iniciativa ou em que participou, mostram ser essa ten­dência uma das constantes, sempre igualmente distendida, de seu espírito e de sua obra e uma de suas características prin­cipais.

Mas, como é nas culturas locais e regionais que a tradição deita raízes profundas e adquire maior resistência, do regiona­lismo costuma nascer um amor mais persistente, senão excessivo apego ao passado. De tal forma se ligam regionalismo e tra­dição que, onde aquele floresce, ganha esta mais vigor e poder de encantamento. Passando anos em estudos e pesquisas para reconstituição de uma das mais notáveis organizações sociais e econômicas que o Brasil já conheceu, e que se concentraram era regiões como Pernambuco, o Recôncavo Baiano e, mais tarde, em Campos de Goitacazes, no sul, Gilberto Freyre percorre a civili­zação do açúcar em toda a sua extensão, procede a uma inves­tigação em profundidade, penetra-lhe o sentido econômico e o contexto sociocultural, entra na intimidade de sua vida e de seus costumes e, apreendendo-a em todas as particularidades, conseqüências e repercussões, já não a descreve apenas como quem a observa mas, segundo já anotei, como quem dela parti­cipou e nela viveu. Do amor às suas tradições não tardou a passar ao culto da tradição. Êle ficou muito perto e no con­vívio da época e do meio que estudou, para se manter indife­rente ao encanto de suas lembranças históricas. Daí, para ci­tar apenas alguns, os trabalhos que mais tarde publicou, Guia prático, histórico e sentimental da cidade do Recife (1934), Olin­da (1939), Região e Tradição (1941) e O mundo que o portu­guês criou (1941). Sente-se, através de toda sua obra, que, a poder de perscrutá-lo, se volta sempre para o passado com uma espécie de nostalgia e tem, nessa atmosfera de coisas antigas, a sua principal fonte de inspiração. Não é possível, certamente, voltar as costas ao passado, — pois há uma continuidade entre o passado e o presente; — mas, se "é, em grande parte, com a tradição que aprendemos, não é com ela que criamos". Assim, O mundo que o português criou e que surge da pena e, em tantas páginas, quase diria do pincel de Gilberto Freyre (tão coloridas e pitorescas as suas evocações), é cada vêz menos por­tuguês e cada vêz mais americano na sua mentalidade, nos seus estilos de vida, em suas atitudes e nas suas realizações.

Regionalismo e culto da tradição que tão freqüentemente se cruzam, são dois dos caminhos que levam ao romantismo. Gilberto Freyre, renovador, no campo dos estudos histórico-so­ciais e na forma literária, mas tradicionalista, em política, não

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é um espírito clássico, de ordem e disciplina, mas, sob certos as­pectos, um espírito romântico. Isto não quer dizer que, no plano científico, não se esforce por ser preciso e objetivo e não o tenha conseguido quase sempre. Antropólogo, educado na melhor es­cola e aparelhado dos mais hábeis instrumentos de investigação, sabe apanhar a realidade sem falseá-la com vagos lirismos e sem se extraviar pelas regiões da retórica. Mas bastará atentar para a sensibilidade e imaginação, discretamente espalhadas por sua obra, para se verificar que por ela circula muito desse roman­tismo que se origina do regional e do tradicional e tem, entre outras características, o individualismo, o sentimento dionisíaco da vida e a atração pela natureza. Êle a envolve e sobre ela cai como a poeira da terra e a das estrelas que vêm do espaço e não vemos distintamente senão quando é colhida por um feixe de luz solar. Nisto assemelha-se a um Malinowsky, observador fino e penetrante, de grande rigor científico, nos seus estudos sobre sociedades primitivas, e que, no entanto, humano, acessivel a tudo o que é arte, tem por vezes, no seu talento sedutor, não sei que de lírico. O tom de Gilberto Freyre pode, de fato, mudar, mas sua maneira de pôr os problemas do mundo moderno fica tribu­tária da tradição como da análise spengleriana, que opõe a cul­tura, — a alma, à civilização, identificada com a técnica racio­nal. E, como observa Francis Erval, em seu estudo, a propósito de Ernst Junger, sobre a Alemanha, "que secreta o romantismo para sua glória literária e sua miséria política", às vezes a na­tureza substitui aí a cultura. Daí, conclui êle, com razão, o isola­mento na natureza, destinado a uma elite restrita, do qual o pró­prio Gilberto Freyre, pensador solitário, dá um exemplo no seu recolhimento em solar antigo, entre árvores velhas. Mas não é difícil sentir que, depois desse retiro, uma elite forjada na soli­dão, retomaria, aqui também, a criação de um Estado ideal, sonho de todos os românticos.

No diálogo entre esses dois espíritos, — o da regionalidade e o da universidade, Gilberto Freyre procura menos manter o equilíbrio do que associá-los para os integrar numa cultura cujas raízes se embebam no regionalismo, mas de que o espírito uni­versal desabroche, como uma flor, na haste fina do pensamento. É assim que sentimos, em nós mesmos, o laborioso desabrolhar dessa flor antiga e rara. Se êle não abriu, acentuou e alargou, porém, na linha região-tradição, esses sulcos por onde rola, na cultura do país, a corrente do romantismo que atravessa em pro­fundidade a política e a literatura. Mas há outro aspecto, não menos importante, da parte que teve na renovação dos valores da cultura. O que predomina em Gilberto Freyre, como já o disse, é o "espírito analítico". Êle sabe que "uma hora de sín­tese supõe anos de análise". E é para a análise que se voltou.

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Êle renuncia, de fato, a visões de conjunto ou às vistas pano­râmicas para descer a investigações minuciosas, revelando ex­traordinária capacidade de percepção do grande significado dos pequenos fatos. Longe de se dispersar, circunscreve sempre o campo de suas pesquisas para melhor estudar a sociedade e a cultura (daí o interesse pelas monografias regionais e por as­suntos precisamente definidos) e explora, como poucos, a arte de que tem o segredo, de extrair dos "pequenos detalhes" um mundo de provas e testemunhos. Refugiando-se na leitura de documentos, de velhos jornais, de cartas tomadas a arquivos par­ticulares, e, percorrendo nos antigos engenhos e nas casas gran­des tudo o que ficou da sociedade patriarcal, compraz-se em examinar e confrontar, umas após outras, pequeninas peças do­cumentárias, em penetrar-lhes o sentido e estabelecer suas liga­ções entre si e com o contexto cultural de que participam, para realizar a obra que se propôs, de reconstituição histórico-cultu­ral. Daí, da recomposição de fragmentos esparsos, essa seqüên­cia de imagens, essa série de evocações a um tempo precisas, coloridas e matizadas, e essa sucessão de detalhes pitorescos que constituem um dos atrativos de dois de seus livros fundamentais.

Os seus processos de composição, como já observou Roger Bastide, em relação a Casa Grande e Senzala, não são os pro­cessos clássicos. "Certamente (escreve Bastide) não os ignora e, contra seus detratores, sem dúvida, êle os utilizou em Nor­deste, onde sua frase se torna mais sintética e mais lírica tam­bém. Mas geralmente procede de uma maneira que lembra a um tempo o Taine das Origens da França Contemporânea, com suas acumulações de "pequenos detalhes" característicos, e o Proust dos longos caminhamentos, das transições sutis e dos remoinhos do pensamento. Êle procede, com efeito, por acer­vos de pequenos fatos, por análises minúsculas, quase infinite-simais; vem e revém sobre certos fatos importantes, cada vez com novas luzes a projetar, e isto pôde suscitar críticas para lhe fazer a censura de ser denso. Mas é preciso reconhecer que atinge perfeitamente, desse modo, o fim que se propôs: o de ressuscitar dessas centenas de parágrafos, comprimidos, com­pactos, pesados de detalhes, uma atmosfera, um clima desapare­cido, o do velho Brasil". Êle procede um pouco à maneira de Taine, não só, como pondera Bastide, -pelo seu gosto de acumular pequenos fatos significativos, mas também por não ver na rua, nos meios históricos, nos fatos enfim, senão "permanências de caráter", "convergências de efeitos". Uma paisagem não é, para êle, apenas uma paisagem, mas um meio, um ambiente, e um traço de costumes não é somente um traço de costumes, mas um "documento" sobre a sociedade e a cultura que elegeu para ob­jeto de suas pesquisas.

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Além de trazer aos trabalhos suscitados em torno da civi­lização do açúcar uma contribuição de primeira ordem, Gilberto Freyre, como se vê, renovou ainda o assunto, dando-lhe um tra­tamento tão vivo quanto original. Um dos méritos que não se lhe podem contestar é, pois, haver inaugurado métodos novos, resistindo à sedução das grandes sínteses, mas para lhes pôr à base as conclusões de aturadas pesquisas e análises minuciosas. Esta foi sua honra e um de seus títulos de glória, a que se pode juntar o da reação que promoveu, por sua obra, contra o dile­tantismo e a improvisação e contra a retórica, o estilo florido e brilhante, armado ao efeito. É um renovador da língua, para cujo enriquecimento concorreu, rompendo contra os moldes tra­dicionais e criando-se um instrumento original de expressão. A sua é uma linguagem fresca e saborosa, de grande força comu-nicativa. Quebram-se, com êle, as orgias de palavras. Nada de artifícios, aparatos ou pompas de estilo. Êle ignora a gra­vidade e a ênfase. Sob sua forma discreta mas maliciosa e às vezes voluntariamente um pouco dispersiva, flutuante, e com esse estilo tão seu, aparentemente descuidado, mas pitoresco e evocador, pinta-nos um retrato admirável do patriarcalismo ru­ral, dando um sabor particularmente picante a certos capítulos, sobretudo àqueles que consagra à análise dos costumes, da vida sexual e das relações entre brancos e negros. É um prazer acom­panhá-lo nas suas visitas às casas grandes, onde nos faz respirar a atmosfera ainda quente da vida familiar; nos passeios aos ca­naviais e às fábricas de açúcar e em suas incursões pelas sen­zalas onde se acotovela a escravaria, depois dos rudes trabalhos, de busto nu, de sol a sol, nas plantações e nos engenhos.

Não há quase detalhe que lhe tenha escapado dessa cultura, estudada sob todos os aspectos, reconstituída e posta ao vivo sob nossos olhos. É que Gilberto Freyre, além de observador sagaz e vigilante, é um escritor de grandes recursos. Seu livro Casa Grande e Senzala, construído com uma negligência de superfície e um rigor secreto, é realmente belo, justamente observado, cheio de análises penetrantes e de maduras reflexões, deliciosamente escrito por um dos maiores prosadores de sua geração. Evoca­dor de uma civilização, êle nos transporta descansadamente, sem atropelo, para um passado tão diferente da vida atual e que, no entanto, — e talvez por isso mesmo, — nos atrai e prende a aten­ção; e o que nele mais nos atrai é o que aí descobrimos de uma humanidade que foi a de nossos pais. Nós a encontramos fixada em seus costumes, seus hábitos de vida, suas atitudes, seus ex­cessos e suas indulgências, entre um cenário de rios tranqüilos e de ásperas paisagens, no livro que lhe resume toda a força e toda a poesia, grandezas e misérias, as asperezas da autoridade,

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a dura altivez na própria pobreza, a paixão intolerante, o ardor religioso, mas também toda ordem de acomodações com o céu . . . O homem que aí descobriu e nos oferece, não é, pois, o homem ideal, uma espécie de entidade metafísica, mas o homem real de determinada sociedade, em certa época, tal como se apresenta no seu quadro histórico. O homem real, sim, apanhado por Gil­berto Freyre tão objetivamente quanto possível, mas a que não faltam vida e calor humano. Sua vivacidade de inteligência su­til, quase tátil, permitiu-lhe surpreender, nas coisas, nas insti­tuições e nos fatos, a significação, a coerência interna e o ritmo de evolução da sociedade patriarcal que aparece restaurada, desde suas origens e na sua originalidade, sob uma luz límpida e calma.

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EDUCAÇÃO PARA O DESENVOLVIMENTO

M. B. LOURENÇO FILHO professor Emérito da Universidade do Brasil

1 .a Parte

I. COMPREENSÃO DO TEMA

1. A associação entre fatos educacionais e os de outras categorias da vida social tornou-se tema muito freqüente nos últimos tempos. Isso tem resultado de dois movimentos para­lelos, ainda que determinados por impulsos diferentes: a intro­dução de métodos objetivos na análise da realidade social, e a difusão de amplas doutrinas ou ideologias relativas à organiza­ção política. Procurando apenas esclarecer, o primeiro mais freqüentemente fala em "educação e desenvolvimento". O segun­do, com mais freqüência também, utiliza-se de dísticos tais como "educação para o desenvolvimento" ou "educação para a mudan­ça social".

2. Na realidade, quando de uma ou de outra dessas últimas expressões nos servimos, estamos afirmando duas coisas. Em primeiro lugar, que a mudança social, ou que desenvolvimento no sentido particular em que formos levados a defini-lo, é coisa desejável, razão por que a ela devemos afeiçoar nossas idéias, propósitos e intenções; e, em segundo, que, entre os fatos e si­tuações da educação e os fatos e situações sociais em geral, exis­tem relações funcionais, em boa parte ao menos passíveis de descrição e explicação, de tal forma que, quando naquelas opere­mos. estaremos nestas influindo também.

3. É evidente que os conceitos aí envolvidos pertencem a duas categorias diversas. Num caso, utilizamos crenças e valo­res que nos movam à ação prospectiva, a programas de ação. No outro, pretendemos definir meros conceitos de realidade, com base na experiência. Serão, porém, esses conceitos realmente possíveis ? . . . Pensadores modernos, entre os quais, em nume­rosos de seus trabalhos, Gunnar Myrdal, insistem em que "não há outro modo de estudar as realidades sociais fora do ponto-de-

Relatório p reparado p a r a os "Encont ros Regionais dos Educadores Bra­sileiros", por solicitação da Confederação Nacional da Indústr ia .

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vista de ideais humanos" e que, "por motivos lógicos, de outra forma nem mesmo podem existir". ' Em termos diversos não há ação, e mais que tudo ação social, sem que esteja apoiada em pressupostos, ou num conjunto de valores que integrem pessoas, grupos e instituições. O perigo não está em que tais pressu­postos existam, mesmo porque eles são irredutíveis, mas, sim, que deles desconheçamos a existência e a influência sobre a marcha de nossa própria ação e pensamento.

4. Em face do problema concreto destes "encontros" — o estudo da legislação atinente a diretrizes e bases da educação nacional — os dois elementos já referidos aparecem expressos. "Diretrizes" significa rumos, direção para objetivos que tenha­mos como úteis, justos ou necessários; e "bases", uma instru­mentação adequada à consecução de tais objetivos, e, tanto quanto possível, fundadas em dados da experiência, obtidos por indaga­ções de muitas e variadas espécies. As diretrizes ou os pres­supostos gerais de uma ação política em matéria de educação, como aliás de outra atividade política qualquer, provêm dos cos­tumes e das leis, podendo mesmo estar referida nos pactos cons­titucionais. Em nossa Constituição assim acontece. Nela, não estão tais diretrizes, como vulgarmente se imagina, indicadas apenas no capítulo específico "Da Educação e da Cultura". Estão em todo o sistema que essa carta esposa e, mais diretamente, nas partes em que se esclarecem os direitos e garantias constitucio­nais, a cidadania e a ordem econômica e social.

5. toda essa matéria constitui um corpo de pressupostos em que se afirmam ideais e aspirações, carregados de valores. Aceitando-os, como não poderemos deixar de fazê-lo, é que se deverá pensar na legislação ordinária. Esta terá de confron­tá-los com as realidades presentes, optando, então, à vista de dados reais que convenientemente as descrevem e possivelmente cheguem a explicá-las, entre a gama de possibilidades de ação política, a fim de que tais valores declarados, ou apenas enun­ciados, adquiram praticidade, para que venham a funcionar como valores reais na vida brasileira. A legislação sobre diretrizes e bases (note-se que a Constituição não determina que haja uma só e única lei a regular a matéria, nem isso em face do texto parece praticável) deverá ter, pois, um caráter "problemático", no sentido de que, em face daquele corpo de pressupostos e do esboço de normas gerais de ação, dever-se-á examinar as realida­des existentes e construir os modos pelos quais, com maior pro­babilidade, se assegure a consecução de novos estados da vida social que se aproximem daquelas concepções ideais.

1 MYRDAL, Guimar — Teoria econômica e regiões subdesenvolvidas (Trad. do inglês), edição do ISEB, Rio, 1960.

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6. Nesse sentido, a construção que se projete deve consi­derar um sistema ascendente com referência a um maior equi­líbrio das relações humanas — políticas, econômicas, sociais em geral — resultado a que, de modo geral, pode caber o nome de "desenvolvimento". O conceito aí contido não é simples ou pas­sível de estrita definição. Nele, temos que admitir a sociedade nacional, as instituições que a compõem, os grupos e também os indivíduos. O sistema geral deverá compreender todos esses ele­mentos partes e subpartes, entre si articuladas. Todo êle se solidariza na ação, isto é, na interação das partes com o conjunto e do conjunto com as partes, para um efeito comum. Sem esse modelo, em que as idéias de estrutura e função aparecem como fundamentais, nem mesmo se logrará admitir a sociedade e o indivíduo como objetos de estudo de maior valor objetivo.

7. Assim, o que podemos chamar de "desenvolvimento", em seu mais amplo sentido, é um processo multicausal, cumulativo e circular. Implica realidades de infra-estrutura — o território, a distribuição demográfica, as formas de trabalho ou de orga­nização econômica — como também as expressões de natureza política, social ou de cultura simbólica. A compreensão, nesse mais amplo sentido, pode ser exemplificada no programa recen­temente adotado pela UNESCO para a Conferência Interame­ricana sobre Educação e Desenvolvimento Social e Econômico, a ser realizada em novembro de 1961. Organizado por um grupo de especialistas de todos os órgãos técnicos das Nações Unidas, e que funcionou no Rio de Janeiro sob a presidência do autor deste relatório, prevê o estudo de numerosos aspectos da vida social, tais como: a estrutura demográfica e suas perspectivas; a estrutura econômica geral e, em particular, a estrutura agrá­ria ; os efeitos dos processos de urbanização e da industrialização, considerada a importância das migrações internas; a estratifica­ção e a mobilidade social; os valores políticos formais e os valo­res reais; o problema de financiamento da educação, segundo as possibilidades de ampliação do ensino, consideradas a renda per capita em cada um dos países a considerar; e, tudo isso, ainda com relação aos sistemas educacionais já existentes em cada um dos países latino-americanos.2

8. Pretende esse órgão técnico das Nações Unidas, com tais estudos, concorrer para o esclarecimento dos pressupostos e bem assim dos métodos a serem utilizados na organização e administração dos sistemas educacionais por ação política bem fundada, e isso implica a convicção geral de que, nos complexos

2 "Reunião Preparatória da Conferência Interamericana sobre Educa­ção e Desenvolvimento Social e Econômico", in Educação e Ciências Sociais, Ano IV, vol. 6, n« 12, novembro 1959, Rio.

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fatos e situações sociais, tais análises possam revelar os pontos nos quais a ação política possa interferir com maior eficácia. Implicitamente, afirma a desvalia de reformas educacionais desde que não se fundem em indagações, tão completas quanto possível, das realidades sociais. Tal é o sentido geral do conceito de de­senvolvimento e de suas relações com as realidades educacionais.

9. Antes, porém, desse movimento, hoje centralizado na UNESCO, pesquisadores e cientistas sociais elaboraram e defen­deram uma compreensão mais restrita da matéria. É a que se refere, em particular, aos efeitos das variações sociais que se possam diretamente atribuir às mudanças da estrutura profis­sional de cada país, e à necessidade de que as instituições de ensino, os seus sistemas, as tomem em especial consideração. O pressuposto essencial dessa maneira de ver cifra-se na idéia de que o desenvolvimento depende do funcionamento ordenado de um sistema econômico, e que, fundamentalmente, essa ordenação requer uma distribuição equilibrada de trabalhadores, pelos dife­rentes grupos profissionais. Em conseqüência, uma das funções capitais de cada sistema será atendê-la.

10. Quando, a partir desse esquema mais restrito, judicio-samente se desenvolvam as investigações, acaba-se por verificar que não há maior colisão entre os resultados que se obtenham por uma ou outra forma. De fato, admitida uma ampla filosofia de "desenvolvimento", a análise dos fatos da produção econômica e de suas condições conduz, por implicações sucessivas, aos pro­blemas de expressão social mais geral, e, enfim, aos de reper­cussão política. Assim, as demais variáveis, consideradas em estudos de mais ampla escala, acabam também impondo-se. O que, na verdade, existe é uma diferenciação de métodos. Os que se aplicam à concepção mais ampla desde logo sugerem modelos mais complexos. Dadas as condições em que se realizam estes "encontros", e à vista da sistemática adotada, como ainda do exíguo prazo estabelecido para a entrega deste relatório, aqui tentaremos tratar de a "educação para o desenvolvimento", com o exame dos problemas da educação em face das exigências da estrutura profissional e das variações que nela tem introduzido o progresso técnico. A boa vontade do eminente Co-relator e a contribuição dos debates regionais e finais certamente supri­rão as numerosas lacunas e deficiências deste rápido trabalho.

II. EDUCAÇÃO E PROGRESSO TÉCNICO

11. As relações entre a educação do povo e o progresso técnico de há muito foram notadas por pensadores sociais, filó-

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sofos, sociólogos e educadores.3 Só recentemente, no entanto, deixaram de ter a forma de vagas proposições para se concre­tizarem em dados objetivos e índices numéricos. Por essa forma, apoiam a idéia de que o funcionamento regular da economia de um país, e, sobretudo, naqueles que manifestem tendências ascen­dentes, reclama uma satisfatória preparação de trabalhadores em número e qualidade. Assim, quaisquer que sejam as opi­niões e doutrinas educativas dos autores, a preparação profis­sional adequada, com relação aos contingentes da população ativa, apresenta-se como um dos principais encargos que socialmente se deverá atribuir a determinado sistema educacional.

12. Para que o faça, no entanto, torna-se necessário não só que tenda a enquadrar esses grupos da população nas opor­tunidades existentes a cada momento, como também que leve em conta as transformações da estrutura profissional e as condi­ções de progresso técnico em cada país. como em recente publi­cação da UNESCO se observa, por muito tempo se acreditou que o progresso técnico conduzisse a uma simplificação constante do trabalho, de tal modo que, para maior número de trabalhado­res, bastaria um mínimo de instrução e um breve período de aprendizagem direta. "Nos últimos anos, porém, reconhece-se que essa hipótese não mais corresponde à realidade. Ainda que, na fase atual de desenvolvimento, uma elevada proporção de trabalhadores exerça atividades que não reclamam capacidades especiais, essa proporção rapidamente vai diminuindo. Na fase que se avizinha, de maior progresso técnico, cujas característi­cas já se apresentam em todos os setores de atividades, consi­deravelmente aumentarão os requisitos educativos da fôrça-de-trabalho destinada à produção. Os serviços que apenas exi­giam força e habilidade manual, estão em declínio, havendo, ao contrário, crescente demanda de pessoal com habilidades espe­ciais e formação mais avançada. A "automação" significará novas mudanças na estrutura do pessoal. Certos trabalhos irão desaparecer, abrindo espaço a outros, de categoria mais elevada. Assim, as qualidades do trabalhador terão de mudar, aumentando, também, consideravelmente, o sentido de sua responsabilidade pessoal".4

13. A observação do que se passa em países de rápido desenvolvimento, nos últimos tempos, é muito ilustrativa a esse

3 Visão histórica de ordem geral, e par t icu la rmente aplicada ao caso brasileiro no últ imo quar to do século passado, pode ser apreciada em BAR­BOSA, Rui — Reforma do Ensino Primário e várias instituições complemen­tares da instituição pública, in "Obras Completas", Vol. X, 1883, Tomo I e seguintes.

4 UNESCO — La situación educativa en América Latina, Par is , 1960.

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respeito, não só quanto aos aspectos de divisão e especialização do trabalho, como também aos de transformação da estrutura profissional de toda a população. Os dados referentes aos Esta­dos Unidos são particularmente expressivos quanto a essa trans­formação. Resumidamente, tem ela consistido na transferência dos grupos de população economicamente ativa nas ocupações primárias (agricultura, criação de gado, indústrias extrativas, caça e pesca), para as atividades secundárias (indústrias de transformação, construção civil e serviços) e terciários (comér­cio, transportes, administração pública, forças armadas e ativi­dades sociais, em geral). De 1840 a 1950, a quota da população empregada em atividades primárias nos Estados Unidos baixou de 78 para 12%. Ao contrário, a quota dedicada a atividades secundárias duplicou, passando de 17 a 34%, ao passo que a população ocupada em atividades terciárias apresentou o enorme crescimento de 5 para 54%.

14. Segundo estudos da Comissão Econômica para Amé­rica Latina (CEPAL), o mesmo fato foi em geral observado na América Latina no período que decorreu entre 1925 e 1950. Enquanto naquele primeiro ano mais de 62% da população ativa se ocupava na agricultura, criação e mineração, já em 1950 esse índice se reduzia a 53%. Inversamente, as atividades não primárias que dantes apenas ocupavam 38%, passaram a repre­sentar-se como 47%.5 Em nosso país, essa transferência tem sido ainda maior, apresentando, é certo, variações regionais muito consideráveis. Nos Estados da região sul, dados esparsos per­mitem afirmá-lo, e a situação presente será revelada pelos tra­balhos de recenseamento geral, ora em curso.

15. desse modo, diminuiu a importância relativa das opor­tunidades ocupacionais, em que não se exigia senão pouca ou nenhuma formação escolar, aumentando-a, quer num sentido geral, como do domínio das técnicas de assimilação da cultura escrita, quer num sentido de semiqualificação e qualificação pro­fissional. Ora, isso reclama a expansão das instituições educa­tivas antes de tudo, por maior demanda do próprio povo, mas, assim também, em função das necessidades das empresas. A opinião pública começa a tomar consciência do problema, ainda que em termos imprecisos. A atitude geral dos candidatos, no último pleito eleitoral, levando aos comícios os temas de educação pública, claramente demonstra essa preocupação.

16. Quais os interesses centrais que a explicam? Em seu conhecido estudo sobre desenvolvimento econômico, Colin Clark observa que, havendo quotas elevadas de população ativa empre­gadas em atividades primárias, há também renda nacional per

5 Idem, ibid.

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capita mais baixa. A média elevada dessa renda requer propor­ção considerável da população em atividades secundárias e ter-ciárias. Mesmo em países que supomos predominantemente agrí­colas, como a Austrália, a Nova Zelândia e a Argentina, isso se observa. Em cada um desses países, tão-sòmente 25% da popu­lação ativa se dedicam a atividades primárias.6

17. Mas as exigências, que a economia moderna apresenta aos problemas de preparação de pessoal, não é apenas a de seu grau, como também a de grande diversificação de tarefas. Bus­cando explicar o desenvolvimento econômico, T. W. Schultz con­sidera que êle tem dependido destes cinco fatores: a) superfície da terra em exploração; b) volume da fôrça-de-trabalho utili­zado; c) volume do capital invertido em bens produtivos, como máquinas agrícolas, equipamento industrial e meios de trans­porte; d) qualidade e capacidade da fôrça-de-trabalho; e) qualidade e eficácia das técnicas de produção. Segundo esse professor

da Universidade de Chicago, o desenvolvimento depende conjuntamente desses cinco fatores, a menos que um fato novo e inesperado se apresente, na forma de exploração de recursos naturais, dantes desconhecidos, como é o caso do petróleo na Venezuela. Aos dois últimos fatores — qualidade de mão-de-obra e qualidade das técnicas de produção — Schultz chama de "variáveis descuidadas", entendendo, ademais, que, na maioria dos países, em rápido desenvolvimento econômico, em época re­cente, isso se deu em virtude da melhoria desses dois fatores. A essa melhoria deve-se atribuir, em metade pelo menos, o aumento de produtividade obtido nesses países.7

18. Tanto quanto Colin Clark, esse autor procura eviden­ciar a relação entre estrutura profissional, produtividade e ren­da, de uma parte, e recursos educacionais, de outra. Essas rela­ções, como dantes se fêz notar, não são, no entanto, de apreciação simples e direta, ou de tal forma que esses recursos possam ser considerados como uma variável independente no sistema. Assim como as oportunidades de educação influem na estrutura pro­fissional e, portanto, na estrutura social, esta também sobre aquela reage, segundo se apresente mais ou menos estratificada. Assim, o sistema sócio-econômico e o educacional apresentam interrelações ou influências mútuas, de efeitos cumulativos e circulares. Tal é a razão por que o problema "educação para o desenvolvimento" tantas vezes se associa ao de "mudança social", em toda a sua extensão. Não obstante, estudos relativos a aspec­tos parciais ou dimensões particulares do processo social — como

6 CLARK:, Colin — The conditions of economic progress, Londres, 1941. 7 SCHULTZ, T. W. — Education and the economic development of the

population.

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os da simples estrutura demográfica, por exemplo — salientam sempre a importância da educação como variável relevante. É o que faz T. Lynn Smith, em obra recente, em que observa que os índices de mais alto analfabetismo associam-se sempre aos de doença, vida curta e subdesenvolvimento, embora, em sentido con­trário, se possa admitir proposição inversa.8

19. Menção menos incompleta, quanto às suas implicações de ordem política, far-se-á adiante a esse ponto, cuja importância não se pode dissimular quando se pretenda compreender o pro­cesso de desenvolvimento em toda sua complexidade. Entre as dificuldades que esse processo encontra estão, sem dúvida, as de nível e diversificação educacional para o trabalho e, através dis­so, para o comportamento social, em geral. Um esclarecimento sobre esse aspecto, ainda que indireto, aparece numa classifica­ção, que fazem Jaffe e Stewart, de todas as atividades profis­sionais hoje correntes, do seguinte modo:

I — Profissões modernas — São as que compreen­dem, principalmente, tecnologias recentes e certo conheci­mento científico, ou as que se referem ao manejo de um tipo moderno de empresa econômica, como, por exemplo, investigadores em laboratório, mecânicos especializados na fabricação de utensílios ou máquinas operatrizes, che­fes de pessoal, etc.

II — Profissões tradicionais — São as que não com­preendem recursos tecnológicos modernos, tais como as de tecido a mão, cestaria ou trançado de palha, condu­tores de veículos a tração animal, vendedores ambulantes.

III — Profissões clássicas — São as que não se rela­cionam com a produção e distribuição e que não com­preendem, necessariamente, técnicas modernas, como, por exemplo, as de certos empregos de escritório, car­reira do funcionalismo público e atividades de membros da polícia.

20. Quando se comparam entre si as ocupações dos dois primeiros grupos, vê-se que as do primeiro requerem treina­mento tecnológico ou científico, o que não ocorre com as do segundo, às quais será suficiente aprendizagem prática. Igual­mente, nas do primeiro grupo, empregam-se máquinas modernas. utilizando-se pequeno dispêndio físico, o que não ocorre com as do segundo. Por fim, naquelas verifica-se grande divisão de

8 SMITH, T. Lynn — Fundamental of population stuãy, Chicago, 1960.

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trabalho, e atenção a amplos mercados, regionais, nacionais ou internacionais; finalmente, que a produtividade nelas sempre atinge níveis mais elevados.9

21. Por sua vez, estudando a variedade de funções neces­sárias para a manutenção de sistemas de economia moderna, e atendendo ao grau de sua importância para um rápido progresso econômico, na América Latina, a CEPAL assim as enumera:

I — Formação de uma classe de administradores de empresas, nos principais ramos das atividades econômi­cas modernas;

II — Formação de um estoque de profissionais de acordo com as novas exigências desses ramos e que, de modo geral, seguem em importância os trabalhos de dire­tores e gerentes;

III — Formação de uma grande variedade de técni­cos e especialistas de nível intermediário, indispensáveis às atividades de todas as empresas — contramestres, mecânicos de reparação, montadores, etc. — de par com a de contadores e pessoal com especialização de grau médio, em atividades de administração e de laboratórios industriais;

IV — Por último, no plano do trabalho manual, ope­rários qualificados, sobretudo em certos processos téc­nicos e no manejo de máquinas especiais.

22. Ao apresentar essas funções, que salienta como as de maior necessidade para esses países do continente, adverte a mesma Comissão que "a deficiência numérica de pessoal devida­mente habilitado, nalguns países latino-americanos, no momento e em futuro muito próximo, poderá constituir um dos principais pontos de estrangulamento para um conveniente desenvolvimento industrial, rápido e equilibrado". Observa também a CEPAL que quase todo o aumento de mão-de-obra na América Latina, tanto no presente como nos próximos anos, por deficiência de escolas, se fará em alta percentagem com mão-de-obra não-quali-fiçada. No entanto, conclui, "o problema da quantidade não resolve o da qualidade".10

9 JAFFE, A. J. e STEWART, D. C. — Manpower resources and utilization,

Nova York, 1951. 10 "Três aspectos sociológicos del desarrollo econômico", in Revista de

Ia Comissión Econômica para America Latina, Nações Unidas, agosto, 1955.

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III. EDUCAÇÃO, MUDANÇA SOCIAL E DEMOCRACIA

23. Em todos os fatos e confrontos antes apresentados, uma hipótese geral se insinua. É a de que o desenvolvimento, rela-cionando-se com as variações da estrutura profissional e, assim. com a da estrutura demográfica, por efeitos da industrialização e urbanização, contém em si a idéia de mudança social num sentido progressivo de organização democrática, bem como a da estabilidade das instituições que a caracterizam. Na realidade, tais instituições supõem mobilidade social no sentido vertical, ou um sistema de classes abertas; supõem o bem-estar econômico e um sistema de valores igualitários no que toque ao exercício de direitos; supõem, enfim, uma participação ativa de todos os cidadãos na direção dos negócios públicos por um sistema repre­sentativo de governo; e, enfim, sob o princípio de que ao Estado competem macro-decisões, no interesse de todos, admite a livre participação individual em organizações voluntárias. todas essas questões não são colaterais a uma filosofia social de desenvol­vimento, mesmo no sentido econômico estrito. Ademais, no caso brasileiro — diga-se de passagem — esse aspecto das relações entre a educação e o desenvolvimento não pode ser deixado à margem, dados os pressupostos político-sociais da Constituição do país.

24. Embora a questão demande, para exame completo, maior espaço, não pode deixar de ser aqui proposta, ao menos em termos genéricos, pois os sistemas políticos e outros aspectos da vida social relacionam sempre a democracia ao estado de desenvolvimento econômico. como observa Seymour Martin Lip-set, em estudo há pouco publicado, isso significa que tanto maior seja o bem-estar econômico de uma nação, maior possibilidade ela terá de manter instituições democráticas. Desde Aristóteles, admite-se que somente em sociedades em que haja relativamente poucos cidadãos em pobreza, existirá condições para que a grande massa da população possa inteligentemente participar das coisas políticas, negando-se a corresponder ao apelo de demagogos irres­ponsáveis. Uma sociedade dividida entre a massa empobrecida e a elite privilegiada caminhará, sempre, para a oligarquia ou para a tirania.

25. Justificando tal idéia, esse professor da Universidade da Califórnia põe em confronto vários índices de desenvolvimento — riqueza, industrialização, urbanização e educação, mediante médias computadas em quatro grupos de nações, a saber: um primeiro grupo de nações com democracia estável (norte da Europa, Austrália, Nova Zelândia, Canadá e Estados Unidos) ; um segundo grupo, com países de democracia instável na Europa;

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um terceiro, com sete países latino-americanos oscilantes entre democracia e ditadura, entre os quais figura o Brasil; e, enfim, o último, com as restantes nações latino-americanas em que um sentido ditatorial de governo tem prevalecido nesse último quarto de século.

26. Os índices principais do que Lipset chama "riqueza" são os de renda per capita, número de pessoas por médico e por veículo motorizado, e número de rádios receptores, telefones e exemplares de jornais por mil pessoas. As diferenças são muito expressivas, como se poderá ver nos quadros que adiante se apresentam. Nas nações européias mais democráticas, há em média dezessete pessoas por veículo motorizado, contra 143 nas que menos o sejam; nas da América Latina, 99, contra 274. A renda per capita tem a média de 695 dólares no primeiro grupo. e 308, no segundo. A diferença correspondente nos dois outros grupos, referentes a países latino-americanos, exprimem-se no confronto dos índices 171 e 119. O mesmo se poderá observar quanto aos coeficientes de industrialização e urbanização, resu­midos na percentagem de homens ocupados na agricultura e na quantidade média de energia consumida per capita, em unidades equivalentes a toneladas métricas de carvão.

27. Os dados relativos à educação, de direto interesse neste relatório, apresentam também alta correlação, e são pelo autor mais largamente examinados, dado que, para repetir uma velha frase de Bryce, "se a educação não faz os homens cidadãos mais perfeitos, torna-os ao menos mais suscetíveis de assim se torna­rem"; ou, no próprio dizer de Lipset, "alarga horizontes de cada qual, a todos tornando mais capazes de entender a necessidade de normas de tolerância, assim restringindo também a facilidade em aderir a doutrinas extremistas". Citando, em apoio dessa idéia, numerosas investigações realizadas em países de vários continentes, insiste em que não se poderá negar que "se se quiser tomar um único fator diferencial que explique respostas demo­cráticas, esse fator é o da educação popular". Cita, também, uma investigação realizada em 1950-51, em seis países do Oriente Médio, sob a direção do Centro de Pesquisas de Sociologia Apli­cada, da Universidade de Columbia (Nova Yorque), que examina diversas variáveis, por análise fatorial, e cujos resultados não se diferenciam de outra, divulgada por Daniel Lorner, em obra de 1958, baseada em dados estatísticos coligidos em 54 países, por órgãos técnicos das Nações Unidas. As intercorrelações obtidas nesse último trabalho foram as seguintes: urbanização, 0,61; índices de instrução popular, 0,91; participação em fontes

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de informação, 0,84; participação política direta, por meio de voto, 0,82. 11

28- Foge dos limites deste relatório a discussão dos mé­todos técnicos empregados. como quer que seja, porém, todas essas pesquisas tornam evidente a relevância das variáveis inter­dependentes, o que tanto basta para a consideração delas no pro­cesso de desenvolvimento, em si mesmas e em suas muitas impli­cações de natureza social e política. Lipset resume este pon­to-de-vista, afirmando: "O aumento de riqueza não está somente relacionado com o desenvolvimento da democracia por alterar as condições sociais dos trabalhadores; na realidade, ela atinge também a forma da estrutura social, que deixa de ser represen­tada como um alongado triângulo para transformar-se num losan­go com uma classe média sempre crescente. A renda nacional (e acrescentemos a sua distribuição) relaciona-se sempre com os valores políticos e o estilo de vida da classe dominante. Tanto mais pobre seja uma nação, e mais baixos os padrões de vida das classes inferiores, maior será a pressão dos estratos supe­riores sobre elas, então consideradas como desprezíveis, inata-mente inferiores, na forma de uma casta de nenhum valor. As diferenças acentuadas no estilo de vida entre aquelas de cima e as de baixo apresentam-se como psicologicamente necessárias. Conseqüentemente, os mais altos estratos tendem a encarar os direitos políticos das mais baixas, particularmente o de inter­ferir no poder, como coisa essencialmente absurda e imoral". E conclui por dizer que é essa resistência ao processo democrá­tico que provoca a intensificação das reações extremistas por parte das classes menos favorecidas.12

29. não nega o autor que certas características histórico-culturais influam também na concepção da "legitimidade" do poder, a propósito de que discute em particular o caso da Ale­manha. Mas sustenta também que a "efetividade" do sistema democrático apóia-se no desenvolvimento econômico, entre outras razões, porque êle permite a ampliação e o progresso constante das instituições educativas. A educação torna-se fator relevante por estar assim associada ao trabalho, à estrutura profissional e à mobilidade social, como o exame dos quadros que a seguir se transcrevem parece realmente demonstrar. O progresso econô­mico e o desenvolvimento social e político, nas condições da vida moderna, vêm a solidarizar-se, através de ação educativa bem exercitada.

11 LIPRET, Seymour Mar t in — "Some Social Requisi tes of Democracy: Economic Development and Political Legit imacy", in The American Politi-cal Science Review, vol. LIII, nº 1, março 1959.

12 Idem, ibid.

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QUADRO I. CLASSIFICAÇÃO DE LIPSET DE 48 NAÇÕES POR GRAU DE VIDA DEMOCRÁTICA E SUA ESTABILIDADE

Nações européias e de língua inglesa

Democracias

estáveis

Austrália

Bélgica

Canadá

Dinamarca

Irlanda

Luxemburgo

Holanda

Nova Zelândia

Noruega

Suécia

Suíça

Reino Unido

Estados Unidos

Democracias instáveis

Áustria

Bulgária Tcheco-Eslo-

váquia Finlândia

França

Alemanha (Oes­te)

Grécia Hungria

Islândia

Itália

Polônia

Portugal

Romênia

Espanha

Iugoslávia

Nações latino-americanas

Democracias 0 ditaduras instá­

veis

Argentina

Brasil

Chile

Colômbia

Costa Rica

México

Uruguai

Ditaduras

estáveis

Bolívia

Cuba

Rep. Dominicana

Equador

El Salvador

Guatemala

Haiti

Honduras

Nicarágua

Panamá

Paraguai

Peru

Venezuela

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QUADRO II. COMPARAÇÃO E N T R E PAÍSES DOS QUATRO GRUPOS CONSIDERADOS P O R ÍNDICES DE RIQUEZA, INDUSTRIALIZAÇÃO,

EDUCAÇÃO E URBANIZAÇÃO.

A. Índices de r iqueza

Valores médios

lº grupo: 2o grupo: 3o grupo: 4o grupo:

Oscilação

dos valores

1° grupo:

2o grupo:

3o grupo:

4o grupo:

Renda per capita

695 308 171 119

420 1453

128 482

112 346

40 331

Médico por mil pessoas

0,86

1,4 2,1 4,4

0,7

1,2

0,6 4

0,8 3,3

1,0 10,8

Pessoas por veículo motorizado

17 143 99

274

3

36

10 538

31

174

38 428

Telefones por mil pessoas

205 58 25

10

43

400

7 196

12 58

1 24

Rádios por mil pessoas

350 160 85 43

160

995

47 307

38 148

4 154

Exemplares jornais p/ mil pes .

341 167 102 43

242 570

46 390

51 233

4

111

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B. Índices de industrialização

Valores médios

1º g rupo :

2º grupo:

3º g rupo :

4º grupo:

Oscilação

dos valores

1º g rupo :

2° g rupo :

3º grupo:

4° grupo:

% de homens na agr icul tura

21

41

52

67

6

46 16

60 30

63 46

87

Ene rg i a consumida per capita

3,6

1,4

0,6

0,25

1,4

7,8 0,27

3,2 0,30

0,9 0,02

1,27

_

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C. Índices de educação

Valores médios

1º grupo:

2º g rupo :

3º g rupo :

4º g rupo :

Oscilação dos

valores

1° g rupo :

2º grupo:

3º g rupo :

4º g rupo :

% de alfa­betização

96

85

74

46

95

100 55

58 48

87 11

76

Matr ícula p r imár ia por mil pessoas

134

121

101

72

96

179 61

165 75

137 11

149

Idem no ensino pós-

pr imár io

44

22

13

8

19

83 8

37 7

27 3

24

Idem no en­sino supe­

rior

4,2

3,3

2,0

1,3

1,7

17,83 1,6

6,1 0,7

4,6 0,2

3,1

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D. índices de urbanização

Valores

médios

1ºgrupo:

2º g rupo :

3º g rupo :

4º grupo:

Oscilação dos valores

1º g rupo :

2º g rupo :

3º g rupo :

4º g rupo :

% em cidades de

mais de 20.000

43

24

28

17

28

54 12

44

11

48 5

36

% em cidades de

mais de 100.000

28

16

22

12

17

51 6

33 13

37 4

22

% em áreas

metropol i tanas

38

23

26

15

22

56 7

49

17

44 7

26

Cf. LIPSET, S. M. "Some Social Requisites of Democracy: Economíc Deve-lopment and Political Legitimacy", in The American Political Science Re-view, vol. Lilí, nº 1, march, 1959.

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2.a Parte

IV. EDUCAÇÃO E DESENVOLVIMENTO NO BRASIL

30. A matéria até agora exposta tentou estabelecer um sistema de referência, aplicável a situações reais, no caso, a do Brasil. A observação geral dos fatos em nosso país, nos últimos trinta anos, claramente revela índices em ascensão na produção industrial, na urbanização, no consumo per capita de energia, de um lado; e de participação cada vez maior do povo em fontes de informação e de ação política, de outro. Há variações da es­trutura social e maior mobilidade, e, em conseqüência, mudan­ças nos valores reais de classes e instituições. O conjunto retra­ta um processo de desenvolvimento. Até que ponto as institui­ções de educação o tem acompanhado? E que mostras dá de nele colaborarem por senso de maior previsão e correspondente ação política?. .. A resposta a tais indagações terá de levar em conta valores ideais e os valores reais de classes e institui­ções, para o que se faz necessária uma alusão a componentes histórico-culturais. Entre essas figura a persistência do regime servil até 1888, base do sistema de economia agrária de todo o império e da primeira república, com vida social e costumes po­líticos de es tab i l idade . 1 3 Tal situação começou a ser alterada a partir da abolição da escravatura e o incremento da imigração européia, apresentando por fim uma fase crítica de mudança na década de 1921-30, acelerada por efeitos sociais e econômicos da primeira grande guerra, e acelerando-se ainda mais depois pelas conseqüências do segundo conflito mundial. Entramos, en­tão, em fase de grandes variações de que os principais índices de vida econômica e social revelam expressão ascendente, ou "pro­cesso de desenvolvimento".

31. A eles não poderiam escapar os de significação educa­tiva geral, no lar e na escola, com variação de costumes, e certo abalo dos valores tradicionais, conseqüência inevitável do proces­so. A análise minuciosa de toda essa transformação, que pros­segue, não se apresenta aqui oportuna, como em outros estudos o temos feito, encarando as idéias, desejos e expressões da famí­lia, da igreja, das empresas e da própria escola, quanto aos problemas gerais do trabalho e da estrutura profissional.14 De modo geral, tudo nos conduz a afirmar que suas maiores caracte-

13 MOACYR, Primitivo — A Instrução e o Império, Companhia Editora Nacional, São Paulo, 1936.

14 LOURENÇO FILHO, M. B. — "Brazil: Guidance in a Rapidly Industria-zing Latin-American State", in The Year Book of Education, The University

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rísticas se revelam como uma crescente passagem da consciência da ação educativa, como problema da maior importância coletiva, das instituições de natureza primária (família e comunidade pró­xima) para as de caráter secundário e intermediário (o estado, os partidos políticos, as igrejas, as corporações de trabalho). Os conflitos de idéias e opiniões relativos à compreensão dessa transferência têm sido claramente revelados nos debates que ultimamente se têm travado sobre os diferentes projetos de dire­trizes e bases da educação nacional.15

32. Para usar de uma simples imagem, diremos que os problemas educacionais passam agora a ser vistos por uma ampliação da escala de observação, não mais como pequenas questões de tática, mas de estratégia. Já se atribuem à escola e seus sistemas funções de integração social, econômica e polí­tica, donde a importância da proposição delas no quadro geral do desenvolvimento. Os prenúncios desse estado de coisas de­ram-se, a princípio, na ação de propaganda de uns poucos edu­cadores e políticos, dentro dos anos 20, e mais marcadamente depois da revolução nacional de 1930. Alcançaram, por fim, o plano da legislação regional e, por esforços da Associação Brasi­leira de Educação, o do plano das reformas constitucionais. Quando se examinam os textos das Cartas de 1934, 37 e atual, verifica-se a expressão de um pensamento constante a esse res­peito. A Carta de 37, ainda que reservando à União as prer­rogativas de legislar sobre os princípios e quadros da educação nacional, exprimiu sob o aspecto político-social um movimento de reação, movimento esse que na discussão da Carta atual rea­pareceu na discussão do conceito "direito de todos à educação". esse movimento tem alimentado, a maioria dos debates nos últi­mos tempos, e o retardamento dos trabalhos relativos à matéria, no Poder Legislativo, também a outra coisa não pode ser atri­buída.

33. Talvez seja oportuno salientar que um aspecto pura­mente formal a tem favorecido. É o que se refere à idéia de que as diretrizes e bases da educação nacional devam ser tra­tadas numa só lei ou diploma. A esse respeito já aqui se fêz uma breve observação que convirá seja agora desenvolvida. A idéia proveio da interpretação dada ao mandamento constitu­cional pela extinta Comissão de Leis Complementares da Cons­tituição, havendo-se refletido nos trabalhos do grupo de educa-

of London Ins t i tu te of Educat ion, 1955 e FARIA GÓIS FILHO, Joaquim —

"Technological Development and Educat ion in Brazil", in The Year Book

of Education, 1954.

15 Cf. Revista Brasileira de Estudos Pedagógicos, I N E P , n° 65 e se­

guintes.

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dores incumbidos da redação de um anteprojeto, depois trans­formado em projeto governamental. Quando se examina a Cons­tituição, verifica-se, no entanto, que o seu texto distingue entre educação, ação formativa genérica dada no lar e na escola, e ensino, de que legislação própria deverá cuidar. De fato, o pri­meiro termo só é empregado no texto constitucional duas vezes, no artigo 5.° em que se afirma a competência da União para a fixação de diretrizes e bases, e no artigo 166, quando se diz que a educação será dada no lar e na escola, devendo inspirar-se nos princípios de liberdade e ideais de solidariedade humana. O adjetivo "educacional" só uma vez é empregado, no artigo 172, em que se diz que cada sistema de ensino terá obrigatoriamente serviços de assistência educacional que assegurem aos alunos necessitados condições de eficiência escolar. Fora disso; o termo empregado é ensino, e não educação.

34. Se há duas palavras diferentes é porque o Constituinte entendeu duas coisas. Ela admite a educação, ação educativa geral, comum à família e à escola; mas distingue a forma insti­tucional de educar, própria das escolas, de que reservou ao Estado a organização e administração geral. Das normas da educação. em sentido genérico, terão de cuidar sempre muitas e importan­tes leis, umas referentes à organização da família e do pátrio poder, assistência e defesa das crianças, serviço social e ainda problemas particulares, como os da regulamentação de publi­cações e espetáculos públicos. A mistura das duas coisas, que­remos pensar, deve-se à confusão que se tem estabelecido, sem proveito algum, nem mesmo o da sistemática legislativa, pois todos os projetos freqüentemente deixam claro que outras leis terão de cuidar da matéria. Ê uma conclusão, aparentemente desprovida de importância, mas digna de ser examinada, e tanto mais que, do ponto-de-vista prático, todos os projetos não têm feito senão propor uma legislação orgânica do ensino.

35. De par com as variações interpretativas, ou de filoso­fia social, importará verificar sempre, porém, as realidades de educação intencional e sistemática, ou as de ensino do país nos últimos tempos, para que as confrontemos com as necessidades e possibilidades suscetíveis de previsão no processo de desenvol­vimento. Só assim será possível, com apoio em dados objetivos, tratar de uma legislação adequada; isto é, de se construir um instrumento político para ação eficaz, tendo-se em vista os valo­res ideais, expressos na Constituição com sentido programático, e a ação problemática a desenvolver, seu mais breve ou largo termo. As dificuldades de uma boa legislação residem na com­preensão desse aspecto problemático, que deverá considerar um processo em marcha, de muitas variáveis em interação, como é o

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do desenvolvimento. A primeira e mais fácil solução, e os últi­mos projetos a tomam por base — inclusive o que deve ser apreciado nesses encontros — é a adoção de normas de descen­tralização administrativa, sem dúvida aconselháveis, mas a serem convenientemente reguladas, para que não se perca uma visão coerente do conjunto, indispensável também, dentro dos termos estritos da Constituição, que manda regular a "educação nacio­nal". Quem esteja a par de estudos da educação comparada, sabe perfeitamente que essa singela e cômoda solução de des­centralizar, seja como fôr, poderia satisfazer a sociedades de outro tipo e de outra época; como sabe também que, mesmo nos países mais tradicionalmente localistas, como a Inglaterra e os Estados Unidos, um movimento inverso nos últimos tempos se tem operado, precisamente por maior consciência das necessida­des de desenvolvimento econômico e social. E não é só. Median­te tratados e convenções, está-se cuidando hoje, ainda, e tam­bém por essas razões, da organização de amplos movimentos de ação educativa regional, como é o caso do chamado Projeto n.° 1, da Unesco, para desenvolvimento da educação primária em toda a América Latina.16

36. Será um grave equívoco afirmar que nossas realidades de educação, e particularmente as de ensino, tenham estado dis­tanciadas das preocupações do desenvolvimento geral do país. Quer em iniciativas oficiais, quer nas de empresas econômicas. como ainda e também nas de certas instituições, de âmbito intei­ramente privado, os reclamos de uma política de desenvolvimento têm sido sentidos, e de uma ou de outra forma vêm sendo aten­didos com maiores ou menores resultados práticos. Entre as de iniciativa do poder público, no campo de investigações de base, devem ser citados os trabalhos da Comissão de Educação junto ao Conselho de Desenvolvimento, e os do INEP, sobretudo pelo Centro de Pesquisas Educacionais, em sua sede, e órgãos regio­nais filiados; quanto a providências executivas, ocupam papel saliente os trabalhos da Comissão Nacional de Aperfeiçoamento de Pessoal em Nível Superior (CAPES), como os da comissão que estuda e instala institutos de pesquisa em nossas universi­dades (COSUPI). Entre os de iniciativa de empresas, estão os dois grandes serviços nacionais de aprendizagem, SENAI e SENAC, por suas realizações em todo o país, com um sistema de cursos e escolas que devotam atenção direta a aspectos do desenvolvimento, e ainda estudos de especial interesse na maté­ria. Os trabalhos do SENAI têm mesmo servido de modelo a organizações similares em outros países latino-americanos. Ade-

16 Projecto Principal de Educación Unesco-América Latina, UNESCO, março de 1960.

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mais, com relação a essa compreensão geral das empresas e à associação de esforços com os poderes públicos, fala por si a realização destes "encontros".

37. É assim evidente que uma nova consciência do pro­blema das relações entre educação e desenvolvimento existe e está produzindo frutos. O que se terá de fazer é bem conju­gar tais esforços para maior esclarecimento dos fatos e apri­moramento dos métodos. Questão eminentemente complexa, exige análise objetiva e séria reflexão, não podendo ser resol­vida por mera transação político-partidária, como se pretendeu fazer quando do último substitutivo da lei de diretrizes, ora em curso no Senado. O exemplo de grandes mudanças na direção educativa de países tais como a Inglaterra e a França, e que só se realizaram após anos e anos de estudos e pesquisas, é cer­tamente digno de ser meditado. Em cada um desses casos, a legislação foi precedida de inquéritos aprofundados e exame inter­pretativo de seus resultados por comissões mistas, constituídas de grandes educadores e representantes das classes produtoras. O que há de contristador no curso do projeto, nos últimos tem­pos, é que o Poder Legislativo deliberadamente procurou excluir de seus trabalhos os resultados de investigação das coisas bra­sileiras, obtidos e coordenados dentro dos próprios órgãos ofi­ciais, o Ministério da Educação e o Conselho de Desenvolvimento Econômico, por exemplo.

38. É muito provável que esses "encontros" possam influir na correção desse modo de ver. Certamente, que nem as insti­tuições que os promovem, nem cada um dos participantes, em particular, poderão acreditar que de seus esforços possa surgir um novo substitutivo, pronto e acabado, com características ideais deles poderão resultar, no entanto, contribuições de grande importância e, sobretudo, o esclarecimento de certos princípios de método para o trato de questão tão relevante à vida nacional. Nesse espírito é que, a seguir, apresentamos algumas observações sobre as realidades atuais do ensino, em confronto com as neces­sidades que o processo de desenvolvimento parece estar exigindo.

39. A proposição dos problemas dessa natureza à educação reclama exame das funções gerais que o ensino deve desempe­nhar. Substancialmente, elas são duas: uma de assimilação ou homogenização, e outra de diferenciação individual. A primeira é exercida na forma de transmissão da herança social, com seus costumes, tradições, técnicas, idéias e aspirações. A segunda reflete um movimento inverso, de seleção de partes dessa herança. e de seu acrescentamento a cada nova geração, como resultado de novas invenções no plano material e social. Devem participar as escolas desse duplo papel, aparentemente contraditório, de

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imprimir às novas gerações um tipo social constante, e, ao mesmo tempo, de permitir diferenciação nesse tipo. Sem a primeira, a vida social não subsistiria, mas, sem a segunda, não poderá apresentar desenvolvimento coerente.

40. Esquemàticamente, essas duas funções são desempe­nhadas pelas instituições que visam a fornecer educação comum e educação diferencial; em termos práticos, por ensino dado às crianças e à adolescência e ainda certa fase da idade adulta. As condições de progresso técnico complicam essa maneira simpli­ficada de propor a questão, mas em essência não a alteram. Obrigam, no entanto, a um maior sentido de previsão e análise das realidades do ensino — do ensino normalmente destinado à infância, o de grau primário, e o que se reserva, às idades ulte­riores, nos graus médio e superior.

a) Ensino primário e desenvolvimento

41. "Primário" se chama o ensino comum mais generali­zado, não só por ser o primeiro no tempo, mas por ser também primacial. Seu desenvolvimento deu-se nestes dois últimos séculos como reflexo de idéias políticas associadas a necessidades do desenvolvimento econômico. Estudos comparativos mostram que os índices de ensino primário são paralelos aos de industria­lização e urbanização, o que importa também dizer que em larga extensão indicam tendências de um estilo de vida democrática. Dois índices de ordem geral resumem seu progresso em qualquer país: a taxa de analfabetos, aspecto negativo, e o número de crianças freqüentes à escola por mil habitantes, aspecto positivo.

42. com relação ao primeiro, o recenseamento nacional de 1950 revelou uma taxa, dos grupos de idade de 15 e mais anos. superior a 50%. Nos últimos dez anos, tal situação tem melho­rado, quer por extensão da rede de ensino nas idades próprias, quer por ação da campanha de educação de adolescentes e adul­tos analfabetos. Ainda assim, a taxa de analfabetos não terá regredido de modo a atender aos reclamos do desenvolvimento. É de observar-se, ademais, que qualificamos como pessoas alfa­betizadas todas aquelas que saibam ler e escrever, ainda com dificuldades; isto é, aquelas que, em outros países, recebem o qualificativo de analfabetos funcionais, por serem incapazes de ler, entender e devidamente apreciar um trecho escrito, de escre­ver uma carta e resolver problemas aritméticos da vida comum. Aplicado esse critério, nossa posição nas estatísticas mundiais se agravaria de muito, passando a ocupar um dos últimos lugares.

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43. A conclusão funda-se na inspeção do segundo índice a que se fêz referência, o do número de alunos matriculados nas escolas, por mil pessoas, o qual permite apreciar não só a capa­cidade virtual dessa matrícula, como também o tempo efetivo de escolaridade, ou o prazo médio em que as crianças recebem ensino. Nesse particular, a situação brasileira é deplorável. Num levantamento feito em 1954, o estatígrafo Moisés Kessel demonstrou que mais de 50% de nossas crianças abandonam o curso depois de um só ano de estudos. Estudos mais recentes do INEP indicam que essa situação não melhorou grandemente. Dos alunos matriculados na primeira série, em 1957, somente 44% lograram promoção à segunda, dados os elevados índices de repetência e de evasão. De modo geral — e essa afirmação consta de uma conferência do sr. Ministro Clovis Salgado, que comenta os dados de 1958 — menos de 10% conseguem concluir a quarta série, ou terminar o curso primário. O déficit de matrí­cula é calculado em cerca de 30% nas idades de 7 a 11 anos. O disciplinado, em relação a cada grupo de mil habitantes, não chega a abranger 90 crianças.

44. esses dados bastam para julgar da insuficiência e da deficiência do ensino primário do país, muito embora se tenha registrado sensível progresso nos últimos anos, sobretudo nos Estados do Sul, precisamente os de maior progresso econômico. Mas a situação de modo geral é muito grave em relação à marcha do desenvolvimento, e de modo especial em face das oportuni­dades de trabalho na indústria. Em inquérito feito há poucos anos pelo SENAI, ficou patente que, na mais alta percentagem, o que pedem as indústrias são pessoas que tenham realizado um bom curso primário mediante o qual hajam desenvolvido capa­cidades gerais de adaptação. A taxa geral de operários qualifi­cados não sobe além de 10%. 17 Essa conclusão prática foi, aliás, em recente investigação, abundantemente comprovada quanto ao aspecto técnico. Referimo-nos à "Pesquisa sobre o nível mental da população brasileira", coordenada por uma comissão nacional de que faz parte o autor deste relatório, e que teve a colaboração de várias entidades econômicas e culturais de todas as regiões do país. Segundo os dados e conclusões preliminares já publi­cados, observou-se, por amostragem estratificada, em grupos da população de 6 a 65 anos, o seguinte: a curva de desenvolvi­mento mental dos grupos alfabetizados diferencia-se da do grupo de analfabetos, não só pelos maiores valores que acusa, mas também por sua fisionomia geral com que descreve o processo evolutivo. Assim, enquanto na primeira, concordantemente com as pesquisas do mesmo processo em outros países, nota-se um

17 Pesquisa sobre mão-de-obra na indústria, SENAI (mimeo.).

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crescimento rápido até 16/17 anos, na curva dos grupos analfa­betos os valores se estabilizam na idade de 11. Na primeira, observa-se lento deperecimento a partir dos 35 anos, mas, na segunda, êle começa aos 25.18 Admitindo-se que o fator originá­rio de todo o desenvolvimento de um povo é o da inteligência de seus filhos, pois em função dela é que todos os demais bens ganham aplicação e sentido, não será desarrazoado afirmar que serviços precários de ensino primário representam um dos maio­res óbices ao processo de desenvolvimento.

45. Essa compreensão é pacífica. não há nação que não considere o ensino primário, gratuito e obrigatório, como dever do Estado. Em nossa Constituição assim se estabelece, mesmo por condição da vida política. A matéria interessa à vida do regime representativo, pois que não podem votar os analfabetos. Do ponto-de-vista de organização técnica, é esse também o grau de ensino que menos exige, em teoria. Para seu conveniente planejamento, bastam de fato os dados demográficos e suas pro­jeções. É possível dizer quantas são as escolas primárias hoje necessárias e onde devem funcionar, como ainda as que se torna­rão necessárias dentro de cinco ou dez anos mais próximos, Que razões impedem então a existência da rede escolar que deve­ríamos ter?. . . A explicação está, em primeiro lugar, no subde­senvolvimento geral de muitos trechos do país, nos quais a sim­ples aprendizagem das primeiras letras ao povo parece classi­ficação profissional para trabalho de certos grupos especiais. Mais uma vez assim se torna patente o caráter circular do pro­cesso, ou de influências recíprocas entre educação do povo e desenvolvimento. Mas está também esse fato associado a ele­mentos históricos que emprestam caráter seletivo ao ensino pri­mário, no sentido de que dele só terão necessidade as pessoas que se destinarem a maiores estudos, até a universidade. O con­fronto de quantitativos de alunos que terminam o curso primário, a cada ano, com o de matrícula inicial nas escolas de grau médio, apoia tal conclusão.

46. Ora, essa visão deformada tem conseqüências das mais importantes nas formas de organização e conteúdo dos programas primários, assuntos esses que certamente serão examinados no relatório específico deste grau de ensino. Entre numerosos estu­dos do INEP, referentes à matéria, destaca-se investigação de J. Roberto Moreira e estudo interpretativo de Anísio Teixeira, dignos ambos de especial exame.19

18 Pesquisa sobre nível mental da população brasileira, SENAC, Rio, 1959.

19 MOREIRA, J. ROBERTO — "Int rodução ao Es tudo do Currículo da Escola P r imár i a " , I N E P , 1955, e TEIXEIRA, Anísio — A escola brasi leira e a estabili­dade social, in Revista Brasileira de Estudos Pedagógicos, n* 67, 1957.

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47. Em conclusão, quer se encare a questão associando-a a todos os aspectos de desenvolvimento, quer especificamente sob o de progresso técnico da produção, não se poderá deixar de ad­mitir que, na legislação a fixar-se, deve o ensino primário rece­ber tratamento preferencial. Isso não significa que os demais graus não devam ser considerados, mas certo é que pelas fun­ções que a escola primária deve preencher nela repousa a qua­lidade de todo o ensino. Estudos do INEP, desde o ano de sua fundação, em 1938, como levantamentos da CAPES e da Comis­são de Educação junto ao Conselho de Desenvolvimento Econô­mico, têm considerado a matéria pelo aspecto das despesas, e representam subsídios indispensáveis à questão da educação para o desenvolvimento.20

b) Ensino de grau médio e desenvolvimento

48. No ensino médio, destinado à adolescência, a situação é ainda de maior insuficiência e deficiência, como se poderia es­perar. Do contingente da população brasileira de 12 a 18 anos, apenas 10% freqüentavam escolas no ano de 1958, e do discipu­lado existente mais de metade estava em escolas privadas, isto é, em escolas onde deviam pagar anuidades. Assim, as oportu­nidades educacionais ainda mais se restringem, com repercussão muito grande no processo de desenvolvimento, por ser a adoles­cência a idade natural de diferenciação e formação profissional. Deve-se observar que, malgrado tudo, esse ramo de ensino foi o que mais cresceu nos últimos trinta anos. O aumento absoluto indica-se pelo crescimento de 150 mil alunos para um milhão. O relativo, pelo índice de 500% No mesmo prazo, o ensino pri­mário só teve acréscimo de pouco mais de 100 %. Tal discre­pância denuncia, é evidente, um grave desequilíbrio, dada a insu­ficiência do ensino primário, como dantes se assinalou.

49. não se deve obscurecer que o aumento de enisno médio é um fenômeno geral nas nações do Ocidente, por motivos gerais de desenvolvimento econômico e social. Mas, enquanto na maio­ria delas se verificam condições de maior equilíbrio, em nosso país tem-se dado mais ênfase a um de seus ramos, o ensino se­cundário, de formação geral inespecífica e de caráter puramente formal. De 60 mil alunos, em 1930, nesse ramo, passamos a ter agora mais de 800 mil. As razões desse fato não são simples, pre-

20 Cf. Boletim mensal da CAPES e Educação para o Desenvolvimento. "Relatório final da Comissão de Educação e Cultura do Conselho do De­senvolvimento. Doc. nº 20, Rio.

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ponderando entre todas, no entanto, a de uma falsa concepção do papel que a educação deve desempenhar na estrutura pro­fissional.

50. O ensino secundário, do tipo de humanidades, com tra­dição clássica, vem conservando entre nós a idéia de uma pre­tensa função seletiva e de privilégio social. Sua evolução nos Estados Unidos, por exemplo, foi inteiramente outra. Desde os fins do século passado, aí tomou êle caráter de ensino comum, aberto a todo o povo, expresso na própria denominação que re­ceberam os estabelecimentos que o ministram — high schools — isto é, estágio mais alto da escola comum, escola de todos. Por isso mesmo, procurou logo adaptar-se às necessidades de produ­ção ou desenvolvimento econômico. O objetivo central é o de preparar os jovens para a vida prática, não especificamente para os cursos superiores. Essa é a razão por que os Estados Unidos têm contado mais alunos em seu ensino secundário que todo o resto do mundo. Em nosso país, as origens clássicas foram man­tidas com o intento seletivo, ou de qualificação social.

51. De qualquer modo, chegamos a esta situação: de todos os alunos de curso médio, ainda no ano de 1958, matricularam-se no secundário 75%. No ramo comercial, que se tornou na espécie de secundário auxiliar, inscreveram-se 16%. No indus­trial, apenas 2%. No agrícola, menos de meio por cento. É possível, pois, dizer que há 2,5% de jovens que se preparam para a produção direta, e 16% para comercializar e contabilizar essa produção. Observe-se que todos os estudos referentes ao sub­desenvolvimento são acordes em apontar como uma de suas ca­racterísticas a hipertrofia do setor comercial.

52. não obstante, por todo esse período têm crescido as indústrias com utilização dos escassos recursos humanos em qua­lidade, os esforços do SENAI e aproveitamento também de jo­vens que abandonam o curso secundário logo após os primeiros anos de estudos, nos quais se observam taxas muito elevadas de evasão. Por mais estranho que pareça, há certa percentagem de jovens que freqüentam algumas clasess do ginásio tendo em vista preparação para o trabalho. É que, dada a precariedade do ensino primário existente, e havendo um interregno forçado entre o seu término, aos 11 e 12 anos, e a idade de ingresso no trabalho, aos 14, muitas famílias matriculam os filhos em giná­sios, ainda que não visem destiná-los a estudos superiores. Ne­nhum inconveniente nisso haveria, não fora o caráter acadêmico acentuado, que concorre para o desajustamento de muitos jovens, os quais passam a ver as atividades produtivas, nas indústrias e na agricultura, como inferiores ou de caráter depreciativo. Por isso, um grande número deles tem como ideal, senão as car­reiras liberais, ao menos o funcionalismo público, atitude essa

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que uma política de clientela infelizmente mantém e acoroçoa. A atração pelo funcionalismo público, de magros proventos, mas de aposentadoria certa, é uma das características também de países subdesenvolvidos. Tal situação retira aos jovens, como é fácil compreender, as qualidades de iniciativa e maior confiança em si.

53. As questões do ensino médio apresentam-se revestidas, como se vê, de grande complexidade. Em todas domina, no en­tanto, a distorção das funções que esse grau de ensino deve ter em face dos problemas do desenvolvimento, é que podem ser as­sim simplificadamente indicados: num país em processo de de­senvolvimento econômico, reclamando estrutura profissional di­ferenciada, o ensino médio deve ter feição distributivo,, não sele­tiva, e muito menos por critérios de qualificação simplesmente formal, de estudos acadêmicos. A gravidade maior da situação brasileira veio a produzir mesmo uma curiosa inversão em nossa legislação do ensino, a esse respeito. Várias leis se aprovaram, nos últimos tempos, admitindo a equiparação geral dos estudos de ensino médio para o efeito de matrícula nas escolas superio­res. Isso importa confessar a falência geral do sistema, em face dos problemas reais que defronta; ou, pelo menos, que a es­cola não cumpre seu dever de formar os jovens para um dos as­pectos primaciais de seu destino, que é o de orientação satis­fatória para o trabalho.

54. Já dantes indicamos a solução ensaiada pelos Estados Unidos, país que, ao contrário, admitiu o caráter comum do en­sino médio, com preocupação conjunta de formação geral e de iniciação profissional, para melhor distribuição dos adolescentes, inclusive em relação aos que possam destinar-se às universida­des. Em outros países, tem-se conservado no ensino médio uma feição dual — ensino geral por um lado, e profissional por outro — a qual retrata aquela mesma idéia de qualificação social. A solução, aí, tem sido a de maior extensão do ensino primário, pelo menos até aos 13/14 anos. Note-se também que essa é ain­da a de muitos Estados norte-americanos, que preferem a estru­tura oito anos de primário e quatro de secundário, em vez da estrutura seis de primário e seis de high School.

55. Nos vários projetos que entre nós se têm preparado (inclusive o que estes encontros deverão apreciar) uma solução mista tem sido proposta. Prevaleceria um esquema de 4 anos de ensino primário e de grau médio, permitindo-se, porém, que no primário também existissem mais duas classes, donde, a seu termo, os alunos poderiam prosseguir estudos na terceira série de qualquer ramo do ensino médio. Teria este, uniformemente, em todos os ramos, a denominação comum de ginásio e colégio,

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para os dois ciclos sucessivos, com que se pretende ainda e sem­pre satisfazer ao desejo de qualificação social por ensino formal. A incoerência, em face da legislação do trabalho, que só o admite aos 14 anos, é transparente. Em tese, melhor seria, conside­rando-se as condições reais de desenvolvimento do país, que todo o ensino primário tivesse seis anos de duração, reduzindo-se em conseqüência a extensão dos estudos de grau médio. Isso atenderia à dificuldade do custo do ensino. Nem por outro mo­tivo, nas difíceis contingências de reconstrução econômico-social depois da guerra, todas as províncias da Alemanha Ocidental adotaram o ensino primário extenso, e não de 6, mas de 8 anos, e algumas até de 9 anos.

56. não dissimulamos, porém, as dificuldades de tal so­lução, em nosso país. Assim, a solução mista, ou intermediá­ria, a que se fêz referência, parece apresentar utilidade, como recurso de acomodação à medida que os poderes públicos venham a expandir não só a rede de escolas primárias, como a de ensino médio, retificando suas funções num sentido de maior compre­ensão dos problemas do desenvolvimento. De qualquer forma, estas considerações de ordem geral evidenciam que a planifica-ção a desejar-se envolve complexos fatores a serem devidamente considerados. No planejamento do ensino primário num país qualquer, bastará considerar os efetivos demográficos e suas pro­jeções, criando-se e pondo-se a funcionar o número de escolas necessárias. No ensino médio, critério tão simples pode ser ado­tado. Primário ou secundário, o ensino não visa apenas a for­mar trabalhadores, mas, sim, o cidadão e o homem. Os dois aspectos, no entanto, como abundantemente se viu na primeira parte deste trabalho, estão estreitamente inter-relacionados. À medida que o progresso técnico se acelera, o desenvolvimento passa a reclamar homens de mais elevada formação geral. É o que nos mostram todos os estudos comparativos, e em especial as mudanças educativas apuradas nos Estados Unidos e, nos últimos tempos, na Inglaterra e na França.

57. Esquemas mistos envolvem flexibilidade, com ajusta­mento regional e mesmo local. A solução mais simples, nesse caso, será admitir muito ampla descentralização administrativa e técnica. Em larga média, nossa Constituição a prevê, no que toca à execução dos serviços. Será preciso considerar, porém, as necessidades de controle direto e de controle indireto, por as­sistência técnica, pois a descentralização à outrance pode levar ao esquecimento de critérios de integração social e econômica e, portanto, a um desequilíbrio no processo de desenvolvimento. A consideração desse fato alterou, por exemplo, fundamental­mente, o panorama educacional na Inglaterra, desde a reforma

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de 1 944, como também, embora mediante controle administra­tivo indireto, está alterando a educação nos Estados Unidos. Num como noutro desses países, de nenhum modo se pretende que o ensino seja regulado por planos totalitários. As exigên­cias de desenvolvimento econômico, no entanto, a ambos têm obrigado a rever antigos esquemas, num propósito de maior in­tegração, com os esforços inclusive das entidades representati­vas de empresas econômicas. Será oportuno lembrar que, na Inglaterra, além de conselhos centrais consultivos, existe no Mi­nistério da Educação um Conselho Nacional de Educação para o Comércio e a Indústria (National Council on Education for Industry and Commerce).

c) Ensino superior e desenvolvimento

58. Se as necessidades de tal compreensão existem para os problemas de ensino médio, mais ainda se tornam patentes no de nível superior. Em nosso país, tem sido mesmo nesse nível mais alto que a questão veio claramente a propor-se, em iniciativas tais como as da CAPES e COSUPI. A razão está em que, em face de acelerado desenvolvimento, com variação muito grande da estrutura profissional e alargamento súbito das atividades não primárias, viu-se o país de um momento para outro desprovido de quadros técnicos, sobretudo nas profissões chamadas modernas, segundo as classificações de Jaffe e Ste-wart, e nas que de modo direto interessam à administração das empresas, como tem feito notar a CEPAL.

59. Quer em qualidade, quer em quantidade, o ensino su­perior brasileiro até há pouco não dava mostras de perceber as grandes transformações porque passava o país. Em quantidade, nossos índices de matrícula nesse grau têm permanecido muito abaixo, mesmo dos de vários países latino-americanos, como o México, a Argentina e o Chile. Ainda em 1 933, a matrícula de nossas escolas superiores orçava apenas por 20 mil alunos, para só agora atingir a ordem de uma centena de milhar. Quanto a diferenciação e qualidades dos estudos, muito pior. Recente­mente, um educador americano mostrou que a produção indus­trial brasileira correspondente ao ano de 1945, já era compa­rável à dos Estados Unidos no ano de 1 890. Mas, enquanto lá existiam 600 engenheiros para cada milhão de habitantes, nós só possuíamos 200. Além disso, a mais alta percentagem de nossos profissionais tinha o curso de engenharia civil, não de ramos que a indústria estava reclamando.

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60. Alguns dados rápidos podem dar visão clara da situa­ção. Em acelerado processo de industrialização, nosso país vi­nha preparando com especial preferência bacharéis em direito. São eles necessários, sem dúvida, ao surto de desenvolvimento; não, porém, de modo exclusivo. Vem depois a classe dos licen­ciados de filosofia e letras, especialmente destinados ao professorado

secundário. Em cada um desses ramos, no ano de 1955, registraram-se dois mil diplomados. Já em medicina, o número baixava a 1.400, e, em engenharia, não era superior a 1 milhar, a quase totalidade dos quais nos ramos de construção civil, ar­quitetura e urbanismo. Engenheiros mecânicos, metalúrgicos ou de outras espécies, não chegavam a três dezenas. Os agrônomos figuravam com 107, e os veterinários eram 24, ainda que nossa principal produção exportável seja agrícola e tenhamos um dos maiores rebanhos do mundo. Os químicos industriais não eram senão 43. Geólogos e especialistas de outros ramos, necessários à indústria do petróleo, não existiam.

61. Desde 1957, algumas e importantes medidas têm sido tomadas pelo Ministério da Educação, por vários de seus órgãos, em especial a Diretoria Geral do Ensino Superior. Disso resul­tou um início de planejamento, cujos primeiros e satisfatórios resultados começam a ser sentidos. Na realidade, porém, como observou em várias oportunidades o Ministro Clovis Salgado e o faz agora o sr. Ministro Pedro Paulo Penido, mais amplo pla­nejamento deverá ser empreendido. A dificuldade dessa tarefa é a mobilidade mesmo do processo, dado que vencidas umas eta­pas, elas desde logo refluem sobre muitos aspectos.

62. Nenhuma legislação, portanto, poderá conter a indica­ção de etapas seguras para planejamento hábil. O que poderá e deverá oferecer serão normas e critérios pelos quais um pla­nejamento satisfatório possa ser feito e refeito, indicando ade­mais os órgãos administrativos, que colijam a documentação ne­cessária, e órgãos consultivos, que ao Governo possam auxiliar, inclusive comissões permanentes com representação da indústria e do comércio, a exemplo do que em outros países já se faz.

63. Em recente reunião de técnicos, convocada pela Orga­nização dos Estados Americanos, em Washington, essa boa dou­trina foi proclamada. Essa reunião afirmou que o planejamento da educação deve ser feito de maneira integral; também, que "deve ser compreendido como um processo contínuo e sistemá­tico, no qual se apliquem e coordenem os métodos de investigação social, os princípios e as técnicas da educação, administração, economia e finanças, com a participação e o apoio da opinião pública"; e ainda, que "isso deve ser feito tanto no campo das atividades estatais como privadas, a fim de garantir educação

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adequada à população, com metas e etapas bem determinadas, que facilitem a cada indivíduo a realização de suas capacidades potenciais e sua contribuição mais eficaz ao desenvolvimento so­cial, cultural e econômico do país". A mesma ampla compreen­são do problema é esposada pelo UNESCO, como anteriormente vimos, ao indicar o programa de uma conferência que prepara para os fins de ano de 1961.

CONCLUSÃO

O tema referente a esse relatório, por sua própria feição geral e múltiplas implicações, não permite atender às sugestões apresentadas pela douta Comissão Executiva Nacional destes "encontros", as quais especialmente consideraram os diferentes ramos de ensino, como se vê no primeiro item dessas sugestões. Na realidade, não há um só ramo de ensino que interesse ao desenvolvimento, por isso que todos, sem exceção, envolvem pro­blemas que lhe dizem respeito. A conclusão de ordem geral, que ousamos apresentar, é que o tema "educação para o desen­volvimento" seja debatido como matéria de ordem geral. desse modo, poderá contribuir para um sistema de referência em que os fatos, situações e valores, a serem tidos em conta no estudo de uma legislação orgânica do ensino e de administração dos sistemas regionais e federal, possam ganhar maior nitidez e con­sistência.

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FINANCIAMENTO DO ENSINO PRIMÁRIO NA AMÉRICA LATINA

ABGAR RENAULT

Da Universidade de Minas Gerais

não é um discurso que vou fazer: é um apelo que conterá, talvez, tantos números quantas palavras e em que as palavras serão, talvez, menos espantosas do que os números. A situação educacional da América Latina é extremamente grave, e agrava-se mais à medida que o processo de sua industrialização se in­tensifica e ganha velocidade mais viva, seja porque essa indus­trialização rápida absorve fatalmente recursos que poderiam ser utilizados para a solução dos problemas do ensino público, espe­cialmente do ensino elementar, seja porque os operários serão, dentro em breve, insuficientes, tanto em qualidade como em quan­tidade, para as novas tarefas por cumprir. Por outras palavras: o processo de industrialização não tem sido acompanhado, até hoje, por um esforço pararelo no sentido da criação de uma base sólida ou de uma infra-estrutura educacional e, por intermédio dela, de fortes elementos de execução, sem os quais tudo quanto se empreenda acima do ensino elementar será mais ou menos inútil.

Tal situação tornar-se-á tanto mais grave quanto o mundo tecnológico em que vivemos faça progressos mais importantes. À medida que as técnicas da produção se forem tornando mais eficazes, a necessidade de um número maior de operários espe­cializados ir-se-á tornando mais aguda. A máquina não pode substituir o homem. Será suficiente lembrar que uma mina de carvão exige 3% de pessoal especializado de nível universitário, ao passo que uma usina atômica exige 4%.

­onsiderai estes números: 54% da população latino-ameri­cana pertence ao grupo etário de menos de 20 anos, o que signi­fica ser êle composto de elementos que têm necessidade de fre­qüentar uma escola qualquer, elementar, secundária ou superior.

Propos ta apresen tada pelo professor Abgar Renaul t , delegado do Brasil, à Assembléia Geral da UNESCO, realizada em Par i s , de 14 de novembro a 16 de dezembro de 1960.

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O número dos analfabetos no grupo de 15 anos e mais varia entre 15 e 20% em alguns países, como a Argentina, o Chile, o Uru­guai e Costa Rica, e atinge 80 % no Haiti. Em 1950, cerca de 50% da população do Brasil e do México eram analfabetos, ao passo que na América Central a percentagem oscilava entre 60 e 70%. É necessário considerar ainda a existência, em todos os países citados, de zonas rurais muito extensas, de densidade de­mográfica extremamente fraca, em que o estabelecimento de es­colas é dificílimo. Atualmente, 18 a 20 milhões dos 40 milhões de crianças da América Latina não podem iniciar-se nas técnicas elementares da leitura, da escrita e do cálculo, — por falta de escolas. Vale dizer que somente 18 a 20 milhões de crianças têm o privilégio de estudar. Menos de 10% dos alunos que con­cluem os estudos primários, isto é, 2 milhões de adolescentes, conseguem entrar em escolas de grau médio, e somente 2% che­gam a freqüentar um curso qualquer, de grau universitário.

Eis aí o quadro da América Latina, no momento em que ela conta 200 milhões de habitantes, população que cresce 2,6% anu­almente, o que representa 1% mais do que a média mundial e não tem paralelo senão em certos países da Ásia. Qual será a situação dentro em 20 anos? Coube a Alfred Sauvy dar-nos a resposta em seu livro De Malthns à Mao Tsé Toung sobre a evolução da população da América Latina durante o período 1950-1980: "Essa população, no caso de uma natalidade média, será, em 1980, de 296.500.000 habitantes".

Alfred Sauvy oferece-nos, no livro citado acima, os seguin­tes dados sobre as populações de alguns países da América La­tina em 1950 e sobre as três populações possíveis dentro em 20 anos, conforme as três hipóteses de uma taxa de natalidade fraca, média ou forte:

1950 1980

Argent ina Bolívia Brasil Chile Colômbia México P a r a g u a i P e r u Uruguai

17.188.000 3.020.000

51.976.000 5.745.000

11.260.000 25.567.000 1.397.000 8.294.000 2.424.000

126.871.000

fraca

24.638.000

6.158.000 98.311.000 9.092.000

25.438.000

48.239.000

2.707.000

18.896.000

3.040.000

236.519.000

média

26.250.000

6.627.000 105.527.000 9.879.000

27.388.000

55.469.000

3.212.000

20.370.000

3.212.000

257.934.000

forte

27.885.000

7.147.000

113.402.000

10.235.000

29.514.000

64.425.000

3.727.000

21.992.000

3.386.000

281.713.000

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Convém completar o quadro acima com as cifras seguintes, que mostram o aumento da percentagem segundo estudos da CEPAL (Comissão Econômica para a América Latina) : Ar­gentina 53% ; Bolívia 119%; Brasil 103% ; Chile 72% ; Colômbia 1437o; Costa Rica 130%; Equador 127%; Guatemala 105%; Honduras 100%; Nicarágua 127%; México 1177o; Panamá 102%; Paraguai 130%; Peru 145%; Salvador 1067o; Uruguai 32%; Venezuela 130%. Essas cifras são espantosas e atraem a nossa atenção numa direção que não nos interessa diretamente, mas que não pode ser esquecida — a inevitável insuficiência de alimentos para essa massa imensa de seres humanos que, em 1980, preencherá uma parte dos espaços, hoje vazios, da América Latina. Por outras palavras: a ignorância e a fome dar-se-ão as mãos. Será que, em 1980, os governos dos países latino-ame­ricanos estarão em condições de arrostar os problemas, torna­dos insolúveis, das massas populares ao mesmo tempo ignoran­tes e esfaimadas?

Que é necessário fazer atualmente? (Eu não penso no ano de 1980). — Construir e aparelhar 600 mil salas de aula e pre­parar 600 mil professores. Que é necessário despender para atingir tais fins? — Três bilhões de dólares e meio, como apli­cação inicial de capital, e dois bilhões por ano para a manutenção dos serviços escolares.

Que dificuldade se oculta atrás dessas cifras aterradoras ? — Créditos capazes de suprir a falta de recursos orçamentários. Por outras palavras: a concessão de créditos a longo prazo — eis a única saída que poderá ser aberta aos países latino-americanos.

Que se pede à UNESCO? — Antes de tudo, é necessário sublinhar que não se pede um dólar mais à UNESCO, mas pede-se à UNESCO não se esqueça de que, se enfrentamos dificulda­des quase intransponíveis, quando a população da América La­tina é de 200 milhões mais ou menos, em que situação estaremos quando essa população fôr de 300 milhões mais ou menos? A solução do problema será encontrada e adotada imediatamente, ou, então, não haverá jamais solução nenhuma. As despesas serão consideráveis, sem dúvida, mas não serão menores ama­nhã; muito ao contrário, aumentarão dia por dia.

A delegação brasileira propõe, portanto, à XI Conferência Geral:

(a) que a UNESCO leve em consideração o que foi apro­vado pelo Conferência sobre o Projeto Maior n.° 1, realizada no Mérico no mês de março de 1960, e utilize o seu prestígio a fim de levar a efeito uma conjunção de esforços de tal eficácia, que torne possível a criação de um fundo internacional capaz de fa-

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zer empréstimos a longo prazo destinados à expansão do refe­rido Projeto Maior n.° 1, o qual fundo poderia receber recursos provenientes das grandes instituições internacionais de crédito, a começar pelo Banco Interamericano de Desenvolvimento;

(b) que a UNESCO se interesse também por que sejam adotadas as sugestões das Recomendações da Política de Finan­ciamento aprovadas na Conferência da Operação Pan-Americana (OPA);

(c) que a UNESCO estabeleça condições para a concessão de empréstimos, entre as quais poderiam figurar as seguintes: 1) aplicação pelos Estados de um montante não inferior a 10% de sua receita nos serviços de educação, a menos que cifra su­perior seja estabelecida por suas leis; 2) apresentação de um programa de aplicação dos empréstimos; 3) verificação, um ou dois anos após a concessão do empréstimo, da aplicação dos re­cursos obtidos; 4) consideração da renda per capita em cada país que solicite empréstimo; 5) estabelecimento de uma escala de prioridades baseada na renda per capita, bem como nas con­dições educacionais locais; 6) aplicação, nos serviços de educa­ção, do montante das reduções que venham, acaso, a ser obtidas nos orçamentos militares, que constituirão o objeto de uma con­ferência em Quito, no mês de março de 1961.

O mesmo plano seria, talvez, válido para a África e a Ásia, que enfrentam dificuldades igualmente graves para resolver seus problemas de educação popular.

Órgãos financeiros regionais devem ser criados para ajudar os países da África e da Ásia a cumprir os programas de exten­são e melhoramento do ensino primário.

A delegação brasileira está segura de que a UNESCO po­derá trazer auxílio decisivo às conjunturas que descrevemos, salvo se confirmar o aforismo de Adams: "O homem é um ani­mal dotado de razão, mas não é um animal razoável" {"Man is a reasoning animal but he is not a reasonable animal").

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EDUCAÇÃO E DESENVOLVIMENTO

ANÍSIO S. TEIXEIRA

Diretor do INEP

Uma transformação, que se iniciou nos fins do século XVIII, na Grã-Bretanha e nos Países Baixos, de métodos de produção, vem criando, em todo o mundo, uma nova sociedade e uma nova civilização, a sociedade e a civilização industrial de nossos dias.

não se pode dizer que nação alguma tenha completado a transformação, mas há as que se acham próximas do que se po­deria chamar de industrialização total, outras em estádios ama­durecidos e avançados e outras ainda a iniciar a grande transi­ção.

Recentemente, essa grande mudança vem sendo objeto de estudos e tentativas de sistematização quanto ao processo de seu desenvolvimento, visando, de certo modo, retirar o assunto do campo da intuição ou profecia política e trazê-lo para o quadro objetivo dos estudos científicos. Dentre tais estudos, poucos se­rão mais importantes do que os produzidos pelo "Inter-Univer-sity Study of Labor Problems in Economic Development", or­ganização criada em 1954, pelos economistas Clark Kerr, John T. Dunlop, Frederick Harbinson e Charles A. Myers, destinada a investigar o fator humano no processo do desenvolvimento eco­nômico. Doze livros e dezenas de artigos científicos já foram publicados, achando-se em impressão outros quatorze livros e de­zenas de monografias. As pesquisas até agora feitas estendem-se por 35 países e ocupam 78 especialistas e autores.

Valho-me da oportunidade, que me oferece este "Encontro entre Educadores", para lhes oferecer um sumário dos resulta­dos dessas pesquisas e análises, constantes do último volume pu­blicado: "O Industrialismo e o Homem Industrial" l.

Relatório apresentado ao Encontro Regional de Educadores Brasileiros. 1 Industrialism and Industrial Man — Clark Kerr, John T. Dunlop,

Frederick H. Harbinson e Charles A. Myers — Harvard University Press, Cambridge, Mass. U.S.A. — 1960.

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Trata-se de análise e interpretação, tão objetiva quanto pos­sível, das diferentes estratégias que vêm conduzindo o processo de industrialização, nos diferentes países, segundo o tipo de elite que passa a comandar a grande transformação.

Reconhecem os autores do estudo que a industrialização leva a certo tipo de civilização de característicos próprios e traços comuns. Nem por isto, contudo, há um só caminho para se che­gar à sociedade industrial. Pelo contrário, diferentes caminhos a ela nos conduzem e, sobretudo, há estratégias diferentes, con­forme o tipo de elite que toma o comando de sua marcha.

Além disto, a sociedade industrial não se desenvolve no vá­cuo, mas sucede a sociedades preexistentes, em diferentes con­dições geográficas e diferentes estádios históricos, o que a obriga a assumir aspectos distintos nos diversos países, sem nos refe­rirmos ao pluralismo e à diversificação do próprio processo de industrialização.

A qualidade e tipo de elite que, em cada país, toma a dire­ção do movimento e conduz a nação através das vicissitudes da transição, parecem resultar de acidente histórico. Conforme se­ja tal elite, como iremos ver, será a marcha, a estratégia, a ve­locidade e a harmonia da transformação.

Os autores examinam cinco tipos de elites, que, aqui e ali, vêm conduzindo, nos diversos países, a grande revolução: a elite dinástica, a da classe média, a dos intelectuais revolucionários, a dos administradores coloniais e a dos líderes nacionalistas. Está claro que se trata de tipos ideais, que não existem na prá­tica em estado de pureza, mas de mistura uns com os outros, com o domínio desse ou daquele matiz. Nem esse domínio será ne­cessariamente definitivo. A própria dinâmica do processo de industrialização poderá extinguir ou substituir a elite originària­mente dominante. De todas, por exemplo, a dos administrado­res coloniais parece a de menor capacidade de sobrevivência. Mas, também as outras não têm a certeza da permanência. O processo de industrialização é terrivelmente dinâmico e, de certo modo, implacável e irreversível. Se a elite que o estiver coman­dando não se revelar capaz, será muito provavelmente destruída e substituída pela elite nova que se vier formando à sombra dos erros da primeira. Aliás, toda fase de transição é fase de luta entre o velho e o novo, e a arte de conduzir tais batalhas, extre­mamente difícil, em virtude das contradições que gera o próprio processo revolucionário de transformação.

Cada uma daquelas elites, ou grupos de liderança, acima mencionados, está longe de possuir composição homogênea; cons­titui-se antes de figuras as mais diversas — ou sejam líderes políticos, industriais, militares, autoridades religiosas, adminis-

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tradores públicos ou de empresa privada. Correspondem as de­nominações, que lhes dá o estudo, muito mais à filosofia e orien­tação central de ação de cada uma do que às pessoas que as com­põem.

Para ser bem sucedida, terá a elite responsável de embarcar na tarefa de transformação da sociedade tradicional sem contudo destruir-lhe a contextura social, nem expô-la ao perigo de des­truição. É de extrema importância, com efeito, que a transição se faça de forma tolerável e sem rupturas destrutivas, ressalvan­do-se, de qualquer modo, a integridade da contextura social; e, por outro lado, é necessário que a transformação não se revele incompatível com a posição do país no quadro internacional, em que se acha êle inserido, a fim de que possa contar com a pro­teção e segurança necessárias.

Embora repetindo, com os autores do estudo, que nenhum caso de desenvolvimento industrial corresponde integralmente a um único dos estilos de industrialização, vamos esboçar os aspec­tos típicos de cada um deles.

1. A elite dinástica e a comunidade paternalista

A elite, que o Prof. C. Kerr e seus colegas de estudo chamam de dinástica, recruta os seus membros dentre os elementos da aristocracia rural ou comercial — agricultura e comércio são as formas de produção preexistentes — e mais raramente na casta militar (os samurais no Japão), na hierarquia religiosa, ou burocrática, ou mesmo dentre chefes tribais ou feudais.

O nexo que une essa elite é o do respeito à tradição. Em­bora possa aceitar um ou outro membro novo, de modo geral, corresponde a um sistema fechado, fundado na família e na clas­se, constituindo uma casta privilegiada — a raça dos governan­tes.

Dentro dessa casta, devotada à ordem estabelecida e à tra­dição, a qual encarna o passado, o presente e o futuro, surge, ante a ameaça da industrialização, uma minoria suficientemente in­teligente para não deixar escapar-lhe o controle da mudança ine­vitável. São os "realistas" que, em oposição aos "tradiciona­listas", se preparam para os compromissos necessários, a fim de permitir a industrialização, desde que se processe sob sua di­reção. Mesmo nos casos clássicos da transformação industrial desse tipo — o da Alemanha e o do Japão — deve ter precedido ao início do movimento a luta entre os dois grupos da classe aris-

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tocrática, e a vitória dos "realistas" é que evita a liquidação ou o desaparecimento dessa classe. Nem por isto cessa a luta com outros grupos, dependendo a vitória final do vigor dos respecti­vos contendores. não surgem, com efeito, na elite aristocrática apenas "realistas" e "tradicionalistas" mas também outro grupo — de todos o mais congênito com essa classe — e que se poderia chamar o dos "decadentes". São estes a flor e o mimo da casta: cultivam o prazer pessoal, o ócio alto e fino, a vida dissipada, são os heróis da "doce vida", geralmente ligados a culturas es­trangeiras pelo gosto e pelos investimentos. Os "realistas" não têm de vencer apenas os "tradicionalistas" mas também estes últimos, inimigos bem mais difíceis e fugidios. Se os vencerem, contudo, e tiverem o necessário vigor, podem enfrentar o pro­cesso de industrialização com estilo próprio, imprimindo-lhe o feitio autoritário que caracteriza a casta. com ênfase no poder pessoal e na perpetuação das famílias "nascidas para o Governo", entre as quais se efetivam as alianças necessárias, processa-se o recrutamento entre elas dos administradores e gerentes e o movimento de transformação tem início, num regime, na reali­dade, de força. Daí a facilidade do grupo tender ao fascismo. Escapando porém a esse perigo, estabelece-se um sistema de pre­domínio familiar patriarcal, servido por Governo paternal e be­nevolente, dotado de relativo poder de sobrevivência.

Repousam os ideais sociais do grupo nos símbolos e nas ins­tituições do passado: a família, a igreja, a propriedade privada e o estado naiconal. Tradicional por excelência, só aceita al­teração da sociedade na medida em que a mudança constitui ne­cessidade de sobrevivência. Por isto mesmo, é inerentemente hostil aos intelectuais, salvo àqueles que se fazem seus "mestres espirituais", interpretando e reinterpretando a essência do pas­sado e, à luz dessa essência, o próprio futuro.

A ordem econômica, fundada na lei e na ordem, inclina-se para os cartéis e as sociedades de economia mista, numa mistura de "público" e "privado", constituindo a base de um sistema político paternalista. Entre o trabalhador e o patrão não deve haver luta, mas harmonia. A lei e o Estado aí estão para criar o clima de paz e amor entre o lobo e o cordeiro. O poder de es­tabelecer as regras do jogo não se distribui, mas fica com a lei e o Governo. O clima do regime é o da lealdade e harmonia entre as fileiras e a hierarquia. O trabalhador faz-se um misto de "menor" e "funcionário público".

A marcha da industrialização é comandada pela idéia de sobrevivência. É preciso não esquecer que a transformação não se faz pelo seu próprio mérito mas apenas para garantir a so-

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brevivência da sociedade tradicional. toda alteração violenta é combatida com extremo rigor. A regra é: "nem mais depressa nem mais longe do que o necessário. . ." A elite dinástica e o estado paternalista devem sobreviver. como o regime indus­trial ganha em ser planejado, esse estilo pode ser bem sucedido, dada a facilidade com que pode fixar metas e objetivos e a apli­cação do dispositivo de força na sua conquista.

não se pense porém que tal forma de industrialização seja pacífica. Pressões externas e internas podem incentivá-la ou destruí-la. As pressões externas — sejam militares, políticas ou econômicas — são geralmente salutares e incrementam o pro­gresso econômico. Já as pressões internas, sejam as da classe trabalhadora, ou de grupos intelectuais e independentes, não são de natureza a facilitar o progresso econômico, tendendo antes a criar instabilidade política, que poderá chegar a fazer cair a classe dirigente e levá-la a ser substituída. O poder de sobre­vivência desse estilo de industrialização é questionável. A ten­dência será para constituir-se fase de transição para o comando de um dos demais grupos. No melhor dos casos, ao da elite de classe média, que passamos a analisar.

2. A elite de classe média e a comunidade do mercado aberto

não será preciso repetir como surge a classe média. Os seus membros se recrutam nos grupos comerciais ou artesanais, já existentes na sociedade anterior e sensíveis às possibilidades dos novos meios de produção. Sensíveis às oportunidades do lucro. A classe não pratica nenhuma rígida ideologia. O seu assalto à ordem velha não toma o aspecto global de uma revo­lução, mas fá-la ruir aos poucos, minando-a aqui e ali, constru­indo lentamente a nova sociedade. No seu conflito com o velho acaba contando, como aliados políticos, com intelectuais ansiosos por liberdade e operários em busca de oportunidades.

A sua flexível ideologia é economicamente individualista e praticamente igualitária. Cada indivíduo é responsável por si mesmo, dentro dos limites da lei. A êle cabe tirar proveito das oportunidades que a sociedade lhe oferece. Nessa áspera e livre competição, é êle o seu próprio Senhor e a sociedade funda-se no seu interesse próprio (esclarecido se possível) em substitui­ção ao "bem-estar da comunidade" que seria o objetivo profes­sado da sociedade anterior.

A mobilidade vertical dos indivíduos, dentro da sociedade, em relação direta com o conhecimento das oportunidades exis-

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tentes e a capacidade de fazer uso delas, quebra a rigidez da classe. A família e o passado deixam por isto de ser importan­tes, salvo quando facilitam tal aproveitamento de oportunidades. O sistema baseia-se politicamente num regime de leis e regras consentidas e, economicamente, na vantagem ou proveito pró­prio. Ninguém nasce para mandar, mas alguns são feitos para gerir e administrar. O empreendedor, o gerente é, em parte, um político, construindo, por entre as pressões dos indivíduos, dos grupos e das instituições, em dinâmico e difícil ajustamento, uma sociedade dominada pela mobilidade e pelo interesse pessoal.

Que ideais pratica essa sociedade? Algo de fugidio e difí­cil de caracterizar. Cultiva antes meios do que um fim: e os meios são o razoável, o interesse próprio, e a relativa embora am­pla tolerância ao dissentimento. A pluralidade de centros de po­der e decisão e um jogo de freios e contra-freios marcam o fun­cionamento social. Separação entre' a Igreja e o Estado e, neste, separação dos três poderes — separados e independentes — ca­racterizam o pluralismo político. O pluralismo econômico está na multiplicidade das empresas. De todo esse complexo jogo de influências e contra-influências decorrerão a ordem e a justiça.

As relações entre o operário e o patrão são as de indepen­dência mútua. O operário ali está por uma transação comercial. Diz um autor: o operário "sabe que é politicamente igual ao pa­trão e não deseja subordinar-se a êle e incorrer em uma dívida de gratidão. Está na fábrica ou oficina em virtude de um con­trato e não considera os demais colegas como uma família de que o empresário seja o chefe e o patriarca". Dessa independência, passa o trabalhador à fase em que se organiza em oposição aos empresários, e um novo pluralismo de poder se estabelece, com a participação crescente do trabalhador nas regras do jogo.

O progresso nesse tipo de sociedade é tido como algo de na­tural. Decorre do complexo jogo de mil e um centros de poder, tomando decisões dia a dia. não deve ser retardado mas tam­bém não deve ser forçado. Considera-se suficiente o incentivo do interesse próprio numa sociedade materialista e competitiva. não há planejamento central. Assim, a velocidade do desenvol­vimento fica entre a da sociedade patriarcal que resiste ao pro­gresso e a da sociedade de mobilização industrial forçada, que caracteriza o terceiro tipo a ser adiante examinado.

A sociedade do tipo classe média não é homogênea nem uni­forme. Seus característicos e distinções decorrem das suas ori­gens. Na Europa e na América Latina surge como uma socie­dade nova em luta contra a ordem estabelecida, a da classe aris-

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tocrática dominante e contra os hábitos de uma civilização an­terior. Nos Estados Unidos, no Canadá, na Nova Zelândia, a classe média é quase a classe original. Nem aristocratas nem peões. Acabam todos se julgando classe média. São essas so­ciedades os modelos mais puros da sociedade de classe média e do mercado aberto, onde melhor se pode sentir as tendências por assim dizer espontâneas desse tipo de organização social. Nesses países, o progresso marcha rapidamente e certa consistência cul­tural interna se processa sob a direção da classe industrial e co­mercial. Nos demais países, o desenvolvimento não é tão homo­gêneo: pelo menos três subculturas surgem, a da aristocracia, a da classe comercial e a dos trabalhadores. Ao lado desses paí­ses que iniciaram cedo o seu desenvolvimento e vêm lentamente aprendendo essa nova sociedade de classe média, temos hoje os países subdesenvolvidos e os novos que se estão rapidamente in­dustrializando. Se o Estado não se transforma no empresário universal, há que recrutar os empreendedores entre os comer­ciantes . . . E a transição não é fácil: o comerciante trabalha com a mentalidade do lucro a curto prazo e custa a mudar para a mentalidade de industrial, de criador de riqueza, de lucro a longo prazo. Surge então o espírito de exploração, tanto mais grave quanto, não havendo também competição industrial, de­saparece qualquer freio ao lucro. Falta de espírito industrial, falta de competição, auxílio do Estado — retiram a essas socie­dades muito dos característicos da sociedade individualista de classe média. Dividida entre o mercado e o Estado, entre o con­sumidor e o burocrata, a "corrupção" e a "dissipação" passam a medrar e com elas o sentimento de "exploração". A luta pelo desenvolvimento faz-se difícil, penosa e tensa. O êxito somente poderá ser obtido se a industrialização fôr tão rápida que con­siga disciplinar os elementos em jogo e restaurar na sociedade aquele mínimo de saúde indispensável ao domínio do espírito do mercado e das forças autocorretivas da competição.

A carreira da classe média desde o seu surgimento como mercadores, depois produtores e empreendedores, até à era dos administradores profissionais das sociedades altamente organi­zadas — representa uma longa carreira, com extrema variedade de tipos de ação e de empresa. Mas algo de comum sempre fi­cou: a busca do lucro, a confianga na iniciativa privada, o es­pírito de gradualidades nas mudanças. .. Eficiência gerencial, atitudes do trabalhador, relações entre operário e patrão variam, entretanto, de forma acentuada. A dinâmica desse tipo de so­ciedade está longe de encerrar-se e não é pequena a sua luta contra o terceiro estilo, que passamos a examinar.

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3. Os intelectuais revolucionários e o Estado centralizado

Uma nova classe de intelectuais, e seus seguidores ou ati­vistas, assume, neste caso, o controle do processo da industria­lização e da sociedade como um todo, substituindo a velha elite e a velha cultura por uma nova classe e uma nova cultura.

Ao se atribuírem o poder de liderança, buscam justificá-la pela aceitação e adoção de uma teoria da história, que lhes en­sina o lugar, o tempo e os meios de agir e os transforma em ins­trumentos do próprio inevitável processo histórico, do próprio processo de criar e fazer o futuro.

Ao contrário da classe média, essa nova classe funda-se numa rígida ideologia, segundo a qual a nova sociedade é inevitável. . . Esta nova sociedade seria a sociedade totalmente identificada com a nova tecnologia e com as relações econômicas e sociais mais compatíveis com o seu máximo desenvolvimento. Daí a elaboração de verdadeira ortodoxia, com os seus "sumos-sacer-dotes" para interpretar e aplicar a ideologia e a "linha" para segui-los. Os novos membros são escolhidos na base de capa­cidade e confiança política,

com o desenvolvimento dessa sociedade, entretanto, os in­telectuais revolucionários cedem crescentemente o lugar de líde­res do sistema a administradores políticos de alto nível e a buro­cratas. Um novo grupo passa a controlar a nova sociedade mas de maneira diferente dos antigos revolucionários. São até, de certo modo, opostos esses novos burocratas aos antigos apóstolos. Em vez da mudança constante são antes conservadores e em vez do debate político básico, discutem interpretações e reinterpreta-ções da doutrina. De qualquer modo, porém, o intelectual revo­lucionário é substituído pela ideologia, pelo partido, pelo Estado: os revolucionários se vão, fica o Estado centralizado.

Se a primeira elite tem sua origem no proprietário de terras, a segunda no comércio, esta terceira nasce com o "manifesto" político. O partido é o centro dessa sociedade. Os conflitos se resolvem na base da correção ortodoxa. O sistema repousa na coesão ideológica dos líderes; na manipulação dos interesses eco­nômicos das massas; e no uso de força quando necessário. Pen­samento coletivo e força coletiva marcam o desenvolvimento so­cial, que é considerado um processo histórico, fundado na nova tecnologia. não há assim objetivos sociais determinados, mas a marcha para a conquista absoluta dessa tecnologia — educação, organização do trabalho, arte, literatura, tudo é posto a serviço do sistema de produção. A sociedade é unitária, monolítica, sem

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distinção alguma entre as instituições econômicas, políticas e re­ligiosas. O poder de estabelecer as regras fica com a hierarquia: o operário depende do gerente e este do Estado. O mais alto atributo do trabalhador é o senso do dever. É um "cidadão" com muitos deveres e poucos direitos. A sociedade é considerada per­feita, na medida em que se submete à lógica da industrialização, e conquista assim o máximo poder de sobrevivência.

toda a ênfase é posta no progresso econômico. A história é considerada um processo consciente e, dentro de certos limites, sujeito a controle central. A teoria é a de que a história marcha por avanços e saltos. Há constelações estratégicas de interesses de classe e estratégicos momentos de tempo a ser manipulados. A capacidade de mobilização industrial constitui, talvez, o seu maior poder de sobrevivência e o grande impacto histórico desse tipo de sociedade.

A falha do sistema talvez esteja entre as exigências da ideo­logia e as aspirações das massas em seus ambientes históricos e geográficos. A versão ortodoxa (União Soviética e China) dá lugar a versões mais moderadas, com maiores concessões às mas­sas (Polônia, Iugoslávia), à luz dessas circunstâncias históricas e geográficas. Os fiéis, entretanto, receiam essa marcha para a heterodoxia.

4. O administrador colonial e a metrópole

não precisamos deter-nos muito neste tipo de industriali­zação, porque já não se aplica ao nosso caso. No interesse, con­tudo, da clareza, convém dizer que os autores do livro dão larga atenção ao caso da introdução do processo de industrialização por uma elite estrangeira, apresentando três tipos de colonia­lismo: o colonialismo temporário e de um segmento apenas da sociedade nativa; o colonialismo de colonos que se estabelecem permanentemente no território e criam uma sociedade dual, de colonos e nativos; e o "colonialismo total" quando os agentes coloniais visam transformar totalmente a sociedade à sua ima­gem (Havaí, Moçambique, Hungria).

Pela própria classificação, pode-se ver que cada tipo de colo­nialismo tem sua lógica histórica. O colonialismo "segmentai" traz consigo a semente de sua destruição. É o criador e a ví­tima do progresso. O segundo é mais tenaz — mas não sabemos ainda se pode sobreviver. O terceiro — o colonialismo total — se bem sucedido deixa de ser colonialismo e, neste sentido, tem maior poder de sobrevivência. não fica, porém, apenas nisto.

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Conforme a Metrópole esteja dominada pela elite dinástica, ou de classe média, ou dos intelectuais revolucionários, o colonia­lismo assume aspectos diversos. Por isto mesmo, é o de mais difícil caracterização como tipo ideal.

5. O líder nacionalista e o Estado como guia

O quinto tipo de condução do processo de industrialização é o do líder nacionalista. não se pode dizer que haja no caso um sistema de idéias. O movimento nacionalista pode servir para a conquista do poder, mas não encerra propriamente uma teoria de ação. Predispõe, entretanto, a certas direções: a re­volta contra a velha ordem, a luta pela independência, a consa­gração de heróis nacionais. A falta de um programa coerente de ação lança a sociedade nos braços de personalidades carismá­ticas e o povo, numa atitude de expectativa de milagres. Os objetivos são extravagantes, episódicos e espetaculares. Trata-se de "tomar de assalto as fortalezas da história", como já disse alguém.

Por isto mesmo, a tendência do nacionalismo é de confiar ao Estado a direção do seu esforço. Daí a sua inclinação à eco­nomia planejada, ao investimento pelo Estado, ao controle esta­tal das organizações trabalhistas, à previdência estatal, à dire­ção estatal da indústria e a dramáticos apelos do Estado para a austeridade e o trabalho árduo. toda essa orientação passará a assumir suas verdadeiras cores, num sentido ou noutro, para a direita ou para a esquerda, conforme sejam os líderes que ve­nham a assumir a direção. Daí serem os países nacionalistas um dos palcos da competição da guerra fria. Tais líderes po­derão ser os da elite dinástica (Iran), os da democracia liberal ou dos intelectuais quase-socialistas (índia), ou os da hierarquia militar (Egito), e conforme as respectivas doutrinas, favorece­rão a iniciativa privada ou a iniciativa do Estado, a liberdade individual e o livre debate ou a força, a disciplina, o dever e o Governo pessoal.

Sua economia tenderá também a ser uma economia mista, entre a da iniciativa privada preferida pela classe média e o con­trole estatal dos intelectuais revolucionários.

O maior perigo desse estilo de industrialização está na con­servação ou excesso dos seus aspectos negativos, os ódios e medos que derem origem ao movimento de independência. Quanto mais depressa se vencer essa fase, mais afortunadas serão as possibi­lidades de se não perderem o ímpeto e o dinamismo do movi-

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mento e de se conquistar aquela unidade nacional indispensável a um progresso firme e contínuo. De qualquer modo, o estilo nacionalista implica líderes carismáticos, massas em expectativas de milênios, e no Estado como instrumento do desenvolvimento econômico.

Demos, assim, em breves traços, uma idéia dos cinco estilos pelos quais se pode processar o movimento de industrialização em nossa época. Resta uma nota, para não me afastar do livro que estou procurando resumir, sobre as duas grandes forças os­cilantes, de que dependem, de certo modo, o êxito de cada um desses estilos: os intelectuais e os generais, representando as idéias e o poder material. Essas forças inclinam-se já num sen­tido, já em outro, e constituem, sem dúvida, fatores cruciais nos momentos críticos da grande transição. Quem tiver a força, comandará o movimento. De todos os estilos só o democrático-liberal pode-se dar ao luxo de ignorar os generais. De modo geral, as duas forças — os intelectuais e os militares — coman­dam o processo de industrialização, sempre que a marcha fôr incerta e crítica. Só com certa normalidade é que forças mais estáveis poderão tomar a direção. Isto posto, e considerando que não levamos em conta o regime de colonização, temos que há quatro métodos paralelos: de conduzir o processo de industria­lização: o da elite dinástica, o da classe média, o dos revolucio­nários intelectuais e o dos líderes nacionalistas. As perguntas cujas respostas caracterizam tais métodos são as seguintes: 1) Quem conduz a marcha? 2) Qual o propósito da marcha? 3) como se organiza a marcha?

Quem conduz a marcha?

a) a elite dinástica responde:

os que nasceram para mandar e que se identificam pela família e pela classe; o Governo é pessoal, fundado na tradição e sustentado pela força, se necessário.

b) a classe média responde: os que por competitiva educação e competitiva expe­riência melhor merecem a responsabilidade da lideran­ça; essa liderança funda-se no consentimento e se pro­cessa segundo certas regras gerais aprovadas do jogo.

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c) os revolucionários intelectuais respondem: os que possuírem uma teoria superior da história e uma estratégia superior para organizar a sociedade de acor­do com as exigências da tecnologia industrial; sua lide­rança apóia-se na força.

d) os líderes nacionalistas respondem: os que pela sua "visão" e "coragem" encarnam o fu­turo da nação; o seu poder se funda no senso de patrio­tismo que logram despertar nos cidadãos da nação.

Qual o propósito da marcha? E como é a marcha organizada?

a) a elite dinástica responde: preservar a ordem tradicional e a comunidade pater­nalista, ao mesmo tempo que manter o controle do novo método de produção. Para isto, precisa-se de um esta-do-forte, a fim de manter a ordem e a estabilidade interna; de deixar nas mãos dos patrões um poder subs­tancial para regular as condições de trabalho e manter os trabalhadores na dependência da sua lealdade aos patrões.

b) para a classe média, o objetivo da marcha é o desen­volvimento de um método de ação que, a longo prazo, traga o máximo bem-estar aos indivíduos: o método do mercado aberto nos negócios econômicos e políticos. Este método importa dar relevo ao esforço privado, na distribuição pluralística do poder na área das relações industriais entre a gerência, as organizações trabalhistas e o Estado. Os trabalhadores, por meio de organizações independentes, podem resolver seus con­flitos com os empregadores.

c) os revolucionários intelectuais consideram o objetivo a construção de uma nova sociedade completamente com­patível com a nova tecnologia. Para isto, há que estabelecer um Estado centralizado, que detenha todo poder de fixar as regras e espere de cada trabalhador o cumprimento do dever e a aceitação, sem discutir, das decisões do Estado que, em teoria, age em seu interesse.

d) os líderes nacionalistas consideram o objetivo a inde­pendência e o progresso da nação, a ser obtido sob a direção do Estado.

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A elite dinástica oferece continuidade; a classe média, esco­lha individual; os intelectuais revolucionários, alta velocidade de industrialização; e os líderes nacionais, a integridade e o pro­gresso da nação. Desenvolve-se assim em plena diversidade o processo de industrialização. A intensidade ideológica de nossa época marca o grau de conflito e de luta. com a aceitação pro­gressiva da industrialização, é de esperar a queda do tonus ideo­lógico e o possível reencontro de todos esses diversos métodos num único industrialismo do futuro. Até esse remoto futuro, a variedade de condições culturais, histórias e econômicas fará do quadro industrial do mundo um quadro diversificado e múl­tiplo, mas, nem por isto, sem uma vigorosa lógica interna e certa unidade fundamental, que irá transformar o homem e sua socie­dade como nenhum movimento da história jamais o transformou.

À luz desse quadro aí esboçado, não por ideólogos ou teóri­cos, mas por frios e objetivos economistas — onde poríamos nosso país e seu arranco inicial em prol da industrialização?

não é verdade que logo sentimos quanto nosso esforço par­ticipa de uma liderança eclética, com aspectos de liderança aris­tocrática, de liderança da classe média e de liderança naciona­lista ? Ora, cada uma dessas lideranças tem suas exigências espe­cíficas quanto à educação e quanto ao modo de conceber o fator humano no desenvolvimento industrial. Será que o exame des­sas diversas posições poderá esclarecer-nos quanto à nossa con­fusão educacional e ao infindável debate em que nos perdemos e que já começa a ser objeto até do humorismo internacional? (Um jornalista suíço em visita ao Brasil manifestou, ao voltar à pátria, sua surpresa: o país oferece o espetáculo de cinqüenta por cento de analfabetos ao lado do mais rico debate pedagógico que jamais lavrou em alguma nação.)

O processo de industrialização afeta a sociedade em quase todos os seus elementos: muda o sistema familiar (da família chamada extensa ou colateral para a família nuclear ou conju­gai) ; mudam as estruturas de classe (de rígidas para flexíveis, de fechadas para abertas) e mudam com elas as relações entre trabalhador e empresários; mudam valores religiosos e éticos em relação ao trabalho, à economia e à satisfação de desejos mate­riais; e em relação à inovação, à mudança e à utilização da tec­nologia moderna; mudam os conceitos jurídicos e legais, a res­peito das relações de trabalhador e empresário; e muda o con­ceito de estado-nação, cujo poder sobre os grupos divididos da sociedade tradicional anterior se faz muito mais forte, conse­guindo muitas vezes certo grau de unificação política e social.

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O interesse nacional torna-se mais consciente na sociedade em vias de industrialização e certa mobilização coletiva de esforços, mais viável. Essas rápidas indicações sugerem a natureza e a diversidade das resistências que a sociedade tradicional pode vir a opor ao processo de industrialização. Se juntarmos a esses fatores, já de si mesmos diversificados e contraditórios, a con­tradição entre as próprias formas de condução do movimento de industrialização, poderemos ver quanto é difícil a situação bra­sileira, no sentido de poder atuar em relação à sua nascente industrialização com a necessária unidade e o necessário ímpeto.

Parece, com efeito, indiscutível o caráter misto de nosso processo de desenvolvimento. Temos o setor francamente aris­tocrático, pouco importando o aspecto humorístico de que alguns dos mais eminentes membros desse grupo sejam acabados e per­feitos novos-ricos do próprio movimento; temos o setor libe-ral-democrático de classe média; e temos o grupo nacionalista.

desses três grupos, só o segundo tem doutrina, a doutrina liberal-democrática. Mas como essa doutrina é aberta e não dog­mática, não se pode evitar certa confusão e obscuridade entre os líderes desse grupo, em contraste com os demais, dominados mais nitidamente por interesses e sentimentos. Entre a difícil doutrina liberal e o emocionalismo nem sempre lúcido do nacio­nalismo, o pensamento político brasileiro se refugia em expe­dientes intelectuais e conjurações de interesses. Falta à cena nitidez e definição. Por isto mesmo, o desenvolvimento brasi­leiro se vem fazendo com uma carga de contradições tão grande e resistências tão implacáveis ao seu funcionamento lógico que, se não receio a sua parada, receio a sua ruptura, devido ao jogo de progressos e regressos que vem provocando e alimentando sua grande confusão ideológica.

Vimos, na análise que reproduzimos, nas páginas anteriores, que somente as elites de classe média e as elites intelectuais mar­xistas têm certa bagagem de idéias para a condução, com uni­dade de propósitos, da transformação social em marcha no mundo. As elites dinásticas são contrárias à industrialização e apenas a admitem enquanto necessária à sobrevivência da ordem anterior; a elite colonial age no interesse da metrópole, salvo os casos do "colonialismo total", em que se confundem com as demais elites e suas respectivas doutrinas; a elite nacionalista, mais um movi­mento que uma doutrina, não tem método próprio de ação, sal-vando-a apenas o estado de consciência e de mobilização emo­cional que cria e lhe permite o programa de surpresas e esforços espetaculares, com que alimenta o famoso clima quiliástico em que arde! (Assuã, Bras í l ia . . . ) .

Ora, achando-se nosso desenvolvimento sob a influência de três grupos, o aristocrático, o de classe média e o nacionalista,

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a salvação estaria em que a ênfase viesse a caber à elite de classe média, por ser a mais aparelhada em idéias específicas relativas à nova ordem industrial.

Sucede, porém, que o debate político dos últimos cem anos, embora de modo algum encerrado, tem concorrido, entre nós, para emprestar à classe média apenas o caráter reacionário que, por vezes, assume, sempre aliás em aliança com a elite dinástica, esquecendo-se o seu passado revolucionário, de iniciadora da transformação da sociedade pela industrialização, e a possibili­dade de continuar ela seu destino inovador.

A verdade é que a classe média somente conseguiu real­mente estabelecer-se e controlar a nova sociedade em certas nações da Europa e na América do Norte, Canadá, Austrália e Nova Zelândia. Em todo o resto do mundo, prevalece a socie­dade tradicional, com as suas formas feudais ou dinásticas, ou as elites revolucionárias comunistas, ou as ainda indefinidas elites nacionalistas.

Em toda a chamada América Latina, estamos emergindo da fase feudal ou dinástica, e tentando criar as tradições da classe média mas sem o conseguirmos, sobretudo porque se per­deu o sentido revolucionário dessa classe e nos radicalizamos numa luta entre os extremos da direita ou da esquerda.

como estas duas sociedades extremadas são sociedades uni­tárias e planejadas, e como as críticas mais vivas à classe média foram sempre ao seu individualismo e ao seu laissez-faire, ambos hoje tão modificados e qualificados, tem-se procurado valer dessa contradição para considerar-se praticamente inviável a teoria da classe média: ou seja a do interesse próprio individual conjugado e disciplinado pelo pluralismo de organização e fun­cionamento.

