literatura brasileira ii

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LITERATURA BRASILEIRA: DO ROMANTISMO AO MODERNISMO Maria Suely de Oliveira Lopes Silvana Maria Pantoja dos Santos UESPI 2010 Licenciatura Plena em Letras Espanhol Modalidade a Distância

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LITERATURA BRASILEIRA: DO ROMANTISMO AOMODERNISMO

Maria Suely de Oliveira LopesSilvana Maria Pantoja dos Santos

UESPI 2010

Licenciatura Plena em Letras EspanholModalidade a Distância

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Literatura Brasileira II

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UESPI/NEAD Letras Espanhol

UAB – UNIVERSIDADE ABERTA DO BRASILUESPI – UNIVERSIDADE ESTADUAL DO PIAUÍNEAD - NÚCLEO DE EDUCAÇÃO A DISTÂNCIALICENCIATURA PLENA EM LETRAS ESPANHOL

UESPI2010

LITERATURA BRASILEIRA: DO ROMANTISMO AOMODERNISMO

Maria Suely de Oliveira LopesSilvana Maria Pantoja dos Santos

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Literatura Brasileira II

Lopes, Maria Suely de Oliveira. Literatura Brasileira: do Romantismo aoModernismo. Maria Suely de Oliveira Lopes; Silvana MariaPantoja dos Santos. – Teresina:UAB/UESPI, 2010.155 p. (Licenciatura em Letras Espanhol)

1. Literatura Brasileira. 2. Romantismo na literatura.3. Realismo na literatura. 4. Naturalismo na literatura.5. Parnasianismo na literatura. 6. Simbolismo naliteratura. I. Santos, Silvana Maria Pantoja dos. II Título.

CDD: B869.09

L864l

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UESPI/NEAD Letras Espanhol

Presidente da RepúblicaLuiz Inácio Lula da Silva

Vice-presidente da RepúblicaJosé Alencar Gomes da Silva

Ministro da EducaçãoFernando Haddad

Secretário de Educação à DistânciaCarlos Eduardo Bielschowsky

Diretor de Educação à Distância CAPES/MECCelso José da Costa

Governador do PiauíWilson Nunes Martins

Secretária Estadual de Educação e Cultura do PiauíMaria Pereira da Silva Xavier

Reitor da UESPI – Universidade Estadual do PiauíProf. Carlos Alberto Pereira da Silva

Vice-reitor da UESPIProf. Nouga Cardoso Batista

Pró-reitor de Ensino de Graduação – PREGProf. Manoel Jesus Memória

Coordenadora da UAB-UESPIProf. Bárbara Olímpia Ramos de Melo

Coordenador Adjunto da UAB-UESPIProf. Raimundo Isídio de Sousa

Pró-reitor de Pesquisa e Pós-graduação – PROPProf. Isânio Vasconcelos de Mesquita

Pró-reitora de Extensão, Assuntos Estudantis e Comunitários – PREXProf. Francisca Lúcia de Lima

Pró-reitor de Administração e Recursos Humanos – PRADProf. Acelino Vieira de Oliveira

Pró-reitor de Planejamento e Finanças – PROPLANProf. Raimundo da Paz Sobrinho

Coordenadora do curso de Licenciatura Plena em Letras Espanhol – EADProfª. Margareth Torres de Alencar Costa

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Literatura Brasileira II

EdiçãoUAB - FNDE - CAPESUESPI/NEAD

Diretora do NEADProfª. Dra. Bárbara Olímpia Ramos de Melo

Coordenador AdjuntoProf. M.Sc. Raimundo Isídio de Sousa

Coordenadora do Curso de LicenciaturaPlena em Letras – EspanholProfª. M.Sc. Margareth Torres de Alencar Costa

Coordenador de T utoriaProf. Esp. Omar Mário Albornoz

Coordenação de Produção de MaterialDidáticoProf. Esp. Marivaldo de Oliveira Mendes

Autoras do LivroProfª. M.Sc. Maria Suely de Oliveira LopesProfª. M.Sc. Silvana Maria Pantoja dos Santos

RevisãoProfª. M.Sc. Leonildes Pessoa FacundesProf. M.Sc. Raimundo Isídio de SousaProfª. M.Sc. Teresinha de Jesus Ferreira

DiagramaçãoLuiz Paulo de Araújo Freitas

CapaLuiz Paulo de Araújo FreitasFonte da imagem: <http://inss.nireblog.com>

UAB/UESPI/NEAD

Campus Poeta Torquato Neto (Pirajá),NEAD, Rua João Cabral, 2231, bairroPirajá, Teresina (PI). CEP: 64002-150,

Telefones:(86) 3213-5471 / 3213-1182

http://ead.uespi.brE-mails:

[email protected] [email protected]

MATERIAL PARA FINS EDUCACIONAISDISTRIBUIÇÃO GRATUITA AOS CURSISTAS UAB/UESPI

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UESPI/NEAD Letras Espanhol

SUMÁRIO

Apresentação .................................................................................................... 9

UNIDADE 1 ROMANTISMO

1.1 A FICÇÃO ROMÂNTICA NO BRASIL: UMA INTRODUÇÃO ....................... 13

1.2 CARACTERÍSTICAS DA PROSA ROMÂNTICA ........................................ 18

1.3 OS ROMANCISTAS ROMÂNTICOS .......................................................... 29

1.3.1 Joaquim Manuel de Macedo ............................................................... 29

1.3.2 Vida e obra de José de Alencar:alma brasileira ................................. 36

1.3.3 Franklin Távora ..................................................................................... 54

1.3.4 Visconde de T aunay ............................................................................. 55

1.3.5 Martins Pena ........................................................................................ 56

1.3.6 O Romance de costumes: Manuel Antonio de Almeida ..................... 58

UNIDADE 2 REALISMO-NATURALISMO

2.1 CONTEXTO HISTÓRICO-CULTURAL DO REALISMO/NATURALISMO ..... 67

2.2 O ROMANCE REALISTA/NATURALISTA BRASILEIRO ............................. 71

2.2.1 Machado de Assis ................................................................................. 72

2.2.2 Aluízio Azevedo .................................................................................... 80

2.2.3 Raul Pompéia ........................................................................................ 86

UNIDADE 3 PARNASIANISMO E SIMBOLISMO NO BRASIL

3.1 PARNASIANISMO ..................................................................................... 93

3.2 SIMBOLISMO ............................................................................................ 96

UNIDADE 4 PRÉ-MODERNISMO

4.1 MODERNISMO NO BRASIL .................................................................... 106

4.2 CONTEXTUALIZAÇÃO HISTÓRICA ........................................................ 108

4.3 CARACTERÍSTICAS DA LITERATURA MODERNISTA............................ 109

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Literatura Brasileira II

4.4 A SEMANA DE ARTE MODERNA ........................................................... 115

4.5 A PRIMEIRA FASE MODERNISTA (1922 a 1930) .................................... 117

4.6 SEGUNDA FASE MODERNISTA NO BRASIL (1930-1945) - PROSA ...... 128

4.7 A SEGUNDA FASE MODERNISTA-POESIA (1930 a 1945) ..................... 133

4.8 TERCEIRA FASE MODERNISTA NO BRASIL (1945- +/- 1960) ............... 140

REFERÊNCIAS ............................................................................................. 149

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UESPI/NEAD Letras Espanhol

APRESENTAÇÃO

O presente livro integra o material de apoio pedagógico

desenvolvido pela Universidade Estadual do Piauí-UESPI,

correspondente à disciplina Literatura Brasileira II. Compõe a

estrutura curricular do Curso de Licenciatura Plena em Língua

Espanhola, na modalidade de educação a distância.

O material foi organizado com a proposta de contribuir com

os seus estudos e reflexões acerca da prosa, estendendo-se do

Romantismo às tendências contemporâneas. Vale ressaltar que

embora a ênfase seja maior na prosa, teve-se o cuidado de abordar

também as estéticas Parnasiana e Simbolista que se destacam na

poesia, a fim de não romper com linearidade da periodização literária.

Para melhor aplicação dos conteúdos programáticos e

eficácia nos estudos, o trabalho foi sistematizado a partir de

pressupostos teóricos formadores da história da literatura brasileira

que discutem os elementos que constituintes dos fatos literários.

Os conteúdos estão distribuídos em quatro unidades, a saber: a

primeira unidade denominada: O Romantismo, que aborda o

contexto histórico, as características gerais e a prosa romântica

brasileira e seus principais representantes; a segunda: O Realismo

e o Naturalismo, envolvendo o contexto histórico, as características

gerais, bem como a prosa realista-naturalista brasileira e os

respectivos representantes; a terceira: Parnasianismo e o

Simbolismo que trata da poesia são abordados de modo mais

geral, haja vista que os objetivos desta disciplina estão mais

voltadas para a prosa. Por fim, a disciplina traz, ainda, breves

referências ao Pré-modernismo, dando maior ênfase no

Modernismo com destaque ao contexto histórico, característica e

principais representantes de cada geração.

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Literatura Brasileira II

Visando colaborar com a metodologia de estudo, sugerem-

se alguns passos: observe os objetivos das unidades e faça as

atividades propostas no final de cada texto, isto ajudará você a

aprofundar o assunto; empenhe-se nos trabalhos de grupo tanto

quanto nas reflexões individuais; compartilhe ideias; consulte os

sites sugeridos; atente para as referências bibliográficas e, se

necessitar, recorra a elas para aprofundar seus conhecimentos.

Por fim, leia, reflita, analise criticamente cada ideia e/ou

teoria aqui apresentada. Suas dúvidas poderão ser colocadas junto

ao seu tutor. Aproveite! Bons estudos!

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UESPI/NEAD Letras Espanhol

UNIDADE 1

CONTEÚDOS:

• A Ficção romântica brasileira

• Contexto Histórico

• Características

• O Romantismo no Brasil

• Autores representativos

• Leitura interpretativa de textos

OBJETIVO:

√ Reconhecer a ficção romântica, destacando suas características

essenciais, seu contexto e seus principais representantes na prosa

brasileira.

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Literatura Brasileira II

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UESPI/NEAD Letras Espanhol

1.1 A FICÇÃO ROMÂNTICA NO BRASIL - UMA INTRODUÇÃO

O Romantismo

no que se refere à

poesia foi estudado no

livro anterior.

Para dar

continuidade ao estudo

desse movimento,

iremos fazer uma abordagem sobre a ficção com seus principais

representantes. Antes é necessário fazermos uma introdução sobre

o movimento em destaque. Foi observado que o Romantismo, de

acordo com Coutinho (2002), tendo inovado, completa e

sistematicamente, a poesia e o drama, substituindo por um ideal

novo superado dos clássicos, não se configurando assim a ficção,

principalmente desenvolvida na França, Inglaterra, e Alemanha onde

a existência de importante tradição levaria o romance romântico à

condição de mero prolongamento do romance dos séculos

precedentes e, em especial, das obras mais significativas dos pré-

românticos. A única exceção, como acentua Paul Van Tieghen, viria

a ser o romance histórico.

Entretanto, foi no romance que o Romantismo encontrou o

melhor veículo para a divulgação de suas idéias. O Romance, forma

definitiva moderna, surgiu como resposta a necessidades de

expressão, da parte do escritor, e como resposta a determinadas

aspirações, da parte do leitor. A partir dessas necessidades, o

Romantismo, proflifera-se. Os movimentos revolucionários dessa

época fizeram ruir a velha estrutura social, emergindo em

consequência elementos novos das camadas inferiores da

estratificação sócioeconômica.

www.infomenews.com. Acesso em 20.02.2010

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Literatura Brasileira II

O industrialismo, com o progresso da técnica, pôs em

vigor novas formas de trabalho, baseadas na especialização.

Uma nova atitude em face da vida, os valores novos, novos

anseios surgiram, ao mesmo tempo, para o homem atordoado

do início do século XIX. O frio equilíbrio racional das idéias, dos

sentimentos neoclássicos e uma linguagem estranha a esses

novos valores a se debaterem na maré revolta de anseios por

justiça e por aspirações reivindicatórias.

Todos esses acontecimentos nos permitem

compreender o que tem sido apontado como característica

fundamental do Romantismo, ou seja, a sua atitude de

permanente oposição, de luta contra o que até então vigorava

e, ao mesmo tempo, de protesto contra as novas formas de

existência. Ao ideal renascentista de uma cultura integral, o

liberalismo burguês respondia com o processo de

individualização derivado dos novos métodos de trabalho, o que,

em última análise, desligava o homem da sociedade. Daí o

sentimento de solidão que domina o Romantismo. Ao destruir

as bases da sociedade, o liberalismo burguês impedia a

estruturação da atmosfera necessária à arte de expressão

extensa. O Romantismo sempre permaneceu atento às lutas

políticas, não obstante sua tendência à embriaguez metafísica,

e fez dos ideais de liberdade, igualdade e fraternidade, sua

inspiração e seu motivo.

Surgia, dessa forma, uma nova temática para a literatura:

as camadas que os movimentos revolucionários haviam trazido

para a realidade social emergiriam, também, para as páginas

dos romances e para os versos do poema. Seriam nas primeiras

que elas encontrariam sua melhor expressão. O romance mais

do que a poesia e o teatro era o meio adequado à difusão das

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UESPI/NEAD Letras Espanhol

ideias românticas, pelo menos daquelas tendências mais profundas

e, por isso mesmo, universais.

O romance romântico europeu, conforme Coutinho (2002,

p. 233), apresenta uma série de características gerais que pouco

variam nas diversas literaturas nacionais, sendo mais importantes

aquelas já indicadas por Van Tieghen: a) o predominante papel

que exerce a personalidade do autor, e cujas origens residem na

nouvelle Héloíse, de Rousseau; b) a importância conferida à paixão,

que já agora não só proclama seu valor intrínseco, como reclama

seus direitos e sua liberdade em face de restrições ou preconceitos

de ordem moral e social; c) o amor ao exotismo, ao maravilhoso, à

aventura; d) a evocação do passado, de regra o nacional; e) o

sentimento da natureza e a pintura de paisagens nas quais se

desenvolve a ação, o que confere às emoções das personagens

ressonâncias mais profundas; g) certo realismo na adaptação e

fixação de aspectos do mundo objetivo, de detalhes da vida familiar;

h) ao lado da narrativa impessoal, a narrativa pessoal, em forma

de romance epistolar e autobiográfico, técnica que apresenta certas

vantagens para a

expressão direta das

grandes paixões; i)

quanto ao estilo,

geralmente este era

mais concreto e mais

colorido do que os dos

romancistas do século

XVIII e, com frequência,

apaixonado, impetuoso, brilhante e sonoro, declamatório para o

gosto atual, abundante no uso de hipérboles, exclamações e

imagens.

A maja desnuda, Goya, Museu doFonte: <www.historiadaarte.com.br>. Acesso

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O ROMANCE ROMÂNTICO

Destaque especial teve, no movimento romântico, a

narrativa romanesca. Foi por meio dos romances que a Europa

marcou seu reencontro com o mundo medieval em que repousavam

as raízes das modernas nações europeias. Ali floresceram os ideais

cavalheirescos que resgatavam, na origem heróica, a dignidade

da pátria e se expressaram nos romances históricos. Encontram-

se também as narrativas apoiadas no embate entre o bem e o mal,

com a vitória do primeiro.

No Brasil, o romance histórico se fez indianista na busca

das raízes da nacionalidade (não esqueçamos que a

independência, há pouco tempo alcançada, legou aos intelectuais

românticos o compromisso de construir a identidade nacional).

O primeiro romance bem-sucedido, na história da literatura

brasileira foi A moreninha , de Joaquim Manuel de Macedo,

publicado em 1844. Seu reconhecimento se deve ao fato de ter

sido a primeira narrativa centrada em personagens brasileiros, com

ambiência local. Vale lembrar que, na Europa e nas traduções

brasileiras as narrativas românticas eram editadas sob a forma de

capítulos, aumentando extraordinariamente a tiragem dos

periódicos. Os leitores se entusiasmavam pelo desenvolvimento das

histórias, eram seduzidos pela riqueza de acontecimentos

bombásticos, pelas emoções desenfreadas, pela linguagem acessível,

pela ausência de qualquer abstração, que suscitava expectativa e

ansiedade pelo penúltimo quando tudo se ajustava e se explicava.

Tais romances, na concepção de Gonzaga (2002, p. 64),

receberam o nome de folhetins. Ao escrever um folhetim, o artista

submetia-se às exigências do público burguês e dos diretores de

jornais. Sue, romancista francês, ressuscitou um personagem

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UESPI/NEAD Letras Espanhol

porque os leitores não se conformavam com sua morte, e isso

ameaçava a venda do periódico no qual a narrativa era publicada.

Além disso, os folhetins não podiam criticar os valores da época,

reivindicar o verdadeiro humanismo, pois obrigatoriamente tinha de

se sujeitar aos valores ideológicos do público, constituindo-se assim

numa arte de evasão e de alienação da realidade. Quase todo

romance romântico assume a estrutura de folhetim, que é a seguinte :

(HARMONIA) -> (DESARMONIA) -> (HARMONIA FINAL)

O sucesso do folhetim europeu possibilitou o surgimento

de vulgares adaptações, feitas por escritores de segunda categoria,

até que vão surgindo autores do nível de Joaquim Manuel de

Macedo. Surgia o romance brasileiro. E o nosso romance

começava sob a dimensão do Romantismo.

Os romances do período romântico foram construídos em

torno de quatro grandes núcleos:

· O romance histórico, voltado para as relações que

fizeram o Brasil colônia;

· O romance indianista , com a intenção de estabelecer

nossas raízes históricas, construiu-se em torno da idealização da

figura do índio, transformado em herói nacional;

· O romance urbano , com ênfase nas relações amorosas,

foram o espaço de revelação das preocupações burguesas, sua

noção de honra e o significado do dinheiro nas relações estabelecidas;

· O romance sertanista ou regionalista , voltado para o

mundo rural, veio configurou a abertura para uma das temáticas

mais significativas a desenvolver-se na literatura brasileira nos

movimentos literários que se seguiram ao Romantismo. Embora

encontrados em muitos dos escritores do período, os romances

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assim caracterizados foram preocupação especial de José de

Alencar, que se propôs, através de sua obra, representar o Brasil

em todas as suas facetas.

1.2 CARACTERÍSTICAS DA PROSA ROMÂNTICA

Grande é o número de características que marcaram o

movimento romântico, características essas que, centradas sempre

na valorização do eu e da liberdade, vão-se entrelaçando, umas

conjugadas às outras, umas desencadeando outras e formando

um amplo painel de traços reveladores. Para aqui discuti-las, vamos

seguir os aspectos considerados os mais significativos por Proença

Filho (1985) em sua análise dos Estilos de Época na Literatura.

Contraste entre os ideais divulgados e a limitação imposta

pela realidade vivida

O universo conhecido se alarga, o Século das Luzes deixa

um rastro de anseios libertários, desloca-se o centro do poder; a

Fonte: <www.portalartes.com.br>. Acesso em 21.02.2010

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dependência social e econômica, a inconsciência, o

desconhecimento estabelecem para a imensa maioria, no entanto,

uma existência marcada por limitações de toda ordem.

Imaginação criadora

Num movimento de escapismo, o artista romântico evade-

se para os universos criados em sua imaginação, ambientados no

passado ou idealizados no futuro idealizados, em terras distantes

envoltas na magia e no exotismo, nos ideais libertários alimentados

nas figuras dos heróis. A fantasia leva os românticos a criar em

tanto mundos de beleza que fascinam a sensibilidade, como

universos em que a emoção se realiza no belo associado ao

terrificante vejam-se, as figuras do Drácula, do Frankstein e a

ambiência que os rodeia.

Subjetivismo

Retrata o mundo pessoal, interior, os sentimentos do autor

que se ou são o espaço central da criação. Com plena liberdade

Fonte: <www.pipocabloq.pop.com.br>

Fonte: <Antigravidade.wordpress.com>

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de criar, o artista romântico não se acanha em expor suas emoções

pessoais, em fazer delas a temática sempre retomada em sua obra,

conforme trecho abaixo, extraído.

(...) O hálito ardente de Peri bafejou-lhe a face. Fez-se no

semblante da virgem um ninho de castros rubores e lânguidos

sorrisos: os lábios abriram como as asas purpúrea de um beijo

saltando vôo (GONZAGA, 2002, p. 72).

O artista romântico, com plena liberdade de criar, não se

nvergonha de expor suas emoções pessoais, em fazer delas a

temática sempre retomada em sua obra.

Evasão

O escapismo romântico manifesta-se tanto nos processos

de idealização da realidade circundante como na fuga para

mundos imaginários. Quando acompanhado de desesperança,

sucumbe ao chamado da morte, companheira desejada por muitos

e tema recorrente em grande número de poetas.

(...) Cecília abriu os olhos e, vendo seu amigo junto dela,

ouvindo ainda suas palavras, sentiu o enlevo que deve ser o gozo

da vida eterna (GONZAGA, 2002, p. 72).

No fragmento acima a evasão se manifesta por meio da

expressão gozo da vida eterna conduzindo a personagem Cecília

a sonhar mesmo estando de olhos abertos.

Senso de mistério

A valorização do mistério, do mágico e do maravilhoso

acompanha a criação romântica. É também esse senso de mistério

que leva grande número de autores românticos a buscar o

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UESPI/NEAD Letras Espanhol

sobrenatural e o terror. Vejamos o excerto abaixo, retirado da obra

Noite na Taverna, de Álvares de Azevedo.

(...) Uma noite, e após uma orgia, eu deixara dormida no

leito dela a condessa Bárbara. Dei um último olhar àquela forma

nua e adormecida com a febre nas faces e a lascívia nos lábios

úmidos, gemendo ainda nos sonhos como na agonia voluptuosa

do amor. Saí. Não sei se a noite era límpida ou negra; sei apenas

que a cabeça me escaldava de embriaguez. As taças tinham ficado

vazias na mesa: aos lábios daquela criatura eu bebera até a última

gota o vinho do deleite… (www.passeiweb.com.Acesso em

21.02.2010)

O senso de mistério é identificado neste trecho

principalmente através das expressões noite, orgia, lábios

úmidos, negra, embriaguez utilizadas pelo autor no sentido de

criar uma sensação quase sobrenatural.

Consciência da solidão

A consciência da solidão é consequência do exacerbado

subjetivismo, que dá ao autor romântico um sentimento de

inadequação e o leva a sentir-se deslocado no mundo real e, muitas

vezes, a buscar refúgio no próprio eu.

(...) Na fronte calma e lisa como mármore polido, a luz do

ocaso esbatia um róseo e suave reflexo; di-la-eis misteriosa

lâmpada de alabastro guardando no seio diáfano o fogo celeste

da inspiração. Tinha a face voltada para as janelas, e o olhar vago

pairava-lhe pelo espaço (MOISÉS, 1971, p.177).

O romântico abre espaço para a individualidade, definidas

por várias emoções e sentimentos. Podemos notar pelos termos

que denotam solidão, como por exemplo, o olhar vago.

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Literatura Brasileira II

Reformismo

Esta característica manifesta-se na participação de autores

românticos em movimentos contestadores e libertários, com grande

influência em sua produção, como foi a campanha abolicionista

abraçada por Castro Alves e o movimento republicano assumido

por Sílvio Romero. Observe o fragmento abaixo da obra A Escrava

Isaura, que aborda o tema da liberdade:

(...) - Deixe-se disso, senhora; eu não penso em amores e

muito menos em liberdade; às vezes fico triste à toa, sem motivo

nenhum...

- Não importa. Sou eu quem quero que sejas livre, e hás

de sê-lo. (MOISÉS, 1971, p.179).

A ânsia pela liberdade é uma das tônicas que acentuamos

neste item. O artista romântico idealiza a liberdade tanto no plano

sentimental quanto no plano social.

Sonho

O sonho revela-se na idealização do mundo, na busca por

verdades diferentes daquelas conhecidas, na revelação de anseios.

Leiamos o exemplo a seguir para focalizar essa característica.

(...) As notas sentidas e maviosas daquele cantar

escapando pela janela abertas e escoando ao longe em derredor,

dão vontade de conhecer a sereia, que tão lindamente canta. Se

não é sereia, somente um anjo pode cantar assim (MOISÉS, 1971,

p.177).

No sonho, o artista cria um mundo segundo os seus

sentimentos e interesses pessoais que podem ser atestados nas

expressões ao longe e em derredor.

Page 23: Literatura Brasileira II

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UESPI/NEAD Letras Espanhol

É a fé que conduz o movimento romântico crença na própria

verdade, crença na justiça procurada, crença nos sentimentos

revelados, crença nos ideais perseguidos, crença que se revela

ainda em diferentes manifestações de religiosidade cristã – fé. Não

podemos esquecer a profunda influência do medievalismo na

construção do mundo romântico, dele fazendo parte a religiosidade

cristã. A título de exemplo, vejamos o trecho abaixo:

(...) Bem sabes, quanto minha sogra antes de expirar te

recomendava a mim e ao meu marido.Hei de respeitar sempre as

recomendações daquela santa mulher, e tu bem vês, sou mais tua

amiga que tua senhora. (MOISÉS, 1971, p. 179)

Ilogismo

O ilogismo conduz o artista romântico para uma

instabilidade emocional traduzida em atitudes antiéticas ou

paradoxais: alegria e tristeza, entusiasmo e depressão.

(...) Não quero que cantes mais, ouvistes Isaura?...Se não,

fecho-te o meu piano.

- Mas senhora, apesar de tudo isso, que sou eu mais que

uma simples escrava? Essa educação que me deram, e essa

beleza, que tanto me gabam, de que me servem? (MOISÉS, 1971,

p. 179).

