intelectuais e raça - o estrago incorrigível - thomas sowell

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Instituto Ludwig von Mises Brasil http://www.mises.org.br Intelectuais e raça - o estrago incorrigível por Thomas Sowell, sexta-feira, 22 de março de 2013 Há tantas falácias ditas sobre raça, que é difícil escolher qual é a mais ridícula. No entanto, uma falácia que costuma se sobressair é aquela que afirma haver algo de errado com o fato de que as diferentes raças são representadas de forma numericamente desproporcional em várias instituições, carreiras ou em diferentes níveis de renda e de feitos empreendedoriais. Cem anos atrás, o fato de pessoas de diferentes antecedentes raciais apresentarem taxas de sucesso extremamente discrepantes em termos de cultura, educação, realizações econômicas e empreendedoriais era visto como prova de que algumas raças eram geneticamente superiores a outras. Algumas raças eram consideradas tão geneticamente inferiores, que a eugenia foi proposta como forma de reduzir sua reprodução. O antropólogo Francis Galton chegou a exortar "a gradual extinção de uma raça inferior". E as pessoas que diziam essas coisas não eram meros lunáticos extremistas. Muitos deles eram Ph.D.s oriundos de várias universidades de ponta, lecionavam nas principais universidades do mundo e eram internacionalmente reputados. Reitores da Universidade de Stanford e do MIT estavam entre os vários acadêmicos defensores de teorias sobre inferioridade racial -- as quais eram aplicadas majoritariamente aos povos do Leste Europeu e do sul da Europa, uma vez que, à época, era dado como certo o fato de que os negros eram inferiores. E este não era um assunto que dividia esquerda e direita. Os principais proponentes de teorias sobre superioridade e inferioridade genética eram figuras icônicas da esquerda, de ambos os lados do Atlântico. John Maynard Keynes ajudou a criar a Sociedade Eugênica de Cambridge . Intelectuais adeptos do socialismo fabiano , como H.G. Wells e George Bernard Shaw, estavam entre os vários esquerdistas

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Há tantas falácias ditas sobre raça, que é difícil escolher qual é a mais ridícula. No entanto, uma falácia que costuma se sobressair é aquela que afirma haver algo de errado com o fato de que as diferentes raças são representadas de forma numericamente desproporcional em várias instituições, carreiras ou em diferentes níveis de renda e de feitos empreendedoriais.

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Page 1: Intelectuais e raça - o estrago incorrigível - Thomas Sowell

Instituto Ludwig von Mises Brasil

http://www.mises.org.br

Intelectuais e raça - o estrago incorrigívelpor Thomas Sowell, sexta-feira, 22 de março de 2013

Há tantas falácias ditas sobre raça, que

é difícil escolher qual é a mais ridícula.

No entanto, uma falácia que costuma se

sobressair é aquela que afirma haver

algo de errado com o fato de que asdiferentes raças são representadas de

forma numericamente desproporcional

em várias instituições, carreiras ou em

diferentes níveis de renda e de feitos

empreendedoriais.

Cem anos atrás, o fato de pessoas dediferentes antecedentes raciais

apresentarem taxas de sucesso

extremamente discrepantes em termos

de cultura, educação, realizações

econômicas e empreendedoriais era

visto como prova de que algumas raças eram geneticamente superiores a outras.

Algumas raças eram consideradas tão geneticamente inferiores, que a eugenia foi proposta como forma de

reduzir sua reprodução. O antropólogo Francis Galton chegou a exortar "a gradual extinção de uma raça

inferior".

E as pessoas que diziam essas coisas não eram meros lunáticos extremistas. Muitos deles eram Ph.D.s

oriundos de várias universidades de ponta, lecionavam nas principais universidades do mundo e eraminternacionalmente reputados.

Reitores da Universidade de Stanford e do MIT estavam entre os vários acadêmicos defensores de teorias

sobre inferioridade racial -- as quais eram aplicadas majoritariamente aos povos do Leste Europeu e do sul

da Europa, uma vez que, à época, era dado como certo o fato de que os negros eram inferiores.

E este não era um assunto que dividia esquerda e direita. Os principais proponentes de teorias sobre

superioridade e inferioridade genética eram figuras icônicas da esquerda, de ambos os lados do Atlântico.

John Maynard Keynes ajudou a criar a Sociedade Eugênica de Cambridge. Intelectuais adeptos do

socialismo fabiano, como H.G. Wells e George Bernard Shaw, estavam entre os vários esquerdistas

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defensores da eugenia.