Considerando a classe média reacionária e assumindo que o que existe no país já é classe média, embora de modo algum se tenha conseguido criar a mentalidade de classe média, o grupo autocrático consegue firmar-se e, com o auxílio do grupo mais revolucionário (que se opõe acima de tudo aos aspectos revo­lucionários da mentalidade da classe média), criar as condições vigentes no Brasil de predomínio reacionário ou, pelos menos, dominantemente autoritário.

não julgo, com efeito, que seja preciso demonstrar que nosso desenvolvimento está, de fato, muito mais sob a influência do espírito dinástico e paternalista, que herdamos do Estado Novo e agora recebe a propulsão do combustível nacionalista, do que sob o comando das doutrinas da classe média, embora estas se

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ostentem na letra da Constituição, que nem sequer logramos com­plementar.

não seria preciso contradição maior para marcar a situa­ção de confusão e de crise em que vivemos. A verdade é que estamos cada vez mais longe da formação do cidadão indispen­sável ao difícil funcionamento da democracia liberal. E por isto mesmo é que a análise da situação educacional é suscetível de tornar patente grande parte dessas contradições que, a meu ver, podem quebrar a coesão e a contextura de nossa sociedade.

como seria muito longo analisar, em face de cada tipo de elite, além das suas respectivas estratégias — que procuramos esboçar nas páginas anteriores — as respectivas atitudes em face dos conflitos culturais provocados pela industrialização, as respectivas políticas em face do chefe de empresa, do adminis­trador e do gerente, do trabalhador, do seu protesto, de sua organização, do seu recrutamento e do seu treino, vamos limi­tar-nos a traduzir o quadro em que Kerr e os seus colegas defi­nem, esquemàticamente, as diferentes posições das elites em questão. A seguir voltaremos à situação brasileira, com respeito à educação, a fim de fazermos mais uma vez a advertência de que a confusão e obscuridade políticas da vida brasileira é que não permitem que esse eterno problema seja equacionado e resol­vido.

não é difícil, percorrendo os quadros seguintes, indicar a posição do país em cada um dos pontos examinados e definidos. Mas somente iremos sublinhar os aspectos educacionais.

como é natural, cada elite estabelece a educação que melhor se ajuste à sua estratégia para a industrialização. A elite dinás-tica, visando, acima de tudo, preservar a tradição, oferece edu­cação, apenas, aos poucos e, especialmente, a grupos seletos e destinados a constituir a elite governante. A ênfase é em edu­cação humanística e na formação jurídica, com restritas faci­lidades para a educação científica. Os valores tradicionais e a religião são postos em relevo em todos os graus e níveis do ensino. não têm as universidades participação no processo de industrialização. Há pouco interesse no treino dos trabalha­dores, além da educação elementar e do aprendizado direto nas fábricas.

Há alguma dificuldade em nos encontrarmos nesse retrato? não se destina até hoje aos "poucos" a nossa educação? não há uma constante pressão para que continui humanística e não científica? Têm as universidades algo a ver com o processo de

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industrialização? com relação aos trabalhadores, deve-se reco­nhecer que fizemos o SENAI, o Serviço Nacional de Aprendiza­gem Industrial. Mas, a despeito da alta qualidade desse ser­viço, não é difícil mostrar quanto êle, por um lado, reflete e, por outro, resiste à realidade do paternalismo efetivamente rei­nante em nossa sociedade. A verdade é que, de modo geral, nosso sistema educacional reproduz estruturalmente a educação dominante nas sociedades conduzidas aristocraticamente. Se voltarmos as nossas vistas para a posição das elites naciona­listas, veremos que também com ela temos as nossas indisfar-çáveis afinidades, sobretudo no dilema entre educação comum e universal e educação de nível superior. Vivemos também dra­maticamente esse dilema e quando o tentamos resolver é para expandir exatamente aquele ensino superior destinado à for­mação de elites de lazer e desprovido de claro propósito técnico ou de reais objetivos de produtividade.

Seremos assim aristocráticos e nacionalistas. Será que tam­bém somos ou começamos a ser uma sociedade de classe média?

O característico do comportamento educacional da classe média é a sua crença na educação como instrumento fundamen­tal de justiça social e de mobilidade vertical, com o enfraqueci­mento das fronteiras e divisões de classe. Das cinco elites, são a da classe média e a dos intelectuais revolucionários que efe­tivamente acreditam em educação. Ambas distribuem a educa­ção a todos. Ambas consideram a educação essencial ao de­senvolvimento econômico. Ambas ligam o processo educacional, as escolas e as universidades ao desenvolvimento industrial. Ambas fazem da educação o método de ascensão social. Já fizemos acaso algo disto? Nada, por certo. Apenas falamos e cansamos de falar em tudo isto. É verdade que há uns vagos sinais de que algo vai acontecendo. Aquele antigo dualismo de educação aristocrática e educação técnico-profissional vem se esbatendo, não porém sem recrudescências ocasionais. A equi­valência, entre as diversas linhas, antes segregadas, do ensino médio, é indicação de certo processo de integração da sociedade brasileira. Mas não nos iludamos. O característico fundamen­tal da educação aristocrática, ou seja, o caráter desinteressado da educação, tão desinteressado que chega a dispensar eficiência, a famosa educação-polimento, a educação-alisar-bancos-da-univer-sidade, sem dúvida ótima para uma classe aristocrática e rica, entra mesmo agora em fase de expansão desvairada, com a pro­liferação de universidades e faculdades de filosofia, inteiramente insuscetíveis de se poder transformar em centros de educação tecnológica para a era moderna.

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não sugere tudo isto que a marcha do desenvolvimento eco­nômico brasileiro não está sendo realmente conduzida pela nas­cente classe média brasileira, mas pelos remanescentes do aris-tocratismo, ajudados pela emoção nacionalista? não se reencon­tram ambos nessa expansão desordenada da educação destinada a produzir prestígio social e não eficiência científica ou tecnoló­gica?

não se pode, com efeito, discutir educação como algo em si mesmo. Nada mais ela é do que epifenômeno de forças muito mais profundas, que controlam a sociedade.

Educação para o desenvolvimento era o título do nosso tra­balho. Quisemos, com a exposição das análises e fatos aqui sumariados, mostrar que nada se pode dizer sobre educação para o desenvolvimento, sem primeiro responder às perguntas funda­mentais aqui reproduzidas: que classe, que elite dirige o desen­volvimento? com que propósito o dirige? Em que velocidade o quer fazer marchar ?

A situação de transição em que se encontra o Brasil faz com que seu desenvolvimento esteja sob a influência de forças, que não são as mais aptas para a sua integração na civilização tecnológica e industrial de amanhã. A própria nascente classe média, cuja doutrina do indivíduo, da competição individual e do pluralismo econômico, político e social poderia servir de lastro ideológico ao movimento, não tem conseguido exercer influência que se possa considerar importante. Mais fortes, no comando do Brasil, são as forças autoritárias ou as forças desaparelhadas de doutrina do nacionalismo. Antes que se estabeleça um am­biente de maior nitidez e claridade política e melhor definição da doutrina democrático-liberal, pouco poderá fazer pela edu­cação nacional. Continuarão os grandes desenvolvimentos de hoje, ou sejam, a expansão de ensino superior destinado a dar prestígio à nação, pelo número de escolas e universidades, e aos alunos, pelos diplomas com que os venham agraciar; a ex­pansão do ensino privado, a fim de permitir a educação dos filhos das classes favorecidas sem competição de matrícula; e as falsas campanhas de alfabetização para "dopar" a consciência nacional cada vez mais incômodamente desperta para a sua tra­gédia educacional.

Quando outras forças, menos arcaicas, ou sejam as da classe média democrática, com fundamento em textos expressos de nossas constituições, poderem vir a exercer a necessária in­fluência, os nossos objetivos educacionais serão facilmente equa­cionados, à luz da doutrina democrático-liberal, que só tem se­gredos e obscuridades para os que, na realidade, não a aceitam.

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A minha conclusão funda-se, pois, em uma preliminar. Enquanto o país não se decidir sobre as suas próprias institui­ções democráticas e, para ser específico, sobre o cumprimento de suas constituições, tanto a federal quanto as estaduais, vota­das em 46 e 47 e até hoje à espera de execução, pouco podemos fazer, nós educadores, para ajustar as arcaicas estruturas edu­cacionais vigentes às novas estruturas econômicas, que o pro­cesso de industrialização, de qualquer modo, está construindo para o Brasil materialmente desenvolvido de amanhã.

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AÇÃO DO INEP E CENTROS DE PESQUISAS NO QÜINQÜÊNIO 1956-60

No cumprimento do programa que se impôs diante da reali­dade educacional brasileira, a atuação do INEP nesse período fêz-se notar, sobretudo, pela organização dos Centros de Pesqui­sas Educacionais, pela assistência técnica e pela assídua par­ticipação no exame, estudo e debate dos problemas brasileiros de educação. Essa atuação estendeu-se a todos os setores da vida escolar, desde a assistência financeira e técnica concedida às Secretarias de Educação, instituições educativas e culturais, para construção de prédios, equipamento, instalação de classes complementares, oficinas de artes industriais, distribuição de li­vros e material didático até a reestruturação dos sistemas de ensino elementar e normal e a assistência pedagógica ao professor.

Apresentamos a súmula dessas realizações:

CAMPANHA DE CONSTRUÇÕES E EQUIPAMENTO ESCOLARES

Competindo o ensino primário à alçada dos Estados, o auxílio federal para construção escolar é de caráter supletivo, sendo concedido mediante convênios firmados entre os Estados e o Ministério da Educação e Cultura, por intermédio do INEP.

A Campanha deu a seguinte aplicação aos recursos que lhe foram destinados:

I. ESCOLAS PRIMARIAS

a. Movimento de verbas

Saldo para obras, oriundo de acordos anteriores Cr$ 62.329.351,00

Novos auxílios 807.782.672,00 Importância remetida para execução

das obras 515.227.977,00 Saldo vinculado às obras restantes . . . 292.554.695,00

b. Andamento das obras

Escolas concluídas .. . 1.234 com 3.018 salas de aula Em construção 293 " 734 " A construir 355 " 791 " TOTAL 1.882 " 4.543 "

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c. Mobiliário

Do montante do auxílio atribuído a cada Estado, o INEP destaca 10% para equipamento, remetidos à medida que as obras vão sendo concluídas. No qüinqüênio foram fornecidos conjuntos de mobiliário para 2.031 salas de aula ao custo total de Cr$ 49.675.273,00 e firmados acordos para aquisição de mo­biliário para 1.093 salas de aula ao custo total de Cr$ 25.085.594,00, o que representa, em números globais, mobi­liário para 3.124 salas de aula ao custo total de Cr$ 74.760.867,00.

II. ESCOLAS NORMAIS

Os recursos para as escolas normais são consignados no Orçamento da União de acordo com a Lei 59/47, que estabelece a concessão de auxílios aos governos estaduais, municipais e a entidades particulares. Foram ao todo 58 as unidades incluídas nesse programa de auxílios.

com a supervisão do INEP foram elaborados projetos para os Centros Educacionais de Maceió, Fortaleza, Aracaju, Caicó e Mossoró; Institutos de Educação de João Pessoa, Recife, Belo Horizonte e o Instituto Superior de Educação Rural de Betim (MG) e para as Escolas Normais de Colatina (ES) ; Afo­gados de Ingàzeira, Floresta e Salgueiro (PE) ; Itabaiana (SE) ; Leme (SP) ; Bela Vista e Ponta Porã (MT) ; S. Borja (RS) ; Lajes (SC) ; Floriano e Paulo Afonso (GO) ; Caetité e Feira de Santana (BA) e Boa Vista, Porto Velho e Rio Branco nos territórios respectivos.

Sendo geralmente pequenas as dotações anuais destinadas a essas obras e seus projetos de proporções maiores, compostos quase sempre de vários blocos, as construções vão sendo feitas paulatinamente, mediante auxílios parcelados. A maioria delas entretanto estão em pleno funcionamento.

Movimento de verbas

Saldo para obras oriundo de acordos anteriores

Novos auxílios Importância remetida para execução

das obras Saldo a remeter

Cr$ 24.083.337,00 272.889.209,00

244.356.868,00 52.615.678,00

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Esta aplicação obedeceu a planos anuais com aprovação do Ministro da Educação e Cultura e do Presidente da República. neles, o ensino particular foi beneficiado, conforme a Lei 49/47, com dotações oriundas do Orçamento da União. No qüinqüênio foram-lhe destinados auxílios para construção ou prossegui­mento de obras num total de Cr$ 46.450.000,00; sendo distri­buídos Cr$ 16.350.000,00 para 20 escolas primárias com 64 salas e Cr$ 30.100.000,00 para 7 escolas normais e 1 centro de estu­dos pedagógicos.

COORDENAÇÃO DOS CURSOS

O programa de aperfeiçoamento do magistério, observado pelo INEP no qüinqüênio 1956-60, procurou beneficiar profis­sionais cuja atuação favorecia o desenvolvimento do ensino pri­mário, de modo eficaz, em virtude das posições que ocupavam. Assim, os cursos do plano destinaram-se a: I. Administradores de sistemas escolares, especialistas em educação primária; II. Supervisores, diretores e professores de escolas normais; III. Diretores e professores de escolas de demonstração e experimen­tais; IV. Supervisores, diretores de oficinas e professores de artes industriais; V. professores especializados, e VI. professores

primários de classe em geral. Ainda, em função do plano, se promoveu o aperfeiçoamento

do pessoal encarregado de cursos, estudos e publicações de assis­tência técnica e professores, bem como demonstração de ensino em vários Centros Regionais. Procurou-se atender às solicita­ções dos Estados quanto à assistência técnica às medidas plane­jadas ou em execução no ensino primário e normal.

Foram promovidos os seguintes cursos:

1. Especialistas em educação para a América Latina. Reali­zado anualmente, a partir de 1958, no Centro Regional de S. Paulo, em colaboração com a Unesco, com a partici­pação de 86 bolsistas; sendo 45 brasileiros e 41 latino-americanos ;

2. Aperfeiçoamento de Supervisores de Educação Rural e Orientadores-Adjunto. No Centro Regional de Minas Gerais. 38 bolsistas;

3. Supervisores do ensino primário. Nos Estados da Paraíba e R. G. do Sul. 37 participantes.

4. Diretores de escolas de demonstração. Bahia, para 4 par­ticipantes.

5. Inspetores do ensino primário. Nos Estados do Espírito Santo e S. Paulo. 115 participantes.

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6. Administradores escolares e Orientadores de ensino. Nos Estados do Rio G. do Norte e S. Paulo. 185 participantes.

7. Diretores de escolas primárias. Nos Estados da Paraíba e Piuaí. 62 participantes.

8. Aperfeiçoamento de professores primários. Nos Estados de Alagoas, Bahia, Ceará, Espírito Santo, Maranhão, Pernambuco, Piauí, Rio G. do Norte, Sergipe e Terr. de Rondônia. 3.509 participantes.

9. Aperfeiçoamento em cadeiras do currículo primário (Lin­guagem, Matemática, Ciências Naturais e Estudos Sociais). Nos Estados da Guanabara e Rio G. do Sul. 79 partici­pantes.

10. professores de escolas normais e orientadores de ensino. No Estado de Minas Gerais, em colaboração com o Pro­grama de Assistência Brasileiro-Americana ao Ensino Elementar (PABAEE), e no Paraná. 250 participantes.

ESTÁGIOS :

1. Formação de diretores e professores para escolas de demons­tração e experimentais. Nos Estados da Bahia, Guanabara e Rio G. do Sul. 123 participantes.

2. Prática de ensino, Recreação e Jogos. Nos Estados do Rio G. do Sul e Guanabara. 39 participantes.

3. Diretores, Supervisores e professores em artes industriais. Nos Estados da Bahia, Guanabara e S. Paulo. 655 parti­cipantes.

SEMINÁRIOS :

1. Delegados de ensino. S. Paulo. 35 participantes. 2. Diretores de escola primária. Ceará. 50 participantes. 3. Cadeiras do currículo normal. (Música, Psicologia, Socio­

logia e Recreação.) Nos Estados da Guanabara e Rio G. do Sul. 48 participantes.

O INEP promoveu ainda cursos e estágios para professores especializados, assim discriminados:

CURSOS:

1. Educadores de Cegos. Guanabara. 36 participantes. 2. Recreação e Jogos. Nos Estados da Bahia e Guanabara.

52 participantes. 3. Arte Infantil. Guanabara. 24 participantes.

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4. Psicologia. Minas Gerais. 16 participantes. 5. Recursos audiovisuais na educação. São Paulo, Santos.

120 participantes.

ESTÁGIOS :

1. Jardim de Infância. Estados da Bahia e Guanabara. 78 participantes.

2. professores de excepcionais. Guanabara — Sociedade Pes­talozzi. 44 participantes.

3. Meios de Comunicação, para professores latino-americanos, organizado pelo Institute of Inter-American Affairs — Ponto IV — em colaboração com o Centro Regional de Minas Gerais. 7 participantes.

Também em colaboração com esse Instituto, tendo em vista o aperfeiçoamento de pessoal para colaborar nos Centros de Pesquisas, 102 bolsistas participaram de cursos na Universidade de Indiana (58) e na de Southern, Califórnia (44), distribuídos em dois grupos: ensino primário e secundário.

Em síntese, durante o qüinqüênio, o INEP ofereceu oportu­nidades de aperfeiçoamento a 5.794 participantes de cursos, seminários e estágios para professores, diretores, administra­dores e delegados de ensino.

SETOR DE EDUCAÇÃO COMPLEMENTAR

O Plano de Educação Complementar, em execução a partir de 1957, foi elaborado tomando em consideração as exigências da atual estrutura social, quais sejam a de uma escolaridade mais intensa e a necessidade de harmonizar a formação geral com a preparação para o trabalho. A primeira se exprime pelo prolongamento da escolaridade obrigatória com a gradativa in­corporação do curso secundário: a educação complementar acres­centa à primária dois anos equivalentes às duas primeiras séries dos cursos médios. A segunda com o programa de iniciação ao trabalho em diversas atividades industriais.

Para atender a essa programação, o esquema do INEP compreende a seguinte estrutura:

a) Cursos de artes industriais para formação de professores ;

b) Construção de Escolas-Parque e Centros de Educação Complementar;

c) Instalação da 5.a e 6.a séries na escola primária.

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com referência ao item a, vêm-se realizando anualmente no Rio de Janeiro, Salvador e em S. Paulo estágios de preparação que se estendem em média por 10 meses. Participaram desses cursos até agora 669 professores, representando quase todos os Estados. Os estágios abrangem as seguintes técnicas: Desenho, Costura, Madeira, Cestaria, Couro, Artes Gráficas, Metal, Tece­lagem, Tapeçaria, Mosaico e Modelagem. As despesas decor­rentes dos cursos elevaram-se a C r | 52.274.352,20.

No que se refere ao item b, a Escola-Parque da Bahia, experiência de educação integral iniciada na administração do Prof. Anísio Teixeira, quando Secretário da Educação, foi toma­da como ponto de partida para as realizações programadas. Consta a Escola de vários prédios situados na mesma área e que se destinam a atividades educativas, como sejam: artes in­dustriais, educação física, educação artística, teatro, biblioteca. O conjunto atende a 2.C00 crianças. com organização similar encontra-se em fase de construção a de Belo Horizonte, devendo iniciar-se brevemente a de Campina Grande, próspero centro regional no interior da Paraíba. Estão programadas as de S. Paulo, Recife, Porto Alegre e Guanabara. Concomitantemente foram construídos 15 Centros de Demonstração, estando 1 em fase de construção e 12 programados, bem como 31 Pavilhões de Artes Industriais já concluídos e 49 em construção, distribuídos pelas capitais e centros regionais de maior expressão econômica e social. Nos centros e pavilhões são instaladas oficinas para aprendizagem das técnicas acima referidas, realizando-se na­queles estágios para o professorado local. As despesas com equipamento para essas oficinas, incluindo máquinas, ferramen­ta manual, fornos elétricos, teares, mobiliário elevaram-se a Cr? 74.867.082,40.

O item c — extensão da escolaridade — constitui etapa que haverá de processar-se com o atendimento satisfatório de exi­gências técnico-pedagógicas e administrativas como a formação de professores, equipamento, organização de classes, reestrutu­ração legislativa do ensino primário no plano federal (Lei de Diretrizes e Bases) e nos Estados. Tendo em vista a educação integral, foi programado o regime do dia escolar em dois turnos, um para as aulas de letras e outro para as demais atividades do currículo: oficinas de trabalho, biblioteca etc. Nos centros de educação complementar esse regime vem sendo cumprido. Ainda no propósito de ampliar a escolaridade, planejou o INEP a regularização das matrículas partindo de sua generalização às crianças de 7 a 8 anos, que ascenderiam do 1.° ao 6.° ano, de acordo com seu desenvolvimento real, decorrente sobretudo de sua idade cronológica. A organização das classes, nesse plano, obedece portanto a um critério misto: a idade cronológica do

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aluno e seu grau de maturidade, nas classes de alunos novos e analfabetos, e a idade cronológica e o rendimento escolar, quando o aluno possuir alguma escolaridade. Em dois Estados — o Rio G. do Sul e o Rio G. do Norte — que promoveram, a partir de 1958, a reforma do ensino primário, o plano vem sendo cum­prido com a ajuda financeira do INEP, tendo sido escolhidos 33 Grupos Escolares em Porto Alegre e 53 unidades do Rio G. do Norte como campo experimental. Aquela ajuda aos dois Estados foi de 18 milhões no primeiro e Cr$ 10.759.980,00 no segundo.

Na execução desse programa o INEP vem prestando aos Estados ampla assistência, fornecendo recursos para construção e equipamento das unidades de ensino, despesas de instalação e manutenção, bem como suplementação de salários de professores que

trabalham em tempo integral.

CENTRO BRASILEIRO DE PESQUISAS EDUCACIONAIS

Instituído juntamente com os Centros Regionais do Recife, Bahia, Minas Gerais, S. Paulo e Rio G. do Sul, em virtude do Decreto n.° 38.460, de 28 de dezembro de 1955, com a finalidade precípua de ampliar o quadro de estudos e pesquisas educacio­nais atribuídas ao INEP desde sua fundação em 1938, procurou a direção do Centro nesse primeiro qüinqüênio de suas ativida­des realizar o planejamento de atividades de pesquisa, adminis­tração e organização escolar.

Na fase inicial, com sede à Rua México, n.° 3 — 18.° andar, reuniu os trabalhos e equipes que compunham a Campanha de Inquéritos e Levantamentos do Ensino Médio e Elementar (CILEME) e a Campanha do Livro Didático e Manuais de Ensino (CALDEME), em funcionamento a partir de 1952. Fo­ram os projetos sobre os aspectos gerais de educação elementar e média, os sistemas estaduais de educação, o ensino das disci­plinas nas escolas primárias e secundárias suas primeiras rea­lizações.

Instalado em edifício próprio à rua Voluntários da Pátria, 107, nos primeiros meses de 1957 estruturou suas atividades nas Divisões de Documentação e Informação Pedagógica, Estudos e Pesquisas Educacionais, Estudos e Pesquisas Sociais e Aperfei­çoamento do Magistério, abaixo discriminadas.

Prevista no Plano de Organização dos Centros, vem-se reu­nindo anualmente a Comissão Consultiva que funciona como órgão de articulação entre o C . B . P . E . e os Centros Regionais para troca de idéias, fixar diretrizes de trabalho, retificação de planos, apreciação de projetos, aprovação de ]recomendações.

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Uma delas referiu-se à distribuição de um Boletim Informativo, preparado mensalmente pelo Centro com variada resenha sobre a vida educacional.

Recebeu o Centro nesse período a visita e a colaboração de educadores estrangeiros que realizaram conferências em nosso auditório ou participaram de nossos programas de estudos. Re-ferindo-nos aos professores Havighurst, Sólon Kinball, George Counts, Andrew Pearse, Harold Benjamin e John Brubacher, dos Estados Unidos; Mme. Brulé e Clément Ferraud, da França, especialistas da UNESCO, e o Prof. Luís Reissig, da Argentina, entre outros.

Essas conferências foram objeto de publicação na Revista Brasileira de Estudos Pedagógicos ou de edições especiais.

Realizaram-se em sua sede Exposições de Livros Didáticos e Guias de Ensino, de Artes Industriais, de trabalhos para jardins de infância dos cursos de aperfeiçoamento e a Exposição Come­morativa do Dia das Nações Unidas.

Atendendo às necessidades de nossas tarefas, foram dados cursos de inglês e alemão para os funcionários da Casa.

Foram promovidos em nosso auditório seminários, palestras para grupos de professores e estudiosos, com a participação, em duas oportunidades, de representantes das Embaixadas Sueca e Finlandesa.

DIVISÃO DE APERFEIÇOAMENTO DO MAGISTÉRIO

Atendendo a sua finalidade de prestar assistência ao ma­gistério primário e normal, a Divisão programou, tomando como ponto de partida a Escola Experimental do INEP, atividades de orientação da vida escolar, cursos, estágios e seminários para professores, estudos sobre o ensino primário e uma série de publicações de assistência ao magistério.

Escola Primária Experimental ão Rio

Pelo acordo assinado em 1955, a Escola Guatemala, da então Prefeitura do Distrito Federal, ficou sob a orientação do INEP, tornando-se campo de experiência para realizações no âmbito da educação primária. A Divisão mantém contato per­manente com a Escola, prestando-lhe assistência administrativa e pedagógica e participando de reuniões semanais com os professores.

A Escola recebeu, no período, 1.200 visitantes.

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Cursos, estágios e seminários

Realizados na Escola Experimental, destinaram-se principal­mente à preparação de professores para Escolas de Demonstra­ção que, nos Estados, possam servir de campo de observação às escolas normais e a professores em estágios de aperfeiçoamento promovidos pelo Estado ou pelos Centros Regionais. Foram ao todo 240 os participantes.

Estudo sobre o ensino primário

Foram programados os seguintes: 1. Bases para formação e aperfeiçoamento do professorado primário; 2. Métodos e re­cursos do ensino primário; 3. Sistema de promoção; 4. Forma­ção de atitudes na escola primária; 5. Programas de ensino elementar, e 6. Medida de rendimento escolar.

Acham-se concluídos os três primeiros, os demais prosse­guem.

Tomando por base a experiência da própria Escola, de promoção flexível, elaboraram-se programas de Linguagem e de Matemática, além de sugestões para a direção de atividades rela­cionadas com o estudo dirigido, em fase experimental. Reali­zam-se ainda dois estudos sobre o professorado primário do Estado da Guanabara.

Publicações

Foi editado e distribuído em 1960 o volume Leitura na Escola Primária, de Juraci Silveira. Acha-se no prelo o 1.° vo­lume da série "Ensinando Matemática a Crianças". Em fase de elaboração encontram-se os Estudos Sociais na Escola Pri­mária e Ciências na Escola Elementar, guias de ensino que ofe­recem relatos de atividades educativas da referida Escola.

Em 1959, por ato do Governo local, a Escola foi transfor­mada em "Primeiro Centro Experimental de Educação Primária da Prefeitura do Distrito Federal, em colaboração com o INEP.

DIVISÃO DE DOCUMENTAÇÃO E INFORMAÇÃO PEDAGÓGICA

O Centro de Documentação, instituído no INEP, em 1953, integrou o Centro Brasileiro de Pesquisas Educacionais, consti­tuindo a Divisão de Documentação e Informação Pedagógica. Alargaram-se as atividades de todos os setores da Divisão, deste modo:

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1. Informação e Intercâmbio

Além de atender aos pedidos de informação sobre ensino no Brasil, procedentes de organismos internacionais e entidades do país, trabalha no levantamento de legislação da União, dos Estados, dos Territórios e Municípios.

Seleciona, também, os assuntos relativos à educação e cul­tura no Diário do Congresso Nacional e na imprensa do país, organizando fichários correspondentes a cada assunto.

Entre os itens desenvolvidos por este setor da Divisão des­tacam-se :

— Intercâmbio de correspondência entre estudantes — Relação das associações pedagógicas no Brasil — Organização do ensino no Brasil — Exercício do magistério no país por professor estran­

geiro — Relação das principais obras de literatura infantil e

respectivos autores — Organização do Ministério da Educação e Cultura —

para atender ao Seminário Interamericano do Planeja­mento Integral da Educação

— Remessa de material sobre a organização e o funciona­mento das escolas superiores no país à Legação do Brasil em Berna

— Programas de ensino nos vários níveis — Aspectos diversos da cultura brasileira — Projeto de Lei de Diretrizes e Bases da Educação — Bibliografia sobre educação em vários países — Material didático usado em escolas brasileiras — Leis orgânicas do ensino primário, normal e outras — Educação da saúde — Textos de acordos culturais entre o Brasil e outros países — Bôlsas-de-estudo para professores de arte — Relação de escolas em vários níveis — Serviços de orientação profissional mantidos por orga­

nizações brasileiras — Dados estatísticos sobre o ensino — Condições de ingresso em universidades brasileiras — Legislação sobre fundos para a educação — Aprendizagem de menores — Indicações bibliográficas diversas — Levantamentos de biografias de educadores — Férias escolares no Brasil — Aspectos da escola primária brasileira

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— Organização, funcionamento e atividades do INEP e do CBPE

— Oportunidades de educação no país existentes para a mulher

— Cursos existentes no Brasil, quanto aos seguintes as­pectos: finalidades, idade de ingresso e condições de matrícula, duração dos cursos, títulos por eles conferidos.

Procedeu-se, em 1960, a um levantamento sobre estabeleci­mentos de ensino normal, mediante questionários que fornece­ram os seguintes informes: nome do estabelecimento, endereço, entidade mantenedora, nome, grau e títulos do diretor, e data da investidura no cargo, escolas anexas ao estabelecimento, cur­sos que ministram, duração, número de alunos, relação de professores,

sua especialização e aperfeiçoamento e dos administra­dores.

Foi elaborado, também, um quadro de "Articulação do en­sino no Brasil" (Revista Brasileira de Estudos Pedagógicos, número 79, pag. 101.

Um cadastro de escolas primárias foi iniciado com a remessa dos respectivos questionários às Secretarias de Educação.

Por solicitação da UNESCO e do Bureau Internacional de Educação, foram realizados os seguintes trabalhos:

— Documentação sobre o ensino técnico-profissional no Brasil, abrangendo: bibliografia analítica; lista das re­vistas mais importantes que tratam do assunto; 28 nú­meros de revistas que incluem matéria significativa a respeito; 2 folhetos; 5 livros.

— Programas do ensino primário. — Relatório sobre o movimento de educação no Brasil, re­

lativo ao ano escolar 1957/58, destinado a constar do Annuaire International d'Education — 1958.

— Resposta ao questionário sobre as possibilidades de acesso à educação nas Zonas Rurais; temário da XXI Conferência Internacional de Instrução Pública, 1958.

— Resposta ao questionário para o Seminário Interameri­cano sobre Aperfeiçoamento do Magistério Primário (UNESCO — Centro Regional no Hemisfério Ocidental

— Havana), em 23/7/1958. — Resposta aos 3 pontos da ordem do dia da XXII Confe­

rência Internacional de Instrução Pública (UNESCO-BIE), em julho, 59.

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1. Elaboração, escolha e utilização de manuais nas esco­las primárias;

2. Medidas destinadas a facilitar a formação dos quadros técnicos e científicos;

3. Relatório sucinto do Ministério da Educação sobre o movimento da educação no país, durante o ano escolar 1958/1959.

— Preparo do volume sobre Educação no Brasil, para a série de estudos bibliográficos publicados em Education abstracts — UNESCO, nov. 1958, V. X, n. 9 (em dezem­bro, 1958).

— Resposta ao questionário enviado pelo "Institut Scien-tifique de Pédagogie de Hongrie", de Budapest, por in­termédio do "Centre d'information du Department de 1'Education" da UNESCO, referente às modificações ocorridas nos planos de estudo e programas escolares, primários e secundários, nos últimos 50 anos, tendo em vista o desenvolvimento tecnológico e a produção social, no Brasil (Em 4/8/1959).

— Resposta ao questionário para "el informe al Comitê Consultivo Intergobernamental dei proyecto principal n. 1 — UNESCO" — Ensino primário e normal no Brasil — 1959 (Ao Coordenador do Projeto Maior n. 1 da UNESCO no Hemisfério Ocidental — Havana) — em 20/12/1959.

— Resposta ao questionário enviado pela UNESCO-BIE quanto à realização da XXIII Conferência Internacio­nal de Instrução Pública, em julho de 1960, cujos pontos da ordem do dia foram:

1. Elaboração e promulgação dos problemas de ensino do segundo grau.

2. A organização do ensino especial para débeis mentais. 3. Relatório sucinto sobre o movimento educacional do

país durante o ano escolar 1959/1960. (Em 26/2/60).

— Resposta à solicitação sobre "O ensino geral e técnico de 2.° grau, no Brasil" para a UNESCO (preparo do 3.° volume da publicação l'éducation dans le monde, dedi­cado ao ensino de 2.° grau). (Em 23/3/1960)

— Resposta ao "Institut pour la jeunesse" — Munich, Alemanha, de questionário sobre "o papel da escola na prevenção da inadaptação social dos jovens e da delin­qüência juvenil" — por intermédio da UNESCO. (Em 28/4/1960).

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— Resposta ao questionário da UNESCO sobre o acesso da mulher à profissão de educador, para a 15.a sessão da "Comissão sobre a condição da mulher" (maio de 1960).

— Resposta ao questionário sobre a organização da educa­ção pré-escolar — BIE-UNESCO (maio de 1960). Resposta ao questionário sobre utilização de recursos audiovisuais no Brasil para o "Stage d'etudes Regional sur 1'emploi des moyens visuais dans 1'éducation des adultes et l'éducation scolaire en Amérique Latine". (Em outubro de 1959).

Um arquivo fotográfico, sobre os diversos aspectos da cul­tura brasileira, está sendo organizado, já contando com 4.600 negativos, com 1.220 cópias, formato 6x6, e 1.380 em 35 milí­metros, dos quais foram obtidas ampliações de cerca de 1.000 fotografias.

Em 1958 e 1959 realizaram-se, na sede do CBPE, duas exposições muito freqüentadas por professores e alunos, espe­cialmente do ensino médio. Uma sobre livros didáticos e guias de ensino da França, Suíça e Inglaterra e outra referente a do­cumentos das Nações Unidas (ONU), em todos os seus setores e organismos subsidiários.

A Seção de Informação e Intercâmbio mantém vasta e con­tinuada correspondência com alunos e professores, não só do Brasil como do estrangeiro, aos quais encaminha informes sobre bibliografias especializadas, livros, currículos escolares, etc.

II. Biblioteca

A Biblioteca do CBPE, dotada de obras básicas não só de educação como de ciências sociais e brasiliana em geral, já cons­titui uma biblioteca central de educação, freqüentada por espe­cialistas e alunos de faculdades de filosofia.

A Biblioteca Murilo Braga vem sendo enriquecida não só com instalações materiais como pelas técnicas modernas de do­cumentação. O acervo inicial de cerca de 12.000 livros atingiu, em 1960, 34.000, calculando-se, ainda, em 5.000 o número de folhetos existentes.

A seção de periódicos, com 600 títulos nacionais e 400 de revistas estrangeiras, possui um índice analítico por assunto e por autor de todos os artigos sobre educação.

No setor de referência levantou bibliografia sobre o ensino da matemática, com 710 itens, toda a matéria contida em livros e revistas existentes na biblioteca. Organizou bibliografia de livros básicos de psicologia e outra referente aos aspectos mais expressivos da vida educacional brasileira.

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III. Revista Brasileira de Estudos Pedagógicos

A Revista Brasileira de Estudos Pedagógicos é publicada trimestralmente e teve seu primeiro número editado em julho de 1944. Tem por finalidade expor e discutir questões gerais de pedagogia e, de modo especial, os problemas na vida educa­cional brasileira.

Possui as seguintes seções: 1. Estudos e debates, na qual se procura refletir o pensamento do magistério nacional e trans­crever de revistas estrangeiras trabalhos que possam trazer contribuição para o esclarecimento dos problemas de ensino; 2. Documentação, onde se apresenta o que, dentro do trimestre, mereceu maior destaque, entre os documentos oficiais ou priva­dos, na área do ensino; 3. Informação do país e do estrangeiro, com noticiário detalhado do que, em matéria de educação, se noticiou nas fontes nacionais e estrangeiras; 4. Livros, Revistas e Jornais, apresentando seleção de trabalhos assinados, publica­dos por revistas especializadas ou jornais diários, recebidos pela Biblioteca do Centro, ou através do Lux-Jornal; 5. Atos da Administração Federal, seleção dos principais atos da adminis­tração federal em matéria de ensino.

A Revista vem sendo distribuída regularmente a 1930 pessoas ou instituições, sendo no país 1650 e no estrangeiro 280, nestas incluindo-se publicações internacionais, à base de per­muta.

A distribuição no país se processa entre os seguintes órgãos, fora os assinantes individuais: Bibliotecas, Secretarias de Edu­cação, Departamentos de Educação e Diretorias de Ensino, Delegacias Estaduais de Ensino, Reitorias de Universidades, Faculdades de Filosofia, Institutos de Educação e Escolas Nor­mais, Escolas Industriais, Centros de Estudos e Pesquisas, Jor­nais e Revistas, Instituições diversas.

Durante o período 1956/1960 foram editados 22 números da Revista (do n.° 59 ao n.° 80) e a 2.a edição do Catálogo, que abrange a matéria publicada em 70 números.

IV. Bibliografia Brasileira de Educação

O serviço de Bibliografia encarrega-se da seleção e classi­ficação de todo o material no país sobre educação, em original ou tradução, incluindo livros, artigos de revistas e jornais, fo­lhetos e outros documentos, do que resulta uma publicação, tri­mestral, a Bibliografia de Educação, que vem sendo editada desde 1953. Contam-se, até a presente data, 7 volumes, perfa­zendo o total de 25 números.

Retomando o levantamento bibliográfico iniciado em 1944 pela Revista Brasileira de Estudos Pedagógicos, e que cobriu o

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período de 1812 a 1944, o S.B. procede ao levantamento retros­pectivo para preencher a lacuna correspondente ao período de 1945 a 1952.

Dessa pesquisa, ainda não terminada, são retirados os dados para a confecção de bibliografias referentes a um campo específico da educação, a fim de atender a solicitações. Já foram organi­zadas bibliografias sobre os seguintes assuntos: educação artís­tica, ensino audiovisual, educação rural, educação pré-primária, educação no D. Federal, e bibliografia seletiva de educadores brasileiros que tenham publicado, no período de 1954-1957, obras de grande valor. Foi também organizada por esse Serviço uma bibliografia seletiva, permitindo retratar a evolução da educa­ção brasileira, desde 1930. esse trabalho foi realizado a pedido da UNESCO, e publicado na Revue Analytique de l'Education, vol. 10, n.° 9, nov. de 1958, sob o título "L'Education au Brésil". Por solicitação do Serviço Cultural da Embaixada da França, fêz o levantamento dos livros didáticos publicados no Brasil para o ensino do Francês.

Encontra-se em fase final de preparação o índice cumula­tivo da BB.E., volumes I a V, 1933/1937.

O Serviço de Bibliografia também se dedica ao levantamen­to das fontes para o estudo da história da educação no Brasil, por Estado da Federação. desse projeto, já foi publicado o primeiro trabalho, referente à Bahia, incluído na série IX — Levantamentos bibliográficos, vol. I, das publicações do CBPE sob o título Fontes para a Educação no Brasil — Bahia, tomo I, Fontes oficiais. O segundo tomo, ainda referente à Bahia, e compreendendo Fontes não oficiais, está sendo elaborado.

O Serviço mantém um arquivo do noticiário surgido nos jornais do país sobre educação, organizado por assunto.

O Serviço organiza ainda listas periódicas de artigos e re­portagens sobre as atividades do INEP, do CBPE e da CAPES, publicados nos jornais do país; Congressos e Conferências rea­lizados e por se realizar no país e no estrangeiro; Cursos em realização na capital do país.

No período 1956/1960 foram publicados 19 números e dis­tribuídos a professores, Bibliotecas, Estabelecimentos de Ensi­no, Editoras, Faculdades de Filosofia, Institutos, Jornais e Re­vistas, Reitorias, Secretarias de Educação, atendendo-se, outros­sim, a pedidos avulsos.

A tiragem por volume, que era de 1.500 exemplares, foi aumentada, a partir do vol. 6, n.° 1, para 2.000.

V. Aquisição e distribuição de livros e outros materiais.

Expressivo tem sido o esforço do CBPE, através da Divisão de Documentação e Informação Pedagógica, no sentido

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de contribuir para o enriquecimento de bibliotecas de escolas e de instituições de cultura, no país e no estrangeiro, atendendo, além disso, a inúmeros pedidos de autoridades escolares e outras.

O movimento de aquisição e distribuição de livros e publi­cações, no período de 1956/60, foi o seguinte:

Aquisição Distribuição 1956 111.246 ex 85.402 ex 1957 61.662 " 60.166 " 1958 121.750 " 101.922 " 1959 61.500 " 63.099 " 1960 89.410 " 22.294 "

Total 445.568 ex 332.883 ex.

Ainda nesse período foi feita a distribuição do material abaixo relacionado:

— 30 aparelhos de projeção cinematográfica de 16 mm — 200 laboratórios de química — 200 laboratórios de física — 16 conjuntos didáticos de física, química e biologia,

totalizando 400 unidades — 190 discos para o ensino de literatura.

VI. Seção de Audiovisuais

O início das atividades da Seção de Audiovisuais do Cen­tro Brasileiro de Pesquisas Educacionais, em 1957, foi assina­lado pela articulação dos trabalhos do INEP com a Diretoria do Ensino Secundário, tendo sido postos à disposição deste Ins­tituto alguns dos funcionários daquela Diretoria e da CADES, pelo sr. Diretor do Ensino Secundário.

Foram as seguintes, algumas das principais atividades rea­lizadas no exercício de 1957 a 1961:

1. Preparação de roteiros para a coleção English by Film; 2. Registro de conteúdo verbal dos seguintes filmes e res­

pectiva tradução: a) "Skippy and the three R's" b) "Learning to understand-children" (Part I and Part

II) c) "Fire in their learning" d) "School in centreville"

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3. Levantamento das disciplinas curriculares em diferentes tipos e níveis de ensino do Brasil e sua distribuição em setores curriculares;

4. Levantamento de filmes, incluindo: a) circulares às filmotecas com o fim de obter informa­

ções sobre filmes educativos existentes no Brasil; b) organização de um arquivo de filmes existentes no

Brasil; c) sumários de filmes. 5. Instituição do Serviço de Empréstimo de Filmes aos

Estabelecimentos de Ensino e Instituições Educativas; 6. Providências para a vinda da Cinemateca Itinerante da

UNESCO para o Brasil e para seu encaminhamento ao Uruguai, por intermédio da Secretaria da Comission Nacional de Ia Unes­co, ao Ministério de Instruccion Publica do Uruguai;

7. Gravação magnética em português do filme "How to make Handmade lantern slides";

8. Projeções e estudo crítico dos diafilmes da Filmoteca Itinerante da Unesco com o exame de material bibliográfico, a fim de promover demonstrações no Distrito Federal e nos Es­tados ;

9. Gravação, transcrição em inglês e português, datilogra­fia, ilustrações em estêncil, do curso ministrado pelo professor Kenneth Lowell sobre "Crianças mentalmente retardadas";

10. Visitas aos Centros Regionais de Salvador e Recife com o fim de articular os trabalhos de coleta de dados para o Catálogo de Filmes;

11. Participação de professores da Seção em cursos espe­cializados, tais como "O cinema na escola", "Arte Dramática na Escola Secundária", promovidos pela CADES;

12. Seleção de termos técnicos para elaboração do Glos­sário Básico, a ser publicado, e para fichário técnico da Seção, e registro das definições dadas em manuais técnicos poligló-ticos;

13. Preparação de roteiros para diapositivos em inglês e português, baseados na publicação do IBGE Tipos e Aspectos do Brasil, e articulação com o Ponto IV para produção de 500 séries dos citados diapositivos;

14. Promoção de estágios individuais e de pequenos grupos visando a utilização dos materiais audiovisuais apli­cados às diversas disciplinas do currículo e destinados a professores do Ensino Médio, notadamente visando os trabalhos

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da Secretaria de Educação de Pernambuco, dos Centros Regio­nais de Pernambuco e da Bahia e do SENAC Regional;

15. Organização das salas para estágio nos setores: Filosofia-Psicologia; Física-Química; História Natural; Geo-grafia-História; Línguas e Artes Gráficas;

16. Realização e conferência pelo dr. C. Schuller sobre "Métodos Audiovisuais aplicados ao Ensino";

17. Participação da Chefe da Seção e professores no Seminário de Audiovisuais promovido pela CNER;

18. Participação de professores e funcionários da Seção em estágios e cursos internacionais: Letícia Faria, no programa conjunto de Cooperação Internacional Norte-Americana e do Governo Brasileiro; Johann Becker, no Laboratoire Arage, França; Bartira d'Arezzo, com bolsa de pesquisa da Fundação Rockef eller;

19. Confecções de materiais audiovisuais, gráficos e tiragem de fotografias para fins educativos diversos;

20. Realização de reuniões semanais com a Chefe de Seção e professores para planejamentos e discussões de assuntos técnicos sobre materiais audiovisuais aplicados às diversas disciplinas curriculares;

21. Sumarização de artigos e revistas especializadas; 22. Cooperação para instalação dos trabalhos do 3.°

Estágio Latino-Americano de Meios Audiovisuais de comuni­cação ;

23. Cooperação para instalação e planejamento de tra­balhos do Serviço Audiovisual do Centro Regional de Pesquisas Educacionais de São Paulo.

DIVISÃO DE ESTUDOS E PESQUISAS EDUCACIONAIS

Suas atividades no qüinqüênio processaram-se atendendo a este esquema básico:

a) tarefas de aconselhamento e orientação, atendendo às consultas que lhe endereçaram órgãos da administração educacional do país;

b) tarefas de informação e de análise da realidade edu­cacional brasileira, respondendo a solicitações de enti­dades nacionais e internacionais de educação;

c) tarefa básica de estudos e pesquisas sobre sistemas escolares no país, escolas, currículos, programas, exames, livros didáticos e elaboração de livros e de

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material de instrução, como instrumentos para o tra­balho do magistério e da administração escolar, no Brasil.

No cumprimento desse programa foi ponderável a partici­pação da Divisão na elaboração de leis e anteprojetos de lei dos mais relevantes para o pais, como sejam, no plano federal, na Lei n.° 3 552, de 16 de fevereiro de 1959, reformando a organização escolar e administrativa dos estabelecimentos de ensino industrial do Ministério da Educação e Cultura e no estudo e, debate sobre a Lei de Diretrizes e Bases da Educação, quando, por meio de artigos, conferências, participação em seminários, buscou o esclarecimento necessário quanto ao papel constitucional da escola pública no nosso estado democrático.

Participou a Divisão outrossim no estudo e discussão de projetos vários de reformas educacionais estaduais, especial­mente no setor de ensino primário e normal.

Entre esses projetos podem ser destacados, pela continui­dade de presença, os do planejamento do sistema escolar de Brasília, onde o CBPE e o INEP estiveram representados pelo seu técnico Prof. Paulo de Almeida Campos e no de reforma do ensino elementar e normal do Rio Grande do Norte, repre­sentado pela professora Eny Caldeira.

Igual participação teve a DEPE nos estudos para reformas educacionais estaduais no Maranhão, Ceará, Piauí, Bahia, Goiás, Paraná, Rio Grande do Sul; no plano municipal para reformas educacionais em Santos e Porto Alegre.

No que diz respeito à sua atividade como órgão informa­tivo de entidades internacionais de educação, vem sendo igual­mente ponderável a tarefa da Divisão. Para se desobrigar delas, recebe a DEPE a preciosa colaboração da Divisão de Documentação e Informação pedagógica deste Centro.

esses inquéritos e pedidos de informação abrangem as­pectos os mais variados da educação nacional, jogando com dados nem sempre fáceis de obter. Para só citar duas situações desse tipo, referimo-nos ao copioso material coligido, ordenado e comentado para atender à Organização dos Estados Ameri­canos, ao ensejo do Seminário Interamericano de Planejamento Integral da Educação, reunido em Washington, e para o "Semi­nário de Aperfeiçoamento do professor Primário em Serviço", promovido pela UNESCO, realizado em Montevidéu.

Nas suas atividades de estudos e pesquisas, tem procurado a DEPE observar as normas que lhe foram prescritas no "Plano de Organização do Centro Brasileiro de Pesquisas Educacionais e Centros Regionais".

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Entre essas normas figuram: a) estudo dos sistemas estaduais de educação; b) estudo das formas e processos de administração edu­

cacional no Brasil.

Na linha desses objetivos figuram os estudos publicados sobre os sistemas educacionais do Estado do Rio de Janeiro, Rio Grande do Sul, Santa Catarina, Paraná, Ceará; concluído o do Piauí.

Processa-se o levantamento do "Sistema Escolar do Estado da Guanabara".

Na linha da recomendação formulada de "estudo das con­dições históricas, sociais, econômicas e culturais da elaboração dos currículos escolares do ensino elementar e médio", foi publicado o trabalho do Prof. J. Roberto Moreira, "Introdução ao Estudo do Currículo da Escola Primária".

Para esboçar um ensaio de caracterização "da escola ele­mentar e média" no Brasil, foram publicados os trabalhos dos professores Jayme Abreu, sobre a educação secundária no Brasil e o do Prof. Paulo de Almeida Campos, sobre a escola primária, apresentados aos Seminários Internacionais de Edu­cação, de Santiago e de Lima.

Para proceder ao "estudo de estabelecimentos de ensino e seu funcionamento" foram executados e concluídos os projetos sobre o funcionamento da Campanha de Educandários Gratuitos e sobre as Classes Secundárias Experimentais, estando em exe­cução o projeto "Ensino secundário Brasileiro", que visa a uma caracterização, por amostragem, do ensino secundário brasi­leiro, nas áreas industrializadas do país.

com o fim de divulgar o processo norte-americano de clas­sificação de escolas secundárias, foi editado o trabalho "Acredi-tação de Escolas Secundárias", confiado ao Prof. Thales de Melo Carvalho.

Para registrar a experiência brasileira de aplicação do plano Morrisson, na escola secundária do Colégio Nova Friburgo, da Fundação Getúlio Vargas, foi editado o livro O Ensino por Unidades Didáticas, de autoria da Prof .a Irene de Melo Carvalho.

A análise de programas e livros didáticos foi objeto de estudo, na escola secundária, por parte dos professores Guy de Hollanda e James Vieira, no campo da história e da geo­grafia, resultando a publicação dos trabalhos respectivos.

Para analisar dois aspectos, dos mais importantes, da situação educacional brasileira, quais sejam, os da promoção e o da formação do magistério elementar, foram montados dois projetos, já realizados. O primeiro, sobre problema de pro-

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moção na escola elementar, foi levado a efeito sob a direção técnica do Prof. Roger Seguin, psicólogo francês, radicado no Brasil, à base de amostragem representativa de escolas elemen­tares do Distrito Federal. O segundo, sobre o problema da extensão e das características da formação do magistério ele­mentar no Brasil, foi executado sob a responsabilidade direta da Prof.a Eny Caldeira.

Uma das atribuições propostas à DEPE, no "Plano de Orga­nização do Centro Brasileiro de Pesquisas Educacionais e Centros Regionais", foi a de estudo e elaboração de manuais de ensino e de material didático. Essa atividade foi julgada de tal significação que inicialmente constituiu uma Campanha, autônoma, do INEP, a do Livro Didático e Manuais de Ensino (CALDEME), hoje incorporada ao Centro, na DEPE.

São livros já publicados, como fruto desse programa, seja às expensas exclusivas do INEP, na maioria absoluta dos casos, seja parcialmente financiados, com aquisição de parte das edições, os seguintes:

1) Iniciação à Ciência — de Andrade & Huxley — Tradução do Prof. José Reis (2 volumes).

2) Álgebra Elementar e Trigonometria — do professor Francis D. Murnaghan (do Instituto Tecnológico de Aeronáutica).

3) História Geral — Delgado de Carvalho — Volume I — Antigüidade.

4) Introdução Metodológica aos Estudos Sociais — Delga­do de Carvalho.

5) Didática Especial das Línguas Modernas — Walnir Chagas.

6) Física na Escola Secundária — de Blackood, Herron e Kelly — Tradução dos Profs. Leite Lopes e Jayme Tiomno.

7) Botânica na Escola Secundária — de autoria do Prof. Alarich Schultz, da Universidade do Rio Grande do Sul.

8) História Geral (Idade Média), 2 volumes — do Prof. Delgado de Carvalho.

9) Teoria e prática da escola elementar — Prof. J. Roberto Moreira.

10) Biologia na Escola Secundária — do Prof. Osvaldo Frota Pessoa.

11) Oportunidades de formação do magistério primário — da Prof.a Eny Caldeira.

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Em elaboração, alguns deles com os originais já entregues, estão os seguintes livros:

1) Manual de História do Brasil — Autor: Prof. Américo Jacobina Lacombe.

2) Manual de Francês — Autor: Prof. Raymond Van Der Haegen.

3) Manual de Latim — Autor: Prof. Wandick Londres da Nóbrega.

4) Geometria Plana — Autor: Prof. Lucas Bunt. 5) Manual de Zoologia — Autor: Prof. Paulo Sawaya. 6) Manual de Português e Literatura — Autor: Prof.

Mário de Souza Lima. 7) Manual de Literatura — Autor: Prof. Afrânio

Coutinho. 8) Currículo na Escola Secundária — Autor: Prof.

Jayme Abreu.

A elaboração desses manuais é sempre precedida de Semi­nários de especialistas, promovidos pelo Centro, onde o plano do trabalho é exposto, discutido e aprovado e sua execução acompanhada e observada.

Na série "Sociedade e Educação" foi publicado o ensaio do Prof. Luís Reissig: A Era tecnológica e a educação.

Na série "Cursos e Conferências" foi editado o ensaio do Prof. George S. Counts, Educação para uma sociedade de homens livres na era tecnológica, e A educação e o ideal demo­crático, do Prof. Harold Benjamin.

Está em fase de impressão o trabalho: A importância da teoria na educação, do Prof. John S. Brubacher.

Foi celebrado, outrossim, este ano, convênio entre o Centro Brasileiro de Pesquisas Educacionais e o Instituto de Mate­mática Pura e Aplicada, para elaboração e co-edição dos seguintes livros:

1) Conjuntos e Funções — Prof. Leopoldo Nachbin 2) Aritmética Racional — Prof. Antônio Aniceto Mon­

teiro 3) Topologia dos Espaços Métricos — Prof. Elon Lages

Lima 4) Geometria na Escola Secundária — Prof. Elon Lages

Lima.

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Curso de Conferências sobre Filosofia da Educação — esse curso, a cargo do Prof. John S. Brubacher, da Universidade de Yale, foi realizado no CRPE de São Paulo e no CBPE do Estado da Guanabara, com inteiro êxito.

Participa e colabora, ainda, a Divisão na elaboração das revistas do Centro — Educação e Ciências Sociais, já em número quinze; Revista Brasileira de Estudos Pedagógicos, do INEP.

como se vê, nesses quatro anos e meio de existência da DEPE (precedidos pela CILEME e CALDEME), realizaram-se e publicaram-se:

a) cinco estudos de sistemas estaduais de educação; b) um estudo global sobre a escola primária e outro sobre

a escola secundária brasileira; c) estudo sobre currículo na escola primária; d) dois estudos sobre programas de ensino na escola

secundária; e) um estudo sobre "Acreditação de Escolas Secundárias"; f) um estudo sobre metodologia na escola secundária; g) um ensaio sobre "Teoria e prática da Escola Primária"; h) nove manuais para uso na escola secundária; i) três ensaios na série "Sociedade e Educação"; j) uma coleção de cadernos sob o título: Oportunidades

de formação do magistério primário.

Realizaram-se Cursos de Conferências; concluiram-se pes­quisas, cujos resultados serão publicados: Promoção na escola elementar; Sistema Escolar do Piauí; Campanha de Educandá­rios Gratuitos; Classes Secundárias Experimentais; efetuam-se levantamentos: Sistema escolar da Guanabara; ultimam-se e elaboram-se livros nas várias séries editoriais da DEPE do CBPE.

DIVISÃO DE ESTUDOS E PESQUISAS SOCIAIS

Em sua fase inicial a Divisão procurou principalmente resolver o problema de pessoal especializado para a realização de um programa científico bem elaborado: em cooperação com a CAPES (Campanha de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior) organizou um curso de Aperfeiçoamento de Pesqui­sadores Sociais, recebendo, através de uma seleção prévia, bol­sistas do Rio e estudantes indicados pelos diversos Centros Regionais, num total de 14. O curso, em regime de tempo integral, teve a duração de dois anos, constando de uma parte

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teórica, com aulas e conferências sobre Antropologia, Socio­logia, Psicologia Social, Demografia, Estatística, Economia, Problemas Brasileiros de Educação e História do Brasil, minis­tradas por técnicos de renome no quadro nacional; e uma parte prática, pela qual os alunos foram sendo integrados na pesquisa social —- propriamente dita, através de sua colaboração e participação ativa em todas as fases das pesquisas em anda­mento na DEPS (formulação do plano, levantamento de dados no campo, apuração e elaboração do material colhido), o que, ao mesmo tempo representava um treinamento ideal para os estudantes e constituía também uma solução para o problema de recrutamento de auxiliares de pesquisa. Esta participação dos alunos tornou-se especialmente intensa na caracterização sociocultural dos municípios de Leopoldina e Cataguases, em Minas Gerais, sob a responsabilidade e direção do professor Oracy Nogueira, e, em seguida, já fazendo parte do quadro técnico da Divisão, em pesquisas autônomas, integradas num programa mais amplo, iniciado pela DEPS em 1958: Pesquisas em Município-Laboratório.

Durante este período inicial a DEPS patrocinou igualmente uma série de pesquisas realizadas por técnicos do CBPE, dos Centros Regionais e de outras instituições, tendo publicado as seguintes: 1. Regiões Culturais do Brasil, Manuel Diegues Júnior; 2. Menores no Meio-Rural, Clovis Caldeira; 3. Mobi­lidade e Trabalho, Bertram Hutchinson (técnico da UNESCO), Cario Castaldi, Carolina Martuscelli e Juarez R. Brandão Lopes ; 4. Opinião de Pais e professores sobre a Escola Primária e Secundária, Aparecida Joly Gouveia; 5. O que se Deve Ler para Conhecer o Brasil, Nelson Werneck Sodré; Os Dois Brasis, Jacques Lambert (técnico da UNESCO). E, ainda, já con­cluída : Mudança da Estrutura Econômica do Brasil e as Profissões, João Jochmann, e em fase de publicação: A Escola e a Comunidade no Rio de Janeiro, Josildeth Gomes Consorte e Andrew Pearse.

O programa dos Municípios-Laboratório. iniciado em 1958, passou a centralizar os esforços do pessoal da DEPS, junta­mente com o Programa de Pesquisas de Urbanização e Indus­trialização, num esforço para obter uma síntese geral e precisa das condições socioculturais do país e de suas implicações em vários aspectos da vida brasileira, particularmente para o pro­cesso educacional.

Programa de Pesquisas em Município-Laboratório

Este programa visava, originalmente, a realização de uma série de "estudos de comunidade" em cidades típicas das diversas regiões do país com o objetivo de reunir o material

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necessário para a elaboração do Mapa Cultural do Brasil e de alcançar um conhecimento acurado dos condicionantes socio­culturais do processo educacional.

com a criação da Campanha Nacional de Erradicação do Analfabetismo e por força do convênio com ela firmado, o programa original foi ampliado de modo a incorporar um projeto de experimentação educacional em cada município que fosse objeto de pesquisa. A experimentação teria em vista determinar os métodos mais adequados e o custo provável da ampliação da rede escolar primária para matricular todas as crianças em idade escolar, aprimorar as práticas de ensino para elevar ao dobro a proporção de crianças que concluam o curso primário e, ainda, promover uma campanha de alfabetização com o objetivo de recuperar educacionalmente todos os maiores de 14 anos insuficientemente instruídos e alfabetizar a popu­lação urbana de 14 a 20 anos.

Esta segunda parte do programa não pôde ser levada a efeito conforme as previsões, em virtude da multiplicação do número de municípios objeto de experimentação que deu à Campanha um caráter meramente assistencial e de haver-se afastado da sua direção, por longo período, o educador encar­regado de orientar a experimentação.

Ainda assim foi possivel concluir os estudos originalmente programadas pelo CBPE e enriquecê-los com a observação controlada dos experimentos onde estes puderam ser condu­zidos adequadamente. A série de monografias resultantes deste programa focaliza 12 municípios brasileiros e uma vez publi­cada representará uma contribuição ponderável ao conheci­mento do modo de vida das populações do interior do país e, ainda, uma contribuição metodológica às ciências sociais, porque se trata da primeira tentativa de combinar a abordagem antro­pológica e observação participante, com técnicas sociológicas, baseadas em critérios de amostragem.

Além das monografias, o programa dará lugar à publi­cação sobre o Brasil Provinciano que, além do material colhido em nossas pesquisas de campo, utilizará também os dados proporcionados pelas diversas pesquisas de comunidade reali­zadas no país e já publicadas. deste modo será possível tratar, pela primeira vez, com ampla documentação original, temas como o contraste rural-urbano em diferentes regiões do país, a estrutura da família, a estratificação social, a visão do mundo e os condicionantes socioculturais do processo educacional.

Os resultados deste programa de pesquisas serão dados a público através de uma coleção especial, da série Sociedade e Educação, publicada pelo CBPE:

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Coleção — O Brasil Provinciano

vol. 1 — Darcy Ribeiro e Oracy Nogueira — O Brasil Pro­vinciano — Síntese de um Programa de Pesquisas.

vol. 2 — Oracy Nogueira — Família e Comunidade — Em Estudo Sociológico de Itapetininga — São Paulo.

vol. 3 — Oracy Nogueira — A Vida Social na Zona da Mata — Leopoldina-Cataguases — Minas Gerais.

vol. 4 — Rudolf Lenhard — O Rural e o Urbano — Júlio de Castilhos — Rio Grande do Sul.

vol. 5 — Ursula Albersheim — Uma Comunidade Teuto-Brasileira — Ibirama — Santa Catarina.

vol. 6 — Klaas A. Woortmann e Roberto D. de Las Casas — O Vale do Tapajós — Um Estudo da Fórmula Brasi­leira de Ocupação dos Trópicos — Pará.

vol. 7 — Rudolf Lenhard — Macaé e Mococa — Estado do Rio e São Paulo.

vol. 8 — Eli Bonini Garcia — Joinville — Santa Catarina. vol. 9 — Fernando Altenfelder Silva — Vida Urbana no

Centro-Oeste — Catalão — Goiás. vol. 10 — Levy Cruz — A Cidade Nordestina — Um Estudo

Sociológico de Timbaúba — Pernambuco.

Programa de Pesquisas sobre Urbanização e Industrialização do Brasil

O segundo programa de pesquisas da DEPS tem em vista proporcionar aos educadores brasileiros os elementos necessá­rios à compreensão das transformações socioculturais que estão afetando a estrutura e o funcionamento do nosso sistema escolar. Compreende três séries de estudos a saber:

A. Estudos Bibliográficos:

Destinados a compendiar o conhecimento existente sobre os aspectos essenciais dos processos de urbanização e indus­trialização no Brasil, através de estudos de síntese bibliográfica. Para isto, cada tema foi entregue a um especialista altamente qualificado e com larga experiência de pesquisa, capaz não apenas de sintetizar estudos alheios, mas de dar uma contri­buição original. A série completa, a ser publicada pelo CBPE, compreenderá os doze livros seguintes:

vol. 1 — Alice P. Canabrava — Estudo Histórico dos. Pro­cessos de Urbanização e Industrialização no Brasil.

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vol. 2 — P. P. Geiger — Evolução da Rede Urbana Brasi­leira.

vol. 3 — Orlando Valverde — Geografia Agrária do Brasil. vol. 4 — Pompeu Accioly Borges — Análise Econômica do

Processo de Industrialização no Brasil. vol. 5 — Vinícius Fonseca — Evolução Demográfica do

Brasil de 1872 a 1960. vol. 6 — J. F. de Camargo — Migrações Internas no Brasil

Moderno. vol. 7 — M. Diégues Júnior — A Contribuição do Imigrante. vol. 8 — Egon Schaden — O Japonês e o Alemão no Brasil. vol. 9 — Edison Carneiro — O Negro Escravo no Brasil. vol. 10 — Florestan Fernandes — Integração do Negro numa

Sociedade de Classes. vol. 11 — Mário Wagner Vieira da Cunha — O Sistema

Administrativo Brasileiro. vol. 12 — Evaristo de Morais Filho — A Organização do

Trabalho no Brasil.

B. Urbanização e Industrialização:

Compreende uma série de pesquisas de observação direta que focaliza oito centros metropolitanos representativos das principais variantes do processo de urbanização na área mais industrializada do país — Rio de Janeiro, São Paulo, Belo-Horizonte, Curitiba, Juiz de Fora, Londrina, Volta Redonda, Americana. Têm em vista o estudo da forma e da intensidade dos processos de urbanização e industrialização e de seus efeitos sobre a sociedade, a família e a educação. Para alcançar esse objetivo foi selecionada nas oito cidades uma amostra básica de 6 000 famílias, complementada por amostras para­lelas para determinadas pesquisas. Todo o trabalho de campo já foi concluído; no momento estão sendo ultimados alguns dos livros resultantes de pesquisa e os demais deverão estar con­cluídos até meados do ano, quando a série poderá ser enca­minhada para publicação, integrando as cinco obras seguintes:

vol. 13 — Bertram Hutchinson — Os Processos de Urbani­zação e Industrialização.

vol. 14 — Carolina Martuscelli Bori — A Família Urbana Brasileira.

vol. 15 — Arrigo Angelini — A Criança e o Adolescente Brasileiro nas Áreas Urbanas.

vol. 16 — Aniela Ginsberg — Adaptação do Imigrante Urbano.

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vol. 17 — Eunice Ribeiro Daurham — Adaptação dos Con­tingentes Rurais nas Metrópoles.

C. Estudos Educacionais:

As oito cidades anteriormente citadas serão objeto de uma série de estudos educacionais que focalizarão a distribuição das oportunidades de educação nos grandes centros urbanos, as relações entre escolaridade e ocupação, o rendimento das res­pectivas redes escolares primárias e secundárias, a formação e a posição social do magistério primário. Também neste caso os estudos de campo já foram completados, e estão a depender somente de dados complementares e as respectivas monografias estão sendo elaboradas. Esta série dará lugar às seguintes publicações:

vol. 18 — Roger Seguin — A Escola Primária Metropolitana. vol. 19 — Luís Pereira — O professor Primário Metropolitano. vol. 20 — Josildeth Gomes Consorte e Edna Soter de Oliveira

— Escolaridade e Ocupação. vol. 21 — Rosa Maria Monteiro — A Escola Secundária

Brasileira. vol. 22 — Aparecida Joly Gouveia — A Formação do Magis­

tério Primário.

Tal é o programa de pesquisas sobre os processos de urba­nização e industrialização que, além das vinte e duas obras citadas, dará lugar, também, a um estudo de síntese focalizando o Brasil Metropolitano, a cargo do Coordenador da Divisão.

Revista Educação e Ciências Sociais:

A DEPS edita quadrimestralmente uma revista destinada a cientistas sociais e professores, em que divulga parte dos resultados dos estudos e pesquisas da Divisão, além de trabalhos de técnicos de outras instituições nacionais e estrangeiras, e vários tipos de documentação relevantes para o conhecimento da realidade nacional. Até o presente foram editados 15 números, com uma tiragem de 2 mil exemplares cada um.

CENTRO REGIONAL DE PESQUISAS EDUCACIONAIS DA BAHIA

DIVISÃO DE APERFEIÇOAMENTO DO MAGISTÉRIO

Neste setor realizou o INEP seu mais amplo projeto de experimentação pedagógica no ensino primário. Estudaram-se

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formas de organização escolar, métodos e recursos educativos, cuidou-se do preparo e aperfeiçoamento do professor primário e foi aplicado um sistema de promoção no propósito de asse­gurar ao educando experiência vital dos valores humanos. Nessa perspectiva planejou-se uma escola de tempo integral com atividades curriculares diversificadas: intelectuais, artesanais, artísticas, recreativas e um conjunto de escolas, em cada uma das quais se realiza uma das atividades referidas, formando ao todo um Centro Educacional.

Escola de Aplicação

Em funcionamento a partir de 1956, sua principal finali­dade é a demonstração de métodos educativos, sendo campo de observação e experimentação destinado a professores bolsistas que freqüentam cursos de aperfeiçoamento no ensino primário. Seu programa consta de atividades ou projetos de acordo com os interesses da criança. As turmas são organizadas pelo critério cronológico, observando-se um sistema flexível de promoção. Os professores relatam em "diários de classe" todo o processo da escolaridade.

Centro Educacional Carneiro Ribeiro

Consta de três escolas primárias (a quarta vem sendo construída), a Escola-parque de artes industriais, o Pavilhão de Recreação e Jogos e a biblioteca, já ultimada. No primeiro turno, os alunos se dedicam às atividades curriculares inte­lectuais (Linguagem, Matemática, Estudos Sociais e Ciências Naturais) e no segundo freqüentam alternadamente as demais unidades do conjunto.

Na Escola-parque, realiza-se a aprendizagem das seguintes técnicas: Desenho, Tecelagem, Tapeçaria, Cestaria, Corte e Costura, Bordados, Modelagem, Cerâmica, Trabalhos em metal, Cartonagem e Encadernação, Trabalhos em madeira e em couro, Alfaiataria e Sapataria.

O Setor de Atividades Recreativas, instalado em maio de 1959, é aberto não apenas aos alunos do Centro; crianças de escolas-classe e do Abrigo dos Filhos do Povo de Salvador participaram de suas programações com números de música e canto orfeônico.

O corpo docente é constituído de professores do Estado e de profissionais contratados pelo Centro Regional que par­ticiparam de reuniões semanais de aperfeiçoamento. Os professores de

cada turma realizam estudo sobre as famílias dos alunos.

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As crianças, ao todo 848, recebem assistência espiritual, médica, dentária, merenda e uniforme. Vêm revelando pro­gressos animadores quanto à capacidade de trabalho e com relação a atitudes sociais.

Cresce anualmente a proporção de educadores que pro­curam entrar em contato com a experiência do Centro.

Cursos e estágios

1. Preparação de professores em artes industriais para o Plano de Educação Complementar; 2. Aperfeiçoamento de professores primários e preparação de professores para Escolas de Demonstração; 3. Administração escolar; 4. Jardim de Infância; 5. Recreação e Jogos.

No qüinqüênio foram beneficiados 279 bolsistas.

DIVISÃO DE ESTUDOS E PESQUISAS EDUCACIONAIS

Instalada em março de 1959, promoveu os seguintes tra­balhos :

1. Estudo sócio-econômico das famílias de alunos da Escola-parque. Foram selecionadas 222 famílias à base de amostragem aleatória; 2. Estudo sobre o ensino normal no Estado da Bahia. Iniciado em maio de 1960, efetuou-se o planejamento, organização e experimentação de questionários, redação de questionários definitivos e coleta de dados nos estabelecimentos da Capital, não estando concluídos os do interior. Executa se no momento a tabulação dos dados rela­tivos à Capital.

DIVISÃO DE DOCUMENTAÇÃO

Inicialmente funcionando como serviço, ampliou-se com a organização que lhe deu a Portaria 18-A do Diretor do INEP. Suas atividades constaram dos seguintes trabalhos:

1. Levantamento de fontes bibliográficas, oficiais e não oficiais, para o estudo da educação na Bahia, sendo editado pelo CBPE; 2. Levantamento sobre a organização didática dos educandários do ensino médio, da capital e do interior; 3. Levantamento sobre as condições de formação do professorado do ensino secundário em Salvador; 4. Levantamento sobre o ensino primário estadual em Salvador; 5. Levantamento sobre a origem social e as aspirações ocupacionais de ginasianos e colegiais, publicado na Revista Educação e Ciências Sociais, n.° 8, do CBPE; 6. Levantamento da matéria publicada sobre edu­cação nos jornais baianos do sec. XIX; 7. Levantamento de

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dados estatísticos sobre a situação educacional baiana, desti­nado ao relatório da Bahia à XIII Conferência Nacional de Educação; 8. Edição mimeografada dos trabalhos: "Reforma do Ensino na Bahia: 1860-1925"; "Bibliografia de Sociologia Educacional"; "Livros de Administração Escolar existentes nas bibliotecas baianas"; "Organização didática do ensino médio"; "O professorado do ensino médio" e "O professorado do ensino secundário na Capital do Salvador"; 9. Compêndio sobre História da Bahia.

Promoveu a Divisão exposição de livros sobre temas edu­cacionais publicados na Bahia ou da autoria de baianos, reali­zada no Instituto Histórico e Geográfico. Foram organizadas 200 pastas com recortes sobre educação na Bahia, classificadas pelo sistema decimal Melwin Dewey. Distribuiu a bibliotecas de escolas normais, primárias e a professores 18.284 livros adquiridos pelo INEP.

Comissão Executiva da Rede Escolar da Bahia (CEREB)

Instalou-se no Centro em março de 1960, do qual vem recebendo ampla colaboração.

CENTRO REGIONAL DE MINAS GERAIS

Instalado em 1956 em setor do Instituto de Educação cons­truído pelo INEP, na Capital, suas atividades constaram da seguinte programação:

Cursos:

1. Para inspetores escolares — 80 participantes; 2. Para professores secundários (Francês, inglês, português e matemática) — 50 participantes; 3. Para religiosas (Con­teúdo e metodologia do ensino primário); 4. Para super­visores do ensino rural; 5. Para orientadores adjunto do ensino rural, e 6. De treinamento para regentes de classes em zonas rurais.

Pesquisas:

A. LINGUAGEM : 1. Levantamento das palavras mais usadas nas composições escolares; 2. Levantamento do voca­bulário infantil para seleção de palavras mais usadas; 3. Evo­lução da estrutura da frase entre crianças da l . a à 4.a série do ensino primário; 4. Seriação das dificuldades ortográficas; 5. Aportuguesamento de palavras estrangeiras usuais; 6.

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Linguagem popular nas composições infantis; 7. Regência; 8. Verbos; 9. Verbos reflexivos; 10. Artigos; 11. Crase; 12. Pronomes; 13. Ter por Haver; 14. Preposições. 15. Expressões de movimento e a preposição em; 16. Concor­dância; 17. Tendências da antroponímia em Belo Horizonte; 18. Estágios lógicos do pensamento e da linguagem; 19. Pontuação em composições infantis; 20. Emprego das palavras invariáveis na 4.a série primária; 21 . Erros mais comuns de linguagem no curso ginasial, e 22. Apreciação e crítica dos livros de leitura mais adotados no país. (21 estão concluídas.)

B. ARITMÉTICA: Erros mais comuns de aritmética no curso primário; 2. Aspectos do ensino da aritmética no curso ginasial, e 3. Dificuldades de execução do atual programa pri­mário. (Concluídas as duas primeiras.)

C. SOCIOPEDAGÓGICOS : 1. Levantamento da situação edu­cacional do Estado de Minas Gerais; 2. Estudo da estru­tura educacional belo-horizontina; Estudo sobre o grau de ade­quação da professora a seu status profissional; 3. Estudo sobre as raízes culturais da ação didática; 4. Influência das matérias do curso de formação na prática de professores pri­mários; 5. Problemas e dificuldades de professores primários em Belo Horizonte; 6. sobre as causas da repetência no 1.° ano primário para determinação da importância do fator "nível mental" nas causas de repetência, mediante prova de Terman e Merrill; 7. Interpretação antropológica em educação; 8. Escola e Comunidade — Um estudo de interação (Relatório de pesquisa realizada na Fazenda Rosário, Ibireté) ; 9. Tensões internacionais e antagonismos de grupos internacionais — Um estudo de estereótipos; 10. Psicologia e estudos pedagógicos em zona rural, e 11. Determinação das áreas de influência das instituições de educação rural em funcionamento na Fazenda Rosário. (A maioria em andamento, estando duas concluídas.)

D. FOLCLORE: 1. Brinquedos preferidos pelas crianças em Minas; 2. Cantigas de roda e outros brinquedos cantados; 3. As fórmulas para escolha de pegador; 4. como brincam as crianças em Belo Horizonte; 5. Superstições mineiras através da escola, e 6. As modinhas mineiras. (Duas con­cluídas.)

Estudos:

1. A Moreninha e a educação nacional de seu tempo; 2. A expressão estética nas escolas mineiras; 3. Compilação de leis

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mineiras referentes à educação, e 4. Análise de 300 obras de literatura infantil (Concluídas).

Traduções:

1. POFFENEERGER, Thomas — "Factors in the Formation of Attitudes toward Mathematics", in Journal of Educational Research, vol. LVII, n.° 5, jan. 1959; 2. Capítulo dedicado à Aritmética na Encyclopedia of Educational Research (Monroe, pag. 44 e segs.) e 3. The Second Report of the Commission on Post-War Plans (Reprinted from The Mathematics Teacher for May, 1945).

Publicações:

Além do Boletim do Centro, que é um informativo periódico, foi editado O Ensino em Minas Gerais no Tempo do Império, do Prof. Paulo Krüger Corrêa Mourão, estando no prelo O Ensino em Minas Gerais na República. Vários trabalhos resul­tantes das pesquisas em andamento serão objeto de publicação.

Outras iniciativas

1. Organização do Museu de Leitura mostrando a evolução da arte da leitura; 2. Organização da Biblioteca com 2.077 volumes classificados, a maioria versando assuntos de Minas; 3. Instalação de oficina gráfica — Multilith — para as publicações; 4. Arquivo da matéria publicada nos jornais sobre educação; 5. Distribuição a estabelecimentos de ensino e enti­dades culturais de 11.415 livros fornecidos pelo INEP, 2.302 exemplares de publicações do Centro e 30 laboratórios de ciências oferecidos pelo IBECC (Instituto Brasileiro de Educação, Ciência e Cultura), e 6. Preparar a documentação destinada à XIII Conferência Nacional de Educação com estes dados: carências qualitativas e quantitativas do ensino em Minas e relatório.

O Centro recebeu a visita de numerosos educadores. O Prof. Edward Fitzpatrick, reitor do Mount Mary College nos Estados Unidos, proferiu três palestras num dos cursos de aperfeiçoamento.

INSTITUTO SUPERIOR DE EDUCAÇÃO RURAL

Integrado no Centro a partir de 1958, nele se realizaram várias das pesquisas e cursos acima referidos e ainda as seguintes iniciativas: 1. III Seminário Latino-Americano de Comunicações Audiovisuais em colaboração com o Ponto IV;

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2. Instalação de classe experimental primária, com três séries simultâneas em escola isolada; 3. Reuniões anuais dos orien­tadores em exercício nos municípios; 4. Supervisão e assis­tência pedagógica, por intermédio de uma Inspetoria Regional de Ensino, das escolas da 6.a circunscrição, que abrange seis municípios vizinhos; 5. Planejamento do Projeto-pilôto da Granja Escolar; 6. Organização do Museu de Ciências Natu­rais e Físicas; Pesquisas ecológicas: a) Flora e fauna; b) Confecção do mapa geográfico, e c) Estação climatológica (2.a classe) com três observações ao dia, doada pelo Instituto

Nacional de Meteorologia; 7. Seleção vocacional das candidatas a cursos normais regionais. Estudo da redação como teste de personalidade e de controle do progresso escolar. Ques­tionário sobre características da professora rural e de sua escola; artes populares e artesanatos; brinquedos; 8. Colabo­ração com a Escolinha de Arte do Brasil; 9. Pesquisas helmin-tológicas em 1.224 pessoas em colaboração com o Dept.º Nac. de Endemias Rurais e a Secretaria de Saúde do Estado. Esquistossomose e tratamento da verminose; 10. Pesquisas acerca do "Barbeiro", em colaboração com o Dept.º Nac. de Endemias Rurais, e 11. Instalação e funcionamento do Centro Social Rural, em colaboração com a Superintendência do Ens. Agrícola e Veterinário e a Comissão Brasileira de Assistência Rural.

CENTRO REGIONAL DO RECIFE

Sua instalação teve lugar a 18 de novembro de 1957, ocupando parte do Instituto Joaquim Nabuco de Pesquisas Sociais, transferindo-se para a sede própria no bairro de Apipucos em setembro de 58. Deu-se execução no período 57-60 ao seguinte programa:

Projetos de pesquisa:

1. Ideologia dos Poetas Populares do Nordeste. Renato Accioly e Carneiro de Campos. Já editada. Orçamento: Cr$ 60.000,00.

2. Interpretação da Literatura Infanto-Juvenil no Nordeste. Paulo da Silveira Rosas. Já editada. Orçamento: Cr$ 120.000,00.

3. Construção de Programa de Ensino Primário adaptado às necessidades de Cultura e Integração Social da Escola ao Meio. Isnar Cabral de Moura. Concluída. Orçamento: Cr$ 120.000,00.

REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS

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4. Levantamento do Sistema Educacional Cearense. Joaquim Moreira de Sousa. Concluída. Orçamento: Cr$ 444.000,00.

5. O Ensino da Filosofia no Ensino Secundário. Carlos Frederico Maciel. Editada. Orçamento: Cr? 15.000,00.

6. Estruturas Tencionais da Censura Familial: Castigo e Recompensa entre Crianças em Idade Escolar. Albino Gonçalves Fernandes Filho. Concluída. Orçamento: Cr$'150.000,00.

7. Ajustamento Emocional dos professores Primários no Interior de Pernambuco. Paulo Silveira Rosas. Concluída. Orçamento: Cr? 100.000,00.

8. O Ensino Médio no Recife. Itamar de Abreu Vasconcelos. Concluída. Orçamento: Cr$ 65.000,00.

9. Levantamento dos Estabelecimentos de Ensino Superior em Pernambuco. Maria Luiza de Melo. Concluído.

10. Levantamento da Situação de Prédios de Escolas Primárias em Pernambuco. Carlos Ribeiro Sales. Concluído. Orça­mento: Cr? 20.000,00.

11. Mobilidade Espacial e Estrutura Social em Pequenas Comunidades do Nordeste Brasileiro. Levy Porfírio da Cruz. Em conclusão. Orçamento: Cr$ 617.850,00.

12. Mudanças em um Grupo de Jangadeiros em Pernambuco. Severino Paulo de Aguiar. Em conclusão. Orçamento: Cr? 117.500,00.

13. Métodos de Seleção para Candidatos ao Ensino Superior. José Otávio de Freitas Júnior. Em conclusão. Orçamen­to: Cr$ 192.00.0,00.

14. A Educação da Mulher no Nordeste. Paulo Silveira Rosas. Em andamento. Orçamento: Cr$ 250.000,00.

15. Levantamento do Sistema Educacional de Pernambuco. Itamar de Abreu Vasconcelos e Antônio Carolino Gon­çalves. Em início. Orçamento: Cr$ 150.000,00.

16. Meios Informais de Educação. Paulo Silveira Rosas e Levy Cruz. Em início. Orçamento: Cr$ 50.000,00 (Excluída contribuição da FAREP).

17. Áreas Homogêneas do Nordeste. José Geraldo da Costa. Em planejamento.

18. O Problema do Menor Abandonado na Cidade do Recife e suas Relações com a Delinqüência Infanto-Juvenil. Márcia Alves de Souza. Interrompida. Orçamento: Cr? 162.000,00.

REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS

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Além desses trabalhos, 11 pesquisas constantes da progra­mação foram canceladas.

Outras atividades:

Cursos: 1. sobre problemas de política e administração escolar, subordinado ao tema "Educação e Região", realizado em dois períodos, constando de uma série de palestras seguidas de debates; 2. De inglês para professores primários estaduais e municipais, e 3. De iniciação a pesquisas sociais e educa­cionais destinado a universitários e professores primários.

Bôlsas-de-estudo: Foram selecionados 52 candidatos para cursos de aperfeiçoamento no país, promovidos pelo INEP e 5 no exterior, em colaboração com o Ponto IV.

Clube de professoras: coordenado pela Divisão de Estudos e Pesquisas Educacionais, executou um programa de palestras para professores primários, seguidas de debates.

Escola de Demonstração: destinada à experimentação peda­gógica no campo do ensino primário, encontra-se em fase de obras.

Representantes do Centro participaram de Simpósio sobre problemas fundamentais de educação, em S. Paulo; de Seminário no Distrito de Palmares, Pernambuco, promovido pelo Serviço Especial de Saúde Pública; da Pesquisa sobre "Caracterização Sociocultural do Município de Timbaúba", a cargo do Prof. Levy Cruz, em colaboração com a Campanha Nacional de Erradicação do Analfabetismo e de reunião promovida pela Comissão do Vale do S. Francisco.

-Quinzenalmente reúne-se o "Seminário" do Centro Regional

com a participação dos diretores, assistentes e interessados, sobre temas educacionais e de ciências sociais, relato de congressos, excursões, comentário de resultados das pesquisas e comuni­cações.

DIVISÃO DE APERFEIÇOAMENTO DO MAGISTÉRIO

O grupo de trabalho constituído prestou colaboração às seguintes iniciativas: 1. Cursos e orientação didática com a Prefeitura e a Secretaria de Educação, no ensino primário; 2. IV Congresso Nacional de professores Primários; 3. Reunião Preparatória da XIII Conferência Nacional de Edu­cação; 4. Seleção de bôlsas-de-estudo.

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Serviços Diversos

Publicações: Desde sua fundação, o Centro edita men­salmente seu Boletim com tiragem de 130 exemplares. Os trabalhos realizados são incluídos na série "Estudos e Pes­quisas", referidos antes, e na de "Conferências e Cursos". Na última, foram publicadas: John Dewey, uma Filosofia da Experiência, conferência proferida por Newton Sucupira no centenário desse pensador e o volume contendo as conferências e debates do curso sobre "Problemas de Política e Adminis­tração Escolar do Nordeste Brasileiro".

Biblioteca: acervo atual — 1.347 livros e 348 periódicos.

Distribuição de livros: Foram remetidos 2.810 a professores e 5.078 a instituições educativas e culturais.

Material didático: encontra-se em organização o setor audio­visual, iniciada uma coleção de diafilmes e aquisição de instru­mentos. Foram doados oito laboratórios de ciências a estabe­lecimentos da capital e do interior, obtidos através do INEP pelo Instituto Brasileiro de Educação, Ciência e Cultura.

O Centro recebeu a visita de numerosos professores e educadores nacionais e estrangeiros.

CENTRO REGIONAL DO RIO GRANDE DO SUL

Funcionando inicialmente como Centro de Estudos Peda­gógicos, reorganizou-se como Centro de Pesquisas em 1956, estando hoje integrado na Universidade do Rio G. so Sul, em virtude do acordo firmado entre o Reitor e o Diretor do INEP. A programação cumprida foi a seguinte:

DIVISÃO DE APERFEIÇOAMENTO DO MAGISTÉRIO

Cursos: 1. Aperfeiçoamento de professores primários; 2. Prática de ensino; 3. Metodologia da Linguagem; 4. Metodologia de Estudos Sociais; 5. Inglês, e 6. Administração escolar e orientação da educação primária.

Além de coordenar a concessão das bôlsas-de-estudo ofere­cidas pelo INEP a professores sul-rio-grandenses, a Divisão tem a seu cargo a seleção, preparação e divulgação de material informativo de interesse didático e planeja a realização anual de cursos de Administração Escolar e de Supervisão Escolar para professores primários.

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REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS

DIVISÃO DE ESTUDOS E PESQUISAS EDUCACIONAIS

Estruturada em 1960, ficaram sob sua responsabilidade os estudos anteriormente planejados. Elaborou-se um plano geral de trabalho com a finalidade de retratar a realidade educacional do Rio G. do Sul. Constam desse plano pesquisas, estudos e providências complementares. Incluindo outras iniciativas, foram estas suas realizações:

Pesquisas: 1. Evolução histórica da educação no Rio G. do Sul; 2. Extensão e qualidade dos serviços educativos do Rio G. do Sul; 3. Levantamento sobre as oportunidades de educação artística oferecidas à criança e ao adolescente sul-rio-grandense; 4. Levantamento do vocabulário ativo de cul­tura média na linguagem comum de adultos e crianças de 12 a 15 anos; 5. Levantamento do vocabulário de palavras que apresentam dificuldades ortográficas; 6. Levantamento de professores municipais sem título; 7. Conteúdo de livros didáticos de nível primário. Estudos: 1. Exames de admis­são ao ginásio; 2. Ensino de ciências naturais na escola primária; 3. Papel da matemática nas atividades humanas; 4. Psicologia da criança; 5. Guias de ensino; 6. Preparação do teste-diagnóstico; 7. Condições do ensino ministrado nas escolas; 8. Reforma do ensino primário. Providências com­plementares: 1. Critério de classificação das escolas primá­rias; 2. Organização de material sobre testes de inteligência, e aptidões, para uso de diagnóstico nas escolas, e 3. Classifi­cação dos prédios em que funcionam os estabelecimentos de ensino público em Porto Alegre.

A Divisão programou ainda, a partir de 1959, uma série de projetos em suas atividades regulares: 1. Direção da aprendizagem na l . a série escolar primária; 2. Ensino da Geografia; 3. Psicologia educacional; 4. Desenho; 5. Seleção e divulgação de trechos de leitura; 6. Ortografia, e 7. Criação de um Instituto de Ensino Normal Superior.

DIVISÃO DE ESTUDOS E PESQUISAS SOCIAIS

Projeto de pesquisa: A criança sul-rio-grandense.

Serviços Diversos

Biblioteca: acervo: 1.645 volumes. Efetuou-se a resenha bibliográfica de livros e artigos publicados na imprensa. Foram elaborados para empréstimo, em colaboração com o Instituto

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de Cinema Educativo, 18 microfilmes. A Biblioteca distribuiu a escolas e bibliotecas municipais 10.758 livros fornecidos pelo INEP.

Museu Pedagógico: Dispõe de 572 obras de caráter didático, 11 cartazes para o ensino da leitura, coletânea de jogos, histórias e gravuras. Realizações: 1. Apreciação de fichas de literatura infantil; 2. Adaptação de histórias infan­tis; 3. Apreciação de fichas relativas à leitura de obras sobre geografia, e 4. Estudo sobre geografia do Brasil.

Destinada a esses setores, o Centro recebeu documentação variada oferecida pela UNESCO e Consulados de países amigos.

Efetuaram-se ainda, por iniciativa do Centro, reuniões semanais de Planejamento para a XIII Conferência Nacional de Educação.

Educadores nacionais e estrangeiros visitaram este órgão, tendo alguns deles realizado palestras sobre temas de sua espe­cialidade.

CENTRO REGIONAL DE SÃO PAULO

Instalado a 6 de junho de 1956, em virtude do convênio celebrado entre o Ministério da Educação e Cultura e a Reitoria da Universidade de S. Paulo, suas atividades iniciais, além da organização dos serviços administrativos, distribuíram-se pelas Divisões de Pesquisas Educacionais e de Pesquisas Sociais.

DIVISÃO DE ESTUDOS E PESQUISAS EDUCACIONAIS

Definidos os principais problemas a serem estudados, orga­nizou-se a Seção de Estatística, sendo elaborado um roteiro para apresentação de propostas de pesquisas em colaboração com a Divisão de Pesquisas Sociais.

A princípio, esta divisão teve a seu cargo a realização de projetos de pesquisa e a realização de um seminário para professores primários, que teve a participação de 55 bolsistas. O Seminário constou de cursos intensivos sobre técnicas de ensino da matemática, da alfabetização, psicologia da leitura, da aritmética, pesquisa em educação e ciências sociais, confe­rências, exibição de filmes educativos, visitas a instituições educativas, empresas e jornais.

Projetos de Pesquisa:

1. Ficha de observação de alunos. Levantamento de tipos e freqüência de comportamentos escolares na cidade de

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S. Paulo pela observação dos próprios mestres. Técnica utilizada: a) elaboração da ficha com levantamento, clas­sificação, escolha e definição das categorias de comporta­mento; b) aplicação experimental — l.a testagem: em 11 grupos escolares da capital; os dados coligidos foram analisados, fornecendo elementos para a reelaboração da ficha; 2.a testagem: em 10 grupos escolares, sorteados entre 77, aplicada a 3 alunos por classe, também sorteados. Utilizaram-se 153 questionários. O Boletim do Centro Pesquisa e Planejamento, Ano II, n.° 2, junho de 1958, publicou o relatório da pesquisa.

2. Escalas de Escolaridade. Elaboração de um instrumento que ofereça informações quanto possível seguras sobre o grau de conhecimentos do aluno de escola primária. Técnica utilizada: a) elaboração de questões; b) aplicação mensal de provas em grupos escolares da capital sobre as disciplinas do currículo, do 1.° ao 4.° ano, num total de 660 alunos. Observadas as etapas do processo esta­tístico. Concluída em 1960, a pesquisa apresenta análise qualitativa e quantitativa das questões propostas. A primeira parte do relatório foi publicada em Pesquisa e Planejamento, Ano II, n.° 2, junho de 1958.

3. Levantamento do ensino secundário e normal. Coleta de dados por meio de questionários destinados a diretores e professores, obtendo-se informações complementares do Departamento de Educação e da Secretaria da Fazenda. Já concluída, seu relatório aguarda publicação na série "Monografias".

4. Conteúdo dos livros de leitura para a escola primária. Técnica utilizada: a) definição das categorias empregadas na classificação do conteúdo das lições; b) análise de apro­ximadamente 2.000 lições. Concluída. Relatório a ser publicado em Pesquisa e Planejamento.

5. A posição de alternativa certa num teste de múltipla escolha. Técnica usada: a) aplicação de 2.400 provas de português em cinco grupos escolares; b) correção e transposição das provas em fichas, e c) elaboração de quadros para a análise estatística. Concluída.

6. Estudo experimental sobre a solução de problemas de arit­mética. Procurou determinar se a familiaridade com as situações apresentadas nos problemas influía na solução. Técnica usada: a) construção de um conjunto de provas de familiaridade; b) testagem piloto dessas provas; c) aplicação em amostra de 4 grupos escolares; d) análise dos resultados e elaboração de 12 problemas para cada ano e cada tipo de atividade (comercial, industrial e recreativa;

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e) aplicação dos problemas na amostra, e f) análise estatística dos dados coligidos. Concluída. O relatório será publicado em Pesquisa e Planejamento.

7. Estudo sobre o vocabulário da criança na escola primária. Palavras mais freqüentes na linguagem escrita e falada. Técnica usada: testagem pela associação controlada, pela composição e pela conversa gravada. Procedida a análise qualitativa e quantitativa dos dados. Concluída.

8. Estudo sobre o rendimento na solução de problemas arit­méticos na escola primária. Em planejamento.

DIVISÃO DE ESTUDOS E PESQUISAS SOCIAIS

Projetos de pesquisa:

1. Levantamento do ensino primário na Cidade de S. Paulo. Foram aplicados 2.837 questionários e realizaram-se entre­vistas com 132 professores e diretores numa amostra de 20% das escolas da Capital. Observadas as etapas do método estatístico, foram analisados e interpretados dados sobre a formação do professor, do diretor e auxiliares. A redação final vem sendo ultimada.

2. Levantamento do ensino normal. Planejado, aguardando execução.

3. Organização de Cadastro sobre a Rede Escolar do Muni­cípio de S. Paulo. Procedeu-se à coleta dos dados, trata­mento e localização das escolas em mapa da Capital.

4. Planejamento da Extensão da Rede Escolar Primária de Presidente Prudente. Procedeu-se à elaboração de ques­tionários, coleta, tabulação e análise de dados sobre as condições materiais, capacidade das escolas e o professor. Fêz-se o levantamento da população em idade escolar. Codificaram-se profissões e dados referentes a 2.500 famí­lias da cidade. Em andamento.

5. Expectativa de Pais de Alunos quanto ao ensino médio. Efetuada a coleta, tabulação e análise dos dados, preparou-se monografia a ser publicada.

6. Análise das exigências educacionais não atendidas no ensino industrial. Inclui: a) estudo da evolução do ensino industrial; b) estrutura atual: rede oficial e rede do SENAI; c) elaboração de um plano de trabalho. Em andamento.

7. Política e expansão da Rede Escolar. Efetuou-se a coleta dos dados.

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REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS

DIVISÃO DE APERFEIÇOAMENTO DO MAGISTÉRIO

Suas atividades iniciaram-se em janeiro de 1958. Cons­taram de cursos, reuniões, missão pedagógica, instalação de classes experimentais e um serviço de recursos audiovisuais, e seleção de professores.

Cursos: De Especialistas em educação para a América Latina. Realizado anualmente, a partir de 1958, sob os auspícios da UNESCO em colaboração com o Governo brasileiro, reunindo bolsistas dos países latino-americanos, inclusive o Brasil, em número de 88. Versaram os três cursos os seguintes campos: Formação e Aperfeiçoamento do Magistério, Planejamento, Organização, Supervisão e Administração Escolar; 2. Para inspetores escolares do ensino primário estadual, realizados em três oportunidades, com o objetivo de um reexame do conceito de inspeção escolar e discussão de problemas de supervisão e orientação pedagógica, havendo 105 participantes, e 3. Cursos de Férias para professores primários, sobre administração escolar, metodologia, psicologia, sociologia e meios audio­visuais.

Reuniões para delegados titulares das 35 Delegacias Re­gionais do Ensino Primário Estadual, a fim de participar de um ciclo de conferências e seminários sobre Administração, Política, Filosofia Educacional e problemas do ensino elementar estadual.

Missão Pedagógica, realizada em Presidente Prudente, em promoção do Departamento de Educação com assistência da DAM, tendo como área de estudos problemas da região e disciplinas do currículo primário. Freqüentaram 175 professores.

Classes Experimentais — Autorizadas pela Secretaria de Educação, instalaram-se duas classes com um total de 50 alunos (25 por classe) como núcleo do futuro Grupo Escolar Experi­mental, destinado à observação e prática de ensino de professores e

bolsistas. O corpo docente é constituído em sua maioria de professores especializados na Universidade de Indiana. A partir de 60, instalou-se mais uma classe, aumentando para 71 o número de alunos. Registraram-se 120 estagiários e 452 visitantes.

Audiovisuais — Foi criado o Serviço pelo convênio assi­nado em abril de 1959 entre a UNESCO e o Ponto IV. Des­tina-se a orientar a produção e utilização desses recursos na educação, bem como o preparo de livros e manuais básicos de ensino. Técnicos do Ponto IV participaram do planejamento.

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Nove candidatos foram escolhidos numa seleção para treina­mento básico. Procedeu-se então a um levantamento dos recursos audiovisuais nas escolas primárias e normais da Capital. Em julho de 60 realizou-se um curso de férias para diretores de grupos escolares estaduais sobre os meios de comunicação audiovisual.

Seleção de professores — 1. De professores primários para Brasília, num total de 107 candidatos, submetidos à veri­ficação de nível mental, conhecimentos gerais, capacidade de redação, além de entrevista individual, sendo habilitados 17; 2. De professores primários para aperfeiçoamento nos Estados Unidos, em colaboração com o Ponto IV, havendo seis habi­litados; 3. De candidatos a bôlsas-de-estudo para aperfeiçoa­mento em recursos audiovisuais nos Estados Unidos, também em colaboração com o Ponto IV. Foram habilitados 4 can­didatos.

Serviços Administrativos

1. Biblioteca. Organizada em novembro de 1956, dispõe hoje de um acervo de 4.915 livros e 235 periódicos. Emprés­timos: 6.576 obras.

2. Seção de Publicações. Tem a seu cargo a reunião de documentos sobre educação, a edição do Boletim Pesquisa e Planejamento que vem sendo publicado anualmente e a distri­buição de livros destinados pelo INEP a bibliotecas escolares de S. Paulo, Paraná, Mato Grosso e Goiás, num total de 47.411 volumes dos 49.972 recebidos.

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ENSINO PRIMÁRIO COMPLEMENTAR, INICIAÇÃO PROFISSIONAL

O grupo de estudos " A " da 3.* Região, com sede em Recife, do Encontro Nacional de Educadores para o Desenvolvimento, baseando-se em o relatório do Prof. João Roberto Moreira, no Projeto de Diretrizes e Bases da Educação em andamento no Senado, no substitutivo ao mesmo projeto proposto pela CNI — SESI e nos co-relatórios das professoras Maria Elisa Viegas de Medeiros (Pernambuco) e Zilda Maciel Pires (Ceará), apre­sentou as seguintes conclusões:

I — CONCEITUAÇÃO DO ENSINO PRIMÁRIO

1 — 0 ensino primário, numa conceituação em correspon­dência com os progressos científicos e as exigências de uma civilização em mudança, é aquele que se exerce:

a) sem quaisquer restrições de credo, raça, nacionalidade ou ideologia, porque é um dos aspectos da educação fundamental, comum, e como tal é um direito de todos;

b) com vistas à formação da personalidade total do edu­cando, como parte de uma educação integral;

c) ajustado às necessidades do meio e às condições futuras de trabalho útil.

2 — Torna-se imperiosa uma revisão dos problemas do ensino primário, mediante um plano elaborado em consonância:

a) com o momento histórico em que vivemos; b) com o processo de desenvolvimento do país; c) com as condições culturais que servem de embasa­

mento ao regime democrático que esposamos; d) com as regiões fisiográficas e as diversidades de suas

diferentes zonas culturais; e) com as limitações impostas pela escassês de recursos; f) com o reconhecimento de que, no conjunto dos sistemas

educacionais, a educação primária deve ter tratamento preferencial.

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II — AVALIAÇÃO DA ESCOLARIZAÇÃO FUNDAMENTAL

1 — Nossa escola primária é insuficiente e insatisfatória:

a) está longe de possibilitar a obrigatoriedade escolar imposta pela Constituição;

b) não consegue reter o aluno até o fim do curso; c) apresenta uma média de escolarização que não vai

além de três anos, para cada aluno; d) elimina, de ano a ano, uma parte considerável de

seus alunos, mediante critério desencorajante de repro­vações em massa;

e) não tem conseguido corrigir o fenômeno da "desordem das idades" que se verifica em todos os graus escolares.

2 — Para eliminar os efeitos dessa escolarização insufi­ciente e desordenada, cumpre adotar uma política educacional que atenda:

a) no âmbito social — à melhoria das condições sócio-econômicas das populações do país, mediante uma reforma de estrutura que possibilite a reforma agrária, a concessão de crédito agrícola supervisionado o escoa­mento dos produtos de trabalho, a garantia mínima de sobrevivência e de satisfação das necessidades básicas do homem;

b) no âmbito escolar — à classificação racional dos alunos, em substituição ao critério nocivo das repro­vações, permitindo que os escolares progridam de acordo com suas diferenças individuais e aproveitem todas as facilidades que a escola-primária lhes possa oferecer.

III — URBANIZAÇÃO E ESCOLARIZAÇÃO

1 — A escola precisa considerar o fenômeno das migra­ções desordenadas, que transformam o processo de urbanização de certas áreas em problema social.

2 — Cumpre à ação do Governo empreender os meios para:

a) fixar o homem à terra, desde que lhe ofereça condições de subsistência condigna;

b) localizar as populações migrantes naquelas áreas em que melhor possam ser atendidos os seus problemas;

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c) oferecer condições de trabalho útil aos pais dos alunos, e a estes possibilidades de iniciação profissional.

IV — EDUCAÇÃO RURAL E DESENVOLVIMENTO SÓCIO-ECONÔMICO

1 — Num plano de educação com vistas ao desenvolvi­mento do país, deve-se levar em consideração não apenas seu processo de industrialização, mas o aproveitamento das riquezas da terra, uma vez que "somos uma Federação formada por Estados predominantemente agrícolas e extrativistas". Cumpre, pois:

a) elevar, por todos os meios ao alcance, os padrões de vida do trabalhador rural;

b) oferecer-lhe condições racionais e trabalho, que ele­variam de imediato a renda per capita do país;

c) empreender a construção de escolas rurais e escolas-granjas, com intensificação do plano de educação complementar, funcionando todas as escolas como verdadeiros "centros de comunidade".

V — ENSINO COMPLEMENTAR

1 — Impõe-se a extensão da escolaridade primária, me­diante a disseminação dos chamados "cursos complementares", reconhecendo-lhes os objetivos educacionais, econômicos e sociais.

2 — Recomenda-se a ampliação do curso primário, em 2 anos com correspondente redução do tempo de escolarização do ensino de grau médio em caráter obrigatório a partir de 1970.

3 — Aceitam-se como disposição transitória, até àquela data, os cursos complementares facultativos, com possibilidade de ingresso, mediante exame de adaptação, na 2.a série dos cursos de grau médio.

4 — O ensino complementar funcionará com currículos ampliados com agrupação de matérias afins, a cargo de um mesmo mestre para cada grupo, numa tendência de preparação dos alunos para os modos e processos do ensino no grau médio, sendo imprescindível:

a) realização do ensino e das atividades em horário integral de 6 horas diárias;

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b) iniciação às técnicas modernas do trabalho, em oficinas, laboratório, e instalações adequadas às es­colas granjas e escolas rurais;

c) aproveitamento de tais centros como campo perma­nente de aperfeiçoamento de professores.

VI — INICIAÇÃO PROFISSIONAL

1 — Recomendam-se as técnicas de iniciação profissional:

a) nos cursos complementares de nível primário; b) nos primeiros anos de ciclo ginasial de todas as escolas

de grau médio; c) nos cursos supletivos ou regulares, para adolescentes

e adultos analfabetos. d) em outras unidades escolares tipo SENAI e SENAC.

2 — O ensino no grau elementar deve oferecer um clima favorável à futura orientação profissional, mediante a adoção de métodos ativos, que levam à construção, manipulação e aplicação de atividades inventivas, criadoras e construtivas.

VII — ADVERTÊNCIAS

1 — O grupo de estudo "a" da 3.a Região manifesta seu desacordo à maneira como o Projeto n.° 2.222-C dispõe sobre as verbas públicas, pondo-se a serviço de entidades de caráter privado. Por outro lado, declara-se insatisfeito com a solução apresentada pelo substitutivo elaborado pela CNI, SESI, no seu artigo 3.°. É de parecer que o Estado, incapaz de atender às necessidades mínimas de sua rede escolar, quando nem sequer pode efetivar as exigências constitucionais sobre a obri­gatoriedade escolar no nível primário, não está também capa­citado a promover a educação mantida por fundações ou inicia­tivas de caráter privado, mesmo quando se proponham a fins altruísticos sem visar interesse de lucro.

somente vencida a insuficiência do Estado, para efetivação de seu dever constitucional no tocante à educação, poderá êle empregar seus excedentes na ajuda àquelas instituições de caráter privado.

Manifesta seu repúdio a qualquer forma de monopólio reconhecendo à família o direito de decidir sobre a educação de seus filhos, sendo de parecer que somente o Estado pode

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oferecer a garantia de um ensino gratuito, aberto a todos, sem restrições de natureza econômica, ideológica, racial ou político-partidária.

2 — Rejeita o artigo 25 do Projeto-de-Lei n.° 2.222-C, de 1957, em que preceitua que "o ensino primário tem por fim o desenvolvimento do raciocínio e das atividades de expressão da criança e sua integração no meio físico e social":

a) porque o raciocínio é apenas um dos elementos que interessam a uma estimável educação intelectual;

b) porque tão valiosa quanto as atividades de "expressão" são as de elaboração mental;

c) porque não atende às exigências de uma educação integral, com vistas à formação de personalidade total.

Recife, 16 de dezembro de 1960.

ass.) Eneida Rabelo Álvares de Andrade, Coordenadora; Maria Elisa Viegas de Medeiros, Manuel Vanderlei de Gusmão — Alagoas, Zuleica da Costa Romano — Rio G. do Norte, Isnar Cabral de Moura — SENAC de Pernambuco, Maria Edite de Barros Vieira, Ana de Uzeda Luna, Luísa Moreira Goibinhas, Celina Lima Verde de Carvalho, Ana Borba de Lima, Maria das Graças. Sá Leitão Didier, Valdeci Rabelo Álvares Camelo, Maria Luísa de Melo, Miriam de Carvalho Didier, Hercília Cunha, Lucilda Jordão d'Oliveira e Antônio Lucena — Paraíba — Senai.

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NOTAS PARA A HISTÓRIA DA EDUCAÇÃO

Refletindo a discussão em torno do Projeto de Diretri­

zes e Bases, ao elaborar o capítulo — DA EDUCAÇÃO E

DA CULTURA — na Constituição do Estado da Guanaba­

ra, os deputados constituintes defenderam filosofias educa­

cionais diversas, prevalecendo afinal a que concede prima­

zia à escola pública. como subsídio para uma análise da

evolução do texto, apresentamos: I. Redação aprovada

pela Subcomissão de Educação e Cultura; II. Substitutivo

do Dep. Paulo Alberto Monteiro de Barros, e III. Redação

aprovada em plenário.

I. Redação aprovada pela Subcomissão de Educação e Cultura

CAPITULO

Da Educação e da Cultura

Art. l .° Obedecidas as normas e os princípios da Constituição Federal, o sistema

de educação escolar do Estado da Guanabara se orientará para a formação da perso­

nalidade do educando, sua promoção e perfeita integração na comunidade, como

elemento consciente de sua responsabilidade no progresso social.

Art. 2.° Ao Estado cabe coordenar, amparar e estimular todas as atividades educa­

tivas e culturais, orientando-as para o bem comum.

Art. 3.° O Estado ministrará ensino primário gratuito e obrigatório e desenvolverá

o ensino técnico-profissional de graus médio e superior, variado, multiplicado e ordenado

às exigências do desenvolvimento e do progresso tecnológico.

Art. 4.° A fim de assegurar igualdade de oportunidade a todos, a lei criará bôlsas-

de-estudo, destinadas aos carentes de recursos e que serão pagas diretamente ao

responsável ou ao educando, se fôr capaz, mediante critérios objetivos de seleção.

Art. 5.° . .Fica assegurado a todos, na forma da Lei, o direito de transmitir seus

conhecimentos e doutrinas.

Art. 6.° Caberá aos professores, dentro das diretrizes traçadas pela Lei Orgânica

do Ensino, plena autonomia didática e responsabilidade integral na aferição de resultados.

Art. 7° A Secretaria de Educação e Cultura exercerá as atribuições do Poder

Público estadual em matéria de ensino.

Art. 8.° Será votada a Lei Orgânica do Ensino da Guanabara, que se constituirá

em código de toda a legislação escolar.

Art. 9.° A lei criará o Conselho Estadual de Educação e Cultura, cujas atribuições,

além de outras, serão:

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I — Planejar anualmente a aplicação dos recursos estaduais destinados à educação,

especificando, dentro de critério de prioridade, os quantitativos globais destinados à:

a) manutenção, conservação e expansão da rede oficial de escolas públicas;

b) construção de novos estabelecimentos de ensino público, de acordo com dados

resultantes de levantamentos demográficos, condições sociais e exigências do mercado

de trabalho;

c) distribuição das bôlsas-de-estudo, em concursos públicos, mediante critérios de

seleção efetiva, que afastem a influência política ou a proteção administrativa.

II — Apresentar ao Governador e ao Secretário, bem como à Assembléia Legis­

lativa, informação completa sobre a situação do ensino no Estado.

Art. 10. A Lei instituirá o Fundo Estadual de Educação, cujos recursos serão

aplicados preferencialmente na manutenção e expansão da rede de ensino público.

Art. 11. A Lei organizará a carreira do magistério.

Art. 12. Os cargos do magistério oficial de qualqueri grau só poderão ser preen­

chidos por concurso de provas ou de provas e títulos.

Art. 13. Os estabelecimentos oficiais poderão contratar técnicos de reconhecida

competência para ministrai* aulas nos seus cursos.

Art. 14. O Estado da Guanabara aplicará nunca menos de 20% das receitas dos

impostos na manutenção e no desenvolvimento do ensino.

Parágrafo único. O Estado solicitará obrigatoriamente da União o auxílio pecuniário

de que trata o art. 171, parágrafo único, da Constituição Federal.

Art. 15. As empresas industriais, comerciais e agrícolas em que trabalhem mais

de 100 pessoas, contribuirão, anualmente, para o Fundo Estadual do Ensino, com a

quantia correspondente a 50 bôlsas-de-estudo integrais, de nível primário.

Parágrafo único. O Conselho Estadual de Educação fixará, no início de cada ano

letivo, o valor destas bolsas.

Art. 16. As empresas industriais e comerciais são obrigadas a ministrar, em coope­

ração com o Estado, aprendizagem de ofícios e técnicas do trabalho aos menores, seus

empregados, dentro das normas estabelecidas pela Lei Orgânica.

Art. 17. Ao ensino noturno, de adolescentes ou adultos de qualquer grau ou espé­

cie, será permitido calendário escolar próprio e independência na organização dos

currículos, orientados sempre para as necessidades do mercado de trabalho.

Art. 18. não haverá distinção de direitos, para qualquer fim, entre os estudos

realizados em estabelecimentos oficiais e os realizados em estabelecimentos particulares

reconhecidos, mantendo o Estado da Guanabara o regime de reciprocidade com relação

aos diplomas das demais unidades da Federação.

Art. 19. A reprovação, por falta de aproveitamento ou de freqüência, de aluno

de grau médio ou superior, matriculado em estabelecimento oficial ou beneficiário de

bôlsa-de-estudo, implica no cancelamento da matrícula ou na perda da bolsa concedida.

Art. 20. Fica criado o Serviço Estadual do Patrimônio Histórico, Artístico e Cul­

tural, com atribuições e recursos que serão fixados em lei.

Art. 21. O Estado promoverá a criação de bibliotecas públicas e a realização de

festivais de música, teatro e cinema, com fins educativos.

Art. 22. A Secretaria de Educação criará um centro de aperfeiçoamento para os

professores de grau médio do Estado, quer do magistério público, quer do particular.

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Art. 23. não são consideradas despesas com o ensino, para fins de elaboração

orçamentária:

a) as de assistência hospitalar, ainda quando ligadas ao ensino;

b) os auxílios e subvenções para fins de assistência e cultura.

DISPOSIÇÕES TRANSITÓRIAS

Fica reconhecido o direito de ingresso automático no magistério primário oficial,

na forma das leis e regulamentos anteriores, às alunas que, na data da promulgação

desta Constituição, estejam freqüentando os cursos normais oficiais do Estado.

Sala Afrânio de Melo Franco, em 3 de janeiro de 1961. — Gladstone Chaves de

Meio — Sandra Cavalcanti — Paulo Alberto Monteiro de Barros, vencido com voto

em separado consubstanciado em substitutivo já apresentado à Comissão Constitucional.

I I . Substitutivo do Dep. Paulo Alberto Monteiro de Barros

CAPITULO

Da Educação e Cultura

Art. — A função de educação e ensino compete ao Estado, na forma da Consti­

tuição Federal, incumbindo sua superintendência e direção ao Conselho Estadual de

Educação e Cultura, órgão autônomo, administrativa e financeiramente, nos termos desta

Constituição e da lei orgânica do ensino.

§ 1.° O Conselho Estadual de Educação e Cultura, além do seu Presidente, com-

por-se-á de seis membros nomeados pelo Governador, entre pessoas de reputação ilibada,

renovando-se de três em três anos pelo terço. As nomeações serão submetidas à

aprovação da Assembléia Legislativa, sendo vedada a nomeação de proprietários de esta­

belecimentos de ensino ou membros do respectivo Sindicato.

§ 2° O Conselho, cujas atribuições serão fixadas em lei Orgânica, funcionará

sob a presidência do Secretário de Educação e Cultura, seu membro nato.

§ 3.° O Conselho elegerá, por maioria absoluta, três pessoas de notório saber

em questões de ensino, dentre as quais o Governador escolherá o Diretor de Educação

e Cultura, cujo mandato será de quatro anos.

§ 4.° Ao Diretor de Educação e Cultura, competirão as funções de Administração

do sistema estadual de ensino e cultura, inclusive o exercício do poder disciplinar,

nos termos da lei orgânica.

§ 5.° Os membros do Conselho Estadual de Educação e Cultura, bem como o

Diretor de Educação e Cultura não poderão exercer atividades político-partidárias, sob

pena de perda dos cargos.

Art. — O Estado promulgará a lei orgânica do ensino e cultura, instituindo, obser­

vadas as diretrizes e bases da educação nacional, o sistema do ensino público e as

condições do particular, incluindo naqueles, além de escolas de todos os graus e ramos,

instituições extra-escolares destinadas à promoção e difusão da cultura física, científica

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e artística e de informação em geral, bem como de proteção ao patrimônio cultural, artístico e histórico.

§ 1.° A lei orgânica do ensino somente será reformada nas seguintes hipóteses: I — Quando se verificarem alterações nas bases e diretrizes nacionais, que impor­

tem na necessidade de fazer adaptações no seu texto; II — Quando assim o solicitar a maioria absoluta do Conselho Estadual, nos estritos

pontos a que se referir a proposta; III — Quando, por iniciativa do Governador ou de um terço da totalidade dos

Deputados, mediante proposta que obtenha aprovação da maioria absoluta da Assembléia. § 2° O Fundo de Educação será constituído com os recursos provenientes das

dotações orçamentárias do Estado, outros que a lei orgânica lhe atribuir e de quaisquer contribuições ou doações.

§ 3.° O Conselho Estadual de Educação e Cultura terá, também, iniciativa para propor à Assembléia Legislativa as leis complementares necessárias ao desenvolvimento dos princípios e diretrizes da lei orgânica do ensino e poderá baixar instruções e regulamentos para a fiel execução e desenvolvimento dos mesmos princípios.

§ 4.° O Conselho manterá os serviços que lhe incumbem com os recursos do Fundo de Educação a cujos cofres serão recolhidas as dotações orçamentárias do Estado e dos Municípios nos termos da Lei orgânica do ensino que regulará, também, as atividades financeiras do Conselho e estabelecerá as condições e normas de aplicação dos seus recursos, bem como, na proposta que deverá ser encaminhada à Assembléia, a especificação das verbas de suas despesas que devam ser incluídas no orçamento geral do Estado, no sentido de assegurar o rigor e a perfeita fiscalização dessa aplicação e a inviolabilidade desses recursos, de exclusiva destinação à obra de educação e cultura.

§ 5.° Constituirão reserva patrimonial do "Fundo de Educação" cinco por cento dos seus recursos anuais.

Art. — A lei orgânica do ensino, dentre outras providências, regulará: a) a obrigatoriedade do ensino primário público a todas as crianças de seis a

quatorze anos de idade; b) o acesso, mediante concurso, às vagas dos estabelecimentos públicos de ensino

médio, aos carentes de recurso; c) o acesso, mediante concurso de bôlsas-de-estudo e de manutenção, às vagas

dos estabelecimentos públicos de nível superior, aos estudantes carentes de recursos, e que revelarem maior capacidade;

d) a aplicação anual da quota constitucional mínima de 20% da receita estadual de impostos na manutenção e expansão da rede estadual: de escolas públicas de nível primário e médio e de formação do magistério primário;

e) a aplicação, na construção de escolas públicas de nível primário e médio, da taxa de 10% sobre o valor dos espólios nas transmissões causa-mortis e de 5% sobre o valor total das operações inter-vivos;

f) a liberdade da iniciativa privada para ministrar ensino de todos os níveis e ramos, nos termos da lei de diretrizes e bases da educação nacional e da Lei Orgânica do Ensino Estadual;

g) a criação e manutenção do ensino posterior ao primário, de caráter geral e vocacional, ajustado às condições do meio e suas necessidades educacionais;

h) o provimento, sempre por concurso de títulos, provas e estágio posterior, das cadeiras das escolas de formação pedagógica e das demais escolas de nível médio;

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i) a exigência da nacionalidade brasileira para os cargos de direção dos institutos

de ensino;

j) a situação funcional do magistério e dos auxiliares dos serviços de ensino e

cultura, cujos direitos e deveres serão regulados em estatuto próprio;

k) a organização do ensino público de nível primário em seis séries, divididas

em dois ciclos, o primário em quatro séries e o complementar de duas, estas últimas

equivalentes à primeira e à segunda do nível médio;

I) a organização do ensino público de nível médio, ministrado, seja em escolas de

ramos isolados, seja em centros compreensivos de ensino médio;

m) a organização do ensino pedagógico;

n) a organização do ensino superior;

o) a duração do ano e dia letivos (calendário escolar);

p) a obrigatoriedade, por parte do Conselho Estadual de Educação e Cultura,

de elaborar o plano Estadual de Educação, qüinqüenal, a ser submetido à Assembléia

Legislativa, que poderá, inclusive, controlar a sua execução.

§ 1.° A educação ministrada pelo Estado será gratuita em todos os seus graus

e modalidades.

§ 2° Os estabelecimentos particulares de ensino ficam isentos de qualquer

taxa ou imposto.

Estado da Guanabara, 2 de janeiro de 1961. — Paulo Alberto Monteiro de Barros.

I I I . Redação final aprovada em plenário

CAPÍTULO II

Da Educação e da Cultura

Art. 54. Obedecidos os princípios e as normas da Constituição Federal e das leis

complementares, o sistema do ensino do Estado orientar-se-á de acordo com as exigên­

cias do desenvolvimento do país, visando à formação do educando como elemento cons­

ciente de sua responsabilidade no progresso e na justiça social.

§ 1.° O Estado estimulará, por todos os meios ao seu alcance, as atividades cultu­

rais, procurando incentivar de modo especial as que reflitam a realidade brasileira.

§ 2° O ensino dos diferentes ramos será ministrado pelo Estado e é livre à

iniciativa particular, respeitadas as leis que o regulem.

§ 3.° O ensino primário nas escolas públicas será ministrado a todas as crianças

de 6 a 14 anos de idade.

Art. 55. São instituídos o Conselho Estadual de Educação e o Conselho Estadual

de Cultura, incumbidos de planejar e orientar, respectivamente, o ensino e as atividades

culturais, com organização e atribuições previstas em lei,

Art. 56. Serão destinados 22% das rendas tributárias do Estado para constituir

o Fundo Estadual de Educação e Cultura.

Parágrafo único. Os recursos do Fundo Estadual de Educação e Cultura serão apli­

cados, exclusivamente, na manutenção e no desenvolvimento do ensino público e das

atividades culturais do Estado.

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Art. 57. O Estado auxiliará a iniciativa particular no setor da educação, concedendo

financiamento aos estabelecimentos de ensino oficializados, de comprovada idoneidade.

com mais de 10 (dez) anos de existência.

Parágrafo único. A lei estabelecerá as condições segundo as quais os bancos do

Estado farão o financiamento de que trata este artigo, cabendo ao Conselho Estadual

de Educação apreciar e dar parecer sobre os respectivos pedidos.

Art. 58. As empresas industriais e comerciais são obrigadas a ministrar, em coope­

ração com o Estado, aprendizagem técnica aos menores, seus empregados, dentro das

normas estabelecidas pela Lei Orgânica.

Art. 59. A lei organizará a carreira de magistério.

§ 1.° Os cargos de magistério oficial, de grau médio e superior, só poderão ser

preenchidos por concurso de provas e títulos.

§ 2° O cargo de professor de ensino primário será provido, exclusivamente, por

professores formados pelos estabelecimentos oficiais de ensino normal mantidos pelo

Estado.

Art. 60. A educação dos excepcionais será objeto de especial cuidado e amparo

do Estado, assegurada ao deficiente a assistência educacional, domiciliar e hospitalar.

Art. 61. não será concedida licença para construção de conjuntos residenciais pelos

Institutos de Previdência, federais ou estaduais, sem que incluam edifícios para fun­

cionamento de escola primária com capacidade para seus prováveis moradores em idade

escolar.

Art. 62. O Estado deverá criar estabelecimentos oficiais de ensino médio nos

bairros ou núcleos de população superior ao 25.000 (vinte e cinco mil) habitantes.

Art. 63. À Universidade do Rio de Janeiro, organizada em Fundação, será assegu­

rada autonomia didática, administrativa, financeira e disciplinar, podendo ser acrescida

das instituições de ensino superior e de pesquisa científica ou de cultura artística,

inclusive as de aplicação técnica, pertencentes ao Estado.

§ 1.° Para custeio das atividades de pesquisa, de ensino, artes e desportos,

receberá a Universidade subvenção nunca inferior a 2,5% (dois e meio por cento) da

arrecadação tributária, cuja aplicação será obrigatoriamente apreciada pelo Tribunal de

Contas.

§ 2.° A mora na remessa das contas referentes à parte subvencionada, até o

quarto mês do exercício seguinte, interromperá o recebimento da subvenção do exer­

cício em curso.

§ 3.° Os saldos resultantes da aplicação da subvenção passarão a constituir um

fundo de reserva destinado à aquisição, dos bens patrimoniais das Faculdades integrantes

da Universidade, ou que a ela vierem a ser incorporadas.

§ 4.° A Universidade do Rio de Janeiro, com a denominação de Universidade cb

Estado da Guanabara, e suas unidades integrantes deverão, no prazo máximo de 60

(sessenta) dias após a promulgação da Constituição, enviar ao Patrimônio do Estado,

para tombamento, por intermédio do governador, a relação de todos os seus bens patri-

monais adquiridos com subvenções ou auxílios do Estado.

