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INSTITUIOESDE

DIREITO ADMINISTRATIVO BRASILEIRO

THEMISTOCLES BRANDAO CAVALCANTIProcurador da Republica no Districto Federal Advogados BrAsileiros Da Ordem dos

Instituies

deDireito .Administrativo'.

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li}', LIVRARIA

EDITORA FRE,ITAS BAS-TOS Ruas Bethencourt da Silva, 21.A e 13 de Maio, 74 e 76RIO DE JAN,EIRO

OTTO MAYER no menos incisivo na condemnao da theoria, que pretende reconhecer a existencia do contracto administrativo semelhante ao contracto de direito privado, mas attribue a sua existencia reconhecida predominancia dos estudos de direito privado. Ha evidente exaggero nos conceitos emittios pelos autores, que pretendem enquadrar as relaes contractuaes realisadas' pela administrao publica dentro de um circulo fechado, e fixar normas rigidas dentro das quaes se tenham de enquadrar os contractos em que parte uma entidade de direito publico. O Estado, quando se obriga, equipara-se evidentemente aos particulares no que diz com o cumprimento das obrigaes assumidas (6). EIle est obrigado a respeitar as clausulas contractuaes por motivos de ordem moral e de ordem economica, que no precisam ser aqui salientados, mas ao assumir essas obrigaes, ficam subentendidas certas restrices de ordem publica, que no podem ser desconhecidas pelo particular que com elle contracta, inherentes sua propria natureza de pessa de direito publico, cujos interesses confundem-se com os da collectividade. Evidentemente que taes restrices liimitam-se esphera da conveniencia ou opportunidade das medidas asseguradoras do interesse publico. Outras th.eorias No se pode reduzir, apenas, ao numero daquelIas j mencionadas as diversas theorias sobre contrctos administrativos. Ellas desdobram-se em modalidades differentes, revestindo-se de graduaes que seria impossivel discriminar.

(6)

OTTO MAYER, Dlf"oit Adm. Allemand, I, pg. 176.

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lia, porm, duas grandes correntes de tendencias oppostas, uma no sentido mais do direito publico, outra procurando conservar, naquelles contractos, os caracteres communs ao direito privado. Entre as duas theorias, ha uma conciliatoria, que differencia .os contractos passados pelo Estado, de accordo com a sua natureza. So de BIELSA (1) as seguintes observaes que reflectem b!'lm a opinio da corrente intermedia:

"EI criterio estricto (quiero decir apegado a los principios deI derecho civil), y ms la ortodoxia de algunos juristas, es, no digo insuficiente, sino inconvenIente para resolver cuestiones de indole esencialmente administrativa; y cuando se las ha resueIto de ese modo se ha llegado a verdaderas herejias. As, no puede considerarse... eI contrato de concesion de servicios publicos como un contrato de derecho comun, en eI cu aI el postulado de la igualdad juridica de los contraentes sirve de base aI pacto y de norma en la ejecucin de las obligaciones. En el contrato de concesion... las partes no estan en un mismo plano... etc." A observao tem inteira procedencia porque nem todos os contractos com o Estado tm por fim a execuo de um servio publico, nem sempre o Estado se apresenta como pessoa de direito publico, com aquellas exigencias que permittem attribuir-Ihe uma situao excepcional perante QS particulares. No se pode confundir um contracto de concesso, em que o particular se substitue ao proprio Estado na execuo de ser.vio publico (2), com uma simples locao de predio, principalmente quando o Estado figura como locador, isto , quando nem ao menos, pode se considerar um destino do predio para fins de utilidade publica. Aqui, isto , na simples locao, re(1)(2)

Relaciones deI codigo civil con el derecho administrativo, VEJ. RoUVIERE, Les Contrats Adtministratifs. 7

LASCO. Los contratos administrativos. pg. 44.

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ge-se O contracto pelas normas de direito privado, salvo as exigencias legaes, que obedecem aos regulamentos de contabilidade publica e que determinam as formalidades a que deve obedecer a administrao na concluso do acto juridico. Mostraremos, opportunamente, como devem ser encaradas essas relaes concluidas pelo Estado e que, embora apparentemente se apresentem como um contracto, pela forma de ~ue se revestem, so, no entretanto, relaes que devem obedecer a normas puramente regulamentares. Isto significa que fica ao arbitrio do p_oder regulamentar, ou legislativo, modi.ficar certas clausulas contractuaes, ou, pelo menos, certas normas que servem de base s relaes entre o Estado e particulares, para a execuo de servios publicos. Mostraremos, em capitulo proprio, que a fixao das tarifas deve obedecer a esses 'principios, bem como outras> condies em que () servio deve ser executado subordinado a exigencias de ordem geral, implicitamente comprehendidas nos direitos que se reservou o Estado ao concluir o negocio. Seria licito, porm, indagar-se si, admittida essa distinco, justifica-se a concluso de que todos os contractos feitos pela administrao podem ser considerados contractos administrativos, ou' se deve ser- feita a distinco de accordo com as observaes adma indicadas. A resposta teria o caracter mais academico ,porque no seria a denominao do contracto que viria alterar a sua ~sutr stancia, mas a finalidade do acto. Se destinado a execuo de um servio publico, a relao contractual ter de se subordinar s normas que regulam a execuo desse servio: ser, portanto, mero accessorio da relao juridica principal, a que se ter de submetter, porque o servio publico deve se considerar como a razo de ser do lao obrigacional, a que se ligou o Estado para realizar as suas finalidades. Mas todos esses contractos devem ser considerados administrativos, porque foram conclui dos pela administrao, qualquer que tenha sido o fim em vista. Devem, ainda mais, obedecer s exigencias formaes impostas pelas leis e pelos regu-

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lamentos administrativos, e, por isso tambem so contractos .administrativos. (3) Todos elles tm a marca do Estado e, por isso mesmo, sofirem a influencia que lhes imprime a interveno do poder publico. Com muita preciso, declarou o Supremo Tr.ibunal Fe.aeral, em um dos seus accordos: (4) "O Estado, sem embargo de entrar em relao contractual com a pessoa privada, no se despe por isso, jamais, dos direitos e faculdades que constituem a sua propria qualidade de pode~." E es~ a doutrina universalmente acceita. O contracto administrativo tem, porm, posio nitidamente definida quando se considera a sua apreciao pelos orgos jurisdiccionaes. Ahi, a ,sua situao caracterisa-se melhor p.o direito positivo. A jurisprudencia do IConselho de Estado da Frana, (5) da Italia, (6) dos Tribunaes americanos, notadamente da Court of ,Claims (7) etc., na applicao das leis que regulam a sua competencia, veio ainda mais caracterisar como especie bem' definida e muito peculiar, os CQntractos passados pela administrao.

(3) Em um interessante trabalho sobre - Do conceit{) do contracto administrativo - escreveu o Snr. Manoel de Oliveira Franco Sobrinho o 'seguilIlte, que e:x;prime com muita clareza a doutrina dominante a respeito das differentes modalidades de contracto: "Um contracto passado pela administrao pode ser ,publico e pode ser pr,ivado em razo da finalidade visada. E' publico sempre que ha interesse maior em jogo. E' :privado quando est em jogo 'o interesse de uma simples pessoa jurdica". (4) Accordo de 26 de Agosto de 1908. (5) .RoGER BoNNARD, Le contrle jurisdictionneZ de l'administration. J. ROUVIERE. Les contrats adm:inistratifs. R. JACQUELIN, La Jurisdiction adminisi'rative. LAFERRIERE, Jurisdiction administrative. (6) RANELETTI, La guarentigie della giustizia nella pubblica am-mtinistrazione . . (7) GooDNOW, Principes de Droit administratif des Etats Unis pagina 55.

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A nossa Constituio de 1934, mesmo, instituindo um Tribunal de feio especial (8), attribuiu-lhe competencia para julgar privativamente: "os litigios entre a Unio e os seus credores derivados de contractos publicos." Ficou,assim, para ser definidh. pela sua jurisprudencia. ou, pela lei que regularia o seu funccionamento, quaes esses contractos, bem como a sua nature~a. O que no resta a menor duvida que ficou bem caracterisado, como categoria distincta, um grupo de contractos, com feio peculiar, que se podem catalogar entre os contractos publicos. Para ns, esses contractos so aquelles reali~ados pela. administrao para a execuo de um servio publico. Este o ponto que melhor os deve distinguir, porque, como j tivemos occasio de dizer, so os traos differenciaes que os caracterisam e no aquillo que tm de commum com os demais contractos. . O assum~to, entre ns, mereceria estudo .mais aprofundado. Faltam, porm, maiores elementos para firmar uma doutrina, porque as demandas que versam sobre as relaes contractuaes do Estado, perde-se no meio das solues inspiradas no direito privado. O mesmo phenomeno occorre naquelles paises onde no, existe j urisdico especial para os actos da administrao, ou naquelles onde os Tribunaes administrativos dividem a sua. competencia com a Justia ordinaria. Nestes ultimos paizes~ deve-se de preferencia procurar a definio dos actos administrativos nas decises do Conselho de Estado e dos T'ribunaes administrativos, mais integrados do que os Tribunaes ordinarios nas questes que interessam mais direetamente ao direito publico. Para concluir, portanto, podemos dizer que o conceito da. contracto administrativo est intimamente ligado ao do ser-

(8)

Artigo 81 da Constituio. Ver vol. I, pg. 828 e segs.

