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Page 1: Ironita Policarpo Machado - Cultura Historiografica e Identidade -Capítulo 1 Autores e motivações historiograficas
Page 2: Ironita Policarpo Machado - Cultura Historiografica e Identidade -Capítulo 1 Autores e motivações historiograficas

~ T I

Não somos historiadores. mas de uma

maneira simples e numa linguagemacessível procuramos deixar a todosum pouco do que foi a vida de nos­sos antepassados. I

Os estudos e a pesquisa sobre história regional e local no âmbitouniversitário são recentes. Diante dessa constatação, consideramos perti­

nente indagar: Quem tem produzido estudos sobre a história regional elocais? Quais são suas motivações para escrever e publicar?

Como ponto de partida para a discussão e análise das questõeslançadas frente aos propósitos deste trabalho, consideramos pertinente,num primeiro momento, tecer algumas considerações a respeito da nature­za coletiva da criação, ou seja, desenhamos um quadro contextualizandoos criadores-autores, o qual possa auxiliar, posteIiormente, na interpreta­ção das narrativas que constituem as obras e elas próprias, como manifes­tações de pensamentos, necessidades e valores sociais daqueles e dogrupo social do qual fazem parte.

Entendemos, contudo, que somente os aspectos biográficos não

poderão nos garantir o entendimento dos elementos referendados nasconsiderações iniciais, pois as obras apresentam uma escrita da históriamultifacetada de valores mateIializados em diversos eventos históricos, os

quais, por sua vez, nem sempre correspondem aos valores dos criadores­autores ou grupo social. Em suma, os aspectos biográficos não nos ga­rantem evidenciar um quadro de valores de grupo social porque a diversi­

dade temporal (cultural) que caracteriza os criadores e, mesmo, a diversi­dade temporal com que eles próprios estão lidando, muitas vezes de formainconsciente, nem sempre cOlTespondem ao seu tempo vivido e do grupoao qual pertence.

Não podemos menosprezar o lugar social do autor como cspa\'otempo de relações que influenciam na formação da consciência hisl<Írit'a~

1 FASSINI. Lauro; SILVA, Odete de Lurdes A. CO/OI'ado: seu povo, SlIa hi,tÚI;a. ('0101.1010 './

ed.•1987. p.6.

Page 3: Ironita Policarpo Machado - Cultura Historiografica e Identidade -Capítulo 1 Autores e motivações historiograficas

I--------------f-------------f;

/Ii Ironito P.Machado

"Cultura historiográfica e identidade29

Semreferência

Passo Fundo:~iário daManhã

1980Genealogiafamiliar

Johann AdamSchell e sua

descendência

MarinaXavier eOliveira

Annes*1 a

Quadro 1- Relação de autores no centro-/1O/1edo Planalto rio-grandensena década de 1980 a 1995 (livros considerados de "histÔria"F

(a) A relação de nomes segue a ordem da data de publicações; ('I') dados biográficos obtidosatravés do instnllnento de pesquisa biobibliográfica - respondido pelos autores num total tiL' 12:

("''I') dados biográficos obtidos num total de ll; (***) sem dados. total de 2. TotaJizam 23 alltol"'Scom dados hiobibliográficos e 32 obras a serern analisadas. (b) A análise dos livros -- "protll1,'Úo

historiográfica" - será contemplada nos capítulos seguintes.

É, portanto, com base nessas inferências que delimitamos a inlcn\;';,odeslecapítulo, de constmir um quadro a respeito da natureza coletiva das obras. Paratal, mapeamos as publicações levantadas no período e espaço delimitado; elabo­ramos um instrumento de pesquisa biobibliográfica que foi enviado aos autores

após breve contato e entrevista com eles, de cujo total - 23 autores, queconespondem ao total de 32 publicações - retomaram devidamente preenchidosdoze; quanto aos demais, buscamos dados nas próplias obras. A pmtir da consi­deração e combinação dos dados, passamos a velificar as vmiáveis antelÍormenteestabelecidas, a saber:

• A que gmpo social peltencem os autores?• Quais são suas funções?• Em que medida possuem poder (status) e esse de que se constituiu?• Que motivos os levaram a escrever e publicar?• De que forma os autores são apresentados e classificados?• O conjunto de autores pode ser considerado elite?Partindo desse preâmbulo de caráter geral, circunscrevemos a discussão à

identificação dos autores, cujos dados são apresentados em tabelas, considera­dos individualmente, bem como aos seus depoimentos, Essa identificação abm'ca

a filiação familiar e religiosa dos autores, sua fOlmação acadêmica, funções e cm'­gos ocupados, atividades atuais e filiação institucionaI. Iniciamos apresentando,no Quadro I, a relação dos autores e suas respectivas publicações, além de algu­

mas especificidades obtidas nos dados indicados pelos livros.

il

;I~;';IIII. O l'ontexlo vivido detennina os "interesses de conhecimento atra­

I"'; dos quais as necessidades de orientação na sociedade se prolongamp;lIa dl'l1lro"2 da escrita da história e/ou da significação da próplia cria­,'ao, a obra. Confonne Bordieu: "Com efeito (".) o que está em jogo é opoder de impor uma visão do mundo social através dos princípios de di­vi,~;loque, quando se impõem ao conjunto do grupo, realizam o sentido eo consenso sobre o sentido e, em particular, sobre a identidade e unidade

do grupo, que fazem a realidade da unidade e da identidade do grupo." 3

O que parece ser insuficiente no estudo histOliográfico, os dados biográ­ficos -lugar social do autor -, reside exatamente na possibilidade de problematizaro pensamento histórico e, conseqÜentemente, em deuimento desse, os interes­

ses de conhecimento - histórico - de detenninada coletividade, as próprias op­ções de procedimentos feitas pelo autor, como testemunho de seu engajamentocom o contexto social, ou elementos subjetivos que podem ajudar a explicar aescolha de temáticas e tomadas de posição presentes na nmrativa.

Nessa perspectiva, justificamos nossa opção de apresentar um quadro arespeito da natureza coletiva da criação (livros) com base na assertiva de Bourdieu

sobre o poder da nanativa como um jogo político pela construção/detennina­ção de identidade étnica, regional ou de detenninado gmpo social. Em suaspalavras: "O autor, mesmo quando só diz com autoridade aquilo que é, mesmoquando se limita a enunciar o ser, produz uma mudança no ser: ao dizer as coi­sas com autOlidade, quer dizer, à vista de todos e em nome de todos, publica­mente e oficialmente, ele subu'ai-as ao mbíuio, sanciona-as, santifica-as, consa­gra-as, fazendo-as existir como confonne à natureza das coisas, naturais."4

No mesmo cmninho, Baczco motiva-nos a refletir sobre a relação entre aprodução historiográfica e o imaginário social;' como peça efetiva do exercí­cio de autOlidade, de poder, quando diz: "C.,) através dos seus imaginálios so­ciais, uma coletividade designa a sua identidade, elabora uma certa representa­ção de si; estabelece a disnibuição de papéis e das posições sociais; exprime eimpõe crenças comuns, constrói uma espécie de código de 'bomcomportamento' ,designadamente através da instalação de modelos formadores(... ). ''6

RÜSEN,JÓrn. Reflexões sobre os fundamentos e mudanças de paradigJna na ciência histórica alemã

ocidentaL In: NEVES. Abilio Afonso Baeta; GERTZ. Renê E. (Coord.) A /lava historiografia(llemâ - Diálogos Brasil - Alemanha nas Ciências Humanas. Porto Alegre: Ed. Universidade _Ufrgs/lnstituto Goethe. J987.p. 37.

3 BOURDIEU (l989). Op. cit. p. 113." lbid .. p. 114.

Baczko designa imaginário social como sendo "um aspecto da vida social, da atividade globaldos agentes sociais cujas particularidades se manifestam na diversidade de seus produtos", pontode referência do sistema simbólico que as coletividades reproduzem e a1ravés dos quais se perce­bcm. dividem e elaboram os seus próprios objetivos. Para tal, ver BACZKO. B. Imaginação social.FlIcicl0l'hli(/ Eill(/udi. 1986. v.5. p. 296-312.ld. ibid .. p.. 111.

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30 lronita P.Mochw l(Il ,t11Ifl'! Ili>.!' .tl< 'i 11IIII! (11' Illt~ldid(lclc

31

Preí. Mun.

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Prd.Mlln.

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Preí. Mun.

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dos reíeridos

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Legislativa

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PF: Berthier

PF: Belthier

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POltO Alegre:s/ecl.(todos)

Não-Me"ToqueGesa

1990

1933

1988

1938

1983

1987

1987

1987

1983

(todos)

História

municipal

História

municipal

História

Illunicipal(todos)

História

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História

mUllicipal,tradicionalis­

IllO e ío Iclore

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19132vol.I1

e III

História

regional e

municipal

História

regional e

municipal

História

regional

História

municipal

História

municipal

História

municipal

História

municipal

História

municipal

Tradicion. e

íolclore

regional

Raízes e

ret,llhos de

Nonoai

povo, suahistória

Passo Fundo

através do

tempo (111volumes)

o Grande

Erechim e sua

história

Folclore ­

nossas raizes

Passo Fundo:

sua h istória e

evoluç50

Colorado: seu

povo, suahistória

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Page 5: Ironita Policarpo Machado - Cultura Historiografica e Identidade -Capítulo 1 Autores e motivações historiograficas

32 Ironita P.Machado Cultura historiogrófica e identidade 33

(continua)

de ]960 a 1970, dez obras -, observamos que a década de 19XO corrcsp"IHk

ao período em que se retomaram os processos de emancip'll.;ão, l'sla!,lI:!dos durante a década de ]970, os quais totalizaram 103 emancip,ll;ocs ""Rio Grande do Sul, número superior ao das décadas anteriores; dL'sSL'I.)

tal, 26 correspondem ao centro-nOIte do Planalto rio-grandense. Da IIll'Sma forma, na década de 1990, ocorreram 133 emancipações no estado, das

quais 23 correspondem à região delimitada neste estudo.Ainda com relação ao período das publicações, esse se caracteriza

por uma conjuntura de transições socioeconômicas marcada por uma cri­se global e aguda no Brasil que atinge todos os setores da vida nacional.É num contexto global de profundas e aceleradas mudanças - globalizaçãodo mercado, firmando suas bases na revolução tecnológica em marcha eprovocando resultados contraditórios nos processos de trabalho; pres­são populacional sobre os países desenvolvidos e áreas urbanas, intro­duzindo novos problemas, como o desemprego e cinturões de misélia noentorno das grandes cidades - que o Brasil enfrenta a crise "pós-milagre".Essa crise teve como ressonância o desequilíbrio da balança de pagamen­tos, o acentuado endividamento externo, as altas taxas de inflação, a es­cassez de recursos para manter elevadas as taxas de crescimento (PIB), odesemprego, a dívida interna, a concentração econômica em determinadasregiões e de renda pessoal, o estrangulamento da pequena e média empre­sas e a dependência techológica. Tais fatores, entre outros, no final dadécada de 1970, motivaram iniciativas/alternativas de descentralização da

administração pública do estado do Rio Grande do Sul para a previsãosetorial do desenvolvimento econômico, como, por exemplo, a formaçãode Conselhos Regionais de Desenvolvimento, experiência de participaçãodas comunidades na construção de seu desenvolvimento.