§ 5.° Caberá ao Estado o direito de fiscalizar a aplicação das subvenções, assim

como o de rever, em grau de recurso, os atos que envolvam matéria patrimonial ou

financeira da Universidade do Estado da Guanabara.

§ 6.° Caberá ao governador a nomeação do reitor, escolhido em lista tríplice

organizada pela Universidade na forma dos Estatutos.

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INFORMAÇÃO DO PAÍS

SERVIÇO AUDIOVISUAL NO

C . R . P . E . DE S . PAULO

Foi inaugurado a 14 de dezem­

bro último, no Centro Regional de

Pesquisas Educacionais de S. Paulo,

o Serviço de recursos audiovisuais,

instalado na Cidade Universi tár ia ,

com a finalidade de pres ta r assistên­

cia técnica aos estabelecimentos de

ensino no planejamento, produção,

t re inamento, utilização e distribui­

ção desses recursos indispensáveis à

didát ica moderna.

O Serviço possui o equipamento

exigido p a r a suas atividades, haven­

do laboratório de som destinado à

produção de filmes, laboratório foto­

gráfico, sala especial p a r a produção

de mater ia is gráficos, além de má­

quinas de projeção pa ra filmes, dia-

filmes e diapositivos.

INSTITUCIONES BRASILEÑAS DE INVESTIGACION

EDUCACIONAL

com esse título, o boletim de in­formações culturais e pedagógicas La Educación en America da OEA (Organização dos Es tados America­nos) divulga, num de seus últ imos números, amplo informativo sobre a e s t ru tu ra e ação do I N E P , bem como dos Centros Regionais de Pesquisas Educacionais .

O SENAI E A INDUSTRIALIZA­ÇÃO DO PAIS

Ao deixar a direção do SENAI, o Prof. Joaquim Faria Góis proferiu estas palavras:

O SENAI nasceu há quase duas décadas, como um dos instrumentos de processo da industrialização do país. Não bastava a crescente aqui­sição de máquinas. Urgia ampliar-se a nossa capacidade de preparar homens para operá-las, mantê-las em funcionamento e, com o andar dos tempos, fabricá-las aqui mesmo.

Um novo conceito legal, o da obrigação de os industriais reali­zarem a aprendizagem "sistemática" dos seus trabalhadores, foi instituí­do e alçado mais tarde ao plano de preceito constitucional.

Por essa forma o Estado asso­ciava-se á empresa privada na fixa­ção de um dever social, na sua rea­lização e no seu controle.

Bons fados fizeram com que um ministro idealista, Gustavo Capane­ma, convocasse dois homens de li­vre empresa, de excepcional espírito de liderança, Roberto Simonsen e Euvaldo Lodi, e alguns educadores com longos serviços e especialização neste setor, um dos quais, Roberto Mange, sempre presente na vida do SENAI, mesmo depois de morto.

Recebemos por igual, em 1939, o privilégio de participar dos estudos iniciais da organização do novo ser­viço, juntamente com Francisco

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Montojos e Lycerio Schreinrer, an­tes com sua prestigiosa presença nesta solenidade. Mais tarde, João Luderítz veio associar-se ao grupo.

Em 1952, surgiu o ato legal da criação do novo serviço e o nosso ingresso em funções de sua direção até o dia de hoje.

No princípio havia só um decre­to e nem um centil nos cofres. Vie­ram a seguir, e lentamente, as pri­meiras arrecadações, os primeiros serventuários, a estruturação de ór­gãos, os cursos pioneiros em prédios provisórios, as primeiras construções escolares, as primeiras máquinas, os programas iniciais, até a realidade dos nossos dias da maior rede de ensino profissional para operários existente na América Latina.

Dezoito anos foram gastos nesse labor fascinante, que granjeou cres­cente apreço em vários países e sig­nificativo julgamento de organismos internacionais que nos têm assistido com missões de técnicos estrangei­ros, com bôlsas-de-estudo para trei­namento de nosso pessoal e com es­tágio de administradores de países americanos, para a observação da solução brasileira, já adotada cm al­guns deles.

Nessa linha de confiança no trabalho do SENAI há que registrar-se com desvanecimento, a decisão do EXIMBANK concedendo-lhe um em­préstimo de US.$ 4.500.000,00 para aquisição de equipamento. com rela­ção a entidades de ensino, o fato ocorreu pela primeira vez na histó­ria daquele organismo de crédito de Washington.

Na evolução do SENAI, cabe re­gistrar o zelo na obediência a cer­tas diretivas e a certas práticas que

se constituíram afinal uma tábua de valores.

A primeira atitude foi a de jun­tarmos em nossa equipe gente de boa qualidade. Rememoramos o traba­lho de joalheiros dos iniciadores do SENAI, descoberta de jovens enge­nheiros o educadores.

Desde logo fêz-se o SENAI uma escola de lealdade aos ideais da ins­tituição, de cultivo e dedicação à obra e de renúncia a propósitos es­tritamente pessoais.

Constituiu-se, ao mesmo tempo, numa escola profissional de forma­ção de administradores, através de um plano consciente e sistemático de treinamento de equipes, o pró­prio desempenho de tarefas suple­mentado por cursos e estágios, al­guns no estrangeiro, nos casos indi­cados.

Foi, por último, uma escola de decência, em todos os sentidos que este termo deva ser usado, criadora de clima de respeito recíproco e de preservação dos recursos da insti­tuição, inteiramente aplicados em prédios escolares, máquinas, ferra­mentas, material didático e no pa­gamento de administradores, técni­cos e professores.

Regras aparentemente tão sin­gelas, aplicadas a um corpo de ser­ventuários, escolhidos por processos seletivos, explicam, no nosso enten­der, a existência de um forte espí­rito de comunidade, de preservação de uma obra nacional, isto é, per­tencente à nação.

com essa repeita, foi possí­vel atravessar quase duas décadas, vários governos, várias administra­ções da Confederação e das Federa­ções da Indústria, com a conserva­ção quase completa do mesmo qua-

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dro de diretores, fato inteiramente inusual em nosso meio.

Em plena fase de sua expansão nos seus aspectos numéricos, geográ­ficos, patrimoniais e técnicos e de conquista da opinião pública, a obra não se transformou em centro de empreguismo. Uma equilibrada di­visão de poderes entre homens de empresa e educadores assegurou tal estrutura.

Outro aspecto de nossa história é o da experiência sucedida, a pri­meira que se faz em nosso país, tão preconizada por vários estudio­sos da administração escolar — da gestão de um sistema de ensino In­teiro, em regime de autonomia didá­tica, financeira e administrativa, através de Conselhos Regionais e di­retorias locais, sem entraves buro­cráticos, agindo com presteza, com flexibilidade e capacidade de adapta­ção às pecularidades locais.

Este é o patrimônio que estamos transmitindo ao novo diretor do De­partamento Nacional, Prof. Abelar­do Oliveira Cardoso, antigo aluno de escola profissional, graduado como professor pela antiga Escola Nor­mal Wenceslau Braz, membro do magistério das escolas industriais e diretor de Escola Técnica de Belo Horizonte.

Do fundo da alma, os nossos de­sejos e os nossos votos são no senti­do do completo sucesso de S. Exa., para benefício e progresso da insti­tuição a que demos tanto de nós mesmos.

Sabemos que o processo inflacio-nário determina não somente a que­bra de valores materiais, como os de natureza ética, aqueles a que deve­mos maior valor que aos técnicos, tão próprios em nossa instituição.

Esperamos que o grande investi­mento feito em prédios e equipamen­tos, em homens e em ideais, assegu­re à estrutura do SENAI a solidez necessária para resistir a tal conti-gência e que os horizontes da espe­rança, que se abrem para o país nesta hora, derramem a sua luz sobre esta

instituição. Retiro-me de sua direção como

um premiado pelas demonstrações tão significativas dos últimos três meses, de tantos nomes expressivos na educação do país e dos meus amigos, serventuários e chefes deste e dos

Departamentos Regionais, aos quais manifesto a minha pro­funda gratidão.

O IBECC EM SAO PAULO

O Instituto Brasileiro de Educa­ção, Ciência e Cultura foi criado em 1946, para cumprir compromissos as­sumidos pelo Brasil na Convenção de Londres, que instituiu a UNES­CO.

A Seção de São Paulo do IBECC, instalada em 1950, vem desenvolven­do um programa que visa:

1 — Incentivar nos jovens o interesse pela Ciência.

2 — Melhorar o ensino das Ciências nas escolas mé­dias.

3 — Auxiliar o ensino e a pes­quisa nas escolas superio­res.

1 — como iniciativas destinadas a despertar e incentivar nos estudan­tes brasileiros o gosto e o interesse peias matérias científicas, mantém o IBECC:

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REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS

a) o Clube de Ciências, cujos associados recebem periodicamente jornais que os orientam na execução de experiências, publicações estas elaboradas por professores de alto ní­vel e cientistas que se oferecem pa­ra colaborar. Cada um desses bole­tins contém 30 ou mais descrições de experiências, inicialmente fornecen­do todos os dados e evoluindo para sugestões de experimentos mais de­licados. Para o Clube de Ciências, o IBECC de São Paulo estudou, pro­duz e fornece, a preço de custo, kits — laboratórios de estudante — que permitem a realização de expe­riências, estando disponíveis, no mo­mento, os seguintes: Ciências, Quí­mica, Física (Eletricidade e Eletrô­nica) e Biologia. Além desses, estão sendo fornecidas também "Caixas de Ciências", unidades especiais para experiências de: eletromagnetismo, radioatividade (Geiger), rádio trans­missor, Genética, síntese de políme­ros, hormônios vegetais o outras. Mais de 8.000 kits estão atualmente em uso no País e mesmo no Exte­rior, sendo que também escolas se utilizam destes conjuntos econômi­cos.

b) o Concurso Cientistas de Amanhã — com o patrocínio das Or­ganizações Novo Mundo — Vemag, o Instituto realiza, anualmente, um certame destinado a revelar jovens com talento científico. Dez estudan­tes, classificados por trabalhos apre­sentados, são levados à Reunião Anual da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência, durante a qual são entrevistados por Cientis­tas, sendo escolhidos os três primei­ros colocados, que recebem prêmios em dinheiro e bôlsas-de-estudo con­cedidas pelo Ministério da Educação, pela Federação das Indústrias de

São Paulo e, eventualmente, por ou­tras Entidades.

c) a Feira de Ciências, que teve sua primeira apresentação, com gran­de sucesso, em 1960, e na qual foram apresentados trabalhos realizados por alunos das escolas secundárias do Estado de São Paulo, sob a orien­tação de seus professores. Consti­tui uma oportunidade para os professores d

e Ciências demonstrarem ao público em geral o trabalho silencio­so e incógnito realizado em suas es­colas.

d) a Casa do Cientista de Ama­nhã, onde professores e estudantes secundários podem adquirir material de laboratório, a preço de custo, e onde são realizadas, semanalmente, demonstrações sobre determinados assuntos das matérias científicas de 1» e 2° ciclos.

e) um programa de divulgação científica pela televisão, apresenta­do semanalmente, com a duração de 30 minutos, que já foi realizado du­rante cerca de um ano (1959/1960), está planejado em novas bases para 1961.

2 — com o objetivo de reformar o ensino científico, pelo emprego de método experimental, demonstração de leis, e ensinando o real signifi­cado do método científico, vem o IBECC de São Paulo desenvolvendo os seguintes setores:

a) Produção de material — O Instituto estuda, projeta e fabrica equipamento para o ensino experi­mental das Ciências, fornecendo-o a preço de custo às escolas, sem inter­mediários. O equipamento é proje­tado com a finalidade de evitar du­plicidade de peças, sendo, ao mesmo tempo, satisfatório do ponto-de-vista científico, pedagógico e econômico.

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Constituído de partes, como um "me-cano", evita a utilização de apare­lhos especiais, com os quais se de­monstram leis e fenômenos aparen­temente "especiais", para dar a pos­sibilidade de serem procuradas (e encontradas várias) condições expe­rimentais para observar-se determi­nado fenômeno. Mais de 2.000 esco­las utilizam hoje esse equipamento, podendo-se afirmar que tal movi­mento realmente iniciou, entre nós, do ponto-de-vista de intensidade e qualidade, o ensino experimental das Ciências nas escolas médias. Os for­necimentos têm sido feitos direta­mente às escolas, ou através do Mi­nistério da Educação, por seus ór­gãos INEP e CADES, ou ainda aten­dendo a solicitações das Secretarias de Educação de vários Estados do País.

b) Instruções para professores — Incluem, no momento: Instruções avulsas para experiências, de Físi­ca e de Biologia, e Demonstrações selecionadas para Química (algumas em tradução autorizada pela "Ma-nufacturing Chemists' Association, Inc."). Essas publicações, que acom­panham o equipamento fornecido às escolas, têm sido utilizadas nos cur­sos para professores, realizados pelo Instituto, e serão fornecidas gratui­tamente a qualquer professor ou en­tidade que as solicite.

c) Cursos para professores — Vêm sendo ministrados vários, e de vários tipos, atendendo a solicitações de diversas Entidades, como a Secre­taria da Educação de Minas Gerais, o SENAI, etc, e destacando-se os ministrados no CATEC (Centro de Aperfeiçoamento de Técnica do En­sino de Ciências), mantido pela CADES junto ao IBECC de São Paulo.

d) Associação de professores de Ciências do Brasil — A.P.C.B. — Trabalhando para fins idênticos aos do Instituto, realiza seu Congres­so Anual na Reunião Anual da S.B.P.C. Distribui a seus associa­dos, periodicamente, as publicações do IBECC e outras de interesse para o ensino experimental.

e) Prêmios a professores — No Concurso Anual "Cientistas de Ama­nhã", são destinados dois prêmios de viagem e um em dinheiro a professores que

se destacarem pelas suas atividades em prol da melhoria do ensino das Ciências, e na Sessão de Educação da S . B . P . C , são confe­ridos prêmios em dinheiro para pro­jetos de aparelhos.

3 — Desde 1955, vem o IBECC de São Paulo atendendo a pedidos de equipamento de laboratório que lhe são dirigidos por Escolas Supe­riores e Institutos de pesquisa em ge­ral, e está à disposição deles para fabricar equipamento padronizado ou especial, destinado ao ensino ou à pesquisa. com o auxílio de vários especialistas, e de um corpo de téc­nicos e operários cada vez mais se­lecionado, e ainda contando com má­quinas de precisão doadas pela Fun­dação Rockefeller, procura-se aper­feiçoar a organização deste serviço.

O Instituto tem suprido, espe­cialmente, escolas médico-biológicas, com material para Fisiologia e Far­macologia, Bioquímica e Química, Anatomia, Histologia, Microbiologia, Clínica e Cirurgia Médica. Dispõe, também, de outro equipamento des­tinado a escolas de Engenharia, De­partamentos de Física e História Na­tural de Faculdades de Filosofia, etc.

O IBECC de São Paulo mantém, em estoque, produtos químicos para

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pesquisas, particularmente os produ­zidos pela "Sigma Chimical Co.", or­ganização sem fins lucrativos, e que foi responsável pelo desenvolvimen­to da pesquisa bioquímica nos Esta­dos Unidos e no mundo, em geral.

Essas realizações da Seção Pau­lista do IBECC tornaram-se possí­veis, e vêm sendo ampliadas, graças a auxílios e subvenções recebidos das seguintes entidades: Governo do Estado de São Paulo, Fundação Ro-ckefeller, Universidade de São Pau­lo, Ministério da Educação (INEP, CADES e CAPES), Conselho Nacio­nal de Pesquisas e numerosas Indús­trias particulares.

CAMPANHA NACIONAL DE EDU­CANDÁRIOS GRATUITOS

Recebemos da Presidência da Campanha, com pedido de publica­ção, o artigo a seguir, da Prof Eliana Maria de Oliveira, assessora pedagógica da Diretoria. O cotejo dessa matéria com as apreciações feitas sobre o funcionamento da Campanha, no trabalho publicado em o nº 78 desta Revista, sob o título "Tendências antagônicas do ensino secundário brasileiro" do Prof. Jai­me Abreu, parece-nos suficientemen­te elucidativo

CAMPANHA NACIONAL DE EDUCANDÁRIOS GRATUITOS

Sua contribuição ao ensino ão Brasil

Nascida de puro idealismo, vi­brando ainda hoje desde o Acre ao Rio Grande do Sul, graças à força deste ideal que a mantém corajosa

e desbravadora como um bandeiran­te incansável, lutando decidida e va­lentemente para firmar-se na concei­tuação das necessidades brasileiras, esta Campanha traz a mais viva e exata característica "dos tempos".

Surgida em pleno século XX, marca-se através da época em que vive. Acompanha, com muita ex­pressão e domínio de consciência, a marcha vertiginosa dos aconteci­mentos e ciclos sucessivos, na evolu­ção natural da res publica.

Isenta das exigências burocráti­cas, realiza-se através de suas carac­terísticas específicas, como entidade de cunho eminentemente democráti­co, sem discriminação religiosa, étni­ca ou social, apoiando-se na movi­mentação comunitária, preocupando-se com, a imperiosa necessidade da difusão do ensino, tornando-o aces­sível a todos os brasileiros.

A quantos compatrícios vem es­ta Campanha beneficiando? E de que maneira vem prestando sua co­laboração?

Aporta em terras "nunca dantes visitadas" pelos Poderes Competentes e sem medir esforços, iça a bandeira da salvação, para os sequiosos do saber e da cultura.

Este é, em nosso entender, um dos maiores atributos do seu valor como entidade, de amplitude nacio­nal. Atinge pontos distantes, afas­tados dos centros urbanos, e até de difícil acesso, executando, com seus parcos recursos, programas de in­tensa repercussão social, econômica e educativa acima de tudo, transfor­mando, em alguns casos, pequenos núcleos em verdadeiros centros de­senvolvidos e prósperos, como é o caso de Inhapim, Minas Gerais, on-

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de 70% dos habitantes locais, possi­velmente, deixariam sua comunidade para estudar fora, ou ficariam com os rudimentos da educação primá­ria, o que nem sempre satisfaz.

com a presença do Ginásio de Inhapím, o mercado de livros ascen­deu consideravelmente e a vida só­cio-econômica foi atingida de modo extraordinário e surpreendente.

Este não é um caso esporádico, outros se intensificam pelo Brasil a dentro, onde as comunidades se reúnem para aquisição dos prédios próprios e material didático.

Em Caravelas, na Bahia, tudo se faz para o Ginásio Santo Antônio, com a participação efetiva da Comu­nidade, onde uma Associação de Pais presta grande serviço à causa do en­sino.

Em Goiás, por exemplo, dos 13 estabelecimentos nove (9) possuem sede própria, o que vem rati­ficar nossa assertiva, do trabalho comunitário. Alagoas é outro exem­plo de esforço e desenvolvimento em benefício da sede própria, pela mo­vimentação da comunidade. Minas Gerais, o Estado do Rio e em quase todas as unidades da Federação há o interesse pela sede própria.

£ realmente um empreendimen­to sui generis de âmbito nacional; recebendo subvenção dos poderes públicos, continua como entidade privada, gozando de independência funcional, caracterizando seus obje­tivos, vinculando-se às iniciativas públicas, fazendo educandários para atender ao povo, nas mais diversas condições de suas necessidades.

Falamos em fazer porque expres­sa melhor nosso sistema educativo, onde há uma realização específica. Ela se faz sem qualquer mescla de

comercialismo, sem fins lucrativos, logo, sem exigir alunos. Ela exige dos alunos estudo, aprendizagem, conhecimentos sólidos.

somente fornecendo os elementos a tal exigência, poderá tomar uma posição de pedir, de reclamar. não se pode exigir de alguém uma coisa, se não se deu a este alguém os meios de que necessita para responder a esta situação.

Desta forma, a CNEG com todo o seu idealismo, com todos os seus adeptos, vem ministrando, na medi­da do necessário, ensino público, atendendo de modo especial às exi­gências da Lei Orgânica do Ensino no Brasil.

Escusamo-nos de uma tabela comparativa entre o custo do aluno cenegista e o do estabelecimento do Governo. Lembramos que a pesqui­sa poderá ser feita pelos interessa­dos, e que as diferenças a nosso fa­vor são surpreendentes, motivo por que deixamos aos curiosos tão sim­ples tarefa.

Iniciamos as atividades educa­cionais em qualquer estabelecimento fundado, com a aprovação do órgão competente, existindo, para isto, o processo de inspeção e verificação prévia das condições mínimas indis­pensáveis, previstas para funciona­mento.

Quando nos referimos à obra ce­negista, pois, assim, já nos podemos expressar, conceituada que é pela consagração do uso popular, — atri­buímos à Campanha Nacional de Educandários Gratuitos o designati-vo de TERCEIRA força, no sis­tema educacional em que vivemos. Sem interesses particulares, dá ensi­no popular, gratuito, sem contudo

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estar mesclada pela exigência de no­meações para seus educandários. Mantém-se livre das interferências afilhadisticas, cabendo a cada diretor escolher seu corpo docente.

Recebendo subvenções do Governo Federal, Estadual e Municipal,

e contribuições de sócios e particu­lares, vem realizando à custa de tra­balhos árduos, persistentes, continua­dos, uma verdadeira tarefa de ex­pansão do ensino, divulgando na sua missão quase evangelizadora, as idéias básicas de orientação educati­va, para o crescimento do povo bra­sileiro, assinalado pela cegueira de elevada percentagem de analfabetos.

Sui generis na sua forma, o é mais ainda na sua substância ínti­ma, porque vem implantando, ape­sar das dificuldades, um sistema de escola comunitária, não experimen­tado pelo Governo ou pelo particu­lar.

E este o aspecto, a nosso ver, que merece todas as atenções, todos os esforços e incentivos a fim de consubstanciar-se, expressivamente na realidade brasileira!

Se a escola secundária no siste­ma educacional brasileiro vem se­guindo caminhos movediços, sem concretizar in totum seus objetivos e finalidades, se a cada passo, uma nova introdução curricular é posta à prova, como sutil experiência, para fixação de horizontes mais adequa­dos e reais, por que, então, não exa­minar e melhor estudar a forma que pretende a integração da comunida­de na obra e sua participação na vida escolar? Aproveitá-la conve­nientemente como padrão de novas experiências, seria objeto de exame por parte das autoridades,

Outro sério problema, longe do alcance de públicos e particulares, é a penetração deste tipo de escola, nas mais distantes áreas do solo pá­trio.

Qual a repercussão deste aspec­to da obra cenegista? Além de sa­tisfazer às exigências e solicitações dos interessados, cria em torno da escola meios de fixar o homem à sua terra. Permite, em excelentes con­dições desenvolver o habitat físico, do ínteriorano. Evita a tão decan­tada evasão das gentes, problema até hoje bastante estudado e discu­tido, sem ter uma solução adequada.

Na simplicidade de sua compo­sição, na riqueza de sua estrutura, vem a Campanha Nacional de Edu­candários Gratuitos realizando um belo programa de ensino, de notáveis proporções educativas, desconhecido por muitos que não lhe dão o ensejo de um conhecimento mais detido e minucioso da especificidade que lhe é peculiar.

Despertando a consciência comu­nitária para o problema do ensino, fazendo com que atue verdadeira­mente na escola, o Educandário Ce­negista reveste-se de um caráter fa­miliar, onde todos cooperam para um fim comum: a educação.

com os seus 373 estabelecimen­tos distribuídos em todo o Brasil, apresenta:

1. Ginásios 285

2. Escolas de Comércio 29

3. Escolas Técnicas de Comércio 35

4. Escolas Normais 20

5. Colégios 4

Total 373

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cujas sedes próprias, quer construí­das ou em construção, inclusive ter­renos para futuras construções, re­presentam uma afirmativa da carac­terística da escola comunitária cene­gista, construída com os recursos da comunidade coadjuvados pelos pode­res públicos.

Um estudo minucioso sobre cada tipo de estabelecimento cenegista se­ria nosso principal objetivo, mas dei­xamos aos interessados a sugestão das visitas in loco, onde poderão ter o retrato mais vivo do que vem fa­zendo, do que possui a CNEG.

Vejamos alguns aspectos do nos­so trabalho:

Atualmente registramos a pre­sença de diretores, professores, alu­nos do sexo masculino e feminino. É uma avalanche de pessoas beneficia­das com os estabelecimentos da Campanha.

Um total de 35 000 alunos, de ambos os sexos, é servido por cerca de 3 000 professores, que dedicam toda

atenção ao magistério cenegista, imbuído pelo ideal que move tão no­bre causa. Que seria de tantos alu­nos se não existisse a CNEG? E quantos já não passaram em suas escolas, e hoje, após brilhante con­cursos, servem à causa pública, ou continuam com extraordinário pro­veito, nos bancos universitários. Um número elevado de alunos cenegistas tem-se distinguido nos primeiros lu­gares, para aquisição de bôlsas-de-estudo do MEC, em concursos esco­lares, em maratonas intelectuais etc. etc.

Há uma acentuada preocupação dos nossos diretores na socialização dos alunos, através de um núcleo, onde se possa introduzir uma educa­ção mais gregária.

E que existe, na nossa rede de escolas, Grêmios Estudantis, Conse­lhos de Estudantes, Clubes e Cen­tros ou Diretórios Escolares, para um aprimoramento educativo dos alunos.

Ê através dessas atividades lite­rárias, recreativas, esportivas que se desenvolve e se forma uma menta­lidade democratizada, ajustada aos ditames do nosso regime constitucio­nal.

Comemorações cívicas e de natu­rezas outras são calorosamente pre­paradas e levadas a efeito pelos alu­nos cenegistas. O índice que possuí­mos destas homenagens crendencia-nos a enumerar algumas:

1. Tiradentes

2. Independência do Brasil

3. Proclamação da República

4. Dia da Bandeira

5. Dia da Arvore

6. Dia das Mães

7. Dia do professor

8. Festa de autoridade (Diretor)

9. Festa Junina

10. Data da criação do Município

11. Dia da Asa

15. Semana da Pátria (Palestra)

13. Dia do Trabalho

14. Dia da Juventude

15. Semana da Pátria (Palestra)

16. Semana do índio

17. Dia do Soldado

18. Constituição Brasileira (Pales­

tra).

Excursões com objetivos educa­tivos são realizadas. Passeios de confraternização são efetivados para maior cordialidade entre alunos e professores.

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O aluno cenegista tem no seu mestre o amigo, o conselheiro, a quem dedica especial atenção nas aulas e nas conversas amigáveis, em periodo extraclasse.

O aluno cenegista é olhado com desvelo e dedicação. É por vezes, e no mais das vezes, vítima sacrifica­da pelas circunstâncias de uma vida dura de trabalhos e afazeres na li­de quotidiana. Após 8 horas de tra­balho consativo, dirige-se aos bancos escolares para, num esforço supremo, enriquecer sua inteligência, desen­volver suas aptidões, na esperança de um trabalho mais suave e com­pensador. Isto leva nossos professores a

aceitarem, por idealismo, uma situação menos condizente com o salário-aula, em vigor, para perma­necer durante anos nessa missão no­bre de educar os desprovidos da sor­te. O que mais nos encanta é que procuram atualizar-se, gastam até mais do que a Campanha lhes ofe­rece, em busca de novas técnicas, no­vos métodos de ensino.

Há trabalhos que o dinheiro não move a realizá-los, mas o idealismo sim. Embora não se possa viver apenas de idealismo, daí porque ape­lamos para a ajuda de todos: pode­res públicos e particulares. O di­nheiro muitas vezes não remunera condignamente a extensão e profun­didade de trabalhos, como os que vêm sendo desenvolvidos pela Cam­panha. Porque haveria o interesse, muito comum das coisas regiamente pagas, permanecendo em plano se­cundário o objetivo primeiro da obra a executar, muito embora isto não constitua uma regra.

E o caso de professores que têm freqüentado com sucesso absoluto cursos da CADES em diversas loca­lidades: Friburgo, Belo Horizonte,

Niterói, Guanabara, Campos, Santa Maria, São Luís, Vitória, Recife. Di­retores que freqüentam seminários, jornadas, cursos de especialização, para melhor atender às necessidades dos alunos cenegistas, o que é co­mum nos quadros dos Educandários Cenegistas.

Nossos diretores e professores, em muitíssimos casos, são os mesmos dos mais ricos estabelecimentos de algumas localidades, bem como de escolas públicas, razão por que não implica mérito pertencer ao qua­dro de outros educandários, mas per­tencer à CNEG é motivo de satisfa­ção e sentido de realização pessoal, pelo trabalho que se tem oportuni­dade de desenvolver.

Reuniões de professores, de Pais e Mestres, Associações ou Clubes de Pais vêm sendo incentivadas e de­senvolvidas, na realização da esco­la cenegista, como centro de comu­nidade.

O professor cenegista, quando integrado nos quadros da Campanha, torna-se autêntico na sua profissão, revela-se em identidade perfeita com o objetivo a alcançar, junto ao edu­cando. Alguns se salientam de tal maneira nesta identidade quase fi­losófica que deixam de receber suas gratificações para beneficiar o edu­candário, haja vista o caso dos gi­násios de Concórdia, em Santa Ca­tarina, e Perdões, em Minas Gerais, onde os professores deixaram de re­ceber por vários anos suas gratifica­ções para ajudar a construção da sede própria.

Há muitos outros casos em que diretores e professores dispensam gratificações, dando seus esforços à CNEG por idealismo, apenas.

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Quanto à situação junto ao MEC é outro assunto palpitante, mas que nos deixa tranqüilos porque a Inspe­ção Federal ainda vive e milita nos nossos educandários, senão freqüen­temente, pelo menos periodicamente, como e quando pode.

não cabe à CNEG realizar atri­buições de outros órgãos. Ela alerta, solicita e procura orientar, no sen­tido de regularização dos seus esta­belecimentos, mas, uma vez criados, com a anuência das Inspetorias Se­cionais, cabe-lhes os trabalhos com­plementares.

Outro aspecto da obra cegenista reside evidentemente no aproveita­mento dos alunos recém-formados e Concluintes de didática, das Facul­dades de Filosofia.

esses professores são prepara­dos pelas Faculdades e têm, por campo de experiências, os próprios ginásios e colégios de Aplicação. O que em hipótese alguma exclui a condição de serem excelentes mes­tres, desde que tenham sido suficien­temente orientados para o exercicio da nova profissão. Se mal houver nesta atitude, quem responde por ela? A CNEG ou as Faculdades?

Evidentemente, este trabalho quase experimental, dos recém-for­mados, apenas se realiza nas capi­tais e, com raríssimas exceções, nas cidades do interior dos Estados.

Mesmo nas capitais, também não atinge grandes proporções, por­que nesta a CNEG possui 57 estabe­

lecimentos distribuídos em todo o o País, resultando uma média míni­ma de atendimentos.

com a maioria de seus educan­dários na zona rural, 336, vem a CNEG cumprindo um programa de elevado sentido educativo, permitindo na maior parte dos casos desenvol­ver-se a formação de uma nova men­talidade cultural, que por vezes fal­tava à localidade, tornando-a, então, mais aceitável aos seus habitantes, porporcionando-lhe vantagens de re­conhecido valor sócio-económico, através dos empreendimentos que por força da permanência do edu­candário vão surgindo.

E por natureza fenômeno ocorri­do por um processo lento, mas im­plantado com o objetivo de produzir resultados satisfatórios, o que vem acontecendo, para gáudio de todos os brasileiros.

Rio de Janeiro, 12 de dezembro de 1960.

ALUNOS ESTRANGEIROS NA UNIVERSIDADE DE S. PAULO

De acordo com estatísticas reali­zadas pela Divisão de Difusão cul­tural da Universidade de S. Paulo, cerca de 637 estudantes estrangeiros estavam freqüentando, em 1960, os diversos institutos universitários, distribuídos nessa ordem:

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Regulares Matr iculados (todas as na- por força de

cionalida- convênios TOTAL

des) cu l tura is (*)

INSTITUTOS UNIVERSITÁRIOS

Faculdade de Direito Escola Politécnica Escola "Luiz de Queiroz" Faculdade de Medicina Facu ldade de Filosofia Faculdade de F a r m á c i a e Odontologia Faculdade de Medicina Veter inár ia . . Facu ldade de Higiene e Saúde Pública Faculdade de Ciências Econômicas Faculdade de Arqui te tura e Urbanismo Facu ldade de Medicina de Ribeirão

P re to Escola de Engenha r i a de São Carlos Escola de Enfe rmagem de Ribeirão

Pre to Ins t i tu to de Zootecnia e Indús t r i a s

Agropecuár ias

TOTAIS GERAIS

R E A T O R ATÔMICO NA U N P / E R -

SIDADE DE MINAS G E R A I S

Foi inaugurado a 11 de novem­

bro último, na Cidade Universi tár ia ,

o rea tor atômico "Tr iga" do Inst i­

tu to de Pesquisas Radioa t ivas da

Escola de Engenhar i a da Universi­

dade de Minas Gerais. Ê o segundo

rea tor atômico instalado no país.

FUNDAÇÃO OTÁVIO MANGABEIRA

com a finalidade de encaminhar

solução para o problema do déficit

escolar, foi designado pelo governador

50 — 50 100 27 127

3 14 17 27 21 48

151 20 171 31 12 43 14 12 26 50 — 50 27 3 30 28 10 38

— 15 15

13 6 19

1 — 1

1 1 2

496 141 637

do Estado da Guanabara Comissão

com o encargo de organizar a Fun­

dação Otávio Mangabeira, em decreto

cuja justificação e teor transcreve­

mos:

DECRETO Nº 294 — DE 7 DE

DEZEMBRO DE 1950

Constitui Comissão incumbida de

providenciar solução para o pro­

blema do déficit escolar.

O a tua l déficit escolar no Es tado da Guanabara assume proporções cuja extensão exige mobilização ge­ral pa ra solução do problema.

(*) Latino-Americanos. Divisão de Difusão Cultural, novembro de 1960.

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Além de procurar por seus pró­prios meios solucionar a questão, o Estado deseja, e até mesmo deve estimular todas as tentativas de co­laboração oriundas da iniciativa pri­vada.

Já se encontram em fase inicial os esforços de várias entidades e pessoas no sentido de instituir uma fundação destinada a intensificar a construção de escolas para todos; tem o Estado o dever de contribuir por todos os meios possíveis para essa obra.

Nenhuma homenagem do povo carioca poderia melhor corresponder ao sentimento de gratidão pelos ines­timáveis serviços prestados à defesa das instituições democráticas e re­presentativas em nosso País pelo ilustre brasileiro Otávio Mangabeira, do que ligar o seu nome a uma obra de tão elevadas finalidades.

Pelo exposto, o Governador do Estado da Guanabara, usando das atribuições que, na conformidade da Lei Federal nº 3.752, de 14 de abril de 1960, lhe confere o item II, § 1º, do artigo 25 da Lei n° 217, de 15 de janeiro de 1948, decreta:

Art. 1º — Fica constituída comis­são composta do Secretário de Esta­do da Educação e Cultura, do Secre­tário de Estado de Agricultura, In­dústria e Comércio, do Presidente do Banco do Estado da Guanabara e do Secretário do Governo, para en­trar em imediato entendimento com as pessoas físicas e jurídicas que, no âmbito da iniciativa privada, já se ofereceram para contribuir com os recursos necessários à instituição de uma Fundação destinada a cola­borar com o Estado na solução do problema do déficit escolar.

Art. 2º — A Comissão acima de­signada terá o prazo de 15 dias para apresentar os estatutos e tomar as demais providências indispensáveis ao imediato funcionamento da Fun­dação.

Art. 3º — A instituição deverá ter o nome de Fundação Otávio Man­gabeira.

Art. 4º — Revogam-se as dispo­sições em contrário.

Rio de Janeiro, 6 de dezembro de 1960, 72º da República e 1º do Estado da Guanabara.

CARLOS LACERDA.

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INFORMAÇÃO DO ESTRANGEIRO

UNESCO E OS NOVOS ESTADOS AFRICANOS

Apresentando à Conferência Ge­ra l da Unesco o plano orçamentár io p a r a o exercício 1961-62, o Diretor Geral, Vittorino Veronese, teceu as seguintes considerações:

não há dúvida de que o progres­

so econômico e social dos países sub­

desenvolvidos constitui o problema

crucial de nossa época. Ao compas­

so das novas necessidades, o próprio

conceito de educação sofreu trans­

formações, sendo entendido hoje

como o meio de propiciar a formação

integral com vista ao exercício de

uma profissão e de acordo com, as

responsabilidades que lhe cabem na

família e na comunidade, seja local,

nacional ou universal. como poderia

a Unesco ser indiferente aos pro­

gramas de assistência técnica desti­

nados aos países menos favorecidos,

quando número tão considerável de

estados africanos vem de alcançar

sua independência f Sem romper o

justo equilíbrio entre as atividades

específicas do programa ordinário e

incumbindo-se de novas tarefas re­

sultantes do programa de assistên­

cia técnica, orçado aproximadamen­

te em dose milhões de dólares, a

Unesco deveria interessar-se de mo­

do particular pelo progresso técnico

e científico, pensando no porvir da

indústria, do comércio, de todas as

atividades humanas.

O problema é por vezes mais grave. Para dar uma idéia da imen­sidão das necessidades a cobrir, va­le citar o caso dos países de língua árabe, em que cerca de 87 milhões de crianças em idade escolar care­cem de meios de instrução. Na Áfri­ca Equatorial outros 17 milhões de crianças estão sem professores, li­vros ou escolas. Todos esses países devem realizar um esforço extraor­dinário, porém a comunidade inter­nacional deve ajudá-los a encontrar soluções adequadas. A Unesco, nes­se terreno, beneficia-se da experiên­cia adquirida com sua campanha pe­la generalização do ensino na Amé­rica Latina. Temos de agir pronta­mente e, assim sendo, propomos vá­rios planos especiais para a África do Sul e Países Árabes.

A presença de novos países inde­pendentes impõe-vos obrigações ex­traordinárias não só em relação ao ensino primário como ao técnico, mé­dio e superior.

A EDUCAÇÃO NO COMITÊ DOS 21

O Comitê dos 21, reunido de 5 a 18 de setembro de 1960, aprovou medidas p a r a o desenvolvimento eco­nômico e social dos países america­nos no quadro da "Operação Pan -Americana" .

Das Recomendações ao Conselho

da Organização dos Es tados Ameri­

canos, t ranscrevemos a que se refere

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às medidas pa ra o aperfeiçoamento dos s is temas e instalações de ensino e t r e inamento :

Reexame dos sistemas de ensino, prestando-se especial atenção a:

1. desenvolvimento de métodos mo­dernos de instrução maciça, para a eliminação do analfabetismo;

2. adequação do treinamento nas artes e ciências industriais, dan­do-se a devida importância aos trabalhos de laboratório e prá­ticos, bem como a aplicação dos conhecimentos à solução de pro­blemas sociais e econômicos;

3. necessidade de ministrar instru­ção nas escolas rurais, não somente nas

disciplinas fundamen­tais, como também em matéria de agricultura, saúde, higiene, nutrição e métodos de melhora­mento doméstico e comunitário;

4. ampliação dos programas de es­tudo das escolas secundárias, no sentido de ministrarem o treina­mento necessário ao pessoal de escritório e diretor da indústria, comércio, administração pública e serviços comunitários;

5. ensino comercial e industrial es­pecializado em função das neces­sidades comerciais e industriais da comunidade;

6. instrução vocacional agrícola, e 7. formação superior de adminis­

tradores, engenheiros, economis­tas e outros profissionais de im­portância para o desenvolvimen­to econômico.

a abertura de um crédito de 5 bi­lhões e 600 milhões de dólares, em donativos e empréstimos às escolas primárias, secundárias e universida­des. O crédito aberto será aplicado com os seguintes objetivos: constru­ção de novos estabelecimentos de en­sino ou ampliação dos existentes; aumentar os salários dos professores e financiar

os cursos universitá­rios dos estudantes pobres.

Do crédito solicitado, 2 bilhões e 300 milhões de dólares seriam divi­didos equitativamente entre os Es­tados da União, cujos governos po­derão aplicá-los, a seu critério, na construção de estabelecimentos de ensino e no aumento de salários de professores. 577 milhões de dólares serão destinados ao financiamento dos estudos superiores dos estudantes pobres, por intermédio da concessão de 212.500 bôlsas-de-estudo. Estas, de acordo com o projeto, serão con­cedidas "sem consideração ao sexo, côr ou crenças religiosas e filosófi­cas dos candidatos".

Por outro lado, o presidente Kennedy, primeiro católico a ocupar a presidência dos Estados Unidos, declara em sua mensagem que "de acordo com a proibição expressa da Constituição, os fundos do Estado não se destinam aos estabelecimen­tos particulares de ensino, inclusive os mantidos pelas diversas seitas re­ligiosas, nem ao pagamento ou eleva­ção de salários dos professores das citadas instituições".

CRÉDITO PARA A EDUCAÇÃO AMERICANA

O presidente John Kennedy en­viou ao Congresso, a 20 de feverei­ro último, projeto de lei que prevê

OBJETIVOS DO E N S I N O SECUNDÁRIO

Pesquisa empreendida pelo Bu­

reau Internacional de Educação sobre os

programas secundários consta­

tou que a formação intelectual é o

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objetivo mais freqüentemente men­

cionado, com 52% das respostas, vin­

do em seguida a formação social dos

futuros membros da coletividade

(37% das respostas), a preparação

aos estudos superiores (S6%), desen­

volvimento físico (compreendendo a

aquisição de hábitos de limpeza e

higiene), a formação moral e reli­

giosa, assim como o desenvolvimen­

to de aptidões artísticas.

São também mencionadas a for­

mação científica e técnica e a edu­

cação cívica.

A ESCOLARIDADE NA AMÉRICA LATINA

Pesquisa efetuada recentemente,

sob os auspícios da Unesco, avaliou

em 4.600.000 o número de crianças

que freqüentam a escola nos países

da América Latina.

Constatou ainda o aumento dos

créditos destinados à educação nes­

ses países, paralelamente ao aumento

da escolaridade. Restam, entretanto,

muitos problemas a resolver: assegu­

rar a instrução a quinze milhões de

crianças sem escola, formação de

500-000 novos mestres, construção de

prédios e fornecimento de material

escolar.

NOVO SISTEMA DE V E R I F I C A ­ÇÃO DE A P R E N D I Z A G E M

O Conselho de Instrução Públi­

ca da Iugoslávia adotou novo pro­

cesso de verificação de aprendiza­

gem. Além da apreciação expressa

em nota de 1 a 5, utiliza-se a nota

descritiva, com o objetivo de indicar

os setores em que o aluno se sobres­

saiu, em quais é deficitário, bem

como a natureza dessas deficiências,

permitindo que se possa ajudar o

aluno a superá-las em breve espaço

de tempo.

Os alunos poderão opor objeções,

cabendo a última palavra ao Conse­

lho de professores.

EDUCAÇÃO DA JUVENTUDE NA INGLATERRA

O relatório da Comissão Consul­t iva Central sobre a educação dos jovens entre 15 e 18 anos, cujo pri­meiro volume foi publicado em de­zembro de 1959, sob o t í tulo "Rela­tório Crowther", expõe o p rog rama a ser executado num período de vinte anos, encerrando entre out ras estas recomendações:

1) Fim da escolaridade obrigatória

estendida até aos dezesseis anos,

a partir de 1966;

2) Instrução obrigatória em tempo

parcelado, a partir de 1970, para

jovens de a7nbos os sexos de 16

e 17 anos, que não prossigam

seus estudos;

3) Melhor integração do ensino pós-

escolar no sistema educativo, fa­

cilidades concedidas aos traba­

lhadores que seguem cursos,

particularmente os que formam

técnicos; transformação dos di­

versos programas de formação

profissional em um sistema na­

cional orgânico;

4) Estudo experimental, em escola

local ou regional, exames "ex­

ternos" que se realizam ao fim

do 5º ano secundário;

5) Medidas destinadas a impedir a

especialização prematura ou ex­

cessiva nas g r a m m a r schools;

6) Medidas diversas para facilitar o

recrutamento de professores.

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INTERCÂMBIO CULTURAL E N T R E E . U . A . E U . R . S . S .

Foi prorrogado por dois anos

acordo celebrado entre o Governo

amreicano e o soviético para o inter­

câmbio científico e cultural. Cerca

de 85 estudantes e instrutores, bem

como 20 professores das principais

universidades de cada país, vão de­

morar-se por dois anos em contato

com institutos científicos e educa­

cionais.

COOPERATIVAS ESCOLARES E M C H I P R E

Em 1958, havia em Chipre 700,

cooperativas escolares com 70.000

membros inscritos. Nelas as crianças

aprendem os princípios gerais de

economia e cooperativismo por meio

de contribuições pequenas, mas re­

gulares. Aos poucos vão compreen­

dendo as vantagens de colocar suas

economias a serviço da coletividade.

Salvo circunstâncias excepcionais, os

depósitos não podem ser retirados

nem pelos pais, nem pelos alunos,

a não ser ao fim do ano letivo.

T E R C E I R O PLANO QÜINQÜENAL DA ÍNDIA

O Ministério da Educação da

União Indiana prevê um orçamento

de 9.800.060,000 Rs para a educação

no terceiro plano qüinqüenal. Os

orçamentos do primeiro e do segun­

do planos se elevavam respectiva­

mente a 1.690.000.000 Rs e 2.750.000.000 Rs; pouco mais da metade dessa

quantia destina-se à difusão do en­

sino primário, incluindo bôlsas-de-

estudo e a distribuição gratuita de

uma refeição nas escolas.

EDUCAÇÃO POPULAR NA SUÉCIA

Cerca de 750.000 suecos aumen­

tam seus conhecimentos participan­

do de círculos de estudo que funcio­

nam em todo o país. Em dez sue­

cos, mais de um se dedica às ativi­

dades educativas extra-escolares gra­

tuitas e voluntárias que complemen­

tam o ensino oficial. São ao todo

72.000 círculos com 10 membros ca­

da. Ocupam eles apreciável espaço

de tempo nas horas de lazer dos

suecos, concorrendo com programas

de rádio, televisão e esportes. O

setor mais popular de sua organiza­

ção é o artístico (música, canto, tea­

tro, cinema), seguindo-se os de ciên­

cias sociais, línguas, economia, co­

mércio, indústria e religião. Os

membros de um círculo podem estu­

dar qualquer assunto de sua escolha:

encadernação, cozinha, línguas (in­

glês, francês, alemão, espanhol, rus­

so, latim, esperanto), cultura física,

marcenaria, escultura, literatura sue­

ca moderna, legislação social (pro­

teção aos empregados) "Nossa Cida­

de" (atribuições do Conselho Muni­

cipal) e música.

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LIVROS

AZEVEDO, Fernando de — Novos Ca­minhos e Novos Fins. (A nova po­lítica de Educação no Brasil). 3º edição, Melhoramentos, São Paulo, 1958, 256 págs.

O professor Fernando de Azeve­do oferece, aqui, "subsídios para uma história de quatro anos" — o quadriênio 1927-1930, durante o qual planejou e executou, na qualidade de diretor-geral da Instrução Públi­ca, profunda e ampla reforma do en­sino. Na Folha da Manhã de janeiro de 1932 (ano cm que foi lançado o livro) Hermes Lima escrevia: "O movimento de renovação pedagógica brasileira ganhou com o novo li­vro . . . a batalha intelectual que êle vem travando para precisar e escla­recer, entre nós, seus postulados, seus princípios e suas técnicas. O livro possui unidade doutrinária admirável. não se trata de ensaios mais ou menos desarticulados, sim­plesmente destinados a assinalar idéias ou sugerir pensamentos sobre os problemas da educação. Ê obra inteiriça que expõe, comenta e de­fende um sistema integral de educa­ção e, portanto, de criação de valo­res sociais e humanos". (Suple­mento Literário de O Estado de São Paulo)

BARROS, Roque Spencer Maciel de — A Ilustração Brasileira e a Idéia de Universidade, Fac. de Filosofia da

Univ. de S. Paulo, Boletim n' 241, S. Paulo, 1959, 411 págs.

Nesse trabalho, o autor exami­na exaustivamente os diversos esforços

de renovação da mentalidade brasileira através da educação, cons­tituindo, assim, preciosa contribui­ção para a história das idéias no Brasil.

Para Roque Spencer, a razão principal do êxito do positivismo en­tre nós decorreu de fornecer "a dou­trina de Comte uma límpida filoso­fia da história, a servir como guia da ação desembocando numa teoria geral da educação". Sendo assim, nenhum instrumento serviria melhor aos nossos intelectuais preocupados em integrar o país na cultura oci­dental. E nota, a este propósito, que, enquanto a ortodoxia positivis­ta, ou mesmo a teoria comtista da ciência, tinha um raio de ação limi­tado, sua filosofia da história encon­trava impressionante aceitação: "ba­charéis de todos os quilates, ainda quando ignorassem os demais aspec­tos da doutrina comtiana, aplaudiam quase unanimemente a lei "científi­ca" dos três estados".

E havia motivo para esse encan­tamento dos nossos intelectuais do último quartel do século XIX, por­que, voltando-se para o passado, Au­gusto Comte estudara a natureza e a marcha das civilizações desde a

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pré-história até os seus dias. Pro­curando o fio diretor das transfor­mações sociais, quer econômicas, quer intelectuais e morais, realiza­das no decorrer dos séculos, des­prendeu do conjunto dos fatos ana­lisados, essa lei que lhe pareceu pre­sidir tanto à evolução coletiva quan­to à do indivíduo.

como salienta Levy-Bruhl, "em vez de deter-se na realidade concre­ta da história, Comte determinou, através de uma abstração ousada, a lei do movimento essencial da socie­dade humana, "deixando a trabalhos ulteriores — como êle mesmo o diz — o cuidado de reduzir a ela as ano­malias aparentes".

Ao apreciar a lei dos três esta­dos, no artigo da Enciclopédia Fran­cesa consagrado à evolução do pensa­mento, observa, por seu lado, Abel Rey: "Comte foi o primeiro a pro­curar descrever a evolução do pensa­mento partindo dos fatos, isto é, da sua história, em vez de tomar por base as teorias dialéticas do conheci­mento, a psicologia e a lógica tradi­cional... Augusto Comte (pai espi­ritual de Durkheim e da sua escola) já previra, de modo notável, desde o primeiro quartel do século XIX, atra­vés da história ainda tão rudimen­tar das civilizações, os resultados a que deveriam chegar, se desprezar­mos as minúcias, os etnólogos e so­ciólogos atuais no atinente ao ponto de partida que poderíamos designar para uma história do pensamento... O essencial — conclui Abel Rey — é não considerar os três estados como etapas bem nítidas que a humanidade houvesse sucessivamente percorrido. O próprio Comte insistiu a esse res­peito: são as diversas manifestações intelectuais que passam por essas três estapas, separadamente e em

momentos diversos para cada uma delas".

A aplicação da filosofia positi­vista da história à realidade brasi­leira — comenta o autor — "ao mes­mo tempo que a esclarecia, possibi­litava traçar um programa de ação". E cita, para estear a sua afirmativa, o seguinte trecho de Pereira Barre­to:

"Sabemos agora para onde va­mos. Temos a chave do futuro; pos­suímos o fio condutor que, com se­gurança, nos dirige através do pre­sente dédalo social; podemos nitida­mente determinar a nossa situação mental e prever o desfecho inevitá­vel que o complexo do passado reser­va às gerações, que nos hão de su­ceder".

A obra de Pereira Barreto — observa ainda Roque Spencer — "re­vela o amadurecimento da idéia po­sitivista na consciência nacional e a sua fecundidade na interpretação de nossa realidade social, mental e política. O terreno estava preparado para a ofensiva positivista, que não iria fazer-se apenas por meio do fu­turo "Apostolado", mas principal­mente pela "heterodoxia" dos bacha­réis, fiéis aos postulados básicos do liberalismo, mas acreditando convic-tamente na verdade incontestável da lei dos três estados".

E, realmente, sem a existência entre nós de um ambiente saturado de positivismo, devido aos que, em graus diversos, muito antes do apos­tolado, e fora dele, aderiram às li­nhas básicas das doutrinas de Au­gusto Comte, a influência destas úl­timas no momento da fundação da República teria sido um milagre tão inexplicável quanto o de Minerva ao sair armada do almo, escudo e lan­ça, da cabeça de Júpiter.

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A nova tese do professor Roque Spencer Maciel de Barros — A Ilus­tração Brasileira e a Idéia de Uni­versidade, como a que antecedeu sobre

Luís Pereira Barreto, comprova a capacidade de pesquisador do novo docente da Universidade de São Pau­lo e o importante papel que sem dú­vida vai desempenhar na historio-grafia da cultura brasileira.

IVAN LINS

LISBOA, J. Carlos — O estudo de le­tras neolatinas no Brasil. Separa-ta de Decimália, Biblioteca Nacio­nal do Rio de Janeiro, Rio, 1960. 18 págs.

Fixa o professor J. Carlos Lis­boa neste opúsculo as linhas da atual estrutura dos cursos de Letras Neolatinas no Brasil, dando nas pá­ginas iniciais uma síntese da histó­ria de sua instituição e sucessivas alterações e, nas finais, mais de uma valiosa sugestão para seu aprimora­mento. Em trabalhos anteriores, já se havia o professor J. Carlos Lis­boa ocupado desse assunto, interes­sado e experiente que é nele, como professor de Língua e Literatura Es­panhola nas universidades do Brasil e de Minas Gerais, há mais de quin­ze anos.

Entre as críticas que faz à orga­nização dos cursos de Letras Neola­tinas, uma há que é nuclear e que merece os maiores aplausos. Tendo a Faculdade Nacional de Filosofia (padrão para a maioria das demais), por força de lei, a finalidade de "preparar trabalhadores intelectuais para o exercicio das altas atividades culturais de ordem desinteressada ou técnica" e juntamente preparar

professores para o magistério secun­dário e normal, não parece necessá­rio insistir na tese de que fins tão diversos se devem objetivar com pro­cessos e instrumentos igualmente di­versos; a verdade, entretanto, é que contra a atual situação (coincidên­cia quase total de currículos e pro­gramas para formar bacharéis ou li­cenciados) poucas vozes se erguem e, dentre essas poucas, quase todas se limitam ao lamento improdutivo de um estado de coisas que é preciso antes combater que simplesmente condenar. O professor J. Carlos Lis­boa é um dos pouquíssimos que têm trabalhado nesse sentido, mas infe­lizmente não esteve nunca a seu al­cance adotar as providências que se fazem necessárias.

O aplauso que ora lhe tributa­mos não implica, entretanto, a acei­tação total e imediata das sugestões que faz para a organização de novos currículos para esses cursos: maté­ria delicada como essa, e de cujo tratamento depende a correta ou in­correta direção dos estudos de uma grande coletividade, não se pode tra­tar sem vagar e longa reflexão, e é justamente a isso que convida a publicação que aqui se noticia. Ê indispensável e também urgente que outros professores interessados e ex­perimentados no ensino de letras em nível superior ofereçam sua contri­buição à causa a que se dá tão inte­gralmente o autor dessa Decimália, e possam, a êle reunidos e devida­mente assistidos pelos poderes públi­cos, promover o exame e definitiva solução desse problema.

Uma única observação, e de or­dem muito geral,, queremos fazer, agora, a seu projeto de currículo pa­ra o curso do bacharelado (págs. 13 e 14): parece-nos que conserva — ao

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lado das melhorias que introduz — um aspecto essencialmente negativo do currículo atual, qual seja o ex­cessivo número de cátedras por sé­rie (sete, sete, cinco, cinco), ao mes­mo tempo que renuncia a dar aos estudantes uma orientação precisa nas duas séries finais, onde as cinco disciplinas são todas escolhidas a critério dos próprios estudantes.

Quando, há tempos, se anunciou, nesta mesma página, a publicação dessa Decimália, ficamos na suposi­ção de que nela se ia tratar do esta­do atual dos estudos de Letras Neo­latinas no Brasil, considerados os resultados de sua instituição e os problemas de métodos a eles ineren­tes; desses aspectos, porém, não tra­ta o professor J. Carlos Lisboa e, em­bora não estivesse obrigado a fazê-lo, deu-nos, com isso, um desconso­lo. Sendo o que são esses estudos e sendo esse professor um dos mais autorizados a atacar tais problemas, esperávamos com ansiedade que o fosse fazer agora, e de público lhe queremos manifestar o desejo de que não retarde a empresa.

Mais do que a constituição dos currículos e dos programas, parece-nos imperioso para o progresso e melhoria qualitativa dos estudos de letras no Brasil que se discuta a re­forma e a própria concepção que deles se

tem nas Faculdades de Filoso­fia, a começar pela da Universidade do Brasil. As dimensões deste re­gistro são insuficientes sequer para a enumeração dos vícios e omissões que entravam seu desenvolvimento ideal, alguns dos quais estão intima­mente vinculados a outros vícios e omissões de toda a Faculdade e da própria Universidade. como um dia afirmou o ilustre professor Manuel Rodrigues Lapa a respeito da Uni­

versidade portuguesa, da nossa po­demos, igualmente, dizer que é ana­crônica pela observância do princípio de vitaliciedade das cátedras, que, uma vez ocupadas — e tantas me­diante duvidosos concursos a que só um concorre e a que se nega inscri­ção pelos motivos mais fúteis ou de­savergonhados —, asseguram a seu detentor total impunidade e intangi­bilidade, coisas que se confundem ali facilmente com a noção de liber­dade de cátedra. Ora, liberdade de cátedra não é a liberdade de não saber ou de, sabendo, não promover o ensino.

Já dissemos que não cabem nu­ma simples nota sequer a enumera­ção de tais vícios e omissões; por isso mesmo encerramos de pronto es­te comentário, com a reafirmação do interêresse e da oportunidade da pu­blicação da Decimália que em tão boa hora o diretor da Biblioteca Na­cional encomendou ao professor J. Carlos Lisboa.

HÉLCIO MARTINS

MOREIRA, J. Roberto — Educação e Desenvolvimento no Brasil, Centro Latino-Americano de Pesquisas So­ciais, Publicação nº 12, Rio, 1960, 298 págs.

Ainda que, em vários de suas páginas, peque por excesso de sim­plificação a respeito de assuntos ex­tremamente complexos, o livro que o professor Roberto Moreira acaba de publicar sobre Educação e Desenvol­vimento no Brasil apresenta-se como um notável esforço no sentido de es­tabelecer a correlação que, desde os começos da era colonial, se vem verificando entre o desenvolvimento brasileiro e os sistemas de ensino em

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vigor na sociedade aqui fundada pe­los portugueses. É livro que deve ser lido por antropólogos, sociólogos, economistas, psicólogos, homens pú­blicos, líderes religiosos e não apenas por educadores, o grupo a que per­tence o autor.

Pois é como especialista em as­suntos de educação que o professor Moreira vem-se afirmando nos meios intelectuais não só do Brasil como das Américas. Apenas, no seu ca­so, o culto da especialidade ilustre em que é, hoje, mestre, não significa indiferença pelo que nos problemas de educação é matéria social, impos­sível de ser compreendida ou domi­nada pelo especialista que se feche, quer no puro pedagogismo, quer no puro economismo. Daí a amplitude que o professor Roberto Moreira dá ao seu estudo, baseando-o, para tan­to, em antropólogos, historiadores, economistas, sociólogos, dos quais procurou assimilar inteligentemente informações idôneas e aproveitar oportunamente sugestões esclarece­doras, adaptando-as ao seu sistema e ajustando-as ao objetivo específico do seu trabalho.

E lamentável que, por vezes, seu afã de esquematização chegue a ex­tremos tais que as omissões prejudi­cam a objetividade dos seus resumos históricos. É o que ocorre, por exem­plo, com sua afirmativa de ter sido o movimento chamado "modernista", no Brasil, de exclusiva origem pau­lista, quando no Recife o modernis­mo regionalista e tradicionalista se desenvolveu, desde o seu início sobre sua

própria assimilação de su­gestões ou de estímulos estrangeiros — europeus e anglo-americanos — e sobre sua própria maneira de reagir a sugestões, até então aproveitadas pelos regionalistas apenas caipiristas

ou pelos simples exploradores do "pi­toresco" ou do "histórico", dos vá­rios passados e das várias situações regionais brasileiras.

Ê também o que ocorre quanto à reforma do ensino realizada em 1928 pelo professor A. Carneiro Leão, em Pernambuco: assunto pelo qual o professor Moreira passa de raspão, esquecido de que a mesma reforma, entre outras inovações que introdu­ziu no Brasil, importou no começo do ensino da Sociologia moderna, acompanhada, para fins pedagógicos, de pesquisas de campo e a estas de caráter ecológico ou regional. De uma dessas pequenas pesquisas, re­sultou ter o Recife se antecipado a São Paulo como a cidade brasileira que primeiro teve playgrounds; ini­ciativa, em 1929, do então prefeito Costa Maia.

Outras omissões do professor Moreira: deixa de dar relevo ao tra­balho que realizaram, no nosso país, missões culturais ou técnicas de nor­te europeus e anglo-americanos que contribuíram de modo notável para o desenvolvimento técnico do país em várias especialidades: arquitetu­ra (Missão Francesa, sob Dom João VI), botânica (Germain, no Horto de Olinda), geologia (Hartt e seus discí­pulos), engenharia (Gorceux), arqui­tetura, urbanismo (Vauthier e seus colaboradores). esses mestres e ou­tros estrangeiros vieram ao Brasil a convite de homens públicos que se aperceberam da necessidade da in­trodução em nosso país de novas técnicas e de novas ciências, recla­madas pelo desenvolvimento brasilei­ro. Nisto foram precedidos, aliás, de modo magnífico, pelo Conde Maurí­cio de Nassau. Quando Governador do Brasil holandês, Nassau fêz do Recife um centro em que se ensaia-

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ram novas técnicas de construção de pontes, de aberturas de canais, de urbanização de área tropical, através das quais se esboçou, no Bra­sil, um nada desprezível começo de desenvolvimento urbano que, por muito tempo, seria recordado pelos brasileiros de origem predominante­mente lusitana como um "tempo dos flamengos" notável por alguns aspec­tos do seu progresso ostensivamente material.

Lamentável é, também, que de um livro como o do professor Morei­ra não conste o reconhecimento do que vem representando como renova­ção dos métodos, senão do ensino, de estudo, entre nós — estudo asso­ciado ao desenvolvimento nacional — esforços como o de Tobias Barre­to, no Recife, quando se empenhou pela maior aproximação do Brasil com a cultura alemã; o de J. B. La­cerda, Roquette Pinto e Froes da Fonseca, no Museu Nacional, como reorientadores do estudo cientifica­mente antropológico do mestiço bra­sileiro (reorientação com evidentes repercussões sobre a orientação do ensino, entre nós); o de Ulysses Per­nambucano, no Recife; o de Lsaías Alves, na Bahia.

A verdade, porém, é que se trata de trabalho em que às informações valiosas se juntam sugestões inteli­gentes. De algumas dessas suges­tões, pode o leitor discordar. Mas sem deixar de reconhecer no autor de Educação e Desenvolvimento no Brasil um homem de estudo sincera­mente empenhado em concorrer pa­ra o esclarecimento dos problemas brasileiros de educação, relacionados com as condições de desenvolvimen­to econômico, em particular, e social, em geral, peculiares ao Brasil.

GILBERTO FREYRB.

SODRÉ, Nelson Werneck — O que se deve ler para conhecer o Brasil. Centro Brasileiro de Pesquisas Educacionais, Rio de Janeiro, 1960, 388 págs.

* Trata-se da segunda edição deste livro, que pretende encaminhar

quantos careçam de informações se­guras acerca da vida brasileira nos seus mais variados e complexos as­pectos. Desde logo fique certo que é uma segunda edição, profundamen­te alterada pelo enriquecimento de dados e pela reforma, não só do pla­no do livro, mas da maneira de pro­por os assuntos que o autor teve em vista como necessários a um co­nhecimento objetivo de nossas reali­dades, no passado e no presente.

Uma obra desse tipo deve ser realizada por equipes de especialistas que, no seu campo próprio, estejam em condições de, num mínimo, es­clarecer, sugerir, informar com se­gurança. Todo esforço, em conse­qüência, resulta de um trabalho preparatório, que exigiu anos de es­tudos, de pesquisa, de coleta de ma­terial. E ainda nesses casos, dado que o Brasil cresce dia a dia, no exa­me que dele fazem os que o anali­sam com olhos de ver, a informação pode pecar por falha, pobre, ultra­passada. O estar em dia com os as­suntos, num país onde os homens de espírito, os investigadores, os analis­tas se desconhecem, não mantêm contato, ignoram-se no que produ­zem; num país em que as investiga­ções que se processam nas províncias ficam mortas nessas mesmas provín­cias, sem que a nação se aperceba do trabalho intelectual intenso que

* Transcrito da Revista Síntese, n.° 7 — jul.-set., 60, Universidade Católica, Rio.

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ocorre, esse estar em dia com os as­suntos significa heroísmo digno de menção especial. Ora, acontece que aquela equipe ainda não se organi­zou. não há, mesmo, notícia de que qualquer entidade nacional se tenha preocupado em lançar-se a tarefa desse porte e significação. O remé­dio será, portanto, satisfazermo-nos com a atividade individual, mesmo que ela possa ser inquinada de infe­rior, insatisfatória. É certo que já se fêz tentativa arrojada, quando um grupo, sob orientação de Rubens Borba de Morais, elaborou o chama­do "Manual Bibliográfico de Estudos Brasileiros", que foi realmente uma esplêndida demonstração das possi­bilidades de execução de obra daque­le gênero. Tentativa sem continua-dores que visassem ao aperfeiçoa­mento da contribuição, merecedora do aplauso e ajuda oficiais.

O Sr. NELSON WERNECK SODRÉ,

com uma decisão muito louvável, vencendo dificuldades que bem pode­mos imaginar na extensão em que elas se tenham apresentado, reuniu nesse livro um mundo de informa­ções utilíssimas, garantindo roteiro bibliográfico a quem se inicia no conhecimento do Brasil. Roteiro sem pretensões, sem que se sinta no autor a preocupação da impeca-bilidade, sujeito, por isso mesmo, a reservas ou dúvidas, nem por isso merece que o ignoremos ou o ne­guemos. Seja, em conseqüência, essa nossa afirmativa, uma demonstração de nossa primeira simpatia pelo esforço

realizado.

Essa simpatia não exclui certas reservas que poderíamos fazer, a propósito de algumas informações menos completas. Vejamos um exem­plo — o caso da independência. Será que se pode falar hoje no processo

de encerramento do período colonial português ignorando o que ocorreu em certas províncias, como a Bahia, Pernambuco, Piauí, Maranhão e Pa­rá? Se não tivesse ocorrido a luta armada contra o poder econômico e o poder político-militar de que os portugueses dispunham naqueles trechos do Brasil-norte, a integra­ção nacional teria sido perfeita? O imenso espaço territorial e o espaço social de que tanto nos orgulhamos seria hoje, realmente, a imensidade que nos caracteriza? Parece-nos que ignorar o esforço que os brasileiros daqueles distritos revelaram, no sen­tido de continuarem partes integran­tes do Brasil que despontava para a vida soberana, não fica bem num roteiro de informações, do tipo do que o Sr. Nelson Werneck Sodré organizou com tanto carinho e tanta dignidade cultural. Aquele esforço foi imenso e importou na melhor de­monstração que as populações nor­tistas podiam revelar, na exterioriza­ção de seus sentimentos de brasili-dade. Sem êle, a retalhação da pá­tria se teria verificado, numa frag­mentação que nos transformaria em outras várias pequenas Repúblicas como as que resultaram do império espanhol. Ademais, esse esforço já tem a sua história narrada, em cer­tos detalhes, por eruditos regionais, como Manuel Correia Garcia, Brás do Amaral, Pereira da Costa, Alfre­do de Carvalho, Abdias Neves, Viei­ra da Silva, Raiol, Palma Munia, que bem mereciam a referência ao que escreveram como fruto de pesquisas em arquivos.

Queremos, por fim, fazer uma referência especial ao capítulo sobre "A Catequese Religiosa", elaborado com critério sério e bem de acordo com o que já é possível afirmar. A

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nossa observação refere-se à biblio­grafia apontada. Notamos a falta de registro do livro fundamental sobre a ação das ordens religiosas na Ama­zônia, "The Indian Policy of Portu­gal in the Amazon Region", 1614-1693, de Mathias C. Kiemen, O. F. M., M. A., editado pela The Catolic Uni­versity of America Press, Washing­ton, D. C. 1954. Notamos, ainda, au­sência de referência aos dois livros de maior importância acerca do as­pecto econômico das missões do Pa­raguai, e que são: Magnus Moerner, "The Political and Economic Acti-vities of the Jesuits in the La Plata Region", edição de The Hapaburg Era. Stockolm, 1953; e Oreste Po-pescu. "El sistema econômico en laa Missiones Jesuiticas", Editorial Pam­pa Mar, Bahia Blanca, 1952. Seria interessante registrar, por fim, os ensaios magníficos, baseados na imensa documentação microfilmada

nos arquivos europeus pelo grupo que organizou, em Porto Alegre, o Instituto Anchietano de Pesquisas, divulgados na revista "Pesquisas", de que já circularam três excelentes nú­meros, ensaios alentados, como se­jam, entre vários outros, "La Com­panhia de Jesus en el antiguo Guai-ra (1589/1631)", de Luis Gonzaga Jaeger S. J.; "O Sistema de Proprie­dade das Reduções Guaraníticas" de Arnaldo Bruxel S. J.

As observações que fazemos não podem nem devem ser tomadas como restrições com objetivo negativista. Ao contrário, visam a uma coopera­ção para que, em próximas edições, o autor possa enriquecer a obra com maiores dados, com elementos bibliográficos que mantenham o seu livro como um livro essencial a quem quiser iniciar-se no estudo do Brasil.

ARTHUR CÉSAR FERREIRA REIS.

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R E V I S T A S

SOCIOLOGIA POLÍTICA DA LEI DE DIRETRIZES E BASES

J. ROBERTO MOREIRA

Introdução ao exame objetivo dos debates

Para o exame objetivo dos debates em torno do Projeto de Lei de Dire­trizes e Bases da Educação Nacional, ora em curso no Congresso Nacional, é indispensável que consideremos, de um lado, as ideologias que inspiram o projeto e os debates, e, de outro lado, os fatos concretos da sociedade bra­sileira (econômicos, culturais e políticos) que condicionam aquelas ideolo­gias.

Importa, desde logo, determinar em que sentido devemos tomar a pala­vra "ideologia", cuja existência lógica é anterior ao marxismo. Na sua Mémoire Sur Faculte de Penser e no seu Project d'Élements d'Idéologie, ambos escritos entre 1796 e 1801, DESTUTT DE TRACY considera a ideo­logia como ciência que tem por objeto o estudo das idéias, de seus caracte­res, de suas leis, de suas relações com os sinais que as representam e, sobre­tudo, de suas origens.

Já que grande parte das idéias usuais (políticas e filosóficas) perdem a relação primitiva com os fatos reais que as originaram, como se tivessem valor e conteúdo em si, na primeira metade do século XIX, a palavra ideo­logia perdia seu valor primitivo, no sentido de DESTUTT DE TRACY, para assumir outro, um tanto pejorativo, com debate ou discussão vazios, median­te o uso exclusivo de idéias abstratas, que não correspondem a fatos reais.

Finalmente com MARX e ENGELS, sob a influência da sociologia econô­mica, nascente na segunda metade do século XIX, a palavra ideologia passou a significar um conjunto de pensamentos, desligados da realidade, conjunto esse que se desenvolve abstratamente, jogando com idéias em si, mas que, apesar disso, não deixa de ser indiretamente a expressão de fatos sociais e econômicos. Numa carta a MEHRING, de 14 de julho de 1893, ENGELS definiu ideologia do seguinte modo: "um processo que o pensador realiza bem, com consciência, mas apenas com uma consciência falseada. As forças motrizes que o movem lhe permanecem desconhecidas.... Para tal, êle imagina forças motrizes falsas ou aparentes.. . trabalha apenas com a do­cumentação intelectual..." Em outro trabalho (sobre LUDWIG FEUER-BACH) diz que "uma ideologia é um conjunto de idéias que vive uma vida independente e unicamente submetida às suas próprias leis. O fato de que a existência material dos homens, em cujo cérebro se processa a ideologia,

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determina em última análise o curso de tal processo, tal fato é inteiramente ignorado por eles, senão a ideologia deixava de ser o que é".

Neste sentido empírico-sociológico é que a palavra ideologia é geralmente aceita em nossos dias. Logo, é com êle em vista que afirmamos ser conve­niente considerar, de um lado, as ideologias que inspiram os debates em torno do Projeto de Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, e, de outro, os fatos que condicionam aquelas ideologias.

A importância desse estudo é visível, se considerarmos que o referido Projeto, pelo interesse que tem despertado em todos os setores mais auto-conscientes da sociedade brasileira, está a revelar que os problemas de ensino no Brasil chegaram a um ponto crucial. E, mais do que isso, cada aspecto dos debates, cada posição que se sustenta ou é derrotada, bem como as próprias contradições, que a análise demonstra haver no contexto do projeto, em sua fase atual, são o reflexo de condições de fato da vida social, política e cultural do Brasil de 1960.

È, portanto, muito difícil uma apreciação valorativa dos diversos aspectos desse projeto, porque os critérios de avaliação, se baseados em fatos e necessidades brasileiras, podem ser contraditórios, como encerra contradições a presente fase de nosso desenvolvimento. As ideologias que se entrechocam na inspiração e nos debates do projeto refletem a contradição dos fatos econômico-sociais e político-culturais do Brasil contemporâneo que, sob certos aspectos, foi muito bem sintetizado no ensaio Os Dois Brasis, de JACQUES LAMBERT.

Tomando por base as principais contradições que aquele ensaio apresenta como características da sociedade brasileira na sua fase hodierna, cremos que é possível compreender a razão de ser do texto do projeto e dos acalo­rados debates que têm provocado.

No ensaio de JACQUES LAMBERT, o dualismo esquemático, que ante­põe uma sociedade nova ou moderna a uma sociedade arcaica ou atrasada, não significa a presença, lado a lado, de duas sociedades no Brasil. O que o professor francês — e isto é facilmente verificável pela leitura dos diversos capítulos, inclusive pelo que diz respeito à demografia brasileira — procura, é indicar os dois extremos de um gradient econômico-social e político-cul-tural. Temos em nossa sociedade muitos e diferentes aspectos do moderno: um novel capitalista industrial, um processo de urbanização em marcha, lenta mas progressiva secularização de instituições, progressos tecnológicos importantes, liberalismo político ao mesmo tempo que um mitigado estatis-mo econômico, progressiva liberdade de pensamento, progressiva organização das classes trabalhadoras e das classes patronais etc. De outro lado, temos ainda muitos aspectos do arcaico ou atrasado: mercantilismo e latifúndio, imensas áreas interiores e subáreas urbanas de vida primitiva, de sub-emprêgo e de semi-servidão, a persistência da grande família de parentesco e de compadresco, mais ou menos teocratizada, o coronelismo político e o populismo demagógico, indidualismo patriarcal e homogeneidade das massas miseráveis que êle domina, primitivismo de meios de produção, etc.

esse estado de coisas, através das ideologias que inspira, leva a discus­são das reformas institucionais, no Brasil, a debates mais ou menos apaixo-

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nados, em que se torna difícil, à primeira vista, distinguir entre o que serve aos maiores interesses do povo em geral, e o que serve apenas a interesses de minorias ou grupos. È o que, a nosso ver, se passa com o Projeto de Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional.

No podíamos esperar que aquelas condições da sociedade brasileira não tivessem tal influência, porque seria negar a verificação empírica, já incor­porada pelas ciências sociais, de que os fatos culturais, em geral, e os fatos educacionais, em particular, são sociais, isto é, resultam da conjuntura so­cial das fases históricas da sociedade em que eles se processam. A própria mudança social provocada tem de partir de condições favoráveis de uma sociedade e ser encaminhada no sentido de, com base em tais condições, suplantar e derrotar o arcaico ou o dificultante da mudança, que, assim, não pode ser uma criação, mas o apressamento deliberado e planificado de uma fase de evolução.

Se admitirmos que o Projeto de Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional é uma tentativa de estabelecer as bases legais de uma mudança educacional provocada, ainda nesse caso não poderá deixar de sofrer as in­fluências das condições concretas ou reais da vida sócio-econômica do Brasil contemporâneo, porque só pode ser base de mudança se não fugir dessas condições, se não abstrair-se do Brasil. Na verdade, como teremos oportuni­dade de ver, o projeto em foco é, ao mesmo tempo, uma tentativa de mu­dança e de conservação, o que corresponde a outro aspecto da vida nacional contemporânea: queremos mudar, ter uma sociedade industrializada, tecno-lògicamente avançada, com uma grande classe média, uma sólida e satisfeita classe operária, etc, mas ao mesmo tempo desejamos conservar o velho patriarcalismo teocrático, uma população acomodada às antigas formas aris­tocráticas de liderança, o mercantilismo seiscentista, o burguesismo nove-centista, o humanismo renascentista, o autoritarismo filosófico, etc.

Âs ideologias político-sociais e as ideologias educacionais em face do Brasil

A história das teorias do poder estatal revela bem a relação entre fatos e ideologias políticas, bem como sua repercussão sobre as teorias ou ideolo­gias educacionais. não pretendemos reproduzir aqui essa história e as rela­ções implicadas por ela. Todavia, basta lembrar uns tantos pontos de refe­rência que nos permitirão compreender o que temos em vista.

Durante a Idade Média, quando do Feudalismo, como organização social, e da Igreja, como superestrutura religiosa e moral, a ideologia do poder se baseava no duplo princípio da lei positiva e da lei natural. Nestas condições, o monarca se colocava acima da lei positiva, mas tinha de submeter-se à lei natural.

Em outras palavras, isso significava que a lei positiva era determinada pelo monarca, sem que entretanto pudesse contrariar a lei natural, que era concebida como algo fundamental e inalterável, mesmo por Deus, e, por isso, sua aceitação era obrigatória por parte de todos, inclusive dos monar­cas e senhores feudais.

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Todavia, o conceito de lei natural, embora derivado em parte das dou­trinas dos estoicistas e dos juristas romanos, não se relacionava com o uni­verso físico e social, como dele resultante. Era, sim, a conseqüência do principio racional último que governava o cosmos, e, portanto, estabelecida por Deus — sede desse princípio — como expressão de sua vontade. Segun­do TOMAS DE AQUINO, a vontade de Deus é submetida à sua Razão imu­tável e, por isso, às leis eternas dela emanadas. Em parte, a lei natural é cognoscível pela razão natural do homem, mas, em suas bases, como lei di­vina, é o resultado da revelação, guardada pela Igreja. Portanto, a lei na­tural só é inteiramente compreendida e inteiramente cumprida, se prati­cada à luz da lei revelada, ou, em outros termos, à luz das leis positivas emanadas da Igreja que, por elas, traduziria a lei revelada.

O sistema de poder ficava, assim, perfeitamente limitado, permanecendo a Igreja como árbitro entre os senhores feudais e os reis, ao mesmo tempo que garantia o seu poder moral e religioso.

Tal teoria do poder era uma ideologia inteiramente conseqüente de pre­missas ideadas, independentemente de suas relações com fatos.

Dessa mesma ideologia se deriva, por dedução aristotélica, uma ideologia educacional, em que se compreenderia a educação sob o aspecto de lei natu­ral de formação das crianças e jovens. Neste aspecto de lei natural, ambas as fontes de conhecimento do que deveria ser feito, se conjugam, isto é, a lei natural descoberta à luz da razão humana e a lei natural reve­lada por Deus. Daí a proeminência da Igreja em educação, porque, como depositária da verdade divina, só ela podia ser juiz entre o que é certo e o que é errado, o que é bom e o que é mau na formação das crianças e dos jovens. Tal forma ideológica correspondia ao fato de toda a educação es­colar, durante a Idade Média, ter sido realizada pela Igreja.

Mas ao estado teocrático seguiu-se o estado absolutista, por condições e motivos histórico-sociais que não cabem nesta digressão. com a organi­zação dos estados nacionais sob o comando único dos monarcas, o princípio da lei natural tinha de ser revisado ou abolido.

Enfraquecido e destruído o feudalismo, uma nova organização social pas­sou a determinar a estrutura do Estado. Três grandes classes se achavam frente a frente, cada uma com interesses materiais e ideais diferentes: a burguesia, fonte da riqueza estatal, a nobreza que se derivava das antigas casas feudais e constituía a superestrutura militar e política do Estado, e o clero (católico ou protestante) que, perdida a função moderadora e arbitrai, se formalizava numa superestrutura religiosa-moral.

Ao monarca cabia, portanto, a função de coordenar as três classes do­minantes, comandando e dirigindo o Estado, o que só era possível mediante o poder absoluto. Daí lima ideologia que, sem relação aparente com os fatos, partia da análise do conceito de lei.

Entretanto, a idéia de lei era, já então, bastante complexa, apesar de sua aparente simplicidade; entre os diversos sentidos que adquiriu no curso da história greco-romana, está o que lhe significa uma relação moral ou reli­giosa da vontade a seu ato, da potência a seu efeito. Daí a ideologia do

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absolutismo, consubstanciada na filosofia de HOBBES e, mais tarde, de HEGEL.

Para HOBBES, a lei é a palavra daquele que, por direito, exerce o co­mando sobre os outros e, conseqüentemente, a autoridade da lei deriva não do seu conteúdo, mas da autoridade da pessoa que a sanciona: quem tem poder, tem direito de comando.

Entretanto, de outro lado, o conceito de lei encerrava também o de essência; entre os comandos, uns são derivados, são simples índices, sinais de outros que lhes estão à base, ou que são essenciais. Logo, a lei humana, a lei positiva dos monarcas surge como uma relação entre os acidentes e a essência que os suportam, entre o contingente e o necessário. O poder dos reis é conseqüentemente um poder delegado; a lei positiva deriva ainda e sempre da lei divina. E, ao mesmo tempo, calvinistas e jesuítas modificam o conceito de lei divina: as ações, que são corretas, o são porque Deus as determina; a vontade se superpõe à razão e, por isso, tais ações nao são determinadas por Deus porque sejam corretas; a vontade divina é que lhes dá correção.

Daí o direito divino dos reis, cujos atos são corretos porque praticados por um rei, que é rei por vontade divina. como se vê, já a teoria teológica não surge mais como uma ideologia reguladora, a quem o poder temporal se submetia, mas como ideologia justificadora do poder temporal.

Nessa mesma época, com RATKE e COMENSKY, surge a teoria de que a educação escolar é um dever dos reis para com os cidadãos e, vice-versa, de que estes têm direito ã educação. Aos reis cabia determinar a educa­ção a ser dada, e aos cidadãos cabia aceitá-la.

Assim como Deus delegava poder aos reis para reinar, também a estes cabia deleger poder a quem estava em melhor condição de educar. Ora, os que exerciam a função religiosa-moral, no Estado, é que poderiam encarre­gar-se da formação das crianças e dos jovens: daí por que os reis deveriam delegar o poder de educação à Igreja (católica ou protestante). A Igreja tinha o direito divino de educar; era a sua função primordial, segundo o ire et docete das escrituras.

como, entretanto, sob a influência de MONTAIGNE e LOCKE, surgia também a teoria de que educar era, em grande parte, ensinar, o direito de ensinar cabia a quem possuía os conhecimentos e as habilidades a serem ensinados, isto é, aos homens de saber, fossem ou não pertencentes ao clero.

Esta teoria era o resultado da laicização crescente da ciência e da filo­sofia, que passavam a interessar de perto a burguesia e a nobreza, também elas em processo de laicização. Já agora os grandes sábios e filósofos eram burgueses ou nobres, os primeiros cada vez mais conscientes do seu poder econômico, e os segundos do seu poder político-militar.

Em contraposição, a ideologia cristã dá mais um passo à frente e, para isso, retorna à distinção entre direito natural e direito positivo. Por direito natural, os primeiros educadores e a primeira instituição educacional são respectivamente os pais e o lar. toda a educação deriva desse direito natu­ral da família e não de um suposto direito de ensino de quem sabe ou tem conhecimentos.

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A escola e os mestres ensinam por delegação da família, e não em decor­rência de uma outorga pelo Estado a quem quer que seja. Ora, a família é, por lei divina, uma instituição cristã e, como tal, só pode delegar o poder de educação escolar às instituições cristãs.

Durante o período dos déspostas esclarecidos, no século XVIII, a posição antagônica à cristã prevaleceu, porque já então a laicização da burguesia e da nobreza levara plenamente à concepção de que os significados e valores humanos eram terrenos e não extraterrenos. Daí por que das próprias situa­ções da vida humana é que se desenvolveriam todas as motivações e todos os princípios orientadores da educação.

Mas, por essa mesma época, a teoria de poder absoluto dos monarcas começava a ser abalada, substituída por outra, que tinha em vista o poder do Estado, como expressão política de organização social.

ROUSSEAU põe-se na vanguarda da nova teoria, tomando como certo que a lei é um comando, mas recusando-se a ver em qualquer indivíduo ou pes­soa o direito de comando sobre os outros. Todavia, para haver comando é preciso quem comanda, criando pois o problema de encontrar o agente do poder. Este é a vontade geral, que se expressa na organização jurídica do Estado.

O poder absoluto dos monarcas é, portanto, substituído pelo poder abso­luto do Estado, criando-se o absolutismo democrático que garantiria a com­pleta autoridade do Estado sobre todas as outras instituições, aí incluída a Igreja, a Família e as diversas associações.

Nesse sentido, o Estado se confundia com a sociedade nacional, sendo a tradução política desta. Daí por que o exercício do poder civil só poderia ser realizado por meio de delegação, expressa na representação política dos indivíduos, representação essa delegada por meio do voto.

No fim do século XVIII essa ideologia justificou a revolução americana, expressão política violenta de uma burguesia agrária e mercantil contra o poder da monarquia inglesa, e a revolução francesa que começou sendo uma reação da nobreza laicizada que se aliava à burguesia reivindicante e às populações urbanas esfaimadas, para se transformar, depois de ROBESPIER-RE, num processo de exclusiva ascensão política da burguesia.

Na sua longa fase de consolidação do poder político, na Europa, tal burguesia teve de descartar-se dos velhos aliados do poder monárquico, isto é, da nobreza e do clero, e daí a teoria do estado laico, que era uma perfeita dedução da teoria do absolutismo democrático.

Para realizar essa derrota de seus possíveis mais importantes inimigos, era importante destruir-lhes os principais meios de influência, entre os quais se achava a educação escolar. Nada melhor para isso que uma ideologia da escola neutra, sem compromissos de fé, tanto para as elites como para o povo, porque aquelas e este tinham tido papel decisivo na revolução e podiam vir a tê-la em novas revoluções. Derivar uma teoria da escola leiga da teoria do absolutismo democrático, era fazer um simples jogo silogístico. Daí por que o século XIX marcou o inicio dos grandes sistemas nacionais de educação pública, mantidos e orientados pelos Estados.

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Nos dias atuais, quando o Estado burguês se transformou no Estado capitalista e este no Estado imperialista, a teoria do poder, como ideologia, sofre novas transformações. O Estado onicompetente e inteiramente inde­pendente, pressuposto pelo absolutismo democrático, tornou-se uma utopia.

Em conseqüência, o capitalismo e o imperialismo criam uma nova ideolo­gia que, em muitos de seus aspectos, lembra as ideologias medievais. Em vez de uma sociedade de feudos, cria-se uma sociedade de nações, em vez de uma Igreja moderadora e arbitrai, invoca-se uma nova espécie de direito natural, o dos princípios eternos da democracia universal, garantidora da ausência do medo, da paz, da abundância, da livre iniciativa e de outras coisas que tais.

Tal democracia universal, como a ordem social na Idade Média, se põe sob a proteção de Deus, e, até certo ponto, é também uma expressão da lei natural de origem divina. Nela se refletiria a ordem do próprio cosmos.

Nessa federação universal dos Estados, nenhuma Igreja particular pode ser a depositária das verdades eternas, porque há várias igrejas, de Estado para Estado e, mesmo, dentro de cada Estado. Daí a teoria de que cada religião é uma expressão particular de tais verdades eternas, podendo, por isso, contribuir para a orientação e coordenação da ordem universal.

Todavia, mesmo numa federação universal de Estado, alguém tem de exercer a liderança; os princípios em si não são capazes de sanção. E eis que o absolutismo democrático dos Estados nacionais é praticamente subs­tituído pela liderança das grandes potências que, ideologicamente, se trans­formam em campeãs da democracia, da liberdade e da paz universais...

Em educação, tais ideologias se traduzem nos chamados princípios co­muns e básicos de educação, nas organizações internacionais de educação, nas sociedades de educação comparada, tudo enfim sob a ideologia das for­mas comuns e harmônicas de educação universal.

Vivemos a era dos congressos internacionais de educação, de combate ao analfabetismo, de reconstrução dos currículos escolares, de ensino das ciências e das artes, de intercâmbio de estudantes e professores, etc.

Ora, o Brasil não chegou a viver inteira e intensamente nenhuma des­sas fases históricas da evolução do poder de fato e das ideologias do poder. Nunca fomos realmente um estado teocrático, não chegamos a ser um abso­lutismo monárquico, nem tampouco um absolutismo democrático-burguês, pa­ra despertarmos num mundo imperialista e universalista. Pomos semifeu-dais e semiteocráticos durante o período colonial, semimonárquicos e semi-feudais no período imperial, semifeudais ainda e semidemocráticos na 1* República, para tentarmos, agora, o absolutismo democrático, quando o im­perialismo nos impõe o internacionalismo.

Somos no âmbito internacional uma contradição, porque aderimos a uma política de participação dispendiosa, representada por nossas contri­buições a organismos internacionais e pelo pessoal que, para esse fim, man­temos no exterior, ao passo que não temos poder econômico capaz de justi­ficar ou compensar essas despesas. No conjunto das nações, somos uma pequena potência que tem mais deveres do que direitos. No comércio inter­nacional, figuramos apenas como fornecedores de produtos tropicais, sem-

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pre sujeitos aos azares de um mercado disputadíssimo e que, por isso, pela concorrência, nos impõe, e aos demais concorrentes, suas condições de com­pra.

Mas queremos estar integrados na democracia universal; é velha aspi­ração, pela qual lutamos, desde os primórdios de nossa independência polí­tica.

Por outro lado, internamente, para nos tornarmos grandes, temos de adotar política de defesa de nossos recursos e de nosso desenvolvimento, o que, até certo ponto, antagoniza aquela vocação internacionalista. Ten­demos ao nacionalismo, praticamo-lo de forma mitigada, conseguindo um incerto equilíbrio entre o "entreguismo" e o "jacobinismo". esse equilíbrio é incerto porque consiste em vitórias ocasionais de uma e outra corrente de interesses, e das respectivas ideologias.

Internamente, contraditórios materialmente, como o livro de JACQUES LAMBERT o indica, apresentamos as mais diversas reações aos fatos, com os quais nos conformamos, por vezes, ou contra os quais reagimos, espora­dicamente, de forma brilhante.

Naturalmente, essas situações e posições têm de se refletir nas ideo­logias educacionais. Temos um grupo modernista e progressivista que olha para as instituições escolares norte-americanas, como o modelo, o final point que precisamos atingir, esquecendo os próprios debates norte-americanos em torno de seus problemas educacionais. Temos outro grupo, mais cultu­ralista, mais crente na razão e seu cultivo, que olha para modelos europeus, mormente para a França, onde, desde 1945, uma crise escolar, sem prece­dentes, tem gerado os mais acalorados debates e manifestações públicas. Temos um terceiro grupo que procura colocar-se numa posição intermediá­ria, tentando estabelecer um hibridismo entre o pragmatismo escolar norte-americano e o culturalismo francês.

Todos os três debatem e escrevem como se o Brasil estivesse pronto para fazer a escolha e implantar os sistemas escolares que decorreriam dessas ideologias. Nenhum deles, na posição que adota, deixa de crer ao mesmo tempo no absolutismo democrático, próprio da república burguesa, nem tam­pouco no internacionalismo democrático, próprio do Estado moderno.

A primeira parcela desse hibridismo os faz laicistas e defensores da escola única para todos os cidadãos; a segunda parcela os torna transplan-tadores de instituições estrangeiras, muito embora disto possa resultar uma negação do laicismo e do unicismo escolar.

Isto porque o internacionalismo, ao procurar a transplantação de insti­tuições, híbrida o sistema existente, já que nunca é possível substituir, inte­gralmente ou em grande parte, a este, pelas instituições transplantadas que, por sua vez — quer queiram, quer não — se transfigurarão no novo ambiente, perdendo o sentido que tinham na sociedade de que foram transplantadas. Tal hibridismo quebra fatalmente o princípio de "escola única".

O internacionalismo educacional é também antagônico ao laicismo, por­que lhe é próprio — a esse internacionalismo — a defesa do princípio de livre iniciativa ou de liberdade das instituições educacionais, o que permite que, onde houver maiorias religiosas muito acentuadas, se dê à educação

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escolar um cunho ou sentido religioso, não laicista. Aliás, os internacio-nalistas norte-americanos já admitem, como própria da educação escolar no mundo ocidental, a orientação no sentido teístico e religioso.

Há, portanto, na posição desses três primeiros grupos de ideólogos brasi­leiros da educação, uma flagrante contradição de princípios ou premissas ideológicas e suas conseqüências.

O Brasil, tal qual é, com suas favelas urbanas, seus latifúndios de pro­dução primitiva, de subemprêgo, de população enfermiça, subnutrida e anal­fabeta, a contradizer o Brasil industrial, do avião, das largas estradas pavi­mentadas, dos belos edifícios, das avenidas imensas, é quase esquecido...

Um quarto grupo, muito reduzido e pouco influente, de cientistas so­ciais, procurando escapar às posições flagrantemente ideológicas, tenta, aos poucos, fixar as bases de uma política realista da educação no Brasil. São, talvez, os nacionalistas da educação brasileira, o que é uma tendência ideo­lógica, embora controlada pelo conhecimento de fatos e possibilidades, o que lhe faz perder a maior e mais importante parte das características de uma ideologia.

Há ainda um quinto grupo, que se subdivide em dois. E o dos educadores católicos. Uns se apegam a uma filosofia da educação que, partindo das premissas do direito natural à educação e da complementação desse direito pelo determinado pela lei divina, revelada, tentam construir todo um edifí­cio ideológico que, num país como o nosso, onde mais de 90% da população se diz católica, significaria a entrega das instituições escolares à Igreja, para o que ela não dispõe nem de pessoal próprio, nem de recursos técnicos. Outros, mais objetivos e menos filósofos, partem diretamente para as rea­lizações educacionais, procurando apoio local e dos poderes públicos, cons­truindo as escolas que podem e como podem, mantendo-as semipagas, semi-jjratuitas e semi-subvencionadas, com maior ou menor eficiência, com pes­soal leigo e clérigos. Realizam educação de acordo com os padrões oficiais e fazem alguma catequese. Quase se despreocupam das teorias teológico-filosóficas que os deviam orientar, para fazer o que lhes é possível, como educação cultural e como educação religiosa. não chegam sequer a debater com os educadores dos primeiros grupos, nem contradizem o que, de legal ou oficial, poderia ser uma limitação ao que fazem. Realizam simplesmente o que lhes permitem os recursos conseguidos e o pessoal de que dispõem, leigo ou não.

Finalmente, a esses cinco grupos, junta-se o último, capaz de aderir a todos eles de per si ou ao mesmo tempo. São os oportunistas ou aventureiros que a fase de desenvolvimento, por que passa o Brasil, vai criando, e que também procuram, por intermédio da iniciativa privada, tirar proveito de nossa confusão escolar.

todas essas correntes têm exercido influência sobre os debates e o texto do Projeto de Lei de Diretrizes c Bases da Educação Nacional.

Vejamos, agora, as condições econômicas e sociais que permitem a maior ou menor influência de cada um de tais grupos.

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A crise de mudança no Brasil

Em declarações que fizemos para o vespertino carioca Ultima Hora, em outubro de 1959, demonstramos que, ainda em passado recente, era muito fácil legislar sobre educação entre nós. Tão fácil era que, mesmo certas tentativas de reformas mais arrojadas, no Distrito Federal e em São Paulo, tornaram-se possíveis entre 1924 e 1935, sem reações ponderáveis ou impedi­tivas. As reformas tentadas por Carneiro Leão, Anísio Teixeira, Fernando de Azevedo e Lourenço Filho foram desse tipo. Embora discutidas e deba­tidas, puderam ser instaladas sem grandes empecilhos, sob os aplausos de grande parte das elites intelectuais.

Ultrapassada a fase das reformas, surgiu outra, em 1937, de contra-re-formas, salientando-se as leis preparadas pelo Ministro Capanema, o que foi feito também sem reações significativas, ou com aplausos de grande parte de nossas elites. Tais leis não foram apenas coisa forçada ou imposta pela Ditadura, porque, ainda hoje, prevalecem, isto é, puderam manter-se durante 15 anos após a reconstitucionalização do país.

De modo semelhante, das reformas feitas entre 1925 e 1935, alguma coisa, principalmente no setor de ensino normal ou pedagógico e no de orga­nização administrativa do ensino primário, sobrou e permanece até nossos dias.

Ora, essas coisas, tanto uma como outra, não seriam possiveis, se não houvesse condições que as permitissem. O velho, representado pela contra-reforma de 1937-1942. prevaleceu, mas sem impedir que algo novo, oriundo das reformas de 1925-1935, permanecesse, concordando isso tudo com o dua­lismo conjugado do moderno e do arcaico na sociedade brasileira.

A explicação para o fato de legislações consecutivas, que se contradiziam. parece-nos estar em que, até 1945, a educação no Brasil era mais para as classes superiores da sociedade. E o que essas classes procuravam no siste­ma escolar existente, o distintivo cultural que lhes era próprio, independia da orientação dos currículos, que tanto podia ser de tendência clássico-hu-manista, como de tendência progressista, desde que desse aos jovens o ins­trumento formal do diploma, então um atributo aristocrático, útil ao exer­cicio de certas funções, próprias da elite dominante.

Nem o ensino primário, público ou privado, fugia a essa situação. Em 1907 havia 638.378 alunos matriculados nas escolas públicas brasileiras. Ora, a população em idade escolar primária (7 a 12 anos) era de aproximada­mente 3.500.000, nessa época, o que significa que se achavam na escola elementar pouco menos de 18% dos que deviam freqüentá-la. Por essa mes­ma época, o conjunto das classes superiores e média no Brasil devia ser de aproximadamente 20% da população. Teoricamente, podemos pensar que apenas essas camadas da população eram atendidas pelas escolas existentes. Em 1930, as matrículas primárias somaram a quase 2.100.000 e a população em idade escolar era de cerca de 6.000.000, o que significa que, já então, aproximadamente 35% da população era atendida pelas escolas primárias existentes. Nessa época, o conjunto das classes superior e média não devia ter ultrapassado ainda de 25% da população brasileira. Provavelmente os

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10% mais, a que a escola atendia, correspondiam às camadas populares ur­banas, proletárias e semiproletarizadas. Em 1940, 40% da população era atendida pelas escolas primárias; em 1950, 50%; em 1958, aproximadamente 55%. Podemos dizer que, a partir de 1950, não apenas as classes superiores e certas camadas populares das cidades, mas também alguma porção das camadas populares rurais começavam a ser atendidas pela escola primária. Note-se que as chamadas classes superiores tanto são urbanas como rurais.

No ensino médio, em 1933, para uma população em idade escolar média de 5.300.000 (11 a 17 anos), as matrículas eram de 109.000 (todos os ramos), o que significa que apenas 2% da população eram atendidos. Considerando que a alta classe da sociedade nessa época devia ser aproximadamente 1,6% da população, resta-nos quase a certeza de que apenas parte dessa classe e pequena parcela da classe média conseguiam realizar estudos secundários. Em 1950, havia cerca de 550.000 alunos em escolas de nível médio (todos os ramos), que correspondiam a 7% da população em idade escolar. Em 1958, as matrículas gerais nas escolas médias atingiam a 994.000, que representa­vam quase 13% da população em idade para esse fim. Podemos também afirmar que, a partir de 1940-1950, a escola de nível médio passou a inte­ressar mais vivamente a camadas intermediárias das classes sociais brasi­leiras, já que a classe alta, no Brasil, parece nunca ter atingido a 2% da população. Evidentemente, de permeio com as camadas intermediárias, ele­mentos das inferiores também conseguiam ingressar nesse nível escolar. Todavia, em percentis, não podiam significar senão fração de 1% da sua classe.

É o que acontece com o ensino superior, onde em 1957, fazendo alguns levantamentos por amostragem, chegamos à conclusão de que provavelmente 10 a 12% dos alunos provinham das classes inferiores da sociedade. Mas, como tais classes representariam cerca de 70% da população brasileira, e as matrículas no ensino superior correspondiam a apenas 0,12% da população, temos que apenas uma pequena fração de 1% dessas camadas inferiores conseguia ingressar no ensino superior (mais ou menos 0,02%).

O que é fato, sobre o qual não pode pairar dúvida, é que até há bem pouco tempo (20 anos aproximadamente) a educação no Brasil era direito apenas das elites. Mas, entre 1940 e os dias atuais, em virtude da conjuntura econômica e política do mundo, o país se viu forçado a abalar sua obscura e estagnante economia de produção de matérias-primas e de agricultura tro­pical, sob pena de fracasso e derrocada das próprias classes que se benefi­ciavam daquela economia.

A industrialização e a policultura agrícola tornaram-se uma necessidade, a que ninguém mais podia iludir.

De outro lado, os processos de comunicação pelo rádio, pelo cinema, pelo telégrafo e pela imprensa escrita, que se desenvolveram extraordina­riamente, graças à necessidade comercial de forçar mercados para tais processos, já que sua restrição às maiores áreas urbanas fatalmente criaria um estado de saturação, esses processos, dizíamos, levaram às cidades e vilas, aos sítios e fazendas de quase todo o interior, a consciência de um outro mundo, em que a vida não era tão árdua, nem tão obscura e pobre.

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Todo um gigantesco processo de mudança social se inicia, incontrolâ-vel em muitos aspectos, mais ou menos planificado em outros. Surgem as usinas de Volta Redonda, a Hidrelétrica de Paulo Afonso, as rodovias asfal­tadas, fábricas de produção de bens de consumo, ensaiam-se no Sul e no Leste novas culturas agrícolas e tenta-se a nacionalização das antigas, os aviões comerciais em número crescente cortam os ares do Brasil em todos os sentidos. Instala-se, portanto, novo ciclo econômico e político-social.

As velhas fórmulas político-administrativas tornam-se obsoletas. O voto passa a ter sentido para uma ponderável parte da população. Uma cons­ciência nacionalista, ainda insegura, forma-se aos poucos. Surgem nas cidades as classes trabalhistas e das áreas rurais, de subemprègo, doenças e obscurantismo, um enorme êxodo se intensifica para as cidades, que co­meçam a cerrar-se de uma população marginal (a das favelas, das malocas, dos mocambos, etc.) não prontamente integráveis na sociedade urbana.

Em meio a isso tudo, a educação escolar começa a ter novo sentido. Ela, que sempre fora um atributo das elites, passa a ser desejada por toda a população urbana, suburbana e das áreas rurais mais próximas e mais em contato com as cidades. Já que era privilégio das elites, passou a ser con­siderada como um instrumento de ascensão social.

A importância deste juízo a respeito da escola está no fato de que a mudança em processo reestruturava a sociedade, dando-lhe uma nova estra­tificação. De dual, que fora, isto é, formada de uma aristocracia agrária e de uma imensa classe de camponeses de baixíssima renda per capita (ex­cluída a pequena população urbana), começava, pela urbanização, a ver definidos estratos de classe média e de classe baixa, a ponto de, já com resultados do censo de 1950, poder-se divisar, com alguma nitidez, além de uma classe alta (1,6%) e de uma classe baixa inferior (50%), duas camadas da classe média e uma camada superior da classe baixa (proletariado espe­cializado e semi-especializado), sendo que esses três estratos intermediários abrangiam 47,4% da população existente.

Via de regra, portanto, podemos afirmar que pelo menos a metade superior da sociedade brasileira passava a querer beneficiar-se da educa­ção escolar, pois que dispunha de condições sociais que lhe faziam sentir a necessidade da escola.

Se considerarmos ainda que, da metade inferior, pelo menos uma parce­la (10 a 20%), estimulada por todos os mencionados fatores econômicos e sociais, também passa a querer educação escolar, temos que, em nossos dias, cerca de 60 a 70% da população brasileira sente a escola como uma necessidade e, portanto, como um direito das novas gerações. E a pressão por mais escolas se faz sentir em todos os cantos do país.

De outro lado, a consciência do desenvolvimento e de suas exigências, por parte de certa parcela das elites dirigentes, bem como a atitude criada, nessas elites, pelo desenvolvimento em marcha, no sentido de tirar o Brasil, o mais depressa possível, das condições de país atrasado e subdesenvolvido, contribuem para que se positive com mais ênfase que educação escolar é mais que um direito de todos, uma necessidade de todos.

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Há, portanto, entre nós, nitidamente posto, um problema educacional, que ninguém nega, nem procura esconder.

Entretanto, se o reconhecimento de tal problema é quase unânime, a questão de "como" resolvê-lo comporta debates e planos diversos.

De um modo geral, o povo, que pressiona por mais escolas, não tem consciência do tipo de educação que mais lhe convém. Pede e aceita a que lhe dão, não estando ainda em condições de discernir entre suas neces­sidades educacionais, quais as mais urgentes e mais importantes. Parece mesmo acreditar — segundo alguns inquéritos que fizemos — que a escola, pura e simples, seja qual fôr a sua organização e eficiência, fará o milagre de dar-lhe os instrumentos culturais e tecnológicos de que necessita. Só agora, depois de 1955, é que certos setores do proletariado e da classe média procuram fazer escolha.

Daí, então, a possibilidade que se abre para a luta entre ideologias educacionais e entre interesses investidos em educação escolar, luta essa de que o povo cm geral não participa, porque ainda não tem capacidade para tanto.

O Conflito e o Projeto de Lei de Diretrizes e Bases

Vimos já, em tópico anterior, que há um acelerado crescimento de ma­trículas escolares no Brasil. Em 1945, as matrículas nas escolas primárias correspondiam a aproximadamente 7,7% da população e, em 1959, atingiam a pouco mais de 11%. Note-se que, neste ramo de ensino, houve redução de ritmo de crescimento entre 1955 e 1959, mantendo-se a mesma percentagem entre os dois extremos do período.

No ensino de nível médio (secundário, comercial, industria), agrícola e normal) estavam matriculados em 1945 cerca de 0,8% da população brasi­leira, em 1950 cerca de 1,0%, em 1955 mais ou menos 1,4% e em 1959 pouco mais de 1,8%.

Essas percentagens nos permitem calcular que as matrículas no ensino de nível médio cresceram, proporcionalmente à população, 1,6 vezes mais depressa que no ensino de nível primário. Em números absolutos, enquanto as matrículas primárias, de 1945 a 1959, dobraram, as de nível médio tri­plicaram.

Está, portanto, bem nítida uma procura mais intensa da escola de ní­vel médio, que da escola de nível primário. Aceitando, com boa evidência nos fatos, que as áreas urbanas já estão servidas de quase suficientes escolas primárias, podemos admitir que, agora, essas mesmas áreas se preocupam cm obter a escola secundária para quase todos. com os dados disponíveis e mediante alguma extrapolação, calculamos que 91,5% da população urbana de 1959, em idade escolar primária (7 a 11 anos), deviam ou podiam estar ma­triculados em escolas primárias, e que cerca de 62,5% da população rural, nas mesmas condições, não eram atendidos por escola primária, ou então, que apenas 37,5% das crianças rurícolas podiam ser atendidos pelas escolas existentes nas áreas rurais.

Considerando, por outro lado, que praticamente não há no Brasil escolas de nível médio para a população rural (nas chamadas escolas agrícolas,

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médias, as matrículas não atingem a 5.000), chegamos, pelo mesmo processo, à conclusão de que, em 1959, já 28% da população urbana de 11 a 12 anos podiam estar sendo atendidos por escolas de nível médio.

Para este fim, tendo em vista a média percentual de crescimento popu­lacional urbano entre 1940 e 1950, admitimos que 40% da população brasi­leira, em 1959, já estivessem urbanizados e suburbanizados, e admitimos ainda. que a proporção da faixa étaria (11 a 17 anos) para todo o Brasil, em 1950, fosse válida para. a suposta população urbana e suburbana de 1959. Feitas as correções nessas suposições, acreditamos que a percentagem apurada (28%) seja um pouco maior.

não há dúvida, portanto, que as cidades mais e mais se esforçam por conseguir mais educação. Entretanto, as percentagens apuradas revelam mais do que isso. Se 91,5% da população de 7 a 11 anos podem ser atendidos pelas escolas existentes nas cidades, entretanto não o são. A população que emigra das áreas rurais só tem oportunidade de fazer a 1» matrícula dos filhos, depois de chegarem às cidades e de aí se aclimatarem precaria­mente, o que leva de 12 a 20 meses, segundo apuramos em duas favelas do Rio. Além disso, nas capitais como nas cidades do interior, que são objetos dos estudos e experiências feitos pelo Projeto Piloto de Erradicação do Analfabetismo, sob nossa direção, encontramos o dualismo sócio-escolar de superescolarização e infra-escolarização, que podemos traduzir da seguinte forma: de um lado, cerca de 30% das crianças obtêm mais tempo de esco­larização (em número de horas diárias e de anos escolares) e mais assis­tência pedagógica (por meio de especial atenção e cuidado dos professores); de outro lado, cerca de 70% das crianças obtêm apenas um número reduzido de horas diárias e de anos de escolarização, e muito menor assistência pe­dagógica. Êsses estudos e outros feitos no Rio de Janeiro por Josildeth Gomes e Roger Seguin, 1 levam-nos à conclusão de que apenas 30% da população urbana em idade escolar primária conseguem, de fato, uma escola­rização suficiente. São os que vão constituir a clientela das escolas de nível médio nas mesmas áreas urbanas.

Mas, além disso, revelam os estudos que tais 30% provêm sobretudo da classe média (superior e inferior) e da camada superior da classe baixa (proletários). Os da classe alta não passam pela escola primária comum, pagam professores particulares, arranjam meios especiais privados de obter educação primária.

A conclusão, portanto, é de que a escolarização das populações urbanas do Brasil é um fenômeno específico das classes médias, isto é, daquelas que ficam entre os dois extremos (superior e inferior) da escala social.

Pelos dados dos estudos e levantamentos, que mencionamos há pouco, a escola primária seleciona, dentre a massa dos que nela se matriculam, jus­tamente os que pertencem a essas camadas médias, para levá-los à escola secundária. Ê, portanto, a escola primária um processo de seleção e de preparação para a secundária.

1 Da equipe de pesquisadores do Centro Brasileiro de Pesquisas Educa­cionais, órgão do INEP.

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E, já agora, passamos a falar só de escola secundária, porque esta corresponde a 76,5% de todo o ensino de nível médio no Brasil (1959).

Logo, o fenômeno de escolarização, em nosso país, é um fenômeno ca­racterístico de escolarização acadêmica (semi-humanística e semicientífica) das classes médias urbanas, que, em face da urbanização e da industrializa­ção, e em virtude de conseqüente crescimento das atividades econômicas terciárias, crescem em número e importância social, à medida que o desen­volvimento nacional se processa.

este fato, próprio de uma sociedade ainda não desenvolvida, condiciona todo o debate em torno do Projeto da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional.

A organização do ensino primário, datando de 1890, sob a influência da filosofia política da lº República, foi laica e pública, a cargo dos Estados. Em 1930 já representava uma inversão substancial de recursos por parte dos poderes públicos estaduais e municipais que davam escolas a 1.700.000 crianças, enquanto as escolas privadas atendiam a apenas 350.000 (20% das que eram atendidas pelas escolas públicas ou 16% do total das matrículas primárias). Estava, pois, firmada a preponderância das escolas primárias públicas sobre as privadas; criara-se a tradição de que o ensino primário era da competência dos Estados e dos Municípios. Em 1959, da matrícula geral de mais de 6 milhões de crianças, pouco mais de 800.000 se achavam em escolas privadas (cerca de 13% apenas).

não há dúvida, portanto, de que, no setor de ensino primário, o pri-vatismo não conseguirá mais fazer concorrência ao público. Foi uma con­quista da 1* República, por ela mesma consolidada.

Mas, esse mesmo regime, em face das condições econômico-sociais de 1890 a 1920, não foi capaz de organizar e difundir o ensino de nível médio. Caracterizou-se o período por idas e vindas nas tentativas de chegar a uma definição e organização do ensino secundário. De cinco em cinco anos, em média, mudava-se a legislação, sem contudo alterar fundamentalmente o processo de "exames parcelados" que eqüivalia a uma escolarização resu­mida e sem freqüência, verificada apenas por exame a cada fim de ano. Chegamos, assim, a 1930 com menos de 80.000 alunos em escolas secundárias. E tudo isso se explica pelo fato de tal escola interessar apenas a uma pequena minoria que tinha em vista fins culturais muito limitados.

Depois de 1930, primeiramente FRANCISCO CAMPOS e, depois, GUS­TAVO CAPANEMA, não só procuraram estruturar a escola secundária, como também atrair para ela o interesse da iniciativa privada. Já então se acelera­va o processo de urbanização, cresciam as atividades econômicas terciárias e se intensificava o processo de burocratização de serviços públicos e pri­vados. Formava-se, por isso, uma bem definida e crescentemente numerosa classe média (white-collar na gíria sociológica norte-americana). Para tal classe, o ensino secundário passava a ter importância, porque a cultura intelectual, semi-humanística e semicientífica, passava a ser instrumento de conquista de posições burocráticas. Era uma clientela certa à disposição da iniciativa privada.

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Por outro lado, a crise econômico-financeira, que perdurou até 1938, dificultava aos poderes públicos a disponibilidade de recursos para inversão em educação escolar. O ensino universitário organizou-se nesse período e solicitou da União recursos financeiros extraordinários, de modo que o ensino secundário ficou inteiramente entregue ã iniciativa particular, en­quanto o ensino primário era predominantemente estadual e municipal. Já em 1945 as matrículas no ensino médio atingiam, entretanto, a quase 400 mil, para ultrapassarem folgadamente de 1 milhão em 1959.

A iniciativa privada realizou, sem dúvida, um trabalho notável de esco­larização. E, certamente, continuaria nesse trabalho, se problemas não sur­gissem que lhe passaram a entravar o caminho.

Em primeiro lugar, no processo de desenvolvimento econômico, mais acentuadamente desencadeado depois de Volta Redonda e de Paulo Afonso, que marcaram a entrada do Brasil na era das indústrias de base, a classe média dos white-collars é a que menos capacidade tem de reação econômica, ao contrário do proletariado que, vital para a produção de bens, pode pres­sionar, por meio de dissídios e greves, no sentido de melhorar seus padrões salariais. Além disso, a sua crescente politização, através das organizações sindicais, lhes consegue a aliança e a proteção dos partidos populistas. Por isso, até certo ponto, seus salários acompanham a espiral inflacionária, que é outra característica da economia brasileira atual, de causas complexas, entre as quais, porém, não deixa de ter função determinante poderosa o próprio desenvolvimento industrialista.

Espremidos entre os capitalistas que, pelo vulto crescente dos negócios, vêem seu poder econômico tornar-se quase absoluto, e o proletariado em formação progressiva, mais essencial ao crescimento daquele poder capita­lista e, por isso, mais capaz de reivindicações e de conseqüente atendimento, os white-collars, ao mesmo tempo que crescem de número, sentem piorar suas condições econômicas, empobrecendo. Individualistas e semiletrados, deixam-se dividir e animar por contraditórias ideologias, a ponto de suas organizações de classe se multiplicarem, dividirem, conflitarem-se reciproca­mente e propugnarem por soluções divergentes, quando não contraditórias.

De forma semelhante, na fase atual do desenvolvimento brasileiro, em­pobrecem os milhões de camponeses sem terras, os quais nem possuem as contraditórias aspirações culturais da classe média, nem o poder reivindica-tório do proletariado. Só a própria miséria, em que se encontram, quando chegar ao extremo da fome aguda, poderá torná-los agressivamente reivin-dicantes, como parece começar a acontecer, agora, no Nordeste. Mais que a educação, uma racional reforma agrária, acompanhada de meios assisten­ciais e de educação de base, 2 poderá evitar um desfecho violento para a situação dessas massas camponesas.

Voltemos, porém, às classes médias urbanas, crescentes em número e cujos recursos se tornam cada vez mais insuficientes para manter os filhos

2 Por educação de base, entendemos aquela que, dependente ou indepen­dentemente de instituições escolares específicas, procura levar grupos humanos em atrasado estágio de vida ou em nível primitivo, a conseguir um estágio su­perior de trabalho, de produção, de vida social e cultural. Os meios para isso variam conforme as áreas e os respectivos graus de atraso ou de primitivismo.

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na escola, secundária, que é predominantemente privada e paga. E, no entan­to, essa escola tem para ela importância extraordinária, pois que é o "abre-te Sésamo" para os cursos superiores que levam às profissões liberais, à alta burocracia, às mais vantajosas posições nas atividades terciárias. Por isso, o white-collar brasileiro se dispõe ao sacrifício e à luta por esse tipo de edu­cação escolar.

Ora, até 1945 aproximadamente, foi-lhes possível pagar a escolarização secundária dos filhos. Os colégios particulares cresceram e prosperaram. Seus proprietários enriqueceram com facilidade. A este respeito, ainda em 1955-1956, fizeram-se estudos em alguns órgãos do Ministério da Educação, nos quais se comprovava a extraordinária renda líquida, anual, de alguns colégios do Distrito Federal. Os relatórios foram feitos para uso interno. quando se procurava fixar as bases do Fundo Nacional de Ensino Médio, e não foram publicados. Mas existem, pois uma cópia deles foi lida pelo autor deste trabalho.

Entretanto, em todas as áreas urbanas do país, o processo de formação das classes médias continuava ativo, dele resultando, pouco a pouco, a subes-tratiftcação em média-baixa, média-média, e média-alta, todas elas aspi­rantes de mais educação. Sem dúvida, a média-baixa, mais numerosa, mais recente, mais aspirante de ascensão e mais confusa em suas reivindicações, transformou a escola secundária — formal e semi-humanística — em meta a ser atingida por suas gerações novas.

Ora, justamente este substrato da classe média é o mais pobre, dispondo de menos recursos salariais que vários escalões da classe operária.

O salário médio dos comercíários no Distrito Federal e em São Paulo, .segundo revelam os dados publicados pelo I .B.G.E. , nos seus Anuários Es­tatísticos, tem sido inferior ao salário médio dos industriários, o mesmo vem acontecendo com o salário médio do funcionalismo público federal, em am­bas as capitais. O "barnabé", nos dias atuais, encontra-se quase em con­dições de subemprêgo.

Todavia, embora não politizada, essa camada da classe média tem o poder de voto e sua pressão por mais educação se reflete nos programas po-litico-administrativos dos municípios, dos Estados e do próprio Governo Fe­deral. (Por isso, as escolas particulares começaram a sofrer a concorrência dos ginásios militares e de seções do Colégio Pedro II.) Já em 1959, as ma­trículas nas escolas de ensino secundário, particulares, constituíam apenas 06% do total, ao passo que, em 1950, elas constituíam mais de 78%.

Por outro lado, uma organização semiprivada (Campanha Nacional de Educandários Gratuitos), com apoio de Municípios, de Estados e do Minis­tério da Educação, tem-se expandido extraordinariamente nos últimos anos. mantendo já cerca de 300 ginásios e colégios gratuitos em todo o território nacional, com cerca de 30 mil alunos.

Vê-se, portanto, que o domínio exercido pela iniciativa privada sobre o ensino secundário (formal e semi-humanístico) tende a reduzir-se pro­gressivamente.

Além desses fatos, há outros, de não menor importância, que contribuem para debilitar a posição da escola privada. Certos setores do subestrato in-

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termediário da classe média caminham para a organização sindical. Marí­timos, bancários, aeronautas e outros grupos mostram-se cada vez mais capazes de reivindicações, por meio de seus sindicatos. De forma seme­lhante, o professorado de escolas secundárias, no Rio, em São Paulo e em outras capitais mais importantes, organiza-se e reivindica melhores salários e melhores condições de trabalho. Já é quase tradição no Brasil a pujança política e reivindicatória dos estudantes de escolas superiores. A seu exem­plo e a eles aliados, os secundaristas também se organizam e se dispõem à luta pela escola barata.

De um lado, a concorrência da escola secundária pública e gratuita, de outro, a reivindicação de melhores salários por parte do professorado, e de anuidades baratas por parte dos estudantes, criam limites às vantagens com que a iniciativa privada explorava o ensino secundário.

Por fim, os novos setores de ensino médio criam ainda mais obstáculos k escola particular. Queremos fazer referência sobretudo às escolas indus­triais e técnicas, criadas e mantidas pelo Governo Federal e por alguns governos Estaduais,

bem como às escolas mantidas pelo SENAI e pelo SENAC, as quais, embora ainda deficientes em número, vão ganhando terreno, so­mando as escolas industriais e técnicas, federais e estaduais, já mais de de 20 mil matrículas, e as do SENAI e do SENAC mais de 100 mil.

A freqüência a essas escolas, inicialmente mais própria da classe baixa, se expande não só aos filhos de operários, mas também aos de vários grupos «le classe média, como pudemos verificar em três delas, que visitamos.

este lento mas seguro avanço de ensino técnico-profissional é, sem dú­vida, uma resultante da mudança de estrutura econômica que faz com que o trabalho especializado e o semi-especializado, na indústria e no comér­cio, sejam altamente remunerados. Além disso, em face da lei de equiva­lência dos cursos médios, os jovens, que se matriculam numa escola técni­ca ou numa escola industrial, ainda podem acalentar a esperança de pros­seguir os estudos em nível superior, em escolas técnico-científicas, cujos graduados são avidamente procurados pelas indústrias nascentes, como pu­demos observar ainda recentemente, com os graduados pelo Instituto Tecno­lógico da Aeronáutica, em São José dos Campos, os quais, tontos com as ofertas de emprego que lhes faziam, não sabiam qual delas era a melhor...

O ensino secundário particular, que, no período de 1930 a 1945, foi uma solução provisória para o Brasil, está, portanto, em crise. B evidente que os interesses invertidos nesse ramo de atividades não podem aceitar, de braços cruzados, essa crise. E, como acontece com toda a iniciativa privada, sempre tão veemente na defesa do laissez faire nos negócios, mas sempre também tão exigentemente reivindicatória do amparo do Estado nos mo­mentos de crise, voltam-se os proprietários de escolas secundárias para o Governo.

Criou-se um Fundo Nacional de Ensino Médio, com o fim precípuo de garantir bolsas escolares aos estudantes, para que estes pudessem pagar as anuidades ou taxas aos colégios, de garantir uma suplementação de sa­lários aos professores, a fim de que estes abandonassem suas reivindicações salariais, e de garantir aos próprios colégios meios de renovação do equipa-

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mento didático resguardando-lhes os lucros a que estavam habituados, isto é, uma suposta remuneração de capital empatado!...

Acontece, porém, que os Municípios, os Estados e a já grande Campanha Nacional de Educandários Gratuitos quiseram também participar dos re­cursos do Fundo, que, assim, se esfarelam, sem satisfazer a ninguém.

Ê nesta conjuntura que surge, para os debates parlamentares, o Projeto de Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional.

Desde 1948, o Ministério da Educação e Cultura tentou, em vão, levar à discussão um grande projeto, elaborado por importante comissão de educa­dores, sem que o assunto fosse capaz de merecer grande atenção. Substitu­tivos foram apresentados, alguns da iniciativa do próprio Ministério, atra­vés de deputados desejosos de prestar esse serviço à Nação.