Foi praticamente a mesma história nos EUA. O presidente democrata Woodrow Wilson, como vários

outros progressistas da época, eram sólidos defensores de noções de superioridade e inferioridade racial. Ele exibiu o filme O Nascimento de uma Nação, que glorificava a Ku Klux Klan, na Casa Branca, e

convidou vários dignitários para a sessão.

Tais visões dominaram as primeiras duas décadas do século XX.

Agora, avancemos para as últimas décadas do século XX. A esquerda política desta era já havia se movido

para o lado oposto do espectro das questões raciais. No entanto, ela também considerava que as diferenças

de sucesso entre grupos étnicos e raciais era algo atípico, e clamava por uma explicação única, vasta e

arrebatadora.

Desta feita, em vez de os genes serem a razão predominante para as diferenças nos êxitos pessoais, o

racismo se tornou o motivo que explicava tudo. Mas o dogmatismo continuava o mesmo. Aqueles queousassem discordar, ou até mesmo questionar o dogma predominante em ambas as eras, era tachado de

"sentimentalista" no início do século XX e de "racista" na era multicultural.

Tanto os progressistas do início do século XX quanto os novos progressistas do final do século XX partiramda mesma falsa premissa -- a saber, que há algo de estranho quando diferentes grupos raciais e étnicos

alcançam diferentes níveis de realizações.

No entanto, o fato é que minorais raciais e étnicas sempre foram as proprietárias -- ou gerentes -- de maisda metade de todas as principais indústrias de vários países. Dentre estas minorias bem-sucedidas, temos os

chineses na Malásia, os libaneses na África Ocidental, os gregos no Império Otomano, os bretões naArgentina, os indianos em Fiji, os judeus na Polônia, os espanhóis no Chile -- entre vários outros.

Não apenas diferentes grupos raciais e étnicos, como também nações e civilizações inteiras apresentaram

níveis de realizações extremamente distintos ao longo dos séculos. A China do século XV era muito maisavançada do que qualquer país europeu. Com o tempo, no entanto, os europeus ultrapassaram os chineses -

- e não há nenhuma evidência de ter havido alterações nos genes de nenhuma destas civilizações.

Dentre os vários motivos para estes diferentes níveis de realizações está algo tão simples quanto a idade. Amédia de idade na Alemanha e no Japão é de mais de 40 anos, ao passo que a média de idade no

Afeganistão e no Iêmen é de menos de 20 anos. Mesmo que as pessoas destes quatro países tivessemabsolutamente o mesmo potencial intelectual, o mesmo histórico, a mesma cultura -- e os paísesapresentassem rigorosamente as mesmas características geográficas --, o fato de que as pessoas de

determinados países possuem 20 anos a mais de experiência do que as pessoas de outros países ainda seriao suficiente para fazer com que resultados econômicos e pessoais idênticos sejam virtualmente impossíveis.

Acrescente o fato de que diferentes raças se desenvolveram em diferentes arranjos geográficos, os quais

apresentaram oportunidades e restrições extremamente diferenciadas ao seu desenvolvimento, e asconclusões serão as mesmas.

No entanto, a ideia de que diferentes níveis de realização são coisas atípicas -- se não sinistras -- tem sido

repetida ad nauseam pelos mais diferenciados tipos de pessoas, desde o demagogo de esquina até as maisaltas eminências do Supremo Tribunal.

Quando finalmente reconhecermos que as grandes diferenças de realizações entre as raças, nações e

civilizações têm sido a regra, e não a exceção, ao longo de toda a história escrita, restará ao menos a

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esperança de que haja pensamentos mais racionais -- e talvez até mesmo alguns esforços construtivos paraajudar todas as pessoas a progredirem.

Até mesmo um patriota britânico como Winston Churchill certa vez disse que "Devemos Londres a Roma" --

um reconhecimento de que foram os conquistadores romanos que criaram a mais famosa cidade britânica,em uma época em que os antigos bretões eram incapazes de realizar esta façanha por conta própria.

Ninguém que conhecesse os iletrados e atrasados bretões daquela era poderia imaginar que algum dia os

britânicos criariam um império vastamente maior do que o Império Romano -- um império que abrangeria umquarto de toda a área terrestre do globo e um quarto dos seres humanos do planeta.

A história apresenta vários exemplos dramáticos de ascensão e queda de povos e nações, por uma variada

gama de motivos conhecidos e desconhecidos. Mas há um fenômeno que não possui confirmação histórica,um fenômeno que, não obstante esta ausência de exemplos práticos, é hoje presumido como sendo a norma:

igualdade de realizações grupais em um dado período do tempo.