Nesse sentido, em face das profundas mudanças que afetavam o paíslodo, assistimos, na região centro-norte do Planalto rio-grandense, a par­tir do final da década de 1970, a transformações nas estruturas tradicio­lIais, tais como: a indústria, o comércio e os serviços passaram a se so­hressair em detrimento da agropecuária; a população sofreu uma diminui­,;;tO do seu contingente rural, passando de 60,64% para 20,57% em 1996;a concentração de renda manteve-se nos estratos de mais alta renda, acar-,rL'lando um empobrecimento generalizado da maioria da população; asl'struturas de mercado passaram a impor, especialmente ao agricultor fami·liar, novas condições à produção, exigindo uma agricultura modema:!groindústria; a formação e fortalecimento de novos grupos ecolIÚmicw;

PMcleMarau

Particular:familiares e

institu ições

PM Selbachs/ local 5/

editora

PF: Berthier

Porto Alegre:Palotti

1990

1992

1992

História

regional ­local e

paroquial

Históriil

municipal

Depoimentomorildores:

história locale casos

História deMarau: umacomunidade

lilboriosa

Severiano deAlmeida e sua

história

DirceuBenincá*

25"

FranciscoBernardi*

28"

"Preíeitura Um povo eMunicipal"*- suas histórias** 29"

Fonte:Obraspesquisaclas,

Como podemos observar, há um total de 25 autores8 e 32 publica­ções, as quais se concentram na década de 1980 a 1995. Com relação àsdécadas anteriores - publicou-se de ] 940 a ] 950 um total de sete obras e,

S Entre os 2S autores identificados, há duas denominações de equipe de trabalho (Comissão de

ESllldos Municipais/Estado do Rio Grande do Sul, Assembléia Legislativa, composta por: pre­sidenLc da Assembléia, dI". Vilson Luiz Nunes/chefc do Gabinete, beI. Bcrnardo Schneider/asses­sor, bcl. Katia Humann/secretária - coordenação geral, jornalista Sônia Bertol/assessora de im­

prensa, Dinamara Garcia Feldens/técn.ica contratada - seis publicações no período delimitado e

Prefeitura Municipal/Município de Sc1bach, composta por: Ianque Schneider/supervisora deensino - coordenadora da pesquisa, Neusa Maria Erbs Wcntz/supervisora de ensino - coordena­dora do trabalho de elaboração e redação - uma publicação); dois autores com co-autoria (LauroI'""illi e Odete de l.urdes A. Silva - uma publicação) e um como coordenador (Eraesto Cassol

l'OOl'di.'lIadol, Nedio Pinto co-autoria): um com o lnesmo título correspondendo a três volumes,Il'<l~;apenas dois desses correspondem ao período delilnilado (Delma Rosendo Gehm):. dois comllldi', d(' 1lI11<lpllhlif.:ai.Jlo no período delimitado (Marílda Kirst Parízzí- duas e Welcí Nascímento­11\",) 11,',dl'llIai,,, 1'011111111<1puhlic<li.;ão.

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34 lrollita P.Machado

,11"\0IllI,l, '••' '! Jllllil'(ll~ identidade 35

'" VARGAS, Álvaro Rocha. Depoimento: instrumento de pesquisa biobibliográfica." V;\RGAS, Álvaro Rocha. Do Caapi ao Caraz;nho: notas sobre 300 anos de histÓria (1631­

11)11). Carazinho: Noticioso, 1980. Prefácio de Mozart Pereira Soares.

('''d,/l'' ..? - f)ados biográficos dos autores regionais - ,filiação e religiào(total 23)

4,3

8,6

43,3

2

10

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11.11. Ic H'tH'ceu - sem justificativa

1101"1;1

,1111111.1

I .•, 11.·. IlIslrlllllento de pesquisa biobibliográlica.

Usaremos a denominação família tradicional para os descendentes deI , .1'llIizadores,fundadores, primeiros moradores do município/região e/ou com1';lIl'ntescocom pessoas que exerceram funções/cargos político-partidários oupllhlicos de outra natureza "reconhecidos" pela sociedade. Algumas dessasIIIIÚrmações são mencionadas na própria obra do autor ou em obra de outro;111101' regional, como podemos observar neste depoimento:

"Descendente dos fundadores de Carazinho (. ..)10 O doutor

Álvaro Rocha Vargas vem dedicando seus escassos vagaresde Médico à difícil tarefa de reviver os primórdios de sua terranatal. Árdua missão que, em seu caso pessoal, tem muito degratificante: é a oportunidade para resgate parcial de sua dívi-da para com os pioneiros do povoamento da região, dos quaisele descende, tanto da linha materna quanto da paterna (...)."11

Como outro exemplo, a autora Marina Xavier e Oliveira Annes, em:;l'U depoimento, diz: "Fui esposa de Gervásio Araújo Annes". Ainda, emscu livro Johan Adam Scheel e sua descendência, está registrado que seu

I'SPOSO é filho do cel. Gervásio Lucas Annes e Etelvina Emilia de Araujo,

l'jlJjl 11l;lInll'~,illl"tll'ln;H\:'\-)l'S, ver: BRUM, Argemiro J. dest11l'oh'Ímento econômico brasileiro. Ijuí:1'01 IllIlilll. 1"'1/: VU.I',NTlNI, Paulo G. Fagundes. A 110\'0 ordem global. Porto Alegre: Ed.11111,.,·.,,1; ••1<- 11111". 1')1)(,: ANDERSON, Perry. Balanço do neoliberalismo. In: SADER B.;I d'r"ll'lIl' I' 1'0\' III'o/if,l'ralis/J/o: as políticas sociais e o Estado democrático. Rio de Janeiro:

I'd/ l' Il"lIl1. Iljij'l f\1()NTOYi\, Marco Antônio (Org.). Descrição e previsão setarial do desen­01\ 1111111111 1" tllI'lIlli, li da Rl'I'j,lo da Produção. Entre 1970 e 2010. Teoria El'idência Econômi­

101 I'il';-;P hllldll hlilll'l. Il)q(), v h.l1. 11.p.l-l67. novo 1998.

1.1 Filiação familiar e religiosa dos autores

c, conscqÜentemente, de novos interesses políticos; a acelerada moderni­/a<.;ão- urbana - de muitos municípios em detrimento de outros.9

Esse contexto de transformações parece ter gerado uma necessida­dc de afirmação regional/local, que passou a ser uma preocupação de al­guns munícipes, de autoridades públicas municipais de instituições, as quaishuscaram resgatar a formação histórica, o que seria peculiar à região e/oulIlunicípio, ou seja, a busca da diferença, do reconhecimento. Isso, de cer­

ta forma, identificamos nas linhas temáticas que agrupam as publicações.As publicações, em seu conjunto, podem ser organizadas em três

grupos temáticos com base no recorte espacial:

a) Histórias municipais: pelo fato de tratarem especificamente deacontecimentos referentes à área de abrangência do município,com pouca ou nenhuma relação com espaços e temáticas demaiores dimensões (história local);

b) Histórias regionais e municipais - local: por iniciarem a narrati­va num tempo histórico que corresponde aos acontecimentos re­lacionados ao processo de ocupação e colonização do extremo­sul do Brasil ou específicos do estado do Rio Grande do Sul,visando nele inserir o município; ou circunscreverem as temáticasapresentadas às especificidades locais para se inserirem em acon­tecimentos históricos do estado;

c) Histórias regionais: em razão de a especificidade do tema e dotempo histórico corresponder à região platina e extremo-sul doBrasil.

.hí tendo feito a apresentação das publicações e identificado os res­plTtivos autores, situando-os na conjuntura histórica das duas últimasd,;cadas, ncsta parte do trabalho, circunscrevemos as considerações aosdados hiogrMicos sociais.

Page 7: Ironita Policarpo Machado - Cultura Historiografica e Identidade -Capítulo 1 Autores e motivações historiograficas

36Cultura historiográfica e identidade

37

lido do capo Manuel José de Araújo e Elmlia Schell, portanto bisneto de

Johalln Adam ScheIl, um dos colonizadores de Passo Fundo; 12quanto àautora, é filha de Francisco Antonino Xavier e Oliveira, o qual exerceuv<Írios cargos e funções públicas de "destaque" no município de PassoFundo, dados esses que também são mencionados nos livros de Nasci­mento e Ghem. JJ

Ainda nessa perspectiva, o autor José Vieira Sperry, referindo-se aosdescendentes dos "fundadores" do município de Nonoai, diz: "Cabe sa­

lientar que foram eles meus avós e viveram sempre no nmnicípio."14 Naspalavras iniciais de seu livro lemos: "Que filhos desta terra tragam a públi­co toda a história ou fato possível deste pedaço do torrão gaúcho, comofez o Sr. José Mazocato e este bisneto do fundador de Nonoai."'5 Como

líftima ilustração, destacamos o autor Pedro Ari Veríssimo da Fonseca, que,ao "narrar" as relações sociais e questões do cotidiano nas estânciasgaúchas, diz:

"Muitas vezes assisti minha avó chegar até o galpão (...) e dizer:Severo eu preciso de peão para isso (...). a conversa era curtae nem se discutia se este peão iria fazer falta ou não. Aestancieira havia dado uma ordem( ...). Lembro-me do mulato

Laire na estância de meu tio Nestor de Quadros( ...)."16

Família descendente de imigrantes foi a denominação que demosas ]'.crações descendentes de imigrantes, entretanto sem distinção étnica'111 ('spccil"icidade do grau de parentesco. Assim como obtivemos alguns,h-poilllenlos especificando a descendência, outros não a mencionaram,

l'0n'llI aparecem indicações, às vezes, nas apresentações; outras, na pró­l"la lIarrativa da obra. Por exemplo:

"Sou descendente de imigrantes italianos. Meu bisavô(;jovallni Bcnincá nasceu na Comuna de Lentiai, Província de

IkIlIlIlO, Itália a 08 de maio de 1879 (...).veio ao Brasil com pou­lO.'; allos de idade e foi residir em Garibaldi, onde trabalhoulOllIo a!'.ricultor( ...)Entre os filhos de Giovanni está o meu avô

( ;1Ii11H'IIlH"nascido em 101ll/1909. O avô com seus pais e ir-

111111', ~I""II" \:I\'il'l l" Oliveira. Johann Adam Schell e slIa descendência. Passo Fundo: Diário01.1 ~Illllltll I1JHO I'a';~,illl p. S/li.

r 1\',1 Il\lIt--IIq, \\'dl i lit/(/ls hi.\'lliricos de Passo Fundo. Passo Fundo: Berthier. 1995. pAI:I li 111\1 111111111 PII',I"lIdo l'I/\\r1 FUlldo (/lro\'(;s do tempo. Passo Fundo: Diário da Manhã. 1982.

11 I' J 111 \ 111 I' IH),)(j'l

',I'II1P-, 111'., "!til ,I ,,",ti 1'\ f' I'I'II/Ihos t/(, NOlloai. Passo Fundo: Berthier, 1985. p. 1] e 13.lI'ld I'

11111'.1' \ 1',dlll\11 \"'11','011110 da FO/'!IIIICÚO t!o gaÚcho. Passo Fundo: Diário da ryIanhã, 1982." ,

mãos migraram para Seveliano de Almeida ( então Nova It<Í­lia).( ...) com 89 anos, ainda trabalha na agricultura( ...) mctl paiGemi, que casou com Élida Barbieli (...). Também trabalham naagIicultura familiar."'7

O depoimento transcrito, de Dirceu Benincá, demonstra explicitamente suaOligem étnica e, como veremos adiante, a influência dessa como fator motivado rpara o escritor escrever e publicar. Diferente na fOlma de enunciação do quadrofamiliar, mas não das motivações, podemos destacar outros autores, como, por

exemplo, Antonio Ducatti Netto, que é apresentado na obra como "filho daprimeira geração dos colonos italianos - septuagenário."18

Em outros casos, a obra, em sua narrativa sobre a colonização e funda­

ção do local, apresenta a relação dos pIimeiros povoadores (agricultores-co­lonos), entre os quais se encontram nomes que demonstram a ligação familiardo autor. É o caso do autor Francisco Bemardi, nascido em Marau, onde mora,filho de Pedro Bemardi e Vitalina Borela Bemardi, que não descreve seu qua­dro familiar em seu depoimento, mas registra em sua obra: "Aqui em Marau, aprimeira fanulia a chegar foi a do aglicultor Luís Tibola, em 1904. Nos anossubseqüentes, chegaram (...) José PIimo Bernardi (...). Assim é que tambémpodem ser tidos como pioneiros os seguintes cidadãos: (...) Paulo Girardi eJúlio Borella, todos na vila."19 Assim, tanto pelo lado materno - Borela - quan­

to pelo paterno - Bernardi, percebe-se a ligação familiar do autor com os agri­cultores pioneiros da colonização do município de Marau. Nesse sentido, noQuadro 2, agmpamos os autores que apresentam, direta ou indiretamente,descendência familiar de imigrantes e colonos agricultores, ou seja, famIllasque exerceram ou exercem atividades ligadas à terra.