Aqui, neste trecho, a personagem Isaura tendo aprendido

a tocar piano é impedida, às vezes de tal atividade pela condição

de se sentir escrava. As idéias são de ordem contraditória.

Page 24: Literatura Brasileira II

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Literatura Brasileira II

Culto à natureza

A natureza adquire especial significado no mundo

romântico. Testemunha e companheira das almas sensíveis é,

também, refúgio, proteção, mãe acolhedora. Costumamos afirmar

que, para os românticos, a natureza foi também personagem, com

papel ativo na trama. Podemos perceber o culto à natureza através

do fragmento abaixo:

(...) Era por uma linda e calmosa tarde de outubro. O sol

não era posto, e parecia boiar no horizonte suspensos sobre rolos

de espumas de cores cambiantes orlados de efênvera de ouro.

(MOISÉS, 1971, p.178)

O fragmento acima aponta para os elementos da

natureza,como o sol, horizonte confirmando dessa forma o

envolvimento do artista ao cantá-la.

Retorno ao passado

Tal retorno deu origem a diversas manifestações: a)

saudosismo voltado para a infância, o passado individual; b)

medievalismo e indianismo, na busca pelas raízes históricas, as

origens que dignificam a pátria. Observemos o trecho retirado da

obra Inocência de Taunay.

(...) Ia com o coração cheio de apreensões e olhos se lhe

arrasavam de lágrimas, de cada vez que contemplava o

melancólico buriti (MOISÉS, 1997, p. 198)

O buriti é o termo poético que transpõem o artista para

um mundo distante, mas presente em seu seio.

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UESPI/NEAD Letras Espanhol

Gosto do pitoresco, do exótico

(...) Ainda a procura de novas situações conduz o romântico

às terras distantes, às florestas virgens, às paisagens orientais

ainda não exploradas.

Diante dela e todo a contemplá-la, está um guerreiro,

estranho, se é guerreiro e não algum mau espírito da floresta. Tem

nas faces o branco da areias que bordam o mar; nos olhos o azul

triste das águas profundas. Ignotas armas e tecidos ignotos cobrem-

lhe o corpo (GONZAGA, 2002, p. 72).

Exagero

É presente, recorrente o exagero nas emoções, nos

sentimentos, nas figuras do herói e do vilão, na visão maniqueísta

ao dividir o bem e o mal, exagero que se manifesta nas

características já listadas.

(...) Há anos raiou no céu fluminense uma nova estrela.

Desde o momento de sua ascensão ninguém lhe disparou

o cetro; foi proclamada a rainha dos salões.

Tornou-se a deusa dos bailes; a musa dos poetas e o ídolo

dos noivos em disponibilidade.

Duas opulências, que se realçam como a flor em vaso de

alabastro; dois esplendores que se refletem , como raio de sol no

prisma do diamante.

Quem não se recorda de Aurélia Camargo, que atravessou

o firmamento da Corte como brilhante meteoro, e apagou-se de

repente no meio do deslumbramento que produzia o seu fulgor?

(MOISÉS, 1997, p. 133)

Page 26: Literatura Brasileira II

26

Literatura Brasileira II

A característica acima é percebida quando o artista utiliza

expressões que remetem exagero. A título de exemplo, destacamos

o enunciado a seguir: raiou no céu fluminense uma nova estrela.

Liberdade criadora

Contra todas as regras dos clássicos, o romântico

proclama a independência pessoal para julgar o que era belo ou

verdadeiro, valoriza o gênio criador e renovador do artista. A regra

das regras é a inspiração.

(...) A graciosa ará, sua companheira e amiga, brinca junto

dela. Às vezes sobe aos ramos da árvore e de lá chama a virgem

pelo nome; outras remexem o uru de palha matizado, onde traz a

selvagem seus perfumes, os alvos fios do crautá, as agulhas da

juçara com que tece a renda, e as tintas de que matiza o algodão

(GONZAGA, 2002, p. 72).

No romantismo o autor tem liberdade para criar de acordo

com sua imaginação, ainda que tenha que infringir algumas regras

da norma culta.

Sentimentalismo

A poesia do eu, do amor e da paixão. O amor, mais que

qualquer outro sentimento, é o estado de fruição estética que se

manifesta em extremos de exaltação ou de cinismo e libertinagem,

mas sempre o amor.

(...) O favo da jati não era doce como seu sorriso; nem a

baunilha recendia no bosque como seu hálito perfumado

(GONZAGA, 2002, p. 72) .

Page 27: Literatura Brasileira II

27

UESPI/NEAD Letras Espanhol

O romântico é um eterno confessor de seus sentimentos.

Sabe combinar as palavras para expressar suas emoções.

Ânsia por glória

Outra característica marca o escritor romântico é seu

desejo manifesto de ser o centro da sociedade em que vive. O

artista quer ver-se reconhecido e admirado.

(...) - Mas, senhora, apesar de tudo isso, que sou

eu mais do que uma simples escrava? Essa educação, que me

deram e essa beleza, que tanto me gabam, de que me

servem?...São trastes de luxo colocados na senzala do africano. A

senzala nem por isso deixa de ser o que é: uma senzala (MOISÉS,

1997, p. 133).

As palavras de Isaura, a seguir, remetem á característica

citada anteriormente: Essa educação, que me deram e essa

beleza, que tanto me gabam, de que me servem?...

Importância da paisagem

A paisagem é tecida de acordo com as emoções dos

personagens e a temática das obras literárias.

(...) A cúpula da palmeira, embalançando-se

graciosamente, resvalou pela flor d’água como um ninho de garças

ou alguma ilha flutuante,formadas pelas vegetações aquáticas

(GONZAGA apud ALENCAR, 2002, p. 72).

No Romantismo, a natureza interage com o eu-lírico e

funciona quase como a expressão mais pura do estado de espírito

do poeta.

Page 28: Literatura Brasileira II

28

Literatura Brasileira II

Gosto pelo noturno

O gosto pelo noturno encontra-se em harmonia com a

atmosfera de mistério, tão próxima do gosto de todos os

românticos. Leiamos o trecho de Alexandre Herculano.

(...) Porque te havia eu de amar, ó sol, se tu és o inimigo

dos sonhos do imaginar; se tu nos chamas á realidade, e a realidade

é tão triste?

Pela escuridão da noite, nos lugares ermos e às horas

mortas do silêncio a fantasia do homem é mais ardente e robusta

(PROENÇA, 1985, p. 185).

Idealização da mulher

Anjo ou prostituta, a figura da mulher para o romântico é

sempre capaz de mudar a vida do próprio homem.

‘’ (...) Eu o escrevi logo depois do nosso casamento; pensei

que morresse naquela noite, disse Aurélia com gesto sublime.

Seixa contemplava-a com os olhos rasos de lágrimas.

- Esta riqueza causa-te horror? Pois faz-me viver, meu

Fernando. É o meio de a repelires. Se não for bastante, eu a

dissiparei’’ (ALENCAR, José. Senhora In:http://

www.lotecultural.com/26/12/2007/200.

Aurélia, com seu gesto de amor transforma a vida de

Fernando e consequentemente a sua também.

Função sacralizadora da arte

O poeta sente-se como guia da humanidade e vê na arte

uma função redentora.

Page 29: Literatura Brasileira II

29

UESPI/NEAD Letras Espanhol

Acrescentemos a essas características os novos

elementos estilísticos introduzidos na arte literária: a valorização

do romance em suas muitas variantes; a liberdade no uso do ritmo

e da métrica; a confusão dos gêneros, dando lugar à criação de

novas formas poéticas; a renovação do teatro.

Agora passaremos a identificar os principais romancistas

do romantismo com suas obras e a caracterização dentro da

proposta da literatura nacional.

1.3 OS ROMANCISTAS ROMÂNTICOS

1.3.1Joaquim Manuel de Macedo

Nasceu em Itaboraí, 1820,

e faleceu no Rio de Janeiro, 1882.

Formou-se em Medicina pela

Faculdade do Rio de Janeiro, mas

não chegou a exercer a profissão.

Autor do primeiro romance urbano

do Brasil, A Moreninha (1844) [ver

Antologia], que obteve um

estrondoso sucesso entre os

leitores da classe média, dedicou

parte de seu tempo escrevendo

outros romances que seguiam os

moldes do primeiro, além de peças de teatro e outros gêneros

literários, acabando por consolidar sua popularidade como escritor.

Também foi jornalista, deputado eleito várias vezes pelo Partido

Liberal. Exerceu também o magistério, sendo professor de História

do Brasil no Colégio D. Pedro II, além de preceptor dos netos do

http://www.cce.ufsc.br/~nupill/literatura/

macedo.html

Page 30: Literatura Brasileira II

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Literatura Brasileira II

imperador. Nos últimos anos de sua vida, veio a sofrer de alguns

problemas mentais, vindo a falecer na capital. Foi jornalista, político

militante e professor de História e Coreografia do Brasil no Colégio

Pedro II, foi Sócio-fundador, secretário e orador do Instituto Histórico

e Geográfico. Brasileiro, desde 1845. Deputado à Assembléia

Provincial do Rio de Janeiro e deputado geral (legislatura 1864-68

e 1878-81) como representante do partido liberal. Ligou-se por

laços de amizade à família Imperial, tanto que foi professor dos

filhos da Princesa Isabel.

Romancista, poeta, autor dramático, é fecunda a sua obra.

Abusou do derramamento sentimental do gosto popular, daí seu

enorme sucesso. É reputado bom cronista do Rio antigo, sendo

um dos patronos da Academia Brasileira de Letras.

Joaquim Manuel Macedo é um dos fundadores do romance

no Brasil e um dos criadores do teatro brasileiro. Descreveu com

senso de - observação à vida familiar e os usos e costumes da

sociedade carioca de seu tempo: as cenas triviais da rua os

preconceitos da sociedade, as festas, - os saraus familiares, as

conversas de comadre, as pequenas Intrigas, os ingênuos ciúmes,

os namoros piegas de estudantes os quais sempre acabavam em

feliz casamento.

Fonte: <http://www.portalsaofrancisco.com.br/alfa/romantismo/imagens/romantismo>

Page 31: Literatura Brasileira II

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UESPI/NEAD Letras Espanhol

Características Literárias da prosa de Joaquim Manuel de

Macedo

Autor do primeiro romance urbano do Romantismo

brasileiro, Joaquim Manuel de Macedo teve também o mérito de

popularizar esse novo gênero entre os leitores, principalmente da

classe média, além de contribuir para propagar de forma

considerável a circulação dos folhetins, verdadeiros veículos

literários do século XIX. Mais do que isso, a fidelidade com que o

romancista descreve os ambientes e costumes serve como um

verdadeiro documentário sobre a vida urbana na capital do Império.

No entanto, Macedo pecou, ao ter como único objetivo, escrever

seus romances para agradar a classe média brasileira, principal

consumidora dos folhetins. Suas publicações seguem sempre a

mesma fórmula empregada em A Moreninha, que o consagrou

como um dos escritores mais lidos do Romantismo. Suas narrações

e descrições, apesar de possuírem uma linguagem muitas vezes

bem elaborada, perdem em muito para o lirismo encontrado nas

obras de José de Alencar. Suas personagens são sempre

superficiais, com diálogos construídos numa linguagem simples.

Não possuem uma penetração psicológica. O enredo sempre gira

em torno dos mesmos temas: amores impossíveis, dúvidas e

segredos, namoricos, festas, brincadeiras estudantis, entre outros.

Tudo é recheado por um tom doméstico, convergindo todas as

tramas sempre para um final feliz.

O crítico Antonio Cândido diz que ele parece ceder a uma

irresistível tagarelice que pode podendo ser comprovada pela

quantidade de sua produção: em pouco mais de trinta anos de

carreira, escreveu dezoito romances, quinze peças de teatro, dois

livros de poemas e ainda sete volumes de variedades.

Page 32: Literatura Brasileira II

32

Literatura Brasileira II

Ainda que tenha sido dessa forma, ele forneceu as bases

para a criação do romance brasileiro. Podemos visualizar, nas suas

obras, certos traços singulares - presentes na vida social -, como é

o caso do patriarcalismo. Ideologia estreita e moralista, o

patriarcalismo abranda a passionalidade do romantismo europeu.

Embora o tema predileto de Macedo fosse o amor, as aventuras

sentimentais que imaginava nunca tiveram a violência e o

amoralismo dos folhetins estrangeiros. Macedo, em sua narrativa,

faz o possível, para não ferir os leitores com o trágico e o desmedido.

Nada de vulcões ou desobediências. Até os vilões adaptam-se às

conveniências. Só praticam a vilania quando o enredo exige. No

final, as donzelas casadoiras enfrentam problemas, como a falta

de dinheiro, ausência de identidade etc., mas que tudo se resolve

satisfatoriamente. A felicidade volta a reinar através do conveniente

casamento.

Vejamos um fragmento da obra A Moreninha, retirada do

capítulo XVI, intitulado O Sarau. Apresentado em Literatura através

dos textos para ser lido. Logo em seguida, faremos uma atividade.

Capítulo XVI

Neste momento a orquestra assinalou o começo do sarau. E

preciso antecipar que nos não vamos dar ao trabalho de descrever

este; é um sarau como todos os outros, basta dizer o seguinte:

Os velhos lembraram-se do passado, os moços aproveitaram o

presente, ninguém cuidou do futuro. Os solteiros fizeram por

lembrar-se do casamento, os casados trabalharam por esquecer-

se dele. Os homens jogaram, falaram em política e requestaram

as moças; as senhoras ouviram finezas, trataram de modas e

criticaram desapiedadamente umas às outras. As filhas deram

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UESPI/NEAD Letras Espanhol

carreirinhas ao som da música, as mães, já idosas, receberam

cumprimentos por amor daquelas e as avós, por não terem que

fazer nem que ouvir, levaram todo o tempo a endireitar as toucas e

a comer doces. Tudo esteve debaixo destas regras gerais; só basta

dar conta das seguintes particularidades:

D. Carolina sempre dançou a terceira contradança com Augusto,

mas, para isso, foi preciso que a sra. d. Ana empenhasse todo o

seu valimento; a tirana princesinha da festa esteve realmente

desapiedada. e não quis passear com o estudante.

A interessante d. Violante fez o diabo a quatro: tomou doze sorvetes,

comeu pão-de-ló como nenhuma, tocou em todos os doces, obrigou

alguns moços a tomá-la por par, e até dançou uma valsa corrupio.

Augusto apaixonou-se por seis senhoras com quem dançou; o

rapaz é incorrigível. E assim tudo mais.

Agora são quatro horas da manhã; o sarau está terminado, os

convidados vão retirando-se e nós, entrando no toilette, vamos ouvir

quatro belas conhecidas nossas, que conversam com ardor e fogo.

— É possível?!... exclamou d. Quinquina, dirigindo-se à sua mana;

pois é verdade que esse sr. Augusto lhe fez uma declaração de

amor?...

— Como quer que lhe diga, maninha!... Asseverou que meus olhos

pretos davam à sua alma mais luz do que aos seus olhos todos os

candelabros da sala nesta noite, e mesmo do que o sol nos dias

mais brilhantes... palavras dele.

— Que insolente!... tornou d. Quinquina, ele mesmo, que me jurou

ser a mais bela a seus olhos e a mais cara ao seu coração, porque

meus cabelos eram fios de ouro e a cor das minhas faces o rubor

de um belo amanhecer!... Palavras dele.

— Que atrevido!... bradou d. Clementina; o próprio que afirmou

ser-lhe impossível viver sem alentar-se com a esperança de possuir-

Page 34: Literatura Brasileira II

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Literatura Brasileira II

me, porque eu sabia ferir corações com minhas vistas e curar

profundas mágoas com meus sorrisos!... Palavras dele.

— Oh! Que moço abominável, disse, por sua vez, d. Gabriela; e

ousou dizer-me que me amava com tão subida paixão que, se fora

por mim amado e pudesse desejar e pedir algum extremo, não me

pediria como a outras, para beijar-me a face, porque das virgens

do céu somente se beijam os pés, e de joelho! Palavras dele.

— Mas isto é um insulto feito a todas nós!

— Como se estará ele rindo!

— Qual! Se ele está apaixonado... Apaixonado?... E por quem?...

— Por nós quatro... talvez por outras mais: ele pensa assim.

— Que maldito brasileiro com alma de mouro!...

— E havemos de ficar assim?...

— Não, acudiu d. Joaninha: vamos ter com ele, desmascaremo-lo.

— Isto é nada para quem não tem vergonha!...

— Pois troquemos os papéis: finjamos que estávamos tratadas

para desafiar-lhe os requebros, e... ridicularizemo-lo como for

possível.

— Sim... obriguemo-lo a dizer qual de nós é a mais bonita; cada

uma lhe pedirá um anel de seus cabelos... uma prenda... uma

lembrança... ponhamo-lo doido.

— Muito bem pensado! Vamos!

— Deus nos livre!... A vista de tanta gente!...

— Então, quando e aonde?

— Uma idéia... seja a zombaria completa: escreva-se uma carta

anônima, convidando-o para estar ao romper do dia na gruta.

— Bravo! Então escreva...

— Eu, não, escreva você...

— Deus me defenda! ... escreva d. Gabriela, que tem boa letra...

— Então, nenhuma escreve? Pois tiremos por sorte.

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A idéia foi recebida com aprovação e a sorte destinou para

secretária d. Clementina, que tirando de seu álbum um lápis uma

tira de papel, escreveu sem hesitar:

“Senhor: — Uma jovem que vos ama e que de vós escutou palavras

de ternura tem um segredo a confiar-vos: ao ralar da aurora a

encontrareis no banco de relva da gruta; sede circunspecto e vereis

a quem, por meia hora ainda, quer ser apenas — Uma incógnita”.

— Bem, disse d. Quinquina, eu me encarrego de fazer-lhe receber

a carta. Saiamos.

As quatro moças iam sair, quando um suspiro as suspendeu; mais

alguém estava no toilette. D. Joaninha, medrosa de que uma

testemunha tivesse presenciado a cena que se acabava de passar,

voltou-se para o fundo do gabinete e o susto logo se dissipou.

— Vejam como ela dorme! ... disse.

Com efeito, recostada em uma cadeira de braços, d. Carolina

estava profundamente adormecida.

A Moreninha se mostrava, na verdade, encantadora no mole

descuido de seu dormir, e à mercê de um doce resfolegar, os

desejos se agitavam entre seus seios; seu pezinho bem à mostra,

suas tranças dobradas no colo, seus lábios entreabertos e como

por costume amoldados àquele sorrir cheio de malícia e de encanto

que já lhe conhecemos e, finalmente, suas pálpebras cerradas e

coroadas por bastos e negros supercílios, a tornavam mais feiticeira

que nunca.

D. Clementina não pôde resistir a tantas graças: correu para ela...

dois rostos angélicos se aproximaram... quatro lábios cor-de-rosa

se tocaram e este toque fez acordar D. Carolina.Um beijo tinha

despertado um anjo, se é que o anjo realmente dormia.

Fonte: <http://pt.wikisource.org/wiki/A_Moreninha/XVI>.

Page 36: Literatura Brasileira II

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Literatura Brasileira II

Tendo lido e respondido as questões, passaremos a

apresentar a prosa de José de Alencar.

A Propósito do autor

1.3.2 Vida e Obra de José de Alencar – Alma brasileira

José de Alencar nasceu em Mecejana, no Ceará em 1829,

apenas sete anos depois da Independência do Brasil, em Mecejana,

ATIVIDADE

Agora que você já leu o fragmento sobre obra A moreninha,

discuta com os colegas e responda as seguintes perguntas:

1 - Identifique características da prosa românticas.

2 - Contextualize o período romântico sob a perspectiva histórica.

3 - Que tipo de narrativa essa obra apresenta?

http://www.portalsaofrancisco.com.br/alfa/jose-de-alencar

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no Ceará. Filho de um ex-padre, que se tornou presidente da

Província do Ceará e Senador do Império, o jovem Alencar é transferido,

com a família, aos nove anos de idade para a cidade do Rio de Janeiro.

Em 1844, aos quinze anos, matricula-se nos cursos preparatórios ao

ingresso na Faculdade de Direito de São Paulo.

Em São Paulo, Alencar cursa os primeiros anos da

Faculdade de Direito e começa a publicar seus primeiros textos

em algumas revistas estudantis. Transfere-se, em 1848, para a

Faculdade de Direito de Olinda, em Pernambuco. Em Olinda, na

velha biblioteca do Mosteiro de São Bento, encontra a literatura

dos antigos cronistas coloniais, Anos mais tarde, Alencar ainda se

recorda da emoção que foi a descoberta desses autores do século

XVI, que nos dão as primeiras impressões dos europeus ao

encontrarem a natureza e o índio do Brasil:

“Uma coisa vaga e indecisa, que devia parecer-secom o primeiro broto do Guarani ou de Iracema,flutuava-me na fantasia. Devorando as páginas dosalfarrábios de notícias coloniais, buscava comsofreguidão um tema para o meu romance; ou pelomenos um protagonista, uma cena e uma época.”(GONZAGA, 2001, p.68).

Voltando a São Paulo, após contrair tuberculose, forma-

se em Direito no final de 1850. No ano seguinte, retorna à capital

do país e lá começa a advogar. Não se esquece, porém, da

literatura. Em 1854, começa a escrever uma seção diária no Correio

Mercantil, intitulada Ao Correr da Pena, em que comenta os mais

variados assuntos da vida do Rio de Janeiro e do país. Esses textos

leves de temática cotidiana podem ser considerados os

precursores da crônica moderna, em que se haveriam de destacar,

no século seguinte, escritores, como Rubem Braga, Fernando

Sabino e Carlos Drummond de Andrade.

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Literatura Brasileira II

Em 1855, Alencar é um dos fundadores do jornal O Diário

do Rio de Janeiro, do qual é editor-chefe. É através desse jornal

que vai publicar os textos que, logo, o tornarão conhecido em todo

o país. No final de 1856, Alencar decide publicar um folhetim como

“brinde” aos leitores do jornal. Inicia, assim, sua carreira de

romancista. Publica o curto romance Cinco Minutos , que é

recebido por seus leitores com grande simpatia. Estimulado pelo

sucesso do primeiro, logo começa a publicar um segundo romance,

A Viuvinha , cuja publicação interrompe quando, por engano, um

companheiro seu publica o final da história na Revista de Domingo.

Inicia, a seguir, a publicação de O Guarani . Eis que surge, com

essa obra, a figura do índio como uma nova estrela colorida e

brilhante, como lembra Caetano Veloso na canção Um índio

quando diz que uma estrela que há de escrever, “numa velocidade

estonteante”, os capítulos do romance do qual descerá um índio

“mais avançado que a mais avançada das mais avançada as

tecnologias” - o apaixonado Peri.

Entre 1857 e 1870, além de publicar diversos romances,

como Lucíola (1862) e Iracema (1865), Alencar foi eleito várias

vezes deputado estadual no Ceará, Ministro da Justiça entre 1868

e 1870, e dedicou-se também ao teatro, escrevendo O Demônio

Familiar (1857), As Asas de um Anjo (1858) e A Mãe (1860),

entre outras peças.

Em 1870, abandona a política. Inicia, então, uma fase de

recolhimento: poucos amigos e nenhum sorriso. Sua produção

novelística é intensificada, agora norteada pelo projeto de descrição

do Brasil, anunciado no prefácio do livro Sonhos d’Ouro (1872).

Em 1875, publica Senhora , um de seus romances mais

complexos. Ao morrer, em 1877, Alencar era considerado o maior

escritor brasileiro de todos os tempos, principalmente por Machado

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UESPI/NEAD Letras Espanhol

de Assis, seu amigo e mais fiel admirador, e que logo o destronaria.

O próprio Alencar aponta que seus romances se encaixam em um

projeto de descrição global do Brasil. Divide-os em quatro tipos:

· Romance urbano, como Lucíola e Senhora ;

· Romance regionalista, como O Gaúcho e O Sertanejo ;

· Romance indianista, como Iracema e Ubirajara ;

· Romance histórico, como O Guarani e As Minas de

Prata .

A crítica posterior haveria de relativizar esta classificação.

Tanto Iracema quanto O Guarani são considerados, ao mesmo

tempo, romance histórico e indianista. http://pt.wikipedia.org/wiki/

Jos%C3%A9_deAlencar. Acesso em 22.02.2010.

Importância da obra de José de Alencar

A obra de Alencar, conforme Gonzaga (2002, p. 67), se

insere na linha nacionalista do romantismo, procurou construir uma

obra romanesca que abrangesse todo o Brasil, principalmente em

sua totalidade física e, por isso, escreveu O Gaúcho sem conhecer

o Rio Grande do Sul. Mas o seu projeto atingia também as

coordenadas históricas do país, através de relatos históricos e

indianistas, situados na era colonial. Buscou também a vida

cotidiana do Rio de Janeiro, em seus romances urbanos. Cogitou

fazer aqui o que Balzac fizera na França: um painel gigantesco dos

múltiplos aspectos da realidade nacional. Mas entre o seu projeto

e a realização do mesmo há no vácuo, do que resultam vários

equívocos.

Equívocos nascidos de suas ligações com os modelos

literários europeus que, juntamente com suas próprias ideias a

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Literatura Brasileira II

respeito da sociedade, acabaram por anular parte da eficácia e

da vitalidade das narrativas.

Ainda de acordo com Gonzaga (2002, p. 68), a estrutura

do folhetim, o nacionalismo ufanista, a visão ideal da existência já

não nos fascinam. E Alencar é a junção desses elementos,

insustentáveis diante da realidade em que vivemos.