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vio publico. Pouco importa o seu caracter bilateral, porque o essencial que elle se defina como uma relao do Estado com .os particulares, ligados por vinculosque adquirem .os mesmos caracteres dos lServi.os que visa executar. A theoria que presuppe .o caracter unilateral de todos -os actos administrativos leva a consequencias imprevistas e a um casuism.o incompativel com a generalidade de toda a classificao IScientifica. Aquelle principi.o no se concilia com a realidade e dahi as numerosas excepes abertas regra geral, pelos autores que assentam em formula to rigida, a definio dos actos administrativos. (9) E' bem verdade que a noo do servio publico est sujeita s maiores divergencias, mas no resta duvida que, dentrf? desse conceito, pode-se incluir a maioria dos contractos passados pela 4.dministrao, ficando excluidos, apenas, os que, de forma alguma, podem-se incluir entre os destinados quelle fim.

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(9)

'VBLASOO. El acto administra#vo, pg. 128 e segs.

CAPITULO IHMOD.ALlDAlDES DOS ACTOS ADMINISTRATIVOSCondies de Validade dos Actos Administrativos - Revogao e Annullao do Acto Adnlinistr~tivo - A Clausula de Impreviso - Theoria Geral - Sua applicao ao Direito Administrativo.

Como vimos nos capitulos anteriores, os Actos Administrativos podem se revestir de numerosas modalidades, de accordo com a sua natureza, o numero de pessoas que intervm na realisao do negocio juridico, ea finalidade do Poder Publico, ao expedir o Acto gerador da relao juridica. Examinaremos, agora, as diversas especies, assim como as condies geraes de validade, .de obrigatoriedade do acto administrativo, alm das condies em que o mesmo pode ser revogado ou annullado. Teremos, ento, opportunidade de estudar as clausulas de impreviso que alteram, em sua substancia at as clausul'aS contractuaes, e que conciliam o interesse da permanencia da norma juridica, com os factos independentes da vontade humana. Comearemos pelo estudo das condies geraes de validade dos actos administrativos.

VALIDADE DOS ACTOS ADMINISTRATIVOSA validade dos At.tos AldminiBtrativos presuppe duas condies essenciaes:

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a)a sua conformidade com a lei, isto , a sua constitucionalidade ou legalidade; b) a competellcia da autoridade que praticou o acto. A primeira condio s abrange necessariamente aquelles actos em que a autoridade que os praticou estava subordinada directamente obediencia s disposies legaes, excluidos, naturalmente ,aquelles praticados no exercicio de uma funco discriCionaria, ou fra da orbita da influencia da norma legal. Excluidos esto, por conseguinte, os actos politicos, e todos aquelles cuja execuo est entregue ao arbitrio da autoridade administrativa. Mesmo osactos sujeitos s normas legaes teem uma esfera dentro da qual a autoridade administrativa o '1mico juiz da conveniencia ou opportunidade da medida ,isto , smente a ella cabe apreciar qual a melhor maneira de executar um acto autorisado pela lei. Por isso que as nossas leis e a jurisprudencia dos tribunaes tm declarado: (1) Consideram-se illegaes os actos ou decises administrativas em razo da no applicao ou indevida applicao do direito vigente. A autorid'ade juriciaria fundar-se- em razes juridicas, abstendo-se de apreciar o merecimento de actos administrativos sob o ponto de vista de sua conveniencia ou opportunidade. Quando se declara que taes actos so invalidos por vic~ de illegalidade, entende-se, naturalmente, que est comprehendida a maior de todas as illegalidades, qual seja a que decorre da inobservancia da Constituio. E' por isso que a lei n. 191, de 1936, referindo-se ao Mandado de Segurana, declara que este cabe para defeza de direito certo e incontestavel, ameaado ou violado por acto manifestamente inconstitucional ou illegal de qualquer autoridade.

(1)

Lei n.O 221, de 20 de Novembro de 1894, art. 13, 9., lettra A.

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Os autores italianos (2) costumam dividir a invalidade dos actos administrativos por illegitimidade e pelo que eUes chamam "vizio di merito". A illegitimidade decorre da sua no conformidade com a lei, e o defeito de merito, de sua inopportunidade ou iniquidade. A illegitimidade pode tomar tres .aspectos, a saber: incompetencia, excesso de poder, violao da lei. Em nosso direito, a validade dos actos administrativos s pode ser apreciada sob aquelle primeiro aspecto, isto da illegitimidade. Esta comprehende, como se viu, no s a desobediencia lei, mas ainda a incompetencia da autoridade. Dentro do nosso regimen administrativo e judiciario, a incompetencia da autoridade constitue a razo maxima da invalidade dos actos administrativos, porque comprehende ainda aquelles praticados em virtude de uma faculdade ou poder discrlclOnario. Nesse caso, a lei permitte que se o tenha como illegal em rezo da incompetencia da autoridade respectiva ou do excesso de poder. (3) A theoria da nullidade por excesso de poder tem interesse muito peculiar no direito francez e no direito italiano (4), nas celebres doutrinas do "empitement de pouvoit", ou "usurpation de 'pouvoir", ou "detournement de pouvoir", comprehendidas no famoso recurso "pour excs de pouvoir "que examinamos em outro capitulo. Entre ns, toda a theoria se resume na apreciao de uma ou de outra forma de invalidade dos actos administrativos, na illegalidade do acto. A incompetencia da autoridade s pode decorrer 'da inobservancia. da lei, ou do exerccio de uma faculdade que no lhe tenha sido outorgada implicitamente ou explicitamente.(2) ORESTE RANELETTI, La Guarantigia della Gt/Ultizia nella Pubblica Amministrazione; U. BORSI, La Giustizia Amminist1'ativa; FRANCESCO D'ALEsslo,Ist. di Di'dtto Amministrativo, v. n, pgs. 212 e seguintes; 00DACCI-PISANELLI, L'Eccesso di Potere.

Lei n.O 221, de 20 de Novembro de 1894, art. 13, 9., lettra B. Oe autores acima citados e mais LAFERRIRE, Jurisdiction Administr., vol. n, pg. 548; HAURIOU, Droit Administratif, pg. 309; CAMEO, CorBO, pg. 1346 (3) (4)

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A nullidade do acto administrativo, ou a sua revogao, pode ser promovida pelas seguintes formas: pelo pedido de reconsiderao; pelo recurso hierarchico; c) pelos meios judicaes perante ,() poder judiciario, e por via das aces proprias o.rdinarias ou especiaes, como a aco. summaria especial, os interdictos possessorios, o mandado de segurana, e o habeas-corpus. Cada uma dessas formas, como interessem mais directamente, principalmente a ultima, ao direito judiciario, examinaremos em capitulo separado.

?)

a)

REVOGA:O E AtNNULLAstinguir, assim, a empreitada com ou sem fornecimento dematerial, o qual altera, em sua substancia, o negocio juridico. . PLANroL et RlrPERT sustentam que o mesmo contraeto deve-se equipa-:-

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As obras publicas podem ser realisadas, ou directamente pelo Estad.o ou por intermedi.o de terceiros. Quando executadas directamente, diz-se por administrao. Quand.o realisadas por terceiros, diz-se de:a) b ),

empreitada; administrao interessada .ou administrao cntra-

dada; tarefas. A .obra executaJda por administrao quando o Estado -executa o servio sob sua pr.opria responsabilidade. E' aquill que os francez.es chamam execution en rgie. Com.o mostra GASTON J~ZE (7), na execution en rgie, .o empreiteir a pr.opria administrao; ella quem assume os riscDs, contracta i>peraris, financia e dirige a obra. Tem sido este processo malsinado pelo pre das .obras realisadas por esta f.orma. Pretende-se que todo .o servio realisad.o directamente pela administra importa em despezas muito elevadas, pela incapacidade d.o Estado na organisao de seus servios e acquisio de materiaes. A crjtica tem a suaprocedeneia, mas deve-se attendera outras circumstancias, que podem ser invocadas em favr do Estad. E' que no menores irregularidades verificam-se nas obras executadas por empreitada .ou administrao contractada. . Todos procuram se beneficiar e tirar proveitos, muitas vezes indevidos, nas obras pagas pelo Estado, quer na majorao das contas, na modificao de prjectos, na construco de obras no previstas no c.ontraeto ou no edital de concurrencia, etc.c)

rar simples venda, quando o operaria fornece o material (Trait Pratique de Droit Civil Franais, tome 11, pg. 158). A Jurisprudencia italiana attrilbue, tambem, caracter commercial empreitadac'om fornecimento de material (SCIALOJA, Dizionario di Diritto Privato, verbo Ap'palto). No mesmo sentido, em nosso direito, COELHO DA RoCHA" Direito Civil, 852, BEN'l1O DE FARrA, Codigo Commercial, nota 243, CARVALHO DE M\ENOONA, Direito Comm~cial Brasileiro, voI. VI, parte 2.. n. o 1046. Ver tambem nosso Parecer, in "Mandado de Segurana", 2." ed., pagina 343.. " , (7) Contrats Adrntinistratif, v'l. I, pg. 41; RoGER' BONNARD, prcis Droit Administratif, pg. 468.&,