Quanto à confissão religiosa, neste ponto do trabalho, restringire­mos nossas observações a duas questões: primeira, a opção de solicitaraos autores sua confissão religiosa pauta-se pela razão de entendermosque dessa são oriundos muitos dos valores, crenças e práticas sociais queeles comungam e pelo fato, como veremos adiante, de termos constatadoque algumas obras apresentam na temática condutora da narrativa insti­tuições religiosas ou acontecimentos religiosos; segunda, de certa fomlaligada à primeira, o número relevante de autores de confissão religiosacristã-católica superou quantitativamente os demais, em que consideramosa relação desse aspecto com a origem familiar (descendentes de imigran­tes e falIUlias tradicionais), essa ligada à origem do local, assim como àsinstituições católicas, no que se refere ao povoamento.

IIhNINCÁ - DepoimentoNJi.'ITO, Antonio Ducatti. O Grande Erechim e slIa histÓria. Porto Alegre: EST, 1981.

,., IIHRNARDI, Francisco. HistÓria de Marau: uma comuuidade laboriosa. Porto Alegre:

l'all<>lIi.1992. p. 17-18.

Page 8: Ironita Policarpo Machado - Cultura Historiografica e Identidade -Capítulo 1 Autores e motivações historiograficas

~

38Iranita P. Machado

(llltura historiográfica e identidade39

1.2 Formação acadêmica

Seguindo a apresentação dos dados biográficos sociais dos autores e

dando um passo adiante, direcionamo-nos à identificação da formação acadê­

mica, a qual permitirá, nos próximos capítulos, a reflexão sobre a orientaçãoteólica e a concepção filosófica que oIientaram os autores na reconstituiçãodo passado. Para tal, agrupamos os autores pelo nível e especificidade deformação, como pode ser observado no quadro que segue.

Quadro 3 - Formação acadêmica dos autores (total 23) das obraspesquisadas

;tpcnas um autor com formação na área de história, Ernesto Cassol, Iicell"iado em Filosofia (UCP-197I) e em História (UFPr-1970) e mcstn: em IlisI<íria Econômica do Brasil (UFPr-1975).

Vejamos, a título demoI1~trativo,a fonnação de alguns autores. lnicicmllspor Welci Nascimento, considerando que, no período delimitado, é o esctitor coml) maior número de obras publicadas. Em seu depoimento, ele diz textualmente:

"Minha formação é humanista. Cursei o Ginasial e o Clássico.Na universidade fiz curso de Pedagogia, Letras e Ciências Polí­ticas e Sociais (Direito ).Embora não tenha realizado o curso dehistória, sentia uma inclinação pelos fatos passados. Durante ocurso Ginasial sempre atingi a nota máxima em história."2o

'O NASCIMENTO. Welci. Depoimento: instrumento de pesquisa biobibliográfica." PARIZZI, Marilda Kirst. Passo Fundo: sua história e evolução. Passo Fundo: Berthier, 1983

CAMPOS, Sônia Siqueira. Depoimento: instrumento de pesquisa' biobibliográfica.'I GHHM, Dclma Rosendo. Depoimento: instrumento de pesquisa biobibliográl1ca.

Em segundo lugar, quanto ao número de publicações, está a escritoraMatilda Kirst Pmizzi, fonnada em "licenciatura plena em Letras e com especiali­

zação em Folclore."21 Com alguma~ aproximações, quanto à formação, com aautora citada, destacamos Sonia Terezinha Siqueira Campos:

"Licenciada em Português - ]nglês pela Universidade do Estadodo Rio de Janeiro, curso de especialização em Costumes Sociais,Alabama - EE.UU, curso de pós-graduação em Folclore - Facul­dade de Palesttina/ Porto Alegre, curso de Animadores Culturaisna área do Folclore - Angra do HeroismoIAçores."22

Ainda na área de português, Delma Rosendo Gehm, com a seguinte

formação: "Curso Complementar, na Escola Complementar de Passo Fun­do - ]933; Curso de POItuguês, Latim e Grego na Faculdade de Filosofia daURGS - 1949 - ]951; curso de Extensão em Sociologia e Técnica em Pesqui­sa Histórica na URGS - s/d."21

Do expressivo número de autores com formação em filosofia e teo-logia, destacamos Dirceu Benincá, que diz:

"Iniciei meus estudos na Escola Municipal D. Pedro II da LinhaCaracol, em 1974,município de Seveliano de A1meida.Postetiormen­te, freqÜentei as sélies ginasiais na Esco]a Estadual de 10 Grau Or.José Bisognin, cidade de Severiano de A]meida. Sentindo que ti­nha vocação para ser padre, em 1982ingressei no SemináJio Na sade Fátima, em Erexim, onde fiz o 2° grau e o curso propedêutico.Obtive licenciatura plena em Filosofia pela Facu]dade de Fi]osofiaNa sa da lmaculada Conceição de Viamão (FAFIMC ), em cmso

4,3

4,3Mestrado ­

História

Especialização ­Sistema de

Avaliação

4,3

Il,G

17,3

2

4

Geografi,l(LP)

Il,G Sem dados

21,7

13,4 Pedagogia

5

3

2

Filosofia ITeologia

Letras (LP)

Medicina

Fonte: Instrumento de pesquisa biobibliográfica.

Pelos dados do Quadro 3, constatamos a disparidade na formaçãodos autores, ou seja: com superioridade, em primeiro lugar, está a forma­ção na área da filosofia/teologia (27,7%), seguida pela área das ciênciasjurídicas (17,3%), licenciatura plena em letras (13,4%), estudos sociais(8,6%), medicina (8,6%), licenciatura plena em geografia (8,6%), licenciatu­

ra plena em história (4,3%) e outras, além de especializações (8,6%), pós­graduação nível de mestrado (17,3%) e doutorado (4,3%). Há, pOltanto,

Page 9: Ironita Policarpo Machado - Cultura Historiografica e Identidade -Capítulo 1 Autores e motivações historiograficas

40Ironifa P.Machado :Cultura historiogrófica e identidade

111

realizado entre 1986e 1988.De 1989a 1992cursei Teologia no Institu­to de Teologia e Pastoral de Passo Fundo."24

Assim também Valdemar Verdi - fonnação em "Filosofia, Teologia,Especialização em Língua Francesa, pela Universidade de Grenoble: Fran­ça",25 e Erno Wallauer:

cultural simbólico30 adquirido pelo escritor individualll1clltl' I' 1'111~a'lI

conjunto no contexto social vivido. Para tal, demonstramos os agrupa 11 1\'11

tos feitos no Quadro 4, em seqüência.

Quadro 4 - Funções e cargos ocupados pelos autores das obraspesquisadas

1\,6

11,(,

II,r,

13,11

J 11,11

N'< «''"

Delegado educação

PH-"sidê,tlcia <lssociaç()l~Si sociedades,

de lega c ias,Acadern i<l S

8,6

11,6

5 2"1,7 Dircç50 - ecluGmd:Hio, imprensa, revistas '{

1:3 5b,S

Sem dados

Pastorais

Imprensa

Magistt'rio pLlb\ico / privado

)0 BOURDIEU (1989). 01'. cit., p. J34.

-'I Empregamos espaço pÚblico para designar questões ligadas a saneamento básico, transporte,habitação popular, pavimentação, áreas de recreação, patrimônios culturais. entre outros, de "res­ponsabilidade" da admitústração pública municipal enl prover e manter.

Com base nas infOlmações da tabela, podemos dest.,cm· que os autores

desempenharam funções e ocupm'mn cargos em maior número no setor público.Concentram-se, quantitativmnente, nas funções ligadas ao magistério, às ativi­dades burocrático-administrativas estaduais/municipais e à imprensa, bem como

predominmn cm'gos de coordenação, chefia e pm1icipação em conselhos.Por um lado, temos as funções profissionais ligadas a instituições e órgãos

públicos de dimensões sociais e, por outro, os cargos ocupados, tmnbémligadosa instituições ou grupos, em iniciativas não oficiais voltadas ao bem social, asquais estabelecem projetos e os executmn em nome de toda a sociedade. Em suma,podemos dizer que são funções e cargos reconhecidos publican1ente em virtudedo reconhecimento da própria instituição. Muitas dessas atividades, por exemplo,

est.7(oligadas a questões i.ntrínsecasao social, como a educação, a comunicação,o espaço pÚblico,3 t a saúde, a filantropia, entre outras.

Fonte: Instrumento de pesquisa biobihliográfica.Ohs.: O nlllllcro de atividades e cargos ocupados não corresponde aO total de aulores, sendo supe-

rior ou inferior pela diversidade constatada entre eles.

< I BHNINCÁ, Dirceu. Depoimento: instrumento de pesquisa biobibJiográfica.VI'RIlI, Valdemar CiriJo - Depoimento: instrumento de pesquisa biobibJiográfica.WAI.I.AUER. Erno. História do mUllicípio de Victor GraeI! s/ed., 1988 - Prefácio.

" /.ANOI.I.A. Darcy. Raizes e história de uma comullidade: 1943-J993 Água Santa. Passo Fundo:(,,,,i fi,';) Hditora UPF. J994 Prefácio.

1;<INSI':( 'A. Pedro Ari Veríssimo. Depoimento: instnunento pesquisa biobibJiográfica.Vi\I~( ;i\S, Alvaro Rocha. Depoimento: instrumento pesquisa biobibliográfica.

1.3 Funções e cargos ocupados

"1960-1964 - Escola NOlmalEvangélica em São Leopoldo - RS, 1966-1968 - CLU'SOde Magistério(2°grau) e de catequistana Escola NOlmal

Evangélica em Ivoti - RS, curso de Filosofia na Fundação Universi­tária de Bagé, 1969 - 1974, Curso de Teologia na Faculdade da IgrejaEvangélica de Confissão Luterana no Brasil! São Leopoldo, cmsode Filosofia na Fundação Universit:áIiade Bagé (...), 1979 - 1985 Es­tudos de pós-graduação com mestrado em Teologia na Universida­de de Hambmgo na República Federal da AJemanha."26

Ou, ainda, Darcy Zanolla: "(...) fez seus estudos primátios em sua terranatal e os secundátios no Seminário São José de Santa Maria. Realizou seus

estudos filosóficos e teológicos no Seminário Conceição de São Leopoldo."27Na área da saúde, destacam-se: Pedro Ari Veríssimo da Fonseca, "for-

mado pela Faculdade de Medicina e Cirurgia do Rio de Janeiro,"28 e Álvaro

Rocha Vm'gas,"formado em Medicina na Ufi'lSs,em Porto Alegre, em 1961."29De acordo com os dados, constatamos a predominância de autores regio­

nais com formação de nível supelior,porém em áreas distintas, ainda que a maiOliase inclua nas áreas sociais/humanas. Portanto, nesse aspecto pm1iculmlnente, porum lado, o que llIes confere um traço comum é o grau de formação superior; poroutro, é o fato de não terem fOlmação em história, o que significa, conseqüente­mente, que não têm habilitação específica pm'a a pesquisa histórica.

Consideramos de grande importância a descrição das funções pro­fissionais desempenhadas pelos autores, bem como os cargos por elesocupados, estes não remunerados, com o que será possível, posteriOlmen­

te, acrescentando-se outras informações, apresentar e discutir o capital

Page 10: Ironita Policarpo Machado - Cultura Historiografica e Identidade -Capítulo 1 Autores e motivações historiograficas

42lronita P. Machado

Cultura historiográfica e identidadelU

I .4 Atividades atuais e filiaçõesinstitucionais dos autores

Continuando neste preâmbulo de caráter geral e de perspectiva seguidaaté aqui, circunscrevemos a exposição a questões ligadas ao tempo de vivênciados autores, que, por sua vez, con-esponde ao tempo da publicação das obras emanálise. Se, até aqui, tratamos de vislumbrar as vivências passadas dos autoresque podem lhes confelir capital cultural simbólico, passamos agora a verificar oselementos que possam estar ou não reificando32 tal posição social. Fazemos isso

pelo mapeamento das atuais atividades dos autores, das instituições com as quaiseles possuem vínculo e de suas publicações (além das selecionadas para análise).

Port~ll1tQ,são poucos os autores que desenvolvem atividadL:s (IL-Pl'squisa, e os que o fazem concentram-se em estudos de cultura popular.