Não obstante, o autor cearense continua tendo a

importância histórica extraordinária. Ele consolidou o romance

brasileiro ao escrever movido por um sentimento de missão

patriótica. Questionou os problemas de autonomia de nossa

literatura, procurando separá-la definitivamente das influências

portuguesas. Problematizou a questão da língua brasileira e,

durante toda sua carreira, quis descobrir a essência da

nacionalidade. Enfim, abriu caminhos para escritores que se

seguiriam.

Foi o primeiro ficcionista a perceber a vastidão e a

diversidade do país, intuiu algumas especificidades regionais e

se preocupou em realizar um painel, o mais abrangente possível,

da realidade brasileira. Seu esforço de totalização fracassou,

porém a ideia de um romance ou de um conjunto de romances

capazes de representar a nação e o povo ainda perturbou

escritores do século XX.

Romances urbanos

Romances ambientados no Rio de Janeiro, protagonizados

por personagens femininos, mostravam o luxo e a pompa das

atividades sociais burguesas; no entanto, apresentavam uma critica

sutil aos hábitos hipócritas da burguesia e ao seu caráter capitalista.

São exemplos de romances urbanos de José de Alencar:

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UESPI/NEAD Letras Espanhol

Senhora - faz crítica ao casamento por interesse, à

hipocrisia, à cobiça e à soberba burguesa;

Lucíola - critica o fato de a burguesia, que financia a

prostituição durante a noite, ter aversão a esta durante o dia.

Diva - ressalta a beleza das jovens e ricas burguesas, o

virtuosismo e a pureza e, em contrapartida, critica o casamento

por interesse financeiro.

Para exemplificar esse tipo de narrativa, utilizamos aqui

um fragmento retirado da obra Senhora de José de Alencar.

‘’ (...) Tinha ela dezoito anos quando apareceu pela primeira

vez na sociedade. Não a conheciam; e logo buscaram todos com

avidez informações acerca da novidade do dia.

Dizia-se muita coisa que não repetirei agora, pois a seu

tempo saberemos a verdade, sem os comentos malévolos de que

usam vesti-la os noveleiros.

Aurélia era órfã; tinha em sua companhia uma velha

parenta, viúva, D.Firmina Mascarenhas, que sempre acompanhava

na sociedade.

Mas essa parenta não passava de mãe de encomenda

para condescender com os escrúspulos da sociedade brasileira,

que naquele tempo não tinha admitido ainda certa emancipação

feminina’’ (ALENCAR, 1968, p. 23).

Romances Regionalistas

Os chamados romances regionalistas são também

construídos a partir daquele nacionalismo que constitui uma das

ideias-chaves do autor. Alencar vê as regiões de fora, mesmo

quando escreve O Sertanejo, cuja realidade desencadeia o cerne

de um mundo diferenciado do litoral. Pelo contrário, quer integrar

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Literatura Brasileira II

as regiões ao corpo de uma nação centralizada, sob o comando

das elites imperiais. Alencar torna-se porta-voz artístico da unificação

nacional, e o resultado é uma literatura mítica, celebratória dos

elementos regionais, porém insuficiente para descrever as

peculiaridades e o atraso das províncias periféricas do país.

Os romances que se enquadram nessa classificação são:

O Gaúcho, O Sertanejo e O Tronco do Ipê. Esses romances

aproximam-se da experiência dos leitores urbanos, ao mostrarem

a vida em fazendas cuja ligação orgânica com a capital federal era

mais nítida. Mesmo assim, o escritor não nos dá um quadro realista

da ambientação rural, sacrificando os costumes dos fazendeiros

ao convencionalismo de histórias folhetinescas. Observemos agora

um fragmento da obra O Gaúcho.

I

O PAMPA

Como são melancólicas e solenes, ao pino do sol, as vastas

campinas que cingem as margens do Uruguai e seus afluentes! A

savana se desfralda a perder de vista, ondulando pelas sangas e

coxilhas que figuram as flutuações das vagas nesse verde oceano.

Mais profunda parece aqui a solidão, e mais pavorosa, do que na

imensidade dos mares.

É o mesmo ermo, porém selado pela imobilidade, e como

que estupefato ante a majestade do firmamento.

Raro corta o espaço, cheio de luz, um pássaro erradio,

demandando a sombra, longe na restinga de mato que borda as

orlas de algum arroio. A trecho passa o poldro bravio, desgarrado

do magote; ei-lo que se vai retouçando alegremente babujar a

grama do próximo banhado.

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UESPI/NEAD Letras Espanhol

No seio das ondas o nauta sente-se isolado; é o átomo

envolto numa dobra do infinito. A âmbula imensa tem só duas faces

convexas, o mar e o céu. Mas em ambas a cena é vivaz e palpitante.

As ondas se agitam em constante flutuação; têm uma voz,

murmuram. No firmamento as nuvens cambiam a cada instante ao

sopro do vento; há nelas uma fisionomia, um gesto.

A tela oceânica, sempre majestosa e esplêndida,

ressumbra possante vitalidade. O mesmo pego insondável abismo,

exubera de força criadora; miríades de animais o povoam, que

surgem à flor d’água.

O pampa ao contrário é o pasmo, o torpor da natureza.

O viandante perdido na imensa planície fica mais que

isolado, fica opresso. Em torno dele faz-se o vácuo: súbita paralisia

invade o espaço, que pesa sobre o homem como lívida mortalha.

Lavor de jaspe, embutido na lâmina azul do céu, é a nuvem.

O chão semelha a vasta lápida musgosa de extenso pavimento.

Por toda a parte a imutabilidade. Nem um bafo para que essa

natureza palpite; nem um rumor que simule o balbuciar do deserto.

Pasmosa inanição da vida no seio de um alúvio de luz!

O pampa é a pátria do tufão. Aí, nas estepes nuas, impera

o rei dos ventos. Para a fúria dos elementos inventou o Criador as

rijezas cadavéricas da natureza. Diante da vaga impetuosa colocou

o rochedo; como leito de furacão estendeu pela terra as infindas

savanas da América e os ardentes areais da África.

Arroja-se o furacão pelas vastas planícies; espoja-se nelas

como o potro indômito; convole a terra e o céu em espesso

turbilhão. Afinal a natureza entra em repouso; serena a tempestade;

queda-se o deserto, como dantes plácido e inalterável.

Fonte: <http://www.sacocheio.com/livros-gratis/jose-de-alencar-o-

gaucho.pdf.>

Page 44: Literatura Brasileira II

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Literatura Brasileira II

Os Romances Históricos e Indianistas

O romance histórico se inicia com a temática limitada do

indianismo, na concepção de Coutinho (2002), e evolui no sentido

de ampliar o seu mundo no tempo e no espaço. Ao criticar A

confederação dos tamoios, de Magalhães, Alencar já acreditava

que a vida primitiva dos nossos indígenas fosse excelente material

para o romance histórico brasileiro. Dir-se-á que tal como criou

Goethe o Romantismo europeu, o romance histórico pretendia fixar

caracteres e sentimentos verossímeis num ambiente histórico

exato, ou tido como exato pelo autor e pelo leitor. E continua a afirmar

“que se atentarmos paro o sucesso de Scot, sobretudo em

Waverley Novels, veremos que o que aí se encontra é uma intriga

ATIVIDADE

1 - Faça a leitura do fragmento retirado de O Gaúcho e aproveite

para caracterizar a prosa regionalista de José de Alencar.

2 - Qual é a proposta da prosa regionalista de José de Alencar.

Fonte: <http://pt.wikipedia.org/wiki/Iracema>

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sentimental situada em quadro histórico e local bem estudado,

dando lugar à descrição de costumes, às cenas de um pitoresco

realista e frequentemente familiar, reconstituição de paisagens

exatas, à evocação de figuras lendárias ou históricas com maior

precisão psicológica possível, todos esses elementos combinados

por mão de mestre e de modo a alcançar o objetivo precípuo do

romance histórico, que é o de afirmar e exaltar o processo nacional.

Enquanto isso, o indianismo de Alencar pouco ou nada teria de

historicamente exato, a não ser o local, os fatos, as personagens

de modo geral, e os índios, de modo particular, sendo mais fantasia

de sua imaginação do que tentativa de autêntico levantamento de

nossas raízes mais profundas.

Ainda que esses comentários fossem uma certeza, e não

é o caso, o romance indianista de Alencar não deixaria de ser,

como é, legítimo romance histórico brasileiro. É possível que a vida

dos selvagens esteja demasiadamente poetizada, que os costumes

indígenas tenham sido algo deturpados pela fértil imaginação do

romancista e que as personagens históricas não confiram muito

com os comprovantes reais, acaso existam. Mas isso nada altera

o sentido e a significação do romance alencariano e coloca em

destaque a intuição do autor. Isso se explica porque a tendência

universal do romantismo visa rebuscar o passado nacional por

meios dos escombros medievais, o que de melhor aí ficara da alma

e da tradição de cada nação. Encontraria no Brasil a melhor

receptividade, pois um dos nossos problemas era o de afirmar

diante de a Portugal o espírito nacional, brasileiro, graças ao qual

queríamos ser independentes, não só do ponto político, mas também

do ponto de vista cultural. A nossa idade média, o mais recôndito e

autêntico do nosso passado teria de ser, pelo poeticamente, a

civilização primitiva, pré-cabralina. Seria, através da valorização

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Literatura Brasileira II

poética das raças primitivas no cenário grandioso da natureza

americana, é que nós alcançaríamos, conforme Coutinho (2002),

aquele nível mínimo de orgulho nacional de que carecíamos para

uma classificação em face do europeu. Era o europeu quem

afirmava que essas raças representavam a decadência dos

primitivos troncos, que eram preguiçosos e pouco inteligentes,

sendo raros os cronistas que se manifestavam em sentido contrário.

E havia sido o europeu, o descobridor e o invasor, quem

massacrava grande parte dessas raças, suas lendas e tradições

não podendo sobreviver nem mesmo, por meio dos catecúmenos,

pelos repetidos exorcismos que estes sofriam até a completa

descaracterização.

Outro argumento que percebemos é que, por outro lado, o

negro, no caso, não se prestava ao papel de valorizador da

nacionalidade; não só porque representava o trabalho, numa

sociedade em que o trabalho era motivo de desclassificação social,

mas porque não era filho da terra, para aqui tinha vindo escravizado

e aviltado. O índio, ao contrário do negro, era a escravidão e a

invasão, não era escravo nem representava o trabalho; era

americano e queria ser livre. Tudo isso era o que convinha, sob

medida, ao idealismo romântico. Era o que convinha a Alencar,

que criou o romance indianista, tendo estudado os velhos cronistas,

ver a vida dos nossos selvagens só iria aproveitar o que se fosse

favorável ao índio ou conviesse aos seus propósitos de romancista

e de não historiador e de romancista romântico,que elevou o

indianismo a uma posição consequente e significativa,

anteriormente ainda não alcançada.

Dessa forma, Alencar criou, com base mais lendária do que

histórica, o mundo poético e heróico de nossas origens, para afirmar

a nossa nacionalidade, para provar a existência de nossas raízes

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UESPI/NEAD Letras Espanhol

legitimamente americanas. E, nascia, assim, a nova tendência

revolucionária do romantismo, já identificada como de tons

cepusculares, cândidos e pastorais, qual a de projetar um mundo

de sentimentos e virtudes ideais.

Por todos esses argumentos, é certo incluir sua obra

indianista nos limites do romance histórico. E não apenas O

guarani, por ele próprio assim, também Iracema e Ubirajara, que

dele não mereceram senão a rotulação de lendas. Pertencem todos

eles, ao domínio do romance histórico, não da forma como

realizaram os europeus, mas como o idealizou e praticou o nosso

Romantismo.

O conceito alencariano emprestou a vários romances um

caráter mítico e poético, que procurou, que encontrou perfeito

ajustamento com a estética de Chateaubriand por ele assimilada,

resultando disso o tipo de romance poemático. Afirma Coutinho

(2002, p. 260) que muitas das criações desses romances

participam da natureza do mito e do símbolo, nos quais pretendeu

integrar aspirações e ideais da alma brasileira. Em alguns desses,

se é falha por vezes a realização técnica, avultam justamente o

valor do símbolo e o conceito poético. Tanto As minas de prata,

como Iracema, como O guarani encerram mitos de significação

nacional. No primeiro, o mito do tesouro escondido, que arrastou

para os sertões brasileiros a onda de aventureiros e bandeirantes

a que se deve o seu povoamento. Nos outros dois, o mito do bom

selvagem, da pureza do americano, em contraste com a rude e

ambição desenfreada sem escrúpulos do branco europeu. São o

próprio conceito de indianismo e sua visão de índio que têm para

ele o valor mítico.

Além dos romances citados anteriormente, pertencem ao

grupo dos romances históricos: O garatuja, O ermitão da glória e

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Literatura Brasileira II

A guerra dos mascastes. Veja o excerto do romance Indianista O

guarani de Alencar.

I I

O Guarani

‘’ (...) A habitação que descrevemos, pertencia a D. Antônio

de Mariz, fidalgo português de cota d’armas e um dos fundadores

da cidade do Rio de Janeiro.

Era dos cavalheiros que mais se haviam distinguido nas

guerras da conquista, contra a invasão dos franceses e os ataques

dos selvagens.

Em 1567 acompanhou Mem de Sá ao Rio de Janeiro, e

depois da vitória alcançada pelos portugueses, auxiliou o

governador nos trabalhos da fundação da cidade e consolidação

do domínio de Portugal nessa capitania.

Fez parte em 1578 da célebre expedição do Dr. Antônio

de Salema contra os franceses, que haviam estabelecido uma

feitoria em Cabo Frio para fazerem o contrabando de pau-brasil.

Serviu por este mesmo tempo de provedor da real

fazenda, e depois da alfândega do Rio de Janeiro; mostrou

sempre nesses empregos o seu zelo pela república e a sua

dedicação ao rei.

Homem de valor, experimentado na guerra, ativo, afeito a

combater os índios, prestou grandes serviços nas descobertas e

explorações do interior de Minas e Espírito Santo. Em recompensa

do seu merecimento, o governador Mem de Sá lhe havia dado uma

sesmaria de uma légua com fundo sobre o sertão, a qual depois

de haver explorado, deixou por muito tempo devoluta.

A derrota de Alcácer-Quibir, e o domínio espanhol que se

lhe seguiu, vieram modificar a vida de D. Antônio de Mariz.

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Português de antiga têmpera, fidalgo leal, entendia que

estava preso ao rei de Portugal pelo juramento da nobreza, e que

só a ele devia preito e menagem. Quando pois, em 1582, foi

aclamado no Brasil D. Felipe 11 como o sucessor da monarquia

portuguesa, o velho fidalgo embainhou a espada e retirou-se do

serviço.

Por algum tempo esperou a projetada expedição de D.

Pedro da Cunha, que pretendeu transportarão Brasil a coroa

portuguesa, colocada então sobre a cabeça do seu legitimo

herdeiro, D. Antônio, prior do Crato.

Depois, vendo que esta expedição não se realizava, e que

seu braço e sua coragem de nada valiam ao rei de Portugal, jurou

que ao menos lhe guardaria fidelidade até a morte. Tomou os seus

penates, o seu brasão, as suas armas, a sua família, e foi

estabelecer-se naquela sesmaria que lhe concedera Mem de Sá.

Aí, de pé sobre a eminência em que ia assentar o seu novo

solar, D. Antônio de Mariz, erguendo o vulto direito, e lançando um

olhar sobranceiro pelos vastos horizontes que abriam em torno,

exclamou:

- Aqui sou português! Aqui pode respirar à vontade um

coração leal, que nunca desmentiu a fé do juramento. Nesta terra

que me foi dada pelo meu rei, e conquistada pelo meu braço, nesta

terra livre, tu reinarás, Portugal, como viverás n’alma de teus filhos.

Eu o juro!

Descobrindo-se, curvou o joelho em terra, e estendeu a

mão direita sobre o abismo, cujos ecos adormecidos repetiram

ao longe a última frase do juramento prestado sobre o altar da

natureza, em face do sol que transmontava.

Isto se passara em abril de 1593; no dia seguinte,

começaram os trabalhos da edificação de uma pequena habitação

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Literatura Brasileira II

que serviu de residência provisória, até que os artesãos vindos do

reino construíram decoraram a casa que já conhecemos.

D. Antônio tinha ajuntado fortuna durante os primeiros anos

de sua vida aventureira; e não só por capricho de fidalguia, mas

em atenção à sua família, procurava dar a essa habitação

construída no meio de um sertão, todo o luxo e comodidades

possíveis.

Além das expedições que fazia periodicamente à cidade

do Rio de Janeiro, para comprar fazendas e gêneros de Portugal,

que trocava pelos produtos da terra, mandara vir do reino alguns

oficiais mecânicos e hortelãos, que aproveitavam os recursos dessa

natureza tão rica, para proverem os seus habitantes de todo o

necessário.

Assim, a casa era um verdadeiro solar de fidalgo português,

menos as ameias e a barbacã, as quais haviam sido substituídas

por essa muralha de rochedos inacessíveis, que ofereciam uma

defesa natural e uma resistência inexpugnável.

Na posição em que se achava isto era necessário por

causa das tribos selvagens, que, embora se retirassem sempre

das vizinhanças dos lugares habitados pelos colonos, e se

entranhassem pelas florestas, costumavam, contudo fazer correrias

e atacar os brancos à traição.

Em um circulo de uma légua da casa, não havia senão

algumas cabanas em que moravam aventureiros S pobres,

desejosos de fazer fortuna rápida, e que se tinham animado a se

estabelecer neste lugar, em parcerias de dez e vinte, para mais

facilmente praticarem o contrabando do ouro e pedras preciosas,

que iam vender na costa.

Estes, apesar das precauções que tomavam contra os

ataques dos índios, fazendo paliçadas e reunindo-se uns aos outros

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para defesa comum, em ocasião de perigo vinham sempre abrigar-

se na casa de D. Antônio de Mariz, a qual fazia as vezes de um

castelo feudal na idade Média .

Fonte: <http://www.fuvest.br/download/livros/guarani.pdf.>

De posse das informações sobre os romances históricos

e indianistas, faremos uma pausa para refletir sobre algumas

indagações sobre a obra em estudo.

ATIVIDADE

1 - Leia o trecho, retirado de O guarani, em seguida discuta

com seus colegas sobre as características dentro de uma

perspectiva histórica e indianista.

2 - Qual é a contribuição dessa obra para a formação da

Literatura Brasileira?

3 - Acesse o site www.youtube.com.br para assistir ao filme

O guarani e, em seguida, faça uma discussão com seus

colegas destacando as passagens interessantes.

ATIVIDADE - O guarani

Em que se fundamenta o Projeto Nacionalista de José de

Alencar?

Quais os autores que influenciaram a estrutura romântica?

Por que o Romantismo tende ao estilo poético? Justifique sua

resposta.

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Literatura Brasileira II

Vamos fazer, a partir de agora, uma abordagem sobre a

prosa sertanista apresentando seus principais autores.

Os sertanistas românticos

O romance regionalista de Alencar, de acordo com o

pensamento de Gonzaga (2002), abriu uma viés para o surgimento

de escritores menores, todos eles sertanistas, ou seja, preocupados

em revelar o Brasil não-litorâneo, não europeu, o Brasil rural. O

ponto de partida dessa literatura é o ufanismo e, nesse sentido, as

manifestações sertanistas dificilmente adquirem maior

autenticidade poética e documental. Há uma intenção realista

inclusive, mas é um realismo que se detém em descrição da natureza,

acento linguístico particular da região, os costumes. Todavia, essa débil

busca de realismo é prejudicada na construção dos personagens, que

bedecem aos esquemas românticos do folhetim.

Bernardo Guimarães

Nasceu em Ouro Preto, onde passou a infância e os

primórdios da adolescência, indo depois para São Paulo estudar

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Direito. Foi colega de Álvares de Azevedo e, na faculdade, tinha

fama de boêmio e satírico, tendo inclusive praticado uma poesia

(Cantos Da solidão) identificada com o satanismo byroniano e

com o humorismo. Retirou-se para o interior de Minas, exercendo

a função de juiz e professor secundário, e de lá não mais se afastaria

até a morte.

Obras principais: - O ermitão de muquém (1864)

- O garimpeiro (1872)

- O seminarista (1872)

- A escrava Isaura (1875)

Nenhum autor expressou, na visão de Gonzaga (2002, p.

73-74), tão bem a tendência sertanista como Bernardo Guimarães.

Suas obras oscilam entre este modesto realismo e o melodrama

pouco convincente, exceção feita a O seminarista.

Em O seminarista, vemos narrado o drama de Eugênio e

Margarida, que, na infância, passada no sertão mineiro,

estabelecem uma amizade que logo se transforma em paixão. O

pai de Eugênio o obriga a ir para um seminário, e ele vai, oscilante

entre o amor e a religiosidade. Mesmo sofrendo pela perda,

Eugênio ordena-se sacerdote. O destino é a favor que ele volte a

sua à aldeia natal e encontre Margarida à beira da morte. Os dois

não resistem e mantêm relações, mas a jovem morre e o padre

enlouquece de dor sentimental e moral: o desaparecimento da

amada e a quebra do voto de castidade. A obra revela uma forte

crítica ao patriarcalismo.

Em a Escrava Isaura, a ideologia abolicionista teve de

pretexto para o desenvolvimento de um melodrama passional,

envolvendo a escrava Isaura e qual nossa surpresa ao verificar que

Isaura é moça branca”e para nossa surpresa Isaura é uma moça

branca, que vive presa numa fazenda de café a Baixada

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Fluminense. O fazendeiro pérfido, Leôncio, tem as piores intenções

com a moça, e o herói, Álvaro, salva Isaura das garras do vilão.

1.3.3 Franklin Távora

Nasceu no interior do Ceará. Formou-se em Direito, em

Pernambuco, mudando-se depois para o Rio de Janeiro, onde

ingressou na vida burocrática.

Obras Principais: - O cabeleira (1876)

- O matuto (1878)

- Lourenço (1881)

Em Franklin Távora, o regionalismo mais do que assunto

é polêmica:

As letras têm, como a política, um certo caráter

geográfico; mais no Norte porém, do que no Sul, abundam os

elementos para a formação de uma literatura propriamente

brasileira, filha da terra. A razão é óbvia: o Norte ainda não foi

invadido como está sendo o Sul de dia em dia pelo estrangeiro

(GONZAGA, 2002, p. 74).

E arrematava no prefácio de O Cabeleira: “Temos o dever

de levantar ainda com luta e esforço os nobres foros dessa região,

exumar seus tipos legendários, fazer conhecidos seus costumes,

suas lendas, sua poesia máscula, nova, vívida e louçã...’’

(GONZAGA, 2002, p. 74).

Os projetos de Távora não no entanto se realizaram,( no

entanto). Suas intenções naturalistas satisfazem a reconstituição

do ambiente e a escolha do tema: um caso de cangaço no século

XVIII. Mas nem o motivo nem a distância histórica garantem realismo

à narrativa, perturbada pela contradição permanente dos

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sertanistas românticos: observações realistas dentro de um

arcabouço de folhetim.

1.3.4 Visconde de T aunay

Nasceu no Rio de Janeiro e cursou a Escola Militar.

Participou da Guerra do Paraguai. Dedicou-se à política, chegou a

ser senador.Com a queda da monarquia, afastou-se do senado.

Obras Princip ais : - A retirada da laguna (1871)

- Inocência (1872)

A obra Inocência talvez seja a menos enfática entre as

obras do romantismo regionalistas. A cor local surge com os desvios

do exotismo ou do estilo. O autor concentra seu olhar parado e frio

em torno dos mesmos detalhes. Por isso mesmo, o romance de

observador quase preciosista é o menos idealizado do período.

Não que a trama central não pertença ao folhetim; ao contrário,

trata-se de um melodrama típico: a jovem sertaneja Inocência, por

imposição paterna, não pode desposar o seu destino amor, o falso

médico Cirino. E ambos sucumbem à adversidade, numa espécie

de Romeu e Julieta. Ressaltamos a crítica que o romance faz ao

patriarcalismo, a exemplo do que ocorre em O seminarista, de

Bernardo Guimarães.

A retirada da laguna é um documento dramático sobre o

episódio ocorrido na guerra do Paraguai.

O Romantismo não se destacou somente na prosa e

poesia, mas também no teatro. Por isso, faremos uma significativa

abordagem.

O teatro Romântico do século XIX está comprometido com

a dependência cultural de nossas elites. Os textos procediam, em

quase totalidade, da Europa; as companhias vinham de Portugal;

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respirava-se uma atmosfera dissociada da realidade local. A

questão da dramaturgia não foi verdadeiramente problematizada,

ao contrário do que aconteceu no romance e na poesia. Gonçalves

Dias (Leonor de Mendonça), José de Alencar (O demônio familiar),

Castro Alves (Gonzaga) e outros criaram obras esparsas e inspiradas

em modelos europeus. Caberia a Martins Pena a elaboração de um

conjunto de peças capazes de refletir a realidade nacional.

1.3.5 Martins Pena

Nasceu no Rio de Janeiro, numa família sem posses.

Estudou comércio e ingressou na vida diplomática, a princípio como

amanuense e depois como adido, viajando para Londres, em 1847.

Atacado pela tuberculose, morreu no estrangeiro.