As conquistas romanas tiveram repercussões históricas por séculos após a queda do Império Romano. Umdos vários legados da civilização romana foi o alfabeto latino, o qual gerou versões escritas dos idiomas da

Europa ocidental séculos antes de os idiomas do Leste Europeu serem transformados em letras. Esta foiuma das várias razões por que a Europa ocidental se tornou mais desenvolvida que a Europa Oriental emtermos econômicos, educacionais e tecnológicos.

Enquanto isso, as façanhas de outras civilizações -- tanto da China quanto do Oriente Médio -- ocorrerammuito antes das façanhas do Ocidente, embora a China e o Oriente Médio posteriormente viessem a perdersuas vantagens.

Há tantas reviravoltas documentadas ao longo da história, que é impossível acreditar que um único fator

sobrepujante seja capaz de explicar tudo, ou quase tudo, do que já aconteceu ou do que está acontecendo. O que realmente se sabe é que raramente, para não dizer nunca, ocorreram façanhas iguais alcançadas por

diferentes pessoas ao mesmo tempo.

No entanto, o que mais temos hoje são grupos de interesse e movimentos sociais apresentando estatísticas --

que são solenemente repercutidas pela mídia -- alegando que, dado que os números não são

aproximadamente iguais para todos, isso seria uma prova de que alguém foi discriminatório com outro

alguém.

Se os negros apresentam diferentes padrões ocupacionais ou diferentes padrões gerais em relação aos

brancos, isso já basta para despertar grandes suspeitas entre os sociólogos -- ainda que diferentes grupos de

brancos sempre tenham apresentado diferentes padrões de realizações entre si.

Quando os soldados americanos da Primeira Guerra Mundial foram submetidos a exames mentais durante a

Primeira Guerra Mundial, aqueles homens de ascendência alemã pontuaram mais alto do que aqueles de

ascendência irlandesa, sendo que estes pontuaram mais alto do que aqueles que eram judeus. Carl Brigham,o pioneiro do campo da psicometria, disse à época que os resultados dos exames mentais do exército

tendiam a "desmentir a popular crença de que o judeu é altamente inteligente".

Uma explicação alternativa é que a maioria dos imigrantes alemães se mudou para os EUA décadas antes da

maioria dos imigrantes irlandeses, os quais por sua vez se mudaram para os EUA décadas antes da maioria

dos imigrantes judeus. Alguns anos depois, Brigham viria a admitir que a maioria dos mais recentes

imigrantes havia sido criada em lares onde o inglês não era a língua falada, e que suas conclusões anteriores,em suas próprias palavras, "não possuíam fundamentos".

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Nessa época, os judeus já estavam pontuando acima da média nacional dos exames mentais, e não abaixo.

Disparidades entre pessoas do mesmo grupo, em qualquer área que seja, não são obviamente uma realidade

imutável. Mas uma igualdade geral de resultados raramente já foi testemunhada em qualquer período da

história -- seja em termos de habilidades laborais ou em termos de taxas de alcoolismo ou em termos de

quaisquer outras diferenças -- entre aqueles vários grupos que hoje são ajuntados e classificados como"brancos".

Sendo assim, por que então as diferenças estatísticas entre negros e brancos produzem afirmações tão

dogmáticas -- e geram tantas ações judiciais e trabalhistas por discriminação -- sendo que a própria históriamostra que sempre foi comum que diferentes grupos seguissem diferenciados padrões ocupacionais ou de

comportamento?

Um dos motivos é que ações judiciais não necessitam de nada mais do que diferenças estatísticas para

produzir vereditos, ou acordos fora de tribunais, no valor de vultosas somas monetárias. E o motivo de isso

ocorrer é porque várias pessoas aceitam a infundada presunção de que há algo de estranho e sinistro quando

diferentes pessoas apresentam diferentes graus de êxito pessoal.

O desejo de intelectuais de criar alguma grande teoria que seja capaz de explicar padrões complexos por

meio de algum simples e solitário fator produziu várias ideias que não resistem a nenhum escrutínio, mas que

não obstante têm aceitação generalizada -- e, algumas vezes, consequências catastróficas -- em vários paísesao redor do mundo.

A teoria do determinismo genético, que predominou no início do século XX, levou a várias consequências

desastrosas, desde a segregação racial até o Holocausto. A teoria atualmente predominante é a de quealgum tipo de maldade explica as diferenças nos níveis de realizações entre os vários grupos étnicos e

raciais. Se os resultados letais desta teoria hoje em voga gerariam tantas mortes quanto no Holocausto é

uma pergunta cuja resposta requereria um detalhado estudo sobre a história de rompantes letais contradeterminados grupos odiados por causa de seu sucesso.