Só agora, quando a crise do ensino privado se agrava, quando as sub­venções, apesar de crescerem anualmente, se tornam cada vez mais insufi­cientes, quando as escolas públicas de nível médio, em todos os ramos, se multiplicam e substituem a iniciativa privada, é que o Projeto tem anda­mento, para modificar-se e ser substituído por outro, inteiramente diferente do original. Os debates estão aí, vivos, candentes por vezes, porque os interesses entram

em choque e, com eles, as ideologias mais contraditórias. Por isso, não acreditamos numa Lei justa e ponderada, que cuide ex­

clusivamente de considerar em bloco os grandes problemas educacionais do Brasil, com objetividade e realismo, para encaminhar-lhes e orientar as soluções. A Lei será eclética, contraditória e provisória, como o Projeto, já aprovado pela Câmara dos Deputados, está a demonstrar. Outras solu­ções terão de vir, porque a lei não poderá ser cumprida.

Contradições internas e externas do Projeto.

Tomaremos do Projeto apenas alguns artigos principais, fora de sua numeração:

1º A educação da prole é direito da família e será dada no lar e na escola.

2º O direito à educação é assegurado a todos: I) pela obrigação do Po­der Público e pela liberdade da iniciativa particular de instituir, na forma das leis em vigor, escolas de todos os graus; II) pela obrigação do Estado de fornecer recursos técnicos e financeiros indispensáveis para que a família se desobrigue dos encargos da educação, quando provada a insuficiência de meios, de modo a assegurar iguais oportunidades a todos.

3º E assegurado a todos o direito de transmitir os seus conhecimentos, não podendo o Estado favorecer o monopólio do ensino.

4º É assegurado às escolas públicas e às particulares igualdade de condições:

a) pela representação adequada das instituições educacionais nos ór­gãos de direção do ensino; b) pelo reconhecimento para todos os fins dos estudos realizados nos estabelecimentos particulares autorizados e reconhe­cido».

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5º É da competência dos Estados e do Distrito Federal reconhecer e inspecionar os estabelecimentos de ensino primário e médio, quando nao mantidos pela União.

A contradição entre os cinco artigos transcritos do Projeto, antes de sua redação final pela Comissão de Redação da Câmara de Deputados, é patente.

Se cabe à família o direito de escolher com prioridade o gênero de educação que deve dar aos filhos, não vemos como esse direito possa ser atendido em sua completa integridade, porque não é dada à família a possi­bilidade de, por si mesma, constituir a escola que lhe interessar possa. Es­tabelecendo o Projeto que o direito à educação é assegurado a todos pela obrigação do Poder Público e pela liberdade de iniciativa particular de ins­tituir, na forma das leis em vigor, escolas de todos os graus, limita desde logo a liberdade de escolha, por parte da família, à alternativa: escola pú­blica, mantida pelo Estado, ou escola particular, não mantida pelo Estado.

A diferença entre escola pública e particular é apenas de manutenção, ou nem isso. Cabe ao Estado, segundo o Projeto, fornecer os recursos técnicos e financeiros para que a família se desobrigue dos encargos de educação, isto é, para que ela possa escolher entre a escola pública e a escola priva­da. Em outras palavras, cabe ao Estado dar à família o dinheiro para que esta possa pagar a escola privada, e cabe ainda ao Estado dar dinheiro à escola privada para que esta tenha equipamento técnico equivalente ao da escola pública.

A livre escolha da família se resume, pois, a decidir entre uma escola pertencente ao Estado e por este mantida, e uma escola não pertencente ao Estado, embora substancialmente por este subvencionada. como as escolas particulares deverão submeter-se a condições de organização curricular, estabelecida pelo Projeto, só lhes cabendo uma opção mínima de 2 matérias em um número superior a 5, a diferença essencial entre escola pública e escola privada é quase que unicamente uma diferença de propriedade.

Na realidade, o Projeto, ao enunciar o direito da família à livre escolha da educação que esta quiser dar aos filhos, tem em vista apenas garantir à escola particular a mesma possibilidade de sobrevivência que à escola pública. Em outras palavras, procura assegurar às empresas particulares de ensino condições econômicas, pela possibilidade de subvenções substan­ciais, sem as quais elas não poderiam sobreviver, em virtude do crescente empobrecimento da classe média e da nascente preferência do proletariado urbano pelo ensino técnico-profissional.

Analisando, porém, a realidade dos fatos que estão por trás da ideolo­gia que os deputados federais procuraram consagrar no Projeto, vemos que o princípio de que "a educação da prole é direito da família e será dada no lar e na escola" procura atender às reivindicações da Igreja, à sua filosofia educacional, baseada no direito natural da família e no direito revelado de iíe et docete. Neste caso, o Projeto, para ser conseqüente, devia falar em escolas mantidas por ordens, associações e organizações religiosas, e não

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em escolas particulares. O Particular inclui tudo o que não é público ou pertencente ao Estado, inclusive escolas mantidas só para fins lucrativos; inclui escolas materialistas, divorcistas, comunistas, anarquistas, anticleri-calistas, etc. E todas elas terão direito de pleitear dinheiros públicos para se manterem, o que, aliás é reforçado pela afirmação de que "é assegurado a todos o direito de transmitir seus conhecimentos, não podendo o Estado favorecer o monopólio do ensino".

A intenção do Projeto, de atender ao mesmo tempo a Igreja e o priva-tismo escolar, faz com que a Igreja seja desde logo prejudicada. Se ela já tivesse a maioria das escolas no Brasil, talvez pudesse, de início, levar vanta­gem na distribuição dos recursos públicos. O que acontece, porém, é que 66% das escolas secundárias brasileiras (em termos de matrícula) são privadas, mas apenas pouco mais de 32% são católicas. Ora, na situação atual, com base no estudo do orçamento federal e de 9 orçamentos estaduais, calcula­mos que 70% das subvenções concedidas a escolas secundárias são dados às escolas católicas. Pela aplicação do que se contém no Projeto, parece-nos que não há dúvida em que as escolas católicas verão suas subvenções di­minuídas.

E, mais do que isso, procurando atender também aos internacionalistas, aos ideólogos da escola norte-americana e da escola francesa, o Projeto li­mita mais ainda as possibilidades da Igreja em ver sua filosofia educacional atendida, porque abre, a todos os seus inimigos, o direito de ensinar, utili­zando para isso os dinheiros públicos.

Já dissemos, em livro e artigo de jornal, que as escolas católicas nunca tiveram problemas no Brasil e que, num regime democrático, quando ela assegura a maioria de um povo ao seu lado, como é o caso do Brasil, a tentativa de legislação de tipo liberal, que lhe procure assegurar vantagens, limitará ou reduzirá o efeito positivo daquela maioria, porque nessa legis­lação de tipo liberal não será possível fixar nitidamente o privilégio de uma só religião. Dominando, embora, o país, ela sai perdendo, porque tal legis­lação tem de ser extensiva a todos, mesmo em situação de minoria.

A nosso ver, a melhor posição da Igreja, de resguardo de seus interesses ideológicos e religiosos, era a que ela assumira depois de 1930 e antes

de 1946: exercer influência para que a escola pública se cristianizasse pro­gressivamente, levando seus padres e seus líderes a ocuparem tantas posi­ções quantas fossem possíveis nas docências das escolas de todos os tipos, e contribuindo para que certos princípios relativos aos fins e aos meios da educação pública levassem, a esta, o valor das verdades sociais e morais do cristianismo. Nessa perspectiva, a atuação da Igreja teria um sentido nacional, brasileiro, porque seria levar a escola a não fugir de uma caracte­rística dominante da cultura de nosso povo.

Mas também as empresas particulares de ensino, não religiosas, não conseguirão vantagens pelo Projeto. este, de acordo com a Constituição, determina que 10% da renda tributária da União, e 20% da dos Estados e dos Municípios, sejam aplicados em educação.

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Ora, em 1958, a União gastou em educação e cultura, não só pelo res­pectivo Ministério, mas também por outros, o total de 11,5 bilhões de cru­zeiros, ao passo que sua renda tributária foi de 113.8 bilhões. Logo, os 10% que lhe cabem já estão sendo aplicados e ultrapassados.

No mesmo ano, os Estados gastaram em educação o total de 14,7 bilhões, e sua renda tributária totalizou 79,0 bilhões de cruzeiros. Deixaram os Es­tados de atingir os 20% constitucionais, apenas por pouco, porque efetivamen­te gastaram em educação 18,6% da receita tributária.

Os municípios, em 1957, gastaram 2,1 bilhões com educação e sua re­ceita tributária foi de 12,6 bilhões. Atingiram, portanto, a apenas 16,6% daquilo que, por força da Constituição, deveriam gastar.

Do total das despesas com educação, pela União, os Estados e os Muni­cípios (em 1957) 21,4% foram aplicados em subvenções e auxílios a institui­ções particulares, ou sejam 4,5 bilhões de cruzeiros. Mas, e isto é impor­tante, deste total, 3,74 bilhões foram concedidos pela União (83%) e apenas 0,76 bilhões pelos Estados e Municípios (17%).

Será muito difícil a estes aumentar a quota de subvenções, sem que isso implique fechamento ou paralisação do ensino público primário, para o qual a contribuição privada é insignificante, acrescendo que, em todas as unidades federativas, há déficit de escolas primárias. Além disso, cumpre observar quo a situação do professorado primário, municipal, é a mais pre­cária possível. Provavelmente, os próximos aumentos das despesas muni­cipais com educação terão de o ser na melhoria salarial dos professores, sem o que a escola será sempre um arremedo daquilo que deveria ser.

À União, portanto, é que caberia, em face da conjuntura educacional, que o Projeto não examina nem procura solucionar, arcar com os auxílios financeiros que reverteriam em benefício das instituições particulares. Ora, em 1958, quando as despesas com educação já ultrapassavam os 10% da receita, tributária, eram elas divididas da seguinte forma:

Administração 727.542.000 — 6,3%

Ensino elementar 1.901.326.000 — 16,6%

Ensino médio 3.199.531.000 — 27,8% Ensino superior 4.433.350.000 — 38,5% não especificado 38.332.000— 0,3% Órgãos culturais 668.331.000— 5,7% Outras despesas 547.578.000— 4,8%

Total 11.511.900.000 — 100,0%

De acordo com o § 1º do art. 80 do Projeto, "com nove décimos dos recursos federais destinados à educação, serão constituídos, em parcelas iguais, o Fundo Nacional do Ensino Primário, o Fundo Nacional do Ensino Médio e o Fundo Nacional do Ensino Superior".

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Neste caso, em 1958, sendo a renda tributária da União aproximadamente de 113,8 bilhões, os 10% para educação seriam de 11,38 bilhões, que, de acordo com o texto do Projeto, se distribuiriam da seguinte forma:

Administração e outras despesas . . . 1.138.000.000 — 10% Ensino Primário 3.414.000.000— 30% Ensino Médio 3.414.000.000— 30% Ensino Superior 3.414.000.000— 30%

Total 11.380.000.000 — 100%

como a iniciativa privada só se interessa pelo ensino secundário e por certos ramos do ensino superior, não poderia, pela repartição de recursos consagrada no Projeto, contar com muito mais auxílios no ensino secundá­rio e veria reduzidas suas possibilidades de auxílio no que diz respeito ao ensino superior.

Além disso, mantida a proporcionalidade entre escolas públicas e esco­las privadas, no ensino médio, é preciso não esquecer que 34% das matrí­culas no ensino secundário são em escolas pertencentes à União, aos Esta­dos e aos Municípios; 6,9%, no ensino comercial; 41,6% no ensino normal, 80,4% no ensino técnico-industrial e 97,2% no ensino agrícola. Tal situação, tendo em vista a ênfase que o Projeto dá ao ensino técnico de nível médio, reduzirá ainda mais as possibilidades da escola privada em obter substan­ciais auxílios e subvenções do Poder Público.

No ensino superior, a situação para a escola privada é ainda pior, dada a dominância das instituições federais e estaduais sobre as privadas.

Conclusões.

Chegamos, pois, à conclusão de que um projeto de lei ideologicamente construído para reforçar a posição da escola privada, ao desligar-se inteira­mente dos fatos, permanece como uma ideologia, segundo a definimos no início deste trabalho. E, como ideologia, é constraditório, em si mesmo, desligando-se dos fatos e pouca influência podendo ter sobre estes. Será, se aprovado e sancionado, uma lei inócua.

O fato concreto da expansão da escola pública, característica dos últi­mos 15 anos de desenvolvimento educacional do país, não pode ser contra­ditado. Nenhuma lei, em face desse fato, conseguirá destruí-lo, porque, se estabelecida democraticamente, reconhecê-lo-á e, embora queira torcê-lo ou degradá-lo, não o conseguirá, porque êle é menos o resultado do interesse de alguns

grupos, que de uma já definida conjuntura econômica, social e cultural.

Para acabar a escola pública, seria preciso negar ao Estado o direito e o dever de proporcionar escolas aos cidadãos, que lhes garantam a educação a que têm direito. Foi por causa deste direito que a escola pública surgiu no mundo e é por causa dele que ela se expande incessantemente. não podendo ser, por isso, meio de lucro para o particular, terá sempre de

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ser obra de Governo, embora o particular possa ter uma pequena parcela nessa obra, ao atender, com mais requinte, certas camadas superiores da sociedade nacional — (Revista Brasileira de Estudos Políticos, Belo Ho­rizonte).

PLANO DE CONSTRUÇÕES ESCOLARES DE BRASÍLIA

ANÍSIO TEIXEIRA

0 plano de construções escolares para Brasília obedeceu ao propósito de abrir oportunidade para a Capital federal oferecer à nação um conjunto de escolas que pudessem constituir exemplo e demonstração para o sistema educacional do país.

como as necessidades da civilização moderna cada vez mais impõem obrigações à escola, aumentando-lhe as atribuições e funções, o plano con­siste — em cada nível de ensino, desde o primário até o superior ou terciá-rio, como hoje já se está este a chamar — num conjunto de edifícios, com funções diversas e considerável variedade de forma e de objetivos, a fim de atender a necessidades específicas de ensino e educação e, além disto, à necessidade de vida e convívio social.

Daí falar-se antes em Centro do que em Escola. O Centro de Educação Elementar compreende pavilhões de "jardim de infância", de "escola-classe", de "artes industriais", de "educação física", de "atividades sociais", de "bi­blioteca escolar" e de "serviços gerais". É, portanto, algo como se fosse uma Universidade Infantil. O Centro de Educação Média também possui um programa consideravelmente diversificado, destinando-se a oferecer a cada adolescente real oportunidade para cultivar o seu talento e aí se pre­parar diretamente para o trabalho ou para prosseguir a sua educação no ní­vel superior.

Tal programa constitui, assim, menos um desafio aos arquitetos de Bra­sília do que um oferecimento de ampla liberdade de concepção para os no­vos e complexos conjuntos escolares.

Em esquema, o programa foi o seguinte:

1 — Educação primária a ser oferecida em Centros de Educação Ele­mentar, compreendendo:

1. "Jardins de infância" — destinados à educação de crianças nas idades de 4, 5 e 6 anos;

2. "Escolas-classe" — para a educação intelectual sistemática de meno­res nas idades de 7 a 14 anos, em curso completo de seis anos ou séries escolares;

3. "Escolas-parque" — destinadas a completar a tarefa das "escolas-classe", mediante o desenvolvimento artístico, físico e recreativo da criança e sua iniciação no trabalho, mediante uma rede de instituições ligadas entre si, dentro da mesma área e assim constituída:

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a) biblioteca infantil e museu; b) pavilhão para atividades de artes industriais; c) um conjunto para atividades de recreação; d) um conjunto para atividades sociais (música, dança, teatro, clu­

bes, exposições); e) dependências para refeitório e administração; f) pequenos conjuntos residenciais para menores de 7 a 14 anos, sem

família, sujeitos às mesmas atividades educativas que os alunos externos. como a nova capital é construída em quadras, e cada quadra abrigará

população variável de 2.500 a 3.000 habitantes, foi calculada a população escolarizável para os níveis elementar e médio, ficando estabelecido o se­guinte:

1. Para cada quadra: a) 1 jardim da infância, com 4 salas, para, em 2 turnos de funciona­

mento, atender a 160 crianças (8 turmas de 20 crianças); b) 1 escola-classe, com 8 salas, para, em 2 turnos, atender a 480 me­

ninos (16 turmas de 30 alunos). 2. Para cada grupo de 4 quadras: a) 1 "escola-parque" — destinada a atender, em 2 turnos, a cerca de

2 mil alunos de "4 escolas-classe", em atividades de iniciação ao trabalho (para meninos de 7 a 14 anos) nas pequenas "oficinas de artes industriais" (tecelagem, tapeçaria, encadernação, cerâmica, cartonagem, costura, bor­dado e trabalhos em couro, lã, madeira, metal, etc) , além da participação dirigida dos alunos de 7 a 14 anos em atividades artísticas, sociais e de re­creação (música, dança, teatro, pintura, exposições, grêmios, educação fí­sica).

Os alunos freqüentarão diariamente a "escola-parque" e a "escola-classe", em turnos diferentes, passando 4 horas nas classes de educação intelectual e outras quatro horas nas atividades da "escola-parque", com intervalo para almoço.

II — Educação média ou secundária, em Centros de Educação Média, compreendendo um conjunto de edifícios destinados a:

1. "Escola Secundária Compreensiva", incluindo: a) cursos de humanidades b) cursos técnicos e comerciais c) cursos científicos. 2. Parque de Educação Média (quadras para volibol, basquete, piscina,

campo de futebol, etc) . 3. Núcleo cultural (teatro, exposições, clubes). 4. Biblioteca e museu. 5. Administração 6. Restaurante. III — Educação Superior Universidade de Brasília, a ser construída, em área própria, compreen­

dendo : 1. Institutos (de Matemática, Física, Biologia, Geologia, Artes, e tc ) ,

destinados ao ensino científico básico e especializado.

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2. Faculdades (de Educação, Politécnica, Ciências Médicas, Direito, etc.) destinadas à formação intelectual e ao adestramento profissional.

3. Reitoria, Sala Magna e Biblioteca Central.

4. Campos de recreação e desportos (estádio, ginásio, piscina, e tc) .

5. Serviços administrativos e gerais. Em todo esse programa, cumpre distinguir a educação comum e obrigató­

ria, destinada a todos, e a educação especial destinada a formar os diversos quadros ocupacionais do país. Quanto à educação para todos, isto é, a ele­mentar, o seu característico, no programa proposto, é o de juntar o ensino propriamente intencional, da sala de aula, com a auto-educação resultante de atividades de que os alunos participem com plena responsabilidade. Por isto, a escola se estende por oito horas, divididas entre atividades de estudos e as de trabalho, de arte e de convivência social. No centro de educação elementar, a criança, além das quatro horas de educação convencional, no edifício da "escola-classe", onde aprende a "estudar", conta com outras qua­tro horas de atividades de trabalho, de educação física e de educação social, atividades em que se empenha individualmente ou em grupo, aprendendo, portanto, a trabalhar e a conviver.

Pode-se bem compreender que modificações deverão ser introduzidas na arquitetura escolar para atender a programa dessa natureza. Já não se trata de escolas e salas de aula, mas de todo um conjunto de locais, em que as crianças se distribuem, entregues às atividades de "estudo", de "tra­balho", de "recreação", de "reunião", de "administração", de "decisão" e de vida e convívio no mais amplo sentido desse termo. A arquitetura es­colar deve assim combinar aspectos da "escola tradicional" com os da "ofi­cina", do "clube" de esportes e de recreio, da "casa", do "comércio", do "restaurante", do "teatro", compreendendo, talvez, o programa mais com­plexo e mais diversificado de todas as arquiteturas especiais. As notas que se seguem mostram como foram abordadas por um arquiteto as novas neces­sidades e funções da ambiciosa escola moderna. 1

Escola-parque

1. O Problema: Construir área para conter cerca de 1.000 crianças de 7 a 14 anos (em cada turno), constituindo os locais adequados às atividades programadas, numa faixa de terreno de 80 x 160 metros.

2. Condições óbvias: a) Só um piso elevado; b) Taxa de ocupação do terreno relativamente baixa com o desafogo necessário para os espaços li­vres circundantes, jardins, piscina e esportes.

3. Resultante geométrica: Planta condensada ao máximo — Um Qua­drado — 50 x 50 metros — 2.500 metros quadrados — no piso superior. Zo­nas livres permitindo a continuidade do terreno — no piso térreo. Fora do quadrado: só o indispensável.

4. Iluminação natural do prisma construtivo: Dupla: — Lateral — uniforme com proteção parcial; Zenital — uniformemente distribuída, na mesma direção.

1 Trata-se do projeto de José de Souza Reis.

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5. Disposição da principal área construída: Economia — aproveitamento quase total do quadrado, com a localização de um só acesso amplo e do bloco de instalações sanitárias na zona central — Completa maleabilidade da distribuição do espaço interno, ampliado pela continuidade — Possibilidade de isolamento total, sem quebra da continuidade, por meio de placas trans­parentes acima de 2 metros.

Centro de Educação Média 1. O Problema: Construir um conjunto de edifícios para conter o

total de 2.250 alunos de 11 a 18 anos, de maneira adequada ao exercício das atividades programadas:

I — Centro cultural, teatro e exposições

II — Biblioteca e museus

III — Centro de serviços gerais

IV — Escola média compreensiva, incluindo ginásio e colégio, escola

comercial, técnico-industrial, curso normal ou pedagógico e escola agrícola.

V — Centro de educação física e esportes em, geral. Terreno disponível, fixado após os estudos preliminares: 400 x 400 me­

tros. 2. Condições óbvias: a) No máximo, 2 pisos elevados; b) Taxa de ocupa­

ção baixa para atender ao desafogo necessário num conjunto dessa natu­reza; c) Grupamento conveniente ao funcionamento das atividades de ca­racterísticas semelhantes, tanto para a constituição dos blocos construtivos, como para a do conjunto.

3. Resultante geométrica do conjunto: Condensação acentuada das áreas construídas, consideradas no conjunto — Seis Blocos Construtivos grupados longitudinalmente em torno de uma praça central que dá acesso ao centro. Três de um só piso térreo. Três de altura relativa a 2 pisos. Grupamento de todas as atividades semelhantes. Continuidade do terreno, por meio do jogo da disposição dos pisos térreos ou elevados. Diversificação de aspectos dentro da unidade geral, por meio do emprego de tipos estruturais diferen­tes, de conformidade com as características próprias dos vários edifícios e decorrentes das respectivas destinações.

4. Escola média compreensiva: As exigências da técnica pedagógica determinaram a localização do Ensino Técnico-industrial e do Curso Normal ou Pedagógico em blocos independentes, ainda que próximos do bloco cons­trutivo que reúne os demais cursos constitutivos da Escola Secundária Com­preensiva mais acima enumerados. Assim, esses cursos foram localizados em 3 blocos de construção formando um conjunto dentro do Centro de Edu­cação Média. O principal desses blocos acha-se em fase de conclusão e a sua execução representou o seguinte:

5. Problema: Construir um edifício para conter cerca de setenta uni­dades de 7 x 9 metros para as salas de classe, salas especiais, laboratórios, salas de trabalhos manuais, etc, bem como subdivididas em salas de professores,

assistentes, gabinetes, etc, além das demais instalações necessárias. Permitir a mais completa maleabilidade de distribuição interna para o gru-

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pamento de salas nas mais diversas combinações, com múltiplos e submúl-tiplos d a unidade padrão ( 7 x 9 m ) .

6. Resultante geométrica: Condensação máxima — retângulo compacto: — Piso superior: esquema reticulado. Economia: 4 galerias de circulação p a r a 8 alas de compar t imentos . Piso t é r reo : recreio coberto — continuidade do ter reno entre as construções té r reas dos 2 blocos contíguos (Ensino Téc-nico-industrial e Curso Normal ou Pedagógico).

7. Iluminação natural: Zenital — uniforme, por meio de sheds espa­çados de 3,50 metros (2 em cada unidade de 7,00 x 9,00 met ros) .

8. Disposição geral: Aprovei tamento quase total do re tângulo : só 2 es­cadas e 2 blocos de instalações sanitárias concentradas , localizados dentro do per ímetro — Localização externa dos acessos principais ( rampas) . 2 pátios de repouso no piso principal (4 unidades de 7,00 x 9,00 metros, cada u m a ) . Possibilidade de novas aber tu ras (até 7,00 x 9,00 m) que interessem ao funcionamento das at ividades escolares, no bloco compacto. (Revista Módulo, Rio.)

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JORNAIS

A INFORMAÇÃO OCUPACIONAL NO ENSINO MÉDIO

MANUEL BAGRICHEVSKY

A educação no Brasil, salvo uma ou outra experiência nova nesse campo. tiinda. hoje se processa em termos de escola acadêmica tradicional, isto é, prepara o homem para a chamada cultura humanística, sem qualquer vin­culação maior com a vida prática.

A escola secundária brasileira, que hoje engloba um vasto contingente humano, não está podendo oferecer ao desenvolvimento nacional aquela con­tribuição que dela é justo esperar-se. E a principal razão dessa ausência reside no fato de os nossos jovens secundaristas continuarem a "dar" lições segundo programas onde não se inclui a orientação ocupacional.

como, na maioria dos casos, não encontra o nosso jovem essa orientação também no lar, atravessa êle todo o currículo e termina por não saber, após o curso secundário, que caminho seguir dai por diante, de modo a melhor utilizar os conhecimentos até então adquiridos em benefício próprio e da coletividade. não sabe, por exemplo, o jovem, não raras vezes, que profis­são seguir. não estando razoavelmente informado sobro ramos e especiali­dades dos diversos campos do conhecimento, procurará, com efeito, seguir aquela "carreira que lhe pareça mais simpática".

Daí ocorrem, muitas vezes, insatisfações na vida profissional, desajusta­mentos e baixo rendimento do trabalho.. .

Uma campanha sistemática e de profundidade impõe-se, visando essa juventude, pais e educadores, esclarecedora das variadas atividades, ocupa­cionais do mercado de trabalho e das suas oportunidades e possibilidades.

A escola assume uma importância fundamental na orientação ocupacio­nal que se deve dar ao aluno. Ela deve manter equipe de professores e orientadores bem preparados e atualizados nesses conhecimentos, capazes de selecionar e aconselhar seus alunos, nas atividades profissionais que pode­rão abraçar, valorizando o trabalho, combatendo os preconceitos profissio­nais e humanísticos.

Uma das primeiras providências para o bom sucesso dessa iniciativa é r. imprescindível entrosamento da Escola com as empresas de trabalho. instituições trabalhistas, formando com elas conselhos de mão-de-obra, ou outras formas de íntima interligação Escola-Trabalho.

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O desenvolvimento vertigioso das diversas áreas de trabalho nestes últi­mos anos não foi acompanhado por um preparo prévio da mão-de-obra de que se necessita. A maioria das pessoas que ingressam na vida prática, além de não estarem preparadas profissionalmente, desconhecem as ativida­des que vão exercer, coagidas a tal apenas pela imperiosa necessidade eco­nômica. E óbvio que nestas condições a instabilidade no trabalho é grande e a fixação se faz depois de constantes períodos experimentais e isso em detrimento da produção, do homem e da sociedade.

Para exemplificar sobre esse desenvolvimento da força de trabalho bra­sileira, citaremos dados referentes à área industrial, e de maior expansão atualmente: nestes últimos anos a Indústria está admitindo uma média de 250.000 a 300.000 novos trabalhadores anualmente, para exercerem cerca de 2.000 ocupações diferentes. Dessas pessoas, talvez não mais de 50.000 rece­bem instrução escolar específica às ocupações que vão exercer e umas 20.000 terminaram os seus cursos.

Um problema de sérias proporções com que nossa indústria se defronta é pois o da mão-de-obra.

O grande desenvolvimento industrial, a variedade de produtos manufa­turados e as técnicas múltiplas de fabricação exigem trabalhadores em todos os níveis e tipos de atividades, que não se encontram no mercado de tra­balho. A indústria metalúrgica, de automóveis, autopeças entre outras, ne­cessita de uma quantidade, atualmente inexistente, de ferramenteiros, me­cânicos montadores e operadores de máquinas operatrizes e outros. As in­dústrias de fabricação de aparelhos eletrônicos encontram dificuldades na obtenção de técnicos especialistas nesse ramo. Técnicos laboratoristas é outra falta sentida pelos produtores do drogas farmacêuticas e químicas.

Seria cansativo enumerar as profissões solicitadas por nossa indústria. Atualmente as solicitações para trabalhos industriais é muito maior que as ofertas. esse desequilíbrio mostra as oportunidades existentes para a nossa juventude, principalmente para o estudante secundarista.

ESCOLAS DE ENSINO PROFISSIONAL

Várias são as instituições que mantêm escolas ou sistemas para a formação da mão-de-obra. Umas são particulares, outras pertencem aos governos e estaduais ou municipais. Creio que todas elas devem estar voltadas para suprir melhor em quantidade, qualidade e variedade a demanda da mão-de-obra do nosso parque industrial: lembro as escolas industriais e técnicas da rede do MEC que vêm instalando novos cursos de aprendizagem, de duração relativamente curta, ampliando e propiciando maiores oportuni­dades a jovens que desejam ingressar nas indústrias e o Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial — SENAI, órgão educacional, mantido e diri­gido pela Confederação das Indústrias, com cerca de 30.000 alunos em suas 116 escolas, matriculados em 80 ofícios diferentes do ramo industrial.

O SENAI, além do ensino em escolas, ajuda nossa indústria na formação e aperfeiçoamento da mão-de-obra, no próprio local de trabalho. Nesse cam­po, as empresas industriais mantêm quase 50.000 aprendizes de ofícios que

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são orientados por esse serviço. Também com sua ajuda já foram treinados diversos métodos de supervisão aproximadamente 37.500 pessoas. Outros ti­pos de auxílio são ainda prestados por essa instituição a nossa indústria.

É para sanar essa lacuna, a de apresentar e dar oportunidade de tra­balho ao estudante que vai concluir seu curso, que se deve introduzir a infor­mação ocupacional na escola secundária, mas devidamente planejada e sob a gestão de especialistas capazes de enriquecer nosso ensino secundário com esse elemento indispensável a sua adequação à realidade brasileira de nosso tempo. — (Diário de Notícias, Rio).

HAVERÁ UMA PEDAGOGIA OPERÁRIA?

ANTÔNIO PINTO DE CARVALHO

Nos manuais de pedagogia tradicional não se encontra, que eu saiba, qualquer alusão a este problema. O termo "pedagogia" é aí tomado em seu sentido puramente literal, isto é: "a arte de dirigir crianças". não raro até "pedagogia" parece ser o equivalente de: "metodologia do ensino pri­mário, secundário, universitário", para não dizer que é um termo muito pomposo, cujo conteúdo as mais eminentes sumidades na matéria não con­seguem tirar a limpo. Ê certo, de vez em quando, alguns autores tratam, em seus manuais, de outros aspectos da questão, como, por exemplo, da educação pós-escolar, da educação na família, da educação sexual, da edu­cação social e cívica. Em todo caso, para os adultos, o processo pedagó­gicos parece estar de há muito classificado: considerar-se terminada a edu­cação deles no dia em que deixaram as bancadas escolares, a casa paterna, e passaram a viver com maior ou menor independência.

Semelhante concepção não passa de aparência enganadora. Se consul­tássemos as estatísticas, veríamos que os mais dos jovens entre 14 e 18 anos não recebem educação regular: tomemos, por exemplo, o caso da Ho­landa ou da Bélgica, onde a obrigatoriedade de instrução é algo mais que simples letra morta no papel, e vemos que a percentagem dos "abandona­dos" se elevam a 70%. Sendo assim, teremos de admitir que, afinal de contas, ainda são os meios financeiros do pai e não as aptidões das crianças e dos adolescentes que decidem da instrução que eles recebem. A educação operária, da qual nos ocupamos em alguns artigos precedentes, tem em mira compensar estas falhas, de que é vítima a grande maioria da nação.

Saltam à vista as diferenças entre a pedagogia operária e a pedagogia habitual. A educação operária — tendendo embora ao máximo de objeti­vidade — não pode, por forma alguma, ser neutra. O fato de ela, nos países onde é cultivada, haver sido criada por uma organização sindical ou política do proletariado, ou pelos patrões, ou pelo Estado, indica já uma tomada de posição, num ou noutro sentido. Além disso, ela tem em mira alunos mal preparados para a cultura, devido a um ensino defeituoso, mas

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cuja atividade intelectual é constantemente inspirada por idéias gerais, religiosas, políticas ou sociais. Ora, as idéias nunca poderão ser "neutras". Insistemos sobre a importância desta primeira característica, mas, pondo-a de parte por ora, apontemos outros contrastes entre a pedagogia operária e a pedagogia infantil. Podemos dispô-los em três categorias, a saber:

a) a educação operária dirige-se a adultos;

b) dirige-se a adultos de uma certa classe social, e praticamente aos elementos mais ativos dessa classe, aos quais se costuma dar o qualifica­tivo de militantes ou futuros militantes (designação esta não muito feliz);

c) a educação operária não é obrigatória.

Muito mais do que nas escolas, importa, neste domínio, agir com muita intensidade. Para os que dela se ocupam, muito mais que para os professores escolares,

todos os minutos são preciosos. Para disso nos capacitar­mos, basta comparar o número de lições que se podem ministrar à noite ou num fim-de-semana com a quantidade de horas de que dispõe o ensino curricular dos estabelecimentos oficiais. Por outro lado, não se cativam os alunos operários; eles esquivam-se aborrecidos ou desanimados. Quando eles consentem em se ilustrar, não pensemos que são uma folha de papel em branco, algo como a tábua rasa, de que fala Aristóteles: possuem já sua bagagem intelectual, sempre defeituosa, sempre a granel, e que muitas vezes não

representa mais do que um lastro de que importa desfazer-se o quanto antes. Mas há neles uma matéria-prima nada despicienda. É ques­tão de se lhes aplicar a devida forma substancial. Será preciso, antes de mais nada, "desensebá-los" intelectualmente (para empregar um termo de Jules Romais) para, em seguida, os ensinar a raciocinar sobre os fatos (sublinho, a um tempo, "raciocinar" e "fatos").

Mas talvez me expresse mal, dizendo que "primeiro" importa desensebá-los e "em seguida" mostrar o caminho do verdadeiro saber. As duas ações cxercem-se simultaneamente. Se quisermos combater os preconceitos dos alunos operários (tarefa que a pedagogia das crianças quase não conhece), não se trata de organizar uma lista de "preconceitos-tipo" e de os desfazer do primeiro ao último. Trata-se de combater aquilo que podemos deno­minar "o espírito de preconceito". Trata-se de penetrar até às raízes do mal.

O espírito de preconceito é, em primeiro lugar, o espírito dogmático. Urge insistir sobre a relatividade das coisas. Em derradeira análise, nossas certezas são hipóteses — revolucionárias hoje, ultrapassadas amanhã — e ainda bem. Mas tomemos cuidado. Evitar o dogmatismo não significa in­correr no preconceito inverso: no ceticismo. Improfícua seria a tarefa do pedagogo dos operários, se deixasse aos alunos uma impressão caótica, desa-nimadora. O que importa é mostrar os limites e, ao mesmo tempo, o valor das teorias. O marxismo dá-nos disto o exemplo clássico. Coube-lhe, sem dúvida, o mérito de dar aos operários uma idéia global do mundo moderno. Mas desde que a hipótese fecunda se congelou em artigo de fé, a inspiração viva cedeu o lugar ao fetichismo das fórmulas.

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Há uma máxima pedagógica elementar, tão velha como a humanidade, muito embora certos que se dizem mestres façam gala de havê-la descoberto neste malfadado século XX: ir do conhecido para o desconhecido. Qualquer criança que freqüente a escola, está mais ou menos familiarizada com estas e quejandas noções: o que tratamos até aqui é o "conhecido", e o "desconhecido" é o capítulo que veremos na próxima aula ou na pró­xima semana. Tratando-se de operários, as coisas são muitíssimo mais complexas. Os alunos apresentam-se com o cérebro prenhe de idéias. Possuem certa concepção da vida, da sociedade, do homem. Têm uma experiência vivida, impressionante. Possuem conhecimentos múltiplos porém mal digeridos, conhecimentos freqüentemente incompletos, a meias, desordenados ou ordenados ao contrário. Se sua faculdade de memorização é sensivelmente inferior à das crianças, seu espírito de lógica é, em contra­partida, muito mais desenvolvido. Por isso mesmo, também é relativamente fácil fazer aflorar ã tona do espírito noções que, a princípio, pareciam "es­quecidas", mas que na realidade só momentaneamente se tinham perdido de vista. Basta uma rápida alusão ou advertência para relembrá-las; basta um raciocínio, habilmente conduzido, para provocar esta e semelhantes rea­ções: "Ah! é verdade!". Na criança, tais descobertas do aluno em seu próprio espírito são muito mais raras.

Porque, enfim, não devemos de maneira nenhuma supor, que o simples fato de ser operário, ou de, por força das circunstâncias, não ter tido a oportunidade de tirar um curso mais ou menos regular, em subordinação a planos de estudos não raro organizados por pedagogos de gabinete, comis­sionados em cargos administrativos ou mesmo diretivos por simples ques­tão de compadrio político, ou por haverem fracassado no desempenho da missão de professor, o simples fato, digo, de não se haver sentado nos ban­cos da escola primária, secundária ou universitária, não implica menor capa­cidade ingênita para o exercício das mais nobres funções da vida social e política.

Isto me traz à memória a história de Mark Twain. Instigava-o a curio­sidade de averiguar quem teria sido o maior técnico militar da humanidade. Dirigiu-se ao céu, bateu à porta e, quando esta se lhe abriu, manifestou a S. Pedro a sua curiosidade. O santo porteiro do empíreo convida-o a entrar e condu-lo através de infindos corredores e salões. Pensando o visitante que S. Pedro lhe mostraria Alexandre Magno, Júlio César ou Napoleão, ficou sumamente espantado quando o santo lhe apontou para um bem-aventurado no canto de uma sala e assim lhe falou "Olha, aquele que ali está foi o maior gênio militar que jamais houve na terra". — "Mas quem era êle?" — "Enquanto viveu sobre a terra, ninguém lhe ligou importância, porque passou a vida inteira remendando sapatos. Infelizmente nunca teve a oportunidade de revelar seu talento militar".

A criança pode aprender, o adulto quer compreender. Na criança, o fato preciso, concreto, constitui, quase sempre, a ponto de partida; no adulto, o raciocínio suscita o interesse muitíssimo mais do que a documentação bruta. O adulto quer mesmo compreender antes de saber, donde para êle (e não para a criança) o perigo de uma "fuga para as idéias gerais". Ês-

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te perigo é sobremaneira palpável nos militantes, que, na atmosfera dos meetings, se comprazem em confundir educação e propaganda, mots d'ordre c dados objetivos. Tem-se muitas vezes a impressão de que não são os oradores de meetings que têm idéias, mas que são as idéias que os possuem. (E isto, diga-se de passagem, não acontece com os simples operários, mas até com outros oradores que o não são, mas que se dão ao luxo de pensar, não por sua cabeça, senão pela cabeça de outrem, o que, sendo um tanto próprio dos irracionais, não deixa de ser menos dificultoso.) Em suma, falta-lhes o nexo lógico entre as idéias, falta-lhes o material de fatos indis­pensáveis, falta-lhes também o suficiente domínio da língua materna. Na pedagogia das crianças, ensinar significa sobretudo: aumentar conhecimen­tos. Na pedagogia operária, pelo contrário, o que interessa é ordenar conhe­cimentos, apoiá-los, completá-los.

Dissemos ser necessário aprender a raciocinar sobre os fatos. "Racio­cinar" inclui estilo e lógica. "Fatos" inclui: documentação. Ambas as coi­sas são indispensáveis, porque, se vemos o perigo de uma "fuga para a.s idéias gerais" não menos damos conta do perigo inverso. Os mesmos oradores, de que acima falamos, que se aventuram no domínio das fórmulas abstratas, logo a seguir se deixam arrastar pela multidão das pequenas mi­núcias, das quais embalde forcejam por tirar conclusões. Perdem-se no "dé-dalo dos fatos insignificantes", e é nessa altura chegado o momento de o educador se lembrar que a documentação não vale senão como alimento do espírito, e que: "instruir não é o mesmo que encher uma garrafa; será antes acender o fogo numa lareira". A experiência demasiado estritamente pessoal ("tomemos por exemplo aquilo que me aconteceu..."), e a recorda­ção de uma leitura fortuita ("num livro que li, há tempos, havia. . .") preci­sam de ser recolocadas no seu lugar, de ser "objetivadas".

A documentação, por si só, outra coisa não produz senão ratos de bi­blioteca, e dentro da classe operária, como aliás também fora dela, há muita e boa gente que, excepcionalmente apetrechada de documentação, não logra tirar dela uma conclusão. A conclusão apressada, pelo contrário, só tem por efeito favorecer a demagogia. Quem se proponha educar adultos deve, portanto, ligar continuamente os fatos às idéias e as idéias aos fatos. Deve apoiar seus raciocínios sobre dados cuidadosamente controlados, e dar relevo lógico ideológico — aos pormenores que assinala... no meio de tan­tos outros. Lembro-me de haver ouvido a um diretor do Instituto Supe­rior Operário de Amesterdão que, ao dar seus cursos, tinha a impressão de saltitar, como um pássaro, de um para outro ramo de árvore. "Começamos por dar, dizia êle, materiais brutos, deles deduz-se uma "teoriazinha", depois derruba-se esta teoria por meio de novos fatos, mostrando, todavia, que a teoria tinha algum préstimo, que era necessária para avançar mais longe".

Eis um método que se poderia denominar "dialético", pois que tende para a síntese de um vivo desejo de exatidão e de uma ardente carência de coesão. Penso que êle é fecundo, visto estimular o trabalho pessoal, a independência do espírito. Subministra os meios de raciocinar e de agir, ao mesmo tempo que ensina a pesquisar, com precisão e a concluir com ló­gica. .. com o risco de buscar outros fatos que servirão para rever o juízo emitido.

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De início, situam-se em primeiro plano os materiais brutos. No estudo da contabilidade, por exemplo, importa começar por um treino quase auto­mático no manejo dos números. Na história, pelo contrário, uma tal pre­paração técnica exigirá muito menos tempo: desde a primeira lição, poder-se-á mostrar como os acontecimentos se entrelaçam mutuamente, muito em­bora se entrelacem também com outros fatos que não conhecemos ou apreciamos mal. não tenhamos receio de simplificar ao princípio, a fim de facilitar a retenção pela memória e de melhor cativar o aluno. Mas, desde que este tenha compreendido — invertamos a tese.

O método dialético afigurar-se-nos não só inspirado num espírito cien­tifico muito puro, como apresenta igualmente a estupenda vantagem peda­gógica de suscitar, de contínuo, um diálogo. Tal método não acumula fatos sobre fatos, lições sobre lições, enquanto o aluno se limita a escutar em ati­tude beatificamente passiva. Põe problema e solicita o aluno a refletir nele. este sentir-se-á pessoalmente, diretamente, envolvido no assunto. No co­meço da preleção, o "professor" não perguntará: "Onde tinha ficado na última aula?", mas: "Onde tinha ficado nossa conversação?"

A tarefa do "dirigente", melhor que do professor, consiste em dois ele­mentos. Primeiramente, é mister que êle não cesse de atiçar o fogo da "conversação", mediante novos combustíveis, novos dados que compliquem as coisas, mostrando que a hipótese anteriormente encontrada só na aparên­cia esgotava o problema. Desempenha êle o papel do gênio mau que pertur­ba as certezas, logo ao nascer, que observa continuamente: "Sim, mas . . . " . Por outro lado. sempre que estes correm o risco de perder no vácuo ou no caos das contradições aparentes. Se assim nos é lícito dizer, êle é, a um tempo, e consoante as ocasições, oraganizador e desmancha-prazeres.

Escusado será dizer que, para sustentar com fruto uma destas "conver­sações", não basta possuir a fundo a matéria em questão. Uma coisa é ser especialista numa disciplina e outra coisa é saber ensiná-la. Podem estas duas qualidades encontrar-se fundidas na mesma pessoa, mas não raro su­cede o estarem dissociadas. É mister, além disso, conhecer a fundo o pú­blico operário, a mentalidade do trabalhador. Sem dúvida, a intuição peda­gógica subministra sugestões indispensáveis, porém ela deve ser completada por uma profundo familiaridade com o ambiente em que vive o trabalhador, com suas falhas de ponto-de-vista intelectual e cultural, com suas concep­ções fecundas.

Contava o mesmo diretor, a que acima faço referência, que muitas vezes lhe entravam no gabinete de trabalho intelectuais ávidos de "fazer alguma coisa" pela democracia e pelo movimento operário. Pensavam que, sendo intelectuais, deviam começar pela educação operária. Respondia-lhes então que a educação operária, ao contrário do que supunham, não é o ponto de partida, senão a última conseqüência de uma experiência pessoal, vivida no seio da comunidade dos trabalhadores. Só os educadores-natos esca­pam mais ou menos a esta regra: seu instinto leva-os a sentir em que mo­mento o diálogo socrático cessa, para se converter em monólogo. não estão nesse caso os mais dos intelectuais, que confundem a intelectualidade com

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a inteligência e pensam que esta é conferida por aquela. Daí provém, não raro, os fracassos que experimentam em sua atuação junto dos trabalha­dores: em vez de contribuírem para educá-los, só concorrem para desedu­cá-los, quando não para os tornarem em instrumentos de pretensões incon­fessáveis, proclamadas em nome da classe operária, mas das quais a pri­meira e mais sacrificada vítima são aqueles que a integram. — (O Estado de S. Paulo.)

DRAMATIZAÇÃO DE TEMAS CÍVICOS NAS ESCOLAS

LOURENÇO FILHO

Analisando a iniciativa do Diretor da CASES de organizar um Concurso de Dramatização de Temas Cívicos, para escolares, o professor Lourenço Filho prestou o seguinte depoimento:

Há necessidade de definir os termos. "Dramatizar" tem muitos sentidos. Segundo leio, porém, nas instruções do concurso da CASES, êle é aí empre­gado no sentido técnico de fazer reproduzir, pelos alunos, fatos quaisquer sob a inspiração de uma narrativa. desse modo, tenta-se levar crianças e jovens a situações similares às da narração com este objetivo: dar-lhes melhor ou mais completa compreensão do que se tenha narrado, inclusive pelas atitudes emocionais que a atuação das personagens, em si mesma, possa conter.

Nesse sentido, dramatizar representa um processo ativo que aperfeiçoa o entendimento das relações humanas, por isso que faz viver idéias, atitudes e sentimentos. O leitor ou o auditor de uma história toma o lugar de cada uma das personagens. É um recurso educativo de integração social, de­senvolvimento do espírito crítico e auto-analise. Na escola primária é um processo geral de aperfeiçoar a comunicação humana.

Pode-se dizer que, partindo dela, é que se criou o teatro. Na forma grega, êle associava a representação à dramatização no público, através de "coros". Na Idade-Média, reativou-se essa forma através dos "autos" re­ligiosos. E de notar que o nosso teatro começou por aí, com os autos do padre Anchieta, visando à ação social educativa.

O teatro evoluiu como sistema puro de representação cênica. Mas os folguedos do folclore, por exemplo, guardam muito dessa comunicação dra­mática direta, ou de dramatização. não se deve confundir, no entanto, as duas coisas: dramatização e representação, embora ambas possam servir à escola.

Os episódios históricos podem ser representados nas escolas, mas tam­bém podem ser simplesmente dramatizados, na vida comum da classe, em exercícios correntes de leitura.

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No caso particular das crianças, só um grande teatro, ou representações de peça de grande força simbólica — as de Lúcia Benedetti, por exemplo — alcançam os melhores efeitos a desejar. Apelam sempre para a fantasia, em alegorias e símbolos. A representação de fatos históricos, dado o aspecto documentário, ou se fará com grande montagem e atos profissionais de alta qualidade, ou terá apenas aspecto caricatural.

Já com a dramatização, que não visa propriamente dar a sentir aos ou­tros, mas fazer sentir, a nós mesmos, a situação é diversa.

O teatro escolar pode ser associado a formas de dramatização, discipli­nada ou inteiramente espontânea, como se pode ver em pequeninas peças de Heloísa Marinho, para jardim de infância. Em qualquer caso é empre­gada como processo ativo para melhor compreensão dos escolares em situa­ções que provoquem sua participação emocional.

No concurso da CASES, pede-se dramatização espontânea de episódios históricos com objetivos educativos. Creio que representará uma grande experiência para a agitação do assunto, a que se poderão seguir investiga­ções mais particularizadas por nossos educadores.

Os objetivos a que a CASES visa, e que são em especial os de despertar maior interesse por episódios da história pátria, poderão ser plenamente atingidos.

O bandeirismo do século XVII e XVIII é excelente tema. Representa a grande fase épica de nossa história. No sentido original da palavra "épico'-

significa o que é digno de ser contado, de ser comunicado às novas gerações. O bandeirismo foi um movimento de muitas e variadas formas, mas com ama idéia central de integração. O que nele especialmente importa não e a reprodução documentária, mas a comunicação geral de seu espírito, ou das atitudes que possa despertar.

E suficientemente simbólico para que, por êle, se possa penetrar no mundo de sonho e fantasia da criança, e suficientemente real para que a criança o veja como uma expressão de energia, determinação e audácia de nossos maiores. Episódios da vida de Fernão Dias, de Antônio Raposo Tava­res, Bartolomeu Bueno, como de tantos outros, prestam-se à dramatização, como à produção de novo interesse por coisas da geografia, da flora, fauna, e das riquezas minerais do país. Prestam-se ao maior esclarecimento da participação de diferentes raças em nossa formação e, portanto, para que determinem o gosto pelo estudo geral de aspectos de nossa vida social.

O bandeirismo é um grande tema que deveria estar sempre presente nas escolas brasileiras, máxime agora, com os problemas de desenvolvimento e um novo surto de conquista econômica e política, efetiva, de nosso território.

Por isso tudo, penso que o tema escolhido pela CASES, como a inicia­tiva geral do concurso, é de louvar-se, e êle terá certamente a melhor cola­boração de nossos educadores.

Tudo estará em que os mestres se sirvam do tema para fortalecer esse espírito necessário à juventude, não só de. aventura mas de aventura profí­cua. Ao bandeirismo inicial, de dilatação material de nossas fronteiras, de-ver-se-á juntar a compreensão do bandeirismo do criador de gado, dos ho­mens de negócios, do saneamento, da indústria, da civilização enfim.

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Tudo isso nos ensina a necessidade de abrir novos caminhos, com forte decisão em abri-los, e esforço solidário para o bem comum ou integração na­cional. Dramatizando, as crianças melhor poderão compreender o bandei-rismo e seu espírito, ou as atitudes que êle requer para que continui a mar­car o caráter nacional.

NOVOS HORIZONTES PARA A PESQUISA CIENTIFICA EM SÃO PAULO

CARLOS CORREA MASCARO

Registrou-se há dias, no Palácio Campos Elísios, um acontecimento que está fadado a exercer profunda influência no futuro do Estado de São Paulo e do País, mas que infelizmente não alcançou, na imprensa e em outras agências de esclarecimento e formação da opinião pública, o lugar que lhe competia de direito. É que, nos jornais — impressos, radiodifundidos e tele­visionados — o espaço e o tempo são concedidos com prioridade, a assuntos de outra natureza, especialmente políticos, como se depreende da extensão indefinida emprestada ao rescaldo dos resultados do último prélio eleitoral, a que se ligam, imediatamente, as negociações em torno da eleição que se avizinha, ou a nomeação, agora anunciada, do futuro prefeito da Capital. E que jornalistas e repórteres em sua maioria não conseguem vencer a velha bossa pelas disputas político-partidárias, numa democracia, na verda­de, sem partidos como a em que vivemos. Enquanto isso, perdem-se, na vala comum dos acontecimentos sem registro, fatos destinados à maior re­percussão e desperdiçam-se excelentes oportunidades para que a opinião pú­blica se esclareça em outros domínios, fora dos limitados quadros rotineiros, com a divulgação e o comentário de matéria de inegável interesse coletivo e popular.

Foi o ato solene de promulgação, pelo Governador do Estado, da lei que autoriza o Poder Executivo a instituir a Fundação de Amparo à Pesquisa, o acontecimento de marcante significado a que nos referíamos, e ao qual se ligou, no mesmo dia, o trágico e infausto desastre em que perdeu a vida um dos participantes mais entusiastas da cerimônia, o ilustre Professor José Benedito de Camargo, dinâmico e querido diretor da Escola Agrícola "Luís de Queiroz", de Piracicaba.

Destinada a legalizar a forma de cumprimento do disposto no artigo 123 da Constituição Estadual, a cerimônia festiva, a que o governo imprimiu cunho excepcional, foi sugerida pela Associação dos Auxiliares de Ensino da Universidade de São Paulo, que via, na pública sanção do novo diploma, o desfecho favorável, em termos gerais, neste governo, de mais de uma de suas memoráveis campanhas, no último qüinqüênio, em cadeia com as rela­tivas às leis de tempo integral, carreira universitária, estabilidade e outras.

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Por essas razões, é justo que nos sintamos autorizados a retornar ao assunto, para, fazendo um pouco de história, reafirmar pontos-de-vista, rei­terando reivindicações que nos parecem pertinentes, dentro de um esquema interpretativo dos fatos ainda não completamente esclarecidos nem esgotados em suas conseqüências.

Três governos se passaram antes que pudéssemos assistir ao cumpri­mento, tantas vezes reclamado, do sábio dispositivo da Constituição Paulista que consagrou o apoio financeiro explícito do Estado às atividades que dão lastro e conteúdo às grandes conquistas revolucionárias que tão fundamen­te vêm afetando a vida do homem e dos grupos sociais em nossos dias.

Tão logo o professor Carlos Alberto de Carvalho Pinto assumiu o Governo do Estado, a Associação dos Auxiliares de Ensino lhe fêz entrega,

em fevereiro de 1958, de um memorial pleiteando o cumprimento, sempre protelado, da Constituição na parte que prescreve a reserva anual de meio por cento da receita ordinária para emprego em financiamento das ativida­des daqueles numerosos grupos de servidores do Estado que, na Universidade ou fora dela, se vinham consagrando à pesquisa, nos vários domínios do conhecimento.

A reivindicação teve pronta acolhida e, no Plano de Ação, publicado em julho do mesmo ano, já se encontrava a peremptória afirmação de que "o Governo do Estado, atendendo o necessário e desejado amparo e estímulo a todo o imenso campo da pesquisa, envidará seus esforços para colocar os recursos já previstos no art. 123 da Constituição Estadual â disposição das atividades nesse campo. Para isso vem tomando todas as providenciais cabíveis para a constituição de uma Fundação, que tomará a si o encargo de garantir a mais fecunda utilização das parcelas do orçamento público e de outras contribuições que se destinem à investigação Técnica e Cientí­fica".

Quando se comemorou o 20'' aniversário da Universidade de São Paulo, que marcou, com a sua fundação, o início de um novo período nos altos estudos desinteressados e na formação profissional de cientistas no Brasil, com a criação concomitante da Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras, e a abertura de novos horizontes e prestigiosos centros de investigação já existentes, anunciou o governador, em comemoração de que foi sede a Fa­culdade de Direito, o início de estudos e as primeiras providências para a regulamentação do citado inciso constitucional. Constituiu-se uma comissão de que foi presidente o secretário da Fazenda sr. Francisco de Paula Vicente de Azevedo e de que participaram o então titular da pasta da Educação seus colegas da Saúde e Viação, respectivamente srs. Queirós Filho, Fauze Carlos e Faria Lima, e na época o Magnífico Reitor da Universidade, Prof. Gabriel Teixeira de Carvalho. Segundo registra a justificativa que acompa­nhou o projeto mais tarde encaminhado à Assembléia Legislativa, essa co­missão procedeu "a cuidadosos estudos, valendo-se não só da assessoria dos órgãos técnicos competentes, como também de proveitosas sugestões, entre as quais aquelas oferecidas pelo Colendo Conselho Universitário, pela Asso­ciação dos Auxiliares do Ensino da Universidade de São Paulo, pelo Institu­to de Engenharia e pela Federação das Indústrias do Estado de São Paulo".

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Encerrados os trabalhos desse grupo de tão altas autoridades, não tar­dou o encaminhamento da mensagem governamental ao Palácio 9 de Julho, capeando o projeto de lei que consubstanciava as linhas mestras da institui­ção cuja estrutura e existência a Lei n" 5.918, de 18 do corrente, veio consa­grar, graça também à colaboração da Mesa da Assembléia Legislativa e ao trânsito livre encontrado no seio das suas diferentes comissões técnicas e bancadas, resultado final para o qual muito contribuiu, ainda, a ação es­clarecida, vigilante, conciliadora e decisiva do Magnífico Reitor, Prof. Antô­nio Barros de Ulhoa Cintra.

Desnecessária se nos afigura, agora, neste retrospecto, a exaltação de todos quantos concorreram para a grande conquista, como nos parece fora de propósito a rememoração dos valores imanentes à pesquisa científica e suas estreitas relações com a prosperidade dos povos e o poderio, sob seus múltiplos aspectos, das nações modernas. Também a recapitulação das funções essenciais dos centros científicos, especialmente da Universidade, na substituição da especulação e do empirismo por novas formas de exploração, investigação e interpretação dos fatos, ao lado da substituição da aventura pelo planejamento. Impertinente, quiçá, o elogio do cientista e do pes­quisador.

não podemos deixar, porém, que se perca a oportunidade para uma tomada de posição face a problemas suscitados pela nova lei. Dados os avançados pontos-de-vista adotados pelo Governo no tocante ao modo de encarar as relações entre a pesquisa e a promoção do desenvolvimento, es­pecialmente os que se acham expressos em várias passagens do Plano de Ação, a assinatura da lei de 18 do corrente parece mesmo ter vindo firmar, de uma vez por todas, que podemos dar por encerrada, em São Paulo, a fase crítica das comunidades sem tradição científica, "cujos primeiros bio-logistas são graduados nas faculdades de medicina, os matemáticos e físicos nas escolas de engenharia, os homens de letras e sociólogos nas faculdades de direito". Esperamos não só haver superado essas limitações que se en­contram entre as que caracterizam um estágio de subdesenvolvimento cul­tural, como lograr conquista de maior porte: — firmar-se definitiva e ofi­cialmente o postulado de que nos orçamentos públicos, como já vem acon­tecendo nos de muitas grandes empresas privadas, os gastos com pesquisa não mais se inscrevem sob a rubrica das despesas consumptivas, mas se arrolam entre os investimentos altamente reprodutivos e de interesse social, nacional e humano. Investimentos que vêm propiciando, por toda parte onde existem, os mais altos dividendos, nos diferentes setores conhecidos de atividades que visem ao bem comum: — aumento da produção e eleva­ção dos índices de produtividade, redução de custos e de horas de trabalho, melhoria do padrão de vida das populações, aumento do tempo de recreação e prolongamento da duração da vida humana.

não nos deixemos, contudo, embalar por uma ilimitada euforia, num momento em que só demos um passo, embora importante, no longo e penoso caminho que ainda temos a percorrer. Sim, porque "não é suficiente a reserva de recursos orçamentários, não bastam instalações e equipamentos,

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textos legais, quadros de pessoal e regulamentos, para que pesquisa exista". Importa que a ela se abram oportunidades efetivas, sem que mil e um con­troles formais e os conhecidos estiolantes entraves burocráticos sobrepo­nham meios a fins. Impõe-se que se estimulem as vocações científicas para que se ampliem e enriqueçam de novos valores os quadros dos que a trabalhos dessa natureza pretendam dedicar-se, vendo-os como atividades lícitas e compensadoras (compensadoras do ponto-de-vista da satisfação ínti­ma que proporcionam, da remuneração e da tranqüilidade de espírito que asseguram, e do status social que garantem) a exemplo do que mais fre­qüentemente ocorre em outras áreas da sociedade moderna — no comércio, na indústria, na agricultura, nas profissões liberais e na política — e para que não se repita o fato recente de, ao receber a láurea de um prêmio pela consagração de sua vida à ciência, não venha o galardoado a esclarecer que os recursos do prêmio vão servir a. vários fins, inclusive ao pagamento de dívidas contraídas em virtude da aquisição de material para seu labora­tório e nas de sua participação em congresso científico.

Nesse sentido pronunciou-se, aliás, com inteira propriedade, nas pala­vras ditas de improviso, depois da aposição de sua assinatura promulgadora, o governador Carvalho Pinto, afirmando: "não seria compreensível que paralelamente a toda a evolução que caracteriza o ritmo de progresso de São Paulo, nós nos mostrássemos indiferentes ante a necessidade de serem ativadas e melhor harmonizadas as pesquisas científicas e as atividades culturais de toda espécie. Neste propósito é que nós nos orientamos ao acelerar os trabalhos que culminam com a promulgação desta lei. Certos estamos do que desta forma entregamos à valorosa classe dos homens de ciência c de pesquisas, a que tanto devo o progresso de São Paulo e do Brasil, mais um poderoso instrumento que nas suas mãos frutificará, em benefício das populações atuais e futuras de nossa Pátria. Neste instante delicado da humanidade, não seria crível que nos esquecêssemos de pro­porcionar meios mais substanciais ao povo que, pela sua própria índole, se revela da maior capacidade no campo das pesquisas e das invenções a que nos tem mesmo proporcionado glórias inexcedidas nalguns setores das atividades humanas. É por isso que, com a maior satisfação consigna­mos, de imediato, no Plano de Ação, recursos substanciais para o setor das pesquisas. Recursos que, englobando dotações referentes aos vários setores administrativos, se aproximam de quatro bilhões de cruzeiros no período da vigência deste plano. E agora damos sanção a esta lei de modo a per­mitir que a instituição ora autorizada possa coordenar as pesquisas e lhes dar o estímulo e a boa orientação necessários ao melhor aproveitamento do elemento humano empregado neste campo de atividades".

não regateemos, portanto, todo louvor ao Chefe do Poder Executivo, pela sua iniciativa de uma lei que está destinada a marcar época na vida científica do País. Mas, repetimos, não basta a lei para que se tenha como demonstrado achar-se o poder público realmente empenhado em valo­rizar as atividades de pesquisa cientifica e os seus especialistas. O que todos desejamos, em prosseguimento à inicial o auspiciosa tomada de consciência

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e de posição, é que se parta imediatamente para o estudo dos critérios que deverão presidir à liquidação da dívida que sucessivos governos lamenta­velmente deixaram se acumulasse para com a pesquisa, desde a entrada em vigor da lei fundamental do Estado. O montante da soma da receita ordi­nária dos orçamentos estaduais de 1948 a 1960 é de aproximadamente tre­zentos bilhões de cruzeiros, o que assegura, de início, à Fundação de Am­paro à Pesquisa, a garantia de um crédito que ascende a quase um bilhão e meio de cruzeiros. Que a dívida existe, cremos não padecer dúvida, pois quando se baixou a Lei n. 589, de 31 de dezembro de 1949, complementando o artigo 67 da mesma Constituição, dispôs-se que o excesso da arrecadação estadual de impostos deveria ser entregue aos municípios, a partir de 1948. não se pode compreender, diante dos fatos, que um preceito constitucional entre em vigor na data própria e outro só venha a ser cumprido treze anos depois, dando-se por quitada ou inexistente, em prejuízo dos mais altos interesses do

País, uma dívida de tamanho vulto. O problema do débito já foi levantado oficialmente pela Associação dos Auxiliares de Ensino e tudo leva a crer que não sejam estranhas à cogitação de Governo fórmulas hábeis, de molde a lhe dar satisfatória solução, máxime considerando que a lei de amparo à pesquisa prevê no parágrafo único do artigo 5'' que "a fundação deverá aplicar recursos na formação de um patrimônio rentável". Se se pretende que a constituição desse patrimônio se deva fazer progressiva e lentamente a expensas das dotações de meio por cento que vão constar dos orçamentos estaduais a partir de 1961, então é de se temer pelo êxito de uma política de investimentos públicos que parecia inspirada em sadios princípios e em sinceros propósitos. As pesquisas c investigações modernas exigem orçamentos a que as nações mais adiantadas asseguram, sem receio, prioridades de orçamentos de guerra, porque com o estímulo às atividades científicas abrem-se várias frentes de luta contra a ignorância, a miséria, a baixa produtividade.

não nos assuste, por outro lado, o vulto da divida que o Estado foi implicitamente contraindo com a prevista Fundação de Amparo â Pesquisa. que muitas fórmulas podem surgir para o seu resgate. Se não fôr possível, nem conveniente, a amortização em exercícios sucessivos, a partir de 1961, mediante a dotação de quotas suplementares do bilhão e meio de atrasados, além da quota regular anual, outras soluções podem ser aventadas e postas em prática, de modo a assegurar a constituição imediata do "patrimônio rentável" planejado. A providência que nos parece a mais indicada e de pronto exeqüível, seria a cobertura do débito apurado, através da imediata transferência, para a Fundação, de bens imóveis de renda garantida, ou de quotas de sociedades de que o Estado é acionista majoritário, como, por exemplo, o Banco do Estado, a CHERP, a USELPA, a COSIPA. com esta medida, o Governo saldaria imediatamente a divida contraída ao longo de quase três lustros, sem risco de prejuízos, antes, certamente, com vantagem para o patrimônio público, porque a operação consistiria em simples trans­ferência dos valores de um para outro órgão público. Então, o previsto amparo à ciência poderia fazer sentir-se sem maiores delongas, abrindo-se amplas perspectivas para o custeio de pesquisas em escala capaz de cobrir,

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em breve prazo, déficit de inúmeros institutos onde as investigações não se realizam no ritmo desejável, nem com o aproveitamento total das disponibi­lidades de pessoal especializado.

Finalmente, dentro da mesma ordem de considerações, há mais um ponto importante a ser lembrado: o fato de o Governo ter de enfrentar, com a entrada da lei em vigor, os percalços naturais da escolha dos elementos à altura de assumir os vários cargos nos órgãos de direção criados sob a deno­minação de Conselho Superior, Conselho Técnico-Administrativo e Assesso-ria Científica.

não se pode negar ao atual Governo numerosos acertos na escolha de elementos e na indicação de titulares para postos de responsabilidade na administração em geral. De qualquer modo, porém, teme-se pelo que possa acontecer em desfavor da pesquisa científica se injunções vierem perturbar a natural e criteriosa seleção de valores. Se a orientação de prevalecer no momento da constituição dos órgãos fôr a de só nomear os que têm demons­trado real e integral consagração à pesquisa, e, por isso mesmo, senhores do conhecimento vivido de seus problemas, então teremos lavrado mais um tento e poder-se-á esperar, ainda antes de findar-se o atual Governo, a primeira colheita dos frutos de uma árvore plantada sob a inspiração do gênio criador bandeirante. — (O Estado de S. Paulo)

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ATOS OFICIAIS

L E I N° 3.835 — DE 13 DE D E Z E M ­BRO DE 1960

Federaliza a Universidade da Paraí­ba, cria a Universidade Federal de S. Paulo e dá outras providên­cias.

O Presidente da República,

Faço saber que o Congresso Na­cional decreta e eu sanciono a se­guinte lei:

Art . lº A Universidade da Pa ra í ­ba, a que se refere o Decreto número 40.160, de 16 de outubro de 1956, pas­sa a in tegrar o Ministério da Educa­ção e Cultura — Diretor ia do Ensino Superior, incluída na categoria cons­t an t e do item I, do a r t . 3º da Lei nº 1.254 de 4 de dezembro de 1950.

Parágra fo único. A Universidade t e r á personalidade jur ídica e gozará de autonomia didática, f inanceira, adminis t ra t iva e disciplinar, na for­ma da lei.

Art . 2º A Universidade compor-se-á dos seguintes estabelecimentos de ensino superior :

a) Faculdade de Filosofia da Pa ra íba (Decreto nº 38.146, de 25 de outubro de 1955);

b) Faculdade de Odontologia da Pa ra íba (Dec. nº 38.148, de 25 de ou­tubro de 1955);

c) Escola Poli técnica da Pa ra í ­ba (Dec. nº 33.286, de 14 de julho de 1953);

d) Facu ldade de Direito da Pa ­raíba (Dec. nº 33.404, de 28 de agos­to de 1953);

e) Faculdade de Medicina da Pa ra íba (Dec. nº 38.011, de 5 de ou­tubro de 1955) e Escola anexa de En ­fermagem, da Pa ra íba (Dec. nº 37.283, de 29 de abril de 1955 e Por­t a r i a Ministerial nº 365, de 9 de junho de 1958);

f) Faculdade de Ciências Eco­nômicas da Pa ra íba (Dec. nº 30.236, de 4 de dezembro de 1951);

g) Escola de Engenha r i a da Pa­raíba (Dec. nº 39.221, de 21 de maio de 1956);

70 Escola de Serviço Social da Para íba (Dec. n° 39.332, de 8 de ju­nho de 1956);

i) Faculdade de Farmác ia , da Universidade da Pa ra íba ;

j) Faculdade de Ciências Eco­nômicas de Campina Grande (Lei n° 512, de 1» de julho de 1955).

§ 1º As faculdades e escolas mencionadas neste ar t igo passam a denominar-se: Facu ldade de Filoso­fia Ciências e Letras , Faculdade de Otontologia, Escola Politécnica, Fa ­culdade de Direito, Faculdade de Me­dicina e Escola Anexa de Enferma­gem, Faculdade de Ciências Econô­micas, Escola de Engenhar ia , Esco­la de Serviço Social da Universidade da Para íba , Facu ldade de Ciências Econômicas de Campina Grande e Faculdade de F a r m á c i a da Para íba .

§ 2° A agregação de outro cur­so ou de outro estabelecimento de

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ensino depende de parecer favorável do Conselho Universitário e de deli­beração do Governo, na forma da lei, e assim a desagregação.

Art. 3° O patrimônio da Univer­sidade da Paraíba será formado pe­los:

a) bens móveis, imóveis e ins­talações ora utilizados pelos estabele­cimentos mencionados no artigo an­terior e que lhe serão transferidos nos termos desta lei;

b) bens e direitos que adquirir ou que lhe sejam transferidos, na forma da lei;

c) legados e doações legalmente aceitos;

d) saldos da receita própria e dos recursos orçamentários, ou ou­tros que lhe forem destinados.

Parágrafo único. A aplicação dos saldos referidos na letra "d" deste artigo, depende de deliberação do Conselho Universitário e somente po­derá sê-lo em bens patrimoniais ou em equipamentos, instalações e pes­quisas, vedada qualquer alienação sem expressa autorização do Presi­dente da República.

Art. 4 º O s recursos para manu­tenção e desenvolvimento dos servi­ços provirão das dotações orçamen­tárias que lhe forem atribuídas pela União das rendas patrimoniais; das receitas de taxas escolares; de retri­buição de atividades remuneradas de laboratórios, de doações, auxílios, subvenções e eventuais.

Parágrafo único. A receita e a despesa da Universidade constarão de seu orçamento, e a comprovação dos gastos far-se-á nos termos da legislação vigente obrigados todos os depósitos em espécie no Banco do Brasil, cabendo ao Reitor a movi­mentação das contas.

Art. 5º Independente de qual­quer indenização, são incorporados ao patrimônio da Universidade, me­diante escritura pública, todos os bens móveis, imóveis e direitos ora na posse ou utilizados pelas Facul­dades e Escolas referidas no art. 2º.

Parágrafo único. Para a trans­ferência dos bens mencionados neste artigo, é assegurado o prazo de 180 (cento e oitenta) dias, findo o qual será o estabelecimento havido agre­gado.

Art. 6º E assegurado o aprovei­tamento do pessoal administrativo c auxiliar técnico dos estabelecimentos referidos no art. 2º, em quadro ex­traordinário aprovado pelo Poder Executivo, não podendo os vencimen­tos exceder aos das atividades cor­respondentes no serviço público fe­deral.

§ 1º Os professores das Facul­dades e Escolas, referidos no art. 2º, não admitidos em caráter efetivo na forma da legislação federal, poderão ser aproveitados como interinos.

§ 2º Para o cumprimento do dis­posto neste artigo, a administração das Faculdades e Escolas apresenta­rão à Diretoria do Ensino Superior a relação, acompanhada de currícu­lo, de seus professores e servidores, especificando a forma de investidu-ra, a natureza do serviço que desem­penham, a data da 'admissão e a remuneração.

§ 3º Serão expedidos pelas auto­ridades competentes os títulos de no­meação decorrentes do aproveita­mento determinado nesta lei, depois e a contar da data da última das es­crituras públicas referidas no art. 5º.

Art. 7º Para execução do que determina o art. 1º desta lei, e criado no Quadro Permanente do Ministé-

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rio da Educação e Cultura — Dire­toria do Ensino Superior — um car-do de Reitor, Padrão 2-C, uma fun­ção gratificada de Secretário 3-F e uma de Chefe de Portaria 15-F para a Reitoria.

Art. 8º Para execução do dis­posto no art. 2" são criados, no Qua­dro Permanente do Ministério da Educação e Cultura, 47 cargos de professor Catedrático (FF Upb-DE-SU), na Faculdade de Filosofia; 12 cargos de professor Catedrático (FO Upb-DESU), na Faculdade de Odon­tologia, 34 cargos de professor Ca­tedrático (EP Upb-DESU), na Esco­la Politécnica, 22 cargos de professor Catedrático (FD Upb-DESU), na Fa­culdade de Direito; 31 cargos de professor Catedrático (FM Upb-DE­SU), na Faculdade de Medicina, 17 cargos de professor Catedrático (FCEc Upb-DESU), na Faculdade de Ciências Econômicas, 34 cargos de professor Catedrático (EE Upb-DE­SU), na Escola de Engenharia, 31 cargos de professor Catedrático (EE Upb-DESU), na Faculdade de Ciên­cias Econômicas, de Campina Gran­de, 14 cargos de professor Catedrá­tico (EE Upb-DESU), na Faculdade de Farmácia da Paraíba, 7 cargos de professor Catedrático (ESS Upb-DESU), na Escola de Serviço So­cial e uma função gratificada de Diretor 1-F, uma de Secretário 3-F e uma de Chefe de Portaria 15-F, para cada uma das referidas Facul­dades e Escolas.

Art. 9º Os cargos de professor Catedrático na Faculdade de Medi­cina da Universidade da Paraíba se­rão reduzidos, progressivamente a 18 {dezoito) à medida que se forem va­gando, por extinção das respectivas cátedras, na forma a, ser prevista no

Regimento da Escola, que deverá ser aprovado dentro de 60 (sessenta) dias após a instalação da Universidade.

Parágrafo único. O disposto nes­te artigo será aplicado às cátedras vagas na data da publicação desta lei, as quais não deverão ser provi­das em caráter efetivo até a aprova­ção do Regimento.

Art. 10. Para provimento, em ca­ráter interino, de cátedras de novos cursos, que forem instalados em qualquer escola integrante da Uni­versidade da Paraíba, só poderão ser contratados Docentes livres, ou professores Catedráticos das mesmas disciplinas ou disciplinas afins.

Art. 11. Fica criada a Universi­dade Federal de São Paulo (U.F.S. P.), com sede na cidade de São Car­los, Estado de São Paulo, e que será integrada no Ministério da Educação e Cultura.

Parágrafo único. A Universidade terá personalidade jurídica e gozará de autonomia didática, financeira, administrativa e disciplinar, na for­ma da lei.

Art. 12. A Universidade compor-se-á dos seguintes estabelecimentos de ensino superior:

n) Escola Paulista de Medicina (Lei nº' 2.712, de 21 de janeiro de 1956);

b) Escola de Engenharia de Sao Carlos (Dec. nº 41.797, de 8 de julho de 19S7);

c) Faculdade de Filosofia, Ciên­cias e Letras de Araraquara (Decre­to nº 45.776, de 13 de abril de 1959);

d) Faculdade de Farmácia e Odontologia de Araçatuba (Dec. nú­mero 41.557, de 22 de maio de 1957);

e) Faculdade Municipal de Ciências Econômicas de Santo André (Dec. nº 42.706, de 29 de novembro de 1957).

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Parágrafo único. São transfor­mados em estabelecimentos federais de ensino superior os estabelecimen­tos referidos nas letras b e e deste artigo, sem ônus para a União e me­diante a incorporação ao patrimônio desta dos bens imóveis em que fun­cionam as escolas, de propriedade do Governo do Estado de São Paulo e da municipalidade de Santo André, Estado de São Paulo, bem como suas atuais instalações.

Art. 13. Dentro de 60 (sessenta) dias, a partir da data da publicação desta lei, o Poder Executivo, enviará ao Congresso Nacional mensagem nos termos constitucionais, para atender ao disposto nos artigos an­teriores.

Art. 14. Para cumprimento das disposições desta lei, é aberto ao Mi­nistério da Educação e Cultura — Diretoria do Ensino Superior — o crédito especial de Cr$ 130.788.000,00 (cento e trinta milhões, setecentos e oitenta e oito mil cruzeiros), sendo: Cr$ 112.760,000,00 (cento e doze mi­lhões, setecentos e sessenta mil cru­zeiros) para pessoal permanente; .. Cr$ 5.508.000,00 (cinco milhões, qui­nhentos c oito mil cruzeiros) para o

pessoal administrativo; Cr$ 10.020.000,00 (dez milhões e vinte mil cruzeiros) para funções gratifi­cadas; Cr$ 1.500.000,00 (um milhão e quinhentos mil cruzeiros) para a Es­cola de Enfermagem e Cr$ 1.000.000,00 (um milhão de cru­zeiros) para a instalação da Reito­ria.

Art. 15. O Estatuto da Universi­dade da Paraíba, que obedecerá à orientação do das Universidades Fe­derais, será expedido pelo Poder exe­cutivo, dentro em 120 (cento e vin­te) dias da data da publicação desta lei.

Art. 16. Esta lei entrará em vi­gor na data de sua publicação, revo­gadas as disposições em contrário.

Brasília, 13 de dezembro de 1960; 139º da Independência e 72º da Repú­blica.

JUSCELINO KUBITSCHEK.

Clovis Salgado.

S. Paes de Almeida.

(Publ. no D. O. de 13-12-60).

LEI Nº 3.843 — DE 15 DE DEZEM­BRO DE 1960

Concede autonomia ã Escola Nacio­nal de Minas e Metalurgia, a qual, desligada da Universidade do Bra­sil, passará a denominar-se Escola de Minas de Ouro Preto.

O Presidente da República.

Faço saber que o Congresso Na­cional decreta e eu sanciono a se­guinte lei:

Art. 1» Fica desligada da Uni­versidade do Brasil a Escola Nacio­nal de Minas e Metalurgia, a qual passa a denominar-se Escola de Mi­nas de Ouro Preto (EMOP).

Art. 2º A EMOP gozará de au­tonomia administrativa, financeira, didática e disciplinar.

Art. 3º Passam a constituir o pa­trimônio da EMOP os bens, equipa­mentos, edifícios e tudo mais que pertencia à antiga Escola Nacional de Minas e Metalurgia.

Art. 4º A EMOP manterá os atuais cursos de Engenharia de Mi­nas, de Engenharia Civil, de Enge­nharia Metalúrgica e de Geologia, além de outros, que poderão ser criados em seus Estatutos.

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Art. 5º Dentro de 60 dias, a con­tar da data da vigência desta lei, a Congregação da EMOP apresentará o Projeto de seus Estatutos, os quais serão apreciados pelo Conselho Na­cional de Educação e aprovados por decreto do Presidente da República.

Parágrafo único. Até que sejam aprovados os referidos Estatutos, a EMOP se regerá pelo Regimento da antiga Escola Nacional de Minas e Metalurgia.

Art. 6º Picam transferidas para a EMOP as responsabilidades e van­tagens decorrentes de acordos e con­vênios celebrados pela Universidade do Brasil para serem cumpridos pe­la antiga Escola Nacional de Minas e Metalurgia.

Art. 7º O Poder Executivo provi­denciará no sentido de que o quadro de pessoal docente e administrativo da antiga Escola Nacional de Minas e Metalurgia, integrado pelos cargos e funções nela lotados, seja reorga­nizado e passe a pertencer à EMOP

Art. 8º Ficam transferidos para a EMOP os recursos atribuídos, no atual exercício, à antiga Escola Na­cional de Minas e Metalurgia, à con­ta das dotações consignadas à Uni­versidade do Brasil.

Parágrafo único. Nos próximos exercícios o Orçamento da União consignará, sob a forma de auxílio, a dotação necessária à manutenção da EMOP e ao desenvolvimento do ensino a seu cargo.

Art. 9» Esta lei entrará em vi­gor na data de sua publicação, re­vogadas as disposições em contrário.

Brasília, 15 de dezembro de 1960, 139º da Independência e 72º da Re­pública.

JUSCELINO KUBITSCHEK.

Clovis Salgado. S. Paes de Almeida.

(Publ. no D. O. de 16-12-60).

DECRETO Nº 49.121-B — DE 17 DE OUTUBRO DE 1960

Aprova Regimento do Serviço Nacio­nal de Aprendizagem Industrial (SENAI)

O Presidente da República, usan­do da atribuição que lhe confere o art. 87, item I, da Constituição Fe­deral e tendo em vista o disposto no art. 8º do Decreto-lei n° 4.048, de 22 de janeiro de 1942, decreta:

Art. 1º Fica aprovado o Regi­mento do Serviço Nacional de Apren­dizagem Industrial que com este baixa assinado pelo Ministro de Es­tado da Educação e Cultura.

At. 2º O presente decreto entra­rá em vigor na data de sua publica­ção.

Brasília, em 17 de outubro de 1960, 139º da Independência e 12º da República.

JUSCELINO KUBITSCHEK.

Pedro Paulo Penido.

REGIMENTO DO SERVIÇO NA­CIONAL DE APRENDIZAGEM

INDUSTRIAL (SENAI)

CAPÍTULO I

Dos Objetivos

Art. 1º O Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial (SENAI) organizado e dirigido pela Confede­ração Nacional da Indústria, nos termos do

Decreto-lei nº 4.048, de 22 de janeiro de 1942, tem por objetivo:

a) Realizar, diretamente ou sob a forma de cooperação, em escolas instaladas e mantidas pela institui­ção, a aprendizagem industrial a que estão obrigadas as empresas das ca-

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tegorias econômicas sob sua jurisdi­ção, pela Constituição Federal e leis ordinárias;

b) assistir os empregadores na realização da aprendizagem metódi­ca ministrada no próprio emprego, complementando-a, se conveniente, através de cursos extraordinários;

c) criar e manter currículos da mesma natureza para o preparo, em ofícios ou ocupações qualificados ou semiqualificados, de trabalhadores adultos, empregados nas empresas contribuintes, colaborando com elas no treinamento do pessoal dos de­mais níveis de qualificação;

d) conceder bôlsas-tde-estudo e de aperfeiçoamento a empregados de excepcional valor das empresas ju-risdicionadas, bem como a professores

instrutores, administradores, pre­postos e servidores do próprio SE­NAI;

e) contribuir para o desenvolvi­mento de pesquisas tecnológicas de interesse para a indústria e ativida­des assemelhadas.

Parágrafo único. O SENAI fun­cionará como órgão consultivo do Governo Federal em assuntos rela­cionados com a formação de traba­lhadores da indústria e atividades assemelhadas

CAPITULO II

Da organisação

Art. 2º O Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial é uma en­tidade civil, com personalidade jurí­dica de direito privado, com sede na Capital da República e atuação em todo o país.

Parágrafo único. O SENAI ins­creverá no registro público compe­tente seus atos constitutivos, para todos os efeitos de direito.

Art. 3* Na sua condição de en­tidade de ensino, o SENAI será fisca­lizado pelo Ministério da Educação e Cultura.

Art. 4º As despesas do SENAI são custeadas por uma contribuição mensal das empresas das categorias econômicas da indústria, dos trans­portes, das comunicações e da pesca.

Art. 5º As ações em que o SE­NAI fôr autor, réu, ou interveniente, correrão no juízo privativo da Fa­zenda Pública, sendo cobrável a sua dívida ativa, decorrente de contribui­ções, multas ou obrigações contra­tuais quaisquer, segundo o rito pro­cessual dos executivos fiscais.

Art. 6º Os bens e serviços do SENAI gozam da mais ampla isen­ção fiscal.

Art. 7° No que concerne a orça­mento e prestação de contas da ges­tão financeira anual, o SENAI, além das exigências da sua regulamenta­ção específica, está adstrito ao dis­posto nos artigos 11 e 13 da Lei nú­mero 2.613, de 23 de setembro de 1955.

Art. 8º Os dirigentes, prepostos e servidores do SENAI, embora vin­culados aos deveres que lhes cabem, não respondem, individualmente, pe­las obrigações da entidade.

Art. 9º O SENAI, afora os ca­sos de dissolução em virtude de lei só poderá cessar a sua atividade por deliberação da Confederação Nacio­nal da Indústria, tomada por três quartas partes dos votos do respec­tivo Conselho de Representantes, em reunião especialmente convocada pa­ra esse fim.

Parágrafo único. O ato extinti-vo, a requerimento da Confederação Nacional da Indústria, será inscrito no registro público competente, para os efeitos legais.

,

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Art. 10. Na hipótese de dissolu­ção, o patrimônio do SENAI rever­te rá em favor da Confederação Na­cional da Indús t r ia que repar t i rá , pelas federações filiadas, os bens re­manescentes , de acordo com sua lo­calização.

Art . 11. O SENAI, sob o regime de ampla descentralização, funciona­rá em intima cooperação com as empresas

contribuintes, de modo a adap­tar-se à variedade das suas condi­ções de produção e de trabalho.

Art . 12. O SENAI, p a r a a reali­zação de suas finalidades, m a n t e r á órgãos nacionais e adminis trações regionais.

§ 1º — Os órgãos nacionais são :

a) o Conselho Nacional ;

b) o Depar tamento Nacional.

§ 2º — As adminis t rações regio­nais compreendem:

a) os Conselhos Regionais ;

b) os Depar tamentos Regionais.

CAPÍTULO I I I

Do Conselho Nacional

Art. 13. O Conselho Nacional do S E N A I t e r á a seguinte composição:

a) presidente da Confederação Nacional da Indústr ia , que será o seu presidente na to ;

b) um a três representantes de cada Conselho Regional, na razão de um por duzentos mil empregados das categorias econômicas contri­buintes, ou fração, existentes na ba­se terr i tor ia l correspondente, sendo um deles o respectivo presidente, ou apenas este se a representação não exceder de u m ;

c) diretor do Depar t amen to Na­cional do SENAI ;

d) diretor da Diretoria de En­sino Industr ia l do Ministério da Edu­cação e Cul tura ;

e) um represen tan te do Minis­tério do Trabalho e Previdência So­cial, designado pelo seu t i tu lar ;

f) um representante das ativi­dades de t ranspor tes , comunicações e pesca, designado pelo Ministro da Viação e Obras Públicas.

§ V — Os represen tan tes dos Conselhos Regionais e respectivos suplentes, em número igual, serão escolhidos por esses órgãos, entre os seus elementos componentes.

§ 2º — Os conselheiros aludidos nas al íneas "b" , " e " e "f" exercerão o manda to por dois anos, podendo ser reconduzidos.

§ 3º — Os membros do Conselho exercerão as suas funções individual­mente, não sendo lícito fazê-lo a t ra­vés de procuradores .

§ 4º — Ocuparão as vagas dos

conselheiros, nos casos de faltas e

impedimentos, os seus subst i tutos es­

ta tu tár ios ou os suplentes designa­

dos.

§ 5º — Os conselheiros presiden­tes de Federações, nas condições do parágrafo antecedente, serão repre­sentados pelo seu subst i tuto legal ou por conselheiro por êle designado.

Art. 14. O Conselho reunir-se-á com a presença de um terço dos seua membros, sendo, porém, necessário o comparecimento da maioria abso­luta para as deliberações.

Parágra fo único. As decisões se­rão tomadas por maioria de sufrá­gios, cabendo ao presidente o voto de qualidade nos empates verifica­dos.

Art. 15. Compete ao Conselho

Nacional :

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a) estabelecer as diretrizes ge­rais que devem ser seguidas pelas administrações regionais na apren­dizagem industrial em todo o país;

b) votar, em verbas globais, os orçamentos do Conselho Nacional e do Departamento Nacional;

c) autorizar as transferências e as suplementações de dotações so­licitadas pelos dirigentes dos órgãos nacionais, submetendo a matéria à autoridade competente, quando a al­teração fôr superior a 25% (vinte e cinco por cento) de cada verba;

d) autorizar • a alienação e o gravame de bens imóveis;

e) homologar o plano de contas apresentado pelo Departamento Na­cional e pelos Departamentos Regio­nais, decidindo sobre quaisquer pro­postas de alteração do mesmo;

f) aprovar as prestações de con­tas anuais do presidente do Conse­lho Nacional e do Diretor do De­partamento Nacional;

g) determinar, depois de verifi­cação realizada por comissão espe­cial que designar, a intervenção na administração regional que descum-prir disposição legal, regulamentar, regimental ou contida em instrução de caráter obrigatório, assim como no caso de comprovada ineficiência;

h) aprovar a designação e a forma de funcionamento de delega­cias para administrar os serviços da instituição nas unidades políticas on­de não haja federação de indústria reconhecida;

i) aprovar os quadros, fixar os padrões de vencimentos, o critério e a época de promoção, bem como exa­minar quaisquer reajustamentos de salários, do pessoal do Conselho Na­cional e do Departamento Nacional;

j) estipular a remuneração do diretor do Departamento Nacional;

Z) fixar as percentagens de aprendizes a serem matriculados pe­las empresas, bem como a duração dos cursos;

TO) conceder e cassar isenção do pagamento da contribuição geral devida ao SENAI;

n) aprovar acordos com os ór­gãos internacionais de assistência técnica, visando a formação de mão-de-obra e o aperfeiçoamento do pes­soal docente e técnico do SENAI e das empresas contribuintes;

o) aprovar estudos e planeja­mento da formação ou do aperfeiçoa­mento de pessoal latino-americano, ou de outras procedências, quando decorrentes de acordo com entidades internacionais;

p) aprovar planos de bôlsas-de-estudo para técnicos das empresas contribuintes, ou do SENAI, a serem custeadas, parcial ou totalmente, pela instituição;

q) aprovar convênios entre o SENAI e escolas de todos os níveis, visando a formação ou o aperfeiçoa­mento da mão-de-obra;

r) julgar, em instância final, os recursos das decisões das adminis­trações regionais que aplicarem mul­tas e penalidades às empresas infra-toras das leis pertinentes ao SENAI;

s) fixar a ajuda de custo e as diárias de seus membros;

t) aprovar o relatório anual das atividades da instituição em todo o país;

M) expedir as normas internas de seu funcionamento, alterando-as quando julgar conveniente;

v) dar solução aos casos omis­sos.

Parágrafo único. — O Conselho Nacional decidirá, em última instân­cia, as questões de ordem geral de interesse do SENAI, ex officio ou

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que lhe forem submetidas pelo De­partamento Nacional e pelas admi­nistrações regionais.

Art. 16. O Conselho Nacional reuhir-se-á, ordinariamente, duas vezes ao

ano e, extraordinariamente, sempre que convocado pelo presiden­te ou por dois terços de seus mem­bros.

Parágrafo único. — No interreg­no das sessões, o presidente exerce­rá, ad referendum do Conselho, todas as

atribuições a este pertinentes e que não possam, sem prejuízo dos serviços, aguardar o funcionamento do plenário.

Art. 17. Compete ao presidente do Conselho Nacional;

o) representar o SENAI, em juízo e fora dele, podendo constituir, para esse fim, mandatários e pro­curadores;

b) abrir contas para guarda dos fundos dos órgãos nacionais em ban­cos oficiais, ou em bancos privados, que operem com a indústria, devida­mente credenciados pelo plenário;

c) movimentar os fundos des­tinados ao custeio dos serviços do Conselho, assinando e endossando cheques juntamente com o titular da Secretaria, inclusive para depósi­tos ou remessas de valores aos órgãos nacionais c regionais do SENAI;

d) baixar os atos necessários à organização dos serviços do Conse­lho, bem como admitir, promover, de­mitir e fixar as ajudas de custo e diárias dos servidores dos órgãos na­cionais;

e) aprovar os nomes dos bolsis­tas da indústria e do SENAI com planos de estudo no estrangeiro.

Art. 18. Para o desempenho de suas atribuições, o Conselho Nacio­nal disporá de uma Secretaria, de serviços com pessoal próprio, além de

uma Auditoria, de uma Consultoria Jurídica e de uma Consultoria Téc­nica, dirigidos pelos seus titulares. cuja constituição e competência se­rão reguladas por ato do plenário.

Art. 19. O Conselho, no exercício de suas atribuições, será coadjuva-do pelos órgãos do Departamento Na­cional que lhe ministrarão, durante as sessões, além da assistência técni­ca necessária, os subsídios de que dispuserem relativos à aprendizagem em todo o país.

Art. 20. O Conselho Nacional manterá contato permanente com a Confederação Nacional da Indústria, no sentido da troca e colheita de ele­mentos relativos à aprendizagem profissional e às atividades produto­ras e correlatas, autorizando, quando necessário, a celebração de acordo e convênios.

CAPÍTULO IV

Do Departamento Nacional

Art. 21. Compete ao Departa­mento Nacional:

a) realizar e promover estudos e levantamentos de mão-de-obra.

6) colaborar com os departa­mentos regionais na elaboração de planos de escolas e cursos;

c) assistir os departamentos re­gionais na implantação de cursos no­vos e no aperfeiçoamento dos exis­tentes;

d) elaborar programas, séries metódicas, livros e material didático, diretamente, ou em colaboração com os departamentos regionais;

e) editar material didático, quan­do conveniente;

f) estabelecer critérios e meios para avaliação do rendimento esco­lar;

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sr) assistir os Departamentos Re­gionais no planejamento de edifica­ções, bem como no exame e escolha de equipamentos escolares;

7t) colaborar com as empresas contribuintes no estudo de planos de treinamento de mão-de-obra no pró­prio emprego, promovendo entendi­mentos entre os Departamentos Re­gionais e os empregadores, para a sua realização;

i) fixar as diretrizes para a es­tatística relativa à aprendizagem mi­nistrada pelo SENAI e pelas empresas,

receber os dados coletados pelos Departamentos Regionais e realizar as análises necessárias;

j) promover reuniões de direto­res, chefes de serviços, professores. instrutores, supervisores e técnicos dos Departamentos Regionais e das empresas para exame de problemas de formação e treinamento de mão-de-obra;

7) elaborar relatório anual sobre a formação e treinamento de

mão-de-obra no SENAI e nas empresas;

m) organizar ou realizar cursos de aperfeiçoamento e de especializa­ção do pessoal docente, técnico e administrativo do SENAI;

N) realizar estudos e pesquisas de natureza técnica e administrati­va encaminhando ao Conselho Na­cional os resultados apurados e as medidas sugeridas;

o) apreciar os recursos inter­postos sobre penas aplicadas pelos Departamentos Regionais aos infra­tores das leis pertinentes ao SENAI.

Art. 22. O Departamento Na­cional será dirigido por um diretor, nomeado e demissível ad-nutum pelo presidente do Conselho Nacional, de­vendo a escolha recair em pessoa

com formação universitária e conhe­cimentos especializados de ensino in­dustrial.

Parágrafo único. O Diretor do Departamento Nacional será substi­tuído, em seus impedimentos, por pessoa designada pelo presidente do Conselho Nacional.

Art. 23. Ao Diretor do Depar­tamento Nacional compete:

a) organizar, superintender e fis­calizar, direta ou indiretamente, to­dos os serviços a cargo do Departa­mento Nacional, expedindo ordens de serviço e praticando todos os atos necessários ao pleno exercício de suas funções;

b) apresentar ao Conselho Na­cional as propostas orçamentárias, os balanços e as prestações de contas anuais do Departamento Nacional. encaminhando estas últimas ao órgão competente;

c) apresentar, anualmente, ao Conselho Nacional o relatório das atividades do Departamento Nacio­nal;

d) organizar e submeter à apro­vação do Conselho Nacional o qua­dro do pessoal do Departamento Na­cional, dentro dos limites orçamen­tários;

e) propor ao presidente do Con­selho Nacional as admissões, promo­ções e demissões dos serventuários do Departamento Nacional, conceder-lhes férias e licenças, e aplicar-lhes penas disciplinares;

f) movimentar os fundos do De­partamento Nacional, assinando os cheques com o presidente do Conse­lho Nacional, ou com pessoa por esse

designada; g) executar qualquer tarefa de

natureza técnica ou funcional que lhe seja recomendada pelo Conselho Nacional ou pelo presidente;

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CAPÍTULO V

Dos Conselhos Regionais

Art. 24. No Distrito Federal, nos Estados e nos Territórios em que houver federação de indústrias, ofi­cialmente reconhecida e filiada ao órgão superior da classe, será cons­tituído um conselho regional com­posto dos seguintes membros: do pre­sidente da Federação das Indústrias, que será o seu presidente nato; de três delegados das atividades indus­triais, escolhidos pelo Conselho de Representantes da entidade federa­tiva; do diretor do Departamento Re­gional; de um representante do Mi­nistério da Educação c Cultura, de­signado pelo Ministro; de um repre­sentante do Ministério do Trabalho e Previdência Social, designado pelo Ministro e de um representante das atividades de transportes, comunica­ções e pesca, designado pelo Minis­tro da Viação e Obras Públicas.

Parágrafo único. Ocuparão os lu­gares dos Conselhos Regionais, nas suas faltas e impedimentos, os subs­titutos estatutários, ou os suplentes designados.

Art. 25. Compete a cada Con­selho Regional:

o) votar em verbas globais, o orçamento do Departamento Regio­nal e submetê-lo ao poder competen­te;

b) autorizar as transferências e as suplementações de dotações soli­citadas pelo diretor do Departamen­to Regional, encaminhando o assunto à aprovação da autoridade competen­te quando as alterações excederem de 25% (vinte e cinco por cento) de cada verba;

c) apreciar periodicamente a execução orçamentária na região;

ti) examinar anualmente o in­ventário de bens a cargo da adminis­tração regional;

e) aprovar a prestação de con­tas anual do Departamento Regio­nal;

f) aprovar a abertura de contas para guarda dos fundos da região em bancos oficiais, ou em bancos privados, que operem com a indús­tria;

g) aprovar os contratos de cons­trução de escolas na região;

h) autorizar a compra de imó­veis;

i) aprovar o relatório anual do Departamento Regional, remetendo uma via do mesmo ao Departamento Nacional em tempo útil para o pre­paro do relatório anual deste órgão;

j) designar, quando fôr o caso, representantes junto ao Conselho Na­cional;

1) encarrega-se de incumbên­cias que lhe forem delegadas pelo Conselho Nacional;

m) aprovar os quadros, fixar os padrões de vencimentos, determinar o critério e a época das promoções. bem como examinar quaisquer rea-justamentos de salários do pessoal do Departamento Regional;

n) fixar a remuneração do di­retor do Departamento Regional, dentro dos níveis estabelecidos pelo presidente do Conselho Nacional;

o) estabelecer as normas inter­nas do seu funcionamento.

Art. 26. Compete aos presi­dentes de Conselhos Regionais:

a) baixar os atos necessários à organização dos serviços da adminis­tração regional, bem como admitir, promover, demitir e fixar as ajudas de custo e diárias de seus servido­res;

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b) abrir contas para os fundos da região em bancos oficiais ou em bancos privados que operam com a indústria, devidamente credenciados pelo plenário.

Art. 27. Os Conselhos Regio­nais reunir-se-ão, ordinariamente, uma vez por mês e, extraordinaria­mente, quando convocados pelo pre­sidente ou por dois terços de seus membros, aplicando-se-lhes, quanto ao funcionamento e deliberações, o disposto no artigo 14 e seu parágra­fo único.

CAPÍTULO VI

Dos Departamentos Regionais

Art. 28. Cada Departamento Regional será dirigido por um di­retor nomeado e demissível ad nutum pelo presidente do Conselho Nacio­nal mediante proposta do presidente do Conselho Regional, recaindo a es­colha em pessoa que, além de ter for­mação universitária, possua conheci­mentos especializados de ensino in­dustrial, com experiência no magis­tério ou na administração dessa mo­dalidade de ensino.

Parágrafo único. O Diretor re­gional será substituído nos seus im­pedimentos, por quem fôr designado pelo presidente do Conselho Regio­nal.

Art. 29. Compete a cada De­partamento Regional:

a) submeter ao Conselho Regio­nal o plano para a realização da aprendizagem na região;

b) criar, com aprovação do Con­selho Regional, onde fôr conveniente, escolas e cursos de aprendizagem e cursos extraordinários para o prepa­ro de adultos em ofícios e ocupações qualificados e semiqualifiçados;

o) promover a aprendizagem e o treinamento de mão-de-obra no próprio emprego, cooperando com as empresas contribuintes na elaboração de planos e programas de preparo de mão-de-obra;

d) complementar, quando cou­ber, através de cursos extraordiná­rios, o treinamento de pessoal reali­zado nas empresas contribuintes da instituição;

e) elaborar programas, séries metódicas, livros e material didático, sempre que possível em colaboração com o Departamento Nacional;

f) cuidar do aperfeiçoamento do seu pessoal docente, técnico e admi­nistrativo, articulando-se, para isso, com o Departamento Nacional;

g) aplicar medidas de rendimen­to escolar para verificação dos re­sultados do ensino;

h) elaborar a proposta orça­mentária, em verbas globais, e pre­parar a prestação de contas anual do Departamento Regional;

i) manter em dia e em ordem a escrituração contábil, adotando o plano de contas aprovado pelo Conse­lho Nacional;

j) elaborar o relatório anual das atividades do Departamento Regio­nal;

Art. 30. Compete ao diretor de cada Departamento Regional:

a) organizar, superintender e fiscalizar, direta ou indiretamente, todos os serviços do Departamento Regional;

b) assegurar a eficiência do en­sino ministrado pelo SENAI na re­gião;

c) apresentar ao Conselho Re­gional as propostas orçamentárias e as prestações de contas anuais do Departamento Regional encaminhan­do-as ao poder competente;

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REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS

d) apresentar, anualmente, ao Conselho Regional, o relatório das atividades do Departamento Regio­nal;

e) organizar e submeter ao Con­selho Regional o quadro de pessoal do Departamento Regional, dentro dos limites orçamentários;

f) propor ao presidente do Con­selho Regional as admissões, pro­moções e demissões dos servidores do Departamento Regional, conce­der-lhes férias e licenças e aplicar-lhes penalidades disciplinares;

g) movimentar os fundos do Departamento Regional, assinando os cheques com o presidente do Con­selho Regional ou pessoa por este designada.

CAPÍTULO VII

Do Pessoal do SENAI

Art. 31. Aos empregados do SENAI, considerado este como enti­dade empregadora, aplicam-se os pre­ceitos da legislação trabalhista e da previdência social.

Art. 32. A admissão de servi­dores far-se-á mediante prova de ha­bilitação, de seleção ou de títulos, salvo os cargos ou funções de con­fiança e os contratos especiais.

CAPITULO VIII

Dos Recursos do SENAI

Art. 33. Constituem receita do SENAI:

a) as contribuições previstas em lei;

b) as doações e legados; c) as subvenções; d) as multas arrecadadas por in­

fração de dispositivos legais e regu­lamentares;

e) as rendas eventuais. Art. 34. A arrecadação das

contribuições devidas ao SENAI será feita pelo instituto ou caixa de apo­sentadoria e pensões a que estiver filiada a empresa contribuinte, con-comitantemente com as das contri­buições de previdência social quer na fase de cobrança administrativa, quer na de cobrança judicial.

Parágrafo único. Para esse efei­to, são conferidos à autarquia arre-cadadora os poderes de representação do SENAI, em Juízo e fora dele, sem prejuízo da ação direta do mesmo, se assim o entender.

Art. 35. Visando o atendi­mento de situações especiais, deter­minadas empresas poderão recolher as suas contribuições diretamente aos cofres do SENAI.

Art. 36. A título de indeniza­ção pelas despesas com a arrecada­ção procedida em favor do SENAI, as instituições de previdência social deduzirão do montante arrecadado:

a) 1% (um por cento), nos re­colhimentos por via administrativa;

b) 20% (vinte por cento), quan­do se tornar necessária a cobrança judicial.

Parágrafo único. Os órgãos arre­cadadores se reembolsarão, ainda, dos gastos efetuados com impressos e com serviços de terceiros na efeti­vação dos recolhimentos destinados ao SENAI.

Art. 37. As instituições de previdência social, até o dia vinte de cada mês, entregarão diretamen­te aos Departamentos Regionais do SENAI as importâncias arrecadadas no mês anterior nas bases territorais respectivas, deduzidas as comissões a que se refere o artigo antecedente, a contribuição adicional prevista em

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lei e a quota de 10% (dez por cento), para as despesas de caráter geral, incidente sobre o montante da recei­ta total da entidade.

Parágrafo único. A importância da contribuição adicional e a da quo­ta das despesas de caráter geral serão entregues, nas mesmas condi­ções, ao Departamento Nacional.

CAPÍTULO IX

Das Disposições Gerais

Art. 38. As despesas de cará­ter geral, calculadas sobre a receita geral do SENAI no índice de dez por cento (10%), são:

a) as de custeio do Conselho Nacional;

6) as de manutenção do Depar­tamento Nacional;

c) as de auxílio a escolas ou cursos em regiões onde a arrecada­ção seja insuficiente para a manu­tenção do mínimo de ensino julgado necessário.

Parágrafo único. A percentagem acima será desdobrada em parcelas de dois, três e cinco por cento para atender, respectivamente, aos gastos definidos nas alíneas a, b e c deste artigo.

Art. 39. Feitas as deduções a que se refere o artigo 37, a receita do SENAI arrecadada em cada re­gião será na mesma aplicada.

Art. 40. Caso se verifiquem ex­cessos nos orçamentos regionais en­tre a receita prevista e a realizada, as administrações respectivas criarão fundos de reserva destinados, preci­puamente, à construção e ao equi­pamento de novas escolas, ou a re­paros, ampliação e reequipamento das já existentes.

Art. 41. Os recursos previstos na alínea c do artigo 38 serão distri­buídos às regiões interessadas de modo diretamente proporcional ao número de operários e à média dos salários mínimos das sedes das esco­las por uma comissão de cinco mem­bros do Conselho Nacional integrada de representantes das mesmas.

Art. 42. A contribuição adicio­nal prevista em lei destina-se a aper­feiçoamento ou especialização de pes­soal das empresas, ou a elas destina­do, e do pessoal docente a serviço da aprendizagem, sob a forma de bolsas, de cursos e estágios, ou à montagem de laboratórios de pesqui­sas para fins de ensino.

CAPITULO X

Das Disposições Transitórias

Art. 43. O pessoal lotado na atual administração nacional do SE­NAI será distribuído entre os órgãos nacionais apontados neste Regimen­to, de acordo com as necessidades, por ato do presidente do Conselho Nacional, mediante proposta do di­retor do Departamento Nacional, ex­cetuados os cargos e funções de con­fiança.

Art. 44. As alterações admi­nistrativas, orçamentárias e contá­beis decorrentes da entrada em vi­gor deste Regimento deverão estar concluídas até 31 de dezembro do corrente ano.

Art. 45. Os membros temporá­rios do Conselho Nacional e dos Con­selhos Regionais serão renovados a partir da primeira reunião ordiná­ria de 1961.

Art. 46. O Conselho Nacional e os Conselhos Regionais, na primei­ra reunião ordinária que se seguir à

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entrada em vigor deste Regimento, adaptarão as suas normas internas de funcionamento aos novos precei­tos regimentais.

Art. 47. A sede do SENAI per­manecerá, em caráter provisório, na cidade do Rio de Janeiro, transfe­rindo-se para Brasília na época em que ocorrer a da Confederação Na­cional da Indústria. — Pedro Paulo Penido.

(Publ. no D. O. de 18-11-60).

DECRETO N» 49.259 — DE 17 DE NOVEMBRO DE 1960

Institui a Campanha de Radiodifu­são Educativa.

O Presidente da República, no uso das atribuições que lhe confere o art. 87, item I, da Constituição, de­creta :

Art. 1» Fica instituída a Campa­nha Nacional de Radiodifusão Edu­cativa (C. N. R. E . ) , a cargo do Serviço de Radiodifusão Educativa (S. R. E.) e diretamente subordina­da ao Ministro de Estado da Educa­ção e Cultura.

Art. 2º A C.N.R.E. , em coope­ração com o S.R.E. , terá por fina­lidade:

I) promover a irradiação de programas científicos, literários e artísticos de caráter educativo;

II) informar e esclarecer, quan­to à política de educação do país;

III) orientar a radiodifusão co­mo meio auxiliar de educação e en­sino;

IV) incrementar o intercâmbio de programas culturais com outras emissoras do país e do estrangeiro;

V) estimular a educação musi­cal do povo, promovendo a criação de obras musicais e literárias, desti-

nadas ao rádio, e realizando concer­tos e recitais destinados à divulgação da música brasileira, em todas as suas manifestações;

VI) organizar concursos desti­nados à seleção de jovens intérpre­tes brasileiros;

VII) organizar cursos e pales­tras sobre assuntos de interesse na­cional;

VIII) promover e patrocinar a gravação, em discos, de obras musi­cais e literárias de autores brasilei­ros, destinadas à documentação e di­vulgação.

Art. 3º O Diretor Executivo da C.N.R.E. será o Diretor do S.R.E.

Art. 4º Para custeio das ativi­dades da C.N.R.E. haverá um fun­do especial, de natureza bancária, de­positado em conta especial no Banco do Brasil S.A., a ser movimentado pelo Diretor do S.R.E. e constituído de:

a) dotações e contribuições que para isso forem consignadas nos Or­çamentos da União, de Estados, Mu­nicípios, entidades parestatais e so­ciedades de economia mista;

b) contribuições de entidades públicas e privadas, e

c) donativos, contribuições e le­gados particulares.

Art. 5º O M'inistro de Estado expedirá as instruções necessárias à organização da C.N.R.E.

Art. 6º este decreto entrará em vigor na data de sua publicação, fi­cando revogadas as disposições em contrário.

Brasília, em 17 de novembro de 1960; 139º da Independência e 72º da República.

JUSCELINO KUBITSCHEK

Clovis Salgado Antônio Carlos Barcelos Ernani do Amaral Peixoto. (Publ. no D. O. de 7-12-60).

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DECRETO Nº 49.304 — DE 21 DE NOVEMBRO DE 1960

Modifica o Regulamento do Ensino Industrial, aprovado pelo Decreto nº 47.038, de 16 de outubro de 1959.

O Presidente da República usan­do das atribuições que lhe confere o art. 87, nº I, da Constituição, e nos termos do art. 26 da Lei nº 3.552, de 6 de fevereiro de 1959, decreta:

Ar t .1 º O parágrafo único do art. 20 do Regulamento aprovado pelo Decreto nº 47.038, de 16 de outu­bro de 1959, passa a ser, com a mes­ma redação, § 1º, acrescentando-se-lhe o seguinte parágrafo:

"§ 2º Os alunos portadores de certificado de conclusão do 2º ciclo de curso de nível médio poderão, a juízo do órgão de direção pedagógi-co-didática competente na escola, ser dispensados de matérias já ministra­das naquele curso".

Art. 2º O artigo 22 do referido Regulamento passa a ter a seguinte redação:

"Art. 22. Os cursos industriais técnicos, noturnos, terão a duração mínima:

a) de 4 anos; 1 — com período escolar anual de

duração mínima de 180 dias letivos efetivamente computados e horário semanal de 33 aulas pelo menos, não podendo os trabalhos diários ultra­passar as 22 horas;

2 — com período escolar anual de duração mínima de 200 dias leti­vos efetivamente computados e ho­rário semanal proporcionalmente re­duzido;

b) de 5 anos — com período es­colar anual mínimo de 180 dias leti­vos efetivamente computados e ho­rário semanal proporcionalmente re­duzido".

Art. 3º — O parágrafo único do art. 33 do mencionado Regulamento passa a ser § 1°, com a redação da­da a seguir, acrescentado § 2º;

"Art. 33 § 1º Nos cursos industriais téc­

nicos, noturnos, as aulas serão de 40 minutos, o horário semanal pode­rá ser reduzido e a duração do curso ampliada quanto ao número de sé­ries ou de dias letivos, na forma do que dispõe o art. 22 desse título.

§ 2º No curso industrial básico, quando noturno, as aulas serão de 40 minutos e o horário semanal deverá ser elaborado nos termos do que dis­põe o art. 22, alínea "a", números 1 e 2."

Art. 4º Será acrescentado ao art. 51 do Regulamento o seguinte parágrafo:

"Art. 51

§ 3º Os estabelecimentos de en­sino industrial equiparados ou reco­nhecidos na forma da legislação an­terior poderão, se requererem clas­sificação até 31 de dezembro de 1960, solicitar prazo de 2 anos, no máximo, para completarem sua adaptação aos requisitos enumerados no artigo pre­cedente."

Art. 5º Os artigos 71, 72 e 73 pas­sam a ter a seguinte redação:

"Art. 71. O curso de aprendiza­gem industrial poderá funcionar em regime diurno ou noturno, sendo o duração mínima de 20 meses, para o diurno e de 30 meses, para o no­turno.

Art. 72. O curso industrial bá­sico poderá funcionar em regime di­urno e noturno, observado, quanto ao último, o disposto no § 2º do art. 33.

Art. 73. Os cursos industriais técnicos, quando funcionarem à noi­te, obedecerão ao disposto no art. 22."

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Art. 6º Este decreto entrará em vigor na data de sua publicação, re­vogadas as disposições em contrário.

Brasília, em 21 de novembro de 1960, 139º da Independência e 72º da República.

JUSCELINO KUBITSCHEK

Clovis Salgado.

(Publ. no D. O. de 7-12-60).

DECRETO Nº 49.305, DE 21 DE NOVEMBRO DE 1960

Institui a Campanha de Formação de Meteorologistas (C.A.M.E.).

O Presidente da República, usan­do da atribuição que lhe confere o art. 87, item I, da Constituição,

DECRETA:

Art. 1" Fica instituída a Cam­panha de Formação de Meteorologis­tas (C.A.M.E.), a cargo da Direto­ria do Ensino Superior, do Ministé­rio da Educação e Cultura, com a fi­nalidade de promover a formação de pessoal especializado em meteoro­logia, para atender às necessidades nacionais.

Art. 2º Para consecução dessa finalidade, a C.A.M.E. deverá, obri­gatoriamente:

I — promover o estudo das neces­sidades do País, no setor da meteorologia, articulada, ou não, com outros órgãos públi­cos, paraestatais e privados;

II — promover a criação e o regu­lar funcionamento de cursos destinados à formação de me­teorologistas;

III — articular em cooperação com instituições públicas ou priva­das, os recursos existentes, pa­

ra oferecer oportunidades ade­quadas à formação e especia­lização de profissionais no se­tor da meteorologia, ou reali­zar esse programa, direta­mente;

IV — colaborar com programas cor­relatos, empreendidos por ou­tros órgãos, oficiais ou priva­dos;

V — promover a expansão dos es­tudos de meteorologia, em ge­ral.

Art. 3º A C.A.M.E. compreen­de:

Comissão orientadora (C. O.) .

Secretaria Executiva (S .E. ) .

§ 1º A Comissão Orientadora compõe-se de cinco (5) membros, to­dos com direito a voto, dos quais dois (2) serão designados pelo Mi­nistro da Educação e Cultura.

§ 2º São membros da Comissão Orientadora o Ministro da Educação e Cultura, como Presidente; o Dire­tor do Ensino Superior, como Secre-rio Executivo; e o Diretor de Serviço de Meteorologia, do Ministério da Agricultura.

§ 3º São gratuitas e constituem serviço relevante as atividades dos membros da Comissão Orientadora.

Art. 4º Compete à Comissão Orientadora:

I — planificar os objetivos da C.A.M.E. e propor ao Minis­tro a relação dos problemas;

II — orientar, supervisionar e controlar os cargos da forma­ção, da especialização, da ex­tensão e da aplicação, fican­do as mesmas para seu inte­gral funcionamento;

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III — propor a admissão de profes­sores, técnicos e auxiliares para prestação de serviços, nos termos da Lei n° 3.780, de 1º de julho de 1960;

IV — propor o plano de aplicação das verbas e apreciar as con­tas a serem aprovadas;

V — apresentar anualmente, até o último dia do mês de feve­reiro, ao Ministro da Educa­ção e Cultura, relatório mi­nucioso das atividades no exercício anterior;

VI — promover a divulgação do trabalhos que interessem aos objetivos da Campanha;

VII — elaborar a previsão anual da receita e da despesa para ser­vir de base aos planos de aplicação dos recursos que lhe forem destinados;

VIII — emitir parecer sobre todas as questões que forem sub­metidas à sua apreciação pe­lo Ministro da Educação e Cultura ou pelo Diretor de Ensino Superior.

Art. 5º À Secretaria Executiva compete a execução das medidas emanadas das decisões da Comissão Orientadora.

Art. 6º' Para custeio das ativi­dades da C.A.M.E. haverá um fun­do especial, de natureza bancária, depositado em conta especial no Ban­co do Brasil S. A., a ser movimenta­do pelo Diretor do Ensino Superior e constituído de:

a) contribuições que para isso forem consignadas nos orçamentos da União, de Estados, Municípios, en­tidades paraestatais e sociedades de economia mista;

6) contribuições provenientes de acordos e convênios com entidades públicas e privadas;

c) donativos, contribuições e le­gados de particulares.

Parágrafo único. A aplicação dos recursos será feita de acordo com plano previamente aprovado pelo Presidente da República e dela serão prestadas contas ao Tribunal de Con­tas, por intermédio do Ministério da Educação e Cultura, até 60 (sessen­ta) dias após o encerramento de ca­da exercício.

Art. 7º O Ministro da Educação e Cultura baixará, no prazo de vinte (20) dias, as instruções necessárias ao cumprimento deste decreto.

Art. 8º Os casos omissos serão decididos pelo Ministro da Educação e Cultura, consultada a Comissão Orientadora.

Art. 9º este decreto entrará em vigor na data de sua publicação, re­vogadas as disposições em contrário.

Brasília, em 21 de novembro de 1960, 139º da Independência e 72º da República.

JUSCELINO KUBITSCHEK

Clovis Salgado

Antônio Carlos Barcelos

Antônio Barros Carvalho

(Publ. no D. O. de 24-11-00)

DECRETO Nº 49.340 — DE 25 DE NOVEMBRO DE 1960

Dispõe sobre o Corpo de Estagiários Permanentes ão Instituto Benja­mim Constant do Ministério da Educação e Cultura.

O Presidente da República, usan-da atribuição que lhe confere o ar­tigo 87, n' I, da Constituição, decre­ta :

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Art. 1º O Instituto Benjamim Constant manterá, diretamente su­bordinado ao seu Diretor, um Corpo de Estagiários Permanentes, consti­tuído de estudantes, cegos ou amblío-pes, do segundo ciclo do Curso Se­cundário, ou de estabelecimento uni­versitário até que concluam o pri­meiro curso superior.

Art. 2º Para ser admitido ao Corpo de Estagiários Permanentes, deverá o cego ou amblíope:

I — Ter concluído curso ginasial ou profissional do Instituto Benjamim Constant, com bom índice de aproveitamen­to;

II — Ter revelado bom comporta­mento como aluno do mesmo Instituto.

Parágrafo único. A admissão ao Corpo de Estagiários Permanentes será concedida pelo Diretor do Ins­tituto Benjamim Constant de acordo com o número de vagas, por êle fixa­do anualmente, em número não in­ferior a vinte.

Art. 3º Aos membros do Corpo de Estagiário;! Permanentes, o Insti­tuto Benjamim Constant dará:

I — Residência e alimentação;

II — Assistência médico-dentária;

III — Objetos de uso pessoal indis­pensáveis, aos que se acharem. economicamente, impossibili­tados de adquiri-los;

IV — Transcrição de material didá­tico necessário aos respectivos estudos;

V — Bólsas-de-estudo obtidas dos órgãos competentes.

Parágrafo único. O Instituto Benjamim Constant deverá fiscalizar sistematicamente o aproveitamento dos estagiários nos estabelecimentos em que estiverem matriculados.

Art. 4º Será facultado ao esta­giário inscrever-se nos cursos profis­sionais do Instituto Benjamim Cons­tant, sujeito a freqüência regular.

Art. 5º São deveres do estagiá­rio:

I — Observar o regime disciplinar do Instituto, acatando as nor­mas que lhes forem especial­mente destinadas;

II — Cooperar, em horário compa­tível com suas obrigações es­colares e de acordo com as recomendações do Diretor, nas atividades de ensino, educação e assistência social, destinadas aos alunos do Instituto, bem' como na realização de progra­mas literários, musicais ou recreativos do mesmo estabe­lecimento.

Art. 6º Será excluído do Corpo de Estagiários Permanentes o mem­bro que, pela reincidência em faltas graves, se revelar inadaptável ao re­gime disciplinar vigente.

Art. 7º O estagiário que exercer função remunerada, ou dispuser de rendimento que lhe permita prover independentemente a sua subsistên­cia, perderá o direito a residência no Instituto.

Art. 8º O Ministro de Estado da Educação e Cultura baixará as ins­truções complementares que forem necessárias à execução deste decreto.

Art. 9º O presente decreto entra­rá em vigor na data da sua publica­ção, revogadas as disposições em contrário.

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Brasília, em 25 de novembro de 1960, 139' da Independência e 72' da República.

JUSCELINO KUBITSCHEK

Clovis Salgado.

(Publ. no D. O. de 5-12-60),

DECRETO N' 49.355 — DE 28 DE NOVEMBRO DE 1960

Cria a Comissão Supervisora do Pla­no dos Institutos (COSUPI), deter­mina seu funcionamento sob a for­ma de Campanha e dá outras pro­vidências.

O Presidente da República, usan­do das atribuições que lhe confere o artigo 87, inciso I, da Constituição, decreta:

Art. 1º E criada, no Ministério da Educação e Cultura, a Comissão Supervisora do Plano dos Institutos (COSUPI), cujas atividades serão exercidas, em todo o território nacio­nal, sob a forma de Campanha, que é instituída com este decreto, desti­nada à implantação e desenvolvimen­to de um programa de educação tec­nológica.

Art. 2º A COSUPI será dirigida por um Presidente e integrada por dois membros, designados por decre­to do Presidente da República, por indicação do Ministro da Educação e Cultura, os quais terão mandato de cinco anos.

Parágrafo único. O Presidente da COSUPI exercerá as funções de Superintendente da Campanha.

Art. 3º Caberá à COSUPI, para alcançar os objetivos colimados, ela­borar, submeter à apreciação e apro­vação do Ministro de Estado da Edu­cação e Cultura e executar:

o) os planos de aplicação das verbas concedidas ao Ministério da Educação e Cultura para a instala­ção de institutos de tecnologia e para aumentar a eficiência do ensino nas escolas de nível superior;

b) as minutas de acordo com as escolas ou universidades que forem beneficiadas por parcelas dessas ver­bas e a verificação do progresso rea­lizado, no correr do tempo, em cada caso específico do acordo, bem assim as sugestões para modificar esses planos, conforme os resultados que estes progressivamente alcancem;

c) os planos para aquisição de equipamentos para escolas e univer­sidades beneficiadas com verbas des­tinadas à Educação para o Desenvol­vimento ou com as que sejam ex­pressamente destinadas àquele fim.

Art. 4º A manutenção dos ser­viços e encargos da COSUPI e as atividades da Campanha serão custeadas com os recursos que lhe forem destinados especificamente e provenientes das seguintes fontes:

a) dotações que para qualquer fim lhe forem consignadas nos orça­mentos da União, Estados, Municí­pios, Autarquias, Entidades Paraes-tatais e Sociedades de Economia Mista;

b) contribuições que lhe forem destinadas por entidades públicas e privadas;

c) contribuições provenientes de convênios com entidades públicas e particulares;

á) donativos, contribuições e le­gados de particulares.

Art. 5º Os recursos atribuídos à COSUPI constituirão um fundo espe­cial, de natureza bancária, e serão depositados, em conta especial de Poderes Públicos, sem juros, no Ban-

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co do Brasil S. A., a ser movimenta­da pelo respectivo Presidente e Su­perintendente da Campanha.

Art. 6' A movimentação dos re­cursos destinados à COSUPI depen­derá da prévia aprovação do respec­tivo plano de aplicação, a ser subme­tido ao Presidente da República atra­vés do Ministro da Educação e Cul­tura.