Obras Principais:

- O juiz de paz na roça (1842)

- O judas em sábado de aleluia (1846)

- Quem casa quer casa (1847)

- O noviço (1853)

- Os dois ou o inglês maquinista (1871)

Martins Pena optou pelo único teatral que poderia se adaptar

às circunstâncias históricas sobre o Brasil, na primeira metade do

século XIX: a comédia de costumes. Como o faria Manuel Antonio de

Almeida mais tarde, o jovem teatrólogo intuiu que o drama não se

adaptaria ao universo que propunha retratar. Tudo isso porque os

grupos burgueses urbanos careciam de tragédia humana, e suas

contradições eram limitadas ou inexistentes. Apenas o riso poderia

dar-lhe interesse (o drama real era o dos escravos, mas os negros

quando surgiam nos palcos, faziam parte de uma mitologia racista:

o pai João, a mãe Joana o moleque endiabrado).

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Martins Pena iniciou a carreira satirizando os costumes

rurais, os costumes na roça. A novidade de suas peças deve-se ao

jeito caboclo, aos hábitos curiosos, da fala simples e de extrema

candura que envolve os seres da roça.

Já as comédias urbanas efetivam uma leitura da vida cotidiana

do Rio de Janeiro, em especial do mundo da classe média.

Vejamos um fragmento da peça Juiz de paz na roça, para

leitura e análise.

‘’(...) Sala com uma porta no fundo. No meio uma mesa, junto à

qual estarão cosendo MARIA ROSA e ANINHA.

MARIA ROSA - Teu pai tarda muito.

ANINHA - Ele disse que tinha hoje muito que fazer.

MARIA ROSA - Pobre homem! Mata-se com tanto trabalho! É quase

meio-dia e ainda não voltou. Desde as quatro horas da manhã que

saiu; está só com uma xícara de café.

ANINHA - Meu pai quando principia um trabalho não gosta de o

largar, e minha mãe sabe bem que ele tem só a Agostinho.

MARIA ROSA - É verdade. Os meias-caras agora estão tão caros!

Quando havia valongo eram mais baratos.

ANINHA - Meu pai disse que quando desmanchar o mandiocal

grande há-de comprar uma negrinha para mim.

MARIA ROSA - Também já me disse.

ANINHA - Minha mãe, já preparou a jacuba para meu pai?

MARIA ROSA - É verdade! De que me ia esquecendo! Vai aí fora e

traz dous limões. (ANINHA sai.) Se o MANUEL JOÃO viesse e

não achasse a jacuba pronta, tínhamos campanha velha. Do que

me tinha esquecido! (Entra ANINHA.)

ANINHA - Aqui estão os limões.

MARIA ROSA - Fica tomando conta aqui, enquanto eu vou lá dentro.

(Sai.)

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ANINHA, só - Minha mãe já se ia demorando muito. Pensava que

já não poderia falar com o senhor José, que está esperando-me

debaixo dos cafezeiros. Mas como minha mãe está lá dentro, e

meu pai não entra nesta meia hora, posso fazê-lo entrar aqui’’.

(PENA, Martins. Juiz de Paz na Roça.In:http://biblio.com.br/

defaultz.asp?link=http://biblio.com.br/conteudo/MartinsPena/

ojuisdepaznaroca.htm.Acesso em 22.02.2010.

Partiremos, agora, para o romance de costumes.

1.3.6 O Romance de Costumes: Manuel Antonio de Almeida

No Romance de

costumes, destacamos o autor

Manuel Antonio de Almeida.

Nascido no Rio de Janeiro, de

família pobre, frequentou curso de

Medicina, o qual não concluiu por

ter se dedicado exaustivamente

ao jornalismo. Redator e revisor

do Correio Mercantil, lá publicou

em livros o seu único romance, escrito aos vinte e três anos de

idade. Nomeado diretor da Tipografia Nacional, tornou-se amigo e

protetor de um jovem funcionário chamado Machado de Assis.

Obra

- Memórias de um sargento de milícias (1853)

Fonte: <www.chapadadosguimaraes.com.br/>

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Memória de um sargento de milícias

O público leitor, ainda acostumado ao sentimentalismo

piegas, não poderia aceitar um romance que rompia com o tipo de

narrativa praticado na época, antecipando formas realistas no

momento em que a literatura padrão era a de a Joaquim Manuel

de Macedo. Por isso mesmo, Gonzaga afirma que Memórias de

um sargento de milícia foi a obra mais adulta e envolvente da

época. A critica que fazemos ao Romantismo é evidência da ironia

direta do narrador que se diverte não apenas com os personagens,

recurso comum aos românticos em geral.

Obras:

• Romance

Memórias de um Sargento de Milícias

• Outros Gêneros

Tese de doutoramento em Medicina

Libreto da ópera Dois Amores (“imitação do italiano de

Piave”), com música da Condessa Rosawadowska, representada

sem êxito após a morte do autor.

• Os Costumes

O início da história é proposto como uma narrativa de

costumes. Observe:

‘’(...) Uma das quatro esquinas que formam as ruas do

Ouvidor e da Quitanda, cortando-se mutuamente, chamava-se

nesse tempo - O canto dos meirinhos-; e bem lhe assentava o

nome, porque era aí o lugar de encontro favorito de todos os

indivíduos dessa classe (que gozava então de não pequena

consideração). Os meirinhos de hoje não são mais do que a sombra

caricata dos meirinhos do tempo do rei; esses eram gente temível

e temida, respeitável e respeitada; formavam um dos extremos da

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formidável cadeia judiciária que envolvia todo o Rio de Janeiro no

tempo em que a demanda era entre nós um elemento de vida: o

extremo oposto eram os desembargadores. Ora, os extremos se

tocam, e estes, tocando-se, fechavam o círculo dentro do qual se

passavam os terríveis combates das citações, provarás, razões

principais e finais, e todos esses trejeitos judiciais que se chamava

o processo.

Daí sua influência moral.” (ALMEIDA, Manuel Antonio de

Memórias de um Sargento de Milícias. In: http://

www.culturatura.com.br/obras/Memorias.Acesso em.22.02.2010.)

O livro começa por deflagrar um processo de realismo

exato e minucioso dos usos dos hábitos sociais e das figuras

típicas, do Brasil no tempo do rei, isto é, O Brasil de D. João VI.

Trata-se de um realismo tão minucioso, tão detalhado, tão

corriqueiro que, às vezes, os personagens parecem existir apenas

para evidenciar os costumes da época. Vários costumes são

arrolados pelo autor, como: procissões e vida religiosa festas,

danças, músicas, a organização policia e administrativa:

(...) Mas voltemos à esquina. Quem passasse por aíem qualquer dia útil dessa abençoada época veriasentado em assentos baixos, então usados, de couro,e que se denominavam-cadeiras de campanha. Umgrupo mais ou menos numeroso dessa nobre genteconversando pacificamente em tudo sobre que eralícito conversar: na vida dos fidalgos, nas notícias doReino e nas astúcias policiais do Vidigal (ALMEIDA,1963, p. 02).

O romance descreve uma sequência de situações

cômicas, que são unificadas pelo personagem Leonardo, que é

acompanhado pelo romancista desde seu nascimento, filho de uma

pisadela e de um beliscão, passando pela infância, adolescência

e início da idade adulta até o ingresso na Milícia. Quase todos os

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personagens das Memórias pertencem às classes populares do

Rio de Janeiro, mais precisamente à pequena burguesia.

O autor deixou escapar da sua obra a burguesia latifundiária

e a aristocracia lusa, as classes dominantes, enfim. Mesmo, assim,

um fidalgo aparece na história e é uma mistura ridícula, delimitando

o que o jovem pensava de nossa nobreza. Na opinião de Gonzaga

(2002), talvez o aspecto mais revolucionário dessa narrativa seja a

construção do personagem central. Leonardo é uma espécie de

marginal vadio e meio estúpido.

A proposta de apresentar, nas narrativas românticas,

personagens certinhos, sem defeitos, que subverte o sistema

literário do folhetim, que exige herois excepcionais e subverte

também os próprios valores da sociedade. A vida de Leonardo se

dá na dimensão da malandragem, como diz o crítico Cândido apud

Gonzaga (2002). E quando Leonardo esgota todas as

possibilidades de aventuras picarescas, só lhe resta o casamento

e o emprego de soldado. No Romantismo, o casamento é o início

da felicidade; mas, em Memórias de um sargento de milícias, é o

fim de tudo. Leia o fragmento abaixo e responda às questões

sugeridas:

‘’(...) Sua história tem pouca coisa de notável. Fora

Leonardo algibebe em Lisboa, sua pátria; aborrecera-se, porém

do negócio, e viera ao Brasil. Aqui chegando, não se sabe por

proteção de quem, alcançou o emprego de que o vemos

empossado, e que exercia, como dissemos, desde tempos

remotos. Mas viera com ele no mesmo navio, não sei fazer o quê,

uma certa Maria da hortaliça, quitandeira das praças de Lisboa,

saloia rechonchuda e bonitota. O Leonardo, fazendo-se-lhe justiça,

não era nesse tempo de sua mocidade mal apessoado, e,

sobretudo era maganão. Ao sair do Tejo, estando a Maria encostada

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Literatura Brasileira II

à borda do navio, o Leonardo fingiu que passava distraído por junto

dela, e com o ferrado sapatão assentou-lhe uma valente pisadela

no pé direito. A Maria, como se já esperasse por aquilo, sorriu-se

como envergonhada do gracejo, e deu-lhe também em ar de

disfarce um tremendo beliscão nas costas da mão esquerda. Era

isto uma declaração em forma, segundo os usos da terra: levaram

o resto do dia de namoro cerrado; ao anoitecer passou-se a mesma

cena de pisadela e beliscão, com a diferença de serem desta vez

um pouco mais forte; e no dia seguinte estavam os dois amantes

tão extremosos e familiares, que pareciam sê-lo de muitos anos.

Quando saltaram em terra começou a Maria a sentir certos

enojos: foram os dois morar juntos: e daí a um mês manifestaram-

se claramente os efeitos da pisadela e do beliscão; sete meses

depois teve a Maria um filho, formidável menino de quase três

palmos de comprido, gordo e vermelho, cabeludo, esperneador e

chorão; o qual, logo depois que nasceu, mamou duas horas

seguidas sem largar o peito. E este nascimento é certamente de

tudo o que temos dito o que mais nos interessa, porque o menino

de quem falamos é o herói desta história.

Chegou o dia de batizar-se o rapaz: foi madrinha a parteira;

sobre o padrinho houve suas dúvidas: o Leonardo queria que fosse

o Sr. juiz; porém teve de ceder a instâncias da Maria e da comadre,

que queriam que fosse o barbeiro de defronte, que afinal foi

adotado. Já se sabe que houve nesse dia função: os convidados

do dono da casa, que eram todos dalém-mar, cantavam ao desafio,

segundo seus costumes; os convidados da comadre, que eram

todos da terra, dançavam o fado. O compadre trouxe a rabeca,

que é, como se sabe, o instrumento favorito da gente do ofício. A

princípio o Leonardo quis que a festa tivesse ares aristocráticos, e

propôs que se dançasse o minuete da corte. Foi aceita a idéia,

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ainda que houvesse dificuldade em encontrarem-se pares. Afinal

levantaram-se uma gorda e baixa matrona, mulher de um convidado;

uma companheira desta, cuja figura era a mais completa antítese

da sua; um colega do Leonardo, miudinho, pequenino, e com

fumaças de gaiato, e o sacristão da Sé, sujeito alto, magro e com

pretensões de elegante. O compadre foi quem tocou o minuete na

rabeca; e o afilhadinho, deitado no colo da Maria, acompanhava

cada arcada com um guincho e um esperneio. Isto fez com que o

compadre perdesse muitas vezes o compasso, e fosse obrigado

a recomeçar outras tantas.’’

(ALMEIDA, José Américo de. Memórias de um Sargento

de Milícias In:sitehttp://www.stockler.com.br/vestibulares/eventos/

LIT.Acesso em 22.02.2010.)

Estamos terminando esta unidade, mas, antes, caros

alunos, vocês deverão responder às questões que propomos sobre

o romantismo na prosa.

ATIVIDADE

1 - Quais as características das narrativas de costumes?

2 - Compare os personagens das obras de Alencar com os de

José Américo de Almeida.

3 - Leia outros fragmentos da obra A moreninha para fazer a

descrição da paisagem.

4 - Pesquise sobre como era a vida no Rio de Janeiro naquela

época. Se possível, estabeleça também diferenças e semelhanças

entre os vários tipos de personagens criados pelos autores.

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5 - Faça uma crítica sobre a obra Memórias de um sargento de

milícias.

6 - Com algumas modificações, o drama vivido por Senhora, de

José de Alencar, é retomado pelo cineastra Adrian Lyne, através

do filme Proposta Indecente (1993). Assista ao filme e, em

seguida, discuta com seus colegas sobre pontos em comum

entre a obra e o citado filme.

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UNIDADE 2

CONTEÚDOS:

• Realismo-Naturalismo

• Contexto histórico-cultural

• A prosa Realista/Naturalista brasileira

OBJETIVOS:

√ Compreender o contexto histórico-cultural do Realismo-

Naturalismo.

√ Identificar tendências estéticas e ideológicas do Realismo-

Naturalismo brasileiro.

√ Ler e analisar textos representativos de autores brasileiros do

Realismo-Naturalismo.

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2.1 CONTEXTO HISTÓRICO-CULTURAL DO REALISMO-

NATURALISMO

O Realismo é uma reação contra o Romantismo: ORomantismo era a apoteose do sentimento; - oRealismo é a anatomia do caráter. É a crítica dohomem. É a arte que nos pinta a nossos própriosolhos – para condenar o que houver de mau na nossasociedade. (Eça de Queiroz)

Como vimos, o Romantismo extremou-se no culto ao

sentimentalismo e à exaltação da natureza, deixando espaço aberto

para a estética seguinte a missão revolucionária. Surge, então o

Realismo-Naturalismo que firma-se na segunda metade do século

XIX, período em que o poder político da burguesia já está

consolidado. A classe Burguesa deste momento tinha o seu gosto

estético orientado para uma arte racional, pautada no experimentalismo

e na observação, no entanto é preciso compreender, pelo menos em

linhas gerais, o contexto cultural da época.

O Realismo reflete as profundas transformações

econômicas, políticas, sociais e culturais da segunda metade do

século XIX. A Revolução Industrial, iniciada no século XVIII, entra

numa nova fase. O capitalismo se estrutura em moldes modernos,

com o surgimento de grandes complexos industriais; por outro lado,

a massa operária urbana aumenta, formando uma população

marginalizada que não partilha dos benefícios gerados pelo

progresso industrial, mas sim explorada e sujeita a condições

sub-humanas de trabalho.

Augusto Comte (1798-1857) cria o Positivismo em que

defende a importância fundamental da Ciência para a vida do

homem em sociedade, para tanto, propunha o abandono da

Teologia e da Metafísica em favor de uma atitude de espírito voltado

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para o conhecimento “positivo” da realidade.

Contemporaneamente, Charles Darwin publica A Origem das

Espécies (1859), uma verdadeira revolução no campo das ciências

biológicas. Ainda como relevante neste contexto surge as ideias

de Hipolite Taine que considera o homem condicionado ao

ambiente e à herança, a chamada teoria determinista.

Com Karl Marx e Friedrich Engel, surge o socialismo

científico, a partir da publicação do Manifesto do Partido Comunista,

em 1848, definindo o materialismo histórico (o modo de produção

da vida material condiciona o processo de vida social).

E como se encontrava o Brasil entre 1850 e 1900?

O Brasil também passava por mudanças radicais. A

monarquia vivia uma vertiginosa decadência; a campanha

abolicionista intensificava-se a partir de 1850; a Lei Áurea de 1888

não resolveu o problema dos negros, mas criou uma nova realidade:

o fim da mão de obra escrava e a substituição pela mão-de-obra

assalariada, representada por levas de imigrantes europeus.

Na década de 70, surge, no Brasil, a chamada Escola de

Recife, com Tobias Barreto, Sílvio Romero e outros, aproximando-se

das ideias europeias ligadas ao Positivismo Evolucionismo e,

principalmente, à filosofia alemã. São os ideais do Realismo que

encontravam ressonância no conturbado momento histórico vivido pelo

Brasil.

Diante desse quadro, a obra literária passa a ser

considerada mecanismo de combate, de reforma e de ação social.

Repudiando a característica da “Arte pela arte”, a arte passa a

funcionar como espelho da sociedade.

O Realismo surge primeiramente nas artes plásticas em

meados do século XIX, tendo como destaque Gustave Coubet que

teve as telas O enterro em Ornans e As Banhisas recusadas na

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Exposição Universal de 1855, entendidas como escandalosas. O

pintor manifesta sua indignação conta a pintura imaginativa do

Romantismo e justifica que seu objetivo era “traduzir os costumes,

as idéias, o aspecto de sua época segundo sua apreciação, em

suma, fazer arte viva” (MOISES, 2004, p. 12).

O ano de 1857, além de

corresponder ao ápice das polêmicas em

favor das ideias realistas, marca a

consolidação da estética no campo

literário, com o aparecimento de duas

obras definidoras: As Flores do Mal, de

Charles Baudelaire, de cunho poético, e

Madame Bovary (1857), de Gustave

Flaubert, que, com seu estilo conciso,

inaugura o romance realista, desnudando

a hipocrisia da sociedade burguesa. Após dez anos, Emile Zola

introduz o romance naturalista, com Therese Raquin.

O Enterro em OrnansFote: <http://www.art-wallpaper.com/4949/Courbet+Gustave/Funeral+at+Ornans-1024x768-4949.jpg>

As BanhistasFonte: <http://3.bp.blogspot.com/_XG8>

Fonte: <http://images.google.com.br/images?hl=pt-BR&source=hp&q=Madame+Bovarry.>

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Literatura Brasileira II

Na renovação temática, destacam-se como temas o

adultério e a critica ao clero e os temas político-sociais, em que os

escritores procuraram traçar diagnósticos da sociedade burguesa

em crise.

O Naturalismo surgiu como um desdobramento do

Realismo, fundamentado, principalmente, na valorização da ciência

como instrumento para uma reflexão crítica da sociedade, assim

os romances naturalistas apresentam temas voltados à análise do

comportamento patológico do ser humano, de suas taras sexuais,

de seu lado animalesco. Em 1865, Claude Bernard publica

Introdução à Medicina Experimental com uma tese sobre a

hereditariedade. Essa nova tendência faz surgir o romance

experimental, ou de tese, como explica Moisés

A semelhança do cientista que, no laboratório,empreende seguidas experiências objetivando oconhecimento positivo de um fato, o romancista sevaleria da narrativa para demonstrar que a situaçãodramática, protagonizada pó figurantes aos fatoreshereditários, ambientais e de momento, fatalmentedeveria resolver-se de acordo com as forcas empresença (MOISÉS, 2004, p. 16).

É necessário salientar que, entre o Realismo e o

Naturalismo, há pontos em comum, no entanto existem diferenças

nítidas entre as duas tendências. A primeira vê esteticamente os

problemas sociais como um expectador, detendo-se a explicações

filosóficas e científicas de modo implícito ou indireto. Por outro lado;

a segunda, de maneira direta e cientificamente, se detém aos

problemas, procurando de forma minuciosa expor os sintomas do

caso clínico analisado.

O adultério, por exemplo, no romance realista, é explicado

como decorrência de causas predominantemente educacionais e

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morais: vício social, fruto de convenções, ainda que com bases

patológicas; já no romance naturalista, ele resulta de distúrbios

fisiológicos e psiquiátricos, não impedindo que as relações sociais

estejam presentes.

Enquanto o Realismo se preocupa com os aspectos

sociológicos e apresenta romance de tese documental, o

Naturalismo se preocupa com os aspectos patológicos e apresenta

romance de tese experimental.

Em 1881, consolidou-se o Realismo/Naturalismo no Brasil

com a publicação de dois romances fundamentais que modificaram

o curso de nossas letras: O Mulato de Aluízio, de Azevedo, primeiro

romance naturalista brasileiro e Memórias Póstumas de Brás

Cubas, de Machado de Assis, primeiro romance realista de

nossa literatura.

2.2 O ROMANCE REALISTA/NATURALISTA BRASILEIRO

A prosa dos fins do século XIX torna-se instrumento de

ataque e demolição de valores sociais, mas, ao mesmo tempo, de

defesa de ideais filosóficos e científicos.

Cultivado por Machado de Assis, o romance realista

concentra-se na análise psicológica, acrescida de crítica à

sociedade, a partir do comportamento de determinados

personagens. No entanto, a análise da sociedade é feita “por

cima”.

A narrativa naturalista é marcada pela forte análise social

a partir de grupos humanos marginalizados, valorizando o coletivo,

além disso, os naturalistas construíram romances experimentais,

fazendo sentir a influência da teoria de Darwin, segundo a qual o

homem é conduzido por instinto animalesco.

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2.2.1 Machado de Assis

Joaquim Maria Machado de

Assis nasceu no Rio de Janeiro em 21

de junho de 1839, filho de um mulato e

de uma lavadeira portuguesa. Após os

estudos elementares, dedica-se a vários

empregos a fim de auxiliar no sustento

da família.

Com dezessete anos, ingressa

como aprendiz de tipógrafo na

Imprensa Nacional, onde ganha a

amizade de Manuel Antônio de Almeida. Em 1858, trava contato

com expoentes literários do seu tempo, e deles recebe estímulo

para continua a escrever.

Em 1869, casa-se com Carolina Xavier de Novais, e quatro

anos mais tarde é nomeado primeiro oficial da Secretaria de

Estado do Ministério da Agricultura, Comercio e Obras Públicas.

Alcançada a estabilidade econômica, entrega-se à criação de sua

obra, numa sucessão apenas interrompida pela morte.

Em 1897, Machado de Assis é eleito presidente da recém-

fundada Academia Brasileira de Letras (também chamada “Casa

de Machado de Assis”), concretizando o velho sonho de reunir a

elite dos escritores da época em um clube literário.

Costuma-se dividir a obra machadiana em duas fases

distintas: a primeira, chamada de fase romântica, porque ligada

aos princípios da estética, enfeixa os romances Ressurreição, A

Mão e a Luva, Helena, Iaiá Garcia; a segunda, fase realista,

envolve as obras Memórias Póstumas de Brás Cubas, Quincas

Borba, Dom Casmurro, Esaú e Jacó, Memorial de Aires. Os

Fonte: <http://images.google.com.br/images>

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romances da segunda fase apresentam as seguintes

características:

- Acentuado gosto pela análise e investigação dos motivos

do comportamento humano: suas fraquezas, egoísmo,

dissimulação, vaidade, luxúria, hipocrisia, orgulho etc.

- Visão profunda da realidade interior e do aspecto moral

do homem.

- Pessimismo e ironia fina e certo humor.

- Interrupções na ordem linear das narrativas e o gosto

pelos monólogos interiores.

Apesar de pertencerem a estéticas distintas, as duas fases

não se excluem, ao contrário, se ligam por osmose, nas palavras

de Moisés (2001), não só aparecem aspectos da primeira

transitando na segunda como nesta já se divisam pormenores

caracterizados daquela. E acrescenta que

os momentos da trajetória do escritor seriamassinalados por uma unidade ou continuidade (sic),nada surpreendente se lembrarmos que a obra dequalquer escritor, por mas variação que apresente, ésempre dominada pelas mesmas forças-motrizes. Asfases machadianas refletiriam, à luz dessaobservação, as modulações ascendentes da mesmacosmovisão (MOISÉS, 2001, p. 80).

Machado foi romancista, contista e poeta, além de deixar

algumas peças de teatro e inúmeras críticas, crônicas e

correspondências.

Com a obra Memórias Póstumas de Brás Cubas (1881),

Machado marca o início do realismo no Brasil e inaugura uma

modalidade romanesca original que se tornaria marcante no século

XX: o romance na primeira pessoa e o romance de memórias: o

próprio título já é sugestivo para a inovação do autor: Brás Cubas,

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personagem que, após a morte, narra as peripécias de sua

passagem na terra.

O estranhamento dos leitores começa já com a dedicatória

do romance: “Ao verme que primeiro roeu as frias carnes do meu

cadáver dedico como saudosa lembrança estas memórias

póstumas”. E certamente continua durante a leitura do prólogo “Ao

Leitor”, em que um narrador bastante ousado afirmava não

pretender mais do que cinco leitores para sua obra, escrita “com a

pena da galhofa e a tinta da melancolia”.

Tem assim o início uma obra em que, autorizado pela

condição de “defunto”, Brás Cubas permite-se falar sobre o que

quer, da maneira que melhor lhe convier.

O romance Dom Casmurro surge como momento único

de recolhimento das experiências com a técnica narrativa e,

simultaneamente, da ficcionalização de tudo aquilo que caracteriza

a estética realista. A obra traz, como foco, a desconfiança de traição

da esposa Capitu. Bentinho, narrador-personagem, vê no filho o

rosto do seu melhor amigo, Escobar.

Muitos críticos da obra de Machado de Assis advertem

para a necessidade de o leitor de Dom Casmurro manter-se

independente das sugestões e insinuações do narrador. A questão

básica parece ser a seguinte: até que ponto a narrativa de um

homem certo de ter sido traído pela esposa é confiável? Como

saber o que de fato aconteceu entre Capitu e Escobar (se é que houve

mesmo envolvimento amoroso entre ambos)? Apenas Bentinho,

amargurado e só decide o que deve ou não ser relatado ao leitor.

A grande questão do livro deixa de ser, assim, se Capitu

cometeu ou não adultério. Na verdade, o que importa é perceber

como Machado de Assis foi capaz de tecer a trama ficcional sem

deixar provas da concretude ou não da traição.