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Poderiamos trazer para aqui innumerosfactoe comprobatorios dessa affirmao, mas que no cabem nesta obra, seno como referencia. A execuo pelo Estado tem outros inconvenientes, como. a morosidade da machina administrativa, a difficuldade nos pagamentos e no empenho das despezas, etc. No se pode, entretanto, condemnar o processo pela excellencia dos demais e sim por uma questo de politica administrativa, sustentada, principalmente, por aquelles que negam a necessidade do Estado exercer actividade industrial.A Empreilada

o processo mais normal de execuo de servio ou de obras: publicas por particulares a empreitada. Presuppoo no s6 o fornecimento da mo de obra e da administrao, como ainda de material. E', assim, o contracto de empreitada, prestao de servios~ e compra e venda de materiaes. SO'bre a sua natureza juridica muito se tem escripto, mas o que interessa neste trabalho fixar a relao juridica que se conclue entre o Estado e o emp,:,eiteiro, e isto j ficou bem definido acima.pagamento pode-se effectuar por differentes moda-. lidades:a) por unidade, calculado o preo do mat.erial empregado, mo de obra; b) por medida, isto , pela quantidade de obra realisada; c) por tarefa, isto , por determinado servio. O contracto de empreitada presuppe a responsabilidade do empreiteiro pela execuo completa do servio; responde, assim, perante terceiros pelos riscos e pelos prejuizos decorrentes da execuo da obra. A forma de pagamento depende da estipulao contractual, e os oramentos so confeccionados de accordo com a natureza do obra.

o

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o contraeto .com pagamento global de todos o mais facil, . principalmente para a fiscalizao. Nem sempre, porm, possivel leva-los a effeito por essa forma, porque depende de obras s possiveis de ser avaliadas durante a execuo. Assim, nas estradas de rodagem, as pontes, viaductos, etc., sujeitas a alteraes durante a realizao do servio. Quando o pagamento feito por preo unitario, o calculo realizado levando-se em conta o trabalho effectuado, de &C.cordo com os preos por unidade de servio. Esses 'preos unitarios variam segundo a natureza da obra, local, difficuldades inherentes a cada obra, etc. Assim, por exemplo, os aterros, as terraplanagens, as cercas e outras obras cuj a medi.da depende de verificao posterior da quantidade de trabalho realizado. Por conseguinte, a no ser no caso do pagamento global, todas as differentes modalidades de pagamento tm por base a medida do servio levado a effeito, quer elle seja representado por um preo unitario, que varia com a natureza da obra, quer, prefixado o preo por medida convencionada, tenha-fle de verificar qual a quantidade de servio prestado. So essas as differentes modalidades do contracto de empreitada, que variam de accordo com a natureza da obra, as condies em que deve ser realizada e as conveniencias da administrao, sob o ponto de vista financeiro.

A administrao contractada aqueHe regimen de execuo de obras publicas em que o Estado entrega a terceiros a realisao do servio, percebendo esses, pela administrao, determinada percentagem. Todo o material e mo de obra so fornecidos pelo Estado. E' aquelle regimen que os francezes chamam, com muita pr~iedooe, rgie mteresse. Este regimen tem sido muito combatido por contravir ao regulamento da contabilidade publica. Foi o preferido, nota.damente, na execuo das obras dos Quarteis do Exercito e do .Arsenal da Ilha das Cobras.

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Regimen de talI'efas . O Regimen de Tarefas consiste na execuo de obras por ordem de servios ou por ajustes a titulo precario., em certos serviospublico.s do EstaJdo.. E' um velho regimen existente entre ns, notadamente para a co.nstruco de estradas de ferro, que parecia abolido pelo. Codigo. de Contabilidade publica, mas que reappa!'eceu, graas ao disposto no. art. 22 da lei n. o 4.911 de 12 de Janeiro de 1925 (8). Antes, porm, considerando constituir tal processo de execuo de obras uma das excepes previstas no art. 246 do. Co.digo. de Contabilidade Publica, j havia o. Ministro da Viao baix~do a portaria de 22 de Janeiro. de 1924, na qual approvava ~s condies para execuo das o.bras de estradas de ferro subordinadas ao Ministerio da Viao.. Esta portaria foi, mais tarde, pelo. Aviso de 4 de Fevereiro. de 1930, applicada aos .servios das Inspectorias de Aguas e Obras Publicas, e de Portos, Rios e Canaes, como antes, em 18 de Maro de 1927, j havia sido determinado. para a cons. truco da estrada de rodagem Rio-So Paulo. A legitimidade das alIudidas portarias deco.rria, confor- me resolveu o Tribunal de Contas, do art. 227 da lei 4.793, de 7 de Janeiro :de 1924, ainda ampliado ,pelo art. 22 da lei 4.'911. de 12 de Janeiro. de 1935 (9). Mas em que consiste o regimen de tarefas, quaes as suas condies? No ajuste a titulo. precario., rescindivel ao. arbitrio. da administrao, para execuo de pequenas ohras publicas, ou parte de uma obra (10).

Ver nota 11 pg. seguinte. Ver A. BIOLCHINI, Codificao da Contabilidade Pu.blica Brasileira, voI. lI, pgs. 915 e seguintes; Legi8lao anterior - Portarias de 22 22 de Dezembro de 1903, 25 d,e Junho de 1905, e de 5 de Abril de 1908. (10) 'Ver Accordo do Supremo Tribunal Federal ,de 7 de Janeiro de 1922. in "Revista do S. T. F.", voI.' XL, pg. 144. (8)(9)

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A forma mais commum a de simples prestao de servios, mas no exclue o forp.ecimento de materiaes (11). : '. O regimen de tarefas est geralmente condicionado a normas geraes, elaboradas pela administrao, s quaes se devem sujeitar todos os tarefeiros. Os preos unitarios so, igualmente, prefixados pela admi. nistrao, que deve tambem demarcar e estabelecer com antecadencia o loal da obra. O pagamento do pessoal feito pelo tarefeiro, mas podeI' a adminirstrao assumir a responsabilidade por esse pagamento, nas condies estipuladas na concesso, descontando posteriormente a administrao, do tarefeiro, as quantias pagas. Terminada a obra, ou durante a' sua execuo, caso o pagamento deva ser parcellado, dever-se- proceder medio e avaliao da obra pelo engenheiro competente..F'ORNECJMENTO DE MATERIAtES

A administrao precisa, para as necessidades dos servios publicos, adqUirir materiaes os mais variados, desde os de simples expediente at os mais indispensaveis para a defesa nacional. Para isso, existem, em nossa legislao, tres systemas principaes : por concurrencia publica e contracto; por concurrencia administrativa; independentemente de concurrencia. O Codigo de 'Contabilidade Publica, em seus arts. 244 e seguintes e 7~6 e seguintes, estabelece as normas geraes relativas ao assumpto, fixando os diversos casos em que so exigidas formalidades legaes para acquisio dos referidos materiaes. O. principio da concurrencia constitue a regra geral da acquisio de mercadorias pela nossa administrao, e s excepcionalmente, ou pela natureza da compra, ou pela urgencia da acquisio,. a lei permitte a sua dispensa.a) b) c)(11) Ver apud BIOLCHINI, op. cit.,~ol.

lI, pg. 926.

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fornecimento dos materiaes para reparties publicas fazia. . se, sob o regimen do Codigo de Contabilidade, pelas proprias reparties, por meio de empenho da despeza e concurrendas por ellas realisadas. No primeiro volume destas "Instituies" tratmos do assumpto, quando estudamos a organizao e o funccionamenro da Commisso Central de Compras, repartio que attende aos fornecimentos necessarios s differentes reparties do Estado (12). DA OONGURRENCIA PUBLICA

o

o systema da concurrencia publica para execuo de obras ou fornecimento de materiaes para o Estado decorre de tres principios fundamentaes: a) uma restrico para a adminis~ trao na escolha de seus fornecedores; b) o direito de todos ao fornecimento em egualdade de condies; c) a necessidade da escolha daquelle que em melhores condies' offerece o servio ao Estado. Por conseguinte, o regimen das concurrencias o que melhores condies offerece para satisfao das necessidades do Estado. E' o principio, alis, consagrado pelas noss'as leis e praxes administrativas. O regimen da concurrencia no exclue, porm, o exercicio de um certo poder da administrao na escolha, no criterio de cotejo das diversas offertas, respeitados os principios 'Iegaes. Nem todos os paizes adoptam esse regimen. Na Frana, segundo se v em GASTON JZE (13), o regimen normal o da livre escolha, discricionaria, da administrao publica (contrat gr gr), a menos que a lei no imponha o regimen d~ concurrencia. Entre ns, porm, outra tem sido a doutrina dominante. O que prevalece o regimen da concurrencia, que s eXlCepcionalmente pode ser preterido pelo da livre escolha.(12) (13) Instituies de Direito Administrativo, voI. I, pg. 438. Contrat8 administratif, VoI. 11, pg. 80.