Art. 7' Da aplicação dos recur­sos, prestará contas o Presidente da COSUPI e Superintendente da Cam­panha, ao Tribunal de Contas da União, com o parecer da Divisão de Orçamento do Ministério da Educa­ção e Cultura, sessenta (60) dias após o encerramento de cada exercício fi­nanceiro.

Art. 8° As atividades exercidas e os serviços prestados pelo Presidente da COSUPI e Superintendente da Campanha e pelos membros de que trata o artigo 2° serão gratuitas, mas consideradas de natureza relevante.

Art. 9º Os serviços administrati­vos da COSUPI serão atendidos por servidores públicos federais ou autár­quicos requisitados através do Minis­tro da Educação e Cultura, sem a perda do vencimento ou salário e das vantagens de caráter permanente cor­respondentes ao respectivo cargo ou função.

Parágrafo único. As requisições de que trata este artigo terão prio­ridade e obedecerão às normas le­gais em vigor, relativas ao afasta­mento do servidor público federal ou autárquico de um para outro órgão integrante da administração direta ou indireta.

Art. 10. A COSUPI poderá re­munerar a execução de serviços de natureza técnica e especializada que

se fizeram necessários, desde que tais serviços não tenham caráter per­manente.

Art. 11. O Ministro da Educação e Cultura, no prazo de trinta (30) dias, expedirá as instruções necessá­rias à execução deste decreto.

Art. 12. este Decreto entrará em vigor na data da sua publicação, re­vogadas as disposições em contrário.

Brasília, em 28 de novembro de 1960, 139º da Independência e 72º da República.

JUSCELINO KUBITSCHEK

Clovis Salgado Antônio Carlos Barcelos. (Publ. no D. O. de 30-11-60).

PORTARIA Nº 202, DE 10 DE OUTUBRO DE 1960

Expede Instruções gerais para a rea­lização de concursos.

O Diretor-Geral do Departamen­to Administrativo do Serviço Públi­co, usando da atribuição que lhe con­fere o item XVIII do art. 74 do Regi­mento aprovado pelo Dec. nº 41.955, de 3 de agosto de 1957, e tendo em vista o que consta da proposta do Diretor da Divisão de Seleção e Aperfeiçoamento resolve:

Expedir novas "Instruções Ge­rais", destinadas a regular a realiza­ção de concursos promovidos pelo Departamento. — J. G. Aragão, Di­retor-Geral.

INSTRUÇÕES GERAIS

DA INSCRIÇÃO NOS CONCURSOS

1. A abertura, a fixação do pra­zo e os locais de inscrição, para ca­da concurso, serão divulgados em edital publicado no Diário Oficial.

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2. O pedido de inscrição consta­rá do preenchimento de uma ficha, fornecida ao candidato nos locais de inscrição.

3. Juntamente com a ficha de inscrição, o candidato deverá apre­sentar duas cópias de fotografia, 3 x 4 cm, tirada de frente e sem cha-péu, bem como documento que com­prove estar em dia com as obriga­ções eleitorais.

4. A ficha de inscrição não será aceita sem que esteja devidamente preenchida. Igualmente, não será aceita a ficha que apresentar rasu­ras ou emendas.

5. Se as condições de concurso exigirem a apresentação de documen­to, o candidato deverá juntá-lo, para que o pedido de inscrição seja acei­to.

6. O pedido de inscrição signifi­cará a aceitação das normas estabe­lecidas nestas instruções, nas instru­ções especiais do concurso, bem como em qualquer outro ato administrati­vo que as suplemente, modifique ou interprete.

7. não será permitida, sob qual­quer pretexto, a inscrição condicio­nal.

8. Para efeito de inscrição em concurso não está sujeito a limite de idade o ocupante de cargo ou fun­ção pública.

9. Será, ainda, aceita a inscri­ção de candidato que:

a) conte seis meses menos do que a idade mínima prevista em ins­truções reguladoras de concurso e

b) tennam servido, em cargo ou função pública, durante um tempo maior que a diferença entre sua ida­de e a idade máxima estabelecida em instruções de concurso.

10. Nos termos do § 3o do art. 19 da Lei 1.711, de 28 de outubro de 1952, todo aquele que ocupar, interi­namente, cargo cujo provimento efe­tivo dependa de habilitação em con­curso será inscrito ex officio, no pri­meiro que se realizar para cargos da respectiva profissão, devendo, pa­ra esse fim, comparecer a qualquer dos postos de inscrição do D.A.S.P. dentro do prazo fixado para as ins­crições. A aprovação da inscrição ex officio dependerá da satisfação. por parte do interino dentro dos pra­zos estipulados, de todas as exigên­cias contidas nestas instruções e nas que regularem o concurso respectivo.

11. Ultimados os trabalhos de inscrição, cujo encerramento se efe­tuará no dia e hora prefixados no edital de abertura, será a matéria submetida à aprovação do Chefe da Seção de Inscrições da D.S.A.

12. Os candidatos dos Estados, cujos nomes constem das listas envia­das pelos postos, terão os pedidos de inscrição aceitos pela D.S.A., fican­do a aprovação definitiva na depen­dência do exame a ser feito pela D. S.A. em qualquer fase da realização do concurso.

13. O candidato, mesmo habili­tado, cuja inscrição fôr cancelada. terá todas as provas anuladas sem direito a qualquer recurso adminis­trativo.

14. Nos concursos que se reali­zarem nos Estados, será permitida a transferência de inscrição, devendo, porém, o candidato interessado soli­citá-la ao Diretor da D.S.A., até cin­co dias antes da realização da pri­meira prova ou parte.

15. O pedido de inscrição de candidatos residentes em localidades distantes dos postos de inscrição po-

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dera ser feito por via postal, desde que regis trado no D . C . T . , dentro do prazo das inscrições.

16. O candidato que fizer, na fi­cha de inscrição, declaração falsa ou inexata, te rá a inscrição cancelada e anulados todos os atos dela decor­rentes .

17. Apurada falsidade nas decla­rações do candidato e cancelada a inscrição, não t e r á êle aceito, pelo prazo de dois anos, pedido de inscri­ção em concurso promovido pelo D . A . S . P .

18. O candidato habil i tado em concurso receberá certificado, que será expedido pela Divisão de Sele­ção e Aperfeiçoamento, de acordo com as seguintes ins t ruções :

a) a expedição do referido cer­t if icado ficará subordinada ao resul­tado da prova de investigação so­cial;

b) no Distr i to Federa l e nos Es­tados, os certificados só serão entre­gues mediante apresentação, por par­te do candidato, dos documentos com-probatórios das declarações feitas na ocasião do pedido de inscrição, a fim de ser verificado se êle satisfa­zia, àquela época, às condições exi­gidas pelas instruções.

19. Os documentos referidos na al ínea b do i tem anter ior são os se­guintes :

a) prova de nacionalidade bra­sileira constante de cert idão de re ­gistro civil de nascimento ou de ca­samento, t i tulo de natura l ização ou t í tulo declaratório de nacionalidade, caderne ta ou certificado de reservis­ta, pela qual t ambém se verifique não t e r o candidato idade inferior nem su­perior aos limites fixados, pava cada •concurso, nas respectivas instruções;

b) prova de identidade, constan­te de car te i ra oficial de identidade, de caderneta ou certificado de reser­vista, da car te i ra profissional ou de título eleitoral;

c) prova de que está em dia com as obrigações mil i tares ;

d) título eleitoral, de que cons­te ter vontado na eleição anterior , ou documento que o substitua, nos termos da

legislação respectiva e

e) prova de declarações feitas p a r a inscrição com base nos i tens 7 e 8.

20. O candidato que não apre­sentar a documentação exigida per­derá todos os direitos conferidos pe­la classificação no concurso, sem que lhe caiba direito a qualquer recurso ou indenização.

DAS PROVAS E DO SEU JULGAMENTO

21. Os concursos serão de provas e títulos.

22. A ordem de realização das

provas será de te rminada pela D . S . A .

23. A organização e os progra­mas das provas serão objeto das ins­truções de cada concurso. Essas ins­truções deverão fixar os mínimos parciais ou globais p a r a habil i tação dos candidatos.

24. As provas dos concursos se­rão realizadas em dia, hora e local prefixados, com aviso público ou me­diante termo de ciência, submetido à ass ina tura dos interessados, com a antecedência de vinte e qua t ro horas . pelo menos.

25. não haverá segunda chama­da p a r a nenhuma prova, importando a ausência do candidato na atr ibuição de grau zero à prova a que tiver fal­tado.

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26. O candidato deverá exibir o seu Car tão de Identificação an tes de cada prova, sob pena de ser conside­rado ausente .

27. O não comparecimento do candidato a qualquer prova, mesmo não eliminatória, impor ta rá em sua exclusão do concurso, não lhe sendo permitido pres ta r as provas subse­qüentes .

28. O candidato que se recusar a p res ta r qualquer prova, ou que se re t i ra r do recinto du ran te a reali­zação da mesma, sem a devida auto­rização, f icará au tomat icamente eli­minado do concurso.

29. Será excluído do concurso por ato do Diretor da D . S . A . o can­didato que se to rna r culpado de in­correção ou descortesia p a r a com qualquer dos examinadores, executo­res, seus auxil iares ou autor idades presentes . Idênt ica penalidade será apl icada ao candidato que, du ran te a realização de qualquer prova, fôr surpreendido em f lagrante de comu­nicação com outro candidato, verbal­mente, por escrito ou por ou t ra qual­quer forma, bem assim utilizando-se de livros, notas ou impressos, salvo os expressamente permitidos.

30. Os candidatos eliminados na forma do item anter ior não poderão inscrever-se, em qualquer outro con­curso, duran te o prazo de dois anos contados da da ta da eliminação.

31. As provas de cada concurso poderão, sempre que necessário e a juizo da D . S . A . , ser realizadas em dias sucessivos.

32. Concluídos os t rabalhos de realização de cada prova, observar-se-á p a r a perfeita ga ran t i a da obje­tividade do julgamento, o seguinte :

a) os talões de identificação que acompanham os folhetos serão desta­cados, logo após a te rminação de ca­

da prova e ficarão em invólucros la­crados sob a gua rda da Seção de Execução de Provas, a t é a conclusão do respectivo ju lgamento ; e

b) cada talão receberá um nú­mero, repetido, p a r a identificação posterior, no folheto do qual o ta lão fôr destacado.

33. O julgamento das provas se­rá feito segundo a quan t idade e per­feição do t rabalho apresentado pelo candidato. Real izadas as provas, os examinadores ou a Seção de Organi­zação e Ju lgamento de Provas deve­rão, em conformidade com as instru­ções a respeito, fixar o critério de correção.

34. A nota será lançada nas pro­vas escri tas an tes do t rabalho de identificação, o qual se fará publica­mente .

35. Nas provas que exigirem o emprego de aparelhos, máquinas , ma­ter ia is ou equipamento especial, o examinador poderá de te rmina r a eli­minação do candidato, desde que este demonstre

não possuir a necessá­ria capacidade p a r a utilizar-se dessas peças, sem risco de danificá-las ou provocar acidentes.

36. Serão aprox imadas da uni­dade as frações de notas iguais ou superiores a 0,5, quer em matér ias eliminatórias, quer em médias finais, quando dessa aproximação resul tar a habil i tação do candidato.

37. A prova que apresen ta r si­nal ou contiver expressão que lhe possibilite identificação será a t r ibuí­da nota zero.

38. Ê permitido ao candidato ter vis ta das provas que prestou, p a r a efeito de recurso, observadas as se­guintes no rmas :

a) a vista de provas aos candi­datos inscritos na localidade em que se processar a identificação das pro-

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vas, somente será concedida no dia ho ra e local designados pela D.S.A.

b) aos candidatos inscritos em localidades diferentes daquela em que se processar a identificação das pro­vas, será facultado o prazo de 20 dias, que se seguirem à da ta da iden­tificação, pa ra solicitar a vis ta das provas na Seção de Execução de P rovas ;

c) comprovada a f raude de adul teração de prova, por ocasião da vista, será o candidato excluído do concurso, por ato do Diretor da D.S.A.

39. Divulgado o resul tado de qualquer prova, o candidato dele po­derá recorrer, desde que o faça den­t ro das normas de urbanidade e em termos, observado o seguinte :

a) o recurso constará de petição dir igida ao Diretor da Divisão de Seleção e Aperfeiçoamento;

b) o recurso formulado pelo can­didato que tiver tido vista de prova deverá, sob pena de indeferimento in limine, ser fundamentado e indi­car, com precisão, as questões e os pontos a serem objeto de revisão;

c) o candidato que t iver vis ta de prova deverá apresentar o recurso a té quaren ta e oito horas depois des­sa vis ta ; o candidato inscrito em lo­calidade onde não haja sido dada vista das provas deverá apresen ta r recurso a té vinte dias depois da pu­blicação dos resultados da prova no Diário Oficial da União;

d) os recursos relativos a pro­vas orais, prático-orais, t í tulos, mo­nografias ou defesa de tese deverão ser apresentados a té quaren ta o oito horas depois da publicação dos re­sultados no Diário Oficial da União ou por qualquer out ra forma de di­vulgação ou ciência ado tada pela D . S . A .

40. Se acei tar o pedido de recur­so, o Diretor da D . S . A . conf i rmará ou modificará o grau atr ibuído à prova, ou ainda poderá m a n d a r pro­ceder à revisão de toda a prova.

41. Antes de proferir o julga­mento, poderá o Diretor da D.S.A. ordenar as diligências que achar ne­cessárias, inclusive a audiência de outro examinador ou do próprio que tenha corrigido a prova.

42. O examinador ou a Seção de Organização e Ju lgamento de Pro­vas, depois de conhecer das razões apresentadas pelo recorrente, fará a revisão geral ou parcial da prova e emit irá parecer fundamentado, só podendo propor a a l teração da nota a t r ibuída anter iormente , se ficar evi­denciado que houve erro de fato na aplicação do critério do julgamento.

43. O Diretor da D . S . A . pode­rá manda r proceder ex officio, pela Seção de Organização e Ju lgamento de Provas ou por examinadores espe­cialmente designados à revisão das provas ou a desidentificação das mesmas, pa ra efeito de novo julga­mento, desde que se verifique apura­ção inadequada do critério a que se refere o item 33, ou não sejam obser­vadas as instruções e normas divul­gadas pela D . S . A .

44. O candidato poderá a inda :

a) recorrer, ao Diretor-Geral do D . A . S . P . , do despacho do Diretor da D . S . A . , a té qua ren ta e oito horas depois de sua publicação no Diário Oficial;

b) reclamar, ao Diretor-Geral do D . A . S . P . , por intermédio do Di­retor da D.S.A., no prazo improrro­gável de cinco dias consecutivos, a contar da da ta da publicação do re­sultado final no Diário Oficial, con­t r a erros ou omissões no cálculo das médias finais ou na classificação.

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45. Os candidatos inscritos nos Es tados terão vinte dias, a par t i r da publicação do despacho no Diário Oficial, pa ra interpor os recursos pre­vistos no item anterior .

46. não serão apreciadas as re­clamações que não forem apresenta­das em termos convenientes ou não apontarem, com absoluta clareza, fa­tos e c i rcunstâncias que a justif iquem e permi tam pronta apuração.

47. Se ficar provado vício, i r re­gular idade insanável ou preter ição de formalidade substancial , o concurso será anulado, parcial ou to ta lmente .

DOS EXAMINADORES

48. Compete à D . S . A . a elabo­ração de questões, organização e cor­reção de provas, no que poderá ser auxil iada por pessoas es t ranhas , de­s ignadas pelo Diretor.

49. O Diretor-Geral do D.A.S.P. poderá designar examinadores, que executarão esses t rabalhos, com as­sistência da D.S.A. e sob a orienta­ção do Diretor .

50. As Bancas Examinadoras , quando houver, serão const i tuídas de pessoas de reconhecida idoneidade moral e capacidade, designadas pelo Diretor-Geral do D . A . S . P . , median­te proposta escri ta do Dire tor da D . S . A .

51. Cada Banca Examinadora poderá t e r um presidente designado dentre seus membros pelo Diretor-Geral do D . A . S . P . , mediante indica­ção do Dire tor da D . S . A .

52. Na ausência eventual do pre­sidente, assumirá a presidência dos t rabalhos o examinador designado pe­lo Diretor da D . S . A .

53. As Bancas Examinadoras orientar-se-ão pelas instruções baixa­das pela D . S . A . p a r a cada concurso e, no que couber, por estas instru­ções.

54. A fim de m a n t e r a necessá­

r ia unidade de orientação, o Diretor

da D . S . A . ou o Chefe da Seção de

Organização e Ju lgamento de Pro ­

vas (quando se t r a t a r de provas es­

cr i tas ou de títulos) ou o Chefe da

Seção de Execução de Provas (no

caso de provas prá t icas e prát ico-

orais) designará um servidor que co­

ordenará os t rabalhos das Bancas

Examinadoras .

55. No caso de impedimento de qualquer dos membros da B a n c a Examinadora , du ran te a realização do concurso, serão designados subs­t i tu tos na forma previs ta nestas Ins­truções.

DA HABILITAÇÃO DOS CANDIDATOS

56. Os resul tados finais serão publicados, obedecendo-se à ordem decrescente de pontos. Serão publi­cados, apenas, os resul tados que per­m i t a m a habili tação do candidato.

57. Só serão considerados habi­litados os candidatos que obtiverem, em cada caso, os g raus ou resul tados fixados nas Instruções do concurso.

58. Nos concursos cujas inscri­ções forem aber tas em diferentes pontos do terr i tór io nacional (Distri­to Federal , Es tados ou Terr i tór ios) , a classificação final dos candidatos , p a r a efeito de nomeação, obedecerá, salvo motivo relevante ou conveniên­cia da adminis t ração, a juízo exclu­sivo do D . A . S . P . , ao critério regio­nal.

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59. Os candidatos classificados no Distr i to Federa l e nos Es tados ou Tirr i tórios poderão, ex officio. ou mediante requer imento à Divisão de Pessoal D . A . S . P . , ser indicados a nomeação p a r a cargos lotados em unidades da Federação diferentes daquelas em que se habi l i tarem, e nas quais, depois de nomeados todos os candidatos constantes da respecti­va classificação final, r e s t a rem va­gas que devam ser providas.

60. Nos concursos em cujas ins­truções forem previs tas seções vá­r ias pelas quais os candidatos devam optar no ato da inscrição, a classifi­cação final far-se-á em t an t a s sé­ries quan tas forem as seções previs­tas , de modo que as nomeações pos­sam obedecer aos interesses do ser­viço.

61. A homologação de concurso poderá ser parcelada, e não depende­rá da solução de recursos interpos­tos, nem do prazo p a r a reclamação contra o processamento dos t raba­lhos nem do resul tado da prova de investigação social.

DISPOSIÇÃO GERAIS

62. A nenhum candidato se rá dado alegar desconhecimento dessas Instruções, bem como das instruções do concurso em que se t e n h a inscri­to.

63. Os concursos, sejam gerais ou específicos, serão válidos, em ge­ral, por dois anos, a contar da da ta da publicação no Diário Oficial da homologação, excetuados os casos em que as Instruções fixarem expressa­mente outro prazo.

64. As presentes instruções en­t r a rão em vigor na da t a de sua pu­blicação no Diário Oficial, passando os concursos, o ra em realização, a reger-se por elas.

65. Os casos omissos serão sub­metidos à consideração do Diretor-Geral do D . A . S . P .

66. F icam revogadas as disposi­ções em contrár io . — Brasíl ia, em 10 de outubro de 1960. — J. S. Aragão — Diretor-Geral.

( rubi . no D. O. de 25-10-60).

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R E V I S T A B R A S I L E I R A

DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS

PUBLICADA PELO INSTITUTO NACIONAL

D E E S T U D O S P E D A G Ó G I C O S

MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO E CULTURA

VOL. XXXV ABRIL-JUNHO, 1961 N.°82

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REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS, órgão dos estudos e pesquisas do Ministério da Educação e Cul­tura, publica-se sob a responsabilidade do Instituto Nacional de Estudos Pedagógicos, e tem por fim expor e discutir questões gerais da pedagogia e, de modo especial, os problemas da vida educacional brasileira. Para isso aspira congregar os estudiosos dos fatos educacionais do país, e refletir o pensamento de seu magistério. REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓ­GICOS publica artigos de colaboração, sempre solicitada; regis­tra resultados de trabalhos realizados pelos diferentes órgãos do Ministério e pelas Secretarias Estaduais de Educação. Tanto quanto possa, REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDA­GÓGICOS deseja contribuir para a renovação científica do tra­balho educativo e para a formação de uma esclarecida menta­lidade pública em matéria de educação.

A Revista não endossa os conceitos emitidos em artigos assinados e matéria transcrita.

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R E V I S T A B R A S I L E I R A

DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS

PUBLICADA PELO INSTITUTO NACIONAL

D E E S T U D O S P E D A G Ó G I C O S

MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO E CULTURA

VOL. XXXV ABRIL-JUNHO, 1961 N ° 82

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INSTITUTO NACIONAL DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS Diretor — Anísio Spinola Teixeira

CENTRO BRASILEIRO DE PESQUISAS EDUCACIONAIS

Diretor Executivo — Péricles Madureira de Pinho

Divisão de Aperfeiçoamento do Magistério

Coordenador — Lúcia Marques Pinheiro

Divisão de Documentação e Informação Pedagógica

Coordenador — Elza Rodrigues Martins

Divisão de Estudos e Pesquisas Educacionais

Coordenador — Jaime Abreu

Divisão de Estudos e Pesquisas Sociais

Coordenador — Darci Ribeiro

toda correspondência relativa à REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS deverá ser endereçada ao Diretor do Instituto Nacional de Estudos Pedagógicos, Caixa Postal 1669 — Rio de Janeiro — Estado

da Guanabara — Brasil.

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R E V I S T A B R A S I L E I R A D E E S T U D O S P E D A G Ó G I C O S

Vol. XXXV Abril-Junho, 1961 Nº 82

S U M A R I O Págs.

Editor ia l 3

Estudos e debates:

ABREU, Ja ime — Anacronismo educacional da classe dominante brasi le i ra 6

FREIRE, Paulo — Escola p r imár i a p a r a o Brasi l 15

Góis, Paulo de — A investigação cientifica: dever social da Universidade 34

LOURENÇO PILHO, M. B. — A educação e os estudos pedagógicos no Brasi l 52

Documentação:

X X I I I Conferência In ternacional de Ins t rução Pública 67

Discurso do Prof. Fe rnando de Azevedo assumindo a Sec. de Educação

da Prefe i tura de S. Pau lo 83

Uma aula de ciências na tu ra i s — Abgar Renaul t 90

F inanc iamento do ensino pr imário — Carlos Correia Mascaro e comen­

tár ios de J a ime Abreu 95

Universidade do Traba lho 107

INFORMAÇÃO DO PAÍS 112

INFORMAÇÃO DO ESTRANGEIRO 137

LIVROS: AZEVEDO, Fe rnando de — A educação na encruzilhada; FROTA-

PESSOA, O. — Biologia na escola secundária; H A N S Nicholas — Edu­

cação Comparada; 142

REVISTAS: ABREU, Ja ime — Os estudos sociais na escola média; G I N S ,

Ota, e JAM, Ki rga t — A escola em Israel ; LOURENÇO FILHO, M. B. —

A propósito do centenár io de J o h n Dewey 151

JORNAIS: CARVALHO, Antônio Pinto de — Democracia e educação; Cou-

TINHO, Afrânio — Educação p a r a todos; FERNANDES, F lores tan — O

t raba lhador e o projeto de Diretrizes e Bases; FLEURY, Rena to Sê-

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neca — Livro didático; PINTO, Estêvão — A colonização por tuguesa na África; TEIXEIRA, Anísio — União intelectual das t rês Américas 165

ATOS OFICIAIS: Decreto nº 49.575, de 22 de dezembro de 1960 — Cria a Escola Nacional de Cinema; Decreto n° 49.913, de 12 de janeiro de 1961 — Cria, junto ao Serviço de Radiodifusão Educativa, do M.E.C, a Orquestra Sinfônica Nacional (O.S.N.); Decreto nº 50.066, de 25 de janei ro de 1961 — Dispõe sobre a agregação de estabelecimentos de ensino superior não federais a universidades federais; Decreto nº 50.241, de 28 de janeiro de 1961 — Modifica o Decreto número 46.376, de 7/7/59, que dispõe sabre educação de base no Nordeste pela radiodifusão, e dá outras 'providências; Decreto nº 50.250, de 28 de janeiro de 1961 — Autoriza o Departamento Nacional de Educação do M.E.C, a instalar, em Brasília, estação de radiodi­fusão com finalidades educativas; Decreto nº 50.293, de 23 de fevereiro de 1961 — Cria o Conselho Nacional de Cultura e dá outras providências; Decreto nº 50.423, de 8 de abril de 1961 — Dispõe sobre ensino primário gratuito para os servidores de empresas

industriais, comerciais e agrícolas; Decreto nº 50.338, de

14 de março de 1961 — Dispõe sobre anuidades escolares; Decreto n° 50.362, de 20 de março de 1961 — Altera disposição do Decreto nº 34330, de 21/10/1953, que se refere ao regime de equivalência entre os diversos cursos de grau médio; Decreto nº 50.366, de 20 de março de 1961 — Cria a Comissão de Filosofia e Ciências no Conselho Na­cional de Cultura; Decreto nº 50.368, de 21 de março de 1961 — Dispõe sobre o atendimento de educação gratuita a filho menor de ex-combatente, e aos órfãos carentes de recursos; Decre to nº 50.370, de 21 de março de 1961 — Dispõe sobre um programa de educação de base e adota medidas necessárias a sua execução através de Escolas Radiofônicas nas áreas subdesenvolvidas do Norte, do Nordeste e do Centro-O este do país a ser empreendida pela Conferência Nacional dos Bispos do Brasil; Po r t a r i a nº 49, de 8 de fevereiro de 1961 — Institui comissão para elaborar ante­projeto reorganizando o Ministério da Educação e Cultura 184

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Editorial

CUSTO MÍNIMO DA EDUCAÇÃO PRIMÁRIA POR ALUNO

Ainda não se deu ao dispositivo constitucional, que manda reservar um mínimo de 10% da renda dos impostos federais e de 20% dos impostos estaduais e municipais para as despesas com o ensino, a aplicação mais adequada e sábia.

É necessário relacionar esse mandamento constitucional com o outro que determina a educação compulsória de todos os bra­sileiros em idade escolar primária, para se estabelecer que os três governos da Federação — o federal, o estadual e o municipal — devem dar prioridade a essa despesa compulsória com o ensino primário, e somente depois de atendido este é que podem realizar outras despesas com educação.

Firmada que fosse tal interpretação, que me parece a mais legítima, haveria de se estudar o custo mínimo da educação pri­mária por aluno, de acordo com Estado e zona e, juntando-se os recursos municipais, os do Estado e os da União, elaborar o orçamento mínimo da educação primária obrigatória.

esse custo mínimo da educação primária, por aluno, seria levantado com os índices locais, como se procede com relação ao custo mínimo da alimentação nas diferentes zonas do Estado. Efetuado o levantamento, as escolas poderiam ser mantidas por um órgão comum local, que recebesse das três órbitas de poder da Federação os recursos necessários, ou pelos três poderes inde­pendentemente. O indispensável seria que as escolas fossem de nível idêntico e pudessem melhorar e progredir em igualdade de condições. Para isso, tornar-se-ia necessário o respeito às condi­ções locais de salários e de custos, ou seja, que a escola municipal, estadual ou federal tivesse seu orçamento controlado por aquele custo mínimo e adequado da educação, por aluno, a ser gradual­mente elevado, desde que as condições financeiras o permitam, com base nas rendas do Município, do Estado e da União, de onde se devem retirar as parcelas de 10 e 20% para o custeio da educação. Subindo essas rendas, subiria aquele soalho de custo mínimo adequado.

É evidente que a sugestão envolve uma coordenação de esforços pelos governos do Município, do Estado e da União. Há

quem julgue tal coordenação impossível, por se tratar de governos autônomos. Restaria tentá-la por meio de convênios. E

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se falhasse a idéia de convênio, penso que ainda seria possível a coordenação, mantidos aqueles governos separados e indepen­dentes quanto aos respectivos sistemas escolares.

Para tal bastaria que a Lei de Diretrizes e Bases., inter­pretando a Constituição, firmasse: primeiro, que as percenta­gens previstas de 10 e 20 das rendas tributárias da União, dos Estados e Municípios, devessem ser aplicadas, prioritariamente, na educação primária obrigatória de todos os alunos em idade escolar primária, respectivamente, no País, no Estado e no Muni­cípio; segundo, que o custo mínimo dessa educação por aluno fosse adotado pelo Ministério da Educação, pelos mesmos métodos com que se fixa o salário-mínimo ou, conforme se pensa agora, o salário-móvel; e terceiro, que a obrigação de ministrar a edu­cação primária competisse sucessivamente ao Município, depois ao Estado e finalmente à União, cada um suprindo a deficiência da órbita anterior.

Pode-se, diante do exposto, ter uma idéia de como o dispo­sitivo funcionaria: o Governo federal fixaria o custo mínimo da educação primária pelas regiões; cada Município, em face de sua renda tributária, verificaria quantas crianças poderia educar; fundado nesse fato, cada Estado calcularia o número de crianças que lhe caberia educar, dentro daquele custo mínimo adequado, a fim de constatar se os 20% de sua renda tributária seriam suficientes; caso contrário, a União, nos termos da Constituição, viria em socorro, concedendo auxílio para o número de crianças que faltasse. No caso de o orçamento do Estado ser suficiente, o auxílio da União a êle far-se-ia nos demais níveis de ensino, médio e superior.

Antes pois de se cogitar de novos recursos, parece-me que se deve planejar aplicação mais adequada dos prescritos pela Constituição. A disposição constitucional de percentagens en­volve, a meu ver, a idéia de um plano conjunto de esforços das três órbitas de Governo da Federação. esse plano deve ser feito em torno do preço da educação por aluno, critério pelo qual se pode facilmente julgar a contribuição de cada Governo. Os re­cursos, sendo fixados em percentagens, crescem de ano para ano e aí já estarão assegurados novos meios. Outros recursos, que se façam necessários, devem provir do aumento de percentagem.

A Constituição do Estado da Guanabara, num exemplo admi­rável, acaba de fixar o seu mínimo em 22% e ainda mais 2,5% para o ensino superior, elevando, deste modo, o mínimo a 24,5%. Eis onde estão os novos recursos. É isto que verdadeiramente conta, pois são recursos permanentes e em crescente desenvolvi­mento e não recursos obtidos acidental e extraordinariamente.

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Se, a despeito de esforço assim conjugado, ainda não fosse possível educar todos os brasileiros em idade escolar, teríamos então de estabelecer a prioridade das zonas urbanizadas do país e levar, gradualmente, a educação às zonas de dispersão demo­gráfica. Estou convencido de que, com a escola de custo local, poderíamos ampliar consideravelmente nosso sistema escolar, e com prioridade das despesas do ensino primário sobre as do ensino médio e superior, poderíamos levar aquele, ou seja, o primário, a todos os brasileiros residentes em comunidades em que fosse possível a escola fixa. Para os demais só a escola ou o professor itinerante.

ANÍSIO TEIXEIRA Diretor do INEP

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Estudos e debates

ANACRONISMO EDUCACIONAL DA CLASSE DOMINANTE BRASILEIRA

JAIME ABREU Do C . B . P . E .

O recente e movimentado debate processado no país em torno à tramitação legislativa da Lei de Diretrizes e Bases da Educação constituiu como que um grande fórum educacional, onde uma tomada de consciência, em escala nacional, dos gran­des valores subjacentes a nossa educação institucionalizada se processou, com expressiva clareza e positiva autenticidade.

Foi particularmente grave a evidência da extrema defasa-gem revelada entre a ideologia educacional defendida pela classe dominante do país e aquela outra que corresponderia ao nosso processo em curso de evolução social, ficando flagrante o ana­cronismo dessa ideologia de nossa ruling class em relação à de uma educação congruente com o nosso regime político democrá-tico-republicano.

Considerando-se as posições defendidas pelo conservadoris­mo brasileiro, vitorioso no concernente à Lei de Diretrizes e Bases da Educação aprovada pela Câmara Federal, ver-se-á correspon­derem elas a posições características da era colonial, refletindo preconceitos de classe e interesses religiosos que lhes dão cober­tura, integrantes do estatuto de uma sociedade colonial fundada à base de estamentações aristocráticas ao invés de o ser à base de democrática integração social.

A concepção colonial de escolas — instrumento de proseli­tismo confessional para perpetuação da estrutura econômico-so­cial vigente — obstou o prevalecimento da ideologia republica-no-democrática, bem como o predomínio da posição de educadores democratas, desejosds de alargar progressivamente as bases da escola pública, integradora da república e da nacionalidade, e de lhe atribuir novas e maiores funções sociais e culturais, como fruto da democracia industrial emergente no Brasil contempo­râneo.

não se pôde assinalar, na ideologia educacional da classe do­minante, estivesse ela minimamente afetada, em relação à aris­tocrática herança de residuais categorias coloniais que incorpora e perfilha, por novos pensamentos ou por novas experiências rela-

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cionadas com o aspecto social da escola numa sociedade que, lenta mas inexoravelmente, evolui do latifundiarismo agrário pa-triarcalista para uma democracia industrial.

Na concepção de escola da nossa classe dominante, as duas forças que, como na colônia, seguem em última instância mol­dando seu caráter, são a religião institucionalizada e a estrutura social de classes, estreitamente ligadas e interdependentes.

No Brasil do século XX processa-se, ainda, com indisfarçada evidência, a íntima associação entre grupo religioso e classe social dominante, associados estreitamente, mobilizando o gru­po social dominante para dar suporte ao trabalho educacional da Igreja, como benéfico à estratificação de seus previlégios.

O que políticos e educadores a serviço da ideologia educa­cional da classe dominante vêm de reputar necessário, possível e desejável como filosofia social de nossa educação esteve longe de se adequar à transição em processo de nossa economia e cul­tura da fase agrocomercial para uma economia e cultura do ciclo urbano-industrial.

A defasagem revelada entre a filosofia social defendida no campo da educação pela classe dominante e aquela intrínseca a movimentos culturais e políticos como ciência, democracia, na­cionalismo foi tão acentuada que, dada a conexão entre tais movimentos e a teoria da educação institucionalizada, só é lícito concluir-se pela tenuidade desses movimentos em relação a valo­res outros que seriam, não obstante aparências puramente for­mais, aqueles verdadeiramente vigentes na teoria de valores da classe dominante do país.

como sempre ocorre em situações semelhantes, houve incre-pação insinuada ou expressa de "comunismo" aos educadores republicano-democráticos, rotulados de "monopolistas educacio­nais totalitários", ardilosa ficção que nossa Constituição não permite e que a composição de nosso aparelho escolar nega fron­talmente, mas cuja solércia acusatória não difere daquela tão conhecida, por exemplo, nos Estados Unidos, manifestada por órgãos do tipo da imprensa Hearst ou promovida por organi­zações como a "National Association of Manufacturers", denun­ciando como "vermelhos", "marxistas", líderes educacionais de­mocráticos como os militantes em Social Frontier ou em Frontiers of Democracy.

Talvez valesse a pena lembrar, a propósito, que de incre-pação semelhante à assacada aos defensores da escola pública não escaparam, outróra, os defensores da abolição da escravatura no Brasi l . . . Também eles eram "comunistas", aos olhos dos pri­vilegiados . . .

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não estiveram, outrossim, ausentes manifestações no mais puro estilo "macartista", ao reivindicarem, sectária, inconstitu­cional e totalitàriamente, "purgações" por discriminações ideoló­gicas, pretendendo condicionar a possibilidade de exercício da função pública a submissões professadas a determinadas crenças religiosas particulares, numa histeria confessional incomportável pelo nosso estado democrático-secular e pelo nosso regime de separação entre a Igreja e o Estado.

como o demonstraram exaustivamente documentos vários, entre eles o comunicado de dirigentes sindicais, lançado em São Paulo ao ensejo da realização da " l . a Convenção Operária em Defesa da Escola Pública", todo o espírito da lei aprovada pela Câmara desatende às necessidades básicas da educação popular, "ameaça, direta e indiretamente, a existência e desenvolvimento do sistema público de ensino, única garantia existente de melho­ria da educação popular e de democratização do ensino no Brasil", converte a direção da educação nacional em "instrumento de interesses patronais e particularistas", "favorece os interesses mercantis do ensino particular e as camadas privilegiadas da população brasileira".1

Na manutenção em pé de igualdade ou, para sermos mais exatos, na preeminência em que se pôs a educação privada em relação à pública, legislando inclusive no sentido de os interesses privados disporem dos rumos da educação pública, está definindo o anacronismo típico da Lei de Diretrizes e Bases da Educação, aprovada pela Câmara.

Isto porque não há como legitimamente conceituar a escola pública como mera extensão da escola privada ou como a escola privada dos pobres, pela boa razão de que ambas expressam básicas antinomias de origem, de inspiração e de propósitos.2

A escola privada (particularmente a confessional), com suas intrínsecas discriminações, é representação característica de pe­ríodos que antecederam aos da organização democrática e secular das sociedades políticas e civis, passando a existir independentes de Igrejas ou do domínio de castas privilegiadas.

Desde que foi organizada a sociedade política e civil em moldes democráticos e seculares, passou a escola pública, "a maior invenção humana" do dizer de Horace Mann, a ser o instrumento essencial à formação de uma moralidade leiga, co-

1 O Estado de São Paulo, de 1/2/61. 2 A propósito dessa concepção de escola pública como a escola privada

dos pobres, lembre-se aquela manifestação do Bispo de Londres, descre­vendo a escola pública como destinada "a criar os filhos dos pobres dentro dos princípios da Igreja Estabelecida, fazendo-os contentar-se com a situa­ção de vida na qual aprouvera a Deus colocá-los".

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mum a uma sociedade leiga e civil, independente de respeitadas crenças privadas de seus cidadãos, unida por um corpo de con­vicções comuns onde estavam a tolerância e o respeito às cren­ças privadas, ao lado do fundamento secular da moral humana.

O funcionamento de escolas particulares no estado demo­crático moderno passou assim a constituir toda uma outra e diferente esfera de interesses que o Estado aceita, no jogo democrático de seu pluralismo institucional, mas que seria para­doxal e contraditório promover, estipendiar, estimular de sua conta, em detrimento da existência ou da expansão de suas mes­mas agências educacionais.

Na preeminência concedida à escola privada em relação à pública, corporificou-se, assim, o anacronismo de se descurar de que é à escola pública que incumbe o dever básico de ser instru­mento natural de realização de uma ética e de uma moralidade leigas e seculares, ante as quais é o cidadão responsável em direi­tos e deveres e cujo âmbito de muito ultrapassa o daquelas ba­seadas no particularismo de crenças religiosas pessoais.

É dever fundamental da escola pública no estado democrá­tico consolidar a existência da república e de uma integrada consciência da nação.

Nem por outro fato é hoje pacífico ser ela, no estado de­mocrático moderno, o cadinho de formação comum da naciona­lidade, como promotora de justiça social pela indiscriminada igualdade de oportunidades concedida aos cidadãos, dever este que lhe é próprio, intrínseco, peculiar e insuscetível de transfe­rência à escola privada, na medida em que é ao poder público que cabe precipuamente zelar pelo interesse coletivo, e a agências privadas outras o cultivo de interesses particulares.

Na linha do anacronismo privatista em que se buscou mol­dar a educação no país, chegou-se à perfeição de legislar atri­buindo à família escolher, "com prioridade absoluta" (sic) o gênero (?) de educação dos filhos, enormidade sem precedente histórico na sociedade civil e politicamente organizada, cujo enten­dimento latu sensu deveria conduzir ao estado anarquista.

não se deu conta a extravagante teoria de que a educação comum, geral, genérica, do cidadão, não pode ficar fora daquela que corresponde a uma dada cultura, a uma teoria aceita por consenso da sociedade civil e política e do Estado, só sendo com­preensível a liberdade de opção por um determinado ramo ou tipo de educação, no que tange à educação especial, entre seus vários ramos, ou a escolha de escolas particulares, naquilo em que o podem ser, como uma promoção pessoal da família.

Lembre-se, a propósito, que esse extravagante privatismo pretendeu apoiar-se numa primária confusão entre taxa e im­posto, admitindo coubesse ao cidadão o direito de receber do

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Estado, de volta, em forma de benefício, o imposto (sic) que paga ao Estado, como se não fora tranqüilo caber ao imposto o custeio de despesas de interesse coletivo e de resultados indi­retos para a sociedade.

Ao aludirmos ao anacronismo educacional da classe dominan­te brasileira, do qual a Lei de Diretrizes e Bases da Educação aprovada pela Câmara é fiel expressão, é fácil demonstrar que esse anacronismo remonta ao que define o espírito da sociedade colonial.

Valer-nos-emos, para prová-lo, daqueles aspectos que a ca­racterizam em matéria de educação, reportando-nos a sua iden­tificação em confronto com a educação norte-americana, feita seguramente por Curti Merle, em seu livro clássico The social idéas of american educators (Edição de 1959).

Começando por caracterizar o jogo das forças sociais domi­nantes da educação americana na era colonial, Curti Merle assi­nala: "não existindo embora um expresso entendimento entre a religião e a classe economicamente dominante, cada uma delas retirava força da outra".

E quanto ao que correspondia ao investimento em educação da classe economicamente privilegiada, feito através da escola privada confessional, Henry Barnard 3 assim o definia: "o es­praiar da verdade religiosa é, no melhor sentido do termo, um bom investimento".

Aplicando-se esse esquema de referência ao caso brasileiro atual, numa análise de conteúdo dos pronunciamentos recém-ocor-ridos no Brasil sobre a Lei de Diretrizes e Bases da Educação, sem maior esforço se verifica, claramente, que religião e classe econômica dominante mutuamente se apoiaram, numa perfeita sinergia de defesa de interesses materiais e espirituais.4

Outrossim, qualquer sumário conhecimento das manifesta­ções de "munificência" da classe dominante brasileira, no campo da educação, evidencia pacificamente a aplicabilidade, ao nosso caso atual, daquela situação de "bom investimento" que alude Henry Barnard, no caso colonial americano.

Essa "munificência" realiza-se por todas as formas de auxí­lio à manutenção de escolas particulares, fechadas ao ingresso de não integrantes da classe privilegiada, escolas daquelas onde uma vaga é reservada já antes do nascimento do futuro aluno, ou, mais raramente, para ajudar escolas de tipo assistencial-cari-

3 American Journal of Education, Jan. 1956. 4 Trata-se de situação tipicamente correspondente àquelas que escan­

dalizaram o Papa Pio XI, conduzindo à perda, pela Igreja, no século XIX, do proletariado.

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tativo, em que o filho do povo é endoutrinado no mais incon-trastável, no mais acrítico acatamento à estrutura social vigente e na mais respeitosa devoção à "caridade" com que o aquinhoaram " f ilantròpicamente ".

não há possibilidade de misturar nelas a clientela de um e de outro tipo, sendo uma preparada para mandar e a outra adestrada para servir, nesse rendoso "bom investimento, no melhor sentido da expressão".

Outro aspecto identificado por Curti Merle como próprio ao espírito colonial na educação, é aquele que chocava aos con­temporâneos do Presidente Monroe ao se investir na Casa Branca em 1817, isto é, a insuficiência de penetração dos valores cívicos no mundo da escola, em que pese no caso, enfatizados por uma revolução, se cotejada essa penetração com aquela de valores advindos do controle eclesiástico das escolas.

não se poderá dizer diferente em relação ao caso brasileiro atual, onde tão descurada e apagada consciência da cidadania civil se assinala em nosso mundo escolar, podendo-se dizer na-ti-morta aquela noção de república e de cidadania, iniciada nos primórdios da República.

Outra situação colonial típica, define-a Curti Merle, na "prá­tica de conceder subsídios públicos a instituições educacionais mais ou menos controladas por grupos religiosos".

Note-se, a esse respeito, a perfeita noção hoje revelada por políticos dos Estados Unidos quanto à distinção entre o público e o privado, quando nesse país de dominante profunda convicção religiosa, John Kennedy, seu primeiro presidente católico, em mensagem ao Congresso propondo maciço investimento da União para expansão, pelos Estados, da escola pública, afirma "que as escolas de religiosos e de particulares deveriam estar excluídas da ajuda governamental".

"De acordo com a proibição expressa da Constituição, não se devem destinar fundos do Estado à construção de escolas elementares ou secundárias das Igrejas nem ao pagamento dos professores que ensinam nessas escolas". Kennedy, católico, repete assim agora a posição recente do protestante Roosevelt no assunto, de acordo com a mais firme tradição americana.

Cotejando essa situação com a existente no Brasil atual, vemos que essa posição, que é, assinale-se, de Kennedy e não de Kruschev, representa o fulcro de toda luta travada entre o pro­grama democrático e o aristocrático na educação brasileira, com essa singela quão incruenta defesa do dinheiro público para a escola pública, constituindo a batalha central de nossa educa­ção, como se ainda vivêramos o pleno tempo da colônia...

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É índice também de pervasivo espírito colonial na educação, demonstra-o Curti Merle, sua subordinação à reverência acrítica a instituições existentes e à estrutura econômica vigente na socie­dade, ungidas de intocável sacralidade pelo endosso que lhes dão valores religiosos, tudo posto em termos da perpetuação acrítica do status quo.

A quem conheça a filosofia "perenialista" predominante em nossa praxis escolar, da qual a Lei de Diretrizes e Bases da Educação é expressão quinta-essenciada, não pode parecer falsa a afirmativa de vigência desse espírito colonial em nossa edu­cação.

Na obra que vimos citando, Curti Merle expõe os concomi­tantes pedagógicos de uma educação estruturada em conformi­dade com o modelo colonial.

Tem ela, como legítima herança "colonial", toda uma peda­gogia que enfatiza o dogmatismo, o autoritarismo, a memorização, visando a impor a "boa ordem", mecanizando a instrução por via da endoutrinação apassivadora.

É-lhe também nota característica a superior hierarquia con­cedida em sua escala de valores aos aspectos lítero-jurídicos na educação, mediante o domínio dos quais se qualificam socialmente os beneficiários da dolce vita.

Trata-se de resíduo histórico da preeminência das Latin ou Grammar Schools, instituições aristocráticas da educação colo­nial, "escolas concebidas, mantidas e perpetuadas por alguns"5; escolas que jamais foram populares, que tinham o destino de pre­parar jovens de boa sociedade para a Igreja ou para as tarefas de mando na Colônia.

como a independência cultural mais sucede do que precede a independência econômica, é também marca do espírito colo­nial a subordinação da educação, da ciência, da tecnologia, a modelos e inspirações alienígenas, distantes de representarem qualquer afirmação de autonomia cultural nacional.

É ainda posição própria ao aristocrático privatismo colonial entender a educação como tarefa básica não do Estado, mas da Igreja ou de empresas privadas, não obstante essa tarefa fundamental do Estado democrático moderno ter conquistado doutrinadores do laissez-faire do porte de um Adam Smith, que via na escola pública o instrumento necessário à consolidação do regime republicano.

Atitude de inspiração colonial é reputada aquela que con­sidera "atentado" à liberdade, dos que preferem a educação par­ticular para seus filhos, a compulsoriedade de destinação exclu-

5 Jernegan, W. — Laboring and Dependent Classes in Colonial Ame­rica.

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siva do dinheiro público para a escola pública, chegando a reação a esse princípio, na América colonial, a ameaçar e se manifestar pelas baionetas.. .

Da essência do espírito colonial é, também, a vigência de sistema de classe no aparelho escolar, com nítida separação entre as escolas destinadas ao povo e aquelas outras existentes para Í». freqüência dos privilegiados.

Raciocinando-se sobre o caso brasileiro, reflita-se que não é por acaso que toda a expansão da escola média brasileira se faz à custa de escolas multipartidas ao invés de escolas multila­terais, com clientelas socialmente distintas, não vingando até hoje, não obstante nosso já ponderável processo de urbanização e de industrialização, escolas médias do tipo das comprehensive School americanas, onde se busca superar esse discriminatório sistema de segregação em castas educacionais.

John Dewey escreveu, vale lembrar, algumas lúcidas páginas a respeito dos perigos que representa para a dinâmica democrá­tica a vigência desse sistema de classe no aparelho escolar.

Essa divisão segregacionista na rede escolar corresponde, afirma êle, a um claro propósito de reconhecer a estratificação de classes e adaptar a máquina administrativa, o curso de estu­dos e os métodos de instrução a perpetuarem essa estratificação.

Assim pensando, Dewey sempre se opôs a que interesses industriais e comerciais dominassem e controlassem escolas pro­fissionais e as erigissem num sistema separado da escola pública comum (como entre nós ocorre), pela evidência de propósito da classe patronal de explorar em seu benefício a educação técni-co-industrial.

Nessa exploração há uma quase inevitável condenação de alunos a um permanentemente inferior status social e econômico, limitando seja a mobilidade econômica e social, como a larga e variada distribuição de oportunidades ou o pleno desenvolvimento das capacidades independente do status social, características essenciais à sociedade democrática que Dewey sente positivamente ameaçadas pela segregação de alunos pobres em fechadas escolas vocacionais.

Voltando ainda às características definidoras da educação de molde colonial, encontramo-la sempre proposta a moldar o aluno nos padrões das atitudes socialmente prevalecentes, ao invés de fazer dele um agente consciente de criticismo e de re­construção da vida social, não lhe conferindo capacidade de autodireção, liderança e julgamento independente.

Tampouco é de seus propósitos a aplicação da ciência a pro­blemas sociais, para alcançar uma democrática promoção de bem-estar humano, o que representa, conforme Dewey, sobrevi-

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vencia típica de cultura aristocrática, em sua sobrestima do chamado conhecimento puro em relação ao conhecimento apli­cado.

A quem quer familiarizado com a educação brasileira é fácil nela identificar o que caracteriza basicamente o molde colonial em educação.

Da filosofia à pedagogia, do regime de classes no apa­relho escolar à sobrevaloração beletrista, do privatismo educa­cional à alienação cultural, todos esses e outros resíduos de uma ideologia educacional própria à colônia, permeiam o anacronismo educacional brasileiro e tiveram sua hipertrofiada, requintada expressão na Lei de Diretrizes e Bases da Educação aprovada pela Câmara de Deputados.

não obstante, e o fato é animador, essa aprovação já não se fêz sem vigoroso protesto do Brasil novo, do Brasil que se urbaniza, industrializa, politiza democraticamente, no qual de­mocracia, ciência, tecnologia, secularização da cultura são valo­res reais que já contam para a sua sociedade nova, civil e demo­crática.

Veja-se que não foi por simples coincidência que São Paulo foi quem veio liderando a luta em prol de nossa democratização educacional, exatamente onde já há uma classe média e um pro­letariado mais esclarecidos, insuscetíveis de ser conduzidos como dócil massa de manobra dos usufrutuários dos privilégios.

No vigor e na capacidade de luta desse grupo que repre­senta o Brasil novo é que se pode confiar para a superação de nosso colonial anacronismo educacional, com o adotar e pôr em prática uma filosofia educacional tal como a queria Dewey, mais volvida para a defesa de interesses humanos do que para a per­petuação de privilégios de poucos.

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ESCOLA PRIMÁRIA PARA O BRASIL

PAULO FREIRE Da Universidade do Recife

A) — As sociedades que atingem ou ensaiam atingir a sua etapa autodeterminação, e, "sujeito de seus próprios pensamen­tos",1 se fazem criadoras, começam a repelir soluções ou receitas alienadamente transplantadas. São sociedades que, ao contrário das alienadas, ganham ar de esperança e de confiança em si mesmas. Seu futuro se reveste de significação especial, porque vinculado a um presente trabalhado em termos tanto quanto possível autênticos. O equacionamento e a solução dos proble­mas do presente — vistos como algo que se processa aqui e agora e para que o remédio tem de ser daqui e dagora, ou reduzidos ao aqui e ao agora — "identifica" o tempo, mesmo que seja tridimensional. As sociedades alienadas se desesperançam pre­cisamente porque, alienadas também suas elites, distanciadas da cultura popular, aplicam soluções a problemas que são seus com instrumental estranho. Partindo da visão deformada de sua realidade, só lhe podem oferecer diagnóstico falso. É da ina-dequacidade do instrumental que resulta o fracasso da solução. As sociedades alienadas, porém, não o entendem e atribuem o fracasso, que ê seu, de suas elites superpostas, ao povo, "para quem, dizem, não há jeito". Daí a sua desesperança, a que juntam um certo desprezo por tudo que é de seu próprio povo. Desprezo que mais tarde, na fase inicial da desalienação, se transforma em medo ou quase horror a tudo que é popular ou receba esse adjetivo. Nestas circunstâncias é que se "desinte­gra" ou se "desunifica" o tempo. O futuro desmente numa mesma geração o presente, de onde partiu. São sociedades cujas gerações maduras, de modo geral, oscilam entre a desesperança total, desajustadas e tristes, e a "acomodação", passiva, aos seus padrões.

Conferência proferida no Simpósio "Educação p a r a o Brasi l" , organi­zado pelo Centro Regional de Pesquisas Educacionais do Recife, em 1960.

1 VIEIRA PINTO, Álvaro — Ideologia e Desenvolvimento Nacional — Rio de Janei ro , ISEB, 1956.

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Nas sociedades que se desalienam, pelo contrário, a tendên­cia é para a substituição da desesperança, dos "idealismos utó­picos", pela esperança, pelo otimismo sadio e realista. Uma sociedade que se desaliena é otimista porque, começando a conhe­cer-se a si mesma nas suas limitações e nas suas possibilidades, é capaz de saber o que pode e o que deve fazer. Seu otimismo é crítico, porque integrado em suas verdadeiras condições. É atuante. Dinâmico. Repele posições quietistas, características das sociedades alienadas. E é exatamente esse antiquietismo que leva essas sociedades — as que entram em processo de desa-lienação — a outra substituição. A da "acomodação" aos pa­drões da sociedade por integração nesses padrões.

A "acomodação", ao contrário da "integração", é uma forma de comportamento preponderantemente emocional. A dose de razão, de criticidade, nessa forma de comportamento, é diminuta. Por isso é que o homem "acomodado" é muito mais um homem "imerso" no seu tempo e no seu espaço. Daí que se prejudique em parte sua historicidade e as sociedades fortemente alienadas, a rigor, tenham mais Geografia que História. É que a histo­ricidade do homem é dado da razão. Daí se fazer histórico o homem que, em vez de "imerso" no tempo, se "insere" no tempo. No inserir-se, ganha decisão, que conforma a própria inserção, resultante da razão. Só aí, então, é que realmente o homem se integra. Na "integração" há uma nota preponderantemente racional. Agora é que será possível falar de uma perspectiva histórica. De um tempo que, apesar de tridimensional, se ofe­rece "unificado". Um passado participando de um presente em que se constrói o futuro.

não pode haver desesperança quando se identifica com as condições de seu contorno. Quando, reconhecendo criticamente suas limitações, responde adequadamente aos desafios que lhe emite esse mesmo contorno. Nestas circunstâncias, que não dão margem a nenhuma posição "vitalista", deve-se desenvolver um alto senso de responsabilidade diante de possíveis distorções a que podem chegar estas sociedades. esse senso de responsabi­lidade, instalado nas elites não alienadas e alongando-se às maio­rias através do trabalho educador dessas minorias esperançosas, resulta da posição "orgânica"2 das elites. De sua identificação com os problemas de sua sociedade. Por isso é que só as socie­dades desalienadas ou em processo de desalienação se sentem problematizadas. Só há problematização quando se tem cons­ciência crítica de situações dramáticas em que se ganha o ânimo

2 A respeito de posição orgânica, FREIRE, Paulo — Educação e atualidade

brasileira — Recife, 1959.

R E V I S T A BRASILEIRA D E ESTUDOS PEDAGÓGICOS

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de superar a situação dramática em que se está.3 Daí o otimismo e a esperança destas sociedades, contra a desesperança das outras, cujas elites dirigentes, superpostas ao seu mundo e justapos­tas às maiorias, não dialogam. E sem diálogo, forma autêntica de "comunicação", não há criticidade, fundamento da "integra­ção". É na "comunicação" que se exercita a própria criticidade.4

A comunicação que não venha da razão e não provoque razão é mero comunicado, imposto ou doado. É domesticação. Por isso é que a comunicação só é verdadeira quando há interação dos pólos que se "simpatizam" através do objeto da comunicação. Aí existe racionalidade e o homem não se domestica. Na com­pulsão — ditado — ou na simples doação, inexiste a interação. Um dos pólos se apropria do objeto da comunicação e, negando possibilidade ao outro para seu "tratamento", deixa-o passivo e "acomodado". Domesticado. No "ditado" ou na doação se estimula a irracionalidade. A acomodação. No diálogo, a na­cionalidade com que o homem se humaniza.

B) O Brasil é uma sociedade que transita de formas aliena­das para formas não alienadas. Autênticas, de vida. Sociedade preponderantemente "fechada",5 "tribal", entrou no trânsito com a "rachadura" que sofreu há algum tempo e que tende a am­pliar-se, fazendo-se hoje não propriamente ainda uma sociedade dominantemente "aberta", mas "aprendiz" desta forma. Daí podemos dizer que vive hoje o país o processo da aprendizagem dessa abertura. Aprendizado que se faz difícil precisamente por causa das forças contraditórias que interferem nele.6 Na verdade, toda sociedade em trânsito de formas marcadamente "fechadas", "tribais", antidialogais, sem povo, para formas em processo de abertura e de dialogação, com emersão popular, ofe­rece ameaça às "elites diretoras", que, seguras no estágio ante­rior, de "fechamento", justapostas às maiorias, se sentem agora forçadas a mudar de posição, sob a pressão dessas maiorias. Da justaposição por isso mesmo sem diálogo, para a cooperação, por isso mesmo com diálogo. O grande problema dessas socie­dades, nesta fase, radica neste ponto — na inexperiência do diá­logo nas minorias como nas maiorias. E na necessidade vital

3 MARIAS, Ju l ian — Introducción a la Filosofia. 4 JASPERS, Kar l — Razão e anti-razão em nosso tempo (Trad. do alemão

por Vieira Pinto) , ISEB.

5 As Expressões "Sociedade fechada" e "Sociedade Tribal" , em posi­ção "abe r t a " são empregadas por Kar l Popper em sua A Sociedade demo­crática e seus inimigos, cuja edição original recebeu o t í tulo de The open Society and its enemies.

6 A propósito das contradições da a tual idade brasileira, FREIRE, Paulo — Op. cit.

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de vencerem essa inexperiência. No momento, porém, em que essa necessidade é reconhecida o processo de aprendizagem se inicia. não com pouca dificuldade, é claro. E isto porque essa aprendizagem implica a mudança de velhas e assentadas posi­ções das elites diretoras. De privilégios. De mando. Daí que a "rachadura" dessas sociedades, a partir de que elas entram no processo de "abertura", signifique naturalmente um desafio àque­las elites. Desafio a que elas respondem se arregimentando no que vimos chamando de "manchas de reação" à "rachadura" de sua sociedade. Lutam para deter o impacto da emersão popular, que, em todos os planos, as assusta. Criam interpretações. Fi­losofias. Doutrinas. Códigos. Sistemas educacionais. Insti­tuições assistenciais, até que são, finalmente, envolvidas pelo pro­cesso de mudança. Embebidas nele.

Vive o Brasil exatamente esse tempo. As nossas "manchas de reação" temem hoje toda ação de que possa decorrer arregi­mentação popular. Promoção popular. Aclaramento da cons­ciência popular. Amplitude do diálogo. Na verdade, porém, somente com um trabalho de que resulte tudo isso teremos um caminho para a salvação, não propriamente dos representantes de tais manchas, enquanto representantes delas, mas do homem brasileiro. Da nova sociedade brasileira, que se levantará em bases preponderantemente racionais — humanas — e por isso democráticas e não passionalmente desumanizadas, como se cons­tituirá se não se lhe abrirem perspectivas de humanização? O dilema, por isso, das sociedades em trânsito como a nossa, não é voltarem ao passado, para a satisfação das "manchas de reação" ou a distorção da verdade — a "desumanização". O dilema será, antes, mudar desumanizadamente, com menor dose de racionalidade, ou mudar humanizadamente, racionalmente.

Sem nenhuma preocupação demagógica, somos dos que acre­ditam que somente na intimidade das nossas elites diretoras com o povo poderão elas receber o selo de sua autenticidade e conse­guir a indispensável e inadiável promoção da consciência popular. não há elite diretora verdadeira sem que se identifique com as maiorias populares. Daí a sabedoria com que Simone Weill7

sugere a criação de universidade popular junto a áreas fabris, para o tratamento do que ela, em linguagem simpàticamente exis­tencial, chama de "desenraização" do homem. Daí também por que nos parece importante e urgente todo esforço nosso através de que diminuamos as distâncias entre os homens brasileiros. Os "movimentos de cultura popular", de que o Recife, sobretudo através do professor Germano Coelho, vem se preocupando viva-

7 Roices dei existir — Buenos Aires, Editorial Sud-Americana, 1954.

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mente, são de importância incalculável, no trânsito em que vive­mos. E sua aceitação ou repulsa é um teste à mentalidade ra­cionalmente progressiva da sociedade em formação ou reacio-nàriamente irracional da velha sociedade.8

C) O fator preponderanta da "rachadura" da sociedade brasileira que vem propiciando o trânsito referido — da socie­dade marcadamente fechada para a nova, em abertura — é o sur-to de industrialização em que estamos envolvidos, cujos ensaios preliminares e incipientes começaram no século passado, se in­tensificaram na década de 20 a 30 e ganharam as proporções atuais após a última guerra.

Somos hoje uma sociedade para a qual o desenvolvimento econômico, a industrialização é um imperativo existencial. Temos de pensar, preocupadamente até, com o que faremos com os mi­lhões de brasileiros que constituirão mão-de-obra daqui a 15 e 20 anos. Temos de pensar no que comerão esses brasileiros todos. Daí nos ser um imperativo existencial nossa integração econômica, sem a qual não teremos a integração nacional.

não há desenvolvimento econômico, porém, sem que incor­poremos ao processo do desenvolvimento, criticamente consciente, o povo.9 Precisamente porque, só muito dificilmente seria pos­sível o trânsito de uma sociedade de economia "parada", colonial, governada pelo mercado externo, para uma sociedade de econo­mia "dinâmica", sem sofrimento. E não só pelo sofrimento, mas pela própria necessidade que a integração econômica tem de uma nova mentalidade, que a aceite e a dinamize.

Daí apresentarem essas sociedades um desafio a suas "mino­rias criadoras", a seus cientistas sociais — a seus educadores: o da reforma de seu sistema educacional, de modo geral inade­quado a seus novos padrões, a seu novo "clima" em formação e atingido pela "demora cultural". Reforma através da qual se dê resposta ao duplo aspecto em que se apresenta o desafio. De um lado, a necessidade imperiosa de se formarem cientistas e técnicos de vários níveis e mão-de-obra qualificada. De outro, a não menos imperiosa necessidade de se formar no homem dis­posições mentais críticas com que não apenas adira ao desenvol­vimento, mas, sobretudo, com que se evite o perigo da sua "de-senraização".

8 A propósito das relações entre posições reacionárias e irracionalismos, LUKACS, Georg — El Asalto a Ia Razón — Fundo de Cul tura Econômica, 1959.

9 A respeito da necessidade de integração do povo no processo do desen­volvimento, VIEIRA PINTO, Álvaro — Op. cit.

MYRDAL, Gunnar — Soliclariedad o desintegración — Fundo de Cul tura Econômica — 1956.

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Se, em nosso caso, não respondermos com adequacidade ao primeiro ângulo do desafio, perderemos a batalha do desenvol­vimento. Se não o fizermos com relação ao segundo, perderemos a batalha da humanização do homem brasileiro.

O Brasil precisará, segundo cálculos de especialistas brasi­leiros eminentes, entre eles o professor Ernesto Luís de Oliveira Júnior,10 a quem a mentalidade tecnológica nacional em formação já deve muito, em 1965, de 60.000 engenheiros. De 1949 a 1953 diplomou apenas 6.354, entre civis e especializados. Enquanto isso, os Estados Unidos graduaram, em 1947, perto de 50.000. E a Rússia, "no ano passado graduou, em seus estabelecimentos de educação superior, mais de 330.000 jovens especialistas e, aproximadamente, 530.000 completaram a especialização secun­dária. Um total de 860.000 jovens especialistas foram treinados durante o ano, incluindo 106.000 engenheiros e 260.000 técnicos para a indústria de transporte e comunicações, 125.000 para a agricultura, cerca de 100.000 médicos, de 200.000 professores".11

Técnicos e cientistas a quem teremos de juntar outros tantos em administração. "Ora, diz Celso Furtado, a insuficiência administrativa talvez seja nosso mais grave problema, isso com respeito à execução de qualquer política. força é convir, con­tinua o economista brasileiro, que, entre nós, o Estado não está aparelhado, sequer, para solucionar problemas econômicos cor­rentes. Muitas das dificuldades que temos com entidades finan­ceiras internacionais, conclui, decorrem do fato de não estarmos preparados para resolver, em tempo devido, nossos problemas mais úteis".12

É em face, pois, desses ângulos apontados no desafio que nossa sociedade em trânsito nos faz, que teremos de pensar, em termos de organicidade, na revisão de nosso processo educativo. Revisão que há de apanhá-lo inteiro e não parcialmente. toda reforma de nossa escola há de ser total porque é todo o processo educativo brasileiro que está inadequado, "inorgânico", e por isso ininstrumental.

D) Fixemo-nos, porém, na escola primária, que é o nosso tema específico.

De uma primeira aproximação que dela tenhamos, resulta a constatação de sua insuficiência quantitativa e de sua dolorosa inadequacidade faseológica. Sua insuficiência quantitativa, com­provada pela triste estatística, esmagadora, mesmo, de dois mi-

10 Ensino técnico e desenvolvimento — Rio, ISEB, 1959. 11 Boletim da International Association of Universities. 12 A Operação Nordeste — Rio, ISEB.

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lhões 13 de meninos brasileiros, em idade escolar, se explica em grande parte pelo chamado "ciclo vicioso" das economias subde­senvolvidas. Somos subdesenvolvidos porque não temos educa­ção e saúde. não temos educação e saúde porque somos subde­senvolvidos. Somos subdesenvolvidos porque não temos indús­trias. não temos indústrias porque somos subdesenvolvidos.

O grande problema dessas economias, por isso mesmo, é arrebentar o "ciclo vicioso".

Por outro lado, junta-se a essa contingência bem forte de nosso subdesenvolvimento, o descanso com que sempre cuidou o país, desde Colônia, do problema da educação popular. Enquanto os Estados Unidos enfatizavam a educação de seu povo e funda­vam as suas convicções democráticas na common School, nós nos nutríamos de uma educação seletiva e verbosa, que insiste ainda hoje em preservar-se.

Em 1839, no Espírito Santo, para uma população de 43.000 pessoas havia apenas 7 escolas. O Recife, à mesma época, pos­suía 7 escolas primárias, um Liceu e 2 escolas de latim. "Cal­cula-se que a província do Ceará, diz Kider,14 de quem retiramos esses dados, tenha cento e oitenta mil habitantes. Em 1841, funcionavam dentro de suas fronteiras trinta e uma escolas com freqüência de oitocentos e trinta crianças e sete escolas de latim com quarenta e seis alunos. O número de soldados, con­clui o cronista com ironia, compreendido pelas diferentes seções da Guarda Nacional — a milícia do país — era de cerca de onze mil". O Rio de Janeiro não era melhor servido. Tinha vinte e oito escolas, com aproximadamente 1.000 alunos. Enquanto isso, em 1890, 50 anos depois, os Estados Unidos já tinham para cada milhão de habitantes, 600 engenheiros graduados. Em compensação, nessa época, na Bahia, tínhamos uma biblioteca de 10.000 volumes, dos quais, a maioria em francês.. .

A inadequacidade de nossa escola primária consiste na sua verbosidade, no exagero da memorização, na sonoridade da pala­vra, com que, fugindo à realidade em que se situa, se superpõe a ela. Daí por que, sem a "inserção" no seu contexto, que a faria autêntica, é uma escola que não infunde esperança. Con­siste na falta de diálogo de que resultam a inexistência de "comu­nicação" e a exacerbação do "comunicado". É uma escola que,

13 "Resposta do Ministério da Educação aos Inquéritos do Bureau Inter­nacional de Educação", in Revista Brasileira de Estudos Pedagógicos, vol. XXVII, nº 66, 1957, pag. 151.

14 KIDER, Daniel, Reminiscências de viagens e permanência no Brasil (Províncias do Norte) — São Paulo, Martins, 1951.

A esse respeito, fundamental a leitura de MOACYR, Primitivo — A ins­trução e as províncias — Brasiliana — 3 vols.

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em regra, vem "domesticando" o educando, precisamente quando, no trânsito que estamos vivendo, mais se precisa de capacidade crítica, somente com que será possível a integração com o ritmo acelerado de mudanças. Uma escola que dita, que impõe, que faz "doações" é uma escola inadequada com o clima cultural de uma sociedade que se desaliena e busca sua promoção de "objeto" a "sujeito". É inadequada com o surto de democratização, inti­mamente ligado ao do desenvolvimento, em que está inserido o país.

Para atender aos anseios da nova sociedade brasileira em formação, ela há de ser uma escola de trabalho, de diálogo, da participação, da "comunicação". Uma escola democrática. Li­vresca e superposta a sua realidade local, regional e nacional, ela perde aquele caráter que Mannheim15 refere de "Agente dos câm­bios sociais" e se transforma numa fábrica de desiludidos e frustrados.. .

esse seu alheamento — que se alonga em quase desprezo à realidade pelo nosso momento histórico, talvez explique, em parte, é verdade, uma outra dolorosa estatística nacional. A que nos dá, para dois milhões, aproximadamente, de operários brasileiros, apenas 400.000 qualificados,16 quando se sabe que é da escola primária "donde partem 70% da mão-de-obra dos paí­ses mais adiantados".17

Em conjunto com as condições de subdesenvolvimento que dificultam intensamente a permanência de meninos em uma escola, nas bases da nossa, pela necessidade que têm de ajudar os pais — ainda será a sua inadequacidade que explicará o seu já hoje alarmante desprestígio. Dos 2.244.342 alunos que se matricula­ram em 1949 nas primeiras séries das escolas brasileiras, apenas 838.045 tiveram promoção à segunda. "Em outras palavras, acrescenta o presidente da COSUPI, 1.406.297 alunos (62,9% dos matriculados) nada aproveitaram dos estudos.18

É interessante salientar nessa altura os estudos da comis­são de desenvolvimento em torno da situação educacional do país, encarregada de apresentar ao sr. Presidente da República suges­tões no campo educacional, adequadas às metas governamentais para o desenvolvimento. Em que pese à seriedade dos estudos

15 M A N N H E I M , Kar l — Diagnóstico de Nuestro Tiempo — México, Fundo de Cultura, 1946.

16 OLIVEIRA JÚNIOR, Ernes to Luís — Op. cit. e A escola e o meio estu­

dantil — Grupo de Es tudos da Escola Superior de Guerra .

17 SALGADO, Clovis — Reforma de Base — in Boletim da CAPES, n" 43, 1956.

18 OLIVEIRA JÚNIOR, Ernes to Luís — O ensino primário, in Boletim da CAPES, n° 42, 1946.

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feitos e à honestidade com que se trataram os problemas, não nos parecem suficientes os reparos propostos como medidas sa-neadoras, o "ordenamento" das matrículas nas escolas primá­rias e a maior flexibilidade do sistema de promoções de uma série para outra. A que juntou ainda a comissão acertadamente suges­tões em torno do melhor preparo do pessoal docente.19

não desconhecemos — nem seria possível — que a "desor­dem" das matrículas de nossa escola opera negativamente. É óbice dos mais fortes à aprendizagem e ao atendimento de um maior número de meninos em idade escolar. É verdade, por outro lado, igualmente, que uma escola excessiva e sonoramente verbal, quase sàdicamente "daspiana", deslocada por isso de seu papel integrador, se faz obstáculo à solução do problema grave dos deficits. Precisamente porque, reprovando em massa, não abre claros que seriam preenchidos por milhares de outras crian­ças que a procurassem cada ano. É bem significativa a estatís­tica, citada antes, do professor Oliveira Júnior, — de dois milhões em números redondos — de meninos matriculados em 1949 na 1a. série das escolas primárias brasileiras, somente 800.000 — em números redondos — se promoveram à segunda.. .

O que parece mais sério nisto tudo — e não está dito •— são outras tantas causas pesquisáveis, além — e talvez mais fortes — da "desordem" das matrículas e da "rigidez", nem sempre existente, no sistema de promoções. Causas que pode­rão explicar, inclusive, não só a "desordem" mas principalmente a própria "reprovação". Por isso é que não nos parece ser de solução meramente administrativa — escolar — apesar de toda a relevância moderna dessas soluções — o problema da "desor­dem" como o das "promoções".

Dadas essas soluções, parece-nos, teremos obtido ameniza-ções.

A questão tem seus grandes suportes na economia subde­senvolvida. De que decorrem — repitamos o que todos sabem — o desemprego, a inexistência de mercado de trabalho, a "inape-tência educativa", a necessidade existencial que têm as famílias proletárias e subproletárias nos centros urbanos — principal­mente do nordeste e do norte — bem como nos rurais,, de ter em seus meninos e meninas elementos "produtivos", numa econo­mia de "biscates". Meninos cedo antecipados em homens — "carregando fretes", "passando bicho", vendendo frutas, cuidando da casa . . . O doloroso, isto sim, é a inadequacidade total de nossa escola que insiste num verbalismo terrível e na doação de meia dúzia de "conhecimentos" a que falta instrumentalidade.

19 Análise do esforço Financeiro do Poder Público com a Educação —

MEC.

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Pense-se na incapacidade de um suporte desse para oferecer con­dições em que educandos situados nele pudessem obter um mínimo de equilíbrio emocional com que incorporassem uma sabedoria nocional, mais adequada a uma classe ociosa. A milhares de meninos que se situam em suporte assim, se dão leituras em que se fala de viagens à "fazenda do tio Mário, onde vamos pas­sar as férias", viajando de trem e de barco e em cujo percurso "mamãe e papai conversam, Ângela e Cármen lêem revistas infantis. E eu estou na janela gozando a viagem" 2 0 . . .

Ao fazermos essas considerações vem-nos à mente uma série de fatos observados e estudados por nós quando à frente da Divisão de Educação e Cultura do SESI de Pernambuco. A um deles nunca esquecemos. O de um menino apático e tristonho. Sempre sentado. Quase "demitido" de sua aula. De seus pro­blemas. Repetente. E que, estudado de perto, tinha no seu horário de escolar o repouso de sua vida de vendedor ambulante. "Comprei uma pitombeira outro dia", disse êle à assistente social que o entrevistava por solicitação da professora. E, ao espanto da assistente, "comprei a safra". Era um menino a quem a escola realmente nada oferecia, senão repouso de suas canseiras de homem antecipado...

Observe-se a incidência das matrículas nas primeiras sé­ries 21 da escola primária e seu declínio nas últimas, a partir da terceira, e veja-se como, ao lado da sua inadequacidade para deter seu aluno e de seu desprestígio, deve-se pensar nesse aspecto assinalado — o da necessidade que tem o menino de ajudar a família, que deve explicar, pelo menos em parte, a fuga à escola, que, verbalista, não pode fixá-lo.

20 não compreendemos mesmo, como até hoje, ainda não se tenha pensado — que saibamos, pelo menos — em oferecer a alunos do Nordeste brasileiro, nos seus livros de leitura, seleção do "Romanceiro popular", de valor não só estético, mas culturológico. Do Romanceiro popular, a algumas de cujas obras nos declarou o já consagrado dramaturgo brasileiro Ariano Suassuna, daria o seu nome, honradamente. Ao invés de leituras assim, acompanhadas de esclarecimento de uma riqueza imensa, e ao lado de outras da mesma forma autênticas, insiste-se quase sempre em histó­rias sem gosto e sem organicidade. Meninos e meninas de zona subproletá-rias e rurais, intensamente sofridas por suas precaríssimas condições eco­nômicas, a ler descrições de passeios a fazendas de tios Mários, de que talvez apenas o nome do "tio" lhes seja peculiar. Quando, na verdade. o que lhes devia ser familiar seria a "situação".

21 No ano de 1958 a divisão de Educação e Cultura do SESI de Per­nambuco matriculou, entre Capital e Interior, num total do 2.904 alunos, em suas escolas, 1.995 alunos na primeira série; 445 na segunda; na terceira 371; na quarta 80 e na quinta 3. Em 1959, num total de 3.115 alu-

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Em relatório deste semestre, professora de escola do interior de Pernambuco, com 33 alunos matriculados e 3 freqüentando, aponta os "trabalhos da lavoura" como fator fundamental, senão exclusivo, de sua estatística.

Essas considerações não invalidam, pelo contrário, dão ên­fase à necessidade imperiosa de a escola primária brasileira se multiplicar, orgànicamente, para diminuir, onde possível, a de-fasagem entre o número de meninos em idade escolar e o número de classes disponíveis. A que deve juntar não menor esforço, também conscientemente crítico, no sentido de se identificar com as condições de seu contorno, renunciando, assim, a um verba­lismo enraizado em nossas matrizes culturológicas. Verbalismo que vem sendo sustentado pela "demora cultural".

Urge afirmar — estamos convencidos — que nenhuma solu­ção em termos tradicionais22 — de verticalidade — deve ser indicada entre nós, para este ou outros problemas. Apesar de todas as contradições características do trânsito e apesar das próprias limitações analisadas, contidas no "ciclo vicioso", é incontestável que vivemos o nosso "grande despertar", para usar uma expressão de Myrdal.23 Assim, a própria solução do déficit escolar, ligada ao "ciclo vicioso", tem de encontrar seu cami­nho num amplo diálogo do Poder Público com o povo. O que na verdade constituirá postura orgânica do Poder Público, pois o clima cultural novo que vivemos é cada vez mais propício a

nos, 1918 na pr imeira série; 613 na segunda; na terce i ra 414; na qua r t a 167 e 3 na quinta .

Por sua vez, a Secretar ia de Educação e Cul tura do Es t ado matriculou, em 1958, janeiro, nas pr imeiras séries em todo o Estado, 40.990. Em junho, êase número subia a 42.319 para, em outubro, sofrer u m a queda e chegar a 37.449. A segunda série apresentou esse r i tmo: 24.454, 24.467 e 22.692 — janeiro — junho — outubro. Eis o r i tmo da terce i ra : 18.120, 17.984 e 17.185. A qua r t a : 9.808, 7.996 e 9.453. Agora, a qu in ta : 3.508, 2.901 e 4.933.

esses dados nos foram gent i lmente cedidos pela Divisão de Educação e Cul tura do SESI, e pela Diretor ia Técnica de Educação da Secretar ia de Educação e Cul tura do Es tado .

22 Fixemo-nos no déficit escolar do Recife que atinge, segundo in­forme da Divisão Estat ís t ica , aproximadamente oi tenta mil crianças. Segun­do est imativas recentes da Prefe i tu ra Municipal do Recife, ser ia necessária u m a inversão de 350 a 400 milhões de cruzeiros, apenas na construção de modestas salas de aula p a r a o a tendimento de 80.000 cr ianças . Pensa-se agora no que se t e r ia de paga r a dois mil professores de quem se pre­cisará p a r a os 80.000 meninos. A salários baixos de oito mil cruzeiros te r íamos Cr$ 16.000.000,00. Mas, e o corpo diretor? E o ma te r i a l ? E a manutenção?

23 MYRDAL, Gunnar — Teoria Econômica e Regiões Subdesenvolvidas,

ISEB, 1960.

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toda experiência dialoga], sem a qual dificultaremos nosso apren­dizado democrático. O Poder Público, no caso, iria ao encon­tro do povo, ajudando-o nas respostas que, desta ou daquela forma, êle vem dando ao desafio que lhe fazem os novos tempos no campo da educação. Há todo um esforço do povo espalhado em sociedades beneficentes, em clubes recreativos, em sindicatos, em associações religiosas, nos centros urbanos ou, em menor escala, nas comunidades rurais brasileiras, que poderia ser aglu­tinado e sistematizado pelo Poder Público. esforço privado a que aquele poder juntaria o seu, melhorando as condições mate­riais e técnicas desse trabalho popular.

Tentativa, como vem sendo experimentada hoje no Recife pelo Movimento de Cultura Popular e pela Prefeitura que, em poucos meses, já conseguiu, através da aglutinação de esforços, atender a 2.000 crianças, aproximadamente, em escolas popula­res, espalhadas pelas zonas proletárias do Recife.

O que se há de fazer no Brasil, sobretudo em áreas mais fortemente subdesenvolvidas, é aproveitar esse esforço do povo e ajudá-lo em suas respostas. Ao invés de continuarmos a "plan­tar" escolas ou unidades pedagógicas sem vinculações sistemáti­cas e estreitas entre si e com sua localidade, deveríamos tentar experiências de integração da escola em sua comunidade local.

Conhecidas as áreas e sub-áreas urbanas, rurbanas ou rurais — menos facilmente estas — de incidência maior de déficit escolar, cuja população apresentasse um mínimo de "apetência educativa", sem o que é infrutífero todo esforço nesta linha, agiria o Poder Público no sentido de alimentá-la, coordenando os esforços dispersos. Seria interessante, em trabalho deste, que o Poder Público criasse unidades pedagógicas ajustadas às con­dições do meio e cuja localização, devida e previamente estudada, lhes proporcionasse a tarefa de dentro de uma cadeia de outras agências populares que funcionariam como seus satélites. estes centros, relacionando-se sistematicamente com as demais agên­cias de sua área — as que mantivessem ou não escolas primárias — funcionariam como testemunho de um orgânico trabalho peda­gógico. não significa isso que o Poder Público se retraísse e, omitindo-se24 mais do que hoje neste capítulo fundamental da vida brasileira, empregasse menos recursos financeiros em educa­ção. Pelo contrário. É preciso que, mesmo com trabalho assim, em que se consciencialize o problema e se aproveite e estimule o empenho do povo, o Poder Público despenda mais do que nor-

24 sobre este aspecto — o da omissão do Poder Público — indispen­sável a leitura de "Análise do esforço Financeiro do Poder Público com a Educação". (1948-1956). Anexo ao relatório final da Comissão de Edu­cação e Cultura do Conselho do Desenvolvimento, MEC.

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malmente vem despendendo. O que pretendemos afirmar é algo já sabido demais — sozinho não resolverá o problema, ainda que dê toda a ênfase possível aos gastos em educação. É um problema nacional, por isso deve envolver o poder central, o estadual, o municipal e o povo.

Parece-nos assim que o primeiro ângulo por que não só se pode, mas se deve ver a escola primária no Brasil, em trânsito, de hoje — o de sua insuficiência quantitativa, — fundada em fatores diversos, é problema de Governo e de povo também. Problema cuja solução depende de esforços que se aglutinem. como cabe aliás a uma sociedade em franco processo de "aber­tura". Processo que se alongará, por questão mesma de sal­vação nacional, às áreas ainda hoje mais fortemente "fechadas", o que se realizará com a esperada e inadiável reforma agrária, sem a qual não será possível a continuação do processo de desenvolvimento e de democratização do país.

Bem razão tem Myrdal quando, discutindo esse problema, afirma categoricamente: "A reforma agrária é condição pri­mordial do crescimento industrial. Um dos principais obstáculos à industrialização nos países subdesenvolvidos é a falta de um mercado amplo e em estado de expansão. E continua — "Embo­ra difícil, é preciso empreender a reforma agrária; a não fazê-la, nunca se poderá sair do ciclo vicioso. As tentativas de elevação do nível de educação e de espírito de empresa dos campesinos, conclui, fracassarão fatalmente, se não lhes derem terras".25

Exatamente porque sem condições mínimas de desenvolvi­mento que se façam suporte da promoção da consciência do homem dessas áreas rurais, de um tipo que vimos chamando de "intransi-tiva", não será possível, na verdade, sequer, a "apetência educa­tiva",26 referida por Mannheim, com relação às massas urbanas. E sem essa "apetência educativa", a escola, ao invés de reivin­dicação, é doação. Motivo por que sua instrumentalidade de-cresce.

Tratar de uma escola primária que se ajuste ao Brasil, implica pensar antes nos brasis vários em que nos dividi­mos. Implica reconhecer, pela necessidade fundamental da "orga-nicidade" da escola, sermos uma sociedade que oscila, desar-moniosamente entre extremos, de um subdesenvolvimento abso­luto, em que não se pode dizer o que já se disse do homem moderno — um "demitido da vida" — porque nem sequer foi ainda admitido a ela, e um ritmo intenso de desenvolvimento. E, entre os extremos, uma variedade de posições.

25 MYRDAL Gunnar.— Solidariedad o Desintegración — págs. 242-243

26 FREIRE, Paulo — Op. cit.

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não sendo possível a persistência desses descompassos, de que a nação realmente vem tomando cada vez mais consciência — mesmo porque não haverá integração nacional sem integração econômica — a tendência é para a diminuição tanto quanto possível rápida desses desencontros. Daí ser o desenvolvimento nacional um imperativo existencial.

A escola primária há de assumir, então, um papel totalmente novo numa sociedade assim. Novo e diversificado. Sempre vol­tado, porém, para uma constante do momento nacional — a de seu desenvolvimento.

Daí não se explicar, — a não ser pela "demora cultural" — uma escola primária como a nossa, em qualquer dos brasis, maciamente sonora, antidemocràticamente palavresca, sem diá­logo, fugindo da realidade circunstancial como se seu encontro com ela significasse um pecado medonho, que devesse evitar. Ou como se fosse essa realidade uma doença contagiosa de que devesse preservar seus indefesos alunos. Parece-nos, pelo con­trário, que, em qualquer dos brasis, deve a escola primária ser algo que responda às condições do contorno. Algo enraizado nele. Vinculado às demais agências sociais sem se esquecer do nacional. Nossas escolas primárias de centros urbanos, indus­trializados ou industrializando-se, são escolas que desconhecem as necessidades do mercado de trabalho, sem se lembrar de que é delas que deve sair grande parte da mão-de-obra para esse mercado. Deixemos claro que não estamos pretendendo defen­der a profissionalização da escola primária. não é tarefa sua a profissionalização, mas oferecer um conhecimento básico a seus clientes com que possam identificar-se com o seu meio e nele atuar. E não será com uma "sabedoria" nocional e acadêmica, erradamente de teórica às vezes chamada, que iremos preparar nossos meninos, nas cidades como nos campos, para as fábricas, para a universidade ou para a agricultura. Para qualquer que venha sendo o destino de nosso educando, a escola primária que aí está é "veículo" inadequado. Memorizadora, palavresca e ociosa, ela não pode, de um lado, ajudar o novo clima cultural em formação ou por se formar, — o do trabalho. De outro, ela não pode deter seu cliente proletário, subproletário ou rural, por mais tempo, uma vez que, desafiado pela deficiência econô­mica, êle tem de se fazer "produtivo" antecipadamente. Mais uma vez palavresca — em qualquer dos brasis — antidialogal, ela estrangula outra dimensão do nosso clima em constituição ou por se constituir — a da democratização do país.

Visitamos certa vez uma escola rural em São Paulo, man­tida pelo Rotary com a colaboração do Governo, com índices excelentes de matrícula e freqüência. Era uma escola de comu-

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nidade e de trabalho. Seus alunos permaneciam nela. Seus alunos freqüentavam-na. Trabalhavam, porém, e — o impor­tante — participavam das vantagens de seu trabalho.

A inadequacidade, a inorganicidade de nossa escola primária assustam o observador quando descobre que, numa sociedade que tem de se fundar no trabalho, ela não cria condições autên­ticas, nem mesmo para uma elite ociosa.

E a sua inadequacidade se reflete ou se agarra a ela com a mesma sensualidade que Gilberto Freyre "descobre" no mas-sapê do nordeste, que "se agarra aos pés da gente, com ares de garanhona".

O que a nossa escola tem de fazer é identificar-se com as diversas características regionais e locais do Brasil atual e esfor­çar-se por oferecer a sua clientela condições com que se incor­pore ao ritmo de desenvolvimento e democratização do país.

Vale dizer que a escola de que precisamos urgentemente é uma escola em que realmente se estude e se trabalhe. Quando criticamos, ao lado de outros educadores, o intelectualismo de nossa escola, não pretendemos defender posição para a escola em que se diluíssem disciplinas de estudo e uma disciplina de estudar. Talvez nunca tenhamos tido em nossa história neces­sidade tão grande de ensinar, de estudar, de aprender, mais do que hoje. De aprender a ler, a escrever, a contar. De estudar História. Geografia. De compreender a situação ou as situa­ções do país. O intelectualismo combatido é precisamente esse palavreado ôco, vazio, sonoro, sem relação com a realidade cir-cundante, em que nascemos, crescemos, e de que ainda hoje, em grande parte, nos nutrimos.

Temos de nos resguardar desse tipo de intelectualismo como também de uma posição chamada antitradicionalista que reduza o trabalho escolar a meras experiências disso ou daquilo e a que falte o exercício, duro, pesado, do estudo sério, honesto, de que resulte uma disciplina intelectual.27 não que estivéssemos agora, contraditòriamente, a negar afirmações anteriores, neste como em outros estudos. Talvez aclaremos bem nossa posição quando reafirmamos que nossa escola não é teórica mas intelectualista, verbalista. Na verdade, teoria, tanto etimológica quanto filo-sòficamente — conforme está bem expressa no pensamento pla­tônico — não é apenas contemplação passiva. Implica também uma inserção na realidade, um contato analítico com o exis­tente, para testá-lo, comprová-lo, vivê-lo e vivê-lo plenamente,

27 Interessante a esse respeito a leitura de AYALA, Francisco — La crise actual de Ia Ensenãnza.

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praticamente. Por isso a teoria é o oposto do verbalismo e é tudo que não é nossa escola. Tudo que, porém, ela precisa ser. Reconhecemos as dificuldades que se levantam para um trabalho assim. Para uma postura dessas. Dificuldades contidas no pró­prio "ciclo vicioso", mais densas e rijas nas áreas mais forte­mente subdesenvolvidas do país. Reconhecemos, inclusive com observações próprias em escolas de zonas proletárias nossas, os obstáculos, os estrangulamentos à formação de uma disciplina séria de estudo nas classes primárias. São obstáculos que, estu­dados e conhecidos, precisam ter em comportamento diferente — orgânico — da escola de que precisamos, amenizações que nos ajudem no trânsito em que vivemos. como todo trânsito, cheio de contradições e óbices. Mas, como todo trânsito, contendo condições favoráveis. A sabedoria está na identificação destas condições e seu aproveitamento.

É interessante salientar aqui a importância que vem sendo dada pela educação atual da Rússia — cujos resultados estão aí à prova no seu estupendo desenvolvimento tecnológico, — a uma disciplina séria de estudos a que são levados seus educandos. Importância em que se quer descobrir um acentuado gosto tra­dicionalista, por isso, condenável.

É verdade que não podemos criar uma disciplina de estudo, um gosto ou uma gulodice do saber, se intoxicarmos o educando com excesso de matéria ou se oferecermos conteúdo alienado à sua inteligência.

O que nos parece, porém, imperativo, é que nossa escola deve esforçar-se ao máximo em despertar em sua clientela, inicial­mente, forte inclinação pelo saber, a que junte empenho igual­mente forte em lhe oferecer adequado saber. Daí, a insistência na constituição urgente da disciplina de estudo a que nos refe­rimos.

Se, no trânsito que vivemos, não nos satisfaz essa escola verbalista que aí temos, da mesma forma não satisfará uma escola que tema, ingenuamente, a formação dessa disciplina, por­que se lhe possa chamar de tradicional.

Se o trabalho da escola não deve ser um fardo para seu aluno, que o esmague e o aniquile, não pode, por outro, na atua­lidade brasileira, se contentar com esse "faz de conta" em que vem se perdendo, com horários até de três horas e anos letivos pontilhados de dias "não", além das férias regulamentares.

A atualidade do país, pelo contrário, está a exigir de suas escolas formação básica para seus educandos com que possam interferir no processo do desenvolvimento ou na superação do "ciclo vicioso".

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Dai a urgente revisão do conteúdo dessas escolas.28 De seus procedimentos didáticos. Revisão a que traga sua colaboração indispensável o cientista social.

De uma revisão orgânica, resultaria a fixação ou a integra­ção de nossa escola em sua comunidade local, com que travaria relações sistematizadas. Relações que ela estimularia, inicial­mente, entre si e as famílias dos educandos, a quem iria ofere­cendo condições de ingerência em seus próprios destinos. Inge­rência com que não só integraria as famílias com seu esforço, fazendo-as conscientes de suas limitações, a serem sanadas em conjunto, mas, também, com que ofereceria condições através de eme as famílias experimentariam posições decisórias. não será demais ressaltarmos a crença em experiências desse tipo, no mun­do atual, como caminho de "enraização" do homem, em Mannheim como em Mareei, se bem que em termos diferentes.29 Experiên­cias de afirmação do homem no seio de grupos limitados ou de pequenas comunidades. "Essas comunidades, diz Mareei, podem apresentar-se em formas diversas: uma paróquia, sem dúvida, porém igualmente uma simples empresa, uma escola, que sei eu"... E essa comunidade escolar não seria apenas a de professores e

alunos, mas destes e mais todos os que nela trabalham e as famílias dos educandos e depois acrescida de outras tantas famílias de sua área de influência, que, motivadas, se incorpo­rariam a seu trabalho.

O antidiálogo de nossa escola não é apenas interno. De seus pólos. Tão comprometedor quanto este, contradizendo tanto quanto este nosso processo de democratização, é seu antidiálogo com o "seu mundo". É o seu isolamento.

Nossa constelação escolar, fechada e "assistencializadora", não se adequa com a fase atual do país, de sociedade "aprendiz" da democracia. Da "abertura".

A tarefa de nossa escola é, pois, muito mais ampla e ins­trumental do que se pode pensar. Temos, aliás, neste sentido, experiências pessoais. Conseguimos um êxito, às vezes maior do

28 Essa revisão deveria ser concomitante com uma outra fundamental; A das escolas normais ou institutos de educação.

Experiência que nos interessa de perto neste campo foi a feita no Sudão, há poucos anos, no sentido da formação de professores ajustados a seu novo clima cultural — o da democratização.

Ver "Cultural Groups and Human Relations" — Conference on Educa-tional Problems of Especial Cultural Groups — Teachers College — 1951 — pag. 127.

29 MANNHEIM, Karl — Libertad, Poder y Planificación Democrática — págs. 293; MARCEL, Gabriel — Los hombres contra Io humano.

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que esperávamos, realizar grande parte das sugestões aqui apon­tadas. Realizamos, em termos positivos, experiências de relações de escola com famílias e daquela com sua comunidade.

Eis objetivos, entre outros, que perseguimos em nossos tra­balhos experimentais:

a) Despertar as escolas situadas na órbita do experimento para os acontecimentos de sua comunidade local, estabelecendo entre elas e as agências da mesma comunidade relações cada vez mais íntimas de que resultasse sua integração com a vida comu­nitária.

b) Despertar nelas a consciência da necessidade de um tra­balho conjunto, de tal forma que as dificuldades de uma unidade pedagógica fossem conhecidas e estudadas por todas. Suas rela­ções assim passariam a ser sistemáticas e não espontâneas, como infelizmente de modo geral o são entre nós. Essa "intimidade" com a análise de seus problemas iria desenvolvendo nelas, cada vez mais, a consciência crítica de sua posição e de sua tarefa em seu contexto.

c) Melhorar, por isso mesmo e para tal fim, os padrões culturais e técnicos do pessoal docente, preparando-o para a nova posição da escola. Nova posição da escola que exigia igual­mente preparação do pessoal administrativo.

d) Promover todos os meios por que se estabelecesse inti­midade entre escolas e famílias, no sentido de oferecer a estas crescente ingerência nos destinos daquela. Desta ingerência re­sultaria aprendizado existencial da democracia, pela substitui­ção de velhos e culturológicos hábitos de passividade por novos hábitos de participação e autogovêrno, em relação de organici-dade com o novo clima cultural em elaboração, que vivemos.

e) Promover, em decorrência da identificação da escola com a comunidade, melhores meios de assistência ao aluno.

f) Tentar a promoção de alguma ou algumas das princi­pais unidades pedagógicas da órbita da experiência em centros de comunidade, de que as demais passariam a ser "satélites".

g) Estimular as famílias, em intimidade com as escolas, a criar associação sua, funcionando na própria sede de cada escola. Grande parte dos problemas considerados de solução exclusiva da escola, passariam a ser de solução comum — da escola e das famílias, representadas democraticamente por sua associação.

h) Sugerir que essas associações se preocupassem, grada­tivamente, com a vida comunitária, o que forçosamente as levaria a contatos com outros "grupos", com agências sociais da loca­lidade e com o Poder Público.

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Após a criação em cada unidade pedagógica de uma asso­ciação das famílias, tentar agregá-las em federação, através de que seria possível uma cada vez maior "parlamentarização" de seus associados.

O que não nos parece possível é ajudar o rompimento do "ciclo vicioso" em que está empenhado o país, sem que fenecerá historicamente — e que só se faz com o povo preparado técnica e ideologicamente — com uma educação inadequada, em que ressalta uma escola primária amofinada e quase totalmente sem sentido como a nossa. Às vezes tão fora de tempo e do espaço que é como se fosse um fantasma.

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A INVESTIGAÇÃO CIENTÍFICA: DEVER SOCIAL DA UNIVERSIDADE

PAULO DE GÓIS Da Universidade do Brasil

Meditando sobre o tema que deveríamos abordar nesta opor­tunidade, não hesitamos em escolher matéria que versasse aspec­tos da investigação científica. não nos pareceu inoportuno ou descabido insistir sobre assunto a respeito do qual já haviam proferido, aqui mesmo, em outras horas como esta, notáveis lições, grandes mestres desta Universidade, como Carlos Chagas e . e o -lindo Couto. O tema, no entanto, é de tal oportunidade e interesse para

nossa Instituição que nos arriscamos a sua discussão, embora convencidos que jamais poderíamos igualar o brilho que alcançaram aqueles que nos precederam nesta tribuna.

não pretendendo abordar na plenitude todos os complexos aspectos e problemas que envolvem a investigação científica, limitar-nos-emos tão-sòmente a tentar fixar o que concerne ao dever da Universidade em face da pesquisa científica. Iremos, certamente, emitir conceitos consagrados, que já estão na cons­ciência de muitos. Iremos repetir frases que outros já disseram, talvez, com mais clareza e poder de convicção. No entanto, repe­tir agora é intencional e fazemos de plena consciência com o propósito expresso de ferir problemas não ainda resolvidos e, portanto, a carecer de apoio.

É ocioso afirmar que a ciência ocupa posição relevante na fase que o mundo atravessa. Na civilização atual a ciência é a força mais atuante. O homem deste século não mais aplica à solução de qualquer dos seus problemas, práticas tradicionais ou empíricas e procura penetrar no entendimento das coisas e fenô­menos, dominando-os e controlando-os.

como acentua Conant, "os conceitos científicos já se inte­graram de modo tão intenso na vida do homem comum da nossa cultura que eles são usados tanto consciente quanto inconscien­temente na tomada de decisões que chamamos éticas ou morais".

Lição de Sapiência proferida ao inaugurar-se o ano letivo de 1961 da

Universidade do Brasil .

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O método científico, utilizado em larga escala em todos os campos das atividades humanas, atingiu admirável aperfeiçoa­mento.

0 sucesso da sua aplicação e a demonstração quotidiana de sua eficiência fizeram com que a humanidade passasse a encarar de modo diferente os fatores perturbantes do seu bem-estar. Tem-se a certeza de que os tormentos de hoje, amanhã poderão estar removidos, o que permite ao homem moderno sentir-se mais seguro e feliz, pois há constantes possibilidades de melhoria de suas condições de vida. É inegável que as criaturas deste século possuem atitude diferente das de outróra para as quais a natu­reza era misteriosa e impenetrável e a maioria das causas do sofrimento humano, aparentemente, impossíveis de ser remo­vidas.

Diz Whitehead que "é próprio do futuro mostrar-se cheio de perigos. E entre os méritos da ciência está o preparar a humanidade para esse futuro com os riscos que êle impõe". Pensamento semelhante expressou Killian, em 1958, na reunião anual da American Association for Advancement of Science, ao afirmar: "A evolução do nosso país tem sido profundamente influenciada pela crença de que é possível fazer a natureza tra­balhar em benefício do homem; pela crença de que a ciência e a tecnologia são as únicas forças propulsionadoras do bem-estar do povo, crenças estas mais úteis ao progresso que modifica­ções sociais profundas ou panacéias ideológicas".

É fato inconteste que no momento atual o desenvolvimento econômico é função direta do desenvolvimento científico. No passado, a pesquisa se desenvolvia à margem das atividades pro­dutivas, representando uma espécie de luxo de civilização. É verdade que o progresso econômico de muitos povos foi a resul­tante de fenômenos imprevistos ou da aplicação de métodos empí­ricos à solução dos problemas. Hoje em dia, no entanto, é dis­cutível possam verificar-se iguais surtos de desenvolvimento, em condições satisfatórias, sem a aplicação do método científico.

Todos os fatos estão a comprovar que o crescimento mate­rial das nações mais desenvolvidas é fruto exclusivo do alto nível científico a que atingiram. desse modo, pode-se afirmar que houve, do século passado para o atual, uma verdadeira inver­são dos fatos. Nível científico era um reflexo do nível econômico. Agora, o nível econômico é conseqüência do nível científico.

não há dúvida que a ciência passou a comandar o mundo. Até poucos anos atrás media-se o poderio de uma Nação por seu potencial bélico. Hoje faz-se esta aferição tomando por base a capacidade científica, o número de pesquisadores e o grau de organização para a investigação científica. Daí, as grandes po-

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tências aplicarem um esforço, cada vez maior, no estímulo ao desenvolvimento científico. Nesse sentido é muito oportuna uma apreciação de Turner: "não é segredo a razão pela qual o Governo está aplicando tanto dinheiro em ciência, é que esta desempenha papel relevante no prestígio e poder das nações. As novas dotações para pesquisa não resultaram, certamente, de súbito aumento do amor pelo estudo". A competição, a corrida entre as grandes potências já não é mais para o aumento dos seus efetivos militares, porém, sim, objetiva principalmente o reforço do seu poder científico. Em 1958, o Presidente Eise-nhower dos Estados Unidos em mensagem afirmou: "é neces­sário um esforço redobrado de todos os americanos na educação e na pesquisa para que possamos estar à altura das demandas dos nossos dias". Vê-se pois que atravessamos uma fase histó­rica nitidamente diferenciada. Após a era da revolução indus­trial passou-se à era da revolução científica, conjuntura que ca­racteriza o período contemporâneo.

Até onde o predomínio da ciência possa trazer novas e dife­rentes implicações é muito difícil julgar e aferir. O que é certo, no entanto, é que a revolução científica já teve profundas reper­cussões dos pontos-de-vista social e político e, até mesmo, nas relações entre os povos.

É oportuna a opinião de Kistiakowski sobre a ciência e rela­ções internacionais: "a ciência é hoje uma das poucas lingua­gens comuns da humanidade; ela pode oferecer as bases para o entendimento e comunicação de idéias entre os povos indepen­dentemente de fronteiras políticas e ideológicas. Ela constitui também o melhor caminho para reunião de esforços capazes de diminuir a tensão entre países".

A característica fundamental da ciência é seu alto nível ético. A verdade representa seu principal alicerce. A ciência busca essencialmente a demonstração da verdade e, buscando alcançá-la, é que se fazem as descobertas e realizam-se conquis­tas que permitem melhorar a vida do homem. Tendo a verdade como princípio e como fim, ela se reveste do que se pode admitir de mais elevado.

Por outro lado, a ciência representa a forma mais diferen­ciada do sentimento de sociabilidade, porque tudo que ela faz tem como objetivo último o bem do próximo.

Apoiando-se em tais princípios, o desenvolvimento científico constitui um processo de grande eficácia educacional, pois os que a desempenham tendem a aperfeiçoar-se ao máximo dos pon­tos-de-vista moral e social.

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Ante essas circunstâncias, podem-se considerar como alta­mente salutares as tendências da civilização atual desde que sejam seguidos os rumos ora perquiridos e que se baseiam na busca da verdade científica.

Naturalmente que o momento não é oportuno para discutir­mos os conceitos que vimos de emitir em face de certas concep­ções filosóficas ou religiosas. Devemos, todavia, insistir em uma afirmação, evidentemente inconteste, qual seja a de que conhe­cimento científico é o substrato do progresso do mundo atual.

Em face dessas premissas, pode-se reiterar que o desenvol­vimento e crescimento dos povos é uma conseqüência direta do seu progresso científico.

não há como negar que qualquer país que se queira desen­volver deve concentrar todos seus investimentos e recursos priori­tariamente na investigação científica.

Em recente relatório sobre visita feita a Israel, DuShane mostra-se vivamente impressionado com o que um pequeno país pode fazer quando convicta e corajosamente aplica a ciência e a tecnologia à solução dos seus problemas, como a criação de fontes de energia e suprimento de água em áreas desérticas.

Considerando o caso particular de nosso país, é difícil esta­belecer julgamento sobre a exata posição em que nos encontra­mos em relação a outros países civilizados.

Se de um lado os pessimistas julgam nossa situação como de penúria, de inércia e improdutividade, de outro há os que, mais objetivos, colocam o problema nos seus devidos termos, e de um balanço criterioso recolhem dados que autorizam julga­mento razoável.

É evidente que nossa conjuntura científica é o reflexo de um longo passado, graças ao qual sedimentaram magníficas expe­riências, que constituem o lastro de nossa formação. não resta dúvida que nossa maior tradição científica se originou nos campos da biologia e da medicina, em que surgiram nossos primeiros institutos de ciência. Sem pretensão à análise histórica, con­vém lembrar alguns dados fundamentais. No período colonial, serviu o Brasil simplesmente como um campo para observação de naturalistas estrangeiros. Pouco incorporaram à ciência na­cional as missões científicas que aqui estiveram, como as de Humboldt, Spix, Lund, Darwin, Agassis, A. Saint-Hilaire, De von Martius e Fritz Müller. Alguma coisa ficou principalmente deste último que se radicou no Brasil, aqui produzindo contri­buição notável à ciência. Releva acentuar que foram muito importantes para as doutrinas da evolução, as observações feitas não só por Darwin mas Bates e Wallace, que aqui também esti-

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veram no século passado. Tudo isso, no entanto, não deixou descendência nem raízes, não se implantando escolas pela pas­sagem desses sábios. Por volta de 1850 é que surge a famosa Escola Parasitológica da Bahia, formada por Ôtto Wucherer, José Francisco da Silva Lima e John Ligertwood Paterson. estes, sim, formando uma equipe, um grupo integrado ao meio, transmitindo a este a influência de uma verdadeira escola. Os problemas que estudaram, a filariose, ancilostomose, beribéri, ainhum e tantos outros, consoante os registros que se encontram na Gazeta Médica da Bahia, obedecem a padrões surpreendentes. Continua essa Escola por discípulos da envergadura de Pedro Severiano de Magalhães, que depois veio para o Rio de Janeiro, e, sobretudo, Manuel Augusto Pirajá da Silva, que foi professor de História Natural e Parasitologia da Faculdade de Medicina da Bahia, cujas descobertas sobre a esquistossomose constituem um dos mais caros patrimônios de nossa ciência. Sem esquecer Gama Lobo, que em 1865 fêz descrição primorosa das manifestações oculares da avitaminose A, ao que chamou "oftalmia brasiliana", chegamos a João Batista de Lacerda, que, a partir de 1876, com agudo espírito de pesquisador, embora autodidata, traz contribuição notável à antropologia, fisiologia, farmacologia e ofiologia. Ajun-te-se ao nome de Lacerda o de Louis Couty, que para aqui veio em 1878, contratado para a Escola Politécnica do Rio de Ja­neiro, mas que acabou trabalhando com Lacerda no Laboratório de Fisiologia do Museu Nacional, com êle realizando trabalhos da melhor qualidade. Já que se falou no Museu Nacional, é de salien­tar-se a contribuição dessa instituição originária da antiga Casa dos Pássaros que, desde o princípio do século passado, juntamente com o Real Horto, hoje Jardim Botânico, foram berços de nos­sas atividades científicas.

não se esqueça, porém, as discussões sobre a etiologia da febre amarela de que participaram Domingos Freire, Lacerda e Torres Homem, que, se não trouxeram uma decisão, pelo menos revelaram o intento de esclarecer questão que na época era das que mais nos afligiam. Ainda, em conexão com o mesmo pro­blema, é de realçar-se a experiência de Emílio Ribas, Adolfo Lutz e outros voluntários, em 1902, sobre a transmissão, pelo mosquito, da febre amarela. O Instituto Bacteriológico de São Paulo de que Lutz foi o grande animador e a obra de Vital Brasil no Butantã são outros registros que se impõem. Foi com Osvaldo Cruz, no entanto, que surgiu no país a mais robusta iniciativa para implantação do trabalho científico e, a partir de então, foi que essa prática perdeu as características de mera curiosidade ou diletantismo, transformando-se de simples ama­dorismo em atividade séria e responsável.

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não há como negar que Osvaldo Cruz se antecipou de muito a sua época. Se, a partir do padrão de trabalho por êle implan­tado, tivesse havido progresso crescente, teríamos hoje posição equivalente ou mesmo superior à de outros países mais desenvol­vidos. Mas por que não houve esse desejado crescimento? Mui­tos fatores devem ter entrado em jogo.

É provável que o mais importante fato tenha sido o Insti­tuto Osvaldo Cruz constituir um núcleo científico isolado, não integrante de uma Universidade.

Embora seu fundador se tenha preocupado, desde logo, em criar e manter cursos para a formação de cientistas, estes não se efetuaram ao máximo das possibilidades da instituição, perma­necendo aquém das demandas do progresso. Se Osvaldo Cruz houvesse atuado em universidade como a de Oxford ou Harvard e nela formado sua magnífica escola, outro teria sido o rendi­mento de sua obra e mais vivificante o fruto de seu esforço. Líder inato, mestre inigualável, êle e seus continuadores teriam encontrado na mocidade das escolas, campo fértil em que semear seu entusiasmo, preparando numerosas gerações de cientistas.

As universidades representam os principais celeiros de cien­tistas. É na juventude, nos bancos acadêmicos, que se desper­tam as vocações, descobrem-se as tendências, e têm início as carreiras para a investigação científica. Daí ser duvidosa a van­tagem da separação entre os institutos científicos e universidades, como em alguns países socialistas, mas nos quais já se vem obser­vando nítida tendência para uma aproximação cada vez maior entre os dois tipos de instituições.

Apontamos como sendo marco de nossa evolução científica a criação do Instituto Osvaldo Cruz. Outro acontecimento fun­damental na história da ciência no Brasil foi, sem dúvida, a criação do Conselho Nacional de Pesquisas, a partir da qual se verificou grande surto nas atividades de investigação. Merece destacar o papel de Álvaro Alberto nesse acontecimento. À sua pertinácia, dedicação e entusiasmo, muito deve a concretização de tão importante medida.

não analisaremos certas restrições que têm sido feitas ao Conselho Nacional de Pesquisas porque julgamos que a sua ação vem sendo tão útil e eficiente que supera a validade de críticas que possam ser formuladas. Os novos laboratórios que surgiram, cresceram e se afirmaram graças ao apoio do Conselho, os jovens cientistas que se formaram em virtude de bolsas concedidas são tão numerosos, uns e outros, que só isso bastaria para fazer pender nitidamente em seu favor a balança de suas realizações.

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não há dúvida que se o Conselho não alcançou o máximo que seria desejável é porque não existem medidas mágicas capa­zes de, em curto prazo, modificar profundamente o panorama geral de um país em relação ao trabalho científico.

São muitas e variáveis as condições que influenciam o tra­balho científico, cabendo destacar as materiais, psicológicas, am­bientais e econômicas, sendo o nível científico a resultante desse complexo sociopsicológico. A ciência constitui o ápice da evolu­ção do pensamento humano e seu aparecimento e consolidação são a conseqüência de lenta estratificação de fatores. Assim não se poderiam esperar conseqüências maiores que as obtidas após a fundação do Conselho Nacional de Pesquisas. Sua simples cria­ção e atuação não poderiam ocasionar todo esse conjunto de fatores

que só o tempo, o progresso educacional e uma mudança de mentalidade produzem.

não obstante, como já afirmamos, a ação desse órgão cor­respondeu a um grande avanço para a ciência no país. Regis­trem-se também, como grande fator de progresso, a criação da C . A . P . E . S . (Campanha de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior), onde Anísio Teixeira e Almir de Castro vêm realizando excelente trabalho.

Data de pouco tempo a prática da investigação científica nas universidades brasileiras, o que é aliás compreensível, eis que tais instituições existem entre nós há uns poucos anos. Por outro lado, excetuando a Universidade de São Paulo que foi criada com características muito particulares, todas as demais, inicialmente, obedeceram a um processo muito artificial em sua constituição, formadas que foram pela simples agremiação de escolas superiores isoladas. Assim, só pouco a pouco é que essas unidades se foram integrando para constituir corporações que, hoje, em alguns casos, já podem ser consideradas verdadeiras universidades.

Seria injusto, no entanto, deixar de referir que, em muitas escolas e faculdades hoje integrantes desta e de outras univer­sidades surgiram núcleos isolados de trabalho que chegaram a realizar pesquisas importantes principalmente no campo da biologia e da medicina. No passado, todavia, era notória a hos­tilidade à pesquisa, o que levou os irmãos Osório de Almeida a criar em sua própria casa um laboratório de investigação para poderem trabalhar.

Em época recente é que se vem iniciando a pesquisa em uni­versidades brasileiras. Papel relevante visando estimular a pes­quisa em nossa instituição coube, sem dúvida, a Carlos Chagas Filho. Foi êle o primeiro a criar um laboratório nesta Uni­versidade com todo o pessoal trabalhando em regime de dedica-

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ção exclusiva. Foi o iniciador de intenso intercâmbio com cien­tistas estrangeiros, aqui os recebendo em curtos ou longos está­gios.. muito úteis para a formação de jovens cientistas brasileiros. Igualmente promoveu um programa de larga extensão, enviando ao estrangeiro todo seu pessoal. Deve-se também a Chagas a introdução de modernas técnicas de investigação biológica, como as de rádio-isótopos, microscopia eletrônica etc. Por todos esses motivos é que Carlos Chagas Filho pode ser considerado como um verdadeiro pioneiro de moderna pesquisa científica nesta Uni­versidade. O mérito do seu trabalho não se resume, todavia, à criação e desenvolvimento do Instituto de Biofísica. Foi pela sua pregação constante e pela força do seu exemplo, que muitos se sentiram estimulados a dedicar-se ao trabalho científico e ins­talar núcleos de investigação nesta e em outras universidades que hoje se encontram em operosa atividade.

De nossa parte é de justiça confessar de público que se che­gamos a instalar nosso pequeno laboratório inicial que deu origem ao Instituto de Microbiologia, que temos a honra de dirigir, muito devemos nessas iniciativas ao estímulo constante recebido de Chagas.

não é fácil traçar um panorama atual da pesquisa científica nas universidades brasileiras. como já foi dito, elas são em sua totalidade organismos novos, improvisados, ou estruturados em condições inadequadas para a investigação científica. O fato de serem novos não constitui razão impediente de progresso, pelo contrário, a força da tradição, o espírito extremamente conser­vador representam às vezes obstáculos a que se possa realizar uma adequação permanente e dinâmica às novas conquistas e aos novos progressos. É por isso que enquanto o avanço de muitas Univer­sidades européias, que se originaram na Idade Média com fina­lidades escolásticas, mantém-se ancilosado pelo ranço da tradição, jovens universidades americanas, a maioria delas formadas neste século, são vanguardeiras de progresso, adaptando-se aos novos estilos e às exigências das novas conquistas. Nesse sentido, é bem expressivo o que se observa nos Estados Unidos e na Europa em relação à educação médica. Na América do Norte tem havido uma completa revolução com a introdução de métodos que per­mitem maior rendimento prático, enquanto, no Velho Continente, as Faculdades amarradas por um conservadorismo excessivo não se têm beneficiado de experiências de indiscutível utilidade. Dentro desse raciocínio, portanto, devemos tirar partido do fato de sermos jovens. Estamos livres para escolher as melhores experiências já consagradas em outros países. Temos também maior liberdade para, graças à nossa imaginação e espírito cria­dor, instituir novos estilos e consagrar novos padrões.

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Já dissemos em outro passo que a pesquisa científica não pode ser improvisada e que depende de um complexo de fatores. não há, no entanto, qualquer outra modalidade ou tipo de ins­tituição que reúna condições tão propícias para investigação cien­tífica quanto as universidades.

Nesse particular, deve ser referido que no plano de fomento da pesquisa nos Estados Unidos a National Science Foundation sugere pela palavra de Waterman que os maiores recursos sejam aplicados nas Universidades, afirmando: "A Universidade é o lar natural da ciência básica". Todavia as universidades não de­vem estar sujeitas a qualquer subordinação a governos. Gozando de autonomia e independência, devem ter consciência própria de sua responsabilidade social e contribuir de modo positivo para o estudo de problemas de interesse geral.

A questão da influência dos governos nas Universidades vem sendo muito discutida estes últimos anos nos Estados Unidos. O aumento do custo da investigação e a necessidade do país em desenvolver a ciência obrigaram o Governo a financiar largamente a pesquisa universitária. este auxílio governamental tem sido aceito desde que não limite as liberdades das universidades, e o perigo de uma possível influência governamental tem sido consi­derado. No ano passado, a União Americana para as Liberdades Civis publicou longo manifesto em que declara que o financia­mento federal interessado principalmente em certos problemas pode induzir a um imediatismo nefasto, incompatível com o ver­dadeiro espírito científico.

É função precípua da Universidade, adiantando-se aos pró­prios órgãos do poder público, caracterizar, equacionar, desen­volver estudos e apontar soluções para os problemas que surgem no processo de desenvolvimento do país. A consciência dessa missão e as responsabilidades que dela decorrem é que definem a posição da universidade na sociedade moderna.

Dentro dessa conceituação é que ressalta como um dos deve­res mais elementares da universidade a prática sistemática da investigação científica. Um corolário dessa atividade será a rea­lização de cursos, destinados à formação de profissionais e de cientistas. "com a pesquisa científica, segundo pensamento ge­ral bem sintetizado por Chagas, é que as universidades passam a ser universidades. A universidade é a instituição onde se pes­quisa e porque se pesquisa dá-se ensino. Subsidiàriamente dis­tribui-se diploma". E pode-se completar com Walter Osvaldo Cruz: "sem pesquisa a universidade é uma reminiscência medie­val quando os estudos escolásticos limitavam-se a uma ginástica de memória e de concentração mental. Hoje, a universidade representa um sistema educacional que ensina para viver. Tem

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precípua obrigação de desenvolver a mente do estudante no sen­tido de torná-lo apto a controlar os instrumentos a serem empre­gados na batalha do conhecimento. Batalha sem fim, da qual depende a permanência, segurança e conforto de todos os con­temporâneos e futuros habitantes da terra".

Atribuindo-se deveres tão relevantes às universidades no equacionamento, estudo e solução de problemas que interessam às comunidades, poderia parecer que delas se devesse exigir o trato tão-sòmente de problemas de interesse e utilidade imedia­tos. Longe estamos de assim pensar, porque inevitavelmente cairíamos dentro de um indesejável dirigismo científico. O fator primário na pesquisa reside em uma motivação intrínseca da curiosidade do pesquisador. A este é que compete decidir, optan­do pelos problemas que feriram sua sensibilidade. A um ver­dadeiro pesquisador é impossível impor um tema para estudo e mesmo nos sistemas de planificação de pesquisa nunca se deve cercear suas atividades. Liberdade de pesquisa é um postulado que as universidades devem preservar como a maior das suas conquistas. Segundo afirma McKeon, liberdade, facilidades, cri­tério e interesse são condições inter-relacionadas necessárias para o avanço do conhecimento, e entre elas a liberdade constitui o princípio indispensável.

É pertinente salientar que em nossa Universidade possuímos esse clima de liberdade essencial às manifestações da ciência. É de justiça acentuar que isso se deve ao obstinado espírito demo­crático do nosso Magco. Reitor que jamais fêz qualquer restrição às opiniões e à orientação doutrinária de quem quer que seja, sempre garantindo todas as franquias para o pensamento criador. Ainda que não possuíssemos outras condições, ainda que nos fal­tassem outros requisitos, bastar-nos-ia esse tesouro de liberdade que tem em Pedro Calmon o seu principal defensor, para afir­marmos que aí está a maior esperança para podermos vencer no campo da investigação científica.

não se deve confundir dirigismo científico com pesquisa orientada para resolver determinados problemas e que consiste na pesquisa aplicada. Talvez nem conviesse incluir este tipo de atividade científica em paridade com a pesquisa propriamente dita, colocando-a na rubrica da tecnologia. É óbvio que esse tipo de trabalho é absolutamente necessário, mas seu desempenho cabe a indivíduos com certas características de personalidade bem diferentes daquela dos cientistas puros. Primariamente compete às universidades a prática da pesquisa pura e subsi-diàriamente a pesquisa tecnológica que, no entanto, nas univer­sidades mais avançadas, deve ser gradativamente abandonada e transferida a institutos tecnológicos ou outros órgãos congêneres.

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não há contradição entre esta última afirmativa, isto é, que à universidade compete primariamente a prática da pesquisa pura e o que dissemos atrás quando afirmamos que a elas competia identificar, equacionar e estabelecer soluções para os problemas do interesse público. A pesquisa pura é que conduz ao escla­recimento dos fatos básicos de todos os problemas. Quando se desvenda o mecanismo de um fato elementar, abre-se o caminho para a solução de uma ou mais questões de interesse prático. Assim, a contribuição da ciência pura é essencial e constitui o lastro de tudo que concerne ao conhecimento aplicado. Desen­volvendo-se a ciência de base, recolhe-se, de imediato, uma série de subprodutos úteis entre os quais destaca-se o conhecimento tecnológico. É errôneo pensar-se que se possa fazer tecnologia sem ciência, como também não é certo admitir-se que a ciência pura é uma forma de trabalho diletante, inconseqüente, de resul­tados duvidosos ou a longo prazo.

Enfatizando a importância da ciência básica como fator fun­damental de Progresso, o Conselho Federal de Ciência e Tec­nologia dos Estados Unidos assim se pronunciou: "Constitui má orientação ao elaborar e dirigir programas de pesquisas a preocupação demasiada sobre o valor prático dos temas a serem estudados. Os segredos e tesouros da natureza estão ocultos em os lugares mais obscuros e inesperados. É claro portanto que os melhores programas científicas são aqueles de maior ampli­tude e mais variadas finalidades. não se pode prever de onde virá o próximo avanço científico e por isso é importante fazer um esforço para manter linhas de trabalho em todas as frentes da ciência".

Nessas definições gerais tem-se as coordenadas para situar o problema brasileiro em face da pesquisa científica. Na con­juntura em que vivemos, somente pela pesquisa a cargo de suas universidades e das instituições científicas é que o país podeíá consolidar sua posição no mundo atual e afirmar-se como grande potência. Somos a oitava nação do ponto-de-vista demográfico; temos dimensões continentais constituindo o quarto país do mundo em superfície territorial. Começamos a ser mais conhecidos e considerados diante do mundo como uma realidade de civilização. Oppenheimer ficou tão impressionado com o que viu em nosso país que pôde afirmar: "A aplicação do conhecimento muda a face da terra. E isto é brilhantemente ilustrado por cidades como S. Paulo, no Brasil, que, simplesmente crescem diante dos nossos olhos".