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Bosi, no livro de ensaios Machado de Assis: O enigma do

olhar, vê a obra machadiana como um reflexo do seu tempo,

oferecendo “linhas de resistência” ideológica. Para Bosi, o

processo de composição literária realista do escritor recorre a

personagens-tipo - representantes de categorias sociais – que

embora remetam a figuras do passado oferecem dialeticamente

ao presente uma representação que se ajusta perfeitamente a

tempos modernos. Acrescenta Bosi que

O romance é o reino do possível: inclui não só o realhistoricamente testemunhável, mas o que poderia teracontecido ou vir a acontecer. (...) O olho crítico doescritor penetra o seu objeto e o transcende. Aconfiguração local – no caso, a estreita esfera daburguesia fluminense – não teria sido representadacomo foi, com os seus limites e mazelas, se o olharque a intuiu não houvesse sido trabalhada por valoresque diferiam, em mais de um aspecto, dos reinantesnaquele pequeno mundo observado.

Desse modo, a ficção trata das coisas possíveis,

probabilidade do real que se instaura pela linguagem.

Machado de Assis passou a infância no Morro do

Livramento, morou no Centro e perto do Largo do Machado; em

1884, mudou-se para o Cosme Velho, bairro tranquilo, onde viveu

até a morte, em 1908. Quase nunca saiu do Rio de Janeiro, assim

também na ficção, em raríssimas vezes, se afasta da “cidade

maravilhosa”, isso justifica a familiaridade com os espaços da

cidade que serviram de ambientações para as suas tramas

ficcionais. John Gledson, no álbum Rio de Assis: imagens

machadianas do Rio de Janeiro, de Aline Carrer, afirma sobre a

obra machadiana que

Romances, contos e crônicas estão cheios dereferências a detalhes concretos, a ruas, becos,

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praias, largos, igrejas, teatros, lojas, etc. Aprópria simplicidade dessas referências ea falta de descrições detalhadamente“realistas” podem fazer com que nem asnotemos. (CARRER,1999, p.11)

“Bruxo de Cosme Velho”, “homem subterrâneo” e “monstro

de lucidez” são alguns dos epítetos com que a crítica vem

procurando rotular o enigma machadiano.

A posição de Machado de Assis, no panorama da

Literatura Brasileira, é a de um renovador, não apenas

porque realmente revolucionou a narrativa brasileira,

imprimindo nela um tom mais verossímel e menos

supérfluo, mas também porque foi além de seu tempo,

atribuindo-lhe um senso psicológico notável.

Para saber mais sobre Machado de Assis, acesse

www.dominiopublico.gov.br. Sugerimos o Vídeo “Machado

de Assis – um mestre na periferia” que você localiza no

site em questão. Bom proveito!

Fonte: <http://www.starnews2001.com.br/marcferrez.html.>

Antigo Cais Pharoux (Praça XV), em 1880, um dos locaispreferidos de Machado de Assis. Nove anos depois dessafotografia, saíram de lá os ferry-boats com os 5000 convidadospara o Baile da Ilha Fiscal, o último do Império.

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ATIVIDADES

Reveja as peculiaridades do realismo, bem como as do

seu maior representante, Machado de Assis, para interagir conosco.

1) Leia o romance Memórias Póstumas de Brás Cubas,

de Machado de Assis, e analise a postura do narrador no que se

refere às denúncias da sociedade do século XIX. Você localiza a

obra em www.dominiopublico.gov.br.

2) Analise a crítica à família, especificamente à mulher, no

conto Missa do Galo, de Machado de Assis.

3) O capítulo que segue é parte integrante da obra Dom

Casmurro, após a leitura, responda ao que se pede.

Capítulo XXXII/ Olhos de ressaca

Tudo era matéria às curiosidades de Capitu. Caso houve,

porém, no qual não sei se aprendeu ou ensinou, ou se fez ambas

as coisas, como eu. É o que contarei no outro capítulo. Neste direi

somente que passados alguns dias do ajuste com o agregado, fui

ver a minha amiga; eram 10 horas da manhã. Dona Fortunata, que

estava no quintal, nem esperou que lhe perguntasse pela filha.

- Está na sala penteando o cabelo – disse-me -; vá

devagarzinho para lhe pregar um susto.

Fui devagar, mas ou o pé ou o espelho traiu-me. Este pode

ser que não fosse; era um espelhinho de pataca (perdoai a barateza),

comprado a um mascate italiano, moldura tosca, argolinha de latão,

pendente da parede, entre as duas janelas. Se não foi ele, foi o pé.

Um ou outro, a verdade é que, apenas entrei na sala, pente, cabelos,

toda ela voou pelos ares e só lhe ouvi esta pergunta:

- Há alguma coisa?

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- Não há nada – respondi - ; vim ver você antes que o Padre

Cabral chegue para a lição. Como passou a noite?

- Eu, bem. José Dias ainda não falou?

- Parece que não.

- Mas então quando fala?

- Disse-me que hoje ou amanhã pretende tocar no assunto;

não vai logo de pancada, falará assim por alto e por longe, um

toque. Depois, entrará na matéria. Quer primeiro ver se mamãe

tem a resolução feita...

- Que tem, tem – interrompeu Capitu. – E, se não fosse

preciso alguém para vencer já, e de todo, não se lhe falaria. Eu já

nem sei se José Dias poderá influir tanto; acho que fará tudo, se

sentir que você realmente não quer ser padre, mas poderá

alcançar? ... Ele é atendido; se, porém... É um inferno isto! Você

teime com ele, Bentinho.

- Teimo; hoje mesmo ele há de falar.

- Você jura?

- Juro! Deixe ver os olhos, Capitu.

Tinha-me lembrado a definição que José Dias dera deles,

“olhos de cigana oblíqua e dissimulada”. Eu não sabia o que era

oblíqua, mas dissimulada sabia, e queria ver se se podiam chamar

assim. Capitu deixou-se fitar e examinar. Só me perguntava o que

era, se nunca os vira; eu nada achei extraordinário; a cor e a doçura

eram minhas conhecidas. A demora da contemplação creio que

lhe deu outra idéia do meu intento; imaginou que era um pretexto

para mira-los mais de perto, com os meus olhos longos, constantes,

enfiados neles, e a isso atribuo que entrassem a ficar crescidos,

crescidos e sombrios, com tal expressão que...

Retórica dos namorados, dá-me uma comparação exata

e poética para dizer o que foram aqueles olhos de Capitu. Não me

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acode imagem capaz de dizer, sem quebra da dignidade do estilo,

o que eles foram e me fizeram. Olhos de ressaca? Vá, de ressaca.

É o que me dá idéia daquela feição nova. Traziam não sei que

fluido misterioso e energético, uma força que arrastava para dentro,

como a vaga que se retira da praia, nos dia de ressaca. Para não

ser arrastado, agarrei-me às outras partes vizinhas, às orelhas, aos

braços, aos cabelos espalhados pelos ombros, mas tão depressa

buscava as pupilas, a onda que saia delas vinha crescendo, cava

e escura, ameaçando envolver-me, puxar-me e tragar-me. Quantos

minutos gastamos naquele jogo? Só os relógios do céu terão

marcado esse tempo infinito e breve. A eternidade tem as suas

pêndulas; nem por não acabar nunca deixa de querer saber a

duração das felicidades e dos suplícios. Há de dobrar o gozo aos

bem-aventurados do céu conhecer a soma dos tormentos que

já terão padecido no inferno os seus inimigos; assim também a

quantidade das delícias que terão suplício escapou ao divino

Dante; mas eu não estou aqui para emendar poetas. Estou para

contar que, ao cabo de um tempo não marcado, agarrei-me

definitivamente aos cabelos de Capitu, mas então com as mãos,

e disse-lhe – para dizer alguma coisa – que era capaz de os

pentear, se quisesse.

- Você?

- Eu mesmo.

- Vai embaraçar-me o cabelo todo, isso sim.

- Se embaraçar, você desembaraça depois.

- Vamos ver.

Que tal refletirmos agora sobre o texto?!

a) Caracterize psicologicamente Capitu com base no

comentário de José Dias a respeito dos olhos dela, no diálogo

que Capitu mantém com Bentinho e na narração de Bentinho.

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b) Por que o narrador caracteriza os olhos de Capitu como

“olhos de ressaca”?

c) Bentinho é considerado um personagem de caráter frágil,

em detrimento de Capitu. Justifique com passagem do texto.

2.2.2 Aluísio Azevedo

Considerado o pioneiro do naturalismo no Brasil, o

romancista Aluísio de Azevedo nasceu em São Luís, Maranhão,

em 14 de abril de 1857. Após os primeiros estudos em sua terra

natal, vai para o Rio de Janeiro estudar pintura e desenho; trabalha

como caricaturista na imprensa. Com a morte de seu pai, retorna

ao Maranhão; na época, escreve alguns artigos de caráter político,

influenciado pelo materialismo positivista, atacando os

conservadores, a tradicional sociedade maranhense e o clero. Em

1880, inicia-se no romance, publicando Uma lágrima de mulher.

No ano seguinte, choca a sociedade do Maranhão ao publicar O

Mulato, primeiro romance naturalista de nossa literatura.

Em 1895, o romancista presta concurso para o cargo de

cônsul. Aprovado, ingressa na vida diplomática e abandona de vez

a literatura. Falece em 21 de janeiro de 1913, em Buenos Aires.

Fonte: <http://images.google.com.br/images.>

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Por tentar profissionalizar-se como autor, Aluísio produziu

uma obra propositalmente diversificada: de um lado, os romances

românticos, que o próprio autor chamava de “comerciais”; de outro,

os romances naturalistas, chamados de “artísticos”. Ao primeiro

grupo pertencem Memórias de um Condenado, Mistérios da

Tijuca, Filomena Borges, O Esqueleto e A Mortalha de Alzira. Ao

segundo grupo, entre outros, pertencem os três romances maiores

de Aluísio: O Mulato, Casa de Pensão e O Cortiço. Importante é

notar que essa divisão não constitui fases, como no caso de

Machado de Assis, os romances românticos eram alternados, com

os naturalistas.

Seguindo as lições de Émile Zola e de Eça de Queirós, o

autor escreve romances de tese, com clara conotação social.

Percebemos nitidamente a preocupação com as classes

marginalizadas pela sociedade, a crítica ao conservadorismo e ao

clero, aliado à classe dominante. Destacamos ainda a defesa do

ideal republicano assumida pelo autor: em O Cortiço, a República

é proclamada em pleno decurso da narrativa, permitindo, assim,

ao autor explicitar sua posição quanto ao acontecimento. E, na

melhor postura materialista positivista, Aluísio valoriza os instintos

naturais, comparando constantemente seus personagens a

animais: Bertoleza “tinha ancas de vaca do campo”, seu marido

morreu “estrompado como uma besta”, puxando uma carroça.

Já dissemos que Aluísio Azevedo inaugura o Naturalismo

entre nós com a publicação de O Mulato em 1881. No entanto, seu

mais bem acabado romance naturalista é o último que escreveu: O

Cortiço. Neste livro, o autor não está mais tão preocupado com as

personagens; concentra-se em demonstrar a tese de que o ser

humano é fruto do meio em que vive. Essa narrativa não relata

dramas individuais, mas coletivos, consistindo numa observação

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direta da realidade, ressaltando a influência que o meio exerce

sobre o homem.

Leia o Fragmento do Capítulo I da obra O Cortiço em que

é narrada a relação entre Miranda e sua esposa Estela.

O CORTIÇO

Odiavam-se. Cada qual sentia pelo outro um profundo

desprezo, que pouco a pouco se foi transformando em repugnância

completa. O nascimento de Zulmira veio agravar ainda mais a

situação; a pobre criança, em vez de servir de elo aos dois infelizes,

foi antes um novo isolador que se estabeleceu entre eles. Estela

amava-a menos do que lhe pedia o instinto materno por supô-la

filha do marido, e este a detestava porque tinha convicção de não

ser seu pai.

Uma bela noite, porém, o Miranda, que era homem de

sangue esperto e orçava então pelos seus trinta e cinco anos, sentiu-

se em insuportável estado de lubricidade. Era tarde já e não havia

em casa alguma criada que lhe pudesse valer. Lembrou-se da

mulher, mas repeliu logo esta idéia com escrupulosa repugnância.

Continuava a odiá-la. Entretanto este mesmo fato de obrigação

em que ele se colocou de não servir-se dela, a responsabilidade

de desprezá-la, como que ainda mais lhe assanhava o desejo da

carne, fazendo da esposa infiel um fruto proibido. Afinal, coisa

http://grimoiredomago.blogspot.com.Acesso em 20.fev.2010.

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singular, posto que moralmente nada diminuísse a sua repugnância

pela perjura, foi ter ao quarto dela.

A mulher dormia a sono solto. Miranda entrou pé ante pé e

aproximou-se da cama. “Devia voltar!... pensou. Não lhe ficava bem

aquilo!...” Mas o sangue latejava-lhe, reclamando-a. ainda hesitou

um instante, imóvel, a contemplá-la no seu desejo.

Estela, como se o olhar do marido lhe apalpasse o corpo,

torceu-se sobre o quadril da esquerda, repuxando com as coxas o

lençol para a frente e patenteando uma nesga de nudez estofada e

branca. O Miranda não pôde resistir, atirou-se contra ela, que, num

pequeno sobressalto, mais de surpresa que de revolta, desviou-

se, tornando logo e que continuava a dormir, sem a menor

consciência de tudo aquilo.

Ah! Ela contava como certo que o esposo, desde que não

teve coragem de separar-se de casa, havia mais cedo ou mais

tarde, de procurá-la de novo. Conhecia-lhe o temperamento, forte

para desejar e fraco para resistir ao desejo.

Consumado o delito, o honrado negociante sentiu-se

tolhido de vergonha e arrependimento. Não teve ânimo de dar

palavra, e retirou-se tristonho e murcho para seu quarto de

desquitado.

Oh! Como lhe doía agora o que acabava de praticar na

cegueira da sua sensualidade.

- Que cabeçada!... dizia de agitado. Que formidável

cabeçada!...

No dia seguinte, os dois viram-se e evitaram-se em

silêncio, como se nada de extraordinário houvera entre eles

acontecido na véspera. Dir-se-ia até que, depois daquela

ocorrência, o Miranda sentia crescer o seu ódio contra a esposa.

E, à noite desse mesmo dia, quando se achou sozinho na sua cama

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Literatura Brasileira II

estreita, jurou mil vezes aos seus brios nunca mais, nunca mais

praticar semelhante loucura.

Mas, daí a um mês o pobre homem, acometido de um novo

acesso de luxúria, voltou ao quarto da mulher.

Estela recebeu-o desta vez como da primeira, fingindo que

não acordava; na ocasião, porém, em que ele se apoderava dela

febrilmente, a leviana, sem se poder conter, soltou-lhe contra o

rosto uma gargalhada que a custo sopeava. O pobre-diabo

desnorteou, deveras escandalizado, soerguendo-se, brusco, num

estremunhamento de sonâmbulo acordado com violência.

A mulher percebeu a situação e não lhe deu tempo para

fugir; passou-lhe rápido as pernas por cima e, grudando-se-lhe ao

corpo, cegou-o com uma metralhada de beijos.

Não se falaram.

Miranda nunca tivera, nem nunca a vira, assim tão violenta

no prazer. Estranhou-a. afigurou-se-lhe estar nos braços de uma

amante apaixonada; descobriu nela o capitoso encanto com que

nos embebedam as cortesãs amestradas na ciência do gozo

venéreo. Descobriu-lhe no cheiro da pele e no cheiro dos cabelos

perfumes que nunca lhe sentira; notou-lhe outro hálito, outro som

nos gemidos e nos suspiros. E, gozou-a loucamente, com delírio,

com verdadeira satisfação de animal no cio.

E ela também, ela também gozou, estimulada por aquela

circunstância picante do ressentimento que os desunia; gozou a

desonestidade daquele ato que a ambos acanalhava aos olhos

um do outro; estorceu-se toda, rangendo os dentes, grunindo,

debaixo daquele seu inimigo odiado, achando-o também agora,

como homem, melhor que nunca, sufocando-o nos seus abraços

nus, metendo-lhe pela boca a língua úmida e em brasa. Depois um

arranco de corpo inteiro, com um soluço gutural e estrangulado,

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arquejante e convulsa, estatelou-se num abandono de pernas e braços

abertos, a cabeça para o lado, os olhos moribundos e chorosos, toda

ela agonizante, como se a tivessem crucificado na cama.

A partir dessa noite, da qual só pela manhã o Miranda se

retirou do quarto da mulher, estabeleceu-se entre eles o hábito de

uma felicidade sexual, tão completa como ainda não a tinham

desfrutado, posto que no íntimo de cada um persiste contra o outro

a mesma repugnância moral em nada enfraquecida. (AZEVEDO,

Aluísio. O Cortiço. São Paulo. Ática, 1975)

ATIVIDADE

1) Comente o estilo de Aluísio Azevedo, a partir da adjetivação

atribuída a Miranda e a Estela.

2) Aponte três passagens tipicamente naturalistas presentes

no texto.

3) No fragmento apresentado, aparece a caracterização do

homem e da mulher como animais instintivos. Justifique.

4) Leia o texto abaixo, em seguida, justifique os pontos comuns

com o Naturalismo.

Uma moça bonita

de olhar agateado

deixou em pedaços

o meu coração

Uma onça pintada

e seu tiro certeiro

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Literatura Brasileira II

deixou os meus nervos

de aço no chão

Foi mistério e segredo

e muito mais

foi divino brinquedo

e muito mais

se amar como dois animais

Meu olhar vagabundo

de cachorro vadio

olhava a pintada

e ela estava no cio

Era um cão vagabundo

e uma onça pintada

se amando na praça

como os animais.

(VALENÇA, Alceu. “Como dois animais”. In: Cavalo de Pau)

2.2.3 Raul Pompéia

Raul d’Ávila Pompéia nasceu em Angra dos Reis, Rio de

Janeiro, em 12 de abril de 1863. Após os anos de internato, no

Fonte: <http://images.google.com.br/

Page 87: Literatura Brasileira II

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Colégio Abílio, que lhe inspirariam mais tarde a obra O Ateneu

(1888), fez o curso secundário no Colégio Pedro II. Em São Paulo,

iniciou estudos de Direito, ocasião em que abraçou ideais

republicanos e abolicionistas, mas terminou no Recife (1885). De

volta ao Rio, exerceu cargos públicos no Diário Oficial e na

Biblioteca Nacional, e o magistério, na Escola Nacional de Belas-

Artes. Além de O Ateneu, deixou obra esparsa, como Uma tragédia

no Amazonas e As jóias da coroa, os contos Microscópicos e o

poema em prosa Canções sem metro, no entanto, Raul Pompéia

pertence à classe dos escritores de um livro só: O Ateneu. Tudo o

mais que criou, apesar do muito engenho, não passou de exercício,

preparação para a sua obra-prima.

O Ateneu é um misto de ficção e memória, deixa

transparecer a complexidade do espaço do internato, onde são

representados os vários protótipos humanos. Quando o pai de

Sérgio, personagem central da obra, lhe diz à porta do internato

“vais encontrar o mundo”, certamente se referia à projeção do

mundo no universo do internato. Moisés acrescenta que

A ambivalência da obra, que o subtítulo “Cônica dasaudade”, igualmente se manifesta no vaticíniopaterno, abrindo caminho ás dicotomias em que orelato vai transcorrer: o que se mostra não é o que sevê, é o que se esconde, e o que se esconde é, afinalde contas, o que deve ser visto. O mundo que o paidescortina ao filho se limita às paredes da escola;para encontrar o mundo, o menino é alheado, qualdelinqüente, da realidade cotidiana da família, comose o mundo não fosse o dia-a-dia doméstico, mas odo internato (MOISÉS, 2001, p. 104)

A obra foi considerada de cunho autobiográfica pela

crítica e isso gerou um escândalo que, no entendimento de Mário

de Andrade, é uma vingança do escritor contra a sociedade. O

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Literatura Brasileira II

romance ressalta instintos, patologias sexuais, ao lado de enfoques

subjetivos e psicológicos, situa-se entre o realismo e o naturalismo.

O Ateneu também na feitura era complexo: oscilava entre as

insinuações de Machado de Assis e as ousadias dos naturalistas,

variava no estilo da sobriedade ao rebuscamento; a julgar-se pelo

tema, pela caricatura de um colégio famoso na época, o Colégio

Abílio.

A obra O Ateneu, ao mesmo tempo em que representa o

mundo infantil, deixa de sê-lo. A criança não tem condições de

protagonizar dramas, já que o seu universo existencial ainda não

apresenta os conflitos próprios da fase adulta. Por outro lado, cada

figura do internato, além de adulto em miniatura, é símbolo de um

tipo de vício ou de ser social, nesse caso o atrito entre os internos

representa o dos adultos, mas sem configurar-se em drama. Além

disso, há uma distância temporal entre o adulto que narra e a criança

que fora um dia; desse modo, fica patente a vacilação de O Ateneu

entre o diário íntimo e a ficção, entre a memória e a narrativa.

ATIVIDADE

Leia o fragmento do Capítulo I, de O Ateneu, para responder

ao que se pede.

“Vais encontrar o mundo, disse-me meu pai, à porta do

Ateneu. Coragem para a luta!”

Bastante experimentei depois a verdade deste aviso, que

me despia, num gesto, das ilusões de criança educada

exoticamente na estufa de carinho que é o regime do amor

doméstico, diferente do que se encontra fora, tão diferente, que

parece o poema dos cuidados maternos um artifício sentimental,

com a vantagem única de fazer mais sensível a criatura à impressão

Page 89: Literatura Brasileira II

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rude do primeiro ensinamento, têmpera brusca da vitalidade na

influência de um novo clima rigoroso. Lembramo-nos, entretanto,

com saudade hipócrita, dos felizes tempos; como se a mesma

incerteza de hoje, sob outro aspecto, não nos houvesse perseguido

outrora e não viesse de longe a enfiada das decepções que os

ultrajam.

Eufemismo, os felizes tempos, eufemismo, apenas, igual

aos outros que nos alimentam a saudade dos dias que correram

como melhores. Bem considerando, a atualidade é a mesma em

todas as datas. Feita a compensação dos desejos que variam,

das aspirações que se transformam, alentadas perpetuamente do

mesmo ardor, sobre a mesma base fantástica de esperanças, a

atualidade é uma. Sob a coloração cambiante das horas, um pouco

de ouro mais pela manhã, um pouco mais de púrpura ao crepúsculo

– a paisagem é a mesma de cada lado beirando a estrada da

vida.

Eu tinha onze anos.

(POMPÉIA, Raul. O Ateneu : Crônica de Saudades. São

Paulo, Ática, 1976, p.11)

A propósito do texto:

1) Como o personagem vê a educação familiar?

2) Comente as reflexões do narrador-

personagem acerca das palavras do pai à porta do internato.

Por questões de periodização literária, vamos agora dar

ênfase no Parnasianismo e Simbolismo no Brasil, no entanto, não

demoraremos nessas estéticas, uma vez que o foco desta disciplina

é a prosa, e sabemos que as duas tendências destacam-se na

poesia.

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UNIDADE 3

CONTEÚDOS:

• Parnasianismo e Simbolismo no Brasil

• Estudo das características e temas

• Autores representativos

OBJETIVO:

√ Reconhecer as Estéticas Parnasiana e Simbolista a partir de suas

características peculiares e de seus autores representativos

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3.1 PARNASIANISMO

O Parnasianismo foi outra vítima dainteligência que construiu a prisão ondequis encarcerar o poeta.(Rubens Borba de Morais)

O Parnasianismo é a manifestação poética do realismo,

embora ideologicamente não mantenha pontos de contato com os

romancistas realistas e naturalistas. É uma estética preocupada

com a “arte pela arte”, com seus poetas à margem das grandes

transformações do final do século XIX e início do século XX.

O movimento parnasiano nasceu na França, por volta de

1865. Reagia contra a lírica de confissão fortemente sentimental, a

sensibilidade romântica, a forma às vezes demasiadamente solta

do romantismo, e valorizando a impassibilidade, o culto da forma,

da rima perfeita, da metrificação rigorosa, de um vocabulário escolhido

nobre, fazendo do poema quase uma escultura. Para os parnasianos,

a estética era mais importante do que a ética, a arte se justificava pela

própria arte e não por um possível alcance moral, ou didático.

Parnasianismo no Brasil

A instalação do Parnasianismo no Brasil como movimento

poético ocorre em 1882 com a publicação do livro Fanfarras, de

Teófilo Dias. É representada, sobretudo, por Olavo Bilac, Raimundo

Correia, Alberto de Oliveira, Francisca Júlia e Vicente de Carvalho.

A poesia parnasiana não alcança a popularidade que teve a poesia

romântica, entretanto, muitos poemas parnasianos conseguiram

tornar-se conhecidos do grande público, como é o caso de Vaso

Grego (Alberto de Oliveira) e As Pombas (Raimundo Correia).

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Literatura Brasileira II

Dos poetas parnasianos, Olavo Bilac é o mais popular.

Nasceu no Rio em 1865, foi jornalista, grande orador, inspetor

escolar. Como poeta, soube cultivar as características da sua

estética: desenvolveu com perfeição a rima e a métrica, fez uso do

mot juste, isto é, do termo preciso; a “arte pela arte” apresentou

correção da língua e do verso. Bilac soube articular como ninguém

a firme economia do poema com a rigorosa adequação das partes

ao todo. Além disso, o seu patriotismo o levou a cantar a paisagem

brasileira e a possível grandeza da nação. Publicou Poesias (1888)

e, um ano após sua morte, ocorrida em 1918, foi publicado Tarde.