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As concurrencias podem ser publicas ou administrativas. Segundo determina o art. 738 do Codigo de Contabilidade, a concur.rencia publica deve se realizar:a) - para fornecimento, embora parcellado, custeado por, creditoB superiores a Rs. 5 :000$00,0, salvo os casos previstos expressamente para a concurrencia administrativa; b) - para execuo de obras publicas superiores a Rs. 10 :000,$000; c) para a avaliao de bens do dominio patrimonial da Unio, moveis ou immoveis. Precede concur,rencia, ou melhor, ao exame das propostas, a verificao da idoneidade dos concurrentes. A abertura das propostas s se dar uma vez verificada aquella idoneidade, de accordo com a comprovao feita pelo concurrente. E' licito a qualquer dos concurrentes reclamar contra a incluso ou excluso de qualquer outro na lista daquelles considerados ildoneos ou inidoneos, provando os factos que forem porventura articulados contra a alludida classificao. A mais ampla publilCidade um presupposto do proprio regimen da concurrencia publica. Para isso, o Codigo de Contabilidade estabelece, em seus artigos 745 e seguintes, normas geraes a que devem obedecer as reparties e que so as seguintes (14) : A' concurrencia publica precede a publicao nos orgos officiaes dos editaes expedidos pela Repartio que ter de firmar o contracto de fornecimento ou a prestao de servios, editaes que :devem conter os seguintes elementos: a) - a autoridade que presidi!' a concurrencia, o logar, dia e hora em que devem ser abertas e lidas as propostas;

.. (14) Art. 745 do Oodi'go de Contabilidade. Anteriormente ao Codi. go de Contabilidade' vigoravam as seguintes disposies: l)e{:. 2926, de' 14 de Maio de 1862; Lei 2221 de 30 de DezeIOOro de 1909,; Lei 3232, de 5 de Janeiro de 1917 (art. 94), 345'4 de 6 de Janeiro de 1918, (art. 170), 3991, de' 5 de Janelr() de 1920 (art. 731), Dec. 4555, de 10 de Agosto de 1922).1

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b) - O objectoda concurrencia, indicadas com a maior minucia todas as condies technicas e administrativas, marca, peSO, medida ou volume ,dos objectos, condies de entrega, emfim, todos os elementos indicativos do objecto. da concurrencia; c) - o local onde podem ser examinadas as amostras no caso de fornecimento cujo objecto no possa ser designado de modo inconfundivel, ou as plantas e desenhos quando se tratar de construces; d) - a prova de idoneidade dos concurrentes, de aceordo com a natureza da concurrencia; e) - a importancia do deposito previo. No dia e hora designados a autoridade que presidir a concurrencia passar a receber as propostas que forem apresentadas. Ninguem comparecendo, far a autoridade lavrar uma acta. No caso contrario, depols de assignadas e rubricadas as propostas pelos concurrentes,' sero as mesmas entregues s autoridades. Em seguida, ser verificada a idoneidade dos concurrentes, e s ento sero as propostrus abertas e lidas, lavrando-se uma acta onde ficaro cireumstanciadamente relatadas todas as occurrencias; Antes de qualquer deciso, sero as propostas publicadas na integra pelos jornaes que houverem publicado os editaes acima referidos. S ento passar a commisso a estudar as propostas, esta- . belecendo quadros comparativos das mesmas, bem como o confronto dos diversos preos offerecidos. Feita a classificao, encaminhar o presidente da commisso todo o processado ao chefe da Repartio, acompanhado de um breve relatorio com as concluses da commisso, e onde dever constar qual a proposta mais vantajosa. Verificada pelo chefe da Repartio a regularidade d processo" e que os preos offerecidos no excedem de 10% dos preos correntes da praa, ser escolhida a proposta mais barata. No caso contrario, ser annullada a concurrencia. Este o processo preliminar da concurrencia publica que, no entretanto, no importa at assignatura do contracto, em

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obrigao para' a administrao publiea., que poder deixar de acceitar as propostas ou annullar a concurrencia, sem que isso importe em responsabilidade civil. E isso explica-se pelas seguintes razes: Feita a classificao das propostas por meio de quadros e outros demonstrativos, ser realizada a escolha pela autoridade competente, o que no exclue certa discreo, limitada. apenaS pelos termos dos ed'itaes e pelas disposies legaes em vigor. Assim, a proposta mais barata, 'por minima que seja a differena, ter preferencia; em igualdade de condies proce.. der-se-ha nova concurrencia, entre aquelles que se acharem em condies. identicas, versando esta ultima sobre os abatimentos que podero ser feitos. Caso no accedam no abatimento, proceder-se-ha ao sorteio que resolver a duvida. Mas entre as propostas p6de acontecer que a differena mais sensivel no se caracterise no preo, mas em outra condio. Esta pde ser estabelecida pela administrao, que dever decidir sobre a classificao de duas ou mais propostas eguaes (15). Reserva-se o Governo, porm, o direito de annuIlar qualquer concrrencia, motivando o seu despacho. E' o principio applicado mesmo no regimen d,a lei 2.221, de Dezembro de 1909, conforme tem reconhecido a' juris:pruIdencia do Supremo Tribunal Federal, in verbis: "A annullao de uma ooncurrencia publica. decretada pelo Governo depois Ida apresentao das propostas, afim de acautelar os interesses superiores da alta administrao do Estado. no importa na. responsabilidade .por perdas e qamnos; mas~ apenas, no pagamento da mesma multa a que seria obrigado o conctU'rente aeeeito, que deixasse de aS(15) Art. 744, do Codigo de Contabilidde.

..

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signar O contracto para o qual fra aberta a concurrenia publica" (16). E' preciso, no entretanto, observar que a resalva contida no final da ementa s se poderia justificar no regimen da lei numero 2.221. No systema do codigo actual no se poderia. impr tal penalidade ao Poder Publico, mormente quando motivado O acto. o Governo, pelo estatuto em vigor, reservou-se essa faculdade, o que importa em uma restrico que preexiste proposta da concurrencia. Essa resalva, alis, deve constar dos editaes. A concurrencia no obriga nem pde obrigar a admini~ trao ntes de concluido o contracto definitivo. Segundo JZE, a concurrenda um acto-condio unilat&- . ral (17) de natureza complexa, para cuja concluso definitiva torna-se necessaria a .pratica de muitos actos. Esta parece ser a ba doutrina que justifica as concluses a que acima chegmos. Nem sempre o regimen da concurrencia deve ser rigorosamente observado pela Administrao Publica; o proprio Codigo de Contabilidade estabeleceu excepes ao principio geral, a saber (18):a) - para os fornecimentos, transportes e trabaJ.h08 publicos, por circumstan.cias imprevistas ou de interesse naeio- . nal, a juizo do Presidente da Republica, que no permittirem a publicidade ou as demoras exigidas pelos pr~s de concurrencias; b) - para o fornecimento do material ou de generos, ou realizao de trabalhos que s puderem ser effectuados pelo productor ou profissionaes especialistas, ou adquiridos no logar da produco;

(16)

(17)(18)

Acc., 27-W-26, Arch. Jud., V, pg. 4'Ol. Contrats Administratifs, V,oI. lI, pg. 123.Art. 246.

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c) -

para a acquisio de animaes para os servios mi-

litares;d) - para arrendamento ou compra de predios ou terrenos, destinados aO servio publico; e) - quando no acudirem os proponentes primeira concurrencia. Constituem, esses, porm, casos excepcionaes, que devem ser apreciados pelo Governo, e, no caso Ida letra a), pelo Presidente da Republica.

:.';

I.

"

CAPITULO V

EMPRESTIMOS PuBLIcOS '

Emprestimos publicos - Natureza - Diversas theorias ,Como diff.erem dos contractos de direito privado - Quaes os. elementos que caracterisam os emprestimos publicos e as consequencias desses principios.

Para manter os servios publioos, o Estado, muitas vezes~ obrigado a recorrer a certos meios extraordinarios de receita~ alm dos impostos e taxas que constituem as fontes ordinarias da renda publica. Estes meios extraordinarios so os emprestimos "de dinheiro, lanados pelo Estado, de accol'do com as modalidaJdes financeiras que se reco.mmendam em cad caso. E', assim, o emprestimo uma parte da divida do Estao que, no. entretanto, se reveste de peculiaridades que justificam a sua incluso em um capitulo. "proprio.. Em nosso regimen administrativo., de acco.rdo co.m a estructura poltica do. systema federal, os emprestimos podem ser federaes, estaduaes, ou municipaes, segundo. a entidade de Jireito publico que os contrahiu. Costumam tambem o.S autores dividir os emprestimo.s publicos em internos ou externos, temporarios ou "perpetuos, etc. O problema financeiro. e eeono.mico, que envo.lve toda essa materia, de grande importancia, bem como. os aspectos de ordem historica, social, poltica, constitucional, juridica e internacional, que, segundo JZE, constituem outras tantas faces da questo (1).(1) Cours de Science des Finances. Les Contrats Administratifs.

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Intimamente ligados ao problema dos emprestimos, encarado em sua expresso juridica, isto , na relao obrigacional concluida pelo EstaJdo, encontram-se, tambem" aquelles relativos:

emisso, juros e prazos; natureza dos titulos; s garantias dos emprestimos; d) consolidao; e) converso; f) amortizao. Antes de apreciarmos a relao juridica que se estabelece pelo lanamento do emprestimo, vamos examinar um aspecto constitucional de maior importancia: Quem pode contrahir emprestimos-? A Constituio vigente estabeleceu um regimen peuliar muito differente daquelle determinado pela Constituio de 1891, :p.o que se refere s formalidades constitucionaes exigidas para que possam as entidades de direito publico contrahir emprestimos. A Constituio de 1891, em seu art. 34, n.o 2, conferia ao Congresso Nacional competencia privativa para autorisar o Poder Executivo a contrahir emprestimos e a fazer outras o~ raes de credito (2) . .A Constituio vigente, imprimindo maior severidade ao texto, declara:a)b) c)

"Art. 35. E' defeso aos Estados, ao Districto Federal e aos Municipios :

c) Contrahir amprestimos externos, sem previa licena do Conselho Federal" (3).