Estamos criando uma consciência de nossa capacidade. Em fatos simples da vida cotidiana transparece um novo sentimento que está surgindo no povo que se sente feliz em poder dizer

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com gáudio que tudo que é brasileiro é melhor, naturalmente que atravessamos um período de crise, porém, como acentua Ulich, nunca houve um período produtivo na história da huma­nidade que não fosse acompanhado de crise, como ocorre na fase atual de nossa evolução. Precisamos refutar a superada quali­ficação de povo subdesenvolvido, estabelecida na base de critérios discutíveis ou seja a renda per capita que não exprime a realidade de um povo, conforme assinalam recentemente Bauer & Yamey, economistas ingleses das Universidades de Cambridge e de Lon­dres. Dizem essas autoridades: "é muito mais esclarecedor sugerir que o capital seja criado no processo do desenvolvimento que admitir que o desenvolvimento seja função do acúmulo do capital. Segundo eles a renda per capita é um índice artificial que pode não exprimir a verdade.

Temos uma considerável responsabilidade em face do mundo atual. como única civilização dos trópicos, constituímos impor­tante laboratório experimental, no passado e no presente, a reco­lher uma cópia de informações intermináveis a servir de roteiro e orientação para os novos países que estão surgindo nos tró­picos, principalmente no continente africano.

não há dúvida que o Brasil deverá ser o líder natural desse novo complexo de nações que provavelmente se constituirá em uma comunidade afro-brasileira. Além de fatores históricos, culturais, antropológicos, geográficos e climáticos, razões outras, políticas, que não vem a pêlo discutir, sugerem para nós aquela posição. Porém, o que é certo, o que é indiscutível é que esses novos países do trópico só no Brasil encontrarão a experiência e as informaçães necessárias a seu desenvolvimento.

Há uma cópia enorme de problemas que só interessa aos trópicos. A nós é que compete estudá-los e resolvê-los, usando dados eventualmente obtidos e suprindo com eles outras áreas do mundo.

Poderíamos alongar-nos numa exaustiva exemplificação de problemas desse jaez. Basta lembrar no entanto, os concernen­tes à patologia tropical. Aí estão a esquistossomose, a doença de Chagas, a diarréia infantil nos seus aspectos particulares aos tró­picos e várias outras doenças que, não constituindo problemas nas zonas temperadas do hemisfério norte, são objeto de inves­tigação limitada nas instituições científicas daquelas regiões. A nós é que competirá enfrentar e resolver esses problemas sem o que continuaremos a pagar um tributo constante, com a limi­tação da produtividade do homem doente ou com as vidas dos que não resistem à enfermidade. Compete às universidades e insti­tuições científicas antecipar-se aos governos, equacionar e de-

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senvolver pesquisas, principalmente de base, que possam abrir caminhos à solução de tais problemas. É assim que se configura a investigação científica como um dever social das universidades.

não é nosso intento apresentar, neste ensejo, fórmulas mági­cas que possam conduzir à solução de todos os problemas que têm constituído óbices ao melhor desenvolvimento da ciência no país. Há muitos a serem apontados, mas que não chegam a formar um quadro melancólico ou desanimador. Pelo contrário, acreditamos sinceramente que há em nosso país um conjunto de condições mais favoráveis do que desfavoráveis. Se isto não fosse verdade, não ocuparíamos a posição destacada que temos em relação a outras nações civilizadas. Ainda recentemente, re­vista de referência das mais autorizadas no campo da biologia e medicina, — a Biologicàl Abstracts — apresentou estatística sobre a produção científica de todos os países do mundo. Nela, o Brasil ocupa o oitavo lugar. A seqüência de posições é a seguinte: Estados Unidos, União Soviética, Japão, Inglaterra, Alemanha, França, Itália e Brasil. Isso, sem dúvida, constitui motivo de orgulho e mostra que mesmo sem contar com certas facilidades para o trabalho científico, nosso país demonstra admirável capa­cidade de realização.

não obstante, a adoção de certo número de medidas poderia ampliar e intensinficar as atividades de pesquisa nas universi­dades, destacando-se, entre outras, as que passaremos agora a enumerar e que foram objeto de proposta concreta que apresen­tamos ao Conselho de Pesquisas desta Universidade, ao qual temos a honra de pertencer.

Em nosso entender, destaca-se como medida prioritária a propaganda entre os jovens da importância da ciência e das perspectivas que o trabalho científico oferece.

Naturalmente deve-se proceder esse trabalho com processos educacionais destinados a despertar na criança, o mais cedo pos­sível, a curiosidade pelos fenômenos e coisas da natureza. Em maio de 1958, o Governo Americano enviou missão à União Soviética para observar seu sistema educacional e um dos fatos que mais impressionou essa missão foi o ensino das ciências começar no jardim de infância. Essa impressão deve ter in­fluenciado os educadores americanos, pois no relatório Policies for Science Education elaborado por um grupo da Universidade de Columbia, em 1960, é recomendado que o ensino das ciências deve ter início no jardim de infância e que nas séries seguintes tenha o mesmo nível de importância que a leitura, a escrita e a aritmética. Infelizmente, em nosso meio, os jovens ainda não se inteiraram convenientemente das possibilidades que oferece a carreira científica. De modo geral, quando atingem a idade de ingressar nas universidades, fazem sua opção por deter-

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minado ramo profissional e entram nas escolas com o propósito exclusivo de receberem um grau e dedicarem-se na vida prática a dada profissão. São raros os que ao iniciarem a vida universitária têm em mira tornarem-se cientistas. É claro que essa atitude é conseqüência do fato de os cientistas em nosso meio não terem uma posição destacada na sociedade e serem em número relativamente pequeno. Há completo desconhecimento pela mocidade do que a ciência pode fazer para o progresso do país. Pensamos que um trabalho sistemático, realizado nas cáte­dras que versam disciplinas científicas e junto aos diretórios aca­dêmicos, seria de grande proveito nesse sentido. Por outro lado, é necessário criar estímulos, prêmios e compensações para estu­dantes que realizem trabalhos científicos, revelando pendor para a investigação. É oportuno assinalar que os próprios estudan­tes já sentiram a necessidade de fomentar o interesse pela ciência e no campo da medicina, criaram as chamadas "Semanas de Debates Científicos", onde, geralmente, são apresentados trabalhos de excelente qualidade. É preciso que a universidade vá ao encontro dessa iniciativa premiando os melhores, oferecendo bôlsas-de-estudo no país e no estrangeiro e aproveitando em seus quadros aqueles valores que às vezes se dispersam por não encon­trarem acolhida ou apoio.

O trabalho científico exige também um conjunto de facili­dades sem as quais é muito sacrificado. A esse conjunto pode­mos denominar de infra-estrutura do trabalho científico, e com­preende facilidades para a importação de material científico, facilidades bibliográficas, oficinas de reparo e recuperação de equipamento e oficinas para a construção de equipamento. Todos conhecem as dificuldades com que lidamos para importação de material científico. Muitos laboratórios só funcionam porque possuem um sistema de contrabando bem organizado e, se tal não acontecer, está o cientista fadado a perder a maior parte do seu tempo junto aos órgãos governamentais para conseguir impor­tar, às vezes, umas poucas gramas de um reagente essencial para o seu trabalho e, assim mesmo, nem sempre consegue vencer as dificuldades.

O problema da literatura científica é outra questão relevante. Já dispomos, principalmente nos grandes centros, — como Rio e São Paulo — de algumas excelentes bibliotecas e de instituições que facilitam o fornecimento de microfilmes de periódicos menos acessíveis. No entanto, nesse setor, deveria o Governo criar um dólar especial para livros e periódicos ou então facilitar a obten­ção dos bônus de livros que a UNESCO fornece e que, salvo engano, o Brasil é o único país que não goza de suas vantagens e benefícios.

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A existência de oficinas especializadas nas instituições para a recuperação ou construção de equipamento também é questão fundamental. como não dispomos ainda de indústria especiali­zada em material científico, a manutenção e recuperação do equi­pamento é às vezes problema insolúvel dada a inexistência de técnicos habilitados.

O problema do pessoal é, sem dúvida, o mais importante de todos. Deve ser considerado antes de qualquer outro porque o cientista com uma idéia, um projeto, e capacidade para o desen­volver, constitui o ponto de partida para toda iniciativa concer­nente à ciência. Entre nós o problema do desenvolvimento da ciência, na maioria das vezes, tem sido encaminhado de forma invertida: primeiro pensa-se no prédio, depois no equipamento permanente, e, por final, quando já estão construídos laborató­rios glamourosos em edifícios suntuosos é que se pensa no pes­soal. Nada mais errôneo. A formação de pessoal deveria ser o ponto de partida. Por todo o país encontram-se sempre exce­lentes laboratórios bem instalados e, muitas vezes, até, equipados razoavelmente. O que falta no entanto é gente habilitada para botar esses laboratórios em funcionamento. Há evidente carên­cia de pessoal para o trabalho científico, não só nas universidades como fora destas, o que depende naturalmente de um complexo de motivos e razões. Já nos reportamos aos problemas do recru­tamento e acentuamos que em nosso entender deve ser intensi­ficado o trabalho junto à mocidade no sentido de interessá-la pelo trabalho científico. Na fase de iniciação e aperfeiçoamento as bôlsas-de-estudo em níveis convenientes, representam, sem dú­vida, a forma de remuneração adequada. No entanto, para aque­les que já demonstraram qualidades e merecem efetivamente a qualificação de pesquisadores, devem ser oferecidas posições que reúnam certo número de atrativos.

Problema sobre o qual tem havido discussões é o de saber se nas universidades devam existir cargos diferentes para pes­soal docente e de pesquisa. Julgamos que essa discriminação é desnecessária porque, conforme já expusemos anteriormente, todos os que ensinam devem pesquisar e todos os que pesquisam devem ensinar. Isso constitui um truísmo que, consagrado pelas uni­versidades alemãs no século passado, serviu de base à filosofia das universidades americanas. como acentua Ulich, o "professor

universitário não deve representar um pregador de verdades supostamente estabelecidas mas um líder na busca da verdade onde ela estiver". Muito expressivo é, igualmente, o pensamento de Bohannan a respeito: "O trabalho do docente (Scholar) não é ensinar ou pesquisar. É ensinar-com-pesquisa, o que cons­titui uma atividade invisível". Assim o problema da denomi­nação do pessoal universitário é questão de somenos. Importa

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é que sejam oferecidas posições com possibilidades de acesso gra­dual em função do tempo e do mérito e com uma retribuição financeira que assegure ao trabalhador científico viver com dig­nidade e sem os tormentos que gera a falta de recursos. Outras vantagens adicionais devem ser deferidas no referente a estabi­lidade relativa, aposentadoria, assistência à família, etc.

sobre o tempo integral, acreditamos ser ponto pacífico estar na consciência de todos que, sem êle, não pode haver trabalho científico sério, princípio já consagrado nos países onde a pes­quisa é largamente praticada. Bem entendido, que tempo inte­gral ou dedicação exclusiva não deve ser conceituado de forma restrita e sujeita a uma rígida regulamentação. Importa é que o cientista desenvolva todas as suas atividades em ensino e pes­quisa dentro de um só campo de trabalho em um mesmo local. Aliás esse é o conceito vigente em muitas universidades ameri­canas, onde cada pesquisador ou docente tem seu programa de pesquisa, mas paralelamente pode ministrar vários cursos, par­ticipar de comitês científicos, receber encargos para escrever trabalhos remunerados sobre sua especialidade, tudo dentro de um regime de relativa liberdade desde que seus compromissos fundamentais sejam satisfatoriamente atendidos.

Falha saliente, entre nós, é a que diz respeito a pessoal auxiliar de nível médio. Em nosso meio predominam dois tipos de pessoal, o diplomado, doutor ou o indivíduo de nível muito baixo que só pode ser aproveitado em tarefas rudimentares, como as de servente. não existem cursos destinados aos chamados technicians, de sorte que os poucos elementos que existem nessa categoria são improvisados e não possuem as qualidades necessá­rias. Para o preenchimento dessa lacuna dever-se-ia estimular a criação de cursos, principalmente nas escolas técnicas. É claro que os lugares a serem preenchidos por esse pessoal devem ofe­recer um mínimo de condições para que constituam um real atrativo. É importante acentuar que a carência desse pessoal de nível médio em nossas instituições é fator limitante da pro­dutividade dos cientistas, obrigados que são a cumprir tarefas materiais muito penosas que poderiam ser realizadas por esses elementos auxiliares. Naturalmente, longe estamos de admitir que o cientista não deva realizar tarefas materiais. Pelo contrá­rio. Nesse sentido nosso pensamento se identifica com o de Ortega y Gasset, quando afirma: "É mister que o intelectual manipule as coisas, que conviva com elas; coisas materiais se é um físico, coisas humanas se é um historiador... É demasiado fácil pensar. A mente em seu vôo só nela mesma encontra resis­tência. Por isso é tão importante para o intelectual palpar objetos materiais e aprender com o seu convívio uma disciplina de contenção".

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Chegamos agora a um ponto relevante de nossa discussão. É o que diz respeito aos fundos para a pesquisa, a seu financia­mento. Em nosso país todos os meios financeiros para a educa­ção e a investigação científica provêm do Governo. A iniciativa privada, seja por desinteresse ou incompreensão, apesar das van­tagens nas deduções sobre o imposto de renda, nada contribui para o trabalho científico. São raros os homens de posses, como Guilherme Guinle, cuja memória reverenciamos, que prestam ajuda à ciência. não há entre nós fundações, como existem, por exemplo, nos Estados Unidos, poderosas, com patrimônios enormes e que dedicam à pesquisa grande parte das despesas, naquele mesmo país ou no estrangeiro, como vem fazendo a bene­mérita Fundação Rochefeller em todo o mundo. O fato é que a fonte quase única dos recursos para a investigação é o orçamento da República. Se é um mal ou um bem, se certo ou errado, não vamos discutir.

No tocante ao volume dos recursos globais despendidos pelo Governo para as universidades em geral e em particular para a investigação científica, não há dúvida que os orçamentos são insuficientes, consideradas as razões atrás expostas, onde pensa­mos ter ficado bastante claro que o progresso do país, ou mesmo sua sobrevivência, depende do desenvolvimento da pesquisa cien­tífica e conseqüentemente de seu desenvolvimento tecnológico. não há exagero em afirmar que o próprio progresso nacional estará comprometido se não fixarmos uma diretriz segura para nosso desenvolvimento científico. Defrontamos o perigo de, na ocasião em que começamos a nos tornar independentes na impor­tação de bens, combustíveis e equipamentos, nos vermos conde­nados à subordinação científica e cultural porque nossa indústria sem o apoio de uma ciência autônoma só produz empregando métodos e técnicas importados. A libertação econômica nacional só será uma realidade quando alcançarmos independência com­pleta firmada em nosso espírito criador em todos os campos do saber. Compete portanto ao Governo, como principal fonte supri-dora dos recursos para o trabalho científico aplicar liberalmente nesse campo onde não estará certamente realizando gastos, mas sim procedendo ao mais útil dos investimentos.

As universidades e as instituições de pesquisa são as únicas organizações onde não se pode pensar em fazer economia, cortar orçamentos ou incluir em planos de limitação de despesas. Natu­ralmente que ao Governo compete cobrar os lucros desses inves­timentos, lucros esses representados por gerações de cientistas, profissionais e técnicos capazes e pela produtividade científica, enfim por uma contribuição positiva ao progresso do país. As universidades, no entanto, devem antecipar-se a essa tomada de contas, e colocar-se numa posição em que tenham autoridade para

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exigir do Governo, por serem os órgãos mais atuantes no processo da afirmação nacional. É este o nosso dever. Esta é a nossa posi­ção firmada em uma consciência perfeitamente lúcida e convicta do papel que nos compete dentro da comunidade brasileira. Acre­ditamos ter ficado demonstrada a tese que nos propusemos: a investigação científica é um dever social das universidades. É o principal caminho para nos conduzir ao que todos almejamos. Um Brasil em paz, em progresso, um Brasil melhor!

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A EDUCAÇÃO E OS ESTUDOS PEDAGÓGICOS NO BRASIL

LOURENÇO FILHO professor Emérito da Univ. do Brasil

CONDIÇÕES G E R A I S DO DESENVOLVIMENTO EDUCACIONAL

As origens da educação no Brasil são similares às de outros países da América Latina. Buscaram os colonizadores portugue­ses, malgrado as dificuldades de ordem demográfica, econômica e política, transplantar para os trópicos as formas e o espírito da cultura católica e renascentista da Europa. As primeiras realizações educativas devem-se a membros da Companhia de Jesus que desde 1549 acompanhavam os colonizadores, e, assim também, um pouco mais tarde, a representantes de outras ordens religiosas, franciscanos, beneditinos e carmelitas.

Empenharam-se os jesuítas na catequização dos indígenas e seus filhos e na instrução de descendentes dos colonizadores. A seus conventos chamaram "colégios", de que foram particular­mente famosos os de Salvador, na Bahia, com Manuel da Nóbrega, e Piratininga, em São Paulo, com José de Anchieta. neles ensi­navam-se a leitura e os princípios mais simples da dogmática cató­lica. Os recursos metodológicos eram os de que se utilizava a ordem jesuítica, ao tempo: memorização e exercícios espirituais sob rigorosa disciplina, na forma dos preceitos pedagógicos da Companhia de Jesus, mais tarde compendiados no Ratio Studio-rum.1

Ademais, iniciaram os jesuítas esforços no sentido de orga­nizar alguns centros de formação humanística, em seminários menores e maiores, e os desenvolviam quando, em 1759, o mi­nistro de Dom José I, Marquês de Pombal, decidiu expulsar esses religiosos das terras do império português. Pombal estabeleceu

Transcr i to de Decimalia, Biblioteca Nacional , Rio de Janei ro , 1960.

1 LEITE, Pe. Serafim, História da Companhia de Jesus no Brasil, 5 vols., Civilização Brasileira, Rio de Janei ro , 1938. O Ratio Studiorum, organizado pelo Pe . Cláudio Aquaviva, é de 1599. Há versão por tuguesa comentada pelo P a d r e Leonel F ranca , Liv. Agir, Rio de Jane i ro .

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um imposto local sobre gêneros alimentícios e bebidas, o "subsí­dio literário", com a renda do qual pretendia criar e manter um sistema de escolas elementares. Sua queda impediu, no entanto, a realização do projeto, obstada também pela falta quase absoluta de pessoas habilitadas para o ensino. Ao findar o período colo­nial, para uma população avaliada em 200 mil habitantes nas vilas e cidades, não havia mais que; cinco dezenas de escolas devi­damente organizadas.2

Em 1808, transferiu-se de Lisboa para o Rio de Janeiro a corte portuguesa, e o Brasil, sete anos depois, foi elevado à cate­goria de reino-unido. O ensino elementar não experimentou melhoria em quantidade ou qualidade, mas seria iniciado o ensino acadêmico. O príncipe regente D. João (depois D. João VI) criou escolas para formação de um escol necessário às funções civis do Governo e postos militares, e dois cursos cirúrgicos; mais tarde, chamaria ao país uma missão de artistas franceses, de que devia resultar em 1820 a fundação de uma escola de belas-artes. Às influências da cultura portuguesa logo assim se jun­tavam as de origem francesa.3

Declarada a independência, em 1822, mostraram as câmaras constituintes grande empenho num programa de instrução popu­lar. O projeto da carta política da nova nação, elaborado no ano seguinte, refletia as idéias liberais da revolução francesa. Pretendia-se que cada vila tivesse uma escola primária, cada comarca um colégio secundário, e os locais mais apropriados, universidades. Era programa demais avançado para o meio. O imperador Pedro I dissolveu as constituintes e, na carta que de­pois outorgou ao país, foram as preocupações de instrução pública reduzidas à declaração de que cada cidadão teria direito à ins­trução primária gratuita. A primeira lei de valor positivo, promulgada em 1827, declarava que se deveriam fundar escolas de primeiras letras em todas as cidades, vilas e lugares mais povoados do império. No mesmo ano, criaram-se dois cursos jurídicos, um no norte, no Recife, e outro no sul, em São Paulo, destinados a formar profissionais para a estruturação e defesa dai ordem jurídica nascente.

No ensino primário, todavia, foi insignificante o progresso. As idéias da era colonial permaneciam, não se havendo a elas juntado senão as práticas do "ensino mútuo", consistente no

2 CENTRO BRASILEIRO DE PESQUISAS EDUCACIONAIS, Fontes para o Estudo da

Educação no Brasil, Bahia, Ins t i tu to Nacional de Estudos Pedagógicos, Minist. da Educação, Rio, 1959.

3 P a r a o estudo da educação ao tempo do reino-unido, como de todo o império, cf. MOACYR PRIMITIVO, A instrução pública no Império, 3 vol., Cia. Edit . Nacional, São Paulo, 1936-38.

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aproveitamento, como auxiliares dos mestres, dos alunos mais adiantados, na forma experimentada algum tempo antes na Ingla­terra, por Bell e Lancaster.

Em 1831, Pedro I abdica em favor de seu filho Pedro de Alcântara, então com cinco anos de idade. O Governo é exer­cido por diferentes regentes. Entende-se, e não sem razão, que o pequeno desenvolvimento do ensino se devia à excessiva cen­tralização administrativa, em país tão vasto e de difíceis comu­nicações. Assim, em 1834, foi reformada a constituição por um Ato Adicional que, entre outras providências, deu competên­cia às assembléias provinciais para regularem a instrução primá­ria e secundária. Dependentes do Governo imperial, ficavam apenas as escolas superiores e o ensino primário da capital do país. não obstante, em 1838, funda-se o Liceu Imperial, depois Colégio Pedro II, destinado a servir de padrão às escolas secundá­rias. Aí se inaugura orientação mais realista, com estudos de ciências naturais, ensinadas em quatro anos, dos seis que com­preendia o curso.

Da liberdade de legislar sobre o ensino pouco se valeram as províncias. Várias delas logo organizaram escolas normais: Niterói, em 1934, a primeira instituição oficial do gênero em todo o continente; Bahia, 1836, e Ceará, 1845. Assim vieram a existir núcleos de formação de mestres primários e, com eles, os primei­ros estudos de cunho pedagógico, embora rudimentares.

As condições sociais e econômicas, fundadas na escravidão negra e na agricultura extensiva, de moldes primitivos, não recla­mavam mais desenvolvimento da educação do povo. Aos escra­vos era proibida a matrícula nas escolas. Em 1872, para um continente demográfico de nove milhões, todas as escolas, públi­cas e particulares, só possuíam 140 mil alunos; e, ainda ao fin­dar-se o império, em 1889, para 13 milhões, apenas 250 mil alunos existiam.4

não faltaram, no entanto, grandes planos e projetos. Ter­minada a guerra em que se envolveu o Brasil com o Paraguai, novas idéias liberais passaram a ser agitadas em vários campos, inclusive nos da educação. Desde 1873, por mais de dez anos, funcionaram no Rio de Janeiro cursos livres de conferências sobre assuntos pedagógicos, e, para divulgá-los, uma revista pas­sou a ser publicada. Criaram-se, igualmente, algumas associa­ções interessadas na difusão do ensino elementar e profissional, destinando-se este último a crianças desvalidas.

4 PIRES DE ALMEIDA, H. R., L'instruction Publique au Brésil, Rio de Ja­neiro, 1889.

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Em 1874, João Alfredo defende no parlamento a idéia de se criarem escolas profissionais por todo o império, bem como a de se fundarem bibliotecas populares. Cinco anos depois, Leôncio de Carvalho apresenta um projeto de subvenção às esco­las primárias, criação de escolas ambulantes e cursos especiais para adultos. Pouco mais tarde, o ministro do império Rodolfo Dantas, depois de discutir os dispositivos do Ato Adicional, de­monstra que conviria disseminar escolas normais imperiais por todo o país e estabelecer um fundo econômico para o desenvolvi­mento da educação popular.

Essa iniciativa provocou de parte do deputado Rui Barbosa, na qualidade de relator da comissão de instrução pública, a elabo­ração de dois grandes pareceres, um sobre o ensino secundário e superior, e outro sobre o ensino primário. Tais documentos reúnem tudo quanto de melhor se conhecia à época em matéria de organização, administração e metodologia de ensino. De fato, propugnam pelos novos moldes de uma pedagogia intuitiva me­diante lições de coisas, salientam o papel social da escola, e apre­sentam idéias inteiramente novas quanto ao ensino secundário e superior, em relação aos quais passavam a influir idéias dos Estados Unidos. Tais pareceres, representam os primeiros gran­des estudos pedagógicos produzidos no Brasil.5

Proclamada a República, a 15 de novembro de 1889, criou-se o Ministério de Instrução Pública, confiado a Benjamim Constant Botelho de Magalhães, professor militar, propagandista das idéias republicanas e das doutrinas de Augusto Comte. De maio de 1890 a janeiro do ano seguinte, decretou o Governo provisório uma reforma de ensino secundário e superior, criando também o "Pedagogium", centro de estudos destinado a servir de órgão coordenador e impulsionador da educação. A morte prematura de Benjamim Constant e a supressão, pouco depois, do Ministério impediram que tais reformas viessem a ter cumprimento inte­gral. Ao mesmo tempo, as constituintes republicanas termi­navam seus trabalhos. A carta do novo regime, de fevereiro de 1891, mantinha a tradição do Ato Adicional em matéria de ensino público, delegando às antigas províncias, agora Estados, as diretrizes que as escolas deveriam seguir. Reservado ao Governo

central, ficava apenas o ensino superior. Separada a Igreja do Estado, encaminha-se a educação pública para a lai-cidade, o ensino livre e o enciclopedismo científico, espírito esse

5 BARBOSA, Rui, Obras Completas, vol. IX, 1882, Tomo I, Reforma do Ensino Secundário e Superior, e vol. X, 1883, Tomo I, II, I I I e IV, Reforma ão ensino primário e várias instituições complementares de instrução pú­blica, Casa de Rui Barbosa, Rio de Janeiro , 1937-1952. Tb. LOURENÇO FILHO, M. B., A Pedagogia de Rui Barbosa. Ed . Melhoramentos, São Paulo, 1954.

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que especialmente inspirou uma lei de reforma da educação do ensino secundário e superior, no ano de 1911. O regime esta­belecido, de estudos livres, com mínima ingerência governamen­tal, através de um conselho superior de ensino, durou apenas quatro anos.6

No plano federal, duas outras leis se sucedem nesses graus de ensino. No primário, no ensino normal e profissional, legis­lam apenas os Estados. Nalguns deles, considerável progresso então se verifica, com maior extensão da rede escolar e melhor preparação dos professores primários, por elevação do nível de estudos nas escolas normais. Isso se deu especialmente em São Paulo, Minas Gerais, Rio Grande do Sul, Paraná e Santa Cata­rina, e ainda no Distrito Federal. Nas demais unidades da Federação, embora houvesse iniciativas esparsas, a escassez de recursos sempre impediu maior progresso quantitativo do ensino popular.

. Desde 1900, por esta razão, vozes autorizadas no Congresso Nacional não cessavam de advogar mais direta intervenção do Governo federal na instrução elementar do país. Diversas auto­rizações legislativas se aprovaram em 1906, 1908 e 1910, sem resultado prático. Por fim, em 1917, estando o Brasil em guerra com a Alemanha, decidiu o Governo federal fechar as escolas alemãs nos Estados de Santa Catarina e Rio Grande do Sul subsi­diadas pelo Governo germânico, votando ao mesmo tempo auxílio para que essas unidades federadas abrissem novas escolas em substituição àquelas. Assim se efetivava, pela primeira vez, a ação supletiva da União na instrução primária.

Em 1922, promoveu o Ministério da Justiça uma conferência interestadual de ensino primário e secundário, para melhor coorde­nação dos esforços regionais e locais. Na reforma constitucional 1925-26, alguns deputados se bateram pela idéia de cooperação federal, sem maiores resultados. Nessa mesma década, refor­mas de novo espírito social dão-se em vários Estados e na capital da República: Ceará, 1922: Bahia, 1925; Minas Gerais, 1927; Distrito Federal, 1928, e Pernambuco, 1929. Refletiam elas o espírito de inquietação e mudança que se começava a operar na economia do país e suas instituições, como conseqüência da

6 como fonte p a r a o estudo da educação no período republicano a t é 1935, MOACYR PRIMITIVO, A instrução pública e a república, 7 vol., Ins t i tu to Nacional de Es tudos Pedagógicos, Rio, 1944. Tb., TEIXEIRA BRANDXO, A edu­cação nacional no regímen republicano, Rio, 1907, e o breve estudo inter­preta t ivo de BITTENCOURT, Raul , "Perspec t iva histórica dos ideais de educação no Brasi l" , in Rev. Brasileira de Estudos Pedagógicos, vol. VII , nº 20, fev. de 1946.

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primeira grande guerra. Debatem-se e experimentam-se as prá­ticas da escola renovada ou progressiva, e insiste-se nos fins político-sociais da educação popular.7

Para esse movimento, muito concorreu na época a Associação Brasileira de Educação, fundada em 1924, e a qual agremiou professores de todos os graus e ramos de ensino, além de juris­tas, médicos e homens de letras. A partir de 1927, passou essa instituição a convocar conferências nacionais de educação com o fim de debater e fixar uma política educacional para todo o país. Realizou também numerosos cursos de divulgação e levan­tou dois importantes inquéritos, respectivamente sobre o ensino secundário e o superior.8

A revolução nacional de 1930, na educação como em outros setores, veio agitar novas idéias e propor grandes reformas administrativas. O Governo provisório criou o Ministério da Educação e Saúde, atualmente denominado da Educação e Cul­tura ; reorganizou o ensino secundário, impondo aos estudos orga­nização seriada obrigatória; deu nova forma ao ensino superior, incentivando a criação de universidades, de que apenas duas ao tempo existiam, a do Rio de Janeiro, criada em 1920, e a do Estado de Minas Gerais, instituída em 1929. Estabeleceu ainda um convênio entre a União e os Estados para coleta, para siste­matização e divulgação das estatísticas educacionais, medida de importante significação.

Pela constituição de 1934, foi a União incumbida de traçar um plano nacional de educação, compreensivo de todos os graus e ramos, na conformidade de idéias defendidas pela Associação Brasileira de Educação. esse plano, logo elaborado pelo Con­selho Nacional de Educação, não chegou a vigorar, por se haver dado o golpe de estado de 1937, que estabeleceu uma nova carta política. Nela declarava-se a competência do Governo federal para fixar "as bases, a orientação e os quadros da educação nacional". Em conseqüência, expediu o Governo federal uma série de leis orgânicas do ensino industrial, comercial, secundário e, por fim, do ensino normal e primário.9

7 LOURENÇO FILHO, M. B., Introdução ao estudo da escola nova. Ed .

Melhoramentos, São Paulo, 1929, e LIMA, Alceu Amoroso, Debates Pedagógi­

cos, 1930.

8 Associação Brasi leira de Educação, O Problema universitário brasi­

leiro. A Encadernadora , Rio, 1928, e O Problema brasileiro de educação

secundária, Rio, 1929.

9 NÕBREGA, Wandick (coord.) Enciclopédia da legislação do ensino, 2 vols ,

Of. do J o r n a l do Comércio, Rio, 1952 e 1953.

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Duas importantes providências igualmente foram tomadas: a criação, em agosto de 1938, do Instituto Nacional de Estudos Pedagógicos, destinado a coligir documentação e a proceder a pesquisas educacionais de âmbito nacional;10 e abertura, no ano seguinte, da Faculdade Nacional de Filosofia, destinada a pre­parar especialistas em vários ramos do conhecimento, professores

secundários e técnicos de pedagogia. À exceção da Uni­versidade de São Paulo, estabelecida em 1934, pelo Governo desse Estado, onde estudos pedagógicos de nível superior já se ensaia­vam, não possuía ainda o país escolas especiais com tal objetivo. Ademais, outras medidas, direta ou indiretamente ligadas à edu­cação, passaram a ter grande influência. Assim, a instituição de um Fundo Nacional de Ensino Primário e a organização do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, o qual, mediante estudos das realidades nacionais, começou a ter decisiva influên­cia nas questões de organização e administração escolar.11

com o retorno ao regime representativo e elaboração de nova carta política em 1946, retomaram-se as idéias de descen­tralização administrativa, conservando o Congresso Nacional a prerrogativa de fixar as bases e diretrizes da educação de todo o país, mediante lei complementar à Constituição. Logo no ano seguinte, uma comissão especial, designada para elaborar o ante­projeto dessa lei, desincumbiu-se da tarefa. Remetido esse do­cumento ao poder legislativo, passaram-se no entanto mais de dez anos sem que o problema se resolvesse em definitivo. Na atual legislatura, obteve-se que o projeto fosse aprovado pela Câmara dos Deputados, embora com grandes modificações, e encaminhado ao Senado, onde se encontra.12

É desde os anos 20, portanto, que o pensamento educacional se firma no país e que seus estudos se multiplicam, em diferentes direções: investigação das condições reais da rede escolar exis­tente ; exame de problemas de biologia e psicologia experimental; desenvolvimento dos estudos demográficos, geográficos, econô­micos e sobre questões sociais diversas; análise das possibili-

10 O Instituto Nacional de Estudos Pedagógicos em sete anos de ativi­dade, Imp. Nacional, 1928. Edi tou esse órgão do Ministério da Educação e Cultura, ent re o ano de sua fundação e 1946, mais de uma centena de t rabalhos de documentação e pesquisas sobre a educação no país. esse t raba lho t em sido continuado com publicações do mesmo gênero. Desde 1944, edita t ambém a Revista Brasileira de Estudos Pedagógicos.

11 O Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística e a Educação, 2 vol., Serviço Gráfico do IBGE, Rio, 1941. Tb. TEIXEIRA DE FREITAS, N. A., O que

dizem os números sobre o ensino primário, Ed . Melhoramentos, 1938.

12 Diretrizes e Bases da Educação Nacional (Exposição de Motivos do Ministro Clemente Mariani , anteprojeto e projeto), Imp. Nacional, Rio, 1938.

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dades financeiras nos vários níveis da administração, municipais, estaduais e federais; e, também, a incrementação dos deba­tes de feição filosófica, no empenho de integração dos dados assim obtidos. Tal resultado, que se poderá chamar de tomada de consciência, advem do conhecimento das condições de infra-es­trutura do sistema educacional do país; do aumento demográfico, de 25 milhões, naquela década, para mais de 65 milhões atual­mente; da rápida transformação das bases da economia do país, que facilmente passou de um regime agrário extensivo para uma agricultura mais racional, e rápido desenvolvimento da indústria. Tudo isso veio acelerar o processo de vida social, acentuando a mobilidade de sentido vertical, e, conseqüentemente, destruindo a rígida estratificação existente, na qual só se admi­tia a educação para uma elite dirigente, não para o povo.

Ainda em 1935, as indústrias fabris não davam trabalho senão a 300 mil operários; hoje empregam cerca de dois e meio milhões de pessoas, em mais de 160 mil fábricas. O valor da produção industrial no mesmo prazo, calculado a preços constantes, aumen­tou vinte vezes. Além disso, adiantada legislação de caráter social (proibição de trabalho aos menores de 14 anos, salário mínimo, regulamentação do trabalho feminino e outras medidas de previdência social) passou a exigir medidas educacionais de grande vulto.

desse modo, o país toma conhecimento de seu próprio pro­cesso social e cultural, de que muitas obras, em diferentes setores e domínios, passaram a dar conta. Duas coleções de textos pedagógicos se organizaram por iniciativa de educadores. No ano de 1932, numeroso grupo de professores e intelectuais fêz divul­gar um manifesto que se chamou "dos pioneiros da escola nova". Uma grande obra de síntese é organizada mais tarde, por ini­ciativa do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, e na qual grande parte se consagra a questões educacionais.13

Assim, nos três últimos decênios, os estudos pedagógicos subiram do nível de simples proposição e revisão de procedimen­tos didáticos, como também de projetos mais ou menos líricos do ponto-de-vista político e administrativo, para o de debate das mais sérias questões objetivas do processo cultural da nação.

13 As duas coleções de textos pedagógicos referidas são : "Biblioteca de Educação" , desde 1927, organizada e dir igida pelo Prof. M. B. Lourenço Filho, e "Atualidades pedagógicas", p r imei ramente dirigida pelo Prof. Fe r ­nando de Azevedo e ora aos cuidados do Prof. J. Damasco Pena . A obra de síntese é a de Fe rnando de Azevedo, A cultura brasileira, Serviço Gráfico do IBGE, Rio, 1943. Há t rad . inglesa, "Brazil ian Culture", MacMillan. Nova York, 1950. Nova edição, de 1958, compreende t rês volumes com 796 págs., Edições Melhoramentos, São Paulo .

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A formação dos docentes no ensino elementar passou a ser feita em dois níveis, em escolas regionais para a formação de regen­tes de ensino, com quatro anos após o primário, e o de professores

primários, com um curso de sete anos, compreendendo os estudos do primeiro ciclo secundário, e mais três, de preparação técnico-pedagógica. A formação dos professores secundários e de ensino normal, dantes inexistente, veio a ser feita em cursos das faculdades de filosofia, ciências e letras, em quatro anos, depois de estudos completos de nível secundário. Preparam tam­bém essas faculdades, em cursos de especialização e aperfeiçoa­mento, orientadores educacionais e especialistas em educação (ba­charéis e licenciados em pedagogia).

ANALISE DA BIBLIOTECA PEDAGÓGICA

A produção pedagógica do país veio a ser, nos últimos tempos, um dos ramos bibliográficos mais bem estudados. Ao ser organizado o Instituto Nacional de Estudos Pedagógicos, logo tratou esse órgão de proceder a um levantamento retros­pectivo da produção dos estudos da espécie, com base em arrola-mento pouco antes iniciado no Ministério da Educação, através das coleções da Biblioteca Nacional. Publicou então esse órgão seis relações sucessivas de autores, títulos de obras, editores, local e data de cada publicação, seguidas de breve ementa. Tal levantamento compreendeu a produção dos estudos relativos à educação, excluídos os livros de uso dos alunos, no período de 1812 a 1944.14

com referência aos anos de 1946 a 1952, relações bibliográ­ficas anuais, de igual feição, acrescidas da indicação dos princi­pais artigos em publicações periódicas, passaram a ser divulga­das no Handbook of Latin American Studies, editado pela Fun­dação Hispânica da Biblioteca do Congresso, de Washington, que em todos os seus volumes na produção pedagógica latino-ameri­cana, destaca uma seção especial referente ao Brasil. De 1953 em diante, retomou o Instituto Nacional de Estudos Pedagógicos, pelo Centro Brasileiro de Pesquisas Educacionais, a êle filiado, e ainda de forma mais completa, esse trabalho, de que já publi­cou sete volumes.15

14 Vol. I, nº 1, 2, 3, 4 e 5, correspondentes aos meses de julho a no­vembro de 1944; e vol. XI, n' 4, maio de 1945, da Revista Brasileira de Estudos Pedagógicos.

15 Handbook of Latin American Studies, n. 11 a 18, The Hispanic Foun­dation, Library of Congress, Washington, 1945-1952; e Bibliografia Brasileira de Educação, vol. I a VII, Ins t i tu to Nacional de Es tudos Pedagógicos, Rio, 1933/59.

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O primeiro levantamento retrospectivo que, como vimos, compreendia 128 anos, incluiu 836 peças. Convirá observar a variação quantitativa por períodos de vinte e cinco anos, o que já por si indica o crescente interesse pelos estudos pedagógicos. De fato, entre 1812 a 1836, só se registraram sete obras; no período seguinte, 31; no terceiro e quarto, mais de uma centena em cada um, e, enfim, no último, mais de meio milhar.

Quais as tendências reveladas nas obras impressas nesses diversos períodos? Até 1882, decorridos mais de 70 anos depois da primeira publicação, a bibliografia pedagógica se resumia quase em relatórios oficiais, de escasso valor doutrinário e, às vezes, nem mesmo informativo, além de discursos de propaganda. Os relatórios se queixam, em geral, da deficiência dos dados numéricos pelos quais se pudesse avaliar do desenvolvimento esco­lar. Quando preocupações de ordem técnica aparecem, cifram-se em discutir o processo do "ensino mútuo". A primeira obra de doutrina sistemática data de 1865, numa adaptação do Compên­dio Prático de Pedagogia, de Daligault, devida a Joaquim Pires Machado Portela, que imprimiu nesse ano a primeira edição no Recife, vindo a dar logo após a segunda, no Rio. como obra original similar, tem primazia a de Carlos Augusto Soares Brasil, Compêndio de Pedagogia, editado em 1878. Pode-se, aliás, fazer idéia da pedagogia do tempo pelo título, um pouco longo talvez, mas elucidativo, de um opúsculo de Abílio César Borges, datado de 1866: Vinte anos de propaganda contra a palmatória e outros meios aviltantes no ensino da mocidade.

O primeiro trabalho referente ao ensino normal aparece em 1846; à educação higiênica, em 1868; ao ensino profissional, em 1876; ao de surdos-mudos, no ano seguinte. com referência à liberdade de ensino e obrigatoriedade escolar, imprimem-se vários panfletos, entre 1867 e 1876. O primeiro trabalho sobre cria­ção de universidades é de 1873; a idéia de um plano nacional de educação já em 1874 é exposta num folheto com esse título, por Januário da Cunha Barbosa. A expressão "educação nacio­nal" aparece como título de uma obra editada em 1878, e de duas outras, três anos depois. É curioso notar que nada menos de sete trabalhos relativos à educação física nesse período se publicam, o primeiro dos quais tem a data de 1828.

Nova fase é inegavelmente aberta ao pensamento pedagógico, em 1882 a 1883, com os grandes pareceres de Rui Barbosa já referidos. O mais simples cotejo entre a bibliografia até então existente e tais trabalhos demonstra que o ambiente geral do país não estava preparado para recebê-los. Pretendendo trans­plantar idéias de países mais adiantados, apresentavam concei­tos e aspirações não ajustados à realidade nacional.

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não obstante, o esforço de Rui Barbosa parece ter sido produtivo. De 1883 às vésperas da República, publicam-se mais desenvolvidos trabalhos sobre organização universitária, ensino secundário e administração escolar, entre os quais um volume do Visconde de Ouro Preto, que defendia a criação de um fundo escolar e a competência do Governo central para criar e manter estabelecimentos de ensino nas províncias. Entre os trabalhos lançados em 1884, figuram várias memórias apresentadas ao Congresso de Instrução, realizado no Rio de Janeiro no ano anterior. Delas, merecem especial menção um estudo de Maria Guilhermina de Andrade sobre os jardins de infância, outro de João Barbalho, relativo â coeducação dos sexos, e um terceiro, sôbre ensino primário obrigatório, composto por Sílvio Romero.

O ideal de educação popular, ainda que sob o aspecto de mera alfabetização, começa a ser defendido. Também a reforma de métodos didáticos se inicia. A aplicação dos processos do ensino intuitivo passa a ser tendência dominante. Em 1886, Rui Barbosa não desdenha traduzir as Primeiras Lições de Coisas, de Calkins. No ano seguinte, Camilo Passalaqua dá a público o volume Pedagogia e Metodologia, e, em 1888, Felisberto de Carvalho lança o seu Tratado de Metodologia.

A fase a seguir, dos primeiros anos da República, reflete as idéias de Benjamim Constant e o movimento do Pedagogium, e bem assim as da reforma escolar de São Paulo, inspiradas na organização escolar norte-americana.

Ao findar o século, José Veríssimo publica um veemente estudo, Educação Nacional, logo reeditado. Surgem revistas peda­gógicas, e multiplicam-se os compêndios de pedagogia. Apare­cem grandes trabalhos de Manuel Bonfim, Pinheiro Guimarães, Feliciano Pinheiro Bittencourt e Alfredo Gomes, entre outros.

A preocupação de adaptar-se o ensino à moderna psicologia começa a ter os seus primeiros reflexos depois de 1910. Em 1914, um trabalho de A. Sampaio Dória faz uma primeira refe­rência aos testes; nesse mesmo ano, aparece uma publicação do Laboratório de Psicologia da Escola Normal, de São Paulo, orga­nizado pelo especialista italiano, para aí contratado, Ugo Pizzoli. Surge também um estudo pioneiro sobre educação de deficientes mentais, escrito por Basílio de Magalhães.

De par com essas tendências de aplicação de novas doutri­nas, elabora-se um movimento em prol de maior adaptação da escola ao meio rural. Em 1918, Antônio Carneiro Leão publica o primeiro trabalho relativo ao assunto. Assim, o pensamento pedagógico começa a deixar as paredes da escola, debatendo pro­blemas de nacionalização e democratização do ensino. Estudos mais amplos de José Augusto e Monteiro de Sousa alcançam repercussão na tribuna da Câmara e na imprensa.

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Mas, à falta de apoio por parte da administração pública, volta o pensamento pedagógico a preocupar-se com temas de caráter técnico especializado. Em 1924, imprime-se o primeiro trabalho de exposição geral sobre testes psicológicos, devido a Medeiros e Albuquerque. Já em 1926, porém, um inquérito organizado pelo jornal O Estado de São Paulo agita novas idéias sobre as funções sociais da escola. É a partir desse ano que nova feição nos estudos se implanta, estimulada pelos trabalhos da Associação Brasileira de Educação, com seus congressos e inquéritos.

Depois de 1930, ganham também os estudos educacionais maior sentido de especialização e aprofundamento. Surgem tra­balhos de biologia, psicologia educacional, bem como os primeiros ensaios de história e filosofia educacional.16

Na década 1941-1950, algumas centenas de outros livros especializados sobre metodologia geral e especial, administração escolar, psicologia educacional, orientação educacional, estatística da educação e história da educação alcançam o grande público. Tomam decisiva importância as publicações de centros de pes­quisas oficiais, federais e estaduais, como também de algumas associações de educadores. Entre as primeiras, figura a série de publicações referentes à Campanha Nacional de Educação de Adultos, iniciada pelo Ministério da Educação no ano de 1947, e que prossegue.17

A partir de 1950, nova fase se inaugura, reclamada pelo desenvolvimento das condições econômicas e políticas. Já então, grandes temas de política educacional passam a ser expostos e debatidos, quer em face do projeto de lei de diretrizes e bases da educação nacional, quer também em função de certo desequi-

16 Servem de exemplo os seguintes t r aba lhos : CARVALHO, C. Delgado de, A escola como ajustamento social, Liv. Alves, Rio, 1931; LOURENÇO FILHO, M. B., Testes ABC, Ed. Melhoramentos, São Paulo, 1933; BACKHEUSER, E., Técnica da Pedagogia Moderna, Civ. Brasileira, Rio 1934; TEIXEIRA, Anísio, Educação progressiva, uma introdução à filosofia da Educação, Id. 1933; RAMOS, Arthur, Educação e Psicanálise, id. 1934; RABELO, Sílvio, Psicologia da Infância, id. 1937; TEIXEIRA, Anísio, Educação para democracia, id. 1937;

RUDOLFER, Noemy, Introdução à Psicologia educacional, id. 1938; ALMEIDA JÚNIOR, A. F., Biologia Educacional, id. 1939; AZEVEDO, Fernando , Sociologia

educacional, id. 1940. Em 1933, as obras principais de Lourenço Filho, e logo depois as de Everardo Backheuser e Fe rnando de Azevedo são t raduzidas p a r a o castelhano, com sucessiva edições nessa língua. Assim, o pensamento pedagógico brasileiro começou a influir no de outros países da América Lat ina .

17 CAMPANHA DE EDUCAÇÃO DE ADULTOS, Publicações de n. 1 a 12, Minis­

tério da Educação, 1947-1951.

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líbrio observado entre o crescimento da rede escolar primária e a do ensino médio e superior. A rápida expansão dos graus ulte­riores ao primário não foi, realmente, por este último acompa­nhada. De 1933 a 1950, a matrícula das escolas primárias cres­ceu de 90%, ao passo que o ensino médio, em 300%. No período de 1941 a 1950, a matrícula das escolas elementares aumentou na taxa de 60%, ao passo que a do ensino secundário cresceu em 230% e a do ensino superior, em 125 %. No mesmo prazo, a população total do país aumentou 27%. Tal situação, embora explicável pelo rápido desenvolvimento econômico do país, com escassos quadros culturais e técnicos, não podia deixar de alarmar os estudiosos da educação, sobretudo pelo aspecto social e político. E, na verdade, a produção bibliográfica está agora refletindo esses temores.18

A criação do Centro Brasileiro de Pesquisas Educacionais, como extensão do Instituto Nacional de Estudos Pedagógicos, com programa especialmente devotado aos estudos demográficos, eco­nômicos e políticos da educação, vem a refletir a mesma ordem de preocupações; igualmente, a criação no Conselho de Desen­volvimento, da Presidência da República, de uma Comissão Espe­cial de Educação e Cultura, para melhor planejamento das des­pesas públicas com a educação.19

não cessam os trabalhos de investigação sobre programas e procedimentos de ensino, mas seu tratamento é agora feito sob outros critérios, não só de eficiência didática estrita, como de visão social, ou amplamente política. Os estudos mais recente­mente publicados, como dantes se indicou, e uma nova série de monografias regionais lançada pelo Instituto Nacional de Estu­dos Pedagógicos assim o demonstram. Em suma, as obras peda­gógicas contemplam agora as questões de educação no país como um problema integral de cultura.20

18 A simples indicação dos t í tulos de a lguns t rabalhos i lus t ra a s i tuação refer ida: LOURENÇO FILHO, M. B., Análise da situação do ensino brasileiro,

Diário de Notícias, Rio, 1954; TEIXEIRA, Anísio, A educação e a crise brasileira,

Edit . Nacional, São Paulo, 1956, e Educação não é privilégio, Liv. José Olímpio, Rio, 1957; ALMEIDA JÚNIOR, A. F., Problemas do ensino superior, Ed . Na­cional, São Paulo, 1956, e E a escola primária, id 1958; AZEVEDO, Fernando , A educação entre dois mundos, Ed . Nacional, São Paulo, 1958.

19 O referido Centro vem editando desde 1957 u m a revista especializada, Educação e Ciências Sociais. Das publicações do Conselho de Desenvolvi­mento, destaca-se a de título Educação para o desenvolvimento, que con­t ém completa análise das despesas públicas com a educação, 2 vols., Rio. 1958.

20 Da série de monografias regionais fazem p a r t e : MOREIRA, J. Roberto, A educação em Santa Catarina; PILOTO, Erasmo, .4. educação no Paraná;

ABREU, Ja ime, O sistema educacional fluminense; SOUSA, J. Moreira de, Estu-

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CONCLUSÃO

como em outros domínios, nos últimos trinta anos os estudos pedagógicos brasileiros transitaram da feição acadêmica ou lite­rária em que por muito tempo estiveram, para um plano de análise objetiva, fundada na observação dos fatos e discussão dos pressupostos e métodos adotados. Em conjunto, estão per­dendo a feição axiomática de outros tempos, para se tornarem instrumentos de análise, reflexão e debate democrático.

esse novo espírito, não se poderá negar, deve-se especial­mente aos novos centros de estudos da especialidade, como o Ins­tituto Nacional de Estudos Pedagógicos e órgãos a êle filiados, tais como o Centro Brasileiro de Pesquisas Educacionais, a Cam­panha de Inquéritos e Levantamento do Ensino Médio e Ele­mentar, e a Comissão Nacional de Aperfeiçoamento de Pessoal em Nível Superior. Aos esforços desses órgãos, têm-se juntado os do Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial (SENAI). e do Serviço Nacional de Aprendizagem Comercial (SENAC). como ainda os das seções de pedagogia de várias universidades, em especial a de São Paulo.

O que tem justificado a instituição de tais órgãos de pes­quisa é o desenvolvimento geral das instituições escolares, que hoje assinalam a educação brasileira como dos maiores empreen­dimentos da vida nacional, quer pelo número de pessoas que envolve, quer pela soma das despesas que consome. No ano de 1958, essas despesas se elevaram a 30 bilhões de cruzeiros, ou aproximadamente 2% da renda bruta nacional.

O levantamento estatístico referente a esse ano registra mais de sete milhões de alunos nas escolas primárias de todo o país, ou seja, praticamente o dobro do total obtido há doze anos. Desde então, o número das escolas primárias elevou-se de 43.405 para 95.358.

No ensino médio, os estabelecimentos são agora 6.348, com 1.076.201 alunos e 88.937 professores.

No ensino superior, a matrícula inicial do corrente ano ascende a 84.481 estudantes, distribuídos em 19 universidades e duas centenas de estabelecimentos de ensino superior isolados,

do sobre o Ceará; MASCARO, Carlos Correia, Município e Ensino no Estado de São Paulo, com levantamento histórico, demográfico, econômico e propria­mente educacional de cada uma dessas unidades da federação. Também nessa série está publicado o volume Introdução ao Estudo do Currículo da Escola Primária, por J. Roberto Moreira, desenvolvimento no mesmo espírito de elevada orientação técnica.

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onde se ministram 387 cursos de formação profissional e técnica. O pessoal docente neles em serviço compreende 19.263 docentes, entre professores, assistentes e instrutores.

Quando se verifica que o número de alunos de grau primário, ainda em 1932, era inferior a dois milhões, os de grau médio apenas sessenta mil, e os de ensino superior, vinte mil, pode-se avaliar o caminho percorrido, e compreender por que há pro­gresso nos estudos pedagógicos do Brasil.

As perspectivas de interrupto desenvolvimento são evidentes. Nos institutos de preparação do magistério primário, em número de 1.119, estão agora matriculados 81.526 alunos; nas escolas de preparação do magistério secundário e formação de especia­listas em pedagogia, que são 62, a matrícula é de 18.453. Cerca de cem mil pessoas assim presentemente se dedicam aos estudos de educação. Por outro lado, o movimento associativo entre os educadores toma crescente consistência, e suas agremiações reali­zam cursos de extensão e aperfeiçoamento.

A fase que o país atravessa de intensa expansão industrial, ou, mais precisamente, de aplicação da grande tecnologia a todas as formas de produção, inclusive nos campos, vem inspirando uma política geral de luta contra o subdesenvolvimento econô­mico, melhor nucleamento demográfico e multiplicação das vias de transporte e comunicação.

Uma expressão dessa política está na recente transferência da capital do país, do litoral para o seu centro geográfico, no planalto central, em Brasília. Pode-se prever que esse fato terá profundas conseqüências de ordem material e cultural na vida brasileira, as quais virão a se refletir na marcha do pensamento pedagógico, em geral, e na organização de maiores e melhores realizações de ensino.

As grandes linhas de direção desse pensamento podem ser resumidas em três pontos: maior democratização do ensino; sentido realista da educação, visando ao desenvolvimento econô­mico ; e planejamento técnico racional, com maior aproveitamento dos recursos, que os poderes públicos já consagram às atividades educacionais.

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Documentação

XXIII CONFERÊNCIA INTERNACIONAL DE INSTRUÇÃO PÚBLICA

Reunida em Genebra de 6 a 14de julho de 1960, por convocação simultânea da Organização das Nações Unidas para a Educação, Ciência e Cultura e pelo Bureau Inter­nacional de Educação, adotou as seguintes recomendações, dirigidas aos Ministérios de Instrução Pública:

RECOMENDAÇÃO N.° 50

Dispõe sobre a elaboração e expedição dos programas de ensino secundário.

A Conferência,

considerando o interesse que a questão dos programas de estudo despertou nos organismos internacionais de educação e notadamente na comissão consultiva internacional dos programas escolares instituída pela Organização das Nações Unidas para Educação, a Ciência e a Cultura;

considerando a Recomendação n.° 46, aos Ministérios de Ins­trução Pública, relativa à elaboração e à promulgação dos pro­gramas do ensino primário, adotada em 15 de julho de 1958 pela Conferência Internacional de Instrução Pública, reunida em sua vigésima primeira sessão;

considerando que a crise de crescimento, que atravessa o ensino do curso secundário, impõe, além das modificações de estrutura, ordenação dos planos de estudo e dos programas esco­lares em função das diversas necessidades verificadas no plano nacional e internacional;

considerando que, em vista das informações submetidas à Conferência pelos Ministérios da Instrução Pública, mais da me­tade dos países acham-se atualmente empenhados em trabalhos de elaboração ou revisão dos programas do ensino secundário;

Transcrito do Bulletin du Bureau International d'Education, n.º 136, em tradução da Prof Marta de Albuquerque.

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considerando que o curso secundário até agora destinado a uma minoria, tende a acolher um número cada vez maior de crianças cujas aptidões intelectuais, origem social e atividades futuras podem ser as mais diversas;

considerando que a generalização do ensino secundário não deve resultar em declínio do nível geral dos estudos e da cultura;

considerando que, além de se desenvolver nos planos intelec­tual, moral, físico e estético, o ensino secundário deve igualmente preparar adolescentes para a vida e para o trabalho socialmente útil;

considerando que o acentuado progresso da ciência e da técnica reclama formas renovadas de pensamento e ação;

considerando que se expandiu o cabedal de conhecimentos e não cessa de crescer em ritmo cada vez mais intenso, tanto no domínio das ciências como no das letras e das artes;

considerando que a concepção de ensino secundário mais di­fundida se baseia num justo equilíbrio entre a formação huma­nista e a científica;

considerando que uma recomendação de alcance universal não estaria em condições de apreciar os múltiplos aspectos do caráter teórico peculiares à questão dos programas do ensino secundário e que, para ser eficaz, uma tal recomendação deve limitar-se ao enunciado de medidas práticas e efetivas;

considerando que, embora sintam aspirações semelhantes, os países cuja situação diverge bastante, devem encontrar soluções diversas para o. problema da elaboração e promulgação dos pro­gramas de ensino secundário,

submete aos Ministérios de Instrução Pública dos diferen­tes países a seguinte recomendação:

P R I N C Í P I O S G E R A I S P A R A A ELABORAÇÃO DOS PROGRAMAS

1. Na elaboração dos programas do ensino secundário convém levar em conta: a) Os diversos objetivos deste ensino; b) sua estru­tura, seja ela uniforme ou dividida em ciclos ou seções; c) importância relativa de cada disciplina ou grupos delas; d) meio onde se desenvolvem as crianças; e) possibilidades de assimilação por parte dos alunos, assim como necessidades e interesses próprios a sua idade e sexo.

2. Na falta de princípios absolutos a serem admitidos e aplicados com proveito em todos os países, pode-se reco­mendar, além da elaboração dos planos de estudo e dos programas, que se estabeleça justo equilíbrio entre

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os diversos aspectos da educação (intelectual, moral, social, manual, físico e estético) de maneira a assegu­rar a cada aluno desenvolvimento integral e harmo­nioso.

3. Para que se consiga esse equilíbrio, convém não perder de vista, quando da elaboração dos programas, que cada disciplina pode contribuir, sob formas diversas, não somente para enriquecer os conhecimentos do aluno, como também desenvolver sua personalidade e orien­tá-lo diante do mundo que o cerca.

4. Convém atribuir à formação moral o lugar que as cir­cunstâncias atuais exigem, recomendando aos professores

que realcem o valor moral e social dos conteúdos da aprendizagem servindo-se de casos concretos que possam surgir com seus alunos na escola ou fora dela.

5. Deve-se estimular a dupla tendência de intensificar a iniciação ao trabalho e os conhecimentos de ordem prá­tica e profissional no ensino secundário, bem como ampliar conhecimentos de cultura geral nas escolas técnicas e profissionais de nível médio.

6. Sem acrescentar matéria nova aos planos de estudo, deve-se, na elaboração dos programas, realçar a con­tribuição que o ensino de certas disciplinas pode trazer à compreensão, à paz e ao bom entendimento entre os povos e as raças.

7. Os programas do ensino geral de nível médio devem ser considerados uma continuação natural dos progra­mas do ensino primário; em conseqüência, convém que propiciem tanto na fase inicial do 1.° ciclo do ensino secundário, como na do segundo, as transições indis­pensáveis para evitar aos alunos esforços excessivos de adaptação, motivo de desencorajamento e de fra­casso.

8. Além da elaboração dos programas do ensino secundá­rio, convém, na medida do possível e sem prejuízo da marcha normal dos estudos da maioria dos alunos, levar em conta as exigências dos estabelecimentos do ensino pós-secundário.

PRINCÍPIOS CONCERNENTES À ESTRUTURA DO ENSINO

9. Nos países em que o ensino secundário abrange dois ciclos, os programas deverão levar em conta seus obje­tivos ; o primeiro ciclo apresentando caráter mais geral e constituindo a seqüência lógica do curso primário; o

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segundo ciclo oferecendo a possibilidade de dar maior importância a determinadas disciplinas, podendo cons­tituir, em certa medida, preparação a estudos mais avançados.

10. Naqueles onde o primeiro ciclo do ensino secundário constitui, no todo ou em parte, ciclo de orientação e de cultura geral comum a todos os alunos, solução que merece ser mais difundida, o conteúdo e a ordenação dos programas deveriam dar oportunidade de escolha aos alunos, bem como facilitar o trabalho de seleção dos mestres e especialistas que se incumbem dessa tarefa.

11. Nos países em que o ensino secundário é diversificado em seções e onde os programas levam em consideração os objetivos particulares de cada uma delas, deve-se atentar para os objetivos de caráter mais geral do conjunto; da mesma maneira, nos países onde os pro­gramas prevêem matérias optativas a fim de atender às necessidades, interesses e aptidões dos alunos; con­vém assegurar que o ensino dessas matérias não se faça em detrimento das disciplinas indispensáveis à formação geral dos alunos.

12. Naqueles onde o ensino secundário não é diversificado e apresenta, conseqüentemente, caráter bastante uni­forme, convém prever todas as facilidades para adaptar os programas às necessidades, interesses e aptidões dos alunos.

13. Os programas de estudo devem ser concebidos de ma­neira que, nos diferentes níveis de escolaridade secun­dária, os alunos tenham possibilidade de acesso de uma seção a outra, ou do ensino geral a outro de tipo especializado e vice-versa.

PRINCÍPIOS CONCERNENTES AO CONTEÚDO DOS PROGRAMAS

14. Os programas devem ser estabelecidos por períodos de estudo, tendo em vista os objetivos previstos para cada classe, as aptidões, as possibilidades e os interesses dos alunos nas diferentes idades, assim como o tempo efe­tivo que pode ser reservado ao ensino correspon­dente.

15. Para serem eficazes, os programas de ensino secundá­rio devem ser adaptados aos alunos das classes a que são destinados.

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16. O conteúdo do programa de cada disciplina deve ajus­tar-se aos objetivos específicos da aprendizagem dessa disciplina e aos objetivos gerais do ciclo ou da seção em que é ensinada.

17. Determinar a importância relativa de cada disciplina é um aspecto essencial para a elaboração dos pro­gramas, devendo e a distribuição das matérias ser revista periodicamente, levando em consideração a evo­lução das condições sociais e as conclusões mais recen-tea da pesquisa pedagógica.

18. É evidente que, nas diversas seções do ensino secundá­rio, as disciplinas que as caracterizam devem ocupar lugar preponderante, o que não impedirá que as outras disciplinas mereçam a importância que lhes é devida, mesmo quando os estudos em questão sejam confirma­dos por exame de tipo especializado.

19. Convém assegurar que os programas das diversas maté­rias não fiquem isolados em compartimentos estanques, mas, ao contrário, que se tire proveito das conexões que podem existir entre disciplinas diferentes, assim como de possibilidades que elas ofereçam de se comple­tarem mutuamente, contanto que se evite qualquer duplicidade e repetição inúteis.

20. A tendência bastante freqüente de sobrecarregar os planos de estudo e os programas, seja pela introdução de matérias novas, seja pelo desenvolvimento do con­teúdo de cada disciplina isoladamente, constitui sério risco; para impedi-lo urge que a introdução de noções novas seja compensada pela supressão de outras menos importantes, e que a seleção de noções essenciais subs­titua o enciclopedismo dos programas.

NORMAS PARA ELABORAÇÃO DOS PROGRAMAS

21. Qualquer que seja o órgão responsável pelo ensino secundário, a elaboração dos programas corresponden­tes deve competir a setores especializados junto aos quais a representação do corpo docente fique assegu­rada.

22. É indispensável que a elaboração e revisão dos pro­gramas de cada disciplina do ensino secundário sejam confiadas, antes de tudo, aos especialistas da disciplina em questão, levando em conta que, no primeiro ciclo desse ensino, talvez seja preferível entregar várias disciplinas conexas a um mesmo professor.

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23. Quando a elaboração dos programas é confiada a gru­pos de especialistas, deve-se criar condições para que haja coordenação entre esses diversos grupos e que obedeça a princípios comuns em suas tarefas; convém recomendar a esses grupos de trabalho que se conside­rem como partes constitutivas de um todo.

24. Convém seja assegurada a coordenação dos trabalhos da elaboração dos programas, não somente no que diz respeito às diferentes disciplinas que figuram no plano de estudo do ensino secundário, mas também em rela­ção ao ensino que o precede, ao que lhe é posterior e ao que ocupa situação paralela; para realizar tal coordenação, deve-se recorrer aos professores que per­tençam a outras modalidades de ensino (primário, nor­mal, técnico-profissional, superior).

25. É indispensável que os setores encarregados da elabo­ração dos programas possam beneficiar-se do conheci­mento de especialistas em questões de didática e psico­logia do adolescente.

26. Para reforçar os laços entre a escola e o meio cultural, econômico e social, recomenda-se que os pais dos alu­nos e os representantes dos diversos órgãos, que, por motivos diversos, se interessam pelos problemas de educação, tenham oportunidade de expor seu ponto-de-vista sobre os programas.

27. Dada a importância das pesquisas psicopedagógicas na elaboração e revisão dos programas de ensino secundá­rio, é de toda conveniência que elas prossigam, nos centros bem dotados de recursos, com a participação, na medida do possível, de professores que se interes­sem por esse gênero de pesquisas.

28. Os setores encarregados da elaboração dos programas devem prever uma etapa preliminar de documentação, versando: a) sobre características e ritmo de desenvol­vimento dos alunos, no momento em que atravessam a crise da adolescência; b) os progressos científicos mais significativos realizados nos diferentes campos do en­sino; c) as contribuições novas da didática, especial e geral; d) o grau de preparação científica e pedagógica dos professores encarregados do ensino; e) as tendên­cias que condicionam a evolução cultural, social e econô­mica do mundo moderno; f) estudos comparados rela­tivos aos programas aplicados em outros países; g) o resultado das experiências realizadas, a esse respeito, no próprio país ou no estrangeiro.

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29. Antes de sua promulgação definitiva, convém que os programas, quando possível, sejam submetidos a ensaios cuidadosamente controlados, tanto nas escolas de tipo experimental, como nos estabelecimentos de regime normal do ensino secundário escolhidos para este fim; seja como fôr, convém efetuar gradativamente sua apli­cação de modo a permitir supressões que se tornem necessárias.

EXPEDIÇÃO DOS PROGRAMAS

30. Nos países onde os programas são expedidos pela auto­ridade central, devem eles apresentar certa flexibilidade para que possam adaptar-se às exigências de caráter regional ou local.

31. Nos de regime escolar descentralizado, é possível in­centivar os diversos setores responsáveis por sua expedição, coordenando esforços no sentido de eliminar as diferenças injustificadas que possam existir entre os diversos programas aplicados no mesmo país, redu­zindo, desse modo, os inconvenientes que resultam para os alunos de qualquer mudança de domicílio.

32. Considerando os inconvenientes que podem apresentar as reformas dos programas muito afins, convém não esquecer que o progresso científico realizado em certas disciplinas exige atualização mais freqüente de seus conteúdos, o que não acontece em outras matérias do ensino.

APLICAÇÃO DOS PROGRAMAS

33. Para melhor salientar a estreita relação existente entre a maneira de ensinar e o conteúdo dos programas, é desejável que estes sejam acompanhados de breve expo­sição sobre o conceito do ensino de cada disciplina e sugestões de ordem metodológica, inspiradas em traba­lhos realizados no campo da psicopedagogia e da peda­gogia experimental.

34. A promulgação de novos programas de estudo deve ser acompanhada de estágios práticos, de reuniões pedagó­gicas, de grupos de estudo, de artigos publicados na imprensa, etc, a fim de que os professores possam estar informados dos princípios em que se inspiram as modificações propostas.

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35. A formação pedagógica, teórica e prática dos professores do ensino secundário deve incluir o estudo dos

programas que lhes compete aplicar.

36. É preferível considerar os programas antes um rotei­ro que um código rígido excluindo as adaptações jul­gadas oportunas e a liberdade do professor.

37. Faz-se mister providenciar para que se assegure, na medida do possível, e levando em conta as despesas que isso deve acarretar, a adequação dos manuais aos novos programas.

38. Convém igualmente tomar medidas necessárias para que, na reformulação dos programas, os estabelecimen­tos disponham de salas bem equipadas com material didático e os diversos instrumentos de ensino (apare­lhos de laboratório, recursos audiovisuais, etc.,) ade­quadas aos novos programas.

39. No desenvolvimento das unidades de cada disciplina, urge considerar as necessidades dos alunos cuja apren­dizagem é mais lenta ou mais rápida do que a média; diversos meios podem servir a este objetivo, notada­mente a ajuda e o estímulo pessoais durante a aula e a organização das atividades extra-escolares.

ASPECTOS INTERNACIONAIS DO PROBLEMA

40. O movimento crescente de pessoas, entre os diversos países, acentua cada vez mais o problema da equivalên­cia dos estudos e diplomas no ensino de nível médio; sem pretender a unificação dos programas, cabe envi­dar esforços para atingir uniofrmidade suficiente que facilite o reconhecimento dos estudos secundários reali­zados no estrangeiro.

41. Contatos visando estabelecer maior uniformidade na terminologia utilizada para designar as matérias do ensino, ou que permitam empreender estudos compa­rativos das semelhanças e diferenças essenciais obser­vadas nos programas escolares dos diferentes países, contribuirão para resolver o problema das equivalên­cias.

42. Além dos manuais escolares, as coleções internacionais de programas de estudo interessam primordialmente, não apenas aos especialistas que os elaboram, mas tam­bém às autoridades escolares e os professores; igual-

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mente os centros nacionais de documentação pedagógica precisam equipar-se a fim de atualizar as coleções desse gênero.

43. Nos planos de assistência técnica de caráter nacional ou internacional, convém prever a designação de espe­cialistas capazes de participar ativamente da elaboração dos programas atendendo a solicitações dos países in­teressados.

RECOMENDAÇÃO N.° 51

Dispõe sobre o ensino especial para débeis mentais

A Conferência,

considerando os princípios já enunciados pela Conferência Internacional de Instrução Pública sobre a organização do ensino especial em sua 7.a Recomendação, adotada em quatorze de julho de mil novecentos e trinta e seis, em sua quinta sessão;

considerando que o direito à educação, proclamado pela Decla­ração Universal dos Direitos do Homem, aplica-se a todos os indivíduos, que dela se podem beneficiar, inclusive os menos dotados;

considerando que a idéia do ensino obrigatório para todos é universalmente aceita e que já é aplicada em numerosos países;

considerando a desvantagem econômica, social e cultural que representa para um povo a existência em seu meio de deficientes mentais, em número apreciável, muitos dos quais poderiam tor­nar-se elementos úteis se fossem convenientemente educados;

considerando que se deve tirar proveito das aptidões indi­viduais demonstradas por uma criança débil mental, com o obje­tivo de encaminhar sua educação;

considerando que, graças aos progressos alcançados pela medicina, pela psicologia da criança e pela pedagogia clínica, existem meios de identificar as crianças que sofrem de deficiên­cia mental, e de promover sua formação por métodos baseados na diferenciação e na individualização do ensino;

considerando que a aplicação de métodos de educação dife­renciada não deve implicar a segregação completa da comuni­dade infantil, que tem necessidade de participar da vida em co­mum para nela vir a integrar-se e que o professor avisado pode tirar partido desta situação, suscitando nas crianças dotadas de aptidões diversas atitudes que favoreçam melhor compreensão mútua;

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considerando que, em cada país, o problema da expansão do ensino especial para débeis mentais está sempre relacionado com o nível de aproveitamento dos alunos normais e que, para orga­nizar este ensino especial, deve-se levar em conta as diferenças existentes entre as grandes e pequenas cidades;

considerando que os problemas relativos à educação especial devem merecer tanto mais atenção no âmbito da cooperação cultural entre as nações e nos programas de assistência técnica, quanto esses problemas, embora prementes, não puderam ainda ser tratados sistematicamente em certos países;

considerando que, não obstante visarem a propósitos comuns, compete aos países, de estrutura diversa, procurar soluções dife­rentes para o problema de organização do ensino especial de débeis mentais,

submete aos Ministérios de Instrução Pública dos diferentes países a seguinte recomendação:

READAPTAÇÃO

1. Onde as circunstâncias o permitam, convém que a rea­daptação de crianças débeis mentais seja desde o início da escolaridade e, se possível, a partir do período pré-escolar.

2. Para este fim, é indispensável que as técnicas de obser­vação e de psicometria, e os meios de diagnóstico de que dispõem os diferentes especialistas sejam aperfeiçoados de maneira a assegurar resultado tão objetivo quanto possível, evitando, entre outras coisas, que se confunda a debilidade mental orgânica com a debilidade mental aparente.

3. Convém outrossim levar em conta a maneira pela qual as crianças suspeitas de debilidade mental se compor­tam no meio familiar, social e escolar.

4. A decisão de retirar uma criança da escola comum e a escolha do tipo de classe ou escola para a qual será encaminhada competem às autoridades escolares, se possível com anuência da família; seria desejável que um período de observação precedesse qualquer deci­são.

OBRIGATORIEDADE ESCOLAR

5. todas as crianças débeis mentais reconhecidamente escolarizáveis têm direito à educação do mesmo modo que outras crianças; em conseqüência, às autoridades

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escolares cumpre oferecer-lhes educação de acordo com suas necessidades.

6. O princípio de obrigatoriedade escolar não pode ser invocado em se tratando da criança débil mental, a não ser na medida em que as autoridades escolares possam assegurar-lhe ensino adequado; convém mesmo reco­mendar que essa escolaridade se prolongue além do limite legal de obrigatoriedade.

7. Visto constituir o princípio de gratuidade corolário da obrigação escolar, convém que os débeis mentais se beneficiem de suas vantagens, mesmo que o ensino espe­cial exija contribuição financeira particular.

8. No caso de crianças débeis mentais que são obrigadas a freqüentar internato, é indispensável a previsão de créditos para ajudar os pais cujos meios não permitam pagar as despesas de pensão e de transporte, seja em instituição oficial ou particular.

ADMINISTRAÇÃO E CONTROLE

9. Nos países em que a importância do ensino especial o justifique, pode-se determinar que um serviço especia­lizado de instrução pública colabore para o desenvolvi­mento do ensino destinado a todos os tipos de crianças inadaptadas, sobretudo coordenando os esforços já rea­lizados neste setor.

10. No que diz respeito aos débeis mentais, o serviço de ensino especial deve promover, com seus próprios meios ou com a ajuda dos centros de documentação ou de pes­quisa pedagógica: a) conceituações precisas sobre diferentes categorias de débeis mentais; b) elaboração de estatísticas rela­tivas à proporção das crianças em idade escolar que entram nestas diversas classificações, assim como sobre a nível de escolarização; c) estudos referentes às ne­cessidades atendidas e por atender neste setor; d) con­cretização dos planos destinados a assegurar expansão racional e progressiva do ensino especial; e) estudo dos problemas decorrentes da formação profissional das crianças débeis mentais e possibilidades de colocações; f) estudo das diferentes formas de ajuda pós-escolar a ser prestada a essas crianças, etc.

11. O serviço de ensino especial deve assegurar o controle das instituições públicas e privadas, que lhe estão subor­dinadas; desde que o número desses estabelecimentos

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assim o justifique, esse controle deverá ser confiado a inspetores ou conselheiros especializados, capazes de orientar os professores e contribuir para o desenvolvi­mento deste ensino.

12. Onde não existir inspetores de ensino especial será con­veniente que os inspetores regulares, sobretudo aqueles que têm a responsabilidade de escolas situadas em pe­quenas cidades e em regiões rurais, dêem atenção ao encaminhamento dos casos isolados de debilidade mental e despertem o interesse de professores e autoridades escolares das organizações de proteção social.

13. A educação dos débeis mentais parece constituir um campo onde a colaboração entre a iniciativa privada e as autoridades escolares se pode revelar particularmente eficaz; assim sendo, convém estimular o esforço das associações privadas que geralmente têm assumido a vanguarda da educação e da proteção aos débeis men­tais e que, ainda agora, compensam por vezes a ausên­cia da ação oficial neste setor.

ESTRUTURA DO ENSINO ESPECIAL

14. Conhecida a variedade de formas de debilidade mental e as circunstâncias particulares de cada caso, é impor­tante prever diversos tipos de classes e de estabeleci­mentos que permitam um ensino diferenciado.

15. É preciso evitar tanto quanto possível o isolamento completo do débil mental de seu meio e principalmente das crianças mais bem dotadas, sem todavia deixá-lo competir com elas nas provas em que ficariam em si­tuação de inferioridade; em virtude disso é recomen­dável a instalação de classes especiais nas escolas co­muns.

16. Para os débeis mentais mais gravemente atingidos, as escolas especiais, com ou sem internato, parecem convir mais; o internato torna-se sobretudo necessário quando o domicílio dos pais é distante de externatos especiali­zados, quando o meio familiar é desfavorável ou quando a debilidade mental é acompanhada de perturbações de comportamento.

17. Nas grandes localidades de países que dispõem dos meios necessários e que resolveram os problemas sur­gidos pela obrigatoriedade escolar generalizada no nível do primeiro grau, justifica-se a instalação progressiva de classes e de escolas do tipo acima referido.

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18. Nas pequenas localidades e nas regiões de população muito dispersa, onde não é possível abrir uma classe ou uma escola especial, pode-se prever uma das seguin­tes soluções: a) ensino individualizado nas classes comuns; b) freqüência a uma classe ou a uma escola especial em localidade vizinha, com a condição de que sejam asse­gurados os meios de transporte e, quando necessário, uma refeição; c) ensino a domicílio no sistema de professores itinerantes; d) internato.

19. Nos países que ainda não possuem meios de organizar sistematicamente o ensino para débeis mentais, e mes­mo nos países onde a obrigatoriedade escolar não é ainda observada integralmente, convém prever, ao me­nos experiência-pilôto que permita escolarizar certo número de crianças débeis mentais, servindo como ponto de partida a um ensino especial autêntico.

MÉTODOS E PROGRAMAS DE ENSINO

20. O ensino dos débeis mentais, mais que qualquer outro, deve ser funcional e concreto; convém então recorrer aos métodos que estimulam as funções mentais para atividades que requeiram inteligência prática e facili­tem a aquisição de noções básicas.

21. O ensino deve ser intensamente individualizado para atender às aptidões, às necessidades e ao ritmo de apren­dizagem peculiares a cada criança e, de outro lado, prever atividades de grupo, relacionadas com o trabalho ou a recreação, tendo em vista o desenvolvimento da sociabilidade.

22. Pelas razões expostas, não se deve confiar, na medida do possível, mais de quinze alunos a um só mestre;

23. não se deve recear exercícios de recapitulação e de repetição destinados a fixar a aquisição dos mecanis­mos de base e de conhecimentos à altura das crianças débeis mentais, dando-se, no entanto, a devida impor­tância à educação do caráter e à formação de hábitos e de atitudes, social e moralmente aceitáveis, de ma­neira a desenvolver neles qualidades que possam com­pensar as deficiências intelectuais, inspirando-lhes, autoconfiança.

24. Convém salientar o valor da logopedia como meio de reeducação para as crianças débeis mentais.

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25. O jogo, a educação física e rítmica, o canto coral e a música, o desenho e as artes plásticas devem integrar a educação dos débeis mentais; são meios de expressão que podem ajudá-los na autodisciplina, no desenvolvi­mento harmonioso da personalidade.

26. Os trabalhos manuais ocuparão, desde o início, lugar primordial na educação dos débeis mentais e poderão, por conseguinte, servir de base a uma verdadeira ini­ciação profissional.

27. A colaboração entre a escola e a família é particular­mente eficaz no ensino para débeis mentais; ação con­tínua deve ser exercida pelo professor e, quando neces­sário, pela assistência social para dar consciência aos pais ou tutores das necessidades especiais da criança débil; sua participação em certas atividades escolares ou extra-escolares deve mesmo ser solicitada.

FORMAÇÃO PROFISSIONAL E ATIVIDADE POS-ESCOLAR

28. Se a escola especial não puder oferecer formação pro­fissional autêntica, será conveniente prever cursos com­plementares profissionais e oficinas de aprendizagem para débeis mentais, com períodos mais extensos de atividades escolares.

29. É necessário multiplicar as atividades que facilitem o ajustamento à vida quotidiana, bem como a integração no trabalho; em certos países, talvez se recomende o sistema "escola-emprêgo", que permite o trabalho em parte do dia sob controle da escola.

30. É preciso ajudar os jovens débeis mentais a encontrar empregos adequados, de maneira que a ação educativa não seja interrompida após a escola e que, recebendo um salário, os adolescentes não se tornem um peso para a sociedade; os serviços de orientação profissional e de colocação devem proceder ao inventário sistemático dos lugares que melhor convenham aos débeis mentais, principalmente na indústria.

31 . É indispensável a organização de um programa pós-es-colar para os débeis mentais; os serviços encarregados dessa atividade devem existir tanto no setor público como no particular; compete-lhes manter contatos regu­lares com os jovens débeis mentais e suas famílias, interessando-se por sua existência, levando-lhes a pro­teção social e os conselhos de que necessitam.

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PESSOAL

32. O ensino especial exige, tanto dos professores como dos educadores, qualidades de devotamento, paciência e tato, sem as quais uma preparação especializada, por mais completa, não dará os resultados esperados.

33. A educação dos débeis mentais apresenta problemas pedagógicos e psicológicos peculiares; deve-se prever, em benefício dos professores que a ela se dedicarem, cursos de especialização de duração suficiente, permi­tindo-lhes completar sua formação pedagógica geral; recomenda-se que os mestres em exercício sejam con­vidados a freqüentar cursos periódicos de aperfeiçoa­mento.

34. Os educadores encarregados das crianças no período fora de aula, e principalmente no internato, exercem papel essencial do ponto-de-vista pedagógico; é impor­tante prever, para eles, igualmente, formação especia­lizada, como já ocorre em vários países.

35. Na remuneração dos professores e dos educadores de­dicados ao ensino especial deve-se levar em conta, como é razoável, as dificuldades inerentes à tarefa e forma­ção complementar que possam ter recebido.

36. Reconhecendo-se a necessidade de intensificar as rela­ções entre o ensino comum e o especial e que grande número de professores pode encontrar entre seus alu­nos crianças acompanhando com dificuldade o ritmo da classe, é de toda conveniência que os professores e os inspetores do ensino comum recebam informação satis­fatória sobre os problemas dos débeis mentais.

37. Recomenda-se o recrutamento de inspetores do ensino especial, sempre que possível, entre professores que tra­balham neste ensino.

COOPERAÇÃO INTERNACIONAL

38. Aos países sem recursos financeiros e sem pessoal qua­lificado, que permitam a organização ou o desenvol­vimento do ensino especial, deve-se prestar assistência técnica, sob forma de concessão de bôlsas-de-estudo, auxílios para a pesquisa, ajuda material, envio de espe­cialistas, etc.

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39. Convém que a Unesco, agindo de comum acordo com os organismos e os especialistas que se interessam pela questão, adote, sem demora, uma classificação que ca-raterize os diversos tipos de crianças inadaptadas.

40. É de toda conveniência que a Unesco promova a cria­ção de um novo organismo internacional ou coordene as atividades dos que existem atualmente prestando assistência aos serviços do ensino especial de todos os países, fornecendo-lhes documentação constante de tra­balhos de pesquisa sobre readaptação, observação, téc­nicas, métodos, material didático, administração etc, relacionados com o ensino especial.

41. É igualmente desejável que a Unesco colabore com o Bureau Internacional de Educação e as outras orga­nizações internacionais interessadas, na ajuda aos paí­ses que se encontram em igualdade de condições, tendo em vista o confronto de suas experiências no campo do ensino especial.

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DISCURSO DE FERNANDO DE AZEVEDO ASSUMINDO A SEC. DE EDUCAÇÃO DA

PREFEITURA DE S. PAULO

Quando Prestes Maia, Governador desta cidade, me surpre­endeu com o honroso convite para com êle colaborar, no posto de Secretário de Educação e Cultura, já me estava despedindo da vida pública, tendo-me exonerado de algumas funções e dispon-do-me a renunciar a outras, para afastar-me, em futuro pró­ximo, de minha cadeira na Fac. de Filosofia da Univ. de São Paulo. Esta, uma das razões que me desaconselham a aceitar o cargo que o Sr. Prefeito resolvera confiar-me. Aleguei, ainda, como era meu dever, compromissos anteriormente assumidos, e, entre estes, o que tomara com meus editores; a necessidade de recolhimento para levar a termo obras em preparo, e, afinal, minha saúde que não é propriamente a de um rapaz e está longe de corresponder à vitalidade e resistência que me atribuem ami­gos e colaboradores. Das homenagens que me prestam os que acompanham de perto minha vida, inteiramente dedicada à edu­cação, à ciência e à cultura, não é a menor nem a menos cati­vante, a oposição, tantas vezes manifestada, à minha idéia de retirar-me da vida pública, a recusa a me verem envelhecer, como se os anos que correm para todos, não corressem também para mim, e minhas energias que às vezes a mim mesmo me espantam, pudessem ter, na atividade sem desfalecimentos, a fonte de sua perene renovação.

Mas, partindo de quem partiu este convite, de um homem eminente que ascende ao poder por uma consagração popular, e que conseguiu, pela sua competência e por suas virtudes, criar em torno de seu nome uma atmosfera calorosa de admiração, respeito e ocnfiança, senti-me no dever de reexaminar aquelas razões e esforçar-me por remover esses obstáculos, a fim de acudir ao apelo com que me honrou. O povo que lhe deu, por seu voto, tão notável vitória, dir-se-ia ter imposto, por sua expressa vontade, a todos os cidadãos paulistanos a obrigação de levar a Prestes Maia a colaboração que lhes fosse reclamada. esse dever, que é de todos, sem exceção, reveste-se, no meu caso,

A solenidade de posse teve lugar a 14 de abril de 1961.

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de um significado especial e se fortalece de um novo imperativo moral e cívico: a Câmara dos Vereadores conferiu-me, há pou­cos dias, o título de "Cidadão Paulistano" e, como uma honra implica sempre obrigações — honor, onus — toda honra é uma responsabilidade, um encargo, concedendo-me o título, impõe-me essa Assembléia deveres maiores, e, entre esses, o de não recusar qualquer serviço a São Paulo, nem posto algum, ainda que de sacrifício, que me fosse designado. Além disso, com a adminis­tração do nova Prefeito, abre-se a perspectiva de estreita colabo­ração entre os dois governos — o do Município e o do Estado de São Paulo, — colaboração indispensável à concepção e execução de qualquer plano, que se proponha a resolver ou a pôr em via de solução nossos problemas fundamentais. Entendidos e liga­dos os três governos, — da União, do Estado e do Município, — para uma grande obra de interesse comum, não se pode ter dúvida de que tudo que se projetar, será firmemente executado. É esse o outro motivo que influiu na minha decisão.

Já bastavam essas três considerações para vencerem minha relutância em aceitar encargo, em cujo desempenho terei de sofrer grande desgaste de energia. Para que me convocou, afinal, o Sr. Prefeito? Para enfrentar e resolver problemas de educação e cultura, e, mais particularmente, do sistema de educação públi­ca, primária e secundária, que aqui no município se começou a organizar. Minha atitude em defesa da escola pública é conhe­cida de todos. Fui eu dos primeiros que levantaram pelo "Mani­festo ao povo e ao Governo", lançado a 1.° de julho de 1959, seu protesto, amplamente justificado, contra o Projeto-de-lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, submetido agora à apreciação do Senado. A Constituição Federal de 1946 deter­mina expressamente que o ensino de todos os graus será minis­trado pelos poderes públicos, assegurada a liberdade de inicia­tiva privada dentro das leis que regulam a matéria. É o que, aliás, a Constituição do mais novo dos Estados da União — Estado da Guanabara — não só reafirmou, mas reforçou em termos ainda mais categóricos, quando declara que os dinheiros públicos devem ser aplicados exclusivamente na educação man­tida pelo Estado. A lei complementar, que a Carta Constitucional do país reclama, e em que se estabeleçam as diretrizes e bases da educação nacional, é uma lei sobre educação pública, de todos os tipos e graus, a que deve e tem de submeter-se toda e qual­quer iniciativa particular, nos domínios da educação. O projeto inverte, porém, os termos da questão: quando não estivesse nos seus propósitos, estará nas suas conseqüências o desenvolvimento à custa dos cofres públicos, das instituições particulares, rele-gando-se a plano secundário o que compete ao Estado e é seu dever constitucional.

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não é aqui, por oerto, o momento de debater essa questão, já amplamente discutida sob todos os seus aspectos e a todas as luzes pelos nossos mais eminentes educadores e pelas mais altas autoridades na matéria. Se a ela me refiro, é para de­clarar, sem rebuços e sem hesitações, que me mantenho fiel à minha posição, e é para o ensino público que se voltará meu pensamento, e é na solução de seus problemas que se empenha­rão todas as minhas forças. Por mais que tenha analisado a questão, depois do Manifesto, que fui encarregado de redigir, e, embora disposto, como sempre, a rever minhas idéias, a repen­sar meus pensamentos, a mudar de pontos-de-vista em face de novos fatos ou argumentos, parece-me ainda estar a boa causa exatamente com aqueles que desencadearam a campanha em que tomei parte ativa, na defesa da escola pública. Podia, pois, perguntar-me, se, tendo assumido atitude tão clara, franca e leal, me seria lícito recusar meus serviços no estudo e na solução de problemas que interessam à educação pública. Se tiver, como espero, o apoio do Sr. Prefeito, a cobertura da egrégia Câmara de Vereadores, a colaboração indispensável do Governo do Estado, a solidariedade do magistério e da imprensa, já manifesta, por expressões tão calorosas, nas simpatias com que acolheram a indicação do meu nome para a pasta da Educação e Cultura, não serei eu quem vá desfalecer, nas lutas que tenha de sustentar para pôr em prática as soluções mais adequadas dos problemas da escola pública. Atento às críticas e sugestões, e, depois de examiná-las sine ira ac studio, a decisão final caberá ao Sr. Pre­feito e a mim, e será firmemente executada, sejam quais forem as dificuldades com que tenha de arrostar na execução fiel do plano traçado.

Dentre os negócios que competem a esta Secretaria, uns dizem respeito à educação, propriamente dita, e outros, às ati­vidades culturais. No tocante à educação ou mais precisamente, ao sistema de ensino público primário, e secundário do Municí­pio, preciso declarar com a minha franqueza habitual, que fui contrário à maneira pela qual a municipalidade entendeu consti­tuí-lo, e radicalmente hostil a essa dualidade, — já em vários momentos transformada em antinomia e mesmo em polêmica, — de sistemas, que nada justifica e é extremamente prejudicial à educação de nossos filhos. E, começo a recear que esteja neste recinto, como Daniel na cova dos leões. Das duas soluções radicais, — a entrega, pelo Estado ao Município de toda a educação primária e secundária e a devolução integral dos dois tipos e graus de ensino ao Estado, a primeira, de minha pre­ferência, me pareceu (e esta é a opinião do Sr. Prefeito), finan­ceiramente impraticável, e a segunda, menos difícil, mas depen-

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dente de um acordo ou convênio entre os dois governos, — convênio no qual se estabelecesse que o Estado absorveria todo o acervo do ensino municipal, que ficaria exclusivamente a seu cargo, obrigando-se o Município a aplicar parte dos 20% de sua receita de impostos, na construção de prédios escolares, que seriam cedidos ao Estado para a instalação de suas escolas primárias e secundárias. Está claro que, no caso de transferência para o Estado, de todo o patrimônio e do magistério municipal, seriam, por esse convênio, resguardados todos os direitos do professorado, a que

desejo, neste momento, tributar a homenagem de meu respeito e admiração, pelo trabalho que vem realizando. Se fôr considerada irrealizável, o que não desejo admitir nem por hipótese, qualquer dessas soluções radicais, teremos de confor­mar-nos com um plano que tenha por objetivo, num regime de coexistência pacífica, — sujeito, em outras administrações, a novos desentendimentos e atritos, — desenvolver, do ponto-de-vista da qualidade, a melhorar e a aprimorar o atual sistema de ensino municipal, sem a ambição de lhe favorecer o cresci­mento quantitativo.

Seria uma lástima que a resistência a uma dessas soluções radicais, — e a segunda, não sendo a de minha preferência, se me afigura a única praticável, — impedisse ou embaraçasse a solução do problema. É preciso cortar o mal pela raiz. A inter­venção cirúrgica é, em muitos casos, a única solução. Devemos ter a coragem de praticá-la. E eu tenho uma boa mão nesses processos operatórios. Mas é preciso que o paciente se submeta à operação e eu tenha assistentes e assessores, do Município e do Estado, que me ajudem a realizá-la. Poderão dizer que, neste caso. eu me transformaria no coveiro do ensino municipal, o que seria de espantar em um educador de tamanha responsabi­lidade e cujas virtudes e qualidades de administrador têm sido tão generosamente decantadas. Mas não importa o que digam, impelidos por interesses, preconceitos e paixões. Em primeiro lugar, sou um homem habituado a viver dentro da tempestade e a enfrentar ventanias. As dificuldades não existem, senão como um desafio, e para serem superadas. Em segundo lugar, o que importa, acima de tudo, para um educador que tenha consciência de suas responsabilidades e deveres, não é que a educação seja dada pelo Município ou pelo Estado; mas que a educação, ministrada por esse ou aquele poder público, municipal ou estadual, seja eficaz, completa, a que mais convenha às con­dições e exigências dos tempos modernos, e mais se ajuste aos interesses de nossos filhos, e dos filhos de nossos filhos. este, o problema; o mais, são caprichos, devaneios e fantasias cujo alto preço quem paga são as gerações novas, sacrificadas por

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uma competição, irracional e descabida, entre dois governos, que deviam sempre marchar juntos, para a solução de problemas de interesse comum.

Perdesse a Municipalidade o seu sistema de ensino primário e secundário, e nada perderia, se o Estado dele se incumbir, pois para ela se abrem não só as possibilidades de colaboração com o Estado, na obra de educação, cedendo-lhe os prédios escolares de que necessitar, como também as perspectivas de desenvolver seu plano de fomentar e estimular a cultura, em todas as suas manifestações. não é uma mutilação que se pro­cessaria, mas uma distribuição de atividades que ficariam repar­tidas, no interesse da educação e da cultura, entre os dois pode­res. Se se examinar atentamente a organização dos departamen­tos, em que se divide esta Secretaria, verifica-se que o de Cul­tura, criado pelo prefeito Sr. Fábio Prado, no Governo de Arman­do Sales de Oliveira e de que foi o primeiro diretor Mário de Andrade, Prepondera em extensão e complexidade ao de ensino. muito mais recente e fundado sem os estudos preliminares e os recursos indispensáveis ao desenvolvimento de seus serviços. Mas, é preciso convir que, longe de ampliar o campo de suas atividades e influências, no mundo cultural, e de impor-se, por uma ação fecunda, em busca das camadas populares, esta Secre­taria parece ter entrado em declínio ou em recesso, perdendo em eficácia e na sua capacidade de servir, sufocada pela própria máquina burocrática que, montada, ao que se supõe, como um instrumento, um meio de realizar uma obra de enorme alcance, no domínio do teatro, da música, das artes plásticas, de expansão cultural, pelas bibliotecas, discotecas e filmotecas, das atividades esportivas, passou a desenvolver-se como um fim em si mesmo.

Se a cultura consiste, essencialmente, num processo criador de novos valores; se não é privilégio de uma minoria, mas, ao contrário, o bem indivisível e a obra comum que resulta do esforço de todos, e cujos benefícios devem estender-se a um número cada vez maior de indivíduos, já se vê que o departa­mento de cultura, criado sob os melhores auspícios, mas sem recursos para se desenvolver, não tem correspondido, por estas ou aquelas razões, aos propósitos de seus fundadores. É neces­sário e, além de necessário, urgente, reestruturá-lo, para lhe dar vida nova e lhe imprimir um tal impulso, que o torne um dos maiores centros de criação, renovação e expansão cultural e artís­tica, não só de São Paulo, nem só do Estado, mas do país. Temos, nesta Capital, as condições mais favoráveis que já s«> apresentaram, no Brasil, e a maior concentração de forças reno­vadoras, que já se constituíram, — no teatro, na música, nas artes e, de modo geral, na cultura literária e artística, — e

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que estão à espera de serem aproveitadas, aquelas, e mobilizadas e utilizadas, estas, para uma obra que, por si só, já bastaria para consagrar um Governo. Estamos decididos a aproveitar a oportunidade que nos oferecem estas condições e a convocar todos os elementos, — onde quer que se encontrem, — que estejam dispostos a colaborar conosco, para a concepção e a execução, firme e corajosa, de plano de uma obra cultural, que seja um modelo para todas as Capitais do país. Temos uma clara cons­ciência das inúmeras dificuldades que temos de enfrentar, e a certeza certíssima dos resultados, que alcançaremos se não nos faltarem com a compreensão, a solidariedade e o apoio de todas as forças vivas, sociais, culturais, artísticas e políticas desta grande Capital.

Por esse departamento, hoje dirigido por um velho amigo, um fino intelectual que me habituei a respeitar e a admirar — Francisco Pati, — confesso ter um interesse particular: fui eu um dos autores do projeto de decreto-lei que o criou. Daí tam­bém, minha participação direta na sua história, — cujas origens remontam a uma proposta, apresentada na Câmara de Vereadores, sob a inspiração de trabalhos meus, e à adminis­tração Firminiano Pinto, cuja primeira fase de realizações se inaugurou no Governo de Fábio Prado, — o meu interesse espe­cial pelos parques de jogos para crianças e de esportes para adultos. Fui eu quem lançou a idéia desses parques infantis (os play-grounds) nas minhas campanhas de mocidade pela edu­cação física no país, como fui também o autor do projeto que Firminiano Pinto solicitou a uma comissão, por êle constituída, para elaborar o plano da primeira praça de jogos para crianças, que se cuidava então de criar no Ipiranga, em terreno para esse fim doado à Prefeitura pela família Jafet, o que ficou no papel. Vejo com prazer o extraordinário crescimento quantita­tivo que tiveram os parques, recantos e recreios infantis, que hoje se integram no Departamento de Educação, Assistência e Recreio. Mas quanto posso julgar, no primeiro exame desse outro setor de atividades, o que lhes falta é uma organização, mais entrosada no conjunto dos serviços desta Secretaria, e mais eficaz, do ponto-de-vista educativo e de assistência à criança, e mais ajustada às condições, necessidades e aspirações da popu­lação a que se propõe servir.

Estas, as diretrizes de uma política de longo alcance, que é a do eminente governador da cidade, Prestes Maia. Mas, se uma concepção justa, racional, é a primeira condição de sucesso, ter concebido não é todavia nada, se somos mal sucedidos no realizar, nesse domínio essencialmente prático, onde somente con­tam os resultados. Conheço muito bem os processos maquiavé-

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licos ou tenebrosos de que hoje tanto se utilizam, mas, sendo um homem, franco e leal, sem pensamentos e intenções ocultas, não seria capaz de recorrer a eles. Ou me aceitam, como sou, ou terei de despedir-me, sem mágoa, para me recolher à vida privada e à solidão. No desempenho, árduo e penoso, de minhas funções, estarei vigilante sobre tudo o que me cair sob os olhos, sobre as correntes de opinião, sobre as necessidades e aspirações do povo de São Paulo, e sobre as reações públicas às minhas atitudes; atento à pesquisa e à descoberta dos interesses con­cretos que possam servir de base a um entendimento, e à das ocasiões de uma compreensão e ajuda recíproca; à necessidade de montar guarda em torno dos resultados adquiridos, e de nada deixar prescrever ou destruir; à liquidação dos incidentes e das dissidências, que venham perturbar a atmosfera; à nego­ciação em toda a boa-fé e sinceridade; à ação política, no sen­tido mais alto da palavra, à conversação e ao entendimento com aqueles que, a títulos diversos, participam da vida pública, e, em primeiro lugar, com os homens que tenham o encargo do poder político, no Município e no Estado. Abrindo um crédito de confiança a todos, e na esperança de que todos me dêem a honra de seu apoio e solidariedade, quero exprimir, nestas últi­mas palavras, a minha convicção da vitória final da verdade, da justiça, do bem público e, portanto, dos mais altos interesses da educação e da cultura.

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UMA AULA DE CIÊNCIAS NATURAIS

ABGAR RENAULT

Da Universidade de Minas Gerais

Aconteceu-me em Chicago. Entrei, sem aviso, numa escola pública e pedi licença para assistir a algumas aulas. Pergun­tado de que disciplinas, decidi-me, em primeiro lugar, por Ciên­cias Físicas e Naturais, e fui conduzido a uma sala em que cerca de quarenta meninos e meninas respondiam à chamada feita por uma professora dos seus vinte anos. Assentei-me na última fila de carteiras, onde havia alguns lugares vagos, e a aula começou na forma do costume, isto é, como se um estranho não estivesse presente.

As primeiras palavras da professora foram uma pergunta a um menino sardento que se achava à minha esquerda:

— Você acha que o nosso corpo é apenas ossos e carne? — não, tem sangue também. — E é o único líquido que há nele? — não, há também água. — Qual é a quantidade de água que há em nosso corpo? — não sei. — Você é capaz de responder? perguntou a professora, diri­

gindo-se a uma das meninas. — Também não sei. — E você? prosseguiu ela, apontando para outra. A resposta foi igualmente negativa, e, como nenhum dos

alunos fosse capaz de responder, a professorinha deu a resposta ela própria:

— Em nosso corpo há 70 % de água. Quer isso dizer que em cada um de nós há mais de 2/3 de água ou mais da metade do nosso corpo é água. Temos água não só no sangue, mas também na carne e nos ossos. Muitas das coisas que comemos são principalmente água: o pepino tem 96% de água; a batata cerca de 75 %, mais ou menos 3/4; a couve 90 %; certos tipos de melão 98% ; o leite, mesmo o mais puro, tem 7/8 de água. Algumas formas da vida animal contêm mais água ainda: a actínia, por exemplo, espécie de urtiga do mar que vocês não conhecem, é feita de mais de 99% de água, que pode, como vocês

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vêem, ser considerada como um alimento. Cerca de 85% de nossa alimentação consistem em água. Qual de vocês, agora, será capaz de dizer-me o que é que há em maior quantidade — terra ou água?

Uma das meninas deu a resposta correta, e a professora lançou à classe outro desafio:

— Quem sabe quantas porções de terra há para quantas porções de água?

Essa pergunta foi também respondida com exatidão por uma das meninas:

— Cinco sétimas partes da superfície da terra, isto é, mais da metade.

(Começava a impressionar-me o número de respostas certas oferecido pelas meninas comparativamente ao de respostas erra­das que os meninos davam).

E o interesse da classe inteira ia num crescendo que eu via e sentia na atitude atenta e séria e no olhar vivaz de cada discípulo.

— como vocês vêem, a água é uma coisa muito importante. não podemos viver sem comer, mas não podemos tampouco viver sem beber água. Quantos dias pensam vocês que é possível à Elizabeth viver sem comer coisa nenhuma? Isso varia um pouco de pessoa para pessoa, mas em regra 6 a 10 dias no máximo. Os que jejuam por profissão ou para ganhar dinheiro conseguem passar até 40 dias sem comer nada, mas bebem água regular­mente.

Em geral, ninguém suporta passar mais de 4 ou 5 dias sem beber água. Essa maior e mais urgente necessidade de água nasce, em parte, do fato de que a água lava o nosso organismo por dentro, assim como lava o corpo por fora.

Além disso, é a água que assegura a elasticidade dos músculos, dos tendões e das cartilagens e produz, nas membranas do nosso corpo, o mesmo efeito que o óleo usado para lubrificar o motor de um automóvel. Sem a água o sangue não poderia circular. É ela que o transporta, como um rio. É ela que dis­tribui o calor em nosso corpo e regula sua temperatura.

— como? indagou um dos meninos. — Ela absorve o calor e por evaporação o elimina quando

é demasiado. Aí têm vocês por que razão precisamos de pelo menos 2.470 centímetros cúbicos de água por dia. Sabem como a água sai do corpo depois de usada por êle?

— Na urina. — Está certo. Mas só pela urina? — É.

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— não. Na urina ou pelos rins sai metade. Mas através da pele saem 28%, pelos pulmões 20% e o restante por outras secreções e excreções.

O método de approach era perfeito: estava evidente que a aprendizagem se tornava tanto mais fácil quanto os estímulos iniciais eram extraídos de fatos pesosais e quotidianos, abrindo interesse para outros aspectos do tópico que estava sendo ensi­nado.

— Pode-se beber qualquer água? — não, respondeu certa menina, a água do mar não se bebe. — E por quê, Larry? — Porque é muito salgada. — Só por isto? — Sim. — não é só por isto, não. Você bebe a água do lago

Michigan ou de um rio qualquer? — É . . . , gaguejou o menino, não bebo, não. — E por quê? Quem sabe? como nenhuma resposta satisfatória surgisse, a professôra-

zinha passou a ensinar, de modo prático, os perigos que a água não filtrada oferece em geral, e imediatamente lançou mão de um microscópio, revelou a trinta pares de olhos acesos o mundo vivo que habita uma simples gota de água e explicou, com simpli­cidade que me espantou, como vários dos habitantes da água penetram no organismo humano e podem devastá-lo. (Os aspec­tos biológicos haviam sido explorados de maneira modelar, e de repente a aula tomou outra direção).

Evitando habilmente as expressões corpo simples e com­posto, a jovem professora, que não expunha, não dissertava, não "monologava", passou a indagar:

Vocês acham que a água é só água mesmo ou é, por exemplo, como o café ou o chá que tomamos, bebidas que contêm chá, café, água, açúcar e, quase sempre, creme de leite também?

A classe alcançou logo o sentido da pergunta e cindiu-se nas respostas: parte — maioria, aliás — opinava que a água é . . . água só, parte sustentava que a água contém outras coisas que não vemos. Sem dizer palavra, a professora fêz a classe reu­nir-se em torno à sua mesa e realizou a experiência da electrólise e, logo após, a da síntese do hidrogênio e do oxigênio e, sem falar em H20, revelou ao grupo atônito que água nada mais é que uma combinação de dois gases na proporção de dois para um.

A água havia sido estudada do ponto-de-vista biológico, do ponto-de-vista químico, noções de geografia e de matemática haviam intervindo na lição.

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A professora mostrou, em seguida, que a água pode existir em estado sólido e em estado gasoso e, finalmente, formulou esta pergunta:

— A nossa escola e as casas onde moramos são perto ou longe do lago Michigan?

— Longe! — exclamaram em coro todos os alunos. — Um de vocês desenhe aqui no quadro-negro o lago e o

ponto da cidade onde estamos. É mais baixo ou mais alto do que o lago o ponto da cidade em que as nossas casas e a nossa escola se acham?

— Mais alto! — veio novamente em uníssono a resposta da classe inteira.

— De onde vem a água que usamos aqui e em casa? — Do Lago. — como pode ser isto? A água pode subir até aqui sozi­

nha?

— Quem a trará e em que a trará?

— Então, ninguém sabe? Você aí, Joan. — Meu pai me contou que é um motor que traz a água. — Que motor? Um motor de automóvel? — Acho que sim. — não. É uma bomba. Vocês compreendem bem que a

água não é capaz de subir. Ela sempre desce. — E por quê não pode subir, se pode descer? — É porque há inclinação de terreno sempre que ela desce.

Se não coincide que deve correr no sentido da inclinação ou declive, volta, ou, se encontra um obstáculo, pára, mas não sobe nunca. (Aqui surgiu timidamente uma primeira noção de gra­vidade em palavras muito simples, que infelizmente não retive). Assim, quando precisamos de água num ponto elevado e ela não vem de outro mais elevado, com força bastante para subir até onde desejamos, somos obrigados a trazê-la por meio de uma bomba que a chupa ou aspira por meio de ar. (As noções de pressão, de bomba aspirante e de bomba premente foram trans­mitidas com clareza e precisão singulares e ilustradas por meio de desenhos muito bons no quadro-negro).

A hora estava a esgotar-se, e os dois últimos minutos da aula foram aproveitados desta forma:

— Qual é o dia da semana em que se gasta mais água em Chicago?

— Domingo, respondeu uma das meninas. — Sábado, exclamou um menino. — Quinta-feira, disse outro.

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— Terça-feira. — não. Segunda-feira. E por quê? — Come-se mais no domingo e bebe-se mais água na 2.a-

feira. — não. Você aí, Tom. — Porque. . . todos saem de casa e ass im. . . — Nada disso. Se ninguém sabe, vou logo dizer porque a

campainha já vai bater. Por que é, Master Dana? Diga. — Por que há pratos mais sujos para lavar na 2.a-feira. — não. Vocês não são capazes mesmo de descobrir. É

porque 2.a-feira é dia de lavar roupa em todas as casas de Chicago.

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FINANCIAMENTO DO ENSINO PRIMÁRIO

como subsídio ao exame desse tema, divulgamos tra­balho publicado na imprensa paulista de autoria do Prof. Carlos Correia Mascaro, tomando por base a experiência administrativa do Estado de S. Paulo; além de estudo com­plementar do Prof. Jaime Abreu:

I

Em dois ou três artigos que, sob o título de "Governo Esta­dual, Orçamento e Ensino", há algum tempo publicamos em o Estado de S. Paulo e que depois foram reproduzidos, ampliados, em o n.° 14 da Coleção "Cadernos da Faculdade", a certa altura da análise feita ao longo da ação de três governos sucessivos, assinalávamos que, "no tocante à Secretaria da Educação e ao ensino primário, proporcionalmente à renda de impostos", estava "o orçamento para o exercício de 1959 entre os menos favorá­veis, desde 1948".

E, logo em seguida, lembrando haver sido aquele o ano do aumento da aliquota do imposto de vendas e consignações, insis­tíamos na afirmação de que "o ano de 1959 poderia vir a ser o ano de menor gasto do Estado com a Secretaria da Educação e o ensino primário, desde a promulgação da Constituição de 1946, quando se formulou para o País uma nova política de financia­mento escolar, mediante a reserva de, pelo menos, um quinto da renda estadual de impostos, para manutenção e desenvolvimento do ensino".

A constância com que temos insistido em avaliar a política de educação dos governos em termos orçamentários resulta de nossa convicção de que pouco representam os planos ou progra­mas oficiais no campo escolar se não pudermos medi-los através dos dados objetivos de seu custo de financiamento. Para nós, as medidas propaladas de melhoria do ensino têm algum significado se nos fôr dado avaliá-las, no cômputo geral das despesas gover­namentais, em confronto com as dotações destinadas a financiar outras metas do Governo, e, no âmbito nacional ou regional, o que representam quantitativamente em atendimento a carências

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específicas da população. Fora daí, quase tudo que se anuncia como clarividência ou ação oportuna dos homens que transito­riamente ocupam o poder pode ser dado como atividade puramente diversionista ou paliativo inconseqüente.

Quando procedemos à análise dos orçamentos de 1948 a 1959, longe estávamos de supor que uma incursão de maior profun­didade no terreno apenas aflorado revelaria o quanto temos na verdade retrocedido em matéria de financiamento escolar, nos últimos anos. Essa a conclusão a que chegamos, poucos meses depois, quando, recebendo o convite para participar da Conferên­cia Nacional de Educação, que seria promovida, nesta Capital, pela tradicional Associação Brasileira de Educação, com o con­vite nos coube o encargo de preparar um estudo preliminar sobre financiamento do ensino paulista.

Pondo mãos à obra, levantamos os dados essenciais, relati­vos às últimas quatro décadas, com os quais montamos uma série de seis quadros que reputamos capazes de, numa breve e sinté­tica visão histórica do problema, facilitar a sua compreensão objetiva e permitir o entendimento cabal das possíveis causas determinantes de uma situação que precisa ser banida da história da escola paulista, mas que para tanto deve ser conhecida em maiores detalhes, para a fixação criteriosa de prioridades no concernente à educação popular.

O estudo já se achava praticamente concluído quando os jornais noticiaram que a Secretaria da Educação havia iniciado o combate às causas do baixo rendimento das escolas primárias, instituindo prêmios para alunos e distribuindo medalhas a professores.

Evidente que não se poderia interpretar a iniciativa como destinada a marcar a posição do Governo face ao vulto e à gravidade do eterno problema do ensino primário comum em nosso Estado. Mas, obtemperando que nunca se faz excessiva uma dose de prudência quando os paliativos podem ser adotados como terapêutica heróica, julgamos oportuno, visando a colabo­rar com as autoridades responsáveis no seu mais uma vez propa­lado empenho de soerguer a educação escolar bandeirante, ofere­cer-lhes uma cópia dos quadros a que aludimos.

Felizmente foi das mais cordiais e compreensivas a recepti­vidade do Exmo. Sr. Secretário da Educação que, sendo homem afeito ao mundo dos negócios, anunciou-nos haver constituído um Grupo de Trabalho para estudar o orçamento da Pasta e propor a sua reformulação com o objetivo de corrigir as defi­ciências de que tomara conhecimento.

não era sem tempo, como se verá, a necessidade dessa pro­vidência e é de se esperar que nos seja dado ver sem mais prote­lações o financiamento do ensino em São Paulo colocado em con-

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sonância com as necessidades de se imprimir outro vigor à expan­são e ação da escola pública no Estado mais industrializado e mais rico da Federação.

Em abono dessa imperativa tomada de posição, vamos aos quadros, que são suficientemente expressivos para que a eles acrescentemos qualquer outra argumentação. Bastam, a nosso ver, pequenos confrontos e leves comentários. No mais, falem as cifras, que são os argumentos de que tem sabido tirar partido o atual Governo, no intuito de ser claro e objetivo nos pronuncia­mentos com que busca esclarecer a opinião pública.

Os quadros, a seguir, foram elaborados com dados obtidos junto às repartições competentes, ou coligidos mediante consulta aos orçamentos estaduais. Nos diversos arranjos propostos sur­gem as relações essenciais entre: 1) arrecadação estadual de impostos; 2) despesas globais da Secretaria da Educação; 3) gastos com o ensino primário comum; 4) população escolar, e 5) matrícula efetiva do ensino primário comum estadual.

QUADRO I

Comparação do crescimento das receitas e Impostos e despesas da

Secretaria da Educação e Ensino Primário

Em Cr$ 1.000,00

Exercidos Impostos Sec. Ensino E. Prim.

Educação Primário S. Educ.

Feios dados constantes desse quadro, a previsão da receita de impostos estaduais subiu de Cr$ 74.782.000,00, em 1920 (na época setenta e quatro mil, setecentos e oitenta e dois contos), a Cr$ 69.446.950.000,00 em 1960. Enquanto isso, as despesas globais da Secretária da Educação e as do Ensino Primário pas­saram de Cr$ 24.078.000,00 e Cr$ 18.923.000,00 a, respecti­vamente, Cr$ 9.878.886.000,00 e Cr$ 6.272.049.000,00. Torna-se imediatamente perceptível, à mais superficial observação, a des­proporção do crescimento dos valores nominais alinhados nas diferentes colunas, patenteando-se, pela comparação do vulto das dotações, relativamente à arrecadação, a preeminência do ensino primário no rateio das despesas da Secretaria da Educação, no

1920

1930

1940

1950

1960

74.782

332.192

561.700

4.159.950

69.446.950

24.07S

79.214

142.288

835.068

9.878.888

18.923

61.309

98.180

731.771

6.672.049

78,6

77,4

69,0

87,6

67,5

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passado. Por esses dados, decresce no período considerado o ensino primário no cômputo das despesas da Secretaria da Edu­cação, numa linha que vem de 78,6% em 1920 a 67,5% em 1960, com exceção de 1950, quando as despesas apresentam um índice salutar de 87,6%. A linha descendente porém é bem marcada.

A medida objetiva do estado de coisas apenas vislumbrado neste quadro encontra-se mais evidente nos subseqüentes.

QUADRO II

índices de Crescimento Nominal das Receitas de Impostos e Despesas da Secretaria da Educação e Ensino Primário

1920

1930

1940

1950

1960

Exercidos Impostos

100

444

751

5.563

92.866

Secretaria

Educação

100

329

591

3.468

41.029

Ensino

Primário

100

324

519

3.867

35.259

Pelo quadro II verifica-se, através dos números índices, que, a partir do decênio iniciado em 1920, no período de quarenta anos, do mesmo passo que a receita de impostos cresceu nomi­nalmente mais de 900 vezes, as despesas da Secretaria da Educa­ção tiveram acréscimo correspondente a 410 vezes e as do Ensino Primário, a 352 vezes. Comparando o crescimento da arre­cadação tributária com o das despesas estaduais relativas ao ensino primário, conclui-se que o da primeira superou o da se­gunda em mais de duas vezes e meia, desproporção para cujo vulto não encontramos, de pronto, justificativa plausível.

QUADRO III

Relação percentual entre Despesas com Ensino Primário e Receita de Impostos.

Exercícios

1920 1930

1940 1950 1960

Ensino Primário

Impostos

25,39 18,45 17,47 17,59 9,60

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No quadro III, evidencia-se ainda mais claramente a situa­ção a que chegou o ensino primário, quando apuramos a quota percentual da receita de impostos aplicada em seu financiamento. De uma parcela correspondente a mais de 25% a esse fim des­tinada, em 1920, chega-se a uma quota que é inferior a 10% da receita de impostos do ano de 1960, quando se atinge a reserva mínima dos últimos quarenta anos, quase duas vezes inferior às dos dois decênios anteriores. E, note-se, com a agravante, no caso do orçamento de 1960, quanto aos totais computados, que já incluem as verbas do Plano de Ação, apresentado, no respectivo setor, como "um esforço suplementar do Governo em investimen­tos destinados à melhoria das condições do Homem". Pelo quadro se vê que, se o ensino primário merecia, em 1920, dos poderes competentes, a atenção de uma reserva de mais de 1/4 de arre­cadação de impostos, em 1960 essa reserva foi estimada em nível inferior a 1/10 da receita correspondente prevista.

QUADRO IV

Crescimento Real da Receita de Impostos e Despesas da Secretaria da Educação e Ensino Primário — Em Cr$ 1.000,00.

Exercidos Deflator Impostos Sec. Edu- Ens. Pri-cação mário

1940 109 515.931 130.540 90.073

1950 433 960.727 192.856 169.000

1960 2.521 2.754.738 391.864 264.658

A desvalorização da moeda nacional, a contar do irrom-pimento da última guerra, dificulta a exata compreensão do crescimento das rendas e das despesas públicas, impondo-se sem­pre, como medida complementar, o deflacionamento dos valores nominais com base no aumento do custo de vida para que não se fixe no espírito dos menos avisados uma impressão errônea da realidade sob observação. Por isso, no quadro IV encontram-se, em valores deflacionados, com base nos índices do custo de vida em 1939, os dados do quadro I, relativos aos anos de 1940, 1950 e 1960. Considerando-se que à luz da desvalorização da moeda nacional, ocorrida nos últimos quatro lustros, em 1960 o cruzeiro se apresenta com poder de compra 25 vezes inferior ao de 1940, constata-se que, enquanto a arrecadação de impostos cresceu realmente pouco mais de cinco vezes, as despesas da Secretaria da Educação e do Ensino Primário cresceram, a pri­meira, pouco mais, e a segunda, pouco menos de três vezes. Assim, põe-se termo à euforia que nos poderia indevidamente do-

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minar ao considerarmos o montante da receita e despesas em bilhões de cruzeiros ou de acordo com os índices de arrecadação e de gastos, em 1960, várias centenas de vezes superior aos de quarenta anos antes.

QUADRO v

Relação entre as percentagens das receitas de impostos destinados ao Ensino Primário e a População Escolar matriculada no sistema estadual.

Exercidos

1920 1930 1940 1950 1960

Ens. Primário

Impostos N.º

25,39 18,45 17,47 17,59

9,60

POPULAÇÃO ESCOLAR Matriculada

absolutos % TOTAL

193.811 265.804 450.377 673.927

1.446.624

29,15

— 30,13 40,88 83.83

961.616

— 1.455.860 1.648.418 1.959.462

Confronto da maior significação é o que se encontra no quadro V, onde temos alinhadas as percentagens das receitas de impostos empregadas no ensino primário desde 1920 e os totais da população escolar matriculada no sistema escolar desse ramo. Em 1920, para atender, na escola primária, a uma clientela que se aproximava da casa das 200.000 crianças, grupo correspondente a pouco mais de 20% da população em idade escolar recenseada, o Governo destinava mais de 1/4 de sua receita de impostos. Nos decênios seguintes nota-se que vai decrescendo percentual-mente a quota de impostos e crescendo a matrícula até que, em 1960, para atender a quase um milhão e meio de crianças — 83,83% da população do grupo etário com direito a escola pri­mária — o Governo só reserva para dar o ensino desse ramo menos de 1/10 da receita prevista de impostos!

QUADRO VI

Confronto entre os índios de crescimento real da arrecadação de Impostos, das despesas e matricula efetiva do ensino primário

ENSINO PRIMÁRIO

Exercícios

1940 1950 1960

Impostos

100 186 935

Despesas

100 188 294

Matrícula

100 150 321

com dados tomados aos quadros IV e V construímos o qua­dro VI — em que são postos em confronto os números índices

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do crescimento real da arrecadação de impostos, das despesas com o Ensino Primário, e do crescimento da matrícula nesse ramo de ensino, de 1940 a 1960. Pelos índices apurados constata-se que a receita de impostos cresceu, efetivamente, em vinte anos, a partir do valor do cruzeiro em 1940 quase 9 vezes e meia: de Cr$ 515.931.000,00 (100), ascendeu a Cr$ 2.754.738.000,00 (935) ; enquanto as despesas com o ensino primário não chega­ram a triplicar, isto é. subiram de Cr$ 90.073.000,00 (100) a Cr$ 264.658.000,00 (294). No mesmo período, a matrícula dos estabelecimentos estaduais de ensino primário comum teve um aumento correspondente a pouco mais de três vezes o efetivo exis­tente no ano-base, isto é, passou de 450.377 (100) para 1.446.624 (321). Do confronto resulta a confirmação do descompasso entre a arrecadação estadual de impostos, as despesas com o ensino primário, e a matrícula, que cresceu mais do que aumen­taram os recursos para financiamento.

Um dado positivo entre os que estamos compulsando é o do aumento auspicioso da matrícula que subiu de 20% da população escolarizável em 1920 a mais de 80% do mesmo grupo em 1960. Mas esse aumento perde muito de seu significado quando o con­sideramos realizado, em sua maior parte, com sacrifício da quali­dade do ensino ministrado nas escolas, em virtude de vários fatores

conhecidos: a redução das horas de aula, falta de material didático, abandono e degradação das edificações, inexistência de equipamento pedagógico, desinteresse por novas técnicas, des­preocupação quanto aos níveis de formação e remuneração do pessoal, bem como quanto ao seu aperfeiçoamento em serviço, e outros.

Voltando ao quadro VI, poder-se-ia indagar se, em face dos números, o crescimento da matrícula sem o correspondente aumen­to do custo global do ensino não seria o natural e feliz resultado de uma redução do custo do aluno/ano. Essa explicação, porém, só serviria para iludir os que porventura não conhecessem o que tem sido em São Paulo, desde 1920, a expansão do ensino pri­mário.

Pode parecer estranho que as coisas sejam assim, e que, pelo curso natural dos acontecimentos, assim continuarão por muito tempo se não houver a desejada e esperada reação dos que dis­põem dos meios para concretizá-la. Os números e os fatos aí estão em sua eloqüente objetividade. Os primeiros se encontram nos orçamentos e nas estatísticas oficiais, os segundos constituem a conhecida e desoladora história da paulatina desfiguração e deterioração do ensino primário bandeirante.

CARLOS CORREIA MASCARO

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II

A quem quer que acompanhe os rumos da expansão do sis­tema escolar paulista, não pode surpreender maiormente o que demonstram os quadros ilustrativos do artigo do Prof. Carlos Correia Mascaro, especialmente no que revelam quanto à hierar­quia de valor que nele vem sendo atribuída à escola primária.