Quanto às atividades ligadas à pesquisa vinculadas a institui(,i(IL:suniversit.mas, registramos apenas dois autores entre os que devolveram o instlllmento de pesquisa biográfica: Cassol, "Du-etorda Revista Perspectiva/URl-1999"(de acordo com o prefácio da obra História de Erechim - 1979), que passou atrazer "estudos históricos" produzidos pelo Centro de Ensino Superior deErechim - CESE/"Fundação Alto Umguai para a pesquisa e o ensino superior"­

Fapes,34 a partir de 1975; e Piran, com várias pesquisas sobre a região do AltoUmguai (temas ligados à área da geografia), publicadas na revista Perspectiva,reconhecida pelo CNPq como periódico científico especializado.

Quadro 5 -Atividades atuais dos autores das obras pesquisadas33

Com base nos dados apresentados no Quadro 5, evidencia-se queas atividades atuais dos autores concentram-se na área de educação, jor­lIali,sllIo,pastoral/religiosa, sendo quantitativamente superiores às demais.

2

2

8,6Sem

730,4

4,3 Sem dddos

11 47,8

4,3 4,34,3

8

34,7

Quadro 6 - Filiação institucional - político-partidária e não partidáriados autores das obras.

Academid Passo-Fundense de Letrds

Instituto de História e Tradição do Rio Grande do Sul

Instituto Brasileiro de Educação, Ciência e Folclore -

Comissão GaÚcha de Folclore

Grande Oriente do Rio Grande do Sul

Movimento Tradicionalista GaÚcho

Sem dados

Pastora I da Juventude

~u Considerando que restringimos nossa investigação a publicações não acadêmicas/científicas, jus­tificamos a opção em contemplar o livro HistÓria de GaLframa de Casso!, historiador por forma­

ção e pesquisador acadêmico, por dois Jnotivos: priJneiro, por ser essa obra e outras puhlicaçõesdo autor fonte de consulta de vários autores contemplados: segundo, pelo falo de ser o referido

autor coordenador da obra que, por sua yez, é fruto de pesquisa de outros autores acadêmicos. mas

sem formação eln histÓria.

Fonte: Instrumento de pesquisa biobibliográfica.

11

j,

li,j

4,3

4,3

8,6

52,1

4,3

8,6

13,0

2

12

3

2

2

4

Advocacia

Bancária

Mé'dicina

Assuntos culturais - folclore

Religiosa

Agricultura - granja

SC'/1l dados

S,'111 atuação

I lJ!llt': Instrumento de pesquisa biobibliográfíca,

I )l'IIOlllillalllOS r('Uiellndo para situações e açÔes que reafinnem/sustentclll mll fato dado como nu­1111;11

\ I :\'. dnIOlllina\'ol's das áreas de atuação foram registradas de acordo com as infonnações dadasIwlo'. Il/OP' io,>,autores, hem como dos locais. Assim, as informações apresentadas nQ texto emILllll II 1111 t'1I1H' a~,pas SilO originais dos depoimentos ou apresentações/prefácios dos livros.

Page 11: Ironita Policarpo Machado - Cultura Historiografica e Identidade -Capítulo 1 Autores e motivações historiograficas

44 lronita P.Cultura historiogrófica e identidade

45

Destacamos aqui o significativo número de autores que mantêm vín­culos com instituições diferentes em suas razões sociais, porém semelhantesna representação social.35 Nesse sentido, paradoxalmente, temos a singulmi­dade dos grupos constituintes das instituições, as quais se restringem a indi­víduos que diferem da maiOlia porque possuem aptidões/talento, o que ostorna diferentes, e pelos interesses específicos e restritos que os unem deacordo com seus princípios. Em seus imagináIios, eles se unem em nome de

uma causa que pensam beneficiar a todos os cidadãos integrantes da coleti­

vidade e da qual eles se distinguem. Assim, as instituições ocupam um espa­ço reconhecido pela sociedade como restrito a alguns poucos indivíduos, mas,ao mesmo tempo, como signiticante a todos, por inscreverem em suas razõesde ser os interesses pretendidos como de toda coletividade.

Daí inferirmos que os autores, em sua maioria, são tiliados a instituiçõesde diversas especificidades, mas mantêm como traço comum as atividades liga­das a questões culturais (históricas, folclóricas, tradicionalistas, literáIias), porpossuírem uma representação social que, na prática, não conesponde aos inte­resses de todos os indivíduos de uma coletividade. Tendo isso em conta, cre­mos ser importante tratm' de fornla específica de uma dessas instituições, aAcademia Passo-Fundense de Letras, que integra o maior número de autores

(Ghem, Fonseca, Pmizzi, Nascimento). VejanlOscomo a apresenta Nascimento:

"A ACADEMIA PASSO-FUNDENSE DE LETRAS é uma en­

tidade civil, sem fins lucrativos e sem caráter político partidá-rio, fundada em 07 de abril de 1938 com o nome de GRÊMIOPASSO-FUNDENSE DE LETRAS, com a finalidade exclusiva­

mente literáIia- cultural. É declarada de utilidade pública muni-cipal e estadual, registrada no Cartório de Registros sob nO249,registrada na Secretaria do Trabalho e Ação Social sob o n°6117 e no CNSS do Ministério da Educação, sob n° 261.488/77."36

Restringindo a expressão entidade civil a seu significado etimológico,definimos entidade como uma sociedade que diIige atividades de um deternli­

nado gmpo civil relativo de cidadãos enquanto membros da sociedade; pOltan­10, nesse sentido, vemos a representação social da Academia Passo-Fundense

de I"eiras,como instituição e de seus membros. Por um lado, a academia repre­s,'nla uma entidade civil declarada de utilidade pública por pretender desenvol­1'1'" I' I'.I/hllldira cultura, no que se constituiIia na manifestação de toda uma,'(li,'Iividade: por outro, restringe-se apenas a alguns indivíduos, aptos a te,1 tarefa.

l'lIlnidl'lll(\,', rl'{J/'c'Sc'll1(/CÚO social como o significado e o espaço que as instituições, em seuI (llIjllllhl, illllJlíllll na l·oll'ti\'idadc, sendo por essa reconhecidas.

f'L\,';( 'II\II'[\]'I'(), \Vvki /)0,/1/ da AC(fdcmia Passo-Fwulense de Letras. p.7. Caderno; sem refe­11'1111.1', Ik ('dnI1Idl';Htl

Podemos observar isso na forma como um acadêmico define a fina-

lidade e o funcionamento da entidade a que pertence:

"A Academia Passo-Fundense de Letras destina-se a congre­

gar, exclusivamente, os escritores de Passo Fundo, com finali­dade primordial de auxiliá-Ios a desenvolver e expandir a cul­tura em todos os níveis do conhecimento humano. Além dis­

so, a Academia coopera para que as obras dos escritores dePasso Fundo e do Rio Grande do Sul sejam cada vez mais

conhecidas, bem como procura cultuar a memória dos escrito­res brasileiros, contribuindo com o aprimoramento da línguanacional. "37

Após essa exposição, devemo-nos interrogar: se é uma entidade decaráter público, todo cidadão pode tornar-se membro integrante da Aca­demia Passo-Fundense de Letras? Em um sentido genético e etimológico,todos teriam, sim, tal direito, contudo nem todos possuem a aptidão ne­

cessária. Vejamos quais são os critétios para ingressar na academia:

"Oconendo vaga, é fixado edital, cuja insClição é feita pelo pró­

prio candidato, que deve residir em Passo Fundo, sendo ne­cessátio possuir livros ou trabalhos publicados de reconheci­do valor literáIio ou técnico, acompanhado do cUlTiculum vitae,

que serão examinados por uma comissão designada pelo Pre­sidente, que expedirá parecer, perante a Assembléia Geral. CadaCadeira, em número de quarenta (40), tem seu patrono, de pre­ferência um intelectual passo-fundense."38

Muito mais do que fechar questões ou generalizá-Ias, procuramosdestacar a relevância de se considerar a filiação dos autores a instituições e,

por conseqüência, a extensão dos interesses dessas em suas criações/obras,como analisaremos mais adiante; também salientamos que, nesse aspecto,

pmticularmente, os autores ocupam um espaço "privilegiado", de destaquena coletividade.39 Embora não possam ser generalizadas as reflexões em tor­no da Academia Passo-Fundense de Letras às demais instituições, ela ilus­

tra muito bem a representação social que as instituições possuem.

" NAscrMENTO. Welci. PC/ji! da Academia Passo-Fundeuse de Lelras. p. lI.Id. Ibid .. p. 12.

") Ao afinnar que os autores ocupam um espaço "privilegiado" na coletividade. temos por referênciaas informações obtidas por meio de instrumento de pesquisa biobibliográfica, no qual eles reve­

lam que publicam nos jornais e participam de programas jornalísticos nas emissoras de rádio deseus municípios constantenlcnte e por convite, bem como são solicitados a proferir palestras nacomunidade.

Page 12: Ironita Policarpo Machado - Cultura Historiografica e Identidade -Capítulo 1 Autores e motivações historiograficas

."'guindo a perspectiva de identificar a natureza coletiva das obras,

"I'1i ." 111 aIDOSoutro traço comum entre os autores, que os identifica entre.1 • " I az reconhecidos socialmente: a diversidade de publicações.

1!l1''';

1;1

47

I .5 Produções, publicações e concepçãode história dos autores

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IIU",/". 7 - Publicações dos autores das obras analisadas43

46

Quanto à filiação pmtidáIia, destacanlos, Plimeiro, a expressiva percelllagem de autores sem filiação pmiídáIia e a elevada percentagem de filiações a illstituições não pmtidáIias. Nesse aspecto, o traço comum entre os autores pareL'l'ser o engajmnento em entidades que, de alguma forma, os identificmn com sua.sfOlmações, suas funções/cm'gos ocupados e atividades atuais, conferindo-Ihesuma identidade social. Em segundo lugm',ressaltamos a especificidade da mai()l'ja

das instituições, as quais, de uma fOlma ou outra, esl.'1oligadas à cultura. aquientendida em seu sentido antropológico - por dizer respeito aos valores, crença.s,costumes e tradições dos homens enquanto seres sociais - e histórico, pela significação e ações que desempenhmn através de seus membros num determinad(Itempo-espaço. Assim, nos dois sentidos, a cultura pm'ece aqui ser o topoi d()processo identitáIio desse grupo social. Nas palavras de bineu Gehlen, um do,spresidentes da Academia Passo-Fundense de Letras, expressa-se bem isso:

"O eco do trabalho do Grêmio Passo - Fundense de Letras che­gou à capital da República e lá no seio das diversas academi­

as estaduais. Com o decorrer dos anos, o sodalício passo ­fundense se consolidou, para brilho e glória do Rio Grande do

Sul e orgulho do povo da ten'a de Fagundes dos Reis, porqueaqui brotam as mais ricas expressões de beleza literáI'ia, traba­lhos e estudos em feitos nobres de civismo."4o

Diante dessas diretrizes, que tanto justificam as ref1exões em torno da.s

filiações dos autores a instituições, como a importância de traçm' um quadIUda natureza coletiva das obrasflivros, destacamos que "identidades culturais

são resultados transitórios e fugazes de processos de identificação( ...), elllelldendo as identificações, além de plurais, como dominadas pela obsess;lo dadiferença e pela hierarquia das distinções."41 POltanto, parece ser nesse seutido que o caráter pmticular das instituições e a cultura se fundem como dl'

mentos identitários de seus membros. Seguindo essa perspectiva de reflexa( I,de forma preliminm', consideramos que "a questão da identidade é assilll

semifictÍcia e seminecessáI'ia,"42justificando, pois, nossa preocupaçÜo ('111

conhecer quem reclama por uma identidade e por quais meios o faz.

92

coletados nos depoimentos dos autores através de instrumento de pesquisa hiobibliográfica.11'101"

I,d.d de

Illd 1111

I I'" 111 Irulnental de pesquisa biobibliográfica.(doi. Ilal n50 foi somado por ser CO-Jutoria e já ter sido contemplado'" Ihid .. p. 1.

II SANTOS. Boaventura de Souza. Pela mão de Alice: o social e o político na p6s-modemidHdl'Sil" Pa"I,,: Corte>'.. 1<)97. p. 135.Ihid.

Page 13: Ironita Policarpo Machado - Cultura Historiografica e Identidade -Capítulo 1 Autores e motivações historiograficas

48 Ironito P.Machado ( IJItUro historiogrófica e identidade 49

li!