(2) Ver AURELINO LEAL, Thecrria e Pratica da Constituio. ,CARLOS MAXIMILIANO Commentario8 Constituio Brasileira. (3) Confere com o art. 19, n. V, da Constituio de 1934. 14

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Por conseguinte, a Constituio de 19'37, como a de 1934, veiu impr aos Estados e aos Municipios, bem como ao Dlstricto Federal, uma restrico e um contrle sobre os seus emprestimos externos, desconhecidos sob o regimen da Constituio anterior. Quanto Unio, diz o art. 16, n.o VI da Constituio actual: "Art. 16: Compete privativamente Unio o poder de legislar sob!'e as seguintes mateiras:

VI - As finanas federaes, as questes de moeda, de credito, de bolsa e de banco". E1sto, portanto, os governos dios gs,tados e Municipios, subordinados autorisao do Conselho Federal, que representa, dentro da estructura politica da Unio, um orgo destinado a contrlar os interesses dos Estados. Por isso mesmo, ao sua constituio deco,rre da representao egualitaria dos EstaJdos da Federao. Quanto ao Governo Federal, as operaes de credito achamse subordinadas, ,para sua val1dade, autorisao do Poder Legislativo, porque, geradora de relaes juridicas materiaes, depeIlldem de uma lei especial (4). E' certo, alis, que um dos attributos dos Parlamentos, em sua ,e:lCpresso mais tradicional, aquelle de ordem financeira. E' o que se verifica em quasi todos os paiz.es, como a Frana, e os Estados Unidos (5). A aeo dos poderes federaes sobre os Estados, com relao ao cumprimento :das clausulas contractuaes, relativas ao

(4) Ver ARAUJO CASTIW, A Nova Constitui.iJ Brasileira, pg. PoNTES DE MIRANDA, Qommentarios Oonstituio. (5) PoMMEROYS, Int/'oduction to the Constitutionnal LCl/W,pg.

18l.

262.

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:pagamento dos juros e os servi8 de sua divid'a fundada, permitte, at, a interveno federal nos termos do art. 9, lettra d) .da Constituio vigente. O mesmo acontece aos Estados, com relao oos Munici:pios, quando se tratar de emprestimos garantidos pelo Estado, ,ou por falta Ide pagamento da divida fundada dos Municipios :por mais de dois annas. Envolve, no entretanto, essa materia, um estudo de direito constitucional que no cabe aqui desenvolver. O que cumpre, dJesde logo, estudar a natureza juridica ,dos emprestimos realisados pelas entidades de direito publico, --o que far objecto do paragrapho seguinte.Natureza juridica dos emprestimos publicos

Neste assumpto, como naquelle relativo aos contractos em :geral, duas tendencias principaes definem a orientao dos autore!) que versaram a materia: uma, nitidamente civilista, presa, ainda, aos antigos principios que orientavam o estudo do direito priv,ado; a outra, seguindo a tendencia moderna orientada pelos .'principios de direito publico que imprimem caracter p,culiar quellas relaes juridicas concluidas com o Estado, attribuindo aos contractos, em geral, e especialmente aos con-.tractos de emprestimos publioos, um caracter administrativo nitidamente definido. Conciliando as duas doutrinas, uma terceira de caracter ,eclectico procura decompr o contracto de emprestimo publico, reconhecendo-Ihe, em parte, isto , em algumas de suas operai.eS, a feio das relaes ide direito publico, emquanto que, em outras, cOnsidera, apenas, simples relaes de ordem privada. J temos accentuado, por diversas vezes, o sentido de direito publico de todas as relaes juridicas em que o Estado parte, ,e hoje cada vez mais accentuada essa tendencia, quando se pretende estabelecer" como principio, o da primazia do di.reito internacional. Por conseguinte, j o direito pubJ;ico 'considerado dentro de um ambito ainda mais lato, nas relaes -de Estado a Estado) e esses principios assim firmados tendem

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a constituir a base sobre a qual se deve assentar o direito moderno. O estudo da natureza juridica dos empreatimos publicos exigiria a decomposio de todos os seus elementos essenciaes, notadamente a posio das partes contractantes, a forma do titulo (6), o typo, os divensos meios de attrahir os portadores dos titulos~ o lanamento do emprestimo, garantias, etc.I. -

A Theoria Civilista.

Essa theoria sustentada, entre outros, por PRESUTTI, LABAND, MEUCCI, etc.. Segundo PRESUTTI, (7), o emprestimo publico nada mais do que um contraeto concluido pela administrao e funda-o mentalmente regulado pelas normas traadas no Co digo Civil. Pouco importam as modalidades desses contraetos, segundo' aquelle autor, modalidades que no alteram a substancia da. relao juridica, que nada tem de peculiar. Segundo LABAND (8), "oontractar um emprestimo o mesmo do que concluir um contraeto de direito privado, isto ,. praticar um acto administrativo; este emprestimo no pode,. sob qualquer Constituio, e em caso algum, ser considerado, um acto de legislao, porque .no se pode ter como um acto unilateral da vontade do Estado, m8JS um contraeto realisaJdo. entre o fisco e terceiros". O proprio autor, porm, () primeiro a abrir uma exc- po, quando tratada emisso de bonus pelo Thezouro, qu~ considera um acto puramente de administrao .. Deve-se notar que LABAND examinava a questo sob 0: ponto de vista do direito allem. Por conseguinte, a affirmao de que o contracto de emprestimo no pode ser con-(6)a) b) c) d)

Pode-se mencionar, entre outras:

as apoHces; as obrigaes diversas (ferroviarias, rodoviarias, etc.); os bonus do Thezu!1o, ou lettras, bilhetes, etc.; os bands de emprestimos externos. (7) IstituzioT di Diritto Amministrativo Italiano, voI. I, pg. 354(8) Droit Public de l'Empire Allem..a,nd, vol. vr, pg. 78.

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siderado um acto legislativo no pode merecer acolhida en! nosso direito, porque; comI() j demonstrmos, a approvao legislativa, no Brasil como nos Estados Unidos, e na maioria dos pai~s, hoje da essencia do proprio contracto. Para MEUCCI (9), o debito publico constitue-se como um vinculo juridico, .de todo em todo identico ao dos debitos t'ivados. Si bem que a natureza do ~stado, sua situao especifica, as exigencias de salvao publica, constituem elementos 9, ser considerados nessas relaes juridicas, no importam em modificar a natureza cIvilista do contraeto, embora differenciado dos demais contractos, mas no collocaJdo como antithese dos de direto 'Publico. Ainda dentro dessa. corrente, GERBINO (10), que considera o instituto do emprestimo publico como de direito 1)rivado, embora por muitos seja considerado, segundo confessa, como de direito publico. Fundamenta o seu ponto de vista attendendo posio do Estado, pemnte os cidados, equiparada de um particular, isto , como a de um contractante, despido de suas ,prerogativas e obediente a um regimen de livre concurrencia. O facto de soffrer a influencia de direito publico na realisao do negocio no tira, segundo o mesmo autor, o caracter privado da transaco. lI. A Theoria de Direito Publico.

Os autores francezes so os que, de preferencia, se orien-

tam no sentido de attribuir aos emprestimos publicos uma feio peculiar ao direito administrativo. J LAF'FERIRE (11), fundado nas leis de 17 de Junho 1790 e Ide 26 Sietembro 1798, ,considerava os emprestimos publicos como de direito admi. nistrativo.

(9) lstituz;oni di Diritto AmministTativo, pg. 519. (10) I./Attivit della Amministrazione F'inanziarie in Primo Tratttato Completo de Orlando, voI. IX, parte U, pg. 160 .. ,(11) Jurisdiction Aftministrative, voI. r, pg. 598.

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Effectivamente, aquellas leis declaravam, expressamen~. como principio constitucional, que nenhum. credito sobre o The-zouro publico poderia ser admittido entre as dividas do E:stado, seno em virtude de um decreto da Assembla Nacional, e que' todos os creditos .seriam regulados administrativamente. No direito francez, portanto, existe uma tradjo legisla-tiva, que, certamente, orientou a doutrina ainda hoje preva-lecente naquelle paiz. GASTON JZE (12) fo.i, porm, quem mais desenvolvida,...mente estudou a materia, sustentando a natureza de direito, adnrinistrativo desses contractos, pelos seguintes fundamentos:: 1) porque se trata de um contracto, e contracto desti-nado a regular o funccionamento de um servio publico; 2) A vontade Idas partes contractantes deve-se submetter a um regimen especial de direito publico. A lei que ap.prova a emiss'o do emprestimo publico deve prescrever que os seus', tomadores ficam investidos de direitos que no pertencem aostomadores de emprestimos particulares'. Elxistelllp egualmente,_ grande numero de regras especiaes relativs impenhorabili-dade das rendas do Estado, immunidade fiscal, s taxas dejuros que no dependem das l,eis de usura, prescripO espe-cial, inscripo no "grande livro" etc. TOdas essas regras exhorbitam do Idireito ;privado.. Assim, apparecem bem definidos os caracteres do contra-cto administrativo. Dentro de um ponto de vista de todo semelhante, encon-tra~, ainda, VELASOO (13) que sustenta ser o' emprestimo.' publico um contracto de direito publico. Si analysarmos, minuciosamente, e at no seu intimo,. taes contractos, diz VELASCO, e os compararmos, com os civis" facilmente verificar-se-ha como so differentes. Como caracte-, risticas essenciaes tm as seguintes: 1) o devedor pode no. estar obrigado a devolver' ao' cre-dor a mesma quantia emprestada;

(12) (13)

Les Contrats Ad'ministratifs, vol. I, pg. 129. Los contl"atos administrativos, pg. 290.