Estes rompantes letais incluem a homicida violência em massa contra os judeus na Europa, os chineses no

sudeste asiático, os armênios no Império Otomano, e os Ibos na Nigéria, entre outros. Exemplos dechacinas em massa baseadas em classes sociais e voltadas contra pessoas bem-sucedidas vão desde os

extermínios stalisnistas do kulaks na União Soviética até a limpeza promovida por Pol Pot de pelo menos um

quarto da população do Camboja pelo crime de serem pessoas cultas e de classe média, crime este que era

evidenciado por sinais tão tênues quanto o uso de óculos.

Minorias que se sobressaíram e se tornaram mais bem-sucedidas do que a população geral são aquelas cujo

progresso provavelmente em nada está ligado ao fato de terem ou não discriminado as maiorias politicamente

dominantes. No entanto, foram exatamente estas minorias que atraíram as mais violentas perseguições aolongo dos séculos e dos países ao redor do mundo.

Todos os negros que foram linchados durante toda a história dos EUA não chegam ao mesmo número de

homicídios cometidos em apenas um ano contra os judeus na Europa, contra os armênios no ImpérioOtomano ou contra os chineses no sudeste asiático.

Há algo inerente aos sucessos de determinados grupos que inflama as massas em épocas e lugares tão

distintos. O que seria? Esse fenômeno inflama não apenas as massas, como também leva a genocídioscometidos por governos, como os da Alemanha nazista ou o regime de Pol Pot no Camboja. Podemos

apenas especular as razões, mas não há como fugir desta realidade.

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Aqueles grupos que ficam para trás frequentemente culpam seu atraso nas malfeitorias cometidas por aqueles

grupos mais bem-sucedidos. Dado que a santidade não é comum a nenhum ramo da raça humana, é óbvio

que nunca haverá escassez de pecados a serem mencionados, inclusive a arrogância e a insolência daqueles

que calham de estar no topo em um determinado momento. Mas a real pergunta a ser feita é se essespecados -- reais ou imaginários -- são de fato o motivo destes diferentes níveis de êxitos pessoais.

O problema é que os intelectuais -- pessoas de quem normalmente esperaríamos análises racionais que se

contrapusessem à histeria das massas -- frequentemente sempre estiveram na vanguarda daquelesmovimentos que promovem a inveja e o ressentimento contra os bem-sucedidos. Tal comportamento é

especialmente perceptível naquelas pessoas que possuem diplomas mas que não possuem nenhuma

habilidade economicamente significativa que lhes permita obter aquele tipo de recompensa que elas

esperavam ou julgavam ter o direito de auferir.

Tais pessoas sempre se destacaram como líderes e seguidoras de grupos que promoveram políticas anti-

semitas na Europa entre as duas guerras mundiais, o tribalismo na África, e as mudanças sociais no SriLanka, um país que, outrora famoso por sua harmonia intergrupal, se rebaixou, por influência de intelectuais,

à violência étnica e depois se degenerou em uma guerra civil que durou décadas e produziu indescritíveis

atrocidades.

Intelectuais sempre estiveram por trás da inflamação de um grupo contra outros, promovendo a

discriminação e a violência física em países tão díspares quanto Índia, Hungria, Nigéria, Tchecoslováquia e

Canadá.

Tanto a teoria do determinismo genético como sendo a causa dos diferentes níveis de realizações pessoais

quanto a teoria da discriminação como o motivo destas diferenças, ambas contraditórias e criadas por

intelectuais, geraram apenas polarizações raciais e étnicas. O mesmo pode ser dito da ideia de que uma

dessas teorias tem de ser a verdadeira.

Essa falsa dicotomia de que uma delas tem de ser a verdadeira deixa aos grupos mais bem-sucedidos duas

opções: ou eles se assumem arrogantes ou se assumem culpados criminalmente. Da mesma forma, deixa aos

grupos menos exitosos a opção entre acreditar que sempre foram inerentemente inferiores durante toda ahistória ou que são vítimas da inescrupulosa maldade de terceiros.

Quando inumeráveis fatores fazem com que a igualdade de resultados seja virtualmente impossível, reduzir

estes fatores a uma questão de genes ou de maldade é a fórmula perfeita para se gerar uma desnecessária eperigosa polarização, cujas consequências frequentemente são escritas em sangue ao longo das páginas da

história.

Dentre as várias e ignaras ideias a respeito de grupos raciais e étnicos que polarizaram as sociedades durante

séculos e ao redor de todo o mundo, poucas foram mais irracionais e contraproducentes do que os atuais

dogmas do multiculturalismo.