Como vemos no Quadro 7, há um total de 92 publicações dos auto­res das obras pesquisadas, entre as quais 77 correspondem a livros; des­ses, 32 são objeto de nossa análise -livros de histólla publicados na década

de 1980-1995, já relacionados no Quadro 1. As demais publicações nãoforam objeto deste estudo em virtude de a data de publicação se situarfora do recorte temporal desta pesquisa ou em razão de as temáticas sedistanciarem da problemática aqui proposta.

Quadro 8 -Amostragem de títulos das publicações dos autoresanalisados

( ;11 1M, Delma Rosendo

NI\SClMENTO, Welci

. Passo Fundo através

tempo (10 volume) - 1982.Passo Fundo através do

tempo (2" volume) - 1982.Passo Fundo através do

(1'1 volume) - 1978

(cOlltillll,t!

. Cronologia do ensino ('111

Passo Fundo -197(,.

Revolução de 1893 emPasso Fundo - 1997

. Segredinho: história e

tradicionalidade - 1990 .. Raizes de Lagoa VermelhaMClsica folclórica e popular -1996. Presença açoriana- 1980. Carreira de bois - (2'] edição) _ 1997. RS

1981. Folk, festa e. aspectos do folclore (3 ,tradições populares ~ 1983, edi<;ão) _ 1995. Rodada de

Carretas e carreteiros - causas _ 1989. ABC da

1984, Gravataí no contexto Guerra dos Farrapos _ 1985artístico e literário do RS -1990

ICAMPOS, Sônia Siqueira

(ASSOL, Ernesto

11I,RI, Gino

I ( tNSI( '1\, I'"dro I\riV<H",iIIlO dd

. História de Marau:urnacomunidade laboriosa ­

1992. Retorno às origens­Linha 18 Rosso - 1996.

(onlimdo a história de ViklMaria - 1996. As bases da

lil<:ralura rio grandense1997

. Rondinha - 1988. Os

monges de Pinheirinho (2"edição) - 1976. 80 anos da

São Pedro - 1976

. Encantado pitoresco.Encantado sua história sua

gente. Muçum princesa daspontes

PII,AM, Nédio

. História de Gaurama (Co­autoria) - 1988.

Contribu ição paraidentificação da regiãoAlto-Uruguai e área de

abrangência da URI - artigo- 1995. Realidade sócio­

econômico e política domeio rural do Alto-Uruguai- artigo - 1992. Geografia

humana da região I\ltoUruguai - artigo - 1<)B4.

Agroecologia:condicionantl's sócio­

econômicos - artigo -I <)B4.Estrutura fundiária do Rio

Grande do Sul - artigo ­1983. A pequena produç,]oem Erechim: um estudo de

caso - artigo - 19H2

. Procedência dos fruti­

hortigrangeiroscomercialízados em

Erechim - artigo - 1977.Tamanho das propriedades

e exploração por nãoproprietários no RS - artigo

- 1979. Geo-história de

Erechim - artigo/equipe ­1975. A pequena produção

como estratégia dedesenvolvimento do

capitalismo no campo naregiJo (prl'lo). Influencia dall1odernizaç,]o IlO processo

de (,lpitalização dapequell,l propriedade no

I\lto-Uruguai (prelo). DGE­W: caracterização sócio­('conômica (co-autoria)

1984. Un iversidade

Pl'squisa e inovação: O RioGrande do Sul em

perspectiva (co-autoria) ­1997

Page 14: Ironita Policarpo Machado - Cultura Historiografica e Identidade -Capítulo 1 Autores e motivações historiograficas

r

FonldllStrlll11l'1llo de pesquisa biobibliográfic:a.

Obs.: ( )s (belos apresentados sobre as publicações foram registrados de acordo com as inforrnJçÔes

('IlVi,ldas pelos autores. Assim, n50 foi possível seguir urn padrão de <lprcsentação, como, por('xel11plo, a dota da pllblicaç50 e slIa especificidade.

11 As tll',( 11',',01"; desta parle do texto pautam-se em dados sistematizados com base nas informaçõesohlldll', 1111 th'poillll'nlo dos autores - instrumento de pesquisa biohibliográfica - e nos registrosna-, IIIIIIUIIl\O\',', t' pl'cr;kios das ohras.

I', 1'0111111 di' lI/Ia ,li' dlls.\'ij/clI{'ilo/lJ;sfinção, segundo a tese de Bazcko sobre imaginário social.

t'1I11-'lllt"lllP'. 101110 :;1'11<10 "as redes de sentido, de marcos de referência símbolos, que os homensse I lllllllllh 11111,',L' d\'lIo1alll de IIllla identidade coletiva", portanto, diferenciando-se uns dos outros<:011111j'llljlll 1111hil'lllIqllia :;odal. Essa rede de sentidos é fruto da vida social produtora dasrel'II~lh 1'1 lilj·, t' \'111· \'\'1'.;\ I'''ra tal. VL'r BAZCKO. Op. dt. p. 307.

Dos oitenta títulos, entre livros e artigos, dos dez autores que maispublicaram entre os 23 biografados, podemos relacionar a temática tratada

com a fonnação, ou quadro familiar, funções e cargos ocupados/atuais e/ou com a instituição a que estão filiados. Temos, por um lado, consciênciado caráter lacunar de nossa conclusão, que resulta de uma análise metó­dica das publicações, mas, por outro, entendemos que todo título é umaenullciação do que se pretende anunciar/comunicar.

A questão que está subjacente às publicações é o interesse peloconhecimento, como motivação oriunda do contexto vivido.44 Nesse pon­to, reportamo-nos a um pressuposto inicial deste trabalho: o livro comosímholo identitário. Considerando as produções, especificamente os li­vros, com títulos relacionados às temáticas que identificam os autores àsinstituições às quais são filiados, podemos dizer que a questão da buscade elemento de identificação representa uma forma de luta de class([ica­ção/disfinção que se traduz num poder de estabelecer uma visão de mun­

do social ligada ao lugar de origem (familiar, institucional, profissional,localidade ... ); assim, o livro torna-se símbolo.45

1\0 iniciar este capítulo, mencionamos nossa preocupação com suacspccificidade e a intenção de traçar um quadro da natureza coletiva dacria,';jo (livros), razão pela qual consideramos necessário, nesta parte doIL'xto. Ieee r duas considerações. A primeira diz respeito ao objeto especí­fico. ;1 idcntificação dos autores, para o que utilizamos os dados biográfi­cos, ll'kr0ncias às relações socioculturais e políticas que motivaram oflllll"" l' o lornar pública a obra. P0l1anto, estamos conscientes de que

"" DECCA, Edgar Salvatore de. Apresentação. In: BURKE, Peter. Velle~a e Amsterdã: um eslndo

das elites do século XVIII. São Paulo: Brasiliense, 1991. p. 8 - 9."' CARVALHO. José Murilo de. A construção da ordem: a elite política imperial. Brasília: Ed,

Universidade de Brasília, 1981. p. 20.I.' BURKE (1991), Op. cit., p. 16 .

:>1.cultura historiogrófica e identidade

não se trata de um trabalho biográfico - nem como objeto nem COIIIO111<'

todo prosopográfico -, pois, mesmo investigando características hasila.'.comuns dos autores um a um e o estudo coletivo de suas vidas, IlOS.';O~;

dados são insuficientes para um trabalho de caráter essencialmenll' hio

gráfico, tanto os que dizem respeito à vida privada quanto aos da púhlic·a.Essa afirmação pauta-se na assertiva de Decca, que diz: "( ... )

prosoprografia é a investigação das características básicas comuns de umgmpo de atores na história por meio do estudo coletivo de suas vidas.(...) estabelecer o universo a ser estudado e formular um conjunto de ques­tões - sobre nascimento e morte, casamento e família, origens sociais,posição econômica herdada, lugar de residência, educação, tamanho eorigem das fortunas pessoais, ocupação, religião, experiência profissional,etc(u.)."-l6

Portanto, como se observa até agora, os dados apresentados ante­riormente não cobrem o universo necessário a uma biografia coletiva; poroutro lado, o objeto de estudo deste texto está vinculado a um problema,referenciado em nossas palavras iniciais, ligado à produção histOliográfica,e não especificamente à elite política. Nesse sentido, o que nos levou aodesenho deste capítulo foi nosso problema, a partir das hipóteses formu­ladas e do método escolhido, matriz disciplinar da história, visto que nelese coloca como questão inicial o interesse pelo conhecimento histórico.Para tal, fez-se necessário trabalhar com dados biográficos.

A segunda consideração, de ce11a forma ligada à primeira, diz res­peito à definição de um gmpo social, o que fazemos, no quadro da natu­reza coletiva dos livros, com base do coletivo de autores. Portanto, passa­mos à segunda parte deste texto, em que pretendemos responder à ques­tão: quem são os autores? Para isso, partimos do pressuposto de que ocoletivo desses autores pode ser denominado de grupo social, o qual,fazendo parte de uma coletividade/sociedade, se distingue no interior dela,configurando-se, portanto, como uma elite.

Segundo Murilo de Carvalho, elites podem ser conceituadas comogmpos especiais marcados por características que os distinguem da po­pulação ou mesmo de outros grupos de elite;47 ou, nas palavras de Burke,"gmpos supeliores (.u) segundo três critérios: status, poder e riqueza."48Nesse sentido, para a questão em foco, a conceituação de elite que pode­rá orientar-nos é a utilizada por Colussi: "(u.) elite (.u) aqueles setores de

Ironita P. Machado

(continua)

. Frei Pio, fenômenomístico do século XX. Um

silêncio que fala. Joanad'Arc, guerrilheira de Deuse da França (prelo). Entre o

amor e o altar

. Soledade das sesmarias

dos Monges Barbudos daspedras preciosas - 1987.

Francisco, irmão universal.Clara de Assis

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t'"",V,"dem" C;"I"

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S2Ironila P.Mochodo

I. \Illura historiogrófica e identidade 53

•...

uma determinada sociedade que ocupam as mais altas posições e que dis­pÓem de maior acesso aos valores e ao controle dessa mesma sociedade.

Nesse sentido, não existe uma única elite, mas diversas, dependendo de quevalores referimos e de que controle ela exerce: elite política, elite econômica,dite intelectual ou cultural( ...)."49

Partindo dos aspectos referenciados na exposição dos dados biográfi­cos obtidos, entendemos que os autores, em seu conjunto, representam umgrupo reduzido de indivíduos pertencentes às coletividades que configurama sociedade constituinte do espaço regional - centro-norte do Planalto rio­

grandense. Esses ocuparam e ocupam posições de prestígio e são reconheci­dos, se não por toda a sociedade, pelo menos, por outras elites, seja pela suadescendência, seja pelas funções ou cargos públicos ocupados (pastoral,magistério, saúde, imprensa), por sua fomlação e/ou filiação institucional.

Particularmente, o fato de escreverem e publicarem livros de história pro­curando enquadrar a memória de toda a coletividade é que lhes dá o atributo de

grupo "superior" e que dispõe de maior acesso aos valores (pela sua experiên­cia familiar, profissional, formação, fontes de pesquisa, apoio institucional noque se refere a questões estruturais). Lembramos que, até as últimas décadas,esse tipo de produção esteve, salvo algumas exceções, sob os cuidados des­ses autores. Quanto ao poder de esse grupo estabelecer uma visão de mundo

singular à sociedade, isso se dá pela escrita da história construída pelos auto­res a pmtir de sua consciência histórica; portanto, a prática de estabelecer uma

visão de mundo efetiva-se pelo exercício da autOlidade e do poder de dizer ascoisas em nome de todos, de construir identidade singular de coletividade eIlIgares a partir do imaginário coletivo, estando eles conscientes ou não.