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2) o credor carece de meios para forar o devedor a cumprir a sua obrigao de pagar a divida ou os juros; 3) no obstante, fica o Estado juridicamente obrigado a cumprir a obrigao. O que equivale a dizer que, aqui, tambem, desa.pparece a causa da obrigao, porque, se o Estado deve sment ao seu legitimo credor, falta a este os meios para forar o pagamento, e o pagamento decorre do mandamento legal, mandamento que se individualiza naquelle que portador do titulo contra o E,stado. O Estado no est livre de cumprir as suas obrigaes; estas, por sua vez, no decorrem smente do contraeto, ou, pelo menos, este contoocto carece da efficac.ia inherente a estes actos~ nas ~laes de ordem privada. Diverge VELAS 00, por este fundamento da inexequibilidade dos contractos de emprestimo publico, da opinio de JZE, que reconhece a plena efficacia juridica desses contractos. Citaremos, ainda, nesta corrente, a opinio de LAPRADELLE e POLITIS, citada por JZE, que no admitte a confus'o entre os contractos privados e os emprestimos publicos (14). Dentro dessa mesma corrente, GABINO FRAGA JUNIOR (15) synthetisa, da seguinte forma, os caracteres essenciaes dos emprestimo8 publicos:

1) A formao das obrigaes do Estado diversificam-se das particulares que realizam um emprestimo civil, porque, emquanto nestas ultimas o contracto constitue a fonte juridica da obrigao, o mesmo no occorre com o Estado, que encontra na sanco legislativa a origem principal da obrigao. 2) A interpretao do contracto de direito publico devp regular-se, egualmente, por normas especiaes., tendo-se em COllsiderao as condies geraes inherenies aos contractos administrativos. 3) A estructura mesma do contracto differente, porque presume um regimen de garantias desconhecid,as nos contractos commul1JS.(14) (15) ftecueil des arbitrages internationaux, lI, 1924, pg. 5415. Derecho admmistrativo. pg. 432 e, segs.

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4) Finalmente, a forma de execuo das obrigaes oriundas dO' emprestimO' est sujeita, egualmente, a um regimen juridicoespecial. Neste sentido que se desenvO'lvem as differentes doutrinas sobre este assumpto. Nunca ser demais ,g,alientar, cO'mO' o faremos adeante. a importancia desses p'incipiO's geraes', que servem de fundamento a consequencias das mais serias quanto s modificaes posteriores das clau.sulas contractuaes, conversO' dos emprestimO's publicos quanto aO's juros e prazos de amortizao, quanto s isenes fiscaes etc. E' evidente que, quanto mais proximas se encontrarem as relaes juridicas dO' direito publico, mais sujeitas estaro, tambem, s exigencias e imposies do interesse publico. Dahi podem ser tiraida.s as consequencias da experiencia.

IH. -

Theoria mixta.

SO'b este titulo, podem-se cO'mprehender as numerosas theorias que procuram conciliar as doutrinas extremas, acima estudadas, ou differenciar, no cO'mplexo das operaes que integram as diversas modalidades de emprestimO's publicos, O's elementos que mai.s se apprO'ximam do direito publicO' ou do direito privadO'. Assim, MANTELLINI (16) O'bserva que, embora revistam-se de feies contractuaes, essas condies no podem ser, todavia, cO'nsideradas comO' taes. E' que razes de O'rdem poltica misturam-se com fundamentos de natureza privada, dandO' a essas relaes jurid,icas caracter de todo e em todo' peculiar. E" tambem a opinio expedida por GRAZIANI (17), que recO'nhece, nestes contractos de emprestimO's publicos, caracteres differentes, de accordO' cO'm a natuerza da O'perao. Assim, se o EstadO' estabelece relaes com os particulares para a execuo de um servio publicO', teremos uma rel,aO' de O'rdem privada; O' mesmo no occorre, pol'm, se o Estado lana um(16) Lo Stato e il codice civile, voI. lI, pg. 395. (17) II debito pubblico in Primo Trattato de Orlando, vol. IX, pagina 590.

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emprestimo publico; nesse caso, estabeleOO-se um vinculo, sui generis, de natureza especial, contendo elementos de direito publico. MEYER, citado por GRAZIANI, tem um ponto rde vista peculiar, porque equrpara o Estado aos particulares, proclamando a natureza de direito privado das relaes juridicas provenientes desses contr~tos, como a de qualquer deved'Or c'Om o seu credor, salvo quando no determinar o contrario uma lei especial sobre emprestimos publicos. Dentr'O dessa corrente eclectica, incluem-se a maioria dos autores, como SANTI ROMANO (18) e aquelles acima enumerados que estudaram as peculiaridades que differenciam a generalidrude dos negocios juridicos dessa natureza. Temos como certo que, embora a relao juri1dica que se estabelece entre 'O portador do titul'O e o devedor possa ser equiparada a qualquer relao creditoril3. entre prurticulares (19). no se pode, entretanto, desconhecer o direito inherente ao. Estado de modificar as clausulas dos contractos, por motiv'O de interesse publico, impr contribuies fietencia daquelle Tribunal impropriamente denominado administrativo (22). Deve-se nota!', tambem~ que a Constituio de 19\37, supprimindo aquelle Tribunal, modificou apenas a competencia especifica, que ficou implidtamente deferida ao Supremo Tribunal. Tem, portanto, aquella referencia ao texto da Constituio de 1934, valor historico mas constitue subsidio doutrinario de .relevo.

(22) Ver no primeiro volume pg. 320 e seguintes, o estudo desenvolvido da mater-ia.6

CAPITULO VI

ACTOS DISCRICIONARIOSActos discricionarios e actos de gesto. Actos politicos Actos de lmperio

Ha uma esphera em que vedada a 'penetrao de exame do poder judiciario. E' aquella em que o poder Executivo age dentro de suas attribuies discricionarias. Cada poder do Estado tem a sua indole peculiar, inherente funco que exerce na organisao poltica de C81dapaiz, e, dentro dos limites dessa sua competencia especifica e privativa, qualquer outro ,poder exhorbita, alli penetrando. E' este um principio fundamental em toda a organisao politica, e cujo desrespeito importa na violao do ~rincipic da separao dos poderes. Como demonstra MARSHALL, si o poder judiciario pudesse conhecer de todas as questes constitucionaes, absorveria as funces legislativas. Si pudesse resolver tudo o que diz com os tratados e leis, usurparia as funces executivas, e o legis.lativo e o executivo seriam absorvidos pelo jUldiciario. Ora, a aco discricionaria exerce-.se, precisamente, dentro daqueIla esphera de aco constitucionalmente demarcada a cada um dos poderes, e apenas na maneira de realisar a sua finaJidade, na apreciao da opportunidade e na conveniencia. do acto, que a aco de cada poder soberana, inaccessivel actuao de outro poder. O proprio poder judiciario, que em nosso regimen politico se encontra em posio privilegiada, como interprete doa Consti-

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tuio e das leis, como orgo tutelar dos direitos individuaes, tem a 'sua competencia limitada pela aco discriciona.ria dos outros pederes. E isto impe-se para que o Estado possa realisar a sua finalidade, que de zelar" no s pelo intereB8e individual. IDas principalmente pelos interesses _collectivos, que se sobrepem a todos os demais. Do poder executivo depende, especialmente, o funcccionamento de todos os servios 'publicos, da sade, da ordem e dc:t segurana eollectiva, da vida, da subsistencia, do bem estar social de todos os ch:lados. Como. realisar essa finalidade, si todos 0.18 seus 'actos, si toda a sua actividade sofifrer a continua fiscalisao, o contrle permanente do poder judiciario., com o seu criterio rigido de apreciao dos phenomenos jurdicos, sem a capac1dade de encarar as questes administrativas, por seu aBlpecto superiormente politico, tendo em vista apenas os interesses superiores do Estado? Como ensina FRITz FLEINER (1), o poder executivo, a administrao em geral, tem r'esponsabilidades formidaveis, porque as leis precisam ser cumpridas, as sentenas devem ser executadas, e isto tem de ser feito pela administrao propriamente dita, pelo Governo, constituido por orgos administrativos complexos. E, porisso, diz que os actos administrativos so, antes de tudo,actos de autoridade (2). A posio da administrao publica, no conjuncto do mechanismo do Estado, tem sido mal comprehendida no. nosso direito, o.nde a materia administrativa no se tem destacado como. uma doutrina propria, desaggregada dos principios fundamentaes do direito privado, para constituir direito autonomo, moldado dentro. da estructurn politica do. Estado (3).

(1)

Droit Administratif Allemand. pg. 2.Idem pg. 198. HANS KELsEN Teoria General del Estado, pg. 117.

(2)(3)

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Os privilegios que lhe tm sido conferidos no podem ser ,coIliSiderados excessivos, porque correspondem aos graves onus que sobre elle ,pesam, na defeza e proteco dos interesses collectivos, e, as mais das vezes, constituem imperiosa necessidade, para que possa o poder publico realisar os seus fins. A theoria dos actos discricionarios, tem, no entretanto, Erav:es difficuldades, que consistem principalmente na fixao ,dos seus limites e dia sua natureza. Aqui, como na maioria td08 casos, no possivel fix~r em uma formula rigida a noo do acto discricionario. Depende, principalmente, do systema juridico dentro do qual tem de se .definir a doutrina. - Actos discricionarios - constitue uma expresso generica. Comprehende modalinstituio de 1891 consagrou ,principio semelhante ao .da Constituio do Imperio, de accordo com o criterio liberal, j hoje incompativel com a doutrina vigente.(18) E' o que 'Occorre, notadamente, na Russia e na AlIemanha, sob formas differentes, mas inspirado nos mesmos princpios polticos. (19) Prcis de Droit Public, pg. 150 e segs.