Aqueles intelectuais que imaginam que, ao utilizar uma retórica multicultural que redefine e até mesmo revoga

o conceito de atraso, estarão ajudando grupos raciais e étnicos que ficaram para trás estão, na realidade,

levando estas pessoas para um beco sem saída.

O multiculturalismo é um tentador paliativo aplicado àqueles grupos que ficaram para trás porque ele

simplesmente afirma que todas as culturas são iguais, ou "igualmente válidas", em algum sentido vago e

sublime. De acordo com este dogma, as características culturais de todas as etnias e raças seriam apenas

diferentes -- nem melhores nem piores.

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No entanto, tomar emprestadas características particulares de outras culturas -- como os algarismos arábicos

que substituíram os algarismos romanos, mesmo nas culturas ocidentais oriundas de Roma -- implica que

algumas características não são simplesmente diferentes, mas sim melhores, inclusive os números utilizados. Algumas das mais avançadas culturas de toda a história pegaram emprestados comportamentos e

características de outras culturas; e isso pelo simples fato de que até hoje nenhuma coleção única de seres

humanos foi capaz de criar as melhores respostas para todas as questões da vida.

Todavia, dado que os multiculturalistas veem todas as culturas como sendo iguais ou "igualmente válidas",

eles não veem nenhuma justificativa para as escolas insistirem, por exemplo, que as crianças negras

aprendam seu idioma materno. Em vez disso, cada grupo é estimulado a se apegar ferreamente à sua

própria cultura e a se orgulhar de suas próprias glórias passadas, reais ou imaginárias.

Em outras palavras, membros de grupos minoritários que são atrasados educacionalmente e economicamente

devem continuar se comportando no futuro como sempre se comportaram no passado -- e, se eles não

conseguirem os mesmos resultados dos outros, então a culpa é da sociedade. Essa é a mensagem principal

do multiculturalismo.

George Orwell certa vez disse que algumas ideias são tão insensatas, que somente um intelectual poderia

acreditar nelas. O multiculturalismo é uma dessas ideias. A intelligentsia sempre irrompe em indignação e

ultrajes a qualquer "diferença" ou "disparidade" de resultados educacionais, econômicos ou outros -- edenuncia qualquer explicação cultural para esta diferença de resultados como sendo uma odiosa tentativa de

"culpar a vítima".

Não há dúvidas de que algumas raças ou até mesmo nações inteiras foram vitimadas por terceiros, assim

como não há dúvida de que câncer pode causar morte. Porém, isso é muito diferente de dizer que as mortes

podem automaticamente ser imputadas ao câncer. Você pode pensar que intelectuais seriam capazes de

fazer essa distinção. Mas muitos não são.

Ainda assim, intelectuais se veem a si próprios como amigos, aliados e defensores das minorias raciais, ao

mesmo tempo em que empurram as minorias para a estagnação cultural. Isso permite à intelligentsia se

congratular e se lisonjear de que estão ao lado dos anjos contra as forças do mal que estão conspirando para

manter as minorias oprimidas.

Por que pessoas com altos níveis de capacidade mental e de talentos retóricos se entregam a este tipo de

raciocínio deturpado é um mistério. Talvez seja porque elas não conseguem abrir mão de uma visão socialque é extremamente lisonjeira para eles próprios, não obstante quão deletéria tal visão possa ser para as

pessoas a quem elas alegam estar ajudando.

O multiculturalismo, assim como o sistema de castas, encurrala e amarra as pessoas naquele mesmo

segmento cultural e social no qual elas nasceram. A diferença é que o sistema de castas ao menos não alega

beneficiar aqueles que estão na extremidade inferior.

O multiculturalismo não serve apenas aos interesses ególatras dos intelectuais; ele serve também aosinteresses de políticos que têm todos os incentivos para promover uma sensação de vitimização -- e até

mesmo de paranóia -- entre grupos de cujos votos eles precisam em troca de apoio material e psicológico.

A visão multicultural do mundo também serve aos interesses daqueles que estão na mídia e que prosperam

ao explorar os melodramas morais. O mesmo pode ser dito de todos os departamentos universitários

voltados para estudos étnicos e sociais, bem como de toda a indústria de assistentes sociais, de especialistas

em "diversidades" e da ampla gama de vigaristas que prosperam ao fazer proselitismo racial.

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Os maiores perdedores de toda essa história são aqueles membros das minorias raciais que se permitem ser

conduzidos para esse beco sem saída do ressentimento e da raiva, mesmo quando há várias outras avenidas

de oportunidades disponíveis. E todos nós perdemos quando a sociedade fica polarizada.