ATIVIDADE

1) O poema de Bilac não perpassa apenas a frieza da

lapidação da palavra. Há um Bilac emotivo – quase romântico –

presente no volume de Poesias, que inaugura sua obra. É de notar

Tríade Parnasiana: Alberto de Oliveira, Raimundo Correia e Olavo BilacFonte: <http://palavrastodaspalavras.files.wordpress.Acesso em 20.fev.2010.>

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na parte do livro, denominada Via Láctea, o soneto, uma das formas

prediletas dos parnasianos. Busque o poema na íntegra no site

http://www.culturabrasil.pro.br/vialactea.htm e discuta, em sala de

aula, os traços do romantismo nele presentes.

Faça um levantamento dos aspectos formais do fragmento

do poema “Profissão de fé”, de Olavo Bilac, que permitem

classificá-lo como parnasiano.

................................................

Quero que a estrofe cristalina,

Dobrada ao jeito

Do ourives, saia da oficina

Sem um defeito;

................................................

Assim procedo. Minha pena

Segue esta norma,

Por te servir, Deusa serena,

Serena Forma!

.............................................

Celebrarei o teu ofício

No altar; porém,

Se inda é pequeno o sacrifício,

Morra eu também!

Caia eu também, sem esperança,

Porém tranquilo,

Inda, ao cair, vibrando a lança

Em prol do Estilo!

(Olavo Bilac)

Page 96: Literatura Brasileira II

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Literatura Brasileira II

3.2 SIMBOLISMO“Sugerir, eis o sonho”(Stéphane Mallarmé – poeta simbolistafrancês)

O Simbolismo surge dentro de uma crise no fim do século

XIX, resultado dos malefícios advindos da revolução industrial e da

descrença nos métodos de abordagens do real através da razão e

dos pressupostos científicos e positivistas. O progresso material

provocou instabilidade, porque o rápido desenvolvimento das

técnicas não só acelera a mudança das modas, mas também as

variações nos critérios do gosto estético e os métodos positivistas

utilizados para captar a realidade mostram-se ineficientes para a

compreensão global do universo.

Schopenhauer, filósofo alemão, em sua obra O mundo como

vontade e representação contesta o princípio positivista de que o

real pode ser apreendido através de uma aproximação objetiva e

experimental dos fenômenos. A realidade é mera ilusão, “o véu de

Maya” e, como tal, inacessível à aproximação racional e positiva.

Schopenhauer acaba por desmitificar o esforço, a luta e a ideia de

competição. Em consequência, ao desestimular a busca, a

conquista, põe em xeque o princípio do progresso, essencial à

ideologia positivista e base da Revolução Industrial.

A crise finissecular é marcada por fundo pessimismo,

devido à crença de que tudo reside em algo inacessível aos

homens. Assim, autores como Spencer, em sua obra Primeiros

princípios, denominava a estética simbolista de “Desconhecida”

uma potencia inescrutável do universo e Hartman em Filosofia

do Inconsciente identificava-a com “O inconsciente”, um espírito

possante, alma de tudo quando existe e inatingível ao

conhecimento humano.

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As filosofias pessimistas, por sua vez, estão diretamente

ligadas a um estado de espírito que caracteriza pela sensação

apocalíptica de fim dos tempos, pelo cansaço e envelhecimento

precoce, como se a civilização ocidental tivesse chegado a seu

término, provocando nos homens desalento mortal, que não pode

ser mitigado nem pelo prazer, nem pelas formas de conhecimento.

A sensação de desalento, de dor irremediável e de descrença

absoluta em valores é experimentada pelo herói do fim do século,

o dandy, como exemplo, podemos citar Dorian Gray, de Oscar

Wilde. É, pois, dentro dessa crise de valores, que leva ao grande

pessimismo e à sensação de decadência da civilização, que surge

o simbolismo.

Se os simbolistas muito devem às novidades românticas,

como o idealismo, a teoria das correspondências, a busca de

sugestões, o senso de mistério, também se transformaram em

críticos do romantismo. Isto porque repudiavam-no pelo

emocionalismo e pela ideia de que o acaso interferia no ato de

criação poética. Opondo-se aos românticos, os simbolistas

supunham o controle não só dos estados afetivos, mas também do

fazer poético. Quanto à atitude mística, ou ao que se convencionou

chamar de

“evangelho das

correspondências”,

ela também sofreu

modificações entre

os simbolistas.

Enquanto os

românticos a

concebiam a partir

da dicotomia Fonte: <http://images.google.com.br/

Page 98: Literatura Brasileira II

98

Literatura Brasileira II

mundo imanente e mundo transcendente, concebendo a divindade

como algo além da realidade terrestre, entre os poetas do

simbolismo, este espiritualismo circunscrevia-se “aos limites da

natureza terrena”. A divindade, tal qual a concebiam os simbolistas,

estaria agregada às coisas.

Simbolismo no Brasil

O início do Simbolismo no Brasil não pode ser entendido

como término da escola antecedente, o realismo. Como vimos, no

final do século XIX e início do século XX, temos três tendências

que caminham paralelas: o Realismo e suas manifestações

(romances realistas e naturalistas e a poesia parnasiana); o

Simbolismo, situado à margem da literatura acadêmica da época;

e o Pré-Modernismo, preocupado em denunciar a realidade

brasileira. Só mesmo um movimento com a amplitude da Semana

de Arte Moderna poderia acabar com todas essas estéticas e traçar

novos rumos para a nossa literatura.

Consideramos que o simbolismo chega ao Brasil com a

publicação, em 1893, de dois livros, ambos de autoria de Cruz e

Sousa: Missal (prosa) e Broquéis (poesia), mas o Brasil não

disseminou a estética, sendo ela mais europeia. A produção

literária brasileira envolve mais especificamente a arte de Cruz e

Sousa – Obras: Tropos e Fantasias; Missal e Broquéis;

Evocações, 1898 (prosa); Faróis, 1900 (poesias); Últimos

Sonetos, 1905 (poesia) e Alphonsus de Guimarães – Obras: Dona

Mística (1899), Câmara Ardente (1899), Centenário das Dores

de Nossa Senhora (1899), Kyriale (1899), Mendigo (1920), entre

outras.

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Vamos à atividade?!

Busque, no site http://www.revista.agulha.nom.br/

csousa.html#antifona, o poema Antífona de Cruz e Sousa, em

seguida compare-o com a poesia de Olavo Bilac, levantando

semelhanças e/ou diferenças quanto à forma e ao conteúdo.

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UNIDADE 4

CONTEÚDOS:

• Pré-modernismo

• Modernismo brasileiro

• Estudo das características e temas

• Autores representativos do Modernismo brasileiro

OBJETIVO:

√ Reconhecer o modernismo brasileiro com suas características e

autores mais significativos.

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Depois de termos estudado a prosa romântica, realista,

naturalista, os poetas parnasianos e simbolistas, passaremos a

abordar o modernismo com os autores que se destacaram nesse

movimento literário.

Mas antes destacaremos O Pré-Modernismo como

antecedente do Modernismo.

Bosi (2008) crê que se podemos chamar pré-modernista

(no sentido mais específico de período que antecipa idéias práticas

e modernistas dos temas vivos em 22) tudo o que problematiza a

nossa realidade social e cultural.

O Pré-Modernismo, no Brasil, não constitui uma escola

literária. Na realidade, Pré-Modernismo é um termo genérico que

designa toda uma vasta produção literária correspondente aos

primeiros vinte anos do século XX.

Enquanto a Europa se prepara para a Primeira Guerra

Mundial, o Brasil vive a República do café-com-leite, dos grandes

Fonte: <www.mac.usp.br/mac/templates/projetos/seculoxx/modulo2/modernismo/artistas/tarsila/images/efcb.jpg.>

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Literatura Brasileira II

proprietários rurais. É a época áurea da economia cafeeira no

Sudeste, é o momento da entrada de grandes. Levas de imigrantes,

notadamente os italianos, é o esplendor da Amazônia; com o ciclo

da borracha, é o surto da urbanização de São Paulo.

Mas toda essa prosperidade vem deixar cada vez mais

claros os fortes contrastes da realidade brasileira. É, também, o

tempo de agitações sociais. Do abandonado Nordeste, partem os

primeiros gritos de revolta. Em fins do século XIX, na Bahia, ocorre

a revolta de Canudos, tema de Os Sertões, de Euclides da Cunha;

nos primeiros anos do século XX, em todo o Sertão, assolado por

constantes secas, vive-se o tempo do cangaço, com a figura

lendária de Lampião.

Essas agitações são sintomas da crise na república do

café-com-leite, que se tornaria mais evidente na década e 1920,

servindo de cenário ideal para os questionamentos da Semana de

Arte Moderna.

Panorama Histórico

O Imperialismo;

Os barões do café;

O atentado de Sarajevo;

O Cangaço.

Apesar de o Pré-Modernismo não constituir uma escola

literária, apresenta traços característicos que evidenciam:

• Obras inovadoras que rompem com o passado , com

o academicismo , a exemplo da poética de Augusto dos Anjos,

cuja tônica literária aponta palavras não-poéticas, como cuspe,

escarro, vômito, vermes.

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UESPI/NEAD Letras Espanhol

• A denúncia da realidade brasileira, do Brasil não-oficial

do sertão nordestino, dos caboclos interioranos, dos subúrbios.

• O regionalismo : o Norte e o Nordeste, com Euclides da

Cunha; o vale do Paraíba e o interior paulista, com Monteiro Lobato;

o Espírito Santo, com Graça Aranha; o subúrbio carioca, com Lima

Barreto.

• Os tipos humanos marginalizados: o sertanejo

nordestino, o caipira, os funcionários públicos, os mulatos.

• Fatos políticos, econômicos e sociais

contemporâneos, diminuindo a distância entre a realidade e a

ficção.

A “descoberta de um Brasil desconhecido dos outros

movimentos literários” é a principal herança do movimento pré-

moderno.

A seguir listamos os principais autores.

√ Augusto dos Anjos (1884 – 1914): Eu (poesia)

√ Euclides da Cunha (1864 – 1909): Os Sertões,

contrastes e confrontos

√ Graça Aranha (1868 – 1931): Canaã

√ Lima Barreto (1881 – 1922): Recordações do Escrivão

Isaias Caminha, Triste Fim de Policarpo Quaresma, Numa e

Ninfa, Clara dos Anjos.

√ Monteiro Lobato (1882 – 1948): Urupês, Cidades

Mortas, Reinações de Narizinho, O Poço do Visconde.

Atenção! Vamos fazer a leitura do poema de Augusto dos

Anjos e fazer uma análise, focalizando a temática sob a perspectiva

pré-modernista.

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Psicologia de um vencido

“Eu, filho do carbono e do amoníaco,

Monstro de escuridão e rutilância,

Sofro, desde a epigênese da infância,

A influência má dos signos do zodíaco.

Profundissimamente hipocondríaco,

Este ambiente me causa repugnância...

Sobe-me à boca uma ânsia análoga à ânsia

Que se escapa da boca de um cardíaco.

Já o verme - este operário das ruínas -

Que o sangue podre das carnificinas

Come, e à vida em geral declara guerra,

Anda a espreitar meus olhos para roê-los,

E há de deixar-me apenas os cabelos,

Na frialdade inorgânica da terra!

4.1 MODERNISMO NO BRASIL

O Modernismo eclodiu no Brasil em fevereiro de 1922,

tendo como marco a Semana de Arte Moderna realizada no teatro

Municipal de São Paulo. O evento pretendia fazer com que a

população, de modo geral, tomasse consciência da realidade

brasileira. Este movimento cultural foi idealizado e liderado por um

grupo de artistas, chamado Grupo dos Cinco, integrado pelos

escritores Mário de Andrade, Oswald de Andrade e Menotti Del

Picchia e pelas pintoras Tarsila do Amaral e Anita Malfatti entre

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UESPI/NEAD Letras Espanhol

outros. É considerado um movimento não só artístico como também

político e social, já que se opunha à política totalitária da época,

bem como à contradição social entre os proletários e imigrantes e

as oligarquias rurais.

A Semana de Arte Moderna foi o ponto de encontro das

várias correntes que desde a I Guerra vinham se firmando em São

Paulo e no Rio, ao mesmo tempo, a plataforma que permitiu a

consolidação de grupos, a publicação de livros, revistas e

manifestos, numa palavra, o seu desdobrar-se em viva realidade

cultural. A necessidade de fundar a nova estética, de direcionar

seus rumos, de romper com os antigos padrões literários conferiu

ao Modernismo do primeiro momento um alto grau de radicalismo.

Mário de Andrade afirmou, a respeito da violência com que se

processou a ruptura com o passado:

(...) se alastrou pelo Brasil o espírito destruidor domovimento modernista. Isto é, o seu sentidoverdadeiramente específico. Porque, embora

Abaporu de Tarcila do AmaralFonte: <http://images.google.com.br/images>

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lançando inúmeros processos e idéias novas, omovimento modernista foi essencialmente , porque,mesmo que os autores tenham divulgado novaspropostas literárias, o modernismo brasileiro foi nadamais que destruidor.http://www.slinestorsantos.seed.pr.gov.br/redeescola/escolas/11/2590/17/arquivos/File/Biblioteca/semana_da_arte_moderna.pdf. Acesso em28.03.2010)

A primeira fase modernista também é marcada pelos

manifestos nacionalistas: do Pau-Brasil, da Antropofagia, do Verde-

Amarelismo e o da Escola da Anta. Através das características

desses manifestos, temos por análise a identificação de duas

posturas nacionalistas distintas: de um lado o nacionalismo

consciente, crítico da realidade brasileira, e de outro um

nacionalismo ufanista, utópico, exacerbado.

4.2 CONTEXTUALIZAÇÃO HISTÓRICA

A I Guerra Mundial (1914-1918) representou o colapso do

universo europeu. Gonzaga diz (2002.p.157) que, durante quatro

anos, os principais países da Europa envolveram-se num conflito

sem precedentes, causado pela ambição imperialista de suas

burguesias e pela manipulação do Nacionalismo chauvinista das

camadas populares. Interminável, a I Guerra estendeu-se nas

trincheiras, onde os soldados morriam como moscas. O morticínio, a

brutalidade, o sacrifício inútil de milhões de vítimas, além da ruína

econômica, levaram à bancarrota todos os valores. Os códigos, os

http://www.mac.usp.br/mac/templates/projetos/seculoxx/modulo2/modernismo/anteced/index.htm

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padrões, a moral, a filosofia, a religião não podiam explicar a violência

e a desintegração que impregnavam a realidade. A própria linguagem

artística parecia ultrapassada diante da ferocidade dos eventos. E

também com ela – a exemplo do mundo que significava - era destruída

e substituída por novas tendências. Veja as palavras abaixo.

Aquilo que entendemos por arte moderna já sepresentificara na primeira década do século XX, massua expansão e vitalidade deu-se na segunda década,quando a guerra, as crises sociais e existenciais, aRevolução na Rússia, o fim do grande ciclo burguês,favoreceram o desenvolvimento de uma arte polêmicae destruidora. Por romper com uma série de cânones,essa arte recebeu o nome de vanguarda, a que estáà frente do tempo (CARPEAUX apud GONZAGA,2002. p.175).

Neste contexto turbulento, os vários grupos inovadores se

multiplicaram, levando suas ousadias formais e temáticas até a

negação da possibilidade da arte de comunicar qualquer coisa.

Constituíram muitas vanguardas. No conjunto, não legaram obras

primas, mas contribuíram para a liberdade de expressão e para a

pesquisa estética.

Pesquise sobre os movimentos de Vanguarda Europeia,

dando certa importância ao futurismo e dadaísmo e discuta com a

turma a repercussão delas aqui no Brasil.

4.3 CARACTERÍSTICAS DA LITERATURA MODERNISTA

A - A liberdade de Expressão

A importância maior das vanguardas residiu no triunfo de

uma concepção inteiramente libertária da criação artística. Aqui o

artista é regido pelas leis da sua própria interioridade. Picasso

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Literatura Brasileira II

não pintará o mais o real, mas sim a sua interpretação do real. A

liberdade só poderá ser cerceada por regimes autoritários que

proíbem a circulação dos objetos artísticos. Em suma, todas as

normas foram abolidas. Poética, de Manuel Bandeira, é um

exemplo dessa nova postura:

Poética

Estou farto do lirismo comedido

Do lirismo bem comportado

Do lirismo funcionário público com livro de ponto expediente

protocolo e manifestações de apreço ao Sr. Diretor.

Estou farto do lirismo que pára e vai averiguar no dicionário o

cunho vernáculo de um vocábulo.

Abaixo os puristas

Todas as palavras sobretudo os barbarismos universais

Todas as construções sobretudo as sintaxes de excepção

Todos os ritmos sobretudo os inumeráveis

Estou farto do lirismo namorador

Político

Raquítico

Sifilítico

De todo lirismo que capitula ao que quer que seja fora

de si mesmo

De resto não é lirismo

Será contabilidade tabela de co-senos secretário

do amante exemplar com cem modelos de cartas

e as diferentes maneiras de agradar às mulheres, etc.

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UESPI/NEAD Letras Espanhol

Quero antes o lirismo dos loucos

O lirismo dos bêbados

O lirismo difícil e pungente dos bêbedos

O lirismo dos clowns de Shakespeare

- Não quero mais saber do lirismo que não é libertação.

(www.astormentas.com/bandeira.htm)

B - Incorporação do cotidiano

Uma das maiores conquistas do modernismo, a

valorização da vida cotidiana traz para a arte uma abertura temática

sem precedentes, pois, até então, apenas assuntos sublimes

tinham direito indiscutível ao mundo literário. O prosaico, o diário,

o grosseiro, o vulgar, o resíduo e o lixo tornam-se os motivos

centrais da estética modernista. À grandiosidade da paisagem,

Manuel Bandeira sobrepõe o beco:

“Que importa a paisagem, a Glória, a linha do horizonte?

- o que eu vejo é um beco’’ (GONZAGA, 2002, p. 160).

C - Linguagem coloquial

Este anticonvencionalismo temático, essa

dessacralização dos conteúdos encontra correspondência na

linguagem. Expressões da língua culta mesclam-se com a língua

popular. Veja abaixo o poema de Bandeira citado por Gonzaga

(2202, p.162)

A vida não me chegava pelos jornais nem pelos livros

Vinha da boca do povo

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Literatura Brasileira II

Língua certa do povo

Porque ele é que fala gostoso o português do Brasil (...)

D - Inovações técnicas

Com o rompimento dos padrões culturais do século XIX, o

modernismo apresenta novas técnicas tanto na poesia como na

ficção. As principais conquistas foram:

- o verso livre : o verso não se assujeita aos rigores dasmétricas e da formas fixas de versificação. Vejamos o poema de

Carlos Drummond de Andrade A flor e a náusea:

A flor e a náusea

Preso à minha classe e a algumas roupas,vou de branco pela rua cinzenta.Melancolias, mercadorias espreitam-me.Devo seguir até o enjôo?Posso, sem armas, revoltar-me?Olhos sujos no relógio da torre:Não, o tempo não chegou de completa justiça.O tempo é ainda de fezes, maus poemas, alucinações e espera.O tempo pobre, o poeta pobre

fundem-se no mesmo impasse.Fonte: <http://leaoramos.blogspot.com/2008/01/preso-sua-classe-e-algumas-roupas.html>

- a destruição dos nexos : as preposições os nexos

sintáticos, as conjunções etc, são eliminados da poesia moderna,

que a torna mais solta, mais descontínua e fragmentária e,

fundamentalmente mais sintética. Veja o poema de Décio Pignatari:

Beba coca cola

babe cola

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UESPI/NEAD Letras Espanhol

beba coca

babe cola caco

caco

cola

c l o a c aFonte: <http://www.jayrus.art.br/Apostilas/LiteraturaBrasileira/VanguardasPoeticas/Decio_Pignatari_poesia.htm>

- O fluxo da consciência-técnica narrativa estabelecida

por Edouard Dujardin e sacramentada por James Joyce. Trata-se

de um monólogo interior levando para o texto de ficção sem qualquer

obediência á normalidade gramatical, à lógica ou mesmo à

coerência. É a mente da personagem revelada por ele próprio,

sem nenhum tipo de barreira racional. Observemos o monólogo

de Molly Bloom no Ulisses de Joyce:

(...) que alívio onde quer que seja teu vento despejaquem sabe se aquela costeleta de porco que comicom minha xícara de chá depois estava boa com ocalor ou não cheirei nada eu certa que aquele sujeitoafrescalhado na charuteria é um grande maroto euespero que essa lamparina não esteja fumegando prame encher o nariz de fuligem (...)(http://educaterra.terra.com.br/literatura/modernismo/modernismo_14.htm Acesso em 28.03.2010)

- Colagem e mont agem cinematográfica - Ainda no

campo da narrativa, valoriza-se a fragmentação do texto, sua

montagem em blocos e a colagem - a exemplo do que tinham feito

os pintores cubistas - de notícias de jornais, cartazes, telegramas,

etc., no corpo dos romances, truque utilizado por John dos Passos

na trilogia U.S.A. No Brasil, eventualmente, Jorge Amado vale-se

da colagem em seus primeiros romances, como em Jubiabá e

Capitães de areia.

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Literatura Brasileira II

- Ampliação das vozes narrativas - No século XIX, os

romances eram narrados em primeira ou terceira pessoa. A estética

modernista, sobremodo depois das experiências do americano

William Faulkner (Enquanto agonizo, O som e a fúria, 1929), passa

a admitir uma multiplicidade de perspectivas, vários narradores,

mescla de primeira, terceira e até de segunda pessoa,

possibilitando um complexo conjunto de ângulos sobre os

acontecimentos e os protagonistas dos relatos.

F - Paródia

Os modernistas realizaram uma releitura de textos famosos

do passado, reescrevendo em termos de paródia. A crítica literária

enquadra A escrava que não é Isaura, numa evidente alusão ao

escritor Bernardo Guimarães. Outro exemplo é de Oswald de

Andrade que se baseia na Canção do Exílio. Veja.

Minha terra tem palmares

Onde gorjeia o mar

Os passarinhos daqui

Não cantam como os de lá

Minha terra tem mais rosas

E quase que mais amores

Minha terra tem mais ouro

Minha terra tem mais terra

Ouro terra amor e rosas

Eu quero tudo de lá

Não permita Deus que eu morra

Sem que volte para lá

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UESPI/NEAD Letras Espanhol

Não permita Deus que eu morra

Sem que volte pra São Paulo

Sem que veja a Rua 15

E o progresso de São Paulo

ATIVIDADE

Compare este poema de Oswald de Andrade com A Canção do

Exílio de Gonçalves Dias. Comente com a turma. Em seguida,

procure ver essa técnica da paródia em outros poemas.

4.4 A SEMANA DE ARTE MODERNA

A Semana de Arte Moderna ocorreu no Teatro Municipal

de São Paulo, em 1922, tendo como objetivo mostrar as novas

tendências artísticas que já vigoravam na Europa. Esta nova forma

de expressão não foi compreendida pela elite paulista, que era

influenciada pelas formas estéticas europeias mais conservadoras.

O idealizador deste evento artístico e cultural foi o pintor DI Cavalcante.

Em um período repleto de agitações, os intelectuais

brasileiros se viram em um momento em que precisavam

abandonar os valores estéticos antigos, ainda muito apreciados

em nosso país, para dar lugar a um novo estilo completamente

contrário, e do qual, não se sabia ao certo o rumo a ser seguido.

No Brasil, o descontentamento com o estilo anterior foi bem

mais explorado no campo da literatura, com maior ênfase na poesia.

Fonte: <http://www.releituras.com/oandrade_menu.asp>.

Fonte: <http://www.releituras.com/oandrade_menu.asp>.

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Literatura Brasileira II

Entre os escritores modernistas destacam-se: Oswald de Andrade,

Guilherme de Almeida e Manuel Bandeira. Na pintura, destacou-se

Anita Malfatti, que realizou a primeira exposição modernista brasileira

em 1917. Suas obras, influenciadas pelo cubismo, expressionismo e

Futurismo, escandalizaram a sociedade da época. Monteiro Lobato

não poupou críticas à pintora, contudo, este episódio serviu como

incentivo para a realização da Semana de Arte Moderna.

A Semana, na verdade, foi a explosão de idéias inovadoras

que aboliam por completo a perfeição estética tão apreciada no

século XIX. Os artistas brasileiros buscavam uma identidade própria

e a liberdade de expressão; com este propósito, experimentavam

diferentes caminhos sem definir nenhum padrão. Isto culminou com

a incompreensão e com a completa insatisfação de todos que foram

assistir a este novo movimento. Logo na abertura, Manuel Bandeira,

ao recitar seu poema Os sapos, foi desaprovado pela plateia

através de muitas vaias e gritos.

Embora tenha sido alvo de muitas críticas, a Semana de

Arte Moderna só foi adquirir sua real importância ao inserir suas

idéias ao longo do tempo. O movimento modernista continuou a

expandir-se por divulgações através da Revista Antropofágica e

da Revista Klaxon, e também pelos seguintes movimentos:

Movimento Pau-Brasil, Grupo da Anta, Verde-Amarelismo e pelo

Movimento Antropofágico.