Ante a compreensível pressão por mais ginásios e mais facul­dades sofrida pelo Estado no período analisado, de parte, essen­cialmente, de uma classe média alargada e em busca do que a ela se afiguram canais de ascensão social, o que veio determinar ponderável e necessária (enquanto autêntica) ampliação da rede escolar estadual de ensino médio e superior, visando evitar uma insuportável ruptura entre as oportunidades oferecidas de escola­rização primária e o constante incremento de sua demanda, a saída alcançada pelo Estado foi a da redução qualitativa da escola primária.

Assim, para atender à pressão sempre mais forte por mais oportunidades de escolarização primária, o preço que, iniludivel-mente, fêz o Estado pagar por essa geração discente, foi o da simplificação, senão deterioração desse ensino, consumada por vários escamoteios, como o do tempo (com os turnos múltiplos), o dos prédios (com os galpões de emergência eternizados), o do número de alunos por turma (com o seu congestionamento), o do equipamento (com sua precariedade quantitativa e qualita­tiva), o do pessoal técnico-docente (com a insuficiência do seu regular aperfeiçoamento em serviço, intensivo e extensivo).

De certo modo, buscou-se mais uma saída do que uma solu­ção, o que lembra, grosso-modo, por sua precariedade, o que fora proposto ao tempo do Governo Washington Luís em São Paulo, exatamente para tentar atender ao desequilíbrio entre a oferta (insuficiente) e a demanda (crescente) da escola pri­mária.

Em nosso entender, sobrelevaria a significação dos quadros apresentados, tivesse o autor os correlacionado com aqueles rela­tivos ao crescimento do ensino estadual médio e superior, levan­tando inclusive seus custos, no período analisado.

como outrossim teria sido oportuna a inclusão de quadros caracterizadores da expansão do ensino primário municipal de 1920 a 1960, para se sentir em que medida essa presença, tam­bém pública, atenua a insuficiência estadual, no cumprimento do dever constitucional de ministrar educação primária pública, gra­tuita, obrigatória e universal, por parte do Estado líder da fe­deração.

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Nada obstante a educação pública ser em São Paulo uma realização essencialmente estadual, nem por isso seria somenos, no caso, aferir a extensão da presença municipal no seu sistema escolar, manifestada, quase exclusivamente, pela escola primária.

Ao afirmar que "pouco representam os planos e programas oficiais no campo escolar se não pudermos medi-los através dos dados objetivos de seu custo de financiamento", talvez haja o autor, assinale-se, data vênia, minimizado quiçá em demasia o que pode representar, como fator positivo de rendimento, a apli­cação de critérios racionais ao investimento educacional, o que de sobejo conhece, autoridade que é em administração escolar.

Seria da maior oportunidade conhecer como no Brasil se pas­sam situações como a analisada no artigo em referência.

Porque, como disse Anísio Teixeira, são estudos como esses "que nos irão, pouco a pouco, dar a sistematização de fatos e de saber, indispensável ao estudo universitário da administração escolar brasileira".

Se essa administração escolar brasileira tivesse "atingido nível de maior objetividade de critérios e as cadeiras de Adminis­tração Escolar das Faculdades de Filosofia já inserissem em sua temática o trato da realidade educacional do seu país, provavel­mente análises indispensáveis como essa já teriam valiosa exten­são nacional, realizadas Estado por Estado.

Se tal não ocorre em termos gerais, nem por isso porém dei­xam já de haver estudos desse tipo em outras áreas nacionais.

Queremos, no caso, em matéria de estudos regionais, repor­tar-nos ao interessante levantamento feito sob o título "Rendi­mento do Ensino Primário", onde a situação educacional do Rio Grande do Sul é analisada no período de 1948 a 1958, de ângulos que comportam alguns interessantes cotejos com aqueles revela­dos no artigo do Prof. Carlos Correia Mascaro.

esse estudo foi elaborado por um grupo de trabalho inte­grado pelos professores Manuel Luís Leão, Cibilis da Rocha Viana e Oldemar Maboni e apresentado em 1960 ao Governador do Rio Grande do Sul.

Entre os vários dados significativos desse estudo verifica-se que, enquanto em 1948 a percentagem de despesa estadual com o ensino sobre a despesa pública nominal total era de 17,3% em São Paulo, era de 9,8% no Rio Grande do Sul; já em 1957 era ela de 16% em São Paulo e de 20,4% no Rio Grande do Sul.

É também de assinalar a progressão crescente das percen­tagens de gastos com o ensino em relação à receita nominal de impostos do Estado, ascendendo no Rio Grande do Sul de 17,1% em 1948 a 30,7% e 30,2% em 1957 e 1958 respectivamente.

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índices de esforço educacional como esses levam os autores do trabalho a assinalar que "no que diz respeito ao esforço finan­ceiro no setor educacional, o Rio Grande do Sul vem destinando recursos em maiores proporções que a União e a maioria dos Estados".

Particularmente no cotejo com São Paulo, registram os auto­res, comentando os dados por nós transcritos: "enquanto se verificou, no Rio Grande do Sul, o aumento da percentagem de 9,8% para 20,4% de 1948 a 1957. . . , o Estado de São Paulo não alterou substancialmente seu programa de inversões, no mesmo setor: em 1948. 17,3% de sua despesa eram destinados ao ensino e, em 1957, como ocorrera nos últimos anos, não se registrou alteração substancial, reduzindo-se mesmo para 16%".

Ao registrar esse assinalável esforço, nem por isso deixam os autores de considerá-lo ainda insuficiente, operada a deflação da moeda, o que reduz o crescimento real da despesa com o ensino no decênio analisado, à média anual de 10,5%, "incapaz de por si só eliminar o analfabetismo e elevar o nível cultural de nossa juventude".

No que respeita à situação do ensino elementar, assinalam os autores, em termos nacionais: "o exame do comportamento da despesa pública total revela, no entanto, que vem decrescendo a participação da despesa com o ensino elementar no cômputo geral da despesa com o ensino em todo o país. O gráfico n.° 10 revela-nos a queda que se tem verificado nas percentagens da despesa do ensino elementar a partir de 1948: de 60,3% nesse ano, para 43,2% em 1956".

Enquanto isso, ainda em termos nacionais, "a despesa pú­blica com o ensino médio tem acompanhado sem grandes oscila­ções o crescimento da despesa pública total com o ensino, com uma participação média anual de 28%, enquanto o ensino su­perior passou de 12,4% em 1948 para 26% em 1956".

como se vê, a situação nacional de decrescente participação dos gastos públicos no ensino primário não difere substancial­mente de São Paulo, muito provavelmente pelas mesmas razões aqui invocadas quanto a São Paulo.

No que concerne especialmente ao Rio Grande do Sul, nada obstante o ensino elementar absorver, a partir de 1952, "parcela correspondente a aproximadamente 70% da despesa global com o ensino" (estadual), ressaltam os autores "que na distribuição proporcional a ensino secundário vem recebendo tratamento pre­ferencial" e ainda que o aumento, nominalmente substancial, da despesa do Estado com o ensino primário, elevando-se de 104.075 milhares de cruzeiros (1948) para 1.334.376 em 1958, não chegou, todavia, a preços constantes, a triplicar, representando um cres­cimento vegetativo anual de 11,3%.

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Ao inverso, todavia, do que assinala o artigo do Prof. Carlos Mascaro quanto a São Paulo, não ocorreu no Rio Grande do Sul, no decênio analisado, uma diminuição do custo nominal do alu­no-ano no ensino primário estadual por isto que "a despesa real de custeio cresceu em progressão mais acentuada do que o número de alunos matriculados", com uma elevação de matrícula efetiva correspondente a 114% (de 114.261 alunos em 1948 para 233.998 em 1958) contra uma majoração dessas despesas de custeio, que subiu, nominalmente, de Cr$ 834,00, em 1948, para Cr$ 4.633,00, em 1958.

Assinale-se que, no Rio Grande do Sul, contrariamente ao que ocorre em São Paulo, a maior matrícula na escola elementar está concentrada nas escolas municipais (44%) contra 38% nas escolas estaduais e 18% em escolas particulares, à base de dados de matrícula geral em 1958.

Do ponto-de-vista da situação nacional, dados interessantes nos enseja também, a respeito, o trabalho "Análise do esforço Financeiro do Poder Público com a Educação (1948-1956)", apresentado ao Ministro da Educação em 1957 e elaborado pela Comissão de Educação e Cultura do Conselho do Desenvolvimento.

Cremos que os dados e as conclusões desse trabalho não logra­ram a divulgação necessária e talvez, por isso, não sensibilizaram notoriamente a consciência educacional do país, quanto à gra­vidade que vem atingindo, nos últimos anos, "a cada vez menor participação do grau elementar no rateio das despesas públicas com o ensino".

As implicações desfavoráveis dessa circunstância educacio­nal nos aspectos de democratização e desenvolvimento do país, situação a que não foge nem mesmo São Paulo como área mais desenvolvida do país, devem constituir um brado de alarme ende­reçado aos governos, no sentido de que a ampliação (necessária, na medida de sua autenticidade) da rede pública de ensino médio e superior do país, não se processe às expensas do sacrifício da escola elementar, que representa a escola comum à nacionali­dade.

Quando se diz "do sacrifício da escola elementar" não se está utilizando mera figura de retórica, ou jogando com uma ficção emocional.

Anísio Teixeira escreveu, certa feita, que a dose mínima de educação necessária não sendo atingida, ocorria fenômeno igual ao da tomada de medicamento em dose insuficiente: nada adianta, é dinheiro jogado fora!

O elevar a escolarização primária de São Paulo de 20,15% em 1920 a 83,83% em 1960, à base de quatro anos (escassamente atingidos) de 160 dias letivos em média, com cerca de 70% dos

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alunos recebendo em média entre 3 e 3,30 horas de aulas por dia, além de outros fatores negativos, é fenômeno que pode iludir, quanto ao seu resultado positivo, apenas aos não versados no assunto-

Chamamos a atenção, a esse propósito, para algumas teses que foram apresentadas ao Colóquio Internacional de Paris (9-18, dezembro, 1959), sobre "O Planejamento da Educação e seus fatores Econômicos e Sociais", promovido pelo Instituto de De­senvolvimento Econômico e Social, com a cooperação da Unesco, publicadas na revista Tiers Monde (Tomo 1 — volumes 1 e 2) .

Na contribuição de Lionel Elvin, * "Nota sobre o problema das prioridades financeiras", se assinala: "Mesmo uma instru­ção primária de quatro anos é terrivelmente insuficiente; em uma sociedade tradicional, êle pode tornar a nova geração inapta a viver, conforme o estilo tradicional, sem lhe dar os elementos indispensáveis para viver em uma sociedade moderna."

E tem ainda o mesmo autor a coragem profissional de afir­mar tese impopular, necessariamente ao arrepio daquela utilizada pelos escamoteadores da pseudo-educação, ou da educação "faz de conta": "é preciso pois reconhecer que, mesmo no estágio inicial do desenvolvimento, há um grau mínimo de educação, abaixo do qual as despesas consagradas a cada criança por essa educação não são senão um desperdício. É talvez um fato difícil de admitir, mas é real. É pois preferível dar esse mínimo indis­pensável a um número menor de crianças, do que dar uma ins­trução de nível inferior a um número maior".

Tese impopular, mas exata, que se impõe à meditação dos responsáveis pela nossa escola primária, em rota batida de dete­rioração, comprovável facilmente, e com a qual se julga "resol­ver" o problema da escola básica à nacionalidade.

JAIME ABREU

* Diretor do Instituto de Educação da Universidade de Londres.

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UNIVERSIDADE DO TRABALHO

Ao mesmo tempo que repercutia na Câmara dos

Deputados a idéia de criar entre nós uma Universidade

do Trabalho, o Pres. Jânio Quadros expediu decretos ins­

tituindo comissão executiva para elaborar o plano res­

pectivo e designando seus componentes. Dada sua atuali­

dade, divulgamos o teor dos atos oficiais e exposição do

Coordenador da Comissão referida, Sr. Roberto Gusmão,

expondo objetivos e características do empreendimento:

I

DECRETO N.° 50.588 — DE 13 DE MAIO DE 1961

Institui a Comissão Executiva da Universidade Nacional do Trabalho e dá outras

providências.

O Presidente da República, usando das atribuições que lhe confere o artigo 87,

inciso I. da Constituição Federal, decreta:

Art. 1.° Fica instituída, junto ao Gabinete Civil da Presidência da República, a

Comissão Executiva da Universidade Nacional do Trabalho.

§ 1.° Incumbem à Comissão Executiva providências para constituir a Fundação

Universidade Nacional do Trabalho, e, até sua organização definitiva, planejar e ministrar,

diretamente ou mediante convênios, em caráter experimental e na forma deste decreto,

todos os serviços, docentes e de pesquisas, a que ela deverá devotar-se.

§ 2.° A Comissão Executiva gozará de plena autonomia para a experimentação

de novos currículos e novos regimes didáticos para os cursos técnicos de nível superior,

mas lhe será vedado conferir diplomas que assegurem prerrogativas legais em cursos

de duração menor que a mínima estatuída na legislação vigente.

Art. 2.° São atribuições da Comissão Executiva:

a) assegurar, precipuamente aos jovens trabalhadores, maiores oportunidades de

estudo e acesso aos cursos de nível superior, visando formação tecnológica e espe­

cialização profissional que o atual regime não proporciona;

b) formar e aperfeiçoar a mão-de-obra qualificada necessária para incremento da

produção, mediante ampliação e eventuais modificações no sistema nacional do ensino

médio;

c) formar técnicos em nível superior capazes de atender à diversificação do

mercado de trabalho, exigida pelo desenvolvimento econômico do País.

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Art. 3.° Os Órgãos federais autárquicos e paraestatais e instituições privadas de interesse público prestarão à Comissão Executiva a colaboração que lhes fôr solicitada.

Art. 4.° A Comissão Executiva será constituída de onze membros, todos de livre nomeação do Presidente da República, incluindo um Coordenador, um representante da Confederação Nacional da Indústria, um representante da Confederação Nacional do Comércio, um representante da Confederação Nacional dos Trabalhadores na Indús­tria e um representante da Confederação dos Trabalhadores no Comércio.

Art. 5.° Compete ao Coordenador:

a) providenciar, no prazo de 30 (trinta) dias contados de sua nomeação, insta­lação e funcionamento da Comissão Executiva;

b) admitir o pessoal docente, técnico e administrativo, mediante contratos regidos pela legislação trabalhista ou mediante requisição de servidores públicos e autárquicos;

c) entender-se com instituições estrangeiras e internacionais, bem assim os órgãos que coordenam as atividades das mesmas em nosso país, para obter colaboração na aquisição de material didático, equipamento de laboratório, bibliotecas, recursos para aperfeiçoamento de pessoal docente no exterior e para contrato de especialistas estrangeiros;

d) determinar providências necessárias para instalação ou construção de unidades indispensáveis para a realização dos serviços da UNT;

e) representar oficialmente a Comissão Executiva. Art. 6.° A Comissão Executiva promoverá as atividades de ensino, de pesquisa e

de treinamento em vários campus universitários (conjuntos de escolas, laboratórios, ofi­cinas e fábricas estabelecidas nos centros industriais do país) diretamente ou mediante convênio, com órgãos de ensino e com empresas.

Parágrafo único. A Comissão Executiva poderá receber doações e subvenções de entidades públicas ou privadas, tanto para livre aplicação em seus objetivos, quanto vinculadas a programas específicos de trabalho.

Art. 7.° As atividades da Comissão Executiva através de seus campus universitários, serão condicionadas a reclamos das atividades econômicas das áreas em que se acharem localizados.

Art. 8.° Os cursos serão divididos em dois níveis: o de formação científica e fundamental, ministrado em Institutos Centrais, tais como o de Matemática, o de Física, o de Química e o de Ciências Sociais, e o de especialização profissional, minis­trado em Escolas e Centros de Treinamento instalados em parques industriais e em instituições de ensino ou pesquisa, mediante convênio.

Art. 9.° este decreto entrará em vigor na data de sua publicação, revogadas as disposições em contrário.

Brasília, em 13 de maio de 1961; 140° da Independência e 73° da República.

Jânio Quadros Oscar Pedroso Horta Brígido Tinoco Castro Neves Artur Bernardes Filho

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DECRETO DE 23 DE MAIO DE 1961

O Presidente da República resolve

Designar

De acordo com o art. 4.° do Decreto n.° 50.588, de 13 de maio de 1961,

Para exercerem as funções de Membro da Comissão Executiva da Fundação Uni­

versidade Nacional do Trabalho, criada pelo art. l . ° do citado decreto:

Roberto H. Gusmão (Coordenador);

Roberto Simonsen Filho — Representante da Confederação Nacional da Indústria;

Nylton Moreira Veloso — Representante da Confederação Nacional do Comércio;

Domingos Alvarez — Representante da Confederação Nacional dos Trabalhadores

na Indústria;

Antônio Ribeiro — Representante da Confederação Nacional dos Trabalhadores

no Comércio;

Dom Jorge Marcos;

César Reis Catanhede;

Joaquim Faria Góis;

Darci Ribeiro;

Antônio Angarita Silva;

Juarez Brandão Lopes.

I I

EXPOSIÇÃO DO COORDENADOR ROBERTO GUSMÃO

O ensino na nova Universidade visa, por um lado, facultar aos jovens brasileiros

um padrão de vida mais alto e, por outro, assegurar â indústria nacional a necessária

mão-de-obra qualificada, que possa conduzir e dinamizar todo o sistema de produção

nacional.

O empirismo e a importação da mão-de-obra estrangeira, muito onerosa aos

investidores nacionais, já chegaram ao limite extremo e impatriótico, porque deixam

em desigualdade o operariado brasileiro.

somente um novo sistema de formação profissional poderá atender a essas neces­

sidades, em substituição às escolas de moldes tradicionais que, superadas pela própria

Revolução Industrial que se processa, foram incapazes de se adaptar às novas solicitações

e exigências do mercado de trabalho. Acresce, ainda, o aspecto negativo do atual

sistema de educação, que discrimina oportunidades, favorecendo apenas parcela redu­

zida da mocidade brasileira, que consegue, vencendo dificuldades de toda natureza,

ingressar no ensino superior.

Anualmente, 14 mil jovens brasileiros se candidatam às escolas de engenharia, e

só são aproveitados 2 500. O ensino técnico superior que será ministrado na Univer­

sidade do Trabalho, onde serão aproveitados os excedentes, nSo é uma experiência

nova; existe nos países industrializados como a Inglaterra, os Estados Unidos e a

União Soviética.

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OPORTUNIDADES IGUAIS

A educação superior, num Governo democrático, tem de ser, necessariamente, um instrumento de formação de todo o povo, e não apenas o privilégio de minorias. O pensamento do Presidente da República, criando a Universidade do Trabalho, é o de ampliar todo o sistema de ensino técnico-profissional brasileiro, de modo que, em todos os níveis, a classe operária e os filhos das camadas sociais menos favorecidas tenham oportunidade de ingressar, usufruir e participar, realmente, do processo de desenvolvimento econômico nacional. Se as metas de desenvolvimento econômico estão sendo atingidas o que se quer, com a implantação da Universidade do Trabalho, é atingir a meta fundamental para uma nação democrática, isto é, o homem como centro de todas as cogitações.

Os alunos dos cursos da Universidade do Trabalho serão recrutados dentre os milhares de jovens que, completando os cursos médios, se vêem frustrados no seu desejo de prosseguir os estudos, em virtude das dificuldades cada vez maiores criadas nos exames vestibulares, ante o reduzidíssimo número de vagas nas escolas superiores, ou — o que ocorre na maioria dos casos — peias dificuldades econômicas.

TRÊS "CAMPUS" EM 62

Inicialmente, serão instalados três campus universitários — conjuntos de escolas, laboratórios, oficinas e fábricas — em São Paulo, na Guanabara e em Minas Gerais, centro de maior densidade operária e crescimento industrial, onde serão oferecidos cursos de Engenharia Mecânica, Eletrônica, Siderúrgica, Automobilística, Metalúrgica e Têxtil. Em 1963, serão instalados em Recife e Porto Alegre mais dois campus do mesmo tipo.

O ensino será altamente especializado, compreendendo um ano de ensino básico e fundamental de Matemática, Física, Química, Desenho Industrial e Ciências Sociais, e dois anos de especialização nas indústrias correspondentes aos cursos escolhidos. O tipo de especialista formado pela Universidade do Trabalho não será, absolutamente, o concorrente do engenheiro civil, cuja formação de cinco anos de estudos é mais completa e lhe dá o título de doutor. Serão formados técnicos de alto padrão, que virão preencher aquela faixa necessária e hoje vazia na hierarquia tecnológica do especialista capaz de executar, conduzir e dominar as operações de transformação que ocorrem em toda indústria.

FORMAÇÃO DE professores

Os alunos que revelarem excepcional capacidade terão na Universidade do Trabalho, em institutos especiais, a oportunidade de aprimorar seus conhecimentos técnicos e científicos e se tornarem até mesmo professores. O sistema que a Universidade pretende adotar, realizando dois vestibulares por ano, um em janeiro e outro em julho, proporcionará maiores oportunidades aos jovens, maior economia e melhor rendimento para os corpos docente e discente. Pretendemos formar na Universidade, anualmente,

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um número superior ao de técnicos formados por todas as escolas atualmente existentes

em todo o Brasil.

A Universidade pretende recrutar, nas escolas de engenharia, de química e nos

centros de pesquisa do País os professores do mais alto nível para compor seu corpo

docente. A par disso, recrutará jovens engenheiros, oferecendo-lhes bôlsas-de-estudo

no exterior, a fim de se aperfeiçoarem nas matérias que serão ministradas nos cursos

realizados, e deverá contratar alguns professores estrangeiros.

ENTIDADES MANTENEDORAS

A Universidade será mantida por uma fundação, criada pelo Governo e que rece­

berá recursos da indústria e do comércio, maiores beneficiários da instituição Farão

parte de sua direção representantes da Confederação Nacional da Indústria, da Con­

federação Nacional do Comércio e dos trabalhadores, indicados por seus órgãos de

classe. A formação, como se vê, é efetivamente democrática, propiciando o entendi­

mento das classes patronais, nesse esforço do Governo para atingir a meta homem.

A Universidade não pretende substituir ou destruir instituições existentes; ela

tem a força de uma instituição nova, oriunda da própria realidade brasileira, na luta

contra o subdesenvolvimento, É um passo além do trabalho que realizam, por exemplo,

SENAI e SENAC. O apoio e a determinação do Presidente Jânio Quadros para a

consecução desse plano são os fatores de maior estímulo para os membros da comissão

que o estudou e a própria antecipação do êxito da Universidade.

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INFORMAÇÃO DO PAÍS

REGULAMENTO DO ENSINO PRIMÁRIO E NORMAL DO

RIO G. DO NORTE

Paralelamente à reforma do ensino promovida no último qüinqüênio com assistência do INEP, o Governo estadual expediu novo regula­mento, elaborado em função das atuais exigências educacionais, e cujo teor divulgamos:

DECRETO Nº 3.590, DE 1º DE FEVEREIRO DE 1960

Aprova o Regulamento do Ensi­no Primário e Normal do Estado do Rio Grande do Norte.

O Governador do Estado do Rio Grande do Norte, usando da atri­buição que lhe confere o art. 45, nº I, da Constituição Estadual,

DECRETA:

Art. 1º Fica aprovado o Regu­lamento do Ensino Primário e Nor­mal do Estado do Rio Grande do Norte, que com este baixa, assinado pelo Secretário de Estado da Edu­cação e Cultura.

Art. 2º este decreto entra em vigor na data de sua publicação, re­vogadas as disposições em contrá­rio.

Natal, 1º de fevereiro de 1960, 72º da República.

DlNARTE DE MEDEIROS MARIZ

Grimaldi Ribeiro de Paiva

REGULAMENTO DO ENSINO PRIMÁRIO E NORMAL DO ESTADO DO RIO GRANDE

DO NORTE

TÍTULO I

Da obrigação escolar

Art. 1» Sendo obrigatório o en­sino para todas as crianças de 7 a 13 anos, deverá o Estado assegurar os meios e as condições para cumpri­mento dessa obrigação.

§ 1» com esse objetivo, amplia­rá a sua rede escolar e o número de professores primários, em proporção com as necessidades, devidamente rec enseadas.

§ 2° Sendo a educação primá­ria a única acessível à grande maio­ria da população, caberá ao Governo do Estado:

I. atribuir-lhe absoluta priori­dade, em relação aos outros graus de ensino, devendo, para tornar efetiva essa disposição, concentrar nela, de forma preferencial, seus recursos;

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II. velar pela sua qualidade, mediante a adequada formação pro­fissional dos professores.

Art. 2º O período de escolarida­de obrigatória, destinado a assegu­rar as condições adequadas de desen­volvimento da criança, de sua inte­gração social e iniciação em ativi­dades de trabalho, abrangerá todos os alunos que não prosseguem seus estudos em curso de nível médio.

Os dois últimos anos desse perío­do, que constituem o curso comple­mentar, se destinam igualmente a cobrir o intervalo entre a idade ter­minal do curso primário (11 anos) e a idade legal do trabalho (14 anos).

O período de escola obrigatória abrange a educação primária e a educação complementar, este último podendo ser substituído por outro curso de nível médio.

TÍTULO II

Da Educação Elementar

CAPITULO I

Dos objetivos

Art. 3º A educação primária te­rá os seguintes objetivos:

a) aquisição dos instrumentos básicos de expressão do raciocínio: ler, escrever e contar;

b) formação moral e desenvol­vimento das aptidões intelectuais, da sensibilidade e da imaginação;

c) conhecimento do meio, esti­mulado o hábito de observação e da pesquisa pessoal, e o interesse pelos assuntos mais ligados à experiência do aluno, a sua região e ao País;

d) estimular o gosto pelo traba­lho e pelas atividades úteis, inclusi­ve pela iniciação em técnicas que correspondam às necessidades cor­rentes.

Parágrafo único. Os métodos a serem utilizados, na realização des­sas finalidades, deverão fundar-se nos interesses e atividades espontâ­neas da criança, e no caráter obje­tivo e prático do ensino.

CAPÍTULO n

Da Estrutura

Art. 4º A Educação elementar compreende:

a) O Jardim de Infância, para crianças no período pré-escolar;

b) o Curso Primário, para cri­anças de 7 a 11 anos.

Art. 5º Os Jardins de Infância públicos atenderão, de preferência, as crianças cujas mães trabalham.

Art. 6º Promoverá o Estado a expansão de educação pré-primária, mas, somente, depois de haver nú­mero suficiente de escolas primárias com a duração do dia escolar esta­belecida neste Regulamento.

Art. 7º O curso primário com­preenderá dois ciclos: o primeiro de três anos e o segundo de dois anos.

Parágrafo único. As crianças que, após o segundo ano de estudos, revelarem perfeito domínio do pro­grama do primeiro ciclo, serão dis­pensadas do 3º ano deste ciclo.

CAPÍTULO III

Da Articulação dos Cursos

Art. 8' Far-se-á articulação:

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a) do Jardim de Infância com o primeiro ciclo do curso primário, para as crianças de 7 anos e, tam­bém, para as de 6 que se mostrarem capazes de aprendizagem escolar;

b) do primeiro com o segundo ciclo do curso primário;

c) do segundo ciclo do curso primário com o curso complementar e os cursos de nível médio, em geral.

CAPITULO IV

Dos Estabelecimentos de Ensino Primário

Art. 9º Os estabelecimentos de ensino primário poderão ser públi­cos ou particulares, conforme depen­dam ou não do poder público e por êle sejam mantidos.

Art. 10. Empenhar-se-á o Esta­do no sentido de instalar as escolas primárias em prédios próprios, e im­pedirá rigorosamente nas escolas ati­vidades estranhas à educação.

Art. 11. As escolas isoladas te­rão local para biblioteca e reunião de pais.

Art. 12. Os prédios escolares, construídos segundo normas corre­tas de orientação e devidamente equipados, deverão apresentar con­dições adequadas quanto à cubagem por aluno, serviços de abastecimen­to de água, instalações sanitárias e outros requisitos higiênicos indispen­sáveis.

CAPITULO v

Do Trabalho Escolar e sua Direção

Art. 13. O ano escolar no Jar­dim de Infância terá a mesma dura­ção que o curso primário.

Art. 14. O número de anos que terá o Jardim de Infância, variável de um a três, aumentará à propor­ção que forem atendidas as neces­sidades da educação primária.

Art. 15. O primeiro ciclo primá­rio terá 24 horas de trabalho sema­nal e o segundo, 36.

Parágrafo único. Enquanto as instalações existentes não permiti­rem o regime estabelecido neste ar­tigo, será assegurado aos alunos um mínimo de 24 horas nas turmas comuns, e 21 nas de aceleração e nas especiais.

Art. 16. A fim de ser evitada qualquer perturbação nas atividades das escolas primárias, será proibido o funcionamento nelas de cursos que lhes sejam estranhos, e tornadas sem efeito as concessões existentes.

Art. 17. Para se desobrigarem, convenientemente, de suas tarefas, inclusive de preparação do material escolar, antes das aulas, permanece­rão os professores na escola pelo menos durante trinta horas sema­nais.

Parágrafo único. Os professores de classe de aceleração e de classes especiais completarão o tempo re­gulamentar, prestando assistência individual aos alunos.

Art. 18. O ano letivo terá 230 dias e só as circunstâncias de força maior, de excepcional gravidade, po­derão determinar sua redução.

Parágrafo único. Em qualquer hipótese terá concluído o ano letivo somente o aluno que contar 200 dias escolares.

Art. 19. Os períodos de férias no meio e no fim do ano — de 10 a 15 dias e de dois meses — respecti-

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vãmente, serão fixados segundo as condições de trabalho e o clima de cada região.

CAPÍTULO VI

Da Matrícula e da Organização das Classes

Art. 20. A matrícula nas esco­las primárias será feita no fim do ano letivo, para o ano seguinte, ad-mitindo-se, todavia, a possibilidade de conseguir o aluno, durante as férias, condições para sua reclassi­ficação. Também em caráter excep­cional poderão ser feitas novas ma­trículas, no início do ano letivo.

Parágrafo único. Tendo em vis­ta o disposto neste artigo, cada es­cola procederá no fim do ano letivo à verificação das matrículas a serem renovadas e das vagas que ocorre­rão em cada classe.

Art. 21. Obedecendo a organiza­ção das classes ao critério de idade cronológica dos alunos, serão matri­culados na lº série os de 6 a 7 anos, e excepcionalmente os de 8; na 2º, os de 8 e 9; na 3º, os de 9 e 10; na 4» os de 10 e 11; na 5º, os de 11 e 12; na 6º os de 12 e 13.

Parágrafo único. O critério de organização de classe, estabelecido neste artigo, deverá ser seguido, com grande cautela e somente na zona urbana, quando se apresentarem con­dições adequadas para sua implan­tação.

Art. 22. Nas escolas onde houver disponibilidade de lugares, serão constituídas classes de aceleração que sirvam a vários estabelecimen­tos de ensino, agrupando todos os

alunos que, neste, não apresentarem condições de ingressar na série cor­respondente a sua idade.

§ 1º As classes ide aceleração deverão funcionar no curso vesper­tino, sempre que fôr inevitável o regime de três turnos, com um pro­grama escolar reduzido às matérias básicas do currículo.

§ 2º Completar-se-á a educação desses alunos com atividades de tra­balho em oficinas de artes indus­triais.

Art. 23. A fim de promover a distribuição sistemática dos alunos pelas oficinas e classes de acelera­ção mais próximas do local onde residem, far-se á o recenseamento dos alunos incluídos na categoria prevista no artigo anterior e seu zoneamento.

Parágrafo único. A Caixa Esco­lar ou outras instituições congêneres, com a cooperação da Secretaria de Educação, concederá auxílio para o transporte de crianças sem recursos, residentes a mais de dois quilôme­tros da escola. Igual finalidade po­derá ter o lucro obtido nas oficinas de artes industriais, além de outras como merenda, uniformes, excur­sões etc.

Art. 24. Tendo em vista o me­lhor rendimento escolar, serão cons­tituídas em cada classe, sempre que possível, turmas de alunos fortes e médios e fracos, ou seja, apresen­tando só dois níveis de aproveita­mento.

Art. 25. As crianças de mais de 9 anos que procurarem a escola, sem nenhuma escolaridade, constituirão turmas especiais de aceleração.

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CAPÍTULO VII

Do Currículo

Art. 26. As atividades do Jar­dim de Infância visam a despertar e desenvolver livremente as aptidões da criança.

Art. 27. O currículo primário incluirá, basicamente, Linguagem, Matemática, Estudos Sociais, Ciên­cias Naturais, Recreação e Jogos, Atividades de Trabalho e Atividades Artísticas.

Parágrafo único. O aprendizado de Estudos Sociais e de Ciências Na­turais deverá basear-se no estudo do meio natural e humano, mediante a observação direta e a valorização da experiência e da pesquisa pessoal do aluno.

Art. 28. Haverá programas pró­prios para as classes de aceleração, os quais utilizarão, para efeito de orientação do ensino, a experiência já adquirida pelo aluno e suas con­dições da maturidade.

Parágrafo único. Os programas referidos neste artigo serão acentua-damente práticos, incluindo como atividade preponderante, ao lado da formação de atitudes morais e so­ciais, o domínio das técnicas de lei­tura e escrita, conhecimentos práti­cos de Matemática e o estudo do meio.

Art. 29. A elaboração dos pro­gramas constituirá e n c a r g o do COPE, que procurará adaptá-lo às condições educacionais concretas do Estado e, ao mesmo tempo, subme­tê-lo, sempre que fôr oportuno, às revisões e melhoramentos inspirados nas experiências realizadas neste e noutros centros educacionais.

Parágrafo único. Para esse fim, contará o COPE com a cooperação dos Orientadores Educacionais e Di­retores de escolas, além de outras pessoas ligadas ao problema.

Art. 30. Todos os professores deverão receber da Secretaria de Educação e Cultura esclarecimentos sobre o programa escolar e seus obje­tivos. A orientação sobre os méto­dos de execução, que também o acompanhará, deverá restringir-se ao indispensável, sem prejuízo da auto­nomia do professor.

Art. 31. Os programas serão fle­xíveis, adaptando-se às diferenças individuais, às peculiaridades do meio e ao tempo de escolaridade dos alunos, devendo, igualmente, ser enriquecidos na medida dos recursos humanos e materiais disponíveis.

Art. 32. Os programas de ensi­no primário serão devidamente estu­dados nos cursos de formação de professores, particularmente os pon­tos em relação aos quais apresentam maiores dificuldades práticaa.

CAPÍTULO VIII

Da Promoção e da Avaliação de Rendimento Escolar

Art. 33. A promoção será fle­xível, segundo o critério de grupos de idade e do aproveitamento es­colar.

Parágrafo único. Constituirão exceção as crianças que, por motivo de imaturidade, serão reunidas às de idade imediatamente inferior.

Art. 34. Caberá ao professor de­cidir sobre a promoção do aluno, mediante o julgamento do conjunto de suas atividades escolares, duran-

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te o ano letivo, levando em conta igualmente o tipo de classe a que pertence.

Art. 35. No final do ano escolar, julgando o professor não ter ele­mentos suficientes para decidir da promoção de certos alunos, valer-se-á, como recurso subsidiário, de provas elaboradas pelo COPE, cor­respondentes aos vários níveis de aproveitamento escolar.

§ 1º As provas previstas neste artigo poderão igualmente ser apli­cadas com preferência no fim do ano letivo, para fim de pesquisa edu­cacional.

§ 2º Para essas provas serão reservadas, no máximo, seis horas de trabalho, por aluno, distribuídas em dois ou três dias.

Art. 36. A dispensa do 3' ano do 1' ciclo elementar nos termos do art. 7», parágrafo único, assim como a concessão do certificado de ensino primário, ficarão condicio­nadas às exigências que parecerem necessárias à Secretaria de Educa­ção e Cultura, inclusive a realização de provas, atendendo-se, em qual­quer hipótese, ao julgamento do professor

e à freqüência escolar.

Art. 37. Os alunos que não ob­tiverem promoção na época regula­mentar, por razões excepcionais de ordem psicológica ou de saúde, po­derão consegui-las nos três primei­ros meses do ano letivo, com a assis­tência, dada individualmente, pelos professores da classe.

Art. 38. A educação da criança, do ponto-de-vista metodológico, obe­decerá às seguintes características:

a) a mais completa integração entre as suas várias formas de ati­vidades, articulando, conveniente­

mente, o conhecimento teórico e a experiência prática;

b) compreensão prática de coi­sas, fatos e técnicas ligados à vida corrente,, em vista da integração social;

c) a vida escolar será organi­zada com mais ampla diversificação de atividades, de modo que todas as aptidões da criança sejam valori­zadas e tenham as mesmas oportuni­dades de revelar-se e expandir-se;

d) aplicação de métodos basea­dos, convenientemente, nos interesses e atividades espontâneas da criança.

Art. 39. Empenhar-se-á a Se­cretaria de Educação e Cultura em proporcional eficiente assistência ao trabalho do professor, através de cursos, seminários, estágios, reu­niões, etc, e da atuação de Orienta­dores Educacionais e Diretores da Escola.

Art. 40. São condições para a nomeação de Orientador Educacio­nal:

a) classificação em curso espe­cializado;

b) cinco anos de eficiente exer­cício do magistério primário;

c) estágio probatório de um ano.

CAPÍTULO IX

Dos serviços de assistência à escola e de sua relação com a comunidade

Art. 41. Organizará a Secretaria de Educação e Cultura, na medida em que tiver pessoal habilitado para provê-los, os seguintes serviços de assistência à escola: Serviço Médi­co, Serviço Dentário, Serviço de As­sistência Social aos alunos e seus pais.

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Art. 42. Caberá à escola incre­mentar a criação de serviços assis­tenciais próprios, aprovados pela Se­cretaria de Educação e Cultura, tais como a Caixa Escolar, a Aferenda Escolar, o Fundo de Assistência aos alunos etc.

Art. 43. Atentos os professores à necessidade de integração da esco­la à comunidade e ao fato de que o rendimento escolar depende, em grande parte, da promoção cultural geral, cabe-lhes:

a) criar Associação de Pais e Mestres e fomentar, de todas as for­mas, a aproximação entre os pais e a escola, tendo em vista os pro­blemas ligados ã vida escolar e à vida local;

b) proporcionar aos pais e à comunidade os meios de informação e cultura, como bibliotecas, conferên­cias, música, teatro, revista, além de outros.

Parágrafo único. Nas reuniões de pais e mestres e nas demais ati­vidades sociais da escola evitar-se-á, rigorosamente, qualquer sentido po-lítico-partidário.

TÍTULO III

Dos estabelecimentos de ensino primário

Art. 44. Haverá os seguintes ti­pos de estabelecimentos de ensino primário:

a) Escola Isolada, com uma turma de alunos e um professor;

b) Escolas Reunidas, com um número de turmas que poderá va­riar de duas a quatro e igual nú­mero de professores;

c) Grupos Escolares, cinco tur­mas, pelo menos, e igual número de professores de classe, aos quais se reunirão, quando possível, professores

especializados em atividades ar­tísticas e de trabalho e em educação física, além de outros, que têm por finalidade o enriquecimento do cur­rículo.

TÍTULO IV

Do curso complementar

Art. 45. O Curso complementar De destina aos menores de 11 a 13 anos, que não ingressem em outro curso de nível médio.

Art. 46. Tendo os mesmos obje­tivos gerais da educação primária, a Educação Complementar visa aper­feiçoar a educação fundamental com elementos de cultura e iniciação nas técnicas mais correntes de trabalho, desse conjunto devendo resultar um mínimo de aptidão para o exercício de atividades úteis.

Art. 47. Abrangendo a educa­ção complementar problemas novos, relacionados com a formação do professor

e a estruturação do curso e sua articulação com outros cursos de nível médio, deverá o Governo do Estado, oportunamente, baixar de­creto com sua regulamentação.

TÍTULO v

Do ensino Supletivo

Art. 48. No curso supletivo, re­ceberão os adolescentes e adultos que dele carecem, educação de base, ministrada de forma quando possível prática e articulada com as ativida­des profissionais.

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§ 1» Os cursos supletivos funcio­narão normalmente, no horário no­turno, só em casos excepcionais, em escolas primárias; nestes casos, o período de funcionamento será pre­viamente estabelecido pelo Secretá­rio de Educação e Cultura.

§ 2" As escolas primárias pode­rão manter cursos supletivos para adolescentes de 12 a 14 anos, em ho­rário vespertino.

TÍTULO VI

Do professor

CAPÍTULO I

Normas Gerais

Art. 49. A formação profissional de professor far-se-á nos Centros de Formação do Magistério e nas Esco­las Normais Regionais.

Art. 50. As Escolas Normais Regionais deverão preencher os se­guintes requisitos:

a) ter preparado pelo menos 90 professores nos últimos três anos;

b) apresentarem seus professores as condições previstas no ar­

tigo 67; c) prédio próprio, com instala­

ções adequadas e Escola de Aplica­ção.

Parágrafo único. Os prédios, on­de funcionam as Escolas Normais Regionais, que não satisfizerem às condições mencionadas neste artigo, serão destinadas a outras institui­ções de ensino, de preferência Cursos Complementares.

Art. 51. Enquanto se mostrar insuficiente o número de professores titulados, promoverá o Governo do Estado a nomeação de todos os Con­

cluintes do curso pedagógico ou nor­mal, logo após sua nomeação.

Art. 52. Ficam obrigados a pres­tar cinco anos de serviço no ma­gistério primário os professores que tenham recebido bôlsas-de-estudo do Estado; a obrigação se reduz a três anos, nos demais casos.

Art. 53. Os professores forma­dos por cada um dos Centros de Formação do Magistério serão no­meados para a Região a que o Cen­tro pertencer, podendo prestar ser­viços noutra região somente os que forem aprovados em concurso, ins­tituído para este fim.

Art. 54. Para efeito de distri­buição e transferência dos professores

primários, o Estado dividirá em zonas as Regiões mencionadas no artigo anterior. Os professores, após sua nomeação, ficarão obrigados a prestar serviço durante dois anos, nas zonas mais afastadas do Centro ou Escola Normal em que se diplo­maram, e durante um ano, na zona intermediária.

Parágrafo único. Dentro da zo­na para que forem designados, terão os professores o direito de escolher a localidade e a escola, atendida a ordem de classificação escolar por eles obtida.

Art. 55. Será levantado, perio­dicamente, o número de professores de que necessitam cada região e cada zona, a fim de ser a estes ofe­recido, nos Centros de Formação do Magistério e nas Escolas Normais, o número correspondente de lugares.

Art. 56. Para receber bôlsa-de-estudo assumirá o candidato o com­promisso de prestar serviço, pelo me­nos durante cinco anos, em locali­dade carente de professores, no interesse

da qual a bolsa é concedida.

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Parágrafo único. Os alunos que, na data da publicação deste decreto, estiverem matriculados no 2» ciclo dos Centros de Formação do Magis­tério, serão dispensados da exigên­cia contida neste artigo.

Art. 57. O contrato de professores leigos, permitido somente na

medida em que fôr deficiente o nú­mero dos titulares, terá vigência de um ano, podendo ser renovado.

§ 1º Só será contratado o professor aprovado em curso de emer­

gência ou em prova de seleção, orga­nizados pela Secretaria de Educação e Cultura.

§ 2° As mesmas condições im­põem-se aos atuais professores lei­gos para permanecerem no exercício de suas funções.

Art. 58. As transferências e re­moções de professores far-se-ão a pe­dido, e segundo critério da eficiên­cia profissional e do tempo de ser­viço na zona em que se encontrem.

Art. 59. Fixará o Estado a com­pensação financeira a ser atribuída aos professores das zonas mais re­motas, e aos que despenderem com alojamento mais da metade de seus vencimentos.

Art. 60. O cargo de Diretor de Escola Primária será exercido por professor diplomado, que preencha as seguintes condições:

a) ter sido classificado em cur­so de formação de Diretor ;

b) prática de educação primá­ria durante pelo menos cinco anos;

c) estágio mínimo de um ano, em estabelecimento de ensino primá­rio.

Art. 61. A nomeação de Diretor de Escola Primária terá a vigência de um ano, podendo este prazo ser renovado.

Art. 62. Caberá ao Diretor da escola primária, além das funções estritas de administração, exercer, com espírito cooperativo, a supervi­são, coordenação e ajuda profissio­nal em relação ao trabalho dos professores

e de outros funcionários da escola.

Art. 63. Para efeito de nomea­ção, estão sujeitos os Diretores do mesmo modo que os professores, ao critério de zoneamento estabelecido no artigo 55.

Art. 64. Só serão nomeados Ori­entadores, professores primários que satisfaçam as seguintes condições:

a) exercício de pelo menos cin­co anos de magistério;

b) curso de formação de Orien­tadores realizado pela Secretaria de Educação e Cultura, com a duração de um ano, seguido ou não, ou outro equivalente, organizado sob os aus­pícios do Instituto Nacional de Es­tudos Pedagógicos;

c) um ano de estágio bem su­cedido.

Art. 65. Só poderão inscrever-se nos Cursos de Orientador os candi­datos que se destinem aos municí­pios deles carentes.

Art. 66. Os professores primá­rios que, após dois anos de exercício do magistério, se distinguirem pela sua capacidade e eficiência, serão designados para as escolas ou clas­ses de aplicação, valendo a designa­ção como título de merecimento na sua carreira.

CAPÍTULO n

Da formação do professor

Art. 67. O COPE investigará, de forma permanente, as condições de formação do professor e os pro-

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blemas ligados ao exercício de suas funções, particularmente no que res­peita à eficiência profissional e aos meios de assegurá-la.

§ 1º com esse objetivo, acom­panhará o COPE o trabalho dos professores

e estará sempre em arti­culação com os Centros Educacio­nais de Formação do Magistério.

§ 2º Os Centros Educacionais de Formação do Magistério deverão adaptar, constantemente, seu currí­culo e planos de trabalho aos resul­tados de pesquisa e às informações do COPE.

Art. 68. De acordo com a Lei nº 2.171, de 6/12/1957, as disciplinas integrantes do currículo de cultura geral, complementares ao curso de ginásio, constituem um ano prope­dêutico, cuja organização será regu­lamentada em decreto especial.

Art. 69. Os cursos profissionais de formação de professores primá­rios serão:

a) o Curso de Treinamento, de um ano;

b) o Curso Pedagógico de dois anos.

Art. 70. O Curso de Treinamen­to proporcionará o mínimo de for­mação cultural indispensável ao exer­cício do magistério e terá um ca­ráter especificamente profissional.

Parágrafo único. As matérias básicas do Curso mencionado neste artigo serão: Português, Matemáti­ca, Estudos Brasileiros, Ciências Fí­sicas e Naturais, Higiene Escolar, Recreação, Música e Artes Aplicadas.

Art. 71. O Curso Pedagógico associará, da forma mais articulada e objetiva, o estudo dos fundamentos da educação e a habilitação prática para o exercício do Magistério.

Art. 72. O Currículo do Curso Pedagógico será constituído das se­guintes disciplinas:

Fundamentos da Educação, En­sino de Linguagem, de Matemática, de Estudos Sociais, de Ciências Na­turais, de Recreação e Jogos, de Música e Artes Aplicadas, entenden­do-se todas essas disciplinas em or­dem ao aprendizado primário.

Art. 73. Os Fundamentos da Educação compreendem os pro­blemas de natureza e fins de edu­cação, de integração social, de desenvolvimento da criança das condições de aprendizagem.

Art. 74. A formação profissional dos professores apoiar-se-á na obser­vação do trabalho de classe, na prática de ensino, era escolas ou classes de aplicação, especialmente escolhidas, e nos estudos dos pro­gramas de ensino e dos métodos mais adequados a sua execução.

Art. 75. Na organização do cur­rículo, ter-se-á em vista que:

a) o aluno não poderá estudar mais de 6 disciplinas de cada vez;

b) o ensino fundar-se-á no es­tudo de problemas, nos quais traba­lharão os professores, quando possí­vel, de forma cooperativa e inte­grada.

Parágrafo único. Tendo em vista o disposto no item b deste artigo, os programas devem ser ela­borados e periodicamente reexami­nados pelos professores em conjunto.

Art. 76. Mediante o conheci­mento dos Fundamentos da Edu­cação e os Estudos Sociais, deverão os futuros professores tornar-se capazes de introduzir seus alunos no conhecimento do meio, da estru­tura e mecanismo das instituições

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sociais mais ligadas à vida comum, das condições de vida do aluno e de sua família.

Art. 77. Os professores dos cursos profissionais dos Centros Educacionais, acima referidos, serão obrigados a um número de 18 horas de trabalho semanal, nas quais se inclui a assistência individual aos alunos e acompanhamento do tra­balho destes nas classes de apli­cação.

Art. 78. Os professores dos Cursos de Treinamento e do Curso Pedagógico deverão ter experiência de ensino primário de pelo menos cinco anos, cursos especiais de dis­ciplinas que pretendam lecionar.

§ 1º Estão incluídos na cate­goria prevista no item b deste artigo, os cursos de Faculdades de Filosofia e os cursos e estágios rea­lizados sob os auspícios do Instituto Nacional de Estudos Pedagógicos.

§ 2º Poderá substituir a exi­gência do exercício do magistério primário um exame de habilitação que demonstre conhecimentos dos problemas práticos de ensino pri­mário e a prova de haver exercido durante cinco anos o ensino secun­dário.

Art. 79. Os Centros Educacio­nais de Formação do Magistério ministrarão os (Seguintes cursos, além dos que foram mencionados no artigo 69:

a) curso de emergência para professores leigos, de preferência com o curso ginasial, realizados em épocas sucessivas de férias, até que se complete o período de dois anos; e para candidatos que tenham curso colegial ou ginasial, durante um ano contínuo, em regime de trabalho intensivo;

b) curso de Orientador do Ensino;

c) curso de Administração Es­colar, destinado particularmente aos Diretores;

d) cursos de extensão;

e) cursos de aperfeiçoamento do professor primário.

Art. 80. São condições para o ingresso no Curso Pedagógico:

a) ter curso ginasial; b) ser considerado apto para

0 magistério primário. Parágrafo único. Será estabe­

lecido em estatuto próprio, o critério para aferição dessa capacidade.

Natal, 1» de fevereiro de 1960.

GRIMALDl RIBEIRO DE PAIVA

Secretário de Estado da Educação e Cultura.

I CONVENÇÃO OPERARIA EM DEFESA DA ESCOLA PUBLICA

Realisada no Sindiato dos Metalúr­gicos em fevereiro último, com a participação de entidades estudan­tis, culturais e profissionais, a Convenção aprovou por unanimi­dade a seguinte "Declaração de Princípios":

"A 1ª Convenção Estadual de Defesa da Escola Pública afirma a sua absoluta, intransigente fidelida­de ao princípio da liberdade de pen­samento e de expressão.

Nessas condições, através de suas comissões permanentes e de quais­quer outros meios eficazes, bater-se-á no campo político, social, edu­cacional, técnico e cultural pelos se­guintes princípios:

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1» — Apoio total à doutrina es­tabelecida pela Constituição Federal em seus artigos 141 §§, 5º, 7º e 8º e 166, 167, 168, números I a TV e VII. O primeiro, que consagra a liberdade de pensamento sem que dependa de censura; liberdade de consciência e crença; não ser o indivíduo privado de nenhum de seus direitos por mo­tivo de convicção religiosa, filosófica ou política. E os últimos que de­terminam:

Art. 166 — A educação é direito de todos e será dada no lar e na escola. Deve inspirar-se nos prin­cípios de liberdade e nos ideais de solidariedade humana.

Art. 167. — O ensino dos dife­rentes ramos será ministrado pelos poderes públicos e é livre à inicia­tiva particular, respeitadas as leia que a regulem.

Art. 168 — A legislação do en­sino adotará os seguintes princípios:

I — O ensino primário é obri­gatório e só será dado na língua nacional;

II — O ensino primário oficial é gratuito para todos; o ensino ofi­cial ulterior ao primário sê-lo-á para quantos provarem falta ou insuficiên­cia de recursos;

III — As empresas industriais, comerciais e agrícolas, em que traba­lhem mais de cem pessoas, são obri­gadas a manter o ensino primário gratuito para os seus servidores e os filhos destes;

IV — As empresas industriais e comerciais são obrigadas a minis­trar, em cooperação, aprendizagem aos seus trabalhadores menores, pela forma que a lei estabelecer, respeita-dos os direitos dos professores;

V — E garantida a liberdade de cátedra.

2° — Prioridade do Estado no ministério e na organização do ensi­no, admitida a iniciativa particular como elemento supletivo respeitada a legislação vigente.

3º — Prioridade do ensino pri­mário tendo em vista as exigências do desenvolvimento social-econômico do País, em contrário à orientação atual da política educacional seguida pelos nossos governos.

4º — Igual expansão e assistên­cia ao ensino industrial e agrícola.

5° — Efetivação da obrigatorie­dade do ensino de maneira a cumprir-se o texto constitucional até agora violado — com adoção de me­didas rigorosas que assegurem a fre­qüência à escola de toda a população infantil em idade legal.

6º — Extensão da escolaridade através do curso complementar equi­valente aos dois primeiros anos do curso médio, até os 14 anos de idade, idade legal do trabalho.

7º — Reorganização total do en­sino médio adaptando-o às exigên­cias da sociedade moderna, com a localização dos estabelecimentos con­soante critérios pedagógicos cientí­ficos; aperfeiçoamento rigoroso dos corpos docentes, sendo que os professores

secundários devem originar-se exclusivamente das Faculdades de Filosofia e de cursos especializados quando inexistente a disciplina nos currículo, daquelas faculdades; ga­rantia do professor contra influên­cias particulares, religiosas ou de po­lítica partidária locais; oportunidade de acesso e freqüência facilitada igualmente a todas as camadas, sem distinção.

8º' — Criarem-se maiores exigên­cias em relação ao ingresso e ao ní­vel do professorado das escolas nor-

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mais e acentuação do ca rá t e r profis­sional dessas escolas. Estabeleci­men to de rígidos concursos de t í tu­los e provas p a r a o ingresso ao ma­gistério pr imário .

9º — Cumprimento pelas escolas super iores em geral do dispositivo sobre concurso de t í tulos e provas p a r a o rec ru tamento dos respectivos magistér ios.

10. — Exigência em relação às escolas super iores par t iculares de condições pat r imoniais e bem assim de renda p a r a o regular funciona­men to de seus cursos.

11. — Adoção de exame de E s ­tado p a r a os por tadores de diplomas de curso profissional de nível supe­rior, devendo esse exame ser reali­zado peran te órgãos disciplinados da classe à medida que ta is órgãos se ins t i tuam p a r a cada classe em 50% das unidades federadas.

12. — Racionalização dos servi­ços de educação de mane i ra a impe­dir que qualquer interferência de política pa r t idá r ia ou de ordem reli­giosa prejudique os interesses do en­sino.

13. — O poder público não pode abdicar dos seus deveres de admi­n i s t r a r o ensino e a educação que g a r a n t e m a própr ia unidade nacional.

14. — O dinheiro público só po­de ser aplicado na manutenção e no desenvolvimento da escola pública. Os auxílios oficiais dados aos estabe­lecimentos par t iculares deverão ser exclusiavmente fornecidos pelos ins­t i tu tos de crédito oficiais, ta is como Banco do Brasil , Banco do Estado, Caixas Econômicas e outros, de acordo com as

no rmas vigentes nessas instituições.

15. — Todos os estabelecimentos

de ensino, pr imário, médio ou supe­

rior, oficiais e par t iculares , sem ex­

ceção, não poderão estabelecer res­

trições à matr ícula de alunos com

base em preconceitos de raça, de

côr, de nacionalidade, de classe, de

religião, de ideologia, ou em vir tude

de de terminada s i tuação civil dos

pais dos a lunos" .

I I I SIMPÓSO D E ORIENTAÇÃO EDUCACIONAL

Promovido pela CADES, reuniu-se

em Recife de H a XI de janeiro

do corrente ano, com a participa­

ção de orientadores, professores

e inspetores do ensino secundário,

aprovando para cada tema rela­

tado estas conclusões:

1 — T e m a : A ORIENTAÇÃO EDUCACIO­

NAL E A ESCOLA

a) Corpo Docente.

1) — Os professores que apresentem

dotes propícios â Orientação

Educacional poderão da r sua

colaboração:

a) como conselheiros (regen­

tes, monitores, etc.) de tur­

mas , devidamente escolhi­

dos e p reparados ;

b) incumbindo-se de ce r t a s

tarefas auxil iares do S . O .

E . , especialmente at ivida­

des extraclasses;

c) servindo de contato huma­no propício ao a jus tamento do a luno;

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d) contribuindo pa ra a ela­boração do planejamento das at ividades da Orienta­ção Educacional ;

e) contribuindo para o ent ro­samento dos demais professores com a equipe de orientação.

2) — a) É aconselhável que o Ori­entador responsável pela função específica e formal de Orientação não exerça a função docente p a r a com os mesmos educandos, não só pelas incompatibil ida­des que poderão surgi r com os alunos como pela ne­cessidade de dedicar-se in­tegra lmente à or ientação;

b) E necessário, porém, que o Orientador t enha experiên­cia docente, pa ra aval iar melhor os problemas rela­cionados com a a tuação do professor.

3) — a) Convém que se preveja na distribuição dos t raba lhos escolares e na organização do horário dos professores, tempo e remuneração cor­respondentes à colabora­ção que deve ser p re s t ada por eles ao Serviço de Orientação Educacional ;

b) Deve o orientador ir ao encontro deles, pondo ao seu alcance as informações indispensáveis ao conheci­mento dos problemas da sua classe e os elementos necessários p a r a que exer­çam a sua função de ma­neira propícia ao espírito da orientação educacional.

4) — P a r a facilitar o conhecimento dos alunos novos por par te dos professores, sugere-se:

a) Que se ofereçam oportuni­dades p a r a encontros in­formais, como por exemplo em atividades extraclasses, promovendo as festas dos novos, e tc ;

b) Que o Serviço de Orienta­ção Educacional , ressalva­do o sigilo profissional, for­neça aos professoras dados sobre tais a lunos;

c) Nos casos de t ransferên­cia, se o colégio de origem possui o Serviço de Orien­tação Educacional , que este forneça, respei tadas as nor­mas do sigilo profissional, as informações solicitadas pelo or ientador do novo co­légio.

5) — a) Que o Serviço de Orienta­ção Educacional leve p a r a as reuniões pedagógicas, informações úteis à a tua­ção dos professores sobre:

1) deficiências da aprendi­zagem;

2) dificuldades de ajusta­mento comum da tur­ma ;

3) atividades extraclasses.

b) Que os professores forne­

çam ao orientador dados e

observações de acordo com

um roteiro sugerido pelo

Serviço de Orientação Edu­

cacional na reunião peda­

gógica.

6) — Convém que as Faculdades de Filosofia incluam nos progra-

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mas de Didática Geral e de Administração Escolar, uma parte dedicada especificamen­te aos objetivos e à estrutura da Orientação Educacional na Escola.

2 — TEMA: A ORIENTAÇÃO EDUCACIONAL

E A ESCOLA

b) Direção.

1) — I) Os diretores poderão pre­parar-se para uma eficien­te colaboração com o Ser­viço de Orientação Educa­cional por meio de:

a) contatos sistemáticos com o próprio orientador e em reuniões periódicas com o corpo docente para fins de orientação;

b) cursos especializados para diretores (jornadas, semi­nários, semanas de estu­dos, e tc ) ;

c) leituras e publicações refe­rentes ao assunto.

ID Na prática:

a) criando um clima de re­ceptividade à instalação do Serviço de Orientação Educacional;

b) participando da elabora­ção do planejamento do do Serviço de Orientação Educacional;

c) prociciando uma situação favorável à atividade do Serviço de Orientação Edu­cacional mediante: 1) a seleção e o estímulo

ao preparo de pessoal técnico para a equipe;

2) a localização adequada e equipamentos neces­sários.

2) — I) O orientador, com os ele­mentos de que dispõe, de­verá oferecer à direção da­dos sócio-econômicos, pe dagógicos e psicológicos que possam auxiliá-los a compreender sua comuni­dade escolar.

II) Proporá, também, à Dire­ção providências que ve­nham a resultar em me­lhores condições educati­vas.

III) O orientador cuidará de preparar o espírito dos alu­nos para que assimilem os princípios fundamentais que devem reger a condu­ta humana, colaborando, assim, na solução de casos disciplinares.

3) — De modo especial, conviria a realização de palestras e cursos rápidos para os inspetores e alunos, a fim de compreende­rem a natureza da Orientação Educacional e aceitarem cer­tas normas mais adequadas ao trato com os alunos.

3 — TEMA: A ORIENTAÇÃO EDUCACIONAL

E A ESCOLA

c) Atividades extraclasses, Recreação e Serviços Mé­dicos

1) — a) N u m entendimento co­mum com a direção da es­cola, convém que o Orien-

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tador Educacional f a ç a um levantamento da reali­dade escolar com o fim de conhecer as agremiações do corpo discente, capazes de desenvolver atividades extraclasses, incluindo a atuação dessas mesmas agremiações no planeja­mento geral da vida esco­lar e estimulando a forma­ção de outras atividades.

b) Embora as atividades ex­traclasses não sejam da responsabilidade exclusiva do Orientador Educacional, compete-lhe estimular sua criação e favorecer o seu desenvolvimento atuando junto aos professores e de­mais pessoas especializa­das cuja colaboração soli­citará, e auxiliando os alunos que delas partici­pam.

mesmo sentido, convém que os professores aprovei­tem os recursos e as técni­cas das atividades extra­classes nas suas discipli­nas.

3) — a) È necessário que entre o Diretor, o Orientador e o médico escolar haja um entendimento prévio para a fixação dos dados e das observações do Serviço Médico, úteis ao Serviço de Orientação Educacional.

b) Convém, ainda, que, de maneira sistemática, o Mé­dico escolar seja informado do andamento de casos es­peciais referentes a alunos com deficiência e colabo­re no encaminhamento e acompanhamento necessá­rio.

2) — a) Por consistir a principal dificuldade na incompreen­são das vantagens educa­tivas das atividades extra­classes, deve-se procurar esclarecer os pais, professores

e alunos a fim de obter deles franca adesão.

b) Considerando-se que outra dificuldade é a que se ve­rifica por força de impos­sibilidade resultante do ho­rário escolar e de exigüi­dade de espaços na escola, recomenda-se o aproveita­mento de instituições exis­tentes na comunidade, des­tinadas à promoção de ati­vidades extraclasses. No

4 — TEMA: A ORIENTAÇÃO EDUCACIONAL, A FAMÍLIA E A COMUNIDADE

1) — O entrosamento do Serviço de Orientação Educacional com a família poderá ser feito, de co­mum acordo com a direção da escola, utilizando-se de encon­tros informais e de reuniões da Associação de Pais e Alu­nos, com a colaboração dos mestres, bem como valendo-se de circulares e entrevistas com os pais.

Se a escola conta com a colaboração de um assistente social, convirá a organização de visitas às famílias dos alunos.

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2) — Para a formação do autêntico espírito comunitário entre os alunos, recomenda-se:

a) aproveitar as atividades extraclasses, nas quais se torna mais fácil a com­preensão mútua;

b) incentivar a formação de equipes para o auxílio mú­tuo na realização dos tra­balhos escolares;

c) conduzir os alunos ao exercício da fraternidade, especialmente para huma­nizar o desnível social e econômico, quer dentro da própria escola quer em be­nefício dos necessitados fora da escola, aproveitan­do-se de instituições tais como: vicentinos, escotei­ros, bandeirantes, Jec, etc.

Procura o Serviço de Orientação Educacional in­teressar os professores no sentido de criar um clima propício à vivência dessas atitudes e ao alcance dos objetivos anteriormen­te indicados.

Outrossim, sugere-se a realização da semana da comunidade com o fim de os alunos virem a compre­ender os problemas huma­nos da própria comuni­dade.

3) — a) Para obter a formação da personalidade para a vida democrática do educando convém insistir, especial­mente, no exercício do sen­so de responsabilidade.

b) É aconselhável, sob conve­niente direção, realizarem-

se visitas que possam ofe­recer elementos construti­vos para a formação cívica dos alunos, bem como às obras sociais que alarguem sua compreensão de socie­dade.

c) Aproveitar todas as opor­tunidades que se oferecem à escola para trazer aos alunos o testemunho de personalidades que se sali­entem por serviços presta­dos à comunidade.

d) Quando houver o exercício do voto por parte dos alu­nos, deve-se orientá-los pa­ra que o exerçam consci­enciosamente tendo em vista o bem comum.

REFORMA DO ENSINO NORMAL DO CEARA

Complementando a exposição do Prof. Lauro de Oliveira Lima pu­blicada em o nº 80, nesta seção, apresentamos a análise que lhe dedicou o Prof. Paulo de Almeida Campos:

Muito embora possam ser feitas algumas restrições à exegese que o Prof. Lauro de Oliveira Lima faz da Lei de Reforma do Ensino Nor­mal do Ceará, consideramos de mo­do geral louvável a linha de ação indicada por êle que foi, por assim dizer, o autor da reforma levada a efeito por via da Lei Estadual nº 4.410, de 26/12/1958, regulamen­tada pelo Decreto n° 3.662, de . . . 21/3/1959.

1. Todo o plano da formação do professor primário do Ceará está nitidamente marcado pela seguinte

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diretriz: intensa, permanente e ín­tima vivência das alunas da Escola Normal com o que ocorre nas esco­las primárias. Primeiro, as norma­listas observam os fatos, entram em

contato com a realidade da escola primária, são lançadas na problemá­tica profissional; em seguida, levam para as classes da Escola Normal e discutem aí com os professores o fruto de suas observações, as dúvi­das suscitadas, as análises feitas. Cada professor — de Psicologia, de Sociologia, de Administração Esco­lar, etc. — focalizará, então, os fa­tos e problemas do ângulo de sua cadeira, fornecendo às alunas o con­teúdo, a orientação teórico-cienti-

fica, a doutrina científica a res­peito dos fatos observados. Cada professor constrói a teoria sobre a prática observada pelas alunas, ao contrário do que geralmente ocor­re em nossas Escolas Normais onde os professores, durante todo o cur­so, comunicam toda uma extensa e complexa teoria elaborada (defi­nições, conceitos, leis, normas, dis­posições, classificações) desligada da realidade que vai pela escola primá­ria, desvinculada do "fato educacio­nal" em si, esperando que no futuro exercício docente possam as mes­tras primárias aplicar, a cada situa­ção nova surgida, a teoria dominada durante seu curso de formação.

O Prof. Lauro inverte totalmen­te a ordem didática seguida nas Es­colas Normais: as normalistas, des­de o primeiro ano normal, vêem, "por dentro" as escolas primárias, sua organização e funcionamento, co­nhecem in loco as instituições sociais da cidade, os recursos econômicos da região (fontes de produção agro­pecuária, fábricas, fontes de abas­

tecimento etc) , os recursos assis­tenciais (hospitais, farmácias, corpo de bombeiros etc), os serviços admi­nistrativos etc. Travam, assim, an­tes da exposição teórica dos professores

das escolas normais, um con­tato com o mundo econômico e social em que estão inseridas as es­colas primárias, e com estas nota­damente, conhecendo, até as minú cias, a vida dos alunos em todos os momentos do dia escolar, do mesmo modo que o trabalho dos diretores e professores primários.

todas essas observações giram em torno de uma "unidade de tra­balho", como núcleo fundamental das atividades de treinamento da aluna-mestre, tal como: a construção do prédio, a utilização do prédio esco­lar, a matrícula, a organização de classes, relações escola-família, re­creação etc. Todos os professores da Escola Normal, cada qual sob o ângulo da respectiva cadeira, parti­cipam de cada "unidade de traba­lho" na orientação do treinamento, incorporando a este todos os subsí­dios, toda a fundamentação cientí­fica de sua especialidade, construin­do, então, a teoria à base do fato educacional, da "situação profissio­nal".

O Prof. Lauro indica, ademais, recursos vários para alcançar o trei­namento pelas "unidades profissio­nais": estágios e plantões, leitura, debates e seminários, atividades de grupo e outras, além de atividades específicas não globalizantes, tais como monografias, pesquisas etc,

A própria prática docente, a chamada "Prática de Ensino" será um dos aspectos do "treinamento dentro do trabalho" a ser efetuado pelas normalistas durante seu curso.

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Espera o Prof. Lauro que somente um treinamento assim tão real será capaz de dar à escola normal seu verdadeiro sentido de profissionali­zação definida que a deve caracte­rizar.

2. Afigura-se-nos muito reco­mendável a estruturação dos cursos em "departamentos" — de cultura geral, de fundamentos da educação, de artes e técnicas — e também que os planos de curso se desenvolvam à base de "unidades de trabalho" ou "unidades profissionais", mediante observação sistemática, leitura, de­bates, seminários, estágios, pesquisas etc, tudo na linha de um legítimo treinamento — dentro — do traba­lho, no qual "dar aula" às alunas da Escola Normal não tem pratica­mente mais sentido, uma vez que o ensino deverá ser vitalizado por uma vivência da realidade da escola pri­mária, com o caráter eminentemen­te prático, funcional, objetivo de in­tegração profissional do futuro professor

primário. 3. Somos de parecer que o

maior óbice para a execução da Re­forma do ensino normal do Ceará residirá nos professores que lecio­nam em suas escolas normais, que não hão de ser muito diferentes da generalidade dos professores dessas escolas do restante do País. esses, ao lado da formação científica em nível universitário, devem possuir experiência anterior de magistério em escola primária, e hão de ser capazes de reformular totalmente seu ultrapassado método de "aulas-expositivas", monologadas, num res­trito e exclusivo ensino oral, em que os alunos organizam os malfadados "pontos", depois confrontam (ou não) com o que está nos livros-fon-

tes e livros de texto (quando há), e memorizam inutilmente definições, classificações, leis etc.

Acreditamos que nesse ponto re­sidirá a grande dificuldade para a execução da reforma: professores capazes de orientar com segurança suas alunas com vistas ao magisté­rio primário. E, mais grave ainda, quando esses docentes são improvi­sados: o médico que leciona Anato­mia Humana, o pároco que leciona Sociologia ou Português. Todos to­talmente desvinculados da escola primária.

Mesmo os diplomados por facul­dade de filosofia, geralmente não possuem nenhuma vivência com a organização e problemática da esco­la primária.

Por isso, nossas escolas de for­mação (alguns já dizem que elas são de deformação...) do professor pri­mário não têm o menor sentido de "profissionalização", que as deveria identificar por excelência, transfor­madas hoje em meros "anexos" a ginásios, simples escolas de "forma­ção geral para moças" e de objetivos propedêuticos a escolas superiores, especialmente faculdades de filoso­fia, nas quais domina a discrimina­ção de disciplinas por séries, estuda­das isoladamente, sem nenhuma articulação funcional ou correlação com outras atividades, num estan-quismo dissociativo, impossibilitando o clima de unidade do curso, a coe­rência progressiva e aglutinadora da aprendizagem, que se resume, assim, num acervo heterogêneo e afinalís-tico de informações e conhecimentos que as alunas devem "armazenar" apenas para as provas e os exames.

4. Um aspecto que ficou neces­sariamente explícito na justificativa

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da reforma, pelo Prof. Lauro de Oli­veira Lima, foi a denominada "Prá­tica de Ensino". Muito embora en­tendamos e obviamente — que ela representa um aspecto do treina­mento — dentro — do — trabalho, de que se constitui, afinal, todo o curso normal, parece-nos que não recebeu tratamento merecido. como será ela conduzida? Por que tempo ela se efetua? Em que série ou séries? Por que período a aluna-mestre observa as aulas do professor da

escola primária, para depois co-participar dessa docência, e final­mente, dirigir sozinha a classe, to­má-la inteiramente a seu cargo?

Consideramos, com efeito, da maior importância essa marcha pro­gressiva, gradativa na prática do­cente: observação, co-participação e direção da classe. De igual modo, hão que ser largos esses períodos, para serem válidos.

5. A reforma em tela estará, de outro lado, a exigir profissional da categoria do Prof. Lauro de Oli­veira Lima para coordenar sua exe­cução, que seria experimentada ini­cialmente em uma escola normal, onde, de futuro, viriam estagiar

professores e diretores de outras esco­las, objetivando não só a dominarem os diferentes aspectos de sua reali-

A EDUCAÇÃO

Entrevistado pela imprensa carioca, o Prof. Darci Ribeiro abordou a situação do ensino no Estado da Guanabara e suas implicações na elaboração do texto constitucional promulgado em março do corrente ano. Apresentamos o teor desse pronunciamento:

zação mas também a ganharem o "espírito da reforma", sua conscien­tização, a integração num trabalho dessa natureza, ainda sem nenhuma tradição entre nós, já que tal linha de ação é agora tentada.

Todos podemos avaliar o quan­to poderá ser imprudente, senão mesmo perigoso, contraproducente entregar indiscriminadamente a re­forma ao arbítrio dos atuais professores

de todas as escolas. Tal ati­

tude poderá fazer com que a refor­ma corra o risco do fracasso. Há que passar pela fase de experimen­tação numa escola normal, e, pro­gressivamente, estender-se a outras.

6. Finalmente, somos de lamen­tar que a lei cearense não houvesse previsto a formação do professor em nível universitário, muito embora pudesse admitir, ainda por algum tempo, a formação em grau médio para os que viessem a exercer o magistério em áreas interiores do Estado, distantes dos centros urba­nos, onde igualmente se admite a escola primária de três anos de estu­dos. A esses mestres primários, após exercício em tais zonas por três a cinco anos, seria assegurado o pros­seguimento dos estudos em grau su­perior, como condição para traba­lhar nos grupos escolares das cida­des.

NA GUANABARA'

A situação educacional no Esta­do da Guanabara melhorou sensivel­mente nos últimos meses, em primei­ro lugar porque há um Secretário de Educação que se tem revelado muito atento. As medidas iniciais são promissoras, entretanto, isto é muito pouco diante do que precisa

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ser feito e só é positivo na medida em que revela a disposição de equa­cionar os problemas e procurar as soluções adequadas.

O plano de rodízio de professores nas escolas públicas primárias

constitui "um ôvo de Colombo", um artifício efetivamente muito prático, porque permitirá atender de imedia­to a um número ponderável de no­vos alunos.

Apesar de habilidosa, a medida só se justifica em vista do estado de calamidade educacional em que nos encontramos. Apresenta os mais altos inconvenientes pedagógicos, porque, obrigando as crianças a mudarem de sala a cada dia, não permite salas especializadas, nem programas continuados de estudos. Medida mais importante que essa foi a convocação de milhares de

professores das escolas primárias e mé­dias que estavam em disponibilidade.

A Guanabara está a exigir um programa educacional muito mais amplo e mais profundo. A situação educacional é de verdadeira calami­dade e não poderá ser resolvida a curto prazo nem com artifícios habi­lidosos. As escolas públicas primá­rias abrigavam em 59 cerca de 220 mil crianças, segundo os dados ofi­ciais. As crianças ausentes soma­vam 110 mil. O primeiro problema é o de levar essas crianças à escola. este não é ainda o problema mais grave, diante do baixo rendimento de nosso sistema escolar público; de cada 100 crianças que freqüen­tam o curso primário, 36 estão na primeira série e apenas 14 na quar­ta. Vale dizer que estamos propor­cionando como educação básica, numa cidade do desenvolvimento do Rio de Janeiro, para um terço das

crianças, um curso de uma única série, pois o grupo mais numeroso de crianças escolarizadas é o da­queles que freqüentam escolas 2 ou 3 anos sem passar à segunda série.

A escola pública está ainda es­truturada como se devesse servir à classe média, que a ela conduz cri­anças já preparadas, em contraste com o despreparo dos filhos das camadas populares. Os quadros de distribuição das matrículas por ida­de, comprovam o fato.

Esta a situação de décadas de descaso e de preterição à causa do ensino popular, pondo em relevo a incúria com a educação do povo: A rede escolar programada por Mário de Brito, em 52, previra a constru­ção de uma centena de novas esco­las. Até hoje, porém, nem 10% da­quele plano foram cumpridos. A re­cuperação de tão grande atraso só pode ser feita planificadamente e em vários anos, dependendo inteiramen­te da política educacional que fôr adotada pelos constituintes.

Duas teses opostas foram defen­didas na Subcomissão de Educação e serão levadas à discussão em ple­nário. A primeira delas, de autoria dos deputados Sandra Cavalcanti e Gladstone Chaves de Melo, propug-nava, em suma, a manutenção do status quo, ou seja, do regime espon-taneísta que fazia do Estado mero estimulador da educação e das artes, com a função de subvencionar qual­quer iniciativa generosa. Trata-se de uma aplicação à Guanabara das doutrinas educacionais propostas no substitutivo Carlos Lacerda à lei de Diretrizes e Bases. Em nome dos soberanos direitos da família, da liberdade do ensino, manda aplicar

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o "preferencialmente" na manuten­ção da rede de ensino público, conti­nuando o regime de subvenção, o mesmo que gerou, na Guanabara, escândalos como o do Serviço de Internamento de Menores.

A tese oposta, defendida por Paulo Alberto, por vários Consti­tuintes, e que só em parte conseguiu passar pela Comissão de Constitui­ção, propugnava a autonomia dos serviços educacionais, pela entrega deles à direção de um Conselho res­ponsável, diante da Assembléia Le­gislativa, e que disciplinaria a apli­cação de todos os recursos estaduais disponíveis, através de planos qüin­qüenais. Tais planos teriam em vista: 1) assegurar, em prazo bre­ve, oportunidades efetivas a todas as crianças de matrícula em escolas públicas primárias de seis séries, as duas últimas equivalentes à primeira e segunda ginasial; 2) organização de uma rede pública de ensino mé­dio; 3) horário escolar de oito horas, 4) formação do magistério em nível superior.

Tal programa educacional pode­ria parecer mirabolante em -vista de nosso atraso educacional. Mas na realidade êle representa mínimos já de há muito superados nas cidades do padrão demográfico, econômico e cultural da Guanabara. E é per­feitamente realizável, desde que da constituintes se decidam a reservar, exclusivamente, para a manutenção da rede pública de ensino a cota mí­nima de 20% dos recursos estaduais e municipais destinados pela Cons­tituição Federal em gastos com a educação.

com igual segurança se pode «firmar que só resultados medíocres poderão ser alcançados enquanto

prevalecer a política oposta, expres­sa por aquele "preferencialmente" do art. 10 do substitutivo Sandra-Gladstone. este é um problema que interessa a toda a opinião pú­blica e precisa ser debatido às claras.

MOVIMENTO DE CULTURA POPULAR DO RECIFE

Entrevistado por O Metropolitano do Rio, o Prof. Germano Coelho teceu as seguintes considerações acerca dos objetivos e atividades do "Mo­vimento" de que é coordenador:

Do ponto-de-vista jurídico, o MCP é uma entidade civil. Prefe­rimos organizá-lo desta forma, vi­sando dar-lhe maior autonomia. Es­tamos apenas no começo, pois o movimento conta menos de um ano; mas se suas atividades são atual­mente exercidas somente no Recife, estender-se-ão futuramente por todo o território pernambucano. Isso é a semente para empreendimento de âmbito nacional, pois suas idéias divulgadas já tiveram acolhida em outros Estados, como Santa Catari­na, onde igual trabalho está sendo planejado.

Em Recife existem de 80 a 90 mil crianças em idade escolar, mas que não podem ser alfabetizadas, por falta de escolas. Mais de 200 mil adultos não recebem, mesmo, ensi­no elementar. Em vista desta situa­ção, estruturou-se o movimento. E não é só: está o professor isolado da juventude, assim como o inte­lectual do povo; dessa forma, pro­blema como o do desemprego e da precária situação de vida, tanto de jovens como de operários ficam por ser resolvidos. O MCP foi elaborado

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para atuar também, no sentido de haver maior integração dos diversos grupos sociais, e trazer assim uma solução para esse tipo de problemas, pelo trabalho de uma equipe onde estejam reunidos os interesses e ca­pacidade de vários. Procuramos me­lhorar o nível cultural do povo, dar-lhe educação especializada, ensi­nando como organizar uma coopera­tiva e ressaltando a importância do sindicalismo.

Entre os objetivos imediatos do Movimento de Cultura Popular, está o de prover educação de base a crianças e adultos. Durante trê3 me­ses, fizemos um levantamento das sociedades existentes nos bairros mais pobres. Eram clubes, onde as pessoas se reuniam aos domingos, alguns para jogar dominó. A recep­tividade foi muito grande, e por meio dessa pesquisa conseguimos as pri­meiras salas de aula. Começamos a trabalhar em março do ano pas­sado quando inauguramos a 1» esco­la. com a colaboração da Prefeitura do Recife, conseguimos 40 mil car­teiras e iniciaram-se as aulas em um turno pela manhã e outro no­turno que, respectivamente, se des­tinam a adolescentes e adultos.

O objetivo imediato do MCP é formar pessoal capacitado a com­preender a cultura popular. Inter­pretar, sistematizar o que há de mais significativo e específico em cada comunidade. Dessa forma po­derá o povo não só produzir mais como usufruir de sua própria cultu­ra, e pensamos em levá-la às gran­des cidades. Recife não contava com nenhuma galeria de arte. Após luta intensa, quando fomos bastante combatidos, inclusive pela imprensa, conseguimos, com a ajuda da Pre­

feitura do Recife, construir a Ga­leria de Arte Popular, às margens do rio Capibaribe. Hoje, o povo já pode entrar em contato com os artistas da terra. Promoveremos, muito em breve, uma exposição de arte popular, em que iremos expor trabalhos de todas as regiões de Pernambuco.

Cada escola-unidade, situada nu­ma rua, é considerada como Asso­ciação de Cultura Popular, direta­mente ligada ao Núcleo Central em Recife. Contamos já com 58 associa­ções, e recebemos pedidos para fun­darmos idêntico movimento em Ca­ruaru. Mas, no momento, nosso tra­balho não pode estender-se a outros municípios ou estados, pois necessi­tamos consolidar nossa experiência em todos os setores do MCP.

O Núcleo Central, em Recife, está localizado no sítio da Trindade, de propriedade da Prefeitura. Uma equipe vem estudando plano para urbanizar o sítio, pois é nosso pro­pósito que fiquem situados lá todos os setores do MCP. Já estão sendo construídos o Teatro do Arraial Ve­lho, uma Biblioteca infanto-juvenil e um prédio para a Divisão de Ar­tesanato e Artes Plásticas. O Centro Artesanal localizar-se-á em Santo Amaro, e consta de nossos projetos a criação de uma divisão de música, canto e dança.

E como é impossível pensar-se numa campanha educativa sem a contribuição dos grandes meios de divulgação, o sítio da Trindade terá uma Divisão de rádio, televisão e imprensa, e o MCP encarregar-se-á de instalar, em cada núcleo, um apa­relho receptor, e transmitir por meio da televisão programas educacionais. O reitor da Universidade do Recife,

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já colocou ã disposição do movi­mento a futura estação de rádio daquela universidade.

O MCP não se liga a grupos po­líticos, tendo como finalidade única dar combate à ignorância. não se pode dispensar a ajuda daqueles que procurem colaborar nesse tra­balho a serviço da comunidade. Em nosso movimento há católicos, pro­testantes, comunistas, etc. Se não fizermos um movimento capaz de empolgar as massas, tão cedo não conseguiremos acabar com o analfa­betismo.

CENTRO DE ESTUDOS E PESQUISAS DE SERGIPE

Foi criado pelo Decreto n" 578, de 31 de dezembro de 1960, do Governo

do Estado, com a justificação, objetivos e estrutura do seguinte teor:

O GOVERNADOR DO ESTA­DO, usando da atribuição que lhe confere o art. 55, incisos I e XVI, da Constituição Estadual e consi­derando o que expôs o Secretário de Educação, Cultura e Saúde sobre a

necessidade de dotar a Se­cretaria de Educação, Cultura e Saúde de meios adequados à pes­quisa e ao planejamento educa­cionais, para melhor cumprimen­to de seus objetivos fundamen­tais de aperfeiçoamento do sistema estadual de educação, nos termos das leis que regulam a espécie,

DECRETA:

Art. lº Fica organizado, na Se­cretaria de Educação, Cultura e Saúde, o Centro de Estudos e Pes­quisas Educacionais — (CEPE).

Art. 2º O Centro de Estudos e Pesquisas Educacionais tem os se­guintes objetivos:

I — Pesquisa das condições cul­turais de Sergipe, das tendências re­gionais de desenvolvimento e de re­gressão, e das origens dessas con­dições e forças, tendo em vista uma interpretação regional do Estado tão exata e tão dinâmica quanto possível para a elaboração gradual de uma política educacional adequada.

II — Pesquisa das condições es­colares do Estado, em suas diversas áreas, por meio de levantamento pe­riódico dos seus recursos em admi­nistração, aparelhamento, professores,

métodos e conteúdos do ensino, visando a apurar até quanto a esco­la está contribuindo para satisfazer as necessidades de uma sociedade em desenvolvimento.

III — Estudo de medidas de rendimento da aprendizagem e da eficiência escolar.

IV — Estudo do aluno conside­rando as relações escolares, a situa­ção familiar e econômico-social e outras condições de desenvolvimento e aprendizagem.

Art. 3ª À luz da política institu­cional que possa resultar da pesquisa antropossocial e das verificações da pesquisa educacional, cabe ao Centro de Estudos e Pesquisas Educacio­nais:

a) elaborar estudos, planos, re­comendações e sugestões para a re­visão e a reconstrução educacional do Estado, bem assim relatórios especiais que lhe forem solicitados, encarada a educação como um dos fatores que devem ser utilizados, até

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onde fôr possível, no processo de aceleramento, correção ou equilíbrio do desenvolvimento regional;

b) organizar, com fundamento nos fatos apurados e de acordo com a política educacional adotada, cur­sos de treinamento e de aperfeiçoa­mento de pessoal docente e de pes­soal para a administração educacio­nal, bem assim de especialização para professores primários.

Art. 4º Fica vinculado ao Cen­tro de Estudos e Pesquisas Educa­cionais o Serviço de Estatística Edu­cacional.

Art. 5º O Centro de Estudos e Pesquisas Educacionais manterá li­gações com o Instituto Nacional de Estudos Pedagógicos, o Centro Bra­sileiro de Pesquisas Educacionais e os Centros Regionais, e outras enti­dades públicas e privadas, e pleitea­rá a cooperação dos meamos, sem­pre que necessária à execução de seus objetivos.

Parágrafo único — A coopera­ção de que fala o art. 5º, sempre que possível, deverá ser executada à base de convênios devidamente registrados e assinados pelas auto­ridades competentes.

Art. 6º todas as repartições es­taduais deverão prestar ao Centro

de Estudos e Pesquisas Educacionais a cooperação que este lhes solicitar para facilidade da execução de seus encargos.

Art. 7º O Secretário de Educa­ção, Cultura e Saúde designará ser­vidores do âmbito da sua Secretaria para as funções indispensáveis do CEPE.

Art. 8º Compete ao Secretário de Educação, Cultura e Saúde ela­borar o plano de organização do CEPE, baixar diretrizes para o seu trabalho e cometer-lhe novos encar­gos que julgar convenientes aos interesses

da educação e da cultura. Art. 9º este Decreto entrará

em vigor na data de sua publicação, revogadas as disposições em con­trário.

Palácio Olímpio Campos, em Aracaju, 31 de dezembro de 1960, 72» da República.

Luiz GARCIA

Antônio Garcia Filho (Diário Oficial do Estácio de Sergipe —

5-1-1961 — N.º 14.129).

Para o cargo de Coordenador do Centro de Estudos e Pesquisas Edu­cacionais foi designado o prof. José Antônio Nunes Mendonça. O CEPE está funcionando no Edifício Walter Franco, 5º andar — Aracaju, SE.

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INFORMAÇÃO DO ESTRANGEIRO

DESENVOLVIMENTO ECONÔMI­

CO E SISTEMA EDUCACIONAL

NA AMÉRICA LATINA

Os trágicos acontecimentos re­

gistrados em Cuba nos últimos dias

servem como dramática demans-

tração, se necessário fôr, da urgên­

cia com que se defronta o Con­

gresso dos Estados Unidos, de auto­

rizar o mais breve possivel o cré­

dito de US$ 500.000.000 solicitado

pelo Presidente Kennedy e destina­

do ao Fundo Interamericano para

o Progresso Social.

O significado primordial e a es­

perança futura desse programa,

estabelecido pelo Ato de Bogotá, em

setembro de 1960, encontram-se re­

sumidos na primeira parte do seu

titulo: "Interamericano". Dezoito

(esperamos que venham a ser vin-

tej outras Repúblicas americanas

cooperarão com os Estados Unidos

em esforço conjunto destinado a ele­

var os níveis de vida entre os povos

americanos. Prevê o plano drás­

ticas e originais providências, a se­

rem tomadas pelos povos latinos, vi­

sando à solução de seus problemas,

com a colaboração e assistência fi­

nanceira dos Estados Unidos. Pre­

cisamos mostrar a esses povos que

estamos preocupados com o seu

este artigo do Dr. Kenneth Holland, Presidente do Instituto de Educação Interamericana, foi publicado em o New York Times de 27-4-61 e traduzido por Maria Helena Happ.

bem-estar e progresso, que não

apoiamos os ditadores, sejam eles

da direita ou da esquerda, tampou­

co concordamos com o s t a tus quo, e que nossos ideais e nosso modo de

vida possuem tanto dinamismo quan­

to o de nossos inimigos.

A América Latina não se encon­

tra em situação idêntica à da Euro­

pa de 1948, onde a população, culta

e habilitada, precisava do auxilio

econômico de um Plano Marshall

para colocar novamente em funcio­

namento as suas fábricas.

Os problemas que atormentam a

América Latina — sistemas arcaicos

de taxação e distribuição de terras,

analfabetismo, falta de moradias, di­

ficuldades para educar-se, isolamen­

to geográfico e social — precisam

ser solucionados de modo a se esta­

belecer melhor base para o desen­

volvimento econômico, social e polí­

tico. Já afirmou o Presidente Ken­

nedy em sua mensagem ao Congres­

so: "O desenvolvimento econômico,

quando não acompanhado pelo pro­

gresso social, resulta em que a gran­

de maioria do povo permaneça

pobre, enquanto uns poucos privile­

giados acumulam os benefícios da

abundância cada vez maior!"

A América Latina representa a

região de crescimento mais rápido

do mundo atual. Durante os últimos

dez anos, sua população aumentou

em 30%. Atingindo presentemente

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195 milhões, total que a equipara à União Soviética, calcula-se que che­gue a 400 milhões em 1980. não sendo iniciada já uma ação coorde­nada, esse aumento de população tornará ainda mais precário o nivel de vida atual que, para milhões de latino-americanos, se expressa no rendimento anual inferior a 70 dóla­res por pessoa. não obstante isso tudo, trata-se de região bem provida em recursos humanos e naturais, dispondo ainda de considerável po­tencial econômico.

Estudos ultimamente realizados confirmaram existir definida relação entre o desenvolvimento econômico de um país e o seu sistema educa­cional. Aproximadamente cem mi­lhões de dólares do crédito solicitado destinam-se â educação e treinamen­to dentro desse programa, dando-se destaque à autodeterminação, seja na construção de escolas em peque­nas comunidades, treinamento de professores, ampliação de bibliotecas centrais ou na construção de labora­tórios em universidades. Nós, que trabalhamos no campo da educação particular, já estamos colaborando em diversos programas desse gênero, embora de âmbito restrito, com re­sultados animadores.

Torna-se evidente que, se os paí­ses da América Latina precisam dis­por de sistemas econômicos e polí­ticos viáveis e equilibrados, devem contar com líderes educados e habili­tados. E esses líderes só podem sur­gir pela ampliação dos fundamentos educacionais obtidos na escola ele­mentar, pelo desenvolvimento de oportunidades vocacionais e técnicas, na escola secundária, de forma que os jovens realizem treinamento nas

tarefas exigidas pelos novos sistemas econômicos e sociais e pela melho­ria e expansão intensiva das insti­tuições de educação superior.

Oitenta milhões de latino-ameri­canos são analfabetos, dezenove mi­lhões de crianças em idade escolar não podem freqüentar as escolas, apenas 2.500.000 alunos matriculam-se no curso secundário (12.500.000 alunos freqüentam escolas secundá­rias em nosso país) o qual se des­tina, quase de maneira exclusiva, a preparar candidatos à Universidade. Em toda a América Latina, apenas 500.000 estudantes freqüentam as ins­tituições de educação superior. Para um número correspondente de habi­tantes, temos quase 4.000.000 de es­tudantes!

A tarefa a realizar é imensa. Aos Estados Unidos compete entrar já em ação. não podemos admitir que outra "Cuba" com 200, mais tarde com 400 milhões de habitantes, grite "Ianques não!" desde o Rio Grande até a Terra do Fogo.

A EDUCAÇÃO NA CHINA

O dr. Kurt Mendelssohn, cientis­ta britânico, expõe, em artigo em The New Scientist (10/11), as con­dições da ciência na China. desse artigo retiramos alguns trechos que se referem, especificamente, às opor­tunidades oferecidas pela jovem Re­pública Popular nos diversos graus do ensino:

Em 191/9, possuía a China SOO instituições de ensino superior, em grande parte desmanteladas, quando não desertas, em conseqüência da lu-

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ta com o Japão e da guerra civil. Essas instituições formaram o nú­cleo do programa educacional.

Seu número cresceu para SOO. Algumas das antigas instituições ha­viam sido fundadas por Missões re­ligiosas, mas foram encampadas pelo Governo em 1951 e incorporadas ao esquema geral de educação estatal.

Para um Estado industrial mo­derno, o padrão tradicional chinês de um número extremamente limi­tado de letrados contra imensas massas analfabetas é insustentável. Grandes esforços estão sendo em­preendidos para apoiar o sistema de educação superior, em rápida expan­são, com expansão equivalente da escola primária. Aqui tem impor­tante lugar o problema de uma es­crita dificil de ler e de escrever. A alfabetização está sendo levada a todas as crianças. O alfabeto latino — e não o russo — foi escolhido, mas a transcrição fonética difere daquela geralmente aceita no Oci­dente. Ainda assim, há a perspecti­va de que as publicações cientificas e tecnológicas chinesas sejam escri­tas em caracteres alfabéticos. O mandarim, que para dialeto chinês é muito simples, serve de base à escri­ta alfabética, mas esta não indica as tônicas. Palavras que se escrevem do mesmo modo, mas têm signifi­cado diferente, precisam distinguir-se, portanto, quer pelo contexto, quer pela introdução de acentos. Assim, além do ensino dos caracteres, a educação escolar chinesa tem de vencer, sucessivamente, dois obstá­culos — as crianças devem aprender a falar mandarim e a escrevê-lo uti­lizando o alfabeto. Mais tarde, rus­so e inglês são ensinados como Hn-guas secundárias.

A educação universitária é pre­cedida por seis anos de ensino pri­mário e mais seis de ensino secun­dário.

Há agora, segundo me disseram, cerca de 100 Milhões de crianças nas escolas primárias, em, comparação com 25 milhões há dez anos, e perto de 15 milhões nas escolas secun­dárias, contra 1,3 milhões. O núme­ro de estudantes de nível universi­tário se aproxima de um milhão, tendo aumentado quase dez vezes em dez anos.

A fim de satisfazer à enorme demanda de tecnologistas e de mé­dicos, a engenharia e a medicina foram desligadas das universidades que assim não constituem centros de estudos vocacionais. Essas ma­térias são ensinadas em institutos separados, às vezes altamente espe­cializados. E há, também, certo número de universidades técnicas, como a de Tsinghua, algo semelhan­te ao Instituto de Tecnologia de Massachusetts, ao Instituto Bau-mann de Moscou e à Escola Técnica Superior de Zurique.

Ao estudante não se conferem graus ao terminar o curso superior. Tendo obtido do Estado um lugar na universidade, tendo o Estado pago seus estudos, o Estado será também seu patrão. O aluno é solicitado a apresentar uma lista de dez assuntos ou tipos de emprego, por ordem de preferência, e seus desejos, naturalmente em confronto com a vida escolar, são levados em conta quando se decide, finalmente, seu lugar de trabalho.

A especialização não se faz em ninei escolar, mas na universidade, em cursos que auram de cinco a cinco anos e meio.

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FUNDO INDUSTRIAL PARA O ENSINO DE CIÊNCIAS

empresas industriais e comerciais da Austrália instituíram, recente­mente, Fundo Industrial com o obje­tivo de prestar ajuda financeira aos planos de desenvolvimento do ensi­no de ciências nas escolas secun­dárias do país. Realiza-se atual­mente o levantamento das necessi­dades materiais de cada unidade, instalações, recursos didáticos. O plano prevê salas-ambiente equi­padas com laboratórios modernos e meios audiovisuais, de modo que o estudo de ciências adquira mais rea­lidade.

CONFERÊNCIA DE INSTRUÇÃO PUBLICA NA UNIÃO SOVIÉTICA

No último trimestre, reuniram-se em Moscou os ministros de instru­ção pública das repúblicas autônomas da Federação Russa e os diretores das administrações regionais de en­sino. O temário da Conferência abrangeu as seguintes questões: 1. Necessidade de reforçar a responsa­bilidade dos pais no que diz res­peito â freqüência escolar; t. Gene­ralização a todas as escolas das condições de funcionamento existen-tes nas melhores delas; 3. Possibili­dades de trabalho produtivo para escolares residentes em regiões de mineração (o trabalho em minas é vedado a menores de 18 anos); 4-Dificuldades encontradas por meno­res de 18 anos na condução de máquinas agrícolas; 5. Medidas a serem adotadas visando o aumento do número de jovens operários que freqüentam as escolas, e 6. Estudo

de providências para atender ás.-necessidades de construção escolar e de pessoal docente. Foram expedi­das diversas comunicações no sen­tido de que os estudos de humani­dade ocupem 39% do horário escolar, cabendo às ciências naturais e ma­temáticas 33%, ao canto, desenho e ginástica 12% e ao trabalho nas ho-ras de recreio 16%.

REUNIÃO DE MINISTROS DE EDUCAÇÃO DA EUROPA

Realizada na primeira quinzenat de abril último, estando representa­dos 16 países, teve lugar em Ham­burgo a II Conferência de Ministros de Educação da Europa, durante a qual foram examinados os seguintes assuntos: 1. Desenvolvimento do-ensino de línguas vivas. Criar pos­sibilidades no sentido de que um número cada vez maior de estu­dantes aprenda as línguas vivas por métodos orais eficientes e com o auxilio dos meios audiovisuais. (A conferência atribuiu especial impor­tância â ampliação desse ensino, dado que o conhecimento de línguas-é indispensável a cada europeu e á Europa como um todo, tanto do pon­to-de-vista da cooperação internacio­nal como da salvaguarda e projeção da herança comum); 2. Dar melhor formação ao professorado e favore­cer a elevação de seu status; 3. Cursos secundários melhor estrutu­rados e mais adequados à condição de numerosos alunos que precisam obter colocação na indústria ou no-comércio, sem haver completado os estudos; 4. Adaptação dos progra­mas às exigências do progresso cien-

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tífico, principalmente no campo da ciência e da tecnologia, pela assis­tência regular do pessoal docente e crescente importância concedida na cultura clássica às idéias em curso nos meios europeus; 5. Continua­ção dos estudos em tempo parcela­dos para os jovens egressos da esco­la, na medida em que as circunstân­cias o permitam. O ensino minis­trado não deve limitar-se à formação técnica, mas abranger também a educação moral, cívica e cultural; 6. Emprego da televisão mais plane­

jado e sua melhor utilização nas atividades recreativas, com o obje­tivo de promover uma cultura popu­lar autêntica em todos os países europeus; 7. Oferecer maiores pos­sibilidades pela equivalência dos diplomas a jovens que tenham estu­dado em universidade de seu pais e queiram prosseguir os estudos no estrangeiro, e 8. Organizar e ampliar um serviço de informações e do­cumentação de experiências para dar assistência às reformas educa­cionais de todos os paises europeus.

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LIVROS

AZEVEDO, Fernando de — A Educação

na Encruzilhada, 2» edição, Me­lhoramentos, 1960, S. Paulo, 271 págs.

Na série das Obras Completas do professor Fernando de Azevedo, com onze títulos já publicados,1 aca­ba de sair o volume que, na história da sua carreira e da sua vida inte­lectual, terá significação mais pro­funda: A Educação na Encruzilha­da. Resultante do inquérito que este jornal publicou, em 1926, sobre os problemas nacionais de educação e, em particular, sobre a educação no Estado de São Paulo, reunido pela primeira vez em volume, em 1937, sob uma denominação que lhe res­tringia o alcance e objeto, deu-lhe agora o Prof. Fernando de Azevedo um título mais exato e expressivo, pois, como êle próprio observa, apa­nhando em cheio, e no momento preciso, "um período e uma situação em que se cruzam os caminhos, e a educação se mantém indecisa em face dos rumos a seguir, pareceu-nos mais adequado, além de mais amplo e significativo, o novo título", visto

1 Da Educação Física; A Educação na Encruzilhada; Novos Caminhos e Novos Fins; A Educação e seus Pro­blemas (2 vols.) ; Princípios de Sociolo­gia; Sociologia Educacional; Canaviais e Engenhos na Vida Política do Brasil; Um Trem Corre para o Oeste; A Cul­tura Brasileira (3 vols.) : A Educação entre Dois Mundos e Figuras de Meu Convívio. Edigões Melhoramentos. São Paulo, s. d.

que a educação ainda hoje, e hoje mais do que nunca, continua numa encruzilhada, "igualmente perplexa e hesitante em escolher, entre as pers­pectivas e orientações que se lhe oferecem, a direção mais consentâ-nea com as novas condições da civi­lização e da cultura" (pag. 17). Real­mente, não apenas o problema em si mesmo permanece atual — a his­tória da educação sendo, no Brasil, a história de sucessivas "tentativas e erros", em que os erros, infeliz­mente, têm sido quase tão numero­sos quanto as tentativas — mas, ainda, a própria formulação que, na­quela época, lhe deu o professor Fernando de Azevedo e muitos dos que colaboraram no inquérito, res­ponde às necessidades mais eviden­tes dos nossos dias. Se, em matéria de ensino primário, indiscutivelmente melhoramos (pelo menos nos Esta­dos mais adiantados do País), não seria de excessivo pessimismo afir­mar que o mesmo não ocorre nem no ensino médio, nem no ensino superior, malgrado o desenvolvimen­to numérico e estatístico (simples reflexo de fenômeno demográfico) que ambos apresentam. não apenas continuamos a ter, nos dois ramos mais elevados da escala pedagógica, um ensino antes nominal do que real e, nos melhores casos, mais dire­tamente profissional do que larga­mente científico, como, ainda, des-

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naturamos por completo o curso secundário, comprometendo, com isso, qualquer possibilidade de êxito e de progresso concreto nos cursos superiores. Atualmente, os primei­ros anos universitários destinam-se a suprir, acalcanhadamente, as la­cunas do curso secundário, mais ou menos calafetadas, pelos "cursinhos", às vésperas dos concursos de habi­litação. não há exagero em dizer que a maior parte dos estudantes faz, nesses poucos meses, o que não teve ocasião de fazer durante os sete anos de ensino médio; é natural que o faça de maneira viciosa, incom­pleta e ilusória.

Situação idêntica (com a vanta­gem, digamos sem nenhuma intenção paradoxal, de não existir a Universi­dade nominal que, na maior parte dos casos, hoje possuímos), encon­trou o professor Fernando de Aze­vedo por ocasião do seu inquérito de 1926. A educação brasileira vivia, então, num "regime de instabilidade e de indisciplina mental", que "vin­do desde o império, continuou no pe­ríodo republicano, com a Reforma de Benjamim Constant (Dec. 8 de no­vembro de 1890), que abrangeu a ins­trução em todos os seus graus. Esta reforma e a chamada "lei orgânica" de Rivadávia Correia (Dec. 5 de abril de 1911), foram as únicas que corresponderam a um sistema de idéias e trouxeram, como expres­sões do positivismo político no Brasil, um conteúdo filosófico..." (pag. 185). Por aqui entramos, justamente, nos aspectos que aproximam o estado atual da educação em nosso País daquele que, há mais de trinta anos, era condenado pelo inquérito de O Estado de S. Paulo, situando-se, en­tre esses dois extremos, o único

periodo realmente construtivo (ape­sar de tais ou tais críticas de pormenor que lhe possamos opor), representado pela reforma do ensino de que o Manifesto de 1932, também redigido pelo professor Fernando de Azevedo, foi a expressão doutrinária. Doutrinária do ponto-de-vista técni­co, enquanto as reformas anteriores — como a que atualmente se pre­tende impor ao País num retrocesso mental inqualificável e inadmissível — eram ideológicas, respondiam a um programa filosófico que só tinha o defeito de pretender, por meio delas, furtar-se à relatividade inse­parável de todas as filosofias e de todos os sistemas. Já os debates que se travaram em 1932 foram orientados, de um lado, pela con­cepção técnica da educação que defendiam os precursores da "escola nova" (expressão que, lançada em 1926, não encontrara qualquer recep­tividade), enquanto, do outro lado, entre os partidários do que se cha­mou, com grande senso de polêmica, o "humanismo pedagógico", o que se tinha em vista era uma concepção confessional do aparelho educativo. As mesmas posições fundamentais repetem-se agora, em torno do pro­jeto de Diretrizes e Bases: isso sig­nifica que voltamos ao ponto zero e que, nos países sem grande matu­ridade, não há, intelectualmente, con­quistas definitivas'. Bem enten­dido, não se trata nem de prolongar o estado atual, nem de regressar nostàlgicamente a uma legislação que já produziu os seus frutos e

2 Cf., a respeito, um livro que reputo de leitura indispensável a todos os brasileiros: Diretrizes e Bases da Educação Nacional. Organizado por Roque Spencer Maciel de Barros. Li­vraria Pioneira Editora, Sao Paulo, 1960.

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que, de resto, respondia e corres­pondia a um determinado momento histórico: trata-se, ao contrário, de prosseguir e não, como deseja o projeto de Diretrizes e Bases, de retroceder a um estado anterior ao de 1932. Na linha das singularida­des brasileiras, é no inquérito de 1926 que poderemos encontrar, em 1961, os postulados básicos de uma reforma do ensino.

Sem poder, naturalmente, dis­cutir a matéria em pormenor, to­marei, apenas, como exemplo o gra­víssimo problema do entrosamento entre o ensino médio e o superior e, em particular, entre esse curso de "cultura geral", que deveria ser o ginásio, e o curso de "cultura pura" que deveria ser, em uma de suas finalidades mais importantes, o das faculdades de filosofia, ciên­cias e letras. Tendo-se dado á for­mação do professorado secundário uma solução que, se não é satisfa­tória na prática, é, pelo menos, cor­reta em teoria, o outro "ponto de contato" entre os dois ensinos mos­tra-se, a cada ano que passa, mais defeituoso. com efeito, "não pode haver praticamente sistema de en­sino, público ou particular, se a lei não organizou o aparelho universi­tário, pela formação uniforme do seu professorado", salientava o professor

Fernando de Azevedo, mas, por outro lado, como o ensino su­perior recruta sua clientela entre os moços saídos do ensino secun­dário (dizia, em sua resposta, o professor Rui Paula Sousa), a for­mação deficiente destes últimos tor­na-os "incapazes de seguir cursos de alto valor científico. De outro lado, estes moços levam neste es­tudo superior seus processos vicio­

sos de trabalho; isto é, a memória ainda Prepondera com sacrifício da verdadeira cultura". Já em 1926! Ainda em 1961! Assim, uma das conclusões do inquérito era a de que o ensino secundário, "ponte de passagem, lançada entre o ensino primário e o superior, é uma constru­ção flutuante, desligada de um e de outro, e que o aluno costuma con­quistar, de um salto aventureiro, e de que se desprende depois, para se lançar, sem firmeza, a qualquar dos cursos superiores de preparação profissional... Estreito demais para ligar as duas margens com que de­veria comunicar-se, não recebe, em condições de o cursarem, os alunos do curso primário, nem os enca­minha, devidamente habilitados para os cursos superiores que se propõem preparar-lhes o acesso direto a uma profissão" (pag. 263).

É que, ao lado desse erro gros­seiro que consiste em impor ao en­sino uma orientação confessional qualquer, os responsáveis pelo sis­tema brasileiro de educação vie­ram cometendo, através dos anos, outro erro de não menores conse­qüências e de natureza técnica: o que a organização do nosso ensino secundário demonstra, para dizê-lo com alguma brutalidade, é que seus organizadores não têm idéia do que seja o ensino secundário, da sua na­tureza e das suas finalidades. Non pas apprendre, dizia numa síntese de extraordinária felicidade o Pe. Auguste Valensin (e um Jesuíta deve ser, em tal matéria, duplamente in­suspeito), mais apprendre a appren­dre. Era o que o professor Fernando de Azevedo e muitos dos seus cola­boradores já acentua\'am em 1926:

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ao ensino secundário, que se destina, não a ensinar muitas coisas, mas a ensiná-las sòlidamente, cabe criar e desenvolver uma "cultura geral e desinteressada". Seu objetivo sendo a "formação integral, física, intelec­tual e moral, do homem e do cida­dão, as matérias que devem consti­tuir o seu curso, além do desenho e da ginástica, são, de um lado, as que se destinam a desenvolver o espírito literário (línguas clássicas e moder­nas e literatura) e o espírito científi­co (ciências matemáticas, físicas e naturais) e, por outro lado, as que tendem a criar a consciência da per­sonalidade nacional (língua e litera­tura vernácula, geografia e história nacional) e a consciência universal (geografia geral, história da civili­

zação e filosofia ou história do pen­samento humano). Enfim, n e s s e plano de estudos orientados segundo as mais altas tradições humanas e distribuído segundo o seu valor edu­cativo. devem ter preponderância aquelas disciplinas que, alargando o horizonte mental, contribuam mais poderosamente para formar o espí­rito e elevar o homem ao domínio das idéias gerais, dentro daa quais se possa desenvolver mais tarde, em qualquer especialidade ou profissão, sem perder o contato com os cam­pos laterais de atividade e pensa­mento" (pag. 189). Sendo, por sua natureza, "formativo e não aquisiti­vo" (Paula Sousa), o ensino secun­dário deve, sobretudo, fornecer aos estudantes as "técnicas do trabalho intelectual", mais do que noções "des­pejadas por um funil", como dizia Montaigne: trata-se de ter "a cabe­ça bem feita e não a cabeça bem cheia".

O mais grave, entretanto, é que o ensino secundário adotou, em nosso País, um critério duplamente nefas­to: por um lado, aplicando exclusi­vamente a técnica da aula repetitiva, circunscrita ao manual e ao compên­dio, multiplicou, ao mesmo tempo, o número de matérias, já que sempre se confundiu, entre nós, a cultura geral com a cultura?) enciclopédica; por outro lado, sujeito ao imperativo dos horários, diminuiu, concomitan-temente, a "dose" efetiva de cada matéria administrada no currículo. Assim, posto sem saber diante do dilema que Pascal já havia resol­vido, obrigado a escolher entre "sa­ber muito de poucas coisas essen­ciais" e "saber pouco de muitas coisas", o ensino secundário esco­lheu, no Brasil, a segunda alterna­tiva, que é o caminho mais certo para terminar não sabendo nada de coisa nenhuma. O mais sério, porém, não é isso: o mais sério é que, empregando o tempo escolar e a idade privilegiada dos estudan­tes nessas tarefas estéreis, deixa o secundário de lhes ensinar as técni­cas de trabalho, não o ensina a pen­sar, não os prepara para resolver sozinhos os problemas da vida inte­lectual e os da vida profissional. Nas hipóteses mais favoráveis, o es­tudante secundário brasileiro é capaz de aprender mas não é capaz de compreender; saberá repetir mas não saberá "reinventar" o conheci­mento, à espera do momento em que, na pesquisa universitária, pudesse "inventá-lo". Tudo isso já foi dito, implícita ou explicitamente, no inqué­rito de 1926; tudo isso precisa ser dito e repetido nos dias que correm.

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Mas, a importância deste livro não consiste apenas em formular de maneira ainda válida a nossa "equa­ção educacional". Ele tem, igual­mente, uma significação biográfica por ter decidido da carreira que viria a seguir o jovem redator de O Estado de 8. Paulo: "entre os artigos que escrevi, para conduzir e orientar os debates, pondo os problemas e traçando-lhes as soluções", observa o professor Fernando de Azevedo, "e os meus últimos trabalhos sobre

educação não há senão as di­ferenças que separam duas fases, já um pouco distantes, da evolu­ção do mesmo espírito aplicado ao estudo contínuo de um ramo de co­nhecimento ou de determinada ca­tegoria de fatos. Se tomaram com o tempo forma e expressão mais claras algumas idéias que então, em 1926, apenas se esboçavam pres­sentidas pela intuição; se as refle­xões e a experiência me confirma­ram a posçião tomada em face de problemas que enfrentava pela pri­meira vez ou me levaram, em outras questões, a retificar pontos-de-vista, nesse inquérito já se encontram, ni­tidamente definidas, as grandes diretrizes que orientaram daí por diante meu espírito, quer no exa­me dos problemas e de suas soluções, quer nas reformas escolares de que tive a iniciativa e a responsabilidade, no Rio e em São Paulo". Entretan­to, ao receber do diretor do jornal

a tarefa do inquérito, revela o professor

Fernando de Azevedo que seus conhecimentos, em matéria educacio­nal, não ultrapassavam as frontei­ras de duas especialidades: a edu­cação física, a que se dedicara durante alguns anos (e a que

Consagraria, ainda como pioneiro

no Brasil, seu primeiro livro) e a literatura e língua latinas, que en­sinara na Escola Normal de São Paulo. O inquérito encaminhou-o para os estudos especializados de pedagogia e abriu-lhe, ainda, a car­reira de homem público: já em janeiro do ano seguinte, nomeado diretor-geral da Instrução Pública no Distrito Federal, tinha êle a oportunidade de pôr em prática suas idéias e de conquistar o renome que desde então o acompanhou. O Estado de 8. Paulo, conclui êle, "foi, assim, a escola em que me preparara para tão alta função pú­blica e somente ao ser provido no cargo é que avaliei, em todo seu alcance, os serviços inestimáveis desse contato a que me forçou a profissão de jornalista, com os fa­tos e os problemas de educação".

Para os que têm o privilégio de conhecê-lo mais de perto, é o professor Fernando de Azevedo não apenas um "mestre de cultura", um educador eminente, mas, ainda, um "mestre de vida", que conserva em plena maturidade; todo o entusias­mo da juventude, enriquecido de sa­ber e experiência, a coragem das atitudes e a paixão intelectual. Sem se cristalizar nas posições conquis­tadas e nas -opiniões feitas, êle está sempre disposto a repensar as suas certezas, a admitir o novo e a cri­ticá-lo, ao mesmo tempo em que abandona sem falso sentimentalis-mo as velhas verdades que já ser­viram. É um exemplo de trabalha­dor intelectual que as Obras Com­pletas estão revelando pela prí meira vez, em sua fisionomia com­plexa e variada; muitos dos seus livros evocam, desde o título, a idéia

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de luta e de combate: a luta e o combate de quem não se recusa a comprometer-se por seus ideais, justamente porque, mesmo sem que­rer ou sem saber, colocou toda a sua vida sob o signo de certo nú­mero de idéias que lhe marcaram a natureza e o sentido.

WILSON MARTINS

FROTA-PESSOA, O., — Biologia na Escola Secundária, Centro Bra­sileiro de Pesquisas Educacionais, 1960, Rio de Janeiro, 797 págs.

O problema das deficiências dos livros didáticos é um dos mais gra­ves com que os nossos professores de colégio se defrontam.

Os defeitos principais da maior parte dos nossos l i v r o s didáticos decorrem de não serem eles escritos por autores que tenham prática de pesquisa. São por isso livros anti­quados que mais contribuem para matar qualquer interesse do que para ensinar. esse defeito é espe­cialmente grave nos livros de His­tória Natural. Detalhes morfoló-gicos e anatômicos são tratados com pormenores enquanto fenôme­nos básicos de importância geral são ignorados ou tratados deficien­temente. A conseqüência é que os alunos saem do colégio sem com­preender fenômenos gerais como evo­lução, mutação, seleção natural etc... Fisiologia, ecologia, genética, em suma todos os fenômenos dinâmicos, são negligenciados em favor de um tratamento mais pormenorizado de uma morfologia de importância cul­tural incomparavelmente menor ou freqüentemente nula.

Nossos estudantes de colégio se formam pensando que História Na­tural é decorar uma assustadora no­menclatura, cujo significado etimo-lógico rarissimamente é explicado e que é usada para denominar deta­lhes insignificantes. Por isso, nossa História Natural de colégio é uma decoração de terminologia a ser es­quecida logo depois dos exames, É surpreendente que o interesse por História Natural ainda consiga so­breviver em tanta gente depois de tanta caceteação. Nossos livros didá­ticos de História Natural talvez se­jam úteis como ricas jazidas de fósseis terminológicos mas nunca como obras educacionais.

Nossos professores universitá­rios, salvo honrosas exceções, têm mostrado relutância em escrever li­vros didáticos. Muitos consideram, erradamente, que a redação de livros didáticos é obra de natureza inferior, e por isso não querem desviar para ela tempo que possa ser usado para pesquisa, ou mesmo para política universitária. Outros não são atraí­dos simplesmente pela falta de estí­mulo financeiro.

Um bom livro didático pode despertar o interesse científico de um número imenso de jovens que mais tarde, dedicando-se à pes­quisa, poderão em conjunto produ­zir enorme obra científica. Um cien­tista que escreva um bom livro didático poderá trazer para a ciência uma contribuição total muito maior do que se ficasse somente trabalhan­do em seu laboratório.

O professor Anísio Teixeira e os outros membros do Centro Brasi­leiro de Pesquisas Educacionais, conscientes da necessidade e da im­portância de livros didáticos, estão

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realizando obra de imensa importân­cia cultural publicando livros de texto escritos por autoridades esco­lhidas por seu valor científico e mé­ritos didáticos. Tais livros são dis­tribuídos grátis aos professores e aos colégios. A iniciativa do Prof. Aní­sio Teixeira e de seus colaboradores trará os maiores benefícios à instru­ção em nosso país e deixo aqui meus votos para que possam continuar por muito tempo a grande obra tão auspiciosamente iniciada.

Na escolha do Prof. Osvaldo Frota-Pessoa, para escrever o volu­me dedicado à Biologia, os membros do Centro Brasileiro de Pesquisas Educacionais foram particularmente felizes. O Prof. Prota-Pessoa não só é um pesquisador de grandes mé­ritos em genética mas é também autoriadde em métodos educacionais em ciências, e expositor de grande clareza e elegância.

O livro do Prof. Frota-Pessoa é exatamente o que dele se esperava, vivo, moderno, completo, preciso, equilibrado, de leitura agradável e Ilustração excelente. Aspecto dos mais interessantes é a ênfase dada, no texto assim como nas ilustrações, à natureza brasileira e às pesquisas aqui realizadas.

O livro é primoroso. Alguns erros escaparam ao autor, mas sua superioridade sobre livros de texto existentes é tão grande que qualquer critica seria somente demonstração de pedantismo.

A única coisa a lamentar é que, devido a dificuldades inevitáveis, o preço relativamente elevado da edi­ção comercial venha impedir que sua divulgação seja tão grande quan­to se deve desejar.

O Prof. O. Frota-Pessoa e o Centro Brasileiro de Pesquisas Edu­cacionais estão de parabéns como responsáveis pelo magnífico livro, assim como a Editora Fundo de Cultura que publicou a edição co­mercial. Recomendo-o sinceramente a todos os biologistas, a todos aque­les que queiram compreender a na­tureza e a todos os alunos de colégio e de universidades que desejem adquirir uma boa base em Biologia e saber o que essa ciência real­mente é.

A. BRITO DA CUNHA

HANS, Nicholas — Educação compa­rada (trad. bras. de J. S. de Ca­margo Pereira), Companhia Edito­ra Nacional, 1961, S. Paulo, 474 págs.

não obstante a inexistência de uma cátedra de Educação Compara­da no curriculum das seções de pe­dagogia de nossas Universidades, não obstante ser relativamente recente o aparecimento dessa disciplina (o au­tor do livro em epígrafe atribui a Marc-Antoine Julien o primeiro es­quema geral para um estudo com­parativo dos sistemas educacionais, e data-o de 1817), não obstante estar fora de nossos hábitos mentais a comparação dos saberes com vistas a revelar seus pontos de contatos e suas divergências (no plano das ciên­cias culturais somente conhecemos a monografia de Viana Moog sobre Bandeirantes e Pioneiros, onde con­trasta e interseciona as culturas ian­que e brasileira, sem contar com a cadeira de Direito Civil comparado, que funciona nos cursos de douto­rado em direito), em verdade a cate-

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goria da comparação afigura-se-nos imprescindível para a perfeita com­preensão de qualquer realidade, mes­mo onde aparentemente menos se faz necessária. È o caso, por exem­plo, nas Faculdades de Medicina, de uma cátedra comparativa entre as correntes alopáticas e homeopáticas, que parecem inconciliáveis e que, em decorrência do dogmatismo de seus adeptos, jamais poderão se harmoni­zar para a defesa da saúde dos acha­cados. Mas, onde o estudo compara­tivo mais se faz necessário e urgente é no campo da educação, tão diversi­ficado conforme o estágio cultural, os preconceitos vigentes, os escóis que governam etc. Em nosso país, então, a necessidade desse tipo de estudo é clamante e dramática, não apenas para mostrar o que "lá fora" se faz melhor do que aqui, mas para revelar o que "aqui" se faz em maté­ria de educação, que em verdade de­seduca e obscurece a serviço de escusos interesses.

Realmente, o que se deve enten­der, em termos gerais, por "compa­ração"? È a operação pela qual se reúnem dois ou mais objetos num mesmo ato de pensamento para dis­cernir suas semelhanças o/u dife­renças. Quem melhor definiu essa operação mental foi Condillac, ao afirmar: "Assim como fixamos nossa atenção num objeto, podemos fixá-la em dois ao mesmo tempo. Daí, em lugar de uma só sensação exclusiva, experimentamos duas e di­zemos que as comparamos, pois não as experimentamos exclusivamente senão para observá-las, uma ao lado de outra, sem ser distraídos por ou­tras sensações. Ora, é isto propria­mente o que significa o termo compa­rar. A comparação não é, pois, senão

uma dupla atenção" (Logique, I, VII). Claro está que a dupla aten­ção do conceito condillaquiano não basta para produzir a comparação, já que é necessária também a inten­ção de considerar suas semelhanças e suas diferenças. Transladando essa acepção geral para o campo da educação, verificamos com Kan­del (citado por Nicholas Hans), que "o objetivo da Educação Comparada, da mesma forma que o do Direito, da Literatura e da Anatomia compa­radas, é descobrir as diferenças que existem entre as forças e as causas que produzem variações nos siste­mas educacionais". E se acrescen­tássemos — o que certamente está implícito na definição de Kandel — "para descobrir os princípios sub­jacentes que regem o desenvolvimen­to de todos os sistemas nacionais de educação" — a definição estaria completa e perfeita.

Assim sendo, ao lado do interesse científico, e até erudito, a

Educação Comparada encerra um flagrante interesse: o de contribuir para a formação de uma consciência pedagógica mais esclarecida, porque informada das raízes e das razões de vária ordem, tanto dos fatos da educação como das concepções pe­dagógicas. Daí, tanto a prática edu­cativa, cada dia mais rica de formas, quanto a construção teórica, cada dia também mais rica de sistemas e teorias, podem melhor explicar-se à luz dos fatores que compõem a trama social, mais ou menos está­veis, mais ou menos mutáveis, de época para época. Portanto, a edu­cação comparada explica ou colabora na tarefa de explicar e, concomitan-temente, procura dar sentido à edu­cação. E, com efeito, esta a

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impressão que se colhe no tratado de Nicholas Hans, quando desfilam diante de nossos olhos formas e teo­rias pedagógicas que contrastam com as vigentes entre nós (quando tais fatos emanam de países desen­volvidos) ou que lembram o que aqui se faz (quando o paradigma são países subdesenvolvidos ou estra­tos populacionais de estamentos pro­positadamente obscurecidos e que são as populações indígenas das colô­nias européias do sul da África).