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Aquella Constituio assegurava a livre manifestao do pensamento pela imprensa ou pela tribuna, sem dependencia de censura, respondendo cada um pelos abusos que commettesse, de accordo com a lei (21). A Constituio de 1937, em seu a-rtigo 122, n.o 15, embora reconhecendo a liberdade de imprensa, subordinou o seu exercicio s restrices legaes, asseguradorasda ordem, dos bons costumes e direitos dos cidados em geral. A lei n.o 38, de 4 de Abril de 1935, definiu a or:dem politica - aquella que resulta da independencia, soberania e integridade territorial da Unio, hem como da organisao e actividade dos po.deres politicos, estabelecidos na Constituio da Republica, nas dos Estados, e nas Leis Organicas respectivas. Quanto ordem social, declarou a mesma lei que aquella estabelecida pela Constituio e pelaIS leis, relativamente aos direitos e garantias individuaes, e sua proteco civil e penal; ao regimen juridico da propriedade, da famlia e do trabalho; organisao e funccionamento dos se-rvios publicos e de utilidade geral; aos direitos e deveres das pessas de d~ reito publico para com os individ'!los e recip,rocamente . .A!pezar .dessas restrices, o regimen ainda vigente, entre ns, o da liberdade de imprensa, independentemente de censura. Nenhuma medida de ordem preventiva pode ser tomada pela autoridade policial, no sentido de evitar a livre manifestao do pensamento. E' bem de v!" que, durante o estado de emergencia ou de guerra, nos termos do art. 168, letra b da Constituio, poder ser estabelecida a censura prvia, no smente da imprensa, mas tambem de toda a correspondencia particular. Questo do maior interesse aquella que diz com as restrices nas publicaes pornographicas, ou prejudiciaes saude ptlblica, como, por exemplo, o annundo de certos medicamentos. Neste caso, afigura-se-nos legitima a interveno do poder

(20) V'er a Consto do Imtperio, art. 179, n. 4 e Consto de 1891, artigo 72, 12.

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publico, afim de cohibir os effeitos damnosos dessas publicaes (2~). Censura theatraI A liberdade da manifestao do pensamento um dos principios consagrados pela Constituio, que independem da censura .previa pela autoridade publica. O proprio texto constitucional, porm, em seu a~t. 122, o 15, exceptua expressamente, dessa garantia irrestricta, os n. espectaculos e diverses publicas, reporduzindo o que dispunha a Constituio de 1934. Vieram, assim, as ultimas disposies constitucionaes P] termo as duvidas sempre suscitadas na interpretao do antigo texto da Constituio de 1891, que, no entender de mUItos, abrangia, em sua generalidade, todas as formas de manifestao de p~msamento,inclusive os espectaculos e diverses publicas. A censura theatral, ape~ar disso, tem, no Brasil, uma historia que vae buscar a sua origem na mais remota vida do nosso direito administrativo. o,s antecedentes das ,dis'posies legaes em vigor podem ser encontrados segundo mostrou MAFRA DE LAET, em these que apresentou Conferencia Judioiaria PoHcial, reunida nesta C3/pital, em 1917, no Aviso n. o 123, de 21 de Julho de 1829. Esse A v1so, expedido em nome d9 Imperador pelo Intendente Geral da Polida, ordenava ao administrador do Theatro S. Pedro de Alcantara que fizesse examinar previamente as peas pelo Dezembargador Intendente (23). Este foi, dahi ,por diante, o rumo seguido pela nossa legislao sobre o assumpto.(21) Citaremos, como exemplos, os seguintes: .'0 art. 253 do dec. 16.300. de 31 dezembro d.e 1923. Atrts. 112 e 123, do dec. 20.377, de 8 de Setembro de 1931. Com relao' s loterias e annuncios de loterias estaduaes, ver os decs. 8.597, d,e 8 de Maro de 1911, art. 38, 5.; dec. 15.775, de 6 de N()~mbro de 1922, art. 92, 7.; dec. 21.143, de 10 de Maro de 1932, art. 59. ' (22) Annaes da Conferencia Judiciaria Policial de 1917.

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o art. 11 do decreto 435, de 19 de Julho

de 1845, j dizia:

"No caso de se annunciar alguma pea que no tenha o visto do Chefe de Policia, este far saber, immediatamente, Directoria das peas, que o Theatro ser fechado naqueHa noite, quando no faa annunciar outra; o que mandar pu.blicar por cartaz na porta do mesmo e mais lugares de costume, para co.nhecimento do publico. Os interessados ficam com o direito salvo de haver da mesma Directoria indem.. nisao dos prejuizos que o Theatro possa ter por essa sUiSipenso de trabalho." (24). A no.ssa legislao, dahi po.r deante, talvez co.m menos rigor, pelo meno.s no. emprego. do.s meios co.ercitivos, mas diuturnamente, exigiu a censura previa. Constituiram-se commiss'es especialisadas, notadamente aquellas creadas pelo. decreto 14.529, de 9 de Dezembro. de 1920. so.bre casas de diverses, e pelo. decreto. 16.590, de 10 de setembro. de 1924. A jurisprudencia tem amparado largamente a medida po.licial, po.dendo-se citar ~ caso. da pea "A Aguia Negra" e o.Utros, to bem analysados por AURELINO LEAL e ARMANDO VIDAL (25). Em to.dos esses caso.s, mereceu a aco da po.liciH a manifes~ao. unanime da Crte de Appellao do. Districto. Federal e do Supremo Tribunal, em suas decises (26). As obras mencio.nadas, de AURELINO LEAL e ARMANDO VIDAL, merecem ser co.nsultadas, po.rque trazem um largo subsidio. e do.cum.entam muito bem o.S diverso.s casos occo.rridos entre ns. So.b o. regimen da Constituio. vigente, no vemos co.mo po.ssa haver duvidas quanto. legitimidade da censura previa, porque, no. texto. co.nstitucio.nal, ficaram bem consagradas as(23) !Ver(24)PAULA PEssoA,

Codigo de Proces8o Oriminal Brasileiro.

pg. 404. nota 2440 e segs.~DO VIDAL,

.(25)

LEAL, Policia e Poder de Policia, pg. 219,. O Teatro e a Lei. Ver Rev. do S. T. F., voI. IH, pg; 32 .AURELINO

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nossas tradies juridicas e os exemplos tirados da doutrina extrangeira. Aqui as limitaes oppostas pela censura devem se referir especialmente, segundo a lio dos autores:a) moralidade e decoro publico; b) ao respeito s autoridades constitui das ; c) proteco da dignidade pessoal contra as alluses iu-

juriosas vida privada; d) segurana das instituies e o respeito s naes extrangeiras e s religies. Comprehende-se, tambem, na censura, segundo nota BlELSA (27), a prohibio de exhibies brutaes, deshumanas, ou que ponham em perigo a vida dos artistas. Na Frana, embora exista a censura, a sua efficacia muito duvidosa porque entregue ao Ministro respectivo, que no dispe de um orgo efficiente para levar a effeito essa difficil tarefa. A reaco contra a censura verificou-se na Allemanha com a Constituio de Weimar, que a aboliu (28), mas foi restabelecida com a tendencia totalitaria do nacional-socialismo allei mo. So essas as orientaes principaes dos diversos paizes em materia de censura theatral, devendo-se chamar a atteno~ tambem, par a regulamentao existente nos paizes do Norte da Europa, na ltalia e nos Estados Unidos. (29) Censura Postal e Telegrapbica De accordo com o texto constitucional, a censura previa,. em regimen normal, s se pode exercer sobre espectaculos e diverses publicas; excluidas, portanto, esto as censuras prvias

Derecho Administrativo, voI. IH, pg. 215. F. FlLEINER, Droit Administratif Allemand, pg. 248, nota 6. (28) WALiNE, Manuel lementaire de Dtoit Administratif, pg. 310. O. RANELETTI, La Polizia de Siccurezza in Primo T'1'attato de 0'1'lomdo. vo1. IV. parte 1.0, pg. 744.(27)

(26)

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da Imprensa e da correspondencnia, qualquer que ella seja, postal, telegraphica radiographica, telephonica, etc. Em estado de emergencia, porm, ou estado de guerra, as garantias constitucionaes relativas a esses assumptos, achamse expressamente suspensas, visto como ellas se comprehendem nas medidas de policia ao estado de emergencia, e, a fortiori, de guerra, autorisadas explicitamente pelo atr. 166 da Gonstituio Federal (30). Censura cinematographica Mais recente do que a censura theatral ou de imprensa, pela ordem natural das cousas a censura cinematographica. Reveste-se, alm do mais, de rigor ainda maior. Mesmo na Allemanha que, como vimos, pela Constituio de Weimar, havia abolido a censura theatral prvia, ficou, no entretanto a censura cinematographica em plena execuo. (31) O mesmo occorre na Frana e na Inglaterra (32), especialmente neste ultimo paiz onde grande o rigor das leis e das autoridades na sua applicao. Na Frana ella est entregue a um regimen burocratico, executada por funccionarios despidos de todo caracter especialisa do. A censura cinematographica tem por fim especialmente proteger a moral publica e evitar possiveis difficuldades politicas internas ou externas, permittindo a exhibio de certos films provocadores de odios, luctas e resentimentos politicos de toda ordem. Entre ns a censura cinematographica foi inicialmente levada a effeito, apenas como uma extenso da lei sobre a cen- sura theatral. (33)

(29)

ARAUJO CAsTOO, A Nova Constituio Brasileira.

BoNTES DE MIRANDA,

Commentari08 Constituio. (30) V F. FLEINER, Droit administrati!, pg. 248, nota 7. Ver tambem o artigo 118, n. 2 da Constituio de 1934. (31) BARTHELEMY, Prcis de Droit administrati!, pg. 200. {32) Ver no paragrapho anterior o estudo sobr~ a cEln~Ur~ theatral..