Todo novo movimento artístico é uma ruptura com os

padrões utilizados pelo anterior, isto vale para todas as formas de

expressões, sejam elas através da pintura, literatura, escultura,

poesia, etc. Ocorre que nem sempre o novo é bem aceito, isto foi

bastante evidente no caso do Modernismo, que, a principio, chocou

por fugir completamente da estética europeia tradicional que

influenciava os artistas brasileiros.

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UESPI/NEAD Letras Espanhol

A seguir, apresentamos a primeira fase modernista,

destacando apenas os autores mais representativos.

4.5 A PRIMEIRA FASE MODERNISTA (1922 a 1930)

OSWALD DE ANDRADE

Biografia, obras e estilo literário

Um dos principais literatos do modernismo no Brasil, José

Oswald de Sousa Andrade, nasceu em São Paulo, no ano de 1890,

e viveu até 1954, quando faleceu.

Em 1916, deu início ao livro Memórias Sentimentais de

João de Miramar. Em 1917, conheceu Mario de Andrade e a partir

de então, passaram a trabalhar juntos iniciando movimentos que

visavam à Semana de Arte Moderna, que ocorreu em 1922.

Ainda no ano de 1922, o escritor modernista Oswald de

Andrade escreveu o romance Trilogia do Exílio. A partir de então,

escreveu outras obras: Estrela de Absinto, A Escada Vermelha,

Primeiro Caderno do Aluno de Poesia etc.

No ano de 1924, Oswald lançou, na Europa, o movimento

nativista Pau-Brasil. Para dar continuidade a este movimento, ele

fundou, em 1927, a Revista de Antropologia com seu Manifesto

Antropofágico.

Fonte: <http://www.suapesquisa.com/biografias/oswalddeandrade>

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Literatura Brasileira II

Com A Crise da Filosofia Messiânica, ele passou a ser

livre docente de Literatura Brasileira na Universidade de São Paulo.

Além dos livros escritos por ele, Oswald de Andrade foi o precursor

de perspectivas totalmente inexploradas pelo teatro brasileiro.

PRINCIPAIS OBRAS:

Romances

Os Condenados (1922), Memórias Sentimentais de João

Miramar (1924), Estrela de Absinto (1927), Serafim Ponte Grande

(1933), A Escada Vermelha (1934), Os Condenados (l941) - reunindo

os livros de 1922,1927 e 1934, constituindo a Trilogia do Exílio, Marco

Zero I - Revolução Melancólica (1943), Marco Zero II - Chão (1946).

Poesia

Pau-Brasil (1925), Primeiro Caderno de Poesia do Aluno

Oswald de Andrade (1927), Poesias Reunidas (1945).

Teatro

O Homem e o Cavalo (1943), Teatro (A Morta e O Rei da

Vela (1937).

Ensaio

Ponta de Lança (1945?), A Arcádia e a Inconfidência (1945),

A Crise da Filosofia Messiânica (1950), A Marcha das Utopias

(1966).

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Memórias

Um Homem sem Profissão (1954).

Os Romances da Destruição

De acordo com Gonzaga (2002), Oswald de Andrade foi o

criador e principal divulgador da orientação Primitivista, com o Pau-

Brasil e com a Antropofagia; escreveu os textos mais corrosivos

da estética modernista. Com efeito, os seus dois romances

desobedecem aos padrões tradicionais da narrativa, diluindo a

separação entre os gêneros. A título de exemplo, citamos Memórias

sentimentais de João Miramar, no qual não distinguimos a prosa

da poesia. Essa mesma observação vale para Serafim Ponte

Grande.

Apresenta uma fragmentação total que implica uma ruptura

com o narrativo e com o descritivo. São capítulos relâmpagos que

formam uma colagem com outros capítulos, igualmente curto, numa

condensação telegráfica.O clima é de inversão permanente.

Mário de Andrade

http://www.suapesquisa.com/biografias/mariodeandrade/

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Literatura Brasileira II

Mario de Andrade é natural de São Paulo, nasceu no ano

de 1893. Foi professor, crítico, poeta, contista, romancista e músico,

formou-se pelo Conservatório Dramático e Musical de São Paulo,

ministrou aulas neste mesmo local posteriormente. Participou da

Semana de Arte Moderna, no Teatro Municipal de São Paulo.

Durante sua trajetória acadêmica Mário de Andrade fundou

a Sociedade de Etnografia e Folclore e exerceu também vários

cargos públicos, entre estes, foi diretor do Departamento Municipal

de Cultura de São Paulo.

Mário de Andrade teve várias ocupações, este artista

modernista sempre tinha tempo para ajudar os escritores que ainda

não eram conhecidos pela crítica acadêmica. Durante sua vida lutou

pela arte com seu estilo de escrita requintado e verdadeiro. Seguro

de que a inteligência brasileira necessitava de atualização, este

escritor modernista nunca abandonou suas maiores virtudes: a

consciência artística e a dignidade intelectual.

Escreveu os versos de Paulicéia Desvairada considerada

o marco inicial da poesia modernista no Brasil. Uma outra obra

deste autor foi aceita por sua contribuição ao movimento

modernista. Essa obra tem como título Macunaíma, romance onde

é focalizado um heroi que tem as qualidades e defeitos de um

brasileiro comum.

Suas obras são:

Poesia

Há uma Gota de Sangue em Cada Poema (1917),

Paulicéia Desvairada (1922), Losango Cáqui (1926), Clã do Jabuti

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(1927), Remate de Males (1930), Poesias (1941), Lira Paulistana

(1946), O Carro da Miséria (1946), Poesias Completas (1955).

Romance

Amar, Verbo Intransitivo (1927), Macunaíma (1928).

Contos

Primeiro Andar (1926), Belasarte (1934), Contos Novos

(1947).

Crônicas

Os filhos da Candinha (1943).

Ensaios

A Escrava que não é Isaura (1925), O Aleijadinho de Álvares

de Azevedo (1935), O Movimento Modernista (1942), O Baile das

Quatro Artes (1943), O Empalhador de Passarinhos (1944), O

Banquete (1978).

A Poesia

Conforme Gonzaga (2002, p.178), se Há uma gota de

sangue em cada poema, Poesias completas, 1972, escrito em

1917, sob a influência da I Guerra, é um livro adolescente, sem

qualquer valor estético, a publicação, em 1922, de Pauliceia

desvairada implica o surgimento de um poeta adulto, e muito jovem

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Literatura Brasileira II

cronologicamente. Um poeta incapaz de teorizar sobre sua própria

poesia sobre as tendências modernistas do novo lirismo. No

prefácio de Paulicéia desvairada ele afirma:

“Quando sinto a impulsão lírica, escrevo sem pensar tudo

o que meu inconsciente me grita. Penso depois: não só para corrigir,

como para justificar o que escrevi. Daí a razão desse Prefácio

Interessantíssimo”.

Assim, percebemos, na elaboração lírica de Mário de

Andrade, uma espécie de a fórmula:

LIRISMO + ARTE = POESIA

Ou seja, o poeta parte de fleches de subconsciente e os

reelabora através de uma adequada técnica rítmica e semântica.

Portanto, não tematiza a máquina pela máquina, a exemplo

de Marinetti, embora percebamos que, em Paulicéia desvairada,

há os indícios da modernidade estejam presentes.

Em outros poemas, ele ironiza e destroi as cidades e seus

habitantes:

Ode ao burguês

Mário de Andrade

Eu insulto o burguês! O burguês-níquel

o burguês-burguês!

A digestão bem-feita de São Paulo!

O homem-curva! O homem-nádegas!

O homem que sendo francês, brasileiro, italiano,

é sempre um cauteloso pouco-a-pouco!

Eu insulto as aristocracias cautelosas!

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Os barões lampiões! Os condes Joões! Os duques zurros!

Que vivem dentro de muros sem pulos,

e gemem sangue de alguns mil-réis fracos

para dizerem que as filhas da senhora falam o francês

e tocam os “Printemps” com as unhas!

Eu insulto o burguês-funesto!

O indigesto feijão com toucinho, dono das tradições!

Fora os que algarismam os amanhãs!

Olha a vida dos nossos setembros!

Fará Sol? Choverá? Arlequinal!

Mas à chuva dos rosais

o êxtase fará sempre Sol!

Morte à gordura!

Morte às adiposidades cerebrais!

Morte ao burguês-mensal!

Ao burguês-cinema! Ao burguês-tiburi!

Padaria Suíssa! Morte viva ao Adriano!

”— Ai, filha, que te darei pelos teus anos?

— Um colar... — Conto e quinhentos!!!

Más nós morremos de fome!”

Come! Come-te a ti mesmo, oh! gelatina pasma!

Oh! purée de batatas morais!

Oh! cabelos nas ventas! Oh! carecas!

Ódio aos temperamentos regulares!

Ódio aos relógios musculares! Morte à infâmia!

Ódio à soma! Ódio aos secos e molhados

Ódio aos sem desfalecimentos nem arrependimentos,

sempiternamente as mesmices convencionais!

Page 124: Literatura Brasileira II

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Literatura Brasileira II

De mãos nas costas! Marco eu o compasso! Eia!

Dois a dois! Primeira posição! Marcha!

Todos para a Central do meu rancor inebriante!

Ódio e insulto! Ódio e raiva! Ódio e mais ódio!

Morte ao burguês de giolhos,

cheirando religião e que não crê em Deus!

Ódio vermelho! Ódio fecundo! Ódio cíclico!

Ódio fundamento, sem perdão!

Fora! Fu! Fora o bom burguês!...

Fonte: <http://www.revista.agulha.nom.br/and.html#ode Acesso em.28.03.2010.>

A Ficção

Sua ficção gira em torno de núcleos: o universo familiar da

burguesia paulista e o primitivismo de fundo folclórico e o popular.

Ao primeiro tipo de narrativa – mais próximo da vida do

autor - pertencem Amar, verbo intransitivo e Contos novos. O

primeiro aborda um caso de amor entre o adolescente de família

tradicional com preceptora encarregada de realizar sua educação

sentimental. Essas governantas eram contratadas para evitar que

os rapazes se iniciassem com as prostitutas e contraíssem doença.

No romance dá tudo trocado. O texto naufraga num psicologismo

duvidoso e nas intervenções contínuas e nem sempre oportunas

ao narrador.

O segundo (Contos novos) é mais eficiente como literatura.

Há, no livro, o conto O peru de natal, entre outros, que merecem ser

lido pela inovação no plano da escrita literária e pela temática

ugerida quanto ao aspecto erótico e psicanalítico.

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O Herói sem nenhum caráter

Macunaíma representa a identificação de Mário com a

questão nacional primitivista. Desde o começo do romance apela

para o suporte mitológico: a lenda indígena de Macunaíma

transfigurada pelo escritor:

No fundo do mato-virgem nasceu Macunaíma, herói da

nossa gente. Era preto retinto e filho do medo da noite. Houve um

momento em que silêncio foi tão grande escutando o murmurejo

do Uraricoera, que a índia tapanhumas pariu uma criança feia. Essa

criança é que chamaram de Macunaíma.

Já na meninice fez coisas de sarapantar. De primeiro passou

mais de seis anos não falando. Si o incitavam a falar exclamava:

- Ai que preguiça!...

e não dizia mais nada. Ficava no canto da maloca, trepado

no jirau de paxiúba, espiando o trabalho dos outros e principalmente

os dois manos que tinha, Maanape já velhinho e Jiguê na força do

homem. O divertimento dele era decepar cabeça de saúva. Vivia

deitado mas si punha os olhos em dinheiro, Macunaíma dandava

pra ganhar vintém. E também espertava quando a família ia tomar

banho no rio, todos juntos e nus. Passava o tempo do banho dando

mergulho, e as mulheres soltavam gritos gozados por causa dos

guaiamuns diz-que habitando a água-doce por lá. No mucambo si

alguns cunhatã se aproximava dele pra fazer festinha, Macunaíma

punha a mão nas graças dela, cunhatã se afstava. Nos machos

guspia na cara. Porém respeitava os velhos e freqüentava com

aplicação a murua a poracê o torê o bacorocô a cucuicogue, todas

essas danças religiosas da tribo.ANDRADE,Mário.Macunaima,Oheroi sem nenhum caráter In: http://www.jayrus.art .br /Apost i las/Li teraturaBrasi le i ra/Modernismo22/Mario_de_AndradeMacunaima_resumo2.htm.

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Literatura Brasileira II

O esforço de Mário foi ao intuito de configurar o herói de

nossa gente. As andanças de Macunaíma da selva à cidade, a

própria origem étnica delimita o caráter do brasileiro. Os traços

definidos do romance para a irreverência, o deboche e uma

sensualidade forte como elementos estruturadores da vida de

Macunaíma.

Manuel Bandeira (1886-1968)

É uma das figuras mais importantes da poesia brasileira e um dos

iniciadores do Modernismo. Do penumbrismo pós-simbolista de A

Cinza das Horas às experiências concretas da década de 60 de

Composições e Ponteios, a poesia de Bandeira destaca-se pela

consciência técnica com que manipulou o verso livre. Participa

indiretamente da SAM, quando Ronald de Carvalho declama seu

poema Sapos.

Sempre pensando que morreria cedo (tuberculoso), acabou vivendo

muito e marcando a literatura brasileira. Morte e infância são as

molas propulsoras de sua obra. Ironizava o desânimo provocado

pela doença, mas em Cinza das Horas apresenta melancolia e

sofrimento por causa da “dama branca”. Além de ser um poeta

fabuloso, também foi ensaísta, cronista e tradutor. O próprio autor

define sua poesia como a do “gosto humilde da tristeza”.

Pneumotórax

Febre, hemoptise, dispnéia e suores noturnos.

A vida inteira que podia ter sido e que não foi.

Tosse, tosse, tosse.

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Mandou chamar o médico:

— Diga trinta e três.

— Trinta e três . . . trinta e três . . . trinta e três . . .

— Respire.

...............................................................................................................

— O senhor tem uma escavação no pulmão esquerdo e o pulmão

direito infiltrado.

— Então, doutor, não é possível tentar o pneumotórax?

— Não. A única coisa a fazer é tocar um tango argentino.Fonte: <http://www.revista.agulha.nom.br/manuelbandeira02.html#pneumotorax>

Ritmo Absoluto e Libertinagem são frutos de um processo

de integração com o Rio. Sua poesia contagia-se de uma visão

erótico-sentimental, resultante da forma de encarar o amor a partir

da experiência do corpo. Libertinagem usa lirismo solto, repleto

de cenas do cotidiano. Em Estrela da Manhã, atinge a plenitude

de seu lirismo libertário, mostrando que tudo pode ser matéria

poética: um clássico esquecido, uma frase de criança, uma notícia

de jornal, a casa em que morava e até mesmo uma propaganda

de três sabonetes (Baladas das três mulheres do sabonete Araxá).

Obras principais:

• Poesia:

o A Cinza das Horas (1917)

o Carnaval (1919)

o O Ritmo Dissoluto (1924)

o Libertinagem (1930)

o Estrela da Manhã (1936)

Page 128: Literatura Brasileira II

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Literatura Brasileira II

o Lira dos Cinquent’Anos (1940)

o Belo, Belo (1948)

o Mafuá do Malungo (1948)

o Opus 10 (1952)

o Estrela da Tarde (1963)

o Estrela da Vida Inteira (1966)

• Prosa:

o Crônicas da Província do Brasil (1937)

o Guia de Ouro Preto (1938)

o Noções de História das Literaturas (1940)

o Literatura Hispano-Americana (1949)

o Gonçalves Dias (1952)

o Itinerário de Pasárgada (1954)

o De Poetas e de Poesia (1954)

o Flauta de papel (1957)

o Andorinha, Andorinha (seleção de Carlos Drummond de

Andrade, 1966)

o Colóquio Unilateralmente Sentimental (1968)

4.6 SEGUNDA FASE MODERNISTA NO BRASIL (1930-1945) -

PROSA

Essa fase modernista se caracteriza de forma madura

porque leva em consideração o documento da realidade brasileira

como matéria para a ficção. Os escritores nordestinos merecem

destaque especial, pela denúncia que faz da região pouco

conhecida nos grandes centros. O 1° romance nordestino foi A

Bagaceira, de José Américo de Almeida. Esses romances retratam

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UESPI/NEAD Letras Espanhol

o surgimento do capitalismo, a exploração das pessoas,

movimentos migratórios, miséria, fome, seca etc. Autores Principais:

Rachel de Queiroz (1910 - )

Cearense, viveu na infância o problema da seca que atingiu

uma propriedade de sua família. Em 1930 (aos 20 anos) publica o

romance O Quinze, que lhe angaria um prêmio e reconhecimento

público. Participa ativamente da política, militando no Partido

Comunista Brasileiro e é presa em 1937, por suas idéias

esquerdistas. A partir de 1940, dedica-se à crônica e ao teatro.

Quebrou uma velha tradição, ao tornar-se (1977) a primeira mulher

a ingressar na Academia Brasileira de Letras.

Sua literatura caracteriza-se, a princípio, pelo caráter

regionalista e sociológico, com enfoque psicológico, que tende a

se valorizar e a aprofundar-se à proporção que sua obra

amadurece. Seu estilo é conciso e descarnado, sua linguagem

fluente, seus diálogos vivos e acessíveis, o que resulta numa

narrativa dinâmica e enxuta.

Em O Quinze e João Miguel há coexistência do social e

psicológico. Caminho de Pedras é o ponto máximo de sua literatura

engajada e de esquerda (mais social e político). As Três Marias

abandona o aspecto social, enfatizando a análise psicológica.

Obras:

• Romances: O Quinze (1930) e João Miguel (1932) - seca;

coronelismo; impulsos passionais / Caminho de Pedras (1937) e

As Três Marias (1939) - literatura engajada, esquerdizante, social

e política, trata ainda da emancipação feminina / O Galo de Ouro

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Literatura Brasileira II

(folhetim em “O Cruzeiro”) / Memorial de Maria Moura (1992;

surpreende seu público e é adaptado para a televisão)

· Teatro: Lampião (1953), A Beata Maria do Egito (1958, raízes

folclóricas), A Sereia Voadora.

· Crônica: A Donzela e a Moura Torta (1948), Cem Crônicas

Escolhidas (1958), O Brasileiro Perplexo (1963, Histórias e

Crônicas), O Caçador de Tatu (1967)

Literatura Infantil: O Menino Mágico, Andira.

José Lins do Rego (1901 - 1957)

Paraibano, é considerado um dos melhores

representantes da literatura regionalista do Modernismo. Em Recife,

aproximam-se de José Américo de Almeida e Gilberto Freire,

intelectuais responsáveis pela divulgação do modernismo no

nordeste e pela preocupação regionalista. Mais tarde também

conhece Graciliano Ramos, e depois para o Rio de Janeiro, onde

participa ativamente da vida literária. Sua infância no engenho

influenciou fortemente sua obra.

Suas obras Menino de Engenho, Doidinho, Bangüê,

Moleque Ricardo, Usina e Fogo Morto compõem o que se

convencionou chamar de “ciclo da cana de açúcar”. Nestas obras

J. L. Rego narra a gradativa decadência dos engenhos e a

transformação pela qual passam a economia e a sociedade

nordestina. Sua técnica narrativa se mantém nos moldes

tradicionais da literatura realista: linearidade, construção do

personagem baseado na descrição dos caracteres, linguagem

coloquial, registro da vida e dos costumes. O tom memorialista é o

fio condutor de uma literatura que testemunha uma sociedade em

desagregação: a sociedade do engenho patriarcalista,

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UESPI/NEAD Letras Espanhol

escravocrata. As obras mais representativas desta fase são Menino

de Engenho e Fogo Morto. A primeira é a história de um menino,

órfão de pai e mãe, que é criado no Engenho Santa Rosa, de seu

avô José Paulino, típico representante do latifundiário nordestino.

Há momento de grande emoção na obra, como a descrição da

enchente, o castigo dos escravos, a descoberta da própria

sexualidade.

Fogo Morto é considerada sua melhor obra: dividida em

três partes que se interrelacionam, compõe um quadro social e

humano do Nordeste. Mestre José Amaro, seleiro, orgulhoso de

sua profissão, sofre as pressões do coronel Lula de Holanda, senhor

do Engenho Santa Fé, em decadência econômica. Antônio Silvino,

cangaceiro, é o terror da região e ataca os engenhos. O capitão

Vitorino Carneiro da Cunha, lunático, é uma espécie de místico e

profeta do sertão.

José Lins ainda escreveu: Pedra Bonita e Cangaceiros,

onde continua a traçar um quadro da vida nordestina, aproveitando

agora elementos do folclore e do cordel. Estes romances pertencem

ao “ciclo do cangaço, misticismo e seca”. Além destes, escreveu

também Água-mãe e Eurídice, de ambientação urbana.

Obras:

- Romances: Menino de Engenho (1932), Doidinho (1933),

Bangüê (1934), O Moleque Ricardo (1935), Usina (1936), Pureza

(1937), Pedra Bonita (1938), Riacho Doce (1939), Água-mãe

(1941), Fogo Morto (1943), Eurídice (1947), Cangaceiros (1953).

- Literatura infantil, memórias e crônicas: Histórias da Velha

Totônia (1936), Gordos e Magros (1942), Seres e Coisas (1952),

Meus Verdes Anos (1956).

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132

Literatura Brasileira II

Graciliano Ramos (1892-1953)

Alagoano, faz jornalismo e política estreando com Caetés

(1933). Em Maceió conheceu alguns escritores do grupo

regionalista: José Lins, Jorge Amado, Raquel de Queirós. Nessa

época redige S. Bernardo e Angústia.

Envolvendo-se em política, é preso e acusado de comunista,

essas experiências pessoais são retratadas em Memórias do

Cárcere. Em 1945 ingressa no Partido Comunista e empreende uma

viagem aos países socialistas, narrada no livro Viagem.

Luta pela sobrevivência é o ponto de ligação entre seus

personagens, onde a lei maior é a lei da selva. A morte é uma

constante em suas obras como final trágico e irreversível (suicídios

em Caetés e São Bernardo, assassinato em Angústia e as mortes

do papagaio e da cadela Baleia em Vidas Secas).

A crítica propõe uma divisão da obra em 3 partes:

- Romances em 1ª pessoa (Caetés, São Bernardo e Angústia)

- pesquisa da alma humana e retrato e análise da sociedade.

- Romances em 3ª pessoa (Vidas Secas) - enfoca modos

se der e as condições de existência no meio da seca.

- Autobiografias (Infância e Memórias do Cárcere) - coloca-

se como caso humano, como uma necessidade de depor, denuncia.

- Suas personagens são seres oprimidos e moldados pelo

meio. Tanto Paulo Honório (personagem de São Bernardo), quanto

Luís da Silva (de Angústia) são o que se chama de “herói

problemático”, em conflito com o meio e consigo mesmo, em luta

constante para adaptar-se e sobreviver, insatisfeitos e irrealizados.

Linguagem sintética e concisa.

Obras : Caetés (1933), São Bernardo (1934), Angústia

(1936), Vidas Secas (1938), Dois Dedos (1945), Insônia (1947),

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UESPI/NEAD Letras Espanhol

Infância (1945), Memórias do Cárcere (1953), Histórias de

Alexandre (1944), Viagem (1953), Linhas Tortas (1962)

Dando continuidade ao estudo do Modernismo,

destacaremos a geração de 30.

4.7 A SEGUNDA FASE MODERNISTA-POESIA (1930 a 1945)

Estende-se de 1930 a 1945, sendo um período rico na

produção poética e também na prosa. O universo temático se amplia

e os artistas passam a preocupar-se mais com o destino dos

homens, o estar-no-mundo.

Durante algum certo tempo, a poesia das gerações de 22 e 30

conviveram. Não se trata, portanto, de uma sucessão brusca. A maioria

dos poetas de 30 absorveria parte da experiência de 22: liberdade temática,

gosto da expressão atualizada ou inventiva, verso livre, anti-academicismo.

A poesia prossegue a tarefa de purificação de meios e

formas iniciada antes, ampliando a temática na direção da

inquietação filosófica e religiosa, com Vinícius de Moraes, Jorge

de Lima, Augusto Frederico Schmidt, Murilo Mendes, Carlos

Drummond de Andrade, ao tempo em que a prosa alargava a sua

área de interesse para incluir preocupações novas de ordem

política, social e econômica, humana e espiritual. À piada sucedeu

a gravidade de espírito, a seriedade da alma, propósitos e meios.

Uma geração grave, preocupada com o destino do homem e com

as dores do mundo, pelos quais se considerava responsável, deu

à época uma atividade excepcional.

O humor quase piadístico de Drummond receberia

influencias de Mário e Oswald de Andrade. Vinícius, Cecília, Jorge

de Lima e Murilo Mendes apresentam certo espiritualismo que vinha

do livro de Mário Há uma gota de Sangue em cada Poema (1917).

Page 134: Literatura Brasileira II

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Literatura Brasileira II

A geração de 30 não precisou ser combativa como a de

22. Eles já encontraram uma linguagem poética modernista

estruturada. Passaram então a aprimorá-la e extrair dela novas

variações, numa maior estabilidade.

O Modernismo já estava dinamicamente incorporado às

praticas literárias brasileiras, sendo assim os modernistas de 30 estão

mais voltados ao drama do mundo e ao desconcerto do capitalismo.

Características

• Repensar a historia nacional com humor e ironia - “Em outubro

de 1930 / Nós fizemos — que animação! — / Um pic-nic com

carabinas.” (Festa Familiar - Murilo Mendes)

• • • • • Verso livre e poesia sintética - “Stop. / A vida parou / ou foi o

automóvel?” (Cota Zero, Carlos Drummond de Andrade)

• • • • • Nova postura temática - questionar mais a realidade e a si mesmo

enquanto indivíduo

• • • • • Tentativa de interpretar o estar-no-mundo e seu papel de poeta

• • • • • Literatura mais construtiva e mais politizada.