No momento preciso em que se discute uma lei de bases e diretrizes da educação nacional com proposi­

ções aristocratizantes numa espécie de apartheid pedagógico, no mo­mento em que se verifica a carên­cia de escolas de alfabetização en­quanto são criadas escolas de nível superior de disciplinas ociosas e va­gamente humanísticas, a leitura da Educação Comparada de Nicholas Hans, enriquecido por um capítulo sobre a educação no Brasil, de auto­ria de Anísio Teixeira, mais que um dever científico, é uma obrigação mo­ral, não tanto pelo que ensina, mas pelo que desensina, pelo que aponta, por comparação, o que aqui se faz errado.

Luis WASHINGTON VITA

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REVISTAS

OS ESTUDOS SOCIAIS NA ESCOLA MÉDIA

JAIME ABREU

Cientistas sociais e educadores norte-americanos vêm concentrando suas vistas sobre a importância do que chamam e descrevem como áreas fecha­das da cultura (closed arcas of culture), na escola.

São elas definidas, como o fazem Maurice P. Hunt e Lawrence E. Metcalf ("Teaching High School Studies: Problems in Reflective Thinking and Social Understanding"), como "áreas de crença e comportamento caracterizadas por uma relativamente larga soma de irracionalidade, preconceito, incon­sistência, confusão e tabus".

Consoante o que acentuam estes autores, são elas áreas nas quais um tratamento racional dos problemas envolvidos é largamente interditado nas escolas.

esses autores identificam como principais áreas fechadas da cultura norte-americana as seis seguintes, com interdição maior ou menor de abor­dagem:

1 — Economia — Nada obstante aberta ao estudo de economistas pro­fissionais e sujeita a incursões mesmo de leigos, é este campo tão afetado por tabus, confusões, emoções e interesses investidos que as escolas não especializadas tendem a evitá-lo como objeto de estudo, ou quando o fazem as especializadas, é, freqüentemente, com forte carga de parcialidade.

2 — Relações raciais e com grupos minoritários — Recentemente, essa área começou a ficar mais aberta a estudos objetivos na escola, mas, fre­qüentemente, é o seu trato ainda permeado por explícitos ou implícitos temores, tensões e confusões que a convertem também numa área fechada da cultura.

3 — Classe social — Esta é uma autêntica área cultural fechada onde prevalece o espalhado estereótipo de que "não há classes sociais na América".

Admitir o contrário, e buscar estudar racionalmente o assunto, acarreta inclusive o risco da suspicaz conotação emocional de se tratar de teoria de "comunistas".

4 — Sexo, casamento, família — Esta é área onde uma atitude menos estereotipada começa, timidamente, a se estabelecer, todavia a verdade é que uma livre análise crítica dos problemas e contradições envolvidos está longe de ser estimulada ou mesmo aceita. E' ainda uma área de tabus.

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5 — Moralidade e religião — Ainda que moralidade constitua área menos fechada à investigação objetiva do que religião, ambas, todavia, representam, no que diz respeito às escolas, uma área fechada onde prevalecem os tabus e dogmatismos.

6 — Nacionalismo — Esta é, freqüentemente, outra área cultural fecha­da, na qual é muito difícil questionar sobre crenças tradicionais, ainda quando inconsistentes com uma análise mais lúcida dos interesses nacionais.

Do ponto-de-vista de uma livre sociedade democrática, seria essencial, todavia, abrir essas áreas fechadas a um livre exame, pelo método da inte­ligência, por processos objetivos, racionais, de avaliação e julgamento.

Por não fazê-lo, essas áreas se convertem em incubadoras das grandes tensões, atritos e conflitos culturais da vida moderna, geradoras de crises e de desintegrações, representando uma função esquizóide na cultura, por não chegarem ao universo comum do entendimento com a fixação em seus absolutismos seculares ou teológicos, com forte carga de irracionalismo emo­cional.

Precisamente por se tratar de áreas que envolvem problemas difíceis da cultura, por sua carga de emocionalidade, é que se justificaria que as escolas as abordassem objetivamente, ao invés do que comumente ocorre com a atitude de omissão escapista, timorata, quanto a responsabilidades inde­clináveis da escola no seu trato.

Fugir à abordagem de problemas culturais controvertidos é condenar a escola a um perigoso papel de inércia, como força social, numa sociedade em acelerada transformação.

não pode ela fugir a habilitar os cidadãos a procurar respostas a esses temas que os envolvem e desafiam.

A incorporação recente aos seus quadros de representantes de várias camadas sociais, heterogeneizando-lhe a clientela, com interesses tantas vezes conflitantes, determinam outrossim que a escola, consciente de sua tarefa, não permita corram esses problemas a sua própria sorte, desassistidos de qualquer esclarecimento e assistência de sua parte.

Papel relevante no particular deveriam representar os "estudos sociais" na organização do currículo escolar, onde todas as instrumentalidades necessárias a um consciente e lúcido exercício de cidadania seriam utiliza­das, seja no preparo do homem comum, seja na formação das elites de lingüistas, cientistas, matemáticos, tecnologistas.

não se trata de consideração gratuita, sem fundo de verdade objetiva­mente apurada.

Nos Estados Unidos da América do Norte, onde a preocupação com o ministrar na escola estudos sociais como forma de preparação para o exer­cicio da cidadania democrática é, desde muito, uma constante, ainda assim, inquéritos sociais recentes para apurar a extensão dos sentimentos de leal­dade à democracia e às liberdades civis mostram que é imenso o trabalho ainda a realizar nessa direção.

Remmers e Radler, utilizando recentemente técnicas de amostragem, chegaram às seguintes verificações que comprovam o que acima enuncia­mos:

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1 — somente trinta e cinco por cento da juventude da nação concordam com a liberdade de imprensa.

2 — Trinta e quatro por cento dessa juventude são contra a liberdade de pensamento.

3 — Vinte e seis por cento dessa juventude admite a violação do domi­cílio.

4 — Vinte e cinco por cento desses moços são contra o pleno exer­cício de propaganda política.

5 — Trinta e quatro por cento deles não admitem seja ninguém livre de depor contra si mesmo, crendo que seria o caso ou de obrigar-se o cidadão a falar ou de lhe aplicar penas severas.

6 — Trinta e quatro por cento desses jovens são contra o reclamar direitos, por parte do cidadão.

7 — Quarenta e um por cento desses adolescentes são contra o cidadão dirigir-se ao Congresso ou aos poderes públicos e igual percentagem não vê diferença básica entre fascismo e comunismo.

Seria interessante a tentativa de realizar-se um inquérito de opinião desse tipo, na juventude brasileira.

Porque, em verdade, só a insuspeitada incidência de poderosas forças educativas extra-escolares poderia justificar o hipotético milagre da veri­ficação de nossa juventude estar adequadamente informada sobre o verda­deiro ideal democrático e lucidamente esclarecida sobre os grandes temas sociais de nosso tempo.

Na nossa organização escolar não se sente qualquer preocupação a esse respeito.

Trata-se, de regra, ou de escola voltada para abstratos intelectualismos acadêmicos, ou dirigida pelo espírito de estrita profissionalização ou inspi­rada pela devoção acrítica a absolutismos teológicos, que não são o mundo secular do cidadão.

A preparação para um lúcido exercício de cidadania democrática, para a compreensão dos grandes problemas do nosso tempo é que não lhe entra na pauta programática.

Houve outróra uma famigerada disciplina de "Instrução Moral e Cívica" em que o alcançar de objetivos morais e cívicos ao invés de ser uma normal tarefa global da escola era concentrada nessa disciplina e pes­simamente posto, de maneira grandiloqüente, retórica, inadequada, contra­producente, de modo a gerar o seu inevitável desaparecimento, envolvida na aura de indisfarçável ridículo, de coisa que não se pode levar a sério, por completa impropriedade de proposição.

Em tempos do Estado-Novo houve também certo místico frenesi pedagógico em que buscou — felizmente sem o conseguir — indoutrinar os discentes na concepção do "estado-forte", sobretudo pela sua participação em demonstrações externas, ostensivamente vinculadas a esse propósito.

Aquilo, todavia, que especificamente deveria ser feito, ao lado de outras medidas de ordem geral e que seria a inclusão dos "Estudos Sociais" no curso de estudos e práticas da escola média, jamais o foi.

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De modo que o nosso aluno sai desta nossa escola não apenas abso­lutamente jejuno quanto às grandes questões controvertidas de nosso tempo, em torno às quais lhe exigem opções para as quais não está preparado, como também em relação às mais comezinhas noções de cidadania, direitos civis, economia, organização política, conhecimento do meio etc.

Terá ouvido para exame e esquecido depois, detalhes eruditos sobre a Tasmânia, sobre Felipe da Macedônia, ou sobre exceções à quarta declina-ção latina, mas o que não é da escola é falar-lhe e esclarecer-lhe sobre os problemas reais de seu tempo, de sua terra e de sua vida.

esforços no sentido de ministrar-lhe noções introdutórias de cidadania, economia, direito usual etc, integradas com estudos históricos e geográficos, sob a forma de "Estudos Sociais", nas séries iniciais do curso médio, onde é um despropósito a tentativa de se introduzir um pretenso início de espe­cialização em geografia e história, têm malogrado sistematicamente por oposição decorrente do prevalecimento de uma deformação profissional de especialistas, sem sentido educativo.

E assim transita o nosso aluno, por nossa escola, com sete longos anos compulsórios de latim, de geografia descritiva, história de memoriza­ção, sem sequer ser iniciado na abordagem de problemas que vão constituir os pequenos e grandes temas imediatos de sua vida de cidadão.

Se nos Estados Unidos da América do Norte, país onde a tecnologia, a ciência, o desenvolvimento chegaram ao nível que conhecemos e onde os "Estudos Sociais" são ministrados na escola da forma sistemática que sabemos, ainda se apuram as gritantes falhas na concepção do que deve ser uma cidadania democrática, como aquelas aqui referidas, imaginem-se os danos que a defecção de nossa escola em cuidar do assunto estarão produzindo entre nós, no clima do nosso subdesenvolvimento, e a geratriz de incompreensões, equívocos, confusões e tensões sociais que esta deserção da escola estará representando!... — (Correio do Senac, Rio).

A ESCOLA EM ISRAEL

OTA GINZ e KIRJAT JAM

Durante os trinta anos de mandato britânico, isto é, de 1918 a 1948, o número de habitantes na Palestina elevou-se de 60.000 a 650.000. Em 1947, 100.000 alunos freqüentavam as escolas. Desde a criação do Estado de Israel em 1948, a população aumentou quase três vezes, e a freqüência escolar seis vezes mais, tendo ultrapassado o total de 600.000 alunos. Dois fatores motivaram esse considerável acréscimo: primeiro, o número relativamente grande de crianças de famílias que haviam imigrado, sobretudo do Oriente Médio e da África do Norte, e segundo, a Lei de 1949 sobre a freqüência obrigatória.

Traduzido pela Prof.» Marta Albuquerque.

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Compreende-se facilmente quantos esforços foram necessários para ins­talar, em breve tempo, determinado número de escolas com professores primários para 500.000 novos alunos. Essa mobilização teve início no mo­mento em que o Estado deveria garantir as bases de sua existência e ocupar-se da manutenção de um milhão de novos imigrantes.

Em várias localidades, o ensino teve que ser ministrado sob tendas ou nas mais modestas cabanas onde os alunos se sentavam em bancos rústicos e por vezes no chão. No entanto, as 10.000 salas de aula restantes foram construídas com equipamento adequado, elevando-se o número de professores de

5.000 para 20.000. As crianças recém-chegadas falavam mais de 70 idiomas diferentes e

este foi o principal mérito da escola, tão rapidamente organizada: obter que elas falassem logo a língua comum, a língua hebraica, o que fêz com que não apenas se entendessem mais rapidamente como também levassem a língua à família. No jovem Estado de Israel aconteceu então esse fato singular: as mães aprendiam a língua de seus filhos. A escola não ia tão-sòmente anular a diversidade lingüística, mas também a diversidade das culturas que as crianças haviam trazido. De seu país natal, onde suas famílias viviam desde gerações remotas, traziam os costumes mais diferen­tes (alimentação, vestuário, trabalho, pensamento). Igualar o nível de vida e aproximá-lo do estado da população já instalada no país foi o principal objetivo tentado com perseverança e sucesso pela escola. Assim, também ela influiu sobre a família dos alunos, ajudando a formar a nação.

A lei sobre a instrução obrigatória de 1949 dispõe que cada criança deve freqüentar a escola durante nove anos: aos cinco o jardim de infância e a partir dos seis anos a escola primária de oito séries. As despesas com essa escolaridade são custeadas pelo Estado, que participa também com as autoridades locais na construção dos prédios.

O Governo agiu com energia para que essa lei fosse rigorosamente cumprida e alcançou resultados satisfatórios com as crianças judias, das quais 97% freqüentam a escola com assiduidade. Mais difícil era a situação do grupo árabe, devido à antiga tradição de manter os filhos, e sobretudo as filhas, afastados da escola. Entretanto, mesmo nas escolas árabes de Israel, atualmente 90% dos meninos e mais de 50% das meninas recebem instrução. Hoje, essa porcentagem é três vezes maior que antes da pro­mulgação da Lei e incomparavelmente mais significativa que em qualquer dos Estados árabes vizinhos

A Lei dispõe também que os jovens de 14 a 18 anos que não hajam recebido instrução primária completa, freqüentem os cursos da juventude operária, com direito ao ensino gratuito.

Em 1953, o parlamento de Israel aprovou uma outra lei de base para a educação, a que estabeleceu as diretrizes do ensino público. Essa Lei extinguiu o sistema vigente há 30 anos, quando haviam sido criadas escolas parcialmente agregadas a diversas organizações. Havia quatro categorias diferentes quando o Estado foi instituído. Essas escolas prestaram na época valiosa ajuda à mocidade hebraica, mas entre elas havia, por vezes, rivalida­des e conflitos. A nova lei eliminou a diversidade dos grupos, promovendo

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a criação de novas escolas de estrutura similar, e estabeleceu o pelo Estado de todo o sistema educacional. Por ela, as famílias desprovidas de recursos puderam escolher para os filhos a escola do Estado ou a escola religiosa também do Estado. Ambas ministram ensino de acordo com o programa oficial; a escola religiosa, no entanto, observa as regras ortodoxas. Além disso, o Estado reconheceu e submeteu a seu controle outras escolas, principalmente as de orientação ortodoxa rígida.

Cerca de 80.000 crianças (de 3 a 5 anos) freqüentam atualmente os jar­dins de infância. Para as de 5 anos, a freqüência é obrigatória. Os jar­dins preparam as bases da evolução mental e física das crianças, propician-do-lhes atividades de expressão.

Graças aos professores primários judeus que vieram da Europa em fins do século passado, Israel herdou em 1948 um sistema escolar primário bastante evoluído. O ensino é ministrado seis vezes por semana: durante as quatro primeiras séries, com quatro horas por dia de atividades escolares; nos anos subseqüentes, cinco e seis horas. Ensina-se as matérias próprias do nivel, dando-se especial atenção aos assuntos hebraicos.

A Bíblia é estudada com profundidade e sistematicamente; a partir do sexto ano, as crianças aprendem uma segunda língua: inglês, francês ou árabe. todas as crianças se exercitam na agricultura e em diversos artesa­natos. Um terço de crianças, aproximadamente, recebe uma refeição na escola, aprendendo maneiras mais polidas de alimentar-se, princípios de die-tética, bem como o preparo das refeições e a ordem da mesa.

A escola primária também orienta os alunos no uso conveniente dos feriados escolares; para os períodos de férias são organizadas colônias de veraneio perto do mar ou no interior do país.

Há escolas adequadas para crianças excepcionais, cegas, surdas-mudas e que sofram de outras enfermidades. Nos cursos da tarde e da noite para os jovens operários, dá-se instrução a cerca de 12.000 alunos de mais de 13 anos, extensiva aos imigrantes que hajam recebido pouca ou nenhuma escolaridade. esse tipo de ensino, certamente exaustivo para a juventude, cessará quando desaparecerem os efeitos das contingências iniciais, isto é, quando todas as crianças estiverem freqüentando a escola primária até os catorze anos.

não é obrigatório em Israel o ensino secundário para os jovens de 14 a 18 anos. Existem escolas de nível médio de ensino geral (secundário) e especializado, destacando-se entre estas as de agricultura. Também não é gratuito, mas as crianças dotadas recebem ajuda. Exames realizados ao fim de um período de quatro anos dão acesso à escola superior.

Numerosas escolas especializadas foram instaladas e mantidas por diver­sas instituições públicas; de início pelo movimento sindical e freqüentemente pelas autoridades locais. Uma escola de nível médio prepara oficiais da marinha. As enfermeiras realizam cursos de três anos e de dezoito meses, este para as que vão dedicar-se à puericultura.

Os professores do curso secundário recebem instrução universitária, os das escolas primárias c dos jardins da infância se preparam nas escolas normais, onde é ministrado também ensino especial a professores de música e de diversas disciplinas.

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A Universidade de Jerusalém e "Tehnion" e a Escola Técnica Superior de Halfa são escolas de alto nível. como o Instituto Waizmann de pes­quisas científicas, elas são mantidas pelo Estado. Os alunos trabalham em edifícios modernos, equipados segundo as técnicas mais atuais.

A Universidade possui seis faculdades: ciências humanas, ciências natu­rais, agricultura, medicina, direito e ciências sociais. Fazem parte da Univer­sidade institutos para professores primários, dentistas, farmacêuticos e biblio­tecários.

A Escola Técnica Superior conta com doze faculdades e seções que englobam os campos mais importantes da técnica moderna.

Na cidade de Rehovot funciona o Instituto Waizmann, consagrado aos estudos de matemática aplicada, física nuclear, eletrônica, óptica, isótopos, polimeria, biofísica, química orgânica, biologia experimental, bioquímica, mi-crobiologia, microanálise e genética das plantas.

Para atender à aspiração de uma escola superior da comunidade, a admi­nistração municipal de Tel Aviv criou uma universidade com quatro escolas, sendo o ensino noturno.

Desde 1955, funciona, em Ramat Gan, a Universidade Barllan, dedicada aos estudos da religião hebraica, ocupando-se também de outros estudos da cultura humanística.

Nas regiões habitadas pelos árabes, há escolas primárias e secundárias em que o ensino é dado em árabe. O Governo se esforça para que o nível seja o mesmo das escolas judias, havendo conseguido resultados animadores. Os árabes estudam nas escolas superiores de Israel.

Ainda que o novo Estado não haja alcançado em seus doze anos de existência todos os objetivos do ponto-de-vista educacional, é, de fato, con­vincente o trabalho realizado. Em tempo relativamente curto e em cir­cunstâncias difíceis, conseguiu organizar para a juventude um sistema de educação completo desde a escola maternal à universidade. — (L'Education Nationale, Paris.)

A PROPÓSITO DO CENTENÁRIO DE JOHN DEWEY

LOURENÇO FILHO

Numerosos são os estudos sobre a obra de John Dewey, agora publi­cados, em comemoração ao centenário de seu nascimento. Na maioria, exal­tam o filósofo. Quanto à poderosa contribuição de Dewey à educação, também a referem; mas, na maior parte, mesmo nos Estados Unidos, comu­nicam ao leitor a impressão de que o' grande pensador organizou o seu sistema filosófico, inteiro e acabado, para só depois dele deduzir regras e normas aplicáveis à educação.

O autor dedicou o presente trabalho ao Prof. Anísio Teixeira.

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Nada menos exato. Dewey começou a sua vida profissional como edu­cador prático. Foi professor e diretor de escola e, precisamente, nos pro­blemas que então defrontou, é que veio a elaborar hipóteses diretamente relacionadas com a aprendizagem e a experiência que já no trabalho escolar procurou validar. Só depois é que as propôs em sistemas interpretativos mais amplos ou de caráter propriamente filosófico. Claro que, então, por implicações de diversa natureza, grande trama de idéias veio a refletir-se no pensamento pedagógico, por via dedutiva. Mas, o trabalho inicial foi indu­tivo, da ação intencional de educar para as razões que a expliquem, não ao inverso.

Note-se que, em seus primeiros trabalhos, nenhuma referência expressa fêz à filosofia. Note-se também que, quando desta veio a tratar, sempre fêz empenho em declarar que entre a educação e a elaboração filosófica via estritas relações de interdependência. O exame de alguns fatos permi­tirá compreender essa posição, ou esse pressuposto metodológico, que jamais deveria abandonar.

Os primeiros estudos de Dewey foram de psicologia experimental. De-ve-se-Ihe uma das primeiras e mais claras demonstrações de que a unidade a considerar, nesse dominio de estudos, não deveria ser, como então se supunha, estados de consciência, ou reações. Deveria ser o "arco nervoso" completo, isto é, uma situação estruturada, que envolvesse estimulação, con­dução e resposta. A justo título, por esse e outros trabalhos, Dewey figura entre os criadores da psicologia funcionalista, cujo pressuposto básico está em considerar os fatos psicológicos em todo o seu conjunto dinâmico, como instrumento de adaptação.

Ainda nessa fase inicial, Dewey tomou contato com Francis Wayrland Parker, um dos precursores da renovação pedagógica nos Estados Unidos com quem passou a trabalhar. Parker, que adotara as idéias de Herbart, procurou nelas aprofundar-se, realizando estudos na Universidade de Berlim. De regresso, foi chamado a dirigir uma escola normal em Chicago, onde também, na Universidade, logrou obter a instalação de uma escola primária experimental. Muitos atribuem a Dewey a criação dessa escola, o que não é exato. O que êle fêz foi dar-lhe maior expansão e brilho, dirigindo-a por vários anos.

Seu ponto de partida foi uma feliz associação dos princípios da psico­logia funcional com os da pedagogia de Herbart. estes últimos traduziam-se especialmente nestes pontos: a introdução de um modelo genético da didá­tica, na feição de passos graduais ou formais, e um princípio dinâmico, consubstanciado na noção do interesse do aluno. Certo é que tal noção ainda não se havia desprendido dos moldes intelectualistas. Para Herbart, o interesse seria certa propriedade de as idéias se ligarem umas às outras, não ainda a impulsão das atividades, sua intensidade e continuidade.

O papel de Dewey foi, precisamente, proceder à elaboração desse cons-tructo central, de tanta importância na elaboração da moderna pedagogia, como depois na proposição de mais amplos modelos explicativos sobre o conhecimento, a vida social e moral.

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A sucessão dos escritos de Dewey o comprova. Em 1895, já em con­tato com Parker, publicava o estudo "O interesse em relação com a vonta­de", o qual mais tarde aprofundou na monografia "O interesse e o esforço", que marcou época, e logo foi traduzida em muitas línguas. A tradução em português deve-se a Anísio Teixeira e figura no volume "Vida e educação".

Em ambos os trabalhos, o que pretendia. Dewey era responder aos que se levantavam contra um ensino que tivesse por base atividades interessadas da criança, e que acreditavam que essa orientação destruía o sentimento do esforço e, em conseqüência, a cultura da vontade. Demonstrou êle que nisso havia um grave erro de observação. interesse e esforço não se contrapõem um ao outro. Compreendem as duas fases de uma mesma realidade. O interesse é o aspecto interno, elemento de impulsão emocional, assim sen­tido pelo indivíduo; o esforço é o aspecto externo, segundo o qual apre­ciamos a persistência da ação, porque dirigida para um alvo. Sem o interesse não há

ação intencional e persistente, e, portanto, não há esforço. Aparentemente simples, essa fórmula era de enorme fecundidade. Eli­

minava desde logo o hiato entre o fator emocional e a ação, como levaria depois a suprir a separação entre a atividade e o pensamento. De fato, dela partindo, Dewey construiria todo um poderoso sistema de idéias: uma teoria da experiência e do conhecimento, um sistema de interpretação social e moral, e o que mais significaria, novos métodos de descrição e compreen­são da vida humana, de considerável influência na reformulação dos estu­dos filosóficos.

A construção relativa à experiência e ao conhecimento desfechava rudes golpes na compreensão intelectualista da época. Essa compreensão supu­nha um mundo de realidades estáticas que uma capacidade humana, sempre igual a si mesma, —• inteligência, juízo ou razão — pode apreender, carac­terizar e combinar. Assim, o conhecimento de coisas estáticas daria símbo­los estáticos, os quais nada tinha de ver com a ação humana e, em con­seqüência, com os impulsos que a determinam, ou com as necessidades naturais do homem, circunstâncias e condições de sua existência.

Contra esse modo de ver, é que se haviam levantado os criadores de uma psicologia de bases dinâmicas. A projeção direta dessa reação gerou o pragmatismo fundado no pressuposto de que tudo quanto se possa conhe­cer deve ter utilidade imediata para a sobrevivência. Dewey jamais esposou o pragmatismo e nenhuma referência em toda a sua vasta obra há que o permita afirmar. Desenvolveria a sua própria teoria do conhecimento, diversa da do pragmatismo, porque valoriza o sentido e a função do pen­samento. "Nos organismos inferiores, escreveu êle, as respostas são con­dicionadas e coordenadas por excitações do momento; mas, no homem, tor­nam-se teleológicas e permitem as manifestações de pensamento. A refle­xão é uma resposta indireta ao meio e o elemento dessa aplicação indireta pode tornar-se dominante, desenvolvendo-se em operações muito complexas. A função da inteligência não é copiar os objetos que a rodeiam, mas tê-los em conta para valorizar, no futuro, as relações mais eficientes ou mais proveitosas em relação a eles".

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Por que teria seguido essa orientação e não outra? . . . A nosso ver, pelo fato de estar trabalhando no ensino e de procurar um elemento d« explicação para a ação de aprender, nos alunos. Dewey a esse elemento caracterizou como uma intenção definida, ou um propósito do próprio edu­cando: "O que se deve desejar no aluno é o inteligente desempenho de atividades com intenções definidas ou integradas em propósitos pessoais". Assim, por ensaio de validação prática, em situações reais de aprendiza­gem, é que veio a compor sua teoria da experiência, em termos dinâmicos ou funcionais.

Os impulsos e desejos são múltiplos e variados, e, freqüentemente, con­traditórios. Mas os desejos se unificam em ação intencional, com um fim. em vista. À medida que se organizam, esboçam um sistema individual de ação, que depois se aperfeiçoa com autodireção, criando o pensamento e a personalidade. não se articula este sistema na obtenção de satisfações imediatas e na transposição dessa relação primária da ação sobre as coisas, fundamentando o princípio de que a verdade será o que atenda a neces­sidades do momento. A inteligência e o conhecimento têm, para Dewey, uma função prospectiva, a ser regulada por esquemas representados ou imaginados, através dos quais o homem cria o pensamento, e o organiza.

Insistia, porém, em demonstrar que isso não se dá no vazio. não se pensa em abstrato, pensa-se em face de situações problemáticas. Ou, em suas próprias palavras; "D Encontramo-nos em presença de uma dificul­dade que tenhamos de resolver; 2) Localizamo-la e a definimos; 3) Uma solução possível é então imaginada; 4) Graças ao raciocínio estabelecemos as bases de uma hipótese; 5) Continuando a observar, a experimentar, ado­tamos ou refugamos a hipótese, quer dizer, concluímos a favor ou contra ela".

Os elementos que nos levem a uma e outra dessas conclusões não resultam apenas da eficácia real e momentânea da ação, ou de nossas relações com as coisas, no sentido de que delas retiremos satisfação ime­diata. Isso porque não vivemos apenas num mundo de coisas, mas sim e também num mundo de pessoas, na interação das quais as próprias coi­sas ganham significação e sentido, tanto atual como futuro.

desse modo, Dewey abria novos horizontes à investigação do social, diretamente à psicologia social, e indiretamente aos estudos que depois se congregaram no que agora chamamos de "sociologia do conhecimento". As implicações de ordem moral, econômicas e políticas desse modelo foram depois por êle mesmo examinadas, como por outros investigadores apro­fundadas.

Será curioso notar que ao mesmo tempo em que Dewey assim construía a sua teoria da experiência, ressaltando a continuidade, entre impulsões, de­sejos e propósitos, de cuja dinâmica brota a capacidade de conhecer, Freud indicava marcha similar, nos dois tão conhecidos princípios de sua dou­trina: o princípio "do prazer" e o princípio "da realidade". Por outro lado, os observadores das atividades livres, de sentido lúcido, nos animais

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e nas crianças, como Schiller e Gross, por exemplo, definiam certos ele­mentos mais tarde seriados numa compreensão evolutiva do jogo, ou brinquedo, ao trabalho. Essa evolução, como Dewey anunciou, funda-se numa crescente tomada de consciência dos propósitos definidos de cada indivíduo.

Mas, na elaboração filosófica de Dewey, as questões práticas do ensino e da educação teriam continuado a influir?... Os fatos indicam que sim. O diretor da escola primária experimental de Chicago aí fêz ensaiar um sistema didático, com base nos propósitos dos educandos. Por elabo­ração sucessiva, sua e de colaboradores, esse sistema veio a ser cha­mado "de projetos".

A construção filosófica de Dewey parece ser, na essência, uma elabo­ração do modelo ideal já aí contido, file próprio admitiu, certa vez, que seu sistema filosófico "estava demasiadamente impregnado de preo­cupações pedagógicas".

Os projetos não visam transmitir hábitos fixados de uma vez por todas, nem conhecimentos prontos e acabados, nem atitudes que não comportem revisão, expansão e novas integrações. Daí, enquanto os de­mais renovadores insistiam numa compreensão dinâmica dos meios, ou dos recursos da ação educativa, na forma que tomou o rótulo geral de ensino ativo, Dewey projetava essa compreensão aos próprios fins da educação. A vinculação para isso, entre meios e fins, eram os propósitos dos educan­dos, exercitados em condições da vida real, sem exclusão das de cunho social, que só podem ser explicadas por elevação das relações humanas.

Donde, em primeiro lugar, a conclusão de que não deve haver nenhuma separação entre vida e educação. As crianças não estão num dado mo­mento preparando-se para a vida e, em outro, vivendo. Vida em con­dições integrais e educação são o mesmo. Depois, a de que os fins da educação não podem ser senão mais e melhor educação, no sentido de maior capacidade em compreender, projetar, experimentar e conferir os resultados da experiência. A educação torna-se, desse modo, uma "con­tínua reconstrução da experiência". Para que ela plenamente se realize, € é a terceira conclusão, a escola deve assumir a feição de uma comunidade em miniatura, ensinando a vida em situações de comunicação de umas a outras pesosas, e cooperação entre elas, visando a propósitos comuns. E. ainda, uma conseqüência, ao mesmo tempo que pequeno sistema social, a escola deve estar conectada com a vida social em geral, ou com o trabalho de todas as demais instituições, a família, os centros de recreação e trabalho, as organizações de vida cívica, religiosa, econômica, política.

Quando a qualquer dessas conclusões isoladamente se tome, ou fora do contexto geral da teoria da experiência, pode ser levado a interpretações errôneas das idéias de Dewey. Dir-se-á, então, que é "um grosseiro mate­rialista"; "homem que nega a cultura e a liberdade"; "um educador que não acreditava nos próprios fins da educação, tanto que para ela não marcava fim nenhum"; "um agitador, que não queria senão a desordem"...

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Lembre-se que coisas muito parecidas se disseram de Pestalozzi e de Froebel, cujas idéias hoje nos parecem de um grande e sensato equilíbrio.

Num dos últimos trabalhos, que escreveu com mais direta aplicação à organização didática, e isto foi em 1936, passados os setenta anos, Dewey esclareceu muito desses erros de interpretação. esse estudo tem o título "Experiência e Educação". Aí começa por fazer notar que a histó­ria dos sistemas didáticos se caracteriza por estabelecer-se neles uma oposi­ção absoluta entre o conceito de educar como desenvolvimento, que pro­venha de dentro, e o conceito de uma formação por elementos que atuem de fora; ou, entre a idéia de que educar será fazer expandir inclinações naturais e a de que deverá vencer essas inclinações, substituindo-as por hábitos, que se inculquem por pressão externa.

No que concerne aos assuntos práticos da escola, admitindo-se esse contraste como fundamental, jamais nos entenderemos. não se deverá pen­sar nisto ou naquilo, mas considerar até que ponto deverá prevalecer uma e outra coisa. Numa hipótese, aceitaremos a educação em termos está­ticos, ajustados talvez a sociedades pouco móveis do passado, mas inade­quadas às sociedades de nosso tempo. Na segunda, tudo será imaginado em termos de transformação e mudança, assim parecendo que nada existe de útil na experiência do passado. Uma e outra dessas conclusões servem a construções abstratas, não porém a formas de aplicação. Quanto a estas, consideremos, o princípio fundamental será a compreensão de um íntimo e necessário relacionamento entre os processos da experiência e as funções da ação educativa intencional. Quando se negue o valor de qualquer con­trole externo, surge o problema de encontrar os fatores de controle inerentes à experiência individual, e a questão continuará aberta.

Deve-se perguntar se a esses fatos não interessam os contatos entre crianças e adultos ou entre pessoas mais amadurecidas e menos amadure­cidas. Claro que interessa. Admitir que a renovação escolar se funde apenas na liberdade, como um fim, não tem sentido. O que deve significar a liberdade e quais as condições que conduzam os alunos aos fins educativos, essa é que é realmente a questão. Para solvê-la, importará verificar como decorre o processo da experiência individual, entre produtos do passado e acontecimentos do presente. Podemos aceitar que a aquisição de conheci­mentos feitos não deva ser o fim da educação; mas isso não quer dizer de que deles nos possamos servir como meios ou recursos para educar.

Ademais, nem toda a experiência é educativa. Muitas há que são dese-ducativas, porque impedem ou perturbam a aquisição de novas e convenien­tes formas da experiência. O que se deve ter em vista, portanto, é a continuidade da formação e desenvolvimento, cuja integração não se torna possível senão quando haja propósitos individuais de ação, os quais podem e devem ser exercidos de modo funcional, em cada caso, e sem prejuízo do sentido da elevação e da dignificação da vida social.

Em nada difere essa conclusão da que escrevera Dewey trinta anos antes: "Há algumas gerações, o grande obstáculo à reforma do ensino provinha da crença muito disseminada da eficácia quase mágica da cultura

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do espírito. Hoje, é a eficácia das coisas, como coisas, que embaraça o caminho. Pensar é o único modo para fugir ao impulso cego e à rotina. O homem privado de pensamento não é senão dominado por instintos e apeti tes. . ."

Nada menos inexato do que imaginar que a pedagogia de Dewey tenda a produzir pragmatistas, no sentido pejorativo do termo, com desprezo da cultura e dos valores sociais e morais. O que êle não podia admitir é que isso fosse obtido por meios impositivos, resultantes de uma concepção da experiência em termos estáticos. Daí, também a errônea interpretação que pessoas pouco conhecedoras de sua obra dão àquela afirmação de que a educação não tem outro fim "senão mais educação". Mais educação significa maior capacidade de pensar, comparar e decidir com acerto e íntima convicção. De outra forma, não há liberdade. "Somos livres — es­creveu Dewey — na medida em que agimos sabendo o que pretendemos obter".

esse, afinal, o eixo da concepção educativa do grande pensador ame­ricano, como o de sua própria construção filosófica. Ter propósitos, e pro­pósitos claros e bem fundados, representa um bem em si, pois projetar e realizar seus projetos será viver em liberdade.

Comentando esse pensamento, escreveu um de seus discípulos e conti-nuadores, William Kilpatrick: "As situações sociais que animem a estru­turação e a realização de propósitos levam a respeitar a personalidade, porque permitem a cada pessoa escolher e realizar aquilo que lhe pareça mais digno ou mais capaz de contribuir para expansão de sua vida, segundo os estímulos de seu coração. Ser respeitado nessa capacidade de projetar e realizar é a função da liberdade que caracteriza o estilo de vida que chamamos democrático."

Assim, longe de não ter em mira uma compreensão finalista da edu­cação, Dewey por ela se bateu, desde que em termos dinâmicos, a fim de que se exerça para cooperação e entendimento social. E ainda Kilpa­trick, com inegável autoridade, quem elucida este ponto, comentando: "A nova educação (a de Dewey) acentua a atividade com o fim em vista, que é, portanto finalista. A velha educação é que a punha de lado, negando-lhe qualquer valor. Para realizar uma atividade finalista producente, a unidade típica dos procedimentos escolares deverá ser o propósito pessoal, porque ao mesmo tempo que respeita a personalidade apoia a democracia, culti­vando os atributos necessários ao seu exercício: respeito por si mesmo, autodireção, iniciativa, ação dirigida pelo pensamento, autocrítica e per­sistência".

não será difícil verificar que esse mesmo esquema, construído e aper­feiçoado no trato com os alunos da escola de Chicago, é que Dewey traba­lhou no domínio da filosofia: "A atitude filosófica é geral no sentido de que se opõe à consideração de uma coisa qualquer tomada isoladamente, fora de seu encadeamento, o que é o mesmo que dizer fora de seu signi-

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ficado humano.. . Seu valor consiste não em proporcionar soluções (o que só se pode obter mediante ação), mas em definir dificuldades e sugerir os métodos para vencê-las. Pode-se dizer que a filosofia é a reflexão que se torna consciente de si mesma, que generaliza sua posição, sua função e valor na experiência humana". "Quando se concebe a filosofia como um sistema de conhecimentos supremos e absolutos, para uso de um pequeno número de filósofos profissionais — escreveu Dewey também — apenas vagas relações se percebem entre ela e a educação. Mas, quando a toma­mos como método de reflexão por um lado, e como uma hipótese geral para o ajustamento social, por outro, suas relações com a educação tarnam-se Imperiosas".

Na compreensão de Dewey, como se vê, a filosofia e a educação com­pletam-se uma a outra, não podendo existir isoladamente. A verdadeira filosofia, observa, deve refletir sobre os conflitos de intenções na sociedade atual e sugerir os métodos para conciliá-los, desenvolvendo pontos-de-vista mais compreensivos, segundo os quais a coerência e a continuidade sociais possam prevalecer. Mas isso será impossível, se acaso deixar de parte os trabalhos correspondentes da educação do povo. "A agitação pública, a propaganda, a ação legislativa e administrativa podem, até certo ponto, realizar alguma mudança, ou várias mudanças, as quais só serão úteis na medida em que sejam educativas; isto é, na medida em que realmente modi­fiquem as atitudes mentais e morais dos indivíduos. não obstante, sua atuação será perturbada porque visarão a indivíduos cujos costumes já de muito se terão formado. À educação, sim, é que caberá sempre um campo mais livre e mais fecundo".

Em conseqüência, se a educação tem necessidade da filosofia para melhor orientar-se, a filosofia tem necessidade da educação a fim de que possa efetivamente concorrer para o desenvolvimento humano, individual e social. Dewey não hesitou mesmo em proclamar que "a filosofia é sem­pre uma técnica de educação em seus aspectos mais amplos.. .".

não parece assim evidente que foram as preocupações práticas do educador que modelaram as mais vastas reflexões de Dewey, as de sua teoria da experiência e do conhecimento, suas concepções morais e políticas, seus métodos para o exame das necessidades da ação e significação dos valores?.. .

Queremos crer que sim. Dewey, a nosso ver, representa um educador que se fêz filósofo, não um filósofo que de suas teorias tenha deduzido um sistema de educação. — (Educação, Rio.)

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JORNAIS

DEMOCRACIA E EDUCAÇÃO

ANTÔNIO PINTO DE CARVALHO

Quando se fala de educação social, importa não esquecer que os termos social e individual, longe de possuírem valor absoluto, são relativos ao tipo de sociedade a que se aplicam. Para de tal nos convencermos, basta obser­var a enorme, diversidade que ocorre entre concepções sociais, tais como a de Platão e Hegel, a de Kant e Rousseau, cada um dos quais imagina um tipo de indivíduo em acordo com a sociedade que concebe.

Se, porém, é certo que os elementos essenciais de toda sociedade, enten­dida como comunidade de vida, são o fim ou o interesse comum e a coopera­ção interativa dos membros e dos grupos sociais menores, claro está que o ideal democrático é o que precipuamente encarna o ideal da sociedade. Numa sociedade despótica, as relações e interações entre chefes e súditos são reduzidas ao mínimo, quase só ao medo e ao interesse, faltando a essência da permuta, da comunicação e da livre determinação. Uma demo­cracia ideal comporta variedade e complexidade sempre mais vasta de inter­câmbios e interesses comuns, e simultaneamente uma contínua readaptação mútua dos próprios intercâmbios e dos contatos. Tal sociedade estará empenhada ao máximo na educação e aperfeiçoamento dos indivíduos que formam a base donde depende sua existência. De fato, como afirma Dewey, a democracia é um princípio educativo.

Por ignorantes que sejamos, ninguém melhor que cada um de nós sabe quais as dificuldades com que vive a braços; deve, pois, cada qual ser consultado, de modo que possa tornar-se parte ativa da autoridade e do processo de controle social. O verdadeiro valor da urna e da maioria está em que cada um conta como unidade.

Também na escola, todo indivíduo é educado na medida em que des­fruta a oportunidade de aduzir a contribuição de sua experiência, grande eu pequena. Reciprocamente, não pode a democracia desenvolver-se nem perdurar sem a escola que se apresenta como distribuidora dos valores e dos fins sociais, com a mira de que estes passem a ser possuídos pela mente e pela vontade de cada membro da comunidade social.

A carência de educação nas massas origina sempre a tirania, quer esta se manifeste em forma monárquica ou oligárquica. Pelo que a democracia não é uma coisa estática, uma posse que transita hereditàriamente de pais

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a filhos, mas é uma criação que cada geração tem de refazer desde a principio, é uma essência que deve recrescer segundo as condições das necessidades e dos problemas da vida social. Nada mais fútil e desanimador, em face dos problemas sempre novos de ordem política e econômica, do que voltar-se embevecido para soluções do passado. De nada vale a tra­dição, se não fôr sempre de novo incorporada no esforço ativo de adapta­ção às circunstâncias presentes. E que estas mudem sem trégua, declara-o eloqüentemente a história dos últimos cem anos.

Ê costume associar à idéia de democracia a de liberdade de ação; mas uma liberdade de ação que não suponha uma livre capacidade de pen­samento é puro caos. Deve pois a educação, relativamente à democracia, ter em conta e reforçar esses universais princípios de força espiritual. Atualmente a escola parece não satisfazer de modo integral a esta sua finalidade, tanto no que concerne ao mestre como no que se refere ao escolar.

O mestre não tem maneira de tomar iniciativas ou de levar por diante um esforço construtivo. não é consultado, nem escutado, naquilo que diz respeito à escola, a livros de texto, a programas etc. Interessa, é claro, a discussão inteligente e não a prescrição imposta a um corpo de gente passiva quem sabe se por parte de um competente: esta é sempre res­trição da inteligência e aprisionamento do espírito. não basta a prática esporádica, que freqüentemente se observa, devida a iniciativas pessoais dos diretores de escolas, ou, o que pior é, de burocratas de gabinete, que porventura nunca se sentaram numa cátedra de aula, mas se julgam idôneos para legislar em matéria de ensino. Nem se objete que muitos dos docen­tes são porventura incapazes de tomar parte em tais discussões. Justamente, o que se pretende é formá-los para isso e só há maneira de formá-los, levando-os a participar em tarefas de responsabilidade.

O escolar encontra-se em condições que impedem, ou ao menos não favorecerem, o desenvolvimento de suas faculdades mentais individuais e da responsabilidade em se servir delas.

Esta é a natural conseqüência da imposição imoral, mais que antide­mocrática, proveniente de uma instrução rigidamente fixa e imutável. com, isto fica também excluído o trabalho da inteligência, que exige experiência, problemas pessoais e imaginação que sugere as soluções.

Em confirmação do que dizemos, podemos citar as seguintes palavras de Dewey: "Só existe educação plena, quando se verifica uma participação responsável de toda a pessoa, proporcionada a sua capacidade, em dar forma às aspirações e modos de Governo dos grupos sociais de que ela faz parte".

A título complementar, permita-se-nos fazer referência a uma interes­sante polêmica, em que o mesmo Dewey tomou parte, acerca da atitude que devem assumir os professores perante a luta de classe.1

1 (Cf. "Class Struggle and the Democratic Way", in Education Today, pag. 325 ss).

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Tinham aparecido uns artigos, em The Social Frontier, tendentes a de­monstrar que a nova ordem, favorável aos trabalhadores, era obstaculada por poderosos interesses de classe, e que, por conseguinte, os mestres, co-inte-ressados com os trabalhadores, deviam valer-se do conceito de classe como de guia intelectual e prático para essa luta. A propósito desta última pro­posição, observa Dewey, é lícito afirmar ser ela uma conclusão que ultra­passa o âmbito das premissas, a menos que não se subentenda uma premissa deste gênero: ser suficiente o fato da luta de classe para orientar o pen­samento e a atividade que depois devem ser empregados para influir nos fatos.

Mas, assente esta premissa, se, por um lado, se segue que os fatos empíricos como tais são os dados que constituem o problema (e ninguém há que não veja isto), por outro lado, deduz-se a conseqüência inadmissível de que os termos de um problema social são idênticos ao método de sua solução; conseqüência inaceitável, principalmente tratando-se de uma solu­ção baseada no método experimental. este apóia-se, decerto, no conheci­mento dos fatos empíricos, mas o problema do uso de tais fatos, e do método para, mediante eles, se chegar a uma conclusão, é algo inteiramente diferente: os termos do problema (a existência, no caso especifico, da luta de classe) não podem constituir idéias que sirvam de guia para a ação dos educadores.

Semelhante identificação entre o fato e a idéia pode admitir-se sem contradição somente numa posição radical como a marxista-leninista, na qual se supõe que a luta de classe é origem de toda mudança social e que ela determina, por meio da produção material, todas as instituições culturais e sociais até ao momento em que, mercê da ditadura do proletariado, se obtenha a sociedade sem classes.

Simplesmente tal posição é abandonada, quando se admite, contra o marxismo ortodoxo, um fator subjetivo no conceito de classe já que, para o marxismo, o conceito de classe é uma determinação estritamente objetiva da realidade social atual e futura: não se pode, portanto, asseverar que todas as classificações são instrumentos construídos para um fim.

Uma outra diferença que mostra como heterodoxa, em relação ao genuíno marxismo, a doutrina dos artigos de The Social Frontier, diz respeito à natureza do fato educativo. Se, na realidade, os fatos decidem por si a natureza do processo educativo e da própria política educacional, e se tais fatos são a luta de classe, que coisa poderá ser a educação senão uma inculcação, ou seja agitação e propaganda? Os articulistas não aceitam esta conclusão, porém ela deduz-se logicamente das premissas por eles assen­tes, e eqüivale à supressão de toda liberdade que não seja a de fazer pro­paganda. Mais concretamente, um dos articulistas prevê a existência de só dois grupos sociais, um dos quais promova e o outro impeça a "drástica reconstrução", que posição deverá tomar o educador? Deverá, enquanto tal, estimular a luta de classe e buscar a solução mediante o conflito? Nada

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terá que dizer a educação sobre os modos como deve ser efetuada a mudança social? Pode acaso um educador aceitar os métodos violentos sem perder toda a fé na educação?

De preferência, a partir de um conceito de classe, deve o educador arrancar de um ponto-de-vista social que, enquanto não o obrigar a fechar os olhos às injustiças presentes, não deve levá-lo a esquecer sua respon­sabilidade na escolha dos meios da mudança social. Excluindo portanto a posição marxista, a posição acima apontada repousa na confusão dos dados do problema com a sua solução, na idéia de que basta "dar conta" ou "adquirir consciência" das injustiças sociais para que por si fiquem determinados a conduta política da educação e seus métodos. Aceitar, ao invés, o ponto-de-vista social em lugar do ponto-de-vista da classe, significa aceitar a idéia democrática como diretiva da ação educativa: uma coisa é que os educadores devam participar no processo de transformação social e outra coisa que tal participação seja determinada e guiada pelo con­ceito de classe.

O ponto-de-vista democrático não é aquiescência apática, mas atividade capaz de dirigir qualquer ação, incluindo a educativa. Por isso se evita confundir a orientação para uma classe (que pode ser legítima) com a orientação que deriva dos interesses de uma classe; neste caso, temos idéias e valores limitados e portanto falsos, no outro caso, temos o senso de um interesse social compreensivo. não se requer, por conseguinte, que os educadores sejam neutros, mas que participem na luta pela reorganização social sem esquecerem que o necessário é justamente a reorganização social, empreendida no interesse de todos, e não de uma só classe. — (O Estado de São Paulo.)

EDUCAÇÃO PARA TODOS

AFRÂNIO COUTINHO

A conquista dos espaços siderais pelo homem, mostrando como está avançada a União Soviética em astronáutica, relativamente a todos os de­mais países, é um testemunho em favor da educação e, sobretudo, da edu cação em bases democráticas e de cunho científico.

não pode haver dúvida para mais ninguém que estamos numa era de civilização em que o eixo da vida é constituído pela ciência. Para o homem que trabalha numa oficina mecânica, ou para o lavrador que melhor trata o campo e cultiva os seus produtos; para o operário espe­cializado de um reservatório de água ou para o ajudante de um laboratório químico, é a ciência que fornece — no atual estágio da civilização — os instrumentos, os processos de raciocínio, os recursos técnicos. Acabou-se a fase do empirismo e da improvisação. todas as atividades humanas podem e devem ser inspiradas pelo espírito e pela técnica científica. Isso que não exigia muito esforço para compreender, foi preciso assistir a um homem atravessar a barreira atmosférica e voltar com vida, foi preciso um feito

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dessa natureza espetacular, para que nos convencêssemos. E foi necessário tal violentação para convencer nossa mentalidade impregnada pela descon­fiança na ciência e pela ausência de inclinação científica, herança dos nossos colonizadores.

Na sociedade de massas em que vivemos, o que houve de mais evi­dente foi a ascensão das classes outróra desprotegidas e abandonadas para o gozo legítimo dos benefícios da civilização. A industrialização geral e intensiva constitui hoje o traço característico da vida, e o povo que desejar participar ativamente da civilização e que não queira permanecer no estágio do subdesenvolvimento, deve entrar firme na industrialização. Indústria e democracia coligaram-se na época atual para fazer a vida humana mais agradável, confortável e feliz. E o traço característico dessa situação é a participação de todos nos benefícios da civilização. O que caracterizava a sociedade pré-democrática era a discriminação de um grupo de privilegiados, para os quais ia tudo, ficando para os demais, que. aliás eram a maioria, somente o direito de vegetar na miséria e morrer de fome. O grupo privi­legiado mantinha seus direitos, controlando o Governo e detendo o poder econômico e militar, transferindo por herança suas regalias. Até a educa­ção era a seu serviço, uma educação de classe, aristocrática, intelectua­lizada, baseada nas famosas humanidades, e criadora de elites intelectuais e jurídicas, de bons oradores e escritores requintados. O trabalho das mãos era desclassificado, sem valia, deixado para os seres considerados inferio­res das camadas populares. Para a elite era a missão da educação, através da escola humanística e das faculdades jurídicas, fornecendo constante­mente elementos distinguidos para o exercício da supremacia intelectual e política das grandes famílias que dominavam e eram donas da vida.

Para uma sociedade democrática, como é a moderna, isto é, em que se valoriza maior número de indivíduos, fazendo-os participar ativamente da produção e do consumo dos benefícios do progresso, é coisa essencial a mudança do conceito de educação. Tal sociedade não pode ser suprida em homens válidos pela educação de tipo aristocrático. O humanismo das humanidades tem que ceder o lugar ao humanismo científico. E o huma­nismo científico não exclui o estudo do que outróra constituirá a base do ensino — isto é — as humanidades clássicas. E um humanismo integral, integrativo, proporcionando à sociedade a possibilidade de dispor de diver­sos tipos de homens capacitados para a infinidade de tarefas que ela tem de executar, e não apenas a elite intelectual como antigamente.

Pelas capacidades e inclinações os homens não são iguais. Há diver­sidades naturais de temperamento e vocação, que devem admitir de saída um sistema democrático de educação. E isso para não pretender impin­gir latim a um menino incapaz de compreender a estrutura das declina-ções. 15 um esforço inútil, um dinheiro desperdiçado criminosamente, man­ter uma escola para tentar esse absurdo durante sete anos. Uma escola verdadeiramente democrática averigua desde cedo as inclinações dos edu­candos, encaminhando-os logo para os diversos ramos que a devem compor, currículos diversificados pelos vários tipos de atividades. Ela não é uma

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escola exclusivista, mantém o ensino tradicional, intelectual, ao lado dos demais, o técnico e o profissional. Haverá sempre necessidade de erudi­tos, de intelectuais, de humanistas, porque haverá sempre indivíduos desse tipo mental. Para esses, preparemos um currículo especial, clássico, huma­nista. Mas deixemos que os outros, os que têm inclinação para a mecâ­nica, a astronomia ou a física nuclear, se encaminhem, desde cedo, para as matérias básicas dessas especializações. Um currículo tradicional, por outro lado, deve ser muito mais rico em disciplinas clássicas do que atual­mente, possibilitando um estudo mais profundo, inclusive com mais latim e mais grego, além da filosofia e da literatura em condições apropriadas. De qualquer modo, a diversidade de currículos é o que se impõe, de acordo com as diversidades humanas. Isso é que é democrático, possibilidade e oportunidade para todos, e não exclusivamente para os dotados de capa­cidades intelectuais, para os quais é orientada a escola atual. E uma educação para todos ofereceria ampla margem ao preparo científico e téc­nico, justamente os que viriam suprir as maiores necessidades da socie­dade industrial moderna. Há um século e meio vem a humanidade cami­nhando para um tipo de civilização caracterizada pela industrialização intensa e vasta. esse processo acelerou a democratização social, porque pôs à disposição da massa os benefícios do progresso técnico, o conforto e o lazer. Essa passagem vem sendo feita não sem sobressaltos e incômodos, conflitos e incompreensões. Cabe à educação facilitá-la. Contando que o sistema educacional seja adequado ao novo conceito geral que informa a vida na sociedade industrial. Uma educação de base científica, à luz do novo humanismo integral, científico e humanista. — (Diário de Noticias, Rio.)

O TRABALHADOR E 0 PROJETO DE DIRETRIZES E BASES

FLORESTAN FERNANDES

O trabalhador sindicalizado constitui, graças á condição em que se acha atualmente, o crítico mais severo e exigente da educação brasileira. Para êle, a educação se apresenta como um meio para atingir fins essenciais. Primeiro, como instrumento de emancipação de si mesmo e de seus filhos do analfabetismo, da ignorância e da servidão intelectual. Segundo, como um instrumento de superação do estado do atraso econômico, cultural e social do Brasil. Entre todas as camadas sociais, só os trabalhadores sindi­calizados possuem interesses sociais que os levam a encarar a educação de uma perspectiva utilitária e prática, bem como a exigir a extensão das oportunidades educacionais a todos os brasileiros, sem nenhuma exceção de qualquer espécie, mesmo no que se refere à instrução de nível superior e especializada.

Palestra realizada durante a I Convenção Operária em Defesa da Escola Pública na capital paulista.

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Por isso, a posição do trabalhador envolve, em si mesmo, as críticas mais profundas e construtivas ao que se vem fazendo e ao que se pretende fazer no terreno do ensino no Brasil, file quer a educação para alguma coisa. De um lado, a educação que prepare o homem para a vida, isto é, que dê a si próprio e a seus filhos a capacidade de agir com plena efi­cácia, responsabilidade e consciência sociais como seres humanos. De outro, a educação que seja capaz de auxiliar o Brasil a superar as condições de seu atraso econômico, social e cultural, incorporando-o de fato nas tendên­cias de desenvolvimento da civilização industrial e científica.

desse ângulo, o principal defeito global do projeto de Diretrizes e Bases da Educação Nacional é evidente, file continua fielmente a orientação da antiga camada dirigente da sociedade patriarcal e escravocrata brasileira, de ver o ensino como simples; fonte de ilustração do espírito, um ornamento da inteligência divorciado dos duros problemas da vida e do destino social dos homens. Trata-se de um contra-senso. Um país que pretenda indus­trializar-se e tornar-se autônomo econômica, social e politicamente, jamais poderá manter em nossos dias concepções tão absoletas sobre a natureza e as funções do ensino no mundo em que vivemos.

A essa limitação de ordem geral somam-se outros defeitos, que o con­vertem em uma peça retrógrada, incongruente e perigosa para os interesses dos trabalhadores no campo da educação. Assim, no plano estritamente educacional, o projeto de Diretrizes e Bases ignora por completo as questões mais graves do momento, que dizem respeito à qualidade do ensino que se dá nas escolas brasileiras, dos grupos escolares às faculdades e escolas superiores. não basta combater o analfabetismo, como pensa muita gente simplista. E' preciso combatê-lo sem perder de vista algo ainda pior, que é a pseudo-alfabetização e a degradação do ensino primário, médio e supe­rior. Além de multiplicar o número das escolas em todos os níveis do sistema escolar brasileiro, impõe-se urgentemente melhorar o rendimento do ensino e aumentar o aproveitamento dos recursos educacionais dispo­níveis. Em outras palavras, o combate ao analfabetismo será inócuo, se não fôr acompanhado de um esforço real de reconstrução educacional, que enfrente ao mesmo tempo os problemas qualitativos e os problemas quanti­tativos do ensino. Apesar de alguns avanços tímidos, especialmente no que concerne ao currículo do ensino primário e á plasticidade do ensino médio, o projeto de Diretrizes e Bases ficou preso ao passado e às fórmulas pedagógicas responsáveis pela má qualidade de nossas escolas, por seu baixo rendimento e por sua indiferença às exigências da educação popular. Em vez de estabelecer as diretrizes educacionais de uma sociedade na qual prevalecem legalmente os princípios da democracia e em que o trabalho se define como uma fonte de afirmação e de valorização do homem, apega-se a concepções caducas que fizeram do ensino brasileiro um fator de depen­dência colonial, de atraso intelectual e de alienação moral.

Coisas análogas ocorrem nos planos do financiamento e da adminis­tração do sistema nacional do ensino. Mantém-se a tradicional e incorrigível cotação inferior que o ensino sempre deve nos orçamentos da Nação. O

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quantum destinado à educação é Ínfimo, irrisório e impraticável, quando se atenta para a gravidade dos problemas educacionais brasileiros para a impor­tância que a solução deles apresenta: o deesnvolvimento econômico, político e social da sociedade brasileira está dependendo, de forma direta e extensa, da educação popular. Apegando-se a padrões mesquinhos de financiamento oficial do ensino público, os deputados ignoraram que estavam contribuindo para manter também a escala de analfabetismo existente, o caráter livresco, vazio e gratuito da mentalidade educacional brasileira e o desprezo pela democratização do ensino, que reside na base de qualquer política eficaz de educação do povo para a sociedade democrática, para a civilização industrial e para os futuros destinos do Brasil na associação das nações livres e independentes.

Se isso não bastasse, tomaram a iniciativa de pulverizar esse quantum ridículo, destinando-o a certos fins que são discutíveis ou claramente impro­dutivos. E' o que se pode pensar das medidas de subvenção às escolas particulares e da destinação indiscriminada de bolsas de ensino para o pagamento pelos poderes públicos das anuidades escolares dos afortunados freqüentadores daquelas escolas. Subvertendo os fundamentos da política educacional inaugurada e fortalecida no Brasil com a implantação da Repú­blica, de incentivar o desenvolvimento do ensino público com os recursos oficiais e promover assim a democratização do ensino, os deputados concor­daram em atrelar o Governo brasileiro a interesses mercantis dos donos de escolas particulares, à ambição de poder de determinadas escolas confes­sionais e aos privilégios educacionais das famílias "ricas" ou "remediadas", que não precisam do auxílio oficial para educar seus filhos. As bolsas devem naturalmente ser mantidas, onde o Estado não tiver escolas públicas e gratuitas, ou onde a procura de oportunidades educacionais fôr além da capacidade de absorção do sistema público de ensino. As subvenções cons­tituem uma afronta aos trabalhadores e à Nação, pois é inadmissível que o Poder Público assuma encargos de mecenas da escola privada no mo­mento em que não consegue, sequer, atender às necessidades mínimas de-conservação e melhoria da rede de escolas oficiais gratuitas, destinadas ao povo e mantidas com o dinheiro do povo. Se há algo de certo nas novas "diretrizes", o princípio em que elas se assentam tem de ser modificado. Ninguém ignora que pelo menos três quintos da população pobre brasileira não podem aproveitar ou aproveitam de maneira insuficiente as opor­tunidades educacionais abertas pela escola pública. E' que as famílias pobres, do campo e da cidade, não possuem recursos para conservar os filhos em inatividade, enquanto deve durar o período extenso de instrução. Que se destinem as bolsas, portanto, àqueles que delas necessitam: aos alunos pobres, para subvencionar os gastos de seus pais com a sua alimentação e manutenção até terminarem seus estudos! Só assim estaríamos assis­tindo a um esforço de amparo aos "direitos" educacionais das famílias e contribuindo para colocar o Brasil na trilha certa na democratização do ensino e na solução dos graves problemas que enfrentamos no terreno da educação popular.

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Contudo, o assalto ao erário não é a única coisa que se pre­tende instituir no Brasil, contra as tradições da política educacional repu­blicana. O projeto de Diretrizes e Bases põe um ponto final também na autonomia e na autoridade suprema do Estado, como árbitro e agente das medidas de importância para a administração e a direção do ensino. Através de um estranho critério corporativista, objetivam entregar a Conselhos de Educação (no plano federal e no âmbito dos Estados) a solução de todas as questões relacionadas com o ensino sejam elas de natureza técnica e legal, sejam elas de caráter financeiro. esses órgãos, que serão um império dentro do império, contarão com a presença permanente dos repre­sentantes dos estabelecimentos de ensino públicos e particulares, escolhidos pelo mecanismo das eleições. Será fácil perceber o que poderá ocorrer: com maiorias cômodas, os proprietários das escolas privadas editarão as leis do ensino, as condições de fiscalização de seus estabelecimentos, a aplicação das verbas oficiais destinadas â instrução, a orientação da política educa­cional de cada Governo, independentemente dos resultados do sistema elei­toral brasileiro, e por aí a fora. Enfim, teremos uma estranha reviravolta, que fará do Estado democrático um instrumento fácil e terrível nas mãos dos que puderem manejá-lo ao sabor dos seus interesses mercantis, confes­sionais ou mesmo ideológicos. Em lugar da política educacional constitu­cionalmente consagrada pela República, veremos o "uso" do Estado para fins mais ou menos inconfessáveis, todos eles em conflito com os interesses reais da Nação. A neutralidade do ensino, a soberania do Estado na fixação das normas a seguir nos assuntos educacionais e a autonomia do Governo na aplicação dessas normas, bem como na formulação e execução de sua política educacional, são essenciais para a normalidade do regime e para o nosso desenvolvimento educacional. Urge defender com unhas e dentes a causa republicana, posta em crise pelos que querem tirar proveito da Demo­cracia em fins mercantis ou em fins confessionais e ideológicos estreitos com o maior desprezo pelas instituições políticas vigentes ou pelas necessi­dades da educação popular.

As circunstâncias atuais conferem ao trabalhador sindicalizado o dever de agir como mandatário dos interesses educacionais das populações pobres do campo e da cidade. Cabe-lhe a tarefa de desmascarar os interesses es­cusos, que se escondem atrás do projeto de Diretrizes e Bases em sua presente versão, e de apontar, inflexivelmente, as medidas que devem ser tomadas para combater o analfabetismo, para eliminar as lacunas e as incon­sistências do nosso sistema de ensino e para democratizar a cultura através da escola pública. Ou seja a tarefa histórica que o transforma em advogado indeclinável da expansão e fortalecimento do sistema público de ensino — o único que pode ser concebido, por suas origens, natureza e funções, como a verdadeira arma do povo em sua luta pelos Direitos do Homem na esfera da instrução. — (O Estado de S. Paulo.)

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LIVRO DIDÁTICO

RENATO SÊNECA FLEURY

Qual a verdadeira função do livro didático do compêndio escolar? De início digamos que é auxiliar. não há livro capaz de substituir o verdadeiro educador. Eis um truísmo pedagógico. não obstante, existe muita gente, muitos professores que não entendem assim.

Vieira, enaltecendo o livro chamou-o "mestre mudo". Justamente, po­rém, por ser mudo, nunca será mestre completo. Aliás, o grande clássico e perseguido da Inquisição não pretendeu asseverar que possa o livro substi­tuir totalmente o mestre.

O disco fonográfico, um tanto usado para lições de línguas, e que apresenta a vantagem de não ser mudo, também não substitui o professor.

Pretender substituir professores por discos ou livros é heresia peda­gógica. Ambos são auxiliares do ensino, o livro principalmente, mas não dispensam mestres, por isso mesmo, embora possam ser obras de mestres.

Há, porém, o bom e o mau uso do livro didático e os abusos. Comecemos pelo bom uso, bastando indicar o verdadeiro papel do livro no ensino, ou, como preferem outros, na aprendizagem.

Uma das utilidades é a limitação, a dosagem da matéria, dos pontos dos programas, das lições. Para que uns professores não se estendam demais, exigindo excesso de noções e minúcias desnecessárias e fatigantes, e outros não resumam em demasia, os livros escolares devem padronizar o desenvolvimento das matérias, respeitando o espírito dos programas. estes, em regra, são sintéticos, ficando ao exclusivo alvedrio dos docentes a exten­são e pormenores de cada assunto, ponto ou lição, o que leva a excessos ou omissões, a acréscimos ou supressões.

A liberdade ou autonomia didática, a independência de cátedra é um direito relativo, não absoluto.

Uma das funções dos livros escolares é, portanto, padronizar a limitação da matéria.

Outro objetivo é apresentarem métodos e processos julgados pelos res­pectivos autores, mercê de seus estudos e experiências, como eficientes, tendo-se em vista proporcionar aos docentes melhores resultados de seu árduo trabalho.

Ninguém, de fato, pode prescindir da experiência alheia, mormente quando quem a transmite é autoridade.

Mesmo assim, o mestre esclarecido não aplica métodos e processos como quem segue receitas.

Seu coeficiente pessoal jamais se anula, pelo que, baseado na própria experiência, amolda a metodologia dos autores à sua, pessoal.

Trabalho premiado no concurso "Crônica sobre o livro", promovido pelo jornal O GLOBO e a Biblioteca Pública do Rio de Janeiro, sendo a comissão julgadora composta do professor AnIsio Teixeira e dos escritores Aurélio Buarque de Holanda o Homero Homem.

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O bom professor não imita servilmente, mas adapta, .afeiçoa o alheio ao próprio, harmonizando-os na prática.

Um terceiro objetivo do livro didático é colocar ao alcance imediato de professores e alunos, estampas, desenhos, retratos, mapas, etc. necessários à objetivação do ensino, bem como oferecer textos parciais, aconselháveis de obras de dificil obtenção ou consulta, por sua raridade, e cópias ou fac-similis de documentos, cujo exame direto é impraticável para muitos, por motivos óbvios.

Todos esses fins visados pelo livro escolar se enquadram, entretanto, no objetivo de servir ao estudante como repositório ou compilação, devida­mente documentada, de noções exigidas por determinado curso; e ao professor como

auxiliar, quase sempre indispensável, de sua difícil missão.

Os livros escolares são, portanto, instrumentos da educação e da instru­ção, mais destinados, porém, ao discípulo do que ao mestre, por instituírem fontes de consulta às mãos do interessado.

Se o professor pode, não raramente, dispensar o livro para o discípulo, a recíproca não é verdadeira: o livro não pode dispensar o professor.

Mas o livro é para ser lido, entendido e assimilado em seu conteúdo nocional, e nunca para ser memorizado, ipsis verbis virgulisque e repetido ao professor ou examinador nos pontos sorteados.

Ê claro que as noções mais importantes, fundamentais, principalmente as de cunho prático, utilitário, devem ser conservadas na mente para sua eventual aplicação ou utilização oportuna. Nunca, porém, devem ser memo­rizadas, decoradas para simples condutas orais, ou melhor, puras exibições verbalistas e verborrágicas como sói suceder, não ra ro . . .

O ensino, as aprendizagens (como se desvirtuam em nossas escolas, geralmente, estas palavras!) cifram-se em repetições textuais de páginas de história, de geografia, de gramática (ó céus) e até de matemática.. .

O que o livro explica e procura inculcar, inocular, deve, por sua neces­sidade, e por ter sido realmente assimilado, "digerido" e aproveitado, deve, repita-se, incorporar-se às reservas de conhecimentos que se acumulam e relacionam para ulteriores modificações da conduta, sua melhor orientação e adaptação a situações reais, quer estas se repitam, quer sejam inteiramente novas. Sempre, no entanto, se exigem mais adequadas soluções dos pro­blemas da vida corrente, por mais simples que pareçam.

Mas tais resultados não são, via de regra, obtidos somente com a leitura, o estudo em livros. É indispensável — a não ser para autodidatas algo geniais cuja existência, aliás, não se pode negar — é imperiosa a ação do professor, orientadora, esclarecedora, sugestiva que anima e vivifica o ensino.

O professor jamais pode ser posto de lado, embora sirva-se o estudante de livros, discos e outros recursos.

O mestre é o primeiro termo do binômio educador-educando, termos interatuantes, sem os quais o fenômeno eminentemente dinâmico e vital da educação não passa de mero conceito.

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Convém aqui lembrar que, admitindo-se a auto-educação como fenômeno ou atividade consciente, voluntária e metódica, é bem de ver que ela é extre­mamente limitada, mormente na idade escolar da infância e na juventude, períodos de imaturidade para o necessário autodomínio e autodeterminação adequados aos fins em vista. Só a plenitude da idade adulta pode conferir ao indivíduo essa capacidade.

O livro é um dos instrumentos da educação e do ensino; o educador é seu fator essencial; o educando é o objeto da educação.

Mas esse objetivo não se concebe em situação de contínua passividade, e sim agindo espontaneamente, voluntariamente, interessadamente, em situa­ção de atividade.

E o professor que promove essa condição com sua presença, sua palavra, seu estímulo, seus exemplos, sua persuasão, sua arte e inspiração, sua graça e jovialidade, serenidade e firmeza.

O bom professor porém... O abuso do compêndio escolar por parte de certos professores, coisa ou

erva má que aprofunda raízes em tempos de antanho, quando o vêzo era marcar o mestre o clássico "daqui até aqui" nas páginas dos compêndios, persiste infelizmente.

Há professores que são meros repetidores dos livros que adotam, abu­sando por comodismo ou incapacidade, da página impressa, fazendo-se subs­tituir por ela, anulando-se.

não é verdadeiro professor, porém, o mestre livresco, o que ministra ensino livresco.

O livro é, em última análise, uma sugestão, não uma receita.

Ater-se a êle o mestre, a êle submetido e não submetendo-o a seu critério; prender-se o aluno a seus textos, é obra de repetição, não obra de criação, de originalidade. Mestres assim, alunos assim, aqueles podem ser substituídos por discos, e estes podem reduzir-se a olhos para ler e ouvidos para ouvir a cantilena cem vezes repetida num fonógrafo...

Repetir quase sempre não é propriamente saber, pois pode ser apenas saber repetir. . . Em muitíssimos casos, é pura atividade mental estéril, exteriorizada no comportamento verbal, graças exclusivamente à memória, capaz de reter e evocar, quando necessário, noções que em geral não impli­cam a conduta nem mesmo lhe importam, não influenciam o sistema geral de reações, sobre a vida nada atuando.

São noções que quase só recheiam o cérebro, não dinamizam o espírito e o corpo para as atividades, a invenção, a criação, a produção útil, o labor.

O livro somente em si não basta. O que realmente vale são as ações, as iniciativas que sugere — pesquisas, experiências, manualismo, trabalho em grupo, cooperação, sociabilidade. As noções que encerra, são logo esquecidas.

Nenhum de nós será capaz de repetir os nomes das capitais de todos os países do mundo nem as superfícies quadradas dos mais importantes, coisas

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severamente exigidas como úteis, ou, pelo menos, como saber escolar. P a r a quê? Ninguém responderá com convicção pedagógica ou di tada pelo simples bom-senso.

Quem ent re tan to fêz um curso, a inda que elementar, de geografia não decorada, por exemplo, t em noção do mundo, dos continentes, dos oceanos, da t e r r a no espaço, e é isso o que importa e convém. não listas de nomes, que em caso de necessidade, podem ser procuradas em qualquer compêndio de geografia.

O abuso do livro leva a esses absurdos didáticos, que fazem do estudo um verdadeiro e inútil suplício.

A COLONIZAÇÃO PORTUGUESA NA ÁFRICA

ESTÊVÃO PINTO

O professor Marvin Har r i s , da "Columbia University", que realizara, há a lguns anos a t rás , vár ias pesquisas-de-campo no Brasil, demorou-se em Moçambique quase um ano (1956-7); seu objetivo era es tudar a lguns dos aspectos da a tua l política por tuguesa nas colônias, sobretudo no setor do t rabalho e da educação. O ensaio do professor Marvin Har r i s foi publi­cado inicialmente em inglês 1 e, agora, acaba de ser vulgarizado pela revis ta Educação e Ciências Sociais.2 Sem a pretensão de fazer u m a "acusação for­mal cont ra o povo português", o autor conclui pelas "caracter ís t icas a l a rman­t e s " daquela política. P a r a obter resul tados (confessa) teve que depender de vár ias pessoas, por tuguesas e afr icanas; mui tas delas "a r r i s ca ram os seus empregos e a sua segurança" para falar-lhe das condições sob as quais e r a m "forçadas a viver", a inda que, no íntimo, não pudessem estar cer tas de que t r a t a v a m com algum espião. E acrescenta que os informantes cor­r iam tais riscos "mais por desespero do que por confiança", — o desespero que se to rnar ia na esperança de o au tor poder, mais tarde, " informar o m u n d o " da sua dolorosa s i tuação social.

Moçambique (permitam-me lembrar) t em u m a á rea superior à dos Es tados de São Paulo, Pa raná , Santa Catar ina e Rio Grande do Sul, reuni­dos, com u m a população t rês vezes e meio inferior à de todas essas uni­dades federais. Lourenço Marques conta pouco menos de cem mil habi tantes , isto é, a cifra demográfica de Aracaju. Mas é u m a região rica em minas de ouro, cobre e estanho, sem falar na sua excelente produção de açúcar, milho, algodão e outros produtos. Hab i t am Moçambique numerosas "na­ções" bantus.3 ,

1 Portugal's Âfrican "Wartls", A first-hand report on Labor and Education in Moçambique.

2 V. 15, de set. de 1960, Rio. A citada revista é dirigida por Darci Ribeiro e publicada pelo Centro Brasileiro de Pesquisas Educacionais.

3 Para classificação dos grupos culturais e raciais de Moçambique, veja-se a recente obra de G . P . Murdoclc, África, Its Peoples and Their Culture Hístory, New York, 1959, pp. 374 e ss.

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O país foi descoberto há quatro séculos e muito, precisamente a 2 da março de 1498, por ocasião do célebre périplo de Vasco da Gama. Teve a primazia de avistar a terra nosso conhecido Nicolau Coelho, o alegre parti­cipante das aventuras de Cabral na costa brasílica. Os habitantes eram da "seita de Mafamede" e falavam como "mouros". Em certa ocasião, para ostentar poderio, os lusitanos desembarcaram fortemente armados, com bom­bardas dispostas na popa dos batéis; atirando contra os "mouros", os inva­sores mataram logo dois deles, um na praia e outro que se abrigara atrás de uma paliçada. Iniciava-se a colonização portuguesa no Moçambique.

Começa o professor Marvin Harris por observar que o "visitante ou o hóspede oficial" deixam Moçambique com uma boa impressão. Há poucos exemplos dos "mecanismos acintosos de apartheid", símbolos clássicos da África do Sul; não se vêem, igualmente, avisos como este: "Europeus somente". E os

brancos podem andar em segurança no bairro afro de Lou­renço Marques, à calada da noite. Todavia, a realidade e as "impressões de harmonia inter-racial são desesperadamente infundadas". Os brancos podem andar, alta madrugada, nas vielas escusas "porque os africanos que lá vivem são proibidos de sair de casa depois das nove horas". não existe, tampouco, necessidade de estabelecer locations para os nativos visto como, nos res­taurantes, nos cinemas e em outros logradouros públicos, "os preços e o traje servem de eficiente filtros de côr". Registo apenas as palavras do autor.

A acomodação ou mesmo a miscigenação luso-nativa, em Moçambique, é um mito. A censura, os delatores e a polícia estatal bem treinada desen­corajam qualquer restrição ou critica. E esse silêncio da população africana é que torna Moçambique uma grande desconhecida. Através dessa cortina de mutismo, floresce um sistema de tratamento desigual e separado, "sob muitos aspectos mais rigoroso do que o existente na União Sul-Africana". Na Guiné Portuguesa, em Angola e em Moçambique só uma fração insignifi­cante do povo goza do status de cidadão, os restantes, chamados de iwdí-genas, estão sujeitos a um dos mais complexos controles jurídicos e adminis­trativos. O status do indígena é mais ou menos semelhante, ao da criança, considerada incapaz de exercer a cidadania. Daí a necessidade que tem o Governo de protegê-las.

O administrador dos diversos conselhos e circunscrições, em que se divide a "província", concentra em suas mãos todas as funções policiais e judiciárias: pode prender, julgar e sentenciar os considerados delinqüen­tes; regula as transações mercantes; autoriza o exercício das profissões; recruta os trabalhadores para as obras públicas; localiza as áreas e tipos de cultura; e, finalmente, autoriza as festas e cerimônias nativas. Quem desobedece aos mandamentos do administrador está sujeito à pena da pal­matória (25 golpes em cada uma das palmas das mãos). Todos devem trazer consigo o livro de passes, onde são anotadas as permissões para andar de um a outro distrito. Se alguém recalcitra e se torna indesejável, é depor­tado para São Tome. As mulheres, quando se zangam com os meninos, utilizam o nome dessa ilha como ameaça para os manter quietos em casa,

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— fato que me faz lembrar as mães inglesas, ao tempo das Cruzadas (ate­morizavam as crianças traquinas ou difíceis com o nome do rei Ricardo Coração-de-Leão); ou me faz lembrar o famigerado "Cabeleira" a quem, na época do governador José César de Meneses, as babás pernambucanas invo­cavam com a intenção de fazer medo aos meninos levados:

Fecha a porta, gente, Cabeleira aí vem, Matando mulheres, Meninos também.

As pretas de Moçambique devem cantar sua loa mais ou menos assim (que me perdoe o venerável apóstolo, cujo único pecado era não acreditar em milagres):

Fecha a porta, gente, São Tome ai vem, Pegando mulheres, Meninos também.

Além da férula e do banimento, há outros processos para conservar a tranqüilidade em Moçambique. Ao anoitecer, o bairro é patrulhado por policiais infantes e montados; viola as posturas o indígena que se esgueira até a casa do vizinho a fim de entreter a mais inocente conversa com o mesmo. Durante o dia, — nas lojas, nos mercados, nas cantinas — o pobre negro precisa estar alerta contra a curiosidade dos delatores ou espiões. não há lugar, em Moçambique, para o africano pensar por si próprio. Basta verificar que, não obstante ser a população nativa cem vezes supe­rior à alienígena, havia 5177 crianças negras registadas nas escolas primá­rias; os escolares brancos somavam 4412 (dados de 1954). Nenhum afri­cano jamais completou os sete anos de "liceu".

Um dos objetivos fundamentais da política colonial portuguesa é a explo­ração da mão-de-obra. As tentativas governamentais de criar uma "massa nativa politicamente inerte e servil" através do controle despótico, prepara as condições prévias a fim de usufruir o colonizador português o máximo de benefícios econômicos. "Moçambique (observa Marvin Harris) não é uma white merís burden; grandes lucros, de importância vital para a economia portuguesa, são anualmente retirados do uso e da venda da mão-de-obra africana. não se deve desprezar o fato de que é o africano, e não o europeu, quem suporta o peso da civilização em Moçambique".

Depois de fazer várias outras considerações a propósito do sistema dos shibalos (trabalhadores forçados) e do sistema, não menos odioso, dos ser-vos-da-gleba (que impera ao norte do Zambeze), o autor termina por afir­mar que não nos devemos embair pelos protestos dos portugueses de Moçambique, quando afirmam não odiar o negro, estando, assim, isentos da pecha de racistas. "E' verdade que raramente se encontram colonos portugueses de Moçambique, que espontaneamente dêem sinais de ódio

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vigoroso e ativo contra os africanos. não faltam, porém, estereótipos pre­judiciais e difamatórios quanto às qualidades intelectuais, físicas e espi­rituais da raça negra". A grande maioria considera o negro "uma eterna criança", divertido no seu atraso, às vezes leal e trabalhador, mas nunca igual a um branco". Tais atitudes, juntamente com os espancamentos, os salários discriminatórios, o trabalho forçado, o toque de recolher, a limi­tação da liberdade de locomover-se, os contratos unilaterais, o sistema de lavoura compulsória, a educação em separado e a sujeição à justiça pessoal arbitrária, — tudo isso não deixa o purismo de Salazar muito límpido, nem o sistema de colonização do atual Governo português a coberto de qual­quer crítica. E não é só Moçambique. Nas demais colônias também impera um regime, senão igual, pelo menos semelhante. O caso da Angola, como se pode ver (lembra-o Joel Silveira, em artigo recente para o Diário de Notícias) dos resultados a que chegou Luís Augusto do Rego Monteiro e que consta do seu relatório à I Conferência Regional Africana. — (Jornal do Comércio, Recife.)

UNIÃO INTELECTUAL DAS TRÊS AMÉRICAS

Na qualidade de memoro do Conselho de Educação Superior das Repúblicas Americanas, o Prof. Anísio Teixeira participou entre 9 e 18 de fevereiro último de duas reuniões desse organismo, realizadas nos Estados Unidos, com o objetivo de estudar o intercâmbio no âmbito do ensino superior no Continente. Ouvido pelo jornal A Noite do Rio de Janeiro, o educador prestou os seguintes esclarecimentos:

Em 1958, a Carnegie Corporation de New York concedeu um auxílio ao Institute of International Education para desenvolver um programa de aproximação pessoal entre educadores e homens de estado das Américas, ligados à educação, e o estabelecimento de um fórum para o livre debate dos respectivos problemas de ensino superior. Em 1960, a Fundação Ford associou-se à Carnegie Corporation para assegurar o funcionamento, por três anos, do Conselho de Ensino Superior das Repúblicas Americanas, de cuja última reunião acabo de regressar.

O conselho, para conseguir seus objetivos, usa dos seguintes recursos: Conferências de educadores norte e latino-americanos para a discussão de problemas de ensino superior no hemisfério; visitas pelos educadores par­ticipantes às universidades dos países do continente e preparo e realização de seminários e estudos destinados a esclarecer problemas e satisfazer neces­sidades educacionais identificadas e programadas nas conferências anuais.

A reunião preliminar do Conselho efetuou-se em San Juan, Porto Rico, em maio de 1958. Desde essa data, vêm-se realizando reuniões anuais, tendo sido a de 1959 na cidade do México, a do Chile, em 1960, e a do cor­rente ano em San Francisco, nos Estados Unidos. A próxima, de 1962, rea­lizar-se-á nesta nossa cidade de S. Sebastião do Rio de Janeiro.

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A responsabilidade da direção do programa do CHEAR compete a um Conselho de seis membros, constituído na cidade do México, em 1959 O Instituto of International Education administra o projeto e o Conselho escolhe os participantes, reúne e preside a Conferência Anual de Ensino Superior, planeja as visitas dos participantes da Conferência às instituições de ensino superior do Continente; examina e estabelece as prioridades dos problemas educacionais a serem estudados. O Conselho, do qual faço parte, reúne-se anualmente, no intervalo das Conferências, para tomar essas de--cisões.

Os participantes desse programa, em curso, como dissemos, há três anos Mão unânimes em reconhecer que as conferências anuais, como a que ora se realizou em São Francisco, além de pôr em foco os problemas maiores com que defronta o ensino superior no hemisfério, vem constituindo base firme para o desenvolvimento de amizades profissionais e de estreitas rela­ções pessoais entre os educadores das Américas e para crescente com­preensão e respeito mútuos entre educadores latino-americanos e norte-americanos. com efeito, todos nós que lidamos no Conselho, visamos com essas conferências criar e fortalecer uma comunidade intelectual em nosso Continente.

PROJETOS EDUCACIONAIS

São vários os projetos liderados pelo Conselho. Um deles se refere ao Estudo Comparativo de Educação Superior nas Repúblicas Americanas. Tra­ta-se de projeto, financiado pelo Ford Foundation, que está sob nossa dire­ção e dele participando o educador Harold Benjamin, professor Emérito de Educação do George Peabody College que é seu assessor-chefe. O estudo compreenderá uma série de monografias sobre a organização, administração e financiamento das universidades nas Américas; o preparo, seleção e paga­mento dos professores; a seleção dos estudantes; e o programa de pesqui­sas, de ensino e de extensão. Constituirá o primeiro estudo compreensivo do ensino superior no continente americano.

Outro projeto importante é o que se refere à comunicação entre intelec­tuais e mestres. Trata-se de programa destinado a incentivar os contatos entre professores e intelectuais nas Américas Latina e do Norte, levado a efeito pelo Dr. Frederico Bukhardt, presidente do American Council of Learhed e membro do Conselho. O ensaio escrito a respeito pelo Dr. Bur-khardt — Inter-American Schorly Communication in the Humanities and Social Sciences — foi traduzido em diversas línguas e teve ampla circulação em todo o mundo. Uma série de seminários vem sendo organizada pela CHEAR, como resultado desse estudo. O problema das comunicações entre cientistas e humanistas no Brasil foi estudado pelo Prof. Durmeval Tri­gueiro, que escreveu uma pequena monografia a respeito, havendo para isto percorrido todo o país.

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Ainda outro projeto digno de referência é o do Seminário Inter-Ame­ricano de Bibliotecas. O primeiro destes seminários reuniu-se em Chicago entre 25 e 27 de fevereiro, dele participando 10 latino-americanos e 10 norte-americanos especialistas em bibliotecas. O seminário estudou o pro­blema das relações da biblioteca da Universidade com a Universidade, debateu métodos e processos de auxílio e cooperação entre as bibliotecas das Uni­versidades Latino e Norte-Americanas e discutiu planos de ampliação e-intensificação dos serviços bibliotecários das Universidades. Os participantes latino-americanos do Seminário, todos por convite e à custa do CHEAR, além da reunião de Chicago, realizaram visitas às bibliotecas das Univer­sidades dos Estados Unidos e os participantes americanos às bibliotecas das Universidades do México e da América Central, a fim de se familiarizarem com os respectivos serviços e problemas.

REUNIÃO INTERAMERICANA DE ESTUDOS REGIONAIS

Imediatamente antes da Conferência do corrente ano, em San Francisco, o CHEAR associou-se ao Chanceler Franklin Murphy, reitor da Universidade de Califórnia, em Los Angeles (UCLA) para realizar uma reunião de três dias, a fim de estudar os meios de fortalecer e expandir os programas de estudos latino-americanos nos Estados Unidos e os programas de estudos norte-americanos na América Latina. Os professores norte-americanos dos institutos e centros de estudos latino-americanos nos Estados Unidos e-muitos dos participantes da Conferência de San Francisco tomaram parte na Conferência de Los Angeles, que estudou e analisou com franqueza e de forma altamente construtiva o desenvolvimento dos estudos comparados das diversas culturas continentais. Os Institutos de estudos de área nas Universidades Americanas vão por certo ter considerável expansão.

Em cooperação com o Social Science Research Council — e o Comitê: de Estudos Latino-Americano do American Council of Learned Societies e associado à American Sociological Association, nosso Conselho (CHEAR) vai realizar em agosto do corrente ano um seminário destinado a aproximar os sociólogos do continente e examinar meios e modos de melhorar e inten­sificar as relações e as comunicações deste campo de estudos. Será o segundo seminário de que falamos acima destinado ao desenvolvimento da. comunicação entre os intelectuais do Continente.

SEMINÁRIO INTERAMERICANO DE ECONOMIA.

O terceiro seminário de comunicações será realizado pelo CHEAR, tam­bém em cooperação com o Social Science Research Council, o American Council of Learned Societies e a American Economics Association e terá lugar ainda no corrente ano, nas proximidades da reunião anual da Ame-

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rican Economics Association. como o de Sociologia, destinar-se-á a esta­belecer contatos entre os especialistas do mesmo campo de estudos e a estudar os modos e meios de melhorar as comunicações mútuas e o de­senvolvimento em comum dos estudos econômicos.

O Conselho de Ensino Superior das Repúblicas Americanas está em­preendendo vasto programa de aproximação, de conhecimento mútuo e de estudos comuns entre os professores, cientistas, especialistas e intelectuais, em geral, das três Américas. O objetivo de longo alcance é, como já disse, o da constituição de unia comunhão intelectual em todo o Continente, comunhão que inspirará e nutrirá a comunidade humana das Américas. Queremos conhecer-nos melhor para melhor nos entendermos. Estamos vivendo tempos difíceis e em tempos difíceis, melhor será estejamos unidos. Nada une mais que a mútua compreensão.

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ATOS OFICIAIS

DECRETO N° 49.575 — DE 22 DEZEMBRO DE 1960

Cria a Escola Nacional de Cinema

O Presidente da República, usan­do da atribuição que lhe confere o artigo 87, item I, da Constituição, decreta:

Art. 1» Fica criada, no Institu­to Nacional de Cinema Educativo, do Ministério da Educação e Cultu­ra, a Escola Nacional de Cinema ( E . N . C ) .

Art. 2º A E.N.C. ministrará ensino técnico, de grau médio, vi­sando à habilitação, de modo geral, para o desempenho de atividades nos diversos setores da arte e da indús­tria do cinema.

Art. 3º A direção da E.N.C fi­cará a cargo do Diretor do mencio­nado Instituto, auxiliado por um Secretário.

Art. 4º A estrutura dos cursos da E . N . C , e bem assim as condi­ções de matrícula e o regime esco­lar, regular-se-ão por Portaria do Ministro de Estado, o qual expedirá as demais instruções que se torna­rem necessárias para execução deste decreto.

Brasília, em 22 de dezembro de 1960; 139º da Independência e 72º da República.

JUSCELINO KUBITSCHEK.

Clovis Salgado.

(Publ. no D. O. de 26-12-1960).

DECRETO Nº 49.913 — DE 12 DE JANEIRO DE 1961

Cria, junto ao Serviço de Ra­diodifusão Educativa, do M.E.C, a Orquestra Sinfônica Nacional (O.S.N.).

O Presidente da República, usan­do da atribuição que lhe confere o artigo 87, item I, da Constituição, decreta:

Art. 1º Fica criada, junto ao Serviço de Radiodifusão Educativa, do Ministério da Educação e Cultu­ra, a Orquestra Sinfônica Nacional (O.S.N.).

Art. 2º A O.S.N., componente da Companhia Nacional de Radiodi­fusão Educativa, instituída pelo De­creto nº 49.259, de 17 de novembro, de 1960, terá como finalidade pre-cípua cultivar e difundir a música sinfônica no país.

Art. 3º A O.S.N. será orga­nizada, de acordo com os seguintes preceitos:

a) será constituída de noven­ta profissionais, admitidos como contratados;

b) para o efeito da fixação de salários, seus integrantes serão classificados em categorias instru­mentais;

c) o preenchimento inicial da tabela de seus integrantes e o pro­vimento das vagas que nela vierem a ocorrer serão feitos mediante pro­vas de seleção;

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d) a permanência dos seus componentes será condicionada a habilitação em prova de suficiên­cia, a realizar-se de três em três anos; e

e) suas atividades artísticas e culturais obedecerão a diretrizes e programações elaboradas anual­mente por um Conselho Artístico, a ser designado pelo Ministro de Estado e que funcionará sob a pre­sidência do Diretor do Serviço de Radiodifusão Educativa.

Art. 4* A O.S.N. terá dois re­gentes, sendo um titular e outro assistente, contratados por período fixo não superior a três anos, e contará com os auxiliares e cola­boradores necessários a seu traba­lho de secretaria e serviços técni­cos de arquivo, cópia de material, inspeção e zeladoria de instru­mental.

Art. 5º Os músicos da Rádio Nacional que nos termos da Lei número 2.193, de 9 de março de 1954, e da Lei nº 2.904, de 8 de ou­tubro de 1956, optaram pelo servi­ço público federal, serão aproveita­dos na O.S.N. desde que aprovados nas provas de seleção previstas na alínea c do artigo 3º.

5 1» Os músicos que fizeram a opção aludida e que não forem apro­veitados na O.S.N., integrarão ou­tros conjuntos musicais ou exerce­rão outras atividades no Serviço de Radiodifusão Educativa.

§ 2º Aos músicos de que tra­ta este artigo será assegurado, indi­vidualmente, o salário que perce­bem na Rádio Nacional, não se aplicando aos mesmos o disposto na parte final da alínea a do arti­go 3º.

Art. 6» As atividades da O.S.N., e, bem assim, dos demais conjuntos de que trata o parágrafo 1» do arti­go anterior, serão custeadas pelos recursos próprios do Serviço de Radiodifusão Educativa.

Art. 7º este decreto entrará em vigor na data de sua publica­ção, ficando revogadas as disposi­ções em contrário.

Brasília, 12 de janeiro de 1961 — 140º da Independência e 73º da República.

JUSCELINO KUBITSCHEK.

Clovis Salgado.

(Publ, no D. O. de 12-1-1961).

DECRETO Nº 50.066 — DE 25 DE JANEIRO DE 1961

Dispõe sobre a agregação de Es­tabelecimentos de Ensino Superior não federais a Universidades fe­derais.

O Presidente da República, usan­do da atribuição que lhe confere o art. 87, item I, da Constituição e tendo em vista o disposto no De­creto nº 19.851, de 11 de abril de 1931, decreta:

Art. 1º Os Estabelecimentos de Ensino Superior, quando legalmen­te autorizados a funcionar, poderão ser agregados a Universidades fede­rais, mediante convênio, desde que assim o requeiram as respectivas entidades mantenedoras e a agre­gação seja concedida na forma do Estatuto da Universidade.

Parágrafo único. O requerimen­to, devidamente instruído, será sub­metido ao Conselho Universitário que emitirá parecer conclusivo, com

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base em relatório minucioso, ela­borado por uma comissão de três professores, por êle designada.

Art. 29 A agregação terá por objetivo a orientação, a fiscalização e o aperfeiçoamento das atividades de ensino, pesquisa e extensão, não podendo a Universidade interferir na administração patrimonial e fi­nanceira da unidade agregada.

Art. 3» Se o Estabelecimento agregado não dispuser de quorum legal em sua Congregação, obrigar-se-á êle a promover os concursos para provimento das cátedras, den­tro do prazo de três anos, a partir da agregação, sob pena de cassação da regalia.

Parágrafo único. Em caso es­pecial, plenamente justificado, po­derá o Conselho Universitário am­pliar o prazo por mais três anos.

Art. 4' A admissão de professor interino, contratado ou substi­

tuto dependerá de prévia autoriza­ção 6o Conselho Universitário.

Art. 5º O Estabelecimento con­servará sua denominação, acrescida de sua condição de agregado à Uni­versidade.

Art. 6º O Diretor da Escola ou Faculdade agregada será designado pela entidade mantenedora e esco­lhido, dentre os professores catedrá­ticos em exercício, de lista tríplice organizada pela respectiva Congre­gação e homologada pelo Reitor da Universidade.

§ 1º A lista tríplice a que se refere este artigo deverá ser apre­sentada à Reitoria da Universidade até trinta dias antes do término do mandato.

§ 2'' Quando a lista apresenta­da não fôr homologada, o processo competente será, no prazo de cinco

dias, devolvido à Congregação de origem, com as razões que funda­mentarem a decisão, a fim de que a mesma organize e apresente nova lista, dentro de dez dias.

§ 3º O mandato do Diretor sè-rá de três anos, a contar da data da posse.

Art. 7º O Diretor da Escola ou Faculdade agregada apresentará anualmente ao Conselho Universi­tário, por intermédio do Reitor, re­latório circunstanciado das ativida­des desenvolvidas pela unidade no período considerado.

Parágrafo único. Além do re­latório a que se refere este artigo, o Diretor prestará ao Reitor e ao Conselho Universitário as informa­ções que lhe forem solicitadas.

Art. 8º Cada unidade agregada se ifará representar no Conselho Universitário pelo respectivo Dire­tor.

Parágrafo único. O represen­tante da unidade agregada no Con­selho Universitário não poderá:

a) votar ou ser votado na com­posição da lista tríplice para a es­colha do Reitor e no processo de eleição de Vice-Reitor;

b) participar do processo de destituição do Reitor;

c) deliberar em matéria de eco­nomia e finanças da Universidade ou de qualquer das unidades incor­poradas, e

d) participar de deliberação sobre o provimento de cátedras das unidades incorporadas.

Art. 9º As unidades agregadas prestarão contas ao Reitor de quais­quer auxílios porventura recebidos diretamente da Universidade e por intermédio do Reitor, ao Ministério

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da Educação e Cultura, de quais­quer auxílios ou subvenções recebi­das da União Federal.

Art. 10. A desagregação poderá ocorrer por iniciativa da Universi­dade ou da Escola ou Faculdade agregada observado o prescrito no artigo primeiro.

Art. 11. Os casos omissos nes­te decreto serão resolvidos pelo Con­selho Universitário, com recurso para o Ministro da Educação e Cultura .

Art. 12. Dentro do prazo de 60 <sessenta) dias, os Estabelecimentos já agregados às Universidades fede­rais deverão firmar termo de rati­ficação da agregação, passando, con­seqüentemente, a observar o regi­me decorrente deste decreto.

Art. 13. este decreto entrará em vigor na data da sua publicação, revogadas as disposições em contrá­rio.

Brasília, D.F. , em 25 de janeiro de 1961; 140º da Independência e 73º da República.

JUSCELINO KUBITSCHEK.

Clovis Salgado.

(Publ. no D. O. de 31-1-1961).

DECRETO N° 50.241 — DE 28 DE JANEIRO DE 1961

modifica o Dec. 1,6.376, de 7/7/59, que dispõe sobre educação de base no Nordeste pela radiodifusão, e dá outras providências.

O Presidente da República, usan­do da atribuição que lhe confere o artigo 87, inciso I, da Constituição e tendo em vista as sugestões da Secretaria Executiva para os traba­lhos decorrente dos "Encontros dos

Bispos do Nordeste", criada pelo Decreto número 46.386, de 7 de ju­lho de 1959, decreta:

Art. 1 º F i c a m alterados os ar­tigos 2º, 3° e parágrafo único do artigo 3º do Decreto nº 46.376, de 7 de julho de 1959, que passam a vi­gorar com a seguinte redação:

Art. 2º A Campanha Nacional de Educação Rural, do Ministério da Educação e Cultura, além da sua competência específica, coordenará as atividades de estudo e planejamen­to do Grupo de Trabalho na reali­zação deste projeto.

Art. 3º Cooperarão com a C. N. E.R., no empreendimento, o Siste­ma Rádio Educativo Nacional, o Serviço Social Rural, a Superinten­dência do Ensino Agrícola e Vete­rinário e outras entidades federais, estabelecendo-se, mediante entendi­mento mútuo, a missão ou tarefa de cada entidade no plano de conjunto a ser submetido ao Presidente da República, dentro de 90 (noventa) dias, a partir da data da publicação deste decreto.

Parágrafo único — A C.N.E.R. articular-se-á ainda com outras en­tidades públicas ou privadas, nos termos do plano que fôr estabele­cido.

Art. 4º O Plano a que alude o artigo anterior deverá especificar as providências cabíveis e os fins a atingir, estes referidos em termos numéricos, com a indicação dos pra­zos previstos para cada etapa do empreendimento.

Art. 5º Os órgãos coordenador e cooperadores mencionados nos ar­tigos 2º e 3º deverão incluir anual­mente, nas respectivas propostas or­çamentárias, as dotações específicas

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e necessárias ao atendimento das tarefas que lhes couberem na exe­cução do plano a que se refere o art. 3" deste decreto.

Art. 6» este decreto entrará em vigor na data de sua publicação, revogadas às disposições em con­trário.

Brasília, em 28 de janeiro de 1961, 140» da Independência e 73» da República.

JUSCELINO KUBITSCHEK.

Clovis Salgado.

(Publ. no D. O. de 30-1-1961).

DECRETO Nº 50.250 — DE 28 DE JANEIRO DE 1961

Autoriza o Departamento Nacional de Educação do M.E.C, a insta­lar, em Brasília, estação de radio­difusão com finalidades educa­tivas.

O Presidente da República, usan­do da atribuição que lhe confere o artigo 87, nº I, da Constituição, e tendo em vista o disposto no art. 5º, número XII, da mesma Constituição, decreta:

Art. 1º Fica o Departamento Nacional de Educação do Ministério da Educação e Cultura autorizado a instalar, em Brasília, uma esta­ção de radiodifusão para funcionar na freqüência de 640 kilociclos com a potência de 10.000/5.000 watts.

Art. 2º A estação radiodifusora referida no artigo anterior terá fina­lidades exclusivamente educativas e se denominará Rádio Educadora de Brasília.

Art. 3º Revogam-se as disposi­ções em contrário.

Brasília, em 28 de janeiro de 1961; 140' da Independência e 73º da República.

JUSCELINO KUBITSCHEK.

Clovis Salgado.

Ernani do Amaral Peixoto

(Publ. no D. O. de 30-1-1961),

DECRETO Nº 50.293 — DE 23 DE FEVEREIRO DE 1961

Cria o Conselho Nacional de Cultu-tura e dá outras providências.

O Presidente da República, usan­do da atribuição que lhe confere o art. 87, item I, da Constituição e

Considerando a necessidade da criação de um órgão de orientação da política cultural do Governo, de­creta:

Art. 1º Fica criado, subordina­do à Presidência da República, o Conselho Nacional de Cultura.

Art. 2º O Conselho Nacional de Cultura será integrado pelas seguin­tes Comissões que ora ficam cria­das:

Comissão Nacional de Litera­tura;

Comissão Nacional de Teatro;:

Comissão Nacional de Cinema;

Comissão Nacional de Música e Dança;

Comissão Nacional de Artes Plásticas.

Art. 3º São atribuições do Con­selho Nacional de Cultura:

a) estabelecer a política cultural do Governo, mediante plano geral a ser celebrado e programas anuais de aplicação;

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b) estudar e opinar 6Ôbre todos os assuntos de natureza cultural que lhe forem submetidos pela Presidên­cia da República;

c) sugerir à Presidência da Re­pública medidas de estímulo à ativi­dade cultural;

d) proceder ao balanço das ati­vidades culturais em todo o País, de caráter público ou privado, relacio­nando os órgãos e entidades que as exercem, para o fim de coordenar a ação do Governo frente a todas as instituições culturais existentes, visando o maior rendimento de sua ação;

e) propor ao Governo a rees­truturação, ampliação ou extinção de órgãos culturais da União, a sua articulação dentro do plano geral de estímulo à cultura e a criação de órgãos novos para atender as neces­sidades de desenvolvimento cultu­ral do País.

f) manter atualizado um regis­tro de todas as instituições culturais de caráter privado do País para o fim de opinar quanto as subvenções, auxílios ou quaisquer outras medi­das de iniciativa do Governo Fe­deral;

g) apresentar anualmente à Presidência da República um re­latório sobre as atividades culturais do país e sobre a ação desenvolvida pelo próprio Conselho;

h) apreciar, previamente, os programas de trabalho anualmente elaborados pelas Comissões criadas pelo art. 2º, bem como decidir sobre quaisquer outras sugestões dessas Comissões;

i) cooperar com os periódicos de difusão cultural do País, contri­buindo para assegurar a sua conti­nuidade;

j) editar uma revista destina­da à difusão das artes e da cultura e ao registro das atividades cultu­rais em todo o País;

k) estudar e desenvolver medi­das no sentido da popularização da cultura, inclusive através da manu­tenção de estação emissora de rádio e de televisão;

1) estimular a criação de Con­selhos Estaduais de Cultura e pro­por convênios com órgãos dessa na­tureza, para unidade e desenvolvi­mento da política cultural do País;

m) elaborar o Regulamento In­terno do Conselho e aprovar o das Comissões a êle subordinadas;

n) articular-se com todos os órgãos culturais da União, podendo requisitar deles o que necessitar para o cumprimento de suas atribui­ções.

Art. 4º As entidades culturais privadas do País, que o requeiram, poderão ser admitidas como insti­tuições complementares do Conse­lho e serão ouvidas, sem direito a voto, quando fôr recomendável essa colaboração ou quando seus esclare­cimentos e sugestões forem do interesse

do Conselho.

Art. 5o O Conselho Nacional de Cultura será integrado pelos Presi­dentes das Comissões a êle subor­dinadas, pelo seu Secretário Geral, por um representante do Ministério da Educação, do Ministério da Fa­zenda, do Ministério das Relações Exteriores, da Universidade do Brasil.

§ 1º O Presidente do Conselho será escolhido pelo Presidente da República entre os Presidentes das Comissões que o integram.

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§ 2º O mandato dos membros do Conselho será de dois anos, po­dendo ser prorrogado por igual tempo.

Art. 6º As Comissões são cons­tituídas de cinco membros, com mandato de dois anos, nomeados pelo Presidente da República, e se­rão integradas por representantes de entidades relativas a cada setor artístico ou por pessoas de reconhe­cido valor cultural.

§ 1º As Comissões elegerão, ca­da uma, um Presidente.

§ 2º A Comissão Nacional de Cinema será o Conselho Consultivo de GEICINE (Grupo Executivo da Indústria Cinematográfica), criado pelo Decreto nº 50.278, de 17 de fevereiro de 1961, podendo, conse­qüentemente, ser integrada por 9 (nove) membros.

Art. 7º O Presidente e os mem­bros do Conselho e das Comsisões perceberão "jeton" por sessão a que comparecer, a ser fixado por ato do Presidente da República.

§ 1º Os membros residentes fo­ra da sede do Conselho terão direito a ajuda de custo para despesas de viagem.

§ 2° O Presidente do Conselho, além do "jeton" de que trata o art. 7º perceberá uma gratificação de representação, a ser fixada pelo Pre­sidente da República.

Art. 8º O Conselho terá como sede a Capital da República e reu-nir-se-á, ordinariamente, duas vezes por mês e, extraordinariamente, sempre que fôr convocado pelo seu Presidente.

Art. 9º As Comissões poderão ser autorizadas pelo Conselho a reu­nir-se fora da Capital da República quando a conveniência de contato com os meios artísticos e culturais assim o recomendar.

Art. 10. O Conselho terá uma Secretaria Geral, diretamente subor­dinada à Presidência.

§ 1º O Secretário Geral será nomeado pelo Presidente da Repú­blica, percebendo vencimentos idên­ticos aos de Diretor de Departamen­to dos Ministérios.

§ 2º Compete ao Secretário Ge­ral executar as resoluções do Conse­lho.

§ 3º Os assuntos a serem apre­ciados pelo Conselho deverão ser previamente informados pelo Secre­tário Geral.

Art. 11. Compete às Comissões o estudo de assuntos que lhes forem submetidos pelo Conselho ou a ini­ciativa de medidas relacionadas com o setor artístico respectivo, a serem aprovadas pelo Conselho.

Art. 12. As Comissões estabele­cerão o seu programa de trabalho no qual será prevista sua forma de articulação com os órgãos culturais ou técnicos da União de natureza executiva, já existentes ou a serem criados.

Art. 13. O Conselho baixará o Regulamento da Secretaria Geral, estabelecendo o seu quadro de pes­soal a ser provido por servidores da União, dos Estados ou Municípios, postos à sua disposição.

Parágrafo único. O quadro de pessoal do Conselho será criado, pos­teriormente, por lei especial, após a verificação da exata necessidade dos serviços e das aptidões técnicas exi­gidas.

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Art. 14. O Conselho fará a pre­visão das despesas para sua instala­ção e funcionamento no presente exercício, a ser objeto de lei abrin­do o crédito especial respectivo.

Art. 15. Do orçamento de cada exercício, a partir de 1962, constará a dotação para atender as despesas com o novo órgão.

Art. 16. Será baixado pelo Pre­sidente da República, dentro de 60 (sessenta) dias, o Regulamento do presente decreto.

Art. 17. este decreto entrará em vigor na data de sua publicação, revogadas as disposições em con­trário.

Brasília, 23 de fevereiro de 1961; 140' da Independência e 73º da Re­pública.

JÂNIO QUADROS

Oscar Pedroso Horta

Afonso Arinos de Melo Franco

Clemente Mariani

Brígido Fernandes Tinoco

(Publ. no D. O. de 23-2-1961).

DECRETO Nº 50.423 — DE 8 DE ABRIL DE 1961

Dispõe sobre ensino primário gra­tuito para os servidores de empresas

industriais, comerciais e agrí­colas.

O Presidente da República, usan­do da atribuição que lhe confere o art. 87, nº I, da Constituição, de­creta:

Art. 1º As empresas industriais, comerciais e agrícolas em que tra­balhem mais de cem pessoas, obri­gadas, nos termos do art. 168, nº- III,

da Constituição, a manter ensino pri­mário gratuito para os seus servi­dores e os filhos destes deverão fazer prova do cumprimento da obrigação constitucional, a fim de que possam:

a) transacionar com os órgãos da administração federal, de autar­quias ou entidades de economia mis­ta em que a União seja portadora da maioria das ações;

b) participar de concorrência pública ou coleta de preços promo­vidas pelos mesmos órgãos e enti­dades; e

c) pleitear ou receber favores, benefícios ou quaisquer auxílios da União.

Art. 2º As empresas atenderão ao preceito constitucional mediante qualquer dos seguintes meios:

a) manutenção, em local aces­sível, de escola ou escolas de sua propriedade, nas quais sejam matri­culados os respectivos empregados ou os filhos destes que não possuam o curso primário;

b) custeio de escola ou escolas pertencentes ao Poder Público, me­diante convênio firmado entre am­bos; e

c) concessão de bôlsas-de-estu-do, em escolas particulares, a seus empregados e respectivos filhos.

Parágrafo único. Para o cum­primento do disposto nas alíneas a e b deste artigo poderão duas ou mais empresas articular-se entre si, me­diante convênio em que haja inter-veniência da Secretaria de Educação do Estado.

Art. 3' A prova a que se refere o artigo 1* será feita por meio de atestados fornecidos pela Secretaria de Educação do Estado onde a empresa

tiver sede.

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Art. 4º O Ministério da Educa­ção e Cultura, com a cooperação do Instituto Brasileiro de Geografia Es­tatística, organizará e manterá atua­lizado o cadastro de todas as empresas nas

condições previstas.

Art. 5º O Ministério da Educa­ção e Cultura, sempre que solicitado, dará assistência e orientação técnica às empresas, para o cumprimento da obrigação constitucional.

Art. 6o O Ministério da Educa­ção e Cultura, sempre que necessário e para os fins deste decreto, man­terá entendimento com os Minis­térios e órgãos locais de adminis­tração do ensino.

Art. 7º A prova a que se refere o artigo 1º se-rá exigida a partir de 60 (sessenta) dias da vigência deste decreto.

Art. 8º este decreto entrará em vigor na data da sua publicação, fi­cando revogadas as disposições em contrário.

Brasília, em 8 de abril de 1961; 140" da Independência e 73º da Re­pública.

JÂNIO QUADROS

Brigido Tinoco

Artur Bernardes Filho

(Publ. no D. O. de 8-4-1961).

DECRETO Nº 50.338 — DE 14 DE MARÇO DE 1961

Dispõe sobre anuidades escolares

O Presidente da República, usan­do das atribuições que lhe confere o artigo 87, item I, da Constituição, decreta:

Art. 1º As anuidades escolares a serem cobradas, no corrente ano, pelos estabelecimentos particulares de ensino secundário e comercial. não poderão ultrapassar de 30% (trinta por cento), nas cidades de mais de cem mil habitantes, e de 20% (vinte por cento), nos demais casos, sobre o valor das anuidades oficialmente aprovadas em 1960.

Art. 2º Será dada prioridade absoluta ao pagamento do auxilio-complementação ao das bôlsas-de-estudo, bem como ao da suplemen­tação dos salários dos professores.

Art. 3º Revogam-se as disposi­ções em contrário.

Brasília, em 14 de março de 1961; 140º da Independência e 73º da República.

JÂNIO QUADROS

Brigido Fernandes Tinoco

(Publ. no D. O. de 14-3-1961).

DECRETO Nº 50.362 — DE 20 DE MARÇO DE 1961

Altera disposição do Dec. nº 34.330, de 2l/10/953, que se refere ao regime de equivalência entre os di­versos cursos de grau médio.

O Presidente da República usan­do das atribuições que lhe confere o art. 87, item I, da Constituição e nos termos da Lei n» 1.821, de 12 de março de 1959, decreta;

Art. 1º As alíneas a, d e e do art. 5º do Decreto nº 34.330, de 21 de outubro de 1953, alterado pelos de números 34.907 e 36.681, datados, res­pectivamente, de 8 de janeiro e 29 de dezembro de 1954, passam a ter a seguinte redação:

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"a) aos cursos superiores de Ci­ências Econômicas, de Ciências Con­tábeis, de Ciências Atuariais, de Di­reito, de Geografia, de História, de Ciências Sociais, de Jornalismo, de Sociologia e Política, de Administra­ção de empresas, de Administração Pública e de Serviço Social, os can­didatos que houverem concluído cur­sos técnicos ou superiores de ensino comercial, com duração mínima de três anos;"

"b) aos cursos superiores de Direito, de Pedagogia, de Letras Neolatinas, de Letras Anglo-Germâ­nicas, de Letras Clássicas, de Geo­grafia, de História, de Ciências Sociais, de Música, de Sociologia e Política e de Serviço Social, os can­didatos que houverem concluído o 2º ciclo do curso normal de acordo com o Decreto-lei nº 8.530, de 2 de janeiro de 1946, ou de nível idêntico, pela legislação dos Estados e do Distrito Federal; e

e) aos cursos superiores de Di­reito, de Filosofia, de Letras Neo­latinas, de Letras Anglo-Germânicas, de Letras Clássicas, de Pedagogia e de Serviço Social, os candidatos que houverem concluído curso de semi­nário com a duração mínima de sete anos."

Art. 2º este decreto entrará em vigor na data de sua publicação, fi­cando revogadas as disposições em contrário.

Brasília, em 20 de março de 1961; 140º da Independência e 73º da República.

JÂNIO QUADROS

Brigido Tinoco

DECRETO N» 50.366 — DE 20 DE MARÇO DE 1961

Cria a Comissão de Filosofia e Ciên­cias no Conselho Nacional de Cul­tura.

O Presidente da República, usan­do da atribuição que lhe confere o artigo 87, item I, da Constituição e

Considerando que o Conselho Nacional de Cultura, órgão de orien­tação cultural do Governo, deve es­tender suas atribuições a todos os ramos do conhecimento filosófico, científico, literário e artístico, de­creta:

Art. 1» Além das Comissões que já o integram, fica ainda criada, no Conselho Nacional de Cultura, a Co­missão Nacional de Filosofia e Ciên­cias Sociais, que será constituída nas bases estabelecidas no art. 6' do Decreto n» 50.293, de 23 de fevereiro de 1961, e submetida às disposições do mesmo decreto.

Art. 2» este decreto entrará em vigor na data de sua publicação, re­vogadas as disposições em contrário.

Brasília, 20 de março de 1961, 140» da Independência e 73» da Re­pública.

JÂNIO QUADROS

Oscar Pedroso Horta

Afonso Arinos de Melo Franco

Clemente Mariani

Brigido Tinoco

( P u b l . no D. O. de 20-3-1961).

( P u b l nº D. O. de 20-3-1961).

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DECRETO N« 50.368 — DE 21 DE MARÇO DE 1961

Dispõe sobre o atendimento de edu­cação gratuita a filho menor de ex-combatente e aos órfãos caren­tes de recurso.

O Presidente da República, usan­do da atribuição que lhe confere o artigo 87, item X, da Constituição, decreta:

Art. 1º O benefício assegurado pela Lei n° 3.663, de 16 de novembro de 1959, será concedido a todo aluno matriculado em estabelecimento de ensino de grau médio e ao candidato habilitado em exame de admissão, que careçam de meios para prosse­guir nos cursos, por motivo de fale­cimento de pai ou responsável, ainda que tal falecimento tenha ocorrido anteriormente ao ingresso do aluno ou candidato no curso de grau mé­dio, aplicando-se-lhes as disposições vigentes para o estudante gratuito nos educandários oficiais.

Art. 2º Os recursos financeiros necessários ao custeio anual da edu­cação gratuita de filhos menores de ex-combatentes amparados pela legis­lação em vigor serão destacados pelo Ministro de Estado da Educação e Cultura no início de cada exercício, mediante estimativa da respectiva despesa.

Art. 3º Para cumprimento do disposto no presente decreto, o Mi­nistro de Estado da Educação e Cultura expedirá, no prazo de trinta dias, as instruções que julgar necea-eárias.

Art. 4º este decreto entrará em vigor na data de sua publicação, revogadas as disposições em contrá­rio.

Brasília, em 21 de março de 1961; 140» da Independência e 73' da República.

JÂNIO QUADROS

Brígido Tinoco

Clemente Mariani

(Publ. no D. O. de 21-3-1961).

DECRETO Nº 50.370 — DE 21 DE MARÇO DE 1961

Dispõe sobre um programa de edu­cação de base e adota medidas necessárias a sua execução atra­vés de Escolas Radiofônicas nas áreas subdesenvolvidas do Norte, do Nordeste e do Centro-Oeste do País a ser empreendida pela Con­ferência Nacional dos Bispos do Brasil.

O Presidente da República, usan­do das atribuições que lhe confere o artigo 87, inciso I, da Constituição e

Considerando a necessidade de fornecer às populações rurais ele­mentos gerais de educação;

Considerando a conveniência de levar a Educação de Base às popu­lações das áreas subdesenvolvidas;

Considerando a experiência ad­quirida e os resultados já apresenta­dos pelas Escolas Radiofônicas, de­creta :

Art. 1º O Governo Federal pres­tigiará o Movimento de Educação de Base (MEB) através de Escolas Radiofônicas a ser empreendido pela Conferência Nacional dos Bispos do Brasil nas áreas subdesenvolvidas do Norte, Nordeste e Centro-Oeste do País.

Art. 2º O MEB executará um plano qüinqüenal 1961-1965 durante o qual instalará 15.000 (quinze mil)

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Escolas Radiofônicas em 1961 e, nos anos subseqüentes, tomará providên­cias necessárias para que a expansão da rede escolar radiofônica seja sem­pre maior do que a do ano anterior.

Art. 3º Para ocorrer às despe­sas de 1961, o Governo Federal deter­minará aos órgãos que participam deste programa que destaquem de seus orçamentos verbas no montante de Cr$ 414.300.000,00 (quatrocentos e quatorze milhões e trezentos mil cru­zeiros) que serão postos, no Banco do Brasil S.A., à disposição do MEB mediante cotas bimestrais fornecidas por antecipação.

Art. 4º Para os exercícios sub­seqüentes 1962-1963-1964 e 1965 os ór­gãos cooperadores mencionados no artigo 8º deverão incluir nas respec­tivas propostas orçamentárias as do­tações específicas e necessárias ao atendimento do plano do MEB.

Art. 5º As prestações de contas anuais deverão ser feitas, pela enti­dade executadora, aos órgãos com­petentes.

Art. 6º O Conselho Diretor Na­cional do MEB poderá solicitar ao Presidente da República a requisi­ção de funcionários federais para serviços julgados indispensáveis aos objetivos do Movimento.

Art. 7º O MEB deverá estabe­lecer convênios com órgãos públicos federais mencionados no artigo 8º cuja colaboração seja considerada necessária para a execução de seus programas e planos de ação nas di­ferentes regiões em que se vai esta­belecer, os quais deverão ser subme­tidos à apreciação do Presidente da República.

Art. 8º Colaborarão com o MEB os seguintes setores da administra­ção pública federal, dentro das suas possibilidades técnico-administrativas de atendimento mediante convênios a serem firmados:

a) o Ministério da Educação e Cultura, especialmente pela Campa­nha Nacional de Educação Rural, pela Campanha Nacional de Educa­ção de Adultos, pela Campanha Na­cional de Merenda Escolar, pela Cam­panha de Erradicação do Analfabe­tismo e pelo Sistema Radioeducativo Nacional;

b) o Ministério da Agricultura especialmente pela Superintendência do Ensino Agrícola e Veterinário, pelo Departamento Nacional de Pro­dução Vegetal, Departamento Na­cional de Produção Animal, Serviço de Informação Agrícola, Serviço de Economia Rural, Instituto Nacional de Imigração e Colonização;

c) o Ministério da Saúde pelo Departamento Nacional de Endemias Rurais, especialmente seu Serviço de Educação Sanitária, pelo Serviço Na­cional de Educação Sanitária e pelo Departamento Nacional da Criança;

d) o Ministério da Aeronáutica pelos Serviços de Transportes da força Aérea Brasileira;

e) o Ministério da Viação e Obras Públicas pela Comissão Técni­ca de Rádio, Pelo Departamento Na­cional dos Correios e Telégrafos, pelo Departamento Nacional do Obras Contra as Secas e pelo De­partamento Nacional de Obras e Sa­neamento;

f) serão considerados órgãos cooperadores ainda, a Superinten­dência do Desenvolvimento do Nor­deste, o Serviço Social Rural, a Co­missão do Vale do São Francisco e

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a Superintendência da Valorização da Amazônia.

Art. 9' Dentro de 45 dias a par­tir da data deste decreto os órgãos cooperadores nele indicados devem estabelecer convênio com a Confe­rência Nacional dos Bispos do Brasil.

Art. 10. este decreto entrará em vigor na data de sua publicação.

Art. 11. Revogam-se as disposi­ções em contrário.

Brasília, em 21 de março de 1961; 140» da Independência e 73° da Re­pública.

JÂNIO QUADROS

Oscar Pedroso Horta Clemente Mariani Clovis Pestana Homero Cabral da Costa Brigido Tinoco Gabriel Grün Moss Catete Pinheiro

(Publ. no D. O. de 22-3-1361)

PORTARIA Nº 49, DE 8 DE FEVEREIRO DE 1961.

Institui comissão para elaborar ante­projeto reorganizando o Ministério da Educação e Cultura.

O Ministro de Estado da Edu­cação e Cultura, usando de suas atri­buições legais e

Considerando que a estrutura do Ministério da Educação e Cultura não mais corresponde às necessida­des da Educação nacional e às fun­ções que essa Secretaria de Estado é chamada a desempenhar na atual conjuntura do Pais;

Considerando que o Ministério da Educação e Cultura está, cada vêz mais, assumindo responsabilida­des de orientação técnica e de assis­

tência financeira à educação nacio­nal em detrimento das funções de fiscalização e controle do ensino;

Considerando ser oportuna a re­visão de sua estrutura tendo em vista:

a) a próxima aprovação do pro­jeto de Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional;

b) a necessidade de que seja o Ministério preparado para a mudan­ça para a nova capital da Repú­blica e

c) o início de novo período go­vernamental;

Considerando, por fim, a impe­riosa necessidade de completa revi­são de sua atual estrutura a fim de aumentar-lhe o rendimento, re­solve:

Art. 1º E instituída Comissão de 5 membros para realizar, no pra­zo de 15 dias, os estudos necessários e elaborar anteprojeto de lei de reor­ganização do Ministério da Educa­ção e Cultura.

Art. 2º Todos os órgãos do Mi­nistério da Educação e Cultura pres­tarão à Comissão de Reorganização as informações e a colaboração que esta solicitar.

Art. 3º São designados para in­tegrar a Comissão de que trata esta portaria, sob a presidência do pri­meiro, os seguintes membros:

Dr. Alberto Francisco Tôrres; Dr. Heli Menegale; Dr. Armando Hildebrand; Dr. Júlio Furquim Sambaqui: Dr. Lafayette Belfort Garcia;

Dr. José Nazaré Teixeira Dias.

Brigido Tinoco.

(Publ. no D. O de 25-2-1961).

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