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Smente pelo decreto 14.529 de 9 de Dezembro de 1920 ficou o assumpto regulado em lei especial. Actualmente a Commisso de censura cinematographica organisada de accordo com o decreto 21.240 de 4 de Abril de 1932 e as instruces de 22 de Abril de 1932 modificadas pelo decreto 24.651, de 10 de Julho de 1934 e pela portaria de 26 de Agosto de 1935. (34) A censura prvia dos films, visa especialmente a verificao da conveniencia na sua exhibio ou sob o ponto de vista moral ou politico. A restrico sob o ponto de vista moral attinge principalmente a prohibio da frequencia dos menores, o que t.em motivaJdo divemos recursos judiciaes (35). No existe at hoje, entre ns, uma prohibio exJpressa da entrada de menores nas casas de diverses publicas, limitando-se a aco da commisso de censura a uma simples advertencia, de effeito puramente platonico, pois que fica ao criterio dos paes ou dos responsaveis a frequencia dos menores indica'dos. No entretanto grande numero de paises adoptam o systema mais rigoroso que consiste em vedar expressamente a entrada de menores, de accordo com as reSipeCti'vas edades e a natureza .do filmo A lei alIem de 12 de Maio de 1922 prohihe expressamente a entrada de menores de 18 annos, acompanha;dos ou no, em divertimentos'que lhes possam ser nocivos. A Belgica, pela lei de 1 de Setembro de 1920 e decreto 11 de Maio de 1922, prohibe a entrada de menores em cinemas desde que as fitas sejam consideradas impropriaos.. Da mesma maneira o Luxemburgo, a Noruega, a Suecia, a HolIanda, a Italia, a Polonia, etc. (36). Nos E,stados Unidos, o rigor no

nores.

(33) Ver o Diario Olfi.ial de 27 de Agosto de 193&. (34) V;er () Acc. da Orte de .A!ppellao d{) Districto Federal, de 1 de Mar.o de 1928. Ver, tambem, ALVARENGA NETTO, Codigo de Me-

Codigo de Menores. (35) Estas indicaes for.am obtidas no Relatorio da C'ommisso de; Censura dnematographica ,de 15 de Julho de 1935.BEATRIZ SOFIA MINEIOO,

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menor, na confeco dos films, salvo naquelles destinados it exportao (37).

Quanto s razes politicas que exigiriam a interveno da .autoridade policial, bastaria citar como exemplo a "Garonne" cuja exhibio poderia ser considerada como umapropaganda desfavoravel aos habitos de moralidade do :povo francez. Motivou a sua emibio uma interveno policiaL O Governo francez, deante do successo escandal)so do filro, prohibiu a sua exportao, deixando o escandalo para o uso interno daquelle paiz (48). Aconteceu, porm, que o film veiu para o Brasil, motivando ..a sua exhibio uma interveno da Embaixada franceza. Provocou a aco policial um recurso dos interessados ao 'Poder Judiciario, recul'lso que mereceu provimento, porque, se:gundo verificou o Juiz OCTAVIO KELLY, que proferiu a sentena, achava-se o film devidamente censurado e supprimidas -as scenas de escandalo que haviam provocado a iniciativa do ,Governo francez. O recurso ao Poder Judiciario constitue, n entretanto, (caso muito excepcional, porque, geralmente, a censura respeita muito as susceptibilidades internacionaes, como QCCorreu, notadamente, com o film "Misso Ide Amor", que motivou, igual:1Ilente, uma reclamao do Governo do Mexico (39).

Ver ARMANDO VIDAL, O Teatro e a Lei, pg. i29 e sega. BARTHELEMY, Prc;is de DroitPubc;, pg. 200. (38) JS ecises judiciaese lLfego - Limitaes a circulao - Vehi'culos - Seus conductones - Oondies de capacidade.

Policia do trafego Uma das manifestaes de maior interesse e opportunidade do exercicio do poder de policia aquella que diz com o trafego, em suas dififerentes modalidades . . EspeCialmente o trafego de vehiculos de traco urbana, . deve ser 'aqui examinado, deixando a policia das estradas de ferro e o trafego aereo para quando tratarmos ido assumpto em capitulo proprio. A ,policia do trafego pode interessar, ou ao regimen mesmo Ida utilizao da via 'Publica sob o ponto de vista administrativo, e neste caso temos a policia das concesses; ou, ento, s medidas de ordem propriamente de preveno policial, e, neste CMO, comprehende-se dentro 'do ,poder de policia em seu sentido restricto. E' este ultimo aspecto que aqui nos interessa. Deve, assim, attender s seguintes questes principaes:.~

a)b) c)

condies do conductor; condies do vehiculo; condies da circulao e do transito .

. . .Cada um desses elementos precisa ser considerado isoladamente. Smente a regulamentao de cada um delles e a

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sua disciplina e obediencia, podem levar a uma perfeita regularidade do trafego. A natureza dos vehiculos, as condies de capacidade pessoal dos seus conductores, os diversos problemas relacionados com a velocidade, a direc.o do trafego, a segurana dos passageiros, tratando-se especialmente de. tranS>pOrte coIlectivo, as horas de trafego, o estacionamento, o barulho, so outras tantas questes que interessam aco da policia do trafego em seu sentido mais restricto, sem falar nos problemas rbanos de caracter mais premente, que exigem das administraes municipaes grandes esforos. A ligao que existe entre os dous problemas, isto , o da policia do trafego e o do urbanismo propriamente dito, os tem caracterisado como da esphera nitidamente Municipal. No Estado de So Paulo, o servio de transito foi organizado .pelo Estado para tornar effectivo o cumprimento do Regulamento geral, pela Directoria do servio de transito (1). No Districto Federal, a Inspectoria do Trafego, como todo o s'ervio policial, acha.-se a cargo ria Unio, embora a fiscali~ zao das concesses e as licenas para a eXiplorao das linhas de bondes omnibus estejam a cargo da Prefeitura, que :regulamenta os alludidos servios. A legitimidade do poder de ,policia, em materia de regulamentao do trafego, decorre da necessidade de attender aos interesses da collectividade, ligados segurana do publico, sua tranquillidade, socego e facilidades de trans1J)Orte de toda natureza. Nesse terreno, muito amplo o poder 'de policia. O prin-:cipio da limitao legal desse poder e a exigencia de uma expresso formal especial, de caracter legislativo, no se coadu.:. nam com as necessidades do ,publico. Assim, por exemplo, a determinao da direco do trafego, a' circulao \dos vehiculos, no podem estar subordinados: a determinaes e~ressas d lei, mas apenas a instruces,

(1) Regulamento baixado pelo decreto 6.856 de 10 de Dezembro. de 1934. t

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portarias e outras medidas regulamentares, expedidas de accordo com os interesses do transito publico e da circulao dos vehiculos. Muitas vezes, cireumstancias occasionaes, como as condies de viabilidade das estradas ou ruas publicas, exigem o desvio do trafego, a mudana na sua direco, e outras limitaes que attingem directamente a liberdade na circulao dos vehiculos e mesmo dos pedestres. Pois bem, essas limitaes acham~se comprehendidas como um ,presupposto do exercicio do poder de policia, sem o qual este tornar-se-ia uma fico, . impossivel de ser exercido. No , portanto, indispensavel uma determinao legal para legitima-lo, porque eUe existe comlo razo de ser da propria auto!"idade. Naturalmente que a medida dessas attri'buies discricionarJas varia de accordo com as ci'.'cumstancias, com o lugar, etc. Quando se exerce dentro do dominio privado, ella muito menor, soffre desde logo a limitao natural decorrente do direito de ,propried'ade. Tudo o mais est subordinado vontade do particular, do proprietario, daquelle que exerce os direitos inherentes ao dominio, di!"eitos que devem ser respeitados, emquanto no ferirem os de terceiros. 'J nos lugares abertos ao publico, maR no do dominio publico, aautorildade age com maior liberdade. A sua proteeo sobre o publico maior. Finalmente, quando se trata da via publica, nenhuma restrico de dominio pode-Ihe ser opposta. Maior a sua liberdade. Quem regula o seu uso, pode-se dizer, a autoridade publica, que exerce o poder de policia em toda a sua plenitude, dentro das leis e regulamentos em vigor, mas, com a necessaria discrio inhe!'ente natureza de sua funco. Este o quadro fixado com muita felicidade por WATRIN, em sua magnifica monographia sobre a policia de circulao na via publica (2), quadro que pode se!' bem applicaJdo aos principios vigentes entre ns.(2) GERMAIN WATRIN,

La police de la circulation

SUT

les voies pu-

bliques pg. 14 e segs.

-15

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Ao prefaciarmos este livro,a;dvertimos da extenso da mate"!'ia nelle tratada e mostrmos como seria preciso incluir essa materia em um trabalho que comprehendesse um volume para cada aspecto differente do direito administrativo, porque cada um del1es deveria ter o desenvolvimento de uma verdadeira monographia. Pois bem, a questo Ido trafego e dos di!"eitos que se podem comprehender no desenvolvimento do assumpto, bem um exemplo. Deve--se attender, na regulamentao do poder de policia, aos seguintes elementos:a) b)

c)

d)

ao ao ao ao

conductor do vehiculo; proprio vehiculo; trafego propriamente dito; regimen repressivo, fiscal e penal.

I - O CONDUCTrOR DO VEHICULO precisa satisfazer condies pessoaes, ,physicas, technicas, fiscaes, que o autorizem a dirigir o vehiculo. Direito de conduzir As provas de habilitao variam, naturalmente, de accord