Assim, diante das referências feitas até aqui, consideramos os livros

11m símbolo - intermediário entre o sinal (narrativa histórica) e o signo(visão de mundo do gmpo social, incutida na narrativa), que estabelece

uma relação com o imaginário social (ainda que já das elites) - visto que,com suas nmTativas, impõem uma imagem e criam uma legitimidade, origi­uada do poder de antepassados, seja étnico, seja político, econômico ou

institucional: "Heróis chefes/guerreiros, estabelecem modelos e o imagi­n;írio social é, deste modo, uma das forças reguladoras da vida coletiva."5o

Essas produções, que passam a existir como sistema simbólico, ins­Innllcnlo de conhecimento e comunicação, exercem um poder estmturante(influenciam os indivíduos nas formas de conceberem a sociedade atual e

nda a/',ircm, reconhecendo gmpos e desconsiderando outros) porque são

• ' "'1 11,~~;j, "Iianl' 1.IIl·ia. A maçol1aria gaÚcha 110 século XIX. Passo Fundo: Ediupf. 1998. p.'I'

11\(11-," "1"i1 ." 111'/\111.

eslruturadas (por meio da narrativa estrutura-se uma concepção de histó­ria que seleciona fatos, sujeitos e ações históricas, privilegiando algum(s)!'rupo(s) e negligenciando outros) de fonua a estabelecer um poder deddinição de mundo social no imaginário coletivo, apresentando-se, assim,como poder simbólico. Nesse sentido, "poder simbólico é um poder deconstmção da realidade que tende a estabelecer uma ordem que dá senti­do imediato ao mundo."51 Através dos sinais (narrativa histórica portado­

ra de signos), os autores buscam uma integração social e contribuem paraa reprodução de dada ordem social, legitimando a ordem estabelecida e asdistinções. Os agentes da produção simbólica, motivados pelos seus inte­resses pessoais e do gmpo do qual fazem parte, direcionam seu olhar auma interpretação de mundo social, colocando, dessa forma, o capital, aoqual devem sua posição, no topo dos princípios de hierarquização.

Tendo como premissa as questões referenciadas, da compreensãode elite no plural e dos valores referidos aos autores regionais, denomina­mo-Ios de elite cultural. Com isso, chegamos ao ceme daquilo que consi­

deramos premente no que se refere à identificação dos autores regionais,que constitui o foco central das reflexões que se seguem.

Os autores regionais, elite cultural, são portadores de capital culturalsimbólico por causa da posição que ocupam no espaço social, da "históriaincorporada" pela vivência ou tradição como grupos sociais tradicionais, issocomo resultado de incorporações dos ganhos acumulados das funções/car­gos desempenhados no passado-presente e origem familiar. Nas palavras deBordieu, "o capital cultural e o capital social e também o capital simbólico,geralmente chamado prestígio, reputação, fama, etc., que é a forma percebidae reconhecida como legítima das diferentes espécies de capital."52

Assim, essa elite cultural apresenta a composição de seu capital

incorporado na seguinte ordem de posse: pela sua descendência de famí­lias tradicionais, as quais são reconhecidas socialmente pelos seus nomes

e feitos ( conforme Quadro 1); pelo fruto de seu trabalho e exercício decargos sociais no passado, bem como pelas instituições sociais (cultural,religiosa) a que foram ou são filiados - "institucionalizadas em estatutosduradouros, socialmente reconhecidos ou juridicamente garantidos" ,53deespecificidade cultural e pÚblica. Portanto, essas posições na hierarquiasocial e nas correlações de força é que determinam o potencial atual e ostatus desses autores, como podemos observar pela forma como são apre­sentados nos prefácios de seus livros .

51 BOURDIEU (1989). Op.cit., p. 9.

Ibid .• p. 134.5' Ibid., p. 135. Ver esses aspectos nos quadros 2 a 7 deste estudo .

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!,;j lronita

Cultura historiográfica e identidade55

Podemos distribuir essa elite cultural em duas categorias de auto­r,'s segundo seus apresentadores ou como eles próprios seaUlodenominam, A primeira categoria, historiador, refere-se aos que, deurna forma ou de outra, escrevem sobre o local e o regional tendo porlema as gerações passadas, na qual se concentram 60,8% do total deautores. Transcrevemos em seqüência alguns fragmentos textuais dasapresentações das obras como ilustração de nossa assertiva e com oohjetivo de verificar quem são os apresentadores. No prefácio do livrode Vargas, lemos o seguinte:

"( ...) consideramos dever de quem escreve hoje sobre temasrelacionados a vida de nossas comunas, ajudar a compreen­são do grande problema contemporâneo, que é o uso da terra.Dirão alguns que não é função de historiadores. Ao que pedi­ríamos licença para retrucar: a História é precisamente a mes­tra capaz de iluminar nossos caminhos( ...) Mozart PereiraSoares. "54

Outro exemplo vem de Fonseca:

"Na mais feliz das horas, vem a público este livro porque pre­encherá um enorme e gritante vazio na literatura especializadabrasileira( ...) agora presente e de forma definitiva e autorizada,através da palavra de um mestre verdadeiro( ...) DI'. Paulo Re­nato Cerati - Membro da Academia Passo-Fundense de Le­tras."55

" (...) Veríssimo da Fonseca, muitas gracias pelo privilégio. Pre­sente macanudo este que faz ao Rio Grande do Sul e ao Brasil.Manancial de vivência (...) Jayme Caetano Braum."56

Nos dois exemplos citados, os autores não são denominados, obje­IlvaIIlL'nll',de historiadores, mas esse sentido subjaz às expressões "quem('~;n('\'e hoje", "função de historiadores", "de forma autorizada e mestreITldadl'iro". Por outro lado, destacamos a relação existente entre os auto­Il'~;(' Sl'USapresentadores, que pode se dever à "aptidão de memorialista",

(01110 pod,'mos observar nas palavras de Vargas na introdução de seu li­110. "lIao podemos deixar de citar Mozat Pereira Soares, nosso mestre e

.11111)'.0 <111(' 110 ,seu Santo Antonio de Palmeira traça definitivamente o que

I \ \PI'.-\,l; 111' 111 P '1

II tll"H \ I 'I' I II 1I1t'lha do livro.1It1.1 I' I

deve ser um livro de histórico de uma cidade"; ou à.filiação illslill/ciolllll.

de que são exemplo as palavras do prefaciador do livro de Fonseca qualldo se refere à Academia Passo-Fundense de Letras e ao Instituto de Ilis

tória e Tradição do Rio Grande do Sul, antes citado.Nessa mesma perspectiva,podemos destacar o que consta na obra de Gdllll:

"A autora professora emérita, membro da Academia Passo­Fundense de Letras, embria em importância com os historia­dores dessa Terra, como Antonino Xavier e Oliveira e EdeteCafruni; todavia em vários aspectos, os sobrepuja,

notadamente, pela coerência e amplitude da pesquisa .. RicardoJosé Stolfo Da Academia Passo-Fundense de Letras."57

Ainda, nas palavras de Netto: "( ...) Independentemente da suaopinião pessoal, cabe ao historiador relatar fielmente os fatose é com este propósito que vamos tratar (...)".58

Na segunda categoria, optamos por escritor-técnico,59 entendidocomo a pessoa que reúne fontes e organiza os dados de uma forma didá­tica. Isso deduzimos pela diversidade de denominações usadas pelos

apresentadores ou pelo próprio autor, que, em alguns casos, confessa nãoser historiador. Assim lemos em Fassini e Silva:

"Não somos historiadores, somos professores, mas de uma

maneira simples e numa linguagem acessível procuramos dei­xar a todos um pouco do que foi a vida de nossos antepassa­dos."60

Outro exemplo vem de Campos: "O presente trabalho é resulta­do do esforço desinteressado e altamente cooperativo de toda umacomunidade( ... ). A comunidade relatou os fatos de sua cultura, ostécnicos compilaram-nos (... )."61 Por fim, outra citação que exemplificaa relação do prefaciador com a obra e com o autor está na obra deNascimento:

"Conheça Passo Fundo, TCHÊ! Não engloba apenas o que foraapurado (...) mas nos oferece mais valioso subsídios para in­tegrmIDos às gerações( ...) Parabéns, professor Welci, estamos

" GEHM (1982). Op,cit., p,5." NETTO. Op,cit., pAS,i'l Na grande maioria dos prefácios dos livros, quando o autor não é referendado como historiador,

a expressão "'técnico" é uma constante, associada à atividade de reunir as fontes, de compil:.í·-Iasordenadulnente de fonna que sejaJn compreendidas.

,," FASSINI, SILVA. Op,cit., p, 5,,,' CAMPOS, Sônia Siqueira, Segredo: história e tradicionalidade, Porto Alegre: IGTF, J '1<)(),I', lI;

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56Ironita P.Machado Cultura historiogróFica e identidade

57

todos orgulhosos de nosso confrade. Antonio AugustoMeireIes Dumte/Presidente da Academia Passo Fundense deLetras.62

Eu não sou um conhecedor profundo da História, apenaspesquiso e refaço os fatos numa linguagem a nível popular,isto é, de fácil entendimento, penso eu (...)."63

Com base nas duas categorias de autores, historiador e escritor­

técnico, estabelecidas pela conceituação dos apresentadores e dos pró­prios autores (presente nos livros - prefácio, apresentação, introdução),delineamos nossa opção conceitual - possível de agmpar todos os auto­res que compõem essa elite cultural -, que é: historiador diletante e, ao

conjunto de suas produções, cultura historiográfica. Nossa opção anco­ra-se na assertiva de Diehl, que expressa: "O historiador diletante é aqueleque constitui o passado tornando-o história, sem formação específica.Mesmo sem essa formação acadêmica, seu papel é impOltante na medidaem que trabalha com vocação política".6~

A opção conceitual historiador diletante, além da assertiva

referenciada, respalda-se no quadro da natureza coletiva das criaçõeslli­vros traçado neste texto, o qual demonstrou, entre outros dados, que, àexceção de Casso I - formado e pós-graduado em Histólia, tendo concluí­

do mestrado em História Econômica no ano de 1975, período esse corres­

pondente a uma certa predominância de orientação teórico-metodológicamarxista, paradigma modemo,65 às pesquisas em história -, os demais

não possuem formação específica em história. Nem por isso, contudo, suasproduções deixam de ter importância, pois, por um lado, o fizeram com

vocação política, entendida corno as diversas motivações objetivas esubjetivas que os levaram a escrever - étnica, apego ao lugar de origem,descendência familiar, propósitos das instituições a que estão filiados _,as quais veremos a seguir.

Por outro lado, considerando que os homens sempre se intenogamsobre sua identidade, é compreensível que cada localidade! coletivida-

" NASCIMENTO, Welci. Conheça Passo Fundo Tehê. Passo Fundo: Berthier, 1992. p. 7." Depoimento: instrumento de pesquisa biobibliográfica.

'" DIEHL, Astor Antônio (Org.). Passo Fundo: uma história, várias questões. Passo Fundo: Ediupf,1998. p.15-40.

65 Paradigma moderno: entendido como as formulações, regras (modelos) universalmente reconhe­cidas para visualizar e compreender o mundo, que se formularam no decolTer do século XVI aoséculo XVII - Renascimento - e intensif1ca.ram-se ao longo do século XIX - Iluminismo _ no seio

das ciências. Sobre esse telna ver, entre outros, KUHN, 1110lnas.S.A. A estrutura das rCl'oluç{jescielltifieas. São Paulo: Perspectiva, 1995: SANTOS, Boaventura( 1997). Op.cit.; BERMAN,

MarshalL Tudo que é sólido desmancha no ar: a aventura da modernidacle. São Paulo: Compa­nhia das Letras, 1992.

de, por meio de suas elites culturais, busque através da "pesquisa" oselementos que identifiquem a gênese do mundo social no qual estãoinselidas. Assim, os livros publicados por essa elite cultural são fontes

importantes atualmente, como o dizem alguns historiadores diIetantes:"Compilar dados históricos sobre o Município de Getúlio Vargas, no sen­tido de proporcionar fonte de registro, pesquisa e debate (...) também, (... )esperamos que satisfaça aos estudiosos de nossa história e à maioria dapopulação de nossa região."66

Ainda, respaldamo-nos em Janotti quando se refere ao objeto dahistória da historiografia, considerando como "material prioritário do estu­do historiográfico obras que deliberadamente recorrem a fontes documen­tais no esforço de compreender o passado vivido,"67 organizando-o deforma que viabilize a compreensão do presente. Quanto à especificidadedas obras analisadas, a autora chama a atenção para o fato de não poder­

mos desconsiderar as produções de não historiadores, dizendo peltinen­temente: "Incluímos igualmente escritos circunstanciais, normalmente em­

penhados em defender uma causa política, que apelam à reconstmção daHistória em busca da própria legitimação. Dessa maneira, não só obras

originais, fruto de pesquisa inédita, mas também texto de naturezajornalística, memorialística, biográfica e didática- que chamaremos de ma­nifestação historiográfica (...) suscetíveis de análise historiográfica.( ... )."68

Ao que Diehl denomina vocação política e J,motti, callsa política, consi­dermnos aqui como todas as manifestações result,mtes do interesse pelo conhe­cimento, ou seja, as motivações que impulsionaram os historiadores diletan/es aescreverem e publicm-em.Pmtimos do pl-eSSUpostode que essas motivações sãomanifestações refletidas do contexto social vivido, sendo, portanto, manifestaçõespolíticas, considerando que, a pmtir do alm'gatnento do campo do político na his­tória, década de 1980/90 - nova história política,69 o político passou a ser com­

preendido como lugar onde se articulatn o social e sua representação. SegundoBordieu, o político é a matriz simbólica onde as relações sociais se matelializatn ese refletem ao mesmo tempo; especificatnente em l-elaçãoao nosso problema de

investigação, relaciona-se com a constmção de identidade marcada pelas estraté­gias discursivas (cultura histOliográficaregional e construção de identidade, limi-

"" OLIVEIRA, Adão Russi. Depoimento: instrumento de pesquisa biobibliográfica.