• • • • • Surge uma corrente mais voltada para o espiritualismo e o

intimismo (Cecília, Murilo Mendes, Jorge de Lima e Vinícius)

• • • • • Aprofundamento das relações do eu com o mundo

• • • • • Consciência da fragilidade do eu - “Tenho apenas duas mãos / e

o sentimento do mundo” (Carlos Drummond de Andrade -

Sentimento do Mundo)

• • • • • Perspectiva única para enfrentar os tempos difíceis é a união, as

soluções coletivas - “O presente é tão grande, ano nos afastemos,

/ Ano nos afastemos muito, vamos de mãos dadas.” (Carlos

Drummond de Andrade - Mãos dadas)

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UESPI/NEAD Letras Espanhol

Autores Principais – Poesia

Carlos Drummond de Andrade (1902 - 1987)

Mineiro, trabalha lecionando em Itabira e, em 45, trabalha

na diretoria de um jornal comunista. Maior nome da poesia

ontemporânea, registrando a realidade cotidiana e os

contecimentos da época. Ironia fina, lucidez, e calma, traduzidos

uma linguagem flexível, rica, mas rica de dimensões humanas. Suas

poesias refletem os problemas do mundo e do ser humano diante

dos regimes totalitários, da 2a GM e da guerra fria; apresenta uns

momentos de esperança, mas prevalece a descrença diante do

mundo dos acontecimentos. Nega formas de realidade, volta-se

para o presente. A partir de Lição das Coisas (1962), há maior

preocupação maior com objetos, valorizando mais os aspectos

visuais e sonoros - tendência concreto-formalista.

Carlos Drummond de Andrade propõe a divisão temática

de sua obra, numa seleção que faz para sua Antologia Poética:

1. O indivíduo

2. A terra natal

3. A família

4. Os amigos

5. O choque social

6. O conhecimento amoroso7. A própria poesia8. Exercícios lúdicos

9. Uma visão, ou tentativa de, da existência.

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Literatura Brasileira II

Obras:

Poesia:

Alguma Poesia (1930)

Brejo das Almas (1934)

Sentimento do Mundo (1940)

Poesias (1942)

A Rosa do Povo (1945)

Poesia até agora (1948)

Claro Enigma (1951)

Viola de Bolso (1952)

Fazendeiro do Ar e Poesia até Agora (1953)

Viola de Bolso Novamente Encordoada (1955)

Poemas (1959)

A Vida Passada a Limpo (1959)

Lição de Coisas (1962)

Versiprosa (967)

Boitempo (1968)

Menino Antigo (1973)

As Impurezas do Branco (1973)

Discurso da Primavera e outras Sombras (1978)

Prosa:

Confissões de Minas (ensaios e crônicas, 1944)

Contos de Aprendiz (1951)

Passeios na Ilha (ensaios e crônicas, 1952)

Fala, Amendoeira (1957)a Bolsa e a Vida (crônicas e poemas, 1962)Cadeira de Balanço (crônicas e poemas, 1970)

O Poder Ultrajovem e mais 79 Textos em Prosa e Verso (1972)

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UESPI/NEAD Letras Espanhol

Cecília Meireles (1901- 1964)

De acordo com Gonzaga (2001) é órfã, carioca, foi criada

pela avó e fez magistério e lecionou Literatura em várias

universidades. Estreia com o livro Espectros (1919), participando

da corrente espiritualista, sob a influência dos poetas que formariam

o grupo da revista Festa (neo-simbolista). Suas principais

características são sensibilidades, forte, intimismo, introspecção,

viagem para dentro de si mesma e consciência da transitoriedade

das coisas (tempo = personagem principal). Para ela, as realidades

não são para se filosofar, são inexplicáveis, basta vivê-las.

Murmúrio

Traze-me um pouco das sombras serenas

que as nuvens transportam por cima do dia!

Um pouco de sombra, apenas,

- vê que nem te peço alegria.

Traze-me um pouco da alvura dos luares

que a noite sustenta no teu coração!

A alvura, apenas, dos ares:

- vê que nem te peço ilusão.

Traze-me um pouco da tua lembrança,

aroma perdido, saudade da flor!

- Vê que nem te digo - esperança!

- Vê que nem sequer sonho - amor!

Fonte: <http://www.revista.agulha.nom.br/ceciliameireles01.html#cancao2/>

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Literatura Brasileira II

Assim sua obra apresenta uma atmosfera de sonho,

fantasia, em contraste com solidão e padecimento. Linguagem

simbólica, com imagens sugestivas e constantes apelos sensoriais

(metáforas, sinestesias, aliterações e assonâncias).

Obras:

• Poesia : Espectros (1919), Nunca mais... e Poema dos Poemas

(1923), Baladas para EI-rei (1925), Viagem (1939), Vaga Música

(1942), Mar Absoluto (1945), Retrato Natural (1949), Ama em

Leonoreta (1952), Doze Noturnos de Holanda e o Aeronauta (1952)

Romanceiro da Inconfidência (1953), Pequeno Oratório de Santa

Clara (1955) Pistóia, Cemiério Militar Brasileiro (1955) Canções

(1956), Romance de Santa Cecília (1957), A Rosa (1957), Metal

Rosicler (1960), Poemas Escritos na Índia (1962) Antologia Poética

(1963) Solombra (1963), Ou isto ou Aquilo (1965), Crônica Trovada

da Cìdade de San Sebastian (1965) Poemas Italianos (1968)

• Teatro : O Menino Atrasado (1966)

• Ficção : Olhinhos de Gato (s/d)

• Prosa poética : Giroflê, Giroflá (1956), Evocação Lírica de

Lisboa (1948) Eternidade de Israel (1959)

• Crônica : Escolha o seu Sonho (1964) Inéditos (1968)

Leia agora o poema retrato para identificar o projeto

poético da poetisa em estudo.

Retrato

Eu não tinha este rosto de hoje,

assim calmo, assim triste, assim magro,

nem estes olhos tão vazios,

nem o lábio amargo.

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UESPI/NEAD Letras Espanhol

Eu não tinha estas mãos sem força,

tão paradas e frias e mortas;

eu não tinha este coração

que nem se mostra.

Eu não dei por esta mudança,

tão simples, tão certa, tão fácil:

- Em que espelho ficou perdida

a minha face?

Fonte: http://www.revista.agulha.nom.br/ceciliameireles01.html#retrato.>

Assim sua obra apresenta uma atmosfera de sonho,

fantasia, em contraste com solidão e padecimento. Linguagem

simbólica, com imagens sugestivas e constantes apelos sensoriais

(metáforas, sinestesias, aliterações e assonâncias).

RÔMULO REMA

Cecília Meirelles

Rômulo rema no rio.

A romã dorme no ramo,

A romã rubra.

(E o céu)

O remo abre o rio

O rio murmura.

A romã rubra dorme

Cheia de rubis.

(E o céu)

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Literatura Brasileira II

Rômulo rema no rio.

Abre-se a romã

Abre-se a manhã.

Rolam rubis rubros do céu.

No rio,

Rômulo rema.

Fonte: <http://artes.com/sys/sections.php>

4.8 TERCEIRA FASE MODERNISTA NO BRASIL (1945- +/- 1960)

Autores Principais

A literatura brasileira, assim como o cenário sócio-político,

passa por transformações.

A prosa tanto no romance quanto nos contos busca uma

literatura intimista, de sondagem psicológica, introspectiva, com

destaque para Clarice Lispector. Ao mesmo tempo, o regionalismo

adquire uma nova dimensão com Guimarães Rosa e sua recriação

dos costumes e da fala sertaneja, penetrando fundo na psicologia

do jagunço do Brasil central. Um traço característico comum a

Clarice e Guimarães Rosa é a pesquisa da linguagem, por isso

são chamados instrumentalistas. Enquanto Guimarães Rosa

preocupa-se com a manutenção do enredo com o suspense,

Clarice abandona quase que completamente a noção de trama e

detém-se no registro de incidentes do cotidiano ou no mergulho

para dentro dos personagens.

Na poesia, surge uma geração de poetas que se opõem

às conquistas e inovações dos modernistas de 22. A nova proposta

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UESPI/NEAD Letras Espanhol

foi defendida, inicialmente, pela revista Orfeu (1947). Assim,

negando a liberdade formal, as ironias, as sátiras e outras

“brincadeiras” modernistas, os poetas de 45 buscam uma poesia

mais “equilibrada e séria”. Os modelos voltam a ser os Parnasianos

e Simbolistas. Principais autores (Ledo Ivo, Péricles Eugênio da

Silva Ramos, Geir de Campos e Darcy Damasceno). No fim dos

anos 40, surge um poeta singular, pois não está filiado

esteticamente a nenhuma tendência: João Cabral de Melo Neto.

Guimarães Rosa (1908 - 1967)

Mineiro, formou-se em Medicina e clinicou pelo interior, foi

ministro e pela carreira diplomática esteve em Hamburgo, Bogotá e

Paris. Foi eleito membro da ABL e faleceu 3 dias depois de sua posse.

A obra de G. Rosa é extremamente inovadora e original.

Seu livro, Sagarana (1946), vem colocar uma espécie de marco

divisor na literatura moderna do Brasil: é uma obra que se pode

chamar de renovadora da linguagem literária. Seu experimentalismo

estético, aliando narrativas de cunho regionalista a uma linguagem

inovadora e transfigurada, veio transformar completamente o

panorama da nossa literatura.

O livro Grande Sertão: Veredas (1956), romance narrado

em primeira pessoa por Riobaldo num monólogo ininterrupto onde

o autor e o leitor parecem ser os ouvintes diretos do personagem,

G. Rosa recuperou a tradição regionalista, renovando-a. Há um

clima fantástico na narrativa: Riobaldo conta suas aventuras de

jagunço que quer vingar a morte de seu chefe, Joca Ramiro,

assassinado pelo bando de Hermógenes.

Sua narrativa é entremeada por reflexões metafísicas em

torno dos acontecimentos e dois fatos se repropõem

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Literatura Brasileira II

constantemente: seu pacto com o Diabo e seu amor por Diadorim

(na verdade, Deodorina, filha de Joca Ramiro, disfarçada de

jagunço). As dúvidas de Riobaldo têm raízes místicas e sua narrativa

torna-se então não mais um documento regionalista, mas uma obra

de caráter universal, que toca em problemas que inquietam todos

os homens: o significado da existência, as dimensões da

realidade. Mas não é só isto que é novo em G. Rosa: sua linguagem

é extremamente requintada.

Recuperando as matrizes arcaicas da língua portuguesa

e fundindo-as com a fala sertaneja, G. Rosa chega a criar um

linguajar mítico, onde o novo e o primitivo perdem as dimensões

tornando-se um linguajar ao mesmo tempo real e irreal, pessoal e

universal. Arcaísmos, neologismos, rupturas, fusões, toda uma

técnica elaboradíssima que torna seu discurso literário ímpar em

toda a nossa literatura.

Grande Sertão: Veredas e as novelas de Corpo de Baile

incluem e revitalizam recursos da expressão poética: células rítmicas,

aliterações, onomatopéias, ousadias mórficas, elipses, cortes e

deslocamentos de sintaxe, vocabulário insólito, arcaico ou neológico,

associações raras, metáforas, anáforas, metonímias, fusão de estilos.

Obras : Sagarana (1946), Corpo de Baile (depois

desdobrado em Manuelzão e Miguilim, No Urubuquaquá no Pinhém,

Noites do Sertão, 1956), Grande Sertão: Veredas (1956),

Primeiras Estórias (1962), Tutaméia - Terceiras Estórias (1967):

Estas Estórias (1969), Ave, Palavra (1970).

Clarice Lispector (1925 - 1977)

Ucraniana, veio com meses para o Brasil - por isso, sentia

se “brasileira”. Tem por formação Direito. Em 1944 forma-se e

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UESPI/NEAD Letras Espanhol

publica o livro que escreveu durante o curso - Perto do Coração

Selvagem surpreendendo a crítica e agradando ao público.

Casa-se com um diplomata, afastando-se do Brasil durante

longos períodos, mas sem interromper a produção artística.

Principal nome da poesia intimista da moderna literatura

brasileira, questionamento do ser, “estar-no-mundo”, a pesquisa

do ser humano, resultando no romance introspectivo.

Características de sua produção literária:

• Sondagem dos mecanismos mais profundos da mente

humana;

• Técnica “impressionista” de apreensão dessa realidade

interior (predominância de impressões, de sensações);

• Ruptura com a seqüência linear da narrativa;

• Predomínio do tempo psicológico e, portanto, subversão

do tempo cronológico;

• Características físicas das personagens diluem-se: muitas

nem nome apresentam;

• As ações passam a ter importância secundária, servindo

principalmente como ilustração de características psicológicas das

personagens (introspecção psicológica);

• Introdução da técnica do fluxo da consciência - quebra os

limites espaço-temporais e o conceito de verossimilhança, fundindo

presente e passado, realidade e desejo na mente dos personagens,

cruzando vários eixos e planos narrativos sem ordem ou lógica

aparente;

• Presença da epifania (“revelação”): aparentemente

equilibradas e bem ajustadas, subitamente as personagens sentem

um estranhamento frente a um fato banal da realidade. Nesse

momento, mergulham num fluxo de consciência, do qual emergem

sentindo-se diferentes em relação a si mesmas e ao mundo que

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as rodeia; esse desequilíbrio momentâneo por certo mudará sua vida

definitivamente;

• Suas principais personagens são mulheres, mas não se limitam

ao espaço do ambiente familiar: Clarice visa a atingir valores essenciais

humanos e universais tais como a falsidade das relações humanas, o

jogo das aparências, o esvaziamento do mundo familiar, as carências

afetivas e as inseguranças delas decorrentes, a alienação, a condição

da mulher, a coexistência dos contrastes, das ambigüidades, das

contradições do ser, num processo meio “barroco”;

• Fusão de prosa e poesia, com emprego de figuras de

linguagem: metáforas, antíteses (eu x não-eu, ser x não ser), paradoxos,

símbolos e alegorias, aliterações e sinestesias;

• Uso de metalinguagem - “Algumas pessoas cosem para fora;

eu coso para dentro”- em associação com os processos intimistas e

psicológicos, político-sociais, filosóficos e existenciais (A Hora da Estrela,

1977). “Depois que descobri em mim mesma como é que se pensa,

nunca mais pude acreditar no pensamento dos outros”.

Obras:

Romances : Perto do Coração Selvagem (1944); O Lustre (1946); A

Cidade Sitiada (1949); A Maçã no Escuro (1961); A Paixão segundo G.

H. (1964); Uma Aprendizagem ou Livro dos Prazeres (1969); Água Viva

(1973); A Hora da Estrela (1977).

Contos : Alguns Contos (1952); Laços de Família (1960); A Legião

Estrangeira (1964); Felicidade Clandestina (1971), Imitação da Rosa

(1973), A Via - Crucis do Corpo (1974); A Bela e a Fera (1979).

Entrevista : De Corpo Inteiro

Literatura infantil : Mistério do Coelhinho Pensante (1967); A Mulher

que Matou os Peixes (1969); A Vida Íntima de Laura (1974), Quase de

Verdade.

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UESPI/NEAD Letras Espanhol

‘’ (...) No momento em que a tia foi pagar a compra, Joana tirou

o livro e meteu cuidadosamente entre os outros, embaixo do braço.

A tia empalideceu. Na rua a mulher buscou as palavras com

cuidado: — Joana... Joana, eu vi.”

Fonte: <http://www.graudez.com.br/literatura/modernismo.html>

João Cabral de Melo Neto (1920 -1999)

Pernambucano, passa a infância em engenhos de açúcar

em contato com a terra e o povo (o que despertou seu interesse

pelo folclore nordestino e pela literatura de cordel), com a palavra

escrita (livros e jornais, desde os dois anos de idade) e a parentela

ilustre e culta (primo de Manuel Bandeira e Gilberto Freire). É eleito

por unanimidade para a ABL (1969).

Estreou em 1942 com Pedra do Sono de forte influência

de Carlos Drummond de Andrade e Murilo Mendes. Ao publicar O

Engenheiro, em 1945, traça os rumos definitivos de sua obra. Em

1956, escreve o poema dramático Morte e Vida Severina, que,

encenado em 1966, com músicas de Chico Buarque, consagra-o

definitivamente.

Só pertenceria à Geração de 45 se levado em conta o

critério cronológico; pois esteticamente afasta-se da proposta do

grupo.

Características de sua produção literária: no início da

carreira, apresenta uma tendência à objetividade, convivendo com

imagens surrealistas e oníricas (relativas aos sonhos): aos poucos,

afasta-se da influência surrealista e aprofundam a tendência à

substantivação, à economia da linguagem, submetendo as palavras

a um processo crescente de depuração, com uso de metáforas,

personificações, alegorias e metonímias (a pedra; a faca; o cão);

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Literatura Brasileira II

a partir de 1945, influenciado por uma concepção arquitetônica,

procede à geometrização do poema, aproximando a arte do Poeta

à do Engenheiro; a preocupação com o descarnamento, com a

confecção da poesia dessacralizada, afastada cada vez mais do

subjetivismo e da introspecção, leva-o à elaboração do poema

objeto.

Nele, o fruir poético atinge-se através da lógica do

raciocínio, da razão, eliminando-se emoções superficiais (ruptura

total com o sentimentalismo); o Poeta questiona o próprio ato de

escrever e a função da poesia; na década de 50, surge e amadurece

a preocupação política e principalmente a denúncia social do

Nordeste e sua gente: os “severinos” retirantes, as tradições e o

folclore regional, a herança medieval, a estrutura agraria canavieira,

injusta e desigual... Aparece ainda a paisagem da Espanha, que

apresenta pontos em comum com o cenário nordestino. Continua

viva e atuante a reflexão sobre a Arte em suas várias manifestações,

desde a pintura (Miró, Picasso, Vicente do Rego Monteiro), a

literatura (Paul Valéry, Cesário Verde, Augusto dos Anjos, Graciliano

Ramos, Drummond), passando pelo futebol e fechando com a sua

própria maneira de poetar: “Sempre evitei falar de mim, falar-me.

Quis falar de coisas. Mas na seleção dessas coisas não haverá

um falar de mim?” (Morte e Vida Severina - Auto de Natal

Pernambucano).

Morte e Vida Severina, obra mais popular de João Cabral,

é um auto de Natal do folclore pernambucano. Sua linha narrativa

segue dois movimentos que aparecem no título: “morte” e “vida”.

No primeiro movimento, há o trajeto de Severino, personagem-

protagonista, que segue do sertão para Recife, em face da

opressão econômico-social. Severino tem a força coletiva de um

personagem típico: representa o retirante nordestino. No segundo

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UESPI/NEAD Letras Espanhol

movimento, o da “vida”, o autor chama a atenção para a confiança

no homem e em sua capacidade de resolver problemas.

Obras:

Prosa : Considerações sobre a Poeta Dormindo (1941); Juan Miró

(1950)

Poesia : Pedra do Sono (1942); Engenheiro (1945); Psicologia da

Composição (1947); O cão sem Plumas (1950); Rio (1954);

Poemas reunidos (os livros anteriores mais Os Três Mal-Amados,

1954); Duas Águas (os livros anteriores mais Morte e Vida

Severina, Paisagens com figuras e Uma Faca só Lâmina, 1956);

Quaderna (1960); Dois Parlamentos (1961); Terceira Feira (os dois

livros anteriores mais Serial, 1961); A Educação pela Pedra (1966),

Poesias Completas (1968); Museu de Tudo (1975); Escola das

Facas (1987); Auto do Frade (1984); Agrestes (1985); Crime na

Calle Relator (1987); Sevilha Andando (1987-1993).

Vejamos um fragmento da Perto do Coração

selvagem

(...) No momento em que a tia foi pagar a compra, Joana

tirou o livro e meteu cuidadosamente entre os outros, embaixo do

braço. A tia empalideceu. Na rua a mulher buscou as palavras

com cuidado: — Joana... Joana, eu vi...

Joana lançou-lhe um olhar rápido. Continuou silenciosa: — Mas

você não diz nada? — não se conteve a tia, a voz chorosa. —

Meu Deus, mas o que vai ser de você? — Não sé assuste, tia.

— Mas uma menina ainda... Você sabe o que fez? — Sei...

— Sabe... Sabe a palavra...?

— Eu roubei o livro, não é isso?

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148

Literatura Brasileira II

— Mas, Deus me valha! Eu já nem sei o que faço, pois ela ainda

confessa!

— A senhora me obrigou a confessar.

— Você acha que se pode... que se pode roubar? — Bem...

talvez não.— Por que então...? — Eu posso.— Você?! — gritou a tia. — Sim, roubei porque. quis. Só roubarei quando quiser. Não fazmal nenhum. — Deus me ajude quando faz mal Joana? — Quando a gente rouba e tem medo. Eu não estou contentenem triste.

(LISPECTOR,Clarice.In: http://enemnota100.blogspot.com/2007/08/

perto-do-corao-selvagem-fragmento.html )

ATIVIDADE

1-Caracterize a poesia modernista.

2- Em que os movimentos de Vanguarda influenciaram nossa

literatura modernista?

3- Discuta com sua turma sobre as propostas da Semana de Arte

Moderna.

4- Caracterize os movimentos primitivos

5- Qual é o projeto ideológico da geração e 22 a 30?

6- Caracterize a ficção modernista.

7- Analise o poema Retrato de Cecília Meirelles sob existencialista.

Para isso, leia sobre o existencialismo para responder essa

questão.

8- Qual é atemática da segunda geração modernista?

9- Leia o conto O amor de Clarice Lispector e analise a narrativa 60.

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REFERÊNCIAS

ABDALA JÚNIOR, Benjamin; CAMPEDELLI, Samira Youssef.Tempos da literatura brasileira . São Paulo: Círculo do Livro S.A.,1990

ASSIS, Machado. Várias histórias . São Paulo: Martin Claret, 2002

BOSI, Alfredo. História Concisa da Literatura Brasileira. São

Paulo: Cultrix, 2008.

CARRER, Aline. Rio de Assis: imagens machadianas do Riode Janeiro . Rio de Janeiro: Casa da Palavra, 1999.

CANDIDO, Antonio. O romantismo no Brasil. São Paulo:Humanitas/FFLCH/SP, 2004.

COUTINHO, Afrânio. A Literatura no Brasil. 5. ed.rev. e atual. SãoPaulo: Global, 1999. vol.3 e vol.5

GONZAGA, Sergius. Manual de Literatura Brasileira . ed. rev.Ampl. Porto Alegre: Mercado Aberto, 2001. 272 p.

MOISÉS, Massaud. História da Literatura Brasileira. vl. II.Realismo e Simbolismo. São Paulo: Cultrix, 2001.

PROENÇA, Filho. Estilos de Época na Literatura . 9. ed. SãoPaulo: Ática, 1985.

SODRÉ, Nélson Werneck. O Naturalismo no Brasil . BeloHorizonte: Oficina do Livro, 1992

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Fichamento do Livro

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AUTORAS DO LIVRO

MARIA SUELY DE OLIVEIRA LOPESPossui graduação em Letras Português pela UniversidadeEstadual do Piauí (1991) e mestrado em Letras pela UniversidadeFederal de Pernambuco (2002). Atualmente é professora doInstituto de ensino supeior múltiplo e professor asistente i daUniversidade Estadual do Piauí. Tem experiência na área deLetras, com ênfase em Literatura Brasileira, atuandoprincipalmente nos seguintes temas: literatura e gênero, literatura

brasileira, crítica, teoria literária, crítica literária, teoria literária e literatura popular.

SILVANA MARIA PANTOJA DOS SANTOSDoutoranda em Teoria da Literatura pela Universidade Federalde Pernambuco - UFPE. Mestra em Letras pela UniversidadeFederal de Pernambuco - UFPE (2002), com área deconcentração em Teoria da Literatura. Graduada em Letraspela Universidade Estadual do Maranhão - UEMA(1997).Atualmente é professor titular da Universidade Estadual doPiauí - UESPI desde 2003, ministrando disciplinas de Teoria

Literária, Literatura Portuguesa e Brasileira. Pesquisadora integrante dos gruposINTERLIT da referida universidade na linha Literatura e Memória. Professoracolaboradora da Universidade Estadual do Maranhão - UEMA desde 2004,ministrando disciplinas de Literatura Portuguesa e Brasileira. Professora deLíngua Portuguesa de cursos da Faculdade Santo Agostinho - FSA.

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AVALIAÇÃO DO LIVRO

Prezado(a) cursista:

Visando melhorar a qualidade do material didático, gostaríamos querespondesse aos questionamentos abaixo, com presteza e discernimento.Após, entregue a seu tutor. Não sendo necessário assinar

Unidade:____________ Município: _________________

Disciplina:___________ Data: ____________________

1. No que se refere a este material, à qualidade gráfica está visualmente

clara e atraente

( ) ÓTIMO ( ) BOM ( ) RAZOÁVEL ( ) RUIM

2. Quanto ao conteúdo, está coerente, contextualizado à sua prática de

estudos

( ) ÓTIMO ( ) BOM ( ) RAZOÁVEL ( ) RUIM

3. Quanto às atividades do material, estão relacionadas aos conteúdos

estudados, e compreensíveis para possíveis respostas.

( ) ÓTIMO ( ) BOM ( ) RAZOÁVEL ( ) RUIM

4. Coloque abaixo suas sugestões para melhorar a qualidade deste e de

outros materiais.

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