07 JANOTTI (1998). Op.cit., p. 120.,,' Ibid.

"" A respeito da "nova história política", entre outros, ver: CHARTIER. Roger. A história boje:dúvidas desafios, propostas. Estudos Históricos. Rio de Janeiro: FGV, 1994. v. 7.n. 13. p. 97­L13; FÉLIX, Loiva Otero. História política hoje: novas abordagens. Revista Cataril1cnse de

História. F!orianópolis, 1998. n. 5; GOUVEA, Maria de Fátima Silva. O ressurgimel1to da his­

tóri" politica 110 campo da história culrural. Passo Fundo: UPF, 1994; RfjMOND, René. Porque a história política? Estudos Históricos, Rio de Janeiro, v. 7. n. 13., 1994, p. 7-19.

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-'>8Ironita P. Machado

Cultura histo~io.~ráfica e identidadew

~-

Il's l' IX)ssibilidades,diante do atual deslocamento paradigmático historiográfico),como :uticulação entre poder e cultura.

Na expressão desse autor:

"As lutas a respeito da identidade étnica ou regional, quer di­zer, a respeito de propriedades (estigmas ou emblemas) ligadasà "origem" através do 'lugar' de origem e dos sinais duradoirosque lhe são cOITelatos,(...) são um caso particular das lutas das

classificações, lutas pelo monopólio de fazer ver e fazer crer, de

dar a conhecer e de fazer reconhecer, de impor a definição legí­tima das divisões do mundo social( ...) o que (...) está em jogo éo poder de impor uma visão do mundo social( ...) que fazem arealidade da unidade e da identidade do grupO."70

Entendendo que a cultura histOIiográfica produzida no centro-nOItedo Planalto rio-grandense, fruto da construção de uma elite cultural com­

posta por historiadores diletantes, representa a articulação entre poder ecultura na busca de uma identidade que dê unidade ao grupo social, jul­gamos pertinente apresentar os elementos constitutivos dessa articulação:as motivações. Para tal, agrupamos as motivações dos historiadoresdiletantes/criadores pela construção da escrita da história, bem como asde seus patrocinadores, em cinco dimensões de interesses. Passamos aexpÔ-Ias, dividindo-as por campo de interesses e exemplificando com al­guns depoimentos dos historiadores diletantes e de seus patrocinadores:

a) preservar a memória dos antepassados da região e ou municí­pio - aqui se concentrou o percentual mais alto, 65,21%, do totalde autores (23). Nesse sentido, lemos:

"Foi para recordar o passado e mostrar gratidão à essa Terra e

it sua gente que resolvi tornar pública a presente monografia."71

"Esse patrimônio sagrado que herdamos de nossos pais é, nus­

ll'l' Iransmiti-los aos filhos para que eles conheçam o signifi­calivo valor de quem doava a vida em prol do futuro calcado11<1 Irahalho (... )."72

111111111111·(1 (1'11('11 (11'<;1. p. 11.1

I \1'1-'1" \';lld.'lIldl ('i.do XIIII'dl/dl' das .\'('smariasdos monges barbudos das pedras preciosas.t ldll f\lt IUljllt' I ;"',01. Iq~U, p. 10.

ItI I \111, 1~I.lpll' f '11\11/ rl/J{nll (' hl~i{'. Passo Fundo: Bcrthier, 1992. Prefácio. p.S.

"Acreditamos que este trabalho possa servir de base para fll

turas pesquisas históricas, afim de ampliar e aperfeiçoar osacontecimentos sobre a historiografia do Município e, espe­

cialmente, para resgatar a memória de seu povo (...)."71

Assim como nessas citações, encontramos em outros depoimentos/

apresentações expressões que anunciam a motivação estabeleci da nessecampo, tais como: "convicção de preservar a memória"; "compilar dadossobre o município"; "contando e recontando a nossa história regional";"mostrar a comunidade o que foi nosso passado"; "elaborado com o pen­

samento dirigido para as comunidades". Com a mesma motivação, encon­tramos declarações dos patrocinadores, por exemplo:

"Coube, pois, à atual Administração complementar dados, bemcomo o esforço de tornar a edição deste livro realidade, por­

que compreendeu o seu sigluficado, de passar aos pósteros avivência, o trabalho, a lúdica dos segredenses deste final demilênio, deixando àqueles uma herança cultural, cujo valor é a

preservação de sua identidade."74

"( ...) Tendo certeza de que, através do presente relato, frutode intensa pesquisa, entrevista e leitura, a História deste Mu­nicípio será resguardada e preservada do esquecimento pelasgerações futuras.( ...)."75

"( ...) elaborar o histórico do Município de Gamanla, foi muito alémdo simples, mais honroso convênio entre FAPES e Prefeitura.

Ao registrar dados, ouvir pessoas, ao documentar fatos, nos en­volvemos culturalmente e emocionalmente com o passado de tan­

ta gente( ...) para mostrar as novas gerações a linha de chegada."76

b) subsidiar a ação de instituições de indivíduos da região e/oumunicípio através do "conhecimento histórico": esse campo ficou emsegundo lugar, com 47,8% do total dos autores (23).

C} FERRI. Gino. ROIldin"a. Chapada: Imagem. 1998. Prefácio. 1'.7.

N Wilson Vicente Dagios - secretário municipal de Educação e Cultura de Segredo. In: CAMPOS

(1990). Op.cit.. p. 9." Clací F. Portaluppi - secretária municipal de Educação e Cultura de Marau. In: BERNARIlI

(l992).üp.cit. p .. 4.João Dautora. Presidente Fapes. ln: CASSOL, Ernesto. HistórÍa de GOl/rama. Passo Fundo:

Berthier.l988. p. 11.

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1>0 Ironito P.Machado.cultura historiográfica e identidade 1>1

~

i\s motivações, declaradas e registradas, que se enquadraram neste('ampo manifestaram-se através de expressões como: "contribuição paraidt'ntificação da região"; "subsídios à ação de diferentes atores sociais";"aprimorar e ou redirecionar o caminho humano capaz de contribuir nacaminhada de grupos"; "para alunos e mestres lerem"; "realizações dopassado como modelo a ser seguido"; "emergir do anonimato", Entreoutros, como ilustração, vejamos:

"C..) é nosso desejo que este trabalho traga sua contribuição a fimde preselvar nossas origens e traga mais um subsídio aos estudan­tes e aos descendentes dos pioneiros(...)."77

"(...)Conuibuição para Identificação da Região (...) contribuir para oconhecimento da realidade regional; fomecer subsídios à discussãosobre a realidade regional; fomecer subsídios 'a ação dos diferentesatores sociais da região."n

"(...) Isso não só como depósito cultural e material de museu mas,Plincipalmente como experiência acumulada capaz de contribuir deforma positiva na can1inhada histórica dos diversos gmpos sociais.Quem ignora ou nega o passado está fadado a repetir seus enos."79

Da mesma fOlma, detectamos tais motivações no pensamento/inten­\'ao de alguns patrocinadores:

"( ...) quando um município novo surge, no mapa político doEstado, faz-se necessário emergir do anonimato e conquistar umespaço no firmamento das comunidades."80

"( ...) uma obra própria para estudiosos do polêmico tema e alÚrma coneta de aplicação do mesmo nos educandários sem de­turpar o folclore com sua síntese histórica (...) A obra dá umasaliente posição a Passo Fundo, tena Natal da autora e centrodos mais importantes de cultura e folclore de nosso Estado."81

IlI'HN;\IUlI (1')()21. Op.cit.J'IH:\ N, Nl'IJill. I )ep(limenlo: instrmnento de pesquisa biobibliográfica.

ItI'NIN( 'A, Dirct'u. Depoimento: instrumento de pesquisa biobibliográfica.1"'1' Ilvlio Mil" KopL ln: Comissão de Estudos Municipais. Os lWI'OS mUllicípios do RGS:1".1.11,011' 1'01111 i\lq',Il': s/ed., 1988. p. 11.

, 11<1011'0 ,1111'11:,10 ~kirdks Illlarlc. Membro da Academia Passo-Fundense de Letras. lu. PARIZZI,

[\!;IlJld;1 1\11',1 NIIH/{S J'I/I.,i'.\': folclore. Passo Fundo: Berthier, 1990. orelha do l.ivro.

,c) origem familiar: esse campo de interesse enquadrasl' na ('.~po.';ição e reflexões feitas em relação à descendência dos historiador(";diletantes de famílias tradicionais e de imigrantes.82 Foram 26,OX% do 101al

de autores (23) que tiveram este campo como motivador, constataç:lo qlll'pode ser feita em alguns depoimentos e apresentações de livros:

"Descendentes dos fundadores de Carazinho, sempre pesquisei ahistória regional e as Oligens familiares."83

"Ao pesquisar sobre a história tenho uma motivação que vaina linha da subjetividade (... ) O gosto pela história pode serjustificado pelo apego-afetivo às raízes étnicas, culturais, so­ciais e religiosas que constituem a minha ( pmticular) a nossaidentidade, enquanto povo.( ...)."84

d) datas "comemorativas" do município e/ou ':tatos" históricos da

região: aqui há uma concentração de 30,4% do total de autores (23), mas tmn­bém encontramos esse campo de interesse registrado nos livros dos demaisautores, embora não s~ja a sua motivação central. Em seu livro, Speni diz tersido motivado a escrever pelo fato de ser bisneto do fundador do município,porém observamos que a publicação de sua obra se deu em função das fes­tividades comemorativas ao aniversário de Nonoai. Assim lemos:

"Este trabalho é comemorativo aos 25 Anos de emancipação políti­ca de Nonoai,E a Gesk'iode José Luiz De Moma e AvelinoMatiello."85

"Ao completar 160 anos de chegada do primeiro morador Alfe­res Rodrigo Felix Martins, quero registrar fatos, eventos, lem­brar datas impoltantes, folclore (... ) e nunca esquecer os bonsmomentos vividos aqui nesta legendária tena histórica( ...)."86

e) religiosas: aqui se concentraranl 13% do total de autores (23) quemencionmn em seus esclitos terem motivações religiosas para escrever e publi­

car. Exemplificmnos: "Nossa proposta não é um estudo sociológico ou econô­mico das comunidades mas suas raízes dentro de uma visão humana e eclesial."87

Os cinco campos de interesse não são distintos, pois, individual­mente ou em seu conjunto, representam manifestações políticas. Obser­vando os campos, com suas devidas ilustrações, percebemos que há inte­" Ver Quadro I, p. 24." VARGAS, Álvaro Rocha. Depoimento: instrumento de pesquisa biobibliográfica.

" BENINCÁ. Depoimento: instrumento de pesquisa biobibliográfica."' SPERRI . Op.cit., p. 7."" DORNELES, Fátima. Pinheiro Marcado: 160 anos de história. Colorado: Sanni, !()X7. p. s/n.

ZANOLLA. Op.cit., p. 7.

Page 20: Ironita Policarpo Machado - Cultura Historiografica e Identidade -Capítulo 1 Autores e motivações historiograficas

ó') Ironita P.Machado___Cultura hist9riQ,gráfica e identidade

ti :1

"HistÓria de P,F. começa com oadvento dos

missioneiros""Atitudes e ações

que influíram na evolução

histÓrica ... '''' ... primeiroshabitantes, suas atitudes. seu

modo de vida ... "" ...os passos

mais impOltantes nacam inhada." " ...evolução

geral cada um faz sua

1I... recordar as tradiçõesllll ... esse

movimento ... Mongesexistiu ... ainda está vivo na

lembrança de muita gente"

a,c,

39,0

30,4

Sf.'erri~Total

Ghen

Font

Fassini

Silva

Wallauer

Zanolla

Nascimento

2" Perspectiva·

Tradição/vivência a serrememorada

Grupo 1 . HistÓriaconcebida como

realizações humanas·

atividades, feitos

importantes e vivências

eu Iturais.l" Perspectiva·

Ações humanas num

tempo linear/evolutivo

Fonte: Instrumento de pesquisa biobibliográfica,* As concepções de história foram agrllpadas conforme a conceilllação feita pelos próprios ,1l1I01'''',

Consideramos "sem dados aparentes" por não termos o conceito de história dos r('ft'rid()s ,llrloll'Spelo depoimento instrumento de pesquisa biobilJliográfica e na introduç50/prd;ício, tl,io l(}i I)()<,',IV('\identificar. Serão cOlltemplados posteriormente quando procedermos.1 illltílis(\ ddS Il.llldtivol',.

em duas perspectivas: em uma, a história é concebida como H'ali:::t/('(I(',I/1/1/1111/1111,

na perspectiva de ações humanas num tempo Unew' e de tradiç'i]o/I'Íl'/:ncill/HIIII

da a ser rememorada; na outra, a histólia é concebida como escrita dO/'(/IIIII/".

aqui convergindo as perspectivas pelo fato de essa concepção ser entendida l'OIIIO

registro, mas divergindo no que diz respeito à opção pelos procedimento,l' usados

no registro. Para ilustrar as duas concepções de história e as perspectivas, sin[cli/,a

mos alguma,> declm<tções no quadro que segue.

Quadro 9 - Síntese das concepções de história subjacentes aos depoimentosdos historiadores*

Il'~;se de busca de elementos de distinção e identificação potencializados

110 l'on[ex[o vivido - dos historiadores diletantes - pelas relações sociais,

quc, por sua vez, são materializadas, como já vimos, através de seus car­

gos, funções, filiações institucionais e capital simbólico, os quais promo­

vem as distinções/hierarquias sociais, sendo reflexo dessa matelialização

a prÓpria motivação pela "pesquisa histórica" e publicações.

Salientamos, com essas indicações, a mticulação existente entre poder e

cultura, pois a busca de elementos de identificação e distinção, que se configuram

lia construção de identidade, dá-se pelo direcionmnento de um olhm' ao passado,

motivado por valores e interesses "pessoais". Portanto, restringe-se a uma "cul­

lura", a de quem olha, resultando em uma imposição de visão de mundo social

que, de plural e contraditólio, passa a singulm', hm11lônico e natural - dado como

//{/tural. Esse viés fica explícito, por um lado, quando lemos as denominações dos

campos de interesse e os depoinlentos: materializm' a memória de detem1inado povo,

de um espaço específico/resuito; o passado como modelo - potencializador de

ações presentes ("modelo às gerações presentes", "ensino como f0l11la de perpe­

[uação ou reconhecimento", "exemplo u'abalho como promotor de progresso")

rercrencial de identificação e distinção entre tempos sociais (presente - passado/

passado - presente - futuro), el11ias, religiões e espaços.

Por outro lado, as entidades pau'ocinadoras são condicionantes da ar­

liculação enU'e poder e cultura, o que se percebe nos depoimentos, apresen­

1a~'ões e prefácios, pois os historiadores diletantes possuem vínculo com

aqudas (membro, funcionário, cm'go, ou compmtilham status social com inte­

!'raules da entidade). Além disso, as entidades patrocinadoras, em sua maio­

ria, silO pOltadoras de poder jmidicamente garantido, por exemplo, prefeituras

Ulllllicipais, secretaria de Estado, escolas superiores, instituições religiosas,

l'utre outras, con-espondendo a 65,2% do total de entidades patrocinadoras,

Portanto, consideramos que, em virtude das transformações

~;,ll'il )cconômicas, político-administrativas tenitOliais e espaciais con-esponden­

ll's ao período das publicações, como fruto da relação modernização/

1I1()(ILTllidade,os historiadores diletantes, autOlidades públicas e instituições

lIadiciouais foram motivados à busca de delimitação das semelhanças e diferen­

,a,'; l(lI'11lac.;;1ohistórica peculiar frente a ouU'as regiões ou municípios ou gm­

I'0~;~;ociai,s- ou à reafu11lação/legitimação dos laços com tradições suposta ou

allll'ul il'aull'u[e enraizadas dessa elite cultUl'al, que, por sua vez, as mobiliza em

:;U;I:;obras para que não se apaguem frente às mudanças presentes.

I >t',w' modo, parece-nos que a distinção que possa existir reside na concep­

',ao dI' hi~;[()JiaqUl' cstá su~iacente aos campos de interesse, Com essa considem­

',a(l, pa:;:;aIIlOS;ISl'oucepçllCs dos historiadores em questão referentes ao conceito

.I" 11I:.I(llIaI'al'a laL l'/)m base nos depoimentos, registros nas introduções e prefá­

, I'1', ,I, ,:, 11\'1(.:; li, I:; ;11111tI\':;' agl1lpamo-los em duas concepções, cada uma dividida

Page 21: Ironita Policarpo Machado - Cultura Historiografica e Identidade -Capítulo 1 Autores e motivações historiograficas

611 lronita P.Machado Cultura historiográfico e identidode tI"

No primeiro grupo, história é entendida como feito humano passa­do, eventos de relevância que, de alguma forma, impulsionaram a evolu­,'ao dc coletividades ou regiões/locais e, por isso, merecem ser

n'mcmorados, Esse entendimento se expressa nas seguintes afirmações:

"Nas páginas desse trabalho relatamos os passos mais impor­tantes na caminhada da comunidade (.,.);"SX "Das pessoas queele revive ou referem foram considerados a disponibilidadesocial, o pensamento, atitudes e ações que influíram na evolu­ção histólica da sociedade."89

Em outro registro, encontramos a seguinte concepção:

"A Histólia de Passo Fundo, como em geral da quase totali­dade dos municípios da região serrana, começa com o adven­to, às plagas do continente, dos missioneiros da companhiade Jesus,"90

Ainda nesse plimeiro grupo, aparecem algumas posições que deno­Iam uma concepção vinculada com feitos humanos, mas que demonstral'clclismo no entendimento do que seja história, Isso pode ser observadoncs((;s fragmentos textuais: "Em matéria de história( ...) é preciso recorrerils Tradições (...)"91; "O leitor encontrará portanto: realidade e história,tamhém mensagens( ...)."92

Pelas citações, é possível entender a forma como os autores vêem o

passado, ou seja, com saudosismo e invenção, como na expressão tradi­ctll!. pela qual entendemos filtos vividos que são transm.itidos de geraçãopara gcração, com certa divinização/ IlÚstica, isto é, de invenção popular;ou com realidade e história, disposta dessa fOlma, que dá uma conotaçãode oposição, com o que a história passa a ser ficção e realidade fatos vi­vidos passíveis de observáveis.

!\s concepções de história como realizações humanas passadas de­luonslramum caráter seletivo, hierárquico, unilateral e "positivo". À medida

'1IIl' privilegiam fatos, grupos ou pessoas pela sua posição de destaque,,h'~;,',111hecendo outros, exteliolizam a idéia de que a histólia é realização de;d,'IIIIS"iluminados" e de fatos heróicos e pontuais, desconsiderando-a comopIOI"~;SOeonnituoso e plural. Assim, a história é dada, acabada, e não umPIll(l':;:;OsOl'ial plural, vivido numa multiplicidade temporal e cultural.

Illllll',',;lO tk 1',',111110.\ J\illlllicipais. Op.cit., p. 11.HIHI 11"li I) 1)1','1. p.. 1.

Id'II!\IIPn;l) (lI' \'il.,p.tl.'I ',I'lllPI (Ili:,'!) ()p t II li 'I

11l1J:r'H'II'~; 111):\11 ()I' \'11 li. sino

O segundo grupo é inteiramente diferente do primciro l'ln ~;U;I:, d,'clarações quanto ao sentido etimológico da palavra história, pon'nl " .o;,'

melhante em suas concepções, com pequena divergência no quc Sl' I,'klt'às perspectivas, Esses autores compreendem a história como o rcgislltl, anarração e o relato do passado vivido num tempo linear, dispondo w; Iatos num ananjo de causas e conseqüências segundo o mesmo caral"1seletivo, determinista e harmonioso. Um número significativo dc hisloriadores demonstra essa concepção, os quais entendem a escrita do passado como uma narrativalrelato fiel de documentos, fatos, acontecimcntos,sem necessidade de interpretação. Tais evidências se revelam nos própriosdepoimentos dos autores:

"Independentemente da sua opinião (...) cabe ao historiadorrelatar fielmente os fatos (...);"93 "(...) procurando buscar o maiornúmero possível de informações sobre os plimeiros habitantes,suas atividades, seu modo de vida e a partir daí como foramoconendo as mudanças, o que existiu (...) e hoje já não existemais, que tipo de vida levavam os plimeiros moradores e comoisso foi evoluindo até chegar aos nossos dias."94

Ainda detendo a mesma concepção, mas noutra perspectiva, ou seja,entendendo que o registro/naITativa é passível de análise e crítica, veja­mos o seguinte depoimento:

"A História é narração de fatos, pura e simplesmente ou nar­rativa crítica de acontecimentos da humanidade. Individualmen­

te cada um faz sua história, a começar por sua família. EstahistOlicidade pode ou não modificar a humanidade. Umas sãodignas de figurar nos registros (documentos históricos), ou­tras ficam, apenas na tradição oral. Para o público infantil háas historietas (...)."95

O depoimento transcrito demonstra certa ambigüidade por expres­sar duas perspectivas de escrita da história (tanto da forma quanto doobjeto - fato/acontecimento): uma em que os fatos devem, simplesmenll',ser nanados e outra em que eles podem ser apresentados em forma deuma nanativa crítica. Na última perspectiva enquadramos apenas um all­tor, que diz:

·u NETO (198] t. op. cit., pA5.." FASSINI, SILVA. Op.cit., p. 5.." NASCIMENTO. Depoimenlo: inslnllncnlo de pesqnisa biobibliogr:ífica.

Page 22: Ironita Policarpo Machado - Cultura Historiografica e Identidade -Capítulo 1 Autores e motivações historiograficas

66lronita P. Machado

"Não basta recolher fragmentos da história e arquivá-los. O

mais importante é proceder a análise estabelecendo as possí­veis e devidas relações. Com essa sábia intervenção, o arqui­vo morto da história tem vida eterna. "96

Recapitulando, podemos observar que, nas concepções de história,reafirma-se o princípio da indissociabilidade entre contexto social vivido/capital cultural simbólico e as motivações para escrever (traduzindo-se nasarticulações entre poder e cultura), que se materializa na busca de elemen­tos de identificação e diferenciação, guiada pela consciência histórica deelite cultural, visando à construção de identidade de coletividades e lu­gares pela esclita da história.

A elaboração desse quadro sobre a natureza coletiva da criação(livros) permite a inferência sobre a identificação do autor e seu lugar social.Trata-se de uma elite cultural por ser portadora de capital simbólico, queintegra historiadores diletantes - "não somos historiadores" -, os quaisbuscam registrar/narrar os fatos passados, usando para tal formas e ferra­

mentas - procedimentos - definidos pelas suas "formações". Tais "açõessão impelidas pela busca", consciente ou não, "dos elementos constitutivos

de uma identidade coletiva que se articula dialeticamente com o campoabrangente das relações sociais."97 Essa premissa está subjacente quan­do anunciam que "numa linguagem acessível procuramos deixar a todos

um pouco do que foi a vida de nossos antepassados e contribuição paraidentificação da região."

Montado o quadro sobre a natureza coletiva da criação (livros), ouseja, da cultura historiográfica do centro-norte do Planalto rio-grandense

publicada na década de 1980 a 1995, lançamos o desafio para o passo se­guinte: o estudo historiográfico do símbolo identitário dessa elite cultu­ral por meio daquilo que denominamos de criação.

"" BENINCÁ. Depoimento: instrumento de pesquisa biobibliográfica ..IANOTTI. Op.cit.. p. 119.